Criar um Site Grátis Fantástico
Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


15 de Novembro / Lima Barreto
15 de Novembro / Lima Barreto

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

15 de Novembro

 

Escrevo esta no dia seguinte ao do aniversário da proclamação da República. Não fui à cidade e deixei-me ficar pelos arredores da casa em que moro, num subúrbio distante. Não ouvi nem sequer as salvas da pragmática; e, hoje, nem sequer li a notícia das festas comemorativas que se realizaram. Entretanto, li com tristeza a notícia da morte da princesa Isabel. Embora eu não a julgue com o entusiasmo de panegírico dos jornais, não posso deixar de confessar que simpatizo com essa eminente senhora.

Veio, entretanto, vontade de lembrar-me o estado atual do Brasil, depois de trinta e dois anos de República. Isso me acudiu porque topei com as palavras de compaixão do Senhor Ciro de Azevedo pelo estado de miséria em que se acha o grosso da população do antigo Império Austríaco. Eu me comovi com a exposição do doutor Ciro, mas me lembrei ao mesmo tempo do aspecto da Favela, do Salgueiro e outras passagens pitorescas desta cidade.

Em seguida, lembrei-me de que o eminente senhor prefeito quer cinco mil contos para reconstrução da avenida Beira-Mar, recentemente esborrachada pelo mar.

Vi em tudo isso a República; e não sei por quê, mas vi.

Não será, pensei de mim para mim, que a República é o regime da fachada, da ostentação, do falso brilho e luxo de parvenu, tendo como repoussoir a miséria geral? Não posso provar e não seria capaz de fazê-lo.

Saí pelas ruas do meu subúrbio longínquo a ler as folhas diárias. Lia-as, conforme o gosto antigo e roceiro, numa "venda" de que minha família é freguesa.

Quase todas elas estavam cheias de artigos e tópicos, tratando das candidaturas presidenciais. Afora o capítulo descomposturas, o mais importante era o de falsidade.

Não se discutia uma questão econômica ou política; mas um título do Código Penal.

Pois é possível que, para a escolha do chefe de uma nação, o mais importante objeto de discussão seja esse?

Voltei melancolicamente para almoçar, em casa, pensando, cá com os meus botões, como devia qualificar perfeitamente a República.

Entretanto - eu o sei bem - o 15 de Novembro é uma data gloriosa, nos fastos da nossa história, marcando um grande passo na evolução política do país.

Marginália, 26-11-1921

                                                                                            Lima Barreto

 

Carlos Cunha        Arte & Produção Visual

 

 

Planeta Criança                                                             Literatura Licenciosa