Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites
A Chama do Desejo
Joaquin Luis Sola é fiel à herança Argentina. Orgulhoso e apaixonado. Com isso, conseguiu reerguer os negócios da família. Mas no amor, ainda era infeliz. Abandonado há cinco anos pela bela Nicole Ashton, Quin ainda a deseja.
Agora, há uma chance de solucionar essa questão. Nicole lhe oferece vinte e seis noites de amor, se ele pagar suas dívidas. E para Quin, esta proposta promete um retorno muito mais rentável...
— Se você não me quer em sua vida, Nicole — disse ele, devagar, baixinho — por que arriscou vir ao meu encontro àquela noite no Havana Club?
— Para fazer você pagar — respondeu ela impulsivamente.
— Pagar pelo quê? Nunca fiz nada que você não quisesse.
— Pelo que você não fez — murmurou com raiva, e depois se controlou para expor seus argumentos com calma. — Usei o sexo, que era só o que você queria de mim, para pagar por esse teto sobre nossas cabeças.
Era a noite de abertura do novo Havana Club, em Sidney, e Joaquin Luis Sola estava no bar lotado, esperando as bebidas que pedira, enquanto observava as pessoas dançando. Seu amigo, o cobiçado advogado Tony Fisher, prometera que todas as pessoas bonitas estariam lá, para verem e serem vistas. Era o lugar do momento. Sem dúvida, Quin conseguiria uma parceira para mais que uma dança.
Para ele, ir à festa de Tony era mais uma maneira de escapar do tédio do que uma busca por sexo casual. Quin saíra de um relacionamento pouco satisfatório e não queria complicar a vida com outra mulher.
Sendo assim, pôs-se apenas a observar os casais dançando salsa. A música latino-americana estava na moda: vários programas de televisão exibiam competições, e o Havana Club apostava na tendência.
— É uma ótima maneira de conhecer gente — entusiasmou-se Tony.
Quin impressionara-se com a alegria exuberante do lugar. A maioria das pessoas havia adotado a moda da música latina; os homens de camisas justas e punhos dobrados, calças boca-de-sino e penteados bem cuidados; as mulheres, roupas provocantes e fendas laterais, calças pretas colantes, blusas que deixavam a barriga à mostra, saias rodadas e saltos altos.
A boate era um país exótico e sensual. Ali, as pessoas podiam soltar o cabelo, vestir-se como quisessem e aproveitar o prazer de mover-se ao som da música, sem esquecer a excitação sexual... com o parceiro certo.
Um casal chamou a atenção de Quin. O homem estava todo de branco. O cabelo preto preso em um rabo-de-cavalo deixava a pele morena e as belas feições mais dramáticas. A mulher usava um vestido preto, justo, de costas nuas. Tinha também um longo cabelo negro, que caía pelos ombros em cachos, fazendo Quin se lembrar de Nicole Ashton, o que não era muito agradável.
— Sua bebida senhor.
Quin pagou ao barman e viu que os preços dos drinques da boate também pertenciam ao mundo da fantasia, como sua clientela, que não calculava os gastos. Por mais rico que tivesse se tornado, o valor do dinheiro ainda era muito forte na mente. Isso não o impedia de comprar as coisas, mas era impossível esquecer as lições aprendidas com a pobreza.
Segurando o copo, Quin atravessou a pista de dança em direção às mesas que Tony reservara para sua festa. Encontrou a mulher com os cachos iguais aos de Nicole na sua frente.
A moça tinha um corpo estonteante. Os seios opulentos ficavam presos em um corpete. Os quadris eram como poesia. E suas longas pernas brilhavam com elegância feminina.
O homem de branco segurou-a e jogou-a sobre seu joelho. O belo corpo da mulher arqueou-se, os pés em ponta, a cabeça para baixo, o cabelo tocando no chão e os olhos verdes reluzindo de êxtase. Tudo isso iluminado com um sorriso. Aquele rosto foi um choque tão grande para Quin que ele chegou a derrubar a bebida.
Era Nicole!
Quin não esperava encontrar com ela dessa maneira, não esperava que seus caminhos se cruzassem novamente. Depois que terminaram, ela viajara, cortando totalmente o contato com ele. No entanto, aqui estava, na boate da Sussex Street. E grudada em outro homem.
Isso fazia sentido, pensou Quin. Por que ela não seguiria em frente? Por que não arranjaria outro homem? Ele arranjou outra mulher, apesar de jamais sentir com ela o mesmo que sentira com Nicole. Na verdade, ele não queria ter ligação emocional forte com ninguém depois que ela saiu de sua vida.
Era um absurdo ficar se remoendo por causa de Nicole. O que passou, passou. Ele desviou os olhos da pista de dança e concentrou-se nos copos que segurava. Procurou Tony e dirigiu-se para lá. Sentou-se ao lado de Amber Piramo, que pedira a bebida. Ela esperava que ele pagasse e que todos os seus caprichos fossem satisfeitos, pois era a bela filha socialite de pais ricos.
— Obrigada, querido Quin — disse, esfuziante. — Estou completamente desidratada.
Ele não era querido para ela. Apesar dos atrativos físicos óbvios, aquele carinho o irritava. Ele teve de forçar um sorriso para responder:
— Desculpe ter demorado tanto no bar.
— Tudo bem — respondeu ela, colocando a mão na coxa de Quin.
Os músculos da perna dele ficaram tensos, repelindo aquele toque. O único toque que ele queria era... Mas Nicole estava com outro homem.
Amber retirou a mão convidativa e segurou o copo. Ela bebeu muito, e muito rápido, descuidando-se do teor alcoólico do drinque. Quin desejou que ela não estivesse armando para dar em cima dele de maneira ainda mais direta. Embora seja uma atitude antiquada hoje em dia, ele achava que ir à caça continuava sendo privilégio do homem.
Quando a música parou, o olhar foi instintivamente direcionado para Nicole. Seu acompanhante a levou para uma mesa onde havia uma mulher com o cabelo incrivelmente roxo. Os três se davam muito bem, riam e conversavam — duas mulheres e um homem entre elas, todos muito amigos.
Tony, que saía da pista de dança com a mais nova namorada, Nina Salter Smythe, bloqueou sua visão.
— Preciso de uma calibrada de cerveja — declarou, deixando Nina na mesa e indo ao bar.
Ela chamou Amber para acompanhá-la ao banheiro e as duas se levantaram. Quin ficou livre para observar Nicole, sem interrupções.
Ele tentou dizer a si mesmo que essa mulher o havia rejeitado. Não devia pensar nela novamente.
No entanto, todos os instintos agressivos estavam pegando fogo. Ela fora sua mulher e ele queria outra chance. Se não fosse casada com o conquistador latino que olhava para as duas mulheres indiscriminadamente, ele ainda podia se mexer.
E, assim, logo que Tony voltou para a mesa, comportando-se como um simpático anfitrião, Quin interceptou-o antes que se sentasse.
— Vi alguém que quero conhecer — explicou. — Você me dá licença?
— Espere um minuto — protestou. — E Amber? Ela está de olho em você.
— É uma decepção — disse Quin, levantando a mão para afastar qualquer comentário. Ele escapou e seguiu em direção à única mulher que lhe ocupava o pensamento.
CAPÍTULO 2
Nicole ficou feliz por Jade e Jules conseguirem convencê-la a acompanhá-los naquela noite. Eles alegaram que ela devia conhecer o Havana Club para passar às suas alunas. No entanto, eles só não sabiam que a escola de dança que Nicole gerenciava para a mãe estava mergulhada em dívidas. Aceitara o convite, pois precisava deixar as preocupações de lado e aproveitar a companhia dos amigos, sem pensar no dia de amanhã.
— Homem bonito se aproximando, Nic — brincou Jade.
— Nota de um a dez? — perguntou Nicole, rindo.
— Dez, com louvor.
Ela sorriu, incrédula. Desde que Jade voltara da longa experiência trabalhando com designers europeus para montar seu negócio em Sydney, ela tentava arrumar namorado para Nicole.
Jules se inclinou e sussurrou em seu ouvido:
— Tenho de admitir que Jade tem razão. Um cara lindo está se aproximando. Top de linha mesmo.
Nicole estremeceu ao escutar aquilo. De repente, lembrou-se de alguém do passado assim... tão atraente...
— Nicole...
Aquela voz... Um arrepio percorreu seu corpo. A pele ficou gelada, o estômago se contraiu e a cabeça girou, tudo tentando negar o som familiar que ouvia. Não podia estar se confundindo.
— Quin... — o nome pulou de seus lábios antes que pudesse evitar.
Ele sorriu, atingindo-a, como a sete anos, e derrubando todas as barreiras de defesa. A única coisa que mudara nele era o cabelo, que agora brilhava com algumas mechas grisalhas, conferindo maturidade às feições incrivelmente bonitas. Nunca lhe faltou autoridade no rosto, com aqueles traços masculinos e bem delineados. O físico alto e forte emanava vigor e sensualidade.
— Que bom revê-la, Nicole — disse ele, em tom suave.
— O que você está fazendo aqui? — as palavras saíram abruptamente, guiadas pelo ressentimento de ver que ele ainda mexia com ela. Dominara sua vida por dois anos. Ela não passava de um brinquedinho sexual para ele.
— Eu gosto de dançar, lembra? — disse, com um leve sorriso nos lábios.
Ela não queria se lembrar de nada, mas ele era realmente um bom dançarino, pelo menos nas poucas vezes em que a acompanhou nas festas.
— Oi! Sou Jade Zilic — isso era típico de Jade: entusiasmada demais para esperar ser apresentada.
— E você?
— Joaquin Sola, mas todos me chamam de Quin — ele a cumprimentou educadamente, lançando um olhar suspeito na direção de Jules.
— Meu namorado, Jules — indicou Jade, deixando Nicole sozinha pelo resto da noite.
Jules estendeu a mão e Quin cumprimentou-o vigorosamente.
Está livre para agir, pensou Nicole, mas logo sua mente foi invadida por outra idéia. Quin não estaria ali sem uma acompanhante. Um homem como ele não precisava ir a lugar algum sozinho, e ele não iria desacompanhado a uma boate. Certamente, estava com um grupo do banco, divertindo-se.
— Posso fazer uma pergunta? — disse Jade, com os olhos travessos.
— Sim — incentivou Quin, abrindo-lhe espaço.
— Você está usando a Cueca Nick!
O sorriso charmoso desapareceu, o olhar virou-se para Nicole. As sobrancelhas enrugadas indicavam que estava reanalisando a situação. Será que aquela pergunta indecente tinha algo a ver com o fato de Joaquin ter sido namorado de Nicole? Estavam fazendo-o de bobo? Queriam rir dele?
Nicole gostou de ver o brilhante Joaquin Sola perdido. Isso a fez sentir-se menos vulnerável. No entanto, quando ele baixou os olhos, sentiu que pensava em sua calcinha, e apressou-se em explicar a pergunta:
— É um novo tipo de roupa de baixo masculina, criado pelos meus amigos.
Ele franziu novamente as sobrancelhas, voltando o olhar para os amigos dela.
— Companheiros de negócios!
— Isso. Com mercadorias muito quentes — alertou Jules, com um grande sorriso.
— Garantimos que vai despertar o diabo que existe em você — continuou Jade. Logo se mostrou aflita: — A propaganda não deve estar indo bem. Quin sequer sabe o nome da marca.
— Não se baseie na ignorância dele — disse Nicole, secamente. — Quin não tem tempo de assistir a comerciais de televisão.
— É mesmo? — indagou Jade, perplexa. Então, deu uma de suas risadas mais faceiras. — Você não parece ficar parado vendo TV. Parece um homem de mais ação. Por isso, você devia comprar a Cueca Nick. É muito excitante, acredite. O Jules faz testes comigo para medir a resposta do público.
— Ele posa para ver se você aprova? — perguntou Quin, tentando arrancar mais informação.
— Não o deixo ficar só posando — Jade deu um beijo no namorado.
— Atiça o fogo todas às vezes — confessou Jules, satisfeito.
Quin também ficou satisfeito, tudo indicava que Nicole estava disponível.
— Nada como propaganda pessoal — disse. — Da próxima vez que eu comprar cuecas, vou procurar sua marca.
— Não tem esposa para comprar para você, Quin? — Nicole agiu normalmente, tentando repelir o calor que subia pelo corpo.
— Não, não tenho — respondeu rapidamente.
— Aliás, se me lembro bem, você não gostava de compromisso.
— Pelo contrário. Eu diria que tenho um histórico de muito compromisso — retrucou, irônico. — Infelizmente, nem sempre escolho a hora certa para meu arrependimento. Quero corrigir esse meu erro de julgamento.
— Sorte da mulher que está com você agora — devolveu Nicole, destruindo a referência delicada ao arrependimento que ele sentia.
— Não estou com nenhuma mulher em especial.
— Quer dizer, nenhuma que importe — zombou ela, pois sabia que as únicas pessoas que importavam para Joaquin Sola eram aquelas que serviam às suas ambições.
— Todos têm valor — declarou ele. Seus olhos a analisavam, colocando-a no alto da escala de desejos.
— Você está certo — concordou Nicole, desafiando-o. — Mas, para alguns, o dinheiro conta muito mais que o valor de uma pessoa.
Os olhos dela estavam fixos nos dele, enquanto sua mente vasculhava os conflitos que destruíram o relacionamento dos dois, cinco anos antes.
— Não vamos fingir que dinheiro não conta, Nicole. Acrescenta valor a todos. Goste ou não, é como o mundo funciona — arrematou ele, sarcástico.
Verdade. Uma onda de ódio tomou o rosto da moça.
— Como calcula seu valor hoje em dia, Quin? — zombou ela. — Já alcançou seu objetivo? Quantos milhões queria mesmo?
Ele levantou a cabeça, medindo a amargura que havia nas palavras dela.
— O que você acha suficiente, Nicole? — perguntou suavemente. — O que supre suas necessidades?
Por um momento, ela foi seduzida pela idéia de que Quin era poderoso o bastante para reconquistá-la. Mas... Não, não podia pensar nisso. Colocaria muita coisa em risco, além da ruína financeira que ela e a mãe estavam vivendo. Ela o fitou, cética, e disse:
— Minhas necessidades nunca fizeram parte da sua vida.
— Gostaria que fizessem.
— Desde quando? Há dois minutos, quando você decidiu interromper minha noite?
— Se a intenção for sincera, o momento não importa.
— É um pouco tarde para demonstrar interesse por mim, Quin. E, sinceramente, não tenho interesse nenhum por você — declarou, insensível.
— Nunca é tarde para consertar o passado.
— Não é bom revirar as cinzas — zombou ela.
— Talvez... Mas sempre podemos encontrar uma brasa acesa.
Ambos estavam totalmente cientes de que a chama entre eles continuava viva. Isso já a levara a um caminho destruidor, e Nicole não seguiria essa direção novamente.
— A vida fica fria sem fogo, Nicole.
— Certamente, há muitos corações que o abrigariam. Eu, infelizmente, não posso lhe oferecer uma porta mágica. Vai ter de procurar em outro lugar — disse, dando adeus. — Hasta la vista.
Ele assentiu, entendendo a despedida. Porém, não deixou transparecer nenhum ar de derrota:
— Até a próxima — sorriu para Jade e Jules. — Foi um prazer conhecê-los.
— Igualmente — respondeu Jade.
— Experimente a Cueca Nick — sugeriu Jules. — É uma porta mágica!
Quin riu, afastando-se. Estava contente por ter causado uma boa impressão nos amigos dela.
Nicole rangeu os dentes. Se Jules ou Jade fizessem algum comentário positivo em relação a ele, certamente explodiria. O duelo de palavras com Quin a deixara muito agitada. Ele a tirava do sério. Sempre foi assim. Nenhum outro homem jamais fora capaz de afetá-la como Quin, mas isso não significava que ele era bom para ela. E algo dentro dela queria que ele sentisse também o gosto da derrota.
Jade e Jules fitaram-na como se vissem uma mulher totalmente diferente da Nicole que conheciam. A porta estava fechada para Joaquin Luis Sola.
— Não há volta — disse. Era tudo sempre do jeito dele.
— Isso não é bom — sussurrou Jules, compreensivo. — Há quanto tempo vocês terminaram?
Jade não estava na Austrália nessa época, mas, se Nicole dissesse a data, estaria lhe entregando todo o ouro. Jade era muito boa em juntar os fatos.
— Não importa — disse, levantando-se. — Esqueça esse assunto. Vou ao banheiro.
— Parece um desperdício — murmurou Jade.
Nicole saiu e esperava que, quando voltasse, o tema estivesse encerrado. De qualquer maneira, aquilo estragara a noite. Saber que ele estava por perto já a deixava ameaçada.
Queria partir agora, mas ir embora seria sinal de uma vulnerabilidade que não desejava que Quin Sola visse. Mas, não, tinha de agir como se fosse indiferente à sua presença.
O banheiro foi um refúgio, porém não podia demorar-se muito para não passar a impressão de que se escondia. O lugar estava lotado — uma fila imensa para usar as cabines e um mar de mulheres se amontoava em frente ao espelho. Nicole entrou na fila e tentou bloquear as lembranças de Quin ouvindo a conversa das outras pessoas.
— Então, como vai com Quin Sola?
A pergunta destacou-se das demais conversas, atraindo o olhar de Nicole para uma bela morena, com um vestido vermelho, que conversava com uma loura a la Paris Hilton, que usava um vestidinho azul e admirava os lábios sensuais no espelho.
— Não sei se ele vale a pena.
— Não vale a pena? O empresário mais bonito da cidade? Todos que têm dinheiro recorrem à empresa financeira dele. Ganha bilhões.
Sua empresa... Bilhões... Nicole percebeu que ele não era mais somente a estrela do time de um banco internacional. Nos últimos cinco anos, Quin devia ter aberto uma empresa própria.
— Então, apresente-me a ele — pediu alguém, provocando um coro.
— Eu também — repetiam todas. O alvoroço foi ignorado.
— Eu não preciso do dinheiro dele, Nina. E ir para a cama com um homem frio não me interessa — disse a loira.
A morena sorriu.
— Quer dizer que você se ofereceu para ele e ele não quis.
Errado, pensou Nicole. Era Quin quem fazia as ofertas. A loira deu de ombros, mas seu ego devia estar arrasado. Também estava errada quanto à frieza de Quin na cama, mas era ele quem tomava todas as decisões. E não havia como fazê-lo mudar de idéia.
A moça que estava atrás dela mostrou que havia uma cabine vazia. Nicole sequer percebeu que era a primeira da fila. Também não viu que as mulheres que falavam de Quin já haviam saído do banheiro. Ela se trancou na cabine, desejando esquecer todas as preocupações.
Pelo que ouvira, Quin poderia lhe emprestar dinheiro para ela manter a escola de dança funcionando. Poderia fazê-lo se conseguisse o que queria dela. Se fosse apenas sexo...
Nicole ficou chocada ao pensar nisso. Era uma estupidez querer Quin para qualquer coisa. Ele destruíra sua auto-estima. Fazer isso de novo seria uma loucura.
Mas ela o usaria dessa vez... Iria usá-lo para suprir as suas necessidades. Um desejo de vingança lhe dizia que era uma atitude justificável. Afinal de contas, Quin colocava valor em tudo. Por que não fazer o mesmo?
Podia armar uma situação controlada — sem interferir em sua vida pessoal. Ela não se machucaria ao confundir sexo e amor de novo. Não com Quin. Na verdade, gostava da idéia de inverter o jogo e dar as cartas.
A pergunta era: quanto Quin queria dela?
CAPÍTULO 3
Quin estava em chamas, animado pela caçada desafiadora. Não ia deixar Nicole escapar dessa vez. No entanto, ela colocou vários obstáculos que ele estava determinado a ultrapassar, derrubando sua resistência e tornando-a sua mulher novamente. Agora, precisava de algumas informações — onde ela trabalhava, como era seu dia-a-dia. Assim, seria muito fácil armar outro encontro casual.
Viu que Tony o observava enquanto voltava para a festa. Em quatro anos de relação pessoal e profissional, Quin aprendeu que poucas coisas escapavam a Tony Fisher. Seja em termos de assuntos legais ou com pessoas em geral, ele estava invariavelmente certo. Era baixo e forte, tinha uma grande personalidade e um sorriso contagiante, olhos joviais e cabelos cacheados que emolduravam seu rosto bem-humorado.
Antes de ir ao encontro de seus convidados, Tony aproximou-se de Quin.
— Acho que você escolheu a expert no assunto — disse, olhando na direção de Nicole.
Quin não entendeu o que ele queria dizer.
— Expert!
— A professora de dança, rapaz — respondeu Tony.
Quin franziu a testa. Aquilo não fazia sentido. Nicole trabalhava no mercado financeiro antes de viajar. Com um diploma de alto nível em finanças, ela chegou ao topo das divisões de vendas, valorizando ao máximo o dinheiro dos investidores. Uma das melhores coisas do seu relacionamento era que ela entendia tudo sobre o trabalho dele.
Apesar disso, ela dançava como uma profissional — uma latina legítima. Mesmo assim, Tony devia tê-la confundido com alguém. Uma mulher com a astúcia de Nicole para os negócios devia estar ganhando muito dinheiro em alguma empresa, e não em uma escola de dança.
— Acho que você se confundiu, Tony — disse, zombando do amigo, que se orgulhava de acertar tudo.
— Você não estava conversando com Nicole Ashton?
Ao ouvir aquele nome, Quin ficou em estado de choque.
— Como você sabe o nome dela?
Tony sorriu maliciosamente.
— Ela lhe deu uma pancada?
Quin ficou tenso ao perceber que os dois se conheciam. Não gostou disso. Tony não sabia de sua relação com Nicole. Fora antes de conhecê-lo, então a pancada não podia se referir a isso. Logo, devia estar relacionada à experiência de Tony com ela.
— Você tem alguma razão para perguntar isso? — indagou com frieza, odiando a idéia de seu amigo conhecer Nicole.
— Apenas que não consegui ir a lugar algum com ela, além das aulas de dança — respondeu, dando de ombros. — Isso não é muito comum. Posso não ter todo o seu poder, mas quando quero conquistar uma mulher, normalmente consigo.
Quin sabia que isso era verdade, portanto, contorcia-se por dentro.
— Mas você não teve sorte com Nicole Ashton? — pressionou.
— Nenhum sinal de interesse da parte dela — garantiu. — Sempre foi gentil, porém estava focada na dança, e em nada mais.
Quin parou, aliviado. Então, bastava passar à fase seguinte: conseguir informação.
— Quando foi isso, Tony?
— Há dois anos. Você me conhece, Quin. Detesto ficar para trás, e a dança latino-americana estava se popularizando. Precisei de um mês de aulas para aprender todos os passos.
— Em uma escola de dança...
— Isso!
— Aulas à noite? — ele não acreditava que esse fosse o trabalho principal de Nicole.
Tony assentiu.
— Três vezes por semana. Aula particular, não em grupo. Tudo que descobri sobre ela foi que gerenciava a escola de dança para a mãe, que era a dona. E ela ganhou vários concursos quando era pequena. Tinha fotos e troféus para provar. Como eu disse, uma profissional.
Ela jamais lhe dissera isso. Quin também não lhe contara nada sobre a infância. Queria que ela o aceitasse como era então — sem remexer no passado. Depois de ignorar o tema "família" diversas vezes, Nicole desistiu de mudar a atitude dele.
— Onde fica esta escola?
— Burwood.
Ficava mais ou menos perto do centro da cidade, onde ele morava e trabalhava. No entanto, era longe o bastante para seus caminhos nunca se cruzarem.
— Nem isso você descobriu dela? — perguntou Tony.
— Eu estava apenas conversando, sentindo para ver se havia uma abertura.
— Será que lhe faltou coragem?
— Não. Foi apenas o início. Não aceito que tudo esteja perdido.
— Boa sorte amigo. Nicole parece quente, mas, na verdade, é uma mulher fria.
Não na cama, pensou Quin.
— Nina e Amber voltaram do banheiro — anunciou Tony, acenando para Nina Salter Smyhte, seu alvo amoroso do momento.
Quin virou-se para cumprimentar as duas mulheres, valendo-se da oportunidade para procurar Nicole. Queria pegá-la olhando para ele, pois seria outra chance de provar que aquele desinteresse que manifestava não era real.
Ela não estava lá. O coração parou quando encontrou seu lugar vazio. Será que fora embora, tentando fugir novamente?
Então, viu que seus amigos continuavam na mesa. Jade Zilic e o namorado, Jules pareciam tramar algo. Se Nicole tivesse ido embora, certamente a teriam acompanhado, pelo menos até o táxi.
Quin disse a si mesmo que, de qualquer maneira, não importava. Ele já tinha informações suficientes para encontrá-la.
CAPÍTULO 4
Quando Nicole saiu do banheiro, a pista de dança estava lotada de casais rodopiando alegremente. Ela encontrou um caminho e voltou para a mesa, de onde Jade e Jules observavam todo o movimento.
— Quin Sola é um ótimo dançarino — comentou Jade apontando para ele, que acompanhava a morena de vermelho que estava no banheiro. — Você ensinou a ele, Nicole?
Ela balançou a cabeça.
— É natural para ele. Uma vez, ele me disse que dançar, na América é uma maneira de expressar a vida. Cresceu lá.
— Onde na América do Sul? — indagou Jules, com curiosidade.
— Não sei. Ele nunca disse.
— Que passado misterioso... — disse o amigo, levantando as sobrancelhas.
— Sei lá — disse Nicole, afastando aquele pensamento. — Ele se tornou cidadão australiano e deixou o passado para trás. Agora, por que vocês dois não vão dançar? Prefiro ficar sentada agora.
Ela não queria falar sobre Quin. Sutilmente, Jade e Jules se retiraram e deixaram-na a sós com seus pensamentos.
Enquanto via Quin dançar, idéias sexuais invadiram a mente. Suas pernas fortes e musculosas seguiam o ritmo da música, as nádegas tesas quase a hipnotizavam. Quin era um ótimo dançarino. Melhor que Jules. O melhor da pista de dança. O melhor em tudo.
Exceto no quesito importar-se com alguém, lembrou ferozmente. Com Quin, tinha de aceitar o que ele oferecia de si mesmo, aproveitar, e também não se importar. Mas Nicole não fora capaz de fazer isso quando estava com ele. Ela se importava demais com muitas coisas e perdeu seu amor-próprio porque ele não retribuiu na mesma moeda.
Há cinco anos, fora uma questão de sobrevivência afastar-se dele e de sua falta de afetividade. Agora, Nicole se perguntava quanto ele daria para se aquecer em seu coração. Será que ela seria capaz de se fechar com uma armadura e fazer tal pergunta a ele?
Se ele dissesse não, era isso. Não teria perdido nem ganhado nada.
Se ele dissesse sim... Anteriormente, já havia limitado seu relacionamento à cama, logo, parecia lógico que aceitasse a mesma limitação. Então, parecia não haver nenhum risco nesse acordo. Na verdade, satisfazer o desejo que ele acendia nela poderia ser bom. Uma pequena dose de Quin podia curar a longa ressaca de ter sido possuída por ele. Era só uma questão de controle.
Neste meio-tempo, a música terminou. Ela o observou guiar a morena de vermelho para fora da pista de dança. Jade e Jules aproximaram-se da mesa fazendo bastante barulho. Se fosse corajosa como Jade, não pensaria duas vezes antes de pedir ajuda a Quin, se precisasse. Aproveite o dia, dizia. Faça-o seu.
Nicole levantou-se firmemente, de pé em seus saltos altos, caminhando determinada.
— Vou falar com Quin Sola — informou aos amigos.
Ou ele a viu se aproximando em alguma parede espelhada, ou sua antena captou os feromônios dela. Virou-se e encarou-a. Ela parou e se aproximou.
— Tenho uma proposta para você, Quin.
Ele a guiou em direção ao bar.
— Deixe-me lhe oferecer uma bebida.
Esse movimento lhe daria maior privacidade, afastando-se dos amigos dele, o que certamente agradava a Nicole. Também prolongaria o encontro, o que agradava a Quin, já que ela o cortara tão abruptamente havia alguns minutos.
— Obrigada — respondeu ela, satisfeita com o consentimento imediato de Quin.
Ele continuou sem olhar para trás, para as pessoas com quem estava, focando toda a atenção nela seguindo pela multidão. Era uma manobra de mestre abrir caminho em meio às pessoas apenas com um movimento das mãos ou um olhar.
A força pensou Nicole. Quin sempre a teve a força de atrair ou repelir pessoas, conforme a vontade. Ou talvez fosse carisma. Isso o tornava uma pessoa especial, fora do comum, e perigosa, pois era fácil ser enfeitiçada, e logo possuída por ele.
Mesmo sabendo disso e estando preparada, Nicole sentia todos os nervos do corpo se contraindo, excitados por estarem tão próximos à fonte desse perigoso poder. Brigar com Quin era o mesmo que brincar com fogo. Mas ela já se queimara e aprendera a lição. Nada a levaria a deixar este homem lhe dominar a vida mais uma vez. Sabia até onde devia ir com ele e não ultrapassaria este ponto.
Chegaram ao bar, enfim. Abriu-se um lugar para eles e um garçom estava pronto para atendê-los.
— Duas margaritas — pediu Quin, sem dar chance a Nicole, controlando a situação como sempre fizera. Mas, dessa vez, ele não dominaria tudo, pensou firmemente.
Ela lembrou que ele pedira margaritas para os dois na primeira noite que passaram juntos. Se achava que conseguiria algo com aquele sentimentalismo, estava errado. O garçom preparou as bebidas. Quin lhe deu algumas notas e disse para ficar com o troco. Nicole pegou seu copo, sem esperar por ele.
Quin pegou o seu e ergueu-o para brindar.
— À chance de segundos encontros, e de repensar tudo — disse, com os olhos brilhando.
Ela resistiu a flertar com ele. Não precisava ganhar. Ele podia aceitar ou não a proposta.
— Você me perguntou o que supriria minhas necessidades — relembrou ela, indo direto ao ponto.
— Sim — concordou, adotando uma expressão mais cortês. — Você preparou uma lista?
Ela ignorou a pergunta.
— Disse que gostaria de se responsabilizar por elas.
— Dentro dos limites — acrescentou rapidamente, com os olhos mais sagazes.
Ela deu um gole no drinque. Precisava relaxar os nervos e esperava que uma boa dose de álcool fosse suficiente. Juntou toda a coragem e continuou:
— Você disse que dinheiro acrescenta valor a todos.
Agora, ele tomou um gole, reparando na agressão que havia nas palavras.
— Você está me dizendo que precisa de dinheiro e que, se eu colocar o suficiente na mesa, você vai abrir a porta mágica!
— É uma necessidade urgente — corrigiu ela. — Então, Quin, quanto você me daria para eu ir mais uma vez para sua cama?
— Dar? — repetiu ele, com um olhar pensativo. — Não era um empréstimo?
— Não — respondeu ela, erguendo o queixo. Não importava. A única coisa que importava era a possibilidade de um final feliz. — Falo de um presente, que tem de estar disponível para mim amanhã.
— E quando você estará disponível para mim, Nicole, no caso de eu aceitar a proposta?
O coração bateu forte diante da possibilidade de ele aceitar. Não acreditou que ele fosse topar e não considerava seu lado do trato. A primeira coisa a fazer era mantê-lo longe da casa de sua mãe, em Burwood.
— Onde você mora agora, Quin?
— Tenho um apartamento no Circular Quay.
Não era difícil chegar ao Circular Quay, vinte minutos de trem de Burwood até lá.
— Posso aquecer sua cama duas noites por semana por... O que seria uma proposta razoável?
— Por quanto tempo eu quiser — forçou ele.
— Não! — Dessa forma, ele ficaria no comando. — Por três meses — decidiu rapidamente. A intuição dizia que não podia arriscar mais. Três meses eram o máximo.
— Vinte e seis noites... — disse, pensativo, enquanto relembrava como o sexo com ela era sublime.
Nicole foi tomada pelo pânico. Será que manteria a objetividade ao lado de Quin por tanto tempo?
Agora, era impossível mudar de idéia. Quin veria a vulnerabilidade dela. Além disso, e se ele desistisse da idéia quando soubesse o valor das vinte e seis noites? Certamente, uma mulher de classe poderia satisfazer seus desejos por muito menos.
— De quanto você precisa, Nicole? — perguntou ele, sem rodeios.
Nicole era o desafio em pessoa quando disse o valor de suas dívidas:
— São 736 mil dólares e cinqüenta centavos — o número estava gravado na mente, pois isso a atormentava.
Quin digeriu a informação, mantendo o rosto impassível.
— E você precisa disso amanhã?
— Exatamente.
— Senão, o que acontecerá?
— Isso não lhe diz respeito. Apenas diga sim ou não.
— Passe esta noite comigo e vou pensar a respeito.
— Não! Não estou distribuindo amostra grátis, Quin. Não vou passar nenhuma noite com você até ter meu valor em dinheiro, e tem de ser amanhã.
— Seu valor... — repetiu, zombeteiro.
— Foram as palavras que você usou — relembrou-o ferozmente. — Afinal, sim ou não?
Os olhos dele falseavam. Estendeu a mão e pegou o copo de Nicole, que estava vazio, embora ela não se lembrasse de ter bebido tudo.
— Vou lhe dar a resposta depois que você dançar esse tango comigo — disse, com um prazer que deixou Nicole arrepiada.
Ela não teve tempo para responder, não teve tempo para resistir. Ele pegou sua mão e segurou-a com força, puxando-a para a pista de dança. A banda acabara de recomeçar a tocar. Ainda não havia nenhum casal dançando. Quin girou-a no meio da pista, levantou seus braços, posicionando-a no abraço inicial do tango.
Nicole arqueou as costas, resistindo ao papel dominante que ele assumia. Aquelas pernas fortes forçavam-na a solida, o passo básico do tango, que Quin transformava em uma energia incontrolável de desejo.
Era uma questão de orgulho estar no mesmo nível que ele, executar as manobras e os passos com a mesma precisão. A cada oportunidade que tinha, acrescentava passos complicados, desafiando-o a ser tão criativo quanto ela. Isso o instigou a arremessá-la em um rodopio genial, fazendo-a escorregar e, logo, enganchando a coxa dela contra a sua, inclinando-se contra ela, envolvendo sua cintura, enquanto ela arqueava as costas. A mão quase tocava aquele seio ardente.
— Nem pense em me tocar, Quin — disse, veemente.
— Estou apenas checando a mercadoria — replicou ele.
O sangue de Nicole ferveu ao ouvir aquela grosseria, mas não havia por que se ofender, uma vez que isso estava de acordo com sua proposta. Além do mais, era melhor Quin pensar nela dessa maneira — isso impediria qualquer ligação emocional.
Mercadoria... Ela ia mostrar a mercadoria!
O jogo de pés complicado e a paixão do seu tango hipnotizaram os outros casais, que lhes deram espaço para dançar ao ritmo dramático da música. Nicole abandonou-se à sensualidade da dança, até que Quin puxou-a novamente, girando-a em passos duplos, erguendo-a e segurando-a firmemente. Nicole encostou-se nele, sentindo a excitação daquele homem.
— Nada feito sem dinheiro, Quin — relembrou ela, triunfante com a saliência daquela ereção.
Os olhos dele ardiam de desejo.
— Não me diga que você não está pegando fogo, Nicole.
— Você não vai destruir minha determinação — disse, mantendo o orgulho.
Estavam ofegantes quando a música acabou. Os seios de Nicole arfavam contra o peito de Quin. Embora todos no salão aplaudissem, eles não escutavam nada. Quin ainda não estava pronto para pôr fim àquela história.
— Admita que me quer — ordenou ele.
— Prove que dá valor ao que posso lhe dar — retrucou ela.
— Amanhã de manhã, o dinheiro. Amanhã à noite, você vem para mim.
— De acordo.
— Quero meu pagamento, Nicole.
Mas não meu coração, pensou ela com ferocidade. Quin Sola não a teria duas vezes.
— Vinte e seis noites — reafirmou.
— Pagamento completo — prometeu ela.
— Você sabe que não há uma cláusula rescisória.
— Eu sei.
— Então, vamos acertar os detalhes necessários.
Ele a levantou e soltou-a, segurando apenas sua mão, posicionando-a ao lado, para agradecer à platéia que ainda aplaudia. Nicole não via rosto algum. Estava em estado de choque, ele aceitara realmente a proposta. Quin pagaria as dívidas, e ela ia se tornar sua escrava sexual por três meses.
— Outro drinque? — perguntou Quin.
— Só água gelada.
Ele pediu duas águas. Enquanto esperavam, um homem se aproximou e deu um tapinha no ombro de Quin, chamando sua atenção e deixando Nicole ainda mais nervosa.
— Puxa, Quin... você encontrou alguém à sua altura — o homem sorriu para eles. — Deram um show na dança!
Nicole gelou. Era Tony Fisher!
Lembrava-se de ter dado aulas de dança para ele havia uns dois anos. Será que ele sabia de Zoe? Será que falaria dela para Quin? Será que eles eram muito próximos?
— Oi, Tony — cumprimentou ela, depois de um tempo.
— Que bom que se lembra de mim! — disse, estendendo-lhe a mão.
— Não há muitos homens com tanto charme. Espero que esteja se divertindo!
— Estou sim. Mas, quanto ao charme... — Ele sorriu para Quin. — Parece que meu amigo tem bem mais do que eu.
Amigo!
— Não é o que vejo — disse, friamente. — Mas o charme não é um componente necessário para se fazer negócios. O objetivo principal é entender um ao outro. Quin e eu estamos fechando os detalhes de um acordo. Então, se não se importa...
— De deixá-los a sós? Entendi! — ele levantou a mão, cumprimentando-os, e se retirou.
Quin lhe entregou um copo de água gelada.
— Muito esperta — comentou. — É uma pena desperdiçar seu talento em uma escola de dança.
Então, ele sabia disso!
— Não estou desperdiçando. Vamos acertar tudo logo, antes que sejamos interrompidos de novo — disse, ríspida. — Você tem um cartão de visita com seu e-mail?
— Tenho — ele deixou o copo no balcão, pegou a carteira e lhe entregou o cartão. — E você, tem um?
— Não será necessário. Quando eu chegar em casa, hoje à noite, vou lhe mandar uma mensagem, indicando para onde o dinheiro deve ser transferido. Você pode responder, me dar o endereço de sua casa e dizer a que horas quer que eu chegue.
— Está bom — concordou.
Agora, Nicole queria afastar-se dele, escapar daquela tensão. Passaria vinte e seis noites com ele, mas não começaria hoje.
— Quero que nosso acordo permaneça em segredo, Quin — declarou.
Com os olhos, ele zombou de sua preocupação.
— Pois você não deu valor quando eu lhe dei —ratificou ela.
— Vou calcular o valor de cada segundo agora.
— Faça isso! Bem, agora me dê licença, por favor. Meus amigos estão me esperando.
— Acho que não estão lhe esperando, Nicole. Mas vou acompanhá-la de volta à sua mesa para mostrar a eles que você estava em boas mãos.
— Não preciso que me acompanhe, obrigada — disse, virando-se.
— Eu sou um cavalheiro... — declarou, determinado.
Nicole rangeu os dentes e não disse mais nada. Sabia que não havia como se livrar dele. Discutir era um desperdício. Na verdade, Quin sempre fora um cavalheiro com as mulheres: abria portas, puxava a cadeira, protegia-as quando era necessário. No passado, isso dera a Nicole à sensação de que era querida, mas essa cortesia nada tinha a ver com carinho. Quin apenas seguia padrões que estabelecera para si mesmo.
Ela foi na frente, sabendo da presença dele logo atrás. Pensava em como ia explicar a Jade e Jules o que estivera fazendo com Quin.
Quin estava ao seu lado quando chegaram à mesa. Jade e Jules sorriam alegremente. Provavelmente, achavam testemunhar o renascimento de uma paixão. Antes que Nicole pudesse se livrar de Quin, Jade surpreendeu-a. Segurava uma borboleta amarela brilhante, de seda e com asas prateadas.
— Para sua árvore — disse. — Fiz para iluminar você. Não que precise disso nesse momento, mas quis lhe dar agora, antes que vocês saíssem da boate. Pode simbolizar esse reencontro com Quin.
— É lindo, Jade. Obrigada, mas...
— Que árvore? — interrompeu Quin.
— A árvore das borboletas — começou Jules. — É uma linda peça de decoração. Os galhos são de madeira e...
Nicole entrou em pânico, com medo que ele mencionasse Zoe.
— Obrigada, gente, mas Quin e eu não vamos sair juntos. Estamos apenas acertando as contas que tínhamos pendentes — virou-se para Quin e estendeu-lhe a mão. — Está tudo certo, não?
Ele segurou com força, olhando-a fixamente.
— O tempo dirá — afirmou. A ameaça por trás das palavras dizia a Nicole que era melhor cumprir sua parte do trato.
— Não vou mais segurá-lo. Pode voltar para sua festa.
Ele sorriu, sarcástico.
— Você também.
Para grande alívio, ele se despediu de Jade e Jules, saindo sem dizer mais nada. Isso a deixou com a tarefa de se esquivar da curiosidade dos amigos pelo resto da noite. Felizmente, eles não queriam ficar até tarde, pois tinham uma reunião de trabalho no dia seguinte.
À uma hora da madrugada, Nicole estava em casa, sentada na frente do computador, pronta para enviar as informações necessárias para Quin transferir o dinheiro.
A partir dali, não havia volta.
CAPÍTULO 5
Nicole tentou relaxar enquanto o trem a levava para o centro da cidade, para seu encontro com Quin. O dia fora estressante — muitas ligações para conferir se o dinheiro entrara, confirmando que todas as dívidas haviam sido pagas. Também fora impossível não dizer à mãe como o milagre se realizara, já que teria de explicar a ela sua ausência duas noites por semana. Precisava que ela cuidasse de Zoe.
O alívio da mãe ao ver a dívida quitada logo desapareceu e se transformou em culpa pelo acordo que Nicole fizera com Quin.
— Você jamais voltaria para ele, se não fosse por mim — lamentou.
— São apenas três meses mãe. Isso não vai me matar. Na verdade, é mais aceitável do que perder esta casa e a escola de dança.
Nicole sabia que, com suas qualificações, persistência e aparência, acabaria conseguindo um emprego no mercado financeiro — com um salário bom o suficiente para sustentá-los. Talvez agora, depois de ser responsável por essa confusão, ela começasse a pensar em um bom caminho para o futuro.
O trem chegou ao Circular Quay e Nicole desembarcou. No e-mail, Quin a instruiu a encontrá-lo em um restaurante chamado Pier Twenty-One, em Benelong Point, perto da Ópera House. Começou a caminhar e olhou o relógio. Eram quase oito, a hora combinada.
Andou mais rápido, não queria se atrasar. Não era apenas uma questão de integridade, mas também de orgulho. Não queria dar a Quin motivo para criticá-la enquanto cumpria sua parte do trato. Afinal, ele pagou uma quantia fenomenal por vinte e seis noites.
No entanto, não quis se vestir como se fosse um encontro amoroso. Não havia romance nesse acordo, e não queria que Quin achasse que essa idéia cruzara sua mente. Se ele queria passar tempo com ela jantando em um restaurante, que fosse! Sem dúvida, iam acabar terminando na cama.
Decidira vestir calça jeans, uma sandália rasteira e uma blusa floral que estava na moda. Sua pequena nécessaire continha apenas alguns produtos de higiene pessoal e uma calcinha extra. A mente estava determinada a conduzir esse relacionamento seguindo uma base prática. Então, não devia envolver-se emocionalmente.
A mesa de Quin estava de frente para o movimento das pessoas; trabalhadores pegavam a balsa para ir para casa, turistas passeavam pela enseada, espectadores iam assistir a concertos, bales, peças de teatro, óperas, em direção à Opera House de Sidney. Era uma agradável noite de verão, uma paisagem fantástica, mas a atenção de Quin estava totalmente centrada em Nicole.
Ele não tinha dúvidas de que ela apareceria no local e no horário marcado. Provavelmente, chegaria um pouco antes à enseada para ser bem pontual, mas se demoraria, para não dar bandeira. Quin não se iludia quanto às razões de Nicole fazer esse acordo devido à péssima situação financeira, além do desejo de vingança pela maneira como ele conduziu o relacionamento que tiveram. Era essa última motivação que o empolgava. O lado financeiro estava resolvido.
Queria fazer sexo com ela, e certamente faria, mas seu primeiro objetivo esta noite era desafiá-la, sabotar seu plano de ação e fazê-la jogar segundo suas regras. Ela acendeu o fogo dentro dele depois da noite anterior. Quin estava confiante de que, depois de armar um cerco ao redor dela, destruiria suas defesas e renderia Nicole.
Já conseguira isso no passado, e queria uma vez mais, agora livre dos demônios que haviam dominado grande parte de sua vida.
E lá estava ela!
Avançava em sua direção. Não usava saia justa ou saltos altos que pudessem atrapalhá-la. As longas pernas estavam cobertas por uma calça jeans e as sandálias rasteiras nos pés indicavam que o conforto era mais importante que uma estratégia feminina de excitá-lo. Ela não se importava com o que ele pensava ou sentia. Simplesmente seguia determinada ao ponto de encontro.
Ele viu a bolsa que ela carregava. Não era grande, devia conter apenas o necessário para passar a noite fora. O cabelo de Nicole, longo e cacheado, estava solto. A blusa que usava era mais feminina que o jeans unissex, mas não muito chamativa. Quin sorriu. Se pensara que a aparência o faria desistir da mercadoria, enganou-se.
Percebendo a análise minuciosa de Quin, levantou o rosto e dirigiu o olhar para onde ele estava sentado. Parou ao ver que ele se levantara da mesa, pronto para cumprimentá-la. Quin sentiu o corpo arder e a intuição de Nicole lhe dizia que estava frente a frente com o inimigo. Agora, era começar a batalha.
A moça ignorou as batidas aceleradas do coração e sorriu, enquanto caminhava em direção ao homem que pagou para ter seu corpo. Como ele esperava ser recompensado, um sorriso parecia a melhor maneira de começar aquilo de forma agradável.
— Olá, Quin — apertou sua mão de leve. — Obrigada por depositar o dinheiro com tamanha rapidez. O dia de hoje já foi bem menos difícil.
Que bom que preparara essa pequena introdução, porque o magnetismo de Quin estava apagando todos os pensamentos sensatos da mente. O mero toque de suas mãos lhe causava arrepios.
— Conquistei minha fortuna sendo eficiente — respondeu ele.
— Sem falar na crueldade — acusou ela. As palavras jorravam de sua boca, apesar da resolução de não reviver antigas feridas. Ela tirou a mão tão rápido que suas unhas arranharam a mão dele.
Os olhos de Quin brilharam sarcasticamente.
— Queria saber quanto tempo ia levar para as garras aparecerem.
— Desculpe. Preciso fazer as unhas.
— Estava me referindo ao seu comentário sobre mim.
— Por favor — repreendeu ela. — Você não pode negar um de seus maiores atributos: estabelecer um objetivo e persegui-lo até o fim.
— Admito que isso já me trouxe muitos bons resultados.
— Conseguiu tudo o que queria — acrescentou ela ironicamente.
— Cheguei, por exemplo, até você, Nicole. É um investimento no futuro...
Ela ergueu a sobrancelha.
— Um futuro de curto prazo.
— Veremos — ele indicou a cadeira em frente. — Por favor, sente-se. Pedi champanhe para comemorar o início de um novo capítulo em nossas vidas.
Nem tão novo, pensou ela. Mas precisava controlar a língua e a adrenalina que aquela troca de ofensas com Quin desencadeava.
Quin fez um sinal ao garçom para abrir o champanhe, que estava no balde de gelo, perto da mesa. O garçom lhes entregou o cardápio e apresentou uma lista das especialidades do chef, enquanto enchia as taças.
— Queremos uma dúzia de ostras, seguidas de lagosta ao molho de manteiga com salada — pediu Quin, ignorando a opinião de Nicole.
Ela não reclamou, mas, assim que o garçom se afastou, comentou friamente:
— E se eu quisesse outra coisa?
— Você esta onde eu queria, Nicole — ele levantou a taça para brindar. — Ao que eu quero.
Ela ficou brincando com a taça, enquanto ele dava um gole. Quin sabia que ela adorava frutos do mar e sempre pedia isso quando saíam para jantar. Lagosta era um prato muito caro, então, ele estava, obviamente, fazendo as vontades dela. Porém, reivindicava dominação absoluta durante o tempo que passassem juntos.
— Se quer receber sua parte do acordo, por que decidiu me encontrar em um lugar tão público?
— Dizem que, quanto mais perto do osso, mais suculenta é a carne. Não me importo com o tempo que vou levar até chegar lá.
Ele estava arrancando suas defesas, camada por camada. Não podia deixar Quin se aproximar muito. Podia destruí-la se não se protegesse.
— Por que não relaxa? — convidou ele, com um sorriso provocativo. — Você está totalmente segura aqui, no meio dessa gente. A noite é uma criança, e estou muito feliz por me deleitar com tudo isso.
— Claro! — ela ergueu a taça, determinada a bloquear algo mais íntimo. — Aqui, a comida é boa...
— A companhia é boa — acrescentou Quin.
— E o vinho é bom — concluiu ela, bebericando o champanhe, que era realmente ótimo.
No entanto, era impossível relaxar com Quin sentado à frente, observando-a e revelando, silenciosamente, seus planos para o resto da noite. Vamos tentar inverter o jogo, pensou Nicole.
— Então, como vai o mercado financeiro? — começou.
— Tenho minha própria empresa agora.
— Hum, interessante... Conte-me mais sobre isso.
— O mundo financeiro não mudou desde que você trabalhou em banco, Nicole.
— Mas a transição de empregado a...
— O trabalho é o mesmo — interrompeu-a. — Acho mais interessante ouvir por que você decidiu dar aulas de dança.
— Você não mudou em nada.
Os olhos dele reluziam, desafiadores.
— O que você quer mudar em mim?
Rapidamente, Nicole fugiu de qualquer conotação pessoal.
— Não quero mudá-lo, Quin — disse. — É apenas um comentário.
— Sobre o quê?
— Você não fala de você. Não sei o que tem medo de revelar.
— Não é uma questão de medo.
— O que é, então?
O garçom chegou com o primeiro prato. Nicole olhou para as ostras, enquanto ele completava as taças, antes de deixá-los sozinhos.
— Você é exatamente assim — disse para Quin. — Uma ostra dentro de uma concha. Já que é assim, deixo a senhorita me comer hoje à noite.
Sexo! Sempre fora apenas isso com Quin. Provavelmente, pediu as ostras porque são afrodisíacas. Enquanto comia, a mente viajava pelas lembranças de seu corpo — nu e excitado — e pelo sexo selvagem que faziam. No entanto, aquilo não era fazer amor. Era apenas sexo! Tinha de se lembrar disso durante todos os momentos que passasse com ele.
— Por que você está trabalhando na escola de dança, Nicole?
— Por razões particulares.
A boca de Quin se retorceu, ironicamente.
— Você sabe que o dinheiro sempre deixa um rastro. Hipoteca da escola, hipoteca da casa, dívida com um agiota, tudo ligado a um nome, que não é o seu. Quem é Linda Ellis?
— Saberia quem era se aceitasse algum dos meus convites para conhecer minha mãe.
Ele ignorou a referência à antiga briga entre eles.
— Sua mãe. Por que o nome é diferente?
— Ela se casou duas vezes.
— Ela é viciada em jogo?
— Não. O que aconteceu não se repetirá.
— Como você pode ter tanta certeza?
— Porque meu padrasto morreu.
Aquela declaração fez com que ele parasse para pensar.
— Ele extorquiu todo esse dinheiro dela? — perguntou, por fim.
— Não. Foram pessoas desonestas que prometeram mundos e fundos a ela. Harry tinha câncer de fígado. Minha mãe passou os dois últimos anos da vida dele levando-o a diversos médicos e clínicas, que prometiam curá-lo. Ela não queria desistir enquanto houvesse esperança. Não importava o preço, ela continuava fazendo empréstimos. Harry não ia morrer porque eles não tinham dinheiro para salvá-lo.
— Fé cega — sussurrou Quin.
— Ela o amava — defendeu-a, envergonhada pela mãe, que acreditava em pessoas que se aproveitavam de seu desespero. Fora difícil perder o pai aos 15 anos. Sem dúvida, fora ainda mais difícil para a mãe. Certamente, a idéia de perder Harry também era insuportável.
— O preço do amor! — disse Quin, com um pequeno sorriso nos lábios. — O mesmo preço que eu paguei por você, Nicole. Acho que devia ter negociado por dois anos em vez de aceitar apenas três meses.
— De maneira alguma!
Ele riu, deixando seu belo rosto ainda mais atraente. Uma agradável onda de prazer invadiu-a, forçando-a a admitir que nenhum homem, desde Quin Sola, fizera isso com ela, despertando sentimentos tão fortes que tentou ignorar, uma vez que não podia arrancá-los de si.
— Senti sua falta, Nicole. Senti muito a sua falta.
— Não o bastante para largar tudo e sair correndo atrás de mim quando fui embora — desabafou, recuando e pressionando as costas contra a cadeira. Tinha de se proteger das memórias do passado, que a enfraqueciam.
— Provando seu poder sobre mim? Eu não tinha tempo para esses jogos.
— Você não tinha tempo para mim.
— Não tanto quanto você queria — retrucou ele. — Mas muito mais do que dediquei a qualquer outra mulher.
— Devo me sentir lisonjeada com isso?
— Só estou dizendo a verdade.
Nicole mordeu os lábios, dizendo a si mesma que devia voltar a um comportamento neutro. Esse tipo de discussão não seria bom. Apesar da tentativa de se acalmar, ela desabou novamente quando Quin sorriu com uma satisfação cruel.
— Você sabe o que vale cada centavo do meu investimento, Nicole?
Ela deu de ombros, fingindo não estar interessada.
— Sua lealdade por ficar comigo, goste ou não, por vinte e seis noites, sem fugir do que somos juntos.
— O que somos, Quin?
— Quero que sejamos incontroláveis.
— E eu quero que, finalmente, nos controlemos.
Ele sorriu, sem se importar com o que ela dizia.
Logo após, o garçom chegou, serviu as lagostas e tornou a encher as taças.
Quin fez um brinde, com entusiasmo:
— Para um bom começo e um final ainda melhor.
Nicole se conteve, pois tinha certeza de uma coisa: não acreditava que Quin se comprometeria a algo além de ganhar dinheiro.
CAPÍTULO 6
Agora, seguiriam para a parte comercial da noite, pensou Nicole quando saíram do restaurante. A consciência de ter Quin ao seu lado e a excitação traiçoeira que ele provocava tornavam muito difícil manter a cabeça no lugar e ser objetiva quando chegassem ao apartamento dele.
— É uma caminhada curta — disse amigavelmente, sem demonstrar nenhuma tensão por estar com ela.
E por que deveria? Ele estava no comando, dirigindo a ação.
Não havia problema em querer transar com ele, Nicole disse para si mesma. Aceite, aproveite, divirta-se e esqueça tudo quando for embora pela manhã. Apenas não pense que é algo mais do que pura química impulsionando um desejo natural. Depois de cinco longos anos de celibato, Nicole tinha direito, como mulher, de sentir prazer sexual de novo.
— Veja! — Quin segurou o braço dela para mantê-la parada enquanto apontava a vitrine em frente.
— O quê?
Seu olhar passeou por uma coleção de suvenires típicos da Austrália. Situada naquele lugar, a loja era uma butique de luxo para turistas. Um pequeno grupo de japoneses lá dentro fazia um estoque de presentes para levar para casa. Havia muitas lojas desse tipo em torno do Circular Quay, atendendo à mesma clientela. Essa era uma das caras, inclusive...
— A borboleta azul! — Quin esclareceu. — Venha. Vamos entrar e comprá-la para sua árvore.
O coração de Nicole deu um pulo; o choque por ele saber daquilo só diminuiu quando ela se lembrou da pergunta sobre o presente que Jade lhe dera na noite anterior. Jules dera uma explicação, embora ela o tivesse impedido de dizer mais do que devia. A árvore das borboletas era uma coisa especial entre ela e Zoe.
Ele não tinha o direito de se intrometer nisso. Não fizera parte daquilo, e nunca faria. No entanto, antes que encontrasse palavras para rejeitar aquele impulso de Quin, ele passou o braço por sua cintura e levou-a para dentro da loja. Em seguida, como sempre acontecia, uma vendedora imediatamente se dirigiu a ele.
— Queremos a borboleta azul — disse ele, de forma contundente.
— Ah, sim, uma peça maravilhosa.
A mulher sorriu para ele e depois se afastou para pegar a borboleta no mostrador de vidro que exibia uma mistura de pássaros, peixes e outros animais australianos. Alguns eram trabalhados em cristal, outros delicadamente feitos de vidro, com cores espalhadas pelo interior.
— É uma Ulisses, nativa do norte de Queensland — continuou a vendedora. — Pode vê-las em qualquer lugar perto de Cairns e da Floresta Tropical de Daintree. A cor natural das asas é um azul brilhante. Por isso, você vai conseguir um melhor efeito se colocar a peça onde o sol passe através do vidro.
— Vamos levar. Pode embrulhar — Quin ordenou.
— Espere! — gritou Nicole, tentando desesperadamente pensar em uma desculpa para impedir a compra. — Parece ser muito cara. Quanto custa?
O preço era exorbitante. Provavelmente, a loja toda era muito mais cara por conta de sua posição privilegiada, perto da Ópera House.
— Não posso aceitar isso, Quin — disse ela, firme.
Ele a fitou incrédulo.
— Depois de tudo que aceitou de mim hoje? — disse, pegando o cartão de crédito na carteira e entregando-o à vendedora. — Pode embrulhar. É a lembrança perfeita para uma noite memorável.
Não havia como impedi-lo, reconheceu Nicole. No entanto, ela podia e iria se recusar a aceitar a borboleta. Manteve-se de braços cruzados quando ele tentou lhe entregar a sacola, ao saírem da loja.
— Isso não é parte do nosso acordo — insistiu.
— Aposto que você não tem uma assim — teimou, tentadoramente.
— Não é esse o problema.
— E qual é então?
— Não quero ter uma lembrança desta noite — Nicole respondeu feroz.
— Minha intenção é que ela seja inesquecível para você de qualquer maneira, querida.
Suas mãos se fecharam em uma necessidade cega de afastar o sentimento de uma ameaça muito próxima à vida que construíra sem ele.
— Isso vai passar — murmurou ela, em uma resolução selvagem.
— Não passou da última vez. E é por isso que estamos aqui agora.
Ela não podia. Ninguém mais a teria levado a oferecer-se por dinheiro. Aquilo acontecera por quem ele era, o que ele era, e como ele a fizera se sentir sem importância no passado, quando sua obsessão por ganhar dinheiro vinha na frente de qualquer coisa. Mas Nicole não admitiria que Quin estava certo. Alimentar aquele ego não estava em seus planos.
— Estamos aqui agora porque você representou uma saída para uma situação que eu não desejava — disse ela, abrindo o jogo.
— Que, por sua vez, representou um caminho para uma situação que eu desejava — ele retrucou. — E esses dois desejos têm raízes no passado... que definitivamente não passou, Nicole.
Não para ele. Fora apenas sexo naquela época, e agora ele sentia tesão por ela de novo. Era apenas uma segunda rodada do mesmo jogo. Mas, para ela, era diferente. Apaixonara-se loucamente por ele. E isso com certeza havia passado.
Não querendo se estender nesse assunto, Nicole ficou quieta. Quin fez sinal para que ela passasse por uma arcada, que dava para um saguão onde havia uma impressionante escadaria em espiral e uma série de elevadores tudo com ladrilhos e paredes de mármore, além de enormes lustres pendendo do teto de pé direito alto. Era o tipo de lugar que deixava bem claro: "Exclusivo para milionários".
— Aqui estamos! — anunciou ele, usando uma chave para operar um dos elevadores.
As portas se abriram.
Quin conduziu-a para a cabine e apertou um botão marcado com um "C". C de cobertura, pensou Nicole. O pânico se instalara nela definitivamente. Será que teria mais dor do que prazer? Onde estava com a cabeça para aceitar esse trato?
Pense no que você conseguiu para sua mãe, disse para si mesma, tentando parecer calma e tranqüila enquanto Quin a guiava para uma fabulosa sala de estar. Dominando o ambiente, janelas iam do chão até o teto, dando para uma vista espetacular do porto de Sidney, desde Bennelong Point até o mar. Nicole andou até lá de modo automático, precisando olhar para algo que não fossem as conquistas materiais de Quin.
O carpete possuía uma nuance suave, algo meio cor-de-telha. Os sofás de couro creme tinham várias almofadas coloridas, e havia também mesas de vidro com pés de granito. Eram apenas acessórios. Símbolos de status. Uma decoração interna cara não fazia daquilo um lar. Mas Quin nunca estivera interessado em construir um lar.
Era uma vista bem alta do porto. Embora estivesse escuro lá fora, a marina e as pequenas enseadas eram delineadas pelas luzes das casas em volta. Barcos ancorados podiam ser vistos com facilidade e as balsas atravessavam as águas para chegar a seus destinos. Nicole se perguntou se viver ali fazia Quin se sentir o maioral.
Será que ele percebia como tudo aquilo era vazio, apesar de todas as suas posses, dentre as quais, agora, ela estava incluída, ainda que apenas temporariamente?
Será que, em algum momento, ele pensava que aquilo não bastava?
Quin ficou de pé junto ao largo balcão da cozinha americana, observando Nicole processar aquela paisagem multimilionária. Ele não fez qualquer menção de se juntar a ela, embora sentisse que ela criava uma barreira em torno de si para se proteger da inevitável intimidade do quarto.
Em circunstâncias normais, mulheres que iam pela primeira vez ao apartamento demonstravam curiosidade ou interesse pelo ambiente em que ele vivia, examinando os móveis e fuxicando a cozinha com admiração. As costas eretas de Nicole ignoravam tudo isso, e o silêncio reafirmava seu desprezo. Não queria fazer parte da vida dele, assim como não queria que ele fizesse parte da sua. Recusar a borboleta que ele quisera lhe dar sublinhava o firme propósito de permanecer afastada onde realmente importava, na mente e no coração.
Nicole usara a borboleta azul como arma contra ele, dizendo de modo muito claro que ele não pertencia a seu mundo e que ela não o deixaria colocar sequer um pé nele.
— Quer um café?
— Por favor... — respondeu ela, sem virar a cabeça.
— Você costumava gostar de cappuccino. Minha cafeteira pode fazer um, se ainda for o que você prefere.
— Sim, obrigada.
Uma voz seca e ainda nenhum olhar para trás.
Isso aumentou a vontade de Quin de derrubar o muro que ela construía entre eles. Ele preparou o café, abriu uma pequena caixa de chocolates belgas e colocou tudo sobre a mesinha de centro. Com o barulho da louça no vidro — ou talvez com o forte aroma do café quente — ela finalmente se virou, reconhecendo os esforços para agradá-la, com um breve sorriso.
— Chocolates? — perguntou ela, como se estivesse zombando de sua tentativa de adoçá-la.
— Já que você está tão entretida com a vista — disse ele, zombando dela também — vou deixá-la aproveitar mais um pouco enquanto coloco algo mais confortável. Você me dá licença?
O olhar de surpresa de Nicole deu a ele enorme satisfação. Quin sorria glorioso até o caminho do quarto. Não era o seu próprio conforto que tinha em mente. Na verdade, o objetivo era tirar Nicole de qualquer zona de conforto que ela pensasse ter conquistado, e não havia nada mais eficiente para isso que um ataque surpresa.
Nicole franziu a testa, confusa, enquanto Quin desaparecia pelo corredor.
Colocar algo mais confortável?
Essa era uma fala de mulher — uma tentativa feminina de seduzir um homem.
O que Quin estava querendo?
Champanhe, ostras, um presente caro, chocolates... Seria isso tudo uma tentativa de quebrar qualquer resistência contra ele? Não fazia sentido. Ele não precisava seduzi-la para levá-la para a cama. Já era sua desde o início. Esse era o acordo, e ela não planejava quebrá-lo.
Ele, certamente, estava tirando a roupa apenas para evitar o inconveniente de se despir mais tarde... Quin sempre ficou muito à vontade nu. E por que não? Tinha um físico perfeito. O estômago de Nicole revirou só de pensar em vê-lo nu novamente.
Ela foi até o sofá e se sentou, tomando o quente e cremoso cappuccino na esperança de acalmar os nervos. Não tocou nos chocolates. Não queria passar a impressão de que estava se divertindo, dando a Quin a satisfação de pensar que a estava seduzindo.
Isso não era um romance. Ela não deixaria Quin fazê-la pensar que era.
Ele estava fazendo um jogo. Provavelmente, nunca pagara para ter sexo antes. Por isso, queria transformar aquilo em uma conquista, para aplacar seu ego sobre os meios usados para chegar ao objetivo final.
Já havia acabado a xícara e ele ainda não tinha voltado. Estaria fazendo-a esperar de propósito, para mostrar quem mandava?
Pare de pensar nele! Nicole gritou para si mesma em silêncio. Ele ganharia simplesmente por dominar seus pensamentos!
Levantou-se e voltou à janela. Seria bom que ele a encontrasse onde a deixara, ignorando as provas de seu sucesso financeiro. Forçando-se a não pensar em mais nada, ficou parada junto à janela, olhando fixamente para fora.
Mas os instintos femininos captaram a presença de Quin no momento em que ele entrou na sala. Não houve som de passos. Ele não falou nada. Ela apenas sentiu o ambiente mudar como se uma força o fizesse vibrar com uma súbita energia. Sabia que ele estava ali, querendo que ela se virasse para atestar sua presença. Todo o corpo sentiu a pressão daquele comando silencioso, mas ela teve de se controlar para resistir.
Ele, então, veio. O coração de Nicole disparou à medida que Quin se aproximava. Ele colocou as mãos em sua cintura, escorregou-as por dentro de sua blusa, soltou o sutiã e afastou o tecido rendado dos seios, deixando-os livres para tocá-los. Seus dedos apalparam delicadamente aquela carne macia, ao mesmo tempo estimulando os mamilos, que logo responderam ao toque.
Nicole se deu conta de que estava prendendo a respiração, todo o seu ser consumido pelo desejo de sentir. Fazia tanto tempo... tanto... E Quin sabia como tocá-la, como excitá-la, como lhe dar prazer. Ela finalmente soltou o ar, mas logo o prendeu de novo quando ele tirou sua blusa e, no mesmo movimento, o sutiã.
— Fique parada — ordenou, os dedos passeando pelo cabelo dela, jogando as longas mechas para frente, sobre seus ombros, de modo a caírem sobre os seios.
Ela ficou parada, porém não conseguiu evitar um arrepio quando ele beijou-lhe a nuca, com a boca quente e sensual. As pontas de seus dedos desceram pela espinha, desenharam círculos tentadores em suas costas e subiram lentamente até alcançar os cabelos, que ele suavemente esfregou em seus seios sensíveis.
— Eu sempre amei sentir você assim, Nicole — murmurou.
Não use a palavra "amor" comigo, pensou Nicole com raiva. Pode me excitar o quanto quiser, mas amor é uma coisa que você desconhece.
Ele deslizou as mãos para o cós de sua calça jeans. Abriu o botão e o zíper. Nicole contraiu a barriga ao sentir as palmas quentes de Quin sobre ela, os dedos buscando o calor que ele provocara entre suas coxas. Sabia como a tocar ali também, com suavidade, acariciando as dobras para separá-las, usando a umidade para excitar o clitóris, provocando um tesão que ela não podia controlar.
A respiração de Nicole se acelerou, e pequenas exclamações escapavam de seus lábios, apesar de ela se esforçar para permanecer parada, como se nada acontecesse. Queria que Quin pensasse que seu corpo apenas respondia naturalmente a estímulos bem-feitos. Ele, como pessoa, não importava. Fixou o olhar na escuridão da noite, dizendo para si mesma que estava apenas tendo prazer com o toque.
— Vamos tirar essas roupas — disse ele bruscamente, interrompendo aquele contato íntimo para tirar sua calça e sua calcinha. Ele levantou um pé de Nicole de cada vez, tirando as sandálias e, ao mesmo tempo, livrando-a das roupas.
Nicole não resistiu a nenhum dos movimentos de Quin. Submeter-se era uma forma de mantê-lo a alguma distância. Estava sendo despida e manipulada por alguém que não podia sequer ver. No entanto, sentia certa liberdade em relação a todas as responsabilidades que carregara por tanto tempo. Naquele momento, existia apenas como mulher, gozando a redescoberta da sexualidade.
Quin tocou suavemente a parte interna das coxas dela enquanto se levantava. Depois, apalpou a curva voluptuosa de suas nádegas, afastando-as para pressionar a rígida ereção entre elas. Os braços envolveram a cintura de Nicole, puxando-a em sua direção e fazendo com que ela sentisse toda a sua nudez.
Era ao mesmo tempo estranho e familiar. Estranho porque ela não estivera assim com um homem desde Quin e familiar porque era Quin, e seu corpo reconhecia cada centímetro do dele. Era impossível reprimir aquele prazer selvagem. Seu homem... seu macho...
— O que você está vendo aí fora? — ele perguntou.
— Nada — respondeu ela.
— Então, vou lhe mostrar uma coisa.
Ele desfez o abraço, tomou suas mãos e conduziu-a pela sala, através do corredor onde entrara antes. Parou diante de uma porta, abriu e fez com que ela entrasse em um amplo quarto. Nicole mal notou a cama. Atrás dela, havia outra parede de vidro, mas seus olhos não se direcionaram para a vista do porto de Sidney. Em vez disso, foram atraídos instantaneamente para o que estava posicionado na frente da janela do meio.
A borboleta de vidro fora colocada em um pedestal, iluminada por trás de modo que suas asas reproduzissem um impressionante azul fluorescente.
Não havia dúvidas, pensou Quin, triunfante. Como tática para quebrar a indiferença de Nicole, colocar a borboleta azul no centro do palco fora um golpe genial. A escrava sexual submissa tinha desaparecido. Ela o encarou, os olhos verdes brilhavam furiosamente, a raiva atravessava-a, os ombros estavam jogados para trás, os seios erguidos; se os mamilos fossem pistolas, o chão já estaria coberto de sangue.
— Que tipo de jogo é esse?
Definitivamente, havia um tom mortal em sua voz.
— É uma linda peça — afirmou ele, calmamente. — Por que isso a irrita tanto?
— Você fez de propósito.
— Fiz — concordou Quin. — Eu queria o melhor efeito.
— Desde quando você se interessa por decoração de interiores?
Sarcasmo mordaz. Ele sorriu.
— Desde hoje. Você me inspirou.
— Por quê?
— Porque significa algo para você.
— Não significa não! — negou ela com veemência, as mãos contraídas, a necessidade de rebater dando a Quin a certeza de que atingira um ponto sensível.
— Então isso não deveria te afetar, Nicole. Meu objetivo era agradar.
— Oh, sim! Agradar!
O ódio transformou-se em confusão, seguida pelo medo de ter reagido de forma muito enfática, deixando transparecer que, por trás do assunto da borboleta, havia muito mais do que ela estava disposta a revelar.
— Agradar mais do que faço na cama — disse ele suavemente, aproximando-se para tomar o que ela lhe devia. Abraçou-a, ignorando a fria resistência daquele corpo junto ao seu. — É apenas uma coisa bonita para você olhar esta noite. E amanhã de manhã.
As mãos de Nicole ainda estavam contraídas. Os olhos ardiam de raiva. Ele não entendia por que ela nutria tanto ódio, mas ódio era bem melhor do que indiferença. Quin sentiu que ela fervia por dentro, querendo descontar nele, e gostou de ter provocado aquela emoção tão instável. Não queria uma Nicole passiva na cama. Queria a Nicole ardente que lhe deixara uma impressão inesquecível.
— Cama! — cuspiu ela, com veneno. — Certo! Vamos logo!
Ele riu da vontade dela de acabar logo com aquilo.
— Não tão rápido Nicole. Ainda nem nos beijamos.
— Não é uma boa idéia — rebateu ela. — Posso morder sua língua.
— Vou arriscar.
— Prostitutas não beijam.
— Você não é uma prostituta. O dinheiro é irrelevante para o que existe entre nós.
— É seu ego quem diz isso. Eu não estaria aqui se não fosse pelo dinheiro.
— Tudo bem. Então me dê o que o meu dinheiro pago. Use sua língua para algo além de falar.
Ela abriu a boca para dizer alguma coisa e ele aproveitou para atacar, sua excitação aumentando com a recusa de Nicole em admitir a química entre eles. Beijou-a com força, decidido a romper qualquer resistência.
Depois, a língua de Nicole se misturou com a dele em uma luta feroz, em total entrega, sem dentes afiados tentando fazê-lo retroceder. Ela buscava sua boca com a mesma paixão reprimida com que ele buscava a dela, e a excitação era tão intensa que todo o corpo de Quin foi tomado pelo impulso de levar aquilo adiante.
Os braços de Nicole estavam em volta do pescoço de Quin, as mãos agarravam os cabelos dele para reforçar o beijo. Foi fácil pegá-la por baixo, usando aquelas nádegas macias como apoio para erguê-la o suficiente e levá-la até a cama. As pernas de Nicole se abriram convidativamente quando ele se atirou sobre ela. A adrenalina atravessou-o diante da evidência de que ela o desejava com tanta urgência quanto ele.
Posicionando-se habilmente, sentindo a umidade quente de Nicole, sabendo que ela estava pronta, Quin estava a ponto de se lançar para frente quando subitamente ela empurrou seus ombros e gritou:
— Não! Espere!
— O quê? — reagiu ele, cada nervo e cada músculo tenso, protestando contra o adiamento, a mente se contorcendo de raiva diante da possibilidade de que ela quisesse entrar em algum jogo sádico, provocante.
— Você tem de usar preservativo, Quin — disse ela decididamente, com os seios encostados em seu peito, os joelhos para cima e os pés posicionados para lhe dar impulso, caso necessário.
— Você tem alguma doença contagiosa? — a voz dele era de frustração. Não acreditava que uma mulher esperta como Nicole fosse imprudente em relação a sexo.
— Como vou saber que você não tem? — retaliou ela. — Não me diga que passou os últimos cinco anos em celibato.
— Não, mas não sou idiota, Nicole.
— Quero que você use camisinha — insistiu, agressivamente.
— Mas não é tão prazeroso, nem para mim nem para você.
— Mesmo assim! Gravidez não faz parte do acordo!
— Gravidez? Você está preocupada com gravidez?
— Acontece... — disse ela, ferozmente.
Ele estranhou tanta preocupação. Parecia sem sentido, dada a eficácia dos métodos anticoncepcionais modernos.
Talvez percebendo que precisava dar uma explicação mais convincente, ela completou:
— Não estou tomando pílula.
A mente de Quin processou o que ela dizia.
— Então você não faz sexo há algum tempo... meses... anos?
Cinco anos? Especulou ele, lembrando-se do que ela dissera sobre o tempo de celibato.
— Não é da sua conta. O fato é que nem eu nem você queremos uma criança como resultado desta noite. Uma responsabilidade desse tipo interferiria muito na sua vida. Mas, é claro, você poderia simplesmente virar as costas, deixando-me com as conseqüências do seu... prazer.
— Por que esse tom amargo na voz? Eu nunca fugi das responsabilidades — afirmou, consciente da dívida familiar que carregara e que, por fim, quitara. — E nunca virei as costas para você, Nicole. Foi você quem foi embora.
— Depois de você fechar um milhão de portas na minha cara — disse ela, sarcasticamente. — Só a porta do quarto estava sempre aberta. Mas não vamos entrar nessa discussão, Quin. A questão é o agora, e eu não quero nenhuma lembrança, sejam borboletas ou bebês, do nosso tempo juntos. Eu trouxe um pacote de preservativos, caso você não tenha. Está na minha bolsa.
O desejo arrebatador tinha passado. Levantar e iniciar todo o processo de colocar a camisinha acabava com qualquer tesão, pensou Quin ao se deitar ao lado de Nicole. Mas tinham a noite inteira pela frente. Não havia pressa para satisfazer aquele desejo louco.
— Quer que eu pegue o pacote? — perguntou ela.
— Claro! É bom ele estar por perto quando eu tiver outra ereção — zombou ele.
Ela olhou para baixo e teve de reconhecer a flácida evidência de que a chama se apagara.
— Desculpe, Quin. Eu devia ter falado antes. Não fiz de propósito.
Ele levantou uma sobrancelha desafiadora.
— Estava pensando em outras coisas?
Os lábios de Nicole se contraíram. Não queria admitir que o desejara, mas era verdade. E Quin sabia disso. Essa consciência triunfante brilhava em seus olhos quando ele disse:
— Coloquei sua bolsa no banheiro — ele indicou uma porta atrás da mesa-de-cabeceira do seu lado da cama. — É por aqui.
Isso significava que Nicole tinha de passar por cima dele ou levantar e dar a volta na cama, passando em frente à borboleta espertamente exposta sob a única luz acesa. Ele a observou seguir a segunda opção. O corpo nu se recortou brevemente contra a lâmpada, a caminho do banheiro. Seu olhar era fixo, sem se desviar para a borboleta.
Seus lindos e fartos seios pareciam maiores, não tão erguidos quanto ele se lembrava. Um corpo cinco anos mais maduro pensou, mas nada menos sensual. O corpo de Nicole continuava sendo o mais belo e feminino que jamais vira; as curvas estavam onde deveriam, em perfeita harmonia; os ossos apareciam suavemente, e as pernas eram compridas e bem torneadas.
Quin ficou feliz por ela não se sentir inibida, não precisar se cobrir na frente dele, o que seria absurdo, pois haviam sido amantes. Ainda assim, isso permitia certa intimidade que ela podia ter desejado evitar naquelas circunstâncias, até porque sua hostilidade era um forte traço da atitude que tinha em relação a ele.
Quin meditou um pouco sobre essa atitude enquanto ela estava no banheiro. Não conseguia entender. Quando eles se conheceram, no banco onde trabalhavam, a química fora instantânea e arrebatadora. Os dois tinham sido tomados por ela. Não houve paquera: apenas um jantar seguido de paixão intensa. Foi necessária muita disciplina para não ficar obcecado por ela, não perder de vista o objetivo que estabelecera para si mesmo.
Apesar de prejudicar sua política de contenção de gastos, ele saíra da casa da mãe e alugara um apartamento para que pudessem ficar juntos o máximo de tempo possível. Nicole gostara dessa solução. O tesão era intenso, e eles também se davam muito bem fora da cama — ela entendia as pressões comerciais e ele podia conversar sobre o trabalho dela na área de vendas.
Nicole fora a única mulher com quem vivera, a única com quem quis viver. Estar com ela sempre fora animado. Ainda era. Mas, no fim, ela não ficara tão satisfeita quanto ele.
Não se lembrava de quando ela começara a insistir para que conhecessem as respectivas famílias.
Ele não queria que a relação tomasse esse rumo. Isso significaria estar ainda mais preso a Nicole, e ele não queria mergulhar em um novo relacionamento sem ter se livrado do peso do passado. Logo, foi enfático sobre continuar partilhando apenas o que eles possuíam, só os dois e que não tinha nada a ver com suas famílias.
Nesse momento, havia sentido um afastamento emocional por parte dela, certa frieza que ele supunha ser por não ter conseguido o que queria. Quin não concordara com o plano de Nicole para sua vida conjugal, fosse ele qual fosse — casamento, filhos, um lar. Ainda assim, ela parecia ter aceitado que ele não mudaria de idéia, permanecendo com ele por mais dois anos antes de romper a relação e viajar para o exterior.
Lembrava-se da queixa de Nicole de que ganhar dinheiro era, para ele, mais importante do que ela. Para Quin, as duas coisas não deveriam se chocar. Ambas eram importantes. Mas ela havia ido embora, abrindo uma distância tão grande entre eles que fora impossível ter uma segunda chance... E, como essa escolha fora dela, por que esse ódio agora?
Será que Nicole tinha desejado ou esperado que ele largasse tudo e fosse atrás dela?
Ele sentira saudade. Muita. Mas tinha um emprego, um objetivo a alcançar, e estava determinado a cumprir suas tarefas e atingir sua meta. Agora estava livre. Sua mãe voltara para a Argentina e se reinstalara no círculo familiar. Ela gostaria que ele tivesse ficado lá também, mas a vida ali não o atraía. A Austrália se tornara sua casa.
Tendo voltado a Sidney e começado o próprio negócio, vinha sentindo falta de ter alguém com quem dividir a vida. Tentou com várias mulheres. Todas o desagradavam em um ponto ou outro. Não as comparara conscientemente com Nicole, mas, no momento em que a vira de novo, soube que ela era a mulher que desejava.
Ela saiu do banheiro e andou direto até seu lado da cama, estendendo-lhe o pacote de preservativos.
— É bom deixar um preparado — disse, os olhos verdes brilhando com o firme propósito de excitá-lo ao sentar-se perto dele, roçando em sua pele.
— Eu já disse que não há pressa, Nicole — lembrou ele, mas, de qualquer maneira, abriu a caixa e começou a tirar um dos preservativos. Queria ter um à mão para quando desejasse usá-lo. — Fico feliz em só conversar com você, por um tempo.
— Então pode falar — disse ela casualmente, sentando-se sobre ele de forma tentadora.
Estava linda em cima dele, os seios balançando suavemente ao movimento voluptuoso de seus quadris, os longos cabelos cacheados caindo pelos ombros de maneira sensual, brilhando contra a luz dirigida à borboleta azul.
Será que Nicole tinha se posicionado assim para ficar de costas para a borboleta, sem poder vê-la?
— Fico feliz que você queira fazer amor comigo — disse ele, como uma provocação para descobrir seus pensamentos.
Ela lançou-lhe um olhar dissimulado.
— Posso estar querendo apenas me satisfazer.
— Então vai ser um prazer ajudar.
Ela passou as unhas de leve no peito dele, não arranhando, mas apenas dando um aviso de que suas garras podiam aparecer caso fosse pressionada.
Quin adorou brincar com o perigo.
— Há quanto tempo você não está com um homem, Nicole? — perguntou, querendo satisfazer sua curiosidade. Se não houve ninguém desde que terminaram...
— Obviamente, estive ocupada com outras coisas — replicou ela, como se ele devesse ter percebido isso pelas circunstâncias que já lhe contara.
— Dois anos?
Isso a deteve por um tempo, mas ela foi rápida em fazer a conexão.
— Seu amigo Tony Fisher não é tão irresistível quanto pensa.
— Muitas mulheres acham Tony bonito.
— Deve ser uma questão de gosto pessoal.
Seus olhos brilharam com sarcasmo quando se inclinou para frente e beijou um dos mamilos de Quin, passando a língua em torno dele e sugando-o como se adorasse aquele gosto.
Se a intenção era distraí-lo de qualquer outro assunto, certamente teve efeito. A mera excitação física levou o autocontrole de Quin ao limite. Mas pensar que ela estava ganhando deu-lhe forças para manter-se parado e com o cérebro funcionando, embora não tivesse se dado conta de que prendera a respiração até que ela afastasse a boca. Rapidamente, exalou e puxou o ar de novo enquanto Nicole movia a cabeça em direção ao outro mamilo.
— Você teve prazer em Londres? — perguntou à queima-roupa, querendo descobrir como ela passara os anos no exterior.
Nicole ignorou a pergunta, e executou a mesma deliciosa tortura novamente. Ele tinha mais vinte e cinco noites para conversar sobre isso. Podia esperar. Mas o outro assunto não podia. Nem por mais um segundo.
Ele agarrou-a pela cintura e a fez deitar de costas, rolando para cima dela e mantendo-a presa sob seu peso. Ela enroscou a mão em seus cabelos quando ele se lançou sobre os seios. Massageou os ombros de Quin quando ele desceu para beijar lugares mais íntimos. Seu corpo se revirou, se contorceu, e, por fim, ela realmente implorou.
Por um momento, ele hesitou quanto a colocar o preservativo.
Se Nicole ficasse grávida e tivesse um filho seu, estaria presa a ele para sempre.
Mas não seria uma escolha livre. Ele queria que ela quisesse estar em sua vida. E não queria ser interrompido dessa vez. Então, o preservativo era necessário.
Ela chegou ao clímax quando ele a penetrou triunfantemente, o mais profundo possível. Mas não era o suficiente para Quin. Ele estava consumido pelo desejo de vê-la gozar várias vezes, indo de um clímax a outro. Queria eliminar a memória de qualquer outro amante eventual, para que ela se lembrasse apenas dele. Usou toda a sua experiência sexual para manter o corpo dela afinado ao seu, respondendo instintivamente, em êxtase, com excitação, com amor, até o fim da noite.
Como acontecia no passado. Sim, ele queria aquilo de volta. E mais!
Esta seria a décima segunda noite. Quase a metade do combinado, disse Nicole para si mesma, tentando controlar a crescente sensação de que nunca estaria realmente livre de Joaquin Luis Sola. Ele era como uma droga. Quanto mais usava, mais queria. Assim como antes. E tachar o que tinham de "apenas sexo" não diminuía o impacto. Deixá-lo a segunda vez seria tão difícil quanto foi da primeira.
Encarou o reflexo de seus olhos no espelho do banheiro. Eles literalmente brilhavam de excitação, só porque ela iria lhe dizer que não precisavam mais usar preservativos. Já estava tomando pílula havia tempo suficiente para que fizesse efeito. Eles não precisavam pensar em proteção, não precisavam parar e interromper a sensação de absoluta e total intimidade.
Nicole não podia sequer fingir que era por ter se esfregado vigorosamente com a toalha que sua pele formigava. Todo o corpo antecipava o toque de Quin. E, agora, ela secava os cabelos recém-lavados para que ficassem mais bonitos para ele, para que estivessem macios, sedosos e sensuais, e...
— Nicole! — sua mãe chamava, batendo na porta. — Telefone para você.
— Já vou — ela desligou o secador, colocou-o sobre a pia e se enrolou em um roupão, até então, estivera nua, aproveitando uma sensação de maliciosa expectativa. Abriu a porta e encontrou a mãe ainda no corredor, esperando ela aparecer.
— Quem é? — disse Nicole, perguntando-se por que a mãe parecia tão nervosa.
Linda Ellis viu o brilho alegre que sua filha emanava e sentiu o próprio coração encolher de preocupação. Aquela mesma aura de felicidade fora completamente estragada pelo homem com quem Nicole voltava a se encontrar agora. Se aquilo acontecesse de novo, a culpa seria toda sua, por não ter medido os gastos na tentativa de salvar Harry. Um sacrifício inútil, afinal. E esse sacrifício de Nicole também poderia acabar em terrível sofrimento.
— É ele — disse simplesmente.
— Quin? — perguntou Nicole, o brilho nos olhos desaparecendo sob uma nuvem de preocupação.
Linda assentiu.
Franzindo a testa, Nicole se apressou até a cozinha, onde ficava o telefone. Linda a seguiu, perturbada com o homem que não quisera conhecê-la evitando qualquer contato com a família de Nicole. Parou junto à porta da cozinha. Precisava ouvir a conversa, precisava saber onde aquilo tudo daria.
Nicole pegou o aparelho que esperava por ela sobre a bancada. O coração disparava feito louco.
— Como você conseguiu esse número? — perguntou. O medo de Quin interferir em sua vida pessoal atravessou-lhe a mente.
— Procurei na lista telefônica — respondeu ele, como se fosse óbvio.
— Mas está no nome da minha mãe — replicou ela.
— O mesmo nome, Linda Ellis, que consta das dívidas que quitei, incluindo a hipoteca de uma casa em Burwood...
Nicole respirou fundo, para se acalmar e colocar os pensamentos em ordem. Claro que Quin tinha informações para encontrá-la. A questão era... por que faria isso? Nunca o fizera antes.
— Não faz parte do acordo ligar para minha casa.
— Estou ligando por consideração. Achei que você não gostaria de chegar ao apartamento hoje à noite e não me encontrar lá.
Ele não estaria lá? A excitação que ela tentara conter o dia inteiro se transformou em desapontamento. Teve raiva. Estava deixando Quin ir longe demais. A determinação de impedir que isso continuasse conferiu certa frieza à sua voz.
— Obrigada por me avisar que vai trocar a décima segunda noite do nosso acordo por outra coisa.
— Não tenho intenção de trocar noite alguma — respondeu ele, rapidamente.
— Você acaba de fazê-lo, Quin.
— Estarei em casa amanhã. É apenas um adiamento.
— Nós já combinamos: segundas e sextas. Não estou disponível em nenhum outro dia.
— Seja razoável, Nicole — a voz estava bastante seca agora. — Estou em Melbourne. Uma reunião de trabalho que se alongou e...
— E, como sempre, ganhar dinheiro vem antes de estar comigo — interrompeu ela acidamente. — Tudo bem, Quin. Você decide. Mas não espere que eu mude meus planos para me encaixar na sua escolha.
Ela pôde ouvir um longo suspiro exasperado diante da recusa. Nicole se sentiu satisfeita por não ceder. Ponto para mim pensou, lembrando-se de como já fizera de tudo para se ajustar ao trabalho de Quin.
No entanto, esse momento de satisfação cruel foi interrompido subitamente quando Zoe veio correndo da sala gritando:
— Mamãe, mamãe! Venha ver o que está na televisão!
Nicole se virou, viu sua mãe parada à porta e lançou-lhe um olhar desesperado e suplicante.
Zoe foi rapidamente erguida nos braços pela avó.
— Eu vou... — disse ela, carregando a menina de volta para a sala.
— Mas eu quero...
— Shhh...
A porta se fechou atrás delas, mantendo-as fora do campo de audição.
Nicole estava em choque, a voz infantil da filha ainda ecoando em seus ouvidos enquanto se perguntava, com medo, se Quin haveria escutado.
— Mamãe? De quem é essa criança, Nicole? — Quin perguntou, intrigado.
Sua mente saiu do estado de torpor e partiu para a rápida defesa:
— É a filha de uns amigos. Eles vieram aqui para... — propositadamente, fez uma voz zangada para acrescentar: — Mas você não tem nada com isso. Obrigada por ligar para cancelar a noite. Sexta-feira está confirmado ou posso esperar outro cancelamento?
Ele se zangou. Ou melhor, deixou escapar um irritado suspiro por entre os dentes.
— Você vai me ver — disse brevemente, e encerrou o telefonema.
Nicole colocou o telefone no gancho e desabou sobre a bancada. Aquela passou perto. O alívio de ter pensado em uma rápida explicação para a presença de Zoe ainda a fazia tremer por dentro.
Não lhe passara pela cabeça que Quin entraria em contato com ela em casa. Ele nunca fizera isso antes. Mas, naquela época, eles moravam juntos e trabalhavam no mesmo banco. Quando ela visitava a mãe, ele interpretava aquilo como um intervalo no relacionamento, e não se intrometia.
Agora, a situação era diferente, e ela não podia criticá-lo por uma gentileza. Deveria ter estado preparada para possíveis falhas na combinação. Apesar de ele ter seu endereço de e-mail, essa não era uma forma de comunicação imediata, a menos que você estivesse sentado na frente do computador. E ela não teria visto a mensagem antes do encontro.
Ficou envergonhada ao pensar em como desejara fazer sexo com Quin. Ele começava a dominar sua vida de novo, e ela precisava se proteger. Mais catorze noites... E se não conseguisse ir até o fim?
Isso era loucura. Ela queria apenas satisfazer sua sexualidade. Quin era bom nisso, nada mais. Se ela não conseguisse manter distância, teria sérios problemas. E, naquele exato instante, Zoe precisava de atenção.
Ela entrou rapidamente na sala e viu a filha sentada no colo da avó, assistindo ao programa "O Mundo à nossa volta". Aparentemente, não estava chateada por ter sido ignorada pela mãe. Nicole parou um segundo, observando as duas pessoas que eram o centro de sua vida.
Elas personificavam o amor, e não a luxúria. Sem o apoio sempre disponível da mãe, Nicole não conseguiria lidar com a doença de Zoe. E, depois, descobrir que Harry tinha câncer... Nicole não podia recriminar as medidas extremas da mãe na busca por uma cura. Elas foram tomadas por amor. E devia ser muito difícil perder dois maridos.
Nas últimas semanas, a mãe tinha se recuperado e estava novamente administrando a escola de dança. Tinha tingido os fios grisalhos do cabelo castanho encaracolado, e seu corpo esguio de dançarina escondia os 55 anos que tinha. Ocasionalmente, Nicole captava um lampejo sombrio naqueles olhos castanhos em geral acolhedores, mas ao menos a depressão que se seguira à morte de Harry passara.
Quanto a Zoe, era sempre uma alegria — uma maravilhosa e saudável alegria —, e, para Nicole, ela era a garotinha mais linda do mundo, com grandes olhos cinzentos e o surpreendente cabelo preto, pesado, brilhante, que a menina queria deixar crescer para poder fazer trancas. Nicole sorria desse objetivo ambicioso ao se aproximar do sofá em frente à televisão.
— Você perdeu, mamãe — Zoe informou, com um suspiro desapontado.
— Desculpe, querida. Estava ocupada no telefone e não podia interromper a pessoa que ligou — sentou-se ao lado da filha e sorriu. — Conta para mim o que você viu.
O rostinho se iluminou de admiração.
— Uma fazenda de borboletas!
— Um viveiro, como um aviário — ajudou a avó.
— E tinha um monte de flores para as borboletas pousarem!
— Flores tropicais — completou a avó — principalmente hibiscos.
— Era perto da floresta de Kranda. Podemos ir lá, mamãe?
— Kuranda — corrigiu a avó. — Perto de Cairns, ao norte de Queensland.
— É muito longe, Zoe. Ainda bem que você viu na tevê — respondeu Nicole.
Zoe suspirou, mas não discutiu. Sabia perfeitamente que algumas coisas podiam ser feitas e outras não.
— Elas eram todas azuis, as borboletas. O homem chamou de — franziu a testa, tentando lembrar o nome — Isses.
— Ulisses — Nicole lembrou com amarga ironia. O exemplar de vidro comprado por Quin ainda estava exposto no quarto. Era uma recordação torturante do que ele não sabia, não gostaria de saber.
— Se não podemos ir vê-las, você pode fazer uma para minha árvore, mamãe? Não temos uma azul. Não toda azul, como Ulisses.
Nicole tremeu por dentro, sabendo que seria uma eterna lembrança de suas noites com Quin.
— Borboletas marcam ocasiões especiais, Zoe. Você vai ter de esperar uma — disse ela, torcendo para que a filha esquecesse a Ulisses. — Agora preciso acabar de secar o cabelo antes de te colocar na cama, está bem?
— Tudo bem, mamãe.
Nicole percebeu certa preocupação nos olhos castanhos da mãe.
— Você... vai sair? — perguntou ela, com cuidado.
— Não. Vou só acabar de arrumar o cabelo para ele não ficar todo crespo.
Nicole saiu despreocupada, tentando desfazer qualquer impressão que sua mãe tivesse captado da porta da cozinha.
No entanto, depois de colocar Zoe na cama e ler uma história para ela, encontrou a mãe andando agitada pela sala, a televisão desligada.
— O que houve, mãe? Está perdendo seu programa favorito.
— Não gosto disso, Nicole — respondeu. — No telefone com aquele homem, você parecia tão vingativa... Está errado. Eu não devia deixar você fazer isso.
— Você não me deixou, mãe, fiz isso sozinha. É minha escolha — insistiu.
— Não é bom para você.
— Não sei... De uma maneira estranha, é sim.
— Como?
Nicole deu um sorriso forçado.
— Duvido que exista um homem tão bom na cama quanto Quin. Não é exatamente um sacrifício passar vinte e seis noites com ele.
— Você ainda o ama?
— Não.
— Não acredito que possa ter sexo realmente bom com alguém que não ama — disse a mãe.
Nicole tentou ignorar esse argumento.
— Bom Quin e eu ainda temos uma atração física forte. Está tudo bem, mãe. Não se preocupe.
— Não, é mais do que isso. Você está se machucando por causa dele de novo. Posso sentir em sua voz, não se pode mudar as pessoas, Nicole, elas são o que são. E se vingar por não terem sido o que você esperava...
— Não tem nada a ver com o que eu quero — interrompeu Nicole com raiva. — Quin e eu temos um acordo. Negócio é negócio. Sem mudanças. Era só isso que eu queria frisar. Agora, por favor, esqueça isso. Eu não quero dedicar a Quin mais tempo do que ele paga.
Mas, é claro, dedicava. Ele ocupava seus pensamentos durante a maior parte do tempo. No entanto, a mãe respeitou sua vontade e não tocou mais no assunto.
Quando as duas se recolheram, Nicole ficou acordada na cama, sentindo-se muito sozinha, tentando descobrir o que realmente sentia por Quin Sola. No fundo, queria que ele mudasse, e sentia raiva por não conseguir realizar seu desejo. Sua mãe estava certa. Ser vingativa não provocaria nenhuma transformação mágica. Por outro lado, satisfazia um estranho senso de justiça, diminuindo o papel dele em sua vida, como ele a diminuíra antes, quando ela precisava desesperadamente de alguma coisa a mais.
Não havia uma resposta para tudo isso, decidiu, e começou a contar carneirinhos na esperança de conciliar o sono. Deve ter dado certo, porque acordou assustada com o alto e insistente toque da campainha.
Olhou o relógio ao lado da cama: 23hl7. A casa estava pegando fogo, ou algo assim? Não sentia cheiro de fumaça. Mas devia haver alguma emergência para justificar tanta insistência em acordar as pessoas da casa. Pulou fora da cama e encontrou a mãe no corredor, já a caminho da porta. Parou ao ouvir Zoe chamando, assustada com o barulho da campainha que continuava soando.
Nem por um segundo passou pela sua mente que Quin Sola poderia estar à porta, que a determinação de não perder uma noite com ela tivesse feito ele encerrar a reunião de trabalho mais cedo, pegar um avião de Melbourne para Sidney e vir à sua casa, em Burwood, para buscá-la antes da meia-noite.
CAPÍTULO 9
Tendo mudado seus planos e viajado durante as últimas horas para chegar até ali, Quin não ficou nada feliz ao encontrar a casa às escuras. Era uma construção antiga, de tijolos vermelhos, em estilo tipicamente australiano. Tinha um quintal e um jardim bem-cuidados, como as outras casas da rua, mas nenhuma iluminação, e sua respeitabilidade antiquada intimidava. Definitivamente, não era acolhedora.
E essa era a casa que ele salvara para ela!
Então, o que Nicole fizera depois de desafiá-lo daquele jeito sobre suas prioridades? Saíra com a mãe pela noite? Tinha ido para uma cama onde ele não estivesse? Não tinha esperado para ver se ele apareceria, isso era certo. E deixava-o furioso. Ela não queria que o acordo fosse seguido à risca? Então, que o seguisse também! Naquela noite, tinha de estar disponível para ele!
O pior de tudo é que pensara que ela estava cedendo um pouco, querendo passar o tempo com ele, gostando de suas noites juntos. Acreditara que estava no caminho certo para reconstruir a relação íntima que tinham antes. Naquela noite, percebeu que tinha dinheiro mais do que suficiente para fazer o que quisesse, e o que ele realmente queria era Nicole Ashton. Não fazia diferença perder um cliente lucrativo. Mas faria diferença perder Nicole de novo.
Se ela precisava de uma amostra do quanto era importante para ele, tudo bem... Mas não estava nada bem que sua demonstração fosse irrelevante para ela. Um ressentimento atroz fez com que tocasse furiosamente a campainha. O alto ruído parecia atravessar uma casa vazia, o que aumentou ainda mais sua frustração.
Se Nicole tivesse saído, acamparia na varanda até ela voltar e exigiria que compensasse o tempo que ele ficara esperando. Seus olhos passearam ao redor, procurando uma cadeira. Não havia. Mas no canto mais afastado... um carrinho de boneca? Provavelmente, fora esquecido pelos amigos que trouxeram a garotinha.
Sua mão ainda tocava a campainha quando uma luz brilhou através dos painéis de vidro. Então, tinha alguém em casa! Ele continuou tocando alto para encorajar que viessem logo. A imagem borrada de uma mulher apareceu por trás do vidro manchado. A porta rangeu enquanto era destrancada às pressas. Quin tirou a mão do botão e se recompôs para confrontar Nicole com sua forte presença.
A porta se abriu. A mulher que o encarava não era Nicole.
Tinha cabelo curto e uns 50 anos. O robe mal colocado e os cabelos desarrumados indicavam que tivera o sono interrompido. Sua expressão inicial, confusa, transformou-se em pura irritação enquanto ele ficava ali de pé, olhando-a, até entender que aquela devia ser a mãe de Nicole, Linda Ellis.
— Quem é você? — perguntou ela, rispidamente.
— Meu nome é Quin Sola e tenho negócios a resolver com sua filha, Sra. Ellis.
— Você! — era uma exclamação de choque. No instante seguinte, ela retrocedeu como se ele fosse a pior notícia possível.
Quin estranhou a reação. Apesar de nunca terem se encontrado, Linda Ellis certamente conhecia seu nome, e ele obviamente não evocava bons sentimentos. O que levantava a questão: o que Nicole lhe dissera? Será que ser salva de uma enrascada financeira não lhe dava razões suficientes para receber melhor seu benfeitor?
— Nicole está? — perguntou, pensando que muitas coisas precisavam ser esclarecidas.
Linda Ellis não respondeu. Não precisava.
Por trás dela, Quin pôde ver Nicole no corredor, saindo de um quarto do fundo. Ela carregava uma criança, uma menina com a cabeça encaixada entre o ombro e a curva de seu pescoço. As duas usavam robes colocados às pressas.
— O que é, mãe?
As palavras escaparam da boca de Nicole antes que ela pudesse ver Quin. Quando sua mãe chegou para trás e ela pôde vê-lo, a moça levou um choque, ficando imóvel.
A menina ergueu a cabeça e olhou diretamente para Quin, querendo descobrir a razão do súbito silêncio. Tinha o cabelo preto e curto, cortado em forma de cuia. Os olhos grandes, de fartos cílios, eram surpreendentemente claros — acinzentados — e Quin pensou haver algo familiar naquele rosto...
— Você conhece esse homem, mamãe? — perguntou a criança.
Mamãe!
Quin olhou para Nicole. Havia angústia em seu rosto agora, e não choque. Uma onda de calor fez as bochechas ficarem vermelhas. Ela engolia em seco, querendo formar palavras, inutilmente. O queixo erguido mostrou um orgulho desafiador antes que ela, por fim, falasse.
— É só alguém de passagem, Zoe — esse rebaixamento a um status tão insignificante em sua vida foi acompanhado por um olhar que excluía qualquer outra possibilidade futura. — Por favor, me dê licença enquanto coloco minha filha na cama.
A menina fitou-o com curiosidade por cima do ombro da mãe quando ela se virou e caminhou de volta pelo corredor. Havia algo familiar nos olhos da menina, no rosto... A cabeça de Quin quase estourou com o pensamento intuitivo que a atravessou.
Minha filha!
A certeza tomou conta dele quando calculou que a menina devia ter uns quatro anos. Mãe e filha sumiram de vista, voltando ao quarto de onde saíram. Ele transferiu a atenção para Linda Ellis, os olhos cravados nela para arrancar a verdade.
— Ela é minha, não é? Minha filha!
As mãos de Linda moveram-se para a garganta como se para impedir uma confissão espontânea. Para Quin, o medo só fazia sentido se a hipótese fosse verdadeira e o plano fosse mantê-lo sem saber de nada. Como haviam feito durante os últimos cinco anos!
Ele se afastou da mãe de Nicole e avançou pelo corredor. A necessidade de confirmar aquilo pulsava em suas veias. A porta do quarto fora deixada encostada. Ele a abriu de todo.
A luz ainda estava acesa. Quin se distraiu momentaneamente pela bela visão da árvore de borboletas, colocada em frente a uma janela, os longos e retorcidos galhos brancos cobertos por dúzias de lindas borboletas de todas as cores e tamanhos. Uma maravilhosa decoração para um quarto infantil pensou ele, forçando-se a tirar os olhos daquela beleza para encarar a mãe e a filha. Nicole estava perto da cama, curvada para tirar o robe da menina, impedindo que ele visse sua filha — a filha deles.
— A mamãe está enganada, Zoe.
Nicole se ergueu e virou-se rapidamente, lançando-lhe um olhar furioso pela intromissão no que ela considerava seu território.
Em silêncio, ele se pôs à frente com o olhar fixo na criança que era tão carne da sua carne, sangue do seu sangue. Ela não tinha medo dele, era sua filha. A menina manteve-se firme, curiosa, querendo saber qual era o engano. Quin foi tomado por uma mistura de sensações — espanto, orgulho, carinho, uma necessidade feroz de protegê-la, o desejo de tocá-la, de abraçá-la bem forte.
Mas ainda era um estranho para ela, e precisava se controlar até ser aceito por ser quem era. Abaixou-se para falar com ela, ficando na altura de seus olhos.
— Não sou alguém que está de passagem — explicou. — Estive fora por um longo tempo. Mas agora ficarei por perto para sempre.
— Quin! — gritou Nicole, revoltada.
— Esse é meu nome — disse ele, dando um sorriso que deixava claro que era inofensivo. Isso fez a garotinha prestar atenção de novo. — Meu nome completo é Joaquin Luis Sola, mas a maioria das pessoas, incluindo sua mãe, me chama de Quin, para facilitar. Estou muito, muito contente por conhecê-la, Zoe.
O olhar da menina foi para a mão estendida de Quin. Depois de um momento de suspense, ela esticou a própria mãozinha. Quin não pôde evitar um sorriso de triunfo ao apertá-la. Zoe devolveu um sorriso tímido.
— Oi — disse ele para incentivá-la, adorando o calor e a maciez daquela pequena mão dentro da sua.
— Oi — respondeu ela, os olhos fixos nos dele, querendo saber mais.
E as palavras simplesmente escaparam dos lábios de Quin.
— Sou seu pai.
CAPÍTULO 10
Nicole estava tão confusa, com tantos pensamentos conflitantes, que era impossível concatenar uma resposta sensata para a declaração de Quin. Ficou apenas escutando Zoe desfiar seu interrogatório infantil na tentativa de entender de onde Quin surgia, por que estava ali naquele momento.
— Meu pai? — começou ela, admirada.
— Sim — confirmou Quin, sem deixar dúvida. — Veja você mesma. Temos os mesmos olhos, o mesmo cabelo, o mesmo nariz. Sou seu pai.
Houve silêncio enquanto ela examinava o rosto. Depois a menina olhou para Nicole, pedindo uma confirmação.
— É verdade, mamãe?
A cabeça de Nicole doía. O coração estava apertado por tantas emoções que parecia fazer um esforço para continuar batendo. A boca estava completamente seca.
— Sim — disse ela com a voz rouca percebendo que seria inútil negar.
Zoe voltou a encarar o pai que estivera ausente até ali e, com cândida inocência, perguntou:
— Onde você esteve, papai? Por que você apareceu agora no meio da noite?
Quin nem parou para pensar. Respondeu imediatamente:
— Estava perdido em um mundo diferente do seu, Zoe. Só agora encontrei o caminho. Não esperaria até amanhã para ver você. Espero que você não se zangue.
Ele transbordava um charme arrebatador. E Nicole o odiava por isso. Conquistar sua filha assim, quando nunca dera a mínima para ela, não era justo. Nem um pouco.
— Você vai estar aqui amanhã? — perguntou Zoe.
— Isso vai depender de sua mãe.
— Mamãe? — Zoe lançou-lhe um olhar suplicante.
— Não sei se podemos contar com a visita dele — avisou à filha antes de lançar um olhar fulminante para Quin. — Seu pai pode precisar voltar para aquele outro mundo.
— Você precisa, papai? — perguntou Zoe.
— Não se eu puder evitar, mas sua mãe e eu precisamos conversar sobre como podemos ficar juntos. Se eu não estiver aqui amanhã, prometo que voltarei logo, certo?
— Certo — respondeu ela, confiante.
— Vamos voltar a dormir, então — ordenou Nicole, incapaz de agüentar aquela intimidade entre Quin e a filha. Colocou Zoe na cama e cobriu-a com cuidado, como se quisesse proteger aquela preciosa criança contra o homem que poderia bagunçar terrivelmente suas vidas.
— Boa noite, querida — murmurou, dando um amoroso beijo em sua testa.
— Boa noite, mamãe. Papai vai me dar um beijo de boa-noite também?
— Vou sim — assegurou Quin antes que Nicole respondesse.
Ela teve de reprimir um feroz ressentimento por ele supor que poderia simplesmente assumir um papel que não merecia. Fingiu não ouvir o murmúrio íntimo entre eles e caminhou até a porta, impaciente para tirar Quin dali e afastá-lo da filha.
Antes de sair do quarto, ele lançou um último olhar para a árvore de borboletas. Nicole apagou a luz, fechou a porta e dirigiu-se à cozinha, que era longe o bastante para que pudessem ter uma conversa particular sem perturbar Zoe.
O cheiro de chocolate quente recém-preparado — uma bebida reconfortante — indicava que a mãe ainda estava acordada, esperando ansiosamente que alguém lhe dissesse o que fazer. Linda desatou a falar no momento em que Nicole entrou na cozinha:
— Eu não contei a ele, Nicole. Ele adivinhou.
— A culpa não é sua, mãe. É minha, por não ter concordado com o adiamento. Ele veio exigir sua noite. Não é, Quin?
— É — respondeu ele, ironicamente.
— Mas é culpa minha, sim! — gritou Linda, parecendo devastada pela situação. — Se não tivesse feito tantas dívidas, você nunca o teria procurado, nunca.
— A senhora está enganada, mamãe — Quin interrompeu bruscamente e ficou ao lado de Nicole. — No momento em que vi Nicole de novo, quis trazê-la de volta para minha vida. As dívidas foram apenas um meio para o objetivo que eu queria atingir.
A firme determinação em sua voz provocou um arrepio em Nicole. Será que ele agora usaria Zoe para mantê-la sexualmente presa a ele?
Sua mãe olhou para Quin, sem entender o estranho conceito de relacionamento dele.
— Por quê? Não é justo! Você não quis minha filha o suficiente para se casar com ela quando realmente importava.
— Naquela época, eu não sabia o quanto importava, Sra. Ellis — respondeu.
— Você não tem culpa por nada relacionado a Zoe ou a mim, mãe. Sempre foi compreensiva. Então, por favor, não faça um caso disso agora. Cabe a mim resolver com Quin, se você puder nos deixar a sós...
Linda deu um profundo suspiro, esfregou a testa, nervosa, pegou a xícara de chocolate quente e começou a deixar a cozinha, com ar desolado.
— Lamento muito não ter estado presente nas vidas de Nicole e Zoe. Agradeço-lhe sinceramente por tê-las ajudado durante minha ausência.
Ela parou ao seu lado, olhou bem dentro de seus olhos, balançou a cabeça, como se a situação fosse completamente além de sua compreensão, e saiu sem dizer uma palavra, em direção ao quarto.
Nicole foi até a geladeira, para pegar o leite e preparar uma bebida quente para ela. Quando a porta do quarto da mãe se fechou com barulho suficiente para indicar a privacidade na cozinha, virou-se para ele, furiosa.
— Lamentar? Você não lamenta coisa nenhuma, Quin! Você simplesmente não se importa com ninguém!
Ele continuava na porta da cozinha, e sua imobilidade dava a sensação de um poderoso animal que observava, esperando o momento de atacar.
— Eu teria feito diferente se você dissesse que estava grávida, Nicole — argumentou ele, com segurança.
— Você nunca fez nada por mim, Quin.
— Na verdade, fiz sim. Montar um apartamento para que vivêssemos juntos custou um bocado — lembrou Quin, em tom irônico.
— Dinheiro! — respondeu ela, com sarcástico desdém.
— Dinheiro que não teria sido gasto se não fosse por você.
— Porque você me queria.
— E teria querido nossa filha também — replicou ele, rápido.
— Bom, eu fiz a opção de não sermos propriedades suas — devolveu ela. — Era apenas isso que eu representava para você, e o que nossa filha seria também.
Ressentida, abriu a porta da geladeira, pegou a garrafa de leite, bateu a porta e, virando-se para a pia, pegou uma caneca e começou a colocar o chocolate em pó que a mãe deixara sobre a bancada. As mãos tremiam.
— Sinto muito tê-la feito se sentir assim.
Ela rangeu os dentes. De forma alguma deixaria aquele pedido de desculpas afetá-la. Eram palavras vazias. Fáceis de dizer quando o passado estava distante. Esforçou-se para controlar o tremor das mãos e servir a bebida.
— Pensei que fôssemos dois adultos solteiros, construindo carreiras próprias e tendo a sorte de partilhar algo bom e recíproco — acrescentou ele como se arrependido, e depois teve o descaramento de dizer: — Eu era propriedade sua tanto quanto você era minha.
Nicole ficou possessa.
— Só quando estávamos na cama! Fora dela, você tinha seus próprios compromissos, que o consumiam muito mais do que eu jamais consegui! Não adianta negar, Quin. Eu sei como eram as coisas para você. E para mim. Eu sei!
O rosto de Quin demonstrou ter sentido o golpe. Ele não disse nada.
A moça se virou novamente para colocar a caneca no microondas e acionar o timer. Os segundos começaram a correr no relógio digital. Eram terrivelmente lentos comparados às batidas de seu coração, mas ela observava-os atentamente, querendo ganhar tempo antes de discutir novamente com Quin.
— Se você não me quer em sua vida, Nicole — disse ele, devagar, baixinho — por que arriscou vir ao meu encontro àquela noite no Havana Club?
— Para fazer você pagar — respondeu ela, impulsivamente.
— Pagar pelo quê? Nunca fiz nada que você não quisesse.
— Pelo que você não fez — murmurou com raiva. — Usei o sexo, que era só o que você queria de mim, para pagar por esse teto sobre nossas cabeças, para que a escola de dança continuasse a funcionar e pudéssemos ganhar dinheiro. Você já cumpriu sua obrigação paterna, Quin. Não precisa ser um pai para Zoe. Nós nos viramos bem sem você.
O microondas apitou.
— Acho que mereço isso — disse ele, admitindo, enfim, que ela pusera um ponto final no relacionamento passado.
De repente, lágrimas embaçaram a visão de Nicole. Para não deixá-lo perceber, ela se virou para pegar a caneca fumegante e segurou-a com as mãos trêmulas.
— Mas a punição para meus crimes de omissão acaba aqui, Nicole. Não vim aqui para cobrar o que você me deve. Vim para provar que estar com você é mais importante que qualquer outra coisa, para mostrar que não quero mais perder nenhum minuto do tempo que você me concede. Para que seja diferente desta vez.
Ela sacudiu a cabeça, tentando, desesperada, ignorar a dor no peito.
— Não acredito que você tenha mudado, Quin.
— As circunstâncias mudaram.
Uma histeria varreu seu cérebro quando ela percebeu o quanto os dois haviam mudado.
— Sim, você descobriu que tem uma filha. E se lançou no papel de pai antes de pensar o que isso significaria para uma garotinha que é muito ingênua para acreditar em você.
— Não darei motivo algum para ela não acreditar — retorquiu ele, sem hesitar.
A raiva tomou conta do corpo de Nicole, endurecendo as costas e fazendo-a parar de tremer. Bateu a caneca com força na bancada e virou-se para confrontá-lo, com um gesto de ironia.
— Ah, claro! Papai vai estar por perto sempre que Zoe quiser, e não apenas quando ele achar conveniente.
Ele ignorou o sarcasmo e foi direto ao ponto:
— Ela me quer aqui amanhã. Você está preparada para deixar isso acontecer, Nicole?
O desafio que brilhava em seus olhos não deu espaço para protestos. Se não concordasse, seria ela quem estava mantendo o papai distante.
— Tem de ser pela manhã, então — respondeu com raiva. — Zoe vai comigo depois para a escola de dança à tarde.
— Estarei aqui as sete em ponto. Suponho que nossa filha já esteja acordada — e, com um breve aceno, dirigiu-se ao corredor.
— Você não vai ficar para usufruir de mim hoje à noite? — correu atrás dele, surpresa por ele ter decidido ir embora e retornar no dia seguinte tão cedo para estar com Zoe.
Ele parou perto da porta e examinou-a com um olhar impiedoso.
— Eu sempre usufrui apenas do que você quis me dar, Nicole — disse em voz baixa. — É bom você começar a se lembrar disso.
Nicole observou Quin sair da casa. Tudo dentro dela ardia com uma sensação de vazio.
Quin não a quisera aquela noite, mas ela ainda o queria.
E doía — como doía — que ele quebrasse o acordo entre eles.
Ela não estava mais no controle.
Será que alguma vez estivera no comando com Quin ou apenas se iludira, usando o acordo como desculpa para ter a única coisa que ele sempre lhe dera?
Agora, sabendo da existência de Zoe, será que as coisas mudariam mesmo?
CAPÍTULO 11
Quin chegou à casa de Burwood antes da hora. O tráfego da manhã não estava tão intenso quanto imaginara e teve sorte, pois pegou quase todos os sinais verdes. Estacionou o Audi no meio-fio da rua e ficou sentado no carro, esperando o tempo passar, até dar sete horas. Nicole não ia gostar de ver que havia chegado mais cedo.
Perdera quatro anos de sua vida. E a gravidez. Apenas porque não era o momento certo para que o relacionamento deles fosse além das necessidades mais imediatas. Não fora sua intenção menosprezar o lugar de Nicole em sua vida, e entendia por que ela reclamava de sua falta de comprometimento. Mas ter um filho seu sem dizer nada?
Antes de tudo, ele era um homem honrado. Teria apoiado Nicole. Mas, evidentemente, não era isso que ela queria. Preferiu ficar sozinha a criar sua filha ao lado dele.
Essa situação tinha de mudar. E era o que ele faria. A pergunta era: qual a melhor maneira de fazer isso?
Ele olhou para o relógio. Já eram quase sete horas. Pegou a sacola com a borboleta azul do banco do carona, saiu do carro e dirigiu-se a casa, decidido a causar um impacto positivo na vida de sua filha. Talvez isso influenciasse Nicole, para que ela fosse menos hostil.
A porta se abriu assim que ele chegou à entrada. Nicole saiu, fechou-a rapidamente — sinalizando sua relutância em deixá-lo entrar na casa. Quin parou e observou-a atentamente, esperando que ela dissesse o que esse movimento significava.
Os belos olhos verdes dela estavam embaçados de cansaço. Não devia ter dormido quase nada, pensou Quin. Havia penteado os longos cachos e sua aparência geral — camiseta, calça jeans e sandálias — era boa, mas seu rosto estava sem maquiagem. Sua pele parecia pálida e cansada. A tensão de ter de encontrá-lo esta manhã fazia-se visível.
Ela começou a se demorar sem dizer uma palavra sequer. Ele sabia que Nicole o via como um habitante de outro mundo, com seu terno cinza impecável. Sentia que isso a atormentava, e ela não queria sofrer de novo. O problema é que, havia cinco anos, eles estavam em momentos de vida diferentes. Ela nutrira expectativas que ele não fora capaz de alcançar.
— Tenho outras ambições hoje, Nicole — disse, com a esperança de aliviar o estresse dela. — Tenho de cuidar da minha empresa, assim como você tem de cuidar da escola de dança. Mas eu já não possuo mais aquela urgência de ganhar o máximo de dinheiro no menor tempo possível.
Ela deu um suspiro. Estava cansada de acreditar nele.
— Sei que ficou grilado ao saber de Zoe, Quin. Você reagiu sem pensar antes no compromisso que a paternidade representa.
— Não tenho de pensar, Nicole. Não estamos falando de algo abstrato; Zoe é uma realidade.
— Bom, Quin, ela ainda está dormindo. Pode ir embora que eu cuido da menina.
— Não! Não vou ser apagado da vida da minha filha!
— É o seu ego que está falando, Quin, não o amor. Acho que você não sabe o que é amor, e não é justo roubar o coração de uma menina e, depois, não ser capaz de dar o que ela vai querer de você — disse, erguendo as mãos em sinal de apelo. — Por favor, pense nisso. Pelo menos, deixe essa decisão para a sexta-feira à noite, quando eu for encontrá-lo.
— Esperar não vai mudar minha decisão. Você concordou que eu viesse aqui hoje, Nicole. Não vou embora.
— Eu não raciocinei direito ontem à noite.
— Mas eu, sim. E estou racionando bem agora também — rebateu ele, olhando para o relógio novamente. — Já passou das sete e, embora você não goste de me ver, acho que minha filha vai gostar. Então, será que podemos encerrar essa discussão fútil e ater-nos ao combinado?
Ela o fitou com um misto de medo e frustração.
— Você não se importa, não é? Tudo tem de ser do seu jeito.
— E o seu jeito era bom, Nicole? — contradisse ele. — Ficar com Zoe só para você, sem se importar se ela queria um pai?
— Você não era bom para mim, Quin. Por que eu acreditaria...
— Era sim — interrompeu-a. — Eu era bom para você ou você não ficaria comigo por tanto tempo. Eu só não dançava no seu ritmo e também não farei isso agora. Deixe-me ver a menina, Nicole. Podemos fazer isso pacificamente. Ou você quer enfrentar uma ação judicial para que eu tenha o direito de visitá-la?
Ela encostou-se na porta, confusa e com medo daquela ameaça. Não imaginava que ele iria tão longe para reivindicar a filha. A necessidade de estabelecer um vínculo com ela dominava-o. A sensação de ter sido arbitrariamente apagado de sua vida pelos últimos quatro anos apenas piorava a situação. Por outro lado, se brigasse com Nicole, podia não conseguir tudo que queria. E, em razão disso, forçou-se a ficar calmo.
— Bem, vamos esquecer o passado, Nicole. Temos de construir o futuro de Zoe, e a cooperação é melhor do que o conflito.
Ela se sentiu vulnerável, impotente, como se Quin houvesse derrubado suas defesas e ela não soubesse para onde ir.
— Vai dar tudo certo. Prometo.
Ela inspirou profundamente e soltou o ar em um suspiro prolongado. Afastou-se e abriu a porta para ele entrar.
— Essa é a primeira promessa importante que você fez, Quin. Espero que mantenha a palavra.
Ele parou ao seu lado e levantou a mão, tocando seu rosto delicadamente. Queria que ela visse sinceridade em seus olhos.
— Vamos selar isso com um beijo, Nicole.
Ele não esperou o consentimento verbal. A necessidade de estabelecer um vínculo com ela, e com a filha, irrompeu em Quin, dando lugar a um beijo de persuasão, e não de possessão. Era importante acalmá-la, fazê-la sentir que ele realmente se importava e que o desejo sexual que ela incitava não era a única razão para que ficassem juntos.
Por alguns instantes, ela se manteve passiva, deixando-o beijá-la, mas sem se envolver. Logo, sua tensão explodiu e seus lábios se moveram para retribuir o beijo, como se estivessem curiosos para provar o que ele oferecia. Quin não forçou mais. Ser aceito era seu objetivo principal esta manhã.
Lentamente, retrocedeu, roçando os lábios contra os dela ao murmurar:
— Um novo começo. Para nós três.
— É melhor aproveitar ao máximo seu tempo com Zoe — disse, áspera. — Você sabe onde é o quarto.
Estava dispensando-o, mas, pelo menos, sem muita hostilidade.
Satisfeito por ter avançado, mesmo que pouco Quin caminhou pelo corredor e, silenciosamente, abriu a porta do quarto de sua filha, feliz apenas por olhar para ela. Odiou ter perdido quatro anos da sua vida, ter sido privado de vê-la crescer.
Zoe não estava dormindo. Estava deitada, olhando para a árvore de borboletas. O sol da manhã entrava pela janela, iluminando as asas multicoloridas, criando uma visão mágica. O país das maravilhas de uma criança pensou ele percebendo como Nicole era uma boa mãe. Quantas mulheres se dedicariam assim?
De repente, Zoe abriu um enorme sorriso ao perceber a presença de Quin.
— Você voltou!
A tensão que ele levara consigo para o quarto desvaneceu. O prazer ao ver a acolhida de sua filha o fez sorrir.
— E trouxe um presente!
Ele lhe deu a sacola e sentou-se na cama ao seu lado, feliz por notar como ela estava surpresa. Arrancou o papel de embrulho e, por fim, viu o presente.
— Uma Ulisses! — gritou. — Como você sabia que era o que eu queria, pai?
— Eu não sabia — respondeu ele, ficando impressionado ao ver que ela sabia o nome da borboleta. — Ontem à noite, percebi que você não tinha essa na árvore.
— Vi na televisão e perguntei para a mamãe se podia ter uma dessas. Ela disse que devia esperar uma ocasião especial.
— Essa é uma ocasião muito especial — garantiu ele.
— É sim! — Zoe bateu palmas. — Meu primeiro dia com o papai!
Algo apertou o coração de Quin. Quantos primeiros dias haveria? O dia em que ela nasceu... Ele sequer sabia qual era a data. Sua primeira palavra... Seu primeiro passo...
— Todas as borboletas da árvore simbolizam datas especiais, Zoe? — perguntou, esforçando-se para manter a voz calma e interessada, lutando contra a sensação de perda por ter sido eliminado de todos os marcos importantes da vida dela.
A menina levantou a cabeça, pensando na resposta.
— Ganhei a maioria quando eu estava doente. Foi quando a mamãe começou a fazer a árvore.
Quin franziu as sobrancelhas ao escutar isso.
— Você ficou muito doente?
— Muito, muito doente — respondeu, assentindo seriamente. — Tive de ficar no hospital, porque peguei... — ela hesitou, esforçando-se para lembrar o nome da doença — "mingite".
Um arrepio percorreu o corpo de Quin.
— Quer dizer meningite Zoe?
— É, isso! — ela parecia orgulhosa pelo conhecimento dele e repetiu a palavra sílaba por sílaba: — Me-nin-gi-te.
Ele ficou horrorizado. Zoe podia ter morrido. Aconteceu algum milagre para ela ter sobrevivido a essa doença fatal. Ele podia nem saber que essa linda criança havia existido. Sua criança, perdida antes que pudesse encontrá-la.
— Lamento não ter estado ao seu lado para fazer você se sentir melhor — disse, suspirando para aliviar a dor no peito.
— Você estava no seu outro mundo?
— Isso — ele ficou agradecido por ela registrar o que dissera na noite anterior. — Eu não sabia o que estava acontecendo com você. Mas eu gostaria de ter sabido.
— Tudo bem, papai. Não foi culpa sua. Fiquei muito doente no hospital, nem podia sair da cama — prosseguiu Zoe. — Mamãe disse que era como uma lagarta em um casulo. Eu tinha de continuar lá até ficar bem forte e me tornar uma borboleta, livre para dançar e me sentir bonita.
— Você é bonita.
Os olhos da garotinha brilharam de felicidade. Ele queria abraçá-la, mas devia ser cauteloso. Zoe podia ainda não se sentir à vontade com isso. Quin ainda era praticamente um estranho, apesar das ligações de sangue.
— Vamos colocar, então, a Ulisses na árvore? — perguntou, animada, jogando o lençol no chão e pulando da cama. Carregando a borboleta de vidro cuidadosamente, estava quase chegando na janela quando parou e olhou para ele.
Quin não se mexera. A filha o deixava extasiado; o andar gracioso, as pernas e os braços gordinhos, a perfeição suave da pele infantil, o cabelo escuro bagunçado pela noite de sono.
Ele sorria e ela devolveu o sorriso antes de dizer:
— Tenho que chamar a mamãe. Ela gruda as borboletas na árvore com cola.
— Tudo bem.
— Aliás, tenho de ir ao banheiro também... — confessou, envergonhada.
— Sempre temos de fazer isso assim que acordamos.
Zoe ficou aliviada por ser compreendida. Entregou-lhe o presente e correu para o banheiro.
— Cuide da Ulisses até eu voltar. Não saia daí.
— Pode deixar.
— Obrigada papai!
Com outro sorriso, ela se foi. Ouviu-a chamando a mãe e a avó. A voz transbordava de animação. Quin tinha de reconhecer que as duas mulheres deram um lar cheio de amor para a menina. Não deviam ter sentido sua falta. Ninguém sente falta do que sequer conhece.
Nicole estava preocupada com aquela intromissão, preocupada quanto ao efeito que isso causaria em Zoe. Não confiava nele. Quin percebeu que apenas o tempo provaria que ela estava errada, mas quanto tempo isso levaria? Ele já perdera muito.
Olhou para a borboleta azul que Zoe colocou em sua mão para garantir que ele não iria embora antes de ela voltar. Pelo menos a filha confiava em sua palavra. Quin jurou que ela jamais teria razão para não acreditar. Podia ser impossível protegê-la de toda dor na vida, mas se esforçaria ao máximo para não lhe causar nenhum sofrimento. Mas havia uma coisa que Nicole não podia negar: ele agradara à menina.
Zoe voltou correndo. Nicole a seguia relutante, apesar dos gritos animados da filha.
— Venha ver, mamãe. É de vidro. Mostre para ela, pai.
Nicole lançou-lhe um olhar duro. Quin entregou o presente à garota.
— Mostre você, Zoe. É seu.
Ela segurou cuidadosamente e virou-se para a mãe, que não queria que ele tivesse comprado o presente. Agora, ele entendia a atitude de Nicole. As borboletas estavam muito ligadas à vida de sua filha — uma vida da qual ele jamais compartilhara.
— Acho que é muito pesado para prender com cola, Zoe — disse, séria. — Você não quer que caia e quebre, não é?
Quin ficou tenso. Ele realmente não fizera parte da árvore, mas não teve escolha. Nicole decidiu não lhe dizer nada sobre a existência da filha. Se tivesse a chance, teria cuidado de Zoe o máximo possível. Negar-lhe um espaço agora era o mesmo que afastar qualquer recomeço.
— Mas, mamãe, temos de colá-la — insistiu Zoe. — E a minha primeira borboleta do papai. Podemos amarrar em um galho?
Que criança esperta pensou Quin, olhando para Nicole, para ver como ela enfrentaria o desafio.
— Isso vai estragar o resto, Zoe. A árvore é muito bonita para colocar um barbante. Por que não botamos no parapeito e fingimos que ela está voando sobre as outras?
Zoe mirou a janela, estudando a posição. Depois de alguns instantes, colocou a Ulisses no peitoril e se afastou para ver o resultado.
— Hum... Não é o mesmo que ficar na árvore, mãe. Ela parece sozinha.
— Talvez seu pai compre outras para fazer companhia — respondeu Nicole, desafiando-o.
— Essa não vai ser a única, Zoe — garantiu ele, avisando a Nicole que não ia desaparecer. — Mas se você quiser que a Ulisses fique na árvore, posso comprar uma corrente prateada para prender, e ficar ainda mais brilhante e bonito. Que tal?
O rosto de Zoe se iluminou.
— Assim ficaria lindo, pai.
Ele não se importava com a reação de Nicole. Na verdade, criar as oportunidades parecia melhor que esperar as coisas acontecerem.
— Trago a corrente no sábado de manhã e, se sua mãe não se importar, poderíamos passar o dia todo juntos.
— Mãe? — implorou Zoe.
Nicole forçou um sorriso.
— Tudo bem. Agora acho melhor você se vestir e ir tomar café.
— O papai pode tomar café comigo? — perguntou, ansiosa.
— Não, ele tem de ir trabalhar. Por isso ele está de terno. Foi muito gentil da parte dele vir aqui hoje especialmente para vê-la. Você agradeceu o presente?
— Não! — Zoe olhou para ele, assustada por ter esquecido de agradecer.
Aproveitando a oportunidade, Quin sorriu e estendeu os braços.
— Que tal um abraço e um beijo?
Ela voou para cima dele. Quin abraçou-a e Zoe lhe deu um beijo na bochecha.
— Obrigada papai. Adorei minha Ulisses.
Ela falou com tanto fervor que Quin sentiu o coração em chamas. Teve de se controlar para não apertá-la forte demais. Essa linda criança era sua e não queria largá-la. Então, viu o olhar dolorido de Nicole e percebeu que alongar mais aquela visita seria contraproducente.
— Fico feliz que seja especial para você, Zoe — sussurrou. — Volto no sábado.
— Não se perca no seu outro mundo de novo, pai.
— Não me perderei. Agora eu encontrei você.
— Que bom!
Os dois sorriam. Ele a colocou no chão.
— É melhor fazer o que a mamãe disse. Tchau Zoe!
— Não esqueça a corrente prateada.
— Vou comprar hoje na hora do almoço. Você decide onde coloca a Ulisses e arrumamos isso no sábado de manhã. Comporte-se até lá!
— Pode deixar. Tchau, papai!
Nicole o acompanhou. Quando saíram do quarto, Quin perguntou:
— Você tem algum álbum de fotos da Zoe?
— Tenho — respondeu, secamente.
— Gostaria de vê-lo — insistiu ele.
— Vou levar na sexta-feira à noite.
— Obrigado. E obrigado por Zoe também, Nicole. Ela é uma criança maravilhosa.
— É sim.
Eles saíram da casa. Nicole parou e disse:
— Não comece a mimá-la com as coisas que seu dinheiro pode comprar, Quin.
Ele assentiu. O dinheiro era o grande problema entre eles. Ele percebeu que não retomariam o relacionamento enquanto não conversasse com Nicole sobre aquilo.
— Teremos muito para conversar na sexta-feira — disse, fitando-a. — Você já se vingou de tudo que acha que eu fiz ou deixei de fazer na época em que estávamos juntos escondendo minha filha de mim por todos esses anos.
Ela recuou e levantou o queixo, desafiadora.
— Foi o melhor a se fazer.
— Nunca saberemos. Não esqueça as fotos. Seria mais uma injustiça.
E assim, ele se foi. Havia muito a organizar antes da noite de sexta-feira.
CAPÍTULO 12
Nicole não falava com Quin desde terça-feira de manhã, nem por telefone, nem por e-mail. Chegou ao apartamento dele às oito da noite, na sexta-feira, sem saber o que aguardar, tentando não esperar nada além da maratona sexual típica.
Esta era a décima terceira noite e, apesar de não ser supersticiosa, Nicole não podia deixar de sentir certo agouro em relação àquilo. O acordo continuava de pé, mas os limites da situação haviam mudado depois que Quin descobriu sobre Zoe e mostrou-se determinado a assumir a paternidade da menina.
Um novo começo... Mas um novo começo para quê? Será que Quin era capaz de tornar o futuro diferente do passado?
Hoje, Nicole levava uma bolsa bem maior que o normal, pois trazia os álbuns de foto que ele pedira. Segurava a alça com tanta força que as unhas estavam fincadas contra a palma da mão, enquanto esperava a porta abrir. Doía deixar Quin entrar nos anos que pertenciam apenas a ela e a Zoe. Achava que estava se abrindo muito.
A porta se abriu.
Seu coração bateu mais rápido quando ficou cara a cara com Quin novamente. Ele deu um sorriso de boas-vindas que ela não retribuiu. A turbulência na mente era maior que sua educação, no momento.
— Entre — disse gentilmente. — Quero que conheça uma pessoa.
Aquelas palavras paralisaram seus movimentos. Não acreditava que ele traria outra pessoa para uma noite de revelações pessoais. Ou será que as fotos da vida de Zoe não eram importantes para ele — apenas uma curiosidade que podia satisfazer a qualquer hora?
Quin respirou fundo. Os olhos cinzentos e determinados dele enfraqueceram-na, e o ar de boas-vindas tornou-se implacável.
— É minha mãe, Nicole. Ela veio da Argentina para conhecer você e a neta.
Nicole vacilou diante dessa atitude inesperada. O que ele queria ganhar com isso? Como ela devia reagir?
— Argentina? — repetiu, estupefata.
— É onde minha família mora. Minha mãe voltou há três anos para ficar com eles. É seu país de origem.
— O seu também? — perguntou, tentando encaixar essa nova informação no pouco que sabia sobre o passado de Quin.
Antes de responder, ele deu de ombros.
— Não mais. Agora, minha casa é aqui. Bem, minha mãe está cansada do vôo de catorze horas desde Buenos Aires, mas quer muito conhecê-la...
Ele se afastou para que Nicole entrasse em sua cobertura. Os pés dela se moviam, impulsionados por uma curiosidade que exigia ser satisfeita. Ao entrar na sala, viu uma mulher se levantar de um dos sofás de couro — uma mulher alta e bonita, cujo rosto forte estava marcado pelo cansaço.
A única maquiagem que usava era um batom vermelho, e o cabelo cinza estava puxado para trás em um coque. Apesar de sua austeridade, ou por causa dela, aparentava uma dignidade intimidante, provavelmente acentuada pelo terno preto e pelo colar e brincos de azeviche. Diante dela, Nicole sentiu-se mal vestida para o encontro.
Ela hesitou ao pensar que a mãe de Quin devia vê-la como uma mulher qualquer — morava com seu filho, teve uma filha fora do casamento, e sequer mencionou a gravidez. Logo, não podiam estar casados, como as boas meninas faziam na Argentina. Sentiu-se envergonhada com aquele pensamento. Mas a culpa era de Quin e não sua!
Ele pegou a bolsa que a moça segurava e pôs a mão em seu braço para guiá-la.
— Nicole, esta é minha mãe, Evita Gallardo.
— Não... não é Sola? — balbuciou, espantada.
— Quando voltei para casa, adotei meu sobrenome de solteira — explicou. — Era muita desgraça ligada ao nome Sola.
— Desgraça? — repetiu Nicole, sentindo-se confusa.
A mãe de Quin havia se aproximado e segurava as duas mãos de Nicole, como em um apelo. Ou seria um cumprimento? Rapidamente, ela estendeu a mão e saudou-a. Os olhos escuros de Evita passavam medo.
— É uma longa história — começou. — E vim até aqui porque quero contá-la para você. Espero que entenda.
Entender o quê? Nicole quase deixou o pensamento escapar, mas, consciente, limitou-se a assentir. Então, percebeu que não havia se apresentado.
— Muito prazer em conhecê-la, senhora... Gallardo.
— Por favor, chame-me de Evita. Já somos uma família. Você me deu uma neta.
— Claro, claro — concordou Nicole. Independentemente de como a visse, Evita Gallardo seria muito cuidadosa para não ofender a guardiã legal de sua neta. O objetivo desse encontro devia ser estabelecer um contato amigável, abrindo uma porta para sua entrada na vida de Zoe, o que significava que Quin realmente queria se tornar parte constante do futuro da filha.
— Trouxe alguns álbuns com fotos da Zoe — disse, mostrando-os a Evita Gallardo. — Talvez você goste de vê-los.
— Gostaria muito — ela apertou a mão de Nicole, com ar de gratidão. Com a outra, indicou o sofá onde estava sentada. — Por favor, sente-se ao meu lado.
— Café, Nicole? — perguntou Quin.
O empresário ficou satisfeito com aquilo, dando a impressão de que as coisas se desenrolavam exatamente como planejara. Ele era implacável em perseguir sua meta, mas ela se perguntava o que realmente tinha em mente. Quin a surpreendeu ao apresentar a mãe dele, e Nicole sentia que estava perdendo o controle da situação. Não via alternativa a não ser passar aquela noite da melhor maneira possível.
— Sim, por favor — respondeu.
Pelo menos, tomar café assim que chegava era normal. Depois da primeira noite juntos, ela negou todos os convites subseqüentes para jantar. Preferia comer com a mãe e Zoe antes de sair de casa. Além disso, jantar fora com Quin parecia um encontro romântico, e ela queria ater-se estritamente ao acordo, sem criar um relacionamento com ele.
Enquanto acompanhava a mãe dele até o sofá, Nicole refletiu que seria impossível evitar algum tipo de relacionamento, principalmente depois de Quin demonstrar o comprometimento de ser mais que um pai ausente. Envolver sua mãe provava a seriedade das intenções.
No entanto, ela ia voltar para a Argentina e suas visitas seriam muito esparsas, logo, sua presença não provava muita coisa.
Nicole obrigou-se severamente a não pensar em um futuro que podia jamais se materializar. Sentou-se ao lado de Evita Gallardo, consciente de que devia dar um passo de cada vez. Não podia fazer nenhuma suposição. Tinha apenas de seguir o desencadear dos fatos.
Quin colocou a sacola na mesa de café.
— Esperem por mim antes de começar. Não quero perder nada.
— Claro que vamos esperar — respondeu Evita. Quin foi para a cozinha fazer café e Nicole virou-se para a mãe dele, buscando as informações sobre o passado, que Quin sempre lhe havia negado.
— Você disse que o nome Sola trouxe muita desgraça. Poderia me explicar isso, Evita?
Ela suspirou, dando a impressão de que era necessário um grande esforço para revelar a história, que devia ser fonte de muita dor e humilhação. Quando começou a falar, havia tristeza e muito arrependimento em seus olhos negros.
— Meu marido, Luis Sola, era um homem muito bonito, charmoso e inteligente. Passei muitos anos enfeitiçada, achando que ele era tudo aquilo que mostrava ser. Mas ele usou nosso casamento para se aproximar de pessoas ricas, e as enganou, roubando muito dinheiro delas. Um dia, tudo parecia estar normal. No outro, ele partiu. Quin e eu tivemos de enfrentar o escândalo de sua traição.
— Deve ter sido muito difícil — murmurou Nicole, solidária.
Evita balançou a cabeça e suspirou novamente.
— Eu não agüentei. Foi especialmente ruim para Joaquin, que teve de carregar o estigma dos crimes do pai durante o colégio. Ele tinha apenas treze anos e, de repente, foi banido de tudo. Até minha família se afastou dele, porque era muito parecido com Luis. Ele foi injustamente considerado uma semente podre, que também nos envergonharia.
— Mas você não acreditou nisso, não é? — perguntou Nicole, envolvida pela história.
— Conheço meu filho. Ele é um Gallardo. Foi melhor para ele aceitar o exílio na Austrália do que continuar em Buenos Aires, onde jamais confiariam nele. Então, viemos para cá e Joaquin jurou que provaria que todos estavam errados.
— Como?
— Devolvendo o dinheiro roubado.
Nicole percebeu que esse era o estímulo para ganhar o dinheiro que havia por trás daquela mente ambiciosa. Ficou impressionada ao ver como sabia pouco sobre o homem que amara.
— Quando nos estabelecemos aqui, ele começou a trabalhar e estudar muito. Ganhou uma bolsa de estudos para a universidade e se formou em administração. Então, foi logo trabalhar em um banco, para aprender a fazer dinheiro...
— O que ele conseguiu com um sucesso extraordinário, convenhamos.
Evita concordou e a encarou.
— Quando ele a conheceu, e saiu da casa que meu pai nos dera para morar com você, o sentimento dele por você era muito forte. Fiquei preocupada que isso pudesse impedi-lo de realizar meu sonho: voltar para Buenos Aires, orgulhosa do meu filho e do que ele conquistara.
Ela ergueu as mãos, em um pedido de desculpas.
— Eu não queria conhecê-la, não queria lhe dar espaço na vida de Joaquin. Sequer deixava-o falar sobre você. Então, foi por culpa do meu egoísmo...
— Você não precisa ir tão longe, madre — interrompeu Quin, que trazia a bandeja com o café. — Eu não deixaria nada me impedir de realizar meu objetivo. Achei que também merecia minha fatia do bolo, mas, ao fazer isso, perdi mais do que esperava. Quer dizer, Zoe.
Restituir o dinheiro roubado estava acima de qualquer compromisso com o relacionamento que tinham, independentemente do sentimento que nutrisse por ela. Para Nicole, o trauma profundo que ele sofrerá aos treze anos não podia ser facilmente ignorado.
— Suponho que, como sua mãe mora lá, você deve ter conquistado respeito em Buenos Aires — observou ela.
— Sim, todas as dívidas foram pagas com juros há três anos — respondeu ele, sem se orgulhar de sua conquista.
O orgulho que sua mãe sentia bastava.
— Foi um feito muito honroso. Minha família finalmente o aceitou.
— Por que você não ficou lá? — perguntou Nicole, sem saber por que ele negou a posição de herói.
— Meu nome é Joaquin Luis Sola. Ainda sou filho do meu pai, e isso não significa nada na Austrália.
— Um novo começo — interpretou Nicole.
— Nem tão novo. Bem, agora, podemos ver as fotos?
As palavras de sua mãe — um feito muito honroso — ressoavam na cabeça de Nicole. Será que o começo nem tão novo está centrado em Zoe? Era uma questão de honra ser um bom pai para sua filha?
Honra não era amor. Tampouco o era a luxúria. Tinha de tomar muito cuidado para não atribuir às ações de Quin sentimentos inexistentes. Isso geraria equívocos enormes, e ela não era a única a pagar por eles. Não queria que Zoe também se decepcionasse com Quin. Mas não sabia como evitar isso agora.
Cercada por ele e Evita, ela abriu um dos álbuns, que continha a primeira foto de bebê de Zoe. Nicole estava entre o pai e a avó de sua filha, e a sensação de envolvimento pesava muito na mente e no coração, deixando-a trêmula por dentro.
Não podia evitar que a mão tremesse um pouco e que a voz ficasse embargada.
— Essa é Zoe no dia em que nasceu.
Ela parecia tão pequena, dentro de uma trouxinha, apenas com o rosto para fora — um rosto rosado emoldurado pelo cabelo negro. Estava com os olhos fechados e seus enormes cílios eram impressionantemente negros.
— Parece com o Joaquin quando nasceu! — maravilhou-se Evita.
— Não, madre — Quin tocou o lábio do bebê na fotografia. — Esta boca perfeita é da Nicole. E Zoe é menina, e não menino.
Era uma boca que ele conhecia muito bem, pensou Nicole, sentindo a coxa dele comprimindo-se contra a sua, e desejando que houvesse mais que sexo no desejo que se acumulava entre eles. Doía que, mesmo agora, não houvesse nada além do que já houvera no passado, exceto a filha que tinha de dividir com ele.
Depois de corrigir a mãe, calou-se, vendo como Zoe crescia. Era Evita quem fazia perguntas a Nicole, além de comentários amorosos sobre sua linda neta. Quin apenas olhava, e Nicole estava cada vez mais consciente da tensão que emanava dele.
Será que estivera errada ao manter Zoe longe dele?
Ele permaneceu em silêncio durante o segundo álbum e quase até o fim do terceiro. Então, virou a página e viu uma Zoe bem mais magra parada ao lado da árvore de borboletas.
— Isso deve ter sido depois que ela teve meningite — supôs ele.
— Meningite! — exclamou Evita, horrorizada.
Nicole ficou chocada. Não contara nada sobre a doença de Zoe. Como ele sabia?
— Felizmente, Zoe se recuperou sem nenhuma seqüela, madre. E Nicole teve a grande idéia de criar uma árvore de borboletas para ajudá-la a se recuperar.
Zoe deve ter contado quando ganhou a borboleta Ulisses. Ele estava disfarçando para diminuir a preocupação da mãe, mas Nicole ficou muito perturbada ao perceber a reação que ele encobria. Será que realmente se importava? Será que ela fora egoísta e injusta ao privá-lo de sua filha?
Enquanto prosseguia com o quarto álbum, que mostrava, sem dúvida, que sua filha era uma criança saudável, sua mente se ateve ao fato de que Quin já estava livre da dívida do pai quando Zoe contraiu meningite. Mas, mesmo depois de voltar para a Argentina, ele continuou acumulando riqueza, logo, não teria tido muito tempo para cuidar de uma criança doente.
Era muito fácil para ele achar que podia ter agido diferente. Nicole disse a si mesma que ele ainda tinha muito a provar antes que ela pudesse acreditar que suas prioridades agora eram outras. No entanto, ele abandonou um cliente para ficar com ela, e foi visitar Zoe na terça-feira de manhã.
— Ela faz aulas de bale! — exclamou Evita.
Era a última foto do álbum: Zoe usando um vestido de bailarina rosa, com a saia de tule, em uma pose típica, com os braços dobrados acima da cabeça e na ponta dos pés.
— Ela faz várias aulas de dança — respondeu Nicole. — Minha mãe tem uma escola de dança e eu dou aula lá. Zoe faz a maioria das aulas infantis. Não porque eu mando, mas porque ela ama.
— Você acha que ela dançaria para mim? — perguntou Evita, esperançosa.
— Não vamos dar um salto muito grande, madre — interpôs-se Quin enquanto Nicole fechava o álbum.
Parecia besteira, mas acabara de conhecer Evita Gallardo e sequer pensara em apresentar outra avó para Zoe. A sensação de ter de aceitar aquela relação, sem poder escolher, trouxe pânico a Nicole. Primeiro Quin. Agora, sua mãe. Parecia que a ligação especial que tinha com sua filha estava ameaçada.
— Não quero abusar — disse, ansiosa. — Estou muito cansada e, ao ver as fotos... — Suspirou, tocando na mão de Nicole. — Vou para o meu quarto agora. Vou deixá-la com Joaquin para vocês decidirem o que é mais apropriado.
Quin levantou e segurou o braço da mãe.
— Precisa de alguma coisa, madre? — perguntou, carinhosamente.
— Não. E boa noite, querida. Lamento que nosso encontro tenha sido tão protelado.
Nicole não soube o que dizer. Limitou-se a dar boa-noite.
— Fique, Joaquin — ordenou a mãe. — Posso ir para o quarto sozinha.
— Tem certeza?
— Claro — ela o beijou e saiu.
— Vou levar Nicole em casa agora. Não vou demorar. No máximo, uma hora.
Era só isso? Nicole estava incrédula. De repente, percebeu tudo. Sem sexo na segunda-feira à noite. Sem sexo hoje. O acordo agora era irrelevante. Tudo estava centrado em Zoe.
CAPÍTULO 13
Nicole não prestou atenção na classe e no conforto do Audi de Quin enquanto pegavam a estrada para Burwood. Estava mais preocupada com as importantes questões que havia entre eles. Não trocaram nenhuma palavra desde que saíram do apartamento, e o silêncio estava destruindo seus nervos.
— Quanto tempo sua mãe vai ficar aqui? — conseguiu dizer finalmente.
— Até o casamento — respondeu.
Ela lançou-lhe um olhar de curiosidade.
— Que casamento?
— Ora! O casamento que devia ter acontecido a cinco anos — disse Quin, voltando a prestar atenção na estrada.
Ela rangeu os dentes. Mal podia conter a indignação que a assolava. Quando conseguiu falar, já mais controlada, as palavras saltaram da boca com ferocidade:
— Nós vivemos juntos por dois anos, Quin. Casamento não fazia parte dos seus planos. Eu não queria e ainda não quero um casamento forçado por causa de uma gravidez acidental.
— Então, foi acidental?
— Eu não planejei nada — disse, chocada por ele imaginar o contrário.
— Você estava tomando pílula anticoncepcional — relembrou ele.
— Meu médico disse que a pílula pode perder o efeito se a pessoa tem algum problema no estômago. Talvez você se lembre de uma intoxicação alimentar que eu tive depois de uma festa... Por que você acha que eu engravidaria de propósito?
Ele coçou a cabeça.
— Estou tentando entender por que você não me disse. Zoe é parte de mim também, Nicole. Por que você não dividiu isso comigo? Perdi tanta coisa...
— Por que você não dividiu comigo o que sua mãe me contou? — devolveu ela recusando-se a deixar a culpa se apoderar dela.
— Isso não tinha nada a ver com você — respondeu, justificando sua decisão.
— Tem razão — concordou ela. — Eu nunca estive no centro de sua vida. Eu já não podia mais viver dessa maneira. E também não queria isso para Zoe.
— Você era o centro do prazer para mim — disse ele, calmamente. — O resto era dor.
— Amar é dividir tanto o prazer quanto a dor. É melhor você aprender isso, se pretende ser um bom pai para Zoe.
Sua voz estremeceu, sufocada pela emoção da noite. Estava determinada a bloquear aquelas sensações, recusando-se a revelar o quanto queria o amor dele, o quanto sempre quis. A atenção que ele dava para a filha deixava-a com ciúmes de Zoe, e isso era péssimo.
Pararam no sinal vermelho e Quin virou-se para ela com uma expressão muito séria no rosto, com os olhos concentrados nos dela, fazendo o coração de Nicole bater forte na esperança de que ela fosse importante para ele — profundamente importante. Não apenas pela intimidade sexual que tinham. Não porque era mãe de sua filha. Precisava ser a mulher que ele amava mais que qualquer outra, com quem ele realmente dividiria sua vida. Toda sua vida, não apenas algumas partes que ele escolheu, excluindo outras.
— O que você ouviu de minha mãe não era apenas a história da minha vida, Nicole. Era a história da vida dela também. Uma história muito dolorosa, que a tirou de sua terra natal. Ela não queria que ninguém soubesse. E isso nunca ia acabar até eu devolver todo o dinheiro, como fiz. Agora, estou livre, livre para aceitar outras responsabilidades e dedicar-lhes a atenção que merecem.
Responsabilidades... Era assim que via o casamento e a paternidade? Não queria que o casamento fosse uma questão de honra para ele, um fardo que assumiria e carregaria para o resto da vida.
— Sei que você se sentiu abandonada quando estávamos juntos — continuou ele. — Não posso voltar no tempo e mudar isso, mas prometo que tudo será diferente dessa vez.
— Como assim? Sem sexo? — zombou ela, desafiando-o.
A frustração reinava dentro do carro, frustração dele e dela. De repente, uma buzina soou atrás deles. O sinal estava verde. Quin voltou a concentrar-se na estrada e pisou no acelerador.
— Quanto sexo você quiser — resmungou ele.
— Achei que você tivesse posto isso de lado depois que conheceu sua filha — provocou ela.
— Havia outros fatores a considerar — respondeu, sucinto.
— Como, por exemplo, planejar um casamento sem me perguntar se eu estava de acordo?
— Não. Como tentar apagar o passado para nós construirmos um futuro baseado na confiança mútua.
— Precisamos de mais do que confiança para construir um futuro.
— Achei que nossa química sexual estivesse implícita, mas...
— Não estou falando de sexo!
— Está, sim! — ele a fitava, furioso. — Se você acha que só sou bom nisso, serei tão fantástico que você não poderá viver sem.
Ele manobrava o Audi pelas ruas enquanto falava e, de repente, virou à esquerda, assustando Nicole.
— O que está fazendo?
— Indo para um hotel, onde teremos total privacidade.
O coração dela estava aos solavancos. Não falava de sexo. Pensava em amor. Amor e confiança. Mas não podia negar a adrenalina que sentia ao pensar em ir para a cama com Quin, tendo-o apenas para si, afogando toda a confusão dos últimos dias.
Mas isso não solucionava nada, disse a si mesma, e se render sem protestar levaria Quin a pensar que ele tinha o poder de fazer o que bem entendesse.
— Você disse à sua mãe que ia me deixar em casa e logo estaria de volta — argumentou ela.
Tais palavras não causaram nenhum impacto nele. Virou na Elisabeth Street, indo em direção ao Circular Quay, em vez de sair da cidade.
— Minha mãe sabe o número do meu celular — declarou. — Duvido que fique preocupada quanto ao meu paradeiro, mas, em todo caso, ela pode me ligar. E sua mãe não está esperando por você — acrescentou ele, com um olhar irônico. — Certo?
Ele estava se referindo ao acordo. Eraa décima terceira noite, uma noite pela qual ele pagara uma quantia exorbitante de dinheiro, e ela teria de dar o que prometera. Sem discutir. O estranho é que Nicole queria que o acordo voltasse ao normal, ressentindo-se do envolvimento dele com sua filha e a intromissão de sua mãe. No entanto, agora que Quin a obrigava... Por que discordava tanto dele?
Eles, enfim, entraram em um hotel muito elegante, de frente para o Hyde Park. Assim que o Audi parou, o manobrista apareceu. Saíram do carro e se dirigiram para o suntuoso saguão. Quin não demorou muito para conseguir um quarto. Em alguns minutos, já estavam no elevador.
— É incrível o que o dinheiro compra — observou Nicole, cínica.
— Verdade. Livrou minha mãe da desgraça, a sua das dívidas, trouxe você de volta para a minha cama...
A resposta áspera fez com que ela o encarasse furiosa. Isso atiçava todas as emoções que a incomodavam desde que ele descobriu sobre Zoe.
— Você está tentando levar mais que a sua parte, Quin.
— Tenho direito a ter mais do que você concordou em me dar.
— Que você seja pai da sua filha, tudo bem! Mas isso não significa que tenho de ser sua esposa.
A porta do elevador se abriu. Quin segurou seu braço, guiando-a pelo corredor. Entraram no quarto. A turbulência selvagem que emanava dele ficou ainda mais evidente quando a puxou para um confronto cara a cara.
— Por que não? Por que não ser minha mulher? Você quer isso tanto quanto eu.
Pôs a boca contra a dela, acendendo todo o desejo que devia ser satisfeito com Quin, nesta décima terceira noite. Nicole respondeu à investida, tomada por sensações indescritíveis. Mas não podia impedir que seu coração aspirasse a algo mais que a união física.
Seus braços o envolviam, segurando-o com uma paixão atrevida. O corpo se colou ao dele, buscando calor, força, desejando que sua necessidade voraz a consumisse, a penetrasse... Seus seios esfregavam-se contra Quin, sua barriga se contorcia ao sentir a ereção dele, as pernas tremiam sob a força que as pressionava. Uma canção frenética corria pela mente — me ame, me ame, me ame...
Ele beijou seu rosto, o cabelo, o pescoço, os ombros... Nicole adorava sentir a boca de Quin, deixando marcas nela para indicar que pertencia a ele. Escorregando as mãos e segurando-lhe as nádegas, ele a puxou para si, em um delírio de desejo. Ele a levantou e atravessou o quarto. Deitou-a na cama, com seu corpo sobre o dela. Um despia o outro para ficarem livres de qualquer barreira entre eles.
Finalmente, estavam nus. Quin pegou as mãos de Nicole, e colocou-as sobre sua cabeça, assumindo uma posição dominante, cheia de arrogância masculina. Então, ela ergueu as pernas e envolveu-as em sua cintura.
— Diga que nunca foi assim com mais ninguém — ordenou ele, com a voz áspera. Havia sensações que não queria reconhecer, mas estavam transbordando e não podia contê-las.
— Diga a mesma coisa — desafiou-o.
— Não houve nenhuma outra mulher na minha vida que tenha se comparado a você, em nenhum aspecto — admitiu.
— Então, talvez, o melhor ainda esteja por vir — respondeu, provocando-o para que tentasse aprofundar o relacionamento.
— Você está certa — disse ele. — Ainda não chegamos lá. Deixe-me pegar um preservativo.
— Não precisa usar hoje — respondeu ela, sedutora.
Enquanto ele a beijava com furor, a cabeça de Nicole rodava de tanta excitação. Era puro êxtase. Ela ardia, realizada, enquanto ele a levava ao clímax, e depois a outro. Parecia uma celebração da mulher, pois sentia cada parte de sua feminilidade sendo amada, adorada, saboreada, e ela se deleitava com cada momento.
No fundo de seu coração, sabia que sempre reagiria a ele desse modo. Não sabia por que, mas, de alguma maneira, pertencia a ele. Talvez não fosse certo esperar que ele pensasse e sentisse como ela. Era um homem de forte instinto caçador, que sempre alcançava seus objetivos, sem que nada o distraísse.
Será que podia culpá-lo por sua natureza? Afinal, isso sempre foi parte do encanto.
Deixou-se amá-lo com suas mãos, com sua boca, com suas pernas — um amor voluptuoso, enquanto se movia no ritmo concentrado em direção ao clímax dele, deleitando-se com a tensão de seu corpo. Sabia que ele estava focado em atingir essa união final íntima com ela, e nada mais importava, exceto pelo momento de se derramar dentro dela, a fusão quente que os transformava em um.
Quando ele atingiu o orgasmo, ela arqueou o corpo sem inibição alguma. Nicole contraía-se de prazer. Abraçou-o com mais força e manteve aquele momento de intimidade pelo maior tempo possível. Estar com Quin era o paraíso. Sempre fora.
Ele se virou, ainda abraçado a ela. Nicole adorava ficar por cima, sentindo o peito arquejar à medida que a respiração voltava ao normal. Quin brincava com seu cabelo, acariciava suas costas, cada toque era encantadoramente sensual. Ela não imaginava fazer amor com outra pessoa.
Mas o sexo era apenas uma parte do casamento.
Não fora o suficiente para mantê-la feliz ao lado de Quin no passado. Será que ele realmente dividiria sua vida com ela dessa vez?
O que impulsionara Quin no passado chegara ao fim. Talvez ele pudesse realmente se concentrar em ser um bom marido e um bom pai. Nesse caso, não deveria dar uma chance ao casamento? O tempo havia passado. Quin abrira a porta da paternidade e entrara, comprometendo-se a ser o pai de Zoe, de verdade.
A grande questão era: podia realmente confiar no compromisso que ele dizia assumir?
— Você comprou a corrente prateada para a borboleta? — perguntou, conferindo se ele se lembrava da promessa que fizera a Zoe.
Os dedos que corriam leves por suas costas pararam. Começaram a massageá-la com mais força.
— Comprei. Vou levar amanhã.
Então, ele não ia decepcionar sua filha. Mas isso não significava necessariamente que ele manteria as promessas feitas no casamento. Zoe era sangue do seu sangue. Nicole, não. E Quin nunca disse que a amava.
— E minha mãe, Nicole? Ela adoraria conhecer Zoe.
Não queria pressioná-la a responder rápido. Não era fácil decidir o que fazer. No entanto, Evita tinhavindo da Argentina para se desculpar de sua rejeição no passado e para se aproximar de sua neta.
E, para conseguir isso, não podia mais ignorar Nicole Ashton.
Agora tinha de dividir uma criança que não pertencia mais apenas a ela e à mãe, mas também a Quin e à mãe dele.
Tinha de admitir que ele se esforçou para consertar a situação entre eles. E as revelações desta noite explicavam muitas coisas. Não a fizeram sentir-se melhor, mas, pelo menos, agora era capaz de entender o passado, e podia aceitá-lo com mais facilidade.
Nicole havia se decidido. Respirou fundo e baixou a guarda.
— Amanhã não, Quin. Zoe espera passar o dia com você. Tenho de falar com minha mãe, mas talvez possamos almoçar todos juntos no domingo.
A tensão que ele sentia desvaneceu-se imediatamente. O triunfo transbordava de seus olhos.
— Não pense que isso significa que vamos falar de casamento — explicou ela, recusando-se a ser controlada dessa maneira.
Ele sorriu.
— Obrigado Nicole. Acho que já fui punido pelos crimes cometidos. Fico feliz que tenha concordado.
Punido... Ela franziu as sobrancelhas ao ouvir isso. Estava punindo Quin por não amá-la escondendo a filha dele? Não fora consciente, mas tinha de admitir que tivera muitos pensamentos vingativos desde que o reencontrou no Havana Club.
— Não se preocupe — murmurou ele, com voz aveludada. — Vai dar tudo certo. Prometo.
Era uma promessa impossível, pensou Nicole, mas não queria pensar mais. O futuro podia esperar até o dia seguinte, nada ia mudar até lá.
Para ele, era fácil fingir que havia carinho em seus beijos, e ternura em seus afagos. Talvez, se ela também fingisse, pudesse chegar a acreditar que ele a amava.
E que não era apenas sexo.
Ela era sua mulher, pensou Quin, segurando Nicole e sentindo prazer em olhá-la nua. Era um absurdo ela não aceitar que ele era seu homem. O sexo não seria tão bom — tão maravilhoso — se eles não estivessem em sintonia, satisfazendo as necessidades um do outro. Por que ela resistia à idéia de se casar com ele?
Certamente, agora ela entendia que não havia nada que o impedisse de abrir mão da firma em nome de um futuro juntos. Seria melhor para Zoe que seus pais fossem casados e que os três morassem juntos. Ficar indo e voltando entre eles era uma perda de tempo.
Quin tinha de frear a impaciência. Nicole era uma mulher muito inteligente. E sensata. Permitira, por exemplo, que sua mãe conhecesse Zoe, o que era um grande passo, uma vez que ela própria não pôde conhecer a mãe de Quin no passado. A sensação de tempo perdido, porém, consumia-o, mas talvez a melhor jogada fosse esperar, enfraquecendo a resistência de Nicole.
Ela suspirou e sua respiração deixou Quin arrepiado. Começou, então, a descer as mãos pelas costas dela, deliciando-se com tanta beleza. Ele amava cada curva feminina do seu corpo, amava a voluptuosidade suave de suas nádegas.
— Você devia voltar para casa, Quin. Já faz horas que saímos.
Ele não gostou daquelas palavras.
— Esta noite é nossa.
Ela se levantou para fitá-lo.
— Você colocou sua mãe no meio. Normalmente, as pessoas ficam indispostas depois de um longo vôo. Ela pode estar inquieta...
— Ela sabe cuidar de si mesma, Nicole.
— Como assim? Ela já fez o que você queria e agora não precisa lhe dar mais atenção? Continua pensando dessa maneira, Quin?
Ele franziu as sobrancelhas diante daquela crítica.
— Minha mãe sabe como você é importante para mim. Sabe que vou passar todo o tempo possível com você.
— Claro — o tom era amargo. — Sua necessidade vem antes, como sempre.
Antes que ele contestasse, ela saiu de cima dele e levantou-se, desafiando-o.
— Vou me vestir e ir embora.
— Nós temos um acordo! — relembrou ele, frustrado.
Ela já estava recolhendo as roupas do chão. Lentamente, levantou-se e encarou-o.
— Que negligência a minha! Com sua visita à minha filha amanhã e com a visita da sua mãe no domingo, quase esqueci que sou sua prostituta! Acho que devemos repensar essas visitas familiares.
— Não!
Ela cruzou os braços, beligerante.
— Você quer que tudo seja do seu jeito, Quin?
Ele fizera algo errado e o perigo de perder o terreno que conquistara levou-o a reavaliar a situação. Ele sorriu, desculpando-se.
— Certo, acho que estou sendo egoísta por não querer que você se vá — admitiu. — A verdade é que nunca vou me cansar de você, Nicole.
— Você está tendo mais do meu tempo do que havíamos combinado.
— Eu sei, e fico grato pela sua generosidade...
Ela desviou os olhos, dedicando-se a pensamentos secretos. A tensão que emanava dela levou Quin ao extremo. Devia se levantar segurá-la e diminuir a distância que ela estabelecia entre eles? Ou devia dar-lhe espaço para fazer o que quisesse?
— Concordei em passar vinte e seis noites com você. Esta é a décima terceira. Você ainda tem mais treze. Eu não devia me distrair com outras considerações.
O número treze nunca lhe parecera tão agourento. Ele tinha de consertar as coisas agora. De repente, ficou muito claro que nem aquele sexo extraordinário o ajudaria a conseguir o que queria de Nicole.
— Não a quero como uma prostituta, Nicole. Quero-a como minha esposa — explicou Quin.
A expressão dele parecia rechaçar o que ouvira. Sequer parou para refletir.
— Acho que isso seria muito conveniente para você. Mas não quero ser um fantoche pelo resto da minha vida. Gostaria que as coisas fossem do meu jeito também.
Quin ficara perturbado, mas tinha de controlar os impulsos.
— Você tem razão. Vou me vestir e vamos embora. Espero que isso prove que me importo com sua opinião. Nicole me dê um tempo. Posso mostrar que podemos ter um bom futuro juntos.
Ela buscou seus olhos, como se quisesse acreditar nele, mas não conseguia.
— Você podia ter me procurado quando terminou de acertar as contas na Argentina. Foi preciso nos encontrarmos por acaso para você decidir que me queria de volta.
— Achei que havia perdido você. Ao vê-la de novo, fiquei determinado a mudar isso.
— Não quero que tudo seja como era antes — implorou ela.
— Não será. Juro que não será — ela parecia insegura, assustada. — Nicole, me dê tempo.
Ela fechou os olhos como se não agüentasse mais fitá-lo.
— Amanhã é um novo dia. Vamos embora.
Sabendo que não conseguiria mais nada dela esta noite, Quin a soltou. A decepção dominou-o e levou-o a se questionar. A reação dela não lhe dava esperanças.
O silêncio no quarto era sufocante. Fazia-o lembrar de outros silêncios, logo antes de ser abandonado por ela, cinco anos antes. Queria invadir seu casulo, alcançá-la, tê-la de volta, mas percebeu que a força não seria o melhor meio.
Durante treze noites, ele decidiu o que fariam juntos. Ela fora condescendente, mantivera-se fiel ao trato. Mas aqui estavam, no meio do caminho, e Quin duvidava que tivesse havido algum avanço em direção ao seu objetivo.
Ele ligou para a recepção e pediu que tirassem seu carro do estacionamento. Quando desligou o telefone, Nicole quebrou o gelo.
— Por favor, peça um táxi para mim.
— Vou deixá-la em casa — disse Quin, decidido.
— Não é preciso.
— É madrugada. Vou deixá-la em casa com segurança, Nicole.
— E se eu não quiser?
— Terá de passar por isso, pois não vou colocá-la em um táxi, como se você fosse minha prostituta — replicou Quin, exasperado. Não houve resposta.
Ela guardou a escova e encaminhou-se para a porta. Enquanto Quin a acompanhava em direção ao elevador, foi atingido pela idéia de que tudo iria por água abaixo se não consertasse o que estava errado para ela.
Seu relacionamento sempre fora do jeito dele. Tinha de dar a volta por cima. Mas não no quesito de deixá-la em casa.
— A que horas você acha melhor eu ir amanhã? — perguntou ele, enquanto descia.
Ela estava com a cabeça baixa. Não o fitou para responder.
— Zoe ficará animadíssima, então é melhor você chegar cedo — disse secamente. — Acho que nove horas está bom. Dez, no máximo.
— Pode dizer que vou chegar às nove.
— Não esqueça a corrente prateada.
— Não esquecerei.
Quin sentiu o maxilar se contraindo, as mãos se fechando. Tinha de controlar o instinto de brigar. A noite passada não fora suficiente para apagar toda a mágoa de ter ocupado apenas um lugar secundário em sua vida. Ela podia estar achando que, agora, era a menina que ocupava o primeiro lugar. Ele não falara em casamento antes de Zoe.
Péssimo momento. Precisava de outro plano para reconquistá-la.
Seu carro estava esperando-os na entrada do hotel. Nicole entrou, afundando-se no assento e colocando o cinto de segurança. Continuava evitando olhar para Quin.
Amanhã é outro dia, disse ele para si mesmo, controlando a frustração com a situação atual. Deu partida no carro, mas, antes de acelerar, fitou-a, desejando que seus olhos se encontrassem. Não se encontraram. Só conseguiu ver as lágrimas que escorriam pelo rosto de Nicole.
Quin nunca a vira chorar, e a certeza de que era a causa daquele choro o assustou. O que dissera para magoá-la? O que fizera?
A mente pirou desorientada enquanto dirigia em direção a Burwood. Era impossível apagar da memória a imagem de Nicole sentada sozinha, triste e derrotada por forças que estavam além do controle. Não havia saída, pois ele era o pai de Zoe.
Não adiantava dizer que não queria machucá-la. Já fizera isso no passado. Por que devia acreditar nele, considerando as experiências anteriores?
Palavras eram inúteis. Levá-la para a cama também era inútil. Era repetir o que havia feito antes.
Tinha de mudar algo e mostrar para Nicole que as coisas haviam se transformado. Podia organizar um jantar e convidar não apenas os seus amigos, mas também os dela, como o casal que ele conheceu no Havana Club, Jade e Jules Zilic. Envolver outras pessoas talvez ajudasse Nicole a relaxar mais em sua companhia, e incluí-la em seu círculo social provaria que ele a queria ao seu lado para mais que sexo; queria-a como sua esposa!
Ele ouviu uma sirene e, imediatamente, conferiu o velocímetro, para checar se não ultrapassara o limite. Estava bem. Não dirigia acima do limite permitido, nem bebera. Talvez a sirene viesse de alguma ambulância a caminho de uma emergência.
Se esse fosse o caso, precisaria mudar de faixa. O espelho retrovisor não mostrava nenhum veículo com luzes piscando, mas o barulho estava cada vez mais alto. Talvez viesse de alguma rua próxima. Pensou em Zoe, seriamente doente com meningite.
Ele não parou no cruzamento. O sinal estava verde. Pensava na filha que não conhecera, nos anos perdidos, nos anos que tinha pela frente e como queria aproveitá-los.
Não viu um outro carro ultrapassando o cruzamento do outro lado em sua direção. Por um microssegundo, ele soube que o carro ia bater no Audi, mas não pôde fazer nada. O impacto foi violento e deixou-o inconsciente.
Dor.
Nicole lutava contra as dolorosas sensações que a atingiam. Tinha de se lembrar de algo, mas a cabeça boiava em um redemoinho e ela não sabia o que era tão importante. Sentiu algo molhado no rosto. Seu coração foi dominado pelo pânico. Estava se afogando?
Ela abriu os olhos e viu uma imensidão de pontos. Não era água.
— Você acordou — disse alguém.
Aos poucos, os pontos foram se agrupando em uma imagem — era uma mulher colocando uma gaze em cima de uma bandeja.
— Só estou limpando a ferida da sua cabeça, que sangrou muito — disse ela, colocando outra gaze úmida na cabeça de Nicole. — Vai precisar levar alguns pontos. Infelizmente, teremos de raspar seu cabelo ao redor do local. Mas será uma parte pequena, não haverá muito problema.
Ferimento na cabeça...
Ela tentou falar, perguntar o que acontecera, mas não conseguiu produzir som algum. Sua garganta estava seca.
— Quer chupar uma pedra de gelo? — perguntou a mulher. Sem esperar pela resposta, ela pegou um copo da bandeja e colocou um pequeno pedaçode gelo na boca de Nicole. — É melhor não tomar muita água agora. Você já vai subir para tirar raios-X.
Parecia estar em um hospital. Aparentemente, se tinha de tirar raios-X, não deviam saber qual era a extensão do ferimento. A dor que sentia na cabeça levou-a a se perguntar se não teria fraturado o crânio.
Depois de chupar o gelo, Nicole conseguiu pronunciar algumas palavras.
— Como... por quê...?
— Você sofreu um acidente de carro, querida — informou a mulher.
Um acidente de carro significa que estava em um carro. Indo para onde? Por quê?
Tentou se concentrar, dispersar a névoa que a envolvia. Aos poucos, as lembranças ficaram mais claras — a discussão no hotel, Quin insistindo em levá-la para casa, a angústia por querer acreditar que podiam ter um bom futuro juntos, o conflito sobre como ele a fez se sentir no passado. Lembrou-se de estar no carro, lutando silenciosamente contra as lágrimas que irrompiam do coração dolorido. Mas não se lembrava do acidente — onde foi, como ocorrera, o que acontecera a Quin.
Um alarme disparou em sua cabeça, parecia uma bomba prestes a explodir. Quin estaria ao seu lado, se pudesse. Com certeza, não a deixaria até assegurar-se de que ela estivesse bem.
Automaticamente, sua mão segurou o braço da enfermeira que colocava a gaze úmida novamente. Precisava da atenção dela. A mulher a fitou.
— Quin... ele também está ferido?
— Quem, querida?
— Quin Sola. Ele estava comigo. O motorista do carro.
— Não sei. Ele não está nesta ala.
— Que ala? Onde estou?
— Na emergência do Hospital St. Vincent. É em Darlinghurst, no interior da cidade.
— Que horas são?
A enfermeira olhou para o relógio.
— Quase duas e meia da madrugada.
Eles saíram do hotel por volta da meia-noite. Não fazia muito tempo.
— Quin teria ficado comigo se não estivesse ferido. Trouxeram ele até aqui, não? — insistiu ela, amedrontada pela idéia de ele ter morrido.
— Desculpe. Não sei nada dele.
— Você pode descobrir para mim?
— Um médico já vem lhe atender — respondeu a enfermeira, evasiva. — Pode perguntar a ele — então, tirou a mão de Nicole do seu braço, apoiou-a de volta na cama e voltou a se concentrar no ferimento.
Sentia uma dor de cabeça horrível. Todo o corpo doía. Por fim, ela explodiu:
— Ele não é meu amigo. É o pai da minha filha e nós vamos nos casar.
Com isso, ela era praticamente o parente mais próximo. Tinha o direito de saber o que acontecera com ele. Ele não podia ter morrido. Ele era um grande lutador, um vencedor, não um perdedor.
Segurou o braço da enfermeira, furiosa. Seus dedos apertavam-na furiosamente.
— Pare com isso agora! — a enfermeira repreendeu-a. — Você não pode...
— Preciso saber de Quin. Vá até a recepção e pergunte o que houve.
— Eu não posso...
— Vou brigar com você até que faça isso — ameaçou Nicole, desprezando as normas do hospital. — O nome dele é Joaquin Sola, entendeu?
— Entendi.
Nicole soltou seu braço. A enfermeira deixou a gaze na bandeja e saiu. Aquele esforço deixou-a exausta. A cabeça girava, deixando-a enjoada. Fechou os olhos e conteve uma onda de náusea. Não sabia quanto tempo ficara ali, esperando notícias e determinada a manter-se consciente.
Rezava para que Quin estivesse vivo. Por mais que houvesse reclamado de sua intromissão na vida que estabelecera sem ele, por mais que ele a deixasse confusa, afirmando que seria um bom pai para Zoe, agora não conseguia agüentar a idéia de nunca mais vê-lo. Queria desesperadamente ter a chance de cultivar um novo relacionamento entre eles. Ele prometera um novo começo...
— Senhorita Ashton? — era uma voz masculina.
A enfermeira estava de volta, acompanhada por um homem que, obviamente, tinha mais autoridade que ela.
— Sou o Dr. Jefferson. Seu noivo está sendo operado. Ele quebrou algumas costelas e teve uma lesão no pulmão. Mas garanto que ele ficará logo bom.
O pai de Nicole havia morrido durante uma operação, por isso sua mãe buscara outros meios de curar Harry do câncer de fígado.
Você não pode morrer, Quin, pensou com força. Não vou deixá-lo morrer.
— Agora você tem de subir para tirar raios-X, senhorita Ashton — prosseguiu o médico. — Parece que você só teve alguns ferimentos e contusões, mas precisamos conferir isso. Podemos contar com sua cooperação?
— Pode, obrigada.
Nicole se agarrou à idéia de que Quin estava em boas mãos enquanto ela tirava raios-X e recebia pontos na cabeça. Ele era muito saudável e estava em forma. A maioria das pessoas sobrevive a cirurgias. Certamente, Quin se recuperaria. Era apenas uma questão de tempo.
Assim que pudesse, lhe diria que podiam começar a planejar o casamento. A verdade é que não queria mais viver sem ele.
Aceitou o sedativo que o médico lhe ofereceu. Precisava aliviar aquela dor, precisava acabar com aquelas preocupações, precisava diminuir o tempo de espera antes que pudesse ver Quin... Amanhã será um novo dia.
CAPÍTULO 16
Quin ouvia a mãe falar com ele em espanhol. Contava sobre as brincadeiras que fez com Zoe. Disse que era uma criança criativa, doce, carinhosa e esperta. De repente, ele percebeu que havia algo de errado nessa história e se esforçou para entender o que era. Sua mãe continuava falando sobre a linda neta.
Mas você só viu as fotos, pensou Quin. O golpe dessa lembrança abriu caminho para outras. O acidente de carro. Nicole inconsciente com a cabeça sangrando. Abriu os olhos. Estava no hospital, cheio de tubos. A mãe dele estava ao seu lado.
— Madre...
Antes que ele proferisse outra palavra, sua mãe se levantou, espantada.
— Você acordou! Gracias Dios! — exclamou ela, como se aquilo fosse um milagre. — Por favor, não se mexa, Joaquin. Preciso ir buscar o médico.
Ela já estava saindo quando Quin conseguiu pronunciar a palavra mais importante.
— Nicole...
Evita hesitou por um instante.
— Ela está bem — respondeu. — Eles apenas a mantiveram aqui por duas noites para observar uma contusão e garantir que o ferimento da cabeça não infeccionaria. Ela está em casa há dias. Agora, por favor, fique calmo enquanto eu chamo o médico.
Há dias?
O alívio de saber que Nicole estava bem se misturou com a confusão sobre o que acontecera a ele. Havia quanto tempo estava aqui? Os tubos davam a entender que ele era alimentado por via intravenosa. Também estava ligado a alguns monitores. Seu peito estava ferido. Tinha uma vaga lembrança de ter sido preparado para cirurgia.
Mas estava tudo bem. Nicole não se ferira gravemente e ele estava vivo, embora não em seu melhor momento. Sua mãe voltou com o médico e ele foi submetido a uma série de exames. Além disso, o doutor fez várias perguntas, testando a memória e a capacidade cognitiva de Quin. Aparentemente, estivera em estado de coma desde a cirurgia — costelas quebradas, pulmão perfurado — mas estava melhorando muito, devido ao descanso absoluto dos últimos cinco dias.
Uma enfermeira entrou e levantou o encosto da cama para que ele se sentasse confortavelmente. Ao se mexer, Quin viu a borboleta Ulisses azul na mesinha-de-cabeceira. Ao vê-la, o coração deu salto. O que aquilo significava? Não se esquecera da corrente prateada. Não merecia ser rejeitado por ter ficado doente, não era culpa sua. Ele alcançou a borboleta.
— Como isto chegou aqui?
— Zoe insistiu em trazê-la para fazê-lo se sentir melhor — respondeu sua mãe, sorrindo.
— Sua filha e sua noiva vêm sempre visitá-lo — informou o médico.
Noiva? Outro solavanco no coração.
— Tenho de ligar para Nicole. Prometi que ligaria se você acordasse — disse Evita.
— Então, faça isso, madre — respondeu Quin, ansioso por descobrir se Nicole mudara mesmo de idéia quanto ao casamento. Era ótimo saber que ela fora visitá-lo, levando Zoe junto.
O médico orientou a enfermeira a trazer uma refeição leve para Quin e se foi, satisfeito por ver que seu paciente saíra do coma sem seqüelas.
Sua mãe voltou muito animada.
— Não consegui falar com Nicole. Esqueci as aulas na escola de dança. Mas falei com Linda e ela vai avisar a Nicole. Acho que ela deve vir visitá-lo amanhã de manhã, Joaquin.
Será? Agora que ele estava fora de perigo?
— É noite? — perguntou ele.
— É, querido. E Nicole só chega em casa às dez e meia. É muito tarde para visitas.
— Você conheceu a mãe dela e Zoe?
— Conheci. A polícia nos informou sobre o acidente. Estavam perseguindo um ladrão, ele ultrapassou o sinal vermelho e chocou-se contra o seu carro. Nós duas viemos correndo para o hospital e nos conhecemos na sala de espera. Linda tem sido muito gentil me fazendo companhia e me recebendo muito bem em sua casa para visitar Zoe.
— Nicole também a recebeu bem?
— Ela não se opôs, Joaquin — respondeu, meio hesitante. — Nicole está muito quieta. Apenas nos vemos de passagem. Nós nos alternamos para ficar com você. Ficávamos conversando com você para ver se saía do coma.
Mas ele não acordou com a voz de Nicole. Será que ela falava com ele? Se falou, o que disse?
Ele olhou para a borboleta azul — recebeu de volta o presente que tinha dado.
Ou será que isso era um elo que ele, Nicole e Zoe teriam para o resto de suas vidas?
Não saberia até que Nicole fosse visitá-lo. Se é que o faria...
Nicole estava parada do lado de fora do quarto particular para onde Quin fora transferido. Evita Gallardo lhe garantira que Quin estava bem, totalmente de volta ao que era, e sua primeira preocupação ao sair do coma fora perguntar por ela. Então, isso devia significar que gostava dela, não?
Ou, então, apenas se lembrara do acidente e queria saber se ela havia sobrevivido. Afinal de contas, tinha de pensar em Zoe. Não seria bom para a menina ficar sem mãe. Tampouco seria bom ficar sem pai...
Zoe não falava de outra coisa a não ser no seu pai. Quin cativara seu coraçãozinho. Ela passou toda a manhã dançando pela casa, incapaz de conter a animação ao saber que ele estava bem. Tinha certeza de que a mágica da borboleta Ulisses dera certo.
Nicole sabia que havia mantido o coração fechado desde que Quin reaparecera em sua vida. Lembrava-se de como fora antes, e se negava a acreditar que, dessa vez, pudesse ser diferente. As pessoas não mudam. Mas as circunstâncias, sim.
Agora, Quin estava pronto para o compromisso do casamento e da paternidade. Era o que queria dele. Os últimos dias de total incerteza fizeram-na ver que havia apenas um homem para ela, e ele estava atrás dessa porta, vivo e saudável, pronto para um futuro juntos.
Não precisava abrir seu coração para ele. Bastava entrar e dizer que decidira se casar com ele. Quin se ocuparia do resto.
Tudo que precisava fazer era dizer sim, dar a ele o queria e deixar acontecer, ignorando qualquer dor e aproveitando todo o prazer.
Seu coração batia forte.
Respirou novamente e abriu a porta.
A espera pela chegada de Nicole aguçara todos os sentidos de Quin. O barulho da porta se abrindo parecia batidas de tambor para ele. Sentiu o peito se retorcer quando ela entrou no quarto. O impacto de sua beleza singular atingiu-o de imediato — uma visão de intenso prazer, todos os momentos mágicos que ela lhe dera cruzavam sua mente.
Parecia o primeiro momento em que a tinha visto, no banco onde os dois trabalhavam havia sete anos — a sensualidade, o rosto adorável, os olhos verdes, a inteligência aguda que o desafiava...
Deixara-a partir cinco anos atrás, mas jamais conseguira tirá-la da cabeça ou substituí-la por outra mulher. Nunca se sentiu tão incrivelmente vivo com mais ninguém. Ele a queria. Precisava dela. Tinha de tê-la.
Sentiu o rosto ruborizar. Será que ele estava deixando-a incômoda com aquele olhar?
— Oi — disse ele, tentando parecer normal, com um sorriso carinhoso.
— Oi — repetiu ela, devolvendo um sorriso tímido, como se aquela situação a incomodasse. — Fico feliz que esteja de volta, Quin — acrescentou. Os olhos expressavam alívio ao ver que ele estava recuperado.
Hoje, ela não usava jeans. No lugar do uniforme tradicional para o acordo que haviam feito, usava uma blusa verde que moldava os seios fartos e uma saia de babados verde, laranja e marrom — além de sandálias laranja nos pés. Será que isso significava que ela mudara de idéia quanto ao relacionamento?
— Fico feliz por vê-la tão bem — respondeu ele. — Por favor, sente-se comigo um pouco, Nicole.
— Quero falar com você — disse ela, resoluta, caminhando em direção à cadeira do lado da cama.
Ele sentiu seu cheiro. Quin aspirou aquela fragrância exótica e deliciosa — o doce cheiro da esperança. Certamente, nenhuma mulher usava perfume para um homem no qual não estivesse interessada.
— A borboleta azul estava me fazendo companhia. Agradeça a Zoe, por favor.
— Prometi que a traria para visitá-lo esta tarde. Assim, você mesmo poderá agradecer. Ela vai gostar. Antes, preciso falar com você, acertar as coisas entre nós.
Ele foi dominado pela tensão. Sua mente pulsava. Tinha certeza de que ela ia abrir mão do título de noiva. Todas as forças prepararam-se para entrar em guerra, mas, com um grande esforço, ele se controlou e calou-se para ouvir o que Nicole tinha a dizer.
Fechou os olhos, respirou profundamente, juntando forças para falar. As janelas da alma refletiam uma necessidade urgente de acertar tudo entre eles.
— Estava errada por ter sido tão má com você, Quin, por ter usado seu desejo para fazê-lo pagar dívidas que não tinham nada a ver com você.
— Eu a magoei com a busca obsessiva por recuperar o dinheiro que meu pai havia roubado — disse ele, calmamente. — Acha que não a compreendo, Nicole?
— Você tinha bons motivos para fazer o que fez — justificou ela.
— Sacrifiquei nossa relação em nome de um trauma de infância.
— Sua mãe manteve-o fiel à sua promessa, Quin.
— Fui eu também, orgulhoso... — disse, com o semblante triste. — Não sei se você pode me perdoar, Nicole.
— Posso e perdoarei — afirmou, enfática. — Se você me perdoar por ter escondido Zoe de você.
— Foi culpa minha por não dividir mais com você.
— Não... O que fiz foi errado. Foi egoísta e vingativo. Desculpe... desculpe. Você devolveu à sua mãe a antiga vida que tinha. Você devolveu a vida também à minha mãe. E tudo que fiz foi condená-la por... por... — as lágrimas começaram a brotar.
— Por eu não dar valor ao que tínhamos — completou ele. — Eu devia ter dado, Nicole — acrescentou. — Só percebi que devia ter dado valor depois que você se foi. Estou tentando lhe mostrar...
— Não quero falar sobre isso — disse. — Era outro momento e outro lugar, Quin. Estamos falando do agora. Na sexta-feira à noite, você disse que me queria como esposa.
Seus pulmões pararam de funcionar. O peito doía. O coração batia loucamente. Ele se esforçou para confirmar o que dissera, esperando desesperadamente que isso não gerasse uma recusa.
— Certo. Decidi me casar com você. Zoe deve ficar ao lado do pai e eu — engoliu em seco — eu também quero ficar com você.
Uma onda de alívio o inundou, dissipando a dor causada pela tensão. Ele estava radiante.
— Nós pertencemos um ao outro, Nicole.
— É verdade — concordou ela.
Mas não havia nenhum sorriso ou alegria em seus olhos.
— Nada como uma crise para unir as pessoas — disse ele, irônico.
— É, concordo — assentiu ela, mantendo a ironia.
Pelo menos suas palavras não estavam carregadas de amargura, pensou Quin, apesar de estar ciente de que ela não estava professando seu amor por ele. Talvez tivesse perdido isso para sempre. Sentia apenas o reconhecimento de que eles tinham uma ligação muito forte para o casamento dar certo, uma vez que deviam pensar no melhor para sua filha.
Um grande peso abateu-se sobre o coração. Foi ele quem fez isso com Nicole, pois não fora capaz de suprir suas necessidades emocionais no passado, sugando dela o amor que sentia por ele. Perdão por seu fracasso não garantia a volta do que tiveram. Significava apenas que deviam seguir em frente, deixando a pesada bagagem emocional para trás. Provavelmente, ela foi movida a tomar essa decisão por seu amor a Zoe.
— O que aconteceu com o álbum de fotos? — perguntou ele, lembrando que aqueles preciosos momentos da vida de Zoe estavam no carro.
— Estão inteiros — garantiu Nicole. — A polícia recuperou tudo e entregou para a minha mãe.
— Graças a Deus, nada se perdeu — murmurou ele, um tanto rouco. O coma podia ter sido bom para curá-lo depois da cirurgia, mas os dias de imobilidade extraíram-lhe as forças do corpo.
— Quin?
Ele ouviu o tom trêmulo e ansioso em sua voz e disse a si mesmo que grande parte do carinho que ela sentia ainda estava lá, e ele podia partir daí. Sentiu-a pegar em sua mão, envolvendo-a suavemente. Não queria deixá-lo, não dessa vez.
— Você está bem? É melhor chamar o médico?
— Não. Estou apenas um pouco fraco. Vai passar.
— Talvez seja melhor deixá-lo descansar. Volto hoje à tarde com Zoe — garantiu.
Ele fitou-a, então, com um ar de súplica.
— Beije-me, Nicole. Assim vou me sentir melhor.
A moça ficou surpresa e assustada. Ele puxou sua mão, trazendo-a para perto de si. Nicole se levantou da cadeira e parou ao lado da cama.
— Tem certeza, Quin?
— Tenho.
Ela se inclinou e encostou seus lábios aos dele. Quin fechou os olhos e sentiu seu cheiro, seu gosto, desejando abraçá-la mais forte e, logo, aceitando com pesar que não devia fazê-lo, dada a sua condição.
A língua agitou-se, instando-a a beijá-lo mais profundamente. Ela respondeu àquele apelo, aproximando-se sensualmente. O prazer espalhou-se pelo corpo. Ele sabia que havia alguma paixão dentro dela. Nicole continha seu desejo, que a forçava a reafirmar a decisão de casar-se com ele e ficar com ele para o resto da vida.
Quando ela se afastou, estava com o rosto ruborizado e os olhos brilhando de preocupação.
— Tem certeza de que está bem?
— Estou, obrigado. Ele estava bem.
Sentia que o amor ainda existia. Estava um pouco distante, mas ainda existia.
De um jeito ou de outro, a distância diminuíra.
Nicole não iria embora. Ela havia concordado em se casar com ele.
CAPÍTULO 17
O dia do seu casamento — o dia em que disse sim a Quin. A realidade da situação a envolvia, enquanto se arrumava na suíte do Hotel Intercontinental. Zoe, a mãe e as damas de honra estavam todas prontas para ir à cerimônia. Dentro de trinta minutos, uma limusine as levaria ao local.
— Que tipo de casamento você quer? — perguntara Quin.
— Não sei — respondera ela, sinceramente. — O que você quer?
— Algo bonito, realmente memorável...
Enquanto Nicole estava sentada terminando de ser maquiada, não podia deixar de pensar que, se alguém estabelecesse um valor financeiro para o casamento, iria ficar maravilhado. Por outro lado, não sabia se ele estava se exibindo para ela ou para os outros.
Sua parte da lista de convidados era relativamente pequena. Tinha algumas amigas entre as mães das alunas da escola de dança, e duas eram suas damas de honra, junto com Jade. Os amigos de sua mãe no mundo da dança também não eram muito numerosos. Já o lado de Quin tinha muitas pessoas do cenário social de Sidney e importantes clientes, além de vários argentinos — a família Gallardo e seus amigos mais próximos.
Mas isso não importava. Eles estavam se casando. Essa era a única coisa realmente importante.
— Nunca a vi tão bonita — elogiou Jade.
Era impressionante como uma boa maquiagem fazia a diferença, pensou Nicole, sorrindo para a amiga.
— Você também. Gosto desse tom avermelhado no seu cabelo.
Jade riu.
— Não podia deixar roxo. Como eu sou a madrinha, podia acabar roubando a atenção da noiva.
— Obrigada por tudo que você fez, Jade. Você e Jules. Os vestidos que vocês fizeram são lindos.
— Quin e Zoe nos orientaram — respondeu, sorrindo. — E, Nicole, você tem agora um homem totalmente comprometido.
É, ele realmente tinha mudado, concordou Nicole, em silêncio. Desde que ele saiu do hospital, havia dois meses, conquistou sua mãe com gentileza e consideração, e estabeleceu uma relação profunda com a filha. Além disso, começou a apresentar a noiva para os amigos, levando-a a jantares e shows, sem concentrar seu relacionamento apenas no sexo, que ainda era ótimo, mas não mais a única coisa que dividiam.
— Você o ama, não? — perguntou Jade, delicadamente.
— Amo — respondeu sem titubear, olhando para o magnífico anel de noivado, de esmeraldas e diamantes, que Quin lhe dera. Na riqueza e na pobreza, pensou, durante toda a nossa vida.
Zoe entrou no quarto dançando.
— Já está na hora de colocar o vestido, mamãe? — perguntou, entusiasmada.
— Já — respondeu a maquiadora, satisfeita com o resultado de sua obra.
— Amei o seu vestido, Zoe — disse Nicole, observando como o azul-escuro ficava bem em sua pele morena.
Ela deu uma voltinha.
— É do mesmo azul que a borboleta Ulisses. Disse ao papai que queria assim. Não foi uma boa idéia, mãe?
— Foi ótima, Zoe — concordou ela.
— E o papai mandou fazer essas presilhas de borboleta especialmente para mim — contou Zoe, orgulhosa.
— Está lindo!
Do mesmo modo, as borboletas azuis de seda enfeitavam o cabelo das damas de honra. Segundo Jade, foi idéia de Quin, para marcar um dia muito especial.
Sua mãe, com um vestido violeta muito elegante, que combinava com as damas, interrompeu:
— São vinte para as três, Nicole. Não vamos nos atrasar, ok? — perguntou, ansiosa.
— Não, mãe. Estou pronta para colocar o vestido. A costureira já foi pegá-lo.
A cerimonialista que Quin contratara tinha diversos funcionários, todos correndo de um lado para o outro, para garantir que tudo estivesse perfeito; o cabeleireiro, a esteticista, a costureira, o florista. Nada foi esquecido, e cada passo da organização estava conforme o planejado.
A costureira segurou o vestido para ajudar Nicole a vesti-lo. Ela tirou o roupão que usara durante todo o dia.
— Uau! — exclamou Zoe ao ver sua lingerie sensual.
Nicole riu, nervosa.
— Isso também é coisa de noiva, mamãe?
— Claro que é! — respondeu Jade, rindo da inocência de Zoe. — Espero que goste do vestido, Nic.
Ela não o vira, experimentara apenas o corpete, jamais o vestido inteiro. Uma frente de seda branca caiu no chão. Parecia haver muitas camadas. Nicole entrou no vestido, tomando cuidado para não prender o salto alto no tecido. Passou os braços sob as alças finas que caíam sobre os ombros e o vestido se ajustou no corpo. Então, a costureira fechou o zíper e Nicole observou seu reflexo no espelho.
O corpete justo ia dos seios aos quadris, belamente adornado com pequenos cristais em forma de borboleta. Na parte da frente da saia, havia uma fenda que ia até a altura dos joelhos, para que fosse mais fácil caminhar. Nas costas, a saia caía graciosamente em uma cauda.
Sua mãe suspirou, contente.
— Você está maravilhosa, Nicole.
— Espetacular! — exclamou Jade, satisfeita. — Gostou?
— Gostei. É lindo! — disse Nicole. — Muito obrigada!
— O conceito foi idéia de Quin. Jules e eu apenas fizemos o melhor possível.
Quin tivera muito trabalho para que tudo saísse perfeito, de uma maneira muito especial. Certamente, um homem não tentava tanto agradar uma mulher se não a amasse, mas ele nunca disse exatamente essas palavras. Mas as diria hoje, na cerimônia de casamento.
— Agora, as flores — disse a costureira, entregando a Nicole as três rosas vermelhas que ela levaria como buquê.
Não eram botões. As rosas haviam desabrochado totalmente, e exalavam um forte perfume, assim como a que estava em seu cabelo, presa atrás da orelha esquerda. Jade lhe disse que Quin não queria um véu — nada que escondesse seu cabelo, apenas uma rosa vermelha para acentuar sua beleza natural. Rosas vermelhas para o amor.
Aquilo tinha de ser verdade. O coração dela desejava um final de conto de fadas para sua história com Quin.
As damas de honra também receberam buquês, com rosas de todas as cores.
— Por que as borboletas gostam de muitas cores bonitas, mãe — explicou Zoe.
Os nervos de Nicole estavam à flor da pele, enquanto todas se encaminhavam para a limusine que as levaria ao local do casamento — que ainda era segredo.
Foi outra surpresa impressionante quando chegaram a Ópera House de Sidney! Subiram ao Salão de Concertos norte, que tinha fantásticas janelas com vista para a enseada. Filas e filas de cadeiras sobre o tapete vermelho — todas ocupadas por convidados.
Mas Quin não era uma fantasia. Estava incrivelmente lindo, em um terno escuro com uma camisa branca. Caminhou, confiante, até ela.
— Está feliz? — perguntou Quin, com os olhos acinzentados transbordando felicidade.
— Estou — respondeu ela, sorrindo, expressando o prazer que sentia ao seu lado. — Muito feliz!
— Ótimo! Hoje, estou tentando compensar todo o romance que não lhe dei, Nicole.
Romance... Isso era amor?
— Você realmente é o melhor de todos, Quin. Nisso e em tudo mais — disse, impressionada com tudo o que ele fizera para que seu casamento fosse memorável.
— Você é o mais importante — murmurou ele, tomando seu braço.
Aquelas palavras reverberavam na cabeça de Nicole enquanto Quin caminhava com ela pelo salão, em direção ao padre. Sua mãe e Zoe foram ido na frente, para se sentar na primeira fila. As damas de honra encerraram o pequeno cortejo e ficaram perto de Nicole, assim como os padrinhos de Quin, que estavam do lado dele.
A cerimônia foi curta e muito emocionante para Nicole. Tony Fisher, padrinho de Quin, e Jade leram lindos textos sobre o amor e o casamento. Uma belíssima voz cantou "Ali The Way". Quando Quin leu seus votos, sua voz vibrava, muito emocionada, fazendo-a chorar. Ela apenas controlou as lágrimas quando assinaram a certidão de casamento.
E as boas surpresas não haviam acabado!
Depois de sair da Ópera House, todos entraram em um catamarã luxuoso que cruzou a enseada. As fotos do casamento foram tiradas com a ponte e o glorioso pôr-do-sol ao fundo. Havia champanhe francês, canapés deliciosos, e os convidados se divertiam alegremente. Muitos queriam tirar foto com os noivos.
O avô de Quin, Juan Gallardo, muito conservado, acolheu a entrada de Nicole na família, felicitou o neto por conseguir uma noiva tão bonita e disse que entendia por que Quin decidira fazer de Sidney seu lar. Nem mesmo Buenos Aires superava essa esplêndida cidade. E, claro, como a dona de seu coração era australiana... Sim, ele entendia. Mas Joaquin tinha de levar Nicole para a Argentina algum dia.
A mãe de Quin se divertiu muito, exibindo Zoe para todos os parentes.
— Minha neta — repetia, orgulhosa.
Nicole estava feliz por ver a mãe conversar animadamente com antigos amigos de competições de dança. Sem dúvida, estavam colocando em dia todas as fofocas profissionais e trocando histórias sobre alunos muito talentosos. Era bom ver que ela estava voltando ao normal, interessando-se de novo pelo trabalho e pelas pessoas. E, ainda melhor, parecia ter conquistado um admirador que fazia aulas de dança com ela.
Nicole e Zoe iriam morar com Quin depois da lua-de-mel, e sua mãe ficaria sozinha na casa de Burwood. Cuidar da escola de dança a manteria ocupada pela maior parte do tempo e elas se veriam várias vezes por semana. Não iam abandoná-la.
O catamarã atracou em Mosman, do outro lado da Ópera House. Todos foram levados para um local exótico — o Taronga Centre, que também tinha vista para a enseada.
O salão de festas estava decorado de branco, com rosas vermelhas sobre as mesas. Os convidados puderam se deleitar com ostras de Sidney, salmão e morangos cobertos de chocolate da Tasmânia, com creme de King Island. A diversão ficava por conta de uma banda ao vivo, cover de um cantor famoso. Um bolo de casamento de três andares — obra de um decorador — esperava para ser partido. Antes disso, no entanto, havia os discursos.
Tony Fisher levantou-se e, logo, fez os presentes rirem com humor charmoso, declarando, por fim, que só mesmo o seu grande amigo Quin podia conquistar a adorável Nicole. Ele ergueu a taça, brindando aos noivos.
Quin levantou-se da cadeira.
Nicole conteve o nervosismo. Ele tornara o dia do seu casamento inesquecível e especial — o auge do romance. Será que ele ia se superar agora, dizendo o que ela tanto queria ouvir?
— Hoje mais cedo, meu avô, Juan Gallardo — apontou para a mesa onde ele estava sentado — reconheceu que Nicole era a mulher da minha vida. — Virou-se e sorriu para ela. — Quando a conheci, há sete anos, pensei instantaneamente que seria minha. Felizmente, o desejo de ficar juntos foi mútuo e ela se tornou minha mulher. Foi assim por dois anos. Ela me deu seu amor, mas eu cometi o grande erro de não apreciar aquele enorme presente. Não dividi meu coração com ela e a fiz se sentir apenas como algo de que eu dispunha a meu bel-prazer. Então, a perdi...
A tristeza e o arrependimento em sua voz eram pungentes, e o silêncio sepulcral que havia no salão era um sinal de respeito a seus sentimentos. Nicole estava impressionada por ele revelar tanto e sentiu-se ruborizar ao escutá-lo falando das acusações cruéis que jogou contra ele.
— Não apenas perdi minha mulher, mas também perdi a criança que ela carregava, nossa linda filha, Zoe.
Sentiu um frio na barriga ao perceber que o amava. Sempre o amou.
— Cinco anos se passaram antes de os nossos caminhos se cruzarem novamente, tempo mais que o bastante para eu ver como minhas conquistas foram inúteis sem ela ao meu lado. Eu faria qualquer coisa para recuperá-la, e foi então que o destino sorriu para mim. Ainda bem que tive tempo para demonstrar que eu não repetiria os erros do passado.
Ele estava se humilhando na frente de toda aquela gente para se redimir da dor que causara a Nicole. Ela jamais teria pedido que fizesse isso, mas estava totalmente fascinada por aquela confissão pessoal.
— Aprendi a importância de partilhar. Aprendi que a sinceridade é o caminho da confiança. Aprendi que o amor é um presente infinitamente precioso e deve ser nutrido, e nunca negligenciado. Espero levar essas lições comigo no futuro que Nicole me concedeu ao se tornar minha mulher hoje. É o que eu espero fazer, pois não quero que ela duvide do quanto a amo e sempre a amarei.
Pronto! Ele falou! Não havia uma sombra de dúvida em sua mente quando a fitou, sorrindo e mostrando-lhe todo o amor que sentia.
— Nicole é mais que a mulher da minha vida. É a rainha do meu coração! — declarou, enfaticamente. — Agora, você me daria a honra desta dança, meu amor?
— Claro — disse, levantando-se da cadeira. Queria ser acolhida por seus braços, senti-lo de perto, declarar seu amor por ele.
Todos os convidados ficaram de pé, aplaudindo-os. A banda começou a tocar a melodia de "Moon River", e ela e Quin estavam novamente juntos — intensamente juntos. Dançavam pelo salão, extasiados; cada passo representava a harmonia de seus corações.
Estavam absortos um pelo outro, sequer percebiam que centenas de convidados os observavam e sorriam. Alguns até secavam lágrimas de emoção.
— Também amo você, Quin... — sussurrou ela. — Obrigada por este dia perfeito — acrescentou.
— Você fez isso — murmurou ele.
— Vou guardá-lo na minha memória por toda minha vida.
— Vamos construir algo para guardar lindas lembranças.
Ela sorriu.
— Como a nossa própria árvore de borboletas!
Quin retribuiu o sorriso.
Eles dançaram seguindo a música do amor que tocava em seus corações, sabendo que sempre dançariam juntos, pois o amor jamais se acabaria.
Emma Darcy
Carlos Cunha Arte & Produção Visual
Planeta Criança Literatura Licenciosa