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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


AMORES CULPADOS / Jan Hudson
AMORES CULPADOS / Jan Hudson

 

 

                                                                                                                                                

  

 

 

 

 

 

Jessica voltou em si depois daquele shock e se encontrou com uns olhos muito familiares cravados nela, e uma voz conhecida que tentava tranqüilizá-la. Aquele homem era um fantasma... ou a viva imagem de seu defunto algemo.

O milionário Smith Rutledge era um texano vivinho e abanando o rabo e ficou tão perplexo como a própria Jessica ao ver quanto se parecia com seu marido... um marido que jamais a tinha feito sentir ou desejar o que Smith provocava nela.

E, embora o magnata texano merecia saber a verdade, isso significava desentupir importantes secretos do passado que podiam fazer muito dano... Enquanto procuravam respostas, ambos se deram conta de que cada vez compartilhavam mais coisas... incluindo a cama...

 

 

 

 

Smith Rutledge levantou os olhos de seu prato de macarrão para olhar a uma moça com calças curtas e camisa larga. Levava na mão uma bandeja e estava procurando mesa na abarrotada cafeteria do Harlingen, Texas.

"Bonitas pernas", foi o primeiro que pensou. Estava admirando o resto quando os olhos da jovem se cravaram nele.

Smith ia levantar se para lhe oferecer sitio em sua mesa quando viu que ela o olhava com expressão horrorizada.

-Tom! -gritou.

Então, pondo os olhos em branco, deprimiu-se.

Um motero cheio de tatuagens tropeçou com ela e caiu ao chão, lhe atirando a bandeja em cima.

A ruidosa cafeteria ficou em silêncio repentinamente. Smith se levantou de um salto e correu a auxiliar à mulher.

O motero, talher de molho de tomate, levantou a cabeça, perplexo:

-O que acontece?

-Creio que se deprimiu. vá procurar ao dono da cafeteria -murmurou Smith, tomando o pulso a jovem.

Estava pálida e a bandeja lhe tinha feito um corte na frente.

O proprietário chegou em seguida, muito nervoso.

-Já chamei a uma ambulância. O que passou, senhor Rutledge?

-Não sei, Juan. deprimiu-se e o homem que ia detrás dela tem cansado em cima. Está inconsciente.

Smith não acrescentou que se deprimiu ao vê-lo, como se ele fora Hannibal Lecter, o assassino do silêncio dos cordeiros. Enfim, não era tão bonito como seu irmão Kyle, mas não estava acostumado a exercer tal efeito nas mulheres. E quem demônios era esse Tom? Pouco depois chegou a ambulância e os enfermeiros a colocaram em uma maca, fazendo perguntas que ele não podia responder. Não sabia seu nome e muito menos se era diabética ou alérgica a algum medicamento.

Smith tomou sua pesado bolsa e procurou o moedeiro para ver se encontrava algum documento que a identifique-se. Encontrou uma de cor marrom e, ao abri-lo, ficou gelado.

No moedeiro da jovem desconhecida havia uma fotografia dela. Não só uma, várias. Mas não podia ser... O não tinha visto aquela garota em toda sua vida. Entretanto, ali estavam os dois juntos. Era absurdo.

-Temos que levá-la ao hospital. Como se chama?

Perplexo, Smith olhou ao enfermeiro que o fazia a pergunta.

-O que?

-Como se chama esta jovem?

-Ah... Jessica Ou'Connor Smith. chama-se Jessica Ou'Connor Smith. Vou com vocês.

-Não pode vir na ambulância.

-Então os seguirei em meu carro.

Smith guardou o moedeiro e, com a bolsa na mão, saiu detrás da maca.

 

Estava sentado na sala de espera, mas os nervos o obrigaram a levantar-se para dar um passeio.

Levava ali uma hora. Tinha tentado entrar na habitação, mas uma enfermeira a quem lhe importavam bem pouco as doações que fazia ao hospital, negou-se a deixá-lo passar.

-Tenho ordens de que ninguém a incomode. O médico falará com você quando tiver terminado.

-Pois está tomando-se seu tempo -murmurou Smith para si mesmo.

Estava preocupado pela mulher, mas sobre tudo estava preocupado pelo que tinha visto em seu moedeiro.

Nervoso, sentou-se em uma cadeira de plástico e olhou as fotografias de novo. Devia as haver cuidadoso uma dúzia de vezes desde que chegou ao hospital. Como era possível? Não recordava ter visto aquela jovem loira em sua vida.

Uma vez, anos atrás, bebeu muito tequila com seus amigos e despertou dois dias mais tarde, confuso e com os bolsos vazios, em um velho hotel do Matamoros. Mas solo tinha ocorrido uma vez e aprendeu a lição.

Após, exceto alguma cerveja ou uma taça de vinho durante as comidas, não estava acostumado a beber. Com o cenho enrugado, estudou a fotografia da Jessica Ou'Connor Smith. Uma garota bonita com um sorriso de cinema. Não teria esquecido a alguém como ela. Na foto tinha o cabelo mais curto, mas era a mesma mulher.

Jessica Ou'Connor Smith, número 218 do Elm Street, Bartlesville, Oklahoma, dizia seu documento de identidade.

Smith não tinha estado nunca no Bartlesville. Também encontrou um cartão de crédito, o carnê de uma biblioteca e vinte e oito dólares em efetivo. Em sua bolsa havia todo tipo de cacarecos, mas nada que pudesse lhe dar pistas sobre ela. Nem agenda, nem cartas, nada pessoal.

O sobrenome Ou'Connor seria seu sobrenome de solteira ou de casada? Não levava aliança. Nem sequer tinha a marca de havê-la levado.

Provavelmente era uma turista, um de tantos visitantes que deixavam atrás o frio para desfrutar da cálida temperatura de Rio Grande.

Smith chamou informação do Bartlesville para localizar a sua família, mas a operadora o informou que não havia ninguém chamado Ou'Connor Smith naquela direção. Que estranho. Possivelmente seu número não estava na guia.

- Senhor Smith?

O levantou o olhar.

-Sou o senhor Rutledge.

-Perdão. Pensei que o sobrenome da paciente era Smith -desculpou-se um homem de bata branca-. Não é você seu marido?

-Não, sozinho... um conhecido.

-Ah, claro. É você Smith Rutledge, da empresa Smith, S.A, a dos ordenadores, não? Perdoe que não o tenha reconhecido, senhor Rutledge. Evidentemente, o médico estava mais impressionado com suas doações que a enfermeira.

-Como está a senhora Smith?

-Confusa e enjoada. O corte na frente não é nada sério, mas creio que tem a boneca fraturada. Agora estamos esperando o relatório de raios X.

-Sabem por que se deprimiu?

-Por isso ela me há dito, parece que não tinha comido nada em todo o dia e certamente sofreu uma baixada de açúcar. Estamos fazendo provas, mas seguro que ficará bem.

-Está acordada? Poderia vê-la?

-Ainda não, senhor Rutledge. A enfermeira lhe dirá quando pode entrar. Quer tomar um café enquanto espera?

Smith negou com a cabeça e se dispôs a passear de novo.

 

Transcorreu mais de uma hora até que a enfermeira foi buscá-lo à sala de espera.

-Temos problemas, senhor Smith.

-Senhor Rutledge.

-Ah, perdão. O médico insistiu em que deve acontecer aqui a noite, mas ela quer ir-se. Diz que não pode pagar a atenção médica neste hospital... Mas não pode partir. Está médio atordoada pelos medicamentos e leva um estuque no braço. Não pode conduzir assim... você pode fazer algo?

Smith se levantou.

-Posso tentá-lo.

A mulher que encontrou na habitação não se parecia muito a que tinha visto na cafeteria, nem à agitada paciente que descreveu a enfermeira. Tinha uma atadura na frente e um estuque no braço esquerdo, da boneca até o cotovelo.

Mas estava dormida como uma menina.

Com o pálido rosto apoiado no travesseiro e as pálpebras fechadas, parecia tão frágil... algo em seu vulnerável aspecto lhe tocou o coração. Sem saber por que, sentiu o desejo de protegê-la.

-Senhora Smith, senhora Smith... -tentava despertá-la outra mulher-. Preciso saber se tiver seguro médico. Qual é sua direção? Senhora Smith, necessito o telefone de algum parente...

-Deixe-a em paz -interrompeu-a ele.

-Mas tenho que saber quem vai pagar a fatura.

-Eu a nota promissória -disse Smith, tirando um cartão de crédito-. Envie a fatura a meu escritório. E agora, vá-se daqui.

A mulher o olhou, indignada.

-Perdoe, mas solo estou fazendo meu trabalho.

Ele se passou uma mão pela cara.

-Sim, claro. Sinto muito.

Smith ficou olhando a jovem dormida, tentando conter seu desejo de despertá-la. Tinha muitas perguntas que fazer, mas não era o momento.

-Creio que o calmante por fim tem feito efeito -suspirou a enfermeira-. Subiremo-la a planta dentro de uns minutos.

-Que a ponham sozinha em uma habitação.

-Mas eu não tenho autorização...

Smith lhe deu seu cartão.

-Chame o diretor, por favor. lhe diga que quero falar com ele agora mesmo.

Se Jessica Ou'Connor Smith ficava no hospital essa noite, ele ficaria também. Não pensava afastar-se daquela mulher até que conseguisse respostas.

depois de falar com o diretor, Jessica foi ascensão a uma habitação na planta de traumatología.

Esperando que despertasse para lhe perguntar pelas fotografias, Smith se sentou em uma poltrona. A meia-noite se sabia de cor cada detalhe de seu rosto, até o diminuto lunar que tinha sob a sobrancelha esquerda. Era uma mulher atrativa, de rasgos fortes: maçãs do rosto altos, lábios generosos e um furinho no queixo, embora não tão pronunciado como o seu.

De repente, ela começou a agitar-se e Smith tomou sua mão, murmurando palavras tranqüilizadoras. Naquele momento lhe pareceu o mais natural do mundo. E a jovem se agarrava a sua mão como a um salva-vidas.

Voltou a comprovar que não levava aliança... de fato não levava jóia alguma, embora tinha buracos nos lóbulos das orelhas.

A enfermeira lhe tinha dado seu relógio para que o guardasse, um relógio barato, com a correia de plástico. Nada que indicasse quem era sua proprietária.

Uns minutos antes, Smith tinha comprovado os bolsos de sua calça para ver se levava algo que pudesse lhe dar informação. Mas solo encontrou um caramelo e cinqüenta centavos.

Isso sim, descobriu que a talha da calça era a 38, o prendedor uma 85 e as sapatilhas de esporte, do 37.

A camisa era de talha extra grande e Smith se perguntou se seria de algum homem. Seu marido, possivelmente.

Às duas e meia da manhã, Jessica se moveu, inquieta. Parecia estar tendo um pesadelo e seus gemidos lhe rompiam o coração.

-Não passa nada. Tranqüila, está bem.

Então ela abriu os olhos e, ao vê-lo, sorriu.

-Tom, está aqui -disse em voz baixa-. Deve ser um anjo.

Apertou sua mão e voltou a ficar dormida.

 

Doía-lhe a cabeça. E tinha tido um sonho muito estranho. Jessica abriu os olhos e olhou ao redor. Tudo era tão branco... onde estava?

Doía-lhe tudo, os braços, as pernas... Quando conseguiu abrir os olhos de tudo, viu que tinha um estuque no braço esquerdo. A cabeça de um homem descansava sobre sua perna e em seguida reconheceu o cabelo castanho avermelhado. E lhe pôs o coração na garganta. -Tom!

Mas não podia ser Tom. Tom estava morto. Tinha morrido dois anos antes.

Entretanto, quando o homem levantou a cabeça, eram os olhos verdes do Tom os que a olhavam. Tão expressivos que telegrafavam seu estado de ânimo, como sempre. Mas eram claros e serenos, não cheios de dor. E seu corpo era sólido e são em lugar de... "OH, Meu deus!".

-morri? Estou no céu?

-O céu? O que diz? Está no hospital do Harlingen, Texas. Não te lembra?

Jessica piscou várias vezes, tentando fazer desaparecer a aquele fantasma. Mas Tom não desaparecia e seu coração começou a pulsar, acelerado.

-por que... está aqui?

-Estou aqui para procurar respostas. Quem é?

-Sou sua mulher. Não me reconhece?

-Vi-te pela primeira vez ontem, na cafeteria. Não te tinha visto em toda minha vida. A que está jogando?

O coração da Jessica pulsava com tal força, que quase o fazia danifico.

-Não sei de que falas.

Tentou incorporar-se, mas se enjoou e Tom teve que sujeitá-la.

-Não te mova. Tem uma via no braço e deve descansar.

Aquelas mãos grandes sobre seus ombros eram muito cálidas e reais. Inclusive podia cheirar sua colônia.

-Está me assustando. Vete, Tom. Vete. Está morto.

Jessica fechou os olhos e ficou a rezar.

-Não estou morto. me toque -disse ele então, pondo uma mão sobre sua cara-. Estou vivo. E não me chamo Tom.

Ela olhou ao homem: os olhos verdes, o furinho no queixo...

-É igual a Tom. Falas igual a Tom. Não entendo o que está passando. Quem é?

-Sou Smith Rutledge. Smith Aliam Rutledge, presidente do Conselho de Administração da empresa de informática Smith, S.A Te soa de algo?

Jessica negou com a cabeça.

-Não, mas eu tenho um ordenador portátil... esse Smith?

-Esse mesmo. E quem é você? Quem é esse Tom do que falas?

-Sou Jessica Ou'Connor Smith. E Tom, Thomas Edward Smith, é... era meu marido. É exatamente...

Um homem com bata branca entrou então na habitação, seguido de uma enfermeira.

-bom dia, Jessica. Sou o doutor Vargas. Como te encontra esta manhã? Melhor?

-Encontro-me bem e quero sair daqui quanto antes. Não tenho seguro médico e esta habitação... A fatura deve ser astronômica.

O doutor Vargas sorriu.

-Não se preocupe pela fatura. comprovei as provas que lhe têm feito e, exceto pela anemia, tudo está bem. Pode ir a casa, mas tem que seguir um regime. É importante que coma mantimentos ricos em ferro.

Ela levantou a mão engessada.

-O que me passou?

-Fraturaste-te a boneca, mas estará recuperada em menos de seis semanas. Para então faremos uma nova análise de hemoglobina.

-Seis semanas? Mas se eu não vivo aqui. Ia de passagem ao Brownsville... bom, Matamoros. Pensava deixar a caravana em...

-Conduz uma caravana? Você sozinha? -perguntou o médico.

-Sim, claro.

-Eu não recomendaria que conduzisse um veículo tão pesado por agora. E com a anemia, deveria descansar durante ao menos quinze dias.

-Mas não posso ficar aqui, doutor Vargas. Não conheço ninguém e, além disso, tenho que trabalhar...

Smith a interrompeu:

-Eu me encarregarei de que faça o que tem que fazer, doutor.

-Ah, muito bem, senhor Rutledge -sorriu o homem dando um golpecito a Jessica na mão boa-. Veremo-nos dentro de seis semanas.

Depois se deu a volta e saiu da habitação.

-Como que você te encarregará de tudo? Quem te crie que é?

Smith sorriu então pela primeira vez.

-Pensei que já lhe havia isso dito. Sou Smith Rutledge, o homem que procura respostas. E penso te levar a casa comigo.

-Disso nada!

 

Não estava segura de como a tinha convencido.

O diretor do hospital insistiu em que Smith Rutledge era um dos homens mais importantes da cidade, mas Jessica não tinha a mais mínima intenção de ir com ele a nenhuma parte.

Possivelmente os remédios a tinham deixado adormecida ou possivelmente estava perplexa ante seu incrível parecido com o Tom... O caso era que se encontrou no assento dianteiro do esportivo do Smith Rutledge, com um travesseiro debaixo do braço e todas suas coisas em uma bolsa de plástico.

-Estou preocupada com minha caravana. Quase tudo o que tenho está ali e segue estacionada diante da cafeteria.

-Não se preocupe. Um de meus homens a levou a meu imóvel.

Ela o olhou, atônita.

-De onde tiraste as chaves?

-Dessa bolsa enorme que leva.

-olhaste dentro de minha bolsa?

-claro que sim. Como se não ia ou seja seu nome?

Jessica ia protestar, mas o pensou melhor. Para que discutir?

-Dói-te a cabeça?

-um pouco. Sou muito sensível aos analgésicos Y... além disso, tudo isto é muito estranho, como um sonho.

-Já me imagino.

-É incrível como te parece com meu marido. Tinha ouvido que todo mundo tem um dobro em alguma parte, mas não acreditava até agora. E que coincidência que nos tenhamos conhecido.

-Eu não creio nas coincidências -replicou ele, sem olhá-la-. E isso dos dobre é uma tolice.

Atônita pela brusca resposta, Jessica ficou olhando-o um momento.

-Então, como o explica? É exatamente igual a Tom.

-Eu não posso explicá-lo. Espero que o você faça.

Estavam chegando a um enorme portalón de ferro sobre o que havia um letreiro que dizia "Granja Sugartime". Um guarda lhes abriu a porta.

-Como posso explicar o que eu mesma não entendo?

-Falaremos mais tarde. Já quase chegamos.

-Onde?

-A minha casa.

Jessica olhou o caminho rodeado de árvores. ao longe se viam imensas plantações de árvores frutíferas.

-Tudo isto é teu?

-Sim.

-O que são?

-Laranjeiras, limoeiros e toronjas.

-Muito suco, não?

Smith assentiu, sorrindo.

-mais de dois mil acres de terreno.

-Eu sou alérgica aos toronjas.

-Alérgica ao pólen?

-Não, solo ao suco de toronja. Me encham os lábios e me saem rodelas. Curiosamente não sou alérgica aos limões nem as laranjas. Solo aos toronjas -suspirou Jessica, apoiando a cabeça no guichê.

-Pois o sinto. Porque meu som os melhores do vale.

Smith deteve o carro frente a uma casa impressionante. De estilo espanhol, com paredes de estuque e balcões de ferro forjado, parecia uma mansão da Beverly Hills.

No jardim, buganvillas, magnólias e todo tipo de flores. Frente à casa, uma fonte de pedra com três canos.

-Que maravilha!

-Obrigado.

Jessica seguia olhando boquiaberta quando ele a ajudou a sair do carro. Doía-lhe tudo ao mover-se, mas tentou não demonstrá-lo.

-Tem que tomar outro analgésico. Espero que a enfermeira já tenha chegado.

-Que enfermeira?

-A que vai cuidar de ti.

-Por favor! Outro analgésico é quão último necessito. E tampouco necessito uma enfermeira. Solo tenho uma pequena fratura na boneca.

-E anemia. O doutor Vargas há dito que precisa cuidados.

-O que cuidados? Umas pastilhas de ferro, um par de filetes de fígado e estarei como nova. Não me passa nada.

-Eis aceito fiscalizar sua recuperação e penso fazê-lo, Jessica.

-Mas...

-Vamos a seu dormitório. Falaremos mais tarde.

-Um momento! Ninguém te há dito que mandas muito? -replicou ela, irritada. Smith sorriu. -Ultimamente, não.

-Têm-lhe medo ao chefe, né? Pois deixa que te diga uma coisa: eu não gosto que me dêem ordens. Pode que seja o dono de uma empresa millonada... mas não é meu chefe, assim me deixe em paz. Nem sequer sei por que eis aceito vir aqui.

-Não me diga?

Suas palavras tinham um claro dobro sentido, mas Jessica estava muito enjoada para seguir discutindo. Quão único desejava era tombar-se e dormir durante cinco dias.

Ia dar um passo adiante, mas se tropeçou.

-Cuidado -disse ele, tomando-a do braço.

Uma mulher alta saiu então da casa.

-Olá, sou Kathy McCauley, sua enfermeira. Deixe que a ajude.

-Estou bem -insistiu Jessica-. Solo um pouco enjoada pelos calmantes...

Mas tropeçou de novo e Smith tomou em braços.

-Não está bem.

-me solte! Estou perfeitamente.

-Deixa de protestar. Além disso, pesos menos que uma pluma.

-Isso não é verdade.

-Eu faço pesos e te asseguro que é muito ligeira.

Jessica deixou escapar um suspiro. Estava muito cansada para brigar com ele. Quando apoiou a cabeça em seu ombro, pareceu-lhe a coisa mais natural do mundo.

E se sentia segura. Pela primeira vez em anos, sentia-se segura.

 

Quando esteve instalada em sua habitação e a enfermeira a informou que se ficou dormida, Smith se dirigiu ao celeiro. A caravana, um veículo velho que tinha visto dias melhores, estava estacionada a um lado do edifício.

Como já tinha sido objetivo de algum vigarista, pensou chamar a seu chefe de segurança, mas decidiu não fazê-lo. Poderia solucionar aquele assunto ele sólito.

Smith vacilou sozinho um momento antes de abrir a porta da caravana. Devia registrá-la se queria respostas.

Em um velho arca encontrou três pares de jeans, duas camisas, cinco camisetas, sapatilhas de esporte... todo roupa usada e de pouco valor, exceto uns jeans de desenho.

Em um pequeno armário havia um casaco de couro negro e uma jaqueta. Também ali, em bolsas de plástico, viu dois trajes de jaqueta, um vestido e três blusas de seda.

Ele não sabia muito de roupa feminina, mas pareciam objetos caras. Entretanto, não tinham etiquetas. "Que estranho", pensou.

além de uns sapatos de salto havia uns mocasines de ante e um par de modernas botas.

Encontrou também natas, produtos de beleza... todos eles baratos. Os únicos produtos caros eram amostras gratuitas, sobre tudo frasquitos de colônia.

As únicas jóias: uns pendentes de ouro, outros de prata e um broche em forma de mariposa.

Os armaritos da cozinha continham cereais, manteiga de amendoim, pão de molde, bolachas e latas. Muitas latas. Se se alimentava assim, era lógico que tivesse anemia.

A colcha da cama estava feita à mão e o travesseiro tinha uma bonita capa de cetim azul. Em cima, um macaco de peluche. O boneco mais horroroso que tinha visto em toda sua vida.

Frente à cama, adesivos com frases de ânimo para começar o dia: "que abandona perde a carreira", "o que sua mente pode conceber, você pode levar a cabo". E um velho provérbio cherokee: "Que sua visão não se veja nublada pelo medo".

Isso estava marcado em rotulador amarelo.

debaixo da cama encontrou uma gaveta com livros, uma lanterna, uma máquina de costurar e um mesa de costura. Sob o assento da cozinha, uma maleta fechada, um ordenador portátil e uma pequena impressora.

além disso, caixas. Montões de caixas. E a maioria continham bolsas. Havia mais bolsas que em uma loja. Quase todos eram do mesmo estilo: metade mochila, metade bandoleira, com vários bolsos. Estavam confeccionados com tecido vaqueiro ou couro negro e marrom.

Outros eram bolsitos de festa com flores bordadas, lentejoulas, cristalitos... Todos diferentes. Havia material para fazer as bolsas e, por fim, cajitas pequenas dentro de outras caixas. Eram de cor nata e tinham uma asa dourada de tecido. Nas tampas, o nome da Jessica Milhares escrito em letras douradas.

Quem demônios era Jessica Milhares? Evidentemente, a criadora das bolsas. Smith abriu a última caixa: material de escritório. além de fólios, um livro de pedidos e cartões profissionais. Todas anunciando as bolsas da Jessica Milhares, com uma direção do Oklahoma e uma página Web. Smith se guardou uma no bolso e colocou um pouco de roupa em uma bolsa.

Pouco depois saía da caravana com a bolsa, o ordenador e a maleta. Quando a Bela Adormecido despertasse, saberia tudo sobre ela.

 

Jessica abriu os olhos de repente. Estava absolutamente acordada. O problema era que não reconhecia a habitação.

Nada lhe parecia familiar, mas assim que apartou o edredom, a dor na boneca lhe recordou onde estava. Igual à bata de hospital.

Então o recordou tudo. Smith Rutledge. O homem que se parecia tanto ao Tom. E que se chamava Smith de nome, em lugar de sobrenome. Tudo muito estranho.

Acendeu a luz e olhou o despertador. As oito. Da manhã ou da tarde?

Jessica olhou ao redor. Os móveis eram de estilo espanhol, as paredes estavam pintadas em cor nata e o estou acostumado a era de ladrilhos cor terracota.

O cabecero da cama, de cor amarela pálida igual às mesinhas, era de madeira muito clara, com um desenho de flores pintado em tons verdes. Era o trabalho de um bom artesão. Um trabalho magnífico.

Nesse momento se abriu a porta da habitação e entrou uma enfermeira.

-Ah, já está acordada. ia despertar a agora mesmo. O senhor Rutledge não queria que se perdesse outra comida.

-Outra comida?

-São quase as oito e o senhor Rutledge pensou que gostaria de jantar na terraço. Gosta?

-Suponho que sim -murmurou Jessica-. Devo ter dormido tanto pelos calmantes. Eu nunca tomo mais uma aspirina... Sinto muito, não recordo seu nome.

A enfermeira sorriu.

-Sou Kathy McCauley. Quer lavar-se um pouco?

-Sim, obrigado.

Tremiam-lhe um pouco as pernas, mas conseguiu apoiar-se no lavabo. Ali havia uma escova de dentes novo e um montão de natas e produtos de banho. Jessica se fixou em que também sua nécessaire estava ali.

-Rosa trouxe suas coisas da caravana -explicou-lhe a enfermeira.

-Quem é Rosa?

-O ama de chaves. Quer que a ajude a escovar o cabelo?

-Sim, por favor. Fazer coisas com o estuque me vai resultar difícil -suspirou ela, deixando cair sobre um tamborete forrado de raso.

-Não se preocupe, em seguida se acostumará -sorriu Kathy.

-Incomoda-me não poder fazer as coisas por mim mesma.

-É normal, mas necessita uns dias de descanso... Já está. O que lhe parece?

Jessica se olhou ao espelho.

-Muito bem. Deveria fazer-se cabeleireira.

-Sou-o. Tenho três filhas -riu a enfermeira-. Espere, vou trazer lhe um penhoar. Por certo, enquanto estava dormida fui a comprar um par de vestidos de manga larga para que não tenha problemas com o estuque. Também comprei sapatilhas e um par de coisas mais.

Quando voltou, levava na mão uma camisola azul com bata a jogo.

-Kathy, eu não posso pagar isso. Mas se deve haver flanco uma fortuna... Prefiro me pôr uma camiseta e uma calça de esporte.

-Não tem que me pagar isso Carreguei-o à conta do senhor Rutledge. Tem muita sorte de que esteja louco por você. além de muito bonito é o homem mais rico do vale. E lhe asseguro que estas compras não têm feito trinca em sua conta corrente.

-Louco por mim? Do que está falando?

-Vamos, vamos... o pobre esteve pego a sua cama até que voltei às compras. Venha, fique o El camisón azul era como un sueño. Y la bata, con mangas de kimono y cuello cerrado, la hacía sentir elegante incluso con aquella estúpida escayola. Kathy insistió en que se pusiera un poco de colorete y brillo en los labios.

A camisola azul era como um sonho. E a bata, com mangas de quimono e pescoço fechado, a fazia sentir elegante inclusive com aquele estúpido estuque. Kathy insistiu em que ficasse um pouco de ruge e brilho nos lábios.

-Vê-o? Com um pouquinho de cor está fabulosa. Disposta para jantar?

-Mais que disposta, faminta. Você vai jantar conosco?

-Disso nada -sorriu a enfermeira-. Penso deixá-los sozinhos.

Smith Rutledge tinha os pés apoiados no corrimão da terraço. Ao vê-lo, Jessica se surpreendeu de novo. Era incrível. Ao Tom também gostava de fazer isso. Estava acostumado a arreganhá-lo porque se danificava as botas... mas as botas de seu marido não eram tão caras como as que levava Smith. Para ouvir seus passos, ele se levantou.

-Está muito bonita.

Jessica tocou sua trança e se voltou para a Kathy... mas Kathy tinha desaparecido.

-Obrigado. Não sei quando poderei te pagar tudo isto. Pode que tarde um pouco. Meu negócio...

-Tem problemas econômicos?

-Temo-me que sim. Acabamos de começar.

-Acabamos?

-Meu sócia e eu. Shirley Milhares.

-Ah, daí o nome de Bolsas Jessica Milhares. combinaste seu nome e o sobrenome de sua sócia.

-Como sabe o da Jessica Milhares?

-Pois... encontrei um cartão quando tirava suas coisas da caravana.

-Pensei que tinha sido Rosa.

-Tirei-as eu. Rosa as levou a sua habitação -explicou Smith, apartando uma cadeira.

Que ele tivesse estado olhando entre suas coisas a fez sentir incômoda. Mas tentou dissimular tomando um sorvo de suco de laranja.

-Está muito rico.

-Obrigado. É de minha plantação de laranjeiras valencianas.

-Não são laranjas nativas?

-As nativas maturam antes, as valencianas em fevereiro e duram até abril ou maio. É uma pena que não possa tomar toronja. Os que ficam agora nas árvores são muito doces.

-Já te contei o da alergia...

-Sim, sei. Mas se supõe que o suco de laranja faz que se assimile melhor o ferro dos mantimentos... e quanto mais fresco, melhor. Assim tome o tudo -sorriu Smith, lhe servindo uma enorme porção de salada de espinafres-. Os espinafres contêm muito ferro.

-Se me como tudo isto, poderá me levantar com um ímã.

-Passei-me?

-Um pouquinho.

-Come o que possa e deixa o resto. Ric chegará em seguida com o segundo prato.

Comer com a mão direita lhe resultava difícil. E fazê-lo com ele olhando-a, impossível.

-É que me resulta incômodo... sou canhota.

-Não se preocupe. me fale de seu negócio. Vírgula começou?

-Shirley e eu tínhamos falado disso muitas vezes. Eramos professoras no mesmo instituto e queríamos ganhar mais dinheiro do que ganha no ensino, assim decidimos abrir um negócio. Como eu estava acostumado a desenhar minhas próprias bolsas, pareceu-nos que merecia a pena tentá-lo.

-É professora?

-Sim, de desenho.

-E deixaste o instituto?

-pedi excedencia durante um ano. Shirley tem dois meninos, assim decidimos que ela levaria as coisas de casa e eu me atiraria à estrada.

-Para que?

-Para procurar negociados. visitei centenas de boutiques. Nosso modelo ergonômico é o mais solicitado...

-Modelo ergonômico?

Jessica sorriu.

-É uma idéia que me ocorreu quando Shirley se fez mal nas costas. Há outros no mercado, mas eu creio que o meu é um bom desenho... além disso, costa mais barato.

-E os fazem em uma fábrica?

-O marido do Shirley tem uma tapeçaria e sua equipe é o que faz o trabalho. A bolsa ergonômica está desenhada para que possa colocar de tudo sem que apesar muito. Assim não lhe doem nem os ombros nem as costas.

-Que interessante. Terá que me explicar como funciona.

-A sua noiva gostaria de ter um. Inclusive posso bordar seu nome ou suas iniciais se quiser. Prefere tecido vaqueiro ou couro?

-Não tenho noiva.

-Um homem tão bonito como você? -sorriu Jessica-. Não me acredito.

-Pois é verdade.

-E que tal sua secretária ou as garotas de seu escritório? Essas bolsas são um bom presente de Natal...

Smith levantou as mãos em sinal de rendição.

-De acordo. Quero uma dúzia.

-Oxalá todas as vendas fossem tão fáceis -riu ela.

-O negócio não vai bem?

-Não vai mau, mas é difícil fazer-se com uma carteira de clientes. Sobre tudo, para as bolsas de festa. Esses são os que dão mais dinheiro. São criações únicas que quero vender em boutiques exclusivas Y... -Jessica se mordeu os lábios-. Temos um stand contratado na feira de Dallas para meados de abril e devo terminar o inventário, mas não sei como vou fazer o com este estuque.

-Não se preocupe, tudo se arrumará.

-Mas é que temos outro stand no Corpus Christi o fim de semana que vem e em Houston depois disso. E, além disso, tenho que localizar a uma mulher no Matamoros -disse ela então, com expressão angustiada.

Um jovem apareceu nesse momento com uma bandeja.

-Obrigado, Ric. terminaste sua salada, Jessica?

Ela assentiu, surpreendida ao ver que quase a tinha comido toda.

Ric serve o segundo prato e desapareceu.

Era um filete de fígado encebollado.

-Muito ferro, né?

-Segundo o médico, isto é o que deve comer.

Ela odiava o fígado, mas não queria insultar a seu anfitrião. De modo que atacou o filete, tomando a maior quantidade possível de purê de batatas para passar o gole.

-Agradeço-te muito o que está fazendo por mim. Mas não se preocupe, partirei-me amanhã.

-O médico há dito que não deveria conduzir. E não creio que possa levar a caravana com uma mão engessada.

-Poderia ficar em casa do Shirley...

-Ou poderia ficar aqui.

-Durante seis semanas? Não posso fazer isso. Nem sequer nos conhecemos Y...

-O vinho também é bom para a anemia. Quer uma taça?

-Não bebo, obrigado.

-Eu tampouco estou acostumado a beber -suspirou Smith-. Me fale do Tom.

Jessica deixou o garfo sobre o prato.

-O sim bebia.

-Tinha um problema com o álcool?

-A noite do acidente tinha estado vendo uma partida com seus amigos Y... bebeu muito. Por isso chocou contra um muro quando voltava para casa.

-Morreu?

Ela negou com a cabeça.

-lesou-se o espinho dorsal. Morreu de pneumonia um ano depois.

-Sinto muito.

-Obrigado -murmurou Jessica, tentando tomar outro bocado. Mas lhe resultava impossível-. Não posso comer mais.

-Nem sequer a sobremesa?

-Embora fora de chocolate.

-Creio que é um bolo de damasco. Já sabe que os damascos são muito...

-Ricos em ferro -terminou ela a frase.

-me conte mais coisas do Tom. A que se dedicava?

-Antes do acidente?

-Sim, claro.

-Tinha uma oficina de reparação de ordenadores no Bartlesville... ali é onde vivíamos. Era um gênio dos ordenadores. E também tínhamos uma granja com jardim e um pequeno horta. Tom podia plantar algo e crescia em seguida... inclusive rosas. Tínhamos uma roseira preciosa. E adorava montar a cavalo. Não poder fazê-lo foi para ele... -Jessica não terminou a frase, afogada pelas dolorosas lembranças-. Sinto muito, mas estou muito cansada. Importa-te se for a minha habitação?

Smith se levantou.

-Perdoa. Deveria me haver dado conta de que ainda está convalescente. Mas, como pode imaginar, estou muito interessado nesse homem que tanto se parece comigo. Deixa que te acompanhe.

Jessica não discutiu. Estava cansada, e falar do Tom era quão último desejava fazer. Já tinha sofrido muito.

-Espero que possa me perdoar se te fizer um par de perguntas mais sobre seu marido. Tinha família?

-Sua mãe, morreu faz vários anos e sua avó tem Alzheimer. Está em uma residência e já nem sequer me reconhece. Às vezes me chama Ruth... assim se chamava a mãe do Tom.

-Já vejo. Espera, vou chamar a Kathy.

-Não faz falta, obrigado.

-Segura?

-Segura.

Com inapetência, Smith saiu da habitação. Ela sabia que desejava fazer mais pergunta sobre o Tom, e era lógico. Mas estava muito cansada e não queria recordar o passado. Já era suficientemente estranho olhar ao Smith e ver seu defunto marido. Quase poderiam ter sido irmãos gêmeos.

Mas eram pessoas muito diferentes. Sua forma de mover-se, seu comportamento... era difícil descrever as diferenças. E pensar nisso fazia que lhe doesse a cabeça.

 

Smith ficou olhando a fotografia na tela do ordenador. A fotografia do Tom e Jessica. Tinha-a escaneado... de fato, tinha escaneado toda a informação que encontrou sobre a Jessica Ou'Connor Smith, inclusive o carnê da biblioteca.

Usando o camundongo, encontrou a guia de telefones do Bartlesville e procurou o Shirley Milhares e Estofados Milhares. Ambos existiam. De modo que, se estava tentando extorqui-lo, tinha uma boa intriga montada.

Mas quanto mais a conhecia, menos podia acreditar que fosse uma vigarista. Parecia uma pessoa séria e decente.

De novo voltou a tirar a fotografia.

-É minha primo? -murmurou-. Poderia ser... meu irmão? Chama-te Smith. Eu me chamo Smith. Qual é a conexão?

Sua mãe lhe havia dito que lhe pôs esse nomeie por um filme em que o muito bonito protagonista se chamava assim. Mas, seria certo? Smith ficou pensativo. Seu irmão? supunha-se que seu irmão era Kyle Rutledge. Mas não o era.

 

Smith não tinha visto ninguém de sua família em mais de três anos. E as coisas seguiriam igual se Kyle não tivesse aparecido em seu escritório uns meses antes, pilhando-o despreparado.

-Senhor Rutledge... seu irmão veio a vê-lo.

Smith apertou o auricular.

-Meu irmão?

-Diz que é seu irmão, Kyle Rutledge. Alto, loiro, bonito, com um sorriso de cinema. Digo-lhe que acontecer?

Smith vacilou. Mirna era muito bocudo. Se não fora tão boa secretária, a teria despedido muito tempo atrás. E como Kyle sabia que estava no despacho, não tinha mais remedeio que vê-lo.

-lhe diga que acontecer -suspirou por fim, tirando um montão de papéis da gaveta para parecer muito ocupado.

Tinha perdido interesse na empresa; de modo que, uns meses antes, contratou um novo diretor geral e se subiu a presidente. Após não tinha muito trabalho.

Kyle entrou sorrindo de orelha a orelha.

-Olá, Smith.

-Que demônios faz aqui?

-Como não me devolve as mensagens, vim para comprovar se seguia vivo. Me alegro de verte -sorriu seu irmão. Quando ia lhe dar a mão, Kyle lhe deu um abraço de urso-. passou muito tempo.

Smith tentava manter-se reservado, mas se alegrava de ver o homem com o que tinha crescido.

-Como trata a vida ao famoso cirurgião plástico?

-Muito bem. Irish e eu não podemos nos queixar. A clínica de Dallas não poderia ir melhor e vamos ter um filho.

-Um filho? Isso é fantástico. Sente-se e conta-me o tudo. Sinto me haver perdido suas bodas... Tinha que ir a China e não podia me liberar da viagem. Já sabe como são os negócios.

Kyle se sentou frente ao escritório fazendo uma careta.

-Pensei que estava no hospital. Um acidente de moto, não era isso?

-Sim, bom, é verdade... O da viagem a China foi nas bodas do primo Matt. Quer um café?

Seu irmão negou com a cabeça.

-Não, obrigado. tomei dois no avião.

-Um suco de laranja?

-Nada, obrigado. Nada, exceto algumas respostas.

-Sobre o que? -perguntou Smith, tentando dissimular. Mas tinha um nó no estômago.

-Sobre o que passa contigo. Durante os últimos três anos ninguém te viu o cabelo. Não chama, não escreve, não aparece em nenhuma das festas familiares... Envias postais e flores, mas é como se não queria saber nada de nós. O avô Pete está preocupado e embora papai te desculpa por tudo, asseguro-te que também o está. E cada vez que alguém menciona seu nome, a mamãe lhe enchem os olhos de lágrimas. O que acontece, Smith?

-Nada -respondeu ele-. É que tenho muito trabalho, já sabe. Terá que trabalhar muito para dirigir uma das empresas de informática mais importantes do país... por não falar das plantações de cítricos. Sabe que é a empresa que criou mais empregos nesta zona do Texas?

Kyle sorriu.

-A mim não tem que me vender sua empresa, Smith. Comprei ações quando saíram ao mercado.

-Ah, sim?

-Sim. E pensava que teria mais tempo livre desde que decidiu contratar a um novo diretor geral.

-Tenho menos trabalho, mas sigo muito ocupado.

-Papai e mamãe agradeceriam uma chamada de vez em quando. E o avô também. O que passou, Smith? Você e eu nos levávamos muito bem.

-A vida, Kyle. Assim é a vida. As coisas não são tão singelas como quando fomos pequenos.

-Sei -suspirou ele-. Tem tempo para comer com seu irmão? Volto para Dallas no avião das cinco.

Smith olhou seu relógio.

-Sim, claro. vou chamar a Rosa para que prepare algo. Assim te ensinarei a plantação.

Aquela tarde, durante um par de horas, voltaram a ser irmãos de novo. Rendo, contando-se coisas, compensando o tempo perdido.

Quando terminaram de comer, Kyle se apoiou no corrimão da terraço.

-Vejo que está muito enganchado com este vale.

Smith se encolheu de ombros.

-Eu gosto de muito, sim.

-Tem uma casa muito bonita. Recorda a que Jackson comprou em Austin.

Jackson e Matt Crow eram suas primos, com os que se criaram em Dallas.

-Jackson vive em Austin?

-Sim. Está na Comissão de Transportes.

-Jackson trabalhando na administração?

Kyle sorriu.

-É que se apaixonou. E já sabe que o amor nos obriga a fazer coisas estranhas. Creio que vai casar se dentro de pouco, assim que convença a Olivia. Parece que todos os netos do Cherokee Pete estão caindo na armadilha... exceto você. Ou me equivoco? Por isso não tornamos a verte?

Smith negou com a cabeça.

-Não tenho tempo para noivas -murmurou, olhando seu relógio-. Se tiver que tomar um avião, será melhor que te leve a aeroporto.

No estacionamento, Kyle duvidou um momento antes de descer do carro.

-Não sei muito mais que antes de vir... exceto que parece estar muito são. Sei que te acontece algo, mas não posso te ajudar a menos que me conte isso, Smith. Pode me chamar quando quiser. Quero-te muito, irmãozinho. Sempre te quererei. E, por favor, chama mamãe de vez em quando.

Smith assentiu com a cabeça. Não se atrevia a dizer nada. Quando Kyle saiu do carro, sentiu como se tivesse um buraco no peito. Estava triste, mais que nunca.

Tinha estado a ponto de lhe contar a verdade, mas não queria complicar as coisas.

Teria sido tão singelo... Solo tinha que lhe perguntar que grupo sangüíneo era, embora já sabia. Kyle era AB negativo, como seu pai. Um grupo sangüíneo muito estranho. Smith era Ou positivo, um grupo comum que pensava devia compartilhar com sua mãe.

Mas três anos antes comprovou que sua mãe era A negativo.

Kyle e ele não eram irmãos. E tampouco era filho natural de seus pais. Impossível.

Tinha consultado com uma dúzia de peritos no campo da genética. Era impossível estar aparentado com sua suposta família.

Smith voltou para o escritório sentindo-se pior que nunca. Pensava que quase o tinha esquecido, mas a visita do Kyle fez que o recordasse todo outra vez... embora nunca pôde esquecê-lo.

Mirna levantou o olhar do teclado ao vê-lo entrar.

-Boa tarde, senhor Rutledge. Espero que o tenha passado bem. É difícil acreditar que o doutor Rutledge seja seu irmão... Não se parecem em nada. Ele é loiro, você tem o cabelo castanho. Ele tem os olhos azuis, você verdes...

-Kyle se parece com seu pai -interrompeu-a Smith.

-Então, você deve parecer-se com sua mãe.

-Quem sabe? -murmurou ele, fechando seu escritório de uma portada.

Não havia tornado ou seja nada do Kyle nem de sua família após.

Não sabia quem eram seus pais naturais e não podia perguntar. Três anos antes, quando teve provas de que não podia ser um Rutledge, interrogou a sua família. Sua mãe começou a chorar e seu pai ameaçou jogando o de casa por lhe dar esse desgosto.

Smith tentou falar com o avô Pete e sua tia Anna Crow, a mãe do Jackson e Matt. Os dois negavam saber nada do assunto. uniram-se à conspiração de silêncio.

De fato, Anna lhe disse que isso de ser adotado era uma idéia ridícula.

-Sara é sua mãe natural, Smith. Eu a visitei na Saint Louis quando estava grávida de seis meses e sigo tendo o anúncio de seu nascimento três meses mais tarde. Está em um álbum.

Apesar do que disse sua tia, Smith sabia que a história de seu nascimento era uma elaborada mentira. Tinha os documentos que o provavam. Os fatos eram indiscutíveis.

Durante trinta e quatro anos tinha vivido uma mentira. Não podia suportá-lo e por isso decidiu não voltar para casa. Nem em Natal, nem à bodas do Kyle, nem a do Matt...

Enviava presentes extravagantes junto com uma nota de desculpa, mas não havia tornado a falar com ninguém. Nem sequer com o Cherokee Pete, aquele velho ao que adorava, depois de que se negou a lhe contar a verdade.

Seu sítio naquela casa tinha trocado de forma irrevogável. Não era sua família. Não sabia quem era.

E a única pessoa que sabia não queria dizer-lhe No, Kyle Rutledge no era su hermano. Pero ni siquiera Mirna podría negar que Tom Smith sí lo era.

Smith olhou de novo a fotografia da Jessica e Tom na tela do ordenador.                        

Não, Kyle Rutledge não era seu irmão. Mas nem sequer Mirna poderia negar que Tom Smith sim o era.

O parecido era tão incrível, que não podia ser acidental. E era uma fotografia autêntica, não uma montagem. Tom e ele estavam aparentados. Tinham que está-lo.

"Minha família. Ele era minha família", pensou.

E tinha chegado muito tarde.

Apagando o ordenador de um zarpazo, Smith se levantou e se dirigiu aos estábulos.

Jessica Ou'Connor Smith tinha a chave de seu passado. Estava completamente seguro.

E queria respostas. Não pensava abandonar até que, de uma vez por todas, soubesse tudo o que queria saber.

 

Não podia atá-los cordões das sapatilhas. Frustrada, Jessica atirou uma delas ao outro lado da habitação, justo quando Kathy abria a porta.

-Uy! -exclamou quando a sapatilha passou por cima de sua cabeça-. Estamos tendo uma chilique, né?

Jessica soltou uma gargalhada.

-Há tentando alguma vez te atar os cordões da sapatilha com uma só mão?

-É um cilindro, sei. irei comprar te umas sandálias ou uns tamancos. Assim estará mais cômoda. Mas Rosa ou eu podemos te ajudar, não tem que fazê-lo sozinha.

-Eu não gosto de depender de ninguém. E não necessito uma enfermeira... embora agradeça muito sua ajuda, Kathy. Mas já estou bem.

-Eu tampouco creio que me necessite, mas o senhor Rutledge insiste em que fique uns dias. E com o que me paga, espero que me agüente um pouquinho mais -sorriu a mulher-. Com esse dinheiro quase posso pagar a universidade de minhas filhas.

-Ah, nesse caso... -disse Jessica com um sorriso.

-Sente-se, vou arrumar te o cabelo. Parece que não dormiste bem, né?

Ela negou com a cabeça. Tinha dormido fatal. A imagem do Smith Rutledge aparecia em seus sonhos constantemente. Tinha tantas das qualidades que tinha admirado no Tom... e nenhum de seus defeitos.

Era o que Tom poderia ter sido se não se equivocou de caminho. Além disso, Smith era um homem muito atrativo... e ela levava sozinha muito, muito tempo.

-me conte o que sabe do Smith.

-além de que é muito rico?

-Sim, além disso.

-Não sei nada sobre sua vida privada, solo o que tenho lido nos periódicos. Doa milhões a hospitais e causas benéficas... mas suponho que isso já sabe.

-Não. A verdade é que não sei nada dele.

Kathy estava a ponto de dizer algo quando bateram na porta.

-Sim?

Smith apareceu a cabeça na habitação. De novo, como cada vez que o via, Jessica se surpreendeu ante o incrível parecido com seu marido.

-Lista para tomar o café da manhã?

-Lista -respondeu Kathy por ela-. Já está.

Jessica se levantou, estirando-a camiseta.

-Não tenho muita fome, mas eu gostaria de tomar uma taça de café. Quer tomar um, Kathy?

-Não, obrigado. Já tomei o café da manhã e tenho que ir comprar umas coisas.

Smith roçou suas costas enquanto a acompanhava ao pátio; o roce a fez sentir um calafrio. Uma reação estranha... embora devia admitir que, além de bonito, tinha algo que a atraía poderosamente.

Sempre lhe tinham gostado dos rasgos do Tom, mas a seu marido faltava a segurança do Smith, aquela confiança em si mesmo que o fazia ainda mais atrativo.

Tom sempre teve um ar abatido, não covarde, mas bem resignado a sua sorte e furioso por isso.

Smith a levou até uma mesa ao lado da piscina. Ali a esperava um bol cheio de morangos e um enorme copo de suco de laranja.

-E o café?

-Tomaremos mais tarde. Os peritos em nutrição dizem que a cafeína interfere com a absorção de ferro. Jessica levantou uma sobrancelha.

-É possível, mas me anima muito. Não posso fazer nada se não tomar um par de taças de café.

-Tomaremos café depois de tomar o café da manhã.

-Que mandão é.

-Isso é verdade -riu Smith-. Te coma os morangos. E logo pode tomar cereais com passas e nozes, ou uma omelete de presunto e queijo.

-Prefiro um croissant e uma taça de café.

-Sinto muito, mas não é possível.

-Pois então, cereais. Por certo, usei o telefone. Espero que não te importe. Tinha-me ficado sem bateria no móvel e tinha que falar com o Shirley.

-Sua sócia?      

Ela assentiu.

-Pagarei-te a chamada.

-Não faz falta.

Jessica ia discutir, mas decidiu não fazê-lo. depois de tomar o café da manhã, quando se tinha comido todos os cereais, as passas e as nozes, Smith lhe serve uma taça de café.

-Ah, obrigado. Por fim.

Enquanto tomavam o café, observou-o atentamente. Smith era mais musculoso que Tom, mas tinha o mesmo queixo quadrado, o mesmo furinho, a mesma cor de pele, os mesmos olhos. Levava o cabelo melhor talhado, mas era do mesmo tom castanho avermelhado do que tanto se queixava seu marido.

E sua voz... se fechava os olhos poderia acreditar que era Tom. Eram tão parecidos e, entretanto, entre eles havia enormes diferencia.

Smith lhe serve uma segunda taça de café.

-me fale dele.

-De quem?

-Tom. Sei que estava pensando nele, nos comparando.

-O que quer saber?

-Quero saber quem eram seus pais, como cresceu, essas coisas...

Jessica observou o sol jogando com a água da piscina.

-Não conheceu seu pai e sua mãe não queria falar dele. Quando ela morreu, Tom tinha sete anos e foi se viver com sua avó no Bartlesville. Quando lhe perguntava por seu pai, ela sozinho lhe dizia: "era um desses hippies com os que foi se viver. Ou seja quem deles era seu pai".

Smith fez uma careta.

-Dizia-lhe isso a um menino?

-A avó Lula era uma mulher amargurada. A verdade, ao Tom teria ido melhor se se tivesse criado em um orfanato, como eu.

-Você cresceu em um orfanato?

-Dos cinco anos. Suponho que isso foi o que nos uniu... os dois tivemos uma mãe alcoólica. Felizmente, meus pais adotivos me ajudaram a agüentá-lo. A avó do Tom, justamente o contrário.

-Sua mãe era alcoólica?

-E drogada, creio. Ao Tom não gostava de falar disso mas, por isso sei, viviam quase da caridade e trocavam de cidade continuamente. Inclusive passaram fome.

Smith se passou uma mão pelo cabelo, nervoso.

-Que horror.

-Ao menos sua avó lhe deu de comer e o levou a colégio. Tom era muito inteligente.

-Foi à universidade?

-Conseguiu uma diplomatura em informática enquanto trabalhava em cem mil ofícios. Eu queria que terminasse os dois anos que ficavam para a licenciatura, mas já tinha seu negócio de reparação de ordenadores e não gostava. Além disso, estávamos prometidos.

-Quanto tempo estiveram casados?

-Sete anos. Saíamos juntos do instituto, e nos casamos na capela da faculdade o dia que eu me graduei na universidade de Belas artes. Shirley e seu marido foram nossas testemunhas. Não foi umas grande bodas, mas fomos felizes... então. Tenho uma fotografia em meu moedeiro.

-Vi-a. Quantos anos tinha quando lhes casaram?

-Pois... eu tinha vinte e dois, assim que ele devia ter vinte e oito.

-Quantos tinha quando morreu?

Jessica apartou o olhar. Não queria falar do Tom, não queria recordar aqueles anos de novo, mas entendia seu interesse.

-Trinta e cinco.

-Quando morreu?

-Faz dois anos, em Natal.

-Então agora teria... trinta e sete -disse ele, olhando a de uma forma muito estranha-. Que dia era seu aniversário?

-Em dezesseis de junho.

Smith, pálido, deixou cair a taça sobre o prato.

 

Era como se lhe tivesse cansado a casa em cima. Como podia ser?

-O que ocorre? -perguntou Jessica.

-Em dezesseis de junho é meu aniversário. E tenho trinta e sete.

-Mas, então, Tom e você seriam...

-Gêmeos -disse Smith, com os lábios apertados-. Me dê a data exata do acidente e da morte do Tom.

Sabia que Jessica teria perguntas que fazer, mas não estava preparado para falar. Antes tinha que digerir todo aquilo. E comprovar os dados. Smith Rutledge não era nenhum parvo.

Entretanto, enquanto se dirigia ao ordenador, sabia... sabia. Tinha sabido sempre que parte de sua vida estava perdida.

Não demorou muito em verificar que Thomas Edward Smith morreu no Oklahoma. depois de um par de chamadas, recebeu um correio eletrônico com o bilhete que apareceu no periódico do Bartlesville, no que nomeavam a sua viúva, Jessica Ou'Connor Smith, e a sua avó Lula Jane Smith. Um tal Mack Milhares tinha sido o portador do féretro.

Um artigo publicado sobre o acidente mostrava uma motocicleta destroçada e mencionava que Thomas Smith voltava de uma festa em casa de seus amigos. E o muito imprudente não levava casco.

Smith, com a cabeça entre as mãos, lançou uma maldição. Ele também teve um acidente de moto... quando Kyle se casou. Um condutor bêbado o jogou da estrada, mas ele levava casco. Não lhe aconteceu nada, mas Tom se quebrado o pescoço e o levaram a um hospital da Tulsa em estado muito grave.

Durante vários minutos, Smith ficou olhando pela janela, observando como o vento movia os ramos das árvores. Pensava, dava-lhe voltas à informação, tentando lhe encontrar sentido.

Se Tom e ele eram irmãos, por que os separaram?

Amaldiçoou a seus pais por não lhe dizer a verdade. Se o tivesse sabido dez anos antes... se o houvessem dito uns dias antes do acidente, Tom poderia estar vivo. E sua vida teria sido diferente.

Por fim voltou para a tela do ordenador e procurou outro artigo no periódico do Bartlesville: o anúncio das bodas do Tom e Jessica. Nele mencionavam que ela tinha ganho o prêmio de professora do ano.

O último artigo foi publicado dois anos antes: os professores do instituto tinham organizado uma tômbola com objeto de arrecadar dinheiro para pagar os gastos médicos do Tom.

Uma tômbola? Por Deus bendito. Quando ele poderia ter pago todas as faturas... Smith se levantou e saiu do estudo.

 

Se Jessica estava surpreendida, podia imaginar o que sentia Smith.

Tivesse desejado consolá-lo, falar com ele, mas se se parecia com o Tom, não agradeceria esse gesto. Possivelmente era um rasgo tipicamente masculino, mas seu marido nunca falava das coisas que o preocupavam. Deixava-a fora. Saía da casa e bebia para esquecer. Bebia muito. Por isso o deixou.

 

Se Smith tivesse sido um homem dado à bebida se teria embebedado. Em lugar disso, selou a Rio e cavalgou durante toda a manhã. Depois subiu ao ginásio que tinha instalado em cima da garagem e esteve levantando pesos até que não pôde mais.

Com a cabeça a ponto de explorar, baixou à piscina e, depois de despir-se, atirou-se à água de cabeça.

 

Jessica, detrás da cortina, observava-o nadar. Levava vinte compridos e não parecia ter vontades de deixá-lo.

Tinha estado a ponto de sair a tomar o sol quando o viu tirá-los calças e lançar-se à água. Como professora de desenho, licenciada em arte e mulher casada, o corpo nu de um homem não lhe resultava nada estranho, mas Smith não era qualquer homem. Tinha o corpo de um atleta grego.

Duro, musculoso, magnífico.

Deveria haver-se dado a volta, mas não o fez. Hipnotizada pelo corpo bronzeado, ficou olhando enquanto se despia e se atirava à água. O não a tinha visto, de modo que deu um passo atrás e ficou médio escondida pela cortina.

Embora tinham um corpo parecido, havia uma grande diferencia entre o corpo do Smith e o do Tom. Jessica não recordava sentir-se tão... excitada pelo corpo de seu marido, nem sequer durante os primeiros meses do matrimônio. Vê-lo nu lhe produzia uma queimação no ventre... Esse pensamento fez que ficasse tinta. estava-se excitando sozinho olhando-o.

Sentindo-se como uma olheira, saiu da habitação. As coisas eram muito complicadas e, quanto antes se fora daquela casa, melhor.

Tinha coisas urgentes que fazer no Matamoros.

 

Jessica não voltou a ver o Smith até o dia seguinte, na piscina. Embora foi amável com ela, logo que disse uma palavra enquanto tomavam o café da manhã.

Cada vez que o olhava, recordava seu corpo nu; de modo que tentava não olhá-lo.

Mas isso não a ajudou nada. Não tinha estado toda a noite obcecada com ele?

Aquilo era ridículo. Solo devia lhe anunciar que tinha trabalho e partir dali.

Mas não podia fazê-lo. Em lugar disso, comia sua omelete francesa sem dizer nada.

Quando terminaram de tomar o café da manhã, Smith serve café para os dois.

-verifiquei...

-Parto-me -disse Jessica ao mesmo tempo.

-Perdoa. Segue.

por que estava tão nervosa? Ela nunca tinha tido nenhum problema para expressar-se.

-ia dizer que, embora agradeça tudo o que tem feito por mim, tenho muito trabalho e devo ir hoje mesmo. Tenho que...

-Não -interrompeu-a Smith.

-Tenho que ir. Tenho que ir ao Matamoros imediatamente. É muito importante que me entreviu com uma mulher que vive ali.

-Não pode conduzir.

-Posso contratar a um condutor. Ontem fiz um par de chamadas Y...

-por que é tão importante que fale com essa mulher?

-É a senhora López, uma mulher que estava acostumado a trabalhar na tapeçaria do Mack. Ela é a que amurada as lentejoulas nas bolsas e faz um trabalho muito delicado. Preciso lhe encarregar vários mais. O problema é que se trocou de casa e não eis podido me pôr em contato com ela nem por telefone nem por correio eletrônico. Estou segura de que algum de seus vizinhos no Matamoros poderá me dizer onde está.

-Se tiver que ir, eu te levarei. Matamoros é uma cidade grande e nada segura para uma mulher sozinha.

-Mas suponho que terá coisas mais importantes que fazer que me levar ali.

-Não tenho nada que fazer. Quando vamos?

Jessica olhou seu relógio.

-Maldita seja!

-Algum problema?

-Me parou o relógio.

-Necessita uma pilha nova?

-Provavelmente, mas uma pilha custaria quão mesmo um relógio novo. Terei que comprar outro.

-Pode fazê-lo na fronteira com o México. Estará lista em uma hora? Suspirando, ela aceitou. -Posso estar lista em quinze minutos.

 

Falaram sobre o Tom durante a viagem até a fronteira. Smith queria conhecer todos os detalhes de sua vida.

-Seus pais não lhe disseram que tinha um irmão gêmeo? Pergunto-me por que não lhes adotaram aos dois.

Jessica viu que Smith apertava o volante com força.

-Não me disseram nada. Nem sequer sabia que tinha sido adotado até faz três anos. E minha família segue sem admitir que Sarah Rutledge não é minha mãe.

-Por Deus bendito! Que horror. Como averiguou que ela não era sua mãe natural?

Smith lhe contou a história.

-Mas nem sequer, tendo provas irrefutáveis, quiseram me dizer a verdade.

-Seus pais lhe maltrataram?

-Não, Por Deus. Foram uns pais maravilhosos. Nunca duvidei de que me queriam tanto como ao Kyle, e nos criaram sem fazer diferença alguma. Tive uma infância maravilhosa... tudo o que um menino tivesse podido desejar.

-Pois então lhe dê graças a seus pais, Smith. Asseguro-lhe isso, é terrível para um menino criar-se em uma casa em que não recebe amor. Tom e eu lhe teríamos trocado o sítio sem duvidá-lo. Pela razão que seja, seus pais querem manter em segredo que é adotado, mas isso já é história. Esquece-o. Como meu adotivo me disse uma vez: "olhar atrás muito solo te dará dor de pescoço".

-Sonha como meu avô Pete... sempre tem um dito para cada ocasião.

Jessica ia replicar, mas o pensou melhor. Smith tinha uma ferida no coração, estava claro. E demoraria tempo em curar.

Viajaram em silencio durante vários quilômetros. Evidentemente, estava ressentido com seus pais, mas não podia dizer nada que o fizesse sentir melhor. por que os homens eram tão teimosos?

Logo chegaram ao Brownsville e cruzaram a ponte sobre Rio Grande para chegar ao México. Embora Brownsville e Matamoros estavam pegas a uma à outra, evidentemente tinham chegado a outro país. além de que os pôsteres estavam em espanhol, a cidade tinha um ar completamente diferente.

E como não sabia onde ia, Jessica se alegrou de que Smith a tivesse acompanhado.

Conforme deixavam as ruas principais, as casas se faziam mais velhas até converter-se em barracões com teto de uralita.

-A gente vem aqui do interior do México, onde as condições de vida são ainda mais precárias e constróem uma casa materiais que encontram. Se viverem aqui durante cinco anos, a parcela passa a ser propriedade dela.

Smith parou diante de uma loja onde havia vários homens congregados e perguntou como chegar à direção que Jessica tinha cotada em um papel.

-Está na seguinte maçã.

-Ah, que sorte tivemos -sorriu ela.

Mas a senhora López já não vivia ali. Seu filho se mudou a outra cidade e ela estava vivendo com sua filha em outra zona do Matamoros. Quando por fim a localizaram, a mulher se alegrou muitíssimo de que Jessica queria contratá-la. Pelas condições de sua casa, era evidente que logo que ganhava o suficiente para viver. Com o Smith como intérprete, chegaram a um acordo econômico pelos bordados. Jessica lhe deixou as caixas de material e também um adiantamento pelo trabalho, ficando de acordo em como e quando lhe faria saber que o produto estava terminado.

Quando se afastavam da casa, ela deixou escapar um suspiro.

-me recorde que não volte a me queixar pelo que ganho. Como sobrevive esta gente?

-Passam-no mau -disse Smith-. O dinheiro que a senhora López ganhe com os bordados servirá para toda a família.

Jessica se mordeu os lábios.

-O preço que lembramos me parece barato. Possivelmente deveria lhe haver devotado mais.

-Não, tem-lhe feito uma boa oferta. Em realidade, quase o triplo do que ganham aqui como salário mínimo.

-Incrível.

Seguiram conduzindo até uma zona de aspecto próspero e, pouco depois, Smith estacionou frente a uma joalheria.

-Podemos comprar aqui o relógio. Quando entraram, o proprietário se mostrou encantado de atendê-los. Mas depois de olhar uns quantos relógios, Jessica lhe disse ao ouvido:

-Parece-me que isto é muito caro para mim. São relógios de marca.

-Também têm boas imitações. Não te dará conta até que ponha a boneca verde -riu Smith.

Depois falou com o proprietário da joalheria e o homem entrou na trastienda.

-O que lhe há dito?

-Que queria ver algumas imitações bem feitas.

O homem voltou pouco depois com uma bandeja de deliciosos relógios femininos. Eram tão bonitos, que parecia impossível que fossem falsos.

-São divinos.

-Pode escolher o que queira por vinte dólares.

Com ajuda do Smith, Jessica se provou uma dúzia.

-Não sei se comprar o Rolex ou o Piaget. Você o que crie?

-por que não compra os dois?

-Porque essa é uma extravagância que não posso me permitir. Levo-me o da correia de metal. Assim me poderei pôr isso em cima do estuque.

Smith tentou lhe dar de presente o relógio, mas ela insistiu em pagar com seu cartão de crédito. Enquanto Smith e o proprietário concluíam o trato em espanhol, Jessica olhou uns preciosos pendentes de diamantes. Já não tinha jóias... enfim, nunca tinha tido grande coisa. Mas já nem sequer tinha a aliança ou o anel de compromisso porque teve que vendê-los.

Comeram em um bonito restaurante e depois passearam um momento pelo mercado antes de voltar para carro.

-Obrigado por vir comigo. Se tivesse vindo sozinha, me teria perdido.

-Me alegro de ter ajudado.

Jessica levantou a mão para admirar seu novo relógio.

-A verdade é que enganaria a qualquer.

-Deveria ter comprado também o outro.

-O que diz? Você não sabe nada de orçamentos apertados, mas eu sim. Não posso comprar dois relógios... embora valham vinte dólares. Por isso tenho que voltar a trabalhar.

-Tem que descansar até que sua boneca esteja curada de tudo. E até que tenha controlado a anemia.

-É que não entende que não posso deixar de trabalhar? -espetou-lhe ela então, irritada-. Estou até o pescoço de...

Não terminou a frase. Suas dívidas eram coisa dela.

-Até o pescoço do que?

-De nada.

-De dívidas?

-Olhe, não estou me queixando. Simplesmente tenho obrigações.

-Que classe de obrigações?

Jessica não queria lhe falar sobre as faturas do Tom; mas ele insistiu tanto, que ao final o soltou.

-Meu seguro médico cobria parte dos gastos, mas não todos. Essa é uma das razões pelas que decidi abrir um negócio. Creio em meu produto e sei que, se trabalho muito e mantenho um pressuposto apertado, posso ganhar o suficiente para pagar todas essas faturas em dois anos.

-Dois anos?

-Com meu salário de professora não teria terminado nunca. Dei-me um ano de prazo para pôr no mercado as bolsas de bandoleira, assim, como vê, é muito importante que me atenga a uma agenda. E a feira de Dallas é fundamental para isso.

-Deixa que te ajude -disse ele então.

-Não estou procurando caridade, muito obrigado.

Smith deteve o carro no borda e se voltou para ela.

-Olhe, sei que Tom era meu irmão e, para mim, é terrível não havê-lo conhecido. Tenho mais dinheiro de que poderia me gastar nunca... por favor, deixa que te ajude a pagar essas faturas. Significa muito para mim.

Jessica estudou sua expressão. Não havia dúvida de sua sinceridade. Era muito importante para ele, e deixar que lhe tirasse aquela terrível carrega econômica de cima seria a solução para todos seus problemas.

Mas ela sempre tinha sido uma pessoa que se dava a outros, não estava acostumada a receber. Independente, auto-suficiente. Mel, seu adotivo, havia-lhe dito milhares de vezes que devia aprender a não ser tão orgulhosa e a deixar que outros fizessem coisas por quando lhe fizesse falta.

Quase podia ouvir a voz do Mel lhe sussurrando ao ouvido: "lhe dê uma oportunidade a alguém que precisa dar".

-Muito bem -disse por fim-. Obrigado.

-Estupendo. E agora que isso está solucionado, pode descansar tranqüilamente.

-Não de tudo. Aceito que pague as faturas médicas do Tom, mas sigo tendo que dirigir um negócio. E sigo tendo problemas econômicos. Necessito as vendas do Corpus Christi e Houston para financiar as amostras de Dallas. E certamente terei que contratar...

Smith levantou os olhos ao céu.

-Por favor, olhe que é cabeça!

-Eu sou cabeça?

-Como uma mula. Aceita que eu sei um par de coisas sobre negócios?

-Sim, claro.

-Um princípio importante nos negócios é estabelecer contatos e usá-los para sair adiante.

-Sei. Por isso visito as boutiques que me interessam e vou às feiras.

-E não me cabe dúvida que o faz muito bem, mas certamente eu sou o melhor contato que possa ter. Deixa que te ajude.

-Como?

-Quantos bolsas pensava vender no Corpus Christi? -perguntou Smith.

-Setenta e cinco, com um pouco de sorte.

-Eu comprarei cem e assim não terá que ir.

-E o que vais fazer com cem bolsas?

-os dar de presente em Natal a minhas empregadas.

-Mas se estivermos em fevereiro...

-Eu gosto de comprar logo para evitar as aglomerações.

Ela o olhou, atônita.

-Não o dirá a sério, verdade? Além disso, essa feira não é a única razão pela que quero ir ao Corpus Christi. Tenho que ir às boutiques para mostrar minha nova linha de bolsas de festa.

-Que tal se fizer uma chamada e apresento ao Sandi?

-Quem é Sandi?

-A mulher do Brandon Myers, um de meus companheiros de universidade -sorriu Smith-. É a relações públicas e encarregada às compras no Neimann Marcus.

-Neimann Marcus, as lojas de departamentos mais importantes do país? -exclamou Jessica.

-Os mesmos.

 

Jessica não podia dormir. Estava muito emocionada. As lojas de departamentos Neimann Marcus...

Smith chamou o Sandi Myers assim que chegaram a casa.

-Quer que lhe envie diapositivas de suas bolsas -havia-lhe dito Smith depois-. Tem diapositivas?

-Não -respondeu ela, angustiada-. Deveríamos as haver feito, mas não me ocorreu. O que posso fazer?

Smith chamou o fotógrafo de sua empresa e, ao dia seguinte tinham umas preciosas diapositivas de suas bolsas, que enviaram ao Sandi por mensageiro urgente.

depois de três dias de mordê-las unhas, Jessica recebeu uma chamada: ao Sandi tinham gostado de muito e queria ver as bolsas pessoalmente. Ela aceitou, é obvio. Embora tivesse que ir a Dallas andando. Mas não o disse em voz alta. comportou-se de uma forma muito profissional e só gritou depois de pendurar o telefone.

Tinha uma entrevista com a relações públicas e encarregada em compras do Neimann Marcus na segunda-feira.

Nem em seus mais loucos sonhos teria imaginado que aquilo poderia passar. Suas bolsas nas melhores cristaleiras do país... era muito.

Não sabia se poderia agüentar a incerteza cinco dias mais. Devia chamar o Shirley para lhe dar a notícia? Mas, e se ao Sandi Myers não gostava das bolsas ao ver os de perto? E sim estava sonhando acordada? E se estava fazendo-se muitas ilusões?

Jessica dava voltas e voltas na cama sem poder dormir e, por fim, decidiu levantar-se. Possivelmente um copo de leite a ajudaria. E uma bolacha. Ou dois. Ou três.

Rosa tinha feito bolachas de chocolate, seus favoritas.

Pensou em ficá-la bata, mas decidiu não fazê-lo. Eram as três da manhã, de modo que todo mundo estaria dormindo. Entraria na cozinha, serviria-se um copo de leite e um prato de bolachas, e voltaria para a habitação.

Mas voltar com a bandeja era um problema por causa do estuque, assim que se serve o copo de leite e guardou as bolachas em uma toalha de papel a modo de bolsa para poder levá-la entre os dentes.

Apagou a luz da cozinha com o cotovelo e voltou a percorrer o corredor, tentando não fazer ruído.

Mas, de repente, encontrou-se com um obstáculo. Sobressaltada, deixou escapar um grito e as bolachas e o copo de leite caíram com estrépito ao chão.

-Mas, o que...?

Smith acendeu a luz. Solo levava uns jeans médio desabotoados.

O copo se quebrado em mil pedaços e havia leite por todo o chão. As bolachas estavam nadando em meio da branca piscina.

Jessica se sentia como uma idiota... ou mas bem como uma menina a que tivessem pilhado fazendo uma travessura.

E o olhar do Smith a fez sentir ainda pior.

Seu torso nu estava empapado de leite e, sem pensar, tocou a branca catarata com a ponta do dedo... mas quando roçou seu umbigo se deu conta do que estava fazendo e apartou a mão, mortificada.

Durante vários segundos ficaram em completo silêncio. Nenhum dos dois se atrevia a respirar. Parecia haver uma estranha tensão no ar.

-Sinto muito -disse ela por fim, rendo nervosamente-. Não estou acostumado a ter problemas para sujeitar a comida sempre que você anda por aí. Não se preocupe, eu o limparei...

-Não! Não te mova. Vai descalça e poderia te cortar com os cristais. Levarei-te em braços.

-Mas você também vai descalço...

-Espera um momento.

Smith deu a volta e entrou em sua habitação.

Jessica, sentindo-se como uma boba, tentou sair daquela armadilha de cristais quebrados, mas o pensou melhor. E então viu que tinha a camisola empapada e o tecido se pegava a seu peito como se fora papel de seda. Era lógico que Smith se houvesse posto pálido.

Nervosa, atirou da parte mais molhada para tentar secá-lo mas, é obvio, era inútil.

Smith voltou em seguida. pôs-se uns mocasines e, sem dizer uma palavra, tomou em braços para levá-la ao quarto de banho.

-Está empapada.

-me diga algo que não saiba. Ouça, sinto muito o do copo.

-te esqueça do copo. Cortaste-te? Tem-te feito mal na mão?

-Não, estou bem. E o estuque também. Mas quero me lavar um pouco.

Esperava que ele se fora. Mas não foi assim. Em lugar de fazê-lo, abriu o grifo e tomou uma toalha.

-O que faz?

-vou limpar te um pouco a camisola. Não pode fazê-lo sozinha. Vê-o? Kathy deveria haver ficado uns dias mais.

-Não necessito uma enfermeira -replicou Jessica-. É um gasto absurdo. Além disso, posso me lavar sozinha -disse então, cobrindo-se com a toalha.

Smith sorriu.

-É muito tarde.

-Para que é muito tarde?

-Para a toalha.

Jessica fechou os olhos, desejando que a tragasse a terra.

-Não seja cabeça. Deixa que te ajude.

-Não. E esta vez não penso negociar.

Por fim, sacudindo a cabeça, ele saiu do banho.

Demorou meia hora em tomar banho e trocar-se de camisola... e quando terminou, estava esgotada. Certamente depois daquilo poderia dormir, disse-se.

Quando entrou em sua habitação, viu um copo de leite e um prato de bolachas sobre a mesinha.

E seus olhos se encheram de lágrimas.

-É um céu -murmurou.

 

Se antes estava inquieto, naquele momento era como um tigre enjaulado.

A imagem da Jessica com aquela camisola molhada lhe queimava no cérebro. Por Deus bendito, desejava à viúva de seu irmão. Não estava bem. sentia-se como um porco.

E mais ardente que o demônio.

Tinha pensado muito na Jessica durante os últimos dias... e não devia pensar. Até recordava seu aroma, sua risada, cada rasgo de seu rosto...

Desejava tocar seus peitos, lhe acariciar os quadris, abrir suas pernas. Não podia recordar quando uma mulher o tinha obcecado tanto como ela.

Estar com a Jessica o deixava esgotado, e vê-la com aquela camisola só tinha acrescentado combustível ao fogo que o queimava por dentro.

"Te acalme", disse-se a si mesmo. "Ela não está a seu alcance".

Smith foi à piscina e se atirou de cabeça.

Mas, por muito que nadasse, não podia deixar de pensar nela. Tê-la perto estava criando um sério problema, mas não podia jogá-la porque necessitava sua ajuda. O devia ao irmão ao que nunca conheceu.

Conseguiria guardá-las mãos para si mesmo e seus pensamentos também, disse-se.

Como fora.

 

Quando chegou na segunda-feira, Jessica estava dos nervos.

Rosa a ajudou a ficar seu melhor traje de jaqueta, um traje de desenho da temporada anterior que comprou na Tulsa. Mas a manga não entrava por culpa do estuque.

Estava a ponto de ficar a chorar quando Smith a convenceu para que, simplesmente, ficasse a jaqueta por cima dos ombros.

Saíam de casa quando gritou: "Espera!" e saiu correndo a sua habitação. A toda pressa tomou um dos frasquitos de perfume, e voltou de novo para a porta.

-Quer me abrir isto?

Smith abriu o frasquito e esperou enquanto ela ficava um pouco de perfume no decote.

-Cheira bem.

-É meu favorito. Guardava-o para uma ocasião especial.

-por que não compra um frasco grande?

-Porque costa uma dinheirama. Isto é uma amostra gratuita.

-Ah, já vejo. Está muito bonita com esse traje.

-É da temporada anterior. Se compras um traje de desenho quando sai ao mercado, custa-te um olho da cara.

-Pois está muito bem.

-Obrigado -sorriu Jessica-. Crie que Sandi notará que meu relógio é uma imitação?

-Duvido-o. É uma imitação muito bom.

Smith abriu o porta-malas do carro e guardou uma mala com rodas em que Jessica levava uma amostra de cada bolsa.

Fizeram a viagem em um avião privado, certamente da empresa Smith, S.A, embora Jessica não perguntou. Chegaram ao aeroporto do Love Field, em Dallas, com tempo suficiente para que o chofer os levasse a edifício do Neimann Marcus.

"Assim se pode viajar", pensava Jessica, olhando pelo guichê do Mercedes negro. "Mas não acostume a estes luxos", advertiu-se a si mesmo. Logo teria que voltar para sua caravana.

Smith quis acompanhá-la até o escritório do Sandi, mas quando foram entrar no elevador, ela o deteve.

-Agradeço muito sua ajuda, de verdade. Mas tenho que fazê-lo sozinha.

Esperava que discutisse, mas se limitou a sorrir.

-Entendo. Irei às compras então. Encontraremo-nos aqui em... uma hora. Parece-te?

Assentindo, Jessica entrou no elevador e pulsou o botão da novena planta.

Muitas coisas dependiam daquela reunião.

 

Uma hora mais tarde, Jessica descia no mesmo elevador.

Smith a estava esperando com uma bolsa na mão.

-Que tal foi?

-Vamos daqui. Agora lhe o conto.

Uma vez de volta no Mercedes, ela deixou escapar um grito de alegria.

-Yupi!

-Vejo que foi tudo bem -riu Smith.

-Encantaram-lhe minhas bolsas! -exclamou Jessica, lhe plantando um beijo-. Diz que são divinos. E pediu cem para começar. Cem! Para começar. Não é incrível? E me falou que os natais, de catálogos, de possibilidades em Internet... Shirley não vai acreditar se o Por favor, nem eu mesma me acredito. Tenho que chamá-la agora mesmo -disse então, abrindo a maleta para tirar o móvel.

-Que tal se comermos juntos para celebrá-lo?

-É obvio.

Smith a levou a um luxuoso restaurante no Turtle Creek e comeram algo divino, embora Jessica apenas se inteirou. Estava flutuando.

-Quando tem que enviar o pedido?

-Prometi-lhe as primeiras cinqüenta bolsas imediatamente. A segunda metade dentro de um mês.

-Tem cinqüenta já feitos?

-Ai, Meu deus, não sei! Sim... não. Não me lembro... E se não os tenho? Não estou segura -exclamou, olhando seu estuque com expressão de pânico-. O que vou fazer? Não posso trabalhar com isto.

Ele apertou sua mão, rendo.

-Não se preocupe, carinho. Faz o que faz o presidente de uma empresa... delegar.

Jessica sorriu.

-Sabe costurar?

Smith soltou uma gargalhada.

-Não, sério.

-Em quem vou delegar? E a senhora López... terminará o encargo a tempo?

-com certeza que sim. E encontrar costureiras que façam as bolsas não te resultará difícil. Quer uma sobremesa?

-Certamente. Um pouco muito pecaminoso, com muitíssimo chocolate -sorriu ela, passando-a língua pelos lábios.

Havia-o dito em brincadeira, mas a lhe sugiram olhar do Smith fez que lhe tremessem as mãos.

Estava tonteando com ela? Possivelmente não deveria havê-lo beijado no carro. Não tinha querido fazê-lo. Foi algo completamente espontâneo, parte da emoção do momento. E devia deixá-lo bem claro. Uma relação entre eles estava fora da questão.

Ou não?

Smith Rutledge era um homem muito sexy. E era absurdo negar a verdade. Não tinha passado horas fantasiando sobre seu umbigo? E seus músculos. E suas mãos. E sua boca.

Curioso, quando o olhava já não via o Tom. Solo via A... Smith, um homem único e extraordinário. Embora se pareciam muito, eram duas pessoas diferentes. Completamente diferentes.

Possivelmente...

Enfim, poderia deixar suas opções abertas.

 

Enquanto voltavam para aeroporto depois de comer, Jessica ia admirando as zonas residenciais pelas que aconteciam: as arvoredos, advinda-las flanqueadas por castanhos e carvalhos.

-Esta parte de Dallas é preciosa.

-Eu cresci perto daqui.

-Ah, sim? Seus pais vivem nesta zona?

-Sim. vamos falar dos empregados que necessita...

-Não quer que paremos para lhes fazer uma visita já que estamos aqui? Não me importa.

-Duvido que estejam em casa.

-Poderíamos chamar por telefone.

-Em outro momento -disse Smith que, evidentemente, não queria seguir falando do tema.

-Quando foste visitar os por última vez?

-Faz tempo. Eu creio que há várias fórmulas para contratar pessoal. Poderia fazer as bolsas no México e isso reduziria custos, mas que fizessem o trabalho ao outro lado da fronteira requer que vivas ali durante um tempo ou que vá cada dia até que tenha treinado a um supervisor. Além disso, está o problema do idioma. E o problema do tempo.

-Não quero viver no México. Não falo o idioma, e ir cada dia seria um horror. Além disso, quanto tempo seria "algum tempo"?

-Três anos como mínimo. Outra opção seria te instalar no Harlingen e contratar gente dali. Seguro que Rosa poderia nos ajudar. Creio que sua irmã é costureira.

-Isso eu gosto mais... Não me diga que não viu a seus pais em três anos? -exclamou Jessica então. -Não.

ia dizer algo, mas a expressão do Smith era tão séria, que deixou o tema e seguiram falando do trabalho e do pessoal que devia contratar até que chegaram ao aeroporto.

Era sua imaginação ou ele estava encantado de ajudá-la com seu negócio? Isso seria absurdo. depois de tudo, Smith era o presidente de uma empresa gigantesca, por não falar da plantação de cítricos. por que ia importar lhe uma empresa tão pequena como a sua?

Possivelmente pelo Tom. Porque, como sua viúva, acreditava- uma responsabilidade familiar. Ou possivelmente lhe parecia uma nova provocação. Fosse qual fosse a razão, sentia-se enormemente agradecida.

-Não te dei as obrigado por me ajudar -disse quando subiram ao avião-. O que aconteceu hoje vai além de minhas expectativas. E nada disto teria sido possível sem ti. Obrigado, Smith.

-De nada -sorriu ele, lhe piscando os olhos um olho.

Quando estavam no ar, Jessica voltou a fixar-se na bolsa do Neimann Marcus.

-O que compraste?

-Um presente -respondeu Smith.

-Para quem?

-Para ti.

-por que me compraste um presente?

-Para te dar o parabéns.

-E se não tivesse vendido as bolsas?

-Então poderíamos considerá-lo um prêmio de consolação.

Jessica não recordava a última vez que alguém lhe fez um presente e o detalhe a emocionou.

-Não pensa abri-lo?

-Sim, claro.

Sorrindo, rasgou o papel. Era um frasco de seu perfume favorito. Um frasco enorme.

E então, sem poder evitá-lo, abraçou ao Smith de novo.

 

Muito agitada para ver a televisão, ler ou dormir, Jessica saiu a terraço a tomar o ar.

Havia lua enche e sua luz de prata iluminava a plantação.

Nos dois últimos dias, as laranjeiras tinham começado a florescer e sua fragrância perfumava toda a casa. Jessica respirou profundamente, desfrutando da brisa que acariciava sua cara.

-É precioso, verdade?

Sobressaltada pela voz do Smith, levou-se uma mão ao peito.

-Que susto me deste!

Ele apareceu então entre as sombras da terraço.

-Perdoa. Não queria te assustar. Ia ao ginásio e me detive um momento para cheirar as flores.

Levava calças curtas, sapatilhas de esporte e uma velha camiseta. Jessica olhou seu umbigo. por que, de todos os umbigos que tinha visto em sua vida, aquele exercia tal fascinação nela? Não sabia por que, mas se tinha convertido em uma zona erógena. Fantasiava sobre ele freqüentemente, desejando tocá-lo, colocar a língua...

"Por Deus bendito!".

Nervosa, apartou o olhar.

-Cheira de maravilha. E esta noite parece cheirar mais do normal.

-Sim, é verdade. Quer ir dar um passeio entre as árvores?

-Não pensava fazer um pouco de exercício?

-Não tenho pressa -sorriu Smith, tomando-a pela cintura-. Vamos.

Passeando entre as árvores, a fragrância era mais forte, mais doce, e as pétalas das flores brilhavam à luz da lua.

-Que classe de árvores são estes?

-Laranjeiras -respondeu ele, cortando uma ramita e colocando-lhe no cabelo-. O que cheira é a flor de flor-de-laranja.

Jessica conteve a respiração. O roce de suas mãos tinha provocado uma imediata resposta erótica.

Não podia mover-se, não podia falar.

Seguia tocando seu cabelo? Ou o roce de seus dedos tinha deixado um rastro indelével?

Seus olhos se encontraram então. Os do homem brilhavam de desejo.

Smith inclinou a cabeça, Jessica levantou a sua.

O tempo pareceu ficar suspenso durante o que pareceu um século, o ar permeado pelo aroma da flor de flor-de-laranja, embriagando-a, aproximando-os cada vez mais até que seus lábios se roçaram.

O primeiro roce foi como uma explosão. Smith a envolveu em seus braços, procurando sua boca como desesperado. Gemendo, ela enredou os sua ao redor da cintura masculina. Desejava mover as mãos, explorar suas costas...

Smith suspirou roncamente sobre sua boca; um som tão carregado de desejo, que Jessica sentiu calor entre as pernas.

Então começou a beijá-la no pescoço. Ela levantou a cara para lhe oferecer sua garganta, apertando-se contra o endurecido membro masculino.

Smith procurou seus peitos por debaixo da camiseta e Jessica deixou escapar um suspiro de prazer quando sentiu a carícia em seus mamilos; uma carícia que a fazia desejar um contato mais íntimo.

Queria tirá-la roupa, queria senti-lo dentro...

-Que Deus me ajude -murmurou, louca de desejo, tomando o elástico da calça.

O ficou imóvel um momento. E então deu um passo atrás.

-Sinto muito... Sinto muito. Não queria que isto ocorresse. Tenho-te feito mal?

-Dano? Não, claro que não. por que há...?

-Sinto muito -repetiu Smith, passando uma mão pelo cabelo-. Já sei que coloquei a pata. Poderia esquecer o que passou?

Aquilo foi como um jarro de água fria. E se sentia como uma idiota.

-Sim, claro. Considera-o esquecido -disse, como se não tivesse importância.

Com a cabeça bem alta, deu-se a volta e virtualmente correu para a casa para não chorar diante dele.

A magia da noite tinha desaparecido.

O aroma da flor de flor-de-laranja se converteu em enjoativo e Jessica se encerrou em sua habitação.

Desgraçadamente, não podia escapar da impressão que os lábios do Smith faziam nos seus, nem do rastro que tinham deixado suas mãos. O aroma das flores, misturado com o do homem, parecia ter ficado impresso em sua roupa.

Deveria lhe haver perguntado o porquê do brusco rechaço, mas se sentia muito humilhada.

Enquanto se lavava a cara, tentou recordar a cena, mas seguia sem entender o que tinha ocorrido. Algo o fez apartar-se, mas o que?

Enfim... sobreviveria. Com o orgulho um pouco prejudicado, certamente.

Possivelmente poderiam ser amigos. Sim, isso seria o melhor. O que outra coisa podiam ser?

Quando ia meter se na cama, viu que havia uma flor de flor-de-laranja sobre seu travesseiro.

E, de novo, aquele gesto voltou a confundi-la.

 

Smith se amaldiçoou a si mesmo por ser tão tolo. O que o havia poseído para beijar a dessa forma? Acreditava que podia controlar-se. Evidentemente, não era assim. Tinha estado a ponto de despi-la e tomá-la ali mesmo, sob uma árvore.

Mas sabia que não era a ele a quem Jessica estava vendo, a não ser a seu irmão gêmeo. Cada vez que o olhava, via o Tom.

E não podia suportar a idéia de ser o dobro de um homem morto.

Para escapar do desejo que sentia por ela, tentou passar mais tempo no escritório; mas ali não tinha muito que fazer e os dias resultavam compridos e aborrecidos.

Sua antiga paixão pelo trabalho tinha desaparecido e era pior desde que perdeu o contato com sua família.

A relação sentimental que manteve com o Stephanie Bridges foi um fracasso mais por seu desinteresse emocional; suas aventuras, após, tinham sido breves, impessoais e nada satisfatórias.

Levava muito tempo sem rumo... até que Jessica apareceu e pôs seu mundo patas acima. Lhe tinha dado um irmão e uma mãe natural. Tinha-lhe dado uma identidade e um propósito.

Não podia imaginar a vida sem ela. Jessica enchia sua casa, seus sonhos, seus pensamentos. Não tinha nenhum interesse por sua própria empresa, que virtualmente funcionava sozinha, mas lhe tinha contagiado sua emoção pelo contrato com as lojas de departamentos Neimann Marcus.

Jessica o fazia sentir vivo de novo e o fazia... ficar brincalhão. Muito brincalhão.

Gotas de suor caíam por sua frente enquanto levantava pesos.

 

As seguintes três semanas foram muito estranhas. Por um lado, as coisas foram de maravilha. Smith tinha insistido em converter uma das habitações da casa em oficina para suas bolsas. Inclusive se ofereceu voluntário para ir ao Matamoros a recolher os que tinha feito a senhora López e lhe levar mais material.

A recontagem na caravana tinha dado como resultado sozinha sessenta e duas bolsas terminadas. Jessica enviou os primeiros cinqüenta a Dallas e se concentrou em terminar o resto.

Juanita Torre, a irmã de Rosa, era uma excelente costureira e tinha duas companheiras quase tão boas como ela. Assim que tudo solucionado. De fato, trabalhando sozinho meia jornada, os outros cinqüenta estiveram terminados com uma semana de antecipação.

E Sandi Myers tinha chamado no dia anterior com boas notícias: os primeiros eram um êxito e várias denta tinham pedido desenhos a jogo com seus vestidos de noite.

Shirley lhe disse que havia muitos pedidos através da página de Internet e Mack tinha a sua equipe trabalhando todo o dia para poder servir os pedidos das boutiques.

Jessica estava no céu. Queria trabalhar dia e noite, mas Smith não o permitia.

-Tem que descansar até que o doutor Vargas diga que está recuperada de tudo.

Ela teria querido discutir, mas o pensou melhor.

Tinha entrevista com o médico a semana seguinte. Podia esperar até então.

Mas se as coisas foram de maravilha profissionalmente, foram menos que bem no aspecto pessoal. Desde aquela noite na plantação, Smith se comportava de forma fria com ela. Não era grosseiro, é obvio, solo distante.

Era amável, terrível, escrupulosamente amável.

Quase se tinha convencido de que tinha imaginado a paixão daquela noite... mas o tinha visto um par de vezes olhando-a com um desejo impossível de esconder.

E logo estava o passeio a cavalo.

Jessica, inquieta toda a tarde, aproximou-se dos estábulos. Doce, a égua do Smith, converteu-se em seu amiga, certamente porque estava acostumado a lhe levar alguma guloseima.

Aquela vez foi uma maçã.

-A mímicas muito -sorriu ele, aparecendo entre as sombras.

-É um céu. Recorda ao Daisy, minha égua. A sinto falta de.

-O que foi que ela?

-Os cavalos foram o primeiro que vendemos depois do acidente do Tom. Não podia dar classes, cuidar dele e dos cavalos de uma vez. Além disso, eram uma carga econômica -sorriu Jessica, acariciando o nariz de Doce-. Oxalá pudesse montá-la, mas este estuque...

-Creio que isso pode solucionar-se.

-De verdade?

Um minuto depois, Smith tinha selado à égua. Subiu a sua garupa e levantou a Jessica como se fora uma pluma para sentá-la frente a ele.

-Pode nos levar aos dois?

-Doce é uma égua muito forte.

Jessica não recordava se tinha desfrutado de do passeio ou não. Nem sequer recordava a rota que tomaram. Solo era consciente da proximidade do Smith, do roce de seu braço no flanco enquanto sujeitava as rédeas... e dos batimentos do coração de seu coração. O calor que irradiava era como um forno.

Então se precaveu de que seu traseiro estava roçando a entrepierna do homem, e tentou apartar-se.

-Não faça isso.

-Fazer o que? -perguntou ela, aparentando inocência.

-te mover.

-Você molesta?

-Incomoda a Doce.

Estava mentindo e sabia. Seus movimentos não incomodavam à égua. Era Smith o que estava... molesto. A atração sexual entre eles era inegável. por que não queria admiti-lo?

 

Possivelmente estava imaginando o interesse do Smith nela, interpretando mal seus olhares; mas aquela noite, durante o jantar, voltou a ocorrer.

Estavam jantando ao lado da piscina, como faziam freqüentemente. Jessica tinha levantado os olhos de sua sopa de frutos do mar e o viu olhando-a como se ela fora o segundo prato.

Quando chegou a sobremesa, estava tão nervosa que logo que podia levantar o garfo.

Mas em lugar de apartar o olhar como estava acostumado a fazer, um fantasia de diabo lhe pediu que o desafiasse. Tinha chegado a hora de ser sinceros sobre aquela atração.

Estava farta de sonhos eróticos e disposta a levá-los a cabo.

Olhando-o aos olhos, tomou um morango e, com deliberada lentidão, passou a língua pela ponta.

Uma e outra vez.

Smith apertou os lábios.

-Quer um mordisquito?

-me diga uma coisa -murmurou ele, com voz rouca.

-Sim?

-Queria muito ao Tom?

Jessica se levantou de um salto.

-Maldito seja, Smith Rutledge -gritou, lhe atirando o morango à cara-. Maldito seja duzentas vezes!

 

Smith nem sequer queria falar da atração que havia entre eles. Era como uma mula. Trocava de tema cada vez que Jessica tentava falar do assunto.

A única vez que falaram disso foi durante um café da manhã, quando ela, frustrada, perguntou-lhe se tinha alguma enfermidade venérea ou era impotente.

Smith, que quase se engasgou com os cereais, olhou-a como se tivesse duas cabeças. -Claro que não!

Não queria falar sobre seus sentimentos, mas sua obsessão pelo Tom e Ruth Smith era cada dia maior. Interrogava-a incesantemente sobre eles e sua avó Lula.

-Se o médico disser que pode viajar, eu gostaria que fôssemos ver ao Oklahoma.

-Não entenderia quem é.

-Possivelmente não, mas é algo que devo fazer. Viria comigo? Juanita pode encarregar-se de tudo enquanto estamos ali, não?

-Sim, claro. É de toda confiança. Smith também queria examinar os papéis do Tom e as coisas de sua família que Jessica guardava em casa do Shirley.

De modo que na terça-feira seguinte, quando a análise de sangue confirmou que tudo ia bem e lhe tinham tirado o estuque, fizeram planos para ir ao Oklahoma.

na quarta-feira tomaram o avião privado com destino ao Bartlesville. Ele estava tenso; muito amável na aparência, mas sério.

Jessica tinha decidido simplesmente esperar.

cedo ou tarde Smith estalaria e então... ah, então, "cuidado, menino".

Quando chegaram ao Oklahoma o céu estava talher de nuvens e, apesar de que levava jaqueta e calças, Jessica estava tremendo ao entrar no carro.

-Creio que comecei a me acostumar ao clima do Texas. Estou geada.

Smith acendeu a calefação e colocou a jaqueta sobre suas pernas.

-Melhor?

-Obrigado.

-De nada.

Tanta amabilidade... Jessica tinha vontades de gritar.

-Agora você terá frio.

-Não, eu sou de sangue quente.

-Pois não me parece isso.

-Por favor, Jessica, deixa-o. Não posso mais.

Ela sorriu, sedutora.

-Seguro que não?

-Já está bem! Só sou humano.

-Não, eu sou humano. E estou começando a pensar que você é um robô.

-Um robô? Como os do Star Trek? -tentou brincar Smith.

Ela deixou escapar um suspiro. Era absurdo tirar o tema. Mas, ao menos, tinha reconhecido que sentia algo. Seu instinto masculino começava a protestar. Melhor. Também ela o estava passando mau.

A anciã estava poda e bem vestida quando entraram em vê-la. Mas vivia em seu próprio mundo, alheia à realidade. Chamava a Jessica indistintamente Ruth e Edwina, sua irmã maior, morta vinte anos antes. Não pareceu reconhecer ao Smith, nem sequer para confundi-lo com o Tom.

Sabia que estava desiludido, mas foi muito amável com Lula. Inclusive lhe tinha levado um presente. A anciã sorriu ao ver o que era.

-Bombons de morango. Meus favoritos -exclamou, em um breve momento de lucidez.

Smith falou com o diretor da residência e com o médico de Lula. Estava disposto a levá-la a um hospital especializado em doentes do Alzheimer, mas ambos insistiram em que ali estava recebendo muito bons cuidados e que uma mudança poderia resultar fatal a sua idade.

-Sinto que não tenha podido falar com ela -disse Jessica quando voltavam para hotel-. Sei que está desiludido.

-Estou-o. Mas me tinha advertido, assim não esperava muito.

-Como sabia que os bombons de morango eram seus favoritos? me tinha esquecido.

-Não sabia -sorriu Smith-. Mas os bombons de morango eram os favoritos de minha avó Beamon.

Quando chegaram ao hotel, Jessica comprovou que cada um tinha uma suíte... e que estavam muito separadas. Nada de portas conectando uma habitação com outra, é obvio.

-Tenho que chamar por telefone -disse ele quando subiam no elevador-. A que hora ficaste para jantar com o Shirley?

-Às sete. Não demoraremos nada em chegar, mas poderíamos ir antes se quer lhe jogar uma olhada às caixas. Suponho que já teria voltado do instituto.

-Estupendo -disse Smith, entrando em sua habitação.

Ou, mas bem, "escapando" a sua habitação.

O que pensava, que ia colocar lhe emano diante do botões?

Jessica soltou uma risinho. Isso não estaria mau. Em lugar de zangar-se por aquele jogo, estava começando a desfrutá-lo. Gostava das provocações. Tinha aprendido a ser forte desde menina. Era teimosa? Certamente. Admitir a derrota era algo que não estava em seu vocabulário. Por isso ficou com o Tom durante tanto tempo.

 

Quando chegavam a casa dos Milhares, começou a chover muito.

Smith, sempre tão previdente, tinha comprado um guarda-chuva na loja do hotel e, ao sair do carro, tiveram que correr para não empapar-se.

Shirley, uma garota moréia de sorriso contagioso, recebeu-os com um par de toalhas. Abraçou a Jessica e se voltou para o Smith...

Seu sorriso desapareceu então.

-meu deus -murmurou, perplexa-. Entrem, por favor. Chove muitíssimo, verdade? -disse, tentando dissimular sua reação-. Mack chegará em seguida.

Jessica lhe tinha explicado a relação entre o Smith e Tom por telefone, mas entendia sua surpresa ao ver um homem que tinha morrido dois anos antes.

-Shirley, apresento ao Smith Rutledge. É incrível como se parece com o Tom, verdade?

-Mais que incrível.

Smith sorriu.

-Ao menos não te deprimiste como fez seu amiga. Me alegro de te conhecer, Shirley. Jessica fala de ti e do Mack todo o tempo. E dos meninos.

-Onde andam, por certo? trouxemos presentes para eles.

-Vamos, fazendo os deveres. Baixarão em seguida. Querem tomar algo?

-Um café -disse ele.

-Eu também.

Seguiram ao Shirley até a cozinha e conversaram sobre o negócio, enquanto ela colocava uma bandeja no forno.

Mack chegou quinze minutos mais tarde e, depois da surpresa inicial ao ver o Smith, uniu-se à conversação.

antes de jantar, Jessica sugeriu que fossem à garagem para olhar nas caixas onde guardava as coisas do Tom. Mas fazia muito frio para ficar a investigar.

-Podemos vir amanhã por elas. Será melhor que as revise em casa, com tranqüilidade.

-Muito bem. Creio que me gelou o nariz. Segue em seu sítio?

-Vamos, anda. Está tremendo.

Ricky e Megan, de sete e nove anos, estavam encantados com os jogos de ordenador que Smith lhes tinha levado de presente. Jantaram com os adultos, mas em seguida pediram permissão para subir a sua habitação.

Mack não sabia se devia falar do Tom mas ele o animou. depois de tudo, tinha sido seu melhor amigo.

Jessica e Shirley limparam a mesa enquanto lhe contava anedotas sobre uma excursão de pesca que tinham feito quando eram crianças.

Na cozinha, Shirley deixou de limpar os pratos e se voltou, olhando-a com expressão preocupada.

-Jess, tome cuidado.

-Com o que?

-Com o Smith. Ele não é Tom.

-Sei. parecem-se muitíssimo e têm coisas em comum, mas são completamente diferentes. Ao princípio me custava trabalho, mas depois de uns dias comecei a ver o de outra forma. É Smith, não um dobro do Tom. E é uma pessoa maravilhosa. Quente, generoso e muito simpático. Além disso, não bebe.

-Ao contrário que Tom.

-Assim é -suspirou Jessica-. Smith não está lutando contra seus demônios, como ele. Não é um homem inseguro nem amargurado, e não lhe faz a vida impossível a ninguém com seu mau caráter.

-Em outras palavras, é como se Tom houvesse tornado... convertido em um homem perfeito, não?

Esse comentário golpeou a Jessica como uma bofetada.

-O que quer dizer?

-Só te peço que tome cuidado. Não quero que te faça mal. Lembrança quanto amava ao Tom e a agonia que passou para deixá-lo. E também recordo quão horrível foi aquele último ano para ti. Olhe, Jessica, você merece ser feliz Y...

-De verdade, isto não tem nada que ver com o Tom.

Shirley deixou escapar um suspiro.

-Perdoa se me coloco onde não me chamam. Mas é que me preocupo com ti, já sabe.

-E eu gosto que se preocupe, mas não tem por que fazê-lo. Sei o que faço, de verdade.

-Até onde chegastes?

-A que te refere?

-Não te faça a inocente. Esse homem está louco por ti. Poderia vê-lo até um cego.

-Você crie?

-Sei.

-Não nos deitamos juntos, se referir a isso -sorriu Jessica-. Mas estou nisso.

Shirley decidiu deixar o tema e se dedicaram a celebrar os benefícios que estavam conseguindo com as vendas ao Neimann Marcus. Depois falaram sobre outros materiais, outros desenhos que Jessica tinha em mente...

Não voltou a pensar naquela conversação até que Smith e ela voltavam para hotel.

"O velho Tom convertido em um Tom perfeito?".

Explicaria isso sua atração por ele? Smith não era perfeito, isso certamente. Ele também tinha problemas, mas a preocupação por encontrar a sua verdadeira família não era nada comparado com a amargura de seu marido. E era teimoso. Isso era algo que os dois irmãos tinham em comum. Não falavam de seus problemas, os guardavam dentro.

Mas possivelmente isso formava parte do caráter masculino. Durante anos lhe tinha pedido ao Tom que fosse a um psicólogo para falar de suas coisas, mas se negava. Em lugar disso, foi ela quem foi à consulta.

O psicólogo lhe disse que as mulheres não tinham problemas para procurar ajuda quando a necessitavam, mas os homens eram outro assunto. Desde aí muitos problemas de álcool, drogas...

-Eu gosto de seus amigos -disse Smith, interrompendo seus pensamentos.

-Obrigado. São boa gente. Sinto que não tenhamos podido abrir as caixas esta noite.

-Não passa nada. Irei amanhã cedo e Mack me ajudará às colocar no carro.

Jessica pensou em uma dúzia de coisas que poderia dizer ou fazer para pô-lo nervoso. Mas não fez nada.

-Até manhã -despediu-se, movendo seductoramente os quadris enquanto entrava em sua habitação.

Então jogou uma olhada pela mira. Smith seguia parecido no sítio.

 

Jessica e Smith estavam sentados no chão do salão, rodeados de caixas. Levavam duas horas procurando e tinham encontrado um álbum de fotografias.

-Quem é? -perguntou ele, assinalando a fotografia de uma menina ao lado de um casal.

-Sou eu com o Mel e Leah Cutter, meus pais adotivos. Devia ter nove anos.

-Não parece muito feliz.

Jessica soltou uma gargalhada.

-Era minha terceira casa em um ano e essa foto foi tomada nada mais chegar. Qui-los muito, mas ao princípio pensava que seriam como todos outros. Seus filhos eram maiores e creio que sentiam falta de ter meninos ao redor. Converti-me em uma combinação de filha e neta para eles.

Enquanto passava as páginas do álbum, Jessica assinalou outras fotografias nas que parecia mais feliz.

-Estes foram meus primeiros natais com eles... e esta minha primeira bicicleta.

Também havia fotografias das férias no Grande Canhão e na Disneylandia.

-Vivem ainda?

-Leah morreu quando eu tinha dezoito anos, mas Mel está muito bem. mudou-se a Florida para viver com seu filho maior quando Tom e eu nos casamos. Faz dois anos que não nos vemos, mas falamos por telefone muito freqüentemente. É um personagem -sorriu Jessica-. Jogo muito de menos. Já Leah.

-E seus pais naturais?

-Não os sinto falta de absolutamente. Meu pai nos deixou quando eu era uma menina, e minha mãe teve uma coleção de noivos e maridos após -suspirou ela-. Gostava mais dos homens e o álcool que eu, e o melhor que pôde acontecer foi que lhe tirassem a custódia.

-É terrível.

-Sim, sei. Como te disse, Tom e eu tínhamos muito em comum. Suponho que meu próprio desejo de esquecer a minha mãe foi o que me fez não pressioná-lo para que falasse da Ruth.

Em outras fotografias, Jessica aparecia com o uniforme do colégio, sorridente e preciosa.

-Foi animadora.

-Sim, durante quatro anos. E aqui estamos Tom e eu vestidos para a festa de graduação. Tom odiava esse smoking.

Smith observou a imagem de seu irmão gêmeo.

-Parece que está de mau humor.

Olharam em outra caixa com as coisas de Lula e encontraram a fotografia emoldurada de uma jovem de corto comprido e olhos tristes.

-É Ruth, a mãe do Tom. Creio que foi tomada quando tinha dezesseis ou dezessete anos.

Smith estudou a fotografia durante comprido momento, a fotografia de sua mãe. sentia-se curiosamente vazio. Seu rosto não lhe resultava mais familiar que o de qualquer estranho.

dentro da caixa havia outra de cetim vermelho em forma de coração. Em seu interior, mais fotografa e um montão de envelopes atados com um laço. As fotografias eram de Lula e Malcolm Smith, as cartas do Malcolm a sua mulher. Quando descobriu o que eram, Smith voltou às guardar.

Encontraram velhas fotografias da Ruth, com o caderno de notas do colégio e um par de medalhas.

-Era uma boa estudante -disse Jessica-. Especialmente sobressaía em matemática.

-Aqui há um diploma da universidade do Oklahoma.

-Não sabia que tivesse ido à universidade.

-Parece que o deixou em primeiro.

-Quando foi, no princípio dos sessenta? Possivelmente foi então quando conheceu esses hippies dos que fala Lula.

-Provavelmente.

No fundo da caixa, Smith encontrou uma gasta Bíblia. Entre suas páginas, a partida de nascimento e o certificado de falecimento de vários parentes, começando por uma tal Naomi Ruth Phillips, nascida em 5 de maio de 1899 e casada em 21 de julho de 1916 com o Samuel Elijah Thomas, nascido em 16 de dezembro de 1894.

-Estes deviam ser os bisavôs do Tom. E meus, suponho -suspirou, sentindo que por fim estava começando a encaixar as peças do quebra-cabeças-. Naomi e Samuel tiveram três filhos: Edwina, Lula Jane e Frank Warren Thomas. Frank morreu em 7 de dezembro de 1941.

-Ao princípio da Segunda guerra mundial -apontou Jessica.

-Provavelmente no Pearl Harbour. Solo tinha dezenove anos. E aqui diz que o marido de Lula, Malcolm, morreu em junho de 1944. Meu avô. Pergunto-me se também ele morreu na guerra.

Lula e Malcolm tinham tido dois filhos: um que morreu ao nascer, em agosto de 1941 e Ruth Anne Smith, nascida em 8 de fevereiro de 1943. O certificado de matrimônio da Edwina com o James T. Patrick também estava ali, junto com a partida de nascimento de suas três filhas.

-O que aconteceu Edwina?

-foi se viver a Califórnia Y... creio recordar que morreu faz uns anos. Ah, sim, Tom foi a seu funeral em trem. Não sei nada de suas filhas.

Smith seguiu procurando e encontrou recortes de periódico. Dois eram dos anos cinqüenta, os bilhetes do Naomi e Samuel. Outro informava sobre a morte do Frank no Pearl Harbour. Também encontrou a carta em que o Ministério de Defesa informava a Lula sobre a morte do Malcolm na França, durante a Segunda guerra mundial.

Nas últimas páginas da Bíblia havia três partidas de nascimento. Uma era de um menino que morreu ao nascer, chamado Malcolm Alvin Smith, outro da Ruth Anne Smith e o terceiro, do Thomas Edward Smith.

Olhou a partida de nascimento do Tom e depois se levantou para procurar a sua própria. Eram idênticas. Os dois tinham nascido no mesmo hospital da Saint Louis. Tom nasceu quatro minutos antes que Smith e pesou três quilogramas oitocentos, trezentos gramas mais que ele. A mãe do Tom era Ruth Anne Smith, de pai desconhecido, enquanto que os Rutledge apareciam como seus pais.

Qualquer dúvida de que eram gêmeos tinha desaparecido por completo.

Era uma certeza.

Uma dor tremenda o golpeou então, tão horrível que tivesse desejado ficar a gritar.

por que? por que?

por que sua mãe o tinha abandonado?

por que ficou com o Tom?

por que?

-Encontra-te bem? -perguntou Jessica.

-É que tenho tantas perguntas... Tom jamais te comentou que tinha tido um irmão?

-Não, nunca me disse nada. E tampouco falava muito de sua mãe. Os anos que passou com ela foram terríveis.

-Maldita seja! por que não ficaram com os dois?

-Quem?

-Meus pais adotivos. Os Rutledge.

-por que não os perguntas, Smith? Não te afaste de uma família que te quis sempre. Pergunta tudo o que queira saber.

-Como vão dizer me por que não ficaram com o Tom se se negarem a reconhecer que sou adotado?

Smith golpeou o escritório com o punho, frustrado, e Jessica, sem saber o que fazer para consolá-lo, acariciou seu cabelo.

Um segundo depois, ele tomava entre seus braços como se queria agarrar-se a algo. Apoiou o queixo em seu cabelo e a abraçou. Solo a abraçou. Com ela a seu lado não se sentia tão sozinho.

 

Ao dia seguinte, Jessica começou a notar uma dor na boneca. Tentou costurar as bolsas, mas lhe resultava impossível.

Smith insistiu em que fora ao médico. De fato, não só a levou a consulta, mas sim teria entrado com ela se não o tivesse impedido.

Às vezes a tratava como se fora sua mãe. Era lhe exaspere e, ao mesmo tempo, adulador. Gostava que cuidasse dela.

O doutor Vargas lhe disse que não era nada grave, mas devia fazer um tratamento de fisioterapia e pediram entrevista para na segunda-feira seguinte.

-Que cilindro. Estou farta disto -queixou-se no carro-. Tenho vontades de voltar para minha vida normal.

-Sente pena de ti mesma?

-Muita pena, sim. Tenho um milhão de coisas que fazer, mas não posso fazer nada.

-Pode fiscalizar o trabalho. Deve entender que seu negócio cresceu e já não tem que fazê-lo tudo. Terá que te perder a diversão de criar coisas.

-Isso é o que aconteceu com ti?

Smith assentiu.

-Comecei com os ordenadores quando estava na universidade. Era divertidísimo. Logo comecei a vendê-los... e pouco depois tinha cem empregados. A partir de então, terminou-se a diversão.

Quando chegaram a casa, Juanita e as demais costureiras já tinham deixado de trabalhar e Jessica passeou pela oficina, nervosa.

Smith a encontrou olhando pela janela, passando uma mão pelo braço.

-Tem frio?

-Não, é que estou... não sei, incômoda. E um pouco desanimada.

-Sabe o que creio? Que necessita umas férias.

-Férias? Não tenho tempo para férias. Devo levar as amostras à feira de Dallas Y...

-Não, sério, necessita umas férias para te esquecer de tudo. Ao menos um fim de semana. estiveste alguma vez na ilha Pai?

-Não.

-Pois vamos.

-Agora mesmo?

-Claro. Solo está a uma hora daqui e nada calma os nervos melhor que o som das ondas.

-Meus nervos estão perfeitamente.

Smith sorriu.

-Tem traje de banho?

-Não.

-Compraremos um na ilha.

 

Smith lhe havia dito que a ilha Pai era como outro mundo, tranqüilo, depravado, sem problemas, sem pressas. E era certo. Suas preocupações começaram a desaparecer assim que viu a praia.

-Que estranho.

-O que é estranho?

-Assim que chegamos à praia foi como se alguém me houvesse meio doido com uma varinha mágica... a tensão começou a desaparecer.

Smith sorriu.

-me passa o mesmo cada vez que venho aqui. antes de que a encontrassem os turistas estava muito melhor, mas enfim...

-Não se pode ter tudo.

-Não, é verdade. vamos comprar te um traje de banho.

No passeio marítimo havia vários hotéis e muitas lojas para os turistas. Smith deteve o carro frente a uma luxuosa boutique.

Enquanto ela olhava uns trajes de banho, ele olhava outros. E, curiosamente, elegia os mais pudicos.

Jessica se levou seis trajes de banho ao provador: três dos que Smith tinha eleito e três biquínis diminutos. depois de provar-lhe decidiu-se por um traje de banho azul elétrico e um biquíni rosa que não deixava quase nada à imaginação.

Tinha pensado sair com ele do provador, mas decidiu não fazê-lo. Se o fazia, certamente ao pobre lhe daria um enfarte.

Smith a esperava com um chapéu de palha na mão. E umas sandálias. E um emparelho.

-Não necessito todo isso. É muito caro. Agora vai bem, mas se começar a gastar dinheiro como uma louca ficarei em números vermelhos.

-É um presente.

-Disso nada. Eu pago por meus próprios trajes de banho... que são muito caros, por certo. Poderia ter comprado um pouco parecido pela metade de dinheiro.

-Por favor, Jessica, é minha convidada -insistiu ele-. Quero comprar isto. E isto...

Quinze minutos depois saíam da boutique carregados de bolsas. Calças de esporte, uma camisa, um vestido azul... Ela tinha tentado protestar, mas não serve de nada. Ao Smith sobrava o dinheiro e era impossível convencer o de que a deixasse pagar por suas compras.

depois de guardar as bolsas no assento traseiro do carro, seguiram pelo passeio marítimo até uma zona mais tranqüila e, por fim, chegaram a uma casa frente ao mar.

-Esta é sua casa? -perguntou Jessica, entusiasmada.

-Sim. Você gosta?

-É incrível.

É obvio, o interior era espetacular. -eu adoro, eu adoro... O salão-comilão tinha o chão de mármore branco e os móveis da mesma cor. Mas o espetáculo mais incrível estava na terraço.

Jessica deixou as bolsas e abriu a porta de cristal. No jardim, uma piscina de águas azul turquesa e, depois dela, o oceano. A menos de cinqüenta metros, as ondas caíam umas sobre outras lavando a areia.

-Isto é fabuloso... vamos dar um passeio pela praia antes de que oscurezca.

Jessica se tirou as sapatilhas e baixou os degraus do alpendre à carreira.

-Vejo que você gosta -sorriu Smith.

-eu adoro!

-Me alegro muito de que você goste.

Uma hora depois, quando já tinha escurecido, caminharam de volta para a casa.

-Se fosse minha, viveria aqui todo o tempo.

-Eu estou acostumado a vir freqüentemente. Eu gosto de ir pescar ou sair com o navio...

-Tem um navio?

-Tenho dois. Estão amarrados no mole de Porto Isabel. Tenho um navio de pesca e outro que estou acostumado a usar para ir navegar. Você gosta de navegar?

-Não o tenho feito nunca. Mas sempre eis querido fazê-lo. Nos filmes parece muito divertido -sorriu ela-. Embora não deve ser nada fácil, não?

-A verdade é que não.

-Pois não creio que possa te ajudar com a boneca assim...

Smith soltou uma gargalhada.

-Não vamos competir na Taça a América, não se preocupe. Eu me encarrego das velas e você sozinho tem que te apoiar na amurada e olhar o mar, de acordo? Se amanhã fizer bom tempo, iremos navegar no Meg.

-O Meg? O nome de alguma antiga noiva?

-Não. É o diminutivo do Megabite, já sabe, como nos ordenadores. O grande se chama Gi-gabite. Tem fome?

-Comeria- um cavalo.

-Há um restaurante aqui perto que serve o melhor linguado do mundo. Gosta?

-Muito. Mas tenho que me trocar.

-Não faz falta. Além disso, está muito bem assim. Jogo-te uma carreira -disse Smith então, correndo para a casa.

-Espera! -gritou Jessica, correndo atrás dele.

Aquele era um Smith Rutledge completamente novo.

E gostava de muito.

 

-Olhe -disse Smith, assinalando algo com a mão.

Jessica estava a seu lado na coberta do Meg, emocionada. Havia golfinhos nadando ao redor do navio enquanto saíam de Lacuna Mãe para as águas do golfo. Devia haver uma dúzia deles saltando sobre a água, como se estivessem jogando esconderijo.

-São como Flipper!

-Não posso acreditar que nunca tenha visto um golfinho.

-Pois acredita-o. Solo os tinha visto nos filmes ou na televisão. Alguma vez tinha visto um golfinho, o que acontece? Bartlesville não está precisamente perto do mar e não viajei muito -sorriu Jessica, levantando a cara para receber a fresca brisa do mar-. Isto é maravilhoso. eu adoro navegar.

Sorrindo, Smith moveu o leme.

-Mas se acabarmos de sair de porto.

-Dá igual. eu adoro.

Estava maravilhada pelo suave movimento do navio sobre a água, pelo som das ondas golpeando o casco... Era tão feliz, que nada podia pô-la nervosa.

As rugas na frente do Smith tinham desaparecido desde que passaram sob a ponte da baía. E desapareceram por completo meia hora depois. Evidentemente, para ele navegar era igualmente tranqüilizador.

Apoiando-se no respaldo dos amaciados almofadões de coberta, Jessica deixou escapar um suspiro.

-Isto é vida. Poderia me acostumar.

Mas se recordou a si mesmo que viver assim para sempre não era possível. Em uma semana se teria partido de sua casa, e as preocupações pelo negócio e todo o resto apareceriam por si só.

Navegaram durante toda a manhã e só a fome os fez voltar para porto.

depois de comer no clube náutico, decidiram voltar para casa para nadar um pouco. Jessica ficou o traje de banho azul e notou por sua expressão que ao Smith parecia muito provocador. E era certo. O decote das costas era indecente e o frontal chegava quase até o umbigo.

"Estupendo", pensou.

Smith emitiu uma espécie de gemido ao vê-la e ela tentou não soltar uma gargalhada enquanto se colocava o emparelho ao ombro.

-Comeu-te a língua o gato?

-Não, absolutamente. Mas pode que faça frio...

-Crie que deveria me pôr um casaco?

-Não creio que faça falta. Está segura de que esse é um dos trajes de banho que escolhemos?

-Certamente. É que você não gosta? -perguntou Jessica, logo que dissimulando a risada.

-Sim... bom, é uma maravilha de engenharia.

-supõe-se que isso é um completo?

-É um pecado e está... está preciosa.

Ela sorriu. sentia-se preciosa.

-Obrigado. Você tampouco está mau.

Smith ia lhe dar um tapinha no traseiro, mas Jessica saiu correndo para a praia.

O sol tinha esquentado a areia e era uma tarde perfeita para encharcar-se um pouco. Pouco, porque a água estava fria. Mas jogaram na água como meninos e depois caíram rendo sobre as toalhas.

-Obrigado por me trazer aqui. Poderia viver nesta casa para sempre. -Sabia que ia gostar de te. -vou vir aqui com minha caravana cada vez que tenha uma oportunidade.

-Minha casa é sua casa. Pode vir quando quiser. -Obrigado.

Smith fechou os olhos e ela aproveitou a oportunidade para admirar seus peitorais e os abdominais marcados. Então descobriu que tinha uma cicatriz no peito.

-O que é isto?

-Uma cicatriz.

-Isso já o vejo, tolo. Do que?

-Uma operação de coração.

-O que? Mas se não ter nem quarenta anos.

-Operaram-me quando tinha dois anos. Nem sequer me lembro.

-O que te passava?

-Que não me funcionava bem uma válvula. Felizmente, como meu pai é cardiologista, operou-me o melhor cirurgião do país.

-Seu pai é cirurgião?

-É especialista do coração, mas solo trata adultos. Levou-me a um cirurgião especializado em meninos e tudo saiu Estupendamente. Nunca tive problemas para jogar futebol nem para nada.

-A que se dedica seu irmão Kyle?

-É médico, cirurgião plástico.

-E a ti alguma vez te ocorreu estudar medicina?

-Nunca. O sangue me põe nervoso. Eu prefiro trabalhar com coisas que não dizem ai! quando as toucas.

Jessica soltou uma gargalhada.

-Como ordenadores ou laranjas?

-Exatamente. Sempre me gostaram das novelo, ver crescer coisas... Nesse sentido, creio que Tom e eu nos parecíamos muito.

-A ele lhe davam muito bem as novelo. Tivemos um horta e seus pêssegos eram os melhores do condado. Me rompeu o coração quando tive que vender a granja, mas...

-por que a vendeu?

-Por razões econômicas -respondeu ela. Mas não queria seguir falando do assunto-. Tenho vermelha o nariz? Pica-me.

Smith enrugou a sua.

-Te pôs muito vermelha... vamos dentro. Porei-te um pouco de aloe beira antes de que lhe saiam ampolas.

Uma vez na cozinha, Smith tirou um bote de nata de uma gaveta.

-Porei-te um pouco nas costas.

-Ah, que bem. A verdade é que me arde -suspirou Jessica.

-Sinto muito, deveria me haver lembrado antes da nata. Este sol é muito traiçoeiro.

-A verdade é que eu não estou acostumado a me queimar. Suponho que será meu sangue cherokee.

-Cherokee? Eu sou em parte... -Smith não terminou a frase-. Enfim, como o avô Pete e eu não somos parentes de verdade, em realidade não sou em parte cherokee.

-Sim o é. Malcolm Smith era quarteirão. E creio que Lula também tinha sangue a Índia, mas não sei de que tribo. Todo mundo no Oklahoma tem algo de sangre a Índia nas veias. me fale de seu avô.

-É um personagem -sorriu ele-. Eu sempre o idolatrei. Cherokee Pete o chama todo mundo. Leva tranças e tem um grande senso de humor. Embora seja mais rico que o presidente dos Estados Unidos, comporta-se como se fora um tipo normal e corrente. Mas tem uma biblioteca incrível e o lê tudo, desde noveluchas até o Kant.

Enquanto falava, estendia a nata por suas costas e Jessica não pôde evitar um suspiro. Lhe dobravam os joelhos ao sentir o calor daquelas mãos sobre sua pele.

-eu adoraria conhecê-lo.

-Se algum dia passar pelo leste do Texas, vá visitar o. Convidará a uns chiles picantes e te ensinará seu mascote: uma serpente de cascavel.

-O que?

-O que ouve. Date a volta -disse Smith então, com voz rouca.

Jessica obedeceu.

Ele pôs um joelho no chão, encheu-se a palma da mão de nata e começou a passá-la por suas pernas. Era uma das experiências sensuais mais excitantes de sua vida.

Mas quando roçou o interior de suas coxas, teve que sujeitar-se à mesa.

O mantinha a cabeça baixa. Durante o que lhe pareceu um século, seus dedos descansaram no bordo do traje de banho, perto de seu entrepierna.

O desejo era incontrolável.

-Smith?

-Não diga nada. me dê um minuto -disse ele, levantando-se-. Pode te pôr você a nata? -perguntou, sem olhá-la.

Jessica se mordeu os lábios.

-Não, prefiro que o você faça.

Smith começou a lhe pôr nata nos braços; primeiro um, logo o outro.

O calor que sentiam não tinha nada que ver com o sol.

Então baixou as tiras do traje de banho para estender a nata por seus ombros. Ao fazê-lo, roçava seus peitos com o canto da mão.

E quando chegou ao decote, levantou o olhar. Em seus olhos havia uma expressão de desejo impossível de dissimular.

Jessica temia uma excitação que não havia sentido nunca. Seu ventre ardia e o bote de aloe beira que tinha na mão caiu ao chão.

-Jessica -murmurou ele-. Isto está me matando. me diga que pare.

-Não pares. Por favor, não pares.

Smith colocou a mão por debaixo do traje de banho para tocar seus peitos.

-Preciosa -murmurou-. É preciosa. Quero te provar... solo um pouco.

inclinou-se para roçar um mamilo com a ponta da língua e ela quase perdeu a cabeça. Aga-rrándose a seus ombros, esfregava seus peitos contra a boca do homem.

Lançando um gemido rouco, Smith lhe baixou o traje de banho de um puxão.

-Não pode imaginar quantas noites estive acordado desejando te despir. E desejando fazer isto -disse então, ficando de joelhos diante dela para afundar a cara em seu púbis-. E maldita seja... quero mais. Quero-o tudo.

-Eu também -murmurou Jessica-. Por favor, estou-me morrendo...

Smith a levou a dormitório em braços. Assim que a deixou sobre a cama, tirou-se o traje de banho e procurou uma camisinha. Estava espetacularmente rígido e ela o observou, excitada, enquanto o punha.

-A próxima vez será melhor, carinho, juro-lhe isso. Mas agora não posso esperar. Desejei-o durante muito tempo.

-Não quero que espere -murmurou Jessica, abrindo as pernas-. Estou tão preparada como você.

Ficando de joelhos, Smith levantou seus quadris para beijá-la intimamente. E ela quase caiu da cama.

-Está quente... e úmida. Poderia te comer.

-Quero-te dentro de mim. Agora, rápido.

-Jessica...

Levantando a cabeça, procurou sua boca com ânsia e a penetrou de uma vez, sua língua movendo-se ao mesmo ritmo que seu membro viril.

Aquela invasão a fez gritar de prazer. O orgasmo durou e durou, convulsionando seu corpo e detonando uma explosiva ejaculação masculina.

-OH, Jessica. Meu amor, carinho... -repetia ele uma e outra vez, tremendo tão violentamente que a cama se movia-. Maldito seja Tom. Maldito seja por te haver tido antes!

 

Atônita pelas palavras do Smith, Jessica ficou imóvel.

-por que há dito isso?

-Sinto muito, de verdade. Sou um idiota. Sei que cada vez que me olha vê o Tom... vivo outra vez.

-Equivoca-te. Conheço a diferença, asseguro-lhe isso. Tom já não está. Sei perfeitamente. deixei atrás o passado faz tempo, Smith. E você é único. E era a ti a quem desejava, solo a ti. foi contigo com quem tenho feito o amor -murmurou ela, apoiando a cabeça sobre seu peito-. Nenhum homem me tem feito sentir isto, asseguro-lhe isso. Nenhum homem.

-Eu gostaria de acreditá-lo.

-Pode acreditá-lo, Smith. Até que te conheci, sempre me tinha considerado mas bem... é-xualmente tímida. Mas agora solo penso em me deitar contigo.

Ele soltou uma gargalhada.

-me passa o mesmo. Não dormi bem desde que te vi na cafeteria.

-Serão as famosas feromonas?

-Será que tem uns olhos preciosos. Ou sua boca, ou esse sorriso matador. Ou este furinho no queixo... Ou possivelmente este precioso traseiro que me volta louco -riu Smith, acariciando suas nádegas-. Carinho, sonhei com isto.

Não houve um só centímetro de sua pele que não beijasse ou acariciasse. E Jessica gozava com cada carícia como nunca antes lhe tinha ocorrido. Nunca lhe tinham feito o amor dessa forma, como se fora uma deusa a que terei que adorar.

sentia-se como a mulher mais desejável do mundo, livre de inibições. Gesso lhe deu poder para explorar novos prazeres, proibidos até então.

Smith parecia amá-lo tudo nela. E quando chegaram ao clímax juntos, seus olhos se encheram de lágrimas.

Seu corpo se convulsionou com um segundo orgasmo, tão potente como o primeiro. Embriagada de emoções, começou a chorar.

-Jess, carinho, está chorando?

-Eu... creio que te quero.

Smith a apertou contra seu coração, sorrindo.

-Isso espero, céu. Isso espero.

 

Fizeram o amor durante toda a tarde. Depois, tomaram banho juntos e voltaram a fazer o amor.

Smith insistiu em secar seu cabelo com o secador. Desfrutava de cada segundo com ela. Não o tinha passado tão bem em muitos anos.

-Seguro que sabe o que faz? Meu cabelo é muito encaracolado e não resulta fácil de dirigir.

-Confia em mim, carinho. Quando era um pirralho eu também tinha o cabelo encaracolado. Tinha uma juba que era o terror de minha mãe e tubo que aprender a me pentear para não parecer um ouriço. Além disso, meu cabelo era muito duro, mas o teu eu adoro... a cor, a textura. É tão suave como o cetim.

Jessica sorriu.

-Quantos adulações. Deve ser o irlandês que há em ti.

-Irlandês?

-Tem aspecto irlandês. Sempre pensei que seu pai...

-Poderia ser. Uma pena que nunca possa me inteirar -suspirou ele. Uns segundos depois apagou o secador e voltou para a Jessica, de cara ao espelho-. O que te parece?

-Está... muito encaracolado -riu ela-. Pareço uma mescla de Diana Ross e Dolly Parton.

-me parece que está muito sexy.

-De verdade?

-De verdade. Eu gosto de ver seu cabelo estendido sobre o travesseiro. Não sei por que sempre leva acréscimo... embora esteja preciosa de todas formas, claro.

Jessica lhe deu um beijo na bochecha.

-Tenho fome. Gosta de um sanduíche?

-Que tal um coquetel de frutos do mar e uma taça de champanha? Ponha o vestido novo e te levarei a dançar.

-A dançar? Você sabe dançar?

-A Batata é católica? Carinho, eu adoro dançar. Minha mãe e sua irmã eram umas peritas e nos ensinaram a dançar a todos.

-Sério?

-Ensinaram-nos a desfrutar das coisas boas da vida. Sei dançar a valsa, o fox-trot, o cha cha cha... inclusive o tango.

-eu adoro dançar, mas faz séculos que não o faço. Não sei se me lembrarei.

-Tom não te levava a dançar?

-Não gostava de muito.

-Nisso não nos parecemos -sorriu Smith-. Não se preocupe, já te lembrará. te pinte as unhas dos pés e te ponha as sandálias de salto. Esta noite vamos de festa -disse então, mordiscando seu ombro-. Bom, dentro de um ratito...

Rendo, Jessica se apartou.

-Disso nada. Antes temos que comer... e dançar. Vístete. Estarei lista em quinze minutos.

Enquanto a via partir, Smith sorria como o gato que se comeu ao canário. sentia-se de maravilha. Como se alguém tivesse aceso uma luz dentro dele. Estava louco por ela, completamente louco. Se não fora por...

Não, não ia pensar nisso. Pensava desfrutar daquele fim de semana. Durante um par de dias, pensaria que Tom nunca tinha existido. Ou, ao menos, tentaria-o.

 

Jessica encontrou laca de unhas em uma das gavetas do banho. Tentando não perguntar-se de quem seria, pintou-se as unhas dos pés enquanto cantarolava uma canção.

O vestido azul que Smith lhe tinha agradável ficava perfeito. Chegava até os tornozelos e tinha uma abertura na perna quase até a coxa.

Embora tinha o nariz ainda um pouco tinta, podia dissimulá-lo com maquiagem. Não necessitava ruge, solo um pouco de brilho de lábios e máscara nas pestanas.

Não estava mau... para quem gostasse da imagem de "recém levantada da cama". Jogou-se o cabelo para trás, sujeitando-o com um clipe, e deixou um par de mechas soltas ao redor da cara.

Uns brincos de prata e um toque de perfume... Então olhou seus pés nus. Sapatos, necessitava sapatos.

As sandálias brancas que Smith insistiu em comprar eram perfeitas.

E estava preparada. Em vinte minutos.

Quando abriu a porta do dormitório, ele estava esperando, muito bonito com uma camisa verde e calças de cor cáqui. E a luz que brilhou em seus olhos ao vê-la-a esquentou por dentro.

-Está muito bonito, carinho.

Jessica levantou um pé para lhe mostrar seus uñitas pintadas de rosa.

-Você gosta?

-Está perfeita.

-Seguro que isso o diz a todas seus amigas -disse ela, fazendo uma careta.

-Não tenho amigas. Faz tempo que não as tenho.

Isso gostou. Embora tentou dissimulá-lo.

 

Jessica deixou escapar um suspiro enquanto apoiava a cabeça no peito do Smith. Estavam dançando uma canção romântica na pista de baile.

O coquetel de frutos do mar tinha sido delicioso, o bolo de pescado fantástico e Smith era um bailarino de fábula.

-Não dançava assim dos dezesseis anos. Tinha esquecido quanto eu gostava.

-Uma pena. Te dá muito bem.

E era certo. Tinha começado a recordar todos os movimentos entre seus braços. Smith estava muito bonito aquela noite... e a Jessica não tinham acontecido desapercebidas os olhares de outras mulheres.

Curiosamente, sentiu o absurdo desejo de lhes dizer que deixassem de olhar ou lhe pôr um pôster nas costas que dissesse: "É meu!"

Tinham a pista de baile quase para eles sozinhos. Havia gente na barra do bar e nas mesas, mas se foram partindo à medida que passavam as horas, deixando-os solos com o disc jóquei e o garçom. Smith lhes tinha dado uma boa gorjeta e pareciam dispostos a ficar até o amanhecer.

-Está cansada?

-um pouco. Mas não quero que termine a noite. Estou-o passando muito bem. Além disso, ainda não dançamos o cha cha cha.

Smith sorriu.

-Não creio que o disc jóquei tenha esse tipo de música. vou perguntar lhe... quer uma taça?

-Outra tónica, por favor.

Jessica se sentou enquanto ele ia falar com o disc jóquei.

-Não tivemos sorte com o cha cha cha, mas acredita que tem algum ritmo latino. vai comprovar o enquanto tomamos algo.

Ao final, quão único tinha eram ritmos caribenhos, molho, lambada... de modo que decidiram partir.

-Creio que tenho algum tango em casa -disse-lhe ao ouvido-. Podemos nos despir e dançar na cozinha.

-Smith! -riu ela, correndo para o carro.

 

Dançar nua na cozinha era uma experiência completamente nova para ela. Mas o fizeram... e adorou.

Fez muitas coisas aquela noite que não tinha feito antes. E as desfrutou de todas.

Era maravilhoso poder dizer e fazer o que quisesse e se sentia embriagada de liberdade.

À manhã seguinte, voltaram a tomar o navio. Jessica estava começando a ser uma perita... no leme.

Smith lhe pôs nata por todo o corpo e a aplicação tinha dado lugar a outras coisas. De fato, alguns dos sítios onde ele insistia em pôr nata nunca veriam a luz do sol.

A temperatura era maravilhosa e não havia ninguém em muitas milhas marinhas à redonda, de modo que navegaram durante uma hora nus por completo. Era sensacional.

-Isto eu adoro -murmurou Jessica, ao leme, com o Smith acariciando-a por detrás-. Não posso acreditar que esteja fazendo-o.

-Eu tampouco.

-Não o tinha feito antes?

-Não me tinha ocorrido até que te conheci. Inspira-me, carinho -suspirou Smith, colocando uma mão entre suas pernas.

-Se segue fazendo isso vamos terminar na água.

-Eu te salvarei. Não se preocupe.

E o fez.

E depois trocaram de sítio.

sentia-se completamente desinhibida. Era maravilhoso.

-Seguro que os do helicóptero o estão acontecendo bomba -disse Smith então.

-Que helicóptero? -exclamou Jessica.

Ele soltou uma gargalhada.

Só havia nuvens e um par de pássaros no céu.

-Era uma brincadeira.

-Será tolo! Que susto me deste.

-Sinto muito, céu. Mas é que contigo me sinto como um menino travesso.

-Sei, me passa igual. Entrar nessa cafeteria do Harlingen é o melhor que tenho feito em toda minha vida. Quero-te muito, Smith.

 

Aquela noite, Smith tinha o coração em um punho. Jessica dormia em seus braços e as ondas golpeavam ritmicamente a praia. Sexualmente satisfeito... sexualmente exausto, deveria haver ficado dormido.

Mas não o estava. Estava absolutamente acordado.

Pensando no Tom.

E na Jessica. Sua mulher.

Smith o tinha tido tudo: educação, dinheiro, uma família, montões de oportunidades... Seu avô lhe tinha agradável um milhão de dólares quando se graduou na universidade e, como ele tinha dobrado essa quantidade em pouco tempo, Cherokee Pete lhe deu dez milhões mais, o trato que tinha feito com todos seus netos.

Tudo o que tocava se convertia em ouro, seu negócio prosperava, tinha as casas de seus sonhos e podia deitar-se quase com qualquer mulher. A vida tinha sido estupenda até que se inteirou de que seus pais não o eram de verdade.

Aquilo foi um golpe terrível, mas nada comparado com o que Tom teve que sofrer.

Sua outra metade tinha tido uma existência terrível, sem pai conhecido e com uma mãe dro-gadicta. Não pôde terminar a carreira e teve que ficar a trabalhar quando era muito jovem. Quão único o fez feliz na vida foi seu trabalho, sua granja... e sua mulher.

Mas o destino lhe jogou outra má passada quando ficou paralisado por um acidente. Não podia caminhar por sua horta, nem montar a cavalo... teve que vender sua granja para pagar as dívidas e seu negócio se arruinou porque não podia trabalhar.

E Jessica, sua mulher.

Certamente foi o melhor de sua vida. Tom morreu e também a perdeu a ela. Perdeu-a, deixando-a com um montão de dívidas.

E naquele momento, em lugar de honrar a memória de seu irmão, Smith se tinha levado a sua viúva à cama.

Não era culpa da Jessica. Estava seguro de que conscientemente ou não, ela seguia pensando no Tom.

Até isto lhe tinha roubado Smith a seu irmão.

Tentava racionalizar seus sentimentos, mas se sentia terrivelmente culpado.

 

O aroma a café recém feito despertou a Jessica. Alargou a mão para procurar o Smith, mas ele não estava na cama.

-bom dia, espreguiçadeira -saudou-a ele quando entrou na cozinha-. É hora de voltar para a civilização. Como você gosta dos ovos?, revoltos?

Ainda meio dormida, ela enredou os braços ao redor de sua cintura e apoiou a cara em suas costas.

-Não quero ovos. Necessito um café. Temos que voltar para o Harlingen?

-Temo-me que sim, Cinzenta. Tem que levar um negócio e eu também. E esta tarde tem sessão de fisioterapia.

-Eu creio que já não necessito fisioterapia. Agora uso muito melhor a mão, vê? -riu Jessica, colocando a mão em sua braguilha.

-Por favor, Jess! Se começarmos assim... me queimassem as omeletes e chegarei tarde à reunião.

-Que reunião?

-por que não toma banho rapidamente? Quando voltar, terá o café da manhã preparado.

um pouco surpreendida por sua atitude, Jessica tomou uma taça de café e voltou para a habitação. Desde quando lhe importava mais se se queimavam umas omeletes que fazer o amor com ela? Mas tinha mencionado uma reunião... possivelmente era importante.

Smith estava servindo os ovos mexidos no prato quando entrou de novo na cozinha.

-Isto tem boa pinta. Sabe cozinhar? -riu ela, abraçando-o.

-Cuidado, vais queimar te. E não sei cozinhar, solo sei fazer ovos mexidos ou fritos. Também sei abrir latas, claro. Sente-se, anda. Quer geléia?

-Não, obrigado.

Tomaram o café da manhã olhando o mar e Jessica desejou estar de novo no navio, em lugar de ter que voltar para o Harlingen.

-Como pode partir daqui? Eu viveria nesta praia toda a vida.

-Às vezes me resulta difícil, mas me recordo mesmo que até o paraíso resulta aborrecido se fica muito tempo. Assim o desfruto mais.

-Possivelmente poderíamos voltar o próximo fim de semana.                                                

-Tem que ir a Dallas, recorda? Para a feira.                        

-Ah, sim, é verdade. E tenho um milhão de coisas que fazer. Virá a Dallas comigo?

-Sinto muito, mas não posso. Tenho uma reunião do conselho de administração e tenho de preparar muitos papéis.

-Ah, claro -murmurou ela, sentindo-se culpado. Estava deixando o trabalho a um lado por sua culpa.

Desde que chegou ao Harlingen, o pobre logo que pisava no escritório. E uma empresa como a sua não se dirigia sozinha.

-Fez a mala?

-Sim, já está tudo preparado.

-Estupendo -sorriu Smith-. Pode deixar os pratos na pia. A criada chegará dentro de meia hora.

 

Se Jessica tinha visto como Smith se animava na ilha, viu que ocorria justo o contrario ao voltar para o Harlingen. quanto mais se aproximavam, mais sério ficava.

Logo que tinha podido lhe tirar duas palavras. Era muito amável, como sempre. Smith sempre era amável. Mas começava a estar... distante.

E os pararam por excesso de velocidade. Felizmente, conhecia polícia e só recebeu um olhar de reprimenda.

Parecia ter uma pressa enorme por chegar a casa. Quando Jessica o mencionou, sua única resposta foi:

-Quando tenho coisas na cabeça, estou acostumado a pisar no acelerador sem me dar conta. Perdoa.

-Posso fazer algo?

-Não.

Quando chegaram a casa, recebeu uma tremenda surpresa: ele deixou a mala na porta de seu dormitório. Jessica pensava que foram dormir juntos, mas... não era assim.

E isso lhe doeu. ia dizer se o mas não se sentia tão desinhibida como no dia anterior. Havia uma barreira entre eles.

-Tenho que ir ao escritório -disse Smith, olhando seu relógio-. Certamente estarei encalacrado todo o dia. Ric te levará a sessão de fisioterapia.

-Não necessito que me leve ninguém. Posso ir eu sozinha se não te importa me emprestar um de seus carros. Ou posso alugá-lo.

-Não faz falta que o alugue, Jessica. Tenho uma garagem cheia de carros, assim pode escolher o que queira. Eu creio que o BMW é o mais fácil de manobrar. Necessita algo mais?

Surpreendida pela mudança de atitude, ela o olhou, atônita.

-Não -disse por fim-. Não necessito nada. Smith Rutledge desapareceu como alma que leva o diabo.

-Falando do Jekyll e Hyde...

Possivelmente se parecia mais ao Tom do que tinha acreditado. Tom sempre foi um pouco distante, mas ela sabia quando estava de mau humor e o deixava em paz. Enfrentar-se com ele era quão pior podia fazer. Possivelmente Smith era da mesma forma.

Isso a preocupou.

Não, não podia acreditar que fosse como Tom. Algo o preocupava. O negócio, certamente.

Uns minutos depois, foi à oficina onde Juanita e outras duas mulheres estavam trabalhando.

Na hora de comer elas se foram e Jessica ficou desenhando novos modelos.

Mas não fez muito. Não podia deixar de olhar pela janela, recordando a ilha, o navio, o vento na cara e as mãos do Smith sobre seu corpo.

-Senhorita Jessica?

Rosa estava frente a ela com a bandeja do almoço na mão.

-Ah, obrigado.

-Tem que comer algo.

-Creio que comerei ao lado da piscina.

ia tomar a bandeja, mas o ama de chaves insistiu em levá-la.

-Já não me dói a boneca. Posso fazê-lo eu.

-O senhor Rutledge me há dito que cuide de você e penso fazê-lo.

-Muito bem. De acordo.

Comer sozinha ao lado da piscina não foi nada divertido. Jessica tomou um pouco de salada e depois foi trocar se para a sessão de fisioterapia.

 

A casa estava em silêncio quando voltou. Na cozinha, Rosa limpava feijões para o jantar. Tentou ajudá-la, mas o ama de chaves se negou em redondo.

Intento trabalhar, mas estava inquieta. E era muito cedo para chamar o Shirley, que seguiria no instituto.

Mel. Não tinha falado com ele em séculos. Animada pela idéia de falar com seu adotivo, chamou a Florida.

Mas Mel estava jogando dominó com seus amigos e não voltaria até a noite, contou-lhe sua nora.

Sentindo-se sozinha, passeou pela plantação e depois foi aos estábulos. Rio apenas lhe emprestou atenção, mas Doce, a égua, relinchou ao vê-la.

-Olá, bonita. Sinto não te haver trazido nada. Solo vim a conversar. Gosta?

Doce levantou a cabeça como se entendesse. Rendo, Jessica acariciou seu nariz. Depois começou a escová-la, conversando sobre umas coisas e outras, sobre tudo do Smith e de quão estranho estava.

-Os homens são muito estranhos, verdade?

Doce moveu a cauda, olhando-a com uns olhos nos que quase podia ler: "Já te digo".

Meia hora depois soltou a escova.

-Obrigado, Doce. Agora me sinto muito melhor. E espero que possamos conversar em outro momento.

Era quase a hora do jantar quando voltou para casa.

-chamou o senhor Rutledge -disse-lhe o ama de chaves com expressão compungida-. Não pode dever jantar, assim Ricardo lhe servirá quando você diga.

-Obrigado, Rosa. vou lavar me um pouco.

Embora levava anos comendo sozinha, Jessica se deu conta de que se acostumou a ter companhia. A companhia do Smith. E a comida lhe teve sabor de cartão.

Não só não foi jantar, mas sim não tinha chegado a casa quando ficou o pijama. Nem a meia-noite.

Pela manhã, Rosa lhe disse que se partiu muito cedo. E aquela noite tampouco foi jantar.

-É que tem muito trabalho. Problemas com a empresa e reuniões, já sabe.

Ao menos poderia chamá-la, pensou Jessica. Ou entrar em sua habitação para lhe dar um beijo.

Mas possivelmente essa era sua forma de lhe dizer adeus. Possivelmente o que tinham compartilhado o fim de semana foi mais importante para ela que para ele. Não estava acostumada a aquele tipo de aventura. Não conhecia as regras. Tom era o único homem com o que se deitou e sua vida sexual era... bastante rotineira.

Smith estava a anos de luz dela quanto a experiência. As coisas que lhe disse ao ouvido seriam sozinho frases feitas? Os dias que passaram na ilha Pai teriam sido sozinho um queda para ele? Estava muito confusa. E doída.

Queria pensar que estava preocupado por seu negócio, queria lhe conceder o benefício da dúvida. Mas não pensava manter outra relação com um homem que a voltasse louca nem que a fizesse questionar-se seu próprio valor.

Ao dia seguinte falaria com o Smith sobre seus sentimentos. E se não lhe contava o que estava passando, partiria. Montaria em sua caravana e se iria dali.

Aquela noite dormiu abraçada ao travesseiro. Mas despertou ao ver uma figura escura ao lado da cama.

-Smith?

-Perdoa que te tenha despertado. Durma, Jess.

antes de que ela pudesse responder, foi-se.

Jessica olhou o despertador. As duas da manhã. Que demônios estava passando?

-Já está bem de tolices! -exclamou, apartando o edredom.

Bateu na porta de seu dormitório e entrou sem esperar resposta. Smith não estava ali, mas ouviu o grifo da ducha.

Carregando nessa direção, ia murmurando para si mesmo o que pensava lhe dizer. O acla-rararían todo imediatamente, aquela mesma noite. No quarto de banho se era necessário.

Nu, empapado e atônito, Smith ficou olhando-a sem dizer nada. Seu membro estava erguido e, ao vê-lo, despertou nela um desejo imediato. Tanto, que esqueceu a urgência de sua missão.

"por que vou desperdiçar este momento?", disse-se a si mesmo.

-Não entre na ducha, Jessica.

-por que não?

-Porque... vais ficar te geada -suspirou Smith, fechando o grifo.

-Temos que falar.

-É tarde. por que não falamos pela manhã?

-Amanhã terá outra reunião e quero falar agora. Bom... possivelmente dentro de uns minutos. Por quem está tão quente? -murmurou Jessica, envolvendo-o seductoramente em uma toalha.

-Jess, por favor... Não faça isso, carinho.

Mas voltou a fazê-lo, esfregando-se contra ele.

-me diga por quem está tão quente.

Smith a beijou então com um anseia que lhe deixou os joelhos trementes.

-Por ti, tola. É por ti por quem estou quente. Está-me matando, Jess. Que Deus me ajude, não posso te apagar de minha cabeça.

Depois tomou em braços e se dirigiu à cama.

E, então, os dois se voltaram loucos.

 

Jessica despertou às sete da manhã na cama do Smith. Sozinha.

Outra vez sozinha. E não tinham falado muito. Certamente, não falaram do que tinham que falar. E era evidente que Smith tentava evitá-lo.

Suspirando, levantou-se da cama e foi a sua habitação. Mas estava decidida: antes de que terminasse o dia ia falar com ele. Evidentemente, o problema não era que se cansou. A noite anterior não parecia cansado absolutamente. Mas passava algo. Um pouco muito estranho. Não se acreditava a história das reuniões.

Tentando esquecer do assunto, trabalhou com as costureiras toda a manhã. Escolheu as bolsas que levaria a feira e, quando todos estavam guardados em caixas, foi à cozinha para tomar um copo de água.

Mas Rosa tinha outra mensagem para ela:

-O senhor Rutledge não deverá jantar.

O anúncio foi como um jarro de água fria. Mas já estava farta daquele jogo.

-Muito bem. Então tampouco fico eu para jantar.

depois da sessão de fisioterapia, foi à barbearia para cortá-las pontas e fazê-la manicura.

Mais tarde se foi às compras, jantou em um restaurante chinês e foi ao cinema a ver o último filme do Mel Gibson. Eram quase as doze quando chegou a casa.

Smith estava esperando na porta.

-Onde demônios estiveste?

Jessica piscou, atônita.

-Perdoa?

-Onde estiveste? -repetiu ele. Quase lhe saía fumaça das orelhas.

-por aí.

-Onde?

-Tinha reuniões -respondeu Jessica, tentando entrar. Mas lhe bloqueava o passo.

-Que demônios significa isso? O que estiveste fazendo?

-Maldita seja, Tom, eu não tenho que te dar explicações!

Smith ficou pálido.

-Não sou Tom. O está morto. Sou Smith. Sou Smith!

-Sei...

-Acaba de me chamar Tom. E eu não sou Tom! Nunca serei Tom. Levo duas horas te esperando, temendo que tivesse sofrido um acidente O... eu o que sei, algo pior.

depois disso, saiu da casa dando uma portada.

Jessica apertou os lábios, pálida. por que lhe tinha chamado Tom? Possivelmente lhe escapou para ouvi-lo gritar. Inclusive antes do acidente, seu marido era paranóico sobre o que fazia ou deixava de fazer.

Depois foi muito pior. Ter que lhe dar explicações de cada um de seus movimentos, voltava-a louca. E não voltaria a passar por isso. De maneira nenhuma.

"Acabou-se. Parto-me".

 

Smith se dirigiu para a plantação. Não estava zangado, a não ser assustado, aterrorizado. E seu maior medo acabava de fazer-se realidade: Jessica o tinha chamado Tom.

Apesar de dizer que não, confundia-os. Seu engano freudiano o tinha deixado claro.

Amaldiçoando e rezando de uma vez, caminhou entre as árvores a grande velocidade para acalmar-se e, por fim, deixou-se cair ao chão, com a cabeça entre as mãos. Que demônios ia fazer? Estava louco por uma mulher que amava a um homem morto.

Seu irmão. Seu irmão gêmeo ao que nunca conheceu.

Tinha tentado afastar-se dela, tentou-o tudo, mas era uma febre, uma obsessão impossível. Possivelmente seria melhor se não voltasse de Dallas. Possivelmente, com o tempo...

Então ouviu o ruído de um motor.

Jessica.

-Não, não!

Smith se levantou de um salto. Estava saindo da plantação quando viu que a caravana se dirigia para a grade de ferro. Decidido, plantou-se no meio do caminho e levantou os braços.

Ela tocou a buzina, mas Smith não se moveu. Se partia, teria que fazê-lo por cima de seu cadáver. Se tinha que lutar por ela contra um fantasma, faria-o.

A caravana se deteve, mas Jessica seguiu tocando a buzina. E ele não se moveu.

-te aparte!

-Não penso fazê-lo até que falemos!

-Falar? Levo dias tentando falar contigo -replicou ela-. Mas tinha muitas reuniões! te aparte!

-Terá que passar por cima de mim. Não penso me mover.

Jessica ficou em silêncio.

-Muito bem. De acordo.

-Apaga o motor e falaremos.

Ela apagou o motor e abriu a lhe chiem porta da caravana.

-Sobe.

-Não, baixa você. Falaremos em casa, carinho.

-Não me chame "carinho". E não penso ir a casa. Se quer falar, sobe.

Smith obedeceu.

-Muito bem. Fala.

-Sinto muito me haver posto assim, mas te quero e estava preocupado por ti.

-Diga-o outra vez.

-Estava preocupado por ti.

-Não, o outro.

-Sinto me haver posto assim.

-Não, o outro -insistiu Jessica.

-Quero-te.

-Nunca me havia isso dito.

-Claro que lhe tenho isso dito.

Ela negou com a cabeça.

-Não. Eu lhe tenho isso dito uma dúzia de vezes, mas você não. Começava a pensar que solo tinha sido um queda e queria te liberar de mim.

-O que diz? Estou louco por ti, mas me confunde com o Tom Y...

-Um momento! Eu não lhes confundo absolutamente. Sinto muito te haver chamado Tom, mas é que estávamos discutindo Y... soava como ele. Estava acostumado a me fazer a vida impossível com seu ciúmes e interrogatórios Y... há coisas que não sabe sobre minha vida com ele, Smith.

-Não preciso sabê-lo.

-Sim, necessita-o. Crie que estava louca pelo Tom e que o vejo de novo em ti. Que por isso estou contigo. Mas não é assim. Deixei de amá-lo antes do acidente. Suponho que não queria te desiludir com esta feia história, mas é a realidade. Tem que saber a verdade sobre o Tom, Smith. Era um alcoólico amargurado e uma pessoa com a que não se podia viver. Supliquei-lhe que fosse a Alcoólicos Anônimos, mas não me fez conta. Ao final, eu tive que ir a um psicólogo e assim encontrei forças para deixá-lo. Levávamos vários meses separados e eu tinha solicitado o divórcio quando sofreu o acidente. Tive que cuidar dele porque não tinha a ninguém mais Y... porque necessitava meu seguro médico.

Nos olhos do Smith havia uma mescla de pena e raiva.

-Maltratava-te?

-Fisicamente? Não. Emocionalmente? Sim, quase desde o começo. Tom se negava a procurar ajuda. separava-se de mim, não me contava suas coisas... como você tem feito estes dias. Passei por um inferno e não penso fazê-lo outra vez, Smith. É melhor partir agora. Agradeço tudo o que tem feito por mim e sinto muito que nunca conhecesse seu irmão. Possivelmente poderia havê-lo ajudado... possivelmente não.

-Pobre homem. Não teve muitas oportunidades, não?

-Isso não é verdade. Teve uma infância difícil, como muita gente. Mas ele escolheu seguir sendo uma vítima. Não o converta em um mártir, Smith. E não seja como ele.

-Eu não bebo.

-Uma sábia decisão, mas não estou falando disso. Não te separe da gente que te quer.

-Você me quer, Jessica?

-claro que sim. Mas não estou disposta a suportar uma relação como a que tive com o Tom. Os casais precisam comunicar-se.

-Estamos nos comunicando agora?

Ela riu brandamente.

-A que fala sou eu. Não te deste conta?

-Deixa que te explique por que eis estado me comportando como um imbecil estes dias.

Smith esvaziou sua alma, lhe contando o culpado que se sentia por querê-la, seus medos de ser um mero substituto do Tom... O contou tudo.

-Jess, quero-te com todo meu coração. Fica comigo e deixa que lhe prove isso. Juro que jamais voltarei a me levar como o tenho feito. Pode que me preocupe, mas manterei a boca fechada. E farei todo o possível para me comunicar contigo como um ser civilizado, prometo-lhe isso -murmurou, beijando sua mão-. Me dê outra oportunidade. me ajude a fazê-lo bem.

-Se disser que sim, fará algo por mim?

-O que queira.

-irás ver seus pais?

Ele não duvidou um segundo.

-Se isso for o que quer, farei-o. Caminharia em cima de brasas acesas por ti, Jess.

-Não necessito que faça isso -riu ela, acariciando seu cabelo-. Solo quero que seja feliz. Sei que sua família te quer e te sente falta de. É hora de falar do passado e deixá-lo atrás.

-Tentei-o, mas não querem falar.

-Pois eu creio que chegou a hora -sorriu Jessica, arrancando a caravana.

-Onde vamos?

-De volta ao celeiro.

Smith sorriu.

-Fez o amor na caravana alguma vez?

-pergunte-me isso amanhã.

 

Jessica despertou nos braços do Smith e com o macaco de peluche em uma mão. Sorrindo se estirou, feliz.

-bom dia, carinho -saudou-a ele.

-bom dia.

-Fez o amor em uma caravana?

-Muitas vezes -riu ela-. Desde quando está acordado?

-Há um momento. Estava te olhando dormidita... Por certo, esse macaco é o boneco mais feio que vi em toda minha vida.

Ela tampou as orelhas do peluche com as mãos.

-Não diga isso. vais ferir seus sentimentos. Shirley me deu de presente isso por meu aniversário antes de que começássemos com o negócio e me acompanhou em tudas minhas viagens. Que horas são?

Smith olhou seu relógio.

-Quase as oito. Quer tomar o café da manhã?

-Sim. Tem reuniões hoje?

Ele se esclareceu garganta.

-Verá... carinho, tenho que te confessar uma coisa.

-Confessar?

-Sim. Promete não te zangar?

-Não prometo nada. Cospe-o.

-Não tinha nenhuma reunião. Bom, nenhuma que durasse mais de uma hora.

-Então, o que estiveste fazendo estes dias?

-Matando o tempo. Jogando às cartas, fazendo pesos no ginásio do escritório... fazendo o que podia para me esquecer de ti. Mas não funcionava -murmurou ele, beijando-a brandamente nos lábios-. E agora solo posso pensar em um montão de tortitas com xarope de caramelo.

-Vá, obrigado -riu Jessica, lhe dando uma cotovelada-. vamos tomar o café da manhã antes de que morra de fome.

vestiram-se e baixaram rendo-se da caravana.

-me recorde que compre uma cama maior... se por acaso voltamos a usá-la -sorriu Smith-. Dói-me o pescoço.

-Darei-te uma massagem mais tarde. Sou uma massagista muito bom. Tomei lições quando Tom... perdoa.

-Não se preocupe. Sua vida com o Tom é um fato. Não podemos ignorar sua existência. Já não passa nada, Jessica. Por certo, já não te dói a boneca?

-Não. De fato, o fisioterapeuta me disse que não tinha que voltar. Mas devo fazer os exercícios em casa.

-Então, exijo minha massagem. por que não vais tomar banho te enquanto eu digo a Rosa que faça o café da manhã? Gostam de tortitas com nata?

-Muito.

Meia hora depois, tomaram-se seis tortitas cada um. Para recuperar forças.

-vou ter que me pôr a regime. Já quase não posso me grampear os jeans... a partir de agora, só saladas. E tenho que fazer exercício. Correr, possivelmente.

-Pois terá que comprar umas boas sapatilhas. Podemos ir às compras esta manhã.

-Já tenho sapatilhas, muito obrigado.

-Não, eu sou seu treinador a partir de agora e insisto em comprar as sapatilhas adequadas.

-Sim, treinador -sorriu Jessica-. pensaste na viagem a Dallas? Eu estarei muito ocupada na feira e poderia falar com seus pais enquanto estou trabalhando.

Smith ficou calado um momento.

-Poderíamos ir na sábado a visitar meu avô. eu adoraria que o conhecesse...

-Perdoe, senhorita Jessica -interrompeu-os Rosa-. Há uma chamada para você. É a senhora Myers, do Neimann Marcus.

-Ah, sim... Olá, Sandi -saudou-a ela, tomando o sem fio-. Mandei-te o pedido ontem. Chegará amanhã.

-Estupendo, mas chamo por outra razão.

Enquanto falava, Jessica tinha que conter seu entusiasmo.

-Sim, parece-me uma proposta interessante. Deixa que fale com minha sócia e te chamarei mais tarde.

Quando pendurou o telefone, virtualmente ficou a dar saltos pela cozinha.

-Yupi! Yupi!

-Boas notícias, vejo -sorriu Smith.

-Tenho que falar com o Shirley, mas agora está em classe. Não me posso acreditar isso... simplesmente, não me posso acreditar isso.

-O que passou?

-Sandi diz que estão lhes tirando as bolsas de festa das mãos. Já os venderam todos e têm uma lista de espera. Neimann Marcus quer que assinemos um contrato em exclusiva durante dois anos, e vão pôr os no catálogo de Natal! Lhe pode acreditar isso? -exclamou Jessica, deitando-se em seus braços-. O que te parece?

-Primeiro terá que decidir se quer vender suas bolsas em um só mercado, ou desejas ampliar horizontes. Quantos empregados necessitaria para isso? Quanto espaço? Garante-te Neimann Marcus um pedido mínimo anual? O que acontece os clientes das outras boutiques? Temo-me que para assinar esse contrato necessita um advogado.

Lhe deu um beijo nos lábios.

-Eu gosto de te ter perto. Não me tinha ocorrido pensar em nada disso. vou fazer uma lista de tudo o que temos que considerar antes de chamar o Shirley.

-Antes ou depois de ir às compras?

-Hoje não tenho tempo para isso. Poderia correr um momento pelo jardim. Ou fazer pesos no ginásio.

Estiveram uma hora no despacho falando sobre todas as contingências de um contrato em exclusiva, e depois chamou o Shirley enquanto Smith ia nadar um momento. Quando chegaram a um acordo, chamou o Sandi Myers e depois foi a sua habitação para ficar o biquíni rosa.

Um minuto depois se atirava de cabeça à piscina.

-O que é isto, uma sereia? -brincou ele.

-Shirley e eu tomamos uma decisão. Queremos servir a todos nossos clientes, mas nos interessa o contrato com o Neimann Marcus -respondeu Jessica, enredando os braços ao redor de seu pescoço-. Se mantivermos uma produção baixa de muito boa qualidade, nossas bolsas seguirão no mercado durante muito tempo, sem passar-se de moda. Além disso, assim se justificará seu alto preço. Por certo, conhece algum bom advogado?

-Duas dúzias -riu Smith.

-Estupendo. Sandi está enviando uma cópia do contrato agora mesmo.

-Então já não precisa ir à feira de Dallas.

-Au contraire, monsieur. Desta não te escapa. Sandi quer que vá a Dallas para conhecer grande chefe e assinar o contrato a semana que vem. Assim podemos visitar seus pais. Escolhe um dia.

 

-Nervoso? -perguntou-lhe Jessica enquanto conduziam pela avenida Highland. no domingo pela tarde era um dia tranqüilo naquela zona de Dallas.

-Como diria meu avô Pete, estou mais nervoso que um peru em Natal. Não sei como vão reagir meus pais. Solo lhes tenho dito que devia ir a vê-los com uma pessoa.

-Tudo vai sair bem. Já o verá.

-Isso espero.

Quando chegaram frente à mansão de tijolo visto, lhe fez um nó na garganta.

-Cresceu aqui? -perguntou Jessica.

-É muito diferente da casa em que viveu Tom, não?

-É uma casa preciosa, Smith. Não tem por que te sentir culpado. Deveria estar orgulhoso.

-E o estou. fui muito feliz aqui. Kyle e eu construímos uma casa em cima de uma árvore, como todos outros meninos. E minha mãe sempre estava preocupada de que nos rompêssemos o pescoço.

-Como todas as mães.

Suspirando profundamente, Smith saiu do carro. Uns segundos depois, sua mãe abria a porta com um sorriso nos lábios.

-Smith! -exclamou, abraçando-o.

-Olá, mamãe.

-Filho -saudou-o seu pai.

Quando Smith ia lhe dar a mão, o homem o abraçou, lhe dando palmadas nas costas.

-Olá, papai.

-Me alegro muito de te ter em casa.

-Ai, perdoa -disse sua mãe então, olhando a Jessica-. Estamos tão contentes de ver o Smith, que nos esqueceram as boas maneiras.

-Mamãe, papai -disse ele então, pondo um braço sobre seus ombros-. Apresento-lhes a Jessica, uma pessoa muito especial para mim.

-Senhora Rutledge... doutor Rutledge -saudou-os ela.

-Estamos encantados de te conhecer, Jessica. Mas nos chame Sarah e TJ. Nesta casa somos pouco jogo de dados às formalidades, especialmente desde que meu marido se retirou. Que pena que Kyle e Irish não estejam aqui... Mas o menino só tem dez dias e não param os pobres. Têm que ir ver os, Joshua é uma macacada.

Jessica sorriu.

-Parece que gostam de ser avós.

.nós adoramos -riu T.J.-. vamos mimar o tudo o que possamos.

-Isso está muito bem.

-Por certo, sua mãe tem feito café e bolo de chocolate, filho.

-o de nozes, mamãe?

-o de nozes. vamos cortar o.

-Espera um momento. Antes quero lhes ensinar algo.

Seus pais se olharam sem dizer nada. Foram ao salão e Smith tirou da maleta a fotografia do Tom e Jessica. Depois tirou outros papéis que colocou sobre uma mesa de mogno.

Sarah tomou a fotografia.

-Aqui parece mais jovem. Não sabia que lhes conhecessem...

-Não sou eu, mamãe. É Tom Smith, o defunto marido da Jessica. Morreu faz dois anos.

Sarah tomou a mão de seu marido, que a ajudou a sentar-se em uma poltrona.

-O que significa isto, filho?

-É a hora da verdade, papai -disse Smith, assinalando os documentos-. Esta é a partida de nascimento do Tom e esta é a minha... Estas são cópias de relatório médico da família. Este é meu grupo sangüíneo... estudei-o tudo a fundo. A semana passada recebi os resultados das provas de DNA que definitivamente me emparentan com uma mulher chamada Lula Smith. Está em uma residência do Oklahoma. Era a avó do Tom... e a minha também, creio. Está claro que sou adotado. Tom Smith era meu irmão gêmeo, não?

Sarah ficou a chorar e T.J. tentou consolá-la.

-Isto era necessário? Olhe o desgosto que lhe está dando a sua mãe.

-É necessário, papai. Quero-lhes muitíssimo, mas preciso saber a verdade.

Sua mãe levantou a cabeça.

-Tinha jurado sobre uma Bíblia não lhe dizer isso nunca, filho. Ela não queria que o fizesse. E você foi tão pequeno... Se não te tivesse deixado conosco, teria morrido. Assim que o juramos.

-A quem?

-Deixa que te conte a história -disse seu pai nesse momento, esclarecendo-a garganta-. Eu estava na Saint Louis então. Kyle tinha dois anos e sua mãe estava grávida, mas perdeu ao menino no parto e ficou destroçada. Na habitação do lado havia uma mulher que acabava de ter gêmeos.

-É esta? -perguntou Smith, lhe mostrando uma fotografia da Ruth.

-Sim. Esta é. Não estava casada e vivia da beneficência... enfim, um dos meninos estava são e o outro, você, tinha um problema de coração. Eu sabia que necessitaria muitos cuidados, uma operação... enfim, muito dinheiro para o tratamento. Sabendo que nós poderíamos cuidar de ti, essa mulher aceitou que lhe adotássemos.

-Para ela foi muito duro te abandonar -disse Sarah então-. Mas sabia que não poderia cuidar dos dois meninos. Lhe partiu o coração, por isso nos fez jurar sobre a Bíblia que nunca lhe diríamos nada. E nos fez prometer que lhe chamaríamos Smith. Eu quis romper esse juramento muitas vezes, mas... que Deus me perdoe por rompê-lo hoje.

-por que não adotaram também ao Tom?

-Queríamos fazê-lo, mas ela não o permitiu. Não podia separar-se dos dois meninos. Ao dia seguinte do parto partiu do hospital sem deixar uma direção, e nunca mais voltamos ou seja nada dela.

-Não lhes contou quem era meu pai?

-Não nos contou nada. Nem sequer de onde era.

Smith deixou escapar um comprido suspiro. Sentia como se lhe tivessem tirado um enorme peso de cima.

-Então, essa é toda a verdade?

-Toda a verdade -disse seu pai.

-Mamãe, quero-te muito. E quero que saiba. Não poderia ter tido uma mãe melhor.

Sarah começou a chorar de novo.

-Eu te quero muitíssimo, Smith. E não verte em três anos sem saber por que...

-Prometo que, a partir de agora, verão-me mais -sorriu ele, abraçando-a-. Onde está esse bolo de chocolate?

-Vou por ele agora mesmo.

-Acompanho-a -disse Jessica-. Por certo, eu adoro a cor das paredes. Nós tínhamos...

Quando saíram do salão, seu pai e ele se olharam.

-Correu localizou a Jessica?

-Não a localizei. O destino a pôs em meu caminho e lhe dou as obrigado por isso. É uma pessoa maravilhosa e estou muito apaixonado. Contaremo-lhes nosso estranho encontro enquanto tomamos o bolo... Por certo, papai, me alegro muito de estar em casa.

-E eu, filho. ides casar lhes?

-Ainda não o pedi, mas penso fazê-lo. É por ela por quem voltei para casa. Eu estava sendo muito teimoso e Jessica me convenceu.

-Então, já a quero -riu seu pai, lhe passando um braço pelos ombros-. Não posso te dizer quanto lhe sentimos falta de.

 

Passaram toda a tarde com seus pais e depois foram ver o Kyle e a sua família. A Jessica caíram bem imediatamente. Os dois irmãos desapareceram em uma habitação e voltaram pouco depois. Kyle tinha um sorriso nos lábios.

Sabia que Smith lhe tinha contado que era adotado porque via uma grande paz refletida em seu rosto.

Estiveram ali uma hora e prometeram voltar o antes possível.

-Estou esgotado -disse Smith quando voltavam para hotel.

-Mas contente.

-Mas contente, sim -sorriu ele-. Obrigado.

-por que?

-Por me fazer voltar para casa. E por me devolver a minha família.

-Tem-no feito você, não eu.

Smith a beijou nos lábios.

-Não sabe quão especial é para mim.

À manhã seguinte foram visitar avô Pete.

Jessica soltou uma gargalhada ao ver as duas lojas índias ao lado da casa.

-O que são, habitações para convidados?

-Embora não lhe cria isso, são-o. Às vezes meu avô dorme aqui -sorriu Smith-. Avô! Onde te colocaste?

-Não faz falta que grite, filho. Estou aqui.

Um homem de cabelo branco apareceu então no alpendre. Levava duas tranças e um velho peitilho vaqueiro. Avô e neto se fundiram em um forte abraço.

-Quem é esta garota tão bonita?

-Jessica Ou'Connor Smith, avô. A luz de minha vida.

Ela sorriu.

-Encantada de conhecê-lo. Eis ouvido falar muito de você.

-Não me chame de você. me chame Cherokee Pete, como todo mundo. Eu gosto, Jessica. E a minha filha também, pelo visto. A ver, ofereço-te um trato: se te casar com meu neto, dou-te dez milhões de dólares o dia das bodas.

Jessica soltou uma gargalhada.

-Tantas vontades tem de casá-lo?

-Certamente.

-Diz-o a sério -disse Smith então-. O que te parece? Dez milhões são dez milhões.

-Mas...

-Já lhe explicarei isso mais tarde. Avô, por que não lhe ensina sua serpente de cascavel?

-Agora mesmo. Mas esta é nova... a outra morreu. Quer que te ensine minha coleção de flechas?

Jessica adorava ao Cherokee Pete. Inclusive gostou dos chiles picantes que lhes serve para almoçar. Não gostava de partir, mas tinham ficado com o Shirley e Mack no aeroporto de Dallas às seis, de modo que tiveram que despedir-se.

-É todo um personagem, né?

-Não há ninguém como ele -Rio Smith-. Sempre foi muito especial para mim.

 

Chegaram ao aeroporto às seis menos cinco e, depois de recolher ao Shirley e Mack, foram ao hotel para trocar-se de roupa. Smith os convidou para jantar em um restaurante de cinco garfos e brindaram com champanha pelo êxito da empresa de bolsas Jessica Milhares.

-chegamos muito mais longe do que imaginávamos. Não posso acreditar que manhã vamos assinar um contrato com o Neimann Marcus.

-Eu tampouco -riu Shirley-. E, como contável da empresa, devo dizer que somos um êxito. Toda graças a ti, Jessica.

-Mas bem aos contatos do Smith.

-Eu creio que o campo estava abonado -riu ele-. As bolsas são uma maravilha. Inclusive eis pensado comprar um para mim...

-Tolo.

-Brindemos pelo êxito.

Jessica tirou então duas caixas envoltas em papel dourado com uma cinta azul.

-Por ser tão bons amigos. Sempre estivestes a meu lado nos momentos difíceis e lhes quero muito.

-Mas isto... -começou a dizer Shirley-. Se meu aniversário não for até outubro.

Ambos se olharam, atônitos, ao comprovar que eram dois relógios de ouro. Rolex, nem mais nem menos.

-Jessica! Isto é muito...

-Não são verdadeiros. São uma imitação que Smith comprou para mim no Matamoros. Olhem, eu tenho outro. A que parecem autênticos?

-Obrigado -disse Mack, incrédulo-. Estão seguros de que...?

-São uma cópia, de verdade. lhes diga que são falsos, Smith.

Ele lhes piscou os olhos um olho.

-São falsos.

-por que piscaste os olhos o olho? Smith Rutledge, estes relógios são autênticos?

-Não penso dizê-lo.

 

Smith bateu na porta do quarto de banho.

-Carinho, o café da manhã.

-Não pode ser. Não estou preparada. Tenho o cabelo feito um asco -suspirou ela, abrindo a porta-. Não posso fazer nada com estes cachos.

-Quer que te ajude?

Jessica levantou os olhos ao céu.

-Preciso parecer executiva, não uma amante desequilibrada. Importa-te me servir uma taça de café enquanto me tento arrumar isso -¿Cómo voy a negarte nada si eres adorable?

-Mas...

-Carinho, por favor. O ferro me sai pelas orelhas, disse-o o doutor Vargas. Além disso, estou tão nervosa que não poderia provar bocado. Solo quero café.

-Como vou negar te nada se for adorável?

-Não sou adorável. E tenho o cabelo feito um asco.

Smith abriu sua mão e pôs nela uma cajita.

-Espero que isto ponha de melhor humor. Vou pelo café.

Quando voltou, Jessica não se moveu do sítio. A cajita estava aberta e ela olhava os pendentes de diamantes com expressão incrédula.

-Você gosta?

-Como não vão gostar de me? São maravilhosos. me diga que são circonitas.

-São circonitas -disse Smith, obediente-. O que são circonitas?

-Diamantes falsos.

-Eu não quero que tenha diamantes falsos, meu amor. Você te merece o melhor.

-Mas devem ser muito caros.

-Você gosta ou não?

-eu adoro mas não posso aceitá-los. Daria-me medo perdê-los.

-Estão assegurados. Venha, ponha os Assim lhe darão confiança na reunião e ninguém notará que tem o cabelo feito um asco.

Jessica jogou os braços ao pescoço.

-O que vou fazer contigo, Smith Rutledge?

-Eu diria que podemos...

-Nem te aproxime. Danificaria-me a maquiagem!

-Pois então, te mova. quanto antes firmes esse contrato, antes poderei te beijar.

Uns minutos depois ela saiu do quarto de banho, tão preciosa como sempre. Nunca esqueceria seu sorriso quando lhe mostrou os pendentes. Estava para comer-lhe Smith queria lhe dar também o anel de compromisso, mas seria melhor esperar até depois da reunião.

Embora isso o punha nervoso. E se lhe dizia que não? Não queria nem pensar nessa possibilidade.

-Preparada?

Jessica respirou profundamente.

-Preparada. vamos procurar ao Shirley e Mack.

 

Jessica e Shirley se despediram dos executivos com um apertão de mãos e, uma vez sós no elevador, abraçaram-se rendo como loucas.

-Pode- acreditar? Esse contrato assegura a educação de meus filhos. Poderia deixar de dar classes amanhã se quisesse.

-vais fazer o?

-Provavelmente, não. Já sabe que eu adoro ensinar. E você? Pensa voltar para instituto?

-Duvido-o. Prefiro desenhar bolsas.

-Além disso, tem que pensar em certa pessoa.

Jessica sorriu.

-Isso também.

-Retiro o que pinjente dele. Agora que o conheço um pouco mais, vejo que não tem nada que ver com o Tom. É uma pessoa diferente e me cai de maravilha. Está apaixonada, verdade, Jess?

-Sim -sorriu ela-. Muito.

-Então te desejo toda a felicidade do mundo.

-Obrigado.

As portas do elevador se abriram no primeiro andar das lojas de departamentos. Smith e Mack estavam esperando.

-Que tal foi?

-De maravilha. Deixei-os de pedra com meus conhecimentos financeiros -exclamou Shirley.

-E eu os deixei de pedra... com minhas pedras -sorriu Jessica, movendo seus pendentes.

-Mas bem os cegaste -riu seu amiga-. vamos comer?

Meia hora mais tarde, os dois casais estavam ao outro lado da cidade; na melhor hambur-guesería de Dallas, segundo Smith.

-Você gosta de ir de pesca, Mack?

-Sim, claro.

-Têm que ir com os meninos a ilha Pai. Ali poderemos pescar tudo o que nos dê a vontade.

-A casa é preciosa e o mar... uma maravilha -disse Jessica-. E tem dois navios enormes.

-Então, claro que iremos -riu Shirley.

-Estupendo. me passe a mostarda, carinho.

 

despediram-se do Shirley e Mack no aeroporto e tomaram o avião privado para o Harlingen.

Ela seguia sorrindo enquanto se grampeavam o cinto de segurança. Assinar um contrato em exclusiva com o Neimann Marcus não era algo que alguém fizesse todos os dias. O que começou sozinho como um sonho se converteu em uma realidade.

-Contente? -perguntou Smith.

-Mais que contente. E muito orgulhosa de mim mesma.

-Dá-me o beijo agora?

-Um e mil. Quero-te muito, Smith.

-E eu a ti, Jess. mais do que poderia te dizer.

Converteste-te no mais importante de minha vida.

-É maravilhoso, Smith Rutledge. Não só te quero, eu gosto. E a meus amigos também... e não pelos relógios.

-São uma gente maravilhosa. Por isso se merecem um Rolex autêntico. Espero que não te zangue.

-Eu já não me zango contigo por nada. Além disso, suponho que quando se tem tanto dinheiro como você, isso tem uma importância relativa -sorriu ela, apoiando a cabeça sobre seu peito-. foi um fim de semana estupendo. E eu adoro sua família.

-Quer formar parte dela?

Jessica se sentou de repente.

-O que está dizendo?

-Estou-te pedindo que te case comigo. Pode aceitar a oferta de meu avô e ter dez milhões o dia das bodas.

-Não necessito dez milhões de dólares.

-Casará-te comigo de todas formas?

-Terei que me pensar isso -Pregúntamelo mañana.

-Carinho, não me faça esperar muito. Meu coração não poderia suportá-lo.

-Pois... já o pensei. Casarei-me contigo.

-Fez o amor em um avião, Jess? -perguntou Smith então, sorrindo seductoramente.

-Pergunte-me isso amanhã.

 

O dia que tinham eleito não podia ser mais perfeito. As laranjeiras estavam em flor e sua fragrância aromatizava o ar com um delicado perfume. Um arco formado por rosas amarelas e flores de flor-de-laranja servia como capela improvisada. Os convidados estavam sentados em cadeiras forradas de linho branco.

Smith estava sob o arco com o sacerdote e o padrinho, seu irmão Kyle, esperando que aparecesse a noiva.

Jessica o tinha convencido para esperar um ano porque queria estar muito, mas que muito segura de que estavam fazendo o que deviam.

E, além disso, queria que as laranjeiras estivessem em flor.

Tinham decidido celebrar uma cerimônia íntima, solo com a família e os amigos mais próximos. De modo que o avô Pete estava encantado de não ter que ficar "um desses trajes de pingüim".

Seus pais estavam na primeira fila, junto com o Irish e o pequeno Joshua. Depois deles, o avô com sua primo Jackson e sua nova esposa, Olivia. Ao outro lado, Matt Crow e sua esposa, Eve, que era a irmã do Irish. E a congressista Ellen Crow... toda sua família tinha ido ao Harlingen. Todos eles. Sua família.

Smith era tão feliz, que estava seguro de não poder sê-lo mais.

Então começaram a soar os lembre da marcha nupcial e Jessica apareceu no jardim do braço de seu adotivo, Mel.

Levava um vestido de cor amarela muito pálida, quase bege, e um buquê de flores de flor-de-laranja pacota com cintas amarelas.

Estava preciosa, deliciosa. E radiante... como todas as noivas.

E o amor que sentia por ela quase o fez cair de joelhos.

Logo chegou a seu lado e juntos repetiram os votos. Smith pronunciou os sua com voz clara e forte, mas fez um em silêncio enquanto lhe punha a aliança:

"Cuidarei muito bem dela, Tom".

 

 

                                                                                                    Jan Hudson

 

 

 

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