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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


ALUGA-SE UM NAMORADO / Josiane da Veiga
ALUGA-SE UM NAMORADO / Josiane da Veiga

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

Biblio VT

 

 

 

 

Anne Ryle acreditava em contos de fadas. Na verdade, durante toda a sua vida preparou-se para um casamento dos sonhos com o rapaz que sempre amou. Contudo, o noivo a deixou às vésperas do casamento para ficar com sua própria irmã.
Duplamente traída, Anne focou-se na carreira e prometeu jamais amar alguém novamente. Mas, não era seu desejo que a família soubesse o quanto ela era solitária e derrotada.
Assim, quando foi convidada para um encontro familiar onde veria o antigo noivo com sua irmã, planejou atentamente um plano para proteger seu orgulho ferido.
E para isso, ela só precisava de um namorado... Mas, nada a preparou para alguém como Alexander.

 


 


Anne

Lady Gaga disse, certa vez, em uma entrevista, que há dois tipos de mulheres. Aquelas que optam por um homem e aquelas que optam por uma carreira. Ambas podem ser felizes em suas escolhas, mas as que escolhem o trabalho não correm o risco de acordar de manhã e ouvir o trabalho a lhes dizer que não as ama mais.

Essa mensagem sempre me marcou. Talvez por conta dela, eu sempre foquei bastante no meu ofício. Contudo, sempre chega o momento na vida de uma mulher que ela precisa dar uma guinada de 180 graus e ir atrás de outra coisa.

Minha hora chegou.

A sala da minha melhor amiga, Mary Scott, ficava no décimo andar daquele arranha-céu no centro de Nova York. Ela observou minha presença e ergueu uma das suas destacadas sobrancelhas, com o olhar interrogativo.

— Ok, Mary — declarei, enquanto caminhava em passos nervosos pela sala. — Você sabe onde eu posso arrumar um homem bem gostosão para o final de semana?

— Querida, se eu soubesse de algo assim, você acha que eu mesma não estaria ansiosa para o final de semana?

Houve um risinho no fundo da sala. Joseane, a secretária jovial de Mary, aproximou-se da mesa carregada de papeis.

— Para quê você quer um gostosão, Anne? — ela indagou.

Era uma boa pergunta. Mas, era tola, na mesma medida. Que mulher não precisa de um gostosão?

Suspirei, resignada. A vida não era fácil, ao menos não a minha. Meus amores haviam sido uma junção de desastres desde sempre, e estava cansada de ser tratada como uma coitada pela família.

Meus pais eram tradicionais e davam muita importância ao fato de uma mulher ter um homem. Mamãe cochichava (às vezes na minha presença) sobre como era triste que a filha mais velha não conseguisse ninguém. Meu pai culpava minha profissão.

“ Que homem vai querer uma mulher tão focada no direito criminal? Você, ao menos, devia pôr um vestido! ”.

E era isso. Todos pareciam se esquecer de que, sim, eu havia tido um grande amor. Havia conhecido Scott na faculdade, e acreditei fielmente que nos casaríamos e teríamos uma casa com cerca branca, três filhos e um cachorro.

Fui tola o suficiente para não perceber sua aproximação com Alana, a forma como se observavam e como ele sempre preferia estar ao lado de minha irmã.

Sim, Alana é minha irmã e destruiu meus sonhos.

Quando Scott me pediu em casamento, chorei de alegria. Não sabia que havia sido apenas para provocar Alana, para fazê-la sair da relação secreta que eles haviam iniciado tão logo eu o apresentei a família. Poucos dias antes do casamento, Scott acabou com tudo e assumiu seu amor pela minha irmã caçula.

A família não pareceu chocada. Ora, Alana era mais bonita, mais gentil, mais feminina. Alana era a filha preferida, o orgulho de todos.

“ Você tem que aceitar que a vida não é como sonha, Anne ”, mamãe decretou quando me viu aos prantos.

E então afundei-me no seu ofício para esquecer o quanto estava ferida e machucada. E tudo estava bem até meu pai enviar um e-mail informando do aniversário de vovó Gerda (única pessoa da família que se mostrou piedosa comigo). Vovó completaria oitenta anos no domingo e a família programou-se para acampar próximo de uma floresta, em um resort .

O lugar era belíssimo, cheio de choupanas, um lago com água cristalina, um verdadeiro paraíso na terra. Todavia, imaginei o inferno, sendo julgada e apontada por todos como a preterida. Soube de imediato que não poderia ir ao evento sem um acompanhante. Os olhares dos tios e dos primos, o deboche descarado nos olhos de Alana, e a vergonha nutrida desde sempre pelos meus pais iriam derrubar-me novamente, e eu nem tinha certeza se já havia conseguido superar o evento. Mesmo que já houvessem se passado meses, aquela lembrança embaraçosa – de quando Alana e Scott se assumiram e mamãe os abraçou como se a filha mais velha não existisse – ainda doía como uma bofetada no meu rosto.

— Você já tentou o Tinder? — Joseane indagou.

— Não acho que seja adequado perguntar a um homem que acabei de conhecer se ele quer ir passar o final de semana com a minha família. Preciso de algo mais prático.

— Um prostituto?

Céus, era isso! Alguém que não faria perguntas, que poderia fingir sobre amor, que poderia mentir sobre ser rico e poderoso e que eu poderia esfregar na cara de todo mundo.

Contudo, não era ligada a esse mundo, então não sabia exatamente como encontrar um homem daqueles.

— Onde se acha um garoto de programa?

— É sério que você está fazendo essa pergunta? — Mary pareceu assombrada.

— Na internet tem vários sites especializados em acompanhantes — Joseane respondeu.

— Como você sabe? — Mary insistiu.

A mais jovem deu os ombros e assustou-me com a velocidade com que meus problemas estavam sendo resolvidos. Ora, verdadeiramente, não era tão difícil se você realmente se propusesse a isso. E tivesse dinheiro para tal. Por sorte – e desespero – estava disposta.

— Você não precisa fazer isso, Anne — Mary se ergueu e andou na minha direção. — Sua família não te apoiou no pior momento, por que insiste em tentar a aprovação deles?

— Eu poderia não ir — admiti. — Mas, vovó Gerda foi a única pessoa da família a ficar do meu lado. Eu não gostaria de faltar ao aniversário dela. E ir sozinha será apenas para ouvir comentários sobre o quanto sou um fracasso.

— Você não é um fracasso. É a melhor criminalista que eu já conheci.

— O que importa o sucesso nos negócios? Alana nem terminou a faculdade, nunca teve um emprego, e mesmo assim meus pais a veem como um exemplo a ser seguido, unicamente porque está noiva de Scott, que é rico.

Joseane aproximou-se de nós.

— Olhe! — me mostrou a tela do seu celular. — Esse aplicativo é de um serviço de acompanhantes.

Eu passei os olhos na tela e vi uma infinidade de perfis de homens agradáveis.

Peguei meu próprio celular e comecei a baixar o aplicativo.

— Um cara para fingir ser meu namorado num final de semana... Será que ficaria muito caro? — meus pensamentos giravam.

— Bom, normalmente prostitutos cobram por hora, então você teria que pagar quarenta e oito horas. — Joseane olhou a taxa de um deles. — Oh, normalmente eles cobram cinquenta dólares por hora.

— Mais de dois mil dólares só pra agradar sua família, Anne — Mary reclamou. — Isso é ridículo!

Obviamente, era uma loucura. Mas, estava movida pelo desespero. Enfim, o celular avisou que o aplicativo estava instalado, e comecei a fazer o registro sem pensar direito.

— Anne, e se o cara for um golpista?

— O site analisa os antecedentes criminais, e o pagamento é efetuado ao site, que depois o repassa aos garotos de programa. Praticamente um Uber — Joseane destacou.

— Um Uber? — Mary ergueu as mãos para o céu, pasma. — Como você sabe tudo isso? — Mary insistiu. — Oh, céus, você usa esse aplicativo?

— É bem melhor que ter um namorado de verdade. — A outra se defendeu. — Meu último namorado já andava soltando pums na minha frente. E esses caras são demais, são lindos, gentis, te tratam como uma princesa e você não precisa cuidar deles como uma mãe. Cada hora é muito bem aproveitada. Eu recomendo.

Eu observei ambas e senti-me em meio a um impasse. Sim, era complicado. Pagar para ter alguém ao lado era o mesmo que decretar meu fracasso absoluto. Mas, ao mesmo tempo, poderia ser a resposta as minhas preces. Sem apegos emocionais, e tudo feito com profissionalismo.

E havia o bônus de não ter que me preocupar com sentimentos complicados ou bagunçados de um relacionamento real. Uma vez que ele cumprisse sua parte no trato, seguiria por um caminho separado do meu.

— Que se foda — digitei os dados do meu cartão de crédito. — Eu vou tentar.


Havia uma infinidade de termos e condições que eu quase aceitei sem ler. Contudo, pela primeira vez na vida, decidi dar uma olhadinha antes de clicar automaticamente no botão abaixo.

Eu havia voltado para minha sala e agora estava sozinha, ainda analisando aquele passo complicado que iria dar.

Ok, os “ Garotos de York ” mantinha um cadastro de homens de idades variadas dispostos a atenderem outros homens ou mulheres que quisessem pagar. Alguns tinham restrições no sexo, ou a determinados lugares, mas isso estaria destacado no perfil de cada um. A lista seria enviada pelo aplicativo tão logo você pagasse a taxa de inscrição (seus dados seriam mantidos em sigilo, então não havia como alguém souber que você contratava um prostituto!), e após escolher o cara, optaria pelas datas e poderia até ter dois encontros (sem sexo) para se conhecerem melhor, sem custos.

O sistema garantia que todos os homens passavam por uma rigorosa checagem antes de serem aprovados, e uma vez que encontrasse alguém que achasse compatível com o que precisava, bastava selecionar o perfil e clicar em “ contratar ”.

Ok, eu precisava de uma bebida. Busquei uma garrafa de vodka que eu deixava escondida na minha escrivaninha para momentos como aquele – ou quando eu perdia uma questão judiciária – e bebi um gole antes de aceitar.

Logo a tela mostrou um “ Iniciar ” onde eu colocaria minhas informações básicas juntamente com uma foto de perfil (ah, os garotos não eram obrigados a aceitar algum cliente que, porventura, fosse feio demais!).

Bom, que se foda!

Enviei uma foto recente e depois coloquei algumas das minhas características. Cabelos castanhos claros, olhos azuis, um metro e setenta, setenta quilos (é, não sou exatamente uma modelo!), sardas... Defeitos? Será que “ minha família me odeia ” serve?
Cliquei em avançar.

“ O que você busca em um homem ”?

Havia alternativas a serem escolhidas. A primeira optada por mim foi “sigilo”, pois não queria que ninguém soubesse que meu lindo namorado era um prostituto que eu pagava para ter. Autoconfiança foi à segunda escolha, porque o cara tinha que ser convincente o suficiente para conseguir manter aquela farsa.

Tomei outro gole da bebida.

Calmo. Gentil. Engraçado.

Pronto. Era isso. Ignorei as demais opções como “ tamanho do pênis ” ou “ preferência por curvatura ” e prossegui no avançar.

Logo o sistema começou a buscar por parceiros dentro dos meus padrões.

Subitamente, meus olhos bateram no homem perfeito.

Alexander Vicent.

Ele era lindo. Mesmo. E, nem de longe, parecia um garoto de programa. Era maduro, provavelmente uns trinta e cinco anos, vestia um terno com bom corte, seu rosto era escurecido por uma barba rasa, bem cuidada. Seus olhos verdes eram inebriantes, e havia a descrição que me fez ter certeza que ele era o cara certo.

“ Eu sou o seu cara. E vou assumir qualquer papel que você precisar. Nunca mais se sinta solitária em uma festa de casamento. Nunca mais se preocupe com chefes molestadores. Eu posso deixar qualquer homem impressionado com meu físico e personalidade, e qualquer mulher ciumenta porque você me tem. Você será minha gatinha protegida. Interpreto quem você quiser para sua família e amigos. Não espere mais. Eu vou te fazer feliz ”.

Pronto. Era ele.

Mamãe e Alana, vocês irão se corroer quando eu aparecer com esse gostosão no encontro familiar. Scott, nem de longe, é tão bonito.

Beijei a foto do celular. Oh, ele até aparentava ser rico. Que profissão eu poderia dar para ele? CEO, isso! CEOs estavam na moda!

Cliquei em contratar.

E que os jogos comecem!

 

Alexander

 

 

A ugust estava sentado em um canto do meu escritório, aguardando eu digitar um documento oficial que precisava entregar para a secretária dar início a uma nova aquisição das empresas Vicent.

Eu percebia o risinho debochado dele, mas não podia realmente prestar atenção. Desde que se casou com Kelly Smith, ele passou a viver com um sorriso estampado no rosto, o que era até estranho para alguém como ele, um nerd que vivia de cara amarrada na escola.

— E como está seu novo projeto? — indaguei, tentando fazê-lo parar de rir.

— Sou cafetão virtual.

August era programador e eu sabia que criava aplicativos funcionais, mas aquela frase me fez, subitamente, parar de digitar e encará-lo.

— O quê?

— Imagine, Alexander, você tendo uns trinta e cinco anos.

— Eu tenho trinta e cinco anos.

— Mas, não como um homem de sucesso nos negócios, e sim como uma mulher sem grandes expectativas. Então, achar um cara legal que não goste de outros caras legais não é fácil, não é? Mas, e se você puder pagar por alguém que possa desempenhar a função de lhe dar carinho e satisfação?

— Um prostituto? — indaguei, não conseguindo acreditar naquilo.

— Um cortesão.

— Você sabe que isso é crime, não é?

— Não, tudo legal, dentro da lei. Todos os contratantes e contratados são maiores de idade, e assinam um termo de compromisso, enfim... Não precisa se preocupar com nada.

Dei os ombros.

— Não estou preocupado. Se estiver se metendo numa enrascada é problema seu.

E lá estava ele. Aquele sorriso que parecia dizer muito, mas ao mesmo tempo escondia demais.

— O quê? — reclamei.

— Nada não.

— Como “nada não”? Por que está me olhando assim?

— Ok... Seguinte — August se levantou e aproximou-se da minha mesa. — Você sabe, eu precisava que esse novo aplicativo fosse um sucesso, porque uma vida nova ao lado de Kelly está gerando custos, e tinha as dívidas do casamento... Enfim, para conseguir isso, carecia de um rosto marcante, bonito...

Ele nem precisava me explicar o resto.

— Você criou um perfil para mim, não é?

— Você é o cara mais charmoso que conheço.

— E sou presidente dessa corporação! — ralhei. — Você ficou louco?

— Se alguém de fora descobrir, diga que é um perfil fake...

— É um perfil fake!

Eu não estava acreditando naquilo. Mas, nem conseguia ficar zangado com August porque éramos amigos desde o ginásio e fazer algo daquele tipo era bem o estilo dele.

— Não quero ser chato, mas você recebeu várias propostas — August riu. — Até de homens...

— Isso é para eu me sentir melhor?

— Tem gente que ofereceu pagar o triplo da taxa normal...

Ergui-me da cadeira e me aproximei de August, buscando seu celular. Ele fugiu com o aparelho nas mãos.

— Apague esse perfil agora!

Subitamente, August parou no meio da sala.

— Oh.

Oh ? Que porra era aquela?

— O que você fez?

— Sem querer aceitei a proposta de uma mulher — ele murmurou. — Eu iria clicar em recusar, mas você me fez correr — tentou me transferir a culpa.

— Para começar, nem devia ter me colocado nesse negócio!

O olhar de August parecia desesperado.

— Ela pagou a taxa de inscrição, Alex — ele murmurou. — Se você não for ao encontro dela, terei problemas com a loja que vende o aplicativo.

— Isso não é problema meu!

— Por favor... Eu sei que é pedir demais, mas... Cara, eu não posso perder esse trabalho. Kelly reformou todo o apartamento... Estou quase falido.

A minha vontade era de dar um tiro em August, mas lembrei-me de todas as vezes que ele me socorreu durante nossa adolescência complicada. Puxei o telefone de suas mãos e observei o perfil da mulher. Era até bonita, aparentava ter trinta anos, cabelos castanhos, um corpo mais ou menos, nada excepcional, mas também nada que remetia a necessidade de pagar para ter um homem.

— Eu não vou dormir com uma mulher por dinheiro.

— O contrato diz que vocês podem ter dois encontros gratuitos e daí pode cancelar o sexo, caso seja da vontade de um de vocês.

Devolvi o celular para August.

— Você me deve uma — decretei. — Peça para ela me encontrar na cafeteria da quinta avenida. Vou ao encontro, mas não espere nada além disso, entendeu?

Outro risinho. O que podia ser tão engraçado naquela situação patética?

— Já pensou se você a encontrar e descobrir que ela é a mulher da sua vida?

— Sim, depois iremos cavalgar pelas ruas num unicórnio — ironizei. — Estou em meio de negócios importantes e tudo que não preciso agora é de uma desesperada por sexo.

— Talvez ela seja apenas uma boa pessoa que não deu certo em relacionamentos. Além disso, para que ser tão ranzinza? Você irá tomar café com uma mulher bonita. Há destinos piores.


Nós trocamos uma única mensagem desde que confirmamos o encontro. Nela, eu indiquei o horário e o local e ela concordou. Oito horas, numa cafeteria na Quinta Avenida, em diagonal com Metropolitan . Cheguei um pouco mais cedo, um tanto porque estava ansioso para resolver isso, um tanto porque gostava do café daquele lugar.

Forte, doce e quente.

Sentei-me numa mesa com a visão da entrada. Eu não queria ter surpresas. Não sabia se aquela foto de Anne Ryle (sim, eu confirmei o nome e sobrenome com August, depois) era recente. E, se era, não podia evitar a curiosidade em saber por que uma mulher como ela precisava pagar por um cara.

Sim, eu era um pouco machista. Eu entendia que alguns de nós, homens, precisávamos de dinheiro para sexo, devido a uma infinidade de motivos. Mas, uma mulher? Ainda mais uma não feia? Aquilo era bem estranho.

Cinco para as oito ela entrou no ambiente. Eu gostei daquela primeira impressão. Não a de seu rosto agradável, mas a de ser cuidadosa com o horário. Eu tinha minhas manias. Atrasos eram vistos por mim como desatenção e defeito.

Ela olhou ao redor do café. O cabelo castanho claro, com algumas luzes douradas, pareceu iluminar com o movimento de sua cabeça. Meus olhos baixaram, analisando seu corpo bonito – não magra como as modelos que eu costumava sair, mas bonito – e a curva generosa de seus seios.

Ok. August estava certo. Havia destinos piores do que tomar café da manhã com uma mulher bonita...

De súbito, seus olhos capturaram os meus. Senti algo estranho diante do olhar forte e enigmático daquela mulher. Ergui-me, estendendo a mão para ela.

Percebi que era determinada pela maneira como me cumprimentou.

— Aceita um expresso? — indaguei.

— Por favor — ela concordou, sentando-se.

Sentei de frente a ela.

— Anne Ryle — murmurei. — Você é exatamente como na foto.

— Alexander Vicent — ela também disse meu nome completo. Se era um desafio, estava encarando-o. — Para minha felicidade, você também.

A garçonete chegou com o café. Eu entreguei a ela alguns dólares.

— Eu não devia estar pagando? — Anne murmurou. — Pois, sou a cliente...

— Que amante deixaria a mulher pagar a conta? — eu murmurei, sedutor.

Porra, eu estava flertando! Não sei porque, mas estava. Eu tinha vários problemas para resolver no escritório e não estava a fim de me envolver com nada complicado, mas alguma coisa naquela mulher me chamou muito a atenção.

— Eu não te contratei ainda — ela devolveu. — Tenho dois encontros para decidir se quero.

Eu ri, baixo. Não esperava que Anne Ryle fosse assim, tão genuína.

— Isso é incontestável — assumi. — Então preciso impressionar você. Isso inclui pagar o café.

Ela bebeu um gole. Seus lábios ficaram úmidos. Era uma cena extremamente encantadora e sensual.

— Então — pigarreei antes de continuar —, preciso perguntar: por que uma mulher como você precisa contratar um — tossi levemente e depois murmurei: — cortesão?

 

 

 

Anne

 


O k, ele era ainda mais bonito que nas fotos. Enquanto bebia o café, tentava me recuperar da visão estonteante dos seus olhos marcantes, do sorriso sedutor e da forma como seu tom denotava um flerte.

Eu pigarrei tentando manter-me no controle. Aquilo era um acordo comercial, e exigia de mim a máxima atenção. Eu não podia me sentir atraída por um prostituto, não é? Era tão ridículo! Eu estava pagando para aquele homem estar ali comigo.

— Então, Alexander — murmurei. — Vou ser direta e franca. Você é minha primeira transação nesse negócio. Eu não costumo encontrar homens por aplicativo.

Seus olhos brilhavam por cima da borda da xícara enquanto tomava um gole de café. Havia em mim uma estranha sensação de que ele gostara de saber daquilo.

— Bom, eu também não costumo encontrar mulheres por aplicativo.

Minha boca abriu, incrédula.

— Mas, seu perfil é um dos mais acessados.

— Que sorte a minha — ele ironizou. — Você é a primeira que aceito um encontro.

Por quê? Eu queria indagar aquilo, mas subitamente percebi que não tinha esse direito. Tudo indicava que Alexander precisava de dinheiro, e por isso aceitou.

— Você ainda não me respondeu — ele comentou. — Por que precisou do aplicativo para encontrar um cara?

A maneira como ele indagava isso era como se dissesse “ você é linda demais para algo assim ” e eu não pude reprimir o rubor diante do elogio. Céus, que homem charmoso, de personalidade marcante. Ele era exatamente o tipo de cara que eu sempre quis: bonito, de bom humor, gentil e atencioso. Ou talvez tudo isso fosse apenas uma encenação para que eu aceitasse seu preço.

— Bom, como eu disse, vou ser direta até porque preciso deixar claro o papel que precisará cumprir nesse acordo. — declarei. — Eu era noiva de um cara, Scott. Enfim, achei que era o homem da minha vida. Para encurtar a história, alguns dias antes do casamento, ele terminou comigo e assumiu seu relacionamento com minha irmã. A família toda a acha perfeita, feminina... E eu super esquisita porque decidi ter uma carreira e ter sonhos próprios aquém de cuidar de uma casa e de um marido. Enfim, minha avó estará de aniversário no final de semana, e eu devo comparecer, porque ela foi à única pessoa a ficar ao meu lado no pior momento. Contudo...

— Sua irmã e seu ex estarão lá — ele completou.

— Exatamente.

— E você vai aparecer com um cara que eles nunca ouviram falar?

— Na verdade, pretendo dizer que estamos juntos há alguns meses e que eu deixei para apresentá-lo no evento, enfim... Eu preciso que você seja mais impressionante que Scott porque eu quero ver a cara da minha mãe e da minha irmã arrastada no chão.

Ele riu diante da minha franqueza.

— Eu imagino que não foi fácil para você — ele murmurou.

— Não — neguei. — Foi pior. Eu estava sendo traída pelas duas pessoas que eu amava, e ninguém se importou. Meus pais até deram um jantar em homenagem ao novo casal. Não sei... Talvez eu seja adotada... — Céus, eu iria chorar na frente dele? — Foi completamente humilhante. E eu tenho certeza que esse final de semana será carregado de piadinhas dissimuladas. Se eu for sozinha, talvez não sobreviva — admiti. — Eu não vou aguentar passar por tudo novamente.

Eu estava sendo completamente séria e sincera. Precisava que ele entendesse bem onde estava se envolvendo. Não me importava com nada além de sua representação. Havia um orgulho ferido em jogo.

Esfreguei as palmas das mãos na minha calça social, não conseguindo esconder meu estado nervoso.

Eu sabia o que ele estava pensando. Eu era deprimente. Uma vergonha. Uma mulher com quase trinta anos ainda tentando ter um pouco de alento da família. Mary estava certa, eles nunca me apoiaram e eu ainda rastejava atrás deles.

— Você ainda gosta desse cara?

— Cara?

— O tal Scott?

Balancei a cabeça, confusa com o fato de ele parecer genuinamente interessado na resposta.

— Não. A dor que eu sinto não é amor reprimido, é raiva. E tudo que eu quero é acabar com aqueles olhares de deboche na minha direção. Por isso, vamos interpretar o casal feliz por alguns dias e, quando voltarmos, a transação estará concluída e poderemos seguir caminhos separados.

— Alguns dias? — Suas sobrancelhas se levantaram em surpresa. — Então, você quer me contratar por mais do que algumas horas.

— Sim. Por todo o final de semana.

Seria um preço alto a se pagar. Mas, ainda mais alto era ir sozinha aquele encontro familiar. Além disso, gostei de Alexander. Ele parecia estar perto psicologicamente. Não parecia me julgar com o olhar, e não havia nenhuma tensão estranha pairando entre nós enquanto conversávamos.

Ele parecia pensar e eu fiquei nervosa.

— Você aceita? — indaguei.

— Estou envolvido em outro trabalho importante — murmurou.

Seria alguma outra cliente fixa?

— Mas eu acho que está tudo bem sendo num final de semana. E onde seria?

— Não longe de Nova York. Duas horas de carro. Nas montanhas. É um resort com cabanas e tal... Nós vamos ter que dividir uma cama — expliquei, de cara. Não queria que aquilo fosse um processo difícil, depois. — Eu pedi um quarto de casal.

O que havia naqueles olhos que me deixaram em estado de alerta?

— Espero que você não considere isso um problema.

— Oh, não — negou, de imediato. Havia um sorriso camuflado em seus lábios másculos. — Eu realmente acho que vou conseguir fazer isso funcionar.

Assenti. Depois, busquei minha bolsa que estava colocada na mesa.

— Eu preciso atender um cliente às nove — expliquei. — Sou advogada — contei. — Então, vou apenas esperar sua confirmação no aplicativo. Claro, se essa for a sua vontade. Sei que não é obrigado.

Nos erguemos. Conforme ia me dando conta de que teria aquele homem na minha cama no próximo final de semana, meus seios começaram a formigar. Eu tentei não exalar um suspiro, mas minhas coxas estavam em brasas.

Ele era muito atraente!

E, caso aceitasse, seria completamente meu por quarenta e oito horas.

— Então, você tem algum trabalho além desse? — indaguei, conforme íamos saindo da cafeteria.

Era como se eu não quisesse que o assunto morresse.

— Sou CEO de uma construtora.

Eu ri.

— Era exatamente o que eu iria pedir para você dizer no final de semana.

— Mesmo?

— Sim... Mas, sério... Você tem alguma ocupação além de garoto de... você sabe...?

Ele arqueou as sobrancelhas.

— Eu sou motorista de um CEO — disse, rapidamente. — Ganho pouco, mas gosto de dirigir.

— Oh, então será mais fácil interpretar um CEO já que conhece um pessoalmente — indiquei.

Ele assentiu. Havia um lampejo de humor iluminando seus olhos verdes.

— Pode ter certeza que eu sei interpretar um CEO.

Ele inclinou-se para mais perto, a fim de me dar um abraço de despedida. Sua colônia era forte e amadeirada. Aquilo aguçava muito meu lado feminino.

Ok, ele era profissional. Ele sabia como despertar uma mulher. Seu sorriso lento e satisfeito parecia uma carícia física e claramente solidificou que não havia nada de fingido ou falso sobre a química latente que se instaurou entre nós. Conforme íamos nos afastando, tive a precisa certeza que de ele era o homem certo. Ele daria a aparência realista de um relacionamento apaixonado que eu precisava.

— Eu vou entrar em contato, Anne Ryle — avisou, sua voz profunda e rouca.

Então cada um de nós passou a andar por um lado. Eu sentia os batimentos fortes do meu coração e sabia que poucos homens haviam me despertado tanto assim.

Ele era incrível...

Subitamente, meu celular vibrou. Percebi que era uma mensagem de texto dele. Cliquei para ler, ansiosa para saber se era a confirmação do nosso acordo.

“ Eu queria que você soubesse... Você é linda de frente, mas sua bunda é algo do outro mundo!”.

Sem, entender porque, comecei a rir. Esse tipo de humor sem receios era bem típico do homem que eu precisava.

 

 


Alexander

 

E ntrei no escritório com um sorriso alegre no rosto. Fazia muito tempo que eu não tinha uma manhã tão satisfatória. Minha secretária, Sonia, não escondeu a surpresa.

Ela arqueou uma sobrancelha na minha direção enquanto me entregava os recados da manhã e as anotações da agenda.

— Alguém teve uma boa noite — ela brincou.

Era minha amiga, tinha muitas liberdades.

— Não do jeito que pensa — devolvi. — Mas, sim, tive um bom momento. Não à noite, mas nessa manhã.

— É mesmo? — pareceu mais interessada. — Quem é a vítima dessa vez?

— Não é uma vítima — ri. — Por que você sempre trata as mulheres com quem saio dessa forma?

— Porque todas sofrem por sua causa — devolveu.

Eu arqueei as sobrancelhas, pensando naquilo. Era verdade que eu gostava de jogos. Costumava escolher uma modelo ou atriz do momento para “ brincar ”. E isso consistia em levar a tal pessoa para a cama. Normalmente perdia a graça depois de eu conseguir tais favores.

Todavia, aquele caso era completamente diferente. Anne era diferente.

Desviei os pensamentos, olhando para os recados que Sonia me repassou, priorizando as mensagens por importância.

— Sendo esse monstro que você aponta, acha que se eu encontrasse uma mulher precisando de ajuda, e eu a ajudasse, estaria pagando um pouco das minhas dividas com a nação feminina?

— Talvez — ela respondeu. — Ela te atrai? Se sim, a resposta é não.

Gargalhei, enquanto girava em direção ao meu escritório.

Anne me atraía? Era uma questão prática, afinal de contas. A foto e o perfil que vi no aplicativo não, de forma alguma. Mas, quando a vi pessoalmente, o olhar determinado e corajoso... Oh, sim, eu balancei.

E depois, quando dei um abraço de despedida... Não, não teve nenhuma conotação sexual no ato, mas o cheiro doce dela, o perfume delicado... Quando ela girou na direção oposta, eu não consegui desviar o olhar do seu belo traseiro.

Por isso mandei aquela mensagem. Pus um emoticon de sorriso no final, para ela não se amedrontar ou achar que estava sendo um tarado. Apenas, queria deixar claro que havia ocorrido uma conexão. E se eu pudesse usufruir dela no final da semana, aquilo seria maravilhoso.

Ser um namorado... Nunca me aconteceu.

Nunca tive um relacionamento. Sempre sexo fácil e rápido. Coisa de uma noite. Mas, com Anne eu teria um encontro familiar e histórias – mesmo inverídicas – para contar.

— Alex! — Sonia disse, alto.

Voltei para ela.

— Oi?

— Estou falando com você desde que saiu da minha mesa — ela riu. — Céus, você estava no mundo da lua... Quem é essa mulher que te fez ficar assim, hem?

— Não pense besteiras — devolvi. — Só estou pensando nos negócios.

— Se você diz — ela cantarolou. — Só para informar, o pessoal do hospital ligou. Parece que Lucy teve alguma melhora.

O telefone na mesa de Sonia tocou. Ela desviou seu olhar de mim e eu pude adentrar meu escritório e fechar a porta. Antes, anotei mentalmente a mensagem de que devia ligar para o hospital assim que resolvesse outra pendência.

Tão logo me vi só, busquei meu celular e disquei um número conhecido.

— Então — a voz masculina do outro lado da linha me atendeu rapidamente. —, como foi? Quer eu clique em “ recusar proposta ” agora? — August indagou. — Você não magoou a garota, não é?

— Não, eu...

Eu podia dizer agora para August que ele poderia recusar o pedido, da mesma forma que eu podia ter dito a verdade para Anne. Eu era realmente um CEO e havia sido incluído naquele programa sem minha autorização. Mas, não fiz uma coisa, nem outra.

— August, eu não mudei de ideia. Você é um idiota por criar um perfil fake e aceitar um encontro com uma desconhecida. No entanto, depois de conhecer Anne, eu realmente gosto dela — Admiti. — Ela é muito gentil e eu não quero ferir seus sentimentos.

Não precisava ver para assistir August com um sorriso de deboche do outro lado da linha. Ele era meu amigo há muitos anos e sabia que eu pouco me importava com os sentimentos das pessoas.

— Certo... — ele disse, depois de um tempo.

— Ela precisa de um namorado temporário — contei. — Não é uma desesperada por um prostituto, e sim uma mulher que quer...

Eu sei lá exatamente o que ela queria. Por que se importava tanto com a opinião da merda da família que tinha? Eu já teria mandado todos se foderem. Mas, queria a chance de beijar os lábios cheios e sensuais, passar meus dedos pelos cabelos bonitos e macios enquanto apalparia sua deliciosa bunda (isso era parte de “ser um namorado”, não é?).

— Enfim... — cortei meu próprio pensamento. — Achei melhor aceitar do que deixá-la vulnerável à vista de algum aproveitador.

Mais silêncio. Claramente, August estava segurando o riso do outro lado da linha.

— Uau — disse, por fim. — Quem diria, meu amigo. Você sendo essa alma tão caridosa — gargalhou. — Especialmente porque nunca se importou com nenhuma mulher... Tirando Lucy, claro.

— Sonia já insinuou que sou maldoso. Isso me fez pensar na questão e decidi ajudar Anne Ryle — menti, descaradamente.

— Tipo uma compensação por todos esses anos sendo um conquistador barato?

— Que bom que você me entende — ri. — Anne tem uma reunião de família e, acredite, o cunhado dela é seu ex-noivo. Ele a deixou pela irmã as vésperas do casamento. Ela só quer ir ao encontro da família sem sentir-se infeliz.

— Eu não falei para você? — August pareceu animado. — Eu disse que ela podia ser simplesmente uma pessoa com histórico triste. E, mais, talvez ela realmente seja a mulher da sua vida.

— Não seja idiota! Isso não é destino ou um encontro de almas-gêmeas. Eu estou apenas fazendo um favor a Anne porque ela é uma garota legal que não quer lidar com o drama familiar pelo qual está passando. E, se você a conhecesse pessoalmente, entenderia. Ela é muito gentil e delicada. Eu senti piedade do seu sofrimento.

— Ah tá — ele prosseguiu. — E quanto tempo vai durar isso?

— Um final de semana.

— A cinquenta dólares a hora? Cara, ela vai desembolsar uma pequena fortuna por você, hem?

— Não ouse cobrar nada do seu cartão de crédito — adiantei. — Eu irei de boa vontade, não vou ser pago por ajudar uma futura amiga.


Não pensei em Anne Ryle e na sua fenomenal bunda até chegar em casa, por volta da meia noite.

Havia sido um dia difícil. Nós queríamos encabeçar um novo plano de construção de um Centro de Convenções criado pela prefeitura, que atenderia ao governo americano, igualmente. Seria o projeto de nossa vida empresarial, e eu trabalhava naquilo dias seguidos. Além disso, o médico de Lucy havia entrado em contato. Ela havia sentido formigamento nos braços. Era a melhor notícia que eu recebia em anos.

Então, tão logo cheguei, fui tomar banho. Os jatos de água quente aliviaram um pouco a tensão dos meus músculos. Estava cansado e exausto, e foi nesse momento que pensei em como seria ter alguém em casa, para conversar num momento daqueles.

A imagem de Anne surgiu, assim, de súbito, avassaladora.

A solidão nem sempre incomoda. Bem da verdade, muitas vezes ela é até preferível. Contudo, havia momentos na vida de um homem que ele queria uma companhia que fosse mais que sexual.

Deitei na cama e puxei o celular, observando a tela. August já havia respondido o anúncio? Eu devia ter conversado com ele, antes, sobre isso. De qualquer maneira, nós ainda podíamos ter mais um encontro antes da viagem e eu imaginei onde poderia levá-la para jantar.

E se para ela já estivesse tudo acertado?

Deixei o celular de lado. Era meia noite e eu não ficaria mandando mensagens para uma mulher como um adolescente deslumbrado.

Cacete! Eu estava sendo exatamente um adolescente deslumbrado!

 

 

 

Anne


E u trabalhei num processo durante toda a manhã, mas meus olhos estavam sempre resvalando para o celular ao lado, imaginando quando viria a confirmação ou recusa de Alexander.

Estava nervosa quanto aquilo. O dia do meu encontro familiar se aproximava, e quanto mais próximo ficava, mais sentia que precisava de um acompanhante. E depois de conhecer Alexander, entendi que nenhum outro cara do aplicativo poderia desempenhar aquele papel tão bem.

Ele era perfeito... de todas as maneiras que eu sempre imaginei. Tinha um sorriso charmoso e um tom de voz neutro que era deveras interessante. Eu o queria muito. Não havia ninguém melhor para ser meu namorado falso.

Mas, aquela demora em sua resposta podia indicar que ele não se sentia da mesma forma, não é? Bem da verdade, eu não era nenhum exemplo de beleza. Até me esforçava, ia ao salão hidratar o cabelo a cada três meses, fazia as unhas, tentava usar roupas agradáveis, e todo o resto, mas meu rosto era um tanto quadrado e meu corpo não estava – nunca esteve – na melhor forma.

Além disso, eu sempre fui uma idiota quando se tratava de homens. Sempre fui traída, parecia um carma, um dedo podre para escolher companheiros, mas nada se comparava ao que Scott fez comigo. Eu definitivamente o amava muito, imaginava uma vida ao seu lado. Ele me destruiu quando cancelou o casamento para ficar com Alana.

Talvez Alexander percebesse minhas inseguranças e decidiu que era hora de sair da jogada.

Levantei-me. Fui até o corredor, em busca da cafeteira. Precisava da cafeína no organismo para me concentrar no trabalho e esquecer aqueles problemas pessoais.

Mary havia me dito, no dia anterior, que eu podia simplesmente não ir ao encontro. Minha avó Gerda entenderia. Aquela possibilidade começou a girar na minha cabeça.

— Anne — o som da voz de Joseane me atraiu. Ela vinha saltitante pelo corredor. — Tem um cara muito, muito e muito gostoso na recepção. E ele está perguntando por você!

Meu estômago revirou-se ao pensar que Alexander poderia estar ali. Ainda assim, um sorriso involuntário formou-se em meus lábios. Caminhei naquela direção e então o vi conversando animadamente com a recepcionista. Logo, seus olhos focaram-se em mim, e meu corpo pareceu passar por uma descarga elétrica.

— Bom dia — ele cumprimentou, sua voz baixa e rouca derramando como uma sensualidade latente que me sentir pegajosa por dentro. — Encontrei o endereço do seu trabalho no Google — contou. — Espero que não se ofenda por eu ter vindo.

— Não, claro que não — respondi rapidamente.

— Então, estava na vizinhança e pensei em trazer-lhe um expresso.

Ele ofereceu-me o grande copo de papel que segurava na mão. Eu senti algo tão quente e gentil naquele ato. Nunca ninguém se importou em buscar algo especialmente para mim.

— Podemos conversar?

Deus, o modo como as palavras saíram de sua boca era tão pecaminoso.

— Por favor, acompanhe-me.

Ele me seguiu até minha sala. Fiquei um pouco incomodada de Alexander perceber a bagunça que estava minha mesa.

— Estou trabalhando numa apelação... — expliquei-me.

— Certo.

Nos sentamos um diante do outro. Eu havia aguardado o retorno pelo aplicativo, mas não tivera resposta. De súbito, percebi que ele podia ser o tipo de cara que preferia recusar pessoalmente para não deixar a mulher abatida. Ora, ele era um profissional. Profissionais sempre tratam os clientes com gentileza.

Cruzei meus braços sobre o peito para me preparar para uma possível rejeição. Seu olhar, novamente, capturou o meu, mergulhando, como se estivesse me lendo.

Engoli em seco.

Toda a vez que ele me encarava daquela forma, eu sentia algo explodindo em meu âmago. Sabia que estava corando, mas não conseguia evitar. Alexander parecia me devorar e eu não era acostumada àquele tipo de atenção.

— Então... — murmurei, desesperada para dissipar um pouco aquele clima. Minhas pernas tremiam e meu corpo estava latejante. — O que o traz aqui?

— Ah, liguei para o gerente do aplicativo e ele me disse que ainda não havia lhe dado à resposta. Eu disse a ele logo após nosso encontro, mas ele preferiu deixar que tivéssemos um segundo encontro.

Então, ele iria realmente me rejeitaria?

— Eu pensei em ter esse segundo encontro, mas percebi que isso só a deixaria mais preocupada.

Céus, ele era tão atencioso... e atraente.

— Então você já tomou sua decisão?

— Sim, claro. Já a tomei no nosso encontro. Por isso estou aqui. Imaginei que saber onde você trabalha e conhecer suas colegas também faz parte da minha tarefa como seu namorado, não é?

Demorou alguns segundos para que sua insinuação fosse absorvida pela minha mente vacilante.

— Você aceitou? Poderei contratá-lo pelo final de semana?

Sua risada baixa e rouca era como uma carícia na pele.

— Sim, Anne. Serei seu namorado. Espero que sua família me ache tão charmoso quanto você, já que me contratou de um seleto grupo dos “ Garotos de York ”.

Eu gargalhei.

— Obrigada... — Queria circular pela mesa e abraçá-lo, mas achei que seria muito íntimo e pessoal. Eu sentia ma enorme onda de alívio tomando conta de mim e tudo que pensava era em abraçar aquele homem e beijar-lhe por gratidão.

Ou por algo a mais...

Então, ele se levantou. Pareceu pronto para ir e eu o segui até a porta.

— Obrigada pela gentileza...

— Gentileza?

— Em vir pessoalmente me dar a notícia.

Ele novamente me observou daquele jeito... Aquele olhar que me fazia perder uma parte da minha racionalidade. Sem nem sentir, eu o abracei, grata, ansiosa, otimista por tudo que poderia ocorrer.

E, tão logo senti meu corpo apertado contra o dele, minhas curvas femininas alinhadas ao seu corpo masculino duro, percebi que aquele caminho poderia ser minha perdição.

Eu não estava acostumada a algo tão delicioso. Minha mente mal conseguia processar minhas sensações e desejos. Eu praticamente me enxerguei nua contra aquele corpo musculoso. Podia sentir meu calor contra o dele, a forma como ele se remexeu para nos encaixar melhor.

Meu Deus, eu estava completamente a mercê de um garoto de programa.

Ele gemeu em meu ouvido, o som torturado de alguém que também estava tentando se conter. Suas mãos agarraram minha cintura, e me atraíram para mais perto. Estávamos grudados.

Não resistiríamos a um simples encontro, como seria dividir um quarto?

— Anne — ele murmurou nas minhas orelhas. Estremeci. — Estou no seu escritório e acho que não seria muito profissional empurrá-la contra a mesa e fazer amor com você aqui e agora.

Suas palavras tiraram-me do nevoeiro sensual em que acabara de me perder. Estava envergonhada pela minha atitude.

— Sinto muito. Eu não sou assim — tentei me explicar. — Não sei dizer o que aconteceu...

— Anne — me interrompeu, sua voz um pouco rouca e o desejo escurecendo seus olhos verdes. — Você não tem que se desculpar, princesa. Eu estou feliz que a gente combine tanto em muitos âmbitos.

Eu umedeci meu lábio inferior com a língua ao pensar que sexo estava incluso no pacote de contratação. E, nossa, fazia muito tempo que eu não tinha uma experiência sexual. Bem da verdade, mesmo quando tinha, em nenhuma estava tão inclinada a viver algo daquele tipo. Não costumava ferver a menção de uma transa. Sexo sempre foi mais uma obrigação de relacionamento do que um uma vivência a ser desfrutada.

— Pare de me tentar com a sua boca — ele murmurou, observando meus lábios.

Eu estava confusa e excitada. Havia muitas questões morais no meu íntimo. E todas elas pareciam desaparecer diante do prazer em sentir aquele corpo grudado ao meu.

— Como?

Ele estendeu a mão e acariciou ao longo de minha mandíbula. Depois, esfregou a ponta do polegar ao longo do lábio inferior úmido, sem se importar em como aquilo me deixava em alerta.

— Toda vez que sua língua desliza pelo lábio inferior — e você faz com frequência —, só consigo pensar em beijá-la. E eu vou fazer isso, mas não aqui e agora. Será num lugar onde eu não precise parar...

Eu estava totalmente sem fôlego. Deus, como vou sobreviver ao final de semana ao lado daquele homem?

Subitamente, ele me soltou. Eu senti todo meu ser reclamar pelo afastamento. Mas, o sorriso dele me fez sorrir também.

— Bom, estarei ocupado até o final de semana, mas se precisar me informar algo que um namorado deve saber, não hesite em me ligar ou me mandar uma mensagem de texto.

— Ok.

Então ele saiu. Eu fiquei parada diante da porta, ainda tentando absorver tudo que havia acontecido. Alexander era definitivamente um homem incrível, e valeria cada centavo que eu pagaria por ele.

 

 

Alexander

 

O cheiro de hospital sempre me causava ânsia de vômito. Talvez porque fosse difícil de ir até lá, todas as semanas, naquele ambiente deprimente, e ver minha irmã caçula estirada na cama, sem movimentos no corpo do pescoço para baixo, com o semblante sempre triste e desanimado.

A empresa que eu presidia era um legado do meu pai. Minha irmã naquela cama, também era um legado dele. Antony Vicent era um homem detestável, de personalidade forte e de gosto incomum pelo álcool. Certa vez, ao voltar para casa com minha mãe e minha irmã, ele provocou um acidente que vitimou as pessoas do outro carro e também a família que estava no seu próprio veículo.

Estranhamente, ele saiu do acidente sem um arranhão. Eu o odiava por isso. Minha mãe morreu, minha irmã ficou tetraplégica, mas ele estava bem, ainda bebendo, ainda festejando a vida, ainda trabalhando na Empresa como se fosse o dono do mundo, saindo com uma modelo diferente a cada semana, ignorando a dor da própria filha que lutava pela vida na Clínica onde a deixou.

Alguns meses depois, teve um infarto. Foi o dia mais feliz da minha vida. Eu contei aquilo a Lucy (minha irmã), e percebi uma réstia de felicidade em seu olhar.

— Você veio cedo essa semana — ela comentou, a voz entrecortada, ao me ver entrando no quarto.

— Porque esse final de semana eu vou sair — expliquei. — Então vim te ver durante a semana mesmo. E também dizer que entrei num programa de financiamento para o estudo de células-tronco. Com o dinheiro investido, acredito que poderemos tentar em pouco tempo tratar de você.

— Acha mesmo que tenho chance?

— Eu acredito em nós — me aproximei da cama e segurei suas mãos. — Enfim, eu cuido de você. Sinto falta de você cuidando de mim.

Nós sempre fomos amigos. Éramos cúmplices da vida desgraçada que víviamos em casa. Vê-la naquela cama sempre me causava uma dor tremenda.

— Você parece alegre, Alex — ela murmurou. — Algo diferente, não sei explicar...

— É mesmo?

— Tem a ver com o final de semana?

— Hum — eu não sabia exatamente como responder. — Diga-me, como está se sentindo?

— O mesmo de sempre. — Ela respondeu de forma automática. — O médico já lhe contou?

— Que você sentiu formigamentos nos braços? — sorri. — Sim, eu fiquei muito feliz.

Lucy me olhou de forma gentil.

— Irmão, sabe... Eu sempre penso que você devia se casar. Você já tem trinta e cinco anos. Sabia que Judy esteve no hospital esses dias?

Judy era uma namorada que tive na adolescência.

— Ela ainda está solteira.

— Não sou mais o mesmo cara, Lucy...

— Eu não quero ser um impedimento para que você siga com a sua vida.

— Nunca pense isso.

— Falo sério, Alex. Estou bem. Eu estou num ótimo hospital, cheio de gente capacitada. Participo de programas de leitura, até mexo com o computador através dos olhos — ela contou uma experiência que estavam testando em pacientes no estado clínico dela. — Eu estou vivendo tudo que posso, mesmo limitada. Mas, você não.

— Eu tenho uma boa vida, irmã — a confortei. — É sério. Nunca mais pense isso — reforcei.

— Então, o que fará no final de semana? Ainda não me respondeu.

— Não é nada demais. Vou visitar a família de uma amiga.

— Vai conhecer a família de uma garota? — ela pareceu animada.

— É só uma amiga — reafirmei. Não queria que tivesse ideias erradas.

Ela ficou desapontada? Eu não saberia dizer. Nunca trouxe nenhuma garota para conhecer Lucy. Nunca me passou pela mente que ela achasse que fosse por algo como vergonha ou imposição.

— Se ela deixar de ser só uma amiga, prometo que será a primeira a saber — disse.

Gostei do sorriso. Ela sempre me animava, mesmo nos piores momentos.

— Eu te amo, Lucy — disse, só para o caso de ela esquecer. — Ver você é a melhor parte da minha semana.

— Eu sei. Eu também te amo.

Ergui-me e me curvei em sua direção, dando-lhe um pequeno beijo na testa.

O enfermeiro chegou naquele instante. Ela tinha algumas atividades de fisioterapia programadas.

— Você vai ficar? — indagou.

Normalmente eu acompanhava aquelas atividades.

— Estou tentando a compra daquele terreno para a Convenção. Muito ocupado... Mas, você sabe que se precisar, é só ligar.

Ela assentiu. Depois, me deu o melhor sorriso que podia.

— Irmão, aproveite muito essa chance. Aproveite cada segundo que puder, porque a gente só vive uma vez.

 

 


Anne

 

F altavam poucos dias para minha ida para o encontro familiar, então resolvi dar uma caprichada no visual. Fui ao Salão e fiz luzes nos cabelos, uma hidratação poderosa, as unhas e também uma depilação não programada – que quase me matou de tanta dor, mas que me dizia, lá no fundo, que valeria a pena.

Quando cheguei em casa eu me sentia uma estrela de Hollywood, pronta para arrasar. Fazia muito tempo que minha autoestima não estava tão aguçada. De alguma maneira, eu percebi que era por conta dos olhares de Alexander. Ele me encarava como mulher, e isso parecia despertar algo poderoso em mim.

Sentei-me no sofá e busquei pelo resto de comida chinesa que havia comprado na noite anterior. Estava faminta e logo degustava a massa, enquanto assistia a um programa qualquer na TV.

Subitamente, o telefone tocou. Observei a tela e percebi que era Alexander. Meu estômago apertou e uma euforia estranha centrou-se no meu íntimo.

O que estava acontecendo comigo?

Larguei a comida na mesinha de centro e atendi. Minha voz gaguejou sem motivo, e eu fiquei em alerta.

— O... Oi? — disse, e depois pigarreei, tentando me concentrar.

Houve uma pausa estranha do outro lado da linha.

— Oi... Anne?

O embaraço aqueceu meu rosto, e engoli em seco.

— Sim, sou eu.

— Você está bem? Sua voz parecia rouca.

— Oh, sim, eu estava comendo, fui atender ao telefone rapidamente... — Por que diabos contei que atendi o telefone rápido? —, e me engasguei. — Cala a porra da boca, caralho! — Fiquei nervosa e gaguejei — Ok. Eu era a pior atendente de telefone do universo.

Ele riu, o som sexy ondulando através da linha como uma carícia física.

— Precisa de ajuda? Se sentir-se mal não me custa fazer um boca-a-boca...

Ai caralho... Por que ele foi falar aquilo? Eu quase podia sentir aquela boca maravilhosa tomando a minha. Eu sabia que isso iria acontecer no final de semana – não só porque ele interpretaria um namorado apaixonado – mas também porque eu queria muito. E, de repente, o tempo pareceu passar devagar demais. Eu queria que chegasse logo para ser tomada pelos braços musculosos.

— Anne — ele me tirou do torpor. — Não se assuste, é só brincadeira...

Ele realmente levou meu silêncio a sério.

— Não... é que... Eu estava... — busquei algo que pudesse usar como justificativa na sala — vendo TV.

— Um programa interessante?

Era um talkshow idiota.

— Um filme romântico — menti.

Eu nem assistia filmes românticos!

— Espero que não seja daqueles com finais tristes que eles terminam separados.

Sorri.

— Não, nesse a mocinha sabe o que quer e vai pegar o cara de qualquer jeito.

— Gosto desse tipo de mocinha que sabe o que quer e não tem medo de irer atrás para conseguir.

Por que aquilo parecia uma sugestão?

— E você? O que você está fazendo? — perguntei.

— Agora? Nesse exato momento? Completamente focado em uma mulher.

Meu corpo ficou em chamas ardentes. Eu estava muito ansiosa, nervosa, desejosa. Mordi meu lábio inferior, tentada a seguir o jogo que ele parecia estar fazendo.

— Você está flertando comigo?

— Desde o exato momento em que te vi na cafeteria. Não percebeu?

Eu o queria. Céus, eu o queria! Do meu lado, agora! Queria me afundar naquele homem. Estava louca por ele!

— Diga-me, Anne... Devo saber algo especial sobre sua família? Sei que seus pais gostam muito de sua irmã e que seu cunhado é seu ex-noivo. Mais alguma coisa?

Eu não me senti decepcionada pela mudança do teor da conversa. Sabia que precisávamos discutir aquilo.

— Gerda, minha avó, é uma pessoa maravilhosa. Irá se dar bem com ela. Meus primos e tios são indiferentes, cada um cuida da própria vida.

— E seus pais?

— Minha mãe é a legítima dona de casa. Ela criou as duas filhas e fazia trabalho para a comunidade. Gosta de arte e filantropia.

— Seu pai deve ter dinheiro para bancar algo assim...

— Ele é médico — expliquei. — Obstetra. Minha família vem de uma linhagem de médicos, e somos muito tradicionais no norte. Meus tios e primos seguem esse caminho, mas meu pai sempre considerou que as mulheres deviam seguir os passos da minha mãe.

— Ok, bem conservadores.

— Não de tudo. Quero dizer, está tudo bem para eles a gente ficar no mesmo quarto. E estava tudo bem para eles Scott me deixar por Alana. Acho que o problema sou eu. Por algum motivo, não são muito afeiçoados a mim.

— Talvez seja só impressão.

— Um dos meus primos se assumiu gay e eles deram muito apoio — contrastei. — Ah, desculpe ficar te alugando com essas picuinhas de família.

— Não tem problema — disse, de imediato. — Eu entendo um pouco sobre isso. Sei que não é fácil.

Percebi a melancolia e a tristeza em sua voz. Algo em mim queria indagar sobre seus problemas, fazer parte da sua vida, ajudá-lo de alguma maneira; mas, outro lado meu me indicava que não era meu direito interferir de algum modo. Afinal, tudo era um contrato.

Reprimia minha curiosidade quando a voz dele voltou a soar:

— Então, alguma coisa interessante para um namorado saber?

— Adoro pizzas sextas à noite — contei, rindo. — Gosto de acordar cedo porque meu dia rende melhor assim. Sou apaixonada por séries, posso passar dias na netflix . Ah, não gosto de comida mexicana.

— O quê? — ele pareceu surpreso. — Adoro comida mexicana!

— É horrível. Não gosto de comida japonesa, também.

— Ok, você terá que experimentar de novo porque experimentou errado na primeira vez.

Eu gargalhei.

— Adoro alho frito — contei. Estava empolgada com aquelas pequenas facetas sobre mim. — Adoro alho frito e massas.

— Não vou te beijar se comer alho — ele disse, e aquilo soou naturalmente divertido. — Eu detesto alho.

— Você é louco. Alho é a melhor coisa que existe.

— Muda o foco — riu. — Sem alho no nosso namoro, ok? E músicas?

— Estava escutando “ Love Me Like You do ” da Ellie Goulding e juro por Deus que não é por causa de Cinquenta Tons de Cinza, apesar de eu saber que é tema do filme.

Ele riu.

— Então por que estava ouvindo?

— Eu sou fã de um casal de uma série antiga. E cai no fanvid deles no Youtube que tinha essa música como tema.

— Que casal?

— Brian e Justin.

— Que série é essa?

— Queer As Folk .

Silêncio.

— Não era aquela série gay que era super polêmica porque o sexo parecia real?

— Na nossa era de Game Of Thrones , a série nem é tão polêmica assim — brinquei. — Mas, na época que passava com certeza era uma quebra de tabus.

Mais um riso confortável do outro lado da linha. Eu fiquei empolgada com a naturalidade que as coisas estavam correndo.

— Então, eu sou fã de The Office — ele contou. — Mesmo já tendo acabado, ainda faço maratona.

— Também gostava — murmurei.

— Enfim, praia ou montanha?

— Montanha.

— Montanha também. Gato ou cachorro?

— Ambos — respondi. — Gosto mais de gatos, mas amo muito todos os animais.

— Combinamos nisso também. Lingerie sexy ou confortável?

Eu travei diante da questão, um tanto chocada com a maneira descarada que ele induziu a pergunta em meio a outras, inocentes.

— Eu... não sei o que dizer — murmurei, por fim.

— Deixe-me adivinhar: você é uma mulher linda, mas extremamente ocupada. Provavelmente precisa passar muito tempo em pé, precisando ir a audiências, etc. Então, você inspira conforto. Uma calcinha de algodão, talvez com detalhes de flores, combina bem com você.

Eu estava impressionada.

— Você está certo — admiti. — Como sabia?

— Não sei. Parece que eu te conheço desde sempre.

Eu também sentia aquilo. Aquela proximidade que desde o primeiro olhar pareceu me atirar em um mar revolto de sensações poderosas.

Meu corpo inundou de calor. Meus mamilos se apertaram e formigaram, e uma parte negligenciada entre minhas pernas pulsava com um desejo e uma necessidade avassaladora.

— Ah, para o registro, eu uso cuecas boxer — ele prosseguiu, indiferente as emoções que despertava em mim.

Minha mente foi dominada pela imagem daquele homem maravilhoso usando apenas uma cueca boxer.

— Você está tentando me seduzir, senhor Vicent?

— Se você vacilar, eu farei isso — ele despejou. — Querida, preciso dormir. Então, boa noite.

— Boa noite — sussurrei.

Assim que pus o celular no sofá, meu pensamento se confrontou com a certeza que aquele homem teria de mim o que quer que ele quisesse. Nunca estive tão acesa e com tanta vontade de estar com alguém.

Era uma loucura da qual jamais experimentei.

E como seria depois? Iria à falência porque não conseguiria ficar sem ele?

— Você só não pode se apaixonar, Anne — disse a mim mesma.

Era isso. Eu podia ceder à luxúria, viver um final de semana cheio de atração. Eu sabia onde estava me metendo, então não havia muitos riscos.

Depois, bastava seguir caminhos separados. Caso eu quisesse, às vezes, sentir algo assim de novo, bastava pagar cinquenta dólares (se valesse a pena!).

Isso! Eu devia ser prática.


Eu não era como minha mãe, no sentido de ser caridosa para um espetáculo. Nunca me importei em passar uma imagem para as pessoas, pois qualquer ato que eu fazia sem pagamento, era sempre de forma sigilosa. Era por isso que eu sempre encontrava minhas clientes vítimas de violência doméstica no final da tarde, quando o expediente já se aproximava do fim.

A maioria delas já tinha uma certa idade, não tinha emprego, e passara a vida toda cuidando da casa e dos filhos de um homem agressivo. Dessa forma, ao tentar o divórcio, sem advogados, elas sempre saiam mal e podiam perder tudo.

A primeira vez que eu soube de um caso assim foi por Joseane. Ela comentou que a diarista que limpava seu apartamento estava sofrendo porque o marido abusador prometeu ficar com a guarda dos filhos caso ela se separasse. Eu disse que a representaria, e pedi a Joseane para chamá-la ao escritório.

A mulher pintou um quadro de horrores para mim. Até me mostrou um áudio que ele enviou através de um aplicativo de mensagens, onde a chamava de todos os piores nomes que uma mulher podia ouvir.

Quando ocorreu a audiência, ele chegou cheio de soberba, ao lado de um advogado. Contudo, quando percebeu minha presença ao lado da esposa, perdeu o ar arrogante. O resultado foi uma pensão para ela e os filhos, e uma medida protetiva que o mantinha afastado da mulher.

Aquele dia havia sido especial. Em todos os meus anos advogando, eu jamais havia tido um momento tão espetacular. Decidi amparar mulheres na mesma condição daquela cliente porque, mais que ajudá-las, aquilo me fazia muito bem.

Então, quando percebi o carro de Alexander estacionando em frente ao escritório, eu fiquei boquiaberta porque não o aguardava e nem tinha tempo para ele.

Era verdade que eu fui dormir com um sorriso idiota na cara, e uma vontade louca de vê-lo, mas não esperava que ele realmente fosse surgir ali, naquele momento.

Ele entrou no escritório e observou cinco mulheres sentadas no sofá de espera, enquanto eu me mantinha ao lado. Joseane e Mary já haviam ido embora e eu fazia daqueles encontros um tipo de autoajuda onde podíamos discutir táticas e também analisar caso a caso. Gostava do vínculo de amizade que se formava entre nós.

— Boa tarde, senhoras — ele cumprimentou. — O que é isso, Anne? Um encontro de lindas damas?

E então nos arrebatou com aquele sorriso incrível. Eu percebi o suspiro resignado das mulheres e precisei rir. Ok, eu não era a única a ficar derretida por ele.

— Meninas, esse é meu amigo Alexander — os apresentei.

Ele arqueou as sobrancelhas como se esperasse que eu o apresentasse de outra forma, mas eu permaneci firme pela minha postura profissional.

Então pedi licença e o puxei para um canto.

— Aconteceu algo?

— Não.

— E você está aqui porquê...?

— Porque... — ele pareceu pensar nas palavras. — Porque eu não aguentei ficar sem te ver...

As palavras formigaram em mim.

— Alexander...

— Alex — me corrigiu. — Pode diminuir o nome.

— Podemos nos ver depois? Estou ocupada agora.

— Estou vendo — ele observou a sala. — Já são quase 18 horas e o turno normal de trabalho vai até às 17 — observou. — Estou curioso. É algum tipo de clube?

— São mulheres que precisam de ajuda judicial e não podem pagar — expliquei rapidamente.

O olhar dele pareceu se iluminar. Ele pegou minha mão e depositou um beijo casto nela.

— Que horas eu volto? — indagou.

— Pode ser daqui a meia hora? — murmurei.

Céus, estava encantada. Seus dedos quentes ainda seguravam minha mão.

— Vou tomar um café na esquina e retorno em meia hora.

Aproximou-se da porta e fez uma reverência as mulheres.

— Foi um prazer, meninas — ele deu uma piscadela que fez várias vozes se alvoroçarem.

Alexander Vicent era de fato um conquistador.

 

 

 

 

Alexander

 

A nne me observou com o ar cansado. Mesmo assim, seu sorriso estava ali, como se o dia houvesse sido ótimo e minha presença coroasse isso.

Eu segurei a porta e ela saiu. Observamos os dois carros parados em frente ao prédio, sem saber para qual deles nós devíamos seguir.

— Já comeu algo hoje?

— Tomei café da manhã, conta?

— Eu sabia — ri. — Você é do tipo que não descansa enquanto não termina uma tarefa, não é?

— É uma crítica ou um elogio?

— Não sei dizer. Mas, sou igual.

Por fim, me aproximei do meu carro e abri a porta do passageiro.

— Vamos! — a chamei. — Vou te levar para comer algo gostoso.

Não sei dizer porque, aquilo pareceu erótico. Era como se eu estivesse me colocando em um prato e dando-me para ela se servir à vontade.

Bem da verdade, eu fui dormir pensando nela, e acordei com ela em meus pensamentos. Eu estava fascinado por aquela mulher.

— Você vai tentar me seduzir se eu entrar? — ela brincou.

— Por sua conta e risco — disse dando uma piscadela.

A levei até um restaurante italiano que servia massas cheias de alho. Eu pensei exatamente em agradá-la, então planejei onde levá-la. Queria que Anne sentisse que não havia nada nela que eu não gostasse ou desejasse.

— Sinto muito por não poder te dar atenção mais cedo — ela murmurou, assim que nos sentamos à mesa.

— Ah, sim... Explique-me... É algum tipo de trabalho voluntário?

— É só algo meu — ela murmurou. — Algumas mulheres não podiam pagar por ajuda num processo contra seus agressores e eu acabei me oferecendo.

— Não ganha nada por isso?

— Não.

— Então, você ajuda as pessoas por bondade... — murmurei. — Até então, isso foi a coisa mais bonita que me mostrou.

— Isso? — ela riu. — Devo estar sendo uma cliente de merda, não?

Eu neguei com a face.

— Não, Anne... Eu quis dizer... Nossa, você é linda, atraente, gentil, e um montão de coisas que eu admiro numa mulher. Mas, esse seu lado me surpreendeu mais. Você não vê muito disso, hoje em dia.

Uma garçonete trouxe o cardápio e eu vi seu sorriso por trás do papel plastificado quando percebeu que tudo tinha alho.

— Eu vou querer o que ela pedir — disse para a mulher, que volveu-se para Anne.

Eu estava admirado por sua natureza abnegada e altruísta. Ela era tão maravilhosa que eu ficava me perguntando como o tal Scott teve coragem de deixá-la a beira do altar?

— Massa com alho — ela indicou.

— Ok — eu ergui as mãos, em rendição. — Você escolheu.

A garçonete saiu, e eu me senti mais confortável em continuar a conversa.

— Você sabe... acho que se todos fizessem um pouquinho, o mundo seria um lugar melhor.

Ela estava certa.

— Hum, ainda não falamos sobre a taxa que pagarei pelo final de semana. Você vai precisar de algum adicional?

Eu quase gargalhei.

Naquele momento nossos pratos chegaram e eu apenas observei o montante de massa.

— Vamos jantar sem pensar nisso? — pedi.

Ela assentiu.

Até mesmo a forma como concordava comigo me deixava em êxtase.


— Obrigada pelo jantar — Anne recostou no banco do carro, sua expressão se tornando séria. — Ainda temos algo importante para discutir — ela lembrou.

A rua estava deserta e a iluminação pública diante do prédio estava estragada. Aquele momento, de súbito, pareceu propício para algo a mais.

Eu relaxei no meu assento. Precisei respirar com calma e pausadamente para não demonstrar o quanto o cheiro dela estava me excitando.

— Meu preço?

— Sim — ela confirmou. — Imagino que você terá um adicional porque ficará muito tempo à minha disposição.

Eu podia dizer a verdade para ela naquele instante.

“ Anne querida, eu sou podre de rico, e eu não quero seu dinheiro. Eu quero sim ser seu namorado e também ir para a cama contigo, fazer sexo até ficarmos velhos, e nunca mais me afastar ”.

Mas, isso seria demais, não é? Ela não estava procurando um namorado real. Ela queria apenas alguém que pudesse ajudá-la num final de semana. E aquilo era uma chance para mim. Se tudo se saísse bem, quem sabe eu poderia tornar aquilo um acordo definitivo.

Céus, em menos de uma semana eu deixei de ser o cara que não queria compromisso para me tornar o cara que faria qualquer coisa por aquela mulher.

— Então? — Ela insistiu, sua voz suave interrompendo meus pensamentos.

Eu abri minha boca. Mas, nenhum som saiu. Eu não queria colocar um preço, mesmo que fosse algo simbólico e que eu não aceitaria receber, depois.

— Ok, está me assustando — ela murmurou. — Seu preço vai subir tanto assim? Eu não sou milionária!

— Você pode pagar o adicional de uma forma não tradicional — indiquei.

— Como assim? — Anne estreitou o olhar em confusão.

— Eu quero beijar você, Anne — admiti. — Estou louco para beijar você. Esse é meu preço.

Ela parecia incrédula.

— Sabe que se cobrar isso das suas clientes, irá à falência, não é?

Eu quase ri.

— Eu te disse na primeira vez, ser um “ Garoto de York ” não é algo que eu faça com frequência.

Seu rosto corou. Eu sabia que ela estava tentada em aceitar. Eu não era ingênuo e entendia que as reações do meu corpo não eram limitadas a mim. Anne estava se sentindo igual ou até mais desejosa que eu.

— Ok... — ela disse, temerosa. — Eu posso pagar o adicional assim...

— Adicionais — murmurei. — Não quero só um beijo.

Ela concordou e eu não perdi tempo.

 

Anne

 

O aromatizador do carro de Alexander era uma mistura de cravo e canela que eu adorava. De todas as especiarias existentes, aquelas eram as minhas favoritas.

Não sei porque pensei no odor perfumado. Talvez porque estivesse surpresa e nervosa pelo fato de Alexander querer me beijar. Até então, eu imaginei que tudo que ele fazia era parte de seu elaborado plano de charme e bom atendimento. Mas, renunciar sua taxa e querer beijos em troca dela me deixou em total euforia.

Ele podia estar atraído por mim? Era quase ridículo pensar nisso. Alexander era um homem muito bonito, daqueles que fazem as mulheres suspirarem pelos cantos. E eu, bem... Digamos que eu nunca condenei Scott por ter me trocado se seu motivo foi à aparência. Não que eu fosse feia, mas era nítido que mais da metade do meu charme era devido a uma boa maquiagem.

Ele me puxou para perto. Seus olhos encontraram os meus, e seu sorriso sensual quase me fez parar de respirar. Senti sua mão deslizar pelo meu braço e tocar minha cintura. Subitamente, ele empurrou o banco para trás, a fim de dar mais espaço. Eu quase perdi o fôlego.

— Suba nas minhas coxas, Anne — aquela ordem firme me deixou ainda mais lânguida.

Meu coração batia com tanta força que eu pensei que fosse passar mal. Nunca um homem me disse tal coisa e, provavelmente, se pedisse, eu negaria porque aquele tipo de coisa não fazia parte de mim.

Céus, estamos num local público, a sombra de um prédio.

Mas, eu não conseguia negar nada a ele. Assim, acomodei-me em seu colo, minhas coxas abertas para seus quadris e minhas mãos firmes no seu ombro. Aquele calor parecia me sufocar.
Alexander deslizou as palmas das mãos para baixo. Logo elas estavam segurando minha bunda, seus dedos abertos.

— Mais perto, gostosa — ele murmurou, e sem esforço guiou-me até os poucos centímetros que nos separava, fazendo com que meus seios roçaram contra seu peito.

Deus, ele era tão sólido e firme. Sua carne sob as calças estava dura. Meu centro feminino começou a pulsar contra a pressão.

A posição era tão íntima e tão excitante que não conseguia segurar meu gemido feminino.

Alexander percebia que eu estava entregue. Ele sentia. Eu não pude evitar.

— Está gostoso?

Eu estava quase me esfregando nele como uma vadia, uma prostituta.

— Sim — foi tudo que disse.

Porque temia falar mais. Temia dizer coisas que não podia.

— Você lembra porque me contratou, Anne? — ele murmurou, sua boca aproximando-se da minha. — Porque um idiota te deixou às vésperas do casamento. E eu quero te fazer entender que era isso que ele era: um idiota. Porque homem nenhum nesse mundo, se tem uma mulher como você, troca por outra. Você é única, um exemplar por demais precioso. E eu vou te mostrar isso. Depois de mim, você nunca mais vai duvidar de si mesma.

Eu estremeci diante das palavras. Alexander era, provavelmente, a melhor coisa que me acontecia em anos. Bendito seja, “ Garotos de York ”!

— Me beija — implorei, diante daquela demora.

Eu queria aquela boca deslizando contra a minha, o calor da sua língua passeando na minha boca.
Ele deslizou a língua no meu lábio inferior.

— Quando o final de semana acabar, Anne, eu juro que você nunca mais pensará em outro homem.

Sua boca finalmente me tomou, roubando minha respiração. Ele deslizou por meus lábios entreabertos, e o recebi com entusiasmo, nossas línguas se enredando.

Seus dedos agarraram meu cabelo, inclinando minha cabeça, deixando meus lábios mais a sua disposição.

Aquilo não devia ser certo. Em que mundo um prazer tão poderoso daqueles não era errado?

E, diante daquilo, percebi que precisava dele. Não apenas para ser um namorado falso, mas queria que ele me fodesse até que a dor agoniante que pulsava entre minhas coxas tivesse fim.

Senti sua ereção. Queria que ele enterrasse aquele pau dentro de mim todas às vezes possíveis. Gemi diante dos pensamentos.

Minha voz o acalentou mais. Logo, ele se forçava, mesmo com a roupa nos separando, contra mim.

Era delicioso...

Todo aquele desejo quente acumulado, descendo em espiral até o ponto onde nossos corpos buscavam uma fusão... Eu nunca havia sentido aquilo antes. Saber que ele também estava extremamente excitado me deixava mais em êxtase.

Sua boca continuou a me consumir, faminta, e quando nossos lábios se separaram, ele puxou minha cabeça para trás para poder arrastar beijos quentes, úmidos e sugadores pelo meu pescoço. Sua língua macia lambeu e depois chupou. Eu sabia que ficaria uma marca ali. Não me importei.

— Você é simplesmente deliciosa — ele murmurou contra meu ouvido, suas palavras derretidas como mel, um tipo de sexo que eu jamais vivenciei. — Eu quero comer cada pedaço de você...

Sua boca voltou a me buscar. Quente, desejosa... eu estava quase gozando só pelo beijo, só pela esfregação mais para baixo, só pelas mãos que queimavam minha pele.
Todavia, lentamente, ele foi afastando, respirando fundo, tentando me dar espaço.

— Não aqui... Não numa rua — ele murmurou.

E eu acordei daquele torpor.

Ele estava certo. Havia momentos para isso, e aquele não era um deles.

— Nós teremos muito tempo para isso — Alexander me assegurou.

Eu saí do seu colo. Havia muitas reações em mim, mas as contive enquanto sorria.

Sim, nós teríamos muitos momentos. Eu mal podia esperar por eles.


Naquela manhã de sexta-feira, o carro de Alexander parou diante do meu prédio. Eu sorri em sua direção.

— Oi — ele cumprimentou.

Estava em pé, na frente do carro, o corpo recostado contra a lataria, as mãos nos bolsos. Era extremamente jovial.

— Nunca a vi de vestido — ele murmurou. — Fica bem em você.

Nós iríamos ficar num resort em Belleayre. Eram duas horas de estrada até o local. No inverno, as pessoas iam para lá para esquiar, mas como estávamos no final da primavera, as montanhas eram floridas e o tempo ameno.

Alexander pegou minha mala e a colocou no porta-malas. Depois, foi até meu lado do carro e abriu a porta. Ele era tão cavalheiro, sabia como fazer uma mulher se sentir única.

Estava eufórica com isso. Com toda aquela interpretação impecável.

Entrei no veículo e o aguardei. Tão logo ele fechou sua porta, me buscou, suas mãos grandes segurando meu rosto e sua boca me procurando para mais um beijo.

Eu sentia meus mamilos endurecendo e minha carne formigando. Mas, eu queria guardar aquelas emoções para mais tarde, porque, francamente, estava nervosa com o reencontro familiar.

Logo ele começou a dirigir. Eu sentia que devia buscar assunto, explicar melhor como funcionava a dinâmica daquela família, mas Alexander estava muito autoconfiante.

— Eu não estou nem aí para a sua irmã — ele disse, um sorriso no canto dos lábios. — Nem para seu cunhado. Francamente, não ligo para sua família esquisita que lhe deixou no seu pior momento. Eu só quero vivenciar esse momento com você, única e inteiramente.

Aquilo pareceu inflamar-me. Eu nunca fui algo de exclusividade de ninguém.

— Contudo, precisa saber que haverá comentários maldosos... Especialmente de minha irmã.

— Você parece temer que eu vá cair de quatro por ela, assim como o tal Scott — ele riu.

Não era algo engraçado. Era realmente meu maior temor.

— Ela é muito bonita...

— Você também...

— Olhe, nem se compara. Ela foi até Miss na adolescência. Meus pais a idolatram. Ela tem um corpo maravilhoso, a voz suave, enfim... E ela sabe disso. Ela vai falar das minhas roupas, do meu corpo, ela vai ficar apontando defeitos, contando coisas desagradáveis que já me aconteceram. Se duvidar, fará até piada sobre eu ter sido deixada por Scott. Então, eu só quero preveni-lo.

— Você não precisa — ele afirmou. Sua mão deixou o volante por um momento e acariciou meus dedos. — Eu estou louco por você. E sua irmã entenderá que você achou um homem que está desesperadamente apaixonado, enquanto o idiota do seu ex perceberá que você arrumou alguém bem melhor que ele. Esse jogo nós já vencemos, querida.

Eu ri. Alexander tinha esse poder de dissolver as minhas inseguranças. Ele realmente era um ótimo ator, tinha uma aparência maravilhosa e era profissional. Com certeza ele faria a sua parte.

De súbito, volvi meu olhar para a estrada, uma nuvem escura formando-se em meus olhos.

E quando o final de semana acabasse e nós fôssemos por caminhos diferentes? Perdê-lo seria de uma dor imensa.

 

 

 

 

Alexander

 

N ós iriamos nos encontrar em um restaurante próximo do resort para um almoço em família. Seria meu primeiro contato com os pais e a irmã de Anne, e estava ansioso. Eu sabia que ela desejava muito mostrar aos pais que era mais do que eles – traiçoeiramente – deram a entender sobre ela, mas meu desejo era maior que esse.

Jurei a mim mesmo que Anne sairia daquele final de semana entendendo a mulher maravilhosa que era e que quem perdia por não tê-la por perto eram seus familiares.

Claro, em meio disso tudo, eu planejava conquistá-la. Não era um jogo. Eu a queria verdadeiramente. Ela era tudo que eu sempre desejei numa mulher.

Pela primeira vez na vida, comecei a planejar a semana seguinte, quando voltássemos para Nova York. Pretendia levá-la a Lucy, ambas as mulheres que eu adorava se conhecendo e criando uma amizade.

Definitivamente, na minha mente, tinha tudo para dar certo. Anne estava muito à vontade comigo e eu não temia iniciar um relacionamento com ela.

Claro, antes precisaria confessar a verdade, mas achava que ela entenderia bem. Bastava apenas aliviar sua mente daquele encontro com os seus.

Apertei as mãos no volante. Porra! Eu estava muito encantado!

Eu já tive dezenas de mulheres, mas nenhuma que me despertasse tal estado de proteção. Ela precisava de mim, estava vulnerável, e eu me sentia o próprio macho alfa com ela. Eu era mais do que um cara com grana para dar a mulheres bonitas. Agora eu era o escudo que ela carecia.

A placa me indicou o restaurante e eu dei a seta, antes de me aproximar do prédio.

O lugar parecia estranhamente vazio.

Observei Anne, percebendo que seu estado estava bastante preocupado.

— Estou aqui — eu murmurei, fazendo com que ela volvesse seu olhar para mim.

Aquele sorriso lindo que sempre me derrubou agora era destinado como um agradecimento sem palavras.

— Devemos entrar? — perguntei, diante da completa insegurança de Anne.

— Certo.

Ela soltou o cinto de segurança e abriu a porta.

Sai rapidamente, dei a volta e me aproximei dela. Pus a mão na sua cintura, protetor, e ela pareceu um tanto nervosa pelo gesto. Então, simplesmente segurei sua mão. Percebi que tremia, e me compadeci.

Eu sabia como família podia ser a base da sua vida, ou podia ser a merda que ferraria com tudo. Meu pai havia destruído minha autoconfiança e eu sempre tentei me manter afastado das bebidas alcoólicas por temer ser igual a ele. Confesso que, igualmente, pegar estradas nunca me deixava confortável. O acidente que deixou minha irmã naquela cama, e levou minha mãe, ainda me causava pesadelos.

Entramos no restaurante. Uma mulher muito bem vestida e com maquiagem carregada se aproximou. O cheiro forte do seu perfume fez meu nariz coçar.

— Anne! Achei que não fosse vir — disse, dando um simples abraço rápido.

— Eu disse que viria, mãe...

— Oh, querida. Seu pai e eu brincamos com o fato de que seu namoro podia ser apenas uma mentirazinha. Você sempre gostou de pregar peças.

Eu não precisava ser adivinho para saber que Anne não era daquele jeito. E sabia que as palavras tinham por única finalidade desconstruir a mulher autossuficiente que entrou comigo.

Um homem mais velho aproximou-se também. Um abraço ainda mais rápido. Ele a olhou dos pés a cabeça como se a analisasse.

— Bom ver você, Anne.

— Igualmente, pai. — Ela virou-se para mim. — Este é o Alexander. Alexander, esta é minha mãe e meu pai, Rebecca e John.

Dei um passo à frente, estendendo minha mão. Os cumprimentos foram formais.

— É um prazer conhecê-los.

— Da mesma forma — respondeu John. — Anne não costuma apresentar namorados. O único foi Scott.

Eu ignorei o comentário porque de nada adiantava tentar trazer o ex-noivo a cena. Então, simplesmente segui com o casal para uma mesa, onde Anne e eu nos ajeitamos diante deles. Logo, recebíamos o cardápio.

— E vovó?

— Ela já está no resort . Está velha, não gosta do barulho desse tipo de lugar.

Que tipo de lugar? Cemitério? O local era completamente vazio e sem movimento.

— Então, Anne nos disse que você é um CEO? — o pai de Anne começou.

— Sim, senhor — respondi educadamente.

— De que ramo?

— Construção. Sou Presidente de uma empresa que projeta e edifica construções em Nova York e outros lugares do país.

— Hum — ele arqueou as sobrancelhas. — Algum projeto conhecido?

Senti que Anne ficou tensa ao meu lado.

— Estamos trabalhando no novo Centro de Convenções do Governo. Está tudo aprovado, estamos na fase final para a aquisição do terreno.

Eu sabia que Anne estava preocupada com o fato dos pais tentarem descobrir se o que eu dizia era verdade. Em nossa época, uma simples busca no google , respondia muitas questões. Eu queria dizer a ela que estava tudo bem, porque eu não estava mentindo, mas não podia, então simplesmente apertei seus dedos na minha mão, confortador.

— Seu sobrenome é Vicent, não?

— Sim, somos dos Vicent de Tallahassee. Minha família esteve entre os primeiros governantes da Flórida.

Era meu trunfo. Não importava o que o babaca do Scott fazia, eu era superior. Ao menos para uma coisa me serviu ser filho daquele desgraçado do meu pai. Meu sobrenome tinha peso.

— Seus pais moram em Nova York?

— São falecidos.

— Você é sozinho? — a mãe indagou, a voz quase confortadora.

— Eu tenho uma irmã.

— E ela faz o quê?

Aquele interrogatório não me causou nada até Lucy entrar na jogada. Eu não queria ver desprezo ou piedade nos olhos daquelas pessoas.

— Infelizmente ela sofreu um acidente de carro há alguns anos e vive numa clínica.

Mesmo sem saber se aquilo era verdade, senti que Anne apertou mais minha mão, como se quisesse dizer “ sinto muito ”.

— Lamento — a voz suave de Rebecca soou.

— Está tudo bem. Ela é uma garota maravilhosa e está em muitos programas de reabilitação física. Lucy é fantástica.

O resto da conversa foi leve e superficial.

Ninguém chegou ao restaurante como eu previa, e acabamos almoçando os quatro, quase que em silêncio.

Quando já estávamos no estacionamento, Rebecca entregou a chave de um chalé para Anne.

Entramos novamente no carro e ficamos em silêncio por alguns segundos.

— Ok — eu murmurei. — Isso foi bem interessante.

— Sabe... — ela disse de uma forma que me fez virar em sua direção. — Estou tão cansada. Se importa de irmos para o chalé? Eu só quero me deitar um pouco.

Eu podia perceber seu desânimo e a puxei para um beijo.

— Anne, eu juro te fazer esquecer toda a dor... — prometi.

Ela sorriu, triste.

Meu desejo foi falar a verdade naquele instante, dizer que não tínhamos apenas o final de semana. Mas, me calei. Mais uma chance desperdiçada. Não havia muitas escolhas quanto a isso.

 

 


Anne


E u dormi boa parte da tarde. Meus pais tinham aquele poder, a energia deles me derrubava de tal forma que eu simplesmente me enfiava embaixo dos cobertores e apagava, uma fuga comum para escapar das garras tortuosas dos Ryle.

O caminho que nos levou até a cabana me deixou ainda mais sonolenta. Apesar da visão única das montanhas e da vegetação, eu sentia meus olhos pesarem. Quando Alexander parou o carro, eu não disse absolutamente nada, apenas segui em direção à cabana e me ajeitei no sofá, puxando uma manta contra mim.

Minha cabeça doía. Eu percebi seus olhos preocupados, mas ele permaneceu em silêncio. Então, eu me afundei num sono profundo. E, provavelmente, foi a melhor coisa que eu fiz porque precisava muito daquele descanso.

O sol já tinha sumido quando acordei, num salto, entendendo o quanto havia sido rude com Alexander e o quanto eu me sentia idiota por ainda me importar tanto com a opinião dos meus pais.

A cabana era pequena. De onde eu estava, eu conseguia vê-lo mexendo algo no fogão. Parecia fazer uma omelete.

Alheio a minha observação, sua postura era calma. Pensei nas coisas que disse no restaurante, e soube que ele havia sido sincero sobre sua irmã. Aquele tipo de dor não se fingia.

De repente, seus olhos volveram para o sofá e ele me observou.

— Boa noite — disse, seu sorriso pareceu me iluminar.

— Olá — respondi. — Desculpe por ter dormido.

— Você parecia cansada. Fez bem — apontou. — Ah, eu olhei o quarto. Sabia que deixaram uma cesta sugestiva para nós, nele?

— Sugestiva?

— Camisinhas, algemas de plumagem, lubrificantes e mais uma infinidade de coisas...

Eu enrubesci, mas não evitei o riso.

— Seus pais que fizeram isso?

— Oh, claro que não. Com certeza foi vovó Gerda. Vai amá-la quando conhecê-la.

— Já a amo.

Ele puxou a frigideira do fogão e despejou a omelete no prato, fazendo com que o cheiro do queijo derretido se espalhasse pelo ambiente. Meu estômago roncou.

— Ah, pelo jeito vou ter que te alimentar de muitas formas.

Apesar das palavras maliciosas, eu ri porque eu realmente me sentia confortável em sua presença. Aproximei-me da mesa e dividi com ele o alimento.

— O que fez durante a tarde?

— Eu li — ele contou.

— Você leu? — ele não parecia muito inclinado a literatura.

— Eu li sobre o projeto do Centro de Convenções — ele indicou.

— Nossa, você realmente sabe representar um papel.

Alexander não retrucou e comemos em silêncio.


Ele me encarou de forma estranha.

— Aonde você vai carregando um cobertor nas costas?

Sorri para ele. Adorava a forma como ele sempre arqueava as sobrancelhas quando me perguntava algo.

— Quero te mostrar um lugar.

— Parece interessante. Imagino se já mostrou esse lugar para outros namorados.

Havia um traço de ciúmes naquele tom?

— Não, nunca mostrei a ninguém. Você será o primeiro, satisfeito?

Sim, ele parecia satisfeito. A maneira como reagia dava a entender que éramos um casal real. O que era estranho, de certa forma, porque longe dos meus parentes, ele não precisava representar nada.

Saímos da cabana e andamos de mãos dadas até uma trilha, seguindo por ela com a ajuda da iluminação da lua. Eu estava tão segura e feliz que quase pensei que estava apaixonada.

Em pouco tempo, chegamos a uma pequena clareira. Abaixo dela, um lago parecia um espelho pela iluminação, trazendo um mundo mágico cercado de pinheiros e montanhas. O efeito era prateado, hipnotizante. O tipo de coisa que só a natureza é capaz de proporcionar.

— Ok. Isso é lindo — ele murmurou, me fazendo rir.

— Eu sempre sonhei em vir aqui à noite com uma pessoa — apontei. — Estou feliz que seja com você.

Sentamos no gramado, apreciando a visão. Eu estendi meu cobertor e ele adentrou nele. Ficamos assim, lado a lado, aquecidos pela magia.

Era um silêncio confortável.

Eu não tinha muito daqueles momentos na minha vida. E eu podia ficar assim para sempre, mas minha boca destruiu meus planos.

— Alexander... Sinto muito pela sua irmã.

Ele fechou os olhos e gemeu.

— Anne...

Percebi a relutância. Aquele não era um assunto que ele queria debater.

— Eu só queria dizer que sinto muito — afirmei.

— E como você sabe que não é uma invenção minha? — seus olhos permaneciam fixos no lago.

— Dor e abandono são coisas que eu entendo genuinamente, Alex — murmurei, recostando minha cabeça em seu ombro. — Eu queria que soubesse que eu sinto muito, mas não superficialmente. Realmente me importo com você.

— Eu sei, Anne — ele afirmou.

— E seus pais? Morreram no acidente?

— Minha mãe sim, meu pai morreu algum tempo depois. Não me importei com a morte dele, não éramos próximos.

Ele sofreu sozinho durante todo aquele tempo? Eu queria dizer uma infinidade de coisas, mas permaneci em silêncio, entendendo que quando ele quisesse se abrir, poderia fazer. Eu estaria ali para ouvi-lo.

Para minha surpresa, seus ombros rígidos relaxaram um pouco. Embora ele mantivesse o olhar focado no lago, decidiu falar mais cedo do que eu imaginava.

— Lucy sempre foi incrível. Ela sempre foi linda, gentil, doce. Era minha irmãzinha, eu gostava de cuidar dela. Nossa mãe era uma pessoa carinhosa, mas meu pai era um canalha. Ele vivia traindo minha mãe, chegando bêbado, nos agredindo...

Eu respirei fundo, me aproximando mais.

“Alex... estou aqui para você”.

— Ele me despachou para um internato assim que pôde. Nós nunca falamos sobre isso, mas eu tenho uma suspeita louca de que ele queria ficar sozinho com Lucy.

Estava horrorizada. Percebi o brilho de lágrimas em seu olhar sempre tão seguro.

— Um dia o diretor me chamou. Parece que meu pai provocou um acidente, vitimando várias pessoas, incluindo minha mãe. Lucy ficou tetraplégica, e vive em uma clínica desde então. Vou vê-la toda semana. Meu pai... Céus... Nenhum arranhão.

— Mas, disse que ele morreu.

— Sim, um infarto durante uma viagem a Paris. Diga-me onde está à justiça nisso?

Eu lhe dei um delicado beijo nos dedos. Nossas mãos ainda estavam juntas.

Ele esfregou a outra mão ao longo de sua mandíbula e finalmente olhou para mim, seus olhos tão sombrios que me fizeram querer chorar. Havia um enorme nó que se acumulava em minha garganta.

— Eu trocaria de lugar com ela, se pudesse. Ela era tão linda e cheia de vida. Agora, passa os dias numa cama. Claro, dou todo o conforto que posso, mas a verdade é que seus olhos nunca mais tiveram qualquer brilho.

Sua voz soava esmagada, e me inclinei para mais perto dele, passando o braço ao seu redor. Sabia que não havia palavras para aliviar sua angústia, então me aninhei ao seu lado apenas para estar ali, para que soubesse que não estava sozinho emocionalmente.
Ele exalou uma respiração entrecortada.

— Eu sinto muito — sussurrei, repetindo.

Ele virou a cabeça e gentilmente beijou docemente minha têmpora.

— Eu sei, Anne.

Envolvendo um braço ao meu redor, ele se deitou no cobertor, trazendo-me para baixo com ele, de modo que fiquei aconchegada contra seu peito másculo. Seus dedos se infiltraram através do meu cabelo, brincando com os fios, enquanto eu deslizava um braço ao redor de seu tronco, segurando-o com força, desejando que houvesse mais palavras para tirar sua dor.

Era estranho... De alguma forma, nós éramos interligados pela dor, negligenciados de uma maneira diferente, e sofríamos por nossas irmãs. Claro, de forma completamente diferente, mas igualmente dolorosa.

— Eu acho que é por isso que eu nunca tive um relacionamento de verdade.

Fiquei boquiaberta. Inclinei-me para ele, incrédula.

— É mesmo?

— Tenho medo de me tornar como meu pai.

— Você nunca será como ele, Alex. Assim como eu nunca serei como minha mãe. Nós não somos quem nos gerou. Além disso, você merece ser feliz como qualquer outra pessoa, merece uma família, filhos, sentir-se parte de algo.

Ele levantou a mão e afastou o cabelo que havia caído para frente e ao redor do meu rosto.

— Isso vale para você também?

Aquela pergunta me energizou. Curvei minha cabeça e o beijei. Quando nossos lábios roçaram, ele gemeu e seus dedos se emaranharam em meus cabelos, apertando seu rosto contra o meu, esmagando nossos lábios em algo que ambos precisávamos.

Alex me rolou para baixo dele, o cobertor nos escondendo da claridade da lua.

Eu me sentia uma adolescente afoita, desesperada, apaixonada...

Seu corpo firme cobriu o meu e eu senti o comprimento duro de sua ereção provocando meu baixo ventre. Minhas pernas abriram, para que nosso contato fosse mais íntimo.

A urgência nele era selvagem e imprudente, seus lábios inflexíveis contra os meus, me fizeram dar um grito mudo, sentindo um desejo poderoso e impiedoso.

Senti sua mão deslizando por baixo do meu vestido, os dedos tocando minha coxa e subindo. Sua palma quente deslizou mais alto, seu polegar roçando o úmido pedaço de algodão que cobria meu sexo, deslizando até o clitóris.

Alex pressionou e esfregou através do tecido cada vez mais úmido, fazendo-me gemer alto. Meus quadris se contraíram por vontade própria contra a mão, tentando aumentar a pressão, o atrito. . . qualquer coisa para dar a meu corpo a libertação que ansiava.

Ele continuou beijando-me enquanto seus dedos se afastavam. Eu percebi que Alexander mexia na própria calça, abrindo o zíper. Eu não conseguia esconder o choque e a inesperada plenitude que me tocou.

Ele empurrou a calcinha para o lado, e depois enterrou seu pau fundo, fazendo meu clitóris pulsar.

Não demorou e ele começou a cavalgar. Saia e entrava de uma forma única. Escondi o rosto no pescoço dele, ofegante, tão perto do orgasmo que era embaraçoso. Estava tão excitada que tudo se tornou rápido demais.

De súbito, ele agarrou meus cabelos, volvendo meu rosto para trás, um sorriso pecaminoso que me prometeu delícias. Ele estava faminto. Eu estava faminta. Eu entendi que aquela não seria a nossa única vez.

— Quero vê-la quando gozar — ele murmurou.

Mordi o lábio inferior para segurar em um gemido.

Estávamos ali, num local público, a vista de qualquer pessoa que pudesse passar pelo lago... Céus, eu nunca fora tão imprudente e...

Ahhhh...

Eu estava sendo levada à loucura, a todos os limites. A boca de Alexander colidiu contra a minha, pegando o grito antes que ele se formasse completamente e transformando-o em um longo e persistente gemido contra seus lábios. Meu corpo estremeceu e, quando ele finalmente retirou seu pau, eu estava ansiosa para vê-lo empurrando contra mim de novo... e de novo...

Ele caiu de lado. Eu puxei a calcinha, ajeitei o vestido.

— Isso foi muito gostoso — ele murmurou.

Eu ri.

— Foi loucura.

— Às vezes a gente precisa fazer loucuras para ficar sã.

Subitamente, o som de vozes próximas demais. Eu fiquei mortificada quando Alexander disse, amigavelmente:

— Olá Senhor e Sra. Ryle. Linda noite, não é?

— Sim — ouvi meu pai concordando.

Eu estava tão envergonhada que não sabia onde me enfiar. Então Alex se ergueu e ajudou-me a ficar de pé.

— Bom, já vamos indo. Tenham uma boa noite.

 


Alexander

 

G argalhei enquanto segurava um brinquedo esquisito, com várias bolinhas penduradas em um barbante.

— Como se usa isso?

Anne riu em resposta, puxando o objeto e o observando atentamente.

— Céus, não faço ideia — ela admitiu.

Após um banho relaxante e quente, buscamos pela caixa deixada pela avó dela. Algumas coisas, ambos conhecíamos, mas a maioria das coisas era novidade.

— Sua avó curte esse tipo de coisa?

— Oh, não — ela negou. — Com certeza é uma brincadeira. Ela é uma pessoa assim, divertida. Sempre foi alto astral.

— E você puxou a ela?

— Você me acha assim? Sempre me considerei uma pessoa enfadonha e...

A calei com um beijo. Anne era qualquer coisa, menos enfadonha. Eu sabia que sua personalidade havia sido massacrada, mas isso não me importava, em absoluto. Ela era a mulher mais encantadora que eu já havia conhecido.

Logo estávamos deitados na cama. Ela por baixo. Sua camisola de cetim deslizando contra meu torso nu.

Meu pênis se mexeu e endureceu contra a camisola.

— Você dorme sempre assim ou está usando isso só para me provocar? — indaguei.

— Eu durmo com uma camiseta velha de algodão — ela admitiu. — Foi Joseane que me deu isso... — riu.

— Joseane?

— A secretária de Mary e a pessoa que me indicou o aplicativo.

— Darei um presente a ela quando retornarmos a York — jurei.

Ela riu baixinho, sensualmente.

Ok. Estava tudo bem claro entre nós. Aquele momento perto do lago não foi um acaso, apesar de eu me envergonhar um pouco por ele.

A verdade é que me senti um garoto de quinze anos que não conseguiu segurar o orgasmo. Gozei muito rápido e não fosse Anne também gozar, eu estaria extremamente envergonhado.

Mas, o fato de ela usar aquela camisola me dizia que ela estava pronta para tudo, naquele final de semana.
O desejo flamejou em seus olhos. Puxei a calça do pijama para baixo revelando o tamanho do meu desejo por ela.

Sua língua roçou seu lábio inferior, e eu me senti o jantar da noite. Esse pensamento fez meu pau pulsar, desejando a sensação de sua boca macia envolvida em torno de meu eixo enquanto ela sugava o comprimento profundamente em sua garganta.

Não queria que fosse rápido como na primeira vez. Agora, eu precisava sentir cada centímentro de Anne. Eu queria tocá-la com as mãos e com a boca. Mais sangue correu para minha virilha, esticando meu pênis.

Deitei de costas e deixei que ela subisse no meu corpo. Seus lábios deslizando pela minha pele, deixando com que um gemido gutural escapasse da minha boca.

Ela baixou a cabeça, colocando um beijo quente e úmido em meu rosto; em seguida, desceu lentamente para o peito e ao longo de meu estômago esticado.

Anne estava à altura do meu quadril, segurando meu pênis, e eu observei como seus lábios rosados ??se separaram sobre a cabeça do meu falo, então ela deslizou até a base. Ela chupou. Meu corpo inteiro estremeceu de prazer. Instintivamente, enterrei as mãos nos seus cabelos, inclinando sua cabeça, aproveitando o calor úmido de sua boca trabalhando o comprimento, amando o modo como ela gemeu, como ela passou a língua sobre a fenda antes de voltar para mais.

A puxei de volta. Lambi seus lábios, sentindo meu gosto em sua boca. Seus olhos azuis estavam obscurecidos de desejo.

Seu rosto estava corado, seus lábios inchados de chupar. Aquela era a mulher que me fez arder como nunca.

Puxei sua camisola para cima, revendo seu corpo perfeito abaixo dela. Seus seios eram maravilhosos e eu não resisti em apertar a carne macia e beliscar levemente os mamilos rígidos até que ela choramingasse e se contorcesse.

Anne, sou egoísta. Quero que saiba que vou cravar minha marca em você, e que nunca mais vai querer outro depois de mim!

Deslizei minha boca até seu pescoço, acariciando com a língua sua garganta. Minhas mãos subiram até sua face, seus cabelos enrolados em meus dedos. Dei num leve puxão para que sua cabeça volvesse para trás e seu pescoço ficasse mais disponível.

Chupei e mordi. Queria que todos vissem o que eu fiz. Queria que o tal Scott soubesse que agora ela me pertencia.

— Alex — ela gritou.

Ela se contorcia embaixo de mim. Larguei seus cabelos e deslizei até os seios maravilhosos. Agarrei seu mamilo com a boca, chupando suavemente, lambendo a carne, beliscando com os dentes. Os sons que ela exalava eram muito sensuais. Desci até sua calcinha e comecei a puxá-la.

Céus, como era perfeita.

Recostei-me nos calcanhares para observar melhor aquela beleza feminina.

Meu pênis latejava, e ignorei a dor e a vontade de fodê-la, porque eu sabia que aquele momento era mágico. Era a primeira vez que eu a via assim, aberta a mim.

Alisei as coxas, até mergulhar o polegar na sua entrada. Ela gemeu sensualmente enquanto eu deslizava dois dedos para dentro dela.

Estava tão molhada... tão deliciosa.

Aproximei minha boca daquele pecado, lambendo a boceta perfeita. Suas unhas rasparam meus ombros e eu fiquei em estado eufórico. Não me importava mais se fosse rápido, eu só queria fazê-la gozar.

Roçei a língua em seu clitóris até vê-la ofegando, tremendo, inclinando os quadris contra mim na tentativa de gozar.

De súbito, não quis o orgasmo na boca. Eu queria que ela gemesse e rebolasse contra meu pau. Ergui-me e a vi em choque, decepção, uma porrada de coisas que eu mal conseguia processar. Fui rápido até o banheiro e peguei um preservativo. Retornei ainda mais rápido, ajoelhando-me entre suas pernas. Desenrolei o látex contra meu pau e me acomodei entre suas coxas.

A cabeça do meu pênis deslizou através de seu calor escorregadio e se concentrou em seu centro.

Então, passei a meter com força, porque eu já estava à beira de explodir. Suas coxas deslizaram pela minha cintura e ela seguia meu ritmo, ondulando contra mim.

Estávamos à beira do clímax, e não demorou muito para despencarmos de encontro ao paraíso.

Anne gemeu contra os meus lábios. Seus olhos azuis brilharam com êxtase, e ela mordeu o lábio inferior para conter seu grito de prazer enquanto seus músculos internos ondulavam em torno do meu membro, latejando e soltando, até que a pressão quente e escorregadia se tornou mais do que eu podia resistir.

Eu clamei por ela.

Gritei o nome dela.

Nunca antes havia chamado por uma mulher durante um orgasmo.

Com um último impulso profundo, desmoronei em cima dela, tomando cuidado para não esmagá-la com meu peso. Senti que ela relaxou embaixo de mim, e eu sorri, satisfeito e feliz.

Eu não queria me mexer. Não queria tirar meu pau de dentro dela, quebrar a conexão que parecia mais que carnal.

Mas, eu precisava fazer. Segurei a borda do látex e puxei. Ela gemeu baixinho, enquanto eu me afastava, tirando o preservativo e o jogando numa lata de lixo.

Eu estava tão feliz como nunca.

 

 

Anne

 

C omo era bom acordar aninhada em alguém como Alexander, que exalava não apenas masculinidade, mas também proteção. Suas mãos firmes estavam fixadas na minha cintura, seu corpo grudado ao meu. Era um momento especial para mim, nunca havia me sentido tão desejada quanto naquele momento.

Ignorei o pensamento de que ele podia agir assim com todas as suas clientes. Eu realmente não queria pensar. Tudo que minha mente se focava era que naquele espaço de tempo ele era meu. Que eu pagasse por isso era indiferente.

— Bom dia — murmurei.

Seus olhos tremeram um pouco. Ele sorriu antes de abri-los.

— Teremos um dia cheio — comentei, me afastando um pouco.

Ele assentiu. Nós havíamos ido para aquele resort por um motivo. E esse não era ficar naquela cama, por mais tentador que fosse.

— É hoje o aniversário da sua avó?

— Amanhã. Mas, provavelmente todos estão nos esperando para o café.

Levantamo-nos. Não tomamos banho juntos, conforme imaginei que ocorresse. Enquanto eu me lavava, ele arrumou o café. Depois, trocamos de posição. Lanchei enquanto ouvia o som do chuveiro ecoando pela cabana pequena.

Então saímos do lugar e começamos a caminhar pelo vasto gramado, em direção ao local onde a família devia se encontrar.

— Ei? — ele me chamou rápido.

Eu volvi em sua direção.

Subitamente, enterrou seus dedos em meus cabelos e me segurou, puxando-me para um beijo apaixonado.

Havia uma aura estranha entre nós, após a noite passada, como se tudo não passasse de uma ilusão. Naquele instante, Alexander a quebrou, demonstrando que havia uma realidade inquestionável de atração.

Ele havia escovado os dentes com um creme sabor hortelã. Eu pude sentir na boca o hálito gelado. Gostei e sorri.

— Agora sim você parece feliz e satisfeita — ele brincou e eu me vi a rir junto.

— Antes não parecia?

— Estava mais para nervosa e preocupada.

— E agora?

— Agora está para “ sou deliciosa e meu namorado adora me foder. Ei, nenhum de vocês teve uma noite melhor que a minha !”.

Era verdade.

— Desculpe — murmurei. — Estou nervosa. Meus encontros familiares são sempre cercados de...

— Escute: você me contratou por um motivo. E eu vou cumprir a minha parte do trato, entendeu? — ele piscou. — Eu sou muito bom no que faço, não precisa se preocupar.

Eu queria sorrir diante das palavras, mas elas só me lembravam de que aquele homem incrível estava comigo porque eu estava pagando. Talvez mamãe e Alana estivessem certas. Eu era incapaz de conquistar alguém.

De mãos dadas, fomos ao alojamento principal onde a família havia programado o encontro. Eu estava ansiosa para ver minha avó, mas a primeira pessoa a surgir diante de mim foi minha mãe.

— Anne... Que bom que não desistiu. Sua avó disse que está ansiosa para vê-la.

Desistir do quê? Parecia que ela esperasse que eu fugisse do local. Uma covarde que não estava pronta para ver a felicidade dos outros.

Subitamente, minhas mãos foram tomadas por outras, mais gentis. Encarei Gerda, minha amada avó, e senti seus braços a me cercarem.

— Olhe para ela, Rebecca — ela disse, alto. — Está radiante. Também, que mulher não estaria com um homão desses ao lado? — observou Alexander.

— Senhora, por favor, não flerte assim, pois não pretendo trocar de namorada — ele piscou sedutor para minha avó, que riu diante do gracejo.

Seus braços cercaram Alex, e ele aceitou o cumprimento com entusiasmo.

Depois, demos espaço para outros parentes que se aproximavam. Rumamos em direção a um tipo de arquibancada. Alguns tios e primos se aproximaram, eu apresentei Alex, e recebi desejos de felicidades de todos.

Nada fora do normal, do comum. Mas, todo o meu corpo se arrepiva com uma estranha sensação de formigamento.

Onde diabos estava minha irmã?

Um tipo de guia começou a explicar como seria o final de semana. Haveria gincanas e brincadeiras, e até um tipo de baile no final, para comemorarmos com elegância os oitenta anos de vovó Gerda.

Eu estava quase me esquecendo de tudo que me trouxe até ali quando meus olhos focaram-se em um casal perfeito, que acabava de entrar de mãos dadas.

— São eles — murmurei para Alex.

Imaginei o que Alex pensou sobre ela. Também ficou tentado, como Scott? Ora, Alana era maravilhosa, elegante, magra, loira, olhos claros e fascinante. Quase um modelo de perfeição. Ela usava um vestido leve de algodão, e ela possível ver, por baixo, a marca do biquíne escuro.

Era impossível não comparar. Eu me envergonharia novamente. Eu e meu maiô sem graça, meu corpo grande, minhas celulites, minha insegurança.

Eu respirei fundo, tentando manter a calma. Só então percebi Scott. Ele não parecia feliz ou dedicado. Seus olhos me encontraram e era como se ele quisesse me dizer algo.

Arqueei as sobrancelhas, tentando forçar-me a desviar o rosto, quando senti o dedo de Alexander no meu queixo.

Ele me puxou, e me beijou.

— Estamos na frente de todos — murmurei, um tanto envergonhada.

Alexander arqueou uma sobrancelha.

— Eu não me importo.

 

 

 

 


Alexander

 

C laramente a mãe de Anne era narcisista. Eu já havia reparado antes, mas aquele encontro na porta me fortaleceu a ideia. Ela não apenas desprezava a filha, como esforçava-se para levá-la para baixo. Havia uma inveja implícita que Anne era incapaz de ver. Rebecca sentia ciúmes porque Anne era tudo que ela – por quaisquer motivos – não fora capaz de ser.

Talvez fosse por causa da profissão. Enquanto Rebecca passou a vida sendo dona de casa, Anne conquistara um diploma e respeito. Alana, pelo que entendi, seguiu os passos da mãe, e isso explicava porque Rebecca tinha óbvia preferência pela filha mais nova.

Elas avassalaram a autoconfiança de Anne. Isso também estava óbvio. Anne não se via, verdadeiramente. A mulher linda, gostosa, tentadora, delicada e bondosa ficava afundada em sua mente. Perto da mãe e da irmã, ela só conseguia se autodesprezar.

Então, veio o ex-noivo. Eu reconheci o olhar de culpa e arrependimento assim que eu o vi.

Obviamente, eu já tinha uma vasta experiência com mulheres, e muitas vezes o que nos faz cair na cama de uma, não nos mantêm nela. Scott devia arder em arrependimento por trocar as irmãs. Ele tivera uma joia rara nas mãos, mas preferiu uma bijuteria barata, apenas porque chamava – a primeira vista – mais a atenção.

Que ele se fodesse! Anne era minha, agora.

Enquanto caminhavamos em direção à saída para participar da primeira brincadeira do dia, a irmã se aproximou. Seu olhar sobre mim foi como se dissesse: “ O que você faz com ela? ”. E eu respondi segurando ainda mais firme a cintura e Anne.

— Oh, Anne! — ela exclamou, numa falsa alegria, aproximando-se para dar dois beijos na irmã. — Você está... Simpática.

Simpática? Anne era linda, fascinante. Simpática você diz para alguém que não tem outra qualidade a se destacar.

— Acho que a palavra certa é maravilhosa — contrapus, firme, puxando mais Anne contra mim.

Percebi que Anne estava rígida.

— Claro... — Alana concordou, incomodada. — E, então, me apresenta seu acompanhante? — indagou, dando uma piscadela para mim, que me irritou bastante.

— Sim, claro... — Anne se volveu na minha direção, mas eu a interrompi.

— Eu sou Alexander Vicent, o namorado. E você é?

— A irmã, Alana. Ela não falou de mim?

— Ela comentou alguma coisa, mas é difícil ouvir com minha cabeça entre as suas coxas.

Claro que eu quis provocar. Não imaginei que Anne fosse ficar azul e quase desmaiar diante das minhas palavras.

Alana riu baixinho, mas eu me mantive sério. Eu não queria que ela pensasse que eu estava brincando.

De repente, o ex-noivo. Scott apareceu e não parecia à vontade. Ele me encarava com certa estranheza, e observava Anne com tristeza. Eu já havia sentido a dor nele, mas aquilo só me enervava mais.

Eu pensei que aquele final de semana seria divertido, mas estava ansioso para ir embora com Anne. Nós não precisávamos daquelas pessoas.

— Você está linda, Anne — ele disse, educado.

Eu não conseguia visualizar Anne diretamente, não conseguia lê-la. Aquilo me deixava louco. Havia qualquer resquício de sentimentos nela?

— Oi, Scott. Este é meu namorado, Alexander Vicent.

Ele apertou minha mão com firmeza. Seu olhar contra o meu parecia declarar guerra.

— Nosso casamento será em maio — Alana assumiu. — Eu penso em uma catedral imponente, mas Scott gostaria que fosse na praia.

— Eu não me importo com o lugar — ele sorriu, tímido.

Céus, eu quase ri. Estava tão claro que ele havia repensado aquela situação. Não fiquei com pena. Traidores merecem isso.

— Eu sei que essa situação é difícil para você, Anne, mas adoraria que você fosse ao nosso casamento.

Eu percebi a confusão nos olhos de Anne, como se ela não soubesse exatamente o que dizer.

E era incrível como em poucas palavras Alana conseguisse a deixar tão desconfortável.

Obviamente, desestabilizá-la era a intenção de Alana, e eu nada podia fazer, porque o papel de seguir adiante era de Anne.

— Ora — ouvi sua voz, após alguns segundos impactantes. — Somos todos adultos e não há nada de difícil em ver o casamento da minha irmã — ela sorriu.

Eu senti meu peito explodir de satisfação e de orgulho. Anne conseguira enfrentar a irmã e Alana mantinha um singelo e discreto olhar de decepção no rosto, por não conseguir seu intento.

— Alex — Anne volveu para mim. — Vamos para o lago? — depois girou para sua irmã. — A gente se vê por aí.

Então saímos.

Quando chegamos ao gramado, eu percebi o sorriso em seu rosto. Não resisti e a puxei. Trocamos um beijo casto.

— Você conseguiu — murmurei.

— Eu consegui — ela afirmou. — Eu consegui — repetiu como se não acreditasse.

— E como se sente?

— Leve...

— É isso aí. Essa é a minha namorada, senhoras e senhores — brinquei, para ninguém, e percebi seu olhar me tocar.

Talvez eu soubesse o que ela pensava. Meu coração apertou. Seria bom se fosse minha namorada de verdade. E seria, se tudo desse certo.


Nós éramos perfeitos como equipe. Vencemos a corrida do saco, a prova de canoagem e a corrida na trilha. Em cada uma das conquistas, mais que medalhas de lata, eu ganhava um beijo gentil da minha “namorada”. Talvez o segundo prêmio fosse exatamente o que havia me impulsionado a dar o meu melhor.

Eu havia reparado nos olhos de Scott sobre nós durante toda à tarde. Ele nem tentou disfarçar. Percebi também que ele havia se esforçado para ter um momento a sós com Anne, quando sugeriu que eles fizessem a prova de canoagem juntos porque em eventos passados haviam ido bem. Recusei de forma imediata.

Tinha sido um dia muito longo, mas eu me diverti e estava determinado em manter tudo sobre meu controle.

Após o jantar, voltamos à cabana. Anne gemeu, enquanto se sentava na cama.

— Estou completamente exausta — murmurou.

Mas, eu estava desesperado para tê-la. Eu não sabia se ela havia percebido o interesse do ex-noivo, ou se ela ainda ansiava por ele. Anne permaneceu uma incógnita durante o dia, e eu queria arrebatá-la para que ela não pensasse em mais nada e ninguém além de mim.

— Vamos tomar banho juntos?

Anne riu.

— Eu morreria de vergonha.

— Por quê? Eu já a vi nua.

— Mas isso é tão...

— Tão coisa de namorados? — completei.

— É — ela sorriu. — Você sabe que é o melhor namorado que eu já tive?

Eu me aproximei e lambi seus lábios.

Eu sabia disso. Era bom nisso porque a queria mais que tudo. E eu provaria mais uma vez naquela noite.

 

 


Anne

 

E u havia percebido todos os olhares que Scott me destinou no dia anterior, mas fingira que não, querendo evitar o desconfortável momento em que ele conseguiria me encontrar a sós.

E tudo aconteceu depois do almoço de domingo. Alexander deitou-se no gramado verdejante, e enquanto ele cochilava, eu decidi voltar à cabana para pegar um livro qualquer e ler às sombras da floresta belíssima.

Obviamente, eu não pensei que Scott se aproveitaria daquele momento para ir até mim. Não que eu o temesse, eu já entendia que meus sentimentos por ele haviam afundado no torpor da indiferença. Eu não mais o amava. Mas, também não sentia ódio. Na verdade, eu não sentia nada. Em todos os anos que estivemos juntos ele não me causou nem um por cento do que Alexander estava acarretando naqueles poucos dias.

— Olá — eu o cumprimentei, próximo da minha cabana. — E Alana?

Indaguei de propósito porque queria que ele se lembrasse que era noivo da minha irmã. E, em especial, queria que soubesse que eu não era como ela, disposta a enganar e cravar uma faca nas costas de outra pessoa.

— Anne... — ele começou. E eu o conhecia o suficiente para saber o que viria.

— Não, Scott — neguei, de cara. — Encerramos, ok?

— Você não pode imaginar como me sinto — ele murmurou. — Todos os dias, quando acordo de manhã, e não vejo seu rosto no travesseiro... Quero dizer, hoje éramos para estarmos aqui juntos, casados, talvez até com um filho.

— Chega, Scott! — fui dura. — Isso é passado.

— Não é passado. Eu sinto que...

— Você teve um caso com a minha própria irmã. Você me deixou a semanas do casamento. Não sabe como me senti quando precisei cancelar tudo, as flores, o buffet , os músicos, devolver o vestido... E então você aparece na minha frente e se declara para Alana. Não fazia nem um mês que me deixou e já estavam fazendo festa de noivado.

— Anne... você acha que não sei o que eu fiz? Olhe para mim. Eu sou um desgraçado. E agora te vejo com esse cara... Mas, algo me diz que você não o ama...

— Algo está te dizendo errado, então — retruquei.

— Eu sei que não acabou. Entre nós, não acabou.

— Você é louco? Claro que acabou. Acabou no momento que você me deixou para ficar com Alana. No momento que me traiu com ela.

— Ela me seduziu, me...

— Oh, coitadinho... — debochei. — Ela te forçou, é? Está se sentindo abusado? Lamento pelos seus sentimentos.

— Se você me der uma chance. Se houver uma chance mínima de voltarmos... Eu vou agora até a cabana e termino tudo com ela. Apenas me diga...

Não vou negar, foi tentador.

Eu poderia dizer o que ele queria ouvir, vê-lo abandonando Alana, e depois lhe dar um pé na bunda. Seria incrível.

Mas, de repente, aquela vingança não me era tentadora.

— Eu sinto muito — disse. — Mas, eu não me importo com você ou com Alana. Se quer deixá-la, deixe-a. Não tenho nada a ver com isso. Eu estou completa e irremediavelmente apaixonada por Alexander.

Por que não soava como mentira? Por que parecia apenas a constatação do óbvio?

— Bom, acho que você já teve a sua resposta.

A voz de Alexander soou casualmente atrás de nós. Ele caminhava em nossa direção, e obviamente havia ouvido a conversa. Quando se aproximou, me puxou contra ele.

— Bom, cara... O que posso dizer? Sirva de lição. Numa próxima vez, quando você encontrar uma mulher como Anne, respeite-a.

O rosto de Scott se avermelhou. Eu imaginei que pudesse ocorrer um embate entre eles, mas Scott recuou diante do olhar de Alexander.

Quando ele sumiu entre as cabanas, eu percebi que era a primeira vez que alguém me protegia assim.

 

 


Alexander


A avó de Anne, Gerda, teve uma linda festa de aniversário. Músicas dos anos sessenta, fogos de artifício, e um bolo que tinha pelo menos cinco andares.

Eu fiquei feliz por participar daquele momento. Não tive avós presentes, minha família se resumia a minha irmã. Dessa maneira, de alguma forma, me senti parte daquela família.

Não que aceitasse os pais de Anne ou sua irmã. Mas, os tios eram boas pessoas, os primos eram divertidos, e a avó era maravilhosa.

Quando tudo se encerrou, e as pessoas começaram a rumar em direção às cabanas, foi que percebi que era o fim de tudo. Encerrava-se ali meu contrato com Anne, que cumpri perfeitamente, e era o momento de eu dizer a verdade para ela.

Depois de tomar banho, achei que a encontraria na cama, para uma última noite como seu “ Garoto de York ”, mas ela não estava ali. Encontrei-a a poucos metros da cabana, sentada no gramado, a observar uma coruja ao longe alimentando filhotes.

Sentei ao lado dela.

Bom, e então, o que eu poderia dizer? Eu sabia que ela gostava de mim, mas estaria disposta a ser minha, em absoluto?

— Amanhã, ao retornarmos, farei uma excelente avaliação dos seus serviços. Você provavelmente é o melhor “namorado falso” que uma mulher pode ter — ela murmurou.

Havia algo na sua voz. Parecia tristeza e mágoa.

— Anne... — Céus, como explicar aquilo? — Eu quero te dizer algo... Eu... — Emudeci alguns segundos. Seus olhos volveram para mim. — Eu não sou um “Garoto de York”... — Notei a estranheza. — Tipo, eu não me inscrevi naquele aplicativo. Ele foi desenvolvido por um amigo, e ele me colocou numa fase de teste. Ele recusava todas as propostas, porque a intenção dele em me ter lá era apenas como uma brincadeira... Enfim, na verdade eu sou Presidente de uma Construtora. Eu não menti para seus pais... Eu estou trabalhando no Centro de Convenções do Governo Americano em Nova York...

Ela permaneceu em silêncio. Aquilo me deixou em pânico.

— Eu não sou um prostituto — tentei ser mais objetivo. — Eu fui te encontrar na cafeteria naquela manhã porque meu amigo aceitou sua proposta sem querer, e não queria uma avaliação negativa. Então, eu iria dizer que não estava a fim... e tal...

— O que mudou?

— Você mudou tudo — fui objetivo. — Quando eu te vi, eu embarquei de cabeça, eu vi a chance de ter uma mulher incrível, e eu quis aproveitar. — Pigarreei. — Não estou falando de sexo, isso não é difícil de conseguir para um homem na minha posição. Estou falando da sua companhia. Eu não sei explicar. Eu pus os olhos em você e eu a quis, de verdade, como nunca quis ninguém nessa vida.

Percebi Anne abrir a boca, um tanto chocada, quase como se não acreditasse. Não havia raiva nela, contudo, apenas surpresa.

— Você quer que isso entre nós continue? — ela pôs a questão sem rodeios. — Ou, contar a verdade foi apenas uma maneira de dizer adeus?

— Eu me apaixonei por você, Anne — confessei.

— Você sabe que eu também. — Ela retrucou. — Mas, parece que há algo em você que não quer que continuemos juntos após esse final de semana.

Havia. Meu pai estava ali, em meu sangue quente, me dizendo que eu era o homem que não servia para ninguém, que eu era um crápula como ele, que eu a faria sofrer, teria amantes, a machucaria de muitas formas.

Anne havia curado seus demônios com a família no final de semana. Mas, o meu havia despertado. Eu tentei reprimi-lo com todas as minhas forças.

— Eu quero — murmurei.

Entretanto, minha voz saiu forçada.

Eu não queria feri-la, magoá-la. Nunca. Eu preferia não tê-la a me tornar alguém que a fizesse chorar.

— Você não quer — ela afirmou, havia dor em seus olhos.

Estava errada. Mesmo diante dos meus conflitos, a única certeza que eu tinha é que daria a vida por ela.

Então, antes que ela se afastasse, esmaguei minha boca contra a dela, um beijo puramente emocional.

Logo, estávamos de volta à cabana, nossas roupas arrancadas, nossos corpos sedentos a se procurar nos lençóis.

Ela arqueou-se e gritou quando eu adentrei, rude e desesperado, na sua cavidade úmida.

Céus, eu a amava.

Mas eu nunca a teria.

Porque ela via minhas inseguranças, mesmo que eu as negasse. E ela não queria se arriscar a sofrer, porque já sofrera muito pelos pais.

Chegamos a um orgasmo completo. Eu quis chorar quando as sensações poderosas começaram a diminuir, e meu corpo caiu de lado, perdendo o efeito mágico da nossa união.


August apareceu na minha sala perto do meio dia. No seu rosto havia o interesse genuíno em saber como havia sido meu encontro.

— Pela sua cara, ela era uma vaca — ele deu os ombros, sentando-se à minha frente.

Eu quis rir daquela situação absurda.

— Você não poderia estar mais enganado. Ela é a mulher mais fantástica que eu já conheci.

— Então por que está com essa cara?

— Eu nem sei por onde começar — volvi os olhos para o computador. — Eu encontrei a mulher da minha vida, mas tenho medo de não ser o homem da dela.

August mexeu-se na cadeira.

— Você sabe... Eu quase perdi Kelly porque achava que uma mulher linda daquelas jamais olharia para um nerd fracassado como eu.

— Você não é um fracassado.

— Eu tinha trinta anos e nunca consegui desenvolver nada que chamasse a atenção. Sério, cara... Quando você se imagina mais velho, sempre pensa que estará numa casa bonita, com uma esposa atraente, filhos e todas essas coisas. Mas, acima de tudo, que terá um bom emprego. E eu não tinha nada. Mesmo assim, Kelly... ela viu algo em mim. Ela acreditou em mim. A gente se casou e passou a viver juntos e suas palavras sempre me motivaram. Meu primeiro aplicativo que teve uma boa comercialização foi ideia dela. Seu apoio me fez crescer.

August se ergueu.

— Talvez isso é tudo que você precise. Alguém que te ame e que te enxergue de verdade, e o faça ver a si mesmo da mesma forma que seus amigos o veem. — Ele se aproximou da porta. — Você não é o seu pai.

Minha cabeça girou, mas não tive tempo de focar naquilo. Meu celular vibrou, anunciando uma mensagem de texto.

Era Anne.


Eu a encontrei próximo do prédio dela. Seu olhar parecia dizer muitas coisas, e eu me aproximei um tanto acanhado, sem saber o que esperar.

Nós havíamos nos visto de manhã, quando a deixei diante do seu prédio. Acreditei piamente que era a última vez que eu a via. Não havia nenhum motivo para Anne desejar um reencontro, mas poucas horas depois do fim, estávamos defronte um ao outro.

— Sabe o que eu percebi, Alex? — ela indagou, me fazendo colocar as mãos nos bolsos, em defesa.

— Não...

— Quando eu estava com medo, triste e rejeitada, você me fez despertar e reencontrar a mulher que havia em mim. Agora, é você que está com medo. E está tudo bem em você ter medo. Mostra o quanto você se importa.

— Eu me importo — retifiquei.

— E eu quero ser essa pessoa que o fará perceber o homem incrível que é — ela apontou. — Porque você é isso. Você é gentil, doce, educado, engraçado... Céus, você tem tantas qualidades. Eu sei que tem defeitos também, mas eu ainda não os vi. E quando eles vierem, terei prazer em destacá-los a você e poderemos trabalhar nisso, juntos. Mas, no mais, eu decidi que quero seus serviços de forma permanente. Resta saber se você quer isso, também.

Eu sorri. Eu estava com medo, é claro, mas lembrei-me de toda vontade que havia em meu íntimo de tornar aquele final de semana algo especial para nós. Eu queria que ela me amasse. E ela amava. Eu queria que ela desejasse ser minha, e ela queria.

O que me segurava estava morto há anos. Aquele homem havia desgraçado demais minha vida, e era hora de eu reagir.

Anne enfrentou os pais, eu enfrentaria o meu.

— Permanente? Você quer dizer, algo sério e exclusivo? Meu preço não é barato — apontei, rindo.

— Estou disposta a pagar por ele — ela devolveu.

Aproximei-me rapidamente daquela mulher. Toquei seus cabelos, sentindo a maciez contra minhas mãos.

— Nunca desista de mim, Anne — pedi.

— Nunca — ela jurou.

E naquele instante eu soube que seria feliz.

 

 

                                                                  Josiane Biancon da Veiga

 

 

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