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Até as Portas de Moscou
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Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

RELATOS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

Até as Portas de Moscou

 

                  

 

25 de Agosto a 7 de Dezembro de 1941

 

Desastres

O Fuhrer tem sempre razão! Nunca a confiança fanática do General Jodl pareceu mais justificada. Os resultados da batalha da Ucrânia ultrapassam todas as esperanças e todos os precedentes.

 

A temeridade de Budienny coopera com a vitória alemã. Ele amontoa 6 exércitos soviéticos, com um milhão de homens, cujas duas únicas linhas de cooperação são as ferrovias, extremamente expostas, de Kiev a Kursk e a Kharkov, na enorme saliência formada pelos cursos do Dniéper e do Desna. A finalidade desta colossal imprudência é a conservação de Kiev. A grande cidade forma, na margem ocidental do Dniéper, uma cabeça-de-ponte defendida por 11 divisões, cuja completa destruição ultrapassa as possibilidades do 6o Exército alemão. A propaganda soviética pode sustentar que, na décima semana de guerra, nenhuma das grandes cidades da URSS foi conquistada pelos hitleristas, mas, para oferecer tal espetáculo de prestígio, todo um grupo de exércitos é posto a perder.

 

Uma conseqüência mais positiva da resistência de Budienny é a evacuação das indústrias da Ucrânia. A ordem foi dada no começo de agosto. No dia 7, começara a mudança da laminação de tubos de Diniepropetrovsk e, no dia 14, a da siderurgia de Zaporojie, especializada em aços finos. A mesma transferência ocorre em todos os territórios ocidentais da Rússia européia. Um milhão e meio de vagões e de plataformas deslocarão, de julho a novembro, 1.360 estabelecimentos industriais, dos quais 419 provenientes da Ucrânia e 498 provenientes de Moscou. Serão remontadas 450 nos Urais, 210 na Sibéria ocidental e 250 no Casaquistão, no coração da Ásia. Tal movimento, em uma precária rede ferroviária, embaraçada com transportes de tropas, representa um desses tours de force russos inexplicáveis, segundo as normas técnicas do Ocidente.

 

Estas usinas em marcha, são talvez, a razão pela qual o OKH é levado a acreditar que Budienny evacua o Oeste da Ucrânia. Em conseqüência, as disposições tomadas visam a fechar a pinça o mais a leste possível, a fim de prevenir a retirada, no espaço russo, das massas inimigas. A manobra merece o qualificativo de gigantesca. De Krementchug, no Dniéper, de onde deve partir o ataque de sul, à região de Roslavl, de onde deve se lançar o de norte, a distância em linha reta ultrapassa 600 km. Ainda que algumas estradas, os principais rios sejam orientadas de leste para oeste, as operações dirigidas segundo os meridianos beneficiam-se com um mínimo de facilidades e encontram um máximo de obstáculos. Deve-se fazer os eixos de comunicação girarem 90o, enviar o abastecimento através da estepe, contornar as florestas, os pântanos e as areias. Estas dificuldades materiais, reunidas à resistência de um inimigo superior em número, tudo isto coroado de um êxito total, fazem da batalha da Ucrânia a obra-prima da Wehrmacht.

 

O ataque ao norte, é desencadeado no dia 25 de agosto. É conduzido pelo 2o Exército, de Von Weichs, composto dos 13o, 33o e 35o Corpos de Exército e pelo 2o Grupamento Blindado, reduzido aos 24o e 47o  PK. Os soldados que entram na Ucrânia, saindo da miserável sombria Rússia Branca, apreciam o contraste. “As espessas florestas tornaram-se exceções, a região e os habitantes causam melhor impressão, as casas são floridas, as pessoas mais limpas, melhor vestidas e mais cordiais...” Porém, as distâncias continuam exaustivas e a poeira é mais espessa ainda do que nas cercanias de Minsk e de Vitebsk.

 

O primeiro grande obstáculo é o Desna, quase tão largo quanto o Dinéper e, como este, complicado por um dédalo de ilhas arborizadas. Na ala direita da frente de ataque, o 2o Exército estabelece laboriosamente uma cabeça-de-ponte, levando consigo o 6o Exército, que completa o cerco de Kiev. Na ala esquerda, as Panzerdivisionen de Guderian dão à ofensiva aspecto mais vivo. As 17a e 18a derrotam os russos no curso superior do Desna. A 3a, comandada por um brilhante comandante de divisão, o Tenente-General Model, avança para Novgorod-Seversky, onde uma ponte de madeira com 700 metros de comprimento atravessa o rio. O Oberleutnant Buchterkirch mergulha em violenta barragem de artilharia, à frente de um pequeno destacamento blindado, e conquista a ponte, antes que os russos tenham tempo de incendiá-la. Budienny responde com enérgicos contra-ataques, sacrifica sua aviação acima da ponte perdida, atira seus carros blindados em massa, tenta manobrar nas retaguardas inimigas, obriga o pessoal dos serviços auxiliares inimigos a combater, inclusive o de uma padaria de campanha, que se cobre de glória em Korop. Mas a cópia dos métodos alemães exige um aprendizado sangrento que os russos ainda não concluíram. No fim de uma semana, a resistência no Desna se desmorona. O Sejn é travessado por sua vez. A estrada de ferro de Kursk é cortada em Konotop. Romny é tomada. A 250 km nas costas dos defensores de Kiev, os carros de combate marcados com um G branco de Guderian, precipitam-se ao encontro dos tanques marcados com o K de Von Kleist.

 

No Grupo Sul, a travessia do Dniéper, rio extremamente largo, a jusante de Krementchug, deu lugar também a uma façanha militar. No dia 31 de agosto, na hora mais improvável, às 2 da tarde, e no local mais inesperado, uma calha de 1.500 m de largura, o 207o Regimento de Caçadores lança seus botes de assalto e alcança a margem esquerda. Ao cair da noite, os caçadores subiram as escarpas que margeiam o rio e conquistaram uma cabeça-de-ponte de 3 km. O outro regimento da 27a Divisão passa, por sua vez, seguido da totalidade do 52o Corpo. Como no Desna, os russos fazem um esforço desesperado para restabelecer a integridade da barreira do Dnieper e lançam várias brigadas blindadas contra a cabeça-de-ponte. A coordenação é má, do lado alemão: os tanques da testa da 16a DP, vanguarda do Grupamento Blindado de Von Kleist, somente atravessam o rio no dia 11 de setembro. Durante 11 dias, tendo pela retaguarda um dos rios mais largos da Europa, um corpo de exércitos isolado quebra incansavelmente vagas sucessivas de infantaria, de cavalaria e de carros blindados. Como Napoleão até o momento em que deu lições de guerra à Europa, o Comando alemão ainda pode pagar seus erros com a superioridade tática de seus soldados.

 

A junção dos dois grupamentos blindados é feita no dia 16. Os restos do Grupo de Exércitos Budienny encontram-se comprimidos no triângulo Kiev-Tcherkassy-Priluki. O 2o exército aperta o lado norte. Os grupamentos blindados dilaceram o flanco leste. Os reconhecimentos aéreos relatam imagens incríveis desse bolsão gigantesco, no qual se debatem mais combatentes do que a Wehrmacht cercou em Flandres. Grandes colunas de infantaria, massas de cavalaria e carros blindados, comboios de toda natureza, movem-se em desordem sob uma formidável nuvem de poeira. O 8o Flieger Korps martela implacavelmente esses vencidos. Toda direção de conjunto e todo comando desapareceram. As tropas alemães arrebatam uma presa colossal. Tomam até fábricas encaixotadas, já carregadas nos trens que não tiveram tempo de partir.

 

No dia 18, fracassa a última tentativa de levantar o bloqueio do Grupo Budienny. Kiev sucumbe no dia 19. O vasto bolsão é subdividido. Uma enorme massa russa está isolada pelo 6o Exército entre Borispol e o Dnieper. O 2o Exército fez junção com a ala esquerda do 17o Regimento, contornando pela retaguarda a batalha agonizante, a ala direita deste último, o 52o e o 55o CE, já invade a Ucrânia oriental, toma Poltava e Krasnogrado. Jamais a Wehrmacht fez, de uma só vez, tantos prisioneiros: 655.000. Muitos morrem de fome, sem que se trate, aliás, de qualquer crueldade sistemática do Exército alemão, mas sim pela impossibilidade de alimentar tantos cativos em um país devastado.

 

Nesta vitória, quase sem comparação na História, há um único ponto negro: o tempo. A chuva começou e cair no dia 3 de setembro, e não se compreendeu logo que ela nada tinha de comum com as tempestades dos princípios do verão. É uma chuva sem barulho, uma chuva forte e densa, atrás da qual não há mais o sol ardente que secava em alguns minutos o lodo superficial formado pelas nuvens de tempestade. A lama que nasce desta chuva metódica adquire uma consistência e uma força de sucção extraordinárias. O solo transforma-se num atoleiro e, em um país sem estradas pavimentadas, o menor deslocamento exige esforços e demoras incríveis. Guderian levou 5 horas para percorrer 75 km e, depois de várias vezes, os horários alemães foram perturbados pelas péssimas condições do tempo e do solo. Ainda não é o Schlammperiod (período da lama), a rasputitsa, a estação sem caminho dos russos; é apenas uma amostra.

 

Hitler decide: “Nach Moskau!”

 

A vitória da Ucrânia é um triunfo pessoal para Hitler. Mais uma vez, contra a oposição de seus generais, ele cobriu de glória as suas bandeiras. Depois de tantas lições de audácia, é uma lição de prudência que acaba de dar. Eles queriam marchar diretamente sobre Moscou, fascinados, como Bonaparte, pelo nome da cidade, deixando o flanco aberto a um exército de um milhão de homens! Ele, Hitler, ficou com a verdade estratégica, destruindo primeiro a ameaça. Provou, nesta operação magistral, a flexibilidade e os recursos sempre renovados de seu gênio. A batalha de cerco da Ucrânia, extrapolação gigantesca da batalha de Cannes (entre os cartagineses de Aníbal e os romanos, 216 a.C.), é o inverso da batalha de Sedan. Clássico e revolucionário, estrategista e psicólogo, tático e visionário, o Fuhrer ganhou o título que lhe outorga a pequena corte melancólica de Rastenburgo: o maior general de todos os tempos...

 

É neste momento que Adolf Hitler toma, pessoalmente, a direção das operações na Rússia. O OKH lhe parece como um órgão inútil, como uma interposição deformante entre os estímulos que dá a resposta dos executantes. Angerburgo, a partir da batalha da Ucrânia, é apenas um transmissor de ordens. As vastas sínteses estratégicas que Franz Halder continua a fazer tornam-se simples confidências para seu diário secreto: já não lhe é permitido abrir a boca diante do Fuhrer. E como Keitel e Jodl são apenas máquinas que dizem “sim”, é definitivamente consigo mesmo que Adolf Hitler tomará, daqui para diante, os conselhos.

 

Ele se encontra diante da mais grave decisão de sua carreira aventurosa. Sua intenção era abater a Rússia com uma só campanha e acabar com ela antes do fim de 1941. Será possível ainda? Ou será preciso reconhecer que a aniquilação do Estado soviético deve ser adiada para o ano seguinte - e assim Hitler deve conformar-se com uma campanha de inverno?...

 

A batalha da Ucrânia terminou no dia 26 de setembro. A guerra entra no quarto mês. Assim, já foi necessário consagrar à Rússia duas vezes mais tempo do que à França - enquanto todos os peritos concordavam em dar ao Exército francês um coeficiente de valor duplo ou triplo do Exército russo. A primeira surpresa veio da coragem dos combatentes - enquanto se supunha que o patriotismo estivesse destruído pelo bolchevismo e se contava com o desmoronamento do moral. A segunda surpresa provém da abundância de material e, notadamente, do número de carros blindados russos. A terceira surpresa reside na rapidez com que o Exército soviético - como certos organismos primitivos - se reconstitui. Halder, que qualificava a Rússia como um colosso de pés de barro, o constata: “Começamos a guerra prevendo 200 divisões inimigas; encontramos 360. Destruímos uma dúzia; surge uma nova dúzia!”. Hitler não experimenta a menor surpresa. As palavras que deixa escapar diante de Guderian, ele repete diante dos íntimos: “Se soubesse, não teria começado esta guerra. São coisas que se pode dizer quando se tem a vitória na mão”. Noutras palavras, o Fuhrer está consciente de ter corrido o risco. Está igualmente certo de que sua estrela não o abandonou e que o perigo está superado.

 

Essa última convicção é alimentada pela batalha da Ucrânia. Ela parece atestar que a capacidade de reconstituição do inimigo chega ao fim e que sua vontade de combater está, finalmente, quebrada. Grande número de prisioneiros rendeu-se apressadamente. Muitos oficiais superiores maldisseram o regime e vilipendiaram o Alto-Comando vermelho. Muitos soldados eram reservistas idosos e muitas unidades de formação recente tinham somente um armamento incompleto. O valor do Exército Vermelho era maior do que o Estado-Maior Alemão imaginara. Os esforços para destruí-lo foram mais violentos do que se tinha previsto. Mas, assim mesmo, o resultado está sensivelmente alcançado: o inimigo não se agüenta mais.

 

O estado do Exército alemão, pelo contrário, não inspira inquietações. No dia 1o de setembro, segundo aniversário da entrada da guerra, Alfred Jodl mostrou ao Fuhrer um quadro comparativo: as perdas alemães se elevaram, durante esses dois anos de hostilidades, a 418.805 homens, dos quais 90.441 mortos e 29.687 desaparecidos; durante os dois primeiros anos da Primeira Guerra Mundial, a cifra alcançara 3.117.797 dos quais 416.672 mortos e 371.321 desaparecidos. A guerra hitlerista, assim, custa 8 vezes menos do que a guerra imperial e, por este baixo preço de sangue, Adolf Hitler, após ter conquistado a Europa, está jogando a Rússia para a Ásia!

 

Comparativamente, o material sofreu mais que os homens. Os relatórios dos exércitos estão repletos de enumerações de carros blindados, da canhões, de caminhões, de transportes de munições e de víveres, de ambulâncias, destruídos pelo fogo ou afundado na lama. O déficit de cavalos é muito importante, e será ainda maior, com os cavalos alemães suportando mal o clima russo e sem que haja grande remonta feita às custas do inimigo. Apesar disso, Hitler sabe que não devem ser encaradas tragicamente as queixas dos comandantes de unidades. Toda guerra se ganha com restos contra restos. Os dos russos, depois da perda de 3 milhões de prisioneiros e de um imenso material, são ruínas. O dos alemães são consideráveis. Os efetivos da infantaria não chegaram a diminuir 15%. De 70 a 80% dos tanques dos grupamentos blindados números 1, 3 e 4 foram repostos. O Grupamento Blindado n° 2, que pagou por um longo desvio pela Ucrânia, será recompletado apenas com 50% de seus carros de assalto. Ainda é percentagem satisfatória para acabar uma campanha.

 

A única consideração que preocupa é a data. O verão está terminando. As chuvas de advertência do começo de setembro cessaram, mas a verdadeira estação da lama se aproxima. Ela enlodaça a guerra, como a tudo mais, e depois vem o frio com todo seu vigor. Se o Exército alemão parasse agora, organizasse seus aquartelamentos de inverno, restabelecesse as comunicações, organizasse suas conquistas, estaria estabelecido em um magnífico mapa de guerra e poderia colocar-se bem para receber em condições toleráveis o assalto do General Inverno. Em compensação, é temerário empreender em outubro, mesmo contra um inimigo enfraquecido, a série de operações de grande envergadura que continuam no programa da Wehrmacht para 1941: completar a ocupação da Ucrânia, conquistar a Criméia, avançar no Cáucaso, tomar Moscou, alcançar a linha Astracã-Arkhangelsk! As distâncias e a pobreza das comunicações representam, por si só, handicaps quase proibitivos.

 

Mas Hitler é prisioneiro do calendário que formulou. Desfazer-se da Rússia, em 1941, é indispensável ao desenrolar de seus planos. Uma campanha de inverno significa que a Wehrmacht ficará imobilizada no Leste até o verão de 1942. A Inglaterra, que devia ser abatida na primavera, recebeu nova trégua. Os Estados Unidos, desde o Pacto do Atlântico, passaram a um estado de quase-beligerância. A Rússia pode encontrar um segundo fôlego com a ajuda das potências ocidentais. A ocupação do Irã indica que os Estados Unidos e a Inglaterra estão prontos para os maiores sacrifícios a fim de ajudá-la. A transferência das forças russas do Extremo Oriente para a Rússia européia - conseqüência da aproximação russo-japonesa favorecida por Hitler - está em curso. “De Chita a Krasnoiarsk - narra um viajante do Transiberiano - contei 200 trens militares rodando para o Oeste. Cada trem era composto de 25 vagões, 10 para a tropa, os outros para o material, inclusive aviões encaixotados...” Deixar passar o inverno eqüivale, pois, a permitir a reconstituição de um grande exército russo contra o qual se terá que recomeçar uma campanha quase ganha.

 

Uma razão de prestígio pesa nas condições de Hitler. Durante a preparação da campanha, ele se opôs com vigor à concepção de uma vitória em dois tempos. Era a idéia de Brauchitsch, que queria contentar-se, em 1941, em tomar Leningrado; de Rundstedt, que considerava o máximo possível a conquista de uma linha Odessa-Kiev-Orscha-Riga; de Kluge, que tinha em vista um avanço frontal até Moscou, após o que seriam estabelecidos novos planos para 1942. Contra essa coalizão de espíritos timoratos, Hitler manteve a opinião de que a totalidade dos objetivos estratégicos e econômicos poderia ser e seria alcançada em 1941. Foi por isso que se recusou categoricamente a ouvir aqueles que lhe falavam em equipar o exército contra o grande frio. “Não quero mais ouvir falar - declarou - nas dificuldades que nossas tropas possam encontrar durante o inverno. Proíbo que alguém me fale disto. Pois não haverá campanha de inverno...” seria necessário, agora, que ele se desmentisse! Enquanto se está apenas em setembro, o tempo se tornou esplêndido; o calor excessivo caiu, o solo está duro como asfalto, o flagelo da poeira diminuiu de intensidade, o inimigo está batido e os soldados cobrem os muros de seus acampamentos e as chapas dos veículos com as palavras Nach Moskau!

 

A 15 de setembro, Hitler prescreve o recomeço da ofensiva em toda a frente. Fixa a data: 2 de outubro. Dirige ao Exército e ao povo alemão duas proclamações, frisando o caráter grandioso da peripécia que começa: “Esta última batalha do ano significa o esmagamento de todos os responsáveis pela guerra, inclusive a Inglaterra! Afastareis do Reich alemão e da Europa um perigo igual àquele que representaram os Hunos e os Mongóis... Falo assim porque o inimigo já está batido e nunca mais tornará a se levantar...”

 

Para esta última batalha na Rússia, importantes modificações foram introduzidas no dispositivo alemão. A ofensiva deve recomeçar do golfo da Finlândia ao mar de Azov, mas a dosagem das forças traduz a hierarquia dos objetivos.

 

Ao norte, Leeb se limitará a apertar o cerco de Leningrado. Não procurará tomar a cidade, pois o Fuhrer a considera como neutralizada e não está disposto a alimentar os 2 milhões de habitantes que a povoam. “Nenhuma capitulação será aceita... Nenhum soldado alemão deverá penetrar no interior de Leningrado... Brechas tão estreitas quanto possível permitirão o êxodo da população para o interior da Rússia, mas quem quer que tente abandonar Leningrado, refugiando-se nas nossas linhas, será repelido a bala...” Para estas tarefas os blindados são inúteis. O 18o Exército, de Von Kuchler, é reduzido, assim, a 10 divisões de infantaria, que prosseguirão, contra a numerosa guarnição da antiga capital, numa guerra de trincheiras.

 

O outro exército do norte, o 16o, de Busch, está em posição em torno do lago Ilmen. Conserva, além de 13 divisões de infantaria, o 39o Corpo Blindado, de Schmidt, com 2 Panzer e 3 divisões motorizadas. A razão desta dotação de unidades rápidas é a ofensiva insólita prescrita a Busch. Ele deve atravessar o Volchov e atacar em direção do Nordeste. O único objetivo estratégico nesta direção é Arkhangelsk - mas ela está separada das posições alemães por 200 km de florestas compactas já tomadas pelo inverno. Hitler, entretanto, recusa-se a renunciar a este movimento ofensivo excêntrico. Busch tomará, na primeira etapa, o entroncamento ferroviário de Tichvin, tomar as jazidas de bauxita de Boksitnogorsk e fará junção com os finlandeses, no Svir.

 

Uma impressionante convergência de meios foi realizada para o grupo de exércitos principal, o do Centro. Leeb cedeu-lhe seu grupamento blindado, que, transportado para o centro da frente, formará 5 Panzer, 2 divisões motorizadas e 2 divisões de infantaria. Rundstedt, se seu lado,. É despojado de 5 divisões de infantaria, 2 Panzer e de uma divisão motorizada. Para a operação Tifun (Tufão), nome convencional da ofensiva contra Moscou, o Marechal von Bock vai dispor das forças mais poderosas jamais agrupadas sob o comando de um general subordinado: 22 corpos de exército, 46 divisões de infantaria, uma de cavalaria, 15 blindadas, 9 motorizadas, 6 de polícia, uma brigada de cavalaria das SS - totalizando 100 grandes unidades, que representam perto de um milhão de homens. As forças aéreas compreendem os 7o e 8o Flieger Korps, formando a 2a Luftflotte, sob o comando do Marechal Kesselring.

 

Recursos imensos, é verdade! Adolf Hitler emprega na batalha do Moskova, o décuplo dos efetivos que Napoleão pusera em linha em Borodino. Seu problema é o mesmo: bater, de maneira decisiva, a principal massa russa antes de fazer sua entrada em Moscou. Mas, embora tão importante que sejam por si mesmos, os recursos de Von Bock só podem ser apreciados de uma maneira relativa. De Veliki Luki a Romny, a frente do Grupo de Exércitos do Centro mede, em linha reta, 750 km. Bock, assim, ataca em uma frente que é o quádruplo da frente ofensiva de toda a Wehrmacht em 12 de maio de 1940, enquanto a densidade de estradas de que dispõe representa apenas um décimo da rede ferroviária franco-belga. Suas forças aéreas são de uma fraqueza impressionante. Que significam 549 aparelhos de reconhecimento, sobre uma área geográfica imensa, coberta de espessas florestas? Um simples corpo blindado em Sedan podia contar com um apoio aéreo tão importante.

 

Este poderoso Grupo de Exércitos Von Bock está subdividido em três massas, compreendendo, cada uma, um exército e um grupamento blindado. Strauss e Hoth, ao norte, com o 9o Exército e o 3o Grupamento Blindado, compreendendo, no conjunto, 5 Panzer e 17 divisões de infantaria, das quais 2 motorizadas. Kluge e Hoeppner, ao centro, com o 4o exército e o 4o Grupamento Blindado, com 5 Panzer e 15 divisões de infantaria, das quais 2 motorizadas. Weichs e Guderian, ao sul, com o 2o Exército e o 2o Grupamento Blindado, com 5 Panzer e 20 divisões de infantaria, das quais 4 motorizadas. Todas estas forças devem, primeiro, participar da batalha de cerco, que, segundo os termos da Diretiva n° 35, deverá “aniquilar o Grupo de Exércitos de Timochenko”. Depois, a ala esquerda e a ala direita atravessarão o meridiano de Moscou para ira até as margens do Volga, de Rybinsk a Gorki. A força do centro cercará e tomará Moscou.

 

O “Grupo de Exércitos Timochenko”, que e trata de bater de maneira decisiva, já estivera em Baranovitch, Minsk, Borissov, Vitebsk, Smolensk e Roslavl. Participa desta assombrosa faculdade de reconstituição de que se maravilha Halder. Em julho, a rota de Moscou estava aberta: a aviação assinalava um completo vazio a leste de Smolensk. No começo de outubro, o serviço de contra-espionagem alemão estima que o Grupo de Exércitos Timochenko está reconstituído em razão de 62 divisões de infantaria, 9 de cavalaria, 11 brigadas ou divisões blindadas, mais umas 20 divisões mal identificadas, suportando sem descanso uma sucessão de fracassos sangrentos, obrigando os alemães, com sacrifícios, a evacuar a saliência de Jelna. Depois, em setembro, cessaram os ataques; os russos refugiaram-se na defensiva, confirmando a impressão de que alguma coisa se quebrou no Exército soviético. Em compensação, prosseguem os trabalhos de fortificação com energia intacta: nunca se removeu tanta terra quanto durante o outono de 1941, diante do objetivo atacado, Moscou.

 

Ao sul do Grupo Centro, o Grupo Sul se prepara, igualmente, para recomeçar a ofensiva. A vitória de setembro, na Ucrânia setentrional, abriu, realmente, um vazio completo. A aviação assinala vastas regiões totalmente desprovidas de tropas inimigas. Rundstedt, depois das cessões que fez ao Grupo Bock, ainda possui 35 divisões de infantaria, 3 Panzer, 3 divisões motorizadas e mais 6 brigadas romenas, 2 brigadas húngaras, uma eslovaca, um regimento croata e 3 divisões italianas, que Mussolini conseguiu fossem aceitas por Hitler. Teria sido possível fazer com que estas forças consideráveis participassem na ação contra Moscou, seja prolongando até Voronej a frente de ataque do Grupo Centro, seja, de preferência, constituindo uma massa de reserva. Mas esta não é a concepção de Hitler. No Sul, mais do que em qualquer outro lugar, chegou o momento da exploração da vitória - e é no Sul que se encontram os principais objetivos econômicos. Longe de se concentrar para o esforço final, o Exército alemão ainda se abre como um leque.

 

O 6o Exército, de Reichenau, com 12 divisões de infantaria (DI), tomará Kharkov. O 17o exército, de Von Stupnagel, com 14 DI, conquistará as grandes aglomerações industriais e a foz do Donetz: Losovaya, Slavjansk, Artemosk, etc. O 1o Grupamento Blindado, de Kleist, com 3 DP, 2 DI motorizadas e 1 DI, o ajudará nesta tarefa, conquistando Stalino por sua ala esquerda; pela ala direita, tomará Rostov e estabelecerá uma cabeça-de-ponte no Don, em direção de Maikop e Batum. O 11o Exército, com 8 DI, estará empenhado em uma direção ainda mais excêntrica: reforçado pelo pequeno 3o Exército romeno, tomará a Criméia e, depois, atravessará o estreito de Kertch, para participar do assalto ao Cáucaso. Como seu chefe, Von Schobert, fez uma aterragem fatal em um campo de minas, Hitler chamou paras substituí-lo o hábil Manstein, que para isso foi retirado da frente de Leningrado.

 

Diante do Grupo de Exércitos Rundstedt, encarregado de tantas missões divergentes em uma imensa frente de 1.200 km, o serviço de contra-espionagem alemão enumera dois grupos de exércitos russos, na frente sudoeste e na frente sul, compreendendo, respectivamente, o 40o, o 21o, o 38o, o 6o, o 12o e o 18o, o 37o, o 9o, o 56o e o 51o exércitos soviéticos, com um total de 82 grandes unidades. Se a Ucrânia do Norte parece quase sem defesa, a rota do Cáucaso e os limites da Criméia, em compensação, estão barrados por forças poderosas. Mas admite-se que se trata de formações medíocres e que a Wehrmacht pode desprezar o cálculo dos efetivos.

 

9 de outubro: primeira neve

 

Dois de outubro, data da ofensiva alemã, é um dia ideal, fresco e luminoso. Em Moscou, houve um acontecimento importante. Uma missão anglo-americana, chefiada por Lorde Beaverbrook e Averell Harriman, assina com Stalin um acordo pelo qual as duas potências ocidentais precisam a ajuda que se obrigarão a entregar à URSS, de 1o de outubro de 1941 à 1o de julho de 1942: 3.000 aviões, 4.000 carros blindados, 30.000 caminhões, 100.000 toneladas de combustível, etc. Em troca, o Governo soviético dá uma espécie de adesão à Carta do Atlântico, fazendo, em todo caso, retirar dos benefícios que ela promete a liberdade de opinião e de religião. Os russos recebem com altivez a ajuda que lhes é dada, declaram que isso não é mais que uma pobre substituição à abertura de uma segunda frente.

 

Moscou ainda está longe da guerra. Desde 22 de julho, a Luftwaffe dirige alguns reides intermitentes contra a cidade: os aviões topam com uma artilharia antiaérea infernal e são mínimos os estragos que causam. Os abrigos são raros e as missões diplomáticas procuram a segurança, dispersando-se pelas datchas (casos de campo) suburbanas. A camuflagem da cidade, em compensação é sensacional. O Kremlin foi convertido em edifício de apartamentos e o Teatro Bolshoi é substituído por um labirinto de ruelas. A população parece indiferente e cansada. As notícias da frente publicadas com grande atraso, referem-se unicamente aos combates que se desenrolam nas duas alas, na Ucrânia e em Leningrado. Falou-se do setor central, em agosto, para celebrar a heróica defesa de Smolensk e, em setembro, para cantar a retomada de Jelna. Os moscovitas tem a impressão de que uma vitória defensiva fora alcançada diante da capital e que a frente que lhes interessa diretamente está estabilizada para o inverno. Esta convicção é a mesma de Timochenko. Quando o ataque do Grupo Centro é desencadeado, a surpresa é total. As fortificações construídas pelos russos, a terra que estes removeram, as divisões que foram reconstituídas, tudo é inútil. Mais uma vez, o Exército soviético se desmorona completamente diante do assalto da Wehrmacht. Esta, apoiando-se nos resultados já obtidos, avançaria com mais ímpeto.

 

Ao norte da frente de ataque, as unidades Panzer do 3o Grupamento Blindado atravessaram a posição fortificada em uma manhã. O 41o PK, a 1a DP e a 36a Motorizada cobre a manobra, dispersando as unidades russas que defendem o entroncamento rodoviário de Blejoi. O 51o PK, a 6a e a 7a DP avançam diretamente sobre Viazma. Eis Cholm e, novamente, o Dniéper, bem próximo de sua nascente. Uma brigada blindada soviética contra-ataca, mas o confronto dos tanques ainda dá vantagem aos alemães, que lançam uma ponte sobre o rio nascente e continuam a correr para sudeste. Viazma, onde Napoleão insultou Berthier, é uma pequena cidade de uns 20.000 habitantes, em um vale verde. Os russos a defendem penosamente. O grupamento blindado toma a cidade em 7 de outubro, apenas cinco dias depois do início da ofensiva. Mais uma vez, combate com a frente voltada e a retaguarda exposta para leste, enquanto o 5o, o 6o e o 8o corpos vem ao seu encontro através das massas inimigas.

 

O braço sul da pinça de Viazma não mostrou poder menor de perfuração nem velocidade menor na exploração da abertura. No dia 8 de outubro, a 10a Panzer, de Hoeppner, e a 7a Panzer, de Hoth, dão as mãos em um campo de batalha juncado de uma quantidade prodigiosa de material inimigo. A agonia do novo “caldeirão” dura somente cinco dias. Os russos se rendem em massa. Novamente intermináveis colunas de prisioneiros põem-se a caminho para o Oeste, semeando a estrada de homens mortos de disenteria e de privações.

 

A ala direita do grupo de exércitos tem maior trabalho. A batalha da Ucrânia fez Guderian descer até Romny, entre Kiev e Kharkov, a 700 km de Moscou. É preciso, agora, que ele torne a subir para o Norte, com a dupla missão de cercar as divisões russas que se encontram na região de Briansk e, por Tula, cortar as comunicações de Moscou com o sul da Rússia. Os caminhos são tão ruins que a menor coluna de caminhões os arrebenta e qualquer chuva os transforma em lamaçais. Voando sem cessar de um PC a outro, em seu Fieseler-Storch, Guderian se assusta com o tipo de dissolução que a extensão da frente fez com que sofresse o poderoso e numeroso grupamento blindado sob seu comando. Cem carros de assalto de substituição, que finalmente conseguiu arrancar de Hitler, são bloqueados em Orscha pelas dificuldades ferroviárias. Seus corpos de infantaria e seu 48o Corpo Blindado ainda estão no coração da Ucrânia. Divide em duas as forças que tem sob seu comando. O 24o PK, de Geyr von Schweppenburg, marcha para nordeste com um movimento tão rápido, que os bondes ainda circulam quando os tanques irrompem nas ruas de Orel. O 47o PK, de Lemelsen, bifurca-se para noroeste, a fim de cortar a estrada ao 3o e ao 13o Exércitos russos repelidos para leste pelo 2o Exército alemão. É preciso combater constantemente, às vezes contra os T 34, tão difíceis de destruir. No dia 9 de outubro, dois bolsões são fechados; um ao sul, o outro a leste de Briansk, em uma paisagem branca, pois a primeira nevasca caiu na véspera. Mas a fraqueza do 2o Exército não permite limpar por completo as profundas florestas da região, nas quais unidades inteiras vão reunir-se aos elementos empenhados em guerrilhas.

 

A dupla vitória de Viazma e de Briansk não é menos triunfal. Igual à batalha da Ucrânia. Foram destruídas 80 divisões; 663.000 prisioneiros capturados. As condições táticas destes grandes sucessos sublinham a sua perfeição. Ataca-se um inimigo entrincheirado atrás de uma frente contínua, na qual era preciso, antes de manobrar e cercar, abrir uma brecha com ataque frontal. Esta dificuldade suplementar não retardou de um único dia a vitória. A frente foi atravessada em toda parte desde o primeiro assalto. O russo é um adversário duro como o couro, que sabe utilizar o terreno e freqüentemente se bate com obstinação. Entretanto, mesmo no combate defensivo, que mais lhe convém, é incapaz de fazer frente à infantaria alemã. Hitler sustenta que o pior de seus soldados é melhor que o melhor dos soldados estrangeiros. A confrontação está, agora, feita com todas as nações militares do mundo: por conseguinte, é conclusiva.

 

A infalibilidade continua a revestir o Fuhrer. Sem ser tão retumbantes quanto a vitória do centro, as operações nas alas não trazem nenhuma catástrofe, como receavam os generais, com uma dispersão de esforços tão grande.

 

No Grupo Norte, a queda de Leningrado estava próximo quando Hitler, em 15 de setembro, retirou dos assediantes seus aviões e carros blindados. Schlusselburg fôra tomada de assalto pela 20a Divisão Motorizada. O 46o Corpo Blindado tinha atravessado as defesas e alcançava os limites da aglomeração. As 1a e 291a divisões abriram caminho até o golfo da Finlândia, isolando diversas divisões russas no bolsão de Orianenburg. A guerra de cerco sucedeu a esta ofensiva, sob a chuva fria que gela os soldados. Em compensação, o 16o Exército atravessou o Volshov rumo a Tichvin.

 

No Grupo Sul, o 6o e o 17o exércitos avançam através das grandes regiões industriais do Donetz. No extremo sul, Von Kleist e Manstein cercaram um exército russo nas margens do mar de Azov e o destruíram, fazendo 65.000 prisioneiros. O grupamento blindado continua sua marcha para Rostov-sobre-o-Don, enquanto o 11o exército recebe o encargo de conquistar a Criméia, forçando o istmo de Perekop.

 

Movimentos tão divergentes criam, entre os exércitos, hiatos com que os generais tendem a se amedrontar, e que tentam reduzir. Hitler vigia, para que não cedam à timidez. Descontente com Heinrich von Stulpnagel, tira-o do comando do 17o Exército, que é confiado a Hoth. Este transmite seu grupamento blindado a Reinhardt. Intervém duas vezes, porque o Corpo de Exércitos Rundstedt tenta subir para o Norte, procurando alinhar-se na ofensiva do Centro. É preciso que o Volga e o Cáspio sejam alcançados antes do Natal e que o petróleo do Cáucaso comece a alimentar a economia de guerra alemã em 1942.

 

Bruscamente, o pânico apodera-se de Moscou. A queda de Orel e de Viazma concretiza a aproximação da invasão. A censura abafa as notícias, mas os rumores correm, pintando a situação com as cores mais sombrias. No dia 15 de outubro, nada pode dissimular aos moscovitas que o Corpo Diplomático e o Governo abandonam a cidade. Um trem abarrotado leva os embaixadores para destino desconhecido. Outro trem leva os ministros, os altos funcionários e o Corpo de Baile do Bolshoi. Os víveres são raros, as paradas, em plena estrada, para deixar passar os trens de tropas duram horas e é uma horda esfomeada que, depois de 5 dias de viagem, desembarca em Kuibytchev, no Volga, a 900 km de Moscou. Falta uma única figura no trem governamental: Stalin. Ficou no Kremlin - mas não sabemos, ainda hoje, se foi com a intenção de sepultar-se em suas ruínas ou se esperava reunir-se à capital provisória no último instante.

 

O relato do que se passou em Moscou nessa época é igualmente incerto. Segundo a história oficial, o Partido Comunista tomou a defesa nas mãos, galvanizou as massas, arregimentou os trabalhadores, identificou-se com grande esforço patriótico da capital e da nação. Segundo outras fontes, o Partido Comunista se desagregou, os altos funcionários fugiram e os número dos aderentes se multiplicou. Explodiram desordens, lojas foram saqueadas, e policiais, assassinados. Foram os militares que retomaram o controle da cidade. Substituindo Timochenko, que Stalin enviara para comandar o Sul, George Zhukov, chegando da Sibéria, tomou a direção da frente central. Decretou o estado de sítio, reprimiu as desordens, mandou fuzilar os soldados debandados que apareceram nos subúrbios. A população foi convocada. Procissões de formigas humanas deixaram Moscou e se dirigiram para os dois fossos contra tanques, que Zhukov fizera cavar em torno da capital. Do alto do céu, os aviões alemães viam uma fina linha negra, um verdadeiro cinturão humano sobre o qual lançavam panfletos com versos mal feitos: “Mulherzinhas de Moscou - Não tenham tanto trabalho - Pois nossos grandes tanques chegam - E encherão os pequenos fossos”. O rádio exaltava o patriotismo e lembrava 1812. Mas as estradas do Leste se cobriam de fugitivos e multidões imensas tomavam de assalto as estações de Kazan e Iaroslavl.

 

No dia 14 de outubro, novas instruções são dadas aos exércitos do Grupo Centro. Cercarão Moscou. O 9o Exército e o 3o Grupamento Blindado se dirigirão para Riev e Kalinin. O 4o Grupamento Blindado passará pelos limites da cidade, ao norte. O 4o Exército atingirá a frente de Mojaisk-Kaluga e depois retomará a progressão até os subúrbios ocidentais da cidade. O 2o Exército, assim que tenha limpado os bolsões de Briansk, se dirigirá para sudeste, a fim de fechar a brecha que está aberta entre o Grupo Centro e o Grupo Sul. O Grupamento Guderian, promovido ao título de 2o Exército Blindado, tomará Tula e Kolomna. Como em Leningrado, o Fuhrer proíbe aceitar a capitulação da cidade. É preciso obrigar sua população a fugir, tangida pela fome ou pelos bombardeios para que ela aumente, com seu êxodo, o caos reinante nas províncias orientais da Rússia. Somente se entrará em Moscou quando esta estiver vazia. Uma ordem particular de Hitler prescreve fazer explodir imediatamente o Kremlin.

 

Os generais, mais uma vez, estão em desacordo com as diretivas de Hitler. Bock as considera inexeqüíveis. Queria concentrar suas forças, atirar-se sobre Moscou, tomar a cidade com um ataque frontal e lá se manter pelo restante de 1941. Enquanto isso, Hitler já traça nos mapas os eixos das progressões ulteriores: Kalinin-Iaroslavl, Moscou-Gorki, Kursk-Saratov... Ele não renunciou à intenção de ocupar toda a linha do Volga antes do Natal.

 

Na realidade, mesmo o movimento limitado desejado por Von Bock é, momentaneamente, impossível. Uma primeira catástrofe meteorológica acaba de se abater sobre o Exército alemão: há muita lama.

 

As grandes chuvas, misturadas com nevascas prematuras, começaram em 10 de outubro. Os alemães as esperavam, mas, apesar de suas experiências polonesas na Primeira Guerra Mundial, estavam longe de prever a amplitude do fenômeno no coração da Rússia. Todos os rios saem dos leitos. Inundações a perder de vista fazem surgir obstáculos intransponíveis. Os caminhos desaparecem em uma lama sem fundo. Os veículos se enterram até o eixo, os cavalos até o ventre. A marcha torna-se um calvário, com a lama transbordando acima das botas, incorporando-se às fardas, maculando o rosto, sujando as armas, manchando os alimentos. Todo bivaque se torna impossível e, como as casas foram incendiadas, as tropas exaustas deixam-se cair na lama. O frio ainda não é intenso, mas a umidade o torna penoso e os pedidos de roupas de inverno continuam sem resposta. Aliás, nada mais chega da retaguarda, além de um pouco de pão. Os sapadores restabeleceram, com esforço titânico, as ferrovias até Smolensk, Gomel, Dniepropetrovsk, mas a colocação de uma terceira linha ainda não está terminada e, pela falta de material rodante russo, o rendimento continua extremamente baixo: dois trens de 400 toneladas por dia - uma miséria - na linha para Moscou. Das estações mais próximas das tropas em posição, restam a percorrer distâncias que alcançam, às vezes, 200 km. Os caminhões, construídos para as estradas da Europa, atolam-se e quebram-se. Seria necessário dispor-se de correntes, para aumentar a aderência dos pneus, e de tratores com lagartas, para rebocar os veículos. Pensar-se-á nisto para as próximas campanhas de outono. O mundo considerava a Wehrmacht como o instrumento de guerra mais bem regulado, o mais inexorável que jamais fora construído; não se duvida que houve um fracasso de previsão e que é uma improvisação o que Adolf Hitler, temerariamente, empreendeu na Rússia.

 

É na Ucrânia, na terra negra, que a lama alcança a maior intensidade. “No outono - diz o provérbio ucraniano - uma colherada de água produz um balde de lama”. Outro provérbio diz que na Ucrânia não se encontra nem uma vara nem uma pedra para enxotar um cão. Com exceção das regiões de forte densidade industrial, aí as estradas sólidas são desconhecidas. O Grupo Kleist (transformado em 1o Exército Blindado), em marcha para Rostov, deve resignar-se a esperar o gelo, para retirar os veículos do mar de lama. As tropas vivem apenas das batatas que encontram nas fazendas, já que está suspenso todo abastecimento. A amplitude das destruições deixa-as espantadas. Todas as localidades estão queimadas, todas as fábricas estão pilhadas, toda as pontes foram pelos ares. Todos os silos estão destruídos, milhares de cabeças de gado apodrecem no campo. Contudo, ainda é graças aos cavalos prisioneiros de guerra, atrelados aos telegas camponeses, que os alemães ainda conservam alguma mobilidade. A maior parte de seus próprios cavalos, como os de Murat, estão mortos de privações, mas os cavalos ucranianos são admiráveis: agüentam tudo.

 

No Centro a situação não é nada melhor. Existe no mapa uma linha majestosa, a auto-estrada de Moscou; mas o que é uma única via, quase sem conexões laterais, quando se trata de abastecer cinco exércitos? Além disso, a auto-estrada tem uma única pista de rolamento, inacabada, cujo cimento se interrompe por várias léguas e cujas partes sólidas estão recobertas por um metro de lama. O rio de veículos que ela suporta avança somente com infinitas penas. No dia 20 de outubro, a velocidade do escoamento do tráfego motorizado cai para 3 km por hora, entre Gjask e Mojaisk. No dia seguinte, cai a zero. Cinco mil caminhões carregados de víveres, de munições e de combustível ficam presos no lodo, sem esperança. A auto-estrada já não funciona.

 

Tenta-se passar para a antiga estrada do correio - a estrada napoleônica: é melhor passar pela planície. Finalmente, como na Ucrânia, são os cavalos russos e as carroças camponesas que salvam o grupo de exércitos de uma paralisia total.

 

A esse fenômeno natural, reúne-se um fenômeno humano ainda mais inesperado: a aparição dos guerrilheiros. A teoria está em Karl Marx: “Uma nação que combate pela sua liberdade não está obrigada a observar as leis da guerra. Levantes em massa, procedimentos revolucionários, guerrilha generalizada, tais são os únicos meios pelos quais lhe é possível resistir a um adversário materialmente superior...” Pré-datando a teoria, o precedente histórico de 1812: os camponeses sublevados atormentam o Grande exército, seqüestrando estafetas, massacrando os retardatários. Apesar de sua obsessão pelos franco-atiradores, os alemães não levaram a sério a consideração de um perigo que parecia pertencer a um passado romântico. A segurança das retaguardas está confiada a meia-dúzia de divisões chamadas de segurança, compostas de velhos soldados do Exército Territorial, fracamente armados. O SD, Sicherheit Deinst, ramificação militar da Gestapo, reúne a elas temíveis especialistas em repressão, mas seus meios militares são irrisórios: 4 Einsatzgruppen, cujo efetivo global não ultrapassa 4.000 homens. Ninguém imagina que a luta contra os guerrilheiros possa tomar a forma de verdadeiras operações. Alguns enforcamentos serão suficientes para fazer desaparecer toda a veleidade de brincar de guerra com a Wehrmacht...

 

A desilusão chega rápido. O OKH, desde 25 de julho, alertou o Exército contra as sabotagens das comunicações. O duro Reichenau, em outubro, dá ordens repressivas ao 6o Exército, que fazem Halder declarar: “Todo oficial decente deve jogá-las nas cestas de papéis”. Mas, da sossegada Prússia Oriental, Halder não mede o caráter implacável desta luta sem lei. Os soldados isolados capturados pelos guerrilheiros são torturados, empalados, profanados. Represálias bárbaras respondem em vão a esses atos de barbaridade. As zonas de insegurança se estendem. Conta-se onze, desde o outono, na zona do Grupo de Exércitos Norte, das quais uma, de Dino a Cholm, mede 100 km de diâmetro. No centro, as regiões florestais de Briansk, de Orscha, de Vitebsk, e as regiões pantanosas de Borodino, de Nevel, de Glusk tornam-se antros que seria preciso dezenas de milhares de homens para limpá-los. Nas frágeis comunicações dos exércitos alemães, a ação fustigante dos patriotas russos se intensifica dia a dia.

 

O avanço prossegue apesar destas dificuldades. Odessa é tomada no dia 16 - mas, em uma façanha militar notável, 70.000 homens da guarnição são retirados, pelo, mar, para Sebastopol. A conquista da Criméia começa dois dias depois: o 11o Exército começa o assalto às linhas de Perekop e delas se apodera após 10 dias de combate. Na Ucrânia meridional, o 1o Exército toma Stalino e, no dia 30 de outubro, atravessa o Mius, última barreira antes de Rostov-sobre-o-Don, antecâmara do Cáucaso. Na Ucrânia setentrional, o 6o Exército entra em Kharkov no dia 24, depois de ter patinado na lama de uma maneira fantástica. No Grupo Centro, os dois bolsões de Briansk são esvaziados de 17 a 25. O 2o Exército Blindado chega, no dia 30, diante de Tula, que o Regimento Grossdeutschland em vão tenta tomar de surpresa. Diante de Moscou, o marechal das vanguardas, Von Kluge, instala seu PC em Maloiaroslavets, quase na linha de fogo: seu 13o Corpo apodera-se de Kaluga e o 57o Corpo toma Borovsk, a 80 km do Kremlin. O 4o Grupamento Blindado, mais ao norte, progride no eixo da auto-estrada: a 7a DI e a 10a DP conquistam o povoado e a estação de Dorochovo, onde identificam a 82a Divisão soviética, chegando da Mongólia Exterior depois de três semanas de viagem pela ferrovia. Finalmente, o 9o Exército e o 3o Grupamento Blindado se aproximam de Rjev.

 

Hitler, em Rastenburgo, não tem qualquer razão para recear que a campanha da Rússia esteja fracassando. Irrita-se com a lentidão com que prossegue a marcha para frente, mede impacientemente o caminho que falta percorrer até o Volga, atormenta Bock, mandar dizer a Guderian que não compreende por que ele “não aumenta a cabeça-de-ponte no Oka com a ajuda de suas unidades rápidas”. Porém, no conjunto, o plano é cumprido. O OKH já não está pessimista. Generais que se revestirão de uma clarividência retrospectiva, como Halder, julgam que a situação se torna definitivamente favorável, que o russo está batido e que é possível alcançar, antes do inverno, os objetivos essenciais da campanha. Nem Hitler, nem Brauchitsch, nem Keitel, nem Jodl, nem Halder foram à frente uma única vez, para ver com seus olhos as condições do terreno, das tropas e do inimigo. O Alto-Comando alemão cai no erro que foi fatal, no ano anterior, ao Alto-Comando francês: conduz a guerra abstratamente.

 

Concretamente, o Exército alemão se esgota. A lama o mata. Para marchar sobre Tula, Guderian manda revestir de tábuas a estrada, mas esse assoalho improvisado desaparece na lama e as unidades rápidas (Hitler censura-o por não saber utilizá-las) são incapazes de ultrapassar a velocidade de um homem a pé. Elas alcançam, aliás, o limite da deterioração. Restam 50 carros de assalto ao 24o Corpo Blindado, que Guderian reagrupa sob o comando do Coronel Eberbach, reduzindo duas divisões blindadas a uma fraca brigada. O desgaste da infantaria não é menor. As perdas estatísticas ainda não alcançam 20% dos efetivos engajados em junho, mas a maioria das companhias caiu ao efetivo de uma seção. A artilharia deixou os canhões na lama. Os homens estão esfomeados. O General Heinrici observa que seu corpo de exército não come pão há 15 dias. O calçado está gasto: muitos infantes marcham com botas esburacadas e sem sola. Todas as manhãs o Feldgrau, uniforme da Wehrmacht, parece mais fino, sob a brisa cortante, cada vez mais cruel. Muitos soldados não tem cobertores: jogaram-nos fora, no verão. O exército ainda marcha estoicamente. Mas o moral está alterado, pois a realidade desmente uma propaganda que, depois da vitória de Viazma, tinha proclamado que o Exército Vermelho deixara de existir. Os homens que combatem diariamente contra um adversário aparentemente indestrutível ruminam amargamente as fanfarronadas do Doutor Goebbels.

 

Estrategicamente falando, a característica da ofensiva é a total ausência de reservas. Todas as divisões estão em linha. Não mais existe qualquer possibilidade de manobra para uma Wehrmacht que, há alguns meses, obtinha suas vitórias mais pela manobra do que pelo combate. Um esforço bergsoaniano leva adiante uma frente linear contra uma crescente resistência de coisas e de homens. Hitler receia de tal forma uma mudança na vontade dos generais, que proíbe a organização de posições de recuo. Para evitar uma campanha de inverno, ele recusou-se a distribuir agasalhos de inverno; para afastar a possibilidade de um recuo, não permite que se cave o solo. Para abolir a lama, a neve, os maus caminhos, o desgaste das unidades blindadas e dos calçados, ele se recusa a ir vê-los.

 

Uma conferência reúne-se em Orscha, em 13 de novembro. Halder convocou os chefes de estado-maior dos grupos de exércitos. Escuta suas lamentações e suas sugestões. A de Von Leeb duvida ser possível prosseguir a ofensiva contra Tichvin. A de Von Rundstedt leva a advertência categórica do marechal: o Exército não agüenta mais, chega o inverno, é tempo de parar a ofensiva. A de Von Bock sustenta, pelo contrário, que é necessário continuá-la. Veio o gelo, solidificando o solo, permitindo recuperar os veículos enterrados e restabelecer os transportes. O frio permanece moderado e há sol. Pode-se contar com quatro semanas deste pré-inverno, antes das baixas temperaturas e das neves profundas. A única coisa impossível é hibernar nas linhas atuais, no meio de um país devastado. É preciso ou tomar Moscou ou retroceder às posições do começo de outubro, recuar 200 km, conceder a vitória ao inimigo, abandonar um terreno regado de sangue... É preferível um último esforço. As tropas estão prontas a fazê-lo, para alcançar o fim que nunca deixou de ser o delas desde o começo da campanha: Moscou.

 

A advertência dos chefes de estado-maior não tem qualquer importância. Hitler tomou suas decisões e Halder é apenas seu ditafone. Ele transmite as ordens que traz para aquilo que, apesar do adiamento da estação, recebe o nome de Herbstoffensive, ofensiva de outono. Não somente Moscou será tomada, mas os objetivos previstos para 1941 - Maikop, Stalingrado, Gorki, Vologda, Iaroslavl - continuam válidos. O Fuhrer exige que a Wehrmacht, no mínimo, não pare antes de uma linha que parta do lago Onega e vá até Rostov pelas cidades de Rybinsk, Tarbov e pelo curso inferior do Don. Isto representa avanços de 200 a 600 km para os exércitos, mas, segundo Halder, a resistência diante de Moscou é o último esforço de um Exército Vermelho agonizante. O inimigo já não está em condições de manter uma frente contínua do Báltico ao mar Negro. Ele se retira da região entre o Don e o Volga para se entrincheirar no triângulo Moscou-Satatov-Vologda. É este último bastão que, de uma vez por todas, se trata de quebrar.

 

O Japão escolhe a guerra

 

Trágica temeridade de Hitler! Enquanto se exaure na Rússia, a guerra inacabada no Oeste se volta inexoravelmente contra ele. Forças imensas se levantam contra o Reich.

 

A trégua é quase total para a Inglaterra. Os reides aéreos praticamente cessaram. Os submarinos são tão bem combatidos, que o número de suas vítimas cai de 154, em abril, para 34, em novembro. Melhor aprovisionada de matérias-primas, livre dos ataques aéreos que interrompiam a produção, a indústria inglesa aumenta rapidamente o potencial militar da nação. Com 2.100 aparelhos de primeira linha, a RAF domina. Daqui para diante, a Luftwaffe sobre todos os teatros de operação europeus e africanos. O número de divisões do exército de terra se eleva a 99: 57 das quais 12 de artilharia antiaérea, guardam o Reino Unido, 16 incluem-se no Exército do Nilo, 9 estão no Iraque e no Irã, 8 nas Índias, etc. Apresenta-se o problema do emprego destas forças intactas. A opinião pública, instigada pelos agentes comunistas, pergunta a Churchill se ele vai deixar o Exército inativo enquanto a URSS combate sozinha contra Hitler.

 

O único teatro no qual a Inglaterra julga ser possível aumentar a atividade terrestre é o contorno do Mediterrâneo. A situação é favorável. As forças aéreas alemães de Creta e da Sicília desaparecem, absorvidas pela frente russa. Os comboios ingleses tomam novamente a rota direta de Alexandria. Malta, que vivia sob a ameaça de uma operação do tipo da efetuada em Creta, tornou-se base ofensiva, de onde os ingleses interceptam o tráfico destinado à África do Norte italiana. A proporção das perdas germano-italianas durante a passagem era, em agosto, de 33%; em outubro, se eleva a 63% e, em novembro; Rommel avisa ao OKW que recebeu apenas 8.093 toneladas das 600.000 que lhes tinham sido prometidas. O Afrika Korps conta agora com 3 divisões - 15a Panzer, 21a Panzer e 90a Ligeira. Os italianos reúnem 7 divisões de infantaria e 1 divisão rápida, mas estas forças devem manter o assédio de Tobruk e a insuficiência do abastecimento as paralisa. Tudo se conjuga para permitir que a Inglaterra retome a iniciativa na Líbia.

 

Churchill vê mais longe. Estuda, sob o nome convencional de Whipcord, um projeto de invasão da Sicília com forças transportadas da Inglaterra e desembarcadas de surpresa. Mas os chefes de estado-maior se opõem. Ainda se está em outubro, a Wehrmacht continua vitoriosa e a possibilidade de Hitler fazer voltar pelo menos um terço de seu exército da Rússia é encarada para os dois meses seguintes. E, assim, contra-indicado arriscar uma resposta alemã e enfraquecer a defesa do Reino Unido quando uma nova Seelowe pode surgir.

 

Contenta-se, assim, com a reconquista da Cirenaica, designada sob o nome convencional de Crusader. O 8o Exército (nome novo do Exército do Nilo) é colocado sob as ordens do conquistador da África Equatorial italiana, o Tenente-Coronel Sir Allan Gordon Cunningham. Seu irmão, o Almirante Sir Andrew Browne Cunningham, comanda as forças navais, e um quase homônimo, o Vice-Marechal-do-Ar neozelandês Arthur Coningham, comanda a aviação. A guarnição de Tobruk, composta de 5 brigadas, participará da ofensiva com uma surtida. Os ingleses consideram que têm superioridade de 2 para 1 nos carros blindados e de 4 para 1 nos aviões. Esperam, diz a ordem do dia redigida por Churchill: “uma página da história que se igualará a Blenheim e a Waterloo...”

 

A ofensiva começa a 18 de novembro, sob chuvas torrenciais. Cinco dias antes, o luto cobriu a Marinha: um dos primeiros submarinos enviados por Doenitz ao Mediterrâneo torpedeou o Ark Royal e todos os esforços para manter à tona o veterano, reputado como insubmersível, foram inúteis.

 

A guerra entre a Alemanha e os Estados unidos, no Atlântico, continua a se aproximar. No dia 11 de setembro, depois do ataque ao contratorpedeiro Greer, Roosevelt dá a ordem “Atirem primeiro” a todos os navios em patrulha na zona de segurança. Em 31 de outubro, o contratorpedeiro Reuben James não é o primeiro a atirar e é afundado por um U-Boot, acarretando a morte de 115 marinheiros americanos.

 

As negociações com o Japão prosseguem laboriosamente. O Imperador queria salvar a paz: intervém muitas vezes para que todas as saídas diplomáticas sejam exploradas antes do recurso às armas. O Príncipe Konoye, o Embaixador Nomura, muitos estadistas, um certo número de almirantes e um número menor de generais partilham deste desejo. A apreciação do poderio americano, salvo entre uma minoria de fanáticos, é extremamente alta e a perspectiva de uma guerra com o gigante do outro lado do Pacífico é encarado com receio. Por outro lado, o Japão está estrangulado. Embarcou no “incidente chinês”: pode abandonar suas conquistas, voltar ao princípio da “porta aberta”, renunciar ao campo de expansão pelo qual pagou sacrifícios tão pesados? Optou pelo Sudeste Asiático, pelas riquezas da Indochina e da Indonésia: pode enterrar-se, aceitar sua continuação como potência dependente dos alimentos indispensáveis à sua indústria? É o que os Estados unidos lhe pedem e, para conseguí-lo, o estrangulam. O embargo sobre o petróleo criou uma situação dramática. O Japão armazenou combustível para um ano de hostilidades; se consumir esta reserva insubstituível, não mais terá nem óleo para seus navios nem gasolina para seus aviões. Se a guerra é fatal, é melhor que venha logo. Mais tarde, será muito tarde.

 

Em 6 de setembro, uma conferência reúne em Tóquio, sob a presidência do Imperador, os chefes civis e militares do Japão. O nervosismo é extremo, pois nenhum povo é mais emotivo e todos percebem o caráter fatídico do debate. Faz-se uma lista de “exigências mínimas”: não-intervenção anglo-americana na questão chinesa, fechamento da estrada da Birmânia e supressão da ajuda a Chiang Kai-check, liberdade de acesso do Japão às matérias-primas. Se, no começo de outubro, pelos meios diplomáticos, parecer impossível a aceitação destas exigências, então será inevitável a guerra. O Japão prorroga a paz por um mês.

 

O Príncipe Konoye tenta utilizar esta curta chance. É um homem muito idoso, muito sensato, que sobrevive há meio século no meio das violentas agitações da política nipônica. Para dar mais força ao Almirante Nomura, mandou a Washington o mais ocidentalizado de seus diplomatas, Sabura Kurusu, marido de uma americana, e não desespera de todo de realizar uma conciliação. Mas, em 7 de outubro, o Ministro da Guerra Tojo, pede-lhe audiência. É para apresentar o ultimato do Exército: este não admitirá que a retirada das forças japonesas da China seja considerada nas negociações com os Estados Unidos. Konoye compreende: pede demissão mas, desta vez, sem esperança de voltar.

 

O novo Primeiro-Ministro é o próprio General Tojo. A linha divisória entre a guerra e a paz está transposta. O ataque a Pearl Harbor se prepara há uns dez meses, independentemente das flutuações políticas. O promotor da idéia é o comandante-chefe das esquadras japonesas, Almirante Isoroku Yamamoto. Ele conhece o poderio dos Estados Unidos e preferiria que não houvesse a guerra do Pacífico. Se houver, é preferível que se desenrole da melhor maneira possível para o Japão. Ele deve andar depressa, levando em conta a modicidade de seus recursos, apoderar-se o mais rapidamente possível das ricas presas que cobiça: Hong-Kong, a Malásia, Cingapura, Sumatra, Bornéu e principalmente Java, a cornucópia de abundância do Sudeste Asiático. Será possível? Sim. A guerra da China estendeu ao máximo as forças da nação; as tropas terrestres são em número limitado, mas, por seu lado, as forças inglesas, americanas e holandesas no Sudeste Asiático são insuficientes, medíocres, dispersas, e o domínio do mar abre à agressão japonesa todas as penínsulas e todos os arquipélagos.

 

A Marinha de Guerra nipônica é a mais moderna do mundo: 10 couraçados, 10 porta-aviões, 35 cruzadores, 111 contratorpedeiros, 64 submarinos e mais, em acabamento, 2 supernavios de linha, os maiores jamais construídos, o Yamato e o Musashi, ambos de 63.000 toneladas e com canhões de 400 mm. Este poderio naval e uma estratégia de surpresa prometem ao Japão sucessos iniciais sensacionais.

 

O que inquieta Yamamoto são as conseqüências. Os Estados Unidos contra-atacarão. O Havaí é posição favorável para cair sobre as linhas de comunicações marítimas que a dispersão das conquistas que se têm em vista vai estender perigosamente. É prudente prevenir-se contra este perigo, infringindo tais perdas à esquadra americana, que esta será obrigada, durante certo tempo, a renunciar a todo movimento ofensivo. Yamamoto certamente prevê que os Estados Unidos substituirão seus navios destruídos e farão mais do que isto. Porém os dois ou três anos necessários a esta tarefa permitirão ao Japão, enriquecido pelas conquistas, estabelecer-se solidamente em um perímetro marítimo, desafiar todos os assaltos e esperar vitoriosamente a hora da paz.

 

A elaboração da surpresa de Pearl Harbor começa em janeiro. Yamamoto encarrega disso, o chefe de seu estado-maior, Almirante Tahijiro Ohnishi, que tem como adjunto o capitão-de-fragata Minoru Genda, brilhante tático aeronaval de 36 anos. O banco de experiência escolhido é a baía de Cagoxima, na ilha de Quiuxu, bem ao sul do arquipélago, por causa da semelhança que tem com a enseada de Pearl Harbor. Um excelente serviço de espionagem, baseado no Consulado-Geral do Japão em Honolulu, fornece todas as informações necessárias. As repetições dos ensaios do ataque se multiplicam.

 

Em compensação, nas altas esferas do Comando, o plano de Yamamoto só encontra objeções. O Estado-Maior Geral o rejeita. O comandante dos porta-aviões, Almirante Chuichui Nagumo, não acredita no sucesso. O próprio Almirante Ohnishi se desencoraja e aconselha ao seu amigo Yamamoto renunciar à idéia. Porém Yamamoto é o mais obstinado dos japoneses. Põe sua demissão na balança: não conservará o comando das esquadras combinadas se o Estado-Maior Geral mantiver sua oposição ao ataque surpresa a Pearl Harbor.

 

No dia 5 de novembro, a obstinação de Yamamoto triunfa. O Estado-Maior Geral cede. Salvo um acordo diplomático de última hora, a operação de Pearl Harbor se realizará em 8 de dezembro - data japonesa, correspondente ao dia 7 das ilhas Havaí. Seria preferível o dia 10, devido às condições da lua - mas o dia 7 é um domingo e os americanos têm o costume de fazer os navios voltarem ao porto aos sábados, para que os marinheiros não sejam privados do weekend...

 

Os navios designados para participar do ataque começam a deixar a base de Kure, um a um, em 10 de novembro. Alcançam a baía deserta de Hitokappu, nas Curilas. Lá já é inverno, a neve cobre o arquipélago e as equipagens tiritantes não tem a menor idéia por que razão tantos navios se reúnem em um lugar tão desolado. Os pilotos dos aviões, eles sim, sabem. No dia 5 de outubro, Yamamoto reuniu-se a bordo do Akagi, na baía de Sbibushi. Revelou-lhes a finalidade e a data da operação para a qual trabalharam tão assiduamente. A opinião geral foi de que se tratava de um reide suicida. Oito dias de licença foram concedidos, em seguida. Tendo nas mãos o maior segredo da guerra, convencidos de estarem marcados para morrer, várias centenas de rapazes se dispersaram por todo o Japão. Nada transpirou.

 

Um dos que, naturalmente, ignoram tudo é Adolf Hitler. Pagam-lhe na mesma moeda. A aliança totalitária vai proceder mais uma vez como uma tempestade tão inesperada pelos amigos como pelos inimigos.

 

Moscou a 22 km: a Wehrmacht faz meia-volta

 

A vida volta ao exército alemão na frente russa. Um a um, como os retardatários reunindo-se à bandeira, os canhões retomam o lugar nos grupos de artilharia e os caminhões nos caminhos da frente. Muitos se arrebentam com o esforço dos tratores para arrancá-los da lama congelada, mas ainda há bastante para que seja possível restabelecer as distribuições e guarnecer novamente os depósitos de víveres. As ferrovias são postas novamente em serviço até Rjev e Mojaisk. Aumenta o moral da tropa. O termômetro, à noite, desce até 15 graus abaixo de zero, mas o frio ensolarado das horas do dia permanece suportável e a idéia de tomar Moscou sustenta a coragem. Este nome mágico associa-se a idéia do fim da guerra. A volta das tropas para a Alemanha e a desmobilização do Exército começarão no Natal.

 

Porém, as circunstâncias mudaram profundamente. O Exército alemão ataca no limite do fim de suas forças. Hitler, na sua presunção, esqueceu-se de alimentar as vitórias. Faltaram as ondas de reforço, o material sobressalente, as tropas de reserva, os poderosos meios necessários à restauração da retaguarda. Do Báltico ao mar Negro, a Wehrmacht emprega na sua suprema ofensiva menos de 1.900 carros blindados e 1.000 aviões. As tropas frescas que a ela se juntaram desde o princípio da campanha se reduzem a 2 divisões blindadas, a algumas unidades especiais, a um corpo de exército italiano, à Divisão Azul espanhola e a três batalhões de voluntários franceses, que receberam o batismo de fogo perto do campo de batalha do Moskova. A Rússia, pelo contrário, concentrou seus recursos. As fábricas dos Urais trabalham há seis meses sem que uma única bomba diminuísse sua atividade. As tropas do Extremo Oriente chegam à linha de fogo. Moscou está repleta de todas as vantagens de uma grande cidade: quartéis, mão-de-obra, estoque de víveres e de combustível, aeródromos cimentados, instalações ferroviárias, etc. A posição avançada construída por Zhukov é uma zona fortificada de vários quilômetros de profundidade, partindo de Klin, seguindo o curso do Istra, atravessando o Moskova em Svenirogog e a auto-estrada em Kubinskoye, seguindo depois o Nara até a confluência com o Oka e vindo apoiar-se no baluarte de Tula. As florestas que cercam Moscou servem para a sua defesa, localizando os eixos do ataque nos caminhos. Inumeráveis blockhaus os defendem, campos de minas os calçam, pilhas de árvores cortadas os obstruem e as pontes estão carregadas de explosivos.

 

O ataque começa, em 17 de novembro, com o tempo claro e um frio forte. Os combates são encarniçados. A 2a Panzer, a noroeste de Moscou, fica estupefata ao ver surgir dos bosques de Volokolamsk toda uma divisão mongol em uma carga de cavalaria, brandindo os sabres sob o fogo da artilharia e dos tanques. Alguns dias depois, a mesma 2a Panzer captura o primeiro tanque inglês e ouve as críticas desdenhosas da equipagem sobre as “caixas de ferro branco” que Churchill lhes envia. Apesar do valor da resistência, os progressos nas duas alas do ataque são substanciais. Ao norte, o 3o e o 4o Grupamento blindados se aproximam de Klin, atingindo o canal Moscou-Volga, e forçam, com perseverança, o cinturão fortificado. Ao sul, Guderian combate em uma região com menos florestas, mais povoada, entremeada de aglomerações industriais. Ele toma Jefremov, Jepifan, Dedilovo, Bocholovo, assim como Iásnaia Poliana, berço de Guerra e Paz, onde se percebe a tempo que os russos minaram a sepultura de Tolstoi. Tenta levar seu exército na direção norte, para atravessar o Oka, mas seu flanco direito está descoberto e Tula é um espinho enterrado em seu flanco.

 

Excelentes notícias chegam do Grupo Sul aos estrategistas reunidos em Rastenburgo. Rundstedt tomou, em 21 de novembro, Rostov-sobre-o-Don, porta do Cáucaso. Manstein assedia Sebastopol depois de ter conquistado rapidamente o resto da Criméia. Ao norte, o Grupo de Exércitos Leeb tomou Tichvin - desmentindo o chefe, que dizia não ter sequer meios materiais indispensáveis para semelhante expedição em tal época do ano. Isso reforça Hitler sem eu princípio de ordem: exigir dos generais o que eles chama de impossível, para obter o mínimo.

 

A situação se grava de repente para o Grupo Centro. Em 20 de novembro, antes da estação, uma onda de frio acompanhada de fortes nevascas se abate sobre a Rússia central. O termômetro desce a 30 graus negativos. Muitos veículos motorizados estão fora de serviço, porque não se distribuiu glicerina para os radiadores. A neve e a geada paralisam os transportes. O abastecimento e o combustível deixam novamente de chegar. Como não se pode deixar em funcionamento permanente os motores, é preciso esquentar os carros blindados com a ajuda de grande fogueiras de madeira, se se quer que eles tornem a partir. Os sofrimentos da tropa tornam-se intoleráveis. Regimentos assinalam 400 casos de congelação dos pés. As retiradas são extremamente difíceis e, sob as tendas dos hospitais de campanha, os feridos são congelados vivos. Os homens não recebem a menor refeição quente e alguns têm calças leves, como no mês de agosto. O Exército ainda ataca. O 3o e o 4o grupamentos blindados tomam Klin, atravessam o canal Moscou-Volga, cortam a ferrovia Moscou-Leningrado. Porém o limite das forças humanas está próximo. As perdas de oficiais são terríveis. Muitas companhias são comandadas por sargentos e regimentos por tenentes.

 

Guderian deixa seu PC, em Iásnaia Poliana no dia 23 e voa até Orscha, para descrever a situação da frente a Von Bock. Sugere suspender a ofensiva, utilizar os carros blindados como fortins, equipar as retaguardas e, na primavera, tomar Moscou. Bock deixa que ele fale, depois liga o telefone, chama Angerburgo e, com seu subordinado na extensão do telefone, repete fielmente o que acaba de ouvir. A voz longínqua de Halder responde que não se trata de adiar a tomada de Moscou. A ofensiva deve prosseguir até o limite das forças. O OKH conhece a resolução do Fuhrer e recusa-se a levar-lhe as lamentações dos executantes.

 

Uma advertência inequívoca é dada ao Alto-Comando, cinco dias depois. O principal vencedor da campanha da França, Von Rundstedt, é demitido. Ele tinha tomado Rostov-sobre-o-Don. A cidade, inteiramente minada, explodiu literalmente sob os passos da Leibstandarte Adolf Hitler, vanguarda do 3o Corpo Blindado. As pontes foram dinamitadas, os franco-atiradores se esconderam nos subúrbios e a 128a Divisão soviética contra-atacou com perseverança no Don gelado. O 38o e o 9o exércitos soviéticos, ao norte da cidade, entraram por uma brecha da frente, ameaçando envolver toda a ala direita do 1o Exército Blindado. A 13a e a 14a Panzer de Manteuffel deram meia volta, contiveram o ataque, mas Rundstedt considerou que a ponta de Rostov estava muito exposta e ordenou uma retirada geral para trás do Mius. Era a primeira vez, desde o início da guerra, que um exército alemão recuava! A chave do Cáucaso, Rostov, fora tomada somente para ser perdida uma semana depois! A repercussão foi mundial.

 

O Marechal-de-Campo Gerd von Rundstedt, relatando a retirada que tinha ordenado, acrescentou que não poderia conservar a responsabilidade do Grupo de Exércitos Sul se sua decisão fosse desaprovada. A ordem de entregar o comando ao Marechal Von Reichenau lhe vem logo. A Reichenau chega a ordem de retomar imediatamente Rostov. Ele voa ao QG de Von Kleist, constata a gravidade da situação e, velho hitlerista, ousa telefonar diretamente para o Fuhrer, dizendo que não tem qualquer alternativa senão encurtar a frente, recuando até o Mius. Hitler não insiste. Mas Rundstedt já voltou para a Alemanha e a medida que o atingiu não é revogada.

 

O Don, que desemboca perto de Rostov, nasce perto de Tula. Um dos Corpos de Guderian, o 53o PK, atravessa o rio em 26 de novembro: brilhante operação que ainda rende 4.000 prisioneiros e 42 canhões. Mas os russos replicam, lançando a 239a Divisão Siberiana contra a 29a Divisão Motorizada alemã: esta cede sob o golpe, deixa seus cadáveres espalhados na neve, restabelece-se penosamente no momento em que Guderian, acorrendo, pensa se o golpe de aríete russo não vai acarretar o deslocamento de seu exército. Os esforços mais custosos não conseguem dar aos alemães um sucesso decisivo neste setor.

 

Hoeppner ainda progride ao norte de Moscou. Toma Dimitrov, no canal Moscou-Volga, a 32 km do Kremlin. Toma Istra, depois de combates implacáveis entre os SS da Divisão Das Reich e a 78a Divisão Siberiana. Mas as condições tornam-se cada vez mais difíceis. A obscuridade não se dissipa antes das 10 horas da manhã e se restabelece às 3 horas da tarde. O termômetro cai até 40 graus negativos com breves subidas seguidas de quedas profundas que gelam os homens até a medula dos ossos. Na retaguarda, as locomotivas congelam. Na vanguarda, as culatras dos canhões não se abrem e o mecanismo das armas automáticas não funciona, em conseqüência do congelamento do óleo e do endurecimento da graxa. Tanques devem ser abandonados porque é impossível desgrudar as lagartas do solo. A manteiga fica dura como mármore. O pão é cortado a machado. Teve-se a idéia de enviar um trem de vinho francês para sustentar o moral dos Feldgrauen: chega - enquanto que os obuses não chegam - sob a forma de blocos de gelo rosado, saindo dos vagões arrebentados. Todo ferimento é mortal: os pacotes de ataduras individuais são duros como madeira e um ferido imobilizado congela em alguns minutos. É perigoso satisfazer as necessidades naturais: a urina gela e perecem homens pelo congelamento do anus. Os soldados tem apenas um capote de tecido sintético, botas de couro falso e, às vezes, um cachecol e um par de luvas. Cobrem-se com tudo o que lhes cai na mão, sacos velhos, farrapos de peles encontrados nos isbas. O cadáver do inimigo torna-se uma bóia de salvação, pois os russos estão melhor agasalhados e particularmente suas botas de feltro salvam um homem. Os mortos são postos a degelar em torno das fogueiras dos bivaques e os soldados tiram a sorte pelas roupas que lhes conseguem arrancar.

 

Guderian e Hoeppner atormentam o Marechal Von Kluge. Seu pesado 4o exército, interposto entre os ataques dos blindados, continua parado entre o Moskova e o Oka. Chega até o Nara, afluente deste último, diante de profundas florestas. Sua esquerda alcança a zona das datchas e sua divisão de ala, a 197a, ocupa a colônia de férias dos artistas de Moscou. De noite, as sentinelas vêem o braço de luz da artilharia antiaérea soviética dançando um bailado no céu. Os homens resolvem esperar, abrigam-se do frio o melhor possível, pensam que, segundo o costume, a marcha para a frente recomeçará quando as unidades blindadas tiverem cercado o inimigo. Mas Hoeppner e Guderian protestam contra a imobilidade do vizinho. Ele não está mais servindo, conforme o plano. A última chance de tomar Moscou é que Kluge saia de suas linhas e ataque ao mesmo tempo que eles. Kluge acaba consentindo. O 4o Exército começará a ofensiva em 30 de novembro. Supremo esforço.

 

Nos longínquos QGs bem aquecidos, começa a se fazer uma luz parcial sobre a situação das tropas alemães. Os boletins de informações sobre o inimigo mencionam a entrada em linha de 34 divisões frescas, das quais 20 diante de Moscou, tropas siberianas acostumadas ao frio e equipadas contra o inverno. Do lado alemão, resta como reserva uma só e única divisão, a 255a DI. “Estamos - observa Halder - no limite extremo de nossas forças”. De Orscha, Von Bock telefona, em 1o de dezembro, fazendo longo relatório, contendo esta frase que resume tudo: “O ataque, assim, apresenta-se sem sentido, uma vez que se aproxima o momento em que a força das tropas estará completamente esgotada”. Munido deste documento, Brauchitsch se faz receber por Hitler, com a intenção de propor-lhe a suspensão da ofensiva contra Moscou.

 

Sai da entrevista prestes a ter uma crise de nervos. Hitler cortou-lhe a palavra, cobriu-o de injúrias, humilhou e ridicularizou em sua pessoa a casta arcaica e estúpida dos militares profissionais. Mas eles não ficarão por cima! A ofensiva continua. “Quero Moscou! Terei Moscou! Você não me impedirá de ter Moscou!”

 

O 4o Exército, lá longe, atravessa o Nara e penetra nas florestas da margem esquerda. O trator afasta, diante da tropa, uma neve dura como chumbo. Os instrumentos de óptica ficam desregulados. A gasolina congela. O aço queima como se acabasse de sair do alto-forno. Os invasores avançam, titubeando na tempestade. Os soldados que progridem melhor são ainda os de Hoeppner. A 106a Divisão abre uma brecha até Krásnaia Poliana, subúrbio industrial situado a 27 km de Moscou. A 35a DI, do General Barão Roman, no setor do Istra, toma as aldeias de Alabuschevo, Kajukovo, Matuschkino, e vê, em uma encruzilhada, esta placa: Moscou, 22 km. O grupo de reconhecimento da 258a DI, no setor do 4a Exército, alcança os terminais de bondes, entrevê as torres do Kremlin na fumaça da batalha. Mas isto é apenas uma estreita brecha e, no conjunto, o ataque do 4a Exército fracassou. Von Kluge decide suspendê-lo.

 

Guderian, ao sul da frente do ataque, ainda tentou fazer cair o bastião de Tula. O 43o Corpo cerca totalmente a cidade em 4 de dezembro e sua queda é só questão de horas. Porém Guderian sente que é iminente a contra-ofensiva russa. Grandes grupamentos foram assinalados na região do Oka e estão em curso desembarques na linha de Riazan. Se essas massas caírem sobre o 2o Exército Blindado, distendido e exausto, podem deslocá-lo e destruí-lo.

 

O sol do domingo dia 6 de dezembro, 168o dia da campanha da Rússia, raia em um céu miraculosamente limpo de nuvens de chumbo. Toda a planície se assemelha a um cristal. As grandes florestas de bétulas e pinheiros cintilam sob os capelos da geada. Nunca fez tanto frio. Em Iásnaia Poliana, o termômetro pendurado fora da casa de Tolstoi caiu a 50 graus negativos. Guderian não mais hesita. Chama Von Bock pelo telefone e pede-lhe que dê ordem a seu exército para retirar-se da saliência de Tula. Espremido entre uma batalha perdida e um Fuhrer apavorante, Bock tenta contemporizar. Pede a Guderian que vá à frente, para julgar de perto, antes de tomar uma decisão tão grave. “Pensa que estou em Orel?” - responde Guderian. “Estou em Iásnaia Poliana e combate-se ao lado do meu PC...”

 

No mesmo momento, como se existisse telepatia entre os condutores dos blindados, Hoeppner suspende igualmente a ofensiva, decide reconduzir seu grupamento blindado para o Istra. Os alemães dão meia-volta às portas da capital inimiga! Retirada custosa. Centenas de carros blindados e de caminhões são imobilizados por falta de gasolina ou ficam grudados ao solo, pelo gelo: é preciso destruí-los. Nas unidades com cavalos, tem-se falta de parelhas e é indispensável sacrificar uma parte do material para salvar a outra. Do dia 6 ao dia 12 de dezembro, os russos tomarão 386 carros blindados, 704 tratores, 305 canhões, etc. O tempo claro não dura, o céu se encobre, o vento sopra forte, os soldados alemães vão em pequenos grupos, a arma a tiracolo, em meio a uma espécie de crepúsculo cuja poeira de neve enche as horas do dia. O terrível precedente, que não deixou de atormentar os espíritos desde o começo da campanha, impõe-se como uma força alucinante. A segunda retirada da Rússia começa...

 

Moscou está salva. A Alemanha deixou de ser invencível. Adolf Hitler perdeu a batalha de Moscou, a guerra da Rússia, toda a guerra. Pugilista ligeiro, ele devia abater o monumental adversário no primeiro assalto. Mas os golpes que deu não foram suficientes. A Rússia encontrou um segundo fôlego, esta respiração profunda que tira de sua imensidão. Daqui, por diante indestrutível, apoiada no mundo anglo-saxão, senhor dos mares, ela não vai deixar de pesar sobre a pequena nação européia que é a Alemanha, com todo o poder de um continente. Tudo o que Hitler empreenderá a partir de agira só servirá para adiar a queda, prolongar a agonia.

 

Neste momento, a situação do Exército alemão é terrível. Desde 6 de dezembro contra a ala esquerda do Grupo Centro, desde 7 de dezembro contra a ala direita, os russos passaram à contra-ofensiva. O comando alemão está completamente desprovido de reservas. É preciso, portanto, que as próprias tropas em retirada se restabeleçam, operação difícil, que alguns estrategistas consideram impossível. Em que linha? A única satisfatória é a do Duna e do Dnieper, o que significa que será preciso recuar 500 km até Riga, Vitebsk e Kiev. O precedente napoleônico surge novamente. A retirada, no auge do inverno russo, aniquilou o Grande Exército. Por que 1942 será diferente de 1812? O frio é extremamente rigoroso. As vias de comunicações estão detestáveis. Imenso material embaraça o Exército. Seu emprego é bastante defeituoso, pois dois terços das forças alemães se acham em volta de Moscou, de Dimitrov a Tula, em um setor de 300 km, e as alas estão muito fracas. Agora, o russo está duas vezes no seu elemento: o país e o inverno. O moral alemão, ao contrário, está quebrado pela bancarrota do sonho de tomar Moscou. Uma alma tão forte como Guderian está afundada no desespero, percorrendo planície branca após planície branca na poeira da neve, envolvendo os fantasmas em farrapos que foram os vencedores de Sedan. Chega o momento em que os exércitos da melhor têmpera se dissolvem na desmoralização. A Wehrmacht está à beira do abismo.

 

... No momento preciso em que a guerra se estende novamente de uma maneira colossal, na hora de Pearl Harbor!

                                                                                      

 

                      

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