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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


ALÉM DA PUREZA / Diana Palmer
ALÉM DA PUREZA / Diana Palmer

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

ALÉM DA PUREZA

 

Elisa Marist olhou para a porta fechada do escritório com todo seu ódio. Ele podia ficar sentado.lá até criar raízes, que Elisa não se incomodava. Ele nunca cometia erros, mas ela, sim. Se algo estava faltando, tinha sido falha de Elisa.

— Não vale a pena agüentar você só por causa das presta­ções do carro — informou ela à porta fechada. — Sou uma excelente secretária. Arrumo trabalho em qualquer lugar. Tudo o que tenho a fazer é responder aos anúncios de jornal e irão chover propostas de emprego, sr. Cabe "Sou o Melhor" Ritter!

Tirou uma mecha de cabelo castanho-claro dos olhos; seus olhos cinzentos dardejavam em direção à porta do chefe. Seus dedos elegantes brincavam com a caneta de laça, enquanto Elisa pensava nas vantagens de datilografar seu pedido de demis­são para enfiar no nariz dó chefe.

Bem, ela não ia se desculpar. Não era sua culpa se o chefe misturara as datas na agenda e fora para uma reunião de ne­gócios no restaurante errado e perdera um importante con­trato. A secretária era culpada por o chefe não saber ler? Era só o que faltava!

Era bem do feitio do chefe acusá-la de ter procedido de forma deliberada. Acusava-a de tudo, de roubar suas canetas, de beber seus licores, e, por que ainda ficava naquele emprego, Elisa não sabia dizer.

O salário era bom, claro. E o sr. Cabe a deixava sair por mais uma hora durante a semana para fazer compras. E tam­bém ele não era tão ruim assim…

Por outro lado, o escritório estava sempre cheio de vende­dores falando uma estranha língua que parecia estar relacio­nada a válvulas diversas e partes de equipamento pesado. Elisa' sabia como o petróleo era retirado do subsolo, mas a nature­za técnica de seu emprego ainda era grego para ela. Sabia e como os geólogos se pareciam e que o trabalho deles era de na­tureza confidencialíssima quando procuravam por campos de petróleo. Sabia disso por causa de sua prima Jenny, que mo­rava com ela e trabalhava para o pai de Cabe Ritter.

Eugene Ritter, que parecia passar a vida procurando novas formas de aborrecer o filho, um belo dia passara a hora de almoço de Elisa explicando-lhe os deveres de um geólogo, as­sim como várias outras coisas que ela não queria saber sobre o ramo petrolífero. Eugene possuía uma empresa para a qual Cabe não mais trabalhava. A deserção do pai do ramo petro­lífero era a razão principal do desentendimento entre os dois. Cabe tivera certeza de que o pai ia falir na crise do petróleo, mas tal não acontecera. O velho arrumara um jeito de ganhar dinheiro com os supergeólogos que trabalhavam para ele e que puderam achar metais importantes para o governo. Era um negócio que envolvia intrigas e espionagem, como sua prima Jenny lhe contara em segredo. Encontrar.os metais dava mais dinheiro do que o petróleo.

Ela escrevia pedidos, tomava ditados, datilografava cartas para o impaciente chefe, marcava reuniões e o agüentava re­gularmente. E, quando os amigos ou parentes perguntavam o que a Ritter Equipamentos fazia e vendia, ela apenas sorria e se fingia de surda. Uma vez, com tremenda cara-de-pau, dis­sera ao tio que Cabe Ritter projetava e construía torpedos de fótons. Infelizmente, o tio não era um fã de Jornada nas Es­trelas, e fora constrangedor quando ele se encontrara casual­mente com Cabe e dissera-lhe que gostaria de ver os foguetes interplanetários que a Ritter produzia.

— Você não sabe ler, pelo amor de Deus? — era Cabe, que interrompia o curso de seus pensamentos, gritando pelo interfone. — Por que não me disse que eu tinha um almoço na Câmara de Comércio ao meio-dia? É meio-dia e dez, o res­taurante fica longe e eu ainda vou ter de fazer um discurso!

Com um profundo suspiro, Elisa apertou o botão para res­ponder:

— O almoço não é hoje, sr. Ritter — disse ela, com força­da polidez e paciência. — É amanhã. Está olhando no dia er­rado… de novo — acrescentou baixinho. — Hoje é dez de abril, não onze.

Houve uma breve pausa.

— Quem virou a página? — indagou ele, a voz mais mansa.

— Acho que fui eu — respondeu a secretária, resignada. — Deus sabe que fui a responsável pelo furacão no litoral e tenho certeza de que eu causo gengivite e queda de dentes.

— Cale-se e venha cá.

Pegando seu bloco e a caneta, Elisa ajeitou a blusa branca para entrar na sala do chefe. Era alta e tinha um belo corpo, com pernas longas e bem-feitas. Seu farto cabelo castanho caía até a cintura quando o soltava. Ficava muito bem com o ca­belo solto, mas normalmente o prendia num coque ou rabo-de-cavalo e não usava muita maquiagem. Seu rosto oval ti­nha feições delicadas. Elisa não era um modelo de beleza, mas era bem atraente e muitos chefes provavelmente a teriam no­tado, mesmo que ela procurasse não chamar a atenção sobre si mesma.

Não valorizava sua figura no trabalho porque sabia que Cabe era um mulherengo e não queria se arriscar a se apaixonar por ele. Elisa conhecia a própria vulnerabilidade, principalmente no dia em que Cabe lhe dirigira um demorado olhar na época de Natal, quando se arrumara para ir a uma festa com as ami­gas. Ele se inclinara para a secretária, como se fosse beijá-la nos lábios, mudando de idéia repentinamente. Beijara-a no ros­to, murmurando um "Feliz Natal" e indo embora, deixando-a com a respiração suspensa. Depois daquele dia, insistira em chamá-la de "Liz" em vez de srta. Marist, tratando-a como se fosse uma amiga. Elisa fingira nada notar, percebendo que Cabe nunca lhe daria uma cantada, mas, mesmo assim, por segurança nunca mais fora trabalhar muito arrumada e de ca­belo solto. Era mais seguro que o chefe a tratasse como ami­ga mesmo.

Seus pais, no Missouri, teriam aprovado sua atitude. Cabe parecia preferir as mulheres loiras e sofisticadas. Era um play-boy, o que não a atraía em absoluto.

De qualquer modo, Elisa tinha apenas vinte e três anos, con­tra os trinta e seis de seu chefe e ele parecia considerá-la uma criança, pois naqueles dois anos em que haviam trabalhado juntos, nunca tentara nada. Falava com ela como se fosse uma irmã mais nova, sobre esportes e às vezes sobre mulheres. Não parecia notar como a secretária ouvia com atenção ou como corava às vezes. Cabe parecia estar falando consigo mesmo.

Ultimamente estava saindo com uma loira muito elegante e bonita de nome Karol Sartain. Andava cada vez mais impa­ciente. No dia anterior, Elisa notara que o chefe a olhava com uma expressão estranha, que nunca tinha visto, Olhava-a co­mo se de súbito quisesse que ela estivesse na Sibéria, e Elisa não conseguia entender por quê.

Era melhor mesmo que Cabe não gostasse dela. Um homem tão experiente assim estava longe de ser o parceiro ideal para uma garota solteira e reprimida que possuía um lagarto gigante como animal de estimação.

Abrindo a porta do escritório do chefe, Elisa entrou. A pre­sença dele sempre a deixava sem fôlego, principalmente por­que Cabe era bem bonitão. Era alto e musculoso, um homem grande com personalidade agressiva. Cabe era um vencedor e isso se mostrava em sua expressão facial. Seus olhos azuis podiam derreter o aço e seus cabelos era pretos e espessos. Seu rosto tinha duas cicatrizes perto do queixo, algo que o torna­va ainda mais másculo. As mulheres pareciam não conseguir resistir a ele. Podia ser charmoso quando queria algo e, se não desse certo, ainda tinha seus punhos de ferro. Não parecia ter medo de nada. Exceto de cobras. Elisa nunca mencionara que possuía um animal de estimação. Perguntava-se se o medo do chefe se estendia a lagartos.

Cabe era todo músculos. Começara trabalhando para o pai em plataformas de exploração de petróleo e parecia um ex­plorador. Hoje em dia, trabalhava apenas no escritório, mas, quando estava com ânimo, ia trabalhar na fazenda do pai, em Tulsá.

O velho Ritter tinha sido jogador profissional de beisebol nos velhos tempos e sabiamente investira o dinheiro ganho nu­ma fazenda em Oklahoma e em outra no Texas. Com aguça­do senso comercial, começara a perfurar o solo e seu filho, Cabe, o ajudara, àté decidir-se a cair fora do domínio do pai e abrir seu próprio negócio de produção e venda de peças pa­ra sondas de petróleo.

Estava no ramo havia dez anos, com sucesso, mas seu pai o aborrecia por nunca mencionar aos outros o que o filho fazia para viver. Na verdade, como vingança, costumava dizer aos amigos que Cabe trabalhava como porteiro num bar. Eli­sa não entendia a confusão dos novos clientes quando perce­biam de quem Cabe era filho, pois Eugene era quase uma lenda no ramo e seus colegas compravam peças de Cabe. Mas ago­ra que ela também fazia parte da brincadeira, era divertido e exasperador ao mesmo tempo.

O velho Ritter nunca aprovara a independência do filho. Gostava de mandar na vida de todos que estivessem ligados a sua própria vida. Quando visitava Cabe, o que era freqüen­te, sempre tinha sugestões para Elisa. A última havia sido pa­ra que ela parasse de chamar o filho de "sr. Ritter" e começasse a usar roupas que dessem ênfase ao seu corpo escultural.

— Nunca chamará a atenção dele assim, você sabe — dis­sera o velho, desaprovando a blusa branca fechada até a gola e a saia comprida.

— Sr. Ritter, não quero chamar a atenção de seu filho — replicara ela. — Ele não é meu tipo.

— Mas você serviria muito bem para ele — continuara o velho, como se Elisa nada tivesse dito, fitando-a com os olhos azuis, iguais aos do filho. — Mantenha-o longe dessas garo­tas de programa. Cabe vai morrer de alguma dessas doenças horríveis — dissera o pai, em tom conspiratório. — Ele nem sabe onde essas meninas andam!

A essa altura, Elisa desculpara-se, indo até a toalete, onde tivera um acesso de risada histérica. Queria tanto contar ao chefe o que o pai dissera sobre ele, mas não sabia como abor­dar o assunto.

O olhar curioso de Cabe por fim chamou sua atenção, tirando-a do devaneio.

— Não fique aí parada, Liz, sente-se — murmurou Cabe, percebendo que a secretária ò encarava. — Não sei o que deu em você ultimamente, mas a sua mente está longe do trabalho.

— Como disse? — Elisa tentava concentrar-se no que seu chefe dizia, sem sucesso, de pé ao lado da poltrona.

— Sente-se!

Elisa sentou-se. A autoridade na voz do chefe tinha o mes­mo efeito com os empregados homens. Cabe estava tão acos­tumado a dar ordens que não tinha nenhuma inibição em fazê-lo nos restaurantes, nas festas de outras pessoas, em qual­quer lugar. Diziam que as anfitriãs suspiravam de alívio quando ele ia embora de suas casas.

— Não me espanta que seu pai não o aprove — murmurou a secretária. — O senhor è igualzinho a ele.

— Insultos são a minha especialidade, não a sua, menina — lembrou-a Cabe, em tom divertido, inclinando-se para trás na poltrona e examinando-a com atenção, fazendo a poltro­na ranger. Cabe era quase um peso pesado. Seus olhos azul-claros fitavam-na. — Você não me parece muito animada es­ta manhã. Algo errado?

— O senhor me repreendeu duas vezes antes de eu passar por esta porta e nenhuma delas foi minha culpa.

— E daí? Eu brigo com você todas as manhãs, não brigo?

— Havia um lampejo bem-humorado em sua expressão. É ine­rente ao seu cargo. Você chorou durante os dois primeiros dias quando entrou aqui.

— Estava morta de medo do senhor naqueles dois dias.

— Foi aí que jogou a agenda em mim — suspirou Cabe.

— Foi bom ter uma secretária que revidasse. Você durou bas­tante, Liz.

Talvez bastante demais, Elisa pensou, com vontade de di­zer. Mas resolveu que era melhor ficar calada.

— Sem comentários? — estranhou Cabe, inclinando-se para a frente, num gesto que sempre a pegava desprevenida. — Olhe aqui — disse em tom conspiratório —, precisamos fazer algo a respeito de meu pai.

Elisa piscou ante a súbita mudança de assunto.

— Nós precisamos?

— Sim, nós. Ele anda fazendo dos seus comentários de no­vo. O assunto favorito agora é que eu esteja procurando uma esposa. Meu telefone tocou várias vezes ontem com ofertas de moças solteiras e disponíveis em Tulsa.

Elisa não pôde deixar de sorrir ante a expressão irritada do chefe. Podia ver as solteiras pondo as manguinhas de fora.

— Sabe por que, não? — perguntou Elisa, divertida. — O senhor mudou a fechadura do seu apartamento e agora seu pai não tem chave para poder entrar.

— Meu Deus, não tenho nenhuma privacidade! Precisei fazer isso. Papai estava esperando por mim no meu apartamen­to na sexta-feira passada — defendeu-se Cabe, cheio de ódio na voz. — Levei Karol para casa comigo depois do jantar e ali estava meu pai, afiando a faca na pedra-mármore. Olhou Karol de cima a baixo e convidou-se para tomar um drinque e depois um café. Ficou conosco até meia-noite. Tratou Ka­rol muito mal, conversando praticamente sozinho e contando como se fazia para castrar gado e outros assuntos que a eno­jaram até que ela foi para casa.

— Posso entender — concordou Elisa, tentando convencer-se de que não havia nada de mais no fato de o chefe levar Ka­rol para casa após o jantar. Mesmo assim, o fato a irritava. A atitude dele ante suas conquistas femininas era algo que me­xia muito com Elisa. — Uma vez ouvi seu pai contando a uma das suas namoradas sobre o tratamento que o senhor estava fazendo para se curar de uma daquelas doenças.

Os olhos azul-claros se arregalaram pelo espanto.

— Foi com Vera, não foi? Não foi? Meu Deus… — Ele bateu com o punho cerrado na mesa. — Foi por isso que ela me deixou tão apressada sem ao menos se despedir! Aquela cobra venenosa do meu pai!

Vera, pelo que Elisa se lembrava, tinha sido a namorada firme antes de Karol.

— Isso é jeito de falar sobre seu pai, sr. Ritter?

— Liz — começou Cabe —, quando meu pai esteve aqui, na semana passada, uma das coisas mais gentis que ele disse sobre você foi que se vestia como se tivesse recebido roupas do Exército da Salvação.

Elisa sentiu-se tão insultada que esqueceu de protestar con­tra o uso do apelido que Cabe lhe dera.

— Aquela cobra velha! — ela exclamou. Cabe levantou uma sobrancelha.

— Foi o que pensei ter dito. Tem alguma idéia?

— Nenhuma que não o leve para a cadeia. Por que seu pai anda interferindo tanto na sua vida ultimamente?

Cabe suspirou fundo, passando uma das mãos pelo denso cabelo escuro.

— Papai acha que eu preciso de uma esposa. Então, está procurando uma mulher para mim.

— Talvez ele esteja apenas aborrecido — murmurou Elisa, pensativa. — Peça a sua madrasta que o leve para um cruzei­ro de volta ao mundo.

— Tenho o mínimo contato possível com minha madrasta — foi a resposta do chefe.

— Desculpe. — Elisa sabia que aquele era um assunto de­licado para seu chefe, mas não sabia o porquê. Cabe era um homem bastante reservado em alguns campos.

— Seus pais ainda estão casados? — ele indagou,

— Sim senhor, fizeram trinta anos de casados em novembro.

— Não me chame de senhor! — Cabe exclamou em tom irado, quebrando um lápis e, levantando-se, foi até a janela, enquanto Elisa respirava fundo, tentando recobrar-se do sus­to. — Não quero me casar. Não quero amar ninguém — ele disse como que para si mesmo, olhando a cidade. — Você não deu nenhuma informação sobre Karol a meu pai, deu? — per­guntou Cabe de repente, virando-se para a secretária.

A figura dele era intimidante.

— Não, sen… — Elisa pigarreou, lembrando-se de sua úl­tima ordem. — Não. Ele é quem fica falando o tempo todo. Como de costume,

— O que ele disse?

Elisa abafou uma risadinha.

— Que o senhor ia pegar uma daquelas doenças horríveis se ele não o salvasse dessas garotas de programa. — E, inclinando-se para a frente, continuou: — O senhor não sabe por onde elas andaram, entende?

Cabe caiu na risada. O som era gratificante, já que ele não era homem de rir, normalmente. Fazia-o parecer mais jovem do que era e seus olhos azuis brilhavam. Elisa não pôde dei­xar de sorrir para ele, pois o chefe ficava incrivelmente boni­to quando ia.

— Então, esta é a opinião de meu pai. Talvez eu possa ter uma conversa com ele sobre a vida moderna.

— Isso só funcionará se o senhor o amarrar e amordaçar antes.          

— Papai anda fazendo confidencias a você, é isso? — Ca­be comprimiu os lábios estudando a secretária com uma aten­ção que estava se tornando cada vez mais freqüente. — Quantos anos você tem, Liz?

— Vinte e três. — "E, se você não parar de me chamar de Liz, vou embrulhá-lo em celofane e jogá-lo pela janela", acres­centou para si mesma..

— Você mal tinha vinte e um quando começou a trabalhar aqui. Era nervosa e muito tímida. De certo modo, você ainda é bem tímida.

— Gentileza sua notar— disse Elisa, pouco à vontade. — Agora, com relação à correspondência…

— Você não sai com rapazes — observou Cabe, como se ele soubesse do fato.

Elisa cruzou as longas e bem-feitas pernas de modo invo­luntário chamando a atenção do chefe.

— Bem, não saio muito — respondeu ela, relutante.

— Por quê? — Os olhos azul-claros mergulharam nos dela.

Escolhendo as palavras com cuidado, Elisa tentou respon­der. Nunca enveredara por aquele tipo de conversa pessoal an­tes e se perguntava por que o chefe trazia o assunto à baila agora. Era óbvio que Eugene tentava bancar o cupido.

— Não sou moderna o suficiente para a maioria dos ho­mens — foi a resposta clara e honesta.

Cabe examinou-a com atenção.

— Você diz moderna em relação à liberação sexual? Sentindo as faces corarem, Elisa respondeu:

— Meus pais eram de meia-idade quando nasci e são pes­soas muito convencionais. Me ensinaram que o amor deve sig­nificar algo mais do que apenas sexo. Mas eu descobri que, para a maioria cios homens, amor quer dizer um bom jantar seguido de uma sessão na cama. Ninguém quer levar tempo construindo uma relação, especialmente quando existem tan­tas mulheres que não querem um relacionamento mais sério. Portanto, desisti de sair para programas com finais desagra­dáveis e trouxe Norman para morar comigo.

Cabe franziu o cenho.

— Norman?

— Norman, meu iguana — explicou a secretária, orgulhosa. O chefe empalideceu, olhando-a horrorizado.

— Seu o quê?

— Meu iguana. É um bom animal de estimação — explicou Elisa, na defensiva. — Eu o comprei quando era apenas um bebê.

— Um iguana! — Cabe olhou em volta do escritório como se esperasse que a secretária tivesse trazido.o animal para o escritório dentro da bolsa. — Meu Deus, ninguém tem um igua­na como animal de estimação! É uma cobra com pernas, pelo amor de Deus!

— Não é! Na verdade, ele parece um pequeno dragão chi­nês. É descendente dos dinossauros da antiguidade. É quieto, limpo e o senhor devia ver o efeito que ele tem nos vendedo­res! Norman mede noventa centímetros, apesar de ainda ser criança — murmurou Elisa, sorrindo.

Nunca discutia coisas pessoais com o chefe e provavelmen­te ele nem soubesse que era prima de Jenny, que a avisara do emprego havia dois anos.

— Por que tem um réptil como animal de estimação? Está tentando criar seu próprio príncipe?

Elisa suspirou, aborrecida.

— Isso só funciona com sapos. Tenho Norman como ani­mal de estimação, não o beijo. — Franziu o cenho. — Apesar de tê-lo beijado quando ele era pequenino…

— Meu Deus! — Cabe olhou-a admirado. — Por isso é que não sai com rapazes! Nenhum homem sai com uma mulher que anda por aí beijando iguanas!

— Não há perigo disso — suspirou Elisa, lembrando-se do dia de Natal, em que seu chefe quase a beijara, mudando de idéia momentos depois.

Levantando-se e andando em volta da própria mesa, Cabe acabou por sentar-se de novo em sua cadeira.

— Agora eu entendo. Uma noite haverá um homem no seu apartamento e você chamará a televisão e a imprensa para ex­plicar como ele apareceu. Primeiro, escolheu seu iguana e o beijou, e de repente, puf! Aparece o príncipe encantado! — Franziu o cenho. — Ou será que conseguirá um rei com algo tão grande quanto um iguana.

— O senhor será o primeiro a saber quando isso acontecer — prometeu Elisa.

O chefe acendeu um cigarro, divertido com a reação impas­sível da funcionária.

— Você me comprou este cinzeiro de Natal. — Acho que sim.

— Tentei parar de fumar.

— Não chamo sair à noite para comprar cigarros tentar pa­rar de fumar — comentou Elisa, empurrando a correspondên­cia para perto do chefe, indicando que havia muito trabalho a fazer.

Cabe sorriu, indulgente.

— Sei que estou enrolando. Já lhe disse o quanto odeio res­ponder a cartas? Ainda estou tentando me recobrar de ontem à noite. Karol quis ir a um concerto. Ficamos sentados du­rante quatro horas ouvindo música de câmara. Odeio quarte­tos de cordas. Preferia ter ido a um show de música country, mas ela não considera violinos cultura.

Elisa deu uma risadinha.

— Do que está rindo? Claro que você sabe que os violinos são parte do folclore americano, e isso é cultura!

— Para o senhor, chili é cultura! — Elisa lembrou-o.

— Claro que é. É a única comida americana da qual gosto. Por que, em nome de Deus, abotoa as blusas até o queixo? Tem medo que eu enlouqueça só em ver um pouco do seu pes­coço nu? E nunca mais soltou o cabelo desde o Natal.

Os olhos da secretária se arregalaram. Era a coisa mais pes­soal que o chefe já lhe dissera e ela estava chocada.

— É blusa de gola alta — gaguejou.

.— Não gostei dela. Não dá para você comprar alguma coi­sa que tenha decote em "V"? E também podia comprar um vestido acinturado.

— Por que esta fixação pelo que eu visto? — explodiu ela, já sem paciência. — Meu cabelo está errado, não gosta das minhas roupas, não sei abotoá-las!

— Não sei — respondeu Cabe, deixando o olhar passear pelo que dava para ver das pernas bem torneadas de sua se­cretária, com visível interesse. — Talvez meu pai tenha razão e eu não deva ter uma secretária que se veste como velha.

Elisa olhou-o, estupefata.

— Sr. Ritter, o senhor está bem?

Cabe suspirou.

— Estou frustrado — respondeu ele, apagando o cigarro.

— Tente passar quatro meses sem mulher e veja o que acontece. Elisa sentiu o rosto pegar fogo, mas não se deu por achada.

— Passei vinte e três anos sem mulher e estou muito bem, obrigada.

— Você entendeu o que eu quis dizer —; disse Cabe, bravo. Infelizmente, Elisa entendia bem. Ele era o homem mais franco que já conhecera. Dizia tudo o que pensava, não im­portava o quão chocante pudesse ser. Franzindo os olhos, Cabe prescrutou o rosto da secretária.

— Você nunca fala da sua vida amorosa.

— Acho que posso inventar algo, se o senhor ficar contente.

— Foi o que pensei.

Seu chefe a olhava de modo estranho. Parecia observá-la mais nesses últimos dias, fazendo-a sentir-se como um inseto ou um animal raro.

— Passar muitas noites sozinha pode tornar uma mulher vulnerável, sabe? — dizia o chefe. — Especialmente uma mu­lher do tipo reprimido.

— Está tentando me dizer alguma coisa? — finalmente Elisa indagou, curiosa.

— Estou preocupado com você — declarou Cabe, surpreendendo-a. — Ben Meadows, o novo gerente de ven­das, me disse que está tentando sair com você há semanas, mas que você o manteve a distância. — E, sorrindo de modo pro­vocante, olhou-a com atenção. — Ben acha que você não sai com ele por ter uma queda por mim. Na verdade, meu pai tam­bém acha isso.

Elisa não pôde evitar de ficar vermelha. Seu coração amea­çava saltar pela boca!

— Meu Deus!

— Não precisa fazer parecer como se isso fosse uma per­versão — disse o chefe, calmo. — As mulheres costumam me achar atraente.

— Um tipo de mulheres, com certeza. Não eu!

Cabe ficou parado, fazendo-a imaginar se tinha ido longe demais dessa vez. Ele parecia imóvel, mas os olhos estavam franzidos e frios.

— Por que não você?

— É pessoal.

— E daí que é pessoal? Quero uma resposta.

Elisa suspirou fundo. Não podia mentir para ele, mesmo que fosse melhor mentir.

— Porque o senhor é um mulherengo, sr. Ritter. — E, bai­xando o olhar, continuou: — Sinto muito, mas não considero esse tipo de homem muito atraente.

O chefe deu uma longa baforada no cigarro, deixando es­capar uma nuvem de fumaça, os olhos mais frios que nunca.

— Acho que pedi por isto. Não percebi que tipo de respos­ta eu poderia ter. — E, sentando-se ereto na cadeira, inclinou-se para a frente. — Muito bem, Liz, você me convenceu que meu pai não sabe o que está falando. Vamos responder à corres­pondência.

Sentindo-se culpada por mentir, Elisa não tinha como reti­rar o que dissera. Mas aprendera na primeira semana de tra­balho com Cabe o quanto ele respeitava uma pessoa de opinião forte, Sentia que havia ferido o amor-próprio do chefe. Cabe a tratava com indiferença, o que a magoava.

Perguntava-se por que ele era tão promíscuo. Em dois anos percebera qual o tipo de mulher que Cabe apreciava. Mas não conhecia seus sentimentos ou idéias. Sabia que sua mãe mor­rera havia dez anos e que o pai se casara novamente com uma mulher de nome Cynthia. Elisa sabia que Cabe passava algum tempo com eles, embora nunca tivesse feito comentário a respeito.

Cabe começou a ditar, andando de um lado para outro co­mo de costume, e Elisa teve de esforçar-se para acompanhar seu ritmo.

No resto do dia seu chefe se manteve mais calado do que o normal. Atendera às ligações que ela passara, tivera as reu­niões de costume,,mas não pedira café e nem lhe dirigira mais a palavra.

No fim do expediente, saiu, apenas meneando a cabeça.

Elisa viu-o ir embora, confusa. Talvez não devesse ter dito nada. Tinha complicado as coisas.

Cobrindo a máquina de escrever e o microcomputador, pe­gou sua bolsa, o casaco e dirigiu-se à fila do ônibus. Viu que sua condução chegava, mas seus pensamentos estavam longe, com seu chefe. Um dia desses beijarei meu iguana, dizia a si mesma, e ele se transformará num homem tão bonito quanto Robert Redford e aí o senhor vai se arrepender, sr. Ritter! Ele vai me comprar casacos de mink e brilhantes e moraremos num lugar luxuoso.

Só percebeu que estava falando alto quando viu a expres­são da mulher a seu lado.

— Sou escritora — improvisou. — É um ótimo enredo, o príncipe iguana e…

— É? A parte sobre Robert Redford foi ótima — disse a mulher mais velha, que a observava. — Mas ninguém beija­ria um iguana!

Elisa apenas sorriu.

 

Norman estava em cima do aquecedor, como de costume, quando Elisa chegou em casa. O animal abriu os olhos e os fechou, o longo corpo verde-esmeralda esticado.

— Você parece tão entusiasmado, Norman — suspirou Elisa fazendo uma pausa para acariciá-lo.

O iguana parecia feroz, pensou, lembrando-se da expres­são horrorizada do sr. Ritter quando ela mencionara que pos­suía um iguana. Mas era só aparência, no caso de Norman. Elisa cuidara dele desde quando era um filhote e não o acha­va nem um pouco amedrontador. Era difícil ter medo de uma criatura que gostava de quiche de espinafre e respondia a as­sobios.

Esquentando um quiche de espinafre para Norman, Elisa pôs uma sonata de Beethoven na vitrola. Adorava música eru­dita. Isto sim, era cultura.

Ao servir o quiche numa vasilha, Norman preguiçosamen­te saiu de cima do aquecedor para degustar sua refeição. Nor­man não era muito regular quanto às refeições. Alimentava-se a cada dois ou três dias, mas, mesmo assim, estava bastante saudável. Sua cauda enorme é que lhe dava pesadelos. Era lon­ga e Elisa morria de medo de pisar nela, pois sabia que era o orgulho do réptil.

Passou a noite toda pensando em Cabe Ritter e em seu es­tranho comportamento. Primeiro, seu chefe quisera que ela se vestisse de forma mais feminina, depois a acusara de ser apaixonada por ele e depois parecera enfurecido com a nega­tiva da secretária. Cabe era mesmo o homem mais intrigante que já conhecera.

Por fim, Elisa deitou-se, deixando Norman sobre o aquecedor. As noites ainda eram frias e o calor do aparelho o atraía. Norman era tão previsível! Sempre podia achá-lo sobre o aquecedor ou em cima do jornal no banheiro, onde já estava acos­tumado a fazer as necessidades. Ainda bem que o sr. Ritter nunca a tinha visitado em casa, pensou, ao se deitar. Norman o faria desmaiar.

Fechou os olhos com determinação, mas continuava a ver seu chefe, o rosto largo e enigmático a sua frente. Negara es­tar atraída por ele e ainda bem que aprendera a esconder o fato. Se confessasse que tinha uma queda por ele naquela ho­ra, quando Cabe fizera a acusação, estaria perdida e procu­rando outro emprego.

Claro que nunca teria chance com um homem como Cabe, suspirou Elisa, virando-se na cama. Cabe era maluco por mu­lheres. Elisa nem seria notada. Só queria saber por que o che­fe ficara tão irritado quando ela dissera que era mulherengo. Claro que não queria que Elisa tivesse uma queda por ele! Claro que não. Elisa gemeu e rolou, de um lado a outro da cama, sem sossego. Precisava tentar dormir um pouco.

Na manhã seguinte, sentia como se não tivesse pregado o olho por uma hora sequer. Seu corpo doía, reclamando as horas de descanso. Elisa foi trabalhar meio tonta e sonolenta, colo­cando apressada um vestido acinturado e decotado, sem o no­tar. Por falta de tempo, também não prendera o cabelo no coque habitual. .

O sr. Ritter normalmente chegava meia hora depois da se­cretária, todos os dias. Hoje, era óbvio, chegara antes. Res­mungando mentalmente enquanto tentava entrar pé ante pé no escritório, Elisa preparou-se para um sermão. O sr. Rit­ter, contudo, nada disse, limitando-se a olhá-la feio e a apontar-lhe o relógio, indicando que sabia muito bem que ela se atra­sara em dez minutos. Estava ao telefone, falando eom um cliente.

Elisa murmurou uma desculpa, apressando-se em tirar o ca­saco pesado para começar logo suas atividades.

— Não tire — foi a voz do chefe se dirigindo a ela, cobrin­do o bocal do telefone. — Pegue caneta e um bloco; nós va­mos até uma plataforma pegar alguns dados sobre um novo equipamento que eu fiz para Harry Deal.

Elisa quase rangeu os dentes. Harry Deal era um velho que odiava mulheres e que não escondia o fato. Fazia-a sentir-se como isca para peixes e seu chefe sabia como ela se sentia. E devia ser por causa disso que queria que Elisa fosse junto, pensou ela, sentindo-se péssima. Vai ver Cabe queria se vin­gar por tudo que ela dissera no dia anterior sobre não querer nada com um mulherengo.

— Não hoje — ela suspirou baixinho para si mesma, pon­do o casaco e pegando as outras coisas. — Não estou disposta a agüentar Harry Deal hoje.

— Pare de resmungar — ordenou o chefe, abrindo a porta do escritório; os olhos frios examinavam a aparência da se­cretária. Mas foi só chegar até a curva dos seios fartos para que o olhar frio se derretesse. O braço que segurava a porta agora se estendia até o batente, claramente impedindo a pas­sagem de Elisa.

Ela olhou-o sem entender, apreensiva. De perto, o chefe era ainda mais devastador. O casaco bege caía-lhe muito bem, nem largo, nem apertado demais. Na medida. O olhar de Elisa foi baixando para o peito musculoso, as pernas firmes de atleta. Podia sentir o calor daquele corpo, fazendo-a ter vontade de abraçá-lo.

— Isto tudo é por minha causa? — indagou Cabe, a voz baixa e perigosamente mansa.

O coração de Elisa estava aos pulos e seus olhos cinzentos se encontraram com o par de olhos azuis bem claros.

— Claro que não — gaguejou. — Eu..; estava atrasada e não tive tempo de prender o cabelo. Pensava em prendê-lo ao chegar aqui, no escritório, mas nós vamos sair e…

— Não estou falando do cabelo — replicou Cabe, a voz bas­tante controlada, deliberadamente acariciando com o braço o ombro de Elisa, fazendo-a sentir-lhe o hálito de perto. — Cuidado — murmurou em tom suave. — Você mesma disse que eu era mulherengo. Usar algo assim tão sexy pode me dar idéias.

O olhar chocado de Elisa prendeu-se no dele, audacioso e provocante. Era como se uma eletricidade passasse entre eles, por um longo momento.

— Não… foi essa minha intenção.

— Não foi? — Cabe tirou o braço, ficando de lado para que ela passasse.

Com as pernas fracas, Elisa mal soube como conseguira pas­sar por ele naquele momento crucial. Seu rosto ardia em cha­mas ao perceber como era vulnerável àquele homem. E ele nem estava tentando nada. Imagine só como reagiria se Cabe esti­vesse lhe passando uma cantada…

Houve um silêncio pesado entre eles durante o percurso todo.

Aquele 'era um poço que estava sendo sondado pela primei­ra vez. Harry ainda não descobrira petróleo, mas Elisa apos­tava como descobriria. Harry tinha muita sorte e competência.

— Meu pai tem uma porcentagem nesta exploração — Ca­be acabou por dizer após alguns minutos, olhando de soslaio para Elisa. — Relaxe, pelo amor de Deus. Não vou pular em cima de você!

Ao ouvir aquilo, Elisa mordeu p lábio com força, machucando-o.

— Aprecio isso — ela falou, com uma pontada de sarcasmo. Dando uma baforada no cigarro, Cabe continuou:

— Está tudo bem, Liz. Não tenho o direito de lhe dizer co­mo deve se vestir, apesar de acreditar que você se vestiu deste modo hoje por causa dos insultos que eu lhe dirigi ontem. — Cabe parecia pouco à vontade. — É culpa de meu pai, droga! Eu nem notava suas roupas antes de ele meter o nariz. — Na verdade, Cabe não notara a existência da secretária antes. Nos últimos dias, passara a observá-la com freqüência. Como ago­ra. Desviou o olhar do vestido, percebendo mais uma vez co­mo Elisa estava sexy com ele. — Esse vestido… favorece bastante você.

Sabendo que seu rosto estava em chamas, Elisa sentiu-se co­mo um espécime sendo analisado.

— O senhor disse que seu pai tem interesse nas explorações do sr. Deal?

Cabe apagou o cigarro.

— Uma pequena porcentagem — respondeu, aliviado por sentir que a tensão entre eles diminuía. Vê-la naquele vestido não estava sendo nada bom para seu autocontrole e esperava que Elisa não percebesse a atração que começava a sentir por ela. — Eugène gosta de meter o dedo em tudo ó que encontra.

— Pensei que o mercado de petróleo fosse um mau investi­mento agora.

— O mercado está baixo, mas subirá de novo. Flutua co­mo o mercado do ouro. Mas, enquanto for uma necessidade, os preços poderão subir. Eugene e Harry são espertos o sufi­ciente para diversificarem suas operações. Vão sedar bem.

— Há algum problema com o equipamento que fizemos pa­ra o sr. Deal?

— Ele acha que sim. Eu acho que não. — Cabe dirigiu-lhe um sorriso. — Sei quem está operando a máquina para Harry. É um velho que não aceita inovações. Provavelmente pôs a peça do lado errado ou algo assim.

O que havia sido exatamente o caso. Mais tarde, observan­do Cabe lidar com uma peça cheia de graxa do equipamento pesado, Elisa viu o homem mais velho ficar rubro quando o motor começou a funcionar com precisão.

A plataforma era operada por homens fortes e musculosos que pareciam achá-la uma atração fora do comum. Havia mu­lheres que trabalhavam naquele ramo, mas não na platafor­ma de Harry. Ela sentiu-se pouco à vontade.

Segurava o casaco do chefe enquanto ele lidava com as pe­ças. Agora, Cabe limpava as mãos num lenço que nunca mais seria branco de novo e dirigiu um eloqüente olhar a Harry.

— Está tudo certo — disse Harry, olhando para o empre­gado mais velho. — Sam, depois você me explica o que houve.

— Sim senhor — e foi embora, envergonhado.

— Como vai seu pai? — indagou Harry.

-— Ganhando dinheiro. Ele espera que você ganhe o sufi­ciente para poder comprar um Rolls novo.

— Estou fazendo o melhor possível. — E, dizendo isto, virou-se para Elisa: — Vejo que ainda está com a mesma se­cretária. Ainda não se casou, srta. Marist?

Elisa abraçou com força o casaco do chefe contra o corpo.

— Achei um candidato, sr. Deal — respondeu, com doçu­ra. — Mas não sabia trocar pneu e falar ao mesmo tempo, então desisti dele.

Harry sorriu, sem jeito.

— A senhorita não sabe trocar pneus?

— Hoje em dia, sou obrigada a saber. A maioria dos ho­mens é tão preguiçosa que eles não querem se ocupar em fa­zer essas coisas difíceis.

Cabe previu desastre. Pegando Elisa pelo braço, levou-a para longe.

— Me avise se tiver maiores problemas. Precisamos voltar ao trabalho.

— Obrigado, Cabe — respondeu Harry, virando-se de costas.

— Velho dinossauro arrogante — murmurou Elisa, cons­ciente do braço másculo apertando o seu.

— Você exagerou na dose, querida — disse Cabe. — Entre no carro e fique quieta até irmos embora. — E, dirigindo-lhe um olhar surpreso: — Você nunca respondeu a Harry antes.

— Talvez eu estivesse sob o efeito do óleo e da graxa — Elisa respondeu em tom doce. Sentia-se livre, agora que puse­ra o velho em seu devido lugar. Talvez por trabalhar para o sr. Ritter tivesse ganho um pouco de autoconfiança. Precisa­va se defender dele e lhe parecia automático ter de se defen­der dos outros.

Cabe ria baixinho ao entrar no Lincoln. Ainda tentava ti­rar a graxa das mãos,

— Malditos exploradores de petróleo. Harry tem de des­pedir aquele filho da…

— Sr. Ritter! — exclamou Elisa, alarmada.

— Desculpe, srta. Pureza. Você já devia estar acostumada ao meu linguajar.

— Eu devia — concordou Elisa, fechando os olhos è se aco­modando no banco macio do carro. — Quando acho que já ouvi tudo, o senhor inventa coisas novas.

— Invento? — Cabe riu, baixinho. — Você é uma gatinha selvagem quando provocada, não? Mas não era assim no iní­cio -— comentou ele, num tom que nunca usara com a secre­tária. — Você não tinha esse fogo. Levou alguns anos para liberar sua agressividade, e hoje em dia não fica sem respon­der a nada, não? — E, dizendo isso, olhou intrigado para Eli­sa, passando os dedos pelos lábios finos e delicados dela, observando-lhe a reação.

A sensação daquela atitude deliberada causou um choque em Elisa. Seu corpo ficou tenso e quente ao mesmo tempo e podia-se ouvir sua respiração irregular.

A reação da secretária era uma delícia, pensava Cabe. Ele esquecera de como uma mulher podia ser sensível ao seu to­que. Elisa era inocente, muito diferente das mulheres expe­rientes e sofisticadas com as quais se relacionava. Podia perceber que toda aquela sensualidade era algo novo para ela. Seus dedos se moviam pressionando os lábios femininos de leve, fazendo com que Elisa sentisse o cheiro de tabaco e da loção de barba, misturados com cheiro de graxa da platafor­ma de petróleo. Cabe percebia o próprio corpo se retesando ao notar a extensão do prazer que Elisa experimentava. Seus olhos azuis se aproximaram dos dela, fazendo com que Elisa ficasse tensa.

— Você sabia que sua boca era assim tão sensível, moci­nha? — perguntou Cabe, a voz rouca, perscrutando os olhos cinzento. —Que seus lábios podiam excitá-la tanto quando um homem brincasse com eles?

Elisa engoliu em seco, nervosíssima, o corpo todo tomado por sensações novas.

— Os… homens… da plataforma… — sussurrou, preocu­pada que eles vissem o que estava acontecendo no interior do Lincoln.

— Os vidros das janelas são espelhados — ele lembrou-a, enquanto os dedos másculos continuavam a exploração.

A sanidade e a razão de Elisa pareciam desvanecer-se, en­quanto Cabe observava, deliciado, as reações da sua inexpe­riente secretária ao seu toque.

— Sr. Ritter! — murmurou ela, sentindo-se perdida num mundo de sensações novas e diferentes, mas temerosa.

— Você já foi beijada de modo apropriado? — sussurrou Cabe, cada vez mais encantado com o que via. — Com seus lábios abertos junto à boca de um homem? Seria tão fácil. Eu poderia abaixar minha cabeça um centímetro, assim. — E, di­zendo isto, puxou-a delicadamente pelo queixo —, e poderia beijá-la assim. Poderia abrir seus lábios com os meus e apertá-la contra meu corpo tão forte que você ouviria as batidas enlou­quecidas do meu coração…

Elisa começou a entrar em pânico, enquanto imaginava as coisas que o chefe dizia se tornando realidade, e, num último lampejo de razão, empurrou-o com toda força.

— Não! Sr. Ritter! Não deve fazer isso… — ela implorou — eu trabalho para o senhor!

— Trabalha para mim — a voz masculina ecoou e Cabe olhou-a como se a visse pela primeira vez. Sentia o corpo doendo de desejo, sentia necessidade de aplacar aquele desejo. "Tra­balho para o senhor." As palavras se repetiam em sua mente, implacáveis, e via Elisa, os olhos arregalados, à sua frente. Elisa!

— Meu Deus, que estou fazendo?!— perguntou a si mes­mo, incrédulo, afastando-se da secretária abruptamente e acen­dendo um cigarro. — Desculpe, Liz — disse em tom seco, sentindo-se culpado; afinal, ela era apenas uma criança. — Não acontecerá de novo.

E, ligando o carro, se afastaram da plataforma de ex­ploração.

Elisa tirou os olhos das feições perturbadas do chefe. Não conseguiria acreditar em tudo o que acabara de acontecer se não fosse pelos lábios machucados pelo toque de Cabe. Era por isso que as mulheres caíam aos pés dele. Cabe mal a toca­ra, fazendo-a sentir as pernas bambas e a respiração entrecortada. Ainda podia sentir o hálito quente e as coisas deliciosas e chocantes que ele dissera. Quase gemera em protesto quan­do Cabe se afastara. Queria ter sentido os lábios másculos so­bre os seus, o calor dos braços fortes envolvendo-a, o peito forte e musculoso contra seus seios. Pôs os próprios braços em volta de si, como que para proteger-se dos pensamentos. Que havia de errado com seu chefe? . Permaneceu calado durante o trajeto de volta, deixando o som do rádio entre eles. Mas todo tempo Elisa ficava se per­guntando se Cabe não teria agido de propósito, para mostrar-lhe o quão vulnerável ela era.

Talvez fosse uma vingança por ter sido chamado de mulhe­rengo no dia anterior. Talvez ele quisesse mostrar quanto Eli­sa era vulnerável às técnicas de um mulherengo. Quando entraram na garagem do prédio onde ficava o escritório, Eli­sa começou a sentir-se mal, certa de que tudo não passava de uma manobra para humilhá-la.

No instante em que estacionaram o carro, Elisa tentou abrir a porta, mas sentiu o braço forte do chefe segurando o seu.

— Ainda não — disse Cabe, baixinho, os olhos mergulhados nos dela, culpados. — Eu a magoei.

— E eu o chamei de mulherengo — Elisa lembrou-o, bai­xando o olhar para o peito forte e musculoso. — Foi por is­so…? Para me dar uma lição?

— Não, não foi. Eu é que aprendi a lição, querida — re­trucou Cabe, suspirando. — Estou acostumado com mulhe­res sofisticadas e experientes que aceitam tudo o que um homem faz. Nunca tive nenhuma experiência com mulheres tímidas, virgens inocentes que fazem tudo parecer novo e excitante.

— E, vendo o rubor nas faces da secretária, sorriu. — Só para eu saber, srta. Marist, já beijou alguma vez de boca aberta?

Elisa sentiu, as faces ficarem vermelhas como tomates.

— Não é da sua conta!

— Em outras palavras, nunca beijou — riu ele, baixinho. — Tudo bem, menina, então aprenda.

— Não preciso de professor! —gritou Elisa, tentando sair do carro.

— Ah, mas vai precisar, sim — replicou Cabe, em tom sua­ve, o braço segurando-a para impedi-la de sair dali. — Não sabe o que eu daria para ser seu professor — acrescentou com os olhos cheios de malícia e de promessas. — Mas seria desas­troso para nós dois. Sou muito experiente e você é pura de­mais. O máximo que eu podia oferecer-lhe são algumas boas horas numa cama e eu não a insultaria com este tipo de pro­posta. Você precisa de um.bom e estável homem que cuide bem de você e lhe dê filhos. Isso requer um tipo de segurança que eu não posso dar a uma mulher. Não quero ser vulnerá­vel, Liz.

— Ninguém está pedindo que seja! — ela replicou, furiosa.

— Você é vulnerável? — indagou Cabe. — Meu pai tinha razão? Você não tem uma queda por mim?

— Não!

Nos olhos azul-claros havia um brilho de autoconfiança.

— Então, por que não tentou me deter e nem brigou comi­go? — perguntou num tom suave.

Elisa saiu do carro e entrou no prédio tão depressa que mal podia respirar ao alcançar o escritório. A primeira coisa que planejava fazer era datilografar seu pedido de demissão. Mas, ao abrir a porta, deu de cara com Eugene Ritter, sentado nu­ma cadeira, impaciente e parecendo muito bravo.

— Que fez com meu filho? — inquiriu ele, desconfiado. Elisa parou de súbito, os cabelos revoltos pela corrida e os lábios ainda vermelhos.

— Pensando bem — continuou o velho, olhando-a demoradamente, — o que meu filho fez com você?

Cabe entrou no escritório em seguida, parecendo tão arro­gante que Elisa sentiu vontade de atirar-lhe a máquina de es­crever.

— Olá, papai — disse Cabe de modo casual. — Precisa de algo?

Eugene olhava fixamente o filho, procurando traços de ba­tom, mas nada achando. Cabe olhava o pai divertido.

— Nada de mais. Queria saber se você aparecerá na nossa festa de aniversário amanhã. Nicky está esperando que você vá.

Nicky? Elisa já tinha ouvido o nome umas duas vezes. Se­ria nome de homem ou de mulher? Talvez de mulher, pen­sou, triste.

— Estarei ocupado amanhã à noite — Cabe apressou-se em dizer. — Vou levar Karol ao balé.

— Então essa mulher vulgar é mais importante para você do que eu, declarou, zangado. — E Cynthia? Ela vai ter de sofrer pelo resto da vida porque eu tive a audácia de me casar de novo?

Cabe virou-se para o pai, com um brilho perigoso no olhar.

— Ela nunca será minha mãe e Nicky nunca será parte da minha família! Eu amava minha mãe! Você nem esperou que ela estivesse enterrada para levar Cynthia até o altar!

— É mentira e você sabe disso — Eugene retrucou em tom calmo. — Cynthia trabalhou para mim enquanto sua mãe es­tava viva, mas foi só depois que ela morreu que nos apaixo­namos. Nicky foi uma deliciosa surpresa, não um acidente, e eu não you me desculpar por ele existir! Meu Deus, ele não está tirando nada de você! Nicky não herdará nada, exceto uma parte das minhas propriedades. Cynthia e eu concorda­mos sobre isso desde o início. Ela tem dinheiro suficiente pa­ra criar o filho, caso você tenha esquecido.

— Não me esqueci de nada — Cabe respondeu em tom frio.

Eugene ia começar a falar, mas deu de ombros, desistindo.

— Você não morreria se passasse uma noite conosco, mes­mo assim. Nicky fica magoado por você ignorá-lo.

— Não lhe devo nada!

Enquanto Eugene saía do escritório, Cabe socou a mesa de Elisa com o punho cerrado, com toda a força, assustando-a.

— Tudo bem! — gritou ele, raivoso. — Maldição, eu irei ao aniversário.

Já perto do elevador, Eugene sorriu.

— Este é o meu menino. A propósito, porque não deixa a loira oxigenada em casa e traz essa aqui com você? — per­guntou ele, referindo-se a Elisa. — Ela tem um iguana. Nicky iria adorá-la.

Elisa quase desmaiou.

— Como sabe sobre Norman?

Eugene sorriu.

— Pergunte a Jenny. Sua secretária parecia bastante alte­rada quando entrou aqui. Pensei que talvez vocês…

— Acabamos de chegar dos campos de petróleo de Harry Deal — disse Cabe, com um brilho malicioso no olhar. — Elisa e Harry trocaram palavras ásperas.

— Espero que ela tenha levado a melhor. Harry é bastante irritante — Eugene deu um suspiro desapontado. — Bem, até amanhã à noite — murmurou. — Loira oxigenada, só Deus sabe quantos homens já…

— Vá embora! — exclamou, por fim.

Eugene não era bobo e sabia quando era hora de parar. Ace­nando para Elisa, foi embora.

Elisa estava tentando ligar o computador, coisa que fazia todos os dias, mas sem sucesso naquele momento. Estava muito embaraçada. Tinha sido uma manhã muito movimentada.

Sentiu o cheiro de cigarro. Era o chefe, que se aproximara dela. Fumava e a olhava com franca admiração masculina.

— Não tenho uma queda pelo senhor — disse Elisa, ten­tando parecer calma.

Dando uma longa baforada, Cabe olhava-a com atenção.

— Sou treze anos mais velho que você. De um ponto de vista prático, você nem tem como me comparar com outros. Sua vida é uma página em branco. Sei que sou a última complicação de que você precisa na sua vida, menina. Portanto, chega de aproximações como a que tivemos. Vamos trabalhar.

E, dizendo isto, entrou em sua sala com o costumeiro pas­so firme. Elisa devia sentir-se aliviada. Mas não estava. Era como o fim de algo que nem começara. Frustrante.

Ligando por fim o computador, sentia o coração aos pulos.

Mas, afinal, se Cabe não queria complicações, por que a tocara daquele modo, no carro? Por que dissera todas aque­las coisas? Franziu as sobrancelhas. Cabe não podia resistir a uma brincadeira. Mas não ia deixar as coisas assim. De agora em diante, estaria imune ao chefe. Ou pelo menos, faria com que ele pensasse assim.

Perguntava-se quem era Nicky. Devia ser um parente, e por que havia de gostar dela só porque tinha um iguana? Suspi­rou. A vida toda parecia ser uma grande pergunta, ulti­mamente.

Ligou o editor de textos e se pôs a datilografar as cartas que Cabe ditara.

 

Elisa suspirava ante a atitude distante que o chefe tomou durante os dias que se seguiram. Não conversava mais do que o estritamente necessário, somente dirigindo-lhe. a palavra quando era assunto de trabalho. Nem a tratava mais como se ela fosse sua irmã mais nova. Elisa sentia-se como uma peça do mobiliário do escritório e Cabe dificilmente lhe dirigia o olhar. Voltara a vestir-se do modo habitual, mas provavelmente o chefe nem notaria se ela fosse trabalhar nua, tal era sua in­diferença. Cabe dissera que não iria complicar o relacionamen­to deles, e, com efeito, estava mantendo a palavra!

Nunca Elisa se sentira tão sozinha, nem quando se mudara para morar com a prima Jenny havia dois anos. Queria ser independente, viver a própria vida e seus pais tinham aceita­do aquela necessidade. Mas agora sentia falta da família e sentia falta de Jenny, que era uma boa ouvinte. A prima, porém, ainda estava viajando a trabalho. Gostaria de ter perguntado a Eugene se tinha notícias de Jenny, mas a ocasião não pare­cera das mais propícias.

Elisa precisava ter alguém para conversar, pois só agora per­cebera o quanto Cabe crescera em importância em sua vida. Quer dizer, o quanto ela própria deixara que isso aconteces­se. Ia com entusiasmo para o trabalho porque o sorriso do chefe a fazia vibrar, sua masculinidade a excitava, seu humor a fazia rir. Só estar perto dele já o fazia sentir-se mais viva do que nunca.

Tinha sonhos eróticos com Cabe desde a manhã em que ele a acariciara nos lábios. Mas aquela manhã podia nem ter acon­tecido, pois Cabe estava determinado a ser apenas profissio­nal durante o trabalho. E Karol andava muito em evidência nesses últimos dias. Cabe falava nela a toda hora, como se quisesse impedir que Elisa alimentasse idéias românticas a seu respeito.

Terminando de digitar as cartas, Elisa as pôs de lado; os dedos finos ainda descansavam sobre o teclado do micro. Tal­vez Cabe quisesse mandá-la embora. O pensamento a fez sentir-se profundamente infeliz. Estava acostumada com o humor do chefe e com seu temperamento e não gostava da idéia de trabalhar para outra pessoa. Mas, se era isso o que ele queria…

Cabe apareceu quando Elisa fazia planos para o futuro, fazendo-a pular de susto ao ouvi-lo.

— Nervosa? — ele perguntou. — Algo errado? Elisa entregou-lhe as cartas impressas no fino papel timbrado da empresa.

— Pelo amor de Deus! — explodiu Cabe. — Agora chega! O que está errado?

— Quer que eu me demita? — Elisa perguntou, decidida.

— Você quer se demitir?

Ela baixou os olhos para a camisa branca e bem passada do chefe.

— É um bom emprego — começou ela. — Mas se prefere me mandar embora, eu irei.

— Não sei o que prefiro — foi a resposta lacônica. Tenta­ra não prestar atenção na secretária, tentara ser frio, mas aquilo se voltara contra ele. Ele a magoara de novo e sentia-se terrí­vel com a vulnerabilidade dela. Por que não conseguia esque­cer a expressão de Elisa quando quase a beijara? Por que não conseguia achar consolo na companhia de Karol?

Com um longo suspiro, Cabe pegou uma das mãos de Eli­sa, levando-a até seu próprio peito. Embaixo do fino tecido da camisa, ela podia sentir os músculos rijos e o calor daque­le corpo. Cabe estava em silêncio enquanto Elisa pressionava os dedos contra o peito forte, fazendo com que ele precisasse se esforçar muito para não fazer com ela tudo o que tinha vontade.

Elisa sentia-se derreter por dentro. Sentia o calor que ema­nava de Cabe, podia perceber os pêlos finos cobrindo o peito másculo. Nunca o vira despido, mas, nesse momento, deseja­va ter visto. Imaginava como Cabe seria por baixo das rou­pas, e como seria senti-lo envolvendo-a com seus braços e beijando-a ardentemente, como fazia com todas as outras. Queria ouvi-lo sussurrar, como tinha feito aquele dia no campo de petróleo de Harry Deal.

De modo involuntário, Elisa deixou escapar um suspiro. Não conseguia mais respirar direito é agora sabia que sua mente também não funcionava mais como de costume. Só uma mu­lher louca se permitiria ficar tão curiosa assim com relação a um chefe mulherengo.

Os dedos experientes de Cabe acariciaram os de Elisa e ele pôde ouvi-la respirando com dificuldade, maravilhado por ver que a secretária estava dócil e quieta. Ficara lisonjeado quan­do Ben Meadows e seu pai haviam sugerido que a secretária tinha uma queda por ele, por isso quase a beijara no carro. Só que não contara com o efeito devastador que Elisa teria nele e nem com os comentários que ela fizera acerca de seu modo de vida. Sempre imaginara como Elisa reagiria se rece­besse uma cantada de seu chefe. Sentira-se tentado a fazer is­so nas últimas semanas, graças aos constantes comentários do pai, chamando sua atenção para a funcionária. Elisa era bo­nita e estava começando a perturbá-lo fisicamente, Tentara ignorá-la, mas estava ficando impossível não reparar nela.

— Seus dedos estão gelados — comentou Cabe, a voz rou­ca, por sentir o perfume de lavanda que emanava de Elisa, em contraste com os perfumes franceses das moças com quem costumava sair. Mulheres que corriam atrás dele e cuja agres­sividade o irritava. Não havia nada de agressivo em Elisa e ela era pura e inocente. Isso fazia com que Cabe começasse a nutrir algumas fantasias a seu respeito, sobre como iniciá-la nos mistérios da intimidade. Não podia esquecer-se da expres­são nos olhos cinzentos quando ele sussurrava o quanto que­ria beijá-la e ser seu professor…

— O escritório está frio — foi o comentário de Elisa.

— Vou aumentar a temperatura do ar-condicionado.

— Faça isso — respondeu Cabe, surpreso com a tonalida­de normal da voz de sua secretária. Mas, apesar do que disse­ra, não a largou. Uma das mãos foi desde o pescoço até o delicado queixo,levantando-lhe o rosto. Seus dedos passea­ram preguiçosamente por seu rosto até pararem nos lábios. Era exatamente o que havia feito no carro, provocando o mes­mo choque nos olhos cinzentos, enquanto um gemido escapava da boca feminina.

Cabe gostou daquele som. Gostou mais ainda da sensuali­dade chocada que via refletida nos olhos dela, muito mais forte do que no outro dia. A fascinação estampada na expressão de Elisa falava por si mesma. O toque de seus dedos tornou-se mais insistente e os lábios carnudos se abriram para ele. Com a outra mão, Cabe segurou-lhe a nuca firmemente.

— É aqui que a brincadeira acaba — disse, a voz rouca. — Quando minha boca cobrir a sua, não haverá volta.

— Não é justo — protestou fracamente Elisa, como que meio encantada com toda a cena. — É como pescar com um tubo de dinamite…

— Sim — Cabe concordou, a voz suave, começando a se aproximar mais e mais dela. — Vai ser assim que nos sentire­mos, querida, como dinamite sendo explodida. Gosto disso. Assim…

Elisa sentiu que a mão de Cabe segurava sua nuca de modo mais firme, fazendo seus joelhos tremerem. Podia respirar o hálito quente que emanava da boca tão próxima da sua.

Mas, quando sentiu o leve toque dos lábios de Cabe nos seus, ouviu a campainha insistente do telefone, desfazendo toda a magia do momento. Elisa tremia dos pés à cabeça, sem con­seguir se mover. Quem teve de atender ao telefone foi seu chefe.

— Ritter.

— Cabe, pode sair mais cedo hoje para ir a um jantar de caridade comigo? — perguntou a voz melodiosa de Karol. — É em benefício do Hospital Infantil.

— Hoje? — repetiu Cabe, de modo ausente. — Acho que sim. Eu apanho você às cinco horas.

— Que amor! Obrigada, querido. Até mais tarde. Karol desligou, mas Cabe não pôs o fone no gancho. Ain­da estava olhando para a expressão chocada de sua secretária.

O silêncio entre eles era tão explosivo agora quanto havia poucos segundos, mas nenhum dos dois conseguia proferir pa­lavra, e foi nesse instante que Ben Meadows entrou na sala, com um monte de papéis.

— Desculpe incomodá-la, mas preciso de algumas cópias xerox — disse ele, entregando a pilha nas mãos de Elisa.

— Pode… deixar comigo — ela respondeu, pegando os papéis e saindo correndo para a sala onde ficava a máquina de xerox.

Durante o resto do dia, Cabe não se aproximou de Elisa de novo. Ela não sabia se ficava feliz ou não com aquilo, mas o relacionamento deles havia mudado para sempre naqueles minutos cruciais.

Após o expediente, foi para seu apartamento solitário, de­sejando que sua prima estivesse lá. Mas a prima mais velha, uma loira estonteante, não voltaria tão cedo. Jenny passava a maior parte do tempo em expedições para lugares rústicos e Elisa sabia que às vezes eram lugares perigosos. Certa vez um homem a seguira até o apartamento, tentando conseguir informações preciosas sobre os metais que estavam sendo ex­plorados.

Mesmo agora, as cartas de Jenny era cheias de intrigas so­bre seu emprego e Elisa se preocupava com ela. Já invejara o trabalho da prima, mas, quanto mais ficava com Cabe, me­nos sentia atração pelo modo de vida de Jenny. Soem pensar em mudar de emprego já a entristecia. E Elisa se recusava a admitir por quê.

Ao abrir a porta, viu Jenny, como que em resposta aos seus pensamentos. Jenny estava mais linda do que nunca, bron­zeada e exuberante.

— Lisa! — exclamou ela, feliz, abraçando a prima. — Co­mo é bom estar em casa de novo!

— Você não devia estar aqui! — riu Elisa, toda feliz. — Puxa, mas fico contente por você estar! Você está linda!

E estava mesmo. O longo cabelo loiro caía em ondas sua­ves, e sua roupa branca contrastava com o dourado de sua pele. Elisa olhou a prima, desejando ser parecida com ela.

— Quanto tempo você pode ficar?— indagou, enquanto ia até a cozinha preparar o jantar.

— Só esta noite — foi a resposta, para desencanto de Eli­sa. — Desculpe, querida, mas estou a caminho de outro lu­gar. E não posso contar mais nada além disso. Não se preocupe. Só se preocupe com o lagarto aqui. Norman fica me olhando como se imaginasse qual é o meu sabor.

-- Ele não come carne. É vegetariano — explicou pela ené-sima vez Elisa, como vinha fazendo desde que trouxera o animal para casa havia dois anos.

Norman era ótima companhia, não era exigente, sempre fi­cava quieto em seu canto e era um excelente repelente para ladrões. Uma vez, um ladrão tentara entrar no apartamento e fugira, em pânico, após dar de cara com o réptil, quase atro­pelando Elisa no caminho. Norman ficara no corredor da sa­la, olhando tudo com sua expressão indiferente, a boca aberta e a cauda abanando ameaçadoramente para o intruso. Quan­do Norman fosse mais velho, sua cauda seria ainda mais amea­çadora e Elisa sentia orgulho dele. Só não ficara muito satisfeita quando um namorado seu fugira para sempre depois de ver seu animal de estimação.

— Que acontece se ele me morder e gostar? Lembra-se do Capitão Gancho e do crocodilo? — Jenny comentou.

— Norman nunca experimentou você. — Elisa sorriu. — E de qualquer modo, ele gosta de você!

— Gosta? — Jenny estava incrédula. — Como você pode saber? — perguntou, observando o lagarto.

— Posso ler a mente de Norman. Sei que você adora seu emprego, mas é mesmo necessário todo esse suspense?

Jenny riu, deliciada.

— É preciso, sim. Considero como um serviço patriótico para o meu país. Talvez até para o mundo, quem sabe? Ago­ra chega de falarmos de mim. Conte-me sobre você.

— Não há nada a contar. Não sou linda como você.

— Eu não sou linda. Só tento melhorar o máximo de mim que posso. Na verdade — disse Jenny, estudando a prima mais nova — você também pode ser linda. Pode ser muito atraen­te, se quiser. Por que tem esta compulsão em se disfarçar pa­recendo um móvel ou uma parede?

— Não estou imitando coisas inanimadas. Só estou me pre­servando, é só.

— Conhecendo seu apetitoso chefe, o sr. Ritter, posso en­tender. Ele derreteria um muro de tijolos. Mas ele não é o único homem na face da terra, Lisa. E você já tem quase vinte e qua­tro anos. Não se enterre naquele escritório passando a vida nutrindo uma paixonite pelo chefe bonitão.

Elisa arregalou os olhos.

— Não estou nutrindo uma paixonite por Cabe Ritter!

— Não está? — indagou Jenny, apanhando pão e maione­se da geladeira, fazendo uma pausa para pegar talheres e pra­tos antes de sentar-se. Seus olhos azuis eram bondosos e preocupados. — Você só fala nele, quando eu estou em casa. Não sai com nenhum homem há quase um ano.

— Não-quero ter de lutar com os homens — explicou Elisa.

— Não é isto. Você está apaixonada pelo sr. Ritter.

— Isto é ridículo! — Elisa riu, nervosa. — Pegue um pou­co de presunto.

As sobrancelhas da prima mais velha se arquearam ao ver que Elisa oferecia um prato com bolo em vez do presunto.

— Lisa, isto não é presunto.

— É minha vida aborrecida que me enlouquece — suspi­rou Elisa. — Talvez eu precise beijar Norman para ver se ele se transforma num príncipe — disse, estendendo o prato com presunto para a prima.

— Isso só acontece com sapos, não com iguanas — corrigiu-a Jenny. —Mas bem que um príncipe na sua vida não seria mau. Um príncipe alto, bonitão, que a tratasse como prince­sa. Você.ficaria bem numa bela casa e cercada de filhos.

— Nós sempre sonhamos com isto, lembra-se? — Elisa sor­riu com as lembranças, enquanto esquentava quiche de espi­nafre para Norman.

Ao olhar para a prima, viu que esta tinha um ar preocupa­do e triste.

— Jenny, algo errado?

— Nada. Só estou cansada. Não há nada de errado. Como vão tio Rob e tia Helen? —indagou, querendo mudar de assunto.

— Mamãe e papai estão ótimos — respondeu Elisa, relu­tante. Estava mesmo preocupada com a prima. — Estão or­ganizando um programa para jovens no Missouri. Pretendem reunir adolescentes que estejam envolvidos com drogas, para recuperá-los. Disseram que sua mãe está aprendendo a dan­çar o break.

Jenny riu gostosamente.

— Assim ela me disse numa carta. Espero que ela não que­bre nada dançando. Puxa, Lisa, você não imagina como é bom estar em casa — suspirou Jenny. — Mesmo que seja por uma noite só.

E foi quase uma noite. Quando Elisa acordou no dia seguin­te, a prima já tinha ido embora. Sua cama estava feita, e ha­via um bilhete dizendo que tivera de pegar um vôo bem cedo e que assim que pudesse escreveria.

Elisa deu algumas bananas e o resto do quiche para Norman e saiu, preocupada. Algo estava acontecendo com sua pri­ma. Algo de estranho, a julgar pela expressão de Jenny.

Jenny trabalhava naquele projeto havia meses. Sua mãe, a tia Doris, bem como os pais de Elisa, ficaram preocupados quando Jenny aceitara o cargo. Mas Jenny parecia estar ado­rando a cada minuto.

Só que ninguém sabia ou entendia o que exatamente Jenny fazia. E talvez fosse melhor assim.

O dia foi bastante trabalhoso no escritório, que ficou cheio de gente todo o tempo, não deixando que Elisa passasse um só segundo a sós com seu perturbador chefe.

Depois do dia anterior, ela não tinha a intenção de ficar mui­to perto dele. Havia sido tola em deixá-lo chegar tão perto a ponto de quase se beijarem, deixando-o perceber quão vulne­rável ela era.

Na hora do almoço, Elisa pegou a bolsa para ir buscar co­mida chinesa num restaurante próximo. Normalmente almo­çava com alguma colega, mas, ultimamente, parecia que todos estavam muito ocupados.

— Quer alguma coisa do restaurante chinês? — perguntou Elisa ao chefe com polidez.

— Não, obrigado — foi a resposta com indiferença força­da. — Vou levar Karol para almoçar. Liz?

Eliza virou-se, feliz por notar que ele usara seu apelido.

— Pois não!

Os olhos azuis passeavam por seu corpo, admirando o ves­tido de crepe cinza que ela usava.

— Esteve muito quieta hoje.

— É que quase não dormi ontem à noite.

— Por que não?

Cabe não tinha o direito de perguntar, mas a resposta veio, automática.

— Tive companhia. Quer dizer, só até o amanhecer — explicou Elisa, perguntando-se o quanto deveria revelar sobre a prima.

A reação de Cabe foi quase cômica. Ele ficou pálido.

Levantou-se. Sua expressão foi da surpresa para a raiva ge­nuína, em questão de segundos.

— Pensei que casos de uma noite não fizessem seu gênero.

— Casos de uma noite… Ah, e não fazem mesmo — res­pondeu ela, entendendo a confusão. — Não era homem. Era minha prima Jenny.

Cabe fez um estranho gesto, percebendo que a pergunta não deveria ter sido feita e muito menos respondida. Seus olhares se fixaram um no outro, uma doce eletricidade passou por eles. O sorriso no rosto de Elisa desapareceu e ela sentiu seu cora­ção aos pulos. Via os músculos saltarem no queixo proemi­nente do chefe, como se ele estivesse lutando para se controlar.

Na verdade, estava lutando mesmo. Mas, antes que pudes­se se mover ou falar, Karol entrou no escritório, usando um vestido colorido, com um lenço combinando, preso nos cabelos.

Foi nesse instante que Cabe decidiu que era preciso mos­trar a Elisa que ela nada significava para ele, pelo próprio bem dela. Podia magoá-la muito se deixasse as coisas andarem do jeito que estavam indo. Não podia se dar ao luxo de se envol­ver com uma virgem inocente que nada sabia da vida ou dos homens. E não havia outro modo de fazer isso. Indo em dire­ção a Karol, abraçou-a e beijou-a com volúpia e paixão, bem na frente da chocada secretária.

— É melhor eu ir andando — gaguejou Elisa, saindo, sem que ninguém notasse.

No caminho todo até o restaurante, não conseguia afastar a cena da cabeça e não podia entender o porque. Cabe, com aquela linda mulher em seus braços, atacando violentamente a boca da moça, apertando-a contra si.

Elisa tinha vontade de chorar ao lembrar-se, imaginando como seria se fosse ela quem estivesse nos braços do chefe.

Precisava parar com isso, disse a si mesma. Estava deixan­do que o charme do chefe a cegasse por completo. Karol era apenas uma conquista, como todas as outras, e seus pais no Missouri não a tinham criado para ser mais um número de telefone na agenda de um homem.

Deliberadamente demorou para voltar ao escritório, a fim de não encontrar o chefe agarrado à loira oxigenada, como a chamara Eugene.

Estava sentada à sua mesa, degustando o Moo Goo Gai Pan que comprara, quando Ben Meadows apareceu à porta, com sua cabeça loira, sorrindo para ela.

— Está sozinha? — murmurou, brincalhão. — Despro­tegida?

— Não, realmente — respondeu Elisa, com um sorriso ma­licioso. — Estou armada! — exclamou, mostrando os palitinhos.

— Você não atacaria de verdade um gerente de vendas tra­balhador, atacaria?

Elisa meneou a cabeça, fazendo que não.

— Quer um pouco de Moo Goo?

Ben fez uma careta.

— Não como uma coisa com esse nome horrível.

— E só frango com legumes e molho oriental. Está delicioso.

— Foi o que me disseram sobre quiche de espinafre. De qual­quer modo, que tal um almoço num restaurante bem caro re­gado a vinho branco e com sobremesas que engordem bastante? Por minha conta.

Elisa estudou-o com curiosidade. Ele não era nada mau e era mais novo do que Cabe. Um ótimo rapaz, sério, que nun­ca corria atrás de mulheres e que nunca estava envolvido em problemas. Gostava dele, apesar de não conhecê-lo socialmente. Não por falta de esforço da parte dele: sempre a convidava para sair e Elisa sempre se recusava. Mas como Cabe dissera que se recusava a sair com Ben por ter uma queda por ele, desta vez iria aceitar.

— Eu adoraria — respondeu Elisa, sorrindo. — Mas já es­tou quase terminando.

— Amanhã — disse Ben, rapidamente, temendo que ela não mais aceitasse. — Que tal amanhã?

— Eu adoraria, Ben. Obrigada.

— Ótimo… Eu… oh, não — gemeu ele. —Espere um mi­nuto, amanhã não posso, estou fora até quarta-feira. Que tal na quinta? — Ben alterou o convite, esperançoso.

Elisa sorriu.

— Está ótimo.

Ben sorriu, satisfeito. Os astros lá em cima estavam cola­borando.                                                                      

— Então, está certo. Fica para quinta-feira. Iremos a um restaurante chique. Portanto, capriche no vestido, certo?

— Certo.

Ben foi embora assobiando, todo satisfeito, enquanto Eli­sa terminava sua refeição, esperando não ter agido mal. Ben trabalhava para a empresa havia apenas dois meses, mas pa­recia ser boa pessoa e seria bom sair com ele para variar.

Cabe só retornou após as duas e meia, com o cabelo todo revolto. Era evidente que não tinha sido apenas um almoço. Elisa olhou-o e voltou ao trabalho. Nada tinha a ver com a vida pessoal do chefe, mas ficara desgostosa ao ver a aparên­cia dele, apesar de tentar camuflar a dor que sentira.

Cabe percebeu a mágoa nos olhos cinzentos, ficando satis­feito por conseguir seu intento. Desarrumara o cabelo de pro­pósito, mas apenas almoçara com Karol. Queria que a secretária se desiludisse logo, e seria bom para ela.

Ao ver a expressão de Elisa, soubera que dera certo.

Elisa era uma boa moça e merecia mais, muito mais do que ele podia oferecer. Tinha uma espécie de acordo com Karol, que também não queria saber de envolvimentos sérios. Saíam juntos para se protegerem.

E graças a Deus não ficaria mais tentado com Elisa. Não percebia o quanto a desejava. A cena no carro e no escritório tinha sido um engano que não mais poderia se repetir.

Elisa entendera o recado, pois saíra às cinco horas em pon­to, sem sequer se despedir.

Em casa, sozinha, assistindo televisão, ela falava com Norman:

— Não acho que iguanas se transformem em príncipes — suspirou olhando para o réptil em cima do aquecedor. — Mes­mo que você fosse um príncipe encantado, eu não o beijaria. Apesar de que prefiro beijar você a beijar o sr. Ritter. Pelo menos eu sei onde você andou.

Elisa não conseguiu dormir direito aquela noite, pensando no abraço apertado e no beijo que o chefe dera na loira oxige­nada na sua frente. Pensava também no "almoço" que teriam tido depois daquele abraço sensual.

A única coisa que a animava um pouco era a perspectiva de almoçar com Ben no dia seguinte. Isso mostraria ao chefe que não estava morta de amores por ele.

A manhã toda notara que o chefe a examinava com o olhar, sem nada dizer. Vestira-se com esmero a pedido de Ben, pois sabia que iriam almoçar num lugar fino. Deixara o cabelo cas­tanho solto em ondas e usara rimei nos cílios. Pusera um ba­tom levemente avermelhado e sapatos de salto alto, que realçavam o formato de suas pernas bem-feitas.

Cabe mal conseguira tirar os olhos dela a manhã toda, o que deixara Elisa satisfeita e divertida.

Cabe Ritter saiu de sua sala bem na hora em que Ben che­gou para buscar Elisa para o almoço.

— Precisa de algo, Ben? — perguntou em tom firme, não gostando do olhar que o gerente de vendas dirigia a sua se­cretária.

— Não, Cabe. Vim buscar Elisa para almoçarmos juntos — respondeu Ben, satisfeito, sem notar o ódio do chefe. — Eu a trago de volta antes de uma hora, prometo. Vamos, Elisa?

Cabe ficou rígido, olhando a cena, a mente num torvelinho. Inadvertidamente jogara Elisa nos braços de Ben Meadows. E sabia de coisas sobre ele que Elisa nem suspeitava. Pegou um cinzeiro e jogou-o longe, soltando uma imprecação. Pre­cisava remediar a situação, mas como?

Suspirou, bravo consigo mesmo. A vida era simples até que beijara a secretária no dia de Natal. Seu corpo ficara preso de um encanto, desde então. Queria experimentar mais, e não sossegava com os pensamentos. Para piorar a situação, seu pai ficava falando sobre ela o tempo todo.

Sentia-se culpado, pois sabia que Elisa jamais sairia com Ben se não tivesse sido provocada por ele próprio. Mas suas intenções tinham sido as melhores possíveis quando agarrara Karol no escritório daquele jeito na frente de Elisa. Não era seu estilo seduzir virgens.

Só que Ben não ficaria tão preocupado com a castidade de Elisa. Não iria se preocupar se ela fosse virgem ou não.

Os olhos de Cabe enfureceram-se enquanto via cenas se de­senrolarem a sua frente, sonhando acordado.

Ben não iria abandonar Elisa sozinha e grávida, nem que Cabe tivesse de lhe apontar uma arma e o obrigasse a casar com ela. Mas aí Elisa viveria infeliz, com um marido que se vira coagido a desposá-la. Não, isso não daria certo, pensava Cabe.

Ele mesmo teria de cuidar da situação. Apertou os lábios, pensando numa menininha correndo pelo jardim. Compraria coisas para ela. Ou, se fosse menino, poderia iniciá-lo nos ne­gócios do petróleo. Um menininho seria ótimo…

— …eu perguntei se o senhor prefere que o sr. Samples ligue de volta ou se vai atender a ligação — dizia de modo edu­cado a secretária de Ben, da porta.

O sorriso desapareceu dos lábios de Cabe. O sonho de ter uma família com Elisa, adotando seu filho ou filha, desvaneceu-se como uma bolha de sabão.

Pigarreando, respondeu à moça:

— Desculpe. Eu atendo a ligação. —E entrou em sua sala, pensativo.

Ainda bem que o filho de Elisa era apenas uma fantasia, pensou ao pegar o fone. Ele não tinha tempo para brincar com crianças agora.

 

Elisa nunca estivera num restaurante caro antes, exceto com os pais de Jenny, numa ocasião, havia anos. A decoração do lugar era exótica e o menu estava escrito em francês: Esco­lheu um frango que não seria um rombo muito grande no bolso de Ben e olhou, divertida, enquanto ele optava por filé e la­gosta e uma garrafa de vinho branco importado.

— Só um copo para mim, por favor — pediu Elisa, com um sorriso, enquanto saboreavam a refeição. Ben havia en­chido o próprio copo umas três vezes e ia encher o dela pela segunda vez, quando Elisa pôs delicadamente a mão em cima de seu copo. — Não estou acostumada a beber álcool.

— É mesmo? Preciso me lembrar disto.

— Seu demônio! — brincou Elisa, bem-humorada, bebe­ricando o vinho suave, degustando seu leve sabor e bouquet. — Foi muita gentileza sua me convidar para sair.

— Gostaria de tornar isto um hábito — declarou Ben, olhando-a de modo apreciativo. — Pensei que você nunca aceitaria.

— Não saio muito — confessou ela. — Não sou uma garo­ta liberada.

Ben levantou as sobrancelhas.

— Sério? — brincou ele.

— Sério.

Após estudá-la por um breve momento, começou a rir.

— Se isto é verdade, então você é única e eu a saúdo — disse, levantando o copo. — Mas você é a primeira das secre­tárias de Cabe que pode dizer isto. Não que ele seja um ho­mem mau. Ele não é. Apenas gosta de mulheres.

Elisa deu um suspiro.

— Assim ouvi contar — ela respondeu, suspirando de mo­do involuntário. — Mas ele não gosta de mim; pelo menos não do jeito como você está falando.

— Então Cabe deve ser cego — disse Ben, sorrindo de for­ma gentil. — Você é muito bonita.

Elisa corou.

— Obrigada.

Ben tomou mais um gole de seu vinho. .

— Existem mais iguais a você em casa? — perguntou Ben, com uma inflexão estranha na voz.

— Sou filha única — sorriu Elisa. — Tenho uma prima que é linda, mas ela não passa muito tempo em casa.

— Por que não?

Elisa então começou a contar a razão, a língua solta com o efeito do álcool. Mas, após alguns minutos, percebeu que estava gaguejando.

— Desculpe. Acho que o vinho subiu um pouco.

— Acontece que tudo em você me fascina — Ben se apres­sou em dizer. — E sua prima parece ser uma mulher bastante interessante. Que pena que não fixe raízes em lugar nenhum.

— E o que penso.

— Imagino que goste de dividir um apartamento com ela, já que sua prima está fora o tempo todo.

— Gosto, sim. Ela esteve em casa no começo desta sema­na, mas somente pernoitou. — Elisa riu, pondo o copo de la­do.— Puxa, Ben, essa coisa é mesmo potente!

— É o que dizem — ele concordou, mordendo o lábio de novo, estudando-a com atenção. — Eu gostaria de conhecê-la melhor, Elisa Marist. Isto é, se você concordar e se seu che­fe não tiver seu nome na lista dele. Não quero passar por ci­ma de Cabe Ritter.

— Não pertenço ao sr. Ritter — Elisa apressou-se em informá-lo. — Nunca percebi que as pessoas achavam que eu pertencesse.

— As pessoas, não: Apenas eu. — Ben deu de ombros. — Sou novo na empresa. Tudo o que sei sobre as pessoas é o que ouço falar.

— Onde você trabalhou antes? — Elisa perguntou, com um sorriso.

— Na Califórnia — ele respondeu, claramente pouco à von­tade e mudando depressa de assunto: — Conte-me sobre esses negócios de geologia. É na empresa do pai de Ritter que sua prima trabalha, não? Pensei que Cabe Ritter tivesse inte­resse nisso quando vim trabalhar aqui, mas parece que eu es­tava errado.

— É que ele e o pai não se entendem muito bem. — Ela meneou a cabeça.—: Acho que ele herdará tudo um dia, mas agora está apenas no ramo de peças e equipamentos. Duvido até que Cabe saiba o que Eugene anda fazendo.

Ben disse algo baixinho para si mesmo e tomou um gole de vinho. Por um minuto, pareceu distante, depois estudou o rosto de Elisa de novo.

— Acho que sua prima deve ter uma vida bastante excitan­te. Ela costuma contar sobre suas andanças?

Algo parecia estranho naquela conversa, mas Elisa estava muito tonta por causa do vinho para prestar atenção ao fato.

— Nenhuma palavra, tudo parece coisa de James Bond — ela riu, em sua simplicidade. — Mas Jenny tira estranhas fo­tos das coisas. Fez um mapa geológico e algumas marcas ne­le. Depois de tanto trabalho, o esqueceu em casa. Terei de colocá-lo no correio para ela amanhã.

Ben pareceu ficar animado.

— Mapa, hein? Eu adoraria ver um verdadeiro mapa geo­lógico.

— Não posso mostrá-lo — desculpou-se Elisa, sorrindo. — Jenny me mataria. Por que achou que eu estava tendo um ca­so com o meu chefe? — perguntou em seguida, curiosa.

— Por nenhuma razão — Ben murmurou. — Só pelo mo­do como ele a olhou outro dia. Mas há Karol Sartain, claro — lembrou ele, sorrindo. — Acho que desta vez Cabe se amar­rou. — Deu uma risadinha. — Pelo que ouvi dizer, Karol não dorme com todo mundo por aí. Se algo acontecer, Cabe terá de se casar; com ela. Aí está uma mulher de classe e muito in­teligente. Irá longe no mundo dos negócios. Eu a conheci há uns dois anos. Ela saía com um tio meu.

Elisa não tinha a menor vontade de falar sobre Karol. Na verdade, sentia-sé tonta e enjoada. Ao empurrar o copo de Vinho, viu que suas mãos tremiam. Era ridículo sentir-se tão triste e aborrecida. Sabia que Cabe era um playboy e que es­tava saindo com Karol havia semanas, e somente com ela. Por que deveria importar-se? Ben gostava dela.

— Você está bem? — indagou Ben, preocupado.

— Claro. O vinho me subiu à cabeça. Desculpe. Não estou acostumada.

— Não tem problema. Eu a ajudo a voltar para o escritó­rio. Até a carrego até o elevador, se quiser.

— Você é um príncipe, Ben — disse Elisa, em tom gentil.

— Eu gostaria que o chefe me pagasse como um deles — suspirou,Ben. — Os salários por aqui são bem baixos. Se esti­ver pronta, podemos ir.

— Adorei o almoço — Elisa comentou, sorrindo.

— Vamos almoçar juntos de novo — prometeu Ben segurando-a firme pela cintura e guiando-a para fora do res­taurante.

Ben levou-a ao escritório, sorrindo para ela.

— Não o deixe aborrecê-la — sussurrou, ao ouvir Cabe se movendo na outra sala. — Você tem mais de vinte e um anos. Pode beber no almoço, se quiser.

— Posso, sim — concordou Elisa. — Até mais tarde. Obri­gada mais uma vez.

Piscando, Ben saiu, fechando a porta atrás de si. O ruído fez com que um preocupado e irritado Cabe saísse de sua sa­la, olhando-a friamente.

— Você demorou — disse, por fim.

Ficara andando de um lado para outro, maltratando as pes­soas ao telefone. E ali estava Elisa, que parecia ter sido afo­gada em vinho por Ben. Teve um maü presságio sobre aquele almoço. Odiou-se por sentir a possessividade tomando conta de si, o instinto protetor emergindo das profundezas de seu ser. Nunca se sentira assim antes.

Fazia tempo que Elisa não via o chefe com ar tão intimidador. Ele era só músculos e aqueles seus olhos azuis podiam derreter gelo, quando queriam. E era precisamente o que es­tavam fazendo agora. Com os cabelos em desalinho, a expres­são dura de raiva, fazia Elisa sentir-se pouquíssimo à vontade.

— Só são cinco para a uma — defendeu-se ela, a voz meio pastosa. O vinho fizera com que seu rosto se tornasse verme­lho e Elisa olhou-o, desafiadora. — Quantas pessoas neste pré­dio imaginam que durmo com o senhor? — perguntou, ainda irritada pelas palavras de Ben durante o almoço.

Cabe não podia ter ficado mais surpreso se alguém o tives­se estapeado. no rosto.

— Como é que é? — perguntou ele.

— Ben pensou que o senhor dormia comigo! Disse que o senhor tem uma grande experiência com suas secretárias,

Cabe olhou para a porta, com vontade de esganar o fun­cionário.

— Maldito Ben! — exclamou, por fim. — Vou quebrar o pescoço dele!

Com medo de que Cabe se referisse ao presente momento, Elisa se pôs na frente do chefe, arrependendo-se do que disse­ra. Agora ele mataria Ben e ela iria presa como cúmplice.

— Não pode fazer isso — falou, percebendo que a própria voz estava engraçada; pigarreou. — Não pode sair por aí ma­tando gente durante a hora do almoço — murmurou em tom conspiratório. — Não haverá ninguém para limpar a bagunça.

A raiva desapareceu do rosto de Cabe como por encanto e ele parou em frente dela, tão perto que Elisa podia sentir seu perfume. Cabe olhava para a secretária de modo sedutor, medindo-a de cima a baixo, registrando a suave feminilidade que emanava dela.

— Não durmo com minhas secretárias. Como você mesma já devia saber após dois anos. — E, dizendo isto, aproximou-se dela. — Você está cheirando a vinho branco. Quantos co­pos tomou?

— Eu não cheiro — retrucou Elisa, indignada. — Só to­mei um pequeno copão de vinho. — Aquilo soou engraçado e Elisa se pôs a rir. — Desculpe. — O riso sumiu ao ver a ex­pressão séria do chefe. — Um copão pequeno de vinho, eu quis dizer.

— Você não bebe, sua menina idiota — falou Cabe, bra­vo.— É melhor você ir para casa.

— Não estou bêbada! Até posso andar em linha reta… opa, desculpe — murmurou ela, quase caindo por cima dele. Cabe segurou-a, fazendo-a suspirar. Elisa pôs os braços em volta do pescoço forte, enquanto ele a carregava para o sofá em sua sala, fechando a porta atrás deles.

Seu chefe era tão forte quanto Elisa imaginara. Olhou para o rosto dele fascinada, pois nunca estivera tão perto de Cabe. Começou a lembrar-se do modo como ele beijara Karol, olhan­do com tristeza para a boca de traços duros. Queria que Cabe se inclinasse e a beijasse, como fizera com Karol, com a boca aberta…

Sentindo o olhar da secretária fixo em seus lábios, Cabe que­ria gemer alto. Elisa estava começando a ficar excitada. Mas ele não podia tirar proveito da situação, apesar de ver que o leve vestido mostrava os contornos do corpo feminino, pon­do fogo em seu sangue.

— Que vai fazer comigo? — perguntou Elisa, com a voz rouca.

Cabe parou em frente ao sofá de couro.

— Não ponha idéias na minha cabeça. Vou deitá-la aqui até que os efeitos do seu almoço passem. Vou fazer café.

— Não posso me deitar no seu escritório — protestou Eli­sa num fio de voz, enquanto Cabe a deitava.

— Por que não?

Maldito braço do sofá, pensou Cabe, com ódio, pois dei­xava a cabeça de Elisa bem no ângulo favorável para um bei­jo ardente e carícias. Os lábios tentadores de sua secretária' estavam entreabertos, convidativos como nunca.

— O senhor dorme com Karol? — perguntou Elisa, baixinho.

Era demais da conta. Passando a mão pelo cabelo dela, Cabe começou a fazer-lhe afagos.

— Você não pode me fazer perguntas como esta.

— Por que não? O senhor me diz todo o tipo de coisas! Os olhos azuis passearam pelo corpo de Elisa, relaxado no sofá, percebendo as curvas que o vestido não escondia. Tinha vontade de despi-la e possuí-la ali mesmo.

— Não durmo com Karol — declarou Cabe, passando o braço pela cintura fina, segurando-a firme. — Você precisa de café. — Devia lembrar-se de que ela era virgem e parar de pensar como seria aquela pele nua em contato com a sua. — Vou fazer café agora mesmo.

— Por quê? — indagou Elisa, os olhos semicerrados, movendo-se languidamente no sofá.

— Porque, Deus me ajude… senão vou possuí-la aqui mesmo, neste sofá. Agora, pare com isso!

E, dizendo isto, levantou-se e foi em direção à cafeteira pa­ra preparar o café prometido. Seu corpo doía e latejava de desejo pela secretária, mas o café resolveria o problema. Tu­do estaria.a salvo se ele conseguisse ficar sem olhar para Eli­sa, deitada em sua sala.

Elisa suspirou fundo, mexendo-se, os olhos fixos no homem que fazia café. Sentia-se bem, a alma leve. Parecia não ter os­sos. Nada mais importava. Cantarolava para si mesma, levan­tando uma das pernas, fazendo o vestido fino escorregar para cima. Até que suas pernas não eram de todo más, pensou, mes­mo que não fossem ganhar um concurso de beleza.

O café já estava quase pronto e Cabe virou-se para Elisa no exato momento em que o vestido escorregou de modo pro­vocante. Nunca vira nada tão adorável e não podia culpar Ben por querer sair com ela. O milagre era que a tivesse trazido de volta. Elisa estava linda e sensual com o vestido que lhe revelava todas as curvas. Ficava realmente estonteante quan­do vestia algo apropriado e não as roupas de velha que usava para ir trabalhar.

Percebendo o olhar do chefe, Elisa ajeitou a saia, cobrindo as pernas. Cabe nunca a olhara daquele jeito antes. Mas, mes­mo sob o efeito do álcool, sabia que não podia encorajá-lo daquele modo. Cabe era um playboy e ela não nascera para ter um caso de uma noite.

Suspirando, virou-se para o outro lado e fechou os olhos.

Por que Ben a fizera beber daquele jeito?, perguntava-se Cabe, desorientado. Seu gerente de vendas andava estranho ultimamente. E comprara um Jaguar novo. Cabe conhecia a situação financeira do funcionário e sabia que Ben não podia se dar ao luxo de ter um carro daqueles com o salário que re­cebia da Ritter Equipamentos. Olhou para a secretária, deita­da languidamente em sua sala, dando graças a Deus por o dia, não ser muito atribulado. Atendera duas chamadas telefôni­cas e olhara a sala de espera para ver se havia algum cliente.

Despejando café bem preto numa caneca, sentou-se ao la­do dela, oferecendo-lhe a bebida.

— Oi — murmurou Elisa.

— Oi para você também. Meu Deus, que dor de cabeça você vai ter. Tome. Sente-se e beba isto.

Com dificuldade, Elisa apoiou-se num dos cotovelos, olhan­do para o chefe, sentindo o corpo mole.

— Está forte demais — reclamou Elisa ao tomar o primei­ro gole.

— Tinha de ser forte — replicou Cabe, paciente. — Não posso dirigir o escritório sozinho.

Elisa prendeu a respiração, de repente dando-se conta da situação.

— Meu Deus, sr. Ritter — gaguejou, corando violentamen­te.— Ben pediu uma garrafa de vinho branco tão caro que eu não queria, mas fiquei com vergonha de recusar.

Nada daquilo fazia sentido. O repentino interesse de Ben por sua secretária. Ben era o verdadeiro playboy da empresa, apesar de atuar com muita discrição. Gostava de mulheres so­fisticadas e que bebiam, o que não era o caso de Elisa.

— Seus pais deviam tê-la encorajado a sair com rapazes quando você era adolescente. Você não tem experiência para reconhecer um playboy.

Elisa levantou as sobrancelhas.

— Claro que sei reconhecer um playboy. Eu trabalho para um.

Cabe não sorriu. Sabia que merecia aquilo.

— Sei que a imagem é essa — suspirou. — E eu encorajo isso. Mas não cometa o erro de achar que sou tudo aquilo que pareço,ser.

Aquilo não fazia sentido. Claro, nada mais fazia.

— Ben é legal.

— É por causa dele que mudou seu uniforme de sempre? — quis saber Cabe, curioso. Seus olhos passeavam pelo cor­po de Elisa.

— Eu não uso uniforme — ela se defendeu.

— Saias compridas e blusas abotoadas até o pescoço e o cabelo preso num coque. Você nunca vem trabalhar de mini-saia, como veio hoje. Só uma vez.

— Sei que mulheres sexy ficam em perigo face a homens farristas. O senhor me disse para não lhe dar idéias erradas.

— Eu disse muita coisa — replicou Cabe bravo.

— E estava certo — ela só concluiu, imaginando por que ele estava tão bravo. — Não tenho casos de uma noite e o se­nhor não ia querer uma secretária que fosse seduzida pelo pa­trão. Só me vesti assim por causa de Ben.

— Elisa, sei que pode parecer difícil de você acreditar, mas também não gosto de casos de uma noite. Não durmo com qualquer uma, por aí.

— Claro. — Elisa deu uma risadinha.

— Só uma criança como você pode acreditar numa facha­da como a que criei para mim.

— O modo como o senhor beijou Karol não era fachada — disse Elisa, com raiva.

Cabe olhou-a com interesse repentino.

— Eu não disse que sou totalmente inexperiente. Eu.disse que não fico dormindo por aí com todas as mulheres que aparecem.

— Então, por que todo mundo pensa que sim?

— Porque isso mantém as mulheres interessadas em casa­mento longe de mim. Nenhuma mulher que queira se casar se interessa por um homem que age como playboy.

— Acho que não mesmo. — Elisa não estava bem certa de estar ouvindo direito ou se aquilo era efeito do álcool.

— Você não está sonhando. Sua cabeça lhe dirá isto mais tarde. — E Cabe começou a acariciar os lábios entreabertos de Elisa. — Você ficou aborrecida ao me ver beijando Karol? — ele perguntou, de modo inesperado, vendo a resposta na expressão do rosto dela.

Elisa terminou o café. Suas mãos tremiam.

— Estou melhor agora. Vou voltar ao trabalho.

Mas Cabe não se moveu e nem ela poderia, tampouco. A mão dele acariciava seu rosto e os olhos azuis começaram a escurecer.

— Algum homem já a amoldou ao corpo dele deste modo e pôs a boca contra a sua, como se estivesse morrendo para fazer isto?

Elisa corou de forma violenta.

— Os homens não se sentem desta forma com mulheres co­mo eu.

— Por que não? — Os dedos experientes desciam pelo pes­coço fino.

— Não sou… o tipo de mulher que inspira emoções vio­lentas. Sou antiquada e quieta e…

— E extremamente sexy — murmurou Cabe, o hálito quente perto de Elisa, os lábios tocavam os dela suavemente. — Dê-me isto — ordenou ele, pegando a xícara de café, vazia.

— Outro dia, o senhor disse…

— Eu disse que uma vez que minha boca cobrisse a sua, não haveria volta — sussurrou Cabe, segurando-a de modo mais firme. — E falei sério. Não se afaste de mim. Deixe-me amoldar.minha boca na sua… deixe que ela abra sua boca, do modo como eu disse que faria… oh, Elisa…

Cabe deslizou os lábios por cima dos dela, os olhos fecha­dos, tentando abrir os lábios femininos e macios, com genti­leza e cuidado, o beijo tornava-se cada vez mais íntimo e quente. Elisa podia sentir a língua de Cabe explorando cada canto de sua boca, assustando-se com a invasão. Sempre evi­tara aquele tipo de beijo, mas não conseguia desvencilhar-se de Cabe. Será que queria desvencilhar-se?

Gemendo, enterrou as unhas nos ombros fortes, como que pedindo apoio.

Cabe precisou de toda a sua força de vontade para parar.

— Você nunca permitiu este tipo de beijo antes, não foi?

— O senhor… me forçou.

— Forcei, sim. Você precisa de um professor.

O coração de Elisa batia descompassado. Nunca sentira al­go parecido, com ninguém. A intimidade tinha sido extrema­mente excitante. Perigosa. Imaginava se seria assim também na cama…

— Foi apenas um beijo, Elisa. Nada para ficar tão preo­cupada.

— Seria exatamente assim… na cama. — sussurrou ela, mor­ta de medo da descoberta sobre si mesma que acabava de fazer.

— Sim, exatamente assim. Você perderia o medo e se en­tregaria a mim. Eu a trataria do modo mais gentil possível e você se colaria no meu corpo, querendo mais e mais. Aí, você não teria mais medo e seria como labaredas subindo no escu­ro, como relâmpago à noite. Você resistiria, mas só por al­guns segundos. Então, você iria querer de novo e nós dois iríamos queimar juntos, no auge da paixão.

O corpo de Elisa tremeu de modo violento só em pensar na descrição de Cabe.

— Um dia — continuou ele, a voz rouca — você será mi­nha. Apesar de tudo, você ficará nos meus braços e se entre­gará a mim.

Mal podendo respirar, Elisa enterrou o rosto no pescoço de Cabe, como que pedindo proteção dele mesmo, abraçando-o forte. Tinha tido medo desse momento desde a primeira vez em que o vira, só que fora um medo subconsciente. Cabe abraçou-a, aninhando-a em seu peito.

Elisa devia ter protestado quando Cabe fizera suas previ­sões, mas sabia que aquela era a verdade. Se não se afastasse daquele escritório, seria exatamente aquilo que iria acontecer. Agora, que experimentara o gosto de Cabe, não seria o sufi­ciente. Fechou os olhos e quis chorar.

Sentiu que Cabe se movia, deitando-se com ela no sofá, ajeitando-a. A expressão descontrolada de seu chefe a assus­tou, e o olhar dele era excitante e amedrontador ao mesmo tempo.

Foi nesse instante que ouviram alguém na sala de espera.

— Há alguém aí?

Ambos pularam. Cabe soltou Elisa e ficou de pé.

— Meu Deus! — sussurrou Cabe, os olhos fixos nos de Eli­sa, saindo para a sala de espera.

Elisa ficou ali, sentada no sofá, sentindo as pernas bam­bas. Estava delirando ou Cabe Ritter a havia beijado, fazendo-a ficar submissa?

Terminou a segunda xícara de café, quando Cabe voltou para a sala.

— Está melhor? — quis saber ele.

— Sinto muitíssimo. Não quis beber no almoço e nunca mais farei isso. Eu… — disse, sem conseguir afastar os olhos do sofá, onde havia pouco estivera deitada, em abandono total. — Vou voltar ao trabalho, agora.

E, antes de abrir a porta, continuou:

— Quero que me desculpe pelo meu comportamento de há pouco. Foi o vinho. Nunca fiz nada assim antes. Espero que não fique com a impressão errada a meu respeito.

— Não. Não há por que ficar envergonhada, Elisa.

— Me desculpe, sr. Ritter.

— Meu nome é Cabe.— disse seu chefe, a voz suave.

— Eu sei, mas…

— Se não me chamar pelo nome na frente dos clientes, tu­do bem. Mas quando estivermos a sós, não quero mais ser cha­mado de sr. Ritter.

— Tudo bem, Cabe — disse ela, por fim, vendo que o che­fe não conseguia tirar os olhos de sua boca.

Elisa é uma mulher perigosamente excitante, pensou Cabe. Virgem esperando pelo homem com quem se casará. Uma ra­ridade. Por que não conseguia' lembrar-se disto mais vezes?

— Ligue-me com Howard Drake, sim? —pediu Cabe, forçando-se a sentar-se a sua mesa.

— Sim senhor — e, dizendo isto Elisa voltou para a sua mesa e fez a ligação. Seria um grande desafio passar por aquele dia. Era como uma linha divisória em sua vida, mas, para on­de a conduziria, Elisa não sabia dizer.

 

Com a dor de cabeça física e o que havia acontecido mais cedo, Elisa estava mais do que apta a ir embora às cinco ho­ras, pontualmente. Às cinco horas, da porta de sua sala, Ca­be viu Elisa pegar suas coisas.

— Você está bem?

Elisa sorriu, ante a preocupação dele.

— Estou sim, obrigada. Da próxima vez não vou tomar vi­nho como água.

— Haverá uma próxima vez? Ben é um bom rapaz, mas persuasivo demais para uma moça inocente como você.

Elisa engoliu em seco.

— Olhe só quem está falando! — não se conteve.

— Eu nunca me aproveitaria. Ele sim. Esta é a diferença. Aquilo fez com que Elisa se questionasse o que significaria se aproveitar, mas estava envergonhada demais para pergun­tar. Vestiu o casaco e se aprontou para sair.

— Então… boa noite.

— Boa noite, querida. Não brigarei se você chegar atrasa­da amanhã.

Aquilo fez com que Elisa olhasse para o chefe, estupefata. Que mudança de atitude!

— Boa noite, sr. … quero dizer, Cabe.

O modo como a secretária dissera seu nome o perturbara. A eletricidade passou pelos olhos de ambos.

— Aí está você, Elisa — dizia Ben da porta, — Vamos, eu a acompanho até o ponto do ônibus.

— Obrigada, Ben. Boa noite — disse Elisa de novo, virando-se para sair com Ben.

Cabe ficou olhando os dois com uma mistura de emoções. Elisa era vulnerável e Ben bastante experiente. Sentiu um ím­peto de acompanhá-los, temendo que Ben se aproveitasse por Elisa estar ainda meio tonta pela bebida. Mas não tinha esse direito. E se interferisse, Elisa iria perceber o quanto ele pró­prio estava vulnerável.

Entrando em sua sala, bateu a porta com toda a força. Ti­nha muito trabalho a fazer. Não havia pressa em ir para casa. Se é que seu apartamento espartano poderia ser chamado de casa.

Sentou-se à mesa e abriu a gaveta, pegando a última proje­ção de vendas.

Elisa pegou o ônibus meio entorpecida. Tinha sido um dia cheio. Sua cabeça estava repleta de sonhos enquanto subia de elevador para o seu apartamento. Inseriu a chave na fechadu­ra, cantarolando, feliz, quando se deu conta de que a porta abriu antes que a chave virasse.

Alerta, Elisa empurrou a porta e suspendeu a respiração com o que viu. Todas as gavetas tinham sido esvaziadas, seus li­vros encontravam-se todos espalhados pelo chão, o sofá esta­va revirado e sem nenhuma das almofadas. Todos os pratos e panelas estavam fora de seus armários, jogados no chão da cozinha. A correspondência aberta.

Elisa precisou se apoiar no batente da porta, para não des­maiar. Seu primeiro pensamento coerente foi para Norman: quem quer que tivesse feito aquilo em seu apartamento podia ter feito mal ao iguana.

— Norman! — gritou, pegando uma barra de ferro que guardava no armário, segurando-a como proteção ao entrar no apartamento, hesitante. Era óbvio, que o visitante já havia ido embora, mas mesmo assim era bom não arriscar.

Abrindo a porta do quarto, viu a mesma desordem dos ou­tros cômodos da casa. Não havia ninguém no quarto, no ba­nheiro e nos armários. Com um suspiro, passou a tranca na porta. Aí se pôs a procurar por Norman. Pelo menos seu cor­po não jazia amassado no chão, mas, onde afinal estava ele?

— Norman!

Um som chamou sua atenção e Elisa suspirou aliviada ao ver o animal, em cima de uma pilha de livros na sala.

— Graças a Deus! Ainda bem que não o machucaram.

Norman olhava em volta assustado. Elisa falou com ele em tom suave é se pôs a fazer as malas para passar a noite fora.

Jamais teria a coragem de dormir no apartamento depois do que houvera. Sabia que devia chamar a polícia, mas relutou: tinha um terrível pressentimento de que aquilo tinha algo a ver com a prima Jenny. A última coisa que queria era pôr a vida da prima em perigo. E chamando a polícia, poderia es­tar fazendo exatamente isso. Sabia que Jenny tinha conheci­mentos no governo. Tentaria entrar em contato com ela e veriam o que deveriam fazer.

Depois que Norman se acalmou, Elisa o pôs em sua gaiola, pagando também comida para ele. O telefone começou a to­car no momento exato em que ela saía do apartamento, mas Elisa não atendeu. Podia ser os ladrões, querendo saber se ela estava em casa ou não.

Sentindo um arrepio percorrer-lhe a espinha, trancou.a porta, embora sabendo que isso de pouco adiantaria, e saiu de casa.

Ela e Norman passaram a noite num Hotel Holiday Inn que ficava por perto. O iguana estava irritado por ter de perma­necer confinado na gaiola. Não estava acostumado a ficar pre­so, mas Elisa não podia correr o risco de deixá-lo solto. Uma vez ela tivera de chamar o técnico da geladeira, pois o iguana ficara preso nas grades. Por sorte o homem não tinha medo de répteis.

Na manhã seguinte, Elisa levantou-se cansada e com pro­fundas olheiras. Não gostava da idéia de deixar Norman em casa, mas não havia outro jeito, uma vez que não podia levá-lo junto para o escritório. Não sabia como faria no fim de semana, olhando para a porta o tempo todo e temendo que os visitantes retornassem. Talvez devesse comprar um re­vólver…

Claro, pensou, ao deixar Norman no apartamento, era uma grande idéia, considerando-se que tinha pavor de armas e que nunca conseguiria atirar no ladrão. Era mais fácil que atiras­se em si mesma.

Não havia prendido o cabelo por falta de tempo e ainda usa­va o mesmo vestido do dia anterior, só que mais amassado. Sentia-se mal pelo jeito como estava e só Deus sabia o que o sr. Ritter diria quando a visse naquele estado deplorável.

Na verdade, Cabe saiu de sua sala com a mesma má apa­rência de sua secretária. Estava com a roupa meio amassada e não fizera a barba. Usava uma camisa branca, aberta no pes­coço, deixando entrever o peito forte, coberto de pêlos.

— Onde diabos esteve ontem à noite? — perguntou ele, de imediato, os olhos azuis dardejantes, o cabelo em desalinho.

— E você, não foi para sua casa ontem? — foi a pergunta que escapou dos lábios de Elisa ao ver a aparência do chefe.

— Não, não fui. E você, pelo jeito, também teve uma lon­ga noite.

— Tive, sim — ela suspirou francamente. — Quase não dormi…

— Sem dúvida. — Os lábios de Cabe estavam comprimi­dos e era evidente que ele fazia força para conter a raiva. — Como foi?

Elisa piscou, sem entender. Será que estavam falando da mesma coisa?

— Não entendo.

— Uma ova que não entende — retorquiu Cabe, o tom de voz gélido. — Dizem que o sexo não é bom para uma virgem na primeira vez. Foi decepcionante?

Os olhos cinzentos se arregalaram e, quando Elisa come­çou a falar, Ben apareceu no corredor, sorrindo de orelha a orelha.

— Bom dia, doçura — disse, atirando-lhe um beijo. — Até a hora do almoço! Bom dia, chefe — acrescentou, dirigindo-se ao patrão. — Não seja duro com Elisa, não foi fácil para ela.

Acenando, Ben sumiu no corredor enquanto Cabe tentava se conter para não ir atrás e socá-lo na parede.

— Pegue seu bloco e vá para a minha sala — ordenou ele, em tom frio. — Talvez possamos trabalhar um pouco, se vo­cê conseguir para de pensar no garotão.

Então,.Cabe pensava que ela passara a noite com Ben Mea-dows! Era,quase cômico, especialmente depois do que acon­tecera entre ela e o chefe no dia anterior.

Pegando o bloco e a caneta, Elisa entrou na sala, mas, quan­do tentou explicar, Cabe a interrompeu. Fazia a barba enquan­to ditava a correspondência; depois colocou a gravata e penteou o cabelo sem dirigir o olhar para a secretária.

— Entendeu tudo isso? — por fim Cabe perguntou. — Li­gue para Karol e avise-a que vou apanhá-la às onze e meia para o almoço e cancele todos os meus compromissos da tarde. Não sei se volto depois. — Ele sorriu ao ver o embaraço de Elisa. — Você não sabia que as pessoas fazem amor à luz do dia? Estou surpreso.

Elisa levantou-se, as pernas amolecidas e voltou para sua sala sem proferir palavra. Trabalhou a manhã toda sem olhar e sem dirigir a palavra ao chefe. Era tudo o que podia fazer para não se debulhar em lágrimas.

— Terá de pedir a Meadows que traga o almoço aqui — avisou Cabe, irritado, ao sair. — Vai precisar atender ao tele­fone. Estou esperando uma chamada importante. E fique fo­ra de minha sala com ele. O sofá não é para ser usado em interlúdios à tarde.

Elisa abriu a boca para falar, mas Cabe já tinha ido embo­ra. Pegando o dicionário, jogou-o com toda a força contra a porta.

— Seu animal! — gritou Elisa, os olhos cheios de lágrimas. — Odeio você!

Foi nesse momento que Ben Meadows entrou, apanhando o dicionário do chão.

— Odeia?

Pigarreando, Elisa enxugou apressadamente o rosto.

— Desculpe. O chefe acaba de sair.

— É o que percebi. Pronta para almoçar?

— Não posso — respondeu, triste. — Tenho de esperar por uma ligação importante.

— Entendo. Bem… quer que eu traga alguma coisa para você?

— Não quero nada, Ben — suspirou Elisa, sentando-se. — Mas obrigada assim mesmo.

Ben hesitou.

— Podíamos jantar fora…

Elisa meneou a cabeça negativamente.

— Acho que não.

Os olhos de Ben demonstravam preocupação.

— Algo errado?

Ela fitou-o nos olhos e quase lhe contou o que acontecera. Mas algo no rosto do amigo a fez hesitar. Forçou um sorriso.

— Nada, nada mesmo.

— Certo — disse o rapaz, sorrindo também. — Como vai o seu iguana?

Ela não se lembrava de ter mencionado que possuía um igua­na para Ben. Talvez Cabe tivesse contado. Ou Eugene.

— Vai bem, obrigada. Tenha um bom almoço.

— Obrigado. Sinto que você não possa vir comigo. Vou co­mer um hambúrguer no caminho. Tenho um compromisso à uma hora. Até mais tarde.

Todo mundo estava se comportando de modo estranho ho­je, pensou Elisa, escondendo o rosto com as mãos. Tivera uma noite horrível e uma manhã pior ainda. Pelo menos o sr. Rit-ter não voltaria após o almoço. Podia fazer seu trabalho em paz e ficar com medo da noite. Seus pais moravam muito lon­ge para passar a noite com eles no Missouri. Que hora para estar sozinha!

A hora do almoço passou logo. Elisa tomou duas xícaras de café e desejou ter tido o bom senso de trazer uma barra de chocolate ou algo assim. Estava morta de fome.

Imaginava que o sr. Ritter e a loira oxigenada estivessem comendo lagosta ou algo igualmente exótico e esperava que os dois engasgassem com a comida. Mordeu o lábio inferior ao pensar no modo erótico como Cabe beijara Karol aquele dia. Provavelmente estavam fazendo isso e muito mais.

Levantando-se de sua mesa, entrou na sala do chefe, os olhos fixos no sofá de couro onde se deitara no dia anterior. Podia fechar os olhos e sentir a boca de Cabe cobrindo a sua. Apoiando-se no batente da porta, pôs os braços em volta de si mesma, deixando que as lágrimas corressem livres. Tudo tinha dado errado. Nunca deveria tê-lo deixado tocá-la. Ja­mais teria qualquer chance com ele. Por que diabos então Ca­be a beijara, sabendo que ela era virgem e inexperiente?

— Não tem nada para fazer, srta. Marist?

Elisa quase desmaiou ao ouvir a voz familiar atrás de si. Foi direto para sua sala, sem levantar os olhos para o chefe.

— Pensei… que não ia voltar — ela gaguejou.

Cabe estudou-a de cima a baixo, notando os traços de lá­grimas nos longos cílios, imaginando se ela estivera olhando para o sofá.

Não podia acreditar que Elisa tivesse estado com Ben de noite. Não com aquela expressão atormentada nos olhos, quan­do, obviamente, estivera lembrando o que ocorrera no sofá no dia anterior.

Pegando o braço de sua secretária com delicadeza e segurando-a firme, Cabe perguntou:

— Onde você esteve ontem à noite, menina?

O tom gentil quebrou a resistência de Elisa.

— Num motel — confessou ela, triste. — Com Norman. Alguém… invadiu meu apartamento.

— Meu Deus! — exclamou Cabe, pegando-a em seus bra­ços, apertando-a contra si, enquanto ela chorava. Sua mão acariciava os sedosos cabelos castanhos. — Está tudo bem. Eu cuidarei de você. Tire o fone do gancho por um minuto e tranque a porta. Vamos conversar.

Elisa fez o que o chefe mandou e o seguiu para dentro da sala. Ia se sentar; mas Cabe a puxou pelo braço, fazendo-a sentar-se em seu colo e acendendo um cigarro.

Os olhos cinzentos de Elisa vasculharam os dele, tentando se ajustar à súbita mudança no relacionamento.

— Conte-me o que aconteceu.

E foi o que Elisa fez. Relatou tudo, desde a hora em que chegara ao, apartamento, até quando resolvera ir para um ho­tel com Norman dentro de sua gaiola.

— Nem sei o que eles procuravam — comentou Elisa, tris­te. — Mas o meu apartamento está uma bagunça e eu tive muito medo.

— Por que não me chamou?

Ela olhou-o, tímida.

— Senti vontade — confessou. — Mas não parecia justo envolvê-lo.

— Não me importo em ser envolvido. Pode ter alguma coisa a ver com o novo projeto de Jenny?

— Pensei nisso. Não sei. É tudo muito secreto. Pode per­guntar a seu pai?

— Claro que sim. Meu Deus, não consigo acreditar nisso. Ainda bem que entraram quando você não estava em casa.

— É verdade — concordou Elisa sem, contudo, revelar que estava morta de medo de voltar para casa para o fim de sema­na. Afinal, o que ele poderia fazer? Ficar de guarda? Não podia colocá-lo nesta posição, não era justo. Cabe era apenas seu chefe.

— Pensei que você tivesse dormido com Ben — revelou Ca­be. — Por isso fui tão seco com você esta manhã, Desculpe.

Os dedos finos de Elisa tocaram de leve o tecido da jaqueta de Cabe e seus olhos fixaram a boca sensual de seu chefe.

— Não me sinto assim a respeito de Ben.

Cabe. gostou do tom de voz. Inclinando-se, pôs-se a roçar de leve os lábios rosados.

— Não — pediu Elisa, num fio de voz. — Você esteve com ela.

O coração parou de bater no peito de Cabe.

— Não estive. Não do modo como você imagina. Eu disse isso para me vingar pelo que pensei que você tivesse feito.

Ela sabia que não deveria ter dito aquilo, mas ao ouvir a, confissão, sentiu que valera a pena.

— Você não se lembra, não é? Ontem eu lhe disse que não durmo com Karol. Falo sério. Não durmo com uma mulher desde o Natal.

Elisa quis indagar por quê; queria entendê-lo melhor.

— Você não vai se entregar a Ben, vai? — quis saber Ca­be, de repente.

— Não, claro que não!

Ele suspirou ao notar o leve movimento dos seios que a res­piração alterada criava.

— Eu não devia me importar. Não é da minha conta o que você faz fora do escritório. Mas eu me importo. Pensar em você com outro homem me magoa.

— Por quê?

— Você não sabe? — Cabe inclinou-se na direção da boca sensual de sua secretária. — Eu quero que a sua primeira vez seja comigo.

Os lábios de Cabe se moviam devagar, sobre os dela, fazen­do com que os braços de Elisa o envolvessem pelo pescoço.

Ele penetrou a suavidade dos lábios de Elisa com sua lín­gua, num ritmo que a fez gemer.

Apenas beijar não era suficiente. Ele sentia-se queimar por dentro. Deslizou uma mão para um dos seios fartos, enquan­to a outra levantava-lhe o queixo, com delicadeza, para ver a expressão dos olhos femininos ante aquelas carícias. Era óbvio que Elisa estava excitada.

— É tudo novidade para você, não? — sussurrou Cabe em seu ouvido, prestando atenção a todas as reações dela.

— Eu nunca quis que alguém fizesse isso comigo — admi­tiu Elisa.

— Até agora. Mas comigo… — e, dizendo isto, excitou-a até sentir que Elisa começara a amoldar seu corpo ao dele, deixando-o, é claro, cada vez mais enlouquecido. Com uma mão, apanhou um dos seios.

Atordoada, ela deixou escapar um gritinho. Como era di­ferente e boa aquela sensação!

— Querida, nunca percebi… Beije-me — pediu Cabe, sen­tindo que estava prestes a perder o controle, chegando mais perto de Elisa. — Beije-me. Não tenha medo de mostrar-me o quanto me deseja…

Devia ter medo, pensou Elisa num último rasgo de sanida­de, sentindo uma das mãos masculinas na base de sua espi­nha, puxando-a para mais perto, querendo que ela percebesse o tamanho de seu desejo.

Mas Elisa não tinha medo dele. Deliciava-se ao perceber que Cabe ficava excitado com ela e era bom demais sentir aqueles toques masculinos em sua pele macia.

Cada vez mais Cabe perdia o controle da situação e das pró­prias emoções. Parecia que sua sanidade mental o estava aban­donando.

Elisa era virgem. Aquele era seu escritório, em meio a um dia normal de trabalho. Olhou para aqueles olhos embaçados pelo desejo, para aquela mulher tão vulnerável e quis gritar de frustração a plenos pulmões. Não aqui, disse a.si mesmo, firme. Não agora.

Suspirando fundo e procurando o olhar de Elisa, os pró­prios olhos cheios de paixão insatisfeita, Cabe murmurou em seu ouvido:

— Não podemos fazer amor assim. Não aqui. Não é possível.

— Fazer… amor? — ecoou ela, num tom de voz meio entontecido, sem querer entender o que ele dizia.

— Não pode ser — disse Cabe. — Não posso seduzir você na minha cadeira, na hora do almoço. Há algo no manual do escritório sobre este tipo de coisa; talvez nós dois devêssemos ler a respeito. Elisa percebeu o tom bem-humorado dele e riu.

— Acho que sim.

— Vou passar o fim de semana na casa de meu pai. Faça as malas, suas e do seu iguana, que eu a levarei comigo. Meu… meio-irmão, Nicky, é um fã incondicional de lagartos. Você se dará muito bem com ele.

— Mas não posso ir para a casa de seu pai com você. Nem sequer fui convidada.

— Mas será — rebateu Cabe, sorrindo, imaginando a rea­ção do pai quando soubesse que pretendia levar a secretária junto para passar o fim de semana com eles. — Quando ele souber que convidei você, vai pegar os candelabros do armá­rio e aprontar o piano. Papai gosta muito de você. Você é a número Um da lista dele de candidatas para se casar comigo.

Sim, da lista do pai, mas não da lista de Cabe, lamentou-se Elisa, triste.

Cabe viu a expressão de tristeza e seus dedos tocaram suas faces- de leve.

— Se eu tivesse uma lista, você seria a número Um tam­bém. Você é muito doce e eu adoraria fazer amor com você.

— Juntamente com várias outras… — Elisa tentou rir. Os dedos de Cabe pressionaram de leve seus lábios, não per­mitindo que ela continuasse.

— Não quero outra pessoa. Por quê, em nome de Deus, acha que fui celibatário por tanto tempo? Desde que a vi no Natal, sonhei com você todas as noites. Não posso nem pen­sar em fazer amor com outra mulher. Sou um play boy, é isto o que você pensa? Um cara que usa e descarta mulheres como se fossem guardanapos de papel? Sexo pelo sexo nunca me atraiu. Queria poder fazê-la entender o que é estar tão seden­to por alguém.

— O que o faz pensar que não entendo?

— Você me quer tanto assim?

Elisa mordeu o lábio superior. Era muito perigoso admitir aquilo para Cabe, mas sentia que era o momento de fazê-lo.

— Quero.

Com adoração, Cabe a envolveu em seus braços.

— Você é virgem — disse, de repente. — Meu Deus, eu não posso!

Afastando-a de si, praguejando, Cabe passou as mãos pelo cabelo espesso e escuro. Com mãos trêmulas, acendeu um cigarro.

— Não quero me casar! — disse ele, por fim. — Não vou seduzir você. Nem que você se dispa agora e faça a dança do ventre para mim.

— Nunca me despi na frente de um homem. E não sei dan­çar a dança do ventre.

— Foi só uma figura de linguagem — respondeu Cabe, per­cebendo que, se Elisa soubesse dançar, talvez dançasse para ele. Ela era adorável e seus cabelos desarranjados lhe empres­tavam um ar de inocência ainda maior. — Machuquei seus lá­bios? Desculpe, não foi minha intenção.

— Não, está… tudo bem — gaguejou Elisa. — Acho me­lhor voltar para o trabalho — disse, ajeitando os cabelos e a blusa; evitando o olhar de Cabe.

— Se quiser evitar chegar perto da minha escrivaninha, pode ser uma boa idéia — falou Cabe, em tom de brincadeira.

— Você está bravo comigo? — indagou Elisa, hesitante.

— Estou frustrado. Eu quero você tanto que até dói.

— Sinto muito…

— Falar sobre isso não ajuda em nada. Recoloque o fone no gancho e destranque a porta. Talvez umas dez pessoas apa­reçam e não tenhamos tempo para olhar um para o outro até a hora do fim do expediente. — E, fitando-a com olhos cheios de segundas intenções: — Eu não estava brincando quando disse que existe gente que faz amor em escrivaninhas, e esta é grande o suficiente. Fique longe daqui.

— Sim senhor — respondeu Elisa, o olhar cheio de adora­ção por ele.

— Ah, esses olhos! — gemeu Cabe, virando-se para a ja­nela. — Elisa, por favor, pare de olhar para mim.

— Sim senhor. — Sabia que parecia mais um papagaio re­petindo sempre as mesmas palavras, mas era tão fascinante ver como Cabe ficava alterado com sua presença! Mesmo as­sim, forçou-se a caminhar para fora da sala dele.

Elisa pôs o fone no gancho e destrancou a porta. Mas nin­guém telefonou ou apareceu. Então Cabe fez uma ligação, e depois outras pessoas ligaram. Elisa voltou à rotina de traba­lho, tentando não pensar em como seria difícil passar o fim de semana perto dele, sem fraquejar. Sabia que Cabe nem che­garia perto dela, tal era seu pavor de perder a liberdade. Mas parecia tão vulnerável quanto ela, e, a menos que houvesse muita gente por perto, seria inevitável que algo acontecesse entre eles. E Elisa imaginava como seria possível viver depois que cedesse ao seu chefe.

Cabe saiu de sua sala vestindo a jaqueta. Apagou as luzes, os olhos azuis com uma estranha expressão.

— Pegue seu casaco, doçura, e vamos — disse em tom gentil, entrelaçando seus dedos nos dela, enquanto se dirigiam ao ele­vador. — Não tenha medo. Vou manter a cabeça fria. Mas você vem comigo. Não posso deixá-la no seu apartamento so­zinha depois do que houve.

— Mas, seu pai…

— Está encantado — replicou Cabe. — Telefonei há pou­co para ele. Cynthia também a convidou. Não estou nada ani­mado com o iguana, mas acho que um homem acaba se acostumando com tudo.

— Ele não morde — foi o comentário ansioso de Elisa, — É vegetariano.

— Se você diz… — suspirou ele, apertando os dedos de Elisa com os seus. — Tranque a porta do seu quarto hoje à noite — disse Cabe, quando o elevador chegou. — Você não pode se dar ao luxo de confiar em mim. Não do modo como estou me sentindo agora.

Elisa abriu a boca para falar, mas as portas, do elevador se abriram. De novo, a atitude entre eles voltou a ser profissio­nal. Mas Elisa não parava de pensar em como seria aquele fim de semana e em tudo o que sentia por Cabe. E em tudo o que Cabe parecia sentir por ela. Oh, Deus, por favor, ela pensou, faça com que ele me ame.

 

Cabe levou Elisa até o apartamento dela, mas hesitou à porta.

— Norman não ataca ninguém — reafirmou ela, sabendo por que seu chefe relutava em entrar. — Está tudo bem.

Cabe esperou que ela abrisse a porta, e depois entrou, em­bora temeroso. Infelizmente Norman tinha acabado de sair do banheiro e se encontrava no hall que conduzia à sala. O lagarto não estava acostumado com homens e estava ainda ner­voso com o acontecido. Avançando, abanou a cauda de mo­do ameaçador.

— Meu Deus! — Cabe deu um passo atrás.

— Norman, seu exibicionista! — Elisa ficou brava com o iguana. — Vá embora, vamos! — e, dizendo isto, o levou pa­ra a cozinha, onde encheu a vasilha dele com abacate e ce­noura. — Está seguro agora! — ela Chamou. — Pode vir, ele está comendo.

Cabe entrou no apartamento meio hesitante, olhando para o iguana com olhos desconfiados.

— Ele não gosta de mim — disse, irritado.

— Norman não está acostumado com homens — explicou Elisa. — Acho que nunca viu um homem antes, só meu pai. Ficou nervoso por causa do susto de ontem e por ter dormido preso na sua gaiola, num lugar estranho. Iguanas são criatu­ras nervosas. Na verdade, aposto como Norman está mais as­sustado com você do que você com ele.

Cabe lançou-lhe um olhar de dúvida.

— Não estou com medo dele — defendeu-se de pronto. — Só não quero apressá-lo.

Elisa sorriu, paciente. Aquela era uma reação bem normal.

— Norman se acostumará com você — e, em seguida, emen­dou. — Quero dizer, durante o fim de semana.

Cabe estudou-a por um longo momento.

— Espero ficar por perto mais do que um fim dê semana. Muito, muito mais do que isso.

O coração de Elisa estava aos pulos ao deparar com aque­les olhos azuis, sentindo os joelhos amolecerem.

— Não sei se posso agüentar ter um caso.

— Nem eu — replicou Cabe, sincero. — Nunca tive um caso antes.

— Nunca? — perguntou Elisa, as sobrancelhas arqueadas.

— Nunca. Tive casos que duravam uma noite e uma vez quase me vi apaixonado quando era mais jovem… Mas nun­ca me senti assim com uma mulher. Não sei como lidar com isto. — As mãos fortes estavam nos ombros de Elisa, posses­sivas. — E, para ser franco, é a primeira vez que estou morto de medo.

— Por quê?

— Já lhe disse que não sou paquerador. — Cabe deu de ombros. — Nada sei sobre virgens e nunca precisei me con­ter. Isto é difícil para um homem que está em jejum há tanto tempo como eu. Não sei -se conseguirei me segurar muito se formos para a cama. Tenho medo de machucá-la. Você en­tende isto?

Elisa nunca pensara pelo ponto de vista masculino e ficou sensibilizada ao perceber a preocupação de Cabe acerca de seu conforto e bem-estar. Descansou a cabeço no ombro dele, dan­do um suspiro quando Cabe a abraçou.

— Sempre tive medo antes — ela confessou, tímida. — Mas se for desconfortável, será apenas da primeira vez e depois… — Engoliu em seco. Seus dedos se agarraram ao tecido do ca­saco de Cabe. — E depois você não me machucará mais, não é?

As mãos de Cabe deslizaram pelas costas de Elisa, numa carícia.

— Depois — ele sussurrou em seu ouvido —, eu a excita­rei bem devagarinho e farei amor de forma mais doce e você dormirá nos meus braços.

O pensamento a fez arrepiar-se toda. Fechando os olhos, aproximou-se mais de Cabe.

— Não acredito que isto esteja acontecendo — ela declarou.

— Se quer saber da verdade, nem eu. Mas não me arrependo por nada disso que está havendo conosco. Você se ar­repende?

— Não importa o que acontecer, não vou me arrepender de nada — respondeu Elisa, olhando-o com adoração.

Cabe respirava com dificuldade, cada vez mais rápido, e afastou-se dela de repente.

— É melhor pegar suas coisas. Estão nos esperando por vol­ta das seis horas.

— Certo. — Elisa deixou-o na sala, enquanto colocou os objetos dos quais iria precisar no fim de semana. Depois, foi à cozinha, pegar a comida de Norman.

— Por que está fazendo isso? — indagou Cabe, ao vê-la tirar comida da geladeira.

— É para Norman. Ele gosta de quiche e de suflê de es­pinafre.

— Pelo amor de Deus, você não precisa levar comida para ele. É só avisar a sra. Fitchens do que ele gosta de comer, que ela faz.

— A sra. Fitchens gosta de lagartos?

— Não muito. Meu pai me disse que uma vez ela perseguiu um dos lagartos de Nicky com uma vassoura, quando ele se soltou e foi parar na cozinha. Ainda bem que Nicky apenas gosta de lagartos e não de cobras.

— Quantos anos tem Nicky?

— Oito — respondeu Cabe, indo para a sala. — Cynthia ficou grávida no mesmo ano que minha mãe morreu. Quase fiquei louco.

— Sinto muito por você. — Elisa sabia que aquele era um assunto bem delicado para Cabe, e pôs os braços em volta de­le, como que para confortá-lo. — Você deve ter amado muito sua mãe.

— Muito mesmo — confirmou Cabe, abraçando-a. — Mais do que amo Eugene. Quando ela morreu, algo dentro de mim se foi também. Eugene casou-se logo em seguida e Cynthia ficou grávida de cara. Meu pai não podia ter amado minha mãe e ter feito isso tão rápido depois que ela morreu. Na ver­dade, não deve ter sentido nada.

— Como é seu irmão? — quis saber Elisa.

— Não sei, para falar a verdade. Não somos muito chegados.

Então era disso que Eugene se queixava quando dizia que Cabe não ligava para o irmão mais novo. Provavelmente, Nicky devia venerar o irmão e não conseguia entender o porquê de Cabe não gostar dele.

— Mas sei que ele gosta de lagartos — continuou Cabe. — E de rãs.

— Também gosto de rãs.

— Imagino. — Cabe afastou-se dela com um ar intrigado.

— Diga-me, por que lagartos? Por que não comprou algo mais razoável como um gato, por exemplo?

— Porque sou alérgica a pêlos de animais — confessou Eli­sa. — Eu queria um animalzinho de estimação e achei Norman numa loja. Ele estava com a boca infeccionada e ninguém se incomodava em tentar alimentá-lo. Mas eu, sim. Ele deve ter gostado de mim, porque afinal, sobreviveu. A maioria dos filhotes iguanas doentes não sobrevive. Necessitam de muitos cuidados especiais.

Cabe olhou para ela com adoração.

— Você é uma pessoa muito bondosa. Cuidado para não se doar demais.

— A gente não pode se doar demais — replicou Elisa, sé­ria. — Apenas o suficiente.

A expressão no rosto dele começou a anuviar-se.

— Não me referi a você, Cabe — sussurrou ela, sorrindo. Uma série de sensações confusas e conflitantes o assaltara.

Elisa o atraía demais. Tinha necessidade de sentir seu calor, seus carinhos.

— Não sei se gosto que leiam minha mente — replicou Cabe.

— Bem, me avise quando se decidir — Elisa murmurou, sorrindo, feliz. — Você é muito forte — disse, passando a mão pelo peito forte e musculoso.

— Trabalhar em plataformas de petróleo ou tornam um ho­mem forte ou o quebram para sempre — respondeu Cabe, bai­xinho, pegando-a pela cintura e carregando-a, enquanto pousava seus lábios nos dela. — Gosto de carregá-la, srta. Marist. Você não pesa muito, pesa?

— Pouco mais de cinqüenta e seis quilos — protestou ela.

— Sou pesada.

Cabe sorriu, dando-lhe pequenos beijos. — Você não é pesada, não.

— Você está com cheiro de cigarro…

— Estou? — Os lábios masculinos envolveram os de Elisa e Cabe, abraçou-a com mais força, pondo-a de pé.

Era a primeira vez que se beijavam de pé, abraçados, e sen­tir aquele corpo feminino de encontro ao dele era maravilhoso.

Cabe a apertava cada vez mais, quase não conseguindo con­trolar o próprio desejo.

— Nunca nos beijamos desse jeito, não é? — ele pergun­tou segurando-a pelos quadris. — É diferente assim.

— É mesmo — gemeu Elisa, sem poder esconder a grande excitação que crescia dentro dela ao sentir as mãos fortes des­lizando pelo seu corpo, numa doce exploração.

— Elisa — sussurrou Cabe, beijando-a com fervor, enquan­to seus corpos se uniam cada vez mais, fazendo com que ela gemesse alto.

— Por favor… — mal conseguia murmurar Elisa, meio per­dida nas novas sensações que a invadiam. — Por favor, por favor…

Cabe sentia que já não dava para segurar a onda de desejo e de sensualidade que os envolvia. Estava prestes a perder a cabeça e possuí-la ali mesmo.

— Precisamos parar com isso — disse ele, de repente, soltando-a e segurando-a ao ver que Elisa perdera o equilíbrio, quase caindo no chão.

— Se eu me sentir assim quando você fizer amor comigo, nem perceberei que me machucou — Elisa sussurrou, baixinho.

— É melhor irmos embora, menina.

— Certo. — Mas Elisa se afastou dele de modo relutante, as lembranças do modo como Cabe a segurava ainda frescas em seu corpo. — Vou pegar as coisas de Norman.

— Isto eu tenho de ver — disse Cabe, aproximando-se da porta da cozinha.

Não foi difícil. Elisa simplesmente o pegou e o colocou den­tro de sua gaiola, com cuidado para não machucar sua longa cauda.

— Ele costuma dormir quando acaba de comer. Norman não é uma graça?

Uma graça não era exatamente o que Gabe achava do igua­na, mas não querendo ser indelicado, ficou quieto.

— Vamos indo — limitou-se a dizer.

Eugene e Cynthia moravam ao norte de Tulsa, em Orange County, a poucos quilômetros do lago Keystone. Havia mui­ta pesca por lá e muitas lojas de apetrechos para tal esporte. Além disso, a região era conhecida por seus poços de petróleo.

— Há muitos campos petrolíferos por aqui? — quis saber Elisa, enquanto Cabe dirigia pela estrada.

— Muitos. Aquele dia, eu e você estávamos bem em cima de um poço que foi descoberto na época da Primeira Guerra Mundial. Muitos exploradores estão abrindo poços antigos com novas esperanças. Às vezes, vale a pena. Meu pai vai reabrir um. Não que ele precise do dinheiro, mas nunca se sabe.

— Acredito — observou Elisa, sorrindo. — Por que deram o nome de Tulsa para o lugar? Soa meio estranho, não?

— Eu li uma reportagem sobre Tulsa numa revista Natio­nal Geographic, onde diziam que o nome veio do Alabama

— comentou Cabe, enquanto dava uma baforada no cigarro.

— Os índios Lochapoka chamavam o lugar de Tulsey, por cau­sa de sua vila no Alabama. De acordo com a revista, quer di­zer "cidade velha", ou seja, Tallassee. Quando vieram para Oklahoma, batizaram a cidade com esse nome, em homena­gem à velha cidade no Alabama. É isso.

— Havia muitos índios aqui?

— Até Oklahoma se tornar um Estado soberano, em 1907 aqui havia três nações indígenas, os Creeks, os Cherokee e os Osage, E a palavra Oklahoma significa "povo vermelho".

— Suponho que você não tenha sangue índio.

— Por causa dos meus olhos azuis? — Cabe riu. — Na ver­dade, tenho -primos que são Osage e Apache do Arizona.

Elisa olhou para as próprias mãos, pensando em crianças. Só Deus

sabia por quê. Se Cabe tivesse filhos, eles teriam uma ascendência interessante.

— Acho que vai chover hoje — lamentou Cabe, olhando para as nuvens no céu e algumas gotas caindo no pára-brisa do carro. — Que pena. Papai tem um barco. Pensei que po­díamos navegar um pouco, mas se este tempo continuar o fim de semana todo, não teremos chance.

— Aguaceiros, secas, estiagem e ciclones; Ao menos o tempo aqui não é aborrecido — comentou Elisa.

— É verdade. Meu pai contou a Nicky sobre o nosso ami­go feio aí atrás — disse Cabe, referindo-se a Norman. — Nicky está animadíssimo para ver um iguana ao. vivo.

— Norman não é feio — rebateu Elisa. — Ele é… — ten­tou pensar numa palavra.

— Feio — continuou Cabe.

— Para Norman, provavelmente nós é que somos feios.

— Sem dúvida.

— Sabe velejar?

— Aprendi quando era menino. Me molhei muito nas pri­meiras vezes, mas depois acabei pegando o jeito. Também gosto de pescar. E você?

— Só com linha comum. Eu pescava muito com meu avô quando era pequena.

— Aqui é um bom lugar para pesca. Que mais gosta de fa­zer? — indagou Cabe, interessado.

— Gosto de andar de bicicleta, de jogar beisebol, de esca­lar montanhas. Nós morávamos nos Ozarks. É lindo demais.

— É mesmo. Também gosto de beisebol, apesar de não tei­mais idade de correr de uma base a outra. Estes treze anos de diferença entre nossas idades podem importar para você um dia.

— Nunca me importarei com isso. Nunca mesmo, Cabe. Ele pegou uma das mãos de Elisa, levando-a aos lábios. Não

disse nada, nem precisava.

A fazenda situava-se perto do lado Keystone, numa área cheia de árvores e pastagens para os cavalos e para o gado Santa Gertrudes de Eugene. Ficava perto da estrada, mas longe o suficiente para não ouvirem p barulho dos carros.

Eugene estava esperando-os fora da casa, sentado e toman­do um refresco. Levantou-se, indo ao encontro deles, alegre.

Elisa pôde ver que havia uma piscina no fundo da casa, uma garagem e uma quadra de tênis.

— Aqui é muito bonito — ela disse, gentil.

— A casa tem apenas alguns anos. Papai derrubou a casa antiga onde nasci e construiu uma nova.

— Talvez tenha sido melhor para ambientar Cynthia — comentou Elisa, em tom conciliador.

— Pode ser, mas eu não penso assim. Não acho tão sim­ples desistir das lembranças — replicou Cabe, triste.

Eugene estava à porta, esperando-os, usando jeans e uma camisa de flanela xadrez. Sorriu ao ver o filho ajudando a se­cretária a sair do carro.

— Que bom que vocês vieram — Eugene dirigiu-se a Elisa. — Só sinto pelas circunstâncias. Soube que entraram no seu apartamento. Sinto muito pelo ocorrido.

— Descobriu alguma coisa? — Cabe indagou.

— Ainda não. Mas já estou tomando providências para des­cobrir. Vamos entrar, está chovendo. É primavera. Agrade­çam por não terem sido apanhados por um ciclone, junto com a chuva. São muito comuns aqui nesta época. Já tivemos dois este ano.

Eugene abriu a porta da frente, quando Elisa lembrou-se de pegar Norman.

— Norman! — exclamou ela. — Nós o esquecemos!

— Eu tentei esquecê-lo.

— Vou buscá-lo — disse Elisa, correndo em direção ao carro.

— Norman? — indagou Eugene, intrigado.

— Não me pergunte — respondeu Cabe.

Em segundos Elisa estava de volta, carregando a gaiola do iguana.

— Aqui está ele — ela anunciou, orgulhosa.

— Então é um iguana.

— Ele se chama Norman e tem três anos. Eugene pôs as mãos dentro do bolso, suspirando.

— Bem, ele se sentirá em casa. Nicky tem de tudo, exceto um iguana. Ele vai ficar radiante.

— Onde está ela? Ela 0 trouxe? — era a vozinha de um ga­roto que Vinha de dentro da casa.

O menino que apareceu à porta era a imagem de Cabe, só que mais novo, e sorria para Elisa.

— Você deve ser Liz. Sou Nicky. Esse é o seu iguana? Pos­so vê-lo?

— Claro — riu Elisa. A excitação do menino era contagiante. — Sou Liz, sim. E este é Norman.

 

Nicky inclinou-se, olhando para dentro da gaiola. De re­pente, cumprimentou Cabe, dando-se conta de que não o ti­nha cumprimentado ainda, mas o irmão mais velho o ignorou por completo, dirigindo a atenção para o pai.

Uma mulher elegante, de seus quarenta anos, usando jeans e uma parka cor-de-rosa, foi encontrar-se com eles, sorrindo. Tinha os cabelo loiros presos num coque e a pele clara, que contrastava com a de Eugene, seu marido. Seus olhos eram castanhos e gentis ao olharem para o filho.

— Nicky adora bichos com cauda — ela explicou. — Sou Cynthia e você deve ser Elisa. Estou feliz em conhecê-la final­mente. Ouvi falar muito sobre você.

— Alguma coisa do que ouviu pode ser repetida? — inda­gou Elisa, brincando.

— Você ficaria surpresa — respondeu Cynthia. — Como vai, Cabe? Que prazer em vê-lo. — E, ao ver que Cabe a evi­tava de propósito, continuou: — Trarei bolo e café. Vamos entrar. Vocês já comeram?

— Não — respondeu Cabe, seco.

— Que tal alguns sanduíches? A sra. Fitchens teve de via­jar no fim de Semana, então nós também não comemos ain­da. Vou fatiar um pouco de presunto e…

— Posso ajudar? — ofereceu-se Elisa, gentil. — Desde que faço parte do problema da comida, ao menos deixe-me ajudar.

Cynthia pegou-a pelo braço e elas foram juntas para a cozinha.

— Claro que pode ajudar. Nicky, não abra a gaiola do iguana ainda. Espere até que Elisa e você o levem para a garagem.

— Tudo bem, mãe — respondeu Nicky, que, deitado no chão, examinava a gaiola e o iguana com profundo interesse.

— Norman não morde — Elisa assegurou a Cynthia. — Estou acostumada com lagartos. Acho-os fascinantes.

Mas conte-me sobre seu emprego. Sinto falta do meu; eu tra­balhava para Eugene, sabe? — suspirou, enquanto pegava o presunto para fatiar. — Agora passo a maior parte do tempo fazendo todo o tipo de trabalho voluntário e cuidando de pro­jetos sociais e de Nicky. Não preciso mais trabalhar, mas ter dinheiro suficiente às vezes sufoca. Elisa já estava gostando de Cynthia e de sua simplicidade.

— Eu gosto de trabalhar para Cabe — confessou Elisa. — Quer dizer, não o tempo todo. Ele tem um temperamento terrível.

— Eu sei. Ele e o pai não se dão muito bem. Cabe não gos­ta de mim. E nem posso culpá-lo. Gene e eu apressamos um pouco as coisas, porque estávamos muito apaixonados. Nos casamos e em seguida eu engravidei, e Cabe fechou as portas para todos nós.

— Trágico para todos vocês — disse Elisa, em tom amável.

— Foi mesmo. Cabe precisa fazer parte da nossa família. Nicky o adora, mas Cabe não parece ter tempo para seu meio-irmão.

— Nicky é a cara dele.

— Meu filho puxou Gene, assim como Cabe. Achei que a semelhança ia desaparecer com o tempo, mas foi exatamente o contrário.

— Talvez mude algum dia.

— Fiquei feliz por ter vindo com Cabe — falou Cynthia, mudando de assunto. Esta é a primeira vez que ele traz alguém.

— Foi muito gentil da parte dele — concordou Elisa. — Eu estava mesmo com medo de ficar no meu apartamento e motéis não são muito mais seguros, além de serem impessoais. Ainda não sei o que os ladrões procuravam.

— Não se preocupe. Todo esse negócio clandestino em que Gene está metido também me preocupa — dizendo isto, Cynthia passou o prato com o presunto fatiado para Elisa, para que esta recheasse os sanduíches-. — Vocês vão dormir em quartos separados?

Era uma pergunta simples, mas desencadeou uma reação muito complexa. Elisa ficou vermelha e Cynthia começou a rir por causa disso.

— Puxa vida! Pobre Cabe. Retiro a pergunta e a implica­ção. Estou deliciada em ver que ainda existem moças como você no mundo.

Elisa sorriu, tímida.

— Desculpe-me, acho que estou com uma aparência horrí­vel — desta vez foi Elisa a mudar de assunto. — Dormi num motel a noite passada e nem troquei de roupa — explicou, referindo-se ao vestido meio amassado.

— Se quiser trocar de roupa, podemos comer mais tarde.

— Não, está tudo bem. Estou morta de fome. Não almocei.

— Coitadinha! Vou chamar os rapazes e iremos comer agora mesmo.

Minutos depois, estavam todos comendo. A refeição foi agradável, exceto por Cabe ignorar por completo Cynthia e o filho, falando exclusivamente com o pai.

Depois de terem terminado, Elisa foi ao quarto que Cynthia lhe designara, todo decorado em azul e branco, e vestiu jeans e uma camiseta amarela, para poder, junto com Nicky, levar Norman para a garagem.

— O caseiro de papai morava aqui — o garoto explicou para Elisa. — Mas ele foi embora. Por isso, eu guardo meus bi­chos de estimação aqui.

Havia uma prateleira cheia de aquários que foram conver­tidos em hábitats para vários anfíbios e répteis. Havia um pa­ra Norman, grande e com comida.

— Esta é para Norman. Papai a construiu para um coelho que morreu no último verão. Achei que daria para um iguana passar a noite.

— E dá mesmo — concordou Elisa. — Vamos colocá-lo lá dentro.

— Posso segurá-lo um pouco?

— Claro.

Norman não se queixou e nem estranhou, o que seria de esperar.

— Uau! — exclamou Nicky. — Norman é bárbaro!

— Também acho. Eu já o tenho há três anos. Ele come qui-che e pizza e todo o tipo de coisas que iguanas não gostam.

E ficaram conversando sobre vários tipos de anfíbios e de répteis.

— Estamos classificando Norman — explicou Nicky, or­gulhoso, para a mãe, o pai e o irmão, que haviam acabado de entrar.

— Norman parece gostar de você — observou Cabe,

— Gosta, sim — suspirou o menino. — Eu queria ter um.

— Por que não pode ter um? — indagou o pai.

— As lojas não costumam ter iguanas. Dizem que os filho­tes só sobrevivem com muitos cuidados especiais.

— Peça à sra. Harris para encomendar um para você — disse Eugene. .

— Fala sério? — O menino não cabia em si de felicidade.

— Obrigado, papai! Liz, pode me ensinar como fazer para cuidar dele?

— Claro que sim — prometeu ela.

— Quer segurá-lo, Cabe? — perguntou Nicky.

— Não mesmo, obrigado. Ele já fez imitação de dragão para mim, hoje.

— Ele achou que você era um intruso — esclareceu Elisa.

— Aposto como fez a mesma coisa quando o ladrão entrou lá em casa. Podia tê-lo até mordido se o ladrão tivesse se apro­ximado.

— Pensei que você tivesse dito que ele não morde — disse Cabe.

— Normalmente não morde. Mas qualquer animal morde para se defender quando atacado.

— Isso mesmo — concordou Nicky. — Minhas rãs mor­dem se forem ameaçadas, mas são muito dóceis sempre.

— Você tem uma coleção e tanto, Nicky — observou Eli­sa, olhando a grande variedade de bichos que o menino possuía.

— Levei muito tempo para colecionar — explicou Nicky, todo orgulhoso. — Cuido deles pessoalmente.

— E vejo que cuida muito bem — comentou Elisa. — Não acha, Cabe?

Pela primeira vez, ele sorriu para o irmão, que ficou feli­císsimo.

— Obrigado, Cabe.

Elisa olhava para Cabe, que, por sua vez, olhava para Nicky, mas sem hostilidade. Então, havia uma esperança, pensou Eli­sa. Um dia seria possível que Cabe aceitasse o irmãozinho. Nicky precisava do irmão. E, quer ele percebesse ou não, pre­cisava de Nicky.

Pegou a mão de Cabe na sua, num ato afável, mas, ao ver a reação dele, quis retirá-la. No entanto, os dedos dele a segu­raram. Depois, Cabe sorriu para ela e Elisa pôde então pres­tar atenção às explicações técnicas que Nicky fornecia sobre sua coleção de répteis. Cabe sorriu para ela e era como se Eli­sa tivesse tomado o néctar dos deuses.

 

Elisa aprendeu mais sobre Cabe em uma tarde do que em dois anos. Viu o diploma dele de Yale de Administração de Empresas, seus troféus de competições de saltos a cavalo e uma camiseta onde estava escrito que ele tinha breve de piloto. Elisa nem sabia que Cabe sabia pilotar!

Eugene lhe contou sobre o interesse do filho mais velho em História e suas atribuições beneficentes à Universidade de Oklahoma, dando duas bolsas escolares por ano.

E mesmo não gostando de répteis, tinha um grande interes­se por cavalos quarto de milha e cavalgava muito bem. Fora Nicky quem contara isto sobre o irmão.

Enquanto Elisa aprendia tudo isso com a família de Cabe, este estava ao telefone, tentando resolver um problema de emer­gência da empresa. Um equipamento, que havia sido manda: do para o Golfo Pérsico, estava errado. Alguém no depósito se confundira, enviando outro equipamento. Cabeças estavam rolando por causa disso e Cabe ordenara que dois de seus em­pregados fossem até o depósito resolver a situação. — Odeio o negócio de equipamentos — ele murmurou ao voltar para a sala, muito depois. Estava só de meias, a gravata afrouxada e sua camisa meio desabotoada e toda amassada. Cabe estava incrivelmente másculo, pensou Elisa. Os pêlos do peito aber­to faziam com que os dedos de Elisa cocassem. Mal podia ti­rar os olhos dele.

Cabe percebeu tudo isso com um sorriso. Gostava de ver que Elisa o apreciava, mesmo que timidamente. Sentou-se ao lado dela no sofá, pondo um braço em volta de seus ombros.

Eugene e Cynthia trocavam olhares divertidos.

— Se realmente odeia o mercado de equipamentos, volte a trabalhar para mim — murmurou Eugene.

— Nada feito. Gosto muito do que faço. — Cabe olhou para Elisa. — Além disso, você iria me mandar para fora da cidade o tempo todo. Estou ficando muito velho para isso, prefiro ficar num lugar só.

— Podíamos pensar em alguma coisa.

— Não.

Eugene deu de ombros.

— Tudo bem. Não me custava tentar. Alguém quer assis­tir a um filme de ficção científica que eu aluguei?

— Você gosta de ficção científica? — Cabe perguntou a Eli­sa enquanto Eugene punha a fita no vídeo.

— Muito — sussurrou ela, feliz por se encontrar ali. Era incrível estar sentada na sala de estar dos Ritter, com o braço de Cabe em torno de seus ombros.

— Eu também gosto — confessou Cabe, roçando-lhe os lá­bios de leve.

Elisa não acreditava que ele pudesse ter feito aquilo, com toda a família presente. Era quase uma declaração de inten­ção. Enquanto assistiam ao filme, Cabe a observava aten­tamente.

Colocou a mão de Elisa dentro de sua camisa semi-aberta, para que ela brincasse com os pêlos de seu peito, sorrindo ao ver que sua respiração estava alterada. Viu que Elisa tentou disfarçar a reação àquela intimidade, sorrindo ao vê-la olhar para cada membro da família, preocupada.

Mas não precisava ter-se preocupado. Eugene e Cynthia acomodavam-se, abraçados, num sofá mais à frente, enquan­to Nicky estava estirado em frente à televisão, no carpete. Nin­guém prestava a mínima atenção a Cabe e a Elisa. O que era uma boa coisa, pois ele, com sua mão livre, fazia carícias num dos seios de Elisa, por cima da blusa, deixando-a totalmente confusa e excitada.

Eu mato você, pensou Elisa, numa agonia de desejo. Vou estrangulá-lo. Tentar ficar sentada ereta e fingindo que nada demais acontecia era demais. Quase gemeu alto ao sentir os dedos indo para cima e para baixo.

— Que tal um cafezinho? — perguntou Cabe, de repente. — Eu e Elisa iremos coar — disse ao ver que Cynthia já se preparava para se levantar.

— Querem que paremos o filme? — indagou Eugene, com malícia, já sabendo qual seria a resposta do filho.

— Não precisa. Voltamos logo — respondeu Cabe, com a maior tranqüilidade. Segurava Elisa pelo braço e conduziu-a até a cozinha.

Chegando lá, fechou bem as portas e encostou-a na gela­deira, envolvendo-a com os braços.

— Finalmente! — sussurrou no ouvido de Elisa, preparando-se para beijá-la. — Eu não ia agüentar muito tem­po mais!

Enquanto sua boca cobria a de Elisa, sua mão escorregou pela abertura da blusa, pegando um dos seios, com muita de­licadeza. Elisa gemia baixinho, feliz em receber as carícias. Cor­respondeu aos beijos. O barulho da geladeira confundia-se com a respiração alterada de ambos.

Cabe pôs os braços dela em volta de seu pescoço, segurando-lhe depois uma das mãos e pondo-a em seu peito.

— Assim está bom — disse ele, mostrando a Elisa como. gostava de ser tocado. — Espero que goste de homens com muitos pêlos, querida.

— Eu gosto — Elisa estremeceu, fitando-o nos olhos. — Achei que ia morrer lá dentro.

— Eu também. — E, dizendo isso, escorregou uma das mãos por baixo do sutiã, vendo que o corpo de Elisa se contorcia com o toque. — Não vou machucá-la. Esta coisa abre na frente ou atrás? — indagou ele, lutando com o sutiã.

— Atrás.

Cabe sorriu.

— É perda de tempo usá-lo — sussurrou, inclinando a ca­beça, enquanto seus dedos abriam a peça íntima. Depois suas mãos deslizaram até os seios, brincando com eles, deixando-a louca de excitação. — Gosta de sentir minhas mãos em você?

— Cabe… — sussurrou Elisa, fora de controle para respon- < der algo inteligível.

— Calma, agora — disse Cabe, baixinho, abrindo-lhe a blu­sa e admirando os seios livres e redondos, o prazer refletido em seus olhos/— Não, não lute contra o que está sentindo — falou ao ver que Elisa tentava se cobrir.

Elisa sabia que, não fosse pela geladeira, já teria caído ao chão havia muito tempo.

— Oh,… Cabe… — gemeu baixinho. — Faça… pare…

— Está ruim? — brincou ele. — Você quer?

— Quero!

— Eu também, querida. Tente não gritar quando sentir mi­nha boca.

Elisa só entendeu o que ele quis dizer alguns momentos de­pois, ao sentir a boca de Cabe envolvendo por completo um de seu seios, enquanto a mão dele brincava com o outro, fazendo-a mergulhar num redemoinho de sensações novas.

— Cabe!

Não parecia a sua voz. Estava mais rouca, mais madura. Suas mãos deslizaram para a massa de cabelos negros de Ca­be, segurando-os como se lhe dessem equilíbrio para agüen­tar a deliciosa tortura de ser tocada daquele modo. Elisa soltou um profundo gemido quando o viu observar seus seios, os mamilos rijos.

— Eu não sabia o quanto uma mulher podia ser linda até agora — sussurrou Cabe. — Nunca fiz amor com uma vir­gem, Elisa. Não sei se poderei sobreviver quando a possuir.

A voz de Cabe parecia vir de muito longe e Elisa beijou-lhe o cabelo, ainda trêmula pelas sensações. Ele moveu-se de tal modo que uma de suas pernas ficou entre as de Elisa, acaban­do com a pouca resistência que ainda havia da parte dela.

As mãos de Elisa deslizavam, sentindo o corpo rijo dele so­bre o tecido. Percebia que estava adorando tocá-lo.

— Mais para baixo — pediu Cabe. — Não pare aí. Elisa engoliu em seco.

— Eu não posso… tocá-lo assim.

— Pode, sim. — As mãos dele guiaram-na até o ponto má­ximo de sua masculinidade. —Abrace-me mais forte. Não te­nha medo. Ambos sabemos que não poderei possuí-la aqui.

— Mas vou machucá-lo — disse Elisa, obedecendo-lhe. Cabe sorriu.

— Não vai, não. — E, dizendo isso, inclinou-se e beijou-a com intensidade. — Se estivéssemos a sós, eu não parada. Ti­raria esta calça, abriria meu zíper e faríamos amor bem aqui — falou Cabe, a voz embargada.

Lágrimas assomaram aos olhos de Elisa ao perceber que ela gostaria muito que isso acontecesse. Cabe olhou-a com ternura.

— Você se entregaria se eu pedisse, não é?

— Sim.

As mãos masculinas deslizaram para os seios, os olhos de Cabe fitavam-na sérios.

— E se eu pedisse que você fosse ao meu quarto esta noite, depois que todos estiverem dormindo?

Elisa mordeu o lábio inferior, nervosa.

— Não machuque seus lábios. Não pedirei que durma co­migo. Pelo menos, não ainda — disse Cabe, afastando-se de­la o suficiente para fechar-lhe o sutiã. — Homens e mulheres fazem isto há séculos. Nada fizemos que possa deixá-la com complexo de culpa. Mas posso pensar em algumas coisas que eu gostaria de fazer com você. Quer ouvi-las?

— Não.

— Quer, sim. — Cabe sussurrou em seu ouvido, descreven­do coisas que gostaria de fazer com Elisa. — Você gostaria de fazer isso comigo?

— Você é um animal — disse Elisa, traindo-se com um sorrisinho malicioso.

— Sou um animal faminto — confessou Cabe. — Que tal fatiarmos o bolo de Cynthia?

Elisa sorriu.

— Tudo bem — ela respondeu, acariciando-lhe o rosto.

— Você está toda desarrumada. Quando voltarmos à sala, Eugene vai sorrir de orelha a orelha.

— Foi você quem me trouxe aqui — defendeu-se Elisa.

— Eu? Meu Deus, você estava me acariciando o peito! O que eu podia ter feito? Ficar ali sentado, deixando que você me torturasse? Pensa que sou de ferro?

— É? E o que você fazia enquanto eu o torturava?

— Aprendia como uma virgem reage a um toque sensual.

— Vamos fazer café! — disse Elisa, resoluta. Enquanto Elisa preparava o café, Cabe a olhava, os braços cruzados na frente do peito.

— Você também está meio desarrumado — ela disse observando-o.

— Acha que devo abotoar minha camisa e voltar para a sala para que Eugene e Cynthia não suspeitem do que estivemos fazendo na cozinha? — perguntou Cabe em tom inocente.

— Se o modo como seu pai nos olhou foi alguma indica­ção, quando voltarmos ele poderá dizer passo a passo tudo o que fizemos.

Cabe deu uma risadinha.

— Disso não tenho dúvidas — disse ele, acendendo um ci­garro. — Eu devia parar de fumar, mas é tão bom depois de… — interrompeu-se.

Elisa olhou-o, intrigada por ele parar a frase no meio. Foi então que percebeu o que Cabe quisera dizer. Que fumar era tão bom depois de fazer amor. Elisa não era a primeira com quem Cabe fazia isso, e esse pensamento não era nada agra­dável. Elisa fez o café sem dizer uma palavra. O clima de har­monia se desvanecera, e em seu lugar ficara a amarga realidade.

Percebendo o que Elisa sentia, Cabe foi até ela, segurando de leve seus ombros.

— Não posso apagar o passado, nem que eu queira. Mas falei sério sobre minha reputação. Não sou o playboy que deixei que você pensasse que eu era. É importante que você acredite em mim.

— Por quê? Sou apenas um caso…

— Não trato meus casos como tratei você. E acho que sa­be disso — defendeu-se Cabe.

— Estou com tanto medo… — sussurrou Elisa.

— Então somos dois, querida. Compromisso é algo que eu nunca quis. Mas não quero ter um caso com você. Não quero que outros homens a toquem.

— Também não quero que outras mulheres o toquem — disse Elisa, hesitante.

— Meu Deus! — Cabe riu, nervoso. — Estamos perdendo a cabeça, não? Alguns beijos e o mundo desaba. Não tinha idéia de que seria assim.

— Podemos parar.

— Como? Sinta isto! — disse Cabe, pegando uma das mãos dela e pondo-a em seu peito, junto ao coração. — Já tentou deter um ciclone? Talvez seja mais fácil. A menos que você queira se mudar para a Sibéria ou para a Alasca e troque de nome, não acho que seja possível determos isto. Mesmo que você fugisse, eu a encontraria.

— Por quê?

— Porque meio homem não pode sobreviver.

Elisa abraçou-o. Também se sentia assim a respeito dele. Mas aquilo não podia durar. Apesar de Cabe dizer que não era promíscuo, tivera muitas mulheres e todas eram lindas. Ele se cansaria logo dela. Era apenas novidade, só isso.

Mas Elisa o desejava muito. Amava-o. Se isso era tudo o que podia ter de Cabe, então teria. Ao menos isso. Abraçou-o forte, sentindo os músculos rijos.

— Não está com medo de mim agora? — sussurrou Cabe em seu ouvido.

— Não.

As mãos dele deslizaram pela coluna dorsal de Elisa, segurando-a pelos quadris e puxando-a contra si, com movi­mentos sensuais.

— Somos bons juntos. Na cama, iremos satisfazer um ao outro tão completamente que nenhum de nós jamais poderá fazer amor com outra pessoa. E isto é o que mais me assusta.

Porque Cabe não queria compromissos.

— Não precisamos ir para a cama — argumentou Elisa.

— Você ficou louca? — Cabe indagou, puxando-a para si. — Por quanto tempo acha que controlarei isto?

— Ficarei grávida. — disse Elisa, enrubescendo ao perce­ber o que tinha dito.

Ele começou a rir.

— Sua diabinha! Isso não foi justo.

— Foi, sim. Eu poderia engravidar. Sei que muitas mulhe­res tomam pílula, mas para isso eu terei de ir ao médico da família e seria muito embaraçoso. Ou precisaria ir a uma clí­nica, e, com certeza, encontraria alguém que conheço.

— Posso entender isso.

— Contudo, são apenas algumas horas por mês em que uma mulher está fértil.

— Não se fie nisso — rebateu Cabe. — Lembro que li que o esperma pode viver dentro do corpo de uma mulher por quase três dias e…

— Cabe!

— Meu melhor amigo é médico. Me contou muitas coisas sobre mulheres. O risco não é apenas naqueles dias, pois há mulheres que ovulam de forma irregular, então nunca se pode ter certeza de qual é a época perigosa. E pare de ficar ver­melha e de olhar para o chão. A reprodução é uma parte natural e linda do que um homem e uma mulher sentem um pelo ou­tro. Não é nada para ser escondido.

— Muita gente esconde. E consideram um ato tão normal quanto assoar o nariz.

— Não para mim e para você, Liz. Você não é uma devas­sa e não sou sedutor de virgens. Não será algo feio e casual o que acontecerá entre nós.

— Será se eu for apenas outra conquista.

— Se você fosse outra conquista, eu não ligaria para con­trole da natalidade e nem a teria trazido à casa de meu pai. Hoje em dia somente um tolo se arrisca na cama. Não me im­porto se você ficar grávida, Liz. Isto soa casual?

— Não entendo o que você pretende. Disse que não quer compromisso, e que não seduz virgens, e agora fala de bebês e…

Cabe sorriu.

— Eu gosto de bebês. Você não?

— Claro que sim. Gosto de, nas lojas, olhar coisas de be­bês — confessou Elisa. — Nunca pensei que eu compraria es­sas coisas, mas pensava nisso quando estava sozinha. Sempre estive sozinha.

— Eu também — Cabe beijou-lhe as pálpebras com cari­nho. — Fiquei sozinho por muito tempo. Aí você veio traba­lhar para mim e percebi que eu ia para o trabalho todo dia para vê-la. Depois daquele Natal, então, me dei conta de que não podia ficar sem você no escritório.

— E eu percebi que não ia para o trabalho, mas sim para encontrar você — confessou Elisa.

— Como duas pessoas puderam ser tão cegas? Meu pai ti­nha toda razão. Você vale duas da Karol.

Elisa tinha vontade de perguntar de Karol, mas teve medo.

— O Café — ela murmurou, olhando para o bule.

— Acho melhor voltarmos antes que venham nos procu­rar. Eu corto o bolo — ofereceu-se Cabe. E, relutante, sem olhar diretamente para Elisa, dirigiu-se à sala, segurando a bandeja.

 

Nicky foi para a cama às nove horas e implorou para que Norman dormisse com ele. Cabe olhou feio, mas como os pais concordaram, se Elisa deixasse, de nada adiantou.

— Você o deixa mesmo solto na sua casa? — indagou o menino, animado, quando levaram Norman para o seu quarto.

— Deixo, sim. Ele é bem treinado. Teremos de colocar umas folhas de jornal no seu banheiro e mostrar-lhe. Norman o usará para as suas necessidades.

— Incrível! — suspirou Nicky. — Puxa, como Norman é bonito.

—: Não fale muito alto, senão ele fica todo convencido — cochichou Elisa em tom brincalhão, fazendo o menino rir. — E, pelo amor de Deus, não deixe a porta aberta. Norman não costuma andar por aí à noite, mas nunca se sabe.

— Se ele entrasse na cama de meu irmão, o mundo acaba­ria, não? — riu Nicky.

Elisa teve de parar e pensar um minuto antes de perceber que o menino se referia a Cabe. Podia imaginar seu chefe sendo atacado pelo iguana. Começou a rir com o pensamento e foi difícil parar.

— Tem certeza de que essa coisa não devia ficar presa nu­ma gaiola? — perguntou Cabe, da porta do quarto.

— Certeza absoluta — assegurou Elisa.—Norman é mui­to quieto e limpo e não vai dar nenhum trabalho, Eu estava mostrando a Nicky como arrumar o banheiro de Norman.

— Posso sugerir um jeito.

— Ele é. apenas um bebê. — Elisa disse em tom suave.

— E que bebê! Aaargh! — exclamou Cabe.

— Feche os ouvidos, querido. — disse Elisa ao iguana, que já fechara os olhos.

— Você fez a felicidade dele hoje — comentou Cabe, ao saírem do quarto do menino. — Nicky está excitadíssimo com Norman.

Elisa rezava a Deus para que o garoto não se esquecesse de trancar a porta. Lembrava-se de que o quarto dele e o de Ca­be eram servidos pelo mesmo banheiro.

— Seu irmão é um bom menino — afirmou Elisa, ao che­garem à porta do quarto que Cynthia lhe destinara. Era cedo para ir para a cama, mas estava exausta e quase não dormira na noite anterior. Além disso, Cabe dissera qualquer coisa a respeito de irem pescar de manhã cedo, mesmo se o tempo ain­da não estivesse muito bom.

— Pegarei uma vara para você e iremos ao pier de papai para pescar um pouco — murmurou Cabe, acariciando o ros­to de Elisa cornos olhos. — Você parece cansada.

— Foi uma longa noite a de ontem. Quase não dormi.

— Então somos dois — comentou Cabe, sorrindo. — Me atormentei pensando em você e no meu gerente de vendas até as cinco da manhã. Só dormi uma hora quando você chegou ao escritório.

— Ben é um ótimo rapaz, mas eu só saí com ele para pro­var que não estava apaixonada por você. Para que não achas­se que eu ia correr atrás de você ou algo assim.

— Eu adoraria que você corresse atrás de mim, menina — disse Cabe, pegando o rosto de Elisa com as duas mãos. — Você é uma novidade na minha vida.

O que ela suspeitava o tempo todo. Mas ele inclinou-se e a beijou ternamente. Elisa suspirou, deliciada. Mesmo saben­do quais eram os sentimentos de Cabe para com ela, não con­seguia evitá-lo.

— Não é uma boa idéia não terminar o que começamos — suspirou Cabe. — Durma bem, querida. Cynthia vai tirá-la da cama ao raiar do dia. Ela e papai acordam muito cedo e Cynthia faz um tremendo café da manhã.

— Adoro café da manhã — disse Elisa. — Norman tam­bém. Adoro ovos e bacon.

— Que triângulo amoroso mais estranho — murmurou Ca­be. — Eu, você e o lagarto irlandês. Boa noite.

Elisa riu, olhando-o afastar-sé. Cabe era, sem dúvida, o ho­mem mais bonito que já vira na vida. Todo musculoso, sensual e másculo. Com um suspiro de frustração, entrou em seu quarto e trancou a porta.

O cheiro do bacon a acordou muito antes de Cynthia bater em sua porta. Levantou-se depressa, vestiu o jeans e uma ca­miseta xadrez e calçou botas. Ainda estava escuro lá fora, mas o sol logo iria aparecer e tinha parado de chover. Elisa esco­vou bem os cabelos, pôs um pouco de maquiagem, escovou os dentes e se apressou a descer para o desjejum.

Cabe já estava na cozinha pegando os pratos para Cynthia. Parecia diferente; Em vez do terno habitual, estava usando jeans apertado e desbotado, com uma camisa de cambraia bege e botas de cano alto, que lhe davam um porte ainda mais atlé­tico. Parecia um cowboy muito sensual e Elisa sentiu o cora­ção, quase' parar de bater.

Elisa observava Cabe enquanto comiam e Eugene e Cynthia prestavam atenção no casal. Cabe também a olhava aberta­mente, portanto, não havia problema.

Nicky teve a tarefa de alimentar Norman, o que ele fez com alegria e carinho. Após a deliciosa refeição, Cabe pegou va­ras de pescar e emprestaram a caminhonete de Eugene para irem até o lago.

Cabe dirigia a caminhonete à vontade. Usava um chapéu que lhe emprestava mais ainda um ar de cowboy. O sol agora estava começando a dar o ar de sua graça e a manhã prometia ser gloriosa, apesar da chuva dos dias anteriores.

— Eu costumava fazer este caminho a pé quando era mais jovem — confessou Cabe. — Há um atalho, mas ainda assim são vários quilômetros de distância. E não dá para fazer esta caminhada com apetrechos de pesca e mais o almoço.

O almoço encontrava-se numa grande cesta que Cynthia pre­parara para eles. Havia refrigerantes dentro de uma caixa de isopor, sanduíches, doces para a sobremesa e uma térmica com café.

— Não gosto da idéia de ter de trazer tanta coisa, mas sabe como Cynthia é exagerada — comentou Cabe.

— Cynthia é uma pessoa muito simpática — disse Elisa. — Seu irmãozinho também.

A reação de Cabe foi instantânea. Acelerou a caminhonete a uma velocidade bem incômoda para o passageiro, no caso Elisa.

— É o que todos dizem.

Ao chegarem, descarregaram tudo no pier de madeira de Eugene, onde o barco ficava ancorado. No barco, havia mui­tas minhocas para servir de iscas.

— Pode colocar a isca no anzol sozinha? — indagou Ca­be, divertido.

— Eu cresci fazendo isso — informou-o Elisa, prendendo uma minhoca no anzol.

— Esta não é a forma de prender a isca no anzol — ele se apressou em dizer. — O peixe precisa se prender em alguma coisa, uma só isca é muito pouco.

— Você vai perder todas essas minhocas soltas e eu vou pe­gar um peixe — disse Elisa, sem se abalar.

Jogaram as linhas e sentaram-se, lado a lado, no pier. Ao longe, podiam ouvir os motores de outros barcos, porém, mes­mo assim, o lugar onde ficava o pier e uma pequena cabana de Eugene eram bastante tranqüilos.

O sol agora estava firme e no horizonte podiam ver as velas brancas dos barcos. Aquela hora da manhã era meio mágica, sem ninguém por perto.

— Queria ter outro tipo de isca — declarou Elisa.

— Bem, minhocas dão muito certo para fisgar peixes, a me­nos que você quisesse, é claro, utilizar lagartos.

Era- óbvio que Cabe se referia a Norman, mas Elisa nada disse.

— Imagino que Norman tenha primos — Cabe insistiu na provocação. O que será que eu pescaria se pusesse Norman no anzol?

— Pescaria o diabo, isso sim. Norman não é isca de peixe.

— Nem dormi direito pensando na porta de comunicação do meu banheiro com o quarto de Nicky. Se Norman é tão inteligente como você diz, podia abrir a maldita porta e me comer durante o sono.

— Olhe aqui, pela última vez, iguanas não comem gente. Em especial, velhos exploradores de petróleo que provavelmen­te têm gosto de couro mofado!

Ao ouvir a provocação, Cabe largou a própria vara de pes­car e, com um sorrisinho malicioso, foi em direção a ela. Quando Elisa deu por si, estava deitada no píer, com o peso dele em cima de seu corpo.

— Não tenho gosto de couro mofado e possa provar isto — murmurou Cabe, abaixando-se para beijá-la com ardor.

Elisa nem sequer fingiu que ia resistir. Abraçou-o, trazendo-o para mais perto de si. Sabia o quanto o desejava, portanto, não havia por que fingir que não.

— Que gosto tenho? — sussurrou Cabe em seu ouvido.

— De café — Elisa respondeu, tocando-lhe os lábios com os dedos, sentindo a pele do rosto, que acabara de ser barbeada, ainda cheirando a loção.

O olhar de Cabe dirigiu-se para os seios fartos, que subiam e desciam de acordo com a respiração alterada de Elisa.

— O que eu não daria para estar atrás de uma porta tran­cada com você agora.

— O que você faria?

— Isso você já sabe — gemeu Cabe. Sua mão deslizou pa­ra um dos seios, com arrogante possessividade. — Lembra-se do que sentiu quando suguei seus seios?

Elisa lembrava-se bem demais, até. Gemeu ao sentir o to­que dos dedos em um dos mamilos rosados. Era impressio­nante como aquilo a deixava maluca, totalmente presa ao fascínio másculo daquele homem.

Cabe levantou a cabeça, olhando em volta. A área estava deserta por completo e, quando seus olhos a olharam de no­vo, Elisa já sabia quais eram suas intenções.

— Alguém… pode vir.procurar você — sussurrou Elisa, mas aquilo nao podia ser considerado um protesto sério.

— Se alguém vier, eu mato — respondeu Cabe, abrindo os botões da blusa de Elisa um a um, de forma enlouquecedora. Elisa estava usando sutiã e Cabe gemeu, impaciente, enquan­to a erguia para abri-lo. — Odeio estas coisas.

Elisa teve um choque ao sentir que Cabe não só tirara seu sutiã, como a blusa também, deixando-a nua da cintura para cima. — Cabe, você não pode!

— Posso, sim — disse ele, já inclinando-se em direção ao vale entre os seios magníficos, expostos ao sol, com os mami­los já duros de excitação.

Os protestos de Elisa foram se desvanecendo, juntamente com o pouco de sanidade mental que ainda lhe restava. Ela gemeu baixinho, sentindo as sensações deliciosas percorrerem-lhe o corpo, numa espécie de torpor mágico que tomara con­ta dela. Queria sentir os lábios de Cabe nos seus, queria senti-los em sua pele, em toda parte.

A mão livre de Cabe segurou-a pela nuca, enquanto a ou­tra explorava sua pele, descendo até a cintura e o fecho da calça jeans.

Percebendo o susto de Elisa, ele se deteve.

— Tudo bem. Esta parte fica para outra vez, quando esti­vermos do outro lado de uma porta trancada.

— Imagino que o que estamos fazendo seja bastante co­mum para você — disse Elisa nervosa.

— Liz — começou ele —, nunca me senti assim com nin­guém. Jamais achei tão excitante acariciar uma mulher e ver suas reações. Estou pronto, agora — sussurrou em seu ouvi­do. — E mal a toquei.

A palavra "pronto" tinha várias conotações, mas Elisa olhou-o sem entender.

— Você não compreende, não é? — comentou Cabe, gen­til. — Não entre em pânico. Apenas vou lhe mostrar uma coi­sa. — E, dizendo isso, levantou-se um pouco, para depois pressionar os próprios quadris nos dela.

Chocada, os olhos arregalados, Elisa pôde sentir toda a ex­tensão da excitação de Cabe.

— Pronto — sussurrou Cabe em seu ouvido. — Até que isto aconteça, um homem não pode fazer amor com uma mu­lher, você não sabia?

A boca de Cabe cobriu a de Elisa com suavidade e expe­riência, deixando-a trêmula de medo.

— Não, vou machucá-la, querida. Está tudo bem.

A voz calma dele a acalmou. Pouco a pouco, Elisa sentiu o corpo relaxar. Cabe a beijou de modo terno, levantando-se para abrir a própria camisa.

— Você está tremendo — ele murmurou em seu ouvido. — Sim, você me quer. E eu te quero, quero muito.

— Cabe… — disse Elisa, baixinho, mordiscando-lhe o ombro.

— Meu Deus, Elisa, como eu te quero! — ele gemeu, no auge da paixão. Quero uma cama, e você nela, e a porta bem trancada. E então…

Elisa não entendia por que sentia necessidade de beijá-lo e de mordiscá-lo também, mas guiada por Cabe, era algo que parecia natural de se fazer.

Cabe pegou uma das mãos dela, levando-a para a sua masculinidade. Elisa abriu os dedos, porém, um segundo depois, tentava tirar a mão, aflita. Foi só então que Cabe percebeu o quão longe tinham ido.

Aquele não era o lugar para estarem fazendo aquilo. Mal­ditas circunstâncias! Não sabia como iam continuar daquele modo, com aquele peso na consciência toda vez que a tocava e parava de excitá-la. A situação estava ficando impossível.

Cabe soltou a mão de Elisa, frustrado, afastando-se dela. Elisa, por sua vez, vestiu-se e ficou intrigada ao ver que Cabe acendia um cigarro e nem olhava em sua direção. Como era possível um homem ser tão ardente num minuto e tão frio e distante no outro?

De qualquer forma, estava embaraçada com as próprias reações.

O silêncio entre eles estava ficando insuportável, até que Ca­be quebrou-o:

— Farei trinta e sete anos em alguns meses. Engraçado, nun­ca pensei que ficaria mais velho. Estava tão ocupado com os meus negócios e ganhando dinheiro que o tempo escorregou das minhas mãos. Estou bem rico, mas não tenho nada. To­do o dia volto para uma casa vazia e uma vida vazia. Até o Natal, havia aventuras ocasionais. Mas, desde então… — Cabe fitou-a nos olhos — não tive nada. O celibato nem sequer foi tão difícil assim. Saio com Karol e não consigo tocá-la. Ela não me atrai porque não é você. E eu nem sequer percebia is­so, até outro dia, quando tentei beijá-la no escritório. A boca de Karol tinha o gosto da sua e era o seu corpo que eu imagi­nava estar abraçando. — Cabe sorriu, meio sem jeito. — Agora você sabe. Tenho pensado em você há meses. Eu te quero, Eli­sa, como nunca quis outra mulher na vida. E você me quer. Só que a sua moral puritana e a minha consciência nos impe­diram de sermos amantes. Precisamos decidir o que vamos fazer.

Então era isto o que estava aborrecendo Cabe. Sua cons­ciência não o deixava seduzi-la, a menos que Elisa concordasse.

Mas Cabe não queria compromissos. O que não a surpreen­dia, pois era algo que ouvira durante dois anos.

— Talvez seja melhor eu arranjar outro emprego — disse Elisa, por fim.

— Acha que essa é a solução? Eu te desejo demais, droga!

— Cabe, não sou uma mulher moderna… — começou Eli­sa. Frustrado, Cabe olhava-a com desejo. Qualquer outra mu­lher já teria caído em seus braços. Mas aquela virgenzinha teimosa ia negar-lhe aquele prazer. Mais ainda, ia negar a si .mesma. E por quê?

Bem, se Elisa esperava ganhar com isso um anel de noiva­do, Cabe logo iria desfazer aquela absurda fantasia! Ficar al­guns dias perto do pai e de Cynthia já havia mudado sua forma de ver as coisas. O amor não durava! Se durasse, seu pai ja­mais teria se casado de novo, e tão depressa!

— Como você é fria. Nada de sexo antes do casamento, na­da de emoções. Você é a vestal virgem. Só que não estamos mais na Antigüidade. É permitido a uma mulher dormir com o homem de quem ela gosta, mesmo se não forem casados. Meu Deus, Liz, sabe que século é este?

— Claro que eu sei. — Nesse ponto, percebendo o jogo dele, Elisa já estava bem irritada. — E não precisa fazer discursos sobre as vantagens do mundo moderno. O controle de natalidade devia dar às mulheres mais liberdade sexual, mas tudo o que vejo é que dá uma bela desculpa aos homens para não se casarem. Por que se casar com alguém quando se pode dor­mir com quem se quer, a qualquer hora? E, se a mulher fica grávida, há muitas alternativas modernas para o problema!

Cabe levantou-se, indignado.

— Se eu a engravidasse, você teria todo o meu apoio. Além disso, para começar, tomaria os devidos cuidados para que isso não acontecesse!

— Bem, pode acontecer de qualquer modo — disse Elisa. — Nenhum controle de natalidade dá cem por cento de ga­rantia, nem a pílula! E os homens podem se dar ao luxo de não tomarem cuidado, pois não engravidam!

Os olhos de Cabe dardejavam.

— Como é que começamos esta conversa sobre gravidez?

— Tem a ver com sexo — respondeu Elisa, sarcástica. Aque­la atitude machista a enfurecia. — Você não sabia?

Suspirando fundo, Cabe precisou se conter para não deitá-la ali rio pier e possuí-la, nem que fosse à força.

— Não espere nenhum pedido de casamento de minha parte. Eu quero você, mas não tanto assim — disse Cabe, desespe­rado por defender-se.

— Ótimo, porque casar com um homem como você é a úl­tima coisa que eu quero no mundo! — gritou Elisa, furiosa.

— Isso me deixa muito feliz — respondeu Cabe. — Acho melhor pegarmos as varas de pescar, se não se importa. Tam­bém acho melhor comermos em casa — disse, pegando a cesta.

— Para mim está ótimo. Nem estou com fome. — Elisa foi pegar sua vara, mas ela estava pesada demais. Surpresa, per­cebeu que havia fisgado um peixe, que se debatia furiosamen­te. — Veja só, peguei um peixe! — exclamou, toda feliz. — E suas minhocas todas se foram. Que pena!

— Não foi a sua minhoca que fisgou o peixe — respondeu Cabe, louco da vida. — Ele deve ter ouvido suas idéias arcai­cas sobre sexo e riu até morrer.

Sem mais agüentar o tom agressivo, Elisa sentiu que lágri­mas lhe assomavam aos olhos. Ficara tão encantada com a perspectiva de pescar com Cabe aquela manhã, no entanto a pescaria se tornara um pesadelo.

— Acho melhor eu voltar para o meu apartamento — ela declarou, triste.

— Não senhora — retrucou Cabe. — Eu a trouxe para cá para que um detetive particular fosse ao seu apartamento in­vestigar quem poderia ter entrado lá. Você fica aqui até ama­nhã, pelo menos. — Ele sorriu, sem jeito. — Sei que você não me atacará durante a noite.

Voltaram para casa em silêncio e durante o resto do dia Elisa ignorou-o. Na cozinha, Cynthia e ela limpavam o peixe para o jantar, enquanto Eugene e Cabe discutiam negócios no es­critório.

Segurando uma rã, Nicky olhou para o irmão mais velho no salão de jogos.

— Pensei que você e Liz tivessem ido pescar.

Cabe deu de ombros, fumando seu cigarro.

— Elisa pegou um peixe. Acho que o comeremos no jantar.

— Vai se casar com ela?

A pergunta à queima-roupa o deixou encabulado, mas Ca­be logo se refez.

— Imagine! Claro que não. Ela é minha secretária.

— Elisa conhece muito sobre lagartos. A maioria das ga­rotas têm medo deles. Até mamãe, se bem que ela finge direitinho que não tem medo.

Mudando de assunto, Cabe perguntou:

— Você já viu um poço de petróleo em funcionamento?

— Nunca. Papai é ocupado demais para me levar.

Cabe percebeu que o pai não mudara. Dava todos os bens materiais que Nicky quisesse, mas não estava presente. Igual ao que acontecera com ele, Cabe.

— Um dos meus clientes tem um poço perto de Beggs. Posso levar você até lá no próximo fim de semana, se quiser. Eu tra­balhava como explorador.

— Papai me contou. Você me leva mesmo, Cabe? — inda­gou o menino, com os olhos brilhantes de alegria. — Eu ado­raria. Se não for muito incômodo.

Cabe afagou os cabelos do irmão menor com afeição.

— Não será incômodo algum. Vamos ver se achamos algo diferente de lagartos para nos distrairmos. — E, olhando pa­ra Norman, perguntou: — Não comem lagartos na América Latina?

— Comem, sim — respondeu Nicky. — Eles chamam de gallina de palo, ou seja, galinha de árvore. Dizem que têm gosto de frango. Mas não pode fazer isso com Norman! Liz nunca o perdoaria!

Cabe suspirou ao saírem.

— Tenho o pressentimento de que ela nunca me perdoará, de qualquer modo — falou ao lembrar-se das coisas que ha­via dito aquela manhã, quando ficara fora de si. Não gostava de lembrar-se das lágrimas nos olhos dela.

 

Elisa não dirigiu o olhar para Cabe um instante sequer du­rante a refeição. Estava muito sentida com as duras palavras. Felizmente, Nicky estava animadíssimo com a visita que faria ao poço de petróleo no fim de semana seguinte com o irmão mais velho e não parava de falar no assunto.

Cynthia estava radiante pela mudança no relacionamento dos dois, e Eugene também não cabia em si de contentamen­to, sorrindo à toa. Elisa ficou feliz com isso, principalmente por acreditar ter uma pontinha de responsabilidade no caso, mas ainda se sentia muito magoada com as palavras ásperas que trocara com Cabe aquela manhã.

Cabe já tinha deixado bem claro que não queria um caso, mas do jeito que as coisas iam, dissera aquilo apenas para enganá-la. Dela, só queria sexo.

Todos comeram o peixe, que estava delicioso, mas Elisa mal sentiu o gosto. Tivera tantas esperanças para aquele dia! Agora sabia bem que nunca poderia esperar nada de Cabe, só de­silusão.

— Dei comida a Norman por você, Liz — era Nicky que lhe interrompia o curso dos pensamentos. E, dirigindo-se ao irmão: — Norman não gosta mesmo de você, não é?

— Não sei — disse Elisa, pela primeira vez falando algu­ma coisa durante a refeição. — Acho que até gostaria, com bastante catchup e mostarda.

Todos riram… Até Cabe riu, mas percebeu a tristeza no olhar dela.

— Ele é vegetariano. Você mesma disse — lembrou-a Cabe.

— Devo ter dito.

— Comprei um jogo novo de videogame, Cabe — Nicky dirigiu-se ao irmão, enquanto comiam a sobremesa. — É um jogo de mistério, tipo Sherlock Holmes. Papai disse que você gosta desse tipo de filmes, então pensei que vai gostar tam­bém do jogo.

Cabe sorriu para o irmão.

— Foi por isso que comprou o jogo?

— É, mais ou menos.

— Gostaria de ver o jogo, sim. — E, dizendo isso, pegou Nicky pela mão e foram jogar.

Nem assim Elisa dignou-se a dirigir-lhe um olhar.

— Terceira Guerra Mundial? — perguntou Eugene a Cynthia enquanto olhava para Elisa.

— Como? — indagou Elisa, sem jeito.

— Cabe a quer — disse Cynthia ao marido — mas sem uma aliança no dedo. — E, notando a expressão de Elisa, prosse­guiu: — Nós conhecemos Cabe muito bem. Fique firme. Ele nunca trouxe ninguém aqui, você foi a única. Cabe vai aca­bar cedendo. Você.verá.

— Só precisa cansá-lo um pouco e jogar com ele — instruiu-a Eugene, inclinando-se para a frente. — Sabe, como um grande e teimoso peixe. Dê-lhe linha suficiente, que ele mesmo se prenderá.

— Não é tão simples assim… — gaguejou Elisa. Seria pos­sível que o próprio pai de Cabe a estivesse instruindo?

— É simples, sim — prosseguiu Eugene, animado. — Ca­be está quase lá, senão, por que a teria trazido aqui em casa?

— Mas eu já disse, meu apartamento foi invadido.

— Cabe poderia tê-la levado para um hotel, querida — co­mentou Cynthia, gentil. — Ou podia apenas tê-la trazido aqui. Não precisava ter ficado aqui com você.

— O pior — disse Eugene — é que Cabe mais parece um touro preso, sem saber o que fazer. Está louco atrás de quem invadiu seu apartamento. Ficou furioso com isso.

— Tiveram notícias de Jenny?

— Nosso detetive particular ligou antes de você e Cabe vol­tarem da pescaria. Temos algo planejado. Jenny volta ama­nhã e você já pode ir para o seu apartamento de noite. Cabe explica tudo depois.

Mas Cabe.passou o resto do. dia jogando com Nicky, muito entusiasmado. Enquanto isso, Elisa ajudou Cynthia a plantar flores no jardim. Quando Elisa deu por si, já era hora de dor­mir e Cabe nada lhe falara dos planos.

Em vez disso, ele foi conversar com o pai.

— Você parece preocupado — disse Eúgene. — É com Eli­sa, não?

Era muito raro conversar com o pai sobre assuntos pessoais.

— É, estou preocupado com ela, sim. Chegamos a um im­passe. Eu a quero, mas ela quer compromisso. E você sabe que não confio nas emoções. Elas não duram.

— Não duram? Talvez tenha esta idéia errada por minha causa. Porque me casei com Cynthia em vez de ficar choran­do a memória de sua mãe para sempre.

— É mais ou menos isso — respondeu Cabe, em tom acusador.

Eugene sorriu.

— Sua mãe e eu nos casamos quando ela tinha dezoito e eu vinte e um, porque os pais dela e os meus acharam que se­ria uma boa idéia. Eu tinha uma carreira e um bom dinheiro. Eles não tinham nada. Eu também não queria compromisso, mas sua mãe, sim. Nos casamos depressa e durou trinta anos. Me casei com Cynthia porque senão teria morrido, de tanto que senti a falta de sua mãe. Vou lhe contar a verdade. Tentei me matar com,um tiro na cabeça. Foi nessa hora que Cynthia entrou na minha sala com alguns papéis para serem assina­dos, pois ela era minha secretária. Num ato único de coragem, tirou a pistola das minhas mãos, me seduziu e me impediu de cometer aquele gesto impensado.

— Meu Deus! — impressionado, Cabe deixou-se cair no sofá pesadamente.

— Agora que sabe de tudo, o que acha? Naquela hora, ha­via toda a chance de eu engravidar Cynthia e não podia morrer e deixá-la com meu filho para criar. Nos casamos bem depres­sa, e Nicky nasceu nove meses depois daquele dia. Isso respon­de às perguntas que você evitou me fazer durante oito anos?

— Sinto muito — limitou-se a dizer Cabe. — Sinto não ter conversado com você a esse respeito antes. Não gosto de me lembrar do modo como tratei Cynthia. Devo a ela a vida de meu pai — disse, emocionado. — E o pobre Nicky, então…

— Cynthia entendeu. Ná verdade, ela nem queria que eu contasse tudo para você. Achou que isso me diminuiria aos seus olhos.

— Ao contrário; Teria mudado minha vida. Todos deve­mos muito a Cynthia.

— E agora, Nicky deve a você. Soube que visitarão um po­ço de petróleo sábado que vem. Eu mesmo devia tê-lo levado.

— Será um prazer se quiser ir conosco. — Cabe sorriu.

— Claro que irei. Eu e meus dois filhos. — E, mudando de assunto, indagou: — E Elisa?

— Não sei. — Cabe suspirou.

— Elisa é uma mulher orgulhosa. Se você não tomar cui­dado, ela irá embora. Nunca achará outra igual.

— Sei disso. Mas não gosto da idéia do casamento, de fi­car preso.

— Todos passamos por isso, rapaz. Sua mãe e eu fomos muito felizes. Eu e Cynthia também. Há muitas compensações.

— Como o sexo? — quis saber Cabe.

— Alguém para quem voltar. Alguém com quem sentar-se para assistir televisão, com quem conversar e dividir as preo­cupações. Claro, o sexo é uma parte saudável do casamento, muito importante. Elisa é virgem, não é?

Cabe quase enrubesceu.

Eugene deu umas palmadinhas no ombro do filho.

— Case-se com ela, filho. Virgens hoje em dia são como diamantes.

Raras.                                          

Cabe estava perplexo ainda com a história do quase suicí­dio do pai. Que Deus abençoasse Cynthia e sua idéia de sedu­zir Eugene! Então, o amor durava. Será que Elisa tinha um amor tão grande assim por ele? Precisava saber se era corres­pondido. Doía pensar que na segunda-feira Elisa poderia es­tar à procura de outro emprego.

Enquanto isso, Elisa tentava descobrir algo sobre o tal pla­no que eles tinham para quando sua prima chegasse de via­gem. Viu que Cabe saía do escritório, mas com uma expressão sombria.

— E Jenny? — quis saber Elisa, ansiosa.

— Amanhã falaremos sobre isso — respondeu Cabe, olhando-a de modo terno.

Só que Elisa já estava farta dos jogos dele. Se Cabe queria brincar, que brincasse sozinho. Não com os sentimentos dela.

Elisa deu boa-noite a todos e se retirou para o seu quarto.

Levou quase uma eternidade para adormecer. E assustou-se ao ouvir gritos. Talvez estivesse imaginando coisas.

— Socorro!

Parecia a voz de Cabe.

Vestindo o robe, saiu do quarto em direção aos gritos. A porta do quarto de Cabe estava aberta e ela quase desmaiou com o que viu.

Ele estava em cima da cama, nu, com um abajur na mão, enquanto Norman o olhava ameaçador. Era a primeira vez que Elisa via um homem totalmente sem roupas. E Cabe ti­nha um físico estupendo! Foi dificílimo desviar ò olhar dele.

— Norman! — Elisa chamou o iguana. — Pare com isso e venha para cá!

O animal obedeceu e Elisa carregou-o no colo.

Nessa hora, Cabe já tinha achado um robe e se vestira.

— Norman já está bem agora.

— Norman está bem?! — ele exclamou, furioso. — Meu Deus, que absurdo! Eu senti algo gelado e nojento subindo nas minhas pernas, tomei o maior susto e "Norman está bem".

— Ele é apenas um bebê. Não ia machucar você.

— Uma ova!

Eugene e Cynthia entraram no.quarto.

— Norman escapou? — Eugene precisou segurar o riso.

— Escapou do quarto de Nicky e veio para o meu! Tentou subir em mim!

— Você ficou nervoso? — indagou Cynthia.

— Um pouco.

— Cabe estava em cima da cama, gritando como um louco — contou Elisa.

— Não estava! Só tentava ficar na melhor posição para jo­gar o abajur nele!

— Que barbaridade! — murmurou Eugene. — Pobre Norman.

— Ele não pode ficar dentro de casa — disse Cabe. — Não dormirei perto dessa criatura.

— Vou colocá-lo na garagem — replicou Elisa. — Nicky está dormindo?

— A sono solto — respondeu Cynthia. — Raramente acorda à noite. Não sentirá falta de Norman quando Jenny chegar. É meio complicado, mas resolverá os problemas.

Elisa fez que sim. Se bem que seu maior problema fosse es­tar sentada tão perto de Cabe.

— Você e seu irmão estão se dando muito bem.

— Estamos, sim. Ele é um bom menino. O que você acha de crianças?

— Gosto de crianças. Mas como você pretende ter filhos se não quer se casar?

— Acho que terei de me casar.

— Com Karol? — Elisa engoliu em seco.

— Acha que Karol se arriscaria a perder as curvas do cor­po para me dar um filho?

— Se ela ama você, creio que sim.

— Então, você acha que uma mulher aceitaria o risco se amasse um homem?

Elisa aquiesceu.

— Então, por que você não vem até aqui e deixa que o meu corpo cubra o seu neste sofá, para fazermos amor?

— Acho que não ouvi direito…

— Ouviu, sim. Acaba de dizer que gosta de crianças. Eu também gosto. Vamos fazer uma.

Elisa levantou-se, tremendo.

— Você está fora de si… não quer compromisso, como já disse várias vezes… Cabe!

Ele se levantara e a pegara pelas pernas, fazendo-a perder o equilíbrio e cair no sofá, com ele. Na confusão, o robe de Cabe se abrira mais ainda e, desta vez, Elisa não pôde evitar de olhá-lo.

— Isto é supérfluo — disse Cabe, fazendo o robe escorre­gar e cair ao chão. — Você já sabe como eu sou, já me viu inteiro.

— Isto ê loucura.

— Não se você me ama, Liz. Se me ama, vou tirar sua camisola e vamos fazer amor aqui mesmo. Não conheço outra maneira de convencê-la de que não tenho medo de compro­misso engravidando-a deliberadamente.

— Que dirão seu pai e sua madrasta? — exclamou Elisa, desesperada.

— E se fecharmos o salão de jogos e o colocarmos lá? — sugeriu Eugene. — Pode ligar o aquecimento para ele.

— Se não se importarem, tudo bem — respondeu Elisa.

— Absolutamente. Cabe vai lhe mostrar como funciona a porta e o aquecimento.

— Vamos — disse Cabe. — Não tenho medo do maldito lagarto.

Cynthia e Eugene voltaram para o quarto, dando risadinhas abafadas.

— Rirão de mim por semanas — disse Cabe, infeliz. Elisa pôs Norman dentro de sua gaiola e fecharam a porta.

Estava bem frio e ela apenas usava um pegnoir leve em cima da camisola.

Cabe ligou o termostato e acendeu uma luz, os olhos fixos nas curvas do corpo de Elisa.

— Não precisa ter idéias — ela limitou-se a dizer. — Não estou usando a camisola por sua causa.

— Pois eu gostaria muito que estivesse — suspirou Cabe. — Significaria que você não está mais magoada com as coisas que eu disse esta manhã.

— E você se importa se fiquei magoada? Você só me quer na cama -— afirmou, ofendida.

— Foi o que eu disse, não? —lamentou-se Cabe, sentando-se no sofá e pegando um cigarro.

— Foi. E eu acho quê você tem razão. A melhor coisa que tenho a fazer é arrumar outro emprego, e logo. Vou começar a procurar na segunda-feira cedo,

— Não! Não faça isso ainda — pediu Cabe:

— Por que não? Quanto mais cedo, melhor.

— Ainda não. Espere umas duas semanas até as coisas se acalmarem. Precisamos descobrir o caso do ladrão do seu apar­tamento antes.

— Eu já tinha até me esquecido. Seu pai disse que vocês fizeram um plano e que Jenny está voltando para casa amanhã.

Cabe deu uma baforada e apagou o cigarro de repente, fa­zendo com que o robe se abrisse um pouco, revelando parte de seu estômago. Elisa desviou o olhar, por motivos óbvios. Não queria nem lembrar-se daquele corpo.

— Vamos ter de vigiar seu apartamento. Eu explico tudo

— Isso é outra história. Lembre-me de contá-la um dia. — As mãos de Cabe já lhe desabotoavam o robe. — Diga-me. Sim ou não.

Elisa tremia dos pés à cabeça. Jamais contara com algo assim.

— Estou com medo — ela confessou, num sussurro.

— Eu também. Acho que deve ser natural quando duas pes­soas criam este tipo de compromisso entre si. Você percebe que estou falando sobre casamento e não sobre viver juntos? A esse respeito, eu sou muito antiquado.

— Você pode se arrepender disto mais tarde. Pode ser ape­nas uma atração física, por causa da novidade. Por eu ser virgem.

— Vamos descobrir, então. — E, dizendo isto, começou a desabotoar o robe de Elisa, hesitando por um segundo para se certificar de que ela também queria.

A fina camisola caiu ao chão, revelando a pele cor de pês­sego e macia de Elisa, fazendo com que Cabe prendesse a res­piração ante aquela visão. Ficou ali, olhando-a por alguns minutos, sem nada fazer.

— Você está vermelha — comentou Cabe, ao fitá-la nos olhos.

— Nunca fiz isto antes.. É mais difícil do que pensei não ter nada para poder me cobrir.

— Por quê? — perguntou Cabe, deliciado com a inocência dela: — Você é linda. Como uma pintura delicada, numa ga­leria particular, somente para os meus olhos e meu prazer. Mas uma pintura que eu posso tocar. Aqui. E aqui.

Os dedos experientes percorriam o contorno dos seios de Elisa com suavidade, devagarinho, de modo torturante. De­pois, desceu até o abdômen, os quadris e as coxas.

— Vai ter de confiar em mim completamente, você enten­de? Porque é um tipo de toque que você nunca conheceu an­tes, uma intimidade que pode chocá-la. Acha que consegue ficar deitada e me deixar fazer tudo, sem tentar me impedir?

— Acho que sim — murmurou Elisa, baixinho, já tremen­do de excitação pelos toques suaves e pelo tom de voz de Ca­be, cheio de promessas;

As mãos de Cabe começaram uma lenta exploração, descobrindo-a de uma forma que a assustava.

— Não vou machucá-la — ele avisou, com ternura. — Não vou precisar fazer isso. Espero que não se incomode por as luzes estarem acesas, querida — disse, beijando-a. — Porque quero vê-la. Quero ver suas deliciosas reações.

Aquelas foram as últimas palavras que Elisa conseguiu re­gistrar em sua mente. Cabe a acariciava com as mãos, boca e língua, despertando-a para uma nova dimensão de sensações.

Ele estava deitado a seu lado quando a puxou pelos qua­dris, fazendo com que se encaixassem nos dele.

— Abra os olhos — pediu Cabe, baixinho, encaixando uma das pernas entre as dela e puxando-a para si. — Agora, não tenha medo. Só vai doer por um segundo, — Dizendo isso, moveu-se novamente, fazendo-a tremer inteira, penetrando-a e encaixando-a contra seu corpo másculo.

Elisa estremeceu.

— É tão… íntimo. — sussurrou ela, olhando-o. — Já… acabou?

Cabe sorriu, num esforço quase sobre-humano, pois o pró­prio desejo era quase incontrolável.

— Não, querida. É só o começo— disse, cobrindo os lá­bios de Elisa com os seus.

O ritmo que envolvia os dois corpos dava um prazer incrí­vel, que Elisa jamais esperara sentir na primeira vez. Sensa­ções eróticas iam de seu estômago até a base da espinha. Podia sentir as batidas de seu coração junto com as de Cabe.

Percebia que Cabe estava se segurando por causa dela, mas a espera estava se tornando uma agonia dolorosa para ambos.

O mundo em volta deles se dissolveu num furor de sons e de movimentos. Elisa sentia que seu corpo se tornava rígido, segundos após o de Cabe, e a tensão rompeu-se numa onda enorme de prazer que os envolveu.

Cabe sentiu as lágrimas de Elisa em seu pescoço, mas esta­va totalmente exaurido para beijá-las. Muito tempo depois, os lábios de Cabe cobriram os dela, num beijo delicado e ter­no, num mudo agradecimento pelo prazer mais intenso que já sentira na vida. Puxou-a para si ao perceber que Elisa que­ria afastar-se dele.

— Não se afaste ainda — pediu. — Eu morro se você tirar seu corpo do meu. — Cabe parecia sério ao olhar para o rostinho de Elisa, toda envergonhada. — Você me ama — foi a constatação. — Nunca me deixaria fazer isso com você se não me amasse.

— Pode ter sido uma necessidade incontrolável — disse ela.

— Mas não foi. Foi um renascimento. Uma criação à par­te. Quero repetir isto, de novo e para sempre, pelo resto de minha vida.

Elisa sentiu um nó na garganta. Seria possível que Cabe es­tivesse confessando que a amava? Olhou-o, hesitante.

— Eu a satisfiz? — quis saber Cabe, ansioso. — Porque, se não a satisfiz, posso satisfazer agora.

Elisa queria perguntar-lhe sobre seus sentimentos, mas a boca de Cabe já cobria a sua, exigente.

Tudo estava acontecendo de novo. Cabe tremia, dizendo-lhe coisas que só agora descobria junto dela. Ele a penetrou, satisfazendo-a de um modo que sabia que Elisa jamais pode­ria se esquecer.

Quando, por fim, Cabe levantou-se e vestiu seu robe, per­cebeu que Elisa agora o possuía para sempre. Estava morto de medo com a nova sensação.

— Você… está bem? — indagou Elisa.

— Eu é que devia perguntar isso, não? — brincou Cabe, acendendo um cigarro. — Estou bem, sim. E você?

Ela fez que sim, abaixando os olhos para o chão.

— Você se arrependeu? — quis saber Elisa, ansiosa. Cabe não sabia. Estava muito abalado para responder. Não percebera como era capaz de sentir tanta emoção.

— Acho que não — foi a resposta evasiva. — É melhor ir­mos para dentro de casa.

Como uma autômata, Elisa o seguiu para dentro de casa. O que começara como algo doce e sensual terminara numa reali­dade fria. Entregara-se para um homem que era um solteirão inveterado. Um homem que não acreditava em casamento ou em compromisso, apesar do que havia acabado de acontecer entre eles. Agora, satisfeito, devia estar arrependido de tudo.

Provavelmente tinha dito tudo aquilo sobre ter filhos no auge da paixão ou num esforço para convencê-la a entregar-se a ele, sem reservas.

Pensando desta maneira, Elisa tinha vontade de morrer. Es­tava envergonhadíssima e morta de medo de engravidar. Ha­via se descuidado e agora poderia enfrentar o inferno por causa disso. Nunca se perdoaria. Seguiu-o para dentro de casa, sem olhá-lo.

Tão imerso em seus pensamentos, Cabe não percebera o efei­to que sua frieza provocava em Elisa. Estava abalado demais com as próprias descobertas para perceber alguma coisa. Fu­mou seu cigarro, em silêncio todo o tempo.

Só quando chegaram à porta do quarto que Elisa ocupava é que percebeu as lágrimas escorrendo pelo rosto dela.

— Pare com isso, vamos — pediu Cabe, com ternura, ten­tando enxugar-lhe as lágrimas.

— Boa noite — disse ela, resoluta, afastando a mão dele. Não ia mais sofrer. E, pensando assim, fechou a porta, trancando-a em seguida.

— Elisa! — gritou Cabe, frustrado.

Mas não houve resposta, nem quando ele bateu à porta.

Estivera tão imerso nos próprios problemas e sentimentos que não percebera o que se passara com Elisa.

Cabe não teve outra alternativa senão ir para o próprio quar­to. Mas o remorso o consumia. Claro que ele queria compro­misso! Depois de uma experiência daquelas, com uma moça tão adorável, só um idiota não perceberia que aquilo era amor.

Por fim, conseguiu conciliar o sono. Falaria com Elisa de manhã e esclareceria tudo.

Levantou-se mais cedo do que o normal e foi tomar o café da manhã. Cynthia, Nicky e Eugene estavam sentados em seus lugares habituais, mas Elisa não.

— Onde está Elisa? — indagou Cabe. Eugene sorriu.

— Bem, filho, ela fez as malas bem cedo, pegou um táxi e foi embora. Voltou para Tulsa e deixou este bilhete.

O bilhete era curto.

 

"Precisei voltar para casa. Obrigada por sua hospitalida­de. Elisa Marist."

 

Cabe deixou-se cair pesadamente numa cadeira. Dessa vez, tinha estragado tudo mesmo!

 

Elisa voltou para Tulsa tentando não pensar em quanto cus­taria o táxi. O motorista dissera que aceitava cheques ao vê-la tão deprimida.

Não queria pensar no que acontecera na garagem na noite passada com Cabe. Uma vida toda honrada terminara em uma noite porque ela deixara seu corpo comandar sua mente. Tre­mia só em pensar em como contaria aos pais, se ficasse grávida.

Imaginava como Cabe devia estar se sentindo. Sabia que o fato de ter ido embora iria poupá-lo de um embaraço. Vira como ele se arrependera pelo que haviam feito, apesar de Ca­be não ter pedido desculpas.

E não podia culpá-lo, afinal, ela deixara que ele fosse adiante.

O táxi, por fim, parou em frente ao seu prédio. Elisa pagou o motorista e pegou suas coisas. Quando abriu a porta de seu apartamento e entrou, viu-se cara a cara com a prima Jenny.

— Surpresa! Sou eu! — sorriu Jenny antes de reparar na expressão sombria de Elisa. — Algo errado?

Elisa pôs as malas no chão, junto com a gaiola de Norman, e fechou a porta antes de se debulhar em lágrimas.

Jenny abraçou-a, sem fazer perguntas, e fez a prima sentar-se na cozinha, enquanto fazia café.

Tomaram café preto sem nada dizerem por alguns minutos.

— Por que você voltou? — Elisa perguntou a Jenny. — E que tipo,de plano Eugene e Cabe tinham em mente?

— Um plano muito bom — respondeu Jenny, inclinando-se para a frente. — Vamos pôr algumas informações falsas e deixar os bandidos pegarem. Achamos que o que queriam aqui era o meu mapa de metais preciosos.

— O mapa! — Elisa lembrou-se. — Mas como souberam do mapa?

— Você contou para eles.

— Contei? Imagine, só mencionei para Ben… — e Elisa fi­cou rubra ao lembrar-se. — Mas ele não iria…

— Iria, sim. Não percebeu que ele tem um Jaguar? Pense nisso, você deve saber quanto os funcionários de Cabe ganham.

— Nunca liguei uma coisa à outra. Ben, ligado ao roubo?

— Não foi Ben que roubou. Ele mal sabe no que se meteu. Disseram a ele que haviam achado um novo poço de petróleo e Ben está sendo bem pago para pegar informações sobre is­so. Não sabe que agentes estrangeiros estão envolvidos.

— Como agentes estrangeiros podem pôr as mãos em me­tais neste país?

— Lisa, você não pode ser tão inocente assim. Nunca ou­viu falar em investidores estrangeiros? Tudo o que têm a fa­zer é comprar a terra que estamos explorando.

— Por que vocês não a compram antes?

— Não é lucrativo comprar terras para especular, especial­mente esse tipo de terras.

— Entendo — disse Elisa. — Que faremos a respeito de Ben?

— Você vai lhe dar algumas informações, quando ele vol­tar de viagem sexta-feira que vem.

Elisa ainda nem pensara sobre a próxima semana, quando teria de ver Cabe todos os dias, lembrando-se do que aconte­cera. Suas mãos agarraram a xícara, que tremeu.

— E daí, depois que eu contar para Ben?

— Esperaremos os resultados — respondeu Jenny. —-Lembra-se do que Eugene falou sobre o sr. Hunter?

— Tenho calafrios só em lembrar o que ele disse. Ele mon­tou um comando quando terroristas quiseram invadir aquela plataforma no Atlântico Norte, não foi?

Jenny aquiesceu.

— Hunter voltou com algumas cicatrizes, mas é um homem duro de matar. Estará cuidando de tudo isso pessoalmente.

— Vamos encontrá-lo?

— Já o conheci — suspirou Jenny. — Na verdade, ele me odeia. .

— O que você fez para ele?

— Nada. Isto é o que me deixa curiosa. Talvez eu o lembre de alguma pessoa. Vai ver odeia loiras. Você provavelmente gostará dele.

— Gosto da maioria das pessoas.

— Por que veio para casa sozinha? Não estava na casa dos Ritter?

Elisa corou de modo violento.

— Outra briga com o chefe? — Jenny perguntou. — Oh, Lisa, que é que farei com você?

— Me ajude a achar um emprego novo. Não agüento mais aquele mulherengo.

— Então ele passou uma cantada em você? Bem, não pode culpá-lo. Você é uma graça de menina. A sua inocência deve ter chamado a atenção de Cabe.

Aquilo era a pura verdade, mas doía ouvi-la.

— Que foi isso?

As duas ouviram barulhos de passos, que pareciam ter pa­rado à porta do apartamento delas. Em seguida, alguém ba­teu na porta.

— Dou duas chances para você adivinhar quem é — disse Jenny, indo abrir a porta.

Cabe nem se incomodou em cumprimentá-la.

— Onde está ela?

— Na cozinha — respondeu. Jenny, dando-lhe passagem. Ele passou por Norman sem olhá-lo, enquanto Elisa resis­tiu ao desejo de sair correndo e fugir.

Quase gritando, Cabe exigia explicações. Então, viu o olhar magoado de Elisa e toda sua raiva acabou como num passe de mágica.

— Querida… sinto muito — disse Cabe, vendo que Elisa começava a chorar. Ajoelhou-se em frente à cadeira onde ela estava sentada: — Está tudo bem agora.

— Não… não está — soluçou Elisa.

— Por que você fugiu? — ele indagou, afagando-lhe os cabelos.

— Você sabe por quê.

— Não, não sei. Ou talvez eu saiba. — Suspirou fundo. — Não tive intenção de lhe dar a idéia de que eu a considerava conquistada. Eu fiquei triste.

— Eu também — disse Elisa, abraçando-o pelo pescoço, dando livre vazão às lágrimas. — Nunca fiz nada como… bem… você sabe, como aquilo, antes. Pensei que você tivesse se arrependido, que só queria me possuir e que, depois que conseguiu, queria se livrar de mim. Por isso fugi, achei que ia ser menos embaraçoso para você.

— Você não entende — Cabe suspirou fundo. — Não sei como fazê-la entender o que sinto. Tenho trinta e seis anos e em toda minha vida sempre estive no controle das minhas emoções com as mulheres. Só que ontem à noite tudo foi di­ferente. Fiquei envergonhado do que fiz, ainda mais por você ser virgem. Foram muitas emoções fortes.

Elisa mordeu o lábio inferior. Será que Cabe estava dizen­do que se arrependia do que fizera?

— Não precisa se preocupar — disse ela. — Não vou embaraçá-lo.

— Não estou embaraçado. — Cabe sorriu, meigo. — Mas acho que você está.

Elisa corou ao lembrar-se do que haviam feito juntos na noite anterior, da expressão de prazer que vira nos olhos dele. No êxtase que partilharam juntos.

— Não seja tímida — disse Cabe, inclinando-se para a fren­te.— Não tenho nenhuma intenção de brincar com o que acon­teceu. Não é o tipo de coisa com que se brinca. — E, sorrindo. — Você perdeu um café da manhã e tanto. Quer ir a algum lugar comigo para comermos waffles?

— Não posso deixar Jenny.

— Então faça uns waffles para nós.

— Não temos waffles em casa — argumentou Elisa, enxu­gando os olhos. — Não sei fazer waffles:

Cabe dirigiu-lhe um olhar exasperado.

— Não sabe? Como viverei se você não sabe fazer waffles? Elisa olhou-o confusa.

— Mas sei fazer panquecas.

— Eu gosto de waffles. Não gosto de fígado e nem de ce­bola, portanto, nunca os prepare. Gosto de café preto e for­te, gosto mais ou menos de macarrão, bife mal passado e caçarola de queijo.

Elisa estava mais confusa ainda.

— Quer comer tudo isso agora?

— Estou dando a lista de coisas mais importantes. Depois eu especifico mais. Ah, nunca faça quiche, porque odeio quiche.

Cabe olhou-a com doçura. Não podia deixá-la escapar. Acordar e saber que Elisa tinha partido aquela manhã ha­via sido terrível.

— Enquanto isso — ele continuou — vamos sair e comer uns waffles. Jenny pode vir junto. Vá chamá-la.

— Posso cozinhar algo aqui mesmo.

— Querida, estou morto de vontade de comer waffles.

— Tudo bem. Vou pegar um suéter. Não desfiz as malas ainda.

— Está tudo bem — disse Cabe, afagando o rosto de Eli­sa. — Não vamos passar da linha de novo.

— Como assim? O que você quer? — Ela estava confusa.

— Você.

— Mas você…

— Mas eu o quê? Eu possuí você, é isso o que está tentan­do dizer? Me apressei e quase estraguei tudo, mas eu quero recomeçar. Desta vez, faremos tudo na ordem certa. Vivere­mos um dia de cada vez. Iremos juntos aos lugares, eu man­darei flores e bombons para você, telefonarei às duas da manhã para dizer que estou com saudade e faremos amor. Mas ape­sar disso, não deixaremos que isto nos impeça de nos conhe­cermos.

— E depois?

— Depois, o que você acha? Levo você para a minha casa e faremos amor até que você não possa andar por três dias, que tal? Deus sabe que é isso que eu queria fazer agora. Mas esperarei até que você esteja pronta, até que perceba que não será um caso de sábado à noite.

— Em outras palavras — concluiu Elisa — está me pedin­do para ser sua amante.

— Por que é tão difícil para você acreditar que eu te quero permanentemente? Já disse que não sou playboy.

— Me disse que não queria compromisso.

— Isso foi antes.

— Antes de eu enlouquecer e cair nos seus braços, deixando-o com complexo de culpa.

— Você não quer ouvir!

— Você se sente culpado, sei disso. Não vou acreditar nas suas histórias. E não posso mais trabalhar para você.

Cabe deu de ombros.

— Concordo. Vai trabalhar em casa.

— Como assim, em casa?

— Você sabe tricotar? — ele indagou.

Elisa ficou boquiaberta até achar algo para dizer.

— Posso sair agora? — perguntou Jenny do hall. — Aca­bei de chegar e estou morta de fome.

— Estávamos mesmo falando sobre comida — disse Cabe. — Pegue seu suéter e todos iremos a algum lugar para tomar café da manhã.

Elisa foi vestir o suéter, tão confusa que levou um tempão para achar a mala que estava a sua frente. Não sabia o que dera em Cabe Ritter.

Nos dias que se seguiram, Cabe aparecia depois do jantar, agradando a prima Jenny sem ser inconveniente e tinha uma atitude protetora e terna em relação a Elisa, tratando-a como sua mulher.

Era uma delícia, mas Elisa estava ainda chocada, sem con­seguir digerir direito os acontecimentos.

O choque maior, porém, veio mesmo quando Karol foi áo escritório para visitar Cabe.

Elisa interfonou, avisando, e Cabe saiu de sua sala.

— Aí está você, querido — disse Karol, com voz melodiosa.

— Essa menina aqui teve a maior má vontade para chamá-lo. Vamos dançar hoje a noite?

— Desculpe, estou fora de circulação desde sábado — res­pondeu Cabe, sorrindo. — Elisa e eu vamos jantar no Big Tom e depois eu a levarei para conhecer meu tio Abe.

— Vai sair com a sua secretária? — perguntou Karol, in­crédula.

— Isso mesmo.

— Por quê?

— Para que a família se acostume com ela. Meu pai e mi­nha madrasta gostam dela, meu irmão já a adora. Passamos um ótimo fim de semana na casa de meu pai.

— Então foi para lá que você foi — resmungou Karol. — Não espere que eu aceite que você saia com esta criança. Te­nho coisas melhores para fazer com o meu tempo!

— Que bom — replicou Cabe. — Por que não vai fazê-las?

Karol olhou-o furiosa e foi embora.

— Uma complicação a menos — disse Cabe, esfregando as mãos. —É melhor reservar uma mesa para nós no Big Tom. Você vai gostar do tio Abe.

— Falou sério aquilo para Karol?

— Claro que sim. — Cabe franziu o cenho. — Você não entendeu ainda? Falo sério. Chega de aventuras com mulhe­res. Chega de noitadas jogando pôquer. Faça as reservas. A propósito, de que tipo de flor você gosta?

— De margaridas.

— Foi o que pensei.

Naquela noite, ao ir buscá-la, Cabe levou um lindo buquê de margaridas. Jantaram com o tio de Cabe, que adorou Eli­sa. A recíproca foi verdadeira.

— Gostei muito de seu tio — disse Elisa, dentro do carro de Cabe, no caminho para seu apartamento.

— Ele gostou de você. Podemos convidá-lo para ficar co­nosco por uns dias, no futuro.

— Conosco? — Elisa estava, mais uma vez, confusa. Cabe afagou-lhe o rosto ternamente.

— Conosco, sim.

— Quer dizer que vamos morar juntos? — indagou Elisa, tentando se soltar do cinto de segurança.

— Gente casada normalmente mora junto. Isso, abra sua boca…

E foi o que Elisa fez, para receber um ardoroso beijo. Pôs os braços em volta do pescoço de Cabe, correspondendo ao beijo e gemendo baixinho. Era incrível o efeito que Cabe ti­nha sobre ela. Sentia as mãos dele já procurando o fecho de seu sutiã, 'numa carícia entontecedora.

Porém, lembrando-se de onde estavam, Cabe parou.

— Que coisa mais estúpida para se fazer — disse ele, afastando-se,de Elisa, que tentava recuperar o fôlego.

— Você disse… gente casada.

— Isso mesmo. Que acha?

— Acho que seria melhor você ter certeza — respondeu Elisa, fitando-o nos olhos.

— Acha que não tenho certeza?

— Você ficou livre por muito tempo. E o que aconteceu na fazenda de seu pai aconteceu rápido demais. Posso não es­tar grávida.

Cabe deu de ombros.

— Então tentaremos de novo. Quando estivermos casados — enfatizou.

— Mas não está me pedindo em casamento só porque pos­so estar grávida?

— Não.

— Então, é porque eu era virgem — insistiu Elisa.

— Não. Como você é cabeça-dura, menina.

— Então, por quê?

Cabe inclinou-se e a beijou.

— Quando descobrir, você me diz. Vamos subir — falou Cabe.

— Jenny deve estar preocupada.

Elisa esperou que ele abrisse a porta do carro. À porta do apartamento, Cabe despediu-se com um beijo, sorriu e foi em­bora assobiando. E Elisa entrou em seu apartamento sem na­da entender.

 

O resto da semana voou. Cabe saiu com Elisa todas as noi­tes, mas não havia mais beijos apaixonados no carro, ou em qualquer outro lugar. Ficavam de mãos dadas, fitando-se nos olhos. Cabe nunca mencionava Karol. Era como ele tinha di­to: fechara a porta do passado.

Jenny não reconhecia o playboy inveterado e Elisa não deu nenhuma explicação. Estava apaixonada demais para expli­car qualquer coisa. Além disso, rezava para que aquele novo relacionamento durasse bastante.

Cabe nunca falava sobre aquela noite na garagem, apesar de Elisa notar que ele às vezes a olhava do modo como a olhara naquela noite. Sua conduta estava sendo irrepreensível, tanto em público quanto quando estavam a sós.

Na sexta-feira, Cabe levou Elisa a sua sala, fechando a porta atrás de si.

— Ben acaba de chegar — ele comentou, baixinho. — Vai convidá-la para almoçar, se o conhecemos bem. Você terá de aceitar.

— Mas você não quer que eu aceite.

— Não, claro — respondeu Cabe em tom possessivo.— Mas preciso deixar. Tudo depende disto. Estamos aprontan­do uma armadilha e você é a isca. Esses homens são perigo­sos. Primeiro foi um roubo, mas pode ficar mais perigoso no futuro. Temos de detê-los agora.

A mão de Cabe deslizou pelos cabelos macios de Elisa. Se algo acontecesse com ela, nunca poderia se perdoar^

— Tome cuidado. Se sentir medo, por qualquer motivo, afaste-se dele e ligue para mim. Não sairei do escritório.

— Ben não vai me machucar — disse Elisa, fingindo uma confiança que estava longe de sentir. — Não se preocupe.

— Como posso evitar? Você é toda a minha vida.

Prendendo a respiração, Elisa tentou impedir que as lágri­mas escorressem por seu rosto, mas era tarde demais.

— Tomarei muito cuidado — prometeu.

— Não se arrisque. Não vá a lugar algum com ele. A lugar algum, nem a uma cabine telefônica, está me entendendo?

— Como você é machista, não, sr. Ritter?

— Sou, sim. Também sou mal-humorado e voraz.

— Nada posso fazer quanto ao machismo e ao mau humor. Mas posso cuidar da parte voraz — disse Elisa, colando seus lábios nos dele.

Por um longo momento, Cabe ficou imóvel. Depois, um som rouco saiu de sua garganta e os braços fortes a envolve­ram, puxando-a para si. Beijou-a com ardor, esquecido de todo o resto do mundo.

— Desculpe. Eu não devia ter feito isso — murmurou Eli­sa, vendo a reação dele. — Acho que piorei as coisas.

— Você vai ter de se casar comigo. Pense na desculpa que quiser, gravidez possível, consciência pesada, o que quer que a leve ao altar. Mas tem de ser logo. Meu Deus, estou mor­rendo de vontade!

— Podíamos trancar a porta e… — sugeriu Elisa, hesitante.

— Não. Uma vez no sofá foi suficiente — disse Cabe, ro­çando os lábios de leve na têmpora de Elisa. — Eu devia ter sido mais forte, por você. Eu devia ter-me segurado.

— Tudo bem — falou Elisa, baixinho, tocada ao perceber a emoção na voz de Cabe.

— Não está tudo bem, não. — Cabe estava tenso. — Você merecia um vestido branco com tudo o mais, uma cerimônia de casamento respeitável e uma noite de núpcias convencio­nal. Eu a despojei disso e sinto muito.

— Você se importa mesmo comigo, não?

— Essa é uma forma meio simplista de colocar as coisas — retrucou Cabe, achando graça.

— Diga as palavras — pediu Elisa, sentindo-se no sétimo céu.

— Ainda não — ele sorriu.

— Quando?

— Na nossa noite de núpcias. — Cabe olhava para Elisa com verdadeira adoração. — Direi até que você se canse de ouvir.

— Nunca me cansarei.

— Neste caso, será uma longa noite.

— Prometa.

— Prometo. Agora, volte para a sua sala e aceite almoçar com Ben, enquanto eu tento não pensar em quantas armas te­nho em casa.

— Vai dar tudo certo — declarou Elisa, afastando-se dele.

— Jenny disse que o homem de confiança de Eugene vai estar no comando hoje à noite.

— Sei disso. Você já conheceu Hunter?

— Ainda não. Jenny disse que ele é… durão.

— Durão só não o define. Hunter já foi do serviço secreto, da CIA, mercenário… acho que Hunter já fez de tudo na vi­da. Nós confiamos muito nele neste tipo de.coisa. Não invejo os amigos de Ben quando Hunter puser as mãos neles.

— E se Ben não morder a isca?

— Morderá.

E mordeu mesmo. Ben a convidou para almoçar e, fazendo perguntas casuais, deu um jeito de descobrir que Jenny havia trazido um monte de mapas da última viagem. Elisa deixou escapar que ela e a prima teriam um compromisso à noite e que sairiam. Ben a deixou no escritório e foi embora com um sorriso nos lábios.

— E então? — indagou Cabe, ansioso.

— Ele mordeu! — sorriu Elisa.

— Aleluia! Ótimo, Volte ao trabalho. Agora, só nos resta esperar.

Naquela noite, Cabe estava de smoking, muito alinhado e muito sexy, e, Elisa teve de se segurar para não agarrá-lo quando ele foi buscá-la em seu apartamento.

— Você está lindo.

Por sua vez, Cabe a comia com os olhos ao vê-la usando um vestido azul de seda pura, com um decote pronunciado, bem colante no corpo bem-feito.

— Você também está maravilhosa — ele disse, com um sor­riso malicioso.

— E eu, não mereço nem uma menção? — era Jenny, com as mãos nos quadris, com um vestido de veludo vermelho que lhe caía muito bem.

— Linda cor — limitou-se a dizer Cabe.

— Estou fazendo jus à imagem que seu colega faz de mim — disse Jenny, referindo-se a Hunter.

Elisa teve de se segurar para não rir. Jenny parecia hostil, coisa que não era característica sua. Imaginava como devia ser o tal Sr. Hunter.

Não precisou esperar muito para descobrir. Tocaram a cam­painha e, lá estava ele.

— Boa noite — respondeu ela, no mesmo tom que Hunter usara, ou seja, de quem ordena uma execução.

Um homem alto, de olhos escuros, entrou na sala. Estava vestindo um smoking, como Cabe, mas tinha a expressão du­ra e dava a impressão de que ele nunca sorrira na vida. A cor da pele e seus traços lembravam vagamente os índios ameri­canos. Seu cabelo era escuro e liso e seu corpo era bem mus-culoso.

— Este é o sr. Hunter — apresentou-o Jenny. — Elisa Marist. E este…

— Olá, Cabe — cumprimentou Hunter, sem esperar que Jenny finalizasse as apresentações.

— Há quanto tempo, Hunter — disse Cabe, abraçando-o.

— Você, presumo, deve ser minha parceira — comentou Hunter.

— Você é um homem forte. Provavelmente sobreviverá a uma noite em minha companhia — respondeu Jenny, sar­cástica.

Todos sorriram, exceto o gélido sr. Hunter.

— É melhor irmos —: falou Hunter, olhando o relógio de pulso. — As reservas estão confirmadas.

— Então, vamos indo — concordou Cabe, segurando o bra­ço de Elisa. — Estou morto de fome!

Saíram todos juntos. No elevador, Jenny. fez questão de fi­car no lado oposto do sr. Hunter. Era até engraçado ver co­mo os dois procuravam ficar distantes um do outro.

O restaurante estava cheio, mas logo se sentaram, graças à reserva que Hunter fizera.

— E agora?— quis saber Elisa.

— Agora esperamos — respondeu Hunter, estudando o car­dápio e logo deixando-o de lado.

— O que você vai pedir, Jenny? — Elisa indagou, enquan­to ela mesma tentava decidir-se entre frango e filé grelhado.

— Algo cru — respondeu Jenny, olhando de modo signifi­cativo para Hunter. — Ostras, talvez.

Hunter levantou uma sobrancelha e a olhou. Não disse uma palavra, mas Jenny enrubesceu de repente e voltou a exami­nar o cardápio.

— Acho que pedirei Camarão à Creole — falou Jenny, nervosa.

— Quero filé mal passado — disse Cabe. E, voltando-se para Hunter: — E você? — E acrescentou alguma coisa numa língua que Elisa não conhecia.

Hunter respondeu na mesma língua, sorrindo. Depois, de­clarou:

— Mas vou pedir filé.

— Que língua era essa? — quis saber Elisa, fascinada.

— Apache — respondeu Cabe, sorrindo. — Nunca lhe con­tei que minha avó era Apache? Ela me ensinou a língua. É fácil, depois que se pegam os sons das vogais.

— E depois que se aprendem as inflexões — acrescentou Hunter, piscando para Cabe.

— Foi muito útil quando estávamos fora do país, numa si­tuação perigosa — continuou Cabe. — Sabíamos que nosso quarto de hotel estava sob escuta, portanto, falamos em Apache.

No meio da refeição, que estava deliciosa, ouviram um bip suave. Hunter pegou um dispositivo minúsculo do bolso e disse algo.

— Pegaram a isca — informou, em seguida, levantando-se. — Não, Cabe, fique e aproveite a refeição. Agora é comigo.

Jenny também se levantou.

— Presumo que serei necessária para identificar o homem que o senhor acha que estava atrás de mim, não?

— É verdade — limitou-se a responder secamente Hunter. — Aí poderá voltar ao seu trabalho e deixar a parte de espio­nagem por minha conta.

— Então, vamos? — perguntou friamente Jenny, levantando-se, alterada. — Boa noite. Até mais tarde, Lisa.

Elisa aquiesceu, vendo-os sair.

— Isto sim é que é guerra fria — comentou, seguindo-os com o olhar.

— Eles são inimigos desde o dia em.que se conheceram — disse Cabe. — Só Deus sabe por que, mas parecem ser duas metades de um todo. — E fitando-a com carinho dentro dos olhos, mudou de assunto:

— Diga uma data.

— Fala sério?

— De todo o coração.

— Cinco de maio.

— Por quê?

— Porque gosto de dizer cinco de maio. Que tal?

— Tudo bem, como quiser. Amanhã você compra um ves­tido de noiva. Que tal uma lua-de-mel na Jamaica?

— Não podemos ir para a Jamaica — disse Elisa, suspi­rando fundo.

— Por que não?

— Norman!

—Tenho uma grande idéia de férias para Norman. Há uma . grande floresta na América do Sul e…

— Iguanas não tiram férias na América do Sul.

— Neste caso, vamos pedir a Nicky para ficar com ele?

— Os dois vão ficar deliciados.

E ficaram mesmo. Uma semana mais tarde, os agentes ini­migos foram pegos, Ben Meadows estava desempregado e sen­do processado por conspiração e furto, Jenny estava de volta ao trabalho depois do casamento e Cabe e Elisa estavam dei­tados preguiçosamente numa praia deserta, ao luar, em Mon-tego Bay, numa mansão que Cabe alugara para a ocasião.

— É divino — disse Elisa, suspirando, deitada ao lado de Cabe, olhando as estrelas.

— Divina é você, querida. — Cabe sorriu, inclinando-se para beijá-la, olhando para o corpo da esposa com adoração. Co­mo era delicioso fazer amor com ela. Como prometera, a noi­te de núpcias fora como se fosse a primeira vez. Agora, Cabe ensinava coisas novas a Elisa, novas formas de excitá-lo, dando prazer aos dois.

— Tem certeza de que ninguém nos verá? — perguntou Elisa.

Tinham acabado de nadar e ele insistira que era uma expe­riência única tomarem banho de lua nus. Estavam os dois estirados em toalhas na areia branca e Cabe olhava-a com uma expressão de ternura.

— Ninguém nos verá — murmurou, tocando-lhe os seios com os lábios, de leve, fazendo-os ficarem rígidos.

— Como pode ser tão doce todas as vezes? — indagou Eli­sa, já meio entontecida pelas carícias.

— É porque nos amamos — sorriu Cabe, brincando com os mamilos. — Ainda não se cansou de ouvir que eu te amo?

— Ainda não — suspirou Elisa, beijando o marido.

— Eu te amo — repetiu Cabe, trazendo-a para perto de si. Elisa deu um gritinho quando Cabe ficou por cima dela: mordiscou o ombro do marido, já antecipando o prazer que se seguiria. Mas ele inverteu as posições e, em seguida, ordenou:

— Sente-se.

— Não posso!

— Claro que pode. Sou seu marido e te amo. E você me ama. Estamos casados. Sente-se.

Cabe ajudou-a, segurando-a pelos quadris, olhando-a com um misto de ternura e malícia, enquanto Elisa se movia de for­ma sensual.

— Isso — ele murmurou, segurando-a pelos quadris e guiando-a. —Assim está bom?

— Sim! — gritou ela. — Oh, Cabe, sim…

Os dois corpos tremiam, encaixados como estavam. As mãos de Cabe apertavam os quadris da esposa, num frenesi. Os mo­vimentos aumentavam em intensidade, deixando os dois lou­cos de prazer, até que sentiram fagulhas invadirem seus corpos e almas.,

Elisa ficou deitada ao lado do marido, apoiada em seu om­bro, até que a respiração voltasse ao normal. Ainda ficava ad­mirada em ver como dois corpos podiam se fundir num só, com tanta harmonia.

Cabe beijava-a com carinho.

— Você ficou me olhando desta vez — sussurrou ao ouvido dela. — Agora já não fica mais envergonhada, não é?

— Não como eu ficava no começo —, confessou Elisa. — Cabe, acho que estou grávida.

— Eu sei — ele sorriu, satisfeito.

— Não se importa?

— De modo algum. E você?

— Não. Estou com vontade de ter um filho. Que faremos com Norman?

— Vamos deixar que Nicky o adote. Aí você poderá visitá-lo quando quiser.

— Certo — concordou Elisa, por fim. Iria sentir falta de Norman. Claro que não se podia comparar a companhia do iguana à do marido. Teria de pensar nesses termos daqui em diante.

— Prometo que, mais tarde, se tivermos um menino, eu lhe comprarei um iguana bebê — disse Cabe, vendo a tristeza de Elisa. — Claro que, como eu, pode ser que meu filho não goste de lagartos.

— Isto é verdade — Elisa concordou, sem olhar direto pa­ra o marido. — Pode ser que prefira cobras…

Cabe inclinou-se para a frente, impedindo-a de continuar com um beijo.

A brisa marinha soprava suave. Elisa fechou os olhos e sus­pirou, feliz da vida. Estava com o homem que amava. Sorriu, pensando que bem podiam estar escrevendo a versão moder­na de Robinson Crusoé, com uma garota chamada Sexta-feira, em vez de um garoto. Ao olhar para o marido, concluiu que era isso o que queria ser para Cabe. Fechou os olhos e se ani­nhou nos braços dele, olhando para a lua. E o mundo parecia muito, muito distante…

 

                                                                                Diana Palmer  

 

                      

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