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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


TRAMA DIABÓLICA / Carole Mortimer
TRAMA DIABÓLICA / Carole Mortimer

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT

 

 

 

 

Lisa sabia que não podia confiar em Andreas. Aquele homem tinha um passado que o condenava, mas estava difícil resistir às propostas que ele lhe fazia… principalmente quando a olhava de maneira tão sensual!

 

 

 

 

Parada diante de um edifício luxuosíssimo. Lisa olhou pela décima vez o endereço anotado no cartão que lhe haviam dado na agência de empregos. Só podia estar enganada. Os moradores daquele prédio, com toda a certeza, eram pessoas muito ricas... Ela não conseguia acreditar que estivesse preparada para trabalhar com pessoas de nível tão alto. Mesmo assim, dirigiu-se à portaria. Ficou um pouco mais tranqüila quando um velhinho a recebeu.

— Eu... eu não tenho certeza, mas acho que o sr. Western está me esperando.

— Seu nome, por favor?

— Lisa... Lisa Thomas. Fui mandada pela agência...

— Pode subir, o sr. Western já está esperando a senhorita.

Lisa caminhou para o elevador sentindo as pernas bambas. Estava quase certa de que não conseguiria o emprego. Era claro que aquelas pessoas seriam muito exigentes; não iriam aceitar nunca uma professorinha recém-formada. Além disso, era bastante provável que a adolescente de quem teria de cuidar rejeitasse a idéia de ser orientada por uma pessoa tão jovem. Naquele momento. Lisa desejou ter mais de vinte e um anos... Afinal, não tinha nenhuma experiência, além dos estágios que fizera durante o curso.

A empregada abriu a porta do apartamento e levou Lisa para uma sala decorada com muita elegância. Sentindo os pés mergulharem no tapete macio, ela ficou observando o requinte do ambiento. Era uma sala maravilhosa, o bom gosto estava presente em cada um dos objetos. Mesmo assim. Lisa achou que tudo era um pouco frio. Nem por um instante sentiu a sensação de estar dentro de um lar. Justificou a frieza do local pelo fato de o sr. Western ser um homem muito ocupado. Certamente viajava muito e não tinha tempo para dar seu toque pessoal à casa em que morava. Sentiu pena da menina e percebeu que já estava emocionalmente envolvida com ela.

A empregada a deixou sozinha e Lisa aproveitou para verificar se sua roupa continuava em ordem. Usava um conjunto verde e uma blusa de seda branca. A roupa lhe dava uma aparência bem sóbria.

— Srta. Thomas?

Lisa voltou-se lentamente. A voz era baixa e simpática. E pertencia a um homem alto e elegante, que não aparentava ter mais de trinta e cinco anos. Ao ver seu sorriso amigável. Lisa sentiu-se melhor.

— Sim. Eu sou Lisa Thomas.

— Clive Western. Por favor, sente-se. Pedi a Margareth que nos prepare um chá.

— Obrigada, eu gostaria muito. — Ela ficou contente por saber que o emprego ainda estava disponível, apesar do grande número de candidatas. A não ser que o chá fosse para amenizar seu desapontamento, quando ele lhe dissesse que a vaga tinha sido preenchida por alguém mais habilitado.

Ela levantou o rosto e percebeu um olhar de admiração em Clive Western. Sabia que seus cabelos castanhos-avermelhados curtos, seus olhos azuis de grandes cílios, seu nariz graciosamente arrebitado e sua boca sensual faziam dela uma mulher atraente, só não sabia que seu futuro patrão iria se impressionar com esses detalhes.

Talvez sua aparência até atrapalhasse. Provavelmente, não conseguiria o emprego. Mas, de qualquer maneira, a entrevista valeria como experiência.

— A secretária da agência me disse que este vai ser o seu primeiro emprego.

— Sim, terminei a faculdade há algumas semanas

— A agência me informou. Eles também me disseram que você não se importa de mudar para o interior.

— Não... Na realidade, até pouco tempo atrás eu vivia em Norfolk.

— Mas a Cornualha fica exatamente do lado oposto de Norfolk!

— Não faz mal. Meus tios, com quem eu vivia, mudaram-se para a Escócia depois que eu vim para Londres. Um dos meus primos foi trabalhar lá e, como meu tio é aposentado, toda a família decidiu ir também.

— E por que você não foi com eles?

— Eu já tinha conseguido uma vaga na faculdade, aqui em Londres.

— E não gostaria de morar com eles agora que se formou? — ele perguntou, enquanto fazia um gesto convidando-a a servir-se do chá que a empregada havia deixado sobre a mesa.

— Bem, como meu tipo de trabalho exige que eu more no emprego, não faz muita diferença em que cidade estou.

— E quanto às folgas?

— As férias eu costumo passar com eles. Nos fins de semana, fico com meus amigos aqui em Londres.

— E você estará deixando alguém em especial?

— Um namorado, quer dizer? Não, ninguém em especial.

Esperava que Donny a perdoasse por isso. Eram amigos, embora ele pretendesse algo mais. Aliás, era uma das razões que a faziam preferir sair de Londres. Queria evitar que Donny se prendesse mais a ela.

— Ótimo. E o que você sabe sobre Helena?

— A garotinha?

— Eu não creio que ela gostasse de ser chamada assim.

— Tenho certeza que não. — Lisa sorriu, encabulada. — Meu professores também não ficariam muito satisfeitos comigo se me ouvissem. Eu quis dizer "a senhorita".

— Sim, ela é uma senhorita com ares de jovem senhora, apesar de continuar uma garotinha para mim.

— Sei muito pouco sobre ela, exceto sua idade, e que sua mãe está morta.

— Gina morreu há mais de dez anos.

— Sinto muito!

— Foi muito difícil para Helena. Ela tinha apenas cinco anos quando a mãe a abandonou.

— Abandonou? Mas o senhor disse que...

— Sim, eu sei o que disse. Sirva-se, por favor. — Ele apontou para o prato de doces que acompanhava o chá. — Bem, quanto a Gina, gostaria de esclarecer que ela já tinha voltado para os Estados Unidos quando o acidente aconteceu.

— Compreendo.

— O casamento foi... bem, não foi muito bem-sucedido. Estou lhe dizendo isto porque acredito que Helena não vá aceitar facilmente a idéia de uma mulher sendo introduzida em seu mundo, principalmente alguém que ela nem conhece. Ela sempre conviveu com homens: os empregados da casa, os tutores e seu pai. Talvez por isso tenha se tornado tão independente...

— Ela não aprecia a idéia de ter uma acompanhante... — Lisa suspirou. Se conseguisse o emprego, enfrentaria muitos problemas.

— Ela não aprecia nenhuma idéia de mudança — Clive a corrigiu. — As coisas, porém, não podem continuar como estão. Helena está livre demais na Cornualha. Meus negócios exigem que eu faça constantes viagens aos escritórios de vários países.

— Qual é seu negócio?

— Vendas, hotéis, turismo.

— Então ela passa muito tempo sozinha...

— Sim, na companhia dos empregados da casa.

— Ela nunca teve governanta?

— Sim, alguns anos atrás, até ir para um colégio interno. Voltou depois de uma gripe que se transformou em pneumonia. Desde então, tem tido professores particulares. Sua saúde é delicada.

— Mas seu professor vive na casa?

— Sim.

— Então não entendo... Qual seria exatamente o meu trabalho?

— Helena estuda até as três horas da tarde e depois desse horário fica sozinha. Você lhe faria companhia.

— Mas eu... O que vou fazer até que ela termine suas aulas?

— Andar, tomar sol, qualquer coisa que você queira.

Ela balançou a cabeça, tentando entender.

— Realmente não acho que o senhor precise de alguém como eu. Não há nenhuma parente ou amiga que posa fazer companhia a Helena até que ela volte à escola? Se eu aceitasse este emprego, não estaria ganhando meu salário honestamente.

Lisa havia sido informada do alto salário oferecido, mas não gostaria de recebê-lo sem trabalhar o suficiente.

— Estaria, sim. Terá muitas horas de trabalho. Você estará livre até as três horas, mas depois disso, até que Helena se deite deverá ficar com ela. E nos fins de semana, esperamos que fique o tempo todo com ela.

— Certo. — A explicação parecia razoável.

— Então você está disposta a aceitar o emprego?

— Sim, eu... Acho que sim. — Parecia que tudo estava acontecendo rápido demais. — Mas não há outras candidatas?

— Não. A agência nos informou que você era a única no momento. De qualquer maneira, você está aprovada. E agora que já sabe tudo sobre o emprego, se ainda estiver disposta a aceitá-lo...

— Oh, sim! — Seus olhos brilhavam.

— Ótimo. O salário você já sabe qual é, então vamos às boas coisas. Você terá autoridade quase total sobre Helena. Os empregados deverão tratá-la muito bem e, quando conseguir vencer a resistência inicial de Helena, tenho certeza de que terá uma amiga sincera. E agora, o que acha?

— Acho... Acho que vou gostar do meu trabalho.

— Então está tudo acertado. Quando pode começar?

— Quando o senhor quiser. Tirei férias quando terminei a faculdade, e estou disponível agora.

— Vejamos... Hoje é quinta-feira e eu tenho que ir até a Cornualha no domingo, para pegar algumas coisas. Você poderia partir domingo comigo?

Era muito pouco tempo, mas Lisa achou que conseguiria.

— Sim, creio que poderei resolver tudo até lá.

— Nove horas está bom para você?

— Sim — Lisa confirmou, pensando na infinidade de coisas que teria de fazer até lá.

— Passo na sua casa às nove horas, então. É uma viagem um pouco longa. Eu costumo tomar um lanche e voltar em seguida. A casa fica bastante isolada, mas é um belo lugar.

— O senhor passa muito tempo com Helena, não é?

— O suficiente. Ela não é muito fácil de se conviver. Espero não a ter feito desistir antes de começar.

Não era isso que Lisa pensava. O fato de ele passar tão pouco tempo com a filha a fazia lembrar-se de seu próprio pai, sempre ausente durante a sua infância. Sentiu ternura por Helena. Seu pai também tinha sido um homem muito ocupado. Passou a vida viajando pelo mundo por causa do trabalho e porque gostava de se divertir. Morreu em um acidente quando ela tinha dez anos. Nessa época já fazia mais de um ano que Lisa não o via. Seus tios, Fred e Edith, cuidaram dela como se fosse a própria filha.

— Você não vai desistir, não é? — Clive notou a repentina tristeza de Lisa.

— Não, de maneira alguma. Gostaria muito de conhecer Helena.

— Fico contente em saber. — Ele se levantou. — Lamento, mas agora tenho de me despedir. Minha próxima reunião começa em alguns minutos.

Lisa ficou em pé, sem acreditar que o emprego fosse realmente seu.

— Tem certeza de que vou servir? Minhas qualificações…

— Já foram discutidas com a agência. Eu vou comunicar a eles que você aceitou o emprego. Até domingo, então.

— Sim, até domingo.

 

Ela ainda sorria quando saiu do prédio. Não podia acreditar que tivesse conseguido aquele emprego que antes lhe parecera tão distante. Resolver fazer algumas compras antes de voltar para o apartamento que dividia com Lindy.

Lisa estava na cozinha quando Lindy chegou.

— Você conseguiu! — ela gritou, vendo dois suculentos bifes que Lisa estava preparando. — Você conseguiu Lisa.

— Sim. — Lisa abriu a geladeira para mostrar uma garrafa de vinho que tinha comprado.

— Que maravilha! Vamos comemorar com muito prazer. Posso abrir o vinho?

— Ora, Lindy, espere os bifes ficarem prontos.

— Como era o sr. Western?

— Muito atraente e elegante.

— Alguma chance de você e ele...

— É claro que não! — Lisa negou imediatamente, apesar do charme de Clive Western a ter cativado. Com um pouco de encorajamento de sua parte, quem sabe? Ainda bem que ele viaja bastante. Não seria nada bom se envolver com o patrão.

— Ora, não precisa se espantar, podia acontecer, não é? E que tal a garotinha?

— Já é uma moça — Lisa a corrigiu. — Eu tenho certeza de que você não teria gostado de ser chamada de "garotinha" quando tinha dezesseis anos. De qualquer maneira, não a conheci, ela está na Cornualha. Parece que vive lá a maior parte do tempo.

— Isto quer dizer...

— Quer dizer que eu vou morar na Cornualha e que Christopher poderá se mudar para cá no domingo à tarde.

— Não fale assim. Lisa. — Lindy ficou sem jeito. — Chris vai ocupar o seu quarto, e não compartilhar o meu. Nós só queremos saber se conseguimos viver bem juntos. Vai ser bem melhor para nosso casamento se descobrirmos desde já que meu horário no hospital não vai atrapalhar a vida a dois.

Lindy estava fazendo um estágio. Pretendia ser enfermeira alto padrão, e suas horas de trabalho eram bem estranhas, incluindo vários meses de serviço noturno, no período de um ano Ela e Christopher McGrath estavam namorando há mais de um ano e, embora seu trabalho não os atrapalhasse agora, poderia prejudicar muito depois de casados. Por isso, decidiram fazer uma experiência, embora Lindy tivesse deixado bem claro que dormiriam em quartos separados.

Lisa aceitou bem a idéia, mesmo sabendo que jamais faria a mesma coisa. Também nunca tivera esse tipo de problema. Tinha vários amigos, mas nenhum realmente importante.

— Domingo, você disse? Você começa a trabalhar no domingo?

— Sim, o sr. Western vai até a Cornualha para ver a filha e me ofereceu uma carona. Achei ótimo... Não seria nada animador fazer esta viagem de trem.

— Talvez ele tenha medo de que você mude de idéia. E suas férias?

Lisa começou a servir o jantar. Elas dividiam o apartamento desde que se encontraram num pensionato para moças, há mais de dois anos. No princípio, ela achou estranho. Havia sido criada junto com os dois primos e uma companhia feminina era novidade para ela. Apesar disso, sempre se entendeu muito bem com Lindy.

— Eu já tive algumas semanas, de descanso e não vai ser um trabalho tão cansativo. Além disso, agora que já tenho um emprego, estou ansiosa para começar.

— Você está se arriscando muito, aceitando antes de conhecer a garota. Ela pode ser um monstrinho.

— O sr. Western disse que é mesmo.

— Que maravilha! E você fala disso assim, com essa calma?

— Ela precisa de atenção. Parece que tem tudo que o dinheiro pode comprar, mas muito pouco carinho.

— E você pretende preencher esta falta?

— Vou tentar. Nossa, esquecemos o vinho!

— Pois pegue e vamos tomá-lo agora. Temos que brindar ao seu novo emprego. — Lindy abriu a garrafa e serviu um copo para cada uma. — Pegue o seu e parabéns. Tenho que dizer que você é muito corajosa. Eu jamais sairia de Londres.

— Não se esqueça de que eu sou do interior. Acho que isso me ajudou muito a conseguir o emprego.

— Ao seu novo emprego! — Lindy fez um brinde alegre.

— Ao meu novo emprego! — Lisa repetiu, sorrindo.

— Donny já sabe?

— Ainda não. Eu nem sei como dizer a ele, apesar de estar contente de ir para bem longe. Ele anda muito possessivo ultimamente. Espero sair dessa sem arranhões.

— Por que você não diz a Donny que não gosta dele?

— Eu tentei — Lisa falou, enquanto ia para a sala de estar levando seu copo e a garrafa de vinho. — Ele simplesmente voltou na tarde seguinte, como se nada tivesse acontecido. E não consegui mandá-lo embora outra vez.

— Acho que ele já percebeu isso. Você é muito mole.

— Talvez, mas acho que ele não vai tentar me seguir até a Cornualha.

— Eu não contaria com isso. Ele parece estar sempre perto de você, com medo de perdê-la de vista. Parece até um cão de guarda.

A campainha tocou e Lindy sorriu, dizendo:

— Aí está a sua chance de descobrir.

— Como você sabe que é ele?

— É simples. Chris vem mais tarde hoje.

Lisa abriu a porta para Donny entrar, sem entender por que não conseguia se apaixonar por ele. Ele era bonito e agradável o suficiente para virar a cabeça de qualquer garota. Era alto, magro e elegante. Lisa sabia que ele trabalhava numa importante firma de navegação. E, pelas roupas que usava, devia ganhar um ótimo salário. Com vinte e dois anos e com aquela aparência, ele tinha tudo para atrair qualquer garota. Ela, no entanto, ficava indiferente aos encantos do rapaz.

Aceitou o beijo que ele lhe deu, mas tratou logo de virar o rosto para impedir outras demonstrações de carinho. Gostaria tanto que Donny aceitasse a amizade dela sem tentar maiores aproximações...

Lindy estava no quarto, quando eles entraram na sala. Sem dúvida achou melhor deixar a amiga sozinha na hora de contar que havia conseguido um emprego e que iria sair de Londres.

— Você vai odiar aquele lugar! Tudo lá é muito parado! Não tem festas, alegria, cinemas, nada... Você é muito jovem para este tipo de vida. Lisa... Lisa, por favor, não vá embora.

— Para ser sincera, já ando cansada dessa agitação londrina. Estou mais interessada em ouvir os grilos no campo, em fazer passeios ao luar...

— Não consigo pensar numa vida mais boba.

— É. Pensar nisso em Londres parece bobagem mesmo. Os grilos já morreram há muito tempo. E a poluição nem nos deixa mais ver o céu. Mas eu sou do interior, Donny. Será que você não entende que eu gosto de outro tipo de vida?

— E eu? — ele perguntou, sem responder à pergunta dela. — Você sabe o que vai acontecer conosco se você for embora?

— Não existe "nós", Donny. E, como já lhe falei, eu quero ir. Morei em Londres até agora porque precisei. Agora que terminei a faculdade, quero voltar para o interior.

— Você não pode garantir que não vai sentir saudade daqui. Eu ficaria maluco se tivesse que viver em alguma cidadezinha pacata de interior.

— Por aí você pode ver como somos diferentes. Eu gosto exatamente do que você detesta.

— Você vai mesmo, não é?

— Sim.

— Está bem. Mas lembre-se de que eu tentei impedi-la. Você vai se lembrar disso?

— Sim, eu me lembrarei. Tenho certeza de que vou sentir saudade de você, Donny.

— Espero que sim.

— Na ausência o coração cresce de saudade.

— Oh, Lisa! Eu gostaria que você não aceitasse esse emprego. — Ele parecia querer dizer mais alguma coisa, mas desistiu. — Não há nada que eu possa fazer para impedi-la, não é?

— Não. Já tomei minha decisão e não vou mudá-la.

— Muito bem, vamos esquecer o assunto, então. Você tem poucos dias antes de partir. Pretendo mostrar a você tudo o que vai perder.

 

Os dois dias seguintes foram uma correria incrível. Quando Lisa não estava passeando com Donny, estava fazendo compras ou arrumando as malas. Muitas de suas roupas não eram apropriadas para a nova função. Tiveram que ser substituídas às pressas.

Telefonou para os tios. O desapontamento deles com a notícia de sua mudança a deixou triste. Lisa gostava muito deles. Deram-lhe muito amor e carinho, mesmo antes do pai morrer. Ela tinha apenas sete anos quando a mãe morreu. Já naquela época morava com tia Edith, por causa das constantes viagens de seu pai.

Após a morte de sua mãe, os tios assumiram toda a responsabilidade de sua educação. Seu pai só aparecia de vez em quando. Mesmo assim, amou-o com a adoração de uma criança por seu herói favorito. Era um homem que chegava sem avisar, com muitos presentes, e que depois desaparecia por seis ou sete meses.

Quando ele morreu. Lisa deixou de sentir a ansiedade causada pelas visitas inesperadas que interrompiam a tranqüilidade de sua vida. Sentiu, por alguns segundos, um certo alívio. A culpa por esse momento jamais a abandonou.

Finalmente, chegou a manhã de domingo, trazendo consigo um maravilhoso e ensolarado dia.

Lisa, com um vestido muito elegante, aguardava ansiosamente Clive Western. Lindy havia chegado do plantão noturno e estava deitada. Ela esperava que a mudança de Chris, naquela tarde, permitisse que eles conseguissem chegar ao casamento o mais rápido possível.

Dizer adeus a Donny não tinha sido fácil, e Lisa esperava que ele a esquecesse depressa. O sr. Western era muito educado, mas poderia não gostar de vê-la recebendo Donny em sua casa.

Quando a campainha tocou, exatamente às nove horas, ela pegou suas malas antes de dar uma última olhada na casa que a tinha abrigado por tanto tempo.

A viagem foi longa e cansativa, apesar de o carro em que viajavam, um Mercedes, ser muito confortável.

Clive Western parecia cada vez mais preocupado à medida que se aproximavam de seu destino. Fazia calor e a música suave fez com que Lisa adormecesse sem perceber.

Quando acordou, ficou preocupada com a aparência.

— Está se sentindo melhor? — Clive perguntou, sorrindo.

— Acho que sim. Sinto muito, adormeci sem perceber.

— Tudo bem. Vou parar no próximo posto de gasolina. Talvez você queira descer e se refrescar um pouco.

Dez minutos depois, ela se sentia grata a Clive pela atenção. Com o rosto lavado, a maquiagem refeita e os cabelos penteados, estava pronta para enfrentar a última etapa da viagem.

A casa ficava realmente isolada. Era um prédio cinza e imponente, no alto de um penhasco, com várias construções em volta, algumas das quais pareciam ser estábulos.

Lisa ficou contente por saber que ali tinha muitos cavalos. Cavalgar sempre havia sido seu esporte favorito.

Clive estacionou o carro na frente da casa. Lisa não resistiu e caminhou até a beira do penhasco para observar o oceano logo abaixo.

— Saia daí, por favor. — Ela estremeceu e voltou-se para , que a observava curioso.

— Este lugar é muito perigoso. Eu não a aconselharia nadar neste mar traiçoeiro. Há uma piscina maravilhosa nos fundos da casa. Poderá usá-la quando quiser.

— Obrigada. Vou gostar muito. Vejo alguns estábulos também, será que poderei cavalgar?

— Você sabe montar? — ele perguntou, surpreso.

— Sou uma garota do interior, lembra?

— É claro que sim. Não vejo por que você não poderia. Creio que os cavalos vão gostar muito de se exercitar.

— Oh! É maravilhoso. Muito obrigada.

— Vamos entrar, srta. Thomas. Tenho certeza de que está querendo almoçar. A sra. Hall vai levá-la até seu quarto. Eu tenho que ir ao escritório, mas nos veremos em seguida. O trabalho vem sempre em primeiro lugar.

A sra. Hall era uma robusta mulher que aparentava uns cinqüenta anos. Lisa foi recebida por ela com um sorriso sincero de boas-vindas.

— Venha comigo, querida. Esses homens só pensam em trabalho. Imagine só, trabalhar num domingo ensolarado como este.

— Eu imagino que o sr. Western está sempre muito ocupado — Lisa falou, pensando que ele deveria ao menos ter perguntado pela filha.

— Está mesmo! E, do jeito que vai, logo não terá tempo sequer para respirar. Chegamos. — Ela abriu a porta e ficou olhando para Lisa com evidente satisfação. — Espero que você goste.

Era um quarto maravilhoso, decorado com suaves tons de rosa. Almofadas de cetim enfeitavam a cama, o tapete era macio e a colcha combinava com o papel de parede, muito delicado. Era um quarto adorável.

Sobre a cômoda havia todo tipo de artigos de toalete, inclusive um caríssimo jogo de escovas.

— O banheiro fica aqui. — A sra. Hall abriu uma porta, escondida no armário embutido. — Um banheiro particular, naturalmente — ela falou com orgulho, como se a casa fosse sua.

— É maravilhoso! Muito mais do que eu esperava, aliás.

— Ótimo. O almoço será servido em meia hora, mas tenho certeza de que verá o patrão antes disso. Enquanto isso, vou providenciar um chá gelado para você.

— Muito obrigada. — Lisa sorriu, sentindo-se bem-vinda naquela casa, pelo menos no que dizia respeito aos empregados.

Assim que ficou só, sentou na cama, mal podendo acreditar em sua sorte e olhando em volta com evidente satisfação. O quarto e o banheiro eram maravilhosos. Só esperava que Helena Western a aceitasse sem muitos problemas. O pouco que Clive havia revelado sobre a filha foi suficiente para Lisa perceber que precisava ser firme desde o princípio. Helena tiraria vantagens de qualquer sinal de fraqueza que ela demonstrasse.

Lisa tirou os sapatos e o casaquinho, feliz por ver que seu vestido não estava amassado. Estava muito quente e ela abriu a janela respirando com prazer o ar puro.

Assustou-se com o barulho de uma bandeja sendo jogada perto da porta. Voltou-se, e encarou Helena Western.

Lisa sabia que tinha que ser ela, pois nenhuma copeira agiria dessa maneira.

— Tirei isso de uma copeira — a garota disse friamente, com os olhos verdes brilhando de raiva. — Ela não está aqui para servir você. Quero que saiba de uma coisa: você não é bem-vinda aqui.

Sim aquela era definitivamente Helena Western, apesar de não lembrar em nada a figura simpática do pai. Os cabelos eram pretos e espessos, caindo até o meio das costas. Tinha olhos verdes e brilhantes, a pele queimada do sol e um corpo muito bem-feito para sua idade.

Será uma garota adorável, dentro de uns dois ou três anos, Lisa pensou, observando-a.

— Acredito que você se considere muito superior à pobre Mary, não é? Pois bem, no que me diz respeito, você está bem abaixo do empregado mais humilde desta casa.

— Helena! — Uma voz ríspida e autoritária chamou-a com evidente desaprovação. Lisa não podia ver quem falava, pois ele ainda estava no corredor. — Vá para o seu quarto. Agora!

— Mas, papai... — Helena protestou. — Eu não quero esta mulher aqui, você sabe disso.

"Papai?", Lisa pensou, preocupada. Aquela voz não pertencia a Clive Western. Mas, afinal, Clive nunca tinha dito que Helena era sua filha. Pelo visto, ela havia tirado conclusões apressadas. Esperou preocupada que o pai de Helena aparecesse. Ele não parecia nada agradável, pela maneira como falara com a filha.

— Você vai para o seu quarto imediatamente. Não vou repetir.

— Sim, papai. — Helena voltou-se para Lisa e, com um último olhar cheio de ressentimento, saiu do quarto.

Lisa esperou, ansiosa para conhecer o pai de Helena. Mas quando o homem alto entrou no quarto, ela sentiu que tudo escurecia à sua volta.

Aquele homem era o anjo mau de seus pesadelos infantis, o homem que ela jamais gostaria de encontrar. Teria reconhecido aquele rosto em qualquer lugar. Afinal, ele a tinha perseguido durante anos, noite e dia.

— Andreas Vatis... — ela disse, tremula.

— Absolutamente certa, srta. Matthews. — Seu sorriso era cruel.

Lisa sentou-se, ainda tremula. Olhava para Andreas Vatis como um ratinho devia olhar para o gato que o encurralava antes de comê-lo. Ele tinha um rosto cruel, com uma grande cicatriz na face direita, cobrindo o agora inútil olho direito.

Os olhos verdes fixaram-se nela com desprezo. A boca firme tinha um sorriso irônico, e seus dentes brancos e perfeitos contrastavam com a pele morena.

Lisa nunca o havia encontrado antes, mas sabia tudo sobre ele. Grego autêntico, ele era um corredor de fibra, até sofrer o acidente que o cegara parcialmente.

Foi numa pista de corrida. E o pai de Lisa esteve envolvido. Aliás, foi depois do acidente que o pai dela passou a viver abertamente com a mulher de Andreas.

— Meu... meu nome é Thomas, agora — ela o informou timidamente. — Meus tios me adotaram.

— Para poupá-la da dor e da vergonha dos pecados de seu pai? Só que uma simples mudança de nome não vai salvá-la de mim.

— Salvar-me de você?! — Ela estava muito assustada.

— Sim. — Andreas Vatis a feria com seu tom frio e cruel. — Eu sou grego. Lisa Matthews, e um grego jamais esquece um insulto ou uma maldade. Pode esperar anos pela vingança, mas sempre a consegue.

Lisa olhou temerosa para aqueles olhos que a fitavam com desprezo, achando difícil acreditar que ele era meio cego. Parecia ser um homem que não tinha paciência para qualquer imperfeição. Sua aparência jamais seria esquecida por homens livres. O que teria feito o pai dela para conseguir roubar a mulher daquele homem? Será que o fato de ele ter ficado meio cego a amedrontou? Lisa jamais poderia saber com certeza.

Tudo aquilo ainda conseguia magoá-la, depois de tantos anos. Seus tios tentaram lhe esconder a verdade, mas não podiam negar o fato de seu pai ter tirado a esposa de Andreas quando ele não tinha condições de impedi-lo.

Lisa havia descoberto tudo sobre o comportamento do pai ouvindo as conversas de seus tios, quando eles não sabiam que estava por perto.

Os dois eram pilotos profissionais, e quando o pai dela conheceu a mulher de Andreas Vatis, apaixonou-se. Naturalmente, Gina Vatis devia ter sido uma mulher muito volúvel, para abandonar o marido justamente quando ele mais precisava dela. Lisa sabia que seu pai havia prejudicado muito aquele homem. E agora ele ia se vingar nela.

— Eu... eu não tenho nada! — Lisa soluçava desesperada, pensando que Andreas era milionário e portanto não ia querer dinheiro dela. Então, o que ele havia de querer?

A família Vatis, da qual Andreas era o cabeça, agora, sempre estivera envolvida com a navegação. Eram armadores conhecidos internacionalmente. Andreas preferiu ser piloto de corridas, mas o acidente havia interrompido sua carreira. Agora tomava conta dos negócios da família e, conforme Clive Western informara, também estava investindo no ramo de hotéis e turismo.

Ele jogou a cabeça para trás, com uma risada sarcástica. Lisa não pôde deixar de sentir a sensualidade que emanava dele. Era um homem atraente, que podia provocar inveja em qualquer       jovem com a metade da idade dele.

— Eu não quero seu dinheiro. Lisa, mas você está certa: eu quero algo. Eu quero o que é meu por direito.

— Eu já disse que eu não tenho nada! — ela insistiu, balançando a cabeça, tentando livrar-se daquele pesadelo.

— Ao contrário, você tem tudo o que eu quero. — Sua voz tornou-se macia, enquanto seus olhos fixavam-se no corpo dela maliciosos. — Eu quero exatamente aquilo que seu pai me tirou.

— E isso é... — Ela engoliu com dificuldade.

— Uma mulher, Lisa. Eu vou fazer de você minha mulher.

 

— Não! Você não pode estar falando sério! — Procurou no rosto dele um pudesse confirmar suas palavras.

— Estou falando muito sério. Lisa. Esperei por este momento quase quinze anos. Nem posso dizer o quanto esperei...

— Mas, eu... O que significa tudo isto?

— Significa que eu a trouxe até aqui só para isto: transformá-la em minha mulher. Quero recuperar a esposa que seu pai me roubou. Nunca me senti particularmente atraído por garotas de cabelos avermelhados. Mas isso não tem importância. Não vou ser rapaz de distinguir a cor de seus cabelos, no escuro.

— Você está louco! Não vou me casar com você. Também não vou permitir que você me toque, no escuro ou não!

— Tem certeza disso? — Ele parecia imperturbável.

— Bastante.

— Então vou mantê-la aqui para você mudar de idéia. E, infelizmente, vou visitar sua cama todas as noites, até que concorde em se casar comigo, o que não vai demorar muito. Helena nasceu exatamente nove meses depois da consumação do meu primeiro casamento — ele acrescentou, sarcástico.

— Você quer dizer...

— Que se você não concordar em se casar comigo agora, poderá ficar na posição muito incomoda de ser considerada minha amante.

— Mas, por quê? Por que você está fazendo isto comigo? — Seus olhos azuis mostravam claramente sua angústia.

— Já lhe expliquei. Quero que seu pai me devolva o que me roubou. Como ele e Gina estão mortos, vou pegar a filha. Você vai me dar os herdeiros para o império Vatis, os filhos que Gina teria me dado, se não fosse seduzida por James Matthews.

— Mas você me trouxe aqui sob falsos pretextos. Sabia que eu nunca teria vindo se soubesse que estava sendo empregada por Andreas Vatis. Imagino o quanto você deve me odiar, e tenho certeza de que também gostaria de estar a mil quilômetros de você. O que não entendo é como conseguiu arranjar tudo tão facilmente.

— É, realmente foi muito fácil. Lisa. Eu sempre soube tudo sobre sua existência, sua adoção e sua vida. Mas, enquanto era uma criança, não tinha utilidade para mim. Agora você é uma mulher... e muito bonita, por sinal.

— Pena que eu tenha cabelos avermelhados, não é? — Ela estava com um terrível sentimento de fatalidade. Era como se tivesse sabido, durante os últimos dez anos, que algo assim ia acontecer.

— Exatamente. Mas, voltando ao assunto anterior, eu sei de todos os seus passos desde que você tinha dez anos. Eu sei de seus amigos de escola, de sua carreira, dos amigos que você fez em Londres...

— E se eu tivesse me interessado seriamente por algum desses amigos e me casado?

— Você quase fez isto, não é? — ele retrucou calmamente. — Um certo Rick Davidson. O romance terminou quando você foi ao apartamento dele e o encontrou com outra garota.

— Você certamente teve muito trabalho para saber isso, não é?

— Nem tanto. Eu sempre achei Diana muito... atraente

— Você quer dizer que arranjou isto também?

— Não foi difícil. Diana gostava dele e seu namorado estava muito indeciso. Eles estão casados agora. E, desde essa época, você tem sido acompanhada por Donny Paulos.

— Não me diga que isto também foi um arranjo seu.

— Foi necessário.

— Então você confessa que planejou também isto?

— É claro! Eu achei mais seguro colocá-la sob os cuidados de um dos meus empregados. Não queria correr o risco de vê-la envolver-se seriamente outra vez. Naturalmente ele não tinha idéia dos meus motivos para vigiá-la.

Nesse instante. Lisa compreendeu por que Donny insistia tanto em ficar perto dela...

— Meu Deus, que coisa horrível!

— Pode ser, mas eu quero uma mulher virgem na minha cama, na primeira noite.

— E como você pode ter certeza de que já não fui para a cama com Donny? — ela o desafiou. — Ele é muito atraente, sabe?

— Ele sabia muito bem o que podia ou não fazer. Se ele tocou um dedo em você, acabo com ele. Farei com que nunca mais encontre um emprego, arrasarei a vida dele...

— Não precisa fazer mais ameaças. Acho que já deixou sua posição bem clara.

— Ele tocou em você?

— Freqüentemente.

— Intimamente?

— Isto depende do que você chama de intimamente. Cada um de nos tem sua própria definição, e minha idéia pode ser imito diferente da sua.

Ele deu um passo na direção dela, e seus dedos se fecharam como garras no braço frágil.

— Eu quero uma resposta clara! Ele a tocou assim... — Sua outra mão tocou um dos seios de Lisa, acariciando-o até que sentiu o bico endurecer. — Ou assim? — A mão se moveu para as pernas dela, explorando a pele macia. — Ele fez isto? — perguntou, enquanto com os dedos acariciava a carne firme das coxas de Lisa.

Ela teve vontade de dizer que sim. Afinal, Donny a havia traído. Mas não teve coragem, sabia que Andreas acabaria com ele. Fora disso, não tinha certeza da extensão da culpa de Donny. Não podia esquecer que ele havia feito tudo para impedir |que ela aceitasse o emprego.

— Não, ele nunca me tocou assim. — Quase confessou que nenhum homem havia tocado nela com tal intimidade, mas ficou com vergonha.

— Nenhum outro homem, não é? — ele falou como se adivinhasse os pensamentos dela.

— Nenhum outro — ela admitiu, horrorizada ao constatar que jamais alguém havia provocado nela um excitamento tão grande quanto naquele momento.

Ele a soltou tão de repente, que ela quase caiu. Andreas parecia totalmente indiferente, pois voltou-se e começou a brincar com o perfume em cima da cômoda.

— Quando você terminou a faculdade, eu entrei em contato com a agência onde você fez a ficha e pedi que a enviassem para uma entrevista.

— Com Clive Western. Ele também está nisto?

— Clive a empregou de acordo com as minhas instruções, mas não sabia a razão verdadeira para eu querê-la aqui. Penso que ele imaginou que eu tinha outro tipo de idéia.

— Então Helena não precisa de uma acompanhante?

— Como sua madrasta, espero que você faça exatamente isto. Seus deveres de esposa não serão tão difíceis... Pelo menos, durante o dia.

— Eu já disse que não vou me casar com você.

— A escolha é sua, naturalmente. — Ele pegou o vidro de perfume de cima da cômoda e voltou-se para Lisa. — Quero que você use este perfume hoje à noite.

— Pode ficar certo de que quando a noite chegar já terei partido!

— Acho que não. — Ele tirou a chave da porta e a colocou do lado de fora. — Nós estamos a três andares do chão. Eu, se fosse você, não arriscaria um salto desses. Poderia se machucar.

— Mas não pode me manter aqui contra a minha vontade.

— Eu não estou fazendo isto. Como minha mulher, será livre para ir onde quiser, sem explicações. Agora, como minha amante...

— Você quer dizer "escrava", não é?

— Eu quero filhos de você. Infelizmente, eles não podem ser conseguidos sem fazermos amor.

— Você não é humano!

— Mas você é. Você gostou das minhas mãos em seu corpo... Não negue! Conheço bem as mulheres. Reconheço o prazer quando o vejo. Você gostou do que fiz. À noite haverá muito mais...

— Não!

— Use o perfume que eu lhe dei. Seu nome é "Desejável", espero que eu ache você desejável esta noite.

Lisa percebeu que ele a estava insultando. Tudo o que dizia era para humilhá-la.

— Você não pode fazer isto neste país. Isto é rapto!

— Não, Lisa, você veio por sua livre e espontânea vontade. Eu tenho testemunhas disto.

— Mas não quero ficar.

— Em algumas semanas você mudará de idéia.

— Você está fazendo tudo isto por causa de um acidente que aconteceu há dez anos?

— Sim.

— E se eu concordar em me casar com você?

— Você terá toda a consideração e o respeito que a esposa de um Vatis merece.

— Para isso só terei que dormir em sua cama, não é?

— A não ser que você conheça outra maneira de termos filhos.

— Está certo, você ganhou. Eu me caso com você.

Andreas olhou para Lisa com desconfiança. Mas ela forçou-se ficar calma.

— Você acha que só por causa desta frase vou deixá-la livre? Pensa que sou idiota? Você vai ficar trancada neste quarto até amanhã. Eu já tenho tudo preparado para nos casarmos logo cedo.

— Você tinha muita certeza da minha decisão, não é?

— Você não tinha outra escolha.

Mas ela tinha uma chance, uma que ele desconhecia. Não tinha sido criada junto de dois garotos à toa. Assim que ele saísse do quarto, desceria pelo cano da calha que havia ao lado da janela. Sabia muito bem como sair dessa maneira, afinal já tinha feito isso centenas de vezes, quando criança.

— Isto quer dizer que você vai me deixar sozinha, esta noite?

— Pobre Lisa. está com medo de passar a noite nos braços de um homem?

— Você não é um homem. É um demônio!

— Então é isso o que você acha de mim? Tome cuidado para não despertar o demônio que existe em mim, quando eu a possuir. Poderei machucá-la bastante.

"Ele jamais me possuirá!", pensou.

— Você vai mandar meu almoço?

Ele olhou para ela, espantado. Depois, deu uma gargalhada.

— Nunca vou entender a cabeça de uma mulher! Seu corpo, sim, mas sua mente, jamais. Num minuto estávamos falando de sexo. No outro, você fala de comida!

Enquanto ele falava, a mente de Lisa trabalhava a todo vapor, planejando a fuga. Precisava ganhar o máximo de tempo antes que a fuga fosse descoberta. Só precisava saber se alguém viria ao quarto durante a próxima meia hora.

— Os dois assuntos são importantes, mas no momento o último parece muito mais importante. E você provavelmente não entende a cabeça das mulheres porque esta nunca foi uma parte que merecesse seu interesse.

— Talvez você esteja certa. Seu almoço será enviado dentro de meia hora. Prefiro não correr o risco de você tentar convencer Clive a levá-la de volta a Londres. Ele é leal a mim, mas também tem um senso muito forte de certo ou errado.

— Isto significa que ele deve condenar o que você está querendo fazer comigo...

— Receio que sim.

Isto a convenceu de que seu plano funcionaria. Assim que conseguisse descer pelo cano, se esconderia no carro de Clive. Ele havia dito que sairia logo após e ela não teria que ficar muito tempo escondida.

— Então você admite isso! — ela o acusou.

— Eu admito que, para um inglês, meu comportamento talvez não seja muito elegante. Mas acontece que eu também não acho nada elegante um homem tentar matar outro. Isso mesmo, seu pai não queria apenas me machucar ou cegar, quando provocou o acidente. Ele pretendia me matar.

— Eu não acredito nisso. — Lisa estava pálida. — Meu pai...

— Era um homem perigoso. Ele achou que me matando poderia casar com Gina sem problemas. Mas nós, gregos, não morremos tão facilmente. Eu fiquei muito mal...

— Eu sei — ela falou, cansada. — Eu... eu li uma reportagem sobre o acidente.

— Quebrei as duas pernas, um braço, algumas costelas e tive o pulmão perfurado. Mas nada disto me importou, comparado com o fato de eu ter perdido metade da visão. Isto jamais poderei esquecer. Gina não podia suportar e tenho que admitir que o meu estado não era nada encorajador, nem mesmo para uma mulher que jurou, diante de Deus, me amar para sempre. Seu pai só não contava com uma coisa: apesar de tudo, eu não concordei com o divórcio.

— Meu pai devia amar essa mulher. Ele... ele queria casar com ela. Eu não acredito que iria prejudicá-lo só para conseguir o que queria.

— Considerando-se que ele nem mesmo foi um pai para você. Estou surpreso que o defenda.

— Eu não o estou defendendo, estou dizendo que você está errado. Meu pai não seria capaz de machucar alguém, muito menos de tentar matá-lo.

— Eu tenho testemunhas, Lisa.

— Testemunhas?

— Naturalmente. O que estou lhe dizendo não é mentira nem loucura. Um pouco antes de a corrida começar, seu pai e eu tivemos uma briga. Ele queria que eu me divorciasse de Gina. E ameaçou me matar quando recusei.

— Provavelmente ele estava nervoso quando lhe fez a ameaça. Meu pai tinha um temperamento explosivo... Mas jamais cometeria um assassinato!

— Eu não penso assim. Nem eu nem os outros cinco pilotos que presenciaram a cena. Enquanto eu estive inconsciente no hospital, foi aberto um inquérito. Secretamente, é claro! Não se poderia acusar um homem sem provas. Se eu não estivesse tão mal, teria falado sobre a forma deliberada com que ele jogou o carro na minha frente.

— E... o inquérito?

— Foi arquivado.

— Então você estava errado! — ela falou, triunfante.

— Eu não estava, nem estou errado. Não é estranho que seu pai tenha desistido de correr exatamente depois do acidente? Alguns meses depois ele morreu.

— E você vem planejando esta vingança durante todos estes

— Eu já lhe disse que pode levar muito tempo, mas um grego não perdoa, nem esquece.

— Estou vendo — ela falou, com a mão na cabeça que doía muito. — Eu gostaria de me deitar. Não estou me sentindo bem.

— Pobre Lisa. Que choque para você.

— Choque?

— Vir até aqui pensando que estava simplesmente iniciando um trabalho, quando na realidade está para se tomar minha mulher. Uma mulher submissa, que vai cumprir suas obrigações direitinho.

— Nunca! Fique sabendo que não pretendo ser submissa, nem na cama, nem fora dela.

Andreas a olhou com curiosidade.

— Vou gostar disso. Sim, eu vou gostar muito. Mas lembre-se que, como minha mulher, você terá uma posição muito importante.

— Eu já sei disso. Você foi muito claro.

— Eu acho que não. Na Grécia, a esposa é respeitada acima de qualquer coisa, respeitada como mãe de nossos filhos. Nós temos amigas, isto é normal, mas a esposa vem sempre em primeiro lugar, Gina tinha este lugar na minha vida, e abusou da minha confiança. Você não terá tanta liberdade.

— Entendo. Sua amiga virá em primeiro lugar.

— Acho que disse "amigas", e foi exatamente isto o que eu quis dizer. Você só servirá para me dar filhos. Prazer eu procuro noutro lugar...

— Meu Deus, você é um monstro!

— Acho que você vai descobrir que sou apenas um homem. Aliás, se você aprender a me agradar, poderá descobrir que sou bastante interessante. Posso até esquecer as minhas amigas e ficar só com você, se for boazinha comigo.

— No que me diz respeito, você pode ir para o inferno!

— Não é lá que vive o demônio?

— Vá embora, deixe-me sozinha!

— E isso mesmo que eu pretendo fazer, mas vou trancar a porta. Assim você não ficará tentada a fugir.

Ela ouviu a chave girar na fechadura assim que ele saiu. Estava revoltada. Prometeu a si mesma que procuraria a policia e o denunciaria assim que conseguisse fugir dali. Aquele homem estava louco. Como poderia imaginar, quando saiu de Londres naquela manhã, que tinha um inimigo tão perigoso? O homem que já há dez anos a aterrorizava!

Lisa havia visto várias fotos dele no jornal sem se impressionar, mas bastou ver uma foto onde ele estava com as feições transformadas pelo ódio para ficar apavorada. Ele era dominador e agressivo, seria horrível ter um homem assim como marido

Será que ele estava certo em relação à causa do acidente? Será que o pai dela havia realmente tentado matá-lo? Lembrou-se da única vez que viu o pai zangado, ele também sabia ser violento. Mas... assassinato? Ela não acreditava que ele fosse capaz disso, independente do que Andreas Vatis dissesse.

Lisa pulou assustada quando a chave girou na fechadura, tão absorta nos pensamentos que se esqueceu que iam trazer seu almoço. Talvez nem precisasse descer pela calha. Se tivesse um pouco de sorte, a copeira não trancaria a porta. Suas esperanças, no entanto, caíram por terra quando Andreas entrou com seu almoço.

Ele riu ao ver o desapontamento no rosto dela.

— Você não esperava que eu fosse correr o risco de deixá-la a sós com uma das criadas, não é? Estou bastante consciente de que ninguém, sabendo do nosso passado, acreditaria que você está aqui espontaneamente. Assim sendo, após a cerimônia você não verá mais ninguém além de mim.

— Será que seus criados não vão achar tudo isso muito estranho?

— Todos já sabem que minha noiva não está passando bem.

— Sua noiva?

— Sim, eu comentei com todo mundo que estávamos noivos. Afinal, como o casamento será amanhã, era necessário que soubessem alguma coisa antes.

Ele tinha preparado tudo, cuidando de todos os detalhes. Agora ela entendia o excesso de amabilidade da sra. Hall. Para ela. Lisa era a noiva do patrão. Só Clive Western sabia da verdade, e ele estaria voltando a Londres logo depois do almoço.

Andreas riu de sua expressão desolada.

— Venho planejando isto há anos, Lisa. Acho melhor você admitir que não tem saída. Pare de lutar comigo.

— Não vou desistir de lutar! Nem que isto me leve ao inferno!

— Amanha à noite, você conhecerá o inferno, prometo. Seu pai me mandou para lá por dois longas anos. Deixou me cego e me fez prisioneiro do desespero e do ódio por ele e pela família dele. Quando eu saí da escuridão, saí com a determinação de fazer com que a filha do homem que arruinou a minha vida sofresse tanto quanto eu.

— Mas eu não posso ser acusada pelo que meu pai fez! Nunca vivi com ele, mal o conhecia e raramente recebia uma visita dele.

— Eu sei. É justamente por isto que ofereci a você a opção do casamento.

— Ofereceu? Não me lembro de ter tido qualquer chance de optar. Você apenas me comunicou que ia casar contigo.

— Eu acho que lhe dei uma alternativa.

— Sim, a de ser sua amante. Grande alternativa...

Ela sabia que ele estava nervoso, mas não percebeu antes o quanto seu rosto refletia seus sentimentos. Nesse momento, mostrava toda a raiva que ele estava sentindo.

— Sua aventureira barata! — Suas mãos a agarraram com força pêlos ombros. — Você acha que eu gosto de ser assim? Que eu gosto de ser meio cego? Eu odeio esta situação. Mas ser meio cego não faz de mim meio homem, como você irá descobrir muito em breve.

— Não! — O protesto de Lisa foi silenciado pelo brutal assalto daquela boca, forçando seus lábios a se abrirem e deixando-a quase sem sentidos.

Andreas estava completamente fora de si, e ela pôde sentir toda sua raiva quando a jogou na cama e deitou-se em cima dela. Ele prendeu as mãos de Lisa acima da cabeça e, em vão, ela tentou se libertar.

— Não, por favor...

— Ah, sim! É só desta maneira que você vai aprender quem manda aqui. — Sua mão livre puxou o elegante vestido que ela usava, abrindo-o completamente, sem se importar. Vários botões caíram e outros se abriram, deixando os seios de Lisa visíveis através do tecido rendado do sutiã.

— Andreas! — ela implorou, mesmo sabendo que de nada adiantava. — Deixe-me ir embora!

— Você logo vai implorar para ficar nos meus braços. Eu pensei que atualmente as mulheres, principalmente as jovens como você, não se importassem mais com esta peça desnecessário — ele disse enquanto tirava, impaciente, o sutiã dela. — Com um corpo como esse, você certamente não precisava usá-lo. — Enquanto falava, ele acariciava a pele delicada, observando as emoções no rosto de Lisa e sorrindo de prazer ao vê-la aos pouco perder o controle. Encostou a boca num dos seios dela, e riu ao vê-la gemer.

Lisa sentia-se flutuar com tantas emoções novas tomando conta de seu corpo. Queria se livrar e, ao mesmo tempo, queria que Andreas continuasse a acariciá-la.

De repente, ele não estava mais com ela na cama, mas à sua frente, impedindo-a de ver quem entrava no quarto.

— Sra. Hall... — Ele parecia aliviado ao se levantar. — Eu pensei que fosse Helena. Receio que, depois de tanto tempo longe da minha noiva, eu tenha perdido o senso de convivência.

Lisa segurava o vestido com as mãos trêmulas, incapaz de olhar a governanta. Como tinha podido corresponder a ele? Ela sabia que não podia impedi-lo, pois Andreas era muito forte, mas... precisava corresponder? E o pior é que ele sabia exatamente o poder que tinha sobre ela.

A sra. Hall parecia estar um pouco chocada, mas logo recuperou o controle.

— Eu só vim para saber se a srta. Thomas precisava de alguma coisa.

Andreas sorriu como se tudo estivesse muito bem.

— Eu acho que ela tem tudo o que precisa...

A governanta permitiu-se um sorriso de compreensão.

— Sim, imagino que tenha. Sinto tê-los interrompido.

— Acho que me fez um favor. — Andreas andou com ela até a porta. — Se não tivesse entrado, eu poderia ter antecipado a consumação do meu casamento. Isto não seria bom! Tenho certeza de que Lisa, assim como eu, está agradecida a você.

A sra. Hall notou a bandeja com o almoço.

— Gostaria que eu lhe trouxesse mais alguma coisa? Tenho certeza de que está tudo frio nesta bandeja.

— Eu...

— A srta. Thomas não está se sentindo bem — Andreas falou rapidamente. — Ela não está querendo comer, não é, querida? — Seu olhar era de advertência e ela entendeu perfeitamente.

— Não. Acho melhor descansar um pouco, pois não estou nada bem. — Seu olhar não deixava dúvidas do que estava causando seu mal-estar, e ela percebeu que Andreas entendia a mensagem.

Se ao menos ela tivesse se sentido mal ao ser tocada por ele... Mas, para seu desespero, havia gostado. Como podia desejar um homem que acusara seu pai de tentar assassiná-lo e queria casar com ela à força, só para substituir a mulher que o pai dela havia roubado? Estava chocada com a própria reação.

— Talvez um pouco de chá ou café... — a sra. Hall insistiu,

— Não, eu... Obrigada, acho que vou me deitar. — Tinha que conseguir ficar sozinha logo, para tentar descer pelo cano da calha, caso contrário perderia a carona de Clive. — Será que eu poderia?

— É claro que sim, querida. — Andreas caminhou em direção à porta. — Nós vamos deixá-la sozinha. Voltarei mais tarde para ver se você não precisa de alguma coisa.

— Obrigada.

Ela esperou até que ele trancasse a porta, antes de levantar-se e ir até a janela. Assustou-se, pois era bastante alta. Pensando bem, já fazia muito tempo que tinha subido pela última vez numa árvore e uma calha não tinha saliências como um tronco. Mas como aquela era a única maneira de sair dali, iria tentar. Ainda que fossem dez andares ela tentaria.

O fato de pensar que sua permanência ali significaria tornar-se mulher daquele homem daria a ela coragem para fazer qualquer coisa.

Que tipo de pessoa ele imaginava que ela era para aceitar um casamento com um homem que a odiava? Um homem que não fazia questão de esconder isso? Bem, seja o que for que ele tenha pensado, está errado. Não havia nada de submisso nela e nunca haveria.

Trocou rapidamente de roupa, colocando jeans e camiseta. Calcou um tênis e, sentada no peitoril, colocou os pés na borda que havia logo abaixo. Caminhar pela borda até a calha foi fácil. Mas logo depois ficou preocupada. Uma olhada para baixo a deixou com os joelhos trêmulos. Sem dúvida, era uma longa distância até o chão. Se ela caísse...

Não deveria sequer pensar nisso. Respirou fundo para se acalmar, antes de alcançar a calha que estava um pouco mais longe do que ela havia pensado. Isso a forçou a dar um salto para conseguir segurá-la firme. A calha balançou com seu peso, mas parecia firme, embora não permitisse que ela se apoiasse na parede com os pés para descer mais rapidamente.

Era uma descida perigosa, mas ela estava indo bem. Tudo o que tinha a fazer quando alcançasse o chão era...

— Meu Deus! — ela ouviu alguém dizer logo abaixo. — O que você está fazendo aí, Lisa?

Ela olhou para baixo, e o chão pareceu estar muito longe. Andreas estava ali, olhando-a espantado.

Ela fixou os olhos na parede, tentando parar o súbito tremor que tomava conta de seu corpo. Ainda estava a quatro metros do chão, longe do alcance das mãos de Andreas, mas também longe do quarto, para poder voltar.

— O que é que você acha?

— Ou você é muito valente, ou é muito estúpida.

— Talvez simplesmente desesperada.

— Desça daí — ele ordenou. — Agora!

— O que é que você pensa que estou fazendo?

De repente, tudo começou a girar à sua volta e seu pé esquerdo perdeu o apoio.

— Oh, não! — Ela caiu e ficou no chão parecendo uma boneca sem vida!

 

Numa relação natural. Lisa tentou se levantar, mas a dor que sentia na perna era tão forte que ela caiu novamente e acabou machucando seriamente o ombro esquerdo.

Andreas chegou perto dela em alguns segundos. A raiva que ele sentia era evidente.

— Sua idiota! — Ele a sacudiu sem se importar com o sofrimento dela. — Estúpida...

— Meu ombro! Pelo amor de Deus, Andreas, pare com isso.

Ele resmungou algumas palavras em grego, antes de pegá-la nos braços.

— Será que você está assim tão desesperada para escapar de mim? Não se importa nem de correr o risco de morrer?

— É claro que estou! — ela falou com firmeza, apesar da dor que estava sentindo. — Eu só quero sair daqui.

A sra. Hall, Clive Western e Helena chegaram até a porta e ficaram parados, olhando assustados para Lisa e Andreas. Ela pensou que Helena deveria estar feliz por vê-la naquele estado. Mas tudo o que parecia importar a ela era ver Lisa nos braços do pai: não podia saber que ela estava detestando aquela situação.

— Srta. Thomas! — A sra. Hall parecia sinceramente preocupada. — O que aconteceu?

— Ela estava andando no jardim e caiu — Andreas respondeu no lugar de Lisa. — Chame Peters, eu a levarei para o quarto.

Lisa estava desesperada, sabia que não poderia tentar fugir outra vez. Lágrimas de dor e frustração rolavam por seu rosto. Ela apertou os lábios para que não tremessem.

Andreas deve ter notado, pois seus braços a seguravam com mais força.

— Chorar, agora, não vai resolver nada.

— Lisa... srta. Thomas — Clive Western corrigiu-se imediatamente ante o olhar desaprovador do patrão. — Você está bem?

— É claro que não! — Mais uma vez Andreas respondeu por ela. — Será que não está vendo que ela se machucou?

— Sim, mas...

— Então não faça perguntas tolas.

Helena deu um passo e segurou no braço do pai, pois ele passara direto por ela.

— Você precisa mesmo carregá-la, papai?

— Esta pergunta é tão tola quanto a de Clive. Eu não estaria com ela nos braços se ela pudesse andar. Agora será que vocês podiam sair do meu caminho para que eu possa levar Lisa ao quarto antes que ela desmaie?

Lisa ficou surpresa por ele ter percebido o estado dela, com tanta gente exigindo sua atenção.

— A chave... — ele falou de repente. — Será que você pode tirá-la do bolso da minha calça? O esquerdo, Lisa.

Lisa tinha esquecido que a porta estava trancada. Não foi à toa que ele não permitiu que ninguém os acompanhasse.

— Você não pode pegá-la?

— Parece que estou cercado de imbecis, hoje. Naturalmente que não. Só tenho duas mãos, que no momento estão segurando você.

— Então me ponha no chão.

— Você vai conseguir ficar em pé?

— Não... — A dor em seu tornozelo era quase insuportável.

— Então pegue a chave. Vamos, Lisa, eu não posso segurá-la para sempre.

— Você quer que eu abra a porta?

— Não. É melhor não mexer o braço antes de saber o que aconteceu com seu ombro. O médico vai chegar em seguida. — Ele a pôs na cama.

— O médico? Você chamou o medico?

— Quem você pensa que é Peters? — Ele inclinou-se sobre ela, tocando-lhe suavemente o ombro e verificando como estava. Foi até o banheiro e voltou com algodão e anti-séptico, em seguida limpou os braços dela com surpreendente delicadeza.

— Eu... eu não sabia. — Quando sentiu o algodão frio sobre a pele, afastou-se num gesto automático.

— Fique calma, não vou machucá-la.

— Eu sei.

— O que deu em você, para fazer uma loucura dessas?

— Já lhe disse... Eu queria ir embora.

— E só conseguiu piorar a situação ainda mais.   

— Piorar? — ela repetiu.

— Sim. Notei que seu pé está inchando. Não acredito que você possa ir a qualquer lugar por muito tempo.

Ela sabia disso. Deitou-se no travesseiro, sem se importar: mais com a dor no ombro e no braço.

— Eu odeio você!

— Eu não esperava nada melhor. Isto vai doer durante alguns dias — ele falou, referindo-se ao ombro machucado.

Lisa olhou para ele com os olhos cheios de lágrimas.

— Já está doendo. E muito!

— Foi uma atitude infantil e estúpida.

— Certo, sou idiota, estúpida e tudo o mais que você quiser. Acho que já discutimos este assunto.

— O que você espera conseguir com isto? Não teria ido longe, mesmo que conseguisse descer sem problemas. Assim que eu descobrisse, iria atrás de você e a encontraria, pode ter certeza.

Ela sabia disso agora. Aonde quer que fosse, ele a alcançaria e a traria de volta.

— Eu não esperei todos estes anos para depois desistir.

— Como você se sentiria se alguém estivesse esperando sua filha crescer para usá-la em sua vingança? — ela perguntou, desafiante.

— Se eu tivesse feito o que seu pai fez, eu esperaria algo assim em retribuição.

— Então você não deve amar muito sua filha.

— Eu amo minha filha, nunca duvide disso. Se você disser ou fizer alguma coisa contra ela, vai prestar contas a mim.

— Ela sabe que você vai se casar?

— Sim. Ela não mostraria tanto ressentimento por uma simples acompanhante.

— E será que ela não acha estranho você se casar com alguém que ela nunca viu antes?

— Isto não é estranho no meu país.

— Mas não estamos na Grécia. E além disso eu não sou grega.

— Quando você se tornar minha esposa, passará a ser. Eu só fico na Grécia alguns meses por ano. Normalmente viajo muito, visitando as diversas filiais das Empresas Vatis, mas continuo sendo grego, e você aprenderá a obediência e submissão das nossas mulheres.

— Isto é o que você pensa. Sou inglesa e continuarei assim.

— Veremos. — Sua voz era fria e impessoal. — Amanha nós nos casaremos. Se tentar me abandonar, saiba que irei buscá-la até mesmo no inferno e a trarei de volta. Entendeu?

— Sim. — Lisa sentia-se completamente perdida.

— Você não precisa tremer tanto — ele falou com ironia. — Eu jamais faria amor com uma mulher nas suas condições.

— É mesmo? Então o melhor que eu tenho a fazer é me manter sempre machucada.

— Esta desculpa não vai durar para sempre. Mas talvez seja melhor assim. Você nunca saberá quando vou exigir meus direitos. Vou me divertir vendo seu tormento, imaginando qual será o dia... — Ele deu um sorriso cruel. — Da mesma maneira que eu imaginava, a cada dia, se recuperaria totalmente a visão ou não. Sofri durante dois anos, Lisa. Mas farei o possível para seu sofrimento não dure tanto.

— O prazer de não compartilhar sua cama pode durar a vida toda, no que me diz respeito.

Havia crueldade no abraço que Andreas lhe deu, voltando-a para que olhasse para ele.

— Apenas alguns dias. Lisa, nada mais. E você vai se comportar como minha noiva. — Ficou em silêncio por um instante.

— Ouvi um carro chegando e tenho certeza de que é o medico. A sra. Hall estará com ele aqui num minuto.

— E se eu disser a ele o que você está fazendo comigo?

— Ele vai pensar que você está em choque e lhe dará um sedativo

— Não, ele não vai fazer isto. Não se eu lhe contar a verdade, que você me trouxe aqui sob falsos pretextos, que você...

— Não vai funcionar, Lisa. O dr. Peters, assim como todos daqui, sabe que eu tinha uma noiva em Londres e que a visitava constantemente, nos últimos seis meses. Ele nunca vai acreditar em você.

— Mas Clive Western sabe a verdade.

— Ele vai embora daqui a pouco. Provavelmente nem estará mais aqui quando você terminar de contar sua história para o médico. E ele estará voando para Atenas ainda esta noite.

— De volta para Atenas?

— Sim, Clive dirige meu escritório em Atenas.

— Eu não acredito em você! Você está mentindo! Você...

Suas palavras foram interrompida por um beijo. Não em um beijo romântico e nem mesmo pedia uma resposta. Era apenas uma maneira de silenciá-la, como Lisa logo percebeu, pois o médico e a sra. Hall apareceram na porta do quarto.

Andreas deve tê-las ouvido subir a escada, e silenciou-a de maneira a deixar tanto o médico quanto a governanta com a, impressão de que tudo estava bem. O dr. Peters jamais acreditaria nela, agora!

Ele encarou Lisa com um sorriso de triunfo nos lábios, antes de voltar-se para receber o médico.

— James, estou contente que você tenha vindo depressa. Como pode ver. Lisa está muito machucada. — Deixou que o médico se aproximasse da cama. — Por enquanto é só, sra. Hall.

— O sr. Western queria...

— Diga-lhe que descerei em seguida. Não deixarei Lisa agora.

— Sim, senhor.

Lisa olhou para o médico enquanto ele a examinava. Tinha certeza de que, se pudesse falar com ele a sós, poderia convencê-lo a acreditar nela.

Voltou-se para Andreas com um sorriso, segurando seu braço com intimidade.

— Eu estarei bem, Andreas. Você não deve negligenciar seu trabalho por minha causa. Tenho certeza de que Clive deseja vê-lo antes de partir.

Ele sorriu, mostrando claramente que sabia o que ela estava pretendendo.

— Sua saúde é mais importante do que qualquer coisa que eu tenha para falar com Clive. — Ele pegou a mão que estava em seu braço e levou-a aos lábios, beijando-a suavemente.

Os dedos de Lisa se endureceram, ela teria puxado a mão se Andreas não a estivesse segurando com tanta força.

— Mas você deve despedir-se dele, Andreas — ela insistiu com falsa delicadeza. — Você sabe que ele deve partir em alguns minutos.

— Então vai ter que partir sem me ver. Eu não poderia deixá-la, agora que... — Ele parou de falar quando ela gritou de dor. — Tem algum osso quebrado, James?

— Eu acho que não — o medico respondeu. — Naturalmente, será necessário tirar algumas chapas para termos certeza.

— Eu a levarei ao hospital em seguida — Andreas falou, preocupado.

— Será bom. — O médico olhou com ar de dúvida para o pé inchado de Lisa. — A sra. Hall disse que sua noiva falseou o pé e caiu, mas seu tornozelo não parece ter sido apenas torcido. Esta com jeito de que foi...

—- Receio que tenha sido minha culpa. Lisa e eu... — Ele fez uma pausa. — Lisa estava em meus braços e eu a deixei cair.

—- Você a deixou cair? — O médico estava muito confuso.

— Sim. Há algumas semanas que não nos víamos, e receio que nosso encontro tenha ficado um pouco... mais eufórico. — Seu tom de voz, seguro e calmo, não faria ninguém duvidar daquelas palavras. — Eu a peguei nos braços, rodamos, acho que perdi o equilíbrio e ela caiu.

— Entendo. Isto explica a contusão no tornozelo.

Lisa olhou para Andreas com raiva. Como ele se atrevia a insinuar que os dois estivessem pretendendo fazer amor no jardim?

Sob o olhar atento de Andreas, o médico fez um curativo no ombro de Lisa e enfaixou seu tornozelo, dando-lhe em seguida um cartão para que tirasse as chapas de raios-X no hospital. Ela tomou alguns comprimidos, pois não estava mais aguentando a dor.

— Eu sei que você não está nada bem, mas acho que deve tirar as chapas ainda hoje.

— Nós não poderemos esperar até amanhã, de qualquer maneira. Lisa e eu vamos nos casar amanhã cedo.

— Casar?! — O médico estava atônito. — Aqui?

— Naturalmente, onde mais poderia ser?

— Eu recomendo à srta. Thomas que não viaje, pois pode piorar bastante se houver fraturas. Mesmo que não esteja quebrado, seu tornozelo está bastante machucado. Ela precisa de descanso absoluto.

— Nós não vamos viajar, James. Vamos passar nossa lua-de-mel aqui mesmo.

— Eu não sabia. Parabéns!

Parabéns. Lisa quase gritou sua frustração por estar sendo totalmente dominada por Andreas. Como é que alguém podia acreditar que ela queria casar com aquele arrogante e satânico homem, por sua livre e espontânea vontade?

— Dr. Peters...

— Tenho certeza de que já tomamos seu tempo em demasia. — Andreas a interrompeu, firme. — Você deve estar ansioso para estar de volta para sua família.

— Quanto a isso, não se preocupe. Minha filha e meu genro chegaram logo após o almoço, e como estão esperando o primeiro filho, ela e minha mulher não sabem falar de outra coisa que não sejam bebês.

Andreas sorriu com simpatia.

— Espero que você esteja presente no nascimento do nosso primeiro filho.

O dr. Peters ficou sem jeito e, quando falou com Andreas. Lisa notou que seu rosto estava mais corado.

— Eu não sabia...

— Eu não estou grávida — Lisa protestou, indignada. O movimento brusco tirou a bandagem de seu ombro do lugar, arrancando-lhe um grito de dor.

— Calma, Lisa. É claro que você não está grávida. Eu só estava me referindo ao fato de que pretendemos dar a Helena muitos irmãos, e o mais rápido possível.

Lisa não respondeu, pois estava realmente indignada com a sugestão dele. Ela não tinha nenhuma intenção de dar sequer um irmão para Helena, quanto mais vários!

— Eu não quero que você tenha outros filhos, papai! — Helena entrou no quarto jogando-se nos braços do pai. — E muito menos dela. Eu não gosto dela, papai.

— Acho melhor você se acalmar, Helena. — Ele ordenou, afastando-se da filha com um movimento firme. — E vai pedir desculpas a Lisa por isso.

— Nunca! — Seus olhos verdes brilhavam de raiva. — Eu jamais vou pedir desculpas a ela. Jamais!

— Você vai fazer o que eu mandei, ou então vai ficar no seu quarto até mudar de idéia.

Helena voltou-se para Lisa com raiva.

— Você nunca vai tirar meu pai de mim. Eu não vou deixar.

— Vá para seu quarto! — Andreas ordenou.

Lisa tentou sentar-se, compreendendo o sentimento de posse de Helena pelo pai.

— Andreas... — Ela tentou amenizar a tensão. — Eu não creio que Helena quisesse dizer isso. Ela...

— Eu quis, sim — Helena falou com teimosia.

— Você tem um minuto para ir para seu quarto. Entendeu?

Helena sentiu que seu pai não ia repetir a ordem, e obedeceu relutante, saindo com a cabeça erguida.

— Mas não vou pedir desculpas por dizer a verdade! Algum tempo depois, ouviram uma porta ser fechada com força.

— As crianças costumam ser cruéis, algumas vezes. — O dr. Peters falou. — Eu não me preocuparia muito, logo ela se acalmará.

— Concordo com você — disse Andreas. — Eu o acompanho.

— Não é preciso. — O dr. Peters pegou a maleta. — Não se esqueça de que ela precisa de descanso absoluto por vários dias.

— Não se preocupe. Eu vou cuidar para que ela fique na cama o tempo todo que for necessário — Andreas tranqüilizou-o sorrindo.

— Eu disse que ela precisa de descanso... — o dr. Peters repetiu, sorrindo com malícia.

Lisa estava tão nervosa que não parava de tremer. Mal pôde se conter até o médico sair do quarto, para dizer tudo que pensava para Andreas.

— Como você se atreve a discutir nossos prováveis filhos com um estranho?

— James Peters não é um estranho. Você é que é, e eu discuti isto com você.

— Não discutiu!

— Eu disse a você que queria filhos. É claro que poderemos ter filhas também. É a lei das probabilidades, eu acho.

— Você ouviu o que Helena disse. Ela não me quer aqui.

— Não é com ela que você vai casar.

— Ela não vai pedir desculpas, você sabe. Não vai ser uma convivência fácil para nós, você pensou nisso?

— Então ela vai ficar em seu quarto por algum tempo.

— Ela não pode ficar lá para sempre! — Lisa protestou. — É muito jovem e teve você só para ela por muito tempo.

— Quer dizer que você vai defendê-la?

— Posso entender que ela não goste de dividi-lo com outra mulher. Esqueça o que ela disse, logo vai passar essa raiva.

— Não — ele falou com firmeza. — Eu nunca volto atrás neste tipo de decisão. Perderia o respeito que ela tem por mim.

— Não se você falar com ela.

— Não, eu não vou falar com ela, não antes de ela pedir desculpas a você.

Andreas não ia mudar de opinião e Lisa sabia disso. Pobre Helena, se ele fosse sempre assim, era natural que ela se revoltasse com a situação. Afinal, ia ter uma madrasta apenas cinco anos mais velha, e soubera disso apenas um dia antes do casamento acontecer.

— Tudo bem, Andreas — ela falou apesar de pretender ver Helena para resolver a situação. E sua chance chegou antes do que esperava.

— Ficarei feliz se você concordar assim com todas as minhas instruções. Por ora, acho melhor você descansar enquanto vou me trocar.

Só então Lisa percebeu que sua roupa estava bastante manchada de sangue.

— Pela quantidade de sangue que você perdeu, eu pensei que fosse bem mais grave.

— E, em vez disso, é apenas um arranhão!

— Não, Lisa, sei muito bem como você deve estar se sentindo.

— E você está contente com isto, não é? — ela acusou, ressentida.

— Não, você está enganada. Eu não quero que você sofra fisicamente.

— Não mesmo? Nem quando você fizer amor comigo?

— Especialmente nesta situação. Dor é a última coisa que eu desejaria que você sentisse nesta hora. — Ele levantou a cabeça dela delicadamente. — Você não é tão insensível assim aos meus carinhos e, quando estivermos juntos, você vai gostar.

Ela entendeu perfeitamente bem o que ele pretendia. Iria dominá-la usando a inexplicável atração que ela havia demonstrado sentir por ele.

— Será que nunca ninguém lhe disse que você é um grande amante? — ela falou, desafiando. — Eu não consigo pensar em nenhuma outra razão que você possa ter para apregoar com tanto ardor suas qualidades sexuais.

— Isto não ê jeito de uma mulher falar sobre sexo.

— Tentando fugir da pergunta, Andreas?

— Não é preciso. Não se preocupe, Lisa, você mesma vai julgar. Então decidirá qual é a resposta. Vou me trocar e volto em seguida para levá-la ao hospital.

— Eu estarei bem com o motorista. Você não precisa vir comigo, Andreas.

— Mas não quero ficar longe da minha noiva, nem por um minuto!

— Você não confia em mim, não é?

— Não.

Quando ele saiu. Lisa estava desolada. Ainda tinha esperanças de conseguir escapar durante a ida ao hospital. Deveria saber que Andreas não lhe daria nenhuma chance.

Num impulso, sentou-se e testou o pé no chão, pretendendo ir até o quarto de Helena. Estava doendo bastante, mas precisava conversar com ela.

Não foi difícil descobrir o quarto dela, pois seus soluços ecoavam no corredor. Com decisão. Lisa bateu na porta.

— Papai?

— É Lisa, Helena — ela falou suavemente.

— Vá embora! — foi a resposta brusca.

— Eu vou entrar. Helena, mesmo que você não queira.

— Eu não quero... — Seu protesto foi interrompido pela entrada de Lisa. — Eu não a quero aqui!

Mais uma vez, Lisa constatou que dali a dois ou três anos Helena seria muito atraente. Com roupas e um corte de cabelo adequados, ela ficaria sensacional. Andreas teria bastante trabalho para mantê-la longe dos conquistadores que certamente a cercariam.

— Eu não me surpreendo com isto. Helena. Se eu fosse você, estaria ressentida também.

Os olhos dela pareceram confusos, por um instante, mas ela respondeu com voz fria:

— Você não devia casar com meu pai.

Lisa ficou surpresa. Era algo bem estranho para se dizer. Não que ela não queria que Lisa se casasse com Andreas, mas que não devia.

— Por quê? — perguntou, curiosa.

— Ele devia de casar por amor. Você não ama meu pai

— Como sabe disso?

— Eu os observei enquanto conversavam. Vocês não, se amam.

— E se você estiver enganada?

— Então eu ficaria feliz. Mas você não o ama e eu não a quero aqui.

— E se eu lhe disser que não quero ser a esposa de Andreas?

Uma total descrença apareceu naqueles olhos verdes.

— Por que você não quereria se casar com meu pai?

— Pela razão que você mesma apresentou. Eu não o amo.

— Então, por que concordou em se casar com ele?

— Porque eu...

— As razões de Lisa para se tornar minha esposa não lhe dizem respeito, Helena — Andreas falou da porta.

Lisa olhou para ele com raiva. Ele sempre aparecia quando ela menos esperava... ou desejava.

— Mas, papai, ela...

— O nome dela é Lisa. E você deve chamá-la pelo nome.

— Helena e eu estávamos apenas conversando.

— É verdade?

Helena olhou para Lisa, hesitante. Não queria se indispor com o pai novamente, mas estava relutante em aceitar a ajuda inesperada de Lisa.

— Helena?

— Não, não é verdade — ela falou finalmente.

— Foi o que eu pensei. — Ele voltou-se para Lisa e falou com autoridade. — Nunca mais minta para minha filha.

Não era necessária a advertência. Se Helena era tão insensível para aceitar uma oferta amigável quando lhe era oferecida que ficasse trancada no quarto quanto quisesse. Além disso, Lisa não devia nenhum favor a ela.

— Eu não queria que ela entrasse aqui, papai.

— Imagino que não. Eu vou levar Lisa ao hospital. Vejo você quando voltar, está bem?

— Sim, papai.

— Você vai jantar comigo.

— Oh, sim, eu vou gostar muito.

Lisa resolveu não se opor quando Andreas a pegou no colo para saírem do quarto, e continuou calada enquanto desciam as escadas.

Ele a colocou no banco traseiro do carro e sentou-se a seu lado, ordenando ao motorista que os levasse ao hospital.

— Eu só estava tentando ajudar.

— Como você pode ver, nem Helena nem eu apreciamos este tipo de ajuda.

— Mas você foi muito severo com ela — Lisa protestou

— Ela respeita minha autoridade.

— Mas você disse que ela ia ficar no quarto, e eu...

— E é o que ela ia fazer — ele a interrompeu. — Mas agora, não. Se ela tivesse concordado com sua mentira, eu a teria punido mais rigorosamente. Helena não é uma criança desobediente.

— Nem eu!

— Você não é criança, concordo. Mas... desobediente? Bem, eu acho que é. De qualquer forma, escute bem isso: nunca mais envolva minha filha em nossas discussões.

— Mas eu não estava...

— Sim, estava. E isso não vai acontecer novamente

— Como você pode ter tanta certeza?

— Porque eu vou ensiná-la a ser obediente.

— Eu não vou ser obediente coisa nenhuma! — Lisa respondeu com raiva.

— Você será, sim...

— O que lhe dá tanta certeza?

— Se você tentar criar problemas na minha casa, pôr minha filha contra mim, ou mesmo tentar fugir daqui, eu tornarei público o fato de que você é filha de um quase assassino.

 

O casamento foi um acontecimento estranho. A noiva, vestida de azul-claro, não parecia feliz. Tinha um braço na tipóia, um dos ombros e os tornozelos enfaixados. A palidez do rosto e as olheiras mostravam claramente que ela havia passado a noite sem dormir.

Depois da ameaça de Andreas. Lisa não conseguiu mais pegar no sono. O medo de que ele contasse às pessoas tudo o que pensava do pai dela a deixara apavorada. E ela sabia que Andreas Vatis não era homem de ficar só na ameaça... A cabeça de Lisa doía muito. Ela não conseguia acreditar que o pai fosse capaz de premeditar a morte de uma pessoa. Tinha lembranças que ele era um homem de temperamento explosivo, mesmo assim não queria aceitar a idéia de que tivesse chegado ao assassinato. Um dia provaria que Andreas estava enganado. Ele iria se arrepender de tudo o que estava fazendo com ela.

Logo depois da cerimônia do casamento, Andreas desapareceu, alegando que precisava dar uns telefonemas. Mas antes fez questão de dizer a Lisa que iria aumentar o sofrimento dela, pois a deixaria sem saber o momento em que exigiria seus direitos. E Lisa sentiu na carne toda a crueldade dessa declaração.

Helena portou-se muito bem durante todo o dia. Lisa havia jantado no quarto na noite anterior, e não tinha idéia do que se passara entre eles, mas era óbvio que estava tudo bem, agora.

Helena também desapareceu quando seu pai foi para o estúdio, e Lisa sentiu-se mais solitária ainda. Não podia sequer voltar ao quarto sozinha.

Seu tornozelo doía tanto, que ela dependia totalmente de Andreas para levá-la de um lugar a outro.

Onde será que estavam todos? Eles não tinham o direito de deixá-la sozinha, não hoje! Chamou pela sra. Hall.

— Sim, sra. Vatis?

— Eu... Será que podia chamar meu marido para mim?

— O sr. Vatis está trabalhando no estúdio — ela falou com certa reserva. — Ele não gosta de ser perturbado.

— Tenho certeza de que Andreas não vai se importar. Ele só ia dar alguns telefonemas.

— Bem...

— Por favor, sra. Hall. Eu tenho certeza de que ele não vai se importar, não hoje...

— É claro que não. Vou chamá-lo imediatamente.

Lisa percebeu, pela maneira como Andreas entrou na sala alguns minutos mais tarde, que ele não havia gostado de ser interrompido.

— O que você pretende, mandando minha própria governanta ao insinuar que eu devia estar a seu lado e não no escritório?

Ela sorriu, pretendendo mostrar uma calma que estava longe de sentir. Talvez ele quisesse tirá-la do pensamento, mas tinha se casado naquela manhã e não ia deixá-lo esquecer!

— Eu não o obriguei a vir aqui, Andreas, eu simplesmente pedi que viesse me ver.

— Muito bem, eu já vi você. E agora, o que você quer?

— A não ser que você tenha se esquecido, nós nos casamos hoje de manhã.

— E você está querendo consumar o casamento agora mesmo?

— É claro que não! Eu só estou pedindo um pouco de consideração.

— Eu pensei que o fato de ter-me ausentado fosse satisfazê-la. Estou errado?

— Você não está errado, mas será que seus empregados não ficarão surpresos com seu comportamento? Afinal de contas, foi você quem quis que o casamento parecesse comum.

— Isto foi antes de você decidir se jogar da janela.

— Mas eu não fiz isto! Eu caí do...

— Depois de pular a janela.

Será que ele tinha que lembrá-la mais uma vez de sua estupidez. Mas não teria sido, se ela tivesse conseguido descer aqueles últimos metros ilesa. Estaria livre agora, longe daquela casa e de Andreas Vatis.

— Você me forçou a isto.

— Talvez, mas tudo o que você conseguiu foi se machucar. Está doendo muito? Foi mesmo uma coisa estúpida...

— Eu estava amedrontada!

— Quer dizer que não está mais?

Lisa não respondeu, mas não pôde esconder que ele ainda a amedrontava.

— Eu posso ver que sim. Talvez você tenha mudado de idéia quanto a querer me ver.

— Não mudei, não. Eu gostaria que você tomasse o chá comigo. Já pedi para a sra. Hall trazê-lo.

— Você não está pretendendo me dar ordens, não é?

— Ora... Pare de ser tão... tão arrogante! Um típico grego arrogante.

— Mas acontece que eu sou grego. Como posso ser diferente?

— Você não precisa ser tão arrogante e presunçoso o tempo todo. O que há de errado em tomar o chá comigo?

— Não gosto de receber ordens. Além disso, não costumo tomar chá à tarde. Raramente tenho tempo.

— Nem mesmo no dia do seu casamento?

— Hoje não é um dia diferente de qualquer outro. Eu tenho muito trabalho a fazer. Vou viajar amanhã cedo.

— Viajar? Você vai embora?

— Vou até Londres, como sempre.

— É mesmo?

— Claro que sim, — Ele interrompeu o que dizia quando a sra. Hall entrou com o chá. Esperou que servisse e a dispensou, antes de voltar a falar: — Você não pensou que eu dirigisse meus negócios daqui, não é?

Lisa tinha que admitir que havia pensado, sim, apesar de a Cornualha estar muito distante de Londres.

— Quantas vezes por semana você vai a Londres?

— Geralmente saio segunda cedo e volto sexta à tarde.

— E eu vou ter que ir com você?

— O quê? — Ele a observou por um instante. — Por que eu a levaria comigo?

— Eu só pensei que... — Parou de falar quando percebeu que ele ria dela e corou.

— Três noites por semana na mesma cama serão suficientes. Se bem que, se você me agradar, pode ser que eu a leve comigo de vez em quando.

Lisa não tinha nenhuma intenção de agradá-lo. Sabendo que ele não estaria em casa, sentia que suas chances de escapar seriam maiores. Andreas não daria ordens aos empregados para vigiá-la.

— Por que você deixa Helena aqui, quando passa tanto tempo em Londres?

— Eu não fico em Londres, lá é somente meu escritório central. Passo a maior parto do tempo viajando, e este não é o tipo de vida aconselhável para uma criança. Além disso, não considero Londres um lugar adequado para uma garota com o temperamento de Helena.

— Eu não acho que Helena se considere tão criança, com dezesseis anos.

— Talvez não... Provavelmente você está certa. Mas só falta um ano para ela se casar.

— Como você pode falar com tanta certeza?

— Ela está comprometida com Demitri Papalos desde que tinha dois anos.

— E quantos anos ele tem?

— Dezenove.

— Eles se amam?

— Amor! — ele falou com desprezo. — Eles não se vêem desde que eram crianças, por isso acho difícil que se amem.

Depois do fracasso de seu primeiro casamento. Lisa entendia que Andreas não fizesse questão de amor na segunda vez mas não podia entender que ele esperasse isso de Helena. Sua decepção era bastante evidente quando percebeu o olhar de Andreas.

— Não interfira em assunto que você não compreende.

— Mas eu compreendo, sim só acho que Helena não é o tipo de garota que vá aceitar isso calmamente.

— Ela fará o que eu disser.

— Você gosta de se imaginar um Deus, não?

— Deus? Eu pensei que você me considerasse um demônio.

— E considero, mesmo. Mas é querer tomar o lugar de Deus, determinar assim o que sua filha deve fazer. Será que você não leva em consideração o fato de que eles podem até mesmo se odiar e que então estará destruindo duas vidas?

— E você acha que um casamento por amor os fará mais felizes? Eu me casei com Gina por amor e quando ela me deixou eu me senti quase aliviado.

— Então por quê...

— Isto não quer dizer que não me senti insultado quando seu pai a tirou de mim.

— Mas, se vocês iam se separar de qualquer maneira!

— Nós não íamos. Um casamento grego é para sempre.

— É por isso que só nos casamos no civil? Para você poder se livrar de mim mais facilmente, quando se cansar da brincadeira?

— Talvez. Seus cabelos avermelhados...

— O quê? — Ela se surpreendeu com a súbita mudança de assunto.

— São uma herança de sua mãe?

— Você os aceitaria se fosse?

— Ora, já estou me acostumando com eles.

— Espero que isso não signifique que você esteja se sentindo atraído por mim.

— Isto não é relevante.

— Porque você pretende fazer amor comigo de qualquer maneira?

— Exatamente.

— Neste caso, espero que você não se importe com o fato da cor dos meus cabelos ser igual à do meu pai. Será que você não lembra?

— Não esqueci nada sobre seu pai. Nada!

— Eu ainda acho que você está errado. Tenho certeza de que ele jamais machucaria alguém de propósito.

— Se você acredita nisso, por que se casou comigo?

— Porque eu não tinha escolha. Mas vou me sentir recompensada quando vir sua humilhação ao lhe provar que está errado.

— Eu jamais me humilharei diante de um homem, e, menos ainda, de uma mulher. Especialmente de uma mulher como você. — Dizendo isso, ele saiu da sala sem explicação.

Ele se humilharia, sim, Lisa faria tudo para que isso acontecesse! Se ao menos ela pudesse pensar em alguma coisa para provar a inocência de seu pai...

 

Quando Lisa conseguiu chegar até a sala, na manhã seguinte, Andreas já tinha partido há bastante tempo, graças a Deus. Helena estava com seu professor, um rapaz jovem e tímido que morava num dos chalés que havia na propriedade.

Lisa conheceu Tom Stills na hora do almoço. Foi uma refeição bastante informal e ela pensou que isso se devia ao fato de Andreas não estar em casa.

Tom Stills era um jovem de pouco mais de vinte anos, simpático e com uma figura bastante atlética Fora contratado como professor particular de Helena há seis meses.

— Andreas me contou que você está preparando Helena para os exames — Lisa falou, consciente do olhar pouco amigo de sua enteada.

— Sim, estou.

— E como ela vai indo?

— Muito bem — ele respondeu com entusiasmo.

— Você não acha aborrecido dar aulas para uma só aluna?

— Bem, eu...

— Você está insinuando que Tom... que o sr. Stills se aborrece comigo? — Helena perguntou, indignada.

Era exatamente isso que Lisa pretendia: a participação de Helena na conversa. Lançou-lhe um olhar calmo e inocente.

— Você acha que ele deve ficar?

— Não, não acho! E você não tem direito de fazer perguntas sobre os meus progressos. Meu pai pode ter casado com você, mas você não conseguiu sequer segurá-lo por dois dias. Isto prova o tipo de mulher que você é!

— Helena! — Tom Stills estava visivelmente sem graça. — Você não deve falar assim com sua madrasta!

— Ela não é...

— O problema, Helena, não é que tipo de mulher eu sou, e sim o tipo de marido que seu pai é. Ele e um homem suficientemente consciencioso para não esperar muito de uma esposa que esta doente e machucada

— Meu pai não dormiu com você esta noite!

— Helena!

— Está tudo bem, sr. Stills. Helena pode falar o que quiser. Eu não me incomodo.

— Você não tem nenhum direito de ficar fazendo perguntas a meu respeito.

— Eu só estava pensando...

— Pois então não pense. Se meu pai quisesse que você soubesse de alguma coisa, teria lhe contado.

— Ele dificilmente poderia fazer isto, já que não está aqui.

— Então espere até que ele volte. — Helena levantou-se. — Estou pronta para começar a aula, sr. Stills.

— Pode ir para a sala de estudos — Lisa ordenou. — Eu quero falar com seu professor.

— Eu não vou a lugar algum! — Helena gritou fora de si. — Eu...

— Faça o que a sra. Vatis disse — Tom Stills falou com paciência.

— Mas...

— Helena! — Sua voz era baixa, mas cheia de autoridade.

— Muito bem, conversaremos depois! — Saiu batendo o pé e todas as portas que encontrou pelo caminho. Lisa deu um suspiro antes de iniciar a conversa.

— Sinto muito, mas preciso irritá-la para conseguir que fale comigo.

— Ela sempre me pareceu bastante sociável — disse Stills.

Ele também parecia surpreso com o comportamento de sua aluna. Certamente tinha um interesse além do normal por Helena. A idéia parecia fantástica, mas Lisa não podia deixar de considerá-la.

— Espero que concorde comigo, sr. Stills. Eu gostaria de ser amiga de Helena, se ela permitir.

— Helena não faz amizades com facilidade.

— Mas fez com você.

O rapaz corou e Lisa entendeu que havia algo mais no relacionamento dele com Helena.

— Eu espero que sim. Seria bastante difícil ensinar alguém que antipatizasse comigo, sra. Vatis.

— Tenho certeza que sim. Obrigada por ter conversado comigo.

— Mas... não falamos quase nada!

— É suficiente para mim saber que Helena tem em você um amigo.

 

Lisa ficou pensando naquela amizade enquanto tomava café sozinha. A idéia de um sentimento mais profundo entre o professor e sua enteada não parecia nada absurda. Os dois ficavam sozinhos durante muito tempo. É claro que Andreas não aceitaria a idéia. Para ele a filha não passava de uma criança, mas Lisa sabia que uma garota de dezesseis anos já é adulta o suficiente para se apaixonar.

 

Observou os dois atentamente nos dias seguintes. Apesar das investidas de Helena, não podia deixar de admirar Tom Stills por seu controle, tratando-a como a uma aluna.

Na sexta-feira. Lisa já estava cansada de passar o dia todo inativa e sozinha. Somente durante o almoço tinha a companhia de Helena e Tom.

Seu ombro estava bem melhor, e à tarde ela resolveu nadar um pouco, na piscina. Enquanto nadava de um lado para o outro, preocupada com o retorno de Andreas, previsto para aquela noite, ela viu alguém mergulhar a seu lado.

Foi com grande alívio que viu Helena aparecer alguns metros adiante. A garota a ignorou completamente. Lisa ainda nadou mais alguns minutos antes de sair da piscina e sentar-se numa das espreguiçadeiras que havia ao redor.

Ficou observando Helena, que nadava com graça e desenvoltura. Quando finalmente ela saiu, irritou-se com os olhos de Lisa que estavam fixos nela.

— O que é que você está olhando?

— Eu?

— É, você mesma. Por que está me olhando desse jeito?

Lisa levantou-se, indiferente, e colocou seu roupão.

— Acho que você está imaginando coisas.

— Você sabe que não estou. E seu comportamento com Tom... com o sr. Stills é inconveniente

— Inconveniente? Por quê?

— Porque sim. Você está sempre tentando chamar-lhe a atenção durante o almoço falando sobre assuntos que eu desconheço.

— Acho que você está exagerando. Helena. Mencione um assunto que discutimos do qual você não tenha podido participar.

— Faculdade! Não acho certo vocês conversarem sobre isto sabendo que eu não tive esta experiência ainda.

— Acho que não fui eu quem começou este assunto.

— Tom estava apenas sendo educado. Então Lisa estava certa: Helena se referia a ele sempre como Tom, e não como sr. Stills.

— Deveria ficar contente por ele ser um homem educado... É por educação que ele me faz participar da conversa.

— Participar? Você domina a conversa, isso sim! Antes de você vir para cá, ele não precisava de nenhuma outra companhia. Está tentando tirá-lo de mim. Quer que ele se sinta atraído por você...

— Está sendo ridícula. Acho o sr. Stills uma boa companhia, e isto é tudo. Eu jamais tentaria conquistá-lo, sendo casada com seu pai.

— Eu ainda não entendi por que meu pai se casou com você, mas tenho certeza de que não foi por amor.

— Será que você já ouviu falar de desejo, Helena? — Lisa perguntou, sarcástica.

— Meu pai não sente nem desejo por você.

A resposta de Helena foi tão imediata que deixou Lisa encabulada.

— Como pode ter tanta certeza?

— Você não tem qualidades para atraí-lo.

Lisa sorriu com superioridade.

— Há apenas alguns minutos você me acusou de estar tirando Tom Stills de você e... ser bem-sucedida. Você tem que se decidir, Helena: eu sou atraente, ou não.

— Não, você não é!

— Então...

— Helena... Lisa... — Uma vos familiar chamou a atenção das duas.

— Estou contente de ver que vocês duas se tornaram amigas na minha ausência.

Lisa olhou para o marido, surpresa e corada. Ele parecia cansado, e seu olhar denotava preocupação.

— Papai! — Helena correu para ele. — Estou contente porque está de volta!

— Seu entusiasmo me deixa contente. É raro vê-la assim.

— Eu não estou entusiasmada, apenas aliviada.

— Aliviada?

— Sim, papai. Eu sinto muito lhe dizer, mas não foi minha amizade que sua mulher cultivou nos últimos dias.

— Explique-se, Helena. — Andreas olhou para Lisa e ela percebeu que ia ter problemas.

— Acho que não devo... Além disso, estou com frio. — Ela esquivou-se e, com um olhar de triunfo para Lisa, entrou na casa.

Andreas caminhou até ela, que continuava sentada.

— Será que você pode me explicar o que está havendo, Lisa?

Ela sentiu-se um pouco magoada ao ver que ele não demonstrou a menor preocupação por sua saúde.

Enquanto esperava que Lisa falasse. Andreas colocou a mão sobre a testa. Parecia que estava se sentindo mal.

— Certamente eu mereço uma resposta.

— Então vá e consiga uma de sua filha — ela falou com raiva e se recusou a continuar a conversa.

Andreas apertou-lhe rudemente o ombro, forçando-a a encostar-se nele.

— Você não se tornou nem um pouco mais amável na minha ausência. Eu gosto disso. — Sorriu, abraçando-a. — Eu gosto muito disso.

— Tire as mãos de mim!

— Com prazer. Acho que você não saiu de casa, certo?

— Como eu poderia? — Lisa falou, olhando para o tornozelo com desânimo.

— É, se não fosse por isso você estaria bem longe daqui. Temos que dar um jeito. Talvez eu possa fazê-la mudar de idéia.

— Nunca!

— Veremos. Por enquanto, acho melhor falar com Helena e saber o que aconteceu entre vocês na minha ausência.

Lisa virou o rosto recusando-se a olhar para ele. Ela podia imaginar o que Helena lhe contaria, mas não se importava. A aprovação de Andreas era a última coisa de que ela precisava ou queria.

Assim que ele a deixou. Lisa levantou-se e foi ao quarto, tomar um banho e vestir-se para o jantar.

Procurava acalmar-se, mas era inútil. Cada vez que olhava para a porta de comunicação entre os quartos, rezava para que ele não resolvesse usá-la naquela noite.

Fechou rapidamente o roupão quando percebeu que Andreas estava entrando.

— O que você quer?

— Certamente não é o que você ofereceu a um empregado meu, nestes dias em que estive ausente — ele falou furiosamente, abrindo o roupão dela. — Foi isto o que esteve oferecendo a ele?

— Não seja ridículo. Tom Stills...

— O que é que tem Tom Stills? Ao que parece, você e Helena tem o mesmo homem na cabeça.

Lisa fechou o roupão com raiva e respondeu, sarcástica:

— Não existe nenhum outro homem por aqui...

Andreas começou a andar de um lado para o outro no quarto.

— Será que isto é razão suficiente para se atirar nos braços de um estranho?

Helena realmente soubera como falar com o pai.

— Eu não me atirei nos braços de ninguém. Conversei educadamente com o sr. Tom Stills, e isto foi tudo. Se você perguntar a ele, terá a mesma resposta.

— Tenho certeza que sim. Você provavelmente o deixou tão apaixonado que ele concordará com qualquer coisa, só para não prejudicá-la. Agora ouça bem: não cuidei de você durante todos estes anos para que fosse infiel a mim depois do casamento. Principalmente não antes de eu ter usado os meus direitos de marido. Tom Stills vai embora hoje mesmo.

— Você não acha isso muito drástico?

— Sua preocupação em defendê-lo só confirma sua culpa.

— Eu não estava pensando em mim.

— Nele, então?

— Não, nem mesmo nele. — Lisa disse com voz cansada e observando disfarçadamente a reação de Andreas.

Ele lançou-lhe um olhar enviesado, mas sua voz soou mais calma:

— Então, em quem?

— Em Helena, naturalmente. — Seus olhos eram inocentes e preocupados. — Há quanto tempo você imagina que eIa está apaixonada por ele?

 

— Você só pode estar louca!

— Não estou louca, não. — Também não parecia nem um pouco preocupada com a fúria do marido.

— Como você pode continuar tranqüila ao dizer que minha filha está apaixonada por um professorzinho qualquer?

Lisa pegou a escova e começou a pentear os cabelos com calma estudada.

— Não seja tão esnobe, Andreas. Você não se casou com uma governanta? Sua filha está apenas seguindo seu exemplo. Ela simplesmente se interessou por alguém de classe inferior, exatamente como você...

Ele arrancou a escova das mãos dela e a jogou no chão.

— Você é uma víbora, apesar de pouca idade. Em tão pouco tempo já está conseguindo jogar minha filha contra mim. Mas fique sabendo que eu não sou esnobe coisa nenhuma! Só acho que Helena é uma criança...

— Para você talvez... — Calmamente Lisa pegou a escova do chão e recomeçou a pentear os cabelos. — Não se esqueça de que ela já está com dezesseis anos, Andreas. E você mesmo disse que ela vai se casar dentro de um ano.

— Mas não com Tom Stills!

— Helena é o tipo de pessoa que não aceita intromissões em sua vida. Tive oportunidade de observá-la nesta semana, e tenho certeza do que estou dizendo. Ela só vai casar com quem quiser. Jamais com o homem que você escolher.

— O marido dela já está escolhido, ela sempre soube disto.

— Saber e aceitar são duas coisas bastante diferentes. Qualquer dia você poderá acordar e descobrir que ela fugiu com Tom Stills.

— Você está querendo me dizer que ele a está encorajando?

— Não. Estou dizendo que ele está suficientemente atraído por Helena para concordar se ela o pressionar o suficiente.

— Ele terá que partir imediatamente — Andreas anunciou.

— Eu não acho que esta seja uma boa idéia.

— Por que não? — ele perguntou, e seu olhar procurava saber até onde Lisa estava envolvida.

— Porque, na minha opinião. Helena o seguiria sem pensar duas vezes.

— Ela é menor, eu a traria de volta um dia depois. Pela lei, tenho esse direito.

— Muitos vão achar que, com dezesseis anos, ela já tem idade suficiente para decidir quem quer para marido. Qualquer juiz levaria em conta o fato de você querer casá-la com um desconhecido.

— Eu não acredito no que diz. Quer que o mantenha aqui para você. Esta história sobre Helena e ele é invenção sua. Uma mentira para que Tom Stills continue aqui e vocês possam manter o caso que já começaram.

— Tudo o que estou sugerindo é que seria melhor você convidar Demitri Papalos para passar algumas semanas aqui. Deixe que Helena mantenha contato com alguém de sua idade.

— Por que você deveria se preocupar se minha filha fugir com um homem inconveniente?

— Eu não me importo nem um pouco com você. Na verdade, eu o odeio — Lisa falou com calma, sem se preocupar com a raiva que via nos olhos dele. — Acontece que eu gosto de Helena, apesar de ela ser agressiva comigo, eu detestaria ver sua vida destruída tão tolamente.

— Será que esta sugestão de trazer Demitri aqui não é apenas para ter mais um homem à sua disposição?

— Durante todos estes anos que você me vigiou, sem que eu soubesse, alguma ver dei a impressão de ser este tipo de mulher?

— Não, acho que não... Mas você pode estar fazendo isto apenas para me irritar.

— Eu lhe dou tão pouca importância, que não iria me dar a esse trabalho.

— Você vai se desculpar por isso. Agora!

— Não sou uma garotinha de dezesseis anos com quem você pode gritar desse jeito. Eu não vou pedir desculpas por falar a verdade, e você não pode me obrigar.

— Tem certeza disso?

— Bem, você não pode me mandar para o meu quarto como fez com sua filha. Eu já estou dentro dele.

— Neste ponto você está errada. Este não é o seu quarto, é o nosso. O quarto ao lado é apenas para me vestir, com uma cama de solteiro para quando eu não quiser sua companhia. — Ele deu um passo na direção dela, decidido. — Eu poderia descansar nesta cama confortável antes do jantar.

Lisa olhou para ele, amedrontada. Não era à toa que a cama era tão grande. O quarto era bastante confortável para um casal.

— Pode descansar à vontade. Eu não vou perturbá-lo — falou, dando um passo atrás.

— Mas como eu já estou bastante perturbado, e não tenho intenção de deixá-la sair...

— Olhe, sinto muito pelo que disse. — Seus olhos mostravam o medo que sentia. — Eu... eu não queria ser rude — ela falou, desesperada. Não podia mais retroceder, pois já estava encostada na parede. — Por favor, Andreas! — Odiava-se por estar implorando a ele, mas não tinha outra escolha. — Quero me vestir.

— Mais tarde. Depois nós vamos nos vestir, mas você vai tirar a minha roupa.

— Eu já pedi desculpas. Por favor, deixe-me ir.

— Suas desculpas vieram muito tarde. Lisa. — Ele acariciava-lhe os cabelos. — Eu tenho pensado neles e não acho que sejam tão feios, afinal. Na realidade, estive pensando se esse fogo é só exterior.

Andreas estava cada vez mais perto, e Lisa sentia-se enfraquecer diante do toque experiente daquelas mãos. O que havia com as caricias desse homem, que tão facilmente conseguiam despertar nela sensações novas e vibrantes?

Com os dedos, Andreas acariciava suavemente o pescoço de Lisa, mantendo a cabeça dela imóvel enquanto a beijava, exigindo que ela correspondesse.

Contra a vontade. Lisa percebeu que seus lábios não resistiam ao toque suave da língua dele e abriu a boca, permitindo que o beijo se tornasse mais íntimo e sensual.

Todo o seu corpo tremeu, e as carícias de Andreas a incendiaram.

— É, não se pode dizer que isto seja uma briga — ele murmurou, acariciando-lhe a orelha com os lábios. — Será que você resolveu facilitar as coisas?

Se ele não tivesse falado nada, teria descoberto que era muito fácil seduzi-la, mas as palavras grosseiras foram como um jato de água fria em Lisa. Ela lutou com todas as suas forças para libertar-se daqueles braços fortes.

Andreas olhou para ela com um sorriso triunfante. Lisa fechou os olhos envergonhada, enquanto ele a pegava no colo e a levava para a cama. Antes que ela soubesse o que estava acontecendo, Andreas abriu seu roupão e começou a beijar-lhe os seios, o prazer que Lisa sentiu era algo que jamais havia experimentado. Todo seu corpo parecia corresponder àquela caricia.

Andreas também estava sentindo prazer, e seus olhos mostravam isso a Lisa, sem reservas. Suas mãos continuavam a acariciar-lhe os seios, enquanto, com a boca, explorava o corpo dela, despertando novas sensações.

Lágrimas de humilhação e vergonha banhavam o rosto de Lisa. Ela estava quase nua embaixo dele; a única barreira entre eles era a roupa de Andreas.

— Eu vou odiá-lo mais ainda... — Lisa encontrou forças para murmurar, mesmo sentindo que suas pernas cediam facilmente à pressão das dele.

— Você já me odeia, e não poderá me odiar mais.

— Se você me possuir agora, jamais permitirei que você se aproxime de mim novamente.

— Eu vou tê-la quando e onde quiser — ele falou, acariciando os seios dela. — Você vai aceitar e ainda vai pedir mais... — Beijou-a novamente e Lisa não pôde evitar de corresponder.

Foi somente o som de alguém batendo na porta, por diversas vezes, que a livrou dele.

Para Lisa, foi uma interrupção bem-vinda. Mas, pelo olhar zangado de Andreas, percebeu que ele não tinha gostado.

— Sra. Vatis? — a governanta chamou.

— Eu tenho que atender, Andreas. Ela sabe que estou aqui e vai pensar que estou doente, se não abrir a porta.

Com um suspiro profundo, ele a soltou.

— Atenda.

Lisa fechou o roupão e dirigiu-se para a porta.

— Sim, sra. Hall? Desculpe a demora, mas eu... eu estava no banheiro. — Ela esperava que a mulher não notasse seus lábios inchados.

— Só queria saber se a senhora sabe onde está o sr. Vatis. Estão chamando de Atenas, e não consigo encontrá-lo.

— Estou aqui, sra. Hall. — Andreas abriu a porta e Lisa viu que ele ainda estava abotoando a camisa. — Você disse que é um chamado de Atenas?

— Sinto muito, eu... eu não sabia. — A sra. Hall olhava de um para o outro, encabulada.

— Não tem importância. — Ele saiu levando-a consigo. — A pessoa se identificou?

— É uma senhora, mas eu não perguntei o nome...

Lisa não esperou para ouvir o resto. Bateu a porta do quarto com força, tremendo de raiva. Devia ser uma das amiguinhas dele, talvez a mesma que ele visitara em sua rápida visita a Atenas, durante a semana.

Saber que provavelmente ele havia estado com outra mulher no dia anterior a deixou irritada. E o que mais a aborrecia era ter certeza de que, se a sra. Hall não batesse à porta, ela teria cedido às exigências de Andreas.

O fato de querer fazer amor com ela, tendo acabado de sair dos braços de outra mulher, era típico dele. Andreas só queria humilhá-la.

Lisa não sabia se ele pretendia voltar ao quarto depois de atender o telefone. De qualquer forma, prometeu a si mesma que não a encontraria mais nervosa quando voltasse.

Ela estava se maquiando quando Andreas voltou. Não gostou da maneira desinibida como ele entrou, mas achou melhor não reclamar. Andreas já havia deixado claro que aquele quarto era dele também.

— Vou voltar para Atenas imediatamente — ele falou, indo ao quarto conjugado pegar algumas roupas.

— Ela é tão boa assim? — Lisa disse com raiva.

— De quem você está falando?

— De sua amiga, é claro.

— Marisa? Sim, eu acho que ela é boa, muito boa.

— Graças a Deus, ela é quem vai dividir a cama com você nesta noite.

— Sim, hoje ela vai ter este privilégio. Mas não fique triste, amanhã esse privilégio será seu. Logo estarei de volta para você.

— De... de volta para mim? — Lisa perguntou tremula, vendo a maneira rápida e precisa como ele arrumava a mala.

— Sim, minha querida esposa. Já decidi que, quando eu voltar, vou passar a compartilhar este quarto com você. Tenho certeza de que vai gostar muito.

— Será?

— Pelo menos, não terá mais a expectativa de não saber quando eu vou exigir meus direitos. Além do mais, eu gostei da amostra. No próximo ano, espero que você me dê meu primeiro filho.

— Mesmo sabendo que ele será neto de um suposto assassino?

— Ele era um homem muito inteligente. Tinha um fraco por mulheres, mas isto é uma questão de educação. Sua mãe deve ter sido muito infeliz ao lado dele.

— Você quer dizer que ele já tinha outras mulheres, antes da minha mãe morrer?

— Sempre teve. Seu pai raramente levava a esposa em suas viagens, preferindo divertir-se com as mulheres que infalivelmente o perseguiam nas pistas.

— Tenho certeza de que você nunca as rejeitou, também.

— Elas eram quase como prostitutas, dando seu corpo em troca de uma cama e uma refeição.

— Você não respondeu à minha pergunta.

— Eu não sabia que você tinha feito uma.

— Pois bem, estou fazendo agora: quantas dessas mulheres você levou para a cama?

— Depois do meu casamento, nenhuma... Antes, saí com algumas delas.

— Você não teve nenhuma amante enquanto esteve casado.

— Nenhuma.

— Quer dizer que você não tinha amigas?

— Não. E, se você tivesse conhecido Gina, entenderia por quê.

— Sei. — Lisa falou baixinho.

— Não, você não sabe. Minha mulher era americana. Ela não teria o menor escrúpulo em causar um escândalo, se desconfiasse de algum caso.

— E como é que você sabe que eu não farei o mesmo?

— Porque, se o fizer, eu a coloco nos joelhos e lhe dou algumas palmadas.

— Não se preocupe, eu não me incomodo nem um pouco com quem você dorme.

— Mesmo que seja você?

É claro que sim, pensou Lisa, estremecendo, isso destruiria definitivamente suas ilusões de um casamento por amor.

— Eu posso notar por sua expressão, que isso a incomoda. Não se preocupe, Lisa, logo você vai descobrir como é bom estar nos braços de um homem.

Ele tirou a camisa, sem se preocupar com o constrangimento dela, escolheu outra e vestiu-a calmamente.

— Tente aproximar-se de Helena enquanto estou fora. Eu gostaria que vocês se tornassem amigas. Acho que já percebeu que ela pode se tornar uma adversária tão temível quanto eu, não é?

— E sobre Tom Stills?

— Por enquanto, ele fica. Helena vai precisar dele nas próximas semanas, pelo menos até os exames. Mas se ele tentar se aproximar de você, mando-o embora na hora. Não vou querer uma segunda mulher com moral de uma prostituta.

— Sua mulher era infiel?

— Não até que seu pai apareceu. As pessoas gregas não costumam ser infiéis.

— Eu serei, se tiver uma chance.

— Pode esquecer isso, pois nunca a terá. Em poucos dias vamos para Vatis, minha ilha na Grécia.

— Sua ilha? — Ela não soube explicar o motivo de tanta surpresa. Ele era rico o suficiente para ter não apenas uma ilha, mas várias. — Você costuma ir muito para lá?

— Sempre que tenho oportunidade, embora isto não ocorra com freqüência. — Enquanto falava, ele terminava de se arrumar e Lisa ficou admirando aquele corpo moreno e sensual. — Passo mais ou menos dois meses por ano em Vatis, longe da chamada civilização.

— Quer dizer que é um lugar selvagem? — Lisa perguntou.

— Não foi isto o que eu quis dizer. Tenho casas em todas as capitais da Europa e um apartamento em Nova York, e posso dirigir minhas companhias de qualquer um desses lugares. Todas as minhas propriedades são devidamente equipadas e meus empregados viajam sempre comigo. Vatis, no entanto, é um lugar de paz e descanso. Sem empregados, com exceção daqueles que cuidam da casa, sem hóspedes inesperados e o que o mais importante, sem telefone.

— Surpreende-me que você não tenha me levado diretamente para lá, já que eu dificilmente conseguiria criar problemas num lugar como esse.

— Não causara mais problemas também aqui — ele falou com arrogância. — Para colocá-la na linha, basta que eu acuse seu pai.

Lisa lembrou da idéia que lhe havia ocorrido enquanto ele estava ausente. Se Andreas acusasse o pai dela, estaria admitindo publicamente seu casamento com a filha do homem que tentou matá-lo. Ela tinha certeza de que ele não gostaria disso.

— No que é que você está pensando?

— Só estava imaginando como alguém pode chegar à ilha, em caso de emergência. — Ainda bem que ela achou uma reposta satisfatória com rapidez.

— Já está planejando outra fuga?

— E se estiver?

— Você não iria muito longe. Tenho guardas patrulhando toda a praia, com lanchas. Em Vatis não entra ninguém sem minha autorização. O rádio só pode ser usado com meu código pessoal.

— E só você o conhece, naturalmente...

— É isso mesmo. Vamos nos preparar para partir quando eu voltar.

— Preparar-nos?

— Helena vem conosco. Alguns dias de folga, antes dos exames, não irão atrapalhar. Tom Stills vai ficar na Inglaterra.

— Eu já lhe disse que não ligo a mínima para ele.

— Parece que você não liga para nada, nem para ninguém. É tempo de mudarmos isso.

— Eu ligo para o que você está fazendo comigo! — ela gritou. — Importa-me a maneira como você fala comigo, como me trata.

— Se você está tentando apelar para o meu lado bom, acho melhor lhe dizer que não tenho esse lado. Se algum dia tive, ele foi destruído junto com a visão deste olho. — Tocou a cicatriz logo acima de seu olho direito.

— Não há nada que possa fazer a respeito disso? Eles podem fazer coisas maravilhosas hoje em dia, e...

— Nada pode ser feito. Os nervos foram totalmente destruídos. Não se preocupe, Lisa, isto não me faz menos homem.

Naturalmente ela concordou com ele. Andreas Vatis era um homem total. Se não fosse, ela não ficaria tão excitada só de olhar para ele. Isso a deixava nervosa, mas não podia controlar-se. Cada vez que ele se aproximava, ela não conseguia sequer pensar direito.

— Vou mostrar-lhe, Lisa. — Ele a puxou e, no mesmo instante, ela sentiu uma onda de calor percorrendo-lhe o corpo. Quando a beijou, Lisa perdeu a noção de tudo. — Cuide-se bem, Lisa, e quando eu voltar faremos com que este casamento seja real.

Mas ela não pretendia estar ali quando ele voltasse.

— Divirta-se com Marisa.

— Vou me divertir, com certeza. Até amanhã, minha jovem esposa.

Alguns minutos mais tarde. Helena entrou no quarto feito um furacão. Seus olhos brilhavam perigosamente.

— Então você é filha dele? A filha de James Matthews?

— Você estava escutando nossa conversa?

— É claro. Do que maneira eu poderia saber a verdade sobre você? Agora eu entendo as razões do meu pai para querer casar com você. Seu pai tirou minha mãe de nós.

— Existem sempre dois lados em cada história. Sua mãe também tirou meu pai de nós, você já pensou nisto? Que eu também tenho razões para ter ressentimentos contra vocês? Afinal, sua mãe não precisava tê-lo acompanhado se não queria. Meu pai...

— Era um mulherengo. Um conquistador barato a que nenhuma mulher resistia, solteira ou casada.

As palavras eram muito duras e adultas para uma garota como Helena. Havia só uma pessoa com quem ela as poderia ter aprendido: Andreas.

— É a opinião exagerada de um homem amargurado.

— Meu pai não é um homem amargurado. Ele teve muito desgosto com a infidelidade da minha mãe, só isso.

— Se fosse com outro homem, ele não se importaria, não é?

— Não foi o que eu quis dizer, apesar de que talvez tivesse sido mais aceitável. Minha mãe estava longe de ser a primeira mulher com quem ele teve um caso

— Foi seu pai quem lhe disse isso.

— Não era nenhum segredo.

— Se era assim, por que sua mãe foi tão estúpida deixando-se seduzir por seu charme?

— Minha mãe não era estúpida, apenas não conseguiu resistir a ele. Seu pai era bem mais velho do que ela. Impressionou-a com a experiência de vida que tinha.

— Meu pai era um homem casado.

— Eu sei disso. Ele tratava sua própria mulher de uma maneira abominável. Sei que sua mãe se matou de vergonha.

Lisa empalideceu e sentou-se na cama com medo de não poder sustentar-se.

— Você... Eu... O que você está tentando me dizer?

— Todo mundo sabe que sua mãe se suicidou. Seu pai a levou a fazer isso, por maltratá-la tanto.

— Não é possível... Eu nunca ouvi nada sobre isto. — Lisa não queria acreditar que havia ficado sem mãe tão cedo, por culpa do próprio pai.

— Ora, na época todos os jornais exploraram bastante o fato. Venha comigo, eu vou lhe provar que tudo o que estou dizendo é verdade. Você sabe por que mudaram seu sobrenome? Para que você não carregasse o nome de um assassino sem escrúpulos, como seu pai!

— Não é verdade! Eu tinha que mudar de nome porque fui adotada.

— Bobagem! Seus tios só queriam proteger você e também proteger a eles próprios. Para eles também não era interessante criar uma menina que tinha um nome tão comprometedor.

— Eles só queriam que eu me sentisse filha deles de verdade!

— E por quê, se eles já tinham os filhos deles?

— Mas eram meninos e os dois eram mais velhos que eu.

— Então, seus tios não queriam que as crianças fossem prejudicadas.

— Eu não acredito numa palavra do que você está dizendo. Minha tia era irmã da minha mãe. Ela não iria esconder uma coisa dessas de mim.

— Ah! — Helena debochou. — A maioria das pessoas faria qualquer coisa para fugir desse tipo de comentário. E você deve admitir que foi isso que aconteceu.

— Eles sempre me amaram muito.

— Mas é claro que sim. Qual outra razão eles teriam para esconder sua verdadeira identidade? Meu pai, no entanto, não foi enganado nem por um minuto.

— Eles não queriam enganar ninguém. Eles me adotaram para que eu me sentisse realmente parte da família.

— E agora você faz parte da minha! — Helena falou com ódio. — A filha do amante de minha mãe.

— Eu não acredito! E você? Não é a filha da amante de meu pai? Qual a diferença? E sabe do que mais? Eu acho que é tudo mentira, tudo invenção sua para me magoar porque você me odeia.

— Não preciso inventar nada. Já que você não acredita em mim, vou lhe mostrar algumas provas.

— Provas?

— Sim, provas. Você pensou que eu não as tinha?

— E você tem?

— Pessoalmente não, mas meu pai sim.

— Mas como...

— Ele não é nenhum tolo, Lisa. Quando descobriu que minha mãe estava tendo um caso com James Matthews, fez uma investigação completa sobre ele. A história sobre a vida desgraçada de sua mãe e sobre o suicídio foi muito bem detalhada pelos investigadores.

— E onde estão as provas que você mencionou?

— No escritório do meu pai. Eu as encontrei quando fui buscar um documento a pedido dele. Naturalmente ele mantém tudo trancado, mas eu sei onde estão as chaves.

— Imagino que sim... Afinal, tem o péssimo hábito de ouvir atrás das portas e de mexer no que não lhe diz respeito.

— Mas isto me diz respeito.

— Acho que só diz respeito a seu pai e a mim.

— Seu pai matou minha mãe e a sua também. É claro que isto me diz respeito. Sabendo o tipo de homem que ele era, minha mãe sem dúvida o achou muito atraente. O perigo a atraiu. Ele era o homem que toda mulher quer conquistar e dominar. Mas nem mesmo minha mãe conseguiu isso. Ele estava dirigindo como um louco, no momento do acidente.

— Você conseguiu todas estas informações nos jornais?

— Sim, e nos arquivos do meu pai, também.

— Talvez os investigadores tenham dito exatamente o que seu pai queria ouvir. Afinal de contas, ser abandonado daquele jeito pela mulher deve ter sido um golpe tremendo para seu orgulho.

— Venha comigo. — Sua mão fechou-se com força no braço de Lisa. — Vou mostrar-lhe tudo o que tem nos arquivos do meu pai. Você verá por si mesma que é impossível tantas pessoas mentirem juntas sobre um só homem.

Lisa não queria ir com ela. A ilusão que tinha sobre seu pai estava sendo arrancada á força de seu coração, por Helena e Andreas.

Não parecia certo entrarem no escritório dele na sua ausências, mas ela precisava saber a verdade.

Helena encontrou a chave e abriu a gaveta com decisão.

— Eu acho que...

— Com medo, Lisa?

— Não! Mas se Andreas descobrir...

— Ele vai ficar muito zangado, mas não pretendo contar-lhe. E, se você contar, vai apenas aumentar a raiva dele. Papai odeia você, não é?

— Será que é tão evidente assim?

— Claro que é! Aqui está, divirta-se. — Entregou uma pasta a Lisa, e caminhou para a porta.

— Aonde você vai?

— Eu posso não gostar de você... Na realidade, acho que detesto você. Mas se tivesse que ler coisas como estas a respeito do meu pai, preferiria ficar só. Coloque a pasta no lugar quando terminar. Você sabe onde deve deixar a chave, não é?

Depois que Helena saiu, Lisa olhou fixamente para a pasta durante alguns minutos, antes de se decidir a abri-la.

Não havia como tentar esconder a verdade: agora via, a cada página, fotos cada vez mais degradantes de seu pai. As reportagens nos jornais eram mais horríveis ainda, com insinuações de que sua mãe estivera doente e que ele a tinha abandonado. Ela teria sofrido tanto que perdeu o desejo de viver.

Lisa sentia-se arrasada. Com um pai com esse passado, que tipo de pessoa seria ela?

 

A viagem de trem foi longa e cansativa. Lisa, chegou a Londres abatida, mas disposta a só ficar ali uma noite. No dia seguinte iria para a Escócia. Seus tios eram as únicas pessoas no mundo que poderiam responder às suas perguntas.

Não tinha sido muito difícil sair de casa. Conseguiu fugir antes que as pessoas da casa levantassem. Havia pegado uma carona com um casal, não muito longe de casa.

Agora estava em Londres, e foi diretamente a seu antigo apartamento, onde tinha certeza de que poderia passar a noite.

Felizmente, Lindy estava sozinha, pois Chris viajara a serviço por alguns dias.

— Desistiu do emprego? — a amiga perguntou, preocupada.

— Não, o serviço é muito bom... — Lisa preferiu mentir, pois não queria explicar tudo o que tinha acontecido. — Eu vou passar alguns dias com meus tios, na Escócia.

— Já está de folga?

— É que... que eles viajaram e me deram alguns dias para ver meus tios. Faz muito tempo que não os vejo.

— O sr. Western deve ser muito bom patrão. Não é sempre que se consegue um serviço assim.

— Sim, ele é muito bom. Como é que estão se saindo você dois, morando juntos?

— É muito cedo para dizer. Ele viajou ontem. Acho que vou ficar louca se ficar mais uma noite sozinha.

— Muito obrigada! — Lisa falou, irônica.

— Você sabe o que eu quero disser. Puxa, que anel bonito! — Ela se aproximou para ver o anel que Lisa tinha na mão esquerda. — Parece de verdade.

— Mas não é. Eu o comprei num bazar. É somente uma bijuteria.

Era uma das jóias da família que Andreas lhe dera e Lisa havia esquecido de tirá-la.

— Mesmo assim, é lindo. Pomo experimentar?

— É claro.

— É realmente maravilhoso. — Lindy o admirou em sua mão. — Será que você poderia comprar um para mim, quando voltar lá?

— Sim, se ainda tiver algum. Posso ficar aqui esta noite?

— Ora, Lisa, que pergunta. Você será sempre bem-vinda aqui. Pode ficar no seu velho quarto. Jogue as coisas de Chris no chão e acomode-se.

— Ele está mesmo dormindo lá?

— Muito contra a vontade. Eu penso que ele não acreditou muito, quando eu disse que ficaríamos em quartos separados..

— Coitado dele...

— Acho que já se acostumou... Bem, vou preparar o jantar enquanto você se acomoda.

Elas passaram uma noite agradável, embora Lisa temesse que a qualquer momento Andreas pudesse chegar para levá-la de volta.

Ninguém foi até o apartamento naquela noite, e ela pôde partir mais tranqüila na manhã seguinte.

Era uma longa viagem de trem, mas Lisa estava feliz, pois gostava muito de tia Edith. Finalmente chegou e, quando desceu do táxi na frente da casa, sorriu, feliz por estar ali. Bateu na porta e esperou, ansiosa.

— Lisa, querida! — Tia Edith abriu os braços, sorrindo. — Entre.

Lisa entregou-lhe uma caixa de chocolates. A tia adorava doces.

— Você não devia, querida. Muito obrigada. São meus preferidos. Pode deixar sua mala aqui... Vamos para a sala tomar uma xícara de chá.

— Tio Fred e os rapazes estão em casa?

— Sim, estamos todos na sala de visitas.

— Você não parece muito surpresa por me ver.

— Não. Bem... Vamos para a sala. Acabei de servir o chá.

— Sim, mas... — A tia já havia aberto a porta, e ela não teve outra alternativa senão segui-la. — Tia Edith, o que... — Lisa parou, empalidecendo Sentado ao lado de seu tio, estava Andreas Vatis. — Você!

— Lisa... — ele falou delicadamente, levantando-se.

— Mas, eu... Como você chegou até aqui? — ela perguntou, sentindo-se num pesadelo.

— Eu vim de avião — Andreas disse, antes de voltar-se para a tia dela. — Espero que a senhora não me julgue impertinente se lhe pedir para falar com Lisa em particular.

— Naturalmente, vocês podem...

— Tia Edith! Será que você não sabe quem é ele?

— Eu já me apresentei. Lisa.

— Como se isto fosse necessário! — tio Fred murmurou.

— Mas, ele...

— Se nós pudéssemos falar só por alguns minutos...

— Leve-o para a sala de jantar, Lisa.

— Mas, tia...

— Venha, Lisa. — Andreas segurou-a firmemente pelo braço. — Não devemos embaraçar sua família com uma discussão particular.

— O que é que você esta fazendo aqui? — ela perguntou assim que Andreas fechou a porta.

— Estou aqui para levar minha mulher de volta para casa.

— Já estou em casa. Esta é minha família.

— Sou sua família. Você é minha esposa, seu lugar é a meu lado.

— Mesmo que eu não queira?

— Mesmo que você não queira.

— Largue o meu braço! Eu não estou pretendendo fugir. Você é que não tinha que estar aqui sem ser convidado.

— Nós dois somos hóspedes de seus tios. Eles me receberam muito bem e não ficaram tão horrorizados como você imagina, quando souberam do nosso casamento.

— Como é que você sabia onde me encontrar?

— Sendo eles seus únicos parentes, não foi muito difícil.

— Mas por que eles o receberam? Se sabem quem é você...

— Eles sabem de tudo, sim. Sabem muito mais do que eu imaginava. Mesmo assim, não lhe disseram nada sobre o passado.

— Não, isso foi deixado para sua filha.

— Eu sei, embora Helena agora tenha motivos de sobra para se arrepender disso.

Lisa estremeceu com o tom gelado daquelas palavras.

— O que você fez com ela?

— Nada. — Ele pareceu surpreso com a pergunta.

— Não acredito! Você... Você...

— Você vai descobrir que existem outras maneiras de puni-la, sem ser físicas, que podem surtir mais afeito. Ela está em Vatis.

— Sua ilha?

— Exatamente. Um lugar onde ela não causará problemas a ninguém.

— E Tom Stills?

— Está na Cornualha. Acho que o castigo é perfeito para ela. Helena fez com que você fugisse de mim e eu a levei para longe do homem por quem ela acredita estar apaixonada.

— Você acredita em mim, agora?

— A cena que Helena aprontou quando lhe comuniquei que ia para Vatis foi mais do que suficiente para provar sua teoria. Algum dia ela vai lhe agradecer por ter sido uma madrasta tão cuidadosa.

— Duvido muito.

— Mas ela fará isso, um dia. Quanto a mim, agradeço-lhe agora. Nunca me ocorreu que isto pudesse acontecer.

Há algo errado. Lisa pensou. Ele deveria estar furioso com sua fuga, e não agradecido.

— Andreas...

— Sim. Lisa?

— Por que meus tios, ou meus primos, não o puseram para fora desta casa assim que descobriram seu nome?

— Por que fariam isso? Eu não fiz nada de mal para sua família. Se é que você não se recorda, eu é que fui a parte agredida.

— Sim, mas...

— Creio que será mais fácil para você entender por que não correram para protegê-la se eu lhe contar o que disse a eles. Contei que nós nos casamos após um namoro rápido.

— Teria que ser mesmo, pois apenas duas semanas atrás eu telefonei para eles e nào falei nada sobre você.

— Foi o que imaginei. Assim, expliquei a seus tios que você só descobriu a trágica relação entre seu pai e eu ontem, ficou muito envergonhada e por isso fugiu.

— E eles acreditaram?

— Por que não?

— Porque... Bem, porque...

— Você está envergonhada, não é?

— Sim! Oh, Deus! Como me sinto mal com tudo isso. Todos aqueles jornais, reportagens, fotos, histórias...

— Na maioria, eles contam só historias mesmo. Não importa o que aqueles jornalistas ou Helena tenham dito, mas quero que saiba que sua mãe não se suicidou. Admito que seu pai a fez muito infeliz, mas ela não era mulher para desistir tão fácil. Ela era uma mulher forte, como você — completou gentilmente.

— Por que você está me dizendo tudo isto? Deveria estar satisfeito com a minha tristeza. Afinal, não foi para isso que me forçou a este casamento?

— Acalme-se. Não me casei com você para puni-la, pelo contrário, lembro que falei que pretendia fazê-la muito feliz.

— Em algumas coisas, apenas.

— Talvez mais tarde nós até nos preocupemos com o bem-estar um do outro, não é?

— Duvido muito — Lisa falou com tristeza, tentando controlar a atração que sentia por Andreas.

— Bem, será melhor esquecermos toda esta historia e tentarmos fazer nossa vida juntos o mais agradável possível.

— Eu não quero você e nem acredito que você me queira. Não com o tipo de pais que eu tive.

— Não havia nada de errado com seus pais. James era egoísta, presunçoso e mulherengo, mas esses defeitos não são hereditários. Sua mãe, uma mulher adorável, só que casou com o homem errado.

— Por que você mudou sua opinião sobre mim tão de repente — ela perguntou, cheia de suspeitas. — Eu pensei que quisesse me fazer sofrer, e tenho certeza de que Helena acreditava que estava lhe fazendo um favor quando me mostrou aquela pasta.

— Pois tenho certeza que não. Ela estava pensando apenas em si mesma quando tentou afastá-la de Tom Stills. Mas não se preocupe, de agora em diante, ela vai aprender a respeitá-la.

— Eu não posso acreditar nisso.

— Não se preocupe, eu cuidarei disso. Agora vamos para a sala, para tranqüilizarmos seus tios antes de partirmos.

— Eu não quero partir.

— Mas nós não podemos ficar aqui!

— Nós não podemos, você está certo, mas eu posso.

— Sendo minha mulher, seu lugar é a meu lado. Lembre-se de que ainda posso usar aquele material que você viu.

Ela não pôde deixar de sorrir ao lhe perguntar se ele não se importava em ser envolvido em outro escândalo, agora que estava tudo esquecido pelo público.

— Não me importaria, e poderia também dizer que fui enganado por você. Poderia dizer que usou um nome falso para me fazer casar com você. Posso garantir que seria o seu nome, e não o meu, que sofreria mais. Você quer isso?

— Por quê, Andreas? Por que você insisti em continuar com isto? Posso lhe assegurar que já estou sofrendo muito. Será que isto não é suficiente para você?

— Eu já lhe disse que não quero que você sofra. Gostaria que aceitasse a idéia de que é minha esposa, que aprendesse a ser uma mulher de verdade a meu lado e uma boa mãe para meus filhos.

— Não! Não, Andreas, eu quero ficar aqui.

— Muito bem, você poderá ficar...

— Oh, obrigada! — Seus olhos brilharam de emoção mal podendo acreditar no que ele havia dito.

— Você não me deixou terminar... Você poderá ficar até amanhã.

— Oh, mas...

—-Eu vou ficar também.

— Você! Mas, não pode! Não o quero aqui!

— Então, nós dois partiremos. É simples, Lisa. Você é minha mulher. Se ficar, também ficarei. Caso não saiba, sua tia já me convidou. Recusei, mas acho melhor ficarmos, pois você me parece bastante cansada. Talvez isso a ajude a aceitar o nosso casamento.

— Eu nunca serei capaz de aceitá-lo. Nunca!

— Por que briga tanto comigo? — A mão forte moveu-se para acariciar suavemente a face pálida de Lisa. — Não quero machucá-la, mas se você continuar agindo assim não terei escolha.

Mais uma vez. Lisa ficou paralisada com as sensações que a dominaram quando Andreas a tocou. Quando ele a fitava daquele modo vencia todas as suas resistências.

— Eu não quero brigar, mas...

— Então não o faça... — Ele a puxou suavemente, abraçando-a e fazendo-a deitar a cabeça em seu ombro. — Você gosta de estar nos meus braços, não é?

Ouviram uma batida na porta e, logo em seguida, tia Edith entrou. Sua expressão suavizou-se quando viu Lisa nos braços de Andreas.

— Sinto interrompê-los, mas vou preparar o jantar e, apesar de ter dito que não iam ficar, sr. Vatis, eu...

— Andreas, por favor — ele a corrigiu, sorrindo. — E gostaria de saber se não haveria problemas se Lisa e eu ficássemos não só para o jantar, mas também para dormir. Ela está muito cansada, e dificilmente poderia enfrentar a viagem de volta ainda hoje.

— Nós ficaríamos honrados em hospedá-los. Vocês poderão ficar com o quarto de Donald... Lisa sabe onde é.

— For favor... — Lisa começou.

Mas já era tarde, a tia já saía para preparar o jantar. Não lhe havia ocorrido que teria de compartilhar o quarto com Andreas. Seus tios nem de longe imaginavam as circunstâncias de seu casamento, e estranhariam se os dois ficassem em quartos separados.

— Não se preocupe tanto. Lisa. — Andreas estava se divertindo com sua expressão assustada. — Este não é o lugar adequado para a consumação do nosso casamento. Quando isto acontecer, quero estar completamente a sós com você.

— Mas nós vamos ter que dormir na mesma cama! — Lisa sentiu as faces corarem assim que acabou de falar.

— Eu não sou impetuoso assim. Posso muito bem passar uma noite ao lado de uma mulher sem tocá-la.

Parecia estar tudo bem entre eles, mas Lisa ficou tensa durante todo o jantar e adiou ao máximo o momento de retirar-se.

Tentou, por diversas vezes, chamar a atenção de sua tia para conversarem a sós, mas Andreas estava atento, e ela acabou desistindo. Finalmente, despediu-se de todos e anunciou sua vontade de subir e descansar.

— Eu vou em seguida, querida — Andreas disse com carinho, antes de voltar-se para continuar o assunto que discutia com o tio e os primos dela.

— Não vamos segurá-lo muito tempo. Lisa — seu tio falou, dando-lhe uma piscada marota.

Lisa estava surpresa com a maneira fácil e simpática com que ele se adaptava às maneiras simples de seus tios. Desconhecia este lado de Andreas e estava confusa. Será que ele não era o homem frio e cruel que ela achava que fosse?

Tomou um banho rápido e deitou-se, agradecendo a Deus pela cama ser suficientemente grande para dois.

Quando ouviu passos na escada, fechou os olhos e fingiu estar dormindo. Era horrível, e ela temia que Andreas notasse sua agitação.

Ouviu o "clique" da luz e logo sentiu que ele se deitava a seu lado. Pelo menos agora podia relaxar, pois Andreas não podia vê-la. O perfume da loção de barba que ele usava entrava pelo seu nariz. Por mais que tentasse, não conseguia se acalmar.

— Andreas.

— Você não está conseguindo dormir? — perguntou, a voz suave e terna.

— Eu... eu devo estar muito cansada.

— Você gostaria que eu a aquecesse?

— Não! Eu... eu estarei dormindo em alguns minutos.

— Se você me deixar aquecê-la, vai relaxar mais depressa.

— Eu acho que não.

Será exatamente o contrário, ela pensou, imaginando o que aconteceria se ele a abraçasse agora.

— Você deveria ao menos tentar. Seus dentes estão batendo de frio.

— Não precisa. Já disse que estou bem.

— Seu primo, muito gentilmente, me emprestou um pijama, se é isto o que a preocupa.

— Sim... Quero dizer, não... Você usa pijama normalmente?

— Não. Venha cá. — Ele a puxou delicadamente e, colocando a cabeça de Lisa junto a seu ombro, abraçou-a pela cintura. — Está melhor agora?

Andreas falava com ternura, e Lisa estremeceu de encontro ao peito nu.

Ele podia ter aceitado o pijama de Paul, mas só estava usando a calça.

— Sim — respondeu baixinho.

— Já lhe disse que não iria magoá-la. Você duvidou de minha palavra?

— Não, é claro que não.

Andreas acomodou-se melhor, ainda abraçando-a com carinho.

— Boa noite. Lisa.

— Você acha que será uma boa noite para nós?

— Sim, eu já estou quase dormindo. Relaxe e durma, pois temos um longo dia pela frente.

Pouco depois, a respiração calma indicou que ele havia adormecido, mas, quando ela tentou se afastar, Andreas abraçou-a com mais força.

Lisa ainda estava nos braços dele quando acordou na manhã seguinte. Abriu os olhos e encontrou-o debruçado sobre ela, observando-a com curiosidade.

— No futuro, você vai dormir do meu lado esquerdo.

— Por quê? — Sua voz era pouco mais que um murmúrio, revelando o medo de qualquer noite que passassem juntos no futuro. Sabia que não seria tão inocente quanto aquela.

— Porque não posso vê-la deste lado. — Ele sentou-se, colocando os pés no chão.

— Sinto muito, eu me esqueci.

Ele colocou o paletó do pijama quando ouviu baterem à porta.

— Entre.

Tia Edith entrou com uma bandeja com suco de laranja.

— Espero não ter vindo muito cedo.

— De maneira alguma. — Ele deu a ela um sorriso cativante. — Lisa e eu não podemos sair muito tarde.

— Vou preparar um café reforçado para vocês. Assim que estiverem prontos, desçam para que eu possa servi-los em seguida.

— Para mim não precisa, tia Edith.

— Tenho certeza de que ela vai comer alguma coisa — Andreas falou, sério. — Temos uma longa viagem pela frente, Lisa. Você não deve viajar com o estômago vazio.

— Está bem, vou comer algumas torradas.

— Estarei esperando por vocês.

— Ela é adorável.

— Eu também acho. Sinto muito ter esquecido sobre seu olho.

— Lembro que Helena queria que eu usasse um tapa-olho, há algum tempo. Eu me recusei, pois ficaria parecendo um pirata. Tenho certeza de que casando com você eu me portei como tal, não é?

— Nem tanto. — Ela tomou um gole do suco, evitando olhar para ele. — E fico contente que você não use um tapa-olho. Acho que só é necessário quando o olho está desfigurado, o que não é o seu caso. Como você deve ter notado, eu não tinha percebido qual era o olho machucado.

— Exceto pela cicatriz.

— Quase nem se nota.

— Mesmo assim, você vai dormir do meu lado esquerdo. Pode não ser visível, mas eu não enxergo com este olho aqui.

— Acho melhor nos vestirmos.

— Você quer que eu use o banheiro primeiro?

— Uma vez que ninguém mais na família o esteja ocupando... Pobre Andreas, não é nada do que você está acostumado.

— Apreciei minha estada aqui. O pessoal é muito simpático.

— Concordo. Tenho certeza de que o tio Fred não vai se importar se você usar seu barbeador.

— Talvez tenha sido bom não termos feito amor esta noite. Minha barba poderia machucar sua pele delicada.

A camisola era de algodão e Lisa não poderia estar mais vestida... No entanto, sentiu-se nua.

— Acho que acabaram de sair do banheiro — ela murmurou.

— Pobre Lisa, vou deixá-la sozinha.

Ela aproveitou para se vestir. Estava arrumando a cama quando Andreas voltou. Sentiu-se ruborizada ao perceber que havia marca de apenas uma cabeça nos travesseiros, pois ela havia dormido abraçada com ele.

— Acho melhor se apressar. Sua tia acabou de me avisar que o café está pronto.

 

Andreas já estava sentado à mesa, mas levantou-se quando ela entrou na sala.

Lisa comeu tudo que sua tia havia preparado. Sentia tristeza em deixá-los, mas sabia que Andreas jamais a deixaria ficar. Seu pai tinha destruído a vida dele e de Helena, e ela lhes devia algo. Talvez, se conseguisse ajudar Helena, também pudesse beneficiar Andreas.

Toda a família veio despedir-se deles. Lisa sentiu como se estivesse dizendo adeus para sempre. Certamente, todas as noivas sentiam-se assim quando saíam de suas casas para começar uma nova vida ao lado de seus maridos.

Eles foram de carro até o aeroporto. Andreas cuidou de tudo, enquanto ela esperava pacientemente. Finalmente, foram para o portão de embarque e dali para um pequeno avião a jato.

— É seu? — Lisa perguntou, surpresa.

— Sim.

Dentro havia lugar suficiente para doze pessoas, com todo o conforto. Andreas indicou-lhe uma poltrona e em seguida sentou-se à sua frente.

Um jovem serviu drinques e salgadinhos assim que eles se acomodaram.

— Quanto tempo vai levar para chegarmos à Cornualha?

— Cornualha? — Ele acomodou-se melhor, recusando uma nova bebida. — Nós não estamos indo para lá, Lisa. Sua tia me deu seu passaporte ontem à noite, e nós estamos a caminho da Grécia. Estamos indo para Vatis.

 

— Por que você não pediu o passaporte para mim? Por que esperou que eu saísse para pedir à minha tia?

— Você estava cansada, ontem. Achei melhor não a incomodar.

— Não, você não falou nada porque sabia que eu desconfiaria.

— Eu acho que nós já combinamos parar de discutir. Lisa...

— Você decidiu que eu não devia mais discutir com você. Você pensa que eu sou objeto de sua propriedade. Sem idéias, sem vontade, sem nada...

— Eu já lhe disse que preciso ir a Vatis. Helena está lá.

— Sim, mas...

— Ela está lá com Demitri.

— O rapaz com quem você quer que ela case?

— Sim. Eles ainda não estão noivos, mas logo ficarão. Eu o trouxe de Atenas e mandei Clive com eles para servir de acompanhante.

— Qual a desculpa que você deu para explicar a minha ausência?

Podia imaginar o quanto ele havia ficado furioso quando chegou em casa com um convidado e descobriu que ela havia fugido.

— Mandei que Helena explicasse a eles que surgira um problema em sua família e que você precisou passar uns dias com sua tia. Não havia razão para não acreditarem nisso.

De qualquer maneira, ele não tinha gostado da fuga. E mostrou isso claramente durante o resto da viagem. Conversou educadamente e falou sobre Vatis, porém sem lhe dar a mesma atenção que havia dado na casa da tia.

Do pequeno jato eles passaram para um helicóptero. Lisa sentiu-se mal durante a viagem, mas Andreas conversou o tempo todo com o piloto, parecendo não notar sua tensão e mal-estar.

Quando avistaram a ilha, Andreas mostrou-se animado e Lisa logo entendeu por quê. Era uma ilha bastante extensa e quase que totalmente arborizada. Sobrevoaram a casa, uma magnífica construção de dois andares, mais uma casa de hóspedes, seguida pelo campo de aterrissagem e o hangar para o helicóptero.

Lisa sabia que havia se casado com um homem rico que comandava um verdadeiro império, formado por suas indústrias. Mas vendo-o ali, em seu próprio país, em sua própria ilha, ela pode perceber o quanto ele era importante. Pela primeira vez, sentiu-se muito inferior a ele.

— Você esta bem? — Andreas perguntou, quando já estavam no carro que os levaria para casa.

— Sim — ela respondeu asperamente.

— A viagem de helicóptero deixou-a enjoada?

— Um pouco. — Porem a maneira servil dos habitantes da ilha a incomodou muito mais. Primeiro o piloto, depois o motorista e finalmente a mulher gorda e sorridente que os recebeu.

Andreas a apresentou dizendo que ela cuidava da casa. Seu nome era Sophia e ela falava um inglês razoável.

— Sophia toma conta de mim desde criança, é como uma mãe.

Lisa corou, sentindo que a última frase soava como uma advertência, para que não fosse rude com aquela mulher. Como se esperasse isso dela.

— Fico feliz em conhecê-la, Sophia. Diga-me, o que é este cheiro delicioso que está no ar?

— Deve ser laranja e limão, kyria. Existem centenas deles na ilha.

— Ainda bem que está fresco aqui dentro. Sei que você me avisou que estaria quente ela sorriu para ele com visível esforço —, mas não pensei que seria tanto assim.

— Poderemos ir até a praia mais tarde, se você não estiver muito cansada. — O calor em sua voz mostrava que estava contente com o comportamento dela. — Como minha filha não veio nos receber, imagino que deva estar no banho.

— Estou aqui, papai. — Helena se aproximou, parecendo muito estranha com aquelas roupas severas que usava.

Eles se abraçaram, e Andreas sorriu.

— Você parece mais contente em me ver do que há dois dias. Helena.

— Não é justo você ficar lembrando isso. — Ela estava bastante embaraçada

— Cumprimente sua madrasta... respeitosamente. — Ele a virou para que pudesse falar com Lisa.

— Você parece bem. Lis... mamãe. Como foi a viagem? — Seus olhos desafiavam Lisa.

— Muito boa. — Lisa não pôde deixar de sorrir. — Você já conseguiu um lindo bronzeado.

— Eu já sou naturalmente morena — Helena falou rapidamente. — Você precisa ver Clive, papai, parece uma lagosta.

— Você o convenceu a ir à praia?

— Bem, como Demitri e eu queríamos esquiar, ele teve que ir para dirigir a lancha. Além disso, ele não poderia nos deixar a sós, não é mesmo?

— Qualquer dia desses, Helena, vou lhe dar umas boas palmadas. Você sabe muito bem que Clive não pode tomar sol. Ele só pode ficar ao sol por alguns minutos.

— Mas você disse que eu precisava conhecer melhor Demitri!

Nesse momento. Clive entrou na sala. Ele realmente parecia uma lagosta! Havia um rapaz com ele, da idade de Lisa. Era alto e moreno como Andreas, mas não tinha o mesmo charme.

— Clive, você não devia guiar-se pela cabeça de Lisa.

— Mas eles queriam esquiar e achei melhor acompanhá-los. Será que agora que você está aqui eu posso voltar para Atenas?

— Sim. Se você quiser pode ir agora mesmo. Diga ao piloto para deixar o helicóptero preparado para você.

— Posso mesmo partir agora?

— É claro. Ponha-se a caminho antes que fique muito tarde.

— Desculpe-me, sra. Vatis, eu gosto de calor, mas não posso ficar exposto ao sol, e, além disso, aqui não há muito o que fazer.

Lisa sorriu compreensiva.

— Não se atrase por minha causa. Sei que você está ansioso para partir.

— Você sabe onde me encontrar, caso precise — Andreas disse, antes de Clive sair da sala. — E agora. Helena, o que você fez além de atormentar o pobre do Clive?

— As coisas usuais: nadei, tomei sol, esquiei...

— E você, Demitri, está se divertindo?

— Sim, muito. — Ele se voltou gentilmente para Lisa. — Congratulações pelo seu recente casamento, sra. Vatis.

— Parece que com toda essa confusão acabei me esquecendo as boas maneiras. Desculpem-me, não apresentei vocês.

Ele fez as apresentações necessárias, observando Lisa atentamente. Ela havia trocado de roupa no avião, mas mesmo assim estava sentindo muito calor.

— Será que eu poderia ir ao meu quarto? — pediu suavemente para Andreas.

— Eu subo com você. Nós precisamos de uma ducha e de roupas mais leves.

Dizendo isso, Andreas conduziu-a pelo maravilhoso saguão de entrada, em direção à escada.

— Não é o seu quarto. Lisa — ele falou delicadamente. — Aqui nós vamos ficar no mesmo quarto. Não tem quarto de vestir com uma cama extra. Sophia e os outros empregados não entenderiam isto. Na Grécia, um casal nunca dorme separado.

Isso não era surpresa para ela; ele a tinha avisado. Mas o quarto a surpreendeu. Lisa nunca tinha visto uma cama tão grande, a não ser no cinema. Era realmente um quarto bem decorado, com toda a mobília combinando, tanto em estilo quanto nas cores suaves. Ela andou de um lado para o outro, tocando vez por outra nas coisas, como para certificar-se de que eram reais. Quando olhou para Andreas, estava com os olhos brilhando.

— É maravilhoso!

— Você realmente gostou?

— Oh, mas é claro!

— Sophia vai ficar feliz. Os empregados trabalharam bastante, para que o quarto ficasse pronto para você.

— Para... para mim?

— Uma noiva merece um quarto novo. Deve ser um que agrade de todas as maneiras. Eu sabia que este era o quarto para você, desde a primeira vez em que o vi.

— Mas a mobília, as cortinas... Como... como você...

— Vieram de barco. Não foi fácil, posso lhe assegurar.

— É realmente muito bonito — ela repetiu, feliz.

— Fico contente que tenha gostado.

Será que era só sua imaginação, ou Andreas parecia ligeiramente desapontado com a sua reação? O que esperava, que ela se jogasse nos braços dele, agradecida?

— Você gostaria de usar o banheiro primeiro? — ela perguntou indecisa. — Eu... eu gostaria de me deitar um pouco.

— Você não está se sentindo bem?

Ela estava se sentindo horrível! Que tipo de homem era seu marido? Até ontem, tinha sido tão cruel quanto possível com ela; com seus tios fora gentil e educado, e agora em Vatis estava diferente outra vez. Parecia que perdera toda a rudeza, e que os problemas que constantemente o afligiam haviam ficado na Inglaterra. Em Vatis, era apenas um homem como qualquer outro, querendo se divertir... Pelo menos, esperava que ele não quisesse que ela o divertisse.

— Eu nunca havia entrado num helicóptero antes.

— Você ainda está com enjôo?

— Sim.

Ele puxou as cortinas e o quarto ficou na penumbra.

— Descanse. Tomar sol agora poderá fazê-la piorar. Quer que eu lhe faça companhia?

— Eu... não. Por favor, eu...

— Aqui está Christina, com um suco de laranja fresquinho — ele a interrompeu, sorrindo para a garota que tinha acabado de entrar.

— É bom tê-lo de volta, kyrie. — Seus olhos voltaram-se para Lisa e admiraram os seus cabelos avermelhados. — Bem-vinda, kyria. — Parecia hipnotizada pêlos cabelos de Lisa, saiu do quarto vagarosamente.

— O que é que ela...

— Christina provavelmente pensa que eu casei com uma deusa. Ela nunca saiu de Vatis... A cor de seus cabelos é novidade para ela. Alem disso, ela estava embaraçada porque, vendo as cortinas fechadas, deve ter imaginado que nós dois tínhamos outros planos.

— Não com Helena e Demitri lá embaixo nos esperando.

— Eu não me importaria nem um pouco com quem estive lá embaixo me esperando, se quisesse fazer amor com você — ele falou com arrogância. — Você tem sorte, pois uma viagem como esta geralmente me deixa pouco disposto.

Ele tirou a camisa e começou a tirar a calça. Sua expressão mudou quando percebeu que Lisa parecia assustada.

— Você não pretende que eu tome banho vestido, não é?

— É claro que não. — Virou as costas para ele, abalada com a visão daquele corpo. Como aquele lugar era diferente da casa de seus tios! Ela tentou se ocupar, colocando um pouco de suco num dos copos. — Você quer um pouco? — Continuou de costas, saboreando o suco de laranja que tinha nas mãos.

— Agora não. Você já pode virar-se, estou decentemente trajado.

Decente não era o termo que ela usaria para descrever a maneira como ele estava vestido. Tinha apenas uma toalha verde enrolada na cintura, mal chegando à metade das coxas. O bronzeado de seu corpo era por igual, e Lisa ficou imaginando se ele tomava sol nu.

Ele parecia irritado com o silêncio dela.

— A nudez não deve envergonhar ninguém.

— Eu não estou com vergonha!

— Então por que ficou de costas?

— Porque... porque tudo isso é estranho para mim.

— Então já é hora de se tornar familiar. — Ele se aproximou e o aroma de sua colônia chegou até ela.

Lisa passou a língua nos lábios e sentiu que tremia.

— Eu pensei que você tinha dito que a viagem de avião fazia... não fazia nada para você... quer dizer, quanto a...

— Não precisa tremer tanto, Lisa. Você não tem razão para ter medo de mim. Mas acho bom adverti-la de que aqui não tem ninguém para me emprestar um pijama.

 

Ela fingiu dormir quando Andreas voltou ao quarto e, quando ele finalmente saiu, relaxou e realmente dormiu.

Acordou com o riso alegre de Helena e levou alguns minutos para coordenar os pensamentos. Finalmente, levantou-se e abriu as cortinas que davam para o balcão. Logo abaixo, deitados na areia, estavam Helena e o pai. Ela usava um maio estranho para a idade. Lisa pensou que precisaria falar com Andreas sobre as roupas de Helena.

Certa de que não estava sendo vista. Lisa ficou observando Andreas. Parecia um deus grego, com aquele corpo perfeito e aquela pele lisa. Não havia dúvida, ele era um homem muito atraente e isso a assustava. Ficou ali, parada, admirando o homem com quem havia se casado contra a vontade. De repente, como se tivesse sentido o olhar dela, Andreas virou-se em direção à janela. Lisa afastou-se o mais rápido que pôde.

O descanso lhe havia feito muito bem. Mas, quando foi surpreendida por Andreas, a palidez voltou ao seu rosto. Não se conformava com o fato de estar apaixonada por um homem que se casara com ela por vingança. Um homem que a odiava. Como ele riria se descobrisse os seus sentimentos! Aí, sim, a vingança estaria completa e o orgulho dele inteiramente satisfeito.

Alguém bateu na porta e Lisa deu um pulo. Não devia ser Andreas, ele dificilmente bateria antes de entrar em seu próprio quarto.

— Entre.

Era Christina, que se dirigiu a ela timidamente.

— O Kyrie mandou perguntar se a senhora não quer se juntar a eles na praia.

— Obrigada. Você fala um inglês excelente, Christina.

Então ele me viu, pensou Lisa. Estava nervosa, mas tentou conversar com a garota, ansiosa para ser bem aceita pêlos empregados.

— O Kyrie ensinou Vick e ele me ensinou. Vick é o piloto do helicóptero que trouxe vocês de Atenas para cá. Eu sou filha de Sophia e Vick é meu marido, kyria. Em setembro, teremos um bebê. Posso dizer ao kyrie que vai descer em seguida?

— Sim. Diga a ele que estarei lá em dez minutos, e parabéns pelo bebê.

Lisa entrou no banheiro, invejando Christina. Ela era realmente feliz, estava cercada de pessoas a quem amava e era correspondida. Será que Andreas ficaria orgulhoso, se um dia Lisa lhe dissesse que estava esperando um bebê, ou será que aceitaria isso como uma ocorrência natural do casamento, algo que, ela, como mulher dele, tinha o dever de lhe dar?

Um filho... Um filho de Andreas Que pensamento! Ela deu uma olhada em seu corpo esguio e harmonioso, imaginando-se grávida.

Ainda estava sonhando com isso quando saiu do banheiro, vestindo apenas um penhoar de seda, e assustou-se quando viu Andreas à sua frente, aparentemente esperando por ela. Sentiu as faces arderem, enquanto tentava desajeitadamente cobrir-se.

— Deixei os dois sozinhos para se conhecerem melhor. — Ele riu, vendo que Lisa continuava embaraçada.

Tentando se acalmar, ela pegou uma escova e começou a pentear os cabelos, sem perceber que seus movimentos tinham aberto o penhoar deixando seus seios quase totalmente descobertos.

— Eu pensei que era exatamente isto que eles estavam fazendo nos últimos dias. — A descoberta do amor que sentia por Andreas a deixava mais tímida ainda diante dele. Sentiu-se feliz ao imaginar como seria ficar grávida e ter um filho, mas logo acordou, sabendo que Andreas jamais iria se apaixonar por ela. Coisas como essas não acontecem na vida real... E o casamento deles estava muito longe de ser um conto de fadas.

— Eu acho que Clive levou muito a sério seu papel de acompanhante. Ele não os deixou um minuto a sós.

— Eu pensei que era assim que as coisas aconteciam na Grécia.

— Helena é só metade grega. Além disso, se Demitri deve fazê-la esquecer-se de Tom Stills, precisa ter alguns momentos a sós com ela.

— Tenho certeza de que ele não abusou de sua confiança, Andreas — Lisa falou sem se voltar, pois não tinha certeza de que conseguiria encarar o marido. — Pelo que eu sei, esta atração ou afeição jamais foi declarada.

— E nem o será.

— Demitri me parece um jovem muito atraente.

— Você acha? — Seu olhar estava cheio de suspeita.

— Eu quis dizer para Helena, não para mim.

— Desculpe, eu não tenho nenhuma razão para supor que você esteja atraída por ele.

Lisa ficou embaraçada com o pedido de desculpa, e procurou algo para falar, pois o silêncio entre eles a estava incomodando.

— Christina acabou de me dizer que está esperando um bebê.

— É mesmo? — Andreas parecia aborrecido e ela não entendia por quê. Parecia que ele esperava mais algum comentário, ou que ela concluísse o que ia dizer. — É só o que você tem a dizer?

Lisa sentiu-se perdida, sem saber que atitude tomar.

— Será que você não quer acrescentar nada à sua primeira frase?

— Eu deveria? O quê?

— Talvez você queira me acusar de ser o pai da criança.

— Mas é claro que não! Por que eu faria uma coisa dessas?

— Porque você gosta de sempre pensar o pior de mim.

— Pode ser que sim, mas não o acusaria de uma coisa dessas. Além disso, Christina parece ser uma garota muito simpática e agradável.

Ele começou a rir.

— O que é tão engraçado?

— Você. Só não pensou que eu fosse o pai do filho de Christina porque a achou uma garota boa demais para se envolver com um tipo como eu.

— E também porque ela é casada com Vick.

— Ah, então ela já conversou bastante com você?

— Ela está muito orgulhosa do marido, e do bebê também.

— Ela tem razão para estar. Ele é um ótimo rapaz e muito trabalhador. Bem, acho melhor você se vestir... Helena e Demitri já ficaram muito tempo sozinhos. Eu não gostaria que ela o afugentasse. Se Helena não gosta de alguém, nem sequer tenta ser educada.

— Já percebi. — Lisa escolheu um biquíni verde.

— Ela conseguiu mandá-la embora, mas você voltou, e Helena vai respeitá-la muito por isto.

— Não acredito muito nisto.

— Pois eu acho que sim. Apresse-se! Será que você não quer aproveitar um pouquinho do sol?

— Sim, é claro que quero, mas você... Bem... Mas você está aqui! — ela falou, desesperada.

— Como eu já lhe disse, este também é meu quarto. — Ele não fez nenhum movimento para se mover.

— Pode ser que sim, mas eu não sou nenhum tipo de teatro de variedade para ficar dando shows! — Ela passou por ele rapidamente e, batendo a porta do banheiro com força, a trancou. Mesmo assim, pôde ver o sorriso de zombaria no rosto de Andreas enquanto saía do quarto.

Helena e Demitri estavam na água, quando ela desceu. Andreas estava deitado na areia. Ela colocou a toalha ao lado dele, sentando-se sem dizer uma palavra. Começou a passar um bronzeador na pele e, quando terminou as partes onde alcançava, sentiu que alguém tirava o vidro de suas mãos.

— Vire-se, eu vou passar nas suas costas. — Andreas parecia divertir-se com a indecisão dela. — Mas eu...

— Vire-se.

Ela deitou-se de bruços, querendo fugir dali e ao mesmo tempo arrepiando-se com o toque suave das mãos de Andreas em seu corpo. Mas ele passava o óleo quase que impessoalmente, embora Lisa se sentisse cada vez mais tensa.

— Você costuma se queimar facilmente?

— Bem, eu nunca estive muito tempo exposta a um sol como este...

— Então cuide-se, e tenha sempre um bom bronzeador com você. Eu não gostaria que você se queimasse... — Ele tirou os cabelos do pescoço dela e Lisa sentiu um beijo suave sobre a pele, estremecendo sem querer diante desse gesto. Andreas riu alto, e deu um tapinha carinhoso nela. — Você é realmente um artigo de luxo, e não um show barato de variedades.

— E você pagou um preço muito alto por mim, alto até demais. — Lisa estremeceu, pensando no acidente, e em como ele devia ter-se sentido quando estava preso entre as ferragens do carro, sabendo que a qualquer momento poderia ser queimado vivo. Ela ficou pálida, imaginando que o acidente podia ter tido conseqüências mais terríveis ainda.

A expressão de Andreas era indecifrável, quando ele tornou a deitar-se em sua toalha.

— Você odeia o simples pensamento de estar casada comigo, e isto quase chega a deixá-la doente.

— Oh, não! — Ela se arrependeu imediatamente de sua negativa impulsiva. — Eu... eu só estava pensando que meu pai devia ter um péssimo caráter para feri-lo desta maneira.

— Você acredita no que lhe contei, agora?

— Sim, agora eu acredito. — Lisa deu um suspiro.

Ele pareceu hesitar, mas finalmente falou:

— Há uma coisa que eu quero lhe falar, algo que você deve saber.

— Não, deixe-me terminar, Andreas, por favor. Eu fui para a casa dos meus tios porque precisava pensar.

— Depois de tudo o que Helena lhe disse, eu não me surpreenderia.

— Não foi exatamente o que Helena disse. Foi tudo, a situação toda. Apesar de todos os relatórios que você tem, eu queria saber dos meus tios sobre... sobre meus pais e a vida que eles tiveram juntos. Mas eu ia voltar quando descobrisse a verdade.

— Para fazer da minha vida um inferno, como você prometeu?

— Não. — Ela deu um sorriso franco. — Para me tomar a esposa que você queria que eu fosse, e cuidar de Helena.

— Cuidar de mim, também?

— Não! — Ela estava preparada para humilhar-se, mas não para admitir a estupidez de ter-se apaixonado por ele. — Não — repetiu, mais calma. — Mas, quando eu cheguei à casa dos meus tios, tudo mudou.

— Você me encontrou esperando por você.

— Não foi por esta razão. Foi o amor que eu percebi nos meus tios por mim, no trabalho que dei a eles durante todos estes anos. Na proteção que me deram. No esforço que fizeram para evitar que eu me decepcionasse com meu pai. Eu percebi o quanto eles devem ter sofrido estes anos, querendo me dizer a verdade e, ao mesmo tempo, não desejando destruir meus sonhos. — Seus olhos se encheram de lágrimas. — Eu me lembro quando tinha quinze anos e desafiei meu tio Fred para uma brincadeira, dizendo que ele não era tão divertido quanto meu pai.

— E qual foi a resposta dele?

— Ele mexeu com meus cabelos e concordou comigo. Ele poderia ter dito... Talvez, durante todo o tempo, ele quisesse me dizer exatamente que tipo de homem era meu pai, na realidade. E foi por isso que não perguntei nada a eles. Não queria que soubessem que o cavaleiro do cavalo branco já estava totalmente apagado da minha mente. Mas isso iria machucá-los e eu não queria. Eu...

— Lisa...

— Eu não terminei ainda, Andréas. Por favor, deixe-me continuar. — Ela não podia sequer olhar para ele, sabendo que, se não falasse agora, nunca mais teria coragem. — É porque não quero que eles sofram mais, que eu decidi não brigar com você. Foi por esta razão que o acompanhei sem protestos. Assim, você conseguiu o que queria, Andreas: eu não vou mais lutar contra você.

— Lisa, eu acho que você deve saber...

— Puxa! — Helena deitou-se na areia ao lado deles. — Estou exausta.

— Helena, Lisa e eu estamos conversando.

A jovem ficou encabulada por alguns momentos e, olhando para Demitri, respondeu com raiva:

— Você quer que nós vamos embora?

Lisa podia entendê-la. Helena tentava agir como adulta, e apenas algumas palavras de repreensão de seu pai reduziam-na ao nível de criança outra vez. Dezesseis anos eram uma idade terrível, e ela sentia-se humilhada na frente de Demitri.

— Não é necessário. — Lisa sorriu para a garota. — Parece divertido se equilibrar numa prancha de surfe... Talvez você possa me ensinar.

— Papai sabe bem melhor do que eu. Ele ensinou Marisa no ano passado.

— Marisa? — Lisa perguntou. Sua voz soou estranha aos próprios ouvidos. Será que Andreas permitia que a filha se relacionasse com a amante dele?

— Sim, ela veio e ficou na casa de hóspedes, quando papai estava ocupado demais para ir a Atenas.

Lisa não pôde deixar de lançar um olhar de raiva para o marido.

— E ela vira para cá, agora?

— Ela possivelmente estará aqui amanhã. — Andreas interveio.

— Mas, papai...

— Foi decisão minha, Helena. — Seus olhos estavam frios.

Sua decisão! Trazer a amante para a ilha era sua decisão! Lisa não podia aceitar, não queria sequer imaginar vê-lo ao lado da mulher que parecia ocupar a maior parte de seu tempo.

Ela se levantou, agitada.

— Com licença, acho que vou dar um mergulho. — Não esperou para ver se havia alguma objeção. Correu e mergulhou na água cristalina.

Andreas ia trazer a amante, e mantê-la ali, junto dela, que, de qualquer modo, era mulher dele. Lisa só conseguia sentir-se melhor, por saber que não tinha chegado a fazer o papel de tola, confessando-lhe seu amor.

 

O jantar foi um acontecimento agradável, servido no terraço e tendo como cenário aquele mar calmo e maravilhoso. Os homens usavam roupas esportivas e Lisa optou por um dos poucos trajes de noite que trouxera. Helena, como de costume, estava vestida num estilo totalmente incoerente com sua beleza jovem. Usava um severo vestido negro que não combinava em nada com seu tom bronzeado.

Lisa conseguiu uma chance de falar com ela logo após o jantar, quando Andreas e Demitri fumavam e conversavam no terraço. As duas foram dar uma volta no jardim.

— O vestido que você está usando é muito elegante — Lisa... falou suavemente.

— Pois eu o detesto.

— Então por que usa? Por que não usa um que você gosta?

— Porque não gosto de nenhum. São todos como este. Minha tia Constantine disse que já era tempo de eu usar roupas de adulta e são estas que você já viu.

Então o mau gosto era da tia! Graças a Deus, Helena concordava com sua opinião.

— É um vestido muito bonito. Helena, para uma mulher de cinqüenta anos. talvez, mas...

— Mas não para mim — Helena concluiu. — Eu sei disso. E sei também por que você está tão preocupada, querendo que eu pareça elegante. Você quer que eu me case com Demitri, não é? Quer se livrar de mim, assim poderá ter meu pai só para você. — Dizendo isso, ela afastou-se de Lisa e caminhou rapidamente até a praia.

Lisa viu quando Andreas levantou-se para seguir a filha.

— Eu vou — ela falou, ficando agradavelmente surpresa quando ele concordou e voltou a sentar-se. — Obrigada, Andreas.

— Você deve agir como mãe, agora.

Sim, era a mãe de Helena, porém não estava preparada para ver aquela jovem bonita e caprichosa usar roupas tão impróprias para sua idade, principalmente sabendo que o pai podia comprar coisas maravilhosas para ela. Lisa sabia que teria que encontrar uma maneira de falar com Andreas sobre isso. Agora, porém, o principal era ir atrás de Helena.

Conseguiu alcançá-la quando chegava na água, e brincava com os pés.

— Eu não quero me ver livre de você, Helena, e você deve saber que, mesmo que se case, será sempre a pessoa mais importante para seu pai. — Assim como eu serei sempre a última, pensou com tristeza,

— Isto não é verdade, e você sabe. Ele já colocou você na frente. Pensei que ele não a amasse, que tinha se casado por vingança. Mas, quando você foi embora, ele saiu correndo atrás. Além disso, como castigo, me mandou para cá.

— Errei quando deixei que você me mostrasse aquelas fotos e relatórios, e seu pai tinha razão de estar zangado com nós duas.

— E o que importa isso agora? Você está aqui, não é?

— E você preferia que eu não voltasse...

— Sim! Não... Eu não sei! Estou confusa. Meu pai realmente gosta de você?

— O que é que você acha? — Lisa evitou responder, e estava começando a acreditar que Andreas tinha razão ao dizer que Helena a respeitaria por ter voltado. Mas apesar disso sabia que teria um longo caminho a percorrer antes de conseguir conquistar a garota. Ajudá-la a escolher roupas mais apropriadas seria um bom começo.

— Eu não sei. Algumas vezes ele olha para você de um jeito que não deixa dúvidas quanto ao carinho que sente. Outras é difícil dizer o que ele pensa ou sente.

Quando ela falou em "carinho", Lisa traduziu para "desejo"; sabia agora que Andreas realmente a desejava, e não tinha mais medo ou repulsa quando pensava nisso. Para ser sincera consigo mesma, ela também o estava desejando.

— Estive pensando sobre suas roupas, Helena. Você não gostaria de ir um dia desses a Atenas, para escolher algumas roupas mais de acordo com sua idade e seu gosto?

Os olhos da garota brilharam de alegria, mas em seguida ela ponderou, preocupada:

— Mas nos compramos estas roupas há apenas alguns meses, e fomos a Paris para isto.

— Você e tia Constantine?

— Sim. Papai estava em Nova York, e fiquei com ela para me recuperar depois da minha doença. Ela me levou junto quando foi à França.

— Mas você não gostaria de comprar roupas novas?

— Não para impressionar Demitri Papalos!

— Você não gosta dele?

— Não tenho nada contra.

— Mas não gosta tanto como de Tom, não é mesmo?

— Você falou com papai a respeito dele? É por isso que estou aqui? Você deu um jeito de me afastar dele.

— Não, Helena, eu...

— Não use esse tom protetor comigo. Eu não vou me casar com Demitri! Eu só me casarei com o homem que eu escolher. Eu...

— Você vai se calar imediatamente — interrompeu uma voz grave. — Ou terá que suportar as conseqüências.

— Eu não vou me casar com Demitri, papai.

— Você está se esquecendo de uma coisa. Helena: são necessárias duas pessoas para se fazer um casamento. Será que já lhe ocorreu que Demitri também pode não querer casar com você?

— Não quer casar comigo? — Helena repetiu, surpresa.

— Isto a surpreende ? — Andreas parecia se divertir. — Pois bem, acontece que é a verdade. E eu não estou surpreso com esta decisão. Você não fez nada que pudesse despertar sua atenção. Pensa que é adulta, mas age como uma criança mimada, e Demitri não está certo se vai querer casar com uma garotinha caprichosa. Ele foi para o quarto envergonhado da cena que você aprontou.

— Ele disse isto a você? — Seus olhos brilharam de indignação.

— E por que não deveria? Você é exatamente isso, uma garota mimada e caprichosa.

— Eu odeio você, odeio vocês dois! — Dizendo isso, virou-se e correu para casa.

— Isto não foi muito agradável.

— A verdade nem sempre é agradável de se ouvir.

— Demitri realmente não quer casar com ela?

— Quem vai saber? Isto foi apenas uma sugestão da minha parte. Mas não menti quando disse que ela é mimada.

— Mas por que dizer aquilo a respeito de Demitri? Pensei que você quisesse que eles se casassem!

— Eu quero e eles vão se casar. Helena não parece muito satisfeita com esta idéia, não é? Ela pareceu desapontada.

— Sim — Lisa concordou, pensativa.

— Agora ela deve estar pensando nos motivos que Demitri teria para rejeitá-la. Amanha vai tentar cativá-lo, só para mostrar a ele o que estará perdendo por desistir dela.

Lisa sorriu e depois começou a rir com vontade, vendo as rugas de preocupação da testa de Andreas.

— E você ainda diz que não sabe o que se passa na cabeça de uma mulher...

— Pelo menos, isto vai tirar a atenção dela de Tom Stills. Venha, a noite está ótima para dar um passeio.

Andreas passou o braço nos ombros dela e caminharam pela areia molhada.

— Ele não estará na Cornualha quando voltarmos.

— Você o despediu?

— Eu disse a você que não faria isto. Ele foi contratado por seis meses. O contrato terminará antes que voltemos. No próximo mês. Helena voltará para prestar exames.

— Ela sabe que não voltará a vê-lo, quando voltar?

— Ainda não. Mas espero que até lá ela não se importe mais com isso.

— Será que não é esperar demais?

— Não estou tentando jogá-la nos braços de Demitri. Basta que ela perca o interesse por Tom Stills, para eu ficar contente. Você gosta de Vatis? — Andreas mudou de assunto repentinamente.

— Até agora achei muito agradável.

— Até agora? Você espera que esta sua opinião mude ainda esta noite?

Lisa sentiu as faces corarem, e ficou contente por estar escuro.

— Eu disse a Helena que pediria a você para irmos a Atenas comprar algumas roupas.

— É mesmo? E por que você fez isso?

— Eu não posso acreditar que você, com essa maneira tão elegante de se vestir, não tenha notado que sua filha tem um guarda-roupa horroroso e totalmente impróprio para a idade dela.

— Eu percebi, mas pensei que ela gostasse.

— Pois é bom que saiba que ela odeia as roupas que tem.

— Então ela deve ir até Atenas o mais breve possível, e você também.

— O que há de errado com as roupas que eu tenho? — ela perguntou, nervosa. Suas roupas não eram caras, mas as considerava elegantes.

— Não há nada de errado com elas, Lisa. Por que será que as mulheres estão sempre pensando que um homem as está criticando se lhes oferece roupas novas? — Ele parou de caminhar e colocou-se à frente dela, segurando-a pêlos ombros. — Não tenho queixas sobre suas roupas... Pelo contrário, o vestido que está usando é muito bonito.

Era um vestido simples, de algodão, porém a deixava muito elegante, e o contraste com a pele agora um pouco mais bronzeada a deixava bastante sedutora.

— Todas as mulheres gostam de vestidos novos.

— Você não pode me comprar com roupas — Lisa falou, lutando para se libertar dos braços dele.

— Não estou pretendendo comprar você, se é o que está pensando. Eu pensei que havíamos concordado que já paguei o seu preço. Venha, não vamos discutir, Lisa. Esta é a nossa lua-de-mel. Temos um cenário ideal e uma noite maravilhem. As estrelas estão brilhando no céu e o murmúrio das ondas cantam para nós. Não é sensacional?

— Andreas, por favor...

— Não pretendo falar agora. Tenho coisas melhores para fazer...

Ele ia beijá-la, ela sabia, e mesmo assim não fez nenhum movimento para afastar-se. Seus lábios abriram-se convidativos. Antes, quando a beijava, era como se fosse um insulto: dessa vez foi diferente. Os lábios dele apossaram-se dos seus e os corpos fundiram-se, naquela noite enluarada.

Para Lisa, era como se estivesse sonhando, como se o oceano os estivesse levado para suas profundezas, e depois os tivesse trazido de volta em suas ondas macias.

Os lábios de Andreas moviam-se da boca para os ombros dela, e suas mãos a acariciavam suavemente, deixando-a tremula.

— Eu a amedronto? — Andreas murmurou no ouvido dela.

Lisa estava com medo de si mesma. Sua reação aos beijos apaixonados de Andreas lhe dava medo. E se ela, no futuro, não soubesse mais viver sem aquelas carícias? Ele a estava absorvendo, ela já fazia parte dele. Se Andreas quisesse deitá-la na areia agora e fazer amor. Lisa não seria capaz de resistir. Ela lhe pertencia mesmo que estivesse desesperada para livrar-se das emoções que ele despertava nela.

— Lisa? — Ele queria uma resposta.

— Não, Andreas — ela falou num sussurro —, você não me amedronta.

— Você está com frio? — Ele não parava de beijá-la, fazendo-a tremer de prazer.

— Não.

— Eu acho que está. — Seus braços continuaram a protegê-la, e ele começou a caminhar em direção à casa. — Acho melhor nós entrarmos.

— Sim. — Ela também queria entrar. Mais do que qualquer coisa, queria estar em seu quarto, naquela cama enorme e maravilhosa, com Andreas.

Lisa passou o braço pela cintura do marido e encostou a cabeça em seu ombro.

No quarto, os lençóis de cetim eram convidativos e sua camisola branca estava colocada aos pés da cama, do lado esquerdo. No lado direito não havia nada. Ele nunca usava roupas para dormir. Lisa teve o pressentimento de que ela também não usaria.

— Eu só vou tomar um banho rápido — ela falou baixinho, andando em direção ao banheiro.

— Lisa... — Sua voz rouca a fez voltar-se.

— Sim?

— Você está esquecendo isto. — Ele pegou a camisola e entregou-a a ela.

— Obrigada.

Lisa tomou um banho rápido, ansiosa para voltar para a cama e para os braços do marido, com a camisola que ele lhe dera. Havia luz apenas do seu lado da cama, quando voltou, e Andreas já estava debaixo dos lençóis. Ele não se moveu quando ela se deitou, e estava virado de costas.

— Andreas? — chamou suavemente, mas não obteve resposta. — Andreas? — Mesmo assim ele não se moveu. Então, percebeu que ele adormecera.

Como ele podia? Como podia adormecer depois de excitá-la como havia feito? De repente ela lembrou que no dia seguinte a amante de Andreas estaria ali. Por que começar uma relação com uma esposa indesejada quando a mulher que ele realmente amava estaria chegando na manhã seguinte? Os beijos trocados na praia tinham sido apenas um prelúdio sem conseqüências, uma maneira de ele passar o tempo até que Marisa chegasse.

Lisa não achou nada fácil adormecer, com Andreas deitado tão próximo a ela, seus corpos se tocando ocasionalmente. Finalmente deve ter dormido, pois acordou uma vez durante a noite, apenas para perceber que estava curvada sobre as costas de Andreas, segurando-o pela cintura. Envergonhada, virou-se imediatamente para o seu lado da cama.

 

Quando acordou de manhã estava sozinha, no meio da cama, e não havia sequer evidência de que Andreas havia dormido com ela. Lágrimas de raiva e frustração escorreram de seus olhos. Estava apaixonada por um homem que não se importava nem um pouco com ela, que nem mesmo queria fazer amor com ela.

Lisa continuava sozinha quando saiu ao terraço para tomar seu café da manhã.

— Onde é que foram todos? — perguntou a Sophia, quando ela lhe serviu café.

— Foram para Atenas, kyria.

— Atenas?

— Sim, o kyria disse que não era para perturbá-la, que estava cansada e precisava dormir.

— Sim, é verdade. A viagem de ontem foi muito cansativa.

— Naturalmente, kyria. O que vai querer para o café? Nós temos...

— Não, obrigada, Sophia. Eu não estou com fome. Meu... meu marido disse quando vai voltar?

— Não, kyria, mas não deverão chegar muito tarde, pois pediu que servisse o jantar no horário de sempre. Isto é tudo?

— Sim... Obrigada! — Na hora do jantar! O que é que ela deveria fazer durante todo aquele longo dia, sozinha? — Sophia? — ela chamou antes que a outra se retirasse. — Eu acho que ouvi alguém galopando hoje cedo. Nós temos cavalos aqui?

— Sim, na parte dos fundos. E você deve ter ouvido o kyrie... Ele sempre cavalga bem cedo, quando está por aqui.

— Obrigada. — Isto resolveria o problema pelo menos durante a manhã.

Lisa passou a manhã toda explorando a ilha, num cavalo que havia sido preparado especialmente para ela. O rapaz que cuidava dos estábulos teve o cuidado de escolher um animal dócil, uma égua castanha da qual ela gostou à primeira vista. Lisa descobriu os pés de limão e laranja de que Sophia tinha falado, e viu vários barcos patrulhando a enseada, reconhecendo-os como os guardas de que Andreas dissera.

Depois do almoço, resolveu tomar um pouco de sol, cuidando para não se queimar em demasia. Já passava das cinco horas quando ouviu o barulho do helicóptero. Recolheu suas coisas rapidamente, e voltou correndo para casa, pois queria trocar seu biquíni por um dos vestidos elegantes que havia trazido de Londres, não querendo estar em desvantagem quando Andreas chegasse.

Era óbvio que a casa estava habitada outra vez, pelo som das vozes e o caminhar pelas escadas. Lisa continuou fazendo sua maquiagem com tranqüilidade quando Andreas entrou no quarto. Seus cabelos estavam presos num coque gracioso por uma fita que lhe dava um ar de menina.

— Você passou bem o dia? — Ele tirou o paletó e inclinou-se para beijá-la ternamente nas costas.

— Muito bem, obrigada. — Lisa viu pelo espelho que ele se endireitava, preocupado.

— Esse vestido cor-de-rosa lhe dá uma beleza fria e distante, e sua voz combina com sua aparência.

— Não sei se você tem motivos reais para me achar fria.

Como se não tivesse entendido a provocação, ele mudou de assunto.

— Sophia me disse que você só comeu uma fruta, durante todo o dia. — Desabotoou a camisa enquanto falava isso. — Você ainda está se sentindo mal da viagem de ontem?

— Está tão quente que não senti fome.

— O calor está lhe fazendo mal?

Era ele quem a incomodava e lhe fazia mal. Ele e sua maneira de agir em relação a ela.

— Um pouco. — Tinha que dar alguma desculpa para sua palidez.

— Então foi bom não ter ido a Atenas conosco. Até eu achei que lá estava mais quente do que o normal. E estou acostumado com o calor da Grécia.

— Teria sido bom ter a oportunidade de opção, pelo menos.

— Você queria ir a Atenas conosco? — Ele parecia surpreso com a irritação dela.

— Bem, esta era a idéia quando eu sugeri a Helena.

— Pois eu achei que sua recusa em comprar roupas significava que você não queria ir.

Lisa tentou desviar os olhos ao ver que ele trocava a calça pelo fino roupão de banho. Andreas não estava embaraçado e ela não se surpreendia com isso. Lisa não conhecia ninguém para comparar, mas sabia que ele tinha um corpo maravilhoso. Com raiva de si mesma por estar tão interessada num homem que nem ao menos se preocupava com ela, falou com mais dureza do que pretendia:

— Você certamente não se preocupou em saber como eu me sentiria sozinha aqui o dia todo, não é?

— Você viajou muito nestes últimos dois dias. Pensei que preferisse descansar.

— Você fez as mesmas viagens que eu, e é muito mais velho.

— Sua garotinha mimada...

— Lisa? — Helena chamou, feliz, batendo na porta. — Lisa, você está aí?

Andreas agarrou-a pelo pulso quando ela se moveu em direção à porta.

— Não responda. Esta conversa está longe de seu fim.

— Lisa? — Helena tornou a chamar, dessa vez com voz preocupada.

— Pare de ser tão machão. Será que não percebe que esta é a primeira vez que ela vem até mim por sua livre vontade? — Com um gesto brusco, soltou a mão. — Eu vou responder, quer você goste ou não. — Abriu a porta antes que ele pudesse impedi-la.

O olhar de Helena foi do rosto desafiante de Lisa para o de seu pai, que não podia esconder a raiva que estava sentindo.

— Sinto muito. Eu não sabia que você estava aqui, papai. Pensei que...

— O que você quer, Helena? Será que não percebeu que Lisa e eu estamos ocupados?

— Nada que não possa esperar. O que você queria. Helena? — Lisa perguntou, mais calma.

— Eu queria que você visse minhas roupas novas. Mas não se preocupe, posso esperar. Não é nada importante.

— Pois eu acho muito importante. Eu adoro ver roupas novas. Venha! — Ela acompanhou a garota para fora do quarto. — Você poderá me mostrar tudo agora.

— Lisa...

— Conversaremos mais tarde. Andreas — ela falou com firmeza. Mais tarde, quando não estivesse tão perturbada diante da nudez dele e pudesse encará-lo em condições de igualdade.

— Talvez papai esteja certo. — Helena parecia assustada diante da raiva que tinha visto no olhar do pai. — Você está ocupada, podemos ver as roupas mais tarde.

— Não — ela insistiu. — Vamos agora mesmo.

— Se você quer...

— Sim, eu quero. — Lisa fechou a porta, sem se importar com o olhar ameaçador de Andreas. — O que é que você comprou?

— Papai insistiu em me comprar um monte de coisas novas.

— Seus olhos brilhavam de encantamento,

— E tenho certeza de que você falou para ele não comprar.

— Não, eu... Ah!, você está brincando. Helena sorriu e entrou no quarto onde havia dezenas de caixas espalhadas pelo chão.

— Papai tem bom gosto para escolher roupas.

— Concordo plenamente com você.

— E o melhor é que ele sabe exatamente aonde ir. — Helena começou a tirar as roupas das caixas.

Lisa tinha certeza disso, não havia dúvidas de que ele era muito generoso também com sua amante. Ficou imaginando se Andreas teria encontrado tempo para ir ver Marisa durante sua viagem a Atenas. Ela não podia imaginá-lo perdendo uma oportunidade como essa.

— Ele ajudou você a escolher tudo isso? — Ela estava espantada com o tempo que ele havia dispensado à filha.

— A maioria delas — Helena confirmou. — Apesar de também ter ido falar com Marisa.

— E você não se importou?

— Bem... Sim, mas uma filha tem que aprender a aceitar essas coisas.

— Uma filha grega, talvez. Mas não uma esposa inglesa! — Ela não ia deixar que Andreas a humilhasse desse jeito. Se ele tinha que ter uma amante, que pelo menos não envolvesse a filha nisso.

— Você está zangada? — Helena parecia divertir-se.

— É claro que sim! Desculpe — ela falou, mais calma. — Vamos ver suas roupas novas, e esqueça o que eu disse.

Helena mostrou, entusiasmada, todas suas roupas novas, e Lisa concordou que eram perfeitas para uma garota de dezesseis anos.

— E o que e que Demitri ficou fazendo durante todo esse tempo?

— Ele foi visitar a família.

— Eu não sabia que ele era de Atenas.

— Ele estava se aborrecendo com as compras. Por que é que você não veio conosco. Lisa? Eu pensei que você queria ir até Atenas!

— Você queria que eu fosse? — ela perguntou, esperançosa.

— Bem. Eu gostaria de ter tido uma opinião feminina. E, afinal, foi graças a você que eu pude ter todas estas roupas novas.

— Talvez na próxima vez. — Lisa agora sabia da razão por que Andreas não a queria por perto. Ela poderia não ter concordado que ele as deixasse sozinhas para ir visitar a amante.

— Bem, acho que não será tão cedo — Helena disse, olhando para a infinidade de roupas espalhadas pelo quarto.

— Provavelmente não — Lisa então percebeu quatro caixas que ainda não tinham sido abertas. — Você esqueceu aquelas coisas, Helena.

A garota pegou as caixas e as colocou sobre a cama.

— Eu não as esqueci, elas não são minhas.

— E de quem são?

— Suas é claro! Papai escolheu tudo sozinho.

— Para mim? — Lisa olhava espantada para as caixas.

— Sim, venha vê-las. Deixe esta aqui por último. — Ela tirou a caixa de cima da cama e separou-a.

As três caixas continham roupas para noite. Um vestido branco, um preto muito sofisticado e o último era azul-safira, que combinava perfeitamente com os olhos de Lisa. Eram muito bonitos e ela gostaria de poder usá-los, apesar de terem sido comprados por Andreas depois de seu encontro com Marisa.

— Você não gostou? — Helena ficou preocupada com o silêncio dela.

— Eles são maravilhosos. Eu nunca tive nada tão bonito!

— E agora, a última caixa... — Ela a colocou na frente de Lisa com um ar de expectativa. Lisa estava relutante em abri-la, mas o entusiasmo de Helena a deixara curiosa para ver o que continha. Quando finalmente tirou a tampa, entendeu a reação da garota. Dentro havia vários tipos de cores de conjunto de lingerie, naturalmente escolhidos para o prazer de Andreas. Pois bem, ele não ia conseguir nada vendo-a com aquelas roupas!

Ela recolocou a tampa sem dizer uma palavra, pondo-a em cima das outras três caixas e segurando-as todas.

— Vejo-a mais tarde, Helena. Gostei muito das suas roupas.

— Mas não das suas, não é? — Helena tinha percebido.

— Eu gostei delas. — Mas não vou usá-las nunca, pensou Lisa.

Andreas já tinha tomado banho e estava vestido quando ela entrou no quarto como um furacão, jogando as caixas com raiva sobre a cama.

— Vejo que Helena já entregou as caixas para você — ele falou, apontando as caixas espalhadas sobre a cama.

— Sim. E agora vou lhe dizer o que fazer com elas! Pode ficar com todas para você!

— E o que é que eu vou fazer com isso? — ele perguntou, surpreso.

— Dê para sua amante! Dê para quem você quiser! Eu realmente não me importo com o que você vai fazer com isto, só sei que não quero!

— Por quê?

— Porque não estou aqui para desfilar para você com este tipo de roupa!

— Que tipo de roupa?

Ela arrancou a tampa da caixa, tirando uma tanga verde-água de rendas e um sutiã que formava conjunto, que mal serviria para cobrir-lhe os seios.

— Este tipo! Se você pensa que vou dar um show particular vestindo isto, está muito enganado.

— A visão de um corpo feminino com roupas ou sem elas não me surpreende.

— Eu sei, mas parece que você tem alguma preferência por este tipo de roupa íntima...

— Basta, Lisa! Eu trouxe essas roupas para você e não para mim. Você vai pedir desculpas imediatamente.

— E por que eu deveria?

— Porque eu disse que você vai pedir.

Lisa percebeu que ele estava realmente furioso e sentiu medo.

— Talvez eu... talvez eu tenha compreendido errado. Talvez...

— Não existe talvez, eu ainda estou esperando seu pedido de desculpas.

Uma olhada naquele rosto tomado pela raiva foi suficiente para fazê-la compreender que não sairia do quarto enquanto não pedisse desculpas. Mas por que o faria? Talvez ela estivesse errada com relação às roupas, mas ele não poderia negar que as comprara apenas para aplacar sua consciência depois de ter visitado a amante.

— Eu não vejo por que deveria. Eu sei que você foi visitar sua amante hoje, Andreas, e não vou aceitar estas roupas para fazê-lo sentir-se melhor.

— Fazer com que eu me sinta melhor? Dar presentes a você não me faz sentir melhor, sua ingrata! Eu não preciso desse tipo de coisa quando Marisa já me fez sentir muito bem.

— Então talvez você devesse ficar com ela.

— E deixar minha linda e jovem mulher sozinha mais tempo do que já deixei? Não, Lisa, somos casados e não pretendo desistir do prazer de dividir minha cama com você, pelo menos por uma noite.

— E foi por esta razão que você dormiu tão rapidamente ontem à noite? — Ela ficou envergonhada ao perceber o que tinha dito. — Eu quero dizer...

— Eu sei o que quer dizer, Lisa. E já lhe disse que uma esposa grega não discute estas coisas.

— Eu já lhe disse que não sou uma esposa grega! — gritou furiosa.

— Você é minha esposa, e farei de você o que eu quiser. Agora é hora de se vestir para o jantar. Use o vestido preto... gostaria que você ficasse o mais sofisticada possível esta noite, e menos a garotinha mimada que é.

— Para você?

— Não, não para mim, para você mesma. Tenho certeza de que vai querer estar deslumbrante esta noite.

— E por quê?

— Porque você vai conhecer Marisa.

— Ela está aqui? — Lisa estava atônita. — Aqui em Vatis?

— Sim Na casa de hóspedes, assim ela tem mais privacidade. Como você vê, não preciso ficar em Atenas para ver Marisa... Eu a trouxe comigo para Vatis.

 

Marisa Lamos era tudo o que Lisa imaginava que fosse. Bonita, sofisticada e, ainda por cima, simpática. Era alta e magra, com cabelos loiros-dourados, e seu rosto bonito parecia uma escultura.

As duas se encontraram um pouco antes do jantar. Marisa vestia um traje vermelho que parecia criado exclusivamente para ela, e Lisa ficou contente por ter seguido a sugestão de Andreas usando o vestido preto, que combinava perfeitamente com seus cabelos avermelhados. Ainda que não quisesse admitir, Andreas estava certo quanto ao seu desejo de estar o mais bonita possível para encontrar-se com a amante dele. Teria que mostrar à outra que ele tinha uma mulher jovem e atraente, uma esposa que brigaria por ele se tivesse alguma chance. Se ao menos ela não fosse tão agradável e simpática!

Andreas tinha descido um pouco antes dela, muito elegante, com um casaco verde-escuro de veludo, calça preta e camisa branca. Lisa ainda ficou rodando pelo quarto, não querendo parecer que ia fazer o que Andreas sugerira e, ao mesmo tempo, tentada a colocar o vestido preto.

Era de seda e marcava cada curva de seu corpo com intimidade. Não tinha alças e ficava preso apenas pela perfeição de seu busto. Seus cabelos soltos sobre os ombros completavam o vestido e, depois de tê-lo experimentado, não conseguiu trocá-lo por outro.

Evitou o olhar do marido quando ele a apresentou a Marisa Lamos, não querendo contemplar a satisfação em seu rosto. Como ele devia estar adorando tal situação!

— Andreas me falou sobre você. — Ela sorriu para Marisa.

— Isto me surpreende e deixa feliz ao mesmo tempo. — A moça parecia realmente surpresa. — Eu não esperava que ele falasse a você de sua...

— Mas claro que falei, Marisa — Andreas a interrompeu, colocando o braço em volta do ombro dela protetoramente. — Você é muito valiosa para mim.

Lisa virou o rosto para não ver o sorriso de Andreas para a outra mulher. Foi ao encontro de Helena, cumprimentando-a pelo vestido novo.

Marisa sentou-se à esquerda de Andreas durante o jantar e eles conversaram em voz baixa o tempo todo, deixando que Lisa conversasse com o jovem casal. Se Helena e Demitri não gostaram, não deixaram transparecer nada, mas Lisa detestou o jantar e não soube como conseguiu controlar seu temperamento explosivo enquanto Andreas sorria para Marisa.

— Quanto tempo ela vai ficar por aqui? — perguntou quando já se preparava para dormir. O jantar fora um desastre para ela e, tão logo pôde, arrumou uma dor de cabeça e subiu para o quarto. Ficou mais do que surpresa quando Andreas resolveu acompanhá-la.

Ele já estava na cama, com um braço passado sob a cabeça, observando-a. Lisa sabia muito bem que sob os lençóis ele estava completamente nu.

— Ela vai ficar tanto tempo quanto eu precise dela.

— E quanto tempo você acha que vai ser?

— Talvez até que minha mulher resolva assumir alguns de seus deveres.

— Se você quis dizer o que eu entendi, pode ir para o inferno! Tenho certeza de que Marisa aprecia muito assumir estes deveres para com você, e eu detestaria privá-la deste prazer.

— Como você queira. — Ele parecia aborrecido e, virando-se de costas para ela, deu a entender que ia dormir. — Se eu não estiver aqui quando acordar amanhã cedo, provavelmente estarei na casa de hóspedes.

— Você não acha melhor ir agora?

— Marisa ficaria tão chocada quanto você, se eu fizesse isto.

— Entendo. Todos na casa sabem o que está acontecendo, mas deve parecer que não está.

— Você está aprendendo rápido.

— Eu acho isto tudo revoltante, ainda mais na frente de sua própria filha! Você...

— Lisa, no momento eu estou quase dormindo mas se você continuar falando vai me acordar e espero que esteja pronta para as conseqüências.

— Eu... O que você quer dizer com isso? — Que pergunta estúpida, pensou ela em seguida.

Andreas naturalmente pensou o mesmo, pois sorriu maliciosamente para ela.

— Eu quis dizer que é uma pena perder tempo discutindo, quando poderíamos usá-lo de uma maneira muito mais agradável para nós dois.

— Não acho que seria agradável estar em seus braços. Pode dormir, Andreas. — Ela apagou a luz antes de tirar o robe. — Guarde suas forças para sua amante. — Ela deitou-se ao lado dele na cama, que de repente lhe pareceu muito pequena para os dois.

Num instante Andreas estava deitado sobre ela, prendendo-a na cama e segurando-a firmemente.

— Você se atreve a me dar ordens?

Lisa já não conseguia raciocinar direito. Sabia apenas que ele não estava pensando em dormir, pois sentia seu corpo rijo prensando-a intimamente.

— Eu... eu sinto muito, Andreas. Ficarei quieta agora. Por favor, vamos dormir.

— Até mesmo uma criança saberia que nesse momento eu não estou querendo dormir. Já é hora da minha jovem esposa aprender a agradar o marido. — Seus lábios desceram lentamente pelo pescoço dela enquanto suas mãos desamarravam o laço que fechava a camisola. Ele a abriu, revelando os seios rijos, e seus lábios desceram beijando-os um após o outro, excitando-a cada vez mais. — Mas antes vou fazê-la muito feliz — murmurou roucamente. — Vai ser muito melhor para nos dois.

Lisa sabia que havia provocado aquele ataque, mesmo assim, não estava arrependida. Ela gostava do que Andreas estava fazendo, gostava daquela boca quente passando por seu corpo, da maneira como as mãos dele a acariciavam, descobrindo sensações jamais sentidas. Na realidade ela não apenas gostava, estava adorando.

Suas mãos perderam-se nos cabelos de Andreas, quando os lábios dele encontraram os seus, explorando-os com intimidade.

— Estou agradando você? — ele perguntou, entreabrindo os lábios.

— Sim! Oh, sim... — Seus olhos brilhavam. Andreas se afastou tão rápido quanto se aproximara.

— Creio que isto é suficiente por hoje, no seu primeiro esforço para satisfazer um homem. — Ele a observava, sorrindo. — Talvez amanhã possamos continuar.

— Eu... — Ela engoliu as lágrimas que queriam saltar de seus olhos. — Eu não fiz nada para agradá-lo.

— É suficiente que eu a tenha agradado. Gosto de vê-la tão dócil. — Ele amarrou com cuidado o laço da camisola dela. — É melhor você dormir agora.

— Mas, Andreas...

— Durma — disse, virando-se de costas para ela.

Lisa ficou mais uma vez com a certeza humilhante de que havia servido de divertimento para o marido, que, depois de excitá-la, deixou-a insatisfeita. Tinha também a sensação de ter sido uma pequena amostra para a satisfação dele, e que Marisa, logo mais, iria completar suas necessidades.

Estava só quando acordou, e lágrimas de vergonha e raiva desceram livremente por seu rosto. Lágrimas que ela escondera durante toda a noite para que Andreas não risse dela.

Como é que iria suportar isso a vida toda? Não que acreditasse que seu casamento iria continuar assim para sempre. Lisa não tinha dúvidas de que Andreas exigiria seus direitos um dia, quando não tivesse Marisa por perto. Mas será que ela conseguiria viver, sabendo que seu amor jamais seria correspondido? Pensou que acompanhando Andreas e tornando-se sua mulher de fato evitaria sofrimento para os tios, mas agora estava em dúvida se agüentaria seu próprio sofrimento.

Demitri estava sozinho no terraço quando ela desceu, algo que a surpreendeu, pois Andreas era sempre um anfitrião atencioso. Ela perguntou por Helena, pois já sabia onde estava o marido.

— Ela disse que ia dar uma volta.

— Sem pedir a você que a acompanhasse? — Era a primeira vez que falava com Demitri sozinha, e estava curiosa para conhecer o rapaz. Rapaz! Ele era apenas um ano mais jovem do que ela!

— Sim — ele respondeu sem muito interesse.

— Você já tinha estado em Vatis antes?

— Não.

— E está gostando?

— Nós temos uma ilha, não muito longe daqui.

Isso não a surpreendia. Andreas não escolheria um marido para a filha que não estivesse no mesmo nível deles.

— Você quer se casar, Demitri? — Sua pergunta realmente o surpreendeu.

— Eu devo ficar noivo de Helena no aniversário dela.

— Isto não responde à minha pergunta.

— Naturalmente que eu desejo me casar.

— Eu não estou querendo me intrometer neste assunto, Demitri. Só quero que Helena seja feliz, que vocês dois o sejam. Não acredito que estejam preparados para o casamento. Você gosta de Helena?

— Eu a admiro muito. — Demitri se levantou. — Acredito que com o tempo eu possa até vir a me apaixonar por ela.

— Mas agora não, certo?

Pela primeira vez o rosto dele demonstrou alguma animação, e Demitri respondeu com mais liberdade:

— Tem tantas coisas que eu gostaria de fazer antes de me casar, tantos lugares para conhecer. O casamento me impediria de fazer estas coisas.

— Você já falou com meu marido, ou mesmo com Helena, sobre isso?

— Não resolveria nada. Está tudo acertado desde que éramos crianças. Nós nos casaremos quando Helena completar dezessete anos.

— Bem, você ainda tem um ano pela frente. Você não poderia viajar neste tempo?

— Acho que não. Meu pai insiste em que eu comece a trabalhar com ele para poder sustentar minha família, quando casar

Então, sem querer, Andreas havia acertado quanto à relutância de Demitri em se casar. Ele naturalmente entenderia isso, pois já tinha confessado seu arrependimento por ter casado tão jovem.

— Você já tentou explicar a seu pai que deseja viajar antes de se casar?

— Ontem eu tentei, mas ele não quis me ouvir. Se eu deixar Helena, vou trazer uma série de problemas para minha família. De qualquer maneira, gostaria de me casar com ela, só que não agora.

— Você quer que eu fale com meu marido? — Provavelmente não a ouviria, mas não custava tentar. — Seu pai e ele são amigos. Tenho certeza de que poderiam encontrar uma solução que agradasse a todos.

— Estou contente de ficar noivo de Helena no próximo mês e casar quando ela completar dezessete anos — ele falou, duvidando de que Lisa pudesse ajudar em algo e concordando com Andreas em que uma mulher grega deve apenas ser vista e não ouvida. Portanto, não deveria de modo algum interferir num assunto como aquele. — Já está tudo decidido por nossos pais.

— Sim, mas...

— Está tudo bem, sra. Vatis. Se me dá licença... — Ele se virou e foi para a praia.

Nesse mesmo instante, Andreas chegou e se sentou ao lado dela.

— Estava boa a conversa com Demitri? — perguntou.

— Sim, muito boa. E você? Apreciou a conversa com Marisa?

— O que é que vocês estavam discutindo tão calorosamente? — Ele ignorou a pergunta dela.

— Estávamos?

— Foi o que me pareceu.

— Acho que se enganou. Eu só estava mantendo nosso hospede entretido como você mantém sua hóspede.

— Não da mesma maneira, espero.

— E se for?

— Eu lhe daria uma surra, como é de meu direito.

— E Demitri? — A arrogância dele era demais, principalmente quando acabava de sair dos braços da amante!

— Ele partiria no mesmo instante e certamente nunca se casaria com Helena.

— Talvez eu devesse contar isto a ele.

— O que é que você está falando agora? O que é que andou dizendo para aquele garoto?

— Eu não andei dizendo nada. E ele não é um garoto, tem dezenove anos. Você já estava casado e era quase pai nesta idade. Sabia o que queria e ele também sabe.

— Espero que não seja você o que ele quer — ele disse, desafiante. — Eu não a deixarei ir como Gina.

— Por quê? — Ela perguntou, cheia de esperanças.

— Você ainda não me deu filhos.

— Ora, por que você não vai para o inferno?

— Acalme-se, Lisa. — Ele estava rindo dela. — Eu não estou com pressa.

— Nem eu!

— Mas ontem à noite me pareceu que você estava.

— Como você pode falar de ontem à noite? Só porque pode desligar suas emoções como uma tomada, não quer dizer que possa me insultar desse jeito. Você achou muito fácil, porque sabia que ia se encontrar com Marisa hoje. E onde está ela, por falar nisso?

— Nós fomos cavalgar hoje cedo. Acho que ela está descansando.

— Você não tem certeza?

— Tenho sim, ela está descansando.

— Ela deve ter motivos para estar cansada — Lisa falou com raiva.

— Eu já lhe disse...

— Que uma mulher grega não discute essas coisas — ela completou, ressentida. — Eu acho que Demitri tem a mesma opinião.

— Demitri? — Andreas se espantou. Sua mão fechou-se no pulso dela com tanta força que a machucou. — Você discutiu essas coisas com ele?

Como ela gostaria de dizer que sim. Porém as conseqüências de uma ação como essa poderia envolver e prejudicar Demitri. E, apesar de estar tão confuso sobre seus sentimentos, ela sabia que ele um dia se casaria com Helena. Lisa jamais poderia deixar Andreas brigar com o rapaz apenas para satisfazer sua irritação.

— Não esse tipo de coisa. — Ela soltou a mão, esfregando o pulso dolorido. — Eu só perguntei como ele se sentia a respeito do casamento com Helena, e Demitri não me respondeu.

— Ele está certo. Isto não é da sua conta.

— Pois eu discordo de vocês. Quando você se casou comigo, deixou bem claro que eu deveria cuidar de Helena e considerá-la como uma filha.

— Ela será feliz com Demitri.

— Ela provavelmente o será, com o tempo. Nenhum dos dois quer se casar tão jovem, Andreas.

— Ele disso isso a você?

— Sim.

— Eu nunca conheci uma mulher como você! — ele retrucou levantando-se. — Eu não sei como é que você conseguiu se aproximar tanto dos dois para que lhe contem o que sentem a respeito deste casamento.

— Eu não consegui. É que é tudo tão óbvio...

— Para quem?

— Para qualquer um que tenha um pouco de bom senso. Você já parou um minuto para perguntar a Helena o que ela quer, se há algo que ela queira fazer em sua vida antes de se casar? — Toda sua frustração da noite anterior veio à tona e ela colocou maior calor em seu argumento. — Não, naturalmente que não! Perguntar não é a sua maneira de agir, não é? Você simplesmente vai em frente... Faz o que quer sem se importar com a felicidade dos outros. Pois bem, eu vou lhe dizer, pois tenho certeza: se você forçar estes dois a se casarem, será um verdadeiro desastre. Mas, se você esperar alguns anos. eles provavelmente serão muito felizes. No momento, estão os dois ressentidos com a pressão que está sendo exercida sobre eles.

— Devo lembrá-la de que foi sua a idéia de aproximá-los.

— E estou feliz que você tenha feito isto, pois mostrou que os dois têm que viver um pouco mais antes de enfrentar o casamento.

— Eles têm um ano ainda.

— Um ano!

— Estou interrompendo? — A voz de Marisa Lamos chegou até eles, tímida e calma. — Eu posso voltar mais tarde... Só vim agora porque pensei que você quisesse me ver às dez horas, Andreas.

— Eu já estou de saída, srta. Lamos, Andreas é todo seu. — Dando um olhar desafiante ao marido. Lisa saiu em direção aos estábulos.

Escolheu a mesma égua do dia anterior, e saiu galopando como se estivesse sendo perseguida. Então Andreas queria a amante às dez horas, não é? Lisa começou a chorar, sem saber até quando iria agüentar. Foi então que viu uma figura solitária e logo a reconheceu. Helena! O que estaria fazendo tão longe de casa?

— Algo errado? — perguntou gentilmente.

— Não, nada.

— Você está com saudade de Tom Stills?

O olhar de Helena mostrou a Lisa que isso era a última coisa a lhe passar pela cabeça.

— Helena, fale comigo.

— Você vai ficar do lado do meu pai — ela falou pensativa, brincando com a areia.

— Não existem segredos entre nós, Helena, e você sabe exatamente por que seu pai casou comigo. Por que eu deveria ficar do lado dele?

— Porque você fez com que ele trouxesse Demitri e eu até aqui.

— Isso foi quando eu pensava que vocês se gostavam. Mas você não gosta dele, não é?

— Ele é… simpático — Helena falou sem muita convicção.

— Mas você não quer casar com ele — falou uma voz grave acima das duas.

Ambos se voltaram para olhar Andreas. Então ele a havia seguido!

— Deixe-nos a sós — ele ordenou a Lisa.

Lisa olhou preocupada para Helena.

— Você quer que eu vá?

— Acho que não há problema em minha filha ficar a sós comigo.

— Eu sei, mas...

— Então vá embora.

— Helena? — Ela se recusava a ir sem que Helena lhe respondesse.

— Tudo bem. Lisa. Papai quer falar comigo, estarei bem.

Lisa resolveu dar uma volta antes de ir para casa. Não se sentia em condições de enfrentar Demitri ou Marisa.

Se ao menos ela não fosse tão educada e simpática, pensou mais uma vez. Mas ela era; tratava Lisa com respeito e amizade. Não lhe parecia certo ter raiva dela.

Como ela pensava, Marisa estava na praia quando voltou, e Lisa sabia que não podia entrar em casa sem falar com ela.

— Você viu Demitri? — perguntou.

Marisa indicou uma cabeça negra nadando a alguns metros da praia.

— Parece que as coisas não estão dando muito certo entre Helena e Demitri. — Era uma afirmação e não uma pergunta.

Lisa ficou na defensiva. Como Andreas podia discutir assuntos de família com a amante?

— Não.

— Andreas está muito preocupado.

— Tenho certeza que sim.

Marisa franziu a testa, demonstrando também preocupação.

— Espero que você não me considere intrometida, mas sendo a secretária de Andreas...

— Secretária? — Lisa repetiu, atônita. — Você é secretária dele?

— Espero que você não tenha pensando que Andreas e eu...

— Não, naturalmente que não! — Lisa disse, veemente. — Andreas não me explicou a situação e eu pensei que você fosse apenas uma amiga de Helena.

— Mas eu sou. Eu a conheço desde que nasceu. Mas sou antes de tudo secretaria de Andreas.

Lisa queria escapar mas não sabia como. Ela olhou para sua camiseta e jeans e decidiu se trocar.

— Você me da licença? Vou trocar de roupa. — Na realidade, o que ela queria era a privacidade de seu quarto.

— Lisa? — Marisa estava preocupada.

— Desculpe. — Ela sorriu com muito esforço. — Eu estava a quilômetros daqui. Não demoro. Vou tomar um banho e desço em seguida.

— Vejo-a depois, então.

Lisa não tinha certeza disso. Depois de acertar essa situação com Andreas, ele ia tentar mantê-la no quarto. Que tentasse!

Só não entendia por que Andreas tinha feito questão de continuar com aquela farsa. Deve ter-se divertido bastante fazendo-a de tola, mas isso ia acabar.

Quando ele entrou no quarto, meia hora depois, ela já estava pronta para falar com calma, mas as primeiras palavras dele não lhe deram chance.

— Já conversei com Helena.

— Isso eu podia prever. Eu estava lá, lembra-se? E, sendo a filha obediente que é, não tenho dúvidas de que concordou que o casamento é a melhor coisa para ela.

— É isso o que você pensa?

— Não foi o que aconteceu?

— Eu perguntei se é isso o que você pensa que aconteceu.

— Mas é claro que sim. — Ela não fez nenhum esforço para esconder o sarcasmo de sua voz. — Quando é o casamento?

— O que é que está acontecendo com você, agora? Está zangada porque eu preferi conversar com Helena sozinho?

— Não, por que eu deveria me preocupar com isso?

— Quer dizer que você não se importa que Helena não se case com Demitri?

— Ela não vai se casar? — Por alguns instantes Lisa esqueceu seu próprio problema.

— Não. Ela quer ir para a faculdade e fazer carreira. Provavelmente não vai terminar, mas não posso deixar de lhe dar uma chance. Ficou acertado que Demitri vai trabalhar com o pai, mas ficará encarregado da parte internacional, assim poderá viajar à vontade. Cada um fará o que deseja e daqui a alguns anos poderão se casar.

— Você já resolveu tudo isso?

— Eu entrei em contato com o pai dele pelo rádio. Parece que Demitri já havia falado alguma coisa com ele ontem. Paul concorda comigo que vai ser melhor esperar. Como você vê, não somos tão maus assim.

— Você já contou a Helena?

— Sim, contei aos dois. Parece que estão se gostando mais e agindo mais naturalmente um com o outro, agora.

— E Tom Stills?

— Esquecido. Ele não era importante. Eu já disse a Helena que ele não estará lá quando voltarmos, e ela não pareceu nem um pouco preocupada com isso.

Lisa ficou imaginando se algum dia, quando ele estivesse cansado de atormentá-la, também se livraria dela com a mesma tranqüilidade.

Gente como ela não era importante para pessoas como Andreas e Helena, eram facilmente substituídos.

— E agora vamos falar de você. O que há de errado?

— Comigo? — Ela abriu os olhos inocentes, levantando-se e caminhando em direção à penteadeira onde havia a mesma variedade de vidros de perfume que na Cornualha. Voltou à sua memória a maneira como Andreas tinha lhe dado um vidro, ordenando que usasse para agradá-lo, e seus dedos se fecharam firmemente em volta do mesmo perfume. — Não há nada de errado comigo. O que lhe deu esta impressão?

— Talvez a maneira como você está segurando esse vidro de perfume, como se quisesse esmagá-lo entre os dedos.

Até ele falar, ela nem tinha percebido, mas simplesmente não pôde se conter e, antes que tivesse tempo para pensar, atirou o vidro em cima dele, com toda a força. Felizmente — ou infelizmente, ela não estava muito certa —, Andreas tinha reflexos excelentes e desviou-se com rapidez.

— Por que você fez isso? — ele perguntou calmo, embora o seu corpo estivesse tenso com o esforço que estava fazendo para se conter.

— Porque você mentiu para mim — Lisa disse, desejando não ter feito uma coisa tão estúpida. Sabia que agora ele não ia sair do quarto sem um castigo.

— E em que foi que eu menti?

— Sobre sua... sua amante. Marisa me contou que é sua secretária... Pode parar com essa farsa.

— Por que eu deveria mentir para você? — Ele começou a caminhar na direção dela. — O que eu ganharia com essa sua decepção?

— Bem, eu não sei. Mas Marisa disse.

— Eu tenho certeza de que ela falou muitas coisas. Mas tenho certeza de que ela jamais falaria a você sobre nosso relacionamento.

— Você quer dizer...

— Quero dizer que ela é minha secretária, mas esta não é a única relação que temos. E já acho que é hora de a nossa relação se tornar mais íntima. Você me atacou, me acusou e agora deve me satisfazer. Não vou esperar mais.

— Não, Andreas, não. Você não pode fazer isto! Eu não quero fazer amor com você.

— Eu não falei em amor em tempo algum — ele disse, cruel. — Você vai ser minha mulher no sentido da palavra, mas não haverá amor no meio disso, lembre-se bem.

E realmente não houve. Lisa lutou com ele, mas não adiantou nada, pois era muito fraca. Andreas praticamente arrancou-lhe as roupas, prendendo seus braços acima da cabeça com uma das mãos e não deixando de tocar em um centímetro de seu corpo. Era como se ele estivesse provando que ela lhe pertencia, que podia fazer com ela o que quisesse.

Não houve ternura alguma quando ele a possuiu, apenas o grito rouco de seu nome, como se Andreas pretendesse fazê-la saber que era ela e não Marisa que ele queria. Lisa deitou-se de bruços quando tudo terminou, incapaz de encará-lo. Sabia que não fora capaz de negar-se a ele, pois todo seu corpo pedia para ser possuída, apesar de Andreas estar fazendo isso como punição a ela. Mas tinha encontrado prazer com ele, e juntos haviam alcançado o êxtase. Andreas sabia que seu corpo a tinha traído, pois era um amante experiente, e Lisa estava envergonhada de seu abandono.

Percebeu quando ele saiu da cama e vestiu-se, mas não conseguiu mover-se para cobrir a nudez.

— Eu vou mandar Christina limpar este quarto. Acho melhor você se vestir antes que ela suba. A porta fechou-se suavemente quando ele saiu.

Lisa estava no banheiro quando Christina entrou no quarto, e só saiu quando ouviu a porta ser fechada. Ela sentia-se como se estivesse muito longe e nada podia tocá-la. Parecia que tudo acontecia em câmara lenta.

Não conseguia entender nada.

Recusou o almoço, permanecendo na cama. Não aceitou o jantar também, alegando dor de cabeça. Na realidade ela sentia-se doente; doente por ela e por Andreas. Nenhuma palavra havia saído dos lábios dele no momento em que a possuiu, nenhum gesto de carinho para com sua inexperiência. Tinha que encarar o fato de que Andreas não estava um passo além dos sentimentos que demonstrou quando a conheceu.

Helena foi vê-la no quarto após o jantar, preocupada com ela, embora respeitasse seu desejo de ficar só. A jovem parecia mais amigável. Insistiu em agradecer a interferência nos planos de casamento, mesmo quando Lisa afirmou que não teve nada a ver com as novas decisões de Andreas.

Ele nem mesmo veio para o quarto naquela noite, e ela não precisava ter muita imaginação para saber onde e com quem estava.

A dor de cabeça que Lisa teve na manhã seguinte era absolutamente verdadeira, causada pela noite de insônia. Não podia encarar Andreas assim. Não importava o que os outros iriam pensar, ela não iria abandonar o quarto, que lhe parecia o único refúgio seguro.

Pouco depois das nove horas, Andreas subiu até o quarto.

— Helena me disse que você não está se sentindo bem. — Sua voz era distante. Não havia nenhum remorso nela.

— É, eu não estou bem — Lisa respondeu com medo.

— Eu vim ajudá-la a se sentir melhor. — Um sorriso amargo desenhou-se em seus rosto ao ver o medo nos olhos dela aumentar. — Não como você está pensando. Pretendo partir dentro de meia hora.

— Partir? — Ela estava confusa.

— Eu estou indo para Atenas. Ficarei tomando conta do escritório, pois Clive vai passar algumas semanas na Inglaterra.

— E você está indo embora hoje?

— Exatamente. Marisa e eu partiremos logo após o café.

— Você vai levar Marisa com você? — A pergunta saiu de seus lábios antes que ela percebesse.

— Mas é claro que sim. Eu já não lhe disse que ela é indispensável para mim?

— Sim, você me disse — Lisa concordou com amargura. — Quando você volta?

— Não finja que você realmente iria me dar as boas-vindas se eu voltasse. Já estou mais do que convencido de que após esta noite você não quer sequer olhar para mim. Eu não voltarei a Vatis. Em algumas semanas, você e Helena deverão ir para a Inglaterra e eu as encontrarei lá.

— Quando? — ela perguntou num tom de desafio que a surpreendeu. — Quando achar que deverá passar alguns dias sem a sua valiosa Marisa?

Se algo mudou na expressão dele foi tão rápido que Lisa não conseguiu perceber.

— Talvez eu a leve comigo para a Inglaterra. Você saberá dos meus planos quando chegar a hora. Por enquanto, descanse bastante e aproveite minha ausência. — Ele se virou e dirigiu-se para a porta.

— Andreas...

— Sim?

— Nada. — Ela se arrependeu de seu gesto involuntário de chamá-lo. — Tenha uma boa viagem.

— Disto não tenha dúvidas. Adeus, Lisa.

— Adeus... até logo. — Sua voz transformou-se num soluço.

Embora não quisesse admitir. Lisa sabia que ia sentir falta de Andreas mais do que nunca, e não havia nada que ela pudesse fazer para mudar a situação. Numa prece muda, pediu a Deus que não fosse um adeus definitivo.

 

A Inglaterra parecia muito fria depois do maravilhoso sol que ela havia encontrado na Grécia. Mesmo sendo verão, não tinha nada a ver com o calor de Vatis. Helena e Lisa chegaram quando faltava uma semana para os exames.

Lisa não teve oportunidade de falar com Andreas durante aquele tempo. Todas as mensagens de rádio para Vatis e telefonemas para a Inglaterra haviam sido feitos para a filha. Helena não discutia a exclusão de Lisa, mas sem dúvida percebia que algo não estava bem. Ela e Helena afinal tinham-se tornado amigas, passando a maior parte do tempo juntas.

Assim que chegaram à Cornualha, foram ao cabeleireiro. Helena modificou o penteado, aceitando a sugestão de Lisa. Mal acreditar quando se olhou no espelho. O novo corte deu-lhe um ar encantador, ameno e jovial. Agora, não via a hora de começar as aulas para exibir sua nova aparência. Iria voltar para a escola, desistindo de aulas particulares, e depois tentaria se qualificar para a universidade.

Havia uma carta esperando por Lisa quando voltaram, e ela ficou imaginando se seria esta a forma que Andreas encontrara para ter noticias da filha. Afinal, depois de abri-la, descobriu Lindy, convidando-a para seu casamento. A carta deixou Lisa desesperada para conversar com alguém que não fosse do circuito ao qual estava presa. Assim, decidiu ir passar alguns dias em Londres, no apartamento que Andreas mantinha lá.

Helena, percebendo a necessidade dela de ficar sozinha, não insistiu muito para acompanhá-la.

Os poucos dias que pretendia passar lá acabaram por transformar-se em uma semana, e ela relutava em voltar à Cornualha, pois a personalidade de Andreas estava por demais estampada naquela casa. Mas o apartamento de Londres não tinha nada a ver com ele. Talvez por isso ela se sentisse tão bem ali, esquecendo um pouco seu casamento.

Como o casamento de Lindy era no final da semana seguinte, Lisa decidiu ficar mais uma semana. Não valia a pena ir para a Cornualha, depois voltar para o casamento, apenas alguns dias após.

Ela levantou os olhos quando Margareth entrou silenciosamente na sala.

— O sr. Western está aqui para vê-la, senhora.

Lisa ainda achava difícil pensar nela como a senhora naquele apartamento, principalmente porque era muitos anos mais jovem do que a governanta.

— Por favor, traga-o aqui.

O que será que Clive queria? Qualquer que fosse seu motivo, era óbvio que ele continuava substituindo Andreas no escritório de Londres e Andreas continuava em Atenas, com Marisa!

Lisa levantou-se quando ele entrou, estendendo a mão para cumprimentá-lo. Ele parecia mais nervoso do que ela.

— Eu... eu só passei para ver como você estava... Isto é, para saber se está tudo bem com você.

— Há alguma razão pela qual eu não devesse estar bem?

— Não, é claro que não. Eu só estava pensando que...

— Você estava... ou Andreas?

— Andreas? Ele está aqui?

— Acho que é mais fácil para você do que para mim saber onde ele se encontra. Parece que eu sou sempre a última pessoa a saber onde ele está ou com quem. Se não foi ele quem o mandou aqui, então deve ter sido Helena.

— Sim... Ela me telefonou e pediu para eu vir até aqui saber como você estava.

— Considerando que eu falei com ela pelo telefone ontem à noite, estou surpresa que ela esteja tão preocupada. — Ela costumava telefonar todas as noites, logo após o jantar, desde que percebera a preocupação de Helena com o seu mal-estar.

— Pois ela está muito preocupada. Acho que está pensando que você também a abandonou. — Mais uma vez ele parecia embaraçado.

— Também? Tenho certeza de que ela sabe que seu pai tem muito trabalho e...

— Eu não me referia a Andreas. Eu estava pensando em Gina.

— A mãe dela? — Lisa não conseguia compreender a relação. — Mas aquilo foi totalmente diferente.

— Helena não pensa assim. Ela se afeiçoou a você, e pensa que também vai abandoná-la.

— Mas ela parecia muito bem ao telefone, ontem à noite.

— Acho que você já deve ter percebido como ela é na realidade: dura como granito por fora, mas mole como gelatina por dentro. Helena jamais deixará você perceber como ela é vulnerável.

— E, no entanto, você percebeu.

— Eu já trabalho com Andreas há oito anos, praticamente acompanhei o crescimento de Helena. Sou como um tio para ela, se você preferir. E nesse exato momento ela está muito preocupada, embora nem por um minuto vá deixar você perceber isso.

— Então acho melhor ela vir para cá. — Ela já tivera tempo suficiente para pensar, e não queria perder Helena também. — Eu também gosto muito dela, você sabe, não é?

— Será que não seria mais simples você voltar para a Cornualha?

— Não! — Imediatamente se arrependeu de sua resposta brusca. — Eu... eu não posso voltar agora. Tenho um casamento para ir dentro de dois dias.

— Ele poderá vir para cá, você sabe — Clive falou gentilmente.

— Quem?

— Ora, Lisa, não precisa brincar comigo. Nós dois sabemos de quem estou falando.

— Andreas?

— É claro que só pode ser Andreas. Não é da minha conta…

— Exatamente, não é. Desculpe, eu não quis ser grosseira. Por favor, Clive, não quero falar sobre Andreas.

— Tem certeza?

— Sim. Absoluta certeza. Você não gostaria de me acompanhar neste casamento? Eu detestaria ter que ir sozinha.

— O quê?

— Eu não tenho ninguém para me acompanhar a este casamento no sábado. Eu gostaria muito, se você pudesse me acompanhar. Naturalmente, se tiver outro lugar para ir...

— Eu não tenho. A que horas e onde será o casamento?

Eles combinaram tudo e, logo em seguida, Clive saiu. Lisa estava ansiosa para assistir ao casamento da amiga, e muito feliz por Lindy e Christopher terem finalmente acertado tudo. Infelizmente, seu casamento parecia estar cada vez mais próximo do fim. Não havia dito nada a Lindy sobre isso, não querendo dar explicações que se fariam necessárias.

Telefonou para Helena assim que Clive partiu, assegurando-lhe que estaria de volta na próxima semana. Convidou-a para ficar uns dias em Londres, mas Helena, em vez de aceitar, fez com que Lisa concordasse em voltar para casa no domingo. Bem, pelo menos um membro da família Vatis parecia se importar com ela.

Deus, como ela ainda amava Andreas! Pensava nele o tempo todo, e sonhava com ele todas as noites. Não podia abandoná-lo, pois isso significaria a incriminação de seu pai, além de magoar muito seus tios. Na realidade, ela não queria ir embora, mas Andreas já havia colocado um ponto final naquele casamento, recusando-se a voltar de Atenas.

Ela ficava imaginando o tempo todo o que ele estaria fazendo e se Marisa continuava em sua companhia. A separação já era triste, mas saber que ele permanecia em Atenas apenas para ficar junto da amante machucava demais seu coração.

As férias de Clive haviam terminado há duas semanas e, portanto, não havia nenhuma outra explicação para sua permanência em Londres, enquanto Andreas ficava em Atenas. Lisa tinha que se conformar com o fato de Andreas preferir ficar com Marisa do que com ela.

E quem poderia culpá-lo? Ela não tinha sido uma boa esposa e a única vez em que fizeram amor não havia contribuído em nada Com certeza ele não sentia a mesma frieza em Marisa.

Queria tanto vê-lo, implorar-lhe, se fosse necessário, que voltasse para casa. Mesmo assim, sabia que nem sequer falar com ela Andreas queria. Certa vez, ela estava na sala quando o telefone tocou e Helena perguntou se ele queria falar com Lisa. Não precisava que a garota lhe dissesse a resposta. A reação dela e sua resposta ríspida em grego foram suficientes para demonstrar a recusa dele.

Ela saiu logo cedo, na sexta-feira, para comprar um vestido para o casamento. Donny Paulos estava esperando do lado de fora do apartamento quando ela voltou.

— Como está? — ele perguntou.

— Por que você deveria se preocupar?

— Ele lhe disse?

— Disse o quê?

— Andreas Vatis lhe falou sobre mim? Sobre a maneira como eu... eu...

— ...me espionou? — ela completou suavemente. — Claro que sim. Agora, se me dá licença, eu preciso entrar.

— Lisa, — Ele a segurou pelo braço. — Lisa, por favor...

— Este homem a está importunando, sra. Vatis? — Albert, o velho porteiro, tinha estado observando e decidira que já era hora de intervir.

— Está tudo bem, Albert. — Ela sorriu para ele. — O sr. Paulos é um velho conhecido meu.

— Bem, se tem certeza...

— Tenho, obrigada. — O sorriso desapareceu de seus lábios quando tornou a falar com Donny. — Acho melhor você entrar.

Entraram no apartamento e, depois de deixar as compras no quarto voltou para a sala para conversar com Donny.

— Então você realmente se casou com ele?

Lisa virou a maravilhosa aliança de ouro em seu dedo antes de responder:

— Como você descobriu?

— Há muitos comentários no escritório. Você sabe, o pessoal acha que ele vai estar menos nervoso, agora que tem uma esposa jovem e bonita para compartilhar sua cama. Só ontem é que eu me dei conta de que poderia ser você.

— Como?

— Eu estava no escritório de Clive quando Helena telefonou. Pelo o que eu ouvi da conversa, deu para perceber que a mulher de Andreas era você.

— Isto são modos de falar de seu patrão?

— Eu não sabia que ele pretendia casar com você.

— E o que é que você imaginava que ele pretendia fazer comigo?

— Eu pensei que... pensei que... — Donny não conseguiu completar a frase e sentiu que seu rosto estava vermelho.

— Acho que entendo. Um homem como Andreas jamais iria sentar-se tranqüilamente em seu escritório e deixar você acompanhar a mulher que ele queria.

— Mas você está casada com ele!

— É, estou. Mas ele não está aqui comigo, está? Sua ausência deve ser suficiente para dizer-lhe em que pé está o nosso casamento. Sendo grego, você provavelmente entende este código de vingança que existe entre o seu povo.

— Vingança? Mas por quê?

— Acho que isto não é da sua conta — ela falou ríspida.

— Provavelmente não. Você é infeliz?

— Não. — Ela respondeu imediatamente.

— Você não pode ser feliz casada com um homem que não a ama, e não se importa com você.

— Você está assumindo muitas coisas, Donny. O que é que você ganha com isso? Você era apenas um auxiliar de escritório na ultima, vez em que nos vimos. Qual a posição que você ocupa agora?

— Eu... eu não fiz aquilo por esta razão. Eu...

— Qual o seu cargo, Donny?

— Eu sou o assistente do escritório de Londres.

— Ora, vejam só! Foi uma recompensa por serviços prestados?

— Eu não teria feito se soubesse a razão. Acredite-me. Lisa, eu não tinha a menor idéia de que ele ia se casar com você.

— Parece-me que esta observação torna as coisas piores. O que é que você pretende agora, Donny? Continuar de onde paramos, depois que Andreas se cansar de mim?

Donny não sabia onde colocar as mãos e mantinha os olhos baixos.

— Você não recebeu as cartas que deixei com Lindy?

Ela havia recebido muitas cartas dele. Mas nem se dera ao trabalho de lê-las.

— Sentindo-se culpado, Donny?

— Sim! Eu queria ter certeza de que ele não fez nenhum mal a você.

— Como você pode ver, estou muito bem e vivendo com todo o conforto que o dinheiro pode dar. Agora, se você não se importa, eu gostaria de ir descansar. Até logo.

— Lisa...

— Não temos mais nada a dizer. Donny. Tenho certeza de que sua hora de almoço já deve estar terminando. Não gostaria que você manchasse sua excelente folha de serviços com um atraso sem necessidade.

— Já basta. Lisa!

— Sim, já é mais do que suficiente — ela concordou, altiva. — Você vai sair por bem ou vou ter que colocá-lo para fora?

— Vai pedir ajuda àquele velhinho da portaria? — Ele estava nervoso e parecia querer continuar a discussão.

— Não. — Lisa pegou o telefone e começou a discar.

— Você está chamando a polícia? — Donny ficou realmente preocupado

— Alô! Por favor, o sr. Clive Western — ela falou tranqüilamente. Não se surpreendeu quando uma mão desligou o telefone. Ela não tinha nem idéia do número do telefone de Clive, mas truque dera resultado.

— Não há necessidade disso. Eu já vou embora.

— Espero que sim.

— Eu só vim até aqui para me desculpar.

— Desculpas aceitas. — Ela apontou a porta aberta. — Donny, eu entendo por que razão você agiu assim. Meu marido é um homem poderoso, não é fácil recusar as coisas a ele.

— Obrigado. Adeus e felicidades.

 

Clive não demonstrou saber que seu assistente tinha visitado Lisa quando passou no apartamento para levá-la ao casamento

A noiva estava maravilhosa. A igreja, as flores, o vestido branco com um cauda longa e vaporosa, tudo lembrava a Lisa o que não tinha sido o seu casamento. E Andreas certamente jamais a olharia com a adoração que Christopher dedicava à noiva.

A recepção foi no apartamento, e os convidados lotaram todos os cômodos. Clive parecia um pouco tímido, pois não estava acostumado com reuniões daquele tipo. A família de Lindy era numerosa e muito alegre. Depois de algum tempo, sentiu-se mais à vontade, pois todos receberam Lisa e ele com muito carinho.

— Uma multidão muito agradável — Clive comentou quando voltavam para o apartamento de Lisa. Já passava da meia-noite, embora a festa estivesse longe de terminar.

— Muito agradável — Lisa concordou. Ela gostaria muito de ter tido um casamento como aquele. O casamento que um dia havia sonhado para si. — Lindy achou você muito simpático. — Sorriu ao se lembrar disso, pois Lindy tinha feito outras observações, pensando talvez que Clive fosse seu namorado.

— Ela não sabe que você está casada, não é?

— Nem eu, na maioria das vezes. É muito fácil esquecer quando não se vê o marido por muitas semanas, principalmente depois de estar casada há tão pouco tempo.

— E quando Andreas vai voltar?

— Ele vai voltar? — Ela já estava começando a duvidar.

— Oh, é claro que voltará! Muito breve.

— Você tem alguma notícia dele? Sabe quando ele pretende voltar?

— Não exatamente. Mas sou de Atenas e tenho uma noiva lá. Andreas sempre viaja bastante e nunca fica muito tempo no mesmo lugar. Ele sabe que prefiro ficar na Grécia e, embora eu não aprecie o sol de lá, gosto demais da minha noiva.

— Então por que veio passar suas férias na Inglaterra?

— Férias? Mas eu não estou de férias. Andreas me pediu para ficar em Londres durante algumas semanas, enquanto ele descansava em Vatis. Só que eu não esperava que fosse tanto tempo. Já estou aqui há seis semanas.

Então Andreas tinha ficado em Atenas porque quis. Ela é que imaginara que Clive estava de férias, apesar de Andreas nunca ter dito isso.

— Você pediu a ele para voltar?

— Sim, tenho pedido a ele todas as vezes que falamos por telefone.

— E ele disse que não. Sinto muito. Clive, acho que sou eu a razão pela qual ele não quer voltar para Londres.

— Eu nunca consegui entender por que razão você se casou com ele. Andreas me pediu para contratá-la, não importava o cargo. Pensei que fosse para ajudá-la, porque talvez você fosse muito orgulhosa para aceitar outro tipo de ajuda.

— Será que podemos discutir isso lá dentro?

Margareth já estava dormindo, mas deixara as lâmpadas acesas e um lanche preparado.

— Café? — Lisa perguntou, servindo-se.

— Não, obrigado. O que você estava dizendo? — Ele estava ansioso para continuar o assunto interrompido.

— Eu não estava, mas vou dizer agora. A última coisa que Andreas deseja é ser agradável ou generoso para comigo.

— Então, por que casou com você? Desculpe — ele ficou embaraçado com a pergunta indiscreta — eu não queria que soasse desta maneira.

— Tenho certeza que não — disse uma voz glacial.

— Andreas! — Lisa e Clive exclamaram ao mesmo tempo.

— Boa noite. Ou será melhor dizer bom dia? — Andreas entrou na sala dominando os dois com sua figura alta.

— Nós fomos a um casamento — Lisa falou na defensiva. Como ele estava maravilhoso! Ela ficou com os olhos fixos no marido sentindo que o amor que sentia por ele aumentava a cada segundo.

— Foi o que Margareth me informou. Ela não soube dizer onde, se não eu teria ido me encontrar com você. — Ele parecia calmo, mas sua referência ao horário mostrava que era só aparência.

— Foi o casamento de Lindy. — Lisa estava feliz por estar usando uma roupa bonita que a fazia parecer mais mulher e marcava suas curvas delicadamente. Seus cabelos estavam sedosos e brilhantes, mas lembrou-se repentinamente que Andreas não gostava deles.

— Sua ex-companheira de apartamento?

— Ela não estava surpresa por ele saber esses detalhe, tinha acompanhado sua vida por tantos anos!

— Acho que já é tarde, eu vou indo. — Clive levantou-se, sabendo que era o melhor a fazer no momento.

— Não há necessidade de sair só porque eu estou aqui — Andreas disse. Seu tom de voz era educado, mas Lisa sentiu que estava carregado de sarcasmo.

Por que ele estava tão nervoso? Ela havia ficado sozinha durante tantas semanas, enquanto ele estava na Grécia, em companhia de sua amante, divertindo-se.

— Tenho certeza de que você não estaria partindo tão cedo se estivessem a sós. Então, por favor, não saia só por minha causa.

Clive conhecia Andreas o suficiente para não se deixar enganar por sua voz baixa e calma.

— Eu tenho realmente que ir. Obrigado pelo convite, Lisa, foi um ótimo casamento. Gostei muito da festa.

— Eu também.

— Devo sair da sala para que vocês dois possam se despedir? — Andreas perguntou, a raiva prestes a explodir.

— Isto não será necessário — Clive falou com calma. — Já nos despedimos.

— No carro, suponho. Você andou beijando minha mulher para todo mundo ver?

— Eu não beijei Lisa em lugar algum. Nem mesmo tentaria, pois tenho certeza de que no mínimo receberia um tapa como resposta.

— Será? Eu duvido muito.

— Então talvez não conheça sua mulher tão bem quanto deveria. E pode me despedir se quiser, mas não vou ficar calado vendo você ofender uma pessoa direita e honesta como Lisa.

— Ela não é tão inocente quanto aparenta — ele falou com amargura. — Posso lhe assegurar.

— Andreas! — Lisa quase engasgou, sentindo as faces em chamas. — Tenho certeza de que Clive não quer ouvir falar sobre nossos problemas pessoais.

— Talvez não, e você continua no seu cargo. Clive. Sabe que não posso dispensá-lo, pois sua presença na firma é muito importante para mim. Já reservei um lugar para você partir amanhã para Atenas.

— Você vai ficar em Londres? — Clive perguntou, os olhos brilhando com a boa notícia.

— Depende... de várias coisas. — Ele deu uma olhada para Lisa. — Mas isto não vai impedi-lo de ficar em Atenas. Agora, eu gostaria de falar com Lisa. Boa noite.

— Boa noite. Tudo bem, Lisa? — ele perguntou suavemente.

— Não precisa se preocupar, que não vou machucá-la.

— Eu sei disso. Eu só...

— Ela é minha mulher. Clive! Nossa amizade não lhe dá o direito de interferir neste problema.

— Pode ir. Clive — Lisa falou, sentindo que a pressão da mão de Andreas em seu ombro aumentava. — Está tudo bem.

— Se você precisar de mim. Lisa, sabe onde me encontrar.

— Ela não vai precisar de você. Agora vá embora. — Ele soltou Lisa e caminhou rapidamente até a porta, abrindo-a.

— Por favor, vá e não se preocupe. Tenha uma boa viagem de volta a Atenas.

Assim que Clive saiu, Andreas caminhou em silêncio até a janela e ficou de costas para Lisa durante alguns minutos.

— Há quanto tempo você está vendo Clive? — ele perguntou, voltando-se lentamente.

— Eu não estive vendo Clive, Andreas. Ele veio até aqui na quinta-feira a pedido de Helena e eu o convidei para me acompanhar a este casamento.

— E como você o convenceu?

— Apenas convidando, Andreas. O que é que você está imaginando?

— E Donny Paulos? Que tipo de convites você tem feito a ele?

— Donny? Mas eu...

— Ele foi me ver, Lisa.

— O quê?

— Ele chegou em Atenas hoje pela manhã, dizendo exatamente o que eu podia fazer com o emprego dele e foi embora.

— Que tolo! Não passa de um estúpido. Suponho que você pretenda despedi-lo, também.

— Pelo contrário. Pretendo deixá-lo cuidando do escritório de Londres, agora que Clive vai voltar para Atenas. Eu gosto de homens que posso respeitar. Fazendo o que fez, Donny ganhou o meu respeito.

— E onde você vai ficar, se ele volta para Londres?

— Como eu disse a Clive, isso depende. Eu poderia ir para Nova York, ou mesmo ficar em Vatis, cuidando de tudo.

— Mas eu pensei que você gostasse de Vatis para descansar.

— Poderá continuar assim, se eu souber organizar meu trabalho.

— E depende do quê? — Lisa perguntou finalmente.

— De você.

— Você quer o divórcio? Pretende levar Marisa para Vatis com você?

— É o que acha?

— Bem, naturalmente que sim. Eu não vou lutar com você, Andreas. — Deu um sorriso amargo. — O que você decidiu?

— Estou surpreso com sua calma, Lisa. Diga-me, você ainda está zangada comigo? — Vendo o olhar confuso dela, continuou: — Você ainda pensa que foi um selvagem que dormiu com você naquela última noite?

— Não. — Ela sentiu que corava.

— Mas não foi como fazer amor, não é? — Seus olhos brilharam, com uma esperança remota.

— Você disse que não seria.

— Então você passou a me odiar por atacá-la daquela maneira, não é?

— Não! — disse, veemente.

— Você agiu como se fosse assim.

— Eu estava envergonhada. — Para que mentir agora, se estava tudo terminado?

— Porque a deixei excitada?

— Será que você tem que tirar tudo de mim? — Lisa começou a chorar. — Não pode deixar ao menos meu orgulho? É claro que eu fiquei envergonhada por reagir daquela maneira... Você me possuiu com ódio.

— Não com ódio, Lisa — ele negou com firmeza. — Nunca houve ódio em meus sentimentos para com você.

— Mas você sempre me odiou. — Ela olhava para Andreas, incerta.

— Eu deixei de odiá-la quando você preferiu saltar da janela em vez de casar comigo. Esperava encontrar uma garota mimada e sem vontade própria, mas descobri uma mulher disposta a lutar contra mim tanto moral quanto fisicamente. Comecei a respeitá-la e admirá-la a partir daquele momento. Acabei descobrindo que estava amando você.

— Amando? — Lisa não conseguia acreditar.

— Você não acredita em mim?

— Eu... eu acho que não posso. Depois da maneira como você me tratou...

— Foi imperdoável, eu sei. Mas eu a amo, Lisa. Eu a amo muito. — Havia uma certa insegurança nele, agora, e seu corpo estava tenso à espera de uma resposta. — Só estava perguntando sobre sua saída com Clive e a visita de Donny porque estava com ciúme. Eu a quero para mim, Lisa.

— Mas você não pode! Marisa...

— É minha secretária... e minha prima.

— Sua... sua prima?

— Sim.

— Era essa a outra relação que você tinha com ela? — Seus olhos fitavam Andreas sem poder acreditar.

— Sim

— Nada mais?

— Nada.

— Então, por que você me disse...

— Porque fui um tolo. lembra que fiz Helena cair numa armadilha quando disse que Demitri não estava interessado nela? Bem, tentei fazer o mesmo com você, só que levei um pouco mais longe... Deixei que acreditasse que havia outra mulher em minha vida. Foi uma estupidez, concordo. Eu tentei mostrar-lhe isso, excitando-a até um ponto que você não podia resistir e depois parando. Tudo aquilo me deixava em agonia todas as noites, principalmente porque parecia que não surtia efeito em você.

Isso era o que ele pensava! Lisa estava atônita diante dessas revelações, mas não conseguia acreditar nele.

— Por que você está me dizendo tudo isso?

— Eu espero poder superar esse mal-entendido, e normalizar nosso casamento.

— Um mal-entendido causado por você! — ela acusou.

— Jamais poderei me desculpar o suficiente, pela maneira como a possuí. Tenho me culpado desde então, mas eu a desejava desesperadamente e não podia esperar mais. Foi...

— Não foi isso que causou o mal-entendido — ela falou, impaciente. — Ter ido embora de Vatis para Atenas com Marisa foi a razão. E também ter passado a noite anterior com ela.

— Eu dormi no quarto pegado ao seu, naquela noite. Ouvi quando você caminhava de um lado para o outro mas sabia que teria de partir ou correria o risco de acontecer novamente. Por Deus, Lisa, eu a amo muito! — Suas mãos queriam tocá-la, mas Andreas temia uma reação negativa. — Eu não posso ficar perto de você sem tocá-la... Tive que ficar longe durante estas semanas, pois sabia que iria querer ficar com você o tempo todo.. Mas não queria magoá-la mais ainda.

— Eu não posso acreditar em você. Você sempre se controlou tão bem. Você... você até me desafiava por causa das minhas fraquezas.

— Eu nunca me controlei, no que dizia respeito a você. — Ele estendeu as mãos. — Você vê, estou tremendo por não poder apertá-la nos meus braços.

— Eu continuo sendo a filha do homem que provocou o acidente no qual você perdeu uma vista, e que roubou sua mulher quando você estava doente.

— Sim, ele a levou, mas não sem o consentimento de Gina. Quanto ao acidento, tenho uma confissão a lhe fazer. Eu soube mais alguns detalhes sobre ele.

— Acidente? Você está chamando uma tentativa de assassinato de acidento?

— Porque foi o que aconteceu. Acredite-me, Lisa, eu não a teria obrigado a casar comigo se não acreditasse que minha versão era verdadeira. Quando seu pai morreu, não foram feitas outras investigações.

— Sim, você já me disse.

— Se eu tivesse continuado, teria descoberto que seu pai estava doente. Ele tinha um tumor no cérebro.

— Não! — Lisa empalideceu.

— Sim. Ele tinha ataques rápidos, e nesses momentos não sabia o que estava acontecendo. Ele teve um desses ataques: durante a corrida...

— Foi por isso que pararam com a investigação?

— Sim. Logo que eu soube da doença de seu pai, verifiquei no processo e descobri que ele havia sido proibido de correr novamente, apesar de nunca terem informado isso ao público. Acredita-se que ele tinha se retirado espontaneamente das corridas, após o acidente.

— Quando você descobriu isso?

— Primeiro eu quero saber se você realmente deseja o divórcio. Será que não existe uma chance de você vir a gostar de mim, ao menos um pouquinho? Perdoe-me a maneira cruel como a tratei.

— Como você descobriu, Andreas? — Ela não podia se entregar ainda. Sabia que assim que confessasse seu amor não haveria mais condições de conversar. Não existiriam mais palavras a serem ditas...

— Eu tive oportunidade de conversar com seus tios antes de você chegar. Eles me contaram a verdade pensando que eu já soubesse.

— Por que você não me contou naquele dia, então? — Ela prendeu a respiração, esperando a resposta.

— Porque você teria me deixado! — Ele parecia desesperado. — Tentei contar-lhe em Vatis, sabendo que você não poderia sair dali mesmo que quisesse, mas sempre havia gente ao nosso redor, e tantos desentendimentos...

— Você já me amava, quando estávamos na casa dos meus tios — A mudança de atitude para com ela naquele dia parecia compreensível agora.

— Claro que sim. Por que é que você pensa que eu mandei preparar aquele quarto em Vatis especialmente para você? Eu imaginei que passaríamos horas inesquecíveis... Eu queria que você fosse feliz e quisesse ficar lá comigo.

— E você conseguiu gostar dos meus cabelos avermelhados? — Sua voz soou mais alegre quando ela sentiu que as barreiras estavam todas destruídas.

— Especialmente dos seus cabelos. Lisa. Eu a amo mais do tudo neste mundo, e se você me deixar estarei acabado.

— Não com sua força, Andreas — ela disse gentilmente.

— Você é minha força. Eu esperava...

— Sim?

— Esperava que você ficasse grávida. Assim teríamos um filho para nos unir, uma criança que a manteria junto de mim.

— Você se importaria se essa criança fosse concebida com amor?

— Com amor? — ele perguntou, tenso.

— Sim, com muito amor. Você pode me levar de volta para Vatis quando quiser. Eu ficarei lá para sempre... com você.

— Lisa! — Ele a abraçou e começou a beijá-la, louco de felicidade. — Como esperei por este momento. Diga-me, querida, diga que me ama.

Ela tomou a mão dele e caminhou para o quarto.

— Eu tenho uma maneira melhor de dizer estas palavras, e pode ter certeza de que desta vez não vou lutar com você.

 

E Lisa lhe disse muitas vezes o quanto o amava, naquela noite. Seu último pensamento antes de adormecer nos braços de Andreas foi que estava no céu e que lá não havia tristezas nem dor, mas a felicidade total que ela sentia no momento e que sentiria durante todo o resto de suas vidas juntos.

 

 

                                                                  Carole Mortimer

 

 

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