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Os homens e mulheres da cidade de Uruk, na antiga Mesopotâmia, local banhado por dois rios caudalosos que diminuíam a fértil e formosa terra onde se encontrava o Paraíso Terrestre, admiravam o seu jovem rei Gilgamesh; mas também o temiam pois, em ocasiões, governava com soberba e arrogância.
Passava o tempo e os cidadãos de Uruk estavam cada dia mais tristes porque notavam que Gilgamesh, o rei de formas perfeitas — já que possuía três partes de deus e uma de humano — ditava continuamente leis e sentenças injustas, distantes da misericórdia e da compaixão exigidas a um governante para com seus súditos. Era tanta a crueldade de Gilgamesh que os deuses escutaram as súplicas dos homens e das mulheres de Uruk e se retiraram a suas sagradas moradas para meditar...
Em silêncio, os deuses refletiram e maquinaram dia e noite...Até que, por fim, decidiram que Aruru, a deusa-mae que tinha criado Gilgamesh, encontrara também a forma de ajudar os humanos. Assim pois, Aruru pôs mãos a obra e, tal qual sábio e aplicado oleiro, preparou a lama e modelou uma figura humana. Logo, sem desperdiçar nem um momento, a criativa deusa soprou a argila e no mesmo instante a figura que acabara de criar tomou vida e movimento.
Aruru, satisfeita com sua obra, retirou-se para descansar; mas antes impôs suas divinas mãos sobre a cabeça, coberta de encaracolados e longos cabelos, daquele novo homem que tinha a sua frente e com voz de trovão, lhe falou: “Te chamaras Enkidu...Serás um grande guerreiro e um herói de valor... e enfrentarás o jovem rei Gilgamesh para obrigá-lo a tratar o seu povo com respeito”.
Passou o tempo e certo dia um caçador em vigília junto às águas do lago, na clareira de um bosque, para espreitar as gazelas que ali acudiam a beber, avistou Enkidu. Num primeiro instante, ao ver sua vestimenta o tomou por um pastor. Mas com o tempo, ao observar que aquele forasteiro protegia os animais, tirava as armadilhas e os impediam de serem enganados, o caçador constatou que não se tratava de um simples pastor.
Cada vez que o caçador se aproximava do lago encontrava suas margens ocupadas pelo rebanho do estranho pastor, de maneira que resultava impossível abater alguma presa. O caçador retornou a sua casa de mãos vazias e quando seu pai lhe perguntou o motivo porque não tinha conseguido nenhuma caça, este lhe respondeu que tinha sido impedido por um homem de aspecto robusto que pastoreava seus rebanhos no monte e que não se afastava da ribeira do lago. E complementou: “Mesmo levando samarra como os pastores, seus fortes e musculosos braços denotavam ser ele um cavaleiro, ou um guerreiro, a serviço dos deuses”.
Então, o pai do caçador ordenou a seu filho que fosse até o palácio real e gritasse com todas as suas forças pedindo ajuda a Gilgamesh, para que este ficasse sabendo da presença de um guerreiro valente nas suas terras. Assim fez o caçador e seus gritos de advertência se escutaram em toda a cidade de Uruk.
Depois de seis dias e sete noites de prazer junto a uma jovem cortesã que, por conselho de Gilgamesh, o caçador pôs em seu caminho para debilitá-lo e minar suas forças, Enkidu partiu para o palácio de Gilgamesh. Enkidu abandonou os bosques e, guiado pela sua formosa companheira, transpassou a muralha da cidade de Uruk e desafiou Gilgamesh.
Os dois heróis lutaram na praça, na frente do povo. Ambos eram jovens e fortes, valentes e atrevidos. Enrolaram-se pelo chão, destruindo na luta as grandes portas da cidade. As lascas saltavam pelos ares até que, após uma longa peleja, a ira dos dois contendores se aplacou. Parou a violência e o amor se apossou de seus corações, a amizade se apoderou da vontade de ambos. Se fizeram amigos e se abraçaram. Todo o povo celebrou o abraço de Enkidu e Gilgamesh... E houve festas e convivas na cidade de Uruk.
Mas, os amigos deixaram para trás o bulício e o regozijo do povo e saíram para cumprir uma perigosa missão. Se dirigiram para o Bosque dos Cedros para matar o temível monstro Humbaba, uma espantosa criatura que cuspia fogo pela boca e tinha atemorizados todos os habitantes da comarca.
Gilgamesh e Enkidu entraram sem temor no interior do bosque e chegaram até a obscura gruta do dragão. Então, lutaram com bravura e cortaram a cabeça da fera...E foram recepcionados pelos habitantes das aldeias que rodeiam o bosque, porém Gilgamesh e Enkidu seguem seu caminho.
Depois de viverem juntos muitas aventuras sentem saudades de suas terras e seus bosques e da cidade amuralhada de Uruk, e decidem regressar para os seus. Durante suas ausências o povo tinha sabido das façanhas e da fama de Gilgamesh e Enkidu e os recebem como heróis.
Isthar, deusa do amor, deseja que Gilgamesh seja seu amante e que se case com ela, mas o valioso e bonito guerreiro a recusa. A despeitada deusa pede ajuda a seu pai, o deus Anu, dono e senhor de todos os mundos e lhe instiga para que envie o Touro do Céu contra a cidade de Uruk. Enkidu e Gilgamesh lutam com o Touro do Céu e o matam. Mas, os deuses se vingam e fazem com que Enkidu contraia uma grave enfermidade e morra. Gilgamesh verte lágrimas de dor diante do cadáver do seu amigo Enkidu e com grande pesar e desconsolo pela perda de seu querido companheiro abandona Uruk e empreende um longo caminho.
Depois de andar léguas e léguas, Gilgamesh chega ao pé de altas montanhas, cujos cumes gémeos voltam-se para o primeiro e para o último dos extremos do mundo; o nascente e o poente. Gilgamesh sobe até os altos picos e, uma vez lã em cima, olha o imenso céu e se pergunta pelo enigma da morte...Mas ninguém responde.
Então, decide descer ao mundo das sombras e roga aos guardiões, às gigantescas e horríveis criaturas, metade escorpião metade homem, que abram as portas da montanha e lhe deixem passar, O valente Gilgamesh caminha sem descanso pelo interior dos infernos na mais completa obscuridade até chegar à morada dos deuses, ao jardim de luz. Aqui também não encontra a resposta ao enigma da morte, mas os deuses lhe anunciam que resolvera o mistério se cruzar até a outra margem do extenso oceano.
O barqueiro dos deuses conduz Gilgamesh pelos mares e oceanos do mundo até chegar às pestilentas aguas, da morte e após atravessa-las, o herói chega num lugar onde se encontra o único homem sobrevivente do dilúvio, quem lhe instrui a respeito da vida e da morte: “Não deveis temer a morte pois, como o sonho, está dentro de nós e a todos alcança; mas, podeis conseguir a imortalidade ou a eterna juventude, se arrancares a planta espinhosa e florida, semelhante a um roseiral, que cresce entre o lodo das aguas profundas que banham o mundo das sombras”.
Assim fez Gilgamesh e de regresso à Uruk, levando consigo a preciosa planta florida da eterna juventude, parou no caminho para beber água num manancial e refrescar todo seu corpo. Mas, de pronto, uma serpente cheirou o perfume que exalava da planta e a tragou; depois se arrastou até as cavidades das rochas e se enfiou num fundo e obscuro buraco que desembocava no reino das trevas. Quando Gilgamesh saiu das aguas e viu as sinuosas pegadas do réptil na areia compreendeu, no instante, que a serpente maligna tinha lhe roubado a planta florida da eterna juventude...
... E Gilgamesh chorou ...
APÊNDICE: Ishtar, Deusa Suméria do Amor
Os sumérios, cuja civilização remonta além do quarta milênio antes da nossa era, associavam a deusa Ishatr com o amor, mas também com o ódio e a guerra. Segunda a crença popular daquele tempo lendário, a deusa Ishtar tinha descido ao mundo subterraneo, o inferno, para apoderar-se das sete chaves que abriam as sete portas dos corredores que condizuam à câmara tenebrosa, onde se guardava o segredo da vida e da morte.
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