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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O Planeta Gigante / Kurt Brand
O Planeta Gigante / Kurt Brand

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

O Planeta Gigante

 

Bombardear o sol do gigantesco planeta Hércules é a única chance para a Galáxia!...

Como os mundos da Galáxia, com seus bilhões de sóis e planetas, são realmente muito pouco conhecidos, não obstante os milhares de aparelhos tipo Explorer, que há muitos anos se dedicam à tarefa de descobri-los e de estudá-los, eles mostram claramente os acontecimentos dos anos 2326 e 2327. Embora os terranos, sob a direção do Grande Administrador Perry Rhodan, venham desenvolvendo há bastante séculos a Cosmonáutica — primeiro com as naves de transição, depois com o sistema kalupiano — foi, entretanto, no ano 2326 que, por uma infeliz coincidência, descobriu-se a existência dos terríveis gafanhotos córneos e dos vermes do pavor. Especialmente estes últimos, que representam um grande perigo para toda a Via Láctea, pois dispõem de armas terríveis, sendo, ainda, praticamente invulneráveis.

Comandos especiais terranos — cientistas, soldados, especialistas e mutantes — passaram por grandes decepções no grande afã de desvendar os mistérios dos vermes-monstro, até que finalmente quatro especialistas da USO, o chamado “Corpo de Bombeiros Galácticos”, organização dirigida pelo Lorde-Almirante Atlan, conseguem entrar em contato com um dos espécimes do verme do pavor no planeta Euhja.

Este, a muito custo, revela o segredo de sua raça aos quatro agentes e faz aliança com os terranos contra seus senhores, os “benévolos”, dominadores do “Segundo Império, na parte leste da Via Láctea.

Entrementes, pouca coisa se sabe sobre as razões de os “benévolos” estarem na dependência dos vermes-monstro, que não têm progresso tecnológico algum. Mas resta ainda muita coisa a ser esclarecida. E quem o descobre é o genial Tyll Leyden, com sua equipe científica na terceira lua do gigantesco planeta Hércules, O Planeta Gigante...

 

                                                

 

A Explorer-777 estava iniciando a aterrissagem na terceira lua do único planeta do Sistema Solar EX-2115-485.

Este planeta fora denominado “Hércules”, e nome mais adequado que este não havia. Hércules era o maior de todos os planetas conhecidos. Seu diâmetro tinha a “bagatela” de 2 213 000 quilômetros. Possuía dezessete luas, e girava em torno de um enorme sol amarelo. Todas estas luas possuíam oxigênio, eram do tamanho da Terra, como se esperassem que os homens as viessem colonizar.

Todos que estavam na central de comando da Explorer-777 olhavam encantados para a tela panorâmica. O gigantesco Planeta Hércules tomava boa parte da tela.

— Dia e noite, paira ameaçador este gigante sobre Impos.

O primeiro-oficial não esperou resposta à sua observação e continuou:

— Com o tempo, ninguém mais vai agüentar isto. A gente tem que estar sempre com medo de que o troço despenque na cabeça de todos aqui.

O que o primeiro-oficial falou, todos já estavam pensando.

A Explorer pousou em terra firme. Ninguém podia perceber que a nave esférica acabava de percorrer 52.419 anos-luz. A grande rampa de desembarque desceu por entre os suportes telescópicos, e a comporta se abriu. Enormes cargas, presas em chapas de guindaste antigravitacional, flutuavam rumo ao solo, comandadas por robôs. E as máquinas desciam indiferentes aos olhares de centenas de homens aglomerados próximo da grande nave.

Era o comando de pesquisa que a Explorer-2115 deixara na terceira lua deste sistema, “Impos”, nome que deram ao satélite, cuja denominação já constava em todos os catálogos siderais.

Os técnicos tiveram que esperar pacientemente meia hora, até que o comandante da nave de exploração veio cumprimentá-los. O Major Guara sabia que os cientistas não estavam ali para ouvir grandes tiradas de oratória. Queriam somente saber o que a Explorer-777 trouxera para Impos. Guara chamou cada um dos chefes de equipe e lhes entregou cópias dos conhecimentos da carga.

 

— Mister Leyden! — O Major Guara estava de pé na plataforma de um dos apoios telescópicos. Por ser o mais alto de todos entre o numeroso grupo de cientistas, podia ver cada um do lugar onde estava. Sua chamada não foi respondida. Repetiu o nome e Mister Leyden não apareceu.

— Leyden não é chefe de equipe — disse alguém.

Guara não se deu por contente.

— Tenho que falar com ele! Onde posso encontrá-lo?

Do meio do grande grupo, falou um técnico:

— Nesta hora, mais ou menos, deve estar tomando café. Mas não vale a pena incomodá-lo, não vai se apressar por isso.

Na sua longa experiência de comandante de naves de exploração, Guara sabia que cientistas são sempre homens diferentes, singulares, mas desta vez não tomou este fato em consideração.

— Onde é que está tomando café? Oito casas de material plástico, de construção achatada, estavam num pequeno planalto, a menos de um quilômetro da espaçonave. Ali se abrigavam os cientistas, já há três semanas, aliás, com muito pouco espaço para se moverem.

Ao lado de mister Mungs, um dos cientistas do comando de pesquisa, o Major Guara se dirigiu para a segunda casa, e seu guia o acompanhou até a porta do refeitório. Tyll Leyden, físico e astrônomo, estava sentado, calmo, à mesa do refeitório.

A chegada da Explorer-777 não o impedira de tomar sua primeira refeição normalmente. Olhou para a porta e respondeu com um movimento da cabeça à saudação do major, cortando ao meio uma torrada onde passara queijo.

— Sou o Major Guara! — apresentou-se o comandante da espaçonave de exploração. — Tenho uma mensagem para lhe transmitir, Mister Leyden.

O físico e astrônomo apontou-lhe uma cadeira com a mão esquerda, enquanto com a direita metia na boca a fatia de torrada com queijo. Guara, naturalmente, ficou perplexo. Fosse outro, teria perguntado: “qual é a mensagem que o senhor me traz?”, mas Tyll Leyden era diferente — não disse uma palavra! Guara se sentou.

— O senhor já tomou café, major? — Leyden continuava comendo com a maior calma do mundo.

— Obrigado — respondeu o major, desajeitado. Seus olhos começavam a tremer e a piscar. Não estava acostumado a um procedimento tão pouco respeitoso.

— Nem mesmo um cafezinho? Está mesmo muito bom.

Guara olhava para o cientista que o acompanhara, sem saber o que fazer. Mas Mungs não mostrou nenhuma reação. Conhecia bem Leyden.

— Mister Leyden, estou chegando da Terra — disse o major, frisando bem cada palavra.

Tyll Leyden duplicou a porção de queijo em cima da torrada, fazendo-o com um capricho artístico.

O major fervia por dentro, mas se dominou e apenas perguntou:

— Mister Leyden, interessa-lhe, por acaso, saber que lhe trago importante mensagem do “Grande Administrador”?

Devia interessar a Leyden certamente, pois o confirmou com a cabeça. Não podia falar e não queria mesmo, porque ninguém fala de boca cheia. Seus olhos claros, porém, não mostravam nenhuma excitação. Olhou para o relógio.

— Daqui a oito minutos, estou de novo em serviço, major. Não quer mesmo um cafezinho?

O que o Major Guara pensava nesse momento de especial sobre os civis e cientistas, não se podia exprimir com palavras decentes.

— Ah!... Com os diabos! — exclamou ele, em voz ríspida de comando, jogando a mensagem de Rhodan sobre a mesa. — Não vou esperar mais oito minutos para falar com o senhor. É pena que não pertence à minha tripulação...!

Leyden não se perturbou. Continuou comendo com a mesma fleuma e apenas olhou para o major, que se precipitou nervoso para a porta, batendo-a com violência. Mungs, que guiara o major para o local onde estava Leyden, permaneceu ali. Tivera em Impos muitos trabalhos ao lado de Leyden por isso o conhecia melhor, estimando muito o físico e astrônomo. Agora, no entanto, era de opinião que seu amigo se excedera em relação ao major, ou melhor, deveria ter sido mais respeitoso para com ele, pelo menos tendo em consideração que o oficial era portador de uma mensagem de Rhodan.

O documento escrito continuava no lugar onde o major o jogara. Leyden esvaziou a xícara de café e consultou mais uma vez o relógio.

Terminara a hora do café. O cientista pegou o grande envelope e o abriu. Desdobrou a folha plástica e começou a ler.

— Mas era só o que faltava...! — disse, depois de ter tomado conhecimento do seu conteúdo. — Quem será que me fez esta brincadeira?

Mungs pensava que tivesse acontecido algo de muito grave com Leyden.

— Você tem que voltar para a Terra com a 777? — perguntou excitado.

— Não, mas Perry Rhodan me nomeou chefe da equipe de pesquisa em Impos. Acho que quem me arranjou este abacaxi foi o Tenente-Coronel Herzog da Explorer-2115.

Mungs olhava para seu colega, sem saber o que dizer. Tyll Leyden, vinte e nove anos, fora nomeado chefe de mais de cem cientistas e nem se alegrava com o maravilhoso e importantíssimo cargo? Não, não mostrava sinais de contentamento, tanto que disse logo em tom de recusa:

— Não tenho nenhuma simpatia pelo papelório da burocracia.

— Pois eu lhe dou os parabéns — disse-lhe o amigo com muita sinceridade. — Mas, que vai dizer a isto o triunvirato?

Leyden também não sabia. Até o presente momento, o comando em Impos era feito por três cabeças.

— Olha aqui, Mungs, leia isto.

O rapaz passou a vista, curioso, nas poucas linhas. Eram muito claras. Rhodan dava plenos poderes ao jovem Tyll Leyden.

Com a mensagem de Rhodan na mão, Leyden procurou o triunvirato.

Os três colegas se encontravam na cabina do Major Guara e discutiam com o comandante, que quase perdeu a calma ao ver Leyden.

— Que pretende o senhor aqui? — gritou.

— Desculpe — disse Leyden entregando ao mais próximo a carta de Rhodan. Embora os três homens contassem na certa que seus poderes provisórios seriam logo substituídos pela nomeação de um chefe definitivo, nunca lhes passou pela cabeça que Tyll Leyden pudesse ser nomeado a este posto de tanta importância.

— O senhor acha — perguntou Guara um tanto ríspido — que não tenho outra coisa que fazer a não ser cuidar do senhor?

— Sim — redargüiu Leyden — gostaria de saber se os mapas siderais que encomendei por meio do Tenente-Coronel Herzog já foram entregues.

— Pergunte ao chefe de sua equipe — foi a resposta seca de Guara.

— Seja como o senhor quiser — e dizendo isto, Leyden se retirou. Não era de seu feitio bajular e procurar agradar os superiores e mesmo assim conseguia sempre o que queria.

Um dia de Impos mais tarde, incumbiu até os arqueólogos de novas missões, de acordo com seus planos. Dispunha as coisas com tal jeito que dias depois os técnicos ficaram surpresos notando que, sem o perceberem, estavam fazendo seus trabalhos já noutra estrutura.

Já na tarde anterior, a Explorer-777 deixara o sistema, Guara e Leyden não se falaram mais. O novo chefe, recém-nomeado, não teve mesmo tempo para isto, mergulhado que estava no “mar de papel”. Trabalhou até além da meia-noite e só parou quando pôde escrever na última folha dos documentos: Tudo pronto até a data presente.

Com a 777 chegaram 42 novos cientistas, o que demonstrava os cuidados que Rhodan dedicava ao planetário descoberto em Impos, no cume de uma montanha.

Leyden entrou num flutuador e se dirigiu à montanha. Atrás de um vale semicircular, a cadeia de montanhas subia a mais de oito mil metros. Sobrevoou primeiro o vale a cem metros de altura, examinando-o bem. Descobriu ruínas de uma cidade destruída, uma torre de uns cinqüenta metros de altura, também bastante destroçada, mas indicando ser o maior edifício no centro.

Grandes fossas cavadas dentro do perímetro urbano indicavam que os arqueólogos procuravam, até em maior profundidade, vestígios de uma velha civilização que aí vicejou, sabendo há quantos milênios foi isto.

Muito raramente se falava em Impos do Ser Coletivo que destruíra seu planeta artificial e fugira de um perigo, não se sabe bem de quê. Ele, o Ser Coletivo, trouxera os homens para Impos, pois escondera na Montanha Canora um dos vinte e cinco ativadores celulares, de tão alto valor. Na busca do instrumento maravilhoso, prolongador indefinido da vida, Tyll Leyden descobrira o planetário na parte escavada na rocha. Quando se iniciou a pesquisa da idade, a surpresa foi tal que os terranos começaram a desconfiar de seus instrumentos. De acordo com o que registravam, a tecnologia na Montanha Canora ia além de 1,3 milhões de anos atrás.

Com o argumento de que nenhuma máquina pode funcionar por tanto tempo, tentou-se duvidar dos resultados da medição do tempo. A Explorer-2115 já havia chegado há mais tempo à Terra e já estava incumbida de outras tarefas de exploração, mas a discussão entre os cientistas ainda continuava.

Indiferentes a isso, as máquinas roncavam na montanha; também indiferente em sua heráldica majestade, lá continuava, na catedral de pedra de seis mil metros de altura, a reprodução da Via Láctea em miniatura, na escala exata de um bilionésimo.

Durante sua curta estada em Impos, os arqueólogos se aprofundavam cada vez mais nas muitas camadas das ruínas da grande cidade. Avançavam rápidos com os mais modernos meios de escavação. Mas, apesar de tudo, não tinham chegado ainda à primeira camada, ou seja, a mais velha.

Deram à cidade em ruínas o nome de Eona. Estava em contradição com todos os conhecimentos científicos o fato de que jamais houve uma raça inteligente, cuja civilização tivesse existido por tantos milênios. Os cientistas não podiam esquecer o diabólico fantasma que o Ser Coletivo fizera descer para eles, quando aportaram com a Explorer-2115 em Impos. Por artes do Ser Coletivo, foram transformados, isto é, regredidos a quarenta milênios na História, travando contato então com os “barrigas-redondas”, uma raça humanóide antiqüíssima e muita beliciosa, que nunca poderão ter sido descendentes desse grande povo que, aí, pelo oitavo milênio, criou este parque de máquinas perfeitas: o planetário em miniatura.

Os “barrigas-redondas” não tinham nenhuma semelhança com esta raça tão evoluída da Antigüidade, da qual se descobrira uma escultura bem insinuante.

No interior arredondado, de oito mil metros de diâmetro, do maciço de pedra, atrás do conjunto de máquinas, fora encontrada esta escultura, representando uma figura esbelta, sem braços e pernas. Uma vestimenta que pendia suavemente não permitia distinguir característicos anatômicos. Estava num pedestal que girava lentamente. A cabeça estilizada, não era de ser humano. Boca e nariz não existiam, mas o par de olhos, que possuía brilho próprio, tinha muita coisa de humano.

No entanto, entre os bilhões de homens da atual Galáxia, não havia um só de cujos olhos transparecesse tanta lucidez, bondade e sabedoria. Não se podia duvidar de que nesta escultura estava encarnada a imagem real da raça desaparecida.

Fizeram medições de idade nesta estátua e não faltou de novo o fator surpresa — a escultura era bem mais nova que todos os instrumentos técnicos na Montanha Canora. Seria o arremate, a coroa de uma série de criações geniais? Colocaram-na no pedestal flutuante e giratório, quando se acendeu no primeiro dia todo o planetário e uma luz suave se difundiu para todos os lados.

Tudo eram mistérios. E Ele, o Ser Coletivo, trouxera os terranos para este ambiente misterioso. Fizera-os descobrir o singular planetário e os terranos prenderam a respiração de surpresa quando constataram que o posicionamento de todas as estrelas estava cientificamente de acordo com a realidade lá fora.

Ele tinha conhecimento desta maravilha e estava fugindo de uma grande desgraça. Nunca fazia nada sem segundas intenções. Havia pois alguma relação entre o planetário e a temida desgraça?

Somente uma pessoa tivera capacidade para chegar a esta pergunta, sem contudo deixar transparecer suas suposições: Tyll Leyden. Seria este legado de tempos antiqüíssimos um elo de ligação para o hoje? Elo que ligava entre si duas margens de 1,3 milhões de anos. Passado e presente.

Leyden não se esqueceu do aviso do ser fantasma do Planeta Peregrino: “Às vezes é bom se entregar a estas brincadeiras, mormente quando se tem que evitar uma região perigosa. Vocês ainda vão viver muita coisa”.

Que estava insinuado nesta referência? Como poderia este sistema ser considerado uma região perigosa?

Ao falar hoje cedo sobre a situação, Leyden fizera referência a isto. Teve que ignorar os olhares perplexos de seus colegas. Não se preocupava com o fato de os colegas o julgarem medroso.

“Ponto 3: Controle diário do sistema, de todo o sistema, a começar pelo Sol, passando para o planeta Hércules, até sua última lua. Diariamente, ao meio-dia, quero ver os relatórios a respeito.”

Num outro item, proibira a desmontagem das máquinas na montanha. Aos protestos dos especialistas em robôs, respondeu ele com a pergunta:

— Podem os senhores garantir que, com a desmontagem das instalações, não se vai prejudicar o funcionamento do planetário?

Ninguém lhe podia dar esta garantia. Passou então para o segundo ponto. Assim, em quinze minutos, distribuiu as incumbências a cada chefe de equipe. Parecia haver deixado muita coisa como estava antes, mas, quem acreditasse nisto, não conhecia bem o jovem físico e astrônomo.

Leyden, em seu flutuador, chegou perto do grande portão interno. O último trecho até o planetário fez a pé, a fim de se aproximar de um grande conjunto de máquinas, que funcionavam com um leve zumbido. No mesmo instante, um campo magnético o levantou para a abertura no teto da sala de máquinas. Ao desaparecer na escotilha, já estava no planetário.

Não conseguia mais somar as horas que havia passado ali, sabia apenas que algo irresistível o atraía para o planetário, obrigando-o mesmo a entrar. Imediatamente, seus olhos estavam voltados para o alto, onde cintilava toda a Galáxia, com seus milhões de sistemas solares, movendo-se constantemente, como acontecia realmente no Universo.

Bastava que ele pensasse apenas numa determinada estrela, com um pouco de concentração, e na mesma hora flutuava no espaço rumo ao local em que pensara. Seus colegas quebravam a cabeça para procurar explicar o fenômeno, mas acabavam desistindo, um após o outro. Não achavam mesmo nenhuma explicação. Até o momento, não se sabia qual era o mecanismo que punha em movimento o planetário sob a cúpula da catedral de pedra de seis mil metros de altura. Muitos cientistas não acreditavam mais ver o dia em que poderiam entender a finalidade de um só destes aparelhos, naquela confusão de máquinas e instalações.

Leyden foi caminhando lentamente para o lado de fora, passou por dois conjuntos de máquinas, maiores que uma casa normal, e encontrou então seus colegas, os astrônomos. Quatro homens projetaram três mapas siderais e os estavam comparando. Tyll Leyden chegou despercebido. Gostava mais de ouvir do que de discutir.

Fazia, às vezes, sinais de aprovação. Dois dos mapas haviam chegado no dia anterior com a Explorer-777. Vieram da Terra, mas eram um velho trabalho arcônida. Foram equipes de cientistas terranos que os salvaram dos planetas de Árcon, onde certamente ficariam jogados ou seriam destruídos pelo relaxamento no fundo de museus e arquivos.

— Leyden tinha razão — ouviu nitidamente Players dizer. — Não quis acreditar. Eu mesmo jamais chegaria a pensar nisso.

Com os diabos!... Então não se pode mais confiar neste planetário. Pode-se ver, em todos os mapas, esta aglomeração de estrelas e, aqui, sobre nossas cabeças há apenas uma mancha escura, nada mais. Ninguém vai me dizer que, depois de alguns milênios, surgiram do nada milhares e milhares de sistemas solares com suas séries de planetas. Tão depressa assim, as coisas não vão.

Foi neste momento que os cientistas notaram a presença de Leyden. Todos já se conheciam da Explorer-2115. Calado e calmo como sempre, o astrônomo e físico se aproximou das projeções de mapeamento sideral.

Mussol, baixote e de traços fisionômicos rudes, sacudia a cabeça sem parar, rindo alto.

— Um vírgula três milhões de anos... não é brincadeira. Num período tão grande assim, muita coisa pode desaparecer. Se, por exemplo, algumas milhares de órbitas deixaram de existir, então é claro que lá em cima fica uma mancha escura. Meu palpite é que houve uma falha parcial.

Players não acreditava nisso.

— Sua hipótese parece-me muito artificial, Mussol. Que acha disso, Leyden?

— Ainda temos que estudar muito esse assunto — evitou de entrar na discussão.

O magro Players e Mussol subiram flutuando com o chefe até a Galáxia artificial.

Os outros dois ficaram embaixo.

— De que maneira pode uma máquina ler nossos pensamentos? Como é que entende nosso sistema de contar. Isto não entra na minha cabeça! — exclamou Players impulsivo.

— É assim e acabou! — disse Mussol.

A uma distância de dois metros um do outro, foram puxados rapidamente para a cúpula, que era ao mesmo tempo sua Galáxia. Aproximavam-se cada vez mais do conjunto cintilante. O que parecia lá do chão uma espiral quase compacta, separava-se agora em sistemas solares isolados, até as nebulosas esféricas.

Flutuavam na direção daquele setor, que lá embaixo estava reproduzido no grande mapa. O raio energético que os trouxe brecou de repente, levou-os em curvas sinuosas, passando pelo Sistema de Halos e penetrando mais para o interior do mar de estrelas.

De repente, não era mais possível prosseguir, pois os sóis artificiais, diferentes em grandeza e potência de irradiação, exata-mente como eram na realidade, estavam por demais juntos uns dos outros. E naquela aparente confusão de sóis, os cientistas pareciam estar em casa. Vários sóis tinham planetas girando em órbitas de velocidades diferentes. Cada ponto luminoso se movia. Os muitos bilhões de sóis giravam junto com a Via Láctea, naturalmente que não se podia ver de imediato.

— Ali — disse Players, sem ter coragem de apontar com a mão. Tivera que passar pela mesma escola que Leyden, pois, quando tentou tocar num dos pontos luminosos, levou um choque que lhe doeu, como acontecera com seu chefe.

Estes “homens antigos”, como os terranos chamavam as velhas civilizações de milênios atrás, ao planejarem esta maravilha técnica pensaram em tudo e montaram um esquema perfeito de segurança, parecendo às vezes exagerado, a fim de evitar a destruição ou a depredação de sua Galáxia artificial.

Os três fitavam parados o mar de estrelas. Num determinado ponto, sem nenhuma explicação, não havia nada, era apenas uma abertura vazia, cheia somente de escuridão. Leyden estava calado, muito pensativo. A escuridão era diferente, não tendo nada em comum com o fundo escuro da cúpula na rocha. Não era propriamente escura, puxava mais para um cinza-forte.

Olhou para Mussol e Players que não repararam nada, não viram nenhuma diferença. Leyden passou a ouvir um pouco de sua conversa.

— Como se tivessem deixado de propósito este buraco vazio. Leyden, como é que você descobriu isto?

— Por acaso — respondeu lacônico.

Uma palavra do comentário de Players fora como um choque elétrico para ele:... de propósito!... Se os “homens antigos” fizeram isto de propósito, só lhe restava uma pergunta: por que motivo?

— Aqui não vamos aprender mais nenhuma novidade — disse Mussol descontente.

Como todo o resto, a falha de estrelas naquele ponto continuaria sendo um mistério. Olhou para Leyden, do outro lado, três metros longe do misterioso ponto, separado por muitas centenas de pequenos sóis, pairando pensativo.

— Nossa visita a este trecho da Galáxia lhe serviu para alguma coisa, Leyden?

— Sim, nos traz novos problemas. Novamente, o raio luminoso os tirou de onde estavam, levando-os para baixo.

— Nada — disse simplesmente Players para os colegas que ficaram trabalhando embaixo. — A viagem para cima foi inútil. Pois é, mas onde está Leyden?

Ao dar a volta pelo conjunto de máquinas que tapava a vista do planetário, viu seu colega descendo a pequena escada de saída.

“Acho que ele também não gostou da visita ao alto”, pensou Players, voltando então para seus colegas. Mas, por dentro, Players não estava nada contente. A perfeição técnica daquela Galáxia artificial não permitia pensar em erro, em esquecimento. Na semana anterior, os técnicos fizeram dezenas de severos testes. Primeiramente quiseram constatar a distância exata do nosso sistema pátrio. Mediram as distâncias para a Terra, para Marte e os demais planetas e finalmente para o nosso Sol. As medições estavam exatíssimas. Quando se processaram os cálculos de volumes e naturalmente a relação de cada corpo celeste com sua miniatura, os técnicos olhavam uns para os outros, estupefatos, sem saber o que dizer. Aquela imensa construção artificial sob a abóbada rochosa era um fac-símile em miniatura de tamanha exatidão, que só este fato já era algo de misterioso.

Nenhum ser inteligente da Galáxia estava em condições, nem mesmo para imaginar, e muito menos para construir o que estava ali acima de suas cabeças, já há mais de um milhão de anos.

Tyll Leyden, porém, continuava perseguido pela expressão de Players — “de propósito”. Bloqueava seus pensamentos e não o deixava em paz. Com muito mais intensidade do que nunca, desde que estivera em Impos pela primeira vez e descobrira o planetário, a idéia do Ser Coletivo do Planeta Peregrino pairava sempre em seu consciente e se lembrava então de tudo que sabia a respeito dele.

Ele, o Ser Coletivo, também era da época dos “homens antigos”. Não teria sentido querer exprimir sua idade em números. Períodos de tempo, que ultrapassam os milhões dos milhões, fogem da capacidade imaginativa do homem. Mas não corria um boato de que o Ser Coletivo prometera um dia velar sobre os passos do chefe, o Grande Administrador?

Leyden estava deixando a gigantesca sala de máquinas e dirigia-se para o flutuador. Quando estava abrindo sua porta, seu minicomunicador interrompe-lhe os pensamentos. O astrofísico Gastão Robet lhe pedia que viesse imediatamente para a central.

O flutuador saiu do estacionamento e subiu logo a oitenta metros. O corredor de quatro quilômetros de comprimento, até chegar à luz do dia, tinha cem metros de altura e quarenta de largura. Oitenta metros era a altura prevista para a mão de saída. Ao sair para o ar livre, deu de frente com o planeta gigante Hércules, pouco acima do vale. Pela primeira vez, depois de tantos dias, sentia a ameaça que parecia rolar do imenso planeta. Como a todos os outros, custava-lhe também muito libertar-se deste sentimento angustiante. Olhou para o planalto, onde, outrora, aterrissará a Explorer-2115. Ele e seus colegas ainda pertenciam a esta nave de exploração. Sua permanência em Impos era só por tempo limitado.

Desde a véspera, modificara-se muito a aparência do planalto. A Explorer-777 descarregara ali 18 casas de plástico que já estavam montadas. Os robôs fizeram este trabalho com muita técnica. Entre as dezoito casas, sete estavam destinadas a fins científicos. Conferindo os conhecimentos de desembarque de material, Leyden vira o que a 777 trouxera para Impos. O valor da carga estava além dos cem milhões de solares. Cada um dos chefes de equipe fizera listas com requisição de material à Terra. Percorreu com a vista as novas construções e se dirigiu com o flutuador para o abrigo provisório dos astrofísicos.

Os cinqüenta robôs descarregados pela Explorer-2115 prestaram, desde o primeiro dia em que os cientistas tinham que fazer tudo sozinhos, inestimáveis serviços. Sem o trabalho destes homens-máquina, os cientistas não teriam feito a terça parte do que fizeram.

Gastão Robet esperava por Leyden junto ao setor de astrofísica.

— Ótimo que o senhor veio tão depressa. Os fantasmas estão se mexendo no seu Hércules — disse como saudação, caminhando à sua frente. O assim chamado acampamento provisório era um recinto de dez por dez metros, e a equipe de três técnicos que ali se abrigava sentia-se relativamente bem.

Leyden olhou para os dois homens. Estes permaneceram em seu posto, sentados diante de um aparelho. Estavam tão aprofundados em seus trabalhos que nem sequer olharam para trás quando ele entrou.

— Veja como a bruxa está solta em Hércules — disse Robet.

Na sua voz não havia ironia ou brincadeira. Seus colegas se afastaram para os lados a fim de que ele pudesse olhar para o aparelho. Leyden puxou um tamborete e sentou. Não disse nenhuma palavra sobre o termo “fantasma” ou “bruxa.” Como Robet e seus dois colaboradores, ficou de olhos fixos no diagrama que se alterava sempre mais.

— Não sei por que não notamos isto antes. Na espaçonave, teríamos simplesmente consultado o computador. Mas, e aqui?

Robet não estava contente com sua descoberta, embora tivesse notado uma coisa muito importante: o centro de gravidade do gigantesco planeta Hércules não correspondia ao seu centro geométrico.

— Mas os senhores podiam ter notado isto — havia um pouco de censura na voz de Leyden.

— É o que nós nos dizemos desde que fizemos tal descoberta, Leyden. É que, antes, ninguém pensou nisso. Sinto muito.

Era um colega falando com o outro. O fato de Leyden ser o chefe, não mudava nada.

Leyden fazia seus apontamentos, quando levantou-se para procurar o pequeno computador, um aparelho de pouca capacidade para o registro de dados. Robet, curioso, ficou ao lado dele. Conseguiu ver o final da pergunta feita. Dava para ter uma noção do que Leyden queria saber e isto era o suficiente.

— Que é isto, Leyden? Você está pensando que...

— E você não? Quero agir com segurança. Tenho que saber se este deslocamento do centro de gravidade ocorre normalmente ou é dirigido. Se muda de lugar, quero saber por quê.

— Nunca chegaria a uma idéia desta. Mas você pode ter razão. Por que será que não reparamos neste fenômeno antes? Santo Deus, não são boas as perspectivas.

O computador começou a roncar, caindo uma longa tira no recipiente de saída. Leyden a examinou, dobrou-a e a meteu no bolso. Havia uma pergunta no olhar de Robet. Gostaria de ler os sinais decifrados.

— O centro de gravidade do Hércules se desloca, Robet, pelo cálculo da maior probabilidade, numa velocidade muito perigosa para nós. Continuem ininterruptamente com os controles e fiquem sempre observando. É possível que este processo seja normal para o planeta gigante. Mas quem pode ter certeza?

Não demonstrou a inquietação que ia nele. O computador lhe revelara mais outra coisa, embora apenas com uma probabilidade de 78 por cento. De acordo com esse dado, o Hércules era um planeta duplo. Podia-se fazer a comparação com um ovo, cuja gema está bem no centro, cercada pela clara. Mas esta gema — aqui uma enorme concentração de massa no planeta gigante — se deslocava.

Leyden reprimiu o desejo de mandar avaliar o tamanho do planeta dentro do próprio planeta. Um pressentimento o obrigava a não deixar transpirar nada de suas suposições, em hipótese alguma. Os mistérios em Impos já eram muitos e davam o que fazer a seus colegas, e não queria jamais aumentar a intranqüilidade entre os mesmos. Antes de sair do departamento de Astrofísica, pediu a Robet que não deixasse transpirar nada sobre suas observações.

— Temos que ter certeza primeiro — disse concluindo.

Não se utilizou mais do flutuador, mas foi a pé até o posto de rádio. Estava de serviço um técnico em hiper-rádio.

— Um momento, por favor! — disse Leyden sentando e começando a escrever. Entregou a folha ao técnico. — Transmita isto para Terrânia.

Tratava-se de uma pequena, mas muito dispendiosa lista de material. Leyden tinha suas dúvidas se iam mesmo colocar estes instrumentos à disposição do comando de Impos.

Esperou até que a mensagem fosse transmitida em código, em ondas curtas.

— Avise-me, por favor, assim que a Administração de Material em Terrânia se manifestar a respeito.

Imperceptível mas ininterruptamente, Tyll Leyden foi ficando senhor dos pontos estratégicos para, em poucos dias, ser o homem mais bem informado de Impos. Não o fazia por egoísmo ou para fazer carreira, mas tão-somente pela inexplicável sensação de inquietação que lhe ia ao íntimo.

“Vocês ainda vão presenciar muita coisa”! Não conseguia se esquecer desta profecia do Ser Coletivo do planeta Peregrino.

Nesta noite foi acordado duas vezes em seguida. O primeiro chamado veio de Gastão Robet. Leyden ouviu com muita atenção seu relatório, o qual afirmava que o centro de gravidade do Hércules coincidia agora com o centro de sua massa. Isto queria dizer que o pequeno planeta se mantinha agora normal no centro do planeta maior.

Leyden começou a pensar nos instrumentos que solicitara de Terrânia, quando, uma hora depois do chamado de Robet, veio a ligação do radiotelegrafista. A Administração de Material em Terrânia recusara o pedido de material feito por Leyden.

“Mas vou conseguir estes instrumentos”, pensava o astrônomo e físico. Deitou-se novamente e logo dormiu.

Uma semana mais tarde, foi novamente alarmado por Gastão Robet. O departamento de Astrofísica se transladara para uma das novas casas, enquanto o recinto de dez por dez metros servia agora para guardar os instrumentos mais sensíveis, que no momento não estavam sendo usados.

Ao penetrar no departamento de Astrofísica, deparou-se com um colega que preferia ver a uns milhares de anos-luz longe dele.

 

Sascha Populos, técnico em gravitação, tinha fama de ser um intrigante inescrupuloso e carreirista. Leyden já havia constatado isto e procurava sempre se desviar de sua presença.

— Continua tudo na mesma! — Com estas palavras, Gastão Robet recebeu seu chefe e, indignado, apontou para o instrumento que apresentava um diagrama. — Populos passou por aqui casualmente, Leyden. Interessou-se pelo caso, mas não concorda com sua teoria de um planeta dentro do outro.

Leyden examinou de alto a baixo o técnico em gravitação, sem dar na vista. Seu sorriso convencido lhe servia de aviso, mas disfarçou seus sentimentos. Em desobediência a suas ordens, Robet, falara, pois, sobre o fenômeno do planeta Hércules. Não se podia, portanto, fazer mais nada. Sascha populos haveria de fazer com que em uma hora todos estivessem a par de tudo.

O equipamento técnico do departamento de astrofísica melhorara, mas nem um só dos aparelhos trazidos pela 777 podia ser utilizado para estudar o fenômeno do Hércules.

O centro de gravidade do planeta já se deslocara novamente, como estava evidente no diagrama.

— Claro que é uma besteira falar que dentro do Hércules se movimenta um outro planeta — disse o intrometido Populos, sem que ninguém lhe pedisse sua opinião. — Temos diante de nós o caso típico que aconteceu no planeta Hutul.

Leyden não conhecia a história do planeta Hutul, mas não fez nenhuma pergunta a Populos. O astrofísico explicou:

— Observei e comparei o fenômeno de hoje com o da semana passada. Aquilo que em certos pontos sai muito do centro geográfico do Hércules, se desloca hoje como há sete dias. Na minha opinião, é muito cedo para se julgar o fato. Temos que ter mais dados, o que importa dizer que temos de esperar algumas semanas. O senhor está de acordo com isto, Leyden?

— Sim.

Com orgulho na voz, embora sem muito alarde, disse Sascha Populos:

— Gostaria de me ocupar do caso.

Tyll Leyden fitou-o enquanto dizia:

— Pelo que me consta, o senhor está lotado na Montanha Canora. O chefe de sua equipe o dispensou de seu trabalho?

Era mais que uma recusa.

— Leyden, sou técnico em gravitação — respondeu ele e seus olhos azuis começaram a cintilar.

— E eu sou físico e em geral minha ocupação é com problemas astronômicos ou astrofísicos. O senhor vai ter a bondade de se dirigir agora para seu setor.

Populos se retirou sem dizer uma palavra e Leyden o seguiu com a vista.

“Tenho que me precaver deste homem”, pensava Tyll, voltando depois a se interessar pelo diagrama do aparelho.

— Robet, com os elementos desta segunda observação, o senhor deve estar em condições de formular um esquema, embora imperfeito, do deslocamento do centro de gravidade.

— Se o senhor quiser aceitar um esquema, admitindo dez por cento de inexatidão, terá então em poucos minutos os resultados do que descobrimos até agora.

— Faça isto, Robet. Até logo mais.

A cada sete dias, se manifestava em Hércules o inexplicável fenômeno do deslocamento. Aos poucos, Robet e seus cooperadores foram perdendo o estímulo de se dedicarem a este enigma. Em compensação, Sascha Populos aproveitava cada minuto livre para observar e fazer medições. Mas não chegou a saber nada do Projeto Hércules que Leyden desenvolvera, num trabalho comum com técnicos em sondas e arqueólogos experimentados.

Na manhã do dia 4 de agosto, três sondas subiram no espaço e ninguém sabia o que elas continham, com exceção de sete terranos que permaneciam sentados no edifício de construção achatada, diante de um amplo parque de instrumentos sofisticados, onde acompanhavam a rota das sondas.

Com estes instrumentos, Tyll Leyden queria penetrar nas profundezas do planeta. Teoricamente era possível, porém precisava-se esperar pelos resultados práticos. O caminho para o Hércules não era tão grande. A distância média entre Impos e ele era de 984.000 quilômetros. Depois de meia hora de vôo, o posto de rastreamento do acampamento comunicou que os três instrumentos estavam em queda livre na direção do planeta.

O tempo passava e Leyden continuava esperando com seus colaboradores, seis ao todo. Neste momento, a primeira sonda tocara o solo gelado do gigante, abrindo caminho na crosta gelada de gás metano. Pouco mais tarde, chegaram também as outras duas sondas. Desapareceram no interior do planeta. As sondas utilizavam a energia da queda e registros impotrônicos a transformavam rapidamente num fortíssimo campo magnético para proteger os instrumentos, que serviam simultaneamente de mecanismo de perfuração. Conversores de grande potência cuidavam que, quando a energia fosse diminuindo, os campos de proteção em torno dos instrumentos continuassem os mesmos. Davam ao mesmo tempo a energia necessária para dissolver a estrutura rochosa, e assim os instrumentos continuavam se aprofundando cada vez mais no interior do Hércules.

“Está dando certo?”, esta era a frase mais repetida na divisão de Astrofísica. Reinava no recinto um silêncio cheio de tensão, muito raramente interrompido pelos estalos dos relês. Quatro vidros foscos iluminados por eles transmitiam diagramas ou amplitudes. Todos os aparelhos estavam acoplados com o computador. Não se perdia nenhum dado. O que escapava aos olhos atentos dos cientistas era captado pelo setor de armazenamento.

Era o dia 4 de agosto de 2326, exatamente no momento em que Lemy Danger, no planeta Eysal, dava seu malfadado tiro no ativador celular.

Quase na frente de Leyden, explodiu e voou pelos ares aquele aparelho que seu colega de escola, na Explorer-7094, lhe trouxera de Terrânia. Todos os instrumentos, atrás e ao lado de Leyden, também arrebentaram. E no mesmo instante cessou a ligação com as sondas. As telas de controle não exibiam mais os diagramas e as amplitudes. Foi como se a mão de um gigante tivesse rebentado todas as ligações.

Um dos cientistas desligou a chave geral.

A tentativa com o planeta redundara em fiasco.

— Que foi que aconteceu? — perguntavam-se os cientistas, homens que não sabiam nada da missão de um membro da USO — Lemy Danger — em Eysal.

De repente, Leyden se converteu no centro das atenções, e todos os olhares se volveram para ele. Mas ele também não podia dizer nada. Seu minicomunicador estava chamando.

— Mister Leyden, por favor venha para cá... por favor!

Dobrou o braço e falou bem perto do microfone de pulso:

— Aqui fala Leyden, estou ouvindo.

— Aqui fala da sala de máquinas da Montanha Canora. Deu a louca em todas as máquinas. O senhor consegue me ouvir com este barulho infernal? De repente, começaram a roncar todos os aparelhos. Parece que o diabo está solto por aqui.

“Aqui conosco também”, pensou Leyden, sem o dizer, naturalmente.

— Quem está falando?

— Engenheiro Turander. Gostaria de dar permissão para todos abandonarem o recinto.

— Somente quando houver verdadeiro perigo. Fim.

Leyden forçava a cabeça para achar uma explicação.

— Será que a causa disso são nossas três sondas? — ouviu um dos colegas dizer atrás dele, e também já fizera esta pergunta a si mesmo. Será que o planeta Hércules se defendera desta maneira inusitada contra a tentativa de sondagem de seus segredos?

— A positrônica está em ordem? — perguntou.

Foram experimentar. Não, não sofrera nenhum prejuízo. Também estavam intactos os instrumentos de rastreamento e de medição de distâncias, porém não existiam mais as ligações com as sondas. Leyden ficou perplexo. Deu mais uma olhada nos instrumentos. Julgava ter descoberto alguma coisa.

Todos os instrumentos que funcionavam à base da quinta dimensão estavam destruídos. Os de quatro, porém, funcionavam normalmente.

— A positrônica está perfeita! — exclamou Robet.

Para espanto de todos, Leyden não fez uso do computador. Estava pensando em outra coisa. Queria conferir sozinho os controles. Uma suspeita vaga, mas terrível, estava tomando forma nele.

— Por favor, meus senhores, saiam um pouco! — pediu, pois queria ficar sozinho com o computador, o mais depressa possível. Mas um chamado do planetário atrapalhou-lhe os planos.

Quando voava no flutuador para a Montanha Canora, Leyden não reconheceu a pessoa que estava sentada no outro aparelho no momento de sua chegada. Mas vira Sascha Populos e virara a cabeça para o lado, quando passou rente em seu flutuador.

Mungs, Players e Mussol chamaram Leyden com as palavras:

— Venha logo, o diabo anda solto por aqui.

Quando atravessou o enorme portal e penetrou na gigantesca sala de máquinas, foi atacado, no verdadeiro sentido da palavra, pelo barulho infernal dos instrumentos. O chão tremia a seus pés. Ao tocar uma máquina, tirou a mão bruscamente, como se tivesse levado um choque. Pelo pequeno aparelho de pulso, chegou aos seus ouvidos um grito como nunca ouvira. Como que atingido por um raio, caiu gemendo.

Quando o campo magnético o levou através da barreira óptica, reparou que era também uma barreira acústica. Sentiu um silêncio benéfico. Olhou para os três auxiliares, como a perguntar alguma coisa. Mungs começou a contar o que se passou.

— Quando é que as máquinas começaram a roncar aqui? Hora exata, por favor? — interrompeu-o Leyden.

Mungs disse a hora com exatidão até dos minutos. Leyden agradeceu. Esperava este dado para o mesmo momento em que todos os aparelhos que funcionavam à base da quinta dimensão foram destruídos.

— E depois? — perguntou Leyden. Mungs continuou:

— As máquinas diminuíram o terrível barulho, mas ainda continuaram com algum zumbido. Falei com Players a respeito e passamos pela escultura. Leyden, você já reparou que não somente seus olhos brilham, mas também seu pedestal? E se não nos enganamos, Players e eu, o pedestal gira agora com mais rapidez, que antes.

Quando passavam ao longo da máquina gigantesca de quase cem metros, Leyden notou que o funcionamento era agora muito mais barulhento que antes. Chegaram à escultura que se apoiava num pedestal giratório, iluminado por um vermelho fraco. A cintilação dos olhos parecia a mesma, mas a velocidade da rotação estava estranhamente maior. Leyden parou.

— É isto mesmo — disse depois de fazer uns cálculos. — Três voltas e meia por minuto.

Depois virou-se para o planetário.

— Ainda está lá em cima, isto é, o principal.

— Ainda — repetiu Mungs. — Quando as máquinas começaram a roncar, todos os sóis começaram a brilhar como se estivessem para explodir. A iluminação que vem da cúpula estava tão berrante, que dava para ofuscar e parecia que tudo iria rebentar em nossas cabeças.

— E depois, tudo se normalizou? — quis saber Leyden.

Mungs respirou profundamente.

— Sim, mas não na sala de máquinas. Turander nos mandou para fora, mas não chegamos até embaixo. O barulho nos fez voltar ao planetário. Estamos sentados num barril de pólvora que pode ir pelos ares a qualquer momento. O que realmente aconteceu? Leyden, você sabe mais do que nos disse até agora.

O cientista procurou uma desculpa:

— Vou subir e ver bem de perto o planetário. Depois, vamos falar mais a respeito.

Deixou-se levar para cima. Ia observando tudo e, para seu alívio, não viu nada de extraordinário. No entanto, ia com o receio de ter deixado de ver alguma coisa importante. Depois voltou para junto dos colegas.

Não continuou a conversa interrompida com Mussol e Mungs, pois devia voltar o mais depressa possível para a positrônica no seu departamento, consultar os dados armazenados e comparar com eles seus cálculos.

Enquanto deslizava no flutuador rumo à sua equipe, começou a pensar, pela primeira vez depois de tanto tempo, na teoria de Falton. Falton foi um arcônida que viveu há mais de seis mil anos. Logo depois de sua morte, seus trabalhos caíram no esquecimento, até que cientistas terranos os encontraram num antigo computador. Mas em toda a extensão do Império, a teoria de Falton não foi bem aceita. Não obstante o parecer negativo de cientistas de renome, Leyden não deixou de se preocupar com a referida teoria, estando disposto a experimentá-la.

Arregimentou para isto a metade dos cientistas da Explorer-2115, embora o comandante o proibisse de mexer com tal assunto.

Faltou afirmava em sua teoria que, em virtude de um certo número de medições em pleno espaço, se podia constatar se um sistema solar tinha ou não planetas e se estes estavam habitados ou eram, pelo menos, habitáveis.

Leyden deixou o flutuador. Mas ficou surpreso e desconfiado ao ver outro flutuador diante do edifício da equipe de astrofísica.

Com três passos largos, chegou até a porta. Abriu-a e viu Sascha Populos diante do computador. O técnico em gravitação estava de costas para ele. Será que não notara a entrada de Leyden?

— Populos?!

O cientista levou num susto e se virou para trás.

— O senhor? — disse em voz sumida, mas silabada. — Santo Deus, o senhor me assustou.

Leyden olhou friamente para ele.

— Que está fazendo aqui? Populos sorriu.

— O planeta Hércules e seus fenômenos me interessam muito. Será que agora é proibido fazer pesquisas científicas nas horas de folga? Estou aqui para resolver uns cálculos. Mas queria saber quem foi o bobalhão que esvaziou todo o computador, colocando-o no zero.

“Foi você mesmo”, pensou Leyden, irritado, mas conseguiu se controlar. Uma explosão de cólera seria sem sentido, pois, como conseguiria provar que Sascha Populos apagara de propósito os dados do computador? Assim, fez cara de indiferente para uma situação tão desagradável.

— Quem sabe, alguém o fez sem querer, Populos. Você tinha necessidade de ativar o setor de dados?

Sabia que, com tal pergunta, jamais iria pegar o técnico em gravitação.

— Não sou, como o senhor, um livro vivo de fórmulas, Leyden. Que eu dependo dos dados do computador, todo mundo sabe. Mas o senhor parece que não vê com bons olhos minha presença aqui, em sua proximidade. Mas vou encontrar um computador em outro lugar. Por favor, o computador está aqui às suas ordens!

Ele sorriu malicioso.

— Obrigado — respondeu Leyden, de rosto imóvel, esperando até que Populos deixasse o recinto e se afastasse com o flutuador. Depois, com poucos controles, constatou que todo o saber ali acumulado fora apagado.

O computador perdia, com isso, o seu valor. Leyden tentou dominar sua cólera. Aproximou-se mais uma vez daqueles aparelhos que, de um instante para o outro, foram destruídos por um agente externo. O cientista não se recordava de jamais ter vivido coisa igual.

— Isto que aconteceu foi de quinta dimensão. Não há dúvida — disse ele em voz alta.

Calou-se e olhou para fora, para o Hércules.

“Vou descobrir ainda o segredo do deslocamento do seu centro de gravidade”, pensou ele, para logo depois começar a rir. Sascha Populos não poderia fazer muita coisa com os conhecimentos roubados do computador. Faltam-lhe os dados básicos que estão somente no cérebro eletrônico da divisão de Astrofísica. Além disso, Populos não possuía o diagrama confeccionado com exatidão, que indicasse a trajetória do deslocamento do centro de gravidade.

Como chefe geral de Impos, era dever de Leyden supervisionar o prosseguimento dos trabalhos de todas as equipes. Voou para Eona e aterrissou bem perto da grande escavação que já tinha a profundidade de uma mina, indo além de duzentos metros sob a terra. Um robô o levou para as profundezas, onde estavam os especialistas. O Professor Attik o cumprimentou amigavelmente.

— Faz tempo que o senhor não vem mais aqui. Alegro-me pela sua visita. Iria mesmo convidá-lo para ver nossos trabalhos.

O arqueólogo falava com entusiasmo e seu rosto irradiava excitação. Leyden, que em si não se interessava muito por escavações, acompanhou o professor. Passou por máquinas especializadas automáticas, por motores que roncavam e por intermináveis esteiras rolantes. Desceram degraus que pareciam polidos há pouco. Attik parou de repente.

— Olhe só isto aqui — disse apontando para os degraus que, mesmo para dentro da escavação, ainda estavam iluminados. — Pesquisamos à esquerda e à direita, Leyden. Cada degrau tem uma largura de trezentos metros, e o número deles vai a quatrocentos. Não nos é conhecido o material de que é feito tudo isto. Nosso aço de Terconit é manteiga em comparação com ele.

Tyll Leyden tentava imaginar uma escadaria de trezentos metros de largura, com mais de quatrocentos degraus. Achava uma coisa absurda, irreal. Olhou então para cima e viu o reboco liso, já um pouco gasto.

— Isto também pertence à escadaria, professor? — perguntou ele.

Attik abanou a cabeça negativamente.

— Aos 202 metros de profundidade, pudemos ligar o aparelho de sucção e em três horas abrimos um vão de doze metros, deixando assim a escadaria livre de todos os lados. Ah! Aí vêm os robôs. O senhor dispõe de tempo para ver a construção?

— Que construção?

— Na profundidade de 372 metros, encontramos a primeira construção existente.

Desculpe meu exagero. O que resta ainda é apenas a abóbada da adega subterrânea. A construção que havia em cima dela deve ter sido destruída numa catástrofe de grandes proporções, há mais 1,3 milhões de anos.

— Esta medição de tempo estará certa, Attik?

O arqueólogo meneou a cabeça.

— Infelizmente, não. Tivemos que fazer uma estimativa. Este material — e ele apontou para os degraus — não permite avaliação por períodos de tempo. É praticamente indeformável.

— O senhor não vai querer dizer com isto que todos os nossos cálculos de idade são falsos — disse Leyden sorrindo.

— Por estranho que pareça, digo que sim. Não falsos, mas inexatos. O senhor quer ver uma residência destes “homens antiqüíssimos”?

Num vôo de flutuador, foram levados para baixo por um robô, descendo os quatrocentos degraus. A cada cinqüenta metros havia uma luz acesa, que, embora muito forte, não dava para iluminar o degrau inteiro. Mas o foco de luz lá embaixo parecia bem maior. Quando o robô guiou o flutuador através de um portal imenso e parou, havia sobre eles uma cúpula polida.

— Veja, Leyden! A construção é do mesmo material que a escadaria.

Era estranho mesmo, que o material que havia nas camadas superiores estivesse todo destruído embora fosse tão resistente.

— O senhor encontrou alguma coisa que dê alguma explicação sobre os “homens da antigüidade”?

A resposta do professor foi meio decepcionante:

— Temos provas irrefutáveis de que os homens da época saíram levando tudo que havia nesta adega. Sobre eles, porém, não sabemos mais do que o pouco que sabemos agora.

— E o entulho ou terra que o senhor está tirando para fora?

— É de data mais recente. Não resistiu a nenhuma determinação de idade. Mas não devemos estar contentes por termos encontrado esta construção?

Leyden olhou para a abóbada da adega, que ao longe mergulhava na escuridão.

— Quando o portão se abriu, recebemos uma lufada de ar fresco no rosto.

Leyden quase não ouviu esta observação do professor. Segundos depois foi que se conscientizou do seu significado.

— As máquinas ainda estão trabalhando, professor?

— Sim, trabalham de novo, Leyden. Estávamos os oito colegas diante do portão e não o podíamos abrir de maneira alguma, quando, de repente, o chão tremeu. Não, não me olhe assim desconfiado! Não fomos vítimas de alucinação. Primeiro veio o tremor que atingiu com toda nitidez também a escadaria e...

— Você se lembra a que horas foi isto?

— Por acaso, sim. Por quê? Interessa-lhe tanto assim?

O professor deu-lhe o momento exato:

— Foi neste mesmo segundo que todos os instrumentos da seção de Astrofísica, que funcionavam à base da quinta dimensão, falharam e a Via Láctea do planetário foi ameaçada e aqui, no fundo da terra, abriu-se um portão de adega.

— Você não acredita no que estou dizendo, não é Leyden?

Havia uma leve censura na voz do professor.

— Você encontrou as máquinas?

Às vezes, o modo de se expressar de Leyden, suas mudanças bruscas de um assunto para o outro, se tornavam quase insuportáveis.

— Não, Leyden! Não conseguimos descobrir nenhum vestígio de máquinas. A abóbada da adega de cinco mil metros de extensão...

— Quanto mesmo?

— Uma adega quadrada, Leyden. Quinhentos por quinhentos metros, sendo que a altura era de oito metros e vinte. Vazia, completamente vazia, sem o menor vislumbre de poeira.

Os pensamentos de Leyden se moviam em outra direção. Com sua enorme extensão, a adega devia chegar, em parte ao menos, até um certo ponto por baixo da grande sala de máquinas da Montanha Canora. De um momento para o outro, o jovem chefe da missão em Impos compreendeu que Attik e seus colaboradores não foram vítimas de nenhuma alucinação, ao sentirem aquele tremor que percorreu todo o chão.

Foi naquele instante que todo o conjunto de máquinas na grande sala começou a roncar, ronco este acompanhado pelo tremor do solo.

— Leyden, não está se sentindo bem? Você está tremendamente pálido!

Tyll não estava mais em condições de pensar com clareza. Não sabia ainda de uma onda de choques gravitacionais que partia de Eysal e se estendia por toda a Galáxia. Sabia apenas que uma equipe de cientistas, usando três sondas, tentaram penetrar no centro do planeta Hércules. Como astrofísico, não podia imaginar que três alfinetadas no gigante pudessem causar tal reação. O que lhe parecia mais obscuro era de que maneira o planeta Hércules podia responder ao ataque triplo exata-mente no plano pentadimensional. As leis da Física não o permitiam e no entanto acontecera.

— Realmente, não me sinto nada bem. Será que um robô me pode levar para cima?

Não viu nada da fantástica escadaria, quando o flutuador do robô o levou de volta. Deixou-se cair no banco de trás e mandou que o robô conduzisse-o para seu posto de trabalho.

Assim que chegou, procurou pelo diagrama onde estava registrada a trajetória do centro de gravidade em deslocamento. Procurou-o por longo tempo, até perceber que fora roubado e sabia naturalmente quem era o ladrão: Sascha Populos.

Deixou novamente seu local de trabalho e se dirigiu para o segundo andar, onde se localizava o laboratório do técnico em gravitação.

Bateu à sua porta e Populos mandou-o entrar. O rosto do técnico se transtornou ao ver Leyden.

— O que há? — perguntou em voz baixa, mas com um pouco de rispidez.

Leyden sentou-se bem na sua frente.

— Estou lhe perturbando o trabalho, Populos?

O técnico se abriu num largo sorriso:

— Na qualidade de chefe, o senhor nunca atrapalha.

— Não estou aqui como chefe. Vim aqui para lhe chamar a atenção, Populos. Acho que você ainda não me conhece bem.

— Não sei a que vem sua repreensão. Tem alguma coisa contra mim? Por que não me diz claramente? Prefiro a sinceridade e a franqueza, sempre.

Leyden se levantou.

— Não são necessárias muitas palavras para nos entendermos. Reflita um pouco no que lhe disse.

Saiu e fechou a porta e não ouviu mais a risada de Populos, nem sua observação: “Você voltará muito mais depressa para a Terra do que está pensando”.

 

Tyll Leyden jamais confiava nos outros. No meio de sua equipe, onde era chefe da turma, até sua nomeação, cumpria toda sua obrigação da turma, pelo menos enquanto seus deveres de chefe geral o permitiam.

Estava agora esperando há uma hora, no posto de hiper-rádio. O quartel-general da USO anunciara uma comunicação importante para este dia, às 14 horas, tempo normal. Até o momento não viera nada. Olhava distraído para o oscilógrafo de ondas, que dava com exatidão a amplitude constante do hiper-rádio. Seus olhos se arregalaram e chegou mais perto.

— Venha aqui e olhe uma coisa interessante — disse ao radiotelegrafista de serviço.

E os dois não tiraram mais os olhos da luzinha verde no vidro do oscilógrafo. A onda parou por uns segundos, depois desapareceu. Parecia não existir mais, enquanto linhas em ziguezague cruzavam a tela, rebentavam rapidamente, revezando-se com a amplitude. Por cinco ou seis vezes, os dois presenciaram este espetáculo, que acabou sumindo.

Chegou então a esperada mensagem do quartel-general da USO. De início foi explicado o motivo do atraso na transmissão. Leyden ouviu o nome do planeta Eysal e depois, pela primeira vez, a palavra “gafanhotos córneos”. Resmungou irritado quando foi dito que estes gafanhotos estariam em condições de devorar até aço terconídio. Mas, de repente, Leyden estremeceu todo, quando no relatório se fez menção da data 4 de agosto em conexão com o nome de planeta Eysal. Falou-se de um gerador de energia gravitacional com choque frontal, que no dia 4 de agosto desencadeou um imenso abalo gravitacional em quinta dimensão. Embora estivesse sob forte pressão nervosa, Leyden se sentia mais aliviado. Não fora, portanto, ele e seus colegas que provocaram o choque gigantesco pentadimensional de gravitação com as três sondas. Que acontecera afinal no planeta Eysal? De onde viera o instrumento Gravestog?

O porta-voz da USO, no quartel-general, não deu tempo a Leyden para prosseguir em seus pensamentos.

— Todos os comandos, independente a que finalidade se destinem, estão solicitados a comunicar imediatamente à USO suas observações sobre o abalo gravitacional. Pelas notícias que temos em mão, deduz-se que todos os rastreadores estruturais deixaram de funcionar no mesmo momento. Há uma fundada suposição de que nas naves Explorer se tenham feito preciosas medições referentes a este abalo. A USO pede a todas as unidades que examinem com cuidado todos os registros e demais observações e os transmitam logo via rádio para o quartel-general.

— O pessoal está nervoso por lá, hein? — constatou o técnico em hiper-rádio.

Leyden concordou. Já havia quase se esquecido dos temíveis gafanhotos. Mas, nas próximas semanas e meses, tornaram-se o pesadelo constante de todos em Impos, pesadelo este ampliado com a figura grotesca do verme-monstro.

Deixou pensativo a cabina de rádio. Gostaria de saber mais coisas sobre o funcionamento do aparelho Gravestog no planeta Eysal. No mesmo instante, porém, reconheceu que teria ainda que esperar muito até se enfronhar nos detalhes. Seus colegas e ele não conseguiram aumentar muita coisa em suas pesquisas. Sucesso verdadeiro estava tendo somente a equipe de arqueólogos.

Leyden voltou a pensar na obra-prima do planetário que já existia há mais de um milhão de anos e suas constelações mantinham a exatidão matemática de sempre. Era realmente uma instalação de valor inestimável.

Parou, de repente, no caminho de piso plástico. Que foi que aconteceu pouco antes da transmissão da USO? Toda a transmissão foi em quinta dimensão e se notaram perturbações no hiperespaço. No entanto, a chapa de amplitudes mostrava com clareza sinais de interferências.

Chamou depressa pelo mini-rádio de pulso, seu colaborador Gastão Robet.

— Venha depressa para o local do rádio, Robet. Fim da transmissão.

Robet encontrava-se na Montanha Canora. A equipe de cibernética solicitara seu auxílio. Falavam de impulsos parasitas que, de acordo com sua opinião, tinham que ter uma só origem.

Até o momento, Robet não conseguira determinar o tipo de interferências, nem podia dizer de onde vinham, embora não pudesse negar sua existência. A chamada de Tyll Leyden lhe viera num momento muito desagradável.

Apressou-se em deixar a escavação gigantesca para chegar o mais depressa possível a seu interessante trabalho. Tinha a intenção de deixar Leyden a par de suas observações. Mas assim que chegou diante dele no posto de rádio, esqueceu todos os outros pensamentos. O que Leyden lhe tinha para contar era cem vezes mais interessante que seu próprio problema, isto é, de procurar a origem das interferências parasitas lá na montanha.

— Perturbações no hiper-rádio — repetiu ele, balançando a cabeça. Depois fitou o técnico de rádio. — Você não reconheceu o tipo destes fenômenos?

— Não e posso lhe dizer que nunca vi coisa semelhante.

— Santo Deus! — disseram quase ao mesmo tempo Leyden e Robet, olhando desconcertados para os colegas.

— Quando foi que você observou isto pela primeira vez? — perguntou Tyll Leyden curioso.

O técnico de rádio era a calma em pessoa.

— Não lhe poderia responder a pergunta, se a USO não tivesse mencionado antes o forte abalo do dia 4 de agosto. Naquela ocasião, o ziguezaguear maluco no oscilógrafo de ondas foi muito pior. E foi assim também agora?

— Sim — respondeu Leyden. — Mas vamos continuar nosso trabalho. Vamos ligar para a faixa de ondas coletivas das Explorer. Procure saber o que foi observado por lá. Você tem tempo, não é?

Robet também olhou admirado para Leyden. Não sabia o que o astrônomo e físico pretendia com tudo isto.

A mensagem foi transmitida, e uma depois da outra as naves de exploração se apresentaram. Aos encouraçados que estavam a mais de dez mil anos-luz, Leyden pediu que fossem excluídos. Finalmente, entrara em contato com sete espaçonaves de exploração. Nenhuma delas estava a mais de cinco mil anos-luz do seu sistema. Três naves Explorer não souberam dizer nada, mas as outras quatro constataram perturbações na recepção do hiper-rádio.

— Faça ligação agora com seu departamento de gravitação — pediu Leyden.

Teve que ter paciência até que ficassem prontos os contatos com as quatro naves Explorer. E os chefes de equipe foram então se apresentando. Em poucas palavras, Leyden lhes disse quais os dados que lhe interessavam. Das quatro naves veio quase ao mesmo tempo a pergunta: o senhor quer localizar a origem de um suposto choque gravitacional?”

— Sim, e aliás, com a fórmula de Falton.

— Falton? — perguntou alguém da nave de exploração. — Quem é este Falton?

Leyden insistiu.

— Por favor, dê-me os dados separadamente. Tenho urgência deles.

Pela ordem do número de matrícula, cada nave transmitiu seus dados pela voz do chefe de equipe. Numa quase monotonia, os valores se repetiam no alto-falante. Ninguém, na cabina de rádio, estava tomando nota, pois o computador recebia os dados com muito mais precisão que o melhor taquígrafo.

Durante a exposição da última nave de exploração, Tyll Leyden virou-se para trás e teve um calafrio. Sascha Populos estava de pé junto à porta, tomando nota. Terminada a transmissão, Populos levantou os olhos, sorriu cínico, fez um cumprimento e saiu.

Somente depois que a porta bateu, foi que o radiotelegrafista e Robet olharam para trás.

— Tivemos uma visita — disse Leyden, seco. — Populos.

— O senhor não gosta de Populos, não é?

Leyden descartou a pergunta:

— É um homem que entende de seu trabalho.

Com isto, Robet não sabia mais do que antes. Leyden pediu ao radiotelegrafista que lhe apanhasse os dados recém-transmitidos do computador. Quando a folha perfurada caiu no aparador, pegou-a, dobrou-a e a meteu no bolso, sem que ninguém notasse.

— Você pode vir comigo, Robet?

No seu escritório, sentaram-se frente a frente.

— Você conhece a teoria de Falton, Robet?

Robet sorriu.

— Será que o senhor se esqueceu de que também vim da Explorer-2115? Lá o senhor levantou muita poeira com sua teoria faltoniana, e inclusive me deu uma boa lista de trabalhos. E o senhor vai querer aplicá-la também aqui? Tem de fato alguma esperança de sucesso? Um choque de gravitação não pode ser comparado com a gravidade específica e a intensidade magnética de um sistema solar.

Parece que Leyden não ouviu a última frase.

— Você me pode sugerir três ou quatro colaboradores discretos, que ao mesmo tempo entendam bem do assunto?

— Em que setor, senhor: gravidade, astrofísica, irradiação, hiperespaço?

— O quanto possível, nenhuma especialidade, mas colaboradores de faro agudíssimo.

Robet o olhou indagativo.

— Deste gabarito só existe um em Impos... o senhor, e talvez mais outro... Sascha Populos.

Sem a menor alteração na fisionomia, Leyden respondeu:

— Foi exatamente nele que pensei. Duas horas mais tarde, Robet e Leyden ainda estavam sentados juntos. Servindo-se do pequeno computador do escritório, examinaram os problemas mais difíceis. O resultado de seus estudos os surpreendeu: não deu em nada. A tentativa de aplicar a teoria de Falton tendo por base os dados transmitidos pelas quatro naves Explorer fracassou miseravelmente. O próprio Leyden ficou espantado.

— Vamos terminar com isto — propôs Gastão Robet.

— Vamos antes até o posto de rádio! No caminho para lá, Robet perguntou:

— O senhor não quer dizer o que pretende fazer?

Leyden entrou em contato com a Explorer-2115, cuja tripulação pertencia a quase totalidade dos cientistas de Impos. Pedira para falar com Gus Orff, chefe da divisão de Astrofísica. Orff se apresentou. Seu rosto surgiu no videofone e mostrou muito contentamento em ver e falar com Leyden, depois de tanto tempo.

Mas Leyden não dispunha de muito tempo para assuntos pessoais.

— Orff, você poderia me enviar todos os documentos sobre o raio de luz que perseguiu a Explorer-2115 no vôo para este sistema? Gostaria muito de ter estes dados.

Gus Orff, a mais de 16.000 anos-luz de distância, ficou pensativo olhando para seu amigo.

— Você vai receber tudo em pouco tempo. Espere um pouco, por favor.

Passou-se alguns minutos até o rosto de Orff voltar à tela.

— Ligue agora a nossa faixa de emergência. Precisa ainda de mais alguma coisa? Eu posso lhe arranjar. Tenho mesmo que falar agora com Terrânia e fazer um pouco de pressão com o chefe do almoxarifado. Como é que você está se dando com o homem?

“Muito mal!” era o que Leyden queria mas não chegou a dizer. Porém, não disse quantas manobras tinha que inventar para chegar a seus objetivos.

— Que estão fazendo os pesquisadores em Impos? Já conseguiu desvendar os segredos do planetário?

— Está muito difícil, Orff, mas sua ajuda vai ser de grande valia, muito obrigado. Há mais alguma coisa?

Não havia mais nada para falar e o videofone apagou. Através da faixa de emergência da 2115, os dados chegaram às instalações de Impos, em ondas curtas. A tira de papel onde se registraram os sinais codificados tinha mais de dois metros de comprimento.

Leyden e Robet voltaram calados para o escritório.

— Vamos continuar com os cálculos — disse Tyll Leyden.

 

Perry Rhodan franziu a testa. Tinha diante de si uma pasta de documentos, em que se levantavam grandes acusações contra o astrofísico Tyll Leyden. Dezessete cientistas em Impos se queixavam da administração pouco planejada, cheia de incoerências, de suas interferências descabidas nos seus respectivos setores de trabalho, afirmando com muita seriedade que Tyll Leyden sabotava toda pesquisa produtiva.

O libelo estava assinado por todos os dezessete cientistas. Ao documento básico também estavam anexados os pareceres individuais de todos os dezessete homens.

Rhodan já estava lendo o quarto parecer contra Leyden, quando se lembrou de que fora ele mesmo quem nomeara Leyden para chefe de Impos. Quem foi que lhe recomendou Leyden? Estranho que não conseguisse se lembrar. Resolveu então entrar em contato com a central dos comandos das naves Explorer.

— Onde se encontra no momento a Explorer-2115?

— Em Terrânia, senhor! Aterrissou ontem à noite. Partirá novamente depois de amanhã para...

Isto pouco interessava a Rhodan.

— Chame o comandante da Explorer. Teve que esperar com paciência até que os traços duros do tenente-coronel surgissem na tela do videofone. O comandante queria se apresentar. Rhodan, com um cumprimento, o dispensou.

— O astrônomo e físico Tyll Leyden pertence à sua tripulação, Herzog? Por favor, dê-me sua opinião sobre este homem. Queria também saber se ele está em condições de chefiar um grupo de pesquisadores.

Herzog se concentrou para responder. Balançou a cabeça.

— Leyden... como se eu tivesse suspeitado, senhor. Posso perguntar por que razão deseja minha opinião sobre ele?

— Não, Herzog. Quero apenas ouvir seu pensamento sincero, pessoal, sobre Leyden. Por favor! — Rhodan insistia.

Este caso ia levar mais tempo do que dispunha.

Herzog se empertigou.

— Senhor, é a primeira vez que Leyden se torna chefe de um grupo de pesquisa. Não é nem o tipo de um comandante, nem o de um chefe de cientistas. Ele é, como tudo indica, um oportunista que foge de todas as dificuldades. Aceita, sem protesto, quando uma coisa lhe é negada, não faz comentários para proibições expressas. Mas, de repente, senhor, se apresenta a seus chefes com fatos consumados. Este homem conhece todos os truques para atingir seu objetivo. Procura sempre o caminho da menor resistência. Não se pode, porém, com isto atribuir a ele desonestidade ou conduta ilegal.

— Seus projetos têm pé e cabeça, Herzog?

— É difícil dizer, senhor! Mas, se me permite voltar ao primeiro assunto...

— Por que não?

— Obrigado. Tyll Leyden sabe, como ninguém, atrair a metade da tripulação de uma Explorer para seu trabalho e, mesmo aí, nenhum colega sabe para que fim realiza este trabalho.

— Você quer contar isto a mim, Herzog? — Rhodan olhou firme para ele.

Os extravasamentos do tenente-coronel pareciam inacreditáveis. Falava e falava e Rhodan ouvia sempre mais interessado. No depoimento de Herzog houve alusão a uma experiência de Leyden com a teoria de Falton e ao fato de que o rapaz fleumático botou no trabalho a metade do pessoal para realizar sua tentativa.

— Senhor, não sei se ele será capaz de fazer isto com o senhor, mas nem Gus Orff, chefe de seu setor na Explorer, nem eu como comandante, estávamos em condições de fazer com que ele nos fornecesse relatórios parciais, a fim de acompanharmos seus trabalhos. Somente quando tinha o resultado completo diante de si é que vinha nos avisar.

— É verdade isto?

— Senhor, tenho que confiar agora no julgamento de seu chefe de setor, Gus Orff, que jura pelo valor do trabalho de Leyden. Chamou-o uma vez de um homem dominado pelo trabalho. E no entanto, externamente, não se nota nada de sua obstinação pelo trabalho. O senhor deve ver um dia como Leyden anda. A gente pensa que está dormindo. Mas não é assim. Conheci homens que parecem fleumáticos, mas são muito mais rápidos que outros.

— Herzog, o que você me vai dizer agora se eu lhe disser que estão se queixando dele? Acusam-no até de estar boicotando o trabalho de pesquisa em Impos.

O Tenente-Coronel Thomas Herzog era dono de uma memória fora do comum. Não se esquecera do que Tyll Leyden fizera no ataque à cidade que revivera seu passado depois de quarenta mil anos de destruída.

Protestou energicamente contra a acusação sem nenhuma base na realidade.

— Herzog — interveio Rhodan — olhe que dezessete colegas assinaram esta acusação.

— Isto não pode ser verdade, senhor. Rhodan leu os nomes dos dezessete acusadores. O de Sascha Populos não estava entre eles.

— E aqui estão os motivos aduzidos para provar a sabotagem.

O comandante da Explorer-2115 ouvia de respiração presa. Não lhe saía da cabeça o pensamento de que se tratava de uma jogada suja. Estava crente de que as acusações não tinham justificativa.

— Então, Herzog? — Rhodan olhou frio para o comandante.

— Senhor, há alguma coisa errada em tudo isto. Há coisa muito diferente atrás desta trama. Naturalmente... — O rosto tenso de Herzog se desanuviou. — Senhor, estou quase afirmando que Leyden está de novo na pista de coisa importante ou experimentando algo desconhecido, que, evidentemente, altera seu comportamento e o justifica também.

Rhodan olhou admirado para ele.

— O senhor tem um excelente conceito a respeito de Leyden.

O comandante reagiu.

— Não, não é verdade. Não posso é esquecer como eu também fiz uma opinião errada do rapaz. Não podia suportar sua moleza e o aparente desinteresse por tudo, o que me levou a julgá-lo erradamente. Até que um belo dia, vi a realidade com meus próprios olhos, e o rapaz me convenceu de que eu estava totalmente enganado. Senhor, uma coisa assim ninguém esquece. Por isso é que tenho muita cautela agora e acho que seus colegas estão interpretando mal o procedimento dele.

— Bem, Herzog, vou confiar em você. Estas acusações não me interessam por enquanto. Eu lhe agradeço.

 

Descobriu-se no planetário o sétimo ponto onde faltavam milhares e milhares de sóis com seus planetas e luas. Este sétimo enigma também continuou insolúvel, ninguém podia atinar com a razão por que faltavam ali as estrelas. Pelo exame sistemático da Galáxia artificial foi que se descobriu, há três dias, esta última falha. Foi novamente Leyden quem reparou que, neste ponto da obra de arte, não existia aquela escuridão suave do fundo, mas apenas um cinza-escuro desbotado.

Novamente ele se perguntou, ali mesmo, no momento da constatação, o que isto poderia significar. Não tinha resposta, pelo menos por enquanto.

— Sete é um número azarento — disse um de seus colegas.

Tyll Leyden não deu muita atenção ao palpite. Deixou-se flutuar para o solo, encaminhando-se depois para a casa de máquinas, onde o ruidoso funcionamento dos estranhos aparelhos era insuportável. Só se podia penetrar agora na sala de máquinas com os trajes espaciais de isolamento acústico. Sem isto, ninguém agüentaria.

O engenheiro Turander se aproximou dele. A comunicação tinha que ser feita através do rádio do capacete.

— Leyden, quero preveni-lo. Mande todo mundo para fora daqui, do contrário todos nós voaremos pelos ares. Exatamente hoje, às 17:34 h, tempo normal, faz três dias que estes mecanismos estranhos roncam desta maneira, e com tal força, que se pode sentir a rocha tremer até mesmo na cúpula da adega. O Professor Attik e seus colaboradores gostariam de parar tudo hoje mesmo e não amanhã. Estão com medo que o colosso caia em cima deles. Nós, porém, temos receio de que tudo vá pelos ares. Leyden não quis entrar no assunto.

— As medições ainda não deram nenhum resultado?

Sua pergunta se referia ao ronco terrível das máquinas. Era e continuou sendo um mistério por que a menor emissão energética na sala de máquinas através do revestimento se extravasava.

Os nervos de Turander já estavam bem abalados. Não era de estranhar sua resposta irritada:

— Vá para o inferno todo este trabalho de loucos! Não conseguimos apurar nada, como se tudo aqui estivesse mudo. Não sabemos nem de onde vêm estas interferências que deixam nossos cibernéticos desesperados.

Pela primeira vez, Leyden ficou sabendo de uma coisa que alguns cientistas já sabiam. Turander tinha que fornecer relatórios. Não foi com prazer que Leyden o escutou dizer:

— O único que se esforça para localizar a origem das interferências é Populos. Mas ele também já desistiu. Robet também fingiu interesse, mas deixou tudo de lado.

Leyden não deu atenção à última observação do engenheiro:

— Os variômetros da quinta dimensão estão derrotando os cibernéticos.

Era cada vez mais freqüente o uso pelos cibernéticos desta construção dos posbis para constatar com exatidão a queda em fenômenos pentadimensionais pouco esclarecidos.

— Derrotar não é bem o termo. Alguma coisa está interferindo e falsificando os resultados dos variômetros. Populos diz que tais interferências vêm do hiperespaço, mas que nada têm a ver com as flutuações da gravitação. Também não chegou a descobrir o que seria e de onde vêm. Leyden, eu lhe peço, mande todo mundo sair da Montanha Canora. As coisas não estão indo nada bem.

Mas a opinião de Tyll era totalmente outra.

Há três dias, às 17:34 h, tempo normal, todas as máquinas deste enorme recinto aumentaram sensivelmente o barulho.

Há três dias, às 17:34 h, tempo normal, quatro fortes tremores de terra abalaram as dezessete luas do planeta Hércules. Todos os sismógrafos arcônidas enguiçaram. No entanto, o único sismógrafo que se encontra no centro da montanha não registrou nada de terremoto.

O nervosismo e quase pânico devido aos fortes abalos, todos eles com mais de dez minutos de duração, já estavam acabando hoje, três dias depois. Mas ninguém tinha ânimo para um trabalho concentrado.

Calados, um olhando para o outro, ali estavam Leyden e Turander, na galeria das máquinas. Os conjuntos imensos, da altura de uma casa normal, não eram mais tocados por mãos humanas. Tocar em sua carcaça equivalia a se expor a um choque de cem mil volts. As vibrações emanadas das carcaças jogariam qualquer pessoa no chão. Ali dentro daquelas máquinas os diabos deviam estar soltos.

Leyden queria apenas saber por quê. Por que roncavam daquele jeito? Que pretendiam alcançar ou impedir?

Achava que os “homens antigos” que há mais de um milhão de anos viveram neste mundo, não iriam fazer coisas fora do bom-senso. Daí então concluir: o funcionamento louco do conjunto mecânico tinha sua razão de ser.

Turander achou que o silêncio de Leyden já estava demasiadamente longo.

— O senhor manda ou não manda o pessoal sair?

A pergunta não podia ser mais clara.

— Não!

Pelo rádio do capacete podia-se ouvir como Turander estava com a respiração ofegante. Chegou bem na frente de Leyden, e este perguntou bem calmo:

— Somente com a próxima coleta de assinaturas, Turander?

O outro riu.

— Não faça isso! Como se o senhor não soubesse que já foram encaminhadas para Terrânia diversas queixas contra sua administração. Que santo forte o senhor tem junto de Perry Rhodan para que este o proteja tanto?

Leyden não tinha a menor idéia de que fizeram queixas contra ele. Ao invés de insistir no assunto, disse:

— Seria uma ótima oportunidade, Turander — e se encaminhou para o grande portão.

Pelo estalo no rádio do capacete, notou que o colega desligara. Seus pensamentos estavam longe. De repente ficou escutando e ligou todo o volume para recepção. Reconheceu a voz de Populos, era ele mesmo. O som estava fraco mas dava para entender. E ouviu um diálogo que lhe revelou muita coisa, menos o nome do personagem desconhecido.

Populos: — Necessito urgentemente do deslocamento das curvas coloridas e todos os dados sobre o campo magnético do planetário. Não me interessa saber como eram antes do tremor de terra. Você pode me arranjá-los até hoje de tarde?

A outra voz: — Robet parece ter ficado desconfiado. Mas posso dar um jeito. Já tenho seus últimos cálculos. Leyden, com a sua teoria de Falton, já lhe mostrou um novo método, muito interessante.

Populos: — Traga tudo. Como vão seus trabalhos na origem das freqüências parasitas? Já descobriu onde começa tudo? Tem que estar na montanha e, na minha opinião, no planetário. Você não consegue ainda entrar no planetário?

A outra voz: — Fim da transmissão. — Quem está respirando aí?

Populos e o outro ouviram a respiração de Leyden, que olhava admirado para os pequenos controles na altura do pescoço de seu uniforme, constatando que mudara sem querer a freqüência do seu minúsculo rádio do capacete e assim se tornara, também, falante.

Passou depois para a outra faixa e desligou o transmissor.

“Sascha Populos...”, pensava Leyden. “Este homem pensava em me enganar.” Depois, voltou ao diálogo que acabara de ouvir. Só não podia compreender por que Populos exigia os deslocamentos das curvas coloridas. Lamentava que Populos não tivesse sido mais claro, mais preciso. Estava ainda mergulhado nestes pensamentos quando entrou na cabina de rádio. Havia em Impos dois técnicos em hiper-rádio. Os dois estavam ajoelhados diante do aparelho, tendo desmontado boa parte dele. Leyden caminhou até eles sem dizer uma palavra. Um deles olhou para o chefe, dizendo:

— Pois é, Leyden, um belo “abacaxi”! Antes do meio-dia de amanhã, não podemos falar nem transmitir. Só podemos captar uma salada, de ruídos e o que irradiamos não pode chegar ao hiper-rádio. Se ao menos soubéssemos onde está o defeito do nosso aparelho...

— Já são três dias que o aparelho não vem funcionando bem.

Esta frase foi uma dica para Leyden. Na mesma hora, deu meia-volta e saiu correndo, ele que geralmente andava tão calmo.

Há três dias, começara algo diferente e, mais uma vez, foi no dia 4 de agosto.

Já tinha passado de meia-noite, quando Leyden, Robet e Mussol, esgotados, fizeram uma pausa. Há oito horas que estavam sentados, numa puxada, no escritório de Leyden, fazendo ininterruptamente medições, cálculos, indo de um resultado para o outro. Uma coisa já estava fora de dúvida: O gigantesco planeta não tinha mais o diâmetro primitivo de 2.213.000 quilômetros, ele estava diminuindo.

Mas não era só isso: o Hércules perdia também massa!...

A massa perdida chegava já a três vezes o tamanho de Impos.

Procurou se orientar por meio de um calendário, pois não confiava mais em si mesmo. Onde ficara o fenômeno do deslocamento do centro de gravidade do Hércules? Hoje seria o dia em que, depois de sete períodos consecutivos, o deslocamento devia estar muito visível. Mas não havia mais deslocamento no Hércules. Neste ponto, ao menos, o gigantesco planeta voltara ao normal.

— Não agüento mais — disse Robet cansado.

Mussol estava sentado, distraído, e olhando para suas unhas. Tyll Leyden olhou de um para o outro.

— Espero vocês amanhã cedo, boa noite!

Depois ouviu seus passos desaparecendo na distância. Não estava cansado, nem exausto. Não tinha mesmo tempo para isto. Levantou-se e fechou a porta por dentro. Passou depois para o recinto ao lado, onde, no correr da tarde, montara um laboratório de medições, com o auxílio de Robet e Mussol, e também dos robôs, mandando vir instrumentos de diversos setores. Protestos de muitos colegas não adiantaram nada. A maior parte destes instrumentos deviam estar à disposição dos técnicos de gravitação.

Somente uma pessoa não protestara contra as ordens de Leyden: Sascha Populos. Acreditava que a erva daninha que semeara entre seus colegas já estava bem crescida para uma boa safra.

Ligou a chave geral e uma máquina depois da outra começou a funcionar, acendendo também os sinais verdes. Começou então o árduo trabalho das medições e cálculos, correndo de um lado para o outro, dos locais de medição à mesa de trabalho, para de repente parar espantado e ficar de respiração presa. O rastreador estrutural ameaçava rebentar. Seus ponteiros e escalas móveis oscilavam com exagerada rapidez, todos na faixa vermelha de alta periculosidade. O que isto representava, somente Tyll Leyden podia saber.

Toda a instalação estava sendo atingida no momento por um gigantesco choque de gravitação. Por um triz que o astrofísico não deu um grito. O Hércules reduzira mais ainda o seu volume, exatamente neste momento.

— Meu Deus! — suspirou ele.

Das profundezas de Impos veio um ronco, qual trovão, seguido de estalos e de um crepitar estranho. Impos estava sendo atingido novamente por violento terremoto. Leyden tentou se agarrar em alguma coisa, mas o movimento do solo a seus pés foi mais veloz e ele foi atirado a um canto. Não perdeu os sentidos, mas ficou um tempo sem poder pensar com clareza. Esperava que a qualquer momento Impos se partisse em pedaços e os atirasse todos no espaço.

De um momento para o outro, tudo voltou à calma. As entranhas do satélite silenciaram e as próprias camadas externas voltaram ao normal. Já se podia ouvir o ronco e a trepidação dos conjuntos mecânicos em volta.

Ao se levantar, com o corpo dolorido, Leyden teve a impressão de ter tido uma alucinação:

“— Ainda haverão de presenciar o que lhes está reservado!”

Quem é que o estava chamando? “Leyden...! Leyden...!”

Era Turander, que gritava como um louco no rádio, lá da galeria de máquinas na montanha.

— Leyden, por amor de Deus!

O astrofísico ligou então seu aparelho do capacete e um gargalhar estranho penetrou em seus ouvidos, acompanhado de outros ruídos que não podia identificar, pois não os ouvira antes.

— Está me ouvindo, Leyden? Isto aqui é o inferno, um inferno de máquinas. Sou o último aqui dentro e também já estou desaparecendo. Eu... — o resto se afogou num fragor indescritível.

Turander tentou de novo se fazer compreender no meio do barulho alucinante, mas sua voz desapareceu e a transmissão cessou também, subitamente.

Teria Turander desligado o rádio ou estava morto?

Leyden reprogramou o robô. Era o único em Impos a quem cabia o privilégio de transformá-lo numa máquina de guerra. A missão do robô seria, dali em diante, impedir que alguém desautorizado penetrasse em seu escritório, durante sua ausência.

Ao chegar ao ar livre, ainda havia leve tremor no chão. As construções de material plástico, em alicerces simples, balançavam de um lado para o outro. Em toda parte estavam acesas as lâmpadas de emergência. — poderosos faróis portáteis que lançavam seus raios concentrados até o próximo maciço da montanha.

Não havia mais nenhum maciço, mas tão-somente a montanha de oito mil metros, cercada por um gigantesco deserto de ruínas.

O terremoto provocara o desmoronamento numa parte da montanha, mas não foi suficiente para destruir o planetário no penhasco.

Leyden compreendeu logo o que pretendia o forte grupo de quase cem homens que marchavam direto para ele. Estava cercado por todos os lados pelos faróis portáteis. É verdade que já esperava coisa semelhante, quando encontrou no seu escritório duas armas de desintegração e outra de raios hipnóticos, bem escondidas.

Os rostos duros que estava vendo não o perturbaram. Ele mesmo estranhou isto.

Tinha na mão direita um desintegrador e na outra a pistola hipnótica de grande alcance. Com olhar sereno, disse em voz normal:

— E agora, meus caros colegas, abram-me caminho, por favor. Quem estiver na minha frente está me impedindo de ver o que está se passando no penhasco e me obriga a fazer uso da arma.

Que pretendia o grupo? Queriam obrigá-lo? Devia renunciar ao cargo de chefe? Teria que dar como causa de sua renúncia “espontânea” os acontecimentos confusos de Impos que ele, pretensamente, não estaria em condições de suportar mais? Leyden já havia pensado em tudo isso. Daí a firmeza de sua atitude e de suas palavras, embora falasse com a paciência de sempre. Ninguém ali estava crendo que Leyden fizesse mesmo uso das armas.

Como braços cintilantes, os feixes de luz atravessavam a escuridão. Alguns tremiam nervosos de um lado para o outro. Encurralado pela multidão, Leyden não podia dar um passo.

— Fique aqui, maluco! — gritou-lhe um colega. — A Montanha Canora está para desmoronar.

Os homens que lhe estavam em volta não arredaram pé. Lia-se no rosto deles indignação e medo de morrer. Da montanha vinha um crepitar constante e roncos intermitentes que anunciavam a desgraça. O chão começou a tremer e, subitamente, milhões de toneladas de pedra começaram a rolar.

Às costas de Leyden ecoou um grito lancinante e, no mesmo instante, a luz gerada pelos muitos faróis se anuviou e os cientistas todos foram atingidos por forte tosse, alguns em perigo de ficarem sufocados. Segundos depois, um não podia mais ver o outro, pois uma densa nuvem de poeira os envolveu.

Leyden guardou as armas. Era empurrado de todos os lados. Não se entendia uma palavra, pois era ininterrupto o ronco do maciço. Será que a montanha de oito mil metros, com o singular planetário, havia desmoronado e encoberto tudo com milhões e milhões de toneladas de rocha?

Leyden foi envolvido pela corrida em pânico dos seus colegas e caiu. Alguém, sem querer, chegou a pisar nele e acabou também caindo. O astrofísico não fez esforço para se levantar. Encostou o ouvido no chão e começou a escutar. Impos gritava! Das profundezas de suas entranhas um ronco anunciava um novo tremor de terra. E ele chegou, dez vezes mais forte que o primeiro, uma coisa simplesmente indescritível. Depois, passou tudo. Depois de dez minutos, depois de meia hora? Leyden não sabia. Perdera a noção do tempo. E o que era aquilo lá ao longe? Leyden levantou a cabeça e viu então que o terrível estremecimento das entranhas de Impos se completava agora com um furacão.

“Não agüento mais, não agüento mais!”, pensava Leyden, agarrando-se com toda força nas pontas das rochas. Será que estava resguardado da ventania? Será que o furacão passava acima dele? Teria forças para quanto tempo? E quando começaria o novo dia?

Viu primeiro somente faróis portáteis, perdidos por seus colegas na confusão da fuga. Percebeu depois que o ar já estava livre da poeira. Pegou num dos faróis e apontou para a direção onde estava antes a grande montanha. Os raios fortes lhe permitiram ver os contornos da Montanha Canora. O planetário ainda estava lá, o maciço de oito mil metros existia, enquanto tudo em torno dele fora destruído.

“Tenho que ir para lá.” Este pensamento o levou para frente e, quando percebeu o que estava fazendo, já estava a caminho do planetário.

Raiava o dia, quando chegou ao portal na rocha e penetrou no gigantesco corredor que levava para o interior da montanha. Viu um flutuador no estacionamento e dentro dele um traje espacial. Examinou-o antes de vesti-lo, partindo então para o portal interno. Pelo que disse Turander, não devia haver mais ninguém na montanha. Leyden estava diante do grande portal fechado. Os raios de seu farol varriam todo o recinto, examinando com muito cuidado o chão e o teto. Procurava pelas conseqüências do tremor de terra. Mas, por mais que olhasse, tudo parecia intacto, tão perfeito como antes.

E aquele admirável e benfazejo silêncio que o cercava! Chegou a ter calafrio.

“Silêncio aqui...” — perguntou a si mesmo — “...e atrás deste portal... será que as máquinas estão roncando? Como é que não sinto o chão tremer?”

Correu para o portal, puxou a viseira para frente e atarraxou o capacete. O portão se abriu e Leyden penetrou na casa de máquinas. Hesitou, mas acabou ligando o microfone externo de seu traje espacial, e ficou parado, atônito. O microfone externo lhe trazia aos ouvidos o ritmo suave das máquinas gigantescas. Não roncavam mais e o chão de rocha não tinha trepidação.

E Tyll Leyden compreendeu o que estava acontecendo.

— Oh! Meus “homens da antigüidade”! — suspirou ele, empurrando o capacete para trás.

O silêncio continuou o mesmo. Aproximou-se devagar dos mecanismos e tocou num deles com a mão. Sentiu apenas o metal frio, nada mais.

— Meu Deus! Está tudo normal! Automaticamente lhe veio a pergunta: “Por quê? Por que uma raça que há tantos milhares de séculos não existia se rodeara de tanta segurança em relação à maior obra-prima da Galáxia? Seria o planetário alguma coisa mais que simples reprodução da Via Láctea?”

Leyden levou as mãos à cabeça. Não compreendia o que estava vendo, estava mesmo perplexo. Tentou deixar de lado tudo que fosse secundário, para só pensar no porquê. Não estava, porém em condições de se concentrar. Passara por tanta coisa nestas últimas vinte e quatro horas, acumulara tantos conhecimentos novos e vira tantas perguntas insolúveis surgirem a cada passo!

“Tenho que voltar ao planetário”... era o pensamento que o dominava. Ao penetrar no foco luminoso, o campo magnético o puxou para cima, passando pela abertura e pela barragem óptica e acústica. Por cima dele, abria-se a cúpula da imensa catedral, abria-se a reprodução da Via Láctea. Estava tudo como deixara antes. Dirigiu-se para um determinado ponto da periferia, sempre olhando para o soberbo planetário. Passava constantemente a mão pelos olhos, pois alguma coisa o fazia ver reflexos. Estaria cansado demais? Seus olhos lhe estariam dizendo que estava passando da conta, indo além de suas forças? Engraçado, pois não se sentia muito cansado. Tinha mesmo a sensação de haver dormido demais e de estar com novas forças.

Sem o perceber, seus passos o levaram para a escultura que continuava girando em seu pedestal. Os olhos da estátua tinham luz de dentro para fora. Passou de novo as mãos nos olhos, mas o brilho deles continuou o mesmo. Ao esticar os braços para ela, não teve nenhum pressentimento de perigo. Quando a escultura deslizou por seus dedos, sentiu o frio de sempre. Deu um passo para trás e sacudiu resignado a cabeça.

Que significaria o resplendor da estátua?

Quanto mais pensava a respeito, mais evidente se tornava a responsabilidade que assumira perante seus colegas. Ao se recordar do modo como fora recebido pelo grupo, pouco antes do tremor de terra, veio-lhe um gosto amargo à boca. Sentia-se feliz agora pelo fato de a nuvem de poeira os ter envolvido, sem nenhum ruído, pelo tremor de terra e pelo furacão que se seguiram. Esta feliz coincidência o livrara de ter que atirar em seus colegas.

Mas, por que razão os olhos da estátua ainda refulgiam com luz tão intensa? Por que as máquinas não roncavam mais?

Tudo isto tinha que ter um significado. Não acreditava que “os homens do passado” pretendessem alguma coisa de mal com os descobridores de seu planetário.

— É para a gente se desesperar! — exclamou em voz alta.

“Tenho que subir ao planetário”, pensou com tanta intensidade, que se ativou um feixe de raios e o transportou para cima.

Não havia um objetivo determinado, e ele, pelo menos, não o tinha. Tinha que pensar em Perry Rhodan. Neste momento compreendeu o que este homem fizera pela humanidade. Com quantos mistérios se defrontara e a todos eles resolvera.

— Sou um fracassado! — disse Leyden amargurado.

Encontrava-se a 2.000 metros acima do solo circular da catedral de pedra. Com a mesma presteza de sempre, foi carregado para cima. Foi então que tornou, enfim, a ver as estrelas artificiais. Apertou de novo os olhos, mais forte que lá embaixo, e lhe voltaram os reflexos.

— Reflexos? — perguntou a si mesmo e repetiu: — Reflexos?

Em certos pontos da Via Láctea artificial via-se uma coloração diferente, fora do natural. Eram manchas coloridas que brilhavam na luz irisada.

Leyden ainda estava a mil metros da periferia da Galáxia, quando fez a segunda descoberta. Contou sete trechos irisados, para ter de novo diante de si mais um por quê. Estes borrões brilhantes dentro da Via Láctea encontravam-se exatamente nos mesmos lugares onde Leyden e seus colegas deram por falta de nebulosas. Concentrou seus pensamentos no objetivo que tinha em mira e os raios o levaram o mais próximo possível deles. Não teve nenhuma sensação diferente ao pairar a quase cinco mil metros de altura e de estar rodeado por milhões de pontos luminosos que representavam sóis. Não tinha tempo de se preocupar com tais coisas. Olhava para as manchas luminosas e se lembrou de que antes estas manchas lhe pareceram de um cinza desbotado.

“Para baixo”, pensou ele. E um outro feixe de raios o levou para o círculo no solo da casa de máquinas. Ao sair, o grande portão se fechou automaticamente atrás dele. Entrou no flutuador, passou pelo longo corredor e chegou ao ar livre.

O dia irrompera em Impos. Mas Leyden não reconheceu mais o trecho em volta, nem mesmo mais ao longe. Onde estava o planalto com suas casas de material plástico? Existiam ainda, mas agora numa forte depressão do terreno. Os telhados rasos pouco sobressaíam dos blocos de pedra arrastados para ali. Percebeu que, enquanto estivera na montanha, um novo terremoto varrera Impos. De Eona e suas ruínas e da torre de cinqüenta metros, não se via mais nada. Uma avalanche de rochas cobrira tudo. Sobrara apenas uma viela estreita, separada à direita e à esquerda da avalancha do monte, viela essa que levava para a Montanha Canora.

Leyden não notou que seu flutuador pousou suavemente depois de chegar ao seu objetivo.

Perplexo, continuava olhando para o singular caminho da Montanha Canora. A viela fora intencional, os “homens da antigüidade” a conservaram apesar dos terremotos e dos deslizamentos, estes fantásticos “homens da antigüidade” que viveram há mais de um milhão de anos, com sua técnica mais forte que as forças da natureza desenfreada, mais forte que as energias de um satélite do tamanho de um planeta normal.

Com o pensamento distante, deixou o flutuador. Quase não notou que a maioria das casas estavam tortas. Viu seus colegas postados à frente delas, discutindo. Passou por eles, caminhando na direção de seu posto de trabalho. Somente à porta, escancarada pela posição oblíqua da casa, lembrou-se de que era o chefe em Impos e, agora, depois de toda a catástrofe, tinha que dar instruções. Virou-se para trás e encarou um por um. Havia medo nos seus olhos, de permeio com ódio e desprezo.

— Meus senhores! — sua voz não estava muito forte. — Os senhores devem começar com os trabalhos de limpeza e depois continuar com suas pesquisas na Montanha Canora. Lá está tudo normal. Procurem agir como homens inteligentes.

Acreditava com isto ter dito tudo.

Entrou na casa e subiu para o primeiro andar. Quatro degraus antes, parou na escada. Na entrada para seu local de trabalho, estava destruído o robô que programara para a defesa de seus documentos. Faltava a metade do tronco do homem-máquina. A porta fora arrombada. Leyden sacou o desintegrador e a pistola de raios hipnóticos. No momento, ali não estava mais o cientista, mas o elemento formado para luta na Explorer-2115. Entrou na sala com dois pulos rápidos. À sua mesa de trabalho estava um homem que logo tentou se levantar.

Eram exatamente sete horas e três minutos.

O homem ali sentado era Sascha Populos, o técnico em gravitação.

Às sete horas e seis minutos, Leyden chamou pelo hiper-rádio o médico da expedição. Sascha Populos estava desacordado, sob o efeito de uma descarga hipnótica. Em poucos minutos chegou o médico, curvou-se sobre a vítima, olhou espantado e disse com expressão de pavor:

— Quem deu esta surra em Populos?

— Eu — explicou Leyden.

Não foi necessário dizer mais que isto.

— Mande levá-lo para a enfermaria e ponha dois robôs de combate para vigiá-lo. Populos está sob ordem de prisão.

O médico não acreditou no que ouvira.

— Pelo amor de Deus, por que surrou o homem assim?

— Tirem-no da minha frente! — Foi só o que disse Leyden.

Pelo rádio, o médico chamou um robô. Poucos segundos depois, o técnico em gravitação era levado nos braços metálicos de um autômato para a enfermaria. E Tyll Leyden passou a estudar os documentos que encontrou nos bolsos de Sascha. Pouco depois, subiu para o segundo andar, onde estava o gabinete de trabalho do especialista em gravitação. Mas não ficou muito tempo ali. Não se preocupava com as acirradas discussões de alguns grupos na rua que ligava as casas. Atravessou-a e foi para a casa onde morava Populos. Ao abrir a porta do quarto, deu de cara com as costas de um homem inclinado contra a mesa, que, levando um susto, se virou, fazendo um movimento rápido com a mão na direção do bolso.

Com a maior calma, Leyden lhe desfechou um tiro de raios paralisadores. Na mesma hora, agachou-se para o corpo inerme e apanhou a folha de papel que ia sendo enfiada no bolso. Examinou os documentos sobre a mesa e, quando viu o diagrama sobre o deslocamento do centro de gravidade do Hércules, que havia sido roubado de seu escritório, não teve dúvida, e ligou mais uma vez o seu minúsculo rádio de pulso. Mas, além de chamar o médico, chamou também Gastão Robet, Mussol e Players. Os cientistas chegaram antes do médico.

— Olhem só uma coisa — disse o chefe. Players reconheceu suas anotações em alguns documentos e Gastão Robet descobriu a letra de Sascha Populos nos papéis roubados.

Quando o médico chegou, Leyden deu as instruções:

— Trate Mille Davis como deve ser tratado do ponto de vista médico. Deve ficar preso até a chegada da próxima espaçonave. Do mesmo modo como Populos, nenhum contato com o ambiente de fora. Obrigado por tudo.

O médico pigarreou, queria dizer alguma coisa, mas ao notar o olhar duro de Leyden, silenciou. Inclinou-se sobre Mille Davis e lhe aplicou o pulsômetro no braço, a fim de constatar com que intensidade fora atingido.

— Leyden, o senhor atirou com carga plena, por que isto? — Havia indignação nos olhos do médico.

— Meta a mão no seu bolso direito, doutor.

O médico obedeceu e tirou para fora um desintegrador destravado. Ninguém viu a expressão de espanto no rosto do médico, pois os dois auxiliares de Leyden estavam ocupados em examinar os papéis roubados e falsificados. O chefe começou a examinar também o recinto, mas antes se dirigiu mais uma vez ao médico:

— Doutor, minhas instruções valem também para o tempo em que os dois pacientes estiverem sob seus cuidados.

— O senhor precisava mesmo bater desta maneira em Populos?

Sem lhe dizer uma palavra, Leyden abriu a boca e mostrou que lhe faltavam dois molares.

O doutor lhe pediu desculpas, meio sem jeito.

A partir deste momento, havia um médico em Impos que não tinha mais dúvidas sobre as qualidades de Tyll Leyden como chefe de uma equipe de pesquisadores.

Depois que Davis foi também transportado por um robô, o astrofísico se dirigiu aos dois colegas:

— Vocês podem me encontrar no aposento, digo, no escritório de Populos. Com toda certeza, encontraremos lá muita coisa interessante.

— O senhor chama isto de interessante, Leyden? Se apenas a metade dos cálculos de Populos está certa, então o seu mutismo significa um atentado de morte contra nós todos.

Leyden deixou os dois colegas sozinhos.

 

Leyden se dirigiu para o primeiro grupo de cientistas que encontrou à frente e interrompeu sua conversa:

— Meus senhores, se quiserem podem ficar aqui até amanhã cedo, de braços cruzados, que eu lhes garanto que deixarão Impos com a próxima espaçonave. Ou voltam para seus trabalhos. Como preferirem, meus senhores.

Já tinha quase atravessado a rua, quando ouviu um comentário mordaz: “Que sujeito atrevido!” — Não deu bola, nem tinha mesmo tempo para perder com bobagens.

No local de trabalho de Populos, encontrou primeiro os papéis normais, até que deu com um bloco de folhas com o título “Molkex”.

Todo membro da tripulação de qualquer espaçonave tinha noção exata do que era molkex, gafanhoto córneo ou verme do pavor. Terranos, arcônidas, acônidas, enfim, todas as inteligências, falavam do assunto. Diariamente, estes temas eram debatidos na televisão. A palavra gafanhoto era sinônimo de destruição. A notícia da existência de um segundo império na Via Láctea causara quase um maior choque do que a reportagem sobre os trezentos planetas habitados que foram devastados e devorados pelos gafanhotos.

Sobre molkex, Tyll Leyden sabia pouca coisa. O documento que tinha em mãos era-lhe desconhecido. Pelo menos não havia tomado ciência dele até então. Começou a ler e a estupefação ia crescendo nele. O conceito “Molkex” o inflamava todo, a tal ponto de se esquecer de que viera ali para examinar o escritório de Populos. Entrou, de repente, Gastão Robet e lhe disse que estava na hora do café.

Leyden sacudiu a cabeça.

— O quê? — Robet estranhou o chefe. — O senhor não quer café hoje? Puxa vida, o que está lendo de tão fascinante? Ah!... Molkex. Este assunto...

— É isso mesmo — disse para ficar livre de Robet.

Neste momento, Impos foi novamente sacudida por um terremoto. Robet puxou Leyden com força e os dois pularam para fora da casa. O chão em que estavam subia e descia em espaços irregulares, sem falar dos roncos provenientes das profundezas e do mesmo inferno de antes com o rolar de rochas e cascalhos.

Em conseqüência do afundamento do solo na região, as casas estavam agora numa profunda depressão do terreno. O medo de ficar preso entre paredes que oscilavam levou Leyden e Robet para mais longe. Mas, onde quer que estivessem, o perigo era o mesmo. Leyden puxou Robet para trás, pois, a poucos metros deles, a terra se abrira, deixando à vista uma fenda ameaçadora. Impos parecia mesmo chegar ao fim.

Robet voltou para trás e viu o braço de Leyden apontando para alguma coisa. Não podia saber o que era, até que, depois de segundos, percebeu tratar-se da Montanha Canora. O gigante de oito mil metros não sofria nada com o terremoto, imóvel na sua grandeza, como uma ilha em meio à tempestade.

De repente, tudo voltou à calma. E Impos ainda existia, se bem que para os cientistas era grande o trabalho. Todos, com exceção de Populos e de Davis, estavam fazendo a mudança de todas as instalações e móveis para o interior da Montanha Canora. Era grande o serviço prestado pelos robôs, que carregavam máquinas pesadas em placas antigravitacionais.

Como um náufrago que, mesmo na hora derradeira ainda espera por milagre, assim todos acreditavam nos dados fornecidos por Leyden, crentes de que, na Montanha Canora, não corriam mais perigo. Os robôs acabavam de carregar o resto da mudança, mais ou menos às 14 horas.

Lá embaixo, na depressão do terreno cheio de sulcos, ficaram apenas as casas semi-destruídas de material plástico, que acabariam desaparecendo com o próximo tremor de terra. Para maior garantia, Leyden fechou o grande portão de entrada para o rochedo.

Nas horas seguintes, Leyden não teve um só momento de sossego, estava em toda parte. Os mini-comunicadores não paravam: “Por favor, venham para cima, tragam tais e tais instrumentos...”

Acima deles estava o planetário. Os oitenta homens que ali estavam podiam se perder naquela superfície de oito mil metros de diâmetro. Lá em cima, cintilava, viva, a Via Láctea. Mas o brilho já não era uniforme. Em sete pontos esmaecera bem a cintilação de antes. Os astrônomos que estiveram no alto voltaram transtornados. Falavam de um brilho fosco, acinzentado.

A estátua estava muito diferente. Quando Leyden a viu depois de muitas horas, ficou parado, olhando sem compreender. Estátua e pedestal irradiavam agora um vermelho forte. Mas a rotação da figura no pedestal estava demasiadamente lenta. Medira o tempo de uma volta completa: 68 segundos.

O que estava se passando? Ninguém o sabia. Leyden deixou o ambiente da estátua giratória e procurou os especialistas em hiper-rádio. O grande transmissor já estava montado e o oscilógrafo de ondas estava ligado. Ao invés de uma amplitude limpa, acusava linhas confusas e ziguezagues.

— O aparelho de hiper-rádio está funcionando perfeitamente, Leyden. As interferências vêm do hiperespaço. Mas depois que o aparelho foi transferido para cá, está havendo outra interferência constante. Está vendo isto aqui?

O técnico apontou para uma chapa iluminada por dentro. Em sua margem inferior aparecia alguma coisa com espantosa regularidade. Não era, porém, possível interpretá-la, pois o que aparecia devia ser uma parte mínima do que de fato havia.

Leyden percebeu um pequeno detalhe. Quando este se repetiu, deixou o tempo correr. Na terceira vez que o detalhe se manifestou — uma interrupção mínima na seqüência ininterrupta do fenômeno — desligou e marcou o tempo: 68 segundos.

— Meus senhores! A estátua está irradiando em hiper-rádio. Utilizem-se do grande computador e tentem decifrar seus impulsos.

Nem reparou que todos olhavam admirados para ele, considerando-o um gênio. Leyden saiu correndo, aparecendo segundos depois entre os técnicos em gravitação, ocupados todos com seus problemas. Todos os instrumentos estavam funcionando. Por incrível que fosse, o terrível tremor de terra não danificara os instrumentos. Somente os arqueólogos lamentavam a falta das escavadeiras automáticas, completamente perdidas.

Dois físicos faziam todo o esforço para substituir, na medida do possível, Sascha Populos, que estava preso. Leyden estava para fazer uma pergunta ao líder do grupo, quando Players se aproximou dele e lhe segredou alguma coisa ao ouvido. Ambos saíram do local. Num canto, formado por dois grandes conjuntos de máquinas, Gastão Robet estava esperando Leyden. Mussol estava sentado diante do intercomunicador tendo acoplado um pequeno computador, que emitia uma folha perfurada depois da outra.

Este recanto se convertera na central de dados. Para cá vinham todas as comunicações, medições e cálculos dos diversos grupos. Oitenta cientistas e técnicos trabalhavam num problema, sem saber mesmo do que se tratava.

— Leyden, veja isto aqui! — pediu Robet, estendendo-lhe um bloco cheio de fórmulas. — Estas fórmulas foram confeccionadas por Populos.

— Descobriu algum erro nelas, Robet? Onde?

Este apontou para um determinado ponto.

— Obrigado.

Leyden apanhou as folhas de papel de suas mãos. Não se podia esconder a desilusão no rosto de Robet, e Leyden fez como se não o visse.

— Vocês podem me achar no grande computador — disse e saiu rapidamente.

Minutos depois, estava ele de novo no minicomunicador.

— Mussol, venha para cá com o intercomunicador.

Nem percebeu, depois, que Mussol já estava montando seu meio de comunicação bem perto dele. Leyden estava à procura e já quase na pista de um processo inimaginável, tudo isso devido a um erro de pensamento de Populos, erro que Gastão Robet descobrira nos cálculos do grande técnico em gravitação. Sascha Populos não fizera propriamente erro de cálculo, mas não pensara com lógica num determinado ponto e tomara então uma fórmula básica errada.

Pelos cálculos de Populos, as dezessete luas do planeta Hércules estavam na iminência de se precipitarem contra o planeta-mãe, catástrofe esta que ocorreria dentro de cinco dias. E este fato, ele escondera de todos, até mesmo de seu superior, a quem tinha obrigação de comunicar a descoberta, a suposta descoberta.

Agora, Leyden quebrava a cabeça para achar o resultado certo. As fórmulas da teoria de Falton lhe vieram de novo à cabeça. Desde que estava em Impos, tentara aplicá-la, sem chegar e nenhum resultado. Agora, porém, estava diante de muitos dados novos, o que fez com que arranjasse mais um trabalho para o computador.

— Players, Robet, venham cá! Depois, dirigindo-se a Mussol:

— Vamos ao computador.

Robet e Players chegaram e Leyden lhes colocou nas mãos as folhas perfuradas.

— Preparem-nas para a programação.

Não estavam mais conhecendo Leyden.

O computador estava de novo em funcionamento e devia agora ficar ocupado com as fórmulas de Falton. Confiara outras tarefas a Players e a Robet, enquanto ele ficou junto do coletor de dados, até que a longa tira começou a dar voltas. Foi quando Leyden empalideceu, dando as costas aos colegas para que não o vissem transtornado. Havia pavor nos seus olhos e tinha fundadas razões para isto: o gigantesco planeta Hércules estava sendo devorado por dentro! Daí a redução de seu volume.

— Leyden, os astrofísicos querem falar com você — disse Mussol.

Levou quase um susto e olhou para trás.

— Leyden, a situação em todos os satélites é a mesma: de plena instabilidade. Nenhuma das dezessete luas foi poupada dos terremotos de proporções planetárias. Parece que neste sistema está se dando uma onda kalupiana invertida.

— Onda kalupiana! — repetiu Leyden apressado. — Mas isto é quinta dimensão! Isto é, constataram como centro dos terremotos o próprio Hércules?

— Infelizmente, não. Não se sabe o ponto de partida, embora suponhamos ser o gigante, mas não o podemos provar.

— Mas o faremos logo, não é?

— Talvez — disse seu colaborador, procurando uma evasiva. — Vou lhe dar agora os dados.

Leyden continuou ouvindo. Após a transmissão dos dados, ficou parado, abstraído, com os olhos fixos na Via Láctea artificial.

Alguém já dissera: “Os ‘homens da antigüidade’ omitiram propositalmente as concentrações de estrelas em sete pontos da Galáxia” porém não se lembrava mais quem o dissera, o que não tinha maior importância. O importante mesmo era o fato e era necessário conscientizá-lo.

Propositalmente...! Leyden continuava olhando para o planetário, com a atenção toda concentrada nos sete pontos de coloração viva. Brilhavam tanto que ninguém podia deixar de ver.

Leyden não ficou mais surpreso quando viu os sete pontos de luz mais intensa ficarem, de repente, mais escuros, voltando logo ao brilho primitivo. Depois de observar o fenômeno pela terceira vez, fez a marcação dos segundos no relógio. Ao ler o número, não teve nenhuma surpresa: 68 segundos.

Portanto, havia dado um passo à frente: a estátua e a Galáxia artificial estavam interligadas. Leyden começou a quebrar a cabeça. Luz vermelha não significava perigo em quase todas as raças? As condições em Impos não podiam ficar mais perigosas do que já estavam. Preocupado, passou a mão pelo cabelo louro-cinza. No meio deste movimento, teve um calafrio. Era como se tivesse ouvido a voz do “Ser Coletivo” do planeta Peregrino. Sabia que era pura imaginação. Mas as terríveis palavras não lhe saíam da cabeça: “Vocês ainda vão presenciar o que está para vir”.

Pensamentos científicos se misturavam com preocupações comuns. O Ser Imortal, aliás, nunca agira contra os interesses dos terranos. Por mais ridículas que fossem suas brincadeiras, estas escondiam sempre um benefício para os homens de Perry Rhodan.

O Ser Imortal fugira de um perigo inimaginável. Não fizera a menor menção sobre o que representava este perigo e de onde vinha. Teria se referido a este perigo quando disse, por ocasião do encontro do ativador celular na Montanha Canora, que esta região não lhe agradava, exatamente por lhe ser perigosa?

Mungs estava na frente de Leyden e o arrancou de suas divagações. Não podia ter chegado numa hora mais desfavorável. Os olhos de Mungs estavam arregalados de excitação:

— Leyden, nossos pesquisadores em Terrânia fizeram uma grande descoberta.

Ele falava dos especialistas de Terrânia que Leyden solicitara para conferir a Via Láctea artificial de Impos, setor por setor, com a verdadeira, para, por meio destes controles, saber por que, em alguns lugares, faltavam grandes aglomerações de estrelas.

Mungs falara de uma grande descoberta. Leyden, por sua vez, já passara por tantas surpresas que nada mais lhe seria estranho.

— Pois não, Mungs, pode dizer.

— Leyden, em sete pontos faltam estrelas que realmente existem lá fora na Via Láctea. Por sua vez, nossos pesquisadores encontraram, no planetário, estrelas que não existem em nossa Galáxia. E o que é singular nesta descoberta: ou este sistema aqui é o ponto de partida para a diminuição de estrelas ou é seu ponto final.

— Onde posso encontrar os cientistas que fizeram esta pesquisa?

Não mencionou qualquer outra palavra que denunciasse sua preocupação, apenas perguntou pelos técnicos.

Poucos instantes depois, estava entre eles.

Dois projetores começaram a funcionar, sem produzirem no entanto qualquer imagem. Enquanto isso, o chefe da equipe fazia o relatório para Leyden.

— Assim que projetarmos os dois mapas siderais simultaneamente na mesma tela maior, o senhor vai constatar que com a direção do abalo no sentido do braço espiralado C-67 existe um trecho de diminuição de estrelas. Por favor, projeção!

O resultado foi espetacular. Cada uma das duas cópias tinha uma coloração básica diferente. Quando a mesma estrela coincidia nas duas projeções, a cor então virava uma mistura. Nos lugares onde não se registrava coincidência, as estrelas projetavam sua cor específica.

Dentro do emaranhado de estrelas, destacava-se com muita clareza um trecho que, conforme o planetário, estava cheio de sóis que na realidade não existiam.

— Nosso sistema aqui ou é um ponto de partida ou o fim. Infelizmente, a projeção não pode dizer qual seja o certo. Qual é sua opinião, Leyden?

O astrofísico não quis se pronunciar. Os projetores foram desligados. Leyden agradeceu e saiu. Para os demais cientistas, fora uma grande descoberta; mas, para ele, o trecho de diminuição de sóis só podia assustar.

Será que o Ser Imortal do planeta Peregrino fugira de um monstro que destruía agrupamentos de estrelas, como se fossem um punhado de areia?

 

Os homens lá da Montanha Canora gemiam com o trabalho que Leyden lhes impusera. Os matemáticos da Explorer-2115 se lembravam de terem feito cálculos semelhantes na nave de exploração.

Tyll Leyden voltou de uma excursão com três homens. Quatro robôs carregavam os instrumentos de que se utilizaram. Lá fora encontraram de novo uma situação infernal. Depois que o enorme portão se abriu no paredão de rocha, puderam ver um panorama conturbado pelo tremor de terra. Estavam agora seguros no longo corredor. Somente ali foi que os companheiros de Leyden puderam compreender como os “homens da antigüidade” haviam construído aquela catedral de pedra com tanta garantia contra terremotos. Enquanto esperavam pelo fim dos abalos sísmicos, do qual não sentiam o menor reflexo ali no corredor, Leyden aproveitou o tempo para dar uma explicação que parecia fantasiosa, mas que não podia de maneira alguma ser desprezada.

— Senhores! O que nos está acontecendo, alguns instrumentos nesta montanha já previram há muito tempo. Uma das primeiras reações foi o ronco de máquinas gigantescas. Para isto só existe uma explicação: as máquinas tiveram que duplicar a energia de que necessitava a instalação da montanha para fazer face ao perigo que se aproxima.

No debate que se seguiu a esta afirmação, Leyden não tomou parte. Depois de esperarem três horas abrigados na montanha, um homem enviado para o portão veio avisar que em Impos já reinava plena calma.

Iniciaram-se então várias séries de exames no Hércules, pelo espaço de quase duas horas. O grupo não se afastara mais do que duzentos metros da rocha. Um homem estava constantemente observando o sismógrafo arcônida que previa os tremores de terra com cinco minutos de antecedência.

A diminuição do planeta gigantesco tomava proporções inauditas. Leyden não estava mais dando tanta atenção ao fenômeno. Com a série de exames, queria constatar qual era o tamanho do planeta dentro do outro planeta Hércules. Fortes abalos gravitacionais em plano pentadimensional tornavam o trabalho um suplício. Já estava quase para desistir da tentativa, quando um de seus companheiros veio gritando e apontando para o Hércules.

A superfície gelada com gás metano rebentou num determinado ponto do planeta. Uma erupção energética, semelhante a uma protuberância, se projetou no espaço. Felizmente para todos não foi na direção de Impos.

— Parece com o raio luminoso — disse Leyden, que não tirava os olhos dos instrumentos. — Até que enfim! Essa erupção valeu a pena.

A protuberância desaparecera num instante e o Hércules voltara a ficar como antes. Tyll Leyden estava intimamente mais feliz: o gigantesco planeta desvendara pelo menos um de seus mistérios.

Aquele raio luminoso vindo do hiperespaço, que há tempos atrás perseguira a Explorer-2115, deixara de ser um mistério. Estava mais do que evidente de que se tratava de uma erupção energética. Mas, depois que Leyden consultou os dados colhidos, sacudiu a cabeça descontente.

A erupção luminosa já era para ele um fato passado, fato este que nunca fora constatado nesta forma tão original.

Na montanha, Leyden deu uma série de incumbências a cada um de seus homens.

— Com os diabos, para que tudo isto de novo? — protestou o líder da equipe de matemáticos.

Mas como Tyll Leyden não queria que penetrassem em seus segredos, simplesmente não respondeu nada, porque era o único que sabia das coisas terríveis que estavam para acontecer. Enfim, queria poupar aos outros este sofrimento inútil. Tinha certeza de que ficariam sabendo de tudo no seu devido tempo. No Hércules, vivia, pois, alguma coisa que devorava o planeta de dentro para fora. O que seria? Algo de vivo? E por que começara sua atividade tão recentemente?

— Já sei, já sei! — gritou Leyden com grande alvoroço.

Todo mundo correu para ele, fazendo-lhe inúmeras perguntas. Leyden, porém, silenciou. Que sentido tinha então mencionar a data de 4 de agosto do ano passado?

Tudo o que estava acontecendo no Hércules fora ativado pela onda de abalos de origem energético-gravitacional que, no dia 4 de agosto de 2326, fizera estremecer toda a Galáxia.

Novamente precisou do computador e se sentia feliz pelo fato de que, há poucos dias, recebera muitos dados sobre a teoria de Falton. Iria aplicá-la de novo, mas de forma diferente, circunscrita ao seu objetivo principal.

Após seis mil anos, Falton, o velho arcônida, iria receber as honras que não teve em vida. Durante cinco horas, Leyden encheu o computador de novos dados. Depois, afastou-se cansado e sentou numa cadeira. Sabia que teria de esperar horas e horas pelo resultado.

O mutismo de Leyden contribuía para afastar os colaboradores curiosos. Neste momento, estava ali sozinho, pensando na teoria de Falton. O velho arcônida levantara a tese de que, sob certas condições, se podia dizer se o planeta possuía vida ou era capaz de possuí-la.

Que era vida? Vida era um conjunto de funções que não precisava ter inteligência nem instinto, mas tinha que mostrar reações. Quanto a saber como seriam estas reações, e se o conceito vida fosse tomado em sentido tão amplo, não seria necessário restringir o âmbito das reações.

Foi deste ponto de vista que Leyden partiu para, durante horas, ficar abastecendo de dados o cérebro eletrônico. E perguntava-se: seria uma forma de vida até então desconhecida que habitava o Hércules, produzindo abalos gravitacionais, deslocando-se no planeta e causando tremores de terra em suas dezessete luas?

Leyden não estava prestando muita atenção no que se passava em torno dele. Os astrônomos e astrofísicos não tiravam mais os olhos do planetário. Alguns poucos observavam a estátua cuja coloração caía cada vez mais para o vermelho vivo. Mais para frente, outro grupo conferia as medições e ficavam preocupados ao constatarem que o Hércules diminuía de volume mais depressa do que supunham, propiciando assim maiores abalos de gravitação.

Não só em Impos, mas em todas as luas, o caos era total. Os tremores se sucediam de tal forma que a cada momento se podia esperar uma destruição total em algum satélite.

Somente na Montanha Canora é que nada mudava. Especialistas em envoltórios magnéticos de proteção tentaram descobrir se o bloco de oito mil metros estava protegido por algo semelhante, pois dentro da rocha não se notava o menor sinal de abalos sísmicos. Embora não conseguissem provar nada, afirmavam que devia haver uma proteção especial e ainda tinham esperança de descobri-la.

Já os dois técnicos de hiper-rádio estavam desanimados. Não tinha sentido desmontar toda a aparelhagem para localizar a causa do enguiço, pois o aparelho estava em ordem. Se, apesar disso, não se conseguia emitir ou receber uma comunicação por hiper-rádio, a causa estava nas perturbações externas que destruíam toda a amplitude.

Os exploradores de Impos estavam isolados, estavam separados do resto do Império. Se a central de comando em Terrânia não se desse conta de que não recebiam mais contatos de Impos e se não lembrassem de mandar socorro urgente, haveriam de encontrar mais tarde apenas uma sepultura natural coletiva.

— Acho que Leyden está ficando louco querendo nos obrigar a permanecer aqui — disse um dos técnicos em radio-transmissão. — Só gostaria de saber o que o prende neste inferno. Está de fato fascinado por este caos que pode ser nossa sepultura.

Um outro estava mais calmo.

— Vou ligar de novo o conversor de símbolos, quem sabe entrará agora em contato com a estátua.

Os dois técnicos de rádio ficaram na escuta. E o conversor de símbolos começou a falar:

— Existência super-heterodinâmica!

Houve uma pequena pausa e logo depois se escutou a voz metálica:

— Os sentinelas do espaço estão chamando! Toda vida está ameaçada de destruição. Evocamos a vida para que se conscientize do perigo.

— Vamos, chame Leyden, ele tem que ouvir isso!

Um dos rapazes do rádio saiu correndo, gritando a plenos pulmões:

— Leyden, transformador de símbolos está falando!

Só assim, conseguiu arrancar Leyden de seus pensamentos. Instantes depois, o chefe de Impos estava ao lado do aparelho de tradução, ouvindo atentamente, e pegou ainda a última parte da mensagem:

— Numa região de sobrecarga, surgida na última hora, a 4.000 cigins do nosso sistema, conseguiu-se deter a existência. Mas a distância de apenas 4.000 cigins era por demais pequena. A explosiva sobre-saturação atingiu nosso sistema com terríveis conseqüências. Contra nossos cálculos, houve o caos em nosso espaço. Penetraram hiper-energias, unindo-se com fenômenos anormais e se precipitaram contra nós. Uma pequena parcela desapareceu nas profundezas das ilhas luminosas. Os sentinelas do espaço estão chamando! Procurem achar o caminho pelo qual a existência chegou até nós e procurem ver os sete sinais e sua significação. Criem uma zona de sobrecarga antes que a existência se aproxime. Destruam-na, ou toda a vida será destruída. Se a existência continuar viva, não haverá mais nenhuma ilha luminosa. Ela é uma existência ultra-heterodinâmica!

Houve uma pequena pausa e mais uma vez soou a voz metálica do conversor de símbolos. Leyden se ergueu, dando a impressão de muito envelhecido. “Agora todos já sabem”, pensava ele. Não podia compreender como não tinham percebido nada, até o momento. Não queriam perceber ou não percebiam mesmo, por lhes faltar um pouco de fantasia? Será que não tinha maior significado o fato de a advertência luminosa se dar exatamente de 68 em 68 segundos? E não se notava que a estátua não era outra coisa senão um transmissor automático? E o que acabara de comunicar não era coisa sem importância, era um aviso de perigo iminente, ameaçando a todos.

Quem transmitiu o aviso chamou o grande perigo de “existência super-heterodinâmica”. Leyden não tinha dúvidas de que o conversor de símbolos traduzira tudo corretamente. Já pelo próprio conceito se evidenciava a situação de perigo. Era um receptor de sobrecarga que transformava matéria estável de quatro dimensões em hiperenergia, para viver da matéria transformada. Era pois um misto de alvo vivo, devendo ser ao mesmo tempo imensamente grande. Leyden não se esquecia daqueles trechos sem estrelas dentro da Galáxia artificial, que no seu ponto final apontava com muita clareza para este sistema.

A “existência” fora capaz de destruir grandes porções da Via Láctea. “Foi capaz”... portanto, já viera uma vez. E quando fora isso?

Seus colegas estranharam quando o jovem astrônomo e físico os encheu novamente de outros trabalhos. Toda nova incumbência estava rotulada com a expressão: “Temos que saber tudo”.

Leyden proibiu todo contato com o grande recinto de máquinas, prendendo assim os cientistas na catedral de pedra. Colocou Mungs como vigia do computador que ainda estava em funcionamento.

— Mungs, não permita que ninguém leia os resultados quando o computador os lançar para fora, e você também não deve ler.

Dizendo isso, deixou a catedral de pedra e se deixou transportar pelo campo magnético para o local das máquinas. Destacou cinco homens para voar com um jato “Space”. A expressão fisionômica dos mesmos indicava não estarem nada entusiasmados com a nova incumbência.

— Mantenham o aparelho preparado para partir assim que lhes der ordem. Deverão se afastar a toda velocidade do sistema e só lá fora entrar em vôo linear. A distância do Hércules deve ser no mínimo de cinco horas-luz. Neste ponto, enviar mensagem na faixa especial de Perry Rhodan, em caráter de urgência urgentíssima. Devem repetir a mensagem.

Os homens se entreolhavam perplexos. Todos compreenderam que Leyden os estava mandando para um comando no espaço. Havia hesitação nos seus olhos.

Mungs entrou em contato com o chefe, pelo minicomunicador:

— Leyden, já saiu o resultado e Gastão Robet quer a todo custo lê-lo.

Todos viram como o rosto de Tyll Leyden se avermelhou de repente.

— Você tem uma arma, Mungs? — perguntou o chefe pelo aparelho de pulso.

— Sim, tenho, mas para quê?

— Para atirar naquele que tocar na tira do computador. Não vou querer ter malucos em torno de mim. Está bem entendido, Mungs?

— Perfeitamente, senhor.

Leyden desligou o aparelho e, olhando para os cinco homens atônitos, disse:

— Acham que a humanidade toda deve ser destruída, ou sentem algum orgulho em fazer alguma coisa pela salvação de todos nós? Meus senhores, a decisão está em suas mãos. Os senhores terão tempo de se decidirem.

Dizendo isto, deixou os homens ali parados.

A expedição de Impos ia passar a noite de ano-bom na catedral de pedra. Ninguém pensava em comemorar o raiar do novo ano. Um depois do outro, os cientistas iam chegando alquebrados de cansaço. Somente um parecia não conhecer a palavra esgotamento: Tyll Leyden. Ouviu com freqüência que, nos últimos dias, o chamavam de “senhor de escravos”.

Era inexorável consigo mesmo e, com sua maneira de dedicação total, conseguia milagres com seus homens. Muitas e muitas vezes o computador lhe negara seus serviços, e outras tantas ele o programara com novos dados. Já sabia agora o que os “homens da antigüidade” entendiam com a expressão “cigin”. Os matemáticos o ajudaram neste trabalho. O cigin correspondia à distância de um ano-luz e se baseava na translação de Impos em torno de seu sol. Mas a idéia de saber, por meio do planetário, quando o suprahet atacaria a Galáxia, só quem teve mesmo foi Tyll Leyden.

Parado a mil metros sob a espiral, concentrou toda sua mente para imaginar a constelação como ela se apresentava no momento da explosão. O que Leyden já conseguira uma vez, foi capaz de repetir, graças aos “homens do passado”. Segundos depois de sua concentração, houve um movimento acima dele. A miniatura da Via Láctea fez uma rotação em torno de seu eixo falso. Milhões e milhões de sóis com seus planetas e satélites se deslocaram de onde estavam. Ficaram muitas horas lá em cima. Milhares de fotografias foram tiradas, às vezes em condições difíceis. Depois, vieram as complicadas interpretações. Ao raiar o dia 3, de acordo com o calendário “Standard”, o resultado total foi apresentado a Leyden: dia 3 de janeiro do ano 2.327.

— Ele levou tanto tempo assim? — admirou-se Leyden ao ver a data do dia. Com este “ele”, Leyden pensava em suprahet, numa existência gigantesca destituída de toda inteligência.

Vindo das profundezas do universo, há quase 1,2 milhões de anos, irrompeu na Galáxia para devorar milhões de sistemas e assim ameaçar a terra-pátria dos “homens da antigüidade”. Literalmente falando, conseguiram no último minuto, com o deslocamento no espaço, uma zona de sobrecarga, através da qual a existência podia prosperar. Ele, o suprahet, não podia mais deter a concentração de energia. Neste caso, “devorava a si mesmo”. Transformou-se num campo fechado de tensões cujos valores ultrapassavam todas as concentrações naturais. A explosão no contínuo normal se assemelhava então a uma detonação atômica. Mas, ao contrário dos cálculos dos “homens da antigüidade”, não se perdeu no hiperespaço, mas se estabilizou, no processo de transformação pela quarta dimensão, em massa.

Sem deixar perceber nada, Leyden ia tomando conhecimento das notícias. Pela terceira vez, graças a seus pensamentos, modificou-se novamente a posição dos corpos celestes. O raio transportador o levou para o ponto mais próximo possível deste sistema. Viu apenas dezessete planetas, circulando em torno de um sol amarelo, não encontrando, porém, o planeta Hércules. Este surgira apenas depois da destruição de suprahet: era ele o monstro. Sua grossa camada gelada de metano não era outra coisa senão uma espécie de forte geada.

O astrofísico continuava contemplando a miniatura da Galáxia. Idéias e fórmulas dançavam em sua mente, pensando também, às vezes, num bloco de apontamentos com o título “Molkex.”

Molkex, a matéria que não devia existir — molkex era o enigma do Hércules. Molkex era sempre ainda o suprahet, era sempre a existência, mas em forma passiva. A onda de choques energéticos de origem gravitacional, do dia 4 de agosto do ano findo, a reativara. Aquele raio luminoso atirado contra a Explorer-2115 se deu então em estado de quase subconsciência, isto é, meramente automático.

“Ele” fora ativado, encontrando-se agora em estado de transformação, vindo da fase de existência, como suprahet, sem sentido e sem razão, nada mais que um monstro de proporções gigantescas.

Será que o Ser Imortal do planeta Peregrino fugira também dele? Era uma pergunta que Leyden não podia responder. Sabia, porém, que o destino da Galáxia estava em suas mãos. Escondera por tempo demasiado tudo que sabia? Não devia ter avisado, há mais tempo, a Perry Rhodan, a Atlan ou mesmo a Reginald Bell?

Quando estava no meio dos cinco homens que selecionara para voar para fora do sistema, com o único jato “Space” que possuíam, a fim de enviar um hiper-rádio para a Terra, disse com a maior naturalidade:

— Eu vou com vocês.

 

O jato “Space” subiu vertical, assim que deixaram a Montanha Canora. Impos foi novamente sacudido por terríveis tremores de terra. O Hércules pendia no espaço, cada vez mais ameaçador. Podia-se ver a olho nu como progredia o processo de redução de volume.

Já era dia, mas os homens não viam o seu sol. Impos estava envolto numa nuvem imensa de poeira revolvida pelo furacão. As forças da natureza pareciam querer competir com o jato “Space”, mas sua propulsão foi mais forte. Em poucos segundos, o aparelho varou as camadas mais baixas da atmosfera e se lançou no espaço. Todos os instrumentos de rastreamento estavam funcionando. Leyden imaginava que continuavam saindo fortes abalos de gravitação do planeta Hércules, que eram superiores às forças amortecedoras do rastreador estrutural, instrumento este que não queria de maneira alguma expor ao perigo. Queria usá-lo somente quando o Hércules estivesse a mais de cinco minutos-luz de distância.

O pequeno jato disparava com velocidade sempre crescente, numa rota que o afastava cada vez mais do planeta em processo de redução. Até então, tudo corria normal, no entanto, à medida que se aproximava o momento em que o aparelho passaria para o semi-espaço, o nervosismo aumentava.

— Vamos, rapaz! — dizia Leyden, olhando para o jovem piloto com expressão encorajadora. Não imaginava quanta força e confiança irradiava seu olhar sereno. Também não sabia que impressão causara na tripulação quando disse que os acompanharia.

Veio a transição para o semi-espaço, sem nenhum incidente. O conversor kalupiano roncava e o rastreador de relevo apontava para o sol que lhes servia de destino, uma estrela a pouco mais de cinco anos-luz.

Leyden se virou para o radiotelegrafista, entregando-lhe uma tira de papel:

— Olhe aqui, irradie isto, depois de passarmos por este sol. Já está com a freqüência de Rhodan?

Ele mesmo se certificou disso e viu como o radiotelegrafista colocou a tira de papel. Estava tudo redigido em código, de maneira que ninguém, fora Leyden, saberia o que fora transmitido. Nem mesmo os técnicos da grande estação de hiper-rádio de Terrânia conseguiriam decifrá-lo.

Leyden hesitava se devia ou não ligar o rastreador estrutural. Olhou para o indicador dos anos-luz. O jato se achava exatamente a dois anos-luz do sistema Hércules.

— Não, não ligo não!

O piloto olhou admirado para ele:

— Gostaria de ter a sua calma!

— Calma? Você me acha calmo? Já fui calmo, mas há algumas semanas que não o sou mais. Quando chegaremos ao ponto certo?

Mudou então de assunto e nem a estes homens disse o que estava para acontecer. Mas no seu relatório a Perry Rhodan não escondeu nada. Neste hiper-rádio, em que também pedia socorro à Terra, podia-se ler: “Se não nos vierem buscar até a meia-noite do dia 4 de janeiro, qualquer outro socorro chegará tarde.”

— Daqui a cinco minutos, entro no espaço normal — disse o piloto.

Estes cinco minutos se transformaram numa eternidade, até que chegou a transição. O pequeno mas possante transmissor de hiper-rádio do jato “Space” irradiou dez vezes seguidas o curto impulso. Na fração de um segundo, estava condensado um relatório de meia hora de duração.

O transmissor silenciou, passando automaticamente para a escuta. Esperaram. O tempo passava e Terrânia não respondia.

— Vamos! Faixa de emergência! — Leyden não estava agüentando mais. Sabia muito bem que nem os mais poderosos super-encouraçados do Império podiam fazer milagre e que um trecho de 50.000 anos-luz era uma grande viagem.

A mão do radiotelegrafista já estava tocando a alavanca de freqüência, quando o alto-falante começou a estalar, ouvindo-se de permeio uma voz que não dava bem para entender. Depois ficou mais clara:

— A comunicação não está clara, repitam a mensagem. Não entendemos nada, repitam.

Em sua poltrona, Leyden se virou para o lado e ligou a chave do rastreador estrutural.

— Santo Deus! — exclamou ao ver os valores fantásticos dos abalos estruturais.

Mesmo numa distância de mais de cinco anos-luz, a estrutura do espaço fora afetada pelos abalos do deslocamento gravitacional. Constantemente, o ponteiro de um instrumento atingia e às vezes passava da faixa vermelha. Leyden estava surpreso de o instrumento estar resistindo tanto, quando, de repente, deixou de funcionar, com um forte estalo.

— Vamos mais cinco anos-luz para frente, tão depressa quanto possível! Espero que o jato agüente...

O pequeno aparelho mergulhou de novo no semi-espaço, atingindo velocidade cada vez maior. Passou novamente para o espaço normal e a mensagem foi transmitida mais dez vezes.

— Aqui fala Leyden, chefe do grupo de pesquisa de Impos. Recebeu nossa mensagem? Em caso afirmativo, transmita-a imediatamente para Perry Rhodan. Grau de emergência urgentíssima. Faça-o com a maior carga energética possível.

Uma voz de homem, quase cavernosa, perguntou:

— Que está acontecendo com vocês?

Calmo, imperturbável, Leyden respondeu:

— Uma centena de homens morrerão, se você continuar com estas perguntas. Está me compreendendo? Não me faça perguntas, mas transmita meu rádio imediatamente a Perry Rhodan.

— Qual é o número de seu registro especial, mister Leyden?

O homem no transmissor do cruzador pesado era um osso duro de roer. Conhecia o regulamento e tinha que agir de acordo. Sabia que somente casos excepcionais de extrema urgência permitiam entrar em contato direto com o Grande Administrador. Leyden que não se esquecia da fórmula mais complicada, não se lembrava agora do número de seu registro de prioridade.

— Não sei, não — constatou ele, falando porém fora do microfone.

No mesmo instante, afastou o radiotelegrafista e virou a alavanca de freqüência para a faixa de emergência. Apertou o botão do automático e o pedido de socorro do pequeno jato “Space” foi pelo espaço em hiper-rádio.

Quando, depois de trinta segundos, o botão do automático desligou, Leyden apertou de novo a tecla de emergência de SOS.

— Mesmo que tenha de assustar toda a Via Láctea, aposto que em cinco minutos minha mensagem estará nas mãos de Rhodan.

O telegrafista olhava para ele espantado. Mas Leyden continuava com o dedo comprimindo a tecla de emergência.

Logo veio a resposta. Espaçonaves a mais de 30.000 anos-luz de distância chamavam o jato “Space”. O pedido de socorro continuava sendo transmitido. De repente, uma voz metálica sobressaiu a toda confusão de vozes:

— Aqui fala Terrânia, aqui fala Terrânia!

Mais do que depressa, Leyden ligou. Pela terceira vez, em dez repetições, saiu o impulso de hiper-rádio. E assim que terminou, apresentou-se de novo à estação de Terrânia:

— Confirmamos recepção, mensagem retransmitida...

Leyden se afastou um pouco e sorriu mais aliviado. Virando-se para o piloto do jato, disse:

— Vamos voltar para Impos. Lá já nos terão colocado na lista dos desaparecidos.

O jato voltou, usando de novo de toda a sua força para mergulhar no semi-espaço. Leyden voltou às suas meditações. Não lhe saía da cabeça a admoestação do Ser Imortal do planeta Peregrino.

O sistema que abrangia Hércules e suas luas era de fato uma região muito perigosa. Inconscientemente abanava a cabeça. Tentava imaginar a formação do planeta gigantesco. Tudo que sabia sobre a constituição de planetas, de nada lhe servia neste caso.

O gigantesco Hércules, no seu interior, nada mais era do que molkex — a forma passiva, materialmente estável do suprahet. No decorrer de mais de um milhão de anos, formara-se, como um manto envolvente, a camada gelada de gás metano. Constituindo-se, então, como novo centro do sistema, abstraindo-se do seu próprio sol, atraíra para si, com o correr do tempo, os dezessete planetas como satélites. Quantos abalos e convulsões físicas devem ter se registrado aqui durante muitos milênios, até que todas as órbitas se estabilizassem, ninguém o poderá saber.

Ao chegar a este ponto, em suas reflexões, perplexo e horrorizado, Leyden perguntou a si mesmo:

— Qual terá sido a intensidade deste abalo, de gravitação, desfechado do Planeta Eysal? Que instalações mecânicas, que parque gigantesco de máquinas foi este que esteve em condições de realizar isto?

Seus pensamentos começaram a girar em torno dos “benévolos”, quando o piloto lhe veio desviar a atenção.

— Leyden, o senhor não está vendo como a montanha de oito mil metros está inclinada? E é neste inferno que tenho de aterrissar?

Impos estava de fato irreconhecível. Este mundo, muito semelhante à Terra, com imensas florestas e majestosas montanhas, se convertera numa esfera de entulhos e blocos de pedra espalhados por todo canto. Como uma cunha, com sua extremidade fina virada para cima, lá estava a Montanha Canora torta, no meio do mar de pedras e cascalhos.

Leyden regulou a ampliação da tela para o máximo. A Montanha Canora parecia pular para dentro do jato “Space”. O chefe nem reparou nisso, o que ele procurava era somente localizar o gigantesco portal na rocha, e logo o achou.

— Aterrisse na frente do portal — ordenou.

Quando o piloto quis retrucar alguma coisa, bastou um olhar duro de seu chefe.

E o jato “Space” aterrissou.

 

Perry Rhodan se encontrava numa reunião muito importante, quando lhe comunicaram a recepção de uma mensagem de urgência urgentíssima, vinda de Impos. Contudo não se mencionou o nome de Leyden.

Rhodan ficou aparentemente perplexo. O nome Leyden já o vinha preocupando há muito tempo. Dentro de um ou dois dias, sairia de Terrânia uma nave Explorer diretamente para Impos, a fim de observar o mais breve possível o correr dos acontecimentos, já que a estação de hiper-rádio não estava funcionando, há mais de três dias, no terceiro satélite.

— Senhor — disse a voz pelo intercomunicador — a mensagem foi transmitida pela faixa de emergência e a origem do rádio não é Impos, mas de um ponto a dez anos-luz do satélite.

Enquanto a mensagem era transmitida, Rhodan tomou sua decisão e, olhando em volta, disse:

— Meus senhores, temos que interromper a reunião.

Pouco depois, estava em seu escritório e mandou reproduzir a mensagem de Leyden. Ainda não chegara à terça parte do relatório, quando mandou chamar Bell, Atlan, Marshal e Mercant, que por sua vez puseram em estado de alerta toda a Frota do Império, inclusive a USO. Todos estes chefes estavam na Terra; no entanto, levou meia hora até que todos se reunissem.

A mensagem foi novamente apresentada e todos ouviam calados e com a respiração presa:

 

— Através do choque gravitacional de Eysal, surgiu novamente uma supersaturação dos resíduos passivos acumulados durante um vírgula dois milhões de anos. A reativação produziu um processo de transformações, em virtude do qual o molkex, materialmente estável, regrediu para o suprahet. Tal processo ainda está em curso e não se pode dizer quando terminará.

“Os sinais de alerta transmitidos pela estátua não forneceram nenhum dado pelo qual se pudesse conhecer os meios utilizados pelos “velhos da antigüidade”, há mais de um vírgula dois milhões de anos, para fazer explodir o suprahet. Pelos cálculos feitos à base da teoria de Falton, pôde ser constatado que nem toda a massa de molkex está acumulada no planeta Hércules, mas uma parte caiu em outro planeta, que temos que supor serem a pátria dos vermes-monstro.

“Desta maneira, temos que contar com o fato de que todas as massas de molkex, independente de suas proporções, dos pontos em que estejam na Galáxia, se encontram atualmente no mencionado processo de transformação. Não se pode, porém, dizer ainda se pequenas quantidades bastam para fazer delas um suprahet vivo.

“Seguem agora os cálculos realizados e as provas...”

 

Nathan, o gigantesco cérebro positrônico da Lua, já os estava conferindo. Já na primeira reprodução do relatório de Leyden, Rhodan mandara fazer uma ligação para Nathan, carregando o enorme computador com os dados de Leyden.

Calados e ao mesmo tempo perplexos, Rhodan e seus amigos ficaram aguardando os resultados da Lua terrana. Ninguém se atrevia a ridicularizar o relatório de Leyden, muito menos contestar suas afirmações. Quando, depois de uma hora, Nathan não deu resposta, Rhodan aconselhou dar o alarme preventivo.

Os povos da Via Láctea ouviram o alarme de grau um, primeiro pelo grande transmissor de Terrânia”, depois pelas estações da USO. Quase ninguém notou a palavra “preventivo”.

Depois de uma hora e dezessete minutos, Nathan apresentou seus resultados.

O maior computador do Império Unido confirmou os cálculos do chefe da missão em Impos, e apoiou a sua proposta de afastar do conjunto tempo-espaço todo o sistema EX-2115-485.

Bell não deixou de dar sua opinião:

— Este Leyden não se preocupa com bagatelas. Como é que ele imagina isto?

Atlan olhou assustado, Rhodan não. Inclinou-se mais para frente e disse:

— Seria uma ótima oportunidade para podermos usar nossas bombas de gravitação, não é, Gorducho?

— Todas? Você vai usar todas as bombas de gravitação? Meu Deus, isto seria o cúmulo!

— É preciso tocar o demônio para fora. O que me deixa admirado é que este Leyden descobriu qual é o meio adequado para isto, isto é, criar algo semelhante com a zona de sobrecarga dos “homens da antigüidade”.

— E, se com isso, destruirmos uma parte da Via Láctea, Perry? Vou lhe dizer com muita franqueza: tenho medo da experiência. Entenda-me bem: tenho receio de desencadearmos uma catástrofe que já de início não podemos controlar.

Rhodan perguntou com muita calma:

— Você quer ficar olhando de braços cruzados até que o processo de transformação esteja completo e surja de novo em nossa Galáxia um suprahet? O que diz, Bell? Ninguém de nós pode se responsabilizar por isso. Nós não somos os “homens da antigüidade”. A nossa técnica não chegou ainda a tamanha grandeza, como a deles, há mais de um milhão de anos. E não esqueça uma coisa, Bell. Enquanto estou informado, Leyden se apaixonou pelo seu planetário em Impos. E é ele quem nos dá o conselho: “Toquem todo o sistema, com Hércules e seus dezessete satélites, para fora do universo de Einstein!” Além disso, disse-nos com toda clareza que a transformação de molkex em suprahet está em andamento. Disse-nos, mais ainda, que o processo de transformação só pode ser contido com saturação de explosivos. No afastamento do perigo, devem estar incluídos também os vermes do pavor.

A central dos comandos Explorer em Terrânia estava chamando Perry Rhodan, com a seguinte mensagem:

— Senhor, acabam de chegar notícias da Frota que observa o sistema Eastside.

As notícias dizem que os “benévolos” estão em pânico, com decolagens contínuas. Nas mensagens dos comandantes há unanimidade quanto à afirmação de que as naves de molkex, depois de decolagens de emergência, explodem no ar como bolhas de sabão.

— Qual é a causa disso? — perguntou Rhodan, que, como seus companheiros, ouvia admirado.

— Até o momento não há explicação, senhor. Nossos comandantes não sabem dizer nada.

Ao terminar a mensagem, Rhodan olhou para Bell, Atlan, Mercant e Marshall.

— Então? Podemos interpretar esta notícia a nosso favor ou temos de novo qualquer obra do diabo nisso?

— Na minha opinião, na nossa Galáxia estão acontecendo coisas demais — disse Bell carrancudo. — Gafanhotos córneos, vermes do pavor, molkex que de repente fica vivo... e agora nós com as bombas de gravitação! Santo Deus, não acham que é demais tudo isto ao mesmo tempo?

— Não fomos nós que provocamos estes desastres — disse Rhodan com muita ponderação, quando os demais nada disseram para as palavras de Bell. — Temos que ver como dar conta de tudo.

— E o que vai acontecer com o comando de exploração de Impos? — perguntou Atlan.

Rhodan começou a andar de um lado para o outro, parou diante da janela, olhou para a selva de pedra de Terrânia lá embaixo e disse, sem se virar para os amigos:

— Dentro de duas horas, os cruzadores tipo Cidade, Lhasa e Troja estarão aterrissando em Impos para receber os cientistas a bordo. Nós partiremos com a Eric Manoli. Neste comando, teremos oportunidade de falar mais detalhadamente com mister Leyden. Acho que todos nós devemos muito a ele. Providenciem para que, junto às bombas de gravitação, tenhamos também uma boa reserva de bombas nucleares.

 

A Montanha Canora se transformara novamente numa caverna onde imperavam fortes vibrações e um barulho caótico. Leyden e a tripulação do jato “Space” foram atingidos, no portão da rocha, por uma onda de ruídos tal, que os obrigou a voltar para o pequeno aparelho, onde vestiram o traje espacial, atarraxaram o capacete com viseira bem larga e ligaram todo o sistema protetor. Assim, penetraram mais uma vez na montanha de oito mil metros, que apresentava agora uma inclinação de trinta graus.

No parque de estacionamento, encontraram flutuadores revirados e totalmente inutilizados, devido ao violento choque provocado pela inclinação da montanha. De cara amarrada, os homens fizeram o trecho de volta em vôo flutuante usando o dispositivo do traje espacial. Ao passarem pelo grande portão interno, uma forte luminosidade ofuscou-os em cheio. Observaram também que os gigantescos conjuntos de máquinas pareciam pequenos sóis.

Leyden ligou o dosímetro de pulso e constatou admirado a ausência de qualquer irradiação. Pelo rádio do capacete, comunicou aos rapazes que não havia perigo nenhum no recinto de máquinas. Ele mesmo não sabia como chegara a confiar tanto assim na técnica dos “homens da antigüidade”.

Tinham que passar pelos conjuntos motores, cujas carcaças incandesciam num vermelho-claro. Parecia incrível que não derretessem com tamanho calor. No entanto, ao medir a temperatura, teve uma surpresa: as carcaças irradiavam luz fria!

“Coisa singular”, pensou ele, correndo atrás dos outros. Mas não disse nada de suas observações. Enquanto o campo magnético o transportava para a abertura no teto, pôde sentir como a montanha tremia e a rocha abaixo dele se rasgava em fendas de cem metros de comprimento.

O raio luminoso deixou-o no planetário.

As palas de suas viseiras, que entravam em ação automaticamente pelo excesso dos raios luminosos, continuavam protegendo seus olhos. Da Via Láctea artificial desciam sete feixes de raios de um vermelho estranho, dando à imensa cúpula uma aparência fantástica.

Leyden não teve tempo de olhar para o planetário lá no alto, nem por fração de segundo. Todos os cientistas e técnicos estavam abrigados na catedral de pedra e, embaixo, na sala de máquinas, não havia ninguém. O chefe da missão em Impos foi cercado pelos colegas exaltados. O que ouvia no rádio do capacete era tão forte e confuso, que não dava para entender uma palavra. Somente quando pediu silêncio com movimento da mão direita, houve uma pausa.

— Meus senhores, Terrânia ouviu nosso pedido de socorro. Esperemos até que sejamos recolhidos pelas Explorer.

Ninguém se deu por satisfeito com estas duas frases, e o vozerio voltou aos ouvidos de Leyden. Com uma calma indizível, ouviu tudo por alguns momentos, depois abriu caminho por entre eles e saiu.

Quinze minutos mais tarde, encontraram-no de novo. Estava tomando seu café, com a maior naturalidade.

Depois do cruzador tipo Cidade, Troja, seu irmão gêmeo Lhasa também deixou o satélite Impos, em estado de alarme. Ainda enquanto os cientistas estavam subindo a rampa de embarque, a terceira lua do planeta Hércules foi mais uma vez sacudida por forte tremor de terra. Assim, a tripulação do Lhasa pôde fazer uma idéia do que os cientistas e técnicos tiveram que agüentar nos últimos dias.

Acelerando ao máximo, o Lhasa deixou o sistema, afastando-se cada vez mais do Hércules, cujos tremendos choques gravitacionais destruíram os rastreadores estruturais do Troja e do próprio Lhasa.

Um único cientista deixava Impos, intimamente a contragosto: Tyll Leyden. Estava pensando no fantástico planetário, nos grandes conjuntos de máquinas, naquela maravilhosa construção dos “homens da antigüidade”, que há mais de 1,2 milhões de anos estava em funcionamento — por assim dizer, como “sentinela do Universo”. Mas pensava também na transformação de molkex, e um calafrio percorreu seu corpo, sentindo depois receio de que Perry Rhodan não levasse a sério seu relatório.

Leyden entrou na sala de comando do Lhasa, exatamente quando a grande tela mostrava o gigantesco planeta que desaparecia na escuridão do espaço. Pela conversa de alguns oficiais, percebeu que o cruzador entraria logo no semi-espaço. Apresentou-se então ao comandante, que olhou admirado para o jovem à sua frente e indagou:

— Ah! O senhor é Tyll Leyden? Não são muito amistosas as observações que seus colegas fazem a seu respeito. Meus homens e eu assistimos o final de um tremor de terra. Tenho que lhe dizer que isto basta para os próximos dez anos. Que foi que o obrigou a ficar tanto tempo assim em Impos? O senhor foi quem descobriu o planetário, não é verdade?

— Sim, fui eu. Posso fazer uma ligação com o Administrador?

O comandante olhou-o mais espantado ainda.

— Ligação com Perry Rhodan, mister Leyden?

Isto não era coisa nem para ele, comandante de um cruzador tipo Cidade... e este jovem falava em ligação para Rhodan, como se fosse seu assistente particular.

— Claro que é com Perry Rhodan, comandante.

A resposta de Leyden parecia tão indiferente, como se nela não houvesse nada de extraordinário. A reação do comandante foi uma negativa, um simples não.

Leyden não reagiu de forma alguma à negativa, apenas perguntou:

— Posso me utilizar do computador de bordo?

Nos cruzadores do Império, o sistema de atividades era diferente do das naves de exploração.

— O que o senhor pretende com o computador? — perguntou o comandante, perplexo.

Leyden botou a mão no bolso e retirou o documento que o nomeava chefe da missão em Impos.

— Leia isto!

O comandante leu o texto, devolveu-o e disse abanando a cabeça:

— Tenho que continuar com o meu não, mister Leyden...

Não pôde ir mais longe, pois sua central de hiper-rádio estava chamando o nome Tyll Leyden, comunicando que Perry Rhodan desejava falar com ele.

O comandante ficou boquiaberto e começou a olhar para o jovem de outra maneira. Leyden olhou em volta, viu a tela do videofone do hiper-comunicador e ligou.

O rosto de Perry Rhodan apareceu na tela.

— O senhor é Leyden? Alegro-me muito em conhecê-lo. O comandante da nave está ouvindo? Eu o vejo daqui e isto vai simplificar um pouco. O Lhasa vai voar de encontro à nossa concentração, e você, Leyden, venha com todos os seus documentos para a Eric Manoli. Eu o espero aqui. Até logo.

Leyden não precisou dizer uma só palavra. A tela do videofone apagou. Atrás dele falou o comandante, em tom de embaraço:

— O senhor pode usar o computador de bordo, mas não toque no piloto automático.

Leyden voltou até o lugar onde deixara uma pasta repleta de papéis. Perry Rhodan teve que esperar dez minutos, até que do Lhasa veio a comunicação de que Tyll Leyden logo faria o transbordo.

Bell e Atlan encontravam-se na cabina de Rhodan. Bell continuava com seu hábito de tamborilar os dedos na mesa.

— Seu Leyden parece se dar muita importância, Perry! Acho o cúmulo nos fazer esperar dez minutos.

Rhodan continuou calmo.

— Não acha melhor, Gorducho, esperar que ele mesmo nos diga por que demorou a vir para cá?

Quando finalmente Leyden entrou na cabina, não teve tempo de dizer uma só palavra, nem mesmo de fazer a saudação ao Grande Administrador do Império Unido. Bell então o atacou com a pergunta formulada em termos ríspidos:

— Por que fez Perry Rhodan esperar tanto tempo?

— Senhor! — Leyden olhou para os três. — Tive um problema no computador e fui obrigado a esperar pelo resultado. Posso pedir que vejam os resultados?

Tyll Leyden se comportou perante Perry Rhodan da mesma maneira como agira com o Comandante Thomas Herzog, da Explorer-2115. Era e continuava sendo um homem de poucas palavras. Era também de opinião de que a folha que entregara a Perry Rhodan era mais clara que todas as palavras.

Rhodan passou uma vista rápida no papel e o passou a Atlan. O terceiro a receber foi Bell que, depois de interpretar os sinais, não disse nada. O primeiro a falar foi Rhodan:

— Temos que avisar, em radio-circular, repetido constantemente, a todos os proprietários de espaçonaves e aos armadores em geral. Só agora compreendo por que, nos últimos dias, chegaram a um número assustador as comunicações sobre espaçonaves perdidas. Leyden, como foi que você descobriu isto? — Rhodan olhava para o jovem com curiosidade, enquanto Bell se retirara para formular e pôr em andamento o aviso circular a todas as naves terranas e não-terranas.

— Senhor, tentei conhecer, ao menos por alto, as quantidades de energia que a existência irradia no planeta Hércules. Não consegui. Então, me perguntei: que acontece com as espaçonaves que operam com o velho sistema de transição, nos hipersaltos? E o resultado disso, já lhe comuniquei.

Rhodan sorriu, apesar da situação tão séria. Em qualquer sentido, este jovem cientista parecia mesmo fora de série. Qualquer outro teria trombeteado sua descoberta, mas Tyll Leyden dissera apenas duas frases simples, que nada diziam, deixando então que os cálculos falassem por ele.

Estes cálculos afirmavam com grande clareza que cada uma das antigas espaçonaves se desintegravam durante a transição no hiperespaço. A causa disso estaria nos abalos energéticos da existência, que no hiperespaço provocam curto-circuito nos motores de tração, levando a uma explosão.

— Onde estão, porém, seus documentos, Leyden? Só para sua informação, quero lhe dizer que o cérebro positrônico da Lua aprovou todos os seus cálculos e nós já estamos a caminho do Hércules com noventa por cento de toda a Frota. Mas onde estão mesmo seus documentos?

Sem dizer nada, Leyden se agachou para apanhar sua pasta e a colocou sobre a mesa, para abri-la sem dizer uma palavra.

— Só isso? — perguntou Atlan com visível ironia na voz. Julgou que ali houvesse umas duas mil folhas.

Sem responder, Leyden apanhou no meio dos papéis um bloco que estava grampeado.

— Aqui estão os resultados finais dos cálculos avulsos que em grande parte estão relacionados entre si.

Meia hora mais tarde, Rhodan, Atlan e Bell ficaram observando com que fleuma Tyll Leyden deixou a cabina.

— É um tipo formidável! — disse Bell sacudindo a cabeça. — Quando fala, parece a própria preguiça. — Depois deu uma boa risada. — É... mas este rapaz fleumático foi quem nos ensinou a ativar nossos próprios pensamentos. Tenho que confessar que o rapaz me impressionou tanto que... Sim, qual é a novidade?

O intercomunicador estava chamando por Reginald Bell.

— Senhor, quanto mais nos aproximamos do nosso objetivo, mais fortes ficam as interferências no hiper-comunicador. Quase não conseguimos mais contato com a Terra ou com Árcon.

— O aviso circular e repetido já foi transmitido para todos os antigos aparelhos de transição?

— Sim, já foi recebido em toda parte e está sendo retransmitido pelas bases e espaçonaves por toda a Galáxia. Eu... um momento, por favor! A frota que está no sistema Eastside se apresenta. O comunicado é o seguinte: Naves dos “benévolos”, vindo em vôo direto na direção do sistema Eastside, mudaram de repente de direção, não se podendo desprezar a hipótese de se dirigirem agora para o gigantesco planeta Hércules. Fim da mensagem.

Bell queria desligar, quando o rato-castor Gucky se apresentou. Ele prestava auxílio ao verme-monstro Pedro, no último convés da espaçonave.

— Perry — disse Gucky — o negócio com Pedro não vai bem. Ele pede para ser transferido para um velho cruzador robotizado.

— Venha prestar mais informações aqui em minha cabina, meu caro.

— Impossível, Perry. Os senhores não fazem idéia de como Pedro está perturbado. Tem medo de perder o juízo. Fala constantemente de influências que se tornam cada vez mais fortes, de visões estranhas e de uma voz que o chama, sempre mais nítida. Perry, temos que transportá-lo, do contrário ele morre a bordo.

Rhodan olhou perguntando para seus colegas e eles concordaram.

— Está certo, meu caro. A Eric Manoli vai parar e uma nave robotizada vai encostar. A nave vai levar Pedro para a zona de libração.

— Mas tem que ser muito rápido, porque o pobre Pedro está se contorcendo em cãibras. Aqui... você o está vendo?

Gucky alterara o ângulo de seu intercomunicador. A objetiva grande-angular dava para pegar agora o verme-monstro que se virava no chão, parecendo mesmo tremer de dor. Tinha nos olhos uma expressão de angústia e perturbação.

Era uma coisa que nem Rhodan, nem Bell e nem Atlan esperavam.

— Vai logo Gucky. Você ainda consegue falar com ele?

— Uma vez ou outra, Perry! O esquisito é que os ataques o acometem em intervalos certos. Há poucos minutos, quando ainda não se sentia tão mal, disse ele: “Já tive isto uma vez, só não sei quando”. Perry, você consegue entender uma coisa destas? Eu, pelo menos, não estou entendendo nada.

— Não tenho muito tempo para conversar, meu amigo. Tenho que mandar chamar uma espaçonave robotizada. Diga a Pedro que ele será transportado logo. Mas por que exatamente uma nave robotizada?

Gucky ia começar a falar, mas parou.

— Vamos, Gucky! Responda! — disse Rhodan mais energicamente.

— Pois é, pouco antes de eu chamá-lo, Pedro me confidenciou que tinha medo de fazer explodir a nossa Eric Manoli...

— A nave robotizada estará aí em pouco tempo. Procure tranqüilizá-lo, Gucky.

Com isso, a conversa chegou ao fim. Os dois minutos que se seguiram foram ocupados em ordens expedidas. A Eric Manoli parou e uma nave comandada por robôs chegou mais perto. Tyll Leyden também foi convocado e, para variar, não chegou a tempo. Bell procurou saber onde estava o astrofísico. Do posto de comando veio a notícia de que Tyll Leyden botara quase todo o pessoal do serviço do computador a trabalhar para ele.

Rhodan colocou a mão no ombro de Bell e disse apenas:

— Então?

Contra sua vontade, Bell desistiu de fazer com que Leyden comparecesse imediatamente ao escritório de Rhodan. Um tanto aborrecido, olhou para o lado de Atlan, que desde o aparecimento do jovem astrofísico não fizera nenhum comentário.

— Almirante, que diz o senhor do procedimento estranho do jovem terrano?

Atlan sorriu irônico!

— Mister Leyden tem uma personalidade e, cá entre nós, é competente.

Pedro, o verme-monstro, já tinha sido transportado para o velho aparelho robotizado que começava já o caminho de volta, quando cinco naves Explorer deram o alarme.

Estas espaçonaves, equipadas com os melhores instrumentos e os maiores cientistas do Império, observaram nas últimas horas que os abalos gravitacionais chegavam a proporções tais que deixavam prever uma catástrofe de conseqüências imprevisíveis.

Não obstante as incríveis e incessantes interferências na recepção do hiper-rádio, foi possível decifrar a mensagem de perigo das naves Explorer, mensagem esta que foi encaminhada a Rhodan, exatamente no momento em que Leyden entrava no seu escritório.

Sem dizer uma palavra, o astrofísico colocou uma tira de papel de mais de um metro sobre a mesa e Rhodan pegou-a imediatamente para estudar. Parou, de repente, olhando perplexo para o jovem astrofísico:

— Já amanhã? Amanhã entre 14 e 18 horas, tempo “Standard”? Amanhã deve terminar a transformação de molkex em existência? Como é que o senhor sabe isto, mister Leyden?

— A teoria de Falton é inesgotável, senhor. Difícil é explicar a constituição da existência, uma mistura da pentadimensional com a quarta dimensão. Mas, se o senhor não está familiarizado com a teoria de Falton, não estou em condições de lhe explicar por que será exatamente amanhã que termina a transformação de molkex em existência no Hércules e nós então passaremos a enfrentar o suprahet.

— Queira Deus que o senhor esteja enganado, mister Leyden. Teve conhecimento de que tivemos de deixar sair de nossa nave o verme do pavor Pedro e deixá-lo voltar? Mandou-nos avisar que tinha receio de sua inteligência.

Leyden fez que sim, como se isto não lhe fosse surpresa.

— Transformações do molkex também nos vermes do pavor! Posso ir, senhor? Tenho ainda alguma coisa que fazer.

— Quando é que o senhor não vai ter nada que fazer, mister Leyden?

— Quando este caso ficar resolvido, senhor.

— Então não quero detê-lo aqui, mister Leyden.

Podia-se calcular a enorme periculosidade das transformações de molkex para toda a Galáxia pelas fantásticas providências que o Império Unido tomou para deter o processo iminente.

Desde a constituição do Império Estelar, nunca houve tamanha concentração de espaçonaves como nesta expedição contra o sistema EX-2115-485 com Hércules e suas dezessete luas. E nunca, até então, uma frota tão numerosa levava consigo tão grande número de bombas de gravitação.

Pela zona de libração do semi-espaço disparavam os mais pesados e os mais leves aparelhos, tendo todos um único objetivo. Todos a bordo já sabiam que era apenas questão de horas e sabiam também que eram impossíveis as transmissões de hiper-rádio para a Terra ou qualquer outra direção, em virtude da crescente onda de interferências.

Uma nave abandonara sua esquadrilha e tomara a direção de retorno. Era a DD-0-586, uma espaçonave robotizada, do tipo de construção antiga, levando a bordo o desesperado Pedro.

As tripulações de todas as cosmonaves estavam prontas para entrar em ação. Sabiam do que se tratava e estavam a par de como consegui-lo. Era a primeira vez que os intrépidos terranos iam tentar a quase fantástica empresa de banir do espaço de Einstein um sistema solar inteiro. Muito natural também que as opiniões dos cientistas estivessem muito divididas quanto ao sucesso ou fracasso do plano fenomenal. Tyll Leyden, o cérebro e articulador de tudo, não podia estar enganado, seus cálculos falavam uma linguagem muito clara. E seu melhor aliado era o próprio Perry Rhodan.

Rhodan voltou novamente ao assunto do fator certeza no plano de Leyden.

— Será que a força de 17 vezes 5.000 gravitações e cerca de 100.000 bombas arcônidas serão suficientes para lançar o Hércules para o hiperespaço? Será que com nossa experiência, o suprahet não se transformará em vida? Será que com a liberação destas energias, vamos provocar um impulso que fortalece de tal maneira o suprahet, que lhe dá possibilidade de continuar no espaço normal, enquanto todo o resto desaparece no hiperespaço?

Leyden pertencia aos homens do alto-comando da operação da Eric Manoli. Todas as perguntas eram feitas a ele, que as ia respondendo:

— Não sei, não, senhor!

— A teoria de Falton não nos poderia ajudar?

— Creio que não, senhor.

Via-se nele que não se sentia bem respondendo a perguntas.

Bell interveio na conversa:

— O senhor não tem nenhuma idéia de como, ou com que meios, os “homens da antigüidade” estabeleceram a zona de sobrecarga, com que há 1,2 milhões de anos o suprahet explodiu? O senhor conhece melhor do que ninguém a Montanha Canora em Impos.

Leyden olhou um pouco para ele, pensativo, e depois disse:

— O certo é que ninguém conhece nada da composição da Montanha Canora. As ruínas de Eona, que nossos arqueólogos escavaram, não revelaram nenhum segredo.

Mas Bell, cabeçudo, insistiu com suas perguntas:

— Como é que o senhor explica a elevada inteligência dos vermes do pavor, enquanto o suprahet não possui nem inteligência nem instinto, o que é uma contradição berrante.

— Não, não há nenhuma contradição, se considerarmos que os tais vermes se originam das massas de molkex, mas de um molkex que se encontra no processo de transformação devido à explosão do suprahet. Este processo de relativamente pequena massa de molkex, em comparação com a enorme quantidade acumulada no Hércules, se deu menos em órbitas energéticas do que muito mais na esfera orgânica. O desdobrar deste fenômeno levou tempo e se estendeu por mais de um milhão de anos. As propriedades energéticas de molkex, praticamente indestrutíveis, passaram como característico inalterado para os vermes-monstro. O comportamento de Pedro provou sobejamente que ainda hoje existem ligações profundas entre a massa de molkex e cada um dos vermes-monstro. Senhor, estas considerações não foram submetidas ainda a nenhum computador. Não passam, portanto, de mera opinião minha.

Chegou a vez de Atlan que também tinha sua dúvida:

— Leyden, como é que o senhor explica a seguinte contradição: o molkex no Hércules foi ativado, vamos dizer assim, pelo choque gravitacional de 4 de agosto. Para poder se transformar no suprahet necessita de enormes quantidades de energia adicional que ele retira de resíduos de matéria no Hércules, matéria esta que não é molkex. Até aí, está claro. Por sua vez, não dispõe ainda no momento de energia suficiente. Como pode então irradiar energia sem parar? De um lado, não tem energia suficiente... do outro, esbanja o pouco que tem. O senhor pode me explicar isto?

— Não há contradição — disse Leyden sem hesitar. — O suprahet é meio pentadimensional, meio da quarta dimensão. Alimenta-se energeticamente das duas fontes.

Mas o Hércules e sua matéria são da quarta dimensão. O que o senhor considera desperdício não é outra coisa do que absorção de alimento em âmbito pentadimensional. Nós mesmos vemos como o Hércules invade nosso contínuo. Mas, senhor, a sua opinião pessoal não é obrigada a seguir a minha.

— Sim, é verdade, ainda tenho minhas dúvidas.

Percebia que o Gorducho não ia muito com as teorias de Leyden. Por que motivo o jovem não defendia com mais ardor suas opiniões? Não teria amor-próprio?

 

O sistema EX-2115-485 estava hermeticamente cercado pelas astronaves do Império. Nesta muralha circular de bloqueio estavam cinco mil encouraçados robotizados e cerca de trezentos cruzadores pesados com tripulação terrana.

Distribuídos por igual, aterrissaram em todas as dezessete luas do Sistema, tomando parte nos infernais tremores de terra. Nenhum comandante se atreveu a mandar para fora da nave um só tripulante. Todo o descarregamento das bombas arcônidas de gravitação foi efetuado pelos robôs. Para isto, tiveram que lançar mão de todos os robôs existentes no Império. As tripulações, por sua vez, olhavam atônitas, nas grandes telas, o desenrolar do maior comando terrano de todos os tempos.

O rádio comum funcionava relativamente bem, mas toda a aparelhagem de hiper-rádio estava desligada. Nas proximidades do planeta Hércules, qualquer ligação destes instrumentos significaria sua destruição.

Com alguma distorção, sempre chegava das dezessete luas algumas mensagens. Eram os comandantes das unidades pesadas falando sobre o andamento dos trabalhos de descarga das bombas. Todas as cosmonaves pairavam a alguns metros do solo sacudido por terremotos. Os robôs desciam em terra com as pesadíssimas bombas, depositavam-nas corretamente e subiam novamente pelas comportas abertas.

Não havia mais dúvida: as dezessete luas estavam condenadas à destruição!...

Os aparelhos de Impos anunciaram ter terminado o descarregamento. E quase na mesma hora veio a mesma comunicação das luas, 6, 9, 14 e 15. Como última esquadrilha, saíram do sistema aquelas cosmonaves que descarregaram bombas na segunda lua. Durante o trabalho de colocação das bombas, tiveram de trocar quatro vezes de local onde flutuavam, devido às enormes fendas que se abriam a seus pés.

Encontravam-se agora somente cinco mil espaçonaves no sistema, agrupadas uniformemente em torno do sol. O império já tinha dado como desaparecida esta enorme esquadrilha. Nenhuma das naves robotizadas tinha possibilidade de escapar da catástrofe que se desencadearia no sistema EX-2115-485. Quem estava atrás das torres de artilharia, fazendo tudo que fora programado, eram os robôs, que não conheciam nem medo, nem perigo. Tinham sob a mira telescópica o sol EX-2115-485, e esperavam apenas a ordem de comando, para que, dos cinco mil aparelhos robotizados, disparassem as bombas de gravitação.

Estava calculado que cada encouraçado robotizado daria três séries de descarga e, depois, acompanhando a destruição do sol, se precipitariam no hiperespaço.

Um corpo celeste deste sistema fora poupado: o Hércules, o planeta que de sua grandeza descomunal não tinha mais nada. Nele não foram despejadas bombas de gravitação e não houve o cerco hermético das cinco mil naves robotizadas.

No posto de comando da Eric Manoli reinava uma tensão diferente. A poderosa Frota do Império se retirara para o semi-espaço, e no rastreador topográfico o sistema EX-2115-485 era observado de todos os lados e por todas as naves.

Os minutos passavam com uma lentidão de arrebentar os nervos. Muitos milhares de torres de artilharia já apontavam para o alvo ainda muito distante. Seria interrompida a contagem do tempo para o momento decisivo e as esquadrilhas voltariam ao espaço normal a fim de impedir que os candidatos à autodestruição se projetassem de encontro ao EX-2115-485?

Na Eric Manoli, os objetivos eram vistos mais depressa que nas demais naves.

— Não há dúvida de que são belonaves dos veneráveis!

Neste momento, surge Leyden ao lado de Rhodan.

— Senhor, não deve interromper a contagem regressiva da hora “H” determinada. A massa de um molkex está quase terminando seu processo de transformação. Olhe por favor, para as correntes energéticas pentadimensionais que não têm quase mais força de tremor de terra.

Apontou para uma curva de cintilação azulada que ficava cada vez mais fraca.

— Mas, e os “benévolos”, mister Leyden?

O astrofísico sorriu.

— Como achar melhor, senhor. Acho que ultimamente tenho me esquecido de tomar café — dizendo isso, cumprimentou-o e desapareceu atrás do computador.

Bell disse com voz suplicante:

— Deixe de lado a contagem regressiva, Perry! Por causa de algumas naves de molkex não vamos arriscar toda a Galáxia.

— Dentro de duas horas — respondeu Rhodan, que ainda não tomara nenhuma decisão.

Neste momento, chegou-lhe às mãos uma notícia que muito o abateu: o verme-monstro Pedro, num acesso de loucura, destruíra a nave robotizada que o recebera. A mais de vinte mil anos-luz de distância deste sistema, ouvira-se a transmissão do pedido de socorro da nave robotizada. Uma astronave do Império, que casualmente trafegava pelas proximidades, disparou para o local da catástrofe e lá só encontrara destroços. Do verme-monstro não se via mais nada.

— Lamento por ele — disse Rhodan. — Sinto muito a sua perda, era um bom amigo.

De repente, olhou para cima. Em três segundos chegaria a hora decisiva. Não se podia mais impedir a destruição do sistema EX-2115-485.

O robô BG-087-653 estava sentado à frente do registro geral do comando ativador da bateria de fogo. Seu sistema de lentes visuais acompanhava o leve tremular de alguns ponteiros. Nele, como em centenas de milhares de outros robôs nas cinco mil naves, a programação corria inexorável. E o fato de que esta programação o levaria à destruição, em nada o afetava. Viu o prazo da hora decisiva chegar a seu término e os relâmpagos dos canhões gravitacionais de sua nave, ininterruptos. As miras telescópicas mantinham as armas apontadas para o sol EX-2115-485. Em 4.999 outras naves robotizadas as cenas se repetiam.

Faltava ainda uma fração de segundo e o robô BG-087-653 continuava observando. Dezoito geradores na espaçonave produziam a energia necessária para os canhões de gravitação. Em rápidas espirais na direção do sol, uma boa dúzia de bombas de gravitação formaram a primeira salva de disparos. O mesmo aconteceu em 4.999 outras espaçonaves robotizadas.

O robô BG-087-653 não tinha a menor idéia do que fosse uma bomba de gravitação, nem sabia que só poderia ser atirada contra um alvo sólido. Também não lhe interessava saber quais eram seus efeitos, e nem por que um sistema solar inteiro iria ser destruído.

O robô não se movia. Somente observava. Pela brusca mudança de cor numa escala colorida, constatou que a primeira salva de bombas já terminara. Veio a segunda, depois a terceira.

Depois, por toda parte, não se via outra coisa a não ser sol. Não havia mais nem uma só das cinco mil naves robotizadas: viraram fumaça e poeira no espaço.

Concomitantemente com a detonação de 300.000 bombas arcônidas nas dezessete luas, lançaram-se também contra o sol dezessete vezes 5.000 bombas de gravitação.

No vidro fosco do rastreador topográfico havia uma assustadora vibração arroxeada. Onde, ainda há poucos segundos, luas giravam em torno de um planeta gigantesco, estendeu-se, por todos os lados, um vagalhão imenso de ondas em tons violeta, cuja direção era o planeta Hércules, que acabou tragado no turbilhão. O sol se transformou num monstro de tonalidade azul-clara, e cresceu com uma rapidez tal que nem mesmo a vista humana podia acompanhar. Então, todos que estavam nas astronaves do Império e assistiam a este fim de mundo, tinham a sensação de estar vendo este vagalhão incandescente já há muitos minutos.

Rhodan, Bell, Atlan e Leyden não tiveram tempo de ver aquele espetáculo sem par. Estavam diante de um grande instrumento ao lado do computador, acompanhando as oscilações loucas dos ponteiros, a rotação acelerada das escalas coloridas, o vaivém das amplitudes e a variação das cores primitivas na pequena tela de iluminação indireta.

Há dois segundos, iniciara a dissolução do sol e de seu sistema. Por quatro segundos, logo no início, houve uma reação à destruição. Neste curto intervalo, o número colossal de bombas que detonavam transformaram matéria em energia numa proporção tal que o espaço normal se dissolveu com o excesso de tensão energética, tocando o excedente para o hiperespaço.

O cronômetro do aparelho acusava 4,37 segundos, quando o sistema desapareceu. Atrás deles, os homens gritavam, homens que não conheciam nem medo, nem terror. O vagalhão incandescente explodira num raio, cuja direção ninguém podia determinar. Mas, com este raio, parece que a imensa onda luminosa chegou ao fim. Ela que, em poucos segundos, partindo do nada, se ampliou milhões e milhões de vezes, oriunda de uma gigantesca explosão, formou então uma imagem como se, com o raio, tivesse provocado uma implosão.

Esta onda, ou melhor, este vagalhão incandescente, continuava com seu brilho ofuscante de um azul-claro. Tornou-se tão intensa sua luz que ninguém mais podia olhar para ela na tela do rastreador. No entanto, o imenso vagalhão se reduzia a olhos vistos, parecendo tomar determinada direção.

De repente, tudo cessou. O vagalhão perdeu a intensidade e seu azul se diluiu para o branco, permitindo uma sensação de alívio, tanto que na sala de comando da Eric Manoli já se respirava com mais tranqüilidade.

Menos Tyll Leyden, que arranjara um lugar no rastreador de relevo, assim que o instrumento ao lado do computador entrou em pane. Olhava para o vagalhão, como se sua vida dependesse dele. Foi o assunto das primeiras conversas, sendo que ninguém mais pensava no Hércules. Calculou-se o diâmetro do vagalhão e o computador de bordo se ocupou com o espectro luminoso de seus movimentos. Leyden ouvia todos os comentários, não perdia uma só palavra. Guardava também os valores estudados. Virando-se, fitou a tela do rastreador.

Uma única pergunta o preocupava: será que o Hércules, e com ele toda a massa de molkex, fora atirado para o hiperespaço quando a onda gigantesca parecia estremecer a metade da Galáxia?

Ninguém estava em condições de responder a uma pergunta destas. Bell se aproximou de Leyden, parou na sua frente, fitou-o duramente e perguntou com mais veemência ainda:

— Então, mister Leyden? O sistema solar, nós já destruímos, não é? Mas, e a massa molkex? Ou será que criamos agora um ultrapotente suprahet?

Não se alterou a expressão calma dos olhos de Leyden. O fato de um dos homens mais poderosos do Império o obrigar a tomar posição quanto à grande experiência, não o perturbava.

— Temos que ter paciência, o senhor, eu e todos os outros. Levará algum tempo até que termine o abalo pentadimensional. É claro que as opiniões podem se dividir e considerar o raio, que a maioria pôde observar, um fenômeno secundário de gravitação. Para mim, foi muito mais do que isto. Para mim, foi a última atuação dos sentinelas, dos “homens da antigüidade”! O raio veio de Impos, dos imensos conjuntos mecânicos e dos reservatórios energéticos da Montanha Canora. Este raio criou a zona de sobre-saturação. Não fomos, pois, nós, mas os “homens da antigüidade” que, pela segunda vez, destruíram o suprahet. Mas, senhor, como posso levar a mal, se tem outra opinião?

— Acho que você não pode levar a mal ninguém — exclamou Bell, meio irritado. — Leyden, por que motivo você nunca se empenha em defender com gana as suas opiniões? Acho que você nem consegue dar um murro numa mesa.

A expressão do astrofísico não se alterou.

— Creio que o senhor está sendo vítima de um engano. Um de meus colegas em Impos, Sascha Populos, julgou poder me atacar sem encontrar resistência. Depois, o médico da expedição me recriminou pelo fato de não ter mais reconhecido Populos. Sobre a maneira de se defender, as opiniões também variam.

Bell teve que se retirar calado. Ao chegar perto de Rhodan, disse aborrecido:

— Mister Leyden é um fleumático exagerado. Você acredita nesta história com Populos?

Rhodan puxou Bell para o lado.

— Meu caro — disse ele quase no ouvido do amigo — não se deixe enganar pelas aparências. Ouvi certos detalhes a respeito de Leyden que me deixaram de boca aberta. Todo homem tem suas particularidades, você, eu, todos nós... mas todas as excentricidades de Tyll Leyden não pesam nada em comparação com o que lhe devemos. Até hoje, não encontrei um homem, que depois de descobrir, por pesquisa ou por acaso, uma solução para um problema importante, não quisesse se elevar acima dos outros, como se fosse algo mais que seus colegas. A única exceção foi Tyll Leyden. É realmente um homem fora de série.

Bell não teve tempo de fazer objeções a esta opinião de Rhodan. O hiper-rádio já estava funcionando normalmente, e as mensagens que chegavam eram estarrecedoras. Centenas de naves de propulsão por transição eram dadas como perdidas. Até a um raio de vinte mil anos-luz, a explosão pentadimensional abalara o Universo. Mas, entre as notícias de grandes catástrofes, havia algumas de causar muita alegria.

Uma espaçonave terrana socorrera Pedro, o verme do pavor, quase já sem forças, flutuando no espaço, e o levaram para bordo, onde se recuperou em pouco tempo, mandando dizer a Perry Rhodan o seguinte: “Nunca me senti tão livre e tão bem como agora. O terrível pesadelo quase me matou, mas felizmente já acabou”.

Rhodan sorriu feliz. Bell estava radiante e o próprio arcônida Atlan tomava parte no contentamento de todos.

— Onde está Leyden? — perguntou Bell, procurando-o por todos os cantos do posto de comando. — Ele deve ouvir a novidade sobre Pedro. Não é a melhor prova de que não existe mais suprahet? Não tenho mais dúvidas agora de que aquele raio, dentro do campo energético das bombas de gravitação, veio do parque de máquinas da Montanha Canora. Mas, neste caso...

Bell parou de repente, mas Atlan continuou seu pensamento:

— Neste caso, estaria provado que nós não tínhamos condições de criar uma zona de sobrecarga, para nela destruirmos o molkex ou o suprahet. Quem sabe mesmo nossa tentativa somente serviria para torná-lo mais forte do que nunca, se não tivéssemos recebido, realmente no último instante, o auxílio dos “homens da antigüidade”. Gostaria, porém, de saber como Leyden descobriu que este raio salvador veio da Montanha Canora.

O fantástico astrofísico estava sendo procurado pelo intercomunicador. Deixara a central de comando, sem que ninguém percebesse.

— Estou aqui, senhor.

— Dê uma chegada, por favor, até nós aqui na central.

— De boa vontade, senhor, logo depois que terminar meu café. Meu tempo de lanche termina daqui a vinte e três minutos. Até lá os senhores terão que ter paciência.

Bell estava quase perdendo o fôlego e o rosto de Atlan parecia uma máscara de ferro. Houve apenas um que sorriu: Perry Rhodan. Sabia que a pausa para o café era uma coisa sagrada para Tyll Leyden.

 

                                                                                            Kurt Brand  

 

                      

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