Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


A ESPERA / Blake Pierce
A ESPERA / Blake Pierce

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT 

 

 

Series & Trilogias Literarias

 

 

 

 

 

 

A princípio, Janet Davis não tinha noção de nada a não ser da terrível dor que lhe atravessava o crânio como se mil castanholas soassem em uníssono.

Tinha os olhos fechados. Quando tentou abri-los, foi cega por uma brilhante luz branca e foi obrigada a fechá-los novamente.

A luz aqueceu o seu rosto.

Onde é que estou? Perguntou-se.

Onde é que eu estava antes... antes disto ter acontecido?

E então começou a lembrar-se...

Estivera a tirar fotos nos pântanos perto do Lady Bird Jonhson Park. O verão já ia muito adiantado para os milhões de narcisos florescerem, mas as folhas dos cornisos eram de um lindo verde, particularmente bonito à hora do pôr do sol.

Ela estava na marina a fotografar os barcos e o magnífico jogo de luzes do pôr do sol na água quando ouviu passos a aproximarem-se rapidamente atrás dela. Antes de ter tempo para se virar e olhar, sentiu uma forte pancada na nuca e a câmara voara-lhe das mãos, e...

Acho que perdi a consciência.

Mas onde estava ela agora?

Estava demasiado atordoada para sentir medo, mas sabia que não faltaria muito para ele entrasse em cena.

Aos poucos começou a aperceber-se de que estava deitada de costas numa superfície dura.

Não conseguia mexer as pernas. As mãos e pés estavam dormentes de estar amarrada pelos pulsos e tornozelos.

Mas a sensação mais estranha era de dedos no seu rosto, espalhando algo suave e húmido na sua pele quente.

Conseguiu articular algumas palavras.

“Onde é que estou? O que é que está a fazer?”

Quando não lhe foi dada qualquer resposta, retorceu a cabeça, tentando fugir ao aborrecido movimento das pontas dos dedos viscosas.

Ouviu uma voz de homem a murmurar...

“Fique quieta.”

Ela não tinha intenção de ficar quieta. Continuou a retorcer-se até os dedos se afastarem.

Ouviu um suspiro audível de desaprovação. Depois a luz mudou de direção, já não estava diretamente virada para o seu rosto.

“Abra os olhos,” Disse a voz.

Ela abriu.

A brilhar à sua frente estava a lâmina afiada de uma faca de açougueiro. A ponta da faca aproximou-se do seu rosto, fazendo-a entortar os olhos e ver a lâmina em duplicado.

Janet arfou e a voz sussurrou novamente...

“Fique quieta.”

Congelou, olhando diretamente para cima, mas um espasmo de terror apoderou-se do seu corpo.

A voz silvou uma ordem mais uma vez.

“Eu disse quieta.”

Ela tentou manter o corpo quieto. Tinha os olhos abertos, mas a luz era dolorosamente brilhante e quente, impossibilitando que conseguisse ver o que quer que fosse com clareza.

A faca afastou-se e os dedos continuaram a esfregar, desta vez em torno dos seus lábios. Ela cerrou os dentes e conseguia ouvi-los a rangerem.

“Estou quase a terminar,” Disse a voz.

Apesar do calor, Janet começou a tremer de medo.

Os dedos começaram a esfregar à volta dos olhos agora e ela teve que os fechar outra vez para evitar que o que o homem espalhava entrasse dentro deles.

Então os dedos afastaram-se do seu rosto e ela pode abrir os olhos novamente. Agora conseguia ver a silhueta de uma cabeça com uma forma grotesca a movimentar-se na luz flamejante.

Sentiu um soluço de pavor sair-lhe da garganta.

“Deixe-me ir,” Disse ela. “Por favor, deixe-me ir.”

O homem não disse nada. Ela sentiu-o a apalpar o seu braço esquerdo agora, prendendo algo elástico à volta do bíceps e depois apertando-o dolorosamente.

O pânico de Janet auentou e ela tentou não imaginar o que estava prestes a acontecer.

“Não,” Disse ela. “Não faça isso.”

Ela sentiu um dedo a sondar-lhe a curva do braço e depois a dor penetrante de uma agulha a entrar numa artéria.

Janet soltou um grito de horror e desespero.

Então, ao sentir a agulha recuar, uma estranha transformação tomou conta de si.

O seu grito de repente converteu-se em...

Riso!

Ria-se vibrantemente, incontrolavelmente, repleta de uma euforia louca que nunca sentira antes.

Naquele momento sentia-se completamente invencível, forte e poderosa.

Mas quando tentou libertar-se novamente do que lhe prendia os pulsos e tornozelos, não conseguiu.

O seu riso transformou-se num acesso de fúria violenta.

“Deixe-me ir embora,” Silvou ela. “Deixe-me ir ou juro por Deus que o mato!”

O homem soltou uma risada.

Depois inclinou a sombra metálica do candeeiro para que a sua luz iluminasse o seu rosto.

Era o rosto de um palhaço, pintado de branco com uns enormes olhos estranhos e lábios pintados de preto e vermelho.

Janet susteve a respiração durante alguns segundos perante aquela visão.

O homem sorriu com uns dentes amarelos que constrastavam com o resto do rosto colorido.

Disse-lhe...

“Vão deixá-la para trás.”

Janet queria perguntar...

Quem?

De quem está a falar?

E quem é você?

Porque é que me está a fazer isto?

Mas agora nem sequer conseguia respirar.

A faca surgiu novamente à sua frente. Depois o homem colocou a sua ponta afiada na sua bochecha, descendo ao rosto e até à garganta. A mínima pressão e Janet sabia que a faca a magoaria.

A sua respiração não normalizava.

Ela sabia que estava a começar a hiperventilar, mas não conseguia controlar a respiração. Sentia o coração a bater dentro do peito, conseguia sentir e ouvir a sua pulsação violenta a aumentar a cada segundo.

Perguntou-se...

O que estava naquela agulha?

Fosse o que fosse, os seus efeitos estavam a tornar-se mais evidentes a cada segundo que passava. Não conseguia fugir ao que se passava com o seu próprio corpo.

Enquanto continuava a afagar-lhe o rosto com a ponta da faca, o homem murmurou...

“Vão deixá-la para trás.”

Ela conseguiu articular...

“Quem? Quem é que me vai deixar para trás?”

“Você sabe quem,” Disse ele.

Janet apercebeu-se que estava a perder o controlo dos seus pensamentos. Estava imersa em ansiedade e pânico, em sentimentos loucos de perseguição e vitimização.

A quem é que ele se refere?

Imagens de amigos, membros da família e colegas atravessaram-lhe a cabeça.

Mas os seus sorrisos familiares e amigáveis transformaram-se em caretas de desprezo e ódio.

Toda a gente, Pensou ela.

Toda a gente me está a fazer isto.

Todas as pessoas que já conheci.

Mais uma vez, sentiu uma explosão de raiva.

Devia saber que não devia confiar em ninguém.

Pior, ela sentiu como se a sua pele se estivesse a mover.

Não, algo estava a rastejar por toda a sua pele.

Insectos! Pensou.

Milhares deles!

Tentou libertar-se.

“Tire-os de cima de mim!” Implorou ao homem. “Mate-os!”

O homem riu enquanto a observava através da sua maquilhagem grotesca.

Não se ofereceu para a ajudar.

Ele sabe alguma coisa, Pensou Janet.

Ele sabe alguma coisa que eu não sei.

Então ocorreu-lhe...

Os insectos...

Eles não estão a rastejar na minha pele.

Eles estão a rastejar debaixo dela!

A sua respiração ecelerou e os pulmões queimaram como se tivesse corrido uma longa distância. O coração batia dolorosamente.

A sua cabeça explodia com emoções violentas – fúria, medo, nojo, pânico e completa perplexidade.

Teria o homem injetado milhares, talvez milhões de insectos na sua corrente sanguínea?

Como é que isso era sequer possível?

Numa voz que oscilava entre a raiva e a autocomiseração, ela perguntou...

“Porque é que me odeia?”

Desta vez o homem riu-se num tom mais elevado.

Ele disse, “Toda a gente a odeia.”

Agora Janet tinha dificuldades e ver. A sua visão não estava a ficar desfocada. Antes, a cena à sua frente parecia estar a retorcer-se e a oscilar e a saltar. Ela imaginou que conseguia ouvir as suas órbitas.

Por isso, quando viu outro rosto de palhaço, pensou estar a ver em duplicado.

Mas rapidamente percebeu...

Este rosto é diferente...

Estava pintado com as mesmas cores, mas as formas eram diversas.

Não é ele.

Por baixo da tinta estavam traços familiares.

Então ocorreu-lhe...

Eu. Sou eu.

O homem segurava um espelho em frente ao seu rosto. O rosto hediondamente garrido que via era o seu.

A visão daquele semblante distorcido, choroso e, no entanto, gozão, encheu-a de uma repugnância que nunca antes sentira.

Ele tem razão, Pensou.

Toda a gente me odeia.

E eu sou o meu pior inimigo.

Como se partilhassem a sua repugnânica, as criaturas debaixo da sua pele começaram a remexer como baratas subitamente expostas à luz do sol e impossibilitadas de se esconderem.

O homem afastou o espelho e começou a acariciar o seu rosto com a ponta da faca novamente.

E disse mais uma vez...

“Vão deixá-la para trás.”

Quando a faca roçou a sua garganta, ocorreu-lhe...

Se ele me cortar os insectos podem fugir.

É claro que a lâmina também a mataria. Mas isso parecia um baixo preço a pagar para se libertar dos insectos e daquele terror.

Ela sussurrou...

“Faça-o. Faça-o agora.”

De repente, o ar preencheu-se com um riso feio e distorcido, como se milhares de palhaços estivessem a regozijar-se ruidosamente com o seu pedido.

O riso fez com que o seu coração batesse ainda com mais descompassadamente. Janet sabia que o seu coração não aguentaria muito mais.

E ela não queria.

Ela queria que ele parasse o mais rapidamente possível.

Deu por si a tentar contar as batidas...

Uma, duas... três, quatro, cinco... seis...

Mas as batidas eram mais rápidas e menos regulares.

Interrogou-se – o que é que iria explodir primeiro, o seu coração ou o seu cérebro?

Então, finalmente, ouvia a sua última batida e o mundo desapareceu.

 

 

 


 

 

 


CAPÍTULO UM

Riley se riu quando Ryan lhe tirou a caixa de livros.

Disse, “Me deixa levar alguma coisa, OK?”

“É demasiado pesada,” Disse Ryan, carregando a caixa até à estante vazia. “Não devia levantá-la.”

“Então, Ryan. Estou grávida, não doente.”

Ryan pousou a caixa em frente à estante e sacudiu as mãos.

“Pode tirar os livros e colocá-los na estante,” Disse ele.

Riley se riu novamente.

Perguntou, “Quer dizer que me está dando autorização para me mudar para o nosso apartamento?”

Agora Ryan parecia envergonhado.

“Não era isso que eu queria dizer,” Disse. “É só porque... bem, fico preocupado.”

“E não me canso de lhe dizer, não tem nada com que se preocupar,” Disse Riley. “Só estou grávida de seis semanas e me sinto ótima.”

Preferiu não falar nos enjoos matinais ocasionais. Até ao momento não tinham sido muito graves.

Ryan abanou a cabeça. “Tente não exagerar, OK?”

“Não exagero,” Disse Riley. “Prometo.”

Ryan anuiu e voltou à pilha de caixas ainda por abrir.

Riley abriu a caixa de cartão à sua frente e começou a colocar livros nas prateleiras. Na verdade, se sentia feliz por estar sossegada e a fazer uma tarefa simples. Se apercebeu de que a sua mente precisava mais de descanso do que o corpo.

Os últimos dias tinham sido muito ocupados.

Na verdade, também as últimas semanas tinham sido agitadas.

O dia da graduação da licenciatura em psicologia tinha sido um dia louco e de grandes mudanças. Logo após a cerimónia, um agente do FBI a tinha recrutado para o Honors Internship Summer Program da agência com duração de dez semanas. Logo após isso, Ryan lhe tinha pedido para ir viver com ele assim que começassse a trabalhar.

O mais incrível de tudo é que tanto o programa de internato como o novo emprego de Ryan eram em Washington, DC. Dessa forma, ela não tivera que escolher.

Pelo menos ele não se passou quando lhe disse que já estava grávida, Pensou.

Na verdade, parecera maravilhado. Ficara mais nervoso com a ideia da vinda de um bebé a partir da graduação – mas Riley também não estava menos nervosa.

A simples ideia a deixava confusa. Estavam a começar uma vida em comum e muito em breve estariam a partilhar a maior das responsabilidades – criar um filho.

Espero bem que estejamos prontos, Pensou Riley.

Entretanto, sentiu uma certa estranheza em arrumar os seus livros de psicologia nas prateleiras. Ryan tentara convencê-la a vendê-los e ela sabia que provavelmente era o que devia fazer...

Deus é testemunha de quanto nos faz falta cada cêntimo.

Ainda assim, tinha a sensação de que precisaria deles no futuro. Só não sabia porquê ou para quê.

De qualquer das formas, a caixa também continha muitos livros de direito de Ryan e ele não considerara vender nenhum deles. É claro que provavelmente os usaria no seu novo emprego como advogado estagiário no escritório de advogados de DC da Parsons and Rittenhouse.

Quando a caixa ficou vazia e os livros todos arrumados nas prateleiras, Riley se sentou no chão a observar Ryan que não parava de empurrar e reposicionar mobília como se tentasse encontrar o lugar perfeito para tudo.

Riley conteve um suspiro...

Pobre Ryan...

Ela sabia que Ryan não estava satisfeito com aquele apartamento numa cave. Ele tinha um apartamento mais simpático em Lanton com a mesma mobília que trouxera – uma agradável coleção boémia de artigos em segunda mão.

Na opinião dela, as coisas de Ryan ainda lhe pareciam muito bem ali. E o pequeno apartamento não a incomodava nem um pouco. Se habituara a um quarto de dormitório em Lanton, por isso, aquele lugar parecia um luxo apesar dos tubos cobertos, pendurados no quarto e na cozinha.

É verdade que os apartamentos dos andares superiores eram mais simpáticos, mas esse era o único disponível. Quando Ryan o vira pela primeira vez, quase recusara arrendá-lo. Mas a verdade era que aquilo era o máximo que podiam pagar. Já estavam muito sobrecarregados financeiramente. Ryan tinha atingido o plafon máximo do cartão de crédito com as despesas da mudança, o depósito do apartamento e tudo o mais que precisavam naquele momento de suas vidas.

Finalmente, Ryan olhou para Riley e disse, “Que acha se fizermos uma pausa?”

“Claro,” Concordou Riley.

Riley se levantou do chão e se sentou à mesa da cozinha. Ryan tirou dois refrigerantes da geleira e se sentou ao lado dela. Ficaram em silêncio durante alguns momentos e Riley pressentiu de imediato que Ryan tinha algo em mente.

Por fim, Ryan tamborilou os dedos na mesa e disse...

“Uh, Riley, temos que conversar sobre uma coisa.”

Parece mesmo sério, Pensou Riley.

Ryan se calou novamente com um olhar distante.

“Não vais acabar tudo comigo, pois não?” Perguntou.

É claro que estava a brincar.

Mas Ryan não se riu. Nem parecia ter ouvido a pergunta.

“Hã? Não, não é nada disso, é que...”

A sua voz se suspendeu e Riley se sentiu desconfortável.

O que se passa? Questionou-se. Será que o emprego de Ryan não se concretizara ou algo do género?

Ryan olhou Riley nos olhos e disse...

“Não te rias de mim, OK?”

“Porque é que me havia de rir?” Perguntou Riley.

Um tanto abalado, Ryan se levantou e se ajoelhou ao lado de Riley.

E então Riley percebeu...

Oh meu Deus! Ele vai-me pedir em casamento!

E obviamente, riu-se. É claro que era um riso nervoso.

Ryan corou profundamente.

“Eu pedi para você não rir,” Disse ele.

“Não estou rindo de você, “ Disse Riley. “Vai, diga o que tem a dizer. Tenho a certeza... bem, avance.”

Ryan remexeu nos bolsos de onde tirou uma pequena caixa. Abriu-a, revelando um modesto mas encantador anel de diamante. Riley suspirou.

Ryan gaguejou...

“Uh, Riley Sweeney, quer... casar comigo?”

Tentando sem sucesso abafar suas risadinhas nervosas, Riley conseguiu dizer...

“Oh, sim. Absolutamente.”

Ryan tirou o anel da caixa e Riley estendeu sua mão esquerda, deixando-o colocá-lo em seu dedo.

“É lindo,” Disse Riley. “Agora se levante e se sente qui comigo.”

Ryan sorriu envergonhadamente ao sentar-se a seu lado.

“Ajoelhar-me foi demais?” Perguntou.

“Foi perfeito,” Disse Riley. “Foi tudo.... Perfeito.”

Ela olhou num relance para o pequeno anel de diamante no seu dedo. O seu ataque de riso nervoso já tinha passado e agora sentia um nó de emoção se formando na garganta.

Não estava à espera. Nem se atrevera a sonhar com aquilo – pelo menos não imaginara que pudesse acontecer tão cedo.

Mas ali estavam ela e Ryan a dar outro salto gigantesco nas suas vidas.

Enquanto observava a luz incidindo no diamante, Ryan disse...

“Um dia ofereço-te um anel mais bonito.”

Riley nem queria acreditar.

“Nem te atrevas!” Disse. “Esse vai ser sempre o meu único anel de noivado!”

Mas ao observar o anel, não conseguiu evitar preocupar-se...

Quanto é que terá custado?

Como se lhe estivesse a ler os pensamentos, Ryan disse...

“Não te preocupes com o anel.”

O sorriso tranquilizador de Ryan despreocupou-a num instante. Ela sabia que ele não era de cometer loucuras no que dizia respeito ao dinheiro. O mais certo era tê-lo comprado por um bom preço – apesar de não se atrever a perguntar.

Então Riley reparou que a expressão de Ryan se alterou quando olhou em seu redor para o apartamento.

“Passa-se alguma coisa?” Perguntou.

Ryan soltou um suspiro e disse, “Vou melhorar a sua vida. Prometo.”

Riley se sentiu estranhamente abalada.

Perguntou, “O que tem de mal a vida que temos agora? Somos jovens e amamo-nos e vamos ter um bebé e...”

“Você sabe do que estou falando,” Disse Ryan, interrompendo-a.

“Não, não sei bem,” Disse Riley.

Um silêncio se interpôs entre eles.

Ryan suspirou novamente e disse, “Ouça, vou começar o trabalho amanhã com um salário de estagiário. Não me sinto propriamente alguém bem-sucedido. Mas é um bom escritório e se lá continuar, vou subir na hierarquia e quem sabe me possa tornar sócio um dia.”

Riley olhou para ele fixamente.

“Um dia, claro,” Disse ela. “Mas já é um grande começo e eu gosto do que temos neste momento.”

Ryan encolheu os ombros. “Não temos muito. Para começar, só temos um carro e vou precisar dele para ir para o trabalho, o que quer dizer que...”

Riley interrompeu-o, “O que quer dizer que eu apanho o metro para o programa de treino todas as manhãs. O que é que isso tem de mal?”

Ryan pegou na mão de Riley.

“Até à paragem mais próxima de metro é uma caminhada de dois quarteirões,” Disse ele. “E este não é o bairro mais seguro do mundo. Não gosto que tenha que andar sozinha. Fico preocupado.”

Riley se sentiu invadir por um sentimento estranho e desagradável. Ainda não sabia ao certo que sentimento era esse.

Disse, “Será que não lhe passou pela cabeça que eu até gosto desse bairro? Passei toda a minha vida na Virginia rural. Isto é uma mudança excitante, uma aventura. Para além disso, você sabe que sou dura. Meu pai era capitão dos Marines. Ele me ensinou a tomar conta de mim.”

Quase acrescentou...

E sobrevivi ao ataque de um assassino em série há alguns meses atrás, se lembras?

Não só sobrevivera ao ataque, como ajudara o FBI a identificar o assassino e a prendê-lo. Por isso lhe deram a oportunidade de se juntar ao programa de treino.

Mas ela sabia que Ryan não queria saber disso naquele momento. O seu orgulho masculino estava delicado.

E Riley se apercebeu de algo....

Fico realmente ressentida com isso.

Riley escolheu as palavras cuidadosamente, tentando não dizer a coisa errada...

“Ryan, sabe, tornar a nossa vida melhor não depende apenas de você. Depende de ambos. Eu tenho uma palavra a dizer. Vou ter a minha própria carreira.”

Ryan desviou o olhar.

Riley conteve um suspiro ao perceber...

Afinal disse a coisa errada.

Quase se esquecera que Ryan não apoiava o seu internato de verão. Lembrara-lhe que eram apenas dez semanas e que não era treino físico. Apenas iria observar agentes a trabalhar, sobretudo a nível interno. Para além disso, estava convencida que até podia resultar num trabalho de escritório ali mesmo na sede do FBI.

Ele se tornara mais recetivo à ideia, mas continuava a não o entusiasmar.

Riley não sabia o que ele preferia para ela.

Será que ele queria que ela fosse mãe a tepo inteiro? Se fosse esse o caso, ia ficar desiludido mais cedo ou mais tarde.

Mas aquele não era o momento para pensar naquilo.

Não estragues este momento, Disse Riley a si própria.

Olhou novamente para o seu anel e depois para Ryan.

“É lindo,” Disse ela. “Estou muito feliz, Obrigada.”

Ryan sorriu e apertou-lhe a mão.

Então Riley disse, “Então com quem é que vamos partilhar a notícia?”

Ryan encolheu os ombros. “Não sei. Ainda não temos amigos aqui em DC. Acho que posso falar com alguns dos meus amigos da faculdade de direito. Talvez possas ligar ao teu pai.”

A ideia não agradou a Riley. A última visita que fizera ao pai não fora agradável. A sua relação sempre fora profundamente atribulada.

E para além disso...

“Ele não tem telefone, lembras-te?” Disse Riley. “Ele vive sozinho nas montanhas.”

“Ah, pois é,” Disse Ryan.

“E os teus pais?” Perguntou Riley.

O sorriso de Ryan desvaneceu-se.

“Escrevo-lhes a contar,” Disse ele.

Riley teve que se impedir de perguntar...

E porque é que não lhes ligas?

Talvez nessa altura pudesse finalmente falar com eles.

Riley nunca conhecera os pais de Ryan que viviam na pequena cidade de Munny, Virginia.

Riley sabia que Ryan tinha crescido entre pessoas da classe trabalhadora e que sentia alguma ansiedade em deitar essa vida para trás das costas.

Interrogava-se se sentiria vergonha deles ou...

Terá vergonha de mim?

Será que eles sabem que estamos a viver juntos?

Aprovariam?

Mas antes que Riley pudesse pensar na melhor forma de abordar o assunto, o telefone tocou.

“Talvez pudéssemos não atender,” Disse Ryan.

Riley pensou durante um momento enquanto o telefone continuava a tocar.

“Pode ser importante,” Disse ela. Dirigiu-se ao telefone e atendeu a chamada.

Uma voz masculina alegre e profissional disse, “Posso falar com Riley Sweeney?”

“É a própria,” Disse Riley.

“Daqui fala Hoke Gilmer, o seu supervisor do programa de treino do FBI. Só lhe queria lembrar...”

Riley disse, entusiasmada, “Sim, eu sei! Lá estarei cedinho às sete da manhã de amanhã!”

“Ótimo!” Respondeu Hoke. “Estou ansioso por conhecê-la.”

Riley desligou o telefone e olhou para Ryan. Ele estava com um olhar pensativo.

“Uau,” Disse ele. “Tudo se está a concretizar, não é?”

Riley percebeu como é que ele se estava a sentir. Desde que se tinham mudado de Lanton que raramente tinham estado afastados um do outro.

E agora, amanhã, ambos iriam para os seus empregos.

Riley disse, “Talvez precisemos de fazer alguma coisa especial juntos.”

“Boa ideia,” Disse Ryan. “Talvez ir ao cinema e a um restaurante simpático e...”

Riley riu ao agarrá-lo pela mão, levantando-o.

“Tenho uma ideia melhor,” Disse ela.

Arrastou-o para o quarto onde caíram na cama a rir.


CAPÍTULO DOIS


Riley sentiu o coração a acelerar quando saiu na paragem de metro em direção ao enorme edifício branco J. Edgar Hoover.

Porque é que estou tão nervosa? Perguntou a si mesma. Afinal, ela tiha conseguido fazer a sua primeira viagem sozinha no metro de uma cidade com uma dimensão inédita para ela até ao momento.

Tentou convencer-se a si mesma de que não era uma mudança assim tão drástica – que ia simplesmente mais uma vez para a escola, tal como sucedera em Lanton.

Mas não conseguia evitar sentir-se impressionada e assustada. Para começar, o edifício estava situado na Avenida Pensilvânia, mesmo entre a Casa Branca e o Capitólio. Ela e Ryan tinham passado pelo edifício no início daquela semana, mas a realidade de que ali iria aprender e trabalhar nas próximas dez semanas só agora a atingia.

Quase parecia um sonho.

Ela atravessou a entrada principal e passou pelo átrio até ao portão de segurança. O guarda de serviço encontrou o seu nome numa lista de visitantes e entregou-lhe um cartão de identificação. Disse-lhe para descer três andares no elevador até um pequeno auditório.

Quando Riley encontrou o auditório e entrou, entregaram-lhe um pacote de regras, regulamentos e informação que deveria ler mais tarde. Sentou-se entre cerca de vinte outros estagiários que aparentavam estar na sua faixa etária. Ela sabia que alguns, tal como ela, eram recém-licenciados; outros eram universitários que regressariam às faculdades no outono.

A maioria dos estagiários eram do sexo masculino e todos estavam bem vestidos. Sentiu-se um pouco insegura com o seu terno que comprara numa loja económica em Lanton. Era o melhor fato formal que ela tinha e esperava que parecesse suficientemente respeitável.

Dali a pouco, um homem de meia-idade postou-se em frente aos estagiários sentados.

Disse, “Sou o Diretor Adjunto Marion Connor e sou o responsável por vos dar as boas-vindas ao Programa de Estagiários de Verão. Todos devem estar orgulhosos de estar aqui hoje. São um grupo seleto e excecional, escolhido entre milhares de concorrentes...”

Riley engoliu em seco enquanto ele continuava a parabenizar o grupo.

Milhares de concorrentes!

Como parecia estranho. A verdade era que ela não concorrera a nada. Ela simplesmente fora escolhida para o programa logo na universidade.

Pertencerei realmente aqui? Perguntou-se.

O Diretor Adjunto Connor apresentou o grupo a um agente mais jovem – Hoke Gilmer, o supervisor de treino que ligara a Riley no dia anterior. Gilmer instruía os estagiários a levantarem-se e a erguerem as mãos direitas no momento do juramento do FBI.

Riley sentiu-se a engasgar-se quando começou a proferir as palavras...

“Eu, Riley Sweeney, juro solenemente que apoiarei e defenderei a Constituição dos Estados Unidos contra todos os inimigos, estrangeiros e domésticos...”

Teve que conter as lágrimas ao prosseguir.

Isto é real, Disse a si própria. Isto está mesmo a acontecer.

Não fazia a mínima ideia do que a aguardava dali para a frente.

Mas tinha a certeza de que a sua vida nunca mais seria a mesma.


*


Após a cerimónia, Hoke Gilmer levou os alunos a uma longa visita pelo Edifício J. Edgar Hoover. Riley estava cada vez mais surpreendida com o tamanho e complexidade do edifício, e com todas as atividades diferentes que ali decorriam. Havia várias salas de exercícios, um campo de basquetebol, uma clínica médica, uma loja de impressões, muitos laboratórios e salas de computadores, uma carreira de tiro e até uma morgue e uma oficina de reparação de viaturas.

Tudo a surpreendia.

Quando a visita terminou, o grupo foi levado para a cafetaria no oitavo piso. Riley sentia-se exausta ao colocar comida no tabuleiro – não tanto pelo que caminhara, mas por tudo o que vira e tentara absorver.

Ela queria aprender tudo o que conseguisse, o mais rapidamente que conseguisse.

E queria começar naquele instante.

Ao procurar um lugar para se sentar e comer, sentiu-se estranhamente deslocada. Os outros estagiários já pareciam estar a criar laços e a sentar-se em grupos, a conversar animadamente sobre as incidências do dia. Riley disse a si mesma que se deveria sentar junto dos seus jovens colegas, apresentar-se e misturar-se.

Mas sabia que não ia ser fácil.

Riley sempre se sentira uma intrusa e fazer amigos e enquadrar-se nunca fora algo natural para ela.

E naquele momento, sentia-se mais tímida do que alguma vez se sentira.

E era só sua imaginação ou alguns dos estagiários a olhavam e cochichavam sobre ela?

Decidira sentar-se sozinha quando ouviu uma voz ao seu lado.

“És a Riley Sweeney, não és?”

Virou-se e viu um jovem que lhe chamara a atenção no auditório e durante a visita. Não pode deixar de reparar que era incrivelmente bem parecido – um pouco mais alto do que ela, robusto e atlético, com cabelo curto encaracolado e um sorriso cativante. O seu fato parecia caro.

“Hum, sim,” Respondeu Riley, sentindo-se subitamente ainda mais tímida do que anteriormente. “E tu...?”

“John Welch. Prazer em conhecer-te. Apertava-te a mão, mas...”

Fez um gesto de cabeça na direção dos tabuleiros que ambos carregavam e riu-se.

“Queres sentar-te comigo?” Perguntou ele.

Riley esperava não estar a corar.

“Claro,” Disse ela.

Sentaram-se numa mesa e começaram a comer.

Riley perguntou, “Como é que sabias o meu nome?”

John sorriu de forma endiabrada e disse, “Estás a brincar comigo, não é?”

Riley ficou alarmada. Conseguiu impedir-se de dizer...

Não, não estou a brincar.

John encolheu os ombros e disse, “Quase toda a gente aqui sabe quem tu és. Acho que podes dizer que a tua reputação te precede.”

Riley olhou para alguns dos outros alunos. Não havia dúvidas de que alguns deles ainda olhavam para ela e trocavam comentários.

Riley começou a entender...

Devem saber o que se passou em Lanton.

Mas o que é que saberiam ao certo?

E seria algo positivo ou negativo?

Ela de certeza que não estava à espera de ter uma “reputação” entre os estagiários. A ideia fazia-a sentir-se extremamente autoconsciente.

“De onde és?” Perguntou Riley.

“Daqui de DC,” Disse John. “Licenciei-me em criminologia esta primavera.”

“Em que faculdade?” Perguntou Riley.

John corou ligeiramente.

“Hum... Universidade George Washington,” Disse ele.

Riley arregalou os olhos perante a referência de uma universidade tão dispendiosa.

Deve ser rico, Pensou ela.

Riley pressentiu que ele não estava completamente à vontade com aquilo.

“Uau, uma licenciatura em criminologia,” Disse ela. “Eu sou licenciada em psicologia. Não há dúvida que tens um avanço sobre mim.”

John riu-se.

“Sobre ti? Não me parece. Quero dizer, tu és provavelmente a única estagiária do programa com experiência de campo.”

Riley fora apanhada de surpresa.

Experiência de campo?

Ela não pensava no que acontecera em Lanton como “experiência de campo”.

John prosseguiu, “Quero dizer, tu ajudaste a apanhar um verdadeiro assassino em série. Nem consigo imaginar como terá sido. Podes crer que te invejo.”

Riley ficou em silêncio. Ela não o queria dizer, mas a inveja parecia ser uma emoção terrivelmente inapropriada para aquilo por que ela passara.

O que é que será que John pensava que teria acontecido durante aquelas terríveis semanas em Lanton? Será que tinha a noção do que era descobrir os cadáveres de duas das suas melhores amigas com as gargantas brutalmente cortadas?

Será que ele tinha a noção de como ela ficara horrorizada e pesarosa – e de como se sentira culpada?

Ainda era assombrada pelo pensamento de que Trudy, a sua companheira de quarto, ainda poderia estar viva se ela estivesse mais atenta.

E teria ele alguma ideia de como ela ficara assustada quando caíra nas garras do assassino?

Riley bebeu um gole de refrigerante e remexeu a comida com o garfo.

Depois disse, “Foi... bem, não foi como deves pensar que foi. Foi só algo que aconteceu.”

John agora olhava para ela com preocupação.

“Desculpa,” Disse ele. “Calculo que não queiras falar sobre isso.”

“Talvez noutra altura,” Disse Riley.

Seguiu-se um silêncio estranho. Não querendo ser mal-educada, Riley começou a fazer perguntas a John sobre ele. John parecia relutante em falar da sua vida e família, mas Riley conseguiu soltá-lo um pouco.

Os pais de John eram ambos advogados proeminentes envolvidos na cena política de DC. Riley ficou impressionada – não tanto pelo background abastado de John, mas pelo facto de ele ter escolhido um caminho diferente. Em vez de seguir uma carreira de prestígio na advocacia e na política, John tinha optado por uma vida mais humilde ao serviço do FBI.

Um verdadeiro idealista, Pensou Riley.

Deu por si a compará-lo a Ryan que tentava deixar o seu passado humilde para trás tornando-se num advogado de sucesso.

É claro que ela admirava a ambição de Ryan. Era uma das coisas que adorava nele. Mas não conseguia evitar admirar também John pelas escolhas que estava a fazer.

Ao continuarem a conversar, Riley pressentiu que John estava a atirar-se a ela.

Ele está a namoriscar comigo, Percebeu.

Ficou um tanto surpreendida com isso. A sua mão esquerda estava bem à vista em cima da mesa, por isso era inevitável que ele tivesse visto o seu anel de noivado.

Deveria referir que estava comprometida?

Sentiu que isso seria estranho naquele momento – sobretudo se estivesse enganada.

Talvez ele não esteja a namoriscar comigo.

Dali a nada John começou a fazer perguntas sobre Riley, mantendo-se longe do assunto assassinatos de Lanton. Como habitual, Riley evitou certos assuntos – a sua relação atribulada com o pai, a adolescência rebelde e sobretudo como vira a própria mãe a ser morta quando era criança.

Também ocorreu a Riley que ao contrário de Ryan ou John, ela não tinha muito a dizer sobre as suas expectativas em relação ao futuro.

O que é que isso diz sobre mim? Interrogou-se.

Por fim, falou da sua relação com Ryan e como estavam noivos desde o dia anterior – apesar de não mencionar que estava grávida. Não reparou em qualquer mudança de comportamento em John.

Calculo que ele seja naturalmente encantador, Pensou.

Sentiu-se aliviada por ter tirado conclusões precipitadas e ele não ter estado afinal a namoriscá-la.

Era simpático e ela gostaria de o conhecer melhor. Na verdade, tinha a certeza de que John e Ryan iam gostar um do outro. Talvez se pudessem encontrar todos um dia.

Quando os estagiários terminaram as suas refeições, Hoke Gilmer foi ter com eles e acompanhou-os até um balneário amplo que seria a sua sede para o programa de dez semanas. Um agente mais jovem ajudava Gilmer a atribuir um cacifo a cada estagiário. Então todos os estagiários se sentaram nas cadeiras que se encontravam em torno de uma mesa no centro do compartimento e o agente mais jovem começou a distribuir telemóveis.

Gilmer explicou, “Estaremos em breve no século XXI e o FBI não gosta de se atrasar no que diz respeito à mais recente tecnologia. Este ano não distribuímos pagers. Alguns de vocês já terão telemóveis, mas queremos que tenham um apenas para uso no FBI. Encontram as instruções no vosso pacote de orientação.”

Então Gilmer riu-se ao acrescentar, “Espero que vos seja mais fácil aprender a usar isso do que foi para mim.”

Alguns dos estagiários também se riram ao receberem os seus novos brinquedos.

O telemóvel de Riley parecia estranhamente pequeno na sua mão. Ela estava habituada a telefones fixos maiores e nunca antes usara um telemóvel. Apesar de ter usado computadores em Lanton e alguns dos seus amigos terem telemóvel, ela ainda não tinha um. Ryan já tinha um telemóvel e um computador, e às vezes metia-se com Riley por causa da sua forma antiquada de estar.

Ela não gostava muito disso. A verdade era que a única razão pela qual ainda não tinha um computador ou um telemóvel era financeira.

Aquele era muito parecido com o de Ryan – muito simples, com um pequeno ecrã para mensagens de texto, um teclado numérico e só mais três ou quatro outros botões. Ainda assim, parecia estranho que ela ainda não soubesse sequer fazer uma chamada telefónica com ele. E sabia que também seria estranho estar sempre contactável por telemóvel, estivesse onde estivesse.

Lembrou a si própria...

Estou a começar uma vida nova.

Riley reparou que um grupo de pessoas de aspeto oficial, a maioria homens, acabara de entrar no balneário.

Gilmer disse, “Todos vocês terão ao vosso lado um agente especial experiente durante estas semanas. Eles começarão por vos ensinar as suas especialidades – análise de dados de crimes, trabalho forense, trabalho laboratorial de computador e tudo o mais. Vamos apresentar-vos a eles agora e eles assumirão as coisas a partir daqui.”

Quando o agente mais jovem começou a juntar os estagiários com o seu agente supervisor, Riley percebeu...

Há menos um agente do que estagiários.

E de facto, depois dos estagiários se retirarem com os seus mentores, Riley deu por si sem um mentor. Olhou para Gilmer perplexa.

Gilmer sorriu ligeiramente e disse, “Vai encontrar o agente que a acompanhará ao fundo do corredor no gabinete dezanove.”

Sentindo-se um pouco inquieta, Riley saiu do balneário e caminhou pelo corredor até encontrar o gabinete certo. Abriu a porta e viu que um homem de meia-idade baixo estava sentado à mesa.

Riley foi apanhada de surpresa ao reconhecê-lo.

Era o Agente Especial Jake Crivaro – o agente com quem trabalhara em Lanton e que lhe salvara a vida.


CAPÍTULO TRÊS


Riley sorriu ao reconhecer o Agente Especial Jake Crivaro. Ela passara a manhã entre estranhos e estava especialmente satisfeita por ver uma cara conhecida.

Acho que não devia estar surpreendida, Pensou.

Afinal de contas, lembrava-se do que ele lhe dissera em Lanton quando lhe entregara os papéis para o Programa de Honra...

“Estou à beira da reforma, mas sou capaz de ficar mais algum tempo para ajudar alguém como tu a começar.”

Ele devia ter solicitado para ser mentor de Riley no estágio.

Mas o sorriso de Riley rapidamente se desvaneceu quando percebeu...

Ele não me está a sorrir.

Na verdade, o Agente Crivaro não parecia minimamente satisfeito por vê-la.

Ainda sentado à mesa, cruzou os braços e acenou a um homem desconhecido mas de aspeto amigável na casa dos vinte que estava em pé. Crivaro disse...

“Riley Sweeney, quero apresentar-lhe o Agente Especial Mark McCune daqui de DC. Ele é o meu parceiro num caso em que estou agora a trabalhar.”

“Prazer em conhecê-la,” Disse o Agente McCune sorrindo.

“Igualmente,” Disse Riley.

McCune parecia muito mais amigável do que Crivaro.

Crivaro levantou-se da mesa. “Considere-se com sorte, Sweeney. Enquanto os outros estagiários estão fechados no edifício a aprender coisas banais, você vai já para o terreno. Acabei de chegar de Quantico para trabalhar num caso de droga. Vai juntar-se ao Agente McCune e a mim – vamos agora mesmo para a cena.”

O Agente Crivaro saiu do gabinete.

Enquanto Riley e o Agente McCune o seguiam Riley pensou...

Ele tratou-me por “Sweeney”.

Em Lanton, ela habituara-se a que a tratasse por “Riley”.

Riley segredou a McCune, “O Agente Crivaro está aborrecido com alguma coisa?”

McCune encolheu os ombros e sussurrou-lhe, “Esperava que me pudesse dizer. Este é o meu primeiro dia a trabalhar com ele, mas sei que já trabalhou num caso com ele. Dizem que ele ficou muito impressionado consigo. Ele tem a reputação de ser algo brusco. Sabe, o seu último parceiro foi despedido.”

Riley quase disse...

Na verdade, não sabia.

Nunca ouvira Crivaro fazer referência a um parceiro em Lanton.

Apesar de Crivaro ter sido duro, nunca o vira como alguém “brusco”. Na verdade, acostumara-se a ver nele uma carinhosa figura de pai – bastante diferente do seu próprio pai.

Riley e McCune seguiram Crivaro até um carro no parque des estacionamento do edifício do FBI. Ninguém falou enquanto Crivaro os conduziu para o exterior do edifício e prosseguiu para norte pelas ruas de DC.

Riley começou a pensar se Crivaro lhes iria o que iriam fazer no lugar para onde estavam a ir.

Acabaram por chegar a um bairro de aspeto duvidoso. As ruas estavam bordejadas com casas alinhadas que pareciam a Riley já ter sido casas agradáveis mas que se haviam degradado com o passar do tempo.

Ainda a conduzir, o Agente Crivaro finalmente lhe dirigiu a palavra.

“Dois irmãos, Jaden e Malik Madison, controlam o correio da droga neste bairro há alguns anos. Eles e o seu gang têm vindo a tornar-se cada vez mais descarados – a vender diretamente na rua como se fosse um mercado a céu aberto. Os polícias locais não conseguiram fazer nada para os parar.”

“Porque não?” Perguntou Riley.

Crivaro respondeu, “O gang tem cuidado para não ser apanhado pela polícia. Por outro lado, aterrorizaram todo o bairro com tiroteios e esse tipo de coisa. Dois miúdos foram atingidos só por estarem onde não deviam estar. Ninguém se atreveu a falar com a polícia sobre o que se estava a passar.”

Olhando para as filas de casas, Crivaro prosseguiu.

“O FBI foi chamado para ajudar há alguns dias. Esta manhã um dos nossos homens à paisana conseguiu prender Jaden. O seu irmão, Malik, ainda está à solta e o gang dispersou. Não será fácil apanhá-los. Mas devido à prisão, conseguimos um mandado de busca na casa onde estavam.”

Riley perguntou, “Se o gang ainda anda por aí, não começarão tudo de novo?”

McCune disse, “É aí que a polícia local pode fazer alguma coisa. Montam uma mini esquadra no passeio – só uma mesa de piquenique e cadeiras com alguns polícias que trabalharão com os locais para se assegurarem de que o mesmo não volta a acontecer.”

Riley quase perguntou...

Não começarão noutro bairro?

Mas ela sabia que era uma pergunta estúpida. É claro que o gang retomaria as suas atividades ilícitas noutro local – pelo menos se não fossem apanhados. E então a polícia e o FBI teriam que recomeçar do zero onde quer que isso sucedesse. Era a natureza daquele tipo de trabalho.

Crivaro parou o carro e apontou para a casa mais próxima.

“As buscas já começaram naquela,” Disse ele. “E nós estamos aqui para ajudar.”

Ao saírem do carro, Crivaro disse a Riley com firmeza.

“Por ‘nós’ referia-me ao Agente McCune e a mim. Você está aqui para ver e aprender. Por isso desampare a loja e não mexa em nada.”

Riley sentiu um arrepio perante as suas palavras, mas anuiu obedientemente.

Um polícia de uniforme conduziu-os ao interior da casa. Riley de imediato viu que uma grande operação estava já em progresso. O corredor estreito estava a abarrotar com polícia e agentes envergando coletes do FBI. Estavam a empilhar armas e sacos de droga no meio do chão.

Crivaro parecia agradado. Disse a um dos homens do FBI, “Parece que vocês encontraram aqui um autêntico filão.”

O homem do FBI riu e disse, “Temos a certeza que é só a ponta do icebergue. Tem que haver muito dinheiro por aqui, mas ainda não o encontrámos. Há muitos lugares para esconder coisas numa casa como esta. Os nossos homens estão a esquadrinhar todos os recantos.”

Riley seguiu Crivaro e McCune por um lanço de escadas no segundo andar.

Podia ver que a casa, e aparentemente as outras que a rodeavam, era maior do que parecia vista do exterior. Apesar de ser estreita, tinha profundidade com muitos compartimentos ao longo do corredor. Para além dos dois andares, Riley calculou que também tivesse um sotão e uma cave.

No topo das escadas, quatro agentes quase colidiram com Crivaro ao saírem de um dos quartos.

“Nada aqui,” Disse um dos agentes.

“Tens a certeza?” Perguntou Crivaro.

“Procurámos por todo o lado,” Disse o outro agente.

Então ouviu-se uma voz vinda do interior do quarto do outro lado do corredor...

“Ei, acho que temos alguma coisa aqui!”

Riley seguiu Crivaro e McCune pelo corredor. Antes que os pudesse seguir até ao quarto, Crivaro agarrou-lhe na mão e parou-a.

“Huh.uh,” Disse ele. “Podes ver a partir do corredor.”

Riley ficou no exterior do compartimento e viu cinco homens a fazerem buscas lá dentro. Aquele que chamara Jake estava ao lado de uma forma retangular na parede.

Disse, “Isto parece ter sido um elevador para comida. Quanto queres apostar em como vamos encontrar alguma coisa ali dentro?

“Abre,” Disse Crivaro.

Riley deu um passo em frente para ver o que estavam a fazer.

Jake olhou para ela e gritou...

“Ei, Sweeney. O que é que acabei de lhe dizer?”

Riley estava prestes a explicar que não tinha a intenção de entrar quando Jake ordenou a um polícia...

“Fecha o raio da porta.”

A porta foi batida com estrondo na cara de Riley que permaneceu no corredor a sentir-se chocada e envergonhada.

Porque é que o Agente Crivaro está tão zangado comigo? Interrogou-se.

Agora ouvia-se muito ruído vindo do interior do compartimento. Parecia que alguém estava a utilizar um pé-de-cabra no local da parede onde tinha existido o elevador. Riley queria ver o que se estava a passar, mas abrir a porta novamente estava fora de questão.

Caminhou ao longo do corredor e entrou no compartimento do outro lado, aquele que os agentes tinham dito já ter sido vasculhado. Cadeiras e mobília estavam virados do avesso, e um tapete estava enrodilhado de ter sido puxado e atirado novamente para o lugar.

Ali sozinha, Riley foi até à janela que dava para a rua.

No exterior viu algumas pessoas a caminharem apressadamente.

Não se sentem seguras lá fora, Percebeu. Aquilo pareceu-lhe incrivelmente triste.

Interrogou-se quanto tempo passara desde que aquele bairro passara de um lugar agradável onde se viver para a situação atual.

Também se perguntou...

Será que realmente fazemos a diferença?

Riley tentou imaginar como seria a vida após a instalação da “mini esquadra” que o Agente McCune mencionara. Será que as pessoas se sentiriam realmente mais seguras porque dois polícias estavam presentes numa mesa de piquenique?

Riley suspirou enquanto as pessoas continuavam a passar apressadas na rua e direção aos seus destinos.

Apercebeu-se de que estava colocar a si própria a pergunta errada.

Não existe “nós” – pelo menos ainda não.

Riley não estava envolvida naquela operação. E o Agente Crivaro não mostrava qualquer confiança nela.

Afastou-se da janela e dirigiu-se novamente para a porta. Ao passar pelo tapete enrodilhado, reparou num som estranho debaixo dos seus pés. Parou e ficou ali durante alguns momentos. Depois bateu com o calcanhar no chão.

Parecia estranhamente oco no local onde ela se encontrava.

Dirigiu-se à borda do tapete e retirou-o do chão.

Não viu nada fora do normal, apenas um chão de madeira vulgar.

Calculo que estivesse apenas a imaginar coisas, Pensou.

Lembrou-se do que um dos agentes dissera ao sair daquele compartiento.

“Procurámos por todo o lado.”

Com certeza que ela não iria encontrar algo que tivesse escapado a quatro agentes do FBI.

E no entanto, ela tinha a certeza de que ouvira algo estranho. Não teria reparado naquilo se mais alguém estivesse a movientar-se no compartimento.

Deu alguns passos para o lado e bateu com o calcanhar no chão. O chão parecia sólido novamente. Então ela baixou-se e tocou no local em que reparara com os nós dos dedos.

Não havia a mínia dúvida, parecia mesmo oco ali. Não via qualquer sinal da existência de uma abertura mas...

E se?

Conseguiu ver que uma das tábuas era mais curta do que as outras. Tinha um ponto escuro numa das pontas que parecia um nó vulgar.

Riley pressionou o nó com um dedo.

E qual não foi o seu espanto quando a tábua se soltou um pouco naquela ponta.

Encontrei alguma coisa! Pensou.

Encontrei mesmo alguma coisa!


CAPÍTULO QUATRO


Riley puxou a ponta da tábua que se tinha soltado um pouco.

E a tábua soltou-se completamente. Colocou-a de lado.

E claro como água, deparou-se com uma abertura que dava para um espaço debaixo do chão.

Riley espreitou com mais atenção. Enfiado debaixo das tábuas num local escondido estavam pacotes de notas.

Riley gritou, “Agente Crivaro! Encontrei algo!”

Enquanto esperava por uma resposta, Riley reparou em algo mais ao lado dos pacotes. Era a ponta de um objeto de plástico.

Riley tentou alcançar o objeto e apanhou-o.

Era um telemóvel – um modelo mais simples do que aquele que lhe fora dado há pouco. Apercebeu-se que deveria ser um daqueles pré-pagos que não podia ser atribuído a um dono.

Um telefone descartável, Pensou. Deve ser muito útil para uma operação de droga.

De repente, ouviu uma voz a gritar da entrada...

“Sweeney! O que é que pensa que está a fazer?”

Riley virou-se e viu o Agente Crivaro com o rosto vermelho de raiva. O Agente McCune estava logo atrás dele.

Riley segurou no telefone e disse, “Encontrei algo, Agente Crivaro.”

“Estou a ver,” Disse Crivaro. “E os seus dedos estão bem em cima do que encontrou. Dê-me isso.”

Riley entregou o telefone a Crivaro que o segurou cuidadosamente com um polegar e indicador, e o largou num saco de provas. Ela viu que tanto ele como o Agente McCune usavam luvas.

Sentiu-se enrubescer de vergonha.

Fiz mesmo asneira.

McCune ajoelhou-se e olhou para o espaço debaixo do chão.

Disse, “Ei, Agente Crivaro! Veja isto!”

Crivaro ajoelhou-se ao lado de McCune que disse, “É o dinheiro por que andávamos à procura pela casa.”

“Pois é,” Disse Crivaro.

Virando-se novamente para Riley, Crivaro perguntou...

“Tocou neste dinheiro?”

Riley abanou a cabeça.

“Tem a certeza?” Questionou-a Crivaro.

“Tenho a certeza,” Disse Riley timidamente.

“Como é que encontrou isto?” Perguntou Crivaro, apontando para a abertura.

Riley encolheu os ombros e disse, “Estava a passar por aqui e ouvi um som oco debaixo do chão, por isso tirei o tapete e...”

Crivaro interrompeu-a, “E arrancou esta tábua.”

“Bem, não foi propriamente arrancar. Soltou-se quando lhe toquei num certo ponto.”

Crivaro disse, “Tocou-lhe. E no telefone também. Nem dá para acreditar. As suas impressões estão por todo o lado.”

Riley gaguejou, “Eu... eu lamento.”

“Bem pode lamentar-se,” Disse Crivaro. “Vou tirá-la daqui antes que lixe mais alguma coisa.”

Levantou-se do chão e limpou as mãos.

Disse, “McCune, mantém a equipa de busca a trabalhar. Quando acabarem de verificar os compartimentos deste andar, continuem a procurar no sótão. Não me parece provável que encontremos mais alguma coisa, mas temos que ser exaustivos.”

“Assim farei,” Disse McCune.

Crivaro desceu as escadas com Riley e conduziu-a até ao carro.

À medida que se afastavam daquele cenário, Riley perguntou, “Vamos voltar para a sede?”

“Não hoje,” Disse Crivaro. “Talvez nunca mais. Onde é que vive? Vou levá-la a casa.”

Com a voz embargada pela emoção, Riley disse-lhe a morada.

Ao seguirem em silêncio, Riley deu por si a lembrar-se de como Crivaro ficara impressionada com ela em Lanton e lhe dissera...

“O FBI precisa de jovens como tu – sobretudo mulheres. Darias uma excelente agente da UAC.”

Como tudo se tinha alterado!

E ela sabia que não era apenas devido ao erro que cometera. Desde o início do dia que Crivaro fora frio consigo.

Naquele momento, Riley apenas desejava que ele dissesse alguma coisa – qualquer coisa.

Perguntou timidamente, “Encontrou alguma coisa no outro compartimento? Quero dizer, onde o elevador estivera?”

“Nada,” Respondeu Crivaro.

Seguiu-se mais um momento de silêncio. Agora Riley começava a se sentir confusa.

Sabia que cometera um tremendo erro, mas...

O que é que eu podia fazer?

Tivera um pressentimento de que algo estava escondido debaixo do chão.

Deveria simplesmente ter ignorado essa sensação?

Reuniu toda a sua coragem e disse...

“Senhor, eu sei que fiz asneira, mas não encontrei uma coisa importante? Quatro agentes revistaram aquele compartimento e não encontraram aquele esconderijo. Estavam à procura do dinheiro e eu o descobri. Será que outra pessoa o teria encontrado se não fosse eu?”

“Não é isso,” Disse Crivaro.

Riley conteve a necessidade de perguntar...

Então o que é?

Crivaro conduziu em silêncio durante vários minutos. Depois disse com um tom de voz baixo e amargo, “Puxei muitos cordelinhos para que entrasse neste programa.”

Seguiu-se outro momento de silêncio. Mas Riley detetou um mundo de significado naquelas palavras. Começou a compreender que Crivaro arriscara muito em seu benefício, não só para que entrasse no programa, mas também para ser seu mentor. E o mais certo era ter deixado alguns colegas zangados, talvez por excluir candidatos internos que eles considerariam mais aptos e promissores do que Riley.

Agora que via as coisas naquela perspetiva, o comportamento frio de Crivaro começou a fazer sentido. Ele não queria mostrar qualquer inclinação ou tratamento preferencial em relação a ela. Na verdade, comportava-se de forma oposta. Contava que ela se mostrasse digna sem qualquer encorajamento dele, apesar das dúvidas e ressentimento dos colegas.

E a julgar pelos olhares e sussurros dos outros estagiários no decorrer daquele dia, os colegas de Crivaro não eram os únicos a ter ressentimentos. Ela enfrentara uma subida árdua para apenas conseguir um sucesso modesto.

E estragara tudo numa única tarde graças a um erro estúpido. Crivaro tinha razão em estar desiludido e zangado.

Riley respirou fundo e disse...

“Peço desculpa. Não voltará a acontecer.”

Crivaro não respondeu de imediato.

Por fim disse, “Calculo que queira uma segunda oportunidade. Bem, deixe-me dizer-lhe que o FBI não é fértil em dar segundas oportunidades. O meu último parceiro foi despedido por cometer o mesmo tipo de erro – e sem dúvida que o mereceu. Um erro assim tem consequências. Por vezes é o suficiente para arruinar um caso e deixar um mau da fita escapar. Às vezes, custa a vida de alguém. Pode custar a sua própria vida.”

Crivaro fixou-a.

“O que acha que devo fazer?” Perguntou.

“Não sei,” Disse Riley.

Crivaro abanou a cabeça. “De certeza que eu também não sei. Talvez ambos devamos dormir sobre o assunto. Tenho que decidir se não julguei devidamente as suas capacidades. Você tem que decidir se tem o que é preciso para continuar neste programa.”

Riley sentiu um nó na garganta e uma vontade incontrolável de chorar.

Não chores, Disse a si mesma.

Chorar só tornaria tudo ainda pior.


CAPÍTULO CINCO


Ainda a acusar a repreensão de Crivaro, Riley chegou a casa duas antes de Ryan. Quando Ryan apareceu, pareceu surpreendido por vê-la ali tão cedo, mas estava demasiado entusiasmado com o seu dia para reparar no aborrecimento de Riley.

Ryan sentou-se à mesa da cozinha com uma cerveja enquanto Riley aquecia o jantar. Ela percebeu que ele estava muito satisfeito com tudo o que estava a fazer na firma e ansioso por lhe contar. Ela tentou dar-lhe atenção.

Tinham-lhe sido atribuídas mais tarefas do que ele estava à espera – muita pesquisa e análise complexa, escrita de relatórios, preparação para litigação e outras tarefas que Riley mal entendia. Até se ia apresentar pela primeira vez num tribunal no dia seguinte. Apenas iria dar apoio aos advogados de proa é claro, mas já era um avanço para ele.

Ryan parecia nervoso, assustado, talvez um pouco amedrontado, mas acima de tudo radiante.

Riley tentou continuar a sorrir ao sentarem-se para jantar. Ela queria estar feliz por ele.

Então Ryan finalmente perguntou...

“Uau, olha só para mim a falar. E tu? Como correu o teu dia?”

Riley engoliu em seco.

“Podia ter corrido melhor,” Disse ela. “Na verdade, correu pessimamente.”

Ryan agarrou na mão de Riley com uma expressão de sincera preocupação.

“Lamento,” Disse ele. “Queres falar sobre isso?”

Riley interrogou-se se falar sobre aquilo a faria sentir-se melhor.

Não, só vou começar a chorar.

Para além disso, o Ryan podia não ficar muito satisfeito com o facto de ela ter realizado trabalho de campo naquele dia. Ambos tinham a certeza de que ela faria o treino de forma segura nas instalações do FBI. Não que ela tivesse estado em verdadeiro perigo...

“Preferia não entrar em pormenores,” Disse Riley. “Mas lembras-te do Agente Especial Crivaro, o homem do FBI que me salvou a vida em Lanton?”

Ryan anuiu.

Riley prosseguiu, “Bem, ele é o meu mentor, mas está com dúvidas se eu deveria estar no programa. E... acho que também eu tenho dúvidas. Talvez isto tudo não tenha passado de um erro.”

Ryan apertou-lhe a mão e não falou.

Riley gostava que ele dissesse alguma coisa. Mas o que é que queria que ele dissesse?

O que é que esperava que ele dissesse?

A verdade era que Ryan nunca se mostrara entusiasmado com a entrada de Riley no programa. Talvez ficasse satisfeito por ela desistir – ou até ser expulsa.

Por fim Ryan disse, “Ouve, talvez este não seja o momento ideal para fazeres isto. Quero dizer, estás grávida, acabámos de nos mudar e eu estou a começar na Parsons and Rittenhouse. Talvez devesses esperar até...”

“Esperar até quando?” Perguntou Riley. “Até ser mãe e ter um filho para criar? Como é que isso vai funcionar?”

Ryan mostrou perplexidade ante o tom amargo de Riley. Até Riley ficou alarmada com o som da sua própria voz.

“Peço desculpa,” Disse ela. “Não queria dizê-lo daquela forma.”

Ryan disse tranquilamente, “Riley, tu vais ser uma mãe a criar uma criança. Nós vamos ser pais. É uma realidade com a qual temos que lidar, quer continues o treino este verão ou não.”

Agora Riley lutava para não chorar. O futuro parecia tão obscuro e misterioso.

Perguntou, “O que é que vou fazer se não estiver no programa? Não me posso limitar a ficar sentada no apartamento o dia todo.”

Ryan encolheu ligeiramente os ombros.

“Bem, sempre podes procurar um emprego, ajudar com as despesas. Talvez uma espécie de trabalho temporário – qualquer coisa que te permita desistir quando estiveres farta. Tens a vida toda à tua frente. Há muito tempo para chegares a uma conclusão quanto ao que queres realmente fazer. Mas daqui a pouco tempo eu posso suficientemente bem-sucedido para que não tenhas que trabalhar se não quiseres.”

Ambos ficaram em silêncio durante alguns momentos.

Então Riley disse, “Então pensas que devo desistir?”

“O que eu penso não importa,” Disse Ryan. “A decisão é tua. E decidas o que decidires, vou dar o meu melhor para te apoiar.”

Não falaram muito mais durante o resto do jantar. Quando terminaram, viram televisão. Riley não se conseguia concentrar no que estava a ver. Não parava de pensar no que o Agente Crivaro dissera...

“Tem que decidir se tem o que é necessário para continuar neste programa.”

Quanto mais Riley pensava naquilo, mais dúvidas e incertezas a assolava.

Afinal, ela tinha que pensar não só nela própria. Havia o Ryan, o bebé e até o Agente Crivaro.

Lembrou-se de outra coisa que o seu mentor dissera...

“Puxei muitos cordelinhos para a ter neste programa.”

E mantê-la no programa não ia tornar a vida de Crivaro mais fácil. O mais certo era ouvir críticas de colegas que consideravam que Riley não pertencia àquele lugar, sobretudo se ela não se apresentasse à altura das expetativas.

E era óbvio que ela não estivera à altura das expetativas naquele dia.

Entretanto, Ryan tomou banho e foi-se deitar. Riley ficou sentada no sofá a pensar nas suas escolhas.

Por fim, pegou em papel e caneta, e começou a redigir uma carta de demissão dirigida a Hoke Gilmer, o supervisor de treino. Ficou surpreendida por se sentir muito melhor à medida que ia escrevendo a carta. Quando a terminou, sentiu que tinha sido libertada de um fardo.

Esta é a opção certa, Pensou.

Calculou que se levantaria cedo na manhã seguinte, comunicaria a sua decisão a Ryan, digitaria a carta no computador, imprimi-la-ia e enviá-la-ia no correio da manhã. Também ligaria ao Agente Crivaro que certamente ficaria aliviado.

Por fim foi para a cama, sentindo-se muito melhor. Não teve qualquer dificuldade em adormecer.


Riley deu por si a caminhar na direção do edifício J. Edgar Hoover.

O que é que estou a fazer aqui? Interrogou-se.

Então reparou no papel na sua mão escrito com a sua letra.

Ah, sim, Compreendeu.

Vim entregar isto ao Agente Gilmer pessoalmente.

Desceu três andares pelo elevador e depois dirigiu-se ao auditório onde os estagiários se tinham reunido no dia anterior.

Para seu espanto, todos os estagiários estavam sentados no auditório a observá-la atentamente, O Agente Gilmer estava de pé a olhar para ela com os braços cruzados.

“O que é que quer, Sweeney?” Perguntou Gilmer, parecendo mais rígido do que no dia anterior quando se dirigira ao grupo.

Riley olhou para os estagiários que a fixavam em silêncio com expressões acusatórias.

Então ela disse a Gilmer, “Não vou roubar o seu tempo. Só preciso de lhe entregar isto.”

Entregou-lhe o papel por si escrito.

Gilmer colocou os óculos de leitura.

“O que é isto?” Perguntou ele.

Riley abriu a boca para dizer...

“É a minha carta de demissão do programa.”

Mas em vez disso, saíram outras palavras da sua boca...

“Eu, Riley Sweeney, juro solenemente que apoiarei e defenderei a Constituição dos Estados Unidos...”

Para sua surpresa, apercebeu-se...

Estou a recitar o juramento do FBI.

E não conseguia parar.

“... que serei leal...”

Gilmer apontou para o papel e perguntou novamente...

“O que é isto?”

Riley queria explicar de que se tratava, mas as palavras do juramento continuavam a jorrar...

“... assumo esta responsabilidade de livre vontade, sem qualquer reserva mental ou propósito de evasão...”

O rosto de Gilmer estava a transformar-se noutro rosto.

Era Jake Crivaro e parecia zangado. Agitou o papel à frente do seu rosto.

“O que é isto?” Perguntou.

Riley ficou surpreendida por ver que nada lá estava escrito afinal.

Ouviu todos os outros estagiários a murmurarem audivelmente, a reproduzirem o mesmo juramento mas numa mistura confusa de vozes.

Entretanto, chegava ao fim do juramento...

“... Cumprirei com zelo e fidelidade os deveres do cargo que assumirei. Que Deus me ajude.”

Crivaro agora parecia ainda mais aborrecido.

“Que raio é isto?” Perguntou ele, apontando para o papel vazio.

Riley tentou explicar-lhe, mas as palavras não saíam.


Riley abriu os olhos quando ouviu um som incomodativo.

Estava deitada na cama ao lado de Ryan.

Foi um sonho, Compreendeu.

Mas aquele sonho tinha um significado. Na verdade, significava tudo. Ela fizera um juramento e não o podia trair. Ela não se podia demitir do programa. Não era um problema legal. Era pessoal. Era uma questão de princípio.

Mas e se for expulsa?

O que faço então?

Entretanto, perguntou-se que som seria aquele que não parava de retinir nos seus ouvidos?

Ainda meio a dormir, Ryan disse...

“Atende o raio do teu telefone, Riley.”

Então Riley lembrou-se do telemóvel que lhe fora dado no dia anterior no edifício do FBI. Tateou na mesa de cabeceira até o encontrar, depois levantou-se da cama, saiu do quarto e fechou a porta atrás de si.

Demorou um momento para perceber qual o botão que deveria pressionar para atender a chamada. Quando finalmente conseguiu, ouviu uma voz familiar.

“Sweeney? Acordei-a?”

Era o Agente Crivaro, soando nada aigável.

“Não, é claro que não,” Disse Riley.

“Mentirosa. São cinco da manhã.”

Riley suspirou profundamente. Apercebeu-se que estava mal-disposta.

Crivaro disse, “Quanto tempo leva a acordar e vestir-se?”

Riley pensou por um momento, depois disse, “Hmm, acho que quinze minutos.”

“Estou aí daqui a dez minutos. Encontramo-nos fora do seu prédio.”

Crivaro terminou a chamada sem dizer mais nada.

O que é que ele quer? Interrogou-se Riley.

Vem cá para me despedir pessoalmente?

De repente, sentiu uma náusea apoderar-se de si. Sabia que era um enjoo matinal – o pior que experimentara até ali.

Soltou um grunhido e pensou...

Era mesmo disto que precisava agora.

E correu para a casa de banho.


CAPÍTULO SEIS


Quando Jake Crivaro parou em frente ao prédio de Riley, ela já estava à sua espera. Jake notou que ela estava bastante pálida ao entrar no carro.

“Não se sente bem?” Perguntou.

“Estou bem,” Disse Riley.

Não parece nada bem, Pensou Jake.

Jake pensou que fosse a consequência de alguma festa da noite anterior. Aqueles jovens estagiários manifestavam alguma tendência para aquele tipo de atividade. Ou talvez tivesse bebido demais em casa. Não havia dúvidas de que parecia desencorajada quando a deixara em casa no dia anterior – e não admirava, depois da descasca que ele lhe dera. Talvez tivesse tentado afogar as mágoas.

Jake esperava que a sua protegida não estivesse demasiado ressacada para reagir.

Assim que se afastaram do prédio, Riley perguntou...

“Para onde vamos?”

Jake hesitou por um instante.

Depois disse, “Ouça, hoje vamos começar do zero.”

Riley olhou para ele com uma expressão de vaga surpresa.

Ele prosseguiu, “A verdade é que o que fez ontem – bem, não foi um disparate absoluto. Encontrámos o dinheiro da droga dos irmãos Madison. E aquele telefone descartável revelou-se muito útil. Tinha alguns números importantes que tornaram possível a polícia abordar alguns membros do gang – incluindo Malik Madison, o irmão que ainda estava à solta. Foram estúpidos em comprar um telefone pré-pago e não se livrarem dele depois de o utilizarem. Mas calculo que não estivessem à espera que alguém o encontrasse.”

Jake olhou para Riley e acrescentou, “Estavam enganados.”

Riley continuou a olhar para ele como se não compreendesse o que ele estava a dizer.

Jake resistiu ao impulso de dizer...

“Peço desculpa por ter sido tão rígido.”

Em vez disso disse, “Mas tem que seguir as instruções. E tem que respeitar os procedimentos.”

“Eu compreendo,” Disse Riley. “Obrigada por me dar uma segunda oportunidade.”

Jake grunhiu algumas palavras impercetíveis. Sabia que não podia encorajar em demasia a miúda.

Mas sentia-se mal pela forma como a tratara no dia anterior.

Estou a exagerar, Pensou.

Ele aborrecera alguns colegas de Quantico ao abrir as portas para Riley entrar no programa. Um agente em particular, Toby Wolsky, queria que o sobrinho Jordan entrasse para o programa naquele verão, mas Jake encaixara Riley em vez dele. Empenhara as suas consideráveis credenciais para o conseguir e pedira alguns favores que lhe deviam.

Jake não tinha Wolsky em grande consideração enquanto agente e não tinha qualquer razão para pensar que o sobrinho tivesse potencial. Mas Wolsky tinha amigos em Quantico que agora estavam insatisfeitos com Jake.

De certa forma, Jake compreendia porquê.

Tanto quanto sabiam, Riley era apenas uma licenciada e psicologia que nunca pensara em integrar o FBI.

E a verdade era que Jake também não sabia muito mais a seu respeito – exceto que tinha visto os seus instintos em ação. Lembrava-se nitidamente de como Riley entrara tão facilmente nos pensamentos do assassino em Lanton apenas co uma pequena ajuda sua. À parte ele próprio, Jake raramente encontrara alguém com aquele tipo de instinto – perceções que poucos agentes sequer compreendiam.

É claro que ele não podia descartar a possibilidade de que o que ela fizera em Lanton fosse pouco mais do que um acaso.

Talvez naquele dia conseguisse ter uma ideia mais aproximada daquilo de que ela era capaz.

Riley perguntou novamente...

“Para onde vamos?”

“Para uma cena de crime,” Disse Jake.

Não lhe queria dizer mais nada até lá chegarem.

Queria observar como é que ela reagia a uma situação bastante bizarra.

E pelo que ouvira, esta cena de crime era do mais bizarro que podia haver. Fora chamado há pouco e ainda lhe custava acreditar no que lhe tinha sido relatado.

Vamos ver o que há para ver.


*


Riley começava a sentir-se melhor.

Ainda assim, gostava que ele lhe tivesse dito de que se tratava.

Uma cena de crime, Dissera ele.

Isso era muito mais do que desejava para o programa de verão – quanto mais logo no segundo dia. O dia anterior já tinha sido suficientemente inesperado.

Não sabia muito bem como reagir.

Mas tinha a certeza de que a ideia não agradaria a Ryan.

Ela apercebeu-se que ainda não tinha dito a Ryan que estava a observar Jake Crivaro. Ryan tabé não gostaria disso porque desconfiara de Crivaro desde o início, sobretudo pela forma como ajudara Riley a entrar na mente do assassino.

Lembrou-se o que Ryan dissera sobre um desses episódios...

“Estás-me a dizer que o tipo do FBI – Crivaro – entrou em jogos mentais contigo? Porquê? Só pelo divertimento?”

É claro que Riley sabia que Crivaro não o fizera só por “divertimento”.

Ele levara aquilo muito a sério. Aquelas experiências tinham sido absolutamente necessárias.

Tinham ajudado a apanhar o assassino.

Mas em que é que estou metida agora? Interrogou-se Riley.

Crivaro parecia estar a ser deliberadamente críptico.

Quando estacionou o carro com casas de um lado e um campo aberto do outro, Riley viu alguns carros de polícia e uma carrinha oficial estacionados nas imediações.

Antes de saírem do carro, Crivaro disse-lhe...

“Agora não se esqueça das regras. Não toque em nada. E não fale a não ser que lhe dirijam a palavra. Está aqui apenas para observar os outros a trabalhar.”

Riley anuiu. Mas algo na voz de Crivaro fê-la suspeitar que ele esperava algo mais dela do que apenas passividade.

Ela gostava de saber o que seria.

Riley e Crivaro saíram do carro e caminharam na direção do campo. Tinha imensos destroços espalhados como se ali tivesse decorrido algum grande acontecimento público.

Havia outras pessoas no local, algumas de uniforme, junto a um aglomerado de árvores e arbustos. Uma vasta área à sua volta estava circunscrita com fita amarela.

Quando Riley e Crivaro se aproximaram do grupo, ela apercebeu-se que os arbustos escondiam algo que se encontrava no chão.

Riley nem acreditou no que viu.

E novamente foi acometida por uma intensa náusea.

Deitado no chão estava um palhaço de circo morto.


CAPÍTULO SETE


Riley sentiu-se tão tonta que temeu desmaiar.

Conseguiu manter-se de pé, mas depois começou a ter a sensação de vómito tal como tivera no apartamento.

Isto não pode ser verdade, Pensou.

Isto tem que ser um pesadelo.

Os polícias e outras pessoas estavam à volta do corpo vestido com um fato de palhaço. O fato era inchado e colorido com grandes pompons no lugar de botões. Um par de sapatos enormes completava o traje.

O duro rosto branco tinha um sorriso bizarro pintado, um nariz vermelho, olhos e sobrancelhas exagerados. O rosto era emoldurado por uma grande peruca vermelha. Uma lona encontrava-se ao lado do corpo.

Ocorreu a Riley que o corpo seria de uma mulher.

Agora que começava a recuperar do choque inicial, reparou num cheiro evidente e desagradável no ar. Ao observar a área, duvidou que o odor viesse do corpo – ou pelo menos não a sua totalidade. Havia lixo espalhado por todo o lado. O sol da manhã fazia sobressair o cheiro de vários tipos de resíduos humanos.

Um homem com um casaco branco estava ajoelhado junto ao corpo, estudando-o cuidadosamente. Crivaro apresentou-o como sendo Victor Dahl, o médico-legista de DC.

Crivaro abanou a cabeça e disse a Dahl, “Isto ainda é mais estranho do que eu estava à espera.”

Levantando-se, Dahl disse, “Pois é, estranho. E é tal como a última vítima.”

Riley pensou...

A última vítima?

“Acabei de ser informado há pouco,” Disse Crivaro a Dahl e aos polícias. “Talvez possam colocar a minha estagiária a par do que se passa. Eu próprio não tenho conhecimento de todos os detalhes deste caso.”

Dahl olhou para Riley e hesitou durante um momento. Riley perguntou-se se pareceria tão agoniada como se sentia. Mas então o médico-legista começou a explicar.

“Na manhã de sábado, foi encontrado um corpo no beco atrás de um cinema. A vítima era uma jovem mulher chamada Margo Birch – e estava vestida e maquilhada de forma muito semelhante a esta vítima. A polícia calculou que se tratasse de um homicídio estranho, mas único. E foi quando este corpo apareceu a noite passada. Outra jovem mulher pintada e vestida desta fora.”

Então Riley percebeu. Não se tratava de um palhaço de verdade. Era uma mulher normal vestida de palhaço. Duas mulheres tinha sido vestidas e maquilhadas desta forma bizarra, e assassinadas.

Crivaro acrescentou, “E foi aí que se tornou num caso do FBI e nós fomos chamados.”

“Exatamente,” Disse Dahl, olhando à sua volta para os destroços espalhados pelo campo. “Decorreu uma festa de carnaval aqui durante alguns dias. Saiu no sábado. É daí que vem todo este lixo – o campo ainda não foi limpo. Ontem à noite, um homem da vizinhança veio para aqui com um detetor de metais à procura de moedas. Encontrou o corpo que estava coberto por aquela lona na altura.”

Riley virou-se e viu que Crivaro a observava com atenção.

Estaria apenas a certificar-se de que ela não faria nada de errado?

Ou estaria ele a monitorizar as suas reações?

Riley perguntou, “Esta mulher foi identificada?”

Um dos polícias disse, “Ainda não.”

Crivaro acrescentou, “Estamos concentrados numa participação de pessoa desaparecida em particular. Ontem de manhã, uma fotógrafa profissional chamada Janet Davis foi dada como desaparecida. Tinha estado a tirar fotografias no Parque Lady Bird Johnson na noite anterior. A polícia pensa que poderá ser ela. O Agente McCune está com o marido neste momento. Talvez nos consiga ajudar a identificá-la.”

Riley ouviu o som de veículos a parar. Olhou e viu que um par de carrinhas de estações de televisão tinha estacionado.

“Raios,” Disse um dos polícias. “Tínhamos conseguido esconder a questão das vestes de palhaço em relação ao outro crime. Será que a devemos cobrir?”

Crivaro soltou um grunhido de aborrecimento ao ver uma equipa de notícias a sair de uma das carrinhas com uma câmara. A equipa apressou-se na direção do campo.

“É demasiado tarde para isso,” Disse ele. “Eles já viram a vítima.”

Quando outros veículos dos meios de comunicação social se aproximaram, Crivaro e o médico-legista mobilizaram os polícias para tentarem manter os jornalistas o mais longe possível da fita amarela.

Entretanto, Riley olhou para a vítima e questionou-se...

Como é que ela morreu?

Não podia perguntar a ninguém naquele momento. Todos estavam ocupados a lidar com os jornalistas que faziam perguntas de forma ruidosa.

Riley inclinou-se cuidadosamente sobre o cadáver, ao mesmo tempo que repetia para si...

Não toques em nada.

Riley viu que os olhos e boca da vítima estavam abertos. Já vira antes aquela mesma expressão de medo.

Lembrava-se demasiado bem do aspeto das suas duas amigas mortas em Lanton. Acima de tudo, lembrava-se da imensa quantidade de sangue no chão dos quartos quando encontrara os corpos.

Mas ali não havia sangue.

Viu o que parecia serem pequenos cortes no rosto e pescoço da mulher, discerníveis debaixo da maquilhagem branca.

Qual o significado daqueles cortes? Não eram suficientemente amplos para terem sido fatais.

Também reparou que a maquilhagem estava aplicada de um modo atabalhoado e estranho.

Ela não se pintou a si própria, Pensou.

Não, outra pessoa o havia feito, talvez contra a vontade da vítima.

Então Riley sentiu uma estranha mudança na sua consciência – algo que não sentia desde aqueles dias terríveis em Lanton.

Arrepiou-se ao perceber o significado daquela sensação.

Estava a ter acesso à mente do assassino.

Ele vestiu-a assim, Pensou.

Provavelmente vestiu-lhe o fato depois de morta, mas ainda estava consciente quando lhe pintara o rosto. A julgar pelos seus olhos abertos, tivera consciência do que lhe estava a acontecer.

E ele gostara disso, Pensou. Ele gostara do seu terror ao pintá-la.

Riley agora também compreendia o porquê daqueles pequenos cortes.

Ele provocou-a com uma faca.

Ele atormentou-a – fê-la pensar na forma como a ia matar.

Riley ergueu-se. Sentiu outra vaga de náusea acompanhada de uma tontura e quase caiu, mas alguém a agarrou pelo braço.

Virou-se e viu que Jake Crivaro a impedira de cair.

Olhava diretamente para os seus olhos. Riley sabia que ele compreendia exatamente o que ela acabara de experimentar.

Numa voz rouca e horrorizada, Riley disse-lhe...

“Ele pregou-lhe um susto de morte. Ela morreu de medo.”

Riley ouviu Dahl soltar um som de surpresa.

“Quem lhe disse isso?” Perguntou Dahl, caminhando na direção de Riley.

Crivaro respondeu-lhe, “Ninguém lhe disse. É verdade?”

Dahl encolheu ligeiramente os ombros.

“Talvez. Ou pelo menos algo semelhante se for como a outra vítima. A corrente sanguínea de Margo Birch estava cheia de anfetaminas, uma dose fatal que fez com que o coração colapsasse. Aquela pobre mulher deve ter vivido momentos de terror mesmo até ao suspiro final. Teremos que fazer exames de toxicologia nesta nova vítima, mas...”

Suspendeu o que ia dizer e então perguntou a Riley, “Como é que soube?”

Riley não fazia ideia do que dizer.

Crivaro disse, “É o que ela faz. É por isso que está aqui.”

Riley estremeceu perante aquelas palavras.

Será que isto é algo em que quero ser boa? Perguntou a si própria.

Pensou se não deveria afinal ter mesmo entregue aquela carta de demissão.

Talvez não devesse estar ali.

Talvez não devesse participar daquilo.

Tinha a certeza de uma coisa – Ryan ficaria horrorizado se soubesse onde ela se encontrava naquele momento e o que estava a fazer.

Crivaro perguntou a Dahl, “Seria muito complicado o assassino ter acesso a esta anfetamina em específico?”

“Infelizmente,” Respondeu o médico-legista, “seria fácil comprá-la na rua.”

O telefone de Crivaro tocou. Olhou para o visor. “É o Agente McCune. Tenho que atender.”

Crivaro afastou-se para atender a chamada. Dahl continuou a olhar para Riley como se ela fosse alguma espécie de aberração.

Talvez tenha razão, Pensou.

Entretanto, Riley conseguia ouvir algumas das perguntas que os jornalistas colocavam.

“É verdade que o assassinato de Margo Birch foi igual a este?”

“Margo Birch estava vestida e pintada da mesma forma?”

“Porque é que o assassino veste as suas vítimas como palhaços?”

“Trata-se de um assassino em série?”

“Haverá mais crimes semelhantes?”

Riley lembrou-se do que um dos polícias acabara de dizer...

“Tínhamos conseguido esconder a questão das vestes de palhaço em relação ao outro crime.”

Era óbvio que os rumores já circulavam ainda assim. E agora não havia forma de esconder a verdade.

A polícia tentava dizer o mínimo possível em resposta às perguntas. Mas Riley recordava-se da agressividade dos jornalistas em Lanton. Ela compreendia porque é que Jake e a polícia não estavam satisfeitos com o aparecimento dos jornalistas. A publicidade não ia facilitar o seu trabalho.

Crivaro voltou para junto de Riley e Dahl ao mesmo tempo que guardava o telemóvel no bolso.

“O McCune acabou de falar com o marido da mulher que desapareceu. O pobre coitado está muito preocupado, mas disse ao McCune algo que pode ser útil. Ele disse que ela tem um sinal atrás da orelha direita.”

Dahl baixou-se e espreitou atrás da orelha da vítima.

“É ela,” Disse ele. “Como é que disse que ela se chamava?”

“Janet Davis,” Disse Crivaro.

Dahl abanou a cabeça. “Bem, pelo menos temos a identificação da vítima. Já a podemos retirar daqui. Gostava que não tivéssemos que lidar com o rigor mortis.”

Riley observou a equipa de Dahl a transportar o corpo para uma maca. Era um esforço desastrado. O corpo estava rígido como uma estátua e os membros estendidos em todas as direções, mostrando-se debaixo do lençol branco que os cobria.

Também estupefactos, os jornalistas olhavam fixamente para a maca que atravessava o campo na direção da carrinha do médico-legista com a sua grotesca carga.

Quando o corpo foi colocado na carrinha, Riley e Crivaro passaram pelos jornalistas e dirigiram-se ao seu veículo.

Quando Crivaro arrancou, Riley perguntou para onde iam de seguida.

“Para a sede,” Disse Crivaro. “O McCune disse-me que alguns polícias estavam a fazer buscas no Parque Lady Bird Johnson onde Janet Davis desapareceu. Encontraram a máquina dela. Deve tê-la deixado cair quando foi raptada. A máquina encontra-se agora na sede do FBI. Vamos ver o que é que o pessoal da tecnologia descobriu. Talvez tenhamos sorte e nos dê alguma pista.”

Aquela palavra ressoou de forma estranha a Riley...

“Sorte.”

Parecia uma palavra estranha de se usar quando se estava a falar de algo tão singularmente desafortunado como o assassinato de uma mulher.

Mas a intenção de Crivaro fora literal. Riley começou a pensar no quanto aquele trabalho o endurecera ao longo dos anos.

Estaria ele completamente imune ao horror?

Não conseguia perceber pelo seu to de voz enquanto prosseguia...

“E o marido de Janet Davis deixou o McCune ver as fotos que ela tirara nos últimos meses. O McCune encontrou algumas fotos que ela tirou numa loja de disfarces.”

Riley ficou interessada naquela dica.

Perguntou, “Quer dizer o tipo de loja que poderá vender fatos de palhaço?”

Crivaro anuiu. “Parece interessante, não é?”

“Mas o que é que significa?” Perguntou Riley.

Crivaro disse, “É difícil dizer para já – exceto que Janet Davis estava suficientemente interessada em disfarces para querer tirar fotos deles. O marido recorda-se dela falar sobre isso, mas não disse onde tirara as fotos. O McCune está neste momento a tentar localizar a loja onde as fotografias poderão ter sido tiradas. Ele depois liga-me. Não deve demorar muito tempo.”

Crivaro calou-se por um momento.

Depois olhou para Riley e perguntou, “Como é que se está a aguentar?”

“Bem,” Disse Riley.

“Tem a certeza?” Perguntou Crivaro. “Parece pálida, como se não se estivesse a sentir bem.”

É claro que era verdade. Uma combinação de enjoo matinal e o choque pelo que acabara de ver, tinham-na afetado. Mas a última coisa no mundo que queria dizer a Crivaro era que estava grávida.

“Estou bem,” Insistiu Riley.

Crivaro disse, “Presumo que teve alguma sensação relacionada com o assassino há bocado.”

Riley anuiu em silêncio.

“Devo saber mais alguma coisa – para além da possibilidade dele ter assustado a vítima terrivelmente?”

“Não muito,” Disse Riley. “Exceto que ele é...”

Hesitou, depois encontrou a palavra que procurava para o descrever. “Sádico.”

O silêncio instalou-se novamente e Riley deu por si a lembrar-se do espetáculo do corpo em cima da maca. O terror reapareceu ao pensar que a vítima sofrera tal humilhação e indignidade mesmo na morte.

Perguntou-se que tipo de monstro faria aquilo a alguém.

Por muito que ela tivesse sentido o assassino próximo, Riley sabia que não conseguiria compreender a forma doentia como a sua mente funcionava.

E tinha a certeza que não queria.

Mas seria aquilo que lhe estaria reservado antes do caso estar encerrado?

E depois?

É assim que vai ser a minha vida?


CAPÍTULO OITO


Quando Riley e Crivaro entrara no arejado e fresco Edifício J. Edgar Hoover, Riley ainda se sentia contaminada pelo que vira na cena do crime. Era como se o horror se tivesse infiltrado nos seus poros. Como é que se iria libertar daquilo – sobretudo do odor?

Durante a viagem até ali, Crivaro assegurara a Riley que o odor que encontrara no campo não era do cadáver. Tal como Riley adivinhara, era apenas do lixo deixado espalhado. O corpo de Janet Davis não estava sem vida há tempo suficiente para produzir aquele odor – nem os corpos das amigas assassinadas de Riley em Lanton.

Riley ainda não se deparara com o fedor de um cadáver em decomposição.

Crivaro dissera na viagem...

“Saberá de que se trata quando sentir o odor.”

Não era algo que Riley antecipasse com entusiasmo.

Mais uma vez interrogou-se...

O que é que eu estou aqui a fazer?

Ela e Crivaro entraram no elevador e saíram num piso ocupado por dezenas de laboratórios forenses. Ela seguiu Crivaro por um corredor até chegarem a uma sala com um sinal que dizia “SALAESCURA”. Um jovem de cabelo comprido e magro estava inclinado junto à porta.

Crivaro apresentou-os ao homem que acenou e disse, “Eu sou Charlie Barrett, técnico forense. Chegaram mesmo a tempo. Fiz uma pausa depois de processar os negativos da máquina que encontraram no Parque Lady Bird Johnson. Estava agora a voltar para fazer algumas impressões. Entrem.”

Charlie levou Riley e Crivaro até um pequeno corredor banhado numa luz difusa. Depois passaram por uma segunda porta até uma sala mergulhada na mesma luz estranha.

A primeira coisa em que Riley reparou foi no cheiro acre e intenso a químicos.

Curiosamente, ela não considerou o cheiro completamente desagradável.

E vez disso, parecia quase...

Purificante, Considerou Riley.

Pela primeira vez desde que deixara o campo onde encontraram o corpo, aquele fedor azedo a lixo desapareceu.

Até o horror se desvaneceu um pouco e a náusea de Riley desapareceu.

Era um verdadeiro alívio.

Riley observou com fascínio todo aquele equipamento elaborado por entre a luz difusa e estranha.

Charlie segurou numa folha de papel com filas de imagens e examinou-a na luz.

“Aqui estão as provas,” Disse ele. “Parece que ela era uma grande fotógrafa. Foi uma pena o que lhe aconteceu.”

Quando Charlie pousou pedaços de filme na mesa, Riley percebeu que nunca antes estivera numa sala escura. Sempre levara os seus rolos a uma loja de fotografia para serem revelados. Ryan e alguns dos seus amigos tinham comprado máquinas digitais há pouco tempo, e não precisavam de rolo.

O marido de Janet Davis dissera a McCune que a sua mulher usava os dois tipos de máquina. Tendia a usar uma máquina digital para o seu trabalho, mas considerava as fotos que tirava no parque arte e para isso preferia máquinas de rolo.

Riley pensou que Charlie também parecia ser um artista, um verdadeiro mestre no que fazia. Isso fê-la pensar...

Isto é uma arte em vias de extinção?

Será que este trabalho de precisão com rolos, papel, instrumentos, termómetros, temporizadores, válvulas e químicos, um dia seguiria o mesmo caminho da ferraria?

Se fosse esse o caso, era triste.

Charlie começou a imprimir uma a uma – primeiro aumentando o negativo para um pedaço de papel de fotografia, depois lentamente ensopando o papel numa bacia de líquido, seguido de mais mergulhos a que Charlie dava o nome de “banho de paragem” e “banho de reparação”. Depois vinha o enxaguamento num lavatório de alumínio debaixo de água corrente. Por fim, Charlie pendurou as fotos com clips numa bancada rotativa.

Era um processo lento e silencioso. O silêncio foi apenas quebrado pelos sons de líquido, pelo som de pés em movimento e algumas palavras trocadas em sussurros quase reverenciais. Não parecia certo falar alto naquele local.

Aquela quietude e lentidão era calmante para Riley, sobretudo depois da ruidosa desordem na cena do crime quando a polícia se debatia para manter os jornalistas à distância.

Riley observou arrebatadamente as imagens a revelarem-se sozinhas ao longo de vários minutos – fantasmagóricas e indistintas de início, por fim nítidas.

As fotografias a preto e branco captava uma tarde tranquila e pacífica no parque. Uma delas mostrava uma pequena ponte de madeira sobre uma estreita passagem de água. Outra parecia ser de um bando de gaivotas a levantar voo, mas quando a imagem se tornou mais nítida, Riley percebeu que os pássaros faziam parte de uma grande estátua.

Outra foto mostrava um obelisco de pedra com o Monumento Washington encimando à distância. Outras imagens eram de caminhos para andar de bicicleta e caminhar que passavam por áreas arborizadas.

As fotos tinha sido claramente tiradas quando o por do sol já se aproximava, criando leves sombras cinzentas, auréolas brilhantes e silhuetas. Riley percebeu que Charlie tinha razão ao dizer que Janet Davis fora “uma grande fotógrafa”.

Riley também teve a sensação de que Janet conhecia bem o parque e escolhera os locais com antecedência – e também o momento do dia, quando os passeantes eram em menor número. Riley não via uma única pessoa em qualquer foto. Era como se Janet tivesse o parque só por sua conta.

Finalmente, surgiram fotos de uma marina, das docas e barcos e água a brilhar enquanto o sol se punha. A calma da cena era verdadeiramente tangível. Riley quase conseguia ouvir o delicado ruído da água e o grasnar dos pássaros, quase conseguia sentir a carícia de ar fresco no seu rosto.

Então, por fim, apareceu uma imagem dissonante.

Também era da marina – ou pelo menos Riley pensou que seria graças às sombras dos barcos e docas. Mas tudo estava desfocado e caótico e emaranhado.

Riley percebeu o que deveria ter acontecido no momento em que aquela fotografia fora tirada...

A máquina foi-lhe arrancada das mãos.

O coração de Riley começou a bater descompassadamente.

Ela sabia que a imagem tinha captado o preciso instante em que o mundo de Janet Davis mudara para sempre.

Numa fração de segundo, a tranquilidade e a beleza tinham-se convertido em fealdade e terror.


CAPÍTULO NOVE


Ao olhar para a imagem desfocada, Riley interrogou-se...

O que é que aconteceu a seguir?

Depois de a máquina ter sido arrancada das mãos da mulher, o que é que lhe aconteceu?

O que é ela experimentou?

Terá lutado contra o agressor até ele ter conseguido subjugá-la e atá-la?

Manteve-se consciente durante toda a situação? Ou já estava inconsciente quando a foto foi tirada?

Será que depois acordou para o horror dos seus momentos finais?

Talvez não tenha importância, Pensou Riley.

Lembrou-se o que o médico-legista dissera acerca da probabilidade de Janet ter morrido de uma overdose de anfetaminas.

Se isso fosse verdade, ela teria ficado tremendamente assustada.

E agora Riley observava o momento parado no tempo em que aquele terror fatal tinha começado.

Estremeceu perante aquele pensamento.

Crivaro apontou para a foto e disse a Charlie, “Aumenta tudo. Não só esta, todas as fotos, cada centímetro quadrado.”

Charlie coçou a cabeça e perguntou, “Estamos à procura de quê?”

“Pessoas,” Disse Crivaro. “Qualquer pessoa que encontres. Janet Davis parecia pensar estar sozinha, mas estava enganada. Alguém estava à espreita à espera. Talvez – apenas talvez – o tenha apanhado numa foto sem se aperceber. Se encontrar alguém, queremos uma imagem o mais nítida possível dessa pessoa.”

Apesar de não o dizer em voz alta, Riley estava cética.

Será que Charlie encontrará alguém?

Ela tinha um pressentimento acerca do assassino – de que ele era demasiado sorrateiro para se deixar fotografar acidentalmente. Ela duvidava que sequer uma busca microscópica das fotos revelasse qualquer traço dele.

Naquele momento, o telefone de Crivaro tocou. Disse, “Tem que ser o McCune.”

Riley e Crivaro saíram da sala escura, e Crivaro afastou-se para atender a chamada. Parecia estar entusiasmado pelo que quer que McCune lhe estava a dizer. Quando terminou a chamada, disse a Riley...

“O McCune localizou a loja de disfarces onde Janet Davis tirou algumas fotos. Estava a caminho e diz que nos encontramos lá. Vamos embora.”


*

Quando Crivaro parou na loja Costume Romp, o Agente McCune já lá se encontrava à espera no seu próprio veículo. Saiu e juntou-se a Riley e Crivaro quando se aproximaram da loja. A princípio pareceu a Riley uma modesta loja de rua. As janelas das montras estavam repletas de disfarces, é claro – desde um vampiro e uma múmia, até fatos que sugeriam séculos passados. Também havia um fato de Tio Sam para o Quatro de Julho que se aproximava.

Quando Riley seguiu Crivaro e McCune ao interior, ficou alarmada com a amplidão do interior, preenchido com prateleiras carregadas do que pareciam ser centenas de disfarces, máscaras e perucas.

Riley ficou sem fôlego com tudo o que a rodeava. Os disfarces incluíam piratas, monstros, soldados, príncipes e princesas, animais selvagens e domésticos, extraterrestres e muitas mais personagens que se possa imaginar.

Riley ficou confusa. Afinal, o Halloween só acontecia uma vez por ano. Haveria realmente mercado durante todo o ano para aqueles disfarces? Em caso afirmativo, para que é que as pessoas precisavam deles?

Calculo que se devam realizar muitas festas do género.

Ocorreu-lhe que não deveria estar surpreendida, tendo em consideração os horrores de que começava a ter conhecimento agora. Num mundo onde aconteciam coisas tão horríveis, não era de admirar que as pessoas quisessem fugir para mundos de fantasia.

Também não era surpreendente que uma fotógrafa talentosa como Janet Davis gostasse de tirar fotos naquele local, no meio de uma tão rica gama de imagens. Não havia dúvida de que ali utilizava rolo e não uma máquina digital.

As máscaras e disfarces e monstros lembravam Riley de um programa de televisão a que assistira nos últimos anos – a história de uma adolescente que combatia e matava vampiros e outros tipos de demónios.

Contudo, nos últimos tempos achara o programa menos apelativo.

Depois de ter conhecimento da sua capacidade de entrar na mente dos assassinos, a saga de uma rapariga com super poderes e super obrigações começou a parecer-lhe demasiado familiar e desconfortável.

Riley, Crivaro e McCune olharam à sua volta mas não viram ninguém.

McCune chamou, “Olá... está aqui alguém?”

Um homem surgiu por trás de uma das prateleiras.

“Posso ajudar-vos?” Perguntou.

O homem tinha uma figura impressionante. Era alto e extremamente magro, usava uma T-shirt de manga comprida com a impressão de um smoking. Também usava óculos à “Groucho” – daqueles com um enorme nariz branco, óculos de armação preta e sobrancelhas abundantes e um bigode.

Obviamente apanhado algo desprevenido, Crivaro e McCune mostraram os seus distintivos e apresentaram-se.

Parecendo nada surpreendido por receber a visita do FBI, o homem apresentou-se como sendo Danny Casal, o dono da loja.

“Tratem-me por Danny,” Disse ele.

Riley deu por si a esperar que ele tirasse aqueles óculos. Mas ao olhar mais atentamente para ele percebeu...

São óculos graduados.

As lentes eram muito grossas. Danny Casal usava sempre aqueles óculos e certamente que sem eles era completamente míope.

McCune abriu uma pasta.

“Temos fotos de duas mulheres,” Disse ele. “Precisamos de saber se alguma vez as viu.”

As sobrancelhas, nariz e bigode falsos sacudiram-se quando Danny anuiu. Pareceu a Riley um homem peculiarmente sério para estar a usar tal traje.

McCune mostrou uma foto e segurou-a para que o dono da loja a visse.

Danny olhou para a foto através dos seus óculos.

Disse, “Não é uma cliente habitual. Não posso garantir que nunca tenha estado na loja, mas não a reconheço.”

“Tem a certeza?” Perguntou McCune.

“Absoluta.”

“O nome Margo Birch diz-lhe alguma coisa?”

“Uh, talvez das notícias. Não tenho a certeza.”

McCune mostrou outra foto. “E esta mulher? Cremos que veio à sua loja tirar fotografias.”

Também Riley observou a fotografia atentamente. Aquela devia ser Janet Davis. Era a primeira vez que via o seu rosto vivo e sem pinturas – sorridente, alegre e inconsciente do terrível destino que a esperava.

“Ah, sim,” Disse Casal. “Ela esteve cá não há muito tempo. Janet qualquer coisa.”

“Davis,” Disse Crivaro.”

“Exatamente,” Disse Casal com um aceno de cabeça. “Uma senhora simpática com uma bela máquina – eu próprio sou apreciador de fotografia. Ela ofereceu-se para pagar para tirar as fotos, mas eu não aceitei. Fiquei lisonjeado por ela considerar a minha loja digna da sua máquina.”

Casal inclinou a cabeça e olhou para os visitantes.

“Mas suponho que não têm boas notícias para me dar sobre ela,” Disse ele. “Ela tem algum problema?”

Crivaro disse, “Receio que tenha sido assassinada. Ambas estas mulheres foram assassinadas.”

“A sério?” Perguntou Casal. “Quano?”

“Margo Birch foi encontrada morta há cinco dias. Janet Davis foi assassinada anteontem.”

“Oh,” Disse Casal. “Lamento saber.”

Riley mal notou qualquer alteração no seu tom de voz ou expressão facial.

McCune mudou de tática. Perguntou, “Vende fatos de palhaço aqui?”

“Claro,” Disse Casal. “Porque é que pergunta?”

McCune tirou outra foto da capa abruptamente. Riley mal conseguia acreditar no que via.

Mostrava outra mulher morta vestida com um fato de palhaço. Estava num chão de cimento junto a um caixote do lixo. O fato era semelhante ao que Janet Davis, a vítima encontrada no parque naquela manhã, usava – tecido macio com grandes botões em forma de pompom. Mas as cores e os padrões eram ligeiramente diferentes, e a maquilhagem também.

Margo Birch, Percebeu Riley. A forma como ela foi encontrada.

McCune perguntou a Casal, “Vende fatos como este?”

Riley reparou que Crivaro olhava McCune com desconfiança. Era óbvio que McCune estava a testar a resposta de Casal à foto, as Crivaro parecia não estar de acordo com a sua abordagem ousada.

Mas tal como McCune, Riley tinha curiosidade em ver como é que o homem ia reagir.

Casal virou-se e olhou para Riley. Ela simplesmente não conseguia ler a sua expressão. Para além das sobrancelhas e bigode, agora também via como as lentes eram grossas. Apesar de estar a olhar diretamente para ela, não dava essa sensação. Recolhidos atrás das lentes, os seus olhos pareciam estar direcionados para outro lugar.~É como se usasse uma máscara, Pensou Riley.

“Esta é a senhora Davis?” Perguntou Casal a Riley.

Riley abanou a cabeça e disse, “Não. Mas o corpo de Janet Davis foi encontrado em condições semelhantes esta manhã.”

Sem qualquer alteração no seu tom de voz, Casal disse a McCune...

“Em resposta à sua pergunta – sim, vendemos esse tipo de fato.”

Conduziu as visitas até uma longa prateleira repleta de fatos de palhaço. Riley ficou espantada com a variedade.

Ao colocar-se junto aos fatos, Casal disse, “Como podem ver há vários tipos de fatos de palhaço. Por exemplo, temos aqui o vagabundo com chapéu e sapatos gastos, maquilhagem suja de fuligem, uma expressão triste e uma pera pintada. O equivalente feminino é frequentemente uma sem-abrigo.”

Dirigiu-se para um grupo de fatos mais heterogéneos.

“De alguma forma relacionado com o vagabundo está o ‘Auguste’, um tipo tradicional europeu, mais um vigarista do que um vagabundo, um inferior. Usa u nariz vermelho, roupa desencontrada e alterna entre a falta de jeito e a astúcia.”

Depois começou a mexer em alguns fatos que pareciam ser sobretudo brancos, alguns decorados e com enfeites coloridos.

Ele disse, “E aqui temos o rosto branco tradicional europeu, o Pierrot – composto, gracioso, inteligente, sempre no controlo. A sua maquilhagem é simples – completamente branca com feições regulares pintadas a vermelho ou preto, como um mimo, e geralmente usa um chapéu em forma de cone. É uma figura autoritária, geralmente o patrão de Auguste – e não um patrão muito simpático. Não admira já que muitas das piadas de Auguste são à sua custa.”

Passou por dezenas de fatos diferentes a dizer...

“Aqui temos imensas personagens de palhaços diferentes, baseados em tipos familiares à vida quotidiana – polícias, criadas, mordomos, médicos, bombeiros, esse tipo de coisa. Mas aqui está o tipo que procuram.”

Mostrou aos visitantes uma fila de fatos coloridos que lembravam a Riley as vítimas da foto e do campo.

“Este é o ‘rosto branca grotesco’” Disse ele.

Aquela palavra chamou a atenção de Riley.

Grotesco.

Sim, não havia dúvida de que descrevia o que fora feito ao corpo de Janet Davis.

Tocando nos fatos, Casal prosseguiu, “Este é o tipo de palhaço mais comum, pelo menos aqui na América. Não reflete nenhum tipo particular ou profissão ou estatuto. O rosto branco grotesco tem um aspeto de palhaço normal, ridículo e tolo. Pensem no Palhaço Bozo ou Ronald McDonald – ou na ‘Coisa’ de Stephen King, para citar um exemplo mais assustador. O grotesco usa um fato colorido, sapatos gigantes e maquilhagem branca com traços exagerados, incluindo uma grande peruca e um nariz vermelho luzidio.”

Crivaro parecia estar genuinamente interessado no que Casal estava a dizer.

Perguntou, “Vendeu algum destes fatos de tipo grotesco ultimamente?”

Casal pensou durante alguns instantes.

“Não que me recorde – pelo menos não nos últimos meses,” Disse ele. “Podia ver nos recibos, mas isso pode demorar algum tempo.”

Crivaro entregou-lhe o seu cartão do FBI e disse, “Agradecia que o fizesse e entrasse em contacto comigo.”

“Farei isso,” Disse Casal. “Mas lembre-se, o fato grotesco é extremamente comum. Pode ter sido comprado em qualquer loja de disfarces da cidade.”

McCune sorriu ligeiramente e disse, “Pois, mas esta não é uma loja de disfarces qualquer. Uma das vítimas esteve aqui há pouco tempo a tirar fotografias.”

Com uma expressão inescrutável, Casal pôs as mãos nos bolsos e disse, “Sim, compreendo porque é que isso é importante para vocês.”

Casal fixou o vazio por um momento como se mergulhado nos seus pensamentos.

Depois todo o seu corpo pareceu despertar.

“Oh, meu Deus,” Disse ele, finalmente soando inquieto. “Lembrei-me de uma coisa que é melhor saberem.”


CAPÍTULO DEZ


Riley ficou entusiasmada quando ela e os dois agentes do FBI seguiram Casal que se afastava da prateleira de fatos.

Vamos ter uma pista? Interrogou-se.

Sem revelar aquilo de que acabara de se lembrar, o dono da loja dirigira-se para a frente da loja.

Quando chegou ao balcão, Casal parou e começou a explicar.

“Janet Davis voltou cá noutro dia para tirar mais fotos. Mas foi-se embora abruptamente – e não estava nada satisfeita.”

Riley, Crivaro e McCune trocaram olhares.

“Porque não?” Perguntou Crivaro.

Casal abriu um armário e começou a remexer o seu conteúdo.

“Bem, ela queixou-se de um jovem que trabalhava cá na altura – chamava-se Gregory Wertz. Aparentemente dissera-lhe algo impróprio. Ela não especificou, mas ficou bastante aborrecida e não era a primeira vez que uma cliente se queixava dele. Também já suspeitava há algum tempo que ele andava a roubar por isso despedi-o.”

Crivaro perguntou, “Pode dar-nos a sua morada?”

“Claro,” Disse Casal, pegando num pedaço de papel de uma gaveta e entregando-o a Crivaro. “Aqui tem – o seu nome, número de segurança social, número de telefone e morada. E também a data do último dia que aqui trabalhou – há exatamente duas semanas.”

Crivaro agradeceu-lhe pela cooperação e Riley seguiu os dois agentes para o exterior da loja.

Ficou espantada ao ver Crivaro agarrar McCune pelo ombro mal puseram um pé fora da loja.

“O que é que pensa que estava a fazer?” Perguntou, zangado.

McCune parecia surpreendido.

“Por lhe ter mostrado aquela foto? Queria ver a reação dele.”

“Foi uma manobra,” Disse Crivaro. “Eu não gosto de manobras.”

O rosto de McCune enrubesceu de raiva.

“Uma manobra, huh?” Disse ele. “Está a dizer-me que confia naquele Casal? A mim pareceu-me bastante suspeito. Na verdade, era assustadora a forma como falava e tudo o mais. Nem foi possível ver-lhe o rosto como deve der.”

Isso é verdade, Pensou Riley.

Mas não lhe ocorrera suspeitar de Casal.

Crivaro caminhava de um lado para o outro, falando rispidamente com McCune.

“Então resolveu apertá-lo, huh? Decidiu obter uma confissão instantânea. Calculou que obteria imensa glória se fosse bem-sucedido. Bem, deixe-me esclarecer-lhe uma coisa. Casal não é o nosso assassino.”

“Como é que sabe?” Perguntou McCune.

Crivaro revirou os olhos e disse, “Não olhou bem para ele? É cego que nem um morcego sem aqueles óculos e é magricela como um carril. O nosso assassino raptou duas mulheres – pelo menos uma delas com uso provável de força. Depois subjugou-as. Consegue imaginar Casal a fazer uma coisa dessas?”

Parecendo tão envergonhado quanto zangado agora, McCune começou, “Talvez tenha um cúmplice...”

Crivaro interrompeu, “Não houve cúmplice. O meu instinto diz-me que o nosso assassino age sozinho. E de certeza que não é Danny Casal. No entanto, talvez seja uma testemunha importante. Temos sorte que não o tenha assustado a ponto de não cooperar connosco.”

McCune ficou sem reação.

Crivaro apontou-lhe o dedo.

“Agora ouça-me bem. Chega de manobras, não quando está a trabalhar comigo. Se tiver alguma ideia, fale antes comigo. Não estamos nos escuteiros. A iniciativa não é propriamente uma virtude neste momento. Ou é como eu digo ou bem pode sair do caso.”

Num sussurro, McCune disse, “Tudo bem. Não volta a acontecer.”

“Espero bem que não,” Atirou Crivaro.

Os três ficaram em silêncio.

Riley sentiu-se desconfortável – e com pena de McCune.

Lembrou-se do que McCune lhe dissera sobre Crivaro quando se tinha conhecido...

“Ele tem a reputação de ser brusco.”

Brusco é a palavra certa, Pensou Riley.

Ela ficara com uma boa ideia da sua brusquidão no dia anterior quando ela metera a pata na poça. No seu encontro em Lanton, Riley não o considerara tão irritadiço. É claro que ela agora também se apercebera que Crivaro tinha uma razão para agir assim com ela...

“Puxei muitos cordelinhos para que entrasse neste programa,” Dissera ele.

Mas não estava à espera que tivesse aquela reação com um agente do FBI creditado como McCune.

Questionou-se novamente como seria ter Crivaro como mentor. Será que teria a constante sensação de estar a pisar terreno sensível?

Entretanto, Crivaro calara-se e olhava para a folha de papel que Casal lhe entregara.

Por fim disse...

“Este Gregory Wertz parece interessante – sobretudo porque algo de desagradável terá ocorrido entre ele e Janet Davis, não muito tempo antes dos crimes. Não temos o suficiente para obter um mandado de detenção, mas não é má ideia fazer-lhe uma visita.”

Depois olhou para McCune e Riley, e acrescentou...

“Mas não quero artifícios de nenhum de vocês. Sigam as minhas ordens – nada mais, nada menos. Ouviram-me?”

Riley anuiu e McCune também.

Então Crivaro deu a morada de Gregory Wertz a McCune que se dirigiu ao seu carro enquanto Riley e Crivaro regressaram ao seu.

Passaram por outro bairro, muito parecido com aquele em que tinha estado no dia anterior, degradado e com graffitis por todo o lado. Mas havia mais gente nas ruas, incluindo miúdos em skates. Era provável que os gangs e a droga também ali fossem um problema, mas ainda não tinham escorraçado as pessoas da rua – pelo menos ainda não.

Riley pensou se talvez a espécie de “mini esquadra” que McCune dissera que se instalaria no outro bairro, também não seria uma ideia a implementar naquele. Era uma pena que ninguém considerasse essa possibilidade até ser tarde demais.

Crivaro estacionou o carro e McCune parou logo atrás deles.

Crivaro virou-se para Riley. “Espere aqui.”

Quando os agentes saíram dos carros, ficaram a conversar sobre o que fazer de seguida.

Riley mal conseguia acreditar no que Crivaro acabara de dizer e fazer...

Ele está a deixar-me completamente de fora.

Como é que ela podia aprender daquela forma?

E porque é que Crivaro tomara aquela decisão?

Ainda naquela manhã parecia estar tudo bem entre eles. Crivaro até lhe assegurara que o que fizera no dia anterior não tinha sido um desastre completo. Na verdade, dissera-lhe que tornara possível apanhar mais membros do gang.

Então o que é que mudara?

Talvez nada, Pensou.

Talvez estivesse simplesmente preocupado com a sua segurança. Se fosse esse o caso, talvez ela devesse estar grata por ele a manter fora de perigo.

Ao mesmo tempo, não conseguia evitar pensar...

Ainda estará zangado comigo por causa daquilo de ontem?


*


Ao caminhar com Crivaro na direção do prédio, o Agente Especial McCune ainda se sentia ressentido do que lhe fora dito há pouco. Ainda não percebia porque é que Crivaro reagira daquela forma. E continuava a pensar que não tinha agido incorretamente ao colocar alguma pressão em cima daquele Danny Casal.

Que mal é que fez? Interrogou-se. Casal ainda veiculara algumas informações – se não estivesse a mentir. McCune não confiava naquele tipo.

E não gostava nada de ser humilhado daquela forma – sobretudo à frente de uma estagiária como era o caso de Riley Sweeney.

Tal como muitos outros no FBI, McCune pensava...

O que é que o Crivaro vê nela afinal?

Ouvira todas as histórias sobre como ela ajudara a apanhar aquele assassino em série em Lanton. Dizia-se que Crivaro a via como uma espécie de prodígio. Não havia dúvida de que fizera de tudo para a integrar no programa e aborrecera algumas pessoas ao fazê-lo.

Também corriam alguns rumores de que Crivaro se sentia atraído por ela.

McCune sorriu ao pensar nisso. Não vira nada que indicasse isso entre Riley e Crivaro. Para começar, Crivaro tivera o bom senso de a deixar no carro enquanto eles iam averiguar a presença de um possível suspeito. Para além disso, Crivaro tinha uma imaculada reputação de integridade e não parecia o tipo de homem que se deixasse distrair em termos profissionais por uma mulher atraente.

Não que o censure.

Logo que a vira, McCune notara que era atraente. Ficaria interessado nela se não tivesse reparado que usava um anel de noivado.

É claro que o podia estar a usar apenas para manter os homens à distância.

De qualquer das formas, lembrou-se...

Riley Sweeney está fora de questão.

Ao subirem as escadas até à porta de vidro do prédio, McCune concentrou-se novamente no que os levara até ali. O suspeito que esperavam interrogar podia ou não ser perigoso.

Crivaro olhou para a lista de nomes até encontrar o nome e apartamento corretos. Depois carregou na campainha.

Quando alguém respondeu pelo intercomunicador, Crivaro perguntou, “Estou a falar com Gregory Wertz?”

“Quem pergunta?” Questionou o homem.

Crivaro trocou um olhar com McCune.

Depois disse, “Somos os Agentes Especiais McCune e Crivaro do FBI. Gostaríamos de lhe fazer algumas perguntas.”

Seguiu-se um silêncio.

“De que é que se trata?” Perguntou a voz do outro lado.

Crivaro disse, “Gostávamos de lho poder comunicar pessoalmente.”

McCune ouviu um suspiro de desagrado e depois...

“Ok, subam.”

A porta abriu-se, e McCune e Crivaro entraram no prédio. A entrada tinha mau aspeto e um cheiro azedo a mofo e bolor pairava no ar. Subiram as escadas até ao primeiro andar onde encontraram o apartamento de Wertz.

Crivaro bateu à porta.

Ouviu-se uma voz, “Entrem.”

McCune olhou para Crivaro e apontou com a cabeça inquisitivamente para a sua arma embainhada.

Crivaro abanou a cabeça e sussurrou, “Esteja alerta”.

Crivaro rodou a maçaneta e deparou-se com um apartamento sujo e caótico. De pé a olhar para eles estava um homem musculado Afro-Americano com rastas. Usava uma T-shirt, calças de ganga e ténis, e tinha as mãos nos bolsos.

Nada na sua linguagem corporal sugeria qualquer perigo. O homem parecia apenas estar a tentar fazer com que os visitantes não se sentissem bem-vindos.

Está a consegui-lo, Pensou McCune.

Mas McCune pressentiu que Crivaro ficara abruptamente tenso, como se em alerta.

McCune questionou-se...

Será que Crivaro sabe alguma coisa que eu não sei?

Gregory Wertz disse, “O que é que querem?”

Crivaro disse, “Gostaríamos de saber o que fez na noite de domingo e durante todo o dia de segunda-feira.”

Wertz sorriu.

“Não me lembro,” Respondeu.

Crivaro acrescentou, “E na sexta-feira e no sábado?”

Wertz riu-se baixinho e olhou à volta do apartamento.

Disse num tom sarcástico, “Como podem ver, sou um homem muito ocupado, por isso não vos sei dizer. Terão de perguntar à minha assistente pessoal. Hoje está de folga. Talvez deva voltar quando ela cá estiver. Só não tenho é a certeza de quando será.”

McCune lembrou-se de meia dúzia de perguntas que queria fazer, mas recordava-se do que Crivaro dissera.

“Siga as minhas ordens – nada mais, nada menos.”

McCune calculou que deveria dar a iniciativa a Crivaro.

Crivaro disse, “Sabemos que trabalhou recentemente para Danny Casal numa loja chamada Costume Romp.”

O sorriso de Wertz alargou-se.

“Pois. Não resultou lá muito bem.”

“O que é que aconteceu?” Perguntou Crivaro.

“Despedi-me. O Danny era um cretino paranoico. Não parava de me acusar de coisas que eu não fazia.”

McCune pensou se o homem não estaria a dizer a verdade.

Se assim fosse, teria Danny Casal os encaminhado para um beco sem saída?

Wertz disse, “Presumo que falaram com Danny sobre mim. Que raio é que ele disse, esse mentiroso filho da mãe?”

McCune percebeu que Crivaro agora fixava Wertz.

Em vez de responder à sua pergunta, Crivaro disse...

“O nome Margo Birch diz-lhe alguma coisa?”

Wertz encolheu os ombros.

“Não me parece.”

“E Janet Davis?” Perguntou Crivaro.

“Não creio que conheça essa senhora. Porque é que pergunta?”

McCune reparou numa mudança em Wertz. Parecia estar cada vez mais ansioso e nervoso perante o olhar penetrante de Crivaro.

Crivaro deu um passo na sua direção.

“Tem aqui um belo apartamento. Talvez queira que nos sentemos, que estejamos à vontade.”

“Não me parece,” Disse Wertz.

“Porque não?”

“Têm um mandado?” Perguntou Wertz.

Crivaro soltou um suspiro de incompreensão.

“Porque é que deveríamos ter um? Isto é apenas uma visita amigável.”

Wertz ficou a olhar para ele de dentes cerrados. Ainda tinha as mãos nos bolsos.

Crivaro disse, “Porque é que está a perguntar por um mandado? Não me recordo de dizer que estamos aqui à procura de alguma coisa. Lembra-se de dizer alguma coisa do género, McCune?”

McCune abanou a cabeça em silêncio.

Crivaro deu mais um pequeno passo na sua direção.

“Está a esconder alguma coisa Sr. Wertz?” Perguntou. “Devemos ir buscar um mandado?”

Wertz deu um passo atrás.

“Não se aproxime mais,” Disse ele.

“Porque não?” Perguntou Crivaro, dando outro passo. “Não estou à procura de sarilhos.”

Wertz tirou as mãos dos bolsos. Depois fez um gesto com a mão direita.

Num milésimo de segundo, Crivaro sacou a sua arma e apontou-a a Wertz.

Sem qualquer alteração no seu tom de voz, Crivaro disse...

“Podemos fazer isto da forma fácil ou da forma difícil, Sr. Wertz.”


CAPÍTULO ONZE


McCune boquiaberto sem saber o que fazer.

Que raio pensa o Crivaro estar a fazer? Interrogou-se.

Crivaro segurava a sua arma com firmeza. Estava apontada a Wertz que parecia vacilar indecisivamente por um momento.

McCune não vira o homem a ter nenhum gesto ameaçador. Esperava que Crivaro não começasse a disparar sem motivo.

Então Wertz ergueu as mãos lentamente.

Crivaro disse bruscamente, “Ouviu o que eu disse. Fácil ou difícil. Vire-se. É tudo o que quero.”

Com um grunhido de desalento, Wertz virou-se lentamente.

Agora McCune conseguia ver um revólver. Há apenas alguns momentos, Wertz tirara as mãos dos bolsos e fizera um gesto com a mão direita.

Agora McCune compreendia...

Ele ia pegar na arma.

Crivaro pressentira aquilo e reagira com velocidade relâmpago, sacando a sua arma primeiro.

Se os reflexos de Crivaro não fossem tão aguçados, um deles ou ambos poderiam estar mortos naquele momento.

Crivaro acenou com a cabeça a McCune e disse, “Faça-me o favor de lhe retirar aquela arma.”

McCune caminhou na direção de Wertz e tirou-lhe a arma. Pousou-a no chão.

“De joelhos com as mãos atrás das costas,” Disse Crivaro a Wertz.

Enquanto Wertz obedecia, Crivaro perguntou-lhe...

“Está mais alguém no apartamento?”

Wertz abanou a cabeça silenciosamente.

“Não o ouvi,” Grunhiu Crivaro.

“Não,” Disse Wertz.

Crivaro pegou nas suas algemas e disse a McCune...

“Provavelmente está a dizer a verdade, mas é melhor dar uma vista de olhos.”

McCune ouviu Crivaro a ler os direitos a Wertz enquanto ele circulava no pequeno apartamento. Espreitou para dentro de um quarto desarrumado com a porta de um roupeiro escancarada e não viu ninguém. Também não encontrou ninguém na casa de banho, nem num armário do corredor.

Então McCune entrou na cozinha, o único compartimento que ainda não tinha vistoriado. Na mesa de fórmica viu cinco máscaras de borracha, das que cobriam toda a cabeça. McCune reconheceu os rostos de filmes de monstros da Universal – a Múmia, a Criatura da Lagoa Negra, o Frankenstein de Karloff, o Drácula de Lugosi e o Lobisomem.

Casal dissera a verdade no que dizia respeito aos roubos de Wertz.

E agora McCune não tinha qualquer razão para duvidar de que Casal também dizia a verdade sobre o confronto de Wertz com uma das vítimas.

Apanhámos o nosso homem, Pensou com satisfação.

Entretanto, sabia bem que não devia tocar nas máscaras.

Regressou à sala onde Wertz já se encontrava algemado e de joelhos.

McCune disse a Crivaro, “É melhor vir ver a cozinha.” E sacou a sua arma.

Crivaro anuiu e foi até ao local.

McCune ficou a guardar Wertz até Crivaro voltar e dizer, “É melhor chamar uma equipa forense para fazer uma pesquisa adequada. Neste momento não teremos qualquer dificuldade em obter um mandado.”

Ao colocar a arma no coldre, McCune reparou no olhar desconfiado do detido.

“Vamos levá-lo para a sede,” Disse.


*


Riley ainda estava impacientemente à espera no carro quando viu Crivaro e McCune a saírem do prédio. Traziam consigo um homem algemado.

Deve ser Wertz, Percebeu.

O homem parecia musculado, perigoso e zangado.

Surpreendida, Riley saiu do carro. Lembrou-se de Crivaro lhe ter dito que não havia provas suficientes para prender aquele homem. Mas estavam a fazê-lo.

Crivaro olhou para ela e disse...

“Volte para o carro.”

Naquele momento, o detido inclinou-se para um lado desequilibrando McCune e tentou pegar na arma de Crivaro.

Mas Crivaro foi mais rápido. Agarrou nas mãos do atacante e atirou-o ao chão.

Então, ambos os agentes sacaram as armas. O detido levantou-se lentamente.

Riley ficou contente por tudo ter terminado tão rapidamente.

Apercebeu-se que o seu próprio impulso fora de parar o homem e sabia que fora uma má ideia.

O pai dera-lhe uma única lição do sistema de combate israelita ultra-agressivo Krav Maga nos últimos meses, e usara-a para se defender de um atacante. De resto, tivera muito pouco treino de autodefesa. Para além disso, estava grávida. Mais uma vez pensou...

Talvez não devesse estar a fazer trabalho de campo.

Regressou ao carro de Jake e esperou que os dois agentes colocassem Wertz no carro de McCune, equipado com uma divisão para detidos. Algemaram-no no local.

Riley perguntou-se se Crivaro lhe teria permitido encontrar-se naquela situação se soubesse que ela estava grávida. Sentiu-se um pouco culpada por não lhe ter contado.

Mas lembrou-se do que Crivaro lhe dissera no dia anterior sobre o que estariam a fazer os outros estagiários...

“...aprender como usar arquivos e clips...”

É claro que Crivaro fizera crer que as atividades dos estagiários eram muito mais aborrecidas do que na verdade seriam. Com certeza que haveria muitas coisas excitantes para aprender sobre dados de crimes, trabalho de laboratório, forense e outros. Mas ainda naquela manhã, Riley tivera uma primeira impressão do que seria trabalhar num caso de assassinato.

Quando o suspeito estava em segurança no veículo de McCune, Crivaro voltou para o seu carro, sentando-se no lugar do condutor ao lado de Riley, olhando-a com rigidez.

Ao iniciar a viagem, Crivaro descreveu concisamente o que tinha acabado de acontecer – que Gregory Wertz lhes tinha dado as boas-vindas com uma arma e que tinham encontrado uma série de máscaras aparentemente roubadas do Costume Romp.

“Máscaras?” Perguntou Riley.

“Sim. Cinco máscaras de monstros, tipo para o Halloween.”

“Para que é que ele as quereria? Questionou Riley.

“Sei lá,” Disse Crivaro. “Mas detivemo-lo por posse de bens roubados, por ameaçar dois agentes da lei e por resistir à prisão. É mais do que suficiente para o deter. Já solicitei um mandado de busca para o apartamento e não tarda nada chega uma equipa forense ao local. Entretanto, temos que ver o que é que ele tem a dizer para se defender durante o interrogatório. Talvez tenhamos sorte e ele confesse tudo.”

Riley ficou entusiasmada com a perspetiva de um interrogatório.

Ela disse, “Agente Crivaro, será que eu posso...”

Crivaro interrompeu-a, “Participar no interrogatório deste tipo? Nem pensar. Mas pode ficar no exterior da sala de interrogatório e ver e ouvir tudo. Talvez aprenda alguma coisa.”

Riley ficou satisfeita. Ela não pretendia mais do que aquilo.

Pouco mais falaram no resto da viagem até ao Edifício J. Edgar Hoover. Assim que Crivaro estacionou o carro na garagem, o seu telefone tocou.

Atendeu a chamada enquanto saíam do carro e caminhavam na direção de McCune que levava o agora dócil suspeito algemado para a entrada do edifício.

Crivaro parou enquanto falava e Riley imitou-o. Crivaro parecia aborrecido com a pessoa com quem estava a falar.

“Estás a brincar,” Disse ele. “Esquece isso. Não tenho tempo para isso. Nem o McCune. E ele já interrogou o tipo. Não lhe podes dizer para se ir embora? Uh, delicadamente?”

Crivaro coçou a cabeça e ouviu por um momento.

Por fim disse, “Ok. Acho que o podemos conseguir de alguma forma.”

Olhou para McCune e para o suspeito que já atravessavam a porta do edifício.

Crivaro virou-se para Riley.

“Tenho uma pequena tarefa para si.” Disse ele.

“Para mim?” Disse Riley surpreendida.

“Sim, preciso que trate de uma coisa.”

Riley sentiu-se entusiasmada.

Crivaro prosseguiu, “O marido de Janet Davis acabou de aparecer. Quer respostas sobre o que aconteceu à mulher. O McCune já esteve com ele hoje de manhã, mas nenhum de nós pode falar com ele neste momento – temos que começar o interrogatório ao suspeito. Preciso que trate do marido.”

“O marido da... da vítima? A vítima que vimos esta manhã?”

“Sim. Ele está na entrada junto ao segurança. Pode encontrá-lo lá.”

Riley ficou confusa.

“Mas o que é que lhe digo? Quem lhe digo que sou?”

Crivaro encolheu os ombros.

“Diga-lhe a verdade, que é uma estagiária a aprender com dois agentes que estão a trabalhar no caso. Mas diga-lhe o mínimo que puder. Pode dizer-lhe que temos um suspeito detido, mas não entre em pormenores – qualquer pormenor. Faça o que fizer, não lhe dê esperanças. Diga-lhe...”

Crivaro fez uma pausa, depois disse, “Diga-lhe só que entraremos em contacto com ele assim que soubermos mais detalhes. Diga-lhe... bem, tente que vá para casa e que aguarde lá por notícias nossas.”

Crivaro ainda acrescentou...

“Odeio quando isto acontece. Um raio de uma distração, uma verdadeira perda de tempo. Temos que nos focar em apanhar o assassino, em impedir que mais alguém seja morto. Trate do assunto da forma mais discreta possível, ok? Mostre compaixão, mas não se deixe entusiasmar. Na verdade é muito simples. Acha que consegue?”

Riley acenou lentamente com a cabeça.

“Ótimo,” Disse Crivaro. “Já agora, ele chama-se Gary. Gary Davis.”

Crivaro afastou-se sem dizer mais nenhuma palavra.

Riley ficou ali parada durante um momento, tentando processar o que acabara de acontecer.

Pensou no que Crivaro dissera...

“Um raio de uma distração, uma verdadeira perda de tempo.”

Riley sentiu um ligeiro ressentimento ao perceber...

Ele deu-me uma tarefa que não queria fazer.

Entretanto, Crivaro e McCune iriam interrogar o suspeito e Riley ia perder tudo.

Mas conteve a sua irritação ao entrar no edifício e dirigir-se ao elevador.

Afinal de contas, de que é que estava à espera? Como estagiária, teria que ficar encarregue de tarefas inevitáveis muitas vezes.

Entrou no elevador até à ampla entrada e dirigiu-se ao segurança. Pensou a quem pediria ajuda para encontrar Gary Davis.

Mas rapidamente viu um jovem com uma indisfarçável expressão de angústia no rosto a caminhar ansiosamente de um lado para o outro.

O seu coração bateu com mais força ao perceber...

É ele.

E a tarefa que lhe fora atribuída seria bem mais difícil do que esperava.


CAPÍTULO DOZE


A ansiedade de Riley aumentava à medida que caminhava na direção do marido da mulher assassinada.

Atravessou o portão de segurança para ir ao seu encontro, lembrando-se das instruções de Crivaro...

“Mostre alguma compaixão, mas não se deixe entusiasmar.”

Como é que iria conseguir aquilo?

Perguntou-lhe, “O senhor é Gary Davis?”

O homem virou-se para ela e anuiu.

Então ela começou, “Sou Riley Sweeney e sou...”

Engoliu em seco ao perceber...

A última coisa que este homem quer ouvir é que sou uma estagiária.

Em vez disso, ela disse, “Lamento a sua perda.”

O homem agora parecia confuso.

“O que é que se passa?” Perguntou. “Está a deixar-me louco não saber o que é que se está a passar. Diga-me alguma coisa, por favor.”

Riley respirou fundo, tentando acalmar-se a ela própria.

Depois disse, “O detetive principal pediu-me para vir aqui dizer-lhe que têm um suspeito detido.”

Os olhos de Gary Davis arregalaram-se.

“Quem é ele?” Perguntou, transtornado. “Como é que o encontraram?”

O coração de Riley quase lhe saltava do peito.

Pensou em mais uma coisa que Crivaro tinha dito...

“Não entre em detalhes – em qualquer detalhe.”

Mas como o poderia evitar?

Como poderia não contar a este homem desesperado o pouco que sabia?

Disse firmemente a si própria...

Ordens são ordens.

Respirou fundo e disse...

“Não lhe posso dizer.”

Davis agora parecia completamente perplexo.

“E porque não?” Perguntou.

Riley gaguejou, “Estou apenas... não o posso fazer neste momento. Mas prometo...”

Parou a meio da frase, a pensar...

Prometo-lhe o quê?

Acabou por dizer a única coisa que se lembrou de dizer...

“Nós estamos a fazer tudo o que está ao nosso alcance.”

“Que somos ‘nós’?”

Riley disse, “O Agente Especial Mark McCune – o agente que esteve consigo há pouco. E o Agente Especial Jake Crivaro. Ele é o responsável pela investigação.”

“E você?” Perguntou Davis.

Riley engoliu em seco.

“Eu sou Riley Sweeney. Sou estagiária e estou a trabalhar neste caso.”

Ao olhar de frustração de Davis sucedeu-se u olhar de pura descrença.

“Uma estagiária? Não acredito nisto. Isto não está certo. Exijo falar com um dos agentes. Agora mesmo. Neste momento.”

“Isso não é possível,” Disse Riley, surpreendida pela súbita firmeza da sua voz. “Os agentes McCune e Crivaro estão a interrogar o suspeito. Acredite em mim quando lhe digo que estamos a fazer tudo o que está ao nosso alcance. E entraremos em contacto consigo quando soubermos algo de concreto.”

Riley esperava estar a dizer-lhe a verdade. Mas na realidade não fazia ideia do que lhe dizer para esperar.

A fúria e frustração desapareceram do rosto de Davis, substituídos por um olhar de profunda tristeza.

“Não vale a pena,” Disse ele, contendo o choro. “Nada disto importa. Nada disto vai trazer a Janet de volta.”

Virou-se lentamente e começou a ir-se embora.

Riley sabia que devia sentir-se aliviada pelo facto de a sua desprezível tarefa estar concluída. Mas em vez disso, a sua mente foi invadida por perguntas.

Disse, “Sr. Davis, espere um momento.”

Davis virou-se e olhou para ela.

Riley disse, “Sabemos que a sua mulher tirou algumas fotos numa loja de disfarces. Esteve lá dois dias. Mas o dono diz que ela estava aborrecida da última vez que lá fora. Por acaso não lhe disse porquê?”

Davis pensou durante um momento.

“Penso que talvez saiba,” Disse ele. “Sim, um empregado lá foi indelicado com ela. Na verdade, parece-me que se atirou a ela. Disse que nunca mais lá voltava. Mas...”

Riley susteve a respiração.

Mas o quê?

Davis abanou a cabeça.

“Não diria que ficou especialmente aborrecida com aquilo – pelo menos não quando chegou a casa. Na verdade, até se riu. Ela era uma mulher muito atraente. Coisas desse tipo aconteciam-lhe com frequência, lamento dizê-lo. Ela aprendera a não se deixar afetar. Porque é que pergunta?”

Riley hesitou.

Deveria dizer-lhe que o homem que a ofendera era o que estava agora detido?

Nada de detalhes, Lembrou-se a si mesma. Provavelmente já dissera e perguntara demasiado.

“Só estou a tentar ser rigorosa,” Disse ela, percebendo de imediato que era uma coisa parva de ser dizer.

Sem dizer mais uma palavra, Davis virou-se e saiu do edifício.

Riley sentiu uma onda de alívio pelo facto de a conversa ter terminado. Mas ainda ficou ali um momento, cheia de vagas incertezas ao lembrar-se das suas palavras sobre o incidente entre Janet e Gregory Wertz...

“Não diria que tenha ficado particularmente perturbada com aquilo.”

“Na verdade, até se riu.”

Riley interrogou-se porque é que aquelas palavras estavam a incomodá-la.

Seria normal Janet ter-se rido de uma situação daquelas?

Talvez não, Pensou Riley.

No final de contas, como é que poderia saber que o homem a ia matar?

Ainda assim, algo sobre o que Davis dissera perturbava Riley.

Mas não conseguia descortinar o quê. E de qualquer das formas, parecia não ser importante naquele momento. Lembrou-se de Crivaro lhe dizer que podia ver e ouvir o interrogatório. Ainda devia estar a decorrer, mas onde?

Ela não fazia ideia do local em que o interrogatório estaria a ocorrer.

Riley suspirou, irritada. Mais uma vez, tinha a sensação de que Crivaro se livrar dela só para a manter longe do que realmente importava.

Mas ela não ia deixar que isso acontecesse – não se o pudesse evitar. Pegou no telemóvel e ligou a Crivaro. Suspirou novamente quando a chamada foi para o atendedor. Ao som do beep, ela disse...

“Agente Crivaro, é a Riley. Já falei com o marido.”

Fez uma pausa e depois disse, “Onde está? O que devo fazer agora?”

Terminou a chamada e começou a andar de um lado para o outro nervosamente, pensando em quanto tempo teria que esperar até Crivaro lhe ligar.

Talvez muito depois de o interrogatório terminar?

Ou talvez nem o fizesse?

Naquele momento Riley sentiu-se insignificante e excluída. Talvez Crivaro se tivesse esquecido que havia uma estagiária que devia estar a aprender com ele naquele momento.

Talvez o caso fosse resolvido enquanto ela ali estivesse à espera.

Se fosse o caso, porque é que se deveria dar ao trabalho de esperar?

Talvez devesse apanhar o metro e ir para casa, Pensou, sentindo-se completamente indecisa.

Então Riley apercebeu-se de que estava com muita fome. Não comia nada desde que deixara o apartamento naquela manhã. Ainda a resmungar para si própria, comprou u pacote de bolachas numa máquina de vending que se encontrava ali na entrada.

Assim que começou a abrir o pacote, o seu telefone tocou. Quando atendeu, ouviu a voz áspera de Crivaro.

“Terceiro andar, Sala 17B.”

A chamada terminou com um clique abrupto. Riley ficou a olhar para o telefone durante um momento. Crivaro não fora acolhedor, mas pelo menos dissera-lhe para onde ir. Colocou as bolachas na ala, depois passou pelo portão de segurança novamente e entrou no elevador até ao terceiro andar. Encontrou a porta que procurava e bateu antes de entrar.

Crivaro abriu a porta, parecendo momentaneamente surpreendido por vê-la.

Depois disse, “Ah, sim. Riley. Entre.”

Riley juntou-se a Crivaro numa pequena sala com um amplo vidro numa das paredes. Riley rapidamente percebeu tratar-se de um espelho duplo...

Uma sala de interrogatório.

Já olhara para um espelho como aquele uma vez em Lanton.

Lá dentro viu Gregory Wertz, sentado e algemado a uma pesada mesa cinzenta. O Agente McCune andava de um lado para o outro silenciosamente à sua frente.

Riley perguntou a Crivaro baixinho, “O que é que se passa?”

“Nada de especial,” Disse Crivaro, cruzando os braços. “O Wertz quer um advogado, é claro. Um advogado de defesa está a caminho neste momento. Entretanto, o Wertz não diz grande coisa. O mais provável é não conseguirmos sacar-lhe nada.”

Riley ouviu a voz de McCune num microfone.

“O que é que disse para perturbar a mulher?”

Wertz virou a cabeça e disse, “Que mulher?”

McCune inclinou-se e cima da mesa impacientemente.

“A mulher de quem tenho vindo a falar. Janet Davis. A mulher que foi à Costume Romp tirar fotos. A mulher que se foi embora porque você lhe disse alguma coisa. A mulher que apareceu morta ontem de manhã. Tal como Margo Birch que apareceu morta no sábado.”

Wertz disse, “Não me lembro desses nomes.”

McCune ficou a olhar para o suspeito durante alguns momentos. Por fim, disse, “E as máscaras?”

“Que máscaras?” Disse Wertz.

“As máscaras que estavam na sua cozinha.”

“Não me lembro de nenhumas máscaras.”

McCune aproximou-se e disse, “Estou a falar das máscaras que roubou na Costume Romp.”

“Eu não roubei máscaras a ninguém.”

É claro que era mentira. Riley percebeu-o no rosto do homem.

Mas havia outra coisa a espicaçar a sua consciência – algo acerca das máscaras.

Lembrou-se de Crivaro mencionar...

“Cinco máscaras de monstros, tipo Halloween.”

Qual a ligação daquelas máscaras com a morte das duas mulheres?

McCune disse a Wertz, “O Sr. Casal disse que você andava a roubar da loja.”

“O Casal é um sacana de um mentiroso,” Disse Wertz. “Eu não roubei nada. Comprei-lhe as máscaras com desconto por ser empregado.”

“Então ok,” Disse McCune. “Porque é que queria aquelas máscaras?”

Wertz limitou-se a encolher os ombros.

Riley sentiu um estranho formigueiro a apoderar-se dela.

Não sabia ao certo o que é que significava, mas virou-se para Crivaro e disse...

“É a pergunta errada.”

Crivaro olhou para ela. “Huh?”

“O Agente McCune perguntou a Wertz porque é que queria as máscaras. É a pergunta errada.”

Crivaro olhou atentamente para Riley.

“O que é quer dizer com isso?” Perguntou.

Riley sentiu-se ligeiramente intimidada pelo tom de voz cortante de Crivaro.

E a verdade era que ela não tinha a certeza do que queria dizer com aquilo.

Ainda assim, o formigueiro persistia.

Ela disse, “Ele não vai responder. McCune devia perguntar-lhe – para quem são as máscaras.”

Crivaro olhou intensamente para ela.

Será que pensa que sou louca?

Não o podia censurar. Não conseguia pensar numa única razão racional para o que acabara de dizer – era apenas um irresistível pressentimento.

Então Crivaro falou para um intercomunicador que fazia a ligação para a sala de interrogatório.

“McCune, quero falar consigo.”

McCune virou-se para o espelho, parecendo desagradado com a interrupção. Depois saiu da sala e entrou na cabine.

“O que é?” Perguntou a Crivaro.

Crivaro olhou para Wertz durante um momento. Wertz estava a recostar-se na cadeira, parecendo inabalável e seguro de si mesmo.

Por fim, Crivaro disse a McCune...

“Vá até lá e pergunte-lhe para quem eram as máscaras.”

“Porquê?” Perguntou McCune.

Crivaro limitou-se a dizer...

“Faça-me a vontade.”

McCune olhou para Riley como se tivesse adivinhado que a ideia tinha partido dela. Depois encolheu os ombros e voltou para a sala de interrogatório. Postou-se mesmo em frente à mesa e perguntou a Wertz...

“Para quem roubou aquelas máscaras?”

Os olhos de Wertz arregalaram-se e endireitou-se na cadeira, parecendo muito ansioso.


CAPÍTULO TREZE


Riley sentiu-se entusiasmada ao observar atentamente Wertz.

Tropecei em alguma coisa, Pensou.

Gostava de saber o que poderia ser.

“Huh?” Perguntou Wertz.

“Ouviu-me bem,” Disse McCune. “Para quem eram as máscaras?”

Há apenas alguns momentos, Wertz parecia calmo e confiante. Agora, de repente, parecia muito ansioso.

“Quando é que o meu advogado vem?” Disse.

“Em breve,” Disse McCune. “Entretanto, qual o problema em falar comigo? Quero dizer, se não tem nada a esconder?”

Wertz abanou a cabeça nervosamente.

“Nem pensar,” Disse. “Não tenho mais nada a dizer-lhe. Nem uma palavra.”

Wertz virou a cabeça, mantendo-se em silêncio enquanto McCune repetia a pergunta vezes sem conta. O suspeito estava obviamente aborrecido e na defensiva.

Riley estudou as reações de Crivaro enquanto observava e ouvia. Tinha a boca ligeiramente aberta e parecia fascinado pelo que estava a suceder – ou talvez pelo que não estivesse a acontecer.

De repente, a porta da pequena sala abriu-se e um homem baixo e curvado transportando uma mala entrou.

“O que é que se está a passar aqui?” Perguntou.

Antes de Crivaro poder falar, o homem olhou para o espelho duplo e viu o que se estava a passar na sala de interrogatório.

Abanou a cabeça e resmungou, “Jesus, vocês são mesmos uns necrófagos que não perdem tempo, pois não? Tirem o vosso homem dali agora mesmo. O meu cliente não vai falar mais.”

Aparentando estar profundamente contrariado, Crivaro falou no intercomunicador, “Chega por agora, McCune. Pode sair.”

McCune olhou para o vidro surpreendido, depois dirigiu-se à sala mais pequena.

Com os olhos inquietos a saltar de Riley para McCune e Crivaro, o homem baixo disse, “Ok, quem são vocês? Sei que são do FBI, mas quero os vossos nomes.”

Crivaro apresentou-se, assim como McCune e Riley.

O homem disse, “Eu sou Lewis Gelb, advogado de defesa de Wertz. Peço desculpa por mão lhes apertar as mãos. Tenho a certeza que compreendem que somos adversários.”

Crivaro anuiu e disse, “Estávamos à sua espera.”

Gelb demonstrou desagrado.

“Pois, estou a ver que sim. E foram rápidos a violar os direitos do meu cliente tanto quanto puderam antes de eu chegar.”

McCune disparou, “Relaxe, ele conhece os seus direitos. Ele exigiu um advogado, não exigiu? Não nos pode censurar por fazer perguntas enquanto se esperava. É o nosso trabalho. De qualquer das formas, não disse nada de útil.”

Gelb disse, “Tratarei de que assim seja. Bem, a palhaçada acabou. Saiam daqui agora mesmo. Tenho que falar com o meu cliente.”

Gelb desligou o intercomunicador e dirigiu-se à sala de interrogatório. Riley viu-o a abrir a mala e começar a falar com Wertz, mas não conseguia ouvir o que diziam.

Crivaro disse, “Ouviram o que ele disse. Já não temos nada a fazer aqui.”

Crivaro, McCune e Riley saíram para o corredor onde ficaram alguns momentos a olhar uns para os outros.

“Raio de advogados,” Disse McCune. “Se ao menos tivesse tido mais uns minutos...”

Crivaro interrompeu-o, “Ele não lhe ia dizer nada. Pelo menos nada que queiramos saber.”

“Porque diz isso?” Perguntou McCune.

Crivaro não respondeu, só olhou pensativamente para a porta da sala de interrogatório. Riley pressentiu que a sua mente congeminava qualquer coisa – e estava relacionado com a pergunta que ela sugerira...

“Para quem são as máscaras?”

A pergunta parecera apanhar o suspeito desprevenido.

Mas porquê? Interrogou-se Riley.

Por fim, Crivaro disse...

“O dia ainda não terminou e ainda temos trabalho a fazer.”

Depois virou-se diretamente para Riley e perguntou...

“Alguma sugestão quanto ao que devemos fazer a seguir, Sweeney?”

Riley engoliu em seco e arregalou os olhos.

Ele está a perguntar-me a mim?

Riley percebeu que McCune também estava surpreendido e nada agradado.

Pensou durante alguns instantes e depois perguntou...

“E a família da primeira vítima? Presumo que a polícia local já falou com eles. Não deveríamos também fazê-lo?”

Crivaro sorriu, como se tivesse pensado na mesma coisa.

“Parece-me bem,” Disse Crivaro. “Vamos lá.”

Ao seguir Crivaro e McCune em direção à garagem, Riley sentiu-se intrigada pela súbita demonstração de confiança em si depositada.

Entretanto, McCune não parava de olhar para ela de forma desconfiada.

Ele não está muito satisfeito comigo, Pensou Riley.

Riley tinha a certeza de que ele percebera que a pergunta sobre as máscaras tinha sido ideia dela. E agora Crivaro acabara de a questionar – e não a ele – sobre ideias do que fazer de seguida. Riley não ficou surpreendida com a sua atitude.

Mas ficou preocupada...

Em que medida isto afetará a nossa relação?

Mas aquele não era o momento para rivalidades vãs – sobretudo porque ainda não tinham apanhado o assassino.

Ela não sabia porquê, mas os seus instintos diziam-lhe que Wertz não era o homem que procuravam.

Também teve a sensação de que Crivaro partilhava da mesma opinião.


*


McCune sentou-se no banco ao lado do condutor e Riley atrás. McCune ligou à família da primeira vítima para os informar de iam a caminho.

Quando McCune terminou a chamada disse...

“Estão à nossa espera. Mas tenho um pressentimento de que não vamos ter uma receção calorosa. Pareciam bastante aborrecidos.”

Riley percebia porquê, sobretudo depois do seu perturbador encontro com Gary Davis, o marido da segunda vítima que dissera...

“Não saber o que se passa está a deixar-me louco.”

Riley compreendia que a família de Margo Birch se sentisse da mesma forma.

McCune abriu o seu ficheiro e remexeu alguns papéis. Informou Riley e Crivaro sobre as pessoas com quem se iriam encontrar. Margo Birch vivera com os pais em Witmer Grove, Maryland, e apanhava um autocarro para DC todos os dias para ir para a faculdade. Os pais de Margo, Lewis e Roberta, não sabiam que tinha acontecido algo à filha até ao momento em que a polícia de DC lhes apareceu à porta com uma foto que haviam encontrado no corpo de Margo.

A polícia falara na altura com o casal. Depois, os agentes tinham levado os pais até à morgue de DC para identificarem o corpo. Nenhum outro agente da lei havia falado com eles desde essa altura. Agora que o FBI tinha tomado conta do caso, falar com eles era sem dúvida uma prioridade.

Durante o resto da viagem, Riley ouviu os dois agentes a tentar criar cenários sobre o caso. Ambos os cadáveres das vítimas tinham sido encontrados no quadrante noroeste de DC. Janet Davis vivera nessa zona e a casa de Margo era do outro lado da linha de DC no Maryland.

Haveria outras ligações entre as duas vítimas? Até ao momento, ninguém descobrira nenhuma outra. A Crivaro e McCune também não lhes ocorria nada. As duas mulheres nem sequer eram parecidas. Então porque é que o assassino as escolhera para vítimas?

Crivaro disse, “Há tanto que não sabemos. Nem sequer sabemos quando ou como Margo foi raptada.”

Riley começou a divagar à medida que a conversa entre Crivaro e McCune se desenrolava. Lembrou-se novamente de Gary Davis ter dito que a mulher se rira dos avanços rudes de Gregory Wertz.

Parecia que Janet Davis não pressentira que Wertz constituísse qualquer perigo.

E quais eram as impressões de Riley sobre o homem que vira do outro lado do espelho duplo?

Riley imaginou outra vez o rosto emoldurado por rastas. E a sua voz – tão presunçosa e confiante de início, depois alarmada e defensiva quando lhe perguntaram para quem eram as máscaras.

Não confiara naquele rosto e voz, e pressentia que se tratava definitivamente de um criminoso.

Mas seriam aquele rosto e voz, o rosto e a voz de um assassino?

No fundo, ela não acreditava nisso.

Entretanto, lembrou-se das bolachas que tinha guardado na mala. Sabia que Crivaro também não tinha comido nada todo o dia e provavelmente McCune também não. Nenhum dos agentes parecia estar disposto a parar para comer, por isso Riley ofereceu-lhes bolachas e eles aceitaram de imediato. Guardou duas para ela e deu as restantes, desejando ter comprado mais do que um pacote.

A noite aproximava-se quando pararam o carro no bairro sonolento de classe média em que os Birches viviam.

Crivaro estacionou em frente da pequena casa de tijolos com um pequeno quintal e sebes imaculadas.

Mal saíram da viatura, uma mulher robusta de meia-idade dirigiu-se acorreu na sua direção, chorando e gritando com raiva.

“Como se atrevem a não nos dizer a verdade!” Gritou. “Como se atrevem!”

O coração de Riley começou a bater com mais força ao interrogar-se...

No que é que acabámos de nos meter?


CAPÍTULO CATORZE


Trocando olhares perplexos, Crivaro e McCune pegaram nos seus distintivos e tentaram apresentar-se enquanto a mulher desabafava.

“Isso foi alguma piada, deixarem-nos descobrir desta forma? Como se atrevem!"

Riley percebeu que a mulher deveria ser Roberta Birch, a mãe de Margo.

Ela lembrou-se do que McCune disse depois de falar com os pais de Margo ao telefone...

"Tenho a sensação de que não teremos uma receção calorosa. Parecem estar muito aborrecidos.”

Riley esperava pesar e até raiva, mas não aquele tipo de histeria violenta e incompreensível.

Afinal, a polícia já havia informado o casal sobre a morte da filha. Eles até já tinham ido à morgue para identificar o corpo.

Mas Roberta Birch agia quase como se tivesse acabado de saber a verdade.

Um homem corpulento e careca também saíra da casa – Riley tinha a certeza que era o pai de Margo, Lewis. Ele aproximou-se da mulher e tentou acalmá-la.

“Querida, não faças isso. Eles estão aqui para ajudar.”

"Deve ser!" Gritou-lhe Roberta. "Que tipo de jogo doentio estão a brincar connosco?"

Lewis abraçou a esposa, cujos gritos se transformaram em soluços amargos.

"Ela era a nossa única filha" Choramingou. "Ela era tudo o que tínhamos."

Riley foi-se abaixo com a tristeza daquelas palavras.

Lewis levou a mulher para casa, virando-se para os três visitantes e dizendo...

"Entrem, por favor.”

Riley, Crivaro e McCune seguiram o casal até à aconchegante pequena sala de estar. Lewis levou a mulher para um quarto, saiu e fechou a porta. Riley ainda ouvia a mulher a chorar.

Agora Crivaro podia apresentar-se apropriadamente, bem como McCune e Riley.

Lewis assentiu e sugeriu que todos se sentassem. Ele estava visivelmente perturbado. As suas mãos tremiam e o rosto estava enrubescido.

Com voz trémula, disse aos três visitantes...

"Quero que saibam que também estou aborrecido. Não entendo porque é que não nos informaram.”

Com uma voz suave, Crivaro disse, “Lamento, senhor. Não tenho a certeza se entendi."

Lewis disse, "Não fazíamos ideia de que a morte da nossa filha estivesse relacionada com um assassino em série."

Crivaro disse, “Entendo como se sente. Mas a outra vítima ainda não tinha sido encontrada. Quando a polícia local veio falar convosco, eles não sabiam...”

Lewis interrompeu, "E não nos contaram – acerca da outra coisa também."

Crivaro ficou em silêncio. Riley sentiu que ele não sabia o que dizer. Ela esperava que Lewis explicasse.

Lewis respirou longa e lentamente, depois disse...

"Quando fomos à morgue, Margo estava... ela estava nua deitada debaixo de um lençol e o seu rosto... bem, ela parecia pálida e pouco natural, mas Roberta e eu pensámos que era só porque..."

Lewis reprimiu um soluço e ficou em silêncio.

Riley ouviu um suspiro de entendimento por parte de Crivaro. Também ela agora entendia o que se passava.

O médico-legista já tinha retirado a maquilhagem de palhaço do rosto de Margo quando Lewis e Roberta identificaram o seu corpo. Eles não sabiam que a sua filha tinha sido encontrada usando um fato de palhaço e maquilhagem. Não até...

Como é que descobriram? Interrogou-se.

Finalmente Lewis disse...

“Nós descobrimos nas notícias da TV. Estão a apelidá-lo de ‘Assassino Palhaço’. Porque é que não fomos ao menos informados da forma como ela...?”

Riley calou-se novamente.

Riley viu Crivaro a curvar-se desconfortavelmente na sua cadeira. Ela podia adivinhar a resposta à pergunta inacabada de Lewis.

Ela também entendeu porque é que Crivaro não a queria dar.

Lembrou-se daquela manhã na cena do crime, como um polícia ficara irritado quando os jornalistas apareceram e viram o corpo da mulher...

"Nós conseguimos manter escondida a questão do palhaço até agora."

Os polícias que tinham entrevistado os Birch não queriam que eles soubessem daquele pormenor. Ainda estavam a tentar manter aquilo em segredo porque sabiam que os meios de comunicação social ficariam loucos com uma coisa daquelas. Então não disseram nada. Mas o segredo já se conhecia desde aquela manhã - e os Birch tinha descoberto a verdade da pior maneira possível.

Crivaro disse lentamente, "Sinto muito. A decisão não foi nossa. O caso ainda não estava nas nossas mãos. ”

Por um momento, Lewis não respondeu, apenas olhou para Crivaro com uma expressão abatida. Então falou suavemente. “Ela nunca gostou de palhaços. Tinha medo deles. Isso só fez com que...”

Riley ficou chocada. Como seria saber que a tornaram em algo que temia? Porque os relatórios diziam que as vítimas estavam vivas quando foram maquilhadas e vestidas.

Lewis ficou em silêncio de novo, olhando para as mãos cerradas.

Riley deu por si a pensar no tipo de “ação” que Crivaro teria desenvolvido se tivesse sido o primeiro a falar com o casal em vez da polícia local.

Teria dito a verdade sobre a maquilhagem e o fato?

Isso tornaria as coisas mais fáceis para eles, ou as transformaria num pesadelo ainda maior?

Teria confiado neles para não mencionarem a ninguém?

E nesse caso...

Como teria sido a minha própria “ação” se dependesse de mim?

Não fazia ideia. Mas sabia que poderia ser um dos incontáveis dilemas que certamente enfrentaria se entrasse para o FBI. Era um pensamento assustador.

Enquanto Crivaro continuava a falar com Lewis Birch, Riley ouviu pela primeira vez gentileza na sua voz.

"Sr. Birch, espero que entenda que eu tenho que fazer algumas perguntas que já lhe fizeram. O caso do assassinato da sua filha entrou numa fase nova e muito inesperada. Temos que ver tudo sob uma nova luz. ”

Lewis assentiu.

Crivaro disse, "Quando é que percebeu pela primeira vez que a sua filha tinha desaparecido?"

Lewis encolheu ligeiramente os ombros.

“Margo estava em casa na quinta-feira à noite, todos jantámos juntos. Eu e a minha mulher fomos dormir e Margo ficou a estudar. Na manhã seguinte, pensámos que ela tinha saído mais cedo do que o habitual para a escola. Começámos a ficar preocupados quando ela não voltou para casa naquela tarde, e não ligou a explicar porquê. Ela não estava em casa à hora do jantar e ficámos realmente preocupados, então ligámos para a polícia. Eles disseram-nos que era muito cedo para dar uma pessoa como desaparecida. Não dormimos a noite toda.

O seu rosto contorceu-se de angústia quando acrescentou...

“Então a polícia veio a nossa casa na manhã seguinte - com o seu documento de identificação...”

Calou-se.

Indicando Riley, Crivaro disse-lhe, "Não se importa que a nossa jovem estagiária veja a casa?"

Lewis assentiu.

Por um momento, Riley questionou-se...

O que é que Crivaro quer que eu faça?

Esperava que ela procurasse algo específico? Ou estava apenas a tentar tirá-la do caminho?

Gostava de saber.

Riley levantou-se da cadeira e entrou na pequena casa. Olhou para dentro de uma impecável e be decorada cozinha. Então parou no corredor do lado de fora da porta do quarto dos pais. Ainda podia ouvir Roberta Birch a soluçar lá dentro.

Devo entrar e conversar com ela?

Estremeceu ao recordar o seu doloroso encontro com o marido de Janet Davis.

Não se julgava capaz de fazer algo assim agora.

E, além disso, certamente não era o que Crivaro tinha em mente para ela fazer.

Mas o que é que ele queria que ela fizesse?

Enquanto permanecia indecisa no corredor, ouviu Crivaro a perguntar a Lewis se ele sabia de alguma conexão entre a filha e a outra vítima. Riley virou-se para uma porta no lado oposto do corredor e abriu-a.

E foi assi que entrou no quarto de Margo. Era pequeno e aconchegante, como tudo na casa. Riley sentiu um aperto na garganta quando se lembrou do que Roberta havia dito lavada em lágrimas...

“Ela era a nossa única filha. Ela era tudo o que tínhamos.”

Aquele era definitivamente o quarto de uma filha única - não mimada, mas profundamente apreciada pelos pais, e muito apreciada por todos que conhecia. Acima de tudo, Riley tinha a certeza de que Margo tinha sido feliz ali.

As paredes estavam repletas de inúmeras fotos dela emolduradas em todas as idades desde tenra idade - fotos tiradas com amigos, parentes e, acima de tudo, com os pais.

As prateleiras estavam cheias de livros, variando entre livros ilustrados e infanto-juvenis, até romances adultos. Parecia que Margo nunca se tinha desfazido de um livro na vida.

Cada peça de mobília estava repleta de recordações - estatuetas, diplomas, prémios e lembranças de todos os tipos de férias em família. E havia dezenas de peluches - coelhinhos, ovelhas, girafas, tigres e tantos ursinhos que Riley lhes perdeu a conta. Entre os animais numa cómoda, havia um pato de borracha amarelo, o tipo de brinquedo com que um bebé poderia brincar numa banheira.

Riley sentiu uma estranha nova emoção enquanto se movia no quarto, absorvendo tudo. Não conseguia identificar que sentimento era esse que a assolava.

Inveja? Interrogou-se.

Como poderia ela invejar uma jovem que fora brutalmente assassinada?

E, no entanto, Riley não pôde deixar de perceber - ela nunca tivera um quarto assim na sua difícil vida. Não teria sido maravilhoso ter um refúgio como aquele, um lugar para fugir aos problemas e ansiedades da vida?

E não teria sido maravilhoso ter pais tão incondicionalmente amorosos, tantos amigos íntimos, tantas alegrias e confortos?

Mas Riley estremeceu profundamente ao pensar no destino de Margo - raptada à força, grotescamente vestida e manietada, com a mente e o coração descontrolados pelas anfetaminas e, finalmente, literalmente assustada até à morte.

Todo o amor e proteção que Margo recebera durante a sua vida não tinha feito qualquer diferença no final.

Parecia comovente, cruelmente injusto, e Riley deu por si a pensar...

Ninguém está realmente seguro?

Riley tentou sacudir o seu horror doentio. Lembrou a si mesma que tinha trabalho a fazer, embora ainda não entendesse exatamente o que era.

Olhou à sua volta e notou que a persiana estava corrida sobre a única janela do quarto.

Caminhou até à janela e levantou a persiana.

Deu por si a olhar para um quintal pequeno e perfeitamente cuidado. A noite já caía, mas ela ainda podia ver tudo claramente. No meio do pátio havia uma árvore velha e robusta. Um baloiço pendia de um dos seus galhos.

O baloiço certamente ali estava há muitos anos, desde que Margo já tinha idade suficiente para o apreciar.

Riley sentiu-se estranhamente atraída por aquele baloiço. Decidiu sair e observá-lo mais de perto.

Voltou para o corredor e ouviu Crivaro perguntar a Lewis Birch se Margo havia mencionado algum encontro desagradável ou alarmante recentemente. Riley podia dizer pelo tom de voz desanimado e ligeiramente cansado de Crivaro que a entrevista não estava a ser muito útil.

Riley também notou que os soluços no outro quarto tinha cessado. Talvez Roberta Birch tivesse chorado até adormecer.

Riley atravessou a cozinha e encontrou a porta dos fundos.

Quando alcançou a maçaneta, perguntou-se...

Devo perguntar se posso ir até lá?

Lembrou-se de Crivaro perguntar claramente a Lewis Birch...

"Não se importa que a nossa jovem estagiária veja a casa?"

Certamente que "casa" incluía o quintal.

Riley rodou a maçaneta e dirigiu-se ao exterior.

O quintal era surpreendentemente agradável - o ar fresco, todo o bairro imerso em tranquilidade.

Parecia um lugar perfeito para uma criança brincar com os amigos vizinhos. Riley questionou-se – com que frequência Margo aparecia ali, mesmo depois de se ter tornado uma jovem mulher?

Atravessou o relvado até ao baloiço e olhou para o chão.

Não havia dúvidas, o solo estava nu e sem relva, e podia ver marcas frescas de saltos altos.

Margo nunca deixara de se sentar naquele baloiço. Ela tinha, sem dúvida, passado muitas horas felizes ali, relembrando momentos maravilhosos.

Riley estava a sentir um impulso para se sentar no baloiço quando o seu olhar foi atraído para uma zona de arbustos na parte de trás do quintal. Para lá deles, Riley podia ver a próxima rua entre duas casas.

E por um momento, Riley pensou ter visto alguém parado entre aquelas casas - um homem sombrio que parecia estar a olhar diretamente para ela.

Rapidamente percebeu que era apenas sua imaginação.

Mas ainda assim aquela presença permaneceu, e Riley sentiu um formigueiro em todo o corpo.

Está acontecer novamente, Pensou.

Ela estava a entrar na mente do assassino.


CAPÍTULO QUINZE


Riley tremeu profundamente mesmo depois da imagem sombria se ter desvanecido. Ela não conseguia parar de olhar para o espaço entre as duas casas onde imaginara a presença do homem.

Lembrou-se de quando se sentira conectada ao assassino no início da manhã enquanto olhava para o corpo de Janet Davis - a onda de crueldade e sadismo que sentira ao imaginar como as sensações do assassino ao matá-la.

E agora estava voltava a acontecer.

Não, Pensou. Eu não aguento isto.

Ela queria virar-se e voltar para a casa.

Então lembrou-se de algo que Crivaro havia dito durante a viagem até ali...

“Há tanta coisa que não sabemos. Nós nem sabemos quando ou como Margo foi raptada.”

Riley engoliu em seco quando percebeu...

Talvez eu esteja prestes a descobrir.

Andou entre um par de arbustos numa fileira que separava o quintal dos Birch da propriedade atrás dele. Então virou-se e teve um vislumbre da visão que o homem poderia ter tido da casa e do quintal da família.

Era tudo muito fácil de imaginar.

Tinha sido à noite, quando os pais de Margo já se tinham deitado.

Depois de estudar, Margo tinha ido até ali para fazer o que costumava fazer - sentar-se sozinha no baloiço e ouvir os grilos e aproveitar o ar fresco da noite, enquanto se lembrava da sua infância feliz, e também sonhando com o que a vida lhe traria.

Ela estava de frente para a casa, é claro...

E ele estava ali perto parado, observando-a por trás, sem ser notado.

Ele não estava ali por acaso.

Riley sentiu que ele já tinha como alvo essa jovem mulher para ser a sua primeira vítima, embora ela não imaginasse porque é que ele a escolhera.

Ele já a perseguia há algum tempo.

Será que ela já tinha reparado nele, a estudar os seus hábitos e movimentos?

Teria ficado com medo dele?

Não, Pensou Riley.

Ela nem sabia que ele estava por perto.

Ele é demasiado esquivo para isso ter acontecido.

Ele tinha sido suficientemente furtivo para se aproximar de Margo ali, com ela desprevenida, no seu próprio quintal. Ele esgueirou-se diretamente atrás dela...

E depois?

Riley lembrou-se das imagens desfocadas de barcos e docas da última foto na máquina de Janet Davis, que obviamente tinha sido arrancada da sua mão naquele exato segundo.

Ele derrubou Janet, Pensou Riley.

Talvez tenha feito o mesmo com Margo.

Ela caminhou até ao baloiço e olhou novamente para o pedaço nu de terra debaixo dele. O solo fora um pouco raspado. Mas com o seu olho destreinado, Riley não sabia dizer se aquilo indicava algum sinal de luta.

Agora, a sua perceção da presença do assassino começava a desaparecer, tornando-se turva como a última fotografia que Janet Davis tirara.

A única certeza que tinha era que precisava de falar com Crivaro – naquele exato momento.

Apressou-se na direção da casa e foi logo para a sala de estar. Crivaro, McCune e Lewis Birch estavam todos sentados exatamente como ela os deixara.

Um pouco sem fôlego, Riley disse...

“Agente Crivaro, penso que tenho algo para lhe mostrar.”

Crivaro e McCune levantaram-se e seguiram-na para o exterior. A escuridão agora adensava-se.

Riley apontou para o baloiço do quintal. "Penso que Margo foi raptada ali - por um homem que veio de entre aquelas casas."

McCune soltou um grunhido de ceticismo.

"Tem alguma razão sólida para pensar isso?" Perguntou.

Riley não respondeu. Como McCune reagiria se ela lhe dissesse a verdade - que estava simplesmente seguindo o seu instinto?

Enquanto isso, Crivaro agachou-se ao lado do baloiço. Tirou uma lanterna do bolso e apontou para o chão. Depois de analisar o chão por alguns momentos, disse...

"McCune, Sweeney – venham cá e vejam."

Riley e McCune aproximaram-se e agacharam-se ao lado dele.

Crivaro apontou a lanterna para lhes mostrar algo que Riley não tinha visto antes. Um pedaço de relva tinha sido cavado, como se alguém tivesse arrastado alguma coisa do baloiço.

Não é algo, Pensou. Alguém. Margo Birch.

Crivaro olhou para McCune e disse, “A Sweeney tem razão. Margo foi raptada aqui mesmo.”

Crivaro apontou para o espaço escuro entre as duas casas.

"Ele deve tê-la levado por ali até um veículo que aguardava."

McCune estava assombrado.

Crivaro ergueu-se, assim como Riley e McCune.

Crivaro disse, “McCune, preciso que chame uma equipa forense para analisarem este local. Terão que a passar a pente fino logo de manhã.”

McCune de imediato pegou no seu telemóvel para fazer a chamada. Crivaro entrou para informar Lewis Birch de que uma equipa forense chegaria dali a poucos minutos.

McCune ainda estava a falar ao telefone quando Crivaro regressou ao exterior.

Disse a Riley...

"Agora quero que me conte exatamente o que experimentou."

Riley contou-lhe tudo, começando com o momento em que estava no quarto e reparou no baloiço através da janela, depois na sua crescente sensação da presença do assassino quando saiu para o exterior.

Crivaro parecia estar imerso em pensamentos quando ela terminou. Não lhe disse uma palavra. Riley desejou que ele dissesse alguma coisa...

“Bom trabalho” seria agradável.

Entretanto, McCune terminou o telefonema e caminhou em direção a eles.

“Os tipos da equipa forense estarão aqui em breve. Tenho algumas notícias sobre as buscas ao apartamento de Gregory Wertz. Eles encontraram algo debaixo do frigorífico - uma planta de um banco e algumas notas rabiscadas à mão. O homem planeava um assalto à mão armada.”

"Cum caraças", Disse Crivaro.

"Ainda há mais", Disse McCune. “Havia também uma lista de nomes e números de telefone - quatro nomes ao todo.”

"Cúmplices" Disse Crivaro, afagando o queixo. “Então foi para isso que as cinco máscaras de monstro foram roubadas. Wertz e o seu gang iam usá-las como disfarces para o roubo.”

De repente, as coisas começaram a tornar-se mais claras para Riley - coisas que intrigavam desde a sua conversa com o marido de Janet Davis e o interrogatório de Gregory Wertz.

Lembrou-se de quão confiante Wertz ficara até ao exato momento em que McCune fizera a pergunta que a própria Riley havia sugerido.

"Roubou as máscaras para que?"

Naquele momento, Wertz ficara agitado e ansioso.

E tinha motivo para tal.

Até àquele momento, McCune questionara o suspeito sobre dois assassinatos dos quais ele não sabia nada. Mas assim que McCune fez aquela pergunta, Wertz receava que McCune tivesse descoberto os seus planos para um assalto.

Riley também entendeu porque é que Janet Davis se tinha rido dos avanços grosseiros de Wertz.

Ela não tinha medo dele.

Ela não tinha motivos para ter medo dele.

Ou pelo menos assim lhe parecia agora.

Ficou surpresa quando McCune disse...

"Então afinal Wertz é culpado."

"Talvez" Disse Crivaro.

Riley hesitou por um momento, preocupada se estaria prestes a fazer uma pergunta estúpida.

Então disse, "Não tenho a certeza se entendi. Sabemos que Wertz é culpado de planear um assalto. Como é que isso o torna culpado dos dois assassinatos também?”

McCune fez-lhe uma careta e disse, “Sabemos que ele é um criminoso. Isso aumenta seriamente a probabilidade de ele ter cometido os assassinatos. Tenho a certeza de que não o encontrámos por acaso.”

Agora Riley estava realmente alarmada. Os seus instintos diziam-lhe exatamente o oposto do que McCune estava a explanar.

Estaria ela a tirar conclusões de principiante?

Crivaro não disse nada, apenas continuou a observar o quintal.

Riley questionou-se...

Será que Crivaro concorda com McCune?

Ela desejou que ele dissesse alguma coisa.

A equipa forense chegou rapidamente e começou a trabalhar assim que Crivaro lhes deu instruções. Eles iam circunscrever a área e registar qualquer coisa que pudessem ver com as suas luzes noturnas. Alguns membros da equipa esperariam lá a noite toda até de manhã, certificando-se de que a área não era violada. De manhã poderiam fazer uma busca mais completa.

Enquanto a equipa continuava a trabalhar, Crivaro perguntou a McCune e Riley...

"Alguma sugestão sobre o que fazemos a seguir?"

McCune disse, “Penso que por hoje chega. O pessoal forense toma conta das coisas por agora.”

Riley tentou segurar a língua, mas não conseguiu deixar de falar

"Espere lá. Nós não estivemos no local onde a primeira vítima foi encontrada - atrás do cinema. Talvez fosse boa ideia irmos ao local.”

McCune zombou e disse, “Agora? Quando já está a escurecer?”

Riley não sabia o que responder.

Talvez seja mesmo uma ideia idiota, Pensou.

McCune deu uma pancadinha na pasta que carregava e acrescentou, “Além disso, eu tenho fotos e informações aqui, tiradas pela polícia local que examinou a cena. Tudo o que precisamos de saber, especialmente agora que temos um suspeito infalível em custódia. Acho que podemos considerar o caso praticamente encerrado no que diz respeito a nós. Podemos preocupar-nos com outras coisas.”

Crivaro olhou para McCune e disse, “O seu suspeito infalível não fala. Isso significa que ainda temos que encontrar provas para ter um caso de assassinato contra ele. O nosso trabalho ainda não terminou.”

Crivaro parou por um momento, depois disse, "Vamos ao cinema."

Riley e os dois agentes voltaram para a casa. Lewis Birch olhava para as mãos no colo. Roberta Birch voltou do quarto e estava sentada ao lado do marido. Ela olhou para os agentes com uma expressão angustiada.

"Do quintal?" Perguntou num sussurro. "Ele levou-a diretamente do nosso próprio quintal?"

"Vamos descobrir" Disse Crivaro. "É por isso que temos aqui a equipa forense."

Agradeceu aos dois pais enlutados pela cooperação e foram-se embora.

Enquanto Crivaro os conduzia de regresso a DC noroeste, McCune folheava as informações contidas na sua pasta.

Disse, "O Cinema Capri é um pequeno cinema especializado em filmes clássicos."

Crivaro perguntou, "O relatório diz que filme estava em exibição quando o corpo foi encontrado?"

"Sim" Disse McCune. “Um filme muito antigo chamado Freaks.”

Crivaro soltou um grunhido. "Jesus. Eu vi isso quando era criança. Tive pesadelos durante semanas. É um filme de terror de 1932 que foi considerado tão horripilante que mal foi lançado e foi banido em alguns lugares, como na Inglaterra. Ainda é considerado um dos filmes mais chocantes já feitos.”

"De que é que trata?" Perguntou Riley.

Crivaro disse, “Aberrações de feira - sabe, pessoas com deformidades grotescas e coisas assim. As aberrações eram interpretadas por artistas de verdade - pessoas sem membros, ulheres barbadas, gémeos siameses, anões e coisas do género. As aberrações são na verdade as personagens simpáticas - gentis, honestas e de confiança. As pessoas "normais" são os verdadeiros vilões. No final, as aberrações vingam-se de uma trapezista maldosa e... ”

Crivaro estremeceu.

"Deixe-me dizê-lo desta forma. Eles mutilam-na, transformam-na numa aberração. E não é bonito.”

Riley pensou por um momento. “Então a segunda vítima foi encontrada num campo onde acabara de se realizar uma feira. E a primeira vítima foi encontrada atrás de um cinema onde passava um filme sobre artistas de feira.”

Crivaro disse, "Sim, o nosso assassino definitivamente rege-se por um tema, com feiras e palhaços e tudo mais."

Durante o resto da viagem, Riley deu por si a pensar em Gregory Wertz e no que havia sido encontrado em sua casa, além de planos para um assalto a banco.

Máscaras de monstros.

Ela tentou pensar em como aquelas máscaras se poderiam conectar com feiras e palhaços.

Nada lhe ocorreu.

Quando Crivaro estacionou em frente ao cinema, Riley viu que o filme em exibição era The Philadelphia Story, uma antiga comédia romântica com Katharine Hepburn. Ela suspeitava que a gerência havia mudado para um filme mais agradável logo depois de a mulher assassinada ter sido encontrada nas proximidades.

Crivaro, McCune e Riley saíram do carro e contornaram a esquina para o beco. A noite tinha-se instalado completamente, mas havia bastante luz derramando-se no beco húmido vinda da iluminação de rua.

Ao lado de um contentor de lixo via-se o contorno do cadáver da mulher.

Riley agachou-se para observar mais atentamente.

Com um arrepio, Riley recordou-se da foto que vira da vítima ao lado daquele contentor - disposta como Janet Davis e usando o mesmo fato colorido e fofo. Era fácil imaginar a vítima à sua frente naquele momento.

E era fácil imaginar o que o assassino sentira ao agachar-se sobre ela, saboreando a sua obra.

Um forigueiro agudo atravessou o seu corpo.

Mais uma vez, ela teve uma sensação de crueldade e sadismo indescritíveis.

O seu estômago revolveu-se com essa sensação renovada de conexão com o assassino. Tinha medo de ficar violentamente doente.

Lembrou-se de quando olhara pelo espelho de duas faces para Gregory Wertz. Ela tentou combinar o rosto de Wertz com o do homem cuja presença sentiu no momento - um assassino cruel que se regozijara sobre o corpo de Margo Birch bem ali, onde ela estava agachada.

Ela não o podia fazer.

Em vez disso, a sua conexão com a mente do assassino desapareceu como uma bola de sabão despedaçada.

Ouviu Crivaro dizer...

"Não vejo nada de interessante aqui. Você está certo, McCune. Está na hora de parar por agora. Vamos para casa. Começamos de novo amanhã.”

Riley ergueu-se trémula, ficando para trás de Crivaro e McCune enquanto caminhavam de volta para o carro.

Riley correu para alcançar Crivaro e sussurrou-lhe ao ouvido...

“Wertz não é o assassino. Tenho a certeza.”

Crivaro limitou-se a grunhir. Riley não fazia ideia do que aquele grunhido poderia significar.

Crivaro concordava com o seu palpite ou estaria a descartar a sua opinião?

Riley sentiu uma onda de horror crescente ao pensar na mente que pressentira...

Ele ainda anda por aí.

E vai matar de novo.


CAPÍTULO DEZASSEIS


Muito cedo na manhã seguinte, o telemóvel de Riley tocou enquanto estava na cozinha a comer cereais. Quando viu que a chamada era do Agente Crivaro, quase deixou cair o telefone na ânsia de atender. Talvez algo excitante já estivesse a acontecer naquele momento.

"Sweeney, tenho algo que quero que faça" Disse Crivaro.

A excitação de Riley aumentou. Devia estar prestes a atribuir-lhe uma nova tarefa.

“O que é?” Perguntou, tentando parecer calma.

“Haverá uma palestra no auditório do Hoover Building esta manhã. Quero que esteja lá.”

Uma palestra, Pensou Riley, sentindo-se desanimada. Mas não fez qualquer comentário.

Crivaro continuou, “Um velho colega meu, Elliot Flack, vai falar com os estagiários sobre a Unidade de Análise Comportamental. Quero que ouça o que ele tem a dizer.”

Riley ficou desapontada. Já tinha conhecimento da palestra, mas não planeava comparecer. Afinal, estava a trabalhar num caso real e esperava passar aquele dia com Crivaro e McCune.

Quando não respondeu, Crivaro disse, “Olá? Ainda está aí?"

"Sim, ainda estou aqui" Disse Riley.

Não sabia o que mais dizer. Crivaro certamente não gostaria que ela lhe dissesse que não estava interessada na palestra.

Depois de uma pausa, Crivaro disse, “Repare, se passar o programa e continuar, o mais provável é que vá para a UAC. Quero que saiba mais sobre esta unidade.”

"OK" Disse Riley. Percebeu que não estava a demonstrar grande entusiasmo, mas Crivaro não pareceu notar.

"Ótimo. Falamos depois.”

Antes que ele desligasse, Riley disse, “Espere um minuto, Agente Crivaro. Há alguma novidade sobre o caso?”

Ele limitou-se a dizer:

“Nenhuma novidade até agora. De que é que estava à espera? Não se preocupe com o caso. O McCune e eu estamos em cima do acontecimento.”

Crivaro terminou a chamada sem dizer mais nada.

Riley ficou a olhar para o telefone, dececionada.

Claro, Disse para si mesma, ele tem razão.

O que Crivaro dizia fazia sentido. Deveria participar na palestra sobre a UAC. Não sabia muito sobre aquela unidade e parecia um ramo interessante do FBI. Podia estar ali a sua futura carreira.

Lembrou-se das palavras de Crivaro quando a convenceu a entrar no programa de estágio de verão...

"Você daria uma ótima agente da UAC."

Isso fez com que Riley se sentisse um pouco melhor. Mas não conseguia deixar de pensar se Crivaro a estava a sacudir.

Será que tinha alguma coisa a ver com o que dissera quando deixaram o beco do cinema na noite anterior?

“Wertz não é o assassino. Eu tenho a certeza.”

Será que o rejeitou por ser tão presunçoso?

Talvez devesse ter ficado calada.

Mas como podia, quando a sua intuição fora tão poderosa? Crivaro não se interessara por ela precisamente devido à sua intuição?

Mas estaria arrependido?

Teria decidido deixá-la fora do caso a partir daquele momento?

Não tinha forma de o saber.

Riley tentou afastar tais pensamentos da sua mente enquanto terminava o seu pequeno-almoço. Então, entrou silenciosamente no quarto para não acordar Ryan. Pegou silenciosamente na sua roupa e entrou na casa de banho.

Depois de um banho rápido, vestiu um fato improvisado - um par de calças limpas e uma jaqueta. Não tinha à sua disposição muita roupa do tipo que se esperava de um estagiário do FBI, por isso tentou não se esquecer que tinha que lavar a roupa quando chegasse a casa. Felizmente, a lavandaria do prédio ficava ali na cave, no fundo do corredor onde se encontrava o seu apartamento.

Quando saiu da casa de banho, Ryan já estava sentado na cama.

"De saída tão cedo?" Perguntou, esfregando os olhos.

"Sim, desculpa a pressa" Disse Riley, beijando-o na bochecha.

"Vieste tarde" Reclamou Ryan. "Não tinhas muito a dizer."

“Eu sei. Tinha sido um longo dia. Estava muito cansada.”

Riley hesitou. Não queria falar sobre a mulher morta pintada de palhaço e a família enlutada. Pelo menos não até que tivesse mais tempo para explicar tudo.

Ryan bocejou e espreguiçou-se, e Riley lembrou-se que o encontrara debruçado sobre livros e papéis quando chegara a casa.

"Tu também estavas muito ocupado" Disse ela.

“Acho que sim" Disse Ryan com um bocejo. “Vim para casa com muito trabalho. Foi um grande dia."

Ele olhou-a. "Estás a ter problemas com as aulas?"

Riley ficou surpreendida com a palavra...

Aulas!

Ryan não fazia ideia daquilo por que tinha passado nos dias anteriores. O que é que pensaria se soubesse tudo o que ela estava realmente a fazer? Como é que lhe poderia contar?

Por enquanto, Riley não conseguia pensar em mais nada a não ser esquivar-se à pergunta.

"Conversamos quando chegar a casa" Disse Riley.

Deu-lhe outro beijo rápido e começou a afastar-se.

"Ei” Disse ele, e ela estacou.

Virou-se para ele e viu um olhar preocupado no seu rosto.

Ryan disse, "Tens que cuidar de ti."

"Eu sei" Disse Riley, "É o que estou a fazer."

Ryan franziu a testa e Riley não lhe queria dar a oportunidade de fazer perguntas sobre o seu trabalho.

"Eu venho para casa mais cedo hoje à noite" Disse alegremente. “Preparo o jantar. Não te preocupes. Adeus."

Riley saiu a correr do apartamento, sentindo-se confusa e um pouco culpada.

Há alguns dias que ela e Ryan não tinham tempo para falar com calma. Riley contou-lhe sobre alguns dos seus problemas com Crivaro e sobre algumas das suas próprias dúvidas.

Mas tanta coisa acontecera desde então!

Tinha que se certificar de que teriam tempo para conversar naquela noite.

Durante a caminhada de dois quarteirões até à estação de metro, Riley começou a sentir-se melhor.

Era uma pena que Ryan se sentisse mal por morarem ali. É verdade que o bairro estava um pouco degradado, mas estava a melhorar visivelmente. E mesmo àquela hora, as pessoas andavam nos passeios e as estradas estavam cheias de trânsito.

Quando entrou na carruagem do metro, reparou que estava repleta de outras pessoas a caminho das suas rotinas diárias.

Os seus primeiros anos na rural e pequena cidade da Virgínia pareciam tão distantes. E descobriu que realmente gostava da mudança. Sentiu como se estivesse realmente começando a acompanhar os ritmos de uma cidade grande e excitante.

Riley também sentiu um renovado sentido de determinação para ter sucesso no programa de estágio.

Tenho que aproveitar ao máximo esta grande oportunidade, Pensou.


*


Quando Riley entrou no auditório, reparou que muitos dos estagiários que já estavam sentados estavam a olhar para ela. Sentiu os seus olhares ainda mais intensamente do que durante o primeiro dia. Embora não tivesse tido contacto com eles enquanto trabalhava com Crivaro e McCune, era como se a curiosidade deles a respeito dela crescesse.

O que é que se passa? Interrogou-se.

Ela sentou-se no momento em que o palestrante se aproximava do pódio. Naquele momento, alguém se sentou no banco ao lado dela. Ela virou-se e viu que era John Welch, o tipo bonito que ela suspeitara ter-se atirado a ela anteontem.

Ele sussurrou-lhe, “Temos que conversar quando isto acabar. Tens que me contar tudo.”

Tudo o quê? Perguntou-se Riley.

Então percebeu...

Oh meu Deus!

A notícia do seu envolvimento no caso do “Assassino Palhaço” já circulava entre os estagiários Era por isso que alguns deles pareciam estar especialmente interessados nela. Mas o que é que teriam ouvido ao certo?

E o que é que ela ia dizer a John sobre aquilo?

Ficou aliviada quando o homem no pódio remexeu alguns papéis e começou a falar.

"Bom dia a todos, " Disse numa voz rouca mas alegre. "Sou o agente especial Elliot Flack e estou aqui para falar sobre a Unidade de Análise Comportamental."

Então, com uma risada abafada, acrescentou: “Eu não grande orador público. A minha especialidade é mais entrar na mente dos maus da fita. Espero não vos aborrecer.”

A sua observação provocou alguns risos na audiência. Obviamente que ninguém esperava que a sua palestra fosse aborrecida.

E não foi mesmo.

Flack tinha uma atitude dura que lembrava a Riley o Agente Crivaro. Mas também tinha um sentido de humor seco e às vezes sombrio.

Começou por falar sobre os primórdios da UAC em 1972, com a fundação da Unidade de Ciências Comportamentais do FBI. Naquela época, o perfil do criminoso parecia uma ideia radical e até um tanto louca. Os primeiros proponentes da criação de perfis fizeram o que era amplamente considerado impensável - passaram centenas de horas conversando com os assassinos mais cruéis atualmente encarcerados, tentando entender as suas mentes.

"Ah, a década de 70" Disse Flack com um certo prazer malicioso. "Essa foi uma época fantástica para estudar assassinos psicopatas."

Flack apontou para o ecrã à frente da sala e disse, "Vejam este homem, por exemplo."

De repente, uma imagem surgiu no ecrã que fez com que o coração de Riley batesse com mais intensidade.

Era o rosto de um palhaço, pintado de branco, com traços exagerados de cores vivas, especialmente uma enorme boca vermelha e sorridente.

Riley lembrou-se do termo que Danny Casal usara para um palhaço assim...

Um "rosto branco grotesco".

Era o mesmo tipo de maquilhagem que ela tinha visto nas duas mulheres assassinadas - a que estava no campo e a outra na fotografia.

Riley questionou-se...

Que raio nos vai ele contar?


CAPÍTULO DEZASSETE


Riley perguntou-se por um momento se estaria a sonhar.

Mas ela sabia que não estava.

Ela estava realmente sentada num auditório a observar uma imagem perturbadora, um rosto que lembrava muito duas vítimas de assassinato.

Era o rosto pintado de um palhaço.

Enquanto esperava que o agente Flack retomasse a palavra, os seus pensamentos dispararam. Iria ele falar sobre os assassinatos que ela estava a ajudar Crivaro e McCune a investigar?

Flack dirigiu-se para o lado do ecrã com um ponteiro.

Disse, "O homem que estão a ver era conhecido como 'Pogo, o palhaço' ou às vezes 'Patches o Palhaço". Ele era uma alma generosa que se apresentava em festas infantis e também em eventos de caridade e para crianças hospitalizadas. Era muito querido pela maioria das pessoas que o conheciam.

Flack parou por um momento, depois acrescentou...

“Ele violou, torturou e assassinou cerca de trinta e três meninos e jovens entre 1972 e 1978. Ele manteve a maioria dos corpos escondidos num espaço debaixo do chão da sua própria casa. As pessoas chamavam-no de "Palhaço Assassino".

Todos ficaram estarrecidos; e Riley não foi exceção.

"Palhaço assassino!"

Aquele não era o rosto de uma vítima. Era o rosto de um assassino.

Mesmo assim, o nome era parecido - demasiado – com aquele que estava a circular sobre os recentes assassinatos - o “Assassino Palhaço”.

Uma série de imagens passou no ecrã - as fotos do assassino, as fotografias de suas jovens vítimas e do espaço onde os corpos tinham sido descobertos.

Flack continuou, “O seu nome era John Wayne Gacy. E uma vez preso, tornou-se objeto de intenso estudo por profilers pioneiros. Passaram muito tempo a conversar com ele. Embora tenha sido condenado em 1980, só foi executado em 1994.”

Flack afastou-se do ecrã e olhou para os ouvintes.

“Alguma pergunta até agora?” Perguntou.

A mão de Riley disparou e Flack assentiu que falasse.

Ela perguntou, “O que é que os profilers aprenderam sobre ele? Quero dizer..."

Fez uma pausa, depois acrescentou, "Porque é que ele fez... as coisas que fez?"

Os lábios de Flack formaram um meio sorriso amargo.

"É uma boa pergunta. Gostaria de lhe poder dar uma resposta clara. Não é surpreendente que ele tenha tido uma infância difícil. O pai era um alcoólico brutal que o espancou e repreendeu. Mas o que é que isso explica? Muitas pessoas têm infâncias violentas e pais cruéis, e nem todos acabam por se tornar predadores sexuais e assassinos.”

Flack encolheu os ombros e acrescentou...

"O meu pai não era o homem mais simpático do mundo."

Nem o meu, Pensou Riley.

E ela nunca sentira o desejo de causar dor a ninguém, muito menos matar pessoas.

E no entanto...

Riley estremeceu ao pensar na facilidade com que entrava na mente de um assassino.

Será que a sua infância tinha algo a ver com isso?

Flack ostrou outro slide com uma pintura a óleo de um palhaço.

Disse, "Enquanto estava na prisão, ele pintou esta imagem de si mesmo como 'Pogo'. Deu-a a um dos profilers que passou muitas horas a entrevista-lo, com eas seguintes palavras escritas no verso..."

Outra foto mostrava a mensagem manuscrita de Gacy ...


“Querido Bob Ressler, não pode esperar desfrutar da colheita sem antes trabalhar nos campos. Muitas felicidades e boa sorte. Sinceramente, John Wayne Gacy, junho de 1988. ”


Depois de ler a mensagem em voz alta, Flack continuou...

“Quando Bob perguntou a Gacy o significado da mensagem, Gacy disse, 'Você é que é o profiler de criminosos. Descubra por si '”.

Flack encolheu os ombros e disse, “Penso que é exatamente isso que a UAC tem tentado fazer todo este tempo - descobrir o que faz os monstros sere monstros. Nós aprendemos muito ao longo dos anos, e tornámo-nos muito melhores a rastrear e apanhar esses monstros. O que nós ainda não conseguimos fazer é detê-los antes de agirem.”

Permaneceu em silêncio por um momento, depois disse, “E o nosso trabalho tem um risco pessoal. O truque é entender os monstros sem que nos tornemos também num monstro. Nem sempre é fácil.”

Riley ouviu o resto da palestra com fascinação extasiada. Ficou surpresa ao saber que o próprio termo "assassino em série" não era muito antigo. Fora inventado em algum momento durante a década de 70 por Robert Ressler, o profiler a quem Gacy escrevera a dedicatória. Ressler havia dito que pensara no termo porque sucessivos assassinatos o lembravam de "aventuras em série", curtas-metragens que ele vira quando era criança nas tardes de sábado.

Cada episódio desses filmes terminava sempre em suspenso, com o herói em perigo extremo. Os espectadores tinham que esperar pelo episódio do sábado seguinte para descobrir como é que o herói escapava à morte. Ressler lembrava-se da insatisfação que sentia no final de cada episódio - uma insatisfação que não aumentava quando o herói sobrevivia, e que parecia aumentar a cada episódio. Talvez, pensou ele, os assassinos que assassinaram sucessivas vítimas fossem movidos pelo mesmo tipo de insatisfação.

Quando a palestra terminou, a cabeça de Riley estava repleta de pensamentos e ideias. Ficou sentada por um momento tentando absorver tudo o que tinha ouvido.

Também se sentiu estranhamente tomada pela frustração.

Algures naquele dia, provavelmente naquele exato momento, Crivaro e McCune estavam à procura de pistas, provando ou contestando que Gregory Wertz era culpado de dois horríveis assassinatos...

E eu estou a perder isso.

O pensamento corroeu-a por dentro...

Insatisfação.

Sim, era isso meso - uma insatisfação palpável, como esperar pelo próximo filme de uma saga.

Fora o mesmo tipo de insatisfação que levara os assassinos em série a cometer os seus terríveis atos?

Se o mesmo sentimento movia assassinos, o que é que isso dizia sobre ela?

O que é que dizia sobre alguém que se sentia atraído por aquele tipo de trabalho?

Resolver um assassinato oferecia alguma satisfação, alguma conclusão?

Ou seria algum tipo de vício doentio?

Ela tocou no telemóvel que tinha no bolso e pensou...

Quem me dera que Crivaro ligasse.


CAPÍTULO DEZOITO


Ainda sentada na primeira fila do auditório, Riley lutava com a sua própria indecisão. O agente Flack estava a juntar a sua papelada e a preparar-se para sair, por isso ela tinha que se decidir naquele momento. Deveria colocar-lhe a terrível pergunta que estava à espreita na sua mente: a questão de saber se os assassinos e seus perseguidores partilhavam o mesmo tipo de insatisfação?

Finalmente acabou por se decidir. Sim, vou lá.

Mas antes de se levantar da sua cadeira, sentiu uma mão no seu braço.

Era John Welch. Com o seu fascínio pela palestra, tinha-se esquecido que ele estava sentado ao seu lado.

"Vamos, Riley" Disse ele. "Tens que falar comigo. Tenho que saber o que está a acontecer.”

Riley olhou para o agente Flack e viu que os outros alunos já se estavam a agrupar em seu redor. Teria que esperar na fila. Pior, teria que colocar a sua pergunta com outras pessoas a ouvir.

Olhou para John. Ele parecia ansioso e em pulgas para falar com ela.

"Ok, vamos" Disse ela.

Quando os dois saíram do auditório, Riley sentiu uma pontada de arrependimento pelo que poderia estar a perder. Mas perdera a coragem, e além disso, não queria ser rude com John.

A verdade era que até gostava dele. Olhando para a sua figura atlética enquanto caminhavam, ela pensou...

Talvez goste dele um pouco mais do que deveria.

Quando saíram para o corredor, John saltitava de excitação.

"Então conta-me tudo!" Disse. "É verdade o que eu tenho ouvido?"

“Não sei" Respondeu Riley. "O que é que tens ouvido?"

"Que estás a trabalhar no caso Assassino Palhaço com Crivaro e McCune."

Riley assentiu timidamente.

John ficou incrédulo.

"Uau!" Disse ele. “Como é que conseguiste? Nós estamos presos a workshops e seminários.”

Riley não sabia o que dizer. A verdade é que ela não tinha a certeza do motivo pelo qual Crivaro a trouxera para o caso.

Lembrou-se do que Crivaro tinha dito ao médico legista depois de Riley ter percebido que o assassino tinha assustado a sua vítima até à morte.

“É o que ela faz. É por isso que está aqui.”

Mas onde estava Crivaro agora?

Tinha perdido a confiança nela?

John disse, "Acho que não devia estar surpreendido. Quer dizer, tu és a única estagiária que entrou no programa com experiência prática real. É claro que tens essa vantagem sobre os outros. Mas tens que me dizer - como foi trabalhar no campo? O que é que fizeste?”

O dia anterior passou pela mente de Riley - o telefonema madrugador de Crivaro, ver o cadáver grotescamente vestido e maquilhado no campo, os cheiros e a luz estranha na câmara escura, a visita à loja de disfarces, a prisão e interrogatório de Gregory Wertz e, finalmente, a visita aos pais de Margo, onde ela teve uma sensação tão poderosa sobre como a jovem fora raptada.

Riley mal podia acreditar que tudo acontecera num só dia.

Por onde é que começo? Interrogou-se.

Ou talvez a questão mais importante fosse...

Devo falar sobre isto?

Crivaro não dissera nada sobre o que ela podia ou não dizer. Estaria ele a contar que ela usasse o senso comum? O que é isso sequer significaria?

"OK, diz-me só uma coisa" Disse John. “É verdade que há um suspeito infalível em custódia? Quero dizer, apanhaste mesmo o tipo? Ainda não há nada nos meios de comunicação social sobre isso, mas as novidades correm por aqui.”

Riley foi sacudida pela pergunta. Ela não considerava que Gregory Wertz fosse realmente o assassino, mas...

Crivaro?

Não sabia se Crivaro achava que o suspeito era culpado de algo além de planear o assalto a um banco.

Riley disse de forma hesitante...

"John, eu... acho que o melhor é não dizer nada."

John limitou-se a olhar para ela.

"Lamento" Acrescentou Riley.

John esboçou um sorriso de satisfação.

"Ei, não lamentes" Disse ele. "Não podes discutir a situação. Isso ainda é mais fixe!”

Riley ficou aliviada.

“Então, para onde vais agora?” Perguntou Riley a John.

"Tenho um workshop sobre computadores" Disse John. "E tu?"

Riley encolheu os ombros e disse, "Acho que não tenho nada por agora."

"Porque é que não vens comigo?" Perguntou John. "Tenho a certeza de que serás bem-vinda."

"Isso seria bom" Disse ela. Mas enquanto se dirigiam para o laboratório onde o workshop se realizaria, Riley começou a questionar-se...

Será isto demais para mim?

Ela nem sequer tinha um computador. Em Lanton, Riley às vezes usava os computadores da escola ou o de Ryan - mas nenhum deles com muita frequência. Os livros antiquados eram mais o seu estilo. Ela considerava os computadores bastante intimidantes e a Internet parecia-lhe algo vasto e confuso.

Estaria ela preparada para conversas sobre codificação e programação?

Ficou aliviada por ver que o laboratório estava repleto de computadores comuns e modems tal como o que Ryan usava no apartamento. O tópico do dia eram os desenvolvimentos recentes nos mecanismos de pesquisa da Internet e como eles poderiam ser usados em investigações criminais.

Riley ficou fascinada quando se ligou à Internet e participou em vários exercícios. Aprendeu rapidamente a usar os termos de pesquisa para encontrar longas listas de informações que, então, precisavam ser reduzidas a itens de interesse úteis e pertinentes.

O que Riley achara mais incrível fora o facto de que essa tecnologia não era nem um pouco fora do comum - certamente não apenas destinada a especialistas de elite da ciência de computação.

Qualquer um pode fazer isto, Percebeu.

O instrutor referiu que aquela tecnologia estava a ficar mais rápida e mais poderosa a cada dia que passava. Riley perguntou-se o que é que isso poderia significar para o futuro. Iria transformar completamente a natureza do trabalho de investigação? Civis comuns seriam capazes de localizar bandidos sem sair de casa - como "detetives de poltrona" da vida real?

As possibilidades confundiam-na.

Quando o workshop terminou, Riley e John foram para o refeitório para almoçar. Enquanto falava um pouco sobre si mesmo – sobre a sua infância privilegiada e os seus sonhos idealistas para o futuro - Riley deu por si a gostar cada vez mais dele.

Se ele estava a atirar-se a ela ou não - bem, naquele dia não tinha a certeza. Mas pelo menos tinha sido clara com ele mencionando que estava noiva, por isso sentia-se confiante de que não estava a enviar-lhe sinais contraditórios. Tanto quanto sabia, ele estava apenas a ser amigável. E era bom finalmente ter um amigo ali em DC.

Riley falou um pouco sobre a sua própria vida, mas havia alguns detalhes que ela não referiu. Evitou falar no assassinato da sua mãe e minimizou o mau humor do seu pai. E ainda não mencionara que estava grávida. Não sabia bem porquê. A verdade é que Riley não se lembrava de ter contado isso a ninguém, exceto Ryan, e não achava que Ryan tivesse falado sobre isso também.

Teria ele sequer contado aos pais?

Se tivesse, nunca o mencionara. Porque é que ambos estavam a ser tão reservados?

Riley não sabia.

Interrompendo os seus pensamentos, John levantou-se da mesa e disse, “O meu grupo vai visitar outro laboratório. Vem comigo."

Riley achou que mais valia ir, já que ainda não soubera nada de Crivaro. Enquanto caminhava pelo corredor ao lado de John, tentou ignorar os olhares curiosos de outros estagiários do seu grupo. Manteve a cabeça baixa e seguiu-o por uma porta.

Dentro do compartimento, um homem envergando roupas de laboratório cumprimentou-os. Apresentou-se como um patologista forense e, em seguida, puxou para trás o que cobria algo que se encontrava na mesa à sua frente.

Era o cadáver de um adolescente, com os olhos bem abertos, o corpo marcado por quatro feridas de bala.

Estamos na morgue, Apercebeu-se então Riley.

O patologista explicou que aquele era um rapaz de dezessete anos que tinha sido morto num episódio de violência de gangues.

Riley sentiu uma pontada de tristeza ao pensar numa vida tão terrivelmente curta.

Vários dos outros estagiários ficara chocados e três deles saíram a correr da sala.

Um desses três estudantes era John.

Riley imaginou que poderia ser a primeira vez que ele e a maioria dos estagiários viam um cadáver, ainda para mais alguém que tinha sido assassinado. Quanto a Riley, aquele era o quarto corpo de uma vítima de assassinato que ela vira na sua curta vida.

O mais recente tinha sido Janet Davis no dia anterior.

Há apenas algumas semanas, em Lanton, ela encontrara dois corpos com as gargantas cortadas. As duas raparigas tinham sido suas amigas - uma delas era a sua melhor amiga e companheira de quarto.

E é claro, Riley tinha visto a sua própria mãe morta a seus pés quando ainda era apenas uma criança.

Questionou-se...

Estarei a ficar indiferente ao horror?

Enquanto ouvia a palestra do patologista, "indiferente" não parecia ser a palavra certa para o que ela estava a sentir.

Curiosidade era mais apropriada.

Enquanto o homem falava, Riley aprendeu coisas que não sabia sobre armas e ferimentos de bala - por exemplo, que uma bala típica viaja a 1,126 pés por segundo. E poucas pessoas sabiam o dano horrendo que uma bala causava ao corpo humano.

O patologista apontou para onde uma bala havia entrado no ombro da vítima.

"Poderiam pensar que uma bala no ombro não seria muito grave" Disse ele. "Mas não é verdade. Quando esta bala atingiu a omoplata, explodiu em fragmentos, cada fragmento ricocheteando através da carne e causando a sua própria parcela de danos nos nervos, músculos e vasos sanguíneos. Cada um desses fragmentos seria como carvão quente sob a carne da vítima.”

Indicando outra ferida, acrescentou, "O mesmo se aplica a este que parece ter atingido a sua pélvis".

Ele apontou para outro ferimento na barriga da vítima.

"Este foi ainda mais doloroso" Disse ele. “Deve ter triturado os seus intestinos ou rasgado o estômago. Mas não foi desta ferida que ele morreu.”

Apontou para uma ferida na coxa da vítima.

"Esta foi fatal" Disse ele. “Atingiu a artéria femoral e não estava ninguém por perto para ajudá-lo a estancar a hemorragia. Mas deve ter parecido uma eternidade antes de perder a consciência devido à perda de sangue.”

O patologista olhou para os estagiários e acrescentou, “Como podem ver, levar um tiro não é nada parecido com o que se vê na televisão. A dor é inimaginável. E se sobreviver, provavelmente ficará com algum dano físico para o resto da vida. E dano psicológico também. As pessoas que foram baleadas muitas vezes passam por mudanças de personalidade profundas e permanentes, tornando-se depressivas, irritáveis e paranóicas”.

Fez uma pausa para olhar o corpo e disse, “Claro que se tiver sorte, vai ser baleado no cérebro ou no coração, e provavelmente morrerá instantaneamente. Se não, provavelmente desejará estar morto. E esse sentimento pode permanecer para o resto da sua vida.”

Enquanto a palestra continuava, Riley reparou que dois dos estagiários que tinham saído da sala haviam regressado - mas não John. Quando o workshop terminou, Riley saiu para o corredor e olhou à sua volta. Não o viu em nenhum lugar.

Perguntou-se... estaria ele envergonhado pela forma como reagira ao ver uma vítima de assassinato?

Riley esperava que não. Ela sabia que a reação dele fora perfeitamente natural. E aquele professor em particular tinha sido excessivamente contundente com os estagiários.

Ao lembrar-se da sua própria curiosidade extasiada, questionou-se...

Terá a minha reação sido perfeitamente natural?

Enquanto vagava sem rumo pelo corredor, sentiu a sua frustração a crescer novamente.

Quando é que Crivaro vai ligar?

Irá ligar?


CAPÍTULO DEZANOVE


Riley sentiu-se bloqueada. Ficou parada no corredor, imaginando quando ou se Crivaro iria ligar. Depois de dois dias de intensa atividade, parecia insuportável não ter para onde ir e nada para fazer.

Deu por si a pensar...

Estarei a ficar viciada neste tipo de trabalho?

Já, com apenas dois dias de trabalho?

Era um pensamento assustador. Este caso não a envolvera diretamente, como os assassinatos na faculdade. Mas sentia-se atraída por aquele magnetismo – o de tentar resolver um mistério mortal.

Tinha que fazer algo para descontrair.

Talvez algum exercício físico ajudasse.

Foi ao balneário dos estagiários e usou a casa de banho para vestir a sua roupa de ginástica. Então foi para a sala de exercícios do FBI. Ficou contente por ver que o compartimento estava muito bem equipado. Inclusive até tinha um saco de boxe pendurado.

Depois de usar uma lição de Krav Maga para afastar um possível violador, passara algum tempo no ginásio de Lanton a aprender algumas táticas básicas de luta com um assistente de pós-graduação em educação física. Com esta bagagem, Riley sabia como se exercitar.

Começou devagar, mantendo as mãos em posição defensiva e batendo apenas alguns socos leves. Sentiu a sua agressividade a crescer à medida que atacava cada vez mais com golpes, uppercuts, socos no corpo e ganchos. Mas mesmo quando ela adicionou pontapés aos seus ataques, não sentiu a libertação que desejava.

Empurrou o saco para que balançasse e se virasse, tentando fingir mais a sério que era um oponente de verdade. Esquivando-se e movendo-se à volta do saco, ela baixou-se, balançou, investiu e girou, tentando apanhar o seu inimigo imaginário desprevenido. Os seus ataques tornaram-se mais e mais brutais, mas...

Algo está a faltar, Percebeu.

E esse algo era um verdadeiro adversário, alguém que realmente quisesse magoar ou até mesmo matar Riley, alguém com quem tivesse que lutar desesperadamente pela sua vida...

Eu quero que este saco seja ele.

Ela queria que o objeto fosse o próprio assassino.

Mas não era.

Ela nem fazia ideia de como era o homem.

Ele era forte, aparentemente - pelo menos forte o suficiente para subjugar e raptar duas mulheres à força.

Ele também era profundamente sádico - Riley tinha obtido essa perceção mais do que uma vez.

Mas como é que ele se parecia?

Seria parecido com um palhaço, inventado e fantasiado?

Ou era apenas uma pessoa comum por quem ela poderia passar na rua sem sequer reparar nele?

Como seria olhá-lo nos olhos?

Será que veria um mundo de mal lá?

Como seria ter que lutar até a morte com ele?

Por fim, Riley afastou-se do saco e ficou de pé com as mãos nos joelhos, ofegando enquanto o seu coração batia e o suor cobria o seu corpo.

Não vale a pena, Pensou.

Bater no saco era algo muito parecido com as séries de filmes antigos, sempre prometendo alguma gratificação que nunca surgia.

Riley sentia-se a enlouquecer de frustração.

Mas o que raio poderia fazer?

Quando o seu batimento cardíaco diminuiu e a sua respiração acalmou, uma possibilidade começou a surgir - algo que pelo menos lhe daria a sensação de fazer alguma coisa. E era algo que ela podia fazer sozinha

Crivaro aprovaria a sua ideia?

Duvidava.

Mas realmente não se importava.

Riley voltou ao balneário, tomou um banho e vestiu as suas roupas normais. Então olhou para o mapa do metro na parede do balneário e viu qual é que tinha que apanhar para chegar ao Parque Lady Bird Johnson. Anexado ao mapa do metro estavam lotes de mapas gratuitos de DC. Ela encontrou o que mostrava o parque com mais detalhes e levou-o consigo.

Então ela saiu do edifício, foi até à estação de metro e apanhou o horário seguinte. Era uma viagem de quarenta e cinco minutos até ao Parque Lady Bird Johnson, por isso teve tempo de sobra para considerar o que estava prestes a fazer.

Aquele era o parque onde Janet Davis tinha sido raptada enquanto tirava fotos ao entardecer. Os polícias locais, é claro, tinha ido até ao local e encontraram a máquina que havia sido arrancada das mãos de Janet no momento da sua captura. Riley tinha visto as imagens reveladoras disso. Mas de acordo com os relatórios, a polícia não encontrou outras pistas.

Riley sabia que não restariam sinais do que acontecera lá. Mas lembrava-se daquele poderoso senso de conexão com o assassino que tinha conseguido sentir no quintal de Margo Birch. Poderia atingir uma conexão semelhante no parque?

Até posso descobrir algo importante.

Algo que mais ninguém descobriu.

Claro, ela sabia que o seu plano poderia ter as suas falhas.

Riley ainda não tinha estado naquela cena de crime e até ao dia anterior, Crivaro e McCune também não. Certamente que os dois agentes iriam até ao parque naquele dia.

Ela não queria encontrá-los lá. Crivaro podia zangar-se seriamente por ela intrometer-se onde não era chamada. Mas eles provavelmente já lá tinham estado e já se tinham ido embora.

Para sua surpresa, Riley percebeu que não se importava minimamente. Não queria ser deixada de fora, não ia tolerar isso.

Quando saiu da carruagem de emtro e caminhou o resto do caminho até ao parque, viu que o céu estava nublado e ameaçando chover. Ela não estava vestida para a chuva e não tinha um guarda-chuva. Mas o risco de ser surpreendida por uma chuva torrencial e ficar encharcado não a preocupava muito.

De imediato reconheceu a passagem que levava a um pequeno canal de água até à Ilha de Columbia, onde ficava o parque. Viu a ponte na primeira foto a preto e branco de Janet. Ainda não era de noite, mas quando Riley atravessou a ponte, o céu nublado tornou tudo estranhamente parecido com a foto, com as mesmas sombras suaves e superfícies silenciosas.

Quando chegou à ilha, desdobrou o mapa para procurar locais familiares. Primeiro, foi até à estátua que viu numa das fotos - uma onda forjada a partir de alumínio, encimada por várias gaivotas que pareciam estranhamente congeladas durante o voo. Segundo o mapa, era o Memorial Navy-Merchant Marine.

Ela reparou que vários visitantes do parque passavam a correr pela estátua em direção à passagem, fugindo do parque por causa da ameaça de chuva.

Isso é bom, Pensou Riley.

Tal como Janet naquela noite fatídica, Riley não tardaria a ter o parque só para si. Ela só esperava que a chuva não caísse até ela conseguir fazer o que queria...

Se eu o conseguir fazer.

Os seus instintos ainda não tinham sido testados até ao limite e ela podia deixar de sentir aquela conexão.

Eu não vim até aqui para nada, Disse a si mesma com firmeza.

Ela seguiu um trilho até chegar ao seu próximo destino - o obelisco grosseiro que ela tinha visto numa das fotos, que era na verdade o Monólito LBJ Memorial Grove. Assim como Riley vira na fotografia, podia agora ver o Monumento de Washington elevando-se à distância.

Até àquele momento, não havia visitantes à vista.

Riley olhou à sua volta, tentando imaginar como Janet se sentira em pé ali tirando fotos da cena inconstante.

Teria Janet tido alguma sensação de estar a ser observada e seguida? Não, Riley já tinha percebido que o raptor de Janet era furtivo. Janet sentiu-se segura, satisfeita e sozinha.

Riley sentiu um profundo arrepio.

Janet estava errada.

Ele estava definitivamente aqui em algum lugar.

Lembrou-se do que Crivaro tinha dito a Charlie na câmara escura...

"Amplie tudo ... todas as fotografias, cada centímetro quadrado."

Charlie já devia ter feito isso agora. Teria encontrado alguma figura ou rostos reveladores?

Não, o assassino certamente ficou fora de vista, atrás dela, ou...

Riley olhou o caminho que dava para um bosque de pinheiros e cornisos. Ele poderia ter-se escondido em algum lugar ali - na verdade, Riley tinha quase a certeza disso. Ela continuou pelo bosque, seguindo um caminho que Janet poderia ter seguido até ao seu último local.

Riley sentiu a presença do assassino, sentiu-o a correr entre as árvores logo atrás dela enquanto caminhava.

Deu por si a pensar...

Ele está realmente aqui?

Agora mesmo?

Em caso afirmativo, ela estaria em perigo naquele exato momento?

Não, Percebeu. Apesar dessa sensação vívida de ameaça, o que ela estava a sentir não estava a acontecer naquele momento. Ela estava a sintonizar algo que já havia acontecido.

Ela sabia que Janet não era um alvo aleatório, tal como não fora Margo Birch. O assassino era tudo menos espontâneo ou impulsivo. Ele tinha perseguido as duas furtivamente e com habilidade até saber exatamente quando e onde atacar.

Enquanto caminhava, uma sensação estranha apoderou-se dela.

Já não estava a imaginar o episódio do seu ponto de vista.

Em vez disso, ela viu toda a cena como o assassino a deve ter visto.

Ela imaginou-se a correr entre essas árvores, evitando a visão da jovem que continuava a caminhar alegremente e sem suspeitar de nada.

Riley sentiu uma onda de terror, tal como nas outras ocasiões em que percecionara a presença do assassino.

Mas lutou contra o medo e continuou até chegar à marina, com as suas docas de madeira projetando-se numa lagoa pacífica. Janet tirara a maioria das fotos daquelas docas. Deve ter sido o local favorito dela e o assassino devia saber isso.

A luz cada vez mais fraca continuou a lembrar Riley das fotos que ela tinha visto. Ao ouvir o suave bater da água e o grasnar das gaivotas, as imagens a preto e branco passaram pela sua mente vividamente.

Ela escondeu-se entre algumas árvores e olhou para a frente, imaginando que ela era a assassina observando Janet a mover-se nas docas.

Finalmente, Riley lembrou-se daquela fotografia turva final, com as suas formas caóticas e confusas de barcos e docas. Por mais confusas que essas formas fossem, Riley sentiu que se alinhavam com a visão que ela tinha da marina naquele momento...

Ela voltou para tirar aquela foto.

E ele estava à espera.

Ele devia ter algum tipo de objeto duro e áspero na mão - um pequeno pedaço de cano, talvez.

Riley agora quase podia sentir o peso daquele objeto na sua mão.

Saiu de entre as árvores, sentindo a prontidão e excitação que ele deve ter sentido quando se esgueirou por trás dela e lhe bateu no crânio e a viu cair a seus pés...

Riley ofegou.

O seu ponto de vista regressou à sua mente.

Ela sentiu que o assassino ainda estava lá à sua frente.

Por um momento, pensou que poderia agarrá-lo pela garganta e exigir...

Quem é você? Onde podemos encontrá-lo agora?

Mas ela não podia fazer isso. E a sua perceção dele estava a desaparecer.

Ela teve uma sensação fugaz do sorriso no seu rosto enquanto olhava para a sua presa ferida, ansioso para o vinha a seguir - o ritual de vesti-la e maquilhá-la, injetando a droga fatal nas suas veias, provocando-a e atormentando-a literalmente até à morte.

Ele teve que movê-la. Como?

Riley olhou à sua volta e viu um pequeno estacionamento nas proximidades. Estava quase vazio agora. Podia estar completamente vazio quando ele atacou Janet. Se assim fosse, não teria sido difícil arrastá-la para o seu veículo estacionado, atirá-la lá para dentro e depois levá-la...

Para onde?

Ela lembrou-se de quando estava sentada no carro de Crivaro, observando Crivaro e McCune a arrastar Gregory Wertz para fora do seu prédio. Ela não tinha visto o apartamento de Wertz, mas a julgar pela aparência da vizinhança, do prédio e do próprio homem, era com certeza relativamente pequeno, apertado e desordenado.

Não, Pensou.

Não aconteceu lá.

Aquele não era o cenário para tal sadismo ritualístico, quase cerimonial.

Wertz arrastou-a para outro lugar completamente diferente?

Não, o homem não possuía as características necessárias para manter tal lugar e realizar tal ritual...

Imaginação.

Riley fechou os olhos, tentando imaginar o lugar onde o tormento das vítimas tinha sucedido.

Ela murmurou em voz alta, num tom quase suplicante...

"Onde? Onde é que o fez?”

Algumas gotas de chuva atingiram-na, arrancando-a do seu devaneio sombrio.

A sua conexão com o assassino terminara.

Mas ela sabia uma coisa que não sabia antes...

Ele tem um covil.

Temos que encontrar o covil.


CAPÍTULO VINTE


Sozinho, finalmente, nos seus aposentos secretos, Joey tirou a sua "fantasia" - as roupas que usava no mundo das pessoas comuns, as roupas que possibilitavam que ele se misturasse com elas, fazendo-as pensar que ele era uma delas.

Se eles soubessem, Pensou.

Interrogou-se - poderia algum dia ensinar a alguém a terrível verdade?

A verdade sobre si e sobre o mundo em que viviam?

Poderiam alguma vez aprender?

Não era uma lição fácil. Ele sabia isso melhor do que talvez qualquer outra pessoa no mundo.

Quando se despiu completamente, foi até um armário onde uma dúzia de maravilhosos trajes de palhaço fofos, berrantes e coloridos estavam pendurados.

Escolheu um e vestiu-o, depois ficou a olhar para si mesmo ao espelho.

Isso, assim está melhor, Pensou.

Agora que se sentia mais autêntico novamente, os seus pensamentos voltaram-se para as jovens que tinham morrido às suas mãos.

Ele sabia que não era fácil para elas, ter que aprender a sua terrível lição num tão curto espaço de tempo - uma lição que ele passara toda a sua vida a aprender e a com ela viver.

Tinha sido realmente impossível para as duas mulheres que ele já tinha escolhido, sentindo o medo e a solidão a surgir em ondas repentinas e incontroláveis, olhando-se ao espelho e finalmente ver os seus rostos...

Não os rostos que costumavam ver no espelho, mas os seus rostos mais verdadeiros, os rostos que o resto do mundo realmente via, brilhantes e barulhentos e estranhos, os rostos rejeitados, os rostos dos banidos.

Porque afinal, era isso que as pessoas realmente eram, todas elas.

Banidas.

Oh, aquelas mulheres não entenderam. Poucas pessoas entendiam. Achavam que estavam cercadas por pessoas em quem podiam confiar - pais, parentes, esposo, amigos, colegas de trabalho. Mas toda essa gentileza, boa vontade e até mesmo amor eram apenas fingidos, um ato, uma zombaria de como as pessoas realmente se sentiam.

Ele tentou explicar àss mulheres...

“Vão deixá-la para trás.”

Ele dissera aquilo vezes se conta.

E ainda assim elas não entenderam.

Foi tão simples, realmente. Como é que ele poderia ter sido mais claro?

Lembrou da forma como a última mulher gritara quando ele a provocou com uma faca...

"Porque é que me odeia?"

Que pergunta estranha!

Ele respondeu com a verdade, claro.

"Todo a gente a odeia."

Então ela entrou em pânico.

Ele sabia que o pânico dela era natural. Ele vivera muitos anos nesse estado de horror perpétuo. Era normal para ele. Ele não podia imaginar a vida sem esse horror.

Mas tudo era novo para ela, e ele lembrou-se de como ela se contorcera e gritara...

“Tire eles de cima de mim! Mate-os!"

Ela pensou que estava cheia de insetos.

À medida que o seu terror aumentava, ela parecia pensar que os insetos estavam debaixo da sua pele.

A outra ulher também sentira esses insetos - um efeito da droga, aparentemente.

Mas, finalmente, quando ele mostrara à mulher o seu rosto no espelho, ele viu uma mudança nela.

Ela realmente entendeu, foi desenganada, mesmo que apenas por um momento.

Ela viu o eu que todos viram.

Ela soube que era verdadeiramente proscrita, tal como ele era.

Ela sabia...

"Vão-me abandonar."

...E que ele era a única pessoa no mundo que a aceitaria como ela era.

Mas ela rejeitara essa oportunidade.

Enquanto ele segurava a faca junto da sua garganta, ela sibilara...

"Faça-o. Faça-o agora."

Ele não tinha intenção de matá-la, é claro.

Coube a ela escolher entre uma morte solitária e o único tipo de companhia que ela poderia esperar...

Uma vida comigo.

Ela não tinha sido suficientemente forte para escolher aquela vida, e a outra mulher também não.

Ambas tinha escolhido morrer.

A próxima será mais forte, Disse a si mesmo.

E já escolhera a próxima mulher, embora ela ainda não o soubesse.

Ele andava a observá-la, a segui-la, à espera do momento perfeito.

Mas esse momento ainda não chegara.

Em breve, Disse. Em breve.

Enquanto isso, ele provocava o mundo que o tinha atormentado – provocava-o com uma mensagem que as pessoas iria ler no dia seguinte...

Um enigma.

Porque não havia uma forma direta de dizer o que ele tinha a dizer.

Só poderia ser dito num enigma.

Haveria alguém que pudesse resolver o segredo do enigma - especialmente a sua palavra chave, paradoxal?

Deve haver, Pensou.

Apenas uma pessoa.

Uma jovem mulher, talvez.

Talvez um dia ele a encontrasse cara a cara.

Certamente que ela entenderia.

Entretanto, estava exausto de passar o dia no mundo, fingindo ser apenas mais um dos seus miseráveis e solitários habitantes.

Pegou num dos inúmeros desenhos de palhaços que pregara na parede. Tinha enviado um daqueles esboços com o seu enigma, e ele perguntou-se se a imagem apareceria juntamente com as suas palavras.

Então dirigiu-se a uma prateleira e pegou numa caixa de metal. Colocou-a no balcão em frente ao espelho e abriu-a. Estava cheia de garrafas de látex e adesivos, próteses coloridas e tubos de maquilhagem.

Ele saiu para o mundo disfarçado, usando o tipo de roupa que as outras pessoas usavam, usando a máscara da sua própria pele.

Ele precisava de colocar o seu verdadeiro rosto para ir para a cama.

Espalhou a maquilhagem branca por todo o rosto. Disse em voz alta o título do enigma que as pessoas leriam no dia seguinte...

"Bem-vindos ao Labirinto."


CAPÍTULO VINTE E UM


Riley estava encharcada até aos ossos no momento em que regressou a casa. A chuva caíra com força quando ela se deslocou do Parque Lady Bird Johnson até à estação de metro e ainda chovia quando ela chegou à paragem perto de casa. Correr aqueles últimos dois quarteirões parecia inútil.

Ryan estava sentado na mesa da cozinha, mas levantou-se de imediato quando ela entrou.

"Oh não" Exclamou. "Pelos vistos não levaste um guarda-chuva."

Riley abanou a cabeça com o seu cabelo a derramar água. "Pelo menos está quente lá fora" Disse ela, rindo.

Ryan encaminhou-a para a casa de banho e começou a esfregá-la com uma das toalhas.

"Tens que cuidar melhor de ti" Repreendeu-a.

"Para" Protestou Riley. "Vou mudar de roupa. Já venho.”

Despiu-se, secou-se e vestiu-se.

Quando voltou para a cozinha, foi arrebatada pela culpa.

Dois lugares estavam postos à mesa. Ryan tinha colocado uma tigela de atum e salada de massa - uma refeição rápida e fácil que Ryan gostava de preparar. Estava lá sentado à espera dela.

Riley lembrou-se das suas palavras nessa manhã.

"Eu venho para casa mais cedo hoje. Preparo o jantar. Não te preocupes."

"Oh, meu Deus" Disse numa voz embargada. "Ryan, eu sinto muito."

Ryan encolheu os ombros e disse, "Estava a ficar tarde".

Ele colocou um pouco de salada no seu prato.

"Eu realmente sinto muito," Disse Riley trémula. "Perdi a noção do tempo."

Ryan começou a comer em silêncio.

Oh, não, Pensou Riley.

Ela percebeu pelo silêncio de Ryan que ele estava realmente aborrecido.

Enquanto se servia, Riley disse, “Como foi o teu dia?"

Sem olhar para ela, Ryan respondeu, “Bom. Foi o meu segundo dia num tribunal.”

"Uau" Disse Riley. "Deve ser realmente emocionante."

Ryan não respondeu.

O seu segundo dia, Pensou Riley com pena.

Ele não tinha mencionado aquilo no dia anterior. Ela estava cansada e ele estava debruçado sobre uma pilha de trabalho que trouxera para casa.

Comeram em silêncio durante alguns momentos.

Finalmente Ryan olhou para ela e disse, “Então e tu? Como foi o teu dia?"

Riley engoliu em seco.

Ela tinha prometido a si mesma que lhe contaria a verdade sobre o seu envolvimento no caso do assassinato assim que estivessem juntos.

Agora parecia ser o momento certo.

Riley decidiu que talvez pudesse facilitar a verdade com algumas das suas atividades mais inócuas...

“Bem, hoje fui a alguns workshops. Um era sobre computadores e como usar a Internet.”

Riu nervosamente e acrescentou, "Vais gostar de saber que estou finalmente a aprender a usar um computador. Talvez já esteja pronta para o novo milénio.”

Ryan não riu nem sorriu. Apenas continuou a comer.

Então Riley disse...

“Depois fui a um workshop na morgue...”

Antes que pudesse continuar, Ryan olhou para ela com uma expressão assustada.

“A morgue? Oh meu Deus! Quão mau foi isso?”

Riley ficou intrigada.

Porque é que ele está tão preocupado?

Ela encolheu os ombros.

Ryan largou o garfo e olhou para ela com preocupação.

"Oh, Riley, por favor, diz-me que não tiveste que olhar para um cadáver."

Riley assentiu.

Ryan agora parecia realmente alarmado.

Disse, “Isso deve ter sido tão difícil para ti - quero dizer, depois do que aconteceu com a tua mãe quando eras pequena, e depois de tudo o que aconteceu em Lanton. Como te aguentaste? Estás bem?"

Riley gaguejou, "Claro, eu estou ... não foi nada de especial."

Ryan pegou na mão de Riley.

“Mas foi duro. Não te deviam ter obrigado a isso.”

Riley quase protestou que ninguém a tinha "obrigado" a fazer aquilo, que ela fora para o workshop porque quis, mas...

Não, eu não lhe posso dizer isso.

Ainda assim, não podia ser completamente desonesta com ele.

Ela disse, "Não foi traumático, Ryan. Na verdade, foi muito interessante. Eu aprendi muito sobre ferimentos de bala.”

Os olhos de Ryan arregalaram-se.

Riley acrescentou, "Realmente, não é motivo para te preocupares."

Ryan abanou a cabeça e disse, "Não gosto disto, Riley. Há uns dias atrás questionavas-te se este programa era certo para ti. Ainda estás incerta? Porque olha que eu estou. Riley, tens que te lembrar...

"Eu sei" Disse Riley, interrompendo gentilmente. "Estou grávida e tenho que cuidar de mim mesma. Não te preocupes. Não é nada com que não possa lidar.”

Ryan apertou-lhe a mão.

"Tens a certeza?" Perguntou.

"Tenho certeza" Disse Riley.

Ryan encolheu os ombros e disse, “Bem, desde que tenhas a certeza. Deves fazer aquilo que quiseres. Eu vou apoiar-te, seja qual for a tua decisão.”

As palavras de Ryan cooveram Riley...

Ele diz que me apoia!

O que diria se soubesse a verdade, que ela visitou uma cena de assassinato terrível e agora estava envolvida num caso de assassinato real - tão profundamente envolvida que entrara deliberadamente na mente do assassino?

Estranhamente, ela sentiu que lhe podia dizer quando estivesse zangado. Então eles poderiam resolver as coisas.

Mas agora, quando ele estava a ser solidário e a mostrar preocupação e respeito pelos seus desejos?

Simplesmente não posso.

Não posso aborrecê-lo assim.

De qualquer forma, o frio desconforto que se instalara entre eles amenizara devido à sua preocupação. Conversaram mais confortavelmente durante o resto da refeição, principalmente sobre o dia extremamente ocupado de Ryan na Parsons and Rittenhouse, e sobre o trabalho que ele ainda tinha que fazer em casa naquela noite.

Enquanto conversavam, Riley sentiu que havia algo mais na mente de Ryan - algo precisavam de conversar, mas que ele receava mencionar. Riley perguntou-se o que poderia ser.

Depois do jantar, limparam mesa e Ryan ficou lá sentado para se concentrar no trabalho legal que tinha trazido para casa. Riley lavou os pratos e depois acomodou-se na sala de estar para ver televisão. Mas era impossível manter-se concentrada nos programas. Sentia-se terrivelmente culpada por não ter sido totalmente honesta com Ryan sobre o que realmente estava a acontecer na sua vida. Tentou convencer-se a contar-lhe naquele momento, mas...

Não posso incomodá-lo quando está a trabalhar.

Ela sabia que aquilo era uma desculpa. Riley simplesmente não tinha coragem para lhe contar a verdade.

Também se sentia inquieta e desconfortável com outras coisas.

Será que Crivaro iria ligar?

Estaria excluída de vez do caso "Assassino Palhaço"?

Seria ainda um caso?

Pelo que sabia, Crivaro e McCune já tinham provado a culpa de Gregory Wertz em definitivo. Ou talvez estivessem a concentrar-se num suspeito completamente diferente. Gostava de saber.

Algum tempo depois, Ryan entrou na sala e sentou-se no sofá ao lado dela. Quando começou a publicidade, ele clicou no botão ute do controlo remoto.

Riley olhou para ele com surpresa.

"Riley temos que conversar" Disse Ryan com uma expressão muito séria.

Riley engoliu em seco, imaginando o que viria a seguir.

Ryan disse, "Liguei para os meus pais hoje e disse-lhes..."

Fez uma pausa e Riley pensou...

Oh meu Deus.

Ele disse-lhes que eu estou grávida.

Mas em vez disso ele disse...

“Eu disse-lhes que estávamos noivos. Planeava escrever-lhes sobre isso em breve, não imediatamente. Mas eles ligaram-me hoje para o trabalho e... bem, eu senti que era o momento certo para lhes contar”.

Ele pegou na mão dela novamente e acrescentou...

"Então, temos que fazer planos - onde o casamento será e quando."

Riley mal podia acreditar no que ouvia.

"Oh, Ryan, eu não sei..."

Calou-se. Ela realmente não sabia o que dizer.

Ryan disse, "O que é que se passa, Riley? Por favor, não me digas que estás com dúvidas. Sobre nos casarmos, quero dizer.”

"Oh, não, não é isso" Disse Riley. "É apenas... bem, agora, há muita coisa a acontecer na nossas vidas. E fazer planos destes... nem sei por onde começar.”

Riley viu desilusão no olhar de Ryan. Percebeu que ele estava à espera que ela estivesse animada e ansiosa para falar sobre aquilo. Ela queria realmente sentir-se assim e não sabia porque é que não conseguia.

Ryan disse, "Bem, vamos começar por falar quando é que casamos. Temos que ver isso ainda este verão.”

Riley ficou estupefacta.

“Este verão?” Perguntou.

Ryan encolheu os ombros e disse, "Claro, por que não?"

“Bem, por um lado, tu tens o teu importante novo trabalho. E eu estou neste programa."

Ryan disse, "Não é permitido aos estagiários tirar um dia de folga por mês? Podias tirar uma folga a uma sexta-feira ou segunda-feira, transformá-la num fim-de-semana prolongado. Eu posso fazer a mesma coisa no meu trabalho.”

Riley olhou fixamente para ele.

“Mas qual é a pressa?” Perguntou. "Porque é que não podemos esperar até ao fim do verão?"

Ryan parecia ter ficado surpreendido com a pergunta.

Disse, "Riley, estás grávida de seis semanas. Tens mais de nove semanas no programa de verão.”

Riley começava agora a compreender a urgência. Ele ainda não tinha dito aos seus pais, ou a qualquer outra pessoa, que ela estava grávida. E dali a nove semanas, a gravidez seria visível.

Riley sentiu uma pontada de ressentimento.

"Não queres ficar envergonhado" Disse ela.

Ryan libertou um suspiro profundo.

"Riley, gostava que não visses as coisas dessa forma."

"De que outra forma deveria encarar isto?"

Ryan disse, “Bem, podes censurar-me? Não sentes a mesma coisa? Sobre o teu próprio pai, quero dizer?”

Riley foi apanhada de surpresa. Ela realmente não tinha pensado em como o pai se poderia sentir a respeito da sua gravidez.

Na verdade, ela não tinha pensado sobre se...

Disse vagarosamente, "Ryan, eu nem sei se quero convidá-lo. Tu sabes que as coisas nunca correram bem entre nós. Não o conheces.”

"Talvez o queira conhecer" Disse Ryan.

Riley abanou a cabeça.

"Não, não ias querer. Acredita em mim. Ninguém se dá com ele. E morar sozinho nas montanhas durante todos estes anos só o fez piorar. E...”

Riley engoliu em seco e disse...

"E ele nunca aprovou nada que eu fiz em toda a minha vida."

Ryan disse, “Então e a tua tia e tio? Não queres que venham?”

Riley sentiu uma pontada ao ouvir falar na tia Ruth e no tio Deke. Eles tinha levado Riley para morar com eles em Larned, Virgínia, depois da morte da mãe e perante a agressividade do pai. Ela estava-lhes grata, mas fora rebelde e difícil durante a sua adolescência, e não lhes facilitou a vida. O comportamento irresponsável de Riley tinha afetado o seu relacionamento com eles.

Não sabia deles desde que começara a faculdade. Sentiu mal e desejou poder compensar essa falta.

Mas era demais a ideia de eles irem ao casamento.

Disse a Ryan, “Eles foram para a Flórida e estão a dar-se bem há anos. Não me sentiria bem em pedir-lhes para fazer a viagem.”

Um silêncio desconfortável caiu entre ela e Ryan.

Riley decidiu não mencionar a sua irmã mais velha, Wendy, que tinha fugido de casa quando era adolescente. Riley nem sabia onde Wendy estaria. Não se lembrava de ter falado a Ryan sobre ela.

Finalmente Ryan falou com uma voz rouca e amarga...

"Então o que é que queres fazer? Despachar o nosso casamento numa cerimónia civil e não convidar ninguém?”

Riley lutou para não dizer em voz alta...

Na verdade, isso parece uma ideia maravilhosa.

Em vez disso, não disse nada.

Finalmente Ryan levantou-se do sofá. "Acho que agora não é um bom momento para discutir isto."

Parecia silenciosamente zangado. Mas Riley não podia discutir com ele. Ele estava obviamente certo.

"Sinto muito" Disse Riley.

Ryan voltou ao seu trabalho sem dizer mais nada. Riley ficou a fitar as imagens silenciosas na TV durante vários minutos, sentindo-se absolutamente infeliz. Ela também estava profundamente exausta depois de três longos, difíceis e confusos dias. Foi à casa de banho, tomou um banho e foi direta para a cama.

Ficou deitada por um momento, imaginando se poderia realmente dormir.

Lembrava-se de como estava empolgada em mudar-se para a capital, morar com Ryan e começar uma família com ele.

Mas agora...

Está tudo uma confusão.

Ela não fazia ideia do que acabaria por fazer naquele verão - poderia trabalhar com Crivaro e McCune, ou estaria apenas assistiria a aulas e workshops como o resto dos estagiários? Ainda se perguntava se as coisas seriam melhores se simplesmente desistisse e encontrasse um emprego.

Lembrou-se das palavras que o pai lhe tinha dito inúmeras vezes ao longo dos anos...

"Não fazes nada bem, miúda."

O pai nem conseguia manter o segredo de que a culpava pelo assassinato da mãe.

Racionalmente, ela sabia o que pensar - ou pelo menos achava que sim...

Eu tinha apenas seis anos.

Mas ela sabia que a culpa do pai se havia enraizado profundamente dentro dela. Não importava o que ela fizesse, não importava o que ela conseguisse, nunca era suficiente - pelo menos não para si mesma.

Sentiu um soluço na garganta enquanto se perguntava...

Alguma vez as coisas serão diferentes?

Começou a chorar. As lágrimas foram um alívio e ela teve a certeza de que conseguiria adormecer rapidamente.

Mas quando a sua consciência se desvaneceu, sentiu novamente a presença horrível do assassino.

Não, não foi Gregory Wertz.

Ela tinha a certeza.

Ele ainda anda à solta.

E vai matar de novo.


CAPÍTULO VINTE E DOIS


Os olhos de Riley abriram-se com o som do seu telemóvel a tocar na mesa-de-cabeceira.

Ela ouviu Ryan soltar um grunhido sonolento de irritação quando pegou no telemóvel. Quando viu que a ligação era do Agente Crivaro, saltou da cama e correu para fora do quarto para não acordar Ryan.

"Está acordada?" Perguntou Crivaro quando ela atendeu.

"Sim" Disse Riley.

E não estava a mentir. Ela estava a dormir profundamente há pouco, mas agora sentia-se tão acordada como se já tivesse tomado uma chávena de café.

"Preciso de si aqui no Edifício Hoover o mais rápido possível" Disse Crivaro.

"O que é que se passa?" Perguntou Riley sem fôlego.

“O Gregory Wertz não é o assassino. Nós verificámos os seus álibis ontem. Ele não tem nada a ver com os dois assassinatos. Então hoje temos que começar da estaca zero. O pior é que os meios de comunicação social descobriram que detivémos o homem errado e estão num reboliço. Há muita pressão. Preciso que todos colaborem comigo. Consegue estar cá daqui a quanto tempo?”

"Vinte ou trinta minutos" Disse Riley. “Ou um pouco mais. Tenho que apanhar o metro.

"Ponha-se a caminho" Disse Crivaro. Informou-a da sala onde o encontraria quando chegasse ao edifício e terminou abruptamente a chamada.

Riley percebeu que estava a hiperventilar enquanto olhava para o telemóvel.

Ela relembrou o que dissera a Crivaro há duas noites...

“Wertz não é o assassino. Tenho a certeza.”

Agora Riley questionava-se...

É por isso que ele me está a chamar?

Porque os meus instintos mostraram estar certos?

Talvez.

Ou talvez a única coisa que lhe importasse naquele momento fosse, como ele dissera...

“Preciso que todos colaborem comigo.”

Ela não fazia ideia, mas rapidamente decidiu que não fazia diferença alguma. Estava de volta ao caso precisava ir para o Edifício Hoover naquele momento. Pegou em alguma roupa, vestiu-se e preparou-se o mais silenciosamente que pôde enquanto Ryan continuava a roncar.

Não tinha tempo para os cereais e café habituais, por isso pegou numa barra energética no armário da cozinha. De seguida escreveu uma nota apressada a Ryan explicando que tivera que ir a correr para uma reunião. Deixou-o na mesa da cozinha e correu para a paragem do metro.

Como fazia todas as manhãs, Riley comprou um jornal a caminho da paragem. Olhou para a primeira página enquanto se sentava para esperar pelo metro.

Compreendeu que Crivaro tinha razão – os meios de comunicação social estava em cima do caso. A manchete anunciava...


Assassino Palhaço ainda à Solta


Ela folheou o artigo. Dizia que o FBI tinha um suspeito sob custódia que acabara por não ser culpado - e assim, tal como Crivaro havia dito, eles estavam de volta à “estaca zero”. Nem valia a pena ler o resto da história - apenas boatos desgarrados e insinuações de todo o tipo provenientes de fontes não confiáveis.

Riley apanhou o metro e, durante a curta viagem, folheou o resto do jornal, olhando colunas e características que normalmente lhe interessavam. Um desses itens regulares chamava-se "Poetry Place". Todos os dias apresentava um poema enviado por um dos leitores do jornal, geralmente assinado apenas com o primeiro nome. Os poemas eram geralmente horríveis e às vezes involuntariamente engraçados, mas eram leitura que entretia.

O título do poema daquele dia chamou a sua atenção de imediato...


Bem-vindo ao Labirinto


Ela sentiu um formigueiro a percorrer-lhe o corpo, embora não soubesse porquê. O formigueiro aumentou de intensidade quando leu o resto do poema...


Vem, minha querida escolhida;

Não vaciles e não te encolhas.

Junta-te a mim sem medo

Por uma última bebedeira alegre.


Vamos dançar e brincar entre

O esmagamento público palpável

Dos foliões que oferecem

Um adeus selvagem à carne.


Nós vamos vestir sem vergonha

Uma roupa extravagante

E parecer e vestir o mesmo

Em disposição colorida.


Nós somos um casal alegre,

Trancado no nosso abraço -

Espera até veres

O olhar no teu rosto!


O poema fora simplesmente assinado com o nome...


Joey


Riley teve uma sensação corrosiva no mais fundo do seu ser.

O assassino! Ele escreveu isto! Ela tinha a certeza.

É uma mensagem!

Ela respirou fundo algumas vezes e disse a si mesma para não tirar conclusões precipitadas. Afinal, teria ela alguma razão concreta para pensar que o poema havia sido escrito pelo próprio assassino? Começou a ler com mais cuidado, escolhendo palavras e frases específicas.

O próprio título despertou o seu interesse. Ela lembrava-se daquela sensação que tinha tido no Parque Lady Bird Johnson - quase certa de que o assassino levara as suas vítimas para algum lugar especial, um covil. O próprio poema era o seu modo insinuante de sugerir a localização do seu covil – o seu “labirinto”?

A primeira linha do poema era bastante sugestiva...


Vem, minha querida escolhida...


O assassino definitivamente "escolhera" as suas vítimas, estudando os seus movimentos e perseguindo-as antes de as raptar.

Em seguida, havia palavras e frases como “Uma roupa extravagante” e “Em disposição colorida”. Não seriam essas referências óbvias de maquilhagem e disfarces de palhaços?

O autor do poema dizia que ele e a sua "querida escolhida" iriam " parecer e vestir o mesmo". Poderia isso significar que ele também se vestia de palhaço enquanto atormentava a sua vítima?

E havia as duas últimas linhas...


Espera até veres

O olhar no teu rosto!


Riley tinha a certeza que essas linhas significavam que ele mostrava à vítima o seu rosto maquilhado num espelho quando ela estava a agonizar.

Mas talvez a linha mais arrepiante de todas fosse...


Um adeus selvagem à carne.


Isso só poderia remeter para a morte - uma despedida “selvagem” da vida provocada pelo medo induzido pelas anfetaminas?

Riley estremeceu.

Sinto-me tão perto dele agora.

Sentiu-se ainda mais perto do que na cena do crime na casa dos Birch, no beco atrás do cinema ou na marina do Parque Lady Bird Johnson.

Também se sentiu cruelmente insultada, quase como se a mensagem se dirigisse a ela pessoalmente.

Tem cuidado, Disse a si mesma.

Não se podia deixar levar pela imaginação e não devia sucumbir à paranóia.

Afinal, era uma mensagem pública.

Certamente não sou a única pessoa que reparou nisto.

E de certeza que chamara a atenção do FBI. Ela estava curiosa para descobrir o que Crivaro e os outros investigadores que trabalhavam no caso tinham a dizer sobre aquilo.


*


Quando Riley entrou no amplo saguão do edifício J. Edgar Hoover, viu mais pessoas por ali aí do que tinha visto nos outros dias, muitas delas com máquinas de filmar.

Jornalistas, Calculou.

Tinham acorrido ao local na expetativa de saber alguma novidade sobre o Assassino Palhaço. Naquele momento pareciam desanimados e frustrados, sem ninguém por perto para incomodar com pedidos de informação. Riley manteve a cabeça baixa enquanto se encaminhava para o portão de segurança, esperando que nenhum deles a reconhecesse da cena em que o corpo de Janet Davis fora encontrado.

Riley ficou aliviada por ter entrado nas áreas seguras sem incidentes. Encontrou a sala que Crivaro havia mencionado ao telefone e bateu à porta.

O estranho que abriu a porta olhou para ela com surpresa.

O homem disse, “Hum, posso ajudá-la? É que estamos bastante ocupados aqui.”

Riley pode ver oito ou nove homens sentados numa mesa de conferência. Reconheceu dois ou três polícias. Calculou que os outros fossem agentes do FBI. É claro que os agentes Crivaro e McCune estavam ali.

Sentado ao lado de Crivaro estava Elliot Flack, o agente especial que lecionara o workshop aos estagiários no dia anterior. Riley lembrou-se de Crivaro referir-se a Flack como "um antigo colega meu".

Crivaro disse ao homem que abriu a porta...

"Deixe-a entrar."

O homem desimpediu o caminho para Riley entrar, ela encontrou uma cadeira vazia e sentou-se. A conversa foi retomada imediatamente sem qualquer introdução ou comentário.

Riley sentiu-se invisível.

Os polícias e agentes pareciam irritadiços e ansiosos. Naquele momento, pareciam estar a conversar sobre uma lista de possíveis suspeitos, sendo que nenhum deles se mostrava plausível.

Quando terminaram com a lista, Flack disse...

"Se alguém tem alguma ideia, agora é o momento certo para falar."

Houve grunhidos de desânimo em redor da mesa.

Riley questionou-se...

Já terão falado sobre o poema?

Se tivessem, que conclusões tiraram sobre aquilo?

Riley levantou a mão timidamente.

Crivaro disse, "O que é que tem, Sweeney?"

Riley tirou o jornal da mala e abriu-o na página do poema.

"Eu estava a pensar... o que é que pensam sobre isto?"

Os homens olharam para ela e para o jornal com curiosidade.

"O que pensamos sobre o quê?" Perguntou um dos polícias.

"Este poema" Disse Riley, apontando para o papel. "Já o viram, certo? Quero dizer, foi escrito pelo assassino, não foi?”

Todos olharam para ela como se estivesse louca.

Crivaro rosnou suavemente...

"Explique-se, Sweeney."

Riley engoliu em seco. Então, com voz trémula, leu o título e o poema em voz alta. Quando terminou, a maioria dos homens demonstrava inquietação.

Riley gaguejou ao tentar explicar os seus pensamentos sobre o poema, especialmente o significado de certas palavras e frases como "querida escolhida", "adeus à carne", "roupa extravagante" e "disposição colorida".

Mas ela estava tão nervosa que tinha medo de não se estar a explicar devidamente.

Aparentemente, a maioria dos homens à mesa não entendia o que ela estava a tentar explicar.

Um dos polícias disse-lhe, “Então acha que o assassino realmente escreveu esse poema? Como se fosse uma mensagem ou algo assim?”

Riley disse, "Bem ... sim. Parece-me óbvio.”

Com um sorriso malicioso, McCune disse, "Tenho que reconhecer, Sweeney - tem uma imaginação incrível".

Riley encolheu-sequando ouviu os outros a rirem em concordância.

Um dos agentes do FBI abanou a cabeça e disse, “Não podemos perder o nosso tempo com este tipo de porcaria. Precisamos de teorias viáveis. Que tipo de perfil podemos criar?”

Os agentes do FBI começaram um debate sobre o assassino, lançando muitas perguntas...

Onde é que ele vivia?

Que tipo de relacionamentos tinha?

Qual era a sua profissão?

Riley tinha a certeza de que todas eram excelentes perguntas, do tipo que profilers habilidosos sempre colocariam sobre tal assassino. Enquanto ouvia, sentiu-se envergonhada pela sua tentativa tola e irrelevante de participar na discussão.

Mas as perguntas não paravam de lhe surgir e ninguém dava respostas.

As mortes tinham tido uma motivação sexual?

Se não, o que o impelia?

Raiva, busca de emoção, vingança, desejo de fama?

Riley não pôde deixar de sentir que os homens sentados à sua volta não estavam a fazer o suficiente. E pelas suas vozes irritadas e rostos carrancudos, ela calculou que tinham essa sensação.

Deu por si a olhar para o poema, colocado na mesa à sua frente.

Teve uma renovada sensação de certeza...

Isto tem um significado.

Mas como é que ela, uma simples estagiária, iria convencer todos aqueles investigadores experientes de que ela realmente descobrira alguma coisa?

Ela tinha a certeza de que vidas dependiam daquilo.

Mas sentiu-se novamente invisível. Na verdade, ninguém pareceu notar quando ela se levantou e saiu da sala.


CAPÍTULO VINTE E TRÊS


Quando Riley saiu da sala, pensou com ironia...

A invisibilidade tem as suas vantagens.

Afinal, ninguém a impediu de sair. Os homens deviam ter partido do princípio que ela tinha ido à casa de banho. Deu por si a perguntar-se porque é que Crivaro lhe tinha ligado para ir à reunião, se não esperava que ela contribuísse com alguma coisa.

Sorriu enquanto pensava...

Talvez os surpreenda a todos tornando-me útil.

Dirigiu-se até ao elevador mais próximo e foi diretamente para a sala de informática, onde tinha participado no workshop do dia anterior. Mostrou a sua identificação de estagiária ao monitor da sala, depois foi para um dos computadores e ligou-se à Internet.

Colocou o poema no suporte de digitação ao lado do computador e olhou para ele, pensando...

Por onde começo?

Como é que começo?

Bem, primeiro havia o título...


Bem-vindo ao Labirinto


Riley sabia que a palavra "labirinto" se referia a um labirinto. Ela lembrava-se de ter visto um filme de fantasia popular sobre um labirinto quando era pequena. Mas também tinha lembranças vagas de ler ou ouvir sobre um labirinto específico na mitologia grega.

Fez uma busca com a palavra e rapidamente encontrou a antiga história de um vasto labirinto na ilha de Creta. No seu centro vivia uma criatura monstruosa chamada Minotauro, meio homem e meio touro, que devorava qualquer herói que encontrasse o caminho.

Riley sentiu-se encorajada.

Sim, a imagem de um labirinto com um monstro no seu interior encaixava-se bem com a convicção de que o homem atormentava e matava as suas vítimas dentro do seu covil.

Mas algumas das linhas seguintes incomodaram-na...


Vamos dançar e brincar entre

O esmagamento público palpável

Dos foliões que oferecem

Um adeus selvagem à carne.


Ela tinha certeza de que "adeus à carne" significava a morte. Mas agora que lera a estrofe mais atentamente, também parecia haver uma sensação de multidão de pessoas - uma “paixão pública” deles oferecendo “uma despedida selvagem à carne”.

Como é que isso se encaixava com a imagem de um covil?

Encaixava?

Talvez tenha percebido tudo mal, Preocupou-se.

Não, ela ainda tinha a certeza de que a frase "adeus à carne" significava a morte, mas...

Talvez signifique outra coisa também.

Ela fez uma busca à frase e rapidamente encontrou alguma coisa.

“Adeus à carne” foi uma tradução literal da frase latina carne vale - da qual veio a palavra carnaval.

Carnaval!

O interesse de Riley aumentou enquanto continuava a ler.

O carnaval era uma época festiva antes da observância católica da Quaresma. Riley ouvira amigos católicos explicarem que a Quaresma era uma época de penitência, autonegação e às vezes jejum. Carne, Riley viu, também poderia ser traduzido para significar "carne". Então carne vale era um tempo de festa e "vivê-la" antes de se poder dizer "adeus" aos prazeres da carne.

Mas é claro que “carnaval” tinha um significado diferente para um não católico como Riley.

Ela fez uma pesquisa sobre a palavra e encontrou-o definido como...


Uma diversão itinerante ou circo


Claro, essa definição era mais familiar para Riley do que a religiosa. Ela tinha ido a alguns festivais ao longo dos anos. Eram eventos coloridos, barulhentos e alegres, com vendedores de comida, jogos de azar, acrobacias em estilo de circo e diversões...

E palhaços.

Riley tinha a certeza de que agora estava no caminho certo. E estava convencida de que a frase “adeus à carne” realmente tinha um duplo significado.

De fato, significava morte.

Mas também se referia de forma literal a um lugar real.

De alguma forma, esse é o seu "labirinto", o seu covil - um festival.

Riley teve a sensação de que as peças do puzzle se uniam. Riley agora estava curiosa em relação ao suposto nome do poeta...

Joey

Ela escreveu "Joey significando".

No início, a lista de resultados que surgiram não parecia animadora.

Joey era, naturalmente, uma abreviação do nome “Joseph”. Riley também viu que a palavra “joey” se poderia referir a “um jovem canguru ou outro marsupial”, o que não lhe pareceu útil.

Examinou várias páginas de busca, esperando que algo útil surgisse. Finalmente, deparou-se com um artigo sobre Joseph Grimaldi, um ator inglês do início do século XIX. Lensog o artigo, percebeu que tinha sido um famoso comediante e pantomimista.

Então reparou que o personagem mais popular de Grimaldi se chamara "Joey".

Riley sentiu uma onda de emoção ao continuar a ler...


Por causa do seu personagem de cara branca, Joey, Grimaldi é considerado o primeiro verdadeiro palhaço de circo. Na verdade, o nome "Joey" tem sido usado para inúmeros palhaços de circo desde então.


Riley tinha a certeza que dera com algo importante.

Joey é um nome de palhaço!

Pedaços do puzzle começavam a encaixar-se rapidamente.

Ela olhou para o poema novamente e reparou mais uma vez nas linhas...


Nós vamos vestir sem vergonha

Uma roupa extravagante

E parecer e vestir o mesmo

Em disposição colorida.


O seu palpite anterior estava certo! O assassino não só vestiu e fez as suas vítimas parecerem palhaços, como também ele se parecia assim...

Ele é um palhaço!

E o seu “labirinto” é um festival!

Por um momento, Riley apenas olhou para o computador, impressionada com a percepção de que aquela era uma ferramenta fantástica.

A sua mão tremia enquanto anotava toda aquela informação num bloco de notas. Então ela correu para fora da sala e regressou à sala onde a se estava a realizar. Não se deu ao trabalho de bater à porta, limitou-se a entrar.

Mais uma vez, ninguém pareceu reparar nela. Riley sentiu que a reunião estava perto do fim. Ouviu os homens a murmurar uns para os outros sobre dividirem-se em equipas e quem iria fazer o quê naquele dia. Crivaro conversava intensamente com McCune e com o Agente Especial Flack.

Ganhando coragem, Riley tocou no ombro de Crivaro. Quando ele se virou para olhar para ela, ela disse...

“Agente Crivaro, posso falar consigo?”

Crivaro olhou para ela por um momento. Então virou-se para o Agente Flack e acenou-lhe com a cabeça. Tanto Crivaro quanto Flack levantaram-se e seguiram Riley até ao corredor.

Riley não tinha a certeza do que pensar sobre a inclusão de Flack na sua conversa. Ela esperava poder falar com Crivaro a sós, tentar convencê-lo da sua teoria provisória olhos nos olhos.

Começou a sentir-se nervosa de novo e respirou devagar para tentar acalmar-se.

Entregou o poema do jornal a Crivaro, e Flack ficou ao lado dele olhando para o poema. Conversou com eles sobre a busca por computador que acabara de fazer, explicando o significado de "labirinto", "adeus à carne" e do nome "Joey".

Quando terminou, Crivaro e Flack apenas olharam um para o outro.

Riley não conseguia ler as suas expressões.

Pensarão que estou a ser idiota? Questionou-se.

Então Crivaro olhou para ela e disse sem sorrir...

“Bom trabalho, Sweeney.”

Os joelhos de Riley enfraqueceram de alegria e orgulho.

Finalmente fiz alguma coisa bem feita, Pensou.

Agora cabia a Crivaro decidir o que fazer a respeito daquilo.


CAPÍTULO VINTE E QUATRO


Enquanto estava no corredor com Flack e Riley Sweeney, Jake Crivaro tentou não sorrir ao ver o olhar de orgulho da miúda.

Não quero que ela fique muito acomodada, Pensou.

Ele dissera "bom trabalho" com a intenção de a elogiar. Não era frequente um novato apresentar uma visão sólida como aquela. Ele não se lembrava de um estagiário fazer aquilo. Mas não era o momento de elogiar em demasia. Na verdade, ele não podia deixar de se perguntar se ela não estaria a ir longe demais com a interpretação do poema.

Olhou para o papel na sua mão e leu o texto novamente.

Não, ela não está a ir longe demais.

Crivaro tinha a certeza que ela estava certa sobre o significado de todas aquelas palavras e frases, especialmente aquele nome...

Joey.

Não era uma coincidência que Joey fosse o nome de um palhaço. Aquela era provavelmente uma mensagem do assassino, que apontava para...

Bem, algo.

A mensagem era bastante enigmática, mesmo agora que Riley a decifrara parcialmente. Mas Crivaro tinha a certeza de que sugeria o paradeiro do assassino – o seu “covil”, como Riley o designava.

Ainda não tinham chegado a detalhes essenciais, mas ele tinha a forte sensação de que estavam no caminho certo.

Crivaro levantou os olhos do poema e dirigiu o olhar ao colega de longa data, Elliot Flack. Crivaro podia dizer pela expressão fascinada de Flack que também ele tinha sido persuadido do significado do poema.

Flack disse, “Esta coluna convida os leitores a enviarem poemas, por isso suponho que devam ter algum tipo de informação sobre quem enviou a mensagem. O meu palpite é que será um nome falso e não nos levará a lugar nenhum. Mas vou mandar alguém até ao jornal para descobrir o que eles sabem.”

Crivaro aprovou.

Abriu o jornal e folheou as páginas até encontrar o que ele esperava que lá estivesse.

Um anúncio de um festival itinerante que já percorria há uma semana o quadrante Noroeste de DC. Parecia ser o único festival a circular atualmente na área.

O seu covil, Pensou.

Crivaro mostrou o anúncio a Flack e disse, "A Sweeney e eu vamos verificar este lugar".

Riley ficou entusiasmada.

Flack assentiu. “Vão até lá então. E eu vou voltar lá para dentro e dar conhecimento aos colegas desta nova informação. Temos que repensar a nossa estratégia. ”

Flack voltou para a sala e fechou a porta atrás de si. Crivaro e Riley foram diretamente para o estacionamento e entraram no carro. Enquanto saía do edifício, Crivaro lembrou-se do que Riley tinha dito na noite anterior, atrás do cinema onde o corpo de Margo Birch havia sido encontrado...

“Wertz não é o assassino. Tenho a certeza. ”

Ele pensou exatamente o mesmo naquele momento, embora não o tenha dito.

Talvez devesse ter dito.

Será que algumas palavras de encorajamento me matariam?

A miúda tinha definitivamente bons instintos. Por isso lhe chamara a atenção. Mas ele sabia perfeitamente que não estava a contribuir para que ela se sentisse muito bem. E ele sabia o porquê.

Ele disse, “Ouça, eu sei que estou a deixá-la de fora da investigação. Realmente não tem acontecido muita coisa, mas não é só por isso.”

Riley limitou-se a olhar para ele sem resposta.

Jake engoliu em seco e continuou, “Deve ter ouvido rumores de que tive problemas com o meu último parceiro. Gus Bollinger era o nome dele. Um verdadeiro novato de merda...”

As palavras saíram antes de Crivaro pensar...

Ela também é novata.

Ele não queria que ela pensasse que ele achava que todos os novatos eram idiotas.

Acrescentou, "Ele não era nada como você, acredite em mim".

Parou por um momento, depois continuou.

“Bollinger e eu estávamos a trabalhar juntos no centro da Virgínia num caso de assassino em série - o chamado 'Matchbook Killer', talvez tenha ouvido falar sobre isso. Alguém estava a assassinar mulheres jovens em quartos de motel. Quando as enterrava em covas rasas, deixava caixas de fósforos com as vítimas - caixas de fósforos de bares da região.”

Crivaro calou-se novamente.

Será que realmente queria entrar em detalhes sobre o quanto Bollinger errara - como ele lidara com um copo em que o assassino tocara num dos bares, apagando qualquer vestígio de impressões digitais que tivesse?

Não, a raiva de Crivaro estava ainda muito à superfície.

Se começasse a falar naquilo tudo, provavelmente perderia a paciência mais uma vez e sem lógica.

Finalmente disse, “Basta dizer que Bollinger estragou todo o caso. O assassino parece ter parado de matar - pelo menos por enquanto, talvez para sempre. Parece que o mais certo é nunca apanharmos o filho da mãe.”

Ele abanou a cabeça e rosnou...

“Porra, mas eu odeio casos por resolver. De qualquer das formas, talvez agora possa entender porque é que sou meio esquisito com parceiros de qualquer tipo. Na verdade..."

Ele estava prestes a dizer que não tinha em grande consideração o agente Mark McCune. Até agora, McCune parecia ser uma melhoria em relação a Bollinger. Mas, no que dizia respeito a Crivaro, McCune não tinha muito a oferecer como investigador - nem muita inteligência e certamente nenhum instinto especial.

Mas disse a si mesmo...

É melhor não falar nisso. O mais certo é terem que trabalhar juntos.

Mas talvez houvesse uma outra coisa que lhe devia contar.

“Riley, eu tenho um filho da sua idade. Tenho que admitir que fiquei aliviado quando ele decidiu não seguir os meus passos. Parece que está encaminhado para o mercado imobiliário.”

Ela ainda não dissera nada, mas Crivaro percebeu que ela o observava atentamente.

"Você tem um potencial real" Disse ele. "Por isso a quis aqui neste verão. Mas se não estiver interessada numa carreira no FBI, quero que saiba que não há problema.”

"Eu realmente ainda não sei " Respondeu Riley.

Crivaro ficou em silêncio novamente. Não se lembrava de alguma vez ter falado naquilo que tinha em mente. Porque é que estava a falar naquilo agora?

Prosseguiu, "Eu não vejo muito o meu filho. Divorciei-me há anos e acredite em mim, foi muito feio. E não foi culpa da minha mulher, nada disso. Foi tudo porque eu era casado com o meu trabalho ”.

Riley disse, "Lamento muito".

"Não lamente" Disse Crivaro. "Lembre-se apenas no que lhe estou a dizer. Você tem um namorado, certo? Quer dizer, com esse anel, deve estar noiva. Bem, aguente o melhor que puder. Porque acredite em mim, ficar obcecado com as partes mais negras da natureza humana causa estragos nos relacionamentos. Fica difícil apenas ... ser um ser humano. Tenha isso em mente, é só o que lhe digo.”

Quando Riley não disse nada, Crivaro olhou e viu que ela parecia estar imersa em pensamentos.

Parece que está a levar o meu conselho a sério, Calculou.

Ou isso, ou ela simplesmente não está a prestar atenção.

Ele esperava que ela estivesse a prestar atenção. Crivaro fizera alguma pesquisa sobre Riley antes de enviar a sua inscrição para o programa. Por isso ele sabia de algo que ela provavelmente não suspeitava que ele sabia - que ela vira a sua própria mãe assassinada quando tinha seis anos de idade.

Questionou-se se deveria mencionar isso naquele momento.

Afinal, estava relacionado com a conversa que estavam a ter. Seguir aquele tipo de trabalho traria recordações e despertaria o seu trauma...

Se é que ainda não tinha acontecido.

Talvez ele devesse dizer algo sobre isso.

Talvez mais tarde, Decidiu.

Enquanto isso, ele tinha a sensação de que Riley não lhe estava a contar algo que estava a acontecer na sua vida naquele momento - algo que ele provavelmente deveria saber. Ele suspeitava disso há dois dias, quando ela parecera estar doente. Aparentava estar melhor hoje, mas a curiosidade ainda o espicaçava.

Ele estava a tentar pensar numa forma de abordar o assunto quando Riley falou.

"E o outro festival?"

"Huh?" Disse Crivaro.

“O festival no campo. Sabe, aquele que se fora embora na noite anterior à descoberta di corpo de Janet Davis. O que sabemos sobre isso?”

Crivaro disse, “Eu designei uma pequena equipa do FBI para investigar isso. A equipa passou o dia todo a tentar encontrar qualquer conexão entre o festival e a vítima ou o crime. Não descobriram nada.

Calaram-se ambos novamente.

Então Crivaro acrescentou...

"A propósito, essa foi uma boa pergunta."

Ele olhou e reparou no seu ligeiro sorriso.


*


Enquanto Crivaro continuava a conduzir, Riley aconchegou-se no que ele acabara de dizer...

"A propósito, essa foi uma boa pergunta."

Ela também gostou que ele tivesse partilhado pensamentos tão sinceros e pessoais com ela. Quase parecia que gostava de tê-la por perto. Talvez as coisas lhe estivessem realmente a correr bem naquele dia.

É claro que provavelmente muito dependia do que ela e Crivaro descobririam no festival.

E se não descobrissem nada?

A questão preocupou Riley. De regresso à reunião, toda a equipa mudou de tática por causa de sua interpretação do poema.

E se eu estiver errada? Interrogou-se.

E se afinal o poema não tiver nada a ver com os assassinatos?

Ficariam todos zangados com ela?

Outra coisa a preocupava. Crivaro acabara de ser honesto com ela. Deveria ela ser honesta com ele, contar-lhe da gravidez?

Talvez, Pensou.

Mas então, será que apenas a tiraria do caso - e do programa?

Não gostou da ideia.

A decisão não devia ser sua, Pensou.

Ela fizera um exame de pré-natal recentemente e tudo estava bem. E embora o caso fosse estranho e problemático, seria mais stressante do que qualquer outra coisa na sua vida – por exemplo, seus problemas com Ryan? O caso não envolvia nenhum stress físico - muito menos do que o treino de boxe que ela fizera no dia anterior e o seu médico garantiu-lhe que podia fazer aquele tipo de coisa.

Decidiu não falar no assunto.

Quando chegaram descobrira que a feira estava situada no parque de estacionamento de um centro comercial. Acima da entrada havia uma placa que dizia...


Mercer and Mathers Midway Entertainments


O coração de Riley começou a bater acelaradamente.

O que iriam descobrir ali?

Estaria a sua teoria correta ou provar-se-ia que estava errada?


CAPÍTULO VINTE E CINCO


Riley tentou manter conter a sua excitação quando ela e Crivaro saíram do carro. Ela queria parecer uma investigadora experiente, não uma iniciante de olhos arregalados. Mas afinal, eles estavam a verificar uma teoria de sua autoria - que o assassino poderia ser encontrado numa feira.

Poderia ser aquela?

Enquanto caminhavam em direção à entrada, Riley reparou que parecia uma feira como qualquer outra, com entretenimentos e música estridente. Também parecia...

Pequena.

Riley pensou no título do poema...


Bem-vindo ao Labirinto


A feira não se parecia muito com um labirinto. Riley começou a duvidar se aquilo poderia ser um covil.

Quando chegaram à bilheteria principal, Crivaro disse ao homem que estava a vender os bilhetes, "Gostaríamos de conversar com o proprietário da feira".

Dentro cabina atrás do vendedor, um homem corpulento lia um jornal.

Ele baixou o jornal e perguntou a Crivaro com uma voz áspera e rouca, "Quem pergunta?"

Crivaro mostrou o seu distintivo e apresentou-se a si e a Riley.

O homem olhou para Crivaro. "Tem uma intimação consigo?"

Crivaro pareceu surpreendido.

"Não" Disse ele. "Preciso de uma?"

O homem grande e careca grunhiu com esforço físico quando se levantou da cadeira desdobrável.

"Depende daquilo que quer" Disse ele.

"Estamos a investigar dois assassinatos" Disse Crivaro.

O homem soltou uma risada rouca de alívio.

Disse, “Ah, tudo bem, então. Desde que não seja por causa dos meus pagamentos da pensão de alimentos. Venha daí. Eu já vou ao seu encontro.”

Crivaro e Riley atravessaram o portão da feira, onde o homem pesado os encontrou, bufando a cada passo que dava. Fumava um charuto barato, o que não pareceu a Riley uma boa ideia para um homem no seu estado.

Apertou a mão de Crivaro e disse, “ Chamo-me Clyde Mercer. Sou o único proprietário desta feira, Mercer and Mathers Midway Entertainments. Sou-o desde que o meu sócio Barrett Mathers morreu há vinte anos, que o desgraçado apodreça no inferno.”

Crivaro perguntou, "Há quanto tempo está neste local?"

“Há apenas uma semana. Estamos a meio da nossa ronda de verão por estas bandas, correndo feiras locais, eventos de angariação de fundos e celebrações cívicas, esse tipo de coisa. Ficamos aqui neste parque de estacionamento uma semana por ano. ”

"Onde estavam antes de virem para aqui?" Perguntou Jake.

“A norte, em Rigbury, estivemos lá dois dias a contribuir para um bazar da igreja. Vamos embora daqui amanhã rumo a Fleetwood para uma angariação de fundos para um corpo de bombeiros voluntários.”

Riley estudou a expressão de Crivaro enquanto ouvia a resposta de Mercer. Certamente ele gostaria de verificar se alguma coisa incomum tinha acontecido em Rigbury enquanto a feira lá estivera - especialmente algum assassinato.

Além disso, ela calculou que ele estivesse a remoer no porquê da feira se ir embora no dia seguinte.

Afinal, da última vez que uma feira saíra da área de DC, um cadáver fora encontrado na manhã seguinte no campo onde tinha estado instalada.

Seria encontrado outro cadáver ali naquele parque de estacionamento?

Não, se o pudermos evitar, Pensou Riley.

Mas se houvesse um assassino a viajar com aquela feira, ele iria matar mais mulheres noutros locais durante o resto do verão?

Crivaro disse a Mercer, "Talvez nos possa mostrar a feira."

"Com prazer" Grunhiu Mercer. "Temos aqui uma bela feira."

Quando Riley e Crivaro começaram a seguir Mercer, um homem que controlava uma das atrações mais pequenas chamou a atenção de Riley. Percebeu que reparou nele pela forma como não parava de olhar para eles. Tentando parecer que estava a olhar noutra direção, olhava para eles de soslaio.

Quando ela se virou para olhar diretamente para ele, ele rapidamente desviou o olhar novamente.

Ele controlava uma das atrações de enor dimensão - um jogo em que os clientes disparavam pistolas de água no rosto de um palhaço pintado num pedaço de compensado. Os fregueses tentavam atirar água suficiente para a boca aberta do palhaço para encher o nariz, que era um balão vermelho. O objetivo do jogo era explodir o balão e ganhar um prémio.

Embora o próprio homem não estivesse fantasiado e o seu rosto não estivesse pintado, ele usava um nariz vermelho e uma peruca vermelha desgrenhada. E parecia não conseguir parar de observar Riley e Crivaro.

Claro, isso não significa necessariamente nada. Era natural que Crivaro tivesse provocado alguma curiosidade entre quem estava presente ao mostrar o seu distintivo. O homem não era a única pessoa que os observava com curiosidade, mas Riley considerou que aquele homem tinha uma expressão particularmente astuta e decidiu ficar de olho nele.

Virou e seguiu Crivaro, que continuava a fazer perguntas a Mercer enquanto andavam entre as atrações - todas elas pertencentes a uma típica feira. Havia uma pequena roda-gigante, carrinhos de choque, algumas atrações de aparência assustadora que giravam os clientes no ar com tremenda força centrífuga e outras mais apropriadas para crianças, como copos de chá giratórios. Havia um carrossel com animais de aparência cansada.

Havia também as habituais cabinas e vendedores - o jogo de balões de água, os jogos de arremesso de moedas, as galerias de tiro, um jogo de pancadaria e algumas barracas de comida.

Riley ficou impressionado com o quão pequeno e lotado o lugar parecia - não como um labirinto, com apenas alguns barracos e casas de banho portáteis.

Achava cada vez mais difícil imaginar que aquele lugar tivesse algo a ver com os homicídios.

Enquanto caminhavam, Crivaro perguntou a Mercer sobre o seu pessoal. Quando Crivaro apontou para um palhaço do tipo vagabundo que andava entre os clientes a fazer animais de balão, Mercer disse que ele estava na feira há anos.

Crivaro observou o palhaço com cautela. Mas Riley estava quase certa de que ele não poderia ser o assassino. Lembrou-se da palestra que Danny Casal lhes dera sobre os tipos de palhaços - o “Pierrot” europeu, o vagabundo “Auguste” e também o “mendigo”...

“... muitas vezes personificado como um mendigo ou um vagabundo, com um chapéu e sapatos gastos, maquilhagem escura, um rosto triste e uma barba por fazer.”

O palhaço que estava a moldar os animais de balão encaixava-se perfeitamente nessa descrição. As mulheres assassinadas, por outro lado, tinham sido compostas como palhaços de “cara branca grotesca”. Riley tinha a certeza de que o próprio assassino usaria o mesmo tipo de traje e maquilhagem das suas vítimas.

A ronda de Mercer trouxe-os de volta ao lugar onde haviam começado. Crivaro tirava notas num bloco enquanto caminhava.

Mas quando se aproximaram do jogo da água novamente, Riley reparou que o homem que o controlava não estava lá.

Então ela viu-o afastar-se a correr, ainda a usar o nariz e a peruca vermelhos. Ele continuou a olhar para trás e, quando a viu a observá-lo, começou a correr.

Riley correu atrás dele.

O homem olhou para trás de novo e tropeçou.

Ela ganhou-lhe terreno.

Frenético, o homem virou-se e subiu uma rampa de madeira.

Desapareceu na boca enorme, aberta e sorridente de um assustador palhaço pintado.


CAPÍTULO VINTE E SEIS


Riley hesitou por um momento.

Acima do enorme rosto de palhaço, uma placa dizia, "Fun House".

Ela olhou à sua volta e viu que Crivaro ainda estava ao lado de Mercer. Crivaro estava estava a olhar para ela, mas teve a noção de que estava longe demais para apanhar o homem em fuga.

Riley voltou-se e subiu a rampa, ignorando o grito de raiva de uma mulher na bilheteria.

Fingiu não ouvir Jake gritar, "Sweeney! Onde raios vai?”

Entrou a correr pela boca do palhaço, empurrando para o lado pedaços de plástico preto que cobriam a abertura.

Uma vez lá dentro, Riley teve a sensação de estar dentro de um pesadelo.

Estava banhada por uma luz estranha e fraca e sons estranhos - cacarejos e gritos e música de órgão arrepiante. Estava cercada por paredes negras com imagens brilhantes de rostos assustadores - palhaços, caveiras e vários tipos de monstros.

A respiração de Riley era agitada agora e uma palavra escapou dos seus lábios ...

"Labirinto!"

Esta era a única estrutura que ela tinha visto no recinto da feira que era suficientemente grande para servir como covil do assassino.

Seria aquilo?

Tem cuidado, Disse a si mesma.

O homem estava algures ali e era certamente perigoso.

Mas naquele momento, ela nem sabia para onde ir.

De repente, formas aladas escuras caíram e a bateram-lhe no corpo.

Assustada e abalada, tentou sacudir as criaturas.

Morcegos! Pensou.

Mas não reais, rapidamente percebeu. Eram morcegos de borracha a saltar de cordões elásticos invisíveis.

Os morcegos desapareceram, e então uma das paredes deslizou para longe, abrindo-se em completa escuridão.

Cautelosamente, Riley adiantou-se.

Com uma explosão de luz e um coro de gritos, um esqueleto humano branco brilhante apareceu, dançando à sua frente.

Riley soltou um grito, mas rapidamente se repreendeu...

Isto é tudo a fingir.

E, no entanto, ela sabia que quem quer que tivesse seguido para aquele lugar era muito real.

O esqueleto soltou um grito final e desapareceu tão rapidamente quanto aparecera.

Luzes pálidas se acenderam-se, mostrando-lhe que estava em pé no que parecia ser um corredor sombrio. Uma figura afastava-se dela pelo corredor, cambaleando como se estivesse bêbada.

É ele! Pensou.

E quase alcançara outra abertura no fim do corredor, coberto com tiras de plástico como na entrada da frente.

Está prestes a escapar, Pensou Riley.

Ignorando um rugido e dois olhos vermelhos, gigantescos e lupinos, começou a percorrer o corredor atrás dele.

Depois de apenas alguns passos, quase caiu.

O chão estava inclinava-se debaixo dela! Só um pouco, mas o suficiente para a desequilibrar.

Era por isso que o homem estava a cambalear.

Mas claro, ele certamente conhecia aquele lugar muito melhor do que ela. Ele estava mais bem preparado para lidar com os seus truques e armadilhas.

Ela tentou correr pelo corredor, mas o chão inclinou-se primeiro para um lado e depois para o outro. Ela sabia que se estava a mover mais devagar do que o seu inimigo.

Quando finalmente empurrou as tiras de plástico penduradas sobre a porta, viu-se numa sala banhada de luz colorida novamente, e estava de frente para uma parede com...

Três portas!

Uma voz profunda e zombeteira ecoou...

“Que porta escolhe?”

Riley sentiu uma onda irracional de raiva.

Ela queria gritar...

"Não tenho tempo para jogos!"

Mas claro, a voz era uma gravação. Pior, o homem que ela estava a perseguir certamente sabia qual era a porta certa e já tinha passado.

Deixando escapar um gemido de frustração, Riley abriu a porta do meio.

Estava cercada por inúmeras imagens de si mesma. Era um aglomerado de espelhos dispostos a multiplicar o seu reflexo aparentemente na distância infinita. A voz gravada soltou uma gargalhada e gritou...

"Porta errada!"

Riley recuou e a porta fechou-se no seu rosto.

Riley soltou um gemido de desespero. Segurou na maçaneta da porta à esquerda e abriu-a. Dessa vez, enfrentou três espelhos ondulados que grotescamente distorceram a sua imagem, um tornando-a baixa e gorda, outro alta e magra e outro descontroladamente de várias maneiras.

Mais uma vez a voz riu e disse...

"Porta errada!"

Ficando cada vez mais irritada e frustrada, Riley afastou-se e a porta fechou-se.

Havia apenas uma porta à esquerda. Ela abriu-a e ficou quase cega pela luz exterior.

Suspirou de alívio.

Mas quando deu um passo na direção da rampa de saída, foi surpreendida por uma onda de vento que irrompeu do chão.

Fora uma última brincadeira - concebida para envergonhar meninas e mulheres fazendo as suas saias voarem para cima. Felizmente, Riley vestia calças compridas.

Passou pela rajada de ar e olhou à sua volta.

O homem que estava a perseguir já estava a alguma distância, correndo pelo terreno do parque o mais rápido que podia, empurrando as pessoas para fora do caminho enquanto avançava.

Riley sentiu uma fúria inesperada dentro de si.

Gritou a plenos pulmões...

"Ei! Você! Pare!"

Quando desatou a correr atrás dele, todo o seu corpo estava pronto para explodir de raiva. Ela queria apanhar aquele homem e esmurrá-lo como tinha feito ao saco de boxe no ginásio.

Ela também empurrou as pessoas para o lado enquanto corria atrás dele.

De repente, viu a sua presa cair no chão

Outro homem o tinha intercetado.


CAPÍTULO VINTE E SETE


Riley ficou desapontada. Ela sabia que deveria estar aliviada por alguém ter derrubado o homem que ela estava a perseguir. Mas em vez disso, sentiu-se frustrada por não ter sido capaz de o apanhar, especialmente depois de segui-lo por aqueles compartimentos com monstros falsos.

Quando ela passou pelos frequentadores feira já cercavam os dois homens no chão, viu que era Crivaro quem tinha capturado o suspeito.

Agora Crivaro tinha virado o homem colocando o seu nariz de palhaço vermelho esmagado contra o chão. A sua peruca vermelha estava por perto, derrubada. Os espectadores estupefatos juntaram-se à sua volta.

Crivaro mostrou o distintivo e gritou, “Afastem-se. É um caso do FBI.”

O grupo recuou obedientemente um pouco e continuou a observar a cena.

Agachando-se ao lado do homem, Crivaro olhou para Riley quando pegou nas algemas. Ofegante, ele disse-lhe...

“Depois de ter corrido lá para dentro, percebi que tinha visto alguém. Então esperei para o apanhar quando saiu.”

Crivaro acrescentou com uma risada sem fôlego, “Mas o o filho da mãe é rápido e ágil, e não foi fácil de agarrar. Acabei por persegui-lo. Tive que recorrer a táticas que não uso há algum tempo.”

Crivaro rosnou para o homem enquanto lhe algemava as mãos atrás das costas...

“Deu-me bastante trabalho, amigo. Não sei o seu nome, mas está preso por suspeita de assassinar duas mulheres.”

O homem virou a cabeça para Crivaro com uma expressão chocada.

"Huh?" Interrogou. "Eu não matei ninguém!"

O homem continuou a prostestar enquanto Crivaro lhe lia os direitos.

"Nunca" Lamentou-se. "Eu não sou um assassino. Nunca faria nada assim.”

Finalmente Riley perguntou, "Se é inocente, porque é que fugiu?"

O homem olhou com olhos arregalados para Riley quando Crivaro o levantou.

Ele parecia realmente em pânico naquele momento.

Acenando na direção de Crivaro, o homem disse a Riley, "Eu vi-o a mostrar o distintivo quando vocês entraram. E eu pensei .."

Crivaro interrompeu, “Que íamos prendê-lo? Rapaz esperto.”

"Não por homicídio!" Disse o homem. "Eu nunca fiz nada assim na minha vida!"

Alguns polícias locais passavam pela multidão. Ajudaram Crivaro a manter o homem subjugado quando começou tentar livrar-se das algemas.

Crivaro disse-lhe, "Como é que se chama, amigo?"

O homem abanou a cabeça e gemeu. "Ah, Jesus."

"O melhor é dizer-me" Aconselhou Crivaro.

Alguém do grupo que os rodeava disse...

“Eu digo qual é o nome dele. É Orson Trilby. E também lhe vou dizer o que é que ele fez. Ele pagou a fiança e não voltou a aparecer em tribunal. Ele contou-me tudo.”

Crivaro ficou surpreendido.

Disse, "E não o denunciou à polícia?"

O homem empalideceu, obviamente percebendo que dissera algo que não deveria ter dito.

"Ele contou isto a muitos de nós" Disse. “Mas pensámos que era treta. Ele parecia esse tipo de pessoa, um artista comum, a tentar impressionar toda a gente, especialmente as mulheres.”

Quando os polícias dispersaram o grupo de pessoas, Crivaro e Riley escoltaram Orson Trilby de volta à bilheteria e sentaram-no lá dentro. Trilby estava mais do que disposto a conversar agora. Ele admitiu que não comparecera em tribunal. Tinha sido condenado na semana passada sob a acusação de tráfico de droga e enfrentava uma longa pena de prisão. Então evitar a condenação em tribunal.

Ao ouvir o relato do homem, Riley percebeu que ele não era nem um pouco brilhante.

Por um lado, deveria ter fugido da área de DC imediatamente, em vez de tentar misturar-se como apenas mais um trabalhador da feira.

Mas como Trilby explicou a Crivaro, pensou que poderia continuar com a feira esta se fosse embora no dia seguinte e ficar afastado de DC até que fosse esquecido pela lei ali.

Crivaro continuou a fazer perguntas a Trilby. Observando-os, Riley podia sentir o crescente desânimo de Crivaro. A cada resposta, ficava cada vez mais claro que Trilby não era o assassino que procuravam.

Na verdade, Riley agora tinha certeza disso.

Ela sabia que o assassino era inteligente e sádico.

Este tipo não é nem uma coisa nem outra, Pensou. Apenas um criminoso menor idiota.

Finalmente, Crivaro parecia estar certo de que Trilby não era o assassino. Entregou o homem à polícia local para ser preso. Enquanto os polícias levavam Trilby para longe, Riley e Crivaro começaram a percorrer novamente o parque de diversões.

O homem que lhes facultara as informações seguiu-os, perguntando se receberia uma recompensa por identificar Trilby.

“Se houve fiança, uma percentagem é uma recompensa por apanhar um fugitivo, certo?” Exigiu.

Alguns amigos dele argumentaram que eles é que mereciam uma recompensa.

Riley nem queria acreditar.

Crivaro tentava enxotá-los, dizendo que precisariam de conversar com a polícia sobre isso. Por fim, acabaram por desistir.

Quando Riley e Crivaro voltaram a atravessar o parque de diversões, fizeram perguntas aos trabalhadores, esperando que talvez outra pessoa aparecesse como suspeita.

Mas as suas esperanças logo se desvaneceram. Não só todas as pessoas com quem conversaram pareciam ser inocentes, como não tinham reparado em mais ninguém a comportar-se de forma suspeita, exceto Trilby.

Riley e Crivaro também percorreram todos os cantos e recantos da feira, tentando encontrar algum lugar que pudesse ser o "labirinto" mencionado no poema - um lugar onde o assassino poderia ter detido, atormentado e matado as suas vítimas.

A casa de diversões era o único edifício de grandes dimensões da feira, e estava inteiramente construída dentro de um semirreboque. Um e segurança disse-lhes que estava trancada à noite e que o terreno era bem patrulhado durante aquelas horas. Riley e Crivaro examinaram a entrada e a saída e viram que ninguém poderia entrar lá sem as chaves quando estivesse fechada e trancada.

"Eu não acho que seja suficientemente grande " Disse Riley desanimada. "Este não é o labirinto do assassino."

Crivaro respondeu com um grunhido irritado, “Vamos lá. Vamos comer alguma coisa.”

Depois daquilo, ele não dirigiu uma única palavra a Riley enquanto os levava até ao restaurante de fast food mais próximo. Ela percebeu...

Ele está novamente zangado comigo.

Mas não podia culpá-lo. A sua teoria tinha sido um fracasso, e o poema provavelmente não tinha nada a ver com os assassinatos, afinal de contas.

Ela devia estar a fazer tudo errado.

Crivaro manteve um silêncio soturno quando se sentaram à mesa para comer.

Riley disse cautelosamente, "Sinto muito, Agente Crivaro".

Crivaro abanou a cabeça e começou a comer o hambúrguer. Durante um longo momento de silêncio, ele olhou para ela enquanto mastigava e engolia.

Então retrucou, "No que raio estava a pensar, Sweeney?"

Riley desanimou.

Isto vai ser pior do que eu pensava.


CAPÍTULO VINTE E OITO


Riley preparou-se para a explosão de palavras que esperava de Crivaro. Ele parecia realmente aborrecido, mas ela sentiu que era apenas parte de como ele se sentia naquele momento.

Ele está desiludido, Pensou ela.

Isso era ainda pior.

Riley temia muito mais a decepção de Crivaro do que a sua raiva.

Então percebeu que ele estava à espera que ela respondesse à sua pergunta, "Em que raio estava a pensar?"

Ela gaguejou, “Eu... eu sei que estraguei tudo. Mas quando li aquele poema, pensei mesmo...”

Crivaro interrompeu, “Para o inferno com o poema. Eu não estou a falar sobre o maldito poema. Você estava certa quanto ao poema, tenho a certeza disso. Eu estou a falar sobre como correu atrás daquele tipo. Devia tê-lo deixado para mim. Você ainda não é agente do FBI, Sweeney. Não tem treino. Não tinha nada que se colocar em perigo.”

Riley ficou surpreendida. Mal lhe tinha ocorrido que estava a fazer algo perigoso.

Ela disse, "Tive medo que ele fugisse".

"Bem, não ia" Disse Crivaro. "Só tinha que me dizer que o tinha visto. Quero dizer, eu apanhei-o sozinho. E os polícias chegaram lá para ajudar. O que teria acontecido se o tivesse apanhado primeiro?”

Riley engoliu em seco.

Era uma boa pergunta - talvez uma pergunta melhor do que Crivaro desconfiaria.

A sua preocupação era que Riley se poderia ter magoado.

Mas Riley lembrou-se da onda de indignação que sentiu quando viu o tipo a fugir da casa de diversões - a mesma raiva que sentira ao bater na saco de boxe na academia.

Ela queria realmente bater-lhe e transformá-lo numa polpa sangrenta.

E se ela o tivesse apanhado, poderia muito bem ter feito exatamente isso.

A constatação surpreendeu-a. Nunca pensara em si mesma como uma pessoa violenta. Uma imagem momentânea brilhou na sua mente - o rosto do seu pai envolto em raiva, como ela o tinha visto muitas vezes.

Crivaro abanou a cabeça novamente e disse, “Você tem alguns problemas sérios ao nível do controlo de impulsos, Sweeney. Precisa superar isso se quiser continuar a trabalhar comigo. Acha que consegue?”

Riley baixou a cabeça envergonhada. Enquanto tentava pensar no que deveria responder, o telefone de Crivaro tocou.

Crivaro atendeu a chamada, respondendo sobretudo em monossílabos enquanto ouvia.

Quando terminou a ligação, disse a Riley...

“Era o Agente Flack. Ele enviou alguns colegas do FBI ao jornal para tentarem descobrir quem escreveu o poema. Disseram que chegou pelo correio. E havia também um desenho no envelope com o poema - um esboço do rosto de um palhaço, que se parecia muito com o modo como as duas vítimas foram pintadas. O jornal não imprimiu o desenho com o poema porque eles não acharam que não valia a pena.”

A respiração de Riley acelerou um pouco.

“Os colegas do FBI descobriram o nome dele?” Perguntou.

Crivaro disse, "O desenho estava assinado ‘Joseph Grimaldi’."

Riley ficou extasiada.

"O nome do primeiro verdadeiro palhaço de circo” Disse ela.

Crivaro disse, “Sim, tal como nos tinha dito. Então, obviamente, não é o nome real do remetente. O assassino escreveu o poema, tudo bem. Se dúvidas restassem, agora já teríamos a certeza. A foto e o nome provam-no.”

Riley estava confusa.

Ela disse, "Então, como poderíamos estar errados sobre a feira?"

Crivaro respirou devagar, como se tentasse manter o seu temperamento sob controlo.

“Sweeney, essa é a natureza deste trabalho. Algumas pistas levam a becos sem saída. E alguns suspeitos acabam sendo a pessoa errada. E muitos e muitos erros são cometidos pelo caminho.”

"Eu entendo tudo isso" Disse Riley.

Crivaro abanou a cabeça e tamborilou com os dedos na mesa.

"Não, você não entende isso, Sweeney. Se entendesse, não teria feito o que fez. Teria falado comigo primeiro. Tem que aprender a ter um pouco de paciência, raios. Não pode esperar resolver um caso como este com um estalar de dedos.”

"Sinto muito" Disse Riley.

Ela odiou a forma como as palavras soaram.

Crivaro pensou por um momento.

Finalmente, disse, "Há muito mais a fazer hoje. Tenho que falar com o McCune e descobrir como é que a equipa dele se está a sair e o que todos estão a fazer. E nós temos que recolher o bilhete e esboço do assassino para entregar à equipa forense. Talvez eles consigam descobrir alguma coisa através da caligrafia ou talvez obtenham impressões. Mas..."

Riley temia o que viria depois daquele "mas".

"Faça uma pausa" Disse Crivaro.

Riley encolheu-se.

Uma pausa - como se eu fosse uma criancinha!

Aquilo parecia absolutamente cruel da parte dele.

Ela quase protestou, mas conseguiu manter-se calada.

Crivaro continuou, “Eu vou levá-la de regresso ao Edifício Hoover. Há outros workshops e aulas ainda hoje. Aprenda alguma coisa. Entretanto..."

Ele parou por um momento, depois disse...

“Pense no que aconteceu agora. E faça uma análise de consciência. Tem que desenvolver alguma disciplina, Sweeney. Ninguém lhe pode ensinar isso. Está tudo nas suas mãos."

Quando acabaram de comer, Crivaro ligou para McCune e marcou um horário para se encontrar com ele. Riley e Crivaro mal falaram durante a viagem de regresso ao Edíficio Hoover.

Quando chegaram, ela descobriu que uma palestra já estava em andamento no auditório onde o agente Flack havia falado ontem. A diretora assistente Marion Connor, diretora assistente do programa de estágio, estava a dar uma longa palestra sobre estatísticas criminais.

Não parecia um assunto excitante, mas Riley lembrou-se do que Crivaro tinha dito...

"Tem que aprender a ter paciência, raios."

É claro que ela sabia que Crivaro tinha razão. Mas sentiu-se envergonhada por ele ter que lho dizer.

Entrou no auditório, onde muitos estagiários estavam a assistir à palestra.

É claro que eles se viraram para a olhar quando ela entrou.

E, claro, Connor ergueu os olhos das suas anotações no meio da frase e fez-lhe uma careta.

Riley abafou um suspiro de desespero.

É um dia daqueles.

Mas ao entrar, viu o rosto de uma pessoa que estava feliz por vê-la. John Welch virou-se e acenou-lhe com um sorriso. Riley notou que o banco ao lado dele estava vazio. Ela desejou poder sentar-se ao seu lado, mas ele estava na segunda fila, e ela já tinha atraído muita atenção. Encontrou um banco atrás de todos.

A princípio, Riley ficou assustada com a exibição de gráficos complicados que Connor apontava em frente ao auditório. Perguntou-se se teria chegado tarde demais para entender o que o tema da palestra.

Mas a compreensão das estatísticas que ela aprendera enquanto aluna de psicologia rapidamente deu frutos, ajudando-a a recuperar pelo menos um pouco. E alguns dos factos e números eram realmente fascinantes.

Por exemplo, o crime violento na América estava em declínio desde o seu auge em 1993. O crime de propriedade também seguia um padrão similar. É claro que, como explicou Connor, os especialistas não sabiam se essas tendências iriam continuar até ao século XXI.

Riley ficou surpreendida. Afinal, todos os que ela conhecia agiam como se o crime violento estivesse a piorar. De facto, as estatísticas também mostraram que os americanos tinham dificuldade em acreditar que a taxa de crimes violentos estava a diminuir.

Calculo que as pessoas pensam sempre no pior, Refletiu.

E de certa forma, isso parecia perfeitamente natural. Depois das suas próprias experiências horríveis com um assassino implacável em Lanton, parecia-lhe difícil sentir-se confortada por números e gráficos frios e abstratos. Também pensou nos seus encontros com o destroçado marido de Janet Davis e os pais enlutados de Margo Birch. O que lhes importava factos como aqueles? Para as vítimas e seus entes queridos, sempre haveria muita violência no mundo.

E sempre haveria trabalho para os investigadores e polícias.

Riley refletiu naquele pensamento. Ela queria ser uma dessas pessoas, dedicada a lutar pela justiça.

Mas será que isso iria acontecer?

Estaria ela pronta para os desafios desse tipo de vida?

Riley aprendeu muito mais factos surpreendentes durante o resto da palestra - por exemplo, que a maioria dos crimes nunca era denunciado à polícia, e a maioria dos que eram denunciados nunca eram resolvidos.

Há muito trabalho a fazer! Não parava de pensar.

E também havia um assassino a apanhar – naquele momento, ali mesmo em DC.

Ela interrogou-se...

Será que alguém conseguiria apanhá-lo antes que matasse novamente?


CAPÍTULO VINTE E NOVE


Riley teve dificuldade em se concentrar durante o resto da palestra.

Não parava de pensar no assassino, imaginando...

O é que ele estará a fazer neste exato minuto?

No que é que estará a pensar?

Já teria escolhido outra vítima?

Já teria raptado outra mulher?

Ou outra mulher já estaria morta?

Estaria um corpo pintado e fantasiado em algum lugar, ainda não descoberto?

Riley odiava ser excluída do caso, impossibilitada de tentar responder a essas questões sozinha.

Quando a palestra terminou, ela levantou-se rapidamente da cadeira, esperando escapar-se antes do resto dos estagiários. Mas mal saiu para o corredor, parou.

Não tinha para onde ir naquele momento.

Sentiu-se bloqueada quando grupos de estagiários saíram do auditório. Enquanto estava parada indecisa, os outros passaram por ela sem fazer comentários.

Estaria apenas a ser paranoica ou a maioria deles olhava para ela e sussuravam entre si sobre ela?

Ficou aliviada ao ouvir a voz de John a chamá-la...

"Ei, Riley!"

Ela virou-se e viu John a caminhar na sua direção. Ele tinha um olhar envergonhado e embaraçado no rosto. Por um momento, Riley não conseguiu perceber porquê.

Então ele postou-se à sua frente, encolheu os ombros e disse...

"Uh ... sobre ontem."

Então ela lembrou-se de como ele fugira da morgue ao ver o corpo assassinado.

Ela riu-se e disse, “Oh, então. Não tens que te preocupar com isso.”

John sorriu, parecendo aliviado.

Naquele momento, uma atraente jovem estagiária veio na direção de John, obviamente tentando distraí-lo de Riley.

Disse, "Ei, John, ainda te queres juntar a nós no King Tut em Georgetown?"

John olhou para Riley e para a jovem mulher.

Disse, "Eu não sei, Natalie..."

Natalie riu-se e puxou-o pelo braço.

"Bem, decide-te" Disse ela. "A happy hour não dura para sempre."

John olhou para Riley e disse, "Queres vir também?"

Riley podia ver a expressão de aborrecimento no rosto de Natalie. Obviamente que estava a tentar atirar-se a John e não queria competir com Riley. Riley não podia censurá-la. John era definitivamente um homem atraente e encantador. Ainda assim, a situação parecia bastante estranha.

Ela puxou John de lado e sussurrou -lhe...

"Lembras-te que estou noiva, certo?"

"Claro, não te preocupes" Disse John. "Iste não é um encontro. Isto é mais uma expedição de grupo. Ei, talvez o teu noivo se queira juntar a nós.”

Riley hesitou.

Deveria convidar Ryan? Será que se sentiria confortável com este grupo?

Estarei eu confortável com este grupo? Questionou-se.

Mas não havia mal nenhum em tentar.

"Dá-me só um minuto" Disse ela a John.

Afastando-se, pegou no telemóvel e ligou a Ryan.

“Olá, Riley. O que se passa? ” Perguntou Ryan.

Ela disse, "Vou sair com alguns dos estagiários. Queres juntar-te a nós? É em Georgetown, um bar chamado...”

Ryan interrompeu bruscamente, “Não posso. Ainda estou no trabalho. Eu tenho que ficar aqui por mais algum tempo.”

Riley sentiu um calafrio ao ouvir o seu tom de voz. Ele estava obviamente ainda zangado depois da discussão na noite passada.

"Tudo bem" Disse ela.

"Acho bem" Disse Ryan. "Sabes que tu não és a única que terá que trabalhar até tarde às vezes."

Riley sentiu um nó na garganta. Não sabia o que dizer.

Ryan disse, "Vai, diverte-te."

"É o que pretendo fazer" Disse Riley.

Terminaram a chamada e Riley ficou olhar para o telefone.

As palavras de Ryan importunaram-na...

"Vai, diverte-te."

Ela conhecia aquele tom de voz. Obviamente, a intenção dele não era aquela.

E como é que ela iria sse iae divertir com ele a sentir-se daquela forma?

Sentiu uma pontada de raiva.

Ele não está a ser justo, Pensou ela. Aquilo determinou-a a não deixar que a sua mesquinhez estragasse a sua noite.

Ela olhou para John que estava acompanhado de vários outros estagiários, incluindo Natalie. John olhava para ela com expetativa, mas os outros não pareciam felizes que Riley os estivesse a atrasar.

Riley reuniu a sua coragem e disse ..

"Ok, eu vou."

John sorriu alegremente e Riley seguiu-os até à garagem do edifício. Entrou para uma carrinha com os outros e dali a instantes estavam a caminho de Georgetown.

Quando chegaram ao King Tut, Riley viu que era um bar de dois andares de classe alta com muitas salas diferentes. O lugar estava completamente decorado com motivos e imagens egípcias.

Mesmo numa noite de semana, o lugar estava lotado por causa da happy hour. A clientela era marcadamente jovem - na sua maioria estudantes universitários ricos, Pensou Riley.

E a maioria deles do sexo masculino.

Na verdade, ela e Natalie eram as únicas mulheres do pequeno grupo de estagiários que acabara de chegar. Todos se dirigiram ao bar, onde eventos desportivos passavam nos grandes ecrãs de televisão.

Gritando sobre o ruído geral, John disse a Riley, “Estou a pensar em pedir algumas asas de frango. Parece-te bem?"

Riley assentiu.

John perguntou, "O que é que queres beber?"

Riley lembrou a si mesma que não podia beber álcool.

Disse a John, "Uma água com gás".

John pareceu um pouco surpreendido, mas fez o pedido ao barman. Quando a comida e as bebidas chegaram, eles seguiram o resto do grupo até uma sala próxima com à volta de uma pista de dança. Alguns jovens estavam a dançar ao som de uma música pop recente.

Natalie e os quatro rapazes estavam a sentar-se numa mesa suficientemente grande para mais pessoas. Mas quando John e Riley se aproximaram da mesa, Riley ficou surpreendida com o olhar furioso de Natalie. A outra estagiária definitivamente não queria Riley lá.

Riley hesitou. As coisas estavam prestes a ficar feias?

Ela ficou aliviada quando John gentilmente puxou o seu braço. "Vamos, vamos sentar-nos aqui."

Ele levou-a até uma mesa menor, longe do resto do grupo.

Quando eles se sentaram, John disse...

“Não ligues à Natalie. Ela é uma puta de primeira classe.”

Riley forçou um sorriso.

"Bem, ela parece ter-te em alta conta" Disse ela.

"Parece que sim" Disse John com um encolher de ombros. "Acredita em mim, o sentimento não é mútuo."

Nem Riley nem John pareciam saber o que mais dizer por alguns instantes. Riley reparou que John não parava de olhar para a mesa onde os outros estagiários estavam a conversar e a rir.

Preferiria estar sentado com eles? Perguntou-se. Apesar da Natalie, preferiria estar a conversar com os seus amigos?

Não gostava de pensar que poderia estar a estragar a sua noite.

Riley deu por si a lutar contra a crescente maré de autopiedade que se apoderava de si. Talvez ela não devesse nem estar ali. Talvez devesse ter dito que não poderia vir.

Ela parecia estar em discordância com todas as pessoas que faziam parte da sua vida - Ryan, Agente Crivaro e agora os seus colegas estagiários. Olhando para o grupo alegre na outra mesa, Riley lembrou-se de momentos mais felizes em Lanton.

Eu costumava ter amigos assim, Pensou.

Eu costumava gostar de sair com eles.

Aqueles dias pareciam ter acontecido há muito tempo.

Então ela ouviu John dizer...

"Lamento. Esta ‘expedição de grupo’ não está a correr como eu tinha planeado."

Riley virou-se, olhou para ele e respirou mais facilmente.

Ele está preocupado com os meus sentimentos, Percebeu.

Sabia muito bem ter um amigo naquele momento – mesmo sendo um amigo que não conhecia muito bem.

Riley olhou para o grupo novamente.

Ela abanou a cabeça e disse, "Eu não me encaixo muito bem".

John soltou uma risada bem-humorada.

"A culpa não é tua, acredita em mim" Disse ele. “A Natalie não gosta de ti porque... bem, só porque eu gosto de ti. Quanto a alguns dos outros...

Ele parou por um momento e olhou para Riley intensamente.

Então disse, "Riley, não percebes que estão assustados contigo? Raios, até eu estou meio assustado contigo. É como eu te disse quando nos conhecemos, nenhum daqueles estagiários fez nada parecido ao que tu já fizeste. Eles nunca trabalharam num caso real de homicídio, muito menos praticamente resolveram um. E é óbvio que não estão a trabalhar num caso neste momento.”

Riley estremeceu ligeiramente.

Deveria ela admitir que lhe tinha sido concedido um "intervalo" do caso e poderia nunca mais voltar a ele?

Então John disse, "Não os podes censurar por serem um pouco..."

Calou-se.

"Um pouco o quê?" Perguntou Riley.

"Ciumentos" Disse John.

Riley abanou a cabeça e disse, “Oh, John. Por favor, não me digas que te sentes assim.”

John riu-se.

"Eu? Huh-uh Assombrado, claro, mas não ciumento. Não sou do tipo ciumento.”

Riley sorriu, sentindo total empatia com ele.

John disse, “A verdade é que tenho a certeza de que poderia aprender muito contigo. Coisas que eu não entendo em nenhuma das aulas ou workshops. Eu gostava mesmo que me contasses como foi resolver o caso em Lanton.”

O sorriso de Riley desvaneceu.

Quereria ela falar com ele sobre aquilo?

Ele provavelmente pensava que tinha sido uma espécie de aventura de Nancy Drew.

Como é que ele reagiria ao verdadeiro horror por que ela passara?

Ficaria assustado e a desejar não ter perguntado?

Será que ele não queria mais nada dela?

Riley olhou-o nos olhos por um momento e então percebeu...

Eu confio nele.

Eu realmente confio nele.

Talvez estivesse a ser ingénua, mas sentiu que podia falar com ele sobre qualquer coisa. Ele era realmente um tipo simpático. Não tinha nenhuma agenda oculta.

Antes de dar por isso, já lhe estava a contar a história toda - como ela encontrara o corpo da pobre Rhea Thorson no seu dormitório, com a garganta brutalmente cortada. Contou-lhe sobre os horrores dos dias seguintes, incluindo como ela encontrara a sua melhor amiga, Trudy, morta no quarto que partilhavam.

Contou como se convencera erroneamente de que um dos professores era o assassino. E contou-lhe sobre a sua terrível experiência quando o verdadeiro assassino, outro professor, a levou em cativeiro e a teria matado se o Agente Crivaro não a tivesse salvo.

Mas talvez as partes mais perturbadoras da sua história estivessem relacionadas com a sua descoberta da sua rara capacidade de entrar na mente do assassino.

Quando terminou, os olhos de John estavam arregalados.

Ele sussurrou, "Eu sinto muito que tenhas passado por tudo isso."

Riley sentiu um nó na garganta.

Ela sentiu a necessidade de dizer-lhe outra coisa, algo que ela nunca contava a outras pessoas.

Devagar e com cuidado, ela disse...

“A verdade é que eu acho que estava mais bem preparada para esse tipo de coisa do que a maioria das pessoas. Sabes, eu...

Ela hesitou, depois acrescentou...

"Eu vi a minha própria mãe morta a tiro quando tinha seis anos de idade."

John abanou a cabeça devagar e disse...

"Oh, Riley."

Riley sentiu um mundo de bondade e simpatia naquelas duas palavras.

Ela percebeu o quanto estava desesperada por poder falar aberta e livremente com alguém – sobretudo desde que ela e Ryan estavam zangados.

Poderia ela falar com John sobre tudo o que acontecera desde que entrara no programa?

Poderia falar sobre o caso?

Ela inclinou-se sobre a mesa em direção a ele e disse...

"John, se eu te disser o que eu tenho andado fazer no caso Assassino Palhaço, prometes...?"

"Não vou contar nada a ninguém" Disse John.

Riley não sabia bem porquê, mas sentiu que podia confiar nele.

Mais do que isso, ela sabia que precisava mesmo de falar sobre aquilo.

Começou com o telefonema das cinco da manhã de Crivaro para ela há três diass, e como ele os levara ao campo onde o corpo de Janet Davis tinha sido encontrado. Ela descreveu a forma chocante como a vítima tinha sido vestida e maquilhada - e como, ali mesmo, Riley tinha percebido corretamente que o assassino sádico literalmente amedrontara aquela pobre mulher até à morte.

Ela contou-lhe sobre a câmara escura e a loja de disfarces, e sobre os seus perturbadores encontros com o marido de Janet Davis e os pais de Margo Birch. Ela descreveu os seus sentimentos contínuos de conexão com o assassino no quintal dos Birch, atrás do cinema e especialmente durante a sua viagem clandestina ao Parque Lady Bird Johnson.

Também lhe contou sobre o seu relacionamento complicado com o Agente Especial Crivaro, e como ele a repreendera mais do que uma vez. Finalmente, descreveu como o comportamento dela na feira a tirara do caso - pelo menos temporariamente.

Finalmente, pegou no jornal com o poema e leu-lho, explicando todas as pistas que lá encontrara.

John pegou o papel e leu o poema para si mesmo, depois disse...

"Uau, o Crivaro deve estar louco em colocar-te de parte. Parece-me que estás a fazer um trabalho incrível. Decifrar esse poema foi qualquer coisa. E o que tem de mal perseguir alguém tão suspeito quanto aquele tipo na feira?”

Riley suspirou profundamente.

Ela disse, "Crivaro diz que eu tenho que aprender disciplina e paciência".

John riu um pouco e disse, "Uma espécie de relacionamento entre Yoda e Luke Skywalker, não é?"

Riley riu. Náo pensara nas coisas naquela perspetiva.

Disse, "Um destes dias falo-te sobre o meu pai estilo Darth Vader."

Mas John não pareceu ouvi-la. Ele estava a olhar para o jornal, aparentemente fascinado pelo poema.

Finalmente olhou para ela e disse...

“Riley, vamos resolver este caso. Apenas nós os dois. Agora mesmo."


CAPÍTULO TRINTA


Riley ficou espantada com aquelas palavras. Por um momento, perguntou-se se teria ouvido John corretamente.

Perguntou, "O que é que queres dizer com resolver o caso?"

John olhou-a durante alguns segundos.

Gaguejou, "Eu... eu não tenho certeza. Provavelmente não resolver. Mas pelo menos tentar. Apenas como um exercício. Pensa num plano, mas não algo que realmente façamos.”

Ele encolheu os ombros e acrescentou, "Olha, eu estou realmente fascinado com a forma como a tua mente funciona. Eu podia aprender muito contigo. E talvez se pensássemos em conjunto um pouco...”

A sua voz desvaneceu-se.

Riley sentiu-se lisonjeada e intrigada.

Talvez seja uma boa ideia, Pensou ela.

Apenas como um exercício.

Ela perguntou, "Como é que achas que devemos começar?"

John coçou o queixo e disse, “Bem, por onde é que tu começarias? O que é que gostarias de fazer agora se Crivaro te deixasse decidir?”

Riley pensou por um momento, então sentiu o formigueiro de uma a formar-se na sua cabeça.

Disse, "Eu tentaria atraí-lo. O assassino, quero dizer.”

"Como assim?" Perguntou John.

Riley pegou no poema do assassino e passo-o a pente fino.

Então disse “Ele adora enigmas. Gosta de os inventar - e aposto que não lhes resistir vêm de outras pessoas. Neste momento, talvez até se sinta desiludido por ninguém estar a tentar equiparar-se a ele.”

John sorriu ansiosamente.

"Continua" Disse ele. "Estou a ouvir."

Riley ficou a pensar enquanto mordiscava uma asa de galinha. Bebeu um gole de água com gás.

Finalmente disse, "Talvez pudéssemos atraí-lo à cena de um dos seus crimes e poderíamos estar prontos para o apanhar lá".

John expirou bruscamente.

"Uau, isso parece uma tarefa difícil" Disse. "Ele tem que estar disposto a assumir um risco enorme".

Riley inclinou-se sobre a mesa na sua direção.

Ela disse, "Sim, mas ele já está inclinado a isso. É um risco sério cometer o tipo de homicídio que ele comete. Nós só precisamos acionar esse aspecto do seu comportamento, fazer com que isso funcione a nosso favor.”

Riley ficou a olhar para o poema por um momento.

Reunindo as ideias, disse...

“Neste momento, ele não pode saber que alguém quebrou pelo menos parte do seu enigma. Ele nem sabe se alguém reparou no poema. Pelo que sabe, perdeu o seu tempo a escrevê-lo. Então... podemos dizer-lhe!”

"Como?" Perguntou John.

"Com outro poema!" Disse Riley, apontando para o poema no jornal. "Eu aposto que ele lê esta rubrica diariamente - caso contrário, porque é que teria enviado o seu poema para aqui? Nós poderíamos imprimir o nosso poema no mesmo espaço. Não diríamos a ninguém o que estávamos a fazer - nem mesmo aos editores do jornal. Seria apenas mais um pequeno poema, do tipo que eles publicam todos os dias.”

John assentiu e disse, "Mas seria um enigma como o poema do assassino - um enigma em que ninguém, exceto o assassino, repararia, muito menos tentaria descobrir."

"Isso mesmo" Disse Riley.

Ela pegou no caderno e numa caneta, depois acrescentou...

"Uh, há apenas um problema."

"Qual?" Perguntou John.

"Eu não consigo escrever poesia."

John riu.

"Eu sou capaz de te poder ajudar com isso” Disse ele. “Sempre me interessei por isso. Até tive alguns poemas publicados na revista literária da universidade. Vem, senta-te mais perto. Vamos escrever juntos.”

Riley puxou a cadeira para perto da sua e sentou-se. Sentia-se surpreendentemente confortável por estar fisicamente táo perto dele. Ela ofereceu-lhe a caneta e o caderno e observou-o a trabalhar com as ideias de ambos.

Ele disse, "Primeiro, precisamos de pensar numa voz, num ponto de vista".

O cérebro de Riley estava a despertar. Foi uma sensação emocionante.

Ela disse, "E se o escrevêssemos na perspetiva de uma das mulheres mortas, refletindo sobre o que lhe aconteceu?"

John olhou para ela e perguntou, “Queres dizer como um fantasma? Achas que ele acreditaria nisso?”

"Não, claro que não" Disse Riley. "Ele sabe que não foi escrito por uma pessoa morta, mas essa não seria a intenção."

"Não há dúvida de que chamaria a sua atenção" Disse John com um aceno de cabeça.

"Certo" Disse Riley.

A caneta de John acelerou, anotando os pensamentos de Riley.

Riley disse, "Talvez a mulher possa estar a pensar no momento em que ele a raptou."

John disse, "Talvez quando Janet Davis foi apanhada na marina do Parque Lady Bird Johnson?"

"Exatamente!" Disse Riley.

Riley descreveu as fotos que Janet tinha tirado no parque - especialmente a última, com a visão turva da marina.

Ela disse, "Tenho a certeza de que ela estava a tirar aquela foto no exato momento em que ele a deixou inconsciente e a levou ".

John assentiu devagar e disse, “Então, no poema, ela poderia decidir voltar para a marina ao pôr-do-sol para tentar recapturar esse momento, para tentar entender o que aconteceu. Ela diria que iria ao local ao pôr do sol naquele mesmo dia. Isso daria ao assassino um tempo e um lugar para esperar algum tipo de encontro. Ainda assim, não consigo deixar de pensar... não estará ele à espera que a polícia esteja à sua espera lá? Quero dizer, ele tem uma personalidade de risco, mas... "

Riley disse, "É por isso que temos que tornar isto tão intrigante que ele não consiga resistir, apesar do risco. Podemos fazer o poema de forma a parecer que não foi escrito pela polícia ou pelo FBI - apenas uma misteriosa pessoa privada que sabe mais do que deveria.”

Assim que as palavras saíram, Riley percebeu...

Quase pareço estar a falar sobre mim mesma.

Afinal, ela agora já não fazia parte do caso.

O que é que Crivaro pensaria se soubesse o que ela estava fazer?

Provavelmente não aprovaria, Pensou.

Pior, provavelmente dir-lhe-ia porque é que era uma péssima ideia.

Mas o que é que isso importava? Afinal, como John havia dito antes, era apenas um exercício...

"Não é algo que realmente façamos."

Que mal havia em explorá-lo apenas como uma ideia?

Riley e John começaram a trabalhar. Primeiro escolheram um título...


O Meu Pôr-do-Sol Perdido


Depois trabalharam no poema. Riley forneceu as ideias e imagens que John moldou em linhas e estrofes. Riley ficou impressionada com a sua capacidade e como as rimas lhe ocorriam com facilidade.

Antes que Riley desse conta, já tinham escrito tudo.

John leu em voz alta...


As últimas coisas que vi naquele crepúsculo

O declínio daquele dia

Eram águas cintilantes, calmas e tranquilas,

E manchas de branco e cinza.


Eu deixo a minha lente cair da minha mão

O meu tremor foi culpado,

E então eu escorreguei e perdi essa visão;

Perdê-la, uma pena!


Se eu tivesse olhado melhor, eu saberia

Que formas me escaparam?

Hoje à noite quando o sol vier novamente

Eu devo voltar e ver!


"Uau," Sussurrou Riley quando John terminou. "Isso é realmente bom."

John anuiu e disse, “Para qualquer leitor comum, pareceria que talvez uma estudante estivesse a imitar Emily Dickinson. Mas descreve exatamente o que aconteceu com Janet naquela noite - especialmente como ela deixou cair a máquina.”

John apontou para as duas últimas linhas e as leu-as novamente em voz alta...


Hoje à noite quando o sol vier novamente

Eu devo voltar e ver!


Então ele disse, "Ela está a dizer-lhe que estará na marina naquela mesma noite, no exato momento do seu rapto. Mas achas que vai realmente chamar a atenção do assassino?”

Riley sentiu um calafrio - um sentido fugaz da astúcia do assassino e também da sua curiosidade.

"Tenho a certeza" Disse ela.

Então Riley abanou a cabeça e novamente...

"Uau."

John continuou, "Mas tem que ser assinado por alguém. Temos que inventar um nome para o poeta - a pessoa que supostamente terá enviado o poema para o jornal.”

Riley disse, "O assassino assinou o seu nome ‘Joey’ e a foto que ele enviou como ‘Joseph Grimaldi’. Não eram os seus nomes verdadeiros. Eram referências de palhaços. Devemos usar um nome falso também.”

Riley pensou por um momento, depois disse...

“O nome da vítima era Janet Davis. Poderíamos talvez transformar isso num anagrama?”

"Ótima ideia" Disse John.

Juntos, começaram a juntar as letras de maneiras diferentes. Riley rapidamente percebeu que criar um anagrama era mais difícil do que escrever o próprio poema. Mas eventualmente surgiu-lhes...


Tina D. Vejas


Riley disse, “Eu acho que soa a um nome real. Só o apelido soa um pouco estranho.”

"Não é assim tão estranho" Disse John. “Parece um nome espanhol. De fato, tem algum significado extra em espanhol”.

John sorriu-lhe, como se estivesse a convidar Riley a adivinhar.

Riley pensou e disse, "Bem, eu era péssima a espanhol no ensino médio e..."

John gentilmente interrompeu, "É a segunda pessoa do singular do verbo 'vejar'".

Riley encolheu os ombros. Ela não se conseguia lembrar dessa palavra ou sequer se alguma vez a aprendera.”

John disse, "Vejar significa vexar ou maltratar - ou humilhar".

Os olhos de Riley arregalaram-se.

Ela disse, “Então, o apelido do poeta significa literalmente tu humilhas' em espanhol! Que é exatamente o que o assassino faz com as suas vítimas, vestindo-as e transformando-as em palhaços!”

John assentiu, sorrindo amplamente.

Riley leu o poema mais uma vez.

Podia imaginar o fascínio e deleite do assassino com os enigmas daquele poema...

Ou...

Talvez não reparasse em nada.

De qualquer forma, ela ainda tinha a certeza de que Crivaro poderia dar-lhe uma dúzia de razões para aquilo não resultar. E, claro, estaria certo.

Além disso, lembrou a si mesma, era apenas um exercício...

"Não é algo que realmente façamos."

Ela e John continuaram sentados, não voltando aos lugares originais em lados opostos da mesa, embora tivessem terminado o trabalho que tinham começado. De certa forma, parecia certo ficarem perto - e era mais fácil ouvirem-se um ao outro por causa da conversa e da música na sala.

Leram o poema um ao outro novamente e falaram sobre como era inteligente, realmente saboreando o que tinham acabado de fazer juntos.

Riley ficou surpreendida com a sensação de bem-estar que sentia - melhor, pensou, do que se sentia em dias.

Afinal, mesmo quando Crivaro a parabenizou por fazer algo certo, a pressão realmente não diminuira. Ela ainda sentia a necessidade de lhe provar alguma coisa. As suas palavras ocasionais de elogio não apagaram a insegurança crónica que ela vinha a sentir ultimamente...

Mas isto... agora...

Estar perto de John era tão diferente

Era tão fácil e simples.

Parecia um enorme alívio poder falar abertamente com ele sobre coisas de que ela raramente falava. E foi tão estimulante e energizante gerar ideias com ele, elaborar um plano em conjunto, mesmo que fosse apenas um exercício hipotético.

Enquanto continuavam a falar sobre uma coisa ou outra, o prazer de Riley começou a desvanecer-se em melancolia. Ela imaginou...

Porque é que é tão raro na minha vida... esta coisa simples que eu tenho agora, esta amizade?

John pareceu notar uma mudança no seu comportamento.

Finalmente ele disse, “Pareces triste, Riley. Passa-se alguma coisa?"

Riley suspirou profundamente.

"Bem, acho que já falei sobre quase tudo, mas..."

Ela hesitou por um momento, depois disse...

“As coisas não estão bem entre mim e Ryan, o meu noivo. Deveria estar tudo ótimo. Ele tem um emprego maravilhoso como advogado de nível básico num escritório de advogados, e eu estou a treinar para o FBI e...”

Ela impediu-se de dizer a John que estava grávida.

Ela sabia que não era porque considerava errado contar-lhe, mas não tinha contado a ninguém no programa de estágio. Nem tinha dito a Crivaro.

Em vez disso, disse, “O Ryan e eu temos passado mais tempo separados. E sempre que estamos juntos...”

A voz de Riley desvaneceu-se.

John disse, "Sentem-se em desacordo, não é? Como se estivessem a sentir dificuldade em entender todas as coisas novas que estão a acontecer aos dois. Não estão ligados como deveriam.”

Riley assentiu e sentiu um nó de emoção na garganta.

John era tão empático - e ela realmente precisava de um pouco de empatia naquele momento.

Então John disse, “Bem, parece-me perfeitamente natural, com todas as mudanças que estão acontecendo nas vossas vidas. É apenas uma transição. Vocês vão ultrapassar isso.”

Ele encolheu os ombros e disse, “Mas o que é que eu sei? Eu nunca estive noiva.”

Então ele riu-se e acrescentou, "E, além disso, não sou eu a licenciada em psicologia."

Riley também se riu.

O riso deles desapareceu e John ficou a olhar para ela com uma expressão gentil.

Então ele disse, "Responde-me só a uma pergunta - sim ou não."

"OK" Disse Riley.

John inclinou-se para ela e perguntou...

"O Ryan é um idiota?"

Os olhos de Riley arregalaram-se de surpresa.

"O quê?” Perguntou ela.

“É realmente uma pergunta simples. Sim ou não?"

Riley riu nervosamente e disse, "Na verdade, Ryan é realmente muito inteligente e..."

John interrompeu, "Isso é um 'não', por isso podes parar. Isso é tudo o que eu precisava de ouvir. Ele não é um idiota, então ele reconhecee uma coisa boa quando a tem. Não vai abdicar de ti.”

John recostou-se na cadeira e acariciou o queixo com uma sagacidade fingida.

Prosseguiu, "E eu sei por experiência própria que tu és tudo menos uma idiota. O que significa que não estarias com o Ryan se ele não fosse a pessoa certa para ti. E tu não vais abdicar dele.”

John estalou os dedos e disse, “Então... aí está. Vocês são inteligentes o suficiente para saberem que têm algo de bom entre vocês. Isso significa que vão ficar bem juntos. Apenas deêm algum tempo.”

Riley sorriu abertamente.

Quando fora a última vez que alguém lhe dissera algo tão carinhoso?

Talvez ele esteja certo, Pensou.

Naquele momento uma música pop rápida e barulhenta chegou ao fim, e os dançarinos na pista trocaram de ritmo quando uma música mais suave e lenta começou a tocar.

Riley sentiu uma dor amarga ao reconhecer a música “One More Night” de Phil Collins.

Era uma das suas favoritas há muito tempo. Claro que era uma música antiga e ela era gozada pelas suas amigas em Lanton, que geralmente acompanhavam as modas mais recentes.

Lembrou-se especialmente como Trudy costumava chamá-la de “avozinha” sempre que a ouviam juntas.

Então ela e Trudy ririam.

Lembrou-se do som musical da risada de Trudy, do brilho do seu sorriso...

Nunca mais vou ouvir aquela risada.

Nunca mais vou ver aquele sorriso.

Era um pensamento quase insuportável.

Mas mesmo assim, aquelas lembranças eram bonitas.

John tocou-a no ombro e disse, "Gostas desta música?"

Riley sorriu-lhe e assentiu.

John gentilmente pegou-a pela mão e disse, "Vamos, então."

Levou-a para a pista de dança e, dali a instantes, estavam juntos e a balançar ao som da música.

Riley sentiu-se tão quente, segura e relaxada, pensou que se poderia derreter nos braços de John.

Foi uma sensação incrível - ainda mais porque não havia nada de sexual naquilo.

John era um amigo simpático e carinhoso - nada mais, nada menos.

E ela tinha a certeza de que ele sentia o mesmo por ela.

Então Riley foi abalada pelo som do seu telemóvel a tocar no seu bolso.

"Oh, peço desculpa" Disse ela a John.

"Tudo bem" Disse ele. "É melhor atenderes."

Riley pegou no telefone. Como esperava, viu que quem lhe ligava era Ryan.

Ficou chocada com a mudança abrupta nos seus sentimentos.

Quando atendeu, questionou-se...

Porque é que de repente me sinto tão triste?


CAPÍTULO TRINTA E UM


Saindo da pista de dança, Riley afastou-se para encontrar um local mais calmo para poder conversar com Ryan.

"Estou a ouvir vozes e música" Disse Ryan. "Onde é que estás?"

A música de Phil Collins continuava a tocar.

Naquele momento percebeu...

O Ryan nem sabe o quanto gosto desta música.

Eu nunca lhe disse.

Por alguma razão, aquilo assumiu uma grande importância naquele momento.

Ela disse, "Estou num bar em Georgetown chamado King Tut's."

Ryan não respondeu.

Sentindo-se um pouco irritada, Riley disse...

“Olha, eu disse-te que ia sair com alguns amigos. Pensei que não havia problema.”

"E não há" Disse Ryan.

Mas ele não soou muito convincente.

E ela não conseguia deixar de sentir uma pontada de culpa por ter dito aquela palavra...

Amigos.

Ela estava a ser desonesta ao dar a entender que estava com amigos - plural?

Ela não tinha quase nada a ver com os outros estagiários, exceto John. E eles também não queriam ter nada a ver com ela.

Riley perguntou, "Onde estás?"

"Eu ainda estou no trabalho, mas não tarda vou para casa. Só queria saber se há alguma coisa para comer em casa.”

Riley suspirou e disse, “Devias saber saber. Fizeste o atum e a salada. Há sobras no frigorífico.”

"Já está meio passado" Resmungou Ryan.

Riley conteve um suspiro e conseguiu não dizer...

"Só o fizeste ontem."

Ela sabia que não ajudaria. Ryan não estava com humor para concordar com ela sobre o que quer que fosse.

Finalmente Ryan disse, "Tudo bem. Eu compro alguma coisa no caminho.”

E terminou a chamada.

Riley ficou ali a olhar para o telefone na sua mão. Ela não sabia se se sentia mais furiosa ou magoada.

Ele quer que eu me sinta culpada, Percebeu.

O que mais a incomodava era que ela se sentia culpada.

Porquê, não sabia ao certo.

Ouviu John dizer, "Passa-se alguma coisa?"

Virou-se e viu-o a seu lado com uma expressão preocupada no rosto. Riley perguntou-se - o que é que lhe deveria dizer? Ela bem que queria dizer...

Está tudo bem. Vamos continuar a falar e a dançar.

Mas isso não era uma opção naquele momento.

Já não era possível desfrutar da noite.

Finalmente ela suspirou e disse...

"Acho que é hora de ir para casa."

John assentiu e não disse nada. Riley sentiu que ele tinha percebido que algo estava errado entre ela e Ryan e que ela preferia não falar sobre o assunto.

Riley deu-lhe um beijo rápido e amigável na bochecha, depois virou-se para sair do bar.

"Espera um minuto" Disse John. "Como é que vais para casa?"

“Como faço sempre, de metro” Respondeu Riley.

John revirou os olhos e disse, "Oh, não sejas pateta. Eu levo-te a casa. Eu já estava a planear apanhar um táxi. Apanhamos um juntos.”

Riley acenou com a mão em protesto.

"Oh, não" Disse ela. "Náo tens que estragar a tua noite. Devias divertir-te com os teus amigos.”

John olhou para a mesa onde os outros estagiários estavam sentados. Riu-se.

“Com aquele bando? Seria muito dececioante depois de...” Ele interrompeu o que quer que fosse dizer, depois acrescentou, “Não estou para os aturar. Vem, vamos."

Riley deixou uma gorjeta na mesa e seguiu John para o exterior, onde ele arranjou um táxi para eles.

Nenhum dos dois falou muito durante a viagem até ao apartamento de Riley. Não era propriamente um silêncio constrangedor. Riley não estava com vontade de falar, e John, obviamente, respeitou isso.

Quando se aproximaram do prédio de Riley, ela reparou que John olhava pela janela do táxi para o bairro decadente onde ela morava. Parecia especialmente decadente à noite, com os jovens vagabundeando nas calçadas vestidos com o que parecia ser um traje de gangue.

Riley não reparou em nenhuma mudança particular na expressão de John, mas podia imaginar aquilo em que ele estava a pensar. Vindo como ele de uma família rica, John certamente vivia num ambiente muito mais sofisticado.

Teria ele ficado chocado com o local onde ela vivia?

Ele viveu uma vida tão protegida e privilegiada, Pensou ela, lembrando-se novamente de como John tinha fugido da morgue perante a visão de um cadáver adolescente.

Estaria ele realmente pronto para viver a vida que escolhera - a vida de um agente da lei dedicado, quase constantemente confrontado com horrores que a maioria das pessoas dificilmente poderia imaginar?

Riley sabia que ele era esperançoso e idealista, mas...

Saberá no que se meteu?

O táxi em frente ao prédio de Riley. Ela estendeu a mão e apertou a mão de John.

"Muito obrigada por noite bem passada" Disse ela com um sorriso.

"Obrigado" Disse ele, retribuindo o sorriso. "Temos que repetir."

Riley saiu do táxi e entrou no prédio, depois desceu as escadas para o apartamento na cave. Quando entrou, ficou aliviada ao ver que as luzes ainda estavam apagadas. Ryan ainda não tinha chegado a casa.

Ela acendeu as luzes e foi logo para o frigorífico onde pegou na tigela de vidro com o atum e salada que Ryan tinha preparado no dia anterior. Tirou a folha de alumínio do topo e viu que parecia tão fresca como no próprio dia.

"Passada”, uma ova, Pensou irritada. Cheirava bem e Riley percebeu que estava com fome.

Pegou num copo de água, num prato e nos talheres e sentou-se à mesa. Enquanto comia, pegou no seu caderno e olhou para o poema que ela e John tinham escrito juntos. Ela reparou em duas linhas em particular...


... Águas cintilantes, calmas e tranquilas,

E manchas de branco e cinza.


É muito bonito, Pensou.

Claro, ela tinha que dar crédito a John pelas qualidades que pudesse ter enquanto poema. Ele era realmente um homem sensível, inteligente e imaginativo - e mais talentoso com as palavras do que provavelmente teria noção.

Mas ao ler o resto do poema naquele momento, era tudo o que parecia ser...

Bonito.

A ideia de que alguém pudesse usá-lo para atrair o assassino parecia-lhe agora improvável e tola. Não que ela e John tivessem levado aquilo a sério. Fora apenas um "exercício", afinal. Mas pelo menos fora divertido escrevê-lo.

Ela ainda estava sentada, a comer o seu jantar e a ler novamente o poema, quando ouviu a porta do apartamento abrir-se. Ryan entrou, carregando um saco de um restaurante de fast food. Assim que o viu, uma sensação estranha apoderou-se de Riley.

Sentiu-se enjoada e a cabeça começou a doer.

O que é que se passa comigo? Interrogou-se.

Ryan olhou para Riley com surpresa quando fechou a porta atrás de si.

"Chegaste mais cedo do que eu esperava" Disse ele. "Mas eu trouxe dois hambúrgueres."

Riley encolheu os ombros, tentando ignorar a dor.

"Eu já comi" Disse ela. "Apanhei um táxi para casa."

Ryan parecia aborrecido quando pousou o saco na mesa.

"Um táxi?" Perguntou ele. “Não o metro? Afinal quanto é que gastaste hoje à noite?”

Riley franziu a testa. Ela queria dizer...

"É da tua conta?"

Mas, claro, eles eram pobres e era natural que ele se preocupasse com aquele tipo de coisa.

"Eu quase não gastei nada" Disse ela. "Deixei uma gorjeta na mesa do bar quando saímos, foi só isso."

Ela viu a expressão de Ryan obscurecer-se e soube imediatamente porquê.

Eu disse "nós".

E agora Ryan não estava apenas irritado. Também estava desconfiado e com ciúmes.


CAPÍTULO TRINTA E DOIS


De forma abrupta, Ryan sentou-se à mesa com Riley. Os seus olhos estavam repletos de desconfiança.

Ele pensa que o estou a trair, Percebeu Riley.

E ela estava a sentir-se demasiado doente para lhe explicar porque é que estava errado. Ela afastou o prato com os restos de atum e salada.

Com uma voz tensa, Ryan disse lentamente, "Então não gastaste nada com comida ou bebidas ou até com o táxi para casa?"

Riley suspirou e disse, “O que se passou foi que um amigo pagou as minhas bebidas e comida esta noite. Nós dividimos o táxi e ele também o pagou”.

Ryan agora olhava para ela. Ainda não tinha aberto o seu saco de comida.

Enquanto isso, o estômago de Riley doía e uma dor de cabeça parecia estar a caminho.

Estaria a ficar com gripe?

As asas de galinha no King Tut's ter-lhe-iam feito mal?

Ou o atum e a salada já não estavam frescos?

Ou ela estaria tão aborrecida que isso a estava a pôr doente?

Sentindo-se bastante irritada agora, Riley disse...

“Era um homem, ok? Não foi um encontro e eu não estou envolvida com ele ou atraída por ele ou algo assim. Ele é outro estagiário do programa de verão. Nós somos apenas amigos."

As palavras estremeceram quando ela disse...

Apenas Amigos.

A palavra "apenas" dificilmente parecia a mais correta.

Naquela noite, uma pequena amizade parecia uma coisa enorme e importante.

Mas ela não queria tentar explicar isso a Ryan naquele momento. As coisas já estavam suficientemente más.

Riley apontou para o saco na mesa. "A tua comida está a arrefecer."

Ryan ignorou-a e e não tocou no saco. Ficou sentado a olhar para o espaço por um longo momento. Finalmente disse, "Riley, nós realmente precisamos conversar. O que é que está a acontecer connosco?”

Riley quase teve que morder a língua para não dizer...

"De certeza que não sou eu que sei."

Em vez disso, ela conseguiu ficar em silêncio.

Parecendo que estava a tentar controlar a sua própria raiva, Ryan disse, “Há alguns dias atrás eu pedi para te casares comigo. Eu dei-te um anel. Tu parecias feliz. Mas desde então eu sinto que te estás a distanciar.”

"Eu não me estou a distanciar" Ripostou Riley.

"Então, porque é que não podemos marcar uma data?" Perguntou Ryan. "Porque é que não podemos definir planos?"

Riley estava a sentir-se cada vez mais doente.

Não ajudava no seu humor.

Ela já não podia esconder a sua amargura e ressentimento.

Ela disse, “Olha, ainda ontem referiste porque tinhas tanta pressa para o casamento. Estás envergonhado. Não queres que os teus pais vejam que eu estou grávida.”

Ryan parecia incrédulo.

"Eu não disse isso" Disse ele.

"Sim, disseste" Rebateu Riley. “Eu lembro-me das tuas exatas palavras quando sugeri que te sentias dessa forma. ‘Podes censurar-mer?’, Disseste. ‘Não te sentes da mesma maneira?’, Foi exatamente o que disseste.”

Ryan saltou da cadeira, obviamente, picado pelas palavras de Riley.

"Eu só quero o melhor para nós os dois" Disse ele.

Ambos ficaram em silêncio. A cabeça de Riley doía tanto agora que ficou tonta. Olhou para a comida no prato com nojo.

Finalmente Ryan disse numa voz suave e triste...

"Talvez o melhor para nós seja.. simplesmente desistir de tudo."

Riley sentiu lágrimas nos olhos. As coisas estavam muito pior do que ela imaginara.

Ela desejou que pudessem calar-se e fingir que aquela discussão nunca tinha começado.

Mas já era tarde demais para isso.

Então Ryan disse, "Queres que eu saia de casa?"

"Eu não sei" Disse Riley, lutando para evitar que a voz tremesse. "Queres o teu anel de volta?"

A cabeça de Ryan descaiu e ele libertou um som que parecia um soluço.

Oh, Deus, Pensou Riley. Falámos demais.

Mas não havia como voltar atrás.

Estava a ficar claro para ela - ambos tinham contido ressentimento e raiva, e isso começava agora a vir ao de cima.

Mas tudo estava a acontecer tão rapidamente.

Há pouco tempo, as coisas tinham sido tão diferentes.

Ela sentiu-se tão confortável com John. Seria possível que ela se sentisse tão à vontade com Ryan?

Alguma vez se sentira assim com ele?

De repente, aquela parecia ser a pergunta mais importante na vida de Riley.

E ela estava desesperada para obter uma resposta.

Riley pegou na mão de Ryan. Lutando contra a sua dor física e emocional, disse...

"Ryan ... somos amigos?"

Ryan olhou para ela com uma expressão de perplexidade.

"O quê?" Perguntou.

"Somos amigos?" Repetiu Riley.

Ryan apertou-lhe a mão.

"É claro que somos amigos" Disse ele. "Estamos apaixonados. Estamos noivos. Vamos ter um bebé. Como poderíamos não ser amigos?”

Riley tentou consolar-se com as suas palavras, mas não conseguiu.

Ele não entende, Pensou.

Ele nem entende a pergunta.

De repente, ela curvou-se, afetada por uma feroz pontada de dor na sua barriga.

Ryan colocou a mão no ombro dela.

Ele disse, "Riley, estás bem?"

Riley sentiu algo diferente na sua voz - uma preocupação profunda e súbita.

Ela abanou a cabeça.

"Estou a sentir-me muito mal" Disse ela. "Acho melhor ir para a cama."

"Posso fazer alguma coisa para te ajudar?" Perguntou Ryan.

"Não" Disse Riley quando outro espasmo de dor sacudiu o seu corpo. "Eu lamento... muito... tudo isto."

"Eu também " Disse Ryan.

Ryan ajudou-a a levantar-se da mesa e depois cambaleou até ao quarto. Ela foi vestir-se para a casa de banho onde tomou uma aspirina, tirou as roupas e se preparou para dormir.

Então voltou para o quarto. Ryan ainda estava lá, a olhar alarmado para ela.

Ela deitou-se na cama e Ryan cobriu-a.

Durante alguns instantes, a dor na cabeça e na barriga pareceu piorar cada vez mais.

Mas então a dor diminuiu e tudo o que ela sentiu foi uma tristeza terrível. Sentiu lágrimas a escorrer-lhe pelo rosto.

As lágrimas eram estranhamente reconfortantes.


*


Riley chorava enquanto vagava pelos corredores vastos e vazios do edifício J. Edgar Hoover, sentindo-se mais só do que alguma vez se sentira. Não viu ninguém em lugar nenhum. Estava sozinha naquele lugar imenso e hostil.

Ela sabia que não pertencia àquele lugar.

Mas não sabia como sair.

Os seus soluços ressoaram pelos corredores.

"Alguém pode ajudar-me, por favor?" Gritou com a voz embargada.

As suas palavras ecoaram à sua volta, misturadas com o que parecia ser uma risada zombeteira.

Então ela ouviu algo atrás dela - o som de passos.

Ela virou-se rapidamente, mas não viu ninguém. Percebeu que os passos deviam vir de um dos corredores adjacentes.

Quase chamou...

"Está alguém aí lá? Por favor, ajude-me!”

Mas então ocorreu-lhe que talvez alguém estivesse a persegui-la - alguém que lhe quisesse fazer mal.

Sim, isso parecia o mais provável. Ela não tinha motivos para pensar que alguém se pudesse estar a aproximar com intenções amigáveis.

Correu o mais silenciosamente que pôde até chegar a um canto de outro corredor. Baixou-se e encostou-se à parede.

Fica quieta, Disse a si própria.

Mas por algum motivo, não conseguia parar de soluçar.

E os seus soluços continuaram a ecoar.

E os passos ainda se estavam a aproximar.

Então desatou a correr. Mas logo viu que os corredores estavam a mudar e quebrar-se em direções diferentes, tornando-se cada vez mais labirínticos.

Virou uma esquina e estacou quando viu uma figura sombria parada à sua frente. Ela tentou correr de novo, mas não se conseguiu mexer. Então algo brilhante cintilou na mão da figura...

Uma faca! Percebeu.

O seu perseguidor mergulhou a faca na sua barriga e ela sentiu novamente aquela dor aguda e terrível...


Riley acordou ao som do seu próprio grito.

Ouviu a voz de Ryan...

“Riley! Que diabos!"

Ela abriu os olhos. O quarto estava escuro. A dor na sua barriga era agora insuportável, assim como a dor de cabeça

Ela debateu-se até sentir algo quente e pegajoso.

Levou a a mão ao rosto, mas não conseguiu ver no escuro.

Ryan ligou o candeeiro do seu lado da cama, cegando-a por uma fração de segundo.

Então ela viu que a sua mão estava coberta de sangue.

Ryan disse...

“Riley! Oh meu Deus!"

Riley sentou-se direita e viu que os lençóis estavam manchados de sangue.

Riley virou o rosto para Ryan. A sua expressão era de alarme, mas também de alguma forma reconfortante.

Ele disse, "Riley, vai correr tudo bem. Eu vou tratar de tudo.”

Ele ajudou-a a ir para o seu lado da cama, onde os lençóis ainda estavam secos e colocou-a de costas.

Então ele pegou no telemóvel que se encontrava na sua mesa de cabeceira.

Riley estava deitada a olhar para o teto enquanto Ryan ligava para o 112 para dizer que a sua namorada estava numa situação de emergência médica.

Quando ele terminou, olhou para o rosto dela e gentilmente acariciou o seu cabelo.

Riley gaguejou...

“Ryan, o que é que está a acontecer? Estou a morrer?”

Ryan sorriu de forma reconfortante.

"Claro que não, querida” Disse ele. “Fica apenas deitada e tenta relaxar. Vais ficar bem. Eu prometo."

Riley estremeceu, sentindo frio no corpo todo.

Estou em choque, Teve a noção.

Então, antes que desse conta, ouviu sirenes e a sala foi rapidamente inundada por homens vestidos de branco que a colocaram numa maca.

Enquanto levavam a maca pelas escadas e entraram na ambulância, Ryan nunca saiu do seu lado.

Ele continuou a dizer repetidamente...

“Vai correr tudo bem, Riley. Eu estou aqui. Não te vou deixar.”

Riley acreditou nele.

Como poderia duvidar dele? Interrogou-se.

Mas também se perguntou...

O que é que está a acontecer comigo?


CAPÍTULO TRINTA E TRÊS


Riley estava deitada numa cama estreita com apoios de ambos os lados. Aos pés da cama, encontrava-se uma cortina branca. Mesmo que a zona das Emergências estivesse bem iluminada, ela sentiu-se como se estivesse envolta em algum tipo de névoa misteriosa.

Na verdade, ela estava realmente envolta em nevoeiro - um nevoeiro mental e emocional. As dores agudas na cabeça e no abdomén tinham deesaparecido e os seus pensamentos eram vagos e incertos.

Ela fora sedada assim que entrara na ambulância, e tinha consciência dos seus efeitos poderosos bem antes de ser levada para ali. Sentira-se entorpecida e indiferente durante o exame físico feito por um médico há pouco.

Ainda assim, ela estava consciente da atividade em torno do seu pequeno espaço isolado. Através das aberturas de cada lado da cortina, podia ver o pessoal do hospital vestido de branco apressando-se, e macas carregando pacientes a balançar de um lado para o outro. Ela ouviu vozes a tagarelar, e avisos urgentes a convocar médicos para diferentes postos.

Já estava sozinha há algum tempo.

Mas sentia-se estranhamente despreocupada com isso.

O médico do sexo masculino que a consultou dissera-lhe com um sorriso sincero e reconfortante...

"Não se preocupe, vai ficar bem."

Ela não tinha motivos para não acreditar nele - pelo menos no que dizia respeito à sua saúde física.

Ela também estava certa de que o mesmo não era verdade para muitas das pessoas naquele tumulto do lado de lá da sua cortina. Lá fora, as pessoas estavam a sofrer de doenças terríveis, ferimentos e feridas que exigiam o tipo de atenção imediata que ela não precisava.

E ainda assim ela perguntou-se...

Onde está o Ryan?

Então ela lembrou-se - fora informada de que Ryan ainda não a podia ver.

Mas ele estaria ali em breve, dissera o médico.

Ninguém lhe havia dito ainda o que tinha acontecido com ela, mas ela sabia sem que fosse necessário informá-la.

Pelo menos sabia-o intelectualmente.

As repercussões emocionais ainda não tinham começado. Riley perguntou-se o quão más seriam.

Dali a nada a cortina abriu-se e uma mulher vestida de branco, com grandes olhos e um rosto simpático e parecido com um pássaro, entrou na sua área. Ryan estava ao lado dela.

A mulher sorriu e disse, "Chamo-me Melissa Pascal e estou de serviço na Obstetrícia/Ginecologia. Como se sente?"

"Estranha" Disse Riley.

A Dra. Pascal deu-lhe uma palmadinha no ombro.

"Não duvido disso."

Olhou fixamente para Riley durante um momento e disse com um sorriso simpático...

"Receio que tenha tido um aborto espontâneo".

Riley engoliu em seco.

Claro que era exatamente o que esperava.

Mas apesar da sedação, ouvir a palavra dita em voz alta foi um choque.

A Dra. Pascal examinou alguns papéis.

Disse, “O seu noivo colocou-me em contacto com a sua médica em Lanton e eu conversei com ela. Parece que estava tudo bem com a gravidez no último exame. Também vejo que teve um regime saudável de suplementos. Tem cuidado bem de si.”

"Então o que aconteceu?" Perguntou Riley.

A Dra. Pascal abanou a cabeça e disse com uma voz tranquila...

“Não tem a noção de como isso é comum. Acredite ou não, cerca de cinquenta por cento de todas as gravidezes terminam em aborto espontâneo. Na maioria das vezes, isso acontece antes mesmo de a mulher saber que está grávida. Entre quinze e vinte e cinco por cento das gravidezes conhecidas terminam em abortos espontâneos, a maioria delas exatamente como aconteceu consigo.”

Ainda assim ocorriam muitas perguntas a Riley.

Terá feito algo que provocasse aquilo?

Seria culpa sua?

Ryan disse à médica, "A Riley tem estado sob muito stress ultimamente".

Stress, Pensou Riley.

Sim, essa era definitivamente a palavra certa.

Mas ela questionou-se – em que é que o Ryan estava a pensar quando disse aquela palavra?

Estaria a sentir-se culpado pela forma como as coisas tinham decorrido entre eles nos últimos tempos?

Ou estaria ele zangado comela por se colocar em situações stressantes?

Ele nem sabe, Lembrou-se a si mesma.

Ryan não fazia ideia do que ela andava a fazer ultimamente. Ele não sabia nada sobre as suas angustiantes ansiedades relacionadas com o sucesso ou o fracasso, o corpo morto que ela viu que não estava numa morgue, os membros da família que ela encontrou, e acima de tudo nada sabia dos seus sentimentos inquietantes e às vezes terríveis de conexão com um assassino.

Ele só pensava que ela tinha assumido muitas responsabilidades ao entrar para o programa de estágio.

E ele considerara isso suficientemente aborrecido.

Se ele ao menos soubesse, Pensou.

A Dra. Pascal falou com Ryan e Riley. “Não se preocupem com o stress. O stress é um facto da vida para todos nós, mais para uns do que para outros. Tenho a certeza que não foi a causa deste aborto espontâneo.”

"Mas o que é que o provocou?" Perguntou Riley.

Olhando novamente para os paéis, Pascal disse, “Bem, podemos eliminar a maioria das causas comuns. Você não tem diabetes ou problemas de tiróide ou distúrbios de coagulação do sangue. De acordo com os seus exames anteriores, não tem anomalias no útero ou no colo do útero. Não fuma e suponho que não tenha abusado de drogas ou álcool ".

"Não" Disse Riley.

Pascal colocou os papéis debaixo do braço.

“Resta apenas a causa mais comum - anomalias cromossómicas. Algo estava errado com o feto - algo verdadeiramente incompatível com a vida. O seu corpo sentiu isso e acabou com a gravidez. Eu sei que é difícil de aceitar agora, mas de certa forma, o que aconteceu foi uma coisa boa, a coisa certa. E não foi de forma alguma culpa sua.”

Riley queria sentir-se tranquilizada, mas não conseguia.

E podia ver pela expressão de Ryan que ele também não estava tranquilo.

Ele gaguejou, "Mas... mas Doutora, poderia dizer-nos...?"

Parecendo adivinhar a pergunta de Ryan, a Dra. Pascal disse-lhe...

"Sr. Paige, a sua noiva é uma jovem perfeitamente saudável. Não há motivos para acreditar que ela não possa ter filhos no futuro.”

Virando-se para Riley, acrescentou...

“Alguém virá em breve para a ver novamente. Então poderá ir embora. Prometo que o pior já passou. Pode ter alguns sintomas, possivelmente um leve sangramento contínuo. Se as coisas ficarem mal, entre em contacto comigo imediatamente. Mas realmente não precisa de se preocupar.”

Riley e Ryan agradeceram à Dra. Pascal, que os deixou sozinhos. Ryan sentou-se ao lado da cama segurando a mão de Riley, olhando para ela com firmeza. Ela não conseguiu devolver-lhe o olhar. Não sabia ao certo porquê.

Dali a pouco chegou outro médico e fez-lhe um rápido exame, depois disse que estava tudo bem e que se podia ir embora. Ryan tinha seguido a ambulância até ali, por isso foi buscar o carro.

Os efeitos do sedativo tinham desaparecido quase inteiramente, mas Riley ainda se sentia vacilante e fraca quando se levantou. Um enfermeiro ajudou-a a sentar-se numa cadeira de rodas e levou-a para o exterior, onde Riley viu que o sol tinha acabado de nascer. Ryan parou o carro e o enfermeiro ajudou-a a entrar no banco do passageiro.

Nem Riley nem Ryan disseram uma palavra durante a viagem para casa.

A expressão de Ryan era de dor e tristeza.

Isto também é difícil para ele, Pensou Riley.

Quando chegaram ao prédio, Ryan ajudou-a a sair do carro e a entrar no apartamento, depois colocou-a diretamente na cama. De seguida, Ryan vestiu o pijama e foi para o seu lado na cama.

Ele abraçou-a com a cabeça dela no ombro dele.

A sua força e calor eram reconfortantes. Mesmo assim, pensamentos preocupantes sobrevieram a Riley.

Ela percebeu que nos últimos tempos pouco tinha pensado na sua gravidez.

Às vezes quase se esquecia completamente.

Na maior parte do tempo, não parecia muito real.

Mas agora que ela já não estava grávida...

Parece mais real do que nunca.

E um profundo sentimento de perda estava a apoderar-se dela.

Lembrou do que a Dra. Pascal tinha dito...

“Prometo que o pior já passou."

A médica também dissera...

"Não há motivos para acreditar que não possa ter filhos no futuro".

Riley queria acreditar nisso e sabia que Ryan também.

Mas ela sabia que teria aquela sensação de perda durante algum tempo, e Ryan também sentiria isso à sua maneira.

Ela também se perguntou...

Como é que isto vai afetar as coisas entre nós?

Iria aproximá-los?

Ou iria afastá-los mais?

Deu por si a pensar em todas as coisas que ela mantivera em segredo dele ultimamente.

Estaria ele a esconder-lhe segredos também?

E havia alguma esperança para a sua relação?

Riley começou a chorar e Ryan puxou-a mais para junto de si.

Pouco depois, tinha adormecido.


CAPÍTULO TRINTA E QUATRO


Riley sentiu como se mal tivesse dormido antes de Ryan gentilmente retirar os braços à volta dela e sair da cama. A luz do sol entrava pela janela agora. Ryan foi até ao lado de Riley, agachou-se e sussurrou...

"Estás acordada?"

Riley assentiu.

"É hora de eu ir trabalhar" Disse ele. "Mas hoje podia ficar em casa."

"Não" Murmurou Riley cansada. "Por favor, não."

"Mas e tu?" Perguntou Ryan.

Riley esfregou os olhos, lembrando-se do trauma por que acabara de passar.

Essa é uma boa pergunta, Pensou. E eu?

Ryan apertou um pouco a mão dela.

Ele disse, "Por favor, não vás ao Edifício Hoover hoje. Tens direito a um dia de licença por mês. Não vás hoje. Tu precisas disso. Tu mereces isso."

Riley pensou por um momento.

A dor na barriga já desaparecera, mas a cabeça doía muito, e ela estava tão mole e exausta que mal podia imaginar sair da cama.

"É uma boa ideia" Murmurou.

Ryan sorriu-lhe e beijou-a na testa. Ela ficou deitada a ouvi-lo a andar pelo apartamento. Finalmente, quando ele estava completamente vestido e pronto para sair, voltou à cama e beijou Riley novamente.

"Calma" Disse ele, acariciando-lhe os cabelos.

"Vou ter" Disse Riley.

Ryan saiu do apartamento e ela ouviu o carro dele a afastar-se.

Quase adormeceu novamente, mas percebeu...

Tenho que ligar, dizer que não vou hoje.

Sentou-se na cama, pegou no telemóvel e ligou para o número de Hoke Gilmer, o supervisor de treino do programa de estágio. Quando uma secretária atendeu, Riley hesitou por um momento.

O que devo dizer? Interrogou-se.

Devo dizer a verdade sobre o que aconteceu?

Parecia muito pessoal. Em vez disso, disse que estava doente, provavelmente por ter comido algo que lhe fizera mal no dia anterior, e que não parava de vomitar. A secretária expressou a sua solidariedade e disse que esperava que Riley melhorasse.

A chamada terminou e Riley ficou a olhar para o telemóvel a perguntar-se...

E quanto ao Agente Crivaro?

Ela não tinha falado com ele desde que a repreendera na tarde do dia anterior por perseguir o suspeito na feira.

E se ele decidisse que queria que ela fosse trabalhar no caso naquele dia?

Não posso, Pensou. Não posso fazer isso.

Não era apenas por se sentir triste e exausta. Riley duvidava que pudesse escapulir-se sem que Ryan descobrisse. E essa podia ser a última gota de água na sua relação, já suficientemente complicada nos últimos tempos. Ela definitivamente não queria estragar o clima de carinho que se instalara naquele momento.

Digitou o número de Crivaro e ouviu o correio de voz.

Ao som do beep ela disse...

"Agente Crivaro, fala Riley Sweeney..."

A sua voz vacilou. Por algum motivo, ela não conseguiu contar uma mentira descarada a Crivaro. Mas isso não significava que tivesse que lhe contar toda a verdade.

Finalmente, disse, "Estou doente, vou tirar um dia. Não estou mesmo bem. Se quiser que trabalhe consigo hoje... peço desculpa, mas não vou estar disponível."

Riley ficou surpreendida com a dificuldade que tivera em pronunciar aquelas palavras.

De alguma forma, soavam a preguiça e a irresponsabilidade. Mas foi o melhor que ela conseguiu fazer.

Hesitou novamente, depois disse...

"Eu espero... espero que esteja a fazer progressos no caso."

Ela terminou a chamada, saiu da cama e foi até à casa de banho e olhou-se ao espelho.

Ficou chocada com o que viu.

O seu rosto estava pálido e inchado, e os seus olhos estavam inchados e vermelhos de tanto chorar.

A visão do seu rosto fez piorar a dor de cabeça.

Tomei a decisão certa, Pensou.

Não tinha que estar com outras pessoas naquele dia, muito menos tentar fazer alguma coisa.

Lavou-se e escovou os dentes, depois voltou para a cama. O seu corpo ficou mole novamente e percebeu o quão verdadeira e profundamente exausta estava.

Lembrou-se das palavras tranquilizantes da Dra. Pascal na noite passada...

“De certa forma, o que aconteceu foi uma coisa boa, a coisa certa.”

"E não foi de forma alguma culpa sua."

Riley queria muito acreditar naquilo.

Mas tão cedo após a sua provação, não sabia no que realmente acreditava.

Numa questão de segundos, já estava a dormir novamente.


*


Acordou com os sons de passos no corredor e com a porta do apartamento a abrir-se.

Foi tomada por uma onda de pânico...

Um intruso! Pensou.

Então ouviu a voz de Ryan a chamar...

"Riley, cheguei."

Ela descontraiu, mas perguntou-se...

Porque é que ele está em casa tão cedo?

Então ela olhou para o relógio na mesa de cabeceira. Já era noite.

Ela dormira o dia todo.

Ryan espreitou para o quarto da porta.

"Então, o que fizeste o dia todo?" Perguntou.

Riley riu e esticou os braços.

"Acho que dormi" Disse ela. “Nada mais. Apenas dormi."

Ryan sorriu e disse, "Isso é ótimo. Isso é exatamente o que quero ouvir. Trouxe pizza. Queres que traga aqui ou...”

"Oh, não" Disse Riley, interrompendo. “É hora de sair da cama. Vou levantar-me e podemos comer na cozinha.”

Ela e Ryan comeram a pizza juntos enquanto Ryan falava sobre o seu dia movimentado e empolgante no escritório de advocacia. Riley poderia dizer pela sua voz o quão feliz estava com o seu trabalho, e sentiu-se feliz por ele.

Ele também trouxera um jornal para casa - a mesma publicação em que o poema do assassino aparecera no dia anterior. Ela abriu o jornal no poema do destaque diário. Aquele estava assinado por alguém chamado Toni Anderson, e era uma pequena ode ao amado cão do autor, Tipsy.

Riley leu várias vezes, procurando por pistas ou enigmas. Mas não, era um peoma alegre, brincalhão e sentimental, sem um traço de escuridão. Também pareceu mau a Riley, mas ela percebeu que fora escrito por alguma miúda do ensino médio e provavelmente agradara a muitos dos leitores do jornal.

Riley folheou o resto do jornal, mas não encontrou nenhuma notícia sobre o Assassino Palhaço.

Quando ela e Ryan se acomodaram para assistir televisão, também não havia nada nas notícias da noite sobre o assassino.

Disse a si mesma...

Calculo que nenhuma notícia é boa notícia.

Ainda assim, ficou um pouco inquieta com a rapidez com que os meios de comunicação social pareciam ter perdido o interesse pelo sensacional caso. Nenhum corpo morto vestido de palhaço tinha sido encontrado desde há quatro dias - aparentemente, muito tempo, para manter a atenção do público. Agora as notícias incidiam sobre um sórdido escândalo político.

Enquanto isso, Riley perguntou-se o que é que Crivaro estivera a fazer e em que estivera a pensar.

Ela tinha certeza de que ele não desistira de apanhar o assassino.

Mas estaria a fazer progressos ou apenas a sentir-se desencorajado?

Embora fosse certamente uma coisa boa que não houvesse mais homicídios, isso tornaria mais difícil encontrar o assassino?

Poderia o assassino desaparecer agora sem deixar rasto?

Riley lembrou-se de algo que Crivaro lhe dissera há alguns dias...

"Raios, eu odeio casos não resolvidos."

Riley estremeceu um pouco. Ela entendeu como Crivaro se sentia. Era horrível pensar que o homem ainda estava à solta - um assassino pervertido que vestia as suas vítimas de palhaços e depois as assustava até à morte.

Onde estava ele naquele momento?

O que é que estava a fazer?

Será que alguém que o conhecesse fazia ideia do monstro que ele era?

Estaria isolado e sozinho, ou vivia uma vida aparentemente comum?

Riley queria descobrir. Ela queria fazer o que pudesse para ajudar a apanhá-lo.


*


O dia seguinte era um sábado. Ryan tinha trabalho a fazer, mas decidiu fazê-lo em casa, em vez de ir para o escritório de advocacia, por isso montou o computador na mesa da cozinha.

Enquanto Ryan trabalhava, Riley andava por ali a fazer uma ou outra coisa. Inicialmente, sentiu-se um pouco abalada, mas a atividade ajudou-a a manter a sua mente ocupada. Limpou o apartamento, lavou roupa na lavandaria do prédio e preparou o jantar. Tinha uma boa caçarola pronta quando Ryan terminou o seu trabalho.

Ryan apreciava os seus esforços, e Riley tentou convencer-se que poderia aprender a gostar de viver uma vida normal, em vez de perseguir um assassino.

Teve outra boa noite de sono e acordou mais tarde do que o habitual no domingo de manhã. Dessa vez, quando saiu da cama e se olhou ao espelho da casa de banho, viu que já parecia quase normal.

O rosto sorridente de Ryan apareceu atrás dela no espelho, e ele colocou os braços à volta dela.

"Com bom aspeto esta manhã, hein?"

Riley riu um pouco.

"Melhor" Disse ela. "Ainda algumas olheiras debaixo dos olhos..."

"Eu não vejo nada" Disse ele, beijando-a no pescoço.

Riley apontou para os olhos e disse, "Elas estão aqui, pateta".

Ryan olhou para cima e disse, "Eu ainda não vejo nada."

"Isso é porque tu não és eu" Disse Riley.

"Bem, se tu és a única que as pode ver, não importam, não é?"

Riley riu enquanto ele fazia cócegas no pescoço dela com mais beijos.

Então Ryan disse, "Ei, vamos sair daqui. Vamos a algum sítio."

"Onde?" Perguntou Riley.

"A qualquer lugar. está um lindo dia. Não temos mais nada para fazer. Vamos aproveitar.”

Parecia uma ótima ideia a Riley.

Ryan preparou um bom pequeno-almoço com bacon e ovos mexidos e, quando terminaram de comer, vestiram-se e prepararam-se para sair. Não se deram ao trabalho de fazer planos, entraram no metro e seguiram para o centro da cidade.

Quando saíram da estação perto do National Mall, viram o Monumento a Washington à distância, todo coberto de andaimes para restauros. A distância até ao National Air and Space Museum era curta, e Ryan puxou-a nessa direção.

"Devias ver isto" Disse ele. "Eu já estive aqui antes. É maravilhoso."

Riley divertiu-se com o seu entusiasmo e rapidamente se apaixonou pelo museu. As suas exposições ofereciam uma excursão estonteante pela história do voo. Em exibição estava o frágil Flyer 1903 dos Irmãos Wright, o primeiro avião a voar. Assim como o Spirit of St. Louis, no qual Charles Lindbergh fez o primeiro voo a solo sem escalas pelo Atlântico em 1927.

O objeto exposto que mais chamou a atenção de Riley foi uma Lockheed Vega vermelha, uma vez pilotada por Amelia Earhart, a aviadora pioneira que tinha desaparecido misteriosamente no Oceano Pacífico enquanto tentava dar a volta ao mundo.

Ela sentia uma estranha empatia com Earhart - talvez porque também ela se estivesse a aventurar numa carreira que não era comum entre as mulheres.

Estremeceu um pouco ao considerar o destino de Earhart...

As coisas nem sempre terminam bem para as mulheres pioneiras.

Também em exibição estavam o foguete Bell X-1, o primeiro avião a quebrar a barreira do som; a pequena cápsula espacial em que John Glenn orbitou a Terra em 1962; e o Módulo de Comando Apollo 11, que levou os astronautas americanos à Lua em 1969.

Ryan parecia uma criança enquanto continuavam a percorrer as exposições.

"Imagina!" Disse ele. “Não faz cem anos desde que os irmãos Wright voaram! Pensa em tudo o que foi conseguido desde essa altura! Que tipos de coisas surpreendentes ainda vão acontecer no nosso tempo de vida? ”

Riley achou que aquele era um pensamento de tirar o fôlego.

Eles tinham andado bastante quando deixaram o museu e estavam prontos para encontrar um lugar onde se pudessem sentar e almoçar. Enquanto vagavam por uma rua próxima, vendo restaurantes e cafés, um antigo prédio de tijolos chamou a atenção de Riley. A placa dizia...


D.C. ESQUECIDO


Riley olhou para a placa por alguns momentos, moldando as palavras silenciosamente com os seus lábios...

"D.C. esquecido"

Ela perguntou-se - porque é que aquelas palavras a intrigavam tanto?


CAPÍTULO TRINTA E CINCO


As palavras no edifício, "D.C. esquecido", lançaram uma espécie de feitiço que atingiu Riley em cheio.

Acho que me tenho sentido sozinha ultimamente.

Apontando para o sinal, ela disse a Ryan, “É um nome estranho. Que lugar será este?”

Ryan olhou para ele e encolheu os ombros.

"Seja o que for, não parece um lugar para comer" Disse ele. "Eu pensei que estavas com fome."

Riley puxou-lhe o braço na brincadeira.

"Oh, vamos lá, vamos espreitar" Disse ela.

Ryan respondeu com uma risada, "Uau, tu estás mesmo a sentir-te melhor, não estás?"

Riley sorriu e segurou na sua mão.

Ela disse, "Vamos ver se me consegues acompanhar".

Quando entraram no prédio, descobriram que era outro museu, embora muito, muito menor do que aquele que tinham acabado de visitar. Obviamente não fazia parte do Smithsonian ou de qualquer exposição nacional.

Uma mulher com cabelos desgrenhados estava sentada a uma mesa, onde uma placa dizia que a entrada custava cinco dólares.

Ryan resmungou num sussurro, "Nós não tivemos que pagar nada para entrar no Air and Space Museum."

Mas Riley estava curiosa. Tirou duas notas de cinco dólares da carteira e entregou-as à mulher que lhes deu as entradas.

A mulher sorriu e comentou com voz rouca mas agradável, “Vocês são os nossos primeiros visitantes hoje. É bom saber que alguém está interessado nos nossos fantasmas locais. É uma coisa horrível, ser deixado para trás, ser esquecido - ser totalmente perdido. Os nossos fantasmas merecem melhor sorte, parece-me.”

Riley e Ryan entreolharam-se. Riley percebeu que ele também ficara um pouco assustado com a afirmação da mulher.

Riley entrou e Ryan seguiu-a.

O lugar estava mal iluminado - e era estranhamente assustador, Pensou Riley. Parecia que provavelmente tinha sido um pequeno prédio de escritórios há muitos anos atrás. Paredes tinham sido derrubadas e suportes de ferro colocados para apoiar o teto, criando muito espaço para exposições e exibições.

Colocados em vitrinas de vidro no centro do piso, uma série de mapas enormes mostravam os estágios do crescimento e desenvolvimento da cidade - desde o assentamento pantanoso e hesitante que os fundadores do país haviam iniciado durante a década de 1790, após a explosão de crescimento da cidade após a Guerra Civil, prosseguindo para a metrópole em expansão que Washington era hoje.

Vitrinas, exposições e fotografias contavam histórias de um passado verdadeiramente esquecido - a fachada ornamentada e o interior do burlesco Teatro Gayety; o enorme prédio onde o Mercado Central já estivera alojado; a Penitenciária de Washington, onde os conspiradores que planearam o assassinato de Lincoln foram executados; a mansão excêntrica, semelhante a um castelo, conhecida como “Stewart’s Folly”; e uma série de outras maravilhas perdidas há muito tempo.

Riley notou em particular numa série de fotos de um antigo parque de diversões chamado Whopping Escapades. O lugar parecia ter sido realmente vasto, com enormes montanhas-russas, gigantescas rodas e um carrossel lindamente decorado...

Um verdadeiro "labirinto", Pensou Riley, recordando-se do poema que o assassino colocara no jornal.

Mas claro, esse lugar já tinha desaparecido há muito tempo.

Finalmente, chegaram a uma porta aberta que conduzia a uma loja de presentes. Riley olhou para dentro. A loja estava cheia de pequenas bugigangas e itens que pareciam ter sido recuperados de ruínas de lugares perdidos há muito tempo.

Riley estava fascinada.

Ela deu um passo para dentro, mas antes que percebesse, as suas pernas saíram debaixo de si e ela deu por si sentada no chão.

Ouviu Ryan gritar depois cair no chão...

“Riley! O que é que aconteceu?"

Por um momento, Riley não tinha a certeza. Desde quando era tão desajeitada? Mas então sentiu o chão e percebeu...

Está molhado.

Num instante, Ryan e a mulher ajudaram-na a levantar-se.

A mulher dizia, "Eu sinto muito, sinto muito. Espero que esteja bem.”

"Estou bem" Disse Riley.

Ao ajudar Riley a sair da loja de presentes, Ryan disse, “Riley, tens que ter cuidado. Ainda estás a recuperar.”

"Eu não estou ferida, apenas envergonhada" Respondeu.

Seguindo atrás de Riley ansiosamente, a mulher ligfalouou para alguém na loja, "Quantas vezes já te disse para colocares o sinal quando estás a limpar?"

Uma voz masculina respondeu...

"Desculpe."

Ryan olhou para trás a tempo de ver um homem magro colocar uma placa amarela de plástico no caminho de entrada...


PISO MOLHADO


Riley garantiu a Ryan e à mulher que estava bem.

A mulher disse, "É uma lojinha simpática. Podia esperar apenas alguns minutos até que ele terminasse de lavar e o chão ficasse seco.”

Mas então Ryan sussurrou, “Vem, Riley. Não gostei muito deste lugar. Dá-me arrepios. Não quero gastar mais dinheiro aqui. E estou definitivamente com fome.”

Riley assentiu silenciosamente e seguiu Ryan em direção à entrada.

A mulher disse-lhes quando saíram...

“Obrigada pela visita! Voltem em breve!”


*


Um pouco mais tarde, Ryan e Riley estavam a comer sanduíches num café ao ar livre nas proximidades. Ainda estava um dia lindo e ensolarado, mas Riley sentiu que o humor de Ryan tinha mudado. Agora estava muito calado.

Comeram em silêncio durante algum tempo até que Ryan falou...

"Riley, eu estive a penar..."

A sua voz desvaneceu e Riley esperou que ele continuasse.

Uh-oh, Pensou. Isto não parece coisa boa.

Finalmente Ryan disse, "Eu acho que tinhas razão."

Riley ficou um pouco intrigada. Não era o tipo de coisa que Ryan lhe dissesse com frequência ultimamente.

"Razão acerca de quê?" Perguntou.

"Razão sobre não nos casarmos imediatamente" Disse Ryan. "Nós realmente não devemos apressar as coisas."

Riley agora estava surpreendida.

“A sério?” Disse ela. "O que te fez mudar de ideias?"

Ryan encolheu os ombros e disse, “Bem, tu deste-me algumas boas razões quando conversámos sobre isso antes. O meu trabalho - eu adoro-o, mas é um desafio ainda maior do que eu esperava. E tu, bem, eu vou respeitar o que tu decidires fazer este verão. Mas o decidires o que decidires, vais passar por muitas mudanças. Como podemos começar a fazer planos para um casamento agora? É realmente demais.”

Riley ficou surpreendida.

Ela tentou dizer a si mesma...

Era isto que eu queria.

Ela sabia que se deveria sentir aliviada por Ryan finalmente ter visto o seu lado das coisas.

Mas porque é que tinha acontecido aquela mudança repentina? Afinal, ele até dissera aos pais que estavam noivos.

Riley disse, "Mas os teus pais..."

Ryan interrompeu com um sorriso, “Eles podem esperar. Eles não se importam.”

Naquele momento, ocorreu a Riley.

Ryan já não precisava de se preocupar com a gravidez de Riley.

Os seus pais não precisavam de saber que aquilo tinha acontecido.

Era por isso que ele já náo tinha pressa?

Ryan pareceu um pouco perturbado pelo silêncio de Riley. Disse, "Pensei que ficasses feliz por... tu sabes... eu concordar contigo."

"Oh, estou" Disse Riley. "Obrigada. Isso vai... ajudar muito, eu acho.”

Mas enquanto comiam em silêncio, Riley sabia que estava a mentir.

A sua mente começou preencher-se com suspeitas estranhas.

Estaria Ryan com dúvidas em relação a casarem-se?

Teria o aborto afetado o que sentia por ela?

Talvez esteja preocupado que eu nunca possa ter filhos, Pensou.

Parecia uma ideia estranha e paranóica, mas Riley não conseguia deixar de pensar nisso.

Talvez só a tivesse pedido em casamento porque estava grávida.

Talvez só estivesse a tentar fazer a coisa certa por ela. E agora, talvez sentisse que já não havia pressão.

Foi um pensamento terrível – o de que Ryan poderia ter um sentimento por ela quando estava grávida, e outro agora que não estava.

Talvez devêssemos falar sobre isto, Pensou.

Mas que tipo de resposta ele lhe daria?

Se ela mencionasse a sua desconfiança, certamente ele negaria, fosse verdade ou não. Não havia nada a ganhar com isso. Pior ainda, provavelmente levaria a uma discussão, ali mesmo num local público.

E Riley estava farta de discussões, e tinha a certeza de que Ryan também estava.

Quando acabaram de comer, Riley e Ryan andaram pela cidade durante boa parte do resto do dia. Fizeram compras e brincaram sobre todas as coisas que não podiam comprar agora. Também brincaram sobre o quão extravagante eles seriam no futuro quando Ryan os tornasse ricos.

Naquele momento pareciam estar descontraídos, mas Riley não podia deixar de sentir que aquilo era uma ilusão.

Por um lado, havia tantas coisas que ela não contara a Ryan - especialmente como estivera envolvida num caso real de homicídio.

Talvez agora fosse um bom momento para esclarecer tudo isso.

Talvez Ryan não se aborrecesse tanto com aquilo agora que ela já não estava grávida.

Mas rapidamente pensou melhor...

Ele ainda me pode culpar.

É verdade que ele estava lá quando a Drs. Pascal lhe garantiu que o stress não tinha sido a causa do aborto de Riley.

Mas acreditaria ele realmente nisso?

E acreditaria ela nisso?

Sentiu-se como se tivesse o peso do mundo de culpa não pronunciada dentro de si.

Parte dessa culpa ainda ainda estava relacionada com os momentos agradáveis, divertidos e estimulantes que passara com John Welch no King Tut na noite de quinta-feira.

Ela não estava apaixonada por John, tinha a certeza que não.

E tinha a certeza de que John não estava apaixonado por ela.

Mas uma coisa era difícil de negar...

Ela sentiu-se mais confortável, mais verdadeiramente ela mesma com John, do que com o seu próprio noivo.

O que é que isso dizia sobre o seu relacionamento com Ryan?

Não pode ser bom, Admitiu para si mesma.

Riley percebeu que agora, mesmo quando pareciam estar a divertir-se juntos, ela não fazia ideia de qual seria o futuro daquela relação.


CAPÍTULO TRINTA E SEIS


Quando voltaram para o apartamento naquela tarde, Riley ainda estava preocupada com dúvidas sobre o seu futuro com Ryan. Mas tinha a certeza de que ambos estavam cansados do dia intenso que tinham passado.

É melhor deixar as coisas como estão, Pensou. Pelo menos por agora.

Ela percebeu que também se estava a desligar. Também não estava ansiosa para discutir planos futuros tal como agora Ryan também não estava.

De qualquer forma, estava certa quanto ao cansaço dele. Ryan foi direto para o quarto e caiu na cama. Quando ela olhou para ele alguns momentos depois, já tinha adormecido.

Uma soneca parecia a Riley uma boa ideia também. Mas assim que se começou a preparar para deitar se ao lado dele, ouviu o telemóvel tocar. Estava na sala onde ela deixara a mala no chão quando entraram e apressou-se para atender.

O seu coração pulou quando viu quem lhe ligava.

"Agente Crivaro, o que é que se passa?" Perguntou, sentando-se no sofá para conversar com ele.

Ouviu um rosnado familiar.

"Gostava de ter novidades" Disse Crivaro. “A equipa está em cima de tudo relacionado com palhaços em toda a área de DC. Devemos ter estado em cem lugares diferentes nos últimos dois ou três dias. Andámos por lojas de disfarces, lojas de magia, serviços que contratam palhaços, até mesmo em algumas escolas de palhaços. Aprendi mais sobre palhaços do que alguma vez quis saber, mas não descobrimos nada. E os resultados forenses sobre a nota do assassino e o desenho foram um fracasso. Ele é esperto demais para deixar impressões digitais ou qualquer coisa assim.”

Crivaro calou-se por alguns instantes.

Então disse, "Riley, estou com medo de perdê-lo. Receio que este seja mais um Matchbook Killer.”

As suas palavras aqueceram o coração de Riley.

Ele chamou-me de Riley, Pensou ela.

Ele não costuma fazer isso.

Ele até lhe estava a confessar as suas frustrações.

Ela disse, "Este caso não vai acabar assim. Não vai ficar por resolver. Tenho a certeza."

Outro silêncio se seguiu.

Riley desejou que Crivaro falasse mais sobre como se estava a sentir.

Então ele disse, “Riley, receio que tenha sido muito duro consigo na quinta-feira, depois daquela coisa na feira. Penso que não merecia isso. É só que... bem, sou responsável pela sua segurança e assustou-me.”

"Eu entendo" Dsse Riley. "Náo há problema."

“Mas quase me esqueci - esteve doente na sexta-feira. Tive pena de sabê-lo. Está a sentir-se melhor?"

"Muito melhor" Disse Riley. "Estou pronta para voltar ao trabalho."

Ela ouviu Crivaro soltar um suspiro profundo.

“Não, isso não é uma boa ideia. Eu tenho-a mantido longe do programa de estágio com este caso. Tem sido uma grande ajuda, especialmente na descoberta daquele poema, mas eu não estou a ser justo consigo. Estou a ocupar muito do seu tempo, e por isso não está a aprender as coisas que deveria estar a aprender. O melhor é seguir o programa. Prometo manter o contacto.”

Crivaro desligou a chamada e Riley ficou sentada, sentindo-se aturdida.

Crivaro acabara de falar com ela de uma forma vulnerável e incomummente aberta.

Parecia estar genuinamente preocupado com ela.

E por essa mesma razão, não queria ela no caso.

O que posso fazer? Questionou-se.

Como posso convencê-lo de que ainda posso ajudar?

Ela levantou-se e espreitou para o quarto. Ryan ainda estava a dormir. Há alguns momentos atrás, também lhe apetecera dormir, mas agora...

Não conseguia dormir nem que a minha vida dependesse disso.

Vasculhou a mala e encontrou o seu pequeno caderno de notas - o que ela e John tinham usado para escrever o poema. Leu-o algumas vezes e percebeu de novo que era uma ideia inteligente e perspicaz.

Afinal de contas, talvez isto seja mais do que um exercício.

Talvez seja o que falta para apanhar o assassino.

Deveria ligar a John e conversar com ele?

Não, a primeira pessoa com quem ela deveria falar era Crivaro.

Começou a digitar o número de Crivaro no telefone, mas parou para se perguntar...

O que é que estou a fazer?

Será que não tinha ouvido o que Crivaro tinha acabado de dizer - que ele sentia que tinha sido injusto com ela por lhe roubar tempo, que ele se sentia responsável pela sua segurança, que ele a queria longe do caso para seu próprio bem?

Ele fora completamente sincero no que dissera.

Não havia forma de Crivaro concordar com aquela ideia, não importando o quanto Riley tentasse apresentá-la.

E é claro que Riley tinha que considerar...

Ele pode ter razão.

Eu provavelmente deveria ficar longe de tudo isto.

Mas quando ela tentou convencer-se mentalmente, sentiu a frustração a crescer dentro de si.

Tanta coisa tinha corrido mal na sua vida nos últimos dias.

A pior coisa, de longe, fora o aborto espontâneo, que a deixara frágil, vulnerável e indefesa.

Não vou mais aceitar isto, Pensou.

Eu não vou continuar a sentir-me impotente.

Encontrou uma cópia do jornal daquele dia e abriu-a na página com a rubrica de poesia. Viu duas moradas para envios - um era uma morada física, o outro um endereço de e-mail. Sem parar para pensar no que estava a fazer, abriu o computador de Ryan e abriu o seu programa de e-mail.

Olhando para o seu caderno, ela digitou o poema completo no corpo de um e-mail, terminando com o nome do “poeta”...


Tina D. Vejas


Então, com um movimento rápido do dedo, tocou em "Enviar".

E o poema foi enviado.

Riley engoliu em seco quando uma onda de pânico começou a apoderar-se dela.

Oh meu Deus, Pensou.

O que é que acabei de fazer?

Ela não tinha dúvidas de que o poema chamaria a atenção do assassino - isto é, se o jornal realmente o publicasse.

Deveria escrever para o editor naquele momento, explicando que o enviara por engano e que queria desistir da sua publicação?

Levantou da mesa da cozinha e andou de um lado para o outro, tentando lidar com a sua agitada incerteza.

O que devo fazer agora? Perguntou-se.

O que devo fazer?

Passaram longos minutos e ela não conseguiu decidir-se.

Ainda estava a andar de um ladfo para o outro quando ouviu o computador de Ryan emitir um som.

Ela sabia que o som significava que acabara de receber um e-mail.

Sem fôlego, sentou-se no computador e leu o e-mail.


Querida Tina—

Muito obrigado por enviar o seu poema. Gostámos muito. Ainda não tínhamos um poema para amanhã, então recebemos o seu a tempo para o prazo de hoje à noite! Será publicado no jornal pela manhã!

Atenciosamente,

Caitlin Gilbert, Editora de Rubricas


Agora Riley quase estava a hiperventilar.

Deveria escrever ao editor e explicar que fora um engano?

Não, ela não era capaz de fazer isso. Ela simplesmente não conseguia.

Se desistisse agora, nunca se perdoaria.

Mas então outro problema lhe ocorreu...

Eu usei o e-mail do Ryan!

Não havia forma de ele não ver os dois e-mails - o que ela enviara e o que ela recebera.

Sem pensar mais, Riley apagou os dois.

Então ficou sentada a olhar para o ecrã do computador, ofegante...

O que é que eu fiz?

Mas ela sabia a resposta a essa pergunta.

Ela apenas marcara um encontro com um assassino.

E tinha certeza de que ele estaria mais do que ansioso para comparecer.


CAPÍTULO TRINTA E SETE


O campo de visão de Michelle Yeaton estava repleto de objetos reluzentes que piscavam e esvoaçavam por toda a parte.

Estrelas, Pensou.

Mas desde quando as estrelas voavam assim, aparecendo e desaparecendo dentro e fora da escuridão?

Ela estava a olhar para um céu escuro cheio de meteoros em voo?

E porque é que a cabeça lhe doía tanto?

Nada fazia sentido.

Onde é que estava naquele momento?

Como é que chegara ali?

Porque é que não via nada além daquele campo escuro repleto de coisas brilhantes?

Então ela ouviu a voz de um homem a falar na escuridão...

“Isto muda as coisas. Isto muda tudo.”

Percebendo que os seus olhos estavam fechados, Michele abriu-os. Ela estava deitada num chão de cimento num lugar mal iluminado.

Como é que cheguei aqui? Perguntou-se novamente.

Então começou a lembrar-se...

Ela acabara de sair do carro na garagem. Era de manhã e estava a caminho da loja Maxim and Abel, onde trabalhava como vendedora. Ouviu o som de passos atrás dela, mas antes que se pudesse virar para olhar...

Uma dor aguda na minha nuca.

A dor que sinto na minha cabeça agora.

Alguém a devia ter colocado inconsciente e a transportado para aquele lugar. O golpe devia ser a causa de ver todas aquelas estrelas, visíveis mesmo agora que os seus olhos estavam abertos.

Mais uma vez, ouviu a voz do homem...

"Oh sim. Tudo é diferente agora. Tão inesperado.”

Ela colocou-se numa posição agachada e olhou à sua volta.

Viu que estava numa pequena área envolta por uma cerca de arame farpado no que parecia ser uma grande sala escura.

Havia um ponto de luz, no entanto.

Incidia numa mesa redonda de madeira. Na mesa havia um rolo de fita adesiva, uma seringa médica, um pequeno espelho redondo e o que parecia ser uma caixa de equipamento de pesca. Alguém estava sentado à mesa, um jornal levantado cobria-lhe o rosto para que ela não pudesse vê-lo. Na penumbra, as suas roupas pareciam estranhas e fofas.

As suas próprias roupas pareciam estranhas, soltas e mal ajustadas, mas ela não conseguia focar suficientemente bem os olhos para vê-las.

Gemeu em voz alta, tentando recuperar os sentidos.

Parecendo ouvi-la, o homem falou por trás do jornal...

"Está acordada agora? Ainda bem. Escute isto..."

Então, soando como se estivesse a ler o jornal, ele disse...


As últimas coisas que vi naquele crepúsculo

O declínio daquele dia

Eram águas cintilantes, calmas e tranquilas,

E manchas de branco e cinza.


Era um poema, percebeu Michelle.

Mas porque é que ele lho estava a ler?

O homem disse com uma voz alegre...

"Alguém sabe! Alguém entendeu o meu enigma! Não é maravilhoso? Que desafio! Que emoção!”

Ele baixou o jornal e Michelle ficou estufefacta com o que viu.

Era o bizarro rosto pintado de um palhaço.

E ele estava completamente vestido com um disfarce de palhaço.

Ela olhou para a manga e viu que estava vestida da mesma maneira.

O seu coração batia descompassadamente quando se lembrou das notícias e rumores...

O Assassino Palhaço!

É ele!

Vai-me matar!

Ela tentou gritar, mas não conseguia nem respirar.

O palhaço abriu a caixa, que estava cheia do que pareciam ser tubos de maquilhagem.

"Bem" Disse ele, "eu estava apenas a preparar-me para pintar o seu rosto, torná-lo real, como o meu. Mas..."

Caminhou até à jaula e agachouse, apontando para o jornal novamente.

"Tenho a certeza que entende... isto muda tudo! Eu não devo apressar-me agora. Devo ser paciente, fazer as coisas devagar. E você também.”

Finalmente, Michelle conseguiu respirar livremente e soltou um grito estridente que explodiu pelo seu crânio.

O palhaço olhou-a calmamente através da cerca, o branco dos seus olhos parecendo estranhamente amarelo em contraste com a tinta branca do seu rosto.

Quando o grito se desvaneceu, ele disse...

"Tem uma excelente voz. Poderia fazer isso de novo?”

Como se forçada pelo seu desejo, Michelle gritou mais uma vez.

Quando terminou, ofegava desesperadamente.

Como um cão, Pensou.

"Sim, excelente" Disse o homem. "De novo, por favor."

Mas Michelle já stava sem fôlego. E além disso, porque é que ela estava fazer exatamente o que ele lhe pedia para fazer? Onde quer que estivessem, deviam estar longe de outras pessoas. Certamente ninguém podia ouvi-la gritar. E é claro que ele sabia disso. Ela só contribuía para a sua satisfação.

O homem riu um pouco.

“Oh, bem, talvez mais tarde. Sim, mais tarde, com certeza. Mas entretanto...”

Ele levantou o jornal, que estava dobrado na página que encontrara, e leu novamente em voz alta...


“Eu deixo minha lente escorregar da minha mão

Meu tremor era culpado ...”


Riu com admiração. "Não é maravilhoso? Muito inteligente. Estou muito satisfeito.”

Michelle começou a soluçar e a chorar, e sentiu as lágrimas queimarem as suas bochechas.

O palhaço inclinou a cabeça no que quase parecia ser uma empatia genuína.

“Sim, entendo como se sente. Vão deixá-la para trás, não vão? Vão esquecer-se de si. Eu sei exatamente como isso é, acredite em mim. É uma sensação terrível, estar perdido... esquecido.”

Olhando para o papel de novo, ele acrescentou...

“E quem quer que tenha escrito isto - aparentemente uma jovem como você, diz que o seu nome é Tina - ela conhece esse sentimento, assim como nós. Eu tenho que conhecê-la. Você também. Então... então podemos continuar. Ela é forte, eu sinto-o, e acho que talvez você também seja, não como as outras. Talvez desta vez... as coisas sejam diferentes.”

Ele levantou-se, voltou para a mesa e pegou numa lata e num pacote de lenços e olhou-se ao espelho.

“Enquanto isso” Disse ele, “devo vestir a minha fantasia, o meu disfarce. Eu devo parecer-me com todos aqueles que estão por aí no mundo. Afinal, eu tenho um compromisso mais tarde...”

Ele sentou-se, colocou creme no rosto e começou a limpar a maquilhagem com um lenço de papel murmurando...


Hoje à noite quando o sol vier novamente

Eu devo voltar e ver!


Michelle recuperou o fôlego e soltou outro longo grito.

O homem agora cantarolava enquanto continuava a tirar a maquilhagem.

Parecia não se importar com os seus gritos.


CAPÍTULO TRINTA E OITO


Quando Riley atravessou a passagem que levava à Columbia Island, murmurou aquelas palavras que ela e John tinham escrito no bar King Tut...


Hoje à noite quando o sol vier novamente

Eu devo voltar e ver!


Olhando para a água, Riley podia ver que o crepúsculo se instalava.

Eu estou realmente a fazer isto, Pensou ela com um arrepio.

E pela enésima vez naquele dia, perguntou-se se estava boa da cabeça.

Riley sobressatou-se quando o telemóvel tocou no bolso.

Pegou nele e viu que era uma chamada de John. Suspirou, abanou a cabeça e sussurrou...

“Agora não, John. Lamento mas não é um bom momento.”

Desligou o telemóvel sem atender, colocou-o novamente no bolso e continuou o seu caminho. Sentiu-se um pouco incomodada com a chamada. Ela não tinha visto ou ouvido fnada de John o dia todo. Porque é que ele escolhera aquele momento para entrar em contacto com ela?

Naquela manhã, Riley ouvira que John já tinha saído do edifício. Ele e o seu grupo estavam a participar numa aula de treino técnico especial, aprendendo a identificar componentes de bombas. Na verdade, iam passar o dia inteiro no campo a observar bombas a explodir, e depois a examinar o que restava delas.

Pareceu divertido a Riley e ela teve pena por perder aquele treino. Em vez disso, ela tivera um dia aborrecido a ouvir uma palestra sobre a análise de dados criminais e participando em dois longos workshops, um deles sobre mandados judiciais e outras questões legais.

Ou como Crivaro havia chamado...

Coisas normais.

Tinha sido difícil concentrar-se em assuntos tão mundanos, ao mesmo tempo que ponderava se iria para a frente com a sua tarefa no fim do dia.

Mas que escolha tinha?

O poema fora publicado no jornal, tal como o editor prometera.

O assassino ou ia reparar nele ou não.

Não era suposto ela descobrir?

Ryan, sem querer, ajudou Riley a decidir-se a a fazê-lo. Quando as aulas terminaram, ele ligou a dizer que voltaria a trabalhar até mais tarde no escritório. Riley disse-lhe que iria sair mais tarde sozinha. Ryan tinha assumido que ela queria estar com amigos novamente, e Riley não disse nada para corrigir essa suposição.

Se ele soubesse, matava-me, Pensou Riley enquanto passava pela estátua familiar dos pássaros de metal voando sobre uma onda do oceano.

Crivaro também me mataria, Pensou.

Mas enquanto continuava a caminhar na direção do LBJ Memorial Grove Monolith, assegurou a si mesma que tinha pensado nas coisas de forma consistente.

Ela só queria ver o assassino para poder identificá-lo. E logo de seguida, chamaria a polícia imediatamente.

Ela não iria colocar-se em perigo, muito menos tentar apanhá-lo...

Se ele aparecer.

E, claro, não havia garantias de que isso acontecesse.

Enquanto seguia pelo bosque de pinheiros e cornisos, notou que as pessoas andavam pelo outro lado, saindo do parque. Logo, o parque estaria bastante deserto â noite, assim como sucedera quando ali estivera da outra vez...

...e assim como foi quando Janet Davis foi raptada.

Por fim, ela aproximou-se da marina, onde a luz do dia brilhava na superfície da água. Quando ali estivera antes, notou num canto no lado de uma das casas de barcos de madeira. Encontrou o lugar que procurava e entrou.

Sem dúvida que o recanto lhe dava uma visão clara da marina, ao mesmo tempo que ela se encontrava bem escondida.

E agora...

Tudo o que tenho a fazer é esperar.

O truque seria ficar fora de vista quando ele aparecesse.

Ou talvez ela tivesse muita sorte e...

Ele não vai aparecer.

Ela esperava que as coisas sucedessem daquela forma.

Então ela poderia ir para casa satisfeita com o seu modesto esforço e nunca ter que explicar nada a Crivaro ou a qualquer outra pessoa.


*


Miúda esperta, Pensou Joey enquanto espreitava por entre as folhas de um arbusto. Ele viu a rapariga a aproximar-se da casa de barcos próxima. Agora ela estava escondida num pequeno recanto lá, a uns quinze metros de distância de onde ele estava agachado.

Tinha que ser a que assinara com o nome Tina D. Vejas. Ele rapidamente descobriu que o nome era um anagrama para Janet Davis.

Agora ele percebia que ela afinal não pretendia conhecê-lo.

Estava apenas a tentar vê-lo.

Tudo o que ela queria era vê-lo.

Joey não ficou nem um pouco desapontado. A rapariga era uma trapaceira, assim como ele. Ela ia servir-lhe perfeitamente, uma vez sob o seu jugo.

Claro que ela estava prestes a aprender uma lição importante...

Nunca tente enganar um trapaceiro.

Ele passou o dia inteiro a hesitar entre ir ou responder ao convite no jornal.

Ele não podia ignorar a possibilidade de que pudesse ser uma armadilha da polícia.

Mas ao ler e reler o poema, convenceu-se do contrário.

Ele tinha a certeza de que ela não estava a trabalhar para a polícia. A mensagem parecia muito íntima, muito pessoal. Aquele era um assunto privado para ela. Ela sentia afinidade com ele.

Ele pensou naquelas linhas...


Eu deixei a minha lente escorregar da minha mão

Meu tremor era culpado...


Ele perguntou-se – como é que ela sabia o que acontecera ali na marina há mais de uma semana?

Como é que ela sabia de Janet, a rapariga que ele raptara enquanto tirava fotos ali?

Ela é uma pequena detetive, Pensou.

Dali a pouco, ele teria a oportunidade de lhe perguntar a ela sobre tudo isso.

Enquanto isso, ele sentiu uma pontada de tristeza ao ver aquela notável jovem criatura naqueles jeans e blusa, o rosto dela tão liso, seco e fantasmagórico. Tal como ele naquele exato momento, ela estava a envergar um disfarce, tentando encaixar-se num mundo ao qual não pertencia.

E ela nem sabia isso.

Ah, quando quando lhe puder ensinar quem ela realmente é!

Será maravilhoso!

Ele tinha a certeza de que esta seria suficientemente forte para passar o seu teste.

Esta definitivamente pertencia ao seu próprio mundo de cor e alegria selvagens - um mundo de tinta berrante, narizes vermelhos e roupas ondulantes, chifres e sinos e flores falsas que esguichavam água no rosto das pessoas.

Talvez a outra também lhe pertencesse - a que ele tinha poupado por algum tempo e deixado viva naquela jaula.

Se as coisas tivessem sucedido como planeado, ele já a teria submetido à sua prova.

Se ela não tivesse sobrevivido, teria deixado o corpo dela num lugar escolhido.

Tudo o que estava em suspenso agora. Mas ele testaria as duas, e talvez duas passassem daquela vez. Ele sempre esperou que as suas prisioneiras sobrevivessem.

Quase riu alto quando pensou...

Duas! Imaginem só!

Nunca na sua vida se atrevera a sonhar com tal companhia.

Enquanto isso, o crepúsculo adensava-se. A rapariga no canto olhava para o relógio. Devia estar a pensar que ele não ia aparecer.

Ele tocou no pequeno pedaço de tubo de aço que usava para agredir as outras mulheres. Lutou contra um impulso poderoso de se aproveitar da indiferença daquela rapariga, sair naquele momento da sua posição oculta, atacá-la como uma fera predadora, e deixá-la inconsciente com um único golpe rápido.

Paciência, Disse a si mesmo.

O truque era ter só um pouco mais de paciência do que ela.


*


Riley suspirou profundamente quando o céu começou a escurecer e a água em redor das docas brilhou menos na luz minguante.

Espera só mais alguns minutos, Disse a si mesma.

Mas a cada momento que passava, ela ficava mais segura de que o assassino não iria aparecer.

Teria ele reparado no poema no jornal?

Como poderia não ter reparado?

Então, porque é que não está aqui?

Ela lembrou-se de algo que John tinha dito quando começaram a escrever o poema...

"Ele não estará à que a polícia esteja à sua espera?"

Riley queria acreditar que eles inventariam um enigma tão tentador que o assassino se sentiria obrigado a correr esse risco.

Aparentemente, tinham falhado.

Se o assassino reparara no poema, não era palerma. Ele saberia que o melhor era não aparecer.

Entretanto, novas preocupações começaram a invadir a cabeça de Riley...

Se ele viu o poema mas não respondeu...

Poderia ela ter causado mais problemas sem intenção?

Agora, o assassino deve perceber que outra pessoa sabia como e onde ele tinha raptado Janet - supostamente a polícia.

E, claro, estaria certo.

Ela sabia que Crivaro estava a dar o máximo para manter os detalhes sobre os homicídios longe do olhar público. Certamente a última coisa que ele quereria seria dar a mão ao próprio assassino.

O que é que eu fiz? Perguntou-se Riley.

Talvez devesse contar a verdade a Crivaro sobre o poema.

Se assim fosse, ela sabia que ele ficaria para além de furioso. Riley murmurou em voz alta para si mesma...

"Teria todo o direito de estar."

De qualquer forma, ela tinha a certeza de que estava perder tempo ali. Saiu do canto e começava a afastar-se da marina quando ouviu uma série de passos e captou um movimento na sua visão periférica.

Virou-se a tempo de ver um homem a tentar atingi-la com um pedaço de cano. Ela tentou baixar-se, mas o golpe passou pela sua cabeça, atordoando-a e desequilibrando-a.

O seu agressor era rápido e forte.

Passado um momento, ele imobilizou-a de costas no chão.


CAPÍTULO TRINTA E NOVE


Riley estava deitada de costas, sentindo-se impotente. Ela queria golpear o homem com os punhos ou levantar o joelho para o atingir na virilha, mas estava imobilizada.

Ele era alto, magro e forte, e tinha força nos braços e pernas. Ele tinha as duas pernas presas sob os joelhos e, com uma mão grande, segurava os dois pulsos no chão acima da cabeça. Na sua mão livre, ainda segurava o cano.

Riley encolheu-se com medo de ser atingida com outro golpe na cabeça.

Mas em vez de atacar, ele colocou o cano num bolso e acenou com outra coisa à frente do seu rosto.

Com um som de estalo, uma lâmina brilhou, cintilando forte e nítida mesmo sob a luz escura.

"Eu podia fazer isto agora" Disse ele sem fôlego. “Eu podia fazê-la parecer com o seu verdadeiro eu. Você nunca viu como realmente é, mas eu juro, não vou deixá-la ir embora até que lhe possa mostrar.”

Riley ficou absolutamente petrificado.

O seu captor inclinou a cabeça com curiosidade e disse, "Não tem que ser doloroso assim. Eu não tenho que fazer isto com uma faca. Posso fazê-lo no labirinto – pintar o seu rosto sem cortá-lo, dar-lhe finalmente o seu verdadeira rosto. Mas pare de lutar. Venha comigo."

O labirinto! Pensou Riley.

Ela ainda não sabia onde ou o que era o labirinto, mas não iria deixá-lo levá-la até lá.

Ela cuspiu no rosto dele.

Ele afastou-se bruscamente e o seu rosto ficou vermelho de raiva. Quando ele meneou a faca, ela torceu o corpo para o lado, mas sentiu a picada da lâmina roçando no seu ombro.

Então ela ouviu uma voz diferente gritar...

"Riley!"

De repente, estava livre do seu agressor. Riley olhou para cima e viu dois homens emaranhados nos braços um do outro. Um deles, claro, era o assassino.

O outro era John Welch. Ele tinha afastado o assassino dela.

Riley gritou...

“John, tem cuidado! Não tentes...”

Então o assassino deu um forte empurrão no peito de John, obrigando-o a cambalear desajeitadamente para trás. Quando John caiu, o assassino iniciou a fuga, mas então virou-se e gritou a Riley...

"Está a cometer um erro. Pensa que ele é seu amigo, mas não é. Você não tem amigos. Todo a gente a odeia. Eles vão esquecer-se de si. Eles vão abandoná-la. Todos no seu mundo. Ficará perdida. Eu sei."

Ele inspirou bruscamente e gritou...

"Eu sou o único no mundo que sabe... quem você realmente é."

Começou a correr novamente em direção ao estacionamento. Através das árvores, Riley podia vislumbrá-lo a entrar num carro velho e a ir embora.

Enquanto isso, John levantou-se e ajudou Riley a levantar-se.

Ele disse, “Jesus, Riley. Parece que ele te acertou na cabeça. E cortou o teu ombro.”

O ombro de Riley doía, mas quando lhe tocou, sentiu apenas um pouco de sangue.

"Eu vou ficar bem” Disse Riley.

Mas enquanto tentava levantar-se, caiu contra John.

John ajudou-a a chegar a um banco próximo e sentou-a.

"Descontrai" Disse ele. “Baixa a cabeça. Vai ajudar com as tonturas.”

Riley obedeceu e sentiu o sangue fluir de volta para a sua cabeça. Ela ouviu John tagarelando ao telefone a uma curta distância. Riley imaginou que ele estivesse a chamar a polícia ou o FBI.

"Eu preciso de ajuda" Ouviu-o dizer. “Uma amiga minha foi atacada - pelo Assassino Palhaço, penso eu. O nome dela é Riley Sweeney. Ela está ferida, mas não mal. Estamos na marina no Parque Lady Bird Johnson.

Então ele voltou e sentou-se ao lado dela.

Ela levantou a cabeça, sentindo-se menos tonta agora. Gaguejou...

"Como é que sabias... ?"

John colocou o braço à volta do seu ombro e disse, “Raios, Riley, eu gostava de te estrangular. Eu comprei um jornal quando o meu grupo voltou da aula de explosivos. Quando eu vi o poema, soube o que estavas a fazer e vim para aqui. O que é que se passa contigo? Eu pensei que tínhamos concordado que era apenas um exercício. Apenas algo que estávamos a fazer por diversão.”

"Eu sinto muito" Murmurou Riley. "Eu estava errada."

"Podes ter a certeza que estavas" Disse John.

Sentaram-se juntos em silêncio por um momento. Então John levantou-se e foi até uma doca, onde começou a caminhar de um lado para o outro agitado.

Riley percebeu como tudo aquilo era grave. E não havia dúvidas - era tudo culpa sua e de mais ninguém.

Levaria muito tempo a desfazer o dano que ela causara, mas precisava começar naquele momento.

E antes que ela fizesse qualquer outra coisa, precisava começar a consertar as coisas com Ryan.

Não há mais segredos, Disse a si mesma.

Ela pegou no telemóvel e digitou o número dele.

Quando ele atendeu, ela não conseguiu impedir que a sua voz denotasse emoção.

"Ryan, eu... algo mau aconteceu, e eu..."

De repente, desatou a chorar.

Ryan gritou, "Riley! Estás bem?"

"Estou bem, Ryan, mas... eu preciso que me venhas buscar. Agora mesmo."

Ela deu as indicações para o estacionamento da marina e terminou a chamada sem mais explicações.

Como posso explicar o que aconteceu? Questionou-se.

Não ia ser fácil.

Entretanto, ouviu o som de sirenes a aproximarem-se e vários veículos entraram no estacionamento. Logo um grupo de homens saiu dos veículos estacionados e encaminhou-se em direção à marina. Um deles tinha um kit de primeiros socorros.

À frente de todos eles estava Jake Crivaro.

Riley engoliu em seco, temendo a ira de Crivaro.

Mas sabia que não se deveria surpreender que ele estivesse ali. Ao telefone, John mencionra o Assassino Palhaço e também dera o nome de Riley. Não era de admirar que Crivaro tivesse sido alertado imediatamente.

Enquanto o polícia com o kit de primeiros socorros começava a tratar dos dois pequenos ferimentos de Riley, Crivaro foi até ao banco e colocou-se à frente de Riley, olhando para ela com uma expressão feroz.

"O que é que aconteceu?" Perguntou-lhe.

Riley abanou a cabeça.

"Ele estava aqui agora” Disse ela. “O palhaço assassino. Ele atacou-me, mas o John afastou-o. Então ele foi-se embora - eu não consegui ver bem o carro dele, mas parecia bem antigo, talvez dos anos setenta.”

Crivaro cruzou os braços e perguntou...

“E como é que você e o assassino acabaram estando aqui ao mesmo tempo?”

Riley reprimiu um gemido de desespero. Quando começou a contar toda a história, viu que John estava por perto a ouvir. O seu primeiro impulso foi tentar não mencionar o envolvimento de John no incidente. Ela não queria que o pobre rapaz tivesse problemas.

Mas rapidamente percebeu...

John não fez nada de errado.

Nada mesmo.

Fora ela quem contara demasiado a John sobre o caso. Ninguém a forçou a fazer isso, muito menos o próprio John. E ela levou-o a acreditar que escrever o poema não faria mal nenhum.

Nada daquilo era culpa de John. Ela podia contar toda a verdade sem lhe causar problemas.

Quando Riley explicou tudo o melhor que pôde, o rosto de Crivaro contraiu-se de raiva.

Ele parecia estar a tentar controlar-se quando perguntou, "Pode dar-me dar uma descrição do homem?"

Riley pensou. Ela ficara tão chocada com o ataque, tão focada em lutar para se defender...

Então disse fracamente: "Não é muito boa."

Crivaro olhou para ela por um longo momento.

Finalmente disse...

"Acabou-se, Sweeney."

"Estou fora do caso?" Perguntou.

"Está fora do caso. Está fora do programa de estágio. Eu não quero mais vê-la no edifício Hoover. Eu não a quero ver nunca mais.”

Crivaro virou-se para John.

"E você?" Retrucou.

Eles afastaram-se juntos e Riley percebeu que John deveria estar a dar a Crivaro uma descrição do assassino, algo que ela não conseguira fazer. Ela estava feliz por alguém ter o bom senso para o fazer, mas o seu fracasso esmagou-a.

Crivaro deu uma palmadinha no braço de John e depois começou a dar ordens aos outros polícias e agentes sobre a análise da área.

Riley desmoronou completamente, colapsando em soluços incontroláveis. John sentou-se ao lado dela novamente e segurou-lhe na mão enquanto Riley baixava a cabeça e chorava.

Algum tempo depois, ela ouviu a voz de Ryan a chamar...

“Riley! O que é que aconteceu? Estás bem?"

Riley olhou para cima e viu Ryan a vir na sua direção. Então ela percebeu como a expressão dele parecia ensombrecer de raiva.

Rapidamente percebeu...

John está a segurar na minha mão.

Riley removeu cuidadosamente a mão dela da de John.

Ryan olhou para John e disse, “Quem diabos é você? O que teve a ver com isto? E o que é que se passa aqui?”

Tentando recompor-se, Riley disse com voz trémula...

“Este é o John, Ryan. Ele é meu amigo. Veio aqui para ajudar.”

Ryan olhou para John com raiva e silenciosamente. Parecendo chocado com a sua hostilidade, John simplesmente virou-se e caminhou silenciosamente para longe.

"Vamos lá" Ryan disse para Riley, ajudando-a a levantar-se do banco. "Vamos para casa."

Enquanto a ajudava a caminhar até ao carro, Riley podia sentir que todo o seu corpo estava tenso de raiva.

Ela sabia que uma noite já horrível estava prestes a ficar muito pior.


CAPÍTULO QUARENTA


Riley entrou no carro com Ryan. Ele ficou em silêncio quando arrancou do estacionamento e começou a sair do parque.

Riley disse timidamente, "Ryan..."

Ryan interrompeu-a com uma voz firme. "Agora não. Quando chegarmos a casa.”

Riley desejou poder dizer-lhe tudo agora e acabar de vez com aquilo. Mas se Ryan não estivesse disposto a ouvir, não havia nada que ela pudesse fazer.

O regresso a casa parecia interminável a Riley e a noite rapidamente se tornou mais escura. Ela teve a sensação de que uma escuridão terrível também se estava a abater sobre a sua vida.

Depois de Ryan estacionar em frente ao prédio, saiu do carro e entrou, como se ela não estivesse ali. Riley seguiu-o até ao apartamento, sentindo uma dormência terrível e ansiosa em todo o corpo.

Ryan dirigiu-se ao armário da cozinha e pegou numa garrafa de bourbon. Ela sabia que ele a guardava ali, mas não tocava nela desde que se tinham mudado para aquele apartamento. Ela calculou que ele estivesse a tentar ser sensível ao facto de que ela não podia beber álcool enquanto estivesse grávida.

Mas agora, claro, isso não importava - para qualquer um deles.

Ryan pegou em dois copos e colocou-os na mesa da cozinha. Os dois sentaram-se e Ryan serviu-se de uma grande quantidade e silenciosamente ofereceu-se para fazer o mesmo a Riley. Ela abanou a cabeça negativamente.

Ryan tomou um grande gole de whiskey e fez uma careta ao engoli-lo.

Com um tom de voz baixo e assustado, Riley disse...

"Ryan, eu sei que tenho muito que explicar e..."

Ryan interrompeu-a novamente.

"Quem era aquele tipo, Riley?"

Riley ficou surpreendida. Por um momento perguntou-se...

Que tipo?

Ele referia-se a Jake Crivaro? Com certeza que Ryan se lembrava de Crivaro dos tempos de Lanton.

Então ela percebeu a quem é que ele se referia.

"Eu disse-te, o nome dele é John" Disse ela. "Ele é um amigo."

Ryan zombou e disse, “Um amigo. Só um amigo. Eu vi-vos juntos, de mãos dadas. Esperas que eu acredite nisso?”

Riley ficou estupefacta. Ela estava a preparar-se para explicar todo o tipo de coisas a Ryan, mas realmente não considerou que teria que explicar o que quer que fosse sobre John.

Ryan disse, “Há quanto tempo você estás envolvido com ele? Desde o início do programa?”

Riley disse, "Eu não estou envolvido com ele. Não estou mesmo. Ele é um amigo. Ele é...”

Ela fez uma pausa e acrescentou, "Ele é um bom amigo".

Era a verdade, claro. Então, porque é que Riley se sentia como se estivesse a mentir?

A resposta surgiu rapidamente. Ela tinha sido mais aberta, honesta e comunicativa com John ultimamente do com Ryan.

Talvez ele tenha o direito de estar com ciúmes, Pensou Riley.

Ainda assim, ela não podia permitir que Ryan pensasse que o seu envolvimento com John era romântico ou sexual.

“Ryan, garanto-te, não há nada entre mim e John - nada do género que estás a pensar. Fiz muitas idiotices nos últimos dias, mas não isso.”

Ryan segurou o copo com força, depois tomou outro gole.

Riley sentiu que ele estava a fazer um esforço para acreditar nela.

Riley disse, “Deixa-me ao menos tentar explicar-te o que aconteceu no parque. Sabes, eu...”

Mas não conseguiu prosseguir.

Como poderia ela explicar o que acontecera naquela noite sem explicar imensas outras coisas primeiro?

Ela tinha que começar do início e foi isso o que tentou fazer.

Começou com o seu primeiro dia no programa de estágio, contando como fora designada para acompanhar o Agente Crivaro e como tinha ido com ele e o seu parceiro a uma casa de chuto, onde ajudara a encontrar um pacote de dinheiro.

Ryan olhou para ela descrente e interrompeu novamente...

“Tu estavas a trabalhar num caso real?” Perguntou. “Riley, é suposto estares num programa de estágio. Devias estar a ter aulas, ir a palestras e outras coisas. Mas estavas a trabalhar num caso?”

Riley ficou surpreendida com a ferocidade na sua voz.

Já não podia esconder a verdade.

Tenho que falar com ele sem rodeios.

Ela disse, "Já ouviste falar no Assassino Palhaço?"

Ryan disse, “O assassino em série que veste as suas vítimas como palhaços? Sim, o que é que tem?”

Riley engoliu em seco e disse...

"Eu tenho trabalhado com Crivaro nesse caso também."

Ryan pousou o copo com tanta força que o bourbon caiu sobre a mesa.

"Tu estás a trabalhar num caso de homicídio?" Perguntou.

Riley assentiu. “Isso é o que eu estava fazer no parque esta noite. Estava à espera para ver o assassino. Mas então ele atacou-me e foi assim que me feri e se John não tivesse aparecido... ”

Começava a parecer magoado e zangado.

Ele disse, “Riley, isto é uma loucura. Penso que não é segredo nenhum que não era favorável a fazeres este programa de verão. Mas respeitei os teus desejos e decidi deixar-te fazê-lo.”

Riley sentiu um pequeno flash de raiva naquele momento.

Ele deixou-me fazer isso?

A permissão de Ryan fora necessária?

Ryan disse, "Porque é que não me contaste isto?"

Surpreendida pelo tom amargo da sua própria voz, Riley disse...

"Alguma vez me perguntaste?"

Ryan abanou a cabeça e piscou os olhos, como se estivesse a tentar conter as lágrimas.

Ele disse numa voz sufocada...

"Riley eu não posso mais fazer isto. É demasiado. Como posso começar uma carreira com tudo isto a acontecer? Como posso criar uma boa vida para nós os dois? Pensei que perder o nosso bebé era o pior, mas agora...”

Ele parou por um momento, depois disse...

"Eu já não posso mais confiar em ti, e eu não posso ... Eu não posso ficar aqui se não posso confiar em ti."

Riley quase caiu da sua cadeira com a enormidade do que ele estava a dizer.

Sem dizer mais nada, Ryan levantou-se e foi para o quarto. Riley foi até à porta do quarto e assistiu impotente Ryan a fazer as malas. Ele não disse mais nada enquanto o fazia. Finalmente fechou a mala, pegou nela, passou por Riley e dirigiu-se à porta da frente.

Chamando por ele, Riley seguiu-o até ao corredor e subiu as escadas em direção à entrada do prédio. Ela ficou a olhar impotente enquanto ele ia para o carro e colocava a mala na bagageira. Os pneus derraparam quando Ryan partiu zangado.

Riley estava à porta do apartamento em completo estado de choque, tremendo da cabeça aos pés. Depois voltou para o apartamento e sentou-se à mesa da cozinha.

Ainda havia um pouco de bourbon no copo de Ryan. Riley encheu mais um pouco o copo e deu um longo gole. O ardor na sua garganta foi reconfortante. Então ela foi até ao sofá e deitou-se com a cabeça apoiada numa almofada.

Reparando no anel de noivado no seu dedo, tirou-o e olhou para ele com tristeza.

Parece-me que vou ter que devolver isto, Pensou, colocando-o na mesa de café.

Ao continuar a beber, reviu algumas coisas na sua mente.

Eu mal lhe contei o que quer que fosse, Pensou.

Ela não disse nada sobre o corpo da mulher assassinada ou sobre os seus encontros com os pais e marido de luto, ou sobre a escrita do poema para atrair o assassino, e certamente nada sobre os seus aterrorizantes sentimentos de ligação com o assassino.

Como é que Ryan reagiria se soubesse de tudo?

Ele já me odeia, Pensou. Se soubesse, ainda me odiaria mais.

Levantou-se e acrescentou mais whiskey ao copo, depois voltou para o sofá.

Já fazia algum tempo desde que ela bebera, por isso a sua resistência ao álcool era baixa. Rapidamente começou a sentir os efeitos bem-vindos do whiskey. Os músculos de todo o corpo relaxaram e respirava de forma mais lenta e fácil.

Pouco depois adormeceu.


Era de manhã e Riley estava num campo cheio de lixo onde uma feira tinha partido na noite anterior.

Com exceção de outra pessoa, Riley estava sozinha no campo.

Era Janet Davis e estava morta.

A mulher assassinada jazia aos pés de Riley, grotescamente fantasiada e maquilhada, os olhos opacos e sem brilho abertos e olhando para o céu da manhã.

Riley ajoelhou-se ao lado do cadáver e sussurrou...

“Eu gostava que pudesses conversar. Eu gostava que me pudesses dizer.”

Para espanto horrorizado de Riley, os lábios do cadáver começaram mexer-se, como se tentassem formar palavras.

Um gemido hediondo saiu dos seus pulmões.

Então surgiram quatro palavras horríveis e coaxantes...

"É uma coisa horrível..."

A boca ficou imóvel novamente e Riley estava com medo de que ela não dissesse mais nada.

Riley disse-lhe...

“O que é uma coisa horrível? Diz, por favor. Eu preciso saber."

A boca moveu-se novamente e a mulher disse...

"É uma coisa horrível... ser deixado para trás... ser esquecido... ser totalmente perdido".

Riley estava prestes a implorar à mulher para lhe dizer mais.

Mas, de repente, o cadáver desmoronou e transformou-se num esqueleto empoeirado diante dos olhos de Riley.

A luz da manhã de repente começou a desvanecer-se e logo Riley viu-se cercada por uma escuridão impenetrável.


Os olhos de Riley abriram-se. Ela ainda estava deitada no sofá e a luz da manhã entrava pela janela.

Eu dormi aqui a noite toda, Percebeu.

Tentou lembrar-se do quanto tinha bebido a noite passada.

Não tinha sido muito - o copo na mesa de café ainda tinha uma boa quantidade de bourbon.

Ela sentia dores físicas em todo o corpo, mas tinha a certeza de que era principalmente por causa da luta de ontem com o assassino. Não era exatamente uma ressaca. Mas ela tinha bebido whiskey mais do que suficiente para a deixar a dormir durante bastante tempo.

Graças a Deus pelas pequenas misericórdias, Pensou.

Muito pior foi a dor emocional de lembrar como Ryan tinha partido na noite anterior.

Ela tentou afastar os pensamentos daquela cena triste enquanto se dirigia para a cozinha. Ligou a cafeteira, colocou um pouco de pão na torradeira e serviu-se de um copo de sumo de laranja.

Sentou-se à mesa e pensou...

Eu tive um pesadelo.

Por alguns momentos, teve dificuldade em lembrar-se do seu conteúdo.

Mas então as imagens surgiram - a mulher assassinada deitada no campo à luz da manhã, a sua boca a mover-se enquanto dizia...

"É uma coisa horrível... ser deixado para trás... ser esquecido... ser totalmente perdido".

Riley estremeceu profundamente.

Como aquelas palavras lhe pareciam familiares!

Onde é que as ouvira? Ela tinha a certeza de que tinha sido antes daquele sonho.

Só então outras palavras sacudiram a sua mente...

"Os nossos fantasmas merecem melhor."

Teriam essas palavras sido faladas no sonho da noite passada?

Não, ouvira-as num outro lugar.

Alguém as tinha dito a eles no dia anterior.

Riley sentiu um arrepio quando se lembrou de quem as havia dito e onde.

Também se lembrou de Crivaro dizer ontem...

"Está fora do caso. Está fora do programa de estágio.Não a quero ver mais no edifício Hoover. Não a quero ver nunca mais.”

Riley de repente sentiu-se acordada.

Não importa se estou fora do caso, Pensou.

Há algo que tenho que fazer.


CAPÍTULO QUARENTA E UM


Quando Riley saiu do metro na mesma paragem em que ela e Ryan tinham saído no domingo, ela perguntou-se...

O que é que eu penso que estou a fazer?

Sua vida estava de pernas para o ar, e ali estava ela a seguir um vago palpite que tivera num pesadelo. Riley suspirou quando começou a andar no caminho que ela e Ryan tinham percorrido naquele dia mais feliz.

Bem, pelo menos isto não é uma perda de tempo, Pensou.

Afinal, ela não tinha mais nada a fazer naquele momento.

Aliás, ela não conseguia pensar em nada de significativo que tivesse que fazer para o resto da sua vida. Tudo o que era importante terminara no dia anterior.

Riley continuou passando pelo National Air and Space Museum até chegar ao seu destino - o pequeno prédio de tijolos com a placa que dizia...


D.C. ESQUECIDO


Ela lembrou-se novamente do que a mulher que lá trabalhava lhe dissera no domingo...

"É uma coisa horrível, ser deixado para trás, ser esquecido - ser totalmente perdido".

E claro, Riley ouvira as mesmas palavras ditas pela mulher morta no sonho. Talvez aquelas palavras não significassem nada. Mas Riley não pôde deixar de se lembrar do que o assassino lhe tinha gritado no dia anterio...

"Eles vão esquecer-se de si. Eles vão abandoná-la. Todos no seu mundo. Estará perdida.”

O seu intinto dizia-lhe...

Tem que ter algum significado.

Riley entrou, e lá estava sentada a mesma mulher com cabelos grisalhos e indisciplinados, pronta para vender bilhetes.

A mulher sorriu quando viu Riley. “Oh, que bom vê-la de novo! Nós raramente recebemos visitantes que regressam - especialmente os jovens. As pessoas hoje vivem unicamente para o momento. Eu sei que é uma boa maneira de viver, toda a gente o diz, mas... "

Ela encolheu os ombros e riu.

“Mas não posso deixar de acreditar que o passado também merece anossa atenção - e o nosso respeito, a nossa consideração e talvez até um pouco de amor. Então, estou muito feliz por estar aqui.”

"Eu também estou feliz" Disse Riley.

Mas em vez de entrar, Riley ficou ali parada, a pensar como começar.

A mulher olhou para ela com curiosidade e disse...

"Mas parece-me que não está aqui apenas por causa da nostalgia. O que posso fazer para a ajudar?"

Riley hesitou, depois mostrou à mulher a sua identificação de estágio.

"Eu sou Riley Sweeney" Disse, "estou a estudar no Programa de Verão de Estágio de Honra do FBI..."

As palavras saíram antes que Riley percebesse que não eram verdadeiras - pelo menos já não.

Ela não gostou de mentir àquela mulher gentil, mas continuou...

"Espero seguir uma carreira no FBI. Quero ser agente do FBI um dia. E estou aqui como parte de... bem, um projeto.”

“Que excitante para si!” Disse a mulher. "O meu nome é Anita Lockwood e trabalho aqui desde que este lugar abriu."

"Senhora Lockwood...”

"Por favor, trate-me por Anita."

Riley ficou em silêncio. O que é que ela queria perguntar à mulher?

Riley simplesmente não podia dizer que estava a investigar um homicídio. Por um lado, sabia que soaria improvável vindo de um estagiário de verão. Mas o mais importante, aquela mulher parecia muito sensível e delicada para qualquer conversa sobre homicídios.

Ela olhou para a sala de exposições e viu que a loja de presentes adjacente estava aberta naquele dia. Ela disse, "Eu adoraria ver a sua loja. Talvez algo ali se enquadrasse no meu projeto.”

"Oh, que bom" Disse Anita.

Riley entrou na loja. Tal como esperava, a mercadoria era composta de todos os tipos de itens de lugares abandonados e de outros tempos - crachás e fivelas de cinto antes usadas por bombeiros, chapéus e bengalas e acessórios de palco do demolido Gayety Theatre, e correntes e algemas da Penitenciária de Washington.

Os preços nesses e em outros objetos eram muito mais altos do que se poderia esperar numa típica loja de presentes. Mas afinal, pensou Riley, estas não eram bugigangas comuns. Eram lembranças antigas, raras e únicas.

Um grupo de pequenos brinquedos chamou a sua atenção: peixes de plástico, alguns cisnes e um pato de borracha amarelo brilhante.

Riley perguntou a si mesma...

Onde é que eu vi um pato assim antes?

Uma imagem lhe ocorreu - uma coleção de brinquedos que incluía coelhos de pelúcia, ovelhas, girafas, tigres e ursos de pelúcia, e...

Um pato exatamente como este.

Riley tinha-o visto no quarto aconchegante de Margo Birch.

Riley apontou para o grupo de brinquedos aquáticos e perguntou...

"De onde vieram?"

Anita disse, “De Whopping Escapades, o antigo parque de diversões”.

Riley lembrou-se de ter visto fotos do lugar durante a sua última visita.

Dedilhando os brinquedos, Anita explicou, "Estes eram parte de um jogo de estilo de carnaval onde as crianças tentavam apanhar brinquedos flutuantes num riacho".

Anita pegou o pato e virou-o de cabeça para baixo. Na parte inferior estava escrito o número 251.

Anita explicou, “Como vê, cada um desses brinquedos tem um número no fundo. Concorrentes receberam prémios que correspondiam a esses números. ”

Quando a respiração de Riley acelerou de excitação, Anita acrescentou numa voz melancólica...

“Whopping Escapades era um lugar maravilhoso, fora da cidade na Virgínia. Fechou há mais de uma década. Ah, eu sei que isso não parece muito tempo, mas hoje em dia as pessoas esquecem-se tão rapidamente. Então, quando comecei a trabalhar aqui, insisti para que fosse exibida. Os terrenos estão abandonados há anos, enquanto proprietários e políticos lutam pelo que pode ser feito com a propriedade. Todas as diversões desapareceram. Todo o parque está trancado.”

Riley disse, "Parece conhecer muito bem o lugar."

“Sim, eu trabalhava lá quando fechou. Apenas escriturária.”

Dando uma palmadinha num cisne de plástico, Anita acrescentou, “Depois do encerramento, consegui guardar algumas daquelas coisas em caixas. Então consegui este emprego e trouxe-os para aqui para vender.”

Riley perguntou, "Anita, já teve mais patos como este à venda?"

Anita franziu a testa. “Oh, apenas alguns. Uma jovem entrou aqui talvez há algumas semanas e comprou o outro que ainda estava à venda.”

Riley pediu a Anita para descrever a mulher o melhor que pudesse. A descrição de Anita era vaga, mas Riley sabia que poderia encaixar-se na aparência de Margo Birch.

Riley tinha a certeza de que não era coincidência.

Mas o que é que significava exatamente?

Ela começou a fazer perguntas desajeitadamente, quase balbuciando, sobre quem mais poderia ter comprado alguns daqueles itens recentemente.

Anita não parecia lembrar-se e começou a parecer um pouco desconfortável.

Ela perguntou, "Para que tipo de projeto disse que estava a trabalhar?"

Riley gaguejou...

"É apenas... uma espécie de... caso de crime em que devo ajudar."

"Oh" Disse Anita. "Bem, há mais alguma coisa que gostaria de saber?"

Riley tentou lembrar-se de mais alguma coisa, tentando desesperadamente entender o que estava a começar a descobrir.

Margo comprou um dos patos, Pensou.

Mas e quanto a Janet?

Lembrou-se do seu encontro com Gary Davis no Edifício Hoover e de como estava perturbado, zangado e frustrado. Riley temia a possibilidade de falar com ele novamente...

Mas tenho que tentar.

Ela disse a Anita, "Tem uma lista telefônica que eu possa usar?"

Anita levou Riley ao escritório do museu, mostrou-lhe a lista telefónica na mesa e deixou-a lá sozinha. Riley abriu a lista telefónica e procurou por Gary Davis. Estava desanimada, mas não surpreendida ao ver que havia uma longa lista de pessoas com esse nome na área de DC.

Mas lembrou-se do relatório que lera sobre a morte de Janet. Incluía o nome da rua em que Janet morava.

Então Riley procurou na lista até encontrar o nome da rua.

Deve ser isto, Pensou.

Pegou no telemóvel e digitou o número. Uma voz familiar atendeu e Riley disse...

"Sr. Davis, o meu nome é Riley Sweeney e...

Hesitou, depois acrescentou...

"Sou a estagiária do FBI com quem conversou há alguns dias."

Ela ouviu o homem soltar um profundo e infeliz suspiro.

“O que é que quer?” Perguntou. "Se não encontrou o assassino de Janet, não quero falar consigo."

Riley reuniu alguma coragem e disse...

"Eu estou a trabalhar nisso. Etamos a fazer tudo o que podemos. Mas precisamos da sua ajuda. O Sr. e Janet já visitaram um museu chamado D.C. Esquecido?”

"Não que me lembre."

"Ela mencionou ter lá ido sozinha?"

"Acho que não."

Riley respirou lenta e demoradamente.

Ele deve saber alguma coisa, Pensou Riley. Só tenho que fazer a pergunta certa.

Finalmente ela disse, “Sr. Davis, a sua esposa alguma vez comprou um tipo estranho de lembrança - o tipo de patos de borracha ou plástico ou peixes ou cisnes que poderiam fazer parte de um jogo de feira? Sabe, o tipo de jogo em que tenta apanhar brinquedos como esses de uma corrente de água?”

"Não, eu não acho..."

A sua voz suspendeu-se.

Então ele disse, “Espere um minuto. Deixe-me ver.”

Riley esperou por um momento, depois ouviu a sua voz novamente.

“Sim, ela comprou um peixe plástico de aparência estranha há pouco tempo. Ela não me disse de onde veio, mas divertiu-se com isso. Sabe, tem um número no fundo. O número é a data do nosso aniversário.”

Riley ficou estupefacta.

Disse, “Obrigada, Sr. Davis. Tem sido uma grande ajuda.”

"Espere um minuto. De que é que se trata?”

Riley gaguejou: “Eu... nós... não podemos dizer ainda. Mas prometo que entraremos em contacto.”

Riley desligou. Ela estava a sentir dificuldades em manter a sua respiração sob controlo.

Eu tenho que ficar calma, Disse a si mesma.

Mas era difícil manter-se calma naquele momento. Tinha quase a certeza de que, finalmente, encontrara uma ligação entre as duas vítimas. Elas compraram itens na loja de presentes ali mesmo no museu D.C. Esquecido.

Será que isso significaria que o assassino tinha reparado nelas ali pela primeira vez?

Ela não podia acreditar nem por um momento que a bondosa Anita Lockwood fosse uma assassina, mas...

Saiu do escritório e encontrou Anita novamente no seu posto na bilheteria.

Riley perguntou, "Será que me poderia dizer quem mais trabalha aqui - além de si?"

Anita olhou para ela e disse, “Bem, quase ninguém. Estamos com pouco pessoal. Este lugar é propriedade de uma sociedade histórica sem fins lucrativos. De vez em quando tenho a ajuda de uma estudante da faculdade durante um dia ou dois. Mas a maior parte do tempo não há ninguém além de mim. Eu sou a gerente, a funcionária e tudo o mais que seja necessário.”

Riley recordou sua última visita ao local.

Disse, “Alguém mais esteve aqui na última vez que vim. Estava a limpar o chão na loja de presentes.”

As sobrancelhas de Anita ergueram-se.

"Oh, refere-se ao Joey" Disse ela.

Riley estremeceu...

Joey!

O autor do poema!

"Esse é o seu nome verdadeiro?" Perguntou Riley.

“Não, mas por alguma razão gosta que o tratem dessa forma. O seu nome verdadeiro é Gordon - Gordon Shearer. Ele é um pouco... desligado, eu diria. Na verdade, ele cresceu no Whopping Escapades. Ele nunca teve uma família adequada, foi criado por pessoas diferentes que trabalhavam lá. Teve uma infância terrível, como pode imaginar. Eu conheço-o desde os meus tempos no Whopping Escapades. Penso que ele terá vinte e tantos anos agora.

Ela encolheu os ombros e acrescentou, "Quando cá veio à procura de um emprego, eu dei-lhe algo para fazer."

Riley engoliu em seco e disse...

"Eu tenho que entrar em contacto com ele. Como posso fazer isso? Qual é o número do telefone dele?"

Anita pareceu surpresa com a abundância de perguntas.

“A verdade é que eu realmente não sei. Eu nunca entro em contacto com ele, ele só aparece várias vezes por semana, sempre que lhe apetece e eu pago-lhe em dinheiro”.

Ela riu um pouco nervosamente e disse, “Oh querida. Talvez isso seja algo que eu não deveria admitir para alguém que estuda para ser agente do FBI. Pagar-lhe em dinheiro, quero dizer.”

Anita coçou o queixo e acrescentou, “Mas eu julgo que tenho a morada dele. Eu não tenho a certeza se devo partilhá-la consigo, embora... "

Riley lutou para não parecer tão desesperada quanto se sentia.

“Por favor, Anita. É realmente importante. Eu não lhe posso dizer quão importante é.”

Anita olhou para Riley um instante, depois encolheu os ombros.

"Bem, você parece-me suficientemente simpática", Disse ela. "Vou confiar em si."

Anita foi ao seu escritório e voltou com um pedaço de papel com a morada escrita.

Riley agradeceu a Anita - talvez de uma forma um pouco extravagante demais - e saiu do edifício. Ficou no passeio a olhar para o endereço na sua mão.

O que é que eu faço agora? Interrogou-se.

Demorou apenas um momento até perceber...

Goste ou não, preciso entrar em contacto com Crivaro.


CAPÍTULO QUARENTA E DOIS


Os dedos de Riley tremiam ao digitar o número do Agente Crivaro no seu telemóvel.

Ela sabia que aquela não seria uma tarefa fácil.

Depois de ouvir a mensagem e o beep, Riley gaguejou...

"Agente Crivaro, aqui é Riley Sweeney e... repare, eu sei que sou provavelmente a última pessoa no mundo que quer ouvir agora, mas.."

Respirou fundo e continuou.

"Se me está a ouvir, atenda, ok? Isto é realmente importante. Acho que descobri algo importante. Penso saber quem é o assassino. O nome dele é Gordon Shearer, mas gosta que o tratem por Joey, e até consegui a morada dele.”

Ela leu a morada em voz alta e disse, “Por favor, ligue-me. Assim que puder. Ligue-me agora."

Quando terminou a chamada, pensou...

Crivaro não me vai ligar.

Depois do que acontecera na noite anetrior, ele provavelmente nunca levaria nada que ela dissesse a sério novamente.

Ele provavelmente nem se incomodaria em ouvir a mensagem dela.

De qualquer forma, ela ainda poderia estar errada em relação a Gordon Shearer.

Afinal, ela bem sequer era uma agente novata, apenas uma estagiária verde e estúpida que fizera figuras tristes repetidamente e não fazia ideia do que estava a fazer.

Então ela perguntou a si mesma...

O que é que o Agente Crivaro faria?

Ela calculou que ele iria diretamente para a morada de Gordon Shearer e lhe faria uma visita, provavelmente com pelo menos um parceiro a acompanhá-lo.

Claro, ir lá para uma entrevista não era uma opção para Riley, mas...

Eu ainda posso lá ir.

Posso ver o lugar de fora.

Ela não se aproximaria dele diretamente nem lhe bateria à porta, mas se pudesse apenas vê-lo, saberia se ele era realmente o mesmo homem que a atacara na noite anterior.

Ela não precisava colocar-se em perigo.

Apenas um pequeno reconhecimento, Disse a si mesma.

Mas então suspirou amargamente.

Apenas um pequeno reconhecimento.

Pois, certo.

Essa fora a sua estratégia no Parque Lady Bird Johnson na noite anetrior.

E como é que terminara?

Nada bem, Pensou.

Nada bem mesmo.

Ela prometeu a si mesma que seria muito mais cuidadosa desta vez. Ela iria certificar-se de que não seria detetada.

Tirou o horário do metro da sua mala e descobriu como chegar à morada que lhe fora dada. Era na extremidade sudoeste da cidade e ela podia ir para lá diretamente de autocarro.

Mas as esperanças de Riley foram frustradas quando desceu do autocarro, virou a esquina e ficou de frente para o lugar onde deveria estar a morada.

Não havia nada lá.

O quarteirão inteiro tinha sido demolido e estava a ser construído um prédio ali.

Riley sentiu-se desanimar.

Mas ao mesmo tempo ficou aliviada porque Crivaro parecia ter ignorado a sua mensagem. Ela podia imaginar a reação dele se ali fosse com um ou mais colegas para descobrir que a morada já não existia.

Riley sentiu-se exausta e desmoralizada, e encostou-se num poste de luz para se apoiar.

É tudo o que posso fazer, Pensou.

Certamente que aquele era o fim de qualquer esforço que ela pudesse empreender.

Se Gordon Shearer era realmente o assassino ou não, tinha-se feito de tudo para não ser encontrado. Claro que ele tinha que viver em algum lugar, mas onde poderia estar? Riley não tinha forma de descobrir.

Talvez ninguém consiga, Pensou. Nem mesmo o FBI.

Talvez nem sequer importe.

Ela errara muitas vezes, a respeito de muitas coisas. Lembrou-se do dia em que reparou no poema pela primeira vez e convenceu erroneamente Crivaro de que deveriam tentar encontrar o assassino numa feira. Eles tinham ido à única feira que estava em DC, e isso não os aproximara da captura do assassino.

Ela ainda não tinha sabia como pudera estar tão enganada quanto à feira.

Ela baseou essa teoria numa estrofe do poema do assassino...


Vamos dançar e brincar no meio

O esmagamento público palpável

Dos foliões que oferecem

Um adeus selvagem à carne.


Riley pensou mais uma vez.

Um “adeus selvagem à carne”...

Uma “paixão pública palpável”...

Riley ainda se perguntava - o que é que aquelas imagens poderiam sugerir, ea não ser uma feira onde muitas pessoas estavam reunidas?

Mas agora que pensava novamente naquilo, uma única palavra se destacou na sua mente...

Palpável.

Por fim, começou a perceber - a palavra palpável levara-a a falhar.

A palavra significava tangível e real, mas ao mesmo tempo...

... Significa algo completamente diferente!

Algo era descrito como "palpável" quando apenas parecia real e tangível.

Os sentimentos eram palpáveis.

Uma sensação de perda era palpável.

Uma multidão de pessoas reais e vivas - o tipo de multidão que se encontraria numa feira - não era o tipo de coisa que poderia designar de palpável.

Então, quando o assassino escreveu sobre uma “paixão pública palpável”, ele realmente queria dizer algo bem diferente - um lugar abandonado, assombrado por pessoas que já não estavam lá.

E que tipo de lugar poderia ser esse?

Riley sentiu um crescente sentido de perceção.

Lembrou-se de sua visita ao museu no domingo, quando olhou todas aquelas fotografias do parque de diversões Whopping Escapades com as suas enormes montanhas-russas, rodas-gigantes e carrosséis.

Lembrou-se das palavras que lhe atravessaram a mente...

Um verdadeiro "labirinto".

Riley ficou extática

Subitamente tudo parecia claro - quase claro demais.

Estou certa? Questionou-se.

Ou estou apenas a enlouquecer?

Tudo o que ela sabia com certeza era que tinha que falar com o Agente Crivaro – naquele exato momento.

Digitou o seu número no telemóvel novamente e reuniu coragem para deixar uma mensagem muito mais enfática do que a anterior, possivelmente usando alguma linguagem colorida desta vez. Em vez disso, ficou surpreendida quando Crivaro atendeu.

"Que diabos quer, Sweeney?"

Riley gaguejou, "Uh, Agente Crivaro - recebeu a minha última mensagem?"

"Sim, recebi. E tentei verificar a morada que me deu. Adivinhe? Não existe. É um maldito local de obras.”

Riley reprimiu um gemido de desespero.

Ela disse, “Eu sei disso e peço desculpa. Eu lá agora mesmo. Mas descobri onde o assassino realmente vive. Tenho a certeza."

"E eu tenho certeza que você é uma tretas, Sweeney. A única razão pela qual atendi esta chamada foi para lhe dizer para nunca mais entrar em contacto comigo. Nunca mais. Estou a falar a sério, Sweeney. Já não posso consigo. Vá procurar uma vida, case-se com o seu namorado, tenha muitos filhos e pare com toda esta loucura. Adeus."

Riley quase gritou...

“Agente Crivaro, por favor! Não desligue! Ouça-me só pela última vez! Se eu estiver errada, prometo que nunca mais entrarei em contacto consigo. Não o incomodo mais. Nunca, para o resto da minha vida. Será como se nunca tivesse ouvido falar de mim.”

Um silêncio seguiu-se.

Riley perguntou-se se Crivaro ainda estaria em linha.

Finalmente ele disse, "Estou a ouvir".

Conseguindo soar muito mais calma do que se sentia, Riley falou sobre o que descobrira no museu - que as duas vítimas de homicídio tinham comprado bugigangas ali, que um jovem que se chamava Joey às vezes trabalhava lá, e que ele tinha sido criado por funcionários do Whopping Escapades até fechar há uma década.

Quando ela terminou, outro silêncio se seguiu.

Novamente, Riley perguntou-se se tinha desligado o telefone.

Então ela ouviu-o dizer devagar...

"Então, pensa que esse tal de Joey mora no local abandonado, onde costumava estar o Whopping Escapades?"

Riley mal conseguia respirar agora.

"Não lhe parece?" Conseguiu dizer.

Um silêncio ainda maior se seguiu.

Finalmente, Crivaro disse, “Não sei, Sweeney. Realmente não sei. Isso ainda soa meio louco para mim. Mas eis o que vamos fazer. O McCune e eu estamos no lado oposto da cidade do local do antigo parque de diversões. Mas vamos para lá imediatamente. Fique onde está e nós apanhamo-la pelo caminho.”

"Não precisa" Disse Riley. "Estou a apenas algumas paragens de autocarro do local. Provavelmente chego lá antes de vocês.”

Crivaro disse, “OK, encontramo-nos lá. Espere por nós do lado de fora do portão da frente.”

Riley terminou a chamada. Ela estava a hiperventilar naquele momento e levou alguns momentos para se acalmar. Então voltou para a estação de metro para apanhar o autocarro que a levaria para o local abandonado.

Espero bem estar certa desta vez, Pensou.


CAPÍTULO QUARENTA E TRÊS


Quando Riley desceu do autocarro e caminhou a curta distância até ao parque, viu que era uma extensão vasta e desolada cercada por altas cercas com arame farpado no topo. O portão principal estava acorrentado e trancado com um cadeado.

Uma grande placa maltratada pelo vento dizia...


PROPRIEDADE PRIVADA

NÃO ENTRAR

INTRUSOS SERÃO PROCESSADOS


Riley olhou através da cerca. Tudo o que podia ver além do portão eram árvores, massas de arbustos e ervas daninhas, e os telhados maltratados de edifícios que não tinham sido completamente demolidos.

Pela aparência do lugar, Riley imaginou que muitas pessoas não tinham desobedecido àquele aviso. Pelo menos não há muito tempo.

Na verdade, Riley começava a perguntar-se...

Estaria errada?

Parecia uma loucura imaginar que alguém pudesse realmente viver ali.

Ela andava de um lado para o outro à frente do portão, interrogando-se quando é que Crivaro e McCune chegariam. Crivaro dissera-lhe que estavam do outro lado da cidade, então ainda podia demorar um pouco.

Enquanto isso, ela sentia-se inquieta.

Ela contornou um canto da vedação e viu que uma estreita estrada não pavimentada corria ao longo do lado de fora dela. A estrada estava cheia de ervas daninhas e coberta de vegetação, mas marcas de pneus revelavam que era usada, pelo menos ocasionalmente.

Ela caminhou ao longo da estrada até chegar a outro portão largo que ficava à sombra de árvores suspensas. Este portão fora fechado, mas não acorrentado com cadeado. Os rastos de pneus passavam por ele, indicando claramente que alguém passara por lá de carrro recentemente.

A pulsação de Riley acelerou e foi arrebata por um arrepio.

É isto, Pensou.

É este o lugar.

Joey esteve aqui.

Ele pode até estar em algum lugar para além daquele portão agora mesmo.

Ela tinha que informar Crivaro.

Pegou no telemóvel e digitou uma mensagem de texto para Crivaro - a primeira mensagem de texto que ela tentava enviar...


Venha para o portão na estrada não pavimentada à direita do parque.


... E ela clicou em “Enviar”, esperando que o tivesse feito corretamente.

Então abriu o portão e deixou-o aberto enquanto caminhava pelos terrenos desolados, seguindo as marcas do carro.

As marcas levaram-na até estruturas sombrias e esqueléticas do que devia ter sido um dia diversões do parque. Um sentimento estranho apoderou-se dela - uma sensação fantasmagórica de como aquele lugar deveria ter sido no seu auge, cheio de pessoas felizes. Ela quase podia ouvir música e gritos e outros sons festivos. Tal como o poema sugeria, Riley sentiu-se cercada por uma “paixão pública palpável de foliões”.

Finalmente, as marcas conduziam a uma grande área coberta por colunas e fragmentos de paredes. O dia ainda estava quente e ensolarado, o que fazia com que aquele lugar parecesse particularmente escuro e húmido. Enquanto ela perambulava entre as sombras, os seus olhos tiveram que se ajustar à escuridão.

Riley adivinhou que aquela área devia ter sido uma espécie de arcada para jogos e diversões. Uma espécie de calha metálica atravessava o espaço - possivelmente onde o riacho já havia corrido para o jogo envolvendo patos, peixes e cisnes.

Mais profundamente dentro da área coberta, as marcas levaram-na a um veículo velho e maltratado. Seria o mesmo carro em que ela tinha visto o assassino a afastar-se na marina? Riley pensou que provavelmente seria. De qualquer forma, alguém estava definitivamente ali em algum lugar naquele momento.

Foi um pensamento aterrorizador.

Riley decidiu que seria melhor não explorar mais, voltar para o portão e esperar que Crivaro e McCune chegassem.

Mas assim que se virou, um som estridente chamou a sua atenção.

Ela parou em silêncio para ouvir.

De seguida ouviu-o novamente - e soube de imediato o que era.

Era o grito de uma mulher.

O grito foi seguido de sons mais suaves que associou ao choro.

Seguiu o som até à extremidade do edifício, onde se viu no meio de corredores escuros que deviam ter sido uma espécie de vasta rede de corredores conectando vários edifícios.

O labirinto!

Mais assustada a cada segundo que passava, Riley virou-se novamente para voltar.

Mas ouviu a voz novamente - mais alta, mais penetrante e urgente.

Tentou obrigar-se a continuar o seu caminho, seguindo uma vala de cimento onde jaziam alguns cascos quebrados de barcos de dois assentos. Percebeu que estava no que devia ter sido um "túnel do amor".

Por um momento, a única luz que via entrava por pedaços partidos do teto. Mas finalmente, a certa distância, viu uma porta parcialmente aberta que lançou alguma luz no labirinto.

Tremendo com medo, Riley aproximou-se da porta e cautelosamente empurrou-a. A porta conduzia a uma grande sala iluminada por uma única luz branca e brilhante que pairava sobre uma longa mesa.

Na extremidade da sala havia uma gaiola de armazenamento de malha de arame.

Dentro da gaiola, Riley viu alguém com um traje de palhaço agachado no chão.

Será ele? Questionou-se.

Mas então o palhaço soltou um gemido de desespero e Riley percebeu...

Não, é ela. É a sua próxima vítima.

O rosto da mulher permaneceu escondido contra os joelhos - ela não parecia estar ciente da chegada de Riley.

Sem parar para pensar, Riley correu em direção à gaiola para libertar a mulher.

De repente, uma figura colorida selvagem saltou à sua frente.

Era um homem vestido de palhaço, usando a maquilhagem completa de um grotesco palhaço de cara branca.

Ele dançou descontroladamente, mostrando um cano de aço curto.

"Oh, veio, veio!" Gargalhou descontroladamente. “Eu sabia que viria! Eu sabia que a noite passada na marina não seria o fim! Eu sabia que nos encontraríamos de novo! Você não poderia ficar longe! Não resistiu!”

Riley estava terrivelmente desorientado naquele momento.

Ela sentiu-se como se tivesse caído no meio de um pesadelo.

Aproveitando o elemento surpresa, o palhaço investiu contra Riley. Ela afastou-se e ele falhou por pouco.

Mal capaz de manter o equilíbrio, Riley continuou a tentar esquivar-se e afastar-se do homem e da sua arma, sempre à procura de algum objeto duro que pudesse usar em sua defesa.

Os seus olhos detetaram outro tubo de aço no chão.

Mas quando ela estendeu a mão, sentiu uma pontada aguda na nuca e o mundo escureceu.


*


Quando Riley tentou abrir os olhos novamente, foi cegada pela luz branca quente e ardente. Tentou mover-se, mas percebeu que estava deitada de bruços e amarrada.

Ela sentiu dedos tocando-a por todo o rosto, espalhando algo frio e húmido na sua face.

Maquilhagem, Pensou.

Ele está a maquilhar-me como um palhaço.

Riley calculou que ele já a vestira com uma roupa de palhaço enquanto ela estavera inconsciente.

Conseguiu abrir um pouco os olhos.

Agora podia ver o seu rosto, todo branco com cores berrantes.

"Já está" Disse ele, erguendo os dedos do rosto dela. “Tudo feito agora. Vê!"

Ele levantou um espelho e Riley viu o seu próprio rosto, horrivelmente pintado.

Ele disse, "Estou tão feliz por teres vindo. Eu mantive a outra mulher viva na esperança de que viesses. Quero ver qual das duas é suficientemente forte para ficar comigo. Tenho a sensação de que serás tu!”

Para horror de Riley, viu que ele segurava numa seringa.

Lembrou do que o médico-legista dissera sobre as outras duas vítimas - como uma dose fatal de anfetaminas provocara mortes horríveis de puro terror.

"Não!" Gritou Riley. "Não! Não!"

"Fica quieta", Disse o palhaço. "Quem sabe? Até podes gostar disto!”

Ela sentiu a agulha afiada no seu braço e preparou-se para a perfuração.

De repente, um estrondo ressoou na sala.

Um jato de sangue esguichou da testa do palhaço e ela ouviu-o cair no chão.

Dali a pouco, viu os rostos de Crivaro e McCune pairando sobre ela.

Estavam ocupados a libertá-la.

Com uma voz abalada, McCune disse a Crivaro...

“Eu tive que atirar. Ele ia injetar-lhe. Não havia tempo.”

"Tudo bem" Disse Crivaro. "Foi uma morte limpa."

Crivaro parou por um momento para acariciar o cabelo de Riley.

"Eu juro por Deus, Sweeney" Disse Crivaro com um sorriso e uma piscadela. "Nunca conheci um ser humano que pudesse estragar tantas coisas em tão pouco tempo quanto você."

Rapidamente Riley foi libertado.

"Não se levante" Ordenou Crivaro. "Eu quero que se sente ali até eu resolver esta confusão."

Riley obedientemente ficou onde estava.


CAPÍTULO QUARENTA E QUATRO


Riley acordou e abriu os olhos.

Por um momento, teve uma ligeira sensação de déjà vu.

Ela estava novamente numa cama de hospital.

Mas era uma cama e uma sala diferentes desta vez.

Esta cama estava separada do resto da sala com divisórias móveis e cortinas corridas.

O estranho feitiço de familiaridade passou rapidamente quando Riley se lembrou de onde estava e como ali tinha chegado...

Não, eu não tive outro aborto espontâneo.

Esta cama ficava na clínica médica do Edifício J. Edgar Hoover. Fora trazida para ali depois da sua luta desesperada contra um assassino psicótico vestido de palhaço.

Sobrevivera a tudo isso e ficaria bem.

No momento, porém, era bom estar deitada e não se esforçar. E sorriu quando se lembrou da eficiência enlouquecida do Agente Crivaro quando entrou em ação depois de McCune atirar no assassino.

Crivaro rapidamente libertou Riley. Depois de se certificar de que não estava drogada, ligou para uma linha de emergência do FBI. Ordenou que uma ambulância levasse a mulher que tinha sido enjaulada e exigiu uma equipa de investigação para se apressar e examinar o local.

Pouco tempo depois as ruínas labirínticas estavam repletas de pessoas seguindo as ordens de Crivaro que colocou McCune no comando do caos e levou Riley até ao seu veículo do FBI. Tinha-se apressado até ali com a sirene ligada, telefonando para se certificar de que um médico estaria pronto para os encontrar na garagem com uma cadeira de rodas.

O sorriso de Riley ampliou-se quando se lembrou de como Crivaro tinha quase enlouquecido o pessoal da clínica com as suas exigências frenéticas para que Riley fosse bem tratada.

“Verifiquem cada centímetro desta rapariga. Não foi drogada, mas foi atingida na nuca e ficou inconsciente algum tempo. Certifiquem-se de que não há nada errado com ela, sobretudo algo como uma concussão. E tirem-lhe essa horrível gosma do rosto. Eu volto em breve."

Uma enfermeira ansiosa fez exatamente o que fora pedido. Observou Riley e determinou que não tinha uma concussão. Tratou do inchaço na nuca de Riley, limpou e enfaixou o corte mais antigo no seu ombro, e cuidou de alguns outros pequenos arranhões e hematomas. Riley ficou especialmente aliviada por lhe ter sido retirada a maquilhagem de palhaço do rosto.

Finalmente, a enfermeira deu a Riley um sedativo e disse-lhe para dormir.

E agora ali estava, acordada e sentindo-se notavelmente renovada.

Dali a pouco Crivaro entrou no quarto e sentou-se ao lado da cama, perguntando ansiosamente como é que se estava a sentir.

"Estou bem" Disse Riley. "Não se preocupe."

Crivaro rosnou, perguntando, "Quem disse que eu estava preocupado?"

Riley conseguiu não rir.

Então ela perguntou, “E a mulher na gaiola? Vai ficar bem?”

"Sim", disse Crivaro. "O assassino inda não a tinha drogado, mas é claro que ficou traumatizada. Foi para as urgências e entrámos em contacto com a família. Os serviços sociais estarão com eles. Ela não sabia há exatamente quanto tempo estava lá trancada, mas parece ter sido algum tempo, talvez dois ou três dias. Mal comeu ou bebeu durante todo aquele tempo, e com certeza não dormiu muito.”

Crivaro fez uma pausa e franziu os olhos.

“É estranho - como o assassino a manteve viva assim, indo contra o seu próprio MO. Agiu tão rapidamente com as outras duas mulheres – raptou-as, levou-as para o covil, drogou-as até à morte e livrou-se dos corpos. Pergunto-me porque é que tratou esta de forma diferente. Questiono-me por que demorou.”

Crivaro coçou o queixo e acrescentou, “De qualquer das formas, você provavelmente salvou-lhe a vida - primeiro descobrindo onde o assassino estava, depois indo até lá como um raio de uma idiota.”

Riley sabia que Crivaro tinha razão - ela salvara a vida da mulher.

Mas Crivaro não tinha a noção da extensão dessa realidade.

Riley lembrou-se de algo que Joey tinha dito quando a amarrou...

"Eu mantive a outra mulher viva na esperança de que tu viesses."

Ele tinha ficado fascinado por Riley – a forma como deslindara o seu enigma e respondera com outro, a forma como escapara das suas garras na marina e, finalmente, a forma como encontrara o caminho até ao seu labirinto .

Riley estremeceu um pouco ao pensar...

A sua obsessão por mim salvou a vida da outra mulher.

Riley calculou que deveria contar aquilo a Crivaro...

Noutra altura. Não agora.

Crivaro olhou para ela em silêncio por um momento, como se tentasse avaliar o seu estado.

Então disse, “Estamos a receber mais informações sobre o assassino. Merece ser posta ao corrente. Quer juntar-se a nós para uma conferência?”

Riley foi apanhada de surpresa.

Nós? Questionou-se.

Quem somos nós?

Mas sentiu que era algo que não deveria perder. Acenou a Crivaro. Ele esperou no corredor do lado de fora enquanto Riley saiu da cama e se vestiu. Então seguiu Crivaro até uma sala de conferências num outro andar do edifício.

Quando entraram na sala, Riley viu três homens sentados na mesa de conferência. O velho parceiro de Crivaro, Elliot Flack, estava ali e também o supervisor de treino interno de Riley, Hoke Gilmer. E, claro, o agente McCune também estava presente.

Ficou surpresa por todos eles se levantarem quando ela entrou, quase como se fosse uma pessoa importante. Ficou ainda mais surpresa por eles se revezarem para cumprimentá-la, parabenizando-a por resolver o caso.

Riley ficou lisonjeada, é claro. Ao mesmo tempo, não pôde deixar de pensar...

O FBI realmente precisa de mais mulheres.

Quando todos se sentaram, McCune começou o briefing, direcionando as suas observações para Riley.

"É claro que o processo da nossa investigação está apenas a começar, mas estamos a reunir algumas informações preliminares sobre o assassino, Gordon Shearer – AKA ‘Joey’. Eu pessoalmente conversei com a mulher que você conheceu no museu, Anita Lockwood. Ela não foi capaz de esclarecer o que quer que fosse.”

McCune olhou por cima das suas anotações por um momento e continuou.

“De acordo com a Sra. Lockwood, Gordon passou a maior parte da vida sem se dar por eler. Aparentemente, os pais trabalharam no Whopping Escapades por um breve período. Eram feirantes que nunca ficavam muito tempo no mesmo lugar. Quando se foram embora do Whopping Escapades, abandonaram o filho de cinco anos de idade – limitaram-se a ir embora e deixaram-no lá. Ninguém voltou a ver o casal. O nosso pessoal está a tentar localizá-los, mas até agora não encontrámos rasto deles. E possivelmente nunca iremos encontrar.”

McCune tamborilou a borracha do lápis no bloco de notas e continuou.

"A Sra. Lockwood deu-nos os nomes de outras pessoas para conversar - pessoas que trabalharam no Whopping Escapades quando estava aberto. Ao longo dos anos, muitos funcionários parecem ter-se revezado para o criar. Por um tempo, um grupo de palhaços foi responsável por ele. Algo mau parece ter acontecido durante esse período. Ele ficou com medo de palhaços, não se aproximou mais deles. Então outros funcionários tomaram conta da criança.”

Riley disse...

"Então, pelo menos um dos palhaços deve ter abusado dele."

McCune assentiu e disse, "É o que parece. Talvez até sexualmente. Então não é de surpreender que tenha desenvolvido algum tipo de fixação doentia em relação aos palhaços. Mas pelo que as pessoas nos contaram, era uma criança bastante perturbada, mesmo quando os pais ainda estavam presentes. A sua estranheza pode estar relacionada com o abandono.”

"Que tipo de estranheza?" Perguntou Riley.

"Alterações bruscas de humor e comportamento" Explicou McCune. “Doce, carinhoso e educado num minuto, hostil, zangado e até mau no outro. Enquanto crescia, ele entrava e saía da escola, entrando e saindo de problemas. As pessoas ficavam mais tranquilas quando assentava e trabalhava em vários empregos no parque. Mas eventualmente o parque fechou - e aparentemente ninguém percebeu que ele tinha voltado para lá e permanecido.”

Essa palavra passou pela mente de Riley novamente...

Abandonado.

Foi a história de vida do menino infeliz.

McCune continuou, "Depois do parque fechar, ninguém da sua antiga vida esteve em contacto com ele, exceto Anita Lockwood."

Riley acrescentou, "E mesmo ela não sabia nada sobre as suas verdadeiras condições de vida".

"Isso mesmo" Disse McCune, olhando novamente para as suas anotações. “Isso cobre bem o que descobrimos até agora. Tem alguma pergunta, Sweeney?”

Riley pensou por um momento, depois disse...

"Talvez não seja tanto uma pergunta, mas tenho a nítida sensação de que ele era muito inteligente."

McCune anuiu, parecendo impressionado com essa perceção.

"De facto, era" Disse ele. “Encontrámos uma pilha de livros escondidos no seu esconderijo - a maioria deles roubados de bibliotecas públicas. Ele parecia ter lido incessantemente, especialmente sobre a história dos palhaços que remontava ao século XVI ”.

Crivaro abanou a cabeça. “Inteligente, distorcido e isolado do mundo - uma combinação mortal. Não é de admirar que ele se tenha tornado num assassino.”

"Uma verdadeira bomba-relógio" Acrescentou Elliot Flack.

Houve um murmúrio de concordância e a reunião chegou ao fim.

Quando saíram para o corredor, Crivaro tocou Riley no ombro.

"Eu sei que tenho sido muito duro consigo" Disse ele.

"Tudo bem" Disse Riley. "Eu merecia."

Crivaro riu e disse, "Pode ter a certeza que sim."

Então ele fez uma pausa e acrescentou, "Mas eu não a avaliei mal quando a inseri no programa. Você tem instintos como eu nunca vi. E... espero que não desista.”

Crivaro afastou-se e Riley viu-se sozinha no corredor, percebendo que tinha uma decisão a tomar. Mas naquele momento, não sabia o que decidir.

"E agora?" Murmurou em voz alta.

De repente, o seu telefone tocou. O seu coração bateu com mais força quando viu que a chamada era de Ryan. Quando atendeu, ele parecia quase histérico.

“Riley! Estás bem? O que diabos está a acontecer? Ouvi nas notícias que o Assassino Palhaço está morto e o teu nome está misturado de alguma forma. Fala comigo. Estás segura? Estás magoada?"

Riley disse: "Estou bem, Ryan. Não te preocupes."

"Quero ver-te. Onde estás? Onde é que nos podemos encontrar?"

Riley ficou surpresa com a diferença em relação à noite anterior.

Ela disse, "Estou no Edifício J. Edgar Hoover".

"Quanto tempo demoras a chegar ao National Mall?"

"Posso ir já para lá."

"Ótimo. Encontramo-nos em frente ao Lincoln Memorial.


*


Quando Riley se aproximou do Lincoln Memorial, viu Ryan sentado na sua majestosa escadaria. Ela gritou para ele, e ele correu na sua direção e abraçou-a. Parecia estar frenético de alívio.

Quando se sentaram juntos nos degraus, olhando para a vasta piscina refletora, Riley pensou...

Não há mais evasões.

Ela não perdeu tempo em contar a Ryan tudo o que tinha acontecido desde que ele saíra, sem poupar detalhes feios. Até lhe contou como o assassino estivera a segundos de lhe injetar uma dose fatal de anfetaminas antes de Crivaro e McCune chegarem para a resgatar.

Quando ela terminou, Ryan apenas ficou durante alguns momentos estupefacto.

Finalmente, Ryan disse, "És uma heroína, Riley".

Riley riu nervosamente.

"Não, não sou uma heroína" Disse.

Ryan abanou a cabeça e disse, "Salvaste pelo menos a vida de uma mulher. Ao resolver o caso, podes ter salvo outras vidas também. É uma loucura. Eu acho que tu és talvez sejas louca. Mas também és ums heroína.”

Riley suspirou. Ela não gostava muito daquela palavra - heroína.

Se as pessoas na sua vida começassem a esperar que ela vivesse à altura daquilo, certamente acabariam amargamente desapontadas.

Um silêncio instalou-se entre eles.

Então Ryan riu nervosamente e disse...

"Então, o que é que queres fazer para o resto da tua vida, Riley Sweeney?"

"Tenho algumas ideias" Disse ela.

"Espero que sejam praticamente iguais às minhas" Disse Ryan. Ele pegou na mão esquerda dela e acrescentou, “Podemos começar indo para casa e colocando o teu anel de noivado de volta no dedo. E as minhas ideias partem daí.”

Olharam-se nos olhos e depois beijaram-se longamente. Então deram as mãos e conversaram distraidamente durante algum um tempo. Mas antes de dar por isso, Riley viu-se distraída por pensamentos relacionados com Gordon Shearer - o jovem doente que se chamava a si próprio "Joey".

O seu sentimento de ligação com ele tinha sido terrível e aterrorizante.

Essa conexão fora cortada agora que ele estava morto?

Riley esperava que sim, mas não podia deixar de se lembrar o que ele gritara para ela na marina...

"Eu sou o único no mundo que sabe... quem tu realmente és."

Claro que essas palavras eram delírios de um louco. Mas ela perguntou-se - talvez houvesse algum vestígio de verdade no que ele dissera? Ela sentiu como se estivesse dentro da mente dele.

Será que ele sentira o mesmo em relação a ela?

Ela lembrou-se de algo que Elliot Flack tinha dito na sua palestra...

“O truque é entender os monstros sem nos transformarmos num monstro. Nem sempre é fácil.”

Riley estava apreensiva quando apertou a mão de Ryan com mais força.

Ela gaguejou...

"Ryan... vamos... nós os dois... vamos apena ..."

Levou um momento para pensar nas palavras que parecia procurar.

"Vamos simplesmente amar-nos um ao outro" Disse finalmente.

Abraçou-se a Ryan e beijaram-se novamente.

 

 

                                                   Blake Pierce         

 

 

 

                          Voltar a serie

 

 

 

 

      

 

 

O melhor da literatura para todos os gostos e idades