Estar rodeada por toda variedade de mortos-vivos, metamorfos e seres sobrenaturais estava começando a não ser nada fora do comum para a garçonete da Louisiana Sookie Stackhouse. Mesmo assim, ela tinha seus limites. Traída pelo seu amor vampiro de muito tempo, Sookie deveria lidar agora não só com a possibilidade de um novo homem em sua vida - o ‚oh tão bonito‛ metamorfo Quinn, mas também com a cúpula vampírica há muito tempo planejada em Rhodes.
A cúpula, a qual estava atraindo participantes ativos do poder dos mortos-vivos de todo o centro dos EUA, estava claro que seria uma situação tensa. A rainha vampira da Louisiana está numa situação precária, sua base de poder enfraquecida pelos danos do furacão em Nova Orleans. E existiam alguns vampiros que queriam terminar o que a natureza começou. Com alianças secretas e acordos de bastidores como ordem do dia — e noite — Sookie deve decidir de qual lado ela vai ficar. E sua escolha pode significar a diferença entre sobreviver e a total catástrofe...
......
O BAR DE VAMPIROS DE SHREVEPORT abriria mais tarde hoje à noite. Eu estava atrasada, e eu automaticamente fui para a porta da frente, a porta do público, só para ser barrada por uma tabuleta perfeitamente impressa com letras escritas em gótico vermelho na cartolina branca: NÓS ESTAREMOS PRONTOS PARA RECEBÊ-LOS COM UMA MORDIDA ESTA NOITE, ÀS OITO HORAS. POR FAVOR, DESCULPEM NOSSO ATRASO. Estava assinado: ‚A equipe do Fangtasia‛.
Era a terceira semana de setembro, por isso o letreiro FANGTASIA em néon vermelho já estava ligado. O céu estava quase escuro como breu. Eu fiquei com um pé dentro do meu carro por um minuto, apreciando a calma noite e o fraco cheiro seco de vampiro que permanecia em torno do clube. Então eu dirigi para os fundos e estacionei ao lado de vários outros carros enfileirados na entrada de empregados. Eu estava apenas cinco minutos atrasada, mas pareceu que todos já tinham me precedido para a reunião. Bati na porta. Esperei.
Eu levantei minha mão para bater novamente, quando Pam, segunda-no-comando de Eric, abriu a porta. Pam dava suporte ao bar, mas ela tinha outras funções nas várias relações comerciais de Eric. Embora os vampiros tivessem ido a público há cinco anos e mostrado o seu melhor lado para o mundo, eles ainda eram muito reservados sobre seus métodos de fazer dinheiro, e às vezes eu me perguntava quanto da América pertenciam aos mortos-vivos na prática. Eric, o proprietário do Fangtasia, era um verdadeiro vampiro no departamento de manter-ascoisas-para-si-mesmo. Claro que em sua longa existência ele teve que ser assim.
— Entre, minha amiga telepata, — Pam disse, gesticulando dramaticamente. Ela estava usando seu uniforme de trabalho: o transparente vestido preto longo, que todos os turistas que chegavam ao bar pareciam esperar de vampiros do sexo feminino. (Quando Pam escolhia sua própria roupa, ela era do tipo de mulher de cores pastéis e twin-set). Pam tinha o cabelo loiro mais pálido e liso que você jamais viu, na verdade, ela era etereamente adorável, com uma espécie de lado letal. O lado letal era o que uma pessoa não devia esquecer.
— Como você está? — Eu perguntei educadamente.
— Eu estou excepcionalmente bem, — ela respondeu. — Eric está pleno de felicidade.
Eric Northman, o vampiro xerife da Área Cinco, transformou Pam numa vampira, e ela ficou igualmente obrigada e compelida a cumprir sua ordem. Isso era parte do negócio de se tornar um morto-vivo: você ficava sempre sob influência de seu criador. Mas Pam me disse mais de uma vez que Eric era um bom chefe para se ter, e que ele a deixaria seguir seu próprio caminho se e quando ela desejasse seguir. De fato, ela tinha vivido em Minnesota até Eric comprar o Fangtasia e chamá-la para ajudálo a gerir o bar.
A Área Cinco ficava mais para o noroeste de Louisiana, que até um mês atrás era a parte economicamente mais débil do estado. Desde o furacão Katrina, o equilíbrio do poder na Louisiana tinha mudado dramaticamente, especialmente na comunidade dos vampiros.
— Como está seu delicioso irmão, Sookie? E o seu chefe metamorfo? — Perguntou Pam.
— Meu delicioso irmão está fazendo cena sobre se casar, como todos em Bon Temps, — eu respondi.
— Você soa um pouco deprimida. — Pam inclinou a cabeça para um lado e me olhou como um pardal de olho numa minhoca.
— Bem, talvez um pouquinho, — eu disse.
— Você tem que se manter ocupada, — disse Pam. — Então você não terá tempo para se lamentar.
Pam amava ‚Dear Abby‛. Muitos vampiros analisavam minuciosamente a coluna diária. Suas soluções para alguns dos problemas dos autores simplesmente o fariam gritar. Literalmente. Pam já tinha me avisado que eu só podia ser coagida se eu permitisse, e que eu precisava ser mais seletiva na escolha de meus amigos. Eu estava recebendo aconselhamento emocional de uma vampira.
— Eu estou, — eu disse. — Me mantendo ocupada, quero dizer. Eu estou trabalhando, eu ainda tenho minha colega de quarto de Nova Orleans, e eu irei para um chá de panela amanhã. Não de Jason e Crystal. Outro casal.
Pam parou, com sua mão na maçaneta da porta do escritório de Eric. Ela considerou a minha declaração, contraindo suas sobrancelhas juntas. — Eu não me lembro o que é um chá de panela, embora já tenha ouvido falar disso, — disse ela. Ela clareou as ideias. — Eles vão se casar em uma cozinha? Não, eu ouvi o termo antes, com certeza. Uma mulher escreveu para Abby que ela não tinha feito uma nota de agradecimento por um generoso presente de chá de panela. Eles ganham... presentes?
— Você entendeu, — eu respondi. — Um chá de panela é uma festa para alguém que está prestes a se casar. Às vezes, o chá é para o casal, e ambos estão presentes. Mas normalmente só a noiva é homenageada, e todas as outras pessoas na festa são mulheres. Todo mundo leva um presente. A teoria é que desta forma o casal pode começar a vida com tudo o que precisam. Nós fazemos a mesma coisa quando um casal está esperando um bebê. Claro, então é um chá de bebê.
— Chá de Bebê, — Pam repetiu. Ela sorriu de um modo gélido. Era o suficiente para congelar uma abóbora, ver aquela curva dos lábios. — Eu gosto do termo, — disse ela. Ela bateu na porta do escritório de Eric, e em seguida, abriu-a. — Eric, — disse, — talvez um dia uma das garçonetes engravide, e nós poderemos ir a um chá de bebê!
— Isso seria algo para ver, — disse Eric, erguendo sua dourada cabeça dos papéis em sua mesa. O xerife registrou minha presença, me deu um olhar severo e decidiu me ignorar. Eric e eu tínhamos problemas.
Apesar do fato da sala estar cheia de pessoas esperando por sua atenção, Eric apoiou sua caneta e esticou seu alto e magnífico corpo, talvez para meu proveito. Como de costume, Eric estava com jeans apertado e uma camiseta preta do Fangtasia com as presas brancas estilizadas que o bar usava como sua marca registrada. — Fangtasia— estava escrito em caligrafia vermelha berrante sobre pontos brancos no mesmo estilo que o letreiro externo em néon. Se Eric virasse, das costas leria ‚O Bar com a Mordida‛. Pam tinha me dado uma quando o Fangtasia começou a fazer seu próprio material de marketing.
A camisa deixou Eric ótimo, e eu me lembrei muito bem de tudo o que havia embaixo dela.
Eu desviei meu olhar para longe do alongamento de Eric para olhar ao redor da sala. Havia muitos outros vampiros lotando o pequeno espaço, mas até que você os visse não saberia que eles estavam ali, estavam tão quietos e silenciosos. Clancy, o gerente do bar, tinha reivindicado uma das duas cadeiras de visitante diante da mesa. Clancy simplesmente tinha sobrevivido à Guerra das Bruxas no ano passado, mas ele não saiu ileso. As bruxas tinham drenado Clancy próximo a um ponto sem volta. No momento em que Eric descobriu Clancy, rastreando seu cheiro até o cemitério de Shreveport, Clancy estava quase no estado de morte. Durante sua longa recuperação, o vampiro ruivo tinha cultivado amargura e mau humor. Agora, ele sorriu para mim, mostrando um pouco das presas. — Você pode sentar no meu colo, Sookie, — ele disse, dando tapinhas nas suas coxas.
Eu sorri de volta, mas não como se meu coração estivesse nisso. — Não, obrigada, Clancy, — eu disse educadamente. A paquera de Clancy sempre tinha que ter uma vantagem, e agora essa vantagem estava afiada como navalha. Ele era um daqueles vampiros com quem eu particularmente não ficaria sozinha. Embora ele conduzisse o bar competentemente, e ele nunca encostou um dedo em mim, ele ainda produzia sinais de alerta. Não posso ler as mentes dos vampiros, e era por isso que eu achava revigorante sair com eles, mas quando eu sentia aquele zumbido de advertência, eu me encontrava desejando poder mergulhar na cabeça de Clancy e descobrir o que estava acontecendo lá dentro.
Felicia, a mais nova bartender estava sentada no sofá, junto com Indira e Maxwell Lee. Era como se fosse um encontro vampírico da Rainbow Coalition (Coalizão Arco-Íris). Felicia era uma bela mistura de Africano e Caucasiano, e ela tinha quase um metro e oitenta de altura, portanto ali havia beleza extra para apreciar. Maxwell Lee era um dos homens mais escuros que eu já vi. A pequena Indira era filha de imigrantes indianos.
Havia mais quatro pessoas na sala (usando o termo — pessoas— imprecisamente), e cada um deles me chateava, embora em graus variados.
Um deles era alguém que eu não reconhecia. Eu tinha usado uma página do livro de regras dos lobis e o considerei como um membro banido do meu bando: eu o abjurei. Eu não falava seu nome, eu não falava com ele, eu não reconhecia sua existência. (Claro este era o meu ex, Bill Compton, não que eu tenha reconhecido que ele estava na sala, taciturno num canto).
Encostada à parede ao lado dele estava a velha Thalia, que era possivelmente mais velha que Eric. Ela era tão pequena como Indira e muito pálida, com cabelos pretos fortemente ondulados - e ela era extremamente rude.
Para meu assombro, alguns humanos achavam aquilo um completo tesão. Thalia realmente tinha um público devoto que parecia emocionado quando ela usava o seu inglês forçado para lhes dizer que se fodessem. Eu descobri que ela tinha até um website, criado e mantido por fãs. Vai entender. Pam me disse que, quando Eric concordou em permitir que Thalia vivesse em Shreveport, foi o equivalente a manter um pit bull mal adestrado acorrentado no quintal. Pam não tinha aprovado.
Todos estes cidadãos mortos-vivos viviam na Área Cinco. Para viver e trabalhar sob a proteção de Eric, todos eles tinham jurado lealdade a ele. Então, eles eram obrigados a dedicar certa parte de seu tempo para cumprir suas ordens, mesmo se eles não trabalhassem no bar. Havia alguns vampiros extras em Shreveport nestes dias, desde o Katrina; exatamente como muitos dos humanos, eles tiveram que ir a algum lugar.
Eric não tinha decidido o que fazer com os mortos-vivos refugiados, e eles não tinham sido convidados para a reunião.
Esta noite havia dois visitantes no Fangtasia, um dos quais era superior a Eric.
Andre era o guarda-costas pessoal de Sophie-Anne Leclerq, a Rainha da Louisiana. A rainha, no momento, era uma refugiada em Baton Rouge. Andre parecia muito jovem, talvez uns dezesseis anos; seu rosto era suave como de um bebê, seus pálidos cabelos eram grossos e pesados. Andre tinha vivido uma longa existência cuidando unicamente de SophieAnne, sua criadora e salvadora. Ele não estava usando o seu sabre esta noite, porque ele não estava atuando na qualidade de seu guarda-costas, mas eu tinha certeza de que Andre estava armado com algo - faca ou revólver. O próprio Andre era uma arma letal, com ou sem ajuda.
Justo quando Andre estava prestes a falar comigo, por detrás de sua cadeira uma profunda voz disse: — Ei, Sookie. — Nosso segundo visitante, Jake Purifoy. Obriguei-me a ficar quieta, enquanto cada impulso que eu tinha me dizia para sair do escritório. Eu estava sendo uma idiota. Se eu não tinha corrido aos gritos ao ver Andre, Jake não me faria pensar em fugir. Forcei-me a acenar para o jovem rapaz de boa aparência que ainda parecia vivo. Mas eu sabia que minha saudação não pareceu natural. Ele me enchia com uma terrível mistura de piedade e medo.
Jake, nascido lobis, foi atacado por um vampiro e sangrou até a beira da morte. No que tenha sido talvez um gesto de misericórdia equivocado, minha prima Hadley (outra vampira), descobriu o corpo quase sem vida de Jake e o trouxe de volta. Isso podia ter sido considerado uma boa ação, mas, conforme ele se transformou, ninguém tinha realmente apreciado a bondade de Hadley... nem mesmo o próprio Jake. Ninguém jamais ouviu falar de um lobis transformado antes: lobis não gostavam e não confiavam em vampiros, e o sentimento era profundamente recíproco. O curso foi muito difícil para Jake, que ocupou sozinho uma terra de ninguém. A rainha deu-lhe um lugar ao seu serviço, uma vez que ninguém mais tinha se prontificado.
Jake, cego pela sede de sangue, veio atrás de mim como seu primeiro lanche vampiro. Eu ainda tinha uma cicatriz vermelha no meu braço como consequência.
Que noite maravilhosa esta estava se transformando.
— Senhorita Stackhouse, — disse Andre, levantando-se da segunda cadeira de visitas de Eric. Ele curvou-se. Esta foi uma homenagem verdadeira, e meu espírito se elevou um pouco.
— Sr. Andre, — eu disse, me curvando em retorno. Andre gesticulou com a mão para indicar educadamente seu assento desocupado, e uma vez que isso resolvia o meu problema de posicionamento, eu aceitei.
Clancy parecia humilhado. Ele deveria ter me oferecido sua cadeira, pois ele era o vampiro mais baixo no ranking. A ação de Andre realçou isso tão claramente quanto uma seta de néon piscando. Tentei arduamente não sorrir.
— Como está Vossa Majestade? — Eu perguntei, tentando ser tão educada quanto Andre tinha sido. Seria demais dizer que eu gostava de Sophie-Anne, mas eu com certeza a respeitava.
— Esta é parte da razão pela qual estou aqui esta noite, — disse ele. — Eric, podemos começar agora? — Uma repreensão gentil para as táticas de retardar tempo de Eric, eu pensei. Pam agachou no chão ao lado de minha cadeira, apoiada sobre seus calcanhares.
— Sim, nós estamos todos aqui. Vá em frente, Andre. Você tem a palavra, — Eric disse com um pequeno sorriso por sua própria terminologia moderna. Ele afundou de volta em sua cadeira, esticando suas longas pernas para descansar os pés na quina de sua mesa.
— A sua rainha está vivendo na casa do xerife da Área Quatro em Baton Rouge, — disse Andre à pequena assembleia. — Gervaise foi muito gentil em conceder sua hospitalidade.
Pam ergueu uma sobrancelha para mim. Gervaise teria perdido a cabeça se ele não tivesse concedido sua hospitalidade.
— Mas ficar na casa de Gervaise é somente uma solução temporária, — continuou Andre. — Estivemos em Nova Orleans várias vezes desde o desastre. Aqui está o relatório da condição de nossa propriedade.
Embora nenhum dos vampiros tenha se movido, eu senti que a atenção havia aumentado.
— O quartel general da rainha perdeu a maior parte de seu telhado, portanto houve extensos danos devido à água no segundo andar e na área do sótão. Além disso, um grande pedaço do telhado de alguém aterrissou no interior do prédio, causando um acúmulo de escombros e alguns buracos nas paredes — problemas como este. Enquanto estivermos secando o interior, o telhado ainda estará coberto com uma lona azul. Uma das razões pelas quais estou aqui desta maneira foi para encontrar um empreiteiro para recolocar o telhado imediatamente. Até agora não tive sorte, por isso, se algum de vocês tiver influência pessoal com algum humano que faz esse tipo de trabalho, eu preciso de sua ajuda. No térreo, existem muitos danos estéticos. Muita água entrou. Tivemos alguns saqueadores também.
— Talvez a rainha deva permanecer em Baton Rouge, — disse Clancy maliciosamente. — Tenho certeza que Gervaise ficaria inundado de prazer com a perspectiva de hospedá-la permanentemente.
Então, Clancy era um idiota suicida.
— Uma delegação de líderes de Nova Orleans chegou a visitar a nossa rainha em Baton Rouge para pedir que ela volte para a cidade, — disse Andre, ignorando completamente Clancy. — Os líderes humanos pensam que se os vampiros retornarem a Nova Orleans, o turismo aumentará de novo. — Andre focou Eric com um olhar gélido. — Enquanto isso, a rainha tem falado com aos outros quatro xerifes sobre o aspecto financeiro de restaurar os edifícios de Nova Orleans.
Eric deu uma quase imperceptível inclinação de cabeça. Impossível dizer o que ele sentia sobre ser tributado para os reparos da rainha.
Nova Orleans tinha sido o melhor lugar para vampiros e para aqueles que queriam estar em torno deles, desde que Anne Rice provou estar certa sobre suas existências. A cidade era como a Disneylândia dos vampiros. Mas desde o Katrina, tudo isso tinha ido para o inferno, é claro, junto com muitas outras coisas. Mesmo Bon Temps sentiu os efeitos da tempestade, e tem sempre sentido desde que o Katrina atingiu o solo. Nossa cidadezinha ainda estava lotada de pessoas que fugiram do sul.
— E sobre a propriedade para ocasiões festivas da rainha? — perguntou Eric. A rainha tinha comprado um antigo mosteiro nos limites do Garden District para entreter um grande número de pessoas, tanto vampiros quanto não-vampiros. Apesar de cercado por um muro, a propriedade não era considerada facilmente defensável (já que era um edifício classificado, histórico e imutável, as janelas não podiam ser bloqueadas), então a rainha não podia realmente viver lá. Eu pensava nele como seu celeiro de festas.
— A propriedade não sofreu muitos danos, — disse Andre. — Houve saqueadores lá, também. Claro, eles deixaram um rastro de seus cheiros. — Os vampiros perdiam apenas para os lobis em suas habilidades de rastreamento. — Um deles atirou no leão.
Fiquei triste por isso. Eu tinha gostado do leão, mais ou menos.
— Você precisa de ajuda com a apreensão? — Eric perguntou.
Andre ergueu uma sobrancelha.
— Eu só pergunto por que seu grupamento está baixo, — disse
Eric.
— Não, já cuidamos disso, — Andre disse, e sorriu apenas um pouco.
Eu tentei não pensar nisso.
— Além do leão e os saques, como estava a propriedade? — Disse Eric colocando a discussão sobre os danos causados pela tempestade de volta aos trilhos.
— A rainha pode ficar lá enquanto visita as outras propriedades, — Andre continuou, — mas no máximo por uma noite ou duas apenas.
Havia pequenos acenos de todos em volta.
— Nossa perda de pessoal, — disse Andre, seguindo adiante em sua agenda. Todos os vampiros ficaram um pouco tensos, mesmo Jake, o novato. — Nossa avaliação inicial foi modesta, como vocês sabem. Assumimos que alguns responderiam ao chamado depois que o impacto inicial da tempestade fosse absorvido. Mas apenas dez apareceram: cinco aqui, três em Baton Rouge, dois em Monroe. Parece que perdemos trinta de nosso pessoal apenas na Louisiana. Mississippi perdeu pelo menos dez.
Houve pequenos sons e movimentos em toda a sala conforme os vampiros de Shreveport reagiram à notícia. A concentração de vampiros, ambos residentes e visitantes, era alta em Nova Orleans. Se o Katrina tivesse ocorrido em Tampa com a mesma intensidade, o número de mortos e desaparecidos teria sido muito menor.
Eu levantei minha mão para falar. — E quanto ao Bubba? — Eu perguntei quando Andre acenou para mim. Eu não o tinha visto ou ouvido falar de Bubba desde o Katrina. Você conheceria Bubba se o visse. Qualquer pessoa na Terra o conheceria; pelo menos, qualquer um acima de certa idade. Ele absolutamente não tinha morrido no chão do banheiro, em Memphis. Não completamente. Mas seu cérebro foi afetado, antes dele ser criado, e ele não era um vampiro muito bom.
— Bubba está vivo, — disse Andre. — Ele se escondeu em uma cripta e sobreviveu de pequenos mamíferos. Ele não está muito bem mentalmente, então a rainha o enviou para o Tennessee para ficar com a comunidade de Nashville por um tempo.
— Andre me trouxe uma lista dos que estão desaparecidos, — disse Eric. — Eu irei divulgá-la após a reunião.
Eu tinha conhecido alguns dos guardas da rainha, também, e eu ficaria feliz em descobrir como eles estavam.
Eu tinha outra pergunta, então eu acenei minha mão.
— Sim, Sookie? — Andre perguntou. Seu olhar vazio se fixou em mim, e eu lamentei de ter pedido para falar.
— Vocês sabem o que eu me pergunto, gente? Eu me pergunto se um dos reis ou rainhas que irão a esta cúpula, ou o que quer que vocês chamem, tem um - como um vidente do tempo ou algo parecido em seu pessoal.
Vários olhares inexpressivos apontaram na minha direção, apesar de Andre ficar interessado.
— Porque, vejam, a cúpula, ou conferência, ou o que seja, era suposto ter acontecido originalmente no final da primavera. Mas - atraso, atraso, atraso, certo? E então o Katrina nos atingiu. Se a cúpula tivesse acontecido, quando foi pretendido, a rainha poderia ter ido em uma posição poderosa. Ela teria um grande arsenal de guerra e uma tropa cheia de vampiros, e talvez eles não estariam tão ansiosos para processá-la pela morte do rei. A rainha teria conseguido tudo o que ela quisesse, provavelmente. Em vez disso, ela está indo como, — eu comecei a dizer — uma mendiga— , mas eu considerei Andre bem a tempo, — muito menos poderosa. — Eu tive medo deles rirem ou talvez me ridicularizarem, mas o silêncio que se seguiu foi intensamente reflexivo.
— Essa é uma das coisas que você precisará averiguar durante a cúpula, — disse Andre. — Agora que você me deu a ideia, isso parece estranhamente possível. Eric?
— Sim, eu penso que há algo nisso, — disse Eric, olhando para mim. — Sookie é boa pensando por outras perspectivas.
Pam sorriu para mim ao lado de meu cotovelo.
— E sobre ao processo movido por Jennifer Cater? — Clancy perguntou a Andre. Ele parecia cada vez mais desconfortável na cadeira que ele pensou ser tão inteligente por pegar.
Você podia ouvir um alfinete cair. Eu não sabia o que diabos o vampiro ruivo estava falando, mas eu pensei que seria melhor descobrir pela conversa ao invés de perguntar.
— Está ainda ativo, — disse Andre.
Pam sussurrou: — Jennifer Cater estava em treinamento para se tornar tenente de Peter Threadgill. Ela estava no Arkansas dirigindo os negócios dele quando a violência irrompeu.
Balancei a cabeça para deixar Pam ciente que eu apreciei sua explicação. Os vampiros do Arkansas, embora eles não tivessem sido afetados por um furacão, passaram por uma redução em seu contingente, graças ao grupo da Louisiana.
Andre disse: — A rainha respondeu à ação, testemunhando que ela teve que matar Peter para salvar sua própria vida. Naturalmente, ela ofereceu uma indenização ao capital comum.
— Por que não ao Arkansas? — Sussurrei para Pam.
— Porque a rainha sustenta que uma vez que Peter está morto, Arkansas fica para ela, de acordo com o contrato matrimonial, — Pam murmurou. — Ela não pode indenizar a si mesma. Se Jennifer Cater ganhar sua ação, a rainha não só perderá o Arkansas, como ela terá que pagar uma multa para o estado. Uma enorme. E fazer outra restituição.
Andre começou a caminhar ao redor da sala silenciosamente, a única indicação de que ele estava descontente sobre o tema.
— Nós ainda temos dinheiro o suficiente após o desastre? — Clancy perguntou. Era uma pergunta imprudente.
— A rainha espera que a ação seja recusada, — disse Andre, novamente ignorando Clancy. A permanentemente face adolescente de Andre estava completamente inexpressiva. — Mas, aparentemente, o tribunal está preparado para ouvir um julgamento. Jennifer está acusando nossa rainha de atrair Threadgill para Nova Orleans, longe de seu próprio território, planejando todo o tempo iniciar a guerra e assassiná-lo. — Desta vez a voz de Andre veio por trás de mim.
— Mas não foi o que aconteceu de modo algum, — eu disse. E Sophie-Anne não tinha matado o rei. Eu estive presente na sua morte. O vampiro parado atrás de mim exatamente neste momento havia matado Threadgill, e eu achei naquele momento que ele foi justificado.
Senti os dedos frios de Andre roçar meu pescoço, enquanto eu estava sentada ali. Eu não podia dizer como eu sabia que os dedos eram de Andre, mas o toque leve, o instante de contato, fez de repente eu perceber um fato terrível: eu era a única testemunha da morte do rei, além de Andre e Sophie-Anne.
Eu nunca havia me colocado naqueles termos, e por um momento, eu juro, meu coração parou de bater. Nessa diminuição do batimento, eu atraí o olhar de pelo menos a metade dos vampiros no aposento. Os olhos de Eric se arregalaram quando ele olhou para o meu rosto. E então meu coração bateu novamente, e o momento passou como se nunca tivesse acontecido. Mas a mão de Eric se contorceu na mesa, e eu sabia que ele não esqueceria deste segundo, e ele ia querer saber o que isso significou.
— Então você acha que o julgamento será realizado? — Eric perguntou a Andre.
— Se a rainha for à cúpula como governante de Nova Orleans - a Nova Orleans como era - eu acredito que o Tribunal irá negociar algum tipo de acordo entre Jennifer e a rainha. Talvez algo que envolvesse elevar Jennifer a uma posição de poder como vice da rainha e recebendo um grande bônus, algo assim. Mas do jeito que as coisas estão agora... — Houve um longo silêncio, enquanto nós preenchíamos o vazio. Nova Orleans não era mais a mesma, poderia nunca ser a mesma novamente. Sophie-Anne estava politicamente incapaz agora. — Agora, por causa da persistência de Jennifer, eu acho que o tribunal irá seguir com isso, — Andre disse, e depois caiu em silêncio.
— Nós sabemos que não há nenhuma verdade nas acusações, — uma voz clara e fria, disse do canto. Eu estava fazendo um bom trabalho em ignorar a presença de meu ex, Bill. Mas não era algo natural para mim. — Eric estava lá. Eu estava lá. Sookie estava lá, — o vampiro (sem nome, eu disse a mim mesma) continuou.
Isso era verdade. A alegação de Jennifer Cater de que a rainha tinha atraído seu rei para sua festa no celeiro com a finalidade de matá-lo, era completamente falsa. O banho de sangue tinha iniciado pela decapitação de um dos homens da rainha por um dos homens de Peter Threadgill.
Eric sorriu relembrando. Ele tinha gostado da batalha. — Eu tinha negócios com a pessoa que iniciou aquilo, — ele disse. — O rei fez o seu melhor para apanhar a rainha em uma indiscrição, mas ele não conseguiu, graças à nossa Sookie. Quando sua trama não funcionou, ele recorreu a um simples ataque frontal. — Eric acrescentou: — Eu não vejo Jennifer há vinte anos. Ela ascendeu rápido. Ela deve ser implacável.
Andre deu um passo à minha direita dentro da minha linha de visão, o que foi um alívio. Ele assentiu. Novamente, todos os vampiros na sala fizeram um pequeno movimento, não muito em uníssono, mas estranhamente próximo. Eu raramente me sentia tão estranha: a única sangue-quente em uma sala cheia de criaturas mortas animadas.
— Sim, — disse Andre. — Normalmente, a rainha iria querer um contingente completo para apoiá-la. Mas uma vez que somos forçados a economizar, os números serão cortados. — Mais uma vez, Andre chegou perto o suficiente para tocar-me, apenas um leve roçar em minha bochecha.
A ideia provocou uma espécie de mini-revelação: era assim que se sentia uma pessoa normal. Eu não tinha a menor ideia das verdadeiras intenções e planos de meus companheiros. Era assim que as pessoas reais viviam cada dia de suas vidas. Isso era assustador, mas excitante, muito como andar por uma sala cheia com os olhos vendados. Como é que as pessoas comuns suportam o suspense da vida no dia-a-dia?
— A rainha quer essa mulher perto dela nas reuniões, já que outros humanos estarão lá, — Andre continuou. Ele estava falando exclusivamente para Eric. O resto de nós poderia muito bem não estar na sala. — Ela quer saber seus pensamentos. Stan está levando seu telepata. Você conhece o homem?
— Eu estou sentada bem aqui, — eu murmurei não que alguém tivesse prestado alguma atenção, exceto Pam, que me deu um sorriso radiante. Então, com todos aqueles olhos gélidos fixos em mim, percebi que eles estavam esperando por mim, que Andre estava falando diretamente comigo. Eu me tornei tão acostumada com vampiros falando sobre e em torno de mim que eu fui pega de surpresa. Eu repassei mentalmente as observações de Andre até que entendi que ele estava me fazendo uma pergunta.
— Eu só conheci outro telepata em toda minha vida, e ele estava morando em Dallas, então eu suponho que seja o mesmo cara — Barry, o mensageiro. Ele estava trabalhando no hotel vampírico em Dallas, quando eu apanhei seu, hã..., dom.
— O que você sabe sobre ele?
— Ele é mais novo do que eu, e é mais fraco - ou pelo menos era na época. Ele nunca aceitou o que ele era, do jeito que eu aceitei. — Eu dei de ombros. Essa era a soma total de meu conhecimento.
— Sookie estará lá, — Eric disse a Andre. — Ela é a melhor no que faz.
Isso foi lisonjeiro, embora eu lembrasse vagamente de Eric dizendo que ele tinha encontrado apenas um telepata anteriormente. Foi igualmente irritante, uma vez que ele estava querendo dizer para Andre que minha excelência era pra ser creditada a ele, ao invés de mim.
Embora eu estivesse ansiosa para ver algo além de minha pequena cidade, encontrei-me desejando que eu pudesse pensar em uma maneira de evitar a viagem para Rhodes. Mas, meses atrás, eu concordei em participar dessa cúpula vampiresca como uma funcionária da rainha. E no mês passado, eu tinha feito horas extras no Merlotte‟ s para acumular tempo suficiente para que outra garçonete pudesse me cobrir por uma semana. Meu chefe, Sam, estava me ajudando a controlar meu tempo extra com um pequeno quadro.
— Clancy ficará aqui para dirigir o bar, — disse Eric.
— Esta humana tem que ir, enquanto eu tenho que ficar? — O gerente ruivo disse. Ele estava realmente muito infeliz com a decisão de Eric. — Eu não verei nada da diversão.
— Isso mesmo, — disse Eric agradavelmente. Se Clancy pensou em dizer algo negativo, ele deu uma olhada no rosto de Eric e se segurou. — Felicia ficará para ajudá-lo. Bill, você vai ficar.
— Não, — disse a voz calma e fria do canto. — A rainha me requereu. Eu trabalhei duro naquele banco de dados, e ela me pediu para comercializá-lo na cúpula para ajudar a recuperar suas perdas.
Eric pareceu uma estátua por um minuto e, em seguida, moveu-se, elevando minimamente suas sobrancelhas. — Sim, eu tinha esquecido suas habilidades com o computador, — disse ele. Ele poderia ter dito: — Ah, eu tinha esquecido que você consegue soletrar gato, — por todo o interesse ou respeito que ele demonstrou. — Acho que você precisa estar conosco, então. Maxwell?
— Se essa é sua vontade, eu ficarei. — Maxwell Lee queria deixar claro que ele sabia algo a respeito de ser um bom subordinado. Ele olhou para todos reunidos ali para ressaltar seu ponto de vista.
Eric assentiu. Eu imaginei que Maxwell ganharia um ótimo brinquedo de Natal, e Bill - oops, sem nome - ganharia uma lembrancinha qualquer. — Então você ficará aqui. E você, também, Thalia. Mas você deve me prometer que irá se comportar no bar. — O turno de Thalia no bar, que consistia simplesmente em circular sendo misteriosa e vampírica algumas noites por semana, nem sempre passava sem incidentes.
Thalia, eternamente rabugenta e cismada, deu um breve aceno de cabeça. — Eu não quero ir, de qualquer maneira, — ela murmurou. Seus olhos pretos redondos não mostraram nada além de desprezo para o mundo. Ela já tinha visto bastante em sua muito longa vida, e ela não se divertia há alguns séculos foi o que eu entendi. Eu tentei evitar Thalia tanto quanto possível. Eu fiquei surpresa que ela ainda saía com outros vampiros, ela parecia uma perigosa para mim.
— Ela não tem nenhum desejo de chefiar, — Pam soprou em meu ouvido. — Ela só quer ser deixada em paz. Ela foi expulsa de Illinois, porque ela ficou muito agressiva, após a Grande Revelação. — A Grande Revelação era o termo vampiríco para a noite que eles foram à televisão em todo o mundo para nos informar que realmente existiam e, além disso, que queriam sair das sombras para a vida econômica e social humana.
— Eric permite à Thalia fazer o que quiser, contanto que ela siga as regras e apresente-se em seu turno no bar, — Pam prosseguiu em seu diminuto sussurro. Eric era o soberano deste pequeno mundo, e ninguém esquecia disso. — Ela sabe que punição haverá se ela sair da linha. Às vezes, ela parece esquecer o quão pouco ela gostaria da punição. Ela devia ler Abby, colher algumas ideias.
Se você não consegue nenhuma alegria na sua vida, você precisa... hã, fazer alguma coisa pelos outros, ou assumir um novo hobby, ou algo parecido, certo? Não era esse o conselho habitual? Tive um flash de Thalia se voluntariado para pegar o turno da noite em um casa de repouso e estremeci. A ideia de Thalia tricotando, com duas longas e afiadas agulhas, me deu outro arrepio do horror. Para o inferno com a terapia.
— Então, os únicos a comparecerem à cúpula são Andre, nossa rainha, Sookie, eu, Bill e Pam, — disse Eric. — Cataliades, o advogado, e sua sobrinha como sua mensageira. Oh, sim, Gervaise da Área Quatro e sua mulher humana, uma concessão já que Gervaise hospedou generosamente a rainha. Rasul, como motorista. E Sigebert, é claro. Essa é a nossa comitiva. Sei que alguns de vocês estão decepcionados, e só posso esperar que no próximo ano seja um ano melhor para a Louisiana. E para Arkansas, que nós consideramos agora parte do nosso território.
— Eu acho que isso é tudo o que precisávamos falar com todos vocês presentes, — disse Andre. O resto das coisas que ele e Eric tinham que discutir seria feito em particular. Andre não me tocou novamente, o que foi uma boa coisa. Andre me assustava até minhas rosadas e brilhosas unhas dos pés. Claro, eu deveria me sentir desse jeito em relação a todos na sala. Se eu tivesse bom senso, eu me mudaria para Wyoming, que tinha a menor população vampírica (dois, segundo o artigo sobre isso na American Vampire). Alguns dias eu me sentia realmente tentada.
Eu tirei um pequeno bloco de anotações da bolsa, quando Eric repassou a data de nossa partida, a data de nosso regresso, a hora que nosso avião fretado da Anubis Airline chegaria de Baton Rouge para pegar a comitiva de Shreveport, e um resumo das roupas que precisaríamos. Com certo desânimo, eu percebi que teria que pedir emprestado para meus amigos novamente. Mas Eric acrescentou, — Sookie, você não teria necessidade destas roupas se não fosse para a viagem. Liguei para a loja de sua amiga e você tem crédito lá. Use-o.
Eu podia sentir meu rosto corar. Eu me senti como a prima pobre até que ele acrescentou: — O pessoal tem uma conta em algumas lojas aqui em Shreveport, mas isto seria inconveniente para você. — Meus ombros relaxaram, e eu esperava que ele estivesse dizendo a verdade. Nenhum piscar de olhos me disse algo diferente.
— Podemos ter sofrido um desastre, mas não iremos parecendo pobres, — Eric disse, tendo o cuidado de me dar apenas uma fração de seu olhar.
— Não parecer pobre, — eu fiz uma anotação.
— Está claro para todos? Os nossos objetivos para esta conferência são apoiar a rainha, enquanto ela tenta se inocentar dessas acusações ridículas, e fazer que todos saibam que a Louisiana ainda é um estado de prestígio. Nenhum dos vampiros de Arkansas que vieram para a Louisiana com o rei sobreviveu para contar isso. — Eric sorriu, e este não foi um sorriso agradável.
Eu não soube disso antes dessa noite.
Oh Deus, isso não foi conveniente.
— HALLEIGH, JÁ QUE VOCÊ ESTÁ se casando com um policial, talvez você possa nos dizer... o quão grande é o cassetete de um tira? — Elmer Claire Vaudry perguntou.
Eu estava sentada ao lado da futura noiva, Halleigh Robinson, uma vez que eu tinha recebido a tarefa muito importante de registrar cada presente e o nome da sua presenteadora, enquanto Halleigh abria todas as caixas embaladas com papel branco e prata e os sacos de presentes floridos.
Ninguém parecia pelo menos surpresa de que a Sra. Vaudry, uma professora quarentona do primeiro grau, fizesse uma pergunta indecente neste evento claramente de senhoras religiosas de classe média.
— Ora, eu não sei, Elmer Claire, — disse Halleigh modestamente, e houve um explícito coro de risadas incrédulas meio abafadas.
— Bem, então, que tal as algemas? — Elmer Claire perguntou. — Você alguma vez usou aquelas algemas?
A vibração das vozes das senhoras sulistas se elevou na sala de estar de Marcia Albanese, a anfitriã, que tinha concordado em deixar que sua casa fosse o cordeiro sacrificado: o local efetivo para o chá-de-panela. As outras anfitriãs tiveram problemas menores trazendo a comida e o ponche.
— Você está uma coisa, Elmer Claire, — disse Marcia de seu lugar na mesa de refrescos. Mas ela estava sorrindo. Elmer Claire tinha seu papel como A Ousada, e as outras estavam contentes em deixá-la se divertir.
Elmer Claire nunca teria sido tão vulgar se a velha Caroline Bellefleur estivesse presente no chá-de-panela.
Caroline era a dirigente social de Bon Temps. Senhorita Caroline tinha cerca de um milhão de anos e tinha um dorso mais rígido que qualquer soldado. Somente algo extremo manteria Senhorita Caroline ausente de um evento social desta importância para sua família, e algo extremo tinha acontecido. Caroline Bellefleur tinha sofrido um ataque cardíaco, para o espanto de todos em Bon Temps. Para sua família, o acontecimento não tinha sido uma enorme surpresa.
O grandioso casamento duplo dos Bellefleurs (Halleigh e Andy, Portia e seu contador) tinha sido marcado para a primavera anterior. Ele tinha sido organizado às pressas por causa da deterioração repentina da saúde de Caroline Bellefleur. Como quis o destino, mesmo antes que o casamento apressado pudesse ser adiado, Senhorita Caroline havia caído com o ataque. Então, ela fraturou o quadril.
Com a concordância da irmã de Andy, Portia, e seu noivo, Andy e Halleigh tinham adiado o casamento, até o final de outubro. Mas eu tinha ouvido que Senhorita Caroline não estava se recuperando como seus netos esperavam, e parecia improvável que ela voltasse à sua antiga forma.
Halleigh, com suas bochechas ruborizadas, estava lutando com a fita em torno de uma caixa pesada. Dei-lhe uma tesoura. Havia uma tradição de não cortar a fita, uma tradição que de certa forma se ligava em adivinhar o número de filhos que o casal de noivos irá produzir, mas eu estava disposta a apostar que Halleigh estava pronta para uma solução rápida. Ela cortou a fita do lado mais próximo dela assim ninguém iria notar seu insensível pouco-caso pelo costume. Ela me dirigiu um olhar agradecido. Estávamos todas em nossos trajes de festa, é claro, e Halleigh parecia muito graciosa e jovem em seu terninho azul claro com rosas corde-rosa salpicadas na jaqueta. Ela estava vestindo um ramo de flores, naturalmente, como a homenageada.
Eu senti como se estivesse observando uma tribo interessante de outro país, uma tribo que por acaso fala meu idioma. Eu sou uma garçonete, vários degraus abaixo de Halleigh na escala social, e eu sou telepata, embora as pessoas tendem a esquecer disso, já que é difícil de acreditar sendo minha aparência exterior tão normal. Mas eu estava na lista de convidadas, assim eu tive que fazer um grande esforço para me encaixar adequadamente. Eu estava certa que tinha conseguido. Eu estava vestindo uma blusa branca bordada sem mangas, calça amarela, e sandálias laranjas e amarelas, e meu cabelo estava solto e livre, fluindo naturalmente acima de minhas omoplatas. Brincos amarelos e uma corrente curta de ouro arrematava o conjunto.
Pode ser final de setembro, mas estava quente como os seis espectros do inferno. Todas as mulheres ainda estavam vestidas com suas melhores roupas de clima quente, embora algumas almas corajosas tinham se vestido com as cores do outono.
Eu conhecia cada uma no chá-de-panela, é claro. Bon Temps não é um lugar grande, e minha família tem vivido nela por quase duzentos anos. Saber quem são as pessoas não é o mesmo que estar à vontade com elas, e eu estava contente por ter recebido a tarefa de anotar os presentes. Marcia Albanese era mais esperta do que eu tinha lhe creditado ser.
Eu estava com certeza aprendendo muito. Embora eu estivesse tentando não ouvir, e minha pequena tarefa ajudou nisso, eu estava recebendo um monte de excesso mental.
Halleigh estava em completa felicidade. Ela estava recebendo presentes, era o centro das atenções, e ia se casar com um cara excelente. Eu não acho que ela realmente conhecia seu noivo tão bem, mas eu estava certamente disposta a acreditar que havia aspectos maravilhosos no Andy Bellefleur que eu nunca tinha visto ou ouvido. Andy tinha mais imaginação do que um homem normal de classe média em Bon Temps, eu sabia disso. E Andy tinha medos e desejos que ele tinha enterrado profundamente, eu sabia disso, também.
A mãe de Halleigh tinha vindo de Mandeville para participar do chá-de-panela, é claro, e ela estava dando o seu melhor para apoiar sua filha. Eu pensei que era a única a perceber que a mãe de Halleigh odiada multidões, até mesmo essa pequena multidão. Todos os momentos que ela sentou na sala de estar de Marcia foram muito desconfortáveis para Linette Robinson. Neste exato momento, enquanto ela ria de outro pequeno gracejo de Elmer Claire, estava desejando ardentemente estar em casa com um bom livro e um copo de chá gelado.
Comecei a sussurrar-lhe que tudo terminaria em (eu lancei um olhar para meu relógio) mais uma hora, uma hora e quinze minutos no máximo — mas me lembrei a tempo que isso iria apenas angustiá-la mais do que ela já estava. Anotei rapidamente — Selah Pumphrey - panos de prato, — e sentei pronta para anotar o próximo presente. Selah Pumphrey esperou que eu concedesse a ela uma Grande Reação assim que ela deslizou pela porta, já que Selah vinha saindo há semanas com aquele vampiro que eu tinha abjurado. Selah estava sempre imaginando que eu iria pular nela e golpear sua cabeça. Selah tinha uma opinião negativa de mim, não que ela me conhecesse de qualquer modo. Ela certamente não sabia que o vampiro em questão estava simplesmente fora de meu radar agora. Eu achava que ela tinha sido convidada porque ela tinha sido a agente imobiliária de Andy e Halleigh, quando eles compraram a sua casinha.
— Tara Thornton - camisola de renda, — eu escrevi, e sorri para a minha amiga Tara, que tinha selecionado o presente de Halleigh do estoque da sua loja de roupas. Claro, Elmer Claire teve muito que dizer sobre a camisola, e o divertimento foi recebido por todas — pelo menos a julgar pela aparência. Algumas das mulheres reunidas não se sentiam confortáveis com o humor liberal de Elmer Claire, algumas delas estavam pensando que o marido de Elmer Claire tinha muito que aturar, e algumas delas só desejavam que ela se calasse. Esse grupo incluía a mim, Linette Robinson e Halleigh.
A diretora da escola onde Halleigh ensinava tinha dado ao casal alguns jogos americanos perfeitamente encantadores, e a diretora adjunta tinha conseguido guardanapos para combinar. Eu anotei esses com ênfase e enfiei alguns dos papéis de embrulho rasgados no saco de lixo ao meu lado.
— Obrigada, Sookie, — Halleigh disse calmamente, quando Elmer Claire estava contando outra história sobre algo que havia acontecido em seu casamento, envolvendo uma galinha e o padrinho. — Eu realmente aprecio a sua ajuda.
— Não é grande coisa, — disse surpresa.
— Andy me contou que te fez esconder o anel de noivado, quando ele propôs, — disse ela, sorrindo. — E você me ajudou outras vezes, também. — Então, Andy contou para Halleigh sobre mim.
— Não tem problema, — eu disse um pouco envergonhada.
Ela disparou um olhar de soslaio para Selah Pumphrey, sentada a duas cadeiras de distância. — Você ainda está saindo com aquele homem bonito que vi na sua casa? — Ela perguntou um pouco mais alto. — O bonitão com o vistoso cabelo preto?
Halleigh tinha visto Claude, quando ele me deixou na minha residência temporária na cidade; Claude, o irmão de Claudine, minha fada madrinha. Sim, de verdade. Claude era lindo, e ele poderia ser absolutamente encantador (para mulheres) por cerca de sessenta segundos. Ele tinha feito o esforço quando ele conheceu Halleigh, e eu só poderia ser grata, já que as orelhas de Selah se aguçaram exatamente como uma raposa.
— Eu o vi talvez três semanas atrás, — eu disse honestamente. — Mas nós não estamos saindo por ora. — Nunca tinha saído, na verdade, porque a ideia de Claude de um bom encontro era alguém com um pouco de barba e equipamento que eu nunca possuiria. Mas nem todo mundo tinha que saber disso, certo? — Eu estou encontrando outra pessoa, — adicionei modestamente.
— Oh? — Halleigh era toda interesse inocente. Eu estava ficando mais afeiçoada à garota (quatro anos mais jovem que eu) a cada segundo.
— Sim, — eu disse. — Um consultor de Memphis.
— Você terá que trazê-lo para o casamento, — disse Halleigh. — Não será incrível, Portia?
Essa foi outra situação inteiramente difícil. Portia Bellefleur, irmã de Andy e outra futura noiva do duplo casamento dos Bellefleurs, me pediu para estar lá para servir bebida alcoólica, junto com o meu chefe, Sam Merlotte. Agora Portia estava em um beco sem saída. Ela nunca teria me convidado, exceto como uma trabalhadora (tenho certeza que não teria sido convidada para qualquer chá-de-panela para Portia.). Neste momento eu sorri com alegria para Portia de uma forma inocente, no estilo eu-estou-tão-feliz.
— É claro, — Portia disse suavemente. Ela não havia se instruído em direito para nada. — Ficaríamos satisfeitos se você quiser trazer o seu namorado.
Tive uma imagem mental feliz de Quinn se transformando em um tigre na recepção. Sorri para Portia o mais brilhante sorriso. — Verei se ele pode vir comigo, — eu disse.
— Agora, todas vocês, — disse Elmer Claire, — um passarinho me contou para escrever o que Halleigh disse quando ela desembrulhou seus presentes, porque vocês sabem, é o que ela dirá em sua noite de núpcias! — Ela agitou um bloco de notas.
Todas se calaram com antecipação feliz. Ou pavor.
— Esta foi a primeira coisa que Halleigh disse: ‘Oh, que embalagem bonita!’— Um coro de risos respeitosos. — Então ela disse, vamos ver: ‘Isso vai caber, eu mal posso esperar!’— Risos abafados. — Então ela disse: ‘Oh, eu precisava de um desses!’— Explosão de risos.
Depois disso, foi a hora do bolo, ponche, amendoins e bolas de queijo. Todas nós tínhamos reocupado nossos assentos, equilibrando cuidadosamente pratos e copos, quando a amiga da minha avó Maxine abriu um novo tópico de discussão.
— Como está a sua nova amiga, Sookie? — Maxine Fortenberry perguntou. Maxine estava passando através da sala, mas se destacar não era problema para Maxine. No final dos seus cinquenta anos, Maxine era robusta e saudável, e ela tinha sido uma segunda mãe para o meu irmão, Jason, que era o melhor amigo de seu filho Hoyt. — A garota de Nova Orleans?
— Amelia está indo bem. — Sorri nervosamente, muito consciente de que eu era o novo centro das atenções.
— É verdade que ela perdeu a casa na inundação?
— Ela sofreu bastante dano, o inquilino dela disse. Então Amelia está esperando notícias da companhia de seguros, e então ela vai decidir o que fazer.
— Sorte que ela estava aqui com você quando o furacão atingiu, — disse Maxine.
Acho que a pobre Amelia tinha ouvido isso umas mil vezes desde agosto. Eu penso que Amelia estava cansada de tentar se sentir sortuda. — Oh, sim, — eu disse agradavelmente. — Claro que ela teve.
A chegada de Amelia Broadway em Bon Temps tinha sido assunto de muita fofoca. Isso é natural.
— Então por ora, Amelia ficará contigo? — Halleigh perguntou prestativa.
— Por um tempo, — disse, sorrindo.
— Isso é simplesmente amável de sua parte, — disse Marcia Albanese com aprovação.
— Oh, Marcia, você sabe que eu tenho aquele andar de cima inteiro que eu nunca uso. Ela está realmente melhorando ele para mim; ela colocou um ar condicionado na janela lá em cima, então está muito mais agradável. Ele não está me incomodando nem um pouco.
— Ainda assim, muitas pessoas não quereriam alguém vivendo em suas casas por muito tempo. Acho que eu levaria uma dessas pobres almas para ficarem no Days Inn, mas eu simplesmente não posso me convencer a deixar outra pessoa na minha casa.
— Eu gosto da companhia, — eu disse, que era predominantemente verdade.
— Ela voltou para verificar a casa dela?
— Ah, só uma vez. — Amelia teve que entrar e sair de Nova Orleans realmente rápido, de modo que nenhum de seus amigos bruxos pudesse localizá-la. Amelia estava num grande problema com a comunidade bruxa da Big Easy.
— Ela obviamente ama aquele gato dela, — disse Elmer Claire. — Ela levou aquele velho e grande gato ao veterinário no outro dia, quando eu levei Powderpuff. — Powderpuff, o persa branco de Elmer Claire, tinha cerca de um milhão de anos. — Eu perguntei por que ela não levou aquele gato para ser castrado, e ela simplesmente cobriu as orelhas do gato como se ele pudesse me ouvir, e ela me pediu para não falar sobre aquilo na frente do Bob, como se ele fosse uma pessoa.
— Ela é realmente amorosa com Bob, — eu disse, não sabendo totalmente se eu queria silenciar ou rir com a idéia do veterinário castrando Bob.
— Como você conheceu Amelia? — Maxine perguntou.
— Vocês se lembram da minha prima Hadley?
Todas na sala acenaram com a cabeça, exceto a recém-chegada Halleigh e sua mãe.
— Bem, quando Hadley viveu em Nova Orleans, ela alugou o andar de cima da casa de Amelia, — eu disse. — E quando Hadley faleceu— aqui houve solenes acenos ao redor — eu fui até Nova Orleans para remover as coisas de Hadley. E eu conheci Amelia, e nos tornamos amigas, e ela simplesmente decidiu que iria visitar Bon Temps por algum tempo.
Todas as senhoras olharam para mim com as expressões mais expectantes, como se elas não pudessem esperar para ouvir o que viria a seguir. Porque tinha que haver mais explicações, certo?
Havia de fato muito mais história, mas eu não acho que elas estavam prontas para ouvir que Amelia, após uma grande noite de amor, tinha transformado acidentalmente Bob em um gato durante um experimento sexual. Eu nunca pedi para Amelia descrever as circunstâncias, porque eu tinha certeza que eu não queria ter uma imagem mental daquela cena. Mas todas elas estavam esperando por um pouco mais de explicação. Qualquer explicação.
— Amelia teve um rompimento ruim com o namorado dela, — eu disse, mantendo meu tom de voz baixo e confidencial.
Todas as faces das outras senhoras se mostraram excitadas e solidárias.
— Ele era um missionário mórmon, — eu disse a elas. Bem, Bob tinha me parecido como um missionário mórmon, em calças escuras e uma camisa branca de mangas curtas, e ele tinha chegado à casa de Amelia em uma bicicleta. Ele era realmente um bruxo, como Amelia. — Mas ele bateu à porta de Amelia e eles simplesmente caíram de amores. — Na verdade, caíram na cama. Mas você sabe - dá no mesmo, para os propósitos desta história.
— Será que os pais dele sabiam?
— Será que a igreja dele descobriu?
— Eles não têm que ter mais de uma esposa?
As perguntas se amontoaram abundantemente para eu administrálas, e eu esperei até que as convidadas diminuíssem seu entusiasmo novamente. Eu não estava acostumada a compor mentiras, e eu estava esgotando a verdade para a base do resto da história. — Eu realmente não sei muito sobre a Igreja Mórmon, — disse à autora da pergunta anterior, e essa era a verdade absoluta. — Embora eu ache que os mórmons modernos não devem ter mais de uma esposa. Mas o que aconteceu foi que os pais dele descobriram e ficaram realmente loucos, porque eles não achavam que Amelia era boa suficientemente para o homem, e eles o agarraram e o fizeram voltar para casa. Então ela quis partir de Nova Orleans para conseguir uma mudança de ambiente, esquecer o passado, vocês sabem.
Todas concordaram, absolutamente fascinadas pela grande drama de Amelia. Senti uma pontada de culpa. Por um minuto ou dois, todas deram a sua opinião sobre a triste história. Maxine Fortenberry resumiu tudo.
— Pobre garota, — disse Maxine. — Ele deveria ter resistido a eles.
Eu passei outro presente para Halleigh abrir. — Halleigh, você sabe que não vai acontecer com você, — eu disse, desviando a conversa para um tema adequado. — Andy é verdadeiramente louco por você, qualquer um pode dizer.
Halleigh enrubesceu, e sua mãe disse, — Nós todas amamos Andy, — e o chá-de-panela estava de volta nos trilhos. O resto da conversa desviou do casamento para as refeições que cada igreja estava se revezando em turnos para cozinhar para os desalojados. Os católicos teriam amanhã à noite, e Maxine soou um pouco aliviada quando disse que o número de cozinheiros caíra para 25.
Enquanto dirigia para casa mais tarde, eu estava me sentindo um pouco cansada da sociabilidade incomum. Também me deparei com a perspectiva de contar para Amelia sobre sua nova experiência fictícia. Mas quando eu vi a caminhonete estacionada no meu quintal, todos esses pensamentos voaram para fora da minha cabeça.
Quinn estava aqui — Quinn o homem-tigre, que ganhava sua vida organizando e produzindo eventos especiais para o mundo do sobrenatural — Quinn, meu querido. Eu fui para os fundos e praticamente saltei para fora do carro depois de uma olhada ansiosa no meu espelho retrovisor para ter certeza que minha maquiagem ainda estava boa.
Quinn arremeteu para fora da porta dos fundos enquanto me apressei nos degraus, e eu dei um pulinho. Ele me pegou e me girou, e quando ele me abaixou estava me beijando, suas mãos grandes moldurando meu rosto.
— Você está tão bonita, — disse ele, tomando fôlego. Um momento depois, ele engasgou. — Você cheira tão bem.
E então ele voltou para os beijos.
Finalmente paramos.
— Oh, eu não vejo você há tanto tempo! — Eu disse. — Estou tão feliz por você estar aqui! — Eu não via Quinn há semanas e, naquele tempo, eu estive com ele apenas por um curto período, quando ele passou por Shreveport em seu rumo para a Flórida, com uma carga de acessórios para a cerimônia de chegada da puberdade da filha de um líder de bando.
— Eu senti saudades, benzinho, — disse ele, seus grandes dentes brancos e brilhantes. Sua cabeça raspada brilhava à luz do sol, que estava chegando perfeitamente em ângulo neste final de tarde. — Eu passei um tempimho para me informar das novidades com sua colega de quarto, enquanto você estava no chá-de-panela. Como foi?
— Como os chás-de-panela costumam ser. Montes de presentes e muita fofoca. Este foi o segundo chá-de-panela que eu estive para esta moça, eu lhes dei mais uma travessa de porcelana chinesa para o uso cotidiano como presente de casamento, então elas me encheram de orgulho.
— Você pode ir a mais de um chá-de-panela para a mesma pessoa?
— Em uma cidade pequena como essa, sim. E ela retornou para casa para ter um chá-de-panela e um jantar comemorativo em Mandeville durante o verão. Então eu acho que Andy e Halleigh estarão muito bem montados.
— Eu imaginei que eles pretendiam se casar em abril passado.
Expliquei sobre o ataque cardíaco de Caroline Bellefleur. — No momento em que ela estava se restabelecendo, eles falaram sobre datas do casamento novamente, senhorita Caroline caiu e fraturou o quadril.
— Uau.
— E os médicos não acreditam que ela ficará recuperada até lá, mas ela sobreviveu a isso, também. Então eu acho que Halleigh e Andy e Portia e Glen de fato terão o casamento mais aguardado do ano em Bon Temps em algum dia no próximo mês. E você está convidado.
— Eu estou?
Nós estávamos nos dirigindo para dentro agora, uma vez que eu queria tirar meus sapatos e eu também queria sondar o que a minha colega de quarto estava tramando. Eu estava tentando pensar em alguma longa incumbência que eu poderia enviá-la, já que eu tão raramente conseguia ver Quinn, que era por assim dizer meu namorado, se na minha idade (27), eu poderia utilizar esse termo.
Isto é, eu acho que ele poderia ser meu namorado se ele pudesse diminuir o ritmo o suficiente para agarrar-se a mim.
Mas o trabalho de Quinn, que funciona como uma subsidiária da Extrema(mente Elegante) Eventos, abrangia uma grande parte do território, literal e figurativamente. Desde que nós separamos em Nova Orleans após o nosso resgate dos sequestradores lobis, eu tinha visto Quinn três vezes. Ele esteve num fim de semana, quando ele passou por Shreveport na sua viagem para outro lugar, e nós tínhamos saído para jantar no Ralph & Kacoo‟ s, um restaurante popular. Tinha sido uma noite boa, mas ele me levou para casa no final, pois ele tinha que começar a dirigir às sete da manhã seguinte. Na segunda vez, ele apareceu no Merlotte's, enquanto eu estava trabalhando, e já que ele foi numa noite lenta, eu tirei uma hora para sentar e conversar com ele, e ficamos de mãos dadas um pouco. Na terceira vez, eu lhe fiz companhia, enquanto ele carregava seu trailer para um galpão de aluguel U-RENT-SPACE. Tinha sido no meio do verão, e nós dois havíamos suado em bicas.
Torrentes de suor, muita poeira, galpões, a ocasional passagem de um veículo através do terreno... Um ambiente nada romântico.
E embora Amelia estivesse agora gentilmente descendo as escadas com sua bolsa sobre seu ombro e claramente planejando dirigir-se a cidade para nos dar alguma privacidade, dificilmente parecia promissor que nós teríamos que agarrar um instante para consumar uma relação que tinha tão pouco tempo para contato.
Amelia disse, — Adeus! — Ela tinha um grande sorriso em seu rosto, e uma vez que Amelia tem os dentes mais brancos do mundo, ela parecia como o gato risonho. O cabelo curto de Amelia estava espetado em todas as direções (ela diz que ninguém em Bon Temps pode cortá-lo direito) e seu rosto bronzeado estava nu de maquiagem. Amelia se parecia com uma jovem mãe suburbana que tem um bebê sentado na cadeira infantil amarrado no banco traseiro de sua mini-van; o tipo de mãe que tem tempo livre para correr e nadar e jogar tênis. De fato, Amelia corria três vezes por semana e praticava Tai Chi em meu quintal, mas ela odiava ficar na água e ela pensava que tênis era para (e cito) ‚idiotas que respiram pela boca‛. Eu mesma sempre admirei tenistas, mas quando Amelia tem um ponto de vista, ela se gruda nele.
— Vou ao shopping em Monroe, — disse ela. — Compras para fazer! — E com um aceno do tipo eu-estou-sendo-uma-boa-colega-dequarto, ela saltou para seu Mustang e desapareceu... Deixando Quinn e eu olhando um para a cara do outro.
— Essa Amelia! — Eu disse sem jeito.
— Ela é... Singular, — disse Quinn, constrangido da mesma forma que eu estava.
— O assunto é — eu comecei, exatamente quando Quinn disse, — Escuta, eu acho que devemos — e ambos tropeçamos para uma indecisão. Ele fez um gesto que indicou que eu deveria ir primeiro.
— Quanto tempo você ficará aqui? — Eu perguntei.
— Eu tenho que ir amanhã, — ele disse. — Eu posso ficar em Monroe ou Shreveport.
Ficamos nos encarando mais. Eu não posso ler as mentes dos metamorfos, não como os humanos comuns. Eu posso pegar a intenção, no entanto, e a intenção era... intenção.
— Então, — disse ele. Ele caiu sobre um joelho. — Por favor, — ele disse.
Eu tive que sorrir, mas depois olhei para longe. — O assunto somente é, — eu comecei de novo. Esta conversa seria muito mais fácil para Amelia, que era franca a um ponto extremo. — Você sabe que nós temos, hum, um monte de... — Fiz um gesto para frente e para trás com a minha mão.
— Química, — disse ele.
— Certo, — eu disse. — Mas se nunca conseguimos nos ver mais do que nos três últimos meses, eu não estou realmente certa se eu quero dar o próximo passo. — Eu odiava dizer isso, mas eu tinha que dizer. Eu não tinha necessidade de ser magoada. — Tenho grande desejo, — eu disse. — Grande, grande desejo. Mas eu não sou o tipo de mulher para uma aventura de uma noite.
— Quando a cúpula terminar, eu estarei tirando uma longa licença, — disse Quinn, e eu podia dizer que ele foi absolutamente sincero. — Um mês. Eu vim aqui para lhe perguntar se eu podia passá-lo com você.
— Sério? — Eu não podia deixar de soar incrédula. — Sério?
Ele sorriu para mim. Quinn tem uma lisa, cabeça raspada, uma tez oliva, um nariz destemido, e um sorriso que cria aquelas pequenas covinhas nos cantos da sua boca. Seus olhos são púrpura, como um amorperfeito primaveril. Ele é tão grande como um lutador profissional, e tão assustador. Ele levantou uma mão enorme, como se ele estivesse fazendo um juramento. — Sobre uma pilha de Bíblias, — ele disse.
— Sim, — eu disse após um momento de verificação de meus escrúpulos interiores para me certificar de que eles eram menores. E também, eu não posso ter um detector de verdade embutido, mas eu poderia ter sabido se ele tivesse pensando, eu estou dizendo isso para entrar em suas calças. Metamorfos são muito difíceis de ler, seus cérebros são todos confusos e semi-opaco, mas eu teria pegado isso dele. — Então... sim.
— Ai meu Deus! — Quinn tomou uma respiração profunda e seu sorriso iluminou o cômodo. Mas no momento seguinte, seus olhos adquiriram aquele olhar focado que os homens criam quando eles estão pensando em sexo muito especificamente. E então, o mais rápido possível, Quinn estava com seus pés e braços ao meu redor tão firmemente como cordas nos atando juntos.
Sua boca encontrou a minha. Continuamos onde nós havíamos parado com os beijos. Sua boca era muito talentosa e sua língua era muito quente. Suas mãos começaram a examinar minha topografia. Abaixo da linha das minhas costas para a curva de meus quadris, de volta para meus ombros para segurar meu rosto por um momento, abaixo para roçar provocantemente meu pescoço com as pontas dos dedos levemente. Então aqueles dedos encontraram os meus seios, e depois de um segundo, ele puxou minha blusa para fora da minha calça e começou a explorar o território que ele só tinha visitado brevemente antes. Ele gostou do que encontrou, se — Mmmmm— for uma declaração de deleite. Ele falou com intensidade para mim. — Eu quero ver você, — disse ele. — Eu quero ver você inteira.
Eu nunca tinha feito amor durante o dia antes. Pareceu-me muito (de modo excitante) pecaminoso estar lutando com os botões antes do sol se pôr, e eu estava tão grata por estar usado um sutiã de renda branca extra-bonito e uma minúscula calcinha. Quando eu me visto, eu gosto de me vestir por completo.
— Oh, — ele disse quando viu o sutiã, que realçava belamente com o meu bronzeado profundo de verão. — Ai meu Deus! — Não foram as palavras; foi a expressão de profunda admiração. Meus sapatos já estavam fora. Felizmente, naquela manhã eu havia dispensado as úteismas-totalmente-não-atraentes meias até a altura dos joelhos em favor das pernas desnudas. Quinn passou algum tempo de qualidade aconchegando meu pescoço e beijando seu caminho até o sutiã, enquanto eu lutava para desfazer o cinto, apesar de que ele se dobrava enquanto eu estava tentando lidar com a fivela dura, que não estava funcionando rápido o bastante.
— Tire sua camisa, — eu disse, e minha voz saiu tão rouca como a dele. — Eu não estou com uma camisa, você não deveria estar com uma camisa.
— Tudo bem, — ele disse, e rapidamente, a camisa estava fora. Você esperaria que Quinn fosse peludo, mas ele não era. No entanto, era musculoso à enésima potência, e no exato momento sua pele cor de oliva estava bronzeada. Seus mamilos eram surpreendentemente escuros e (não tão surpreendentemente) muito duros. Oh, meu Deus - diretamente no nível dos meus olhos. Ele começou a lidar com seu próprio maldito cinto, quando eu comecei a explorar uma pequena saliência dura com a minha boca, a outra com a mão.
O corpo inteiro de Quinn estremeceu, e ele parou o que estava fazendo. Ele correu seus dedos por meus cabelos para segurar a minha cabeça contra ele, e ele suspirou, embora saísse mais como um rosnado, vibrando através de seu corpo. Minha mão livre puxou sua calça, e ele retomou o trabalho no cinto, mas de um jeito sem foco e distraído.
— Vamos para o quarto, — eu disse, mas não saiu como uma calma e controlada sugestão, mais sim uma exigência desesperada.
Ele me arrebatou, e eu tranquei meus braços ao redor de seu pescoço e beijei a sua boca bonita novamente.
— Não é justo, — ele resmungou. — Minhas mãos estão cheias.
— Cama, — eu disse, e ele me depositou na cama e em seguida simplesmente caiu em cima de mim.
— Roupas, — eu o lembrei, mas ele tinha um bocado de rendas brancas e meu seio, e ele não respondeu. — Oh, — eu disse. Eu posso ter dito — Oh— mais algumas vezes; e — Sim, — também. Um pensamento repentino me puxou com força exatamente para fora do fluxo do momento.
— Quinn, você tem, você sabe... — Eu nunca precisei ter esses itens antes, uma vez que vampiros não podem deixar uma garota grávida ou transmitir-lhe uma doença.
— Porque você acha que eu ainda estou com minha calça? — disse ele, puxando um pequeno pacote do bolso. Seu sorriso desta vez foi muito mais selvagem.
— Bom, — eu disse do meu coração. Eu teria me jogado de uma janela, se tivéssemos que parar. — E você pode tirar sua calça agora.
Eu já tinha visto Quinn nu antes, mas decididamente sob condições estressantes — no meio de um pântano, na chuva, quando nós estávamos sendo perseguidos por lobisomens. Quinn parou ao lado da cama e tirou seus sapatos e meias e em seguida sua calça, movendo-se devagar o suficiente para eu assistir. Ele tirou sua calça, revelando cueca boxer curta, que estava sofrendo seu próprio tipo de stress. Em um movimento rápido ele o liberou, também. Ele tinha uma apertada bunda grande, e a linha do seu quadril para a coxa era simplesmente de dar água na boca. Ele tinha finas, finas cicatrizes brancas listradas nele aleatoriamente, mas parecia uma parte natural dele, que não prejudicava o seu corpo poderoso. Eu estava ajoelhada em cima da cama, enquanto eu o admirava, e ele disse: — Agora você.
Eu desenganchei meu sutiã e o deslizei para fora de meus braços, e ele disse: — Oh, Deus. Eu sou o homem mais sortudo vivo. — Depois de uma pausa, ele disse, — O resto.
Eu fiquei ao lado da cama e tirei a pequena coisa branca rendada.
— Isso é como estar na frente de um Buffet, — ele disse. — Eu não sei por onde começar.
Toquei meus seios. — Primeiro prato, — eu sugeri.
Eu descobri que a língua de Quinn era apenas um pouco mais áspera do que um homem comum. Eu estava ofegante e fazendo barulhos incoerentes, quando ele mudou do meu seio direito para o esquerdo, enquanto tentava decidir qual que ele gostava mais. Ele não conseguiu tomar sua decisão imediatamente, o que foi muito bom para mim. Até o momento que ele se resolveu pelo seio direito, eu estava me empurrando contra ele e fazendo sons que não podiam ser confundidos com qualquer coisa, a não ser desesperado.
— Acho que vou pular o segundo prato e ir direto para a sobremesa, — ele sussurrou, sua voz áspera e irregular. — Você está pronta, benzinho? Você parece pronta. Você se sente pronta.
— Estou tão pronta, — eu disse, me movendo entre nós para envolver minha mão em torno do seu comprimento. Ele tremeu todo quando eu toquei nele. Ele pôs o preservativo.
— Agora, — ele rosnou.
— Agora! — Eu o guiei para minha entrada, empurrando meus quadris para cima para encontrá-lo.
— Eu sonhei com isso, — disse ele, e empurrou para dentro de mim completamente. Essa foi a última coisa que qualquer um de nós foi capaz de dizer.
O apetite de Quinn era tão proeminente como o seu equipamento.
Ele desfrutou tanto da sobremesa, que ele voltou para repetir.
NÓS ESTÁVAMOS NA COZINHA QUANDO Amelia retornou. Eu havia alimentado Bob, seu gato, já que ela tinha sido tão discreta mais cedo e merecia uma recompensa. Tato não era algo natural em Amelia.
Bob ignorou sua ração a favor de assistir Quinn fritar bacon e eu cortar os tomates. Eu havia pegado o queijo, a maionese, a mostarda e o picles, qualquer coisa que eu conseguisse imaginar que um homem poderia querer em um sanduíche de bacon. Eu coloquei um short velho e uma camiseta, enquanto Quinn tinha pegado sua bolsa em sua caminhonete e vestido sua roupa de ginástica - uma camisa sem manga e um short feitos de material anti-suor.
Amelia deu a Quinn uma varredura de cima a baixo, quando ele voltou para o fogão, e então ela olhou para mim, dando um largo sorriso. — Vocês tiveram um bom reencontro? — disse ela, lançando suas sacolas de compras sobre a mesa da cozinha.
— Para o seu quarto, por favor, — eu disse, porque senão Amelia iria querer que admirássemos cada coisa que ela comprou. Com um resmungo, Amelia pegou as sacolas e levou-as para cima, retornando em um minuto para perguntar a Quinn se havia bacon suficiente para ela.
— Claro, — disse Quinn gentilmente, tirando algumas tiras e colocando um pouco mais na frigideira.
Eu gostava de homens que sabiam cozinhar. Enquanto eu arrumava os pratos e talheres, fiquei agradavelmente consciente da ternura que eu sentia ao sul do meu umbigo e do meu humor predominantemente relaxado. Eu peguei três copos do armário, mas meio que esqueci o que eu estava fazendo no meu caminho para o refrigerador, uma vez que Quinn se afastou do fogão para me dar um beijo rápido.
Seus lábios estavam tão quentes e firmes, que me lembrou de outra coisa que tinha sido quente e firme.
Tive um lampejo sobre o meu surpreendente momento de revelação, quando Quinn tinha escorregado para dentro de mim pela primeira vez. Considerando que minhas relações sexuais anteriores haviam sido com os vampiros, que estão definitivamente do lado frio, você pode imaginar a experiência espantosa que foi ter um amante respirando com batimento cardíaco e um pênis quente. De fato, metamorfos tendem a ser um pouco mais quentes do que os seres humanos normais. Mesmo com a camisinha, eu fui capaz de sentir o calor.
— O quê? — Quinn perguntou. — Por que esse olhar? — Ele estava sorrindo zombeteiro.
Eu sorri. — Eu estava pensando em sua temperatura, — respondi.
— Ei, você sabia que eu era quente, — disse ele com um gracejo. — E sobre a leitura de mentes? — disse ele mais a sério. — Como foi que lidou com isso?
Eu pensei que foi importante que ele quisesse mesmo saber. — Não posso chamar os seus pensamentos de aborrecedores de qualquer forma, — eu disse, incapaz de reprimir um sorriso enorme. — Se for possível considerar um ininterrupto ‚simsimsim porfavorporfavor‛ como um pensamento.
— Sem problema então, — disse ele, totalmente desembaraçado.
— Sem problema. Desde que você esteja envolvido no momento e esteja feliz, eu estarei feliz.
— Bem, cacete. — Quinn voltou para o fogão. — Isso é simplesmente incrível.
Eu acreditei que era, também.
Simplesmente incrível.
Amelia comeu seu sanduíche com um bom apetite e em seguida pegou Bob para alimentá-lo com pedacinhos de bacon que ela guardou. O grande gato preto e branco ronronou alto.
— Então, — disse Quinn, após seu primeiro sanduíche desaparecer com uma rapidez incrível, — esse é o cara que você transformou por acidente?
— É, — disse Amelia, coçando as orelhas de Bob. Esse é o cara. — Amelia estava sentada de pernas cruzadas na cadeira da cozinha, que é algo que eu simplesmente não conseguia fazer, e ela estava concentrada no gato. — O carinha, —, ela sussurrava. — Ele é meu querido peludinho, não é? Ele não é? — Quinn pareceu levemente enojado, mas eu era igualmente culpada por falar com Bob como se fosse bebê, quando eu ficava sozinha com ele. Bob o bruxo tinha sido um magricela, um cara esquisito com uma espécie de encanto nerd. Amelia tinha me dito que Bob tinha sido um cabeleireiro, eu tinha decidido que se isso fosse verdade, ele arrumava cabelo em uma casa funerária. Calça preta, camisa branca, bicicleta? Alguma vez você já conheceu um cabeleireiro que se apresentasse dessa maneira?
— Então, — disse Quinn. — O que você está fazendo sobre isso?
— Estou estudando, — disse Amelia. — Estou tentando descobrir o que eu fiz de errado, para que eu possa consertar. Seria mais fácil se eu pudesse... — A voz dela sumiu numa espécie de culpa.
— Se você pudesse falar com sua mentora? — Eu disse prestativa.
Ela fez uma careta para mim. — É, — disse ela. — Se eu pudesse falar com minha mentora.
— Por que você não fala? — Quinn perguntou.
— Um, eu não devia ter usado magia de transformação. Isso é bastante inaceitável. Dois, eu tenho procurado por ela online desde o Katrina, em cada sala de bate-papo que bruxas usam, e não consigo encontrar nenhuma notícia dela. Ela pode ter ido para um abrigo em algum lugar, ela pode ter ficado com seus filhos ou algum amigo, ou ela pode ter morrido na inundação.
— Eu acredito que sua renda principal venha das suas propriedades alugadas. Quais são seus planos agora? Qual é o estado de sua propriedade? — Quinn perguntou, levando o seu prato e o meu para a pia. Ele não estava sendo tímido com perguntas pessoais esta noite. Esperei com interesse em ouvir as respostas de Amelia. Eu sempre quis saber um monte de coisas sobre Amelia, que era simplesmente grosseira perguntar como, do que ela estava vivendo agora?
Embora ela estivesse trabalhando meio expediente para minha amiga Tara Thornton na Tara’s Togs, enquanto a ajudante de Tara estava doente, os gastos de Amelia excediam em muito os seus rendimentos visíveis. Isso significava que ela tinha um bom crédito, algumas economias, ou outra fonte de renda além de leituras de tarot que ela fazia em uma loja na Jackson Square e seu dinheiro do aluguel, que agora não estava entrando.
A mãe dela tinha lhe deixado algum dinheiro. Devia ter sido uma
nota.
— Bem, eu estive de volta a Nova Orleans, uma vez depois da tempestade, — disse Amelia. — Você conheceu Everett, meu inquilino?
Quinn assentiu.
— Quando ele conseguiu acessar um telefone, ele relatou alguns danos no andar inferior, onde eu moro. Havia árvores e galhos derrubados, e é claro que não houve eletricidade ou água por algumas semanas. Mas o bairro não sofreu tanto como alguns, graças a Deus, e, quando a eletricidade voltou, eu fui lá. — Amelia tomou uma respiração profunda. Eu podia ouvir direto de seu cérebro que ela estava com medo de se aventurar em um território que ela estava prestes a nos revelar. — Eu, hã, fui falar com meu pai sobre o conserto do telhado. Até então, tínhamos um telhado azul como metade das pessoas ao nosso redor. — O plástico azul que cobria os telhados danificados era o novo modelo em Nova Orleans.
Essa foi a primeira vez que Amelia mencionou sua família para mim, mais que numa maneira muito geral. Eu tinha descoberto mais com seus pensamentos do que com sua conversa, e eu tive que ter cuidado para não misturar as duas fontes, enquanto estávamos conversando. Eu podia ver a presença de seu pai em sua cabeça, amor e ressentimento misturados nos pensamentos dela formando uma massa confusa.
— Seu pai está consertando sua casa? — Quinn perguntou casualmente. Ele estava vasculhando minha Tupperware, onde eu guardava qualquer biscoito que cruzasse minha soleira - não que fosse uma ocorrência frequente, uma vez que tenho tendência para engordar quando tenho doces em casa. Amelia não tinha esse problema, e ela tinha abastecido a caixa com alguns biscoitos do tipo Keebler e havia dito a Quinn que ele era bem-vindo para se servir.
Amelia fez que sim com a cabeça muito mais fascinada agora pelos pêlos de Bob do que ela tinha sido há um momento atrás. — É, ele tem uma equipe nisso, — ela disse.
Isso era uma novidade para mim.
— Então, quem é seu pai? — Quinn estava mantendo a objetividade. Até agora isso tinha funcionado para ele.
Amelia se contorceu na cadeira da cozinha fazendo Bob levantar a cabeça em sinal de protesto.
— Copley Carmichael, — murmurou ela.
Nós dois ficamos em silêncio com o choque. Após um minuto, ela olhou para nós. — O quê? — ela disse. — Ok, ele é famoso. Ok, ele é rico. E daí?
— Sobrenome diferente? — Eu disse.
— Eu uso o de minha mãe. Eu cansei de pessoas agindo estranho ao meu redor, — disse Amelia incisivamente.
Quinn e eu trocamos olhares. Copley Carmichael era um grande figurão no estado da Louisiana. Ele tinha dedos em todos os tipos de gráficos financeiros, e todos os dedos estavam muito sujos. Mas ele era um tradicional humano especulador: sem vestígio do sobrenatural em torno de Copley Carmichael.
— Ele sabe que é uma bruxa? — Eu perguntei.
— Ele não acredita nem por um minuto, — respondeu Amelia, parecendo frustrada e desamparada. — Ele pensa que eu sou uma iludida aspirante sem valor, que eu estou andando com pessoas estranhas sem valor e fazendo trabalhos estranhos sem valor para mostrar minha língua para ele. Ele não acreditaria em vampiros se ele não tivesse os visto repetidamente.
— E sua mãe? — Quinn perguntou. Eu peguei mais um pouco de chá. Eu sabia a resposta para essa pergunta.
— Morta, — disse-lhe Amelia. — Três anos atrás. Isso foi quando eu me mudei da casa de meu pai para o andar inferior do prédio na Chloe. Ele o tinha me dado quando me formei na faculdade assim eu teria o meu próprio rendimento, mas ele garantiu que eu obtivesse sucesso por mim mesma para que eu tivesse a experiência.
Aquilo parecia muito bom para mim. Hesitante eu disse, — Não era a coisa certa a fazer? Levá-la a aprender fazendo?
— Bem, é, — admitiu ela. — Mas quando eu me mudei, ele queria me dar uma mesada... na minha idade! Eu sabia que tinha que fazer isso sozinha. Entre o aluguel, o dinheiro que eu ganho fazendo leituras, e os trabalhos mágicos que consegui sozinha, tenho ganhando a vida. — Ela jogou a cabeça para trás com orgulho.
Amelia não parecia perceber que o aluguel era o rendimento de um presente de seu pai, não de algo que ela realmente conseguiu sozinha. Amelia estava verdadeiramente muito satisfeita com sua própria autossuficiência. Minha nova Sookie Stackhouse amiga, a quem eu adquiri quase por acaso, era um pacote de contradições. Já que ela era uma emissora muito clara, eu recebia seus pensamentos altos e claros. Quando eu ficava sozinha com Amelia, eu tinha que me proteger como uma louca. Eu estava descontraída com Quinn por perto, mas eu não deveria. Eu estava recebendo um caos total da cabeça de Amelia.
— Então, seu pai poderia ajudá-la a encontrar a sua mentora? — Quinn perguntou.
Amelia pareceu pálida por um momento, como se ela estivesse levando isso em consideração. — Eu não vejo como, — disse ela lentamente. — Ele é um cara poderoso; você sabe disso. Mas ele está tendo tanta dificuldade em Nova Orleans desde o Katrina como o resto das pessoas estão.
Exceto que ele tinha muito mais dinheiro e poderia ir para outro lugar, retornando quando quisesse, o que a maioria dos habitantes da cidade não podiam. Eu fechei minha boca para manter essa observação para mim. Hora de mudar o tópico.
— Amelia, — disse. — Como então você conheceu Bob, em todo caso? Quem está procurando por ele?
Ela parecia um pouco assustada, não era uma coisa normal para Amelia. — Estou me perguntando, também, — disse ela. — Eu só conhecia Bob de ouvir falar antes daquela noite. Mas eu sei que Bob teve - tem - grandes amigos na comunidade mágica. Eu não acho que algum deles sabia que nós ficamos juntos. Naquela noite, antes do baile da rainha, quando a merda bateu no ventilador entre os vampiros de Arkansas e os nossos vampiros, Bob e eu voltamos para meu apartamento depois que nós deixamos Terry e Patsy na pizzaria. Bob ligou no dia seguinte para o trabalho dizendo que estava doente, já que tínhamos comemorado muito, e então ele passou aquele dia comigo.
— Então é possível que a família de Bob esteja à procura dele há meses? Querendo saber se ele está vivo ou morto?
— Ei, relaxa. Eu não sou assim tão detestável. Bob foi criado por sua tia, mas eles não se davam bem em nenhuma hipótese. Ele não tinha muito contato com ela há anos. Tenho certeza que ele tem amigos que estão preocupados, e eu realmente, realmente sinto muito por isso. Mas mesmo se eles soubessem o que tinha acontecido, não iriam ajudar Bob, né? E por causa do Katrina, todos em Nova Orleans tem muito o que se preocupar.
Neste ponto interessante na discussão, o telefone tocou. Eu estava mais próxima, então eu o apanhei. A voz de meu irmão estava quase elétrica com a excitação.
— Sookie, você precisa vir para Hotshot em cerca de uma hora.
— Por quê?
— Eu e Crystal vamos nos casar. Surpresa!
Embora aquilo não fosse um choque total (Jason estava ‚namorando‛ Crystal Norris há vários meses), a cerimônia súbita me deixou ansiosa.
— Crystal está grávida de novo? — Eu perguntei desconfiada. Ela tinha abortado um bebê de Jason não havia muito tempo.
— Sim! — respondeu Jason, como se essa fosse a melhor notícia que ele poderia transmitir. — E desta vez, nós estaremos casados quando o bebê nascer.
Jason estava ignorando a realidade, e estava cada vez mais disposto a casar. A realidade era que Crystal tinha ficado grávida pelo menos uma vez antes de ficar grávida de Jason, e ela tinha perdido a criança, também. A comunidade de Hotshot era vítima de sua própria endogamia.
— Ok, eu vou estar lá, — eu disse. — Amelia e Quinn podem ir, também?
— Claro, — disse Jason. — Crystal e eu teremos orgulho em recebê-los.
— Há algo que eu possa levar?
— Não, Calvin e eles estão se preparando para cozinhar. Tudo vai rolar do lado de fora. Temos luzes de pendurar. Eu acho que eles farão uma grande caçarola de jambalaya, um pouco de arroz preto, e salada de repolho, e eu e meus chegados estamos levando o álcool. Apenas venha parecendo bonita! Vejo vocês em Hotshot em uma hora. Não se atrasem.
Eu desliguei e sentei ali por um minuto, minha mão ainda segurava o fio do telefone. Aquilo era exatamente típico de Jason: venha em uma hora para a cerimônia planejada no último minuto pela pior razão possível, e não se atrase. Pelo menos ele não tinha me pedido para levar o bolo.
— Sookie, você está bem? — Quinn perguntou.
— Meu irmão Jason esta se casando está noite, — eu disse, tentando manter minha voz calma. — Fomos convidados para o casamento, e precisamos estar lá em uma hora. — Eu sempre tinha imaginado que Jason não se casaria com uma mulher que eu realmente adorasse; ele sempre tinha mostrado uma tendência para vagabundas desagradáveis. E aquela era Crystal, sem dúvida. Crystal era também uma mulher-pantera, membro de uma comunidade que guardava seus próprios segredos desconfiadamente. Aliás, meu irmão era agora um homem-pantera porque ele tinha sido mordido repetidas vezes por um rival que queria a atenção de Crystal.
Jason era mais velho do que eu, e Deus sabe, ele teve sua cota de mulheres. Eu tinha que assumir que ele sabia quando uma lhe fosse apropriada.
Eu saí de meus pensamentos para descobrir que Amelia estava parecendo espantada e animada. Ela gostava de sair para uma festa, e as chances para isso em Bon Temps eram limitadas. Quinn, que conheceu Jason quando ele foi me visitar, me olhou com uma cética sobrancelha levantada.
— Sim, eu sei, — eu disse. — Isso é louco e idiota. Mas Crystal está grávida novamente, e não há como pará-lo. Vocês dois querem vir comigo? Vocês não precisam. Estou com medo que eu tenha que estar pronta agora mesmo.
Amelia disse, — Oh, ótimo, eu posso usar o meu traje novo, — e acelerou para cima para arrancar as etiquetas.
Quinn disse, — Benzinho, você quer que eu vá?
— Sim, por favor, — eu respondi. Ele se aproximou e envolveu seus braços fortes em torno de mim. Senti-me confortada, embora eu soubesse que Quinn estava pensando que Jason era um tolo.
Eu quase concordava com ele.
AINDA ESTAVA QUENTE À NOITE, mas não opressivamente, para fins de setembro. Eu usava um vestido branco sem mangas com flores vermelhas, um que eu tinha usado antes, quando eu tive um encontro com Bill (de quem não quero lembrar). Por pura vaidade, eu coloquei minhas sandálias vermelhas de salto alto, apesar de ser um calçado pouco prático para um casamento em uma estrada grosseiramente asfaltada. Eu coloquei um pouco de maquiagem, enquanto Quinn tomava banho, e eu não estava descontente com o meu reflexo. Não há nada melhor que um ótimo sexo para te dar um brilho. Eu saí do meu quarto e olhei para o relógio. Precisávamos sair rápido.
Amelia estava usando um vestido de mangas curtas, bege com uma diminuta estampa azul marinho. Amélia gostava de comprar roupas e se considerava uma pessoa elegante, mas seu gosto era exatamente como o de uma jovem mãe suburbana. Usava sandálias azul-marinho com pequenas flores sobre as tiras, muito mais adequadas do que os meus saltos.
Exatamente quando eu estava começando a me preocupar, Quinn saiu do meu quarto vestindo uma camisa de seda marrom e calças cáqui.
— Coloco uma gravata? — perguntou ele. — Eu tenho algumas na minha bolsa.
Pensei na zona rural e na falta de sofisticação da pequena comunidade de Hotshot. — Eu não acho que seja necessário uma gravata, — eu disse, e Quinn pareceu aliviado.
Amontoamos-nos em meu carro e dirigi para oeste e depois para o sul. Durante o passeio, eu tive uma chance de explicar aos meus convidados de fora da cidade, sobre o bando isolado de homens-pantera, seu pequeno aglomerado de casas agrupadas na área rural de Renard Parish. Eu estava dirigindo, já que assim seria mais simples. Uma vez longe dos antigos trilhos ferroviários, a região tornou-se cada vez mais despovoada, até por duas ou três milhas não víamos luzes de qualquer tipo. Em seguida vimos os carros e as luzes em um cruzamento adiante. Nós estávamos lá.
Hotshot ficava no meio do nada, assentado em uma longa depressão no meio da terra suavemente elevada, elevações que eram muito mal definidas para serem chamadas de colinas. Formado em torno de um antigo cruzamento, a isolada comunidade tinha uma poderosa vibração de magia. Eu podia dizer que Amelia estava sentindo esse poder. Sua expressão tornou-se mais aguçada e mais sábia, quando chegamos mais perto. Até Quinn respirou profundamente. Quanto a mim, eu podia detectar a presença de magia, mas isso não afetava alguém nãosobrenatural como eu.
Eu me aproximei da lateral da estrada, atrás da caminhonete de Hoyt Fortenberry. Hoyt era o melhor amigo de Jason e sua sombra por toda a vida. Avistei-o a nossa frente, caminhando pela estrada para uma área bem iluminada.
Eu tinha dado uma lanterna para Amelia e Quinn, e mantive uma apontada aos meus pés.
— Hoyt, — eu chamei. Corri para alcançá-lo, pelo menos tanto quanto fosse possível nos saltos vermelhos. — Ei, você está bem? — Eu perguntei, quando vi seu rosto abatido. Hoyt não era um cara muito bonito, ou muito brilhante, mas era sensato e tendia a ver as coisas além do momento para suas consequências, algo que meu irmão nunca tinha dominado.
— Sook, — disse Hoyt. — Não posso acreditar que ele está se amarrando. Eu acho que eu pensei que eu e Jason seríamos solteiros para sempre. — Ele tentou sorrir.
Dei-lhe um tapinha no ombro. A vida poderia ter sido agradável e ordenada se eu pudesse ter me apaixonado por Hoyt, conectando-o assim ao meu irmão para sempre, mas Hoyt e eu nunca tivemos o menor interesse um pelo outro.
A mente de Hoyt irradiava uma tediosa miséria. Ele estava certo de que sua vida estava mudando para sempre esta noite. Ele esperava que Jason consertasse seu caminho completamente, para ficar com sua esposa como um marido devia, e abandonar todo o resto.
Eu certamente esperava que a expectativa de Hoyt estivesse correta.
No canto da multidão, Hoyt reuniu-se com Catfish Hennessy, e eles começaram a fazer piadas sobre Jason estar quebrado e se casando.
Eu esperava que a união masculina ajudasse Hoyt a passar pela cerimônia. Eu não sabia se Crystal amava verdadeiramente meu irmão, mas Hoyt amava.
Quinn segurou minha mão e, com Amelia no nosso rastro, atravessamos a pequena multidão até chegar ao centro.
Jason estava vestindo um terno novo, e o azul era apenas um pouco mais escuro que o azul dos seus olhos. Ele parecia ótimo, e ele estava sorrindo até não poder mais. Crystal estava usando um vestido com estampa de leopardo de corte mais curto na frente, tão curto quanto pudesse para ainda ser chamado de vestido. Eu não sabia se o motivo de leopardo era uma ironia de sua parte ou uma simples expressão de seu senso de moda. Eu suspeitava que fosse o último.
O feliz casal estava no meio de um espaço vazio, acompanhado por Calvin Norris, líder da comunidade de Hotshot. A multidão continuou respeitosamente distante, formando um círculo irregular.
Calvin, que era tio de Crystal, estava segurando o braço dela. Ele sorriu para mim. Calvin tinha feito a barba e colocou um terno para a ocasião, mas ele e Jason eram os únicos homens usando gravata. Quinn percebeu isso e seus pensamentos se aliviaram.
Jason me viu logo depois de Calvin, e acenou para mim. Eu dei um passo à frente, de repente percebendo que eu teria um papel na cerimônia. Eu abracei meu irmão, cheirando seu perfume almiscarado... Mas nenhum álcool. Eu relaxei um pouco. Eu suspeitava que Jason tivesse se fortalecido com uma bebida ou duas, mas ele estava bastante sóbrio.
Eu fui até Jason e olhei para trás para ver o que tinha acontecido com meus companheiros, então eu soube o momento em que os homenspantera perceberam que Quinn estava lá. Houve um súbito silêncio entre os dupla-natureza, e eu ouvi seu nome pairar por eles como um sussurro ao vento.
Calvin sussurrou, — Você trouxe o Quinn? —, como se eu tivesse chegado com Papai Noel ou alguma outra criatura mítica.
— Está tudo bem? — Eu perguntei, uma vez que eu não tinha ideia que criaria tal rebuliço.
— Oh, sim, — disse ele. — Ele é o seu homem agora? — O rosto de Calvin manteve essa mistura de perplexa reavaliação e especulação, que eu imediatamente comecei a querer saber o que eu desconhecia a respeito do meu novo amante.
— Hum, bem, algo do tipo, — eu disse com repentina cautela.
— Estamos honrados em tê-lo aqui, — Calvin me assegurou.
— Quinn, — Crystal sussurrou. Suas pupilas foram dilatando, e eu senti que seu cérebro se focou em meu companheiro com uma espécie de desejo. Eu quis chutá-la. Está aqui para casar com meu irmão, lembra?
Jason parecia tão confuso quanto eu estava. Visto que ele era uma pantera há apenas alguns meses, havia muito sobre o mundo oculto dos dupla-natureza que ele não tinha captado ainda.
Eu também.
Crystal fez um esforço para se dominar e voltar ao presente. Ela naturalmente estava gostando de ser o centro das atenções, mas dispôs de um momento para reavaliar sua futura cunhada. Seu respeito por mim (praticamente inexistente até então) tinha subido de conceito.
— Qual é o procedimento? — Eu perguntei bruscamente, tentando colocar a todos nós de volta aos trilhos.
Calvin voltou para seu eu prático. — Uma vez que temos convidados humanos, nós adaptamos a cerimônia, — explicou ele em voz muito baixa. — Aqui está como acontece... você responde por Jason como seu parente vivo mais próximo, porque ele não tem ninguém mais velho que você para fazer isso. Eu sou o parente mais velho vivo de Crystal, por isso, respondo por ela. Nos oferecemos a pagar a pena se algum deles fizer algo errado.
Oh-oh. Não gostei de como isso soou. Eu dei um rápido olhar para o meu irmão, que (naturalmente) não pareceu pensar duas vezes sobre o compromisso que eu estava fazendo. Eu não devia ter esperado nada além disso.
— Então, o ministro se apresenta e realiza a cerimônia como qualquer outro casamento, — disse Calvin. — Se não houvesse estranhos aqui, seria diferente.
Fiquei curiosa sobre isso, mas este não era o momento de fazer muitas perguntas. No entanto, havia algumas que precisavam ser respondidas. — Que pena eu estou me comprometendo pagar? O que constitui fazer algo errado?
Jason bufou um suspiro, exasperado por que eu queria descobrir o que eu estava me comprometendo. Os olhos amarelos e calmos de Calvin encontraram os meus, e eles estavam cheios de compreensão.
— Aqui está o que você estará respondendo, — Calvin disse em uma voz que era calma, porém intensa. Nos reunimos em torno dele. — Jason, preste atenção. Nós falamos sobre isso, mas eu acho que você não estava me dando sua total atenção. — Jason estava ouvindo agora, mas eu podia sentir sua impaciência.
— Estar casado aqui, — e Calvin acenou com a mão para indicar a pequena comunidade de Hotshot, — significa ser fiel a sua companheira, a menos que a companheira tenha que procriar para manter o crescimento do grupo. Uma vez que Crystal está praticamente fora da obrigação, Jason, isso significa que ela tem que ser fiel a você, e você a ela. Vocês não têm obrigações de reprodução, como os puro-sangue têm. — Jason se ruborizou neste lembrete de seu estado inferior, uma vez que ele era um homem-pantera apenas porque ele foi mordido por um, e não porque ele nasceu com o gene. — Então, se Crystal for infiel a você e um membro da comunidade puder testemunhar isso, e se ela não puder pagar a pena por algum motivo - gravidez ou doença ou uma criança para criar - eu tenho que pagar. Não estamos falando de dinheiro aqui, entendeu?
Jason concordou. — Está falando de castigo físico, — disse ele.
— Sim, — disse Calvin. — Você não está somente prometendo ser fiel, mas também está prometendo manter o nosso segredo.
Jason assentiu com a cabeça novamente.
— E ajudar outros membros da comunidade se eles estiverem necessitando.
Jason fez uma careta.
— Exemplo? — Eu perguntei.
— Se o telhado de Maryelizabeth precisar ser substituído, podemos todos economizar um pouco para comprar o material e nós todos cedemos tempo para fazer o trabalho. Se uma criança precisa de um lugar para ficar, sua casa está aberta a essa criança. Nós cuidamos uns dos outros.
Jason assentiu com a cabeça novamente. — Eu entendo, — disse ele. — Eu estou disposto. — Teria que desistir de um pouco do seu tempo de diversão, e eu me senti triste por Hoyt, e confesso que me senti um pouco triste por mim. Eu não estava ganhando uma irmã, eu estava perdendo meu irmão, pelo menos em algum nível.
—Diga isso com todo o coração ou cancele agora, — eu disse, mantendo minha voz muito baixa. — Você está envolvendo a minha vida nisso também. Você pode manter as promessas que está fazendo para essa mulher e sua comunidade, ou não?
Jason olhou para Crystal por um longo momento, e eu não tinha o direito de estar em sua cabeça, portanto me retirei e me lancei pelos pensamentos aleatórios da multidão ao invés disso. Eles eram em sua maioria o que você esperava: um pouco de excitação por estarem em um casamento, um pouco de prazer ao ver o solteiro mais notório da área acorrentado a uma jovem mulher selvagem, uma pequena curiosidade sobre o estranho ritual de Hotshot. Hotshot era um provérbio na comunidade — tão estranho como alguém de Hotshot — tinha sido dito por anos, e as crianças de Hotshot que frequentavam a escola em Bon Temps, muitas vezes tinham momentos difíceis até passar as primeiras poucas brigas no parquinho.
— Manterei minhas promessas, — Jason disse com sua rouca voz.
— Manterei as minhas, — disse Crystal.
A diferença entre os dois era a seguinte: Jason era sincero, mas eu duvidava de sua capacidade de manter sua palavra. Crystal tinha a capacidade, mas ela não estava sendo sincera.
— Você não quer dizer isso, — eu disse a ela.
— Ao inferno o que você diz, — ela respondeu.
— Eu não costumo dar palpites, — eu disse, me esforçando para manter minha voz baixa. — Mas isto é muito sério para eu ficar calada. Eu posso ver dentro de sua cabeça, Crystal. Não se esqueça que eu posso.
— Eu não estou esquecendo de nada, — ela disse, garantindo pesar cada palavra. — E eu estou casando esta noite com Jason.
Olhei para Calvin. Ele estava preocupado, mas no final, ele deu de ombros. — Não podemos parar isso, — ele disse. Por um segundo, eu estive tentada a lutar contra seu pronunciamento. Por que não? Eu pensei.
Se eu a agarrasse e a estapeasse, talvez fosse suficiente para acabar com a coisa toda. Então eu reconsiderei. Eram ambos adultos, pelo menos teoricamente. Eles se casariam, se eles quisessem, seja aqui e agora ou em algum outro lugar em alguma outra noite. Baixei a cabeça e engoli meus medos.
— É claro, — eu disse, levantando meu rosto e sorrindo o sorriso brilhante que eu tenho quando eu estou realmente ansiosa. — Vamos prosseguir com a cerimônia. — Eu peguei um vislumbre da face de Quinn no meio da multidão. Ele estava olhando para mim, preocupado pela discussão em voz baixa. Amelia, por outro lado, estava feliz conversando com Catfish, a quem ela tinha conhecido no bar. Hoyt estava sozinho bem debaixo das luzes portáteis improvisadas para a ocasião. Tinha as mãos enfiadas nos bolsos, e ele parecia mais sério do que eu jamais tinha visto. Havia algo de estranho sobre a visão, e depois de um segundo eu descobri o porquê.
Era uma das poucas vezes que eu vi Hoyt sozinho.
Eu tomei o braço de meu irmão, e Calvin novamente segurou o de Crystal. O sacerdote entrou no centro do círculo, e a cerimônia começou. Embora eu tentasse duramente parecer feliz por Jason, eu tive um momento difícil segurando as lágrimas, enquanto meu irmão se tornava o marido de uma garota selvagem e voluntariosa, que era perigosa de nascimento.
Houve depois um baile, e um bolo de casamento, e um montão de álcool. Havia abundância de comida, e, consequentemente, não havia latas de lixo grandes o suficiente para encher com pratos de papel, latas e guardanapos de papel amassados. Alguns dos homens tinham trazido caixas de cerveja e vinho, e alguns tinham licor também. Ninguém podia dizer que Hotshot não podia fazer uma festa.
Enquanto uma banda zydeco de Monroe tocava, a plateia dançava na rua. A música ecoava por todo o campo de uma forma estranha. Eu tremi e me perguntei o que estava nos observando na escuridão.
— Eles são bons, não são? — Jason perguntou. — A banda?
— Sim, — eu disse. Ele estava ruborizado de felicidade. Sua esposa estava dançando com um de seus primos.
— É por isso que nós apressamos este casamento, — ele disse. — Ela descobriu que está grávida, e decidimos ir adiante e casar, apenas casar. E a banda favorita dela estava livre para esta noite.
Eu neguei com a cabeça com a impulsividade de meu irmão. Então me lembrei de manter os visíveis sinais de desaprovação no mínimo. A família da noiva podia fazer um estardalhaço.
Quinn era um bom dançarino, embora eu tivesse que lhe mostrar alguns passos Cajun. Todas as belas mulheres de Hotshot quiseram uma dança com Quinn também, então eu tive uma rodada com Calvin, Hoyt e Catfish. Quinn estava se divertindo, eu podia dizer, e de certa forma eu estava também. Mas por volta de duas e meia da manhã, demos um breve aceno de cabeça. Ele tinha que sair no dia seguinte, e eu queria ficar sozinha com ele. Além disso, eu estava cansada de sorrir.
Enquanto Quinn agradecia Calvin pela noite maravilhosa, eu observei Jason e Crystal dançando juntos, aparentemente satisfeitos um com o outro. Eu soube diretamente do cérebro de Jason que ele estava apaixonado pela garota-pantera, pela subcultura que a tinha criado, pela novidade de ser um sobrenatural. Eu soube a partir de cérebro de Crystal que ela estava exultante. Ela tinha estado determinada a casar com alguém que não tinha crescido em Hotshot, alguém que era muito excitante na cama, alguém capaz de enfrentar não só a ela, mas a sua família... E agora ela o tinha.
Eu fiz o meu caminho até o feliz casal e dei a cada um deles um beijo na bochecha. Agora Crystal era da família, afinal de contas, e eu tinha que aceitá-la como tal e deixar os dois viverem suas próprias vidas juntos. Eu dei um abraço em Calvin também, e ele me segurou por um segundo antes de me soltar me dando um tapinha tranquilizador nas costas. Catfish me girou em círculos, e um Hoyt bêbado o substituiu logo que me soltou. Eu tive dificuldade de convencer os dois de que eu realmente queria sair, mas finalmente Quinn e eu voltamos para o meu carro.
Enquanto nos afastávamos da multidão, vi Amelia dançando com um de moradores de Hotshot. Ambos estavam de ótimo humor, tanto no sentido literal como no alcoólico. Gritei para Amelia para dizer que estávamos indo embora, e ela gritou: — Vou pegar uma carona com alguém mais tarde!
Ainda que eu gostasse de ver Amelia feliz, esta estava sendo uma Noite Apreensiva, porque eu me preocupava com ela um pouco. No entanto, se alguém podia cuidar de si mesma, este alguém era Amelia.
Nós estávamos nos movendo devagar, quando chegamos em casa. Eu não chequei a cabeça de Quinn, mas a minha estava confusa por causa do ruído, do clamor de todos os cérebros ao meu redor, e dos picos extras de emoção. Tinha sido um longo dia. Grande parte dele tinha sido excelente, apesar de tudo. Enquanto recordava as melhores partes, eu me peguei sorrindo para Bob. O grande gato esfregou-se contra os meus tornozelos, miando de uma forma questionadora.
Oh céus.
Eu senti como se eu tivesse que explicar a ausência de Amelia para o gato. Eu me agachei e cocei a cabeça de Bob, e (me sentindo incrivelmente estúpida) disse: — Ei, Bob. Ela vai estar realmente atrasada esta noite, ela está dançando na festa. Mas não se preocupe, ela voltará para casa! — O gato virou as costas para mim e saiu da sala. Eu não tinha certeza de quanto de humano espreitava no pequeno cérebro felino de Bob, mas eu esperava que ele só dormisse e esquecesse tudo sobre a nossa estranha conversa.
Nesse exato momento, ouvi Quinn me chamar de meu quarto, e eu coloquei os pensamentos sobre Bob em espera. Afinal, era a nossa última noite juntos, talvez por semanas. Enquanto eu escovava os dentes e lavava meu rosto, eu tive um último momento de preocupação por Jason. Meu irmão tinha feito a sua cama. Eu esperava que ele pudesse deitar-se confortavelmente nela por algum tempo. Ele é adulto, eu disse para mim uma vez mais, enquanto eu entrava no quarto com minha camisola mais bonita.
Quinn me puxou para ele, e disse: — Não se preocupe, benzinho, não se preocupe...
Eu expulsei meu irmão e Bob dos meus pensamentos e deste quarto. Levantei uma mão traçando a curva do couro cabeludo de Quinn, mantive os dedos descendo por sua coluna, adorando quando ele estremecia.
EU ESTAVA DORMINDO EM PÉ. E era uma coisa boa eu conhecer cada centímetro do Merlotte's como eu conhecia minha própria casa, ou eu teria colidido em cada mesa e cadeira. Eu bocejei largamente, quando eu tomei o pedido de Selah Pumphrey. Normalmente, Selah me deixava profundamente irritada. Ela estava namorando meu inominável ex-namorado há várias semanas - bem, meses agora. Não importa o quão invisível o ex havia se tornado, ela nunca seria a minha pessoa favorita.
— Não conseguiu descansar o suficiente, Sookie? — Ela perguntou, sua voz afiada.
— Perdão, — eu me desculpei. — Acho que não. Eu estive no casamento do meu irmão na noite passada. Que tipo de molho você quer na salada?
— Ranch. — Os grandes olhos escuros de Selah estavam me examinando como se ela estivesse pensando em gravar o meu retrato. Ela queria saber tudo sobre o casamento de Jason, mas me perguntar seria como se render ao terreno inimigo. Tola Selah.
Pensando bem, o que Selah estava fazendo aqui? Ela nunca vinha sem Bill. Ela morava em Clarice.
Não que Clarice fosse longe, você pode chegar lá em quinze ou vinte minutos. Mas por que uma vendedora de imóveis de Clarice está... oh. Ela deve estar mostrando uma casa aqui. Sim, meu cérebro estava se movendo lentamente hoje.
— Sem problemas. Já está vindo, — Eu disse, e virei para ir.
— Escuta, — disse Selah. — Deixe-me ser franca.
Ai, não. Na minha experiência, isso significava, ‚Deixe-me ser francamente malvada‛.
Eu girei, tentando parecer qualquer coisa menos imensamente irritada, o que era realmente como eu estava. Este não era o dia para ferrar comigo. Entre as minhas muitas preocupações, Amelia não tinha voltado para casa na noite anterior e, quando eu estive lá em cima para procurar por Bob, eu descobri que ele tinha vomitado no meio da cama de Amelia... o que teria sido ok por mim, mas ela estava coberta com a colcha de minha bisavó. Ficou para eu limpar a bagunça e colocar a colcha em imersão na máquina de lavar. Quinn tinha saído de manhã cedo, e eu estava simplesmente triste com isso. E então houve o casamento de Jason, que tinha tal potencial para ser um desastre.
Eu consegui pensar em mais alguns itens para adicionar à lista (até a torneira pingando na minha cozinha), mas você pode entender que meu dia não estava feliz.
— Eu estou aqui trabalhando, Selah. Eu não estou aqui para ter qualquer conversa fiada pessoal contigo.
Ela ignorou isso.
— Eu sei que você está indo em uma viagem com Bill, — disse ela. — Você está tentando roubá-lo de mim. Há quanto tempo você esteve planejando isso?
Eu sabia que minha boca estava aberta, porque eu não tinha recebido um aviso adequado para o que estava chegando. Minha telepatia ficava afetada quando eu estava cansada - assim como meu tempo de reação e os processos de pensamento ficavam - e eu ficava fortemente protegida quando trabalhava, como de costume. Então eu não tinha apanhado os pensamentos de Selah.
Um flash de raiva passou por mim, perdendo a razão levantei a palma de minha mão e a ergui para bater nela. Mas uma quente, forte mão segurou a minha, agarrando-a, abaixando-a ao meu lado. Sam estava lá, e eu mesma não tinha visto ele chegar. Eu estava perdendo tudo hoje.
— Senhorita Pumphrey, você terá que arranjar algum outro lugar para almoçar, — Sam disse calmamente. Claro, todo mundo estava assistindo. Eu pude sentir todos os cérebros ficarem alerta para a fofoca fresca, enquanto olhos absorviam cada nuance da cena. Eu pude sentir meu rosto corar.
— Eu tenho o direito de comer aqui, — disse Selah, sua voz grosseira e arrogante. Isso foi um erro enorme. Em um instante, a simpatia dos espectadores mudou para mim. Eu pude sentir aquela onda me atingindo. Eu arregalei meus olhos e pareci melancólica, como uma daquelas pinturas horríveis de crianças abandonadas com olhos anormalmente grandes.
Parecer patética não foi um grande esforço. Sam colocou um braço em volta de mim como se eu fosse uma criança ferida e olhou para Selah com nada em seu rosto, a não ser uma grande decepção pelo comportamento dela.
— Eu tenho o direito de pedir para que você saia, — disse ele. — Eu não posso admitir você insultando minha equipe.
Selah provavelmente nunca foi rude com Arlene ou Holly ou Danielle. Ela mal sabia que elas existiam, porque ela não era o tipo de mulher que realmente olhava para um garçom. Sempre esteve entalado em seu papo que Bill tinha me namorado antes dele a conhecer. (‚Namorado,‛ no dicionário de Selah, era um eufemismo para ‚ter entusiástico e frequente sexo com.‛)
O corpo de Selah sacudia com raiva quando ela jogou o guardanapo no chão. Ela se levantou de forma tão abrupta que a cadeira teria caído se Dawson, uma rocha de um lobisomem que dirigia uma empresa de conserto de motocicleta, não a tivesse pegado com sua mão enorme. Selah pegou sua bolsa de alça curta para sair com arrogância pela porta afora, evitando por pouco uma colisão com a minha amiga Tara, que estava entrando.
Dawson estava se divertindo muito com a cena toda. — Tudo isso por causa de um vampiro, — disse ele. — Então as coisas de sangue frio devem ser algo especial, para deixarem mulheres lindas tão chateadas.
— Quem está chateada? — Eu disse, sorridente e de pé em posição para mostrar a Sam que eu era inabalável. Duvido que ele tenha sido enganado, já que Sam me conhece muito bem, mas ele entendeu minha deriva emocional e voltou para atrás do bar.
O zumbido de discussão sobre essa cena suculenta cresceu entre a multidão no almoço. Eu caminhei até a mesa onde Tara estava sentada. Ela tinha JB du Rone em reboque.
— Você parece bem, JB, — eu disse alegremente, puxando os menus entre a caixa de guardanapos e os recipientes de sal e pimenta no meio da mesa e entregando um para ele e outro para Tara. Minhas mãos tremiam, mas eu não acho que eles perceberam.
JB sorriu para mim. — Obrigado, Sookie, — disse ele em sua agradável voz de barítono. JB era simplesmente bonito, mas realmente com limitado cérebro. No entanto, isso lhe dava uma inocência encantadora. Tara e eu tínhamos tomado conta dele na escola, porque uma vez que a inocência era notada e visada por outros, os garotos menos bonitos, JB se encontrava em algumas situações difíceis... especialmente no colegial. Visto que Tara e eu também tivemos enormes defeitos em nossos próprios perfis de popularidade, nós tentamos proteger JB tanto quanto pudemos. Em contrapartida, JB tinha me acompanhado para alguns bailes, quando eu queria muitíssimo ir, e a família dele dava um lugar para Tara ficar algumas vezes, quando eu não podia.
Tara teve relações sexuais com JB em algum momento ao longo desta estrada dolorosa. Eu não tive. Não parecia fazer qualquer diferença para este ou aquele relacionamento.
— JB tem um novo emprego, — Tara disse, sorrindo de uma maneira vaidosa. Então foi por isso que ela veio. Nossa relação esteve desconfortável nos últimos meses, mas ela sabia que eu iria querer compartilhar o seu orgulho por ter feito uma coisa boa para o JB.
Isso era uma grande notícia. E isso me ajudou a não pensar em Selah Pumphrey e sua carga de raiva.
— Em que local? — Perguntei ao JB, que estava olhando para o menu, como se ele nunca tivesse visto isso antes.
— Na academia de ginástica de Clarice, — disse ele. Ele olhou para cima e sorriu. — Dois dias por semana, eu sento na mesa vestindo isso. — Ele acenou uma mão para sua camisa pólo limpa e justa, listrada em bordô e marrom, em sua calça cáqui apertada. — Recebo a matrícula dos membros, faço shakes saudáveis, eu limpo o equipamento e distribuo toalhas. Três dias por semana, eu visto roupas de ginástica e exercito todas as senhoras.
— Isso soa incrível, — eu disse, boquiaberta com a perfeição do trabalho para as qualificações limitadas de JB. JB era atraente: músculos impressionantes, rosto bonito, dentes brancos retos. Ele era uma propaganda ambulante para a saúde física. Além disso, ele era naturalmente bem-humorado e bem cuidado.
Tara olhou para mim, esperando o devido elogio. — Bom trabalho, — disse para ela. Levantamos as palmas de nossas mãos e tocamos uma à outra.
— Agora, Sookie, a única coisa que tornaria a vida perfeita é você me ligando alguma noite, — disse JB. Ninguém poderia planejar uma luxúria saudável e simples como JB.
— Muito obrigada, JB, mas eu estou namorando agora, — eu disse, não me incomodando em manter a minha voz baixa. Após a pequena exibição de Selah, senti a necessidade de me gabar um pouco.
— Oooh, aquele Quinn? — Tara perguntou. Talvez eu o tivesse mencionado para ela uma ou duas vezes. Concordei, e fizemos outra batida de mãos. — Ele está na cidade hoje? — Ela perguntou em voz mais baixa, e eu disse, — Saiu esta manhã — quase em voz tão baixa.
— Quero o cheeseburger mexicano, — disse JB.
— Então você terá um, — eu disse, e depois que Tara fez o pedido, eu marchei para a cozinha. Não só eu estava contente por JB, eu estava feliz, pois parecia que Tara e eu aparamos nossas arestas. Eu precisava de um pouco de ânimo para o meu dia, e eu estava conseguindo.
Quando cheguei em casa, com algumas sacolas de mantimentos, Amelia estava de volta e minha cozinha brilhava como um mostruário no programa Southern Homes. Quando ela ficava se sentindo estressada ou entediada, Amelia limpava, o que era um hábito fantástico para se ter em uma colega-de-quarto - especialmente quando você não está acostumada a ter uma de modo algum.
Eu gosto de limpar minha própria casa, e eu venho a ter surtos de limpeza de tempos em tempos, mas depois de Amelia eu fiquei uma relaxada.
Olhei para as janelas limpas. — Sentindo-se culpada, hein? — Eu
disse.
Os ombros de Amelia caíram. Ela estava sentada na mesa da cozinha com uma caneca de um de seus chás estranhos, o vapor subindo do líquido escuro.
— É, — disse ela com mal-humor. — Eu vi que a colcha estava na máquina de lavar. Eu trabalhei na mancha, ela está pendurada no varal agora e de volta ao combate.
Visto que eu tinha notado isso quando cheguei, eu apenas balancei a cabeça. — Bob revidou, — eu disse.
— É.
Comecei a perguntar-lhe com quem ela tinha ficado, então percebi que realmente não era da minha conta. Além disso, embora eu estivesse muito cansada, Amelia era uma emissora de primeira categoria, e em poucos segundos eu soube que ela tinha ficado com o primo de Calvin, Derrick e o sexo não tinha sido bom; também, os lençóis de Derrick estavam muito sujos o que a deixou maluca. E tem mais, quando Derrick acordou esta manhã, ele indicou que em sua opinião, uma noite juntos fizeram deles um casal. Amelia teve dificuldade para convencer Derrick a lhe dar uma carona de volta para casa. Ele queria que ela ficasse com ele, em Hotshot.
— Assustada? — Eu perguntei, colocando a carne de hambúrguer na gaveta do congelador. Era a minha semana de cozinhar, e nós teríamos bife de hambúrguer, batatas cozidas e ervilhas.
Amelia assentiu com a cabeça, levantando sua caneca para tomar um gole. Era um tônico caseiro para ressaca que ela tinha preparado, e ela estremeceu quando experimentou em si mesma. — É, eu estou. Aqueles caras de Hotshot são um pouco estranhos, — disse ela.
— Alguns deles. — Amelia tinha se ajustado melhor à minha telepatia que qualquer um que eu alguma vez me deparei. Já que ela era franca e aberta de qualquer maneira - às vezes de forma demasiada - acho que ela nunca sentiu que tinha segredos a esconder.
— O que você vai fazer? — Eu perguntei. Sentei-me frente a ela.
— Veja, não é como se eu tivesse saído com Bob por muito tempo, — disse ela, saltando direito no meio da conversa sem se preocupar com preliminares. Ela sabia que eu tinha entendido. — Nós tivemos apenas um encontro amigável aquela noite. Acredite em mim, foi ótimo. Ele realmente me motivou. Por isso que começamos a, hã, experimentar.
Fiz que sim com a cabeça, tentei parecer compreensiva. Para mim, experimentar era, bem, ser lambida num lugar que você nunca tinha sido lambida antes, ou tentar uma posição que lhe dava uma cãibra na coxa. Desse jeito. Isso não implicava em transformar o seu parceiro em um animal. Eu nunca tinha desenvolvido coragem o suficiente para indagar Amelia se o objetivo deles foi atingido, e era uma coisa que o cérebro dela não estava revelando.
— Eu acho que você gosta de gatos, — eu disse, seguindo minha linha de pensamento à sua conclusão lógica. — Quero dizer, Bob é um gato, mas um pequeno, e então de todos os caras que teriam vibrado em passar a noite contigo, você escolheu Derrick.
— Oh? — Disse Amelia, mostrando interesse. Ela tentou soar casual. — Mais que um?
Amelia tinha a tendência de pensar de maneira muito bem de si mesma como uma bruxa, mas não o suficiente de si mesma como uma mulher.
— Um ou dois, — eu disse, tentando não rir. Bob entrou e envolveu a si próprio em torno de minhas pernas, ronronando alto. Dificilmente nada poderia ter sido mais incisivo, já que ele passou ao redor de Amelia como se ela fosse um monte de cocô de cachorro.
Amelia suspirou profundamente. — Ouça, Bob, você tem que me perdoar, — ela disse ao gato. — Eu sinto muito. Eu apenas me empolguei. Um casamento, algumas cervejas, baile no meio da rua, um parceiro exótico... sinto muito. Realmente, sinto muito de verdade. O que você acha de eu prometer ficar celibatária até que eu possa descobrir uma maneira de transformá-lo de volta em você mesmo?
Isto seria um sacrifício enorme por parte de Amelia, como qualquer pessoa que tivesse lido seus pensamentos por alguns dias (e mais) saberia. Amelia era uma mulher muito saudável e era uma muito direta. Ela também era bastante diversificada em seus gostos. — Bem, — disse ela, depois de refletir no assunto, — o que acontece se eu prometer não fazer com qualquer um dos caras?
Bob sentou seu traseiro deixando suas costas retas, e sua cauda enrolada nas patas dianteiras. Ele parecia adorável quando olhou para Amelia, seus grandes olhos amarelos resolutos. Ele parecia estar pensando sobre isso.
Finalmente, ele disse, — Rohr.
Amelia sorriu.
— Você tomou isso como um sim? — Eu perguntei. — Neste caso, lembre-se... eu só faço com caras, então não vá olhando para mim.
— Oh, eu provavelmente não iria tentar ter relações com você em qualquer caso, — disse Amelia.
Eu mencionei que Amelia é um pouco indelicada? — Por que não? — Eu perguntei, insultada.
— Eu não escolhi Bob aleatoriamente, — disse Amelia, parecendo embaraçada como se fosse possível para ela. — Eu gosto deles magros e morenos.
— Eu terei apenas que viver com isso, — eu disse, tentando parecer profundamente decepcionada. Amelia atirou um infusor de chá de metal em mim, e eu o peguei no ar.
— Bons reflexos, — disse ela, assustada.
Dei de ombros. Embora tivesse sido há muito tempo atrás que eu tive sangue de vampiro, um vestígio parecia ainda se prolongar no meu sistema. Eu tinha sido sempre saudável, mas mesmo agora eu raramente tinha uma dor de cabeça. E eu me movia um pouco mais rápido do que a maioria das pessoas. Eu não era a única pessoa a desfrutar dos efeitos colaterais da ingestão do sangue de vampiro. Agora que os efeitos se tornaram de conhecimento comum, os próprios vampiros se tornaram presas. Colhimento de sangue para vender no mercado negro é uma profissão lucrativa e altamente perigosa. Eu ouvi no rádio esta manhã que um drenador desapareceu de seu apartamento em Texarkana depois que ele saiu em liberdade condicional. Se você fizer um vampiro de inimigo, ele pode esperá-lo muito mais do que você pode.
— Talvez seja o sangue de fadas, — disse Amelia, olhando para mim pensativa.
Dei de ombros novamente, desta vez com uma impressão clara de abandone-este-assunto. Eu descobri só recentemente que tenho um vestígio de fadas em minha linhagem, e eu não fiquei feliz com isso. Eu nem sabia de que lado da minha família tinha me legado esta herança, muito menos qual indivíduo em particular. Tudo o que eu sabia era que em algum momento no passado, alguém na minha família tinha se tornado próximo e pessoal com uma fada. Eu passei algumas horas debruçada sobre as árvores genealógicas amareladas e das histórias familiares que minha avó tinha trabalhado tão duro para compilar, e eu não tinha encontrado uma pista.
Como se ela tivesse sido convocada pelo pensamento, Claudine bateu na porta dos fundos. Ela não tinha voado nas asas diáfanas, ela tinha chegado em seu carro. Claudine é uma fada puro-sangue, e tem outras maneiras de chegar nos lugares, mas ela usa esses meios só em emergências. Claudine é muito alta, com um abundante cabelo escuro e grandes olhos escuros oblíquos. Ela tem que cobrir suas orelhas com o seu cabelo, pois ao contrário de seu irmão gêmeo, Claude, ela não teve as partes pontiagudas alteradas cirurgicamente.
Claudine me abraçou com entusiasmo, mas deu a Amelia um aceno discreto. Elas não são loucas uma pela outra.
Amelia adquiriu magia, mas Claudine é magia até o osso. Nenhuma confia inteiramente na outra.
Claudine é normalmente a criatura mais radiante que já conheci. Ela é muito gentil, doce, e prestativa, como uma escoteira sobrenatural, porque é da sua natureza e porque ela está tentando progredir pelo próprio esforço na escala mágica para se tornar um anjo. Hoje à noite, o rosto de Claudine estava surpreendentemente sério. Meu coração afundou. Eu queria ir para a cama, e eu queria sentir saudades de Quinn em particular, e eu queria esquecer a discussão que tiraram meus nervos no Merlotte's. Eu não queria más notícias.
Claudine se arrumou na mesa da cozinha de frente a mim e segurou minhas mãos. Ela lançou um olhar para Amelia.
— Cai fora, bruxa, — ela disse, e fiquei chocada.
— Cadela de orelhas pontudas, — murmurou Amelia, levantandose com sua caneca de chá.
— Assassina de companheiro, — respondeu Claudine.
— Ele não está morto! — Gritou Amelia. — Ele está apenas... diferente!
Claudine bufou, e realmente aquela foi uma resposta adequada.
Eu estava cansada demais para repreender Claudine por sua grosseria sem precedentes, e ela estava apertando minhas mãos com muita força para me sentir satisfeita com a sua presença reconfortante. — E aí? — Eu perguntei. Amelia bateu os pés para fora do cômodo, e eu ouvi seus sapatos nos degraus até o segundo andar.
— Sem vampiros aqui? — Claudine disse, sua voz ansiosa. Você sabe como se sente um chocólatra a respeito de um sorvete com gotas de chocolate, duas vezes mergulhado no chocolate escuro? Isso é como se sente os vampiros a respeito das fadas.
— Sim, a casa está vazia, exceto por mim, você, Amelia, e Bob, — eu respondi. Eu não ia negar a humanidade de Bob, embora às vezes fosse muito difícil de lembrar, especialmente quando sua caixa de areia precisava ser limpa.
— Você está indo para esta cúpula?
— Sim.
— Por quê?
Essa foi uma boa pergunta. — A rainha está me pagando, — disse.
— Você precisa tanto do dinheiro?
Comecei a rejeitar a sua preocupação, mas então eu pensei seriamente nisso. Claudine tem feito muito por mim e o mínimo que eu poderia fazer por ela era pensar no que ela disse.
— Eu posso viver sem ele, — disse. Afinal, eu ainda tinha parte do dinheiro que Eric me pagou para escondê-lo de um grupo de bruxas. Mas uma parte dele tinha ido embora, como o dinheiro sempre vai; o seguro não cobriu tudo o que tinha sido danificado ou destruído pelo fogo que consumiu minha cozinha no inverno anterior, eu atualizei meus utensílios, e eu fiz uma doação para o departamento de bombeiros voluntários. Eles vieram tão rápido e tentaram duramente salvar a cozinha e meu carro. Então Jason precisou de ajuda para pagar a conta da médica para o aborto de Crystal.
Eu descobri que me fazia falta aquela camada protetora entre estar com dinheiro e estar quebrada. Eu queria reforçá-la, reabastecê-la. Meu pequeno barco navegava em águas financeiras precárias, e eu queria ter um rebocador em torno para mantê-lo à tona.
— Eu posso viver sem ele, — eu disse, com mais firmeza, — mas eu não quero.
Claudine suspirou. Seu rosto estava cheio de aflição. — Eu não posso ir com você, — disse ela. — você sabe como os vampiros ficam ao nosso redor. Eu não posso mesmo investir em uma aparição.
— Eu entendo, — eu disse, um pouco surpresa. Eu nunca sonhei com a ida de Claudine.
— E eu acho que vai ocorrer um problema, — disse ela.
— Que tipo? — Na última vez que eu fui a um evento social vampírico, houve um grande problema, o maior problema, o mais sangrento tipo de problema.
— Eu não sei, — disse Claudine. — Mas eu sinto que está vindo, e eu acho que você deveria ficar em casa. Claude acha, também.
Claude não se importa com o que acontece comigo, mas Claudine era generosa o suficiente para incluir o seu irmão em sua bondade. Até o ponto que eu poderia dizer, o benefício de Claude para o mundo era estritamente como uma decoração. Ele era totalmente egoísta, não tinha habilidades sociais, e era absolutamente lindo.
— Sinto muito, Claudine, e eu sentirei sua falta enquanto eu estiver em Rhodes, — eu disse. — Mas eu tenho o dever de ir pessoalmente.
— Seguir a comitiva de um vampiro, — disse Claudine com tristeza. — Isso irá marcá-la como uma no mundo deles, para sempre. Você nunca irá ser uma espectadora inocente de novo. Também muitas criaturas vão saber quem você é e onde pode ser encontrada.
Não foi tanto o que Claudine disse, mas a maneira como disse que fez um comichão frio correr pela minha espinha e se espalhar ao longo do meu couro cabeludo. Ela estava certa. Eu não tinha defesa, de qualquer forma eu prefiro pensar que eu já estava profundamente envolvida no mundo dos vampiros para optar por não participar.
Sentada ali na minha cozinha com o sol da tarde descendo através da janela, eu tive uma dessas iluminações que muda você para sempre. Amelia estava lá em cima em silêncio. Bob retornou para o cômodo para sentar junto a sua tigela de comida e olhar Claudine. A própria Claudine estava resplandecente com um raio de sol que a atingiu direto em seu rosto. A maioria das pessoas estaria mostrando cada falha desestimulante da pele. Claudine ainda parecia perfeita.
Eu não tinha certeza se algum dia iria entender Claudine e seu pensamento sobre o mundo, e eu espantosamente conhecia pouco sobre sua vida ainda; mas eu tinha a absoluta certeza que ela se dedicava ao meu bem-estar, por qualquer motivo, e que ela estava realmente temia por mim. E ainda assim eu sabia que estava indo para Rhodes com a rainha, Eric, um abjurado, e o restante do contingente da Louisiana.
Eu estava apenas curiosa sobre o que poderá ser a pauta de uma reunião de cúpula vampírica? Eu queria a atenção de mais membros da sociedade dos mortos-vivos? Eu queria ser conhecida como uma fangbanger, um daqueles humanos que simplesmente adoravam os mortos-vivos? Será que algum lugar dentro de mim esperava por uma chance de estar perto de Bill sem esperar ansiosamente por ele, ainda tentando fazer algum sentido emocional de sua traição? Ou era sobre o Eric?
Sem eu mesma perceber, eu estava apaixonada pelo Viking ostentoso que era tão bonito, tão bom em fazer amor, e tão político, tudo ao mesmo tempo?
Isso soou como um conjunto promissor de problemas para uma temporada de novela.
— O que tiver que ser será, — eu murmurei. Quando Claudine me fitou desconfiadamente, eu disse, — Claudine, me sinto envergonhada por te dizer que eu estou fazendo algo que realmente não faz muito sentido de muitas formas, mas eu quero o dinheiro e vou fazer isso. Eu estarei aqui para te ver novamente. Não se preocupe, por favor.
Amelia andou de forma pesada e sôfrega de volta para a cozinha e começou a fazer para si um pouco mais de chá. Ela estava flutuando.
Claudine a ignorou. — Eu vou me preocupar, — disse ela simplesmente. — Há uma encrenca chegando, minha querida amiga, e vai cair diretamente na sua cabeça.
— Mas você não sabe como e quando?
Ela balançou a cabeça. — Não, eu só sei que está vindo.
— Olhe em meus olhos, — murmurou Amelia. — Eu vejo um homem alto e escuro...
— Cala a boca, — eu disse para ela.
Ela virou as costas para nós, fez um grande barulho ao espremer entre os dedos as folhas mortas de algumas de suas plantas.
Claudine saiu logo depois. Durante o resto de sua visita, ela não recuperou seu comportamento normal e feliz.
Ela não disse mais uma palavra sobre a minha partida.
NA SEGUNDA MANHÃ DEPOIS DO CASAMENTO do Jason, eu estava me sentindo muito mais eu mesma.
Ter uma missão ajudou. Eu precisava estar no Tara‟ s Togs logo assim que abrisse às dez horas. Eu tinha que escolher as roupas que Eric disse que eu precisava para a cúpula. Eu não estava escalada para o Merlotte’s até às cinco e meia mais ou menos esta noite, então tive aquela sensação agradável do dia inteiro estendido só para mim.
— Ei, garota! — Tara disse, vindo dos fundos da loja para me cumprimentar. Sua assistente de meio período, McKenna, olhou para mim de relance e reiniciou o deslocamento das roupas aqui e ali. Assumi que ela estava colocando os artigos fora de lugar em suas posições corretas; os empregados das lojas de roupas pareciam gastar um bocado de tempo fazendo isso. McKenna não falou, e a menos que eu estivesse muito equivocada, ela estava tentando evitar falar comigo em todo caso. Isso doeu, já que fui visitá-la no hospital, quando ela teve o apêndice retirado há duas semanas atrás, e eu tinha levado um pequeno presente, também.
— Bobby Burnham, parceiro comercial do Sr. Northman, ligou para cá para dizer que você precisa de algumas roupas para uma viagem? — disse Tara. Assenti com a cabeça, tentando parecer trivial. — Seriam roupas casuais o que precisa? Ou terninhos, algo de natureza comercial? — Ela me deu um brilhante sorriso falso, e soube que ela estava furiosa comigo porque tinha medo por mim.
— McKenna, pode levar aquela correspondência à agência de correios, — Tara disse a McKenna com uma voz cortante. McKenna correu pela porta dos fundos, a correspondência socada sob seu braço como um acessório.
— Tara, — falei, — não é o que pensa.
— Sookie, não é da minha conta, — ela disse, se esforçando para soar neutra.
— Acho que é, — falei. — Você é minha amiga, e não quero que pense que estou de viagem com um grupo de vampiros por diversão.
— Então por que você está indo? — A rosto da Tara desprendeu toda a falsa alegria. Ela estava mortalmente séria.
— Eu estou sendo paga para ir com alguns vampiros da Louisiana para uma grande assembleia. Eu irei agir igual a um Contador Geiger humano deles. Direi para eles se um humano está tentando enganá-los, e saberei o que os humanos de outros vampiros estão pensando. É só por esta vez. — Não podia explicar mais inteiramente. Tara esteve no mundo dos vampiros mais do que ela precisava estar, e quase tinha sido morta.
Ela não queria mais nada com isso, e eu não podia culpá-la. Mas ela ainda não podia me dizer o que fazer. Tinha examinado minha própria alma sobre este assunto, até mesmo antes da repreensão de Claudine, e eu não iria permitir que qualquer outro me fizesse críticas posteriores uma vez que eu tinha tomado minha decisão. Conseguir as roupas tudo bem. Trabalhar para os vampiros tudo bem... contanto que eu não deixasse que humanos terminassem mortos.
— Nós temos sido amigas por um tempo muito longo, — Tara disse calmamente. — Por bons e maus momentos. Te amo, Sookie, eu sempre amarei; mas isso é um realmente muito delicado. — Tara teve tanta decepção e preocupação em sua vida que simplesmente não estava disposta a se comprometer mais. Então ela estava cortando relações comigo, e pensou que ligaria para JB essa noite e renovaria a relação carnal deles, e ela faria isso quase em minha memória.
Era uma forma estranha de escrever meu epitáfio prematuro.
— Eu preciso de um vestido para noite, um vestido para coquetel, e algumas roupas refinadas para o dia, — respondi, checando minha lista muito desnecessariamente. Não ia mais desperdiçar o tempo com Tara.
Iria me divertir, não importa quão zangada ela parecesse. Ela pensará melhor, disse para mim mesma. Eu ia me divertir comprando roupas.
Comecei com um vestido de noite e um vestido para coquetel. E escolhi dois terninhos, como terninhos de executivo (mas não de verdade, já que eu não consigo me ver em risca-de-giz pretas). E duas calças. E meias até a altura dos joelhos, e uma camisola ou duas. E um pouquinho de lingerie. Eu estava oscilando entre a culpabilidade e o deleite.
Gastei mais do dinheiro de Eric do que o absolutamente necessário, e me perguntei o que aconteceria se Eric pedisse para ver as coisas que ele tinha comprado. Senti-me muito mal então. Mas era como seu eu estivesse envolvida num frenesi de compras, em parte por puro prazer, e em parte por raiva de Tara, e em parte por negar o medo que sentia na possibilidade de acompanhar um grupo de vampiros para qualquer lugar.
Com outro suspiro, esse pessoal e muito silencioso, devolvi a lingerie e as camisolas para suas prateleiras. Supérfluos. Senti-me triste por me separar delas, mas me senti melhor no geral. Comprar roupas para satisfazer uma necessidade específica, bem, isso era bom. Isso era sustentável. Mas comprar roupas de baixo, isso era algo inteiramente diferente. Isso era como um Moon Pie. Ou Ding Dongs. Doce, mas ruim para você.
O padre local, quem tinha começado a assistir às reuniões da Irmandade do Sol, tinha me sugerido que favorecer vampiros, ou até trabalhar para eles, era uma forma de expressar um desejo de morte. Ele me havia dito isso sobre sua cesta de hambúrguer na semana anterior. Pensei a respeito disso agora, parada perto da caixa registradora enquanto Tara registrava todas minhas compras, que seriam pagas com dinheiro vampiro.
Eu acreditava que queria morrer? Agitei minha cabeça. Não, eu não queria. E eu pensei que a Irmandade do Sol, que era um movimento anti-vampiro de ultra-extrema-direita que estava conquistando uma solidez alarmante na América, era uma enganação. Sua condenação de todos os humanos que tivessem qualquer interação com vampiros, até mesmo visitar uma empresa de propriedade de um vampiro, era ridícula. Mas por que eu mesma me sentia atraída pelos vampiros para começar?
Aqui estava a verdade: eu tive tão poucas oportunidades de ter o tipo de vida que meus colegas de classe alcançaram - o tipo de vida que cresci pensando que era o ideal - que qualquer outra vida que eu pudesse moldar para mim mesma parecia interessante. Se eu não podia ter um marido e filhos, me preocupar a respeito do que levaria de comida para a igreja e se nossa casa necessitava de outra camada de tinta, então me preocuparia com o que fariam os saltos de sete centímetros ao meu senso de equilíbrio quando eu vestisse vários quilos extras em lantejoulas.
Quando estive pronta para ir, McKenna, que tinha retornado da agência de correios, carregou minhas bolsas até meu carro enquanto Tara esclarecia a quantia com o homem do dia de Eric, Bobby Burnham. Ela desligou o telefone, parecendo contente.
— Eu usei tudo? — Perguntei, curiosa para descobrir quanto Eric tinha investido em mim.
— Nem perto, — ela disse. — Quer comprar mais?
Mas a diversão estava terminada. — Não, — falei. — Eu peguei o bastante. — Tive o definitivo impulso de pedir a Tara para pegar de volta cada artigo. Logo pensei que era uma coisa muito injusta de se fazer com ela. — Obrigada por me ajudar, Tara.
— O prazer foi meu, — ela me garantiu. Seu sorriso estava um pouco mais quente e genuíno. Tara sempre gostou de fazer dinheiro, e ela nunca tinha sido capaz de permanecer zangada comigo por muito tempo. — Você precisa ir ao World of Shoes (Mundo dos Sapatos) em Clarice para conseguir algo para o vestido de noite. Estão tendo uma liquidação.
Preparei-me. Este era o dia para resolver coisas. Próxima parada, World of Shoes.
Eu partiria em uma semana, e o trabalho nessa noite passou em um borrão enquanto crescia em mim a excitação da viagem. Nunca estive tão longe de casa como Rhodes, o qual ficava além de Chicago; na verdade, eu nunca estive ao norte da Linha Mason-Dixon. Havia voado só uma vez, e esse tinha sido um vôo curto de Shreveport a Dallas. Eu teria que conseguir uma mala, uma daquelas que rodam. Teria que levar... pensei numa lista comprida de artigos pequenos. Eu sabia que alguns hotéis tinham secadores de cabelo. Teria um a Pirâmide de Gizé? A Pirâmide era um dos hotéis mais famosos direcionado para vampiros que tinha surgido nas mais importantes cidades americanas.
Visto que eu já tinha organizado meus dias de folga com o Sam, essa noite contei a ele a que horas eu estava programada para partir.
Sam estava sentado detrás de sua mesa no escritório quando bati na porta - bem, na moldura da porta, porque Sam quase nunca a fechava. Ele ergueu os olhos das suas contas. Ficou contente por ser interrompido. Quando ele trabalhava nos livros contábeis, passava suas mãos pelos cabelos loiros-avermelhados, e agora pareciam um pouco eletrificados com o resultado. Sam preferia atender o bar a fazer esta tarefa, mas ele de fato tinha contratado um substituto para esta noite exatamente com o objetivo de pôr seus livros em ordem.
— Entra, Sook, — ele disse. — Como está indo lá fora?
— Muito movimentado; não tenho mais que um segundo. Só queria te dizer que partirei na próxima quinta-feira.
Sam tentou sorrir, mas ele terminou parecendo simplesmente infeliz. — Tem que fazer isso? — Ele perguntou.
— Ei, conversamos a respeito, — respondi, dando um aviso claro.
— Bom, sentirei saudades, — explicou. — E me preocuparei um pouco. Você e um monte de vampiros.
— Haverão humanos lá, como eu.
— Não como você. Serão humanos com uma paixão doente pela cultura vampiresca, ou coveiros, procurando fazer um dinheirinho com os morto-vivos. Nenhuma dessas pessoas são saudáveis com longas expectativas de vida.
— Sam, há dois anos atrás eu não tinha nenhuma ideia de como era realmente o mundo ao meu redor. Não sabia o que você era de verdade; não sabia que os vampiros fossem tão diferentes uns do outros como nós somos. Não sabia que existiam fadas reais. Eu não podia imaginar nada disso. — Sacudi minha cabeça. — Que mundo é esse, Sam. É maravilhoso e é assustador. Cada dia é diferente. Nunca pensei que eu teria qualquer tipo de vida por conta própria, e agora eu tenho.
— Eu seria a última pessoa no mundo a impedi-la de ter seu lugar ao sol, Sookie, — Sam disse, e ele sorriu para mim. Mas não escapou à minha atenção que sua declaração foi um pouco ambígua.
Pam veio à Bon Temps nessa noite, parecendo entediada e indiferente num macacão verde pálido com bordas finas em azulmarinho. Ela estava usando mocassins marinhos... sem brincadeira. Eu nem mesmo entendia que aquilo ainda estava à venda. O couro escuro foi lustrado para ter um alto brilho, e eram novos. Ela recebeu muitos olhares de admiração no bar.
Ela se encarapitou numa mesa em minha seção e sentou-se pacientemente, suas mãos entrelaçadas sobre a mesa diante dela. Ela entrou num estado de suspensão vampírica que era enervante para alguém que não tivesse visto ainda - seus olhos abertos mas sem ver, seu corpo completamente imóvel, seu rosto vazio de expressão. Já que ela estava tendo algum período de inatividade, esperei para servir algumas pessoas antes de ir a sua mesa. Com certeza eu sabia por que ela estava ali, e não estava pronta para a conversa.
— Pam, posso te trazer uma bebida?
— O que há com o tigre, então? — Ela perguntou, indo direto para a jugular da conversa.
— Quinn é quem eu estou saindo agora, — respondi. — Não conseguimos passar muito tempo juntos por causa do trabalho dele, mas iremos nos ver na cúpula. — Quinn tinha sido contratado para produzir algumas das cerimônias e rituais esperados na cúpula. Ele estaria ocupado, mas eu pegaria vislumbres dele e já estava entusiasmada com a perspectiva. — Passaremos um mês juntos depois da cúpula, — contei à Pam.
Oh-oh, talvez eu tenha compartilhado informações demais. O rosto de Pam perdeu o sorriso.
— Sookie, não sei qual estranho jogo você e Eric têm jogado, mas ele não é bom para nós.
— Eu não tenho jogado nada! Nada!
— Pode ser que você não, mas ele sim. Ele não tem sido o mesmo desde o tempo que vocês dois passaram juntos.
— Não sei o que posso fazer a respeito disso, — falei fracamente.
Pam disse, — Eu tampouco, mas espero que ele possa resolver seus sentimentos por ti. Ele não gosta de ter conflitos. Ele não gosta de se sentir preso. Ele não é o vampiro despreocupado que acostumava ser.
Dei de ombros. — Pam, eu tenho sido tão correta com ele quanto posso ser. Acho que talvez ele esteja preocupado sobre outra coisa. Você está exagerando a minha importância no esquema das coisas de Eric. Se ele tem qualquer tipo de amor imortal por mim, com certeza ele não me contou a respeito. E eu nunca o vejo. E ele sabe sobre o Quinn.
— Ele fez o Bill confessar para você, não fez?
— Bom, Eric estava lá, — respondi incertamente.
— Você acha que Bill algum dia teria te contado se Eric não o tivesse ordenado contar?
Tinha feito o meu melhor para esquecer aquela noite completamente. No fundo de minha mente, tinha percebido que a estranha ocasião oportuna da revelação de Bill foi significativa, mas simplesmente eu não quis pensar a respeito.
— Porque você acha que Eric se importaria com alguma merda que Bill tinha sido obrigado a fazer, muito menos se revelar a uma mulher humana, se ele não tivesse sentimentos impróprios por você?
Nunca tinha posto desse modo para mim. Fiquei tão arrasada com a confissão de Bill — a rainha o tinha plantado para me seduzir (se necessário) para ganhar minha confiança — que não pensei por que Eric tinha forçado Bill na posição de me contar sobre o plano.
— Pam, eu não sei. Escuta, estou trabalhando aqui, e você precisa pedir algo para beber. Eu tenho que cuidar das minhas outras mesas.
— O-negativo, então. TrueBlood.
Me apressei para ir tirar a bebida do refrigerador, e a esquentei no microondas, sacudindo gentilmente para estar segura que a temperatura estava uniforme. A garrafa é revestida nas laterais de uma coisa pegajosa desagradável, mas certamente parecia e tinha gosto de sangue de verdade. Eu tinha derramado algumas gotas num copo uma vez na casa de Bill assim poderia ter a experiência. Até o ponto que eu podia dizer, beber sangue sintético era exatamente como beber sangue de verdade. Bill sempre tinha gostado, embora ele tenha comentado mais de uma vez que o sabor não era a mesma coisa; era a sensação de agarrar a carne com os dentes, sentindo o batimento do coração humano, que fazia divertido ser vampiro.
Só engolir de uma garrafa não dava conta do recado. Levei a garrafa e uma taça à mesa de Pam e depositei ambas na frente dela, com um guardanapo, é obvio.
— Sookie? — Ergui os olhos para ver que Amelia tinha entrado.
Minha colega de quarto vinha ao bar frequentemente, mas fiquei surpresa de vê-la esta noite. — É aí? — Perguntei.
— Hmm... oi, — Amelia disse a Pam. Eu notei a calça cáqui apertada de Amelia, sua bonita camisa pólo branca, seus tênis igualmente brancos. Dei uma espiada em Pam, cujos olhos pálidos estavam mais arregalados do que alguma vez os tinha visto.
— Esta é minha colega de quarto, Amelia Broadway, — disse a Pam. — Amelia, esta é Pam a vampira.
— Prazer em conhecê-la, — Pam disse.
— Ei, linda roupa, — disse Amelia.
Pam pareceu contente. — Você parece muito bonita, também, — ela disse.
— Você é uma vampira local? — Amelia perguntou. Amelia era nada menos que direta. E conversadora.
Pam disse, — Sou segunda-em-comando de Eric. Você sabe quem é Eric Northman?
— Claro, — Amelia respondeu. — Ele é o galã loiro de amor ardente que vive em Shreveport, correto?
Pam sorriu. Suas presas se sobressaíram um pouco. Olhei da Amelia à vampira. Jesus Cristo.
— Quem sabe você gostaria de ver o bar alguma noite? — Pam perguntou.
— Oh, claro, — respondeu Amelia, mas não como se ela estivesse particularmente entusiasmada. Bancando a difícil. Por uns dez minutos, se eu conhecesse Amelia.
E saí para atender um cliente fazendo gestos de outra mesa. Vi pelo canto de meus olhos, Amelia se sentando com Pam, e elas conversaram por alguns minutos antes que Amelia se levantasse e se aproximasse do balcão, esperando que eu retornasse.
— E o que te traz aqui esta noite? — Perguntei talvez um pouco abruptamente.
Amelia levantou suas sobrancelhas, mas não me desculpei.
— Eu apenas queria te dizer que você recebeu uma ligação em casa.
— De quem?
— Do Quinn.
Senti um sorriso se estender através do meu rosto, um pra valer. — O que ele disse?
— Ele disse que te veria em Rhodes. Ele já sente saudades.
— Obrigada, Amelia. Mas você poderia simplesmente ter ligado para cá para me dizer, ou teria me dito quando eu chegasse em casa.
— Oh, estava um pouco entediada.
Eu sabia que ela ficaria, mais cedo ou mais tarde. Amelia precisava de um trabalho, um emprego de período integral. Ela sentia falta da sua cidade e de seus amigos, é obvio. Embora ela tenha deixado Nova Orleans antes do Katrina, ela sofria um pouco diariamente desde que a tempestade devastou a cidade. Amelia sentia falta da bruxaria, também. Eu tinha esperança que ela ficasse amiga de Holly, outra garçonete do bar e uma Wiccan dedicada. Mas depois que eu as apresentei e elas tiveram algumas conversas, Amelia me disse mal humorada que ela e Holly eram tipos muito diferentes de bruxas. A própria Amelia era (ela se considerava) uma bruxa verdadeira, enquanto que Holly era uma Wiccan. Amelia tinha um velado desprezo pela fé Wiccan. Uma ou duas vezes, Amelia tinha se encontrado com o coven de Holly, em parte para se manter atualizada... e em parte porque Amelia desejava a companhia de outros praticantes.
Ao mesmo tempo, minha hóspede estava muito ansiosa porque podia ser descoberta pelas bruxas de Nova Orleans e a fariam pagar caro por seu erro em transformar Bob. Para somar ainda outra camada emocional, desde Katrina, Amelia temia pela segurança destes mesmos antigos companheiros. Ela não conseguia saber se eles estavam bem sem que eles a descobrissem em troca.
Apesar de tudo isto, eu sabia que chegaria o dia (ou a noite) quando Amelia ficasse agitada o suficiente para ver além da minha casa, do quintal e do Bob. Eu tentei não olhar carrancuda quando Amelia foi para a mesa de Pam para bater mais papo.
Recordei à minha apreensão intíma que Amelia podia cuidar de si mesma. Provavelmente.
Tive mais certeza antes da noite em Hotshot. Conforme eu avançava com meu trabalho, mudei meus pensamentos para a ligação de Quinn. Desejei ter meu celular novo comigo (graças ao pequeno aluguel que Amelia está me pagando, eu podia bancar um), mas não achei que fosse correto levá-lo para o trabalho, e Quinn sabia que não o teria ligado comigo a menos que tivesse a liberdade para atendê-lo. Desejei que Quinn estivesse à espera em casa quando eu deixasse o bar em uma hora. A força dessa fantasia me embriagou.
Embora tenha sido agradável me envolver nessa sensação, me entregando ao fluxo de meu novo relacionamento, concluí que era tempo de pôr os pés na terra e enfrentar um pouco a realidade. Concentrei-me em servir minhas mesas, sorrir e conversar quando necessário, e renovar o TrueBlood de Pam uma ou duas vezes. De qualquer forma, deixei Amelia e Pam com seu tête-à-tête.
Finalmente, a última hora de trabalho estava terminada, e o bar ficou vazio. Junto com as outras empregadas, cumpri com minhas tarefas de fechamento. Quando eu verifiquei que os portas-guardanapos e os saleiros estavam cheios e prontos para o dia seguinte, fui ao pequeno hall no almoxarifado para depositar meu avental na cesta grande da lavanderia. Depois de escutar nossas sugestões e queixa por anos, Sam finalmente tinha pendurado um espelho ali para nosso benefício. Me encontrei parada absolutamente imóvel, olhando para ele. Estremeci e comecei a soltar o avental. Arlene estava afofando seus brilhantes cabelos vermelhos. Arlene e eu não éramos tão boas amigas atualmente. Ela estava envolvida com a Irmandade do Sol. Embora a Irmandade se apresentasse como uma organização informativa, dedicada a propagar a ‚verdade‛ sobre os vampiros, suas fileiras estavam infestadas daqueles que acreditavam que todos os vampiros eram intrinsecamente maus e que deveriam ser eliminados, por recursos violentos. O pior sobre a Irmandade era que dirigia sua cólera e medo para os humanos que se consorciavam com os vampiros.
Humanos como eu.
Arlene tentou encontrar meus olhos no espelho. Falhou.
— A vampira no bar é sua amiga? — Ela perguntou, aplicando uma ênfase muito desagradável na última palavra.
— Sim, — respondi. Até se eu não gostasse de Pam, teria dito que ela era minha amiga. Tudo a respeito da Irmandade fazia os pêlos do meu pescoço arrepiarem.
— Precisa andar com mais humanos, — Arlene disse. Sua boca estava imóvel em uma linha sólida, e seus olhos pesadamente maquiados se estreitaram com intensidade. Arlene nunca foi o que você chamaria de uma profunda pensadora, mas eu estava assombrada e pasma com a rapidez com que ela tinha sugado o modo de pensar da Irmandade.
— Estou com humanos noventa e cinco por cento do tempo, Arlene.
— Deveria estar cem por cento.
— Arlene, de que modo isso é da sua conta? — Minha paciência estava estirada para seu ponto limite.
— Você está compensando todas estas horas porque vai com um montão de vampiros a alguma assembleia, certo?
— Outra vez, o que te interessa?
— Você e eu fomos amigas por muito tempo, Sookie, até que aquele Bill Compton entrou no bar. Agora você vê vampiros todo o tempo, e tem pessoas estranhas hospedando-se em sua casa.
— Não tenho que defender minha vida para você, — falei, e meu temperamento explodiu completamente. Eu podia ver dentro da cabeça dela, ver todo o julgamento presunçoso e o moralismo satisfeito.
Doeu. Causou amargura. Eu tinha sido babá dos filhos dela, consolei-a quando ela foi abandonada e desprotegida por uma série de homens indignos, limpei seu trailer, tentei encorajá-la para que saísse com homens que não iriam pisá-la.
Agora ela estava me encarando, realmente surpresa por minha raiva.
— Obviamente você tem alguns buracos grandes em sua própria vida por isso teve que enchê-los com essa bosta de Irmandade, — falei. — Olhe para os caras excelentes que você escolheu para sair e casar. — Com esse sarcasmo anticristão, girei em meus calcanhares e saí andando do bar, agradecida por já ter pego minha bolsa no escritório do Sam. Nada é pior do que ter que parar no meio de uma manifestação justa.
De alguma forma Pam surgiu ao meu lado, tendo se aproximado de mim tão rapidamente que nem tinha visto o movimento dela. Olhei sobre meu ombro. Arlene estava parada com suas costas contra a parede, seu rosto deformado com dor e raiva. Meu tiro de misericórdia foi verdadeiro. Um dos namorados de Arlene tinha roubado a prataria da família, e seus maridos... difícil saber onde começar.
Pam e eu saímos antes que pudesse reagir à sua presença. Eu estava rígida com o choque do ataque verbal de Arlene e da minha própria fúria. — Eu não deveria ter dito nada a respeito dele, — falei. — Somente porque um dos maridos de Arlene foi um assassino não é razão para que eu seja cruel. — Eu estava canalizando totalmente a minha avó, e dei uma risada trêmula.
Pam era um pouco mais baixa que eu, e ela levantou os olhos para meu rosto curiosamente quando eu lutava para me controlar.
— Ela é uma puta, aquela lá, — disse Pam.
Tirei um lenço de papel Kleenex da minha bolsa para enxugar minhas lágrimas. Eu frequentemente chorava ao me zangar; odiava isso. Chorar simplesmente me fazia parecer débil, não importa o que o tenha provocado.
Pam segurou minha mão e limpou minhas lágrimas com seu polegar. O gesto delicado ficou um pouco enfraquecido quando ela inseriu o polegar em sua boca, mas eu imaginei que ela teve boas intenções.
— Não a chamaria de puta, mas ela não é verdadeiramente tão cuidadosa como deveria ser a respeito com quem ela sai, — admiti.
— Por que a defende?
— Hábito, — respondi. — Fomos amigas por anos e anos.
— O que fez ela por ti, com sua amizade? Que benefício houve ali?
— Ela... — tive que parar e pensar. — Acho que era só para ser capaz de dizer que tinha uma amiga. Eu me importava com seus filhos, e a ajudei com eles. Quando ela não podia trabalhar, eu cobria seus horários, e se ela trabalhava por mim, limpava seu trailer em troca. Ela ia me ver se eu ficasse doente e me trazia comida. Mais do que tudo, ela foi tolerante com minhas diferenças.
— Ela te usou e ainda assim você se sente agradecida, — Pam disse. Seu rosto inexpressivo não me dava pista de seus sentimentos.
— Escuta, Pam, não foi assim.
— Como foi, Sookie?
— Ela realmente gostava de mim. Nós realmente tivemos alguns bons momentos.
— Ela é preguiçosa. Isso se estende às amizades dela. Se for fácil ser amigável, ela será. Se o vento soprar para outro caminho, a amizade dela terá desaparecido. E eu estou achando que o vento está soprando para outro caminho. Ela encontrou outro jeito para ser uma pessoa importante por sua própria conta, odiando os outros.
— Pam!
— Não é verdade? Eu tenho observado as pessoas por anos. Eu conheço as pessoas.
— Há verdades que deveriam ser ditas, e há verdades que é melhor não dizer.
— Há verdades que você prefereria que eu não dissesse, — ela me corrigiu.
— Sim. Como aliás, isso é... verdade.
— Então te deixarei e voltarei para Shreveport. — Pam girou para dar a volta no edifício para onde seu carro estava estacionado.
— Pare!
Ela voltou. — Sim?
— Por que veio para cá em primeiro lugar?
Pam sorriu inesperadamente. — Além de te fazer perguntas a respeito de sua relação com meu criador? E o bônus de conhecer a sua colega de quarto deliciosa?
— Oh. É. Além de tudo disso.
— Eu quero falar contigo a respeito de Bill, — ela disse para minha absoluta surpresa. — Bill, e Eric.
— NÃO TENHO NADA PARA DIZER. — Destranquei meu carro e joguei minha bolsa lá dentro. Então eu virei pra encarar Pam, embora eu estivesse tentada a entrar no meu carro e ir pra casa.
— Nós não sabíamos, — a vampira disse. Ela caminhou lentamente, assim pude ver sua chegada. Sam tinha deixado duas cadeiras dobráveis na frente do seu trailer, que ficava perpendicularmente nos fundos do bar, de modo que eu as peguei e as coloquei perto do carro. Pam entendeu a ideia e se acomodou numa, enquanto eu sentei na outra.
Eu inspirei profunda e silenciosamente. Eu vinha me perguntando, desde que voltei de Nova Orleans, se todos os vampiros de Shreveport sabiam do objetivo secreto de Bill pra me cortejar.
— Eu não teria te contado, — Pam disse, — mesmo se eu soubesse que Bill tinha recebido essa missão, porque... vampiros primeiro. — Ela deu de ombros. — Mas eu te juro que não sabia.
Eu inclinei minha cabeça concordando, e um pouco da tensão que eu sentia por dentro finalmente relaxou, mas eu não sabia como reagir.
— Eu preciso dizer, Sookie, que você tem causado um bocado de problemas na nossa área. — Pam não parecia se incomodar com isso, ela estava só expondo um fato. Eu sentia que dificilmente poderia me desculpar. — Bill tem andado cheio de raiva estes dias, e ele não sabe a quem odiar. Ele se sente culpado, e ninguém gosta disso. Eric está frustrado porque não consegue se lembrar do tempo em que esteve escondido na sua casa, e ele não sabe o que lhe deve. Ele está zangado pela rainha ter incorporado você para seus próprios objetivos, através de Bill, e, dessa forma, cruzado o território de Eric, é assim que ele vê. Felicia acha que você é o bicho-papão, já que tantos bartenders do Fangtasia morreram enquanto você estava por perto. Longshadow, Chow. — Ela sorriu. — Oh, e seu amigo, Charles Twining.
— Nada disso foi minha culpa. — Tinha escutado Pam com crescente agitação. Não é bom ter vampiros zangados com você. Mesmo a atual bartender do Fangtasia, Felicia, era muito mais forte do que eu jamais seria, e ela era definitivamente a vampira mais fraca dessa lista.
— Não acho que isso faça a menor diferença, — Pam disse, sua voz curiosamente gentil. — Agora que sabemos que você tem sangue de fada, graças ao Andre, seria fácil admitir tudo isso. Mas eu não acho que seja isso, você acha? Conheci muitos humanos descendentes de fadas, e nenhum deles era telepata. Acho que é só você, Sookie. Claro que, saber que você é parte fada faz que a gente se pergunte que gosto você tem. Eu certamente desfrutei da provinha que eu tive quando a ménade te mutilou, mesmo estando contaminado com o veneno dela. Adoramos fadas, como você sabe.
— As adoram até a morte, — sussurrei pra mim mesma, mas é obvio que Pam ouviu.
— Às vezes, — ela concordou com um pequeno sorriso. Essa Pam.
— Então qual é a moral da história? — Eu estava pronta pra ir pra casa e ser só humana, sozinha.
— Quando digo que ‚nós‛ não sabíamos do acordo de Bill com a rainha, isso inclui o Eric, — Pam respondeu ingenuamente.
Olhei para os meus pés, lutando para conservar meu rosto sob controle.
— Eric se sente especialmente zangado sobre isto, — Pam disse. Ela estava escolhendo suas palavras agora. — Ele está zangado com o Bill, porque Bill fez um acordo com a rainha pelas costas dele. Ele está zangado porque não percebeu o plano de Bill. Ele está zangado contigo porque você entrou demais na vida dele. Ele está zangado com a rainha porque ela é mais esperta que ele. É obvio, por isso que ela é a rainha. Eric nunca será um rei, a menos que ele possa se controlar melhor.
— Você está de verdade preocupada com ele? — Nunca soube de Pam seriamente preocupada com nada. Quando ela fez que sim com a cabeça, eu me vi perguntando, — Quando conheceu o Eric? — Sempre tive essa curiosidade, e esta noite Pam pareceu estar em um estado de ânimo comunicativo.
— Eu o conheci em Londres na última noite da minha vida. — Sua voz estava num tom baixo, meio sombria como se viesse da escuridão. Podia ver um pouco do seu rosto pela luz do poste acima da sua cabeça, e ela parecia bem calma. — Arrisquei tudo por amor. Você vai rir ao ouvir isso.
Eu não estava sequer remotamente perto de rir.
— Eu era uma garota muito selvagem para minha época. Jovens senhoras não deviam estar a sós com cavalheiros, ou qualquer homem, por falar nisso. Tão diferente de hoje. — Os lábios de Pam se curvaram para cima em um breve sorriso. — Mas eu era uma romântica, e atrevida. Saí às escondidas de minha casa tarde da noite para me encontrar com o primo de minha melhor amiga, a garota que vivia na casa ao lado. O primo estava de visita de Bristol, e ficamos atraídos um pelo outro. Meus pais não consideravam que ele fosse meu igual na esfera social, então eu sabia que não o deixariam me cortejar. E se eu fosse pega a sós com ele à noite, seria o fim para mim. Nada de casamento, a menos que meus pais pudessem obrigá-lo a se casar comigo. Então, sem futuro de qualquer jeito. — Pam balançou a cabeça. — Louco pensar nisso agora. Nessa época as mulheres não tinham escolhas. A parte irônica é que nossos encontros eram muito inocentes. Alguns beijos, um monte de besteira sentimental, amor eterno. Blá, blá, blá.
Sorri abertamente para Pam, mas ela não olhou para perceber o sorriso.
— Em meu caminho de volta a minha casa, tentando atravessar o jardim silenciosamente, encontrei Eric. Não tinha jeito de me mover silenciosamente o bastante para evitá-lo. — Por um longo momento, ela ficou em silêncio. — E realmente foi o fim para mim.
— Por que ele te transformou? — Me sentei mais na ponta da minha cadeira e cruzei minhas pernas. Esta era uma conversa inesperada e fascinante.
— Acho que ele estava sozinho, — ela respondeu, uma débil nota de surpresa em sua voz. — Sua última companhia se lançou ao mundo sozinha, já que as crianças não podem ficar com seu criador por muito tempo. Depois de alguns anos, a criança deve aprender a se virar sozinha, embora possa retornar ao criador, e deve, se o criador chamar.
— Não ficou furiosa com ele?
Ela parecia estar tentando lembrar. — No começo, fiquei chocada, — Pam respondeu. — Depois que ele me drenou, ele me pôs na cama em meu próprio quarto, e é obvio, minha família pensou que eu tinha morrido de alguma doença misteriosa, e me enterraram. Eric me desenterrou, então eu não tive que acordar no meu caixão e abrir caminho por conta própria. Isso foi uma grande ajuda. Ele me segurou e me explicou tudo. Até a noite em que morri, eu sempre fui uma mulher muito convencional debaixo de minhas tendências atrevidas. Estava acostumada a usar camadas e camadas de roupas. Você ficaria assombrada com o vestido com que morri: as mangas, o adorno. Só com o tecido da saia você poderia fazer três vestidos! — Pam parecia lembrar-se do passado com ternura, nada mais. — Depois que eu acordei, descobri que ser vampira liberou alguma coisa selvagem em mim.
— Depois do que ele fez, não quis matá-lo?
— Não, — ela respondeu instantaneamente. — Quis fazer sexo com ele, e fiz. Transamos muitas, muitas vezes. — Ela sorriu abertamente. — O laço entre o criador e sua criança não tem que ser sexual, mas conosco foi. Isso mudou bem cedo, realmente, quando meus gostos se ampliaram. Quis provar tudo o que me tinha sido negado na minha vida humana.
— Então você realmente gostou disso, ser uma vampira? Você ficou contente?
Pam encolheu os ombros. — Sim, sempre amei ser o que sou. Levei alguns dias para entender minha nova natureza. Nunca tinha ouvido a respeito de um vampiro antes de me transformar em um.
Não podia imaginar o choque de Pam ao despertar. Sua autoproclamada rápida adequação ao seu novo estado me assombrou.
— Voltou alguma vez para ver sua família? — Perguntei. Ok, isso foi meio meloso, e lamentei assim que as palavras saíram dos meus lábios.
— Eu os vi de longe, talvez dez anos mais tarde. Entenda, a primeira coisa que um vampiro novo precisa fazer é deixar sua área de residência. De outra maneira corria o risco de ser reconhecido e caçado. Agora você pode se exibir o quanto quiser. Mas éramos tão secretos, tão cuidadosos. Eric e eu saímos de Londres tão rápido quanto pudemos, e depois de passar um tempinho no norte da Inglaterra, enquanto me acostumava a meu estado, deixamos a Inglaterra pelo continente.
Isto era horrível, mas fascinante. — Você o amou?
Pam pareceu um pouco confusa. Houve uma pequena ruga em sua testa lisa. — Amá-lo? Não. Fomos bons companheiros, e desfrutei do sexo e da caça. Mas amor? Não. — No resplendor das luzes do poste acima de sua cabeça, que lançavam curiosas sombras escuras nos cantos do terreno, observei a cara de Pam relaxar em suas linhas suaves normais. — Devo minha lealdade a ele, — Pam disse. — Tenho que obedecer, mas faço isso por vontade própria. Eric é inteligente, ambicioso, e muito divertido. Estaria me desintegrando em nada no meu túmulo agora se ele não tivesse me observado me esgueirar de volta pra minha casa do encontro com aquele jovenzinho bobo. Segui meu próprio caminho por muitos, muitos anos, mas fiquei contente em ouvi-lo, quando abriu o bar e me chamou pra servi-lo.
Era possível que alguém no mundo seja tão desprendido quanto Pam era sobre toda a questão de ‚ser assassinada‛? Não existia dúvida que Pam sentia prazer em ser uma vampira, ela parecia genuinamente nutrir um leve desprezo pelos humanos; de fato, parecia achá-los divertidos. Ela achou que foi hilariante quando Eric exibiu pela primeira vez seus sentimentos por mim. Será que Pam podia verdadeiramente ter mudado tanto do seu antigo eu?
— Que idade tinha, Pam?
— Quando morri? Tinha dezenove anos de idade. — Nem um flash de sentimento cruzou seu rosto.
— Usava seu cabelo para cima todo dia?
O rosto de Pam pareceu se empolgar um pouco.
— Sim, usava. Usava-o em um estilo muito elaborado; minha criada tinha que me ajudar. Eu colocava almofadinhas debaixo de meu cabelo para dar altura. E as roupas de baixo! Você morreria de rir se me visse dentro delas.
Apesar da conversa estar sendo realmente interessante, eu percebi que estava cansada e pronta pra ir pra casa. — Então o ponto principal é, que você é realmente leal ao Eric, e quer que eu saiba que nenhum de vocês sabia que Bill tinha um plano secreto quando ele veio a Bon Temps. — Pam assentiu com a cabeça. — Então, veio aqui esta noite para...?
— Para te pedir que perdoe Eric.
A ideia de Eric precisando do meu perdão nunca tinha cruzado minha mente. — Isso é tão engraçado quanto suas calcinhas humanas, — falei. — Pam, eu sei que você acredita que deve ao Eric, embora ele tenha te matado - querida ele te matou - mas eu não devo nada ao Eric.
— Você se importa com ele, — ela disse, e pela primeira vez soou um pouco zangada. — Eu sei que se importa. Ele nunca esteve tão confuso em suas emoções. Ele nunca esteve em tal desvantagem. — Ela pareceu se retrair, e acreditei que nossa conversa tinha acabado. Nos levantamos, e devolvi as cadeiras de Sam.
Não tinha ideia do que dizer.
Felizmente, não tive que pensar em nada. O próprio Eric saiu andando das sombras no limite do terreno.
— Pam, — ele disse, e essa palavra estava carregada. — Estava tão atrasada, que segui seu rastro para ter certeza que tudo estava bem.
— Mestre, — ela disse, isso foi algo que nunca tinha ouvido de Pam. Ela se inclinou sobre um joelho no cascalho, o que deve ter sido doloroso.
— Parta, — Eric disse, e assim à toa, Pam se foi.
Fiquei em silêncio. Eric estava me dando aquele fixo olhar vampiresco, e eu não conseguia decifrá-lo de jeito nenhum. Eu tinha plena certeza que ele estava aborrecido - mas a respeito do que, com quem, e com que intensidade? Essa era a parte divertida de estar com vampiros, e a parte horripilante de estar com vampiros, tudo ao mesmo tempo.
Eric decidiu que a ação falaria mais alto que as palavras. Repentinamente, ele estava na minha frente. Ele pôs um dedo sob meu queixo e levantou meu rosto até o dele. Seus olhos, que pareciam simplesmente escuros na luz irregular, apanharam os meus com uma intensidade que foi excitante e dolorosa. Vampiros; uma mistura de sentimentos. A mesma coisa.
Não exatamente para meu assombro, ele me beijou. Quando alguém teve aproximadamente uns mil anos para praticar beijos, ele poderia ficar muito bom nisso, e eu estaria mentindo se dissesse que era imune a esse talento osculatório. Minha temperatura subiu uns dez graus. Foi tudo o que podia fazer para me abster de dar um passo na direção dele, envolver meus braços ao seu redor, e me amassar contra ele. Para um cara morto, ele tinha a química mais viva - e aparentemente todos os meus hormônios estavam completamente acordados depois da minha noite com o Quinn. Pensar no Quinn foi como um balde de água fria.
Com uma relutância quase dolorosa, separei-me do Eric. Seu rosto tinha um ar focado, como se ele estivesse provando algo e decidindo-se se era bom o bastante para manter.
— Eric, — falei, e minha voz estava tremendo. — Não sei por que você está aqui, e não sei por que estamos tendo todo este drama.
— Você é do Quinn agora? — Seus olhos se estreitaram.
— Sou dona de mim, — respondi. — Eu escolho.
— E escolheu?
— Eric, isto está além dos limites. Você não está saindo comigo. Você não me deu nenhum sinal do que se passava em sua mente. Você não me tratou como se eu tivesse algum significado na sua vida. Não estou dizendo que estaria aberta a essas coisas, mas eu estou dizendo que, na sua ausência, tive liberdade de encontrar outro, hã, companheiro. E até aqui, eu gosto bastante de Quinn.
— Você não o conhece melhor do que realmente conhecia o Bill.
Isso bateu bem onde doía.
— Pelo menos eu tenho a maldita certeza que ele não recebeu ordens para me levar para cama para me transformar em um trunfo político!
— Foi melhor você saber sobre Bill, — Eric disse.
— Sim, foi melhor, — eu concordei. — Isso não quer dizer que aproveitei o processo.
— Eu sabia que seria difícil. Mas eu tinha que fazer ele te contar.
— Por quê?
Eric pareceu perplexo. Não conheço outra forma de colocar isso. Ele olhou para longe, em direção a escuridão do bosque. — Não era certo, — ele disse por fim.
— Verdade. Mas talvez você só quisesse ter certeza de que eu nunca o amasse outra vez?
— Talvez as duas coisas, — ele respondeu.
Houve um momento claro de silêncio, como se alguma coisa grande estivesse puxando o fôlego.
— Certo, — falei lentamente. Como se isso fosse uma sessão de terapia. — Por meses você tem andado mal-humorado perto de mim, Eric. Desde que você... você sabe, não foi você mesmo. O que há contigo?
— Desde aquela noite em que fui amaldiçoado, eu tenho me perguntado por que eu acabei correndo pela estrada para sua casa.
Dei um passo ou dois para trás e tentei achar alguma evidência, alguma indicação do que ele estava pensando, através de seu rosto pálido. Mas foi inútil. Nunca tinha me ocorrido perguntar por que Eric esteve lá. Eu tinha estado tão assombrada sobre tantas coisas que as circunstâncias de encontrar Eric sozinho, quase nu, e perdido, no início da madrugada do primeiro dia do Ano Novo, tinha sido enterrado como resultado da Guerra das Bruxas.
— Encontrou alguma resposta? — Perguntei, percebendo o quão estúpida a pergunta era depois que as palavras deixaram minha boca.
— Não, — ele disse em uma voz que era quase um chiado. — Não. E a bruxa que me amaldiçoou está morta, embora a maldição esteja quebrada. Agora ela não pode me dizer no que implicava sua maldição. Pretendia que eu procurasse pela pessoa que odiava? Amava? Foi por acaso que me encontrei correndo no meio do nada... exceto que esse nada era o caminho para sua casa?
Um momento de silêncio inquietante de minha parte. Não tinha ideia do que dizer, e Eric estava claramente esperando uma resposta.
— Provavelmente o sangue de fada, — falei fracamente, embora eu tivesse passado horas dizendo a mim mesma que minha porção de sangue de fada não era significativa suficientemente para causar mais que uma atração leve por parte dos vampiros que eu conheci.
— Não, — ele disse. E então se foi.
— Bem, — disse em voz alta, desgostosa com o tremor de minha voz. — Como fuga, essa foi uma muito boa. — Era bem difícil ter a última palavra com um vampiro.
— MINHAS BOLSAS ESTÃO EMBALADAS... — avisei.
— Bem, eu não estou tão solitária que poderia chorar, — disse Amelia. Ela gentilmente concordou em me levar ao aeroporto, mas eu deveria tê-la feito prometer ser agradável nessa manhã, também. Ela esteve um pouco contemplativa todo o tempo que eu estive colocando minha maquiagem.
— Eu queria ir também, — disse ela, admitindo o que estava entalado em sua garganta. Claro, eu conhecia o problema de Amelia, antes de ela ter dito em voz alta. Mas não era uma coisa que eu pudesse fazer.
— Não cabe a mim convidar ou não convidar, — eu disse. — Eu sou a empregada.
— Eu sei, — disse ela irritadamente. — Irei pegar a correspondência, e irei regar as plantas, e irei escovar Bob. Ei, ouvi dizer que o vendedor de seguros do Bayou State precisa de uma recepcionista, já que a mãe da mulher que trabalhava para ele foi evacuada de Nova Orleans e tem que ter cuidados em tempo integral.
— Oh, se candidate para entrar nesse trabalho, — disse. — Você irá simplesmente adorar. — Meu cara do seguro era um bruxo que respaldava suas apólices com magia. — Você realmente irá gosta de Greg Aubert, e ele irá se interessar por você. — Eu queria que a entrevista de Amelia na agência de seguros fosse uma surpresa feliz.
Amelia olhou para mim de lado, com um pequeno sorriso. — Oh, ele é atraente e solteiro?
— Não. Mas ele tem outros atributos interessantes. E lembre-se, você prometeu ao Bob que não faria com caras.
— Ah, é. — Amelia pareceu triste. — Ei, vamos procurar o seu
hotel.
Amelia estava me ensinando como usar o computador da minha prima Hadley. Eu o trouxe de volta comigo de Nova Orleans, pensando em vendê-lo, mas Amelia tinha me persuadido a montá-lo aqui em casa. Ele parecia engraçado sobre uma mesa no canto da parte mais antiga da casa, o cômodo agora usado como sala de estar. Amelia pagou por uma linha telefônica extra para a Internet, já que ela precisava da Internet para seu laptop lá em cima. Eu ainda era uma novata nervosa.
Amelia clicou no Google e digitou — Hotel Pirâmide de Gizé. — Olhamos para a imagem que apareceu na tela. A maioria dos hotéis de vampiros estava nos grandes centros urbanos, como Rhodes, e eles eram também atrações turísticas. Muitas vezes chamado simplesmente de ‚a Pirâmide‛, o hotel foi modelado como uma, é claro, e era coberto com vidro reflexivo na cor bronze. Ali estava uma faixa de vidro claro em torno de um dos andares perto da base.
— Não exatamente... hmmm. — Amelia olhou para o edifício, com a cabeça inclinada para o lado.
— É preciso inclinar mais, — eu disse, e ela fez que sim com a cabeça.
— Você está certa. É como se eles quisessem ter uma pirâmide, mas eles realmente não precisavam de tantos andares para fazê-lo parecer certo. O ângulo não é íngreme o suficiente para fazê-lo parecer realmente grandioso.
— E ele está montado em um retângulo grande.
— Isso, também. Espero que essas sejam as salas de convenções.
— Sem estacionamento, — eu disse, olhando fixamente para a tela.
— Oh, ele estará abaixo do edifício. Eles podem construí-los dessa forma lá.
— Ele está de frente para o lago, — eu disse. — Ei, eu consigo ver o Lago Michigan. Veja, há apenas um pequeno parque entre o hotel e o lago.
— E cerca de seis pistas de tráfego, — apontou Amelia.
— Ok, isso, também.
— Mas é perto do principal shopping, — disse Amelia.
— Tem um andar inteiro para humanos, — eu li.
— Aposto que é neste andar, o que é mais claro. Eu pensei que era apenas o design, mas isto é assim para que os humanos possam ir a algum lugar para ter luz durante o dia. As pessoas precisam disso para o seu bem-estar.
— Tradução: é uma lei, — disse Amelia. — O que mais tem lá? Salas de reuniões, blá blá blá. Vidro opaco por toda a parte, exceto o andar humano. Suítes primorosamente decorados no mais alto nível, blá, blá, blá. Funcionários perfeitamente treinados nas necessidades dos vampiros. Isso significa que todos eles estão dispostos a serem doadores de sangue ou companheiros de cama?
Amelia era tão cínica. Mas agora que eu sabia quem era seu pai, isso fazia sentido de certo modo.
— Eu gostaria de ver o quarto mais alto, na ponta da pirâmide, — eu disse.
— Não pode. Diz aqui que isso não é um andar real para hóspede. Isto é na verdade onde todas as coisas de ar condicionado ficam.
— Bem, inferno. Hora de ir, — eu disse, olhando para meu relógio.
— Ah, é, — Amelia olhou melancolicamente para a tela.
— Eu estarei fora por apenas uma semana, — eu disse. Amelia era definitivamente uma pessoa que não gostava de ficar sozinha. Descemos para o andar de baixo e carregamos minhas malas para o carro.
— Eu peguei o número do hotel para ligar em caso de emergência. Eu tenho o número do seu telefone celular, também. Você guardou o seu carregador? — Ela manobrou para baixo pela longa entrada de carro de cascalho e saiu para a estrada Hummingbird. Nós iríamos pela direita em torno de Bon Temps para pegar a interestadual.
— Sim. — E minha escova de dentes e creme dental, minha lâmina de barbear, meu desodorante, meu secador de cabelo (só pra garantir), minha maquiagem, todas as minhas roupas novas e algumas extras, montes de sapatos, um pijama, o relógio despertador de viagem de Amelia, roupa íntima, um pouco de jóias, uma bolsa extra, e dois livros de bolso. — Obrigada por me emprestar a mala. — Amelia havia colaborado com sua mala com rodinhas vermelha brilhante e uma bolsa do tipo porta traje combinando, além de uma bagagem de mão que eu tinha estufado com um livro, um compêndio de palavras cruzadas, um CD player portátil e um fone, além de um pequeno estojo de CD.
Nós não falamos muito na viagem. Eu estava pensando como estranho iria ser, deixar Amelia sozinha na casa de minha família. Havia Stackhouses residindo no local há mais de cento e setenta anos.
Nossa conversa esporádica morreu no momento em que nos aproximamos do aeroporto. Não parecia haver outra coisa a ser dita. Tínhamos ido diretamente pelo terminal principal de Shreveport, mas estávamos indo a um pequeno hangar privado.
Se Eric não tivesse reservado com antecedência um avião fretado da Anubis semanas atrás, ele poderia estar em uma grande enrascada, porque a cúpula definitivamente tinha sobrecarregado as capacidades da Anubis. Todos os estados envolvidos enviaram delegações, e um grande pedaço da América Central, proveniente do golfo até a fronteira canadense, foi incluído na divisão da América Central.
Há alguns meses atrás, Louisiana teria precisado de dois aviões. Agora um seria o bastante, especialmente porque alguns dos participantes tinham ido na frente. Eu tinha lido a lista dos vampiros desaparecidos após a reunião no Fangtasia, e para meu pesar, Melanie e Chester estavam nela. Eu os conheci no quartel-general da rainha de Nova Orleans, e embora não tivéssemos tido tempo para nos tornar amigos do peito ou qualquer outra coisa, eles pareciam ser vampiros agradáveis.
Havia um guarda no portão no muro que confinava o hangar, e ele verificou minha carteira de motorista e de Amelia, antes de nos deixar entrar. Ele era um policial humano comum fora de serviço, mas ele parecia competente e atento.
— Vire à direita, e não estacione na porta na parede leste, — ele
disse.
Amelia se inclinou um pouco enquanto dirigia, mas a porta estava fácil de ver, e havia outros carros ali estacionados. Era aproximadamente dez da manhã, e havia um toque de frio no ar, logo abaixo da superfície quente. Era um sopro inicial do outono. Após o quente, quente verão, aquilo era simplesmente delicioso. Estaria fresco em Rhodes, Pam havia dito. Ela verificou a temperatura para a próxima semana na Internet e me ligou para dizer para empacotar um suéter. Ela parecia quase animada, que era algo muito impressionante para Pam. Eu estava começando ter a impressão de que Pam estava um pouquinho agitada, um pouco cansada de Shreveport e do bar. Talvez fosse apenas eu.
Amelia me ajudou a descarregar as malas. Amelia empregou uma série de feitiços nas Samsonites vermelhas antes que ela pudesse entregálas para mim. Eu não perguntei o que aconteceria se ela tivesse esquecido. Puxei a alça da mala de rodinhas e atirei a bagagem de mão em meu ombro. Amelia pegou a bolsa de alça e abriu a porta.
Eu nunca havia estado em um hangar de avião antes, mas era exatamente como nos filmes: cavernoso. Havia alguns pequenos aviões estacionados no interior, mas seguimos como Pam havia instruído para grande abertura na parede oeste. O jato do Anubis Air estava estacionado lá fora, e os caixões estavam sendo carregados em cima da correia para bagagem pelos empregados uniformizados da Anubis. Todos vestiam preto realçado somente por uma cabeça de chacal estilizada sobre o peito do uniforme, uma afetação que eu achei irritante. Eles olhavam para nós casualmente, mas ninguém nos desafiou ou pediu para ver a identificação até chegarmos às escadas que conduziam ao avião.
Bobby Burnham estava parado no pé da escada com uma prancheta. É claro, uma vez que era luz do dia, era óbvio que Bobby não era um vampiro, mas ele estava quase pálido e quase severo o suficiente para ser um. Eu nunca havia encontrado ele antes, mas eu sabia quem ele era, e ele certamente me reconheceu. Eu arranquei isso diretamente de seu cérebro.
Mas a sua certeza não o impediu de verificar a minha identidade em comparação com sua lista maldita, e ele estava dando a Amelia uma grande encarada, como se ela não pudesse transformá-lo em um sapo. (Isso era o que Amelia estava pensando).
— Ele teria que coaxar, — murmurei, e ela sorriu.
Bobby se apresentou, e quando acenou com a cabeça, ele disse, — Seu nome está na lista, senhorita Stackhouse, mas senhorita Broadway não está. Eu receio que você tenha que levar a sua bagagem sozinha. — Bobby estava amando o poder.
Amelia estava sussurrando algo sob a sua respiração, e em uma precipitação Bobby deixou escapar, — Vou carregar a pesada mala até a escadaria, senhorita Stackhouse. Você pode cuidar das outras bolsas? Se isso não for algo que você queira fazer, eu vou estar de volta em um minuto e as levarei para você. — O assombro no rosto dele era impagável, mas eu tentei não aproveitar demais. Amelia estava jogando um truque levemente malvado.
— Obrigada, eu posso me arranjar, — eu o tranquilizei, e levei a bolsa de alça da Amelia, quando ele subiu a escadaria com a bagagem mais pesada.
— Amelia, sua mau-caráter, — eu disse, mas não muito irritada.
— Quem é o idiota? — perguntou ela.
— Bobby Burnham. Ele o cara das horas do dia de Eric. — Todos os vampiros de um determinado status tem um. Bobby era uma aquisição recente de Eric.
— O que ele faz? Espana o pó dos caixões?
— Não, ele faz os acordos comerciais, ele vai para o banco, ele pega a lavagem a seco, ele lida com os órgãos estaduais que ficam abertos apenas durante o dia, e assim por diante.
— Então ele é um office-boy.
— Bem, é. Mas ele é um office-boy importante. Ele é o office-boy do
Eric.
Bobby estava voltando agora, ainda parecendo surpreso que tinha sido educado e prestativo.
— Não faça qualquer coisa para ele, — eu disse, sabendo que ela estava considerando.
Os olhos de Amelia brilharam antes que ela percebesse o que eu estava dizendo. — É, eu sou mesquinha, — ela admitiu. — Eu odeio imbecis loucos pelo poder.
— Quem não odeia? Escuta, eu vou te ver em uma semana. Obrigada por me trazer para o avião.
— Tá, tá. — Ela me deu um sorriso desolado. — Divirta-se, e não seja morta ou mordida ou qualquer coisa.
Impulsivamente, eu a abracei, e após uma segunda surpresa, ela me abraçou de volta.
— Cuide bem do Bob, — eu disse, e subindo as escadas eu parti.
Eu não pude deixar de me sentir um pouco ansiosa, pois eu estava cortando meus laços com minha vida familiar, pelo menos temporariamente.
A funcionária da Anubis Air na cabine de passageiros disse, — Escolha seu assento, senhorita Stackhouse. — Ela pegou a bolsa de alça de mim e a colocou em outro lugar. O interior da aeronave não era como a de qualquer avião para humanos, ou pelo menos era o que o site da Anubis tinha alegado. A frota da Anubis tinha sido projetada e equipada para o transporte de vampiros adormecidos, com passageiros humanos vindo em segundo lugar. Havia compartimentos para caixões em torno da parede, como compartimentos de bagagens gigantes, e na parte dianteira do avião havia três fileiras de assentos, à direita três lugares, e à esquerda dois, para pessoas como eu... ou, pelo menos, pessoas com alguma capacidade que seriam úteis aos vampiros nesta conferência. No momento, havia apenas três outras pessoas sentadas nos assentos. Bem, outro humano e dois parte humanos.
— Oi, Sr. Cataliades, — eu disse, e o homem redondo se levantou de seu assento, sorridente.
— Cara senhorita Stackhouse, — ele disse com cordialidade, porque essa era a maneira do Sr. Cataliades falar, — Estou muito feliz em vê-la novamente.
— Prazer em vê-lo, também, Sr. Cataliades.
Seu nome era pronunciado Ka-TAL-ee-ah-deez, e se ele tem um primeiro nome, eu não sabia. Sentada ao lado dele estava uma mulher muito jovem com o seu brilhante cabelo vermelho eriçado: sua sobrinha, Diantha. Diantha vestia roupas incomuns, e hoje ela se superou. Talvez com uns 1,52 cm de altura, magra ossuda, Diantha tinha escolhido leggings laranja que iam até a panturrilha, sapatos crocs azuis, uma saia branca com babados, e uma camisa tie-dyed sem manga. Ela estava ofuscante para os olhos.
Diantha não pensava em respirar enquanto falava. Visto que ela disse, — Bomtever.
— A ti também, — eu disse, e já que ela não fez qualquer outro movimento, dei-lhe um aceno de cabeça. Alguns sobrenaturais apertam as mãos, outros não, então você tem que ter cuidado. Virei-me para o outro passageiro. Com outro humano, eu pensei que estava em terra firme, então eu estendi minha mão direita. Como se ela tivesse sido oferecida a um peixe morto, o homem estendeu a própria mão após uma pausa perceptível. Ele pressionou minha palma de um jeito fraco e desviou seus dedos como se ele pudesse apenas abster-se de limpá-los na calça de seu terno.
— Senhorita Stackhouse, este é Johan Glassport, especialista em direito vampírico.
— Sr. Glassport, — eu disse polidamente, lutando para não ficar ofendida.
— Johan, esta é Sookie Stackhouse, telepata da rainha, — Sr. Cataliades disse em sua maneira cortês.
O senso de humor do Sr. Cataliades era tão abundante como sua barriga. Ali estava uma piscadela em seus olhos agora mesmo. Mas você tinha que lembrar que uma parte dele não era humana - a parte majoritária do Sr. Cataliades - era um demônio. Diantha era meio demônio; seu tio até mais.
Johan me deu uma breve varredura de cima a baixo, fungou quase audível, e voltou para o livro que ele tinha em seu colo.
Naquele momento, a aeromoça da Anubis começou a nos dar a fala usual, e eu me afivelei em meu assento. Logo depois, estávamos no ar. Eu não tive uma pontada de angústia, porque eu estava muito zangada com o comportamento de Johan Glassport.
Eu não acho que já tinha encontrado grosseria tão evidente. As pessoas do norte da Louisiana podem não ter muito dinheiro, e pode haver uma alta taxa de gravidez adolescente e todos os tipos de outros problemas, mas por Deus, nós somos educados.
Diantha disse, — Johanéumimbecil.
Johan prestou absolutamente nenhuma atenção para esta avaliação precisa, mas virou a página do seu livro.
— Obrigado, querida, — Sr. Cataliades disse. — Senhorita Stackhouse, me atualize até esta data sobre sua vida.
Me movi para sentar em frente ao trio. — Não há muito a dizer, Sr. Cataliades. Eu recebi o cheque, como te escrevi. Obrigada por amarrar todas as pendências da propriedade de Hadley, e se você reconsiderar e me enviar uma conta, eu ficaria feliz em pagá-la. — Não exatamente feliz, mas aliviada de uma obrigação.
— Não, criança. Era o mínimo que eu podia fazer. A rainha ficou feliz ao expressar seu agradecimento dessa forma, mesmo que a noite dificilmente se revelou como ela tinha planejado.
— É claro, nenhum de nós imaginou que terminaria assim. — Pensei na cabeça de Wybert voando pelo ar cercado por uma névoa de sangue, e eu estremeci.
— Você é a testemunha, — disse Johan inesperadamente. Ele deslizou um marcador de livros em seu livro e o fechou. Seus olhos pálidos, ampliados por trás de seus óculos, estavam fixos em mim. De cocô de cachorro em seu sapato, eu tinha sido transformada em algo completamente interessante e extraordinária.
— É. Eu sou a testemunha.
— Então precisamos conversar, agora.
— Estou um pouco surpresa, que você não viajou de um lugar a outro para conversar comigo antes, se você está representando a rainha neste julgamento muito importante, — disse em uma voz tão suave como eu poderia controlar.
— A rainha teve problemas para entrar em contato comigo, e eu tinha que terminar com meu cliente anterior, — disse Johan. Seu rosto sem linhas de expressão não mudou exatamente, mas ele parecia um pouco tenso.
— Johan estava na cadeia, — disse Diantha muito clara e distintamente.
— Oh, meu Deus, — eu disse, verdadeiramente assustada.
Johan disse, — É claro, as acusações foram totalmente infundadas.
— Certamente, Johan, — disse Sr. Cataliades com absolutamente nenhuma modulação em sua voz.
— Ooo, — eu disse. — Quais foram essas acusações que eram tão falsas?
Johan olhou para mim novamente, desta vez com menos arrogância. — Fui acusado de golpear uma prostituta no México.
Eu não conhecia muito sobre aplicação da lei no México, mas isso pareceu absolutamente incrível para mim que um americano pudesse ser detido no México por bater numa prostituta, se essa fosse a única acusação. A menos que ele tivesse um monte de inimigos.
— Aconteceu de você ter algo em sua mão quando você bateu nela? — Eu perguntei com um sorriso brilhante.
— Eu acredito que Johan tinha uma faca na mão, — Sr. Cataliades disse seriamente.
Eu sei que meu sorriso desapareceu na mesma hora. — Você estava na cadeia no México por esfaquear uma mulher, — eu disse.
Quem era cocô de cachorro agora?
— Uma prostituta, — ele corrigiu. — Esta foi a acusação, mas é claro, eu estava completamente inocente.
— É claro, — eu disse.
— O meu caso não é o que está na pauta neste momento, senhorita Stackhouse. Meu trabalho é defender a rainha das acusações muito graves contra ela, e você é uma testemunha importante.
— Eu sou a única testemunha.
— Certamente - da morte efetiva.
— Houve várias mortes efetivas.
— A única morte que importa nesta cúpula é a morte de Peter Threadgill.
Suspirei à imagem da cabeça de Wybert, e então eu disse, — É, eu estava lá.
Johan poderia se mais baixo que o lodo da lagoa, mas ele conhecia seu negócio. Passamos por uma longa sessão de pergunta e resposta, que deixou o advogado saber mais sobre o que tinha acontecido que eu, e eu estive lá. Sr. Cataliades ouviu com grande interesse e de vez em quando acrescentava um esclarecimento ou explicava o esboço do mosteiro da rainha para o advogado.
Diantha escutou por um tempo, sentou no chão e jogou cartas por meia hora, depois reclinou sua cadeira e foi dormir.
A atendente da companhia aérea Anúbis cumpria a tarefa oferecendo ocasionalmente bebidas e aperitivos no vôo de três horas para o norte, e depois que eu terminei minha sessão com o advogado de defesa, levantei-me para usar o banheiro. Aquilo foi uma experiência; eu nunca estive em um banheiro de avião antes. Em vez de retomar ao meu assento, eu caminhei pelo avião, dando uma olhada em cada caixão. Havia uma etiqueta de bagagem em cada um, amarrada às alças. Conosco no avião hoje estavam Eric, Bill, a rainha, Andre, e Sigebert. Eu encontrei também o caixão de Gervaise, que tinha sido anfitrião da rainha, e Cleo Babbitt, que era o xerife da Área III. A xerife da Área II, Arla Yvonne, tinha sido deixada no comando do Estado, enquanto a rainha estivesse fora.
O caixão da rainha estava incrustado com desenhos de madrepérola, mas os outros eram bastante simples. Eles eram todos de madeira polida: nenhum metal moderno para esses vampiros. Corri minha mão sobre o de Eric, tendo assustadoras imagens mentais dele deitado dentro, totalmente sem vida.
— A mulher de Gervaise dirigiu antes durante a noite com Rasul para se certificar que todos os preparativos da rainha estivessem no lugar, — a voz do Sr. Cataliades afirmou do meu ombro direito. Saltei e gritei, o que divertiu o advogado civil de opinião política progressista da rainha. Ele riu e riu.
— Movimento silencioso, — eu disse, e minha voz estava azeda como um limão espremido.
— Você estava se perguntando onde o quinto xerife estava.
— Sim, mas você ficou um ou talvez dois pensamentos atrás.
— Eu não sou telepático como você, minha querida. Eu estava apenas seguindo suas expressões faciais e linguagem corporal. Você contou os caixões e começou a ler as etiquetas de bagagem.
— Então a rainha não é apenas a rainha, mas a xerife de sua própria área.
— Sim; isso elimina a confusão. Nem todos os governantes seguem esse padrão, mas a rainha achou tedioso consultar constantemente outro vampiro quando ela queria fazer alguma coisa.
— Soa como a rainha. — Dei uma espiada adiante em nossos companheiros. Diantha e Johan estavam ocupados: Diantha com sono, Johan com seu livro. Eu me perguntava se era um livro de dissecação, com diagramas - ou talvez uma descrição dos crimes de Jack o Estripador, com as fotografias das cenas dos crimes. Aquele parecia ser o estimulante de Johan. — Como a rainha chegou a ter um advogado como ele? — Eu perguntei em uma voz tão baixa como eu podia lidar. — Ele parece realmente... fajuto.
— Johan Glassport é um notável advogado, e um que pegará casos que outros advogados não pegam, — disse Cataliades. — E ele também é um assassino. Mas por outro lado, todos nós somos, não somos? — Seus pequenos e brilhantes olhos escuros olharam diretamente para os meus.
Devolvi o olhar por um longo momento. — Em defesa de minha própria vida ou da vida de alguém que eu amasse, eu mataria um atacante, — eu disse, pensando antes que cada palavra deixasse minha boca.
— Que forma tão diplomática de pôr isso, senhorita Stackhouse. Eu não posso dizer o mesmo por mim. Algumas coisas que eu matei, eu rasguei em pedaços por absoluto prazer.
Oh, urgh. Mais do que eu queria saber.
— Diantha gosta de caçar veados, e ela matou pessoas em minha defesa. E ela e sua irmã até mataram um vampiro patife ou dois.
Lembrei-me de tratar Diantha com mais respeito. Matar um vampiro era uma tarefa muito difícil.
E ela poderia jogar cartas como uma viciada.
— E Johan? — Eu perguntei.
— Talvez eu faça melhor em deixar as pequenas predileções de Johan veladas no momento. Ele não vai sair da linha enquanto estiver conosco, afinal de contas. Você está satisfeita com o trabalho que Johan está fazendo, instruindo você?
— É isso que ele está fazendo? Bem, sim, acho que sim. Ele tem sido muito meticuloso, que é o que você quer.
— De fato.
— Você pode me dizer o que esperar da cúpula? O que a rainha vai querer?
Mr. Cataliades disse, — Vamos sentar e eu irei tentar explicá-la.
Para a próxima hora, ele falou, e eu ouvia e fazia perguntas.
Até ali Diantha sentou e bocejou, me senti um pouco mais preparada para todas as coisas novas que eu enfrentaria na cidade de Rhodes. Johan Glassport fechou o livro e olhou para nós, como se ele estivesse pronto para falar.
— Sr. Glassport, você esteve em Rhodes antes? — Sr. Cataliades perguntou.
— Sim, — respondeu o advogado. — Eu costumava advogar em Rhodes. Na verdade, me acostumei a viajar diariamente entre Rodes e Chicago, eu morava a meio caminho entre os dois.
— Quando é que você foi para o México? — Eu perguntei.
— Oh, um ou dois anos atrás, — respondeu ele. — Eu tive algumas divergências com colegas de trabalho aqui, e pareceu uma boa hora para...
— Cair fora da cidade? — Eu completei utilmente.
— Correr como o inferno? — Diantha sugeriu.
— Pegar o dinheiro e desaparecer? — Mr. Cataliades disse.
— Todas as alternativas acima, —, disse Johan Glassport com o mísero sinal de um sorriso.
ERA MEIO DA TARDE QUANDO NÓS CHEGAMOS em Rhodes. Tinha um caminhão da Anubis esperando para carregar os caixões e transportá-los para a Pirâmide de Gizé. Eu olhei pelas janelas da limousine cada segundo do percurso para a cidade, e apesar da presença irresistível das cadeias de lojas que nós também víamos em Sheveport, eu não tive dúvidas que estava em um lugar diferente. Pesados tijolos vermelhos, trânsito da cidade, casas enfileiradas, vislumbres do lago... eu tentava olhar para todas as direções ao mesmo tempo. Então nós tivemos a visão do hotel; era incrível. O dia não estava ensolarado o suficiente para que o vidro bronze cintilasse, mas a pirâmide de Gizé parecia impressionante de qualquer maneira. Como era de se esperar, tinha um parque do outro lado da rua de seis pistas, o qual estava fervendo com a movimentação, e mais à frente dele o vasto lago.
Enquanto o caminhão do Anubis fazia a volta para a parte de trás da Pirâmide para descarregar a carga de vampiros e bagagens, a limousine se moveu para frente do hotel. Enquanto nós criaturas diurnas deslizávamos para fora do carro, e eu não sabia o que olhar primeiro: as vastas águas ou a decoração da estrutura por si só.
As portas principais da Pirâmide estavam guardadas por homens de uniforme marrom e bege, mas tinham guardiões silenciosos, também. Haviam duas elaboradas reproduções de sarcófagos na posição vertical, um de cada lado da porta principal do saguão. Eles eram fascinantes, e eu gostaria de ter a chance de examinar ambos, mas nós fomos arrastados para dentro do prédio pela equipe de funcionários. Um homem abriu a porta do carro, um examinou nossa identificação para ter certeza que nós estávamos registrados como hóspedes — nenhum repórter humano, perseguidores curiosos, ou fanáticos variados — e outro empurrou abrindo a porta do hotel para indicar que nós deveríamos entrar.
Eu já tinha ficado em um hotel de vampiros antes, então eu esperava os guardas armados e a falta de janelas no piso térreo. A Pirâmide de Gizé fazia mais esforço para se parecer como um hotel humano do que o Hotel Silent Shore em Dallas fazia; embora as paredes possuíssem murais que imitavam a arte das tumbas egípcias, o saguão era luminoso com luzes artificiais e horrivelmente pomposo com música ambiente ‚A garota de Ipanema‛ em um hotel vampírico.
O saguão estava mais atarefado que o Silent Shore, também.
Haviam vários humanos e outras criaturas caminhando de forma decidida ao redor, muita ação no balcão de check-in, e muita inquietação ao redor do estande de serviços ao turista providenciado pelo ninho de vampiros da cidade anfitriã. Eu tinha ido com Sam a uma convenção de suprimento para bares em Shreveport uma vez quando ele estava comprando um novo sistema de bomba, e eu reconheci a organização geral. Em algum lugar, eu tinha certeza, haveria um salão de convenções com estandes, e uma programação de painéis ou manifestações.
Eu esperava que houvesse um mapa do hotel, com todos os eventos e localizações apontados, no nosso pacote de inscrição. Ou será que os vampiros eram muito orgulhosos para tais ajudas mundanas? Não, tinha um diagrama do hotel emoldurado e iluminado para a leitura cuidadosa dos convidados e passeios programados. Esse hotel estava numerado em ordem inversa. O último andar, a cobertura, estava numerado como 1. A parte inferior, o maior andar - o andar humano - estava numerado como 15. Tinha um mezzanino entre o andar humano e o saguão, e havia grandes salões de convenções no anexo do lado norte do hotel, a projeção retangular sem janelas que parecia tão bizarro na foto da Internet.
Eu observei pessoas correndo através do saguão - arrumadeiras, guarda-costas, camareiros, mensageiros ... Aqui estamos, todos nós pequenos castores humanos, correndo para deixar as coisas prontas para os congressistas mortos-vivos (Você poderia chamá-los assim, quando isso foi anunciado como uma reunião de cúpula? Qual era a diferença?) Me senti um pouco irritada quando eu me perguntei porque essa era a ordem das coisas, quando há alguns anos atrás, os vampiros eram os que corriam a toda pressa, voltando para um canto escuro onde eles pudessem se esconder. Talvez tivesse sido o jeito mais natural. Me esbofeteei mentalmente. Eu poderia também me unir à Irmandade, se assim fosse como eu realmente sentia. Eu percebi os manifestantes no pequeno estacionamento do outro lado da rua da Pirâmide de Gizé, o qual alguns cartazes referiam como ‚A Pirâmide dos Bastardos‛.
— Onde estão os caixões? — Eu perguntei ao Sr. Cataliades.
— Eles estão vindo através de uma entrada no porão — ele disse.
Tinha um detector de metais na porta do hotel. Eu tentei fortemente não olhar quando Johan Glassport esvaziava seus bolsos. O detector soou como uma sirene quando ele passou através dele — Os caixões têm que passar pelo detector de metais também? — eu perguntei
— Não. Nossos vampiros têm caixões de madeira, mas suas partes duras são de metal, e você não pode esvaziá-los tirando os vampiros para revistar os bolsos deles por objetos de metal, então isso não faria o menor sentido— Sr. Cataliades respondeu, pela primeira parecendo impaciente — E mais, alguns vampiros escolhem os modernos caixões de metais.
— Os manifestantes do outro lado da rua, — eu disse — Eles me assustam. Eles adorariam se esgueirar por aqui.
Sr. Cataliades sorriu, uma visão aterradora. — Ninguém entrará aqui, Senhorita Sookie. Existem outros guardas que você não pode ver.
Enquanto Sr. Cataliades nos registrava, eu parei ao seu lado e me virei para percorrer com os olhos para as outras pessoas. Todos eles estavam muito bem vestidos, e todos eles estavam falando. Sobre nós. Eu me senti imediatamente ansiosa pelos olhares que nós estávamos recebendo dos outros, e o zumbido de pensamentos dos poucos convidados vivos e equipe de funcionários reforçaram minha ansiedade. Nós éramos os humanos do séquito da rainha que tinha sido a mais poderosa governante vampira na América. Agora ela não estava apenas fraca economicamente, mas ela estava sendo julgada por matar o seu marido. Eu poderia ver porque os outros lacaios estavam interessados — eu teria nos achado interessantes - mas eu estava desconfortável. Tudo que eu poderia pensar era como brilhante o meu nariz poderia estar, e como eu desejaria de alguns momentos sozinha.
O recepcionista verificou nossas reservas muito devagar e deliberadamente, como se fosse para nos manter em exibição no saguão por todo o tempo possível. Sr. Cataliades negociou com ele com a sua elaborada e usual cortesia, embora até que ficou tenso após dez minutos.
Eu fiquei em pé em uma discreta distância durante o processo, mas quando eu pude dizer ao recepcionista — quarentão, usuário de drogas por diversão, pai de três - que estava exatamente nos sacaneando para o seu completo divertimento, eu me aproximei. Eu deitei uma mão na manga do Sr. C para indicar que eu gostaria de me juntar a conversa. Ele se interrompeu e virou para mim com uma expressão interessada no rosto.
— Você nos dará nossas chaves e nos dirá onde nossos vampiros estão, ou eu vou contar ao seu chefe que você está vendendo itens da Pirâmide de Gizé no eBay. E se você subornar uma camareira para tocar nas calcinhas da rainha, até mesmo roubá-las, eu irei incitar Diantha a te atacar. — Diantha tinha justamente retornado da sua procura por uma garrafa de água. Ela gentilmente revelou seus pontiagudos, dentes afiados em um sorriso letal.
O recepcionista ficou branco e depois vermelho em uma exibição interessante de padrões de fluxos sanguíneos. — Sim, madame, — ele gaguejou, e eu me perguntei se ele iria molhar suas calças. Após minha pequena busca através de sua cabeça, eu não me importei muito.
Em um curto espaço de tempo, nós todos tínhamos nossas chaves, tínhamos uma lista do lugar de descanso dos ‚nossos‛ vampiros, e o mensageiro estava nos trazendo a nossa bagagem em um desses carrinhos elegantes. Isso me lembrou de algo.
Barry, eu disse na minha cabeça. Você está aqui?
Sim, disse uma voz que estava longe de ser vacilante como tinha sido da primeira vez que eu ouvi. Sookie Stackhouse?
Sou eu. Nós estamos nos registrando. Eu estou no 1538. Você?
Eu estou no 1576.Como você está?
Bem, de uma maneira pessoal. Mas Louisiana... nós tivemos um furacão, e nós teremos o julgamento. Eu acho que você sabe tudo sobre isso?
Sim. Você viu alguma ação.
Pode-se dizer que sim, eu disse a ele, desejando saber se meu sorriso estava topando com a minha cabeça.
Recebi isso alto e claro.
Agora eu tinha uma noção de como as pessoas devem se sentir quando elas estão cara a cara comigo.
Eu irei te verei em breve, eu disse ao Barry. Ei, qual é o seu verdadeiro sobrenome?
Você começou algo quando fez meu dom abrir, ele me disse. Meu nome verdadeiro é Barry Horowitz. Agora eu só me chamo Barry Bellboy. É como eu estou registrado, se você esquecer o número do meu quarto.
Ok. Esperando ansiosa para visitar você.
Eu sinto o mesmo aqui.
E então Barry e eu voltamos nossa atenção para outras coisas, e aquela estranha sensação de cócegas da comunicação mente-com-mente se foi.
Barry é o único outro telepata que eu já tinha encontrado.
Sr. Cataliades descobriu que os humanos - bem, os não vampiros - tinham sido colocados cada um em um quarto com outra pessoa da mesma comitiva. Alguns vampiros tinham companheiros de quartos, também. Ele não estava satisfeito por ter que dividir o quarto com Diantha, mas o hotel estava extremamente lotado, o recepcionista havia dito. Ele talvez possa ter mentido sobre um monte de outras coisas, mas isso era uma verdade absoluta.
Eu estava dividindo o quarto com a namorada de Gervaise, e enquanto eu deslizava o cartão na abertura da porta, eu me perguntava se ela estaria lá dentro. Ela estava. Eu estava esperando uma mulher como as fangbangers que ficam andando à toa no Fantasia, mas Carla Danvers era completamente outro tipo de criatura.
— Ei, garota! — ela disse, enquanto eu entrava. — Eu calculei que você estivesse por aqui logo quando eles trouxeram suas bagagens para cima. Eu sou a Carla, namorada do Gerry.
— Prazer em conhecê-la, — eu disse, apertando as mãos. Carla era a rainha do baile. Talvez ela não tivesse sido, literalmente; pode ser que ela não tivesse ganhado como a rainha do Baile de Boas-Vindas, tampouco, mas ela tinha certamente estado no tribunal. Carla tinha o cabelo marrom escuro até o queixo, e grande olhos castanhos, e dentes que eram tão retos e brancos que eram uma propaganda para o seu ortodentista. Seus seios tinham sido aumentados e suas orelhas eram furadas, e seu umbigo, também. Ela tinha uma tatuagem na parte inferior das costas, algumas vinhas pretas em um padrão em V e um par de rosas com folhas verdes no meio. Eu podia ver tudo isso porque Carla estava nua, e ela não parecia ter a mínima ideia que a sua nudez era um pouco de ‚muita informação‛ para o meu gosto.
— Você e Gervaise estão juntos há muito tempo? — Eu perguntei para camuflar o quão desconfortável eu estava.
— Eu conheci Gerry, deixa eu ver, sete meses atrás. Ele disse que seria melhor para mim ter um quarto separado porque ele poderia ter reuniões de trabalho no dele, sabe? Além disso, eu vou fazer compras enquanto eu estiver aqui - terapia de varejo! Grandes lojas na cidade! E eu gostaria de um lugar pra deixar as minhas sacolas de compras então ele não vai me perguntar quanto tudo isso custou. — Ela me deu uma piscada eu só posso dizer que foi travesso.
— Ok, — eu disse. — Parece bom— Isso não parecia honestamente bom, mas a programação de Carla estava longe de ser assunto meu. Minha mala estava esperando por mim no carrinho, então eu a abri e comecei a desfazê-la, notei que a minha mala de mão com meus bons vestidos já estava no armário. Carla deixou pra mim exatamente a metade do espaço do armário e das gavetas, o que foi decente. Ela tinha trazido vinte vezes mais roupas do que eu tinha, o que fez sua decência ainda mais notável.
— De quem você é namorada? — Carla perguntou. Ela estava fazendo a unha do seu pé. Quando ela levantou uma perna, a luz acima cintilou em algo metálico entre suas pernas. Completamente envergonhada, eu me virei para endireitar meu vestido de noite no cabide.
— Eu estou namorando o Quinn— eu disse.
A olhei por cima do meu ombro, mantendo meu olhar para o alto.
Carla parecia pálida.
— O homem-tigre, — eu disse. — Ele está organizando as cerimônias aqui.
Ela parecia relativamente mais receptiva.
— Cara grande, cabeça raspada, — eu disse.
Seu rosto se avivou. — Ah, é, eu o vi essa manhã! Ele estava tomando café-da-manhã no restaurante quando eu estava me registrando.
— Existe um restaurante?
— Sim, claro. Embora como era de se esperar ele é minúsculo. E tem serviço de quarto.
— Sabe, em hotéis de vampiro frequentemente não há um restaurante, — eu disse, apenas para manter a conversa. Eu tinha lido um artigo sobre isso no American Vampire.
— Oh. Bom, isso não faz nenhum sentido, — Carla terminou um conjunto de dedos e começou outro.
— Não do ponto de vista dos vampiros.
Carla franziu a testa. — Eu sei que eles não comem. Mas as pessoas sim. E isso é um mundo de pessoas, certo? É como não aprender inglês quando você imigra para a América.
Eu me virei para examinar o rosto de Carla, para ter certeza que ela estava falando sério. É, ela estava.
— Carla, — eu disse, e então parei. Eu não tinha nenhuma idéia do que dizer, como a fazer entender que um vampiro de quatrocentos anos realmente não se importava sobre os programas de refeições de uma humana de vinte anos de idade.
Mas a garota estava esperando que eu terminasse. — Bem, é bom que tenha um restaurante aqui, — eu disse fracamente.
Ela aprovou com a cabeça. — Sim, porque eu preciso do meu café da manhã, — ela disse. — Eu simplesmente não posso me mover sem ele. Claro, quando você namora um vampiro, sua manhã está sujeita a começar às três da manhã ou quatro da tarde, — ela gargalhou.
— Verdade, — eu disse. Eu terminei de desfazer a minha mala, então eu fui até a nossa janela e olhei para fora. O vidro era tão fortemente matizado que era difícil de ver a paisagem, mas ele era visível. Eu não estava do lado do hotel que dava para o Lago Michigan, o que era uma pena, mas eu olhei os edifícios ao redor do lado oeste do hotel com curiosidade. Eu não via cidades frequentemente, e eu nunca tinha visto uma cidade do norte. O céu escurecia rapidamente, assim entre isso e as janelas matizadas eu realmente não podia ver muito depois de dez minutos. Os vampiros estariam acordados logo, e meu dia de trabalho iria começar.
Apesar dela ter mantido uma esporádica torrente de conversa fiada, Carla não perguntou qual era o meu papel nessa cúpula. Ela supôs que eu estava ali como uma jovem mulher bonita nos braços de um homem mais velho. Por um momento, isso estava muito bom para mim. Cedo ou tarde, ela iria descobrir qual era o meu talento particular, e então ela ficaria nervosa perto de mim. Por outro lado, no momento ela estava bastante relaxada.
Carla estava se vestindo (graças a Deus) em um estilo que eu achei ser como ‚puta de classe‛. Ela estava usando um vestido curto usado em ocasiões formais verde brilhante que quase não tinha uma parte superior e uns sapatos que diziam ‚me-coma‛ que foi somado com uma transparente tanga. Bem, ela tinha as suas roupas de trabalho, e eu tinha as minhas. Eu não estava muito contente comigo mesma por estar julgando, e talvez eu estivesse um pouco invejosa que meus trajes de trabalho fossem tão conservadores.
Para hoje à noite, eu tinha escolhido um vestido marrom chocolate com lenços de renda. Eu coloquei meus grandes brincos de ouro e deslizei para dentro de meus escarpins marrom, coloquei um pouco de batom e escovei meu cabelo muito bem. Predendo a minha chave-cartão dentro da minha bolsa de noite, eu me encaminhei à recepção para descobrir qual suíte era a da rainha, uma vez que o Sr. Cataliades tinha me dito para me apresentar lá.
Eu tinha esperanças de me encontrar com Quinn ao longo do caminho, mas eu não vi nem a sombra de seus não cabelos. Devido eu ter com uma companheira de quarto e Quinn estar tão ocupado o tempo todo, essa cúpula podia não prometer tanta diversão nas horas vagas como eu havia esperado.
O recepcionista empalideceu quando me viu chegando, e ele olhou em volta para ver se Diantha estava comigo. Enquanto ele rabiscava o número do quarto da rainha em um pedaço de papel com as mãos trêmulas, eu olhei ao meu redor mais atentamente.
Havia câmeras de segurança em localizações um pouco óbvias, apontadas para as portas da frente e para o balcão da recepção. E eu achei que eu pudesse ver uma nos elevadores. Lá estavam os usuais guardas armados - usual para um hotel de vampiro, isso sim. A grande estratégia de venda para qualquer hotel vampírico era a segurança e a privacidade dos seus hóspedes. Caso contrário, vampiros poderiam ficar em quartos especiais mais baratos e centrais de hotéis com tendências vampíricas. (Mesmo o Motel 6 tinha um quarto de vampiro em quase toda a localização.) Quando eu pensei sobre os manifestantes do lado de fora, eu realmente esperava que a equipe de segurança daqui da Pirâmide estivessem qualificados.
Eu acenei com a cabeça para outra mulher humana enquanto eu cruzei o saguão para o declive central dos elevadores. Os quartos ficavam mais ostentosos quanto mais alto você avançava, eu deduzi, visto que ali existiam menos sobre o andar. A rainha tinha uma das suítes do quarto andar, já que ela fez a reserva para esse evento há muito tempo, antes do Katrina - e provavelmente enquanto seu marido ainda estava vivo. Havia apenas oito portas no andar dela, e eu não precisava ver o número para saber qual quarto estava Sophie-Anne. Sigebert estava em pé em frente a ele. Sigebert era uma rocha de homem. Ele tinha guardado a rainha por centenas de anos, como tinha Andre. O antigo vampiro parecia solitário sem o seu irmão, Wybert. Por outro lado, ele era o mesmo velho guerreiro anglo-saxão que ele costumava ser da primeira vez que eu o conheci - barba espessa, físico de um javali, e um ou dois dentes faltando em lugares cruciais.
Sigebert sorriu para mim, uma visão aterradora. — Senhorita Sookie, — ele disse por meio de saudação.
— Sigebert, — eu disse, pronunciando cuidadosamente — Seeyabairt — Você está bem? — eu quis demonstrar simpatia sem afundar em águas muito sentimentais .
— Meu irmão, ele morreu como um herói— Sigebert disse orgulhosamente — Em batalha.
Eu pensei em dizer, — Você deve sentir muito a falta dele depois de milhares de anos — então eu decidi que era exatamente como repórteres perguntam aos pais de crianças desaparecidas, — Como você se sente?
— Ele foi um ótimo lutador, — eu disse instantaneamente, e isso era exatamente o que Sigebert gostaria de ouvir. Ele me deu um tapinha no ombro, quase me nocauteando no chão. Então seu olhar ficou um pouco preocupado, como se ele ouvisse um aviso.
Eu tinha a suspeita que a rainha poderia falar com suas ‚crianças‛ telepaticamente, e quando Sigebert abriu a porta pra mim sem nenhuma palavra, eu soube que isso era verdade. Eu fiquei contente que ela não pudesse falar assim comigo. Ser capaz de me comunicar com Barry era um tipo de diversão, mas se nós passássemos um tempo juntos constantemente eu estava certa que envelheceria rapidamente. Além disso, Sophie-Anne era um inferno de muito assustadora.
A suíte da rainha era generosa. Eu nunca tinha visto nada como isso. O carpete era espesso como uma pele de ovelha, e ele era branco sujo. Os móveis eram estofados em tons de dourado e azul escuro. A placa obliqua de vidro que fechava a parede de dentro era opaca. Eu tinha que dizer, a grande parede de escuridão fez me sentir inquieta.
No centro desse esplendor, Sophie-Anne estava sentada enroscada no sofá. Pequena e extremamente pálida, com seu brilhante cabelo castanho apertado num coque, a rainha estava usando terno de seda cor de framboesa com bordas pretas e saltos pretos de crocodilo. Suas jóias eram em grande quantidade, ouro, e simples.
Sophie-Anne poderia parecer mais apropriada à sua idade vestindo a linha de roupas L.A.M.B de Gwen Stefani. Ela morreu como humana quando ela tinha talvez quinze ou dezesseis anos. Em seu tempo, isso poderia ter feito dela uma mulher e mãe totalmente crescida. No nosso tempo, isso poderia ter feito dela um rato de shopping. Para olhos modernos, suas roupas eram muito adultas para ela, mas teria que ser uma pessoa maluca para lhe dizer. Sophie-Anne era a adolescente mais perigosa do mundo, e o segundo mais perigoso estava atrás dela. Andre estava de pé exatamente atrás de Sophie-Anne, como sempre. Quando ele me deu um olhar meticuloso, e a porta se fechou atrás de mim, ele na realidade se sentou ao lado de Sophie-Anne, o que foi uma espécie de sinal que eu era um membro do clube, eu acho. Andre e sua rainha estavam bebendo TrueBlood, e eles pareciam rosados com o resultado - quase humanos, de fato.
— Como são suas acomodações? — Sophie-Anne perguntou educadamente
— Agradável. Eu estou dividindo o quarto com uma... namorada de Gervaise, — eu disse.
— Com Carla? Por quê? — Suas sobrancelhas se levantaram como aves escuras no céu claro.
— O hotel está lotado. Isso não é nada de mais. Eu acredito que ela ficará com Gervaise a maior parte do tempo, de qualquer maneira, — eu disse.
Sophie-Anne disse, — O que você achou do Johan?
Eu podia sentir meu rosto enrijecer. — Eu acho que ele pertence a cadeia.
— Mas ele vai me manter fora dela.
Eu tentei imaginar como uma cadeia para vampiro deveria ser, desisti. Eu não poderia dar a ela nenhuma reposta positiva sobre Johan, então eu apenas fiz que sim com a cabeça.
— Você ainda não está me falando o que você captou dele.
— Ele está muito tenso e ambivalente.
— Explique.
— Ele está ansioso. Ele está assustado. Ele está lutando com diferentes lealdades. Ele só quer sair vivo. Ele não se importa com qualquer um a não ser nele mesmo.
— Então o que faz dele diferente de qualquer outro humano? — Andre criticou.
Sophie-Anne respondeu com um movimento de um dos lados da sua boca. Esse Andre, que comediante.
— A maioria dos humanos não apunhalam as mulheres, — eu disse tão calmamente e tranquilamente como eu pude. — A maioria dos humanos não apreciam isso.
Sophie-Anne não estava completamente indiferente à morte violenta que Johan Glassport havia cometido, mas naturalmente ela estava um pouco mais preocupada com a sua própria defesa legal. Ao menos, foi como eu li dela, mas com vampiros, eu tenho que ir pela sutil linguagem corporal ao invés do verdadeiro conhecimento de dentro de seus cérebros. — Ele vai me defender, eu vou pagá-lo, e então ele estará por conta própria, — ela disse. — Qualquer coisa pode acontecer com ele depois. — Ela me deu um olhar perspicaz.
Tudo bem, Sophie-Anne, eu entendi totalmente.
— Ele te questionou a fundo? Você sentiu que ele sabia o que estava fazendo? — Ela perguntou, voltando a coisa importante.
— Sim, senhora, — eu disse prontamente. — Ele me pareceu ser bastante competente.
— Então ele vai valer a pena.
Eu nem sequer deixei meus olhos pestanejarem.
— Cataliades te disse o que esperar?
— Sim, senhora, ele disse.
— Excelente. E assim como o seu testemunho no julgamento, eu preciso que você me acompanhe em cada reunião que inclua humanos.
Isto foi o porquê dela estar me pagando bem.
— Ah, você tem alguma programação das reuniões? — eu perguntei — É só, eu estaria pronta e a serviço se eu tivesse alguma idéia da hora que você precisar de mim.
Antes que ela pudesse responder, houve uma batida na porta. Andre se levantou e se moveu para responder a porta tão polido e fluido que eu poderia jurar que ele era uma parte gato. Sua espada estava na sua mão, embora eu não tivesse a visto antes. A porta abriu um pouco da mesma forma que Andre a alcançou, e eu ouvi Sigebert murmurar.
Após eles trocarem algumas palavras, a porta se abriu mais, e Andre disse, — O rei do Texas, minha senhora. — Havia apenas um indício de surpresa na sua voz, mas isso era o suficiente para Andre fazer piruetas de lado a lado pelo tapete. Essa visita era uma demonstração de apoio para Sophie-Anne, e todos os outros vampiros notariam.
Stan Davis entrou, puxando um grupo de vampiros e humanos.
Stan era o nerd dos nerds. Ele era um tipo de cara que você percebe um protetor de bolso. Você poderia ver as marcas do pente no seu cabelo cor de areia, e seus óculos eram pesados e grossos. Eles eram um tanto quanto desnecessário. Eu nunca conheci um vampiro que não tivesse uma visão excelente e uma audição precisa. Stan estava usando uma camisa branca que não necessitava ser passada com o logotipo da Sears e uma calça azul marinho da Dockers. E moccassins de couro marrom. Ai, meus Deus. Ele tinha sido o xerife quando eu o conheci, e agora ele era um rei, ele estava mantendo a mesma abordagem comedida.
Atrás de Stan veio o seu sargento pela lei e ordem, Joseph Velasquez. Um pequeno, corpulento hispânico com cabelos espetados, Joseph nunca parecia sorrir. Ao seu lado estava uma mulher com cabelo vermelho chamada Rachel; eu me lembrava dela, também, da minha viagem a Dallas. Rachel era uma selvagem, e ela não gostava de cooperar com humanos muito menos. Seguindo os dois estava Barry o Mensageiro, parecendo bem em jeans de marca e uma camiseta de seda cinza, um discreto colar de ouro ao redor do seu pescoço. Barry amadureceu de uma maneira assustadora desde da última vez que eu o tinha visto. Ele tinha sido um bonito menino desajeitado de talvez dezenove anos quando eu o tinha encontrado trabalhando como mensageiro no Hotel Silent Shore em Dallas. Agora Barry tinha feito as unhas, tinha um bom corte de cabelo, e os olhos cautelosos de alguém que vinha nadando em uma piscina com tubarões.
Nós sorrimos um para o outro, e Barry disse, Bom ver você. Você está linda, Sookie.
Obrigada, e eu digo o mesmo, Barry.
Andre estava representando a coisa das saudações vampíricas apropriadas, o qual não incluía aperto de mão. — Stan, nós temos o prazer de ver você. Quem você trouxe para nos conhecer? —
Stan gentilmente beijou a mão de Sophie-Anne. — A mais bela rainha — ele disse. — Esse vampiro é meu segundo subordinado, Joseph Velasquez. E essa vampira é sobrinha da minha irmã Rachel. Esse humano é o telepata Barry Bellboy. Indiretamente, eu tenho que agradecer você por ele.
Sophie-Anne simplesmente sorriu. Ela disse, — Claro, eu estou sempre contente de fazer qualquer tipo de favor que esteja ao meu alcance por você, Stan— Ela gesticulou para ele se sentar na frente dela. Rachel e Joseph tomaram posições flanqueadas. — É tão bom ver você aqui na minha suíte. Eu estive preocupada de que eu não teria qualquer visita em hipótese nenhuma. — (‚Já que eu estou sob acusação por matar meu marido, e já que eu tive também um golpe econômico assombroso‛, estava no subtexto.)
— Eu estendo minhas simpatias a você, — Stan disse com uma completa inflexão na voz. — As perdas em seu país devem ter sido extremas. Se nós pudermos ajudar... eu sei que os humanos do meu estado tem ajudado vocês, e é justo que os vampiros façam o mesmo.
— Obrigada pela sua bondade, — ela disse. O orgulho de SophieAnne estava ferido de modo significativo. Ela teve que lutar para colocar aquele sorriso de volta no seu rosto. — Eu acredito que você conhece o Andre— , ela continuou. — Andre, agora você conhece o Joseph. E eu acredito que todos vocês conhecem a nossa Sookie.
O telefone tocou, e visto que eu estava perto dele, eu o atendi.
— Eu estou falando com um membro da comitiva da rainha da Louisiana? — a voz brusca perguntava.
— Sim, você está.
— Um de vocês precisa descer para o compartimento de carga e pegar uma mala que pertence a sua comitiva. Nós não podemos ler a etiqueta.
— Oh... ok.
— Quanto mais cedo melhor.
— Tudo bem.
Ele desligou. Certo, isso foi um pouco rude.
Como a rainha estava esperando para que eu dissesse a ela quem havia ligado, eu relatei a solicitação, e ela pareceu igualmente perplexa por alguns milésimos de segundo. — Mais tarde, — ela disse sem interesse.
Entretanto, o luminoso olhar do rei do Texas estava focado em mim como raios lasers. Eu inclinei a minha cabeça pra ele, o qual eu imaginei ser a resposta correta. Isso parecia adequado. Eu gostaria de ter tido tempo de ter passado o protocolo com o Andre antes que a rainha recebesse convidados, mas sinceramente, eu não tinha esperado que houvesse qualquer um, muito menos um cara poderoso como Stan Davis. Isso tinha que significar algo bom para a rainha, ou talvez fosse um sutil insulto do vampiro. Eu estava certa que iria descobrir.
Eu senti a cócega do Barry na minha mente. Ela é boa para se trabalhar? Barry perguntou
Eu apenas a ajudo de vez em quando, eu respondi. Eu ainda tenho o meu emprego fixo.
Barry me olhou com surpresa. Você está brincando?Você poderia faturar bem, se você fosse a um bom estado como Ohio ou Illinois onde eles têm muito dinheiro.
Eu encolhi meus ombros. Eu gosto onde eu moro, eu disse.
Então nos dois nos demos conta que nossos vampiros empregadores estavam assistindo nossa troca silenciosa. Nossos rostos estavam mudando de expressão, eu acho, como os rostos fazem durante uma conversa... exceto que nossa conversa tinha sido silenciosa.
— Desculpe-me, — eu disse. — Eu não queria ser grosseira. Eu apenas não vejo pessoas como eu muito frequentemente, e é um tipo de convite falar com outro telepata. Eu peço desculpas, senhora, senhor.
— Eu quase consegui ouvir, — Sophie-Anne disse maravilhada. — Stan, ele tem sido muito útil? — Sophie-Anne podia falar com as suas crias mentalmente, mas isso era uma rara habilidade entre os vampiros tanto quanto era entre os humanos.
— Muito útil, — Stan confirmou — O dia que sua Sookie o trouxe a minha atenção, foi um dia muito bom para mim. Ele sabe quando os humanos estão mentindo; ele sabe quais são seus motivos ocultos. Isso é uma percepção maravilhosa.
Eu olhei para Barry, perguntando se ele pensava em si mesmo como um traidor da raça humana ou apenas como um fornecedor de prestação de bem necessário. Ele encontrou meu olhar, com sua face inflexível. Claro, ele estava em conflito sobre servir um vampiro, revelando segredos humanos ao seu patrão. Eu brigo comigo mesma com essa idéia de vez em quando.
— Hmmm. Sookie somente trabalha pra mim em algumas ocasiões, — Sophie-Anne estava me encarando, e se eu pudesse caracterizar o humor no seu rosto, eu poderia dizer que ela estava pensativa, Tinha mais alguma coisa acontecendo atrás da fachada adolescente caracterizada do seu Andre, e isso era algo que eu tinha que me precaver. Ele não estava apenas pensativo, ele estava interessado; compromissado, por falta de uma descrição melhor.
— Bill a levou para Dallas, — Stan observou, não formulando uma pergunta absolutamente.
— Ele era seu protetor à época, — Sophie-Anne disse.
Um breve silêncio. Barry me olhou de rabo de olho, esperançoso, e eu dei a ele um olhar de — em seus sonhos— . Na verdade, me senti como se o estivesse abraçando, já que um pequeno diálogo quebrou o silêncio em algo que eu poderia controlar.
— Vocês realmente precisam de mim e do Barry aqui, já que nós somos os únicos humanos, e não me parece sermos tão produtivos se nós somente nos sentarmos sem fazer nada e lermos nossas mentes?
Joseph Velasquez na realidade riu antes que ele pudesse conter-se.
Depois de um momento de silêncio, Sophie-Anne assentiu com a cabeça, e depois Stan. A rainha Sophie e o rei Stan, recordei a mim mesma. Barry se inclinou de uma maneira respeitosa, e eu me senti como se estivesse mostrando a minha língua pra ele. Eu fiz uma espécie de reverência e então corri a passos curtos da suíte. Sigebert nos olhou com uma cara questionadora — A rainha, ela não precisa de você? — ele perguntou.
— Não neste momento, — eu disse. Dei uma leve batidinha num pager que o Andre havia me dado no último minuto. — O Pager irá vibrar se ela precisar de mim, — eu disse.
Sigebert espiou o aparelho com desconfiança. — Eu acho que seria melhor se você ficasse aqui, — ele disse.
— A rainha, ela disse que eu posso ir, — eu disse pra ele.
E então eu parti, Barry logo atrás de mim. Nós pegamos o elevador e descemos para o saguão, onde nós achamos um canto isolado onde ninguém poderia se aproximar de nós às escondidas para bisbilhotar.
Eu nunca tinha conversado com alguém somente com a minha mente, e nem o Barry, então nós nos divertimos por algum tempo. Barry me contava a história da sua vida enquanto eu tentava bloquear os outros cérebros ao meu redor; portanto eu tentava escutar todos e o Barry também. Isso foi muito divertido.
Barry resultou ser melhor que eu em escolher quem estava pensando o quê na multidão. Eu fui um pouco melhor em ouvir nuances e detalhes, nem sempre é fácil pegar os pensamentos. Mas tivemos um denominador comum.
Nós concordamos quais eram os melhores transmissores no aposento; quero dizer, nossa — audição— era a mesma. Ele apontou alguém (e nesse caso foi minha companheira de quarto, Carla) e nós ouvimos os pensamentos dela, e então os avaliamos numa escala de um a cinco, cinco sendo o mais alto, transmissão clara. Carla era um três. Após esse entendimento, nós classificamos outras pessoas, e nos descobrimos reagindo quase como um só.
Ok, isso foi interessante
Vamos tentar nos tocando, eu sugeri
Barry não me olhou de maneira lasciva. Ele estava nisso comigo. Mas sem demorar, ele pegou a minha mão, e nós encaramos de frente em direções opostas.
As vozes vieram muito claramente, era como se tivesse um autofalante na conversa de todos no aposento, todos de uma vez. Semelhante a aumentar o volume de um DVD, com o agudo e o grave perfeitamente balanceados. Isso era excitante e assustador, tudo de uma vez. Embora eu estivesse encarando a mesa da recepção, eu ouvia claramente uma mulher perguntando sobre a chegada dos vampiros da Louisiana. Eu percebi minha própria imagem no cérebro do recepcionista, que estava sentindo prazer em falar mal de mim.
Aí vem problema, Barry me avisou.
Eu me virei e vi uma vampira avançando em minha direção com uma expressão não muito agradável no seu rosto. Ela tinha incríveis olhos cor de avelã e lisos cabelos castanhos claros, e ela era magra e de tamanho médio.
— Finalmente, alguém da comitiva da Louisiana. O resto de vocês estão escondidos? Diga a sua cadela puta promíscua que eu irei pregar o couro dela na parede! Ela não vai a lugar nenhum por ter assassinado meu rei! Eu vou vê-la estaqueada e exposta ao sol no telhado desse hotel!
Eu disse a primeira coisa que veio na minha cabeça, infelizmente. — Guarde o drama para sua mamãe, — eu disse a ela, como se tivesse mais ou menos onze anos. — E além disso, quem diabos é você?
Claro, ela deveria ser Jennifer Cater. Eu comecei a dizer a ela que o caráter do seu rei tinha sido realmente de muito baixo nível, mas eu gostava da minha cabeça exatamente no seu lugar, acima dos meus ombros, e não tomaria muito para essa menina incliná-la sobre o precipício.
Ela daria um legítimo olhar furioso, se eu tivesse dito aquilo pra
ela.
— Te drenarei até você secar, — ela disse, cruelmente. Nós estávamos atraindo uma certa quantidade de atenção, depois disso.
— Ooooo, — eu disse exasperada além da sensatez. — Eu estou muito assustada. Não amaria o tribunal ouvir você dizer isso? Corrija-me se eu estiver errada, mas os vampiros não são advertidos por — oh, sim — a lei de ameaçar os humanos com a morte, ou apenas li isso errado?
— Como se eu desse muita atenção para as leis humanas, — Jennifer Cater disse, mas o fogo estava morrendo dos seus olhos quando ela se deu conta que todo o saguão estava ouvindo nossa conversa, incluindo vários humanos e possivelmente alguns vampiros que adorariam vê-la fora do caminho.
— Sophie-Anne Leclerq será julgada pelas leis da nossa gente, — Jennifer disse como um disparo. — E ela será condenada. Eu terei Arkansas, e o farei grande.
— Esse será o primeiro, — eu disse com alguma justificativa. Arkansas, Louisiana e Mississippi eram três estados pobres amontoados juntos, muito para nossa mortificação mútua. Ficamos todos gratos uns aos outros, porque nós temos que nos revezar na parte inferior de quase toda lista nos Estados Unidos: nível de pobreza, gravidez na adolescência, morte por câncer, analfabetismo... Nós estamos bastante rodados na boa reputação.
Jennifer marchou para longe, sem querer tentar um retorno. Ela estava determinada, e ela era malévola, mas eu achei que Sophie-Anne poderia dominar Jennifer qualquer dia. Se eu fosse uma mulher apostadora, eu colocaria meu dinheiro no pônei Francês.
Barry e eu encolhemos os ombros. Incidente acabado. Nós juntamos nossas mãos novamente.
Mais problemas, Barry disse, parecendo conformado
Eu foquei meu cérebro onde ele estava indo. Eu ouvi um homemtigre dirigindo-se a nós com muita, muita pressa.
Eu deixei a mão do Barry cair e me virei, deixei meus braços preparados e coloquei um sorriso no rosto. — Quinn! — eu disse, e depois de algum momento onde ele parecia muito indeciso, Quinn me balançou em seus braços.
Eu o abracei tão forte quanto eu pude, e ele devolveu o abraço tão energicamente que minhas costelas estalaram. Então ele me beijou, e isso requereu toda a minha força de caráter para manter o beijo num limite social.
Quando nos separamos para respirar, eu percebi que Barry esperando sem jeito a alguns centímetros de distância, não certo do que fazer.
— Quinn, esse é Barry Bellboy, — eu disse, tentando não me sentir envergonhada — Ele é o único telepata que eu conheço. Ele trabalha para Stan Davis, o rei do Texas.
Quinn estendeu a mão para o Barry, o qual agora eu percebi que estava esperando sem jeito por alguma razão. Nós tínhamos transmitido um pouco explicitamente demais. Eu senti uma maré vermelha sobre minhas bochechas. A melhor coisa a fazer era fingir que eu não tinha reparado, é claro, e foi isso que eu fiz. Mas eu pude sentir um pequeno sorriso aparecendo bruscamente nos cantos da minha boca, e Barry pareceu mais divertido que bravo.
— Prazer em te conhecer Barry, — Quinn retumbou.
— Você é o que está responsável pelos arranjos da cerimônia? — Barry perguntou.
— Sim, esse sou eu.
— Eu ouvi sobre você, — Barry disse. — O grande lutador. Você realmente é um representante entre os vampiros, cara.
Eu ergui minha cabeça. Alguma coisa eu não estava entendendo aqui. — Grande lutador? — eu disse.
— Eu vou te contar sobre isso mais tarde, — Quinn disse, e sua boca tinha uma linha enrijecida.
Barry olhou de mim para o Quinn. Seu próprio rosto estava com algum enrijecimento, eu estava surpresa de ver tanta tenacidade no Barry. — Ele não te contou? — ele perguntou, e então eu li a resposta diretamente na minha cabeça. — Ei, cara, isso não está certo, — ele disse ao Quinn — Ela deveria saber.
Quinn quase resmungou. — Eu irei contar para ela em breve.
— Em breve? — os pensamentos de Quinn estavam cheios de turbilhão e violência. — Como agora?
Mas nesse momento, uma mulher caminhou a grandes passos pelo saguão em nossa direção. Ela era uma das mulheres mais aterrorizantes que eu já tinha visto, e eu já tinha visto algumas mulheres horripilantes. Ela tinha provavelmente um metro e setenta e três, com cachos negros que envolviam a sua cabeça, e ela estava segurando um escudo em seu braço. Isso combinava com a sua armadura. A armadura por si só, preta e sem brilho, era como um traje de um receptor de baseball: um protetor de peito, protetores de coxas e protetores de canelas, com a adição de uma grossa braçadeira de couro que enfaixava os antebraços. Ela tinha algumas botas pesadas também, e ela carregava uma espada, uma arma, e uma pequena balestra adornada adequadamente sobre seu coldre.
Eu somente pude ficar de boca aberta.
— Você é o que eles chamam de Quinn? — ela perguntou, detendo-se no meio do caminho. Ele tinha um sotaque pesado, um que eu não podia identificar.
— Eu sou, — Quinn disse. Eu percebi que Quinn não parecia tão espantado quanto eu estava com a aparição desse ser letal.
— Eu sou Batanya. Você está encarregado dos eventos especiais. Isso não inclui a segurança? Eu gostaria de discutir as necessidades especiais do meu cliente.
— Eu achei que a segurança fosse o seu trabalho, — Quinn disse.
Batanya sorriu, e isso poderia ter feito o seu sangue gelar. — Oh, sim, esse é o meu trabalho. Mas protegê-lo seria mais fácil se...
— Eu não estou encarregado da segurança, — ele disse. — Eu estou encarregado apenas nos procedimentos e dos rituais.
— Tudo bem, — ela disse, o seu sotaque fazendo uma frase casual parecer séria. — Então com quem eu deveria falar?
Um cara chamado Todd Donati. Seu escritório está na área dos funcionários atrás do balcão de registro. Um dos recepcionistas pode te mostrar.
— Com licença, — eu disse.
— Sim? — Ela olhou para baixo e dirigiu um nariz certinho pra mim. Mas ela não parecia hostil ou esnobe, apenas preocupada.
— Eu sou Sookie Stackhouse, — eu disse. — Para quem você trabalha, Senhorita Batanya?
— O Rei de Kentucky, — ela disse. — Ele nos trouxe aqui com um grande gasto. Então é uma pena que aqui não tenha nada que eu possa fazer para impedir que ele seja morto, tal como estão as coisas agora.
— O que você quer dizer com isso? — Eu estava bastante alarmada e assombrada.
A guarda-costas pareceu que iria me dar uma resposta completa, mas nós fomos interrompidos.
— Batanya! — Um vampiro jovem estava correndo através do saguão, seu corte de cabelo estilo militar e conjunto gótico todo preto parecendo todo frívolo quando ele permaneceu parado em frente a mulher formidável. — O mestre disse que ele precisa de você ao seu lado.
— Eu estou indo, — Batanya disse. — Eu conheço meu lugar. Mas eu tinha que protestar pela maneira que o hotel está tornando o meu trabalho mais difícil do que precisava ser.
— Queixe-se por sua própria conta, — o jovem disse sumariamente.
Batanya deu a ele uma olhada que eu não gostaria de ter merecido. Então ela nos saudou, cada um por vez. — Senhorita Stack-house, — ela disse, estendendo sua mão para eu apertá-la. Eu não tinha imaginado que mãos poderiam ser caracterizadas como musculosas. — Senhor Quinn. — Quinn apertou a mão também, enquanto Barry obteve uma inclinação da cabeça, uma vez que ele não havia sido apresentado. — Eu vou chamar esse Todd Donati. Desculpa se eu ocupei seus ouvidos, quando isso não é da sua responsabilidade.
— Uau, — eu disse, observando Batanya ir embora. Ela estava usando calças parecidas com couro líquido, e você podia ver cada nádega contraindo e relaxando com o movimento dela. Foi como uma lição de anatomia. Ela tinha músculos no seu bumbum.
— De que galáxia ela veio? — Barry perguntou, soando deslumbrado.
Quinn disse , — Não de uma galáxia. De uma dimensão. Ela é uma Britlingen.
Nós esperamos por mais explicações.
— Ela é uma guarda-costas, uma super guarda-costas, — ele explicou. — Britlingens são os melhores. Você tem que ser realmente muito rico para contratar uma bruxa que possa trazer um deles, e a bruxa tem que negociar os termos com a associação deles. Quando o trabalho está terminado, a bruxa tem que mandá-los de volta. Você não pode deixá-los aqui. As leis deles são diferentes. Métodos diferentes.
— Você está me dizendo que o Rei do Kentucky paga rios de dinheiro pra trazer essa mulher para essa... essa dimensão? — Eu já tinha ouvido várias coisas inacreditáveis no decorrer de dois anos, mas essa foi a maior de todas.
— Isso é uma ação muito extrema. Eu me pergunto do que ele tem tanto medo. Kentucky não está exatamente rolando em dinheiro.
— Talvez ele aposte no cavalo certo, — eu disse, já que eu tinha minha própria realeza para me preocupar. — E eu preciso falar com você.
— Benzinho, eu tenho que voltar ao trabalho, — Quinn disse se desculpando. Ele lançou um olhar nada amigável ao Barry. — Eu sei que nós precisamos conversar. Mas eu tenho que organizar os jurados para o julgamento, e eu tenho que arrumar uma cerimônia de casamento. As negociações entre o Rei de Indiana e o Rei do Mississippi devem ser concluídas, e eles querem se unir enquanto todos estiverem aqui.
— Russell está se casando? — Eu sorri. Eu me perguntei se ele seria a noiva ou o noivo, ou um pouco de ambos.
— Sim, mas não diga a ninguém ainda. Eles vão anunciar esta
noite.
— Então quando nós vamos conversar?
— Eu vou aparecer no seu quarto quando os vampiros forem para a cama durante o dia. Onde você está?
— Eu tenho uma companheira de quarto, — Eu dei a ele o número de qualquer forma.
— Se ela estiver lá, nós iremos nos encontrar em outro lugar, — ele disse, dando uma espiada no seu relógio. — Escuta, não se preocupe; está tudo bem.
Eu me perguntei com o que eu deveria me preocupar. Eu me perguntei onde a outra dimensão estaria, e como difícil deveria ser para trazer os guarda-costas de lá. Eu me perguntei porque alguém poderia gastar tanto. Não que Batanya não parecesse eficaz pra cacete; mas o esforço extremo pelo que Kentucky tinha passado, isso com certeza parecia algo de extremo medo. Quem estava atrás dele?
Minha cintura vibrou, e eu percebi que eu estava sendo chamada de volta para a suíte da rainha. O pager do Barry disparou, também. Nós nos olhamos.
De volta ao trabalho, ele disse, enquanto que nós fomos para o elevador. Me desculpe se eu causei problemas entre você e o Quinn.
Você não pretendia.
Ele me deu uma olhadela. Ele tinha o decoro de parecer envergonhado. Eu acho que não. Eu tinha uma imagem construída de como seria você e eu juntos, e Quinn tipo se intrometeu na minha vida fantasiada.
Ah... ah.
Não se preocupe - você não tem que pensar em algo para dizer. Isso foi uma daquelas fantasias. Agora que eu estou realmente com você, eu tenho que me ajustar.
Ah.
Mas eu não deveria ter deixado o meu desapontamento me fazer parecer um idiota.
Ah. Ok. Eu estou certa que o Quinn e eu podemos consertar isso.
Então, eu mantive a fantasia oculta pra você, hein?
Eu assenti com a cabeça vigorosamente.
Bem, pelo menos isso é algo especial.
Eu sorri para ele. Todo mundo tinha direito de ter uma fantasia, eu disse a ele. Minha fantasia é descobrir onde Kentucky conseguiu esse dinheiro, e quem ele contratou para trazer essa mulher aqui. Ela não foi a coisa mais horripilante que você já viu?
Não, Barry respondeu, para a minha surpresa. A coisa mais assustadora que eu já vi... bem, não foi Batanya. E então ele bloqueou a porta de comunicação entre nossos cérebros e jogou a chave fora. Sigebert estava abrindo a porta para a suíte da rainha, e estávamos de volta ao trabalho.
Depois que Barry e sua comitiva partiu, eu de certo modo agitei minha mão no ar para que a rainha soubesse que eu tinha algo a dizer se ela quisesse ouvir. Ela e Andre estiveram discutindo sobre a motivação de Stan em recompensar pela significante visita, e eles pararam em posições idênticas. Isso foi muito estranho. Suas cabeças estavam inclinadas no mesmo ângulo, com suas palidez extrema e quietude, isso era como ser apreciada por obras de artes esculpidas em mármore: a Ninfa e o Sátiro em repouso, ou algo como isso.
— Vocês sabem o que são Britlingens? — eu perguntei, tropeçando com a palavra pouco familiar.
A rainha afirmou com a cabeça. Andre apenas esperou.
— Eu vi uma, — eu disse, e a cabeça da rainha se sacudiu.
— Quem gastou tanto para contratar uma Britlingen? — Andre perguntou.
Eu contei a eles toda a história.
A rainha parecia - bem, é difícil dizer como ela se parecia. Talvez um pouco preocupada, talvez intrigada, uma vez que eu havia juntado muitas informações no saguão.
— Eu nunca soube o quão útil seria encontrar uma, tendo uma empregada humana, — ela disse para Andre. — Outros humanos dirão qualquer coisa ao redor dela, e até a Britlingen falou livremente.
Andre ficou possivelmente um bocadinho ciumento se o olhar em seu rosto fosse uma indicação.
— Por outro lado, eu não posso fazer uma mínima coisa sobre nada disso, — eu disse. — Eu apenas posso te dizer o que eu ouvi, e isso dificilmente é uma informação secreta.
— Onde Kentucky conseguiu o dinheiro? — Andre perguntou.
A rainha balançou sua cabeça, como se estivesse dizendo que ela não tinha nenhuma pista e realmente não se interessava sobre isso. — Você viu Jennifer Cater? — ela me perguntou.
— Sim, senhora.
— O que ela disse? — perguntou Andre.
— Ela disse que vai beber meu sangue, e ela verá você estaqueada e exposta ao sol no telhado do hotel.
Ouve um momento de silêncio absoluto.
Então Sophie-Anne disse, — Estúpida Jennifer. Qual é aquela frase que o Chester costumava usar? Ela cresce muito para as suas calças. O que fazer...? Eu me pergunto se ela aceitaria uma mensagem minha?
Ela e Andre se olharam instantaneamente, eu resolvi que eles estavam tendo uma pequena comunicação telepática.
— Eu acredito que ela está na suíte reservada para a comitiva do Arkansas, — a rainha disse ao Andre, e ele pegou o telefone interno e ligou para a mesa da recepção. Essa não foi a primeira vez que eu ouvi o rei ou a rainha de um estado referindo a si mesmos como o próprio estado, mas pareceu uma forma impessoal de se referir ao seu falecido marido, sem importar de como violento tenha acabado o casamento.
— Sim, — ele disse após desligar.
— Talvez nós devêssemos pagar-lhe uma visita, — a rainha disse. Ela e Andre entregaram-se a algum tipo de silêncio dinâmico que era a maneira deles conversarem. Provavelmente como assistir eu e Barry, eu calculei. — Ela vai nos admitir, eu tenho certeza. Existirá algo que ela quer dizer pra mim pessoalmente. — A rainha pegou o telefone, mas não como se fosse algo que ela fizesse todo dia. Ela discou o número do quarto com seus próprios dedos, também.
— Jennifer, — ela disse de forma charmosa. Ela escutou uma avalanche de palavras que eu pude ouvir só um pouco. Jennifer não soava de qualquer forma mais contente do que quando ela esteve no saguão.
— Jennifer, nós precisamos conversar. — A rainha soou muito mais charmosa e um pouco mais obstinada. Houve um silêncio do outro lado da linha. — As portas não estão fechadas a discussões ou negociações, Jennifer, — Sophie-Anne disse — Ao menos, minhas portas não estão. E as suas? — Eu acho que a Jennifer falou novamente. — Tudo bem, isso é maravilhoso, Jennifer. Nós vamos descer em um minuto ou dois. — A rainha desligou e permaneceu em silêncio por um longo momento.
Pareceu-me que ir visitar Jennifer Cater, quando ela estava apresentando uma ação judicial contra a rainha Sophie-Anne por assassinar Peter Threadgill, era uma péssima idéia. Mas Andre acenou a cabeça com apoio à Sophie-Anne.
Após a conversa de Sophie-Anne com sua arqui-inimiga, eu pensei que nos encaminharíamos ao quarto do grupo de Arkansas qualquer momento. Mas talvez a rainha não estivesse tão segura quanto ela parecia. Ao invés de pôr-se em marcha rapidamente para o confronto com Jennifer Cater, Sophie-Anne perdeu tempo. Ela se deu um tempo extra se arrumando, trocando os sapatos, procurando em volta pela sua chave do quarto, e assim por diante. Logo ela recebeu uma chamada telefônica sobre as despesas do serviço de quarto dos humanos de seu grupo se podiam ser colocadas na conta do quarto. Assim se foram mais de quinze minutos antes que nós conseguíssemos sair do quarto. Sigebert estava saindo da porta da escada, e ele se uniu a Andre pela espera do elevador.
Jennifer Cater e sua comitiva estavam no sétimo andar. Não tinha ninguém na frente da porta do seu quarto. Eu supus que ela não tinha seu próprio guarda-costas. Andre fez as honras de bater na porta, e SophieAnne endireitou-se esperançosamente. Sigebert ficou atrás me dando um sorriso inesperado. Eu tentei não hesitar.
A porta se abriu. O interior da suíte estava escuro.
O cheiro que flutuou através da porta era inconfundível.
— Bem, — disse a rainha da Louisiana rapidamente. — Jennifer está morta.
— VÁ OLHAR, — a rainha me disse.
— O quê? Mas todos vocês são mais fortes que eu! E menos assustados!
— E somos nós aqueles que ela está processando, — destacou Andre. — O nosso cheiro não pode estar lá. Sigebert, você deve ir ver.
Sigebert deslizou na escuridão.
Uma porta no outro lado entre os lances da escada abriu, e Batanya saiu.
— Sinto cheiro de morte, — disse ela. — O que aconteceu?
— Nós ligamos antes de vir, — eu respondi. — Mas a porta já estava aberta. Algo está errado lá dentro.
— Você não sabe o quê é?
— Não, Sigebert está explorando, — expliquei. — Nós estamos esperando.
— Deixe-me chamar a minha segunda. Não posso deixar a porta de Kentucky desprotegida. — Ela se virou para retornar uma chamada para a suíte, — Clovache! — Pelo menos, eu acho que foi soletrado dessa forma, foi pronunciado ‚Kloh-VOSH‛. Uma espécie de Batanya Júnior surgiu - a mesma armadura, mas em menor escala; mais jovem, de cabelos castanhos, menos aterradora... mas ainda abundantemente formidável.
— Explore o lugar, — Batanya ordenou, e sem uma única pergunta Clovache puxou sua espada e se moveu na direção do apartamento como um sonho perigoso.
Todos nós esperamos, segurando nossas respirações - bem, eu estava, de qualquer maneira. Os vampiros não têm respiração para segurar, e Batanya não parecia perturbada em nenhuma hipótese. Ela tinha se movido para um lugar onde ela poderia observar a porta aberta do quarto de Jennifer Cater e a porta fechada do Rei de Kentucky. Sua espada estava desembainhada.
O rosto da rainha parecia quase tenso, talvez até excitado, isto é, um pouco menos inexpressivo do que o habitual. Sigebert saiu e balançou a cabeça sem dizer uma palavra.
Clovache apareceu na porta. — Todos mortos, — ela relatou à Batanya.
Batanya esperou.
— Por decapitação, — Clovache aprimorou. — A mulher estava, hã— Clovache parecia estar contando mentalmente — em seis partes.
— Isso é ruim, — disse a rainha no mesmo momento que Andre disse, — Isso é bom. — Eles trocaram olhares exasperados.
— Algum humano? — Eu perguntei, tentando manter minha voz baixa porque eu não queria a atenção delas, mas eu queria saber, ardentemente.
— Não, todos vampiros, — respondeu Clovache depois que ela recebeu um aceno de Batanya para seguir em frente. — Eu vi três. Eles estão se decompondo muito rápido.
— Clovache, entre e chame aquele Todd Donati. — Clovache entrou silenciosamente na suíte de Kentucky e fez uma ligação, o qual teve um efeito eletrizante. Dentro de cinco minutos, a área em frente ao elevador estava abarrotada com pessoas de todos os tipos, descrições e posições da vida.
Um homem vestindo uma jaqueta marrom com Segurança escrito no bolso parecia estar no comando, então ele deve ser Todd Donati. Ele era um policial que se aposentou cedo por causa do muito dinheiro produzido escoltando e auxiliando os mortos-vivos. Mas isso não queria dizer que ele gostasse deles. Neste momento ele estava furioso que algo tinha acontecido tão cedo na cúpula, algo que poderia causar-lhe mais trabalho do que ele era capaz de lidar. Ele tinha câncer, eu ouvi claramente, embora eu não fosse apta para discernir que tipo. Donati queria trabalhar enquanto ele pudesse para prover sua família depois que ele se for, e ele estava indignado com o stress e tensão que esta investigação iria causar, a energia que seria drenada. Mas ele estava obstinadamente determinado a fazer seu trabalho.
Quando o chefe vampiro de Donati, o gerente do hotel, apareceu, eu o reconheci. Christian Baruch tinha sido capa da Fang (a versão vampiresca da People) alguns meses atrás. Baruch nasceu na Suíça. Como um humano, ele tinha projetado e gerenciado um grupo de hotéis de luxo na Europa Ocidental. Quando ele contou a um vampiro na mesma linha de negócio que se ele fosse — trazido — (não só para a vida de vampiro, mas para a América), ele poderia administrar excelentes e lucrativos hotéis para um sindicato de vampiros, ele foi favorecido em ambos os sentidos.
Agora Christian Baruch tinha a vida eterna (se ele evitar objetos pontiagudos de madeira) e o sindicato de hotéis vampiro estava colecionando dinheiro. Mas ele não era um cara da segurança ou um especialista no cumprimento da lei, e ele não era da polícia. Claro, ele poderia decorar o hotel por nenhuma razão em particular e dizer ao arquiteto quantas suítes precisava de um bar para misturar bebidas, com pia e água corrente, mas que bem ele faria nesta situação? Seu prestador de serviços humano olhou Baruch com cara azeda. Baruch estava vestindo um terno que parecia extraordinariamente maravilhoso, mesmo aos olhos inexperientes como os meus. Eu tinha certeza que o terno tinha sido feito para ele, e eu tinha certeza que tinha custado uma fortuna.
Eu tinha sido empurrada para trás pela multidão até que fui pressionada contra a parede por uma das portas da suíte - de Kentucky, eu percebi. A porta não tinha sido aberta ainda. As duas Britlingens teriam que defender seu protegido com cuidado fora do comum com aquela multidão se aglomerando de maneira confusa. O tumulto era extraordinário. Eu estava ao lado de uma mulher em um uniforme de segurança; era exatamente como uma ex-tira, mas ela não tinha que usar uma gravata.
— Você acha que deixar todas essas pessoas entrarem neste espaço é uma boa idéia? — Eu perguntei. Eu não queria estar informando à mulher sobre seu trabalho, mas merda, ela nunca assistiu CSI?
A mulher da Segurança me deu um olhar sombrio. — O que você está fazendo aqui? — ela perguntou, como se essa fosse a questão mais importante.
— Estou aqui porque eu estava com o grupo que encontrou os corpos.
— Bem, você só precisa ficar em silêncio e nos deixar fazer nosso trabalho.
Ela disse aquilo num tom mais esnobe possível. — Que trabalho seria esse? Você parece estar fazendo absolutamente nada, — eu disse.
Ok, talvez eu não devesse ter dito aquilo, mas ela não estava fazendo nada. Me pareceu que ela deveria ser... e então ela me agarrou à força e me atirou na parede e me algemou.
Eu dei uma espécie de grito de surpresa. — Não era isso o que eu quis dizer que você fizesse realmente, — eu disse com alguma dificuldade, já que meu rosto estava amassado contra a porta da suíte.
Houve um grande silêncio na multidão atrás de nós. — Chefe, eu tenho aqui uma mulher causando problemas, — disse a mulher da Segurança.
O da cor marrom a olhou inspirando temor, a propósito.
— Landry, o que você está fazendo? — Disse uma voz masculina muito razoável. Era o tipo de voz que você usa com uma criança irracional.
— Ela estava me dizendo o que fazer, — contestou a mulher da Segurança, mas eu podia dizer que sua voz foi diminuindo enquanto ela falava.
— O que ela estava dizendo para você fazer, Landry?
— Ela quis saber o que todas as pessoas estavam fazendo aqui, senhor.
— Não é uma pergunta válida, Landry?
— Senhor?
— Você não acha que devemos dispersar algumas dessas pessoas?
— Sim, senhor, mas ela disse que estava aqui porque ela estava no grupo que encontrou os corpos.
— Então ela não deveria sair.
— Certo. Senhor.
— Ela estava tentando sair?
— Não, senhor.
— Mas você a algemou.
— Hã.
— Tire a porra das algemas dela, Landry.
— Sim, senhor. — Landry ficou arrasada na mesma hora, a deixando de todo jeito sem ar.
As algemas saíram, para meu alívio, e eu fui capaz de me virar. Eu estava com tanta raiva que eu poderia ter derrubado Landry. Mas já que eu poderia estar de volta às algemas, me contive. Sophie-Anne e Andre abriram caminho através da multidão; na verdade, a multidão por assim dizer meio que se dissolveu na frente deles. Vampiros e humanos de maneira similar pareciam contentes em sair do caminho da Rainha da Louisiana e de seu guarda-costas.
Sophie-Anne deu uma olhada nos meus pulsos, viu que eles na verdade não ficaram feridos de qualquer modo, e corretamente diagnosticou o fato de que o pior ferimento foi ao meu orgulho.
— Esta é minha funcionária, — Sophie-Anne disse calmamente, aparentemente dirigindo-se à Landry mas se assegurando de que todos ali a ouvia. — Um insulto ou lesão a esta mulher é um insulto ou lesão a mim.
Landry não sabia quem diabos era Sophie-Anne, mas ela podia perceber o poder quando o via, e Andre era quase tão assustador. Eles eram os dois adolescentes mais assustadores do mundo, acredito.
— Sim, senhora, Landry se desculpará por escrito. Agora você pode me dizer o que aconteceu aqui neste instante? — Todd Donati perguntou com uma voz muito razoável.
A multidão ficou em silêncio e esperou. Eu procurei por Batanya e Clovache e vi que elas estavam ausentes. De repente, Andre disse, — Você é o chefe de segurança? — Com uma voz ligeiramente alta, e enquanto ele dizia, Sophie-Anne se inclinou muito perto de mim para dizer, — Não mencione as Britlingens.
— Sim, senhor. — O policial passou a mão sobre seu bigode. — Eu sou Todd Donati, e este é meu patrão, o Sr. Christian Baruch.
— Eu sou Andre Paul, e esta é minha rainha, Sophie-Anne Leclerq. Esta jovem é a nossa funcionária Sookie Stackhouse. — Andre esperou pela próxima etapa.
Christian Baruch me ignorou. Mas ele deu a Sophie-Anne o olhar que eu dei a um assado que eu estava pensando em comprar para o jantar de domingo. — Sua presença é uma grande honra para o meu hotel, — ele murmurou com forte sotaque inglês, e vi de relance as pontas de suas presas. Ele era muito alto, com uma mandíbula larga e cabelos escuros. Mas seus olhos pequenos eram de um cinza ártico.
Sophie-Anne tolerou o elogio, ainda que suas sobrancelhas se juntaram por um segundo. Exibir presas não era exatamente uma forma sutil de dizer, — Você estremece o meu mundo. — Ninguém falou. Bem, nem por um longo, embaraçoso segundo. Então eu disse, — Todos vocês estão indo chamar a polícia, ou o quê?
— Eu acho que devemos considerar o que temos que dizer a eles, — Baruch respondeu com sua voz macia e sofisticada, fazendo graça da minha condição humana-caipira-sulista. — Sr. Donati, você irá ver o que há na suíte?
Todd Donati abriu caminho através da multidão sem sutileza alguma. Sigebert, que esteve vigiando a porta aberta (por falta de coisa melhor para fazer), afastou-se para deixar o humano entrar. O guardacostas enorme se moveu até a rainha, parecendo mais feliz quando ficava perto de sua governante.
Enquanto Donati examinava tudo o que foi deixado na suíte de Arkansas, Christian Baruch se dirigiu para a multidão. — Quantos de vocês vieram aqui depois que ouviram que algo tinha acontecido?
Talvez quinze pessoas levantaram suas mãos ou simplesmente acenaram com a cabeça.
— Vocês por favor dirijam-se ao bar Draft of Blood (Gole de Sangue) no andar térreo, onde os nossos bartenders terão algo especial para todos vocês. — Os quinze se moveram rapidamente depois disso. Baruch conhecia seu povo sedento. Vampiros. O que seja.
— Quantos de vocês não estavam aqui quando os corpos foram descobertos? — Baruch perguntou após que o primeiro grupo tinha saído. Todos levantaram a mão, exceto nós quatro: eu, a rainha, Andre e Sigebert.
— Todo mundo pode se sentir livre para ir, — disse Baruch tão polidamente como se estivesse concedendo um agradável convite.
E eles foram. Landry hesitou e recebeu um olhar que a teria despachado violentamente escadaria abaixo.
A área em torno do elevador central parecia espaçosa agora, já que ela estava muito mais vazia.
Donati retornou. Ele não parecia profundamente perturbado ou enojado, mas ele pareceu menos contido.
— Há apenas pedaços deles separados agora. Existe material por toda parte pelo chão, em todo o caso; resíduos, eu acho que você teria chamado aquilo. Penso que havia três deles. Mas um deles está em tantos pedaços, que poderia ser dois deles.
— Quem está no registro?
Donati se reportou a um aparelho eletrônico de bolso. — Jennifer Cater, de Arkansas. Este quarto foi alugado para a delegação de vampiros de Arkansas. Os vampiros remanescentes de Arkansas.
A palavra remanescente possivelmente recebeu uma ênfase extra. Donati definitivamente sabia do histórico da rainha.
Christian Baruch levantou uma sobrancelha espessa e escura. — Eu conheço minha própria gente, Donati.
— Sim, senhor.
O nariz de Sophie-Anne pode ter enrugado delicadamente com desgosto. Seu próprio povo, o cacete, aquele nariz dizia.
Baruch tinha no máximo quatro anos de idade, como um vampiro.
— Quem entrou para ver os corpos? — Baruch perguntou.
— Nenhum de nós, — respondeu Andre prontamente. — Nós não colocamos os pés na suíte.
— Quem colocou?
— A porta estava destrancada, e sentimos cheiro da morte. Em vista da situação entre minha rainha e os vampiros de Arkansas, nós pensamos que seria insensato ir lá dentro, — respondeu Andre. — Enviamos Sigebert, guarda da rainha.
Andre simplesmente omitiu a exploração de Clovache na suíte. Assim Andre e eu tínhamos algo em comum: nós podíamos contornar a verdade com algo que não era bem uma mentira. Ele fez um trabalho magistral.
Como as perguntas continuaram - em sua maioria sem respostas ou incontestáveis — encontrei-me perguntando se a rainha ainda teria de ir ao julgamento agora que sua principal acusadora estava morta. Gostaria de saber a quem pertencia o estado do Arkansas; era razoável supor que o contrato de casamento tinha dado à rainha alguns direitos relativos às propriedades de Peter Threadgill, e eu sabia que Sophie-Anne precisava de cada pedaço da renda que ela pudesse reclamar, por causa de Katrina. Ela ainda teria esses direitos sobre Arkansas, uma vez que Andre matou Peter? Eu não tinha pensado muito bem o quanto pairava sobre a cabeça da rainha nesta cúpula.
Mas depois que eu terminei de me fazer todas estas perguntas, percebi que o assunto mais imediato ainda tinha que ser tratado. Quem tinha matado Jennifer Cater e seus companheiros? (Quantos vampiros de Arkansas conseguiram partir, depois da batalha em Nova Orleans e ao massacre de hoje? Arkansas não era um estado grande, e tinha poucos centros populacionais.)
Fui chamada de volta para o aqui e agora, quando Christian Baruch capturou meus olhos. — Você é a humana que pode ler mentes, — disse ele tão de repente que dei um solavanco.
— Sim, — eu disse, porque estava cansada de todo esse +++ senhor e senhora‟ .
— Você matou Jennifer Cater?
Eu não tive que fingir surpresa. — Isso é me dar muito crédito, — respondi. — Pensar que eu poderia ter conseguido levar a melhor sobre três vampiros. Não, eu não a matei. Ela veio até mim no saguão esta noite, falando bobagem, mas essa foi a única vez em que eu alguma vez a vi.
Ele parecia um pouco surpreso, como se esperasse outra resposta ou talvez uma atitude mais humilde.
A rainha deu um passo para ficar ao meu lado, e Andre se espelhou no exemplo dela, de modo que eu fiquei delimitada por vampiros antigos. Que sentimento caloroso e acolhedor. Mas eu sabia que eles estavam lembrando ao hoteleiro que eu era a humana especial deles e não devia ser incomodada.
Naquele momento muito oportuno, um vampiro abriu a porta das escadas e se arremessou em direção à suíte da morte. Mas Baruch foi tão rápido que barrou o caminho fazendo com que o novo vampiro ricocheteasse nele para o chão. O pequeno vampiro se levantou em um movimento tão rápido que meus olhos não puderam seguir o movimento e estava fazendo um esforço desesperado para tirar Baruch da frente da porta.
Mas o recém-chegado não pôde, e finalmente ele deu um passo de distância do hoteleiro. Se o vampiro miúdo fosse humano, ele teria ficado ofegante, como se seu corpo sentisse a tremedeira do efeito retardado. Ele tinha cabelos castanhos e uma barba curta, e ele estava vestindo um terno, um comum JCPenney velho. Ele parecia um cara normal até que você visse seus olhos arregalados e percebesse que ele era algum tipo de lunático.
— É verdade? — ele perguntou, sua voz baixa e decidida.
— Jennifer Cater e seus companheiros estão mortos, — respondeu Christian Baruch, não sem compaixão.
O homem pequeno uivou, uivou literalmente, e os pêlos do meu braço se arrepiaram. Ele caiu de joelhos, seu corpo oscilando para frente e para trás num acesso de dor.
— Eu creio que você é um componente do grupo dela? — perguntou a rainha.
— Sim, sim!
— Então agora eu sou sua rainha. Ofereço-te um lugar ao meu lado.
Os uivos cessaram como se tivessem sido cortados por uma tesoura.
— Mas você matou nosso rei, — disse o vampiro.
— Eu fui a esposa de seu rei, e como tal, eu tenho o direito de herdar o seu estado em caso de sua morte, — disse Sophie-Anne, seus olhos escuros parecendo quase benevolentes, quase luminosos. — E ele está incontestavelmente morto.
— É isso que diz as letras minúsculas do contrato, — Sr. Cataliades murmurou no meu ouvido, e eu mal contive um grito de espanto. Eu sempre pensei que o que as pessoas diziam sobre homens grandes que se movem levemente era uma total besteira. Pessoas grandes se movem pesadamente. Mas o Sr. Cataliades caminhou tão levemente quanto uma borboleta, e eu não tinha ideia que ele estava por perto até que falasse comigo.
— No contrato matrimonial da rainha? — Eu consegui dizer.
— Sim, — respondeu ele. — E o advogado de Peter o releu muito a fundo naturalmente. O mesmo se aplica em caso de morte de SophieAnne, também.
— Eu adivinho que havia um monte de cláusulas a respeito?
— Oh, só algumas. A morte tinha que ser testemunhada.
— Oh, meu Deus. Que sou eu.
— Sim, decerto é. A rainha quer você ao alcance de sua vista e sob a sua influência por uma razão muito boa.
— E as outras condições?
— Não poderia haver um segundo em comando vivo para assumir o controle do estado. Em outras palavras, uma grande catástrofe teria que ocorrer.
— E agora ocorreu.
— Sim, parece que ocorreu. — Sr. Cataliades se mostrou muito satisfeito com isso.
Minha mente estava rodando em círculos como uma daquelas gaiolas de arame que lançam números de bingo na feira.
— Meu nome é Henrik Feith, — o pequeno vampiro disse. — E há apenas cinco vampiros que abandonaram Arkansas. Eu sou o único aqui em Rhodes, e só estou vivo porque eu desci para reclamar das toalhas no banheiro.
Tive que pôr uma mão sobre minha boca para não rir, o que teria sido, digamos, inapropriado. O olhar de Andre permaneceu fixo no homem ajoelhado diante de nós, mas de alguma forma sua mão vagou e me deu um beliscão. Depois disso foi fácil não rir. Na verdade, foi difícil não berrar.
— O que havia de errado com as toalhas? — Perguntou Baruch, desviando completamente do assunto por essa calúnia contra o seu hotel.
— Jennifer usou três sozinha, — Henrik começou a explicar, mas esse desvio fascinante foi encurtado quando Sophie-Anne disse, — Basta. Henrik, você vem conosco para minha suíte. Sr. Baruch, estamos aguardando ansiosamente receber suas atualizações sobre esta situação. Sr. Donati, você pretende chamar a polícia de Rhodes?
Foi educado da parte dela se dirigir ao Donati como se ele na prática tivesse uma declaração para o que foi feito. Donati respondeu, — Não, senhora, isso para mim parece ser uma questão entre vampiros. Visto que não há corpo para examinar, não há nenhuma imagem uma vez que não há câmera de segurança na suíte, e se você olhar para cima... — Todos nós olhamos, é claro, para o canto do corredor. — Você vai perceber que alguém teve muita precisão jogando um pedaço de goma de mascar sobre a lente da câmera de segurança. Ou talvez, se foi um vampiro, ele saltou e colocou o chiclete na lente. É claro que vou rever as fitas, mas tão rápido quanto os vampiros podem saltar, pode muito bem ser impossível determinar quem é o indivíduo. No momento, não há quaisquer vampiros na equipe de homicídios da polícia de Rhodes, então eu não tenho certeza se existe alguém que podemos convocar. A maioria dos policiais humanos não vão investigar crime vampírico, a menos que tenham um parceiro vampiro para auxiliá-los.
— Eu não consigo pensar em mais nada que possamos fazer aqui, — disse Sophie-Anne, exatamente como se ela não desse a mínima. — Se você não mais precisa de nós, vamos para a cerimônia de abertura. — Ela olhou para seu relógio algumas vezes durante essa conversa. — Mestre Henrik, se você estiver pronto, venha conosco. Se você não estiver pronto, que naturalmente nós iremos entender, Sigebert irá levá-lo até minha suíte e você poderá ficar lá.
— Eu gostaria de ir para qualquer lugar tranquilo, — disse Henrik Feith. Ele parecia um cachorrinho espancado.
Sophie-Anne acenou para Sigebert, que não pareceu contente por receber ordens para ser o condutor dele. Mas ele teve que obedecê-la, é claro, então partiu com o pequeno vampiro que era um quinto de tudo o que restava dos mortos-vivos de Arkansas.
Eu tinha tanta coisa para pensar que o meu cérebro entrou em um compartimento. Justamente quando eu acreditava que nada mais poderia acontecer, o elevador tocou a campainha e as portas abriram com grande velocidade para permitir que Bill se destacasse. Ele não chegou tão dramaticamente como Henrik, mas ele fez uma entrada precisa. Ele parou e avaliou a situação.
Verificando que todos nós ali permanecíamos calmos, ele se recolheu em torno de seu autocontrole e disse, — Eu ouvi dizer que houve problemas? — Ele dirigiu a pergunta para ninguém, portanto ninguém pôde respondê-lo.
Eu estava cansada de tentar pensar nele como inominável. Maldito, era Bill. Eu poderia odiar cada molécula em seu corpo, mas ele estava inegavelmente ali. Gostaria de saber se os Lobis realmente conseguiam manter o abjurado fora de seu radar, e como eles lidam com isso. Eu não estava me saindo muito bem.
— Há problemas, — respondeu a rainha. — Embora eu não entenda qual a finalidade da sua presença.
Eu nunca tinha visto Bill mostrando-se embaraçado, mas ele ficou agora. — Peço desculpas, minha rainha, — disse ele. — Se você precisar de mim para alguma coisa, eu estarei retornando para o meu estande no salão de convenções.
Num silêncio glacial, as portas do elevador deslizaram para fechar, bloqueando o rosto e a figura do meu primeiro namorado. Era possível que Bill estivesse tentando mostrar que ele se preocupava comigo, aparecendo com tanta pressa quando era suposto que ele devia estar fazendo negócios para a rainha em outro lugar. Se esta demonstração foi concebida para amolecer meu coração, falhou.
— Existe algo que eu possa fazer para ajudá-lo em sua investigação? — Andre perguntou ao Donati, embora suas palavras fossem na verdade destinadas ao Christian Baruch. — Já que a rainha é a herdeira legal de Arkansas, estamos prontos para ajudar.
— Eu não esperaria nada menos que algo semelhante de uma rainha bonita, aquela também famosa por sua perspicácia empresarial e tenacidade. — Baruch curvou-se para a rainha.
Mesmo Andre pestanejou diante do elogio convoluto, e a rainha deu ao Baruch uma olhada estreita. Eu mantive meu olhar fixo no vaso de plantas, e eu mantive o meu rosto absolutamente inexpressivo. Eu ficaria em perigo por rir baixinho. Aquilo foi bajulação numa escala que eu nunca tinha me deparado.
Não parecia haver realmente nada mais a dizer, e em silêncio subjugado peguei o elevador com os vampiros e o Sr. Cataliades, o qual tinha permanecido notadamente mais quieto. Uma vez que as portas se fecharam, ele disse, — Minha rainha, você deve se casar de novo imediatamente.
Me deixa te contar, Sophie-Anne e Andre tiveram uma reação completamente devastadora com aquela afirmação; seus olhos se arregalaram inteiramente por um segundo.
— Case com qualquer um: Kentucky, Flórida, eu acrescentaria ainda Mississippi, se ele não estivesse negociando com Indiana. Mas você precisa de uma aliança, alguém letal para respaldá-la. Caso contrário os chacais como Baruch irão orbitar em volta, latindo por sua atenção.
— Mississippi está fora da corrida, felizmente. Eu não acho que poderia aguentar todos os homens. De vez em quando, é claro, mas não um número grande deles entra dia, sai dia, — disse Sophie-Anne.
Foi a coisa mais natural e irrefletida que eu já a ouvi dizer. Ela parecia quase humana. Andre estendeu a mão e apertou o botão para parar o elevador entre dois andares. — Eu não aconselharia Kentucky, — disse ele. — Toda e qualquer pessoa que precise de Britlingens fica em encrencas o suficiente.
— Alabama é adorável, — disse Sophie-Anne. — Mas ela gosta de algumas coisas na cama que eu não concordo.
Eu estava cansada de estar no elevador e também de ser considerada como parte do cenário. — Posso fazer uma pergunta? — Eu disse.
Após um momento de silêncio, Sophie-Anne assentiu.
— Como você consegue manter seus filhos contigo, e ir para a cama com eles, se a maioria dos vampiros não são capazes de fazer isso? Não se supõe ser um relacionamento de curto prazo, criador e criança?
— A maioria das crianças vampiras não ficam com seus criadores após um certo tempo, — Sophie-Anne concordou. — E há muito poucos casos de crianças que ficam com seus criadores como Andre e Sigebert têm estado comigo. Essa proximidade é minha dádiva, meu talento. Cada vampiro possui um dom: alguns podem voar, alguns têm habilidades especiais com a espada. Eu posso manter meus filhos comigo. Nós podemos falar uns com os outros, como você e Barry podem. Podemos amar uns aos outros fisicamente.
— Se tudo isso é assim, por que você simplesmente não nomeia Andre como Rei de Arkansas e se casar com ele?
Houve um longo e total silêncio. Os lábios de Sophie-Anne se separaram algumas vezes como se ela estivesse prestes a me explicar por que aquilo era impossível, mas ambas vezes ela os comprimia fechandoos novamente. Andre olhou para mim com tal intensidade que eu esperava ver duas marcas no meu rosto começando a fumigar. Sr. Cataliades apenas pareceu chocado, como se um macaco tivesse começado a falar com ele em poesia iâmbica.
— Sim, — respondeu Sophie-Anne finalmente. — Por que eu não faço isso? Ter como rei e marido meu querido amigo e amante. — Num piscar de olhos, ela pareceu positivamente radiante. — Andre, a única desvantagem é que você terá que passar algum tempo separado de mim quando voltar para o Arkansas para cuidar dos assuntos do estado. Minha criança primogênita, você está disposto?
O rosto de Andre estava transformado com amor. — Por ti, qualquer coisa, — ele respondeu.
Nós tivemos um Momento Kodak em andamento. Eu verdadeiramente me senti um pouco sufocada.
Andre apertou o botão novamente e fomos para baixo.
Apesar de eu não ser imune ao romance - longe disso - na minha opinião, a rainha precisava se concentrar em descobrir quem havia matado Jennifer Cater e os vampiros remanescentes de Arkansas. Ela precisava interrogar severamente o cara da toalha, o vampiro sobrevivente - Henrik Qualquer Que Seja. Ela não precisava ficar perambulando por aí como monitora de recepção de aeroporto. Mas Sophie-Anne não me perguntou o que eu achava, e eu ofereci voluntariamente ideias o suficiente pelo dia.
O saguão estava repleto. Mergulhado em uma multidão tão grande, meu cérebro normalmente entrava em sobrecarga a menos que eu fosse sem dúvida muito cuidadosa. Mas como a maioria dos seres com cérebros eram vampiros, eu tinha um saguão cheio de nada, apenas umas poucas agitações dos cérebros dos bajuladores humanos. Observar todo o movimento e não ouvir muito que fosse estranho, era como assistir as asas das aves batendo e ainda assim não ouvir o movimento. Eu definitivamente estava trabalhando agora, então eu agucei e rastreei os indivíduos que tinham sangue circulando e corações palpitantes.
Um bruxo, uma bruxa. Um amante/doador de sangue - em outras palavras, um fangbanger, mas de alta classe. Quando eu o segui visualmente, eu vi um homem jovem muito bonito todo vestido com roupas de estilistas até às cuecas brancas apertadas, e orgulhoso disso. Parado ao lado do Rei do Texas estava Barry o Mensageiro: ele estava fazendo o seu trabalho como eu estava fazendo o meu. Eu rastreei um pouco os funcionários do hotel cuidando de seus assuntos.
As pessoas não ficam sempre pensando em coisas interessantes como, — Hoje à noite eu estou em uma conspiração para assassinar o gerente do hotel, — ou algo parecido, mesmo se ficavam. Eles ficavam pensando coisas como, — O quarto no onze precisa de sabonete, o quarto no oito tem um aquecedor que não funciona, o carrinho do serviço de quarto no quatro precisa ser movido...
Então me deparei com uma prostituta. Neste momento, ela era interessante. A maioria das prostitutas que eu conheci eram do tipo amadoras, mas essa mulher era uma profissional completa. Fiquei bastante curiosa para fazer contato visual.
Ela era razoavelmente atrativa no departamento rosto, mas nunca seria uma candidata para a Miss América ou mesmo para Rainha do Baile de Boas-Vindas - definitivamente não era ‚a garota da porta ao lado‛ (garota comum), a menos que você vivesse na Rua das Luzes Vermelhas (bairro das prostitutas em Amsterdã, capital da Holanda). Seu cabelo platinado estava em um penteado emaranhado do tipo ‚acabou de sair da cama‛, e ela tinha olhos castanhos particularmente oblíquos, completamente bronzeada, seios turbinados, brincos grandes, saltos finos, batom brilhante, um vestido que era quase todo de lantejoulas vermelhas - você não poderia dizer que ela não chamava a atenção. Ela acompanhava um homem que foi transformado em vampiro quando ele estava na casa dos seus quarenta anos. Ela se agarrava ao braço dele como se ela não pudesse caminhar sem ajuda, e eu me perguntei se os saltos agulha eram os responsáveis por aquilo, ou se ela se agarrava porque ele gostava.
Eu fiquei tão interessada nela - ela projetava a sua sexualidade tão fortemente, ela era extremamente uma prostituta - que eu passei escondida através da multidão para rastreá-la mais de perto. Absorvida em minha meta, eu não pensei a respeito dela me notando, mas ela parecia sentir meus olhos sobre ela e olhou por cima do seu ombro para me observar aproximando. O homem que estava com ela conversava com outro vampiro, e ela não precisava ter que lhe mostrar submissão por enquanto, então ela teve tempo de me encarar com astuta desconfiança. Me mantive uns poucos metros de distância para ouvi-la, por pura curiosidade malcriada.
Garota estranha, não é uma de nós, o que ela quer dele? Ela pode ficar com ele, eu não consigo suportar aquela coisa que ele faz com a língua, e depois de transar comigo ele vai querer que eu faça nele e naquele outro cara - céus!, eu tenho algumas baterias sobressalentes? Pode ser que ela consiga ir embora e pare de me encarar?
— Claro, desculpe, — eu disse, envergonhada de mim mesma, e mergulhei de volta no meio da multidão. Em seguida verifiquei os garçons contratados pelo hotel, que estavam ocupados circulando através da multidão com bandejas de taças cheias de sangue e algumas bebidas reais para os humanos espalhados por toda parte. Todos os garçons estavam preocupados em se esquivar da multidão, sem derramar, esbarrar em costas e tombar com os pés, coisas assim. Barry e eu trocamos acenos de cabeça, e eu capturei um pensamento posterior que tinha o nome do Quinn incorporado, assim eu segui a trilha até que eu descobri me dirigindo para uma funcionária da E(E)E. Eu soube disso porque ela estava usando uma camiseta da empresa. Essa garota era uma jovem mulher com um corte de cabelo muito curto e pernas muito longas. Ela estava conversando com um dos garçons, e definitivamente era uma conversa unilateral. Em uma multidão que estava notavelmente bem vestida, os jeans e tênis dessa mulher se destacavam.
— ... e uma caixa de refrigerantes gelados, — ela estava dizendo. — Uma bandeja de sanduíches, e algumas batatas chips. Ok? No salão de baile, dentro de uma hora. — Ela se virou abruptamente e ficou cara a cara comigo. Ela me olhou de cima abaixo e ficou pouco impressionada.
— Está namorando um dos vampiros, loira? — Perguntou ela. Sua voz era irritante para os meus ouvidos, um sotaque bem pronunciado do norte.
— Não, eu estou namorando Quinn, — eu respondi. — Loira, para você também. — De qualquer forma pelo menos eu era naturalmente loira. Bem, natural com ajuda. Os cabelos daquela garota parecia palha... se palha tivesse raízes escuras.
Ela não gostou daquilo de modo algum, embora eu não tivesse certeza qual parte a desagradou mais. — Ele não disse que tinha uma nova mulher, — disse ela, e, claro, ela disse da forma mais ofensiva possível.
Me senti livre para mergulhar em seu cérebro, e lá encontrei um profundo afeto por Quinn. Ela achava que nenhuma das outras mulheres eram dignas dele.
Ela achava que eu era uma garota atrasada do sul que se escondia atrás dos homens. Uma vez que isso foi baseado em nossa conversa de menos de sessenta segundos, eu poderia desculpá-la por estar errada.
Eu poderia desculpá-la para amar Quinn. Eu não podia desculpar o seu desprezo esmagador.
— Quinn não tem que te contar informações pessoais, — eu disse. O que eu realmente queria perguntar-lhe era onde Quinn estava agora, mas isso certamente a daria vantagem, então eu irei manter essa pergunta para mim mesma. — Se você me der licença, eu tenho que voltar ao trabalho, e eu suponho que você, também.
Seus olhos escuros faiscaram para mim, e ela se afastou. Ela era pelo menos quatro centímetros mais alta que eu, e muito magra. Ela não se incomodou em usar um sutiã, ela tinha seios pequenos como ameixas que balançavam de uma forma atraente. Essa era uma garota que sempre quer ficar por cima. Eu não fui a única que a observou cruzar o salão. Barry tinha descartado sua fantasia ao meu respeito por uma novinha em folha.
Voltei para perto da rainha porque ela e Andre estavam seguindo do saguão para dentro do salão de convenções. As amplas portas duplas estavam abertas escoradas por um muito bonito par de urnas que continham imensos arranjos de ervas secas.
Barry disse, Você já foi a uma convenção de verdade, uma normal?
Não, respondi, tentando manter a varredura da multidão circundante. Eu queria saber como os agentes do Serviço Secreto conseguiam. Bem, eu fui com Sam em uma, uma convenção de suprimentos para atendentes de bar, mas apenas por algumas horas.
Todo mundo usava um crachá, certo?
Se você pode chamar um objeto numa corda em volta de seu pescoço de crachá, sim.
É assim que os funcionários da portaria podem ter certeza que você pagou sua entrada, e fazendo com que pessoas não autorizadas não entrem.
Sim, é daí?
Barry ficou silencioso. Portanto, você vê alguém com um crachá? Você vê alguém checando?
Ninguém além de nós. E o que nós sabemos? A prostituta pode ser uma espiã para os vampiros do norte. Ou algo pior, eu adicionei com mais bom senso.
Eles estão acostumados a serem os mais fortes e assustadores, disse Barry. Eles podem até temer uns aos outros, mas eles não temem seriamente os humanos, quando estão juntos.
Eu entendi a sua opinião. A Britlingen já havia despertado a minha preocupação, e agora fiquei ainda mais preocupada.
Então eu olhei para trás para as portas do hotel. Elas estavam vigiadas, por vampiros armados ao invés de humanos armados, agora que estava escuro. A recepção também estava equipada com vampiros vestindo o uniforme do hotel, e esses vampiros estavam examinando cada e toda pessoa que entrava pela porta. Este edifício talvez não fosse tão frouxamente desprotegido como aparentava. Eu relaxei e decidi conferir os estandes no salão de convenções.
Havia um estande de próteses com presas que você poderia ter implantadas; elas vinham em marfim natural, prata ou ouro, e as realmente caras eram retráteis por meio de um diminuto motor quando a sua língua apertava um minúsculo botão em sua boca. — Imperceptíveis dos genuínos, — um homem idoso estava garantindo a um vampiro com uma longa barba e cabelos trançados. — E afiadas, oh Deus, sim! — Eu não conseguia imaginar quem iria querer um par. Um vampiro com um dente quebrado? Um aspirante a vampiro que queria fingir? Um humano procurando por um pouco de RPG?
O estande seguinte vendia CDs de música de vários períodos históricos, como Canções Russas Folclóricas do Século Dezoito ou Música de Câmara Italiana, os Primeiros Anos. O estande estava fazendo um negócio estimulante. Pessoas sempre gostam da música da sua época, mesmo se essa época fosse de séculos anteriores.
O estande seguinte era de Bill, e ele tinha uma enorme placa abóbada acima das ‚paredes‛ temporárias da área delimitada. IDENTIFICAÇÃO VAMPIRESCA, ela dizia simplesmente. LOCALIZE QUALQUER VAMPIRO, EM QUALQUER LUGAR, A QUALQUER HORA. TUDO O QUE VOCÊ PRECISA É UM SERVIÇAL USUÁRIO DE COMPUTADOR, dizia uma placa menor. Bill estava conversando com uma vampira que estava estendendo seu cartão de crédito para ele, e Pam estava atirando uma caixa de CD em uma sacolinha. Pam pegou meu olhar e piscou. Ela estava vestindo uma roupa de odalisca ridícula, o qual eu teria imaginado que ela se recusaria usar. Mas Pam estava sorrindo de fato. Talvez ela estivesse aproveitando a mudança de sua rotina. EDITORA HAPPY BIRTHDAY (FELIZ ANIVERSÁRIO) APRESENTA: SOPA SANGUINÁRIA PARA A ALMA era a placa do estande seguinte, na qual uma vampira entediada e solitária estava sentada, com uma pilha de livros na frente dela.
A exposição seguinte ocupava diversos espaços e não precisava de explicação. — Você definitivamente deve modernizar, — um vendedor sério estava dizendo a uma vampira negra, cujo cabelos eram trançados e amarrados com milhares de fios coloridos. Ela ouvia atentamente, olhando para uma das amostra de caixões em miniatura abertos na frente dela. — Certamente, a madeira é biodegradável e é tradicional, mas quem precisa disso? Seu caixão é a sua casa; é o que meu pai sempre dizia.
Havia outras, incluindo uma para Extrema(mente Elegante) Eventos. Aquela era uma grande mesa com vários catálogos de preços e álbuns de fotos que estavam abertos para atrair os transeuntes. Eu estava pronta para dar uma olhada quando reparei que o estande estava sendo — operado— pela Senhorita Arrogante de Pernas-Longas. Eu não queria falar com ela novamente, então eu saracoteei adiante, embora eu nunca perdesse a rainha de vista. Um dos garçons humanos estava admirando a bunda de Sophie-Anne, mas eu calculei que aquilo não era punível com a morte, assim eu o deixei ir.
Nesse meio tempo a rainha e Andre se encontraram com os xerifes Gervaise e Cleo Babbitt. Gervaise era um homem pequeno, talvez um metro e sessenta e sete, com um rosto largo e grande. Ele parecia ter cerca de trinta e cinco anos, embora você pudesse facilmente adicionar uma centena de anos e estar mais perto de sua verdadeira idade. Gervaise tinha assumido o fardo de apoiar e distrair Sophie-Anne nas últimas semanas, e o desgaste era visível.
Eu ouvi dizer que ele era conhecido por suas roupas sofisticadas e estilo jovial. A única vez que eu o vi antes, seus cabelos claros estavam penteados tão lisos como vidro em sua cabeça redonda e lustrosa. Agora o cabelo estava definitivamente desgrenhado. Seu bonito terno precisava ir para a tinturaria, e seus sapatos precisavam de polimento.
Cleo era uma mulher robusta com ombros largos e cabelos pretos como carvão, um rosto largo com uma boca de lábios cheios. Cleo era moderna o suficiente para querer usar o seu sobrenome, ela era uma vampira por apenas cinquenta anos.
— Onde está o Eric? — Andre perguntou aos outros xerifes.
Cleo riu, o tipo de risada do fundo da garganta que fazia os homens olharem. — Ele foi recrutado, — respondeu ela. — O sacerdote não apareceu, e Eric fez um curso, então ele vai oficiar.
Andre sorriu. — Isso será algo para se ver. Qual é a ocasião?
— Será anunciado em um segundo, — disse Gervaise.
Fiquei imaginando qual igreja teria Eric como padre. A Igreja dos Lucros Elevados? Eu fui à direção do estande de Bill e atrai à atenção de Pam.
— Eric é um sacerdote? — Murmurei
— A Igreja do Espírito Amoroso, — ela me disse, ensacando três cópias do CD e entregando-os a um fangbanger enviado por seu mestre para buscá-los. — Ele pegou o seu certificado de um curso on-line, com a ajuda de Bobby Burnham. Ele pode dirigir cerimônias de casamento.
Um garçom de alguma forma driblou todos os convidados em torno da rainha e se aproximou dela com uma bandeja cheia de taças com sangue até a borda. Num piscar de olhos Andre ficou entre o garçom e a rainha, e num outro piscar de olhos, o garçom girou e caminhou em outra direção.
Eu tentei olhar a mente do garçom mas a encontrei completamente apagada. Andre tinha tomado o controle da determinação do cara e o mandou embora. Eu esperava que o garçom estivesse bem. Eu segui sua jornada até uma modesta porta localizada num canto até que eu tivesse certeza de que ele estaria de volta a cozinha. Ok, incidente evitado.
Houve uma corrente de murmúrios no corredor do salão de exposições, e me virei para ver o que estava acontecendo. O Rei do Mississippi e do Rei de Indiana chegaram juntos de mãos dadas, o que parecia ser um sinal público de que eles tinham concluído as negociações de seu casamento. Russell Edgington era um vampiro delicado e atraente que gostava de outros homens - exclusiva e extensivamente. Ele poderia ser uma boa companhia e ele era um bom lutador, também. Eu gostava dele. Eu estava um pouco aflita por ver Russell, já que há alguns meses atrás eu havia deixado um corpo em sua piscina. Eu tentei olhar pelo lado positivo. O corpo era de uma vampira, por isso deve ter se desintegrado antes da cobertura da piscina ser removida na primavera.
Russell e Indiana pararam na frente do estande de Bill. Indiana, aliás, era um cara grande e forte como touro com cabelos castanhos encaracolados e um rosto que eu achei como prático.
Eu cheguei perto, porque isso poderia ser um problema.
— Bill, você parece bem, — disse Russell. — Minha equipe me contou que você passou uns momentos difíceis na minha casa. Você parece ter se recuperado bem. Eu não estou seguro de como você se libertou, mas estou feliz. — Se Russell estava esperando por uma reação, ele não conseguiu uma. O rosto de Bill estava tão impassível como se Russell tivesse comentando sobre o clima, não sobre a tortura de Bill. — Lorena era sua criadora, então eu não podia interferir, — disse Russell, sua voz tão calma quanto o rosto de Bill. — E aqui está você, vendendo a sua própria coisinha de computador que Lorena tentou tanto pegar de você. Como diz o Bardo, 'Tudo está bem quando termina bem’.
Russell foi muito eloquente, o que foi a única indicação de que o rei estava preocupado com a reação de Bill. E como previsto, a voz de Bill era como seda fria deslizando sobre o vidro. Mas tudo o que ele disse foi, — Não foi nada, Russell. Felicitações são satisfatórias, eu percebo.
Russell sorriu para o seu noivo.
— Sim, Mississippi e eu estamos amarrando o nó, — o Rei de Indiana disse. Ele tinha uma voz profunda. Ele tinha a aparência de se sentir à vontade batendo em alguns caloteiros em um beco ou sentado em um bar com serragem no chão. Mas Russell fez tudo, exceto corar.
Talvez esse fosse um casamento por amor.
Então Russell me reconheceu. — Bart, você tem que conhecer esta jovem, — ele disse imediatamente. Eu quase tive um ataque de pânico, mas não havia maneira de sair da situação sem simplesmente girar o traseiro e correr. Russell arrastou seu noivo através de suas mãos unidas até mim. — Esta jovem foi estaqueada enquanto esteve em Jackson. Alguns daqueles brutamontes da Irmandade foram num bar, e um deles a perfurou.
Bart parecia quase assustado. — Você sobreviveu, obviamente, — disse ele. — Mas como?
— Sr. Edgington aqui me ajudou, — respondi. — Na verdade, ele salvou a minha vida.
Russell tentou parecer modesto, e ele quase conseguiu. O vampiro estava tentando parecer bom na frente do seu noivo, semelhante a uma reação humana que eu mal pude acreditar.
— Entretanto, eu acredito que você levou algo consigo quando partiu, — disse Russell severamente, sacudindo um dedo para mim.
Eu tentei colher alguma coisa do seu rosto que me dissesse qual caminho arriscar com a minha resposta. Eu tinha levado um cobertor, com certeza, e algumas roupas que os jovens do harém de Russell tinham deixado soltas sem uso. E eu tinha levado Bill, que foi um prisioneiro em uma das dependências. Muito provavelmente Russell estava se referindo ao Bill, né?
— Sim, senhor, mas eu deixei algo para trás, em retribuição, — eu disse, já que eu não poderia aguentar esse jogo verbal de gato e rato. Muito bem, agora mesmo! Eu salvei Bill e matei a vampira Lorena, embora tenha sido mais ou menos por acaso. E eu atirei aquele traseiro do mal na piscina.
— Eu achei que tinha algum lodo no fundo quando nós mandamos deixar a piscina pronta para o verão, — disse Russell, e seus olhos de chocolate amargo me examinaram com ponderação. — Que jovem empreendedora você é, senhorita...
— Stackhouse. Sookie Stackhouse.
— Sim, eu me lembro agora. Você não estava no Club Dead com Alcide Herveaux? Ele é um Lobis, querido, — Russell disse ao Bart.
— Sim senhor, — respondi, desejando que ele não tivesse lembrado desse pequeno detalhe.
— Não ouvi que o pai de Herveaux esteve fazendo campanha para a liderança da alcatéia em Shreveport?
— Isso mesmo. Mas ele ... hã, ele não conseguiu.
— Então esse foi o dia que Papai Herveaux morreu?
— Foi, — respondi. Bart estava ouvindo atentamente, sua mão subindo e descendo pela manga do paletó de Russell o tempo todo. Era um pequeno gesto sensual.
Quinn apareceu ao meu lado naquele momento e só colocou seu braço em volta de mim, e os olhos de Russell arregalaram.
— Cavalheiros, — disse Quinn para Indiana e Mississippi, — Eu acredito que temos a sua cerimônia de casamento pronta e à espera.
Os dois reis sorriram reciprocamente. — Sem pés frios (medo)? — Bart perguntou ao Russell.
— Não se você mantê-los quentes, — Russell respondeu com um sorriso que teria derretido um iceberg. — Além disso, nossos advogados nos matariam se nós repudiássemos aqueles contratos.
Ambos acenaram para Quinn, que subiu a longos passos num palco numa das extremidades do salão de exposições. Ele parou no nível mais alto e estendeu seus braços. Havia um microfone lá em cima, e sua voz profunda retumbou sobre a multidão. — Sua atenção, senhoras e senhores, reis e súditos, vampiros e humanos! Todos vocês são solicitados e convidados a estarem presentes à união de Russell Edgington, Rei do Mississipi e Bartlett Crowe, Rei de Indiana, no Salão de Rituais. A cerimônia se iniciará em dez minutos. O Salão de Rituais fica na ala leste do hall após às portas duplas. — Quinn apontou regiamente para as portas duplas.
Eu tive tempo para apreciar sua roupa enquanto ele falava. Ele vestia calças largas daquelas franzidas na cintura e nos tornozelos. Elas eram de um escarlate profundo. Ele havia apertado as calças com um largo cinto dourado como de um lutador, e usava botas de couro preto com as pernas das calças enfiadas por dentro. Ele não estava usando camisa. Ele parecia um gênio que tinha exatamente acabado de pular de uma grande garrafa.
— Este é seu novo homem? — Russell perguntou. — Quinn?
Eu fiz que sim com a cabeça, e ele pareceu impressionado. — Eu sei que você tem coisas em sua mente agora, — eu disse impulsivamente. — Eu sei que você está prestes a se casar. Mas eu só quero dizer que espero que estejamos quites, certo? Você não está bravo comigo, ou guardando rancor de mim, ou algo assim?
Bart estava aceitando as congratulações de vários vampiros, e Russell deu uma olhada na direção dele. Então ele me fez a gentileza de se concentrar em mim, embora eu soubesse que ele tinha que me dar as costas e aproveitar sua noite por um breve tempo, o que era justo.
— Eu não guardo rancor em relação a você, — ele respondeu. — Felizmente, eu tenho senso de humor, e felizmente, eu não dava a mínima para Lorena. Eu emprestei-lhe o quarto no estábulo porque eu a conhecia há um século ou dois, mas ela sempre foi uma cadela.
— Então me deixa te perguntar, visto que você não está bravo comigo, — eu disse. — Por que todos parecem tão intimidados com Quinn?
— Você realmente não sabe, e você tem o tigre pelo rabo? — Russell parecia alegremente intrigado. — Eu não tenho tempo para te contar a história toda, porque eu quero ficar com meu futuro marido, mas quer saber duma coisa, senhorita Sookie, seu homem fez muito dinheiro para muita gente.
— Obrigada, — eu disse, um pouco confusa, — e felicidades para você e, hã, o Sr. Crowe. Espero que vocês sejam muito felizes juntos. — Já que o ato de apertar as mãos não era um costume vampírico, eu demonstrei reverência inclinando a cabeça e tentei de certa forma me afastar rapidamente enquanto ainda estávamos às boas com o outro.
Rasul apareceu inesperadamente perto do meu cotovelo. Ele riu quando eu pulei. Esses vampiros. Tem que amar o senso de humor deles. Eu só tinta visto Rasul no traje da SWAT, e ele parecia ótimo com aquilo. Hoje à noite ele estava usando outro uniforme, mas tinha aparência bem militar também, num tipo de estilo Cossaco. Ele usava uma longa túnica de mangas compridas e calças confeccionadas sob medida numa profunda cor ameixa com adornos pretos e com brilhantes botões de latão. Rasul era profundamente moreno, muito naturalmente, e tinha enormes olhos escuros suaves e cabelos negros de alguém do Oriente Médio.
— Eu sabia que supostamente você estaria aqui, então é bom me encontrar por acaso contigo, — eu disse.
— Ela mandou Carla e eu antes da hora, — disse ele em seu sotaque ligeiramente exótico. — Você está parecendo mais fascinante do que nunca, Sookie. De que forma você está apreciando a cúpula?
Ignorei seus gracejos. — Qual é a do uniforme?
— Se você quer dizer, de quem é o uniforme, é o novo uniforme da casa de nossa rainha, — respondeu ele. — Nós usamos isso em vez da armadura quando não estamos nas ruas. Bonito, hein?
— Oh, você está estiloso, — eu respondi, e ele gargalhou.
— Você está indo para a cerimônia? — Ele perguntou.
— Sim, claro. Eu nunca vi um casamento vampiro. Ouça, Rasul, eu sinto muito por Chester e Melanie.
Eles estiveram de plantão com Rasul em Nova Orleans. Por um segundo, todo o humor deixou o rosto do vampiro.
— Sim, — disse ele após um momento de rígido silêncio. — Ao invés de meus companheiros, agora tenho o ex-peludo.
Jake Purifoy estava se aproximando de nós, e ele estava vestindo o mesmo uniforme que Rasul. Ele parecia desolado. Ele não era um vampiro há tempo suficiente para manter o rosto calmo que parecia ser uma segunda natureza para os mortos-vivos.
— Oi, Jake, — eu disse.
— Oi, Sookie, — disse ele, parecendo triste e esperançoso.
Rasul se curvou fazendo uma reverência para nós dois e partiu em outra direção. Eu fiquei empacada com Jake. Isso foi parecido demais com a escola primária para o meu gosto. Jake era o garoto que chegava para a escola vestindo a roupa errada e trazendo um lanche esquisito. Ser uma combinação de Lobis e vampiro tinha arruinado suas chances com esta ou com aquela turma. Era como tentar ser um atleta Gótico.
— Você já teve uma chance para conversar com Quinn? — Eu perguntei por falta de coisa melhor para dizer. Jake tinha sido empregado de Quinn antes da sua mudança efetivamente colocá-lo para fora do emprego.
— Eu disse olá de passagem—, disse Jake. — Isso simplesmente não é justo.
— O quê?
— Que ele seja aceito não importando o que ele fez, e que eu seja punido ao ostracismo.
Eu sabia o que ostracismo significava, porque a palavra esteve no meu calendário Palavra do Dia. Mas meu cérebro precisamente esbarrou com dificuldade nesta palavra porque o significado maior do comentário de Jake afetou meu equilíbrio.
— Não importando o que ele fez? — Eu perguntei. — O que isso quer dizer?
— Bem, é óbvio que, você sabe sobre Quinn, — disse Jake, e eu pensei que eu poderia pular em suas costas e bater com algo pesado em sua cabeça.
— O casamento começou! — Veio a voz ampliada de Quinn, e a multidão começou a correr para dentro das portas duplas que ele tinha indicado anteriormente. Jake e eu corremos junto com eles. A assistente tetas-saltitantes de Quinn estava parada mais ou menos na parte de dentro das portas, distribuindo pequenos saquinhos de potpourri. Alguns estavam amarrados com fitas azuis e douradas, outros com azuis e vermelhas.
— Por que as cores diferentes? — A prostituta perguntou para a assistente de Quinn. Eu apreciei a pergunta dela, porque significava que eu não precisava perguntar.
— Vermelho e azul da bandeira do Mississipi, azul e dourado de Indiana, — respondeu a mulher com um sorriso automático. Ela ainda tinha o sorriso colado em seu rosto quando ela me entregou um saquinho amarrado com vermelho e azul, mas ele desapareceu de uma maneira quase cômica quando ela percebeu quem eu era.
Jake e eu abrimos nosso caminho para um bom lugar um pouco à direita do centro. O palco estava vazio com exceção de alguns adereços, e não havia cadeiras. Eles não esperavam que isso levasse muito tempo, aparentemente. — Responda-me, — eu sibilei. — Sobre Quinn.
— Depois do casamento, — disse ele, tentando não sorrir. Fazia alguns meses desde que Jake tivera vantagem sobre alguém, e ele não conseguiu esconder o fato de que ele estava se divertindo. Ele deu uma espiada para trás e arregalou seus olhos. Eu olhei naquela direção para ver que na extremidade oposta do salão foi montado um buffet, embora a principal apresentação do buffet não fosse comida, mas sangue. Para meu desgosto, havia cerca de vinte homens e mulheres parados enfileirados junto a uma fonte de sangue sintético, e todos eles tinham crachás que simplesmente diziam, ‚Doador Voluntário‛. Eu quase vomitei. Isso podia ser legal? Mas eles eram todos livres e acessíveis e podiam sair de repente se preferissem, e a maioria deles parecia muito desejosa para começar sua doação. Eu fiz uma análise rápida de seus cérebros. É, voluntários.
Virei-me para a plataforma, com apenas 45 cm de altura, que Mississippi e Indiana tinham acabado de subir.
Eles tinham posto vestimentas elaboradas, no qual eu lembrava ter visto antes em um álbum de fotos na oficina de um fotógrafo que era especializado em registrar rituais sobrenaturais. Pelo menos essas eram fáceis de vestir.
Russell estava vestindo uma espécie de roupão aberto na frente de brocado pesado ajustado por cima de suas roupas normais. Era um traje esplêndido de tecido dourado resplandecente trabalhado num padrão de bordados azuis e escarlates. Bart, o Rei de Indiana, estava vestindo um roupão semelhante numa cor marrom-acobreada, decorado com um desenho em verde e dourado.
— Suas vestes formais, — Rasul murmurou. Mais uma vez, ele flutuou para o meu lado sem que eu notasse. Eu pulei e vi um sorriso se contorcer nos cantos de sua boca generosa. À minha esquerda, Jake se aproximou um pouco mais perto de mim, como se estivesse tentando se esconder de Rasul, escondendo-se atrás do meu corpo.
Mas eu estava mais interessada nesta cerimônia do que numa demonstração de superioridade vampírica.
Uma ankh gigante estava destacada no centro do palco entre o grupo. Na lateral, havia uma mesa ostentando dois grossos maços de papéis com duas canetas em forma de penas dispostas entre eles. Uma vampira estava em pé atrás da mesa, e ela estava vestindo um terno executivo com uma saia até os joelhos. Sr. Cataliades se mantinha atrás dela, parecendo benevolente, suas mãos transversalmente juntas sobre sua barriga.
Parado do lado oposto do palco, em oposição à mesa, Quinn, meu querido (cujos fatos anteriores eu estava determinada a descobrir muito em breve), ainda estava em sua roupa de gênio Aladin. Ele esperou até que os murmúrios da multidão esmorecessem e então fez um grande gesto para o lado direito do palco. Uma figura surgiu nos degraus e subiu a plataforma. Ele estava vestindo uma capa de veludo preto, e estava encapuzado. O capuz estava bem puxado para a frente. O símbolo do ankh estava bordado em ouro sobre os ombros da capa. A figura tomou sua posição entre Mississippi e Indiana, de costas para o ankh, e levantou os braços.
— Se inicia a cerimônia, — disse Quinn. — Vamos todos ficar em silêncio e testemunhar esta união.
Quando alguém diz a um vampiro para ficar quieto, você pode ter certeza que o silêncio é absoluto. Vampiros não tem que se remexer, suspirar, espirrar, tossir ou assoar o nariz como as pessoas fazem. Me senti barulhenta apenas respirando.
O capuz da figura encapuzada retrocedeu. Eu suspirei. Eric. Seus cabelos cor de trigo estavam lindos contra o negro da capa, e seu rosto estava solene e imponente, que era o que você queria em um oficiante.
— Estamos aqui para testemunhar a união de dois reis, — disse ele, e cada palavra ecoava para os cantos do salão. — Russell e Bart concordaram, por contrato verbal e escrito, confederar seus estados por cem anos. Por cem anos, não poderão se casar com qualquer outro. Não poderão formar uma aliança com qualquer outro, a menos que esta aliança seja mutuamente consentida e testemunhada. Cada um deve satisfazer o outro com uma visita conjugal pelo menos uma vez ao ano. O bem-estar do reino de Russell deve vir em segundo lugar somente ao seu próprio diante de Bart, e o bem-estar do reino de Bart deve vir em segundo lugar somente ao seu próprio diante de Russell. Russell Edgington, Rei do Mississipi, você está de acordo com este contrato?
— Sim, estou de acordo, — respondeu Russell claramente. Ele estendeu sua mão para Bart.
— Bartlett Crowe, Rei de Indiana, você está de acordo com este contrato?
— De acordo, — disse Bart, e pegou a mão de Russell. Oooohhhh.
Então Quinn deu um passo para frente e se ajoelhou, segurando um cálice com as mãos unidas, e Eric puxou depressa uma faca e cortou os dois pulsos com dois movimentos muito rápidos de se perceber.
Oh, eca. A medida que os dois reis sangravam sobre o cálice, me censurei severamente. Eu deveria saber que uma cerimônia vampiresca incluiria uma troca de sangue.
Como era previsto, quando as feridas se fecharam, Russell tomou um gole do cálice e, em seguida o entregou ao Bart, que o esvaziou até secar. Então eles se beijaram, Bart segurando delicadamente o homem menor. E então eles se beijaram um pouco mais. Evidentemente que o sangue misturado foi um verdadeiro tesão.
Eu peguei o olho de Jake. Arrumem um quarto, ele balbuciou, e eu olhei para baixo para esconder meu sorriso.
Finalmente, os dois reis seguiram para a próxima etapa, a assinatura solene do contrato que tinham acordado. A mulher do terno executivo se revelou ser uma advogada vampira de Illinois, uma vez que um advogado de outro estado teve que redigir o contrato. Sr. Cataliades tinha sido um advogado neutro, também, e ele assinou os documentos depois dos reis e da advogada vampira.
Eric permaneceu em sua glória em preto e dourado enquanto tudo aquilo era feito, e uma vez que as canetas estavam de volta em suas posições elaboradas, ele disse, — O casamento está consagrado por cem anos! — E um grito de vivas se elevou.
Os vampiros não são generosos nos aplausos, tampouco, por isso foram os humanos principalmente e os outros metamorfos na multidão que deram os aplausos, mas todos os vampiros produziram um murmúrio apreciativo — não tão bom, mas era o melhor que eles podiam fazer, eu acho.
Eu obviamente queria descobrir mais sobre como o Eric tinha se qualificado como um padre, ou seja o que for que eles chamavam de oficiante, mas primeiro eu faria Jake me dizer sobre Quinn. Ele estava tentando sair sinuosamente para longe da multidão, mas eu o peguei muito rápido. Ele ainda não era um vampiro bom o suficiente para escapar de mim.
— Desembucha, — eu disse, e ele tentava agir como se não soubesse o que eu estava falando, mas ele viu no meu rosto que eu não estava engolindo a história.
Assim, enquanto a multidão se movia em círculos ao nosso redor, tentando acelerar em direção ao bar, eu esperei pela história de Quinn.
— Eu não posso acreditar que ele mesmo não te contou, — disse Jake, e eu estava tentada a bater-lhe na cabeça. Eu olhei furiosa para ele para que soubesse que eu estava esperando.
— Ok, ok, — ele disse. — Eu ouvi tudo isso quando eu ainda era um Lobis. Quinn é como uma estrela do rock no mundo metamorfo, sabe. Ele é um dos últimos homens-tigre, e ele é um dos mais ferozes.
Eu fiz que sim com a cabeça. Até aqui, aquilo se assemelha com o meu conhecimento sobre Quinn.
— A mãe de Quinn foi capturada numa lua cheia, quando ela se transformou. Um grupo de caçadores estavam acampando, armaram uma armadilha porque eles queriam um urso para as suas rinhas ilegais de cães. Algo novo para apostar, sabe? Uma matilha de cães contra um urso. Isto foi em algum lugar do Colorado, e estava nevando. A mãe dele estava fora por conta própria, e de alguma forma ela caiu na armadilha, não percebeu.
— Onde estava o pai dele?
— Ele morreu quando Quinn era pequeno. Quinn tinha cerca de quinze anos quando isso aconteceu.
Eu senti que algo pior estava por vir, e eu estava certa.
— Ele trocou, naturalmente, na mesma noite, logo que descobriu que ela estava desaparecida. Ele os rastreou até o acampamento. Sua mãe tinha voltado a ser uma mulher sob o estresse da captura, e um deles a estava estuprando. — Jake respirou fundo. — Quinn matou todos eles.
Eu olhei para o chão. Eu não conseguia pensar em nada para dizer.
— O local de acampamento tinha que ser limpo. Não havia uma alcatéia por perto para intervir - claro, tigres não andam em bando - e a mãe dele estava muito ferida e em estado de choque, assim Quinn foi para o ninho local de vampiros. Eles concordaram em fazer o trabalho, se ele ficasse em débito com eles durante três anos. — Jake encolheu os ombros. — Ele concordou.
— O que exatamente ele concordou fazer? — Eu perguntei.
— Lutar no fosso para eles. Por três anos ou até que ele morresse, o que viesse primeiro.
Comecei a sentir dedos frios subindo pela minha espinha, e desta vez não era o assustador Andre ... era apenas medo.
— O fosso? — Eu perguntei, mas se ele não tivesse audição de um vampiro, não teria sido capaz de ouvir minhas palavras saírem.
— Há um monte de apostas realizadas num combate no fosso, — respondeu Jake. — São como as rinhas de cães que os caçadores queriam em relação ao urso. Humanos não são os únicos que gostam de observar os animais se matando. Alguns vampiros adoram. Assim como alguns outros metamorfos.
Meus lábios se curvaram em desgosto. Senti-me quase nauseada.
Jake estava olhando para mim, preocupado com minha reação, mas também dando-me tempo para entender a história triste que não estava no fim. — Obviamente Quinn sobreviveu nos seus três anos, — disse Jake. — Ele é um dos poucos que sobreviveu por tanto tempo. — Ele olhou para mim de lado. — Ele continuou vencendo e vencendo. Ele foi um dos lutadores mais selvagens que alguém jamais viu. Ele lutou com ursos, leões, ficou famoso.
— Não são todos eles muito raros? — eu perguntei.
— Sim, eles são, mas penso que até mesmo criaturas raras precisam de dinheiro, — respondeu Jake com um menear de cabeça. — E você pode fazer muitos dólares lutando no fosso, quando você ganha o suficiente para apostar em si mesmo.
— Por que ele parou? — Eu perguntei. Lamentei mais do que eu poderia afirmar por eu ter sido curiosa sobre Quinn. Eu deveria ter esperado até que ele oferecesse tudo isso. Ele teria, eu esperava. Jake pescou um empregado humano passando e agarrou uma taça de sangue sintético da bandeja. Ele esvaziou em um gole só.
— Seus três anos terminaram, e ele tinha que cuidar de sua irmã.
— Irmã?
— Sim, sua mãe ficou grávida naquela noite, e o resultado foi a loura tingida que nos deu os saquinhos de potpourri na porta. Frannie fica em apuros de vez em quando, e mãe de Quinn não consegue lidar com ela, então ela a envia para ficar com Quinn por um tempo. Frannie apareceu aqui na noite passada.
Eu tive tudo quanto eu poderia digerir. Virei-me em um movimento rápido e me afastei de Jake. E para seu mérito, ele não tentou me parar.
EU ESTAVA TÃO ANSIOSA PARA ESCAPAR da multidão no salão do casamento que colidi com um vampiro, que girou e agarrou meus ombros em um borrão de escuridão. Ele tinha um longo bigode Fu Manchu e uma crina de cabelos que teria dado orgulho a alguns cavalos. Ele estava vestindo um terno preto. Em outra ocasião, eu poderia ter gostado do pacote inteiro. Agora eu só queria que ele se movesse.
— Por que tanta pressa, minha doce donzela? — Perguntou ele.
— Senhor, — eu disse educadamente, pois ele devia ser mais velho que eu, — eu realmente estou com pressa. Desculpe-me por esbarrar em você, mas eu preciso ir embora.
— Você não é uma doadora, por acaso?
— Não, desculpe.
Bruscamente, ele soltou meus ombros e voltou para a conversa que eu tinha interrompido. Com uma grande onda de alívio, eu continuei a escolher onde colocar meus pés através da assembleia, embora com mais cuidado agora já que eu tive um momento tenso.
— Aí está você! — Andre disse, e ele quase parecia zangado. — A rainha precisa de você.
Eu tinha que lembrar para mim mesma que eu estava lá para trabalhar, e realmente não importa quanto drama interior eu estivesse suportando. Segui Andre até a rainha, que estava conversando com um grupo de vampiros e humanos.
— Claro que eu estou do seu lado, Sophie, — disse uma vampira. Ela usava um vestido de noite de chiffon rosa preso a um dos ombros com um grande broche cintilante de diamantes. Eles poderiam ser cristais Swarovski, mas pareciam reais para mim. O que eu entendo? O rosa pálido parecia realmente bonito contra sua pele chocolate. — Arkansas era um idiota, de qualquer maneira. Eu fiquei simplesmente estupefata por você ter se casado com ele em primeiro lugar.
— Então se eu for a julgamento, você será benevolente, Alabama? — Sophie-Anne perguntou, e você teria jurado que ela não tinha um dia a mais do que dezesseis anos. Seu rosto erguido era macio e rígido, seus olhos grandes brilhavam, sua maquiagem era sutil. Seus cabelos castanhos estavam soltos, o que era incomum para Sophie-Anne.
A vampira pareceu esmorecer visivelmente. — É claro, — disse ela.
O companheiro humano dela, o fangbanger fashionista que eu tinha notado mais cedo, pensou, — isso no final durará dez minutos, até que ela vire suas costas para Sophie-Anne. Então eles conspirarão outra vez. Claro, todos eles dizem que gostam de fogueiras crepitando e longas caminhadas na praia ao luar, mas toda vez que você vai a uma comemoração, é intriga, intriga, intriga e mentira, mentira, mentira.
O olhar atento de Sophie-Anne simplesmente passou para o meu, e eu dei uma pequena sacudida de minha cabeça. Alabama pediu licença para ir felicitar os recém-casados, e seu humano a seguiu de perto. Atenta a todos os ouvidos à nossa volta, a maioria que poderia ouvir muito melhor do que eu poderia, falei, — Mais tarde, — e obtive um aceno de cabeça de Andre.
O próximo a cortejar Sophie-Anne foi o rei de Kentucky, o homem que era protegido por Britlingens. Kentucky estava bem apresentado para parecer muito como Davy Crockett. Tudo o que ele precisava era de um urso empalhado e uma boina de pêlo de animal. Ele de verdade estava vestindo calças de couro, camisa e uma jaqueta de camurça, botas de camurça com franjas, e um grande lenço de seda amarrado no pescoço. Talvez ele precisasse de guarda-costas para protegê-lo da polícia da moda.
Eu não vi Batanya e Clovache em nenhum lugar, então eu presumi que ele as havia deixado em seu quarto. Eu não via que vantajoso era contratar guarda-costas caras que não são deste mundo se elas não estavam em torno de seu corpo para protegê-lo. Então, já que eu não tinha outro humano para me distrair, eu notei algo estranho: havia um espaço atrás de Kentucky que ficava constantemente vazio, não importando possivelmente qual o fluxo da multidão. Não importando o quão natural seria para alguém passar por trás de Kentucky para caminhar nessa área, de certo modo ninguém caminhou. Eu calculei que as Britlingens estavam a serviço, afinal de contas.
— Sophie-Anne, você é um colírio para os olhos, — disse Kentucky. Ele tinha um sotaque arrastado que era denso como mel, e ele fez questão de deixar que Sophie-Anne visse que suas presas estavam parcialmente para fora. Aff.
— Isaiah, é sempre bom vê-lo, — disse Sophie-Anne, sua voz e rosto suaves e calmos como sempre.
Eu não poderia dizer se Sophie-Anne sabia ou não que as guardacostas estavam atrás dele. Conforme eu me aproximei um pouco mais, descobri que embora eu não pudesse ver Clovache e Batanya, eu podia pegar suas assinaturas mentais. A mesma magia que ocultava a presença física delas também abafava suas ondas cerebrais, mas eu conseguia perceber um eco moroso de ambas. Eu sorri para elas, que foi realmente tolo de mim parte, porque Isaiah, rei de Kentucky, assimilou imediatamente. Eu deveria ter sabido que ele era mais esperto do que parecia.
— Sophie-Anne, eu quero ter uma conversa contigo, mas você tem que tirar essa pequena garota loira daqui enquanto perdurar, — Kentucky disse com uma cara risonha. — Essa loira peituda me dá calafrios. — Ele acenou na minha direção, como se Sophie-Anne tivesse muitas mulheres humanas louras no rastro dela.
— Claro, Isaiah, — disse Sophie-Anne, me dando um olhar exatamente igual. — Sookie, por favor, vá até o subsolo e traga a mala que o pessoal do hotel mencionou mais cedo.
— Certo, — eu disse. Eu não fiz caso de uma missão modesta. Eu quase tinha esquecido da voz rouca ao telefone no início da noite. Eu achei que era estúpido o procedimento que nos exigia descer às profundezas do hotel, ao invés de permitir que um carregador nos traga a mala, mas a burocracia é a mesma onde quer que você vá, certo?
Quando me virei para ir, o rosto de Andre estava muito inexpressivo, como de costume, mas quando eu estava quase fora de alcance, ele disse, — Desculpe, sua majestade, nós não informamos à garota sobre sua agenda para esta noite. — Em um daqueles flashes desconcertantes de movimento, ele estava ao meu lado, uma mão no meu braço. Eu me perguntei se ele tinha começado uma dessas comunicações telepáticas com Sophie-Anne. Sem uma palavra, Sigebert tomou o lugar de Andre ao lado de Sophie-Anne, meio passo para trás.
— Vamos conversar, — disse Andre, e ligeiro como um piscar de olhos, ele me guiou para uma placa SAÍDA. Encontramo-nos em um corredor de serviço num bege vazio que se estendia por talvez nove metros, então fazia uma curva à direita. Dois garçons carregadores vieram logo em seguida e passaram por nós, nos dando olhares curiosos, mas quando encontrou os olhos de Andre saíram correndo em sua tarefa.
— As Britlingens estão lá, — eu disse, supondo que foi por isso que Andre queria falar comigo em particular. — Elas estão no rastro de Kentucky exatamente atrás. Todos as Britlingens podem se tornar invisíveis?
Andre fez outro movimento que foi tão rápido quanto um borrão, e então seu pulso estava na minha frente, pingando sangue. — Beba, — ele disse, e eu percebi ele empurrando na direção de minha cabeça.
— Não, — eu disse, ultrajada e chocada com o movimento brusco, a exigência, o sangue. — Por quê? — Tentei recuar, mas não havia nenhum lugar para ir e nenhuma ajuda à vista.
— Você tem que ter uma conexão mais forte com Sophie-Anne ou comigo. Nós precisamos de você ligada conosco por mais que um cheque de pagamento. Já que você provou ser mais valiosa do que tínhamos imaginado. Esta cúpula é importante para a nossa sobrevivência, e nós precisamos de todas as vantagens que podemos obter.
Conversa sobre honestidade brutal.
— Eu não quero que vocês tenham controle sobre mim, — eu disse a ele, e foi horrível ouvir minha voz saindo hesitante com medo. — Eu não quero que vocês saibam como eu estou me sentindo. Eu fui contratada para este trabalho, e depois disso, vou voltar à minha vida real.
— Você não tem mais uma vida real, — disse Andre. Ele não parecia cruel; isso foi estranho, e a coisa mais assustadora. Ele parecia absolutamente prático.
— Eu tenho! Vocês são o ponto de luz no radar, não para mim! — Eu não estava totalmente certa com o que eu quis dizer com isso, mas Andre pegou minha intenção.
— Não me importa quais são os seus planos para o resto de sua existência humana, — disse ele, e deu de ombros. Desprezo por sua vida. — Nossa posição será reforçada se você beber, então você deve beber. Eu expliquei isso para você, que não me incomodaria de fazer se eu não respeitasse sua habilidade.
Empurrei-o, mas foi como se empurrasse um elefante. Isso só funcionaria se o elefante se sentisse deslocado. Andre não sentiu. Seu pulso se aproximou da minha boca, e eu apertei meus lábios, mas eu tinha certeza que Andre quebraria meus dentes se ele tivesse que fazer. E se eu abrisse minha boca para gritar, ele teria aquele sangue em minha boca antes que você pudesse dizer Jack Robinson.
De repente houve uma terceira presença no austero corredor bege. Eric, ainda vestindo a capa de veludo preto, capuz atirado para trás, estava de pé exatamente perto de nós, com o rosto atipicamente vago.
— Andre, — disse ele, sua voz soando mais profunda que o habitual. — Por que você está fazendo isso?
— Você está questionando a vontade de sua rainha?
Eric estava em uma posição ruim, porque ele estava definitivamente interferindo com a execução das ordens da rainha - pelo menos, eu supus que a rainha soubesse disso - mas eu só podia rezar para que ele ficasse para me ajudar. Eu o supliquei com os meus olhos.
Eu poderia citar vários vampiros que eu preferiria ter uma ligação do que Andre. E, estupidamente, eu não pude deixar de me sentir magoada. Eu tinha dado a Andre e Sophie-Anne uma boa ideia sobre ele ser o rei do Arkansas, e esta foi a maneira que eu fui recompensada. Isso me ensinaria a manter minha boca fechada. Isso me ensinaria a tratar os vampiros como se fossem pessoas.
— Andre, deixe-me oferecer uma sugestão, — disse Eric em voz muito mais fria, mais calma. Bom. Ele estava mantendo sua cabeça no lugar. Um de nós precisava. — Ela deve ser mantida feliz, ou ela não irá cooperar mais.
Oh, bosta. De alguma forma eu sabia que sua sugestão não seria, — Deixe-a ir, ou eu vou quebrar seu pescoço, — porque Eric era muito prudente para isso. Onde estava o John Wayne quando você precisava dele? Ou Bruce Willis? Ou mesmo Matt Damon? Eu ficaria feliz de ver Jason Bourne agora.
— Nós trocamos sangue várias vezes, Sookie e eu, — disse Eric. — Na verdade, nós fomos amantes. — Ele deu um passo mais perto. — Acho que ela não seria tão teimosa se fosse eu o doador do sangue. Satisfarias seus propósitos? Eu estou sob juramento a ti. — Ele baixou a cabeça respeitosamente. Ele estava sendo cuidadoso, de modo cuidadoso. Isso me fez sentir mais medo de Andre.
Andre me soltou enquanto ele ponderava. Seu pulso estava quase curado, de qualquer maneira. Tomei algumas respirações longas, trôpegas. Meu coração estava disparado.
Andre olhou para Eric, e eu pensei que poderia detectar uma certa desconfiança em seu olhar. Então, ele olhou para mim.
— Você parece um coelho escondido debaixo de um arbusto enquanto a raposa a persegue, — disse ele. Houve uma longa pausa. — Você prestou para minha rainha e para mim um grande serviço, — afirmou. — Mais de uma vez. Se o resultado final for o mesmo, por que não?
Eu comecei a dizer, — E eu sou a única testemunha da morte de Pedro Threadgill, — mas meu anjo da guarda calou minha boca para selar as palavras. Bem, talvez não fosse realmente meu anjo da guarda, mas o meu subconsciente, que me disse para não falar. Seja o que for. Eu estava agradecida.
— Tudo bem, Eric, — disse Andre. — Contanto que ela esteja ligada a alguém em nosso reino. Eu só tive uma gota de seu sangue, para descobrir se ela era parte fada. Se você trocou sangue com ela mais de uma vez, o laço já é forte. Ela tem respondido bem a sua chamada?
O que? Que chamada? Quando? Eric nunca tinha me chamado. Na realidade, eu o tinha desafiado muitas vezes antes.
— Sim, ela se dedica gentilmente, — disse Eric sem uma piscada. Eu quase engasguei, mas isso teria arruinado o efeito das palavras de Eric, então eu olhei para o meu peito como se estivesse envergonhada pela minha escravidão.
— Bem, então, — disse Andre com um gesto impaciente de sua mão. — Continue.
— Aqui mesmo? Preferiria um lugar mais privado, — disse Eric.
— Aqui e agora. — Andre não iria arriscar mais.
Eric disse, — Sookie. — Ele me olhou atentamente.
Eu olhei diretamente para ele. Eu entendi o que aquela única palavra estava dizendo. Não havia maneira de sair disto. Nenhum esforço ou gritaria ou recusa evitaria esse procedimento. Eric poderia ter me poupado de me submeter ao Andre, mas ele foi tão longe quanto podia ir.
Eric levantou uma sobrancelha.
Com aquela sobrancelha arqueada, Eric estava me dizendo que esta era a minha melhor opção, que iria tentar não me machucar, que estar ligada a ele era infinitamente preferível a estar ligada ao Andre.
Eu sabia tudo isso não só porque eu não era estúpida, mas porque nós estávamos ligados. Assim como Eric, Bill teve meu sangue, e eu o deles. Pela primeira vez, entendi que havia uma conexão real. Eu não via os dois mais como humano do que vampiros? Eles não tinham o poder de me ferir mais do que qualquer outro? Não eram apenas os relacionamentos anteriores com os dois que me mantinha ligada a eles. Foi a troca de sangue. Talvez por causa da minha herança incomum, eles não podiam me dar ordens. Eles não tinham controle mental sobre mim, e eles não podiam ler meus pensamentos; e eu não podia fazer qualquer dessas coisas com eles. Mas nós compartilhamos um laço. Com que frequência eu tinha ouvido suas vidas zumbindo longe na obscuridade, sem entender o que eu estava ouvindo? Toma mais tempo dizer tudo isto do que pensar.
— Eric, — eu disse e inclinei minha cabeça para um lado. Ele leu na mesma medida o gesto e a palavra como eu tinha lido. Ele andou até mim e estendeu seus braços para segurar o manto negro quando ele se inclinou sobre mim, assim o manto e o capuz poderiam nos dar alguma ilusão de privacidade. O gesto foi cafona, mas a ideia era boa. — Eric, sem sexo, — eu disse com uma voz tão dura como eu podia. Eu poderia tolerar isso se não for como uma troca de sangue entre amantes. Eu não teria relações sexuais na frente de outra pessoa. A boca de Eric estava na curva do meu pescoço e ombro, e seu corpo pressionou contra o meu. Meus braços deslizaram em torno dele, porque era simplesmente a maneira mais fácil para me acomodar. Então ele mordeu, e eu não pude abafar um suspiro de dor.
Ele não interrompeu, graças a Deus, porque eu queria acabar com aquilo. Uma de suas mãos acariciou minhas costas como se ele estivesse tentando me apaziguar.
Depois de uns poucos segundos, Eric lambeu meu pescoço para ter certeza que sua saliva carregada de coagulante tinha revestido as pequenas feridas. — Agora, Sookie, — ele disse em meu ouvido direito. Eu não podia alcançar seu pescoço a menos que estivéssemos deitados, nem se ele se curvasse desajeitadamente. Ele começou a segurar seu pulso até minha boca, mas teríamos que nos reorganizar para que funcionasse. Eu desabotoei sua camisa para abrir. Eu hesitei. Eu sempre odiei esta parte, porque os dentes humanos não são tão afiados como dentes de vampiro, e eu sabia que ia ser uma bagunça quando eu mordesse. Eric fez algo que me surpreendeu, então; ele apresentou a mesma pequena faca cerimonial que tinha usado no casamento de Mississippi e Indiana. Com o mesmo movimento rápido que ele tinha aplicado em seus pulsos, Eric talhou um corte em seu peito logo abaixo de seu mamilo. O sangue gotejou lentamente para fora, e eu tirei vantagem do fluxo depois de certa dificuldade. Isso foi embaraçosamente íntimo, mas pelo menos eu não tive que olhar para Andre, e ele não podia me ver.
Eric se moveu impacientemente, e eu percebi que ele estava ficando excitado. Não havia nada que eu pudesse fazer a respeito, e eu mantive nossos corpos separados por alguns centímetros cruciais. Eu suguei firme, e Eric fez um pequeno ruído, mas eu estava tentando acabar rápido com aquilo. O sangue de vampiro é espesso e quase doce, mas quando você pensa no que está realmente fazendo e não está sexualmente estimulada, isso não era agradável em nenhuma hipótese. Quando eu achei que tinha feito o suficiente, eu soltei Eric e abotoei novamente sua camisa de com mãos trêmulas, pensando que este pequeno incidente estava terminado e que eu poderia me esconder em algum lugar até que o meu coração parasse de bater.
E então Quinn abriu a porta violentamente e entrou no corredor.
— Que diabos você está fazendo? — Ele rugiu, e eu não tinha certeza se ele queria dizer para mim, Eric, ou Andre.
— Eles estão obedecendo ordens, — disse Andre categoricamente.
— Minha mulher não tem que receber ordens suas, — disse Quinn.
Eu abri minha boca para protestar, mas nestas circunstâncias, era difícil dizer ao Quinn que eu poderia cuidar de mim.
Não havia um manual de etiqueta para cobrir uma calamidade como esta, e até a regra multiuso de etiqueta de minha avó (— Faça o que deixará com que todos fiquem mais confortáveis— ) não poderia remotamente se aplicar para abranger a minha situação. Fiquei imaginando o que diria Dear Abby.
— Andre, — eu disse, tentando parecer firme em vez de intimidada e amedrontada, — Eu irei terminar o trabalho que me comprometi a fazer para a rainha, porque concordei com isso. Mas eu nunca mais irei trabalhar para vocês novamente. Eric, obrigada por tornar isso tão agradável para mim quanto você pôde. — (Entretanto agradável dificilmente parecia ser a palavra certa).
Eric tinha cambaleado um passo para se encostar na parede. Ele permitiu que a capa abrisse, e a mancha em sua calça ficou claramente visível. — Oh, sem problemas, — Eric disse de maneira sonhadora.
Isso não ajudou. Eu suspeitei que ele estava fazendo isso de propósito. Eu senti calor surgir em minhas bochechas. — Quinn, falarei contigo mais tarde, como nós combinamos, — eu respondi bruscamente. Então eu hesitei. — Quer dizer, se você ainda estiver disposto a falar comigo. — Pensei, mas não podia dizer porque teria sido extremamente injusto que teria sido mais útil se ele tivesse chegado dez minutos mais cedo ... ou não em qualquer caso.
Olhando nem para à direita nem à esquerda, me obriguei a caminhar pelo corredor, pegando à direita, e passei através de uma porta vaivém que dava diretamente para a cozinha.
Claramente não era onde eu queria estar, mas pelo menos estava distante dos três homens no corredor.
— Onde fica a área de bagagem? — Eu perguntei à primeira pessoa uniformizada que eu vi. Ela era uma garçonete carregando taças com sangue sintético numa enorme bandeja redonda, e ela não interrompeu sua tarefa, mas acenou com a cabeça na direção de uma porta na parede sul dizendo SAÍDA. Eu estava chegando num monte dessas placas esta noite.
Esta porta era mais pesada e conduzia a um lance de escadas que descia para um nível inferior, o que eu calculei que ficava realmente no subterrâneo. Não temos porões de onde eu venho (o lençol freático é muito alto), por isso me deu um pequeno frisson estar abaixo do nível da rua.
Eu estava andando como se alguma coisa estivesse me perseguindo, o que de uma forma não literal era absolutamente verdadeiro, e eu estava pensando na maldita mala assim eu não teria como pensar em outra coisa. Mas quando cheguei ao destino, fiquei completamente imobilizada.
Agora que eu estava fora de vista e verdadeiramente sozinha, eu levei um tempo para ficar parada, uma mão apoiada contra a parede. Deixei-me reagir ao que tinha acontecido. Eu comecei a tremer, e quando eu toquei meu pescoço, me dei conta que meu colarinho parecia esquisito.
Eu arranquei o tecido e dei uma espécie de torcida para o lado e para baixo para dar uma olhada. O colarinho estava manchado com meu sangue. Lágrimas começaram a inundar os meus olhos, e eu agachei meu quadril no patamar daquela escada fria em uma cidade longe de casa.
EU SIMPLESMENTE NÃO PODIA PROCESSAR o que tinha acabado de acontecer; não coincidia com a imagem interior de mim mesma ou como eu me comportava. Eu pude apenas pensar, você tinha que estar presente. E mesmo assim não soava convincente.
Ok, Sookie, eu disse a mim mesma. O que mais você poderia ter feito? Não era a hora de fazer uma reflexão detalhada, mas um rápido exame das minhas opções deu zero. Eu não poderia ter repelido Andre ou persuadi-lo a me deixar em paz. Eric poderia ter confrontado Andre, mas ele escolheu não fazer porque ele queria manter sua posição na hierarquia da Louisiana, e também porque ele poderia ter perdido. Mesmo se ele tivesse a chance de ganhar, a penalidade seria incrivelmente pesada. Vampiros não brigam a favor dos humanos.
Do mesmo modo, eu poderia ter escolhido morrer a me sujeitar à troca de sangue, mas eu não tinha tanta certeza de como eu teria conseguido isso, e eu estava certa de que eu não queria.
Simplesmente não havia nada que eu poderia ter feito, pelo menos nada que viesse à minha mente enquanto eu me agachava ali atrás da escada bege sem cor.
Me recuperei, sequei meu rosto com um lenço de papel do meu bolso e endiretei o meu cabelo. Me levantei ereta. Eu estava no caminho certo para recuperar a minha auto-imagem. Eu teria que guardar o resto para mais tarde.
Eu empurrei para abrir a porta de metal e pisei para dentro de uma aérea cavernosa pavimentada com concreto. Enquanto eu progredia mais para a área de trabalho do hotel (começando com o primeiro plano do corredor bege), a decoração se reduzia ao mínimo. Essa área era absolutamente funcional.
Ninguém prestou a mínima atenção em mim, então eu dei uma boa olhada ao redor. Não é como se eu estivesse ansiosa para correr de volta para a rainha, certo? Do outro lado do andar, tinha um enorme elevador industrial. Esse hotel fora projetado com tão poucas aberturas para o mundo exterior quanto possível, para minimizar as chances de intrusos, tanto humanos quanto o sol inimigo. Mas o hotel tinha que ter pelo menos uma grande plataforma para carregar e descarregar caixões e provisões. Esse era o elevador que servia a essa plataforma. Os caixões entravam por aqui antes de serem levados aos seus respectivos quartos. Dois homens uniformizados e armados com espingardas estavam em pé na frente do elevador, mas eu tenho que dizer que eles pareciam notavelmente entediados, de forma alguma se assemelhavam como os alertas cães de guarda do saguão.
Em uma área ao lado da parede distante, a esquerda do imenso elevador, algumas malas que estavam amontoadas como se estivessem sido abandonadas em um curral de malas, uma área delimitada por aqueles postes que contém tiras retráteis que são usadas para conter a multidão em aeroportos. Ninguém pareceu estar encarregado delas, então eu caminhei até lá - e era uma longa caminhada - e comecei a ler as etiquetas. Já tinha um lacaio como eu investigando totalmente a bagagem, um homem jovem com óculos e vestindo um terno executivo.
— O que você está procurando? — eu perguntei — Se eu encontrálo enquanto procuro, eu posso pegar pra você.
— Boa ideia. A recepção me ligou para dizer que tinha uma mala aqui em baixo que não tinha chegado no quarto, então aqui estou eu. A etiqueta deveria dizer ‚Phoebe Golden, Rainha de Iowa‛ ou algo parecido. E você?
— Sophie-Anne Leclerq, Louisiana.
— Uau, você trabalha pra ela? Ela fez aquilo?
— Não, e eu sei porque eu estava lá, — eu respondi, e o seu rosto curioso ficou ainda mais curioso. Mas ele soube perceber que eu não diria nada mais sobre isso, e ele prosseguiu procurando.
Eu estava surpresa com o número de malas no curral.
— Como pode, — eu perguntei ao jovem homem, — eles não podem simplesmente levar essas coisas e deixá-las nos quartos? Como o resto da bagagem?
Ele deu de ombros — Eu disse que isso era um tipo de questão de responsabilidade. Nós temos que identificar nossas malas pessoalmente, então eles podem dizer que fomos nós os que as pegaram. Ei, essa é a que eu quero, — ele disse depois de um momento. — Eu não consigo ler o nome do dono, mas diz que é de Iowa, então isso deve pertencer a alguém do nosso grupo. Bem, adeus, prazer em falar contigo. — Ele saiu muito rápido com uma bolsa preta com rodas.
Imediatamente depois disso, eu encontrei a bendita bagagem. Uma mala de couro azul etiquetada com — Xerife, Área — bom, ela estava muito rabiscada para decifrar. Os vampiros usam todos os tipos de escrita, dependendo da educação que eles tiveram e na época em que nasceram. — Louisiana— a etiqueta dizia. Eu peguei a velha mala e a levantei sobre a barreira. A escrita não ficou clara de qualquer forma perto dos meus olhos. Como meu colega de Iowa, eu decidi que o melhor rumo seria subir com ela e mostrá-la por aí até que alguém a reclamasse.
Um dos guardas armados virou-se no meio do caminho do seu posto para descobrir o que eu estava fazendo.
— Onde você está indo com isso, belezura? — ele intimou.
— Eu trabalho para a Rainha da Louisiana. Ela me mandou para pegá-la, — eu respondi.
— Seu nome?
— Sookie Stackhouse.
— Ei, Joe! — ele gritou para um colega de trabalho, um cara pesado que estava sentado atrás de uma mesa muito feia onde exibia um computador maltratado. — Cheque o nome Stackhouse, valeu?
— Sem dúvida, — Joe respondeu, arrancando seu olhar do jovem de Iowa, que estava parcialmente visível no outro lado do espaço cavernoso. Joe me observou com a mesma curiosidade. Quando ele viu que eu reparei, ele pareceu culpado e começou a digitar no teclado. Ele olhava a tela do computador como se este fosse dizer a ele tudo que ele precisasse saber, e para os propósitos do seu trabalho, talvez ele estivesse certo.
— Ok, — Joe gritou para o guarda — Ela está na lista. — Essa era a voz brusca que eu lembrei na conversa telefônica. Ele voltou a me encarar, e apesar de todas as outras pessoas do espaço cavernoso estivessem tendo pensamentos em branco, neutros, os de Joe não estavam. Os pensamentos estavam blindados. Eu nunca encontrei algo assim. Alguém colocou um escudo metafísico na cabeça dele. Eu tentei atravessar por ela, ao redor, por baixo, mas ela permaneceu no mesmo lugar. Enquanto eu remexia aqui e ali, tentando entrar nos seus pensamentos, Joe estava olhando pra mim com uma expressão zangada. Eu não acho que ele soubesse o que eu estava fazendo. Eu achei que ele era um mal-humorado.
— Com licença, — eu pedi, chamando de modo que minha pergunta pudesse alcançar os ouvidos do Joe. — A minha foto está com o meu nome na sua lista?
— Não, — ele respondeu, bufando como se eu tivesse feito uma pergunta estranha. — Nós temos uma lista de todos os nossos hóspedes e quem eles trouxeram consigo.
— Então como você sabe quem eu sou?
— Hein?
— Como você sabe que eu sou Sookie Stackhouse?
— Não é você?
— Sou.
— Então o que você está reclamando? Dá o fora daqui com essa maldita mala. — Joe olhou para seu computador, e o guarda deu uma volta para encarar o elevador. Essa deve ser a lendária grosseria Ianque, eu pensei.
A mala não tinha um mecanismo de rodas; nenhum relato de quanto tempo o dono a tinha. Eu a peguei e marchei de volta para a porta das escadas. Tinha outro elevador próximo a porta, eu percebi, mas não era nem a metade do tamanho do outro que dava acesso ao exterior. Ele poderia carregar caixões, verdade, mas talvez só um de cada vez.
Eu já tinha aberto a porta das escadas quando me dei conta que se eu fosse por esse caminho eu teria que passar pelo corredor de serviço outra vez. E se Eric, Andre e Quinn estivessem ainda lá? E se eles tivessem rasgado as gargantas um dos outros? Embora apenas no momento tal cenário não me deixaria desolada, decidi me privar a chance de um encontro. Peguei o elevador em vez disso. Ok, covardemente, mas uma mulher só pode lidar com o suficiente em uma noite.
Esse elevador era definitivamente para os peões. Tinha acolchoamento nas paredes para impedir que o carregamento fosse danificado. Servia só para os primeiros quatro andares: porão, saguão, mezzanino, andar humano. Depois disso, a forma da pirâmide ditava que para subir você teria que ir ao centro para pegar um dos elevadores que subiam para todos os andares. Isso tornava a remoção dos caixões um processo lento, eu pensei. O pessoal da Pirâmide trabalhava duro por seu dinheiro.
Eu decidi levar a mala direto para a suíte da rainha. Eu não sabia o que mais fazer com ela.
Quando eu saí no andar de Sophie-Anne, a área do vestíbulo ao redor do elevador estava vazia e silenciosa. Provavelmente todos os vampiros e seus acompanhantes estivessem no térreo no sarau. Alguém tinha deixado uma lata de refrigerante descartada deitada em um grande vaso, audaciosamente padronizado contendo algum tipo de árvore de pequeno porte. O vaso estava posicionado contra a parede entre os dois elevadores. Eu acho que a árvore era um tipo de palmeira pequena, para manter o tema egípicio. A estúpida lata de refrigerante me incomodou. Claro, havia o pessoal da manutenção do hotel cujo trabalho era manter tudo limpo, mas o hábito de recolher estava impregnado em mim. Eu não sou doente por limpeza, mas mesmo assim. Esse era um lugar bonito, e algum estúpido estava colocando lixo por aí. Me aproximei com a intenção de recolher a maldita coisa com a minha mão direita livre, planejando arremessá-la no primeiro lixo de latas disponível.
Mas ela estava um pouco mais pesada do que deveria.
Eu coloquei a mala no chão para olhar a lata mais perto, sustentando-a com ambas as mãos. A cor e a forma faziam o cilindro parecer uma lata de Dr. Pepper (refrigerante à base de cola) em quase todo o aspecto, mas não era. A porta do elevador moveu ruidosamente se abrindo novamente, e Batanya saiu com uma arma de estranha aparência numa mão e uma espada na outra. Olhando através do ombro da guardacostas no elevador eu vi o Rei de Kentucky, que me olhou de volta com curiosidade.
Batanya parecia um pouco surpresa de me ver parada ali, estática diante da porta. Ela vasculhou a área, então ela apontou a sua estranha arma cuidadosamente para o chão. A espada permaneceu pronta na sua mão esquerda. — Você poderia dar um passo para a minha esquerda? — ela pediu educadamente — O rei quer fazer uma visita a esse quarto. — Sua cabeça indicou para um dos quartos à direita.
Eu não me mexi, não pude pensar no que dizer.
Ela reparou a maneira como eu estava em pé e na minha expressão facial. Ela disse de uma maneira simpática, — Eu não sei porque vocês bebem essas coisas gasosas. Elas me dão gases, também.
— Não é isso.
— Tem algo errado?
— Isso não é uma lata vazia, — eu respondi.
O rosto de Batanya congelou. — O que você acha que é? — ela perguntou muito, muito calmamente. Essa era a expressão do filme Big Trouble (Grande Problema - filme de 2002 com Tim Allen e Rene Russo).
— Isso pode ser uma câmera espiã, — eu respondi esperançosa. — Ou, veja, eu estou achando que isso pode ser uma bomba. Porque não é uma lata de verdade. Está cheia de algo pesado, e esse peso não é fluido. — Não apenas não havia a argola no topo da lata, mas o conteúdo não espirrava.
— Eu entendo, — Batanya disse. Outra vez com calma. Ela apertou um pequeno painel na sua armadura sobre seu peito, uma área azul escura do tamanho de um cartão de crédito. — Clovache, — ela disse. — Dispositivo desconhecido no quarto andar. Eu estou levando o rei de volta.
A voz de Clovache disse, — O quão grande é o dispositivo? — Seu sotaque era mais ou menos como o russo, pelo menos para os meus ouvidos pouco viajantes (— O quão grrrrrrrrrrrande....? — )
— Do tamanho de uma daquelas latas de xarope adoçado, — Batanya respondeu.
— Ah, as bebidas que arrotam, — Clovache disse, boa memória Clovache, eu pensei.
— Sim. A garota Stackhouse a notou, não eu, — Batanya disse com desagrado. — E agora ela está parada com isso nas mãos.
— Diga para ela para colocar no chão, — avisou a invisível Clovache com uma simplicidade de quem expressa um fato óbvio.
Atrás de Batanya, o Rei de Kentucky começava a parecer muito nervoso. Batanya espiou por cima do seu ombro para ele. — Traga uma equipe anti-bomba da unidade de policia local até aqui, — Batanya disse para Clovache. — Eu estou levando o rei de volta.
— O tigre está aqui, também, — Clovache disse. — Ela é sua mulher.
Antes que eu pudesse dizer, — Pelo amor de Deus, não o mande subir, — Batanya apertou o retângulo de novo e ele ficou preto.
— Eu tenho que proteger o rei, — Batanya disse com uma desculpa em sua voz. Ela recuou para dentro do elevador, esmurrou o botão e me deu um aceno com a cabeça.
Nada me assustou tanto quanto essa inclinação de cabeça. Era um sinal de despedida. E a porta se fechou.
Ali eu estava, sozinha no andar silencioso do hotel, segurando um dispositivo mortal. Talvez.
Nenhum dos elevadores deu qualquer sinal de vida. Ninguém saiu pelas portas do quarto andar, e ninguém entrou nelas. A porta das escadas não se moveu. Houve um longo e mortal momento em que eu não fiz nada a não ser aguentar e segurar a lata de Dr Pepper falsa. Eu respirei um pouco, também, mas nada muito violento.
Com uma explosão de som que me fez sobressaltar a ponto de eu quase deixar a lata cair no chão, Quinn irrompeu no andar. Ele tinha subido as escadas numa pressa enorme se a sua respiração fosse qualquer indicação. Eu não podia poupar os recursos cerebrais para averiguar o que estava ocorrendo em sua cabeça, mas o seu rosto mostrava nada que apenas a mesma expressão de calma de Batanya exibiu. Todd Donati, o cara da segurança, estava exatamente na cola de Quinn. Eles pararam cerca de um metro de distância de mim.
— O esquadrão anti-bombas está chegando, — Donati disse, destacando as boas notícias.
— Coloque onde isso estava, benzinho, — Quinn disse.
— Ah, é, eu quero colocar isso de volta onde estava, — eu disse. — Eu só estou com medo de fazer. — Parecia que eu não movia um músculo em um milhões de anos, e eu já estava começando a ficar cansada. Mas eu continuava em pé olhando para a lata que eu segurava com ambas as mãos. Prometi para mim mesma que nunca mais tomaria outra Dr Pepper enquanto eu vivesse, eu realmente tinha sido apreciadora da bebida antes desta noite.
— Ok, — Quinn disse, estendendo sua mão. — Me dê isso.
Eu nunca quis tanto fazer algo em toda a minha vida.
— Não até a gente saber o que é isso, — eu disse. — Talvez seja uma câmera. Talvez algum tablóide esteja tentando obter fotos de dentro da grande cúpula vampírica. — Eu tentei sorrir. — Talvez seja um pequeno computador, contando vampiros e humanos enquanto eles passam. Talvez seja uma bomba que a Jennifer Cater plantou antes de ser morta. Talvez ela quisesse explodir a rainha. — Eu tive alguns minutos para pensar sobre isso.
— E talvez isso vá arrancar a sua mão fora, — ele disse. — Me deixe pegar isso, benzinho.
— Você tem certeza que quer mesmo fazer isso, depois de hoje à noite? — perguntei com tristeza.
— Nós podemos conversar sobre isso depois. Não se preocupe. Só me dê a maldita lata.
Percebi que Todd Donati não se ofereceu, e ele já tinha uma doença fatal. Ele não queria sair dessa como um herói? O que havia de errado com ele? Na mesma hora tive vergonha de mim mesma por pensar dessa forma. Ele tinha uma família, e queria cada minuto com ela.
Donati estava suando visivelmente, e ele parecia branco como um vampiro. Ele estava falando com um pequeno fone de ouvido que estava usando, retransmitindo o que ele estava vendo para... alguém.
— Não, Quinn. É necessário alguém com uma daquelas vestimentas especiais para pegá-la, — eu disse. — Eu não estou me movendo. A lata não está se movendo. Nós estamos bem. Até que um daqueles caras especiais venha aqui. Ou garotas especiais, — eu adicionei com interesse de justiça. Eu estava me sentindo um pouco zonza. Os vários choques da noite estavam pesando em mim, eu estava começando a tremer. E mais, eu achava que estava louca por fazer isso; e mesmo assim eu estava aqui, fazendo. — Alguém tem visão de raio X? — eu perguntei, tentando rir — Onde está o super-homem quando você precisa dele?
— Você está tentando ser uma mártir para essas coisas malditas? — Quinn perguntou, e eu percebi que as — coisas malditas— eram os vampiros.
— Rá, — eu disse. — Oh, rá-rá. É, porque eles me amam. Você está vendo quantos vampiros há aqui? Zero, certo?
— Um, — disse Eric, saindo da porta das escadas. — Nós estamos atados muito fortemente para o meu gosto, Sookie. — ele estava visivelmente tenso; eu não conseguia lembrar alguma vez ter visto Eric tão ansioso. — Eu estou aqui para morrer contigo, pelo jeito.
— Ótimo. Para tornar o meu maldito dia absolutamente completo, aqui está Eric novamente, — eu disse, e se eu soei um pouco sarcástica, bom, eu estava no meu direito. — Vocês estão completamente malucos? Dêem o fora daqui!
Com uma voz enérgica, Todd Donati disse, — Bom, eu vou. Você não vai deixar ninguém pegar a lata, você não vai largá-la, e você não terá explodido ainda. Então eu acho que vou descer e esperar o esquadrão anti-bombas.
Eu não podia culpar sua lógica. — Obrigada por chamar as tropas, — eu disse, e Donati pegou as escadas, porque o elevador estava muito próximo de mim. Eu pude ler a sua mente facilmente, e ele se sentia profundamente envergonhado por não ter na prática me oferecido ajuda de uma maneira mais concreta. Ele planejou descer para um andar onde ninguém pudesse vê-lo e então pegar o elevador para se fortalecer. A porta das escadas se fechou atrás dele e então ficamos nós três parados sozinhos em posição triangular numa cena dramática: Quinn, Eric e eu. Isso era simbólico, ou o que?
Minha cabeça se sentia leve.
Eric começou a se mover muito lenta e cautelosamente - acho que para eu não ficar alarmada. Em pouco tempo, ele estava junto ao meu cotovelo. O cérebro de Quinn estava palpitante e pulsando como uma bola de discoteca mais distante à minha direita. Ele não sabia como me ajudar, e é lógico, estava com um bocado de medo do que pudesse acontecer.
Quem sabia, com Eric? À parte de ser capaz de localizá-lo e determinar como ele estava orientado em relação a mim, eu não conseguia ver mais nada.
— Você vai dar isso pra mim e partir, — Eric disse. Ele estava empurrando a sua influência vampírica com toda a força na minha cabeça.
— Não vai funcionar, nunca funcionou, — eu resmunguei.
— Você é uma mulher teimosa, — ele disse.
— Eu não sou, — eu disse a beira das lágrimas, primeiro por ser acusada de nobreza, e depois de teimosa. — Eu só não quero mexê-lo. É mais seguro!
— Alguns podem pensar que você é suicida.
— Bem, ‚alguns‛ podem enfiar isso na bunda.
— Benzinho, coloque-a no vaso. Apenas coloque muuuuuuito devagar, — disse Quinn, com sua voz muito gentil. — Então eu irei buscar para você uma bebida grande com muito álcool. Você é uma garota muito forte, sabia disso? Eu estou orgulhoso de você, Sookie. Mas se você não largar isso agora e der o fora daqui, eu vou ficar muito zangado, você me ouviu? Eu não quero que nada aconteça contigo. Isso seria maluquice, certo?
Eu fui salva de mais um debate com a chegada de outra entidade na cena. A policia mandou um robô pelo elevador.
Quando as portas se abriram ruidosamente todos nós pulamos, porque nós estávamos tão concentrados no drama que não percebemos o barulho do elevador. Eu na verdade dei uma risadinha quando o robô atarracado rolou para fora do elevador. Eu comecei a estender a bomba para ele, mas percebi que o robô supostamente não iria pegá-la. Ele parecia ser operado por controle remoto, e ele girou levemente para me encarar diretamente. Ele permaneceu imóvel por alguns minutos para dar uma boa olhada em mim e para o que estava em minhas mãos. Após um minuto ou dois de exame, o robô recuou em direção ao elevador e seu braço se estendeu espasmodicamente para apertar o botão correto. As portas se fecharam, e ele partiu.
— Eu odeio tecnologia moderna, — Eric disse calmamente.
— Não é verdade, — eu disse. — Você adora o que os computadores podem fazer para você. Eu sei disso de fato. Lembra como você ficou feliz quando viu a lista de funcionários do Fangtasia, com todas as horas de trabalho preenchidas?
— Eu não gosto da impessoalidade. Eu gosto do conhecimento que pode conter.
Para mim essa foi uma conversa estranha demais para continuar sob aquelas circunstâncias.
— Alguém está subindo as escadas, — Quinn disse, e abriram a porta das escadas.
O cara da desativação de bombas caminhou até o nosso pequeno grupo. O esquadrão de homicídios não podia ostentar qualquer tira vampiro, mas o esquadrão anti-bombas sim. O vampiro vestia uma daquelas roupas parecidas com trajes espaciais. (Mesmo que você consiga sobreviver, eu acho que explodir não é uma boa experiência). Alguém tinha escrito ‚BOOM‛ no seu peito onde normalmente deveria estar um crachá. Oh, isso foi tão engraçado.
— Vocês dois civis precisam deixar o andar para a moça e eu, — Boom disse, movendo-se vagarosamente cruzando o andar em minha direção. — Caiam fora, caras, — ele disse quando nenhum dos homens se mexeu.
— Não, — disse Eric.
— Vá pro inferno, não, — disse Quinn.
Não é fácil encolher os ombros dentro daqueles trajes, mas Boom conseguiu. Ele estava segurando um recipiente quadrado.
Francamente, eu não estava com humor para dar uma olhada naquilo, e tudo que me importou foi que ele abriu a tampa e a segurou, cuidadosamente colocando-a sob as minhas mãos.
Muito, muito cuidadosamente eu abaixei a lata até o interior acolchoado do recipiente. Eu a deixei lá e tirei minhas mãos para fora do recipiente com um alívio que eu nem consigo descrever, e Boom fechou o recipiente, ainda sorrindo alegremente através da proteção para o seu rosto claro. Me tremi toda, minhas mãos tremendo violentamente por ter saído da posição.
Boom se virou, devagar devido ao traje, e gesticulou para que Quinn abrisse a porta das escadas novamente. Quinn abriu, e o vampiro desceu as escadas: devagar, cuidadosamente, equilibradamente. Talvez ele sorrisse durante todo o caminho. Mas ele não explodiu, porque eu não ouvi qualquer barulho, e eu tenho que dizer que nós ficamos congelados em nossos lugares por um longo tempo.
— Oh, — eu disse, — Oh. — Isso não foi brilhante, mas eu estava aproximadamente em milhares de pedaços emocionais. Meus joelhos cederam.
Quinn saltou sobre mim e envolveu seus braços à minha volta. — Sua idiota, — ele disse. — Sua idiota. — Era como se ele estivesse dizendo, — Obrigado, Deus. — Eu estava sendo sufocada pelo homemtigre, e esfreguei meu rosto contra sua camisa E(E)E para enxugar as lágrimas que escapavam dos meus olhos.
Quando eu espreitei pelo seu braço, não tinha mais ninguém na área. Eric tinha desaparecido. Então eu tive um momento para aproveitar ser abraçada, saber que Quinn ainda gostava de mim, que a coisa com Andre e Eric não tinha matado todos os sentimentos que ele tinha começado a ter por mim. Eu tive um momento para sentir o alívio absoluto por ter escapado da morte.
Então o elevador e a porta das escadas se abriram ao mesmo tempo, e todo o tipo de pessoas querendo falar comigo.
— FOI UMA BOMBA, — Todd Donati disse. — Uma bomba tosca, de detonação rápida. A polícia me dirá mais, espero, depois de que tenham terminado sua investigação. — O chefe da segurança estava sentado na suíte da rainha.
Eu finalmente tinha conseguido arrumar a mala azul perto de um seus sofás, e, cara, eu fiquei feliz de me livrar dela.
Sophie-Anne não se deu ao trabalho de me agradecer por trazê-la de volta, mas eu não esperava isso dela mesmo, eu acho. Quando você tem subalternos, você os manda em missões e não tem que agradecê-los. É por isso que são subalternos. Por falar nisso, eu não tinha certeza se aquela coisa estúpida fosse mesmo dela.
— Acho que vou ser despedido por isso, especialmente depois dos assassinatos, — o chefe da segurança disse. Sua voz estava calma, mas seus pensamentos estavam amargurados. Ele precisava do seguro saúde.
Andre deu ao chefe da segurança uma de suas longas, olhadas azuis. — E como a lata veio aparecer no andar da rainha, nessa área? — Andre não seria capaz de ter se importado menos com a situação do emprego de Todd Donati. Donati o encarou de volta, mas foi um tipo cansado de olhar.
— Por que em nome de Deus você seria despedido, só porque alguém foi capaz de trazer uma bomba e plantá-la? Talvez porque seja você o responsável pela segurança de todos no hotel? — Gervaise perguntou, definitivamente de um jeito cruel. Eu não conhecia muito bem o Gervaise, e estava começando a achar que pra mim estava muito bom assim.
Cleo deu um tapa no braço dele, forte o bastante para fazer Gervaise sobressaltar.
Donati disse, — Em poucas palavras, é isso aí. Obviamente alguém trouxe aquela bomba e colocou no vaso de planta perto da porta do elevador. Pode ter sido destinado à rainha, já que estava mais próxima da porta dela. Quase da mesma forma, pode ter sido destinada para qualquer outra pessoa no andar, ou pode ter sido plantada ao acaso. Então, eu acho que a bomba e o assassinato dos vampiros do Arkansas são dois casos diferentes. Em nossa investigação, achamos que Jennifer Cater não tinha muitos amigos. Sua rainha não é a única com um rancor contra ela, entretanto sua rainha é o caso mais sério. Possivelmente Jennifer plantou a bomba, ou planejou ter alguém que o fizesse, antes dela ser assassinada.
Eu vi Henrik Feith sentando em um cantinho da suíte, sua barba se agitando com a sacudida de sua cabeça. Tentei imaginar o único membro remanescente do contingente de Arkansas se esgueirando por ai com uma bomba, e isso simplesmente não entrava na minha cabeça. O pequeno vampiro parecia convencido que ele estava em um ninho de víboras. Eu tinha certeza que ele estava se arrependendo por ter aceitado a proteção da rainha, porque agora mesmo isso não parecia uma perspectiva muito segura.
— Há muito o que fazer aqui e agora, — disse Andre. Ele soava só um pouco preocupado, e mantinha sua própria sequência de conversa. — Christian Baruch foi imprudente ao ameaçar despedi-lo agora, quando ele mais precisa de sua lealdade.
— O cara é temperamental, — Todd Donati disse, e eu soube sem dúvida alguma que ele não era nativo de Rodhes. Quanto mais estressado ele ficava, mais familiar ele parecia; não da Louisiana, possivelmente, a não ser do norte do Tennessee. — A demissão não foi apresentada ainda. E se conseguirmos chegar ao fundo do que está acontecendo, talvez eu receba meu emprego de volta. Poucas pessoas gostariam deste trabalho. A maior parte do pessoal da segurança não gosta de...
Trabalhar com os malditos vampiros, Donati completou sua frase silenciosamente para todo mundo exceto para mim e para ele. Ele se lembrou bruscamente de voltar ao imediato presente. — ... não gostam do tempo que levam pra checar a segurança num lugar grande como este, — ele terminou em voz alta, para benefício dos vampiros. — Mas eu gosto do trabalho. — Meus filhos vão precisar dos benefícios quando eu morrer. Só mais dois meses e eles ficaram cobertos quando eu me for.
Ele tinha vindo à suíte da rainha para falar comigo sobre o incidente com o Dr Pepper (assim como a polícia, e o sempre presente Christian Baruch), mas ele continuou conversando. Embora os vampiros não parecessem notar, Donati estava tão falador porque tinha tomado uns remédios pesados para dor. Eu sentia pena dele, e ao mesmo tempo me dava conta de que alguém com tantas distrações não estava bem para fazer um bom trabalho. O que tinha passado por Donati nos últimos meses, desde que sua doença tinha começado a afetar sua vida diária?
Talvez ele tenha contratado as pessoas erradas. Talvez ele tenha omitido algum passo vital em proteger os hóspedes do hotel. Talvez - eu fui distraída por uma onda de calor.
Eric estava chegando.
Nunca tinha sentido sua presença tão claramente, e eu senti meu coração no estômago quando percebi que a troca de sangue tinha sido tão importante. Se minha memória estava certa, foi a terceira vez que tinha tomado o sangue de Eric, e três é sempre um número significativo. Senti uma constante percepção de sua presença quando ele estava em qualquer lugar perto de mim, e eu tinha que acreditar que ele sentia o mesmo. Pode haver ainda mais que o laço agora, mais do que eu já tinha experimentado. Fechei meus olhos e me curvei para descansar minha testa nos meus joelhos.
Houve uma batida na porta, e Sigebert atendeu depois de olhar cuidadosamente através do olho mágico. Ele deixou Eric entrar. Eu mal consegui me forçar a olhar para ele ou cumprimentá-lo casualmente. Deveria estar agradecida ao Eric, e eu sabia; que de certo modo estava. Tomar sangue de Andre teria sido intolerável. Rabisque isso: eu teria que tolerar. Teria sido repugnante. Mas trocar sangue não tinha sido de modo algum uma escolha eu tive que fazer, e eu não ia esquecer isso.
Eric se sentou no sofá ao meu lado. Eu pulei como se tivesse sido cutucada por um aguilhão para tanger gado e cruzei o quarto até o bar para me servir um copo de água. Não importava onde eu fosse, podia sentir a presença de Eric; para ficar ainda mais inquietante, eu descobri que sua proximidade era de algum jeito reconfortante, como se fizesse me sentir mais segura.
Ah, que ótimo.
Não havia outro lugar para me sentar. Me acomodei miseravelmente ao lado do viking, que agora possuía uma parte de mim. Antes desta noite, quando via Eric, eu sentia simplesmente um prazer casual - embora eu tenha pensado nele talvez um pouco mais frequentemente do que uma mulher deve pensar a respeito de um homem que viverá por séculos depois dela.
Eu me lembrei que isso não era culpa de Eric. Eric podia ser político, e ele podia estar focado em procurar ser líder (o qual se soletrava E-R-I-C), mas não entendia como ele pôde ter suspeitado da intenção de Andre e nos alcançado convencendo-o pela lógica, com qualquer grau de premeditação. Então eu devia um grande obrigado ao Eric, não importa como você enxergue isso, mas essa não seria uma conversa que teríamos em qualquer parte perto da rainha e do antes mencionado Andre.
— Bill ainda está vendendo seu disquinho de computador no andar térreo, — Eric comentou comigo.
— E aí?
— Pensei que talvez você estaria se perguntando por que eu apareci quando você estava em uma situação difícil, e ele não.
— Isso nunca me passou pela cabeça, — falei, desejando saber por que Eric estava puxando esse assunto.
— Fiz ele ficar lá embaixo, — disse Eric. — Afinal de contas, eu sou xerife da área dele.
Dei de ombros.
— Ele queria me bater, — Eric disse com um pequeno indício de sorriso em seus lábios. — Ele queria tomar a bomba de você e ser seu herói. Quinn teria feito isso, também.
— Eu lembro que Quinn se ofereceu, — eu falei.
— Eu me ofereci, também, — Eric disse. Ele pareceu um pouco chocado com o fato.
— Não quero falar sobre isso, — eu disse, e esperei que meu tom tivesse deixado claro que eu estava falando sério. Estava próximo do amanhecer, e eu tinha tido uma noite estressante (que era a maneira mais suave que eu poderia dizer). Consegui apanhar o olhar de Andre e lhe dei um pequeno aceno com a cabeça na direção de Todd Donati. Estava tentando lhe dar a dica que Donati não estava inteiramente bem. Na verdade ele estava tão cinzento quanto um céu com nevasca.
— Se você nos der licença, Sr. Donati... desfrutamos da sua companhia, mas temos muitas coisas a discutir sobre nossos planos para amanhã à noite, — Andre disse suavemente, e Donati ficou tenso, já que ele sabia muito bem que seria demitido.
— É claro, Sr. Andre, — o chefe da segurança disse. — Espero que todos vocês durmam bem neste dia, e os verei amanhã à noite. — Ele se levantou com mais esforço do que deveria ter tomado, e suprimiu uma careta de dor. — Srta. Stackhouse, espero que você consiga superar a sua má experiência o mais breve possível.
— Obrigada, — falei, e Sigebert abriu a porta para que Donati saísse.
— Se vocês me derem licença, — eu disse assim que ele saiu, — Eu irei para meu quarto agora.
A rainha me deu um olhar afiado. — Você esta infeliz com alguma coisa, Sookie? — Ela perguntou, embora parecesse que ela realmente não queria ouvir minha resposta.
— Oh, por que estaria infeliz? Eu adoro que façam coisas comigo sem minha permissão, — eu respondi. A pressão subia e subia, e as palavras saíram como erupção de lava de um vulcão, mesmo que meu subconsciente mais inteligente continuasse me dizendo para por uma tampa nele. — E também, — falei bem alto, não escutando a mim mesma nem um pouquinho, — eu gosto de passar o tempo com os responsáveis. Isso é ainda melhor! — Eu estava perdendo a coerência e ganhando ímpeto.
Eu não saberia o que eu teria dito depois se Sophie-Anne não tivesse erguido uma pequena mão branca.
Ela pareceu um pouquinho perturbada, como minha avó teria dito.
— Você está supondo que eu sei do que está falando, e que eu quero ouvir uma humana gritando comigo, — Sophie-Anne disse.
Os olhos do Eric resplandeciam como se uma vela ardesse detrás deles, e ele estava tão belo que eu podia me afogar nele. Deus me ajude. Me forcei a olhar para Andre, que estava me examinando como se ele estivesse decidindo onde estava o melhor corte de carne. Gervaise e Cleo simplesmente pareciam interessados.
— Me desculpe, — eu disse, voltando ao mundo da realidade com um baque. Já era tão tarde, eu estava tão cansada, e a noite tinha sido tão cheia de incidentes que pensei por uma fração de segundo que poderia realmente desmaiar.
Mas os Stackhouses não produzem frouxos, e nem as fadas, eu acho. Era hora de eu dar um cochilo para essa pequena porcentagem de minha herança. — Estou muito cansada. — Não tinha mais forças para brigar, de repente. Eu, realmente queria ir pra cama. Nenhuma palavra foi dita enquanto eu me arrastava para a porta, o que foi quase um milagre.
Entretanto, quando eu a fechei atrás de mim, ouvi a rainha dizer, — Andre, explique.
Quinn estava à espera na porta de meu quarto. Não sabia se tinha energia para ficar contente ou triste por vê-lo. Tirei o retângulo plástico e abri a porta, e depois que eu examinei o interior e verifiquei que minha colega de quarto não estava (embora eu tivesse a curiosidade de saber onde, já que Gervaise se encontrava sozinho), sacudi minha cabeça para dizer ao Quinn que ele podia entrar.
— Tenho uma ideia, — ele disse bem baixinho.
Levantei minhas sobrancelhas, muito exausta para falar.
— Vamos só subir na cama e dormir.
Eu finalmente consegui sorrir para ele. — Essa é a melhor oferta que tive o dia todo, — Eu disse. Nesse segundo, percebi como eu poderia vir a amar Quinn. Enquanto ele visitava o banheiro, eu tirei minhas roupas, as dobrei, e escorreguei para dentro de meu pijama, curto e rosa e sedoso ao toque.
Quinn saiu do banheiro em sua cueca sumária, mas eu estava cansada demais para apreciar a vista. Ele se meteu na cama enquanto eu escovava meus dentes e lavava meu rosto. Deslizei-me ao lado dele. Ele girou do seu lado e abriu seus braços, e eu simplesmente continuei deslizando na direção deles. Nós não tínhamos tomado banho, mas ele cheirava bem para mim: cheirava vivo e vigoroso.
— Boa cerimônia esta noite, — lembrei-me de dizer depois de desligar a lâmpada da cabeceira.
— Obrigado.
— Tem mais por vir?
— Sim, se sua rainha for levada à julgamento. Agora que Cater foi morta, quem sabe se isso vai continuar. E amanhã à noite é o baile, depois do julgamento.
— Oh, eu vou conseguir usar meu lindo vestido. — Um pouco de prazer me animou com a perspectiva. — Você tem que trabalhar?
— Não, o baile corre por conta do hotel, — ele disse. — Vai dançar comigo ou com o vampiro loiro?
— Ah, inferno, — falei, desejando que Quinn não tivesse me lembrado disso.
E na hora certa, ele disse, — Esquece isso, benzinho. Estamos aqui, agora, juntos na cama como devíamos estar.
Como devíamos estar. Isso soou bem.
— Você escutou sobre mim esta noite, certo? — Ele perguntou.
A noite tinha encerrado com tantos incidentes que levei um momento para lembrar que eu tinha descoberto sobre as coisas que ele teve que fazer para sobreviver.
E que ele tinha uma meia-irmã. Uma meia-irmã problemática, louca e dependente que me odiou à primeira vista.
Ele estava um pouco tenso, esperando por minha reação. Pude sentir em sua cabeça, em seu corpo. Tentei pensar numa forma doce, maravilhosa para formular como me sentia. Eu estava cansada demais.
— Quinn, não tenho problema com você, — eu disse. Eu beijei sua bochecha, beijei sua boca. — Nenhum problema. E eu vou tentar gostar de Frannie.
— Oh, — ele disse, soando simplesmente aliviado. — Pois bem, então. — Ele beijou minha testa, e caímos no sono.
Dormi como um vampiro. Não acordei nem para ir ao banheiro, ou mesmo para me virar. Flutuei até quase a consciência uma vez ao ouvir Quinn que estava roncando, só um barulhinho, e eu me aconcheguei mais para perto dele. Ele parou, murmurou, e ficou silencioso.
Olhei o relógio de cabeceira quando finalmente, realmente, despertei. Eram quatro da tarde; eu tinha dormido doze horas. Quinn tinha saído, mas ele tinha desenhado um grande par de lábios (com meu batom) numa folha de papel do hotel e a deitou sobre seu travesseiro. Sorri. Minha colega de quarto não tinha chegado. Talvez ela estivesse passado o dia no caixão de Gervaise. Estremeci. — Ele me dá calafrios, — eu disse em voz alta, desejando que Amelia estivesse ali para responder. Falando em Amelia... busquei meu celular da bolsa e liguei para ela.
— Ei, — ela disse. — E aí?
— O que está fazendo? — Perguntei, tentando não sentir saudades de casa.
— Escovando o Bob, — ela disse. — Tem uma bola de pêlos.
— Além disso?
— Ah, trabalhei um pouco no bar, — disse Amelia, tentando soar casual.
Fiquei embasbacada. — Fazendo o quê?
— Bom, servindo drinks. Que mais tem para se fazer?
— Como foi que Sam precisou de você?
— A Irmandade está tendo um grande comício em Dallas, e Arlene quis alguns dias de folga para ir com aquele babaca com que ela está saindo. Então o filho de Danielle pegou pneumonia. Ai o Sam ficou realmente preocupado, e já que aconteceu de eu estar no bar, ele me perguntou se sabia como fazer o trabalho. Eu respondi, ‚Ei, quão difícil pode ser?‛
— Obrigada, Amelia.
— Oh... Ok, eu acho que soei meio desrespeitosa. — Amelia gargalhou. — Então, é um pouquinho complicado. Todo mundo quer falar contigo, mas você tem que acelerar, e não pode derramar suas bebidas sobre eles, e tem que lembrar o que cada um está bebendo, e quem está pagando a rodada, e quem vai pagar a conta. E tem que ficar de pé por horas e horas.
— Bem-vinda ao meu mundo.
— Então, como está o Sr. Riscado?
Percebi que ela estava falando do Quinn. — Estamos bem, — falei, com plena certeza de que era verdade. — Ele fez uma grande cerimônia ontem à noite; foi bem legal. Um casamento vampiríco. Você teria adorado.
— O que terá para esta noite?
— Bem, talvez um julgamento. — Não senti vontade de explicar, principalmente pelo celular. — E um baile.
— Uau, como Cinderela.
— Ainda não está claro, mas o tempo dirá.
— Como está indo a parte dos negócios?
— Terei que te contar sobre isso quando voltar, — falei, de repente não tão animada. — Me alegro que esteja ocupada e estou contente que tudo vai bem.
— Ah, Terry Bellefleur ligou para perguntar se você queria um filhote. Lembra quando Annie fugiu?
Annie era a muito cara e muito amada cadela Catahoula de Terry. Ele tinha ido à minha casa para procurar por Annie quando ela fugiu, e durante o tempo que ele levou pra achá-la, ela tivera alguns encontros íntimos.
— Como se parecem os filhotes?
— Ele disse que você tem que vê-los para acreditar. Eu disse a ele que você talvez chegasse na próxima semana. Não te comprometi com nada.
— Ok, bom.
Conversamos mais um minuto, mas como eu tinha saído de Bon Temps há menos de quarenta e oito horas, realmente não havia muito para dizer.
— Então, — ela disse antes de desligar, — Estou com saudades, Stackhouse.
— É? Estou com saudades, também, Broadway.
— Tchau. Não deixe qualquer presa estranha te morder.
Muito tarde para isso. — Tchau. Não derrame cerveja no xerife.
— Se eu fizer, será de propósito.
Eu ri, porque também tinha muita vontade de dar um banho de cerveja em Bud Dearborn. Eu desliguei me sentindo muito bem. Pedi o serviço de quarto, muito hesitantemente. Isso não era algo eu que fizesse todos os dias; nem mesmo a cada ano. Ou nunca. Fiquei um pouco nervosa a respeito de deixar o garçom entrar em meu quarto, mas Carla chegou no mesmo tempo. Ela estava decorada com manchas roxas de beijos e usando o vestido da noite passada.
— Isso cheira bem, — ela disse, e lhe dei um croissant. Ela bebeu meu suco de laranja enquanto eu tomei o café. Funcionou bem. Carla falava por nós duas, me contando tudo sobre as coisas que eu tinha experimentado. Ela parecia não perceber que eu estava com a rainha quando a carnificina do grupo de Jennifer Cater foi descoberta, e ainda que ela tenha ouvido que eu tinha achado a bomba de Dr. Pepper, ela me contou tudo sobre isso de qualquer jeito, como se eu não tivesse estado lá. Talvez Gervaise a fizesse ficar em silêncio, e as palavras simplesmente lhe brotavam.
— O que vai usar para o baile esta noite? — Perguntei, me sentindo impossivelmente artificial até mesmo por fazer tal pergunta. Ela me mostrou seu vestido, que era preto, decorado com lantejoulas, e quase inexistente acima da cintura, como todos os seus outros trajes de noite. Carla definitivamente acreditava em enfatizar seus predicados.
Ela pediu para ver meu vestido, e ambas fizemos ruídos nada sinceros a respeito do bom gosto que a outra tinha.
Tivemos que nos revezar no banheiro, naturalmente, o que eu não estava acostumada a fazer. Eu já estava bem irritada no momento em que Carla saiu. Esperava que a cidade inteira não tivesse ficado sem água quente. É obvio, tinha sobrado o suficiente, e apesar dos seus cosméticos estarem espalhados no balcão do banheiro, eu me arranjei para ficar limpa e maquiada a tempo. Em honra ao meu lindo vestido, tentei prender meu cabelo para cima, mas não sou boa com nada mais complicado do que um rabo-de-cavalo. O cabelo ficaria solto. Peguei um pouco mais pesado na maquiagem do que uso durante o dia, e eu tinha uns brincos grandes que Tara me disse que ficariam impecáveis. Experimentalmente girei minha cabeça e os observei balançarem e brilharem. Eram prateados e brancos, como o ornamento decorado no corpete do meu vestido de noite. O qual já é hora de vesti-lo, disse a mim mesma com um pequeno choque de antecipação.
Ai, meu Deus. Meu vestido era azul-gelo, e tinha contas pratas e brancas, e tinha um decote na profundidade correta na frente e nas costas. Tinha um sutiã embutido então eu não precisava usar um, e vesti uma calcinha azul que nunca me deixaria uma marca. Então meias finas 7/8. E depois meus sapatos, que eram prateados e de saltos muito altos.
Eu tinha feito as unhas enquanto a Mulher da Água estava na ducha, e coloquei meu batom e dei uma última olhada no espelho.
Carla disse, — Você está realmente linda, Sookie.
— Obrigada. — Eu sabia que estava sorrindo um sorriso enorme. Não há nada como se vestir bem de vez em quando. Me senti como se meu par do baile de formatura estivesse vindo me buscar com um ramo de flores para prender no meu vestido. JB tinha me levado ao meu baile de formatura do segundo grau, embora outras garotas o terem convidado por que ele era fotogênico. Minha tia Linda tinha feito meu vestido.
Nada mais de vestidos caseiros para mim.
Uma batida na porta me fez olhar ansiosamente no espelho. Mas era Gervaise, checando para ver se Carla estava pronta. Ela sorriu e girou para receber a sua devida admiração, e Gervaise lhe deu um beijo na bochecha. Não estava muito impressionada com o caráter de Gervaise, e ele não fazia a minha praia fisicamente, tampouco, sua cara larga, insossa e seu bigode ralo, mas tive que dar o braço a torcer por sua generosidade: imediatamente ele fechou um bracelete flexível de diamantes no pulso de Carla, sem promover comoção como se ele tivesse lhe dado uma quinquilharia. Carla tentou conter sua excitação, mas então ela jogou tudo para o ar e atirou seus braços ao redor do pescoço de Gervaise. Fiquei envergonhada por estar no quarto, porque alguns dos apelidos carinhosos que ela usou enquanto o agradecia eram até certo ponto anatomicamente corretos.
Depois que eles saíram, contentes um com o outro, eu fiquei parada no meio do quarto. Não quis sentar em meu vestido até que tivesse que fazê-lo, porque sabia que o amarrotaria e perderia o caimento perfeito. Isso me deixava com muito pouco para fazer, a não ser tentar não ficar zangada sobre o caos que Carla tinha deixado no lado dela e me sentir um pouquinho perdida. Certamente Quinn havia dito que ele viria ao quarto para me buscar? Nós não tínhamos combinado de nos encontrarmos lá embaixo, certo?
Minha bolsa fez um ruído, e percebi que tinha metido o pager da rainha ali. Oh, certamente não!
— Desça até aqui, — dizia a mensagem. — Julgamento é agora.
Ao mesmo tempo, o telefone do quarto tocou. Eu atendi, tentando conter meu fôlego.
— Benzinho, — disse Quinn. — Sinto muito. Caso você não tenha ouvido, o conselho decidiu que a rainha irá a julgamento, imediatamente, e você tem que correr até aqui. Sinto muito, — ele disse outra vez, — Estou encarregado de organizar. Tenho que trabalhar. Talvez isso não demore muito.
— Ok, — falei fracamente, e ele desligou o telefone.
Demais para minha noite glamourosa com meu novo namorado.
Mas, droga, não ia me trocar para qualquer coisa menos festiva. Todos os outros estariam usando roupas de festa, e mesmo que meu papel na noite tenha se alterado, eu merecia parecer bonita, também. Desci no elevador com um dos empregados do hotel, que não sabia dizer se eu era uma vampira ou não. Eu o deixei muito nervoso. Sempre acho graça quando as pessoas não conseguem saber. Para mim, os vampiros mais ou menos brilham, só um pouco.
Andre estava me esperando quando saí do elevador. Ele estava perturbado como eu nunca tinha visto; eu podia dizer porque apertava e afrouxava seus dedos, e seus lábios estavam ensanguentados onde ele havia mordido, embora tenham se curado enquanto eu observava. Antes da noite passada, Andre tinha me deixado nervosa. Agora eu o detestava.
Mas era evidente que tive que colocar assuntos pessoais de lado até outra oportunidade.
— Como isso pôde acontecer? — Ele perguntou. — Sookie, você precisa se informar de tudo o que puder a respeito. Temos mais inimigos do que sabíamos.
— Pensei que não haveria um julgamento depois que Jennifer foi assassinada. Já que ela era a principal acusadora da rainha...
— Isso foi o que todos nós pensamos. Ou, se houvesse um julgamento, estaria vazio, simplesmente encenado para que as acusações pudessem ser descartadas. Mas descemos aqui hoje à noite e eles estavam a nossa espera. Adiaram o início do baile para fazer isto. Pegue meu braço, — ele disse, e fui pega tão surpreendida que deslizei meu braço através do dele.
— Sorria, — ele disse. — Pareça confiante.
E entramos no salão de convenções com rostos destemidos - eu e meu bom amigo Andre.
Por sorte eu tinha muita prática em sorrisos nada sinceros, porque isto foi como a maratona de Salvando sua Honra. Todos os vampiros e seus acompanhantes humanos abriam caminho para nós. Alguns deles sorriam, também, ainda que não agradavelmente, e alguns pareciam preocupados, e uns só pareciam levemente expectantes, como se estivessem prestes a assistir um filme que tinha obtido uma boa crítica.
E a onda de pensamentos me consumiu. Sorri e caminhei no automático enquanto ficava na escuta.
Linda... Sophie-Anne terá o que ela... talvez eu consiga ligar para o advogado dela, ver se ela está acessível a uma aproximação de nosso rei... belos seios ... meu homem precisa de um telepata... ouvi dizer que ela está dando para Quinn... ouvi dizer que ela está transando com a rainha e com Garotinho Andre... a encontrou em um bar... Sophie-Anne está derrotada, ela será punida... ouvi dizer que ela está trepando com Cataliades... julgamento idiota, onde está a banda?... espero que tenham alguma comida no baile, comida para pessoas...
E assim por diante. Alguns deles eram relacionados comigo, à rainha, e/ou Andre, alguns deles pensamentos simples de pessoas que estavam cansadas de esperar e querendo que a festa começasse.
Caminhamos recebendo críticas até terminarmos no salão onde se celebrou o casamento. A multidão neste salão era quase cem por cento vampira. Uma ausência notável: os servos humanos, e qualquer outro humano empregado do hotel. Os únicos circulando com bandejas de bebidas eram vampiros. As coisas que iriam ocorrer neste espaço não eram admitidas para humanos. Se for possível que eu me sentisse mais ansiosa, eu me sentia.
Pude ver que Quinn tinha estado ocupado. A plataforma baixa tinha sido reorganizada. O ankh gigante tinha sido posto fora do caminho, e dois púlpitos foram adicionados. No lugar onde Mississippi e seu amado tinham feito seus votos, a meio caminho entre os dois púlpitos, havia uma cadeira semelhante a um trono. Nela estava uma mulher anciã com cabelos brancos desordenados. Nunca tinha visto uma vampira que tivesse sido transformada quando ela fosse tão velha, e embora tivesse jurado que não falaria com ele, disse o mesmo com Andre.
— Essa é a Antiga Pitonisa, — ele disse distraidamente. Ele estava examinando a multidão, tentando encontrar Sophie-Anne, supus. Eu aviste Johan Glassport, que teria seu momento como centro das atenções afinal de contas, e o resto do contingente da Louisiana estava com o advogado assassino - todos exceto a rainha, Eric e Pam, a quem vislumbrei parada perto do palco.
Andre e eu tomamos nossos assentos na parte dianteira direita. Na parte dianteira esquerda estava uma aglomeração de vampiros que não eram nossos fãs. O chefe entre eles era Henrik Feith. Henrik tinha se transformado de um gato aterrorizado em uma bola de fúria. Ele nos olhou furiosamente. Ele fez de tudo menos nos lançar bolinhas de cuspe.
— O que rastejou pelo traseiro dele e morreu? — resmungou Cleo Babbitt, se deixando cair no assento a minha direita. — A rainha oferece colocá-lo sob sua proteção quando ele estava sozinho e indefeso, e este é o agradecimento que ela recebe? — Cleo tinha posto um smoking tradicional, e ela parecia extremamente bem nele. A severidade caia bem nela. Seu brinquedinho sexual parecia muito mais feminino que ela. Admirei-me por sua inclusão na multidão, o qual era toda de sobrenaturais e esmagadoramente vampira. Diantha se inclinou para frente da fileira de trás para me dar um tapinha no ombro. Ela tinha posto um bustier vermelho com plissados pretos e uma saia preta de tafetá, também plissada. Seu bustier não tinha muito busto para enchê-lo. Ela agarrava firmemente um videogame portátil.
— Bomtever, — ela disse, e fiz esforço para lhe sorrir. Ela voltou sua atenção ao jogo eletrônico.
— O quê acontece conosco se Sophie-Anne for considerada culpada? — Cleo perguntou, e todos nós ficamos silenciosos.
O que aconteceria conosco se Sophie-Anne fosse condenada? Com a Louisiana em uma posição debilitada, e com o escândalo sobre a morte de Peter, estávamos todos em perigo.
Eu não sei por que não tinha pensando sobre isso, apenas eu não tinha.
Em um momento, entendi que não tinha mesmo pensado em me preocupar porque tinha crescido como uma cidadã humana livre dos Estados Unidos; não estava acostumada a me preocupar com meu destino estar em questão. Bill se uniu ao pequeno grupo ao redor da rainha, e quando olhei com atenção no outro lado do salão para eles, ele se ajoelhou, junto com Eric e Pam. Andre deu um salto de seu assento à minha esquerda, e num de seus movimentos relâmpago ele cruzou o salão para se ajoelhar com eles. A rainha se levantou diante deles como uma deusa romana aceitando tributo. Cleo seguiu meu olhar fixo, e seu ombro se agitou. Cleo não iria se ajoelhar.
— Quem está no conselho? — Perguntei à vampira de cabelos escuros, e ela inclinou a cabeça para o grupo de cinco vampiros sentados em frente ao nível baixo do palco, encarando a Antiga Pitonisa.
— O Rei de Kentucky, a Rainha de Iowa, o Rei de Wisconsin, o Rei do Missouri, a Rainha do Alabama, — ela respondeu, assinalando-os em ordem. O único que conhecia era Kentucky, embora reconhecesse a sedutora Alabama de sua conversa com o Sophie-Anne.
O advogado do lado contrário se uniu a Johan Glassport no palco. Alguma coisa no advogado do Arkansas me lembrou do Sr. Cataliades, e quando ele inclinou a cabeça em nossa direção, vi Sr. Cataliades inclinar a cabeça de volta.
— Eles têm alguma relação? — Perguntei a Cleo.
— Cunhados, — respondeu Cleo, me deixando imaginar como seria uma fêmea demônio. Certamente elas não se pareceriam todas com a Diantha.
Quinn subiu no palco. Ele estava usando um terno cinza, uma camisa branca, e uma gravata, e ele carregava um longo cajado coberto com entalhes. Ele acenou para Isaiah, Rei de Kentucky, que flutuou sobre o palco. Com um gesto vistoso, Quinn passou o cajado para Kentucky, que estava vestido muito mais elegante do que havia estado mais cedo. O vampiro golpeou pesadamente o cajado contra o piso, e toda conversa cessou. Quinn se retirou para a parte detrás do palco.
— Eu fui eleito oficial encarregado desta sessão judicial, — Kentucky anunciou em uma voz que ecoou facilmente pelos cantos do salão. Ele levantou o cajado de modo que não pôde ser ignorado. — Seguindo as tradições da raça vampírica, convoco todos a testemunharem o julgamento de Sophie-Anne Leclerq, Rainha da Louisiana, sob a acusação de assassinato do seu marido por contrato assinado e selado, Peter Threadgill, Rei do Arkansas.
Soou muito solene, na voz profunda, arrastada de Kentucky.
— Eu convoco os advogados das duas partes para se prepararem para apresentar seus casos.
— Estou pronto, — disse o advogado parte-demônio. — Sou Simon Maimonides, e represento o enlutado estado do Arkansas.
— Estou pronto, — disse nosso advogado assassino, lendo um folheto. — Sou Johan Glassport, e represento à viúva enlutada, SophieAnne Leclerq, falsamente acusada do assassinato de seu marido por contrato assinado e selado.
— Antiga Pitonisa, você está pronta para ouvir o caso? — Kentucky perguntou, e a senhora idosa encarquilhada virou sua cabeça para ele.
— É ela cega? — Sussurrei.
Cleo fiz que sim com a cabeça. — Desde nascimento, — ela respondeu.
— Como foi que ela se tornou juiza? — Perguntei. Mas os olhares dos vampiros ao nosso redor me recordaram que suas audições dificilmente fariam um sussurro valer à pena, e seria somente educado calar-se.
— Sim, — disse a Pitonisa Antiga. — Estou pronta para ouvir o caso. — Ela tinha um forte sotaque que eu não conseguia identificar. Houve um movimento de ansiedade na multidão.
Ok. Deixem os jogos começarem.
Bill, Eric, e Pam foram parar contra a parede, enquanto Andre se sentou ao meu lado.
Rei Isaiah deu um pequeno golpe com o cajado outra vez. — Que a acusada seja trazida adiante, — disse sem um nenhum drama.
Sophie-Anne, parecendo muito delicada, caminhou até o palco, escoltada por duas guardas. Como o resto de nós, ela tinha se preparado para o baile, e ela estava usando púrpura. Perguntei-me se a cor nobre tinha sido uma coincidência. Provavelmente não. Tive o pressentimento que Sophie-Anne arranjava suas próprias coincidências.
O vestido tinha colarinho alto e mangas largas, e realmente tinha uma cauda.
— Ela é linda, — disse Andre, sua voz cheia de reverência.
Tá, tá, tá. Eu tinha mais em minha mente do que admirar a rainha. As guardas eram as duas Britlingens, provavelmente pressionadas ao serviço pelo Isaiah, e elas tinham trazido umas roupas blindadas em suas malas interdimensionais. Eram pretas, também, mas brilhavam vagarosamente, como água escura movendo-se lentamente. Eram tão apertadas quanto o primeiro conjunto de armaduras. Clovache e Batanya levantaram Sophie-Anne em cima da baixa plataforma e então se afastaram um pouco. Dessa forma, elas ficavam perto da prisioneira e do seu patrão, então isso funcionava bem, suponho, do ponto de vista delas.
— Henrik Feith, apresente seu caso, — Isaiah disse sem mais comoção.
O caso de Henrik foi longo e ardente e cheio de acusações. Trocando em miúdos, ele testemunhou que Sophie-Anne se casou com seu rei, assinou todos os contratos usuais, e assim imediatamente começou a manipular Peter para sua luta fatal, apesar do temperamento angélico do rei e sua adoração por sua nova rainha. Soou como se Henrik falasse do Kevin e Britney, em vez de dois vampiros antigos e astutos.
Blá blá blá. O advogado de Henrik o deixou continuar, e Johan não fez objeções qualquer das declarações altamente coloridas de Henrik. Johan pensou que (eu chequei) Henrik perderia simpatia sendo tão fervoroso e excessivo - e chato - e ele tinha toda razão, se fosse para levar em conta as mudanças e movimentos leves na linguagem corporal da multidão.
— E agora, — Henrik concluiu, lágrimas debilmente rosadas descendo pelo seu rosto, — há somente um punhado de nós no estado inteiro. Ela, que matou meu rei e sua tenente Jennifer, me ofereceu um lugar com ela. E eu quase fui fraco o bastante para aceitar, por medo de ser um patife. Mas ela é uma mentirosa e me matará, também.
— Alguém lhe disse isso, — murmurei.
— O quê? — A boca do Andre estava perto da minha orelha. Manter uma conversa particular em um grupo de vampiros não é uma coisa fácil.
Levantei uma mão para pedir seu silêncio. Não, não escutava o cérebro de Henrik mas dos advogados de Henrik, quem não tinham tanto sangue de demônio quanto Cataliades. Sem me dar conta do que eu estava fazendo, me inclinei para frente no meu assento e estiquei o pescoço para o palco para ouvir melhor. Ouvir com a minha mente, quero dizer.
Alguém havia dito ao Henrik Feith que a rainha planejava matá-lo. Ele estava disposto a escapar da ação judicial, já que o assassinato de Jennifer Cater tinha tirado o acusador principal. Ele nunca tinha sido avaliado alto o bastante na hierarquia para assumir o manto da liderança; ele não tinha a inteligência ou o desejo. Ele teria preferido ficar a serviço da rainha. Mas se ela realmente tinha a intenção de matá-lo... ele tentaria matá-la primeiro como único recurso que de poderia sobreviver, e isso seria através da lei.
— Ela não quer te matar, — falei em voz alta, dificilmente sabendo o que eu estava fazendo.
Não estava nem mesmo consciente de estar de pé até que senti os olhos de todo mundo na audiência sobre mim. Henrik Feith estava me encarando, sua cara atordoada, sua boca ainda aberta. — Nos diga quem te disse isso, e saberemos quem matou Jennifer Cater, porque... —
— Mulher, — disse uma voz retumbante, e eu fui abafada e calada muito eficazmente. — Faça silêncio. Quem é você e que direito tem para intrometer-se nestes solenes procedimentos? — A Pitonisa era surpreendentemente poderosa para alguém tão fraca como ela aparentava. Ela estava inclinada para frente em seu trono, fitando furiosa em minha direção com seus olhos cegos.
OK, ficar de pé numa sala cheia de vampiros e interromper seu ritual era uma ótima maneira de conseguir várias manchas de sangue sobre todo o meu lindo vestido novo.
— Não tenho nenhum direito no mundo, Vossa Majestade, — respondi, e de alguns metros a minha esquerda, ouvi Pam dar uma risadinha. — Mas eu sei a verdade.
— Oh, então eu não tenho nenhum papel nestes procedimentos, tenho? — Grasnou a Antiga Pitonisa com seu inglês de sotaque muito forte. — Por que eu deveria ter saído da minha caverna, para dar a sentença?
Por que, de fato.
— Posso ouvir a verdade, mas não tenho como agir para que a justiça seja feita, — falei honestamente.
Pam deu uma risadinha outra vez. Eu simplesmente sabia que era ela.
Eric tinha estado parado na lateral do aposento com o Pam e Bill, mas agora ele se moveu para frente. Pude sentir sua presença, calma e estável, muito perto de mim. Ele me deu alguma coragem. Não sei como. Eu senti isso, de qualquer forma, senti uma força crescendo onde havia só meus joelhos tremendo. Uma chocante suspeita me golpeou com a força de um caminhão Mack. Eric tinha me dado sangue suficiente que me qualifiquei agora, em sabedoria hemoglobínica, estar próxima de um vampiro; e meu estranho talento transbordou em território fatal. Eu não estava lendo a mente do advogado de Henrik. Estava lendo a mente de Henrik.
— Então venha me dizer o que eu devo fazer, — disse a Antiga Pitonisa com um comentário sarcástico tão afiado que podia ter cortado um bolo de carne em rodelas.
Eu precisaria de uma semana ou duas pra superar o choque da minha terrível suspeita, e tive a convicção renovada que eu realmente devia matar Andre, e talvez Eric, também, mesmo que um pedaço do meu coração chorasse com a perda.
Tive vinte segundos para processar isto.
Cleo me deu um beliscão dolorido. — Vaca, — ela disse furiosamente. — Você vai arruinar tudo. — Avancei pelo lado esquerdo da fileira, pisando em cima de Gervaise quando fiz isso. Ignorei sua encarada e o beliscão de Cleo. Os dois eram pulgas comparadas com os outros poderes que podiam querer um pedaço de mim primeiro. E Eric se adiantou detrás de mim. Minhas costas estavam cobertas.
Quando me aproximei da plataforma, foi difícil de determinar o que Sophie-Anne pensava desta nova virada inesperada em seu julgamento. Concentrei-me em Henrik e seu advogado.
— Henrik acha que a rainha decidiu matá-lo. Alguém lhe disse isso, assim ele testemunharia contra ela em defesa própria, — eu disse.
Agora estava atrás das cadeiras dos juizes sobre o piso, com o Eric ao meu lado.
— A rainha não decidiu me matar? — Henrik perguntou, parecendo esperançoso, confuso, e traído tudo ao mesmo tempo. Aquela era uma exigência absurda para um vampiro, já que as expressões faciais não são seu meio de comunicação principal.
— Não, ela não decidiu. Ela foi sincera ao te oferecer um lugar. — Mantive meus olhos fixos nos dele, tentando semear minha sinceridade em seu cérebro assustado.
Tinha me movido quase na frente dele agora.
— Você provavelmente está mentido, também. Você está na sua folha de pagamentos, afinal de contas.
— Talvez eu possa ter uma palavra? — A Antiga Pitonisa disse, com sarcasmo ácido.
Ops. Houve um silêncio que era simplesmente arrepiante.
— Você é uma vidente? — Ela perguntou, falando muito lentamente para que eu pudesse entendê-la.
— Não, senhora, eu sou uma telepata. — Assim de perto, a Antiga Pitonisa parecia mais velha, o que eu não achei que seria possível.
— Você pode ler mentes? Mentes de vampiros?
— Não, senhora, esses são os únicos que não consigo ler, — falei muito firmemente. — Juntei todas as peças dos pensamentos do advogado.
O Sr. Maimonides não ficou contente com isso.
— Você estava ciente de tudo isso? — A Antiga Pitonisa perguntou ao advogado.
— Sim, — ele respondeu. — Eu sabia que Sr. Feith se sentia ameaçado de morte.
— E você sabia que a rainha tinha se oferecido a aceitá-lo ao seu serviço?
— Sim, ele me contou que ela tinha dito isso. — Aquilo foi dito num tom tão ambíguo que não precisava ser uma Antiga Pitonisa para ler as entrelinhas.
— E você não acreditou na palavra de uma rainha vampira?
Ok, isso foi uma pergunta difícil para o Maimonides. — Senti que era meu dever proteger meu cliente, Antiga Pitonisa.
Ele tocou a nota certa de humilde dignidade.
— Humm, — disse a Antiga Pitonisa, soando tão cética quanto eu me sentia. — Sophie-Anne Leclerq, é sua vez de apresentar seu lado da história. Você irá prosseguir?
Sophie-Anne disse, — O que Sookie disse é verdade. Ofereci ao Henrik um lugar comigo e minha proteção. Quando chamarmos as testemunhas, Anciã, você ouvirá que Sookie é minha testemunha e estava lá durante a luta final entre o povo de Peter e o meu. Embora eu soubesse que Peter se casou comigo com intenções ocultas, não levantei a mão contra ele até que sua gente atacou na noite de nossa festa de celebração. Devido a muitas circunstâncias, ele não conseguiu escolher o melhor momento para ir atrás de mim, e como consequência, sua gente morreu e a maior parte da minha sobreviveu. Ele na verdade começou o ataque quando havia outros ali que não eram de nosso sangue. — Sophie-Anne obteve sucesso para parecer chocada e entristecida. — Levei todos estes meses para ter certeza que as contas foram saldadas. —
Pensei que eu tinha levado a maioria dos humanos e Lobis para fora antes que a matança começasse, mas aparentemente tinham ficado alguns na área.
Provavelmente já não estavam mais por aí.
— Nesse tempo desde aquela noite, você sofreu muitas outras perdas, — a Antiga Pitonisa comentou. Isto soou muito simpático.
Comecei a perceber que a maré tinha virado a favor de SophieAnne. Foi importante que Kentucky, que esteve cortejando Sophie-Anne, fosse o membro do conselho encarregado dos procedimentos?
— Como você disse, tive muitas perdas - tanto em relação ao meu povo quanto aos meus rendimentos, — Sophie-Anne concordou. — É por isso que preciso da herança de meu marido, a qual tenho direito como parte do nosso contrato de matrimônio. Ele pensou que herdaria o rico reino da Louisiana. Agora ficarei satisfeita em herdar o pobre reino do Arkansas.
Houve um longo silêncio.
— Devo chamar nossa testemunha? — Johan Glassport perguntou. Ele soou muito indeciso e incerto, para um advogado.
Mas nesta sala de tribunal, não foi difícil de entender o porquê. — Ela já está aqui, e ela foi testemunha da morte de Peter. — Ele me estendeu sua mão, e eu tive que subir na plataforma. Sophie-Anne parecia relaxada, mas Henrik Feith, uns poucos centímetros à minha esquerda, agarrava os braços de sua cadeira.
Outro silêncio. Os cabelos brancos desordenados da vampira anciã caíram para frente para esconder seu rosto enquanto ela fitava seu próprio colo. Então ela olhou para cima, e seus olhos cegos foram infalivelmente na direção de Sophie Anne. — Arkansas é seu por lei, e agora seu por direito. Eu a declaro inocente de conspirar para assassinar seu marido, — a Antiga Pitonisa disse, quase casualmente.
Bem... vivas. Eu estava perto o suficiente para ver que os olhos de Sophie-Anne se ampliaram com alívio e surpresa, e Johan Glassport deu um pequeno sorriso particular para seu púlpito. Simon Maimonides olhou para os cinco juízes para ver como eles tinham recebido o pronunciamento da Antiga Pitonisa, e assim que nenhum deles expressou uma palavra de protesto, o advogado deu de ombros.
— Agora, Henrik, — grasnou a Antiga Pitonisa, — sua segurança está garantida. Quem te disse mentiras?
Henrik nem mesmo parecia seguro de si. Ele parecia estupidamente assustado. Ele se levantou para ficar comigo.
Henrik era mais esperto do que nós erámos. Houve um clarão no
ar.
No momento seguinte uma expressão cruzou sua face, foi horror absoluto. Ele olhou para baixo, e todos nós seguimos seus olhos. Havia uma fina flecha de madeira se projetando de seu peito, e assim que seus olhos a identificaram, a mão de Henrik levantou para tocá-la, e ele balançou. Uma multidão humana teria irrompido em caos, mas os vampiros se jogaram no chão quase em silêncio. A única pessoa que gritou foi a Antiga Pitonisa cega, que exigiu saber o que tinha acontecido e por que todo mundo estava tão tenso. As duas Britlingens saltaram através do palco para Kentucky e se colocaram na frente dele, suas armas em nas mãos e prontas. Andre literalmente voou de seu assento na audiência para aterrissar na frente de Sophie-Anne. E Quinn cruzou o tablado num salto para me derrubar, e recebeu a segunda flecha, a flecha de garantia, que estava destinada para Henrik. Ela foi completamente desnecessária. Henrik já estava morto quando atingiu o chão.
BATANYA MATOU O ASSASSINO COM UMA SHURIKEN. Ela estava de frente para a multidão, e então viu o vampiro parado depois que todos os outros prudentemente se lançaram ao chão. Este vampiro não estava atirando flechas de um arco; ele as arremessa, razão pela qual ele conseguiu se manter imperceptível. Mesmo naquele grupo, alguém transportando um arco teria atraído uma certa atenção.
Apenas um vampiro poderia lançar uma flecha e matar alguém. Talvez apenas uma Britlingen poderia lançar uma estrela afiada como navalha de tal maneira a decapitar um vampiro.
Eu tinha visto vampiros decapitados antes, e não é tão complicado quanto você poderia pensar; não é como cortar a cabeça de um humano. Mas não é agradável, tampouco, e quando eu assisti a cabeça cair dos ombros, eu tive um momento de náusea e bati meus joelhos no chão. Arrastei-me ajoelhada para inspecionar Quinn.
— Eu não estou mal, — disse ele instantaneamente. — Não estou. Ela está no meu ombro, não no meu coração. — Ele girou para deitar sobre suas costas. Todos os vampiros de Louisiana saltaram para a plataforma para circundar a rainha, apenas um segundo depois de Andre. Uma vez que eles estavam certos de que o perigo havia acabado, eles aglomeraram-se em torno de nós.
Cleo se livrou do paletó do seu smoking e arrancou a camisa branca pregueada. Ela a dobrou com uma almofada em movimentos tão rápidos que eu quase não pude seguir. — Segure isto, — disse ela, pressionando a minha mão e a colocando perto da ferida. — Prepare-se para pressionar fortemente. — Ela não me esperou concordar. — Aguenta, — disse ela para Quinn. E ela colocou suas mãos fortes em seus ombros para segurá-lo imóvel enquanto Gervaise puxou a flecha.
Quinn urrou, não tão surpreendentemente. Os minutos seguinte foram bastante ruins. Pressionei a almofadinha contra a ferida, e enquanto Cleo vestia o paletó do smoking sobre seu sutiã preto de renda, ela ordenou Herve, seu namorado humano que doasse sua camisa, também. Eu tenho que dizer, ele a removeu imediatamente. Havia algo realmente chocante a respeito de ver um tórax nu peludo no meio de toda esta noite refinada. E foi mais do que estranho que eu notaria aquilo, depois de eu ter visto justamente a cabeça de um cara separar-se de seu corpo.
Eu sabia que Eric estava a meu lado antes que ele falasse, porque me senti menos aterrorizada. Ele se ajoelhou ao meu nível. Quinn se concentrava em não gritar, então seus olhos estavam fechados como se ele estivesse inconsciente e ali havia muita ação à minha volta. Mas Eric estava perto de mim, e me senti... não exatamente calma, mas não tão angustiada. Porque ele estava ali.
Simplesmente odiei aquilo.
— Ele vai curar, — disse Eric. Ele não soou especialmente feliz com isso, nem triste, também.
— Sim, — eu disse.
— Eu sei. Eu não vi a flecha chegando.
— Oh, você teria se atirado na minha frente?
— Não, — Eric disse simplesmente. — Porque ela poderia ter me atingido no coração, e eu morreria. Mas eu teria mergulhado e segurado você para te tirar do caminho da flecha se tivesse havido tempo.
Eu não consegui pensar em uma coisa para dizer.
— Eu sei que você pode vir a me odiar porque eu te poupei da mordida do Andre, — disse ele calmamente. — Mas eu realmente sou o menor dos dois males.
Olhei de soslaio para ele. — Sei disso, — eu disse. O sangue de Quinn manchou minhas mãos e encharcou a almofada improvisada. — Eu não teria propriamente morrido por ser mordida pelo Andre, mas teria sido por um triz.
Ele riu, e os olhos de Quinn tremeram. — O homem-tigre está recuperando a consciência, — disse Eric. — Você o ama?
— Não sei ainda.
— Você me amou?
Uma equipe de padioleiros chegou. É claro, estes não eram paramédicos normais. Os paramédicos normais não teriam sido bemvindos na Pirâmide de Gizé. Estes eram lobis e metamorfos que trabalhavam para os vampiros, e sua líder, uma jovem que parecia um pote de mel em formato de urso, disse, — Nós garantimos que ele ficará curado em tempo recorde, senhora.
— Eu o verei mais tarde.
— Nós vamos cuidar dele, — disse ela. — Entre nós, ele ficará melhor. É um privilégio cuidar de Quinn.
Quinn acenou. — Eu estou pronto para ser levado, — disse ele, mas ele estava apertando as palavras entre seus dentes.
— Até mais tarde, — eu disse, tomando sua mão na minha. — Você é o mais bravo dos bravos, Quinn.
— Benzinho, — disse ele, mordendo seu lábio inferior de dor. — Tome cuidado.
— Não se preocupe com ela, — disse um rapaz negro com um curto, corte afro. — Ela tem guardiões.
Ele deu ao Eric um olhar frio. Eric estendeu sua mão e eu a peguei para levantar. Meus joelhos estavam doendo um pouco após a familiaridade com o piso duro.
Quando eles o puseram sobre a maca e o levantaram, Quinn pareceu perder a consciência. Eu arranquei para frente, mas o cara negro estendeu seu braço. Parecia ébano esculpido, os músculos eram tão definidos.
— Irmã, você precisa ficar aqui, — disse ele. — Estamos trabalhando agora.
Eu assisti eles o carregando. Uma vez que ele ficou fora de vista, eu olhei para meu vestido. Surpreendentemente, ele estava em ordem. Sem sujeira, sem mancha de sangue, e os amassados eram mínimos.
Eric esperava.
— Eu amei você? — Eu sabia que Eric não iria desistir, e eu poderia também calcular uma resposta.
— Talvez. De certa forma. Mas eu soube desde o começo que quem quer que esteve comigo, não era o verdadeiro você. E eu soube que mais cedo ou mais tarde você se lembraria quem era e o que era.
— Você parece não ter as respostas sim ou não sobre os homens, — disse ele.
— Você parece não saber exatamente como se sente sobre mim, tampouco, — eu disse.
— Você é um mistério, — disse ele. — Quem foi sua mãe, e quem foi seu pai? Oh, eu sei, você vai dizer que eles te educaram desde criança e morreram quando você era uma garotinha. Eu lembro de você me contando a história. Mas eu não sei se isso é exatamente verdade. Se for, quando é que o sangue de fadas entrou em sua árvore genealógica? Ele veio com um de seus avós? Isso é o que eu estou supondo.
— E quando isso é da sua conta?
— Você sabe que isso é da minha conta. Nós estamos ligados
agora.
— Isso irá desaparecer? Irá, certo? Não seremos sempre desse jeito?
— Eu gosto que seja assim. Você gostará, também, — disse ele, e ele me pareceu muitíssimo seguro.
— Quem era o vampiro que tentou nos matar? — Eu perguntei para mudar de assunto. Eu esperava que ele não estivesse certo, e de qualquer maneira, tínhamos dito tudo o que havia para dizer sobre o assunto, no que me dizia respeito.
— Vamos descobrir, — disse ele, e pegou minha mão. Arrastei-me junto com ele, só porque eu queria saber.
Batanya estava junto do corpo do vampiro, que havia começado a rápida desintegração do seu gênero. Ela havia recuperado sua shuriken, e a estava polindo na perna de sua calça.
— Bom arremesso, — disse Eric. — Quem era ele?
Ela encolheu os ombros. — Eu não sei. O cara com as flechas, é tudo que o que sei. Tudo o que me importa.
— Ele era o único?
— Sim.
— Você pode me dizer como ele parecia?
— Eu estava sentado próximo dele, — disse um vampiro muito pequeno. Ele tinha talvez 1,50 cm de altura, além de magro. Seus cabelos caiam sobre suas costas. Se ele fosse para a prisão, ele teria caras batendo na porta de sua cela no prazo de trinta minutos. Eles se arrependeriam, é claro, mas para o olho desatento, ele parecia ser o alvo mais fácil do mundo. — Ele era um bruto, e não estava vestido para a noite. Calças cáqui e uma camisa listrada... bem, você pode ver.
Embora o corpo estivesse enegrecendo e descamando inteiramente como cadáveres de vampiros faziam, naturalmente as roupas estavam intactas.
— Talvez ele tivesse uma carteira de motorista? — Eu sugeri. Isso era quase uma determinação entre os humanos, mas não entre os vampiros. No entanto, valia a pena tentar.
Eric se agachou e inseriu seus dedos no bolso da frente do homem. Nada saiu, ou do outro bolso da frente, então sem mais cerimônias Eric o inverteu. Tomei alguns passos para trás para evitar a enxurrada de flocos de cinza. Havia algo no bolso traseiro: uma carteira normal. E dentro dela, como era previsto, tinha uma carteira de motorista.
Ela tinha sido expedida em Illinois. Sob o tipo sanguíneo estava a designação ‚NA‛ (não disponível). É, um vampiro, com certeza.
Lendo sobre o ombro de Eric, eu pude ver que o nome do vampiro tinha sido Kyle Perkins. Perkins tinha colocado ‚3V‛ como sua idade, então ele tinha sido um vampiro por apenas três anos.
— Ele deve ter sido um arqueiro antes de morrer, — eu disse. — Porque essa não é uma habilidade que você ganharia imediatamente, especialmente tão jovem.
— Eu concordo, — disse Eric. — E durante o dia, eu quero que você verifique todos os locais próprios onde se pode praticar tiro com arco. Arremessar flechas não é uma habilidade que dá para improvisar. Ele treinou. A flecha foi especialmente fabricada. Precisamos descobrir o que aconteceu com Kyle Perkins, e porque este patife aceitou o trabalho para participar desta reunião e matar quem quer que fosse necessário.
— Então ele era um assassino de aluguel... vampiro?
— Sim, eu creio que sim, — disse Eric. — Alguém está nos manobrando com muito cuidado. Certamente, este Perkins foi apenas um suporte no caso do julgamento acabar mal. E se não fosse por você, o julgamento poderia muito bem ter ido mal. Alguém preparou uma grande confusão para tirar proveito dos medos de Henrik Feith, e o estúpido Henrik esteve prestes a ceder a esse alguém. Este Kyle, ele foi plantado apenas para impedir isso.
Na mesma hora a equipe de limpeza chegou: um grupo de vampiros com um saco para corpo e material de limpeza. As empregadas humanas não seriam obrigadas a remover Kyle. Felizmente, todas estavam ocupadas limpando os quartos dos vampiro, o qual estava proibida a entrada neles durante o dia.
Numa rápida preparação, os resíduos de Kyle Perkins foram ensacados e levados embora, com um vampiro permanecendo para utilizar um pequeno aspirador de pó portátil. Deixe o CSI de Rhodes tentar conseguir a posse disso.
Senti uma grande quantidade de movimento e ergui os olhos para ver que as portas de serviço estavam abertas e a equipe entrava torrencialmente na ampla sala para guardar as cadeiras. Em menos de quinze minutos, a parafernália judicial de Quinn estava sendo guardada, a irmã dele dirigia o trabalho. Então uma banda foi montada na plataforma, e o salão foi liberado para o baile. Eu nunca tinha visto nada parecido. Primeiro um julgamento, então alguns assassinatos, depois baile.
A vida continua. Ou, neste caso, a morte continua.
Eric disse, — É melhor que você se apresente para a rainha.
— Oh. Sim, ela pode ter algumas coisas para me dizer. — Espiei em volta e localizei Sophie-Anne muito rapidamente. Ela estava cercada por uma multidão de pessoas felicitando-a pelo veredicto favorável. Naturalmente, eles teriam ficado felizes da mesma forma em vê-la executada, ou seja, o que for que teria acontecido se a Antiga Profetisa tivesse virado a votação contra. Falando na A.P...
— Eric, onde irá a anciã? — Eu perguntei.
— A Antiga Profetisa é o oráculo original que Alexandre consultou, — disse ele, sua voz absolutamente neutra. — Ela era considerada tão venerada que mesmo na sua velhice, ela foi convertida por vampiros muito primitivos de seu tempo. E agora ela sobreviveu a todos eles.
Eu não quis pensar em como ela se alimentava antes do advento do sangue sintético que mudou o mundo dos vampiros. Como ela mancaria atrás da sua presa humana? Talvez trouxessem pessoas para ela, como os donos de cobras trazem ratos vivos para seus animais de estimação?
— Para responder sua pergunta, eu acho que suas criadas irão levá-la para sua suíte. Ela é exibida em ocasiões especiais.
— Como a boa prataria, — eu disse com seriedade, e na mesma hora explodi em risos. Para minha surpresa, Eric sorriu, também, aquele grande sorriso que fazia aparecer múltiplos pequenos arcos nos cantos da sua boca.
Tomamos nossos lugares atrás da rainha. Eu não tinha certeza se ela ainda havia registrado a minha presença, ela estava de tal modo ocupada sendo a Rainha do Baile. Mas em uma calmaria momentânea no bate-papo, ela estendeu sua mão para trás e pegou a minha, apertando-a levemente. — Iremos conversar mais tarde, — disse ela, e em seguida cumprimentou uma vampira robusta em um terninho enfeitado com lantejoulas.
— Maude, — disse Sophie-Anne, — Como é bom vê-la. E como vão as coisas em Minnesota?
Naquele momento um tapinha no suporte para partitura chamou a atenção de todos para a banda. Eram todos vampiros, notei com um sobressalto. O cara de cabelo liso no palanque disse, — Se todos vocês vampiros e vampiresas sexys estão prontos para arrebentar, estamos prontos para tocar! Eu sou Rick Clark, e esta é... a Banda Dead Man Dance (a dança do homem morto)!
Houve uns aplausos superficialmente educados.
— Para abrir a noite aqui estão os dois magníficos dançarinos de Rhodes, cortesia da Blue Moon (lua azul) Produções. Por favor, recebam... Sean e Layla!
O casal que pisou no meio da pista de dança era impressionante, quer você fosse humano ou vampiro. Eram ambos mesmo da espécie sangue frio, embora ele fosse muito velho e ela recentemente transformada, pensei. Ela era uma das mulheres mais bonitas que eu alguma vez tinha visto, e ela estava usando um vestido bege de renda que flutuava em suas pernas de nível internacional como neve caindo ao redor das árvores. Seu parceiro era talvez o único vampiro que eu já vi com sardas, e seu cabelo vermelho era tão longo como o dela.
Eles só tinham olhos um para o outro, e juntos eles dançaram como se estivessem deslizando através de um sonho.
Eu nunca tinha visto nada parecido, e pela atenção extasiada da platéia, ninguém nunca tinha, também. Quando a música traçou para uma conclusão — e até o dia de hoje, eu não consigo lembrar o que eles dançaram — Sean deitou Layla de volta em seus braços, curvou sobre ela, e a mordeu. Fiquei chocada, mas os outros pareciam esperar por isso, e aquilo os excitou um pouco. Sophie-Anne ardeu lentamente por Andre (embora ela não tenha muito para arder, já que ele não era mais afetado do que ela), e Eric olhou para mim com aquela luz quente em seus olhos que me deixava perturbada.
Voltei minha atenção para a pista de dança com determinação e aplaudi como uma maníaca quando os dois se curvaram em agradecimento e outros casais começaram a se unir a eles quando a música começou de novo. Por hábito olhei em volta por Bill, que não estava em parte alguma para ser visto.
Então Eric disse, — Vamos dançar, — e achei que eu não podia dizer não.
Tomamos a pista juntamente com a rainha e seu possível rei, e eu vi Russell Edgington e seu marido, Bart, entrarem para dançar, também. Eles pareciam quase tão encantados um com o outro quanto os dois bailarinos.
Eu não sei cantar, mas céus, eu sei dançar. E Eric deve ter tido algumas lições de salão de baile ao longo do caminho, algum século após outro. Minha mão repousou nas suas costas, a dele na minha, nossas mãos livres se entrelaçaram, e lá fomos nós. Eu não tinha exatamente certeza de que tipo era a dança, mas ele era um condutor competente, por isso foi fácil seguir adiante. Mais parece valsa que qualquer outra coisa, eu decidi.
— Lindo vestido, — disse a bailarina Layla quando passamos por
eles.
— Obrigada, — eu disse, e sorri com alegria para ela. De alguém tão encantadora como ela era, aquilo foi um grande elogio. Então o seu companheiro se inclinou para lhe dar um beijo, e eles giraram para dentro da multidão.
— Esse é um lindo vestido, — disse Eric. — E você é uma bela mulher.
Eu estava estranhamente constrangida. Eu já tinha recebido elogios antes - você não pode ser uma garçonete e não receber elogios - mas a maioria deles consistia de caras (em vários graus de alcoolismo) me dizendo que eu era realmente bonita - ou, no caso de um homem, como impressionante as minhas — tetas— eram. (De algum modo, JB du Rone e Hoyt Fortenberry conseguiram pisar nos dedos dos pés do cara e derramar uma bebida em cima dele ao momento mesmo, apenas acidentalmente.)
— Eric, — eu disse, mas eu não pude terminar a frase, porque eu não conseguia pensar no que dizer em seguida. Eu tinha que me concentrar na velocidade com que meus pés estavam se movendo.
Nós estávamos dançando tão rápido que eu me senti como se estivesse voando. De repente Eric soltou minha mão para agarrar minha cintura, e quando nós girávamos, ele me suspendeu para cima, e então eu estava realmente voando, com uma pequena ajuda de um viking. Eu ri como uma louca, meus cabelos ondulando ao redor de minha cabeça, e então ele me soltou e me apanhou, apenas alguns centímetros do chão, e então ele fez novamente e novamente, até que finalmente eu estava em pé no chão e a música estava terminada.
— Obrigada, — eu disse, sabendo que eu deveria parecer como se eu estivesse parada no meio de uma ventania. — Me dê licença enquanto eu vou ao toalete feminino.
Eu escapei através da multidão, tentando não sorrir como uma idiota. Eu deveria estar com - ah, é - meu namorado. Em vez de dançar com outro cara até que me sentisse latejante de felicidade. E isso não foi algo bom de se fazer, me justificando por causa do nosso laço de sangue.
Sophie-Anne e Andre tinham parado de dançar, e eles estavam com um grupo de outros vampiros. Ela poderia não precisar de mim, então, uma vez que não havia nenhum humano para eu — ouvir— . Eu localizei Carla dançando com Gervaise, e eles pareciam bastante felizes. Carla estava recebendo muitos olhares de admiração dos outros vampiros, e isso fazia Gervaise inchar com orgulho. Ter seus companheiros vampiros desejando o que ele já tinha era maravilhoso.
Eu sabia como Gervaise se sentia.
Eu interrompi meu pensamento.
Eu tinha... eu realmente não tinha lido a mente dele, tinha? Não, eu não podia. As únicas vezes que eu peguei um fragmento de pensamento de vampiro antes de hoje à noite, senti aquele fragmento frio e traiçoeiro. Mas eu sabia como Gervaise se sentiu, com certeza, da mesma forma que eu tinha lido os pensamentos de Henrik. Foi apenas o meu conhecimento dos homens e suas reações, meu conhecimento dos vampiros, ou eu poderia realmente compreender melhor as emoções vampíricas já que eu tive sangue de Eric pela terceira vez? Ou teria minha habilidade, ou meu talento, ou minha maldição - seja o que for que eu chame isso - ampliado para incluir os vampiros já que eu estava perto de me tornar uma?
Não. Não, não, não. Eu me sentia como eu mesma. Me sentia humana. Me sentia quente. Eu estava respirando. Eu tive que usar o banheiro. Eu estava com fome, também. Eu pensei no famoso bolo de chocolate da velha senhora Bellefleur. Minha boca encheu d‟ água. Sim, humana.
Ok, então, essa afinidade nova com vampiros irá desaparecer, como a minha força extra irá desaparecer, com o tempo. Eu tinha bebido do Bill duas vezes, pensei; talvez mais. E três do Eric. E toda vez que eu tive o sangue deles, em dois ou três meses tinha visto o declínio da força e da perspicácia que eu tinha ganhado da ingestão. Então isso irá acontecer desta vez, também, certo? Me sacudi rapidamente. Óbvio, irá.
Jake Purifoy estava encostado na parede, vendo os casais dançar. Eu o tinha vislumbrado mais cedo conduzindo uma vampira jovem ao redor do salão, e ela estava sorridente. Portanto nem tudo era melancolia para Jake, e eu fiquei contente.
— Ei, — eu disse.
— Sookie, bastante ação no julgamento.
— É, foi assustador.
— De onde aquele cara veio?
— Contratado, eu acho. Eric me mandou verificar amanhã algumas áreas de tiro com arco para localizá-lo, tentar descobrir quem o contratou.
— Bom. Aquele quase foi um desastre para você. Sinto muito, — disse ele sem jeito. — Eu sei que você deve ter ficado assustada.
Eu realmente estava muito preocupada com o Quinn para pensar sobre a flecha sendo apontada para mim. — Eu acho que estava. Você está se divertindo, agora.
— Alguma coisa tem que compensar por não ser capaz de trocar mais, — disse Jake.
— Eu não sabia que você tinha tentado. — Eu não conseguia pensar em mais nada para dizer.
— Repetidas vezes, — disse ele. Olhamos um para o outro por um longo, longo momento. — Bem, eu estou livre para encontrar outra companheira, — ele me disse, e se dirigiu propositadamente na direção de uma vampira que tinha vindo com o grupo de Stan Davis do Texas. Ela parecia contente de vê-lo chegando.
Nesse meio tempo eu fui mergulhar no toalete feminino, que era pequeno, é claro; a maioria das moças na Pirâmide de Gizé não precisavam usar tal instalação, exceto para pentear os cabelos. Havia uma atendente, um requinte que eu nunca tinha visto antes embora tivesse lido a respeito disso em livros. Eu considerei dar gorjeta para ela. Eu ainda tinha minha pequena bolsa de noite com a minha chave do quarto nela, e eu fiquei aliviada ao lembrar que eu tinha guardado alguns dólares lá dentro, junto com alguns lenços de papel e balas de menta e uma minúscula escova. Eu acenei para a atendente, uma atarracada mulher de pele escura com uma cara triste.
Eu fiz o que tinha que fazer na bonita bancada limpa e depois emergi minhas mãos para lavar e tentar alisar meu cabelo. A atendente, usando um crachá que dizia ‚Lena‛, abriu a torneira para mim, de um jeito que me deixou esquisita. Quero dizer, eu posso virar uma torneira. Mas eu lavei minhas mãos e usei a toalha que ela estendeu para mim, esperando que isso fosse a rotina e eu não deveria agir como uma ignorante. Eu deixei cair dois dólares na tigela de gorjetas, e ela tentou sorrir para mim, mas ela parecia muito infeliz para conseguir rir. Ela deve estar tendo uma noite ruim.
— Obrigada, — eu disse, e virei para sair. Eu não sei porque, mas eu dei uma espiada para o espelho no interior da porta antes que de eu puxar a maçaneta. Lá estava Lena, fitando um buraco nas minhas costas. Ela tinha parecido tão infeliz porque ela tinha trapaceado para dissimular o quanto ela me detestava.
Isso é sempre um mau pressentimento, quando você conhece alguém que te detesta; especialmente quando é sem nenhuma boa razão. Mas os problemas dela não eram os meus, e se ela não queria abrir a torneira para mulheres que saíam com vampiros, ela deveria procurar outro emprego. Eu não queria que ela abrisse a maldita torneira, em todo caso, por Deus.
Então eu tomei meu caminho através da multidão, conferindo com a rainha para ver se ela tinha algum humano por aí que precisava de varredura (não), conferindo para ver se eu poderia encontrar um lobis ou metamorfo que podia me dar uma atualização sobre Quinn (não).
Por um golpe de sorte, eu encontrei o bruxo do tempo, o bruxo que eu tinha visto mais cedo. Confesso que me orgulhei um pouco por descobrir que minha conjetura realmente estava correta. Sua presença aqui esta noite foi sua recompensa por um bom serviço, embora eu não pudesse detectar onde estava o seu chefe. O bruxo meteorologista tinham uma bebida em sua mão e uma mulher de meia-idade em seu braço. Sra. Bruxo, eu descobri com outro rápido mergulho em sua piscina mental. Ele esperava que ela não tivesse notado que ele estava muito interessado na bela vampira dançarina e na linda loira humana vindo na direção dele, aquela que tinha olhado para ele mais cedo como se ela o conhecesse.
Oh... essa seria eu.
Eu não consegui pegar o nome dele, o que facilitaria as coisas, e eu não sabia o que dizer. Mas esta era uma pessoa que deve ser levado à atenção de Sophie-Anne. Alguém o tinha usado contra ela.
— Olá, — eu disse, dando-lhes o meu maior sorriso. A mulher sorriu de volta, um pouco cautelosamente, porque o tranquilo casal geralmente não era abordado por jovens mulheres solteiras (ela espiou a minha mão esquerda) durante festas glamourosas. O sorriso do bruxo do tempo ficou mais do tipo assustado. — Vocês estão gostando da festa? — Eu perguntei.
— Sim, uma noite perfeita, — disse a esposa.
— Meu nome é Sookie Stackhouse, — eu disse, deixando escapar um charme.
— Olive Trout, — respondeu ela, e apertamos as mãos. — Este é meu marido, Julian. — Ela não tinha ideia o que o seu marido era.
— Vocês são da vizinhança? — Eu estava rastreando a multidão tão discretamente quanto possível. Eu não tinha ideia do que fazer com eles agora que os tinha encontrado.
— Você não tem assistido nossas estações locais, — disse Olive orgulhosamente. — Julian é o meteorologista do Canal 7.
— Que interessante, — eu disse, com sinceridade absoluta. — Se vocês dois vierem comigo, eu sei de alguém que simplesmente irá amar conhecer vocês. — Enquanto eu arrastava os dois através da multidão, eu comecei a pensar duas vezes.
O que aconteceria se Sophie-Anne intencionasse uma retaliação? Mas isso não faria sentido. O fato importante não era que havia um bruxo do tempo; o fato importante era que alguém havia contratado Julian Trout para prever o tempo para Louisiana que, por qualquer razão, adiou a cúpula até que Katrina descarregasse sua destruição.
Julian era perspicaz o suficiente para descobrir que algo estava errado com o meu entusiasmo, e eu tive medo que eles se recusassem a seguir adiante. Fiquei muito aliviada por localizar a cabeça loura de Gervaise. Eu chamei o seu nome com num tom cordial como se eu não conversasse com ele por um tempo muito longo. No momento que eu o alcancei estava quase sem fôlego por reunir os Trouts com tanta rapidez e ansiedade.
— Gervaise, Carla, — eu disse, depositando os Trouts na frente do xerife como se eu os tivesse drogado completamente. — Esta é Olive Trout e seu marido, Julian. A rainha tem estado ansiosa para encontrar alguém como Julian. Ele realmente está dentro do clima. — Ok, não foi delicado. Mas o rosto de Julian ficou branco. É, um pequeno entendimento da transgressão definitivamente estava presente na consciência de Julian.
— Querido, você está enjoado? — Olive perguntou.
— Precisamos ir para casa, — disse ele.
— Não, não, não, — disse Carla, pulando na conversa. — Gervaise, querido, você se lembra que Andre disse que se nós ouvíssemos falar de alguém que fosse realmente uma autoridade em clima, ele e especialmente a rainha gostariam ter uma palavra com ele? — Ela enrolou seus braços em torno dos Trouts e sorriu para eles. Olive parecia incerta.
— É claro, — disse Gervaise, a lâmpada finalmente ligando acima de sua cabeça. — Obrigado, Sookie. Por favor, venha conosco. — E eles direcionaram os Trouts para longe.
Eu me senti um pouco tonta com o prazer de ter obtido genuíno sucesso.
Olhando em volta, localizei Barry pondo um pequeno prato sobre uma bandeja vazia.
— Você quer dançar? — Eu perguntei, porque a Banda Dead Man Dance estava tocando um cover incrível de uma antiga canção de Jennifer Lopez. Barry pareceu relutante, mas eu o puxei pela mão, e logo estávamos agitando nossos traseiros por todos os lados e nos divertindo. Nada como dançar para relaxar a tensão e se perder, só por um tempinho. Eu não era tão boa como Shakira no controle muscular, mas talvez se eu praticasse de vez em quando...
— O que você está fazendo? — Eric perguntou, e ele não estava sendo jocoso. Ele estava frio como gelo de desaprovação.
— Dançando, por quê? — Eu fiz um gesto indicando para que Eric desse o fora. Mas Barry já tinha parado e me deu um pequeno aceno de adeus.
— Eu estava me divertindo, — eu protestei.
— Você estava agitando seus atributos na frente de cada homem neste salão, — disse ele. — Como uma...
— Se segura aí, amigo! Pare agora mesmo! — Eu levantei o dedo, alertando ele.
— Tire seu dedo da minha cara, — disse ele.
Inspirei para dizer algo imperdoável, acolhendo a maré de raiva com real prazer - eu não estava atada com ele pela cintura - quando um forte, rijo braço me envolveu, e uma voz desconhecida com sotaque irlandês disse, — Dançar, querida? — Assim o dançarino de cabelos vermelhos que tinha aberto o baile da noite me girou de uma forma mais serena mas com uma série de passos complicados, vi sua parceira agarrando o pulso de Eric para fazer o mesmo.
— Apenas me acompanhe enquanto você se acalma, garota. Eu sou
Sean.
— Sookie.
— Prazer em conhecê-la, jovem mulher. Você é uma boa dançarina.
— Obrigada. Isso é um grande elogio, vindo de você. Eu realmente gostei de sua apresentação mais cedo. — Pude sentir o ímpeto de raiva se esvaindo.
— É a minha parceira, — disse ele, sorrindo. Não parece ser fácil para ele, aquele sorriso, mas o transformou de um homem magro de rosto sardento com um baita de um nariz num homem com sensualidade de sobra. — É um sonho dançar com minha Layla.
— Ela é muito bonita.
— Oh, sim, dentro e fora.
— Quanto tempo vocês tem sido parceiros?
— Na dança, dois anos. Na vida, mais de um ano.
— Com base em seu sotaque, acho que você veio até aqui por caminhos indiretos. — Vislumbrei Eric e a bela Layla. Layla tinha um sorriso fácil em seus lábios, e ela estava conversando com Eric, que ainda estava parecendo mais ou menos carrancudo. Mas não zangado.
— Você pode dizer que sim, — ele concordou. — Claro, eu sou da Irlanda, mas eu tenho estado aqui por... — Sua testa franziu pensando, e foi como assistir mármore ondular. — Tenho estado aqui por uns cem anos, em qualquer caso. De tempos em tempos, pensamos a respeito de retornar ao Tennessee, de onde Layla vem, mas nós ainda não temos opiniões formadas.
Esta era um monte de conversa para um cara que parecia calado. — Você está cansado de viver na cidade?
— Muita besteira anti-vampiro por aí ultimamente. A Irmandade do Sol, o movimento Tire a Noite dos Mortos: parece que eles estão procriando aqui.
— A Irmandade está em toda parte, — eu disse. A menção do nome me fazia sentir muito deprimida. — E o que acontecerá quando eles começarem a ouvir falar sobre os metamorfos?
— Sim. E eu acho que será em breve. Eu continuo a ouvir dos metamorfos que isso é quase iminente.
Você pensaria que, de todos os sobres que eu conheci, um deles me deixaria saber o que estava acontecendo. Cedo ou tarde lobis e metamorfos teriam que deixar o mundo conhecer o seu grande segredo, ou ficariam expostos pelos vampiros, intencionalmente ou involuntariamente.
— Pode haver até mesmo uma guerra civil, — disse Sean, e eu forcei a minha mente de volta ao tópico em questão.
— Entre a Irmandade e os metamorfos?
Ele fez que sim com a cabeça. — Estou acreditando que pode acontecer.
— O que você faria nesse caso?
— Eu já passei por algumas guerras, e eu não quero passar por outra, — disse prontamente. — Layla não viu o Velho Mundo, e ela irá apreciar, por isso, nós iremos para a Inglaterra. Podemos dançar por lá, ou podemos apenas encontrar um lugar para nos esconder.
Apesar de tão interessante como era, eu não estava nem perto de esclarecer os inúmeros problemas que me confrontava diretamente no momento, e que eu poderia contar nos dedos. Quem pagou Julian Trout? Quem plantou a bomba no Dr Pepper? Quem matou o resto dos vampiros do Arkansas? Foi a mesma pessoa que tinha matado Henrik, o empregado da vampira malévola?
— Qual seria o resultado? — Eu disse em voz alta, deixando em confusão o vampiro de cabelos vermelhos.
— Como disse?
— Eu só estava falando comigo mesma. Foi um prazer dançar com você. Desculpe-me, tenho que encontrar um amigo.
Sean dançou comigo até à borda da multidão, e nos separamos. Ele já estava à procura de sua companheira.
Casais vampiros não ficam juntos por muito tempo, em regra. Mesmo os casamentos de cem anos dos reis e rainhas é somente obrigatório uma visita nupcial uma vez por ano. Eu esperava que Sean e Layla provariam ser a exceção.
Eu decidi que deveria checar Quinn. Isso poderia ser um processo demorado, pois eu não tinha ideia de onde os lobis o levaram. Eu estava tão confusa com o efeito que Eric tinha sobre mim, e toda pertubada com o início da afeição por Quinn. Mas eu sabia para quem eu estava em dívida. Quinn tinha salvado a minha vida esta noite. Eu comecei minha procura ligando para seu quarto, mas não tive resposta.
Se eu fosse uma lobis, para onde eu levaria um tigre ferido? Bem, em nenhum lugar público, porque lobis eram reservados. Eles não iriam querer funcionários do hotel pegando uma palavra ou uma frase que daria pista sobre a existência deles e de outros metamorfos. Então eles levaram Quinn para um quarto privado, certo? Então, quem tinha um quarto privado e era simpatizante dos lobis?
Jake Purifoy, claro - ex-lobis, atual vampiro. Quinn poderia estar lá - ou ele poderia estar em algum lugar na garagem do hotel, ou na sala do chefe da segurança, ou na enfermaria, se houvesse tal coisa.
Eu tinha que começar em algum lugar. Exigi informação na recepção, onde a recepcionista não pareceu ter qualquer problema em liberar o número do quarto para mim, embora seja verdade que Jake e eu estávamos marcados como sendo membros do mesmo grupo. A recepcionista não era a mesma que tinha sido tão rude quando nós nos tínhamos registrado. Ela achou que meu vestido era muito bonito, e ela queria um igual.
O quarto de Jake estava um andar acima do meu, e quando eu levantei a mão para bater na porta, casualmente rastreei lá dentro para contar os cérebros. Não havia o buraco de ar que marcava um cérebro de vampiro (essa é a melhor maneira que eu posso descrever), e algumas assinaturas humanas. Mas eu obtive um pensamento que congelou meu punho antes que ele tivesse uma chance de tocar a porta.
...todos devem morrer, chegou um fraco fragmento de pensamento. Nada o seguiu, entretanto - nenhum outro pensamento que esclarecesse ou desenvolvesse essa ideia maligna. Então eu bati, e o padrão no quarto mudou instantaneamente. Jake abriu a porta. Ele não pareceu receptivo.
— Oi, Jake, — eu disse, fazendo meu sorriso tão brilhante e inocente como eu podia. — Como está? Eu vim para ver se Quinn estava contigo.
— Comigo? — Jake soou alarmado. — Desde que eu me transformei, eu mal falei com Quinn, Sookie. Nós simplesmente não temos qualquer coisa para falar. — Devo ter parecido incrédula, porque ele falou às pressas, — Oh, não é Quinn; sou eu. Eu apenas não consigo atravessar o abismo entre quem eu era e quem eu sou agora. Eu nem tenho certeza do que eu sou. — Seus ombros caíram.
Aquilo soou honesto o suficiente. E eu senti uma grande simpatia por ele. — De qualquer maneira, — disse Jake, — eu ajudei a levá-lo para a enfermaria, e eu aposto que ele ainda está lá. Há uma metamorfa chamada Bettina e um lobis chamado Hondo com ele.
Jake manteve a porta fechada. Ele não queria que eu visse seus companheiros. Jake não sabia que eu poderia sentir que havia pessoas em seu quarto.
Não era nada da minha conta, é claro. Mas era inquietante. Mesmo quando eu o agradeci e virei para sair, eu fiquei pensando na situação. A última coisa no mundo que eu queria era causar ao preocupado Jake mais problemas, mas se ele estava de alguma forma envolvido na trama que parecia estar deslizando pelos corredores da Pirâmide de Gizé, eu tinha que descobrir.
Primeiro as coisas mais importantes. Fui para meu quarto e liguei para a recepção para obter as direções para a enfermaria, e cuidadosamente eu as anotei no bloco para apontamentos do telefone. Então eu voltei furtivamente para as escadas para ficar do lado de fora da porta de Jake novamente, mas no momento que eu parti, o grupinho de amigos começou a se dispersar. Eu vi dois humanos de costas.
Estranho; eu posso não estar certa, mas um deles parecia o Joe rabugento, o empregado que consulta o computador na área de bagagens. Jake tinha se reunido com alguns dos funcionários do hotel no seu quarto. Talvez ele ainda se sentisse mais à vontade com os humanos do que com os vampiros. Mas certamente lobis teria sido a sua escolha....
Enquanto fiquei parada ali no corredor, sentindo pena dele, a porta de Jake abriu e ele saiu. Eu não tinha verificado os pontos em branco, apenas as assinaturas vivas. Meu erro. Jake parecia um pouco desconfiado quando me viu, e eu não podia culpá-lo.
— Você quer ir comigo? — Eu perguntei.
— O quê? — Ele pareceu assustado. Ele não era vampiro tempo suficiente para aprender o oportuno rosto impenetrável.
— Para ver Quinn? — Eu disse. — Tenho as orientações para a enfermaria, e você disse que não conversava com ele há um tempo, então eu achei que você pudesse querer ir comigo se eu tipo, facilitar o caminho?
— Essa é uma boa ideia, Sookie, — disse. — Eu acho que vou deixar passar. O fato é que a maioria dos metamorfos não me querem mais por perto. Quinn é melhor que a maioria, tenho certeza, mas eu o deixarei desconfortável. Ele conhece minha mãe, meu pai, minha exnamorada; todas as pessoas da minha antiga vida, aqueles que não querem andar comigo agora.
Eu disse impulsivamente, — Jake, eu sinto tanto. Eu sinto muito por Hadley ter te transformado ainda que você preferisse ter morrido. Ela gostava de você, e ela não quis que você morresse.
— Mas eu morri, Sookie, — disse Jake. — Eu não sou mais o mesmo cara. Como você sabe. — Ele pegou meu braço e olhou para a cicatriz, aquela que ele tinha deixado com seus dentes. — Você nunca mais será a mesma, também, — ele disse, e se afastou. Eu não tive certeza se ele sabia onde estava indo, mas ele só queria ficar longe de mim.
Eu o observei até ele ficar fora de vista. Ele não se virou para trás para me olhar.
Meu ânimo ficou frágil de qualquer maneira, e esse encontro deu partida no seu declínio. Me arrastei para os elevadores, determinada a encontrar a maldita enfermaria. A rainha não havia me intimado, então presumivelmente, ela estava tendo relações amigáveis com outros vampiros, tentando descobrir quem havia contratado o bruxo do tempo e, por via de regra, deleitando-se com seu alívio. Sem mais julgamento, uma herança desimpedida, a chance de colocar seu amado Andre no poder. As coisas estavam indo muito bem para a Rainha da Louisiana, e eu tentei não ficar amarga. Ou será que eu tenho o direito de ficar? Hmmm, vejamos. Eu tinha ajudado a parar o julgamento, embora eu não havia levado em conta que interrompi definitivamente e completamente do mesmo modo como havia feito, digamos, o azarado Henrik. Já que ela foi declarada inocente, teria a herança como prometido em seu contrato matrimonial. E quem tinha tido a ideia a respeito do Andre?
E eu tinha provado estar certa sobre o bruxo. Tudo bem, talvez eu pudesse estar um pouco amarga com a minha própria má sorte. Além disso, mais cedo ou mais tarde eu teria que escolher entre Quinn e Eric, não por minha culpa. Eu fiquei segurando uma bomba por um tempo muito longo. A Antiga Profetisa não era um membro do meu fã clube, e ela era um objeto de reverência para a maioria dos vampiros. Eu quase fui morta com uma flecha.
Bem, eu já tive noites piores.
Achei a enfermaria, o que foi mais fácil de localizar do que eu pensei, porque a porta estava aberta e eu pude ouvir uma risada familiar vindo do quarto. Entrei para descobrir que Quinn estava conversando com a mulher que parecia o pote de mel em formato de urso - que devia ser Bettina, e o cara negro, que devia ser Hondo. Para meu espanto, Clovache também estava lá. Estava com sua armadura, mas ela conseguiu dar a impressão de um cara que tinha afrouxado a gravata.
— Sookie, — disse Quinn. Ele sorriu para mim, mas os dois trocaformas não. Eu era definitivamente uma visitante indesejada.
Mas eu não vim para vê-los. Eu vim para ver o homem que salvou minha vida. Fui até ele, deixando-o me observar, dando a ele um pequeno sorriso. Sentei-me na cadeira de plástico ao lado da cama e peguei sua mão.
— Me diga como você está sentindo, — disse.
— Como eu tivesse realmente escapado por um triz, — disse ele. — Mas eu vou ficar bem.
— Vocês podem nos dar licença por um momento, por favor? — Fui a mais educada a medida que eu encontrava os olhos dos outros três no quarto.
Clovache disse, — Voltar para escoltar Kentucky, — e partiu. Ela poderia ter piscado para mim antes de desaparecer. Bettina pareceu um pouco desapontada, como se ela tivesse sido a aluna que aprendeu por conta própria e agora o professor voltou e pegou de volta sua autoridade.
Hondo me deu um olhar sombrio que continha mais que uma insinuação de ameaça. — Cuide bem do meu chapa, — disse ele. — Não lhe traga problemas.
— Nunca, — eu disse. Ele não conseguiu pensar em uma maneira de permanecer, já que Quinn aparentemente queria falar comigo, então ele saiu.
— Meu fã-clube só fica maior e maior, — eu disse, vendo eles partirem. Levantei-me e fechei a porta atrás deles. A menos que um vampiro, ou Barry, ficasse do lado de fora da porta, estávamos razoavelmente em privacidade.
— É aqui que você vai terminar comigo pelo vampiro? — Quinn perguntou. Todos os vestígios de bom humor desapareceu de seu rosto, e ele ficou muito mais controlado.
— Não. Aqui é onde te conto o que aconteceu, e você escuta, e depois falamos. — Disse aquilo como se eu tivesse certeza que ele concordaria, mas estava longe de ser o caso, e meu coração estava batendo na minha garganta enquanto eu esperava pela sua resposta. Por fim, ele concordou, e eu fechei meus olhos com alívio, segurando sua mão esquerda entre as minhas.
— Ok, — eu disse, me estimulando, e então eu decolei e transcorri com minha narrativa, confiando que ele visse que Eric era realmente o menor de dois males.
Quinn não puxou sua mão, mas ele não segurou a minha, tampouco. — Você está ligada ao Eric, — ele disse.
— Sim.
— Você trocou sangue com ele pelo menos três vezes.
— Sim.
— Você sabe que ele pode transformá-la a qualquer hora que ele tiver vontade?
— Qualquer um de nós poderia ser transformado a qualquer hora que os vampiros sentirem vontade, Quinn. Mesmo você. Seria necessário dois deles para te segurar e outro para tomar todo o seu sangue e te dar o dele, mas isso ainda poderia acontecer.
— Não levaria muito tempo se ele tiver vontade, agora que vocês dois compartilharam repetidas vezes. E isso é culpa do Andre.
— Não há nada que eu possa fazer a respeito agora. Eu gostaria que houvesse. Eu gostaria poder cortar Eric da minha vida. Mas eu não posso.
— A menos que ele fosse estaqueado, — disse Quinn.
Senti uma pontada no meu coração que quase levei uma mão no
peito.
— Você não quer que isso aconteça. — A boca de Quinn ficou comprimida em um linha dura.
— Não, claro que não!
— Você se importa com ele.
Ah, merda. — Quinn, você sabe que Eric e eu estivemos juntos há algum tempo, mas ele teve amnésia e não se lembra. Quero dizer, ele sabe que é um fato, mas ele não se lembra de modo algum.
— Se alguém além de você me contasse essa história, você sabe o que eu pensaria.
— Quinn. Eu não sou outra pessoa.
— Benzinho, eu não sei o que dizer. Eu me importo com você, e eu adoro passar o tempo contigo. Eu amo ir para a cama contigo. Eu gosto de comer à mesa contigo. Gosto quando cozinhamos juntos. Eu gosto de quase tudo sobre você, inclusive o seu dom. Mas eu não sou bom em compartilhar.
— Eu não fico com dois caras ao mesmo tempo.
— O que você está dizendo?
— Eu estou dizendo, eu vou ficar com você, a menos que você me diga algo diferente.
— O que você vai fazer quando Sr. Grande e Louro te ordenar a pular na cama com ele?
— Eu irei dizer a ele que estou comprometida com... se você for
falar.
Quinn mexeu desassossegado na cama estreita. — Eu estou me curando, mas estou machucado, — ele admitiu. Ele parecia muito cansado.
— Eu não o incomodaria com tudo isso se não fosse muito importante para mim, — eu disse. — Estou tentando ser honesta contigo. Absolutamente honesta. Você tomou a flecha por mim, e isso é o mínimo que posso fazer em troca.
— Eu sei disso. Sookie, eu sou um homem que quase sempre sabe da minha própria opinião, mas eu tenho que te dizer... eu não sei o que dizer. Eu pensei que nós éramos quase perfeitos um para o outro até o presente. — Os olhos de Quinn brilharam em seu rosto de repente. — Se ele morresse, não teríamos problemas.
— Se você o matasse, eu teria um problema, — eu disse. Eu não podia deixar mais claro do que isso.
Quinn fechou os olhos. — Temos que pensar nisso novamente quando eu estiver curado e você tenha dormido e tido tempo para relaxar, — disse ele. — Você precisa conhecer Frannie, também. Estou tão... — Para meu horror, eu pensei que Quinn estava engasgando. Se ele chorasse, eu também choraria, e a última coisa que eu precisava eram de lágrimas. Inclinei-me tanto que pensei que eu estava caindo em cima dele, e o beijei, apenas uma pressão rápida da minha boca na dele. Mas então ele segurou meus ombros e me puxou de volta para ele, e havia muito mais para explorar, seu calor e intensidade... mas então seu suspiro quebrou o momento. Ele estava tentando não fazer careta de dor.
— Oh! Me desculpa.
— Nunca mais peça desculpas por um beijo como esse, — disse ele. E ele não parecia mais lacrimejante. — Definitivamente nós temos algo especial rolando, Sookie. Eu não quero que o merda do vampiro Andre arruíne isso.
— Nem eu, — disse. Eu não quero desistir de Quinn de maneira alguma, por causa da nossa química abrasadora. Andre me apavorava, e quem sabia quais eram suas intenções? Eu certamente não sabia. Eu suspeitava que Eric não sabia, também, mas ele nunca foi avesso ao poder.
Eu disse adeus ao Quinn, um relutante adeus, e comecei encontrando o meu caminho de volta para o baile. Me senti obrigada a checar com a rainha para ter certeza de que ela não precisava de mim, mas eu estava exausta, e eu precisava tirar meu vestido e desmoronar na minha cama.
Clovache estava encostada contra a parede do corredor em frente, e eu tive a impressão de que ela estava esperando por mim. A jovem Britlingen era menos escultural do que Batanya, e enquanto Batanya parecia um impressionante gavião com cachos escuros, Clovache era totalmente mais simples, com um fino cabelo marrom acinzentado que precisava de um bom cabeleireiro e grandes olhos verdes, com sobrancelhas altas, arqueadas.
— Ele parece ser um bom homem, — , disse ela em seu sotaque duro, e eu tive a forte sensação que Clovache não era uma mulher sutil.
— Ele parece desse jeito para mim, também.
— Enquanto um vampiro, por definição, é desonesto e enganador.
— Por definição? Você quer dizer, sem exceção?
— Sem exceção.
Me mantive em silêncio enquanto caminhávamos. Eu estava cansada demais para descobrir o propósito da guerreira em me dizer aquilo. Resolvi perguntar. — O que há, Clovache? Qual é o assunto?
— Você se perguntou por que estávamos aqui, protegendo o Rei de Kentucky? Por que ele decidiu pagar nossos honorários verdadeiramente astronômicos?
— Sim, me perguntei, mas eu me dei conta que não era assunto
meu.
— É muitíssimo assunto seu.
— Então me diga. Eu não estou alerta para suposições.
— Isaiah capturou uma espiã da Irmandade no seu séquito um mês atrás.
Eu parei de repente, e Clovache parou, também. Eu processei suas palavras. — Isso é sem dúvida péssimo, — eu disse, sabendo que as palavras foram inadequadas.
— Péssimo para a espiã, é claro. Mas ela deu algumas informações antes que partisse para o vale das sombras.
— Uau, é um jeito bonito de dizer isso.
— É um monte de porcaria. Ela morreu, e não foi bonito. Isaiah é um cara à moda antiga. Moderno na superfície, um vampiro tradicional por dentro. Ele teve um divertimento maravilhoso com a pobre cadela antes que ela se desse por vencida.
— Você acha que pode confiar no que ela disse?
— Bem pensado. Eu teria confessado qualquer coisa se eu achasse que iriam me poupar de algumas das coisas que seus colegas fizeram com ela.
Eu não tinha certeza se isso era verdade. Clovache era feita de material muito resistente.
— Mas eu acho que ela disse a ele a verdade. Sua história foi, um grupo dissidente da Irmandade se interou dos assuntos desta cúpula e decidiu que seria uma oportunidade de ouro para revelar publicamente a sua luta contra os vampiros. Não simplesmente protestos e sermões contra os vampiros, mas absoluta campanha. Este não é o corpo principal da Irmandade... os líderes estão sempre atentos em dizer, ‚Oh, Deus, não, nós não toleramos a violência contra ninguém. Nós estamos apenas alertando às pessoas a terem consciência de que se eles se associarem com vampiros, eles estarão se associando com o diabo‛.
— Você sabe muito sobre as coisas deste mundo, — eu disse.
— Sim, — ela concordou. — Eu faço um monte de pesquisa antes de aceitarmos um trabalho.
Eu quis perguntar a ela como era o seu mundo, como partia de um mundo para outro, o quanto ela cobrava, se todos os guerreiros do (em?) seu mundo eram mulheres ou os rapazes poderiam chutar traseiros, também; e se sim, quanto deles pareciam maravilhosos naquelas calças. Mas este não era o momento nem o lugar.
— Então, qual é o resultado final deste assunto? — Eu perguntei.
— Eu acho que talvez a Irmandade esteja tentando montar uma grande ofensiva aqui.
— A bomba na lata de refrigerante?
— Na verdade, isso me desconcerta. Mas ela estava fora do quarto de Louisiana, e a Irmandade deve saber a esta altura que sua espiã não teve êxito, se esse foi o seu trabalho.
— E há também os três vampiros assassinados na suíte Arkansas, — eu apontei.
— Como eu disse, desconcertada, — disse Clovache.
— Será que eles mataram Jennifer Cater e os outros?
— Certamente, se tiveram uma chance. Mas apostar em algo tão pequeno quando de acordo com a espiã eles estavam planejando algo realmente grande - parece muito improvável. Além disso, como poderia um ser humano entrar na suíte e matar três vampiros?
— Então, qual foi o resultado da bomba no Dr. Pepper? — Eu perguntei, tentando com esforço compreender o pensamento por trás daquilo. Retomamos a caminhada, e agora estávamos exatamente do lado de fora do salão de cerimônias. Eu podia ouvir a orquestra.
— Bem, a bomba te deu alguns novos cabelos brancos, — Clovache disse, sorrindo.
— Eu não posso acreditar que esse foi o objetivo, — eu disse. — Eu não sou tão egocêntrica.
Clovache tomou uma decisão. — Você está certa, — disse ela, — porque a Irmandade não a teria plantado. Eles não querem chamar atenção para o seu plano maior com uma pequena bomba.
— Então ela foi posta lá para algum outro propósito.
— E qual propósito foi esse?
— O resultado final da bomba, se tivesse explodido, a rainha teria tomado um grande susto, — eu disse lentamente.
Clovache pareceu surpresa. — Não matado?
— A rainha nem mesmo estava no quarto.
— Ela deveria ter explodido bem antes de você encontrá-la, — disse Clovache.
— Como você sabe disso?
— O cara da segurança. Donati. Isso foi o que a polícia lhe disse. Donati nos vê como colegas de profissão. — Clovache sorriu. — Ele gosta de mulheres em armaduras.
— Ei, quem não gosta? — Eu sorriu de volta.
— E era uma bomba fraca, se qualquer bomba pode ser chamado de fraca. Eu não estou dizendo que não causaria dano. Causaria. Talvez até alguém morto, como você poderia ter sido. Mas o episódio pareceu ser ineficaz e mal planejado.
— A menos que ela tenha sido projetada apenas para assustar. Projetada para ser localizada. Projetada para ser desarmada.
Clovache deu de ombros.
— Eu não entendo, — eu disse. — Se não foi a Irmandade, quem foi? O que a Irmandade planeja fazer? Atacar o saguão armados com bastões de beisebol afiados?
— A segurança aqui não é tão boa, — , disse Clovache.
— É, eu sei. Quando eu estava no porão, pegando uma mala para a rainha, os guardas foram muito preguiçosos, e eu não acho que os empregados sejam revistados quando entram, também. E eles tinham um monte de malas misturadas.
— E os vampiros contrataram essas pessoas. Inacreditável. Por um lado os vampiros entendem que eles não são imortais. Eles podem ser mortos. Por outro lado, eles têm sobrevivido por tanto tempo, que isso os faz se sentirem onipotentes. — Clovache deu de ombros. — Bom, de volta ao dever. — Nós chegamos ao salão de baile. A banda Dead Man Dance ainda estava tocando.
A rainha estava muito próxima de Andre, já que ele não mais ficava atrás dela, mas ao seu lado. Eu sabia que isso era significativo, mas não era claro o suficiente para motivar Kentucky a perder a esperança. Christian Baruch estava de plantão igualmente. Se ele tivesse uma cauda, ela estaria abanando, ele estava tão ansioso por agradar Sophie-Anne. Olhei ao redor do salão para os outros reis e rainhas, reconhecíveis por seus séquitos.
Eu nunca tinha visto antes todos eles juntos num aposento, e eu contei. Havia apenas quatro rainhas. Os outros doze governantes eram homens. Das quatro rainhas, Minnesota parecia estar emparceirada com o rei de Wisconsin. Ohio tinha seu braço em torno de Iowa, então eles eram um casal. Além de Alabama, a única rainha sem companheiro era SophieAnne.
Embora muitos vampiros tendem a ser flexíveis quanto ao gênero de seu parceiro sexual, ou pelo menos tolerantes com aqueles que preferem algo diferente, alguns deles definitivamente não são. Não admira que Sophie-Anne estivesse brilhando tão gloriosamente, mesmo sob a nuvem suspensa pela morte de Peter Threadgill. Os vampiros não parecem ter medo de viúvas alegres.
O brinquedo humano de Alabama percorreu seus dedos nas costas nuas dela, e ela gritou com medo fingido. — Você sabe que eu odeio aranhas, — disse ela brincando, parecendo quase humana, agarrando-o com força para perto dela. Embora ele tivesse brincado de assustá-la, ela o agarrava mais.
Espera, eu pensei. Espera só um minuto. Mas a idéia não se formou.
Sophie-Anne me notou espreitando, e ela acenou. — Eu acho que para a maioria dos humanos a noite já acabou, — disse ela.
Uma espiada ao redor do salão me disse que era verdade. — O que você achou de Julian Trout? — Eu perguntei, para dissipar meu medo de que ela fez algo terrível a ele.
— Acho que ele não entende o que fez, — disse Sophie-Anne. — Pelo menos até certo ponto. Mas ele e eu chegaremos a um entendimento. — Ela sorriu. — Ele e sua esposa estão muito bem. Eu não preciso mais de você esta noite. Vá se divertir, — disse ela, e não soou condescendente. Sophie-Anne realmente queria que eu aproveitasse, porém, a verdade é que ela não foi muito detalhista sobre como eu me divertiria.
— Obrigada, — eu disse, e então lembrei que seria melhor se eu disfarçasse um pouco. — Obrigada, senhora, e tenha uma boa noite. Te vejo amanhã à noite.
Fiquei feliz por sair dali. Com o salão repleto de vampiros, os olhares que eu estava recebendo estavam mais para o tipo dentes-afiados. Sanguessugas solitários tiveram mais facilidade para aderirem ao sangue artificial comparado a um grupo. Algo sobre a memória dos bons velhos tempos os faziam querer algo quente da fonte, ao invés de um líquido criado em um laboratório e aquecido no microondas.
Bem a tempo, a multidão de doadores voluntários retornaram através de uma porta dos fundos e colocaram-se em fila, mais ou menos, contra a parede. Em muito pouco tempo, estavam todos ocupados, e (suponho) felizes.
Depois que Bill tomava meu sangue durante o ato sexual, ele me dizia que o sangue do pescoço de um humano - após uma dieta de Trueblood, digamos - era como ir à Churrascaria Ruth Chris após muitas refeições no McDonald's.
Eu vi Gervaise aninhando Carla em um canto, e me perguntei se ela precisava de ajuda; mas quando eu vi o rosto dela, decidi que não. Carla não voltou naquela noite, tampouco, e sem a distração de Quinn, eu fiquei numa espécie de pesar. Eu tinha muito em que pensar. Parecia que a encrenca estava procurando por mim nos corredores da Pirâmide de Gizé, e não importando qual curva eu vá tomar, a encrenca viria me encontrar.
EU FINALMENTE FUI PARA A CAMA às quatro da manhã, e eu acordei ao meio-dia. Aquelas oito horas não foram boas. Me mantive meio acordada, e não conseguir regular minha temperatura, o qual pode ter tido algo a ver com a troca de sangue... ou não. Eu tive sonhos ruins, também, e por duas vezes eu pensei ter ouvido Carla entrar no quarto, apenas para abrir meus olhos o suficiente para ver que ela não estava lá.
A estranha luz que entrou através do grosso vidro pintado no único andar de humanos não era como a verdadeira luz do dia, nem um pouco. Isso estava me desorientando.
Eu me senti um pouco melhor depois de um longo banho, e eu ergui o telefone para chamar o serviço de quarto para ter algo para comer. Então eu decidi descer ao pequeno restaurante. Eu precisava ver outros humanos.
Tinham poucos aqui; não minha companheira de quarto, mas um colega humano ou dois, e Barry. Ele gesticulou para a cadeira vazia na sua mesa, e eu me deixei cair nela, procurando ao redor pelo garçom para sinalizar por café. Ele chegou em seguida, e eu estremeci de prazer ao primeiro gole. Depois que eu terminei a primeira xícara, eu disse - da minha maneira - Como você está hoje? Esteve acordado a noite toda?
Não, Stan foi para cama cedo com a sua nova namorada, então eu não fui necessário. Eles estão ainda no estágio de lua-de-mel. Eu fiquei no baile por um tempo, depois eu sai com a maquiadora que a Rainha de Iowa trouxe com ela. Ele balançou suas sobrancelhas para me dizer que a maquiadora era gata.
Então, qual é o seu programa para hoje?
Deslizaram alguns desses por baixo de sua porta? Barry empurrou para mim um feixe grampeado de papéis através da mesa no exato momento que o garçom trouxe meus muffins ingleses e ovos.
Sim, eu enfiei isso na minha bolsa. Uau, eu podia conversar com o Barry enquanto comia, as mais hábeis respostas para falar com a boca cheia que eu jamais pudesse imaginar.
Dê uma olhada.
Enquanto Barry cortava um pãozinho para preenchê-lo com manteiga, eu olhei as páginas. Uma agenda para a noite, o que era bastante útil. O julgamento de Sophie-Anne era o mais sério caso a ser julgado, o único envolvendo a realeza. Mas havia alguns outros. A primeira sessão estava marcada para às 20:00 horas e era uma disputa sobre um dano pessoal. Uma vampira de Wisconsin chamada Jodi (o que parecia improvável por si mesma) estava sendo processada por um vampiro de Illinois chamado Michael. Michael alegou que Jodi esperou até que ele cochilasse durante o dia e então arrancou um de seus caninos. Com alicate.
Uau. Isso parece... interessante. Eu arqueei minhas sobrancelhas. Como é que os xerifes não estão lidando com isso? Vampiros sem dúvida não gostam de lavar suas roupas sujas publicamente.
— Interestadual, — Barry disse sucintamente. O garçom tinha trazido uma jarra inteira de café, então Barry preencheu minha xícara e encheu a sua.
Eu virei uma página. O próximo caso envolvia a cidade de Kansas, Missouri, uma vampira chamada Cindy Lou Suskin, que tinha transformado uma criança. Cindy Lou afirmava que a criança estava morrendo de uma doença no sangue de qualquer forma, e ela sempre quis um filho; então agora ela tinha um perpétuo vampiro pré-adolescente. Além disso, o menino tinha sido transformado com o consentimento de seus pais, por escrito. Kate Book, a advogada da cidade de Kansas, Kansas, nomeada pelo estado para supervisionar o bem-estar do menino, queixava-se que agora o menino se recusava a ver seus pais humanos ou ter qualquer interação com eles, o que era contrário ao acordo entre os pais e Cindy Lou.
Parecia com algo na programação diurna da televisão. Juíza Judy, alguém?
Então, esta noite é de tribunal de julgamento, eu resumi depois de ler as folhas remanescentes. — Eu acho que nós seremos necessários?
— Sim, eu acho assim. Haverão testemunhas humanas no segundo caso. Stan quer que eu esteja lá, e eu aposto que sua rainha irá querer você lá, também. Seu subalterno Bill é um dos juízes nomeados. Apenas reis e rainhas podem julgar outros reis e rainhas, mas para casos envolvendo vampiros inferiores, os juízes são escolhidos num sorteio. O nome do Bill saiu do chapéu.
— Oh, que bom.
Você teve uma história com ele?
É. Mas eu acho que ele provavelmente deve ser um bom juiz. Não tinha certeza porque eu acreditava nisso; depois de tudo, Bill mostrou ser capaz de grande decepção. Mas eu achei que ele tentaria ser justo e desapaixonado.
Eu percebi que o ‚tribunal‛ de julgamento seriam das oito às onze horas. Depois disso, meia-noite às quatro da manhã estava planejada como ‚Comércio‛. Barry e eu olhamos um para o outro e demos de ombro.
— Reunião de trocas? — eu sugeri. — Mercado de pulgas?
Barry não tinha ideia.
A quarta noite da conferência era a última, e a primeira metade dela estava marcada — Hora Livre para Todos em Rhodes. — Algumas atividades sugeridas: ver os dançarinos do Blue Moon de novo, ou a sua divisão mais explícita, Black Moon. A diferença não estava em como se soletrava, mas eu tive a ideia definitiva que os empregados do Black Moon faziam atuações muito mais sexualmente orientadas. Diferentes grupos de dançarinos do estúdio eram selacionados para aparecerem em diferentes locais. Os vampiros visitantes eram também aconselhados a visitar o zoológico, que estaria aberto à noite por um acordo especial, ou o museu da cidade, idem. Ou eles poderiam visitar um clube ‚para o divertimento privativo daqueles que curtem seus prazeres do lado negro‛. Ele era chamado de Beijo de Dor. Me lembre de andar do outro lado da rua para longe desse, eu disse ao Barry.
Você não curte uma pequena mordida? Barry tocou sua língua nos seus próprios caninos assim eu não poderia errar a insinuação.
Há uma porção de prazer nisso, eu disse, porque eu nem mesma poderia negar. Mas eu acho que esse lugar provavelmente vai um pouco além de uma mordida no pescoço. Você está ocupado agora? Porque eu tenho que fazer um certo trabalho de campo para Eric, e eu posso precisar de ajuda.
— Claro, — Barry disse. — O que é?
— Nós precisamos achar lugares de tiro com arco e flecha, — eu respondi.
— Isso foi deixado para você na recepção, senhorita, — disse nosso garçom, que largou um envelope de papel manilha na mesa e recuou como se ele suspeitasse que nós tivéssemos raiva. Evidentemente nossa troca de ideias silenciosa tinha deixado alguém assustado.
Eu abri o envelope para achar dentro uma foto de Kyle Perkins. Tinha uma nota de papel grampeado com a familiar caligrafia rígida de Bill. ‚Sookie: Eric disse que você precisa disso para algum trabalho de detetive, e que essa foto é necessária. Por favor seja cuidadosa. William Compton‛. E justamente quando eu estava pensando em perguntar ao garçom pela lista telefônica, eu vi que tinha uma segunda folha. Bill tinha pesquisado na Internet e fez uma lista de todos os lugares de prática de arco e flecha na cidade. Tinham apenas quatro. Eu tentei não ficar impressionada com a preocupação e auxílio de Bill. Eu estava exausta de ficar impressionada com Bill.
Eu liguei para a garagem do hotel para pegar um dos carros trazidos pelo contingente de Arkansas. A rainha assumiu a propriedade deles, e Eric me ofereceu um deles.
Barry tinha corrido ao seu quarto para pegar uma jaqueta, e eu fiquei parada na porta da frente, esperando pelo carro que seria trazido e desejando saber quanto eu deveria dar de gorjeta ao manobrista quando eu avistei Todd Donati. Ele veio em minha direção, andando devagar e por qualquer razão pesadamente, ainda que ele fosse um homem magro. Ele parecia péssimo hoje, o couro cabeludo exposto por sua calvície grisalha incipiente parecendo úmida, até mesmo seu bigode arqueado.
Ele ficou me encarando por um tempo, sem falar. Eu achei que ele estava juntando sua coragem, ou seu desespero. Se alguma vez eu vi a morte sobre os ombros de um homem, ela estava em Todd Donati.
— Meu chefe está interessado na sua patroa para um encontro, — ele disse abruptamente. Se eu imaginasse como ele começaria nossa conversa, nunca incluiria estes termos.
— É, agora que ela é uma viúva, ela está atraindo bastante interesse, — eu disse.
— Ele é um cara das antigas em várias maneiras. — Todd Donati disse. — Vem de uma antiga família, ele não gosta do pensamento moderno.
— Ahãm, — eu disse, tentando soar neutra mas encorajando.
— Ele não acredita em mulheres fazendo suas próprias decisões, sendo capazes de se defenderem por si mesmas, — disse o chefe da segurança.
Eu não poderia parecer como se estivesse entendendo o que Donati estava falando, porque eu seguramente não sabia.
— Mesmo as mulheres vampiras, — ele disse, e me olhou diretamente e francamente.
— Ok, — eu disse.
— Pense sobre isso, — Donati disse. — Induza sua rainha perguntar a ele onde está a fita de segurança que mostra aquela área em frente ao quarto dela.
— Eu farei isso, — eu disse, tendo nenhuma ideia porque eu estava concordando. Na mesma hora o homem doente girou sobre os seus calcanhares e andou a diante com um ar de ter cumprido o seu dever.
Em seguida o carro chegou, Barry saiu correndo do elevador e veio se encontrar comigo, e qualquer pensamento que eu pudesse ter tido sobre o encontro murchou pelo meu medo de dirigir pela cidade. Eu não acho que Eric alguma vez considerou como difícil seria para eu dirigir em Rhodes, porque ele simplesmente não pensava sobre coisas assim. Se eu não tivesse Barry comigo, isso teria sido quase impossível. Eu podia lidar com a direção, ou eu poderia olhar no mapa que o manobrista nos emprestou, mas não os dois.
Eu não dirigi tão mal, embora o trânsito estivesse pesado e o tempo estivesse frio e chuvoso. Eu não tinha estado fora do hotel desde que nós chegamos, e foi um pouco reconfortante ver o mundo exterior. Também, este seria provavelmente o único vislumbre do resto da cidade que eu teria. Eu olhei tanto quanto eu pude. Quem sabe se eu voltasse algum dia? E a cidade ficava tão ao norte.
Barry organizou nosso percurso, e nós começamos nosso tour de arco e flecha em Rhodes.
Nós começamos com a empresa mais distante, chamada Flecha Direta. Era um comprido, estreito lugar numa avenida muito movimentada. Era reluzente, bem iluminado - e possuia instrutores qualificados atrás do balcão que estavam pesadamente armados. Eu soube disso, porque uma enorme placa informava assim. Os homens ali não ficaram impressionados com o sotaque sulista de Barry. Eles acham que isso o fazia parecer estúpido. Entretanto quando eu falei, eles acharam que eu era fofa. Ok, o quão ofensivo é isso? O subtexto, o qual eu li muito claramente em suas mentes, era: mulheres soam estúpidas de qualquer jeito, então um sotaque sulista apenas realça aquela adorável impressão. Os homens acreditavam que eram inteiramente decisivos e diretos, então os homens sulistas pareciam estúpidos e fracos.
De qualquer forma, à parte do preconceito embutido deles, esses homens não foram de ajuda alguma. Eles nunca tinham visto Kyle Perkins em qualquer de suas aulas noturnas, e eles não acharam que ele tivesse reservado uma hora para praticar em seu estabelecimento.
Barry estava furioso pelo desrespeito que teve que aturar, e ele nem mesmo quis ir ao segundo lugar. Trotei eu mesma com a foto, e o único cara a serviço na segunda loja de suprimentos de arco e flecha, o qual não tinha espaço para a prática, disse: — Não, — imediatamente. Ele não discutiu a foto, nem me perguntou porque eu queria saber sobre Kyle Perkins, ou me desejou um bom dia. Ele não tinha um cartaz para me dizer como bacana ele era. Eu descobri que ele apenas grosseiro até a morte.
O terceiro lugar, alojado em um prédio que eu pensei ter sido uma vez uma pista de boliche, tinha poucos carros no estacionamento e uma porta opaca pesada. PARE E IDENTIFIQUE-SE a placa dizia. Barry e eu conseguimos ler isso do carro. Isso parecia um pouco ameaçador.
— Eu estou cansado de estar no carro de qualquer forma, — ele disse galantemente, e saiu comigo. Nós paramos onde podíamos ser vistos, e eu alertei Barry assim que eu localizei a câmera acima das nossas cabeças. Barry e eu nos mostramos tão simpáticos quanto podíamos. (No caso do Barry, que foi muito agradável. Ele simplesmente tinha um jeito dele.) Depois de alguns segundos, nós ouvimos um click alto, e a porta destravou. Eu olhei para Barry, e ele abriu a pesada porta enquanto eu dava um passo para dentro do espaço e para o lado para que ele pudesse entrar, também.
Nós ficamos diante de um comprido balcão que se estendia ao longo da parede oposta. Havia uma mulher com mais ou menos a minha idade atrás do balcão, com cabelo e pele acobreados, o produto de uma interessante mistura racial. Ela tingiu as suas sobrancelhas de preto, o qual adicionou um toque bizarro ao efeito de uma cor só.
Pessoalmente ela nos observou cuidadosamente da mesma forma quanto ela tinha visto do outro lado da câmera, e eu pude ler o pensamento de que ela estava muito feliz por ver o Barry do que ela estava em me ver. Eu disse ao Barry, é melhor você pegar essa aqui.
É, eu estou pegando a ideia, ele respondeu, e enquanto eu colocava a foto de Kyle no balcão, ele perguntou, — Você poderia nos dizer se esse cara alguma vez esteve aqui para comprar flechas ou para praticar? —
Ela não perguntou porque nós gostaríamos de saber. Ela se inclinou para olhar a foto, talvez um pouco mais afastada que o necessário para dar ao Barry o benefício de seu decote. Ela olhou atentamente a foto de Kyle e imediatamente franziu o rosto. — É, ele veio aqui logo após escurecer ontem, — ela respondeu. — Nós nunca tivemos um cliente vampiro, e eu honestamente não quis atendê-lo, mas o que fazer? Ele tinha o dinheiro, e a lei diz que nós não podemos discriminar. — Ela era uma mulher que estava pronta e propensa a discriminar, sem dúvida.
— Tinha alguém com ele? — Barry perguntou.
— Oh, deixe-me pensar. — Ela assumiu uma postura afetada, jogando sua cabeça para trás, para o benefício do Barry. Ela não achou que o sotaque sulista dele fosse estúpido. Ela pensou que era adorável e sexy. — Eu simplesmente não consigo lembrar. Escuta, eu vou te dizer o que vou fazer. Eu vou pegar a fita de segurança da noite passada; nós ainda temos ela. E eu vou deixar você dar uma olhada nela, ok?
— Nós podemos fazer isso agora mesmo? — eu perguntei, sorrindo docemente.
— Bem, eu não posso deixar o balcão neste momento. Não tem ninguém aqui para olhar a loja se eu tiver que ir lá atrás. Mas se vocês voltarem para olhar hoje à noite após meu substituto chegar aqui— - ela lançou um olhar muito intencional ao Barry, para garantir que eu entendesse que não precisaria vir - — Eu vou deixar você dar uma espiada.
— Que horas? — Barry perguntou, meio relutantemente.
— Diríamos sete? Eu saio logo depois disso.
Barry não pegou a dica, mas ele concordou voltar às sete.
— Obrigada, Barry, — eu disse enquanto afivelávamos o cinto de novo. — Você está realmente me ajudando. — Eu liguei para o hotel e deixei uma mensagem para a rainha e Andre, explicando onde eu estava e o que estava fazendo, assim eles não ficariam zangados quando eu não estivesse à disposição deles no momento que acordassem, o que seria muito brevemente. Afinal de contas, eu estava seguindo as ordens de Eric.
— Você vai ter que vir comigo, — Barry disse. — Eu não encontrarei essa mulher sozinho. Ela vai me comer vivo. Aquilo foi a Guerra de Agressão do Norte, com certeza.
— Ok. Eu vou ficar no carro, e você pode gritar para mim da sua cabeça se ela subir em cima de você.
— Negócio fechado.
Para passar a hora, nós tomamos uma xícara de café e comemos algum bolo na padaria. Isso foi ótimo. Minha avó sempre acreditou que as mulheres do norte não poderiam cozinhar. Foi prazeroso descobrir exatamente como essa convicção tinha sido errada. Meu apetite também estava prazeroso. Foi um alívio prolongado descobrir que eu estava tão faminta quanto eu normalmente ficava. Nada vampiresco em mim, não senhor!
Depois que nós enchemos o tanque e checamos nossa rota de volta à Pirâmide, era finalmente a hora de retornar a área de tiro com arco e flecha para falar com a Acobreada. O céu estava completamente escuro, e a cidade se enchia de luzes. E me senti um pouco urbana e glamurosa, dirigindo ao redor de uma cidade tão grande e famosa. E me foi concedida uma tarefa que desempenhei com sucesso. Uma caipira que vista uma cidade grande, não eu.
Minha sensação de felicidade e superioridade não duraram muito.
Nossa primeira pista de que tudo não ia bem na Companhia de Arco e Flecha Monteagle foi a pesada porta de metal pendurada torta.
— Merda, — Barry disse, que resumiu os meus sentimentos em uma palavra.
Nós saímos — muito a contra gosto— e, com muitos olhares de lado ao outro, fomos até a porta para examiná-la.
— Arrebentada ou arrancada? — eu perguntei.
Barry agachou no cascalho para ter uma visão mais próxima.
— Eu não sou nenhum 007, — ele disse, — mas eu acho que ela foi arrancada.
Eu olhei para a porta com dúvidas. Mas quando me agachei para ver mais de perto, eu vi o metal retorcido das dobradiças. Ponto para o Barry.
— Ok, — eu disse. Aqui é a parte onde nós efetivamente temos que entrar.
A mandíbula de Barry se contraiu. É, ele disse, mas não soou muito claro. Barry definitivamente não estava interessado em violência ou confrontos. Barry estava interessado em dinheiro e ele tinha o emprego que pagava melhor. Agora mesmo, ele estava se perguntando se qualquer quantia em dinheiro seria suficiente para compensar isso, e ele estava pensando que se ele não estivesse com uma mulher, ele simplesmente iria para o carro e dirigiria de volta.
Algumas vezes o orgulho masculino pode ser uma coisa boa. Eu tinha certeza que eu não queria fazer isso sozinha.
Eu empurrei a porta, a qual respondeu de uma maneira espetacular caindo de suas dobradiças e batendo no cascalho.
— Olá, nós estamos aqui. — Barry disse fracamente, — Alguém que não sabia antes...
Após o barulho ter parado e nada surgido do prédio para comer a gente, Barry e eu nos endireitamos da nossa posição instintiva de agachamento. Eu dei uma longa respirada. Esta era a minha tarefa, uma vez que esta tinha sido minha missão. Eu andei em direção a corrente de luz vindo da entrada vazia. Eu dei um grande passo adiante sobre a soleira do prédio. Uma rápida rastreada não me deu um sinal cerebral, então eu calculei bem o que eu iria encontrar.
Ah, é, Acobreada estava morta. Ela estava em cima do balcão, estendida com os membros espalhados, sua cabeça inclinando-se para um lado. Havia uma faca projetando-se de seu peito. Alguém tinha vomitado mais ou menos a um metro à esquerda do meu pé - sem sangue - então tinha havido ao menos um humano no local. Eu ouvi Barry caminhar para o prédio e parar, exatamente como eu tinha.
Eu tinha notado duas portas no espaço na nossa visita mais cedo. Havia uma porta à direita, além do balcão, que poderia permitir aos clientes a área de prática. Havia uma porta atrás do balcão que permitia aos empregados uma pausa para descanso e atendimento aos clientes na área de prática. Eu estava certa que a fita que nós tínhamos vindo para assistir estava ali na parte de trás, porque lá seria o lugar natural para o equipamento de segurança.
Se isso ainda estava lá atrás, esta era a grande pergunta.
Eu gostaria de dar meia volta e partir sem olhar para trás, e eu estava com a mente muito assustada, mas ela havia morrido por causa dessa fita, eu acreditei, e parecia que eu estaria descartando seu sacrifício involuntário se eu descartasse a fita. Isso não fazia realmente nenhum sentido, mas era assim que eu me sentia.
Eu não estou descobrindo mais ninguém na área, Barry me disse.
Nem, eu, eu disse após eu ter realizado minha segunda, mais meticulosa, exploração.
Barry, claro, sabia exatamente o que eu planejava fazer, e ele disse, Você quer que eu vá com você?
Não, eu quero que você espere lá fora. Eu te chamarei se precisar de você. Na verdade, teria sido bom tê-lo por perto, mas cheirava muito mal no aposento para qualquer um que ficasse por lá por mais de um minuto, e nosso minuto tinha acabado.
Sem reclamar, Barry voltou a sair, e me arrastei até o balcão para uma área iluminada. Me senti indescritivelmente horripilante por arrastar, evitando o corpo da Acobreada. Eu estava grata que seus olhos cegos não apontavam em minha direção quando eu usei um lenço para limpar a área onde minhas mãos tinham apoiado.
Do lado dos empregados no balcão, havia uma evidência de uma luta considerável. Ela lutou duro.
Havia manchas de sangue aqui e ali e documentos espalhados no chão. Havia um botão de alarme para casos de emergência claramente visível, abaixo do topo do balcão, mas eu acho que ela não teve tempo de apertá-lo.
As luzes estavam acesas no escritório atrás do balcão, também, como eu pude ver através da porta parcialmente aberta. Eu a empurrei com o meu pé, ela balançou com um pequeno chiado. Novamente, nada saltou sobre mim. Eu tomei um longo fôlego e dei um passo para dentro.
O aposento era uma combinação de sala de segurança/escritório/sala de descanso. Havia balcões embutidos ao redor das paredes com cadeiras giratórias colocadas em cima deles, e havia computadores, um microondas e um pequeno refrigerador: coisas usuais. E lá estavam as fitas de segurança, amontoadas numa pilha no chão em chamas. Todos os outros cheiros no aposento externo tinham sido tão ruins que nós simplesmente não tínhamos percebido esse. Havia outra porta que conduzia para fora; eu não fui checar para ver onde ela levava, porque tinha um corpo bloqueando. Era um corpo de homem, e estava deitado com o rosto para baixo, o qual foi uma benção. Eu não precisava ir checar para ver que ele estava morto. Ele estava certamente morto. O substituto de Acobreada, eu supus.
— Bem, merda, — eu disse alto. E depois eu pensei, obrigada Deus por eu poder dar o fora daqui. Uma coisa sobre as fitas de segurança terem sido queimadas: qualquer gravação com a nossa visita anterior tinha sido destruída, também.
No meu caminho, eu apertei o botão de alarme com meu cotovelo. Eu esperava que isso estivesse soando em algum lugar na delegacia de polícia, e que eles estariam aqui em breve.
Barry estava esperando por mim do lado de fora, como eu tinha 99% de certeza que ele estaria. Embora eu confessasse que eu não estaria inteiramente surpresa se ele tivesse ido embora. — Vamos nos mandar! Eu acionei o alarme, — eu disse, e nós pulamos no carro e demos o fora dali.
Eu estava dirigindo, porque Barry parecia verde. Nós tivemos que encostar uma vez (e no trânsito de Rhodes isso não era fácil) para que ele vomitasse. Eu não o culpei nem um pouco. O que nós tínhamos visto foi horrível. Mas eu fui abençoada com um forte estômago, e já tinha visto coisa pior.
Nós voltamos ao hotel na hora da sessão judicial. Barry me olhou com um boquiaberto assombro quando eu comentei que seria melhor nós estarmos preparados para ela. Ele não tinha tido nenhuma suspeita do que eu estava pensando, então eu soube que ele estava realmente se sentindo mal.
— Como você pode pensar em ir? — ele perguntou. — Nós temos que dizer a alguém o que aconteceu.
— Eu chamei a polícia, ou pelo menos a companhia de segurança que irá reportar, — eu disse. — O que mais nós podemos fazer? — Estávamos no elevador subindo da garagem para o saguão.
— Nós temos que falar com eles.
— Por quê? — As portas abriram e nós caminhamos para dentro do saguão do hotel.
— Para dizer a eles.
— O quê?
— Que alguém tentou matar você noite passada aqui com... ok, lançando uma flecha em você. — Ele caiu no silêncio.
— Certo. Vê? — Eu estava lendo seus pensamentos agora, e ele tinha chegado numa conclusão correta. — Isso ajudaria a solucionar o assassinato dela? Provavelmente não, porque os caras estão mortos e as fitas estão destruídas. E eles viriam aqui fazendo perguntas sobre o mestre dos vampiros de uma terça parte dos Estados Unidos. Quem irá me agradecer por isso? Ninguém, isso sim.
— Nós não podemos ficar parados sem fazer nada.
— Isso não é perfeito. Eu sei disso. Mas isto é realístico. E prático.
— Oh, então agora você é prática? — Barry estava começando a gritar.
— E você está gritando com a minha - com a Sookie, — disse Eric, ouvindo um outro grito (esse mudo) de Barry.
Nesse meio tempo, Barry não se importou se ele me veria novamente em sua vida. Embora eu não me sentisse assim tão drástica, eu não achava que nós estávamos para nos tornar amigos distantes, tampouco.
Se Eric não sabia como escolher um termo para o que eu era para ele, eu estava igualmente perplexa. — Você precisa de algo? — Eu o perguntei num tom que o avisava que eu não estava com humor para qualquer duplo sentido.
— O que você descobriu hoje? — ele perguntou, todo sério, e a formalidade jorrou de mim numa torrente.
— Você pode ir, — eu disse ao Barry, que não precisou dizer duas vezes.
Eric olhou ao redor por um lugar seguro para conversar, não viu nenhum. O saguão estava cheio com vampiros que estavam indo aos procedimentos judiciais, ou conversando, ou paquerando. — Venha, — ele disse, não tão rudemente como soou, e nós fomos para os elevadores e subimos até o seu quarto. Eric estava no nono andar, o qual abrangia uma área bem maior que a da rainha. Havia vinte quartos no nono, pelo menos. Tinha um pouco mais de tráfego, também; nós passamos por alguns vampiros a caminho do quarto de Eric, o qual ele me disse estar dividindo com a Pam.
Eu estava um pouco curiosa sobre ver um quarto normal de vampiro, já que eu tinha visto somente a sala de estar da suíte da rainha. Eu fiquei desapontada ao descobrir que além dos caixões de viagem, ele parecia um pouco comum. Claro, aquilo tinha um tipo magnânimo de à parte. Os caixões de Pam e Eric descansavam sobre pomposos cavaletes cobertos com hieróglifos chapeados de ouro falso sobre madeira pintada de preto, o que dava a eles um elegante toque atmosférico. Havia duas camas, também, e um banheiro bastante compacto. Ambas as toalhas estavam penduradas, o qual eu pude ver porque a porta estava aberta. Eric nunca tinha pendurado a sua toalha quando ele viveu comigo, então eu estava disposta a apostar que Pam as tinha dobrado e pendurado no porta-toalhas. Isso parecia estranhamente doméstico. Pam provavelmente fazia isso para Eric por mais de um século. Bom Deus. Eu nem mesmo consegui por duas semanas.
Com os caixões e as camas, o quarto estava um pouco abarrotado, e eu me perguntei o que os vampiros de menor escalão teriam que aguentar, digamos, no décimo segundo andar. Você poderia organizar caixões em uma configuração de beliche? Mas eu estava falando besteiras, tentando não pensar sobre estar sozinha com o Eric. Nós nos sentamos, Eric numa cama e eu na outra, e ele se inclinou para frente. — Me diga, — ele disse.
— Bem, isso não é bom, — eu disse, apenas para colocá-lo no curso certo.
Seu rosto ficou sombrio, as sobrancelhas douradas se encontraram, sua boca se curvou para baixo.
— Nós achamos o local de prática de arco e flecha que Kyle Perkins visitou. Você estava certo sobre isso. Barry foi comigo para ser simpático, e eu realmente apreciei, — eu disse, recebendo meus créditos de abertura. — Para sintetizar a tarde inteira, nós achamos o local certo na nossa terceira parada, e a garota atrás do balcão disse que a gente poderia olhar a fita de segurança na noite que Kyle visitou. Eu achei que a gente poderia ver alguém que conhecíamos junto com ele. Mas ela quis que a gente voltasse no final do seu turno, às sete horas. — Eu dei uma pausa para tomar um grande fôlego. O rosto do Eric não mudou em nada. — Nós voltamos na hora combinada, e ela estava morta, assassinada, na loja. Eu passei por ela para olhar no escritório, e as fitas tinham sido queimadas.
— Morta como?
— Ela foi apunhalada, e a faca foi deixada no seu peito, e o assassino ou alguém com ele vomitou comida. Também, um cara que trabalhava na loja foi morto, mas eu não o chequei para saber como.
— Ah. — Eric considerou isso. — Algo mais?
— Não, — eu respondi, e me coloquei em pé para partir.
— Barry estava zangado contigo, — ele observou.
— Sim, ele estava, mas ele vai superar.
— Qual é o problema dele?
— Ele não acha que eu lidei com... ele não acha que nós deveríamos ter ido. Ou... eu não sei. Ele acha que eu fui insensível.
— Eu acho que você fez tudo excepcionalmente bem.
— Bem, ótimo! — Na mesma hora eu fui severa comigo mesma. — Desculpa, — eu disse. — Eu sei que você quis me elogiar. Eu não estou me sentindo tão bem pela morte dela. Ou deixá-la. Mesmo se isso fosse a coisa prática a fazer.
— Você está se criticando.
— Sim.
Uma batida na porta. Já que Eric não tinha se movido, eu me levantei para atender. Eu não achei que fosse uma coisa sexista; era uma coisa de status. Eu era definitivamente o ser inferior no quarto.
Não completa e totalmente para minha surpresa, o batedor era Bill. Aquilo simplesmente tornou meu dia completo. Me coloquei de lado para deixar que ele entrasse. O cacete se eu iria perguntar ao Eric se eu deveria deixá-lo entrar.
Bill me olhou de cima a baixo, eu acho que era pra checar se minhas roupas estavam em ordem, então avançou por mim sem nenhuma palavra. Eu revirei meus olhos às suas costas. Então eu tive uma brilhante ideia: em lugar de voltar para o quarto para favorecer uma discussão, eu caminhei para fora da porta aberta e a fechei atrás de mim. Eu marchei rapidamente e peguei o elevador sem nem mesmo precisar esperar. Em dois minutos, eu estava destrancando a minha porta.
Fim do problema.
Me senti muito orgulhosa de mim mesma.
Carla estava no nosso quarto, pelada novamente.
— Oi, — eu disse. — Por favor coloque um roupão.
— Bem, ei, se isso incomoda você, — ela disse de uma maneira bastante relaxada, e colocou um roupão. Uau. Fim de outro problema. Ação direta, declarações francas; obviamente, essas eram as chaves para melhorar a minha vida.
— Obrigada, — eu disse. — Não vai as coisas judiciais?
— Namoradas humanas não foram convidadas, — ela respondeu. — É tempo livre para nós. Gervaise e eu vamos sair para um clube noturno mais tarde. Algum lugar extremo chamado Beijo de Dor.
— Você tenha cuidado, — eu disse. — Coisas ruins podem acontecer se existem muitos vampiros juntos e um ou dois humanos sangrando.
— Eu posso lidar com o Gervaise. — Carla disse.
— Não, você não pode.
— Ele é louco por mim.
— Até ele deixar de ser louco. Ou até um vampiro mais velho que Gervaise se apaixonar por você, e Gervaise ficar todo confuso.
Ela pareceu incerta por um segundo, uma expressão que eu senti que Carla não exibia frequentemente.
— E a respeito de você? Eu ouvi que você está atada ao Eric agora.
— Apenas por um tempo, — eu disse, e eu quis dizer isso. — Isso vai enfraquecer.
Eu nunca mais iria a algum lugar com vampiros novamente, eu prometi a mim mesma. Eu deixei a sedução do dinheiro e a excitação da viagem me atrair. Mas eu não iria fazer isso novamente. Com Deus como minha testemunha... Então eu tive que rir alto. Eu não era Scarlett O‟ Hara. — Nunca mais passarei fome novamente, — eu disse a Carla.
— Porque, você não comeu um jantar generoso? — ela perguntou, focada no espelho porque ela estava depilando as sobrancelhas.
Eu gargalhei. E eu não podia parar.
— O que há contigo? — Carla se virou para me olhar com alguma preocupação. — Você não está agindo como você mesma, Sookie.
— Apenas tive um péssimo choque, — eu disse, suspirando por ar. — Eu estarei bem em um minuto. — Foi mais parecido com dez antes que eu recolhesse o meu controle de volta para mim. Eu era esperada na reunião judicial, e francamente, eu queria ter algo para ocupar a minha mente. Eu lavei meu rosto e coloquei alguma maquiagem, troquei para uma blusa de seda bronze e calças cor de tabaco com um cardigã combinando, e calcei saltos de couro marrom.
Com a chave do meu quarto em meu bolso e um adeus aliviado para Carla, eu sai para procurar as sessões judiciais.
A VAMPIRA JODI ERA FORMIDÁVEL. Ela me fazia pensar em Jael, da Bíblia.
Jael, uma mulher determinada de Israel, enfiou uma estaca para barraca na cabeça de Sísera, um capitão inimigo, se eu estivesse me lembrando corretamente. Sísera estava dormindo quando Jael realizou a façanha, da mesma forma que Michael quando Jodi quebrou sua presa. Embora o nome de Jodi me fizesse rir, vi nela uma determinação e força de aço, e fiquei imediatamente do seu lado. Eu esperava que a bancada de juízes conseguisse ver além das lamúrias do vampiro Michael a respeito do seu maldito dente.
Aquilo não foi montado como na noite anterior, apesar da sessão acontecer na mesma sala. A bancada de juízes, acho que é assim que chamam, estavam no palco sentados numa longa mesa de frente para a platéia.
Havia três deles, todos de estados diferentes: dois homens e uma mulher. Um dos homens era Bill, que parecia (como sempre) calmo e controlado. Eu não conhecia o outro cara, um loiro. A mulher era uma minúscula vampira bonita, com costas retas e com os cabelos pretos ondulados mais longos que já vi. Ouvi Bill dirigir-se a ela como Dahlia. Seu pequeno rosto redondo se movimentava de um lado para outro enquanto ouvia o testemunho de Jodi primeiro, e então de Michael, como se estivesse assistindo a uma partida de tênis. No centro da mesa coberta com uma toalha branca, diante dos juízes, havia uma estaca que imaginei que fosse o símbolo da justiça vampírica.
Os dois vampiros queixosos não estavam representados por advogados. Eles alegavam seus pontos de vista e então os juízes faziam perguntas antes de decidirem o veredicto pela maioria dos votos. Era simples na forma, senão na prática.
— Você torturou uma mulher humana? — Dahlia perguntou a Michael.
— Sim, — ele respondeu sem piscar. Dei uma olhada em volta. Eu era a única humana na platéia. Não é de se estranhar que houvesse uma certa simplicidade nos procedimentos. Os vampiros não estavam tentando se disfarçar para uma platéia de sangue quente. Estavam se comportando como fariam se estivessem sozinhos. Eu estava sentada pertos daqueles do meu grupo que estavam presentes - Rasul, Gervaise, Cleo - e talvez a proximidade deles mascarasse meu cheiro, ou talvez uma enfadonha humana não contasse.
— Ela me ofendeu, e eu gosto de sexo desse jeito, então a sequestrei e me diverti um pouco, — disse Michael. — Então Jodi ficou toda irritada comigo e quebrou minha presa. Vê? — Ele abriu a boca o suficiente para mostrar aos juízes o toco de presa. (Tive a curiosidade de saber se ele tinha ido ao estande ainda montado na área de vendas, aquele que tinha incríveis presas artificiais.)
Michael tinha o rosto de um anjo, e não conseguia entender que o que ele fez foi errado. Ele quis fazer aquilo, então ele fez. Nem todas as pessoas que foram transformadas em vampiros eram mentalmente estáveis para começar, e alguns deles ficavam totalmente inescrupulosos após décadas, ou mesmo séculos, utilizando dos humanos como bem eles entendiam. No entanto, apreciavam a acessibilidade da nova ordem, podendo perambular por aí sendo eles mesmos, com o direito de não serem estaqueados. Eles não queriam pagar por esse privilégio, aderindo às regras de decência comum.
Achei que quebrar uma presa foi um castigo muito leve. Eu não conseguia acreditar que ele teve ousadia de trazer um caso contra alguém. Aparentemente, nem Jodi, que ficou de pé e partiu para cima dele novamente. Talvez ela quisesse arrancar outra presa. Isso era muito melhor que ‚The Peoples Court‛ (O Tribunal do Povo) ou Judge Judy (Juíza Judy).
O juiz louro a agarrou. Ele era muito maior que Jodi, e ela pareceu aceitar que não ia conseguir alcança-lo. Notei que Bill movera sua cadeira para trás para que pudesse saltar se as coisas fossem mais além e requeresse ação rápida.
A pequena Dahlia perguntou, — Por que você faz tal objeção às ações de Michael, Jodi?
— A mulher era irmã de um de meus empregados, — respondeu Jodi, sua voz tremendo de raiva. — Ela estava sob minha proteção. E esse Michael estúpido fará com que todos nós sejamos caçados novamente se ele continuar desse jeito. Ele não pode ser corrigido. Nada o detém, nem mesmo perdendo uma presa. Eu o avisei três vezes para ficar longe, mas quando ele a fez propostas sexuais na rua novamente, a moça lhe respondeu que o orgulho dele era mais importante que sua inteligência ou discrição.
— Isso é verdade? — a pequena vampira perguntou ao Michael.
— Ela me insultou, Dahlia, — ele respondeu tranquilamente. — Uma humana me insultou em público.
— Esse é fácil, — disse Dahlia. — Ambos concordam? — O homem loiro dominando Jodi fez que sim com a cabeça, assim como Bill, que ainda se encontrava empoleirado na ponta da cadeira à direita de Dahlia.
— Michael, você irá trazer retaliações sobre nós por suas ações imprudentes e sua incapacidade para controlar seus impulsos, — disse Dahlia. — Você ignorou as advertências, e ignorou o fato de que a jovem estava sob proteção de outro vampiro.
— Você não pode estar falando sério! Onde está seu orgulho? — Michael gritava de pé.
Dois homens saíram das sombras no fundo do palco. Ambos eram vampiros, é claro, e ambos tinham um tamanho considerável. Eles seguraram Michael, que se mostrou um completo lutador. Fiquei um pouco chocada com o barulho e a violência, mas num minuto eles levariam Michael para alguma prisão vampírica, e os procedimentos tranquilos continuariam.
Para meu absoluto assombro, Dahlia indicou com a cabeça para um vampiro na platéia, que se levantou e ajudou Jodi a fazer o mesmo. Jodi, com um largo sorriso, cruzou o palco num único pulo, como uma pantera. Ela agarrou a estaca repousada sobre a mesa dos juízes e, com um poderoso movimento de seu braço magro, enterrou a estaca no peito de Michael.
Eu fui a única que ficou chocada, e cobri a boca com as mãos para reter um grito.
Michael a fitou com absoluta fúria, e continuou lutando, eu imagino para libertar os braços e poder arrancar a estaca, mas em poucos segundos tudo estava acabado. Os dois vampiros levaram embora o novo cadáver, e Jodi saiu do palco, ainda sorridente.
— Próximo caso, — convocou Dahlia.
O caso seguinte era aquele sobre o garoto vampiro e havia humanos envolvidos nele. Senti-me menos evidente quando eles entraram: os pais envergonhados com sua representante vampira (seria possível que humanos não podiam testemunhar perante esta corte?) e a ‚mãe‛ com seu ‚filho‛.
Este foi um caso mais extenso, mais triste, porque o sofrimento dos pais pela perda do filho - que ainda andava e falava, mas não com eles - era quase palpável. Eu não fui a única que gritou, — Que vergonha! — quando Cindy Lou revelou que os pais pagavam mensalmente o sustento do garoto.
A vampira Kate argumentou ferozmente pelos pais, e ficou claro que ela achava que Cindy Lou fosse uma vampira porca e uma péssima mãe, mas os três juízes - diferente dessa vez, e eu não entendia nenhum deles - respeitaram o contrato escrito que os pais assinaram e se recusaram a dar ao garoto um novo guardião. Contudo, eles decidiram que o contrato deveria ser igualmente aplicado a favor dos pais, e o garoto seria obrigado a passar um tempo com os pais biológicos durante todo o período que eles escolhessem valer esse direito.
O juiz principal, um sujeito com cara de falcão com um escuro delineador nos olhos, convidou o garoto a comparecer diante deles. — Você deve respeito e obediência a essas pessoas, você também assinou esse contrato, — ele disse. — Você pode ser um menor para a lei humana, mas para nós, você é tão responsável quanto... Cindy Lou. — Rapaz, era de matar ter que admitir a existência de uma vampira chamada Cindy Lou. — Se você tentar aterrorizar seus pais humanos, coagi-los ou beber do sangue deles, nós iremos amputar sua mão. E quando ela voltar a crescer, amputaremos de novo.
O garoto dificilmente conseguiria ficar mais branco do que já era, e sua mãe humana desmaiou. Mas ele tinha sido tão arrogante, tão desdenhoso com seus pobres pais, que eu achei que o aviso violento foi necessário. Me peguei concordando.
Ah, sim, isso foi justo, ameaçar um garoto de ter sua mão amputada.
Mas se você visse esse garoto, poderia ter concordado. E Cindy Lou não era nada valorosa; quem quer que seja que a transformou deve ter sido mental e moralmente deficiente.
Eu não fui necessária, afinal de contas. Fiquei me perguntando sobre o resto da noite quando a rainha entrou pelas portas duplas no fundo do salão, com Sigebert e Andre a seguindo de perto. Ela usava um terninho de seda azul safira com um belo colar e pequenos brincos de diamantes. Ela parecia elegante, absolutamente harmoniosa, reluzente e perfeita. Andre veio direto a mim.
— Eu sei, — disse ele, — isto é, Sophie-Anne me disse que eu tenho agido mal com você. Não estou arrependido, porque farei qualquer coisa por ela. Os outros não significam nada para mim. Mas me arrependo por eu não ter sido capaz de impedir de algo que te causa aflição.
Se isso foi um pedido de desculpas, foi o mais meia-tigela que eu já recebi na vida. Deixou quase tudo a desejar. Tudo que pude dizer foi, — Entendi. — Era o máximo que eu conseguiria.
Naquela altura, Sophie-Anne parou na minha frente. Fiz minha espécie de reverência. — Precisarei de você comigo durante as próximas horas, — ela disse, e eu respondi, — Claro. — Ela examinou minhas roupas de alto a baixo, como se desejasse que eu estivesse mais bem vestida, mas ninguém me avisou que parte da noite restringida para o Comércio significava que roupas elegantes eram apropriadas.
Sr. Cataliades surgiu ao meu lado, vestindo um belo terno e uma gravata de seda vermelha-escura e dourada, e disse, — Que bom vê-la, minha querida. Deixe-me instruí-la a respeito do próximo item da agenda.
Estendi as mãos para mostrar que estava pronta. — Onde está Diantha? — perguntei.
— Ela está trabalhando com algo fora do hotel, — disse Cataliades. Ele franziu o cenho. — É muito peculiar. Aparentemente, havia um caixão extra lá embaixo.
— Como pode ser isso? — Caixões pertenciam a alguém. Não é característico de um vampiro viajar com um caixão excedente, como se tivesse que ter um para formalidades e outro para o dia-a-dia. — Por que eles te chamaram?
— Tinha uma de nossas identificações, — respondeu.
— Mas todos os nossos vampiros estão presentes, certo? — Senti uma pontada de ansiedade no peito. Naquele momento, eu vi os garçons comuns se movimentando entre a multidão, percebi um me reconhecer e se afastar. Então ele viu Barry, que vinha com o Rei do Texas. O homem se afastou novamente.
Na verdade eu comecei a chamar por um vampiro nas proximidades para que segurasse o sujeito, assim eu poderia dar uma olhada em sua cabeça, então eu percebi que estava agindo como uma arrogante conforme os próprios vampiros. O garçom desapareceu, e não tive um olhar atento sobre ele, e aí não tive certeza se eu poderia identificá-lo numa multidão de outros garçons com o mesmo traje. O Sr. Cataliades estava falando, mas levantei uma mão. — Espere um segundo, — murmurei. A fuga rápida do garçom me lembrou de mais alguma coisa, outra coisa que parecia estranha.
— Por favor, preste atenção, Srta. Stackhouse, — disse o advogado, e tive que guardar o fio de pensamento.
— Aqui está o que você precisa saber. A rainha irá negociar por alguns favores que ela precisa para ajudar a reconstruir seu estado. Apenas faça o que você faz de melhor para descobrir se todo e qualquer indivíduo que negociar com ela é honesto.
Isso não foi uma orientação muito específica. — Fazer o meu melhor, — respondi. — Mas acho que deve procurar Diantha, Sr. C. Acho que há algo realmente estranho e errado sobre este caixão extra de que estão falando. Havia aquela mala extra também, — falei. — Eu a levei até a suíte da rainha.
O Sr. Cataliades me fitou desinteressadamente. Pude notar que ele considerava pequeno e abaixo das suas preocupações o problema dos itens extras surgindo no hotel. — Eric lhe contou a respeito da mulher assassinada? — perguntei, e sua atenção se aguçou.
— Não vi Mestre Eric esta noite, — respondeu. — Vou me certificar de localizá-lo.
— Algo está acontecendo; só não sei o quê, — resmunguei mais ou menos para mim mesma, então me afastei para alcançar Sophie-Anne.
O Comércio era conduzido em uma espécie de estilo bazar. SophieAnne se posicionou à mesa onde Bill estava sentado de volta ao trabalho de vender programas de computador. Pam o estava ajudando, mas usava suas roupas normais, e fiquei feliz pelo traje de harém ganhar um descanso. Desejei saber qual seria o procedimento, mas adotei uma atitude de esperar para ver, e logo descobri. O primeiro a se aproximar de Sophie-Anne foi o vampiro loiro grandalhão que serviu como juiz mais cedo. — Cara senhora, — disse, beijando a mão dela. — Estou encantado por vê-la, como sempre, e devastado pela destruição de sua bela cidade.
— Uma pequena porção de minha bela cidade, — disse SophieAnne com o mais doce dos sorrisos.
— Eu fico em desespero com a ideia das dificuldades que você deve estar passando, — ele continuou após uma breve pausa para registrar a correção dela. — Você, a governante de um reino tão lucrativo e prestigioso... agora tão assolado. Espero ser capaz de ajudá-la da minha humilde maneira.
— E de que maneira seria essa ajuda? — Sophie-Anne indagou.
Após muita tagarelice, descobriu-se que o Sr. Afetado estava disposto a levar uns porrilhões de tábuas de madeira serrada a Nova Orleans se Sophie-Anne lhe desse dois por cento do rendimento dela nos próximos cinco anos. Seu contador estava com ele. Fitei seus olhos com grande curiosidade. Dei uns passos para trás e Andre deslizou para o meu lado.
Me virei para que ninguém pudesse ler meus lábios.
— Boa qualidade, a madeira, — falei tão silenciosamente quanto o bater das asas de um beija-flor.
Aquilo levou uma eternidade para se chegar a uma solução, e foi chato, chato, chato. Alguns dos pretensos fornecedores não trouxeram humanos com eles, e fui inútil nesses casos; mas a maioria trouxe. Às vezes, o humano pagava uma soma substancial a um vampiro para que este o ‚patrocinasse‛, então ele poderia estar no salão e lançar seu galanteio em um ambiente particular. No momento em que o vendedor número oito sorria tolamente parado diante da rainha, eu já estava incapaz de reprimir meus bocejos. Notei que Bill alcançou um marco na venda de cópias do seu banco de dados vampírico. Para um sujeito reservado, ele fazia um bom trabalho ao explicar e promover seu produto, considerando que alguns dos vampiros eram muito desconfiados sobre computadores. Se eu ouvisse sobre o — Pacote de Atualização Anual— mais uma vez, eu vomitaria. Havia um bocado de humanos se aglomerando ao redor de Bill, porque eles eram mais acessíveis aos computadores do que os vampiros de modo geral. Enquanto eles estavam ocupados, tentei uma varredura aqui e ali, mas eles pensavam apenas em megahertz, RAM e discos rígidos - coisas assim.
Eu não vi Quinn. Já que era um metamorfo, imaginei que ele já teria superado completamente o ferimento da noite anterior. Eu só podia tomar sua ausência como um sinal. Eu estava aborrecida e com o coração pesado.
A rainha convidou Dahlia, a pequena e bonita vampira que tinha sido tão direta no julgamento, à sua suíte para um drink. Dahlia aceitou regiamente, e o grupo inteiro subiu para a suíte. Christian Baruch seguiu de perto; ele esteve rodeando Sophie-Anne à noite toda.
Sua corte a Sophie-Anne era exagerada, para dizer o mínimo. Pensei de novo no rapaz que observei na noite anterior, fazendo cócegas nas costas de sua amada em imitação de uma aranha, porque sabia que ela tinha medo delas, e como conseguiu que ela se aconchegasse perto dele. Senti uma lâmpada acender sobre minha cabeça e imaginei se era visível para mais alguém.
Minha opinião sobre o hoteleiro despencou. Se ele achava que tal estratégia funcionaria com Sophie-Anne, ele tinha muito em que pensar para fazer.
Eu não vi Jake Purifoy por perto e me perguntei o que Andre lhe mandou fazer. Algo inofensivo provavelmente, como verificar se todos os carros estavam com o tanque cheio. Ele não era realmente confiável para lidar com qualquer coisa mais desgastante, pelo menos não ainda. A juventude e a herança Lobis de Jake contavam contra ele, e ele teria que se esforçar para ganhar pontos. Mas Jake não tinha aquele entusiasmo. Ele ficava olhando para o passado, para sua vida como Lobis. Ele carregava um acúmulo de amargura.
A suíte de Sophie estava limpa; todas as suítes dos vampiros tinham que ser limpas à noite, é claro, enquanto eles estavam fora. Christian Baruch começou a nos contar sobre a ajuda extra que teve que empregar para suprir a demanda da cúpula e como alguns deles ficaram nervosos sobre limpar quartos ocupados por vampiros. Eu poderia dizer que Sophie-Anne não ficou impressionada com o ar de superioridade de Baruch. Ele era bem mais jovem que ela, devia parecer um adolescente arrogante para a rainha com centenas de anos.
Jake chegou naquele momento, e após prestar seus respeitos à rainha e conhecer Dahlia, veio se sentar ao meu lado. Eu estava empoleirada numa cadeira reta e desconfortável, e ele puxou outra igual.
— O que tá rolando, Jake?
— Nada em particular. Fui pegar os ingressos da rainha e do Andre para um show amanhã à noite. É uma produção totalmente vampiresca de Hello, Dolly!
Tentei imaginar aquilo e não consegui. — O que você vai fazer? Está marcado como horário livre na programação.
— Eu não sei, — ele respondeu num tom curiosamente distante na voz. — Minha vida mudou tanto que eu simplesmente não consigo prever o que vai acontecer. Você vai sair amanhã durante o dia, Sookie? Compras, talvez? Há algumas lojas maravilhosas na Widewater Drive. É perto do lago.
Mesmo eu ouvi falar da Widewater Drive, e respondi, — Acho que é possível. Não sou uma compradora exagerada.
— Você deveria ir de verdade. Há algumas lojas ótimas de sapatos, e uma Macy‟ s enorme - você amará a Macy‟ s. Tire um dia para isso. Saia desse lugar enquanto pode.
— Eu irei pensar a respeito com certeza, — eu disse, um pouco intrigada. — Hum, você viu Quinn hoje?
— De relance. E conversei com Frannie por um minuto. Eles estão ocupados preparando as cerimônias de encerramento.
— Oh, — falei. Certo. Claro. Aquilo tomava bastante tempo.
— Ligue para ele, peça para levá-la amanhã, — disse Jake.
Tentei me visualizar pedindo ao Quinn para me levar para fazer compras. Bom, não estava totalmente fora de questão, mas não era provável, tampouco. Dei de ombros.
— Talvez eu saia um pouco.
Ele pareceu satisfeito.
— Sookie, você pode ir, — disse Andre. Eu estava tão cansada que nem notei sua aproximação.
— Ok. Boa noite aos dois, — falei, levantando para me espreguiçar. Notei que a mala azul ainda estava onde eu a larguei duas noites atrás. — Oh, Jake, você precisa levar aquela mala de volta ao porão. Eles ligaram e disseram para trazê-la para cá, mas ninguém a reivindicou.
— Vou perguntar por aí, — ele disse vagamente, e partiu para o seu próprio quarto. A atenção de Andre já tinha retornado para a rainha, que ria da descrição de um casamento que Dahlia esteve presente.
— Andre, — disse em voz bem baixa. — Eu preciso falar contigo, acho que o Sr. Baruch teve algo a ver com aquela bomba do lado de fora da porta da rainha.
Andre pareceu como se alguém tivesse enfiado um prego em seu traseiro. — O quê?
— Estou achando que ele queria assustar Sophie-Anne, — respondi. — Estou achando que ele pensou que ela ficaria vulnerável e precisaria de um protetor masculino forte caso se sentisse ameaçada.
Andre não era o Sr. Expressivo, mas vi incredulidade, desgosto e crença cruzarem seu rosto em sequência rápida.
— E eu também estou achando que talvez ele tenha dito ao Henrik Feith que Sophie-Anne iria matá-lo. Porque ele é o dono do hotel, certo? E teria uma chave para entrar no quarto da rainha, onde achávamos que Henrik estaria seguro, certo? Então Henrik continuaria no julgamento da rainha, porque seria persuadido por ela que estaria dentro. Novamente, Christian Baruch estaria lá, para ser seu grande salvador. Talvez ele tivesse matado Henrik depois que o emboscasse, então poderia ‚tá-dá‛ fazer uma grande revelação e deslumbrar Sophie-Anne com seu maravilhoso cuidado com ela.
Andre estava com a expressão mais estranha no seu rosto, como se estivesse tendo dificuldade de me acompanhar. — Existem provas? — perguntou.
— Nem uma migalha. Mas quando falei com o Sr. Donati no saguão esta manhã, ele deu a dica de que havia uma fita de segurança que eu poderia querer assistir.
— Vá assistir, — disse Andre.
— Se eu pedir por ela, ele será despedido. Você precisa fazer a rainha pedir diretamente ao Sr. Baruch se ela pode ver a fita de segurança do saguão durante o momento que a bomba foi plantada. Com chiclete na câmera ou não, aquela fita mostrará algo.
— Saia primeiro, assim ele não conectará você nisso. — Aliás, o hoteleiro parecia absorvido na rainha e sua conversa, ou sua audição vampírica o teria indicado que estávamos falando sobre ele.
Embora eu estivesse exausta, tive a gratificante sensação de que estava merecendo o dinheiro que eles estavam me pagando por essa viagem. E foi um fardo a menos na cabeça sentir que o negócio da lata de Dr. Pepper foi resolvido. Christian Baruch não plantaria mais nenhuma bomba agora que a rainha estava com ele. A ameaça que o grupo dissidente da Irmandade apresentava... bom, eu só tinha ouvido falar através de boatos, e não havia qualquer evidência de que forma poderia ser. Apesar da morte da mulher no local de tiro com arco e flecha, me senti mais relaxada do que quando entrei na Pirâmide de Gizé, porque estava inclinada a responsabilizar Baruch pelo arqueiro assassino, também. Talvez ele quando viu que Henrik de fato tomaria o Arkansas da rainha, tenha ficado ganancioso e mandou o assassino eliminá-lo para que a rainha conseguisse tudo.
Havia algo confuso e errado a respeito do cenário, mas eu estava muito cansada para pensar naquilo, e eu estava contente por deixar toda aquela trama intricada de lado até estar descansada.
Cruzei o pequeno vestíbulo até o elevador e apertei o botão. Quando as portas soaram a campainha para abrirem, Bill saiu, com as mãos cheias de formulários com pedidos.
— Você se saiu bem esta noite, — falei, cansada demais para odiálo. Eu indiquei com a cabeça para os formulários.
— Sim, faremos muito dinheiro com isso, — ele respondeu, mas não soou particularmente animado.
Esperei que ele saísse do meu caminho, mas não saiu, tampouco.
— Eu daria tudo se pudesse apagar o que aconteceu entre nós, — disse. — Não o tempo em que passamos amando um ao outro, mas...
— O tempo em que passou mentindo para mim? O tempo que você fingiu que mal podia esperar para sair comigo quando no fim das contas estava sob ordens? Aqueles tempos?
— Sim, — ele respondeu, e seus profundos olhos castanhos não vacilaram. — Aqueles tempos.
— Você me magoou demais. Isso nunca mais vai acontecer.
— Você ama algum homem? Quinn? Eric? Aquele JB idiota?
— Você não tem o direito de me perguntar isso, — respondi. — Você não tem de maneira nenhuma qualquer direito no que diz respeito a mim.
JB? De onde veio aquilo? Eu sempre gostei muito do cara, e ele era adorável, mas sua conversa era tão estimulante quanto um pedaço de tronco. Eu estava sacudindo minha cabeça enquanto descia pelo elevador até o andar humano.
Carla estava fora, como de costume, e já que eram cinco da manhã, as chances de que ela permanecesse fora pareciam boas. Vesti meu pijama cor-de-rosa e coloquei os chinelos ao lado da cama para que não tivesse que procurá-los no quarto escuro, caso Carla entrasse antes de eu acordar.
MEUS OLHOS SE ABRIRAM RAPIDAMENTE como persianas que estavam enroladas muito bem apertadas.
Acorda, acorda, acorda! Sookie, algo está errado.
Barry, onde você está?
Parado nos elevadores no andar humano.
Estou indo. Vesti o traje da noite passada, mas sem os saltos. Em vez deles, deslizei meus pés em meus chinelos com solado de borracha. Peguei a carteira que reunia minha chave do quarto, carteira de motorista e cartão de crédito, e a empurrei em um bolso, pressionando meu celular no outro, e saí apressada do quarto. A porta bateu com força atrás de mim com uma pancada agourenta. O hotel se percebia vazio e silencioso, mas meu relógio dizia 09:50.
Tive de correr por um longo corredor e virei à direita para chegar aos elevadores. Eu não encontrei uma alma. Um momento de reflexão me disse que não era tão estranho. A maioria dos humanos no andar ainda estariam dormindo, porque eles mantinham os horários dos vampiros. Mas não havia mesmo sequer funcionários do hotel limpando os corredores.
Todos os pequenos sinais de inquietação que havia se movido lentamente através do meu cérebro, como rastros de lesmas no degrau da porta dos fundos, tinha se aglutinado em uma grande massa pulsante de inquietação.
Me senti como se estivesse no Titanic, e eu tinha acabado de ouvir o casco raspar contra o iceberg.
Finalmente localizei alguém, deitado sobre o piso. Eu tinha sido despertada tão repentina e rispidamente que tudo o que eu fazia tinha uma característica irreal, portanto encontrar um corpo no corredor não foi tão perturbador.
Deixei escapar um grito, e Barry veio pulando do canto. Ele se agachou comigo. Inverti o corpo. Era Jake Purifoy, e ele não podia ser despertado.
Por que ele não está em seu quarto? O que ele estava fazendo fora tão tarde? Até a voz mental de Barry soava aterrorizada.
Olha, Barry, ele está deitado mais ou menos apontado na direção do meu quarto. Você acha que ele estava indo me ver?
Sim, e ele não conseguiu.
O que poderia ter sido tão importante que Jake não estava se preparando para o seu sono do dia? Me levantei, pensando furiosamente. Eu nunca, jamais tinha ouvido falar de um vampiro que não soubesse instintivamente que o amanhecer estava chegando. Pensei nas conversas que eu tive com Jake, e os dois homens que eu tinha visto deixando seu quarto.
— Seu bastardo, — sibilei através dos meus dentes, e o chutei tão forte quanto eu pude.
— Jesus, Sookie! — Barry agarrou meu braço, horrorizado. Mas então ele recebeu a imagem do meu cérebro.
— Nós precisamos encontrar o Sr. Cataliades e Diantha, — eu disse. — Eles podem se levantar, não são vampiros.
— Irei pegar Cecile. Ela é humana, minha colega de quarto, — disse Barry, e ambos partimos em direções diferentes, deixando Jake deitado onde ele estava. Era tudo o que podíamos fazer.
Estávamos juntos novamente em cinco minutos. Tinha sido surpreendentemente fácil pôr de pé o Sr. Cataliades e Diantha, que estava compartilhando seu quarto. Cecile mostrou ser uma jovem com um corte de cabelo prático e um estilo competente, e eu não fiquei surpresa quando Barry a apresentou como assistente executiva do novo rei.
Eu tinha sido uma tola em não considerar, mesmo que por um minuto, o aviso que Clovache tinha repassado. Estava tão zangada comigo mesma que eu mal podia estar dentro de minha própria pele. Mas eu tive que empurrar aquilo para o lado e tínhamos que agir agora.
— Escutem o que eu acho, — falei. Eu estava formulando coisas simultaneamente em minha cabeça. — Alguns dos garçons estiveram evitando Barry e eu nos últimos dias, tão logo que eles descobriram o que somos.
Barry fez que sim com a cabeça. Ele tinha notado, também. Ele parecia estranhamente culpado, mas aquilo teve que esperar.
— Eles sabem o que somos. Eles não queriam que soubéssemos o que eles estavam prestes a fazer, eu estou supondo. Então, eu estou supondo também que deve ser algo realmente, realmente ruim. E Jake Purifoy estava nisso.
Sr. Cataliades estava parecendo ligeiramente entediado, mas agora ele começou a parecer seriamente alarmado. Os olhos grandes de Diantha se moviam de rosto em rosto.
— O que devemos fazer? — Cecile perguntou, o que lhe valeu uma pontuação elevada em meu livro.
— São os caixões extras, — eu disse. — E a mala azul na suíte da rainha. Barry, foi pedido a você para subir uma mala, também, certo? E ela não pertencia a ninguém?
Barry respondeu, — Correto. É ela ainda está acomodada no vestíbulo da suíte do rei, já que todos passam por ali. Nós pensamos que alguém reivindicaria por ela. Eu a estava levando de volta hoje para o departamento de bagagem.
Eu disse, — A que eu peguei está acomodada na sala de estar da suíte da rainha. Eu acho que o cara que estava com ela era Joe, o gerente da área de entrega de bagagem. Ele é aquele que me chamou para descer e pegar a mala. Ninguém parecia saber qualquer coisa sobre ela.
— As malas irão explodir? — Diantha disse em sua voz estridente. — Os caixões não reclamados no porão, também? Se o porão explodir, o prédio irá desmoronar! — Eu nunca tinha ouvido Diantha soar tão humana.
— Temos que despertá-los, — eu disse. — Temos que tirá-los daqui.
— O prédio vai explodir, — disse Barry, tentando processar a ideia.
— Os vampiros não acordarão. — Cecile a prática. — Eles não podem.
— Quinn! — eu disse. Eu estava pensando em tantas coisas ao mesmo tempo que eu fiquei parada enraizada no lugar. Pescando meu celular do meu bolso, eu cutuquei o número dele na discagem rápida e ouviu seu murmúrio na outra extremidade. — Sai daqui, — eu disse. — Quinn, pegue sua irmã e caia fora. Vai haver uma explosão. — Eu apenas esperei para ouvi-lo mais alerta antes de desligar o celular.
— Temos que salvar a nós mesmos, também, — Barry estava dizendo.
Brilhantemente, Cecile correu pelo corredor até um dispositivo vermelho e acionou o alarme de incêndio. O barulho quase rompeu nossos tímpanos, mas o efeito foi maravilhoso nos humanos adormecidos neste andar. Em segundos, eles começaram a sair dos quartos.
— Tomem as escadas, — Cecile os conduziu com um bramido, e obedientemente, eles tomaram. Fiquei contente em ver a cabeça escura de Carla entre eles. Mas eu não vi Quinn, e ele sempre foi fácil de detectar.
— A rainha está no alto, — disse Sr. Cataliades.
— Aqueles painéis de vidro podem ser quebrados por dentro? — Eu perguntei.
— Eles conseguiram no Fear Factor, — disse Barry.
— Poderíamos tentar deslizando os caixões para baixo.
— Eles quebrariam no impacto, — disse Cecile.
— Mas os vampiros sobreviveriam à explosão, — eu apontei.
— Para serem queimados pelo sol, — Sr. Cataliades disse. — Diantha e eu subiremos e tentaremos tirar o grupo da rainha, envoltos em cobertores. Nós iremos pegá-los... — Ele olhou para mim desesperadamente.
— Ambulâncias! Ligue para o 911 agora! Eles podem descobrir para onde levá-los!
Diantha ligou para o 911 e estava incoerente e desesperada o suficiente para conseguir que as ambulâncias partissem para uma explosão que ainda não tinha acontecido. — O prédio está em chamas, — disse ela, que era como uma futura verdade.
— Vá, — eu disse ao Sr. Cataliades, realmente empurrando o demônio, e ele se apressou para a suíte da rainha.
— Vá tentar buscar o seu grupo, — disse ao Barry, e ele e Cecile correram para o elevador, embora a qualquer minuto ele poderia ser inutilizado.
Eu tinha feito tudo o que podia tirando humanos dos arredores. Cataliades e Diantha poderiam cuidar da rainha e Andre. Eric e Pam! Eu sabia onde ficava o quarto de Eric, graças a Deus. Eu tomei as escadas. Enquanto corria para cima, eu encontrei um grupo descendo: as duas Britlingens, ambas com mochilas largas em suas costas, carregando um pacote embrulhado. Clovache tinha os pés, Batanya a cabeça. Eu não tive dúvida que o pacote era o Rei do Kentucky, e que elas estavam fazendo o seu dever. Ambas acenaram com a cabeça enquanto eu abracei a parede para deixá-las passar. Se elas não estavam tão calmas como se estivessem prontas para um passeio, elas estavam perto disso.
— Você acionou o alarme? — Batanya perguntou. — O que quer que seja que a Irmandade esteja fazendo, é hoje?
— Sim, — eu respondi.
— Obrigada. Nós estamos saindo agora, e você deveria, também— disse Clovache.
— Nós voltaremos para nossa cidade após o deixarmos, — Batanya disse. — Adeus.
— Boa sorte, — eu disse a elas estupidamente, e então eu estava correndo pelas escadas como se eu tivesse treinado para isso. Como resultado, eu estava colocando os bofes para fora dos pulmões quando eu abri de uma vez só a porta do nono andar. Eu vi uma camareira solitária empurrando o carrinho pelo longo corredor. Eu corri na direção dela, assustando-a ainda mais que o alarme de incêndio já tinha feito.
— Me dê sua chave mestra, — eu disse.
— Não! — Ela era de meia idade e hispânica, e não estava a ponto de ceder a uma ordem tão maluca. — Eu serei demitida.
— Então abra essa porta — eu apontei para a porta de Eric — e saia daqui. — Eu tinha certeza que parecia como uma mulher desesperada, e eu estava. — Esse prédio vai explodir em alguns minutos.
Ela jogou a chave para mim e atravessou pelo corredor para os elevadores. Droga.
E então as explosões começaram. Houve um profundo, retumbante tremor e um barulho vindo debaixo dos meus pés, como se alguma gigantesca criatura marinha estivesse fazendo caminho para a superfície. Eu cambaleei para o quarto de Eric, introduzindo a chave de plástico na abertura e empurrando para abrir a porta num momento de absoluto silêncio. O quarto estava completamente escuro.
— Eric, Pam! — Eu gritei. Eu tateei por um interruptor de luz no quarto escuro como breu, sentindo o prédio balançar. Pelo menos uma das principais cargas explosivas tinha explodido. Oh, merda! Oh, merda! Mas a luz acendeu, e eu vi que Eric e Pam estavam nas camas, não nos caixões. — Acordem! — Eu disse, sacudindo Pam uma vez que ela estava mais perto. Ela não se moveu de modo algum. Era exatamente como sacudir uma boneca revestida de serragem. — Eric! — eu gritei diretamente em seu ouvido.
Isso causou um pouco de reação; ele era muito mais velho que Pam. Seus olhos se abriram semicerrados e tentaram focar.
— O quê? — ele disse.
— Você tem que levantar! Você tem! Você tem que sair daqui!
— É dia, — ele sussurrou. Ele começou a baquear para seu lado.
Eu o esbofeteei forte como eu nunca tinha batido em alguém na minha vida. Eu gritei, — Levanta! — até minha voz quase não fazer efeito. Finalmente Eric se movimentou e se ajeitou para se sentar. Ele estava usando pijama preto de seda, obrigada Deus, e eu espiei que a capa cerimonial preta estava jogada sobre seu caixão. Ele não a tinha devolvido para Quinn, o que foi uma sorte enorme. Eu a coloquei sobre ele e a apertei no pescoço. Eu puxei o capuz sobre seu rosto.
— Cubra sua cabeça! — Eu gritei, e eu ouvi uma explosão de estrondos sobre a minha cabeça: vidros se espedaçando, seguidos por gritos.
Eric voltaria a cair no sono se eu não o mantivesse acordado. Ao menos ele estava tentando. Eu me lembrei que Bill conseguiu cambalear, sob circunstâncias terríveis, pelo menos por alguns minutos. Mas Pam, embora tivesse a mesma idade de Bill, simplesmente não conseguia ser despertada. Eu até puxei o seu longo cabelo pálido.
— Você tem que me ajudar a tirar Pam, — eu disse finalmente, desesperada. — Eric, você tem que tirar neste momento. — Houve outro estrondo e balanço brusco no piso. Eu gritei, e os olhos de Eric ficaram enormes. Ele cambaleou sobre seus pés. Como se estivéssemos compartilhando pensamentos como eu e Barry conseguíamos, empurramos seu caixão para fora do suporte e sobre o carpete. Então nós o deslizamos para o painel de vidro opaco inclinado que formava a lateral do prédio.
Tudo ao nosso redor tremia e chacoalhava. Os olhos de Eric estavam um pouco mais abertos agora, e ele estava se concentrando tão arduamente em manter-se em movimento que sua força estava puxando a minha.
— Pam, — eu disse, tentando incentivá-lo a mais uma ação. Eu abri o caixão, após um desastrado desespero.
Eric foi até sua criança adormecida, andando como se seus pés estivessem presos ao chão com cada passo. Ele pegou os ombros de Pam e eu peguei seus pés, e a erguemos com cobertor e tudo. O chão balançou novamente, mais violentamente dessa vez, e cambaleamos sobre o caixão e atiramos Pam dentro dele. Eu fechei a tampa e a tranquei, embora uma ponta da camisola de Pam estivesse para fora.
Eu pensei em Bill, e Rasul passou pela minha mente, mas não tinha nada que eu pudesse fazer, e não tinha tempo para isso. — Nós temos que quebrar o vidro! — Eu dei um grito agudo para Eric. Ele fez que sim com a cabeça muito devagar. Nos ajoelhamos para nos firmar contra a extremidade do caixão e empurramos tão forte tanto quanto podíamos até bater na direção do vidro, que se rachou em mil pedaços. Eles ficaram unidos, surpreendentemente - o milagre do vidro temperado. Eu poderia ter gritado de frustração. Nós precisávamos de um buraco, não uma cortina de vidro. Agachamos, firmando nossos pés no carpete, tentando ignorar os barulhos estrondosos no prédio abaixo de nós, Eric e eu empurramos com toda a nossa força.
Finalmente! Nós esmurramos o caixão completamente até o fim. A janela se soltou da moldura e caiu pela lateral do prédio.
E Eric viu a luz do sol pela primeira vez em mil anos. Ele gritou, um terrível som visceral. Mas no momento seguinte, ele puxou a capa com força ao seu redor. Ele me agarrou e saltou montando no caixão, e nós o empurramos como nossos pés. Por apenas uma fração de minuto, nós ficamos indecisos, e então nos inclinamos para frente. No pior momento da minha vida, nós saímos pela janela e começamos a escorregar como um tobagã pelo edifício sobre o caixão. Nós iríamos bater ao menos - repentinamente nós estávamos afastados do caixão e tipo que cambaleando através do ar, Eric me abraçando contra ele com obstinada persistência.
Eu expirei com profundo alívio. Claro, Eric podia voar.
Em seu torpor atordoado em razão da luz, ele não conseguia voar muito bem. Não era o curso suave que eu já havia experimentado antes; nós estávamos mais num zig-zag, oscilando a descida.
Mas isso era melhor que uma queda livre.
Eric soube retardar nossa descida o suficiente para me proteger de ser arremessada violentamente para minha morte na rua do lado de fora do hotel. Contudo, o caixão com Pam dentro teve uma má aterrissagem, e Pam chegou catapultando para fora dos restos da madeira e para dentro da luz do sol onde ela ficou estendida imóvel. Sem fazer nenhum barulho, ela começou a queimar. Eric aterrissou em cima dela e usou o cobertor para cobrir ambos. Um dos pés de Pam ficou exposto, e a carne estava fumegando. Eu o cobri.
Eu também ouvi o som de sirenes. Eu sinalizei para a primeira ambulância que vi, e as médicas saltaram para fora. Eu apontei para o amontoado coberto. — Dois vampiros - tirem eles do sol! — Eu disse.
O par de paramédicas, ambas jovens mulheres, trocaram um olhar incrédulo. — O que nós fazemos com eles? — perguntou a mais morena.
— Levem eles para um bom porão em algum lugar, um sem quaisquer janelas, e digam aos donos para manterem o porão aberto, porque haverão mais.
Lá no alto, uma explosão menor estourou em uma das suítes. Uma mala bomba, eu pensei, perguntando quantas Joe nos tinha falado para carregar para dentro dos quartos. Uma fina chuva de vidro brilhou no sol enquanto olhávamos para cima, mas coisas escuras estavam seguindo o vidro para fora da janela, e as paramédicas começaram a se mover como o time treinado que eram. Elas não entraram em pânico, mas elas definitivamente se moviam com urgência, e elas já debatiam qual prédio mais próximo tinha um grande porão.
— Nós vamos dizer a todos, — disse a mulher mais morena. Pam estava agora na ambulância e Eric na metade do caminho de lá. Seu rosto estava vermelho brilhante e vapor estava subindo dos seus lábios. Oh, meu Deus.
— O que você vai fazer?
— Eu tenho que voltar lá, — eu respondi.
— Tola, — ela disse, e então se lançou na ambulância, que arrancou.
Houve mais chuva de vidro, e parte do alicerce pareceu estar desmoronando. Isso seria devido a alguns explosivos enormes acondicionados nos caixões-bomba na área de carga e descarga. Outra explosão veio do sexto andar, mas do outro lado da pirâmide. Meus sentidos estavam tão entorpecidos pelo som e pela visão que eu não fiquei surpresa quando vi uma mala azul voando através do ar.
Sr. Cataliades teve sucesso em quebrar a janela da rainha. Repentinamente eu percebi que a mala estava intacta, não tinha explodido, e estava caindo diretamente sobre mim.
Eu comecei a correr, retornando aos meus dias de softball quando eu arrancava da terceira base para o home run e tinha que escorregar nele. Apontei para o parque do outro lado da rua, onde o trânsito teve que ser parado por causa dos veículos de emergência: carros de polícia, ambulâncias, corpo de bombeiros. Havia uma guarda bem a minha frente que estava direcionada em direção oposta, indicando algo para o outro tira. — Se abaixa! — Eu gritei. — Bomba! — e ela deu meia volta para me olhar e eu a derrubei, levando-a para o chão comigo. Algo me atingiu no meio das minhas costas, como som de ondas, e o ar foi retirado dos meus pulmões. Ficamos deitadas ali por um longo minuto, até que eu saí de cima dela e levantei incertamente com meus pés. Foi maravilhoso inalar, embora o ar estivesse cáustico com fogo e poeira. Ela pode ter dito algo para mim, mas eu não conseguia ouvi-la.
Eu me virei para olhar para a Pirâmide de Gizé.
Partes da estrutura estavam caindo em pedaços, dobrando e ruindo, todo o vidro e concreto e aço e madeira separando-se do conjunto em partes distintas, enquanto a maioria das paredes que delimitavam os espaços — dos quartos e banheiros e corredores — ruíram. Esse desmoronamento soterrou vários corpos que ocupavam aquelas áreas absolutamente divididas. Eles eram todos um agora: a estrutura, suas partes, seus habitantes.
Aqui e ali ainda estavam pedaços que continuavam unidos. O andar humano, o mezzanino, e o andar do saguão estavam praticamente intactos, embora a área ao redor do balcão de registro estivesse destruído.
Eu vi uma forma que eu reconheci, um caixão. A tampa tinha sido removida com o impacto da sua queda. A medida que o sol atingiu a criatura dentro, ela soltou um gemido, e eu corri para lá. Havia um pedaço grande de parede de gesso sobre ela, e eu a carreguei para cima do caixão. Houve silêncio imediatamente quando o sol ficou impedido de tocar o vampiro no interior.
— Socorro! — Eu berrei. — Socorro!
Alguns policiais se moveram em minha direção.
— Existem pessoas e vampiros ainda vivos, — eu disse. — Os vampiros têm que ser cobertos.
— Pessoas primeiro, — disse um veterano musculoso.
— Claro, — eu concordei automaticamente, entretanto ao mesmo quando eu disse isso, eu pensei, vampiros não prepararam essas bombas.
— Mas se você puder cobrir os vampiros, eles podem sobreviver até as ambulâncias levá-los para um local seguro.
Havia um bloco do hotel ainda de pé, um pedaço da parte sul. Erguendo os olhos, eu vi Sr. Cataliades em pé em uma armação vazia onde um vidro tinha caído. De alguma maneira, ele arrumou o seu jeito de descer para o andar humano. Ele estava segurando um pacote embrulhado numa colcha de cama, agarrando-o firmemente em seu peito.
— Olhem! — eu gritei, para ter a atenção dos bombeiros. — Olhem!
Eles saltaram para a ação ao verem uma pessoa viva para resgatar. Eles ficaram muito mais entusiasmados a respeito disso do que em resgatar vampiros que possivelmente seriam queimados até a morte na luz do sol e poderiam facilmente serem salvos se fossem cobertos. Eu tentei culpá-los mas eu não pude.
Pela primeira vez eu notei que havia uma multidão de pessoas normais que pararam seus carros e saíram para ajudar - ou para observar como idiotas. Havia pessoas que estavam gritando, — Deixem-os queimar!
Eu observei os bombeiros subirem em uma caçamba de draga para irem buscar o demônio e sua carga, e então eu voltei atrás para explorar minha passagem através dos escombros.
Depois de um tempo, eu estava cansada. Os gritos dos humanos sobreviventes, a fumaça, o raio de sol obscurecido pela imensa nuvem de poeira, o ruído da estrutura rangendo se acomodando, o agitado barulho dos trabalhadores de resgate e a maquinaria que estava chegando e sendo empregada... eu estava sobrecarregada.
Nesse meio tempo, desde que eu tinha roubado uma das jaquetas amarelas e um dos capacetes que todo o pessoal de resgate estava vestindo, eu estive perto o suficiente para achar dois vampiros, um deles eu conhecia, nas ruínas da área de check in, pesadamente cobertos por escombros dos andares acima. Um grande pedaço de madeira sobreviveu para identificar o balcão da recepção. Um dos vampiros estava bastante queimado, e eu não tinha ideia se ele tinha sobrevivido ou não. O outro vampiro estava escondido debaixo do grande pedaço de madeira, e apenas seus pés e suas mãos tinham sido chamuscados e enegrecidos. Logo que eu gritei por ajuda, os vampiros foram cobertos com cobertores. — Nós conseguimos um prédio a duas quadras daqui; nós o estamos usando como depósito de vampiros, — disse a motorista da ambulância de pele morena que levou os mais seriamente feridos, e eu percebi que ela era a mulher que havia levado Eric e Pam.
Além dos vampiros, eu descobri um Todd Donati quase morto. Eu passei alguns minutos com ele até que uma maca chegasse. E eu achei, próximo a ele, uma camareira morta. Ela havia sido esmagada.
Eu tinha um cheiro no meu nariz que simplesmente não ia embora, e eu odiei isso. Estava revestindo meus pulmões por dentro, eu imaginei, e eu iria passar o resto da minha vida inspirando e expirando o cheiro. O odor era composto de materiais de construção queimados, corpos queimados, e vampiros desintegrados. Era o cheiro do ódio.
Eu vi coisas tão horríveis que eu não conseguia sequer pensar sobre elas.
Repentinamente, eu senti que não conseguiria achar mais alguém. Eu tive que me sentar. Eu fui atraída para uma pilha criada por acaso com um grande tubo e algumas paredes de gesso. Me empoleirei sobre elas e chorei. Então a pilha inteira se moveu para o lado, e eu acabei no chão, ainda chorando.
Eu olhei para a abertura revelada pelos escombros deslocados.
Bill estava agachado lá dentro, metade do seu rosto queimado. Ele estava vestido com as roupas que eu tinha visto na noite anterior. Eu me curvei sobre ele para manter o sol longe, e ele disse, — Obrigado, — através dos seus lábios rachados e sangrentos. Ele se manteve entrando e saindo do seu sono letárgico do dia.
— Jesus Eterno, — eu disse — Venham ajudar! — eu gritei, e vi dois homens começarem a se mover em minha direção com um cobertor.
— Eu sabia que você iria me achar, — Bill disse, ou eu imaginei isso?
Eu permaneci agachada na posição incômoda. Não havia nada perto o suficiente para agarrar que poderia cobri-lo mais do que eu cobria. O cheiro estava me fazendo ter náusea, mas eu permaneci. Ele tinha sobrevivido todo esse tempo porque tinha sido coberto por acidente.
Apesar de um dos bombeiros ter vomitado, eles o cobriram e o levaram embora.
Então eu vi outra figura de jaqueta amarela rasgar o campo de escombros em direção as ambulâncias tão rápido que qualquer um poderia se mover sem quebrar uma perna. Eu peguei a impressão de um cérebro vivo, e eu o reconheci imediatamente. Eu engatinhei sobre pilhas de entulhos, seguindo a assinatura cerebral do homem que eu mais queria encontrar. Quinn e Frannie deitados meio-enterrados sob a pilha de entulho solto. Frannie estava inconsciente, e ela esteve sangrando pela cabeça, mas já tinha secado. Quinn estava atordoado mas recuperando a total consciência. Eu pude ver que água fresca tinha talhado um caminho na sujeira do seu rosto, e eu percebi que o homem que tinha saído com pressa havia dado água para Quinn beber e estava retornando com macas para os dois.
Ele tentou sorrir para mim. Eu cai de joelhos ao seu lado. — Nós teremos que mudar os nossos planos, benzinho, — ele disse. — Eu terei que cuidar da Frannie por uma semana ou duas. Nossa mãe não é exatamente Florence Nightingale.
Eu tentei não chorar, mas era como, um vez ligado, eu não poderia dizer aos meus ductos lacrimais que se fechassem. Eu não estava soluçando mais, mas eu gotejava constantemente. Estúpida. — Faça o que tiver que fazer, — eu disse. — Me liga quando você puder. Ok? — Eu odeio pessoas que dizem — Ok? — toda a hora, como se estivessem pedindo permissão, mas eu não pude evitá-lo, tampouco. — Você está vivo; isso é tudo que importa.
— Graças a você, — ele disse. — Se você não tivesse me ligado, nós estaríamos mortos. Mesmo o alarme de incêndio não nos teria tirado do quarto a tempo.
Eu ouvi um gemido a alguns metros de distância, um fôlego no ar. Quinn ouviu, também. Eu rastejei para longe dele, empurrando para o lado um grande pedaço do vaso sanitário e da pia. Ali, coberto com poeira e escombros, sob vários pedaços grandes de parede de gesso, jazia Andre, completamente inconsciente. Uma rápida olhada disse-me que ele tinha várias lesões sérias. Mas nenhuma delas estava sangrando.
Ele iria se curar de todas elas. Droga.
— É Andre, — eu disse para Quinn. — Ferido, mas vivo. — Se a minha voz estava desgostosa, eu me senti desgostosa. Havia uma boa, longa lasca de madeira bem ao lado da perna dele, e eu fiquei muito tentada. Andre era uma ameaça à minha liberdade de escolha, para qualquer coisa que eu apreciava em minha vida. Mas eu já tinha visto tantas mortes neste dia.
Eu me inclinei ali ao seu lado, odiando ele, mas apesar de tudo... eu o conhecia. Isso devia ter facilitado, mas não.
Me rastejei para fora da pequena alcova onde ele jazia, e escapei de volta para Quinn.
— Aqueles caras estão voltando para nos pegar, — ele me disse, soando forte cada minuto. — Você pode ir embora agora.
— Você quer que eu vá?
Seus olhos estavam me dizendo algo. Eu não estava compreendendo.
— Ok, — eu disse hesitante. — Eu irei.
— Eu tenho ajuda chegando, — ele disse gentilmente. — Você podia estar encontrando qualquer outra pessoa.
— Está bem, — eu disse, não sabendo como fazer isso, e me esforçando para ficar em pé. Eu tinha caminhado talvez uns dois metros quando eu o ouvi começar a se mover. Mas após um momento de quietude, eu continuei andando.
Eu retornei até uma grande van que foi trazida e estacionada perto do centro de comando de resgate. Aquela jaqueta amarela tinha sido um passe mágico, mas poderia acabar em qualquer minuto. Alguém poderia notar que eu estava calçando chinelos, e eles estavam rasgando, já que dificilmente eles foram projetados para escalar destroços. Uma mulher estendeu para mim uma garrafa de água da van, e eu a abri com mãos trêmulas. Eu bebi e bebi, e joguei o resto da água pelo meu rosto e minhas mãos. Apesar da friagem no ar, a sensação foi maravilhosa.
Naquela altura, duas (ou quatro, ou seis) horas se passaram desde a primeira explosão. Havia agora grande quantidade de equipes de resgate que tinham equipamentos, máquinas, cobertores. Eu estava procurando ao redor por alguém que parecesse uma autoridade, pretendendo descobrir onde os outros humanos sobreviventes foram levados, quando uma voz falou na minha cabeça.
Sookie?
Barry!
Em qual condição você está?
Muito abalada, mas não muito machucada. Você?
O mesmo. Cecile morreu.
Eu sinto muito. Eu não pude pensar em mais nada para dizer.
Eu pensei em algo que podemos fazer.
O que? Eu provavelmente não soei muito interessada.
Nós podemos encontrar pessoas vivas. Nós seremos melhores juntos.
Isso é o que eu estava fazendo, eu disse a ele. Mas você tem razão, juntos nós seremos mais fortes. Ao mesmo tempo, eu estava tão cansada que algo dentro de mim contraiu-se ao pensamento de fazer mais esforço. Claro que nós podemos, eu disse.
Se essa pilha de escombros tivesse sido tão horripilantemente enorme quanto as Torres Gêmeas, nós não conseguiríamos fazer isso. Mas esse local era menor e mais contido, e se nós pudéssemos ter alguém que acreditasse na gente, nós teríamos uma chance.
Eu achei Barry perto do centro de comando, e eu peguei sua mão suja. Ele era mais novo que eu, mas neste momento ele não parecia, e eu não achei que ele alguma vez voltaria a se comportar novamente assim. Quando eu observei a fileira de corpos na grama do pequeno parque, eu vi Cecile, e eu vi o que provavelmente deveria ter sido a camareira que eu encontrei no corredor. Havia alguns fragmentos, formas vagamente humanas que eram vampiros se desintegrando. Eu poderia ter conhecido alguns deles, mas era impossível dizer.
Qualquer humilhação seria um pequeno preço a pagar se nós pudéssemos salvar alguém. Então Barry e eu nos preparamos para sermos humilhados e zombados.
A princípio, foi difícil fazer alguém escutar. Os profissionais ficavam nos encaminhando ao centro de feridos ou a uma das ambulâncias estacionadas prontas para levar os sobreviventes para um dos hospitais de Rhodes.
Finalmente, eu fiquei cara-a-cara com um homem magro de cabelos grisalhos que me escutou sem qualquer expressão em seu rosto.
— Eu nunca pensei que estaria resgatando vampiros, tampouco— ele disse, como se explicasse a sua decisão, e talvez fosse isso. — Então, levem esses dois homens com vocês, e mostre a eles o que vocês podem fazer. Vocês têm quinze minutos do tempo valioso desses homens. Se vocês desperdiçarem, vocês podem estar matando alguém.
Barry teve a ideia, mas agora ele parecia querer que eu falasse por nós. Seu rosto estava enegrecido com manchas de fuligem. Nós tivemos um debate silencioso sobre a melhor maneira de fazer a nossa tarefa, e ao final disso, me virei para o bombeiro e disse, — Coloque-nos numa daquelas caçambas.
Surpreendentemente, eles nos colocaram, sem mais argumentos. Nós fomos levantados acima dos escombros, e sim, nós sabíamos que isso era perigoso, e sim, nós estávamos preparados para receber as consequências. Ainda segurando as mãos, Barry e eu fechamos nossos olhos e procuramos, abrindo e estendendo nossas mentes.
— Nos mova para a esquerda, — eu disse, e o bombeiro dentro da caçamba conosco gesticulou para o homem na cabine da máquina. — Me observe, — eu disse, e ele olhou para trás. — Pare, — eu disse, e a caçamba parou. Nós procuramos de novo. — Diretamente para baixo, — eu disse. — Bem aqui embaixo. É uma mulher com o nome alguma coisa Santiago.
Alguns minutos depois, um bramido subiu. Eles acharam a mulher viva.
Ficamos populares depois disso, e não houve mais perguntas sobre como fazíamos aquilo, desde que continuássemos fazê-lo. O pessoal de resgate estavam todos concentrados em resgatar. Eles estavam trazendo cães, e estavam inserindo microfones, mas Barry e eu éramos mais rápidos e mais articulados que os cães, e mais precisos que os microfones. Nós achamos mais quatro pessoas vivas, e achamos um homem que morreu antes que eles pudessem chegar até ele, um garçom chamado Art que amava sua mulher e que sofreu terrivelmente até o fim. Art foi especialmente de cortar o coração, porque eles estavam tentando como o inferno desenterrar o cara, e eu tive que dizer-lhes que aquilo não ajudaria.
Claro, eles não aceitaram minha análise: eles continuaram escavando, mas ele já tinha morrido. Nesse meio tempo, a equipe de regate estava muito animada com nossa habilidade e quiseram que trabalhássemos durante a noite, mas Barry estava falhando e eu não estava muito melhor. Pior, a escuridão estava se aproximando.
— Os vampiros estarão levantando, — eu lembrei ao chefe dos bombeiros. Ele assentiu com a cabeça e me olhou para mais explicações. — Eles estarão muito machucados, — eu disse. Ele ainda não havia entendido. — Eles precisarão de sangue imediatamente, e não terão qualquer controle. Eu não mandaria nenhum da equipe de resgate aos escombros sozinho, — eu disse, e seu rosto ficou branco com o pensamento.
— Você não acha que eles estão todos mortos? Você não pode encontrá-los?
— Bem, na verdade, não. Nós não podemos encontrar vampiros. Humanos, sim. Mas não mortos-vivos. Seus cérebros não transmitem qualquer, hã, ondas. Nós temos que ir agora. Onde estão os sobreviventes?
— Eles estão todos no Edifício Thorne, diretamente lá em baixo, — ele disse, apontando. — No subsolo. — Nós nos viramos para ir embora. Nessa hora, Barry deslizou seus braços ao redor dos meus ombros, e não porque ele se sentia cortês. Ele precisava de apoio.
— Deixe eu pegar seus nomes e endereços, assim o prefeito poderá agradecer a vocês, — o homem de cabelos grisalhos disse, segurando uma caneta e um bloco de notas engatilhado.
Não! Barry disse, e minha boca se fechou.
Eu neguei com a cabeça. — Nós teremos que deixar passar, — eu disse. Eu dei uma rápida olhada na sua cabeça, e ele estava ávido por mais da nossa ajuda. Repentinamente eu entendi porque Barry me parou tão abruptadamente, embora meu companheiro telepata estivesse tão cansado que não podia me dizer ele mesmo. Minha recusa não foi um grande sucesso.
— Vocês irão trabalhar para os vampiros, mas não querem se expor e ser conhecidos como alguém que ajudou nesse dia terrível?
— Sim, — eu respondi. — É absolutamente isso aí.
Ele não ficou feliz comigo, e eu pensei por um minuto que ele iria forçar a questão: tomar à força minha carteira das minhas calças, me mandar para a cadeia, ou algo mais. Mas ele relutantemente acenou com a cabeça e se retirou depressa na direção do Edifício Thorne.
Alguém irá tentar descobrir, Barry disse. Alguém vai querer usar a
gente.
Eu suspirei, e eu quase não tinha energia para pegar mais ar. Eu assenti com a cabeça. É, alguém irá. Se nós formos para o abrigo, alguém irá nos espionar lá, e irão perguntar pelos nossos nomes para alguém que nos conheça, e depois disso, será uma questão de tempo.
Eu não conseguia pensar num jeito de escapar de ir para lá. Nós tínhamos que ter ajuda, nós tínhamos que achar nosso grupo e descobrir como e quando nós poderíamos deixar a cidade, e nós tínhamos que descobrir quem tinha vivido e quem não.
Eu dei um tapinha no meu bolso traseiro, e para a minha surpresa, meu celular estava ainda lá e ainda tinha sinal. Eu liguei para Sr. Cataliades. Se alguém além de mim saiu da Pirâmide de Gizé com um telefone celular, o advogado foi um.
— Sim, — ele disse cuidadosamente. — Senhora St-
— Shhh, — eu disse. — Não diga meu nome em voz alta. — Era absoluta paranóia falando.
— Muito bem.
— Nós ajudamos-lhes aqui, e agora eles querem nos conhecer melhor de verdade, — eu disse, me sentindo muito inteligente por falar tão cautelosamente. Eu estava muito cansada. — Barry e eu estamos do lado de fora do prédio onde você está. Nós precisamos ficar em outro lugar. Muitas pessoas fazendo listas lá dentro, certo?
— Esta é uma atividade usual, — ele disse.
— Você e Diantha estão bem?
— Ela não foi encontrada. Nós fomos separados.
Eu não falei por alguns segundos. — Eu sinto muito. Quem você estava segurando quando eu os vi te resgatando?
— A rainha. Ela está aqui, embora muito machucada. Nós não conseguimos achar Andre.
Ele pausou, e pela razão de eu não conseguir evitar, eu perguntei, — Quem mais?
— Gervaise está morto. Eric, Pam, Bill...queimados, mas aqui. Cleo Babbitt está aqui. Eu não vi Rasul.
— Jake Purifoy está aí?
— Eu não o vi, também.
— Porque você pode querer saber que ele é no mínimo parcialmente responsável se você o vir. Ele estava no complô da Irmandade.
— Ah. — Sr. Cataliades registrou aquilo. — Oh, sim, eu certamente desejaria saber disso. Johan Glassport ficará especialmente interessado, uma vez que ele tem uma clavícula e várias costelas quebradas. Ele está muito, muito zangado. — Digamos que algo a respeito da violência de Johan Glassport, fazia com que Sr. Cataliades pensasse que ele seria capaz de minuciosa vingança tanto quanto um vampiro. — De qualquer modo como foi que você veio a saber que existia um complô, Senhorita Sookie?
Eu contei ao advogado a história que Clovache me contou; eu imagino agora que ela e Batanya voltaram para o lugar que elas vieram, que seria bom.
— Contratá-las provou valer o custo para o Rei Isaiah. — Cataliades soou pensativo em lugar de invejoso. — Isaiah está aqui e completamente ileso.
— Nós precisamos encontrar algum lugar para dormir. Você pode dizer ao Rei de Barry que ele está comigo? — Eu perguntei, sabendo que eu tinha que desligar o telefone e elaborar um plano.
— Ele está muito machucado para se importar. Ele não está consciente.
— Tudo bem. Apenas alguém da comitiva do Texas.
— Eu encontrei Joseph Velasquez. Rachel está morta. — Sr. Cataliades não podia evitar a si mesmo; ele tinha que me contar todas as más notícias.
— Cecile, a assistente de Stan, está morta, — eu disse a ele.
— Onde você está indo? — Cataliades perguntou.
— Eu não sei o que fazer, — eu disse. Eu me sentia exausta e sem esperança, e eu tive muitas notícias más e recebi muitas pancadas para me refazer mais uma vez.
— Eu vou mandar um táxi para você, — Sr. Cataliades ofereceu. — Eu posso conseguir um número de telefone de um desses simpáticos voluntários. Diga ao motorista que vocês são da equipe de resgate e vocês precisam ser levados para o hotel mais perto e barato. Você tem um cartão de crédito?
— É, e meu cartão de débito, — eu disse, abençoando o impulso que tinha me levado a colocar a pequena carteira no meu bolso.
— Não, espere, eles irão rastreá-la muito facilmente se você usá-lo. Dinheiro?
Eu chequei. Graças principalmente ao Barry, nós tínhamos cento e noventa dólares conosco. Eu disse ao Sr. Cataliades que nós podíamos nos virar com ele.
— Então passem a noite em um hotel, e amanhã me ligue de novo, — ele disse, soando indescritivelmente cansado.
— Obrigada pelo plano.
— Obrigado pelo seu aviso, — o demônio cortês disse. — Nós estaríamos todos mortos se você e o Bellboy não tivessem nos acordados.
Eu descartei a jaqueta amarela e o capacete. Barry e eu cambaleamos juntos, mais ou menos apoiando-nos um ou outro. Nós achamos uma barricada de concreto para nos encostar, nossos braços em volta um do outro. Eu tentei dizer ao Barry do porque nós estávamos fazendo aquilo, mas ele não se importou. Eu estava preocupada que algum bombeiro ou policial do local em qualquer minuto nos visse e nos parasse para descobrir o que nós estávamos fazendo, onde nós estávamos indo, quem nós éramos. Eu fiquei tão aliviada que eu senti náusea quando eu avistei um táxi cruzando devagar, o motorista espreitando para fora da janela. Tinha que ser para a gente. Agitei meu braço livre freneticamente. Eu nunca tinha chamado um táxi antes na minha vida. Era exatamente como nos filmes.
O motorista do táxi, um cara da Guiana magro como arame, não ficou muito animado em deixar criaturas imundas como nós entrar no seu táxi, mas ele não podia recusar pessoas tão lamentáveis como nós estávamos. O hotel ‚barato‛ mais perto ficava um quilômetro e seiscentos metros atrás do interior da cidade, longe da água. Se nós tivéssemos energia, poderíamos ter andado. Pelo menos a corrida de táxi não foi tão cara.
Mesmo para hotel de categoria mediana, os recepcionistas estavam menos comovidos com nossa aparência; mas afinal de contas, esse era um dia para caridade com as pessoas que estiveram envolvidas na explosão. Nós pegamos um quarto por um preço que me faria engasgar se eu não tivesse visto as taxas dos quartos na Pirâmide. O quarto por si só não era algo fora do comum, mas nós não precisávamos de muito. Uma camareira bateu na porta imediatamente após nós termos entrado e disse que ela iria lavar nossas roupas, já que nós não tínhamos nenhuma outra. Ela olhou para baixo quando disse isso, então ela não me envergonhou. Tentando não engasgar com a sua bondade, eu olhei para baixo para minha blusa e minhas calças frouxas e concordei.
Eu me virei para o Barry para perceber que ele estava absolutamente desmaiado. Eu mudei a posição dele na cama. Era desagradável como lidar com um dos vampiros, e eu mantive meus lábios pressionados juntos numa fina linha todo o tempo em que eu despia seu corpo mole. Então eu tirei minhas próprias roupas, achei uma sacola plástica no armário para guardá-las, e entreguei as roupas sujas para ela. Eu peguei uma toalhinha e limpei o rosto de Barry e suas mãos e pés, e então eu o cobri.
Eu tinha que tomar banho, e agradeci à Deus pelo shampoo, sabonete e condicionador e a loção corporal grátis. Eu também agradeci à Deus pela água de chuveiro quente e fria, particularmente a quente. A camareira simpática tinha me trazido até duas escovas de dentes e um pequeno tubo de pasta de dente, e lavei minha boca limpando o sabor de cinzas. Eu lavei minha calcinha e sutiã na pia e os enrolei em uma toalha antes de pendurá-los para secar. Eu tinha dado a moça todas as peças das roupas de Barry.
Finalmente, não havia mais nada a fazer, e eu engatinhei para a cama ao lado de Barry. Agora que eu cheirava tão bem, eu percebi que ele não, mas era apenas difícil para mim, certo? Eu não poderia acordá-lo por nada. Me virei para meu lado longe dele, pensando em quanto apavorante havia sido aquele longo, vazio corredor - não é engraçado que foi isso o que eu escolhi como assustador, depois de um dia tão horrível?
O quarto do hotel estava muito calmo depois do tumulto do local das explosões, e a cama estava muito confortável, e eu cheirava muito melhor e quase não doía nem um pouco.
Eu dormi e não sonhei.
SEI QUE EXISTEM MUITAS COISAS PIORES do que acordar nua em uma cama com alguém que você não conhece muito bem. Mas quando meus olhos tremularam se abrindo no dia seguinte, não consegui pensar em nada, por pelo menos cinco longos minutos. Eu sabia que Barry estava acordado. Posso perceber quando um cérebro estala para a consciência. Para meu alívio, ele saiu de mansinho da cama e foi para banheiro sem falar nada, e ouvi o barulho da água do chuveiro logo depois.
Nossas roupas limpas estavam em um saco pendurado na maçaneta na parte de dentro de nossa porta, e havia um exemplar do USA Today, também. Depois de vestir minhas roupas com pressa, eu abri o jornal na pequena mesa enquanto eu preparava uma xícara de café de cortesia. Também conduzi o saco com as roupas de Barry ao banheiro e o larguei no chão, balançando-o um pouco antes para chamar a atenção dele.
Dei uma olhada no cardápio do serviço de quarto, e nós não tínhamos dinheiro suficiente para comer nada nele. Nós tínhamos que guardar um pouco do nosso dinheiro para um táxi, por que eu não sabia qual seria o nosso próximo movimento. Barry saiu, parecendo tão refrescado quanto eu na noite passada. Para minha surpresa, ele me beijou na bochecha, e então se sentou na minha frente com sua própria xícara que continha alguma coisa que parecia um parente muito distante de café preparado.
— Não me lembro muito sobre a noite passada, — ele disse. — Me conte por que estamos aqui.
Eu contei.
— Isso foi bem pensado da minha parte, — ele disse. — Estou admirado comigo mesmo.
Eu ri. Ele pode estar sentindo uma pequena humilhação masculina por ter esmorecido antes de mim, mas pelo menos ele conseguia rir de si mesmo.
— Então, acho que precisamos ligar para seu advogado demônio?
Concordei com a cabeça. Já tinha passado das onze, então eu liguei.
Ele atendeu imediatamente. — Há muitos ouvidos aqui, — ele disse sem preâmbulo. — E entendo que estes telefones não são muito seguros. Celulares.
— Tudo bem.
— Então eu vou me encontrar com vocês daqui a pouco, levando algumas coisas de que vocês irão precisar. Onde vocês estão?
Com uma pontada de receio, já que o demônio era um cara que as pessoas notariam, disse-lhe o nome do hotel e o número de nosso quarto, e ele me disse para ser paciente. Eu estava me sentindo bem até Sr. Cataliades dizer isso, e de repente eu comecei a tremer por dentro. Senti como se estivéssemos em uma fuga agora, quando não merecíamos estar de maneira nenhuma. Tinha lido o jornal, e o relato a respeito da Pirâmide dizia que a catástrofe foi devida a — uma série de explosões— que Dan Brewer, diretor da força tarefa de terrorismo do estado, atribuiu a várias bombas. O chefe dos bombeiros foi menos comprometedor: — Uma investigação está em andamento. — Eu devia esperar muitíssimo por isso.
Barry disse, — Podíamos transar enquanto esperamos.
— Eu gostava mais de você inconsciente, — eu disse. Eu sabia que Barry só estava tentando não pensar em bobagens, até agora.
— Tirou minha roupa ontem à noite? — Ele disse com um olhar lascivo.
— É, fui eu, que sorte a minha, — eu falei. E sorri para ele, fiquei surpresa comigo mesma.
Uma batida na porta nos fez encará-la como dois cervos assustados.
— Seu cara demônio, — disse Barry depois de um segundo de checagem mental.
— Sim, — eu disse, e fui atender a porta.
O Sr. Cataliades não teve os cuidados de uma camareira, então ele ainda estava com a roupa suja do dia anterior.
Mas ele conseguiu parecer digno, de qualquer maneira, e suas mãos e rosto estavam limpos.
— Por favor, como está todo mundo? — Eu perguntei.
— Sophie-Anne perdeu suas pernas, e não sei se retornarão, — ele respondeu.
— Oh, céus, — falei, estremecendo.
— Sigebert se livrou dos escombros depois do anoitecer, — ele continuou. — Ele tinha se escondido em algum lugar seguro na garagem do estacionamento, onde ele parou depois das explosões. Suspeito que ele encontrou alguém para se alimentar, porque ele estava mais saudável do que devia estar. Mas se esse for o caso, ele empurrou o corpo em um dos pontos de incêndio, porque teríamos notícias se um corpo drenado tivesse sido encontrado.
Torci para que o doador fosse um dos caras da Irmandade.
— Seu rei, — Sr. Cataliades disse ao Barry, — está tão ferido que pode levar uma década para se recuperar. Até que a situação esteja desanuviada, Joseph lidera, embora ele seja desafiado em breve. Rachel, a criança do rei, está morta; provavelmente Sookie lhe contou?
— Sinto muito, — falei. — Eu simplesmente tive más noticias demais para chegar ao final disso tudo.
— E Sookie me contou que a humana Cecile morreu.
— E quanto a Diantha? — Perguntei, hesitando em perguntar. Tinha que ser importante já que o Sr.Cataliades não tinha mencionado a sua sobrinha.
— Desaparecida, — respondeu brevemente — E mesmo assim aquele pedaço de porcaria, Glassport, só teve contusões.
— Sinto muito por ambas as coisas, — eu disse.
Barry parecia entorpecido. Todos os traços do seu ânimo frívolo tinham sumido. Ele parecia lastimável, sentando na beira da cama. O camareiro arrogante e ríspido que eu tinha encontrado no saguão da Pirâmide tinha sido enterrado, pelo menos por enquanto.
— Contei-lhe sobre o Gervaise, — Sr. Cataliades disse. — Identifiquei o corpo de sua mulher esta manhã. Qual era seu nome?
— Carla. Não consigo lembrar seu sobrenome. Eu vou lembrar.
— O primeiro nome provavelmente será suficiente para que eles a identifiquem. Um dos cadáveres com uniforme do hotel tinha uma lista de computador no bolso.
— Não estavam todos nela, — disse com alguma certeza.
— Não, claro que não, — Barry disse. — Só alguns.
Nós olhamos para ele.
— Como você sabe? — Perguntei.
— Ouvi eles sem querer.
— Quando?
— Na noite anterior.
Mordi o interior de minha boca, com força.
— O que você ouviu? — O Sr. Cataliades perguntou em um tom direto.
— Estava com o Stan no, você sabe, a coisa de compra e venda. E eu notei que os garçons e outros estavam se esquivando de mim, então eu observei para ver se eles estavam se esquivando de Sookie também. Então eu pensei, ‚Eles sabem o que você é, Barry, e há alguma coisa que eles não querem que você saiba. É melhor você checar isso.‛ Encontrei um bom lugar para de uma maneira me esconder atrás de algumas daquelas palmeiras falsas, perto da porta de serviço, e consegui ter uma leitura do que eles pensavam lá dentro. Eles não abriram o jogo ou qualquer coisa parecida, ok? — Ele teve uma leitura precisa de nossos pensamentos, também. — Foi só, como, ‚Ok, vamos pegar esses vampiros, malditos sejam, e se pegarmos alguns de seus escravos humanos, bem, isso é uma lástima, viveremos com isso. Condenados por associação.
Só pude me sentar ali e olhá-lo.
— Não, eu não sabia quando ou o que eles iriam fazer! Finalmente fui para cama meio preocupado a respeito deles, qual era o plano, e quando não consegui dormir sossegado, finalmente desisti de tentar e te chamei. E tentamos tirar todo mundo, — ele disse, e começou a chorar.
Sentei-me ao seu lado e coloquei meu braço em volta dele. Não sabia o que dizer. É claro, ele podia saber o que eu estava pensando.
— Sim, eu queria ter dito alguma coisa antes, — ele disse em uma voz sufocada. — Sim, fiz a coisa errada. Mas achei que se falasse alguma coisa antes que saber de algo com certeza, os vampiros cairiam sobre eles e os drenariam. Ou eles exigissem que eu apontasse quem sabia e quem não. E eu não poderia fazer isso.
Houve um longo silêncio.
— Sr. Cataliades, você viu Quinn? — Perguntei para romper o silêncio.
— Ele está no hospital humano. Ele não conseguiu impedir de ser levado.
— Tenho que ir vê-lo.
— Quão sério é o seu medo que as autoridades obriguem vocês a cumprirem suas ordens?
Barry levantou a cabeça e me olhou. — Muito sério, — respondemos simultaneamente.
— É a primeira vez que eu revelo a alguém, salvo o pessoal da minha cidade, o que eu posso fazer, — eu disse.
— Eu, também. — Barry enxugou as lágrimas com as costas de sua mão. — Você devia ter visto a expressão daquele cara quando ele finalmente acreditou que poderíamos encontrar as pessoas. Ele achou que éramos médiuns ou alguma coisa do tipo, e ele não conseguia entender que o que fazíamos era registrar a assinatura de um cérebro vivo. Nada místico a respeito disso.
— Ele ficou completamente envolvido com a ideia logo que acreditou na gente, — Eu falei. — Você podia ouvir em sua cabeça que ele estava pensando em umas cem maneiras diferentes de usar a gente em operações de resgate, para o governo em convenções, interrogatórios policiais.
O Sr. Cataliades nos olhou. Eu não conseguia distinguir seus pensamentos demoníacos emaranhados, mas ele estava tendo um montão deles.
— Perderíamos o controle de nossas vidas, — Barry disse. — Eu gosto de minha vida.
— Eu acho que poderia salvar um monte de pessoas, — eu disse. Eu nunca tinha pensado a respeito disso antes. Nunca tinha enfrentado uma situação como a que tínhamos encarado no dia anterior. Eu esperava nunca mais enfrentar outra vez. Qual era a probabilidade de eu estar novamente in loco em um desastre? Eu seria obrigada a deixar um trabalho que eu gostava, entre pessoas que me importavam, para trabalhar para desconhecidos em lugares distantes? Tremi quando pensei a respeito disso. Senti algo endurecer dentro de mim quando me dei conta de que a vantagem que Andre havia tirado de mim seria só o começo, em situações como aquela. Como Andre, todo mundo ia querer ser meu dono.
— Não, — falei. — Não vou fazer. Talvez eu esteja simplesmente sendo egoísta e condenando a mim mesma, mas não vou fazer isso. Não acho que estamos exagerando o quanto isso seria ruim para nós, nem um pouco.
— Então ir ao hospital não é uma boa ideia, — Cataliades disse.
— Eu sei, mas tenho que ir, de qualquer jeito.
— Então você pode fazer uma parada ao caminho do aeroporto.
Nós nos sentamos mais retos.
— Há um avião da Anubis saindo em três horas. Irá primeiro para Dallas, e depois Shreveport. A rainha e Stan estão pagando através de esforço comum. Terá sobreviventes de ambas as comitivas no avião. Os cidadãos de Rhodes doaram caixões usados para a viagem. — O Sr. Cataliades franziu a cara, e honestamente, não podia culpá-lo. — Aqui está todo o dinheiro que nós pudemos juntar, — ele continuou, me dando uma pequena pilha de notas. — Cheguem no terminal da Anubis a tempo, e vocês irão para casa conosco. Se vocês não chegarem, assumirei que algo aconteceu pra detê-los e vocês terão que ligar para fazer alguma outra providência. Sabemos que temos uma grande dívida com vocês, mas estamos feridos e devemos chegar em casa por nós mesmos, e os cartões de crédito da rainha e etcetera foram perdidos no incêndio. Terei que ligar para o serviço de emergência da companhia de crédito dela, mas isso não deve demorar muito.
Isto pareceu um pouco frio, mas no fim das contas, ele não era nosso melhor amigo, e como cara diurno da rainha, ele tinha muito que fazer e muito mais problemas para resolver.
— Ok, — eu disse. — Ei, ouça, Christian Baruch está no abrigo?
Seu rosto se intensificou. — Sim. Embora um pouco queimado, ele está passando o tempo com a rainha na ausência de Andre como se tomasse o lugar de Andre.
— Ele quer, você sabe. Ele quer ser o próximo Sr. Rainha da Louisiana.
— Baruch? — Cataliades não poderia ter sido mais desdenhoso se um duende tivesse solicitado o trabalho.
— Não, ele partiu para o extremo. — Já contei ao Andre sobre isso. Agora tinha que explicar outra vez. — Por isso ele plantou aquela bomba Dr Pepper, — disse quase cinco minutos mais tarde.
— Como sabe você isso? — O Sr. Cataliades perguntou.
— Eu calculei, a partir disso e daquilo, — falei modestamente. Suspirei. Cá vinha a parte nojenta. — Encontrei com ele ontem, escondido embaixo do balcão da recepção. Havia outro vampiro com ele, extremamente queimado. Eu nem mesmo sei quem era aquele. E na mesma área estava Todd Donati, o cara da segurança, vivo mas ferido, e uma camareira morta. — Senti o cansaço excessivo em todo o corpo sentindo o cheiro horrível, tentando respirar o ar denso. — Baruch estava fora do prédio, naturalmente.
Não estava exatamente orgulhosa disso, e olhei para baixo para minhas mãos. — De qualquer jeito, eu estava tentando ler a mente de Todd Donati, para descobrir o quanto ele estava ferido, e ele estava simplesmente odiando Baruch e o culpando, também. Ele estava disposto a ser sincero, desta vez. Não tinha mais emprego para se preocupar. Todd me disse que ele tinha assistido repetidamente todas as fitas de segurança novamente, e finalmente entendeu o que ele estava vendo. Seu chefe estava pulando para bloquear a câmara com chiclete assim ele pôde plantar a bomba. Uma vez que ele percebeu aquilo, Donati soube que Baruch quis amedrontar a rainha, fazê-la se sentir insegura, para que ela arranjasse um novo marido. E esse seria Christian Baruch. Mas adivinhe por que ele quer se casar com ela?
— Não posso imaginar, — respondeu Sr. Cataliades, profundamente chocado.
— Porque ele quer abrir um novo hotel vampiro em Nova Orleans. O Blood in the Quarter (sangue no quarteirão) foi inundado e fechou, e Baruch pensou que ele poderia reconstruí-lo e reabrí-lo.
— Mas Baruch não teve qualquer coisa com as outras bombas?
— Eu tenho certeza que não penso assim, Sr. Cataliades. Acredito que foi a Irmandade, como falei ontem.
— Então quem matou os vampiros de Arkansas? — Barry perguntou. — Eu imagino que a Irmandade fez isso, também? Não, espera... por que eles fariam? Não que eles precisem de argumentos para matar alguns vampiros, mas eles sabiam que os vampiros provavelmente seriam mortos na grande explosão.
— Temos uma sobrecarga de vilões, — falei. — Sr. Cataliades, você tem alguma ideia de quem poderia ter matado os vampiros do Arkansas? — Eu dei ao Sr. Cataliades uma encarada diretamente-nos-olhos.
— Não, — Sr. Cataliades respondeu. — Se tivesse, nunca diria essas ideias em voz alta. Acho que você deveria estar se concentrando nos ferimentos do seu homem e em voltar para sua pequena cidade, não se preocupando com três mortes entre tantas.
Eu não estava exatamente preocupada com as mortes dos três vampiros de Arkansas, e me pareceu ser uma ideia realmente boa adotar o conselho do Sr. Cataliades de coração. Tive o momento ímpar para pensar a respeito dos assassinatos, e decidi que a resposta mais simples geralmente era a melhor.
Quem tinha pensado que ela tinha uma boa chance de evitar completamente um julgamento, se Jennifer Cater fosse silenciada?
Quem tinha preparado o terreno para ser permitida a entrada no quarto de Jennifer, por meio de um simples telefonema? Quem tinha tido um tempo muito bom de comunicação telepática com seus subalternos antes dela começar o alvoroço falso de se vestir com luxo para a visita improvisada?
De quem era o guarda-costas que tinha surgido pela porta da escadaria justo quando estávamos saindo da suíte?
Eu sabia, assim como Sr. Cataliades sabia, que Sophie-Anne tinha se assegurado que Sigebert seria admitido para entrar no quarto de Jennifer Cater por ter ligado e dito a Jennifer que ela mesma estava a caminho. Jennifer olharia pelo olho mágico, reconheceria Sigebert, e consideraria que a rainha estava logo atrás dele. Uma vez dentro, Sigebert desembainharia sua espada e mataria todo mundo no local.
Então ele voltaria subindo rapidamente as escadas para aparecer a tempo para escoltar a rainha de volta ao sétimo andar. Ele tinha entrado no quarto de novo para ter uma desculpa para seu cheiro estar no ar.
E naquele momento eu não tinha suspeitado absolutamente de
nada.
Que choque deve ter sido para o Sophie-Anne quando Henrik Feith apareceu vivo; mas então o problema foi solucionado quando ele aceitou sua proteção.
O problema se reafirmou quando alguém o convenceu de acusá-la de qualquer jeito.
E então, espantosamente, problema solucionado outra vez: o pequeno vampiro nervoso foi assassinado diante do tribunal.
— Eu fico pensando como Kyle Perkins foi contratado, — eu disse. — Ele devia saber que estava em uma missão suicida.
— Talvez, — Sr. Cataliades disse cuidadosamente, — ele tinha decidido encontrar o sol de qualquer maneira. Talvez ele estivesse procurando uma forma espetacular e interessante de partir, ganhando um legado financeiro para seus descendentes humanos.
— Parece estranho que eu fosse enviada à procura de informação a respeito dele por um membro de nosso próprio grupo, — falei, minha voz neutra.
— Ah, nem todo mundo precisa saber de tudo, — Sr. Cataliades disse, sua voz também neutra.
Barry podia ouvir meus pensamentos, é obvio, mas ele não estava entendendo o que dizia Sr. Cataliades, o que foi bom. Foi estúpido o que me fazia sentir melhor, Eric e Bill não saberem do jogo sujo da rainha. Não que eles não fossem capazes de fazer suas próprias jogadas sujas, mas não achei que Eric me enviaria numa caçada em círculos nos lugares de prática de arco e flecha onde Kyle Perkins tinha treinado se Eric soubesse que a própria rainha tinha contratado Perkins.
A pobre mulher atrás do balcão tinha morrido porque a rainha não tinha contado à sua mão esquerda o que sua mão direita estava fazendo. E desejei saber o que aconteceu ao humano, aquele que tinha vomitado na cena do assassinato, aquele que tinha sido contratado para levar Sigebert ou Andre à área de tiro... depois que eu ponderadamente deixei uma mensagem para lhes dizer quando Barry e eu voltaríamos para coletar a prova. Eu mesma tinha selado o destino daquela mulher ao deixar aquela mensagem telefônica.
O Sr. Cataliades teve sua partida, apertando nossas mãos com seu sorriso radiante, quase normal. Ele nos encorajou outra vez para chegarmos ao aeroporto.
— Sookie? — Perguntou Barry.
— Sim.
— Eu realmente quero estar nesse avião.
— Eu sei.
— E quanto a você?
— Não acho que eu consiga fazer isso. Sentar no mesmo avião com
eles.
— Todos eles foram feridos, — Barry disse.
— É, mas isso não é troco.
— Você já se encarregou disso, não foi?
Não perguntei o que ele quis dizer. Sabia que ele podia pegar da minha cabeça.
— Tanto quanto eu pude, — eu disse.
— Talvez eu não queira estar no mesmo avião com você, — Barry disse.
Claro que isso doeu, mas eu acho que mereci.
Dei de ombros. — Você tem que decidir isso sozinho. Todos nós temos coisas diferentes com as quais somos capazes de conviver.
Barry considerou isso. — É, — ele disse. — Eu sei. Mas por ora, é melhor que a gente siga caminhos separados, deste ponto. Eu estou saindo para o aeroporto para perambular até que eu possa partir. Você vai para o hospital?
Eu estava muito cautelosa agora para lhe dizer. — Não sei, — respondi. — Mas vou achar um carro ou um ônibus para me levar para casa.
Ele me abraçou, desconsiderando o quanto aborrecido ele estava sobre as escolhas que eu tinha feito. Eu pude sentir o afeto e o pesar em seu coração. O abracei de volta. Ele tinha feito suas próprias escolhas.
Deixei dez dólares para a camareira quando parti a pé cerca de cinco minutos depois que Barry tomou um táxi. Esperei até que eu estivesse a duas quadras do hotel, e então perguntei a um transeunte como chegar ao St. Cosmas (São Cosme). Foi uma longa caminhada de dez quadras, mas o dia estava bonito, fresco e revigorante com um sol brilhante. Me senti bem estar sozinha. Podia estar usando chinelos de borracha, mas estava suficientemente bem vestida, e estava limpa. Comi um cachorro quente a caminho do hospital, um cachorro quente que eu tinha comprado de um vendedor de rua, e isso era uma coisa que eu nunca tinha feito antes. Comprei uma boina de um camelô, também, e enfiei todo meu cabelo embaixo dela. O mesmo cara tinha alguns óculos escuros para vender. Com o céu estando tão brilhante e o vento assobiando do lago, a combinação não parecia tão estranha.
O St. Cosmas era um edifício velho, com montes de ornamentos arquitetônicos no exterior. Era enorme, também. Eu perguntei sobre a condição de Quinn, e uma das mulheres que ficavam no lotado balcão de visitantes disse que não podia me dar essa informação. Mas para ver se ele estava registrado no hospital, ela teve que procurar nos arquivos, e eu arranquei o número do quarto de seus pensamentos. Esperei até que todas as três mulheres estivessem ocupadas com outras consultas, e eu deslizei para o elevador e subi.
Quinn estava no décimo andar. Nunca tinha visto um hospital tão grande, e nunca tinha visto um tão movimentado. Foi fácil andar rápido como se eu tivesse um propósito e soubesse onde estava indo.
Não havia ninguém de guarda do lado de fora de seu quarto.
Bati de leve, e não tinha nenhum som de dentro. Empurrei a porta muito gentilmente e entrei. Quinn estava adormecido na cama, e ele estava ligado a máquinas e tubos. Ele era um metaformo que se curava rápido, então suas lesões deviam ser graves. Sua irmã estava ao seu lado. Sua cabeça enfaixada que estava sustentada em sua mão foi jogada para cima a medida que ela tomou consciência da minha presença. Tirei os óculos escuros e o chapéu.
— Você, — ela disse.
— É, eu, Sookie. Frannie é diminutivo de que, a propósito?
— Na verdade é Francine, mas todo mundo me chama de Frannie. — Ela pareceu mais jovem quando disse isso.
Embora eu estivesse satisfeita pela diminuída na hostilidade, decidi que era melhor ficar do meu lado do quarto.
— Como ele está? — Perguntei, movimentando meu queixo para o homem adormecido.
— Ele acorda e apaga. — Houve um momento de silêncio enquanto ela tomava uma bebida de um copo plástico branco da mesinha de cabeceira. — Quando você o acordou, ele me levantou, — ela disse abruptamente. — Começamos a descer a escada. Mas um pedaço grande do teto caiu em cima dele, e o piso cedeu debaixo de nós e a última coisa que eu soube foi que alguns bombeiros estavam me dizendo que uma mulher louca me encontrou enquanto eu ainda estava viva, e eles me fizeram todo tipo de exames, e Quinn estava me dizendo que ele ia cuidar de mim até que eu ficasse bem. Então me contaram que ele tinha quebrado as duas pernas.
Havia uma cadeira extra, e eu desmoronei em cima dela. Minhas pernas simplesmente não me segurariam. — O que o médico diz?
— Qual deles? — Frannie disse desoladamente.
— Qualquer um. Todos. — Peguei uma das mãos de Quinn. Frannie quase estendeu sua mão como se ela achasse que eu fosse machucá-lo, mas então ela declinou. Peguei a mão que estava livre de tubos, e a segurei por um momento.
— Não podem acreditar o quanto ele já está melhor, — Frannie disse justamente quando eu havia decidido que ela não ia responder. — Na verdade, acham que é algo como um milagre. Agora vamos ter que pagar alguém para tirar seus registros do sistema. — Seu cabelo de raiz escura estava embaraçado, e ela ainda estava suja do lugar da explosão.
— Vá comprar algumas roupas, volte e tome uma ducha, — eu disse. — Eu vou ficar com ele.
— Você é namorada dele mesmo?
— Sim, eu sou.
— Ele disse que você tinha alguns conflitos.
— Eu tenho, mas não com ele.
— Então, ok. Eu vou. Você tem algum dinheiro?
— Não muito, mas aqui está o que eu consigo dispor.
Dei a ela setenta e cinco dólares do dinheiro do Sr. Cataliades.
— Ok, eu posso esticar ele, — ela disse. — Obrigada. — Ela disse sem entusiasmo, mas disse.
Sentei-me no quarto tranquilo e segurei a mão de Quinn por quase uma hora. Nesse tempo, os olhos dele abriram uma vez, registraram minha presença, e fecharam outra vez. Um leve sorriso curvou seus lábios por um momento. Sabia que enquanto ele estivesse dormindo, seu corpo estaria se curando, e quando acordasse, poderia ser capaz de andar novamente. Eu teria achado muito confortante subir nessa cama e me aconchegar com o Quinn por um tempo, mas podia fazer mal para ele se eu fizesse isso; eu podia empurrá-lo com o cotovelo ou algo assim.
Depois de um tempo, comecei a falar com ele. Disse-lhe por que eu acreditava que a bomba tinha sido deixada de lado de fora da porta da rainha, e lhe contei minha teoria a respeito das mortes dos três vampiros do Arkansas. — Você tem que concordar, faz sentido, — falei, e então lhe disse o que pensava a respeito da morte de Henrik Feith e a execução de seu assassino. Contei-lhe sobre a mulher morta na loja. Contei-lhe sobre minhas suspeitas a respeito da explosão.
— Lamento que Jake estivesse com eles, — disse-lhe. — Sei que costumava gostar dele. Mas ele simplesmente não conseguia suportar ser um vampiro. Não sei se ele se aproximou da Irmandade ou a Irmandade se aproximou dele. Eles tinham o cara do computador, aquele que foi tão rude comigo. Penso que ele ligou para um representante de cada grupo para vir pegar uma mala. Alguns deles foram muito espertos ou muito preguiçosos para pegá-las, e alguns deles devolveram as malas quando ninguém as reivindicou. Mas não eu, oh não, eu coloquei a maldita na sala de estar da rainha. — Sacudi minha cabeça. — Acho que não tinha muita gente da equipe envolvida nisso, porque de outra maneira Barry ou eu teríamos percebido algo muito antes do que Barry percebeu.
Então eu dormi por alguns minutos, eu acho, porque Frannie estava ali quando olhei ao redor, e ela estava comendo de um saco do McDonald’s. Ela estava limpa, e seu cabelo estava molhado.
— Você o ama? — Ela perguntou, engolindo Coca-cola por um canudo.
— Muito cedo para dizer.
— Eu terei que levá-lo para casa em Memphis, — ela disse.
— É, eu sei. Eu posso não conseguir vê-lo por um tempo. Eu tenho que conseguir ir para casa, também, de algum jeito.
— A estação Greyhound está a duas quadras daqui.
Estremeci. Uma longa, longa viagem de ônibus não era uma perspectiva que eu pudesse esperar avidamente.
— Ou poderia pegar meu carro, — Frannie disse.
— O quê?
— Bem, chegamos aqui separadamente. Ele dirigiu até aqui com toda aquela parafernália e um trailer, e eu saí apressadamente da casa de minha mãe em meu pequeno carro esportivo. Então há dois automóveis aqui, e só precisamos de um. Vou ter que ir para casa com ele e ficar por um tempo. E você tem que voltar ao trabalho, certo?
— Certo.
— Então, dirija meu carro até sua casa e nós o pegamos quando pudermos.
— Isso é muito legal de sua parte, — falei. Estava surpresa por sua generosidade, porque definitivamente tive a impressão que ela não estava entusiasmada por Quinn ter uma namorada, e ela não estava entusiasmada comigo, especificamente.
— Você parece legal. Você tentou nos tirar dali a tempo. E ele realmente se importa contigo.
— E como você sabe disso?
— Ele me disse.
Ela tinha adquirido parte da sinceridade da família, eu pude perceber.
— Ok, — eu disse. — Em que lugar você estacionou?
EU FIQUEI ATERRORIZADA DURANTE OS DOIS DIAS inteiros de viagem: que eu seria parada e eles não acreditariam que eu tinha recebido permissão para usar o carro, que Frannie mudaria sua opinião e diria à polícia que eu o tinha roubado, que eu teria um acidente e que teria que reembolsar à irmã do Quinn pelo veículo. Frannie tinha um velho Mustang vermelho, e era legal para dirigir. Ninguém me parou. O tempo esteve bom todo o caminho de volta para Louisiana. Eu pensei que veria uma parte da América, mas ao longo da interestadual, tudo parecia o mesmo. Imaginei que em qualquer pequena cidade por onde passei, havia outro Merlotte’s, e talvez outra Sookie.
Eu não dormi bem na viagem, tampouco, porque eu sonhei com o chão tremendo sob os meus pés e no momento terrível que saímos pelo buraco da janela. Ou eu vendo Pam queimando. Ou outras coisas, coisas que eu tinha feito e visto durante as horas que patrulhamos os escombros, procurando por corpos.
Quando eu virei para a minha entrada para carros, havia passado uma semana, meu coração começou a bater como se a casa estivesse esperando por mim. Amelia estava sentada na varanda da frente com uma fita azul brilhante em sua mão, e Bob estava sentado na frente dela, batendo na fita pendurada com uma pata preta. Ela levantou os olhou para ver quem era, e quando me reconheceu atrás do volante, ela pulou. Eu não estacionei nos fundos; eu parei ali mesmo e saltei do banco do motorista. Os braços de Amelia me envolveram como videiras, e ela gritou, — Você está de volta! Oh, Virgem Santa, você está de volta!
Nós dançamos e pulamos para cima e para baixo como adolescentes, gritando de felicidade pura.
— O jornal listou você como uma sobrevivente, — disse ela. — Mas ninguém conseguiu encontrá-la no dia seguinte. Até que você ligasse, eu não tinha certeza se você estava viva.
— É uma história longa, — eu disse. — Uma longa, longa história.
— É o momento certo para contar para mim?
— Talvez depois de alguns dias, — eu disse.
— Tem alguma coisa para levar dentro?
— Nada. Todas as minhas coisas viraram fumaça quando o prédio caiu.
— Oh, meu Deus! Suas roupas novas!
— Bem, pelo menos eu tenho minha carteira de motorista e meu cartão de crédito e meu celular, mas a bateria acabou e não tenho o carregador.
— E um carro novo? — Ela olhou para o Mustang.
— Um carro emprestado.
— Eu não acho que tenha um único amigo que iria me emprestar um carro inteiro.
— Metade de um carro? — Eu perguntei, e ela riu.
— Adivinha só? — Disse Amelia. — Seus amigos se casaram.
Parei de repente. — Que amigos? — Certamente ela não poderia querer dizer do casamento duplo dos Bellefleur; seguramente eles não teriam mudado a data mais uma vez.
— Oh, eu não deveria ter dito nada, — disse Amelia, parecendo culpada. — Bem, falando no diabo!
Havia outro carro chegando parando exatamente perto do Mustang vermelho.
Tara saiu. — Eu vi você dirigindo perto da loja, — disse ela. — Eu quase não te reconheci no carro novo.
— Emprestado de uma amiga, — eu disse, olhando para ela com desconfiança.
— Você não contou para ela, Amelia Broadway! — Tara estava puramente indignada.
— Eu não contei, — disse Amelia. — Eu comecei, mas parei na hora!
— Me contar o quê?
— Sookie, eu sei que isso vai parecer uma loucura, — disse Tara, e eu senti minhas sobrancelhas se unirem. — Enquanto você esteve viajando, tudo se encaixou de uma maneira estranha, como algo que eu soubesse que deveria acontecer, sabe?
Eu balancei minha cabeça. Eu não sabia.
— JB e eu nos casamos! — Disse Tara, e a expressão em seu rosto estava cheio de tantas coisas: ansiedade, esperança, culpa, espanto.
Passei essa frase incrível pela minha cabeça várias vezes antes que eu tivesse certeza de ter entendido o significado dela. — Você e JB? Marido e mulher? — Eu disse.
— Eu sei, eu sei, parece talvez um pouco estranho...
— Parece perfeito, — eu disse com toda a sinceridade que eu podia reunir. Eu não tinha certeza de como me sentia, mas eu devia a minha amiga o rosto feliz e a voz alegre que eu ofereci para ela. No momento, esta era a coisa real; presas de vampiros e sangue sob os holofotes brilhantes pareciam sonho, ou uma cena de um filme que eu não tinha apreciado muito. — Estou tão feliz por vocês. O que vocês precisam como presente de casamento?
— Apenas sua benção, colocamos o anúncio no jornal de ontem, — disse ela, falando num fluxo borbulhante como um riacho feliz. — E o telefone simplesmente não parou de tocar na parede desde então. As pessoas são tão agradáveis!
Ela realmente acreditava que tinha varrido todas as suas más lembranças em um canto. Ela estava disposta a dar crédito ao mundo com benevolência.
Gostaria de tentar isso, também. Eu faria o meu melhor para abafar a memória daquele momento quando eu olhei para trás para ver Quinn arrastar a si mesmo para frente em seus cotovelos. Ele alcançou Andre, que jazia mudo e ferido. Quinn se apoiou em um cotovelo, estendeu sua outra mão, agarrou o pedaço de madeira encostado na perna de Andre e o pressionou dentro do peito dele. E, inesperadamente, a vida longa de Andre acabou.
Ele fez isso por mim.
Como eu poderia ser a mesma pessoa? Eu me perguntava. Como eu poderia estar feliz que Tara havia se casado e ainda lembrar uma coisa dessas - não com horror, mas com uma sensação de prazer selvagem? Eu queria Andre morto, tanto quanto eu queria que Tara encontrasse alguém para viver que nunca iria importuná-la por seu passado terrível, alguém que iria cuidar dela e ser doce com ela. E JB faria isso. Ele pode não ser algo fora de comum numa conversa intelectual, mas Tara pareceu ter feito as pazes com isso.
Teoricamente, então, fiquei muito contente e esperançosa por meus dois amigos. Mas eu não conseguia sentir. Eu tinha visto coisas horríveis, e sentido coisas horríveis. Agora eu me sentia como duas pessoas diferentes tentando existir dentro do mesmo espaço.
Se eu ficar afastada dos vampiros por um tempo, disse para mim mesma, sorrindo e acenando o tempo todo enquanto Tara falava e Amelia dava tapinhas no meu ombro ou no braço. Se eu rezar toda noite e permanecer com os humanos, e deixar os metamorfos sozinhos, eu ficarei bem.
Abracei Tara, apertando até que ela chiou.
— O que disseram os pais de JB? — Eu perguntei. — Onde você conseguiu a autorização? No Arkansas?
Quando Tara começou a me contar tudo a respeito, eu pisquei para Amelia, que piscou de volta e me abaixei para pegar Bob dos braços dela. Bob pestanejou quando ele olhou no meu rosto, e ele esfregou sua cabeça contra meus dedos oferecidos e ronronou. Entramos com o sol brilhante sobre as nossas costas e nossas sombras precedendo na velha casa.
Charleine Harris
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