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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


Risco Infinito / Kurt Brand
Risco Infinito / Kurt Brand

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

Risco Infinito

 

Os pos-bis desconhecem a palavra amizade?...

Estamos no ano 2.213 do calendário terrano. Quer dizer que para o homem do planeta Terra menos de cento e cinqüenta anos se passaram desde que o primeiro foguete de propulsão química conseguiu pousar na Lua, dando início à verdadeira navegação espacial.

Esse tempo é extremamente curto, se medido pelos padrões cósmicos, mas o Império Solar, criado e dirigido por Perry Rhodan, conseguiu transformar-se numa das vigas mestras do poder galáctico.

Naturalmente, os terranos encontraram colaboradores importantes na execução da tarefa por eles mesmos proposta. Basta mencionar o arcônida Crest, o Ser energético de Peregrino, Atlan, Harno, os swoons e Gucky, o rato-castor. Mas a tarefa nunca poderia ser cumprida se não fosse a atividade desinteressada e a capacidade de sacrifício de todos os terranos, que trazem no coração o anseio de atingir as estrelas.

A nova ameaça vinda do intercosmo, ou seja, do espaço situado entre as galáxias, traz um problema quase insolúvel para os dirigentes. Como combater um grupo de agressores cujas espaçonaves são praticamente indestrutíveis?

Os primeiros dados para a solução desse angustiante problema já foram descobertos pelos robólogos, e o Assalto à Galáxia, iniciado pelos robôs positrônico-biológicos, também conhecidos como pos-bis, pôde ser interrompido por um truque, no momento em que os mundos centrais de Árcon estavam para ser atingidos pela onda de destruição.

Entretanto um risco continuava a existir... um Risco Infinito...

 

                                               

 

O relógio-calendário da Teodorico marcava o dia 2 de agosto de 2.113, tempo terrano. Segundo o tempo padrão, válido para o Império Solar e o Império de Árcon, eram 16:18 h. Fazia pouco mais de duas horas que Perry Rhodan se transferira para a nave fragmentária dos pos-bis, juntamente com Kule-Tats, um biólogo ara, e o robólogo Moders.

Há oito horas a luta das frotas unidas contra as naves da raça de robôs tivera um fim provisório. Todas as naves fragmentárias que haviam penetrado no grupo estelar M-13 suspenderam no mesmo segundo o fogo de radiações, e interromperam seu vôo em direção a determinados objetivos.

Agora mantinham-se imóveis, mas sob a proteção dos campos relativistas regulados para o tempo atual.

A nave fragmentária em cujo interior se encontrava Perry Rhodan era a única que não dispunha mais do campo defensivo, que podia ser deslocado até dez horas no futuro. O teleportador Tako Kakuta abrira a comporta principal, e com isso o campo defensivo foi desligado automaticamente.

Reginald Bell, que permanecera a bordo da Teodorico, não conseguia afastar-se do microfone do hipercomunicador. Utilizando a ligação coletiva, entrara em contato com todas as naves das frotas unidas. Vivia martelando a ordem para que, em hipótese alguma, os comandantes atacassem uma nave fragmentária.

Desejava-se que o armistício, alcançado literalmente na última hora, levasse a um entendimento pacífico com a raça de robôs vinda do espaço intercósmico. Bell também se comunicou com as centrais dos mercadores galácticos, com os setores de comando dos superpesados, com todos os povos coloniais ativos do Grande Império, dizendo-lhes a mesma coisa que já ordenara aos comandantes das unidades.

Há várias horas fazia três coisas diferentes ao mesmo tempo. Pelo telecomunicador transmitia ordens e instruções, lia os relatos mais importantes e recebia as notícias sobre os acontecimentos que se desenrolavam na nave fragmentária apresada.

O epsalense Jefe Claudrin, que entrou várias vezes na sala de comando, espantou-se com o domínio completo que Bell exercia sobre a situação.

Pouco antes das 17 horas, quando Perry Rhodan deixou a nave fragmentária e voltou para bordo de sua nave capitania, Bell já havia liquidado os casos mais importantes. Exausto, fitou Perry Rhodan, cujo rosto também apresentava sinais das canseiras dos últimos dias. Apesar disso parecia muito mais disposto que seu amigo ruivo.

— Podemos respirar aliviados, Bell, mas não devemos dar-nos por satisfeitos com a situação. O fio de seda pelo qual pende o destino da Galáxia é fino demais. Não estou satisfeito com a ligação parapsicológica estabelecida com o detentor do poder de comando no intercosmo, nem com a comunicação pelo hiper-rádio. Receio que tanto a estação de rádio como nós mesmos acabamos por não atingir o assunto que realmente interessa. A idéia de que uma palavra errada poderá voltar a desencadear o ataque não me deixa sossegado.

A palestra estava sendo realizada na grande sala de comando da Teodorico. Bell respirava nervosamente.

— Os dois especialistas que se encontram na nave dos pos-bis não fizeram nenhuma observação?

— Não disseram nada de importante. O plasma que se acha nas abóbadas não permite nenhuma experiência. E não se pode dizer até que ponto compreende nossos pensamentos. Por isso não podemos fazer qualquer desmontagem no setor de comando dos raios conversores, a fim de descobrir o segredo dessa arma.

— Será que estou enganado, Perry? Você não está satisfeito com o resultado da experiência? Não conseguimos mais do que esperávamos?

Rhodan sacudiu a cabeça.

— O que conseguimos não basta. Quem dera que descobríssemos o que a bio-substância entende por “verdadeira vida”! Nenhum especialista sabe dar-me uma explicação definitiva sobre os motivos pelos quais os robôs estão apaixonados por tudo que é maquinai. Mas no momento não vale a pena falar sobre isso. Como vai indo a evacuação dos planetas ameaçados, gordo?

— Vem sendo realizada a alta velocidade, exatamente de acordo com o plano. Os superpesados também participam da operação. Nem preciso pedir. Atlan retira as unidades da frota até a distância de um ano-luz e as vem reagrupando em conformidade com a situação.

Perry Rhodan acenou com a cabeça.

— Voltaremos à Terra com a Tóquio. A Teodorico tem de ficar aqui, e os telepatas também. Já informei John Marshall a este respeito. Claudrin também está informado sobre a tarefa que deverá cumprir. Está na hora, Bell.

Quando chegaram à sala de comando, o transmissor acônida que os levaria à Tóquio já estava funcionando.

Poucos minutos depois de terem subido a bordo, a nave esférica da classe Cidade começou a acelerar, e pouco depois desapareceu no semi-espaço, em direção à Terra.

 

No dia seguinte, todas as transmissoras de grande potência do Império Solar e do Império de Árcon interromperam suas programações, a fim de transmitir uma notícia importante vinda de Terrânia.

Perry Rhodan, Administrador do Império Solar, foi visto em muitas telas e ouvido em muitos aparelhos.

Perry Rhodan falou aos povos galácticos sobre a raça de robôs, vinda do intercosmo, e suas naves fragmentárias. Não ocultou mais nada. Relatou com minúcias a circunstância de que os pos-bis eram seres mecânicos semi-orgânicos dotados de tendência para o aprendizado. Falou nos comandantes de plasma das naves fragmentárias, nas suas faculdades parapsicológicas e na teoria elaborada pelos especialistas, segundo a qual a bio-substância em certas quantidades, poderia ser dotada de inteligência.

Sem dramatizar, retratou o perigo em toda sua grandeza. E não teve dúvida em apontar a relação numérica entre a frota dos pos-bis e as frotas unidas como sinal de inferioridade das forças da Galáxia.

Nem mesmo o homem mais simples deixaria de compreender o perigo que penetrara na Via Láctea, vindo do espaço sem estrelas, situado entre duas galáxias.

— Não sabemos o que nos reserva a próxima hora — prosseguiu Rhodan. — Por isso cabe-nos tomar todas as precauções, a fim de evitar o sacrifício de vidas humanas. Mas, se não contarem com o apoio de todos, os governos do Grande Império e do Império Solar serão impotentes. Por isso faço um apelo, em nome do imperador e na minha qualidade de administrador. Peço a todos os donos de espaçonaves que se apresentem a fim de ajudar na evacuação dos planetas ameaçados.

“Há necessidade de uma ajuda imediata e desinteressada. O estado de emergência reina em nossa Galáxia. Os que estiverem prontos a ajudar não devem esquecer-se de que as frotas unidas não se encontram em condições de destruir quinhentas naves fragmentárias, ou expulsá-las de nossa Galáxia. É só o que tenho a dizer.”

O apelo de Perry Rhodan não foi feito em vão.

Dali a cinco horas, Árcon I apresentou os primeiros resultados. Depois de sua exposição esclarecedora e de seu apelo, cinqüenta mil donos de espaçonaves se haviam apresentado. Parte dos seus grupos de unidades já haviam entrado em ação, a fim de levar milhões de habitantes dos planetas coloniais a lugares relativamente seguros.

A maior operação de resgate da História Galáctica estava sendo iniciada.

Em Terrânia, os debates sobre a situação sucediam-se ininterruptamente. Os técnicos em armamentos trabalhavam a toda força. Os restos de naves fragmentárias parcialmente destruídas foram levados à Terra. Esperava-se que um acaso feliz permitisse a descoberta dos equipamentos que produziam os raios conversores.

As naves arcônidas e terranas não tinham nada que se pudesse comparar a essa arma.

Os pos-bis usavam o raio conversor para transportar, à velocidade da luz, bombas atômicas cuja potência ia até cem gigatons. Durante o transporte por mero do raio, essas bombas eram desmaterializadas, e só se rematerializavam perto do alvo. Geralmente a energia liberada era suficiente para romper os campos energéticos superfortes dos gigantes esféricos de mil e quinhentos metros de diâmetro.

Alguém já designara o raio conversor como a arma definitiva, mas Rhodan não concordou com essa designação, pois defendia a tese de que para qualquer nova arma de ataque não demorava a ser inventada a respectiva arma defensiva. Acontece que os terranos ainda não sabiam como os robôs semibiológicos conseguiam realizar a maravilha técnica de desmaterializar uma bomba no início de sua trajetória para rematerializá-la junto ao alvo.

Perry Rhodan nem sequer chegou a sentir-se decepcionado quando o chefe da divisão de pesquisa de armamentos o avisou sobre o resultado negativo dos trabalhos. Em compensação houve um progresso espantoso em outro setor.

A central dos swoons acabara de avisar a administração sobre a construção de um aparelho. A pessoa encarregada do assunto achou que a notícia era tão importante que resolveu transmiti-la diretamente a Perry Rhodan.

Este leu-a e ordenou imediatamente que um desses aparelhos lhe fosse apresentado. Ainda determinou que Oligo e Petid, os construtores pertencentes à raça dos swoons, lhe explicassem o funcionamento.

Os swoons eram considerados os melhores microtécnicos do Universo. Descendiam de um grande grupo que há muitos decênios abandonara Swoofon, seu mundo natal, situado a 192 anos-luz da Terra, a fim de colocar-se a serviço de Perry Rhodan.

Tinham trinta centímetros de altura e seu aspecto não tinha nada de humanóide. Seu formato lembrava um pepino com dois pezinhos. Em vez de dois braços possuíam quatro, que terminavam em mãos extremamente hábeis.

Os homens-pepino estavam em condições de modificar à vontade a distância focai das lentes de seus olhos, transformando seus órgãos de visão em microscópios de alta potência. Por isso, e ainda por causa de suas mãos pequenas e extremamente ágeis e de um sentimento inato para tudo quanto era técnico, eram inigualáveis como construtores de microaparelhos de elevada potência.

Rhodan dirigiu-se à hora marcada ao recinto da divisão física em que Oligo e Petid deveriam comparecer com o novo aparelho.

Estavam sentados em cima de um transformador de dez centímetros de altura, colocado sobre uma mesa de plástico que tomava toda a parede; encontravam-se entre aparelhos que à vezes tinham o dobro do seu tamanho. Levantaram-se quando Rhodan entrou, cumprimentou os físicos e biólogos, que se encontravam presentes, e dirigiu ao lugar em que estavam os swoons. Oligo segurava um aparelho de um centímetro na mão direita inferior. Diante do olhar encorajador de Rhodan, animou-se a falar.

— Senhor, este aparelho produz vibrações celulares. A potência de todas as freqüências pode ser regulada. Mas o que há de notável neste aparelho não é isto; é o fato de que ele nos permite produzir as vibrações individuais dos laurins.

Os físicos e biólogos inquietaram-se. Os dois swoons notaram o sorriso de Perry Rhodan. Mas, quando o administrador se virou para os cientistas nervosos, parecia novamente sério e objetivo.

— Será que os senhores duvidam das informações de Oligo?

Oito homens procuraram falar ao mesmo tempo. Quem acabou tomando a palavra foi o professor Indrha.

— Sir, isso é uma tolice. Os swoons podem afirmar muita coisa, mas não estamos em condições de verificar a exatidão de afirmativas como esta. Afinal, o que sabemos a respeito dos invisíveis? Menos que a respeito dos pos-bis.

— É verdade — disse Rhodan. — O senhor ainda agora estaria com a razão, se o Imperador Gonozal VIII não tivesse realizado pesquisas bastante esclarecedoras durante a batalha com as naves-pingo dos laurins.

— Durante a batalha? — perguntou o idoso professor, sacudindo a cabeça num gesto de incredulidade.

Rhodan não se zangou com a incredulidade do especialista, cujo espírito pairava longe das realidades deste mundo. Indrha nunca tivera a experiência de um vôo pelo Universo e nem imaginava que as grandes belonaves também eram laboratórios de pesquisa muito bem equipados.

— Naturalmente, durante a batalha, professor. Na oportunidade também se realizaram medições sobre as vibrações individuais dos laurins. Na sucessão extremamente rápida dos acontecimentos o tempo foi relativamente escasso. Apesar disso os resultados foram surpreendentes — dirigiu-se a Oligo e Petid. — Os dados mais recentes estão aqui?

— Sim senhor — respondeu Petid, enquanto sua mão direita superior apontava para uma pilha fina de folhas de plástico.

Dali a meia hora, o minúsculo aparelho denominado vibrador celular foi testado por Oito cientistas.

Três horas depois Perry Rhodan levantou os dois eufóricos swoons de suas mesas de trabalho e voltou a agradecer pelo serviço que tinham prestado.

O professor Indrha exprimiu com uma única palavra sua opinião sobre o vibrador celular:

— Incrível!

O Dr. Illertissen fez mais uma pergunta.

— Sir, por que o senhor deu ordem para que este vibrador celular seja fabricado em série, e que a fabricação seja iniciada imediatamente?

Havia uma expressão séria nos olhos cinzentos de Perry Rhodan.

— O senhor se esqueceu dos pos-bis? Esqueceu-se de que estes e os laurins talvez sejam inimigos há tempos imemoriais? Esqueceu-se de que nossa Galáxia é ameaçada por quinhentas naves fragmentárias? Se a luta recomeçar, talvez enviemos naves robotizadas para a periferia das zonas de batalha, e essas nave levarão centenas destes vibradores celulares. Cada um dos aparelhos, regulado para a potência máxima, será um chamariz para os pos-bis. Com isso os desviaremos das nossas naves, fazendo com que acreditem que seus inimigos mortais, os laurins, vivem nas naves robotizadas.

— Face ao alcance fantástico destes minúsculos aparelhos — disse o professor Indrha, em tom de perplexidade — estou convencido de que os pos-bis se precipitarão com toda a força sobre nossos chamarizes.

— Perfeitamente — concordou Rhodan. — Acontece que estes vibradores celulares não representam um meio de destruirmos as naves fragmentárias. No fundo, apenas são uma palha à qual se agarra a pessoa que morre afogada. Boa noite, senhores.

Retirou-se e, ao chegar a seu gabinete, encontrou Reginald Bell.

— Perry, o Grande Conselho enviou uma mensagem. Uma delegação que dispõe de todos os poderes está a caminho. Atlan encarregou nosso amigo Tiff de assinar em seu nome...

— Faça-me um favor — disse Rhodan, interrompendo o amigo. — Conte tudo na devida ordem, gorducho.

Bell acendeu outro cigarro, caminhando tranqüilamente de um lado para outro.

— O Sistema Azul está disposto a celebrar conosco, e também com Árcon, uma aliança de igual para igual. Pedi a confirmação por três vezes, pois desconfiei de que me tivesse enganado. Mas não houve nenhum engano, Perry. Bem, o resto já contei.

Rhodan não demonstrou alegria nem surpresa. Bell percebeu e ficou espantado.

— Será que você confia menos nos acônidas do que eu? — perguntou.

Rhodan sacudiu a cabeça.

— Não é isso. Apenas, não estou satisfeito com aquilo que eles nos oferecem. O que significa de igual para igual? Mas antes de mais nada ouçamos o que a delegação tem a dizer. Quando chegará?

— Já deveria...

Bell foi interrompido por uma notícia vinda do porto espacial. O grupo de plenipotenciários acônidas acabara de chegar numa nave da Frota Solar.

— Aqui fala Rhodan. Transmitam uma mensagem ao comandante. Ele deverá reter a delegação na nave até minha chegada.

Ao virar a cabeça para Bell, parecia contrariado.

— Você deveria ter-me avisado imediatamente. Não se lembrou de enviar alguns representantes da administração ao porto espacial, a fim de receber os acônidas?

— Não. Acho isso ridículo.

— Você irá comigo. Os acônidas serão recebidos por nós. Se Soolas participar da delegação, você não o deixará perceber o que pensa a respeito dele.

— Isso não depende de mim, Perry.

No momento em que o planador pousou, Rhodan anunciou pelo rádio que se encontrava à frente da nave. Quase no mesmo instante, uma das comportas abriu-se, e a rampa desceu automaticamente entre as colunas telescópicas de apoio.

Veículos aproximavam-se velozmente, vindos do edifício da administração. O chefe do porto espacial reconhecera a situação e estava agindo de acordo com a mesma. Antes que a rampa ficasse parada, viram-se cercados de ambos os lados por fileiras de veículos. Os ocupantes desceram e mantiveram-se imóveis, em posição de sentido.

Bell e Rhodan esperaram no final da rampa. Uma enorme fila humana saiu da comporta.

— Santo Deus! — exclamou Bell. — Isso até parece uma invasão acônida. São várias centenas.

Eram quatrocentas e vinte e oito pessoas.

Soolas não estava entre as mesmas.

Rhodan e Bell aguardavam quatorze diplomatas na grande sala de conferências, para os primeiros contatos, embora fosse quase meia-noite.

Um robô anunciou os acônidas. Todos os quatorze homens pertencentes ao grupo pareciam inseguros.

De repente apareceram robôs, que conduziram os acônidas a seus lugares. Rhodan cumprimentou os presentes em poucas palavras. Não fez a menor alusão ao perigo vindo do intercosmo. Em compensação apresentou o Marechal Julian Tifflor, Embaixador do Império Solar em Árcon I, que exercia as funções de plenipotenciário do Imperador Gonozal VIII.

Bell observava atentamente os acônidas. Quando Rhodan falou em Árcon, os rostos dos ancestrais dos arcônidas permaneceram impassíveis. Ignoraram Julian Tifflor.

Depois de Rhodan falou Oolris, um acônida idoso, que não era apenas o dirigente do grupo de quatorze, mas o chefe da gigantesca delegação que Bell designara como uma “invasão acônida”.

A alocução de Oolris, que não continha frases bombásticas, transmitia a oferta do governo acônida.

Bell respirava pesadamente. Julian Tifflor fitou Oolris com uma expressão de perplexidade. Perry Rhodan não demonstrou sua surpresa.

A oferta do Grande Conselho era extraordinária!

 

O biólogo Kule-Tats e o robólogo Van Moders permaneciam a maior parte do tempo a bordo da nave fragmentária. Utilizando seus conhecimentos sobre os pos-bis, procuraram investigar o funcionamento do comandante de plasma, composto de seis partes. Uma equipe de engenheiros deveria ajudá-los.

Mas a experiência fracassou no estágio inicial, pois os especialistas não conseguiram pôr as mãos nos controles que ligavam o plasma guardado sob as seis abóbadas com os mecanismos positrônicos. Para chegar ao comando, seria necessário destruir outras peças. Mas isso por certo aborreceria o plasma e colocaria em perigo o instável armistício.

Não havia ninguém que estivesse disposto a assumir esse risco.

Mas Moders e Kule-Tats sentiam-se atraídos constantemente por essa nave dos pos-bis. Devia haver algum lugar em que os controles estivessem à vista. Mas, por mais vezes que percorressem a nave cúbica, não descobriram nada e sempre voltavam à nave capitania sem que tivessem obtido o menor resultado.

Uma das faixas de ondas da estação de hiper-rádio da Teodorico funcionava ininterruptamente há alguns dias. Enviava uma mensagem simbólica para as profundezas do intercosmo:

— Pertencemos à verdadeira vida porque somos orgânicos como você e vivemos em comunhão com máquinas.

O contato subseqüente com a estação desconhecida dos pos-bis funcionava em base parapsicológica è dificilmente seria compreendido por um homem normal.

Um grupo de telepatas que se encontrava a bordo da Teodorico irradiava em seqüência ininterrupta a mensagem simbólica por via telepática, em direção ao comandante de plasma da nave fragmentária. Este, por sua vez, usava um contato telepático para transmitir a mensagem recebida dos orgânicos em direção à estação situada no intercosmo.

Além disso a grande quantidade de plasma guardada na sala de comando transmitia outras paravibrações, que nem Marshall e nem qualquer dos outros mutantes conseguia interpretar claramente. Apenas se sabia que a bio-substância trazida da Terra havia estabelecido um estreito contato com a porção de plasma que se encontrava na nave dos robôs. E não havia dúvida de que suas informações sobre os orgânicos — os humanos — eram positivas. Devia ter sido principalmente por causa dessa substância que o ataque das quinhentas naves fragmentárias fora suspenso de repente. Há alguns dias um armistício estranho e inquietante reinava no grupo estelar M-13.

A chegada da grande delegação acônida enviada à Terra foi muito comentada. Jefe Claudrin, que por acaso conversava com Kule-Tats e Moders, apenas disse como quem se sente libertado de uma terrível pressão:

— Até que enfim!

A reação do ara foi diferente:

— O que pensarão os acônidas e principalmente o Grande Conselho, quando descobrirem que estou trabalhando para o Império Solar?

O epsalense soltou uma estrondosa gargalhada.

— Deixe isso por conta de Perry Rhodan. Ele saberá dar uma boa explicação aos acônidas. O que mais me interessa é saber se os acônidas estarão dispostos a reconhecer o Império de Árcon como unidade política.

Kule-Tats, que conhecia muito bem a mentalidade dos ancestrais dos arcônidas, afirmou:

— Eles reconhecerão Árcon. O motivo da reviravolta é evidente. Não é por sentimentos altruístas que de repente resolvem mostrar seu lado bom. Foi exclusivamente o perigo dos pos-bis que os obrigou a se aliarem com a Terra e com Árcon. Preferem reconhecer o Império Solar como parceiro de igual para igual e perdoar aquilo que chamam de traição dos arcônidas emigrados a submeter-se ao regime de força de uma raça de robôs semibiológicos.

— Quer dizer que teremos uma amizade forçada com o Sistema Azul — constatou Van Moders.

— Quase isto... — confirmou o ara. — Entretanto o que importa é que dessa forma criar-se-á um estreito contato entre a Terra e os acônidas, pelo menos enquanto durar o perigo dos pos-bis. Espero que vocês saibam aproveitar esse tempo para fazer com que eles compreendam que a união de todos os povos da Via Láctea representa, agora mais do que nunca, uma necessidade vital.

— Bem — disse Moders, em tom pensativo. — Acônidas e arcônidas. Eles têm uma coisa em comum: o orgulho. Será que os primeiros conseguirão realizar uma adaptação tal que com o tempo se possa confiar nas alianças celebradas com eles?

Um sorriso matreiro surgiu no rosto de Kule-Tats.

— Até parece que o senhor não confia muito no chefe, Moders — disse. — Acredito que um dia os acônidas se sentirão felizes por reconhecerem Perry Rhodan como Administrador do Império Solar.

— Espere aí — disse Moders. — Isso é mais difícil de entender que um comando H positrônico. Quem reconhecerá quem?

O biólogo ara fitou-o com um sorriso.

— O senhor compreendeu perfeitamente o que eu disse, Moders. O Sistema Azul sofrerá o mesmo destino do Império de Árcon. Transformar-se-á numa colônia do Império Solar, governada por Perry Rhodan.

— Ora veja! — disse o epsalense com sua voz trovejante. — Até parece que para o senhor nós, os homens do Império Solar, somos caçadores de escravos bem-sucedidos, Kule-Tats.

— Antes pelo contrário, Claudrin. Justamente porque não ando ocupado exclusivamente com minha profissão, mas também acompanho com o maior interesse a evolução política e econômica, estou em condições de dizer que o primeiro homem na História Galáctica que conquistou um império “sem guerra” é Perry Rhodan. E ele acabará conquistando o Sistema Azul da mesma maneira. Os acônidas governados por Perry Rhodan não se sentirão escravizados, da mesma forma que os povos do Império de Árcon não se sentem.

— O que acontecerá se o Imperador Gonozal VIII ouvir isso? — perguntou Moders.

Claudrin, que conhecia perfeitamente o imperador arcônida, soltou uma estrondosa gargalhada.

— Atlan diria que o senhor tem razão, Kule-Tats. Ele gostaria de despir-se o quanto antes de sua dignidade de imperador.

Claudrin foi chamado pelo sistema de intercomunicação. A Tóquio, uma nave da classe Cidade, informou que era obrigada a retirar-se por ordem de Atlan, a fim de voltar para junto do grupo ao qual pertencia.

Jefe Claudrin estava num beco sem saída. Será que a ordem de Atlan devia prevalecer sobre as instruções de Perry Rhodan, segundo as quais a Tóquio deveria vigiar a nave fragmentária juntamente com a Teodorico?

Van Moders, o jovem cientista cheio de idéias, teve mais uma.

— Claudrin, retenha a Tóquio até que eu volte a entrar em contato com o senhor.

Saindo do camarote do comandante, correu pelo amplo convés, em direção aos alojamentos de John Marshall.

O chefe dos mutantes levantou os olhos, espantado, quando o robólogo entrou correndo.

Moders falava uma frase após outra. Marshall acenou com a cabeça. O ar tremeu à frente do cientista, e Gucky, que fora convocado por via telepática, apareceu de repente.

— Informe Claudrin, Moders. Estamos preparados.

Moders ligou o intercomunicador.

— Aqui fala Moders, Claudrin. A Tóquio pode afastar-se. Nossa experiência está em andamento.

Kule-Tats ainda se encontrava em companhia do epsalense. Claudrin dirigiu-lhe uma pergunta:

— Tem alguma idéia de qual seja a experiência que Moders está realizando desta vez?

O ara respondeu que não.

— Também estou curioso para saber o que bolou — disse.

Enquanto isso, Marshall e Gucky se haviam introduzido nas paravibrações do comandante de plasma. O sistema de localização da nave fragmentária, que para os terranos continuava a ser um livro fechado a sete chaves, voltara a trabalhar há dias, conforme se constatara.

Pelo sistema de intercomunicação de bordo, regulado para um quarto do volume, ouviram Jefe Claudrin dar permissão para que a Tóquio se afastasse.

Sentado numa poltrona, Moders observava os dois telepatas tão diferentes no aspecto exterior. Gucky, que geralmente gostava de brincar, dedicava-se de corpo e alma à sua tarefa. O rosto um tanto magro de Marshall mostrava sinais de extremo cansaço.

A Tóquio voltou a chamar. Informou que partiria dentro de dez segundos.

Os dez segundos passaram.

Van Moders prendeu a respiração.

Instantes depois, a Tóquio penetrou no semi-espaço. Com isso a experiência chegou ao fim. Moders teve certeza disso porque o rosto de Marshall descontraiu-se. O mutante recostou-se lentamente em sua poltrona. De repente Gucky exibiu o dente-roedor.

— Essa coisa gosmenta se diverte! — disse.

Marshall lançou um olhar para o robólogo.

— Gucky tem razão. No momento em que a Tóquio iniciou sua viagem e se afastou da nave cúbica, houve um reforço das vibrações do setor sentimental do plasma que, numa aproximação grosseira, identificamos como impulsos de alegria.

— A bio-substância também irradiou uma paramensagem — afirmou Gucky. — Foi tão breve que não consegui captar nada.

Marshall não se admirou de que até mesmo essa observação lhe tivesse escapado. Por outro lado, unha certeza absoluta de que as observações de Gucky eram corretas.

— Então, mister Moders, está satisfeito com a experiência?

Moders esfregou as mãos. Estava radiante.

— Com isso conseguimos avançar mais um pequeno passo. Se não houver nenhuma pane, um dia destes estaremos conversando com o gigante de plasma que se encontra no intercosmo.

— Com o gigante? Mister Moders, o senhor ainda mantém a teoria de que o centro de comando dos pos-bis, do qual partem todos os impulsos orientadores, é uma montanha de plasma?

— É mesmo uma montanha, Marshall.

É somente em quantidades gigantescas que o plasma se torna inteligente, que seu nível de inteligência lhe permite atingir nosso Q.I. Permite que eu me retire? Preciso discutir o assunto com Kule-Tats.

Foi o que Moders fez. Mais uma vez a palestra foi realizada no camarote do Comodoro Jefe Claudrin. Este acompanhou a palestra. De repente protestou.

— Esperem aí. Não podemos continuar assim. Terei problemas com o chefe. Não posso agir sem consultá-lo.

Kule-Tats confirmou com um gesto, mas Moders ergueu as mãos.

— Claudrin, quem dera que o senhor tivesse ao menos uma idéia pálida das conexões positrônicas. Mas paciência. Do jeito que estão as coisas não teremos outra alternativa senão entrar em contato com o chefe.

— Não permito. Em Terrânia são quatro horas e trinta minutos. O chefe está dormindo.

— Nesse caso terá que ser acordado — disse Moders, com a maior calma. — Claudrin, será que o senhor realmente não compreende, ou apenas faz de conta?

— Escute, jovem — disse a voz potente do epsalense. — Não permito que ninguém fale comigo desse jeito. Se eu lhe digo que ninguém chamará o chefe, então ninguém o chamará. Entendido?

Kule-Tats procurou apaziguar os ânimos.

Mas Moders não se deixou influenciar. Lançou um olhar penetrante para Claudrin.

— Preste atenção ao que vou dizer, mister Claudrin. O senhor chamará Perry Rhodan. Não poderá deixar de fazê-lo, pois, do contrário, ele o rebaixará. Preciso saber o quanto antes se o chefe concorda em que todos os membros do comando, com exceção de um pequeno grupo de vigilância que permanecerá na sala de comando, saiam da nave fragmentária. Preciso saber se, diante da retirada de nossos homens, a reação do comandante de plasma em seu paracampo será tão positiva quanto foi a que se verificou há pouco, por ocasião do afastamento da Tóquio.

“Esta experiência não representa o menor risco. Claudrin, o que será de nosso comando que se encontra a bordo da nave fragmentária se o plasma ordenar aos pos-bis que destruam os orgânicos? Menos de cem pessoas sairiam vivas da Teodorico. Então? Posso entrar em contato com o chefe?”

Jefe Claudrin ainda permanecia indeciso. Não deixava de reconhecer a importância da experiência de Van Moders, mas sabia melhor que qualquer outra pessoa o quanto Perry Rhodan vivia sobrecarregado mesmo se encontrando em Terrânia.

Moders continuava a fitar o gigantesco epsalense, e havia algo de coercitivo em seu olhar. Mas Jefe Claudrin não permitia que ninguém o coagisse, nem mesmo um cientista de renome.

Kule-Tats interveio na discussão.

— É possível que, para a central de plasma do intercosmo, a retirada do comando que se encontra a bordo da nave fragmentária represente a prova mais evidente de que nossas intenções são honestas.

— A experiência realmente é tão importante assim? — perguntou Claudrin, já um tanto inseguro.

— Não sei qual será o resultado — confessou Moders. — O fato é que a experiência terá de ser iniciada imediatamente.

— Está bem. Entrem em contato com o chefe — disse Claudrin, dando-se por vencido.

— Obrigado — limitou-se Moders a dizer.

Levantou-se e saiu do camarote, a fim de dirigir-se à gigantesca sala de rádio da nave capitania.

Voltou dali a quinze minutos.

— O chefe não estava dormindo — informou. — Participava da conferência final com os acônidas. Apesar disso teve tempo para ouvir-me. Claudrin, dispomos de inteira liberdade de ação no que diz respeito às futuras experiências.

— O quê? Inteira...?

Claudrin engoliu em seco. O epsalense não compreendia. Perry Rhodan colocava o destino da Via Láctea nas mãos desse jovem.

— Olhe! — exclamou Moders e entregou a Claudrin uma folha de plástico na qual estava registrada, em sinais codificados, a palestra travada entre o chefe e o robólogo.

E ali estava escrito aquilo que o cientista acabara de dizer.

Moders foi até a porta do camarote e fez um sinal para o ara.

— Podemos começar.

Kule-Tats lançou um olhar indagador para Claudrin. O epsalense teve que digerir o fato de que, a partir de agora, Moders dispunha de um poder quase inconcebível. Será que a sensação do poder não subiria à cabeça do jovem?

— Moders — disse num tom de pai para filho. — Não se esqueça de que nesta Galáxia vivem bilhões de criaturas inteligentes.

— Isso mesmo — respondeu Moders. — Eu sou uma dessas criaturas. Será que tenho cara de suicida?

 

Nos últimos dias a evolução política no interior da Via Láctea fizera progressos, que há um mês ainda seriam considerados impossíveis.

No dia 9 de agosto de 2.113 foi celebrado um tratado entre o Sistema Azul, o Grande Império e o Império Solar. Esse tratado não visava apenas enfrentar o perigo dos pos-bis. Perduraria mesmo depois de removida a ameaça biopositrônica. Os acordos fundamentais ficariam a cargo dos diversos ministérios, e estes seriam aprovados até o dia 10 de setembro pelo parlamento terrano, pelo Grande Conselho e pelo Imperador Gonozal VIII. Esses acordos resultariam de uma série de consultas recíprocas a serem realizadas em Terrânia, e constituiriam objeto de um aditivo ao tratado.

O acônida Oolris felicitou o administrador e o plenipotenciário do Império de Árcon, Marechal Julian Tifflor, pela conclusão do tratado.

Perry Rhodan recebeu as felicitações, emocionado.

— Rhodan — disse o acônida. — Ao dirigir-lhe a palavra, em nome do Grande Conselho, lembro-me de uma jovem cientista do nosso mundo, que infelizmente não está mais viva. Sua morte abriu os olhos de muitos acônidas. Sinto-me orgulhoso por ter sido designado pelo Grande Conselho para realizar negociações com o senhor em Terrânia. Fico feliz por ter falado pelo telecomunicador com o Imperador Gonozal VIII. Sou um velho diplomata, e sinto-me profundamente emocionado por saber que o imperador e o administrador são amigos. Permite que me retire com minha delegação, sir?

Era a primeira vez que Oolris tratava Rhodan de sir.

Rhodan engoliu em seco. Bell respirava ruidosamente. Allan D. Mercant, Deringhouse e Julian Tifflor sentiram-se emocionados. Homer, o gênio financeiro do Império Solar, que também se conservara jovem em virtude da aplicação regular das duchas celulares do planeta Peregrino, cochichou:

— Quem dera que todos os acônidas fossem assim...

Depois que a delegação se havia retirado da grande sala de conferências, Rhodan dirigiu-se ao agente financeiro.

— Homer — disse — os acônidas são como Oolris. Basta acreditar nisso. Basta querer que sejam. Um dia a gente compreende os milagres que podem ser realizados pela Fé. Afinal nós, os terranos, também temos um grande caminho a percorrer...

Era a modéstia do homem mais poderoso da Via Láctea, daquele mesmo homem que, como major da força espacial dos Estados Unidos, fora o primeiro que voara à Lua. Era um homem que nunca se transformara em escravo do poder; pelo contrário, sempre colocara o poder a serviço de um objetivo: conquistar o espaço cósmico para os humanos.

O dia-a-dia voltava a exigir sua atuação.

O dia-a-dia de Árcon III, o dia-a-dia de Marte...

As maiores naves cargueiras da Terra já voavam em direção a Sphinx, a fim de receber alguns milhares de acônidas e centenas de milhares de toneladas de material. Gigantescos transmissores de matéria do Sistema Azul seriam montados num prazo extremamente curto em Árcon III, o planeta da guerra do Grande Império, e em Marte, a fim de criar uma ligação direta entre as três entidades estatais.

Há várias horas as grandes estações de hiper-rádio de Terrânia e de Árcon III transmitiam dados astronômicos em seqüência ininterrupta. Tratava-se da posição de todos os mundos habitados do Sistema Azul e da situação geográfica das bases acônidas, cuja capacidade de desempenho técnico também era transmitida nas mensagens.

Três potentes emissoras de Sphinx, o planeta do governo, irradiavam em ritmo condensado e distorcido uma série de conhecimentos técnicos, que fariam com que, por alguns anos, os cientistas do Império Solar voltassem a ser simples estudantes.

O império dos acônidas era muito mais velho que o dos arcônidas, e sua tecnologia chegara a um nível incomparável.

Apenas haviam negligenciado a navegação espacial no curso dos últimos milênios, porque cercaram seu império por uma abóbada energética azul. O tráfego entre os astros, situados no interior desse império, era feito por meio de transmissores.

Perry Rhodan e Bell mergulharam no sono no interior de um supergigante, enquanto a nave corria velozmente pela zona de libração do semi-espaço, em direção à área de M-13 em que se encontrava a nave capitania de Rhodan e a nave fragmentária dos pos-bis.

Era o oitavo dia do estranho armistício. Era o dia em que Moders e Kule-Tats talvez pudessem se sentir triunfantes.

 

John Marshall acordou um grupo de telepatas. Oito mutantes voltaram a formar um parabloco regulado para as vibrações do comandante de plasma da nave cúbica.

A operação de evacuação acabara de ser iniciada. Um comando de apenas dezoito homens permaneceria a bordo da nave dos pos-bis para ocupar-se com as seis abóbadas.

Moders, o ara, e mais alguns especialistas, que eram verdadeiros gênios em sua área, encontravam-se no laboratório para-técnico.

Kule-Tats lançou um olhar de admiração para seu jovem colega, que dominava totalmente a situação. Não demonstrava o menor nervosismo. Estava trocando algumas palavras com Marshall, chamando a atenção do mutante para certos pontos. O telepata acenava tranqüilamente com a cabeça.

Um silêncio profundo passou a reinar no laboratório.

— Isto é um jogo com o destino — acabara de dizer Van Moders.

E dissera mais:

— Temos de arriscar. Devemos apresentar à misteriosa estação do intercosmo outras provas de que nossa estrutura biológica guarda uma semelhança orgânica com seu plasma celular.

Kule-Tats lançou um olhar para o rato-castor. Encolhida numa poltrona, a pequena criatura parecia mergulhada em transe.

O ara ainda não se acostumara inteiramente ao aspecto exterior do rato-castor. Quando se lembrava das parafaculdades que essa criaturinha de um metro de altura possuía, tinha a impressão de estar sonhando.

Os especialistas viram na tela que os planadores espaciais saíam da comporta da nave cúbica e tomavam a direção da Teodorico. A evacuação da nave fragmentária era realizada segundo um cronograma exato.

Dez minutos.

Nada.

Quinze minutos após o início da evacuação.

Nada.

Mais de oitenta por cento dos homens já haviam saído da nave dos pos-bis.

Mais três planadores passaram pela comporta e tomaram a direção da gigantesca esfera espacial.

Moders olhou para o relógio. Dali a dois minutos, a evacuação estaria concluída.

Depois disso chegaria a hora...

O último planador espacial seguiu em direção à Teodorico. Um planador espacial e dezoito homens que se encontravam na sala de comando permaneceram a bordo da nave fragmentária.

Mas, para os mutantes, a experiência ainda não chegara ao fim. Estes mantiveram-se imóveis, na expectativa.

Vinte e um minutos.

John Marshall virou a cabeça na direção de Moders. Estendeu o braço e segurou a mão do cientista, que parecia um tanto perplexo.

— Meus parabéns, Moders. O senhor tinha razão. Parabéns!

Era muito raro ver John Marshall entusiasmado. Mas, naquele minuto, transformou-se num menino travesso. Colocou as mãos nos ombros de Moders e disse:

— Rapaz, foi uma idéia de ouro! Gucky, que continuava em sua poltrona, sorriu e exibiu o dente-roedor. Seus olhos brilhavam. Fitou Kule-Tats, penetrou nos pensamentos do ara e foi parar no seu colo. Enlaçando seu pescoço com os bracinhos, piou muito alegre:

— Vovô, você é um ara formidável, porque se alegra de todo coração com o êxito de Van Moders.

Dessas palavras, Kule-Tats depreendeu que a pequena criatura lera seus pensamentos. Sentiu-se embaraçado, e mais embaraçado ficou quando Gucky disse:

— Ora, ninguém precisa envergonhar-se por ter pensamentos decentes. Na maior parte das vezes, um colega até deseja que o outro fique sem ar para respirar.

— Nada de discursos, Gucky! — gritou Marshall, chamando-o à ordem. — Mister Keeler quer fazer-me algumas perguntas.

Marshall respondia às perguntas de três cientistas. Dali a uma hora tinha-se certeza absoluta de que a reação do plasma guardado na nave dos pos-bis diante da evacuação quase chegara a ser eufórica. Um paraimpulso prolongado e inconfundível fora irradiado pelo comandante de bio-substância em direção ao intercosmo.

Quando se viu novamente a sós com Kule-Tats, Moders defendeu sua hipótese, segundo a qual o plasma se tornava inteligente, desde que uma grande massa do mesmo constituísse uma unidade.

— Se partirmos desse pressuposto chegaremos a cifras astronômicas, Moders — objetou o ara. — Sob o meu ponto de vista, que é o biológico, uma aglomeração de plasma deveria ter mais de cem metros de aresta para ser capaz de realizar um processo intelectual. Face a isso não posso compartilhar sua opinião.

— O senhor não pode compartilhá-la porque não possui fantasia, Kule-Tats. Então acha que um monstro desses seria uma coisa inconcebível? Seria capaz de jurar que a estação do intercosmo é formada por um monstro de plasma. É bem verdade que seu grau de inteligência continua a ser um mistério. Se me lembro de que há uma semana lhe enviamos mensagens pelo hiper-rádio e por via parapsicológica, sem constatar qualquer reação da parte do plasma, sinto-me tentado a duvidar da minha teoria. Mas não quero entreter essa dúvida. Sei que estou no caminho certo, muito embora o senhor conteste minha teoria na qualidade de biólogo. Por quê? Gostaria de conhecer o motivo.

— O senhor é um pesadelo, Moders — disse o ara num gemido. — Quer saber por que não posso concordar com sua teoria? É simples. As hipotéticas quantidades gigantescas de plasma esmagariam a si mesmas!

— Por quê?

— O senhor sabe perfeitamente — disse Kule-Tats, em tom contrariado.

— Gostaria de ouvir de sua boca. Então?

— Porque a estrutura molecular da bio-substância é muito sensível à pressão.

— Mesmo que a montanha de plasma se espalhe em largura?

— Mesmo que ocupe uma grande área? — sentenciou o ara.

— Exatamente... — confirmou Moders, lacônico.

— O que está inventando desta vez? — perguntou Kule-Tats, perplexo.

— Nada. Apenas gostaria de conhecer os motivos de sua discordância.

— Se ocorresse a ampliação da área imaginada pelo senhor, o monstro de plasma teria de cobrir uma superfície imensa.

— Ah! Aos poucos o senhor chega lá. Imagine que o plasma se deposite em camadas.

— Pelos deuses de Árcon, Moders! Será que o senhor também quer atribuir habilidades artesanais ao plasma?

— De forma alguma. Mas o senhor se esquece dos robôs semibiológicos chamados de pos-bis... Então?

De um instante para outro o ara deu-se por vencido.

— A fantasia de vocês terranos realmente é apavorante.

— Nada disso. Por que deixaríamos de recorrer à fantasia, se com seu auxílio obtemos soluções mais rápidas que as proporcionadas por um computador positrônico?

— Para recorrer à fantasia devemos possuí-la. Vocês estão nessa situação feliz; eu não.

 

Quando se encontravam a oito dias-luz da Teodorico e da nave fragmentária, Rhodan e Bell transferiram-se para a Gazela. Pretendiam percorrer o último trecho na pequena nave-disco.

Seguindo seu costume, Bell de início achara graça dos cuidados de Rhodan, mas logo se convenceu de que este estava certo. Assim que chegou a bordo, Rhodan pediu que o informassem sobre os acontecimentos. Moders tomou a palavra, enquanto o ara se mantinha em posição discreta. O robólogo mencionou o fato de que Kule-Tats não concordava com sua teoria.

— Por que não adota a teoria de Moders, Kule-Tats? — perguntou Rhodan.

— Porque a mesma contraria uma das leis fundamentais da Biologia.

— O senhor se refere às pressões que surgiriam no interior da montanha de plasma?

— Isso mesmo. Quando a pressão atinge certa intensidade a estrutura molecular é modificada, ou danificada. Os processos genéticos tomam um curso totalmente diverso...

— É isso! — interrompeu Moders. — Talvez a solução seja esta, chefe. Uma montanha de plasma. Uma pressão intensa em seu interior. Uma modificação da estrutura molecular faz com que numerosos processos tomem um curso inesperado. Nestas condições o monte de plasma nem precisa chegar a ser uma montanha para desenvolver certo grau de inteligência. Uma pressão elevada em seu interior produziria resultados que nunca poderiam ser alcançados com uma massa muito maior, bastante espalhada. O que diz a Biologia a este respeito, Kule-Tats?

Numa atitude quase desesperada, o ara esforçava-se para que Rhodan o ouvisse.

— Sir, meu colega procura solucionar à força um problema que não pode ser resolvido por essa forma.

— Quer dizer que o senhor recusa totalmente as especulações de Moders? — perguntou Rhodan, em tom curioso.

O ara esfregava as mãos.

— Não senhor. Não posso chegar a esse ponto. Também não posso afirmar que a última especulação de Moders não passa de uma criação cerebrina. Há um grãozinho de verdade na mesma. Quem dera que esse robólogo pudesse pôr um pouco mais de método em suas pesquisas — concluiu com um olhar recriminador para Moders.

O jovem cientista fez um gesto.

— De que me serviria um método de pesquisa? Será que temos tempo para isso? Compreendo o que Kule-Tats quer dizer, sir. Para ele não existe nenhuma possibilidade de resolver o problema do plasma dos pos-bis, fora da trilha das pesquisas convencionais. Acontece que a situação em que nos encontramos não permite que desperdicemos nosso precioso tempo. Por isso devemos buscar um novo caminho. Aliás, depois de nos termos apresentado tantas vezes à estação do intercosmo como formas de verdadeira vida, já chegou a hora de pensarmos em algo de novo para finalmente dialogarmos com o plasma inteligente.

Rhodan manifestou-se de acordo. Depois disso mudou de assunto.

— Moders, o senhor acompanhou a operação em Frago, o planeta dos robôs. Na oportunidade não foi travada uma palestra com o comandante de plasma da nave pos-bi, por intermédio do conversor de símbolos?

— Perfeitamente, sir. Quase não consigo deixar de pensar nisso. E vivo perguntando a mim mesmo por que não conseguimos entrar em comunicação com a estação de rádio do intercosmo ou com esse biocomandante. Por enquanto não conheço a resposta a esta pergunta.

O ara estava mergulhado em profundas reflexões. Rhodan não perturbou o esforço mental do biólogo. Kule-Tats nem notou o silêncio que, de repente, passou a reinar no camarote. Começou a falar como quem desperta de um sonho.

— Tenho uma suposição sobre os motivos pelos quais a estação situada no intercosmo não se comunica conosco. O plasma ainda se sente ameaçado por nós. Sir, o Imperador Gonozal VIII retirou todas as naves, ou será que ainda existem unidades nas proximidades das quinhentas naves fragmentárias?

— Naturalmente deixamos algumas naves esféricas nas proximidades das naves dos pos-bis, Kule-Tats. Pelo que estou informado, junto a cada nave fragmentária encontra-se um pequeno grupo de couraçados. Mas... diga logo aonde quer chegar.

— Sir, o senhor se lembra da reação de nosso comandante de plasma, quando a Tóquio se afastou e quando a maior parte dos nossos homens evacuou a nave cúbica? Os comandantes de bio-substância vêem um perigo nas diversas naves esféricas que vigiam cada uma das naves cúbicas. E devem ter transmitido ao chefe de plasma do intercosmo a sensação de perigo. A resposta do chefe de plasma é seu silêncio.

— Santo Deus! — disse Rhodan um tanto sobressaltado. — A suposição encerra uma boa dose de probabilidade. Mas é impossível retirarmos as naves de observação. Isso seria uma irresponsabilidade de minha parte. Como faremos para remover a desconfiança dos plasmas?

Ninguém soube responder a esta pergunta.

Nas horas que se seguiram não aconteceu nada de extraordinário. Por várias vezes Rhodan entrou em contato com Árcon III. O trabalho conjunto dos técnicos terranos, arcônidas e acônidas estava criando um novo foguete que, segundo se esperava, atingiria a velocidade da luz em cinco minutos. E esse foguete deveria ser capaz de transportar uma ogiva atômica cuja explosão liberasse a potência de quinhentos gigatons. O problema consistia em construir um projétil de tamanha potência, que fosse relativamente pequeno. Além disso, a fabricação em série só se tornaria possível se o sistema de propulsão e o de direção fossem extremamente simples.

Durante a execução desse pedido, formulado à indústria de armamentos de Árcon, provou-se que a aliança com o Sistema Azul era altamente favorável. Os acônidas confessaram que possuíam um sistema de localização bastante simples, mas muito preciso. Árcon encontrou em seus arquivos milenares dados sobre um sistema de propulsão seguro, que correspondia perfeitamente às exigências da fabricação em série. Uma equipe gigantesca de técnicos de armamentos terranos trabalhou em Árcon III, reduzindo em oitenta por cento o tamanho da carga explosiva, sem alterar seu desempenho energético.

Dezenas de grandes computadores positrônicos foram utilizados e, além disso, os técnicos tiveram à sua disposição um gigantesco centro de computação situado no Sistema Azul. Um projeto, cuja implantação antigamente teria consumido meses, passou à fase da fabricação em série em uma semana.

Há algumas horas uma nave de transporte pousara em Árcon III, a fim de encher seus gigantescos porões de carga com os novos torpedos espaciais e levá-los pelo caminho mais rápido às frotas unidas.

Perry Rhodan sentia pelo plasma a mesma desconfiança com que este encarava tudo quanto era orgânico.

Justamente por isso era tão difícil compreender o armistício dos pos-bis.

 

O Tenente Merg acabara de revezar seu colega Poul Nelson no setor de rastreamento estrutural. Ajustou a poltrona aos contornos de seu corpo. Naquele momento viu um abalo estrutural de grande amplitude, retratado no sistema de localização.

O dispositivo positrônico, acoplado ao computador de bordo, levou apenas uma fração de segundo para, com base na amplitude, identificar as naves que haviam provocado o abalo estrutural, e transmitir o resultado dos cálculos ao setor de observação.

O alarma fez com que os homens que se encontravam na Teodorico corressem para seus postos. No mesmo instante o setor de localização ligou a tela especial, que passou a retratar as naves-pingo dos laurins!...

Os invisíveis acabavam de chegar com cerca de trezentas naves. Encontravam-se a menos de quatro minutos-luz da Teodorico e da nave fragmentária. Haviam caído do hiperespaço que nem um bando de gafanhotos, e passaram a dispor-se em vários tipos de formação.

Sua velocidade permanecia constantemente em 0,67% da luz.

Rhodan e Bell chegaram à sala de comando antes de Jefe Claudrin. Moders já estava sentado à frente dos instrumentos de medição do conversor de símbolos.

— O que houve, Moders?

Rhodan não gostava de gritar, mas desta vez ele o fez. O rosto cadavérico do robólogo fez com que supusesse que algo de terrível estava acontecendo.

— Chefe, mande que todas as torres de canhões abram fogo. Abrir fogo! Abrir fogo!

— Quero uma explicação! — berrou Rhodan.

Rhodan ao menos precisava saber por que devia atirar.

Van Moders conseguiu controlar-se. Sua explicação revelou algo de terrível.

— Os laurins estão nos enganando como se fôssemos uns patetas. Transmitem constantemente a seguinte mensagem: “Vocês descobriram a arma secreta dos robôs? Em caso afirmativo, destruam-na. Nós os ajudaremos.”

Perry Rhodan não deixou que essa notícia calamitosa o abalasse. Rapidamente, mas com a maior tranqüilidade, gritou para dentro do microfone do intercomunicador:

— Chame de volta imediatamente o comando que se encontra a bordo da nave fragmentária. Perigo de vida!

Depois passou a dirigir-se ao setor de comando de tiro:

— Abrir fogo contra as naves dos laurins!

Outra ordem foi dirigida ao hangar das gazelas:

— Envie imediatamente três gazelas, que procurarão resgatar os homens do comando que se encontra a bordo da nave fragmentária. A Teodorico seguirá na direção da frota dos laurins.

Os propulsores instalados na gigantesca protuberância equatorial da nave uivaram. O veículo espacial de mil e quinhentos metros de diâmetro acelerou.

— Os laurins transmitem ininterruptamente sua mensagem simbólica, chefe! — esbravejou Van Moders, prevendo que o surgimento inesperado dos invisíveis poderia inutilizar o trabalho cansativo que haviam realizado.

Acelerando ao máximo, a Teodorico dirigiu-se ao lugar em que circulavam as naves dos laurins.

Estas afastaram-se de repente!

O Capitão Brazo Alkher, que se encontrava junto ao computador positrônico de comando de fogo, não teve oportunidade de disparar um único tiro contra qualquer das naves-pingo. Não gostava de desperdiçar energia.

Mas com isso cometeu um erro que traria graves conseqüências...

A Teodorico não disparou um único tiro!

— Atirem! Atirem! Que diabo, por que não estamos atirando?

Van Moders não pertencia à Frota Solar; era cientista. Do contrário não se teria exprimido dessa forma.

Mais uma vez Rhodan viu-se obrigado a pedir que esclarecesse o motivo dos berros.

— Chefe, a esta hora o plasma só pode acreditar que somos aliados dos laurins, já que não atiramos contra os invisíveis e...

A sala de rádio regulou os alto-falantes para o volume máximo. Uma notícia desastrosa foi transmitida da nave fragmentária.

De repente todos os robôs que se encontravam no interior da mesma voltaram à atividade. A pequena tripulação, que já estava a caminho da comporta, recebeu pelo conversor de símbolos a mensagem do comandante de plasma:

— Salvem o interior! Amem o interior!

Gucky materializou-se ao lado de Rhodan.

— Terminou, chefe! A nave fragmentária vai se autodestruir. Mas irradia os mais terríveis impulsos de ódio em direção ao intercosmo.

Uma voz vinda sala de rádio berrou pelo intercomunicador:

— Sir, Atlan informa que a batalha foi reiniciada. As quinhentas naves dos pos-bis voltaram a atacar.

O telecomunicador transmitia ininterruptamente a mensagem infame dos laurins, traduzida pelo conversor de símbolos:

 

Vocês descobriram a arma secreta dos robôs? Em caso afirmativo, destruam-na. Nós os ajudaremos.

 

Uma das três gazelas chamou. O comando de dezoito homens, que se encontrava na nave fragmentária, conseguira abandoná-la, sem sofrer nenhuma perda. No momento encontrava-se no planador, que se aproximava da gazela.

Naquele instante, uma chama atômica saiu da nave dos pos-bis e precipitou-se espaço a fora, dando inicio ao ato suicida de destruição.

Os robôs semibiológicos estavam salvando e amando o interior.

A nave fragmentária dissolveu-se num sol ofuscante, que se espalhou com grande turbulência para todos os lados. A destruição foi acompanhada por um enorme abalo estrutural.

Os laurins já haviam desaparecido no hiperespaço. Sua mensagem simbólica já não era transmitida pelo hiper-rádio.

Sentado à frente do conversor de símbolos, Van Moders estava com os olhos cheios de lágrimas. Eram lágrimas de cólera! Lágrimas derramadas por bilhões de criaturas inteligentes, cujas vidas estavam ameaçadas de novo.

Não se envergonhou das suas lágrimas.

— Diabo! — dizia constantemente, mas nem por isso sentia-se aliviado.

Caminhou a passo cambaleante em direção à escotilha, a fim de sair da sala de comando.

Perry Rhodan correu atrás dele. Colocou a mão no ombro do jovem, virou-o para ficar de frente e disse:

— Não desanime, Moders. Teremos de começar de novo.

— Começar como, chefe? — perguntou Moders com a voz entrecortada. — Não sei mais o que fazer.

Estas palavras foram proferidas por um homem que quase chegara a ser difamado pelos colegas, por causa de suas idéias arrojadas.

 

Os comandantes terranos das frotas unidas não dormiram.

Quando as naves fragmentárias transferiram seus campos relativistas dez horas para o futuro, tornando-se invisíveis, os oficiais de comando de tiro já estavam com os dedos encostados aos botões de contato.

Pouco importava que as naves inimigas fossem invisíveis. Sabiam onde procurar essas caixas feias. Com a diferença de uma fração de segundo responderam com todas as armas ao fogo infernal das naves pos-bis.

Aquilo parecia transformar-se num desastre para as naves dos robôs. A tática de Atlan, que mandara vigiar cada uma das caixas por um grupo composto de seis a quinze naves estava trazendo seus frutos.

Os impactos concentrados dos canhões de costado de vários aparelhos esféricos rompiam os campos temporais energéticos dos pos-bis e provocavam a explosão das naves cúbicas.

Com o reinicio da batalha travada entre os sóis do grupo estelar M-13, que ficavam muito próximos uns dos outros, o grosso da frota acelerou ao máximo e, tomando as direções mais variadas, aproximou-se do campo de batalha.

Na nave capitania de Atlan reinava a euforia. Os receptores de hiper-rádio quase não conseguiam captar as mensagens que noticiavam a derrubada de naves inimigas.

Os seres semibiológicos defendiam-se desesperadamente. Recorriam constantemente aos terríveis raios conversores, que faziam surgir junto ao alvo uma bomba atômica desmaterializada.

A morte também fez sua colheita entre os terranos. Mas, em comparação com as lutas travadas há dez ou doze dias, as perdas de naves esféricas eram espantosamente baixas.

Quando a batalha em M-13 entrava no segundo período de trinta minutos, restavam menos de cem naves fragmentárias para fazer frente à gigantesca frota arco-terrana.

A Teodorico já se havia unido à frota. Atlan e Rhodan mantinham contato pelo hipercomunicador.

Mais uma vez, sete naves fragmentárias explodiram quase ao mesmo tempo. Quando Atlan transmitiu a notícia a Rhodan, seu rosto se manteve impassível.

— Daqui a uma hora não restará uma única nave dos robôs em M-13, meu caro! — disse.

— Não se esqueça dos pedidos de socorro em linguagem simbólica, que os pos-bis estão irradiando com a potência máxima — ponderou Rhodan. — Já vimos muitas vezes que a reação dos pos-bis do intercosmo a esse tipo de mensagem costuma ser muito rápida.

Atlan não levou a sério a advertência de Rhodan.

— Mais quatro dessas caixas deixaram de existir. Faz dezoito minutos que não perdemos uma única nave. Rhodan, chego a acreditar numa coisa que há pouco ainda me parecia inconcebível. Os comandantes de plasma das naves fragmentárias estão dominados pelo pânico. Não tenho outra explicação para o tiro pouco preciso dessas caixas infernais...

Mas os telepatas de Rhodan tinham outra explicação. Estavam captando no paraplano os impulsos dos pos-bis, que deixavam claro que muitas vezes os robôs destruíam a si mesmos e às suas naves de dentro para fora.

Amavam o interior e o salvavam!

Concluía-se que nem todas as naves dos pos-bis destruídas podiam ser creditadas aos tripulantes de uma nave esférica.

— Se minha conta estiver certa faltam trinta e quatro, Perry. Daqui a uma hora a confusão...

Atlan silenciou.

Rhodan ouviu a terrível notícia em sua nave, ao mesmo tempo que o arcônida a recebia.

Essa notícia foi ouvida em todas as unidades terrano-arcônidas. Os pos-bis haviam recebido reforços vindos do espaço intercósmico. Ainda não se conhecia o número exato de naves fragmentárias. Os cálculos variavam entre duas mil e três mil unidades.

Saíram do hiperespaço em silêncio, sem provocar o menor abalo estrutural, e seus campos defensivos estavam regulados para o tempo atual.

Eram visíveis!

— Chefe, isso constitui uma manifestação de lógica positrônica, não de engaste hipertóictico.

Rhodan não se sentiu espantado ao ver o robólogo Van Moders a seu lado e ouvi-lo falar. O jovem cientista já se recuperara do choque e voltara a ser o homem que observava atentamente e pensava depressa.

— Refere-se ao fato de os pos-bis se terem tornado visíveis para nós, Moders?

— Sim, senhor. Acreditam que podem impressionar-nos com a frota muito mais numerosa que acaba de chegar. Isso é um produto da técnica do raciocínio positrônico. Não estou gostando, sir. A ligação entre o plasma e o mecanismo positrônico me parece mais simpática. É mais humana.

— Como? É o quê? — perguntou Rhodan, perplexo.

Picou nisso mesmo.

A conversa não teve prosseguimento.

Cerca de três mil naves fragmentárias precipitaram-se sobre as belonaves de dois impérios estelares, que disparavam com todos os canhões de radiações. A terrível batalha teve início numa frente de mais de dez mil anos-luz.

Havia um único fato tranqüilizador. Num raio bastante amplo, todos os planetas coloniais haviam sido evacuados. As cidades e aldeias estavam abandonadas; não havia por ali um único terrano ou arcônida. Se esses planetas fossem atacados no curso da batalha, os odientos pos-bis poderiam destruir materiais de valor inestimável, mas não eliminariam nenhuma vida inteligente.

De repente os raios conversores das naves fragmentárias abriram enormes frestas na linha de combate. Quando o terceiro supergigante foi atingido por vários conversores e explodiu, a derrota parecia nitidamente configurada.

Acontece que a primeira nave cargueira que transportava os novos torpedos espaciais já decolara de Árcon III, com destino à frente de combate.

Bell informou Rhodan a este respeito.

— A nave deverá chegar dentro de meia hora, se não for destruída por algum pos-bi.

Rhodan imediatamente tomou sua decisão.

— Envie uma mensagem à nave cargueira. Diga-lhe que deve sair da zona de libração nas imediações do sistema de Golla. As unidades que serão equipadas com os torpedos espaciais esperarão lá. E agora quero ver Atlan novamente na tela.

O rosto do imperador apareceu.

— Arcônida, a primeira remessa de torpedos espaciais está a caminho. Providencie para que pelo menos vinte grupos de destróieres se dirijam ao sistema de Golla, a fim de receberem os torpedos. Assim que as novas armas se encontrarem a bordo, as unidades voltarão à frente de combate e as utilizarão. O ponto de encontro da nave cargueira e dos grupos de destróieres será o único planeta do sol Golla. A transferência da carga naturalmente será realizada no espaço.

— Está bem! — disse o arcônida.

Seu rosto desapareceu da tela, mas a ligação foi mantida.

Dali a duas horas, o Grande Império possuía dezesseis mundos coloniais a menos. Os pos-bis transformavam sistematicamente um planeta após o outro em infernos chamejantes.

Os comandantes viram-se impotentes diante da destruição absurda, que acompanharam pela tela. Atlan, o chefe da frota, dera ordens terminantes de não perturbar os pos-bis nessa obra.

Para o arcônida foi muito difícil dar essa ordem. Mas, no momento, o mais importante não eram os planetas evacuados, mas as belonaves aptas para a luta, que deveriam evitar que os pos-bis avançassem até o centro de Árcon.

De repente um milagre parecia anunciar-se...

Os grupos de destróieres equipados com os novos torpedos intervieram na luta.

Dispararam os projéteis bem longe das linhas de combate. Já não se podia falar numa frente de combate no sentido normal do termo. De um momento para o outro, o lugar em que antes se encontrara uma espaçonave que disparava suas armas, ficou vazio. E não era necessário fazer pontaria antes de disparar os novos torpedos.

A pontaria e o alcance do alvo ficavam a cargo do sistema de localização embutido em cada projétil. Essa localização, que reagia a determinadas concentrações de matéria, sabia analisar essa matéria a fim de distinguir entre as unidades da própria frota e as naves fragmentárias. As naves terranas e arcônidas não corriam o perigo de serem atingidas por um torpedo.

Em compensação os pos-bis travaram um conhecimento muito estreito com essa arma, que, depois de cinco minutos de vôo, quase alcançava a velocidade da luz.

Minúsculos, mas potentíssimos transmissores de sinais goniométricos, informavam todas as naves esféricas sobre as áreas em que penetravam os torpedos. As naves terranas procuravam atrair os pos-bis para estes setores. Por surpreendente que pudesse parecer, elas muitas vezes o conseguiam. Talvez os pos-bis acreditassem que os pequenos projéteis fossem meteoritos que se deslocavam em alta velocidade.

O sistema de localização dos torpedos registrava a posição das naves fragmentárias e corrigia a rota dos projéteis. As bombas velozes atingiam os campos relativistas das naves fragmentárias em grandes grupos, e as nuvens de gases luminosos, que se expandiam rapidamente, eram o último vestígio de numerosas espaçonaves dos robôs.

— Ainda não compreenderam o que destruiu suas naves — disse Van Moders, dirigindo-se a Rhodan. — Quando souberem, eles se desviarão dos torpedos.

— De forma alguma! Ninguém pode estar certo de conseguir desviar-se sempre de um projétil que desenvolve velocidade aproximada à da luz. E mesmo que a nave se desvie, Moders, nem por isso pode sentir-se livre do torpedo... O sistema de localização o dirige para o alvo que deixou de ser atingido. O projétil acaba acertando, e quando isso acontece verifica-se a liberação de quinhentos gigatons, e uma quantidade de energia como esta representa uma carga pesada até mesmo para o campo relativista de uma nave dos pos-bis.

A gigantesca torre polar da Teodorico estava disparando. A tela panorâmica do supercouraçado mostrava oito feixes de raios que pareciam cruzar-se. Uma nave fragmentária defendia-se do ataque de quatro gigantes esféricos.

Jefe Claudrin fitava tranqüilamente determinado ponto do grande painel de instrumentos. Era o lugar em que há apenas dois dias os técnicos haviam instalado um novo aparelho. O epsalense pilotava a nave capitania em conformidade com os dados fornecidos por esse aparelho. Esses dados provinham dos raios goniométricos expedidos pelos novos torpedos espaciais, que indicavam os setores do espaço pelos quais cruzariam à velocidade da luz. E, valendo-se desses dados, quatro belonaves terranas procuravam empurrar uma nave cúbica para a faixa de trajetória dos projéteis.

Pela quinta vez no espaço de poucos minutos, os potentes campos defensivos da Teodorico ameaçaram desmoronar. As bombas que os robôs transportavam para perto do envoltório energético, por meio dos raios conversores, constantemente exigiam o máximo da capacidade dos campos energéticos.

Claudrin desviou-se de um raio. Brazo Alkher, o melhor oficial de controle de tiro da frota terrana, parecia bombardear um ponto do campo defensivo da nave dos pos-bis, juntamente com dois outros couraçados. No interior da nave, os geradores e transformadores rugiam, enquanto os conversores emitiam um zumbido suspeito.

Um raio vermelho ofuscante, que no mesmo instante mudou de cor, brilhando num branco reluzente, indicou a destruição de uma nave fragmentária.

Claudrin transferiu a Teodorico à distância de meia hora-luz, em direção ao centro de Árcon. Um cruzador pesado, que era uma antiga nave robotizada do Grande Império, estava em chamas.

Fazia um minuto que a nave transmitia pedidos de socorro.

Utilizando o atalho da zona de libração, Claudrin fez a nave capitania voltar ao espaço normal a um quilômetro do cruzador incendiado. O kalup, que era o coração do extraordinário propulsor linear, apenas emitira um ligeiro rugido.

Não havia nenhum pos-bi por perto. O campo defensivo da Teodorico foi desligado. Comportas gigantescas abriram-se. Enormes contingentes de robôs flutuaram em direção à nave em chamas. Eram homens-máquinas com uma programação especial, que estavam até em condições de deter os processos atômicos.

O cruzador pesado sofrerá graves avarias causadas por três impactos de raios conversores. As grandes máquinas haviam sido quase totalmente destruídas e a terça parte da protuberância equatorial deixara de existir. O kalup explodira. Oitenta por cento dos mecanismos automáticos haviam sido colocados fora de ação. Havia mais de trezentos mortos e feridos a bordo. Setenta e quatro homens estavam desaparecidos. A nave esférica já não poderia acelerar com suas próprias forças. E, além disso, o incêndio lavrava em quatro conveses.

As explosões dos bancos energéticos atingidos causavam incêndios. No momento em que o quarto comando de robô se deslocava em direção ao cruzador, duas naves fragmentárias saíram do hiperespaço.

Uma dessas naves cúbicas talvez já fosse demais para a Teodorico. No entanto, Rhodan não estava disposto a entregar aos robôs os tripulantes do cruzador pesado reduzido à impotência.

O rádio transmitiu o alarma. A Teodorico solicitou reforços. Brazo Alkher disparou um tiro de radiações contra o campo relativista da nave fragmentária vinda da esquerda, fazendo com que por um instante a mesma se parecesse com um sol.

Dali a pouco o outro veículo espacial dos robôs teve o mesmo destino. Brazo Alkher, que geralmente não se abalava tão depressa, gritou pelo intercomunicador:

— Isso não foi feito por nós! Foram as bombas-relâmpago!

Jefe Claudrin virou o rosto para Rhodan e acenou com a cabeça.

— É verdade, chefe! As duas caixas foram destruídas por nossos torpedos espaciais. É bem possível que os mesmos ainda venham trazer uma reviravolta na situação.

— Não se iluda, Jefe. Os pos-bis não só substituíram as naves que perderam por nossa causa, mas trouxeram mais algumas centenas de unidades para o grupo estelar M-13. Ainda não divulguei a notícia. De qualquer maneira teremos de acostumar-nos à idéia de que os robôs possuem inúmeras naves.

Van Moders acenou lentamente com a cabeça. Não vira as enormes frotas de naves fragmentárias, mas já estivera em Frago, o planeta dos robôs situado no intercosmo, a noventa e dois mil anos-luz da extremidade da Galáxia. Os mutantes haviam constatado que muitos milhões de robôs estavam armazenados em Frago. Ficavam empilhados em gigantescos depósitos, prontos para serem ativados a qualquer momento.

Moders lembrou-se do que um dos mutantes dissera em Frago:

— Os robôs que constroem outros robôs já não sabem o que fazer com sua produção.

Van Moders sabia que Perry Rhodan não exagerara, ao falar na frota gigantesca dos pos-bis.

As duas nuvens de gás, que apareciam na tela e eram os últimos remanescentes das antigas naves dos pos-bis, consumiam-se a olhos vistos. O negrume do Universo voltou a espalhar-se; só de um lado era interrompido por uma forte luminosidade. Era o lado em que ficava o centro de M-13.

Do outro lado via-se o cruzador pesado, iluminado pela luz forte dos holofotes. O que não se via era o trabalho dos comandos de robôs.

De repente um grande número de naves esféricas apareceu em torno da Teodorico. O pedido de socorro de Rhodan fizera com que sete naves se aproximassem às pressas. Dali em diante, a presença da nave capitania no local já não seria necessária. Apesar disso, mais trinta minutos se passaram até que o último robô fosse recolhido, enquanto os comandos desembarcados por outras naves passaram a executar o trabalho.

Voando pelo semi-espaço, a Teodorico corria velozmente em direção ao setor em que a situação da frota arco-terrana parecia mais ameaçadora.

Assim que a nave de Rhodan voltou ao espaço normal, quase todas as faixas de hiper-rádio transmitiram pedidos de envio dos novos torpedos espaciais.

Com a maior tranqüilidade Perry Rhodan tomou conhecimento disso. A fabricação em série acabara de ser iniciada em Árcon III. E o planeta não poderia enviar, por ora, à frente de combate mais projéteis. Pelo menos vinte e quatro horas se passariam até que as gigantescas instalações industriais de Árcon III produzissem os torpedos espaciais em números tal que se poderia pensar em estocar parte da produção.

Mas haveria tempo para isso?

Atlan voltou a chamar. Era ele que recebia as notícias, que depois eram interpretadas pelo estado-maior. No momento tinha-se a impressão de que para cada nave fragmentária destruída três outras vinham do intercosmo.

O rosto de Atlan mostrou inconfundíveis sinais de pavor, quando Rhodan aludiu ao gigantesco transmissor acônida instalado em Árcon III.

— Bárbaro, será que você brinca com a idéia de evacuar os três mundos centrais do império?

Rhodan respondeu sem a menor comoção:

— Há várias horas o Império Solar se encontra em estado de rigorosa prontidão, meu caro. Isso significa que todos os preparativos para a evacuação do Império Solar estão sendo tomados.

— Pelo amor de Deus, Rhodan, para onde? Para onde pretende levar bilhões de pessoas?

— Se necessário, levá-las-emos ao Sistema Azul, arcônida — falou e calou-se.

Atlan virou o rosto. Uma notícia extremamente importante devia ter chegado à sua nave capitania. O rosto do arcônida desapareceu da tela por alguns segundos. Quando reapareceu, o imperador disse com a voz apagada:

— Perry, as naves fragmentárias romperam nossas linhas num ponto e avançam em alta velocidade em direção ao centro de Árcon.

— Quais foram as medidas defensivas que vocês tomaram?

Num gesto de pavor, o arcônida mostrou as mãos vazias ao amigo.

Mas havia uma pessoa que ainda não se dava por vencida. Era o terrano Perry Rhodan!

— Atlan, ainda não vamos desistir. Chame a direção central de produção de torpedos espaciais de Árcon III. Envie dez grupos de destróieres para lá. Todos devem carregar a maior quantidade possível de torpedos. A única coisa que os destróieres terão de fazer depois disso é lançar os projéteis no sistema pertencente ao sol de Árcon, nem que tenhamos de gastar milhões deles. Atlan, Árcon III, que é nossa fábrica de armas, tem de ser mantido, custe o que custar. Entendido?

Moders, que se encontrava num ponto mais afastado, voltou a admirar esse homem, que mesmo numa situação desesperada não perdia a calma e sempre possuía forças para procurar e encontrar uma salda.

Muito controlado, Rhodan virou o rosto para o cientista.

— Não adianta ficarmos na área do front. Nossa inferioridade é tão flagrante que um supergigante a mais ou a menos não faz a menor diferença. O senhor e eu poderemos fazer muito mais se estivermos na Terra. Entendido, Jefe?

A pergunta fora dirigida ao epsalense.

— Entendido, chefe. A Teodorico toma a rota da Terra!

 

Quando a nave capitania pousou no porto espacial de Terrânia, o gigantesco transmissor acônida instalado em Marte já havia entrado em funcionamento. Uma pequena estação contígua realizava o tráfego com a Terra. O outro terminal estava instalado num pavilhão do porto espacial.

Enquanto se dirigia à comporta, Rhodan foi informado de que um grupo de cientistas acônidas acabava de chegar via Sistema Azul—Marte—Terra, a fim de expor um plano elaborado com todas as minúcias.

Rhodan desceu correndo pela rampa da Teodorico. Bell, que era baixo e atarracado, seguiu-o fungando. Entraram num planador que se ergueu do solo antes que a porta se fechasse. Dali a alguns minutos, o veículo pousou na cobertura do gigantesco edifício da administração, em cujos andares superiores ficavam os gabinetes de Rhodan e Bell.

Menos de dez minutos depois do pouso da Teodorico, os dois homens em cujas mãos repousava o destino da Via Láctea tinham à sua frente um grupo de sete acônidas.

As formalidades foram deixadas de lado. Não havia tempo para isso.

Os acônidas realmente apresentaram uma sugestão elaborada até os últimos detalhes. Mas os habitantes do Sistema Azul só puderam criar o plano com o auxílio de seus inimitáveis computadores positrônicos.

Rhodan ficou admirado. Bell fungava; não conseguia dissimular a desconfiança. Um dos acônidas disse:

— Todos os prós e contras foram considerados, sir. O prosseguimento da luta contra os pos-bis mergulharia os três impérios estelares no caos dentro de uma semana. Batalhas espaciais do tipo das que vêm sendo travadas, além de serem inúteis e representarem um desperdício de energias, constituem um crime no sentido literal da palavra, se considerarmos o destino de bilhões de criaturas inteligentes.

Era uma linguagem dura. Bell esteve a ponto de interromper os acônidas com algumas palavras ásperas, mas a um sinal de Rhodan conteve-se.

— Sentoon, permita que examine sua sugestão com toda calma. Daqui a uma hora quero recebê-los novamente neste gabinete.

Quando Bell se viu a sós com Perry, fez questão de dizer ao chefe o que pensava sobre o acônida Sentoon.

— Por que pensa assim, Bell? Sentoon tem razão, não tem? O prosseguimento da batalha realmente seria um crime. Não conseguiremos resistir às naves fragmentárias por muito tempo...

O gordo exaltou-se.

— Você pode dizer de antemão se amanhã não sentiremos falta das dez mil naves que devem ser retiradas da linha de frente para possibilitar a execução do plano?

— Chega de discussão, Bell. Providencie para que os dados sobre a posição galáctica de Frago se tornem imediatamente conhecidos em Sphinx. Você cuidará para que todos os dados sobre a estrela dos robôs sejam transmitidos pelo rádio para Sphinx. Também quero vê-lo novamente daqui a uma hora.

Bell saiu para cuidar de sua tarefa. Estava contrariado.

 

Rhodan estudou um resumo da proposta acônida. Não poderia ocupar-se das centenas de milhares de detalhes. Não tinha tempo para isso, nem teria condições para conferir todos os cálculos. Confiava inteiramente no saber dos especialistas de Ácon, que haviam elaborado o tremendo plano por ordem do Grande Conselho.

Abandonariam uma posição defensiva que não oferecia a menor possibilidade de êxito, e passariam ao ataque contra os pos-bis.

Em essência, o plano era este.

Dizia-se que para isso seriam necessárias dez mil espaçonaves, o que representava uma insignificância em comparação com o total das naves das duas frotas. Mas as dez mil espaçonaves, retiradas da linha de frente, poderiam perfeitamente representar o fiel da balança.

Rhodan tinha plena consciência dos riscos que o plano envolvia. Mas será que na situação atual poderia perder alguma coisa?

O tempo parecia voar. Quando os acônidas voltaram, Rhodan ainda não havia tomado nenhuma decisão. Bell, Deringhouse e Mercant chegaram pouco depois dos seres de Ácon.

Sem dizer uma palavra, Bell entregou algumas folhas de plástico ao amigo. O autodomínio de Rhodan era admirável.

Da frente de combate tinham vindo notícias de derrotas inconcebíveis. De repente os cubos dos robôs pareciam estar em toda parte. As naves esféricas reuniram suas últimas forças para evitar que os monstros semibiológicos destruíssem algum mundo habitado.

O sistema central de Árcon era o único setor em que os pos-bis ainda não haviam penetrado. Atlan seguira o conselho de Rhodan e mandara que todos os torpedos disponíveis fossem disparados pelos destróieres em torno do sol de Árcon. Inúmeros projéteis, dirigidos por seus sistemas de localização, precipitavam-se sobre qualquer caixa de robôs que se aproximasse da área e a transformavam numa nuvem de gases incandescentes.

Rhodan teve uma ligeira lembrança disso quando leu o último relatório. Achava que os monstruosos pos-bis seriam perfeitamente capazes de, em breve, encontrar um meio de inutilizar o sistema de localização dos torpedos.

Levantou a cabeça. Seu olhar cruzou com o do acônida Sentoon.

— Acho que aceitaremos a proposta do Grande Conselho. Mas preciso verificar mais alguns documentos antes de tomar uma decisão definitiva.

Dirigiu-se a Mercant e cochichou. A seguir, o chefe da Segurança levantou-se e saiu da sala.

Depois disso a sessão foi interrompida por um chamado da estação de hiper-rádio de Terrânia. O Grande Conselho do Sistema Azul desejava falar com Perry Rhodan e Sentoon. A ligação foi estabelecida.

Um especialista do Grande Conselho, que não citou seu nome, dirigiu a palavra ao administrador.

— O quê? — interrompeu Rhodan. — O senhor diz que segundo seus cálculos positrônicos o planeta dos robôs não pode possuir nenhum envoltório atmosférico? Peço licença para ponderar que Frago já foi visitado por um grupo de terranos, que não apenas constatou a existência de um envoltório atmosférico, mas até mediu a temperatura do mesmo. Essa temperatura situa-se entre vinte e dois e vinte e três graus. Além disso, o senhor parece esquecer que os pos-bis “desinfetaram” nossa nave com um banho de ácido.

O especialista de Sphinx não se afastou da afirmação de que Frago, o planeta dos robôs, era um mundo sem atmosfera.

A paciência de Rhodan parecia ter chegado a fim.

— Pois realize cálculos para ambas as alternativas.

— Sir — respondeu o especialista em tom cortês, mas enérgico — isso não é possível. Nossos computadores rejeitam a tarefa, dizendo que a mesma é impossível. Os dispositivos positrônicos só começaram a realizar os cálculos quando partimos do pressuposto de que Frago não possui atmosfera.

Bell, que se encontrava ao lado de Rhodan, disse em voz baixa e em tom pouco amável:

— Este sujeito ainda me deixa maluco! Deringhouse sentiu o olhar de Rhodan.

Levantou a cabeça e ouviu a voz do chefe:

— Moders deve estar neste edifício. Traga-o para cá o mais depressa que puder.

O robólogo foi chamado pelo sistema geral de intercomunicação. Entrou, respirando apressadamente. Quando ainda se encontrava na porta, ouviu a pergunta de Rhodan.

— É claro que Frago tem uma atmosfera. Não sei por quê. Quando estive lá achei isso um tanto misterioso. A atmosfera do planeta contém uma porcentagem, elevada de argoncid, e isso a uma temperatura que varia de vinte e um a vinte e três graus...

— O senhor ouviu? — perguntou Rhodan, dirigindo-se ao especialista do planeta Sphinx.

— Ouvi, sir, mas essa informação só pode ser falsa. O que pretende fazer?

— O que é que ele está dizendo? — perguntou Moders, exaltado, e apressou-se em ficar atrás de Rhodan, a fim de ver a tela.

— O senhor esteve em Frago? — indagou o acônida com a maior calma.

— Naturalmente.

— Qual é sua profissão?

— Sou robólogo.

A voz de Moders não parecia nada amável.

— O senhor está em condições de realizar análises de ar?

Moders inclinou-se, a fim de ver o rosto de Rhodan.

— O que está querendo esse homem, chefe?

Rhodan explicou em poucas palavras.

— Pois continuo a afirmar que Frago possui envoltório atmosférico — disse o robólogo.

Rhodan pôs fim à discussão inútil.

— Faça o favor de remeter-nos quanto antes a interpretação dos dados relativos a Frago.

— Já foi enviada e deverá chegar em breve — uma vez proferidas estas palavras, a tela tornou-se cinzenta. O especialista do Grande Conselho de Sphinx não parecia ser amigo dos terranos. Desligara sem despedir-se.

Mercant voltou. Os delegados acônidas esticaram o pescoço. Allan D. Mercant vinha em companhia dos homens-pepino Petid e Oligo. As criaturas inteligentes, de formato estranho, pareciam ser uma novidade para os ancestrais dos arcônidas. Não era de admirar que se mostrassem espantados.

Os dois swoons caminharam em direção ao lugar em que estava Rhodan. O administrador falou baixinho com eles.

Oligo gesticulou com os quatro braços enquanto dava a resposta.

— Qual será o prazo mínimo, Oligo?

— De três a quatro horas, senhor. Mas, durante esse tempo, só poderemos fabricar um único aparelho. Se nossos laboratórios e instalações de montagem, bem como nossos colegas, fossem levados para bordo da Teodorico, poderíamos colocar em condições de funcionamento cem aparelhos no mesmo espaço de tempo.

Bell, que acompanhara atentamente a conversa, foi incumbido por Rhodan de providenciar imediatamente aquilo que Oligo acabara de sugerir.

Os delegados acônidas deram mostras evidentes de impaciência, mas o olhar de Rhodan fez com que se controlassem. Se havia um terrano capaz de impressionar os acônidas, esse terrano era Perry Rhodan. Até mesmo Sentoon, que demonstrava mais abertamente seu nervosismo, desistiu do seu intento de exigir uma decisão imediata do administrador. Sentiu que dificilmente esse homem se dobraria diante de qualquer força.

A porta fechou-se ruidosamente atrás de Bell.

— Temos de esperar até que tenhamos em mãos os cálculos relativos a Frago, vindos de Sphinx — disse Rhodan, com a maior tranqüilidade.

Os acônidas voltaram a impacientar-se. Sentoon levantou-se.

— Rhodan, cada hora que perdemos é importante...

— Não se desespere, Sentoon — respondeu Rhodan, com um aceno de cabeça. — Os terranos não costumam viver de aventuras. Dessa forma adio minha decisão para o momento em que dispuser de todos os dados e me tiver familiarizado com os mesmos.

Moders continuava parado a seu lado. Rhodan dirigiu-lhe a palavra.

— O senhor tem alguma explicação para o fato de, juntamente com seu grupo, ter constatado a presença de atmosfera em Frago, enquanto os grandes centros de computação acônidas afirmam exatamente o contrário?

Moders sacudiu a cabeça.

— Sir, já fiquei perplexo ao notar que Frago possuía atmosfera e espantei-me quando medimos essa temperatura de estufa... Ora essa, como foi que me esqueci disso? O senhor se lembra de nosso relatório sobre Frago, chefe? Tillurn foi alvejado por um pos-bi, por ter perdido seu neutralizador individual. Um de nós abriu o capacete espacial dele. E abrir o capacete espacial num mundo sem atmosfera sempre traz a morte. Acontece que Tillurn está vivo. Não poderia haver prova melhor de que Frago possui envoltório atmosférico.

— Moders, gostaria de dar-lhe razão, e na verdade aquilo que o senhor diz deve ser real. Mas como se explica que os computadores acônidas afirmam o contrário? Bem, deixe para lá. Talvez ainda descubramos.

Um robô anunciou a presença de um mensageiro.

O acônida entrou. Viera à Terra através das estações de transmissores de Sphinx e de Marte. Pretendia entregar a Sentoon os dados sobre Frago. Mas bastou um olhar de Rhodan para que o mensageiro entregasse os cálculos a ele.

O administrador fez como se não notasse a expressão de contrariedade no rosto de Sentoon.

Dali a dez minutos foi tomada a decisão.

Frago seria atacado.

— Sir...

Era Allan D. Mercant que se dispunha a falar.

— Mercant — interrompeu Rhodan — sei o que pretende dizer. Sinto vontade de dizer exatamente a mesma coisa. Desde que a vida da Galáxia é dirigida por criaturas inteligentes, a mesma nunca enfrentou um perigo tão grave como agora. Mais uma vez pretendemos fazer frente ao destino. Será que desta vez também conseguiremos?

— O senhor sente dúvidas, Perry? — perguntou o Marechal Solar Mercant, em tom apavorado.

Rhodan fez um gesto débil em direção aos dados vindos de Ácon.

— São números, Mercant, cifras, graus de probabilidade, posições com dez casas decimais depois da vírgula... E é nisso que se baseia nosso passo desesperado; o ataque a Frago. Não adianta conservar o ânimo quando sabemos que teremos de penetrar no nada absoluto, a fim de atacar um astro que, segundo os números, é um dos centros nervosos dos pos-bis. Não é a operação em si que me preocupa. O que me causa preocupação são as conseqüências que poderão resultar da ação. Qual será a reação das naves fragmentárias e das estações de rádio situadas no intercosmo? Será que toda a frota dos pos-bis decolará para destruir nossa Galáxia...?

Os sete delegados acônidas ouviram tudo. Nenhum deles fez o menor movimento. Sentiram-se fascinados diante do homem que criara o Império Solar, partindo do nada. E o mesmo homem acabara de traçar um quadro do futuro que não poderia ser mais medonho.

— Meu Deus — disse Van Moders, com um gemido. — Eu nem teria sonhado com isso!

Rhodan parecia cansado.

— O que acontecerá se atacarmos Frago? O quê...?

Levantou-se. Não queria ouvir nenhuma resposta à sua pergunta. E no grande recinto não havia ninguém que fosse capaz de dá-la.

Retirou-se. Deixou para trás um grupo de pessoas apavoradas: alguns terranos, dois swoons e sete acônidas.

 

A noventa e dois mil anos-luz da periferia da Galáxia, na direção da nebulosa de Andrômeda, Frago, o mundo dos robôs, pairava no espaço intercósmico.

Era o destino de dez mil unidades pesadas da Frota Solar. Todas as naves estavam equipadas com mecanismos de propulsão linear e pertenciam aos modelos mais recentes, saídos dos estaleiros lunares.

As dez mil naves esféricas, que se afastaram, abriram frestas ainda maiores nas linhas defensivas de M-13, e as naves dos pos-bis tiveram mais facilidade em romper essas linhas, levando a morte e a destruição para os mundos do Grande Império.

Antes de dar seu consentimento para o afastamento de dez mil naves, Atlan refletira por bastante tempo. De início suplicara a Perry Rhodan que não levasse avante o plano dos acônidas. Contudo a situação enfraqueceu sua súplica...

— Atlan, mais de duzentas naves de grande tamanho, cheias de torpedos, saíram da Lua e estão a caminho do front. No momento é só o que posso fazer por todos nós. Quanto a você, poderá desejar-nos boa sorte para a operação contragolpe — disse Perry Rhodan.

Num ponto situado a três mil anos-luz dos confins do intercosmo, dez mil naves esféricas terranas aguardavam a Teodorico.

Todas as naves achavam-se em estado de prontidão rigorosíssima, as peças de artilharia estavam prontas para disparar; todas as unidades energéticas funcionavam a plena potência, os kalups estavam prontos para entrar em ação. Só o hipercomunicador permanecia em silêncio. O chefe em pessoa ordenara a suspensão total das comunicações pelo rádio.

A misteriosa estação dos pos-bis e o planeta Frago não deveriam desconfiar de nada, até o momento em que fossem disparados os primeiros tiros.

Os sete delegados espantaram-se quando viram o administrador transferir o governo sem quaisquer formalidades a um terrano de aparência jovem.

— Capriche no seu trabalho, Tiff, e não se deixe esmagar pela guerra de papéis — disse Rhodan ao jovem.

Tiff respondeu:

— Chefe, por aqui as coisas não podem ser piores que no mundo de cristal de Atlan. E o senhor já me ensinou a fazer sempre a coisa mais importante em primeiro lugar.

A Teodorico decolou com uma potência extraordinária. Mais de quarenta swoons estavam a bordo, bem como os elementos mais importantes do Exército de Mutantes e quase todos os membros do governo terrano.

Quando a Teodorico fez rugir seus propulsores e correu em direção ao Sol poente, a noite descia sobre Terrânia.

No camarote de Rhodan houve uma conferência muito importante. O plano de batalha foi traçado. Não era muito difícil comandar o vôo de uma frota gigantesca, mas a tarefa de empregar dez mil naves sobre um alvo relativamente pequeno e confiar-lhes missões precisas exigia algo mais que simples conhecimentos práticos.

Três grandes centros de computação positrônicos funcionavam ininterruptamente. Elaboravam os detalhes do plano básico de Rhodan e, além de fornecer cronogramas para as diversas unidades, com uma profusão estonteante de coordenadas, indicavam o procedimento a adotar se todo o plano falhasse e as unidades tivessem de retirar-se.

Enquanto a Teodorico, comandada por Jefe Claudrin, um homem já consagrado nesta tarefa, corria pela zona de libração do semi-espaço a uma velocidade muito superior a mil vezes a da luz, o plano de ação estava praticamente completo.

O fato de que o planeta Frago era desconhecido, com exceção de uma superfície de alguns quilômetros quadrados, não representava nenhum problema para a execução do plano. Mas havia um problema bastante difícil, que era o de encontrar uma maneira de comunicar a cada nave as tarefas que lhe haviam sido confiadas.

Foi Bell quem levantou o problema.

Não se poderia cogitar dos telepatas. E o uso dos teleportadores também estava excluído.

— Que tal o rádio? — perguntou Deringhouse.

Rhodan, que não participara da discussão, tomou a palavra.

— Por que perdermos nosso precioso tempo com uma bagatela como esta? Quando ainda éramos jovens existiam as ondas ultracurtas. Pelo que sei, os rádios de todas as naves estão equipados com ondas ultracurtas. Por que está tão perplexo, Bell?

— Perry — gritou Bell — como pretende atingir com as ridículas ondas ultracurtas uma nave que se encontre afastada meia hora-luz? E como é que essa onda poderá passar por nossos campos defensivos?

— Basta desligá-los, gorducho. Quanto à outra pergunta que você acaba de fazer, as naves que se encontram no intercosmo estão bem perto umas das outras. Você realmente acha que não pensei nisso antes de retirar as dez mil naves do front?

Bell engoliu em seco. Teve a impressão de dispor de mais um trunfo, mas por sorte sua notou em tempo o olhar de Rhodan e ficou calado.

Rhodan penetrara nos pensamentos do amigo.

— Terei o maior prazer em responder à pergunta. Oligo e Petid, os homens-pepino, criaram há algum tempo um lindo “brinquedo”. Trata-se de um aparelho muito pequeno, capaz de produzir e irradiar as vibrações celulares dos laurins. Mandei que o aparelho fosse produzido em série. A bordo da Teodorico existe um bom estoque dos mesmos. Mas até o momento não temos um rastreador que, se necessário, nos permitirá localizar e pôr em movimento esses aparelhos. Durante a conferência com a delegação acônida, Petid e Oligo garantiram-me que, dentro de três horas, construiriam cem desses aparelhos de rastreamento. É por isso que os swoons se encontram a bordo. Faça outra pergunta, gorducho, que eu terei imenso prazer em responder-lhe.

— Você não está tomando uma atitude muito nobre ao espionar meus pensamentos, Perry — disse Bell um tanto contrariado, para voltar imediatamente ao tema central da conversa. — O que pretende fazer com esses aparelhos?

— Ora, gorducho — disse Rhodan com um sorriso — você verá quando eu der ordem para usá-los. Até lá tenha paciência, por mais difícil que seja.

 

Quando se encontraram no camarote de Perry Rhodan, Van Moders e Brazo Alkher já sabiam quais eram os planos do chefe. Não se sentiam muito felizes.

Wuriu Sengu, o espia, entrou pouco depois deles.

De repente o ar tremeluziu e Gucky apareceu. Mas não veio só. Trazia um homem-pepino em cada braço: Petid e Oligo. Colocou os microtécnicos cuidadosamente no chão e dirigiu-se ao sofá que ficava nos fundos do recinto.

Havia mais de vinte homens reunidos no camarote. A sala de comando anunciara há poucos minutos que, dentro de meia hora, a Teodorico chegaria ao ponto do intercosmo onde dez mil unidades dos tipos mais modernos a aguardavam.

Oligo, que era muito mais loquaz que Petid, caminhou a passos balouçantes em direção a Rhodan e informou-o de que cento e quarenta e cinco rastreadores haviam sido construídos e testados. Procurou atingir a borda da mesa com a mão direita superior. Gucky, que continuava no sofá, ajudou-o por meio da telecinese, e fez com que Oligo pairasse a meio metro de altura.

— Acho que assim é mais confortável, não é, meu pequeno? — piou Gucky e segurou Oligo por via telecinética, até que este colocasse o minúsculo aparelho sobre a mesa.

— Ora veja! — exclamou Bell. — Acho que não poderia mesmo ser menor que isso, não é, Oligo? Como é que um de nós pode fazer uma regulagem nesse aparelho?

— Hum... — fez Rhodan e examinou o pequeno aparelho de todos os lados.

“Será que Oligo estava rindo?”, pensou Rhodan.

— Este rastreador dispensa qualquer tipo de regulagem — disse. — Foi previamente ajustado. Só neste momento a face do instrumento parece ser tão pequena e difícil de ser vista. Permite, senhor?

O swoon, que mais uma vez pairou no ar graças às forças paranormais de Gucky, pegou o pequeno rastreador, encostou-o a uma superfície abaulada e virou a face dos instrumentos na direção em que estavam Rhodan e Bell.

A disposição dos instrumentos de medição, que no original se espalhavam por uma superfície de três centímetros de comprimento e pouco mais de um centímetro de largura, parecia ser dez vezes maior.

— O que é isso? — perguntou Bell, em tom de espanto.

— Senhor — disse o homem-pepino, em tom humilde — Petid e eu tomamos a liberdade de dar utilização prática a certas noções bem conhecidas da Física. A ampliação do quadro de instrumentos por dez vezes só produziu um pequeno aumento no volume do instrumento.

— Excelente! — disse Bell.

O gorducho era especialista na área, e por isso estava em condições de avaliar a façanha dos swoons que haviam conseguido esse efeito amplificador.

O pequeno swoon voltou a comprimir a superfície abaulada, e o quadro de instrumentos ficou reduzido ao tamanho de antes: três centímetros de comprimento e um centímetro de largura.

Gucky deixou que o swoon descesse suavemente ao chão.

Rhodan levantou-se. Dirigiu a palavra ao grupo. Expôs o plano em palavras precisas, sem ocultar os perigos que sua execução encerrava. Fitou os homens que já haviam posto o pé em Frago, o planeta dos robôs.

Todos pareciam pensativos quando saíram do camarote de Rhodan.

 

Enquanto a Teodorico ainda corria velozmente em direção ao primeiro ponto de destino, Allan D. Mercant já se encontrava em Árcon III.

Os habitantes dos três planetas de Árcon foram evacuados. Só aqueles que tivessem funções compatíveis com a missão poderiam permanecer para ajudar na evacuação.

Logo após sua chegada o chefe da Segurança procurara a grande estação de hiper-rádio e ordenara as providências que faziam parte do plano de Perry Rhodan. Só às estrelas saberiam dizer se essas providências jamais chegariam a traduzir-se em medidas práticas. E o destino do sistema de Árcon também estava escrito nas estrelas...

A presença de Allan D. Mercant no planeta da guerra logo viera ao conhecimento do público. Ainda não fazia meia hora que chegara à grande estação de rádio quando alguém anunciou a presença do engenheiro Macon.

Mercant teve de refletir um pouco para lembrar-se de quem era Macon. Finalmente lembrou-se de que era o homem encarregado da fabricação dos torpedos espaciais, que no momento eram a única arma eficiente contra os pos-bis.

Macon, um homem esbelto de seus quarenta anos, entrou. Parecia tresnoitado, fato que não prenunciava nada de bom. Sentou-se. Parecia exausto.

— Marechal solar, nosso estoque de matéria físsil será consumido até as 16:35 h, tempo padrão. A essa hora terei de paralisar todas as fitas de montagem em que são produzidos os torpedos. Agora são 11:13 h.

— O que é que eu tenho com isso, Macon? — disse Mercant com a voz áspera. — A manutenção de um estoque suficiente de material é problema seu e...

Calou-se de repente. Macon interrompera-o com uma risada amarga.

— Naturalmente o problema é meu, marechal solar, mas será que isso adianta alguma coisa se não há como trazer quantidades suficientes de matéria físsil? Será que o senhor não compreende? Veja nossas cifras atuais de produção, que não são nada desprezíveis. Cada projétil exige uma gigabomba. Estas cifras representam as quantidades de matéria físsil, em toneladas, que nossas fitas de montagem devoram por hora.

“Assim que foi iniciada a fabricação em grande escala solicitei a remessa de novas quantidades de material. Oito naves especiais de grande tamanho seguiram em direção a Árcon III. Nem uma única chegou. Expedi mensagens de emergência. Mais cinco naves seguiram em direção ao nosso planeta. As mesmas deveriam ter chegado há mais de sete horas. Não respondem a qualquer mensagem. Por isso vim discutir com o senhor as possibilidades de obter novos suprimentos.”

Mercant, que era um excelente psicólogo, deixou que Macon concluísse sua fala. Sabia por experiência própria que, muitas vezes, o homem nervoso, de tantas árvores que vê, não enxerga a floresta. Sabia que Macon era um excelente coordenador, que não tinha competidor na área da produção em grande escala. Se a situação era tão grave como o engenheiro acabara de expor, então estava na hora de informar Atlan, e até mesmo toda a Galáxia.

Será que realmente não havia solução para o grave problema de suprimentos?

— Macon, quais são as últimas notícias?

O engenheiro fez um gesto de desânimo.

— Na melhor das hipóteses, a primeira nave cargueira chegará amanhã de manhã. Mas o que adianta? Não conseguirá passar. Os malditos robôs a interceptarão no caminho. É o que está acontecendo há horas, há dias...

O homem parecia desesperado e esgotado.

Mercant levantou-se e foi para junto de Macon.

— Preste atenção e fique tranqüilo, Macon. Não me interrompa. Assim que sair daqui, o senhor irá diretamente à central de rádio. Chame as naves cargueiras que procuram trazer matéria físsil pelo telecomunicador. Pouco importa que se percam mais algumas horas. Mande que as cargas sejam levadas para Marte. Isso mesmo: para Marte. Lá foi instalado o grande transmissor acônida, e o mesmo transportará a carga para cá sem contratempos.

O olhar de Macon exprimiu uma admiração quase infantil. De repente seu rosto cansado parecia saudável.

— Meu Deus — balbuciou várias vezes. — Por que não me lembrei disso? Por quê?

Mercant teve a impressão de que conhecia o motivo da falha de Macon.

— Quando dormiu pela última vez, Macon? Quero dizer, quando dormiu de verdade?

Macon sobressaltou-se e fez menção de levantar-se. Mercant segurou-o na poltrona.

— O quê? Quando dormi? Dormir, eu? Não sei, marechal solar.

— Era o que eu imaginava. Liquide o assunto de que acabo de falar. Depois disso só terá de fazer uma coisa: dormir. Isto é uma ordem oficial. Peça a alguém que o acorde às dezesseis horas. Assim o senhor ainda chegará em tempo para paralisar as linhas de montagem às 16:35 h.

— Paralisar as linhas de montagem às 16:35 h? Não, marechal solar. Ainda não posso ir para a cama. Se os cálculos que realizei quando o senhor expôs a idéia do transmissor são corretos, os primeiros suprimentos chegarão pelas quatorze horas. Quando isso acontecer, preciso estar presente...

— Quando isso acontecer, o senhor deverá estar dormindo. Que diabo, Macon! O senhor dormirá, ou enfrentará a corte marcial da Frota Solar. Faça o favor de retirar-se.

Macon saiu apressadamente.

Mercant entrou em contato com Atlan. Quando viu o rosto de Gonozal VIII projetado na tela, compreendeu qual era a situação no front de M-13.

O arcônida, que há mais de dez mil anos, quando era almirante de uma gigantesca frota, descera na Terra como náufrago espacial, falava em inglês:

— Mercant, o fim está chegando. Esses robôs caçam-nos como se fôssemos lebres. Não existem torpedos espaciais em número suficiente para dispararmos alguns milhares deles contra cada uma dessas caixas. Neste momento estou sendo ouvido por trinta homens. E estes homens pensam exatamente aquilo que eu digo. Nosso fim está próximo. O Sistema Azul deixará de existir, o Império Solar e Árcon estão no fim. Tudo terminou!

Atlan devia estar certo, pois era ele que recebia todas as notícias sobre as lutas. Os trinta homens a que acabara de aludir eram os membros do estado-maior. Tratava-se de homens treinados na Frota Solar, que haviam dado provas de seu valor nas situações mais difíceis.

Mercant fez um esforço para controlar-se e disse com a maior tranqüilidade:

— Atlan, só acreditarei que tudo está no fim quando o chefe disser.

Ouviu-se uma risada vinda de uma distância de muitos anos-luz.

— Mercant, estes pos-bis com seus raios conversores roubaram-nos todas as esperanças. Se o Senhor tivesse visto o que nós observamos também se sentiria desesperado. Constantemente assiste-se à destruição de planetas, onde bilhões de homens viviam pacificamente há muitas gerações. E nós... bem, nós não podemos fazer nada para evitar esses crimes. Temos de entregar um planeta após o outro a esses robôs desalmados. E ouvimos ininterruptamente sua mensagem simbólica: “Nós somos vivos de verdade.” Então, o que me diz, Mercant?

— Não é muita coisa, Atlan — respondeu Mercant, que fitou o arcônida com uma expressão pensativa. — O chefe está a caminho de Frago. Segundo revelam as pesquisas dos especialistas acônidas, o planeta Frago ocupa uma posição-chave nas estações intercósmicas dos pos-bis. É um tipo de centro nervoso.

— Que os deuses de Árcon tenham compaixão de nós, Mercant — interrompeu o imperador. — Sabe lá o que vai acontecer se Rhodan puser a mão nesse centro nervoso? Centenas de milhares de naves fragmentárias investirão contra nossa Galáxia. E não há dúvida de que isso será o fim.

Mercant lembrou-se de que o chefe manifestara os mesmos receios. Teve dificuldade em responder às palavras de Atlan. Esquivou-se com uma observação:

— Nunca existe uma única possibilidade, imperador; sempre são duas...

— Estamos perdendo tempo, Mercant. Uma hora destas voltarei a chamar. Talvez isso aconteça quando do Grande Império de Árcon, que costumava ser tão orgulhoso, só restar Árcon I, II e III.

A tela de Mercant apagou-se. O arcônida cortara a ligação de telecomunicação em sua nave capitania. O chefe da Segurança permaneceu imóvel em sua poltrona por alguns minutos. Sacudiu a cabeça, pensativo.

Atlan tinha razão. A situação era desesperadora. E era preferível nem pensar nas conseqüências da experiência que Rhodan realizaria em Frago.

“Será que o fim realmente está próximo?”, questionou-se mentalmente.

Talvez se estivesse no início de uma nova era, em que os robôs semibiológicos se investiriam no domínio da Via Láctea.

 

A órbita de Frago fora determinada com toda precisão, pois os computadores das naves estavam em condições de calcular a posição que o planeta ocupava a cada instante. Apesar de ser protegido por um gigantesco campo relativista, o mundo dos robôs, que constituía um único centro industrial, podia ser localizado.

Além do oceano de estrelas, a três mil anos-luz do limite do espaço intercósmico, dez mil naves terranas aguardavam o primeiro momento X. O lado esquerdo das telas panorâmicas mostrava a fita reluzente da Via Láctea, em cujo interior se travava uma luta de vida e morte.

Nas salas de comando das espaçonaves reinava o silêncio. Em cada uma das naves, o computador de bordo fazia a contagem regressiva.

Finalmente chegou o primeiro momento X.

Dez mil espaçonaves dirigidas por computadores movimentaram-se. O compacto grupo ampliava-se a cada segundo que passava, e as naves seguiram as rotas prescritas a cada uma.

O segundo momento X chegou.

Os kalups rugiram no corpo das naves. Os gigantes esféricos pareciam desaparecer dos lugares em que estiveram pouco antes. Dez mil veículos espaciais deixaram de existir no Universo normal.

Haviam sido recolhidos pelo semi-espaço. Uma vez aí mergulhados, aceleraram e sua velocidade atingiu cifras astronômicas.

As telas de visão global escureceram por um instante. A fita reluzente da Galáxia voltou a aparecer. O rastreador de relevo permitia que os tripulantes que se encontravam no semi-espaço enxergassem no Universo normal.

O terceiro momento X chegou.

Dez mil naves aproximavam-se de Frago, o mundo dos robôs. Tratava-se de um planeta que há tempos imemoriais pertencera a um grupo de estrelas, mas passara a flutuar no abismo escuro de tempo e espaço, para aproximar-se cada vez mais daquela Via Láctea em que certas criaturas inteligentes travavam uma luta desesperada contra robôs semibiológicos — contra os mesmos robôs que haviam feito de Frago seu planeta da guerra.

Quando chegou o terceiro momento X, Rhodan e Bell dirigiram-se à sala de comando. Um grupo de pessoas que participaria de um comando estava preparado a bordo da Teodorico. Cada um sabia o que tinha a fazer. E todos estavam conscientes de que a experiência com Frago, o mundo dos robôs, representava a última tentativa de salvar a Galáxia dos pos-bis.

Bell estava sentado ao lado de Rhodan, à frente do grande painel de instrumentos. Jefe Claudrin ocupou a poltrona do piloto. Por enquanto o epsalense não tinha nada a fazer. A Teodorico ainda estava sendo pilotada pelo computador positrônico. Mas, no momento em que a nave voltasse a penetrar na estrutura espaço-temporal normal, haveria trabalho de sobra para o epsalense.

Em grande parte dependeria dele se o gigante esférico seria transformado num sol pelo fogo dos fortes intercósmicos dos pos-bis, ou se escaparia dos perigosos raios conversores.

Rhodan olhou para o relógio de bordo. Dali a alguns segundos, a nave retornaria ao Universo normal.

A hora chegou!

Localização em três ou quatro aparelhos ao mesmo tempo.

Desta vez Brazo Alkher não se encontrava no centro de comando de tiro. Pertencia ao comando que visitaria o planeta. Pertencia ao pequeno grupo de pessoas que logo pisariam pela segunda vez em Frago.

— Disparar torpedos! — disse a voz transmitida pelo intercomunicador.

Seis torpedos espaciais foram disparados. Eram minúsculos projéteis, que levavam cinco minutos para alcançar uma velocidade próxima à da luz. Uma nave fragmentaria podia desviar-se deles com uma manobra rapidíssima. Acontece que Frago não era nenhuma nave, mas um planeta. E a única coisa que este poderia fazer era tentar derrubar os torpedos.

O kalup rugiu. Pela segunda vez a Teodorico mergulhou no semi-espaço. Estava mesmo na hora. Frago havia localizado nave e disparara um tiro de radiações.

O impacto e a passagem para o semi-espaço foram simultâneos.

— Escapamos por pouco! — disse Jefe Claudrin.

Dali a um segundo, o epsalense nem s lembrava mais disso.

O rastreador de relevo voltou a funcionar.

A tela estava envolta na escuridão. A iluminação da sala de comando fora reduzida ao mínimo.

Um relógio especial tiquetaqueava, indicando o tempo em que os seis torpedos espaciais deveriam atingir o campo relativista de Frago.

Face ao excelente sistema de localização dos pos-bis era duvidoso que todos os mísseis chegassem lá. Mas, segundo os cálculos, dois torpedos que explodissem no ponto exato do campo relativista, cada um com um desempenho energético de quinhentos gigatons, seriam suficientes para eliminar o campo defensivo planetário.

Três minutos.

Quatro! Os seis torpedos aproximavam-se lateralmente do planeta, desenvolvendo 0,8% da velocidade da luz. Deveriam tangenciar o campo defensivo, para que apenas uma pequena porcentagem de sua capacidade destrutiva causasse devastações no mundo dos robôs.

O quarto minuto chegou ao fim.

Um sol fulgurante surgiu na tela. A Teodorico voltou a sair do semi-espaço. Com Isso, um impulso simultâneo foi transmitido a mais de sessenta por cento da frota. Mais de seis mil espaçonaves apareceram repentinamente acima de Frago.

— O campo relativista desapareceu! — gritou um oficial.

A Teodorico disparou. E mais trinta naves juntamente com ela. Os fortes de Frago voaram pelos ares.

Os sóis de seis torpedos detonados derramaram sua luz artificial sobre um mundo que há anos descrevia sua órbita no intercosmo. Era a primeira vez que milhares de humanos viam a superfície do mundo dos robôs.

A Teodorico atirava ininterruptamente. Mais de trezentas espaçonaves atacaram ao mesmo tempo. Era de se admirar que a profusão de radiações destruísse constantemente os fortes dos pos-bis, deixando intactas as instalações industriais.

— Tomara que os robôs não levantem outro campo relativista numa questão de segundos, Perry.

O gigante esférico correu velozmente sobre Frago. Bell olhou para Jefe Claudrin! O epsalense não pilotava a nave.

Perry leu os pensamentos do amigo.

— Queremos encontrar a usina de cisão celular, gorducho.

— Isto é um verdadeiro “comando suicida”! — exclamou Bell, em tom exaltado.

— Tomara que a usina de plasma não fique do lado oposto desta estrela maluca. É apavorante ver o que os robôs construíram lá embaixo — disse Jefe Claudrin.

— Sir, Frago não possui atmosfera! — gritou de repente o analista de ar. — Não existe envoltório gasoso. Aqui reina o frio do espaço. Não encontrei o menor vestígio de gases. Apenas constato a presença de certas quantidades de calor, mas as fontes desse calor estão perfeitamente delimitadas e podem ser identificadas perfeitamente como produto de processos energéticos.

— Caramba! — disse Bell. — Os computadores acônidas têm razão.

— Vamos esperar, Bell.

O planeta de robôs parecia ser um único forte cósmico. Em todos os lugares surgiam pontos ofuscantes, que no mesmo instante se transformavam em raios que cortavam o espaço.

Os sóis atômicos produzidos pela explosão de seis torpedos já se haviam apagado, mas apesar disso Frago estava envolto numa luminosidade que nunca existira por ali.

A frota terrana disparava com todas as torres de canhões. Concentrava seu fogo sobre determinadas instalações defensivas. Dez ou vinte naves dirigiam seu fogo sobre um único forte. Lá embaixo irrompiam vulcões energéticos, que se abriam em forma de cogumelo e espalhavam sua luz por uma extensão de vários quilômetros.

Mas não eram só os raios disparados pelas naves terranas que acertavam o alvo. Os fortes também golpeavam.

— Conversor de símbolos funcionando, sir!

Rhodan esperara por isso há alguns minutos. Precisou ter mais alguns segundos de paciência. A tradutora parecia debater-se para decodificar a mensagem simbólica.

— Ataque à verdadeira vida e ao milagre interior! Salvem o milagre e amem a verdadeira vida!

Bell fitou Perry Rhodan com uma expressão de perplexidade. Não se atreveu a formular qualquer pergunta. Qual seria o sentido dessa mensagem simbólica? O que vinha a ser o milagre interior? Era mais uma coisa nova e misteriosa.

— A mensagem simbólica vem sendo repetida ininterruptamente — informou a tradutora.

— Não sabem quem somos — disse Rhodan com um aceno de cabeça. — Isso nos favorece e corresponde ao cálculo de probabilidade dos acônidas. Eu...

Claudrin interrompeu-o. No mesmo instante, os neutralizadores de pressão da nave uivaram. A Teodorico devia ter mudado de rumo numa fração de segundos. As palavras de Claudrin confirmaram o fato.

— A usina de cisão celular acaba de ser descoberta. A nave segue em direção à mesma.

A sala de rádio apresentou a primeira interpretação do pedido de socorro de Frago.

— A mensagem de hiper-rádio é dirigida para o intercosmo. A recepção parece ter sido confirmada pela mesma estação que dirige o ataque à nossa Galáxia. Nada mais. Fim da interpretação.

Rhodan pegou o microfone do sistema de intercomunicação.

— Grupos, mutantes e Alkher — disse com a voz controlada. — Estamos próximos ao destino. De inicio os teleportadores entrarão em ação. No devido tempo serão fornecidas novas instruções. O momento da atuação dos teleportadores ainda será anunciado. Entendido?

A voz de Brazo Alkher soou no alto-falante.

— Entendido, chefe. Teleportadores aguardando ordens. Final.

A algumas centenas de quilômetros do lugar em que se encontrava a Teodorico uma nave terrana explodiu. Quantas já seriam?

Não tiveram tempo para refletir sobre isso. Tornava-se necessário cumprir o plano de que dependia o destino da Via Láctea.

Jefe Claudrin conhecia sua tarefa, até mesmo dormindo. Por meio de um impulso transmitido pelo rádio convocou quatro supergigantes e dezoito couraçados, que flanqueariam a Teodorico.

A fase mais perigosa do plano teria início.

 

A produção em série de torpedos em Árcon III não sofreu nenhuma interrupção. No último minuto o material físsil para as gigabombas chegou pelo transmissor acônida instalado em Marte.

Allan D. Mercant não prestou muita atenção quando o engenheiro Macon lhe comunicou esse fato. Aguardava com uma impaciência cada vez maior a mensagem condensada vinda do intercosmo, que representaria o sinal para entrar em ação.

Mas não veio nada, com exceção da mensagem simbólica permanente expedida pela estação de Frago. Para Mercant, era o único sinal de que a frota terrana sobrevoava e combatia o mundo dos robôs.

Informou Atlan, mas a noticia do início da operação no intercosmo não provocou nenhum entusiasmo no imperador. O arcônida estava extenuado.

Mercant, que se encontrava na sala de chefia da grande estação de hiper-rádio, assustou-se quando a tela se iluminou.

Mas quem estava chamando não era Rhodan.

Era Atlan. Seus olhos pareciam chamejar. O rosto estava transformado numa máscara. Começou a falar.

— Mercant, as naves fragmentárias dos pos-bis respondem ao ataque que Perry lançou contra Frago com um bombardeio de raios conversores como nunca vimos. Pela primeira vez essas caixas diabólicas mostram todo seu poder de fogo.

“Marechal Solar Allan D. Mercant, ainda assistirei a isto por uma hora. Se as perdas continuarem no mesmo nível, darei ordem para suspender a luta. Salve-se quem puder, será esta a...”

— Não faça isso, Atlan! — gritou Mercant, descontrolado, para o arcônida. — Atlan, com isso estaria golpeando Perry Rhodan pelas costas. Será que todos perderam a capacidade de raciocinar?

— Sabemos raciocinar, mas não conseguimos mais acreditar. Faz uma hora que o último clã dos saltadores abandonou o planeta Archetz. Dentro de duas horas sua atmosfera também estará em chamas. Mercant, seria uma irresponsabilidade da minha parte mandar maior número de homens para uma morte absurda. E a luta contra os pos-bis é um absurdo.

— Arcônida...

— Mercant, minha nave sofreu dois impactos graves. No momento abrimos fogo concentrado contra uma dessas caixas. Apesar disso não conseguimos destruir a nave fragmentária. Em compensação um cruzador pesado da Terra explodiu. Lembro que a minha embarcação sofreu dois impactos graves. Se a nave fragmentária não tivesse sido atingida por um dos torpedos, minha nave já teria deixado de existir.

— Atlan, por enquanto nenhuma nave pos-bi conseguiu pousar nos três mundos de Árcon. A evacuação de Árcon III quase foi concluída...

O Imperador Gonozal VIII não interrompeu o chefe da Segurança.

— Atlan, o senhor não viveu dez mil anos na Terra? No momento não vejo o menor sinal disso. O senhor realmente não passa de um arcônida de boa estirpe.

O fato de Mercant dirigir estas palavras ao imperador do Grande Império era bastante significativo.

De início teve-se a impressão de que o arcônida iria enfurecer-se diante da tela instalada em sua nave capitania, mas logo um sorriso cansado passou por seu rosto.

— Com isso vocês sempre conseguem convencer-me — disse a contragosto. — Que diabo, Mercant! O senhor deve ter aprendido o método com o gorducho. Vocês terranos são mesmo um povo obstinado. Bem que eu deveria conhecê-los.

— Muito obrigado pelo elogio, Atlan — disse Mercant com uma risada. — Um instante, por favor...

O intercomunicador da sala de rádio estava transmitindo uma notícia. Mercant parecia curioso para ouvi-la.

— Imperador — disse depois de algum tempo, dirigindo-se novamente a Atlan. — Mais três linhas de montagem acabam de iniciar a produção de torpedos espaciais. Dentro de algumas horas, o suprimento deverá quadruplicar. Com isso deverá ser possível ao menos reduzir o ritmo dos ataques dos pos-bis.

— Bem que eu gostaria de ter seu otimismo, Mercant. Até logo mais.

O tempo parecia ter parado para Mercant. Os minutos arrastavam-se preguiçosamente. O chefe da Segurança Solar sabia de cor o cronograma de Perry Rhodan. Se metade do intercosmo não tivesse desabado sobre o chefe, naquele momento a Teodorico deveria sobrevoar Frago, acompanhada por mais de seis mil espaçonaves.

O resto da gigantesca frota ainda prosseguiria em vôo linear. Estaria preparada para, a um impulso de rádio expedido por Rhodan, retornar ao Universo normal, a fim de, rapidamente, executar uma tarefa bem definida.

Mercant respirava pesadamente. Os acônidas haviam elaborado um plano complicado, mas este não excluía a hipótese do fracasso.

Em seu conjunto, as chances dos terranos e dos pos-bis se igualavam, isto se não fosse considerado o fato de que não havia mais nada que detivesse o ataque das naves fragmentárias contra M-13.

O plano dos acônidas deixava de responder a uma indagação. Frago era ou não era um mundo de importância extraordinária para os robôs semi biológicos?

Mercant voltou a olhar para o cronômetro.

— Santo Deus! — disse com um gemido. — A mensagem condensada já deveria ter chegado há oito minutos.

O intercomunicador emitiu um estalido. Um som, como se alguém respirasse com dificuldade, saiu do alto-falante.

— Marechal, Frago envia ininterruptamente pelo hipercomunicador pedidos de socorro do seguinte teor: “Ataque à verdadeira vida e ao milagre interior! Salvem o milagre e amem a verdadeira vida!” Segundo revelam as medições, o pedido de socorro vem sendo irradiado em direção ao intercosmo.

— Faça o favor de informar o imperador!

— Isto já foi providenciado, sir. A nave capitânia confirmou o recebimento. Mais alguma ordem?

Mercant não tinha nenhuma. Preparou-se para outra espera enervante.

 

O analista de ar da Teodorico segurou a cabeça com ambas as mãos. Mais uma vez soltara um grito.

— Procure controlar-se! — berrou Bell. — Confirme a análise. Rápido!

O oficial empalideceu. Deixou cair os braços e voltou a olhar para o painel de instrumentos, onde os ponteiros deslizavam sobre as escalas.

— Sir, Frago possui uma atmosfera! E essa atmosfera tem uma elevada percentagem de argoncid. A temperatura é de estufa e... Santo Deus! Não é possível! Tudo voltou ao marco zero. Tudo!

Rhodan inclinou-se para Claudrin. O epsalense mantinha-se imóvel na poltrona principal, com ambas as mãos sobre as teclas da pilotagem manual.

— Jefe, procure sobrevoar mais uma vez a usina de cisão celular. Tenho uma suspeita.

Bel sabia que esta não era a hora de fazer perguntas.

Três disparos de raios conversores passaram rente ao envoltório energético da Teodorico. O epsalense assobiou. Junto ao painel de pilotagem alguns ponteiros dançaram sobre as escalas, em direção aos valores máximos. Os neutralizadores de pressão uivaram fortemente.

A usina de cisão celular voltou a aparecer na tela. Estava cercada por um cinturão de fortes, que disparavam ininterruptamente seus raios conversores.

— Onde está o terceiro grupo de naves? — esbravejou Claudrin, que de repente perdeu um pouco de sua calma habitual.

Em sua opinião o terceiro grupo sofrera um atraso de alguns minutos. Rhodan sabia por quê. Essas naves, cuja tarefa consistia principalmente em proteger a Teodorico, não estiveram em condições de executar com a mesma rapidez a mudança de rota realizada por Claudrin.

— Sir — voltou a gritar o analista, desta vez com a voz controlada. — Frago só possui atmosfera em áreas estreitamente limitadas. Trata-se de uma capa de ar guardada sob um envoltório energético bastante débil.

— Era só o que eu queria saber. Volte à rota anterior, Claudrin! — disse Rhodan, satisfeito.

Sua suspeita fora confirmada. Frago era um mundo sem envoltório atmosférico Apenas a usina de plasma, na qual segunda a teoria de Kule-Tats o plasma era levado à cisão, estava coberta por um “colchão de ar”.

— Sir, o quinto e o vigésimo segundo grupo acabam de chegar — informou alguém pelo intercomunicador.

Essa notícia destinava-se ao chefe e Claudrin.

Os dois grupos estavam com um atraso de onze minutos em relação ao cronograma As instalações defensivas de Frago eram muito mais numerosas e potentes do que os computadores acônidas haviam calculado.

Apesar disso, as perdas totais de naves terranas eram reduzidas em comparação com as posições intercósmicas de fogo. Mas o que quase chegava a preocupar era o número de naves que sofreram avarias médias. Os pos-bis conseguiam constantemente danificar os envoltórios esféricos por meio de seus diabólicos raios conversores.

De repente os canhões da Teodorico silenciaram. Mais de seiscentas unidades, que compunham o grupo 23, haviam-se colocado à frente da nave capitania da Frota Solar. Frago estava sendo inundado pela luminosidade. As telas acopladas à ampliação máxima mostravam perfeitamente a superfície bizarra do planeta com seus loucos conjuntos industriais. Mais três círculos vermelhos trêmulos cercaram a usina de plasma celular.

Rhodan hesitou em enviar seus teleportadores a esse inferno atômico. Perfeitamente controlado, mas tenso por dentro, aguardou a informação sobre os valores R que reinavam nessa área de Frago.

Os valores foram fornecidos. Rhodan não acreditou no que estava ouvindo. Esteve a ponto de solicitar uma confirmação, mas lembrou-se do envoltório energético que evitava que o ar que cobria a usina escapasse.

Era este o motivo por que os raios R não chegavam às imediações da usina.

— Os teleportadores entrarão em ação imediatamente — ordenou Perry.

Recostou-se lentamente na poltrona.

— Será que pelo menos um deles voltará? — perguntou a si mesmo.

 

Gucky fechou o capacete espacial assim que o alto-falante transmitiu a voz de Rhodan, dizendo que “os teleportadores entrarão em ação imediatamente”. O africano Ras Tschubai e o japonês Tako Kakuta já estavam preparados há alguns minutos. Os três usavam trajes voadores arcônidas. Estavam armados até os dentes, no sentido literal da expressão. Além disso havia grandes volumes depositados à sua frente.

Gucky não teve necessidade de carregar peso. Este foi eliminado por meio da telecinese.

Ras comandava o pequeno grupo.

— Saltar! — disse pelo rádio de capacete.

Havia três seres a menos na cabina de operação dos mutantes. Os teleportadores haviam saltado.

Gucky praguejou quando foi parar menos de cem metros de altura, na mesma área em que há algum tempo pousara a Alta-663, obrigada que fora por uma nave fragmentária.

— Silêncio, Gucky! — ordenou Ras Tschubai, pelo rádio de capacete.

O rato-castor parou de praguejar. Os três teleportadores desceram lentamente.

— Espalhem-se conforme o plano e voltem a reunir-se imediatamente! — determinou Ras.

Gucky teleportou-se em direção a uma torre que se erguia em espiral. Ao que se dizia, havia uma entrada para a usina de plasma à direita da mesma.

Gucky parou junto à torre. Jogou ao chão dois dos quatro volumes que levava consigo. Abriu-os com um simples movimento da mão.

Diante dos pés de Gucky encontravam-se os pequeninos aparelhos construídos pelos swoons Petid e Oligo. Esses aparelhos produziam e irradiavam as vibrações celulares dos laurins.

Gucky desapareceu e dois segundos depois estava de volta. Em cada salto levava certo número de aparelhos e os colocava num lugar adequado.

Ras Tschubai trabalhava a três quilômetros dali, junto ao tanque de ácido em que a Alta-663 fora “desinfetada” tempos atrás.

O débil Kakuta cumpria sua tarefa do lado oposto, junto ao envoltório energético que prendia o colchão de ar junto à usina.

Ras foi o primeiro a terminar o trabalho. Mas não esperou muito tempo pelos outros.

Gucky apareceu.

— Livrei-me de metade dos aborrecimentos causados pelos pos-bis, Ras! — disse em tom petulante. Kakuta também se apresentou. Verificaram a hora. Haviam consumido na primeira parte da tarefa 150 segundos menos que o previsto.

Teleportaram-se e materializaram-se no setor em que Van Moders e seus companheiros haviam visto o plasma sair de uma máquina e cair na gigantesca tina.

Gucky captou a mensagem telepática de John Marshall com uma incrível debilidade:

— Suspender ação na usina de plasma. Passem para o plano três.

Gucky confirmou por via paranormal o recebimento e a retransmitiu pelo rádio do capacete. Logo após saiu à procura de Ras e Tako. Voltou a utilizar suas forças telepáticas e não demorou em encontrar Ras. O africano levantou a arma quando viu a luz do farol à sua frente.

— Sou eu! — piou a voz nervosa de Gucky pelo rádio de capacete. — Marshall deu ordem para que nos desviássemos para o plano três.

— Também ouvi pelo rádio! — disse Kakuta que estava um pouco afastado.

Gucky foi buscá-lo a fim de ganhar tempo.

— Pos-bis! — gritou Ras Tschubai de repente.

Haviam sido localizados pelos robôs. Ras Tschubai atirou com ambas as armas narcotizantes, enquanto Gucky disparava seu desintegrador.

— Apaguem os faróis! — berrou Tako Kakuta pelo rádio de capacete.

No mesmo instante os mutantes viram-se cercados por uma escuridão impenetrável.

— Não consegui pegar o robô! — constatou Gucky, em tom triste.

Sentiu que Ras o segurava. A outra mão do africano entrou em contato com Tako Kakuta. Os três saltaram ao mesmo tempo.

O plano três previa que se dirigissem aos fortes espaciais.

Mas o plano continha uma ressalva. Antes de executá-lo deviam solicitar o valor R.

Frago, o mundo sem atmosfera, estava coberto por nuvens atômicas incandescentes numa extensão de muitos quilômetros, e as mesmas espalhavam-se numa forte turbulência.

Gucky logo conseguiu entrar em contato com Marshall. O chefe dos mutantes já dispunha dos níveis de radiações. Marshall respondeu assim à pergunta que Gucky lhe transmitiu por via telepática:

— A permanência por oito minutos, tempo padrão, não envolve nenhum perigo. Em hipótese alguma devem expor-se por mais tempo às radiações intensas, pois estas são fortes demais até mesmo para os trajes voadores arcônidas.

Gucky transmitiu a notícia a Ras pelo rádio de capacete. Realizaram uma conferência numa gigantesca área livre, que devia ser um dos numerosos portos espaciais de Frago.

Em oito minutos não conseguiriam muita coisa. E as perguntas de Gucky ainda trouxeram novas preocupações.

— Será que os pequenos aparelhos suportam doses fortes de radiações? Será que continuarão a funcionar nesses níveis elevados?

Estas perguntas foram transmitidas por via telepática a Marshall, que se encontrava na Teodorico. Marshall teve de consultar o chefe, que por sua vez se viu obrigado a transmitir a pergunta aos swoons.

Gucky recebeu a resposta de Marshall:

— Os aparelhos são à prova de radiações.

Ligaram os cronômetros. Quando os ponteiros indicaram a marca zero, teleportaram-se. Dentro de oito minutos todos deveriam voltar para bordo da Teodorico. Guck informou Marshall por via paranormal.

Ras encarregou-se do primeiro círculo de fortificações em torno da usina de plasma e Kakuta, do segundo. Gucky reivindicara para si o círculo mais extenso.

— Santo Deus! — piou a pequena criatura, em tom apavorado. — Uma caixa.

A nave fragmentária passou sobre suas cabeças como se fosse um cometa, num silêncio fantasmagórico, irradiando energias atômicas para todos os lados. Estava condenada à destruição.

— Hora zero! — anunciou Ras pelo rádio de capacete.

Tinha certeza de que Gucky se teleportaria para o anel externo de fortificações. Mas no último instante o Tenente Guck resolvera outra coisa...

Saltou na direção da nave fragmentária que estava caindo. Materializou-se por um instante cem quilômetros acima dela, a fim de orientar-se. Lá embaixo o gigantesco cubo bateu no chão e desfez-se numa orgia de luzes. Numa extensão de trinta quilômetros todos os objetos foram profusamente iluminados.

Gucky não se interessou pelo fato de estar caindo que nem uma pedra. Seus olhos inteligentes gravaram as características mais importantes do mundo de Frago — agora iluminado — que se estendia sob seus pés.

Um complexo industrial muito alto provocou sua curiosidade.

No mesmo instante teleportou-se para lá.

Viu-se cercado pela escuridão. Não havia atmosfera. Encontrava-se pelo menos a duzentos quilômetros da usina de plasma. Queria saber onde estava. O lugar em que se encontrava não lhe proporcionava muita liberdade de movimentos. Não se sentiu muito à vontade quando ligou o farol.

Viu um pos-bi bem à sua frente! Gucky sentiu-se tomado pelo pânico e esteve a ponto de atirar, mas notou que havia algo de esquisito no robô.

Arriscou-se a ligar novamente o farol.

O Tenente Guck compreendeu onde estava. Deixou caminhar o feixe de luz tranqüilamente de um lado para outro. Estava sentado sobre um pos-bi. À frente, atrás dele, dos lados, em toda parte havia robôs.

Fora parar num depósito de robôs. Mas nenhum dos que se encontravam ali havia sido ativado. Estavam paralisados.

— Uma coisa destas tem vida! — piou a pequena criatura sob o capacete de plástico. — Eu lhes mostrarei o que é bom!

Abriu os últimos dois volumes que trazia. Mais uma vez viu vibradores celulares à sua frente. A cada salto, seu estoque diminuía. Quando deu o décimo salto tentou avaliar o comprimento do depósito, mas a luz de seu potente farol ainda não atingia o fim do pavilhão.

A pequena criatura divertia-se a valer. Esfregou as mãos de contentamento ao pensar no que aconteceria dali a pouco.

Tudo foi feito numa questão de segundos. Colocou cada vibrador celular embaixo de uma pilha de robôs.

Seu cronômetro emitiu um sinal. O sétimo minuto estava chegando ao fim. Gucky não se importou. Ainda faltava muito para distribuir seu estoque de aparelhos. O fato de poder brincar bem à vontade fez com que se esquecesse de que se encontrava num planeta de robôs situado no intercosmo.

No momento em que estava empilhando algumas centenas de robôs, Marshall chamou, de tão ocupado que estava, Gucky nem chegou a ter consciência da paramensagem.

John Marshall, que se encontrava na cabina de operações dos mutantes, empalideceu.

— É inacreditável! Quer que eu cuide do meu trabalho. E o pequeno atreve-se a dizer uma coisa dessas a mim!

Gucky estava inocente. Nem desconfiava da resposta telepática que acabara de dar a John Marshall. Apenas queria que o deixassem em paz.

Queria que os pos-bis tivessem seus problemas com os vibradores celulares, que estava escondendo como se fossem ovos de páscoa.

Ele se alegrou quando uma pilha de robôs se precipitou para o corredor estreito, arrastando consigo outros robôs. Divertia-se a valer. Sob a pilha havia um único aparelho.

Gucky, que se sentia eufórico, estremeceu quando captou os pensamentos de Rhodan.

Uma trovoada desabou sobre ele; o rato-castor temeroso emitiu:

— Chefe, nunca tive a intenção de transmitir o que Marshall captou. Ainda não posso sair daqui, Perry. Por aqui há milhões de robôs não ativados, e estou escondendo os aparelhos embaixo das pilhas...

Em toda a Via Láctea só havia uma única pessoa que podia atrever-se a falar assim com Perry Rhodan. Naquele momento, o administrador não se sentiu chocado com as expressões usadas por Gucky, e esqueceu-se do que a pequena criatura dissera por via telepática ao chefe do Exército de Mutantes. Viu em Gucky o que o mesmo sempre era quando a situação se tornava crítica: um tenente da Frota Solar que devia ser levado a sério e possuía senso de responsabilidade.

— Está bem, Gucky. Mas ande depressa. O mais importante é não perder nem um minuto. Quanto tempo ainda demorará?

A pequena criatura rejubilou-se no seu íntimo.

— Chefe, estarei de volta dentro de cinco minutos, no máximo.

Dali a três minutos e dezoito segundos Gucky apareceu na cabina de operações dos mutantes. Seu traje espacial absorvera a dose de radiações melhor do que se esperara. Fez como se não visse John Marshall. Em sua opinião, John bancara o dedo-duro com ele. Era uma coisa que não suportava. Quando Marshall pretendeu dirigir-lhe a palavra, teleportou-se para a sala de comando da nave capitania.

— A coisa pode começar, Perry! — piou, e uma alegria marota brilhava em seus olhos.

— Isso está liquidado, pequeno. O impulso já foi irradiado — respondeu Rhodan.

As pessoas que se encontravam na sala de comando estavam curiosas para conhecer o resultado da atuação dos teleportadores.

A Teodorico continuava cercada por uma quantidade imensa de raios de vários metros de espessura. Mas as naves terranas não deixaram de dar a resposta adequada aos fortes do planeta intercósmico.

Finalmente a notícia que todos aguardam veio da grande sala de rádio.

— Sir, Frago modificou seu pedido de socorro. O novo texto é o seguinte: “A falsa vida encontra-se entre nós e está diante do milagre interior.” Esta mensagem está sendo irradiada ininterruptamente em direção ao intercosmo. Pelo que pudemos constatar, o destinatário é aquela estação misteriosa.

Van Moders correu para junto de Perry Rhodan.

— Chefe, o milagre interior é a usina de plasma, e para os robôs os invisíveis são a falsa vida. Tomara que os pos-bis não nos tenham identificado como terranos. Nesse caso todo o risco terá sido em vão.

— Façamos votos de que não seja assim, Moders. Quer fazer o favor de permanecer na sala de comando? Quero que esteja por perto. E Kule-Tats também.

Correu para a sala de rádio. Assim que entrou, alguém disse em voz alta:

— Chefe, a notícia destinada ao Marechal Solar Mercant acaba de ser irradiada.

Tratava-se da mensagem condensada e distorcida, que o chefe de Segurança esperava em vão há trinta minutos.

O terceiro grupo precipitou-se sobre Frago, atirando com todo os canhões de radiações, a fim de destruir os últimos fortes que cercavam a usina de plasma.

A Teodorico seguiu na esteira do grande grupo. Dezoito mutantes e oitenta membros da tripulação iriam entrar em ação.

Moders colocou-se à frente de Rhodan.

— Por que não posso ir com eles, chefe? Acho que minha participação é indispensável.

— Será que ainda tem saudades de Frago? — perguntou Rhodan, em tom irônico.

— Não se trata disso, chefe. Gostaria de dar mais uma olhada na máquina que despeja o plasma na gigantesca tina. Além disso em Terrânia não existe mais plasma para as experiências.

Rhodan não dissimulou o espanto. Moders lhe relatara pessoalmente quanto lhe haviam custado as horas que passara em Frago.

— Nunca mais ponho os pés nesse mundo infernal! — dissera.

E agora havia mudado de opinião... Mais uma vez Moders apresentara-se voluntariamente para participar da operação.

Como sempre acontecia, Rhodan não levou muito tempo para tomar sua decisão.

— Prepare-se, Moders. Quero dar-lhe uma sugestão. Não gosto muito de desintegradores. Acho que os raios paralisantes são a arma mais humana, até mesmo contra os pos-bis.

— É exatamente a minha opinião. Quando poderei descer em Frago? O comando já está a caminho...

— O senhor irá com o segundo grupo, Moders. Poderia informar por que de repente tem tanta vontade de entrar na usina de plasma?

— Isto é fácil de explicar, sir. Quero verificar se a teoria de Kule-Tats, segundo a qual a máquina que expele o plasma não produz a bio-substância, mas apenas provoca sua cisão, é correta.

— Hum... — Rhodan parecia espantado. — O senhor não acredita na teoria do ara, enquanto defende a sua com uma obstinação que quase chega a ser anti-científica. Isso não é bom.

Moders soltou uma risadinha.

— O senhor está enganado, chefe. Se há alguém que desconfia de minhas hipóteses, este alguém sou eu. Kule-Tats e eu precisamos ter certeza ao menos sobre este ponto. Se o biomaterial realmente é um produto da natureza, então... então, sir, ainda podemos entreter a esperança de chegar a um acordo com o plasma. Nós...

Um terrível golpe sacudiu a Teodorico. O alarma energético da sala de comando não conseguiu sobrepujar o ribombar do envoltório da nave. O campo defensivo da nave fora destruído por uma bomba transportada por raio conversor.

Os geradores, conversores e transformadores da nave chiaram. A reconstituição do campo defensivo exigia quantidades gigantescas de energia. E a mudança de rota levada a efeito por Jefe Claudrin exigia quantidades adicionais.

O segundo tiro dos pos-bis não acertou o alvo. O forte que por pouco não destruíra a nave capitania da Frota Solar não teve tempo para disparar o terceiro tiro. Desmanchou-se sob o fogo concentrado de três cruzadores pesados.

Três minutos se passaram até que o interior da nave voltasse ao normal. A Teodorico retomou a rota antiga, aproximando-se a cinqüenta quilômetros de Frago.

Numa grande área em torno da usina de plasma os canhões de radiações do planeta de robôs silenciaram. Haviam sido destruídos pelo fogo das belonaves terranas.

A distância de cinqüenta quilômetros, que a nave de Rhodan mantinha em relação a Frago, representava o alcance dos vibradores celulares dos swoons, que Ras Tschubai, Tako Kakuta e Gucky haviam espalhado nesse mundo sem luz. Bastou um único impulso do aparelho de comando instalado na Teodorico para que esses vibradores entrassem em ação. E assim, os pos-bis com seus aparelhos de localização de alta precisão ficariam convencidos de que os seres invisíveis, chamados de laurins, haviam descido em seu planeta Frago.

Se os cálculos de Rhodan eram corretos, o fato devia ter provocado pânico até mesmo entre os robôs semibiológicos. O administrador estava aguardando informações neste sentido.

O primeiro grupo de comando chamou. Todos os membros deste comando eram protegidos contra a localização por meio de dois neutralizadores de vibrações individuais e tornavam-se invisíveis por trás do campo de deflexão do traje de guerra arcônida. Estavam equipados com armas portáteis de alta potência. Os seres mecânicos de Frago só poderiam pensar que eram os laurins sob novo aspecto.

O grupo recebeu ordem para operar junto à usina de plasma, onde deveria realizar destruições. Estas deveriam conter-se dentro dos limites do razoável e, na medida do possível, só deveriam atingir instalações de importância secundária.

Rhodan sabia perfeitamente que os homens que se encontravam em Frago poderiam, por ignorância, destruir aparelhagens vitais, pois em toda a Via Láctea não havia ninguém que conhecesse a tecnologia dos pos-bis.

A Teodorico deslocava-se velozmente em direção ao gigantesco pavilhão em cujo interior Gucky escondera parte dos aparelhos de vibrações celulares sob as montanhas de robôs não ativados.

O diabo devia estar às soltas no interior desse pavilhão. Moders, que pretendia descer em Frago com o segundo grupo, estava ao lado de Rhodan, à frente de um instrumento de medição, cujo ponteiro dançava loucamente sobre a escala.

Rhodan virou a cabeça e olhou para o grupo de mutantes. Fez um sinal para Wuriu Sengu. O espia, que enxergava através da matéria opaca, correu para junto do chefe.

— O que está vendo, Sengu?

O espia já havia sido informado sobre a brincadeira de Gucky. Concentrou-se em sua tarefa e, no mesmo instante, soltou uma estrondosa gargalhada.

— É pena que o senhor não pode ver isso, chefe — disse. — Os pos-bis estão saindo de todos os cantos e disparam sobre as pilhas gigantescas de robôs. A fim de abrir caminho em direção aos aparelhos de vibrações celulares, fundem os robôs sem a menor consideração. Ora, veja no que deu a idéia de Gucky!

— Quer dizer que não estão procurando? Apenas trabalham com suas armas de radiações, Sengu?

Em hipótese alguma, os pos-bis deveriam pôr as mãos em qualquer dos pequenos aparelhos. Deviam continuar a acreditar que aquilo que estavam localizado eram verdadeiros laurins, e não uma série de vibrações celulares artificiais.

Rhodan aproximou-se do microfone do intercomunicador.

— Ras, salte com o localizador para o grande pavilhão que estamos sobrevoando neste momento. Ligue o campo defletor. Não assuma riscos. Verifique quantos aparelhos continuam a irradiar vibrações. Assim que tenha feito isso, volte.

Depois disso dirigiu-se a Moders.

— Ainda deseja fazer uma segunda visita a Frago?

— Mais do que nunca, chefe!

— Está bem. Gucky o levará para lá. Ficará com o senhor. Dar-lhe-ei ordens expressas para que não assuma nenhum risco, por insignificante que seja. Acho que estamos entendidos, Moders.

Estavam entendidos. Gucky, que fora convocado pela mensagem telepática de Rhodan, apareceu. A pequena criatura sorria, exibindo o dente-roedor.

 

Mercant, que durante a última hora dera provas cada vez mais evidentes da tremenda tensão a que estava submetido, suspirou aliviado quando, finalmente, recebeu a mensagem da Teodorico.

Aquilo que ele e sua equipe teriam de fazer fora preparado há muito tempo. A estação de rádio de Árcon irradiou com a energia máxima uma mensagem simbólica destinada ao planeta Frago, situado a 92.000 anos-luz.

A falsa vida encontra-se no mundo de vocês e está próxima ao milagre interior. Embora vocês pretendam destruir-nos, que também somos a verdadeira vida, estamos dispostos a ajudar, desde que suas naves saiam imediatamente de nossa Galáxia.

A segunda grande antena direcional da gigantesca estação de Árcon transmitiu o mesmo texto para a misteriosa estação de rádio, situada nas profundezas do intercosmo.

Atlan viu e ouviu tudo pelo hipercomunicador. Por enquanto não havia feito nenhum comentário. Notava-se que a tensão e o nervosismo ameaçavam tomar conta dele.

O Marechal Solar Allan D. Mercant recuperara a calma habitual. Agora, que o jogo desesperado entrava na fase final, assistia a tudo com o sangue-frio que sempre o distinguira.

A mensagem era repetida ininterruptamente pelas duas emissoras. Os símbolos que a compunham foram irradiados vinte vezes, oitenta vezes, cem vezes...

— Nada! — disse Atlan. — Continuam a atirar que nem uns malucos. — Se não houver nenhum milagre, dentro de dez minutos o planeta dos saltadores Archetz será transformado num inferno de fogo. Não existem torpedos espaciais em número suficiente para impedir que as naves fragmentárias destruam mais um planeta.

Mercant fitou-o em silêncio.

— Eu e a frota perdemos as esperanças, terrano — disse Atlan, contrariado. — Ainda estamos enfrentando três mil naves fragmentárias. Se uma centena delas for destruída por torpedos ou pelo fogo concentrado de nossas naves, outra centena virá substituí-la e a relação de forças continuará a ser a mesma de antes. As coisas não podem continuar assim, Mercant.

— Calma, Atlan! — berrou Mercant.

Ninguém deixaria de notar o movimento repentino de Atlan, mas o braço estendido de Mercant também não deixaria de ser notado.

Um silêncio apavorante reinava em torno do marechal solar. O alto-falante transmitiu um farfalhar distante. A grande lâmina em cima do oscilógrafo apresentou silenciosamente um desenho: era uma amplitude de formato estranho, que possuía certa semelhança com as ondas de hiper-comunicação.

A estação de rádio do intercosmo estava irradiando. Mas por enquanto só irradiava energia, sem transmitir um único símbolo.

Frago mantinha-se em silêncio.

A Teodorico acabara de enviar uma mensagem condensada para Árcon III. Mercant olhou para a direita. A tela apresentou o texto da mensagem de Rhodan.

O comandante de plasma continua a enviar pedidos de socorro para o intercosmo exclusivamente em base para-normal. Ao que parece a bio-substância considera a situação em seu planeta bastante ameaçadora. Gucky e Moders estão na usina de plasma. A última nave fragmentária foi derrubada. Um terço dos fortes pos-bis foram destruídos. Nosso ataque a Frago prosseguirá segundo o plano F-21. Rhodan.

Mercant fez um gesto afirmativo. O plano F-21 não previa mais muita coisa. O plano F-22 determinava o ataque a todos os objetivos existentes em Frago, ataque este que seria levado avante com todas as armas disponíveis, até a destruição total.

O fato de Rhodan pretender agir segundo o plano F-21 não era um bom sinal.

— A faixa de símbolos...

O homem que se encontrava junto ao oscilógrafo estava nervoso. Atlan ouvira seu grito pelo telecomunicador. O arcônida não notou o olhar de Mercant. Concentrava-se exclusivamente nos fatos que se desenrolavam na estação de rádio de Árcon III.

A amplitude continuava na tela. As minúsculas alterações que sofria constantemente poderiam provir perfeitamente dos diversos símbolos.

A tradutora começou a zumbir. Era uma verdadeira maravilha técnica.

O alto-falante começou a dizer:

— Entendido. Entendido. Entendido. Entendido...

Repetia ininterruptamente a mesma palavra.

Qual era o sentido disso?

— A tradutora não funciona muito bem — afirmou Ako Myss.

A opinião de Mercant não era a mesma. Aguçou o ouvido e esperou que viessem outras palavras.

Mas não veio mais nada.

A transmissão foi interrompida. A amplitude continuou por mais algum tempo na tela do oscilógrafo e depois desapareceu.

A misteriosa estação do intercosmo desligara.

Outra mensagem de Rhodan foi recebida.

 

Ouvimos tudo. Sem comentários. O comandante de plasma de Frago suspendeu as transmissões pelo hiper-rádio e a irradiação de mensagens por via paranormal. O ataque passará a ser conduzido em conformidade com o plano F-22. O tempo XY será dentro de sete minutos. Rhodan.

 

Atlan também captou esta mensagem de telecomunicação e inteirou-se de seu conteúdo.

— Que pena! — disse. — Seria bom demais.

As esperanças de Mercant desvaneceram-se. Lembrou-se dos cálculos feitos pelos acônidas, segundo os quais o plano F-15 tinha uma probabilidade de êxito de noventa por cento.

Os planos de ataque que traziam os números 16 e 22 apenas haviam sido elaborados por uma questão de precaução. Até parecia que nem mesmo a forma de luta mais áspera levaria Perry Rhodan ao êxito.

Será que o comandante de plasma de Frago descobrira o truque dos terranos e identificara suas naves como veículos dos seres orgânicos da Via Láctea?

Mercant não conhecia a resposta a esta indagação. Desfez a ligação de hipercomunicação com Atlan.

 

Gucky teleportou-se levando Van Moders para a usina de plasma.

Os pos-bis não precisavam de luz. Enxergavam por meio de irradiações de calor e por isso dispensavam a claridade. Mas Gucky e o robólogo sentiram-se perdidos em meio à escuridão.

Seus faróis acenderam-se. O rato-castor soltou um grito sob o capacete espacial. Moders, pelo rádio, escutou. O rato-castor e o robólogo viram três robôs à sua frente, mas antes que Van Moders pudesse usar a arma, o alvo desapareceu diante de seus olhos e subiu velozmente para a escuridão que se estendia acima deles.

Um terrível estrondo saiu da escuridão. Gucky piou pelo rádio:

— Ninguém consertará estes robôs.

A última palavra foi abafada por novo estrondo. Os robôs, que o rato-castor fizera subir ao teto como se fossem aviões a jato, caíram ao chão e foram totalmente destruídos.

— Isso está começando bem! — disse o robólogo, que se sentia bastante impressionado, já que não estava acostumado às ações bélicas.

Gucky encarou o pequeno incidente sob seu ponto de vista.

— Não foi nada de especial, Van. O que é bem pior são estas irradiações transmitidas por via paranormal. Se pudesse ter certeza no significado da confusão que estou captando, diria que a bio-substância está sendo “sacudida” pelo medo. Mas não é um absurdo rematado acreditar que aquilo tenha inteligência?

Moders não prestou atenção às suas palavras. Dirigia a luz do farol para todos os lados. Voltou a contemplar as máquinas gigantescas e bizarras, cuja finalidade era desconhecida. Não tinham formato definido e não possuíam nenhum revestimento, e era justamente por isso que tinham um aspecto ameaçador.

Gucky praguejou contra as irradiações parapsíquicas do plasma. A tremenda força das vibrações perturbava-o no plano telepático. Respondendo à pergunta de Moders, apontou na direção em que devia ficar a máquina que despejava quantidades imensas de bio-substância na gigantesca tina.

Moders pôs-se em movimento e o rato-castor seguiu-o.

Tiveram de desviar-se de um conjunto que rugia e uivava. Os microfones externos dos capacetes transmitiram integralmente o ruído.

— Pos-bis! — gritou Gucky.

Dois pos-bis haviam localizado a luz de seus faróis, mas as feias construções de metal ainda hesitavam em atacar os intrusos. Seu sistema de localização não constatou a existência de vibrações celulares. Tanto Gucky como Moders possuíam dois neutralizadores individuais, e estes impediam que suas vibrações orgânicas se propagassem.

— Não faça nada, Gucky! — advertiu Moders.

O robólogo trocou seus desintegradores por armas paralisantes. Acabara de lembrar-se do conselho de Rhodan, segundo o qual os robôs semibiológicos não deviam ser combatidos da mesma forma que os outros seres mecânicos.

Gucky dirigiu a luz do farol diretamente sobre os dois pos-bis. Estes não reagiram à luz. Suas armas embutidas nem sequer estavam apontadas para os intrusos.

— Van, na nave fragmentária que apresamos também foi assim.

— Foi muito diferente, meu caro — objetou o robólogo. — Todos os robôs que se encontravam na nave fragmentária sabiam que éramos orgânicos. Os que estão aqui não sabem. Acham que somos uma espécie de robôs, apenas não sabem a que classe pertencemos. Neste ponto seus conhecimentos positrônicos apresentam uma lacuna. Não nos atacarão.

— Pois hoje prefiro não arriscar — disse o rato-castor e disparou as duas armas paralisantes.

Os pos-bis perderam o equilíbrio, cambalearam e caíram ruidosamente no chão metálico.

Moders e Gucky passaram pelos dois robôs, que estavam paralisados e não percebiam mais nada. Outras máquinas interpuseram-se no caminho dos dois.

— Olhe! — exclamou Moders, de repente.

Viram à sua frente uma gigantesca máquina, que continuava a despejar grandes quantidades de plasma numa gigantesca tina. À luz dos faróis viram a abertura oval, da qual saía o plasma, num fluxo uniforme em quantidade e velocidade. No curso dos anos dali deveria sair uma quantidade enorme de bio-substância.

Gucky não se interessou por isso. Suas tarefas eram outras. Cabia-lhe cuidar para que o cientista voltasse para a Teodorico, são e salvo. Rhodan lhe fornecera instruções detalhadas por via telepática. E uma dessas instruções dizia que Van Moders devia ser retirado da zona de perigo por meio de teleportação, mesmo que se opusesse a isso. Se necessário, Gucky devia usar os raios paralisantes.

Acontece que Moders nem desconfiava da existência dessas ordens.

Encontrava-se à frente da gigantesca parede metálica, que parecia amassada em toda parte. Sua superfície possuía saliências, reentrâncias, arestas e outras formas irregulares. Aquela parede protegia um segredo!...

Mais uma vez Moders teve a impressão de que a máquina produzia o plasma sintético, muito embora se lembrasse de que, segundo Kule-Tats, a bio-substância não poderia ser um produto artificial, porque sua estrutura química era muito complicada.

— Será que você poderia teleportar-nos para dentro da máquina, Gucky?

O rato-castor fitou o robólogo.

— Poder posso, Van, mas não vou fazer nada disso. Não estou com vontade de sair desse buraco, transformado em plasma.

Moders teve outra idéia.

— Gucky, preciso de recipientes. Ou melhor, de grandes tanques. Temos necessidade de grandes quantidades de plasma. Você tem de ajudar-me. Procure entrar em contato com o chefe.

— Não é possível, Van. Esse seu “mingau” irradia terríveis impulsos de medo. Não posso arriscar-me a trabalhar em base paranormal. Na sua intensidade atual, os impulsos de medo produzem em mim o efeito de um narcotizante.

Ouviram-se quatro estrondos às costas de Moders. Virou-se e seu farol rigidamente montado acompanhou o movimento. O raio de luz iluminou um monte de sucata.

— Quantos foram, Gucky?

— Sete — disse a pequena criatura sem a menor comoção. — Estes robôs tinham uma programação diferente da dos outros. As intenções desses sujeitos para conosco não eram nada boas.

Sem dizer uma palavra, Moders voltou a olhar para a frente. Não estava disposto a desistir de seu plano. Pretendia levar grandes quantidades de plasma para bordo da Teodorico. Na Terra já não se dispunha de nehuma quantidade de bio-substância. Todo o estoque fora utilizado na tentativa de localizar uma nave fragmentária, que tivera um êxito parcial.

— Van — piou Gucky — não consigo entrar em contato com Rhodan. Por que será que este plasma tem tanto medo?

— Em cima desta usina ou nas proximidades da mesma, provavelmente está sendo travada uma terrível batalha, Gucky. Além disso alguns dos vibradores que produzem as emanações celulares dos laurins ainda devem estar emitindo seus impulsos a toda força. Certamente o plasma acredita que os laurins estejam por aqui.

— Realmente parecem estar, Van! O primeiro grupo de comando que age em Frago também foi equipado com os aparelhos dos swoons. Para os pos-bis, cada um dos homens protegidos pelos campos defletores deve ser um verdadeiro laurin. A propósito, Van, por que não ligamos nossos campos defletores?

— Não estou interessado nestas brincadeiras técnicas. Se você não consegue estabelecer contato, terá de saltar para fora e tentar de novo. Os tanques têm de ser trazidos para cá, pequeno, pois só assim conseguiremos novo suprimento de plasma.

Distraidamente, Gucky colocou uma das mãos sobre seu cinto e teleportou-se para fora, juntamente com Moders.

O céu que cobria Frago parecia estar em chamas. Sob a luz ofuscante, a praça gigantesca à frente da usina de plasma parecia ser ainda maior do que Moders tinha na lembrança. O tanque em que a Alta-663 fora mergulhada por um raio de tração dos pos-bis projetava uma sombra que lhe dava o aspecto de gigantesca cova.

Uma vez do lado de fora, Gucky conseguiu entrar em contato com a Teodorico. Quem respondeu primeiro foi Marshall, que transmitiu a paraligação ao chefe.

— De acordo, pequeno. Soltaremos uma gazela que levará os tanques de que precisam. Preste atenção. A gazela terá de realizar uma transição a pequena distância, a fim de atravessar o envoltório energético que cobre o “colchão de ar.” Cuide de Moders. Entendido, Gucky?

— Perry, no seu íntimo o robólogo está praguejando contra mim. Ele tem cada idéia, chefe! Mais tarde falaremos sobre isso. Agora saltaremos de novo para dentro dessa usina nojenta. Até, chefe.

Depois disse em voz alta dirigindo-se ao robólogo:

— Tudo preparado, Van. Uma gazela trará os recipientes até aqui. Mas como faremos para tirar sua bio-substância deste pavilhão gigantesco?

Moders segurou a pequena criatura e sacudiu-a.

— Essa gazela voa para a morte, Gucky. Esta parede de um quilômetro de altura está cheia de canhões de radiações. O disco será consumido pelas chamas se tentar pousar aqui.

— Não será não, Van. Até parece que você não conhece mais seus amigos, os pos-bis, os adoradores da verdadeira vida. Posso garantir-lhe que os tripulantes da gazela usarão neutralizadores individuais.

— Mas é claro! — disse Moders e soltou Gucky.

Dali a instantes encontravam-se novamente à frente da máquina de plasma, junto à tina gigantesca que, em velocidade uniforme, tal qual uma cobra, levava a bio-substância a um destino desconhecido.

— Da próxima vez que quiser teleportar-se avise-me... — gritou Moders, em tom exaltado. — Será que você ao menos pode colocar-me em cima da máquina?

No mesmo instante encontrava-se lá. Deram mais três saltos.

— O que será isso? — piou Gucky.

A luz de seu farol iluminou uma verdadeira floresta de tubos curvos e transparentes, em cujo interior alguma coisa fluía para cima e para baixo.

Não se descobria nenhuma função para aquilo.

— Van, para que serve esta floresta de tubos?

O robólogo não ouviu a pergunta. Observava seu medidor de radiações. Por aqui havia radiações, mas nenhuma delas era do tipo duro ou ultra duro. Há duzentos anos, quando foram iniciadas as pesquisas de plasma na Terra, os cientistas haviam denominado essas radiações de raios da vida. Esses raios estimulavam a bio-substância a multiplicar-se, a cindir suas células.

“Quem me dera ter neste momento, bons instrumentos de medição,” pensou Moders.

No mesmo instante lembrou-se da teoria de Kule-Tats.

O ara tinha razão! A gigantesca máquina estava oferecendo a prova. No interior do sistema extremamente complicado de tubos transparentes o plasma era estimulado a realizar a cisão das células. Em outras palavras, era levado a executar um processo de cisão extremamente rápido. Ao que tudo indicava, isso significava que certas substâncias químicas eram acrescentadas ao plasma primitivo, substâncias estas que eram processadas no sistema de tubos para, no fim do processo artificialmente desencadeado, transformarem-se em plasma.

“Kule-Tats tem razão”, pensava Van Moders, constantemente. “As substâncias químicas acrescentadas à massa só podem servir de alimento ao plasma, possibilitando a incrível reprodução!”

Um chamado de rádio assustou Moders, em meio às suas reflexões:

— Acabamos de pousar, mister Moders. Pavor responder, mister Moders.

A gazela estava parada na gigantesca praça que ficava junto à usina.

— Temos de ir para lá! — disse Gucky.

No mesmo instante viram-se junto à gazela. A batalha sobre Frago prosseguia com a mesma violência. Também na gigantesca praça as fúrias do inferno pareciam estar soltas. Moders ouviu pelo rádio a risadinha do rato-castor.

— Os robôs estão doidos atrás de nossos vibradores celulares, Van. Como esses seus amigos são estúpidos! Nem sequer sabem distinguir um vibrador celular de um verdadeiro laurin!

A pequena comporta da gazela abriu-se, a rampa foi descida e vários recipientes de plástico amarrados rolaram pela mesma.

— Não há nenhum teleportador entre vocês? — perguntou Gucky.

— Não! — respondeu alguém.

— Quer dizer que terei de fazer tudo sozinho? Chefe, isso lhe custará três rações extras de cenouras deliciosas. Olá, Langer! Você também, rapaz! Venham cá. Segurem-me. Andem logo! Você também, Moders.

Ninguém se atreveu a contradizer a pequena criatura. Gucky procurou enlaçar a pilha de recipientes com os braços. No mesmo instante desapareceu juntamente com o material e os três homens.

— O que é isso? — disse um dos homens depois do ligeiro salto, fitando a gigantesca máquina de cisão celular com uma expressão de perplexidade.

Moders passou a dirigir o pequeno grupo. A embalagem de plástico foi aberta junto à tina. Havia, na tal embalagem, uma bomba de elevada potência com duas conexões de quarenta centímetros de diâmetro. O pessoal da Teodorico não havia esquecido nenhum detalhe.

Gucky desapareceu. Retornou da teleportação com mais um volume de plástico e dois homens. Quando voltou pela terceira vez, trouxe uma notícia para Van Moders:

— Ordem do chefe para todos! Frago deve ser evacuado imediatamente. Temos de voltar para bordo. Parece que uma frota dos pos-bis aproxima-se do planeta.

 

— Não! Não pode ser verdade.

Atlan pôs a mão na cabeça. Por instantes reinou o silêncio na sala de comando. Depois disso as vozes dos homens pareciam atropelar-se. O sistema de intercomunicação já não conseguia transmitir as mensagens. Dois homens saíram correndo da sala de rádio.

— Sir! — berraram. — Foram embora! Debandaram...! A sala de rádio está parecendo um hospício.

Atlan teve vontade de atirar os braços para o alto e fazer alguma coisa, a fim de dar vazão aos seus sentimentos.

As naves fragmentárias dos pos-bis haviam desaparecido de M-13.

Todas elas!

E no mesmo instante.

De repente milhares de torpedos espaciais não encontraram nenhum alvo. Seus sistemas de localização atingiram o vazio. Os propulsores de milhares desses aparelhos desligaram-se automaticamente e prosseguiram em vôo livre.

Allan D. Mercant acompanhou a tremenda confusão pelo telecomunicador. Os receptores da grande estação de rádio de Árcon III mostraram-se insuficientes para captar todas as notícias. Todas as naves de guerra anunciaram o desaparecimento totalmente inesperado das gigantescas caixas espaciais.

Um instante antes os pos-bis ainda atacavam com todos os canhões. No momento seguinte, se tornaram invisíveis, por trás de seus campos relativistas, e desapareceram no espaço.

Mercant teve a impressão de saber o que isso significava.

— Quero uma ligação urgente-urgentíssima com o chefe!

O rosto de Rhodan apareceu na tela.

— Ouvi tudo, Mercant. O que lhe parece?

— Antes de mais nada, permita uma pergunta, sir. Nossos homens ainda se encontram em Frago?

— Sim.

— Sir, na minha opinião os pos-bis procurarão chegar o mais rápido possível a Frago, a fim de expulsar os invasores que eles acreditam serem os laurins. Acho que os pos-bis, vindos de M-13, saberão distinguir entre uma nave laurin e nossas naves esféricas.

— Sou da mesma opinião, Mercant. Obrigado e final.

No mesmo instante, Bell transmitiu o alarma para o comando que se encontrava em Frago. Os diversos grupos foram informados por faixas distintas.

Mais uma vez Rhodan fez sinal para que Wuriu Sengu, o espia, se aproximasse.

— Como estão as coisas no depósito de robôs, Sengu?

— É um quadro difícil de ser descrito, chefe. Os pos-bis agem como loucos contra seus irmãos não-ativados! Ou melhor, como alguém que executa as ordens de um louco. Agem com um ódio numa forma que não posso descrever. Destroem milhares de robôs armazenados para dar cabo de um vibrador celular que pensam ser um invisível. Em toda parte atiram nos lugares em que Gucky escondeu os aparelhos sob as montanhas de robôs.

Rhodan fez um gesto de agradecimento para Sengu. A voz retumbante de Jefe Claudrin encheu a sala de comando. Não compreendera as ordens de Bell. Este repetiu-as. A Teodorico desceu ainda mais sobre Frago. E os dois grupos de belonaves aproximaram-se da nave capitania.

Não se conseguiu estabelecer contato de rádio com três pequenos grupos que se encontravam no mundo dos robôs. A Teodorico irradiava ininterruptamente a ordem de responder à chamada.

Dezoito homens não davam nenhum sinal de vida.

John Marshall aproximou-se de Rhodan.

— Também não consigo entrar em contato com Gucky, chefe — disse.

Rhodan empalideceu.

— Continue a tentar ininterruptamente, John. Se o pequeno estiver na usina de plasma, então...

Interrompeu-se, porque de repente Marshall levantou a mão.

Rhodan leu os pensamentos de Marshall. E também ouviu a resposta de Gucky. O rato-castor pediu que lhe dessem mais dez minutos.

— Van Moders terá um acesso de loucura, se não conseguir levar o plasma para bordo — disse por via telepática. — Dê-nos mais dez minutos, John.

Neste ponto Rhodan interveio no intercâmbio telepático.

— Gucky, abandone imediatamente a usina de plasma e volte para a nave. As naves fragmentárias que estavam operando em M-13 estão a caminho.

Perry Rhodan não ficou zangado com a resposta que Gucky emitiu. Consistia numa praga violenta.

Mas havia uma coisa de que Rhodan nem desconfiava. Ao dar o terceiro salto para dentro da usina, Gucky levou o terceiro recipiente de plástico.

Van Moders não sofreu nenhum acesso de loucura. Parado ao lado da bomba, que trabalhava com a rotação máxima, via a bio-substância fluir para dentro do recipiente. O bocal estava mergulhado na gigantesca tina. Graças à sua grande capacidade de sucção, a bomba arrastava enormes quantidades de plasma pelo tubo flexível de quarenta centímetros de diâmetro.

— Leve os homens, Gucky. Eu irei por último — ordenou imediatamente o robólogo.

O rato-castor fitou-o com uma expressão de perplexidade.

— Será que seu receptor não está funcionando, Tenente Guck?

Os olhos de Moders brilhavam nervosamente sob o capacete de plástico.

— Você pode chamar-me de Gucky, Van — respondeu o pequeno.

Aproximou-se de dois homens, segurou os cintos dos mesmos e saltou para a gazela.

O propulsor da mesma já estava funcionando, colocando o aparelho em condições de decolar de um instante para outro.

Quando o rato-castor se dispunha a dar o último salto, a fim de levar Moders para fora da usina, juntamente com o plasma que se encontrava nos recipientes, recebeu o pensamento de Marshall.

Os pêlos de Gucky arrepiaram-se. Dezoito membros do comando estavam desaparecidos... E com isso Moders ganhou mais cinco minutos! Dentro desse prazo, ele e o plasma deveriam estar a bordo da gazela.

O pequeno transmitiu a notícia quando se materializou à frente de Moders. Nos últimos minutos o robólogo trabalhara bastante. Acabara de ligar outra bomba, a fim de bombear quantidades adicionais de plasma para outro recipiente.

— Você é capaz de teleportar esta carga, pequeno?

Gucky limitou-se a medir o robólogo com um olhar. Era um olhar bastante expressivo; Moders compreendeu.

Três minutos dos cinco já se haviam passado. As bombas números um e dois estavam despejando a bio-substância no segundo tanque.

— Pronto, pequeno! — disse Moders.

No mesmo instante o rato-castor desapareceu juntamente com o recipiente de plástico. Moders prendeu a respiração. Jamais esperaria que Gucky pudesse teleportar tamanho peso!

O rato-castor voltou dali a trinta segundos. No mesmo instante, Moders desligou as bombas e apressou-se a fechar o recipiente. O plasma correu dos dois tubos e espalhou-se pelo chão.

Quando o relógio indicava quatro minutos e dezoito segundos, Gucky e Moders desapareceram da usina de plasma, juntamente com o segundo recipiente cheio de bio-substância.

Houve problemas na gazela! Um homem ficou meio enterrado sob o recipiente de plástico. Praguejou enquanto se libertava; o piloto quis decolar.

Como sempre costumava fazer nas situações desse tipo, Gucky deixou que seus pensamentos se desenrolassem no plano telepático, embora as emanações parapsicológicas da bio-substância o perturbassem bastante.

Sem que o quisesse, o rato-castor introduziu-se nos pensamentos de um homem desesperado.

— Não decole! — gritou o mais alto que pôde.

O piloto voltou a colocar a chave mestra na posição zero. Formulou uma pergunta, mas o rato-castor não respondeu. Sentado ao lado de um dos recipientes de plástico, permaneceu imóvel. As emanações do plasma celular dificultavam a determinação do local em que se encontrava o homem desesperado.

— Meu Deus, Gucky desapareceu! — gritou de repente um dos tripulantes da gazela.

Um homem olhou para o relógio. O prazo de cinco minutos já fora ultrapassado. Os homens que se encontravam na cabina entreolharam-se, mas não disseram nada.

Gucky apareceu em meio a um tremeluzir, juntamente com dois homens feridos. Ficou de pé ao lado do piloto.

— Está vendo o fogo de artifício ali adiante? Pois vá. Lá, dezesseis dos nossos homens estão num aperto.

O “lá” a que Gucky se referia ficava a mais de cinco quilômetros. O lugar situava-se na periferia de uma área gigantesca que só poderia ser um campo de pouso de naves fragmentárias. Uma confusão de raios finos formava uma grade irregular. A essa distância parecia inofensiva. Mas os homens que se encontravam no interior da gazela conheciam as armas de radiações, e por isso sabiam que naquele local estava sendo travada uma luta encarniçada.

A gazela saiu a toda velocidade, mantendo-se poucos metros acima do solo. Um homem ficou sentado atrás do piloto, para cuidar do controle dos armamentos. A ótica de combate ligara a mira para a ampliação máxima. A fim de melhor enxergar os possíveis alvos, o homem ligou os poderosos faróis. A torrente de luz, dirigida por um dispositivo de mira, iluminou tudo.

Gucky não exagerara...

Uma outra gazela totalmente destruída encontrava-se na beira da grande superfície! Nas saliências, reentrâncias e arestas das construções, as pessoas vindas da Teodorico travavam uma luta desesperada contra os pos-bis. Só por um milagre o pequeno grupo ainda não fora destroçado.

A gazela aproximou-se velozmente, disparando todas as armas. Os geradores uivaram no interior do disco. Na tela os tripulantes do barco espacial viram como o homem que controlava os armamentos fazia uma limpeza entre os robôs.

A gazela parou entre os pos-bis. O disco começou a girar no mesmo lugar. Depois de ter executado o terceiro movimento de rotação, o pior do perigo havia passado para os homens que lutavam desesperadamente.

Eles mesmos cuidaram do resto.

Moders, que se sentia comovido diante dessa luta do homem contra o robô, notou a falta do rato-castor quando virou a cabeça. Gucky voltara a teleportar-se....

Contudo, tão repentinamente como havia desaparecido voltou a surgir. Trouxe um homem ferido. Um tiro de radiações rompera-lhe o traje de guerra.

A comporta da gazela abriu-se. A rampa foi descida. Lutando contra os últimos pos-bis, quinze homens exaustos, que não teriam dado muito pela própria vida, subiram pela rampa e entraram no barco espacial.

Dois tripulantes da gazela cuidaram do ferido. O disco decolou. A abóbada energética que evitava que o “colchão de ar” escapasse para o espaço teve de ser atravessada numa transição de emergência.

O pequeno computador positrônico anunciou o momento exato para a transição. Era perigoso efetuar o salto à velocidade reduzida que a gazela desenvolvia, mas não havia outra alternativa. E o que poderia ser mais grave era o fato de que a gazela estava atrasada, visto que segundo as ordens do chefe já deveria estar no hangar da Teodorico.

O rádioperador transmitiu o sinal de chegada pouco antes do salto. Os feridos gemeram sob a dor provocada pela transição.

O piloto foi o primeiro a recuperar-se.

— O que será aquilo lá adiante — perguntou a si mesmo examinando determinado ponto na tela.

Levou alguns segundos para compreender. Depois comunicou sua descoberta aos gritos:

— Os pos-bis chegaram de M-13!

O rádioperador procurou alcançar a nave capitania na faixa da Teodorico. Não havia tempo para lançar um único olhar para a tela panorâmica... Ininterruptamente a gazela chamava a Teodorico.

O supercouraçado não respondeu.

Acima da gazela, à sua direita e à sua esquerda, atrás dela e à frente, viu-se um enorme fogo de artifício, que se tornava mais grandioso a cada segundo que passava.

— Ligue o automático! — gritou o rádioperador para o piloto.

Este, num movimento rapidíssimo, moveu a chave principal. A gazela passou a ser dirigida pelo computador positrônico, que acabara de receber pelo hiper-rádio as coordenadas da Teodorico.

Dali a dois minutos a gazela entrou em alta velocidade no gigantesco hangar e, utilizando todas as energias possíveis, freou com tamanha força que por pouco os neutralizadores de pressão não conseguiam contrabalançar a tremenda pressão produzida. Enquanto as duas alas da comporta se fechavam atrás do disco, muitos suspiravam aliviados.

A gazela chegara a bordo no último instante.

Dali a alguns segundos, o supergigante disparou em direção ao intercosmo.

Rhodan viu a fisionomia de Bell desanuviar-se.

As naves fragmentárias, vindas da Galáxia, haviam chegado muito mais cedo do que se esperava. Protegida por seus campos relativistas, que as haviam transferido para o futuro por algumas horas, surgiram sobre o planeta ameaçado, sem provocar o menor abalo estrutural.

Foi por um simples acaso que os robôs não reconheceram os terranos. As naves fragmentárias voltaram ao Universo normal a três horas-luz de Frago. A tal distância, tornava-se difícil para eles constatarem, com segurança, se o ataque a Frago estava sendo realizado por naves laurins em forma de pingo ou por naves esféricas da Via Láctea.

A Teodorico foi uma das últimas naves que bateram em retirada. Mas ainda havia o grupo formado por muito mais de três mil naves, que permanecia na zona de libração, situada no semi-espaço.

Todas estas naves receberam ao mesmo tempo o impulso de comando expedido por Rhodan.

A promessa de Allan D. Mercant, que se propusera a ajudar a “verdadeira vida”, deveria ser cumprida ao menos na aparência.

Enquanto a nave de Rhodan desaparecia, a frota que até então se mantivera em posição de espera irrompeu do semi-espaço, voltando ao espaço normal nas proximidades de Frago. As estações de rádio de todas as naves transmitiram mensagens idênticas:

— Somos vivos de verdade! Viemos para ajudar a verdadeira vida de vocês, conforme prometemos. Morte à falsa vida!

Numa distância ainda maior de Frago que os monstros fragmentários, que há pouco ainda haviam semeado a morte e a destruição na Galáxia, mais de três mil naves terranas aproximaram-se velozmente do mundo dos robôs. Entrementes, as primeiras naves fragmentárias já se encontravam acima de Frago e abriam um fogo devastador sobre os lugares em que, segundo acreditavam, estavam os laurins.

Hendrik Cornis, o comandante do grupo de naves terranas que deveria provocar a impressão de que voava para Frago, a fim de ajudar a “verdadeira vida”, viu pelo tele-amplificador que algumas naves fragmentárias destruíram totalmente com seu fogo de radiações o gigantesco depósito em que estavam guardados milhões de pos-bis não-ativados, depósito este onde Gucky escondera a maior parte dos pequenos aparelhos que irradiavam as vibrações celulares dos laurins.

Cornis não precisou intervir com suas naves. Enquanto ainda voava em direção ao mundo dos robôs, recebeu a hipermensagem simbólica:

— A verdadeira vida agradece o aviso. Mas a verdadeira vida não precisa de auxílio.

— Se é assim, podemos voltar — disse Hendrik Cornis, em tom alegre.

Dali a alguns minutos, seu grupo de naves desapareceu no semi-espaço, em direção à Via Láctea, que ficava a noventa e dois mil anos-luz e, vista dali, parecia uma faixa reluzente de madrepérola, tornada visível pelo rastreador de relevo.

Pelo telecomunicador avisou o chefe de que estava regressando. Reginald Bell recebeu a mensagem.

— Sir — disse Cornis, exprimindo o desejo de todos. — Tomara que os pos-bis continuem no seu lugar... isto é, no intercosmo!

— Tomara, Cornis. Tomara que os invisíveis não voltem a colocar essa raça de robôs em nossa pista. Quem será mais perigoso, os pos-bis ou os invisíveis? Quem dera que nunca houvesse necessidade de responder a esta pergunta...

 

                                                                                            Kurt Brand  

 

                      

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