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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


FUGA NO CREPÚSCULO / Maggie Shayne
FUGA NO CREPÚSCULO / Maggie Shayne

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

FUGA NO CREPÚSCULO

 

Um assassino em série que atua sob a luz da lua cheia, tinha feito de Mary McLean seu seguinte objetivo. Ela sabe que deve ser cautelosa, porém não pode ficar longe de Michael Gray, um homem misterioso com um segredo sobrenatural. 

Será que ele irá protegê-la? Ou será que ele é o verdadeiro perigo?

               

Chicago, 1928

Havia só uns poucos policiais na área. Porém os poucos que ficavam eram suficientes para ouvir os disparos. O oficial Michael Gray se manteve em um beco entre os edifícios com sua arma preparada, e embora fosse completamente inútil contra quadrilhas rivais, disparava a cada minuto sobre os lados opostos da rua. As armas de brinquedo cuspiam fogo na escuridão. As janelas estavam destroçadas, e as pessoas corriam para salvar suas vidas. Um carro acelerou, só para deter-se abruptamente, as janelas explodiram e o condutor caiu vagarosamente sobre o volante.

Estava nisso quando viu o menino. Não tinha mais que sete ou oito anos e estava mortalmente assustado por todo o barulho. Saiu de alguma parte e foi cruzando o lugar em direção ao caos. Michael reagiu por puro instinto. Saiu do beco, metendo sua pistola no coldre, sabia que precisaria das mãos. Saltou sobre o menino, imobilizando-o sobre o chão, cobrindo o corpo dele com o seu. Estava movido pela adrenalina, e não sentiu dor até que ficou imóvel, mantendo o menino embaixo dele.

 

E em seguida, veio a dor. Doeu como o demônio, em uma dezena de lugares de seu corpo. Porém, não por muito tempo.

 

Quando Michael voltou a si, estava em uma cama de hospital, sob o efeito de sedativos.

Não sentia nada. Não podia ouvir e ver o que passava a seu redor. Escutou o doutor dizer que tinha feito o que podia. Viu uma enfermeira fazer uma negativa com a cabeça e tocar ligeiramente seus olhos, então ela deslizou para o lado e olhando em sua direção lhe piscou um olho. Como se ela soubesse que ele sabia. Que diabo? Ele estava ali morrendo e a enfermeira lhe piscava o olho? Que tipo de hospital era esse?

Estava ensimesmado pensando no ocorrido, quando viu Sally, sua esposa, sentada em uma cadeira, num canto do quarto, pálida como um fantasma, emocionada. O doutor a segurou pelo braço aproximando-a dele e a tirou do quarto. Logo que se foram, a enfermeira que tinha estado flertando comigo, se apressou em fechar a porta detrás deles. Logo fechou as cortinas e se aproximou de sua cama.

- Até que enfim! – disse ela – O amanhecer se aproxima. Pensei que nunca sairiam. Escuta, logo estarão de volta. Não temos muito tempo.

Era bonita. De cabelo negro, curto e olhos enormes. Procurou mover seus lábios, expressar as perguntas que se amontoavam em sua mente, porém elas não conseguiam sair.

- Não tente falar. – disse ela – Só escuta, certo? Eu não sou uma enfermeira. Meu nome é Cuyler Jade. Vi o que aconteceu na rua e a forma como salvaste o menino, eu segui o carro que te trouxe aqui. Logo, entrei às escondidas e tomei emprestado o uniforme do armário de alguma enfermeira. – fez um pequeno círculo com os braços.

- Foi um bom ataque… Você é rápido, não?

Ele piscou devagar, perguntando-se se isso era alguma espécie de alucinação.

- Temos que fazer isso rápido. – disse ela – Você é um tipo admirável. Um herói. Não merece morrer, mas isso vai passar, provavelmente dentro de alguns minutos.  Fizeram-lhe mais buracos que um queijo suíço, e eu não sou Whistlin' Dixie [1].

Esperava que essa informação fosse confortá-lo?

- Posso me ocupar de que não morra, Michael Gray. Posso me encarregar de que vivas. Não será como antes, porém estará vivo. Será forte. Saudável. Porém diferente. Muito diferente. Me entendeu?

Ele piscou, pensando que essa mulher estava louca, e negou com a cabeça ligeiramente.

- Caramba, é claro que não me entende. E eu não tenho tempo para lhe dar informações detalhadas. Conforme-se em saber, contudo, que quando vi o que fizeste passei por todos os disparos e por montes de explosões. E olha para mim! Estou bem. Poderá fazer o mesmo. Só vou lhe perguntar isto. Você quer viver? – ele apenas conseguiu inclinar a cabeça.

- Então está bem. Isto pode impressionar a princípio. Você precisa ficar imóvel, assim como está agora, não importa o que sinta. Dentro de alguns minutos o sol sairá e você dormirá o sono mais pesado que já sentiu na vida. Vai dormir o dia todo. Eu não estarei aqui quando despertar. Entendeu?

Uma vez mais inclinou a cabeça. Logo a mulher empurrou as cortinas fechando-as ao redor da cama, e se inclinou sobre ele e afundou os dentes em seu pescoço.

 

Aconteceu da forma que ela disse que seria. Sentiu um poder sibilando através dele como se tivesse caído um raio em cima. Cada nervo terminal zumbindo em seu interior, deixando-o com a sensação de que viria outro: torturando-o com a dor. Cada perfuração de bala em seu corpo ardia como fogo. Sua dor umas mil vezes pior que quando tinha recebido os primeiros disparos. Todo o seu ser gritou em agonia, e o sangue correu pelas feridas empapando a cama.

A mulher, seja lá quem fosse, havia ido embora. As portas se abriram com um golpe, e os doutores e as enfermeiras entraram precipitadamente no quarto. Mais além deles, eu vi a Sally, mordendo os nós dos dedos e chorando, e mais além dela, os primeiros raios de sol matutino espalhavam reflexos através de uma janela distante. Logo a dor desapareceu e todo se tornou negro.

Vagamente, sentiu uma mão em seu pulso, e ouviu a voz do doutor dizendo:

- Sinto muito, senhora Gray. Foi-se.

Porém, ele não tinha ido. Não realmente. Quando despertou outra vez, horas mais tarde, no necrotério do hospital, se sentiu mais vivo do que alguma vez esteve. E gostou da mágica, os tiros tinham desaparecido.

A mulher, Cuyler Jade, lhe explicava o que era agora. No que tinha se convertido e o que havia tentado dizer a ele antes. Se dirigiu com ela às portas traseiras do hospital e à noite que seria sua casa a partir de então.

À ele, realmente importava muito pouco todas as coisas que ela dizia. Tudo o que o preocupava era voltar para a Sally. Diminuir sua dor. Mostrar a ela que estava vivo, que estava bem apesar de tudo.

Cuyler lhe tinha dito que essa idéia não era muito boa, porém não a escutou. Não acreditou nela quando disse que Sally não entenderia; que ela agora não o aceitaria. Não podia acreditar nisso. Porém foi algo que teve que aprender por conta própria.

E o fez horas mais tarde, quando finalmente convenceu a mulher de que o deixasse só, para fazer o que tinha que fazer. Foi para casa. Aonde iria, senão para casa? Sally encontrava-se na cama, porém não dormia. Estava completamente acordada, chorando.

Ela ainda não tinha fechado a casa esta noite, assim ele pôde entrar como se voltasse a casa depois de uma dura jornada diária. Sentiu-se bem ao voltar para casa. Entretanto, sua mente ainda estava desequilibrada por sua morte recente e as revelações do dia, de todas as coisas impossíveis que Cuyler Jade lhe tinha dito e as inumeráveis sensações novas que corriam a grande velocidade por todo o seu corpo. Não podia assimilar nada disso, ou inclusive começar a descobrir o que poderia querer dizer tudo isso. Não até que falasse umas palavras com Sally.

Deus, a tinha perdido. Entrou silenciosamente no dormitório. Ela endireitou-se na cama, com um pequeno grito de alarme, e ele disse:

- Está tudo bem, amor. Sou eu. Estou aqui. Estou bem. – encontrou o interruptor, o acendeu, assim ela poderia vê-lo por si mesma.

Seus olhos se alargaram quando percorreram meu corpo de cima a baixo, e só então parei para pensar sobre a impressão que poderia dar-lhe, vestido com o uniforme crivado de balas e duro com o sangue seco.

- Me olhe, estou bem. Não estou morto. Estou bem. – ela deslizou sobre a cama, pressionando-se contra a cabeceira. Ele pensou que se pudesse, ela atravessaria a parede.

- Você está morto. – disse ela – Eu falei com você. Durante horas. Eu sustentei sua mão enquanto ficava fria como gelo. Você está morto.

- Não. Não. Teve uma enfermeira... Não uma enfermeira de verdade. Ela disse que poderia viver. Ela fez algo e... Ela disse que eu não voltaria a ser o mesmo. Porém, continuo aqui. Eu ainda sou Michael, ainda sou seu esposo.

- Vá embora! Fora!

Ele negou com a cabeça lentamente.

- Amor, está tudo bem. Olha, os buracos dos tiros, todos sumiram. – ele levantou a camisa para mostrar.

- Fora!

- Mas...

- Meu Michael morreu, eu não sei quem você é... Um morto-vivo. Um fantasma.

- Um vampiro. – disse ele, e então desejou voltar atrás, quando viu sua cara de puro horror.

- Não é como nos livros, amor. Não é isso. Não é nada como isso.

- Meu marido está morto. – disse ela. Porém sua voz e seus olhos o olharam mais detalhadamente que qualquer coisa que alguma vez pôde imaginar – Agora, quero que vá embora! – como um raio ela rodou para um lado e tirou rapidamente da gaveta do criado mudo. Sua arma. Seu revólver. Ela apontou para ele.

- Fora... Vá... Agora... e não regresse!

Ele manteve suas mãos com as palmas para cima dirigidas para ela. Cuyler lhe tinha dito que os tiros doeriam como o diabo, “sacas”, diria ela. Tinha exagerado o tipo. Igual ao significado de cada um. Porém as balas não o matariam... A menos que morresse sangrando pelas feridas. Logicamente, eu não tive vontade de tentar.

- Amor, não faça isso. Olha, estou bem, vê? Irei embora, se isso é o que você quer. Porém, tem que acreditar em mim, estou bem. E realmente sou eu. Sou eu.

Ela negou com a cabeça enfaticamente e engatilhou a arma.

- Estou indo. – ele se voltou para a porta, sua mente buscando a forma de provar a ela que era quem dizia ser. E o encontrou nas coisas que ele sabia sobre ela que ninguém mais conhecia. Continuou retrocedendo lentamente, porém falando ao mesmo tempo, necessitava que ela acreditasse e aceitasse, de alguma forma como jamais acreditou na vida.

- Teu nome de solteira é Lichfield. Vestiu uma camisola de cetim branco com pequenas rosas nos ombros em nossa noite de núpcias. Você coleciona conchas marinhas. Odeia verduras, exceto as guisadas, porém só os pequenos, e...

As lágrimas rodavam por seus olhos.

- Se você não está morto Michael, então está condenado. E eu não posso viver com isso, tampouco.

— Não, não, amor, você entendeu mal. Só me escuta e poderei...

Ela voltou a arma rapidamente, pressionou o cano sobre sua cabeça e puxou o gatilho. Assim de repente. Ela se foi.

Cuyler Jade apareceu a seu lado, quando ficou ali, paralisado pelo choque.

— Oh, Deus! — disse ela — Oh, Deus, não pensei que ela reagiria tão mal.

Michael agarrou seu braço.

— Traga-a de volta! — gritou ele — Faz o que fizesse comigo.

A pequena vampira o contemplou com seus enormes olhos molhados, negando com a cabeça lentamente.

— Não posso, Michael. Só certas pessoas podem se converter no que somos. Tem algo a ver com o sangue. Tu saberás quando olhar um. O sentirá até os dedos dos pés. Ela não o tem. — implorou com o olhar outra vez — Além do mais, ela está morta.

Ele fechou os olhos, afundando-se em arrependimento.

— Deveria ter sido eu. Se eu estivesse morto, ela agora estaria viva. Isto deve ser algum tipo de castigo. Eu enganei a morte então assim ela a levou no meu lugar.

 Cuyler negou com a cabeça lentamente.

— Você está deixando passar muitas pistas, para ser um policial. Em primeiro lugar, por que pensa que ela tinha uma pistola carregada aqui dentro, Michael?

Franzindo cenho, ele olhou mais detidamente o criado mudo. Viu o copo de vinho, a fotografia dele com uniforme... E, uma folha de papel escrita a mão por ela.

Tremendo, ele se aproximou mais, até ver o que estava escrito: “Não se entristeçam por mim, irei me reunir com Michael.”

 

Época Atual, Bangor, Maine.

Estava sentado em um lugar chamado “A Cripta”, a esquina mais escura do pequeno bar chamado Vampire Bar, olhando aos mortais brincarem de deuses. O divertiam. A maioria era gente jovem. Vinte anos, que apenas tinham servido para saborear a vida, muito menos a imortalidade. As mulheres vestiam trajes de noite muito ajustados de veludo negro ou lantejoulas roxas. Os homens vestiam couro ou trajes de calda e gravata branca engomada com jóias de pedras falsas brilhando no centro. Levavam capas de um ou outro tipo: cetim, veludo, forrado em roxo ou em branco. Algumas tinham o pescoço rígido de Drácula em um estilo que nunca tinha existido fora o de Hollywood. Outras levavam capuz. Muitos dos patrocinadores levavam presas falsas. Uns poucos que eram, a seu modo, demasiado obsessivos, na necessidade mental de os ajudar, talvez tinham deixado crescer seus incisivos. Escutavam a banda “Disco Rígido” cujas canções concentravam-se no número de mortos, enquanto bebidas coloridas artificialmente mesclavam um criativo cardápio. “Transfusão Tipo O” e “Ponche de Plasma”. “Glóbulos Brancos Watusi” e “Plaquetas de Poder”. Todo mundo que bebia ali conhecia o nome real da bebida que estava por trás do nome excitante. Um “destornillador”[2] por exemplo, era conhecido como um “fura crânio”. Todos continham licor o que era agora, perfeitamente legal. E a maioria vinha também com cores roxas brilhantes para criar efeitos, e os canudos para agitar pareciam estacas de madeira em miniatura.

Michael conhecia o código. Porém ele não bebia ali. Ele não o faria. Todavia.

Contudo, desfrutava olhando o jogo. Era interessante ver o que o mundo da cultura pop do século vinte e um pensava realmente dos de seu tipo.

Estavam longe de seguir o rumo dos vampiros já que não era freqüente levar os lábios negros, e ele só havia encontrado um que insistia em levar a capa.  Com respeito aos múltiplos piercings e tatuagens, isso seria menos saudável para os vampiros dada a sua tendência a perder muito sangue.

Certamente, os clientes de costume não eram a razão pela qual estava ali noite após noite.

Era ela.

Mary McLean estava de pé atrás do balcão, empurrando bebidas e manejando bêbados com graça e bom humor que desmentia sua situação. Levava jeans cômodos e uma blusa de cor jade de cetim brilhante por baixo de um avental tão original como muitas gravatas do lugar. Seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo e se movia cada vez que ela se movimentava, fascinando-o. Estava realizando um grande esforço tentando não cair hipnotizado por ela e aproximar-se. Ele estava ali para fazer um trabalho.

Ela olhou para cima em sua direção, contudo haviam muito mais corpos, demasiada fumaça e muito pouca luz para que ela o tivesse visto ali. Contudo ela o viu. Ela sentiu seus olhos sobre ela, talvez, sua presença. Isso provavelmente não era algo bom. De fato, supus que era uma má idéia. Ela não deveria ser consciente dele. Os mortais raramente eram, mesmo os de seu tipo.

Tinha ocorrido a ele que, provavelmente, haviam outras formas com as quais poderia observá-la além de sentar-se ali, dentro do Vampire Bar, onde o pulsar das batidas de seu coração são retumbava demasiadamente para seu gosto, competindo com as batidas da música. Era um perigo para ele fazer isso, porém não podia resistir. Ele queria que ela o visse, que o notasse e falasse com ele.

Estúpido.

Ela era uma das eleitas. O antígeno raro da beladona bailava em seu sangue, e isso queria dizer que existia uma relação entre eles, em algum plano distante e abstrato. Só as pessoas com esse antígeno da beladona poderiam converter-se em vampiros. E cada vampiro havia sido em algum momento, um mortal. Cuyler o tinha ensinando, fazia muito tempo. Ela tinha sido sua amiga, uma dos poucos.

Porém isso era diferente de qualquer coisa que ela tenha dito, e de qualquer coisa que ele tenha sentido antes. Mary McLean empurrou seus sentidos de uma forma poderosa e aguda. Ele tinha sentido a presença de uma eleita antes. Porém, nunca o afetou.

Seu tipo tendia a morrer jovem. Porém ela não estava debilitando-se. Era forte, saudável, vibrante, viva.

Por agora.

 Iria ser assassinada muito em breve. Por isso ele estava ali.

Olhou outra vez como ela despejava whisky dentro de um pequeno copo de cor roxo sangue. Seus olhos como flechas, exploraram as sombras onde eu me encontrava sentado. Senti a força do seu olhar fixo, olhando as pessoas do lugar que enchiam o espaço vazio entre eles. Os mortais cobertos de suor, vestidos como vampiros, girando em um baile que era mais mímica de um ato sexual, enquanto o cantor repetia o mesmo refrão várias vezes.

 

"Let the bodies hit the floor.

Let the bodies hit the floor.

Let the bodies hit the floor. "

 

Um pequeno vaso roxo sangue aterrisou do outro lado da mesa com um golpe ligeiro, deslizando-se facilmente até deter-se justo diante dele. Levantou a cabeça lentamente, deixando o seu olhar penetrante tomar seu tempo em escalar seu corpo, começando por suas cadeiras ao nível da mesa, sua talha, até seu peito, traçando as formas de seus seios, e movendo-se muito, muito lentamente sobre sua garganta. Finalmente ele examinou sua cara: o queixo, a mandíbula, as bochechas... Deus! Ela, seguramente, havia sido esculpida pelas mãos de um mestre... E logo encontrou os seus olhos. Verde jade, como sua blusa de seda, tal como temia.

Seus olhos não se sobressaltaram ante seu olhar minucioso. E ele supôs que logo romperiam o silêncio. Assim disse:

- Eu não pedi nada.

E ela contestou:

- É por conta da casa.

Franzindo seus lábios, inclinando a cabeça, ele envolveu suas mãos ao redor do pequeno vaso.

- Eu não pedi nada.

- Não precisava pedir. Você se importa se eu me sentar? – à medida que ela falava, desatava os cordões do avental branco, tirando-o habilmente pela cabeça.

Ele pensou em dizer que se importava, porém não podia resistir à oportunidade de passar um pouco de tempo com ela. Recordando a si mesmo que a união que compartilhavam era só a de sangue, mesmo que isso fosse assim, era de certa forma exagerado. Ele assentiu com a cabeça. Ela empurrou a cadeira de sua frente e sentou.

- Eu sou Mary. – disse ela.

- Eu sei.

Ela levantou as sobrancelhas, insegura do que devia dizer.

- Eu disse: sou Mary. E você diz: É um prazer te conhecer, Mary. Eu sou...

Ela estendeu uma mão para ele, com a palma para cima.

- Michael. – ela assentiu com a cabeça.

- Bem, Michael, tem estado vindo aqui cada noite durante as últimas semanas. Não come. Não bebe. Não dança. Em geral se senta justo aqui na esquina e me vigia. Eu tenho que te dizer que isso começa a ser incômodo.

Ele piscou com uma ponta de surpresa.

- É muito direta, não?

- Não sei fazer joguinhos com as palavras. Assim, por que não me diz o que está fazendo aqui, e logo podemos seguir adiante.

- Fazendo?

Ela assentiu.

- Em geral está na esquina, me olhando.

Ela evitou seus olhos, e isso fez com que ele sentisse suficiente curiosidade para indagar em sua mente, ouvir seus pensamentos e seus sentimentos às escondidas.

O que encontrou foi medo. Ela sentia medo dele. Isso golpeou seu ser, e no momento lamentou a resposta enganadora.

- Nunca faria mal a você, Mary.

Ela se sobressaltou um pouco quando ele disse isso.

- Nunca pensei que o faria.

- Sim, pensou. Só não sei por que.

Ela não poderia saber o que ele era. Não podia ser isso. Se soubesse, então sim faria com que tivesse medo dele. E repulsa e horror, e a impulsionaria a...

- Olhe, não importa. – disse ela, interrompendo seus pensamentos – Esse não é um problema seu. Deixe de vir aqui, pare de me vigiar.

- Temo que não possa fazer isso.

- Então, provavelmente receberá uma visita da polícia. – ela pegou sua caderneta e sua caneta - Necessito seu sobrenome, seu endereço e número.

Ele sorriu com ironia.

- Vai me denunciar para a polícia?

Ela concordou, sem levantar os olhos da caderneta, mantendo a caneta equilibrada em cima, como se esperasse que ele lhe desse a informação.

- Simplesmente porque venho a este bar para ver o que acontece e de que maneira cada um perde seu tempo?

Outra afirmação de cabeça.

- Por que a polícia pensaria que isto é um comportamento suspeito? Você é uma mulher bonita, Mary. Não posso ser só um homem que desfruta em te olhar?

Ela encontrou seus olhos, centralizando-os, e o sangue subiu por suas bochechas. Havia algo em seus olhos, a chispa e o calor da atração. Por um momento ele leu seus pensamentos e soube que ela sentia uma atração tão forte como a dele, porém a afastou com uma vontade inflexível, e disse a si mesma que isso não só era estúpido como também perigoso.

- Se vem aqui por isso, para me olhar, provavelmente encontraram algo suspeito em mim. Além disso, combinado com as chamadas telefônicas, a pessoa que tem estado me seguindo e as que forçaram a entrada do meu apartamento...

Ele levantou uma mão para silenciá-la.

- Um momento. Forçaram a entrada do seu apartamento? - Por que ele não tinha sabido disso?

- Isso é muito bom, Michael. Devo supor que não sabia sobre isso? Ou de qualquer uma das chamadas telefônicas?

- Eu não estive te ligando. E nunca forcei a entrada do teu apartamento.

Ela tragou saliva, deixou sua caderneta e a caneta, porém manteve seus olhos sobre a mesa. Ele percebeu seu conflito. Uma parte dela queria acreditar quase desesperadamente. Outra parte dela soube, por instinto, que ele estava dizendo a verdade. E uma terceira parte tinha medo de ceder às outras duas. Estava mortalmente assustada e não era de se estranhar. Ele não sabia se tinha se dado conta de que ela estava sendo acossada. Teria que ter notado. Os demais teriam dado conta disso.

- Então, supõe-se que é só uma coincidência? – disse ela – Isso de que eu tenha arrumado a algum tipo de assediador obsessivo e lunático e a um inofensivo admirador fixados em mim exatamente ao mesmo tempo?

Ele a alcançou através da mesa e, usando só seu dedo mínimo, levantou seu queixo até que seus olhos se encontraram.

- Suponho que isso seria difícil de engolir. Não, não vou te dizer que é uma coincidência. Não é. As duas coisas se relacionam. Porém não da forma que você pensa. Eu não sou teu assediador, Mary. Vim aqui para te proteger dele.

Ela piscou rapidamente.

- Se fosse meu assediador – disse ela suavemente – esta seria a melhor mentira que poderias usar para se aproximar de mim.

- Não é uma mentira.

- Como posso saber?

- Me dê sua mão.

- O que?

Ele não esperou, alcançou sua mão e a encerrou na sua. Ela chiou um pouco, provavelmente pelo gelo de sua pele ou talvez pelo poder do contato. Tocá-la fez com que seu corpo cobrasse vida de uma forma que não tinha feito em anos. E talvez ela tenha sentido também. Ela não tentou liberar sua mão. Ele não necessitava tocá-la para ler seus pensamentos. Embora isso aumentasse essa faculdade. Ele queria seu contato, ardia de desejo de tocá-la.

Uma centelha passou rapidamente por sua mente à medida que ele abria por completo seus pensamentos. Fechou os olhos para vê-los melhor. O telefone soou. Ela o levantou com cautela. Logo sorrindo. Sim.

- Tua tia Cherry… Cheryl… Sherry. Sherry te ligou cedo pela manhã. Te disse que seu cachorro tinha estado doente.

Ela puxou de repente sua mão.

- Ok. Está bem, entendi. Você é uma espécie de psíquico.

Ele concordou.

- Algo assim, sim.

- E você veio aqui para me proteger do assediador.

Ele molhou os lábios. Ela não acreditava nele nem um pouquinho. Pensava que era uma fraude, um caloteiro.

- Ele, na realidade, é algo mais que um assediador. Ele é... É um assassino, Mary.

Ela piscou e seu rosto empalideceu.

- Ataca quando é lua cheia. Não sei por quê. Parece que não posso ler... Não posso ler a mente dele. Porém sei que você é sua próxima vítima. E estou aqui para te proteger.

Ela olhou para ele durante um longo momento.

- É policial?

- Já fui uma vez. Agora não sou mais.

- A polícia é a razão pela qual você está tratando tão arduamente de afastá-lo de mim?

Ele fez uma pausa estudando-a, sentindo seus pensamentos.

- Você já está assustada... Porém com a pessoa errada. Não represento uma ameaça para você, Mary. Ele sim. O medo é bom. É uma arma poderosa. Contudo, se mal conduzido, pode te matar.

- E a confiança é uma preciosidade – ela contrapôs – porém fora de lugar, isso faria com que eu morresse mais rápido.

Foi um disparo bem dirigido, e atingiu o alvo. Queria que confiasse em mim. Porém estava indo rápido demais. Por outro lado, não tinha muito tempo.

- Então você teve essa visão – disse ela – e veio até aqui para me proteger?

Ele concordou.

- Bom.

- É verdade.

Ela mostrou o whisky.

- Vai beber isso?

- Provavelmente não.

Com um amplo gesto de sua mão ela agarrou o copo e bebeu seu conteúdo. Logo o colocou com força sobre a mesa.

- Terminarei em meia hora. Te quero bem longe daqui antes disso. Terei meu celular e o pastor alemão de meu chefe comigo, e se vejo você se aproximar de mim em qualquer lugar, te jogarei o cachorro e chamarei ao 911 enquanto você trata de evitar te converter em um lanche para o jantar. Entendido?

Ele a estudou por um longo momento.

- Como posso estar seguro de que chegará em casa sã e salva, se não cuido de ti?

Ela reprimiu um calafrio, que ele sentiu, depois voltou o olhar para a janela.

- Deveria sabê-lo, sendo psíquico. A lua ainda não está cheia. – lhe disse afastando com força sua cadeira da mesa – Então, se dizes a verdade, deveria estar bem esta noite.

 

Mary suspirou ligeiramente aliviada quando, o homem que dizia se chamar Michael, deixou o bar. Ela o tinha notado desde a primeira vez que tinha entrado. É claro que ela o tinha notado. Uma mulher tinha que estar morta para não notá-lo.

Era pálido, porém, Deus!, era muito bonito. O homem mais surpreendentemente bonito que alguma vez tinha visto. Seu cabelo era farto, de um intenso marrom escuro. Não o levava amarrado atrás. O levava solto, conforme crescia, sem desculpas. Era magro, porém forte. Essa sensação de energia bruta era mais palpável que qualquer coisa visível. Não estava pleno de músculos. Tinha justamente essa força serena em torno dele que não deixava dúvida de sua presença.

Porém seus olhos a afetaram mais que nada. A primeira vez que ele levantou seu olhar fixo em sua direção, ela tinha sentido esses olhos sobre ela como se quisessem marcá-la, e quando ela devolveu o olhar, sentiu derreter-se, caindo dentro deles. Seus olhos eram negros e hipnóticos. Fizeram com que seu coração batesse mais forte contra seu peito e sua respiração se acelerasse rapidamente. Formou-se um nó em seu estômago e suas mãos tremeram.

Foi então que ele rompeu a conexão para olhar para fora, tão rapidamente que ela percebeu que ele não queria esse contato. Ele não estava tratando de vigiá-la. Ao longo de toda essa noite e das que se seguiram, ela tinha notado o seu olhar fixo, penetrante sobre ela uma e outra vez, porém cada vez que ela tratava de devolvê-lo, ele apartava o olhar. Sofria a angústia de uma intensa atração física por um completo estranho. Não era o tipo de mulher que cobiçava homens que nunca poderia ter. Não ia aos clubes de strip-tease ou comprava peças de calendário ou arquejava diante de heróis em ação. “Porém se este tipo estivesse em um calendário – pensou ela – compraria uma cópia para cada parede do apartamento”.

Fantasiava com ele à noite, quando estava só em sua casa. Fantasias tão atrevidas e disparatadas que ela mesma se surpreendia. E apesar disso saboreava cada imagem proibida que cruzava sua mente e seus sonhos.

Não foi até que a polícia na qual fez sua denúncia sobre a entrada forçada, lhe perguntou se ela tinha alguém novo em sua vida, qualquer estranho ao seu redor, talvez dirigindo uma atenção indevida a ela. Foi quando começou a suspeitar que o desconhecido na escuridão do balcão poderia ser o mesmo homem. A polícia pensava que a entrada forçada, combinava com a sensação de estar sendo perseguida até a casa três noites seguidas e a chuva de chamadas estranhas, somavam uma possível assediador. E isto a assustou.

Não tanto como Michael.

As chamadas telefônicas tinham começado fazia algumas semanas. Em um primeiro momento a pessoa chamou só umas duas vezes depois de fechar o bar, despertando-a de um profundo sono. Logo seguiu com a respiração ruidosa, como um fôlego. E agora tinha avançado nas ameaças sussurradas. Brincadeiras. “Estou te vendo”, e dizia, “estou preparado para você”.

Ela tinha conseguido mudar seu número, a companhia telefônica tinha se encarregado de fazê-lo, porém isso tinha sido ontem. Esta vez,alguém tinha entrado em seu apartamento ,embora não tinham roubado nada. Em qualquer caso, nada que pudesse notar.

          Então agora todas as fechaduras das portas e janelas eram novas, e a polícia havia prometido manter os olhos bem abertos, seja o que for que isso significasse.

Quando o último cliente do bar se foi e fechou as portas, um calafrio a percorreu desde o alto de sua coluna vertebral. Michael tinha dito a ela que o tal era mais que um assediador, era um assassino. E que ela era a próxima em sua lista. Engoliu em seco, enxaguou rapidamente o resto dos pratos e passou por baixo do balcão.

Tommy veio da cozinha, secando as mãos com um trapo de pano.

- Foi uma boa noite, Mary? – perguntou. Jogou o pano por cima de seu ombro e andou de mesa em mesa dando voltas nas cadeiras e colocando-as em cima das mesas.

Ela olhou para a caixa de gorjeta. Uma nota de cem dólares sobressaia em cima dos demais trocos de um e cinco.

- Uh... Sim. Outro bom dia. – ela não se surpreendeu. Tinha tido  uma em sua  caixa todas as noites desde fazia um tempo. Desde que o desconhecido chamado Michael começou a aparecer pelo lugar.

Os clientes não iam colocar o dinheiro na caixa de gorjetas. Deixavam na mesa ou davam a ela. Colocou a caixa em uma estante do balcão de madeira, e adicionou as gorjetas que lhe tinham dado ao longo da noite. Nunca tinha visto Michael deixar sua mesa ou vir de alguma parte para aproximar-se da caixa. Nem sequer uma vez. E ainda assim, em certa forma ela sabia que ele era o responsável por isso.

Devolveria o dinheiro a ele se permitissem. Porém até agora suas gorjetas mal tinham permitido esquivar tanto a companhia de arrendamento como a seu dono. Não poderia dar-se ao luxo de ser orgulhosa.

Tampou o frasco e o deixou cair em seu bolso.

- Me acompanhas até meu carro? - perguntou.

Tommy sorriu abertamente.

- Com certeza.

Colocou a última das cadeiras, lançou seu pano sobre o balcão e logo foi atrás dela, para o pequeno armário escondido a um lado da parede de espelhos.

- Tem uma jaqueta aqui?

- A azul. - disse ela.

Pegou a jaqueta, ajudando-la a colocá-la antes de colocar a sua que era de couro.

- Pronto?

- Pronto.

Tommy abriu a porta. Mary apagou as luzes e saiu porta a fora, saíram numa chuva ligeira e numa noite negra como o azeviche, puxou a porta traseira fechando-a e comprovando duas vezes a fechadura. Fechada. Bem fechada.

O estacionamento em frente estava deserto. Só tinha um carro nele, e era o seu. Ela olhou acima e abaixo da rua, esticou o pescoço para ver através da chuva mansa, em torno da parte traseira do edifício. Tinha outros negócios de ambos os lados do bar, com certeza, porém todos estavam fechados a essas altas horas da noite. Não tinha tráfego nenhum, e os faróis fizeram muito pouco para dissipar a escuridão.

- Onde está teu carro, Tommy?

- Deixei acesos os faróis a noite. – respondeu ele com um tímido encolher de ombros - A bateria estava morta esta manhã. Porém não se preocupe. Moro a somente cinco quadras de distância.

- Vai caminhando?

Ele concordou, e pegou seu pescoço.

Ela engoliu em seco, suas chaves estavam em sua mão, brigou consigo mesma em pensamento.

Tommy sempre a tinha perturbado. Podia ser ele que fazia as chamadas, acossando-a? Era muito descabido, inclusive mais descabido se esse assediador realmente fosse algo muito mais perigos. Tommy não faria mal a uma mosca.

E então, o que aconteceria se ela o deixava caminhar sozinho para casa e ocorria algo? Poderia ela viver consigo mesma depois?

- Desculpe-me. - disse uma voz na escuridão.

Ela reconheceu essa voz. Enviou calafrios de reconhecimentos que dançavam em sua coluna vertebral. Michael, seu admirador pálido, de cabelos despenteados, e olhos penetrantes.

Ela voltou-se e viu seus olhos, fundindo-se neles, sentiu que seu sangue fervia e seu ventre tensionava. 

Deus, por que ele se movia desta maneira? Ela mordeu seu lábio e deu uma rápida olhada nele parado ali.

- Eu suponho que necessita que te levem também. - disse. Uma parte dela esperava que ele aceitasse e discutiu com essa outra parte sua que esperava que não fizesse.

Ele concordou.

- Só cinco quadras.

Cinco quadras. Só queria ir de carro até onde Tommy fosse. Bom certamente Tommy não tentaria nada com Michael adiante. E Michael também não a assassinaria diante de Tommy. E isso era exatamente o que pretendia fazer o estranho, não? Fazê-la sentir-se perfeitamente segura? Deixá-la saber que ela não estava em nenhum perigo?

Bobagens. Ele não era um guarda-costas para cuidar dela. Não era.

E, contudo, ela desejava que fosse.

- Bom. Entrem. Vocês dois. - Tommy parecia apagado, porém se moveu para o carro. Michael segurou na porta dianteira, abrindo-a e entrou sem perguntar. Quando Tommy se sentou no banco traseiro, quase parecia estar mal-humorado.

- Tommy, – disse Mary enquanto colocava as chaves na ignição e arrancava com o carro – este é Michael. Michael, Tommy.

- Prazer. – disse Tommy.

- Digo o mesmo. – replicou Michael.

Mary revirou os olhos, e saiu de ré do estacionamento. Não pôs o cinto de segurança.

Algum insano e primitivo terror lhe dizia que deveria estar pronta para sair do carro e correr para salvar sua vida ao primeiro aviso.

O cinto de segurança a atrasaria.

Enquanto dirigia seu celular tocou. O pegou sem pensar, não fazendo caso de todos os anúncios de serviço público que sugeriam que era uma má idéia. Simplesmente não tinha tido tempo para comprar um auricular.

- Alô?

- Tem medo Mary? Deverias ter. – a voz seguiu o curso de seus pesadelos e foi seguido por um afiado e decisivo “clic”.

Ela tirou com força o telefone de perto de sua cabeça e olhou o visor, porém não aparecia o número no painel de chamadas, de onde teria sido realizado. Jogou o telefone no piso.

Michael estava olhando para ela. Esses olhos a sondavam olhando diretamente através de sua pele, lendo cada pensamento. Ele supôs exatamente quem tinha feito a chamada.

Talvez, inclusive o escutou através de seus ouvidos. Não. Impossível.

- Mary? Algo vai mal? – perguntou Tommy do assento traseiro.

Ela sacudiu a cabeça.

- Foi engano. – mentiu.

Oh, bem. Ao menos o culpado não era nenhum dos dois homens sentados a sós com ela, na escuridão de seu carro.

E então isso a golpeou, e o coração pareceu cair a seus pés. Sim. Michael não era o assediador, então, na realidade, não tinha nenhuma razão para pensar que ele estava mentido para ela. Não?

Claro que seu lado prático argumentou que tinha razões de sobra. Talvez tentasse fazer seu nome como psíquico entretendo-se em casos criminais. Provavelmente tinha uma conexão com o Departamento de Polícia, que lhe teria informado sobre ela. Ou talvez quisesse se meter a lhe dar ordens. Isso seria razão suficiente para assustá-la até a morte não é verdade?

Ela o olhou de lado. Seus olhos estavam justo ali, esperando, ele sacudiu sua cabeça lentamente de um lado para o outro.

- Ofensivo em ambos os casos. – murmurou.

Ela sentiu que seus olhos se alargavam.

- Como raios...?

- O que acontece? – perguntou Tommy, inclinando-se para diante – Não te escutei.

- Nada. Já estamos aqui.

Mary pisou o pé no freio, levando o carro com dificuldade até em frente ao edifício de Tommy, sem soltar o freio.

- Sim. Obrigada por me trazer Mary. – ele abriu sua porta, logo olhou carrancudamente as costas de Michael.

- Você vem?

- Veja, agora está chovendo mais forte. – disse Michael assinalando as diminutas gotas que brilhavam no pára-brisa. - Eu vivo só uma quadra mais acima. Você se importa?

Demônios, não era ele o assediador. Porém isso não significava que não fosse perigoso.

Tommy a percorreu com o olhar quando saiu.

- Está segura, Mary?

- Deveria estar. – disse Michael - Essa pistola atordoante escondida em baixo da parte lateral do assento é suficiente para me manter longe.

Ela retirou com força a mão do volante. Tinha abaixado a mão só para se assegurar que poderia agarrar a pequena arma rapidamente em caso de necessidade. Como ele adivinhou?

- Mary?

- Muito bem, Tommy. Vá em frente. Nos vemos amanhã a noite.

- Sim, nos vemos. – fechou a porta e saiu correndo.

Ela percorreu com o olhar a seu passageiro.

- Na realidade vive a uma quadra de distância?

Ele sacudiu a cabeça de um lado a outro.

- Eu vou para sua casa com você.

Ela entrecerrou os olhos.

- Oh, pelo amor de Deus!

- Não, Mary. Por amor a ti.

Ela suspirou, agarrou o volante até que os nós dos dedos ficaram brancos.

- De que se trata, Michael? Devo supor que acredita ser uma espécie de cavalheiro de armadura brilhante? Talvez deva me lançar contigo na cama agradecida pelo resgate do homem mal da chamada telefônica?

Ele levantou suas sobrancelhas.

- É muito mais que o “homem mal da chamada telefônica”, Mary. Ele é um assassino, te atacará. Posso demonstrá-lo se me der uma hora, te mostrarei as provas.

Bateu na bolsa a tiracolo que pendurava sobre sua gasta jaqueta impermeável de cor cinza.

- Atacará a menos que nós o detenhamos. Não vai conseguir.

Pensou que tinha terminado. Parecia racional, convincente e bastante lúcido. Também parecia como um homem que queria cuidá-la e protegê-la. O qual dava a entender que era muito bom para ser verdade.

Então ele dirigiu um sorriso conhecedor e continuou:

- Igual ao que decidisse pensar de mim, esta decisão é completamente tua.

 

Michael não era a pessoa que a tinha estado assediando. Ela se repetiu várias vezes. Se recusou a pensar que “Ele não era o assassino” porque não queria acreditar que havia um assassino. Só um louco obsessivo.

Michael não era fácil de dissuadir e se sentiu de um modo ridículo, – inclusive estúpido - feliz por isso. Simplesmente queria ver que “provas” ele tinha sobre o caso na bolsa de couro marrom.

Conduziu pela cidade com os limpadores trabalhando no ritmo estável da chuva que caía como uma torrente sobre o carro até que chegou ao desvio de seu edifício. Tinha uma garagem na parte traseira. Não era agradável nem seco. Não tinha um encarregado, porém estava bom, tinha uma porta com ferrolho, e só os inquilinos tinham a chave. Chegou à porta, deteve o carro e revisou o assento traseiro em busca de seu guarda-chuva.

- Eu o faço. – disse Michael.

Odiou admitir que tinha tido a esperança de que ele se ofereceria para fazê-lo. Porém tinha o pressentimento de que ele sabia. Deu a chave a ele. Ele saiu do carro antes que ela pudesse oferecer-lhe o guarda-chuva e retornou quase ao mesmo tempo.

Olhando-o com o cenho franzido, lhe disse:

- Decidiu pegar o guarda-chuva depois de tudo?

- Já está.

Ela olhou dele para a porta. Através dos limpadores viu a porta que se mantinha aberta de par em par.

- Que rapidez. – ela franziu ainda mais o cenho - Apenas se molhou.

- Eu... O fiz rapidamente.

- Bom.

Cruzou a porta com o carro e notou quando Michael saiu para fechá-la outra vez, levou um pouco mais de tempo. Quando voltou ao carro, os pingos da chuva tinham escurecido seu casaco, e reluziam em sua larga cabeleira. Ela levantou sua mão, e se refreou a tempo. Tinha estado a ponto de levantar a mão e apartar as gotas de chuva de seu cabelo, um ato que teria sido muito íntimo e familiar. Contudo, sentia que era tão natural como seria fazer amor com ele.

Oh, Meu Deus!

Ele lhe entregou as chaves. Sua mão acariciou a dela enquanto as tomava, e em nenhum momento acreditou que fosse um gesto acidental.

- Obrigada.

Conduziu através da garagem até sua área de estacionamento, justo em frente de seu apartamento no térreo. Tinha um pequeno pórtico na entrada, medindo cinco metros por cinco, onde tinha plantada uma palmeira em um enorme vaso, uma begônia pendurada em uma cesta, uma espreguiçadeira, um móvel de campainha e um tapete de boas vindas. Tudo estava abrigado da chuva pelo balcão que sobressaía do apartamento de cima, o qual era exatamente do mesmo tamanho e também oferecia iluminação para o exterior.

- Deixas estas coisas fora, e nada te foi roubado?

Ela encolheu os ombros.

- Suponho que a ninguém interessa levar uma planta e uma espreguiçadeira de três dólares. – abriu a porta, entrou para acender a luz e então parou muito quieta, com o olhar fixo na desordem que tinha em seu impecável apartamento. As almofadas do sofá se encontravam no chão, os livros da diminuta estante estavam espalhados pelo chão, o abajur caído de um lado.

- Oh, demônios, outra vez não.

Começou a entrar, porém a mão de Michael em seu ombro a deteve.

- Não o faças. Ainda poderia estar aí dentro.

- Se está aqui, então vai se arrepender de estar me assediando! – colocou a mão no porta guarda-chuvas atrás da porta, pegou seu fiel bastão de beisebol e entrou pisando forte. - Vamos, saia daí, bastardo. Já tive o suficiente de tudo isto. E vou te pegar.

Se encontrava na metade do caminho para sua pequena cozinha quando ouviu Michael dizer:

- Está tudo bem. Já foi.

Parecia ligeiramente divertido. Ela o percorreu com o olhar. Agora estava tirando o casaco, e colocando sua bolsa sobre a mesa do café.

- Como sabes? – lhe perguntou, olhando-o.

Ele golpeou ligeiramente sua cabeça com o dedo indicador.

- De acordo. Pode adivinhar o pensamento. – pôs os olhos em branco. - Se não se importa, voltarei em seguida, depois de passar uma vista.

Ele sorriu e ela quase deixou cair o bastão. Seu sorriso era poderoso. Um sorriso assassino, que fez com que seus joelhos se debilitassem.

Maldição.

Ela se afastou movendo-se através da sala de estar para a pequena cozinha, as quais estavam separadas só por um balcão de desjejum que era suficientemente grande para que alguém se escondesse atrás.

Não tinha nada ali. Porém as portas do armário de comidas estavam abertas, todas e cada uma delas, havia pratos e comida fora que não tinha estado ali antes. Retrocedeu e entrou na sala e olhou a única porta longe dela, a qual conduzia a seu dormitório. Sua mão tensionou sobre o bastão.

- Me deixe ir. – se ofereceu Michael.

Ela concordou. Não tinha sentido fingir ser valente quando estava assustada de morte. Ela lhe deu o bastão. Ele o percorreu com o olhar e sorriu outra vez, porém não o pegou. Simplesmente girou a maçaneta e abriu a porta do dormitório, deu um passo para dentro, olhando ao redor.

Era seu herói, nem sequer tinha acendido a luz. Ela entrou pouco a pouco por trás dele, pronta para golpear com o bastão, apertou o interruptor da luz e examinou o quarto.

Não viu nada. Porém a gaveta superior do armário estava aberta, e suas delicadas peças de renda tinham sido espalhados pelo quarto. Ele se deu conta. Ela o viu fixar-se neles. Seu olhar permaneceu muito tempo cravado no roupão de banho. O tinha comprado em uma loja de lingerie simplesmente porque era muito bonito. Era muito fino, de um negro transparente e diminuto, e estava em cima da cama. Como se ela tivesse a intenção de pô-lo.

- Isso não estava aí antes! – disse ela quase na defensiva.

- Me alegra sabê-lo. Teria pensado que esperava alguém.

- Não é assim. De qualquer forma, eu não me vestiria assim para qualquer pessoa. Quer dizer... Para alguém que estivesse vendo atualmente, porque não o faço. Ver a ninguém, quero dizer...

- Eu sei. – caminhou a grandes passos para o armário, abriu a porta, e olhou dentro dele. Logo abriu a porta contigua que o conduzia ao banheiro, onde a maquiagem e os pinceis estavam esparramados sobre a pia. Inclusive moveu a cortina e olhou a ducha.

- Não há ninguém. – disse ele.

Não tinha inspecionado embaixo da cama. Ela mordeu seu lábio e se perguntou se pareceria muito tonta se o dissesse. Quando regressou ao dormitório, caminhou diretamente para a cama, levantou os cobertores deixando-os em seu lugar.

- Eu esqueci algo?

- Não.

- Bom.

Se dirigiu a penteadeira, se agachou e começou a recolher as coisas do chão, levando-as de volta aos seus lugares. Suas grandes mãos sobre seus soutiens e calcinhas lhe produziram um forte nó em seu estômago. Sua mente sussurrava coisas que ela não tinha intenção de ouvir, e sua respiração era entrecortada e mais rápida que antes.

Ela foi até ele e tomou os artigos.

- Na realidade... Uh... Eu me ocuparei disto.

- Quero ajudar.

- Então... Comece pelo resto das habitações.

Ela tinha pensado em insistir que ele a deixasse fazer tudo, porém de alguma maneira sabia que ele não o veria como uma opção válida. Simplesmente a ela não apetecia que recolhesse sua roupa interior, porque não podia suportá-lo, e muito menos quando desejava estar em suas mãos nesse momento. Era algo ridículo pensar em um homem que apenas acabava de conhecer. Não importava o que parecia. O quanto intensos eram seus olhos. Sentia como se o conhecesse intimamente, como se o conhecesse desde sempre.

Ele sustentou seu olhar fixo um longo tempo, até que ela se estremeceu. Então, finalmente, rompeu o contato visual como se fosse um grande esforço, girou e a deixou só no dormitório.

 

Michael teve que se obrigar a mover-se devagar. Tinha cometido um grave erro, quando tinha aberto a porta da garagem. Instintivamente tinha passado velozmente através da chuva, movimentando-se a uma velocidade sobrenatural que nenhum humano poderia alcançar. Se alegrou que estivesse muito escuro para que ela pudesse observar seus movimentos. Não teria visto mais que um raio, um borrão em movimento.

Repôs as almofadas no sofá, endireitou o abajur, e começou a recolher os livros olhando os títulos à medida que os colocava na estante. Ela lia clássicos. Shakespeare, La Brontë, T. S. Elliot. Isso estava em harmonia com o que tinha observado dela. Sabia que era inteligente. Manteve sua opinião de que era tímida e lhe incomodava estar rodeada de gente. Apenas dirigia a palavra aos clientes do bar em que trabalhava, embora em um lugar que era escuro e ruidoso tampouco era necessário. Quando qualquer deles lhe dispensava uma atenção imprópria, ela começava a brincar com a cruz que levava posta, deslizando-a de um lado a outro em sua corrente. Um tique nervoso, como se na realidade a clientela fossem vampiros e a cruz realmente os mantivesse longe.

Deus, ela se assustaria se soubesse o que ele era realmente?

Ela tinha assombrado a ele, pensou vendo-a através da porta aberta do dormitório, – tinha terminado ali dentro e se dirigia para o banheiro - quando tinha pego o bastão e desafiado ao intruso. Estava surpreendido e contente. E gostava muito mais dela por isso. Estava petrificada de medo, porém pronta para lutar e proteger seu espaço. O medo não a faria retroceder abatida. Era uma qualidade notável em uma mulher, cuidar de si mesma desta forma. Se perguntava se tinha interpretado mal, talvez não fosse tímida. Talvez simplesmente não gostasse das pessoas. Contudo parecia gostar dele, talvez um pouco demasiado quando o considerava pouco aconselhável.

Se dirigiu a cozinha e empilhou os pratos na lava-louças, consciente de que não quereria comer em nada que o intruso tivesse tocado. Não estava tão seguro no tocante a comida. Mary não andava bem economicamente. Trabalhava em turno duplo no bar para pagar o aluguel e a matrícula, algumas vezes apenas dormia. Estava se especializando em filologia inglesa, tinha a esperança de poder ensinar algum dia. Cuidava dos pequenos e dos velhinhos para ganhar dinheiro extra, e quando o dono do bar procurou alguém para limpar o lugar nos fins de semana, também tinha aceitado este trabalho. Sua licenciatura demorava a chegar – ela tinha vinte e sete anos -, porém se aproximava pouco a pouco de sua meta. Só tomava as matérias que podia permitir-se, uma ou duas de cada vez, ajustando-as a seu plano de trabalho. Estava agora mesmo, entre as classes de primavera e verão.

Conhecia muitas coisas dela. Supôs que deveria ter esperado essa coragem, dada a determinação e o empenho que mostrava na dedicação a sua educação. Ele não os tinha. Havia encontrado isso tão surpreendente e cativante, gostava de absolutamente tudo nela, o excitava como o inferno.

Mary saiu do dormitório enquanto ele sujeitava em sua mão uma caixa de macarrão com queijo. A sustentou no alto, levantando as sobrancelhas e perguntou.

- E quanto à comida?

Ela encolheu os ombros.

- Não pode opinar sobre isso? Usar seu talento? Desentranhar se ele fez algo?

- Leio as pessoas. Não a comida.

Cruzou a sala, acoplada na cozinha, aproveitou para escutar seu pensamento de que esta parecia muito menor com ele dentro, e que isso não importava a ela. Então pensou em seu cabelo outra vez. Mary pensava muito em seu cabelo. Provavelmente não era muito sábio para ele continuar lendo seus pensamentos, porém não quis se deter. Ela se imaginou a si mesma passando suas mãos por seu cabelo, e logo se imaginou espalhando-se por seu peito à medida que ele beijava seus seios. Ele quase gemeu em voz alta. Depois, ela se obrigou a concentrar-se na comida do armário.

- Vamos jogar tudo o que está aberto, e deixar o que está selado. – disse ela.

- Tiremos tudo para estar realmente seguros.

- Não posso me permitir isso.

- Eu sim, posso.

Ela abaixou a cabeça, lutando com sua consciência, dizendo a si mesma que não podia aceitar dinheiro de um homem que não conhecia. Que de uma forma ou de outra, isso era um erro.

- Considere como pagamento pela minha estada esta noite.

Ela levantou a cabeça rapidamente.

- De verdade, não pode ficar aqui.

- Claro que posso.

- Não cabe em meu sofá. É demasiado alto.

- Esse não é o ponto, – jogou a comida no lixeiro, logo fechou os armários – vamos nos sentar, assim poderei resolver suas dúvidas a meu respeito.

Ela o fuzilou com o olhar.

- Está lendo minha mente outra vez não é verdade?

Ele se sentiu um pouco culpado.

- Sinto muito. Parece que não estou ajudando. Pararei se você me pedir.

Ela lhe sorriu. Deus, era uma criatura realmente linda. Com esses grandes olhos verde jade, e as maçãs do rosto perfeitamente esculpidas.

- Não precisa se desculpar, Michael. Eu sou totalmente cética em relação a isto, se por acaso não se deu conta disso.

- Apesar das pequenas demonstrações que tenho dado a ti? Sei que você não acredita em mim. Essa é a primeira coisa que necessitamos eliminar do nosso meio. Venha. Sente-se. – ele pegou seu braço, a levou até a sala de estar e a colocou no pequeno sofá com estampas florais – Agora me diga que faça algo, porém não diga em voz alta. Simplesmente ponha a idéia em sua mente.

Seus lábios se curvaram em um sorriso a medida que várias vozes, na mente dela, começaram a discutir.

Isto poderia ser divertido.

Não seja idiota. Diga que te busque um copo de água.

Não, diga que te beije.

Honestamente, não vai ter importância o que diga a ele. Poderia dizer que me leve a cama e me dispa com os dentes, porém ele não vai ouvir nada disso.

Ele levantou uma mão.

- É suficiente.

- Mas eu não disse...

Ele encontrou seus olhos.

- Sim, disseste.

Então foi até a cozinha, pegou um copo no armário de comidas, o encheu com água da garrafa no refrigerador. E o levou, porém não o deixou em sua mão. O colocou sobre a mesa de fazer café. Apoiou as mãos em seus ombros, a pôs em pé e a aproximou, deslizou seus braços ao redor de sua cintura e inclinou a cabeça até que seus lábios se tocaram.

Ela se estremeceu. Envergonhou-se ao se dar conta de que ele tinha ouvido cada um de seus pensamentos, porém seu corpo vibrou de antecipação e necessidade. Ele a estava beijando. Quando ela desejou que se aproximasse mais, ele se aproximou, e quando ela desejou que ele usasse sua língua, assim o fez.

Ela estava adorável e tímida, envergonhada e ansiosa, nervosa e acovardada, porém, sobretudo estava faminta... Dele.

Michael começava a pensar que este pequeno jogo tinha sido uma má idéia, esta não tinha sido sua intenção. Não tinha ido ali para fazer amor com ela, porém isso era exatamente o que ia fazer. E sim era uma boa idéia, na realidade, não importava muito nesse momento.

A levantou nos braços e levou até o dormitório, explorando sua boca. Logo a colocou na cama e se inclinou sobre ela, afastando sua boca da dela, descendo até seu pescoço, e até o primeiro botão verde jade de sua blusa de seda. Beijou sua carne, logo liberou o botão superior da blusa com os dentes. A beijou outra vez ali e desabotoou outro, voltando a beijar o lugar.

- Não. – ela pôs suas mãos firmemente em seus ombros e o empurrou.

Michael se congelou, reprimiu sua paixão recém nascida e lentamente se endireitou ficando longe dela.

- Isso era o que você queria. – lhe disse.

- Passou por minha mente. Não é o mesmo.

Ele concordou, concedendo este ponto a ela.

- Tem razão. Um pensamento passageiro não é o mesmo que um realmente desejado. Porém parecia que queria de verdade quando pensou.

Ela parou com o olhar fixo nele. Ainda jazia sobre a cama, sua blusa estava desabotoada e o desejo brilhava em seus olhos.

- E era. – murmurou ela - Estou tratando de levá-lo ao senso comum. Esta não sou eu, Michael. Não atuo desta maneira.

- Jamais pensei que fosse assim.

Ela concordou.

- É muito cedo.

Inclinando-se sobre ela, abotoou delicadamente sua blusa, sujeitou seus ombros e a ajudou a levantar-se.

- Certo, me convenceu. Agora acredito em você. E vou aceitar seu oferecimento.

Ele levantou as sobrancelhas.

- Te despir com meus dentes?

Sabia que não era isso o que ela queria dizer, porém não pode resistir.

- Deixa de escutar furtivamente cada um dos meus pensamentos.

- Temia que fosse dizer isso. – ele suspirou, mostrando sua desilusão - Está bem. Já o sabia, e francamente... Teus pensamentos são tão bajuladores.

- Não é justo. Eu não posso ler os seus!

E isso era bom, porque um segundo antes tinha pensado coisas que, a teriam deixado louca, teria dado um susto de morte. E não queria assustá-la.

- Confia em mim. – ele disse - Também te encontraria com minhas bajulações.

Ela alisou seu cabelo e se pôs em pé.

- Então, está pronto para me mostrar o que tem na sua carteira?

Ele concordou, tomou sua mão, e a levou de volta a sala de estar. Embora sair do dormitório era a última coisa que desejava fazer.

 

Sobre o balcão de desjejum se encontravam espalhadas fotocópias de documentos de quatro pessoas desaparecidas, tomadas de vários departamentos de polícia. Havia nomes escritos a máquina do outro lado da foto, e todos tinham de três a cinco fotos sujeitas com clipes: Samantha Carlson, Vivian Marie Patinski, Kathy Somerfield, Cynthia Stone.

Mary olhou as páginas escritas a máquina e tratou de ignorar as bonitas caras sorridentes das mulheres, e a vida em seus olhos.

- Nova Jersey, Vermont, Massachusetts, Connecticut, todas elas desapareceram em diferentes estados.

- Todas elas no nordeste. – disse ele - Como Maine.

- Bom. Então é um assediador que viaja.

- Leia os informes.

Engolindo em seco, tratou de concentrar a atenção nas páginas antes que a intensidade do olhar de Michael e o inquietante formigamento produzido por sua proximidade. No final, não teve que fazê-lo porque ele leu, muito impaciente para esperar.

- Em todos e cada um dos quatro casos aparece que elas deram parte de chamadas telefônicas anônimas e a impressão de estar sendo observadas durante uma ou duas semanas antes de seus desaparecimentos. Cada uma delas informa de uma invasão de domicílio. Cada uma delas desapareceu durante a lua cheia.

Um pequeno tremor percorreu sua espinha dorsal.

- Encontraram... Alguma delas?

Ele baixou a cabeça.

- Se desfez delas em distintos lugares. O corpo de Samantha foi encontrado por uns pescadores em Crosswicks Creek. Vivian apareceu em um desaguadouro da cidade, debaixo de um monte de porcaria. Kathy e Cynthia seguem desaparecidas.

Ela apertou os lábios e olhou de novo as fotos. Então passou a vista nas datas de nascimentos.

_ Todas perto dos trinta anos.

_ Isto não é tudo o que elas têm em comum, Mary.

Ela fechou os olhos, seguramente não estava com ânimo para que lhe informasse isso, porém indubitavelmente tinha que fazê-lo.

- Todas compartilham um antígeno muito raro em seu sangue, conhecido como beladona. Você também o tem.

Ela o olhou rapidamente.

- Como sabe isso?

Ele sustentou seu olhar.

- Do mesmo modo que sei tanta coisa a seu respeito. Te sinto, Mary. Às vezes, é como se estivesse dentro de ti.

Ela fechou seus olhos, escondendo um calafrio. Tinha esperado que suas supostas provas o revelassem como uma fraude, ou talvez como um benfeitor sincero, porém equivocado. Ao invés disso, a convenceu totalmente.

- Como elas...? – não teve que terminar a pergunta.

- Não é importante como morreram. Só que foram assassinadas da mesma maneira.

- As duas que foram encontradas, ao menos.

- As quatro. – disse ele - Porém só estão os informes das autópsias das que foram encontradas.

Seu olhar se deslocou para a bolsa de couro marrom, que estava sobre a mesa, com a aba aberta. A quina de uma algema era visível dentro. Michael então fechou o estojo com pretexto de levá-lo a polícia. Colocou-o a seu lado. Não queria saber como ele tinha matado as mulheres, as quais, como supunha ela, tinham sido horríveis.

- Também tratasse de adverti-las? – perguntou ela.

Ele negou com a cabeça lentamente.

- Não soube nada delas até depois de serem assassinadas. E não por uma visão senão por uma conversa casual entre... Alguns de meus companheiros.

- Teus amigos são psíquicos?

Ele sorriu.

- Algo pelo estilo. Soube destas quatro mulheres assassinadas, todas elas portadoras do antígeno. Não espero que entendas porque, e não posso explicá-lo, porém entre as pessoas como eu, foi um tema que gerou muita polêmica e inquietude.

- As pessoas como você...

- E então te vi em um sonho. Te senti. E soube que seria a próxima.

- Como soube onde me encontrar?

Ele olhou o chão, sacudindo a cabeça.

- É difícil de explicar. Além do mais, temo que já pense que sou um enganador.

- Então não tem nada o que perder.

Ele tomou ar.

- Uma vez que vi teu rosto, senti sua aura, embora fosse só um sonho, fui capaz de entrar nela e seguir sua pista.

- Como uma espécie de sabujo que persegue o cheiro?

- Algo parecido.

Ela lambeu os lábios e se perguntou por que não o temia. Pelo que sabia, ele podia ser o assassino. Porém se era ele, por que se empenhava tanto em preveni-la? E como tinha engendrado o truque da chamada ao celular enquanto estava sentado a seu lado no carro?

Difícil. Porém não impossível. Tinha dispositivos, gravadores, temporizadores. Ela tinha visto isto em filmes de espionagem.

E ainda assim, ela não tinha medo dele. Era estranho. Diferente. Nunca tinha encontrado a um homem como ele. Não tinha sentido nenhum temor. O que ele queria exatamente? Contudo, quisesse ou não, não tinha maneira de que fosse ele o responsável pela tormenta de desejo que passeava em seu interior. De nenhuma maneira. Estava tudo nela. Ele não teria podido planejar isso.

Ele a observava, estudando sua cara. Então concordou com a cabeça, pegou seu casaco, e o colocou em um cabide atrás da porta principal.

- Há uma arma no bolso esquerdo de meu casaco. Balas extras no direito. A trouxe para ti... Para que te protejas.

Ela piscou.

- Eu não... Gosto das armas.

- Tampouco eu, porém estamos falando de tua vida. Anda, toma-a. E enquanto estás aí, revista os outros bolsos. Te assegure de que não escondo outra arma.

Apertando os lábios, ela foi para o casaco, e fez o que ele tinha dito. A arma era um pequeno revólver negro. As balas estavam em uma caixa roxa e branca. Os outros bolsos estavam vazios.

Quando girou, ele estava a seu lado, embora não lhe tinha ouvido atravessar a sala.. Estava parado com os braços estendidos longe do corpo.

- Continua. Quero que esteja segura de mim.

Engolindo com força, ela colocou o revólver e as balas no solo e pôs a mão no canto do seu braço esquerdo, percorrendo todo o comprimento, lentamente, todo o caminho até sua munheca. Repetiu a ação com o outro braço. Ele deu a volta para que pudesse revistar suas costas e seus ombros, enquanto ela pensava que era uma pena que ele tivesse vestido na camisa. Ele não escutou esse pensamento, por que girou outra vez. Ela percorreu suas palmas através de seu peito e abdômen.

Seu coração batia com tanta força que pensou que ele tinha escutado. Michael também reagia, sentia. Seus olhos tinham se fechado, e sua mandíbula estava fortemente apertada. Ela moveu sua cabeça para os lados, e de cima abaixo. Então dobrou seus joelhos, agachando-se, e massageando o caminho ao longo do exterior de seus músculos, até suas panturrilhas. Ela o sentiu tremer quando foi subindo a mão pelo interior de suas pernas. Finalmente se endireitou.

- Não tem armas. – as palavras saíram roucas, teve que esclarecer a voz.

- Em todo o caso, nenhuma letal.

Ela afastou rapidamente o olhar.

- O que é isto, Michael? Por que me sinto tão...? – ela não pôde terminar. Simplesmente deixou escapar as palavras em silêncio.

- Não sei. Exceto que isto... Não passa só contigo.

Ela olhou e viu claramente em seus olhos: a desejava. Com tanta ânsia como ela desejava a ele. Porém rompeu o contato visual para recolher as armas e as balas de onde as tinha colocado e depois as pôs em suas mãos.

- Leva o revólver com você. – disse ele - E mantenha-o carregado. Não precisa se preocupar com o seguro dele, e é bastante fácil de manejar.

Ela pensou em colocá-la de lado, porque tinha que fazer algo para desviar sua atenção das demandas de seu corpo. Ela não precisava convidá-lo para sua cama, não teria que lhe perguntar, somente teria que pegar sua mão e guiá-lo até o dormitório.

Separou o cilindro da arma, e pôde ver as agulhas que alojavam as balas. Logo o golpeou fechando-o outra vez, pensou em carregá-lo, e onde poderia guardá-lo enquanto dormia, e se poderia ou não disparar em alguém. Pensava em qualquer coisa, exceto em ter relações sexuais com Michael Gray.

- Entre isto e tua pistola atordoante deverias ser capaz de te defender. – disse ele.

Ela concordou.

- Não te proporcionaria uma arma de fogo se pretendesse lastimar-me, Mary.

- Pensa que a estas alturas eu não sei?

Ele concordou jogando um olhar de soslaio.

_ Daqui a pouco amanhecerá. Deverias dormir um pouco.

Tinha razão. Eram cerca de 3:00 horas da manhã quando tinham deixado o bar.

- Você também deveria fazê-lo. – Vamos, diga! Simplesmente convida-o a ficar!

- O farei. Temos uma coisa mais trabalhando a nosso favor, Mary. Ele sempre ataca à noite. Sempre.

- À esta hora, você quer dizer.

Ele concordou.

- E como é que isso está a nosso favor?

- Posso protegê-la à noite.

Ela franziu o cenho, não estava segura do que isso poderia significar. Então uma idéia passou em sua mente.

- Tem um trabalho de dia. – então suspirou - Então, tem a intenção de trabalhar durante o dia, e logo permanecer toda a noite cuidando de mim? Isso é loucura, Michael. Quanto tempo pensa que pode manter um horário semelhante?

- Enquanto faça falta. E não estou tão louco como você pensa. – de novo olhou o relógio - Tenho que ir.

Se pôs em pé e caminhou para a porta. De repente, ela sentiu o pânico gelar seu coração. Correu para a porta atrás dele.

- Michael...

Se deteve, deu a volta e colocou suavemente a palma de uma mão em sua bochecha.

- Ele não está perto daqui, em nenhuma parte. Eu saberia se estivesse.

Ela fechou os olhos.

- Além do mais, – disse ela – ainda não é lua cheia.

- Fecha a porta atrás de mim.

- Farei. Porém... Quando voltarás?

- Estarei no bar imediatamente depois do pôr-do-sol. Te assegure de chegar ali antes que escureça. Dessa maneira estarás a salvo. E mantenha as armas contigo.

Ela concordou.

- Certo. – engolindo em seco, ela tomou sua mão entre as suas - Obrigada, Michael. Não tenho idéia de porque estás fazendo isso. Inclusive não sei por que te importa, porém... Obrigada.

- Estou fazendo – disse ele – porque não posso deixar de fazê-lo.

- Não entendo o quer dizer.

Ele sorriu suavemente.

- Me deixe dizer simplesmente que tens algum tipo de poder sobre mim. Não acredito que poderia resistir embora quisesse. E para ser honesto, não quero. – ele rodeou sua bochecha com a palma da sua mão e se inclinou para roçar os seus lábios - Procure descansar um pouco, Mary.

Ela assentiu. Quando ele deu um passo fora da porta, Mary fechou e girou as fechaduras. Logo se dirigiu para a janela e separou as cortinas para vê-lo ir... Porém ele já tinha ido.

Como se tivesse... Desvanecido.

 

Mary dormiu até que a campainha da porta a despertou. Seus olhos não queriam se abrir, mas o som era rápido, persistente e tenaz como o inferno. Eu não quero levantar. No entanto, verificou que não tinha escolha no assunto.

Rolando para um lado, abriu suas pálpebras separando-as durante tempo suficiente para ver o vermelho brilhante dos dígitos do alarme do seu relógio, 10:00. Ela tinha dormido cerca de cinco horas e meia... Desde que Michael havia feito o seu desaparecimento em torno das quatro e meia.

A campainha continua tocando.

- Estou indo!

Retirou os lençóis e deixou a gravidade puxar suas pernas até bater os pés

no chão. Tentando não bocejar, encontrou seus chinelos e colocou os pés dentro. Ela se levantou, ainda não terminando o bocejo, e então se tornou rígida quando a neblina do seu cérebro foi suficientemente clara para permitir sobressair o pânico. E se o assassino estava agora à sua porta?            Mas Michael disse que ele só tinha atacado durante a noite. E durante a lua cheia. Agora, em pleno dia. No entanto...

           Ela abriu a gaveta da mesa de cabeceira e puxou o revólver. Ela tinha carregado e colocado lá antes de ir dormir na noite passada. No entanto, onde diabos isso ia levar? Não tinha bolsos no seu pijama de flanela. Lambeu os lábios, escrutinou o quarto, enquanto a campainha repicava todo o tempo, divisou um roupão manchado na parte de trás de uma cadeira e o agarrou rapidamente.

           O colocou, e colocou a arma no bolso do roupão de pelúcia, a campainha se tornou rapidamente em batidas na porta, e uma voz gritou: - Abra senhorita McLean. É a polícia!             Polícia?             Ela amarrou a cara, amarrou o cinto do roupão em torno de sua cintura enquanto arrastava os pés para a porta e olhou cuidadosamente através do olho mágico. Dois homens fardados estavam em pé na porta. Para além do portão viu um carro preto e branco com todos os seus respectivos logotipos e as respectivas luzes. Ela abriu a porta, mas pôs na corrente. - Olha, eu não quero desgostá-los, mas eu preciso ligar para a estação e verificar se você é realmente polícia, OK?             Um deles pôs os olhos em branco. Era corpulento, com uma cara que lembrava a de um panda, com círculos em torno de seus olhos escuros e um robusto queixo.             O outro era mais jovem, um loiro com olhos azuis parecia com um anúncio publicitário para óleos bronzeadores.

- Faz sentido, considerando a natureza da queixa apresentada na semana passada e, em seguida, a entrada forçada, disse ele.             Ela piscou. - Porque estão aqui? Você não é da polícia que é responsável por isso. - Bem, tem havido alguns progressos, madame. Seu caso poderia coincidir com outro que estamos trabalhando, e... - Sabe alguma coisa sobre este maníaco que está me perseguindo? - Talvez. E você? - questionou o mais velho. - Espere aqui.

Virou as fechaduras das portas, olhava para o carro para ver de que parte da cidade eram os polícias e, em seguida, abriu a lista telefônica e encontrou o número da central da polícia. Ela obteve uma resposta rápida de uma verificação rápida e sim, dois agentes com os nomes de Dunst e Strickland estavam atualmente em sua porta. - Obrigado. - disse ela e desligou o telefone.

Depois que ela levou a pequena arma de seu bolso e colocou sob as enormes folhas de uma planta no interior. Finalmente, ela abriu a porta. - Eu sou o oficial Dunst. - disse o mais jovem. - Este é o oficial Strickland. Temos de perguntar-lhe, minha senhora. Você se importa se nós entrarmos? - Claro que não. Lamento o atraso. Fico feliz ao saber que são confiáveis. – nenhum dos dois mostrou um sorriso diante de sua brincadeira. Ficou de lado e os deixou passar, em seguida, fechou a porta novamente, sem perder tempo com os ferrolhos. Ela não achou ser necessário os colocar com os dois polícias e um revólver no pote. Ela mostrou o sofá com a mão e sentou na cadeira em frente a eles. - Então, do que se trata?

- Tommy Campbell. - disse Strickland - Você o conhece? - Claro que o conheço. Temos trabalhado em conjunto no “A Cripta”, que é um bar, e não uma cripta real, claro. - Eu sei. - foi a voz da Dunst mais suave. - Pode dizer-nos a natureza da sua relação com ele, minha senhora?            Pequenos arrepios viajavam em alta velocidade ao longo de seu pescoço. - O que está acontecendo aqui? Tommy se meteu em qualquer problema? - Basta responder as perguntas, minha senhora. Está envolvida com Tommy Campbell? - Envolvida? Não, eu não estou envolvida com Tommy. Nós somos amigos. Trabalhamos juntos. - ela molhou os lábios e os policiais a olharam fixamente, esperando. Como se soubessem que havia algo mais. - Ele... Ele pode estar um pouco encantando comigo.

- O que te faz pensar isso?            Ela deu de ombros. - Eu não sei. Ele nunca pediu-me para sair, ou algo parecido, apenas emite vibrações, sabe? - Ótimo, pensou. Agora soava como Michael. - Quando foi a última vez que o viu, Mary? - Dunst perguntou.                Ela franziu o cenho, um medo súbito consumiu sua coluna vertebral. -Na noite passada. Levei-o para sua casa a partir do bar. Estava chovendo, e ele não queria andar. O que está acontecendo? - A que hora o levou?            Ela fechou os olhos, lembrando.

- Fechamos as duas. Provavelmente nos levou vinte minutos ou mais para que os clientes saíssem de lá e depois limpar. Ele apenas vive a poucos quarteirões, não sei. Devia ser cerca de três. - Está segura disto? - Sim. - Há alguém que possa confirmar?            Ela franziu o cenho. - Não basta perguntar ao Tommy?            Os policiais trocaram olhares. Dunst, foi quem finalmente falou. - Senhorita McLean, Tommy Campbell foi morto ontem.

Ela se sentiu desfalecer, e sua mente parecia relutante para processar as palavras. Era como se ele tivesse falado em outra língua. Ela os viu desfocados, e negou com a cabeça. - Não, isto não é possível. Tommy está... Tommy está... - Morto, senhora McLean. - disse Strickland.           Ela fechou os olhos, pressionando fortemente tentando apagar as palavras do homem. - Mas como? Por quê? - Alguém o atou a sua cama, encharcou com gasolina e incendiou. - Strickland, não... - avisou Dunst, demasiado tarde. Ela havia ouvido o horror e seu estômago se rebelou. Ela se levantou de um salto, e correu até seu quarto para o banheiro para vomitar. Caiu sobre seus joelhos, em frente ao banheiro.

Dunst foi atrás dela. - Você está bem? - Eu não... Entendo isso. Por quê? Porque é que alguém iria machucar Tommy? Ele era simpático... Inofensivo.          Ele veio até ela, tirou sua cadeia, em seguida, molhou uma toalha na pia e a entregou. Mary limpou o rosto e as mãos e se levantou. - Você foi a última que o viu vivo Mary. - disse o funcionário Dunst.         Ela cruzou os olhos com os dele e balançou a cabeça de um lado para o outro. - Não, não eu. Foi a pessoa que o matou. - o homem revolveu os olhos, e ela compreendeu. - Meu Deus! Você acha que eu tinha algo a ver com isso? - Temos de interrogá-la. É o procedimento normal. - ele pegou seu braço, e a conduziu para a sala em direção a sala de estar, seus olhos escrutinadores, tudo pareciam assimilar tudo - Precisamos saber de tudo o que aconteceu ontem à noite, mesmo quando você deixou Tommy.

Ela parou de andar quando chegou à sala. O outro policial estava em pé, esperando. - Eu já disse tudo. Tommy precisava de carona. Eu dei. Ele saiu e entrou no prédio, e voltei para casa. - E é isso?           Ela concordou. - Não viu ninguém estranho rondando ao redor do local, quando você saiu?           Ela balançou a cabeça lentamente. - Chovia a cântaros. As ruas estavam vazias. - E quanto ao bar? - Dunst perguntou. - Alguém novo na vizinhança que poderia chamar a atenção para ele?           Ela pensou em Michael. Deveria falar sobre ele. Poderia corroborar a história dela, confirmando que Tommy estava vivo quando ela o deixou e responder do seu paradeiro pelo resto de sua noite. Mas uma coisa lhe disse que seria um erro, então ela simplesmente negou com a cabeça. - Após o regresso a casa, o que fez?           Ela piscou lentamente.

- Eu fui para a cama. Não me levantei até que vocês dois me acordaram agora. - Não voltou a sair, isto é, entre as quatro e meia e as 5:00 a. m. ?           Ela negou com a cabeça. - Foi... Foi quando isso aconteceu?          Não respondeu. Ocorreu a ela que, de qualquer modo, nem sequer falar sobre Michael serviria de nada. Tommy foi morto depois que Michael saiu de lá. Tommy foi morto depois de Michael sair de lá.          Ela desabou no sofá e os contemplou. - Alguém tem que fazer alguma coisa. Alguém deve saber quem fez isso.          Dunst negou com a cabeça. - Se alguém sabe, então vamos aprendê-lo.          Ela suspirou e baixou a cabeça.

- Peço a Deus que o encontrem.          Os policiais olharam entre si. Dunst encolheu os ombros. - Talvez depois tenhamos mais perguntas para lhe fazer, uma vez que encontremos algo mais. Não deixe a cidade, por enquanto, ok?          Ela levantou a cabeça fortemente. - Eu sou suspeita, não é? - Todo mundo é suspeito até o descartarmos. Nós ainda não temos provas para excluí-la. - disse Strickland. Foi para a porta, abriu-a e parou na saída. - Eu estarei fora em um momento. - avisou Dunst. - Preciso de seus números de telefone alternativos para ser capaz de te encontrar mais tarde.          Dando a sua aprovação, Strickland se foi.          Dunst se acocorou na frente do sofá. - Mary, isso é entre nós, ok? Acreditamos que possa ter sido Tommy quem a tenha acossado. Strickland acredita que você soube e o assassinou. Eu não. - Eu aprecio isso. - Há alguns indícios encontrados no local para se conectar com... Os outros. Incomuns casos.

- Está sendo terrivelmente ambíguo, oficial Dunst. - Desculpe. Tenho de ser. – tomou um cartão do bolso e deu a ela. - Estas pessoas podem ajudar a pôr fim a tudo isso. Eu sei. Eles são boas pessoas.          Ela olhou para o cartão. Ele tinha gravado a primeira S. I. S. no topo, e abaixo, em um menor, lia-se Serviços de Investigações Sobrenaturais. - Sobrenaturais? - Você não o conseguiu de mim, né? Essa conversa nunca aconteceu.         Ela negou lentamente. - Que diabo está acontecendo, oficial Dunst? - Não sei. - ele evitou seus olhos quando disse isso, como se a dizer que conhecia um pouco mais do que aquilo que ele disse. - Dá-me teus outros números de telefone, em caso de Strickland me perguntar.         Ela recitou o seu número de telefone, e ele anotou rapidamente. Então, ele ofereceu um sorriso tranqüilizador e se foi. Ela permaneceu na entrada tremendo, chocada com o comentário, até que ele entrou no carro com seu companheiro e se foram. Em seguida, fechou a porta, colocou as fechaduras e afundou no solo, abalada.

        Michael poderia ter feito.        Michael não tinha nada a ver com isso, e você sabe disso.        Ele teve tempo depois de sair. Não tinha dado a impressão de que gostasse de Tommy. Mas por quê? Por que ele faria algo tão horrível? E se, afinal, fosse ele o assediador?        Ele não. De jeito nenhum.        Mas houve um assediador, e não poderia ser Tommy. A polícia estava errada. E se o verdadeiro maníaco matou Tommy porque ele sabia que ele era fascinado com ela? Que tal uma espécie de explosão de ciúme? Essa chamada prova, deveria ter sido plantada na casa de Tommy precisamente para torná-lo culpado? Em sua mente rodavam perguntas, e uma sinistra imagem que não podia apagar... O pobre Tommy Campbell, queimado vivo na sua cama.

 

       Algo estava errado.

      O bar estava escuro, tinha só um carro estacionado, quando ele chegou depois do pôr do sol. O carro de Mary.        Ela ficou tensa quando os faróis de seu Jaguar iluminaram a frente onde ela estava sentada. Ele sentiu o seu crescente medo. Era palpável, apesar de que ele não estava a tentar ler os seus pensamentos. Rapidamente desligou o motor e apagou as luzes, para que pudesse vê-la.        No entanto, os seus receios apenas atenuaram ligeiramente.        Ele abriu a porta e saiu, ela se levantou e foi para ele. Seu rosto estava inchado e olhos vermelhos, como se tivesse estado chorando. - O que aconteceu?        Ela sustentou seu olhar. -Tommy. Lembra-se de Tommy, a noite passada?        Ele concordou.

- Está morto. Alguém o matou.        Ele correu para ela, pôs seus braços ao redor dela para trazê-la mais perto, o instinto de consolá-la foi superior à sua certeza de que ela, de novo, tinha medo dele. Mas ela não o deixou. Se afastou, e ele baixou os braços para os lados, enquanto um grito de terror se afundou em seu coração. Suspeitava dele. - A polícia suspeita de mim. - disse ela.        Essa era a última coisa que esperava ouvir. - O quê? Como santo... O quê? - Me disseram que ele foi assassinado cerca de 5:00 a. m. Eu era a última pessoa que viu ele vivo. Pelo menos a última que sabem eles. - Meu Deus!        Ela tinha os olhos em seus sapatos. Ele olhou para além, notando o cartaz colado na entrada. "Fechado por morte familiar", ele balançou a cabeça dele com repugnância. Tommy era um homem jovem, começando o vigésimo ano. E embora Michael tivesse encontrado o garoto um pouco irritado, ele estava certo de que ele não tinha feito nada para merecer isso.

       Olhou Mary novamente. Mantinha-se em pé fracamente. - O que aconteceu? - Ele foi amarrado e queimado na sua cama, ela olhou para os seus olhos por alguns instantes. Assume-se que você é uma espécie de vidente. Porque não viu isto acontecer?        Ele negou a cabeça dele. - Eu não vejo tudo, Mary. Não tenho nenhuma ligação com Tommy. - Você não tem nenhuma ligação comigo, também. -  Sim, eu tenho. Você sabe bem, como eu. A sente tão fortemente como eu, Mary. Não negue isso.        Ela levantou suas sobrancelhas. - Porque não devo negá-lo quando você recusa-se a explicar? Sei que não me diz tudo, Michael.        Ele permaneceu em silêncio por um momento. Ela queria saber tudo. A última pessoa a que tinha confiado o suficiente para dizer tudo o tinha furado um tiro fatal na cabeça em resposta. Mary não podia reagir tão mal como isso. Mas seguramente se afastaria dele, e se fazia isso, o assassino a encontraria só, sem proteção.

       Ele não poderia dizer tudo. Mas, claramente, ele tinha que dizer alguma coisa. - A ligação que compartilhamos é de sangue. - lhe disse, escolhendo as palavras cuidadosamente- O antígeno. - Também o tem?        Ele só concordou com a cabeça. Não lhe diria o resto... O que ele era. - Mary, eu não tinha nenhuma razão para querer magoar Tommy.        Ela molhou os lábios. - Você não deveria ter vindo aqui só para isso. – assinalou o cartaz- Você pode estar em risco, você sabe.        Ela deu de ombros. - Eu trouxe a arma. Eu sabia que você me procuraria aqui. E eu precisava ver. Além disso, a polícia acha que Tommy poderia ter sido o assediador. Aparentemente esta é a minha razão para matá-lo. - O que lhes faz pensar isso?

       Ela negou com a cabeça. - Não me disseram. Supõe-se que eu não deva saber.        Limpando sua garganta, ela caminhou para o seu carro, parado ao lado do preto Jaguar. - A polícia queria saber se alguém estava comigo quando deixei Tommy ontem à noite. Alguém que poderia confirmar que ele estava vivo quando saí. Mas não conto com você.        Era melhor que ela não tivesse dito nada. Ele não precisava o tipo de monitoramento e investigação que teria sido se tivesse feito. Mas se isso a deixaria livre da suspeita... - Em qualquer caso, não teria tido qualquer importância. Eles o assassinaram depois que deixou a minha casa. Você não podia jurar que eu não havia retornado e feito uma coisa dessas... Mais do que eu poderia jurar que não o fez você.        Ele optou por ignorar o último comentário. - Que prova está contra você? - ele perguntou. - Eu te disse, eu era a última pessoa que viu ele vivo, e se ele era o assediador, então...

- Isso é circunstancial. Existe algo físico?

       Ela franziu o cenho. - Eu não sei. Como poderia ser, Michael? Nunca estive ali. - Não importa. Farei uma averiguação. Mas primeiro temos que levá-la em algum lugar seguro.        Ela estava perigosamente perto das lágrimas. - Presume-se que eu não posso abandonar a cidade.        Ele pensou que um momento. Se a levasse para longe e a polícia não pudesse localizá-la a suspeita sobre ela iria aumentar exponencialmente. - Você tem um celular? - ela concordou. - E você deu à polícia o número? - Sim. - Boa. Eu quero que você dirija o seu carro e siga-me de volta para seu apartamento, certo? Deixe o seu carro lá, e você pode vir comigo.        Ela negou com a cabeça.

-Eu não vou a qualquer lugar com você, Michael.        Sustentou seu olhar por um longo período de tempo, então finalmente disse suspirando, que se rendia. - Você acha que fui eu. Você acha que eu matei Tommy, não é? - Não. Não penso isso em absoluto, mas parte de mim pensa que é possível e que eu deveria... Que talvez... Esta química entre nós... Nubla meu julgamento. - agitou a cabeça com frustração - Inferno, eu não sei o que pensar. Só sei que você é um estranho. Até quando eu sinto que conheço você desde sempre, você é um estranho para mim, Michael. Nem mesmo sei o seu nome.        Ele engoliu com força. Por que sua falta de confiança causou-lhe dor foi além dos seus conhecimentos. Foi deslocada.

- Eu não posso culpá-la por ser cautelosa. Você está certa. Deus, parece que me conhece melhor que ninguém que eu já conheci na minha vida, mas é que justamente isso... Isto é justamente isso... – à medida que o disse acariciou sua bochecha com os nós dos dedos, e ela fechou os olhos, aproximando-a de seu toque.        Em seguida, os abriu e encontrou o seu. - É poderoso, Michael. Todo o meu ser confia em ti. Mas eu tenho que ter certeza. - ela franziu o cenho. - Existe alguma parte do que você que quer saber se posso ser culpada? Se os seus sentimentos não estão nublando sua opinião?        Seus olhos exploraram os dela.

- Não. Absolutamente. Mas de qualquer maneira, estou mais habituado a confiar no meu instinto do que você. Todos eles me dizem que você não é uma assassina. E raramente tenho me guiado mal. - assentiu lentamente. - Retornaremos para o seu apartamento. Verei se você está segura no interior e deixarei o número do meu celular. Grave-o no seu telefone, para que você possa rapidamente me ligar se precisar de mim. Você pode ficar lá, sairei e verei o que posso encontrar de informações sobre o assassinato de Tommy, e depois voltarei e a informarei.        Ela piscou, claramente insegura. - Você pensa que pode encontrar alguma coisa?

       Ele molhou os lábios, inseguro sobre o que dizer. - Eu era um policial, Mary. Por dez anos eu fui da polícia. - Em Nova York? - Em Chicago. - Por que você parou?        Ele hesitou. - Eu fui ferido no exercício do meu dever. As lesões foram... Mudaram a minha vida. Ele não estava disposto a dizer que o resultado tinha sido nas mãos de um Capone, na era da Tommy Gun, ou que ele foi declarado morto em um hospital, apenas para acordar em um necrotério mudado para sempre.        Tinha sido oferecido a ele, então, uma escolha de viver ou morrer. Ele tinha preferido viver. - Desculpe. É ainda uma memória dolorosa para ti?        Ele negou com a cabeça.

- Isso está no passado. - mais passado do que ela poderia imaginar. - Mas eu sei alguma coisa sobre trabalho policial. Eu sei onde encontrar as respostas que precisamos, e fazê-los sem ninguém se dar conta. - ele havia visitado um grande número de departamentos da polícia, desde a sua transformação. Tinha sempre crimes por resolver, coisas que fez em dia através da sua capacidade de ler os pensamentos dos mortais, deslocando-se de um lado para o outro quase silenciosamente.        Teve sempre males que ele poderia ajudar a corrigir. E ele fez. O tinha feito durante anos. As provas surgiam onde ninguém tinha visto antes, as armas que estavam em falta tinham sido encontradas, testemunhas que se ofereciam. A polícia não sabia que tinha uma mão que os ajudava... Uma fria, pálida mão. De muitas maneiras, ele era policial agora mais do que nunca havia sido antes.        Ela franziu os lábios, então concordou.

- Se você realmente acha que pode aprender alguma coisa, então... Então, sim. Vamos fazê-lo. Pegue a chave para a porta extra para que você possa entrar na garagem. - ela virou e saiu andando em direção de seu carro. - Gray. - disse ele, às suas costas.        Ela parou e começou a virar novamente. - O quê? - Meu nome é Michael Gray. - Oh. - ela sorriu fracamente, hesitante. - Obrigado por me dizer.        Ele concordou. Ela entrou seu carro enquanto ele entrava no seu.

 

       Depois de sair, Michael foi primeiro ao edifício onde Mary tinha deixado Tommy na noite anterior. Não havia guarda de segurança que requeresse identificação para entrar no edifício, e não foi difícil encontrar o apartamento. Mesmo sem a fita amarela da polícia que selava a porta, ele teria conhecido. Ainda podia sentir o ar frio e persistente da morte. E lá estava o fedor. A carne queimada não tinha um cheiro agradável.        A porta do apartamento não estava fechada. O trinco cedeu sem grande resistência à pressão de sua mão, entrou e fechou a porta atrás dele. Não acendeu as luzes. Não era preciso.        O lugar cheirava a fumo e carne carbonizada, mas o único sinal de incêndio foi no quarto. Um anel preto rodeava a cama, tinha queimado através do tapete e carbonizou também o solo abaixo. A cabeceira foi destruída, deixando apenas um pouco de madeira carbonizada em sua base. A parede sobre a qual foi apoiada estava enegrecida, assim como em cima do telhado. Faltava o colchão que provavelmente estava no laboratório de criminologia.

       Curiosamente, o resto do quarto mostrou muito pouco dano. Bombeiros deveriam ter chegado a tempo para conter as chamas, economizando mais do resto do edifício. E provavelmente muitas vidas durante o processo.        O quarto tinha sido registrado de cima a baixo. Suspeitou que muitos objetos estavam faltando. Foi para a cama, mentalmente preparado para o impacto dos sentimentos que viriam quando colocasse as mãos sobre o local do incidente.        Ele esperava o horror. A dor insuportável. O calor tórrido e o tormento. Não foi o que sentiu. Nenhuma outra coisa senão uma imagem de um corpo em chamas.    Nenhum pensamento. Nenhuma sensação. Tommy não estava consciente quando foi envolvido em chamas.

       Franzindo o cenho, registrou o apartamento, porém não encontrou nenhum indício, nenhuma outra imagem obtida. Não foi até que ele deixou o prédio, a caminho do Departamento de Polícia, que ele sentiu novamente o templo de morte. Não a partir do interior, mas a partir do beco logo abaixo da janela de Tommy.        Ele seguiu o seu instinto para o beco cheio de lixo. Os ratos foram movendo-se rapidamente à sua chegada. E então, o cheiro.        Sangue.        Aproximando-se identificou a fonte, um esguicho escuro no tijolo do muro do prédio ao lado de Tommy. Pressionou a mão no local e imediatamente sentiu um golpe esmagador em sua testa diretamente entre os olhos, e aquilo que parecia uma explosão atrás de sua cabeça. Sentiu cheiro de enxofre queimado e pólvora, e ainda que não ouvisse o tiro, seus ouvidos apitaram, como se tivesse ouvido.        Alguém tinha sido baleado na cabeça. Aqui, neste beco.        Um jovem. No início dos vinte anos, era pequeno, magro e rijo, de cabelo castanho.        Deus, Tommy tinha recebido um disparo aqui mesmo. Foi quando ele tinha morrido.

       Não faz sentido obrigar a colocar Tommy no beco e depois levá-lo para o apartamento dele, pensou Michael quando voltou para seu carro e saiu. O risco de ser visto carregando um corpo deveria ter sido uma razão suficiente para não. E amarrar o garoto à sua cama e queimar o corpo, é uma loucura.        Percebeu que não estava sequer perto de saber o que a polícia tinha encontrado para incriminar Mary. Quem tinha feito isto a Tommy sabia onde ele morava. Talvez alguém que conhecia. Ou talvez ele fosse apenas alguém que tinha sido visto o suficiente para ser conhecido nos mínimos detalhes.        Diabos, eles poderiam ter seu endereço conhecido pela sua carteira de motorista.        Mas, por quê? Por que matar o garoto para nada, muito menos queimar o corpo?

       Michael descobriu quando chegou a esgueirar-se para a delegacia e jogou com a mente dos oficiais para mantê-los longe dos locais onde necessitava espionar. O lugar não era como uma delegacia de uma cidade pequena, mas também não foi uma esmagadora falta de pessoal como na cidade grande. Não, esta era uma rica comunidade e seu departamento de polícia era bem financiado.        Os arquivos estavam cheios dos habituais papéis, cada um tinha uma pasta no bolso da frente, contendo um CD-ROM. Uma rápida revista permitiu ver a pasta que continha fotografias detalhadas da cena do crime, estava abaixo do gravador de CD. Não poderia ter sido mais fácil.        Ele achou o CD-RW e copiou sem utilizar os registros oficiais. Em seguida, recolocou tudo em seu lugar, e saiu silenciosamente do departamento policial.

Fácil. Quando você pode colocar pensamentos nas mentes das pessoas, persuadi-los de que eles precisam estar noutro local, e você se move tão rápido que o olho humano só pode detectar-te como uma mancha cor, é muito fácil.        Entrou no seu Jaguar e conduziu de volta ao apartamento de Mary, ansioso para examinar as provas que tinha encontrado. Apesar de estar ainda mais preocupado com ela, novamente.

 

       Mary andou de um lado para o outro, dividida em dois sobre o que fazer agora.  Uma pequena parte do seu cérebro disse a ela que devia chamar a polícia e dizer tudo que sabia sobre Michael Gray, que era pateticamente pouco. Todas as outras partes dela confiavam cegamente nele baseadas em nada mais do que instinto.        Mas pode apostar sua vida?        Lambendo os lábios, tomou o cartão de visita que lhe tinha dado o agente  Dunst. Olhou para o número de telefone. O agente Dunst lhe disse que eram "boas pessoas".

       Ela olhou para fora uma vez, não houve sinais de Michael, então agarrou o telefone e discou o número. - Serviço de Investigação Sobrenatural.        Mary pensou melhor. Certamente não há necessidade de acrescentar algo sobrenatural ao que deveria ser um simples inquérito. - Acho que confundi o número. Desculpe. - Não acha que deve ter certeza disso, antes de desligar?

       Ela suspirou. - Olha, eu só preciso de um detetive particular para executar uma relatório de rotina sobre os antecedentes de alguém... Não há nada de sobrenatural nisso. Não devia ter chamado.

- Como conseguiu este número? - perguntou a mulher. - Ahn... Um policial me deu. - O agente Dunst? - Sim. - Bem, ele nos envia muitos trabalhos. Acho que sabia que estaria mais do que feliz em cuidar de sua investigação rotineira, embora não seja exatamente o nosso habitual área de trabalho. - disse a mulher. - Sério?

- A menos que ele tenha a impressão de que há algo de sobrenatural no seu caso.        Essa foi a sensação que tinha tido Mary quando Dunst deu a ela o cartão. Mas não queria aprofundar muito essa suspeita. - Eu só... Olha, há um homem que apareceu na minha vida. Parece saber coisas que não devia e diz ser um tipo de médium. Só quero alguém para investigar seus antecedentes. - Normalmente podemos fazer um relatório bastante exaustivo, em menos de vinte e quatro horas. Vai custar cem dólares. Essa é a nossa taxa especial para as referências de Dunst. Você acha aceitável? - Sim, perfeito. Seu nome é Michael Gray. Está aqui agora em Bangor, mas a polícia disse que estava em Chicago, e que foi ferido em cumprimento do dever. - Claro, garota, com tudo isso para começar, não teremos qualquer problema. - Boa. - Ouviu um carro lá fora, e rapidamente virou a cabeça em direção à porta. - Chame-me. Só não se esqueça de falar somente comigo. Meu número é ... - Tenho, querida. Estou vendo no nosso identificador de chamadas. Iremos falar amanhã.

       Desligou o telefone, sentindo-se culpada como o diabo e pedindo a Deus que Michael mantivesse a sua promessa de não ler sua mente, ler coisas que eram privadas. A chamada que acabava de fazer a fazia sentir-se como uma traidora grave e imperdoável. Para separar sua mente disso, se ele xeretasse, pensou em Tommy, e quando o fez, o horror sobre a maneira em que foi morto novamente a inundou. Ela pensava que não teria qualquer problema em manter-se focada nisso, mas poderia ter problemas em apartá-lo de sua mente mais tarde.

       Alguém chamou na porta, e ela sabia que era Michael, ela podia mesmo sentir a sua presença, de qualquer forma olhou no olho mágico. Em seguida, abriu a porta para deixá-lo entrar, resistindo à duras penas jogar os braços em torno dele, abraçá-lo e sussurrar o que tinha jogado de menos.        Talvez estivesse perdendo a cabeça.        Ele parecia cansado. Ou também poderia ser uma preocupação que fez seus olhos parecerem tão cansados e seu rosto tão tenso.

- Você encontrou alguma coisa?        Ele concordou. - Muitas coisas. Nem tudo ainda. Acho que acabei com mais perguntas do que tinham antes. - procurou seus olhos, e ela quase teve torções de culpa, pensando o que ele poderia ver ali.  - Como está? - Estou bem. E você tem de aceitar a minha palavra, já que prometeu não fazer mais entradas sem autorização nos meus pensamentos privados.        Ele apenas sorriu um pouco. - Não é o que estava fazendo. Eu disse que não iria fazê-lo, Mary, e não o farei. Eu prometo. - Eu só estava me assegurando. O que você aprendeu sobre Tommy?

- Você quer primeiro a notícia boa ou ruim? - ele deixou a sua bolsa de couro marrom no chão e tirou a capa de chuva, então pendurou sobre o cabide. - Significa que há uma boa notícia?        Ele concordou, pegou de novo a bolsa, andou pelo apartamento e tomou um lugar no balcão. - Sim, há boas notícias. Tommy não foi queimado vivo. Ele foi baleado na cabeça no beco fora do seu apartamento. - Mas... Mas a polícia disse que ele foi amarrado à cama e queimado vivo. - Ele foi amarrado e queimado, mas não vivo. Já estava morto.

       Enquanto falava, Michael sacou o seu laptop, abriu e apertou o botão.        Ela quis saber como inferno ele não poderia saber nada sobre isso, então supor. - Você deve ter dado uma olhada no relatório da autópsia.        Ele negou a cabeça enquanto o computador continuou sua rotina de aquecimento. - Uma autópsia ainda não foi realizada. - Então... - Eu fui para o apartamento. Toquei na cama. Eu não recebi nada. Mas fora, no beco, senti a bala. Entrou aqui, - disse com um dedo entre suas sobrancelhas - e saiu aqui. - com a palma aberta, tocou a parte de trás da cabeça. - Houve uma explosão de cegueira, dor, mas muito breve. Tal como o flash de uma câmera. Então se foi.

       Ela fechou os olhos dela. - Você não sabe o quanto eu gostaria de acreditar que aconteceu dessa forma, Michael, mas... - Achei o esguicho de sangue na parede do beco. A polícia também encontrou. E quando você tiver o relatório da autópsia confirmará que Tommy foi baleado na cabeça e estava morto quando o seu corpo foi queimado. - Você é assim de bom? – ela perguntou. - Eu sou assim de bom. - pressionou um botão no computador e abriu o compartimento do CD. Em seguida, depositou um disco brilhante e fechou novamente. Clicou em algumas teclas. Ela parou no caminho de volta para olhar a tela. - Vai ser difícil de levar, Mary.

- Então, isso deveria ser parte da má notícia?        Ele concordou. - A polícia estava investigando o Tommy.        Ela franziu o cenho. - Por quê? - Era o principal suspeito no seu caso de roubo e assédio. - Disseram-me isso. Mas... Acho muito difícil de acreditar. - Eles estavam indo para executar um mandado de busca em sua casa hoje. Mas no final, não tiveram que fazer isso. O incêndio foi concentrado em uma parte do quarto. O resto do local apenas sofreu dano por causa do fumo e água. Imagino que os bombeiros poluíram qualquer evidência forense que poderia estar lá, mas... Bem, eles encontraram isto.

       Apertou um botão e apontou com a cabeça em direção à tela. Houve filas e filas de imagens em miniatura e eram todas dela. Mary arregalou os olhos.        Moveu o mouse até a seta apontar para um, clicou sobre ele, e apareceu a foto no seu tamanho real. Ela estava colocando bebidas, em pé atrás do bar na cripta. Tirada a partir de trás, de suas costas. Michael fechou e selecionou outra, em seguida, outra e outra.        Em uma, ela estava deixando o apartamento dela. Outra estava em sua cama, dormindo profundamente. Havia fotos dela no supermercado, no banco, as fotos do seu carro, com as primeiras matrículas.        Ele teve um álbum inteiro, completo. - Ele era tão obcecado assim por mim? – ela olhou para Michael, agitando a cabeça em descrença.

- Não, Mary. Eu não acho que ele estava obcecado com você em absoluto. Acho que estava te perseguindo. Estas não são o tipo de fotografias de um homem com uma obsessão. Estas fotos são monitoradas. Cada uma delas tem a data, hora e local listado na parte inferior. E ainda há mais. - selecionou outra imagem. Ampliada, revelou um plano desenhado à mão.        Ela olhou de novo e de cara amarrada. - Esta é a minha rota a partir do trabalho. - Ele fez mapas de todas as suas rotas. Desde a ida ao ginásio, a loja, até em qualquer lugar que você foi regularmente. Juntamente com os horários e as datas de visitas a tais lugares. - Mas... Por quê?

       Ele lambeu os lábios. - Este é o trabalho de um profissional, Mary. Estas chamadas não foram apenas para incomodar. Provavelmente para verificar se estava em casa, ou quanto tempo levava no chuveiro ou na lavanderia ou qualquer outra coisa. Ele tinha todos os seus movimentos controlados e localizados.        Ela piscou lentamente. - E o roubo?        Ele suspirou, selecionou outra imagem. Era grande o suficiente para encher quase todo o ecrã. Era seu apartamento, desenhado como um plano, em que cada item, incluindo luz interruptores, janelas, portas, móveis e telefones, foram identificados e marcados. - O distúrbio que deixou era apenas para encobrir o que tinha estado realmente fazendo ali. Traçando o plano do apartamento para conhecê-lo perfeitamente quando retornasse para fazer o trabalho.

       Ela levantou os olhos para os de Michael. - Ele... Ele estava no carro quando eu recebi a chamada. Você estava lá. Lembra?        Ele concordou. - Encontraram no seu apartamento, um dispositivo que bloqueia qualquer tentativa de localizar a chamada, outro que pode ser programado para ligar para uma gravação e reprodução em um determinado tempo antes de desligar.

       Mary não podia acreditar no que ele estava dizendo. - Tommy ia me matar...?        Ele concordou. - Tenho medo que sim. - Mas... Mas por quê? - Não sei. Mas acho que, pela mesma razão que ele matou a outras mulheres com o antígeno... Também foi encontrado em seu apartamento algumas fotos delas.        Ela tentou controlar as lágrimas, mas sentia-se tão traída. Tão enganada.   Tommy tinha parecido um jovem inocente e ingênuo, pouco mais que um menino com um amor. Não um assassino frio e calculista. Tinha sido completamente enganada.

       Procurando em sua mente confusa respostas, encontrou uma única réstia de esperança. - Pelo menos eu já não tenho que preocupar-me mais. Está morto. A lua cheia é depois de amanhã, assim eu posso ir lá fora e olhar para ela, se eu quiser, sem ter que me preocupar que um maníaco me ataque.         Tentou imprimir um toque de leveza ao seu tom de voz. Inclusive um sorriso falso veio aos seus lábios. Mas Michael ainda parecia preocupado. - O quê? O que acontece? - Não sei. Está me matando não saber, mas... Mary, tenho a sensação de que a ameaça não acabou. Ainda sinto o perigo em torno de você.        Ela buscou em sua mente, se perguntando por que ela ainda poderia estar em perigo. E depois a verdade apareceu.

- Sei o que é. É a polícia. Se eles sabem tudo isto... – ele lhe enviou uma olhada questionadora. - Eu sei. Tudo isso saiu de seus arquivos.        Ela suspirou. - Então deve parecer que tinha o motivo perfeito para matar Tommy. Assumirão que eu descobri que havia um assassino serial, e matei-o para impedir que me matasse. – apoiou um dedo em seu queixo. - O que não entendo é por que eu ainda não fui presa.

- Porque é absolutamente incrível pensar que uma garçonete, sem formação especial pode terminar com um assassino profissional como Tommy Campbell. É por isso. Eles estão procurando por algo em seus antecedentes, que possa fazê-lo acreditável. - Algo como o quê? - Como que seja uma perita atiradora, ou que você seja faixa preta em qualquer arte marcial, ou que tenha passado dez anos trabalhando como uma agente da CIA ou algo assim. - Ou que tenha sido policial antes?

       Ele a olhou duramente. - Michael, você sabia que ele tinha matado antes, e sabia que estava vindo atrás de mim. Eu não poderia nem sequer culpar você, se o fez para me proteger. Dada a força dos nossos sentimentos, eu poderia ter feito o mesmo.        Manteve os olhos fixos no dela por um longo tempo. - Eu sabia que ele tinha matado antes, e sabia que viria depois por você. Mas eu não sabia que era Tommy Campbell. E eu era um policial, Mary. Polícia, não um assassino. Se tivesse sabido, tinha solicitado uma sentença para condená-lo. Eu teria dado a dica para a polícia, deixando-o exposto de alguma forma. Não matá-lo a menos que ele não me desse nenhuma outra escolha. Eu não sou um assassino.        Ela teve que retirar o olhar de seus olhos. Parecia tão magoado porque ela havia suspeitado que ele pudesse ter feito uma coisa dessas.

- Desculpe. - disse ela. - Por favor, Michael, lembre que eu ainda não te conheço bem.        Ele suspirou, fechando uma mão em torno da sua. - Me conhece muito bem. Igual eu conheço a ti. Eu sei o que você sente, Mary.        Fechando os olhos, se permitiu admitir. - Sim. Desculpe. Este estranho sentimento de familiaridade, como se fosse meu melhor amigo. Alguém a quem eu amava, e que me amava, toda a minha vida. Ou talvez ainda mais.

 

       Michael fez uma amarga tentativa de convencer Mary que ela não tinha necessidade de rever o conteúdo do CD, que ele poderia revelar as informações importantes. Ele sabia, mesmo antes de sugerir, que ela nunca iria concordar. Lógico, dado o bem que a conhecia. Como era esperado, insistiu em vê-lo. Quando começou a olhar para os arquivos, relatórios de várias declarações de testemunhas, listas de provas, não só passou por cima, mas leu cada palavra.

- A polícia sabia sobre as outras mortes. E a ligação de sangue. Está tudo aqui. – apertou os lábios, sacudiu a cabeça enquanto baixava a tela. - Há uma anotação para me manter sob vigilância para minha própria proteção, mas eles não viram qualquer necessidade de alarme, já que as possibilidades que meu caçador fosse o mesmo que tinha matado as outras mulheres não era confiável. - Eu não posso discordar com a sua decisão sobre ele. - disse Michael, tentando ver o caso do ponto de vista de um policial. - Se eu não tivesse essa ligação com você, tampouco o saberia. O fato de que tenha um sangue raro, o mesmo que um punhado de mortos de outros estados, poderia ter sido uma coincidência. Pelo menos tomaram medidas cautelares. - ele pegou uma xícara cheia de café e, em seguida, a devolveu em cima da mesa. – Deveríamos sair desse apartamento, Mary.

- Não vejo a necessidade. O assassino está morto. - Mas o perigo ainda existe.        Ela o olhou com o cenho franzido. - Eu não sei o que você quer dizer com isso. Como pode ser quando Tommy morreu?        Ele suspirou, deslizando sobre um banquinho ao lado dela. - Eu tampouco o sei, mas estamos em perigo aqui, é tudo o que posso dizer. Está em torno de você como uma nuvem escura. Não mudou mesmo depois da morte de Tommy. Eu sei que tenho razão, Mary.

       Ela apertou os lábios. - Eu não posso sair daqui. O meu principal objetivo é me livrar de qualquer suspeita no assassinato de Tommy. E, eu não posso fazer isso se me esconder.        Ele pesquisou os olhos dela. - Se Tommy era o caçador, o assassino, então porque é que ele está morto? Quem o matou?        Ela negou lentamente com a cabeça. - Eu não sei. Um parente de uma das suas vítimas? Ou talvez não tenha qualquer ligação. - Eu não penso assim. - Quem poderia ser? - ela escorregou uma mão sobre as suas. - Michael, Tommy está morto. Talvez... Os seus sentimentos por mim estejam nublando este caso. -

ele verificou a veracidade desta teoria, mas não se enquadraram. Tinha invocado seus sentidos demasiado tempo para começar a duvidar deles agora. - Então, o que era que estava acontecendo, então? - Mary, e se todos os testes estão errados? E se o Tommy não era o caçador e alguém deixou todos os elementos de prova, para que parecesse que foi ele e, em seguida, o matou. Isto irá desviar a suspeita do assassino.

       Seus olhos se nublaram tão rápido, ele quase estremeceu. - Eu pensava assim também. Mas achei que era muito elaborado. A resposta simples é geralmente a correta, não é isso que você disse? - É o que dizem. Mas nada disso tem sido simples. - Será possível? - É a única explicação que posso pensar de acordo com o que eu sinto.        Ela engoliu com força, e seu queixo levantou de uma vez.

- Bem, então... Isto é apenas mais uma razão para nós encontrarmos o homem que matou Tommy. Não só temos de limpar meu nome do assassinato de Tommy, mas também limpar Tommy, da acusação de assassino psicótico. É injusto para com sua memória. – baixando os olhos acrescentou - E se o assassino ainda está lá, temos de achá-lo antes que ele ache a mim. Essa é a razão número três. - Seria a razão número um. - corrigiu Michael - E este apartamento não é essencial para qualquer um dos nossos objetivos.

       Ela pesquisou os olhos dele. Talvez, ela estava se perguntando que segundas intenções se esconderiam atrás deles? Ainda desconfiava dele? Ele estava certo, determinado, resolvido, deixando aprofundar tanto quanto gostaria, esperando sem uma palavra, como se ela não tivesse nada a esconder. Quando na verdade escondia algo.        Em seguida, o telefone tocou, quebrando o silêncio tão bruscamente que Mary saltou de repente alguns centímetros do solo.        Michael a agarrou pelos ombros.

- Você está bem? - Sim, bem. - Você quer que eu...? - Não, não, é coisa minha. - soou novamente, e ela levantou o telefone auricular. - Olá?        Michael viu o olhar em seus olhos que não houve resposta e, instantaneamente, instintivamente, escorregou em sua mente para ouvir através de suas orelhas. - Olá? - repetiu ela - Quem é?

       Não houve resposta. Fecho os olhos, Michael ouviu seus pensamentos.        Isto não pode estar acontecendo. Não pode ser...        Mas o silêncio durou. E depois houve uma palavra, profundo e penetrante. - Pronto.        Clique. A linha estava morta. Mary desligou o telefone de um golpe e, de repente virou-se para encarar Michael.

- Eu vou para qualquer lugar aonde você queira me levar. - Era ele. - foi uma declaração, não uma pergunta. E ele se retirou de sua mente, sentindo-se culpado por ter quebrado sua promessa anterior.        Ela o enfrentou e concordou. - É quase um alívio. Eu nunca pensei que era Tommy de todos os modos. Será duplamente satisfatório derrubar esse canalha. E saber que ele tentou agir como se o pequeno e doce Tommy fosse responsável pelos seus crimes. - ela respondeu rapidamente, muito rapidamente, sem fazer pausa para respirar entre as palavras - Falando sobre o morto. Já é suficientemente mau que ele assassinou Tommy, mas para criar todo este cenário para tentar estragar sua memória, é só... Só...

       Tinha ficado sem ar, ele pensou. Seu rápido discurso verbal parou. Ela fechou os olhos, mas as lágrimas vieram assim mesmo, e quando ele a abordou, desta vez ela não resistiu. Pareceu amolecer em seus braços contra seu peito, a cabeça enterrada nele e se permitiu chorar. Ele friccionava os ombros e as costas dela, ele acariciou o seu cabelo, perguntando-se pelo nó da garganta dele e a queimação nos olhos. Ele se sentia ferido por vê-la desse jeito, e tudo que queria era aliviar o seu medo e o seu sofrimento. - Tudo está indo bem, Mary. Não vou deixar passar nada. Eu prometo. Ele não chegou perto de você. Está segura comigo. Te guardarei em um cofre. Confia em mim. Acredita em mim, Mary, não deixarei nada te prejudicar.

       Ela concordou com ele, sorvendo pelo nariz. - Eu acredito. - ela sussurrou. - Por que não pega algumas coisas? Guardarei o laptop no carro e, em seguida, volto para pegar suas malas. Ok? - Bem. – se endireitou, levantando os olhos.        O coração dele se quebrou ao ver as bochechas molhadas pelas lágrimas. -Bem. - ele disse novamente. Custou a ele um esforço enorme deixá-la ir, mas ele fez.        Ela foi para o quarto fazer as malas, e ele tirou o CD-ROM do laptop, desligou o computador e fechou-o. Então o guardou em sua maleta de couro marrom e a fechou. Agarrou seu casaco e correu em direção ao carro.

 

       Ela esperou até que ele havia saído antes de pegar o telefone do quarto. Suas mãos tremendo enquanto pressiona os números. Seu coração, alma e corpo estavam em guerra com sua mente, rasgando uns aos outros. Ela sentiu como se apunhalasse Michael no coração por fazer esta chamada. E, no entanto, ainda uma pequena voz em sua mente disse-lhe que alguém, em algum lugar, deveria saber aonde e como ele iria com ela.        O sinal tocou duas vezes antes de alguém responder. - Serviços de Investigação Sobrenatural, Stormy falando.

- Olá, sou Mary McLean. Eu te liguei ontem. - Olá, Mary. Olha, deve ser muito cedo para dizer nada ainda, mas... - Não, não, é isso. Eu só queria dar o meu número de celular. Estarei fora do apartamento, na casa de Michael Gray. Poderão me localizar ali. - Boa. Conte-me.        Ela jogou um olhar para fora da janela. Michael já retornava cruzando o pavimento e pela sua porta traseira. Tão forte, tão belo e tão completamente fiel a ela. Como poderia ela ainda suspeitar dele?

       Não suspeitava, e era a verdade. Estava inteiramente ligada nesse cara.  Michael não era em quem não confiava, era em seu próprio julgamento. Recitou o número rapidamente. Stormy repetiu, percebendo que tinha tomado errado no último número. Mary o corrigiu. Michael abriu a porta. - Tenho. - Sim. - Boa. - ela desligou o telefone, justo quando ele entrou e puxou a porta fechando-a atrás dele.

- Serão apenas alguns minutos. - disse ela. O mais rápido que ela podia, puxou uma mala para fora do armário, abriu e começou a jogar roupa nela. Quando a fechou, também tentou fechar a porta do seu sentimento de culpa. Mas não foi assim tão fácil de fazer.

 

       A casa de Michael não foi o que ela esperava. Ela não tinha certeza exatamente do que estava esperando... Algo que falasse de riqueza, supôs, já que ele estava dirigindo um Jaguar e usava roupas caras. O local devia proclamar a sua riqueza, mas não aconteceu. Era uma casa de praia. De apenas uma planta, não minúscula, mas não muito grande. Ele pegou uma estrada transversal na Rota 1, ao norte de Bangor. A poucos quilômetros de distância dirigia por um caminho de cascalho branco que acabava justo diante das portas da rua, de vidro e deslizantes, com pesadas cortinas por trás deles. Para além da casa estava a praia, mais rochas do que areia, e muitas ondas. - Você mora aqui?        Ele concordou.

- Só desde que vim ao Maine, atrás de você. A achei na primeira noite. Eu amo o oceano. - Eu também.        Eles deixaram o carro e ele pegou a chave. Em seguida, abriu o porta-malas para retirar a maleta, levando em uma mão sua própria maleta, com o laptop, na outra. Mary passou à frente dele para fechar o porta-malas e, em seguida, caminhou ao seu lado no caminho delineado por flores até a porta.

- É a chave com a cabeça quadrada. - ele disse - A prateada.        Ela inseriu a chave na fechadura e, em seguida, deslizou a porta, abrindo as cortinas e afastando-as para o lado para entrar. O local estava aberto e arejado, a cozinha e a sala de jantar eram combinadas em um grande espaço. Em seguida, a poucos metros estava a sala de estar, decorada com um sofá de veludo marrom e cadeiras que pareciam convidá-los para sentar como nunca tinha visto antes. A mesa de café e as outras mais baixas eram de cobre e vidro, e um outro conjunto de portas corrediças, no outro extremo. Ela colocou as chaves sobre a mesa e correu para a porta, e abriu as cortinas de lado para observar a vista.

       Da porta traseira, através de uma escada de madeira em ziguezague se descia até a praia rochosa. Esta tarde não tinha uma alma à vista por causa do tempo. Mas a areia. As rochas e as ondas chegavam delicadamente até a praia, um após outro, era uma vista impressionante. De certa forma, tranqüilizadora. - É um lugar bonito. - ela sentia como se eles realmente tivessem encontrado um refúgio. - Estou feliz que você tenha gostado. - ele levou sua mala até a porta à esquerda da sala de estar. - Este é o quarto de visitas. Você será a minha primeira inquilina.

- Eu não consigo imaginar por que. Se eu tivesse um amigo com um lugar como este, eu estaria aqui tantas vezes que se cansaria de mim. - ela disse com um sorriso divertido. - Você tem um amigo com um lugar como este. - disse ele. Seu tom não era leve ou zombeteiro - E duvido que alguma vez me cansaria de você.        Ela encontrou seus olhos, viu a tensão e a paixão neles. Ele teve que desviar o olhar. - Michael, eu... As coisas que estão acontecendo. Não posso pensar...

- Eu sei. Eu só estava tentando... - ele molhou os lábios e comentou - Eu não quero pressionar você, Mary. Não por mim, não agora. Só me esqueci de guardar meus sentimentos para mim por um segundo.        Seu estômago se contraiu, e seu rosto ruborizou. - Quero explorar isso... Isso que existe entre nós. - Eu também. - Eu só preciso de tempo.        Ele concordou.

       Talvez... Talvez quando tudo isso estivesse terminado e quando ela soubesse mais sobre ele. Deus, tinha de aprender mais sobre ele, talvez, em seguida, estaria pronta para dar esse próximo passo, para ver onde ele poderia levar.        Mas até lá... Até lá, ela lutaria contra todos os instintos e desejos para permanecer em sua própria cama, no quarto de hóspedes e longe dele.        Esclareceu sua garganta, rompendo o contacto visual.

- Olha, meu horário está um pouco transtornado. Estarei em pé antes de você acordar de manhã e provavelmente não serei capaz de despertar até a escuridão. Eu não quero que você se sinta presa aqui. Mas é seguro. Ninguém sabe onde encontrá-la. Os fechos são de primeira classe e também há um sistema de segurança.        Ela concordou.

- Eu não me sinto presa, sinto-me liberta. Tem perfeito sentido deixar o meu carro em casa, para não alarmar os policiais, e você precisa do seu. E eu vou ver o que faço, enquanto espero a água baixar. Vou passear ao longo da praia, não há problema. E não se preocupe com o seu horário, Michael. Eu costumava trabalhar de noite e dormir de dia porque estou na cripta.        Ele sorriu, abrindo a porta do quarto e levando a sua bagagem para dentro. O quarto era pequeno e, obviamente, não foi utilizado. Enfim, tinha um espesso carpete, a cama parecia enorme e confortável. Um armário próximo fazia jogo e ao lado um suporte com um relógio foram os únicos outros itens em seu interior.

- É perfeito. Obrigado, Michael. - De nada. - ele olhou ao redor da sala, como se inspecionasse os defeitos. - É perfeito, como eu te disse. - Eu deveria ter planejado melhor. - disse ele - Poderia ter arejado um pouco mais o quarto. E agora que penso nisso, acho que é provável que não haja nem uma lata de comida neste lugar.        Ela o olhou quase como se estivesse alarmada, mas depois viu o sorriso brincalhão dele e o devolveu. - Existe uma pequena loja aqui perto. Nós podemos abastecer esta noite. - ele olhou para seu relógio - Ainda estão abertos a esta hora.

- Então é melhor que nos apressemos. - ele jogou um olhar sobre a sua mala. – Eu desempacoto quando a gente voltar. -Boa. - ele a conduziu do quarto, saindo pela porta traseira e descendo as escadas em ziguezague até a praia e, em seguida, virou-se para a esquerda, e caminharam lado a lado na areia. Enquanto eles faziam isso, sua mão acariciou a dela e virou, como se fosse envolver na sua, mas parou.        Ela queria que ele segurasse sua mão. Ela queria ir mais longe do que isso.  Mary escorregou sua mão na dele, e quando fechou à sua volta, o calor inundou todo seu ser.

       Algo capturou sua atenção, e ela olhou para o mar. A lua estava flutuando no oceano, uma luz prateada iluminar a água ondeante.        Ela engoliu em seco. - Ela está quase cheia. - Eu sei. - ele acariciou sua mão. - Manterei a minha promessa, Mary. Você está segura comigo, eu juro.        Um tremor subiu por sua coluna, apesar do calor dela. Foi uma súbita sensação de medo, agouro, quase uma advertência. Ela esperava que ele pudesse manter a sua promessa. Mas não tinha certeza se era possível, se o destino tinha outros planos para ela.

 

       Não queria se sentir da maneira como se sentia com Mary. Não queria que esse poder entre eles fosse mais do que a consciência inegável que sempre via entre os de sua classe e os seus. Ela era, como denominavam os vampiros, uma dos Escolhidos, um humano com o antígeno beladona. Eles estavam ligados por sangue. O enorme impulso de protegê-la de qualquer coisa era esperado.        Ainda assim, não poderia negar que havia mais do que isso. Foi obrigado a andar em torno dela, a estar parado perto dela, a se sentar ao seu lado, a tocá-la em todas as oportunidades, cheirá-la.        Prová-la...

       Não. Isso não. Ele não faria isso. Ela jamais devia saber quem ele era. As memórias da reação de Sally ante o conhecimento eram tão frescas em sua memória como se tivesse acontecido ontem.        Eles caminharam até a pequena loja praia abaixo e compraram dois sacos de compras. Foi uma tarefa difícil, já que houve um longo tempo desde que ele tinha tido que comprar comida e os artigos oferecidos hoje eram bastante diferentes dos que tinham enchido o seu armário antigamente.        Ela tinha pedido seu ponto de vista sobre tudo que deveria ser comprado, mas vendo que ele não ia ajudar muito, deixou-o de lado. Quando eles chegaram ao caixa, o alívio ainda transparecia na face dele.

- Você não faz muitas compras, certo?        Ele encolheu os ombros. - Em geral, como fora.        Ela balançou a cabeça. - Você não sabe o que está perdendo.

       Realmente sabia, mas para ser honesto, não tinha perdido muito. A necessidade de alimentos desaparecia, em comparação com a necessidade de sangue. Claro, ele não poderia dizer isso a ela. Ou talvez pudesse dizer que quando comia o saboreava, que era tudo que ele estava fazendo. O sangue cobrava vida em seu interior, e brilhava e faiscava em suas veias como pura energia. Vida. Isso era vida. Mesmo o sangue velho que ele usou como alimento, roubando bancos de sangue ou hospitais, tinha a centelha desse poder. Ele estava faminto. Devia ter passado dias desde que tinha se alimentado. No entanto queria estar perto dela, protegê-la em todos os passos nesse momento. Mas, não podia afastar a idéia da comida de sua cabeça.

       Ele pegou a maior parte dos sacos de papel que continham os alimentos e levou um em cada braço, deixando a loja. Mary o alcançou rapidamente e pegou uma das bolsas. - Não custava nada que esperasse por mim, você sabe. - Não, não custa.        Não. Ele estava tentando impedir que ela visse o brilho da sede de sangue em seus olhos. Ele lutou contra a fome, lutava omitindo-a, sufocando-a e concentrando-se somente nela.        Ela caminhou ao lado dele, quente e viva e bonita. Seu cabelo era longo e estava solto. O vento do mar o fazia voar em torno de seu rosto. Na frente da loja tinha uma pequena área de estacionamento, e um pouco mais adiante, a estrada. Por detrás da estrada, tinha um caminho estreito, muito gasto que serpenteava de volta a praia.

- O que você faz? - ela perguntou. - Fazer? - Sim. Você disse que o seu trabalho te mantinha distante de dia, lembra? - Ah. O meu... Trabalho.        Ele riu para ela um pouco nervoso. - Eles devem pagar bem. Dirige um Jaguar. Você vive em uma casa em uma bela praia privada.        Além de setenta anos de cuidadosos investimentos que deram benefícios, pensou ele. - Está relacionado com a polícia?

       Ele jogou um olhar, percebendo que ela estava à espera de uma resposta, algo que tivesse tanto sentido quanto a sugestão que ela tinha feito. - Sim, realmente está. Eu sou um consultor para, uh, empresas de segurança. Você sabe, que tipo de sistemas de alarme colocar e fechaduras para edifícios de escritórios, bancos e coisas assim.        Perguntou-se se tudo soaria plausível e observou seu rosto procurando a sua reação.        Ela concordou como se fizesse perfeito sentido. - Parece emocionante. - Não tanto como estar aqui com você. - disse ele.        Ela se ruborizou na escuridão baixando seus olhos, não respondeu.

       Eles chegaram à casa de praia, e ele insistiu em levar sua bolsa quando subiu as escadas. Ela não poderia saber que esse não peso não era nada para um homem tão poderoso como ele era, e discutiu. - Eu sou capaz de transportar um saco de mantimentos até escadas como você, sabe? - disse ela, subindo rapidamente as escadas atrás dele. - Não, não é. - Sim, eu sou. - Quer que leve a ti também, Mary?        Ela olhou sobre seu ombro por trás. - Fanfarrão.        Ele adorava quando ela se divertia, com um humor lúdico. Isso significava que não estava tão assustada. Alcançaram a entrada e ele deu a volta para afrontá-la.

- A chave ainda está no meu bolso. - ele indicou para baixo com a cabeça - Quer olhar dentro e pegá-la?        Ela sorriu com satisfação. - Se você quiser.        Então lhe tirou uma das bolsas, liberando-o para que ele mesmo pegasse as chaves. Estava mais descontraída do que a primeira vez que ele a tinha visto no bar aquela noite quando tinha ido vigiá-la, quase duas semanas atrás. Então, era lua nova.        Ele abriu a porta e ela entrou, tirou os sapatos transportou as bolsas do supermercado para a cozinha. Colocando-as sobre a mesa, começou a desempacotar. Virou-se para um armário para abri-lo, então franziu o cenho e abriu mais um par.

- Você não estava brincando sobre comer fora muitas vezes, certo? - Só levo vivendo aqui um par de semanas. Na verdade eu ainda não abasteci o lugar. - Muito ocupado sendo meu anjo da guarda para se preocupar com a alimentação adequada.        Não poderia saber o quanto tinha razão. Ele encolheu os ombros, nervoso ainda de que a falta de alimentos nos armários iria provocar perguntas, mas Mary parecia aceitar a sua explicação. Havia alguns pratos nos gabinetes. Eles estavam lá quando ele tinha se mudado para o local, e ele os tinha lavado e colocado de volta no lugar... Mesmo que fossem só para decoração.

- Sabe, você realmente vive sem comodidades, Michael. Não tem cafeteira. Ou torradeira. Nem mesmo um microondas. - Como eu disse... - Ah, não precisa explicar. Eu nunca encontrei a um membro de sua espécie que esteja muito preocupado em ficar no mesmo lugar.

       Ele entrou na pequena cozinha. - O meu tipo...? - Sim. Homens.

       Ele fechou os olhos quando o alívio veio como uma respiração e relaxou os músculos tensos. Durante um segundo pensou que tinha sabido ou poderia ter adivinhado o que ele era.        Mas, por que o adivinharia? Provavelmente nem sequer pensava que havia criaturas como ele.        Quando terminaram de esvaziar as bolsas da mercearia, ela esticou seus encantadores braços e bocejou dizendo: - Passa da meia noite. Acho que vou dormir. Eu não posso acreditar que você está acordado até tão tarde quando tem que levantar antes do amanhecer. - Raramente, durmo muito à noite.        Ela encolheu os ombros.

- Bem, deveria. - ela riu para ele - Não se importa muito com você mesmo. Você deveria fazer melhor. - Tentarei fazer melhor.        Seus olhos se encontraram e se sustentaram por um longo tempo. Finalmente ela suspirou e apartou o olhar. - Boa noite, Michael. - Boa noite.        Então ela entrou em seu quarto.        Michael se sentou na sala, ouvindo-a. Sentindo-a. Poderia fechar os olhos e saber onde ela estava, o que ela estava fazendo, bastava abrir a sua mente. Ele nem sequer tinha que sondar a sua.

       Ouviu a água do banho, sentiu sua pele despojando-se da roupa e entrou na ducha. A desejava. Isto era fome, como fome de sangue. E era tão natural na sua classe. O desejo, em um vampiro, não era uma mera imaginação ou um impulso passageiro. Era uma exigente, insaciável e condutora necessidade. Ele, por alguma razão... Não duvidava de que a necessidade de sangue fosse uma delas. A desejava. Não teria paz até que a tivesse.        Ele suspirou e disse a si mesmo que provavelmente nunca iria ter paz. Porque ele não ia tê-la. O risco de perder-se na necessidade de testar seu sangue era muito grande. Agora ele o sabia como ele nunca tinha feito antes. Iria protegê-la até que soubesse que ela estava a salvo e, em seguida, continuar a sua viagem, muito antes de ela descobrir o que ele era.

       Continuou ali, sintonizado na sua essência, a seus pensamentos por um longo, longo tempo. O chuveiro deixou de correr, e ela colocou algo um pouco mais leve. Uma camisola, talvez. Em seguida, escorregou na cama e fechou os olhos. Adormeceu. A sentiu entregar-se rapidamente ao sono e percebeu que ela não tinha dormido bem desde que começou tudo. Ela se sentia segura com ele aqui.        Por um tempo, ele ficou satisfeito em ficar sentado ali, sentindo-a dormir. Então ele a ouviu, muito claramente, sussurrar o seu nome. Michael. Inicialmente pensou que o tinha dito deliberadamente, chamando-o, e já estava de pé na porta do seu quarto antes de dar-se conta que ela ainda estava dormindo.

       Tinha dito o nome dele em um sonho.        Ele fechou sua mão sobre a maçaneta da porta, a virou, abriu a porta e entrou no quarto. Ela estava de lado, e ele podia ver o rosto dela, tranqüilo, relaxado. Sim, ela estava dormindo, abraçada a seu travesseiro. Ela esfregou a suavidade da sua bochecha, com o travesseiro, e murmurou o nome dele novamente. Seu fino quadril deslocou-se um pouco enquanto seus braços seguraram o travesseiro contra seu peito.        Ela estava sonhando. Com ele.        Não deveria. Ele disse para si mesmo que realmente não devia. Ela tinha pedido a ele para não se meter em sua mente, e ele honrou esse pedido, a maior parte do tempo.

       Porém não acreditava que qualquer homem, mortal ou não, que possa ter resistido a um pouco de exploração. Chegou perto da cama até que ficou diretamente em pé ao lado dela, as suas pernas tocando o colchão. Baixou a mão, deixando a sua mão um pouco acima dela, para reforçar a sua ligação, para ver os seus pensamentos de forma mais clara e com menos esforço. Mas antes que pudesse entrar em contato, sua mão estendida se moveu, voltando-se e agarrando com força o seu punho. Sua respiração se acelerou ligeiramente. E, no entanto ainda estava dormindo.        Ele baixou a vista para o seu rosto e, em seguida, fechou os olhos e concentrou-se na sua mente, seus pensamentos, o seu toque.

       E então estava ali, no seu sonho. Ele viu duas pessoas nuas, que rodavam na cama: ele e Mary. Ela estava deitada sob ele, suas pernas em torno de sua cintura unidas nos tornozelos. Seus quadris movendo-se enquanto ele se conduzia dentro dela, e as suas se moviam ao compasso, recebendo-o. Ele sentiu sua necessidade aumentar, construindo o seu desejo e ainda assim ela ainda não foi capaz de conseguir satisfação. Nem no seu sonho. Não em uma fantasia.

       Ele se queimou com o desejo dela, o desejo de aliviar a sua fome, mas sabia que isso significaria ceder à tentação de atenuar o seu. E agora mesmo precisava de toda a sua confiança. A perderia se ela descobrisse o que era e, se perdia a sua confiança, ela morreria. Mesmo com Tommy morto, sentia a ameaça à sua volta. Ela ainda estava em perigo.        Ele acariciou seu rosto e os cabelos, se aproximando, sussurrando em sua mente, enchendo o seu sonho erótico com imagens projetadas em sua mente e palavras suavemente sussurradas em seu ouvido, até que ela tremeu e se estremeceu com a liberação e, inevitavelmente, chegasse ao orgasmo.

       E então seus braços se envolveram em torno de seu pescoço e seu rosto levantou-se na direção dele. Ele a beijou. Sabia que não deveria, porém negar-se inclusive a este breve sabor dela era mais do que poderia lidar. A beijou, e sua boca se moveu embaixo da dela, separando seu lábios, provando a sua língua. Seus dedos enroscados em seu cabelo enquanto ela beijava-o, e ele aproveitou a oportunidade para explorar a sua boca.        Porém, ela estava escorregando para mais perto da lucidez, emergindo lentamente do estado de sono e ele sabia que tinha que terminar antes que ela abrisse os olhos.

       Ele entrou em sua mente e ordenou que ela deveriam dormir. Ele disse que era apenas um sonho agradável e nada mais. Ele não podia dizer que esquecesse. Não, queria que ela lembrasse, porque ele o faria.        A sentiu desaparecer nas profundezas do sonho, e levantou sua cabeça da dela. Agasalhando-a novamente, acariciando os extraviados cachos cor de cobre de sua bochecha, enquanto se forçava a ignorar o suave e convidativo galopar do sangue fluindo sob sua pele,o sensível e estável pulso do pescoço.  Involuntariamente lambeu os lábios.

       Então fechou os olhos e forçou-se a afastar-se dela, saindo do quarto e da casa. Ele precisava sangue. Não lhe tomaria muito tempo.

 

       Quando ele se arrastou de volta para casa meia hora antes do amanhecer, saciado e tranqüilo graças as débeis fechaduras do banco de sangue local, mas não menos faminto dela, cheirou algo que o fez enjoar-se ligeiramente. Seguiu o perfume e sua percepção deu com Mary na cozinha, onde estava a dar volta às tortas amarelas com pintas verde, marrom e vermelho nos pratos. Duas delas. - Mary? - ele perguntou - Por que você levantou tão cedo?        Ela virou para ele, sorrindo intensamente. A maneira como ela se iluminava pela manhã lhe tirava o fôlego.

- Pus o alarme para me levantar cedo para que pudesse fazer um especial café da manhã antes de você ir para o trabalho.        Ele olhou para o prato, em seguida, para ela. Seu estômago se retorceu. - Não deveria ter se incomodado... - É o mínimo que podia fazer depois de tudo que você fez para mim. - ela encolheu os ombros - Você disse que comia fora a maior parte do tempo. Eu pensei que um café da manhã caseiro seria bem-vindo. - Sim, é... Não sei o que dizer.

       Realmente não sabia. Ele realmente não podia... Comer essa coisa. Certo? E, no entanto, lhe tocou o coração que ela tivesse feito isso por ele. Cuidar dele... Da maneira que ele queria cuidar dela.        Ela sorriu novamente e puxou uma cadeira. - Eu vou sair para um passeio e, se passar por uma loja, comprarei uma cafeteira para você. Não sei como você pode começar o dia sem café. - ela puxou uma cadeira e sentou - Bem? Sente-se.        Lambendo os lábios, sentou na cadeira na frente dela. O cheiro da torta alcançou seu nariz, e seu estômago se rebelou novamente. Ele jogou um olhar para o relógio de pulso. - Eu não tenho muito tempo para apreciar esta deliciosa refeição com justiça.

- Não vou me sentir ofendida se você tem que comer e sair. Sei que tem que começar cedo.

       Ele concordou e a observou dar uma dentada. Porém ela continuava lhe olhando e sabia muito bem que ela se sentiria ofendida e ferida e, o que era pior, suspeitaria se não provasse sua comida. Obrigando-se, pegou a colher, endireitou os ombros e levou um pedaço à boca.

       Comida sólida não era um nome pouco apropriado. Não era sólida em absoluto, senão uma massa pesada que só se fazia mais úmida enquanto tentava mastiga-la para conseguir digerir. Ele fez tudo o que pode para trocar o som de repulsa de seu estômago por gemidos de êxtase. Quase se engasga quando teve que engolir, porém se obrigou a fazê-lo e voltou a dar outra mordida, e mais outra.

       Ele devorou completamente a metade de seu alimento e, em seguida, apartou a cadeira da mesa. Os pedaços desta horrível coisa ainda estavam aderindo aos seus dentes e língua, e nas fissuras da sua boca. - Foi a mais deliciosa torta que já provei, Mary. Obrigado. Lamento muito ter que sair. - Não, não há de que pedir desculpas.        Ele já estava a meio caminho da porta da rua. Seu corpo não foi projetado para digerir alimentos sólidos. Sua dieta líquida era absorvida pela corrente sanguínea diretamente, desde estômago. O resto... Demônios, não sabia, tinha sempre presumido que simplesmente não podia. Seguramente não houve danos em qualquer órgão desde que ele tinha se transformado.

       Fechou a porta atrás dele e correu para o carro, chaves na mão enquanto o seu estômago se convulsionava. Seu plano era entrar no carro, dirigir até sair de vista e, em seguida... Mas, era tarde demais para ele. Deixando cair às chaves no banco da frente do carro, de repente fechou a porta e cruzou correndo toda a rua e entrou no bosque de pinheiros carregados de pinha. E depois caiu sobre os joelhos, enquanto seu estômago rejeitava a comida em termos tão violentos que ele pensava que seu corpo estava sendo dilacerada por dentro.

       Quando ele finalmente parou, afastou-se alguns passos e caiu ao chão, deitado lá, tremendo violentamente, sentindo calafrios e estranhamente fraco. Assim permaneceu por alguns minutos, até que a repugnância obrigou-o a se levantar e sair. Havia um riacho alguns metros mais longe, escorrendo entre as montanhas e desembocando para o mar. Foi para lá, encheu as mãos de água gelada e lavou a boca com ela, repetidas vezes, enxaguando e cuspindo para livrar toda a boca de qualquer migalha que poderia permanecer.        Precisava de um banheiro com ducha, lavabo e uma escova de dente. E fio dental. Tremeu e depois se moveu entrando no estreito caminho.

       O sol estava subindo. E ele podia sentir no ar, mas ainda estava flutuando acima do oceano. Seguiu o caminho, um atalho para o cemitério, e surgiu na parte de trás. Era um antigo cemitério, com vários mausoléus familiares, cada um composto de uma enorme pedra e várias menores, tudo rodeado por uma grade de ferro. Eram de diferentes tamanhos e estilos, mas quase todos foram agrupados desta forma.        Umas poucas sepulturas mais recentes estavam sozinhas. Subindo o morro estavam as criptas, incluindo a sua própria. Seu nome estava gravado na tampa, pincelada em granito. Ele havia comprado, alegando que era para o seu pai, inclusive tinha realizado um falso funeral fazia um mês preparando a sua transferência para cá, sabendo que iria precisar de um refúgio a luz do dia.

       A porta estava selada e parecia com todas as outras. Mas tinha sido preparada para abrir a fechadura desde o exterior. Assim o fez, deu uma olhada ao seu redor, abriu os seus sentidos para se certificar de que não era observado. Em seguida, abriu a porta e entrou. A fechou atrás dele com fechaduras adicionais de uma casa que ele tinha instalado no interior da cripta.         Suspirou, quando enfrentou o retângulo de oito por oito e a laje de pedra na qual ia passar o dia.

 

        Esta noite era lua cheia.         Não importava no que Mary tentasse se ocupar durante o dia, esse era um dos pensamentos que ainda estavam fluindo através de sua mente.         O segundo era uma pergunta. Porque é que Michael não tinha levado o carro esta manhã? Ela mentiu para si ao pensar que tinha decidido no último minuto antes de sair, porém havia encontrado as chaves jogadas sobre o banco da frente e o carro aberto. Era incompatível com o seu passado como um policial.

        Ele tinha saído com tanta pressa, como se ele estivesse louco para sair de sua vista. Ela tinha corrido para a janela para se despedir, mas parecia que ele estava... Subitamente doente. No caminho ele parou perto do carro, lidando com as chaves, deixando-as cair, então ele tinha tropeçado cruzando toda a rua para desaparecer de vista.        Alguém o tinha recolhido? Ele tinha de partilhar o estacionamento e tinha esquecido, ou algo assim?        Não importa, perguntaria quando ele voltasse para casa. Ela tinha certeza que haveria uma explicação.

       A terceira coisa em sua mente era o sonho que ela teve na noite passada. Deus! Foi tão real. No sonho fez amor e tinha sido tão intenso e surpreendente e o mais erótico que já teve, real ou imaginário.        Ela limpou a cozinha e, em seguida, usou o carro de Michael para fazer algumas compras, uma cafeteira, era o primeiro na sua lista. Durante todo o dia, vibravam em sua mente imagens eróticas e seu despertar sexual, que lutavam por um espaço ao lado do gelado medo em sua mente. As compras não ajudaram a aliviar qualquer das emoções contraditórias. Então, ela voltou para casa, colocou as compras no seu lugar e tentou pensar em outra coisa, para ocupar sua mente.

       Ela tentou assistir televisão, porém não tinha muitos canais. Pensou em planejar um jantar chique, mas não acreditava que ele tinha realmente desfrutado o café da manhã também. Em seguida, sentou no sofá e cedeu ao mais agradável de seus pensamentos. Os autorizou a voltar a viver o seu sonho rico da noite anterior. Ela e Michael, fazendo amor. Coisas que ele tinha sussurrado em seu ouvido, como isso afetava seus sentidos, os lugares que tinham sido tocados, a sensação dele dentro dela...        Ela estremeceu e fechou os olhos. Nunca teve uma experiência como essa em seus sonhos. Ela tinha tido relações sexuais, mas nunca como esta... Era algo mais além. E não tinha certeza, mas acreditava que culminou em seu sono. Até ontem, não tinha pensado que tal coisa era possível.

       Ah, demônios, agora ia sentar ali e fantasiar com Michael todo o dia?        Sim, compreendeu, por que não? Ela o tinha desejado desde a primeira vez que o viu a observando no bar, no escuro. Seus olhos, tão intensos e apreciativos.  Quase faminto.        Um delicioso arrepio subiu por sua coluna. O deixou de lado enquanto se perguntava se ele se sentia tão poderosamente atraído por ela como ela estava por ele. Ela pensava que sim, e ainda parecia impossível que alguém pudesse sentir algo tão forte como o que ela sentia por ele.        Mas ela não deveria pensar nisso, não quando tanta coisa estava para acontecer. Esta noite era lua cheia.

       Ela levantou-se e decidiu explorar a casa. A melhor coisa foi remover da sua mente o sexo com o Michael. Então ela começou a vagar. Não havia muito mais do lugar do que já tinha visto. A área de serviço na parte de trás com uma encantadora lavadora - secadora preta. A garagem era ao lado. Entrou sem esperar encontrar algo de grande interesse, afinal, era apenas uma garagem. O que teria, além de ferramentas e acessórios de carros e talvez alguns pneus sobressalentes? Mas quando entrou parou surpreendida. Havia uma moto brilhante, azul meia-noite que se inclinava em seu suporte.

       E porque saber que ele montava aquela coisa o ainda mais atraente? Ela teve uma imagem dos dois montados nela, as pernas dela emoldurando seus quadris, os braços firmemente em torno de sua cintura, seu cabelo acenando ao vento. Suspirou, voltou para a casa e foi para o quarto que havia evitado até agora. O dormitório de Michael. Sua mão fechou sobre a maçaneta e foi surpreendido com o fato de que cedeu tão facilmente. Então, novamente, por que iria fechar o quarto?        O que surpreendeu foi quando terminou de abrir a porta, a completa escuridão que a saudou do outro lado. O lugar era tão escuro como breu. Tateou procurando um interruptor na parede, o achou e ligou.

       Mas iluminado, o quarto era quase tão severo como tinha sido na escuridão. Havia uma cama, perfeitamente feita sem uma única ruga. Uma escrivaninha e a correspondência espalhada por cima, mas, além disso, o quarto estava vazio.   Provavelmente era tão pouco usado como o quarto de hóspedes. E as janelas!   Havia duas no quarto e estavam cobertas tão milimetricamente que nenhuma partícula de luz poderia penetrar.        Aproximou-se para inspecionar as espessas cortinas de veludo vinho escuro. Atrás delas estavam alguns painéis de tecido preto de algodão que era o mais denso que já tinha visto. Eram pesadas e grossas. E, por trás, algumas janelas que deveriam ter sido feitas de encomenda.

       Ela puxou o escudo da janela para olhar um pouco mais além. Mas por fora a janela estava bloqueada, também, por persianas apertadas. - Suponho que não pode dormir com qualquer luz no quarto. – grunhiu ela.        Suspirando, alisou cuidadosamente o pano escuro, o colocou em seu lugar e virou-se para sair. Mas se interrompeu quando viu que ele havia deixado a maleta marrom sobre a cama.

Nela continham as provas do assassinato de Tommy e dela e o seu laptop, e...

Lambendo os lábios, se perguntou se de repente aquela mala teria provas de outros assassinatos também. Ela jogou um olhar ao redor quase com um ar de culpa, mas era um absurdo. Não estava fazendo nada de errado. Ela certamente tinha tanto direito a ler os arquivos como Michael. Ainda mais. Assentindo com convicção, pegou a maleta da cama e levou para fora do quarto.        Decidiu trabalhar na pequena cozinha, pois a sua ensolarada janela da frente mostrava diretamente o caminho de entrada, de forma que veria se ele voltasse.   Também poderia ver a porta traseira e a trilha para a praia a partir da cozinha. Se fosse cuidadosa, o veria chegar e seria capaz de retornar os arquivos para a pasta e voltar para seu quarto na saída do leito e voltar antes que ele abrisse a porta.

       De última hora, passou o ferrolho nas duas portas, só no caso dele chegar sem ela notar. Finalmente extraiu os registros da pasta e começou a examinar o mesmo. Começando com o que foi marcado como Samantha Carlson.        Desejaria não estar só para ler aquele inferno. O relatório da polícia disse que o corpo da mulher foi encontrado por um pescador em um rio, em Nova Jersey, como Michael tinha dito. Mas a polícia também encontrou as fotografias, tomadas pelo assassino, bem como aquelas que tinham sido esquecidas no apartamento da mulher. Havia várias fotos, do tipo instantâneas, e as olhou um por um, tornando-se mais fria e mais doente com cada uma.

       A mulher estava nua, seu corpo quebrado pelas feridas de punhalada que o médico forense disse que não tinha sido a causa da morte. Ela tinha sido amarrada pelos tornozelos e deixada sob uma fraca iluminação. Sua garganta foi cortada profundamente, e um fundo de sangue cobriu o chão debaixo dela.        Ela tinha sido apunhalada várias vezes e, em seguida, espetada e finalmente teve sua garganta cortada. Seus braços eram finos e, provavelmente, não tivesse lutado. Mary deduziu, pela linha da frente dos braços e as mãos cobertas de sangue, que a mulher havia tentado parar o fluxo do sangue precioso, enquanto estava pendurada de cabeça para baixo e tinha sangrado até a morte.

       Assim que foi a forma como as matou. E foi por isso que Michael não queria que ela soubesse.        Finalmente encontrou a habilidade de mover-se novamente e olhou o relatório escrito. Isto sugeria que a mulher tinha sido esfaqueada várias vezes em um esforço para submetê-la ou um desejo de torturá-la. O assassino aparentemente sabia onde ele poderia levar a lâmina imediatamente sem causar ferimentos fatais. O assassino tinha alguma mórbida razão para querer manter a vítima viva até que ficasse sem sangue.        Ela não podia ler mais. Fechou a pasta e colocou todos na maleta marrom. Olhou lá fora, sem ver qualquer sinal de Michael, em seguida, tirando proveito do caso, voltou para o quarto e colocou a maleta na cama justo onde a tinha encontrado. Saía nas pontas do pé do quarto, puxando suavemente a porta e fechando atrás dela, quando um som caiu em sua cabeça como uma flecha diretamente ao coração.

       Mas era só a melodia do seu celular.        Suspirando, percorreu a casa até seu quarto, virou a sua bolsa, enquanto o telefone soava de novo e de novo, e finalmente o encontrou, o seu coração batia rapidamente quando acionou o botão de resposta. - Mary McLean falando. - Olá, Sra. McLean, sou Stormy da S. I. S. Terminamos de verificar o seu arquivo e pensei que provavelmente iria querer saber o mais rapidamente possível. - O que encontrou?        A mulher suspirou.

- Primeiro, você deve saber que entrei em contato com o oficial Dunst e obtive o registro de que eles estavam investigando sobre você. Não disse nada, apenas fiz minhas perguntas. Normalmente este não é o tipo de informação que tem precedência sobre um cliente que não conheço, mas acho que no seu caso, você precisará de toda a história. Pode vir aqui? Eu realmente gostaria de dizer em pessoa.        Ela jogou um olhar para o relógio. - Eu não sei. Onde você está? -À duas horas ao norte, na Eaton. O endereço está no cartão.        Mary apertou a cabeça. - Não. Não há nenhuma maneira de que eu possa ir tão longe e regressar a tempo e realmente não posso esperar. Tenho que saber agora.        A mulher hesitou, mas finalmente começou a falar novamente.

- Bem. Mas isto não é algo que deve ser tratado por telefone, especialmente se você não sabe... Algumas coisas que eu vou te contar. Michael Gray era realmente um funcionário do Departamento de Polícia de Chicago, e é verdade que ele esteve envolvido na linha de impostos... Como um membro da gangue Capone em 1928. - Desculpe-me? - O oficial Michael Gray, Chicago PD, já está morto a mais de setenta anos.        Ela negou com a cabeça. - Existe algum tipo de erro. Era provavelmente o pai ou avô, ou alguém com o mesmo nome.

- Ele é o único Michael Gray, que trabalhou lá. Mas dada a imperfeição humana, eu consegui colocar minhas mãos sobre uma foto só para ter certeza. Você tem um fax? - Não. - Ela recordou do laptop - Uh, mas há um computador. Pode enviar por e-mail? - Certo. Qual o endereço?        Ela recitou a toda pressa o endereço de sua conta on-line para que pudesse ser acessado a partir do computador de Michael, mas odiava a idéia de voltar a seu quarto e pegar o laptop. Estava ficando tarde. Chegaria em casa em breve.

- A enviarei agora mesmo. Telefona-me se você quiser fazer alguma outra coisa. Mas... Mary, penso que deveria se preparar para enfrentar algumas coisas que provavelmente nunca acreditou. - Como o quê?        A mulher deu um suspiro final. - Alguma vez viu Michael durante o dia? - Bem... Não, mas... - Eu não creio. Escute-me, isto vai parecer exagerado. Mas, Mary, há uma possibilidade de que Michael Gray poderia ser um vampiro.

- Vampiro? - ela riu, mas a mulher do outro lado do telefone não ria, por isso o riso morreu em sua garganta - Você está brincando, não é? - Não. Eu sei o suficiente sobre eles. Existem. E eles não são como a maioria das pessoas pensa. Eles tendem a proteger as pessoas como você. - Pessoas como eu? - Tem a ver com o seu sangue, Mary. Dunst disse-me que tem o antígeno beladona.        Ela se tornou fria, recordando quantas vezes Michael tinha mencionado que o antígeno a conectava com ele. Mas certamente que este foi uma total completa fantasia. Vampiros? - Sim, claro. Você diz. Basta enviar-me a fotografia. Acho que posso gerir a partir daqui. - Bom. Se você mudar de idéia, me ligue.

- Não vou. - ela desligou o telefone.        Vampiros. Essa foi boa, a mulher estava louca. Contudo, mesmo quando sabia que não havia tais coisas, ela pensava na absurda coincidência de nunca ter visto Michael durante o dia. E a estranha reação ao alimento, esta manhã. Como se tivesse sido obrigado a comê-lo. A forma ele podia ler sua mente. E como poderia se mover de forma rápida e silenciosamente.

       E as coisas que ele tinha dito sobre o antígeno que criava um vínculo entre eles.        Suspirando, Mary afastou a ridícula noção de sua mente e vagou pela casa, olhando para fora com cuidado, sem ver ninguém. Mas escurecia. Breve, seria noite. Ele disse que voltaria novamente após escurecer.        Só uma outra coincidência?        Maldição. Teria que ser rápida.        Ela foi para seu quarto e pegou o laptop, pegando-o diretamente de cima de sua cama. Os segundos passavam enquanto esperava para examinar os documentos. Em seguida, pressionou a Internet sem fios, e ligou imediatamente o laptop. O mais rápido que pode mover os dedos, digitou o seu servidor on-line, para acessar a conta de seu e-mail privado. Então ela esperou, tamborilando os dedos, olhando para a caixa de ícones, esperando, esperando... Já!

       Apareceu a pequena tela. Rapidamente teve acesso a seu e-mail, clicou sobre o ícone do anexo e, observou como, linha por linha, mostrava uma foto na tela. O cabelo, o início de uma testa, sobrancelhas e, finalmente, os olhos e a ponte de um nariz. - Oh, meu Deus...        Linha por linha, suas bochechas, a boca, seu queixo. A cara Michael a olhou fixamente de debaixo do chapéu da polícia. Esta era uma foto, com o seu nome e data abaixo. Michael Gray, nascido em 5 fevereiro de 1899. - Isto não pode ser... - Mary? Eh?! Mary, você está aqui? - chamou ele.

       Mary ficou rígida e levantou seu queixo. Em seguida, abriu a porta do quarto e ele estava lá, olhando fixamente para ela e para o computador. - Mary, o que está acontecendo?        Abanando a cabeça lentamente de um lado para o outro, ela disse: - Eu não sei. Penso que é hora que você me diga. Não? - Eu não... - ele parou de falar quando ela virou o computador para que ele pudesse ver a cara dele enchendo a tela.

 

       Ele não sabia o que dizer, que fazer. Se ela apenas pudesse ter controlado sua curiosidade durante mais um dia. Mas Deus, não poderia lidar com isso agora... Não esta noite dentre todas as noites. Esta noite era lua cheia. Se ela fugisse agora dele... - Eu posso explicar. - Como?        Ele pressionou os lábios, negando com a cabeça. - Bom. Olha, eu realmente não queria entrar neste ponto tão cedo. Inferno, não queria entrar de jeito nenhum. Não quero que você tenha medo de mim, Mary. Eu não sou mal. Só tento te proteger. Você tem que acreditar.

       Ela se levantou da cama, deu alguns passos para trás. Ele sentiu como se voltasse a viver seu pior pesadelo. - Então é você naquela foto?        Ele hesitou. - Mary, eu conto tudo, mas primeiro diga-me onde você colocou a arma que te dei.        Ela franziu o cenho. - Michael, por que diabos precisa ver... - Por favor, confia em mim. Você me conhece. Basta responder à pergunta.        Ela lambeu os lábios. Ele sabia que ela tinha medo dele, sim, mas também confiava nele.

- Ela está no quarto, ao lado de minha cama. - Você jura? - ele quebrou sua promessa, sondando sua mente para ter certeza de que ela disse a verdade. - Sim. Agora você responde a minha pergunta. É você na foto? - Sim. - Então, você tem mais de cem anos?        Ele concordou. - Como é que pode ser, Michael? Não aparenta nenhum dia mais que trinta. - Não deveria aparentar nem um dia a mais de vinte e nove. Estes foram os anos que eu tinha, quando me acertaram um tiro. - Um membro da gangue de Capone?        Ele fechou os olhos.

- Tinham duas gangues que disparavam. Uns contra os outros. - ele lhe observou o rosto cuidadosamente. Não havia nenhum sinal de pânico. Nenhum toque da histeria que tinha visto no rosto de Sally naquela noite. Até agora. - Michael, acabei de falar ao telefone com uma agência de detetive que me disse que você poderia ser um... Um... Deus, eu nem mesmo posso falar. - Diga. – ele pediu.        Ele sustentou seu olhar no dela. - Ela disse que você poderia ser um vampiro. É isso que você é, Michael?        Ele escolheu suas palavras cuidadosamente.

- Mary, vou te dizer exatamente quem eu sou. Eu sou o homem que você vê na sua frente, que esteve com você durante dias até agora, protegendo-a de um assassino. Me conhece, por dentro e por fora. Nada sobre mim é diferente do que você já conhece. Mas há algumas coisas sobre mim que ainda não conhece. Coisas que são únicas. Não me fazem um monstro ou um demônio. Ainda sou eu.        Ela concordou lentamente. - Continue.        Ela não ia perder, ainda não. - Não envelheço. Se eu for para a luz solar, estalarei em chamas. E para evitar a loucura ou morrer lentamente, eu tenho que me alimentar de sangue. Mas não matar. Nunca matar. Nunca tomei uma vida humana. Nunca.

       Ela o olhou fixamente, e então olhou para a porta atrás dele. -Eu não queria dizer-te, Mary. Eu não quero ver o medo em seus olhos da maneira que eu vejo agora. Eu não sou mal. Eu não sou um monstro. - Não, certamente não. - ela disse. Mas, nesse minuto ela pensava que tinha de se afastar dele. Que não poderia pensar corretamente, era muita informação de uma vez. Mantenha o bom humor, ela pensava. Mantenha a calma e saia deste inferno.  Ele ouviu tudo. - Estou te protegendo. É tudo o que tento fazer. - E eu sou... Tão agradecida. - ela estava a poucos metros da porta. Ele ainda estava ao lado da cama. Ela ia se atirar rapidamente para a porta e sair.

       Ele baixou a cabeça, suspirou, e a deixou ver a possibilidade enquanto a olhava. Ela correu para a porta, mas ele também se deslocou, uma explosão de velocidade tão rápida que ela colidiu com seu peito. - O quê? Como você...?        Ele colocou suas mãos sobre os ombros dela, estabilizando-a e impedindo-a de sair. Sua mente tropeçou, dizendo que não havia nenhum modo de que ele poderia estar lá. Ele não tinha se movido. - Tudo é expandido nos de minha classe, Mary. Rapidez e agilidade, força e resistência física, e todos os sentidos.        Ela sacudiu a cabeça enfaticamente.

- Não. Acho que não. Eu não acredito. - Qual é a alternativa, Mary? O que é louco? Uma espécie de falso louco? Será que fiz até agora para você perguntas sobre a minha lucidez? - Por favor, deixe-me ir. Deixa-me ir, Michael.        Suspirando, com o coração quebrado, fechou os olhos. - Eu não posso te deixar ir. É lua cheia. Ele está ali.        Fantástico, ela pensou que agora tinha que escolher entre a sua capacidade para lidar com um maníaco ou enfrentar um assassino. A menos que... - Não o faça. Nem sequer pense. Você sabe que não sou um assassino. - Como? Como eu poderia saber isso, Michael?

Ela estava tremendo agora. O medo em seus olhos, era prejudicial e havia confusão brilhando neles, era tão real. E a preocupação também. Ela sentia tanto por ele... Podia vê-lo claramente nos seus olhos, em sua mente. Não sabia por que nem como, se preocupava por ele. Profundamente. Mesmo agora, depois do que ele havia confessado. - Eu sei. - ele sussurrou - Eu sei, Mary. É a mesma coisa para mim.        Ela baixou a cabeça. - Pare de invadir minha mente! - Shhhh.        Sua mão aconchegou sua bochecha, levantou seu rosto e beijou-a. Sua boca cobriu a dela, movendo-a, acariciando os seus lábios.

       O calor se focalizou em sua virilha quando deslizou os braços em volta do seu pescoço. Ele deslizou os braços em torno de sua cintura, puxando-a, apertando-a contra seu corpo, e sua língua se separou de seus lábios para explorar a sua boca. Tinha um gosto bom. Seus quadris se moveram contra ela, e as dela se moveram em resposta. Queimava por ela, e embora isto não tivesse sentido, ela não se incomodou em negar que também ardia por ele. O queria e não estava preocupada com o que ele era. Seu coração pulou com esse conhecimento.

       Suas mãos aconchegaram suas nádegas, sustentando-a ainda mais perto.  Então, ele escorregou a mão em suas costas, embaixo da camisa, acariciou suas costas nuas. Não havia sutiã que bloqueasse o seu caminho... Ela não o colocara.        Empurrou suas pernas arrastando-a para trás até que ela caiu em cima da cama.  Ele caiu sobre ela, rompendo o beijo enquanto lhe fazia passar a blusa pela sua cabeça e a jogava para um lado. O laptop escorregou para o outro lado, batendo no chão, e ele nem sequer levantou a vista. A sua atenção foi sobre o seu peito.

       Baixou a boca sobre um e utilizou seus dedos para segurar o outro. Ela seguia ali, retorcendo-se em resposta a essa lambida, os mamilos se erguiam e os beliscões que ele dava regularmente deixaram de ser divertido e se fizeram mais poderosos. Ela moveu a cabeça de um lado para o outro sobre o colchão.        Seu corpo estava quente, pegando fogo. Ele pegou suas mãos entre as suas, em seguida, apartou a cabeça substituindo-a pela pressão de suas mãos em seus peitos, dirigindo seus dedos para seus próprios mamilos e apertando-os mais e mais até que ela gemeu. Então, ele escorregou mais abaixo a sua boca fazendo um caminho sobre sua cintura e estômago, afundando sua língua no seu umbigo. Ele lhe desabotoou os jeans e puxou-os. Então, se ocupou também da calcinha, suas mãos separaram suas coxas, e ele a beijou ali.

- Michael. - ela sussurrou. - Shhh. Me deixe fazer você gritar.        Ele a empurrou abrindo-a com os polegares e a beijou novamente. E então a língua escorregou, brincalhona, lentamente, antes de conduzir-se finalmente dentro dela. A devastou com a boca, a língua e os dentes, levando-a a beira do êxtase... Então, se levantou em cima dela, nu, embora ela não tivesse recordação de que ele tinha se desnudado, e desceu sobre ela enquanto suas mãos lhe separavam os joelhos. Escorregou para dentro dela, fazendo-a tremer da cabeça aos pés.

       Ela fechou suas pernas em torno de seus quadris, os braços em torno de seus ombros. Suas mãos cobrindo as suas costas, e ele tremeu sob seu toque. Ela era linda e maravilhosa, e era dele. Um feroz sentimento de posse o sobrecarregou enquanto a conduzia ao êxtase. Afundou suas unhas em seu corpo como se não quisesse lhe deixar levantar. Ela queria tudo ele, algo mais do que esta ligação física. Ela lhe disse com a mente, com seu corpo. Foi uma necessidade primária, uma que era estranha para ela. Não poderia mais que assumir que isto veio a partir da inundação de seu clímax que esticava sobre ela.         Mas ele podia identificá-lo. Ele sabia o que ela queria. Foi a mesma primitiva urgência que fazia com que se arqueasse por baixo dele, que levantasse seu queixo e apertasse sua cabeça contra a sua garganta. E ele respondeu, separando sua boca contra a pele dela ali, mordendo-a profundamente.

       A pontada de dor foi breve, o êxtase que se seguiu cegou a ambos, enquanto ele saboreava sua vida, sua essência, tomando-as para si, fazendo-os um.

 

       Quando a sua mente voltou da estratosfera e seu corpo finalmente parou de se estremecer, Mary se encontrou nua na cama com Michael, sustentada em seus braços, sua cabeça descansando sobre seu ombro e peito, enquanto uma de suas mãos desenhava círculos preguiçosos nas suas costas. Gradualmente percebeu que lhe falava, sua voz suave e um pouco espessa. - Eu nunca vou te prejudicar. Tampouco permitirei que alguém o faça, eu prometo. Morrerei antes de deixar alguém te fazer mal. Você sabe, Mary. Você tem que saber.

       Ela piscou lentamente saindo do estado de felicidade e relaxamento. Estava na cama com Michael. Ele acabava de confessar ser um vampiro, uma teoria que tanto a agência de investigações como a polícia local parecia achar absolutamente real.  Ele podia se mover tão rápido que seus olhos não poderiam segui-lo. Podia ler sua mente. E acreditava que tinha mordido seu pescoço.

       Franzindo o cenho, levantou uma mão para tocar o pescoço. Ela sentiu duas sensíveis manchas em sua pele.

       Era possível, se perguntou, que acabara de ter sexo com um vampiro? E o que importava? Ela amava a este homem.

       Ele seguia falando, acariciando-a e sussurrando sua devoção.

- Sabia que o sangue, o antígeno, nos conectava, porém é mais que isso. Nunca tinha me sentido atraído por ninguém. Nem uma só vez. Antígeno de beladona ou não.

       Ela piscou e levantou a cabeça.

- Michael, me explique como esse... Este antígeno nos conecta.

       Ele a olhou nos olhos, os dela pareciam decepcionados. E nada assombrados. Ela não tinha respondido exatamente a sua conversa de travesseiro. E ele devia estar honrando seu pedido de que deixasse de ler seus pensamentos, talvez soubesse o que ela estava pensando. Isso era estranho, porém estava alcançando o ponto onde podia sentir quando ele estava entrando em sua mente; era quase irracional. Porém ela não o sentia antes.

- Cada vampiro foi uma vez um mortal com o antígeno belladona. - disse ele.

Ela franziu o cenho.

- Então um a pessoa sem o antígeno...?

- Nunca poderá se converter em vampiro. Só aqueles que têm o dito antígeno tem essa opção. Me deram essa opção quando estava para morrer na cama de um hospital, crivado de balas, faz muitos anos. Escolhi a vida.

- E... Como se converte em um vampiro?

Ele tirou o cabelo do rosto.

- Outro vampiro tem que te transformar. Primeiro lhe drenaria o sangue e logo...

- Drenar o sangue. - repetiu ela, sentindo frio por todas as partes.

- Não é tão ruim como parece.

Talvez não, porém era exatamente a maneira em que as ouras mulheres, todas as que compartilhavam o antígeno beladona, tinham sido assassinadas. Por sangrar-se. Deus, ela sentiu como se estivesse se partindo ao meio. Como podia estar apaixonada por ele e ao mesmo tempo lhe ter medo? Seu poder o fazia perigoso. Porém não para ela. Deus, ele nunca poderia ser um perigo para ela.

- Não deveria pensar isso, Mary. Não é algo que tenhas sequer que considerar. Não agora. Você é forte. Está bem. E estará ainda por muito tempo.

- Espero que tenhas razão nisso.

- Tenho a intenção de assegurar isso. Esta é a primeira noite de lua cheia. - disse ele – E planejo mantê-la em meus braços, resguardada e protegida, até a saída do sol.

Não tinha nada que ela pudesse fazer... E nada que gostaria mais do que passar a noite em seus braços. As perguntas podiam esperar.

Ela relaxou em seus braços. E se sentiu tão bem, tão segura e tão perfeita, que não podia acreditar que tivesse algo errado nisso. Estar com Michael era como reunir algumas partes dela que tinha estado omitindo toda a vida.

Fizeram amor outra vez. Então ela necessitou fazer uma parada para comer, ele admitiu que não pudesse digerir comida sólida e que seu desjejum o tinha colocado gravemente doente. Que se tivesse obrigado a comer, saber como sofreria por isso, a tocou profundamente. Não importava o que ele fosse, Mary acreditava que os sentimento por ela eram reais.

Então passaram toda a noite falando, rindo e fazendo amor.

E então, finalmente, ele se levantou, se vestiu enquanto caminhava para a porta da rua, olhando pela janela.

Ela ficou atrás dele deslizando as mãos por seus ombros. Por que não podia ser um homem normal? Por que...?

- Tenho que te deixar, amor. Logo amanhecerá.

- Por que não pode ficar aqui?

Ele baixou os olhos.

- Eu... Não posso. Não quero que veja como sou quando durmo.

Ela decidiu não discutir, embora quisesse fazê-lo.

- Certo.

Ele a girou envolvendo-a em seus braços e a beijou profundamente.

- Não sabe o que isso significa para mim, Mary, que não fugisses de mim quando te disse o que sou. Não pode saber. Um dia... Um dia te direi. Por agora só precisa saber que você restaurou os pedaços de um coração que estava maltratado. Ninguém poderia tê-lo feito, exceto você.

Lágrimas. Havia lágrimas iluminando seus olhos. Nadando ali, sem derramar-se. Ele tinha muitas para deixá-las cair, pensou ela.

Ele acariciou seu cabelo.

- Ainda estará aqui quando eu voltar?

Ela concordou, olhando-o diretamente nos olhos.

- Estarei. Te prometo, Michael, estarei aqui. Não entendo nada disto, porém quero fazê-lo. E não tenho medo de ti. Não importa o que sejas.

Ele separou a vista, piscando rapidamente.

- Feche a porta atrás de mim. – ele lançou um olhar para o céu. Este já empalidecia. E ainda ele esperou.

Ela sabia que ele estava atrasando o momento que teria que ir, para protegê-la até que simplesmente não pudesse fazê-lo mais. E finalmente, justo quando os primeiros raios de sol iluminavam o céu, a beijou uma vez mais, logo abriu a porta e andou com passos ligeiros.

Mary o observou enquanto cruzava o caminho e desaparecia no bosque um pouco mais além. Ela tratou de colocar de lado a curiosidade, porém não podia. Ela não o temia, não fugiria dele. Porém tinha que saber. Tinha que saber tudo sobre ele.

Tinha passado um tempo desde que ele tinha ido, quando ela entrou no bosque. Já sabia que ele podia se mover rápido. Não a surpreendia. Inclusive os bosques estavam escuros; os raios matinais não penetravam nele. O calor entrava e esquentava a terra úmida, liberando essa umidade em forma de névoa que se elevava desde o solo e se aglomerava ao redor dos seus pés e dos joelhos. Tinha um caminho. Era difícil de ver além da névoa, contudo estava ali.

Mary o seguiu. Este serpenteava pelo bosque, então terminava bruscamente em um campo completamente aberto pontuado com formas que se ocultavam entre os capins. Muito curtos para serem árvores. Talvez arbustos de alguma tipo. Um som chamou sua atenção, como uma porta ao fechar-se e se voltou nesta direção, porém, só viu o que parecia ser uma pequena casa de formas não definidas.

Então entrecerrou os olhos quando uma das formas pareceu clarear. Tinha asas. As asas de um anjo. Ela se aproximou. Quando os raios do sol arderam através da névoa e esta diminuiu, viu as pedras ao seu redor. Lápides. Monumentos. E a casinha? A casinha era uma cripta.

Ela estava de pé no meio de um cemitério. E a menos que estivesse muito enganada, seu amante acabava de entrar justamente em uma das criptas e a tinha fechado atrás dele. Engolindo o impulso de dar meia volta e começar a correr, recordou a si mesma que se tratava de Michael, seu Michael. Ela tinha que conhecer onde ele passava seus dias.

Obrigou seus pés para que a levassem mais perto... Mais perto... Até a cripta de onde tinha vindo o ruído.

E quando esteve justo diante dela, parou olhando o nome gravado no alto.

M I C H A E L   G R A Y

 

       Maria se adiantou para ligar para a SIS, logo após levou duas horas de carro até a agência de investigações. Tinha esperado um edifício de escritórios na cidade. O lugar ao qual tinha chegado não era nenhuma daquelas coisas. Era uma enorme mansão vitoriana, recentemente renovada e restaurada.

       O ramo de investigações sobrenaturais deve ser lucrativo, pensou Mary, enquanto conduzia o Jaguar de Michael pelo caminho de entrada e se detinha a poucos metros.

       E então se sentou ali durante um par de minutos, fazendo o que tinha estado fazendo durante todo o passeio. Perguntando-se se tinha perdido o juízo.

       Quando uma pessoa te diz que é um vampiro, deveria ouvir. Qualquer pessoa lúcida teria passado o dia pondo tanta distância entre si mesma e Michael quanto fosse possível. Porém não. Ela não devia estar lúcida, porque em troca estava aqui em uma missão de investigação. E ela sabia exatamente que tipo de fatos queria encontrar: os fatos que lhe diriam que tudo ia bem. Que poderia ter uma espécie de futuro com Michael. Que ele já tivesse dito tudo, que não guardasse mais segredos. Queria se assegurar. Queria saber tudo sobre ele.

        Sim, foi pega por um lado pelo que ele clamava ser, e por ver seu nome gravado em uma cripta. E sim, estava assustada até a morte por tudo o que tinha passado ao longo destes últimos dias. Não de Michael. Nunca de Michael. Era só que tudo o que tinha passado era bastante forte para anular os sentimentos que tinham estado crescendo regularmente dentro dela desde a primeira vez que ele entrou no Bar A Cripta.

       Ontem à noite aqueles sentimentos a tinham transbordado. Faziam com que seus medos e sua racionalidade empalidecessem em comparação. Ela não queria fugir dele. Queria ficar. Talvez para sempre.

       Enquanto se sentava ali, com tudo isso dando voltas, a porta principal se abriu e uma mulher com o cabelo curto e vermelho e um brinco de diamantes no nariz apertou o comando da porta principal, cruzou os braços e inclinou a cabeça.

Mary desligou o carro e se abaixou.

- Fantásticas rodas. – disse a mulher – Sou Stormy. Você deve ser Mary.

       Mary concordou e se aproximou uns passos para lhe apertar a mão.

- É um prazer enfim te conhecer.

- Não estás com uma boa cara. Está bem?

       Ela passou a palma da mão pelo pescoço, onde os dentes de Michael tinham perfurado sua pele. Ainda lhe ardia.

- Não estou segura. Acho que ontem à noite um vampiro me mordeu, porém não tenho nem idéia do que isso significa.

       Stormy sustentou seu olhar fixo.

- Bom, ainda está viva, então suponho que isso quer dizer que você teve uma noite fantástica. Deixe-me ver. – ela tirou a mão de Mary e olhou detidamente seu pescoço - Diabo, não posso estar segura. Os buracos se curam no instante em que o sol os toca, porém às vezes fica um pequeno ponto rosa de presente. – Ela trocou os olhos e se inclinou para mais perto – Sim, ainda há um rastro.

Mary fechou os olhos. Para a mulher era normal, como se falasse disso todo o tempo.

- Então...?

Stormy riu dela.

- Realmente não sabe nada disso, verdade?

Mary sacudiu sua cabeça.

- Vamos entrar e nos sentar. Te trarei um chá. Max e Lou estarão aqui a qualquer momento.

Ela pegou o braço de Mary e a conduziu para dentro.

O vestíbulo era espetacular e tirou o fôlego de Mary, como a aranha de cristal, os móveis antigos e a fantástica escada que conduzia para o segundo andar.

- Vivemos na parte principal da casa. A biblioteca nos serve de oficina. Me acompanhe, é por aqui...

Ela conduziu Mary por um jogo de portas duplas e entrou em uma biblioteca. A sala tinha duas escrivaninhas. Uma estava completamente vazia com nada mais que um computador sobre ela. A outra tinha um computador, porém tinha também pastas de arquivos, periódicos, as marcas das xícaras de café e uma miniatura do cartaz do filme “A Teoria da Conspiração” de um lado. Tinha umas chaminés a gás em uma parede e umas cadeiras de couro que se viam bastante cômodas, um sofá e filas e filas de livros enchendo as paredes.

- Sente-se. Vou ver o chá. E relaxe. Não te vão crescer os dentes ou algo por uma mordida de vampiro, de acordo?

Ela não podia acreditar o tamanho alívio que sentiu ante essas palavras. Deus! Pensar que tinha estado preocupada por algo tão exagerado... Tudo o que alguma vez tinha acreditado que era verdadeiro, normal e ordinário tinha se voltado ao contrário nos últimos dias.  Chegando a esse ponto nada mais lhe parecia ridículo.

Stormy a deixou na biblioteca, fechando as portas atrás dela. Mary se dirigiu para uma cadeira, como lhe foi sugerido, porém fez uma pausa observando as estantes quando lhe chamou a atenção títulos tão intricados como: O Kybalion, o Livro Tibetano dos Mortos, a Chave do Rei Salomão...

Cada livro na estante tinha algum título místico, e muitos pareciam ser muito velhos. Tinha manuscritos de tempos medievais, pelo amor do céu!

- Vejo que aprecias nossa coleção. – disse uma voz de mulher.

Mary se voltou para vê-la de pé na entrada. Era pequena, com o cabelo curto de cor cobre e enormes olhos verdes. Para Mary parecia um diabinho ou um duendezinho de madeira. Estava de pé ao lado de um homem que usava umas calças folgadas e uma camisa branca. Era maior que ela e tinha uma aparência intensa. Stormy entrou atrás deles fechando as portas.

- Mary McLean, te apresento Maxine Stuart e Lou Malone. Nós três somos empregados dos Serviços de Investigações sobrenaturais. Oficialmente, ao menos.

- Oficialmente?

Maxine riu, avançando com a mão estendida.

- Sim. Extra-oficialmente temos um par de companheiros silenciosos, porém muito proveitosos. Me chame de Max.

Mary apertou sua mão.

- Estes livros são incríveis. – disse ela.

- Obrigada. Há muita informação incrível e exata naqueles livros, material que necessitamos neste negócio. Porém você tem que abrir um caminho entre muita superstição e dogma religioso para encontrá-lo.

Mary não sabia se tinha que rir ou não.

- Sente-se, – disse Lou - e ouviremos o que nos trás.

Ele apontou com a cabeça uma das cadeiras de couro e ela se sentou. Stormy lhe deu uma taça de chá fumegante e se sentou no sofá, enquanto Maxine ia atrás do desordenado escritório com o cartaz do filme em cima do seu computador. Lou ocupou a cadeira de couro restante.

- Não sei por onde começar. – disse Mary.

- Pelo começo de tudo. – disse o homem. Ele tinha um caráter afável e aberto que a fazia sentir-se cômoda e a salvo.

- Bom.

Então Mary tomou dois goles de seu chá e lhes contou tudo a partir do início.  Falou a eles das chamadas telefônicas e do roubo, acerca da reportagem da polícia. Falou sobre Michael, como simplesmente tinha aparecido na Cripta, observando-a, até que finalmente lhe pediu para acompanhá-la até a casa para lhe advertir então que seu caçador era um assassino em série e que ela era a seguinte em sua lista negra. E depois lhes falou do assassinato de Tommy, as suspeitas da polícia, e que se mudara para a casa de Michael. E ali se deteve.

Maxine, que tinha estado teclando regularmente no computador em todas as partes da história e Lou, que tinha sido paciente e silencioso, ambos a olhavam esperando. Ela não disse nada até que Stormy a incitou a continuar.

- O que aconteceu ontem à noite, Mary? Depois que te enviei o e-mail com a foto do policial chamado Michael Gray que foi assassinado em Chicago a setenta e tantos anos?

Mary suspirou, lambeu os lábios. Ela bebeu o último trago da xícara de chá.

- Ele chegou enquanto eu olhava a foto. Então eu a mostrei e lhe pedi que me explicasse.

- E?

Ela baixou a cabeça, sacudindo os ombros.

- Me disse que era... Um vampiro. – incapaz de permanecer sentada, levantou, dando uns passos e girando ao chegar à parede – Não sei o que aconteceu depois disto. Minha mente lógica me dizia que devia correr, porém não o fiz. Não queria ter medo dele. Tenho todos esses sentimentos por este homem que não têm nenhuma lógica. Me disse que em parte se devia a meu sangue... Algo sobre um antígeno, porém isso me parece ficção científica. Porém ele disse que tem mais. E, não sei... Ele me beijou, e o próximo que soube era... Eu só... Nós estávamos... – ela deixou de caminhar e passou uma mão pelo cabelo – Passamos a noite juntos na cama. E ele...

- Ele bebeu dela. - adicionou Stormy - Não muito, obviamente. Não está pálida. Provavelmente só o fez levado por um pouco... Bom, já sabem como são os vampiros.

- Pequenos chupa-sangue apaixonados, até o último deles. - disse Maxine com uma piscada e um sorriso diante de seu próprio jogo de palavras.

- Então foi isso que passou esta manhã? Solucionaste alguma coisa?

Ela sacudiu a cabeça.

- Me lembrou que à noite teria uma lua cheia. Que é quando, em geral, o assassino age, e inclusive embora Tommy esteja morto e todas as provas apontassem para ele, Michael disse que ainda pode sentir o perigo ao meu redor. Me fez prometer que estaria ali quando voltasse. O fiz. E então se foi. – ela olhou os pés – O segui. Foi a um cemitério e entrou na cripta, acho. Tem seu nome gravado na parte de cima.

Ela se abraçou e tremeu.

- Não é tão horripilante como parece, Mary, – disse Maxine - acho que alguns deles têm os interiores das criptas com uma decoração mais agradável que uma suíte de luxo no Ritz.

Ela levantou o olhar, devagar. Lou disse:

- Tem que entender, eles têm que ser cuidadosos. Há gente que os caça como animais. E Deus sabe, se sua existência se tornasse de domínio público, não haveria paz para eles.

- Tudo o que querem, – disse Stormy - é viver suas vidas em paz. Não são maníacos, do modo em que a cultura folclórica os representa. São só pessoas. Iguais a todos nós, com algumas diferenças notáveis.

Ela tinha olhado fixamente a cada um deles enquanto falavam. Eles falavam naturalmente, sobre algo que, para ela era muito recente e nem sequer teria acreditado. Seus joelhos cederam e se deixou cair, aterrizando na cadeira atrás dela.

- Está me dizendo que isto não é uma situação única? Os vampiros são tão comuns que vocês sabem sobre eles?

Os três concordaram. Maxine girou o monitor de seu computador para Mary.

- E também as suposições dos assassinatos que te contou o Michael. Nós os estamos investigando também. Todas as vítimas tinham o antígeno beladona. Você o tem, assim que a preocupação de Michael com sua segurança é normal.

Mary concordou, deixando que seu fôlego escapasse todo de uma vez.

- Esperava que me dissessem justamente o contrário. Quero dizer, acredito em Michael, sempre acreditei nele. Porém seria agradável se alguém me dissesse que eu estava reagindo de forma exagerada... Que nunca estive realmente em perigo.

- Sinto, porém não.

Deixando escapar um suspiro, Mary endireitou os ombros.

- Poderiam me explicar um pouco mais sobre este antígeno... Em meu sangue? E o vínculo que Michael disse que se cria entre nós?

Concordando, Max lançou um olhar a Lou. Ele pigarreou.

- Primeiro, carinho, deixe-me te dizer com toda honestidade, que há cinco anos, pensava que isto era um monte exagerado de besteiras que alguém alguma vez tinha tratado de me vender. Porém eu vi as provas. Sei que é real. É muito para digerir no princípio, porém é real. É importante que não pare só nesta parte, porque tem que se abrir para fazer com que o resto tenha sentido.

- Eu tento, acredite.

Ele sorriu, cruzou o espaço entre eles e acariciou sua mão que descansava sobre o braço da cadeira.

- Algumas pessoas têm o antígeno beladona. É uma raridade. E fazem com que tenham uma coisa em comum. Em primeiro lugar, tendem a sangrar muito quando se cortam. Uns até o ponto de ser hemofílicos, porém para outros não é tão mal. É bastante difícil encontrar doadores de sangue quando necessitam, porque muito poucas pessoas têm o antígeno.

Ela assentiu.

- E o que mais?

Ele arqueou as sombrancelhas.

- Você disse que essa era uma das poucas coisas que temos em comum. Quais são as outras?

Ele enviou um olhar para Maxine. Ela apertou os lábios, movendo a cabeça quase imperceptivelmente de um lado a outro. Estavam lhe escondendo algo, supôs ela. Por que tantos segredos?

- Bom, há realmente um monte de coisas que descobrimos até agora. – disse Lou – Porém o primeiro que você tem que saber agora mesmo é isto. Os únicos que podem converter-se em vampiros são as pessoas com o antígeno.

- Os eleitos. – sussurrou ela.

- Sim. Assim é como os chamam os vampiros. Eles sabem quem tem o antígeno e quem não. O sentem de algum modo, e tem esse impulso instintivo de protegê-los. Alguns lutam contra ele, outros o abraçam, porém é extremamente difícil para eles ignorá-lo. Que um vampiro faça mal a um dos eleitos é uma raridade. É quase impossível para eles. Só tenho ouvido um caso, e naquele caso ambos eram vampiros com complicadas enfermidades mentais.

- Isto quer dizer que é altamente improvável que Michael pudesse ser o assassino. – disse Maxine.

- Improvável como o inferno. - adicionou Lou – É de tudo impossível.

Mary concordou.

- Sabia isso sobre ele, porém é bom ter algo mais sólido que meus próprios sentimentos em que me embasar.

Max se levantou da escrivaninha.

- Há uma ciência que sugere que cada vampiro estabelece um vínculo com um dos eleitos muito mais poderoso que com os outros. Esta suposição se sustenta, inclusive se essa pessoa tenha sido transformada, inclusive antes que os dois se conheçam. O antígeno permanece, supostamente. Não sei se isso é verdade. Acredito que isso aconteceu com Dante e Morgan. Nunca tinha visto nada igual ao vínculo de poder que há entre eles dois.

— Dante e Morgan? —perguntou Mary.

- Minha irmã e seu esposo. Nossos companheiros silenciosos neste negócio. Ainda não tinha adivinhado? Eles são vampiros.

 

Vampiros. A própria irmã gêmea de Maxine Stuart… A premiada roteirista supostamente morta de que tinham falado uns anos atrás... Estava viva e bem. Ou não-morta e bem.

E segundo Max, os vampiros estavam muito bem representados nos filmes de sua irmã. Não eram os monstros cruéis de Stokes e os demônios desalmados de Whedon. Nem sequer eram imortais. Não realmente. Podiam morrer de várias formas, inclusive incinerados, sangrados e de fome. Porém realmente tinham alma, sentimentos, e eram totalmente capazes de cada emoção supostamente humana.

       Mary se pôs em dia para aprender tudo sobre o Michael, o que era e o que isto significava, em seguida, passou o dia inteiro conversando com Maxine, Lou e Stormy. Eles retiraram os DVDs de filmes de vampiro de Morgan DeSilva, e os colocaram, respondendo às perguntas de Mary pausando o vídeo. No meio da noite, contaram os seus próprios encontros com vampiros nos últimos cinco anos desde que a agência abriu pela primeira vez. Mary perdeu a conta, de quantas vezes lhe disseram que as suas vidas foram salvas por um não-morto. Lamentaram não terem sido capazes de localizar Morgan e Dante para que ela os conhecesse, mas o jovem casal passava os feriados na Irlanda, visitando um dos mais antigos e mais queridos amigos de Dante, enquanto estavam lá.

       Quando ouviu tudo o que tinham que lhe dizer, Mary estava convencida de que seus instintos estavam corretos. Não tinha nenhuma necessidade de que fugisse de Michael. Havia perguntas que ambos teriam que se fazer. Deus, ali estavam mais desafios nesta nova relação do que poderia começar a pensar agora. Porém ele era exatamente o que lhe tinha dito que era, exatamente o que sabia em seu coração.  Era o homem que amava.

       Agora todos estavam na cômoda sala de estar, na seção particular da casa. O último filme tinha terminado, e as histórias tinham chegado ao fim.

       Maxine tinha abandonado brevemente o quarto e agora voltava com uma pasta de arquivos nas mãos que ofereceu a Mary.

- Acredito que deveria ver o os outros registros. – disse ela - Tem só o que é oficial. Não tenho nenhum modo de saber o que aconteceu com ele depois que mudou, porém uma vez que vi tudo isto, não tive nenhuma dúvida sobre o caráter de Michael Gray. Tampouco acredito que você terá. Não que pareça as ter de todos os modos. Porém você disse que queria saber tudo. Sabia que atiraram nele?

       Negando lentamente com a cabeça, Mary abriu a pasta, olhando seu conteúdo. Continha elogios, recomendações e uma informe de 1928 da manchete de um jornal, a morte de um Herói.

- Houve um tiroteio entre o bando de Capone um bando rival. – disse Lou Malone. E quando ela detectou a surpresa em sua voz, lembrou que lhe tinha dito que havia sido da polícia durante vinte anos antes de unir-se a Maxine neste negócio.

Maxine se sentou a seu lado, depositando uma mão sobre seu ombro. Era um toque de carinho. Ela a acariciou com a sua, em um gesto amistoso.

- Um menino de sete anos, confuso e assustado pelo barulho, atravessou o fogo cruzado. Michael Gray saiu de sua posição estratégica direto para o meio do tiroteio, se lançou sobre o menino e atuou como um escudo humano. O menino saiu machucado, nada sério.

       Gray recebeu nove tiros.

       Ela então ficou em silêncio, seus lábios fortemente apertados.

- Um homem assim não parece mal. – disse Stormy – Trocou fisicamente, de um moribundo mortal, a um poderoso vampiro. Porém por dentro, ainda é o mesmo. Um herói que morreu salvando a um menino.

       Maxine assentiu.

- Os informes oficiais dizem que sua esposa, Sally, se matou com o revólver de serviço de Michael uma noite após sua morte. Andei investigando há rumores de que ele foi visitá-la depois que trocou. Dizendo-lhe o que era. Ela enlouqueceu de terror e se matou diante dele.

- Oh, Deus. – as lágrimas caíam dos olhos de Mary. Ela se esticou para apertar as mãos de Stormy - Obrigada. Obrigada a todos. Não posso dizer o muito que vocês têm me ajudado.

- Me alegra ouvi-lo. – disse Stormy. Lançou um olhar a seu relógio, logo sacudiu a cabeça - Passamos horas falando. Por que não se une a nós na ceia e depois nós...

- Que hora é? – perguntou Mary. Pela primeira vez se deu conta de todo o tempo que devia ter ficado ali, no escritório dessas pessoas. Três filmes, horas de conversa... E o céu além das janelas escurecia.

_ Oh, não.

_ Acontece algo?

- Eu... Prometi a Michael que estaria ali quando voltasse a casa esta noite. Se não estou... Irá pensar...

- Olha, lhe chamaremos... – começou Maxine.

- Tenho que ir. Tenho que estar ali. – ela se pôs em pé e correu para a porta apesar dos protestos dos demais. Não podia sequer pensar em que Michael voltasse para casa e não a encontrasse ali. Assumiria que, como sua esposa não podia entender o que ele era. E isso era o que estava mais longe da verdade.

 

Maxine olhou ao Lou quando o Jaguar derrapou pelo caminho da entrada e se perdeu de vista.

- Ela disse que o assassino estava morto. E Dunst está de acordo, não?

- Também disse que Michael Gray sentia que ela ainda estava em perigo. – disse Lou e pressionou os lábios levantando os olhos para o céu – Esta noite vai ter lua cheia.

- Tem razão. Será melhor que a sigamos. Porém vai ser condenadamente difícil nos manter perto dela, considerando como conduz e o modo em que conduz.

- Então será melhor que nos apressemos.

- Tratarei de entrar em contato com Michael Gray. — disse Stormy, enquanto Lou e Max corriam até o carro – Vou fazê-lo farei saber o que está acontecendo, onde ela está, só se por acaso...

 

Michael emergiu da cripta ao pôr do sol e se arrastou pelo cemitério enquanto a escuridão se fazia mais intensa até alcançar a parte de trás do bosque. Uma vez na ponta, fora da vista, oculto pelas árvores, optou por sua velocidade. Porém em vez de sentir a Mary mais perto com cada passo, só sentia um estranho e inclusive crescente vazio. Ele sabia, antes inclusive de que estivesse no ponto livre do caminho de entrada, que ela não estava ali.

Mary se tinha ido. Tinha pego seu carro, e o tinha abandonado.

Nem sequer estava surpreendido. Atado até os intestinos pela decepção, porém não surpreendido. Percorreu todas as partes da casa, descendo para a costa até a praia e buscando-a pela margem como se esperasse encontrá-la ali. Porém não a encontrou e sabia que não o faria.

Não tinha sentido nenhuma dúvida nela enquanto faziam amor durante toda a noite. Não tinha provado o medo em seu sangue. Não tinha se desmoronado, não tinha se voltado louca ao ponto de tirar-se a vida, da maneira em que tinha feito sua esposa quando enfrentou o conhecimento do que ele tinha feito. Estupidamente se tinha permitido acreditar que ela não mudaria quando tivesse tempo para analisá-lo friamente à luz do dia. Obviamente o tinha feito.

Esteve ali de pé na margem enquanto as ondas lavavam seus pés e sentia pena porque não lavavam também a sua alma. Porém a pena não lhe durou muito. Quando a curva superior da enorme lua prateada se elevou no horizonte e sua luz se derramou sobre o espelho ondulado do oceano, deixou de lamentar-se imediatamente. O raio da luz da lua perfurou o véu de sua dor com a recordação de que essa noite poderia muito bem ser a última noite da vida de Mary.

Não cedeu ao pânico. Tinha sido policial durante muito tempo para sucumbir ao pânico. Em vez disso, correu para a casa enquanto sua mente punha ordem dentro do caos. Onde diabos poderia estar? Como diabos poderia encontrá-la a tempo? Tratou de senti-la, porém ou estava muito longe ou tinha se fechado por completo devido ao medo, a repulsa ou a ambos.

Um telefone soava quando entrou na casa de praia. E não era o seu. Levou três toques completos para se dar conta de que era o celular dela. Maldição, tinha estado tão impaciente para estar longe que tinha esquecido o telefone. Assim como todos os seus pertences, reparou quando entrou no quarto de convidados e pegou rapidamente o telefone.

- Mary?

- Não, sinto muito – disse a voz de um homem – Você é Michael Gray?

- Sim. Quem é?

- Sou o oficial Dunst. Tenho estado trabalhando no caso de Mary McLean e o assassino Tommy Campbell. Obtive este telefone de um investigador que está trabalhando com Mary. Disse a ele que me poria em contato com você depois de telefonar a Mary. Ela está aí?

A cabeça de Michael dava voltas.

- Não. Esqueceu o celular. Não sei onde está.

- Eu sim. Sr. Gray, Mary passou a maior parte do dia em Easton com essas investigadoras, e agora, se tudo for bem, ela está de caminho...

       Um monte de perguntas se precipitou por sua mente. Alcançou fazê-las uma por uma. Que investigação? Onde estavam elas? A que horas tinha saído Mary? Estava sozinha? Ele tomou nota rapidamente interrompendo ao oficial sempre que dizia alguma coisa estranha. Não tinha tempo para histórias.

Uma vez que soube que Mary tinha saído fazia meia hora de um lugar há duas horas ao norte da Rota 1, começou a desligar o telefone.

- Espere, Sr. Gray. Há mais. A razão pela qual chamei em primeiro lugar.

- Fale rápido. Tenho que alcançar a Mary.

- O corpo que encontramos no apartamento de Tommy Campbell... Não era ele. Parece que matou a um vagabundo, então queimou o corpo para nos fazer pensar que era ele. Também descobrimos que Tommy tinha uma irmã gêmea que morreu em um acidente de trânsito à idade de dez anos. Sangrou até morrer. Não puderam encontrar um doador a tempo de salva-la. Ela tinha o antígeno, Gray.

- Tommy está vivo ainda, – disse Michael suavemente - e vai atrás de Mary.

- Vou pegar a Rota 9. Você pega a Rota 1. Poderia ter ido por um ou outro caminho.

Michael desligou. Correu da casa até a garagem apertando o botão para abrir a porta elevadora e subiu uma perna sobre o tanque de sua moto. Segundos mais tarde corria através da noite para Mary.

 

Mary conduzia o Jaguar como podia, não era algo fácil em uma estrada que serpenteava por pequenas cidades e demais áreas nas quais tinham limites de velocidade ao longo de todo o caminho. Ela não tinha tocado o pedal do freio... Não até que passou por outro carro que estava fora da estrada estacionado em um ângulo torcido com uma porta aberta. Tinha uma pessoa caída no caminho e ela apenas pôde dar uma guinada no volante para esquivá-lo. Ela então derrapou ao deter-se ao lado da estrada, deu marcha a ré e voltou ao acidente.

Se esticou para alcançar o telefone celular e chamar ao 911 antes de lembrar que o tinha deixado na casa de Michael. Maldição. Ela saiu e foi correndo para a vítima. Um homem jovem, estendido e imóvel, emborcado.

Ajoelhando a seu lado, Mary o sacudiu com cuidado pelos ombros.

- Ei! Ei! Você está bem? – não houve resposta, porém ele estava quente. Pressionou os dedos contra o pescoço e sentiu uma pulsação forte e estável - Vamos, desperte já. Tem que despertar.

Ela sabia que o melhor era não movê-lo, mas maldição, ele estava caído na metade do caminho. Outro carro podia vir e...

Ele gemeu e rodou lentamente sobre suas costas.

- Espere, talvez não deveria se mover ainda. Agüente. – então ela viu seu rosto e sentiu que o sangue lhe fugia - Tommy?

Ele riu muito lentamente e a esfaqueou na barriga. A dor a atravessou e retrocedeu, suas mãos indo instintivamente a seu estômago. Uma quente umidade o cobria e baixou o olhar para ver que tinha uma faca cravada até o punho. Não a tinha furado. A tinha apunhalado.

- T-Tommy? Por quê? Deus, por quê?

Ela tentou se por em pé, cambaleando, porém conseguiu endireitar-se. Se arranjou para dar dois passos para o Jaguar de Michael, e então ele a pegou pelo cabelo, arrastando-a para trás enquanto a lâmina entrava em suas costas.

Um grito escapou de seus pulmões.

- Deveria ter entrado em contato com a polícia hoje, Mary. Terminaram a autopsia e descobriram que o corpo encontrado em minha cama não era o meu.

A dor a atormentou e caiu novamente sobre os joelhos.

- Tiveram que esperar a autópsia ou teriam te dito muito antes. Porém não importa. Amanhã há esta hora, estarei em uma nova cidade, usando um novo nome.

Ele a rodeou para ficar diante dela, a lâmina, gotejando sangue, ainda em sua mão. Ela se obrigou a levantar seus olhos, passando da lâmina, a seu rosto. Mais além de sua cabeça, ela viu a lua cheia no alto do firmamento.

- Por que Tommy? Só me diga por que.

- Quer dizer que teu precioso amante vampiro ainda não te tinha contado? Sobre os caçadores de vampiros? As pessoas que dedicam suas vidas a erradicar aos de sua classe do planeta? Não?

- Mas... Mas não sou... Não sou um vampiro.

Ele riu.

- E nunca o será. Verá, essa é a beleza de seguir este método. Me livro de todos de seu tipo antes de que possam, alguma vez, ser como eles. É o método mais eficiente.

- Isso é assassinato.

- Ao diabo se o é. Você não iria viver muito depois de tudo. A maioria não vive além dos trinta.

Ela franziu o cenho, sacudindo a cabeça em confusão.

- O que, tampouco te contou isso? Isto é um pequeno e prático efeito secundário que vem com o sangue que você tem, Mary. Fica debilitada, fica enferma e, a não ser que eles te transformem, morre.

Ela fechou os olhos. Ele afundou a faca em seu ombro, e seus olhos se abriram outra vez de par em par com seu grito.

- Admito que provavelmente você tivesse uns anos mais. Mas que diabo, agora ou depois, não faz diferença. De todos os modos impedirei que haja mais como eles. Deveria me agradecer, Mary. Estou a ponto de salvar tua alma.

Ela estava perdendo a consciência rapidamente. Seus olhos se fecharam outra vez, e pensou em Michael, querendo Deus, que tivesse esperado e permitido que Michael lhe contasse sua história em vez de sair para averiguá-la por si mesma. O amava, e nem sequer tinha cedido ante sua necessidade de saber de tudo. Por que não tinha confiado em seu coração?

Sabia o que vinha depois. Tinha lido os informes e as autópsias das outras vítimas deste homem. As apunhalava repetidamente, as pendurava pelos pés e lhes cortava a garganta enquanto ainda estavam vivas, de forma que cada gota de sangue se drenasse assim de seu corpo.

- Por que os odeia assim? – se arranjou para dizer.

- Por quê? Porque eles poderiam ter salvado minha irmã. – lhe disse ele - Porém não o fizeram. Nenhum deles veio para ajudá-la quando mais os necessitava. Se ela não podia viver, nenhum de vocês o fará.

A apunhalou outra vez, esta vez nas costas. Contudo, ela não sentia a dor. Estava perdendo a consciência, e sussurrou uma prece de agradecimento por isso.

 

       Maxine disse quando viu os dois veículos na estrada.

- Lá! Lá!

  Lou levou o carro para fora da estrada por trás dos outros carros, pegou as armas e saiu correndo à frente antes Max dizer uma palavra. Ela foi atrás dele quando seus faróis iluminaram a área. Um jovem, cheio de sangue, inclinado sobre uma mulher que estava imersa no mesmo, com uma corda amarrado em torno de seus tornozelos. Quando ele correu para lá, viu que a outra ponta da corda estava pendurada em um ramo baixo de uma árvore próxima. - Parado cara ou você vira história! - Lou, quando estava na polícia tinha uma voz como se estivesse falando com um megafone - Fique longe da senhora.        O homem, o assassino, se endireitou. Ele tinha uma faca na mão enquanto recuava alguns passos e, em seguida, ele desceu, virou e correu para a floresta. - Cuida de Mary. – gritou Lou e correu atrás dele.

- Deus, eu odeio quando você faz isso. - Max se ajoelhou ao lado de Mary McLean - Oh, olhe para isso. - resmungou enquanto rasgava a blusa da mulher decidindo qual buraco cuidar primeiro. Mary já tinha perdido muito sangue. Max sabia perfeitamente bem provavelmente não haveria nenhum doador o bastante perto para ajudá-la. Ela correu para o carro em busca do kit de emergência que ela e Lou guardavam ali.    Deus sabia que eles tinham que parar o sangramento o suficiente para saber o que fazer. Pressionando ligaduras vigorosamente pressionou o 112 no seu celular e, em seguida, segure-o entre o ombro e o ouvido, para que pudesse usar as mãos para o prosseguimento dos trabalhos sobre Mary enquanto falava.        Stormy tinha telefonado para dizer que Dunst e Michael Gray estavam de caminho tomando rotas alternativas. Max, em seguida, disse ao operador do 112 para alertar o funcionário Dunst pelo rádio do que tinha acontecido e onde. Ela desligou o telefone, apesar do insistente "manter contato" do operador do telefone.

Mesmo enquanto trabalhava tampando uma ferida de faca após a outra, Max estava dolorosamente consciente de que embora evitasse que sangrasse, não podia fazer nada com nenhuma lesão interna, muito menos substituir o sangue que a mulher tinha perdido. Ela continuou a acompanhar no escuro bosque tentando encontrar algum sinal de Lou e do assassino. Não queria que o seu obstinado companheiro fosse a próxima vítima desse sacana.

       Então começou a ouvir um som de motor. Uma única luz veio com o som e, eventualmente, a moto se aproximou o suficiente para poder distingui-la claramente, esta derrapou até parar, caindo ao seu lado quando o motorista saltou para fora dela e foi em frente correndo. - Espero, por Deus, que você seja Michael Gray. - disse Maxine enquanto ele se aproximava correndo.        Ele demonstrou que era quando caiu de joelhos gritando:

- Meu Deus, não! Mary!        Max o agarrou pelos ombros vigorosamente, sacudindo-o. - Ela perdeu muito sangue, Michael. Não lhe cortou a garganta, mas tem muitas feridas de faca e estamos a milhas de um hospital. Eu chamei uma ambulância, mas vai demorar meia hora para chegar. Já fiz tudo que eu pude.        Ele ficou parado olhando os olhos de Max durante uma dúzia de batidas e pensou que ele a estava lendo muito bem. Então ele se libertou de suas mãos e trouxe a Mary a seu tórax, inclinando-se para lhe acariciar os cabelos. - O meu parceiro foi atrás de Tommy. Eu tenho que trazê-lo de volta. - disse Max - Agora é com você. Faça o que você achar melhor.

 

Michael sustentou Mary perto dele, podia sentir a vida escapando  lentamente de seu corpo.

Deus, não queria perdê-la.

- Michael...

Seu sussurro esquentou seu pescoço. Ele liberou-a um pouco, o suficiente para olhar seu rosto. Deus não permita que ela se assustasse mais com isso. Porém depois de tudo talvez tivesse medo... Dele.

- Tudo bem. Não te farei mal, Mary. Nunca poderia te fazer mal.

- Eu sei. – debilmente levou sua mão até sua bochecha - Já não dói. – sussurrou ela - Acho que estou morrendo, Michael.

- Agüenta. Chamamos uma ambulância. A ajuda está a caminho. – Deus, outra vez a revelação do que era conduzir a mulher que amava a morte. Não podia suportar.

As pálpebras de Mary se fecharam, porém ela voltou a abri-las outra vez.

- Tenho que te dizer... Explicar-te...

- Está bem. Economize suas forças. Não tem que explicar-me. Entendo porque fugiste.

Ela moveu a cabeça negando, parecia tomar-lhe um enorme esforço.

- Não. Eu não... Fugi. Eu só... Tinha que saber.

Ele franziu o cenho, sem entender.

- Tinha que entender... O que eras. O que isso significava. – ela fez uma pausa como se custasse respirar.

- Então foste a... Aquelas investigadoras? – doía que não tivesse ido a ele com suas perguntas - Poderias me ter perguntado, Mary. Teria te contado. O que quisesse saber.

- Eu não teria acreditado em nada do que tu me dissesses. – ela lutava para manter os olhos abertos, agarrando-se com unhas e dentes a consciência - Tinha que perguntar a alguém... Alguém a quem não amasse.

Ele fechou os olhos ante a talha de angústia em suas palavras. Ela o amava. Meu Deus, ela o amava.

- Perdi a noção do tempo. Porém voltava para ti, Michael. Voltava...

As lágrimas encheram seus olhos, turvando sua visão, enquanto ele se inclinava para mais perto, pressionando seus lábios nos delas. Quando levantou a cabeça, lhe sussurrou.

- Queria dizer que te amo, Mary. Porém essas palavras nem sequer começam a descrever o que sinto por ti. Isto é mais do que amor, ao menos mais além do que pensei que poderia ser o amor. É uma força mais poderosa que o céu e terra combinados.

- Eu sei. – disse ela. Sua voz mais débil agora. Tão débil que ele teve que inclinar-se para ouvir suas palavras - Sinto muito. – ela se deteve, respirando com força, como se as simples palavras sussurradas tomassem cada pedaço de sua força - A ambulância... Não chegará a tempo não é verdade, Michael?

Ele apenas podia falar porque um nó apertava sua garganta.

- Não. – e então se obrigou a continuar - Porém eu estou aqui. E que Deus me ajude, não quero te deixar ir, Mary.

Ela viu em seus olhos, sua própria força e determinação e com as últimas forças que tinha, levantou a cabeça e se obrigou a levantar suas últimas palavras no tom de voz mais forte que podia conseguir.

- Então, não deixe.

Então sua cabeça caiu de novo, e fechou seus olhos.

Ela queria dizer...? Oh, Deus, não podia estar seguro. As investigadoras lhe tinham explicado esta parte? Como poderia cometer este ato sem estar seguro?

Não tinha tempo. Mary morria. As batidas de seu coração, que ele podia sentir como se fossem os próprios, começaram a saltar e falhar. Sua respiração se deteve completamente.

Nem sequer tinha certeza de poder salvá-la nesse ponto.

Porém tinha que tentar.

A lâmina do assassino estava sobre o pavimento perto dos pés de Mary. Michael se estirou para ela, pegando-a, tomando sua decisão. Usando a ponta, cortou sua própria garganta. E então atraiu a Mary mais perto e pressionou seus lábios na fonte gotejante. Fechando os olhos, a obrigou a engolir.

E finalmente, depois do que pareceu um momento infinito, o fez.

Seu corpo estava rígido em seus braços e seus dentes se fundiram em sua pele em reação a rajada de poder que provava. E então ela relaxou e bebeu.

De repente, afastou a cabeça, seus olhos desmesuradamente abertos.

- Oh, Deus, oh, Deus, isto dói! Michael dói!

Ela a sustentou contra si.

- Eu sei. Sinto muito meu amor, sinto muito. Sentimos tudo mais intensamente que os mortais, inclusive a dor.

Ela gritou, sua cabeça arqueando-se para trás, as veias de seu pescoço tensionaram.

- Q... Quanto tempo?

- Até o amanhã. Só até o amanhã. Então dormirás e sararás.

A mulher, Maxine, e o homem que ele supunha era seu companheiro surgiram do bosque enquanto Mary se retorcia e gemia em agonia. O homem sustentava a Tommy em um férreo aperto. Maxine se adiantou apressadamente e se acocorou ao lado de Michael, seu olhar fixo ia dele a Mary, que apertava os dentes contra a dor.

- Michael, podemos te ajudar. A ambos. Pega a maleta médica e traz aqui.

Michael olhou para onde ela apontava, descobrindo a enorme caixa branca sobre o pavimento do outro lado de Mary e o trouxe tão rápido como pode.

- Não sei o que podes fazer por ela. – disse ele pondo a caixa ao lado de Maxine - Eu... Ela...

- Ela é agora uma de vós. Posso vê-lo, Michael. – ela segurou uma tira de pano quadrado em sua mão - Ponha isso sobre o corte do pescoço. Está sangrando.

O pegou e fez o que lhe sugeriu e observou a Maxine trabalhar. Ela pegou uma agulha hipodérmica de uma caixa de celofane, lhe tirou a tampa e logo pegou um frasco e inseriu a agulha até o final.

- O que é isso? O que fazes?

Ela estava absorta em seu trabalho, inclinando a ampola ao contrário, fazendo entrar o fluído nela.

- Alguma vez ouviu falar do DPI, Michael?

Ele assentiu.

- Costumavam caçar-nos. – disse ele.

- Também os usavam como cobaias. Consegui pegar alguns de seus arquivos há vários anos. Sua investigação tem resultados malditamente úteis. Esta matéria, por exemplo. – ela retirou a agulha do frasco, batendo no corpo da seringa várias vezes com os dedos - Isto é um tranqüilizante que inventaram para manter seus prisioneiros sedados... É o único que existe e que funciona com os vampiros. Vou administrar nela uma pequena dose. Descansará tranqüila até que chegue a saída do sol.

Michael olhou da mulher para o homem. Podia confiar neles?

Mary gritou, e ele sabia que a dor estava além de sua resistência.

- De acordo. – disse ele - Faça-o.

Maxine assentiu e se inclinou sobre Mary, injetando-a rapidamente e experientemente. Imediatamente a face de Mary se aliviou. Relaxou o corpo, soltando um forte suspiro.

- Oh, obrigada. Obrigada. – sussurrou ela.

Maxine sorriu enquanto colocava um band-aid sobre o lugar da injeção.

- Vai dormir em uns minutos. A próxima vez que despertar, estará bem. Prometo. De acordo?

- Sim.

Max se voltou para Michael.

- Leve-a a algum lugar seguro. Observa essas feridas até amanhã. Se começar a sangrar outra vez, ainda podemos perdê-la.

- Não a deixarei nem um minuto.

- Cuidaremos da motocicleta. - continuou ela – Pode recolhê-la amanhã à noite. Mary sabe onde estamos.

Ele concordou, mais agradecido do que se podia imaginar. Então ele lançou um olhar ao preso.

- O que acontecerá a Tommy?

- Tommy irá para a prisão. – disse Lou - Ou talvez ao hospital psiquiátrico. De uma ou outra maneira, não voltará a ver a luz do dia. Mary é agora uma pessoa desaparecida e a polícia está a caminho enquanto falamos. Inclusive sem um corpo há bastante sangue aqui de Mary para convencê-los de que não poderia estar viva. Muito do qual está sobre o garoto Tommy. Não será culpa nossa que se negue a dizer o que fez com o corpo. Ele a espreitava, fingiu sua própria morte. Não tenho a menor dúvida de que as investigações o relacionarão também com os outros assassinatos.

- Não podem fazer isso. – resmungou Tommy - Eles não podem viver.

- Sim podem, amigo. – disse Maxine - Inclusive felizmente, se me perguntas.

Ela recolheu seu equipamento médico e o colocou no carro enquanto Lou colocava a Tommy no assento de trás. Então voltou a motocicleta, a endireitou e subiu nela. Lou arrancou o carro com o preso, e Max os seguiu na moto, montando como se fosse sua.

Com tanto cuidado como pôde, Michael pegou a Mary nos braços e a levou ao Jaguar.

- Os bancos ficarão perdidos com meu sangue. – sussurrou ela. Suas palavras pastosas, caindo rapidamente na inconsciência... Não de morte como antes, senão na do sono. Um sonho indolor e descansado.

- Não me preocupam os bancos, Mary. – Ele abriu a porta e a colocou sobre o lado do passageiro acionando o controle para baixar o apoio do assento, até recliná-lo.

- Como vai?

- Mmm. – Ela suspirou - Me sinto tão estranha, Michael. Tudo parece... Diferente.

- Tudo é diferente. – ele passou a mão através do cabelo – Agora você é diferente. Entende isso, Mary?

Ela assentiu.

- É o que eu queria.

- Não estava seguro.

Sorrindo de lado, disse:

- Eu sei. Porém te amo, Michael. E não sou como ela... Não quero morrer, antes prefiro aceitar algo novo e diferente. Quero viver. Quero te amar por tanto tempo como o universo me deixe. Sempre, se for possível.

- Quando você descobriu? – sussurrou ele, sacudindo lentamente a cabeça. Como consegui ser tão afortunado para te encontrar?

- Não acredito que a sorte tenha nada a ver com isto.

Ele só a beijou, longa e lentamente.

- Dorme, meu amor. Quando despertar, vou te mostrar todo um novo mundo.

Ela sorriu suavemente e deixou que seus olhos se fechassem.



 

[1] (*)Dixie faz referencia a canção popular: “You ain't just whistlin' Dixie”. (Você não está simplesmente falando ou mantendo uma conversação trivial, o que dizes é algo importante, que vale a pena). De: “Whistli'n Dixie: um dicionário de expressões sulinas” por Robert Hendrickson (livros de bolso, New York, 1993)

[2] Bebida que deixa o usuário desvairado, enlouquecido, pirado.

 

                                                                                            Maggie Shayne

 

 

                      

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