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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


DEPOIS DA MEIA NOITE / Teresa Medeiros
DEPOIS DA MEIA NOITE / Teresa Medeiros

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

DEPOIS DA MEIA NOITE

 

«Nossa irmã vai casar se com um vampiro»

Quando a sempre prática Caroline Cabot ouviu pela primeira vez essas palavras de lábios de sua fantasiosa irmã menor, acusa a Porta de ter uma imaginação desbocada. O que outra coisa pode pensar se sua irmãzinha vê duendes sob as couves e sereias na baía?

Mas quando descobre que sua irmã Vivienne realmente está sendo cortejada pelo Adrian Kane, o misterioso visconde do que se rumoreia que é um vampiro, ela decide aceitar seu convite para um jantar a meia-noite e fazer sua própria investigação. Porque o que passaria se sua irmã Porta tivesse razão esta vez? E se Adrian Kane fosse um vampiro? Não faria ela então todo o possível para impedir esse matrimônio?

E para sua consternação Caroline logo se encontra apanhada sob o feitiço sedutor do Kane. Depois de tudo... O que deveria fazer uma dama judiciosa quando o pretendente de sua irmã acordada nela algo mais que umas simples suspeitas?

 

*                    *                    *

 

Londres, 1820

Rondava nos becos talheres de névoa, procurando uma presa. Seus passos, suaves sussurros, enquanto se deslizava de sombra em sombra, sua capa ondeava. Embora seu passeio atraiu mais de um olhar de soslaio dos ladrões de carteira e as prostitutas que estavam agachados nos portais, não lhes jogou nem sequer uma olhada. Para ele, a noite não tinha perigos. Ao menos, nenhum que os vivos pudessem proporcionar.

Ultimamente, a escuridão se tornou tanto seu amante como seu inimigo, o que ele desejava ardentemente e do que mais queria escapar. Quando uma rajada de vento fustigou pelo estreito beco propulsando tanto a névoa como as nuvens ante isso, volteou sua cara para a lua, seus sentidos esfomeados pela luz. Mas inclusive seus raios pálidos, chapeados, já não era nenhum bálsamo para a sede de sangue que tinha infectado sua alma. Possivelmente era muito tarde. Possivelmente estava voltando-se quão mesmo caçava. Um predador sem misericórdia ou remorso.

Então ouviu… uma suave onda de risada feminina seguida pelo sob murmúrio de um homem, fumegante com promessas e mentiras. Retrocedendo dentro das sombras, escorregou uma mão dentro de sua capa e esperou a que sua presa aparecesse.

O homem podia ter sido qualquer macho jovem, tenro de um recente triunfo em alguma timba infernal ou bordel do Covent Garden. Sua cartola estava colocada em um ângulo arrogante sobre seus cachos recortados na moda. A mulher caminhava fazendo esses em seu abraço possessivo, era pouco mais que uma moça, sua delicadeza andrajosa e suas bochechas avermelhadas marcando-a como uma de quão cabeças-de-vento permaneciam muito tempo fora dos infernos das salas de jogo, esperando para encontrar um protetor embora fosse por uma noite.

Cantarolando um fragmento de canção de bêbado, o homem a balançou ao redor em uma torpe parodia de uma valsa antes de imobilizá-la contra o farol mais próximo. Seu risinho gritã tinha uma nota de desespero e desafio. Assim que o uva sem semente escorregou uma mão dentro de seu sutiã para cavar seu peito nu, ele enrolou seu grosso cabelo castanho avermelhado ao redor de seu outro punho e inclinou sua cabeça para trás, despindo a curva pálida de sua garganta para a luz de lua.

A visão dessa garganta tão tenra, tão grácil, tão lastimosamente vulnerável avivou uma fome antinatural em seu ventre.

Caminhando a grandes passados fora das sombras, agarrou ao homem pelo ombro e lhe fez girar ao redor. Quando ela viu o brilho animal em seus olhos, a cara bonita da garota se voltou frouxa com temor. Ela tropeçou a uns metros e caiu de joelhos, agarrando firmemente seu sutiã aberto.

Fechando sua mão ao redor da garganta de sua presa, golpeou-lhe ruidosamente para cima contra o farol. Elevou-lhe sem esforço algum, esticando seu agarre até que os pés calçados com botas do homem ficaram agitando-se violentamente no ar e seus gélidos olhos azuis começaram a inchar-se. Nesses olhos, viu tanto medo como fúria. Mas o mais lhe gratifiquem de tudo foi o reconhecimento desolado que veio um momento muito tarde para que importasse.

—me perdoe, companheiro —grunhiu, um sorriso afável curvou seus lábios— Odeio te incomodar, mas acredito que a dama me prometeu esta dança .

 

—Nossa irmã vai casar se com um vampiro. —anunciou Porta.

—Isso é agradável, querida —Caroline murmurou, fazendo outra anotação, claramente delineada, no livro professor aberto no escritório.

Tinha aprendido fazia muito a ignorar a imaginação desbocada e a propensão de sua irmã, de dezessete anos, para o drama.

Não poderia permitir-se abandonar as responsabilidades cada vez que Porta detectava a um homem lobo farejando ao redor do montão do lixo ou caía para trás no sofá em um semi-desvanecimento e anunciava que estava adoecendo da Peste Negra.

—Deve escrever à Tia Marietta imediatamente e insistir que envie a Vivienne a casa antes de que seja muito tarde. Somos sua única esperança, Caro!

Caroline levantou o olhar da coluna de números, surpreendida de encontrar a sua irmã pequena olhando genuinamente angustiada. Porta estava de pé em meio da poeirenta sala, aferrando uma carta em uma mão tremente. Seus olhos azul escuro se viam angustiados e suas bochechas normalmente rosadas estavam tão pálidas como se algum demônio vestido com uma capa lhe tivesse chupado tudo o sangue de seu tenro jovem coração.

—Que ato sobre a terra está acontecendo agora? —Sua preocupação estava crescendo, Caroline apartou sua pluma e se deslizou fora do tamborete. Tinha estado encurvada sobre o escritório durante quase três horas, lutando para encontrar alguma forma criativa de reduzir os gastos mensais das contas da família sem fazer que o resultado final totalizasse menos que zero. Sacudindo a tensão de seus ombros, bisbilhotou a carta na mão de sua irmã— Certamente não pode ser tão sombrio. Me deixe jogar uma olhada.

Caroline imediatamente reconheceu o florido gancho de ferro de sua irmã média. Apartando um maldito fio de pálido cabelo loiro de seus olhos, rapidamente esquadrinhou a carta, saltando-as intermináveis descrições dos trajes de noite drapeados em tule dos bailes formais e os enérgicos passeios em limusine pelo Rotten Row no Hyde Park. Não tomou muito tempo para afinar dentro da passagem, o que tinha drenado toda a cor da cara de Porta.

—Meu meu —murmurou ela, arqueando uma sobrancelha— depois de só um mês em Londres parece que nossa Vivienne adquiriu já a um pretendente.

Caroline se recusou a reconhecer a familiar pontada em seu coração como inveja. Quando sua tia Marietta se ofereceu a patrocinar a estréia do Vivienne, nunca lhe tinha ocorrido ao Caroline dizer que sua própria temporada se havia posposto indefinidamente quando seus pais haviam falecido em um acidente de carruagem na mesma véspera de sua apresentação na corte. E Caroline sensatamente tinha descartado essas mesmas ferroadas quando Vivienne se foi a Londres com um baú apinhado com todas as coisas belas que sua mãe tinha escolhido para sua própria estréia cancelada. Era um esbanjamento de valioso tempo angustiar-se por um passado que nunca poderia trocar-se, um sonho que nunca poderia ser realizado. Além disso, aos vinte e quatro, Caroline estava tão firmemente arraigada na prateleira que tomaria um terremoto deslocá-la.

—Um pretendente? Um monstro, quer dizer! —Porta olhou fixamente sobre o ombro do Caroline, um de seus cachos de cabelo da Marta fazendo cócegas a bochecha do Caroline—. Passou por cima apontar o nome do descarado?.

—Ao contrário. Vivienne o há transcrito com sua atrevida emano com pródigos embelezamentos carinhosos—. Caroline fez uma careta na segunda página—. Céus!, dedilhou ela realmente o i com um coração?

—Se o mero sussurro de seu nome não golpeia terror em seu coração, então deve ser ignorante de sua reputação.

—Sou-o agora. —Caroline continuou esquadrinhando a carta— Nossa irmã atentamente há provido um catálogo extremamente extensivo de seus encantos. De seu aceso relato, a gente pode assumir que a lista das virtudes do cavalheiro é emulada só pelo arcebispo do Canterbury.

Enquanto ela elogiava o fino corte do tecido de seu pescoço e suas muitas bondades para as viúvas e os órfãos, suponho que não se incomodou em mencionar o fato que é um vampiro.

Caroline se voltou contra sua irmã, sua escassa paciência se evaporava.

—OH, vamos, Porta. Desde que você leu esse ridículo conto do Dr. Polidori, estiveste vendo vampiros espreitando detrás de cada cortina e cada planta. Se tivesse sabido que «O Vampiro» capturaria sua imaginação em um agarre tão cruel, teria arrojado a revista no montão de lixo logo que chegou. Talvez um dos homens lobos que viu escavar por entre o lixo a teria levado já e a teria enterrado.

Levantando-se até sua altura completa de metro cinqüenta e oito, Porta inalou pelo nariz.

—Todo mundo sabe que o Dr. Polidori não escreveu essa história. Por que, ele mesmo admitiu que a publicou em nome de seu célebre paciente… George Gordon, o muito mesmo Lorde Byron!

—Uma afirmação que Byron decididamente negou, lhe deveria recordar isso replicou-lhe Caroline.

—Pode-lhe culpar? —argumentou Porta— Como podia fazer ele outra coisa quando o caráter cruel e ameaçador do Ruthven era só uma versão delgadamente disfarçada de si mesmo? Ele pode negá-lo tudo o que goste, mas «O Vampiro» revelou sua verdadeira natureza para que todo mundo a visse.

Caroline suspirou, uma veia em sua têmpora começando a pulsar.

—Sua verdadeira natureza é a de uma criatura chupa-sangue da noite, suponho?

—Como o pode duvidar alguém depois de ler «O Infiel»? —Os olhos de Porta cobraram um brilho distante que Caroline conhecia muito bem. Levantando uma mão e golpeando uma postura apropriadamente dramática, Porta entoou:

«Mas primeiro, sobre a terra, como vampiro enviado,

Seu cadáver da tumba será arrancado;

Logo, lívido, vagará pelo que fora seu lar,

E o sangue de todos os teus tem que chupar;

Ali, de sua filha, irmã e esposa,

A meia noite, a fonte da vida secará»

 

Enquanto a voz de Porta se desvanecia em uma nota apropriadamente funesta, Caroline massageou sua têmpora palpitante com dois dedos.

—Isso não prova que Byron seja um vampiro. Só que ele, como cada outro grande poeta, é de vez em quando capaz de dizer estupidez transcendental. Só posso esperar que tenha provas mais substancial para condenar ao novo pretendente do Vivienne. Do contrário, terei que assumir que isto é algo assim como a vez que me sacudiu até despertar antes do amanhecer e insistiram em que uma família de fadas vivia baixo um dos cogumelos venenosos da horta. Pode imaginar minha aguda desilusão quando tropecei descalça através do rocio matutino solo para descobrir que sua família de fadas não eram mais que larvas com nem uma asa de mariposa ou uma orvalhada de pó de fadas.

O rubor de Porta fez pouco para temperar a mal-humorada protuberância de seu lábio inferior.

—Tinha só dez anos então. E te posso assegurar que isto não é um desejo de minha própria fabricação. Não recorda a fofoca que nos contou nossa prima, sobre sua última visita a Londres? Disse-nos que nem uma vez durante todos esses meses na cidade viu fora durante o dia, ao que agora é o pretendente do Vivienne.

Caroline deixou escapar um bufido impróprio de uma dama.

—Esse é apenas um hábito reservado para o não morto. A maior parte dos moços jovens, na Cidade, passam seus dias dormindo os excessos da noite anterior. Só emergem depois de que o sol se pôs para que possam reiniciar o ciclo de beber, apostar e procurar rameiras uma vez mais.

Porta lhe agarrou firmemente seu braço.

—Mas não encontra como mínimo um pouquinho estranho que ele chegasse a sua casa ao amparo da escuridão e se fora da mesma maneira? Que insistisse que cada cortina na casa fora conservado fechada durante todo o dia e que cada espelho fora coberto com braçadeira de luto negro?

Caroline se encolheu de ombros.

—Poderia ter estado simplesmente de luto. Possivelmente tinha perdido recentemente a alguém muito querido para ele.

—Ou algo muito querido para ele. Como sua alma imortal.

—Deveria pensar que tal reputação não lhe faria um comensal muito desejável.

—Ao contrário —lhe informou Porta.— Theton não ama nada mais que um delicioso indício de escândalo e mistério. Justamente a semana passada no Tatler, li que ele deve patrocinar um baile de disfarces em sua sede familiar esta Temporada, e a metade de Londres está competindo pelos convites. Por isso tenho lido, ele é um dos mais solicitados solteiros na cidade. Pelo qual é precisamente pelo que temos que tirar o Vivienne fora de seus agarre antes que seja muito tarde.

Caroline se tirou de cima a mão como garra de Porta. Ela logo que poderia permitir-se ceder às ilusões escuras de sua irmã. Era a primogênita, a sensata, forçada-a a dar um passo firmemente dentro das sapatilhas de sua mãe e as botas de seu pai depois de sua prematura morte oito anos antes. Quão única havia para confortar a duas garotinhas soluçantes, afligidas quando seu coração ainda jazia em fragmentos quebrados em seu peito dolorido.

—Não trato de ser cruel, Porta, mas realmente deve refrear essa tua imaginação. Depois de tudo, não ocorre diariamente que um visconde faça a corte a uma garota sem dote.

—Assim não te importa se Vivienne se casa com um vampiro, enquanto ele também resulte ser um visconde? Não te importa que ele este provavelmente rondando somente Theton procurando alguma alma inocente para roubar?

Caroline amavelmente beliscou a bochecha de sua irmã, restituindo seu matiz rosado.

—Até onde eu se, ele não tomará a alma do Vivienne por algo menos de mil libras ao ano.

Porta ofegou.

—Convertemo-nos em uma carga tão terrível para ti? Está tão ansiosa por te liberar de nós?

O sorriso brincalhão do Caroline se desvaneceu.

—Claro que não. Mas você sabe assim como eu que não podemos depender da generosidade do Primo Cecil para sempre.

Depois da morte de seu pai, seu segundo primo não tinha perdido o tempo em reclamar sua herança legal. O primo Cecil tinha considerado que era caridade cristã afastar às garotas da casa principal do Edgeleaf Manor e as alojar na desvencilhada velha casa de campo familiar metida na esquina mais úmida, e lúgubre da fazenda. Tinham passado os últimos oito anos ali, com solo uma mensalidade escassa e um par de velhos serventes para cuidar delas.

—Quando nos visitou a semana passada, —Caroline recordou a sua irmã,— Cecil passou mais de seu tempo fazendo “ejem” —imitou.— e pavoneando-se sobre o salãozinho, resmungando a respeito de seus planos para converter a casa de campo em um pavilhão de caça.

—Você sabe que ele poderia ser mais caridoso conosco se não o houvesse tão firmemente desprezado faz anos.

Ao recordar a noite que o solteiro de cinqüenta e oito anos as havia convidado graciosamente a mudar-se de retorno ao senhorio —a condição de que ela, de dezessete anos, convertesse-se em sua noiva—Caroline se estremeceu.

—Entregaria minha alma a um vampiro antes de me casar com esse velho sátiro gotoso.

Porta se afundou em uma descolorida turca de cretone que tinha sido de algodão em ramo vermelho sangre muito antes que se mudaram à casa de campo, apoiou seu queixo sobre uma mão e jogou ao Caroline um olhar recriminatório.

—Bem, pôde te haver recusado amavelmente. Não tinha que lhe empurrar fora da porta. E mais com o temporal de neve que caía.

—Esfriou seu ardor, verdade? Entre outras coisas. —Caroline resmungou pelo baixo. Depois de esforçar-se em convencer a do que seria um marido atento, o primo Cecil a tinha sujeito contra ele com suas mãos grosas, gordas, com a intenção de convencê-la com um beijo. Greve dizer, a quente ávida urgência de sua língua contra seus lábios estreitamente fechados. Ao Caroline tinha inspirado repulsão, não devoção. A lembrança ainda o fazia querer esfregar sua boca com lixívia.

Ela se afundou pesadamente junto a Porta na turca.

—Não quis lhes alarmar a ti ou Vivienne, mas quando o Primo Cecil veio chamando a semana passada, ele também sugeriu que poderíamos ter esticado os limites de sua caridade. Ele insinuou que a menos que lhe conceda certos… —tragou e apartou a vista, incapaz de encontrar-se com o olhar inocente de Porta — ...favores sem o benefício do matrimônio, poderíamos nos ver forçadas a procurar outro lugar.

—O que?, Miserável desgraçado! — Porta estalou.— Pavilhão de caça em efeito! Deveria ter montado sua gorda cabeça na parede de nosso salão!

—Até se ele nos dá permissão de permanência no Edgeleaf, não sei quanto tempo mais posso seguir espremendo cada libra de nossa concessão até o último meio pene. Só a semana passada tive que escolher entre comprar um ganso para o jantar e um par de reveste novas de couro para suas botas. Nossas capas de inverno estão todas puídas e ficamos sem panelas para colocar sob as goteiras deste velho teto mofado. —O olhar indefeso do Caroline flutuou brandamente do perfil indignado de sua irmã até seu traje. Descolorada a popelina branca tinha sido deixada em herança dela ao Vivienne, logo finalmente a Porta. Seu sutiã de volantes estava estirado tenso sobre os peitos gordinhos de Porta, e a puída prega arrastava a ponta de suas botas cheias de arranhões.— Não estranhas alguma vez os pequenos luxos que você e Vivienne estavam acostumado a amar tão quando Mama e Papa estavam vivos… os potes de aquarelas, a música do pianoforte, as fitas de seda e os pentes de pérola para seu cabelo bonito?

—Adivinho que nunca me importou prescindir deles enquanto nós três pudéssemos permanecer juntas. —Porta descansou sua cabeça contra o ombro do Caroline.— Mas adverti que suas porções no jantar continuam fazendo-se menores enquanto a nossa permanece do mesmo tamanho.

Caroline acariciou com sua mão os cachos suaves de Porta.

—Você vais ser um prêmio algum dia, minha pequena, mas nós sabemos que Vivienne é a verdadeira beleza da família, a que mais provavelmente fará um matrimônio vantajoso que nos liberará da intimidação do primo Cecil e assegurará tanto seu futuro como o nosso.

Porta inclinou sua cabeça para contemplar ao Caroline com lágrimas não derramadas aferrando-se a suas pestanas grosas e escuras.

—Mas não o vê, Caroline? Se Vivienne cair sob o feitiço deste diabo, ela não pode ter um futuro. Se lhe entregar seu coração, tirará-nos isso eternamente!

Caroline poderia ver uma sombra de seus medos refletidas nos olhos suplicantes de Porta. Se Vivienne tinha êxito em conseguir um marido, só seria questão de tempo antes que ele encontrasse um pretendente para Porta entre seus amigos elegíveis. Ele inclusive poderia ser o suficientemente caridoso para convidar a sua cunhada solteirona a ir viver com eles. Mas do contrário, ela passaria o resto de seus dias com os nervos crispados ao redor desta ventosa velha casa de campo na caprichosa misericórdia do primo Cecil. O pensamento enviou um estremecimento fritou por de sua coluna vertebral. Ela era o suficientemente maior para saber que haviam alguns homens que poderiam ser muitos mais aterradores que os monstros.

Antes d que ela pudesse tratar de serenar qualquer de seus medos, Anna chegou caminhando arrastando os pés dentro do quarto com algo entre as mãos, sua cabeça branca se inclinou ante ela.

—O que é isso? —Caroline perguntou à velha criada, levantando-se da turca.

—Isto precisamente chegou para você, senhorita.

Caroline tomou a missiva da mão paralítica da Anna. Os olhos remelados da criada estavam empanados pela idade.

Caroline percorreu em pergaminho de marfim com as pontas de seus dedos, admirando sua cara malha. A missiva dobrada tinha sido selada com uma só embarradura de cera cor rubi que refulgia como uma gota de sangue fresca contra o papel fino. Ela franziu o cenho.

—Pensei que o correio matutino já tinha chegado.

—Certamente, senhorita —Anna confirmou.— Um mensageiro privado o trouxe. Era um moço de grande musculatura que vestia librê de cor escarlate.

Enquanto Caroline rompia o selo com sua unha e desdobrava a carta, Porta ficou de pé.

—O que é? É de tia Marietta? Vivienne tem cansado doente? Entrou em um declive repentino e inexplicado?

Caroline negou com a cabeça.

—Não é de tia Marietta. É dele.

Porta levantou uma sobrancelha, urgindo-a a continuar.

—Adrian Kane… o visconde Trevelyan. —Enquanto os lábios do Caroline moldavam o nome pela primeira vez, ela teria jurado que sentiu uma onda de tremor através de sua alma.

—O que quer de nós? Está requerendo alguma classe de resgate pela alma do Vivienne?

—OH!,pelo amor de Deus, Porta, deixa de ser um ganso tão tolo! Não é uma demanda de resgate —disse Caroline, esquadrinhando a mensagem.— É um convite para que vamos a Londres a conhecê-lo. Isso deveria apaziguar suas ridículas suspeitas, ou não? Se este visconde albergasse menos que intenções nobres para o Vivienne, então ele não se incomodaria em obter nossa bênção antes de persegui-la, verdade?

—por que ele não nos faz uma visita aqui mesmo no Edgeleaf, como qualquer jovem cavalheiro correto faria? OH, espera, esqueci-o! Um vampiro não pode entrar na casa de sua vítima a menos esta convide. —Porta moveu sua cabeça para o lado, vendo-se por um fugaz momento maior e mais sábia.— A que exatamente nos há convidado o visconde?

Caroline estudou o temerário gancho de ferro masculino por vários segundos, logo levantou sua cabeça para encontrar os olhos de sua irmã, já temendo o brilho triunfante que ela sabia logo ia encontrar ali.

—A um jantar a meia-noite.

 

—O que ocorre se não ser um convite, a não ser uma armadilha? —Porta murmurou no ouvido do Caroline enquanto a desvencilhado carruagem de sua tia Marietta se deslocava através das desertas ruas de Londres.

—Então suponho que logo nos encontraremos maniatadas à parede de uma masmorra, a mercê dos desejos escuros de algum demônio —Caroline murmurou de volta. Apanhadas fora de guarda pelo curioso calor que suas próprias palavras avivaram nela, abriu de repente seu leque e o usou para esfriar suas bochechas excitadas.

Porta se voltou para trás para contemplar mal humoradamente a paisagem que via pela janela da carruagem. Sua irmã menor era a única pessoa conhecida pelo Caroline que poderia irritar-se tanto pelo simples batear de uma pestana. Caroline sabia que Porta ainda albergava um aborrecimento, tinha-a feito jurar que calaria os rumores relacionados com o misterioso Visconde Trevelyan. Se Vivienne não o advertia, Caroline não via o ponto de deixar que essa tolice turvasse a felicidade de sua irmã ou pôr em perigo todos seus futuros.

Tia Marietta disparou ao Caroline e Porta um olhar reprovatório.

—Não foi de uma grande bondade por parte de Lorde Trevelyan estender a suas irmãs seu convite, Vivienne? —Tirou um lenço de seu sutiã e tamborilou com os dedos em seus socos. Que já começavam a refulgir sob sua grosa capa de pó de arroz. Com sua peruca loira de cachos e sua pele empoeirada, a Tia Marietta sempre tinha recordado ao Caroline, bastante pouco amavelmente, a uma confeitaria crua.— É simplesmente outro exemplo brilhante de generosidade do cavalheiro. Se continua engastando sua teimosia, querida, espero que inclusive possamos apanhar um convite para o baile de disfarces que deve patrocinar em sua fazenda ancestral.

A tia Marietta não tinha que assinalar que o nós não incluía o Caroline ou Porta. A caprichosa irmã de sua mãe sempre tinha considerado a Porta fastidiosa e ao Caroline muito parva e pedante para ser boa companhia. Nunca tinha respirado uma palavra a respeito das acolher depois da morte de seus pais, e de não ser pelo convite do visconde, nunca as teria convidado a compartilhar as residências Shrewsbury que seu defunto marido lhe tinha deixado em herança, nem sequer por uma miserável semana.

Sua tia seguiu elogiando ao visconde com uma lista de virtudes ao parecer infinita. Caroline já estava mais que farta do homem, mas como, que ainda não lhe tinha conhecido.

Jogou um olhar ao outro lado da carruagem a Vivienne. Um sereno sorriso rondava os lábios de sua irmã enquanto ela respeitosamente escutava o bate-papo gritão da Tia Marietta. Tomaria mais que uma escassa nuvem atenuar o brilho do Vivienne, Caroline pensou tristemente, sua expressão mitigando-se enquanto estudava a sua irmã.

Com seu cabelo dourado recolhido em um coque alto e a bela e cremosa pele tão apreciada pelo Ton, Vivienne positivamente resplandecia. Inclusive como uma menina, tinha sido quase impossível desgrenhar sua compostura. Quando tinha apenas cinco anos, Vivienne tinha chegado atirando fortemente das saias de sua mãe enquanto cortava rosas no horta no Edgeleaf.

—Não agora mesmo, Vivi —Mamãe a tinha arreganhado duramente sem apartar-se de sua tarefa.—Não pode ver que estou ocupada?

 —Muito Bem, Mamãe. Simplesmente retornarei mais tarde então.

Alertada pela nota desafinada nessa pequena voz, obediente, sua mãe se tornou para encontrar ao Vivienne coxeando, a flecha do arco de um caçador furtivo ainda alojada em sua coxa. Embalada nos fortes braços de seu papai, Vivienne tinha suportado em silencio com a cara branca enquanto o médico do povo extraía a flecha. Tinham sido os chiados histéricos de Porta os que tinham ameaçado ensurdecendo a todos eles.

Com seu próprio temperamento tão rápido para brilhar, Caroline sempre lhe tinha invejado a Vivienne sua serenidade. E seus reluzentes cachos dourados. Caroline tocou com uma mão seu próprio cabelo pálido, de trigo. Comparado ao do Vivienne, parecia quase descolorido. Já que os finos fios não mantinham um pouco parecido ao fantasma de um cacho, não tinha tido mais remedeio que dissimulá-lo para trás em um apertado nó na coroa de sua cabeça. Para ela, não haveria nenhuma franja bonita de cachos de cabelo para emoldurar os ossos angulares de sua cara mas bem simples.

—Não acredito que nunca te tenha visto levar seu cabelo desse modo —disse ao Vivienne—. É realmente encantador.

Vivienne elevou a mão até a cascata trêmula de cachos.

—Por estranho que pareça, foi Lorde Trevelyan quem sugeriu o estilo. Disse que complementaria meus olhos finos e o corte clássico de minhas maçãs do rosto.

Caroline franziu o cenho, pensando o estranho que era que um cavalheiro tomasse um interesse tão agudo pelo cabelo de uma dama. Possivelmente o pretendente de sua irmã era um desses seguidores da moda fantasiosos como Brummel, mais interessado na qualidade do encaixe recortando a garganta de uma dama que em ocupações mais viris como a política ou caçar.

—Então como exatamente fez para conhecer lorde Trevelyan? —perguntou.— Explicou em sua carta que lhes encontraram no baile formal da Lady Norberry, mas passou por cima proporcionar qualquer dos detalhes mais deliciosos.

O sorriso do Vivienne se suavizou.

—O baile tinha acabado e todos nos dispúnhamos a entrar em jantar. —enrugou seu magro nariz—. Acredito que o relógio justamente tinha dado a meia-noite.

Caroline grunhiu com dor enquanto Porta propulsava um cotovelo em suas costelas.

—Olhei por cima de meu ombro para descobrir ao homem mais extraordinário recostando-se contra o marco da porta. Antes que me precavesse o que ocorria, ele tinha acotovelado à parte a meu companheiro do jantar e tinha insistido em me escoltar dentro do salão. —Vivienne agachou sua cabeça timidamente—. Não houve ninguém para nos apresentar oficialmente, assim é que suponho foi tudo bastante inapropriado.

A tia Marietta riu dissimuladamente detrás de uma mão enluvada.

—Inapropriado certamente! Não podia manter seus olhos fora da garota. Nunca vi um olhar tão atordoado! Quando divisou pela primeira vez ao Vivienne, voltou-se tão branco que você teria pensado que ele tinha visto um fantasma. Foram quase inseparáveis após, comigo fazendo a funções de chaperona, claro está —adicionou com um farejo estirado.

—Então desfrutastes os dois alguma vez de alguma excursão de dia? —Porta se inclinou avançado no assento, um sorriso alegre se fixou em seus lábios—. De um passeio em calesa ou de montar a cavalo pelo Hyde Park? Visitar o elefante na Torre de Londres? Tomado o chá em algum jardim ensolarado?

Vivienne deu a sua irmã um olhar estupefato.

—Não, mas nos acompanhou ao Teatro Real da Ópera, duas veladas musicais, e um jantar de meia-noite patrocinada pela Lady Twickenham em sua mansão de Park Lane. Temo que Lorde Trevelyan segue as horas da aristocracia. A maioria dos dias inclusos não se levanta até depois de que sol se pôs.

Esta vez Caroline estava preparada. Antes que Porta a pudesse acotovelar, Caroline apanhou seu antebraço e lhe deu um duro beliscão.

—Ai!

Ao involuntário agudo uivo de Porta, a Tia Marietta levantou seu cristal curiosamente para olhar franzido à garota.

—Pelo amor de Deus!, Menina, adquire controle de ti mesma. Pensei que alguém tinha pisado a um cão de águas.

—Sinto-o —Porta resmungou, encolhendo-se mais desço em seu assento e lhe disparando ao Caroline um olhar furioso—. Um dos alfinetes de meu vestido deve me haver cravado.

Caroline se voltou para a janela para observar as largas estradas do Mayfair, seu sorriso sereno refletindo a do Vivienne. O transporte justo girava no Plaza Berkeley para expor um terraço de formosas casas urbanas de tijolo gozando do calor na incandescência suave dos faróis.

Enquanto a carruagem rodava até uma parada, Caroline estirou o pescoço para olhar fixamente acima a seu destino. Ali havia pouco para distinguir da casa de estilo georgiano de quatro pisos de sua vizinhança… nenhuma gárgula rosnando estava estalagem sobre o teto de piçarra, nenhuma das figuras de capa negra espreitando em torno de seus balcões de ferros forjados, nenhum grito amortecido vindo da carvoeira.

Em vez de ser dissimuladas com pesadas cortinas, as janelas Palladian estavam acesas com luz dos abajures, derramando uma alegre bem-vinda sobre o caminho pavimentado e o pórtico coberto.

—Ah, já chegamos finalmente! —A tia Marietta anunciou enquanto recolhia seu ridículo leque—. Deveríamos nos apressar, Vivienne. Estou segura que seu Lorde Trevelyan está frenético de impaciência.

 —É dificilmente meu Lorde Trevelyan, titia —indicou Vivienne—. Depois de tudo, não é como se me tivesse declarado ou inclusive insinuado suas intenções.

Olhando um rubor encantador de rosa propagar-se sobre as belas bochechas de sua irmã, Caroline suspirou. Como poderia qualquer homem não cair loucamente apaixonado por ela?

Alargou a mão para lhe dar à mão enluvada do Vivienne um carinhoso apertão.

—Tia Marietta tem razão, meu amor. Se tiver capturado o coração deste cavalheiro, então é só uma questão de tempo antes  que conquiste seu nome também.

Vivienne lhe devolveu o apertão, lhe dando um sorriso agradecido.

Descenderam da carruagem uma a uma, apoiando suas mãos na do lacaio que esperava. Quando o turno de Porta chegou, vacilou. O lacaio limpou sua garganta e estendeu sua mão mais profundamente dentro da carruagem.

Caroline finalmente teve que estirar sua mão além dele e atirar bruscamente de sua irmã fora da carruagem. Quando Porta tropeçou com seus braços, Caroline murmurou por entre dentes empunhados.

—Ouviu a Vivienne. É apenas estranho para um aristocrata patrocinar um jantar de meia-noite.

—Especialmente não se ele for um…

—Não o diga! —Caroline advertiu—. Se ouvir essa palavra de seus lábios uma vez mais esta noite, morderei-te eu mesma.

Já que sua tia e sua irmã já tinham desaparecido dentro da casa, Caroline urgiu a Porta, pondo má cara, a subir o caminho. Estavam quase nas escadas da fachada quando uma forma escura se separou das sombras com um frágil bato as asas de ramos.

Porta esquivou e soltou um chiado ensurdecedor.

—Viu isso? —ofegaram, suas unhas fincando-se nas luvas largas do Caroline— Era um morcego!

—Não seja ridícula. Estou segura que foi simplesmente uma chotacabras ou algum outro pássaro noturno. Inclusive quando Caroline tratou de apaziguar os nervos de sua irmã, ela lançou às cornijas da casa um olhar furtivo e se arregaçou o capuz de sua capa para cobrir seu cabelo.

Logo se encontraram de pé em um saguão brilhantemente iluminado com o tinido de cristal, risada calada, e as ricas, doces nota de uma sonata do Hayden flutuando brandamente até seus ouvidos. O piso de parquê tinha sido encerado até tal brilho elevado que virtualmente poderiam admirar seus reflexos nele. Tentando não olhar estupidamente, Caroline lhe deu sua capa a uma jovem criada com bochechas vermelhas como maçãs.

A garota se voltou impacientemente para Porta.

—Não, obrigado —resmungou Porta—. Acredito que poderia agarrar um esfriamento. —Aferrando o pescoço da capa ao redor de sua garganta, fabricou uma tosse lastimosa para emprestar credibilidade a sua afirmação.

Oferecendo à criada um sorriso de desculpa, Caroline tendeu uma mão.

—Não seja tola, querida. Se te acalorar, seu esfriamento muito bem poderia resultar ser fatal.

Reconhecendo o brilho resistente de advertência nos olhos do Caroline, Porta a contra gosto se encolheu fora da capa. Fazia molhos de um xale de lã baixo ela, cuidadosamente oculta para encobrir a magra coluna de sua garganta. Caroline terminou em um combate atirando fortemente enquanto tratava de desembrulhar o xale com Porta tercamente aferrando-se ao outro extremo. Finalmente o arrancou, só para descobrir um cachecol de seda baixo isso.

Estava desatando o cachecol, opondo-se ao desejo de estrangular a sua irmã com ela, quando um aroma acre flutuou brandamente até seu nariz. Inclinou-se para frente, cheirando a pele de Porta.

—O que é esse fedor? Isso é alho?

Porta ficou rígida.

—Deveria dizer não. É simplesmente meu novo perfume. —Fincando seu nariz no ar, saiu passando rapidamente além do Caroline, arrastando o terroso perfume por detrás dela. Caroline lançou o cachecol à boquiaberta criada e seguiu a sua irmã dentro do salão.

Enquanto examinava a elegante assembléia, Caroline quase desejou haver-se recusado a entregar sua própria capa. Vivienne era uma visão de graça em popelina azul celestial, e Porta conseguia ver-se cativante como uma menina em seu mais fino vestido dominical. Desde que as prisões fortificadas tinham surto e estava de moda que um peito se derramasse da parte superior do mesmo sutiã, Caroline esperava que ninguém advertisse que o traje de Porta tinha mais de dois anos.

Caroline se tinha visto obrigada a tomar seu armário inteiro de Londres de um dos baús velhos de sua mãe. Só poderia estar agradecida que Louisa Cabot tivesse sido tão alta, magra, e de peito pequeno como ela o era. O pálido traje de noite de musselina da Índia que levava era quase grego em sua simplicidade, com um sutiã talhado quadrado, a cintura alta, e nenhum dos vincados e volantes que tinham sido introduzidos outra vez, na moda, durante a década passada.

Dolorosamente consciente dos olhares curiosos dirigidos em sua direção pelas dúzias, ou assim, dos ocupantes do salão, pegou um sorriso forçado em seus lábios. A julgar pelas expressões presumidas e os diamantes cintilando tanto nas mãos das mulheres como nas dos homens, parecia que Porta tinha tido razão. A reputação do Adrian Kane não parecia ter prejudicado sua posição social. Umas quantas das mulheres já disparavam olhadas ressentidas a Vivienne.

Ela e a tia Marietta caminhavam sem rumo pelo quarto, inter-cambiando saudações murmuradas e recebendo-os, com a cabeça. Porta espiava por detrás delas, suas mãos sujeitas sobre sua garganta.

O pianoforte na esquina caiu silencioso. Uma figura escura se levantou do banco do instrumento, sua aparência enviando uma onda de antecipação através dos convidados congregados. Parecia que Caroline e sua família tinham chegado bem a tempo para alguma classe de recitação. Aliviada ao descobrir que já não era o centro de atenção, Caroline se relaxou em um rincão ovalado ao longo da parede traseira onde ela poderia olhar as atuações sem ser olhar sem dissimulação. Uma porta de vidro próxima dava para o jardim do pátio, oferecendo uma escapada apressada se fazia falta.

Simplesmente passando de uma pernada para posar diante do suporte da chaminé de mármore, o desconhecido de traje negro magicamente transformou a chaminé em um cenário e os ocupantes do salão em uma audiência absorta. Sua palidez de moda só fazia que seus sentimentais olhos escuros e os negros cachos garbosos, derrubando-se sobre sua frente, fossem mais notáveis. Era largo de ombros, mas de quadril estreito, com um nariz firme, aquilina e lábios cheios que traíam um indício tentador de sensualidade. Do tenro sorriso curvando os lábios do Vivienne, Caroline deduziu que devia ser seu anfitrião.

Um reverente silêncio caiu sobre o salão enquanto ele apoiava um pé na chaminé. Caroline se encontrou sustentando sua respiração enquanto começava a falar em um barítono tão melódico que podia ter feito aos anjos chorar com inveja.

«Mas primeiro, sobre a terra, como vampiro enviado,

Seu cadáver da tumba será arrancado;

Logo, lívido, vagará pelo que fora seu lar,

E o sangue de todos os teus tem que chupar;

Ali, de sua filha, irmã e esposa,

A meia noite, a fonte da vida secará»

Os olhos do Caroline se alargaram quando ela reconheceu as palavras do legendário conto Turco do Byron, palavras que tinha ouvido Porta recitar com uma quantidade igual de drama só uns poucos dias antes. Jogou um olhar a sua irmã pequena. A mão de Porta se cansado de sua garganta até seu coração enquanto contemplava de pé ao jovem Adonis, uma luz adoradora emergindo em seus olhos. OH, querida, Caroline pensou. Isso logo que faria a Porta começar a albergar um amor não correspondido pelo pretendente de sua irmã.

Com sua boca ressentida e seu queixo fendido, o orador jovem poderia ter sido confundido pelo Byron mesmo. Mas todo mundo em Londres sabia que o poeta elegante atualmente adoecia na Itália nos braços de seu amante nova, a Countess Guiccioli.

Enquanto se lançava a outro verso do poema, exibindo seu perfil clássico a todo mundo no quarto para admirar, Caroline teve que cavar uma mão sobre sua boca para conter um soluço de risada. Assim que este era o notório visconde! Com razão oferecia sugestões ao Vivienne de como dar estilo a seu cabelo. E não é estranho que a sociedade acreditasse que era um vampiro. Era obviamente uma reputação tão cuidadosamente cultivada como as dobras em cascata de sua gravata e o brilho deslumbrante em suas botas Wellingtones. Um modista tão afetado poderia roubar o coração de sua irmã, mas a alma do Vivienne não parecia estar em nenhum perigo imediato.

Enjoada tanto com regozijo como alívio, Caroline ainda tratava de conter suas risadas afogadas quando um relógio em alguma parte da casa começou a repicar a meia-noite.

—me permita.

Caroline começou a rir violentamente enquanto um lenço se mostrava justamente sob seu nariz.

—Trato de vir preparado. Esta é dificilmente a primeira vez que sua interpretação tem feito chorar a uma mulher. Soube-se que as damas mais sentimentais incluso se deprimem em ocasiões.

Essa risível voz masculina, entoada apenas por cima de um grunhido, pareceu ressonar através de seus ossos. Como podia ela ser tão parva quanto a preocupar-se a respeito de vampiros quando uma voz tão cheia de fumaça e enxofre poderia só pertencer ao mesmo diabo?

Cautelosamente tomou o lenço antes de jogar um olhar furtivo ao homem recostando-se contra a parede junto a ela. Parecia ter aparecido de repente. Devia haver-se deslizado pela porta de vidro quando tinha estado distraída, não uma pequena proeza para um homem tão grande.

Embora teria jurado que havia sentido seu olhar fixo sobre ela só um segundo antes, ele estava olhando fixamente a chaminé, onde seu anfitrião se lançava dentro de outra estrofe da obra professora do Byron.

—Seu cavalheirismo é muito apreciado, senhor —ela disse brandamente, dando ligeiros toques em seus olhos transbordantes com o caro linho—. Mas lhe posso assegurar que não há nenhum perigo de meu ser desesperado com emoção e deprimindo-se em seus braços.

—Machuca —murmurou ainda olhando para a fronte.

—Perdão? —murmurou Caroline, desconcertada,

—Bonito chapéu —disse, inclinando a cabeça para a beberagem de pérola e pluma no alto, em cima dos cachos prateado de uma matrona.

Entrecerrando os olhos, Caroline se aproveitou de sua pretendida indiferença para lhe estudar. Seu grosso cabelo era um mel quente trancado com fios mais brilhantes de ouro e o suficiente comprido para roçar os impressionantes ombros de seu fraque vermelho. Se se endireitasse em lugar de recostar-se contra a parede com ambos os tornozelos e braços cruzados, teria se elevado sobre ela por quase trinta centímetros. Mas parecia completamente em casa com seu tamanho, não encontrando necessidade de usar seu poder para intimidar ou adular.

—O que quis dizer, senhor —sussurrou, insegura por que era tão importante que este forasteiro não a confundisse com alguma boba muito sensível,— foi que não estava vencida pelo sentimento, mas sim pela diversão.

Lançou-lhe um olhar enviesado ilegível sob suas abundantes pestanas. Seus intermináveis, cristalinos olhos não eram nem azul nem verde, a não ser algum matiz fascinante entremeios.

—Deduzo que não é admiradora do Byron?

—OH, não é o poeta quem me diverte, a não ser seu intérprete. Viu alguma vez tal adaptação de uma postura desavergonhada?

Uma das mulheres diante deles girou para olhar furiosamente ao Caroline. Tocando com um dedo enluvado seus lábios e vaiou.

—Shhhhh!

Enquanto Caroline lutava por armar uma expressão conveniente, seu companheiro murmurou.

—Você parece a única mulher no quarto imune a seus encantos.

Não havia argumentação para isso. Porta ainda contemplava a chaminé como se tivesse cansado em um transe. Várias das damas tinham tirado seus lenços para dar ligeiros toques a seus olhos. Inclusive os cavalheiros olhavam a interpretação com bocas frouxas e expressões vidradas.

Caroline se tragou um sorriso.

—Possivelmente ele os enfeitiçou com seus poderes sobrenaturais. Não é esse um dos rasgos de sua classe… a habilidade para hipnotizar aos fracos de caráter e fazê-los realizar sua ordem?

Esta vez seu acompanhante começou a olhar a completamente à cara. Seu semblante poderia ter sido denominado juvenil de não ser pela frente sulcada de rugas, um nariz que tinha sido rota, e o indício zombador de uma fenda em seu largo queixo. Tinha uma boca raramente tenra, expressiva para uma cara tão forte.

—E precisamente que classe seria essa?

Estava dificilmente dentro de seu caráter permitir um bocado saboroso de fofoca com um total desconhecido, mas havia algo em torno de seu olhar direto que convidava às confidências.

Cavando uma mão ao redor de sua boca, apoiou-se mais perto dele e murmurou.

—Não sabe? Se rumoreia que nosso anfitrião é um vampiro. Certamente deveu ter ouvido a intriga sobre o misterioso e perigoso Adrian Kane. Como se levanta de sua cama só depois de que o sol se pôs. Como ronda as ruas e os becos da cidade de noite procurando a presa. Como prova às mulheres inocentes em sua guarida e as escraviza com seus poderes escuros de sedução.

Ela tinha conseguido trazer um brilho de diversão a seus olhos.

—Sonha realmente como um tipo vil. Então o que a alertou para desafiar sua guarida esta escura noite? Não lhe importa sua própria inocência?

Caroline levantou seus ombros em um leve encolhimento.

—Como pode ver, não é uma ameaça para mim. Sou completamente insensível aos meditabundos senhores, que declamam Byron e passam uma quantidade desmesurada de tempo diante do espelho praticando suas posturas e frisando suas mechas.

Seu olhar fixo se estreitou sobre sua cara.

—Devo confessar que me tem intrigado. Verdadeiramente que tipo de cavalheiro poderia apresentar uma ameaça para você? Que poderes escuros deve possuir um homem para seduzir uma criatura tão ajuizada como você? Se uma cara bela e uma língua ágil não a fazem deprimir-se nos braços de um homem, então o que o fará?

Caroline elevou o olhar e lhe contemplou, um caleidoscópio de imagens impossíveis formando redemoinhos através de sua cabeça. E se esta fosse sua Temporada em lugar da do Vivienne? E se ela fosse uma inocente de dezenove anos em lugar de uma sensata de vinte e quatro? E se não era muito tarde para acreditar que um homem como este a poderia tentar em um jardim iluminado pela lua para roubar um momento privado… ou possivelmente inclusive um beijo? Destruída por um calafrio de desejo, Caroline arrastou seu olhar longe dessa tentadora boca dele. Era uma mulher adulta. Dificilmente poderia permitir-se sucumbir aos tolos desejos de uma moça.

Inclinou sua cabeça com um sorriso com covinhas na cara, decidindo que era mais sábio tratar suas palavras como a brincadeira que indubitavelmente eram.

—Deveria envergonhar-se, senhor. Se confessasse tal coisa, então você me teria a sua mercê, verdade?

—Possivelmente fora você —se inclinou para murmurar, sua voz tão profunda e fumegante como um gole proibido de uísque escocês—, quem teria a sua mercê.

Caroline sacudiu sua cabeça, hipnotizada pelo brilho inesperado de desejo em seus olhos. Pareceu uma eternidade sem fôlego, antes que ela se desse conta de que a recitação tinha acabado e os outros ocupantes do salão tinham estalado em um aplauso entusiasta.

Seu companheiro se separou da parede, endireitando-se a sua altura completa.

—Se me perdoar, senhorita… temo que o dever é uma amante brutal e implacável.

Já lhe tinha apresentado suas largas costas quando lhe chamou.

—Senhor! Esqueceu seu lenço!

Não se precaveu que batia o recorte de linho como uma bandeira de rendição até que ele girou e uma esquina de sua boca se curvou em um sorriso preguiçoso.

—Conserve-o, fará-o?. Possivelmente encontrará alguma outra coisa para divertir-se antes que a noite tenha terminado.

Enquanto lhe observava abrir-se passo pelos convidados, Caroline alisou o lenço sobre seus dedos enluvados. Tinha um desejo absurdo de levá-lo a sua bochecha, para ver se carregava os perfumes masculinos de sândalo e rum da baía que ainda pendia no ar ao redor dela.

As pontas de seus dedos cegamente riscaram as siglas costuradas no tecido enquanto sua voz profunda, dominante se transmitia sobre a multidão.

—Bravo! Bravo, Julian! Essa foi realmente uma interpretação. Atreve-te a que esperemos uma repetição depois do jantar?

O parco, elegante sátiro ainda posando com graça negligente diante da chaminé sorriu abertamente.

—Só se meu irmão e meu anfitrião o ordena.

Os dedos do Caroline se congelaram.

Lentamente levantou o lenço, mas inclusive antes que visse o sátiro golpear ruidosamente uma mão cordial em seu ombro, inclusive antes que observasse aos convidados lhe saudar como um dos seus, inclusive antes que visse uma Vivienne radiante tomar seu lugar a seu lado como se sempre tivesse tido um sítio ali, Caroline soube o que encontraria costurado no caro linho.

Uma A elaborado vinculado com uma K lhe redemoinhem.

—Caroline! —Vivienne a chamou. Um sorriso radiante iluminava sua cara enquanto intrometia uma mão magra na curva do braço de seu companheiro—.O que está fazendo te acovardando ali na esquina? Deve vir e conhecer nosso anfitrião.

Caroline sentiu tudo o sangue drenar-se de sua cara enquanto ela levantava seus olhos para encontrar o olhar fixo igualmente surpreendido do Adrian Kane, o Visconde Trevelyan.

 

—Gostaria de um pouco de porto, Senhorita Cabot?

Embora a pergunta foi perfeitamente inocente, não havia nada inocente sobre o brilho zombador nos olhos de seu anfitrião. Ou a forma em que formou redemoinhos do licor sangüíneo ao redor do fundo de seu copo antes de incliná-lo até seus lábios.

O copo de porto se teria visto mais em casa pendurando dos dedos pálidos, aristocráticos de seu irmão. Curiosamente, Adrian Kane tinha as mãos de um trabalhador… largas, fortes, e poderosas. Seus dentes eram retos e brancos, sem nenhuma presa à vista. Posto que se tinha sentado no lugar de honra a sua direita na mesa larga, coberta em damasco, Caroline tinha muitos oportunidades de lhe estudar cada vez que emitia um de seus sorrisos enigmáticos.

Era difícil imaginar qualquer sendo o suficientemente parvo para acreditar que este homem abraçava a escuridão e a morte. Mais que nada, parecia estar possuído de um vigor quase antinatural. Embora segundo o rumor fugia a luz do dia, teria jurado que os fios dourados de seu cabelo tinham sido fiados pelo sol. Inclusive tinha a ridícula noção que se apoiava mais perto, poderia ouvir o constante zumbido do sangue percorrendo dentro de seu coração poderoso.

Antes que Caroline pudesse declinar sua oferta, Porta, que estava sentada diretamente frente a ela, à esquerda dele, forçou para fora seu copo e piou. —O que, obrigado, Sua Senhoria! Eu gostaria de um pouco de porto!

Caroline olhou a sua irmã de reolho. Porta parecia momentaneamente ter esquecido seu medo de que Kane pudesse inclinar-se e lhe morder no pescoço. Estava muito ocupada estirando o pescoço para olhar fixamente ao irmão do Kane, quem estava sentado justamente na mesa debaixo da dela, ao outro lado de Vivienne. Não importa o que pensasse de sua pose e seu pavoneamento, inclusive Caroline tinha que admitir que era uma tragédia que o perfil do Julian Kane nunca tivesse sido cunhado em uma moeda romana.

Seu anfitrião torceu um dedo ao lacaio revoando perto do aparador de nogueira, deu ao homem uma sacudida de advertência com sua cabeça antes que pudesse verter mais que uma dose de porto de cor de rubi no copo de Porta.

A tia Marietta tinha sido desterrada ao extremo mais afastado da mesa, onde estava obsequiando a um rechonchudo barão com um relato estridente de seu último triunfo na mesa do Boddle ( jogo de cartas ). Já que muito bem não poderia cobrir seus pulsos com um garfo de duas pontas, o pobre homem parecia firmemente estar bebendo em um torpor. Tinha estado deslizando-se mais baixo e mais desço em sua cadeira durante a passada meia hora. Quando a sobremesa fosse servida, provavelmente estaria sob a mesa. Não por que a Tia Marietta o notasse, provavelmente se voltaria para a boba marquesa ao outro lado e continuaria sua recitação sem incomodar-se em fazer uma pausa para respirar.

Caroline se perguntou se sua tia tinha sido desterrada deliberadamente. Possivelmente Kane tinha tão pouca tolerância a seu bate-papo incessante como ela. É obvio, depois da tolice que lhe tinha solto no salão, devia pensar que um pássaro tinha o dobro de inteligência que ela e a Tia Marietta.

Cada vez que recordava suas imprudentes palavras, queria baixar a cabeça e golpear sua frente contra a mesa. Não sabia se deveria estar mais envergonhada por insultar ao irmão do homem ou por repetir esses ridículos rumores a respeito de suas atividades noturnas. Poderia ter conseguido perdoar-se a si mesmo por ambas as indiscrições a não ser se permitiu também um flerte desavergonhado com o pretendente de sua irmã.

—Senhorita?

Agradecida pela distração, Caroline girou sua cabeça para encontrar a um lacaio oferecendo uma bandeja de prata carregada com fatias de carne vermelha pouco assada nadando em suco ensangüentado. Sentindo seu estômago já tremente derrubar-se, tragou duro e murmurou.

—Não, obrigado.

—OH, eu tomarei. —Em lugar de esperar para que o lacaio levará a bandeja ao redor, Julian estirou a mão através da mesa e apunhalou uma fatia de carne com seu garfo.  Levou a carne vermelha diretamente a sua boca, mastigando com sensual deleite.

Repentinamente se deteve e cheirou o ar, seu nariz perfeitamente alinhado enrugando-se pela aversão.

—Simplesmente deve lhe dizer ao Gaston que atenue o alho, Adrian. É quase entristecedor esta noite.

Caroline foi quão única viu Porta inundar seu guardanapo em sua pequena tigela de cristal para limpar os dedos e usá-la para esfregar sua garganta.

Ao menos pensou que era a única, até que jogou um olhar a seu anfitrião e lhe apanhou observando não a Porta, a não ser a ela, com diversão não dissimulada.

—Terá que perdoar a meu cozinheiro —disse—. É francês, e você sabe como o francês ama seu alho.

Caroline não podia deixar passar seu sorriso satisfeito incontestada.

—E você, milord? É aficionado a isso também?

—Bastante. Encontro que acrescenta um elemento excitante de surpresa para inclusive a maioria dos pratos comuns.

Deu-lhe um olhar travesso.

—Ah, mas algumas pessoas não são tão apaixonadas das surpresas como você parece ser. Há aqueles que inclusive as poderia considerar uma prova para ser evitadas.

Kane se inclinou atrás em sua cadeira, um brilho especulativo em seus olhos fazendo-se mais profundo.

—Isso dependeria da natureza da surpresa, ou não?

—Certamente —respondeu, encontrando-se com seu olhar fixo de cheio—. E se a surpresa tivesse sido iniciada por um simples mal-entendido ou subterfúgio deliberado.

Ele tomou outro sorvo de porto.

—Devo admitir, senhorita Cabot, que você mesma foi uma revelação para mim. Já que Vivienne me informou que você teve quase que criá-la a ela e a jovem Porta aqui, eu esperava a alguém muito mais…

—Velho? —ofereceu.

—Experiente —rebateu com tato.

—Então lamento lhe decepcionar, milord. Se tivesse sabido que esperava a uma arpía senil, não me teria incomodado em trazer postos meus dentes de madeira.

—Caroline tinha só dezesseis anos quando perdemos a mamãe e papai —explicou Vivienne, contemplando a sua irmã com afeto manifesto.— foi a mãe e o pai para nós desde esse momento. Desde não ser por ela, o primo Cecil nos teria enviado a um orfanato.

Caroline sentiu sua cor levantar-se enquanto Kane inclinava sua cabeça para estudá-la.

—Não pôde ter sido fácil carregar com a responsabilidade de duais meninas quando você era pouco mais que uma moça.

Julian ondeou seu garfo em sua direção.

—Pensava que seria mortalmente aborrecido estar metido no campo com dois mucosos para criar. Sem ânimo de ofender, pequena— adicionou, apoiando-se além do Vivienne para lhe oferecer a Porta uma piscada brincalhona. Ela se engasgou com um bocado de codorna e avermelhou até as raízes de seu cabelo.

Caroline recordou os incontáveis dias passados encurvada sobre os domésticos livros maiores, seus dedos constrangidos com o frio e a fadiga. As noites sem dormir enfeitiçadas por visões de suas irmãs encerradas em um reformatório ou trabalhando como escravas longe, como instrutoras em algum lar com um amo lascivo e uma ama cruel. As visões que ainda poderiam chegar a passar se não podiam obter um marido adequado para uma delas.

Mas disse simplesmente.

—Ao contrário do que a maior parte da sociedade crie, há muitas recompensas para ser encontradas em uma tranqüila vida campestre dedicada aos prazeres do lar e a família.

Embora meio esperava que seu anfitrião se mofasse de suas palavras, sua voz se suavizou em uma nota que poderia ter sido desejo.

—Posso imaginá-lo.

—Então me diga, minha querida Senhorita Cabot —disse Julian, pondo a força cheia de seu encanto sobre ela— é verdade que no campo se espera tanto que durma como que te levante «com as galinhas», por assim dizê-lo?

—Se estivéssemos no Edgeleaf, eu teria estado na cama faz horas —reconheceu.

—É obvio —murmurou Kane.

Caroline repentinamente se encontrou incapaz de encontrar-se com seu olhar. Como era isso que a mera menção da cama diante deste homem lhe poderia fazer ruborizar como uma noviça?

Seu irmão se estremeceu.

—Então temo que eu não sobreviveria ali durante mais de duas semanas.

Kane riu entre dentes.

—Mais de uma noite, eu deveria dizer. Você terá que perdoar a meu irmão pequeno, senhorita Cabot —disse, a carícia rouca de sua voz a fez sentir como se eles dois estivessem sozinhos no quarto—. Aqui, o pobre Julian teme já nossa volta ao campo na próxima semana. Se eu não tivesse prometido um baile para mantê-lo divertido, duvido que tivesse sido capaz de arrastá-lo longe de seu infernal jogo favorito. Temo que os prazeres da vida do campo não sejam para ele. Prefere muito mais, uma nuvem sufocante de fumaça de puro pó de carvão, a um sopro de ar fresco. E rechaçou muito tempo o sol por medo de que isto arruinaria sua palidez de moda.

Julian se reclinou em sua cadeira, emitindo um amplo sorriso bonachão.

—Você sabe tão bem como eu, estimado irmão, que nada interessante ocorreu nunca antes da meia-noite.

Para provar seu ponto, ali estava o som de vozes levantadas e uma rixa repentina fora do salão.

Embora o visconde não fez muito mais que contrair um músculo, o perigo repentinamente condimentou o ar ao redor dele, sua tácita ameaça o suficiente forte para agitar os imperceptíveis cabelos nos antebraços do Caroline.

As portas do comilão se abriram repentinamente e um homem apareceu na entrada, livrando-se de um lacaio ofegante. Sua peruca empoeirada estava obliquamente sentada sobre sua cabeça, revelando um denso cabelo vermelho acobreado.

Os convidados alarmados ofegaram, os garfos e as taças estavam suspensos a meio caminho para suas bocas.

Sacudindo com força seu colete reto, o jovem lacaio lhe disparou ao intruso um negro olhar.

—Sinto muito, Sua Senhoria —disse, ainda respirando pesadamente—. Tratei de dizer ao cavalheiro que não recebia a visitantes, mas não tomou amavelmente a negativa.

Apesar da postura lacônica do Kane e o olhar fixo sob suas pesadas pálpebras, Caroline suspeitou que a aparição do desconhecido era definitivamente uma surpresa. E uma não bem-vinda.

—Boa noite, Oficial —disse, elevando-se de sua cadeira só o tempo suficiente para riscar uma reverência zombadora—. Se tivéssemos sabido que você ia honrar-nos com sua presença esta noite, teríamos atrasado o jantar. Seus respeitos devem ter sido perdidos no correio.

—OH, vamos, Trevelyan —disse o homem, fazendo alarde de escovar sua manga onde a mão do lacaio tinha descansado—. Eu gosto de pensar que os velhos conhecidos como nós estão por cima de tais delicadezas sociais absurdas. Nunca as reconhecemos quando estávamos em Oxford juntos.

Com sua larga, e ampla compleição, mal ajustada e enrugada levita, e o desalinhado denso cabelo marrom claro, Caroline suspeitou que o forasteiro pareceria pretensioso até uma tarde sem ar. O que sua cara carecia no encanto era mais que compensado no caráter. Ele poderia não ser de lábios finos e de nariz aquilino, mas tanto o humor como a inteligência brilhava em seus olhos marrons de caramelo.

Aqueles olhos esquadrinharam a mesa até que encontraram o que estavam procurando.

—Senhorita Vivienne —disse, seu tom adoçando-se enquanto inclinava a cabeça para a irmã do Caroline.

—Oficial Larkin —murmurou, formando redemoinhos com sua colher ao redor de sua tigela de sopa de lagosta sem nem sequer lhe jogar um olhar.

Caroline saltou enquanto Porta a chutava sob a mesa. Nenhuma delas alguma vez tinha visto sua irmã de natureza doce dar a alguém o corte direto.

O intercâmbio não foi perdido por seu anfitrião, tampouco. A diversão ondeou através de sua voz enquanto varria fora uma mão.

—Não acredito que tenha conhecido às irmãs da senhorita Vivienne… a senhorita Cabot e a senhorita Porta. Deveria estar familiarizado com o resto de meus convidados. Estou seguro que os acossaste ou interrogou a todos eles em um momento ou outro.

Os convidados do visconde continuaram olhando ao intruso, um pouco curiosamente, outros com apenas hostilidade velada. Um sorriso de desprezo retorceu os lábios esculpidos do Julian Kane, e por uma vez inclusive a Tia Marietta pareceu confundida.

Impávido por sua avaliação, ou sua falta disso, Larkin se localizou em um assento vazio em meio da mesa e lhe lançou ao jovem lacaio um olhar espectador sobre seu ombro.

O lacaio cravou o olhar para o fronte, sua mandíbula sardenta determinada, até que o visconde soprou um suspiro ruidoso.

—Oferece ao oficial um pouco de jantar, Timothy. Se não alimentarmos ao homem, temo que nunca possamos nos liberar dele. Quão único ama mais que entrar de sopetão sem ser convidado é comer.

Sob o carrancudo escrutínio do lacaio, o oficial provou as palavras do Kane servindo-se a si mesmo abundantes porções de codorna guisada e pudim vegetal. Caroline suspeitou que tomaria mais que uma comida semelhante para encher suas bochechas fracas e seus ombros estreitos. Ela não podia menos que perguntá-lo que poderia ter conduzido a um graduado de Oxford procurar uma carreira na força policial em lugar de um posto mais proveitoso no clero ou as forças armadas.

Larkin despachou a codorna em meia dúzia de dentadas, depois do último bocado tomo um avaro gole de vinho e emitiu um suspiro entusiasta.

—Independentemente de seus defeitos, Trevelyan, tenho que confessar que realmente põe uma das mesas mais finas de Londres. Suponho que não deveria me surpreender já que se rumorea que é um homem de tal enorme e variedade… de apetites.

A palavra inócua enviou um curioso tremor à coluna vertebral do Caroline.

—É por isso o que vieste aqui esta noite? —perguntou Kane. — Para me insultar e empilhar louvores sobre meu cozinheiro?

O oficial se reclinou em sua cadeira, dando um golpe a sua boca com seu guardanapo.

—Vim aqui porque pensei que te interessaria saber que houve outro desaparecimento na Charing Cross.

Adrian Kane nem se alterou. Se acaso, seu olhar se fez até mais sonolenta.

—E por que me concerniria essa informação? Considerando a desafortunada pobreza do terreno, quão devedores procuram evitar a seus credores provavelmente desaparecem cada dia. E noite.

Larkin tendeu seu copo com o que o lacaio verteu outro jorro pouco generoso de porto nela.

—Isso muito bem pode ser certo, mas como sabe, houve mais que meia dúzia de desaparecimentos misteriosos desde que você e seu irmão retornaram de suas viagens ao estrangeiro. —deu ao Kane um olhar inequivocamente afiado.— Na maior parte desses casos, convenientemente não houve testemunhas. Mas ontem pela manhã uma jovem veio a nós com uma história extremamente extraordinária.

—Cevada pela histeria e a genebra troca, sem dúvida —ofereceu Julian, ocultando um braço comprido, elegante sobre o respaldo da cadeira do Vivienne.

Larkin se encolheu de ombros.

—Possivelmente. Mentiria se dissesse que a garota era de caráter moral sólido. Mas te posso assegurar que tanto sua história como seu terror realmente eram convincentes.

—Segue —ordenou Kane, suprimindo um bocejo— Meus convidados tinham esperanças de outro recital de poesia do Julian depois de que jantássemos, mas estou seguro de que sua história resultará ser tão entretida, se não mais.

O oficial ignorou o sarcasmo.

—Segundo a garota, o incidente ocorreu pouco depois da meia-noite quando ela e seu acompanhante passeavam pela Charing Cross.

—Devo assumir que o companheiro era um antigo conhecido? —perguntou Kane amavelmente.

—Realmente —Larkin confessou— o tinha encontrado só minutos antes fora de um dos infernos de jogo de azar no Beco do Ladrão de carteira. Detiveram-se sob um farol para… —vacilou, roubando uma olhada aflita ao perfil de porcelana do Vivienne—… conversar quando foram atacados por um desconhecido em uma larga capa negra.

—Atacados? Repetiu Julian—. Como? Ameaçou-os ele com um pau? Uma faca? Uma pistola possivelmente?

—A garota não viu arma. Afirma que seu assaltante estava possuído por uma extrema destreza física. Simplesmente lhe tirou de um puxão ao homem de cima e lhe empurrou contra o farol, lhe elevando do chão com uma mão.

Caroline bicou sua codorna com seu garfo para evitar olhar os ombros fornidos do Kane.

—A garota estava tão angustiada e aterrada que caiu de joelhos e escondeu sua cara. Quando finalmente se atreveu a levantar a cabeça, seu companheiro se foi.

—Ido? —A tia Marietta repetiu estridentemente, tocando-se com uma mão sua grosa garganta.

Larkin assentiu com a cabeça.

—Desaparecido. Como: sem deixar rastro.

—Dispense, Oficial Larkin, mas se você não tem nenhum corpo para proporcionar qualquer prova de jogo sujo, então como sabe que o homem simplesmente não escapou? —Caroline não podia haver dito o que a apressou a falar. Só sabia que um silêncio cristalino tinha cansado sobre a mesa e todo mundo cravava os olhos nela.

Inclusive seu anfitrião.

O oficial limpou sua garganta, seu olhar estreitando-se em sua cara como se a visse pela primeira vez.

—Uma pergunta válida, Senhorita Cabot, mas com este incidente lhe pegando nos talões aos outros desaparecimentos na área, não temos mais remedeio que tratá-lo com igual suspicacia. Especialmente logo depois do que o assaltante fez depois.

—O que fez ? —disse relutantemente, perguntando-se se era muito tarde para saltar através da mesa e tampar os ouvidos de Porta.

Os convidados sustentaram suas respirações coletivas enquanto aguardavam sua resposta. Inclusive Vivienne lhe jogou um olhar furtivo, seus lábios tremendo.

Larkin dobrou sua cabeça, sua larga cara taciturna.

—Segundo a jovem, abordou-a e lhe ajudou a levantar-se. Sua cara estava na sombra, mas ela descreveu que possuía os maneiras e o comportamento «de um senhor». Lhe intrometeu um soberano de ouro em sua mão e lhe disse que corresse a toda pressa a casa com sua mãe porque havia piores monstros que ele vagabundeando na noite. Logo se girou, e com um redemoinho de sua capa, desapareceu dentro das sombras.

Kane ficou de pé, deixando claro que tanto sua paciência como sua hospitalidade tinham alcançado seus limites.

—Obrigado, Oficial. Foi muito amável de sua parte passar de visita e compartilhar esta fascinante historia comigo e meus convidados. Posso-lhe assegurar que escutaremos sua advertência e tomaremos cuidado em evitar Charing Cross depois de pôr-do-sol.

Larkin se levantou, de cara a ele na mesa.

—Vejo que você o faz. —Enquanto dois lacaios corpulentos apareciam na porta, um sorriso sardônico curvou seus lábios—. Aprecio a cortesia, mas acredito que posso encontrar minha própria saída. —fez uma pausa na entrada como se tivesse esquecido algo tão insignificante como uma luva ou um lenço—Quase me esqueci de mencionar que me topei com um velho nosso amigo de Oxford, justamente, o outro dia no Covent Garden… Victor Duvalier.

Embora Julian visivelmente empalideceu, a cara do Kane pôde ter estado esculpida de pedra.

—Aparentemente, retornou a Londres depois de uma vasta expedição pelos Cárpatos. Disse-me que lhe desse suas saudações afetuosas e que te dissesse que esperava que seus caminhos se cruzassem muito em breve.

—Como espero eu —murmurou Kane, algo em sua cara impassível enviou outro tremor à coluna vertebral do Caroline.

Antes de girar para partir, Larkin esboçou uma reverência surpreendentemente graciosa em direção ao Vivienne.

—Senhorita Vivienne.

—Sr. Larkin —devolveu, voltando-se de retorno para bater a congelada sopa como se o futuro inteiro da Inglaterra dependesse disso.

Flanqueado pelos lacaios, o oficial se foi, deixando um silêncio embaraçoso em sua esteira.

—Em vez que você e as senhoras nos prevêem de sua companhia para que possamos desfrutar de nosso porto, por que não nos dirigimos ao salão para a sobremesa? —sugeriu Kane e se inclinou para Porta— Se você desdobrará seu sorriso mais bonito, querida, poderia simplesmente enrolar ao Julian em recitar outra estrofe ou dois do Byron.

Porta se arrastou ansiosamente fora de sua cadeira enquanto o resto dos convidados se levantavam e começavam a caminhar sem rumo fora do salão, lentamente para reatar seu bate-papo.

—Posso falar com você, Senhorita Cabot? —perguntou Kane enquanto Caroline se deslizava fora de sua cadeira.

—Certamente, milord —girou, sobressaltada novamente por seu tamanho. Dada sua estatura, ela não estava acostumada a ter que levantar a vista precisamente para contemplar a cara de um homem. Sempre tinha estado realmente a gosto se sobressaindo em altura à primo Cecil por cima do nariz.

Não estava segura como tinha ocorrido, mas repentinamente eles dois estavam completamente sós no salão. Inclusive os serventes pareciam ter desaparecido. Como se temessem todos os vestígios de diversão nos olhos luminosos do visconde.

—Simplesmente quis que soubesse que sou perfeitamente capaz de dirigir tanto ao Larkin como suas suspeitas. Não necessito que me defenda.

Desconcertada pela reprimenda, levantou seu queixo.

--Não defendia a ninguém. Fazia simplesmente uma pergunta, a qual alguém com uma noção de sentido comum faria .

Ele se inclinou mais perto, sua fumegante voz de barítono lançada só em cima de um grunhido.

—Se você tiver noção do sentido comum, senhorita Cabot, não se implicará em meus assuntos.

Sua boca se abriu involuntariamente, mas antes que pudesse forjar uma réplica, ele tinha esboçado uma brusca reverência, girado sobre seus calcanhares, e afastando-se andava a grandes passos pelo quarto.

Caroline fechou de repente sua boca. O oficial Larkin poderia ter expresso suas advertências na urbanidade, mas não poderia haver duvida a respeito das arrudas palavras do Kane.

Ela tinha sido advertida.

 

A lua cavalgava desce no céu sem estrelas quando as irmãs Cabot finalmente murmuraram suas despedidas educadas e se foram da casa da cidade do visconde. Uma névoa fina se pegava às árvores e a erva, nublando os borde da noite adoecendo. Ainda a incontida Porta começava a arrastar seus pés calçados com sandálias. Caroline suspeitou que sua irmãzinha estaria profundamente dormida em seu ombro antes que sua carruagem ficasse em marcha. Afogou um bocejo em sua luva enquanto a Tia Marietta tomava a mão do lacaio e se elevava dentro da carruagem esperando.

—Senhorita Cabot? —As três irmãs se deram a volta, quando um homem se separou da parede de pedra baixa que confinava com o passeio. Mas foi Caroline quem suportou o peso de seu olhar fixo marrom—. Me perdoe por assustá-la, mas me perguntava se poderia ter um momento de seu tempo.

O oficial Larkin estava parado diante dela, humildemente. Devia ter estado posado sobre essa parede esperando que elas aparecessem quase três horas. A julgar pelas sombras sob seus olhos, esta não era sua primeira noite sem dormir, nem seria a última

Para surpresa do Caroline, foi Vivienne quem falou.

—Eu não lhe falaria se fosse você, Caro. É apenas correto para um homem abordar a uma senhorita na rua.

—É um policial, querida, não um assassino da tocha —replicou Caroline— por que não me esperam as duas na carruagem com Tia Marietta? Só será um momento.

Vivienne vacilou justamente o tempo suficiente para lhe jogar ao oficial um olhar desdenhoso antes de subir dentro da carruagem, sua boca suave, rosada comprimida em uma linha desaprovadora.

Caroline conduziu ao Larkin uns poucos passos longe, assegurando-se de que estavam fora do alcance do ouvido de suas irmãs. Porta sempre tinha podido conseguir ouvir uma delicadeza suculenta de bisbilhoteiro a cem passos.

—Apreciaria se você pudesse fazer isto breve, Oficial. Preciso retornar com minhas irmãs à residência de minha tia. Não estamos acostumadas a continuar a horas tão extravagantes.

Embora fez um valente intento, Larkin realmente não pôde esconder o desejo em seus olhos quando jogou um olhar furtivo à carruagem.

—Posso ver que você se toma sua responsabilidade pelo bem-estar delas muito seriamente. O que é precisamente por que devia lhe falar. Queria lhe advertir que tome cuidado no concernente à Senhorita Vivienne. —Ainda evitando o olhar fixo do Caroline, volteou seu chapéu em suas mãos, seus dedos fracos acariciando a asa— Embora só conheci a sua irmã durante pouco tempo, tenho-lhe em muito alta avaliação e eu nunca me perdoaria que qualquer dano lhe viesse.

—Nem o faria eu, Oficial. O qual é precisamente por que deve parar de deixar cair estes indícios horripilantes e simplesmente me dizer se tiver alguma evidência para provar que Lorde Trevelyan é um perigo para minha irmã ou qualquer outra mulher.

Sacudiu com força sua cabeça, explicitamente desarmado de equilíbrio por sua franqueza.

—Possivelmente você lhe deveria perguntar o que lhe aconteceu à última mulher que cortejou. Uma mulher que albergava um parecido mais que surpreendente com sua irmã.

Quando divisou pela primeira vez ao Vivienne, voltou-se tão branco que teria pensado que ele tinha visto um fantasma.

Enquanto a voz escandalosa da Tia Marietta ressonava em sua memória, Caroline sentiu uma onda fria através dela.

—Possivelmente deveria perguntar-lhe a você.

—Eu não tenho a resposta. Eloisa Markham desapareceu sem deixar sinal faz mais de cinco anos. O mistério rodeando seu desaparecimento não foi nunca solucionado. Sua família finalmente decidiu que simplesmente devia ter declinado os afetos do Kane e haver-se fugido com seu amante a Gretna Green com alguém sem dinheiro que nunca prosperaria.

Era difícil imaginar a qualquer mulher desprezando os afetos de um homem como Kane.

—Mas você não crê isto?

O silêncio do oficial foi resposta suficiente.

Caroline suspirou.

—Tem alguma prova qualquer que Lorde Trevelyan está relacionado com seu desaparecimento ou a de qualquer de outros?

Larkin ficou muito silencioso, seu olhar se estreitou sobre sua cara.

—Em lugar de me interrogar a mim, Senhorita Cabot, possivelmente deveria perguntar-se por que se sente obrigada a lhe defender.

Caroline se endireitou. Esta era a segunda vez que tinha sido acusada de tal atrocidade em só umas poucas breves horas.

—Não lhe defendo. Eu simplesmente me recuso a estelar as esperanças de minha irmã para um futuro feliz e próspero quando você não tem um só farrapo de prova para lhe condenar.

—Como posso solicitar provas de um fantasma? —Percebendo o olhar preocupado que Caroline lançou a carruagem, Larkin baixou sua voz até um sussurro feroz— Como posso caçar a um homem que se move como uma sombra através da noite?

Caroline riu, dizendo-se a si mesmo que era só a fatiga o que lhe dava ao som um bordo histérico.

—O que está tratando de dizer, Oficial? Que você, um homem que aparentemente decidiu dedicar tanto sua vida como sua vocação a inconquistável perseguição da lógica e a verdade, também acredita que o visconde verdadeiramente poderia ser um vampiro?

Larkin contemplou acima a uma das janelas obscurecidas no terceiro piso da casa da cidade, em sua cara transbordaram linhas sombrias.

—Não sei exatamente o que é. Só sei que a morte lhe segue em qualquer lugar que vai.

Em qualquer outra circunstância, suas palavras poderiam ter provocado mais risada. Mas estando parada diante da casa de um desconhecido em uma cidade pouco familiar no frio do pré-amanhecer, Caroline se viu forçada a abraçar sua capa mais estreitamente ao redor dela.

—Esse é um sentimento mais digno da pluma caprichosa do Byron, não crie?

—Possivelmente Byron esteja simplesmente disposto a recrear a noção que não cada mistério pode ser solucionado pela lógica. Se você estiver verdadeiramente preocupada com o bem-estar de sua irmã, então firmemente sugiro que faça o mesmo.

Enquanto ficava seu chapéu e girava para ir-se ela disse.

—Não posso menos que me perguntar se não haver um motivo mais pessoal detrás de suas suspeitas, Oficial. Mencionou que você e Lorde Trevelyan assistiram à universidade juntos. Possivelmente este é só seu modo de colocar um rancor contra um velho inimigo.

—Inimigo? —replicou Larkin, retrocedendo. Inclusive enquanto uma esquina de sua boca se inclinava em um sorriso pesaroso, uma tristeza inefável nublava seus olhos— Ao contrário, Senhorita Cabot. Amei ao Adrian como um irmão. Foi meu mais querido amigo.

Inclinou seu chapéu para ela antes de afastar-se andando, deixando a de pé a sós na névoa.

 

—Maldito Larkin até o Inferno e de volta! — jurou Adrian, olhando o passo lento do oficial fora, como se ele não tivesse nenhuma preocupação no mundo.

Caroline Cabot estava de pé em meio da rua debaixo, vendo-se como uma garotinha perdida. A névoa se formava redemoinhos ao redor dela, formando uma dobra avidamente na prega de sua capa.

Enquanto Adrian observava das sombras do telhado, ela girou e lançou um olhar preocupado à casa da cidade. Seus olhos cinzas observando eram tão claros, tão incisivos, que ele quase se mergulhou depois de uma chaminé de tijolo antes de recordar a capa de escuridão que lhe protegia, como sempre fazia.

Ela girou e subiu à carruagem que esperava, seus ombros baixando bruscamente com esgotamento. Quando a carruagem se afastou, Adrian caminhou a grandes passos pelo bordo do teto, observando até que desapareceu ao redor de uma esquina longínqua.

Era justo como ele tinha temido. Larkin tinha estado à espreita, como uma aranha ardilosa, esperando para enredá-la em seu tecido. Falando em sua defesa, marcou-se com a mesma mancha feia de suspeita que corrompia tudo o que ele fazia. Acostumou-se fazia muito aos sussurros nervosos e as olhadas de soslaio que o seguiam a todas partes que ia. Não havia nenhuma razão para que ela não fizesse o mesmo.

—Aí está! —exclamou Julian, saindo de improviso de uma janela do apartamento de cobertura como uma caixa de surpresa embriagada. Seu zigue-zagueio era explicado pela jarra médio vazia de wisky escocês que agarrava em uma mão— Pensei que tinha saído.

—Qual seria o motivo? —Adrian observou o horizonte. Nos poucos anos passados, fez-se um perito no descobrimento da mudança mais fraco de negro à cinza.— O sol se elevará em menos de duas horas.

Julian se cambaleou e se afundou abaixo em um canhão de chaminé derrubando-se sem rastro da graça que tanto tinha deslumbrado aos convidados do Adrian.

—E não um momento muito logo, até onde me concerne —disse, bocejando amplamente— Não sei o que foi mais extenuante… ser obrigado a vomitar a poesia super-excitada por muitas horas ou ter esse olhar fixo da garotinha em mim toda a noite como se pendurasse a lua.

Um sorriso sardônico tocou os lábios do Adrian.

—Não o fez?

—Não —replicou Julian, levantando a jarra até o céu em um brinde zombador— Só as estrelas.

Por cima de suas cabeças, essas estrelas estavam piscando uma a uma, angustiando-a transição da noite. As sombras mortiças só afundavam a palidez do Julian e acentuavam os nichos sob seus olhos. A mão agarrando firmemente a jarra, traía um pequeno tremor visível.

Adrian cabeceou para a jarra, sentindo seu coração retorcer-se com uma preocupação que se estava voltando excessivamente familiar.

—Pensa que isso é realmente sábio?

—Ganha na alternativa—disse Julian sarcásticamente, tomando outro profundo gole— Há só um tanto de estranho rosbife que um tipo pode estrangular abaixo em uma noite. Além disso, tenho todo o direito para celebrar, como o faço. Não ouviu o Larkin? Depois de rastrear ao Duvalier através de cada sórdido oco do inferno nos sete moderados, finalmente temos ao bastardo em nossas miras. Cai diretamente em nossa pequena armadilha.

Adrian bufou.

—Ou tendendo uma armadilha própria.

Julian se reclinou sobre seus cotovelos, cruzando suas largas pernas pelos tornozelos.

—Pensa que a viu já? Ou foram justamente os rumores de sua iminente dita romântica o que finalmente lhe tentou de volta a Londres?

—Estou seguro de que o mero pensamento que eu possa encontrar a felicidade nos braços de qualquer mulher lhe deve impulsionar a uma demente fúria. Tratei que arrumá-lo para que não tenha mais que seu vislumbre até a festa do baile. Por isso é que estivemos freqüentando teatros escuros e jantares privados. Quero aguçar seu primeiro apetite, para lhe atrair tão profundo em nossa rede que escapar seja impossível.

—O que te faz pensar que agarrará a ceva e seguirá ao Wiltshire?

—Porque a metade de Londres seguirá ao Wiltshire. Sabe tão bem como eu que um baile de disfarces dado pelo misterioso Visconde Trevelyan será o mais procurado depois do convite da Temporada. E Duvalier nunca poderia resistir a uma audiência.

Julian estendeu a mão para limpar uma bolinha de fuligem de sua bota, explicitamente pesando com cuidado suas seguintes palavras.

—Estou completamente crédulo em sua habilidade para manter ao Vivienne fora dos agarre pelo Duvalier, mas não está simplesmente um pouquinho preocupado a respeito de romper o coração da garota?

Adrian ofereceu a seu irmão um sorriso pesaroso.

—Poderia ser. Se fosse meu para romper. —Julian franziu o cenho pelo desconcerto, mas antes que seu irmão lhe pudesse perguntar mais, Adrian continuou falando do Vivienne, não acredito que sua irmã maior estivesse realmente tão apaixonada por ti como a jovem Porta o estava.

Julian pôs má cara.

—Ela era todo amido e vinagre, isso era.

—Ao contrário— disse Adrian, conservando sua cara cuidadosamente impassível.

—Encontrei a maior das senhoritas Cabot realmente intrigante.

Vivienne tinha falado de sua irmã maior com tal afeto desdenhoso que Adrian tinha esperado uma solteira seca, não uma beleza magra, de olhos cinzas vestida como a mesma Afrodita. Se Vivienne era luz do sol, então Caroline era luz de lua… loiro prateado, brumoso, efêmero. Se se tivesse atrevido a tocá-la, Adrian temia que ela se teria derretido como raios lunares através de seus dedos.

Julian rematou o wisky escocês, logo se limpou sua boca com o dorso de sua mão.

—Não parecia estar particularmente apaixonada por ti, tampouco. Se era sua bênção o que estava procurando, temo que está condenado à decepção.

—Deixei de procurar bênçãos faz muito tempo. Tudo o que precisava era alguma segurança que não se misturaria nos assuntos de sua irmã. Mas graças à miserável sentido da oportunidade do Larkin, temo que tudo o que consegui fazer esta noite foi avivar sua curiosidade.

Julian se incorporou, com o cenho franzido preocupado enrugando sua frente.

—Agora que sabemos que nosso plano está em marcha, não podemos permitir deixar ao Duvalier escapulir-se de nossos dedos outra vez. Você não pensa que ela poderia expor um problema, verdade?

Adrian recordou aqueles momentos indefesos antes que Caroline se deu conta quem era ele. Tinha ficado cego pelo brilho pícaro em seus olhos, o borrifo quase imperceptível de sardas sobre suas bochechas, a plenitude convidativa de seus lábios e o brilho de suas covinhas, tão em contradição com a pureza angular de suas maçãs do rosto altas e seu pequeno nariz afiado. Nunca tinha pretendido que sua brincadeira florescesse em um flerte em toda a extensão da palavra. Mas todas suas nobres intenções tinham saído voando pela porta do terraço quando lhe contemplou como se quisesse que a engolira.

Voltou seu olhar para o horizonte esclarecendo-se, desejando poder dar a bem-vinda à saída do sol em lugar de temê-la.

—Não se puder malditamente evitá-lo.

 

—Apesar de ser um vampiro, encontrei que Lorde Trevelyan é uma alma bondosa ontem à noite —comentou Porta.

—Pensei que os vampiros não tinham almas —resmungou Caroline, marcando o passo no salão octagonal de sua tia como se fora uma jaula.

A tia Marietta e Vivienne tinham aceito um convite para a reunião de cartas do Lady Marlybone, deixando ao Caroline e Porta para que fizessem o que quisessem. Os serventes se retiraram cedo, aliviados por estar livres das demandas tirânicas de sua ama.

Caroline fez uma mudança abrupta na direção, quase tropeçando com um travesseiro cheio. Os alojamentos de três pisos de sua tia ocupavam exatamente a metade de uma casa urbana estreita. O salãozinho era tão afetado e empolado como a Tia Marietta. Caroline podia alcançar apenas uma taça de chá sem enredar sua manga na vara de alguma pastora de porcelana a China sorrindo bobamente. Uma lhe enjoem grande coleção de zarazas florais e abundantes brocados cobria os numerosos sofás, cadeiras, e ocasionais mesas.

Porta estava enroscada em uma daquelas cadeiras, seus pés nus colocados sob a prega de sua camisola de linho, um livro dos poemas do Byron recostado em seu regaço. Seus cachos escuros apareciam sob uma boina revolta.

—Não pensa que Julian seria um vampiro muito mais distinto que seu irmão? Tem tais mãos elegantes e olhos sentimentais... —abraçou o volume encadernado em couro contra seu peito, um sorriso sonhador encurvou seus lábios— Não é muito velho para mim, sabe. Tem só vinte e dois anos, cinco anos mais jovem que o visconde. Se Vivienne consegue casar-se com Lorde Trevelyan, pensa que ela poderia persuadir ao Julian para oferecer por mim?

Caroline trocou de direção e contemplou a sua irmã.

—Devo entender que agora que você te encontraste com seu OH! tão arrumado e sempre tão elegível irmão, está disposta a passar por cima o fato que crê que Lorde Trevelyan é um vampiro?

Porta piscou.

—Não é você quem sempre me impulsiona a ser mais prática?

Enquanto Porta intrometia seu nariz de volta no livro, Caroline negou com a cabeça e reatou seu passeio. Supunha que não tinha direito a arreganhar duramente a Porta por suas ridículas suspeitas quando começava a sentir como se Adrian Kane tivesse arrojado alguma classe de feitiço hipnótico sobre ela. Não tinha pensado em nada —nem em ninguém— mais do primeiro momento que lhe tinha devotado seu lenço. Certamente não poderia admitir a Porta que tinha intrometido esse inofensivo recorte de linho sob seu travesseiro ao retornar da casa urbana do visconde. Ou que o tivesse tirado o despertar para ver se um sopro tentador de perfume de louro e sândalo ainda se aferrava a suas exuberantes dobras.

Embora Kane tinha sido o perfeito cavalheiro durante a maior parte da noite, Caroline estava ainda enfeitiçada por esse momento no salão quando sua máscara de urbanidade tinha escorregado, revelando que poderia ser até mais perigoso do que Porta suspeitava. Segundo o Oficial Larkin, o suficiente perigoso para fazer que uma jovem que possuía um estranho parecido com sua irmã desaparecesse do mapa.

Tratou de inspirar profundamente, mas a sufocante doçura do perfume de lavanda de sua tia parecia pegar-se a cada esquina da desordenada casa urbana.

E se essa Eloisa Markham se parecesse realmente ao Vivienne? Era tão terrível imaginar que um homem poderia ser atraído a uma mulher que recordava a seu amor perdido? Sobre tudo se a tinha perdido por outro homem.

Caroline tinha passado a tarde procurando qualquer signo de uma grande paixão entre Vivienne e seu visconde… olhadas largas, persistentes, um ligeiro roce discreto de mãos quando pensavam que ninguém estava olhando, escapulir-se detrás de um vaso de barro com palmeira para compartilhar um beijo apaixonado. Mas foram o mesmo modelo da decência. Kane tinha rido as brincadeiras de sua irmã, deu-lhe efusivos louvores quando toco mediocremente a harpa, e freou de espremer o cabelo quando ela disse algo particularmente sagaz. Parecia que tratava a Vivienne com o mesmo afeto carinhoso que poderia mostrar a um amado primo ou um apreciado mascote.

Caroline esfregou sua frente sulcada de rugas. E se os afetos do Vivienne estavam mais profundamente comprometidos que os do Kane? A diferencia de Porta, Vivienne nunca tinha sido alguém que levasse o coração na mão. Caroline não poderia suportar a idéia de romper esse tenro coração quando suas únicas armas eram rumores e acusações não demonstradas. Era também agudamente consciente que o coração do Vivienne não era a única coisa em jogo. Não com o primo Cecil ameaçando as lançando à rua se não se comprometia a «lhe olhar mais bondosamente» no futuro.

Estremeceu-se ante esse pensamento. Não estava ainda pronta para condenar ao Kane. Não quando sabia seguro que o primo Cecil era um monstro.

Mas mesmo assim não podia evitar perguntar-se que pecado poderia ser tão escuro para converter ao melhor amigo do Kane em seu inimigo jurado? E quem era o misterioso Victor Duvalier? O oficial obviamente tinha usado o nome do homem como uma brincadeira. A reação da cara pedregosa do Kane só lhe tinha feito parecer mais culpado, não menos. Especialmente quando seu irmão se tornou tão pálido como um cadáver pela mera menção do nome.

Caroline vagou até a janela. Em uns poucos dias ela e Porta seriam desterradas de retorno a sua velha casa de campo ventosa no Edgeleaf. Mas como podia deixar Londres, sabendo que poderia abandonar sua irmã à mercê de um vilão?

Enquanto contemplava as sombras da noite, perguntando-se que segredos escuros suportavam, a advertência do Oficial Larkin ressonou através de sua memória: Não sei exatamente o que é. Só sei que a morte lhe segue em qualquer lugar que vai.

—A morte não será o único lhe seguindo esta noite —murmurou ela. Se o Oficial Larkin não lhe podia brindar a prova que necessitava para condenar ou exonerar ao Kane, simplesmente teria que fazer um pouco de investigação própria.

—Disse algo? —perguntou Porta, levantando o olhar de seu livro.

—Com toda segurança o fiz —respondeu Caroline, voltando energicamente as costas à janela— Vista-se e vai por sua capa. Saímos.

Sentindo alguma excitação estranha estava em marcha, Porta fechou de repente seu livro e engatinhou fora da cadeira, seus olhos cintilando com ilusão.

—Onde vamos?

Quando o olhar fixo do Caroline caiu em um par de poeirentas meias máscaras de papel maché descansando no suporte da chaminé de sua tia, lembranças de alguma mascarada por muito tempo esquecida, um sorriso sombrio curvou seus lábios.

—A caçar um vampiro.

 

Quando ela e Porta se deslizaram do coche alugado, até o Caroline teve que admitir que era uma boa noite para que os vampiros e outras criaturas da noite estivessem em pé… ventosa e inoportunamente quente, com uma quantidade suficiente de ameaça de chuva no ar para agitar os ramos das árvores e o jogo das florescentes folhas de maio. Uma meia lua tímida aparecia pelo véu andrajoso das nuvens. Ao menos elas estavam a salvo dos homens lobos, Caroline pensou sardonicamente.

Tinha gasto quase a última moeda de sua magra atribuição para contratar o transporte. Agora teria que retornar ao Edgeleaf e implorar à primo Cecil uma mísera renda para as tirar do apuro até final de mês. Ele juraria que tinham esbanjado seu dinheiro na vida luxuosa de Londres. Em lugar disso, tinham consumido uma hora sentada em um pangaré alugado tão emprestado de fumaça de puro e perfume rançoso, à espera de que Lorde Trevelyan emergisse de sua casa urbana.

Caroline tinha estado disposta a reconhecer a derrota quando a jactanciosa carruagem do visconde tinha emerso do beco que corria por detrás da fileira de casas. Tinha cravado para despertar a uma Porta que dormitava e tinha feito assinale ao condutor, o qual, tinha recebido ordens para seguir a carruagem a uma distância discreta. Uma vez que o visconde alcançou seu destino, ela e Porta tinham feito uma pausa para grampear suas capas e ajustar as máscaras de folhas de ouro que cobriam só a metade superior de suas caras antes de ansiosamente abandonar o interior mofado da carruagem para a noite quente, ventosa.

—OH, Meu Deus! —Porta respirou, olhando fixamente para cima com temor.

Caroline esteve tentada a fazer o mesmo. Tinha esperado que Kane as conduzisse a algum beco úmido, mas em troca as tinha atraído a um dos reino de fadas imaginárias de Porta, gastos a vibrante vida por uma garoa de pó de duendes e o ligeiro golpe de uma varinha mágica.

Enquanto contemplava acima aos faróis oscilantes trespassados por entre os ramos dos olmos, e ouvia as variedades distantes de violino e bandolim, Caroline se precaveu que estavam de pé diante das entradas do Vauxhall, os jardins de prazer mais celebrados —e notórios— em todo Londres.

Seu coração se saltou uma pulsação quando Adrian Kane emergiu da fila de veículos estacionados diante delas. A diferença de um dos reino fantásticos de Porta, este lugar sustentava tanto encantamento como perigo.

O visconde não levava chapéu e o mel quente de seu cabelo brilhava sob o beijo da luz do farol. A capa de longitude até a cintura de seu casaco fazia seus ombros ver-se até mais largos e intimidantes. Ele jogou um olhar em sua direção, seus olhos penetrantes esquadrinhando à multidão. Caroline agarrou o cotovelo de Porta e se agachou rapidamente detrás de uma matrona corpulenta, enquanto pensava que ia diretamente para trás até elas e a sacudiria com força pela orelha.

Mas quando apareceu pelo ombro da mulher, tinha dado meia volta e posto-se a andar para a entrada, fortificação em mão.

—Rápido! Aí vai. —Agarrando a Porta da mão, Caroline se cambaleou em um trote torpe para igualar as largas pernadas dele.

Apesar das insinuações do Oficial Larkin, não havia nada furtivo em torno dos movimentos do Kane. Caminhava na noite como se a possuísse, os ombros e a cabeça elevados sobre a maior parte dos clientes que se dirigiam ao jardim.

—Eu mas bem esperava que Julian estivesse com ele —confessou Porta já sem fôlego por seu passo enérgico.

—Entendo que à maioria de predadores gostam de caçar a sós —Caroline resmungou sem pensar.

Porta se deteve em seco, sacudindo com força ao Caroline para que parasse. Caroline se deu a volta para encontrar a sua irmã contemplando-a, seus olhos redondos pela incredulidade.

—Pensei que estávamos aqui por uma brincadeira —disse Porta— Pensa me dizer que não brincava sobre caçar um vampiro? Realmente crie que o visconde poderia ser um vampiro?

—Não estou segura do que acredito —respondeu Caroline em tom grave, atirando de sua irmã para que se movesse.— Mas tenho a intenção de averiguá-lo esta noite.

Estavam quase pela porta do jardim quando um homem parcialmente calvo em calça e camisa caseiras estendeu a mão desde seu barraco de madeira para bloquear seu caminho.

—Sou ali, senhoras!

Embora se dirigiu a elas como «senhoras», não havia equívoco no brilho cético em seus olhos. Caroline logo que poderia lhe culpar por pensar o pior de duas jovens fêmeas sem chaperona fora da cidade a esta hora ímpia. Ela era dolorosamente consciente que arriscava as reputações de ambas. Mas como podia pesar suas reputações contra o futuro total do Vivienne? Só poderia pedir que as máscaras as mantivessem de ser reconhecidas por qualquer no círculo social da Tia Marietta.

Logo que jogando um olhar ao homem, saltou de cima abaixo nas pontas dos pés, desesperada-se por conservar ao Kane na vista.

—Temos uma pressa terrível, senhor. Pode apartar-se por favor?

—Não até que solte três xelins por cabeça.

Quando começou a cravar os olhos nele inexpresivamente, suspirou e pôs seus olhos em branco.

—Para o ingresso ao jardim.

—OH! —Caroline retrocedeu com consternação. Este era um custo que não tinha esperado, um que as deixaria com um pouco mais de um punhado de peniques em seus cofres, que diminuíam rapidamente. Mas a não ser que queriam retornar às estalagens de Tia Marieta não mais soube do que eram antes de partir, não tinha muita opção. Kane já se perdia de vista.

Tirando sua retícula de seda do bolso interior de sua capa, Caroline contou o dinheiro e o jogou na mão estendida do homem.

Ela e Porta se apressaram através da porta tiradas da mão. Os farristas se aglomeravam no Grande Passeio do jardim. As lanternas cintilavam como estrelas entre os ramos majestosos dos olmos que bordavam a estrada de cascalho. Os amantes passeavam do braço no meio do ar perfumado com o jasmim da noite e as castanhas assadas.

Uma senhora com muito busto passou rapidamente a seu lado, arrastada por um menino uniformizado, sua peruca empoeirada era tão branca como a neve, sua pele Lisa tão escura como ébano gentil. Um punhado de meninos se lançou pela multidão como elfos animados, seus olhos brilhavam com travessura e seus dedinhos gordos sujeitavam bolachas de açúcar ou qualquer outro doce que logo tinham convencido a seus pais que comprassem. Um homem de olhos negros se deteve junto a uma fonte de mármore, sob seu queixo sustentava um violino que chiava uma melodia melancólica.

Enquanto olhava todos os monumentos agradáveis ao redor delas, os passos de Porta se atrasaram. Caroline dificilmente poderia culpá-la. Ela mesma estava em grave perigo de cair sob o encanto do jardim. Mas foi sacudida de seu feitiço por um arrogante grupo de tipos que observaram com muita insistência e muito tempo o peito de Porta. Fazia apenas uns dias, tinha ouvido por acaso à Tia Marieta e a alguns de seus amigos murmurando sobre uma jovenzinha desafortunada que tinha sido arranco do lado de sua mãe em um dos sítios sombrios que rodeavam os jardins por um par de bêbados de sangue jovem que tinha intenções da pior classe de maldade.

—Depressa, Porta —insistiu Caroline, aproximando de sua irmã ainda mais —Não devemos deixá-lo afastar-se muito de nós! —Manteve seu olhar fixo sobre o Kane, seus poderosos ombros pareceram de repente mais uma comodidade que uma ameaça.

Tinham avançado só uns passos quando Porta a obrigou a deter-se de novo. —OH, olhe, Caro! Têm gelado!

Caroline se girou para encontrar a sua irmã olhando com desejo um vendedor italiano que entregava um cone de papel cheio de sorvete de limão a uma senhorita elegantemente vestida de uma idade próxima a de Porta.

—Por favor, Porta! Não temos nem o tempo nem o dinheiro para tais tolices neste momento. —Caroline arrastou a sua irmã de volta à ação, mas quando seus olhos exploraram o caminho diante delas, deu-se conta de que era muito tarde. Kane se tinha ido.

—OH, não! —suspirou, soltando a mão de Porta.

Deixando a sua irmã ali de pé, abriu-se caminho entre a multidão, tirando-a máscara para procurar o visconde com desespero. Mas foi inútil. Kane tinha desaparecido, tragado pela corrente constante de farristas.

Farristas ou vítimas?, Perguntou-se, tocada por um frio repentino.

Esse fritou se converteu em um profundo horor quando escutou o cacarejo familiar de uma risada. Sem pensar, volteou ao redor. Tia Marieta e Vivienne estavam percorrendo o atalho, dirigindo-se diretamente para ela. Tinham passado ao lado de Porta, muito absortas em seu bate-papo para notar a jovem mascarada que estava paralisava a metade do caminho.

Intercambiando um olhar aterrorizado com Porta, Caroline procurou as cintas de sua máscara. Em um par de segundos as mulheres estariam onde ela.

—Tia Marieta! —gritou Porta, despojando-se da máscara.

As duas mulheres se voltaram para mesmo tempo. Caroline não sabia se tornar-se a chorar de medo ou de alívio.

 —Porta? É você? —chamou Vivienne, o atordoamento soava em sua voz.

A cara de Porta se enrugou. —OH, Vivienne! Tia Marietta! Estava tão assustada! Alegra-me tanto que tenham vindo! —jogou-se na Tia Marieta, lhe envolvendo a ampla cintura com os braços e enterrando seu rosto em seu peito com volantes.

Depois das costas de sua tia, fez- um sinal frenético ao Caroline. Esta obedeceu o sinal, escondendo-se detrás da bela coluna de um templo gótico ao bordo do caminho.

—Que diabos está fazendo aqui, menina? —clamou a Tia Marietta, fazendo uma careta de desgosto enquanto tirava as mãos de Porta de seu vestido— Se supõe que deveria estar em casa em cama.

Porta se ergueu, mas não antes de usar um dos volantes de sua tia para soá-la nariz. —Temo que fui muito desobediente —confessou, ainda respirando penosamente.— Estava terrivelmente zangada contigo por me deixar esta noite quando me inteirei de que só faltavam uns quantos dias para que me partisse de retorno ao campo. Sempre quis ver Vauxhall, assim esperei a que Caroline dormisse, roubei algumas moedas de sua bolsa, e me escapei da casa. Mas tão logo cheguei aqui, dava-me conta de que tinha cometido um engano terrível. Assustei-me tanto, e agora só quero ir a CA—a—seja! —a voz rompeu em um chiado.

Caroline pôs os olhos em branco, agradecendo pela primeira vez que seu irmãzinha sempre tivesse sido uma mentirosa tão convincente. A gente teria que possuir um coração de pedra para duvidar de seus olhos chorosos e seus lábios trementes.

—Vá, menina má! Deveria te enviar de retorno ao Edgeleaf a primeira hora da manhã. —Quando a Tia Marietta levantou um grosso punho para lhe devorar as orelhas a Porta, Caroline se esticou, pronta para saltar fora do lugar onde estava escondida.

—O que estão fazendo vocês dois aqui? —reclamou Porta, seu tom foi o suficientemente acusador para aturdir à Tia Marietta, que baixou sua mão.— por que não estão em sua apreciada partida de naipes?

—Lady Marlybone estava doente e não tínhamos um quarto para nossa mesa —explicou a Tia Marietta.

—Era uma noite tão bela que Tia sugeriu que déssemos um passeio pelos jardins antes de nos retirar. —uma nota de felicidade insuficientemente reprimida se insinuou na voz do Vivienne.— Posso-te assegurar que não tem nada que ver com o fato de que reconhecêssemos a insígnia de Lorde Trevelyan em uma das carruagens estacionadas fora.

Tia Marietta suspirou. —Já não há mais remédio, não é certo? Deve vir conosco também. Me recuso a deixar que uma menina desobediente arruíne uma noite tão agradável. Suponho que não é culpa tua que essa tola irmã minha nunca te ensinasse maneiras. Tive a boa fortuna de receber tanto a beleza como a inteligência na família.

Elevando seu enorme nariz no ar, a Tia Marietta enlaçou o braço ao do Vivienne e se afastou caminhando pelo atalho, sem lhe dar outra opção a Porta mais que apressar-se às seguir. Porta ficou um pouco atrás, só o suficiente para piscar os olhos um olho ao Caroline, lhe dando a ela uma silenciosa bênção para que procedesse com sua missão.

Caroline se endireitou lentamente, seu coração se encheu de gratidão. A manobra de sua irmã menor lhe tinha brindado tempo e oportunidade.

Colocando-a máscara e atando-as cintas, apressou-se pelo caminho onde Kane tinha desaparecido, determinada a encontrá-lo antes que elas o fizessem.

Caroline nunca tinha imaginado que era possível sentir-se tão só enquanto te rodeava tanta gente. Percorria os caminhos aglomerados do jardim, examinando o rosto e a forma de cada cavalheiro em vão. Duas vezes teria jurado que pôde captar um vislumbre de cabelo dourado e o imperioso giro de uma capa justo diante dela, mas não se abriria passo através do tumulto só para achar-se navegando em muito desconhecidos.

Ao tempo que a noite avançava e as multidões começavam a diminuir, um grupo de galãs e senhoritas passaram rendo bobamente, com seus rostos também mascarados. As sombras salpicadas davam a seus olhos ocos e seus lábios lascivos um molde sinistro. Um deles sacudiu um molho de sinos frente a sua cara, gargalhando-se grosseiramente.

Ela retrocedeu, apertando os dentes. Começou a desejar ter sido a que corresse aos braços da Tia Marietta, soluçando e suplicando perdão, quando descobriu a um homem solitário entre as árvores, partindo por um caminho que corria paralelo ao dele.

Com seu pulso acelerando-se, Caroline esquivou o ramo de um cedro e transitou através do claro. Saiu por uma área deserta do passeio. Não havia sinais do homem que tinha visto.

O caminho era mais estreito aqui, as lanternas estavam penetradas mais à parte, as árvores mais perto. Os ramos entrelaçados formavam um pavilhão escuro sobre sua cabeça, bloqueando os últimos rastros da luz da lua. Com o coração afogado, Caroline compreendeu que devia ter tropeçado com o infame Passeio do Amante, o mais legendário lugar de encontro em todo Londres.

A reputação do Passeio se pulverizou por todo Edgeleaf. Dizia-se que aqui, entre estes atalhos ventosos e claros frondosos, as damas que se casaram por dinheiro deviam encontrar amor. Aqui os cavalheiros que tinham sido desterrados dos frios leitos de suas esposas vinham em busca de braços mais quentes e acolhedores. Aqui tanto os libertinos como os respeitados membros da Câmara dos Lordes vinham para agradar seus apetites de prazeres tão escuros e deliciosos que ninguém se atrevia sequer a sussurrar.

Caroline escutou um gemido baixo proveniente da escuridão frente a ela. Deu um passo involuntário para o som, temendo que alguém se achasse em confusões. E como pôde ver, não eram o tipo de confusões que tinha esperado.

A tão somente uns passados do caminho, um homem sujeitava a uma mulher contra o tronco liso de uma grande árvore. Seu desalinho casual era de algum jeito mais impressionante que se tivessem estado nus. O casaco e a camisa do homem penduravam pela metade fora de seus ombros bronzeados, enquanto a saia da mulher tinha sido levantada por cima dos joelhos, revelando um vislumbre de meias de seda e uma coxa cremosa. O homem prodigalizava carícias e beijos sobre um dos grandes peitos que se sobressaíam pelo alto do sutiã da mulher. A outra mão tinha desaparecido por debaixo da saia.

Caroline nem sequer podia imaginar-se que lhe estava fazendo por ali abaixo que a fazia retorcer-se e gemer de forma tão desavergonhada.

Contra sua vontade, sentiu que sua própria respiração se acelerava, sua própria pele começava a acalorar-se. Os olhos ausentes da mulher se abriram e encontraram ao Caroline por cima do ombro de seu companheiro. Inchado-los lábios pelos beijos se curvaram em um sorriso satisfeito, como se ela possuísse um delicioso secreto que Caroline jamais conheceria.

Tomando o capuz de sua capa para cobrir suas bochechas ardentes, Caroline se apurou a passá-los. Teve muitas vontades de voltar sobre seus passos, mas não podia suportar o pensamento de passar junto aos amantes outra vez. Possivelmente se simplesmente seguia adiante, poderia encontrar alguma outra saída deste desconcertante labirinto de caminhos.

Durante vários minutos não viu acontecer nem uma alma. Sua sensação de inquietação cresceu com cada passo, igual ao rangido rítmico das folhas atrás dela.

—Só é o vento —murmurou, apressando o passo de novo.

Um ramo se rompeu no bosque a sua esquerda. Girou ao redor, levando uma mão ao palpitante coração. Embora seus olhos fixos não conseguiram detectar nenhuma sombra de movimento, não podia tirá-la sensação de que alguém —ou algo — a observava das sombras, uma presença malévola que se contentava esperando até que ela baixasse o guarda. Assim de rápido, o caçador se converteu em presa.

Voltou-se para correr. Logo que conseguiu dar três pernadas antes de chocar precipitadamente contra um peito masculino. Se o impacto não a tivesse aturdido, o fôlego do homem o teria feito. Obviamente tinha bebido mais que o prezado ponche do Vauxhall que tanto gostavam dos visitantes regulares do jardim. As exalações de seu fôlego eram o bastante fortes para irritar seus olhos.

Piscando para esclarecer sua visão, viu que ele era enfraquecido, loiro e o bastante maior para ter costeletas, com um pingo inofensivo de sardas na ponte do nariz. A julgar por sua cartola de castor e o corte fino de seu casaco de pano, também era um cavalheiro.

—Desculpe-me, senhor —disse ela, alagando-se de alívio enquanto tentava tomar ar.— Parece que perdi o caminho. Seria você tão amável de me dirigir de retorno ao Grande Passeio?

—Vá, o que temos aqui? —cantarolou ele, imobilizando-a com uma mão enquanto explorava debaixo de seu capuz com a outra.— Chapeuzinho Vermelha de caminho a casa de sua vovozinha?

Um segundo guri chegou balançando-se das árvores detrás dele, aterrissando sobre seus calcanhares com a graça de um gatinho jovem. O chapéu inclinado sobre seus cachos escuros.— Não te há dito ninguém que estes bosques estavam cheios de grandes lobos maus que esperam saltar em cima de garotinhas como você?

Enquanto o olhar assustado do Caroline virava de uma cara à outra, viu que estes dois não necessitavam máscaras. Seus olhares lascivos eram genuínos.

Deu um empurrão ao peito de seu captor, liberando-se de seu apertão possessivo. —Não vou caminho à casa de minha vovozinha e tampouco sou uma garotinha! —Esforçando-se por manter a voz mais estável que as mãos, acrescentou: —Posso ver que os dois são cavalheiros. Pensei que vocês estariam dispostos a emprestar ajuda a uma dama.

Enganchando os polegares no bolso de seu colete, o jovem moreno soprou. —Nenhuma dama deveria passear por este caminho só a menos que estivesse procurando um pouco de diversão.

—Estava procurando um homem —soltou Caroline, desesperada-se por fazê-los entender.

O sorriso zombador do guri loiro era muito glacial para ser tão amável. —Então, estou seguro de que dois homens serão o dobro de diversão.

 Enquanto avançavam, com cuidados passos instáveis, Caroline começou a retroceder. Em meio de uma neblina de medo, recordou à desafortunada garota a que tinham arrancado dos braços de sua mãe. Segundo Tia Marietta, ninguém tinha feito caso a seus gritos até que foi muito tarde.

Sabendo que tinha que tentar de qualquer modo, Caroline estava abrindo a boca para deixar sair um chiado espantoso quando deu diretamente aos braços de um terceiro homem.

Um poderoso braço rodeou seus ombros desde atrás, colocando-se justo em cima da elevação de seus peitos. —Lamento decepcioná-los, moços —disse o tom profundo e escuro de uma voz—, mas há mais que só lobos vagando pelo bosque esta noite.

 

Caroline tremeu de alívio, embalada pelo calor perfumado de sândalo e malagueta do abraço do Adrián Kane. Tinha-lhe prometido que não era do tipo que se deprime nos braços de um homem, mas sua força inegável fez que semelhante idéia a tentasse estranhamente. Sobre tudo unido a sua devastadora confiança em si mesmo. Não podia evitar a idéia de que era o tipo do homem que saberia exatamente que fazer com qualquer mulher que casualmente encontrasse em seus braços.

—Quem demônios é você? —exigiu seu loiro atacante, seu sorriso cordial substituído por um cenho mal-humorado.

A voz do Kane era normal, quase jovial. —Sou o que se comeu ao Grande Lobo Mau e não deixou nada salvo os ossos.

O moço intercambiou uma vacilante olhada com seu companheiro. O menino moreno deu um passo adiante até que os dois estiveram ombro com ombro.

—Saímos para praticar um pouco de deporte durante esta fresca noite da primavera, —disse com seriedade, atirando de sua cartola.— Não vamos brigar com você, senhor.

—Se quer deixá-lo assim, sugiro que você e seu amigo partam e esqueçam que alguma vez entraram por este caminho.

—Isto não é justo! —grunhiu o outro moço, tirando peito com a tola fanfarronice da juventude.— Nós a apanhamos. É nossa!

Antes que Caroline pudesse cuspir uma réplica, Kane disse brandamente, —Já não. Agora é minha.

Aquela elementar reclamação, proveniente dos lábios do Kane e pronunciada com absoluta convicção, enviou um tremor involuntário dançando pela pele do Caroline. Seu apertão se esticou, advertindo a de que ele o tinha notado.

—Pode tê-la quando tivermos terminado, se quiser, —ofereceu o jovem moreno, obviamente planejando uma futura carreira como diplomático no Ministério de assuntos interiores.— Nós, sabemos tratar a uma dama. —molhou-se o lábio superior com a língua, piscando com olhar lhe sugiram para o Caroline.— Pode começar por implorar compaixão, mas quando tivermos acabado, implorará por mais.

O corpo inteiro do Kane ficou tenso, como se se preparasse para saltar. Mas simplesmente disse, —Não, obrigado. Eu sempre tive predileção pela carne fresca.

Horrorizada por sua deliberada crueldade, Caroline ficou rígida. Tentou voltar-se para ver sua expressão, mas seu implacável apertão a manteve quieta.

—É uma estupidez, —declarou o menino loiro.—Somos dois contra um. Digo que vamos recuperar-la.

Enquanto os dois intercambiavam um olhar desafiante, Kane murmurou.

—me perdoe, querida. Só será um momento, —e a afastou com mãos firmes, mas gentis.

Teve razão. Em um minuto seus atacantes se apressavam para ele, ao seguinte estavam tombados sobre o chão, gemendo. O sangue se derramava do nariz sardento do loiro. O outro moço agachou a cabeça e cuspiu um dente, seu lábio partido inchado até duas vezes seu tamanho.

Kane permaneceu em metade do caminho com apenas uma gota de suor sobre a frente, golpeando o extremo de sua fortificação em sua palma.

Deu um quase imperceptível passo em sua direção, e ambos se precipitaram para trás sobre cotovelos e talões como caranguejos feridos.

—A próxima vez que os dois cachorrinhos queiram ir de caça, sugiro que invistam em uma matilha de sabujos e se unam a um clube de caça da raposa. De outro modo, poderiam encontrar suas próprias peles penduradas em minha parede.

Ainda fulminando-o com o olhar, cambalearam-se e tropeçaram entre as árvores, gemendo e amaldiçoando entre ofegos.

Devagar, Kane se voltou para  Caroline. Embora não fizesse mais que um leve movimento em sua direção, suas intenções eram claras.

Tinha tratado com eles. Agora trataria com ela.

Endireitou sua máscara, ainda com a esperança de que não a tivesse reconhecido. 

—Obrigado, senhor. Sua valentia é muito apreciada.

—Seriamente?

Acovardada por seu inescrutável olhar fixo, começou a afastar-se dele.

—Não sei o que teria feito se você não tivesse vindo em um momento tão oportuno.

—Oportuno para os dois, pareceria,—respondeu, seguindo sua marcha atrás passo a passo.

Era sua imaginação ou estava seu olhar fixo sobre a curva pálida de sua garganta? Sobre o pulso que revoava sob sua suave pele branca? Posou a mão ali, mas pareceu uma débil defesa, certamente.

Sempre tive predileção pela carne fresca.

Suas palavras voltaram para atormentá-la. E se tinha estado falando da satisfação de um tipo totalmente diferente de fome?

Lutando para rechaçar a ridícula fantasia, retrocedeu no claro de luz de lua. Seu brumoso brilho não o dissuadiu. Ele seguiu aproximando-se, cada passo tão compassado como as badaladas da igreja distante anunciando a chegada da meia-noite.

—Eu deveria retornar a minha festa—disse ela, aumentando mais seu ofego com cada passo. —Separamo-nos e provavelmente nestes momentos outros estarão frenéticos de preocupação.

— Também devem estar …

Ela se voltou para escapar, quase esperando que um de seus poderosos braços a rodeasse outra vez. Uma de seus grandes, quentes mãos estendida sobre a curva delicada de sua mandíbula, para lhe inclinar a cabeça a um lado e expor a vulnerável curva de sua garganta e então ele poderia inclinar-se e afundar seu…

—… senhorita Cabot, —terminou ele.

Caroline se parou em seco, logo se voltou para confrontá-lo, incompreensivelmente zangada porque tivesse visto através de sua pequena e ridícula máscara.

—Como me reconheceu?

Apoiando sua fortificação contra uma árvore próxima, fechou a distância entre eles em uns poucos e largos passos.

—Por seu cabelo. Não acredito que nenhuma outra mulher em Londres tenha o cabelo com este matiz. —Alargou a mão para atirar de um fio de seu apertado coque, investigando a mecha entre seus dedos como se fora a mais incomum das sedas.

—Parece luz de lua líquida.

Despreparada pela inesperada carícia, Caroline levantou devagar seu olhar para ele. Apesar da ternura de seu toque, seus olhos ainda brilhavam pela cólera.

Molesta pelo traidor formigamento que tinha invocado tanto seu toque como suas palavras, resgatou a mecha errante e arrumou seu capuz para cobrir o cabelo.

Aceitando a tácita recriminação, ele dobrou os braços sobre seu peito.

—Possivelmente queira me explicar por que me seguia e quando conseguiu despistar a sua irmã pequena e terminou em tal apuro. Pensei que supostamente era a sensata da família.

—Sou sensata! Ou ao menos o era. Até que me encontrei.. —deteve-se, mordendo o lábio inferior— Quanto tempo soube que eu lhe seguia?

—Do momento em que seu pangaré se incorporou atrás de minha carruagem em Berkeley Square. Sugiro-lhe encarecidamente que nunca solicite um posto no Ministério da Guerra. Parece carecer da capacidade de esconder-se e a habilidade de sigilo requeridas para uma carreira na espionagem.

—Como conseguiu desaparecer tão rapidamente? —perguntou.— Distraí-me um instante e se foi.

Encolheu seus amplos ombros.

—Nunca sei quando Larkin e seus homens me rastreiam. Aprendi faz muito tempo que perder-se entre a multidão é o melhor modo de perder a alguém mais. —Inclinou a cabeça.— É pelo que me seguia? Ofereceu-lhe a polícia um posto sob lista de nomes?

Caroline baixou a cabeça para evitar seu penetrante olhar. Uma coisa era permanecer em um salão lotado e admitir em brincadeira que havia em Londres quem acreditava que era um vampiro, outra coisa era estar em um caminho deserto com seus dentes brancos brilhando à luz da lua e confessar, que em algum rincão de sua imaginação começava a perguntar-se se não tinham razão.

—houve rumores, —murmurou ela.

—Sempre os há, não é assim?

Tragou com força, desejando desesperadamente ser tão boa mentirosa como Porta.

—Estes rumores me deram motivos para duvidar de sua fidelidade a minha irmã. Segui-lhe esta noite porque acreditei que poderia estar envolto em uma entrevista com outra mulher.

—Estou envolto em uma entrevista com outra mulher. —Levantou seu queixo com dois dedos, não lhe permitindo evitar seu olhar por mais tempo.— Com você.

O franco desafio em seus olhos a fez assombrar-se do que poderia ter acontecido encontrando-se nesses escuros e secretos atalhos em outras circunstâncias, em outra vida.

Encontrou seu olhar com audácia, a mentira e as verdades pela metade fluindo de seus lábios com mais facilidade.

—Agora compreendo que parva fui ao escutar os falatórios. Nunca deveria ter duvidado de sua devoção por minha irmã. E certamente nunca deveria ter arriscado minha reputação para lhe espiar.

Sua boca expressiva se endureceu em uma linha severa.

—Se eu não houvesse me tornado para segui-la, aqueles malvados descarados se teriam ocupado de que perdesse algo mais que sua reputação.

Pôde sentir o calor que se eleva em suas bochechas.

—Não podemos estar seguros. Com mais tempo, estou completamente segura de que poderia ter raciocinado com eles. Depois de tudo, não eram vândalos comuns, a não ser cavalheiros.

—Possivelmente é hora de que aprenda, senhorita Cabot, que sob o colete de seda de cada cavalheiro pulsa o coração de uma besta.

Com ele surgindo para a luz da lua, com sua voz como um rouco grunhido, aquela reivindicação não era difícil de acreditar.

—Inclusive sob o seu, Lorde Trevelyan?

Ele se inclinou ainda mais perto, seu fôlego perfumado de brandy roçando seus lábios.

—Especialmente sob o meu.

Poderia haver-se inclinado mais perto ainda se um trio de familiares vozes femininas não tivesse chegado à deriva através das árvores. Devemos continuar? Estas malditas sapatilhas formaram ampolas em meus talões.

—Pobre tiíta! Não entendo. Estava completamente segura de que viu o visconde ir por este caminho.

—Não pode sabê-lo tudo. Tentei lhes dizer que o descobri perto do Passeio do Ermitão faz quase um quarto de hora.

—por que deveríamos confiar em ti? Uma vez jurou que viu um crocodilo no apartamento de cobertura do Edgeleaf. E o que há sobre todos esses anos insistindo sobre um bebê sob uma folha de couve no jardim de mamãe?

—OH, não!—sussurrou Caroline horrorizada. —São a tia Marietta e minhas irmãs!

Kane lhe franziu o cenho.

 —Há alguém mais de sua família me espreitando esta noite? Um cambaleante tio avô ou um primo longínquo de terceira geração possivelmente?

Ela agarrou seu braço sem dar-se conta.

—Shhhh…se permanecermos muito calados, talvez dêem a volta e retornem por onde vieram.

As vozes avançaram, aproximando-se da curva do caminho. Parecia que não haveria volta atrás. Para nenhum deles.

—Está totalmente segura de que este é o caminho correto? —A mal-humorada tia Marietta se queixou lhes avisando que seria só um segundos problema antes que avançasse vacilando ao redor da esquina sobre seus saltos de cetim, com as irmãs do Caroline a reboque discutindo.

—Quer ser você quem explica a sua irmã por que desfrutamos de uma entrevista no Passeio dos Amantes? —murmurou Kane, com expressão severo.— Ou o faço eu?

De repente Caroline recordou outra entrevista e um olhar de olhos negros tão cheia de prazer e paixão que a tinha feito correr a toda pressa como um coelho assustado. No momento em que o desarrumado peito de sua tia apareceu, agarrou o fronte do casaco do Kane e o impulsionou para trás sob o véu de sombras das árvores.

Lhe olhando fixamente com olhos suplicantes, sussurrou com urgência, —Me faça o amor!

 

—Perdão?—murmurou Kane roncamente, enquanto Caroline se apertava a ele freneticamente, enterrando as unhas em sua jaqueta.

—Se pensarem que somos amantes, há uma oportunidade que passem sem nos reconhecer.Tem que pretender me fazer o amor!

Kane agitou sua cabeça, sua respiração se fez dura e rápida. 

—Srta. Cabot, realmente penso que não é o mais sábio...

Sabendo que não havia tempo para pensar, Caroline tomou uma respiração profunda para dar-se valor, subiu na ponta de seus pés e apertou seus lábios contra os dele.

Por vários pulsados do coração se manteve de pé tão rígido como uma pedra, resistindo a seu torpe abraço.  Então murmurou um juramento e seus braços a envolveram. A linha proibitiva de sua boca se abrandou contra a dela, enquanto apertava o abraço.  Repentinamente nenhum deles fingia.

Através da névoa dessa sensação deliciosa, ouviu o Vivienne falar bruscamente.

—OH!—exclamou estalando a língua.

—Porta, cubra seus olhos imediatamente! E deixe de espionar através de seus dedos!

O grito assustado de Porta foi seguido pelo inconfundível som que faz um aficionado quando encontra a mais surpreendente oferta.

—OH!—Porta se lamentou.  —Não me cubra os olhos! Não posso ver onde piso!

Então, a língua do Kane deu um golpeio suave em cima dos lábios do Caroline, persuadindo-a a abri-los, e ao fazê-lo, acelerou o pulso dela afogando-a em um prazer profundo pulsando em suas veias e precipitando os erráticos batimentos do coração de seu coração.

Quando o primo Cecil tinha tentado penetrar suas defesas, ela tinha fechado firmemente seus lábios e só tinha sentido repulsão. Mas Kane tocou as mesmas portas com uma doçura irresistível, seduzindo-a. Podia não saber beijar, mas ele era um professor mais que disposto a ensinar. Ele esfregou seus lábios para frente e para trás através dos seus, criando uma faísca na fricção que ameaçou acendê-los a ambos. Sua língua cavou mais profundo na doçura virginal de sua boca, formando redemoinhos e acariciando e rogando a sua própria língua para provar seu sabor.

Quando ela se aproximou, seus braços se apertaram acomodando-a até que a suavidade dolorida de seus peitos se esmagou contra seu peito. Ele afundou seu beijo bebendo de seus lábios como se não se satisfizera até ter consumido sua essência. Caroline se aferrou a ele sentindo crescer seu desejo.

Apoiados o um no outro quão compridos eram seus corpos, ela se sentia completamente maravilhosa, simplesmente sentindo seu calor e sua força.  Sem inclusive compreendê-lo, suspirou em sua boca, um som doce de abandono.

 

Ele se estremeceu contra sua boca, ao olhá-la viu que seus olhos brilhavam com fome primitiva, imediatamente compreendeu que sua tia e irmã a muito tempo os tinham deixado sozinhos neste paraíso à luz da lua.

Pela primeira vez em sua vida Caroline entendeu por que homens e mulheres procuravam a solidão, escapando da sociedade que sempre estava espreitando, a necessidade de esconder-se nas sombras e explorar o chamariz atormentando do proibido. Ela se teria rendido com um só beijo. O que estaria disposta a sacrificar por outro e que mais faria pelos mais provocadores prazeres? Seu próprio respeito? A felicidade de sua irmã? Se permanecesse mais tempo nos braços deste homem que poderia ocorrer?, Teve medo de averiguá-lo.

Baixou seus olhos e empurrou seu peito. 

—Acredito que se foram. Podemos deixar de fingir.

Ao princípio Adrian não se moveu, lhe deixando simplesmente saber o ineficaz de suas resistências contra sua força.  Então baixou seus braços devagar liberando a de seu abraço.

Quando caminhava afastando-se dela, uma rajada de vento perfumado revolveu seu cabelo e elevou a capa de sua jaqueta.  Seu olhar era mais inescrutável que antes. 

—Essa foi uma atuação muito convincente, Srta. Cabot. Considerou a carreira de atriz alguma vez?

—Posto que me dei conta que não me acomodam os rigores da espionagem, possivelmente deveria...

Endireitou sua máscara, esperando que as sombras escondessem o tremor nervoso de suas mãos. 

—Se não retornar a minha cama antes que Tia Marietta chegue a casa, posso muito bem terminar vendendo bolos do Banbury em alguma esquina.

—Espero que isso não ocorra.

As palavras do Kane foram cortantes como o súbito som de um ramo ao quebrar-se. Caroline começou a temer que possivelmente sua tia e sua irmã tinham retornado já a casa.  Movendo-se rapidamente e com uma graça silenciosa, Kane recuperou sua fortificação e a colocou detrás dele, sem advertir nela sua rebeldia. Uma vez defendida atrás de seu corpo examinou as sombras sob a lua, sua cautela aparentemente iniciada por um som inofensivo.

Agarrando a parte posterior de sua capa com uma mão, Caroline olhou com fixidez ao redor de seu ombro, recordando o sentido entristecedor da ameaça que tinha experiente anteriormente. Tinha assumido que Kane era quem a seguia, mas se se tinha equivocado? E se havia algo mais na escuridão, olhando e esperando? Algo perigoso? Algo faminto?

Tremeu, perguntando-se de onde tinha vindo tal pensamento extraviado.

—Qual é ele? —sussurrou.— Não pensa que esses brutos tornaram, o que fazem?—

 

Em lugar de responder, Kane a assustou devorando-a novamente dentro das sombras das árvores e sujeitando uma mão firmemente sobre sua boca. Os olhos dela se alargaram ao ver como um homem vinha andando ao redor em uma curvatura do caminho. Suas contorções e gemidos minguaram quando reconheceu ao Oficial Larkin doente e desencaixado com passo frouxo e um quarteto de homens com chapéus e capas indescritíveis o seguiam. A um sinal discreto do Larkin, separaram-se nos bosques em direções diferentes, um deles passo perto do Caroline e Kane.

Quando estavam todos fora do alcance do ouvido, Kane a soltou. Poderia ter sido sua imaginação muito exaltada, mas sua mão parecia atrasar-se contra a suavidade de seus lábios por um batimento do coração do coração mais comprido que o necessário.

—O que fazem Larkin e seus homens aqui? —sussurrou.

—Ao parecer quão mesmo fazem todos outros no Vauxhall esta noite —murmurou Kane, enquanto disparava um olhar sinistro— me Buscar.

Sua mão a insistiu a seguir na direção oposta, jogando uma olhada sobre seu ombro. Caroline devia correr para manter-se ao ritmo de seus passados compridos.

Ainda perguntando-se se simplesmente saltaria como uma caçarola ao fogo, quando disse bruscamente, —aonde me leva?

—por que, onde, Srta. Cabot? —Deu-lhe um olhar lateral, permitindo-se só a mais fraco dos sorrisos.— À cama.

 

—Está acordada? Caro, desperte! Pssssst!—

Ignorando o vaio frenético assim como tinha ignorado o ranger da porta ao abrir-se e o gemido revelador da tabuleta, Caroline arrastou seu travesseiro em cima de sua cabeça e se enterrou mais profundamente sob as tampas. Sempre tinha sido incapaz de fingir o sonho frente a Porta. Que começaria lhe atiçando nas costelas, atiraria uma pluma do chapéu mais próximo e começaria a fazer cócegas nos dedos de seus pés. Uma vez, no frenesi por compartilhar suas últimas teorias com respeito à sereia que tinha visto capoteando no poço que estava ao final do jardim, descarregou completamente a cubeta da lavagem em cima da cabeça do Caroline. Esta se tinha levantado enquanto gritava nas orelhas de Porta que dificilmente sentiria algum som em uma semana.

Mas essa vez Porta escolheu uma estratégia de longe, mais diabólica.

Atirou longe de uma esquina da manta e pôs sua boca ao lado do ouvido do Caroline. Baixando sua voz a um barítono falso, sussurrou:

—Não seja tão tímida, Srta. Cabot. Venha a nos dar um beijo.

Caroline se sentou tão rapidamente que quase toparam as cabeças.

—Pequena mucosa infeliz! Reconheceu-nos, não?

Deu de chutes fora de suas sapatilhas e meneou seus dedos.

 —Acredito que não era fácil de reconhecê-los, com Tia Marietta dando puxões meu capuz em cima de meus olhos e me dando uma bofetada entusiasta cada cinco segundos. Tropecei em uma árvore e quase me golpeei.

Caroline se recostou contra os travesseiros, enquanto seu olhava brilhava para sua irmã. 

—É uma compaixão que não o fez. Pelo menos então poderia ter podido conseguir o resto de uma noite decente.

Arrastando fora de suas luvas um de uma vez, Porta se apoiou adiante e lhe confiou:

—Ao princípio pensei que o visconde te estava mordendo. Não poderia entender por que não estava tentando lutar.  Estava lista para gritar quando de repente compreendi te estava... Beijando —Sussurrou o último como se fora alguma classe de rito carnal antigo, escuro e proibido e mais lascivo que qualquer ato que um vampiro poderia cometer.

—Só estava pretendendo me beijar—insistiu Caroline, enquanto tentava não recordar o sabor embriagador de seus..., o varrido tenro de sua língua através de sua boca.

O bufo cético de Porta era menos que elegante. 

—Então deve ter uma imaginação muito vívida, de fato, porque lhe estava saindo certamente com muito entusiasmo.

—Não tinha opção —Caroline se retorceu, só muito consciente de que seu próprio entusiasmo havia a condenando mais até. 

—Se Tia Marieta nos tivesse reconhecido, teria sido o desastre para todos especialmente para o Vivienne.

Sua consciência se acovardou ao pensar em sua irmã. Quase desejou acreditar que Kane tinha arrojado alguma classe de feitiço em cima dela. Então teria uma desculpa a seu comportamento lascivo em seus braços.  Parecia estar disposta a abandonar tudo, sempre tinha estimado, incluindo a confiança do Vivienne , por um prazer tão efêmero como um beijo.

—Não precisa preocupar-se pelo Vivienne—lhe assegurou Porta.

—Não tem nenhuma suspeita. Tia Marietta estava com muita pressa por passar rapidamente e denunciar ao indivíduo. Bem, não você pessoa, a não ser a quem estava tão descaradamente nos braços do visconde. Claro, não fez que os conhecia eram os doxy de latão nos braços do visconde. E não sabia que eram os braços do visconde. Sóacreditou —Porta ondeou sua própria malha apressadamente afastando a confusão. 

—OH, não importa. Como conseguiram chegar a casa? O cavalo de aluguel ainda esperava por vocês?

—O Senhor Trevelyan me enviou a casa em seu próprio tílburi.

Tinha-a colocado no interior luxuoso do veículo com nada mais uma curta ordem ao chofer, lhe dizendo ao homem que na porta, diretamente a sua tia.

—Não te acompanhou?

Caroline agitou sua cabeça, agradecida por que não tinham tido que compartilhar os limites íntimos da carruagem.

 —Duvido que queria passar-se outro minuto em minha companhia depois de que fiz semelhante enredo.

Porta escutou extasiadamente enquanto Caroline lhe contou todos os detalhes dos dois jovens que a tinham acossado e o resgate do visconde.

Quando tinha terminado, Porta se apoiou contra o pé da cama com um suspiro confundido.  —Muito estranho. Pergunto-me por que um vampiro se passaria suas tardes vagabundeando pelos Jardins do Vauxhall resgatando donzelas de sua aflição.

—Se não fora tão impossível quase me tentaria a acreditar que é um vampiro. Deveria ter visto como despachou a esses dois rufiões. Nunca vi a um homem exibir tal velocidade assombrosa e poder.—Caroline agitou sua cabeça, enquanto se estremecia ao recordar.— Havia algo quase sobrenatural... Nisso.

Porta estudou sua cara para um momento antes de perguntar brandamente,

—Isso? O que? Seu beijo? Havia algo também “sobrenatural” sobre isso?

Caroline inclinou sua cabeça amaldiçoando sua cútis. 

—Não é como se tivesse algo com que compará-lo—mentiu tiesamente, enquanto sentia o rubor em suas bochechas.

—Estou segura que era um beijo absolutamente ordinário.

Um beijo absolutamente ordinário que a tinha enjoado. Um beijo absolutamente ordinário que lhe tinha fundido cada pensamento prático, afastando os de sua cabeça, incluindo o fato de que o homem que a beija pertencia a sua irmã.

Não podia suportar mais o escrutínio de Porta, Caroline escorregou na cama e rodou sobre se ficando de cara à parede.

—por que não vai a sua própria cama e me deixa em paz para que possa voltar para meus sonhos absolutamente ordinários?

 As campainhas repicaram a meia-noite.

Estava de pé sobre os paralelepípedos quando chegou, enquanto andava sob a garoa, seu cabelo brilhando à luz da lua, sua capa se formava redemoinhos ao redor de seus tornozelos.  Soube que vinha por ela, ainda não podia gritar, tinha a garganta paralisada, não podia mover nenhum músculo.

A luz da lua desapareceu deixando-a na sombra.  Tomou em seus braços, sua gentileza tão irresistível como sua força.

Seus dentes brilharam quando descenderam para ela. Muito tarde, compreendeu que não era seus lábios o que procurava mas sim sua garganta.  Mesmo assim, não podia deter-se de inclinar sua cabeça ao lado e convidá-lo, sem ele pedi-lo, participando dela, bebendo até saciar-se de seu fluxo de vida que pulsava apenas sob a seda lisa de sua pele.

Lhe oferecia o que ela desejava, o que ela tinha desejado sempre em segredo.

Rendição.

Quando seus dentes furaram esse véu frágil, enviando uma brisa de êxtase ímpio através de sua alma, as campainhas conservaram o som, anunciando a chegada da meia-noite onde eternamente pertenceria a ele.

 

Caroline se endireitou repentinamente na cama, lutando com a pressão lhe esmaguem em sua garganta. Tomou um terrível momento compreender que era sua própria mão que se achava envolta ao redor dela.  Seu pulso correndo loucamente sob suas gemas dos dedos.  Baixou sua mão devagar, olhando fixamente a seus dedos trementes como se pertencessem a alguém mais.

Mais desconcertante que seu pânico era o rubor inexplicável que parecia ter tingido o resto de seu corpo. Sua boca estava seca, sentia o formigamento em sua pele e havia uma dor tenra em seus peitos e entre suas pernas que era mais agradável que doloroso.

Jogou uma olhada ao redor do quarto, esforçando-se por afastar o sonho que se atrasava em deixá-la.  A cama estreita de Porta estava vazia e o quarto da água-furtada se encontrava na escuridão, fazendo impossível dizer que hora do dia era. O caprichoso sonho do Caroline continha fragmentos de outros sonhos onde a perseguiam por caminhos escuros atacantes mascarados, de bocas torcidas e cruéis com olhadas lascivas.

Esfregou seus olhos nublados. Teria sido a noite inteira nada mais de um sonho com a viagem zangada de Porta a Jardins do Vauxhall; esses momentos deliciosos nos braços do visconde; o sabor embriagador de seu beijo? O que se eles tinham estado em uma fantasia febril, nascida de um excesso de imaginação?

Quase foi tentada a acreditar que ainda estava sonhando, porque as campainhas da meia-noite ainda estavam soando.

 Franziu o sobrecenho, reconhecendo finalmente a chocalhada áspero do puxão do timbre dianteiro.  Jogou as mantas para trás, desceu da cama e se apresso à janela.  Uma elegante carruagem atirada por um par de formosos corcéis se estacionou na rua.  Estirando o pescoço conseguiu ver um só homem de pé no pórtico.  A pesar que o bordo encaracolado de seu chapéu de castor escondia seus rasgos, não havia nenhum equívoco pela forma em que o casaco se atia a seu ombro destacando seu imponência.

Adrian Kane tinha chegado e em pleno dia nada menos.

Caroline se curvou contra o batente da janela com alívio, sem cair em conta, que até esse momento as fantasias de Porta tinham sido as causadores seus sonhos e imaginação.

Agitou sua cabeça ante sua própria tolice, lançou um olhar lamentável para o céu.  Uma chuva firme estava caindo, estava tão nublado e cinza que parecia como se o sol nunca brilhasse de novo.

Seus olhos estreitaram quando estudou essas nuvens ominosas.  Era luz do dia a que se supunha destruía aos vampiros?

Ou a luz do sol?

Esfregou sua sobrancelha, desejando de repente ter emprestado mais atenção à teoria de Porta. A campainha tocou de novo. Tia Marietta não era nenhum vampiro, mas raramente se levantava antes do meio-dia ou recebia às visitas antes das duas. Mesmo assim, Caroline podia ouvir uma revoada frenética, seguido por ordens ladradas no piso de abaixo, como se Tia Marietta e Vivienne se apressassem em suas espaçosas antecâmaras, tentando ficar apresentáveis.

Quando baixou seu olhar à porta, Kane jogo sua cabeça para trás e Miro fixamente a janela onde se encontrava.  Caroline se agachou detrás das cortinas.  Não poderia ter negado o poder desse olhar. Inclusive o encaixe poeirento não poderia proteger a da influência hipnótica.

A campainha deixou de soar. No silêncio ensurdecedor que seguiu, uma simples e pequena confusão do popular vampiro de Porta soou forte e clara na mente do Caroline... Um vampiro não podia entrar na casa de sua vítima a menos que fora convidado.

Caroline tentou afastar essa idéia ridícula, mas o sonho ainda era muito vívido em sua memória.  E se estivesse ignorando a teoria de Porta e era realmente um lobo quem estava parado na porta de sua tia?

Posto que não se veria muito bem que fosse ao piso inferior em camisola, jogando-se pela porta e pretendendo sofrer de uma enfermidade muito contagiosa como cólera ou praga bubônica, espionou pela janela.

A porta dianteira estava aberta. Mas em lugar do lacaio de sua tia, era uma Porta radiante a que estava introduzindo ao visconde na casa e fora da chuva.

A boca do Caroline caiu aberta.

— Porta? —sussurrou, enquanto agitava sua cabeça com cepticismo.

Caroline sob os degraus depois de colocar um vestido azul severo que não lhe favorecia absolutamente a sua figura magra. O pescoço engomado parecia tirado de faz dois séculos da época da Rainha Elizabeth.  Tinha aplanado cada rastro de seu cabelo cruelmente em um nó e fazendo plaff se colocou uma boina.  Determinada a vencer todos os rastros da criatura lasciva que se obstinado com tal abandono desavergonhado ao pretendente de sua irmã.

Duvidou um momento com sua mão no corrimão.  A voz de barítono do visconde poderia fundir a distância as inibições de uma mulher, mas seu tom lhe fez difícil escutar detrás da porta.  Esforçou-se em ouvir, mas solo podia escutar retalhos da conversação. O conversar constante de Porta era acompanhado pelo tinido amável da taça de chá no pires, os murmúrios corteses do Vivienne e as risadas chiadas de Tia Marietta.

De repente, o salão entrou em um silêncio.  Inclusive Porta cessou seu balbuceio.

Quando o visconde começou a falar, Caroline baixou outro passo.  Mas tudo o que ela alcançou a escutar era

—...  Ao acudir aqui hoje... Presumo sobre seus sentimentos... Uma pergunta muito importante.—

Sua mão se apertou no corrimão, seus nódulos ficaram brancos.  Kane ia se propor.  Ia oferecer fazer sua esposa ao Vivienne e uma vez feito nada na vida seria o mesmo.  Sentia uma pressão estranha perto de seu coração, como se uma veia até o momento desconhecida tivesse dado um salto mortal

Sem dar-se tempo para examinar a sensação, acelero os últimos passos. 

—Absolutamente não!—proclamou quando se precipito no salão.  —O proíbo!—

 

Todos no salão se deram a volta e a olharam boquiabertos, como se tivesse perdido a cabeça. Embora a umidade estava fazendo que o cabelo de Porta se frisasse ao redor de seu rosto, e uma nuvem de pós faciais seguia envolvendo a tia Marietta. Vivienne se via tão fresca como uma manhã da primavera com seu cabelo recolhido em um coque ao estilo preferido do visconde. Sua esbelta figura estava embelezada com um vestido de cetim floreado de cor verde salgueiro que complementava perfeitamente com os olhos cinzas do Caroline, quando tinha a oportunidade de levá-lo.

Depositando a taça de chá em seu prato com excessivo cuidado, Kane se levantou para enfrentar-se a ela. Elevando-se sobre o caos desordenado do salão de sua tia, parecia mais imponente e duas vezes mais robusto. Se tivesse sido um vampiro, provavelmente poderia havê-los deixado sem sangue e seguiria tendo um salão para o chá e pão-doces.

—Espero que perdoe minha imprudência, senhorita Cabot —disse, com belicosa diversão mas com cautela em seu olhar.—Não tinha idéia de que você se oporia tão apaixonadamente ao convite que fiz a sua irmã a minha propriedade.

Ela piscou.

—Sua propriedade?

Ele piscou.

—É obvio. O que é exatamente o que pensava que estava lhe propondo? —seu inocente comportamento não a enganou. Ele sabia exatamente o que estava pensando.

Seus joelhos estavam fracos de alívio, e se derrubou em uma poltrona de orelhas estofado em um horrível brocado floral ao que não lhe via o bordo.

—Pensei que possivelmente você estava sugerindo… uma excursão com este espantoso clima. Vivienne sempre teve uma delicada constituição e temia por sua saúde.

Vivienne entrecerrou os olhos.

—Terá que perdoar a minha irmã, Lorde Trevelyan. Pensa que é mamãe galinha e Porta e eu seus pintinhos.

Seguindo ao Caroline, Kane se sentou e pediu uma taça de chá, o tamanho de suas mãos diminuía à fina porcelana a China.

—Posso lhe assegurar senhorita Cabot que nunca poria em risco a saúde de sua irmã —ela pôde imaginá-la inclinação zombadora de seu fixo olhar.—Como você terá ouvido, celebrará-se um baile de máscaras no castelo Trevelyan na próxima semana e com todos os preparativos que se têm que fazer, pensei que seria melhor retirar-se ao campo uns dias antes. Devi convidar a sua irmã para que me acompanhasse —olhou a tia Marietta esboçando um sorriso afetado.—Com sua tia servindo de chaperona, é obvio.

Naturalmente ele tinha um castelo. Um castelo onde Vivienne algum dia seria a senhora.  Caroline sentiu uma profunda dor no peito.

—E exatamente onde está o castelo, milord? —perguntou ela.—Rumania?

Porta se afogou com seu chá, ganhando uma palmada da tia Marietta nas costas. Todos sabiam que no país europeu do este abundavam as histórias de ciganos sobre vampiros, homens lobos e outras criaturas da noite. Inclusive alardeavam de ter monstros reais, incluindo o Vlad Drácula o Empalador, o infame soberano cujo reino de terror chegou a ser ambas as coisas, lenda e pesadelo.

Kane reconheceu sua brincadeira com um sorriso vacilante.

—Em algum lugar mais prosaico, temo-me. O Castelo Trevelyan está localizado no Wiltshire ao oeste do Salisbury.

Caroline se perguntou se seu súbito desejo de fugir de Londres tinha algo que ver com o acontecido entre eles a última noite. Estava procurando apartar ao Vivienne de sua influência? Ou a ele mesmo? Quaisquer que fossem suas intenções, não permitiria que ele as levasse a cabo. Necessitava mais tempo para assegurar-se que ele não era uma ameaça para sua irmã.

Caroline aceitou uma transbordante taça da donzela, assombrando-se da firmeza repentina de sua mão.

—É muito amável de sua parte incluir tia Marietta em seu convite, milord, mas não haverá necessidade de incomodá-la mais do que já o temos feito. Estou perfeitamente capacitada para atuar como chaperona de minha irmã.

Foi o turno de tia Marieta de afogar-se com seu chá. Com uma faísca de regozijo em seu olhar, Porta lhe golpeou entre as omoplatas com mais força da estritamente necessária.

Enquanto ainda seguia crispada, os olhos do visconde se entrecerrarão ligeiramente.

—me perdoe senhorita Cabot. Tinha a impressão de que você e Porta retornariam ao Edgeleaf em uns dias.

Caroline tomou um pequeno sorvo de seu chá.

—Realmente não há pressa, verdade?. O primo Cecil dificilmente sentirá saudades, e ouvi que o ar do Wiltshire pode ser muito tonificante nesta época do ano.

—Não posso imaginar que pôs essa idéia extravagante em sua cabeça, menina —tia Marietta resmungou, esfregando ligeiramente com um lenço uma gotinha de chá que tinha em seu vestido— Falando do cego guiando a outro cego!

—Temo-me que sua tia tem razão. Não deveria lhe recordar que você também é uma jovem solteira —a nota de sarcasmo na voz do Kane de algum modo se burlou de ambas.— Dificilmente se lançaria você sobre a suspeita compaixão de um solteiro cansado como eu.

Deixando fora suas objeções, Caroline riu.

—Posso lhe assegurar que não tem nada que temer nesse aspecto. Faz muito que passei a idade em que acreditava que cada homem que conhecia tentaria me seduzir ou me cativar.

 

—Caro! —exclamou Vivienne, ruborizando-se da raiz de seu loiro cabelo.

—Se, estava-me perguntando como ia comer se essas bolachas agora que você está entrando na velhice —disse Kane secamente quando Caroline tomou uma bolacha açucarada da bandeja de chá.

Ela tomou uma fina bolacha.

—Nego-me a usar o título de “líder dos símios” sem reclamar qualquer de suas vantagens. Como mulher que muito provavelmente não estará sob o amparo de um marido, deveria ser capaz de me mover em sociedade, como tia Marietta o faz —lhe lançou um olhar por debaixo de suas pestanas, incapaz de resistir ao fingida revoada.—Também devo confessar que posso contar com seu bom caráter. De acordo à carta do Vivienne, você é um verdadeiro santo entre os homens —um campeão designado para salvar aos gatinhos guias de ruas perdidos.

—E de uma mulher tola e jovem que insiste em ir aonde não é bem-vinda.

Assim que encontrou seu estimulante olhar com a sua, os dois poderiam ter retornado ao iluminado jardim no Vauxhall, justo um beijo antes de cair nos braços do outro. Embora o gracioso sorriso do Kane nunca titubeava, o frio brilho de seus olhos, advertiu-lhe que ele não estava acostumado a ver frustrada sua vontade. Não se preocupada disso.

Os protestos de tia Marietta foram afogados pelo som dos aplausos de Porta.

—OH, um baile de máscaras! Que emocionante! Dificilmente posso esperar para começar a fazer a bagagem! Me diga milord, seu irmão nos alcançará imediatamente?

—Uma vez que Julián se inteire de que estarei acompanhado pelas formosas jovens Cabot, estou seguro que não serei capaz de superar seu passo com minha fortificação —agarrando-o, levantou-se.—Agora se me desculpam, senhoras, acredito que abusei muito de sua hospitalidade. Devo ir e fazer os acertos para a viagem.

Enquanto tia Marietta o fazia gestos à donzela para que lhe trouxesse o casaco e o chapéu, Vivienne se levantou.

—Estou agradada de que tomasse em conta, milord. Foi um prazer inesperado.

—O prazer foi todo meu —murmurou ele atraindo a mão do Vivienne a seus lábios.

Os mesmos lábios que tinham sido tão afetuosamente carinhosos com os seus. Os mesmos lábios que os tinham avivado e enrolado até que os abriu ao possessivo calor de sua língua. Os mesmos lábios que a tinham reclamado como se sempre lhe tivesse pertencido e seguiria sendo-o.

—Um inesperado prazer efetivamente —disse Caroline rigidamente, embora seu tom implicava o oposto.—Tinha a impressão de que você raramente se aventurava a sair durante o dia.

Logo que Kane baixou a mão do Vivienne, girou-se para olhá-la, inclusive Caroline tinha que admirar seu aprumo.

—Raramente o faço a menos que haja algo interessante, tal como mimar-se na companhia de quatro encantadoras senhoras. O movimento de sua mão incluiu tia Marietta. Ela riu dissimuladamente, como uma colegial, fazendo que Caroline se desanimasse.

Ele estava agarrando seu chapéu e casaco da donzela, quando Caroline inocentemente disse:

—Espero que o casaco não esteja muito quente para você, milord. Enquanto me vestia poderia ter jurado que vi o sol aparecendo de detrás de uma nuvem.

Por um comprido momento, Kane ficou completamente imóvel, nada se movia exceto um músculo em sua bochecha. Logo, sem esperar à donzela, cruzou de uma pernada para a porta abrindo a de par em par. A chuva seguia caindo torrencialmente.

O girou sua imponente silhueta contra a cortina de chuva e ofereceu ao Caroline um tenro sorriso.

—Aprecio sua preocupação, senhorita Cabot, mas parece que a chuva chegou para ficar.

 

Adrián chegou a sua casa da cidade como uma tempestade, golpeando a porta, fechando-a detrás dele. Não havia nenhum lacaio para lhe dar a bem-vinda, nem donzela que se precipitasse e sacudisse seu chapéu e seu casaco que gotejavam. Os serventes não estavam acostumados à chegada de ninguém durante o dia. Muitos deles provavelmente se foram a suas camas ou escapado para uma tarde no povo. Cada tapeçaria e portinha da casa tinham sido desenhados minuciosamente de acordo às instruções do amo. Inclusive o lacaio mais humilde e a criada de cozinha sabiam que uma simples infração a essa regra em particular, conduziria à demissão imediata.

Por um momento traidor, Adrián se permitiu perguntar o que seria ter a uma esposa esperando por ele. Alguma criatura amorosa que viesse alvoroçando as sombras para ajudá-lo com suas roupas molhadas e lhe oferecer uma taça de chá quente e um tenro beijo, enquanto o arreganhava por aventurar-se a sair em um dia tão espantoso. Mas quando essa criatura se materializou como uma magra, menina de olhos cinzas com uma cascata lisa de cabelo loiro que caía em suas costas, ele implacavelmente ganhou a partida a sua imaginação.

Acostumado a andar na penumbra, tirou-se dos ombros o molhado casaco e o lançou junto com seu chapéu sobre o móvel do saguão. Estava passando uma mão através de seu úmido cabelo quando chegou Julián tropeçando-se nas escadas, seus morenos cachos estavam igual a quando eram uns meninos e Adrián se levantava para encontrar a um apavorado Julián parado ao pé de sua cama. Embora lhe tivesse resmungado e arreganhado, Adrián sempre tinha terminado saindo fora de sua quente cama, para assim poder matar ao monstro imaginário que rondava debaixo da do Julián.

—Bom Deus, homem! —exclamou Julián dando um puxão ao nó do cinturão de sua bata negra de veludo.— por que toda esta animação? É bastante ruidoso para despertar aos mortos.

Adrián lhe lançou um escuro olhar antes de cruzar para o aparador de mármore e tornar um jorro de brandy. Olhou com o cenho franzido à garrafa quase vazia em tanto a colocava em seu lugar. Teria jurado que o mordomo a tinha recheado tão somente ontem.

Seu irmão se deixou cair no último degrau, bocejou e se esfregou os olhos.  Abriu a boca quando notou o atoleiro de chuva ao redor da pata do móvel do saguão. Olhou incrédulo para a janela. Um inconfundível feixe de luz do dia apareceu através da greta das pesadas cortinas.

—estiveste fora?

Adrián se voltou para apoiar-se contra o aparador. Esfregou-se a parte de atrás do pescoço. Tratando de pensar sobre quantas horas tinham acontecido desde que dormisse.

—Se, estive.

—E que se apoderou de ti para que saísse de casa a esta hora ímpia? Teve uma má noite? Sua caçada foi sem êxito?

—OH não, ao contrário, minha caçada foi muito bem-sucedida! —Adrián tomou um gole de brandy, recordando a exuberante textura do Caroline em seus braços.— Acabo de apanhar algo que não me esperava.

Julián o olhou ironicamente.

—Conhecendo sua devoção ao dever, estou seguro que não foi varíola francesa. Embora passar umas horas em um daqueles bordéis que há nos becos que freqüenta poderiam melhorar seu temperamento.

Por alguma razão o pensamento de uma efêmera liberação nas mãos de alguma rameira não teve seu encanto no Adrián. Não com a doçura irresistível da boca do Caroline ainda tão afresco em sua memória.

Bebeu-se o resto de brandy de um só gole, mas nem seu calor pôde tirar completamente o sabor dela em seus lábios.

—A única coisa que melhoraria meu temperamento neste momento seria a rápida volta da senhorita Cabot a sua casa no Surrey.

—Deduzo por seu semblante severo que a volta da senhorita Cabot ao campo não é iminente.

—Ao contrário. Parece que ela e suas queridas irmãs acompanharão ao Wiltshire esta semana.

Julián se sentou direito, entrecerrando seus escuros olhos.

—Esta semana? Está seguro que não é muito em breve? Pensei que não iríamos até a seguinte semana. O que acontece Duvalier? Como pode estar seguro que nos seguirá?

—OH, eu diria que obtivemos satisfatoriamente picar seu interesse —Adrián encontrou os olhos de seu irmão diretamente, negando-se a sentir-se mal pelo golpe que sua notícia ia dar .—Estava aí esta noite, no Vauxhall.

Julián estava tão silencioso, que seus lábios apenas se moveram quando murmurou:

—Viu-o?

Recordou seu recente pânico. Tinha sentido através da noite a espreita do Duvalier a uma inconsciente Caroline. Sacudiu sua cabeça.

—Não tive que fazê-lo. Apalpava-o. Podia senti-lo. Mas no momento no que me aproximava do bastardo, ele se fundiu nas sombras.

Adrián não se deu conta até mais tarde que o desaparecimento do Duvalier tinha sido uma bênção. Se Duvalier tivesse sido testemunha de que tinha beijado ao Caroline com uma inegável paixão, poderia ter quebrado todos seus planos.

—Temo-me que não temos mais opção que deixar Londres o antes possível —disse Adrián severamente.— Duvalier não era o único no Vauxhall esta noite. Larkin se está voltando mais persistente. Se não lhe lançar nosso aroma, ambos terminaremos no Newgate antes do baile. Não tenho que te dizer que desastre poderia ser —ele pôs sua cansada mão sobre a mandíbula.—Tenho um assunto que atender no Wilshire também. Recebi notícias do Wilbury esta manhã. Alguém —ou algo— esteve aterrorizando aos aldeãos e matando o gado no Nettlesham —disse, referindo-se a uma pequena aldeia perto de seu povo.

—Não fui eu —brincou Julián.—Nunca desenvolvi o gosto pela carne de ovelha —ele desviou seus olhos mas não antes  que Adrián pudesse vislumbrar uma sombra de dúvida neles.

—Sei que difícil pode ser para ti. Mas não desistirá, verdade? —perguntou, mantendo o tom ligeiro de sua voz para ocultar a importância da pergunta.

Adrián se dirigiu às escadas. Embora sua primeira intenção era acariciar os escuros cachos de seu irmão, pôs uma mão no ombro do Julián lhe apertando brandamente até que este se forçou a procurar seu olhar.

—Não, não me darei por vencido, Jules, por ti. E que Deus ajude a qualquer que trate de ficar em meu caminho.

Julián elevou sua sobrancelha

—Incluindo à senhorita Caroline Cabot?

Ignorando a afiada punhalada de remorso, Adrián respondeu:

—Especialmente a senhorita Caroline Cabot.

 

A chuva açoitava os cristais dos guichês, obscurecendo-o tudo, refletiu Caroline. Tentou, entrecerrando os olhos, olhar através da escuridão e dar uma olhada ao campo do Wiltshire, mas não lhe resultou. O que a chuva não cobria, o fazia a noite.

Um relâmpago brilho, alagando a paisagem com luz sobrenatural, deslumbrando seus olhos despreparados. Por um breve momento quase teria jurado vislumbrar uma forma gigantesca galopando diante do carro. Então a escuridão descendeu de novo, deixando-a sobressaltada.

Estremecida, abriu a persiana de madeira de mogno sobre a janela e se acomodo contra os almofadões marroquinos preparando-se para dormir. O formoso carro do visconde não tinha aroma de perfume barato ou charutos antigos, a não ser a couro, rum e a uma certa presença masculina indefinível. O brilho intenso do cobre e as tulipas cristalizadas dos abajures do carro complementavam perfeitamente a sóbria elegância de seu interior.

Porta foi acomodando-se no assento frente a ela, com a cabeça apoiada no ombro do Vivienne, preparando-se para dormir com o acolhedor teclar da chuva no teto do carro e o suave bamboleio do veículo bem dirigido.

Pelo menos, ela e suas irmãs estavam quentes e secas. Caroline só podia imaginar-se como estaria esse pobre chofer por ter que chegar a sua hora. A chuva tinha cansado constantemente desde que a carruagem do visconde tinha chegado à soleira da casa de tia Marietta para as recolher cedo essa tarde. Para decepção do Vivienne e alívio do Caroline, Kane tinha saído por volta do Wiltshire no dia anterior para preparar aos criados para sua chegada.

Tinham parado duas vezes para trocar de cavalos e tiveram que atravessar um pátio cheio de esterco que chegava aos tornozelos, para chegar à estalagem a esquentar-se frente ao fogo com uma taça de chá. A esse passo provavelmente não chegariam ao castelo do Trevelyan antes de meia-noite.

Possivelmente seu anfitrião o tinha planejado dessa maneira.

Caroline se sacudiu esse ridículo pensamento. Adrian Kane exsudava força e autoridade por cada poro, mas sua influência não se estendia certamente ao controle do clima.

Jogo uma olhada ao Vivienne, quem elaborava pacientemente um mostruário de costura com a débil luz dos abajures do carro. Esta era sua oportunidade para descobrir quão forte estava enraizado Kane no coração de sua irmã. A boca de Porta estava levemente aberta e sua respiração uniforme tinha aprofundado seus roncos.

—Deve olhar adiante em nossa visita e no baile do visconde— Caroline comentou de forma tentativa.

—OH, bem—Vivienne cravou a agulha através do tecido sem levantar o olhar.

Caroline suspirou. Procurar a maneira de enrolar ao Vivienne a estava enlouquecendo, era como conseguir que Porta parasse de dizer cada pensamento que passava por sua cabeça.

—Lorde Trevelyan parece estar absolutamente prendado de ti. Um sorriso comedido curvou os lábios de sua irmã.

—Então devo me considerar afortunada, não? Ele é tudo o que uma moça deseja em um pretendente, inteligente, educado, com classe.

Beija maravilhosamente...

Caroline se mordeu o lábio, sentindo uma pontada aguda de culpabilidade enquanto recordava o calor persuasivo da boca do Kane.

Jogou outra olhada a Porta para certificar-se de que sua pequena irmã não olhava às escondidas através das pestanas.

—me diga algo Vivienne, não posso evitar ser curiosa, em todo o tempo que vocês aconteceram juntos, o visconde não tentou tomar-se algumas...   uummm... Liberdades indecorosas?

Vivienne finalmente levantou seu olhar do mostruário. Um rubor se filtrou em suas bochechas, um contraste alarmante com o branco detrás de suas orelhas. Ela se inclinou adiante, ganhando um minúsculo bufo de protesto de Porta, e colocou a cabeça de sua irmã sobre os almofadões.

“OH, não, aqui vem” pensou Caroline.

Ela estava a ponto de inteirar-se que Kane passava todo seu tempo livre beijando a mulheres jovens inexperientes.

—Uma vez, confessou Vivienne em um sussurro, seus olhos azuis enormes, —quando descendíamos de sua carruagem, tropecei e o senhor Trevelyan apóio sua mão em minhas costas para me estabilizar. Dadas as circunstâncias senti que não tinha nenhuma opção que perdoá-lo pela indiscrição.

Alagada com uma emoção que se parecia perigosamente ao alívio, Caroline fechou sua boca aberta.

—Muito magnânimo de sua parte. Ela escolheu suas palavras seguintes ainda com mais cuidado. Falou-te que algum enredo romântico anterior?.

Ao Vivienne a pergunta a pilhou por surpresa.

—É obvio que NÃO!, Ele é de longe um verdadeiro cavalheiro.

Caroline espremeu seu cérebro procurando uma pergunta menos agressiva, quando notou um brilho dourado, inclinou-se para frente e atirou da cadeia que rodeava a garganta de sua irmã. Um camafeu delicado do perfil de uma mulher emoldurado em um bordado de ouro emergiu da blusa do Vivienne. Caroline o estudou, desconcertada. Quando os tinham desalojado da casa principal, o primo Cecil havia, é obvio, reclamado todas as jóias valiosas, inclusive os pendentes de pérola que o pai do Caroline lhe tinha agradável em seu décimo sexto aniversário. As moças não tinham usado nenhuma jóia após.

—É uma jóia preciosa, disse Caroline, lhe dando volta para um dos abajures do carro. —Nunca te vi usá-lo antes. Estava em algum baú da casa?. Vivienne baixou os olhos, parecendo tão culpado como Caroline se havia sentido quando recordou o beijo do visconde.

—Deve saber que é um presente de senhor Trevelyan. Estava assustada de dizer-lhe a tia Marietta pelo medo a que me faça devolvê-lo.

Levantou seus olhos suplicantes ao Caroline.

—Não me gane por favor! Sei que é incorreto aceitar uma bagatela tão pessoal de um cavalheiro, mas ele parecia tão contente quando decidi usá-la, é um homem muito generoso.

—Certamente o é, murmuro Caroline. Franziu o cenho olhando o camafeu, contemplava o brilho do perfil da mulher, a garganta elegante.

Um afiado trovão cintilou despertando a Porta. O camafeu se deslizou dos dedos do Caroline. Vivienne o guardou rapidamente dentro da blusa, onde estaria seguro de outros olhos curiosos.

—Que ocorre? Murmurou Porta. Esfregando-os olhos, olhou com fixidez ao redor esperançosamente. Era esse um disparo? São os assaltantes de caminhos? Aqueles que seqüestram e violam?.

—Não te assuste, pequena, respondo Caroline. Teremos nossa aventura em outro momento.

Porta bocejou e se estirou, empurrando ao Vivienne. Estou morta de fome. Terão guardado algumas tortas frias da estalagem. Agachou-se procurando a maleta debaixo do Caroline, mas esta o afastou de seu alcance.

Porta se endireitou lhe dirigindo um olhar ferida.

—Não há necessidade de ser tão egoísta, Caro. Não ia comer as todas.

 —Acredito que estamos parando, comentou Vivienne, sentindo como a oscilação do carro diminuía. Chegamos?

Agradecida pela distração, Caroline tomo a maleta e o colocou cuidadosamente sobre o assento ao lado dela.

—Deve ser, se viajarmos mais longe e giramos à direita chegaremos ao rio Avon. A pergunta do Vivienne foi respondida quando um lacaio uniformizado abriu a porta do carro e exclamo.

—Bem-vindas ao ensolarado Wiltshire!.

 Não podiam saber se era uma exclamação irônica. A chuva ainda se transbordava do céu, as rajadas de vento dirigiam seu tamborilar desigual, acompanhado de perto dos lúgubres grunhidos do trovão.

Repentinamente relutantes a abandonar o interior acolhedor do carro, as irmãs passaram uma quantidade excessiva de tempo compilando luvas e ajustando-as capuzes de seus casacos. Quando já não havia nada que recolher, Caroline descendeu do carro, tomando a maleta debaixo de seu braço.

Um segundo lacaio se aproximuo para tomá-lo.

—Não, obrigado! Posso levá-lo! gritou sobre o ulular do vento.

Pelo menos ela esperava que fora o vento.

Enquanto Porta e Vivienne descenderam detrás dela, o castelo do Trevelyan surgiu ameaçadoramente na escuridão. A fortaleza se elevava imponente resistindo ao clima, podia ser modesta comparando-a com os padrões de castelos mais famosos do Wiltshire, mas não se permitiu cair em ruínas como o velho Castelo do Wardour. Podiam-se apreciar numerosas renovações realizadas através dos séculos, onde se mesclavam astutamente os estilos medieval, renascimento e gótico. O castelo se gabava de suas gárgulas e os contrafortes elevados, dos que a casa da cidade do visconde carecia.

 

Ao parecer também era absolutamente capaz de divertir-se, tinha uma masmorra totalmente equipada, com cadeias e ferros firmes.

Caroline levantou seus olhos fixando-os nos aterros observando um jorro de chuva que se deslizava entre os dentes de uma gárgula, quando repentinamente um pressentimento a apanhou. E se tinha cometido um terrível engano ao trazer para suas irmãs aqui?, Um que não poderia ser corrigido nem sequer em um livro de contas?.

Antes que pudesse retornar novamente dentro do carro e exigir ao condutor, simulando estar muito zangava, que as levasse de volta a Londres, a porta de ferro e madeira do castelo se abriu lhes conduzindo dentro.

Permaneceram de pé molhando os ladrilhos do grande vestíbulo da entrada. Séculos de antiga frieza parecia impregnar o ar, fazendo ao Caroline estremecer-se. A cabeça de um veado parecia as olhar de uma parede longínqua, com um brilho selvagem em seus olhos frágeis.

Porta colocou sua mão pequena na do Caroline antes de sussurrar

—Eu sempre ouvi que uma casa deve refletir a personalidade de seu amo.

—É por isso que estou assustada, sussurro Caroline retrocedendo, observando as tapeçarias antigas com vividas cenas de violência e mutilação.

Alguns representavam batalhas antigas em todo seu violento esplendor, enquanto que outros glorificavam a selvageria da caça. Na tapeçaria mais próxima ao Caroline, um cão de caça grunhia saltando para rasgar a garganta de uma formosa gazela.

Embora Vivienne olhava duvidosamente a seu redor, comento

—Seguro que será absolutamente encantador com a luz do dia.

Quase saltaram quando um mordomo levemente curvado e com um alarmante cabelo branco emergiu das sombras, sustentando um candelabro em sua mão retorcida. Era tão velho que Caroline podia escutar seus ossos ranger e chiar enquanto que arrastava seus pés para elas.

—Boa tarde, senhoras. Sua voz estava quase tão oxidada como o jogo de armadura antigo que se escondia em um rincão à direita do Caroline.

—Deduzo que são as irmãs Cabot. Esperávamo-las. Confio em que tenham tido uma viagem agradável?.

 —Simplesmente divino, mentiu Porta, realizando uma enérgica reverência.

—Meu nome é Wilbury e estarei a seu serviço durante sua estadia no castelo. Seguro que estão impacientem por trocar suas roupas úmidas. Se me seguirem, ensinar-lhes suas habitações. O mordomo se deu a volta arrastando os pés para a ampla escada de pedra que conduzia para cima, à escuridão, mas Caroline se mantinha em seu lugar.

—Desculpe-me cavalheiro, mas onde se encontra o senhor Trevelyan? Esperava que estivesse aqui para nos dar a bem-vinda.

 Wilbury se deu a volta lhe dirigindo um olhar desdenhoso debaixo de suas nevadas sobrancelhas. Os largos pêlos se arrepiaram para fora como os bigodes de um gato.

—O amo saiu.

Caroline Miro para a enorme janela arqueada se localizada sobre a porta, no momento em que a figura dentada de um relâmpago fraturava o céu e uma rajada fresca de vento açoitava os cristais.

—Fora? —repetiu duvidosa. Com este tempo?

—O amo tem uma constituição muito vigorosa, declarou, ao parecer insultado porque ela se atrevesse a sugerir algo assim. Sem outra palavra, iniciou a subida pelas escadas.

Vivienne fez um movimento para lhe seguir, mas Caroline tocou o braço de sua irmã, detendo-a.

—O professor Julian também está fora? Perguntou.

Wilbury se deu a volta outra vez, soltando um suspiro tão exagerado que Caroline quase esperava ver um sopro de ar emergir do bramido que rangia em seus pulmões.

—O professor Julian não chegará até manhã de noite. A cara de Porta caiu. A menos que desejem permanecer aqui no hall de entrada e esperar sua chegada, sugiro-lhes que me acompanhem.

O olhar fixo do Caroline seguiu a trajetória dos pés arrastados pelo mordomo ao primeiro patamar da escada. Supôs que tinha razão. A menos que desejassem estar paradas ali toda a noite, tremendo dentro de seus casacos molhados e aguardando o início de alguma enfermidade, não tinham nenhuma opção a não ser segui-lo às sombras.

Wilbury girou à esquerda deixando a Porta e Vivienne em habitações contigüas no segundo piso. Quando Caroline seguiu a luz vacilante da vela para cima três pisos mais, através da escada sinuosa, as pernas já lhe tinham começado a doer e seu espírito a afundar-se. As escadas finalmente terminaram em uma porta estreita. Aparentemente, Kane planejou castigá-la, impondo sua hospitalidade, desterrando-a a algum apartamento de cobertura privado de ar e ainda mais desprovido de encanto que a casa de tia Marietta.

Quando o mordomo passo rapidamente abrindo a porta, ela se abraçou assim mesma preparando-se para o pior.

Sua queixada caiu.

—Deve haver algum engano, protestou. Possivelmente este lugar foi pensado para minha irmã Vivienne.

 —Meu amo não incorre em equívocos. Nem tampouco eu. Suas instruções eram absolutamente explícitas. Wilbury aprofundou sua voz em uma personificação elogiável do Adrian Kane. “A Srta. Caroline Cabot se hospedará na torre do norte”. É você a Srta. Caroline Cabot, não? —Esquadrinhou-a baixando seu venoso nariz para ela. Não parece ser uma desonesta impostora.

 —É obvio não sou uma impostora, replico tomando-o por surpresa. Era impossível saber se a cintilação nos olhos do mordomo provinha da travessura ou a maldade.

—Só que não contava com… isto. Caroline agitou uma mão abrangendo o dormitório ante eles.

Enquanto que os alojamentos de suas irmãs eram cômodos e encantadores, pouca semelhança tinham com este opulento aposento, situado no mesmo topo do castelo.

Um fogo crepitava na chaminé emoldurado por um suporte de mármore, seu alegre resplendor refletido no cristal defumado de múltiplas janelas. Esbeltas velas de cera colocadas em spots de ferro enchiam as paredes da habitação circular. As paredes de pedra tinham sido branqueadas e pintadas com um bordo de hera entrelaçada. Uma cama com altas colunas dominava uma parede, em sua elegante marquise penduravam graciosas cortinas de seda de cor safira.

Com sua permissão, Wilbury saiu prometendo enviar a um lacaio com sua bagagem e a uma criada para ajudá-la com sua indumentária para a tarde, Caroline se aventurou na habitação, ainda com sua descolorida mala na mão.

Debaixo de uma das janelas havia um lavabo de cerâmica e uma jarra com água quente posta sobre uma madeira acetinada em forma de meia lua. Uma cadeira se encontrava frente à chaminé, onde descansava uma bandeja com carne e queijo. Preparado sobre a cama se encontrava um vestido cor esmeralda de veludo, convidando a cobrir os calafrios que provocavam a roupa molhada e deslizar-se em seu sedutor calor.

Não se tinha economizado nenhuma comodidade para o viajante cansado. Cada aspecto da habitação tinha sido desenhado para fazer que seu visitante se sentisse bem-vindo e era uma sensação de calor que Caroline não tinha gozado desde que seus pais morreram.

Seu olhar se fixou no par de portas francesas no lado oposto do quarto. Depois de guardar a mala segura debaixo da cama, agarrou um dos candelabros da parede e se moveu para abrir as portas.

Justo como tinha suspeitado, abriram-se para um empapado balcão de pedra. Embora o rio não se encontrava à vista, o vento lhe levava seu som metálico.

Seu olhar contemplou o céu encapotado.

Estaria Kane ali fora, em alguma parte, totalmente só e empapado? E se era assim, que diligência desesperada conduziria a um homem a semelhante audácia, em uma noite tão selvagem e perigosa?

A chama da vela se agitou, ameaçada pelo vento e seu suspiro. Ela cavada sua mão ao redor e se voltou para as portas fechadas, cobrindo-se no acolhedor ninho que seu anfitrião tinha previsto para ela.

Maltratado pela tormenta, Adrian conduzia seu cavalo na noite. Sua capa fechada não sérvia de nada para parar as rajadas de vento que se estrelavam molhando sua cara ou da umidade que afundava suas presas profundamente em seus ossos.

Ele tinha montado todo o caminho ao Nettlesham somente para descobrir que a criatura misteriosa que aterrorizava aos aldeãos e que rasgava as gargantas do gado, não era nada mais que um animal sarnento, metade lobo metade cão, conduzido pela crueldade e a fome. Tinham deixado ao Adrian sem opção, teve que matar a pobre besta. No momento que apertou o gatilho, olhou seus olhos selvagens e solitários, sentindo uma alarmante sensação de familiaridade.

Quando ultrapassou um topo coberta de aulaga divisou o castelo do Trevelyan. Desejava desde seu coração poder contemplar a paisagem de antigamente, mas desde que ele e Julian tinham começado a perambular pelo mundo detrás do Duvalier, o castelo se converteu em pouco mais que uma parte fria de pedra, desprovido de calor acolhedor.

Quase tinha alcançado a parede exterior do pátio quando sentiu que o castelo não estava tão frio como de costume. Piscando na chuva olhou para cima à torre norte. A janela deixava entrever uma tênue luz de vela. Essa trêmula e frágil luz pareceu atrai-lo a casa, prometendo que teria um momento de paz nessa noite solitária.

Atirando do cavalo fez um alto escorregando debaixo dos ramos molhados de um velho carvalho retorcido. A égua sacudiu sua cabeça, quase soltando de um puxão as rédeas de sua mão. Apesar de seu esgotamento, a arreios ainda soprava e se encabritava com inquietação, Adrian o reconheceu muito bem.

Enquanto ele caminhasse como um cavalheiro, dentro do limite das restrições rígidas da sociedade de Londres, poderia conter-se. Mas aqui neste território antigo, com o vento açoitando através de seu cabelo e do aroma do rio nas janelas de seu nariz, ameaçava consumir-se.

Esticou-se quando Caroline Cabot apareceu na janela da torre, sua cara faiscante iluminada pela chama de uma só vela, seu cabelo solto fluindo sobre seus ombros. Pôs o vestido que ele tinha deixado para ela, o veludo abraçava suas curvas magras, traindo a suavidade que ela lutava tão duramente por ocultar debaixo de seu exterior espinhoso.

Adrian suspirou. Parecia que ali não havia escapatória. Não entre a multidão no Vauxhall e não aqui, em seu único lugar de retiro. Nem em seus sonhos que ela tinha freqüentado desde que ele a provasse com um beijo.

Me faça o amor, tinha sussurrado ela sozinho a noite anterior, agitando-o entre os lençóis enredados. Sua voz não estava frenética pelo desespero, mas era lânguida carregada de desejo. Tinha-lhe cuidadoso com seus olhos cinzas brumosos cheios de desejo. Suas mãos tinham acariciado meigamente sua cara, enquanto as sedosas pétalas de seus lábios se entreabriam para convidá-lo dentro.

Adrian jurou, amaldiçoando sua imaginação traidora. Sua vida seria muito mais simples se fosse Vivienne quem freqüentasse seus sonhos. Era Vivienne quem devia estar parada nessa janela, olhando melancolicamente na noite como se procurasse algo.

Ou alguém.

Ou a ele.

Cavando uma mão ao redor da chama da vela, Caroline se deu a volta e se afastou da janela, levando-a luz com ela.

Adrian se tinha orgulhado sempre de seu controle, mas havia alguns apetites que eram simplesmente muito grandes para ser negados. Envolvendo as rédeas do cavalo ao redor de seu punho, cavalgou rapidamente para o castelo, rechaçando os braços que o abrigavam na escuridão.

Caroline abriu os olhos, deslizando do sonho à insônia com apenas uma mudança na respiração. Por alguns desorientados segundos ela estava no apartamento de cobertura de tia Marietta com Porta que roncava na outra cama. Mas não era um ruído o que despertou a não ser a ausência dele. A chuva tinha parado, seu afastamento aumentava o silêncio em proporções ensurdecedoras.

Ela se incorporou, sentia-se pequena nessa cama de colunas extravagantes, a habitação tinha estado tão morna e cômoda quando ela se arrastou à cama, tanto que não se incomodou em correr as cortinas da cama. Mas agora o fogo diminuía no lar e o frio se aderia ao ar.

Ela alcançou as cortinas da cama, mas sua mão se congelou no ar. Uma das portas francesas no lado oposto da torre se abria, convidando sigilosamente a entrada da luz da lua e a névoa.

Ela apartou sua mão, seus dedos começavam a tremer. Seu olhar fixo nervoso procurou no dormitório. Todas as velas estavam apagadas, deixando a torre coberta de sombras.

O fantasma emitiu um som chamando sua atenção de novo ao balcão. Era o vento?, Perguntava-se. Ou passos furtivos? Mas como poderiam ser pisadas, quando ela estava ao menos cinco pisos acima?

Umedeceu seus lábios, surpreendendo-se de ouvir algo sobre os frenéticos batimentos do coração de seu coração. Não desejava mais que mover de um puxão as mantas sobre sua cabeça e ficar baixo elas até manhã.

Mas perdeu o luxo de acovardá-la noite que seus pais tinham morrido. Porta e Vivienne podiam ficar sob as mantas ante qualquer circunstância, mas foi ela quem sempre teve que arrastar-se fora da tibieza de sua cama, nas noites tempestuosas para apertar uma portinha frouxa ou adicionar outro tronco ao fogo.

Reunindo valor saiu das mantas, baixando os pés para o chão, avançou lentamente sobre os ladrilhos para o lago que formava a luz da lua. Encontrava-se a meio caminho da porta quando uma sombra oscilou através do balcão. Ela retrocedeu, um grito de assombro ficou agasalhado em sua garganta.

"Deixa de fazer o ganso" arreganhou-se em voz alta através dos dentes apertados. “Certamente é uma nuvem que passava através da lua”, deu outro passo resistente para a porta. “Se esqueceu simplesmente de fechar a porta e o vento soprou abrindo-a.”

Tentando não imaginar que eram as gárgulas dos aterros que desdobravam suas asas da pedra e se mergulhavam direito a sua garganta, fez uma respiração profunda e cruzou o resto do espaço em três amplos e determinados passos. Abriu ambas as portas completamente impedindo algum monstro atrevido saltar sem ser visto para a escuridão.

O balcão estava deserto.

Um véu de névoa se levantou da pedra úmida, sua teia de fios de prata sob o resplendor da lua. Caroline cruzou o parapeito abrigando-se no balcão, usando sua pedra áspera para estabilizar o tremor de suas mãos. Dividida entre o alívio e o aborrecimento de sua própria insensatez, observo com fixidez a parede, calibrando a distância impossível à terra. Se qualquer pessoa desejasse aproximar-se, requeria certamente de asas para voar.

—Boa tarde, Srta. Cabot.

Essa voz saiu das sombras detrás dela, burlando-se, em meio de uma nuvem de enxofre Caroline girou ao redor e deixou sair um chiado aterrorizado.

 

Caroline caiu de costas. Enquanto o duro parapeito de pedra golpeava suas costas, o céu se precipitou e ameaçou trocando de lugar com o chão. De repente os braços do Kane estiveram aí, envolvendo-a, duramente ao princípio e logo se suavizando ao recolher seu tremente corpo contra seu peito.

Uma de suas grandes mãos alisou seu cabelo, pressionando sua bochecha contra o quente e amplo refúgio de seu peito.

—meu deus, mulher —disse asperamente— O que tenta fazer? Matar-me de um susto?

À medida que o mundo lentamente retornava ao seu lugar e seus tremores diminuíam, Caroline não desejava nada mais que afundar-se em sua força e seu calor. Acreditar que nada mal podia lhe passar em tanto estivesse em seus braços. Esquecer, inclusive por um hesitante batimento do coração, que tão tola idéia era o perigo mais sedutor de todos.

Ela empurrou contra seu peito, afastando-se de seu abraço com um desespero que a surpreendeu.

—te assustar?Você é o que saltou para mim das sombras! Se tivesse cansado por volta de minha morte e o pobre Wilbury tivesse tido que passar toda a manhã me esfregando dos paralelepípedos de seu pátio, tivesse sido menos do que te merece por vir de de maneira tão sigilosa —Começou a afastar-se dele, enquanto suas suspeitas cresciam— E como foi que chegou até aqui acima?.

Ele seguiu seus movimentos sem mover um músculo, seus olhos brilhando com uma inconfundível diversão.

—Caminhei.

Caroline se deteve, franzindo o cenho, perplexa. Seguiu o movimento de sua mão, dando-se conta, pela primeira vez, que a estrutura que tinha confundido com um balcão privado era em realidade um corredor que rodeava toda a torre. Provavelmente haveria uma ponte ou escada no lado contrário que conectaria a outra torre ou piso.

Kane cruzou suas mãos contra seu peito antes de perguntar brandamente.

—E como acreditava você que cheguei aqui, senhorita Cabot?

Caroline passo saliva.

—Bom, eu… Não estava segura o que é o que tinha pensado. Depois de tudo não era como se tivesse podido converter-se em um morcego e pirado até seu balcão só para meter-se em seu dormitório, cobrindo sua forma indefesa com sua sombra e… —Ao imaginá-lo aproximar-se dela, imponente, na escuridão de sua cama, outra imagem se meteu em sua cabeça, uma mais perturbadora, e muito mais provocadora. Piscou desesperadamente desejando desaparecer— OH, bom eu… bom… assumi que talvez…

Ele sentiu lástima por sua nervosa gagueira.

—Não pretendia assustá-la, pensava que já estaria em cama, temo-me que ainda não me acostumo à hora do campo. Não podia dormir, assim saí para dar um passeio e fumar.

Pela primeira vez Caroline notou o magro charuto ainda fumegando nas pedras. Deveu havê-lo atirado quando se moveu para sujeitá-la do bordo do desastre; agora entendia por que tinha cheirado um reflexo de enxofre antes que ele aparecesse.

E ao mesmo tempo em que notava o charuto também começou a notar outras coisas. Como a bastante escandalosa ausência do casaco, colete e gravata do Kane. Sua magra camisa de algodão estava metida em sua calça de montar de couro, que abraçava seu magro quadril e acentuava cada músculo de suas esculpidas coxas. A camisa estava aberta no pescoço, revelando uma parte de músculo dourado e uma generosa distribuição de pêlos frisadas cor mel. Embora tinha penteado seu cabelo em uma cauda descuidada, algumas fios molhados caíam ao redor de sua cara.

Sua aparência só servia para lhe recordar seu próprio estado deplorável. Nem sequer se tinha incomodado em ficar o salto de cama que ele tão generosamente lhe tinha emprestado. Estava frente a ele com sua camisola desbotada e pés descalços, com o cabelo caindo pelas costas como o de uma colegial. O desgastado sutiã de sua camisola apertava  a proeminência de seus seios.

Incomodamente dobrou seus braços sobre eles, agradecendo pela primeira vez em sua vida não ser tão bem dotada como sua irmã Porta.

—Espero que meu grito não tenha levantado toda a casa.

—Os serventes provavelmente seguiram dormindo sem dar-se conta —lhe assegurou Kane, seu olhar entrecerrado folheava, não seu peito, a não ser a graciosa curva de seu pescoço—. Depois de tudo já deveriam estar acostumados a sons como esse… gritos terríficos, súplicas por piedade, o pranto torturado dos inocentes.

Estava-o fazendo de novo. Burlando-se de ambos sem nada mais que o arquear perversamente uma sobrancelha leonada.

Caroline contra-atacou com um sorriso frio.

—Não me surpreende. Assumo que tão fina propriedade tem que ter um calabouço disponível.

—Certamente. Justo aí é onde escondo a todas essas virgens desaparecidas da vila. Talvez poderia arrumar um percurso antes que termine sua visita.

—Isso seria estupendo

Ele se apoiou contra o parapeito.

—Temo-me que fui tristemente negligente como anfitrião. Espero que me perdoe por não ter estado presente para lhe dar a bem-vinda a você e a suas irmãs.

—Wilbury nos informou que estava fora —Seu olhar se manteve em seu peito, onde sua camisa molhada apertava a impressionante superfície de músculo e força. A vista a fazia sentir curiosamente enjoada. Tocou-se uma sobrancelha. Possivelmente ainda estava enjoada por sua quase queda do balcão— Deve ter sido algo muito urgente para necessitar sua atenção em uma noite tão aterradora.

—Ao contrário. Encontro a tormenta muito menos aterradora que estar encerrado em um salão de baile abarrotado ou um teatro cheio de fumaça. Prefiro lutar contra os elementos que com as línguas rápidas dos fofoqueiros da sociedade. Mas sim lamento não ter estado aqui para recebê-las.

Perfeitamente consciente de que ele tinha esquivado limpamente sua pergunta tácita, ela fez um gesto para as portas francesas, que ainda estavam abertas, lhes oferecendo a ambos uma vista iluminada pela lua de seus lençóis enrugados.

—Não posso acusar o de ser negligente com sua hospitalidade quando me proporcionou tão extravagante alojamento.

Ele bufou, esticando sua mandíbula.

 —Mais extravagante que a que lhe proporcionou sua tia, sem dúvida. Surpreende-me que não a tenha agasalhado no depósito de carvão.

Caroline franziu o cenho.

—Como sabia…? —Mas o recordou a ele parado no portal de sua tia sob a chuva, levantando seu olhar para a água-furtada poeirenta. Devia haver-se oculto detrás das cortinas um segundo muito tarde.

Inexplicavelmente envergonhada de que ele soubesse que tão pouco carinho tinha sua tia por ela, levantou seu queixo.

—Como hóspede de honra Vivienne devia ter seu próprio quarto, Porta e eu estamos bastante acostumadas a compartilhar.

—Pensei que aprovaria o acerto. Depois de tudo, não posso ser acusado de tentar me colocar ao quarto de sua irmã e comprometer sua virtude com Porta fazendo guarda, poderia acaso?

“Mas quem protegerá minha virtude?”. Caroline não se atreveu a lhe fazer essa pergunta. Não quando ela tinha insistido que estava além da idade em que acreditava que todos os homens que conhecia estavam planejando seduzi-la ou manchá-la. Inclusive aqueles que apareciam fora da porta aberta de sua antecâmara a meia-noite, meio vestidos e cheirando a vento e chuva e a uma  intoxicante mescla de tabaco e licor.

—Temo-me que Porta é mais um terrier que um mastim —disse ela.

Ele teve um falso estremecimento.

—Então a considero um inimigo mais formidável. Prefiro ser atacado por um mastim que ter um terrier ladrador mordendo minhas botas.

Caroline sorriu, apesar de se mesma, por sua acertada descrição de sua irmã menor.

—Usualmente encontro que golpeá-la no nariz com o Morning Post pode ser bastante efetivo.

—Terei isso nele memore levantou sua cabeça para um lado, lhe dando uma dessas olhadas penetrantes que ela começava a desejar e temer—. Assim me diga, senhorita Cabot, o que opina de meu humilde casa? É de seu agrado?

Ela duvidou.

—Suas antecâmaras de convidados são encantadoras, meu senhor, mas devo admitir que encontro que seu vestíbulo um pouco… intimidante. Há uns poucos animais mortos e cenas de batalha de mais para meu gosto.

—Suponho que lhe falta o calor que só pode dar o toque de uma mulher —replicou, sua profunda voz acariciava cada palavra.

—Ah, mas essa é uma falta que pode ser facilmente remediada, não?

Por um instante seus olhares se encontraram, Caroline teve a assombrosa impressão de que nenhum dos dois estava falando do Vivienne.

A sensação foi tão desconcertante que ela começou a retroceder para a antecâmara. Ela quase esperava que a seguisse, emparelhando cada passo como tinha feito no caminho do Vauxhall.

—Se me desculpar, meu senhor, realmente deveria estar retornando à cama. O amanhecer estará aqui antes que nos demos conta.

—Sim, assim será, não é certo? —Em lugar de segui-la, Kane se voltou para sujeitar o parapeito, seu olhar afastando-se para o distante horizonte, onde o brilho dos relâmpagos ainda dividia a parte mais baixa das turbulentas nuvens—. Senhorita Cabot?

Ela se deteve, sua mão já procurava o pomo da porta atrás dela.

—Sim?

Ele falou sem voltar-se para olhá-la, seu olhar ainda cravado na noite.

—de agora em diante talvez deveria lhe pôr ferrolho a essas portas. Não sempre se pode confiar em que um elemento tão caprichoso como o vento exerça seu melhor julgamento.

Caroline respirou fundo antes de dizer brandamente.

—Como desejar, meu senhor.

Retrocedendo para sua habitação, fechou brandamente as portas atrás dela. Duvidou pelo mais curto dos instantes antes de agachar-se e assegurar o ferrolho de ferro em seu lugar. Quando levantou seus olhos Kane já se foi, o balcão estava vazio.

Estava sozinha.

 

—OH, meu céu! Quem morreu e te fez Rainha da Inglaterra?

Caroline não podia dizer que era mais horrível. Despertar à manhã seguinte com o chiado exuberante de Porta ou que as cortinas de sua cama fossem abertas de repente deixando acontecer o resplendor da luz do sol. Enquanto os ardentes raios esquentavam sua cara, deu uma mão sobre seus olhos, sentindo-se como se fora realmente a estalar em chamas.

Muito depois de que Adrian Kane desaparecesse de seu balcão, tinha dado voltas na cama entre os lençóis enredados, perguntando-se se tinha sido o vento, ou talvez um elemento mais primitivo e perigoso, o que tinha aberto sua porta. Perguntando-se por que cada encontro com o Kane tinha que começar ou terminar com ela em seus braços. E sobre que classe de criatura malvada podia encontrar estar em seus braços tão alarmantemente agradável quando não tinha nenhum direito a estar aí.

Enquanto Porta saltava sobre o colchão de plumas como uma espécie de cachorrinho alegre, Caroline gemeu e atirou a colcha estampada sobre sua cabeça.

—Vai!. Recuso-me a acreditar que já seja de amanhã.

—Amanhã? —repetiu Porta—. Vá. Mas se for quase meio-dia!. Só porque lhe tenham hospedado na torre da rainha não significa que possa adoecer todo o dia na cama como a realeza. Se esperas que eu atue como ajudante de câmara e chame uma servente para que te traga chocolate à cama, espera-lhe uma surpresa, sua alteza!

—Meio-dia? —Caroline se sentou e atirou a colcha, lançando-a acidentalmente sobre a cabeça de Porta—. Como pode ser meio-dia? Teria jurado que acabava de amanhecer.

Duplamente horrorizada por esta nova evidência de sua decadência moral, Caroline saiu disparada da cama. Só tinha uma semana antes do baile para determinar se Kane era amigo ou inimigo e já tinha esbanjado meio-dia.

Deixando de lado a colcha, Porta se deixou cair no espaço morno que Caroline tinha desalojado com um suspiro entusiasta.

—Suponho que não posso te culpar por ser tão preguiçosa, se tivesse um quarto tão magnífico, jamais quereria deixar minha cama.

Enquanto Caroline abria o seguro de seu baú e levantava a tampa, tratava de não pensar em outras razões, mais convincentes, para não sair da cama.

Porta se levantou e começou a deslizar-se pelo quarto, examinando seus muitos tesouros.

—Agora sei por que Vivienne insiste em que o conde é tão generoso. Assim me diga, o que fez para merecer tal recompensa?

—Nada! —escapou ao Caroline, colocando sua cabeça no baú para esconder um rubor traiçoeiro—. Nada absolutamente!

Ela rebuscou entre várias anáguas e fustões desgastados antes de localizar finalmente um simples vestido de percal com mangas largas e pescoço alto.

Para lhe evitar ter que chamar uma servente, Porta se aproximou para lhe atar o espartilho. Levantando seu cabelo para que não incomodasse, Caroline perguntou:

—Onde está Vivienne esta manhã?

Porta pôs seus olhos em branco.

—Provavelmente está encolhida em alguma esquina, bordando um verso bíblico em algum mostruário. Você sabe que não necessita muito para divertir-se.

—Oxalá tivéssemos todos essa bênção —Ainda resolvida a aproveitar os últimos minutos da manhã, Caroline se apressou para a bacia para molhá-la cara e escovar seus dentes com um pano e um pouco de pó com sabor a hortelã.

—Não sei por que está tão apurada —disse Porta—. Segundo esse mordomo intratável, Julian não chegará até esta noite. E já sabe que Lorde Trevelyan não poderá aparecer até depois do pôr-do-sol.

—Não crê que já é tempo de que deixe de manter essa ridícula fantasia? —Sentando-se no banco estofado da penteadeira coberto de felpa, Caroline levantou a tampa e começou a procurar pelo pacote de forquilhas que a criada tinha desempacotado ontem à noite. Recolhendo uma lustrosa mecha de cabelo para sua nuca. Ela disse—. Não acredito que Lorde Trevelyan seja um vampiro mais do que te acreditei aquela vez que decidiu que foi a filha ilegítima do Prinny e portanto herdeira ao trono Dela se deteve, olhando fixamente o interior da penteadeira.

—O que acontece? —Perguntou Porta, aproximando-se—. Realmente não te vê tão mal. Se quiser, posso-te trazer minha pata de coelho e te jogar um pouco de pó de arroz nesses círculos sob seus olhos.

Quando Caroline não disse nada, Porta olhou atentamente por cima de seu ombro. Tomou um minuto reconhecer o que Caroline via. Ou mas bem, o que não estava vendo.

As irmãs lentamente voltaram para ver-se a uma à outra, a verdade refletida em seus olhos. Embora a madeira de carvalho da penteadeira mostrava claramente um esculpido ovalado, não havia espelho.

Não havia espelhos cobertos por tecidos no castelo Trevelyan. Não havia nenhum espelho absolutamente. Nenhum ovalado delicado sujeito aos dedinhos rechonchudos de dourados querubins. Nenhuma coluna alta de cristal situada entre duas janelas. Nenhuma lâmina de espelho pendurada sobre o suporte da chaminé, para que os convidados pudessem fingir que olhavam ao fogo enquanto secretamente admiravam seu reflexo. Nenhum elegante espelho de pedestal parado direito nas esquinas das antecâmaras, tentando à dama a posar e arrumar-se, enquanto o espelho inclinado lhe mostrava tanto sua figura como seu penteado com maior vantagem.

Caroline e Porta aconteceram a maior parte da tarde esquivando lacaios e criadas para poder deslizar-se dentro e fora das habitações desertas do castelo. A busca não produziu nem sequer um deslustrado espelho de mão guardado em alguma gaveta de armário.

—Talvez esteja mais inclinada a me acreditar a próxima vez que te diga que sou a legítima herdeira ao trono da Inglaterra —disse Porta com uma choraminga presunçosa enquanto se apressavam para a asa sul.

—Estou segura de que existe uma explicação totalmente razoável —insistiu Caroline—. Possivelmente tiraram os espelhos para poder poli-los antes do baile. Ou possivelmente a família Kane simplesmente não é dada à vaidade.

Porta suspirou melancolicamente.

—Se eu fosse tão formosa como Julian me sentaria frente ao espelho e me admiraria todo o dia.

—Igual o faz agora —lhe recordou Caroline.

Ambas se estremeceram de culpa quando a melodiosa voz do Vivienne soou atrás delas.

—Onde diabos estiveram vocês duas toda a tarde?

Voltaram para encontrar a sua irmã parada sob as vigas da abóbada da parte mais longínqua do amplo corredor de ladrilhos.

—terminei dois mostruários, feito a prega a uma dúzia de lenços e tomado o chá, todo eu sozinha —lhes informou com pesar—. O senhor Wilbury não é exatamente o mais brilhante conversador. Estive cada vez mais cansada de minha própria companhia.

—Não tínhamos intenção de te abandonar —gritou Caroline—. Só estávamos explorando um pouco —Jogando um olhar furtivo sobre seu ombro para as enormes leva de mogno que protegiam a entrada à asa sul, deu-lhe a Porta um ligeiro empurrão em direção ao Vivienne—.Por que não vai com o Vivienne e lhe faz companhia, querida?. Eu me reunirei com vocês dentro de pouco.

A contra gosto Porta obedeceu, lhe lançando um olhar sobre seus ombros, com os olhos muito abertos

—Tomará cuidado, verdade? A gente nunca sabe que classe de criatura poderia aparecer nestes velhos quartos mofados.

Caroline desprezou a advertência de Porta. Não só tinham falhado em encontrar algum espelho. Também tinham falhado em encontrar algum rastro de seu anfitrião. Apesar dos temores de Porta, Caroline se negava a acreditar que ele estivesse dormindo a sesta em um ataúde na cripta familiar.

Enquanto via suas irmãs afastar-se, agarradas do braço, franziu o cenho. Não era normal no Vivienne ser tão queixosa. E não estava sua tez mais pálida do usual? Caroline descartou a idéia. Talvez eram só as largas sombras as que roubavam a cor das bochechas de sua irmã. Através dos cristais de chumbo da janela ao final do corredor, ela podia ver a neblina lavanda do crepúsculo aproximando-se lentamente ao castelo.

Com uma sensação de urgência crescendo inexplicavelmente retrocedeu para a porta, cautelosamente girou o pomo. A porta se abriu com um desconcertante chiado e Caroline se encontrou a se mesma olhando para um corredor sem janelas coberto de sombras. Pinçou no bolso de sua saia, agradecida de ter tomado a previsão de colocar um pedaço de vela e um isqueiro em seu bolso.

A mecha da vela vaiou à vida sob sua assistência, projetando um brilho lhe pisquem a seu redor. Deslizando-se no corredor, sustentou a vela em alto, só para encontrar-se a se mesma cara a cara com o Adrian Kane.

Ela soltou um agudo uivo e tropeçou retrocedendo, tão surpreendida que quase lhe cai a vela. Tomou vários estrondosos batimentos do coração ao dar-se conta que não era o visconde mesmo parado frente a ela, a não ser um retrato de corpo inteiro montado em um marco dourado. Lutando para controlar sua respiração, ela deslocou a vela em um tremente semicírculo. Isto não era um corredor ordinário a não ser uma galeria de retratos, cada um de seus residentes congelados no tempo pelo feitiço arrojado pelo pincel do artista.

Aproximou-se sigilosamente ao retrato do Kane, sabendo que talvez nunca teria uma oportunidade de estudá-lo em pessoa tão desprotegido. Ele tinha sido pintado contra um pano de fundo de céu tormentoso, uma mão descansando em seu quadril e a outra sujeita à cabeça chapeada de uma fortificação. Um par de cães aborrecidos recostados na grama ante seus pés calçados de botas.

Caroline estudou sua cara, consternada de descobrir que tão familiar se tornou em tão pouco tempo, sabia exatamente como as tênues enruga de seus olhos se acentuavam quando sorria. Como aparecia um sulco entre os arcos leonados de suas sobrancelhas quando ela o deixava perplexo ou o desafiava. Como sua boca expressiva podia apertar-se em uma linha ameaçadora ou relaxar-se sempre que fixava seus olhos nela.

Tocou com a gema de seus dedos a carnuda elevação de seus lábios, recordando como aquela boca se arqueou tão meigamente contra a sua. Alertada por uma melancólica pontada em seu coração, afastou o olhar de sua cara, solo aí se deu conta de que a roupa estava toda mal.

Perplexa, aproximou a vela ao tecido. O homem do retrato vestia um casaco de cetim azul meia-noite com uma saia acompanhada adornada com uma trança dourada. Elaboradas cascatas de encaixe emolduravam sua musculosa garganta e poderosas mãos. Usava calças apertadas ao joelho e as médias com liga baixavam até um par de sapatos negros com broche, um estilo que tinha desaparecido uma geração atrás.

Possivelmente tinha sido pintado por um desses artistas excêntricos que preferiam pintar a seus modelos disfarçados com roupas de outra era. Solo uma década atrás todo o grego tinha estado de moda, dando como resultado uma alarmante quantidade de retratos familiares representando gordinhas matronas vestidas com togas escapando de cabeludos centauros que luziam suspeitosamente parecidos com seus abatidos maridos.

Roubando um último olhar ofegante ao quadro, Caroline se dirigiu ao seguinte retrato. Sua boca se abriu da surpresa. Era Kane outra vez, esta vez vestido com um chapéu emplumado e uma gola isabelina, as dobras de uma capa se balançavam desde seus ombros. Seu cabelo caía por debaixo desses ombros, os bigodes frisados e a barba de cabrito o faziam parecer mais diabólico que de costume. Ela poderia não acreditar o que via se não fora pela expressão sardônica de sua boca e a audaz inclinação de sua cabeça.

Para aumentar sua comoção, o sujeito do seguinte quadro também se parecia Kane. Neste tinha um sorriso satisfeito e zombador, um capote debruado de pele e umas apertadas malhas verde escuro. Caroline apartou seus olhos, tratando de não notar o extraordinariamente bem que enchia as malhas.

—Deve estar usando um calção com recheio —murmurou.

Sacudindo sua cabeça com desconcerto, levantou a vela no seguinte retrato. O fôlego saiu assobiando de seus pulmões. Um guerreiro se impunha sobre ela com armadura completa, sujeitando uma brilhante espada na mão. Não havia forma de confundir as manchas oxidadas de sua folha, era tudo o que ficava da última pessoa que tinha sido o bastante parva para interpor-se entre este homem e o que queria.

Ele se pavoneava sem mover um músculo, seu olhar entrecerrado desafiando ao mundo a aceitar sua provocação. Este era o Kane despojado da capa de gentileza imposta sobre ele pela sociedade. Este era o homem que Caroline tinha vislumbrado nos jardins do Vauxhall. O homem que se havia refugo de seus atacantes sem nem sequer derramar uma gota de suor. Sua crua masculinidade era tão aterradora como irresistível.

Uma fome feroz brilhava em seus olhos, um apetite pela vida que recusava ser negado. Ela reconhecia essa fome porque a havia sentido quando a apertou contra ele no Caminho dos amantes, tinha-a saboreado quando seu beijo se fez mais profundo e sua língua tinha reclamado sua boca, exigindo uma rendição que ela tinha estado muito disposta a dar. Aproximou-se para acariciar com as gemas de seus dedos sua bochecha, perguntando-se se era possível domar tão selvagem criatura só com uma carícia.

Apesar das cores apagadas e a pintura rachada, via-se como se fosse perfeitamente capaz de sair do marco deslustrado e tomá-la fortemente em seus braços.

Que foi pelo que Caroline logo que saltou quando sua voz saiu da escuridão atrás dela.

—Um parecido assombroso. Verdade?

 

Caroline arrancou a mão da pintura como se lhe tivesse abrasado a ponta dos dedos, depois girou lentamente sobre seu eixo para encontrar ao Kane apoiado contra a parede, com os braços cruzados sobre o peito. Dificilmente podia lhe acusar de aproximar-se dela às escondidas esta vez. Tinha estado tão fascinada por seu retrato, que duvidava que tivesse ouvido um regimento inteiro de gaiteiros partindo pela galeria.

Estava, uma vez mais, vestido com o traje adequado de um cavalheiro. Embora não levava casaco, seu colete de seda a raias cor borgonha e ouro estava completamente abotoado. Seu profundo V não revelava mais que os volantes dianteiros da camisa. Sua gravata pulcramente atada assegurava que não pudesse captar muito mais que um vislumbre do cabelo crispado que cobria seu peito. Ignorando a pontada de desilusão, perguntou-se quanto tempo levava ele aí de pé, observando-a. Perguntou-se se a tinha visto tocar ao feroz guerreiro do retrato como nunca havia feito a ele.

—Uma maravilha, não crê, milord? —replicou, cabeceando para o carrancudo cavalheiro—. Só estava admirando os extraordinários traços. Não posso imaginar onde encontrou a tão habilidoso artista. Rivaliza com o Reynolds ou Gainsborough.

Kane se endireitou, sua graça sem esforço lhe recordou que nenhum artista, sem importar quão habilidoso fora, poderia captar completamente sua raivosa vitalidade em carne e osso.

—Temo-me que o artista morreu faz muito. Como seu modelo. Este retrato é tudo o que fica de ambos.

Quando se aproximou mais a ela, Caroline tratou de escapar a seu penetrante olhar para voltar para retrato.

—Não entendo. Não é você? —Gesticulou para a parede—. Acreditava que era você.

—Acreditava que tinha encarregado múltiplos retratos de mim mesmo, vestido com disfarces diversos de épocas passadas? —Sua fumegante risada afogada fez que lhe arrepiassem os cabelos da nuca—. Posso lhe assegurar, Senhorita Cabot, que embora seja um homem de muitos outros vícios, a vaidade não está entre eles.

Ela se encolheu de ombros, perguntando-se quais poderiam ser esses outros vícios.

—Alguns poderiam chamá-lo vaidade. Outros simplesmente um desejo de imortalidade.

Apesar de que estava detrás dela, pôde sentir a súbita imobilidade nas profundidades de sua alma.

—Não muitos homens estão dispostos a pagar o preço da imortalidade. Pode ser muito custosa certamente.

Estendeu o braço junto a ela para lhe tirar gentilmente a vela da mão, e a dirigiu para a placa de latão manchada que havia na parte baixa do marco. Aceitando seu tácito convite, Caroline se aproximou, entrecerrando os olhos para ler os números esculpidos ali.

—Mil trezentos e noventa e cinco —sussurrou, endireitando-se lentamente para fixar seu incrédulo olhar no Kane.

Ele fez um gesto cortês para o retrato.

—me permita lhe apresentar ao Sir Robert Kane, Senhorita Cabot. Ele construiu este castelo em mil trezentos e noventa e três, anos depois de podar um montão de cabeças francesas na Guerra dos Cem Anos. Convenientemente teve o descuido de não solicitar uma licença de construção ao rei Ricardo II, mas lhe concedeu o perdão não muito depois. Temo-me que nós os Kane sempre têm se sobressaído em pedir perdão depois de um cortês atrevimento. Por isso a maior parte dos homens aos que vê aqui eram considerados de uma vez reprovadores e descarados—. Como eu mesmo. Embora as palavras não foram pronunciadas, bem poderiam havê-lo sido.

Caroline lançou outro olhar ao guerreiro de olhos acerados.

—Teria jurado que era você. As similitudes são extraordinárias.

Examinando a acidentada fila do Kanes, seu anfitrião suspirou.

—Há um parecido familiar indiscutível, verdade? Suponho que meus filhos serão amaldiçoados com ele também, pobres diabos.

Seus filhos. Os filhos que teria com o Vivienne. Meninos altos e atléticos de olhos verde azulados e cabelo cor mel que a chamariam Tia Carol, poriam grilos em sua cama, e secretamente lhe teriam pena por não ter filhos próprios. Embora Caroline não se sobressaltou, sentia-se como se o guerreiro do retrato lhe tivesse atravessado com dureza o coração com a ponta de sua espada.

—Como escapou Julian a este terrível destino? —perguntou, mantendo a voz deliberadamente ligeira.

—Teve o bom sentido de parecer-se com nossa mãe —Kane se girou, o varrido da vela revelou os retratos da parede oposta pela primeira vez. Caroline seguiu seu brilho até o retrato ovalado de uma mulher miúda com o cabelo cor visom e escuros olhos risonhos. Sua alegria era tão contagiosa que Caroline não pôde evitar sorrir também.

—É preciosa. Ainda vive?

Kane assentiu.

—esteve no estrangeiro desde que o coração de meu pai falhou faz quase seis anos. Sofreu uma febre severa de menina, e o clima da Itália é muito melhor para seus pulmões que o ar deste úmido e ventoso lugar. Eu acabava de terminar em Oxford quando enviou ao Julian a viver comigo.

—Ah, assim descobriu o que era converter-se em pai antes de tempo?

—Certamente. Embora eu diria que você teve bastante mais êxito nisso que eu. Quando veio pela primeira vez de Oxford, Julian desejava desesperadamente me seguir a onde quer que fora, mas eu acreditava que era muito jovem assim que lhe aplaudia na cabeça e tentava que fora pelo bom caminho. Para me chatear, temo-me que encontrou uma matilha bastante insípida de jovens de sangue quente.

—Parece ter acabado bem —ofereceu Caroline.

—Tão bem como pode esperar-se, suponho.

Surpreendida pela inconfundível nota de amargura em seu tom, lançou-lhe um olhar sobressaltado. Um véu havia tornado a cair sobre sua cara, fechando a janela do passado. Notando uma curiosa omissão entre os retratos, perguntou.

—por que não há retratos seu e de seu irmão?

Ele se encolheu de ombros.

—Minha mãe sempre disse que não podia conseguir que nos sentássemos juntos o tempo suficiente.

Caroline se girou para o primeiro retrato de todos. O homem da fortificação e os spaniels só podia ser o pai do Kane. A graça atrevida de sua postura e o brilho malicioso de seus olhos fazia que entendesse muito facilmente por que a mãe do Kane se apaixonou por ele. Invejou-lhe a alegria de amar a semelhante homem. Mas não a angústia de perdê-lo.

Incapaz de resistir o puxão desse olhar, voltou para retrato do guerreiro medieval. Lançou um olhar furtivo ao Kane, depois se aproximou mais ao retrato, uma suspeita incrível começava a rondar o fundo de sua mente.

—O parecido é absolutamente sobrenatural. A gente quase juraria que é você. Inclusive tem o mesmo lunar justo aí sobre... —A vela se apagou, deixando-os no mais absoluto negrume.

—Milord? —sussurrou Caroline inseguramente.

Kane resmungou um juramento rouco.

—Terá que perdoar minha estupidez. Ao parecer deixei cair a vela.

A porta ao final do corredor não deixava passar muito mais que um raio de luz, advertindo ao Caroline que fora do castelo, a noite absoluta tinha caído. O manto aveludado da escuridão lhe proporcionou outros sentidos de ofegante consciência. Podia ouvir a acidentada respiração do Kane, cheirar a colônia de louro perfumando, a curva recém barbeada de sua mandíbula, sentir o calor irradiando de sua carne.

Embora estava tão desorientada que duvidava que pudesse ter localizado seu próprio nariz, a mão dele encontrou a sua na escuridão. Entrelaçou seus grandes e quentes dedos com os dela, puxando-a gentilmente para ele. Seu primeiro instinto foi resistir, mas um impulso mais primitivo a insistiu a obedecer, a que fora voluntariamente a seus braços ou onde quer que ele queria levá-la.

—me siga —murmurou ele—. Eu cuidarei de você.

Nesse momento, temia-se que lhe teria seguido ao mesmo inferno. Mas seus pés a traíram e tropeçou. Os braços dele a rodearam para estabilizá-la, o sussurro do fôlego dele contra sua bochecha lhe advertiu o perigosamente perto que estavam os lábios dele dos seus.

Sua língua saiu para umedecer esses lábios. Em certa forma os sentia alheios... Inchados, tenros, desejando um beijo que nunca chegaria.

A luz apareceu. Captou só uma olhada dos olhos do Kane, fumegando com uma emoção que poderia ter sido desejo, antes de compreender que tinham companhia.

Giraram-se como um só para encontrar ao Julian apoiado contra o marco da porta, com uma mecha de cabelo astutamente desgrenhado derrubado sobre sua frente e um candelabro na outra.

—Se foste mostrar à Senhorita Cabot os esqueletos de nosso armário familiar, querido irmão —disse arrastando as palavras—realmente deveriam ter recordado trazer velas.

Adrian sabia que devia benzer ao Julian por sua oportuna intervenção, mas em vez disso queria lhe estrangular. Não era a primeira vez que desejava acabar com a vida de seu irmãozinho. Nem seria a última, suspeitava.

Caroline se havia posto rígida entre seus braços. Já não suave e flexível, a não ser arrepiada pela suspeita, seus lábios formavam uma rígida linha. Era difícil de acreditar que só segundos antes, esses lábios tinham estado separados em convite, refulgindo com néctar, suplicando sem palavras seu beijo.

Quando tinha ido a seus braços sem duvidar, quase tinha sido sua perdição. Sua confiança, de uma vez não ganha e imerecida, tinha desatado uma fome mais profunda do que desejava. Eu cuidarei de ti, havia dito. Pronunciar essas palavras descuidadas em voz alta só lhe tinha feito compreender quão impossível seria cumprir cabalmente sua promessa. Ainda lhe perseguia o fantasma da última mulher que tinha sido o bastante parva para acreditá-las.

Avançando a pernadas, arrebatou o candelabro da mão de seu irmão.

—Seu sentido da oportunidade, como sempre, é impecável. Temo-me que a Senhorita Cabot foi uma vítima inocente de minha estupidez. Deixei cair nossa única vela.

—Que trágico para ambos —disse Julian, com um sorriso brincando ao redor de seus lábios—. De não ter vindo quando o fiz, estremeço-me ao pensar o que poderia ter ocorrido.

—E eu —disse o oficial Larkin, emergindo de entre as sombras detrás o Julian.

Adrian ofegou para o Larkin com incredulidade, depois voltou o olhar para seu irmão.

—Que demônios está acontecendo aqui?

Cruzando suas largas pernas nos tornozelos, Julian suspirou.

—Se por acaso quer sabê-lo, eu lhe hei convidado.

Agudamente consciente de que Caroline ainda revoava atrás dele, Adrian lutou por manter a voz algo por debaixo de um rugido.

—Que você o que?

—Não seja tão duro com seu irmão. —O sorriso do Larkin era estudadamente amável—. Não lhe dava eleição. Vinha-me com ele ao Wiltshire. Ou ele podia ter vindo comigo... a Newgate.

—Com que cargos? —exigiu Adrian.

Larkin sacudiu a cabeça tristemente.

—Temo-me que o jogo forte e os bolsos pouco profundos não se dão bem. Seu irmão percorreu bastante as casas de jogo clandestino de jogo e às damas desde sua volta a Londres. Tinha toda a intenção de deixar detrás de si um grosso montão de dívidas de jogo, notas promissórias não pagas, um bando de corações quebrados, e a vários cavalheiros irados dispostos a lhe acusar de perder seu dinheiro por ganhar os corações de suas prometidas.

Adrian se voltou para o Julian.

—Não te adverti sobre isso? Sabe que não tem cabeça para as cartas ou as mulheres quando bebes. —Sacudiu a cabeça lutando com a urgência de puxar do cabelo... ou do Julian... de frustração—. Dei-te duzentas libras só a semana passada. Que demônios tem feito com elas?

Agachando a cabeça timidamente, Julian dedicou toda sua atenção às rugas imaginárias de seus punhos franceses.

—Pagar a conta de meu alfaiate.

Adrian sabia que quereria voltar a estrangular seu irmão. O que não tinha compreendido é que seria tão logo. Ou que quereria fazê-lo pela gravata de seda escandalosamente cara do Julian.

—por que não foi para mim quando compreendeu o que te vinha em cima? Não poderia ter reparado os corações quebrados mas te teria dado o que necessitava para voltar a comprar essas notas promissórias.

Quando Julian elevou a cabeça, não houve forma de equivocar-se sobre a amargura que havia em seus íntimos olhos.

—Já te devo mais do que nunca poderei pagar.

Sentindo o agudo olhar do Larkin como uma adaga pressionada contra sua garganta, Adrian se passou uma mão pelo cabelo, tragando-se de uma vez sua réplica e seu orgulho.

Pressentindo uma greta em sua armadura, Larkin aproveitou a vantagem.

—Quando ouvi que tinha convidado às irmãs Cabot a visitar Trevelyan Castle e assistir a seu baile de máscaras, não vi nenhum machuco em que unisse a sua pequena festa. Depois de tudo, passe todas as férias aqui quando estavam em Oxford. Não foi você quem me implorou que pensasse neste lugar como em minha segunda casa?

Antes que Adrian pudesse detê-los, os anos se desvaneceram e Larkin esteve uma vez mais de pé no vestíbulo do castelo, todo cabelo revolto e extremidades amplas, tão tímido que logo que pôde gaguejar seu nome a um carrancudo Wilbury.

Não se preocupe, companheiro, havia dito um risonho Victor, rodeando ao Adrian para dar ao Larkin um gentil empurrão. Wilbury só come meninos de Cambridge.

Essa lembrança caprichosa só servia para lhe recordar quão inseparável ele, Larkin e Duvalier tinham sido uma vez. Até que Eloisa se havia interposto entre eles.

Ainda estava tentando sacudir o eco da lembrança quando Caroline se deslizou por seu flanco e tomou o braço do Larkin. A cautela que tinha exibido para o homem em Londres parecia haver-se desvanecido milagrosamente.

Quando lhe ofereceu um ligeiro sorriso, inclusive o imperturbável Larkin pareceu deslumbrado.

—Eu por minha parte estou encantada de que pudesse unir-se a nós, oficial. E estou segura de que minhas irmãs estarão tão encantadas como eu.

—Estou bastante falto de um pouco de companhia civilizada, Senhorita Cabot —lhe disse ele—. O jovem Julian aqui presente esteve um pouco aborrecido durante a viagem. Insistiu em passar dormindo a tarde e sofria um ataque fechando a cara cada vez que eu tratava de abrir as portinhas da carruagem.

—Possivelmente enquanto esteja aqui, me poderia contar isso tudo sobre seus dias de universidade com Lorde Trevelyan. —Arrastando ao oficial corredor abaixo, lançou um olhar ilegível sobre o ombro ao Adrian—. Assim me conte... Mudou muito o visconde com o passar dos anos? Ou sempre foi tão... Imponente?

A voz do Larkin vagou atrás deles.

—Em realidade, deve cuidar-se excelentemente. Quase juraria que não envelheceu nem um dia desde nossos anos em Oxford.

—Um bom casal, verdade? —assinalou Julian, observando ao Adrian estudar aos dois que se afastavam corredor abaixo, agarrados do braço—. Com freqüência pensei que uma esposa jovem e bonita seria o que manteria ocupado esse inquisitivo cérebro dele.

Adrian voltou o olhar para seu irmão.

—Não tem umas botas que lustrar ou uma gravata que engomar?

Julian podia ser tolo, mas não estúpido. Agarrando o candelabro da mão do Adrian, afastou-se pausadamente pelo corredor, assobiando uma canção discordante e deixando a seu irmão na escuridão.

O porão do castelo Trevelyan bem podia hospedar uma masmorra medieval, mas seu grande vestíbulo se converteu em uma acolhedora sala de estar. Tapetes turcos de tons quentes carmesim e ouro tinham sido pulverizadas pelo salão, mitigando o frio de seu estou acostumado a lajeado. A pesar do alto teto abaulado, as madeiras claras e os balcões que rodeavam o vestíbulo, vários grupos de sofás, tilburis e cadeiras acolchoadas proporcionavam à habitação uma sensação convidativa. Abajures Argand com globos de cristal cristalizado ardiam em quase cada mesa, lançando um brilho pitoresco. As cortinas de veludo estavam firmemente fechadas, mantendo a noite a raia. Caroline não pôde evitar notar que essas janelas pesadamente fechadas também faziam impossível captar uma olhada do reflexo de ninguém.

Retiraram-se ao quarto de desenho depois de um jantar relativamente indolor. Ambos, Lorde Trevelyan e o oficial Larkin pareciam ter combinado uma trégua tácita, baixando temporalmente suas armas para evitar ferir algum inocente transeunte. Já que Kane estava atendendo a Vivienne, e Porta estava passando as páginas de música do Julian ao que se persuadiu para tocar uma das melodias mais cheias de vida do Hayden no grande pianoforte, Caroline terminou compartilhando um tilburi grego com o oficial, um acerto que servia bem a seus propósitos.

Apunhalou com sua agulha o círculo de linho, lutando por dar os toques finais ao trabalho que tinha começado seis meses atrás. Davam-lhe um livro maior, uma coluna de números, um frasco fresco de tinta e podia fazer um balanço do orçamento de Bretanha e lhe sobrariam ainda dois penes. Davam-lhe um bastidor para bordar e uma agulha, e tudo o que podia produzir era um desesperado enredo. Mas a tarefa ocupava suas mãos e mantinha seus olhos longe da harpa da esquina, onde Vivienne estava recebendo instruções do visconde. Justo quando Caroline lhes lançava um olhar de reolho sob as pestanas, um risonho Kane se inclinava sobre o ombro de sua irmã, cheirando a rosa branca do cabelo desta antes de voltar a colocar gentilmente os esbeltos dedos do Vivienne sobre as cordas.

Era muito fácil imaginá-los aos dois comportando-se assim os próximos trinta anos... Seus cabelos cristalizados de prata, seus netos jogando ao redor de seus joelhos, o afeto em seus olhos sem empanar-se pelo passado do tempo. Golpeada pelo ciúme e a vergonha, Caroline voltou o olhar ao trabalho, dando à agulha um puxão feroz que quase partiu o fio em dois.

Sem bordado que lhe ocupasse, o oficial Larkin não era tão afortunado. Embora fazia uma valente representação de estar sorvendo seu chá e olhando ao fogo, era o perfil precioso do Vivienne o que acendia o brilho triste de seus olhos.

—Se segue olhando fixamente a minha irmã desse modo, senhor —murmurou Caroline—Lorde Trevelyan vai ver-se obrigado a lhe desafiar a duelo.

Larkin saltou culposamente e voltou bruscamente o olhar à cara do Caroline.

—Não sei do que está você falando. Só estava admirando o trabalho de pedra veneziana ao redor da chaminé.

—Desde quando está apaixonado por ela?

Larkin lhe dirigiu um olhar sobressaltado, depois suspirou, compreendendo que não tinha sentido resistir a sua franqueza. Quando descansou a taça em seu prato Sévres, seu olhar se desesperada vagou de novo para o Vivienne.

—Não posso dizê-lo em realidade, embora juraria que cada instante em que ela me despreza é toda uma vida. Viu-a no jantar? Nem sequer me olhava. E logo que tocou sua comida. Qualquer pensaria que minha mera presença lhe roubou o apetite.

Caroline franziu o cenho confusa.

—Minha irmã sempre foi excepcionalmente equânime. Nunca a vi manifestar semelhante aversão para ninguém.

Ele se apartou uma mecha de cabelo rebelde dos olhos.

—supõe-se que devo me sentir adulado? Deveria me esforçar por inspirar ódio a cada criatura gentil que me encontre?.

Caroline riu em voz alta, ganhando um olhar ilegível do visconde. Teria jurado que tinha visto o olhar do Kane desviar-se em sua direção mais de uma vez. Não era justo que invejasse seu agradável intercâmbio com o oficial quando ele estava cortejando tão meticulosamente a sua irmã.

Deliberadamente voltou toda sua atenção ao Larkin, e disse:

—Possivelmente Vivienne se sinta insultada pela idéia de que tenha vindo aqui a proteger a de sua própria temeridade.

Larkin soprou.

—Como poderia esperar-se que inclusive a mais prática das mulheres conservasse a prudência quando Kane está esgrimindo esse notório encanto dele?

Encontrando de repente dificuldade em tragar, Caroline se esclareceu garganta e dedicou toda sua atenção a desatar um nó no fio.

—Desejaria poder lhe oferecer algum ânimo, oficial, mas tanto os afetos de minha irmã como suas esperanças para o futuro estão comprometidos. Aconselho-lhe não esbanjar seu tempo em perseguir um sonho que nunca se converterá em realidade —Lançou um olhar furtivo ao Kane sob as pestanas, pensando em que deveria emprestar atenção a seu próprio conselho—. Falando de nosso anfitrião, prometeu me contar como se conheceram.

Larkin arrancou o olhar do Vivienne, seus olhos perderam seu olhar maravilhado.

—Conheci o Adrian meu primeiro ano em Oxford. Encontrou-me no Cristo Church Meadow com uma panda de moços briguentos a mim ao redor, me gritando e me empurrando. Eu era órfão e um estudante de caridade, já sabe, e encontravam muito graciosa minha forma de falar, minha roupa andrajosa, meus livros de segunda mão —Um sorriso relutante curvou seus magros lábios—. Enquanto seus interesses consistiam só o jogo, as moças camponesas, beber muito brandy e burlar-se daqueles menos afortunados que eles, Adrian dedicava seu tempo livre a estudar boxe no Jackson´S. Acabou com todos, com cada um deles. A partir desse dia, nomeou-se a si mesmo meu campeão e ninguém se voltou a atrever a me incomodar outra vez.

—Esse é um papel que parece abraçar com mais entusiasmo do habitual —murmurou Caroline, recordando seu oportuno resgate no Vauxhall—. E o que tem que o Victor Duvalier? Era outro dos protegidos do Kane?

Os olhos do oficial cintilaram com algo que teria sido diversão em um homem menos reservado.

—Está você muito atenta, verdade, Senhorita Cabot? Está considerando uma carreira na contestaduría?

—Só se me permite você continuar meu interrogatório —replicou, incapaz de resistir um sorriso presunçoso.

Ele suspirou.

—Se quer sabê-lo, o pai do Victor era um conde rico e seus pais foram ambos enviados à guilhotina durante a Revolução. Uma tia lhe trouxe de contrabando a Inglaterra poucos anos depois. Infelizmente, nunca se livrou do todo do acento, o que proporcionava diversão sem fim a nossos companheiros estudantes, especialmente já que estávamos em guerra com a França nesse momento. Até que Kane tomou sob sua asa, fizeram-lhe viver um inferno.

Seu olhar curioso procurou a cara do Larkin.

—Por isso me contou em Londres, Kane não era só seu campeão. Também era seu amigo.

O sorriso do Larkin decaiu.

—Isso foi faz muito tempo.

—antes que Eloisa Markham desaparecesse? —aventurou, baixando a voz para assegurar-se de que sua conversação permanecia em privado.

—depois de que Eloisa desaparecesse, Adrian nunca voltou a confiar em mim —admitiu Larkin, incapaz de ocultar a nota de amargura em sua voz—. Foi como se nossa amizade nunca tivesse existido.

—E o que tem que o Victor?. Kane continuou confiando nele?.

—Victor voltou para a França pouco depois do desaparecimento da Eloisa.

Um estremecimento de excitação fez que Caroline se sentasse erguida.

—Como sabe que não lhe acompanhou em segredo?.

—Porque foi um coração quebrado o que lhe conduziu de volta a França. Verá, Senhorita Cabot, os três fomos amigos muito queridos, e dos três, Victor era o que mais amava a Eloisa. Não acredito que perdoe nunca ao Adrian porque fora o que ela escolheu corresponder.

—E o que tem que você? —atreveu-se a perguntar Caroline—. Lhe perdoará alguma vez?. Ou a Eloisa? —acrescentou agudamente.

Larkin posou sua taça de chá no pires.

—Se eu tivesse tido algo que ver com seu desaparecimento, honestamente, acredita que teria abandonado meu sonho de me unir ao clero e teria dedicado minha vida a caçar aos que cometem semelhantes crimes?.

Caroline sabia que a culpa tinha conduzido a homens a fazer coisas estranhas. Mas havia algo no olhar claro do Larkin que convidava a confiar.

—Foi uma grande perda para o clero, senhor —disse, lhe absolvendo com seu sorriso—. Teria sido um grande vigário.

Quando ele tomou um sorvo de seu chá, a mecha rebelde de cabelo voltou para sua cara. Caroline as arrumou para resistir a necessidade de corrigi-lo, mas tinha passado muito tempo arrumando os diversos laços e cintas de Porta para ignorar o laço torpe da gravata médio desatada.

Posando seu bordado no regaço, estendeu a mão e voltou a atar a gravata em um nó pulcro, surpreendendo-se ao encontrar sua exasperação mesclada com genuíno carinho.

—Devo dizer, Oficial Larkin, que tem uma necessidade horrenda já de um ajuda de câmara ou de uma esposa.

—O que posto está você solicitando, Senhorita Cabot?

Ante esse grunhido ressonante, Caroline olhou sobre seu ombro para encontrar ao Adrian Kane erguendo-se sobre o tilburi. Olhava-lhes encolerizado com pouca evidência de seu "notório encanto". Vivienne tinha começado a tocar uma melodia na harpa, lhe deixando livre para rondar pela habitação. Caroline não pôde evitar perguntar-se quanto levava ali de pé e quanto de sua conversação podia ter captado.

Sua pergunta impertinente lhe produziu um furioso rubor nas bochechas. Antes de poder soltar uma mordaz negativa, Larkin sorriu com arrependimento e disse:

—Temo-me que não poderia me permitir nem um valete e nenhuma esposa com minha magra comissão.

O olhar do oficial vagou de volta ao Vivienne. Seus dedos esbeltos jogavam sobre as cordas da harpa, extraindo um delicado glissando de notas do instrumento. A luz do oscilante abajur fazia empalidecer a cor de suas imaculadas bochechas, fazendo-a parecer particularmente etérea, como um anjo de cabelo dourado que pudesse ser convocado de volta aos céus em qualquer momento.

Unindo as mãos na parte baixa das costas, Kane se inclinou sobre o respaldo da cadeira e inclinou a cabeça para estudar o trabalho do Caroline.

—Deus benza a nossos elfos —leu—. Certamente são palavras de acordo às que viver.

—supõe-se que tem que ler-se "Deus Benza Nossas Vidas" —replicou Caroline, olhando de esguelha à homilia de letras retorcidas. Quando Kane se passeou tranqüilamente para voltar a sentar-se no sofá oposto a eles, seu olhar zombador a inspirou a atacar seu bordado com renovado vigor—. Não era consciente de que seguia você nossa conversação, milord —disse, esgrimindo a agulha como se fora uma diminuta estaca de madeira e o trabalho o coração do visconde—. De havê-lo sabido, teria falado mais claramente para lhe fazer mais fácil ouvir às escondidas.

Kane simplesmente sorriu.

—Isso dificilmente seria necessário. Tenho um ouvido extremamente bom.

—Isso dizem —replicou ela mais alto do que pretendia, sua ardente indignação a voltava descuidada—. Junto com uma excepcional visão noturna e uma apaixonada afeição pelo sabor de sangue.

—Só dizem isso porque todo mundo acredita que é um vampiro —disse Vivienne sem emoção, com os dedos suspensos sobre as cordas da harpa.

 

  A taça de chá do Larkin se chocou com estrépito contra o pires. A boca de Porta ficou aberta. Os dedos do Julian golpearam uma discordante nota desafinada sobre o pianoforte. Caroline cravou a agulha na sensível almofada de seu polegar. Todos olharam boquiabertos ao Vivienne, mas nenhum deles pôde obrigar-se a olhar ao Kane.

—Você sabia? —sussurrou Caroline no torpe silêncio que tinha cansado sobre o salão.

—Certamente —respondeu Vivienne, pondo os olhos em branco.— Teria que ser cega e surda para não ver as olhadas de esguelha ou ouvir os sussurros sempre que ele entra em uma habitação.

—E não te incomoda? —perguntou Caroline cautelosamente.

Vivienne se encolheu de ombros e deslizou um dedo cheio de graça por uma das cordas da harpa.— por que emprestaria atenção a tais tolices? Não foi você a que sempre me ensinou a desprezar as intrigas?

—Sim.—Caroline se afundou nas almofadas da poltrona, envergonhada pelas palavras de sua irmã. —Suponho que sim, não?

Até aquele momento, não tinha compreendido o perto que estava de avançar sobre aquela desagradável enjoa de intrigas e insinuações. Não tinha a juventude de Porta ou sua amalucada imaginação para culpar por sua predisposição a condenar a um homem inocente que não tinha mostrado nada mais que bondade para ela e sua família.

Quando Porta passou a página da música e Julian reassumiu sua canção, Caroline jogou uma olhada e compreendeu que tinha salpicado sangue por toda parte do antigo linho do modelo. Distraidamente aproximou o polegar a sua boca, logo jogou uma olhada ao Kane, tendo conseguido finalmente reunir suficiente coragem para calibrar sua reação às palavras do Vivienne.

Não olhava ao Vivienne. Olhava-a a ela. Seu fascinado e faminto olhar sobre seus lábios enquanto ela chupava as gotas de sangue que fluíam. A máscara cortes que ele tão freqüentemente levava tinha desaparecido, revelando uma necessidade nua que lhe roubou o fôlego.

Quase podia sentir seus lábios curvando-se ao redor de sua sensível carne. Sua boca chupando cuidadosamente todas suas feridas até que não houvesse nenhuma dor, só agradar. Seu coração pareceu reduzir a marcha, crescendo mais cheio e mais pesado com cada pulsado até que pôde sentir seu ritmo primitivo repetindo-se profundamente em sua matriz.

Kane lentamente, levantou seu olhar de seus lábios a seus olhos. Em vez de romper o feitiço, o movimento só o intensificou.

Vêem a mim.

Ouviu as palavras tão claramente como se as houvesse dito em voz alta. Tanto uma ordem como um rogo, fizeram-lhe quase impossível resistir ao puxão hipnótico de sua vontade. Por um momento tão aterrador como estimulante, Caroline pensou que ia levantar se, cruzar a habitação diante de todos e entrar em seus braços. Quase podia ver-se adaptando-se a seu regaço, entretecendo suas mãos pela brilhante seda de seu cabelo, lhe oferecendo sua boca e algo que ele desejasse, incluindo sua alma imortal.

Levantou-se bruscamente, derrubando seu bordado ao chão. Deixando de lado sua taça de chá e o pires, Larkin se voltou para recolhê-lo cortesmente. Quando o deu, com um olhar preocupado fixa sobre sua cara, ela agarrou a arruinado parte de tecido, esperando ocultar o violento tremor de suas mãos.

—O que, obr..Obrigado, agente Larkin. Se me perdoarem, acredito que me retirarei. —Evitando cuidadosamente os olhos do Kane, começou a retroceder para a porta, quase levando uma mesinha no processo.— Por favor não tomem por grosseira. Sou uma moça de campo no fundo e ainda não me adaptei a permanecer levantada até altas horas da noite.

—Durma bem, senhorita Cabot, —disse Larkin depois de que ela se desse a volta para escapar.

Embora lhe dirigiu uma risada afirmativa, Caroline não estava segura de que alguma vez voltasse a dormir.

Caroline se passeava de um lado a outro da torre iluminada pela lua, seu caminho circular se correspondia perfeitamente com o giro de seus pensamentos. A habitação maravilhosamente designada já não lhe parecia um refúgio, a não ser uma jaula. Se não escapava de seus barrotes dourados logo, temeu que nunca o faria. Inclusive se empacotava suas coisas e escapava essa noite, levando-se a suas irmãs, temia que seu coração permanecesse aqui, prisioneiro de um homem que, apesar de todo seu poder, era incapaz de ocultar seu desejo por ela.

Mas que exatamente poderia um homem como Kane querer dela? Era a vista de seu sangre o que tinha aceso a fome em seus olhos? Ou algo ainda mais inconcebível?

Tinha visto esse olhar antes. No rosto de um guerreiro medieval na galeria de retratos. O guerreiro que Kane havia dito que era só um antepassado longínquo, embora fossem quase idênticos, embora compartilhassem o mesmo diabolicamente incitante lunar sobre sua sobrancelha esquerda.

Se aquele homem a tivesse querido, a teria tomado, e nenhum poder sobre a terra ou o céu o teria detido.

Caroline se abraçou sobre sua fina camisola, defendendo-se de um tremor mescla de medo e desejo. Sentiu como se sua carne estivesse sendo consumida por uma febre terrível, um minuto queimando, ao seguinte esfriando-a até os ossos. Sua tranqüila lógica habitual parecia havê-la traído. E o que se Kane mentia sobre os retratos? E o que se Porta tinha tido razão todo o tempo e ele era realmente algum tipo da criatura imortal que tinha existido da alvorada dos tempos?

Não queria acreditar que os monstros existissem. Mas como poderia um mero homem exercer uma opressão tão desumana tanto sobre seu coração como sobre sua imaginação? Se fosse só um homem, como poderia tentá-la a trair a confiança de sua irmã com apenas um olhar ofegante?

De reolho viu uma piscada de movimento, como se algum tipo de sombra alada se lançou através da lua. Olhou assustada às portas do balcão.

De agora em diante, poderia querer fechar essas portas. Não sempre pode depender de um elemento tão caprichoso como o vento para exercer o melhor julgamento.

Como as palavras do Kane repetidas em sua mente, Caroline recordou como indescritivelmente só ele tinha parecido naquele momento com suas mãos apertadas sobre o parapeito e sua cara volta para a noite.

Cruzou de uma pernada até as portas, decidida a emprestar atenção a sua advertência. Mas quando as alcançou, vacilou, seus dedos serenos sobre o ferrolho.

Estava aí fora.

Sabia com uma certeza além da mera intuição feminina. Podia senti-lo, sentia-o como a sombra inescapável de um feitiço sobre sua alma. E se não temia que Kane derrubasse aquelas portas? E se temia lançar-se às abrir ela mesma? Possivelmente não era o desejo dele o que temia, a não ser o seu próprio. Depois de tudo, era ela a que tinha passado seis compridos, solitários anos, apanhada em uma prisão do dever e a obrigação, sufocando suas necessidades, seus desejos. Envelhecendo antes de tempo e pensando só o que seria melhor para Porta e Vivienne. Era de sentir saudades que ansiasse abrir aquelas portas de par em par e convidar de noite a seus ofegantes braços?

Pressionando sua frente contra o frio cristal, fechou os olhos frente a uma necessitada quebra de onda de desejo. Fora Kane um vampiro ou simplesmente um homem, temeu que se olhasse a seus olhos naquele momento, estaria perdida sempre.

Caroline levantou devagar a cabeça e abriu os olhos.

O balcão estava vazio, à deriva na chapeada esteira de luz da lua.

Jogou de repente o ferrolho com dedos trementes, logo cruzou de uma pernada até a porta de sua habitação e se assegurou de que estivesse fechada também. Subindo à cama, correu as cortinas a seu redor, fechando-se de noite e todas suas escuras tentações.

Adrián retrocedeu devagar nas sombras do balcão. Já não desejava a luz da lua. Uma vez tinha crédulo nela para guardar seus segredos, mas agora seus raios implacáveis só iluminaram a escuridão em sua alma.

Era a lua, a que o testemunhava ali com apenas um frágil cristal que o separava do arco de alabastro da bochecha do Caroline, a elevação carnuda de seus lábios, a atrativa curva de sua larga, esbelta garganta. A lua a que o tinha visto levantar seus dedos ao cristal, acariciando-o como ansiava acariciar a suavidade de sua pele.

Soube que se ela abria seus olhos naquele momento, a lua já não seria sua única amante. Então se fundiu nas sombras e esperou o som do ferrolho se chocando com sua amarração.

Se ela não tivesse emprestado atenção a sua advertência e jogado o ferrolho, teria estado contente de penetrar na habitação e olhá-la dormir como tinha feito a noite anterior? Ou alguma escura força o teria levado a inclinar-se sobre a cama e prová-la, cobri-la com sua boca e beber profundamente até que a fome que queimava seu corpo fora saciado?

Adrián fraquejou contra a parede e fechou os olhos, cada vez mais enjoado pelo desejo. Sabia que só prová-la nunca o satisfaria. Só lhe daria sede de mais. Negou-se a si mesmo muito tempo. Se se permitisse um só sorvo de sua doçura, nunca estaria satisfeito, não antes que sua fome os tivesse consumido a ambos.

—Caroline! Caro, tem que abrir a porta! Necessito-te!

Quando o grito de Porta penetrou seu aturdido cérebro, Caroline se voltou e abriu os olhos, com membros pesados pelo esgotamento. Era quase a alvorada quando finalmente se afundou em um sonho profundo, e o repico acolhedor da chuva contra as janelas da torre só a fazia desejar dormir o resto do dia. Depois da passada noite, não estava segura de poder suportar enfrentar-se ao Kane ou Vivienne.

Inundando-se em seu travesseiro, se encolheu mais profundo no colchão de plumas.

—Caroline!—Sua irmã golpeou a porta com ambos os punhos.

—Abre a porta e me deixe entrar!

Caroline suspirou. Não era como se Porta em um estado próximo ao histerismo fora causa de alarme.

—Parte ! —gritou, pressionando o travesseiro sobre seus ouvidos.— A não ser que estejamos sendo invadidos pelos franceses ou o castelo esteja ardendo, quero estar sozinha!

—Por favor, Caro! Necessito-te agora mesmo!— Aquela súplica lastimosa foi acompanhada por uma renovada série de porradas.

—É suficiente, —resmungou Caroline.

Apartando tanto o travesseiro como as mantas, saltou da cama e destrambelhou através da torre. Deu volta à chave da porta, abriu-a para encontrar a sua irmã pequena ali plantada, seu pequeno punho preparado sobre o nariz do Caroline.

—O que ocorre esta vez, Porta? —exigiu Caroline com os dentes apertados.— Serena no fosso? Duendes dançando uma alegre ginga sobre a grama de castelo? Zumbis saindo da cripta da família Kane? Uma senhora pálida flutuando pelo corredor com a cabeça do Wilbury colocada sob o braço? Inclinou-se até que seu nariz quase tocava a de Porta.— Se quer sabê-lo, realmente não me importa se tiver descoberto uma multidão inteira de vampiros voando para a torre para afundar suas presas em nossas gargantas e nos converter em suas noivas eternas. Em realidade, se não me deixar em paz, vou começar a morder às pessoas por puro rancor. Começando por ti!

Dispunha-se a fechar a porta de repente na cara de sua irmã quando Porta quase sussurrando, disse:

—É Vivienne.

Caroline piscou, notando pela primeira vez os cachos cansados de Porta, a tez cinzenta, e tremor de seus lábios.

—O que acontece?—perguntou, com seu coração começando a encolher-se pelo temor.

—Não vai despertar.

 

—Quando te deu conta de que algo ia mal? —  reclamou Caroline correndo escada abaixo, atando torpemente o cinto da bata de veludo que o visconde tão atentamente lhe tinha proporcionado. Jogou um olhar ao relógio de pé no patamar como se descobrisse que a manhã estava médio perdida.

– Ao princípio pensei que estava apenas adormecida, – Porta declarou, seguindo Caroline abaixo por um comprido passadiço revestido com painéis e piso de madeira de mogno, forçando a dar passos dobros por cada uma das decididas pernadas de sua irmã. — depois de tudo, Julian nos tinha mantido a ambas levantadas até quase as três jogando farol com grampos. Mas quando tentei despertá-la para o café da manhã, não se movia. Pigarreei em sua orelha, fiz-lhe cócegas nos dedos dos pés com uma pluma, inclusive lhe salpique a cara com água fria. Toquei o timbre para as criadas, mas não a puderam despertar, tampouco. Então, assustei-me e vim a por ti.

Caroline lançou um sorriso reconfortante sobre seu ombro, lutando por encobrir seu próprio medo. —Fez bem, pequena. Provavelmente esta só sendo preguiçosa. Estou segura de que logo estará saltando de novo.

À medida que cruzava a acolhedora sala de estar que conectava os dormitórios de suas irmãs, Caroline só podia rezar para que tivesse razão. Entrou na câmara do Vivienne para encontrar que três criadas se apinhavam perto da porta, sussurrando e apertando suas mãos.

Conforme Caroline se aproximava da elegante cama com dossel, seu temor se acrescentava. Com o pálido de suas bochechas e seus dourados cachos pulverizados pelo travesseiro, Vivienne parecia como se estivesse ensaiando o papel de Bela Adormecido em um dos teatros de aficionados que as garotas estavam acostumadas pôr em cena para seus pais.

Deixando cair pesadamente no bordo da cama, Caroline tocou com o dorso da mão a frente do Vivienne. A pele de sua irmã não estava acesa pela febre, a não ser tão fria como a morte. Sentindo um calafrio pelo pensamento, Caroline jogou um olhar furtivo ao peito do Vivienne. O compassado subir e descer do sutiã da camisola não deixava entrever desassossego. Simplesmente parecia como se tivesse sucumbido a algum escuro encantamento.

Tomando a sua irmã pelos ombros, Caroline a sentou e a sacudiu brandamente. —Acordada, Senhorita Preguiçosa! É meia manhã. Não mais vadiar na cama para ti!

As pestanas do Vivienne incluso no revoaram. Pendurava desmaiadamente nos braços do Caroline, sua cabeça caída para um lado.

Caroline lançou um olhar suplicante sobre seu ombro às criadas. —Têm amoníaco à mão?

Depois de uma consulta breve, duas das mulheres correram da habitação. Uma delas voltou uns minutos mais tarde com uma garrafa de cristal.

Agüentando o peso de sua irmã com um braço, Caroline tirou atampa do frasco e o agitou sob seu nariz. Embora o aroma acre da amônia fez ao Caroline retroceder, o nariz do Vivienne não se contraiu.

Cruzando um gesto desesperado com Porta, Caroline colocou gentilmente ao Vivienne sobre o travesseiro. Apertou a mão gelada de sua irmã, desejando desesperadamente ter prestado mais atenção ontem a sua palidez em vez de ir a galeria de retratos, e à falta de apetite que Larkin tinha comentado no jantar. Deveria ter sabido que Vivienne nunca se queixaria de uma doença física. Mas tinha estado muito ocupada sonhando com o Kane para lhe dar a sua irmã a atenção que necessitava. Agora podia ser muito tarde.

Sumida em seus inquietantes pensamentos, sentiu o frio dos dedos do Vivienne estender-se a seu próprio coração. A contra gosto soltou a mão de sua irmã, levantou-se e correu ao outro lado para a janela escondida na parede norte. Como tinha temido, a janela estava aberta e aberta o ferrolho. Um simples empurrão a enviou balançando-se para fora. Apareceu pela janela, piscando contra a chuva. Não havia balcão aqui, só uma cornija estreita.

—Ouviu algo ontem à noite depois de que foi à cama? —Começou a lhe perguntar a Porta. —Alguém se movendo na habitação de Vivienne? Um grito assustado possivelmente?

Porta negou com a cabeça desamparadamente. —Não ouvi nada.

Caroline não tinha motivos para duvidar das palavras de sua irmã pequena. Porta sempre tinha dormido como um tronco.

Voltou para a cama. Agudamente consciente do escrutínio das criadas, deixo-se cair de novo ao lado do Vivienne. Cautelosamente se aproximo da cinta do pescoço da camisola de sua irmã quando ouviu o suave som de saltos detrás dela.

Girou-se para encontrar ao Kane de pé na porta em mangas de camisa e calças, sua juba leonina desgrenhada. Larkin, Julian, e uma jovem criada pálida revoavam detrás dele. Poderia ter estado surpreendida de lhe ver levantado tão pouco tempo depois do amanhecer de não ser pelo contínuo tamborilar de chuva contra os cristais.

— O que ocorre, Caroline? —Perguntou pressuroso, usando seu nome de pilha pela primeira vez. — A criada me disse que algo estava mal com Vivienne. —Com cara preocupada, começou a ir para a cama.

Lutando contra o desejo traiçoeiro de correr a seus braços, Caroline se levantou para colocar-se entre ele e sua irmã.— Sua presença não é necessária aqui, milord, —disse rigidamente. — O que precisamos é um médico.

Kane se congelou, como todos outros na habitação, inclusive as boquiabertas criadas. Embora ele se elevava sobre ela, Caroline manteve sua posição, as mãos apertadas em punhos. Kane encontrou seu olhar fixo sem alterar-se, mas tenso sua mandíbula como se lhe tivesse dado um golpe inesperado. Ela nunca tivesse sonhado que teria o poder para ferir um homem como ele. Ou que o preço por exercer esse poder fosse tão alto.

—Mattie? —Disse finalmente, olhando ao Caroline até.

A jovem criada se lançou para frente, levantando seu avental engomado para fazer uma nervosa reverência. —Sim , m'lorde?

—Envia um servente ao Salisbury a chamar o Kidwell. Que lhe diga ao doutor que um de meus convidados adoeceu e que é necessário que venha imediatamente.

—Como desejo, m'lorde. —A criada fez outra reverência e se foi depressa da habitação.

Larkin passou roçando ao Kane e se deteve frente a Caroline. Incapaz de resistir a silenciosa súplica em seus olhos, Caroline deu um passo a um lado lhe deixando passar. Quando ficou em joelhos ao lado da cama, agarrando meigamente a mão frouxa do Vivienne, Caroline teve que desviar seus olhos pois temia que as lágrimas que os alagavam se transbordassem.

Porta se aproximou instintivamente ao Julian, quem ficou apoiado contra o marco da porta, com expressão assombrada.

Dando meia volta, Kane caminho airadamente para seu irmão e grunhiu, —Umas palavras, senhor, por favor.

Impulsionando-se contra a parede, Julian seguiu a seu irmão com todo o entusiasmo de um homem partindo para a forca.

Adrian entrou na biblioteca, ainda enfeitiçado pela imagem do Caroline olhando para ele, seus claros olhos cinza escurecidos pela suspeita.

Embora poderia havê-la feito a um lado de um golpe com facilidade, lhe tinha desafiado com a coragem feroz de uma leoa mãe protegendo a seus filhotinhos, o queixo para cima e os ombros jogados atrás.

Nunca antes se havia sentido tão monstruoso

Aproximo-se do muito alto escritório da esquina e moveu livros e papéis até localizar uma poeirenta garrafa de brandy. Desprezando o copo, verteu um gole diretamente abaixo para sua garganta, dando a bem-vinda a brutal queimadura. Só depois de que o licor golpeasse seu ventre e lhe moderasse o caráter girou para enfrentar a seu irmão.

Julian se tinha recostado em uma poltrona de couro frente à fria chaminé. Sua aparência era quase tão alarmante como a do Vivienne. Não havia rastro do dandy elegante que os tinha entretido no jantar com uma anedota graciosa sobre sua última visita ao Bond Street Sua juba mogno estava despenteada, a camisa branca enrugada e manchada com gotas de vinho tinjo. A gravata pendurava frouxa ao redor de sua garganta. Os ocos profundos sob seus olhos estiravam a pele tensa sobre as maçãs do rosto esculpido e lhe fizeram parecer uma década maior do que era.

Adrian não disse uma só palavra. Simplesmente escrutino a seu irmão sem piscar.

—por que me olha assim?  —Julian finalmente estalou, seus olhos escuros ardendo desafiantes. — Sei o que pensa, mas não tive absolutamente nada que ver com isto.

—Suponho que é pura casualidade que Vivienne sofresse um colapso depois de passar a tarde contigo.

—Passaram a tarde jogando farol comigo, —corrigiu Julian— te juro que solo tome umas forquilhas sem valor da moça. Quando o relógio deu as três, foi acima com sua irmã e não as voltei a ver outra vez até que ouvi essa criada chorando e a segui a sua habitação.

—Se deixaram de jogar às cartas às três, ainda ficavam três horas antes de amanhecer. Onde esteve durante esse tempo?

Julian deixou cair a cabeça entre suas mãos, seu desafio derrubado em derrota. —Se quer saber, não me lembro.

Adrian negou com a cabeça, muito zangado para esconder a repugnância em sua voz.— Bebia outra vez?

O silêncio de seu irmão foi resposta suficiente.

—Te ocorreu alguma vez que bebendo te põe em tal estado que não pode recordar onde estava ou que fazia e poderia ser um pouquinho perigoso?

Julian se levantou. — e te ocorreu alguma vez que poderia ser ainda mais perigoso se não bebesse?

Os dois irmãos se pararam frente a frente em um momento tenso, mas foi Julian quem aparto primeiro o olhar, seus olhos desolados. —por que incomodar ao Vivienne? É a pequena, quem fica ao redor me seguindo como se fora alguma classe de cachorrinho doente de amor que só pede um bocado de minha atenção. Ela é quem me olhe fixamente com aqueles olhos azuis encantados como se eu fora a resposta a cada reza. Se eu fosse cometer um deslize, não pensa que seria com ela?

 

O controle do Adrian se rompeu. Agarrando ao Julian pelo peitilho da camisa, grunhiu, — Se puser um só dedo nessa menina…

Não terminou a ameaça. Não teve que fazê-lo.

Soltou a seu tremente irmão, só para descobrir que suas mãos não foram muito cuidadosas. Julian brigou por recuperar a dignidade penteando-se e sacudindo com força o nó perfeito de sua gravata. Renunciando a encontrar o olhar do Adrian, dirigiu-se para a porta.

—Onde vai?  —Chamou Adrian.

—Ao inferno, o mais provável, —Respondeu Julian de maneira concisa sem dar a volta.

—Se deixar de chover e o sol sai antes que possa retornar aqui, vais desejar estar no inferno.

Julian se parou na porta e giro lentamente. — Seria mais fácil para ti e sua preciosa Senhorita Cabot se não voltasse absolutamente, não?

Desconcertado pelas palavras de seu irmão, Adrian negou com a cabeça. — Se não ter tido nada que ver com o desmaio do Vivienne, por que diz tal coisa?

O sorriso do Julian era um agridoce fantasma do amplo sorriso que Adrian sempre tinha amado tanto. — Não falava do Vivienne.

Adrian abriu a boca para negar as palavras, mas antes que pudesse, Julian se foi. 

 

—Julian! Julian! Onde vai?

A encantadora chamada ressonou sobre as paredes de pedra do antigo castelo que uma vez acolheu torneios para reis, cavalheiros, e suas belas damas.

Ignorando-a, Julian sacudiu a chuva de suas pestanas e continuou para os estábulos. Não sábia onde ia. Mesmo que o céu era uma plúmbea massa de nuvens e água caindo, não parecia haver nenhum sítio ao que fugir para escapar do que se converteu. A pesar do alarde imprudente que tinha arrojado a seu irmão, duvidou que no inferno lhe desse a bem-vinda aos que eram como ele.

—Julian! Por que não me responde? Não serei ignorada, sabe, assim nem o tente.

Reprimiu um gemido. Não havia duvida sobre isso. Porta Cabot era ainda mais persistente que seu irmão. E imensamente mais encantadora.

Giro tão rapidamente que por pouco se choca com ele. Quis estirar uma mão para estabilizá-la, mas teve medo das conseqüências, assim simplesmente se paro, contemplando como torpemente recuperava o equilíbrio na erva escorregadia.

Ela agarrava uma sombrinha com sua mão enluvada — uma confecção ridícula de seda e laços em perigo de desfazer-se sob o peso da chuva. Com seus brilhantes olhos azuis escuros e seus úmidos cachos ameaçando transbordar dos grampos parecia uma fada manchada de barro.

—Não deveria estar ao lado da cama de sua irmã?  —Demandou.

Ela enrugou seu nariz insolente, surpreendida por sua brutalidade. — Estou segura de que ela estará bem agora que tem a Caro para cuidá-la. Estou preocupada com ti. Estava tão pálido na habitação de Vivienne que temi que poderia te encontrar mal.

Ele soprou. —Temo que não haja cura para o que me adoece. Ao menos nenhuma que um medico possa proporcionar.

—É por isso que você e seu irmão hão discutido?

—Como sabe? —Entrecerrou seus olhos, baixando seu olhar para estudar o círculo débil de pó que arruinava a musselina nívea de sua saia. — Estava olhando pelo olho da fechadura da biblioteca, por acaso?

Um rubor culpado tingiu suas delicadas maçãs do rosto quando limpou sua saia. — Dispunha-me a chamar quando acidentalmente me caiu o lenço. Foi só por acaso que ouvi suas vozes levantadas.

Julian rapidamente deduziu que isso foi tudo o que ela tinha ouvido. Se lhe tivesse escutado denunciá-la como “um cachorro doente de amor”,  duvidava que ela até pisasse em seus talões.

—Meu irmão simplesmente dava sua conferência padrão. Pensa que bebo muito, —Julian confessou, surpreso de achar-se tão perto da verdade. Nos últimos anos, tornou-se muito competente em mentir, especialmente a si mesmo.

—Faz-o? —Perguntou, sinceramente curiosa.

Ele passado uma mão através de seu cabelo, encontrando de repente difícil encontrar seu olhar. — Em ocasiões, suponho.

—por quê?

Encolheu-se de ombros. —por que bebe qualquer homem? Para adormecer a sede por algo que quer desesperadamente, mas nunca poderá ter.

Porta se aproximou quase imperceptivelmente a ele, captando atrevidamente seu olhar. —Sempre pensei que se desejas algo o suficiente, então deveria estar disposto a remover céu e terra para obtê-lo.

Julian olhou seus escuros cabelos e seus lábios exuberantes, pensando no irônico de que uma cara tão angélica lhe podia trazer tal tortura infernal. Com um controle que não sabia que ainda possuía, gentilmente acaricio seu nariz. —Deveria estar agradecida, olhos brilhantes, que não siga essa mesma filosofia.

Dando meia volta, seguiu para os estábulos, deixando a de pé a sós com sua sombrinha murchando-se sob chuva.  

Sentada na cadeira que tinha aproximado da cama, Caroline amavelmente acariciou os cachos dourados da frente de sua irmã. O estado do Vivienne nem tinha melhorado nem tinha piorado com o passar do dia e a noite. Simplesmente se via como se pudesse continuar nesse antinatural torpor para sempre.

O servente tinha retornado ao castelo justo quando caía a noite e cessava a chuva com o aviso de que o doutor assistia um parto difícil e não poderia chegar até a manhã. Porta tomava uma sesta em sua cama, enquanto o Agente Larkin tinha insistido em manter sua vigília na sala de estar que conectava as duas câmaras. A última vez que Caroline apareceu a ele, estava dormindo sobre uma taça de chá já fria, seus pés descalços apoiados em uma turca, um volume desgastado do Tyburn Gallows: Uma Historia Ilustrada tombada em seu regaço.

Vivienne suspirou dormida e Caroline se perguntou se estaria sonhando. Sonhava ela com os olhos verdes azulados do Kane dançando à luz do sol e sinos de bodas? Ou sonhava com escuridão e rendição e sinos que eternamente dobravam a meia-noite? Tal como fez uma dúzia de vezes, Caroline sob o pescoço da camisola de sua irmã para estudar o espaço cremoso de sua garganta.

—Deduzo que não encontrou o que procurava.

Com essa sombria voz arrastada, Caroline olhou por cima do ombro para encontrar a figura escura do Kane recortada contra a luz da lua. Por que deveria assombrá-la que ele não estivesse de pé na porta, a não ser na janela aberta?

—Não sei de que falas, — mentiu Caroline, atando com arte a cinta da camisola do Vivienne. Ela tinha registrado cada polegada de carne pálida de sua irmã, mas não tinha encontrado nenhuma marca, nenhuma prova de jogo sujo.

Ele avançou. Caroline se levantou, colocando-se outra vez entre ele e a cama.

Esta vez não se deteve até que esteve o bastante perto para tocá-la. — por que não me deixa me aproximar mais, Senhorita Cabot? Teme por sua irmã? Ou por ti mesma?

—Tenho motivos para isso, milord?

Um olhar escrutinador acariciou seu rosto. —Se me crie um vilão tão desprezível, então por que não chia para o Agente Larkin? Estou seguro que nada gostaria mais que precipitar-se aqui dentro e te resgatar de minhas miseráveis garras. —Quase como se não pudesse resistir o desejo, elevo a mão para sua cara, seus nódulos roçando muito ligeiramente a curva da maçã do rosto.

Ao princípio Caroline pensou que o gemido tinha saído de seus lábios. Logo se precaveu que foi Vivienne. Voltando as costas ao Kane, correu de retorno ao lado da cama de sua irmã.

Vivienne estava murmurando e agitando-se com desassossego sob as mantas, suas bochechas já não pálidas, a não ser salpicadas e ruborizadas. Caroline tocou com uma mão a frente de sua irmã, logo lançou ao Kane um olhar indefeso. —Esta ardendo de febre!

—Temos que esfriá-la. —Deixando a um lado ao Caroline, implacavelmente desentupiu ao Vivienne, logo recolheu seu corpo frouxo e o levou para a janela.

O protesto do Caroline morreu em seus lábios ao ver que ele simplesmente expor a carne acalorada de sua irmã ao ar fresco de noite. Ele afirmou um quadril contra o suporte da janela, seus braços firmes embalando ao Vivienne com tal cuidado que Caroline teve que apartar o olhar.

Ela detectou ao Larkin de pé na porta, seu olhar penetrante viajando por entre os três. A sombra de recriminação em seus olhos poderia ter sido uma invenção de sua percepção mordaz.

—Um mensageiro acaba de chegar, —informou-lhes de maneira concisa. — O doutor está em caminho.

Enquanto se apinhavam na salinha fora do dormitório do Vivienne, esperando que o doutor terminar-se seu exame, o resplendor nebuloso do amanhecer começou a suavizar os bordos exteriores do firmamento fora da janela. Porta estava recostada na esquina de um sofá adamascado, sua expressão inusualmente pensativa. Larkin caminhava agitadamente de cima abaixo pelo acolhedor aposento, suas largas pernas lhe levando do fogo da chaminé à porta fechada da câmara do Vivienne e de volta outra vez. Caroline se sentava rigidamente em uma cadeira de balanço, suas mãos pregadas em seu regaço enquanto Kane se apoiava contra a parede da janela, perdido em seus pensamentos.

Todos exceto Kane saltaram quando a porta se abriu e o doutor emergiu, seguido pela jovem criada sardenta que Kane tinha chamado Mattie.

Embora o olhar fixo do médico imediatamente foi para o visconde, Caroline se levantou e deu um passo adiante, com o Larkin rondando detrás de seu ombro. —Sou Caroline Cabot, senhor — a irmã maior do Vivienne.

O doutor Kidwell tinha o tamanho e a conduta de uma pequena rã de mau caráter. Fulminou-a com o olhar por cima dos óculos de aço em seu nariz arrebitado. —esteve sua irmã exposta à intempérie recentemente? Sofreu uma molhada possivelmente?

Estorvada pelo cansaço excessivo, Caroline rebuscou em sua memória. —Pois bem, chovia três noites atrás quando chegamos ao castelo. Suponho que Vivienne poderia havê-la sofrido.

—Ah há! —gabou-se, cortando-a. — Tal como suspeitei! Acredito que pude ter encontrado ao culpado.

Tomou a última onça da frouxa força de vontade do Caroline, mas obteve não olhar ao Kane.

O doutor Kidwell estalou seus dedos à assustada criada. Ela avançou e ele agarrou rapidamente um objeto de suas mãos, sujeitando-o no alto. Caroline piscou, reconhecendo-o como um das botas de cano longo de couro de sua irmã. Excitado com o triunfo, o doutor deslizou seu dedo entre a sola e a impigem cheia de arranhões da bota, expondo uma abertura enorme.

Caroline e Porta ofegaram. Quando a Tia Marietta tinha convidado ao Vivienne a vir a Londres, ela tinha herdado todos os preciosos trajes de noite e as sapatilhas para a estréia do Caroline. Mas não tinha demasiado mais dinheiro de sua escassa atribuição para comprar botas novas.

—Há outra como esta remetida debaixo da cama, —informou o doutor, — junto com um par de meias que ainda estão úmidas.

Caroline recordou abrir-se passo entre a lama dos pátios da estalagem, seus ombros vencidos pela chuva torrencial. Ela negou com a cabeça na súbita desilusão. — Suponho que Vivienne montou por horas sem queixar-se nem uma vez dos buracos em suas botas ou as meias molhadas.

Larkin apoiou uma mão sobre seu ombro, lhe dando um apertão reconfortante.— A Senhorita Vivienne parecia perfeitamente bem no jantar a noite que cheguei. Estava um pouco pálida, mas além disso, não deu sinais de desassossego.

Os olhos inchados do doutor não eram cruéis.— Algumas vezes estas coisas estão escondidas nos pulmões por um tempo, esgotando a força e o apetite antes de dar-se a conhecer.

Caroline inspirou profundamente antes de fazer a pergunta mais difícil de todas. — Recuperar-se-á?

—É obvio que o fará! É jovem e forte. Suspeito que voltará a estar de pé em pouco tempo. Vou deixar lhe os ingredientes e as instruções de um cataplasma de mostarda.

Caroline cabeceou, uma quebra de onda de alívio fez afrouxar seus joelhos. O braço do Larkin rodeou sua cintura, apoiando-a.

Porta engatinhou ansiosamente a seus pés. — E sobre o baile, senhor? O baile de mascasse do visconde será em menos de uma semana. Minha irmã estará bastante bem para assistir?

—Acredito que sim, — disse o doutor— Simplesmente lhe aplique o cataplasma duas vezes ao dia e abrigue-a muito bem antes de sair. — Agitou um dedo com reprove sob o nariz do Caroline. — E te assegure que a menina tenha botas novas!

—Farei-o, —jurou Caroline. Encarregar-se-ia de que suas irmãs tivessem botas novas, até se isso queria dizer que teria arrastar-se ante o primo Cecil.

—OH, por favor, senhor, está acordada? Podemo-la ver? —perguntou Porta.

O doutor fixo seu duro olhar nela. —Com tal de que prometa não rir nervosamente e saltar sobre a cama, jovenzinha.

—OH, não o farei, senhor! Estarei tão quieta e tranqüila como um camundongo na igreja, — Porta lhe reconfortou, quase lhe tombando quando correu estabanadamente para a porta.

Larkin deu um passo involuntário adiante, logo jogo um olhar ao Caroline, a incerteza refletida em seus olhos. Ela inclinou a cabeça para a porta, lhe dando sua bênção. Quando seguiu a Porta ao dormitório, Mattie fez passar ao doutor ao corredor, deixando sozinhos ao Caroline e Kane na sala de estar.

Caroline percorreu com o olhar para lhe encontrar examinando-a, seus olhos verdes azulados mais inescrutáveis que antes. Mordeu-se o lábio, lutando contra uma emoção que se parecia perigosamente à culpabilidade. Pôs-se a prova a si mesmo muito deliberadamente para acreditar o pior dele. Mas o que outra coisa podia fazer quando ele rechaçou defender-se contra a mais estranha das acusações? Como podia condená-la por trair sua confiança quando ele alguma vez a tinha devotado em primeiro lugar?

Determinada a encontrar uma desculpa, de qualquer maneira, insuficiente, esclareceu-se voz e disse, — Parece que lhe julguei mal, milord. Acredito que lhe devo uma…

—Aí se equivoca, Senhorita Cabot. Você não me deve nada. — Dando meia volta, Kane cruzo de uma pernada o quarto justo quando os primeiros raios do sol da manhã chegaram derramando-se sobre o horizonte.

 

A luz do sol fluiu sobre a parede de pedra que rodeava o horta do castelo, transformando as bolinhas de pólen em brilhante pó de fadas. Sob os verdes ramos frondosos de uma árvore de tilo, um par de passarinhos saltava, piando e preocupando-se sobre que varinhas de lenha e trocinhos de musgo serviriam melhor para os acabamentos finais de seu ninho primaveril. Uma brisa suave flutuou do Este, levando em suas asas a fragrância lhe intoxiquem de madressilva da zona.

Enquanto Caroline andava com o passar do sinuoso caminho de calhaus da horta, desejou girar a cara para o sol. Mas seu olhar fixo continuou voltando de retorno à terceira janela, passando por cima a horta. Só um cristal dividido por colunas os separava, inclusive a ensolarada horta com sua estufa frondosa e as mariposas podiam ter sido um mundo além das sombras do castelo. Em alguma parte detrás dessas paredes de pedra de altura imponente, seu senhor dormitava seus sonhos e seus segredos conhecidos unicamente por ele.

Kane não tinha delatado nem um indício de recriminação por volta dela nos dias posteriores ao ataque do Vivienne. Parecia ter talhado pulcra e cruelmente o cordão invisível que os tinha pacote. Se ele ainda sentia seu puxão irresistível quando queira que ela entrasse em um quarto, então o escondia detrás de uma máscara de educada indiferença. Não mais respostas agudas, nenhuma faísca de brincadeira em seus olhos quando a olhava. Comportava-se com perfeita propriedade, quase como se ele fosse já seu cunhado. A gente teria pensado que nunca tinham compartilhado uma entrevista a meia-noite no Caminho do Amante ou um beijo que fazia pedaços a alma.

Embora ela continuava fechando com fecho da porta do balcão cada noite antes de deitar-se, Caroline suspeitava que já não havia necessidade de fazê-lo. Dormiu a noite inteira e se levantou sentindo-se despojada, como se alguém querido por seu coração tivesse morrido.

—Por favor, senhor, chamaria por algo mais de chá?

Enquanto a voz do Vivienne ia à deriva para seus ouvidos, Caroline fez uma pausa sob a sombra da árvore de tilo, sua mão se posou em seu suave tronco.

Sua irmã se reclinava em um tílburi ao pé da colina, uma manta de lã sobre seu regaço se rendia ao redor de suas pernas magras. O oficial Larkin se levantou de um banco de pedra e se apressava para a casa. A julgar pelo livro aberto que tinha abandonado no banco, aparentemente tinha estado lendo em voz alta para o Vivienne. Caroline sorriu apesar de si mesmo, perguntando-se se ele estava lendo Tyburn Gallows: Uma História Ilustrada ou possivelmente The Halifax Gibbet: O Baile Dos Malditos.

Desde seu ataque, Vivienne já não estava contente sofrendo em silêncio. Realmente parecia desfrutar mandando ao oficial quando o visconde não estava presente, lhe perguntando “poderia trazer meu xale?” ou “poderia fazer o favor de chamar para pedir outro tijolo quente envolto em flanela, senhor?” Quando queira que ele parecia relaxar sua vigilância.

—Aqui está, Caro! —gritou Vivienne, divisando-a— Não deverás falará comigo enquanto o oficial Larkin vai trazer chá fresco?

Fez-lhe gestos com a mão com a graça régia de uma rainha jovem, o que não deu ao Caroline nenhuma eleição exceto obedecer.

—Parece ter tido uma recuperação milagrosa —comentou Caroline, tomando o assento que Larkin tinha desocupado.

Vivienne se encolheu mais profundamente nos frescos travesseiros e se cobriu a boca para amortecer uma tosse mas bem pouco convincente.

—Posso me dirigir o suficientemente bem enquanto permaneça afastada de atos desmedidos.

Nesse momento, com a luz solar da tarde tirando brilhos dourados de seu cabelo e a brisa devolvendo o rosado a suas bochechas, parecia resplandecer com boa saúde. Se tivesse sido Porta, então Caroline a teria acusado de fingir.

—O baile de Lorde Trevelyan é amanhã de noite —lhe recordou Caroline— Está segura de que vais estar bastante bem para assistir?

Baixando suas pestanas para pôr um véu sobre seus olhos, Vivienne brincou com a cadeia que havia ao redor de seu pescoço. O camafeu estava ainda cuidadosamente metido entre as dobras de seu sutiã.

—Seguro que o estarei. Depois de tudo, não poderia agüentar decepcionar ao visconde depois de suas bondades conosco.

Nesse preciso instante, Porta chegou apressadamente pelo caminho da casa, lutando sob o peso de uma caixa de madeira que era quase tão grande como ela. Sua cara estava adornada com um sorriso muito contente.

—Não acreditará o que um dos jovens serventes acaba de entregar em nossa câmara, Vivi! Não podia esperar até que retornasse. Sabia que quereria vê-lo agora.

Com sua curiosidade avivada, Caroline se levantou para que Porta pudesse apoiar sua carga sobre o banco.

—É simplesmente a coisa mais preciosa que nunca vi! —proclamou Porta, apartando rapidamente a tampa da caixa com um floreio.

Caroline e Vivienne ofegaram ao uníssono enquanto o tule da sombra mais etérea de rosado saiu esparramando-se da caixa. O tule estava posto cortinas sobre uma anágua de prata lustrosa.

Porta pôs o decotado sutiã raso do traje de noite sob seu queixo, guardando-se de arrastar a sianinha loira de sua prisão fortificada sobre a erva.

—Não é belo?

—Delicioso —murmurou Caroline, incapaz de resistir passou a ponta do dedo sobre a fila de pérolas brilhantes que adornavam a banda de cetim rosado do traje.

—É algo que uma princesa teria posto —disse Vivienne, enquanto seus lábios se curvavam em um tolo sorriso.

Ainda agarrando o traje de noite como se receasse a deixá-lo, Porta se girou de volta à caixa para recuperar um cartão de papel marfim. Deu- o cartão ao Vivienne.

—Pude ter aberto a caixa, mas não fui tão impertinente no que se refere a ler o cartão.

—É bonito saber que não perdeste seus escrúpulos —disse Caroline secamente. Porta lhe tirou a língua.

Vivienne estudou o cartão.

—É um presente do visconde —disse ela, seu sorriso desvanecendo— Me diz que o tenha posto para o baile de amanhã de noite.

Caroline tirou a mão como se o traje de noite tivesse irrompido em chamas, para encontrar-se repentinamente esperneando de afronta.

—Como se atreve? Quem pensa que é, fazendo essa ostentação? Te dar de presente algo tão pessoal como uma gargantilha foi o suficientemente mal educado, mas isto se eleva à altura de um nível inteiramente novo de impropriedade. Se tivesse sido um leque ou um par de luvas, então poderia ter podido passar por cima sua insolência, mas isto… isto…

Ondeou um braço para o objeto ofensivo, soando incoerente.

Porta agarrou firmemente o vestido, como tendo medo de que Caroline o pudesse arrancar de seus braços.

—OH, por favor, não o proíbas ao Vivienne que o aceite, Caro! Ela estará tão mas tão preciosa nisso!

—Estou segura de que o estaria, mas simplesmente não o posso permitir. Se alguém se inteirar-se de onde vem o vestido, então a reputação do Vivienne ficaria destroçada. É o tipo de presente que um marido poderia dar a sua…

A voz do Caroline se desvaneceu enquanto Vivienne lentamente levantava seus olhos para encontrar os dela. Falando em um sussurro, sua irmã disse:

—Pode que fale de mais, mas Lorde Trevelyan esteve comportando-se mas bem estranho da semana passada. Acredito que ele poderia ter feito planos para aproveitar a ocasião do baile para me perguntar se quero ser sua esposa.

Ao princípio Caroline pensou que o som de cristais ao romper-se que ouviu era o som de seus sonhos impossíveis destroçando-se em mil pedaços. Logo elevou a vista para encontrar ao oficial Larkin de pé sobre o caminho. Suas mãos estavam vazias, mas as partes de vidro quebrado de um bule estavam dispersados ao redor dele. Embora sua cara podia ter estado atalho em mármore, seus olhos eram um espelho golpeado dos dela.

Agachando a cabeça, ajoelhou-se em um atoleiro de chá, limpando a desordem do chão ineficazmente com seu lenço.

—fui terrivelmente torpe, senhoras. Todo polegares, temo-me. Ao menos isso é o que minha mãe estava acostumada dizer quando era um moço. Estou horrivelmente causar pena. Encontrarei a uma criada para limpar o desastre imediatamente.

Sem encontrar nenhuma de seus olhares, remeteu o lenço empapado de volta ao bolso de seu casaco e caminhou a grandes passos para a casa.

Caroline se girou para encontrar ao Vivienne lhe olhando com o cenho franzido.

—Homem odioso —resmungou ela, dando um puxão à manta de seu regaço— Uma vez que meu compromisso matrimonial com o visconde saia à luz, suponho que ele não terá mais desculpa para me acossar.

Apesar da expressão feroz do Vivienne, Caroline quase teria jurado que vislumbrou um brilho revelador nos olhos de sua irmã.

—O que é isso, Vivienne? Não está chorando, verdade? —perguntou Caroline, desconcertada pelo humor volúvel de sua irmã tanto como pelo seu próprio.

Piscando para apartar a umidade, Vivienne levantou seu queixo e sorriu brilhantemente.

—Devo dizer que não. Meus olhos são ainda um pouco sensíveis ao sol. Se estava chorando, pode-te reconfortar a idéia de que chorava de pura alegria. Lorde Trevelyan será um marido esplêndido, não crê? Serei a inveja de cada mulher no Theton!

Meigamente acariciando o sutiã do traje de noite, Porta jogou ao Caroline um olhar suplicante.

—Especialmente quando a virem levando posta isto na mascarada de amanhã de noite.

Examinando as caras esperançadas de suas irmãs, Caroline suspirou. Sua afronta tinha sido varrida por uma emoção mais escura e ainda mais perigosa.

—Não posso brigar com ambas. Enquanto ninguém averigúe que o traje foi um presente do visconde, suponho que não haverá nenhum dano.

Repentinamente estava ansiosa de escapar da companhia do Vivienne como Larkin fazia, começou a retroceder para a casa.

—Acredito que voltarei correndo à casa e me assegurarei de que o oficial recorde chamar por uma bandeja de chá fresco.

Muito a par do olhar fixo de Porta, voltou para o refúgio da casa, reveste-as de seus sapatos rangiam sobre a porcelana a China quebrada.

 Caroline não perdeu o tempo uma vez que alcançou sua câmara. Caminhou a grandes passos para a cama, ajoelhou-se ao lado dela, e extraiu a mala brocada que tinha guardado cuidadosamente sua primeira noite no castelo. Apoiando-a sobre a cama, extraiu uma pequena garrafa de cristal de seu interior revestido em seda e a sustentou à luz do sol.

—O que é isto? Estiveste guardando licor?

Caroline se girou rapidamente para encontrar a Porta de pé no portal.

—Alguma vez chamas a porta? —demandou Caroline.

—Não quando a porta está já aberta —assinalou Porta, cruzando o quarto— Estava preocupada com ti —se desculpou— Te comportava de maneira tão estranha lá abaixo. Não tinha idéia de que subia aqui para jogar um pequeno gole de algo que acalme seus nervos.

Antes que Caroline pudesse protestar, sua irmã tinha extraído a garrafa de sua mão e tinha tirado a cortiça. Deu uma farejada no seu conteúdo antes de atrair a garrafa para seus lábios.

—Não o faça! —gritou Caroline, lhe arrebatando a garrafa.

Porta se congelou, seus lábios já molhados com o líquido claro. Jogando ao Caroline um olhar ferido, lambeu-se uma das gotas.

—Não há necessidade de me sobressaltar até médio morrer. É só água.

A pesar do bisbilhoto desavergonhado de Porta, Caroline podia sentir um rubor culpado avançando a rastros desde sua garganta.

Os olhos de sua irmã se estreitaram lentamente.

—Ou não o é?

Repondo cuidadosamente a tampa da garrafa e deixando-a a um lado, Porta se aproximou da mala e tirou uma cadeia de prata. Um chamativo crucifixo de prata pendurava ao final, cintilando ao sol.

—Que interessante —comentou Porta, olhando ao Caroline com olhos brilhantes— antes que deixássemos Edgeleaf, informou por acaso ao vigário do povo de que acreditava estar te convertendo em uma papista?

—Encontrei a cadeia —respondeu Caroline fracamente.

—E o que temos aqui? —alcançando de novo a mala, Porta extraiu um pedaço de madeira comprido, redondo, suave, esculpido com uma ponta letal ao final— Estava fazendo planos para te pôr ao dia com sua costura?

Caroline se sobressaltou antecipadamente enquanto o artigo mais irrebatível de todos emergia do interior da mala, era uma cópia muito usada da Nova Revista Mensal de abril de 1819, quão mesma continha uma controvertida história do Dr. Polidori, "O Vampiro".

—Porque, pequena delatora miserável! —Porta a olhou enquanto examinava rapidamente as páginas da revista— estive procurando isto toda a semana! Foi você quem roubou pequenas quantidades de dinheiro de debaixo de meu colchão em casa de Tia Marietta, não é certo?

Caroline suspirou e inclinou a cabeça, sabendo que o tempo para as negações e as desculpas tinha passado.

Porta lançou a revista à cama com o resto de sua bota de cano longo mal adquirido, logo apoiou suas mãos sobre seus quadris.

—Não seja ridícula, Porta! Não há coisas como vampiros —imitou, perfeitamente, ao Caroline em seu tom mais imperioso— Ou homens lobos. Ou fantasmas. Ou sereias na horta. Ou príncipes de aparência agradável que lhe resgatarão de cada perigo antes de te levar a seu castelo e viver felizmente após.

Ela sacudiu um dedo para Caroline.

—Não é a não ser uma fraude, Caroline Enjoe Cabot! Deveria ter vergonha de ti mesma!

—Não sabe nem a metade —resmungou Caroline, apartando do caminho de sua irmã para pôr de um puxão a água bendita, o crucifixo, e a revista de volta ao saco.

—Pensei que foi a prática.

—Não é preparar-se para cada eventualidade ser prático? —replicou Caroline. Depois de vacilar um momento, guardou a estaca no bolso de sua saia.

Porta seguiu o movimento, seus olhos ampliando-se.

—O que tem intenção de fazer?

Caroline mediu brevemente a idéia de mentir, mas sua irmã já tinha provado ser um aliado excelente quando estavam em matéria de subterfúgio. De cara a Porta, disse:

—vou registrar cada câmara deste castelo até que encontre ao visconde. Se lhe posso encontrar antes de pôr-do-sol, possivelmente possa jogar ao esquecimento todos nossos medos.

—Uma eleição mas bem desafortunada de palavras, não crie?

—Se Kane verdadeiramente tiver a intenção de declarar-se ao Vivienne amanhã de noite durante o baile, então esta poderia ser minha última oportunidade para provar que ele é simplesmente um homem, um mero mortal como o resto de nós. —Ignorando a estreiteza sufocante de sua garganta, Caroline acrescentou— Se posso fazer isso, então estarei em liberdade para lhe dar a ele e ao Vivienne minha bênção.

—Está completamente segura de que quer fazê-lo? —perguntou Porta, escolhendo explicitamente suas palavras com cuidado.

—O que quer dizer?

Porta mordiscou seu lábio inferior um momento antes de responder.

—Vi sua cara na horta quando Vivienne mencionou o fato de converter-se na esposa de Lorde Trevelyan. Tive medo de que começasse a ter sentimentos para ele.

—É obvio que tenho sentimentos para ele —disse Caroline energicamente— O tipo de sentimentos que se espera que tenha para um homem que muito bem pode terminar por salvar a sua família da ruína.

Reconhecendo o brilho de luz nos olhos do Caroline, Porta suspirou derrotada.

—O que quer que faça? Quer que vá detrás de ti, ondeando o crucifixo e orvalhando com água bendita?

—Somente mantêm a Vivienne ocupada e fora de meu caminho.

—Deveria ter dado essa tarefa ao oficial Larkin. Duvido que uma manada de homens lobos uivadores lhe pudessem se separar de seu lado. Suponho que deveria estar agradecida de que ao menos Julian não esteja apaixonado por ela, também —O casual encolhimento de ombros de Porta realmente não pôde encobrir a dor que obscurecia seus olhos— É obvio, ele deixou perfeitamente claro que não está apaixonado por mim tampouco.

Caroline negou com a cabeça impotentemente, desejando ter o poder de desenredar as cadeias que amarravam seus corações.

—Não acredito que encontre ao oficial associando-se com o Vivienne esta tarde. Por isso necessito que conserve um olho nela até que retorne.

Quando Caroline passou roçando-a, Porta agarrou seu braço.

—Tomará cuidado, verdade, Caro? Até se o visconde não resulta ser um vampiro, ainda poderia ser perigoso.

Para ser um lugar com tantos secretos, Trevelyan Castle tinha notavelmente poucas portas fechadas. Caroline vagou pelos ocos da sinuosa escada e os corredores pelo que pareceu uma eternidade, sentindo-se um pouco como uma princesa em um dos amados contos de fadas de Porta. Mas estava por ver-se se este castelo estava encantado ou amaldiçoado. Ou se seu invisível captor era um príncipe ou uma besta.

O castelo já estava agitando-se com serventes que preparavam seus inumeráveis quartos para o fluxo de convidados que começariam a chegar na manhã. Alguns dos convidados do visconde ficariam em posadas próximas, mas muitos deles passariam a noite no castelo. Passando facilmente entre os serventes distraídos, Caroline registrou cada piso com precisão metódica, encontrando várias câmaras que ela e Porta tinham passado por cima quando andavam procurando espelhos. Depois de uma busca fútil dos pisos altos, encontrou-se de pé ante a porta da galeria do retrato.

Tocou com as pontas dos dedos o cabo, desejando escorregar-se dentro e ver se ainda possuía a coragem para agüentar de pé cara a cara com esse guerreiro cruel que refletia a cara do Kane.

Jogou um olhar sobre seu ombro para a janela ogival no extremo mais afastado do corredor. Seu tempo se acabava. A luz do dia decrescia; a lua se levantaria logo. Voltando as costas à galeria do retrato, levantou-se as saias e se apressou para as escadas, com passos aliviados pela urgência.

Não foi tão difícil passar entre os serventes da cozinha para o porão. Estavam por toda parte gritando ordens e fazendo soar as caçarolas como sinos enquanto cortavam verduras e coziam pão para a extravagante janta que devia ser servida depois do baile de amanhã de noite. Moveu-se rapidamente depois de um portal arqueado, fazendo uma careta quando viu um caldeirão de cobre cheio de graxa que tinha estado situado sob um gancho de ferro para apanhar o sangue de dessecação de alguma parte sem identificar de carne.

Duvidava em encontrar alguma coisa significativa fora do labirinto de quartos que compunham a cozinha, mas ficava sem lugares de busca. Jogou um último olhar detrás dela para assegurar-se que não tinha sido divisada, e se deslizou para um corredor estreito, deixando atrás o alegre caos.

O corredor tinha o piso inclinado e sujo e o teto de carvalho baixo. Agachou-se rapidamente, uma teia fazia cócegas detrás de seu pescoço, fazendo-a estremecer-se. Desde não ser pelos candelabros oxidados colocados a intervalos regulares ao longo das paredes picadas, manchadas pela umidade, tivesse jurado que ninguém tinha usado este caminho durante séculos. As velas de sebo jogavam mais sombras que luz. Caroline não se precaveu de que o corredor tinha dado uma volta até que girou o olhar detrás dela para descobrir que sua boca tinha desaparecido. Havia só escuridão atrás e sombras titilantes diante.

Algo saiu do chão detrás dela, escavando com garras afiadas na sujeira. Deixando escapar um agudo uivo pouco digno, Caroline deu um salto para frente, golpeando-se de cara em uma porta. Frenética por escapar do que temia devia ser um rato grande, faminta, estralou sem parar o cabo da porta, solo para descobrir que finalmente tinha encontrado o que tinha estado procurando, uma porta fechada.

Esquecendo-se completamente do rato, retorceu o cabo outra vez, provando-a em busca de qualquer indício de vulnerabilidade. O que aconteceria inadvertidamente tinha tropeçado com a porta da cripta familiar? Ou com essa masmorra tão acondicionada da que Kane se gabou tão louquazmente?

Estava ajoelhada para pressionar seu olho no olho da fechadura quando uma voz tão seca como o pó saiu da escuridão detrás dela.

—Posso ajudá-la em algo?

Caroline saltou sobre seus pés e girou rapidamente. Wilbury aguardava detrás dela, parecia como se ele mesmo tivesse saído da cripta familiar. Sua cara estava seca e pálida como uma máscara mortuária à luz cítrica.

Tinha posto um anel de chaves de ferro em sua cintura, muitas delas oxidadas pelo desuso.

—O que? Boa tarde, Wilbury —disse ela, rebuscando um sorriso agradável.— Que oportuno é você! Justamente desejava que alguém viesse e abrisse esta porta para mim.

—Certamente.

Sua resposta desdenhosa a deixou sem eleição exceto perseverar em sua fanfarronada.

—Seu, seu senhor me enviou abaixo para agarrar algo para minha irmã.

—Fez-o? E porque somente não chamou o mesmo?

—Porque ele sabia que vinha por aqui e não teve o desejo de lhe incomodar. —A única reação do mordomo foi arquear uma sobrancelha nevada. Caroline se aproximou mais e murmurou— Te conviria ajudar a seu senhor a agradar a minha irmã, sabe? Algum dia pode ser a senhora deste castelo.

Resmungando algo sob sua respiração que soou suspeitosamente a “Disparates”, Wilbury começou a tocar a provas seu molho de chaves. Finalmente localizou a que procurava e a escorregou no olho da fechadura. Caroline agarrou uma das velas do candelabro, com a antecipação aliviando sua respiração.

Wilbury abriu a porta, seus ossos aparentemente chiavam tão ruidosamente como as dobradiças antigas. Muito a par de que a espreitava atrás dela, Caroline avançou a rastros adiante, mantendo a vela no alto. Em lugar de cadeias mantendo os restos purulentos de jovens virgens e ingênuas, a modesta câmara luzia mundanas prateleiras de madeira que alojavam filas e filas de jarras, garrafas, e bolsas de lona. Suas etiquetas cuidadosamente inscritas não liam Restos de Lobo ou Olho de tritão, a não ser Noz Moscada, Gengibre, e Tomilho.

Parecia que tinha tropeçado acidentalmente com nada mais que um porão de especiarias.

—Respeitamos as velhas tradições aqui —lhe informou Wilbury— Em tempos medievais, era usual que o administrador do castelo guardasse sob chave as preciosas e custosas especiarias.

Isso só tinha sido três ou quatrocentos anos atrás. Wilbury provavelmente tinha sido um menino então, pensou Caroline sem piedade.

—Ah, ali está! —lutando por dissimular sua desilusão, agarrou a garrafa mais próxima da prateleira sem incomodar-se em ler sua etiqueta e a guardou no bolso de sua saia— Estou segura que este será justo o chá que minha irmã toma.

Quando Caroline passava junta a ele, Wilbury disse:

—Poderia querer lhe levar um pouco de açúcar além disso, senhorita.

Caroline se girou, piscando

 —E por quê?

Ele inclinou a cabeça para seu bolso.

—Camuflará o sabor amargo do láudano.

 

Caroline estava sentada sobre sua cama, abraçando seus joelhos e observando pôr-do-sol no horizonte ocidental. Seu último dia antes do baile logo estaria terminado e sua busca no Trevelyan Castle a tinha deixado com mais pergunta que respostas. Apesar de suas atrevidas intenções, não estava mais perto de descobrir a verdade a respeito do Adrian Kane do que tinha estado a primeira noite que pôs os olhos sobre ele.

—Adrian —murmurou, perguntando-se como seria ter o direito de lhe tratar por seu nome de pilha— Gostaria de algo mais de chouriço, Adrian? Planejaremos um jantar de meia-noite para seu aniversário este ano, Adrian? Como você gostaria de chamar a nosso primeiro filho, Adrian?

Assediada por uma dolorosa punhalada de solidão, Caroline apoiou sua bochecha sobre seu joelho e observou as sombras do crepúsculo avançar a rastros para as portas do balcão. Possivelmente tentaria ao destino esta noite e as deixaria sem o ferrolho.

Caroline se enrijeceu. Levantou a cabeça, seu olhar fixo nas portas do balcão. Estava recordando um passo furtivo, uma sombra movendo-se rapidamente através do céu da noite, uma tênue névoa saindo furtivamente da luz de lua. Levantando-se da cama, deslizou-se para as portas, com passos tão medidos como se tivesse cansado em algum tipo de transe hipnótico.

Quando ele apareceu fora de suas portas primeira noite no castelo, Kane tinha afirmado que não podia dormir. Que tinha abandonado sua cama e tinha saído a fumar e passear. Logo se desvaneceu como tinha aparecido.

Abrindo as portas, Caroline saiu um momento ao balcão. O ar fresco da tarde acariciou seus braços nus sob as pequenas mangas inchadas de seu traje de Cambraia, lhe pondo arrepiada. Em todas suas aventuras infrutíferas da tarde, por que não lhe ocorreu alguma vez simplesmente voltar a riscar seus passos?

Percorreu com o olhar o horizonte. Tinha pouco tempo que perder. O sol já tinha perdido intensidade até uma incandescência nebulosa, bordeando a parte inferior das nuvens de dourado.

Caroline cruzou em silêncio as almenas do castelo, pega à curva da parede da torre para não ser divisada por alguém que pudesse espreitar na parte inferior. Só podia rezar para que Porta ainda mantivera ao Vivienne ocupada.

A um lado da torre já alcançada pelo crepúsculo, finalmente encontrou o que parecia o princípio sinuoso de umas escadas de pedra. Seguiu-as para baixo, onde conectavam com uma ponte estreita, que se estendia ao longo da abertura entre as torres norte e sul. Enquanto se apressava através da ponte, o vento açoitava sua magra saia, fazendo-a lamentar ter deixado sua capa atrás.

A noite que chegou, Wilbury lhe tinha informado que seu senhor tinha sido muito explícito em suas instruções: a senhorita Caroline Cabot devia estar alojada na torre norte. Enquanto Caroline alcançava o outro lado da ponte e começava a subir as escadas da torre sul, fez um intento em não pensar nas escuras implicações das palavras do mordomo. Tentando não pensar em quão fácil seria para os ocupantes das duas torres ter um encontro tórrido sem que ninguém mais do castelo soubesse. A petição do Kane provavelmente tinha sido completamente inocente. Depois de tudo, tinha presenciado os esforços frenéticos dos serventes hoje. Possivelmente no momento de sua chegada, a torre norte tinha tido uma das câmaras habitáveis.

Logo se encontrou de pé fora de um par de portas quase idênticas às dela. Cavou suas mãos ao redor sua cara e tratou de olhar com atenção dentro, mas as pesadas cortinas cobriam o cristal. Olhou por cima seu ombro. Embora o sol não tinha terminado completamente sua descida, as estrelas já começavam a brilhar intermitentemente contra a paleta de cor anil do céu do este.

Não podia atrasar-se mais tempo. Enquanto fechava seus dedos gelados ao redor do atirador da porta, perguntou-se se Kane tinha emprestado atenção a seu próprio conselho e tinha jogado o fecho a suas portas contra o vento. Se o tinha feito, então não teria mais alternativa que voltar para rastros a seu dormitório onde passaria uma noite mais em uma agonia de incerteza.

Reunindo coragem, girou o atirador e lhe deu à porta um empurrão suave. Esta se moveu sem nada mais que um chiado de protesto, convidando a à escura guarida do visconde.

 

Caroline se deslizou ao interior da torre, deixando que a porta se fechasse a suas costas. Sentiu seu coração palpitar tão forte para despertar aos mortos. Estremeceu-se, afastando o desventurado pensamento.

Vacilou, esperando que seus olhos se adaptassem à penumbra. Embora as felpudas cortinas de veludo cobriam as janelas, a câmara não estava completamente escura. Uma vela de cera se queimava em um candelabro de ferro fixado à parede no lado oposto da torre.

Quando as sombras se retiraram, fixou seu olhar no móvel que dominava o quarto. Para seu eterno alívio, não era um ataúde fechado em um soalho de mármore, a não ser uma muito alto cama imperial de mogno, similar à sua, mas adornada por cortinados de seda vermelho-rubi. Estava fechada, ocultando a cama.

Avançou pouco a pouco, quase tropeçando com outro móvel situado perto do pé da cama. Sua forma alta, magra também estava coberta de seda. Levantou  uma esquina do tecido, determinada a jogar uma olhada debaixo, quando ouviu o distintivo rangido de algo movendo-se detrás da cortina da cama.

Volteou-se, perdida sua esperança secreta de que a cama podia estar vazia. Colocando a mão no bolso de sua saia, envolveu seus dedos trementes ao redor da estaca. Sentindo como se seus pés se afundassem em areias movediças, arrastou-se ao lado da cama mais próximo à vela. Seus dedos se deslizaram sobre a seda e retirou a cortina da cama para expor seu inquilino.

Em lugar de estar jogado de costas com os braços cruzados sobre seu peito, Adrian Kane estava convexo sobre seu estômago entre as savanas de seda vermelhas. A Lisa seda tinha escorregado  perigosamente até seus magros quadris, expondo os músculos esculpidos de suas costas e ombros e lhe fazendo impossível dizer o que ele tinha posto ou não sob o lençol.

Caroline retornou o olhar a sua cara, tragando para combater a repentina secura de sua boca.

Ele dormia com a cara girada para o suave brilho da vela, seus largos cílios acariciavam suas bochechas. Já que estas se tornavam douradas nas pontas, Caroline nunca se precaveu de quão largas e luxuriosas eram. O sonho tinha apagado a tensão que tão freqüentemente marcava sua frente e tinha aliviado o peso da responsabilidade que sempre parecia carregar sobre seus amplos ombros. Com o grosso cabelo despenteado e seus lábios ligeiramente abertos, quase podia vislumbrar ao moço que tinha sido.

Quando um ronco decididamente mortal abandonou aqueles lábios, Caroline sacudiu sua cabeça, vencida por uma onda de ternura. Tinha vindo aqui para demonstrar de uma vez para sempre que ele era simplesmente um homem. Tudo o que tinha feito era demonstrar que parva era. Não havia nada simples sobre ele. Ou a respeito de seus sentimentos por ele.

Ele não tinha estado enganando-a; ela tinha estado enganando-se. Tinha insistido em acreditar que  representava uma ameaça para sua irmã quando o único em perigo tinha sido seu próprio coração. Enquanto pudesse aferrar-se à ridícula idéia que podia ser um vampiro, não tinha que deixar ir.

Caroline fechou seus olhos durante um momento, lutando para controlar-se. Quando os abriu, ainda picavam, mas estavam secos.

Sabia que deveria ir-se, mas não podia mover-se. Nunca voltaria a ter a possibilidade de  aproximar-se dele na escuridão, olhá-lo dormir e perguntar-se, durante um momento egoísta, se ele sonhava com ela.

Uma carícia.

Era tudo o que se permitiria. Então se arrastaria longe tão silenciosamente como tinha vindo e o deixaria descansar. Voltaria para sua câmara e juntaria toda sua força de modo que quando ele chamasse a sua porta para pedir a mão do Vivienne, fora capaz de lhe dar a bem-vinda como ao irmão em que se converteria.

Caroline estirou sua mão, agudamente consciente que este não era nenhum retrato, a não ser carne e sangue cheio de calor e pleno de vida.

Um segundo seus dedos roçavam o cetim de ouro quente de suas costas, ao seguinte se encontrava com as costas sobre o colchão de plumas, com seus pulsos capturados em cima de sua cabeça por uma de suas mãos, a outra mão se enroscava ao redor da magra coluna de sua garganta.

Piscou, hipnotizada pelo brilho selvagem de seus olhos. Cada fôlego era uma luta, mas não poderia dizer se era por estar aprisionada sob seu peso ou por inalar o embriagador aroma que emanava de seu corpo morno pelo sonho. O perigo acrescentado a seu habitual mescla de sândalo e rum de baía criava uma espécie nova e ainda mais potente.

O reconhecimento baixou devagar por seus olhos, deixando-os cautelosos e pesados. Relaxou o apertão em seus pulsos e garganta, mas não fez nenhum movimento para liberá-la.

Não estava segura de poder fugir embora a soltasse. Uma frouxidão paralisante parecia haver-se instalado nela, reduzindo a marcha do tempo a uma valsa medida por cada pulsado de seu coração. Era agudamente consciente de seu peso, seu calor, do fornido corpo que a fixava ao colchão. Inclusive em sua inocência, Caroline reconheceu que a mão em sua garganta não era a maior ameaça.

—Não o faça —sussurrou quando viu seu olhar fixo em seus lábios. Não podia falar, não podia pensar, não podia respirar sem encher do almiscarado aroma de seu desejo— Por favor não…

Enquanto as pronunciava soube que era muito tarde. Sabia que tinha sido muito tarde do primeiro momento que seus olhos se encontraram, em que seus lábios se tocaram.

Sua mão se deslizou desde sua garganta até sua bochecha. Capturou seu olhar com a própria, sustentando-a cativa tão certamente como ao resto dela. A gema de seu polegar jogou sobre a brandura de seus lábios, explorando seus contornos flexíveis com uma ternura que ameaçou desfazendo-a.

Então sua cabeça estava ali, bloqueando a última da luz da vela quando ele aproximou sua boca à sua. Seus lábios se moveram sobre os seus, separando-os suave mas firmemente, deixando-a completamente vulnerável ao calor fumegante de sua língua explorando sua boca, reclamando-a junto com seu coração. Usou aquela língua para cortejar, adular, fazer promessas mudas que nunca poderia manter.

Caroline não podia haver dito como suas mãos escaparam. Ela só sabia que de repente se enredavam em seu cabelo, atendo-se ao redor de sua nuca, aprofundando o beijo, atraindo-o mais.

Muito tarde, deu-se conta que sua mão estava livre. Livre de examinar cuidadosamente a seda de seu cabelo até liberar o de suas forquilhas, para deslizá-lo por seus dedos. Livre de deslizar-se por sua garganta até o delicado oco na base. Livre para roçar seu peito sobre a suave cambraia de sua blusa. Não estava pronta para o erótico toque de seus dedos quentes deslizando-se sob a blusa e o espartilho, enfrentando pele a pele. Sua mão se curvou ao redor de seu peito, seu polegar movendo-se com delicioso cuidado sobre o topo do seio, enviando diminutos estremecimentos de prazer diretamente a sua matriz. Embora ela delirava de prazer, foi ele o que gemeu com mortal agonia.

Durante seis anos se negou qualquer prazer. Agora sentiu como se se afogasse nele, afundando-se mais profundo em seu abraço com cada suspiro, cada beijo, cada hábil golpe das gemas de seus dedos contra sua carne. Quando sua mão se deslizou mais abaixo, roçando a curva de seu ventre, remontando o elegante arco de seu quadril, solo pôde jogar sua cabeça atrás, bebendo mais profundamente do néctar proibido que lhe oferecia.

Tinha sabor de bolachas de açúcar quentes durante uma nevada amanhã de Natal; morangos amadurecidos e nata fria durante uma abafadiça tarde do verão; fumegante vapor de cidra de maçã durante uma tarde de outono rangente. Pela primeira vez desde que tinha perdido a seus pais, era como se todos os lugares vazios dentro dela estivessem cheios e nunca teria que deitar-se faminta outra vez.

Como se queria enchê-la em todas partes, separou suas coxas brandas com um joelho, colocando-se no oco quente entre suas pernas com uma ligeira pressão que trouxe um afogado grito a sua boca e a fez arquear-se na cama. Não sabia o que fazia. Só sabia que queria mais.

Mais dele.

Quando colocou sua boca sobre a sua, ela gemeu um protesto. Mas seus gemidos se converteram em suspiros quando ele pressionou beijos suaves como uma pluma contra a esquina de sua boca, a curva delicada de sua mandíbula, a pele suave sob seu ouvido.

Arqueou o pescoço, incapaz de resistir à suavidade desses lábios procurando o pulso em sua garganta. Um pulso que corria fora de controle, revoando como uma ave cativa em suas mãos.

Aturdida de prazer, sentiu o raspar de seus dentes um instante antes que deixasse cair sobre a sensível carne uma aguda dentada.

—Auch! —Seus olhos se abriram. Levando uma mão à marca em sua garganta, fulminou-o com um olhar ultrajado— Me mordeu!

Fulminou-a com o olhar, seus olhos brilhavam como exóticas gemas à luz da vela.

—E por que não? Isso é o que esperava, não é certo? —sustentou o afiado palito que havia retirado do bolso de sua saia enquanto tinha estado caindo em muito prazer— Se não, não houvesse o trazido para minha cama.

Caroline tragou com força, seu olhar culpado deslocando-se da estaca a sua cara.

—Suponho que não acreditaria que ia pôr-me à corrente com minha malha?

—O que ia fazer? Bordar “Benzer a Nossos Elfos” sobre meu coração? —soprando com o escárnio, colocou a estaca em seu peito e se apartou. Abrindo as cortinas de seda, abandonou a cama.

Caroline se sentou, sua mandíbula se abriu quando se deu conta do que ele usava para dormir.

Nada.

Parecia que o David do Miguelangello tinha cobrado vida, cada tendão e músculo esculpido com carinho pelas mãos de um artista magistral. Atravessou o quarto tão inconsciente da masculina graça de seus movimentos que ela esquecimento retirar o olhar até que esteve detrás de um biombo dourado para vestir-se.

Avermelhando até as pontas dos pé, ela esquivou sua cabeça.

—Não pode me culpar por acreditar o pior de você. Não é como se alguma vez houvesse tratado de negar essas horríveis intrigas que comentam a suas costas.

Sua voz entrecortada vinho da tela.

—Pensei que era a única pessoa que nunca acreditaria nessas ociosas intrigas.

—Não tenho outra opção que lhes emprestar atenção enquanto corteja a minha irmã!

Ele reapareceu, ficando às pressas umas calças cor carvão. Seu olhar foi atraído para suas mãos enquanto se esforçava para abotoar a tampa dianteira. Apesar de sua habilidade, parecia ter alguma aula de dificuldade.

—Até esta noite, tinha-lhe dado alguma vez alguma razão para acreditar que minhas intenções para sua irmã eram algo menos que honoráveis?

Sim! Quis gritar. Quando me beijou nos Jardins do Vauxhall como se eu fora a única mulher que amaste alguma vez. Mas conteve sua língua. Porque ele não a tinha beijado. Ela o tinha beijado.

—Suas intenções para minha irmã podem ser irrepreensíveis, mas sua intenção para mim faz um momento não eram tão inocentes.

Colocou uma camisa enrugada e começou a sujeitar os botões.

—Teria recebido o mesmo tratamento de qualquer homem que a visse tendida em sua cama com esse imprudente abandono quando estava médio dormido.

O rubor do Caroline se fez mais profundo, mas Kane não o viu. Pela primeira vez desde que se encontraram, seu olhar tinha vacilado. Parecia não poder olhar a de frente.

Suspeitando que tratava de convencê-la tanto como a si mesmo, ela replicou.

—Não caí em sua cama. Devorou-me.

—E o que se supunha que fizesse? Não é normal que uma mulher se introduza em meu recamasse disposta a me assassinar enquanto descanso —Sacudindo a cabeça, passou uma mão por seu cabelo já despenteado— No que pensava pelo amor de Deus? Se um dos criados a tivesse visto entrando aqui sua reputação teria ficado arruinada.

—Assegurei-me de não ser vista —disse ela.

—Então é ainda mais parva do que pensei —Sua voz vibrou perigosamente quando se moveu para a cama com a graça inexorável de algum felino selvagem.

Caroline se levantou para confrontá-lo, seu cabelo se derramava por ter perdido a metade de suas forquilhas, mas sustentou seu queixo em alto. Depois de seguir a direção de seu zombador olhar, deslizou a estaca no bolso de sua saia.

—Não vim aqui esta noite para lhe assassinar. Vim para averiguar a verdade de uma vez por todas. E não vou a nenhum lado até obtê-lo —Respirou fundo, determinada a não chiar quando finalmente disse as palavras em voz alta— É ou não é um vampiro?

Surpreendeu-o tanto que se parou a escassos centímetros dela, inclinando sua cabeça para um lado para estudá-la.

—Nunca deixa de me surpreender. Em nossa primeira reunião, teria jurado que era muito prática para acreditar em tais criaturas.

Encolheu-se de ombros.

—Ninguém nega a existência do Vlad o Empalador ou Elizabeth Bathory, celebre-a Condessa da Transilvania que estava acostumado a pendurar às virgens de povo de barriga para baixo e cortar suas gargantas para beber seu sangue e manter sua juventude.

A nota sedosa de sua voz se fez mais profunda.

—Posso lhe assegurar, senhorita Cabot, que tenho usos muito mais agradáveis para as virgens.

Embora sua cara a traísse com outro rubor, decidiu não fazer caso do insulto deliberado.

—Não  pode negar que tem os instintos de um assassino. Tinha-me sobre minhas costas e com sua mão em minha garganta antes que pudesse juntar ar para gritar.

Arqueando uma sobrancelha, ele disse.

—Agora que o penso, não lutava muito forte —se aproximou e coloco um cabelo fugitivo detrás de seu ouvido— Quase teria jurado que fugir era a última coisa em sua mente.

O toque de seus dedos na sensível pele detrás de seu ouvido a fez estremecer de desejo.

Ele retirou sua mão, como se também o houvesse sentido.

—É o que acredita que sou? Um assassino?

—Não sei o que é você —admitiu, sua voz tremendo pela emoção— Só sei que desde o primeiro momento que pus meus olhos em você, já não pude pensar em nada nem ninguém mais. Sei que cada vez que entra em uma habitação, parece que as varas de meu corsét estão muito apertadas e não posso respirar. Sei que não deveria estar tendo pensamentos vergonhosos e sonhos com o homem com quem minha irmã virtualmente se comprometeu em matrimônio se ele não tivesse jogado alguma classe de feitiço sobre mim!

—A primeira vez que nos encontramos, você me disse que só os de pouca vontade estavam em perigo de sucumbir a meu encanto.

Uma risada desesperada lhe escapou.

—Então minha vontade deve ser muito mais fraca do que pensei.

—Se isso for verdade, então o que passaria se neste mesmo momento eu lhe mandasse aproximar-se? —aproximou-se o bastante para sentir o calor que irradiava de seu corpo, cheirar o masculino almíscar de sua pele, sem tocá-la— Seria capaz de resistir se lhe ordenasse que me abraçasse? O que me beijasse?— Sua voz se deslizou em uma nota rouca— O que me amasse?

Caroline tratou de afastar-se, mas Kane a agarrou pelos ombros, obrigando-a a encontrar seu ardente olhar.

—E se tiver razão, Caroline? E se a tivesse enfeitiçado? E se fosse o feitiço mais forte de todos? E se se apaixonasse por mim?

Sacudiu sua cabeça em um mudo protesto, horrorizada de que conhecesse seu mas profundo segredo. Nenhuma quantidade de água bendita poderia tirar tal mancha. Não havia nenhum padre, nenhum remédio, nenhum encantamento para ser quebrado. Bem poderia atrevasar seu traiçoeiro coração com essa estaca.

—Insulta-me milord. Nunca faria isso ao Vivienne. Não sou essa classe de mulher.

O apertão em seus ombros se abrandou até parecer-se perigosamente a uma carícia.

—Não acredita que sei que classe de mulher é? É a classe de mulher que abandonaria seus próprios sonhos só para fazer realidade um dos sonhos de suas irmãs. Mas possivelmente seu coração não é tão escrupuloso e cheio de abnegação como o resto de você. Poderia insistir egoistamente em seguir seu próprio caminho até se você não o fizer.

Ela o olhou fixamente, retendo as lágrimas.

—Então suponho que merece estar quebrado, verdade?

—Não por um homem como eu —resmungou Kane.

Franzindo o cenho, recuperou sua volumosa capa das costas de uma cadeira e a colocou ao redor dos ombros.

—Aonde me leva? —exigiu quando a sujeitou do braço através da capa e a impulsionou para as portas francesas.

—De retorno a sua habitação. A menos, é obvio, que deseje que chame um dos criados para que a escolte.

Sem esperar sua resposta, empurrou-a pelas portas francesas e saíram ao exterior. O vento se elevou, colocando farrapos fantasmas de nuvens atravessando o arco prateado da lua crescente.

—Não irei tão facilmente —Caroline insistiu enquanto a arrastava rapidamente a pelas escadas para a ponte. Agudamente consciente da altura  a que se encontravam, tropeçou a seu lado, sem fôlego pelo esforço para manter o ritmo de suas largas pernadas— Se não é um vampiro, quero saber por que dorme todo o dia e rechaça mostrar-se à luz do sol. Quero saber por que seus antepassados luzem iguais a você. Quero saber por que você deixa que a sociedade, e eu, criamos o pior de você em vez de defender-se contra suas acusações. E quero saber por que não há um só espelho em nenhuma parte deste maldito castelo!

Resmungando um juramento, Kane a fez girar para confrontá-lo. Elevando-se sobre ela, com seus amplos ombros emoldurados pelas nuvens, mostrando os dentes. A luz da lua iluminou os planos de seu rosto, afiando-os e fazendo-o parecer  ainda mais perigoso.

Antes que pudesse protestar, sua mão se inundou em seu bolso e tinha surto com a estaca. Envolvendo o outro braço ao redor de sua cintura para acautelar sua fuga, colocou a estaca em sua mão e a  forçou a fechar-se ao redor. Por mais que resistiu, girou a primitiva arma e a colocou contra seu próprio peito.

—Se realmente crie que sou alguma classe do monstro —disse, seu olhar tão feroz como nunca a havia visto— então segue adiante e me estaque. Meu coração não foi meu do primeiro momento em que pus meus olhos em ti, bem poderias terminar o trabalho.

Caroline piscou, totalmente confundida por sua confissão. Naquele momento, não lhe preocupou se era um homem ou um monstro. Só queria que fora dele. Incapaz de esconder o anseia em seus olhos, estirou-se e brandamente acariciou a rígida curva de sua mandíbula. Seus dedos devagar se relaxaram, como fizeram os seus , soltando a estaca que recife ao chão.

Rendendo-se, arrastou-a contra ele, tomando sua boca em um beijo tão escuro e doce como a mesma morte. A pesar do golpe de seu cabelo na cara e o selvagem bato as asas da capa no vento, era como se estivessem congelados no tempo. Para Caroline, não havia nenhum passado ou futuro. Nenhuma Vivienne e nenhuma desculpa. Só este momento, este homem, este beijo.

Uma eternidade mais tarde, separou sua boca da sua e a olhou profundamente. Sacudiu sua cabeça, parecendo inclusive mais impotente do que ela se sentia.

—Sem importar o que vou fazer contigo, minha querida senhorita Cabot?

—O que seja, milord —murmurou ela como se estivesse sonhando, sentindo o toque fervente de seus lábios em seu cabelo quando descansou a bochecha contra seu peito.

—Adrian —lhe sussurrou, abraçando-a.

—Adrian —suspirou.

Estava tão aturdida pelo prazer que tomou um momento entender que o rítmico som sob sua bochecha era o palpitar de seu coração. Lançando-lhe um olhar assustado abriu sua camisa e pressionou a palma contra a morna pele de seu peito. O batimento do coração quase dobrou seu ritmo baixo aquele casto toque. Como o resto dele, seu coração estava quente, cheio de vida, e muito mortal.

—Sempre soube que não foi tão desumano como aparenta —murmurou ela, lhe jogando um olhar conhecedor.

—Suponho então que meu segredo esta descoberto. Não sou um vampiro.

—É obvio que não o é —riu dele, quase enjoada de alívio— Não existem tais coisas! Não posso acreditar que me deixei influenciar pelas fantasias ridículas de Porta. Deve pensar que sou uma cabeça oca. Eu nunca deveria…

Os braços do Adrian se apertaram ao seu redor, detendo abruptamente seu bate-papo. Seu sombrio olhar se fixou cuidadosamente nela.

—Não sou um vampiro, amor. Sou um caçador de vampiros.

 

Caroline piscou para o Adrian, lhe recordando a um pequeno mocho aturdido.

—Não é um vampiro —repetiu devagar.

—Assim é.

—É um caçador de vampiros.

Adrian assentiu com a cabeça.

—Alguém que caça a vampiros.

Ele assentiu com a cabeça outra vez.

—E os mata.

—Não exatamente. Porque eles estão já mortos —explicou brandamente— O que faço é destruí-los e enviar as cascas desalmadas de seus corpos ao diabo de modo que eles não possam fazer mais dano.

Inclusive quando com cuidado se tirou suas armas e começou a andar de costas para o meio da ponte, Caroline assentiu com a cabeça, como se o que lhe dizia tivesse perfeito sentido.

—Asim que por isso dorme durante o dia. Dessa maneira pode sair a caçar vampiros de noite.

—Isso me temo, eles não são muito aficionados ao sol.

Ele quase podia ver os complexos e vigamentos engrenagens de seu retorcido cérebro.

—Suponho que não compartilha suas outras características. Como, ah... A imortalidade, por exemplo?

Ele arqueou uma sobrancelha.

—Isto é pela galeria de retratos outra vez?

Ela assentiu com a cabeça.

Ele cruzou seus braços sobre seu peito, apressado por recordar a ultima vez que se haviam sentido tão vazios.

—Eu não te menti sobre o forte parecido de minha família. Meu tatara—tartara—tatara—tio uma vez engendrou a um menino com a criada de sua esposa. Foi capaz de negar que o menino era seu até o dia que nasceu com aquela marca reveladora em cima de seu olho esquerdo.

—O que passou então? —perguntou ela, devagar, mas retirando-se.

—Meu tatara—tartara—tatara—tia lhe disparou. Por sorte para mim e o resto de seus descendentes, ela tinha muito má pontaria e só conseguiu lhe pegar um tiro na tíbia. Ele continuou engendrando a mais de quinze meninos, sete desses em minha tia. Ela esteve obrigada a lhe pegar um tiro duas vezes mais antes que finalmente morrera em sua cama à amadurecida idade de noventa e dois anos.

Caroline inclinou sua cabeça.

—E os espelhos? Se for um caçador de vampiro em vez de um vampiro, então por que é tão contrário a vislumbrar seu reflexo?

Adrian suspirou e pousou uma mão sobre sua mandíbula. Esta era a pergunta mas tinha estado temendo.

—Se deve saber, ele se desfez dos espelhos por mim —Julian arrastou as palavras quando chegou saindo das sombras detrás dela.

Ao mesmo tempo, Adrian soltou um juramento, Caroline colocou uma mão sobre seu coração e se girou para confrontar a seu irmão.

—por que  é contrário a vislumbrar seu reflexo?

—Não —Julian respondeu, dando outro passo para ela— Porque já não o tenho.

Caroline ficou em silencio durante um comprido momento antes de fazer silenciosamente uma pergunta.

—E suponho que já não tem uma alma tampouco?

Julian acariciou os bolsos de seu colete desdenhosamente correto, logo sacudiu sua cabeça tristemente

—Não para mim, temo-me.

Caroline devagar se voltou para trás para o Adrian, o calor de seus olhos esfriando-se até gelar-se.

—Quanto te levou a ti e a seu irmão para vir com esta pequena brincadeira cruel e pesada? Pensou  que isto seria uma grande diversão para enganar à moça crédula do lugar? Planejastes todo o assunto com uma agradável garrafa no porto e alguns puros finos? —Ela levantou seu queixo, mas não podia esconder completamente seu tremor— Parece que me equivoquei contigo depois de tudo, milord. Você é tão desumano como quis que eu acreditasse que era.

Adrian deu um passo indefeso para ela.

—Se só me escutasse, Caroline.

—Ah, não —disse ela, sacudindo sua cabeça— Acredito que ouvi bastante por uma noite. Agora se ambos estão entretendo-se a meus gastos, acredito que voltarei para minha câmara.

Com seus ombros magros, rígidos sob a capa do Adrian, Caroline começou andar para o final da ponte bloqueada pelo Julian.

Muito tarde, Adrian compreendeu o que seu irmão ia fazer.

Quando Caroline se aproximou dele, um grunhido desumano saiu da garganta do Julian. Ele ensinou os dentes, os recursos de escuridão em seus olhos se cavaram para aparecer os brancos.

Caroline ofegou e foi tropeçando para trás. Julian seguiu passo a passo, a luz da lua  brilhando nas curvas letais de suas presas. Ele não retrocederia até que ela se apoiou diretamente nos braços do Adrian.

Adrian juntou seu corpo tremente contra o seu e fulminou com o olhar a seu irmão por cima de sua cabeça.

—Maldito, Julian! Não é muito oportuno.

Julian se encolheu de ombros, seu semblante angélico voltou para a expressão arrependida que sempre lhe permitia fazer a pior travessura.

—Não sou oportuno possivelmente, mas completamente eficiente.

Adrian teve que confessar que não era nenhum grande sacrifício ter ao Caroline em seus braços. Ainda fulminando a adagas com o olhar ao Julian, ele acariciou a brandura de seu cabelo.

—Esta bem, amor. Não deixarei que te faça mal esse moço repugnante.

Como Caroline seguiu boquiaberta de assombro, Julian o ofereceu a classe de sorriso que alguém podia oferecer a uma menina depois de agarrá-la pelo queixo e lhe assegurar que o monstro de debaixo da cama havia sido vencido e não havia perigo.

—Não há nenhuma necessidade de que esteja aterrorizada, senhorita Cabot. Pode ser um bocado deliciosa, mas a diferença de meu querido irmão aqui, sou capaz de controlar meus apetites.

Quando ele olhou viu o fixo olhar indolente de seu irmão a cada detalhe indiscutível de seu abraço, inclusive Caroline com o cabelo cansado e com os lábios maturados por beijos, Adrian disse.

—Sei o que  pensa, mas isso não é o que quero.

—Ah, pela bem da compaixão, não o faça! —respondeu Julian— Pode lhe mentir, pode te mentir até a ti se quiser. Mas não me minta. Ela é exatamente o que quer.

—Faça-o outra vez —mandou Caroline de repente— Aquela coisa que fizestes. Com os olhos. E o… —Um frio estremecimento desceu por ela, quando Adrian brandamente esfregou suas pequenas costas— dentes.

—Não faço pelo geral um bis, mas para você… —Julian contemplou a seu irmão para que o passasse.

Embora soubesse que provavelmente teria que lamentá-lo mais tarde, Adrian suspirou e assentiu com a cabeça.

Esta vez não poderia culpar à transformação do Julian a uma brincadeira pesada ou uma brincadeira da luz da lua. Quando a escuridão chegou a seus olhos, convertendo-o em algo tanto menos que humano, era tudo o que Adrian podia fazer para não retroceder. Então, como rapidamente, a escuridão se afundou e seu irmão pequeno não estava de pé ali antes deles.

—Ah, Prezado senhor, é verdadeiro, verdade? Realmente é um vampiro —respirou Caroline. Embora tivesse assegurado uma vez ao Adrian que não era a classe de mulher que se deprimiria em seus braços, pareceu estar no perigo de fazer isso.

—Isso acredito —murmurou ele, sustentando-a estável até que deixou de balançar-se a seus pés.

Ela não podia arrancar seu fixo olhar do Julian.

—…você…? —privada da coerência, fez pequenos movimentos agitando suas mãos— …se voltou você mesmo em um morcego e voou até aqui?

Julian retrocedeu.

—meu deus! Mulher, estiveste escutando as tolice de Porta outra vez? Realmente deveria fiscalizar os hábitos de leitura da menina com mais cuidado. Se segue enchendo sua cabeça das tolices do doutor Polidori, verá vampiros detrás de cada cortina e palma em conserva. Posso dormir bem em um ataúde, mas posso lhe assegurar que nunca tenho...

—Realmente dorme em um ataúde? —soltou Caroline, com a curiosidade que começava a vencer seu shock.

Adrian pôs seus olhos em branco.

—Terá que perdoar a meu irmão. Sempre teve uma notável aptidão para o drama, inclusive antes de fazer um vampiro.

—Não entendo —sussurrou Caroline, dando-a volta para olhar fixamente a cara do Adrian— Se Julian for vampiro, então por que deixa acreditar em todos que o é você?

—É o caminho mais fácil —explicou Adrian— podem suspeitar, mas nunca poderão demonstrar nada.

Julian estendeu seus braços em um eloqüente encolhimento.

—E enquanto desdenho o sol, visto tudo de negro, e arrojo poesia abominável sobre sangue e morte em cada velada musical e jantar de meia-noite, como é possível que alguém possa tomar a sério?

Devolvendo-lhe um olhar cauteloso.

—E os misteriosos desaparecimentos na Charing Cross? É responsável por elas?

—Não —disse Adrian— Fui eu— Quando o olhar fixo assustado do Caroline lhe açoitou por detrás, acrescentou— Eles eram vampiros, querida. Todos eles.

—Então os destruiu —disse ela, repetindo suas anteriores palavras— E enviou as cascas desalmadas de seus corpos ao diabo.

—Assim que ali! —Julian exclamou— Não há nenhuma necessidade de ser tão depreciativa sobre o destino do desalmado.

—Julian não se parece com outros —lhe assegurou Adrian— Nunca bebeu que outro ser humano.

—Só porque aqui meu irmão maior gastou uma pequena fortuna em açougues durante os cinco anos passados.

Embora ela fez um valente esforço, Caroline não podia esconder completamente sua careta de  repugnância.

Julian deu um suspiro resignado.

—Quando as mulheres são todo desvanecimentos sobre o romance com um vampiro, um alguma vez se para a pensar nas pequenas moléstias como o fôlego de sangue, verdade?

—Cinco anos —repetiu Caroline, com seus olhos ainda aturdidos— Esse é mas ou menos o tempo que sua mãe esteve no estrangeiro e Julian veio para ficar com você em Oxford.

Adrian assentiu com a cabeça.

—Disse-lhe que ele aceitou companhias desagradáveis de jovens. Infelizmente, eles estavam conduzidos por um homem que desejava me fazer um grave dano.

—Duvalier —Caroline sussurrou antes que qualquer deles pudesse mencionar um nome.

Os dois homens intercambiaram uma olhada assustada antes de grunhir em harmonia.

—Larkin.

—Mas pensava que Duvalier era seu amigo —disse Caroline.

—Também eu —disse Adrian, sentindo que sua cara se obscurecia com velhas memórias, velhas desculpas— Não me dava conta até que foi muito tarde, que ele sempre esteve em segredo ciumento de mim.

—Só porque foi mais forte, mais elegante, mais rico, com melhor aspecto, um boxeador mais hábil, mais respeitado, e muito mais popular entre as damas —Julian franziu o cenho— agora que Miro para trás, foi bastante insuportável.

Adrian lhe mandou uma olhada de repressão.

—Victor conseguiu esconder sua amargura para mim até que eu por descuido roubei o major de seus tesouros.

—Não seria o coração da Eloisa Markham por acaso, verdade? —Caroline perguntou brandamente, mas firmemente se soltou de seus braços.

Embora soubesse que não era justo, Adrian sentiu que seu caráter começava a exaltar-se.

—Há algo que o bom polícia não lhe disse quando lhe sussurrava doces promessas em seu ouvido?

Pondo uns pés de distância entre eles, Caroline encontrou seu fixo olhar desafiante com a sua própria.

—Ele não me disse o que aconteceu com Eloisa.

Adrian se deu volta afastando-se dela, descansando suas mãos no antigo parapeito de pedra que separava a ponte. Uma brisa chegou com o aroma do jasmim que florescia de noite e agitou seu cabelo.

—depois de que Eloisa rompeu seu coração, Victor mudou. Começou a beber em excesso e a freqüentar um dos clubes mais sórdidos do Whitechapel. Larkin e eu não tínhamos nem idéia de que isso era um jogo do inferno em todo o sentido da palavra.

—Uma escala de vampiros —disse Julian brandamente.

Adrian seguiu.

—Já que eu tinha tomado uma coisa que ele queria, decidiu ter uma coisa que acreditava que eu não poderia ter nunca, imortalidade. Fez-se um deles. Com muito gosto rendeu sua alma a aqueles monstros de modo que tivesse poder para me destruir e a todos os que amava —Adrian se voltou para trás para enfrentar ao Caroline, rechaçando fugir de sua própria culpabilidade com o que seguia— Quando ordenei ao Julian que parasse de me seguir como um cachorrinho, Victor esperava. Tomou ao Julian sob sua asa e o tratou como um igual. Até o levou a clube de jogo de azar. Quando Julian veio e tratou de me dizer que havia vampiros em Londres e Victor podia ser um deles, agitei seu cabelo e lhe acusei de ter uma imaginação hiperativa.

Podia notar no Caroline como quase imperceptivelmente se estremecia com suas palavras que tinham golpeado um nervo cru.

—Eloisa e Julian desapareceram ao dia seguinte. Eu não sabia onde procurar, então fui ao clube, acreditando em minha candura que Victor poderia ser capaz de me ajudar a encontrá-los. O clube estava abandonado. Ele e seus companheiros tinham fugido já. Mas Eloisa… —Adrian fechou seus olhos, ainda freqüentados pela vista daquela garganta pálida, magra que derramava cintas geme as de vermelho, aqueles olhos azuis formosos congelados para sempre em um ausente olhar fixo— Nunca imaginei que destruíra algo que tinha amado tanto —abriu seus olhos para encontrar ao emocionado olhar fixo do Caroline —Eu fui salvar muito tarde a Eloisa, mas encontrei ao Julian enroscado na esquina, ofegando e agarrando sua garganta. Quando cheguei, grunhiu-me como alguma classe de coisa selvagem. Victor tinha assassinado a Eloisa a sangue frio, mas tinha decidido que isto seria um castigo mais apropriado se convertia a meu irmão na mesma coisa que sabia que eu desprezaria mais.

—Como? — perguntou Caroline, parecendo tão desanimada como Adrian se sentou naquele momento.

Julian olhou fixamente ao distante horizonte, a lua refletia na água a pureza de seu perfil em sua luz luminosa.

—Naquele mesmo momento quando meu coração deixou de bater, ele me estava mordendo outra vez. Ele rompeu minha alma diretamente, freqüentemente pensava que Eloisa era afortunada. Quando morreu, sua alma foi posta em liberdade.

—por que não encontrou alguma vez seu corpo a polícia?

Adrian enviou um torpe olhar ao Julian.

—Então não tinha nenhum modo de saber se Eloisa ia ficar morta ou se ia converter se…em algo mais. Assim depois de colocar ao Julian no carro, voltei para o clube e queimei as cortinas —seus olhos assombrados pelo fantasma de fuligem e lagrimas— Estive de pé no passeio e olhei como se queimava o maldito lugar, não me dando conta até que foi muito tarde que acabava de destruir todas as provas que culpavam ao Duvalier e minha própria inocência.

Caroline sacudiu sua cabeça inutilmente.

—por que não confiastes  no Larkin? Era seu amigo mais querido. Não te teria ajudado?

—Eu não podia arriscá-lo. Estava aterrorizado de que se alguém mais averiguasse o que tinha passado ao Julian, eles o levariam longe de mim…ou o destruiriam.

Dirigindo-se para trás pelo parapeito e cruzando seus braços sobre seu peito, Julian o contemplou com afeto sardônico.

—Eu me teria destruído naqueles primeiros dias se não tivesse sido por ti —Ele trocou seu olhar ao Caroline— Teve  que me encerrar sob chave longe e me reter durante quase um mês. Lutei contra ele. Arranhei-o. Tratei de lhe mordê-lo teria arrancado sua garganta se pudesse me haver evadido de minhas cadeias. Mas o parvo obstinado rechaçou me abandonar, trouxe-me o sustento que necessitava para sobreviver e passo  horas encerrado,, com chave naquele desvão comigo, gritando até que estava rouco, me recordando quem era, quem tinha sido, até que pudesse encontrar algum magro fio de minha humanidade para me agarrar. E me esteve recordando isso cada dia após sem falhar.

Adrian jogou uma olhada para baixo para encontrar ao Caroline lhe olhando fixamente, com seus olhos cinza nublados com lagrimas.

—Não me veja dessa forma —advertiu ele— Posso não ser o bandido que acreditava,  mas posso lhe assegurar que não sou nenhum herói.

—Como pode dizer isso quando sacrificou tanto para salvar a seu irmão?

—Quando não o salvei —respondeu ele em tom grave— Ainda.

—Adrian não esteve caçando só a vampiros durante os cinco anos passados —disse Julian— esteve estudando sua ciência também. Foi quem descobriu que pode haver um modo de restaurar minha alma.

—Como é possível?— perguntou Caroline.

Os olhos do Julian brilharam pelo entusiasmo.

—Se destruir ao vampiro que me engendrou e recupero o que me roubou, posso viver outra vez, temos que encontrar e capturasse Duvalier, então eu tenho que drená-lo seco.

—Drená-lo seco? —Caroline tragou— Significa isso o que é o penso que é?

Julian assentiu com a cabeça.

—Tenho medo, terei que deixar meus hábitos de comida, pelo menos uma vez.

—Mas e se alguém o destruir primeiro? Estivesse perdida sua alma para sempre?

Adrian intercambiou um olhar com seu irmão antes de dizer.

—Não necessariamente. Mas faria as coisas extraordinariamente mais difíceis porque a alma do Julian e todas as almas que Duvalier roubou nos cinco últimos anos voltariam atrás para vampiro que engendrou ao Duvalier, só lhe fazendo mais poderoso. E embora tenhamos uma idéia, não estamos completamente seguros de quem era.

Caroline deu a sua cabeça uma pequena sacudida,  ainda lutando por examinar cuidadosamente todo que eles lhe diziam.

—Então os vampiros não são só criaturas que bebem o sangue para sobreviver. Eles não têm alma  própria, mas acumulam as almas daqueles que convertem em sua própria classe.

—Assim é —confirmou Adrian— Se alimentam deles e se voltam mais capitalistas com cada alma que roubam.

Cobrindo-se com seus braços ao redor, Caroline reprimiu um tremor.

—Então Duvalier esteve ficando mais capitalista todos estes anos.

—Mais poderoso, mas não invencível —disse Adrian em tom grave— passamos os ultimos cinco anos rastreando ao bastardo por toda parte do mundo, Roma, Paris, Estambul, os Cárpatos. Seguimo-lo na carreira, mas sempre esta um passo por diante de nós. Até agora.

—Agora? —chiou Caroline— por que agora?

Adrian alcançou ao Caroline, já não era capaz de resistir pôr suas mãos sobre ela. Sobre tudo já que poderia ser por última vez. Cavando sua cara em suas mãos, seus polegares meigamente acariciando o cetim cremoso de suas bochechas.

—Porque finalmente encontramos algo que não poderá resistir.

Julian apoiou uma bota na parede e começou a polir um invisível raspão com seu lenço, olhando como se  desesperadamente desejasse poder converter-se em um morcego e sair voando.

Caroline sacudiu sua aturdida cabeça.

—Mas o que poderia tentar possivelmente a tal monstro …?

Adrian só podia olhar inutilmente quando seu atordoamento começou a endurecer-se pelo horror.

—Ah, Deus —sussurrou ela, o sangue que visivelmente desaparecia de sua cara— É Vivienne, verdade? A tia Marietta, disse que a primeira vez que a viu, olhou-a como se tivesse visto um fantasma. Larkin tratou de me advertir de que tinha um parecido assombroso com a Eloisa, mas não lhe escutava. Por isso a treinava em como ter posto seu cabelo. O baile, o camafeu…o vestido comprido… pertencia a Eloisa, verdade? Por que arrumado que ela até levava postas rosas brancas em seu cabelo e tocava a harpa, verdade?

—Como um anjo —admitiu Adrian a contra gosto.

Colocando uma mão sobre sua boca, Caroline escapou do ele. Esta vez quando a alcançou, ela retrocedeu violentamente.

—Querido Senhor —respirou ela, retrocedendo ante ele —só quer usar a minha irmã como ceva, nunca sentiu carinho por ela absolutamente.

—É obvio que sinto carinho por ela! Ela é uma moça muito querida!

—Bastante querida para atrair a aquele monstro? Bastante querida para ser conduzida como um cordeiro à matança? —A voz do Caroline se elevou, rachando-se em uma nota rouca— Lhe deu o vestido de uma moça morta! Teve a intenção de convertê-lo em seu sudário?

Adrian sacudiu sua cabeça, desesperado por apagar a angústia dos olhos do Caroline.

—Juro-lhe por minha vida que eu nunca deixaria que lhe causasse nenhum dano. Eu não me teria aproximado dela absolutamente se não acreditasse que sou o bastante capitalista para protegê-la.

—Da mesma maneira que protegeu a Eloisa?

Adrian fechou seus olhos brevemente.

—Sou muito mais forte agora do que era então. Gastei cada dia desde que morreu afinando minhas habilidades, tanto físicas como mentais. Inclusive então, se me tivesse  dado  conta antes de que ela estava em perigo mortal, eu poderia ter sido capaz de salvá-la.

—Mas não a salvou, verdade?

Adrian não tinha nenhuma defesa contra aquele golpe. Caroline se girou ao redor e empreendeu a viagem de volta através da ponte, com seus punhos apertados com determinação. Esta vez Julian não fez nenhum movimento para pará-la.

—aonde vai? —Adrian a chamou.

—A lhe dizer ao Vivienne todo sobre seu pequeno feio plano.

—vai contar lhe sobre nós também?

Caroline se congelou em metade de uma pernada. Se não fora porque o vento movia as dobras de sua capa e estremecia a seda de seu cabelo iluminado pela lua, Adrian poderia ter acreditado que se havia convertido em pedra.

Ela devagar se deu volta para confrontá-lo. Isto não era desprezo em seus olhos. Isto era o desejo, a pena. Sua voz era suave, tão clara ainda como o cristal.

—Só quando começava a acreditar que não era um monstro, teve que me demonstrar quão equivocada estava.

Embora não quisesse nada mais que ir detrás dela, para arrastá-la a seus braços e lhe pedir que entendesse, Adrian só podia estar de pé e olhar quando Caroline se foi pela ponte, levando-se consigo o que ficava de seu destroçado coração.

Caroline entrou silenciosamente na câmara de suas irmãs. Terminando de chorar, suas lágrimas se secaram finalmente, deixando sua cara devastada e sentindo-se tão intumescida como seu coração.

Tinha esperado encontrar a suas irmãs deitadas em suas respectivas habitações, mas ambas se dormiram na sala. Porta estava enroscada em uma cadeira de braço, com seu gorro de noite deslizando-se para baixo sobre um olho, enquanto Vivienne estava tombada na chaise diante do lar, com a bochecha apoiada em suas mãos e um edredom descolorido ao redor dela. O fogo minguante dava um brilho acolhedor a suas caras turvadas pelo sonho. Julgando pelo par de taças de chá meio vazias e o prato de louça sujo com miolos de bolacha que descansava no lar, Porta tinha feito bem sua promessa de manter ao Vivienne ocupada toda a tarde.

Caroline ainda se cambaleava ao saber que Julian era um vampiro e Adrian era um caçador de vampiros. Mas diminuindo aquelas revelações que não podiam comparar-se com o descobrimento mais assombroso de todos: Adrian não lamentava que Vivienne não o quisesse.

Durante anos jogando no teatro que faziam para seus pais tinha sido unida ao príncipe só porque era a maior e a mais alta de suas irmãs. Agora tinha encontrado finalmente a um homem serviçal com quem fazer o papel de princesa só para descobrir amargamente que não havia nenhum final feliz para eles dois.

Adrian tinha demonstrado ser tão desumano como Duvalier. Duvalier podia roubar almas, mas Adrian se escorreu por diante de toda sua defesa bem afiada para lhe roubar seu coração. Teve que fechar seus olhos contra uma quebra de onda de ansiedade quando recordou aqueles momentos em seus braços, em sua cama, quão únicos conheceria.

Estava à deriva mais profunda no quarto, suas sapatilhas sussurrando sobre o tapete Aubusson. Como um convidado honrado em um lanche, a caixa que continha o vestido do baile estava aberta e apoiada no sofá coberto por damasco, onde podia ser admirado melhor. Só fazia umas poucas horas havia estado tão loucamente apaixonada por sua beleza como suas irmãs. Agora só pensar nisso na pele comovedora do Vivienne a fez querer estremecer-se. Se o vestido fora não mais que uma coberta, então a caixa era um ataúde, preparado para ser cravada e fechada com todos seus sonhos dentro.

Ainda agora mesmo, algo sobre o resplendor do vestido ainda o fazia irresistível. Caroline a contra gosto passado as gemas dos dedos sobre o tule brilhante, perguntando-se sobre a moça que o tinha tido posto uma vez. Aceleraram-se os batimentos do coração de seu coração cada vez que Adrian entrava em um quarto? Havia sentido o desejo cada vez que lhe mandava um de seus sorrisos preguiçosos? Tinha acreditado que ele se precipitaria e a resgataria até aquele mesmo momento quando encontrou seu destino impensável nas mãos de um homem no que tinha crédulo uma vez, mas alguma vez tinha amado?

Caroline retirou sua mão do vestido, olhando a suas irmãs. Parecia só ontem que eram meninas, todas com os joelhos ralados e os cachos soltos. Agora vacilavam ao bordo de ser mulheres crescidas, ainda com seus lábios exuberantes encurvados na metade com pensativos sorrisos quando sonhavam com vestidos deliciosos e dança e formosos príncipes que as resgatavam de cada perigo.

Chegou ao ombro de Vivienne, determinada a sacudi-la daqueles sonhos e leva-la desse lugar antes que se convertessem em pesadelos. Mas algo parou sua mão.

Ainda podia ver o Adrian de pé naquela ponte, o vento soprando por seu cabelo. Inclusive embora não fora um homem que pedia, tinha visto o rogo em seus olhos. Pensou nos anos que tinha passado caçando ao Duvalier e a outros monstros como ele, a enormidade dos sacrifícios que tinha feito para proteger o segredo de seu irmão. Enquanto outros homens de sua idade e posição dançavam até a alvorada, perdendo suas fortunas, e seduzindo a mulheres casadas, ele tinha gasto os últimos cinco anos, banido de sua própria classe, vivendo nas sombras justo como as bestas que caçava.

O que faria ela se suas situações fossem investidas? Olhou fixamente a Porta quando brandamente acariciou o cabelo de Vivienne. Até onde chegaria para salvar as vidas de suas irmãs? Salvar suas mesmas almas?

Tinha acreditado que suas lágrimas estavam todas secas, mas se tinha equivocado. Podia as sentir picando em seus olhos quando se deu conta exatamente do que faria.

Algo. Algo, imperiosamente.

 

—Que quer dizer com que não posso ir ao baile? Como pode ser tão cruel?

Caroline olhou para baixo a Porta, endurecendo-se ante o olhar de dolorida indignação que viu nos olhos de sua irmã. Sentia-se duplamente cruel ao lhe atirar este golpe estando de pé em meio de sua habitação rodeada por uma colorida coleção de anáguas, cintas e laços. Vestida só com sua camisa e calcinhas, e com seu escuro cabelo penteado em alto com mechas frisadas, Porta se via de doze anos. A caixa aberta de pó de arroz que brilhava na cômoda podia ter sido pó de fadas, esperando a ocasião de transformar a uma difícil jovenzinha em uma formosa mulherzinha na noite de seu primeiro baile.

—Não estou sendo cruel —respondeu Caroline— Simplesmente estou sendo prática. Ainda tem que ser apresentada na corte, ou nunca terá uma apresentação adequada. Não seria adequado para ti aparecer em um baile devotado por um dos mais ilustres membros do Ton com seu cabelo recolhido e seu decote baixo.

—Mas tenho dezessete anos! —gemeu Porta— Se não me apresento logo, alcançar-me-á o momento de voltar a me encerrar novamente! —Seus olhos se esgotaram até formar duas frestas acusadoras— E além disso, você nunca teve uma apresentação adequada e ainda assim assistirá ao baile.

—Não tenho opção. Você irmã requer uma chaperona.

Porta olhou freneticamente ao redor da habitação, tratando de idear um novo argumento que lhe lançar.

—Não tem que ter medo de que te envergonhe. Uma das criadas ajudou a Vivienne e a mim e improvisei um perfeitamente respeitável traje de ornamento a partir de meu velho vestido de domingo —Tomou a familiar musselina azul a raias do respaldo de uma cadeira e a sustentou diante de seu peito para que Caroline pudesse admirá-la, lhe dedicando um sorriso esperançado— Não é formoso? Inclusive costuramos uma nova bandagem e uma capa extra de franzidos para esconder o muito que cresceu meu busto durante o ano passado. E só lhe dê um olhar a isto! —disse arrancando da cômoda uma meia máscara de papel marche decorada com um impertinente nariz rosa e largos bigodes felinos sustentando-a frente a sua cara— Julian a encontrou para mim em um dos apartamentos de cobertura do castelo.

Caroline ficou rígida. Desesperadamente desejava acreditar que Julian verdadeiramente tinha rechaçado seu destino, mas enquanto recordava a escuridão que se deu procuração de seus olhos e o brilho da lua refletido em suas garras, sentiu que sua confusão aumentava.

Recolhendo a máscara de mãos de Porta, Caroline a atirou novamente sobre a cômoda.

—Tudo é certamente precioso e estou segura de que terá ocasião de usá-lo muito em breve. Mas não esta noite.

Seu sorriso foi substituído por um tormentoso cenho, Porta lançou seu vestido sobre a cama em um descuidado montão.

—Não entendo que vai mal contigo. Desde que ontem foi em busca de Lorde Trevelyan não tornaste a ser você mesma. Em um momento está convencida de que poderia ser o mesmo demônio encarnado. E ao seguinte me está dizendo que tudo foi uma espécie de estúpido engano.

Caroline recolheu uma parte de encaixe da cômoda e o deu voltas ao redor de seu dedo, evitando o olhar de Porta.

—O que te disse foi que o Visconde e eu esclarecemos todos nossos mal-entendidos. Ele não é um vampiro e eu decidi que será um marido perfeitamente aceitável.

—Para o Vivienne? —Porta cruzou os braços sobre seu peito— Ou para ti?

Sentindo que suas bochechas se alagavam de cor, Caroline elevou bruscamente a cabeça para encontrar o olhar desafiante de sua irmã. Deveria ter antecipado isto. Apesar da diferença de idades, sempre se havia sentido mais próxima a Porta que a Vivienne. O que fazia que lhe mentir agora fora duplamente difícil.

—Para o Vivienne, é obvio, sua pequena gansa tola! Não sei por que sente a necessidade de pôr-se a voar sua imaginação com todas estas fantasias românticas quando não sabe absolutamente nada do que ocorre entre um homem e uma mulher.

—Se não me deixa ir ao baile, pode que nunca o descubra! Por favor, Caroline! —Porta uniu suas mãos, com um atrativo olhar suplicante capaz de derreter um coração de pedra— Quando disse ao Julian que as três estávamos acostumadas a praticar nossos passos de baile no salão do Edgeleaf, prometeu-me que me reservaria uma valsa.

Enquanto se imaginava a sua irmã dando voltas ao redor do salão de baile em braços do Julian, seus branquíssimos dente a só polegadas da vulnerável curva de sua garganta, a confusão do Caroline se converteu em um pânico total e absoluto.

Antes de poder deter-se, tinha agarrado a Porta pelo braço lhe dando uma forte sacudida.

—Não porá um pé fora desta habitação esta noite, jovenzinha. Se descobrir que o fez, enviarei-te de retorno ao Edgeleaf pela manhã e jamais voltará a posar seu olhar sobre o Julian Kane outra vez. Nem sobre nenhum outro homem.

Liberando do agarre pelo Caroline, Porta começou a afastar-se dela, com lágrimas banhando seus olhos.

—Porque, não é mais que uma criatura egoísta e odiosa! Quer que me converta em uma solteirona velha e ressecada como você, assim não terá que ficar reveste quando Vivienne se case com o homem que amas! —Dando-se volta, atirou-se de barriga para baixo sobre a cama e rompeu em dilaceradores soluços.

Até ontem, as palavras de Porta poderiam ter quebrado seu coração até o fundo. Mas hoje não. Caroline sabia que sua irmã era tão bondosa como impulsiva. Porta logo lamentaria suas duras palavras, se já não o fazia.

Embora não desejava outra coisa que afundar-se na cama e massagear os ombros de Porta até que minguassem suas violentas sacudidas, Caroline se forçou a se mesma a dá-la volta e sair da habitação.

—Sinto muito, pequena —sussurrou, fechando gentilmente a porta detrás dela— Possivelmente algum dia o compreenda.

Encolheu-se ante o som de um pouco pesado que soava suspeitosamente como uma bota jogada contra a porta fechada detrás dela, lhe advertindo que talvez “esse dia” poderia não chegar tão rapidamente como esperava.

 

—Uma criada me alcançou sua nota. Desejava conversar?

Caroline se deu a volta lentamente na banqueta da penteadeira para encontrar-se com Vivienne parada na entrada da torre, vendo-se absolutamente radiante embelezada com os presentes do Visconde.

O sombreado rosa do tule, da saia, do vestido de baile realçava o rubor de suas bochechas, enquanto que o camafeu que descansava entre a curva de seus seios enfatizava sua própria perfeição marfim. A infaltavel rosa branca luzia detrás de sua orelha direita. A segunda vista, Caroline decidiu que sua irmã se via um pouquinho muito radiante. Seus olhos brilhavam muito, suas bochechas também estavam excessivamente ruborizadas. Enquanto Caroline a observava, uma das pálidas e finas mãos de Vivienne, saiu disparada para seu cabelo, alisando a cascata de cachos dourados que já tinham começado a pentear ao redor de seu cocuruto com uma cinta de cetim rosa adornada com um penacho de plumas de avestruz brancas.

—por que não está vestida? —Vivienne mirou com evidente desconcerto ao Caroline que tinha posto um vestido de veludo e tranças— É quase a hora de baixar para o baile.

Caroline se levantou da banqueta, sentindo-se insolitamente acalmada enquanto se deslizava para sua irmã.

—Não se preocupe. Ainda temos muito tempo. Porta ainda está zangada?

Vivienne suspirou.

—Não ouvi nem um ruído proveniente de seu quarto em mais de uma hora. Desejaria que cedesse e a deixasse baixar para ao menos participar de um baile.

—Nada eu gostaria mais, mas simplesmente não seria apropriado —Nem prudente. Pensou Caroline seriamente, imaginando novamente a sua irmã pequena dando voltas pelo salão de baile em braços do Julian— Porta é jovem. Tenho confiança de que se recuperará desta terrível tragédia. Para a semana que vem provavelmente nem sequer se lembre por que estava tão zangada comigo. Além disso, supõe-se que esta é sua noite especial, não a dela.

Vivienne pressionou uma mão contra seu estômago.

—Será por isso que sinto como se me tivesse tragado um bando inteiro de morcegos.

—Tive o pressentimento de que poderia estar um pouco ansiosa, assim chamei para que trouxessem algo que acalmasse seus nervos.

Dando as costas a Vivienne, Caroline serve uma taça de lhe da bandeja que havia sobre a mesa próxima à cama, sua mão perfeitamente firme. O medo a que sua irmã pudesse recusar seu oferecimento se esfumou quando lhe arrebatou a taça da mão e a esvaziou em três sorvos agradecidos.

—Não posso imaginar por que estou tão nervosa —Vivienne adiantou para ela a taça reclamando que lhe servisse mais— Não é como se nunca tivesse concorrido a um baile de máscaras antes.

 —Mas nunca antes tinha recebido uma proposição de um próspero Visconde— Caroline tomou gentilmente a taça da mão de sua irmã e a deixou na bandeja ao lado de uma garrafa aberta de láudano.

Em menos de um minuto Vivienne se afundou no bordo da cama, o brilho de entusiasmo de seus olhos lentamente substituído por uma expressão vidriosa.

Caroline se sobressaltou quando tomou a mão e a atraiu para a cama perto dela.

—Caro, acredita que alguma vez poderá me perdoar? —Seu lábio começou a tremer enquanto esquadrinhava o rosto do Caroline.

—por que razão? —Perguntou Caroline, desconcertada pelo rogo de sua irmã. Especialmente quando era ela a que deveria estar suplicando seu perdão

—Por isso! —A mão do Vivienne bateu as asas sobre o brilhante tule de sua saia— Enquanto estava em Londres, vivendo a vida que deveria ter sido tua, você estava apanhada no Edgeleaf, furtando batatas extras para o prato de Porta e tratando de economizar um xelim de cada dois meios penes. Tire-te o carinho da tia Marietta. Tire-te sua apresentação em sociedade. Tire-te todos os formosos vestidos e sapatilhas que mamãe tinha feito para ti. Porque, se você tivesse ido a Londres em meu lugar, esta noite o Visconde poderia estar te fazendo uma proposição a ti.

Por um penoso instante Caroline não pôde respirar, muito menos responder.

—Já está, querida —finalmente as arrumou para murmurar— Não precisa ocupar sua linda cabecinha com nada disto agora.

Vivienne descansou essa cabecinha contra o ombro do Caroline, sua voz desvanecendo-se a um impreciso sussurro.

—Querida, doce Caroline. Espero que saiba que sempre haverá um lugar para ti em meu coração e em meu lar —caindo para trás sobre os travesseiros, ocultou um bocejo detrás de sua mão— Uma vez que estejamos casados, possivelmente Lorde Trevelyan até possa encontrar um marido para ti —seus olhos bateram as asas até fechar-se— Algum viúvo solitário com dois ou… três… filhos… que… necessitem… uma… —se foi para trás, um delicado ronco escapando de seus lábios separados.

Com o dourado leque de suas pestanas descansando sobre suas bochechas e uma sonolenta meia sorriso curvando seus lábios, era novamente uma princesa encantada, perfeitamente contente de sumir-se no sonho até que despertasse o beijo de seu príncipe.

—Dorme, querida —sussurrou Caroline, depositando um beijo na frente de sua irmã ao tempo que gentilmente tirava a rosa branca de detrás de sua orelha e passava a cadeia do camafeu por cima de sua cabeça— Sonha.

Não havia nada que adorasse mais Ton que um baile de máscaras. Por uma noite mágica eram livres de deixar de lado os rígidos róis que se viam forçados a adotar pela sociedade e se convertiam em qualquer pessoa —ou coisa— que desejassem ser. Uma vez que se colocavam as elaboradas mascassem, podiam converter-se em Virgem ou Vikingo, ovelha ou leão, camponês ou príncipe. Enquanto passeavam entre a multidão do grande salão do castelo, seu picaresco festejo recordava os festivais pagãos das noites de meios do verão de antigamente quando cada homem era um pirata e a virtude de nenhuma mulher estava a salvo.

Seu anfitrião observava do balcão, seus amplos dedos curvados ao redor de uma delicada taça de champagne, como uma pastora mascarada corria entre a multidão, perseguida por um centauro de olhar impudico. Ela se encolheu entre risadas quando ele capturou seu cajado e a arrastou a seus braços. Dobrando-a por sobre seu braço, assaltou sua boca com um comprido e profundo beijo. Chegou-lhe o som da ovação aprobatória da multidão, obrigando ao centauro a endireitar-se e fazer uma reverência em tanto a ruborizada pastora paralisava em um fingido desmaio. Adrian tomou um sorvo de champagne, lhes invejando o despreocupado jogo amoroso.

A parte de uma fila de cadeiras alinhadas na parede sul, cada peça de mobiliário tinha sido retirada do grande salão, restituindo à cavernosa câmara seu austero esplendor medieval. De acordo a suas ordens, os lacaios tinham enrolado e se levaram as pesados tapetes turcos, deixando exposto o piso de laje para o baile. Uma orquestra completa vestida como monges beneditinos, com hábitos singelos e tonsura na cabeça, achava-se sentada em uma plataforma se localizada em uma esquina, as exuberantes nota de um concerto do Mozart fluindo de seus instrumentos.

O suave brilho dos abajures Argand tinha sido substituído por tochas recobertas de alcatrão dispostas em candelabros de ferro. As sombras se agrupavam debaixo das vigas da abóbada do teto da torre, essa turva concentração somando-se para incrementar a aura de mistério e ameaça que revestia ao salão.

Adrian esquadrinhava cada máscara, cada rosto, procurando uma pista de sua presa. A errática transição de sombras e luz de tocha parecia transformar a cada olhar brilhante em um resplendor predatório, a cada sorriso em uma careta sinistra, a cada homem em um potencial monstro.

—OH, céus. Esqueci que isto supostamente era uma Mascarada —brincou Julian enquanto se aproximava. Estendeu sua fluida capa negra e deu um instável giro para que Adrian o visse, mostrando um par de presas marfim que era óbvio que tinham sido fabricados com cera.

—Não é gracioso —cuspiu Adrian, que como única concessão à ocasião luzia um simples domino negro. Tinha desafiado às convenções, evitando usar o acostumado casaco da cor de alguma pedra preciosa e calças marrons para luzir uma jaqueta formal negra, camisa negra e calças negras, todos desenhados deliberadamente para ajudá-lo a deslizar-se entre as sombras sem ser detectado.

Julian arrebatou uma borbulhante taça de champagne da bandeja de um lacaio que passava por ali.

—E que disfarce me tivesse aconselhado usar? Um alado querubim, possivelmente? O Arcanjo Gabriel?

Adrian terminou a taça de champagne que tinha na mão e a devolveu à bandeja, seu cenho tão franzido que foi suficiente para que o lacaio saísse voando pelas escadas.

—É possível que queira te conservar sóbrio esta noite no caso de Duvalier decidisse aparecer por aqui, atrai-lo é só a metade da batalha. Ainda temos que capturá-lo.

—Não há por que preocupar-se. As damas me hão dito que ainda depois de me beber uma garrafa… ou duas de champagne me conservo excepcionalmente sóbrio —Julian lhe uniu no corrimão do balcão, observando à multidão de abaixo através de suas pálpebras cansadas— Duvido que tenhamos que nos inquietar a respeito de que Duvalier apareça. Sem Vivienne para persuadir o de que se deixe ver, provavelmente se tenha miserável justo de volta ao inferno que o engendrou —olhou ao Adrian de flanco, apesar de seus melhores intentos por disfarçá-lo um brilho de esperança aparecia detrás de seu cinismo— Não posso evitar notar que as irmãs Cabot ainda não fugiram de nossas nefastas garras. Crê que exista alguma possibilidade de que seu Miss Cabot permita a Vivienne nos ajudar?

—Não ouvi nada dela em todo o dia —respondeu Adrian, o champagne sabendo repentinamente amargo em sua língua— E ela não é minha Miss Cabot. Depois de ontem à noite provavelmente nunca o seja.

—Sinto-o por isso —disse Julian, seu despreocupado tom suavizando-se com uma nota mais séria.

—por que deveria senti-lo? O único culpado sou eu —Adrian levantou sua taça para o Julian em um irônico brinde— Incluso como vampiro, é melhor homem que eu. Arrumou-lhe isso para controlar seus apetites, enquanto que eu permiti que minha fome de uma moça de língua aguda e olhos cinza pusessem em perigo tudo o que tentei proteger os últimos cinco anos, incluindo a alma de meu próprio irmão.

—Ah, mas que valor tem a alma de um homem em comparação com as fabulosas riquezas do coração de uma mulher? —roubando a taça da mão do Adrian, Julian a levou aos lábios e se bebeu todo seu conteúdo.

Adrian soprou.

—falaste como um verdadeiro romântico. Realmente deveria deixar de ler tanto ao maldito Byron. Está te apodrecendo o cérebro.

—Ah, não se —murmurou Julian, seu olhar subitamente transfigurada dirigida para as portas dobre no extremo mais longínquo do grande salão, onde Wilbury se dedicava à tarefa de anunciar aos que foram chegando— Não foi Byron o que escreveu:

“Ela caminha em beleza, como a noite

De climas sem nuvens e céus estrelados;

E todo o melhor da escuridão e a luz

Se reúne em seu aspecto e em seus olhos”

Adrian seguiu o olhar de seu irmão para as portas onde uma remota visão com uma máscara de cor dourada e tule rosa, com uma rosa branca detrás de sua orelha, estava esperando pacientemente que Wilbury girasse para seu lado.

Adrian só podia sentir-se agradecido de já não estar sustentando sua taça de champagne porque indubitavelmente tivesse pulverizado seu frágil pé. Suas mãos se curvaram ao redor da balaustrada, aferrando-se como se fora o corrimão de um navio que se afunda.

— Que acontece, querido irmão? —perguntou Julian, denotando diversão em sua voz— Parece que tivesse visto um fantasma.

 Mas esse era precisamente o problema. Adrian nunca poderia ter confundido à mulher da entrada com uma trágica sombra de seu passado. Não tinha vindo a espantá-lo, a não ser a tentá-lo com um futuro que nunca poderia ter. Poderia estar usando o vestido de uma mulher morta, mas a vida vibrava em cada polegada de sua deliciosa pele, desde suas baixas sapatilhas até seus orgulhosos ombros, até a decidida inclinação de seu queixo. Examinou o salão com a graça régia de uma jovem rainha, seus olhos cinza rasgados como os de um gato atrás do escudo que lhe brindava a máscara.

Julian e ele não foram quão únicos notaram a chegada da encantadora criatura. Um sob murmúrio tinha começado a elevar-se de seus convidados, eclipsando inclusive as últimas notas triunfais do concerto.

Devido ao rugido em seus próprios ouvidos, tomou ao Adrian um momento dar-se conta de que seu irmão se estava rindo. Rendo-se com uma alegria acalmada que Adrian não tinha escutado em cinco anos.

Virtualmente lívido da fúria, Adrian o rodeou.

—De que demônios te está rindo?

Julian se limpou seus olhos transbordados pelas lagrimas.

—Não vê o que tem feito a pequena garota inteligente? Nenhuma só vez olhou a Vivienne como a está olhando a ela neste momento.

—Como se queria estrangulá-la? —grunhiu Adrian.

Julian ficou sério antes de dizer brandamente.

—Como se queria tomá-la em seus braços e nunca deixá-la ir enquanto ficasse um pouco de fôlego no corpo.

Adrian queria negar as palavras de seu irmão, mas não pôde.

—Não te dá conta? —perguntou Julian— O que mais deseja Duvalier é destruir o que você ama. Quando escutar sobre isto, se estiver a menos de cinqüenta léguas deste lugar, não vai poder resistir a vir. Simplesmente por aparecer no baile, Caroline acaba de dobrar nossas possibilidades de capturá-lo.

Adrian voltou a apoiar-se no balcão, sua fúria tinta com um crescente pânico. Se Julian tinha razão, seu amor podia muito bem custar a vida a Caroline. Justo como a havia feito a Eloisa. Finalmente tinha tido êxito em tender sua armadilha, só para dar-se conta de que suas mandíbulas de aço se fecharam limpamente sobre seu próprio coração.

Deu-se volta e começou a baixar os degraus com um enérgico passo.

—aonde vai? —chamou-o Julian desde atrás.

—A lhe tirar esse maldito vestido.

—Brindarei por isso —murmurou Julian, lhe fazendo gestos a um lacaio que levava uma bandeja cheia de taças de champagne.

—Seu nome? —Ladrou Wilbury, sua librê vermelha e sua mofada peruca o faziam parecer como se tivesse escapado da guilhotina recentemente.

—Miss Vivienne Cabot —respondeu Caroline, olhando para frente.

Wilbury se aproximou, espiando dentro dos olhos da máscara.

—Está segura disso? Quase poderia jurar que há algo em você que lhe confere um ar de impostora.

Caroline se voltou a olhá-lo.

—Acredita que não sei meu próprio nome, senhor?

Sua única resposta foi um “harrumph” cético.  

Como continuava olhando-o, esclareceu-se garganta emitindo um som que se aproximava de um gorgogeo de morte, requereu atenção e coaxo.

—Miss Vivienne Cabot!

Caroline levantou o queixo para enfrentar o ávido escrutínio da multidão, desejando sentir-se tão tranqüila e composta como se via. Não podia evitar perguntar-se se possivelmente Duvalier já se encontrasse entre eles, sua turva intenção encoberta por algum engenhoso disfarce. Mas enquanto olhava as caras curiosas, seu olhar foi apanhado e sustentado por um muito familiar par de olhos de cor caramelo.

Estava segura de que seu disfarce era o suficientemente convincente para enganar a aqueles que tinham conhecido casualmente a sua irmã em Londres, mas se tinha esquecido que havia um homem ao que não seria tão singelo fraudar. Os olhos vigilantes do Larkin se estreitaram, com o desconcerto neles convertendo-se em suspeita enquanto se desculpava de sua companhia e começava a abrir-se caminho através da multidão.

Caroline se lançou à multidão, pensando só em escapar. Enquanto esquivava a uma cigana que adivinhava a fortuna e se agachava para passar a uma mulher que levava a cabeça da Maria Antonieta sob seu braço, uma solitária pluma de pavão comichão seu nariz, forçando-a a fazer uma pausa o suficientemente larga para recuperar o fôlego.

Antes que pudesse ficar novamente em movimento, a mão do Larkin se fechou ao redor de sua cintura com a mordida implacável de umas frias algemas de aço.

Deu-lhe a volta de um puxão para que o enfrentasse, não havendo lhe proibido luzir sua estreita cara por não levar máscara.

—Que pensa que está fazendo, Miss Cabot? Que demônios tem feito com sua irmã?

—Não feito nada com ela —insistiu Caroline, tratando de não gaguejar pela culpa— Simplesmente não se sentia o suficientemente bem para assistir ao baile.

—Deus querido —sussurrou, baixando a vista da rosa em seu cabelo para seu vestido— Conheço este vestido… este colar… —estirou sua mão para atirar do camafeu, seus dedos tremendo visivelmente— Eloisa estava usando este vestido a noite que nos conhecemos no Almack’S. E Adrian lhe deu de presente este camafeu para seu décimo oitavo aniversário. Levava-o a última vez que a vi. Nunca o tirava. Jurou que o levaria sobre seu coração até o dia de seu… —seu olhar retornou a sua cara— Como conseguiu estas coisas? Acaso ele as deu?

—Posso lhe assegurar que está imaginando muitas coisas por causa de um velho vestido e um punhado de bagatelas que minha irmã encontrou no apartamento de cobertura.

—Também estou exagerando a respeito da forma em que acaricio sua bochecha a noite que Vivienne ficou doente? Sobre a forma em que a olhe quando pensa que ninguém o está observando? —Larkin a aproximou mais ainda, acerada-a resolução em seus olhos impregnando-a até os ossos— Se tiver estado aliada ao Kane todo este tempo confabulando para lhe fazer algum machuco ao Vivienne, juro que os verei ambos apodrecendo-se no Newgate antes que possam fazer algo.

Infelizmente consciente do interesse encantado que estava gerando seu pequeno drama, Caroline sorriu através de seus dentes apertados.

—Não há necessidade de me conduzir à força, senhor. Se deseja dançar, só tem que pedi-lo.

—Dançar? —Vaiou Larkin— É que perdeu a razão, mulher?

Caroline estava lutando para liberar o pulso de seu implacável agarre quando uma ameaçadora sombra caiu entre os dois.

—me desculpe, companheiro —grunhiu Adrian— Acredito que a dama me prometeu este dança .  

 

  Umas notas elevando-se de uma valsa vienense, um giro vertiginoso e Caroline estava novamente no único lugar ao que tinha temido não voltar jamais, nos braços do Adrian. Pela esquina de seu olhar viu o Larkin sacudir sua cabeça com desgosto antes de dá-la volta e afastar-se, com sua larga pernada abriu uma brecha através da multidão.

Seu alívio foi de breve duração. Quando inclinou sua cabeça para encontrar-se com os olhos fixos do Adrian, seu olhar fazia que a ameaça do Newgate fora igual a passar um fim de semana em um balneário do Bath.

—Só me diga onde esta sua irmã? —demandou—. Inconsciente e atada dentro de algum roupeiro?

—te remoa a língua! Nunca rebaixaria a uma traição tão baixa. —Vacilou um momento antes de soltar impulsivamente —Se tiver que sabê-lo, droguei-a.

Adrian elevou sua cabeça gargalhando-se, recebendo olhados de esguelha de um sultão turco e de uma garota do harém que giravam além deles na valsa.

—Minha querida Senhorita Cabot, me recorde nunca subestimar sua crueldade uma vez que dita deixar de lado seus entusiastas escrúpulos e fazê-lo a sua maneira.

—Estou segura que não se pode comparar com a sua, meu lorde, —respondeu docemente—. Duvalier poderia estar nos observando, como sabe, —precisou enquanto a dirigia em outro intrincado giro de baile, com seu forte emano estendida sobre a delicada curva de suas costas—. Você deveria estar me observando como se desejasse me fazer o amor, não me estrangular.

—E se desejo fazer ambos? —replicou, suas resolvidas palavras enviaram um estremecimento de calor que desço por sua coluna.

Sua graça natural lhe serve tão bem, para o baile, como quando se fez cargo dos rufiões no Vauxhall. Inclusive com sua mão descansando tão ligeiramente sobre seu ombro, Caroline podia sentir o movimento fluido de seus músculos sob o tecido de cachemira de seu casaco.

Ele franziu o cenho ao observar o ramalhete de cachos dourados que brotava da parte superior do meio turbante rosa acetinado que levava ao redor de sua cabeça.

 —Esse não é seu cabelo.

Caroline franziu o nariz desdenhosamente.

—Minha irmã tem cachos em abundância. Não acreditei que lhe importasse se tomava emprestados uns quantos.

Seu olhar fixo baixou até mas, examinando audazmente o generoso decote revelado pelo pescoço desço de seu vestido.

 —E esses não são seus…

—Claro que o são! —Caroline dirigiu seu ultrajada olhar para baixo—. Se surpreenderia do que se pode conseguir simplesmente lhe pedindo à donzela que aperte as cintas de seu espartilho. Além disso, não era como se tivesse outra opção, —admitiu envergonhada—. Em caso de que não o tenha notado, estou carente nessa área em comparação com minhas irmãs.

—Fiz mais que notá-lo, —murmurou, seu possessivo olhar lhe recordando que só a noite anterior tinha ajustado seus cálidos dedos ao redor de seu peito nu, reclamando-o para si—. Posso lhe assegurar que de quão único carece é de uma boa dose de sentido comum. Se tivesse algum, não tivesse preparado esta perigosa pequena charada.

—Não é esse o objetivo de uma mascarada? Converter-se em algo que não se é? —Devolveu-lhe seu desafiante olhar com uma própria—. Eu poderia ser esta noite Vivienne ou Eloisa para você. Qual preferiria ter em seus braços? A quem preferiria lhe fazer o amor se acreditasse você que Duvalier nos olhava neste preciso momento?

Sem perder um só passo de baile, Adrian se inclinou perto de seu ouvido e lhe murmuro,

—A você.

As firmes pernadas do Larkin o levaram fora do Grande salão e a subir as escadas, as notas da valsa se desvaneceram em um eco fantasmal. Até seguia emocionado por ter visto o Caroline levar o camafeu da Eloisa. Nunca tinha esquecido como o encantador rosto da Eloisa se acendeu a noite de seu aniversário dezoito quando Adrian os tinha apresentado. Ao observar como Adrian grampeava o colar ao redor de seu bonito pescoço, Larkin tinha deslizado seu obséquio, um belo volume dos sonetos do Blake, de retorno ao bolso de seu casaco.

Sua resolução vacilou justo para fora da porta da sala de estar do Vivienne e Porta. Agora que tinha alcançado seu destino, deu-se conta de quão impróprio era o estar à espreita perto da porta da recamasse de uma jovem dama sem sequer um acompanhante ou criada à vista.

Esclarecendo-a garganta torpemente, bato na porta com um forte golpe.

 —Senhorita Vivienne?, —disse em voz alta—. Senhorita Porta? É Constable Larkin. Queria falar umas palavras com vocês se me permitirem isso.

Só o silêncio respondeu a sua petição.

Jogou uma olhada para ambos os lados do corredor, depois probo o pomo. A porta se abriu facilmente ao empurrá-la.

A sala de estar estava deserta, a chaminé apagada. A porta da recamasse de Porta estava fechada, mas a porta do Vivienne estava entreaberta. Incapaz de resistir um convite tão evidente para investigar, Larkin cruzo a sala de estar e abriu a porta umas polegadas mais. Embora uma vela estava acesa sobre a penteadeira, um ar de abandono se aferrava à habitação.

Larkin sabia que não tinha nenhum direito a estar farejando, mas a tentação era quase muito capitalista. O delicado perfume de lilás do Vivienne o atraiu para a habitação como o mais potente dos afrodisíacos. Julgando pela urgente resposta de seu corpo, parecesse ser que tinha entrado nos proibidos reino do harém de um sultão.

A coberta da penteadeira era uma encantadora confusão de pós, ungüentos, e outras misteriosas poções consideradas indispensáveis na busca do evasivo ideal de beleza feminina. No que concernia ao Larkin, Vivienne não requeria de nenhuma delas. Uma meia de seda tinha sido lançada descuidadamente sobre a banqueta da penteadeira. Deslizou a ponta de seus dedos sobre o delicado material, tentando não imaginar-se ao Vivienne sentada sobre essa mesma banqueta deslizando a meia sobre uma de suas cremosas panturrilhas. Tentando não imaginar-se percorrendo com seus lábios esse mesmo caminho até alcançar a sensível covinha detrás de seu joelho.

Larkin retirou sua mão, apavorado por sua falta de auto controle. Estava- dando a volta para ir-se quando descobriu a nota que jazia sobre o penteadeira. Uma nota escrita com uma precisa letra feminina.

Esta vez subiu os degraus de dois de uma vez, temendo o que se encontraria subindo justo junto a ele. Sem preocupar-se com tocar, irrompeu na torre norte.

Seus passos se fizeram mais lentos conforme se aproximo da cama do Caroline. Os cortinados estavam corridos como o pano de fundo de um cenário preparado para executar o ato final. Embelezada com um vestido de veludo esmeralda, Vivienne estava reclinada sobre suas costas nos travesseiros, os magros dedos  de sua mão como de menina, encolhidos perto de sua bochecha. A respiração do Larkin se estabilizou enquanto observava seu peito subir e descer em doce repouso.

Recostou-se sobre uma das colunas da cama, deslizando uma mão tremente sobre sua queixada. Parecia que devia uma desculpa ao Caroline. Talvez Vivienne realmente não se havia sentido o suficientemente bem para assistir à mascarada. Talvez se tinha retirado aos aposentos do Caroline na torre para escapar do alvoroço e ruído que emanavam do Grande salão. Talvez inclusive tinha encontrado o vestido e o camafeu no apartamento de cobertura e tinha insistido em que Caroline os usasse, sem dar-se conta de que uma vez tinha pertencido a outra mulher, a qual Kane tinha amado.

Embebido na angélica pureza de seus rasgos, suspirou. Teria estado contente de poder ficar e guardar seu sonho pelo resto da noite. Mas se algum dos criados tropeçava com ele, haveria graves conseqüências para sua reputação.

Deslizou brandamente o edredom para cobri-la, decidido a atrasar-se só o necessário para adicionar outra pá de carvão ao fogo.

Uma taça de chá vazia repousava sobre a mesinha junto à cama, junto a um frasco sem etiqueta. Seus instintos se ativaram de novo, Larkin desentupiu o frasco e o cheirou com suspeita. Tomou pouco mais que um odor da doçura acre para que reconhecesse seu conteúdo.

—Malditos sejam, —murmurou, fechando o frasco e devolvendo-o à mesa—. Malditos sejam ambos.

Sentou-se junto ao Vivienne afundando o colchão de plumas, sem que lhe importasse mais o que os criados poderiam pensar se eram descobertos.

Tomando-a pelos ombros, deu-lhe uma gentil sacudida.

 —Vivienne! Vivienne, querida, dormiu bastante tempo. Tem que despertar agora!

Removeu-se, um gemido sonolento escapo de seus lábios. Seus olhos se abriram e fecharam. Era muito tarde para que Larkin pudesse cobrir suas facções com indiferença. Tudo o que pôde fazer foi esperar, o grito horrorizado que sem dúvida viria uma vez que descobrisse quem estava com ela na cama, olhando-a com o coração aparecendo por seus olhos.

Tomou um atordoante momento dar-se conta de que ela devia seguir sonhando, porque aproximou uma mão até sua bochecha, seus lábios se curvaram lentamente em um terno meio sorriso, e murmurou:

—Porta sempre me disse que meu príncipe viria.

 

Caroline fechou seus olhos, ruborizada, sem fôlego e enjoada, não pelo movimento giratório da valsa, mas sim por seu sangue que corria apressado desde sua cabeça até outros rincões muito mais imprudentes de seu corpo. Quase desejava poder desvanecer-se nos braços do Adrian para que então a tirasse pelos braços do salão e fazer todas as coisas ternas e travessas que secretamente desejava mas que nunca poderia ser o suficiente atrevida para exigir.

Nenhuma de suas infantis fantasias a tinha preparado para este momento. Já não era mais a irmã sensível, satisfeita só olhando desejosamente enquanto suas irmãs se uniam à dança da vida. Em seu lugar, era a que dirigia os olhares de todos no salão, a que girava ao redor da pista em braços de seu magnífico homem.

Sua mão acariciou suas pequenas costas, impulsionando-a a aproximar-se até mais, tão perto que seus seios doeram por escapar do confinamento tortuoso de seu espartilho cada vez que se esfregavam contra as lapelas engomadas de seu fraque.

—Se quiser você montar uma representação para o Duvalier, Não deveríamos fingir que estamos de novo no Vauxhall? —sussurrou Adrian, sua voz vibrando com urgência. Com seu polegar esfregando o centro de sua palma, seus lábios acariciando o sensitivo lóbulo de sua orelha, provocando um estremecimento de desejo em sua matriz—. Não esqueci que pequena atriz tão convincente pode ser. Ainda lembrança o som de seus suspiros, o sabor de seus lábios, a forma em que se aferrou para mim como se nunca desejasse deixar ir.

Outros bailarinos começaram a lhes deixar espaço. Alguns tinham parado de dançar ao mesmo tempo e estavam estirando seus pescoços para olhar boquiabertos a escandalosa exibição. Os convidados do Adrian tinham assistido ao Trevelyan Castle esperando alguma classe de espetáculo, mas não esta fogosidade.

—Seus convidados… —se arrumou finalmente para ofegar—. Estão nos observando.

—Não era isso o que você desejava? Não veio esta noite para que Duvalier a visse? Para que pudesse acossá-lo com sua beleza? Para que pudesse fazer arder sua ímpia luxúria e convertê-lo em um homem pela metade de desejo por você?

O morno veludo dos lábios de Adrian roçou a curva de sua garganta, ela soube por instinto que já não falavam do Duvalier. Na verdade, nenhum vampiro, ao menos ardiloso, poderia lhe expor um perigo como este homem o era. Duvalier podia só conseguir que seu coração deixasse de pulsar, Adrian possuía o poder de rompê-lo em mil pedaços, deixando-a para caminhar pelo resto de seus dias com os fragmentos quebrados alojados em seu peito.

Cravando seus dedos em seus ombros para evitar derreter-se contra ele em completo abandono, disse:

—Vim aqui esta noite para ajudar ao Julian. Para ajudar a você.

Adrian voltava a olhá-la fixamente, seus olhos ardendo com desejo e cólera.

—E como se propõe fazer isso? Conseguindo que assassinem seu parvo ser? Esta usando o vestido da Eloisa. Deseja ter seu mesmo destino?

—Claro que não! Sei que você me protegerá. Jurou que era o suficiente forte para proteger a Vivienne, Ou não? Como pode você prometer que protegerá a minha irmã, mas não confiar em que poderá me manter a salvo?

A música aumentou em um crescendo. Mas Adrian a manteve cativa contra o musculoso comprido de seu corpo, abandonando toda pretensão de dançar.

—Porque não perco minha inteligência cada vez que Vivienne entra em uma habitação. Não me sacudo e dou voltas cada noite em minha cama sonhando lhe fazendo o amor. Ela não me distrai com suas intermináveis perguntas, sua incessante curiosidade, suas atordoadas intrigas. —sua voz se elevou—. Posso confiar em mim mesmo para proteger a sua irmã porque não estou apaixonado por ela.

Suas palavras ecoaram contra as vigas, lhes advertindo muito tarde de que tanto a valsa como a música tinha terminado. Caroline dirigiu um olhar envergonhado a outros bailarinos, esperando descobrir que cada olhar no salão estava cravado neles. Mas estranhamente, os convidados pareciam ter sido distraídos por uma nova chegada.

Enquanto seus sobressaltados murmúrios se convertiam em um audível zumbido, Caroline seguiu a direção de seus olhares até a porta. Seu coração se afundou até suas sapatilhas quando reconheceu a magra figura embalada nos braços de um homem cujos olhos entrecerrados prometiam justiça e castigo.

Só alcançou a olhar brevemente a expressão atordoada de sua irmã antes que Constable Larkin pressionasse o rosto do Vivienne contra seu ombro, economizando a de ser testemunha um minuto mas do sórdido espetáculo que ela e Adrian acabavam de fazer de si mesmos.

 

O silêncio dentro da biblioteca do castelo era o pior som que Caroline tivesse podido escutar. Passeava-se de um lado a outro diante da porta, retorcendo um lenço entre suas mãos intumescidas. Quando Adrian tinha escoltado à pálida Vivienne dentro da habitação, Caroline esperava escutar os terríveis soluços de um coração destroçado, enquanto gritava amargas recriminações. Mas embora, tinha passado quase uma hora, nem uma choramingação tinha escapado do quarto. Possivelmente Vivienne tinha decidido sofrer esta traição, como tantas outras coisas que lhe tinham passado em sua vida, em silêncio.

  —Não deve estar sozinha ali com ele. Requerem uma acompanhante —murmurou Larkin, enquanto lançava ao Caroline um intenso olhar acusador que lhe recordou o miseravelmente que ela tinha falhado. Em lugar de proteger o generoso coração de sua irmã, tinha-o quebrado.

  O oficial estava recostado contra a parede oposta, sua postura casual era desmentida pelo aço de seus olhos. Tinha vindo em um sopro quando Adrian tinha insistido em arrebatar a Vivienne de seus braços e levá-la fora dos olhos entremetidos de seus aturdidos convidados. 

—depois de tudo o que lhe hei dito, —disse Caroline, — você ainda não pode acreditar que lhe faria algum dano. Não foi o que lhe deu essas gotas de láudano. Fui eu. —Larkin agitou sua cabeça. —Você realmente pensa que eu posso acreditar que Víctor assassinou Eloisa a sangue frio, e converteu ao Julian em alguma classe de monstro? Que esse tal Kane é um caçador de vampiros e ele e Julian se aconteceram os últimos cinco anos rastreando ao Víctor por todos os extremos da terra? Por que, eu nunca ouvi semelhante conto! 

—Eu pensei o mesmo quando Adrian me disse isso pela primeira vez, mas Julian me mostrou…—Caroline arrastou seus pés fora da habitação, enquanto retorcia seu lenço em um novo nó. Não podia esperar nenhum tipo de ajuda nesse quarto. Embora tinha posto aos serventes a que o buscarão, desde que se apresentou de forma tão pouco cerimoniosa, Julian não foi encontrado por nenhuma parte.

Desesperada por convencer Larkin que estava dizendo a verdade, tanto no concernente ao Adrian e como ao seu, procurou seus olhos diretamente.

—Não foi você o que uma vez me desafiou a confiar em algo além da lógica?

Ele a olhou fixamente sob seu largo nariz, sua expressão pedregosa não se abrandou nenhum pingo.

—Seria mais fácil para você acreditar que eu sou o tipo de mulher que narcotizaria a sua irmã com o único propósito de roubar seu pretendente para um tórrido interlúdio?

Continuou-a olhando por um momento mais, antes de soltar um relutante suspiro de derrota. —Suponho que isso é ainda mais absurdo, não?

  Sem advertência alguma, a porta da biblioteca se abriu. Caroline girou quando Adrian surgiu das sombras do quarto. Em algum pequeno rincão de seu coração tinha esperado que ele viesse andando a pernadas por essa porta, arrastasse-a a seus braços, e apagasse cada um de seus temores e penas com seus beijos. Mas essa esperança morreu quando viu sua cara. O amante apaixonado do grande vestíbulo tinha desaparecido tão certamente como se tivesse sido uma invenção de sua imaginação, tão irreal como um dos Tritões de Porta ou um nobre príncipe.  

—Adverti-te sobre o Duvalier,—disse e seu inescrutável olhar passou apenas sobre Caroline. —disse-lhe tudo. —Embora Larkin se endireitou como se nada gostasse mais que confrontá-lo, Adrian se aproximou furtivamente seguindo reto , além de onde se encontrava e baixou o corredor, o clique dos calcanhares das botas que calçava ecoaram de detrás dele.

  Caroline não tinha tempo para meditar sobre seu desprezo deliberado, não com a porta aberta da biblioteca a atraía.

Larkin lhe jogou um olhar incerto.

—Quer que eu …

Antes que pudesse terminar, Caroline agitou sua cabeça. A última coisa que merecia era o companheirismo ou a simpatia do oficial. Já não podia demorar mais o momento que tinha estado temendo.  Introduziu-se na biblioteca, e fechou silenciosamente a porta atrás dela.

  

Vivienne estava sentada na turca de couro diante do fogo, a saia verde esmeralda que Caroline vestia se acomodou em forma de leque ao redor dela. Permanecia sentava absolutamente silêncio, sua cara enterrada em suas mãos. 

Caroline olhou fixamente os ombros de sua irmã, sabia que se sentiria muito melhor se Vivienne gritasse com toda a força de seus pulmões, ou lhe atirava algo sobre sua cabeça, castigando-a por ser uma ladra rameira desavergonhada.

 Logo que ela se atreveu, sussurrou.

—Vivi?

  Vivienne se esticou, negando-se a reconhecer sua presença.

Caroline estendeu uma mão para a cabeça inclinada do Vivienne, sofrendo por tocar a seda dourada de seu cabelo.  Mas antes de chegar a seu destino a retirou rapidamente, temendo que tal toque quebrantasse a seu frágil irmã em mil pedaços.

—Não posso nem imaginar o que deve estar pensando de mim,—começou , enquanto se estrangulava com cada palavra que saía de sua garganta. —Tem que saber que eu teria dado algo que estivesse em meu poder para te fazer feliz. Teria talhado meu braço direito se isso tivesse assegurado sua felicidade e seu futuro. —Um atoleiro quente de lágrimas encheu seus olhos.— Mas ele foi a única coisa que não pude suportar te dar por que … o queria para mim. 

Para horror do Caroline, os ombros de Vivente se começaram a sacudir. Tinha pensado que seria um alívio, se sua irmã chorasse. Mas não foi. Esses soluços silenciosos rasgaram o coração do Caroline quase em dois.

  Colocou-se de joelhos ao lado da turca, enquanto sentia como rapidamente se derramavam de seus olhos lágrimas ferventes.

—Devia ter deixado este lugar no momento que me dava conta que estava apaixonada por ele.  Poderia ter rogado a Tia Marietta para que me encontrasse algum posto de instrutora ou como dama de companhia e ir muito longe, a um lugar onde nenhum me teria tido que ver jamais. Se tivesse uma onça de decência em minha alma, eu voltaria para o Edgeleaf em seguida e aceitaria a proposta do primo Cecil. Toda uma vida de despertar cada manhã com esse sapo odioso não é mais do que mereço pelo que te tenho feito.!

Sua voz se afogou em um soluço. Já não podia por mais tempo suportar o peso de sua culpa, deixou cair sua cabeça no regaço do Vivienne, enquanto agarrava as saias de sua irmã e chorava sua vergonha. 

A última coisa que esperou foi sentir que uma mão acariciava sua cabeça. Por um momento foi como se o tempo jogasse para atrás e sentisse o toque aprazível de sua mãe que procurava aliviar a dor de seu coração.  Caroline levantou lentamente seus incrédulos olhos fazia a cara da irmã. As bochechas de Vivienne também estavam cheias de lágrimas, mas seu sorriso sereno não era menos amoroso que antes.

—Não pode te casar com o Primo Cecil,—informou-lhe Vivente.  —Nego-me a jogar o papel de tia senil para uma multidão de mucosos odiosos com cara de sapo.

Caroline pestanejou e olhou a sua irmã através da cortina de lágrimas.

—Você não quer me castigar pelas terríveis coisas que te tenho feito? Como pode me perdoar por te roubar ao homem que amas?

Vivienne deu outro golpe a sua cabeça, parecendo mais sábia que seus anos.

—Porque não o amo, Caro. Nunca o amei .

Caroline agitou sua cabeça com perplexidade.

 —Não entendo. Como pode dizer semelhante coisa? O que há sobre essa carta que me enviou? Encheu páginas e páginas detalhando seus irresistíveis encantos e suas varonis virtudes. Pelo amor de Deus, você dedilhou seu nome com um coração!

Vivienne fez uma careta de dor ao recordá-lo.

—Todas as coisas que disse sobre ele eram verdades, mas penso que estava tentando me convencer a mim mesma que estava apaixonada . Depois de tudo, era exatamente a classe de homem com o que sonhava me apaixonar, com dinheiro, títulos, poderoso. Se pudesse pescar a um homem como ele, eu sabia que podia ser a salvação de nós. Eu poderia tirar nossa família da ruína. Estava tentando cuidar de ti e de Porta —Agarrou a mão do Caroline, seus olhos azuis brilhavam com uma ternura que Caroline tinha temido não voltar a ver de novo— Sobre tudo você, querida Caro, depois de tudo, tinha te sacrificado por nós. Não sempre tinha que ter sido a forte. Porta e eu lhe teríamos ajudado. Precisávamos te ajudar. 

Caroline sacudiu a cabeça tristemente, enquanto se esforçava por absorver as palavras de sua irmã. 

—Fazemos um bom par, não? Ambas tratamos de nos sacrificar a uma pela outra, e o que fizemos foi um enredo espantoso. Deu um apertão feroz à mão de Vivienne.— Inclusive se tivéssemos tido que mendigar nas ruas, nunca te teria forçado a te casar a um homem que não amasse.—

—E pensa que não sabia? —Arrancando sua mão das do Caroline, Vivienne as aproximou do fogo.— Não é como se converter-se na esposa de um visconde tivesse sido uma prova terrível.  É um homem amável e bonito e o admiro mais do que posso dizer, ainda mais agora que me há dito tudo a respeito do Julian e… sua pobre aflição—Se girou para encarar ao Caroline, sua bonita frente franzida em um cenho atormentado. —Mas como poderia me casar com ele quando meu coração pertence ao Alastair?

—Alastair?—Caroline repetiu, desconcertada novamente pela declaração apaixonada de sua irmã.  Procurou em sua memória, perguntando-se se havia algum moço da aldeia ou algum jardineiro musculoso que tinha deixado passar. —Quem demônios é Alastair?

—O oficial Larkin, é obvio! Amei-o desde dia em que respingou xerez em minha saia na velada musical de Lady Marlybone e logo tratou de limpá-lo com sua gravata. Mas sabia que não me convinha. Não provém de uma família de grande reputação e a menos que haja algum grande roubo, apenas pode sustentar-se assim mesmo com suas comissões, muito menos poderia sustentar a uma esposa e sua família. E além disso, tem um sentido abominável da moda.

—Sim, ele é assim não? —murmurou Caroline, enquanto pensava o feliz que ficaria o oficial quando soubesse que não ia ter que contratar a nenhum criado para atar sua gravata depois de tudo.

—E o pior de tudo, —continuou Vivienne, —sabia que não tinha nem um só conhecido com o que você ou Porta pudessem casar-se. Nem um amigo, nem um irmão, nem um segundo primo!

—Que tal um velho tio senil? —perguntou Caroline, encontrando cada vez mas difícil suprimir seu sorriso.

Vivienne sacudiu a cabeça tristemente.— Nem isso, temo-me. Sabia que não era uma perspectiva conveniente desde o começo por isso tentei desalentá-lo me mostrando distante e cruel.— Seus olhos se abrandaram em um olhar que Caroline não necessitava um espelho para reconhecê-la.— Mas mais insuportável me voltava eu, mas parecia me amar.

 —Isso parece ser a maldição do verdadeiro amor, —sussurrou Caroline, já não pensava no oficial. Um pensamento a golpeou de súbito, inclinou sua cabeça para estudar a sua irmã. —Se não estava doída porque eu te tivesse roubado ao homem que amava, então por que demônios estava chorando?

—Porque estava aliviada, ao entender que estava verdadeiramente apaixonada pelo Adrian e eu não tinha cometido um engano terrível!— Vivienne fixou seu olhar nela.— Agora que decidi arrumar tudo e que você e Porta estarão bem cuidadas, Alastair e eu podemos estar finalmente juntos.

—Arrumar tudo? —Caroline se levantou para enfrentar a sua irmã, sentindo repentinamente um formigamento de pressentimento. Se a memória não lhe falhava, a última vez que Viviene tinha arrumado algo, sua boneca favorita tinha terminado com três pernas e nenhum cabelo.

—Decidi que era tempo de endireitar tudo. Estiveste me cuidando todos estes anos. Agora é meu turno de cuidar de ti.  

—O que quer dizer?

 Vivienne levantou seu queixo com toda a altivez da viscondessa, que nunca chegaria a ser.

 —Informei a Lorde Trevelyan que se comportou em uma maneira vergonhosa ante nós e que só havia um modo em que um verdadeiro cavalheiro poderia dar satisfação a tal afronta.

Caroline logo que pôde balbuciar as palavras.

—E isso era?

—Deve casar-se contigo o mais breve possível. —Caroline sentiu que seus joelhos a traíam e se derrubou na turca. 

—Não sente saudades que parecesse como se todos os cães do inferno o estivessem perseguindo. Piscou olhando em sua irmã com um atordoamento produzido pela incredulidade —OH, Vivienne, o que tem feito?.

Vivienne entreabriu seu olhar fazia ela, enquanto ainda parecia intoleravelmente paga de si mesmo. 

—Não é óbvio? Fiz todo o necessário para que as duas nos casássemos com os homens que amamos.

—Mas sabe que o Oficial Larkin, Alastair, quer casar-se contigo. Deu o visconde qualquer indicação que se sente da mesma forma ante mim?

—Be—e—e bem ele…—Vivienne se mordeu seu lábio inferior. A diferencia de Porta, nunca tinha sido uma boa mentirosa.— Não parecia completamente resistente à idéia de te fazer sua esposa. Possivelmente esteve um pouco resistente ao princípio, mas uma vez que eu lhe recordei seu dever ante ti, esteve bastante agradável.

Enterrando a cara entre suas mãos, Caroline gemeu. 

—Além disso —continuou Vivienne,— não tinha eleição alguma. Comprometeu-te no grande vestíbulo, diante da vista de todo o mundo— Apertou uma mão em seu peito, seu tom grave cada vez mais próximo ao da Tia Marietta.— Pessoalmente, eu nunca presenciei um desdobramento tão espantoso de decadência. A gente teria pensado que estavam em "o Caminho dos Amantes" no Vauxhall. Agora que mandou aos hóspedes a empacotar, a intriga se saberá em todo Londres para amanhã. 

—E o que pensa que dirão as intrigas quando o visconde se case com a irmã equivocada? O que dirão quando ouvirem os cochichos de que foi forçado ao matrimônio contra sua vontade? Isto pode afetar seus ternos sentimentos, mas nem todos homens são tão nobres como seu Alastair. Um homem como Adrian Kane é perfeitamente capaz de levar a uma mulher à cama sem ter intenção alguma de casar-se com ela.

—Não quando essa mulher é minha irmã! 

Caroline soltou um suspiro exasperado.

 —interpretaste mal minhas palavras. Como posso me casar com ele sabendo que só se está casando comigo porque está sustentando convenientemente uma pistola sobre sua cabeça?

  Vivienne franziu o sobrecenho.

—Não acredito que uma pistola seja necessária, mas posso perguntar ao Alastair se quiser. Estou segura que ele tem uma...

Esta vez não foi um suspiro, a não ser um chiado de frustração o que escapou dos lábios do Caroline.  A porta da biblioteca se abriu de repente, mostrando a um Larkin de olhar selvagem. Tinha esperado obviamente as encontrar dando voltas pelo tapete turco, cuspindo epítetos e puxando-se pelos cabelos.

Quando o olhar do Larkin acariciou a cara do Vivienne, um rubor manchou suas altas maçãs do rosto.

—Perdoe a intrusão, Srta. Vivienne.  Tinha medo que você tivesse sofrido algum dano.—Agarrando suas mãos diante dela, Vivienne o recompensou com um sorriso adorável.

 —Não, senhor, agora que está você aqui. —A boca do Larkin caiu aberta. Não poderia parecer mais emudecido se lhe tivessem derramado sobre sua cabeça ferro fervendo.

Seu olhar desconcertado viajou entre as duas, finalmente decidindo-se pelo Caroline. 

—Esta você bem, Srta. Cabot? Parece como se alguém tivesse caminhado em cima de sua tumba. 

—Bem, isso parece, não é assim? Não o ouviu você? —Caroline se dobrou, enquanto de sua garganta saía uma risada levemente histérica. —Eu me casarei com um caçador de vampiros.

Os serventes não tinham sido capazes de localizar ao Julian, porque se tinha encarrapitado entre dois merlons no parapeito da almeia mais alta do castelo. Sabia que havia só uma pessoa que pensaria em buscá-lo ali, assim nem seguisse se incomodou em dá-la volta quando ouviu umas pegadas detrás dele.

Ele e Adrian tinham acontecido muitas horas nesse lugar quando eram meninos, jogando aos vikings, às Cruzadas e os piratas. Os prados e claros que rodeavam o castelo tinham sido seus campos de batalha e seus oceanos. Aos olhos insolentes de sua imaginação, o pesado carro de um granjeiro que fazia sulcos pelo caminho se converteu na caravana exótica de um Sarraceno protegido por guerreiros de escuro olhar que esgrimiam afiados sabres, enquanto o velho e miserável cão de caça do resmungão granjeiro se transformava em um corcel árabe e um grupo de violentos lobos que assaltavam o castelo, rugindo por seu sangue.  Então, seus inimigos invisíveis, eram vencidos com nada mais que um grito de guerra ensurdecedor e uma porrada sólida de um pau de madeira. Julian inclinou a garrafa de champanha que tinha nas mãos, fazia seus lábios desejando voltar para esses dias tão singelos.

Esta noite o caminho estava iluminado pela luz de abajures das carruagens oscilantes. Seus convidados estavam partindo um por um, levando-se com eles a última das esperanças do Julian.

—Sinto muito, —disse Adrian brandamente, enquanto se detinha detrás dele, olhando as luzes que se perdiam na escuridão.— Quis deixá-la ir contigo, mas não pude me obrigar fazê-lo. Nem sequer por ti.

—Se tivesse ao menos meia alma, não lhe teria perguntado, —disse Julian com um encolhimento de ombros.— Nego-me a acreditar que utilizando o fantasma da Eloisa para lhe atrair, era nossa última esperança. —bufou Julian— Possivelmente tinha sido nossa única esperança.

—Juro-te que nós encontraremos outra forma. Encontrarei outra forma. Só necessito um pouco mais de tempo.

Julian se girou e lhe brindou um sorriso torcido a seu irmão.

—Tempo é uma coisa que tenho de sobra. Posso-te dar até uma eternidade se isso for o que requer.

Apenas pronunciou essas palavras, Julian soube que se estava enganando.  Seu tempo tinha estado correndo desde fazia muito tempo, sua humanidade se escorria pouco a pouco fora dele, como os grãos de um relógio de areia gretado.

Adrian lhe tocou brevemente o ombro, e então se girou para ir-se.

—Adrian?—Seu irmão se voltou, e por apenas um instante Julian viu o fantasma de um Adrian mais jovem.

—Se tivesse uma bênção para te dar, faria-o. —Adrian assentiu antes de fundir-se entre as sombras. 

 

Julian girou sua cara ao vento, dando bem-vinda a fria chicotada. A noite devia ter sido seu reino, seu reino para governar. Estava aqui sentado, apanhado entre dois mundos, dois destinos, com apenas a companhia de uma garrafa de champanha para aliviar a fome que roia o lugar onde sua alma tinha residido uma vez.

Inclinou a garrafa fazia seus lábios, quando uma cadeia saiu de nenhuma parte, serpenteio ao redor de sua garganta com força selvagem. A garrafa escorregou de seus dedos, quebrando-se contra as pedras. Julian arranhou nas pesadas conexões, lutando contra a pressão que o estrangulava, mas sua força sobrenatural parecia diminuir, escapulindo-se como as pétalas de uma rosa agonizante.

Seus olhos se sobressaltaram quando jogou uma olhada e viu o crucifixo de prata que se balançava ao final da corrente e que queimava o caminho de sua camisa e o peito. O fedor de carne carbonizada alagou seus narizes.

Enquanto lutava por soltar um bramido de dor e raiva, um cochicho rouco encheu sua orelha.

—Não deveria ter mentido a seu irmão assim, mon ami. Seu tempo se acabou. Duvalier o pôs de joelhos com eficiência brutal, tudo no que Julian podia pensar era em que seria uma maldita vergonha que Adrian jamais se inteirasse de que seu complô tinha triunfado.

 

—Compreendo que minha irmã só tem o maior interesse por meu bem-estar em seu coração e avaliação sua disposição a acessar às demandas da decência, milord, —disse Caroline, seu tom era de uma vez frio e comedido— perfilando cada um de meus argumentos e considera-os profundamente, acredito que deixei perfeitamente claro por que não tenho mais eleição que rechaçar sua proposta. —Terminou seu discurso mantendo a cabeça alta e as mãos apertadas ante ela... O mesmo modelo da razão e o sentido comum.

Ao menos isso era o que esperava. Já que não havia ninguém que escutasse seu discurso bem treinado e só era capaz de julgar sua atuação pelo reflexo vacilante nas portas francesas de seu dormitório, era difícil de dizer. Embora tinha aceso cada vela da torre a sua volta da biblioteca, o negrume absoluto da noite além das portas tirava toda definição a sua imagem, deixando-a tão brumosa como um fantasma.

Uma rajada afiada sacudiu ruidosamente as portas, fazendo-a saltar. O vento se levantou firmemente nas últimas poucas horas, enviando mais nuvens a percorrer a cara luminosa da lua. O brilho vacilante das velas fazia impossível rastrear as sombras que atravessavam rapidamente seu balcão.

Em algum lugar nas profundidades do castelo um relógio começou a marcar as doze, cada gongo ressonava através dos nervos destroçados do Caroline. Mais que nada, queria arrancar o maldito traje da Eloisa, deitar-se na cama, e cobri-la cabeça com as mantas. Mas se obrigou a avançar para a imagem fantasmagórica das portas francesas, estender a mão e comprovar metodicamente que estava jogado o ferrolho.

Quando o momento passou, novas dúvidas começaram a arrastar-se até sua consciência. Possivelmente Adrian não estava de caminho. Possivelmente culpava a ela por arruinar seu plano para apanhar e destruir ao Duvalier. Possivelmente era tão infeliz ante a perspectiva de ver-se obrigado a casar-se com ela que lamentava cada momento que tinham compartilhado... Cada roce, cada beijo.

Caroline começou a passear-se nervosamente ao redor da cama. Dificilmente podia culpar a de lhe obrigar a casar-se quando tinha sido ele quem a tinha comprometido diante do meio salão. Era ele quem tinha aproveitado sua devoção por suas irmãs e a tinha esgrimido como uma arma, pensou, zangando-se mais a cada passo pela injustiça dele.

Não tinha intenção de passar o resto de seus dias passeando-se em seu dormitório e desejando ouvir os passos de seu marido nas escadas. Se ele não vinha a ela, então Por Deus, ela iria a ele.

Estava girando para as portas quando estas se abriram de repente. Captou a breve olhada da silhueta de um homem contra a escuridão antes que o vento açoitasse a torre, apagando todas as velas com um só fôlego.

Conteve seu próprio fôlego, esperando que as nuvens voltassem a mover-se. Esperando um solo brilhante faz de luz de lua que dourasse o cabelo e banhasse os planos rudes da cara.

Era a cara do guerreiro do retrato. E tinha vindo por ela. Caroline deu um passo involuntário para trás, sua coragem tinha desertado. O negro inflexível da camisa e as calças do Adrian encaixavam perfeitamente com sua face sombria. Quanto mais distante e remoto parecia ele, mais parecia seu traiçoeiro coração lhe desejar.

—Surpreende-me que não fixasse a porta com parafusos —disse ele.

—Isso te teria mantido fora?

—Não —admitiu, dando um só passo para ela.

—Então possivelmente tenha mais em comum com seus ancestrais do que acredita.

—Tentei te advertir que eram todos descarados e réprobos, não? Estou seguro de que roubaram e raptaram a mais de uma noiva em seu dia.

A indignação do Caroline ante sua arrogância pôs-se a voar de sua cabeça todo seu discurso bem ensaiado.

—Enquanto minha irmã e você estavam decidindo meu futuro de forma tão arrogante, alguma vez lhes ocorreu a nenhum dos dois que poderia desejar que me consultasse?

—Não vejo que tenha nenhuma eleição na questão. Sua boa reputação está arruinada. Nenhum homem decente pedirá sua mão.

Caroline se perguntou por que era tão rápido em colocar-se a si mesmo entre as filas dos indecentes.

—Tal e como o vejo eu —continuou ele—, só tem dois possíveis futuros. Pode te converter em minha esposa —A nota fumegante de sua voz se aprofundou—. Ou pode te converter em minha amante... Com todos os deveres inerentes que suporta esse privilégio.

Negando-se a ruborizar-se, Caroline elevou o queixo.

—Tal e como o vejo eu, uma esposa tem exatamente os mesmos deveres. Só que normalmente não a compensa por eles com flores e jóias.

Os olhos dele se entrecerraram.

—É isso o que quer de mim? Rosas? Diamantes?

Caroline se mordeu o lábio antes de poder soltar o que queria dele. Queria que voltasse a tocá-la com estremecedora ternura. Desejava compridos e ardentes beijos à luz da lua. Desejava que pressionasse os lábios contra seu cabelo e a chamasse seu amor.

—Não quero nada de ti, —mentiu—. Minha irmã deixou abundantemente claro que só te casa comigo por obrigação. Bom, isto não é o Vauxhall e não te deixarei fazer de campeão por meu bem. Não preciso ser resgatada e não me converterei em outra de suas aventuras. Não tenho nenhum uso para sua lástima. Minha reputação pode estar arruinada, mas ainda tenho meu orgulho.

—Sua irmã está absolutamente no certo, —esteve de acordo ele—. Me casar contigo é quão último quero fazer.

Um ofego inesperado escapou dos lábios do Caroline. Pode que tivesse suspeitado muitas coisas dele no passado, mas nunca lhe tinha acreditado capaz de crueldade deliberada.

—Não quero me casar contigo. Não quero te desejar, —acrescentou ferozmente, dando um passo comedido para ela, depois outro—. E seguro como o inferno que não quero te amar. Mas, que Deus me ajude, não posso evitá-lo. —Fechando a distância entre eles de uma só pernada, agarrou-a pelos ombros, seu ardente olhar lhe percorria a cara como gravando a fogo seus rasgos na memória—. Não quero me casar contigo porque te amo muito para te pedir que passe o resto de sua vida te ocultando entre as sombras.

Com o coração transbordante de alguma nova e maravilhosa emoção, Caroline lhe pôs uma mão na bochecha.

—Prefiro passar o resto de meus dias vivendo entre as sombras contigo que caminhando à luz do sol totalmente sozinha. —Quando as algemas do orgulho caíram, Caroline sussurrou—. Casará-te comigo?

Os lábios do Adrian se posaram sobre os seus, lhe dando a única resposta que podia necessitar. Acariciou as sedosas comissuras de sua boca, voltando-se mais insistente, mais persuasivo, com cada tenra passada de sua língua. Sem romper o beijo, agarrou-a entre seus braços, embalando-a contra seu peito como se não pesasse mais que uma menina.

Quando começou a dirigir-se para as portas, ela murmurou contra seus lábios.

—Aonde me leva?

Ele sozinho apertou sua garra possessiva.

—A minha cama. Onde pertence.

Enquanto Adrian a levava escada abaixo e através da ponte, seu corpo a defendeu da força de espanquem do vento. As janelas de abaixo estavam agora obscurecidas. Não havia olhos curiosos que presenciassem sua viagem. Caroline rodeou o pescoço do Adrian com os braços e enterrou a cara contra a calidez de sua garganta, respirando profundamente seu aroma de sândalo e louro.

Ainda estava timidamente apertada contra seu pescoço quando ele a pôs sobre seus pés. Quase tinha esperado que a tombasse diretamente em sua cama, mas quando abriu os olhos se encontrou parada aos pés da mesma, diante do alto móvel coberto com cortinas de seda que tinha provocado sua curiosidade na última visita à antecâmara dele.

Adrian retrocedeu para as portas francesas para abrir as pesadas cortinas de veludo que as velavam, convidando à luz da lua a entrar em sua guarida.

Tão silencioso como uma sombra, deslizou-se atrás dela. Tirou a rosa de detrás de sua orelha e espremeu as aveludadas pétalas entre os dedos, liberando sua intoxicante fragrância. Quando estes caíram ao chão, puxou a fita de seda, lhe liberando o cabelo que se derramou ao redor de seus ombros em uma cascata sedosa. Elevando-lhe o luxurioso peso da nuca, pressionou ali os lábios, provocando um delicioso estremecimento de prazer que desceu por sua espinha dorsal. Quando deslizou um braço ao redor de sua cintura para estabilizá-la, ela pôde sentir o calor de seu corpo irradiando através de cada poro.

Envolvendo-se seu cabelo na mão, expôs a larga e elegante curva de sua garganta.

—Tinha razão sobre mim todo o tempo, —disse, o fumegante sussurro de sua voz era uma carícia em si mesmo—. Do primeiro momento em que posei meus olhos em ti, não desejei mais que te devorar ali mesmo. —Seus lábios procuraram o pulso palpitante no flanco da garganta, partindo para consolar o mesmo ponto que tinha perfurado sozinho a noite antes—. Desejei beber de seus lábios. Desejei provar a suavidade de sua pele—. Sua boca se moveu para a orelha, a rouca urgência de sua voz se vertia sobre os sentidos famintos do Caroline como mel derretido—. Desejei provar cada gota de néctar que sua doce carne tinha para oferecer.

Seus lábios riscaram a orelha, atrasando-se contra o tenro lóbulo. Quando a aveludada calidez de sua língua percorreu a concha delicada, um batimento do coração de prazer em resposta entre suas pernas umedeceu seus calções e fez que seus joelhos se debilitassem. Fechou os olhos enquanto se recostava contra a dura longitude do corpo dele, sentindo-se tão frouxa e dobradiça como uma boneca de trapo entre suas mãos.

Sentiu-lhe rodeá-la e de repente soube exatamente o que havia baixo esse sudário de seda. Manteve os olhos apertados, em alguma esquina caprichosa de sua alma ainda temia abri-los e tirar o chapéu encolhida entre os braços invisíveis de um amante demônio e não ter nem força, nem vontade para resistir.

Ouviu o roce da seda quando a cortina caiu ao chão.

—me olhe, meu amor —urgiu Adrian—. Olhe-nos.

Incapaz de resistir, Caroline obedeceu, só para encontrar-se olhando fixamente os olhos luminosos do homem ao que amava. O reflexo do Adrian no dourado espelho de corpo inteiro era tão sólido como o seu próprio, unindo-os muito mais que só por seu terno abraço. Pela primeira vez em sua vida Caroline ficou surpreendida por seu próprio reflexo. Não era o trêmulo tule de seu traje ou a cortina de cabelo iluminada pela lua que fluía sobre seus ombros o que a fazia formosa. Era o cru desejo nos olhos do Adrian.

—Oh Deus —sussurrou Caroline, girando-se entre seus braços.

Adrian a levou a cama então, gemendo seu nome profundamente na garganta enquanto rodavam pelos lençóis de seda até que ela esteve debaixo e ele erguendo-se sobre ela na escuridão. Quando sua boca se posou na dela e lhe rodeou com os braços, saboreou a maravilha de estar entre seus braços. Nunca pertenceria a Vivienne nem a nenhuma outra mulher. A partir deste momento, era todo dela.

O hipnótico mergulho e retirada de sua língua persuadiu à sua a lhe perseguir com tentadores golpezinhos que imploravam que tomasse sua boca mais completamente, mais profundamente. Ele acessou ansiosamente até que ambos ficaram sem fôlego de desejo. Seu acanhamento se desvaneceu, as mãos do Caroline rasgaram o tecido fino da camisa dele.

Adrian riu afogadamente, deleitado por seu atrevimento. Tirando-o que ficava da camisa, jogou-a a um lado, e depois se desfez de suas calças, meias três-quartos, e botas com igual rapidez.

Puxou gentilmente para tirar o vestido da Eloisa pela cabeça de Caroline, depois se deslizou atrás dela para desabotoar o espartilho.

—Amava-a? —perguntou Caroline brandamente, tirando-a cadeia pela cabeça e olhando ao frágil camafeu.

A pena, culpabilidade e arrependimento do Adrian estavam tão misturados que já não podia recordá-lo. Tudo o que pôde fazer foi lhe plantar um tenro beijo no ombro e lhe dizer:

—Acredito que sim. Até que te conheci.

O camafeu se deslizou entre seus dedos. Girou-se entre os braços dele, seus lábios se fundiram em um beijo feroz. Quando ele apartou os lábios só o suficiente para lhe tirar o espartilho e a camisa pela cabeça, o vento afastou as últimas nuvens, banhando a torre e seus corpos entrelaçados com a neblina chapeada da luz da lua.

—Deus bendito —sussurrou ele, as palavras era mais prece que juramento enquanto a posava de volta entre os travesseiros.

Seus olhos a devoravam. Era inclusive mais adorável do que tinha imaginado... Toda curvas ágeis e delicados ângulos. Levantou o olhar para ele com os grandes olhos cinza, o cabelo fluindo como uma cortina de teia sobre seu travesseiro. Parecia como se estivesse em uma cama de musgo em meio de um bosque encantado, esperando a chegada de um unicórnio.

Em vez disso estava lhe esperando a ele.

Seu olhar se atrasou no inchaço gentil de seus peitos de pontas rosadas, no sedoso triângulo de cachos entre as coxas. Embora teria jurado que era impossível, eram de um tom mais pálido que o cabelo de sua cabeça.

—Graças a Deus pela lua, —disse—.  Me estava começando a cansar da escuridão.

—Não me importa, —sussurrou Caroline, lhe acariciando meigamente as crispadas espirais de cabelo do peito com as pontas dos dedos—, enquanto possa compartilhá-la contigo.

Caroline não podia acreditar-se que estivessem nus um em braços do outro, e não sentisse nenhuma necessidade de ruborizar-se ou esconder a cara. Assombrava-a ainda mais que seu toque pudesse causar tal descalabro em tão magnífica criatura masculina. Quando sua mão vagou mais abaixo, roçando os músculos tensos do abdômen do Adrian, o corpo inteiro dele saltou como golpeado por um raio.

Agarrou-lhe a mão com a sua, olhando profundamente a seus olhos enquanto a urgia a baixar mais ainda. Quando lhe pressionou a palma aberta na longitude plenamente excitada, Caroline deixou escapar um pequeno gemido, compreendendo finalmente o alcance total de seu desejo por ela. Era um grande homem... Em mais de um sentido. Seus dedos se fecharam instintivamente ao redor dele, maravilhando-se de que um pouco tão forte e duro pudesse sentir-se como veludo ao tato.

Jogando a cabeça para trás, Adrian gemeu com os dentes apertados.

Alarmada, Caroline retirou a mão bruscamente.

—O que acontece? Fiz algo mal?

Entrelaçando seus dedos com os dela, levou-se a palma aos lábios e pressionou nela um tenro beijo.

—Não, anjo, fez algo muito, muito bom. Mas se o volta a fazer, esta noite vai acabar antes de começar.

Adrian baixou a cabeça, mas esta vez não eram seus lábios o que procurava, a não ser o pico rosado de um peito. Soprou brandamente, banhando-a com a névoa sedosa de seu fôlego, antes de tocá-la com a boca. Quando a língua lambeu o broto turgente do mamilo, o prazer fluiu profundamente em seu interior, fazendo-a choramingar e arquear-se contra ele. Embora seus peitos não podiam comparar-se com os de Porta, pareciam voltar-se mais cheios e pesados baixo tão habilidosas carícias. Para quando voltou seus cuidados ao outro peito, ela já estava retorcendo-se com algum primitivo desejo muito profundo para articulá-lo com palavras.

Adrian elevou a cabeça para olhá-la sobre os resplandecentes picos, seus olhos iluminados pelo mesmo desejo.

—Quando meu irmão te viu pela primeira vez, insistiu em que estava cheia de amido e vinagre.

—Você esteve de acordo com ele? —perguntou, sua respiração chegava em curtos e trementes ofegos.

Ele sacudiu a cabeça, com um sorriso malicioso curvando uma das comissuras de sua boca.

—Sempre soube que estava cheia de mel.

Para provar este ponto, roçou gentilmente os cachos na conjunção de suas coxas, seus dedos ardilosos procurando infalivelmente e encontrando a espessa piscina de néctar que fluía entre suas dobras internas.

Caroline jogou a cabeça para trás, ofegando ante a atrevida intimidade de seu toque. Já não era tão parva para acreditar que tinha as mãos de um trabalhador. Poderiam ser grandes e poderosas, mas eram tão hábeis como as de qualquer artista, moldando-a a sua vontade com cada roce hábil de seus dedos. Acariciava, brincava e roçava, separando as delicadas pétalas para expor o botão extraordinariamente sensível que descansava entre eles.

—Aqui, —sussurrou-lhe no ouvido, a gema de seu polegar rodeou essa doce protuberância de carne com delicioso cuidado—. Cuidaste de todo o mundo tanto tempo, minha doce Caroline. Deixe-me cuidar de ti.

Não é que tivesse eleição. Jazia afligida pelo êxtase, em meio de seu abraço, raptada pelas quebras de onda de sensações que desdobrava seu toque.

Enquanto o polegar continuava operando sua escura magia, dois dedos se inundaram mais abaixo... Rodeando, acariciando, abrindo gentilmente o apertado oco até seu mesmo centro, como a preparando para um pouco inexplicavelmente delicioso que só ele podia lhe dar.

—Por favor, —disse sufocada, sem saber sequer o que estava suplicando, mas desejando-o mais do que tinha querido nunca nada. Moveu a cabeça adiante e atrás sobre o travesseiro, quase incoerente de desejo—. OH, por favor...

Nem sequer em seus sonhos mais selvagens teria imaginado que sua súplica teria como resultado que Adrian se deslizasse para baixo por seu corpo com sensual frouxidão até que o delicioso calor de sua boca esteve onde tinha estado seu polegar.

A língua lambeu a carne mortificada, suas coxas se separaram, lhe convidando a fazer com ela o que quisesse. Uma vez lhe tinha acusado de escravizar mulheres com seus escuros poderes de sedução, mas em sua inocência nunca tinha suposto quão ansiosa aceitaria suas cadeias ou como estas lhes uniriam.

A língua se deslizou sobre a carne distendida, devorando-a como se fosse o único alimento que fora a necessitar nunca. Ela não tinha defesas contra um desejo tão primário, tão poderoso. Como estava empenhado em honrar seu voto de saborear cada gota de néctar que a suave carne dela tivesse que oferecer, tudo o que pôde fazer foi aferrar a áspera seda de seu cabelo entra as mãos e render-se a ele, em corpo e alma. Só então a língua redobrou o ritmo; só então deslizou um dedo mais profundamente em seu interior.

Uma quebra de onda de êxtase, tão grande e ardente como o mais doce dos néctares, atravessou seu corpo tremente. Arqueou-se contra ele, gritando seu nome. Ele se elevou para capturar o grito quebrado em sua boca, beijando-a grosseiramente.

Trocou seu peso e de repente já não era seu polegar o que estava embalado na úmida suavidade dos cachos. Não eram seus dedos os que se colocavam para enterrasse em sua dócil suavidade.

—Caroline, —murmurou contra seus lábios—. Minha doce, doce Caroline... Não quero te fazer dano. Nunca quereria te fazer dano.

—Então não o faça —sussurrou, lhe emoldurando a cara com as mãos e lhe obrigando a encontrar seu suplicante olhar—. Só me ame.

Não teve que pedir-lhe duas vezes. Esfregou-se entre essas tenras pétalas até que esteve escorregadio por seu rocio, depois se colocou contra a parte dela que desejava lhe receber. Utilizando uma deliciosa contenção, penetrou-a centímetro a centímetro. Só quando seus gemidos aprofundaram a ofegos empurrou contra ela, rompendo a última resistência de seu corpo e enterrando-se na vagem de sua acolhedora suavidade.

Adrian sentiu que seu corpo inteiro se estremecia quando Caroline lhe conduziu ao êxtase. Tinha-a confundido com a luz da lua, mas ela era luz do sol, iluminando e esquentando todas as esquinas solitárias e escuras de sua alma. Enterrando a cara em sua garganta, conteve-se tanto como pôde, tentando dar ao corpo destreinado tempo para ajustar-se a sua arruda invasão.

Quando a dor passou a ser uma moléstia apagada, os olhos dela se abriram de par em par ante de pura surpresa de sua posse. Estava sobre ela; estava dentro dela; seu domínio era completo. Embora era ela a que tinha o poder de lhe voltar meio louco sem nada mais que o inquieto arqueamento de seus quadris, o desesperado arranhar de suas unhas para baixo pela curva das costas.

Aceitando seu convite com um gemido rouco, começou a mover-se mais profundamente dentro dela, tomando sua inocência, mas lhe dando algo imensamente mais precioso. Deslizou-se dentro e fora dela como uma poderosa onda atraída pela vontade da lua. Este era um tipo de prazer diferente aos pequenos tremores de pura sorte que tinha feito que a atravessassem só minutos antes... Mais forte, mais primitivo. Ela dava e ele tomava. Ele dava e ela tomava. Ele a fazia sua mulher enquanto o fazia a ele seu homem. Aferrou-se a ele, murmurando seu nome em uma ofegante lituânia, enquanto suas estocadas contidas davam passo a ritmo palpitante e implacável que desterrou todo pensamento, toda razão, deixando só sensação.

Justo quando pensava que não poderia suportar outro segundo de tão doce tortura, ele colocou os quadris de forma que cada empurrão lhe levasse contra esse tenso ponto no centro de seus cachos.

Caroline gritou quando seu corpo explodiu em um frenesi de deleite. Sentindo esse puxão irresistível, Adrian se estrelou contra a borda com ela, um gemido gutural escapou de sua garganta quando entregou sua semente e alma a seu cuidado.

 

Caroline estava sentada sobre os joelhos ao pé da cama, olhando para seu reflexo iluminado pela lua no espelho do Adrian. Embora a mulher do cabelo revolto e o lábio inchado pelos beijos poderia ter sido uma desconhecida, tinha visto esse olhar antes... Nos olhos da mulher do Passeio dos Amantes no Vauxhall. Agora conhecia o segredo que levava aos amantes a citar-se nessas paragens escuras e sombrias. Tinha saboreado os prazeres que desejavam e tinha ficado conscientemente satisfeita, embora desejando mais.

Como pressentindo seus caprichosos pensamentos, Adrian se elevou atrás dela.

Quando seus fortes e musculosos braços a envolveram, aferrou-se ao lençol em que se envolto mais firmemente, assaltada por uma quebra de onda de tardia modéstia.

—Acreditei que estava dormindo.

—Estava-o —murmurou ele, lhe esfregando o pescoço com o nariz—. Até que escapou de meus braços e meus sonhos.

Derretendo-se contra ele, elevou a cabeça para lhe dar acesso a seus lábios e à pele branda sob sua orelha.

—Com o que estava sonhando?

—Com isto. —Deslizou os braços sob o lençol, enchendo-as mãos com seus peitos nus.

Caroline ofegou quando ele deu a seus peitos um gentil apertão, e depois começou a brincar com os mamilos entre seus polegares e índices. Esticaram-se sob seu toque, absorvendo ansiosamente cada onda de prazer que lhe dava. Deixando que o lençol se deslizasse até que uma vez mais esteve nua entre seus braços, girando-se para lhe embalar a cabeça na palma, desesperada- por roubar um beijo de seus lábios intrigantes.

—Se quer sabê-lo, —murmurou, saboreando a comissura de sua boca com a língua—. Estava ficando dormido quando de repente me ocorreu que tinha esquecido comprovar suas estacas. Bem poderia me haver assassinado em meu sonho.

Caroline se arqueou contra ele, sentindo a prova impressionante do desejo do Adrian aninhada contra a suavidade de seu traseiro.

—Por isso posso ver, milord, é você o único que está armado por aqui.

Sentiu a boca dele curvar-se com um sorriso malicioso.

—Isso significa que poderei te estacar?

—Já o tem feito. —Apartando seus lábios dos dele, Caroline encontrou seu olhar através do espelho—. Justo através do coração.

Gemendo, ele pressionou a palma contra o mesmo centro de sua feminilidade reclamando-o como dele. Observou-lhe no espelho, hipnotizada pela visão do dedo mais comprido desaparecendo entre seus cachos inferiores, desaparecendo em seu interior. Completamente desfeita por essa deliciosa pressão, arqueou-se contra ele, convidando a uma invasão mais profunda. Extremamente ansioso por agradar, ele se elevou sobre os joelhos, conduzindo-se mais profundamente no interior de seu lhe fundam suavidade.

Caroline gemeu, a débil dor atrás de seu primeiro encontro só aumentava a sensação de estar sendo empalada por alguma inquebrável estaca desenhada somente para agradá-la. A sensual criatura do espelho era inclusive mais que uma estranha para ela agora mesmo, disposta a contorcesse e arranhar e suplicar para conseguir o que necessitava. Seus lábios úmidos se separavam, seus olhos brilhavam de desejo.

Adrian utilizou a gema do dedo para proporcionar um irresistível contraponto ao exigente impulso dos quadris. Logo seria ela quem lhe montasse, a que controlasse o ritmo de suas largas e profundas estocadas. Seu amor tinha banido o que ficava de acanhamento, transformando-a em uma tentadora... Uma atrevida feiticeira que já não suplicava satisfação, exigia-a. Estremecimentos de prazer se desdobravam ante seu toque, crescendo com cada passada de seu dedo, com cada sinuosa elevada e queda dos quadris dela.

—Isso, coração —ofegou em sua orelha—. Aceita o prazer e o poder. Reclama-os como teus.

Quando esse prazer foi em crescendo, o nome do Adrian irrompeu de seus lábios, meio soluço, meio grito. Enchendo suas mãos com a suavidade dos peitos, ele ficou rígido, seu corpo inteiro estremecendo-se com o mesmo êxtase que arrasava o útero dela.

Derrubou-se entre seus braços, tão deslumbrada pelo prazer que lhe levou um comprido tempo compreender que o corpo dele já não se estremecia de prazer, mas sim de risada.

—por que te ri? —exigiu, no mais mínimo divertida ao pensar que tinha feito algo estúpido ou o bastante torpe para provocar tanto regozijo.

O envolveu os braços mais firmemente a seu redor, seus olhos brilhavam com ternura quando encontrou os dela no espelho.

—Só estava pensando em todas as vezes que Julian me recriminou por conservar este espelho porque era muito torpe para me atar a gravata sem ele.

Sentindo-se tão satisfeita como um gato, Caroline jazia encolhida entre os braços do Adrian observando um nebuloso raio de sol arrastasse para a cama. Quando lhe aconteceu os dedos por entre o cabelo revolto, fez tudo o que pôde por não ronronar. Apoiou a bochecha contra o peito dele, maravilhando-se pelo firme batimento do coração do coração sob seu ouvido.

A risada afogada do Adrian foi um profundo trovão.

—O que acontece, coração? Está escutando um coração que ainda não está convencida que tenho?

Ela acariciou a lã dourada do peito, retorcendo uma das espirais ao redor de seu dedo.

—Só me alegro de que não se rompesse quando Vivienne fez a um lado pelo contestável Larkin.

Ele se esclareceu garganta.

—Bom, devo admitir que a devoção de sua irmã pelo bom contestável não foi do todo uma surpresa.

Caroline se elevou sobre um cotovelo, lhe olhando com os olhos entrecerrados. Embora piscava para ela com juvenil inocência, ainda as arrumava para parecer um felino da selva que se acabava de tragar-se de repente um canário bastante grande e ossudo.

—Miserável desavergonhado! —murmurou—. Sabia todo o tempo que Vivienne estava apaixonada pelo Larkin, verdade? —Ao pensar em toda a culpa que tinha sofrido a conta de sua irmã, gemeu—. Pelo amor de Deus, por que não me disse isso?

—Se lhe houvesse isso dito antes que averiguasse o do Julian, teria-lhes dado a ela e ao Larkin sua bênção e te teria partido. —Embalou-lhe a bochecha na mão, olhando-a profundamente aos olhos— Não só teria perdido ao Vivienne, te teria perdido a ti também.

Apartou-lhe a mão, negando-se a ser seduzida por seu olhar carinhoso.

—E se me houvesse isso dito depois que averigüei o do Julian e Duvalier, não teria tido nenhuma razão que fizesse que seguisse sem lhe contar ao Vivienne todo o de seu malvado plano. —recostou-se para trás sobre o travesseiro e sacudiu a cabeça, rasgada entre o ultraje e a admiração— Você, milord, é um descarado e um réprobo!

Adrian se elevou e se inclinou sobre ela, seus olhos faiscavam com malícia.

—Não quereria me privar de meu complô mais malvado de todos.

—E qual seria esse? —Seu tom severo não pôde ocultar do todo que se estava ficando sem respiração à medida que ele começasse a deixar beijos suaves como mariposa ao longo da curva de sua mandíbula.

Os lábios se deslizaram para baixo por sua garganta, particularizando cada palavra com um beijo.

—Meu diabólico plano para te tirar desse maldito vestido antes que houvesse a mais mínima oportunidade de que Duvalier te visse. —Embalou um de seus peitos com a mão, moldando-o até lhe dar a forma perfeita para que sua boca se retorcesse ao redor do broto ereto de seu mamilo.

Caroline ofegou, seu gênio se aplacou por uma rajada de ardente de desejo.

—Pode que não aprove seus motivos —disse sem fôlego, retorcendo os dedos entre a seda áspera do cabelo dele— mas não posso discutir a efetividade de seus métodos.

A tentadora calidez dos esses lábios acabava de fechar-se ao redor de seu peito quando uma chamada aguda chegou da porta.

Caroline gemeu.

—Se Porta me seguiu até aqui, tem minha permissão para lançar a à masmorra.

Adrian elevou a cabeça.

—E se for Wilbury? É um inquebrável defensor da decência, já sabe. Se averiguar que me comprometeste, insistirá em que faça de mim um homem honesto.

Sorriu-lhe.

—Essa seria uma mudança refrescante, não crê?

—Senhorita impertinente —grunhiu Adrian, lhe fazendo cócegas nas costelas. Nem sequer seus gritos de risada puderam apagar um novo assalto de golpes na porta.

Murmurando uma maldição pelo baixo, Adrian se apartou rodando dela e caminhou até o biombo da esquina para recuperar sua bata.

Colocou o objeto de veludo ao redor e atou o cinturão, deixando ao Caroline uma visão dos músculos definidos de suas panturrilhas.

Enquanto ela subia a colcha até o queixo e se separava de um sopro uma mecha de cabelo dos olhos, ele se aproximou da porta e a abriu. Não era Porta nem Wilbury quem estava ali, a não ser o contestável Larkin.

Passando uma mão pelo cabelo revolto, Adrian suspirou.

—Se tiver vindo a me recriminar pelo bem da Senhorita Cabot, Alastair, não há necessidade. Decidi me casar com ela logo que possa conseguir uma licença especial do arcebispo. Não tenho nenhuma intenção de que meu herdeiro nasça somente nove meses depois de nossas núpcias.

Caroline se colocou uma mão no estômago sob o lençol, perguntando-se se Adrian poderia ter posto já seu bebê dentro dela. A possibilidade fez que seu coração voasse de alegria.

Mas quando ele deu um passo a um lado e pôde ver o aspecto da cara do Larkin, seu coração caiu até seus pés.

—Não vim pelo Caroline, mas sim por Porta —disse Larkin, sua cara estava cinza e fatigada—. Desapareceu. Tememos que possa ter fugido.

 

    O dormitório de Porta estava deserto, mas a janela próxima à cama estava totalmente aberta, convidando a uma alegre canção de cotovia e a uma brisa suave da primavera. Era muito fácil para Caroline imaginar soe distantes de uma valsa flutuando através dessa janela, planejando uma melodia irresistível.

Enquanto Larkin rondava na porta, murmurando palavras de consolo à pálida Vivienne, ela e Adrián seguiram o rastro dos lençóis atados ao redor de um dos postes da cama para a janela. Improvisada-a escada desaparecia sobre o peitoril. Colocando um cabelo depois da orelha, que tinha escapado de seu apressado coque chignon, Caroline apareceu pela janela do segundo piso. O final do lençol se balançava sobre uma parcela verde memora de grama banhada em um brilhante remanso de sol. A noite anterior tinha havido só sombras esperando receber a quem fora o suficientemente atrevido para descender.

—Não sou capaz de encontrar nenhum sinal de luta ou ato criminal —lhes informou Larkin. —Tudo o que encontrei no peitoril foi isto. —Sustentava um pouco parecido à palha de uma vassoura.

—É um bigode da máscara de gato que Julián lhe deu —disse Caroline, aumentando seu desgosto— Estava muito entusiasmada ficando o para ele.

—É tudo por minha culpa —disse Vivienne, ainda obstinada ao braço do Larkin— Se tivesse voltado para minha habitação antes do amanhecer, poderia me haver dado conta que não estava.

Enquanto Caroline ficava com a boca aberta, Adrián se girou dirigindo um penetrante olhar a seu velho amigo.

—Terei que lhe gritar, Agente?

Larkin puxou seu colete, e um íntimo rubor tingiu suas altas maçãs do rosto. Pela primeira vez, Caroline se deu conta que embora Vivienne ainda levava seu verde vestido de noite, a gravata do Larking estava atada em um nó francês tão meticuloso que Brummel empalideceria de inveja.

—Tenho que dizer que não. Posso te assegurar que minhas intenções para a irmã da senhorita Cabot são honestas. Se o tivéssemos feito a meu modo, estaríamos agora mesmo a meio caminho da Gretna Green. Mas Vivienne recusou fugir-se. Insistiu que o correto seria que sua irmã maior se casasse primeiro.

Olhando quão meigamente a tinha tomada entre seus braços, Adrián disse baixinho:

—Melhor vai te acostumando a isto, companheiro.

—O que?—perguntou Larkin.

—O não fazê-lo a seu modo.

—Não o entendo, —disse Vivienne quando Adrián apareceu pela janela para estudar o terreno de abaixo.

—Se Porta simplesmente se aproximou às escondidas ao baile contra os desejos do Caroline, então por que não voltou? Alastair perguntou discretamente no castelo, e os serventes juraram que não tinha havido seus signos desde ontem pela tarde.

Caroline sacudiu a cabeça, recordando seu último encontro com Porta.

—Estava terrivelmente zangada comigo por não permitir ir ao baile. Poderia estar zangada em qualquer lugar, me dando um susto parar me castigar.

Quando disse as palavras, Caroline soube o improvável de que fossem certas. Porta não tinha sabido nunca guardar rancor. Seu temperamento normalmente acalmado fervia a fogo lento para logo depois de repente estalar em ebulição. Caroline tinha perdido a conta da quantidade de vezes que Porta a tinha enfeitiçado a lhe perdoar alguma raiva ou má palavra simplesmente abraçando-a e soltando uma desculpa. Daria quase algo para sentir esses braços ao redor.

Tampouco podia ajudar o recordar como deliberadamente se burlava dos medos e fantasias de Porta. Como, em um equivocado intento de protegê-la, tinha-lhe assegurado que isso não era um perigo real. Graças a ela, Porta era a única deles que não sabia que os vampiros realmente espreitavam na noite.

Puxou a manga do Adrián, incapaz de conter seus crescentes medos.

—Não pensa que tenha podido ser Duvalier, não?

Tirou a cabeça da janela e lentamente se voltou para ela, esticando a mandíbula em uma linha sombria. Antes de passar a noite anterior entre seus braços e em sua cama experimentando de primeira mão a profundidade ilimitada de sua paixão, não poderia haver-se dado conta da ausência absoluta de emoção em seus olhos.

Deu um passo atrás e se tampou a boca com a mão, recordando muito tarde que Duvalier não era o único monstro conhecido.

Caroline seguiu ao Adrián pelos armazéns da cozinha, dando dois passos por cada uma de suas largas pernadas. Quando começou a baixar o úmido, frio e inclinado passagem que se dirigia ao porão das especiarias, teve que recolher o vestido da Eloisa em uma mão para não tropeçar-se com ele. Começava a desprezar essa coisa até mais que antes, mas agora não tinha tempo de voltar para sua habitação a trocar-se. Não com a urgência do Adrián conduzindo-os por todo o castelo como um látego.

Nem teve tempo de estremecer-se quando um rato grande se apartou a toda pressa do caminho das botas do Adrián, chiando freneticamente. Antes que pudesse recuperar o fôlego, estavam de pé fora da porta do porão das especiarias.

Recordando o aro de ferro de chaves que Wilbury levava em sua cintura, ela disse:

—Não necessita uma…

Adrián levantou uma poderosa perna e chutou a porta por suas dobradiças.

—…chave? —terminou fracamente, agitando longe uma asfixiante nuvem de pó.

Arrancou uma das primitivas velas de sebo do candelabro de ferro situado fora do porão, então caminhou para a prateleira da parede oposta. Antes que Caroline pudesse lhe alcançar, seus dedos seguros tinham procurado e encontrado a fumegante garrafa de cristal colocada depois do bordo da prateleira.

—O que é? —perguntou—Água bendita?

Em vez de responder, deu um selvagem giro à garrafa. A parede inteira de prateleiras se balançou para dentro, revelando uma passagem que era inclusive mais úmido, frio…e escuro…que o que acabavam de atravessar.

—Sabia!  Exclamou Caroline.—Claro, apostaria que Wilbury soube todo o tempo.

Adrián se agachou sob o marco da porta oscilante.

—Provavelmente um de seus antepassados foi quem ajudou a construí-lo. Sua família serviu à meus durante séculos. Por isso é que ele foi ao único que alguma vez confiei o segredo do Julián. —Olhou por cima do ombro, seus olhos quentes por um elusivo instante. —Até ti.

Quando desapareceu nas sombras, Caroline se apressou atrás dele. Uns estreitos degraus de pedra abraçavam a parede circular, descendo em espiral para a escuridão. Enquanto descendiam com apenas a vacilante chama da vela para iluminar o caminho, Caroline se aproximou lentamente ao Adrian, agarrando um punhado de sua camisa em sua mão tremente. Pô-la atrás dele, entrelaçando seus quentes dedos com os seus.

Parecia que descendessem para o reino da eterna noite, algum reino escuro e proscrito por sempre da luz do sol que eles tinham deixado atrás. Caroline podia ouvir a água gotejando em alguma greta subterrânea e o débil chiado de algo que ela fervorosamente esperava fora outro rato.

Quando chegaram ao final das escadas, Adrián tocou uma tocha pendurada na parede e empapada de breu com a mecha da vela. A tocha flamejou à vida com um sinistro vaio, seu resplendor infernal transformou as sombras em monstros gigantescos.

—Bem-vinda a minha masmorra, —disse Adrián brandamente, arrancando a tocha de sua sujeição mantendo-a em alto.

Seus dedos escaparam dos seus, Caroline se deslizava adiante, seu medo momentaneamente substituído pelo assombro. Apesar da ausência das virgens do povo, a fria e úmida câmara de pedra era justamente como imaginou. Cadeias e grilhões penduravam nas paredes, de ganchos colocados em intervalos regulares, com os elos de ferro oxidados pelo desuso.

Caroline recolheu uns grilhões, estudando-os com mal dissimulada fascinação.

—Possivelmente possamos prová-los em outro momento se estiver tão disposta, —disse Adrián.

Devolveu-lhe o provocador sorriso de suficiência com uma própria.

—Só se estiver de acordo em lhe pôr isso.    

Arqueou uma sobrancelha, a nota rouca em sua voz fazia estragos tanto em seu corpo como em seu coração.    

—Por ti, meu amor? Com muito prazer.

Os grilhões se deslizaram de sua mão, golpeando a parede com um musical som metálico. Enquanto inspecionava a sombria caverna da habitação, uma impotente risada lhe escapou.

—O que acontece? —perguntou Adrián, suas duras facções se suavizaram pela preocupação.

—Estava pensando como gostaria a Porta tudo isto. Um misterioso desaparecimento. Passagens secretas. Uma verdadeira masmorra. É como uma cena de uma das ridículas histórias do Dr. Polidori. —Sem prévio aviso, umas cálidas lágrimas alagaram seus olhos.

Adrián cruzou para ela e a agarrou em um intenso abraço com um só braço— A encontrarei, —jurou, pressionando os lábios em seu cabelo.— Juro-o por minha vida.

Piscando para afastar as lágrimas, Caroline jogou atrás a cabeça para lhe oferecer um tímido sorriso.— Temos que nos assegurar que esta história acaba bem, verdade?

Já que Adrián foi o suficientemente amável para assentir, fingiu não ver a sombra de dúvida em seus olhos. Voltou-se, com a tocha frente a eles. Pela primeira vez, Caroline se deu conta da porta de madeira colocada profundamente na esquina, uma grade de ferro sua única janela ao mundo.

Embora meio esperava que Adrián levantasse a perna e chutasse a porta abaixo, simplesmente lhe deu um leve empurrão. Caroline ofegou, assombrada de novo.

Em lugar de uma cela infestada de ratos, a porta se abriu brandamente para revelar uma espaçosa habitação que poderia ter estado em qualquer lugar do castelo.

Da manta de cachemira atirada sobre o braço lavrado da chaise longue até as paredes cobertas de rica seda a China, o jogo de xadrez de mármore sobre a mesa do Chippendale a meia partida, era evidente que a habitação estava habitada por uma criatura que apreciava a comodidade. Poderia ser a opulenta habitação de um jovem rajá índio se não fora por uma coisa.

Não havia uma cama no estrado do centro da habitação, só um ataúde de madeira.

Caroline tragou, a visão lhe provocou um nó primitivo de temor em sua garganta. Jogou um furtivo olhar ao Adrian para encontrá-lo com os olhos entrecerrados e a mandíbula apertada. Dando-se conta de quão difícil deveria ser para ele, deslizou-lhe um braço.

Percorreu-a com o olhar.

—Tenho que te avisar que meu irmão não estará muito feliz de que o incomode. Inclusive quando era menino, sempre foi um jovem irascível.

Aproximou-se ainda mais a ele.

—Se insistir em estar carrancudo, avisaremos ao Wilbury para que lhe traga algumas bolachas e leite.

Sua inapetência era cada vez mais evidente, Adrian se moveu lentamente para o ataúde. Caroline lhe seguia passo por passo, lutando com seu próprio medo.

Agüentou a respiração quando Adrian alcançou e deslizou a um lado a pesada tampa. Enquanto a luz oscilante da tocha jogava em seu interior, deu-se conta que havia algo mais terrível que ver um vampiro real dormitando em seu ataúde.

Porque o ataúde estava vazio. Julian se tinha ido.

 

Julian estava convexo e encolhido no frio chão de pedra, seu corpo atormentado com agônicos espasmos. Tinham passado quinze horas desde que tinha tido algum sustento. A fome o estava devorando de dentro, a sede filtrando cada última gota de umidade das veias, as deixando tão seca como um interminável deserto sob o calor abrasador do sol. Embora sua pele estava geada, ardia em febre. Se permitia arder às chamas sem restrição, sabia que queimaria o último de sua humanidade, deixando atrás a uma besta voraz que poderia devorar inclusive a aqueles que ele amava para ter a oportunidade de sobreviver.

Com um grunhido mais animal que humano, deu um selvagem puxão às algemas que atavam os grilhões de seus pulsos à parede. Só umas poucas horas atrás poderia as haver arrancado do morteiro com uma só mão. Mas o crucifixo que Duvalier tinha posto em seu pescoço durante a larga noite tinha dobrado a drenagem de seu decrescente força. Embora Duvalier tinha vindo a tirá-lo ao amanhecer, seu rastro estava ainda na carne chamuscada de seu peito. A depravação absoluta do Duvalier tinha convertido um símbolo de esperança em uma arma de destruição.

Um frio estremecimento lhe atravessou, tão violento que inclusive podia ouvir seus ossos ranger todos de uma vez. Derrubou-se contra as pedras, as algemas escaparam de seus dedos.

Estava morrendo. Logo não estaria mais entre as hierarquias não consagradas dos mortos viventes, só os mortos. Sem sua alma, não havia promessa de redenção, nenhuma esperança do paraíso. Simplesmente se secaria completamente e se converteria em pó, deixando ao pó das cinzas de seus ossos pulverizar-se no vento.

Pressionou seus olhos fechados, a luz da única tocha muito brilhante para tolerá-la. Os versos de uma oração que ele e Adrián estavam acostumados a repetir na hora de deitar-se quando eram meninos se ecoavam em sua mente em um estribilho zombador. Nenhuma oração podia lhe proteger do intenso desejo de matar que devastava sua prudência e vontade. O impulso de alimentar-se foi suplantado por outros instintos, cada farrapo de decência humana, Adrián tinha brigado duro para conservá-la.

Gemendo, Julián voltou a cara para o chão. Inclusive se Adrián chegava a tempo, não sabia se toleraria que seu irmão o visse assim outra vez. Quase desejou que Duvalier o tivesse deixado encadeado em algum verde claro do bosque onde os cruéis raios do sol tivessem acabado com sua miserável existência antes que ninguém se desse conta que tinha desaparecido.

De repente a cara de Porta Cabot se levantou frente a ele na escuridão, toda encanto peralta e fresca inocência. Perguntava-se se choraria sua morte quando se fora. Choraria sobre seu travesseiro e sonharia com o que poderia ter sido? Tratou de evocar uma imagem dela sentada a seu lado no banco do piano, mas tudo o que podia ver era a luz da vela jogando sobre a grácil curva de seu pescoço, o tentador pulsado do pulso ao lado de sua garganta quando se inclinou para lhe sorrir. Podia ver-se inclinado sobre ela, roçando com seus lábios a pele cremosa e acetinada... Antes de afundar suas presas profundamente em sua carne suculenta, tomando sua inocência e seu sangue com a mesma impiedade.

Uivando com negativa, Julián se equilibrou sobre seus joelhos, jogando-se contra o peso de suas algemas uma e outra vez até que finalmente se paralisou em um exausto montão.

Nunca ouviu o chiado da porta ao abrir-se. Não soube que já não estava só até que a voz melodiosa do Duvalier se verteu sobre ele como veneno adoçado.

—Decepcionaste-me, Jules. Esperava muito mais de ti.

 

É a pequena, quem fica ao redor me seguindo como se fora alguma classe de cachorrinho doente de amor que só pede um bocado de minha atenção. Ela é quem me olhe fixamente com aqueles olhos azuis encantados como se eu fora a resposta a cada reza. Se eu fosse cometer um deslize, não pensa que seria com ela?

Adrian comprovou o carregador de sua pistola com enérgica eficácia antes de guardá-la no cinturão da calça, as palavras de seu irmão o freqüentavam tanto como o olhar fixo do Caroline.

Enquanto ela olhava a entrada de seu recamasse, olhou novamente dentro do arca derrubado que tinha cruzado oceanos e tinha viajado a metade de caminho ao redor do mundo com ele e Julian, tirou uma capa negra. A qual colocou ao redor de seus ombros, assegurando as dobras volumosas com um broche de cobre.

Pinçando no fundo do arca, encheu vários bolsos interiores da capa com meia dúzia de estacas de madeira esculpidas de álamo e espinheiro selvagem, todas afiadas a um ponto letal, várias facas de várias formas e tamanhos, três garrafas de água bendita, e uma mola de suspensão em miniatura.

Deslizava uma lâmina de prata pequena mas mortal na vagem interior de sua bota quando Caroline se aproximou furtivamente, olhando atentamente na arca.

—vais encontrar a minha irmã ou lutar em uma guerra?.

Fechando de repente a tampa, Adrian deu a volta para confrontá-la. Era agudamente consciente da cama detrás dela. Os lençóis ainda estavam enrugados de seu amor, e não podia menos de sentir que profanava de algum jeito este lugar sagrado com seus instrumentos de destruição. Vendo as manchas nos lençóis, que foram deixadas da inocência do Caroline, sentiu-se parecido a um dos monstros que se dispunha a caçar.

—Se Duvalier estiver de algum jeito comprometido —disse—então vou fazer ambos.

Deu meia volta para a porta, mas lhe agarrou o braço antes que pudesse escapar.

—E se isto não é Duvalier? O que fará então?

Atirou seu braço de seu afeto, encontrando seu olhar fixo acerado.

—Meu trabalho.

Ia a metade de caminho através da torre quando se deu conta que ia detrás dele.  Girou para confrontá-la.

—Onde demônios pensa que vai?

—Contigo.

—De maneira nenhuma!

—Certamente que se. É minha irmã.

—E ele é meu irmão!

O um ao outro se fulminaram com o olhar, podia-se ouvir o eco de seu rugido em meio deles. Caroline finalmente levantou seu queixo e disse:

—Não pode me dizer que fazer. Não é meu marido.

Os olhos do Adrian se alargaram de incredulidade.

—E caso que eu fora seu marido, obedeceria cada ordem?

Caroline abriu a boca, logo voltou a fechá-la outra vez.

Ele soprou. 

—Não pense.

Ele passou seus dedos pelo cabelo, logo a agarrou pela mão e arrastou suas costas ao peito. Ainda murmurando imprecações sob seu fôlego, desenterrou do arca, uma capa ligeiramente mais curta, e a pôs ao redor de seus ombros. Ela se sustentou de pé com paciência enquanto lhe prendia armas de cada variedade em cada bolso concebível.

Quando a equipou com duas garrafas de água bendita, disse:

—Sempre deve recordar que não são os artigos benditos os que um vampiro teme. É a fé nestes artigos. A fé é um inimigo que nunca podem derrotar totalmente.

Quando Caroline assentiu com a cabeça obedientemente, ele deu meia volta e andou a pernadas para a porta. Não foi até que Caroline deu seu primeiro passo para segui-lo que se precaveu que estava tão pesada pelas armas que logo que podia andar.

Suspirando, deu marcha atrás e começou a despojar a das mais pesadas. Evitando seus olhos, ele bruscamente disse:

 —Quando encontrei a Eloisa esse dia no inferno de jogo de azar, tratei de beijá-la. Suponho que pensei que poderia esquentá-la com minha carne, que poderia respirar de algum jeito a vida através dela. Mas seus lábios eram frios, azuis e inflexíveis. Já não sou capaz de resistir—passou as gemas dos dedos aos lábios do Caroline, meigamente remontando seus contornos aveludados— Se tal coisa passasse a sua formosa boca…

Ela agarrou sua mão com a sua, pressionando sua bochecha.

—Posso ter posto seu vestido, Adrian, mas não sou Eloisa. Se tivesse sabido que ela estava em perigo antes que fora muito tarde, estou convencida que a teria salvado. Do mesmo modo que vais salvar a minha irmã. E a seu irmão —o olhou fixamente, seus lábios se torceram em um trêmulo sorriso— Acredito com todo meu coração porque tenho fé em ti.

 

Quando a sombra do Duvalier caiu, Julian investiu, expondo seus dentes com um grunhido

—Ah, isto é melhor!  —Disse Duvalier, com seus lábios torcidos em um sorriso—Prefiro te ter me grunhindo como um cão louco que te encolhendo na esquina como um cachorro açoitado.

Apertando os dentes contra uma ronda fresca de frieza, Julian disse:

—O único louco por aqui, Victor, é você.

Duvalier feito atrás o capuz de sua capa deixando ver seu lustroso cabelo negro comprido. Levantando seus ombros em um encolhimento galo, disse:

 —Temo que a loucura, como tantas coisas, esteja no olho do observador. —Seu acento francês só se feito mais profundo em seus anos longe da Inglaterra, abrandando suas consoantes a um ronrono rouco— Uns poderiam considerá-lo até um presente, justo como a imortalidade.

—Considero ambos uma maldição —Cuspiu Julian.

—Por isso sou mais forte que você. Muito mais poderoso. Gastei os cinco anos passados me abraçando ao que sou, enquanto você gastaste os cinco anos passados correndo disso.

—Aonde estive de pé, o único que corria foi você.

O sorriso do Duvalier já não se refletia em  seus olhos.

—Tenho só a culpa disto. Parece que subestimei a persistência de seu irmão. Pensei que estaria obrigado a te destruir ou você o destruiria.

—O que subestimou é seu amor por mim e sua determinação de te caçar nos limites da terra.

—Se realmente te amasse, aceitar-te-ia como é, ou não? —Suspirando, Duvalier sacudiu sua cabeça— Quase me compadeço de ti. Não quer ser um vampiro, mas não é um homem, tampouco. Me diga, o que pensa quando está com uma mulher? Pensa no aroma de sua pele, na brandura de seus peitos, o prazer que pode te dar com suas mãos, sua boca, aquela pequena fenda doce entre suas pernas? Ou escutas o batimento do coração de seu coração sob o teu quando entra nela, o sussurro irresistível do sangue que se precipita por suas veias quando a faz vir-se?

Julian gemeu como se uma adaga o tivesse atravessado. Dobrando-se, derrubo-se a seu lado.

Duvalier se ajoelhou ao lado dele, sua voz suave ainda implacável.

—É um homem que adora às mulheres, ou não? Ainda em todos estes anos, nunca te permitiste uma virgem. Por que é? Pensa que é indigno para profanar tal tesouro? Ou tem medo que o aroma do sangue de sua inocência pudesse te voltar louco? Tem medo que pudesse despertar sem a memória de como a moça com a boca frouxa e olhos  mortos chegou a seu lado?

Julian pôs suas mãos sobre seus ouvidos, lançando um gemido.

Duvalier acariciou seu cabelo, seu toque quase era suave.

—Pobre moço. Fiz-o, sabe. Quando jogava caçador de vampiro com seu irmão e sua nova puta, alguma vez te ocorreu que eu poderia lhe caçar também?

Julian tinha medo de pensar, medo de sentir, medo de esperar, quando Duvalier colocou uma chave em um bracelete e logo na outra. As esposas de ferro desapareceram, liberando suas mãos do peso das cadeias.

Julian deu ao Duvalier só tempo para elevar-se a seus pés antes de investir para sua garganta, com as presas expostas. Duvalier saltou facilmente fora de seu alcance, Julian deu tombos avançando uns passos, logo se estrelou em um joelho. Inclusive sem as algemas, a carga do crucifixo gravado em seu peito conectado com a fome o tinha deixado muito fraco para lutar. Fraco para fazer algo agora, sem comida. Logo só teria forças para morrer.

 Duvalier cacarejou com compaixão.

—Possivelmente é tempo de que te demonstre que até um monstro como eu é capaz de ter piedade.

Ficando-a capuz de sua capa para proteger-se da luz do sol, esquivou a porta. Reapareceu uns segundos mais tarde levando um vulto que se retorcia.

Julian lambeu seus lábios secos. Possivelmente  Duvalier havia lhe trazido uma ovelha ou algum outro animal para sustentá-lo. O bastardo era bastante sádico para o ter vivo, e prolongar sua tortura.

Quando Duvalier pôs a carga a seus pés e sacudiu o vulto, a antecipação indefesa do Julian girou a horror.

Porta estava de pé ali, suas mãos ligadas por diante  e uma mordaça de seda enchia seus formosos lábios. Seu cabelo caiu ao redor de seus ombros em selvagem desorganização selvagem e suas bochechas estavam manchadas de sujeira. A musselina azul raiada de seu vestido estava rasgada e manchada em vários lugares, como se tivesse apresentado uma luta valente contra as maquinações do Duvalier.

Quando o viu, soltou um grito surdo, a esperança brilhava em seus olhos aterrorizados. Ela não tinha nenhum modo de saber que confrontava seu destino.

Embora isto tomasse a última onça de sua força, Julian conseguiu cambalear-se a seus pés.

—Não! —ele sussurrou—Não te deixarei matá-la do modo que matou a Eloisa!

O sorriso do Duvalier era como a oferta de  um amante.

—Ah, não vou matar-la. Você sim.

Mofando-se pelo triunfo, Duvalier lançou a Porta diretamente nas mãos do Julian. Com seus sentidos aumentados pela fome, podia cheirar seu medo, ouvir cada matiz rítmico do sangue que bombeava seu caminho por seu coração como uma carreira de cavalos. Quando pressionou seu corpo tremente contra ele, seu corpo reagiu com uma luxúria tão penetrante como nunca havia sentido.

—Não —sussurrou, sentindo o alongamento de suas presas.

—Quando a tirei ontem à noite pela janela de seu recamasse, pediu-me que tomasse. Então disse, tenho piedade. —Varrendo sua capa ao redor, Duvalier girou para ir-se.

Tragando os últimos sedimentos amargos de seu orgulho, Julian lançou um gritou:

—Não me faça isto, Victor! Por favor! Peço-lhe isso!

 Duvalier se encolheu de ombros como se suas palavras fossem só uma nova idéia.

—Se  não querer matá-la, sempre poderia esperar até aquele momento precioso quando seu coração golpeia seu último pulsado e sorver a alma diretamente. Então  seria um de nós e poderia desfrutar de do prazer de sua companhia para toda a eternidade.—Demorou só um momento para dar ao Julian um último sorriso é sua opção.

Então a porta se fechou, a chave no cadeado se escutou como um estrondo.

 

Quando Adrian e Caroline escaparam por uma das portas janela do quarto de café da manhã, procurando evitar os olhos curiosos dos criados, encontraram ao Vivienne e Larkin no terraço esperando-os.

Vivienne tinha posto um gorro bastante pequeno e uma capa verde florestal, enquanto Larkin vestia sport, uma pistola e uma expressão resolvida.

—Isto não pode ser certo —disse Adrian, dobrando suas armas sobre seu peito e contemplando-os com os olhos entrecerrados.

Caroline passou diante dele, fulminando com o olhar a sua irmã.

—Se pensar durante um minuto que vou permitir que nos acompanhe, senhorita, então este pequeno gorro tolo deve estreitar seu cérebro.

Vivienne se preparou com uma régia aspiração .

—E por que não deveria eu de te acompanhar? Porta também é minha irmã.

Tendo sido derrotado com o mesmo argumento, Adrian desfrutava de do desconcerto do Caroline.

—Tem um ponto válido, querida.

Caroline girou para ele furiosa.

—Quem te perguntou?

Recordando que ia armada, levantou suas mãos em um gesto de rendição e retrocedeu, trocando um olhar cauteloso com o Larkin.

As duas irmãs não tiraram o pé do talão, nenhuma vacilação nem signos de retroceder.

—Porta pode estar em problemas —disse Caroline— Não estou preparada para deixar que ponha em perigo também. Não tenho o tempo, nem inclinação das resgatar às duas.

—Não peço sua permissão —replicou Vivienne— É minha irmã, não minha mãe.

Larkin teve que aplaudir as costas do Adrian quem teve um repentino ataque de tosse.

Depois de um momento de silêncio, Caroline respirou.

 —Bom, sua pequena mucosa ingrata! Depois de que todo que tenho feito por ti, todo que sacrifiquei, como  poderia....

Vivienne começou a falar diretamente .

—Ninguém alguma vez te obrigou a desempenhar o papel de mãe ou mártir. Se não fosse tão orgulhosa e tão cabeçuda, poderia ter sido capaz de pedir uma mão de vez em quando. Tudo o que tinhas que fazer era dizer, ‘Vivienne, opor-te-ia a pôr o arco no cabelo de Porta hoje?’ ou 'Vivienne, por que não baixas correndo ao mercado e nos escolhe um agradável...

—Poderia, se, mas você tinha a sessão provavelmente ocupada diante do espelho para pentear seus largos cachos de ouro ou praticar como dedilhar os i com pequenos corações ridículos ou te provar todos os vestidos formosos que Mãe tinha feito para ti!

Vivienne ofegou.

—por que, sua vaca ciumenta! Eu poderia te haver emprestado vestidos durante um tempo, mas ao menos nunca por acaso deixei sua boneca favorita sentada perto do fogo!

Caroline se inclinou avançado até que seu nariz quase tocou ao Vivienne, com um sorriso repugnante que encurvou seus lábios.

—Quem disse que isso foi um acidente?

Quando cada uma delas se lançou a uma nova diatribe, detalhando os defeitos da outra uma durante as duas décadas passadas, Adrian deu um toque ao Larkin no ombro e sacudiu sua cabeça para os bosques.

Eles tinham chegado quase ao bordo do achaque quando a cabeça do Caroline de repente volteou a seu redor.

—Vocês dois onde acreditam que vão?

Adrian suspirou.

—A encontrar a Porta e ao Julian.

—Não sem nós! —Agarrando ao Vivienne da mão, Caroline arrastou a sua irmã do terraço para os bosques. —Os homens não são as criaturas mais impossíveis? Passas uma noite em suas camas e  pensam que só porque lhe deram umas horas de prazer inexprimível,  podem passar o resto de sua vida decidindo que é o melhor para ti.

Vivienne sacudiu afirmativamente com a cabeça.

—São absolutamente insuportáveis. Por que, Alastair rechaçou me deixar vir hoje até que  consentisse em ter posto um par de suas botas! —Levantou sua prega para mostrar as botas desajeitadas.— Tive que me pôr meia dúzia de pares de meias  para que ficassem. Agora meus pés parecem grandes fatias feias de presunto.

—Pobre cordeiro —cantarolou Caroline, unindo seu braço ao do Vivienne—logo que encontremos a Porta e ao Julian, daremos a seus pés um bom escalda-pés frente ao fogo.

Quando passaram aos homens, ainda conversando como araras, Adrian e Larkin intercambiaram um olhar de dúvida.

—Parecem que encontraram um inimigo em comum —murmurou Larkin.

—Sim —suspirando Adrian esteve de acordo— Nós.

Andaram com dificuldade sobre colina e vale, caminharam na água em correntes frias, e esquivaram o beiral de execução na forca,  passaram desdo covas e praias, procurando o Julian e seus lugares prediletos de menino, Caroline quase lamentava não ter tomado emprestados um par das botas do Adrian. O revestimento das botas que usava, estavam tão magros que podia sentir a mordida de cada rocha e raiz.

Tinha sofrido um colapso de esgotamento em mas de uma ocasião, mas cada vez que tropeçava, a mão do Adrian estava aí. Cada vez que sua força vacilou, a vista de sua cara decidida a aguilhoava a que continuasse.

Estava-a ajudando a passar um tronco cansado com uma fissura escarpada e rochosa quando ele murmurou:

 —Prazer Inexprimível, né?

Caroline baixou sua cabeça para esconder seu sorriso.

—Não tem que parecer tão satisfeito. Suponho que isto era só…passível.

—Só passível? —Deu a sua mão um puxão, não lhe dando nenhuma outra opção, só tropeçar contra ele. Com a brandura de seus peitos esmagados contra seu peito, olhou-a fixamente e viu em seus brilhantes olhos uma promessa.— Então pareço que não terei nenhuma outra opção, só redobrar meus esforços esta noite.

Esta noite, quando Porta e Julian estivessem seguros. Esta noite, quando estivessem enroscados na cama acolhedora do Adrian, fazendo planos para suas bodas, rindo do medo que seus tolos irmãos lhes tinham dado. Contemplando seus olhos, Caroline podia ver como ambos queriam acreditar naquele futuro.

Mas quando o dia minguou, suas esperanças também. O sol desapareceu detrás de um véu de nuvens e uma chuva ligeira começou a cair, apressando o pendente do crepúsculo. O pequeno gorro animado do Vivienne começou a inclinar-se. Quando este sofreu um colapso, atirou-o longe e desprezou com desgosto, ficando o capuz da capa sobre seu cabelo.

Surgiram das sombras do bosque para encontrar-se em um grande claro. Um edifício baixo e largo se elevava  em meio disso, com pedras antigas  e encravado pelo líquen. Uma pedra gel montava guarda sobre a entrada, sua cara severo  lhes adverte que este não era nenhum asilo para o cansado viajante.

—O que é este lugar? —Caroline sussurrou, perturbando o silêncio pouco natural.

—A cripta da Família Kane —murmurou Adrian em resposta.

Ela tremeu, pensando que não era surpreendente que as vozes da vida parecessem tão inoportunas aqui.

Adrian escolheu um caminho sobre a manta de folhas esmagadas e empapadas, com cautela aproximando-se da cripta. O resto  detrás  com relutância. Mas uma vez que ele alcançou a porta da cripta, simplesmente posou a mirarada fixamente na manga de ferro ornamentado.

—O que é isso? —perguntou Larkin, sustentando ao Vivienne mais perto.

Adrian levantou a cabeça. Caroline poderia pensar que era a mesma expressão que quando ele esteve de pé fora daquele inferno de jogo de azar com o corpo da Eloisa dentro e o olhou queimar-se.

—A porta da cripta nunca foi aberta ao exterior antes. Não tem que preocupar-se de que seus ocupantes escapem.

Caroline sentiu os diminutos cabelos de sua nuca arrepiar-se de temor.

—lhes apartem —Adrian mandou, tirando a pistola do cinturão de sua calça.

Quando  retrocedeu vários passos, o resto o seguiu.

Apontou e atirou do gatilho, rompendo o cadeado de um só tiro. O som agudo da pistola ressonou pelo claro. Quando a fumaça que se elevou como a névoa devagar se limpou, a porta da cripta com um rangido se abriu.

 

   Julian entrou cambaleando-se pela porta da cripta, levando a Porta como a uma menina em braços. Sua cabeça pendurava sobre seu braço, seus negros cachos se derramavam até seus quadris. Seus olhos estavam fechados, sua pele mortalmente pálida, tão pálida que não havia engano possível no par das gema incisões que danificavam a cinzenta perfeição de sua garganta.

Um esmigalhado soluço escapou dos lábios do Caroline. Os joelhos doe Vivienne cederam e Larkin se deixou cair com ela, abrigando-a em seus braços para amortecer seus soluços contra seu peito.

Sua cara era inclusive mais formosa e terrível que a de um anjo guardando o sepulcro, Adrian procurou dentro de sua capa e tirou uma estaca de madeira.

Começou a apartar-se, mas Caroline lhe agarrou o braço, contemplando-o.

—Não, Adrian —sussurrou ela com ferocidade, cravando seus dedos em sua manga—Olhe seu peito. Está viva!.

Embora o movimento era quase imperceptível, o peito de Porta subia e baixava ritmicamente.

Julian se cambaleou para eles, suas lágrimas mesclando-se com a chuva. Caroline ofegou, sem dar-se conta até esse momento que ele se via inclusive mais perto da morte que Porta. Seus olhos estavam ocos, suas bochechas afundadas, sua pele tão pálida como o pergaminho. Seus dentes se viam espantosamente brancos em comparação a seus azulados lábios.

Sua voz era pouco mais que um rouco grasnido.

—Só tomei o que necessitava para sobreviver —Baixou o olhar à cara de Porta com dilaceradora ternura— não o teria feito se a pequena obstinada idiota não tivesse insistido. Tentei lhe advertir que era muito perigoso, que não confiava em mim mesmo para me deter antes que fosse muito tarde, mas não escutou.

Quando se derrubou sobre seus joelhos, ainda embalando a Porta contra seu peito, todos eles ficaram em movimento. Larkin agarrou gentilmente a Porta de braços do Julian com a ajuda do Viviene enquanto Adrian punha ao Julian sobre seu regaço.

—Nunca quis que me visse assim outra vez—balbuciou Julian através de seus trementes dentes. Aferrou-se ao Adrian, seu corpo se sacudiu com incontroláveis tremores— Não quero que ninguém vê—veja o que Victor me fez. Que descubram o terrível m—m—monstro que sou.

—Não é um monstro. —Adrian acariciou com cuidado o cabelo empapado de suor apartando o de sua cara, sua própria mão tremia.— Se fosse, Porta estaria morta agora mesmo.

Julian piscou ante ele.

—Se não ser um monstro, Então que sou?.

—É o que sempre foste e o que sempre será —Adrian apoiou sua frente contra a do Julian e fechou os olhos, mas não antes que Caroline pudesse ver as lágrimas brilhando neles — Meu irmão.

—Como vai? —sussurrou Caroline, ficando na soleira da torre sul várias horas depois.

Adrian estava recostado em uma cadeira ao lado da cama em mangas de camisa e calça, suas largas pernas estendidas frente a ele e seu queixo apoiado sobre sua palma. Embora seus olhos lhe fechavam de esgotamento, o brilho da vela revelava que não tinham perdido nada de seu vigilante brilho.

Tinha insistido em subir ao Julian ele mesmo por esses cinco pisos de escadas e lhe instalar em sua própria cama. O amanhecer se estava aproximando e as pesadas cortinas de veludo da torre tinham sido corridas para assegurar-se que não havia risco de que um simples raio de luz de sol penetrasse na habitação.

—Está descansando bem —disse Adrian quando Caroline se aproximou da cama. Seu carinhoso olhar descendeu sobre o dormido rosto de seu irmão.— Voltará a me criticar por levar as gravatas torcidas e me dará uma surra ao xadrez em não muito tempo.

Os lábios do Julian tinham perdido seu tom azulado e a cor estava retornando lentamente a suas bochechas. Caroline apartou seus olhos da taça que descansava sobre a mesa ao lado da cama, sabendo que não tinha que perguntar se continha vinho tinjo.

—Como está Porta? —Perguntou Adrian.

—Positivamente insofrível —lhe assegurou Caroline.—Continua exigindo copos de água fresca e bolo de rins e desfrutando-se, em que ela e o Dr. Polidori tinham razão, todo este tempo, a respeito da existência dos vampiros. Vivienne insistiu em fazer-se carrego de Porta por um tempinho, e não ousei me negar.—Fez uma careta ante a destroçada prega do vestido da Eloisa. — Além disso, não podia esperar para me tirar este vestido e pedir um banho de vapor.

—Está segura que não quer que chame ao Dr. Kidwell para que a examine? Posso me encarregar de algumas pergunta embaraçosas se tiver que fazê-lo. Especialmente com o Alastair de meu lado. As autoridades locais provavelmente estariam bastante impressionadas com um policial londrino.

—Não, obrigado —replicou ela estremecendo-se.— O doutor provavelmente só quereria sangrá-la.

Adrian vacilou.

—Porta falou a respeito do que aconteceu na cripta?

Caroline negou com a cabeça antes de dizer brandamente.

—Não acredito que vá fazer o nunca. —Estudou a atrativa cara do Julian, pensando no infantil e inocente que parecia em repouso.— Lambe o chão pelo que anda. Faria algo por ele.

Caroline descansou sua mão sobre o ombro do Adrian, recordando esse terrível momento quando este acreditou ter observado como seu irmão tinha assassinado a sua irmã…e qualquer esperança de futuro que possivelmente tivessem compartilhado.

Esperou que Adrian cobrisse sua mão com a sua. Mas em troca se levantou da cadeira, deixando que sua mão pendesse torpemente no ar.

Caminhou para as portas francesas e apartou a um lado as pesadas cortinas, observando no interior da minguante noite.

—O que há a respeito do Duvalier? —perguntou, o nome um venenoso juramento em seus lábios.— O que há dito Porta a respeito dele?

Caroline sentiu como lhe endureciam os rasgos.

—Disse-me que a tinha raptado antes inclusive de que pudesse chegar à festa, que a manteve atada em alguma cova toda a noite, que a jogou naquela cripta com o Julian como se não fosse nada mais que um pedaço de carne crua.

Adrian soltou um juramento.

—Desde que começou tudo isto, esse bastardo, não se atreveu nenhuma só vez a enfrentar-se comigo cara a cara. Deveria ter sabido que esta vez não seria diferente. Provavelmente agora mesmo esteja a milhas daqui.

—O dia de ajustar contas chegará, Adrian. Responderá por cada vida que destruiu, cada preciosa alma que roubou, incluindo a do Julian. Juntos, assegurar-nos-emos disso.

Adrian continuou observando a noite.

—logo que Porta esteja o bastante forte para viajar, quero que a agarre a ela e ao Vivianne e deixem este lugar.

—Estou segura que o Policial Larkin estaria mais que disposto a ver minhas irmãs voltando para a segurança da casa da Tia Marietta.

—Alastair já acordou lhes escoltar a vocês três a Londres.

Caroline sorriu.

—Assim que os dois estiveram conspirando a nossas costas né? Isso não é muito esportivo de sua parte. Simplesmente teria que lhe haver dito ao bom do policial que não vou a nenhum lado sem ti.

—Sim, fará-o. Vais voltar para Londres e vais pretender que os últimos quinze dias nunca aconteceram.

Seu sorriso decaiu.

—Não pode me pedir isso.

—Não lhe estou pedindo isso.—Adrian se voltou para enfrentá-la, seus olhos se encontraram com os dela pela primeira vez desde que tinha entrado na torre. O que viu em suas desoladas profundidades a estremeceu até o osso.

Apesar de sua crescente apreensão, conseguiu rir fracamente.

—Pensava que já tínhamos esclarecido que não tem direito a me dar ordens. Isso só pode consegui-lo com uma licença especial do Arcebispo.

Ele sacudiu a cabeça antes de dizer brandamente.

—Temo-me que não possa me permitir adquirir essa licença. Não quando isto poderia nos custar tanto aos dois.

—Esse é um preço ao que estou mais que disposta a pagar.

—Mas eu não. Quando Julian saiu cambaleando-se dessa cripta com Porta em seus braços, ambos o meio mortos, dava-me conta que tinha sido um parvo em acreditar que eu poderia lhes proteger a algum de vós. Isso é pelo que tem que ir agora… antes que seja muito tarde.

—Como pode admitir que me quer, e ao seguinte fôlego me pedir que te deixe?.

Indicou com um dedo a forma imóvel do Julian.

—Porque poderia ser você a que estivesse tendida nessa cama agora mesmo. Ou pior ainda, tendida em sua tumba. Ninguém a quem amo estará a salvo até que Duvalier esteja destruído. E até esse dia, não posso confrontar nenhuma distração mais.

—Isso é tudo o que sou para ti?—murmurou Caroline—Uma distração?

Avançou para ela, sua cara tensa com a angústia.

—Se disser que sim, Irá? O que acontece se digo que a noite que passamos juntos não foi mais que uma agradável diversão passageira? Que é mais fácil de seduzir que a maioria? Que encontro sua falta de experiência aborrecida e que prefiro muito mais as peritas carícias de uma prostituta e bailarinas de ópera que seus torpes manuseios e superexcitadas declarações de amor?.

Caroline lhe deu as costas afastando-se dele, incapaz de deixar de estremecer-se sob o látego cruel de suas palavras.

Agarrou-a pelos ombros, sacudindo-a.

—É isso o que quer ouvir de meus lábios? Se te disser que minha única intenção desde o começo era te seduzir, depois te descartar, odiaria-me o bastante para me deixar?.

—Não —sussurrou, olhando-o através de um véu de lágrimas.— Isso só me faria te amar mais, por que saberia que me ama o bastante para pôr sua própria alma em perigo por dizer tão descarada mentira.

Contendo um inarticulado juramento, Adrian a liberou e se apartou uns quantos passos.

—Possivelmente você esteja disposta a arriscar sua própria vida para ficar comigo, Mas que passaria se trouxermos um menino ao interior de toda esta loucura? Estaria disposta a arriscar sua vida, sua alma, também?

Caroline se levou uma mão a seu estômago.

—esqueceste que poderia já estar levando a seu filho?

Adrian possivelmente fosse capaz de ocultar seu amor por ela detrás de uma máscara de decisão, mas não podia disfarçar o desesperado desejo em seus olhos quando olhou seu ventre. Só então ela se deu conta de que tinha cometido um engano tático.

—Mais razão para que vá —disse ele brandamente, elevando lentamente os olhos para encontrar-se com os seus.

Sentiu as lágrimas que escorregavam por suas bochechas.

—Se fizer isto, Adrian, então Duvalier já ganhou.

E ela tinha perdido. Esse conhecimento tinha um sabor tão amargo como cinza na boca de Caroline.

Decidida a demonstrar que podia ser tão desumana como ele, parou-se frente a Adrian.

—Se fosse uma prostituta ou uma bailarina de ópera, deveria-me ao menos um último beijo —Cavando sua cara em suas mãos, ficou nas pontas dos pés e pressionou seus lábios contra os dele, ao igual a tinha feito essa mágica noite no Vauxhall onde lhe tinha devotado tanto seu beijo como seu coração sem dar-se conta.

Ele estava inclusive mais impotente para resistir ao que lhe oferecia agora. Quando seus lábios se separaram para lhe dar a bem-vinda ao meloso varrido de sua língua, seus braços a rodearam, amoldando suas curvas aos duros planos de seu corpo. Quando começou a fazê-la retroceder, puxando-a para o biombo do vestidor do outro lado da habitação, ela se uniu de boa vontade ao baile.

Afundou-se sobre o tamborete que havia depois do biombo e a sentou em seu regaço, sem abandonar jamais a ambiciosa reclamação de seus lábios. Caroline reconhecia a urgência em seu beijo por que era quão mesma corria por suas veias, uma desesperada fome celebrava a vida no tenro redemoinho de sua língua através de sua boca, o quente fôlego de seu suspiro, o irresistível pulso que golpeava onde seus corpos doíam por unir-se. Isto era um rechaço à morte e escuridão e a toda a corte de sombrios horrores cometidos por um monstro como Duvalier.

Enquanto puxava para baixo o sutiã de seu vestido com uma mão, a boca dela se entreteve na audaz curva de sua mandíbula, saboreando a salgado doçura de sua pele, o te sugiram roce de suas costeletas contra seus sensíveis lábios.

Ela levantou a cabeça para encontrar as curvas marfim de seus peitos expostas a seu entrecerrada olhar. Seus mamilos estavam já amadurecidos e rosados como frescas cerejas.

—Seu irmão…—ofegou , atando os dedos em seu cabelo.

—Estará morto para o mundo durante horas, —prometeu-lhe, arrastando seu mamilo ao interior de sua boca e chupando-o com uma feroz e tenra fome que a deixou ofegando com necessidade e apertando juntas suas coxas contra um pressuroso líquido de desejo.

Trocando sua posição no tamborete, passou uma de suas pernas sobre as dele, de modo que ela se sentasse escarranchado sobre o crescido vulto rígido que atirava da suave pele de manteiga de suas calças.

Caroline reprimiu um gemido, só esse delicioso prazer bastava para enviar tremores de antecipação através de seu sob ventre. Esses tremores se converteram em estremecimentos quando a mão do Adrian desapareceu sob sua saia, seus hábeis dedos se deslizaram na profunda suavidade de sua coxa para procurar a estreita abertura em seus calções de seda. Quando ela tinha espiado aos amantes no Vauxhall, perguntou-se que poderia ter estado fazendo a mão do homem sob a saia da mulher para fazê-la retorcer-se e gemer tão desavergonhadamente. Agora sabia.

Desde que já estava gotejando de desejo por ele, não havia necessidade de que Adrian a preparasse para o que ia começar. Ainda seus dedos se entretiveram contra sua ansiosa e tremente carne, obrando sua habilidosa magia até que se viu obrigado a capturar seu selvagem grito de abandono em sua boca. Ainda beijando-a como se fosse a única mostra do céu que poderia conhecer jamais, abriu-se a lapela frontal de suas calças e se conduziu a si mesmo através da abertura dos calções dela e a seu interior.

Esta vez não se contentou deixando-a manter o ritmo. Cavando seu traseiro em suas grandes e fortes mãos, levantou-a do tamborete. Ela envolveu suas pernas ao redor de sua cintura, aferrando-se a ele, impotente, enquanto a apoiava contra a parede mais próxima e se afundava nela uma e outra vez, suas largas e profundas investidas golpeavam a mesma boca de seu útero enquanto sua língua forçava sua boca com igual crueldade.

Justo quando Caroline pensou que não poderia agüentar outro segundo de agradar sem deixar escapar um grito o bastante alto para despertar aos mortos, Adrian se retirou para um embate final que ameaçava partindo seu corpo e coração em dois.

Ela se derrubou contra sua garganta, ainda empalada por sua estremecedora longitude. Desejou que pudessem ficar dessa maneira para sempre com seus corações pulsando como um, seus corpos unidos e palpitando com aliviou. Adrian se deslizou lentamente pela parede, ainda embalando-a em seus braços.

Já não poderia fingir indiferença. Quando sua voz soou no ouvido dela, estava rouca com urgência e pesar.

—Uma vez que esteja a salvo de volta em casa e nós estejamos fora da Inglaterra e voltemos sobre o aroma do Duvalier, escreverei-te. Enviarei-te dinheiro, todo isso que você e Porta possivelmente necessitem. Nunca terá que depender outra vez da caridade de ninguém. Já empreguei ao Alastair para que dirija alguns de meus assuntos em Londres assim Vivienne nunca terá que preocupar-se de onde virá sua próxima comida.

Caroline sentiu que cada gota de calor em sua alma se gelava. Cuidadosamente se levantou de seu regaço, ficando em pé. Com toda a dignidade que pôde reunir, subiu o sutiã e se ajustou a saia. Estava bastante perdida sobre como proceder de ali até que Adrian alcançou uma das prateleiras próximas e lhe tendeu um de seus lenços. lhe dando as costas, realizou as abluções necessárias.

Quando se voltou para ele, sua cara estava composta como se tivesse sido ela a que tinha estado na soleira do grande saguão e pretendesse ser Vivienne.

—Se crê que vou esperar te, então está equivocado.—Informou-lhe ela.—Temo-me que não serei capaz de fingir que esses passados quinze dias nunca aconteceram. Agora que me deste uma amostra dos prazeres que uma mulher pode encontrar nos braços de um homem, duvido que me contente passando o resto de minha vida em uma fria e vazia cama. Não precisa preocupar-se em mandar dinheiro. Se não poder encontrar um marido, então possivelmente possa encontrar algum homem bom e generoso que estaria disposto em me converter em sua amante.

Adrian abotoou a fronte de suas calças, seus olhos tão tempestuosos e perigosos como os tinha visto sempre.

—Exatamente quem vai ao inferno por mentir agora?

Caroline alisou a enrugada saia do vestido da Eloisa, continuando como se ele não tivesse falado.

—Não quero mais que lançar este vestido ao cubo do lixo, mas farei que os serventes o lavem e o engomem e lhe devolvam isso. Possivelmente te console quando só tenha a seus fantasmas para te manter quente pelas noites.

Com isso, voltou-se e o deixou. Com o Julian dormindo, não teve sequer a satisfação de bater as portas francesas detrás dela.

Caroline se apressou a baixar os degraus de pedra e começou a cruzar a ponte, arrojando quentes e furiosas lágrimas que caíam por suas bochechas quando caminhava. As estrelas se estavam desvanecendo e a chuva se deteve, deixando o mundo reluzente com a promessa de um novo amanhecer. Mas sem o Adrian, sabia que estaria apanhada por sempre em alguma deprimente noite das almas.

Diminuiu o passo quando alcançou o topo da ponte. Não tinha nenhuma pressa por voltar para seu solitário dormitório. Ali não havia nada que pudesse fazer exceto lavar o aroma do Adrian de sua pele por última vez e começar a empacotar.

—Estúpido, homem impossível—murmurou, dando-a volta para reclinar suas mãos sobre o parapeito da ponte. Cravou suas unhas na áspera pedra, lhe dando a bem-vinda ao potente picor. O vento moveu seu cabelo, tentando secar suas lágrimas antes que pudessem cair.— Deveria lhe haver atravessado o coração com uma estaca quando tive ocasião.

—Ao Adrian gosta ultimamente das mulheres sanguinárias, não é verdade?.

Caroline se voltou para encontrar uma figura encapuzada e com capa de pé no meio da ponte, lhe bloqueando o passo para seu dormitório. Podia ter jurado que não o tinha visto ali segundos antes.

—Como tem feito para chegar aqui? —perguntou, seu coração cambaleando-se a um ritmo irregular.

Tornou-se atrás seu capuz para revelar uma queda de cabelo negro e um sorriso totalmente aberto que era tão cruel como sensual.

—Possivelmente voei.

Caroline se esforçou por tragar-se seu crescente temor.

—Espero que não espere que acredite em tal sentido, Monsieur Duvalier. Julian já me disse que os vampiros não podem converter-se em morcegos.

 

O amanhecer estava chegando, mas não para o Adrian.

Caroline se tinha levado a última das luzes com ela, deixando-o sentado ao lado da cama de seu irmão, talher com um sudário de abatimento. Sem seu cabelo iluminado à luz das velas, o tenro brilho em seus olhos, o carinhoso calor de seu sorriso, estava condenado a morar na sombra, totalmente indistinguível das criaturas que ele caçava.

Adrian fechou seus olhos, mas tudo o que podia ver era ao Caroline agitando seu lenço ante ele na sala de desenho da casa do povo; ficando nas pontas dos pés para pressionar audazmente a tentadora suavidade de seus lábios contra os seus no Vauxhall; tendida entre os travesseiros de sua cama, sua pele marfim banhava em luz de lua, seus braços totalmente abertos para lhe dar a bem-vinda. Adrian se esfregou sua dolorida fronte, vindo a dar-se conta que ela ia estar rondando-o como uma vingança que inclusive Eloisa nunca tinha mostrado.

Julian se revolveu, lhe dando uma desculpa para abrir seus olhos e escapar dela, tão só por um momento.

Os olhos do Julian pestanejaram abertos. Lambendo-os lábios, grasnou.

—Ainda sedento.

Sujeitando a cabeça do Julian, Adrian inclinou a taça para seus lábios. Julian tragou, os músculos de sua garganta trabalhavam com ânsia. Embora o primeiro instinto do Adrian era o que sobressaía, tinha aprendido fazia muito tempo que não podia ser fastidioso quando se tratava dos hábitos alimentícios de seu irmão. O sangue era quão único o sustentava, era vida.

Quando Julian o bebeu tudo, voltou-o a depositar brandamente contra os travesseiros.

—Nosso plano—sussurrou Julian, piscando. —Funcionou.—

O que quer dizer?—perguntou, aproximando-se da cama.

—Nosso plano—repetiu Julian—Eloisa… Duvalier sabe.

—Sabe o que?

—A respeito… de Caroline. Ele a chamou…—as pestanas do Julian voltaram a baixar a suas bochechas, sua voz se esvanecia em um cansado suspiro.—…você nova prostituta.

Adrian se endireitou lentamente. Não se tinha dado conta de que a taça que tinha em suas mãos se inclinou até que viu o escuro atoleiro de sangue estendendo-se ao redor de seus pés.

—Adrian —disse Julian sem abrir os olhos.

—O que? —Respondeu subitamente, seu pânico crescia com cada respiração.

Julian abriu seus olhos, olhando-o diretamente antes de sussurrar.

—Necessita mais que seus fantasmas para te manter quente de noite.

 

—Ah, assim que as apresentações não são necessárias —disse Duvalier, com rastro de acento francês polindo cada uma de suas palavras com um estilo continental. Deu um passo para Caroline, fazendo que a ponte de repente não parecesse muito estreita, a não ser infranqueável.

—Bem. Sempre as encontrei pesadas. Geralmente posso aprender tudo o que preciso saber a respeito de um homem, ou mulher, escutando o som de seus gritos enquanto me pedem piedade.

—Encantador —disse Caroline energicamente, lutando por ocultar seu temor. Sabia que só se alimentava disso. Desejou desesperadamente levar ainda a capa carregada de armas. Com seu corpo embelezado pela pobre mescla de cetim e tule do Eloise, sentia-se muito mais que nua. — Como sabe que sou a mulher do Adrian?.

Suas aquilinas fossas nasais de abriram com desgosto.

—Porque posso cheirá-lo em ti, do mesmo modo que podia lhe cheirar a ele no Eloise.—Não lhe escapou a sombra que oscilou por sua cara.— OH, ele pode havê-la amado, mas nunca foram amantes, mon cher. Mas isso não o deteve de pôr suas mãos sobre ela, sua boca…

—Isso deveu ser muito difícil para você.

Encolheu-se de ombros.

—Mais difícil para ela, acredito. Ao final me assegurei que morre-se virgem. Apenas essa foi minha maior vingança de todas. Que morrera sem conhecer o tato de um homem. Que nunca conhecesse o prazer que ele poderia lhe dar, só a dor.

Caroline começou a afastar-se dele, desesperada por voltar sobre seus passos ao dormitório do Adrian, a seus braços.

Duvalier a seguiu passo a passo, a prega de sua capa se sacudia ao redor de suas botas.

—Não pode imaginar como foi estar ali de pé com o sabor de seu sangue em minha boca e vendo cada desejo, cada esperança, cada sonho que ela tinha desvanecendo-se de seus olhos enquanto seu coração se rareava a um suspiro, depois a um murmúrio, para finalmente deter-se. Então ia ter a, sabe, mas chegou o servente e o arruinou tudo.

Caroline se estremeceu.

—Como pôde sequer contemplar uma coisa tão inqualificável? Pensei que se supunha que a amava.

A indiferença de seu rosto se rachou.

—Ela não era digna de meu amor! É por isso o que está levando esse ridículo vestido? Por que Adrian acreditou que quando te visse, levaria-me uma mão ao coração e romperia a chorar, "Minha querida Eloisa, sempre soube que retornaria para mim”.—Entrecerrou seus olhos.— Não posso acreditar que pensasse realmente que eu tinha estado tão louco por essa volúvel prostituta todos estes anos. Sempre foi um romântico incurável.

—Sim, fui.—Disse Adrian, emergindo do pé das escadas detrás do Duvalier— E ainda o sou. Por isso só vou te dizer uma vez que te separe da mulher que amo.

Caroline deixou escapar um involuntário soluço, seu coração ressurgiu com esperança. Adrian devia haver-se escapulido da torre sul e dar um rodeio através de seu dormitório.

Duvalier lentamente se voltou a encará-lo, um gelado sorriso esfriava suas facções.

—Bonjour, mon a mi, Ou deveria te chamar meu irmão?.

—Você não é meu amigo, bastardo. E certamente não é meu irmão.—Disse Adrian, seu cabelo avermelhado se movia ao vento— Abandonou o direito a ambos os títulos quando abraçou uma irmandade de monstros e assassinos.

—Enquanto que você estava abraçando à mulher que supostamente me pertencia.

—Isso é tudo o que sempre foi Eloisa para ti, não é verdade?— Disse Adrian, seu olhar se posou brevemente na aliviada cara de Caroline.— Uma posse. Uma bonita bagatela para pendurar de seu braço, não diferente de uma nova e brilhante fortificação.

Obedecendo ao muda sinal do Adrian, Caroline se voltou para escapar.

O braço do Duvalier lhe rodeou o peito igual a uma banda de ferro. Capturando-a contra ele, agarrou seu queixo em sua mão, suas largas unhas afundando-se na tenra carne de sua garganta. A julgar pela tensa força de suas mãos, poderia provavelmente lhe romper o pescoço com nada mais que um movimento seco de seus dedos. 

—Eloisa era uma estúpida cordeirinha cabeça oca. —Disse ele— Acredito que esta é muito melhor. Arrumado a que brigará como uma tigresa quando afundar meus dentes nela.

—Adverti-lhe isso, Victor —disse Adrian brandamente, dando um passo para eles, depois outro— só vou dizer-te que te dela separe uma só vez.

—Ou que fará? Atravessar-me-á o coração com uma estaca? Se me destruir, pode que seu irmão nunca recupere sua preciosa alma, e todos sabemos que não arriscaria sua alma só para salvar a sua última prostituta. Por que não lhe suplica por sua vida, doçura? —vaiou ao ouvido do Caroline.— eu adoro quando uma mulher suplica.

Envolvendo um punhado de seu cabelo em sua mão com suficiente pressão para lhe arrancar o couro cabeludo, Duvalier a forçou a ajoelhar-se. Seus olhos ardiam com lágrimas de agonia; as ásperas pedras lhe cravavam nos joelhos através do fino tecido do vestido da Eloisa.

—Esta não é provavelmente a primeira vez que estiveste que joelhos por ele —cantarolou Duvalier.—Mas posso te prometer que será a última.

Caroline levantou o olhar para o Adrian através de um véu de lágrimas, sabendo que sua vida era a única coisa que não podia lhe pedir. Não quando já tinha sacrificado tanto para tentar salvar a alma de seu irmão. Desejando poder lhe dizer o muito que o amava com solo um olhar, sorriu através das lágrimas.

—Eu escolhi este destino, Adrian. Não tem a culpa. Não importa o que ele diga ou faça, recorda sempre que ele é o monstro, não você!

Adrian a olhou com derretida doçura quando Duvalier lhe puxou do cabelo, expondo o vulnerável lado de sua garganta. Quando suas brilhantes presas descenderam, Adrian entrecerrou seus olhos e disparou.

A letal estaca foi direta ao coração do Duvalier. Gritou com raiva, mas só teve o tempo suficiente para captar uma olhada de sua atônita expressão antes que a seta lhe alcançasse o coração e seu corpo se dissolvesse em um poderoso redemoinho de pó.

Sua capa caiu, cegando momentaneamente ao Caroline. No momento em que pôde desembaraçar-se dele, Duvalier já se foi, o pó de seus ossos se dispersava sobre o vento. A estaca seguiu em linha reta, impactando na parede sobre o lado oposto da ponte, onde chocou ruidosamente de maneira inofensiva contra as pedras.

Lançando a mola de suspensão a um lado, Adrian se lançou pelo Caroline e puxou-a para seus braços. Olhava-o com incredulidade, seu estado de shock lentamente ia deixando passo à compreensão.

Tomando a frente de sua camisa em suas mãos, sacudiu-o com força.

—Pelo nome de Deus, por que disparou? Com o Duvalier destruído, Como vamos encontrar a alma do Julian? Depois de tudo o que estiveste fazendo, tudo o que sacrificaste para lhe proteger, Como pôde me escolher a mim por cima dele?

Adrian cavou sua cara meigamente em sua mão, limpando uma molhada lágrima de sua bochecha com seu polegar.

Olhando fixamente no interior de seus empanados olhos cinza, disse.

—Como me disse uma vez um homem muito sábio, Que vale a alma de um homem quando a compara com a incomparável riqueza do coração de uma mulher.?

Quando baixou seus lábios aos seus, o coração do Caroline se inchou com amor e alegria. Seus lábios se encontraram justo quando os primeiros raios do sol rompiam ao este sobre o horizonte, banhando-os com a sagrada luz do amanhecer.

 

—Quem sobre a terra ouviu o de umas bodas a meia-noite?

Tia Marietta se abanou assim mesmo, sua aguada voz obtinha curiosos olhares de quão convidados estavam sentados ao redor deles no grande salão do castelo. Os mesmos convidados que tinham sido sumariamente despedidos do grande salão fazia só quinze dias quando a mascarada do Visconde tinha irrompido em uma corrente de fofocas e insinuações que tinham sido diseccionados pelos mais vergonhosos periódicos Londrinos.

Nenhuma quantidade de leques poderia secar as pérolas de suor que baixavam gotejando pela garganta da Tia Marietta para desaparecer entre seus expandidos peitos. Estas recolhiam copiosos montões de pó de arroz que tinham miserável consigo através de sua empapada carne, fazendo-a parecer igual a uma massa recoberta de mazipã derretido.

—Não é só umas bodas a meia-noite, a não ser umas bodas a meia-noite que nem sequer se levará a cabo em uma igreja! Não sei se minha própria reputação se recuperará nunca do escândalo. Todo mundo sabe que umas prósperas bodas deveria levar-se a cabo na ensolarada manhã de um sábado e seguida de um copioso café da manhã.

Porta se afundou em sua cadeira, pensando que sua tia estava provavelmente muito mais interessada no copioso café da manhã que nas bodas.

—Eu já te tinha indicado que seria na sexta-feira de noite, Titia. O qual quer dizer que no minuto que o relógio dê a meia-noite, será a manhã do Sábado.

Tia Marietta fechou de repente seu leque e golpeou a coxa de Porta com ele.

—Não seja descarada. Não quereria acabar igual a sua irmã.

—Ah, sim, pobre desafortunada Caroline. —Porta suspirou— Forçada a passar o resto de sua vida casada com um bonito, atrativo visconde que a adora. Nem sequer sei como as arrumará.

—Eu estava falando de sua outra irmã.   

Tia Marietta tirou um lenço de seu decote e se enxaguou os olhos.

—Minha querida, doce Vivienne. Tinha postas tantas esperanças nessa menina. Nunca sonhei que tivesse cansado tão baixo para fugir-se a Gretna Green com um policial.—Cuspiu a palavra como se fosse o mais asqueroso dos epítetos.

—É polícia, Titia, não o assassino da tocha. E eles não se fugiram se Caroline não lhes tivesse dado sua bênção. Disse que já estava cansada de ver como se olhavam o um ao outro com olhos de bezerro apaixonado.—Porta olhou para trás onde Viviene e seu novo marido se olhavam o um ao outro com olhos de bezerro apaixonado por cima de um buquê fresco.

—OH, olhe, Ali está o pobre de seu primo!—O lenço desapareceu voltando para decote de Tia Marieta.— OH, Cecil! Cecil! —gorjeou, movendo seus enluvados dedos ante o recém-chegado antes de inclinar-se e sussurrar a Porta,— Perguntei-me freqüentemente por que alguém tão bonito nunca se casou.

Porta estirou o pescoço, incapaz de morder uma travessa resposta.

—Possivelmente isso é justo o que Lorde Trevelayn está aproximando-se de lhe perguntar.

—Ah, você deve ser o primo Celil do Caroline! —exclamou Adrian, sua sombra diminuía ao homem miúdo.— Falou-me muito de você.

—Fez-o? —Dividido entre a adulação e o medo, o Primo Cecil agachou sua empoeirada cabeça, seus pequenos olhos redondos se lançavam sobre a gente como se estivesse procurando um escapamento.— Sempre a tive em uma alta consideração. Muito mais alta do que devesse, certamente.—adicionou nervosamente.

Adrian lhe dedicou um animado sorriso.

—Tem muito que dizer a respeito da amabilidade e generosidade que você mostrou a ela e a suas irmãs nos passados anos.

—Assim que o tem? —Com sua confiança incrementando-se, o primo Cecil inchou o peito como uma adornada perdiz.— Só espero poder convidá-lo alguma vez no futuro, Milord. Me ocorreu que você provavelmente estará impaciente por pôr a mais jovem dos Cabot em minhas mãos. Se a dote for o bastante generosa, possivelmente esteja disposto a ajudar. A jovem Porta tem uma natureza algo teimosa e impertinente, mas com uma mão firme, acredito que eu poderia tirar-lhe

—Essa é uma idéia maravilhosa—disse , conduzindo-o para a porta. —por que não saímos ao jardim para discuti-lo?

O sorriso do Adrian nunca vacilou. Simplesmente passou um braço ao redor do pescoço do Primo Cecil, colocando-o em uma improvisada chave.

Quando Adrian voltou para grande salão alguns minutos depois, estava totalmente sozinho. Tirou o pó da parte de diante de sua jaqueta, puxou o colete para endireitá-lo, depois estudou preguiçosamente seus nódulos esfolados, esperando que sua noiva não se fixasse neles.

—Certamente não pode estar planejando te casar com o aspecto que tem sua gravata,—disse Julian, aparecendo de um nada para retomar uma de suas brigas, por como levava seu irmão o lenço de linho a modo de gravata.

Adrian deu um salto.

—Sagrado Inferno! Eu adoraria que deixasse de fazer isso! Vais conseguir que me de uma apoplexia.

Julian lhe sorriu.

 —estive praticando. Decidi que Duvalier tinha razão em uma coisa. Possivelmente é hora de que aproveite algum de meus dons, ao menos os mais úteis.

Adrian posou sua mão no ombro de seu irmão, lhe dando um carinhoso apertão.

—Isso me satisfará enquanto não te converta em morcego e revoe pelos candelabros em qualquer momento.

—Caroline me disse que te tinha ido.

Os irmãos se voltaram para encontrar a Porta diante deles. Seus escuros cachos se amontoavam no alto de sua cabeça e o alto pescoço de seu vestido de cotonia branca não era tão passado de moda para gerar curiosidade ou comentários entre os convidados.

Disparando a seu irmão um significativo olhar, Adrian tirou o relógio do bolso de seu colete e o abriu.

—É quase meia-noite. Devo ir. Não quero fazer esperar a minha noiva. —Beliscando a Porta com carinho na bochecha, dirigiu-se para a enorme chaminé que tinha sido improvisada como altar, deixando ao Julian totalmente sópara enfrentar-se a Porta.

Ela olhou a seu redor para assegurar-se que não havia ninguém escutando às escondidas antes de dizer.

—Minha irmã me disse que vai a Paris para procurar o vampiro que pôde ter engendrado ao Duvalier.

Julian assentiu.

—Com o Duvalier derrotado para bem e Adrian casado, pensei que possivelmente era hora de que começasse a brigar minhas próprias batalhas. Pode que não seja capaz de envelhecer, mas isso não quer dizer que não possa maturar. Ah, aí vem o vigário, —disse, visivelmente aliviado de ter encontrado uma distração.— Deveria me dirigir à parte de atrás do salão. Avaliação que Adrian e Caroline não levassem a cabo suas bodas em uma igreja, em terra sagrada e todas essas bobagens, mas todas essas batinas e velas ainda me fazem querer saltar pela janela mais próxima.

Voltou-se para ir-se, então jurou em voz baixa e se voltou. Fechando suas mãos sobre os antebraços de Porta, Aproximou-se dela e a beijou brandamente na frente, seus lábios persistentes contra o acetinado calor de sua pele.

—Não me esqueça, olhos brilhantes.

—Como poderia?—Quando se afastou, Porta se levou uma mão a seu pescoço, seus olhos já não faiscavam com a inocência de uma menina, a não ser com a sabedoria de uma mulher.—Sempre terei as cicatrizes para te recordar.

—Porta! —Pigarreou Tia Marietta.— Tem que te sentar!.Faltam três minutos para a meia noite!

—Agora mesmo estarei ali, —respondeu Porta, olhando-a por cima de seu ombro. Quando se voltou, Julian já se foi. Franzindo o cenho, examinou aos hóspedes, mas sua magra e elegante forma não a podia encontrar por nenhuma parte.

Suspirou com nostalgia e voltou a cruzar o salão, sem ver jamais a sombra que revoava ao redor do candelabro que pendurava justo sobre sua cabeça.

—E qual senhorita Cabbot será hoje? —Perguntou Wilbury secamente quando Caroline caminhou para a soleira, preparando-se para uni-la ao noivo que a esperava no improvisado altar onde repetiriam seus votos e começariam suas vidas como marido e mulher.

Ela golpeou o braço do mordomo com seu ramo de rosas brancas, liberando um odor de sua potente fragrância

—Não precisa tomar o cabelo com isso, Wilbury. Depois de esta noite, será capaz de te dirigir a mim simplesmente como Lady Trevelyan.

Deixou escapar um elaborado suspiro.

—Suponho que isso será apropriado para meu, posto que você será a senhora deste castelo em —se esclareceu garganta— aproximadamente um minuto.

E seu medo se desvaneceu quando olhou às escondidas ao redor do marco da porta e viu o Adrian esperando por ela no outro lado do grande salão. Seu cabelo cintilava à luz das velas enquanto que seus olhos brilhavam com amor e ternura, o convite em suas luminosas profundidades azul esverdeadas era impossível de resistir.

Caroline arrancou uma dos casulos das rosas e o colocou detrás da orelha em um silencioso tributo à mulher que os tinha reunido. Quando agarrou seu ramo e deu um primeiro passo a para os braços do Adrian, cada relógio no castelo começou a dar as badaladas, anunciando a chegada de um novo dia.

 

                                                                                            Teresa Medeiros  

 

                      

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