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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


ANONIMAT / Barbara Biazioli
ANONIMAT / Barbara Biazioli

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Não vejo graça alguma nisso tudo, não vejo nenhum tipo de futuro promissor e, para ser honesto, isso é um péssimo presságio. Estou em um casamento. Não um casamento de algum parente distante ou primo que quer mostrar que conseguiu uma foda sem graça pelo resto da vida, estou no casamento do mais canalha e que prometeu a todos nessa porra de vida que nunca seria domado... pobre homem.
Poderíamos estar jogando golfe, ele perdendo e eu ganhando como sempre!, penso comigo. Eu até o deixaria ganhar, se isso fosse salvá-lo dessa coisa toda exposta e sem sentido.
Ele disse sim... caralho! Minha mente não faz conexão com o que escuto, mas meus ouvidos ouviram bem a tragédia.
Quando recebi o convite, eu demorei muitos minutos para assimilar nomes e fatos. Fatos, diga-se de passagem, impossíveis diante do que somos, e toda essa merda começou com Evan, que resolveu fazer o quê? Apaixonar-se! E como se não bastasse, se apaixonou por uma encomenda, e depois de tudo achei que os demais tivessem aprendido a lição. Mas Sebastian não, ele ignorou o exemplo clássico do que não fazer, e resolveu mudar o curso natural da Terra e fez o mesmo que Evan. Não, ele não está com uma encomenda, mas está apaixonado e isso por si só já é um problema.
Não consigo não pensar na futura gravidez, nas partidas de golfe onde ele não vai estar, porque é isso que acontece, nascemos, crescemos, trepamos e casamos, exatamente assim.
O Clube ficou desfalcado em um integrante, já que o retardado do Sebastian preferiu a multa a ter que colocar um substituto. Deixou claro que não queria mais nenhum tipo de vínculo. Fiquei com receio de lhe desejar um feliz Dia de Ação de Graças por conta de sua atitude tão definitiva em querer se afastar de tudo. Afinal, somos amigos e éramos do mesmo recorte de tecido, éramos do Clube, ou melhor, ele era, eu ainda sou.
— Ele disse sim! — falei em protesto para os meus ouvidos, mas Benjamin ouviu e olhou repentinamente, como se eu tivesse gritado no altar.
— Cara, é a décima vez que você repete isso, está enchendo. — Benjamin adverte, idiota, não vê o que está acontecendo? É como se estivéssemos caminhando sobre a prancha de um navio pirata.
— Ele disse sim! — exclamei novamente e sinto que estamos vulneráveis, é como se a maldição Evan estivesse sobre nós, mas justo Sebastian? Talvez devêssemos esperar pelo próximo fim do mundo.
— Ainda bem, cara, imagina se ele fala não? Pobre noiva. — Benjamin respondeu e eu consigo apenas repetir a frase: Ele disse sim!
— Sim, ela disse sim também, e você está tão preocupado que parece que é você que está fazendo essa merda! — Benjamin resmunga e eu faço o sinal da cruz, Valha-me Dios!
Estou assistindo ao casamento de Sebastian Charper Lousan e ele, por incrível que pareça, está com um sorriso idiota naquela cara dele. Espero que ele não abandone o golfe, é o perdedor que mais respeito. Sebastian sabe perder, ele não perde a piada e pouco se importa com o dinheiro que dispensa em nossas partidas. Ele é um grande amigo e estou seriamente preocupado, como ele se deixou levar? Como, depois de tantas, devo ponderar minhas palavras, estou no casamento do puto, mas é isso mesmo, depois de tanto sexo, ele deveria estar blindado, ser à prova desse tipo de coisa e possuir um estado avançado de inteligência. Bom, pelo visto, não.
A cerimônia acabou e uma mulher alta direciona todos ao salão anexo, uma festa nos espera. Como ele pode comemorar isso? Seu nome está em todos os jornais e me remete ao período em que Evan se casou e todos os jornais nova iorquinos falavam a mesma coisa. É como se nossa pobre vida rica, recheada de trepadas escandalosas e totalmente escondidas, fossem expostas. Na primeira página a chamada sobre isso, como se isso fosse bom, isso não é bom!
Uma plateia desconhecida lendo sobre você no café da manhã. O seu rosto exposto, como se estivesse em um cartaz de recompensa, como se essa mídia desnecessária sobre a vida alheia fosse salvar o mundo de alguma epidemia.
Prefiro meu anonimato.

 


 


1

Christen


Sobre algumas coisas que acontecem na noite, mais precisamente em uma balada, eis um fato: diante de uma traição não existe salto ou reputação a ser poupada. O grande problema é que estou na Jonh Jonh e recebi uma ligação da proprietária da casa, somos amigas desde a faculdade e ela não deixaria isso passar.

A verdade é que quando o telefone tocou eu mal podia acreditar no que estava ouvindo e se tem uma coisa que não devemos fazer é acreditar em fofocas, mas no meu caso ela me salvaria de uma futura situação na qual eu não penso com tanto entusiasmo.

Thyna me liga e diz que meu noivo, Otto (que deveria estar no Texas segundo nossa conversa pela manhã) estava aos beijos com uma loura dentro da Jonh Jonh. Seria esse o motivo que preciso para não me casar? Não havia pensado em desistir até então, mas é fato que pensei ultimamente em como seria se não me casasse.

Existe um grande desinteresse de minha parte nesse casamento, não sou mulher de fazer aplicações em instituições destinadas a falência.

Talvez seja a pressão do meu dia a dia, ou minha posição que requer um exemplo permanente de coisas boas. Mas é certo que não sou boa, tenho minhas falhas infinitas e que não serão reajustadas, eu não quero reajustá-las.

Então, quando Thyna terminou de falar e desligamos, peguei Rocco e a convenci a irmos até lá, isso não me deu nenhum trabalho, afinal de contas, Rocco é uma amostra grátis de loucura, totalmente avessa a regras comportamentais. Ela aplica tudo que deveria ser disciplinado em uma preocupação irritante com a minha imagem, mas isso é o trabalho dela. Não revelei o que estava sabendo, Rocco poderia alimentar uma raiva desnecessária e isso poderia me trazer mais problemas do que os naturalmente existentes em minha vida.

Assim, partimos em direção a boate, eu dirigi sob o olhar de Rocco que estranha essa minha vontade em ir para a Jonh Jonh. Geralmente não frequento lugares de grande tumulto, acho que parei no tempo. A Jonh Jonh tem sido o ápice das noites nova-iorquinas. Rocco possivelmente tem carteirinha desse lugar e por vezes desconfiei que fosse sócia de lá. Ela ajeita seu vestido vermelho colado ao corpo e seu salto com pouco mais de dez centímetros de altura a deixa ainda mais magra.

— Não precisa confirmar, mas eu sei que estamos indo matar alguém — ela solta isso do nada e eu a encaro.

— E como chegou a essa conclusão? — tento brincar.

— Covinha em cima da sobrancelha direita, sobrancelha suspensa e você não para de bater o indicador sobre o volante, sim, vamos matar alguém essa noite com certeza — ela faz brincadeira em cima de uma grande vontade e eu me calo e a deixo com suas conclusões.

Alguns bons minutos depois e depois de algumas perguntas investigativas estilo CSI de Rocco, chegamos à boate. Ela usa seu talento nato para convencer pessoas a nos deixarem entrar, mas a verdade é sua frequência assídua nesse lugar e a amizade com Bart, segurança com estrutura de tanque de guerra, que facilitou nossa entrada.

— Vamos ao Lounge, Dimitri vai nos fazer a melhor La Negra de toda NY — Rocco dispara e eu a olho com espanto. Ela é uma pessoa que age da mesma forma independente do lugar. Super responsável no trabalho, mas ela é assim; essa coisa atirada e cheia de respostas. E eu sei que em pouco tempo ela estará sobre uma das mesas, dançando e sendo a maluca que eu não posso nem sonhar em ser. Rocco nasceu com vidas extras dentro dela e ela as vive, todas juntas e da forma mais insana possível.

— Vai indo, eu vou ao banheiro — não a quero por perto, ela vai partir para cima de Otto antes mesmo de mim, e isso não seria bom para ele.

— Vou com você! — Ela diz e caminha me arrastando para o banheiro, não a quero por perto, ela vai explodir que eu sei, eu a conheço.

— Escute — respiro fundo e tento encontrar uma frase adequada para começar essa conversa — Não acho que deva me acompanhar para o que pretendo fazer — falo e penso na merda que acabei de soltar, digitei a senha dela, a senha que explode e não a que desativa a bomba.

— Ah! Mas agora eu quero saber tudo e eu vou ficar perto sim. Eu sabia, você querer vir aqui do nada? Eu sabia! Agora anda, desembucha, fala tudo, quem eu tenho que matar nessa merda? — eu sabia que não era uma boa ideia trazê-la aqui.

— Antes me prometa que não vai fazer nada! — exijo e cruzo os braços olhando para o rosto de Rocco que já dá sinais claro de irritação.

— Prometo, mas posso voltar atrás, agora fala! — ela diz a frase num suspiro só e me encara. Respiro fundo e fecho a porta do banheiro.

— Otto está aqui — eu falo e ela cruza os braços e me olha com total desprezo e bate o pé três vezes no chão. Sei do total desafeto dela por Otto. — Rocco, ele está aqui com outra mulher — assim que termino a frase seu rosto muda de desinteressada para serial killer.

— Vou matar esse filho da puta! Eu sabia! — Ela vai em direção a porta e eu a seguro.

— Você prometeu! — protesto e ela me olha transtornada, era tudo que ela queria, um motivo para matar Otto.

— E eu disse que poderia voltar atrás. Juro por Deus, se você der mais alguma chance para esse imbecil eu mesmo bato em você e me demito em seguida. — Ela anda como uma leoa de um lado para o outro — Eu tenho meus motivos para odiá-lo — ela diz e se apoia sobre a pia do banheiro.

— Eu sei, mas antes de mais nada preciso verificar se é verdade e não quero que você se intrometa nesse assunto — ordeno e ela torce a boca, como se dissesse: FODA-SE! EU TE AVISEI!

— Tudo bem, me encontre no lounge assim que se livrar dessa coisa — ela diz e aponta para o anel no meu dedo.

— Nos encontramos no Lounge — digo e saio em direção a pista de dança, onde segundo Thyna, era lá que ele estava aos beijos com outra mulher. Ando pelas laterais mas fica difícil ver alguma coisa. Me arrisco e vou para o meio da pista de dança, mas antes peço uma dose de absinto no bar lateral.

Se existe algo que ninguém nesse mundo é capaz de explicar é a traição. Podem usar todas as palavras do dicionário cabíveis nessa situação ou tentar explicar algum lado bom, mas o ato por si só já é um adjetivo, no pior sentido da palavra. Não existe uma explicação, algo que justifique essa ação, mas ela é uma excelente justificativa para fazer o que estou prestes a fazer.

E lá estavam eles, na lateral da pista de dança, ele sentado e ela sentada em seu colo. Estão em uma cadeira de alumínio que espero estar presa ao chão, caso contrário ela vai voar.

Me aproximei por trás de ambos e puxei todo ar que pude para dentro dos meus pulmões e pensei exatamente no que dizer.

— FILHO DE UMA GRANDE PUTA! — gritei ao ouvido de Otto, meu ex-futuro marido, que segundo ele chegaria apenas na próxima semana e não contava que pudéssemos nos encontrar aqui, no Jonh Jonh, muito menos que eu o pegaria aos beijos com Dill, a vaca maldita que me segue em minha rede social apenas para tentar de uma forma bem covarde, frequentar os mesmos lugares que eu. Pobre Dill, vai apanhar se avançar dois passos em minha direção.

— Calma! Não é o que você está pensando! — Otto decorou a famosa frase dita por todos que são pegos em flagrante. Ele salta da cadeira empurrando Dill que fica atrás dele. Aponto o dedo na cara dele e sem preceber o empurro para mais perto do centro da pista de dança.

— Não estou pensando, seu canalha, não costumo pensar, se tivesse essa porra de hábito não teria deixado minha vida amarrada à sua por sete anos! — dei um tapa na cara dele, desfazendo o cabelo louro que formava um topete. Para ser franca há mais de um ano insisto que ele corte essa merda, não combina com seu rosto redondo.

— Vamos conversar! — ele tenta me segurar e a Dill muge algo e sem pensar viro meu copo com absinto sobre sua cabeça loura artificial, por dentro e por fora.

— Cai fora, sua puta, não é com você que quero conversar. — a encaro e uso minha altura, tenho um metro e setenta e cinco e meus saltos mais uma dúzia de centímetros a meu favor. Ela me olha xingando e querendo me alcançar, mas eu rosno um palavrão em sua direção e ela se afasta. Baixinha.

— Isso, Chris, vamos conversar. — Otto tem uma esperança incabível, quase cômica.

— Não quero conversar com você, nem agora, e nem depois e não me chame de Chris, eu odeio. — respiro como minha instrutora de ioga recomendou. Tamy sempre tem razão, respirar faz bem, mas acertar um soco na cara, ou melhor, no nariz empinado de um noivo traidor é mil vezes melhor.

Quando me dei por conta, Otto segurava o nariz explodindo em sangue e agradeço pelas aulas de boxe, as que faço logo depois da ioga.

— Sua puta! Olha o que fez com meu nariz! — ele segura o sangue e eu sorrio. Por mais que eu gostasse dele e tivesse realmente puta da vida, eu estava era feliz por ter acertado o rosto dele, deveria chutar seu saco, isso sim.

— Não sou puta! — arranco a aliança com um belíssimo diamante e arremesso contra ele. — Sou Christen Madson, sua ex-noiva para minha sorte. — ele olha com desespero para minha cara e para a aliança que deve ter lhe custado alguns milhares de dólares. — Mimado filho da puta!

— Christen, você vai terminar um relacionamento de sete anos por conta de um beijo? — ele dispara segurando o nariz e sua voz sai afônica.

— Não, Otto, vou terminar algo que não deveria existir, não tem um nome apropriado para isso. Você mentiu, e agora eu penso em todas as mentiras que possam ter acontecido e me pergunto: Otto Kalil tem patente para fazer Christen Madson verdadeiramente feliz? Acho que não, meu caro, essa merda que estávamos vivendo começou a ruir há muito tempo e você sabe que não estamos tentando nada a nosso favor. Tenho quase trinta anos, tenho uma posição profissional impecável e, acima de tudo, não posso ter uma âncora como você em minha vida.

— Vou transformar a sua vida em um verdadeiro inferno! — ele ameaça.

— Não vai, não vai porque não tem competência para isso; não vai porque na ameaça você corre para o colo da mamãe que vive pagando suas contas e te sustenta até hoje, mas fique tranquilo, a burra aqui sou eu, que não percebeu que você não é homem para mim, e afirmo isso em todos os sentidos.— pisco um dos olhos e o faço entender que na cama, ele tem muito o que aprender.

Viro-me, começo a caminhar, olho para os lados verificando o tamanho do estrago e vejo alguns celulares em minha direção. Amanhã os jornais estarão alimentados com essa merda e Rocco vai estar com um cutelo nas mãos me defendendo, porque é isso que ela faz, ela se preocupa com a minha imagem.

Procuro por Rocco que possivelmente esteja bebendo o que há de mais forte em doses não recomendadas. Esbarro em algumas pessoas e tento sair da confusão de gente misturada na pista de dança.

— Cadela! — Otto covardemente vem em minha direção e segura meu cotovelo me virando bruscamente. Sinto meu vestido subir um palmo com a abertura de minha perna na tentativa de me esquivar. Ele levanta a mão querendo acertar um tapa em meu rosto, e eu me recolho, me protegendo com o outro braço e fecho os olhos esperando o tapa certeiro. Percebo a demora e espio lentamente com receio de receber o golpe.

Abro um dos olhos lentamente e vejo o braço de Otto imobilizado por uma mão, grande, aquilo é uma abotoadura? O que diabos um homem faz de terno, gravata e abotoaduras no Jonh Jonh? Se for o Superman, acho que ele deveria ter encontrado uma cabine telefônica antes de chegar aqui.

— Não faça isso. — vejo Otto se contorcer e a mão do homem faz meu ex-noivo se virar em seu próprio eixo. — Acabei de sair de um casamento, preciso de uma bebida e não estou a fim de sujar minha roupa com sua merda, porque é isso que vai acontecer, vou chutar tanto seu traseiro gordo que possivelmente você vai me sujar, então, tenha pelo menos o mínimo de vergonha na cara e desapareça daqui. — Otto solta meu braço automaticamente e eu viro uma telespectadora atenta ao homem que acaba de me livrar de uma marca de dedos no rosto.

O homem que fala segurando o braço de Otto dobrado em suas costas tem uma voz que deveria ser contratada para anúncios de serviço sexual, voz grossa. Ele é alto, e apesar de estar vestido como meu tio Noris, é atraente, barba rala, pele morena clara, cabelos escuros e ondulados, estão arrumados para trás. Ele tem um rosto retangular, maxilar quadrado. Caralho, que homem lindo. Vamos, meu amigo, deixa eu ver se está com seu uniforme por baixo dessa roupa, penso comigo olhando as costas largas dele.

O homem empurra Otto, que salta alguns passos adiante e mesmo assim volta, apontando o dedo e balbuciando algumas palavras na direção do homem, agora percebo que o homem está acompanhado de outro, vestido como ele. Será que mudaram alguma regra na Jonh Jonh e ele virou cenário de encontro de executivos em grande escala no sábado à noite? O outro também é bonito e eu preciso saber de onde estão saindo esses homens com rosto bonito, porque se eu descubro a fonte, eu tranco a porta de saída e seguro a chave.

O outro homem pede uma bebida no balcão, próximo de onde estamos, e Otto enfrenta o primeiro homem, mas ele segura o colarinho dele e fecha os punhos.

— Cara, não me obrigue, não estou em um bom dia. Entenda que vou detonar sua cara e não há o que ser feito depois disso, então saia, agora. — o homem joga Otto e eu gosto dessa cena, me sinto terrivelmente vingada.

Otto sai xingando e eu, por mais que tenha analisado toda a cena, estou muda, petrificada, nunca ninguém me salvou de nada, também, eu nunca passei por nada disso. O número de celulares clicando o show gratuito aumenta e eu desconfio que minha manhã de domingo será bem interessante e Rocco pode não gostar muito disso, ela não gosta de trabalhar no domingo.

O homem vira seu rosto em minha direção e me olha por alguns minutos, tenho a suave sensação de que estou encarando a boca dele.

— Você está bem? — ele pergunta e eu aceno que sim com a cabeça. Ele deveria fazer a barba, porque assim, com ela rala, por fazer, me faz ter ideias nada convencionais.

— Consegue falar? — ele pergunta suspendendo as sobrancelhas.

— Sim.

— Muito bem, fico aliviado em saber que ele não havia arrancado a sua língua. — ele sorri e eu deveria voltar a respirar, mas seu sorriso, caralho, o que eu estava fazendo com Otto com homens como esse por aí? Idiota Christen, se levou um par de chifres do Otto, imagina desse. Quase gargalho, primeiro, porque eu nunca mais vou cair nessa merda de relacionamento, e outra, sexo agora só casual, sem compromisso, nome, telefone nem pensar.

— Obrigada, poupou meu rosto de um tapa. — agradeço e ajeito meu vestido, meu cabelo e alcanço dentro da minha bolsa de mão um espelho, verifico os olhos e está tudo bem, eu acho.

— Por nada, vai ficar bem, ou tem mais algum homem que prefere te bater aqui nesse lugar? — ele está olhando diretamente para o meu decote, cara de pau. — Com tanta coisa boa para se fazer com uma mulher, o idiota prefere bater. — ele sorri e nega com a cabeça encarando meu corpo e não acho isso muito respeitoso e confesso gostar muito dessa encarada.

Observo o rosto do homem e o outro lhe entrega um copo sem dizer nada e sai na companhia de uma moça, jovem e também bonita. Jesus, de onde estão saindo essas pessoas? Excursão da Vogue?, penso comigo estranhando esse volume absurdo de pessoas atraentes e bem vestidas.

— Posso perguntar seu nome? — ele diz.

— Pode, mas não vou responder. — ele sobe seus olhos e encontra os meus. Ele é sedutor apenas por olhar e eu acabo de flagrar meu noivo, meu ex-noivo, aos beijos com uma cretina. A ficha começa a cair e penso no meu vestido de noiva e nos seis meses que faltavam para o casamento. Tudo mudou e agora o mesmo trabalho que tive para fazer tudo isso, eu vou ter para desfazer, sem contar nas justificativas e na série de perguntas sem noção da minha família.

Família, caralho, meu pai volta na terça-feira de Santa Monica, ele e meu ex-sogro são sócios do mesmo campo de golfe, inferno. Minha mãe eu duvido muito que entenda alguma coisa, ela e seu mundo paralelo e fantasioso.

— Sem nomes então. — o homem diz e tudo acontece de novo diante dos meus olhos. São sete anos, tudo que fazíamos juntos, apesar das minhas viagens a trabalho eu estava constantemente presente, ele sabia tudo sobre mim, senhas bancárias, gostos e manias. Ele sabia demais a meu respeito e me flagro sabendo tudo sobre ele também, desde sempre, sabemos tudo um do outro e agora parece que somos completos desconhecidos.

— Sim, sem nomes, preciso sair daqui e esquecer essa noite. Se quiser fazer parte disso tudo bem, não quero saber o seu nome, o que faz, não quero nada de você, não quero saber nada sobre você ou sua cor preferida, e se quiser vamos no meu carro. — disparo de uma única vez e meu propósito hoje é exatamente isso, viver o hoje, amanhã será um novo dia, começando do zero e sem noivos traidores de topete ridículo.

— Você tem noção do que está dizendo? Você é uma desconhecida, estava para levar um generoso soco na cara, não quer me dizer seu nome e tampouco saber o meu. — ele coça o queixo com o polegar e deixa um sorriso quase sair.

— E você possivelmente é seguidor de uma seita ou religião que não permite esse tipo de coisa, só pode falar com pessoas que conhece e não faria sexo com uma desconhecida. — disparo o encarando.

— Parou para pensar que depois você pode querer saber o meu nome e eu posso não querer dizer? — ele brinca, com fogo, pobre criança, não me conhece.

— Não, para ser franca não quero pensar, quero apenas sair daqui. — viro minhas costas para ele e fico imóvel.

— Benjamin, fique com meu carro. — ele joga as chaves no ar para o outro homem, que sem querer agora sei o nome, e para exatamente atrás de mim. — Espero que não se arrependa. — ele sussurra em meu ouvido e coloca o copo com a bebida em cima de uma mesa próxima.

— Vai depender mais de você do que de mim. — respondo séria e tento caminhar, mas ele segura meu cotovelo e me vira de frente a ele, levando meu corpo para junto do dele e, então, ele se aproxima do meu pescoço e sinto sua respiração. Ele tem perfume que mexe um pouco com minha coordenação motora.

— Não faça isso, pode ser perigoso — Ele diz e roça a porra da barba que ele deveria ter feito em meu rosto, suavemente. Então tudo se mistura na região da minha calcinha, ele é naturalmente sedutor.

— Você é um serial killer? — zombo e o encaro, quase que friamente.

— Se eu te disser vou ter que te matar — ele também me encara e não acho que tenho algum tipo de vantagem nessa situação. Ele me empurra em direção a uma pilastra e pressiona seu corpo contra o meu, empurra contra minha pélvis seu membro duro, forte e engulo seco.

— Escute, não sou de brincar e para ser honesto prefiro o anonimato a ter que ficar lembrando de detalhes. — ele me beija com força, pegando os cabelos de minha nuca com fúria e tudo em mim esquenta, como não esquentar? Ele morde meu lábio e puxa. — Então, se você quer brincar eu aceito, como um favor, uma exceção e você vai ficar me devendo. — ele retoma o beijo com mais intensidade e me provoca com sua língua. Deve existir algum tipo de oração para poupar calcinhas desavisadas.

— Você acha que estou brincando? — tento manter solidez nas palavras.

— Bom, se não estiver, é algo que terá que fazer, essa noite vamos brincar, brincar como gente grande, sem nomes, sem telefone e uma forte amnésia assim que o dia chegar, então, não mude de ideia, não gosto de percursos alterados sem prévio aviso, entendeu? — ele me beija de novo e desta vez ele morde forte meu lábio inferior.

— Sim, senhor, mas as regras são minhas. — o desafio. — Não pense que sou como as menininhas que assistem o que lhes acontecem, eu sou a que participo, entendeu? — puxo sua boca apoiando minha mão em sua nuca, segurando firme seus cabelos e ele geme. As fotos estão acontecendo e pela primeira vez não me importo com isso.

Seguro a mão dele, ando em direção a porta e sou surpreendida por Rocco, que só aparece agora. Sei que estou sendo alvo de flashs e amanhã serei alvo de todo tipo de fofoca, inclusive as verdadeiras.

— Está indo embora? — ela pergunta sorrindo e continua. — Porque eu não vou, esse lugar está muito bom e espero apenas que o que aconteceu — ela encara o homem que está comigo e volta a olhar para mim. — tenha valido a pena. — Rocco é linda, branquinha, formada em comércio exterior e minha amiga desde o jardim da infância; se mudou para Nova York a meu pedido há quatro anos e desde então trabalha comigo, minha assistente paranoica e com vinte e sete tatuagens.

— É uma longa história. — falo e coloco cem dólares em sua mão. — Amanhã a gente conversa, se importa se for embora de taxi? — ela olha de lado para o homem que está comigo e depois me encara.

— Vai e amanhã eu te conto o resultado das doses de La Negra. — ela beija meu rosto e sai, encarando o homem que a olha sem entender. O som é Pompeii, da banda Bastille. “Fui abandonado à própria sorte”, diz a letra.

Saímos assim que paguei minha conta e do homem que ficou assustado assim que peguei o seu cartão de consumo e paguei junto com o meu. Andamos sem dizer absolutamente nada. Entramos em minha MacLaren 650s, vermelha e nada discreta.

Acelerei e percebi pelo canto dos olhos que o homem, completamente desconhecido, estava também assustado, eu não estava segura do que estava fazendo. Sexo há sete anos com o mesmo bastardo filho de uma puta traidor. Nunca o traí, penso que sobre a traição pouco se explica e muito se condena e decidi não ser algo condenado ou sob a tortura de uma mentira escondida.

Como sempre, Nova York não para, não hesita e em vinte minutos estou no The Plaza, 768 5th Av, e a essa altura quero brincar, como gente grande.

Fizemos o check in em menos de dez minutos, cuidei para que ele não visse meu nome, ele anda em direção ao elevador e eu vou para a escada.

— Não acha mais prático usarmos o elevador? — ele pergunta estranhando minha atitude e eu não me sinto confortável em falar para um estranho que tenho um trauma sobre essa geringonça, odeio mortalmente elevadores, com todas as minhas forças, e não me sinto segura, mesmo estando com um homem muito bem vestido em seu terno preto feito sob medida.

— Prefiro a escada. — sou sucinta e ele inclina a cabeça. — Escolhi um quarto no segundo andar. Não me diga que sofre de algum problema de coluna e não pode fazer esforço, isso frustraria meus planos. — ele me encara incrédulo.

— Geralmente você fala assim com as pessoas? — ele pergunta vindo em minha direção.

— Somente com desconhecidos. — sorrio e ele nega com a cabeça e subimos pela escada, alguns olharam com surpresa, mas não me importo, evito elevadores.

Os meus saltos estralavam no chão, mesmo eu caminhando com calma e, assim, atingimos o primeiro lance, aquele que não chega em lugar nenhum e nos leva apenas a mais um lance, quando coloquei meu pé direito no segundo degrau do segundo lance senti o tranco do homem contra meu corpo.

— Se está me testando, saiba que vai se arrepender. — ele de novo me pressiona contra a parede, e agora ele coloca a mão em minha coxa e a suspende, passando seus dedos por entre minhas pernas. Busco na memória a calcinha que escolhi, preta, lisa, sem renda, da cor do vestido e ela está molhada e ele acaba de perceber isso. — Gosto assim, me esperando. — ele diz e desvia o dedo da calcinha e desliza o dedo sobre meu sexo, quase violento.

— Pode ser um teste, com etapas, talvez tenha passado na primeira. — digo com sua boca colada na minha e seu dedo entra e sai, rapidamente e eu preciso chegar logo no quarto.

— Mas, lamentavelmente você não passou... ainda. — ele diz e me solta, segurando minha mão e acelerando os passos rumo ao quarto 213.

Coloquei o cartão na porta para liberar nosso acesso e ele pelo visto tem pressa, empurra seu membro duro contra minha bunda e me prensa na parede. — E devo avisá- la que está muito longe de conseguir algum tipo de sucesso nesse teste. — ele diz com a boca na minha nuca.

Consigo abrir a porta e entramos, nos enroscamos sobre uma penteadeira, ele está entre minhas pernas, ele arranca o paletó e joga em algum canto. Meu vestido subiu na altura da minha cintura. O abraço com minhas pernas. Ele suspende meu vestido e agora estou diante de um completo desconhecido apenas de calcinha, são sete anos do mesmo sexo e agora isso, meu Deus. Escuto minha bolsa de mão cair sabe-se lá onde.

Meus seios empinam em sua direção e ele os agarra com as duas mãos e me beija.

— Você é linda. — ele diz dentro da minha boca e eu tento remover sua gravata e desabotoar sua camisa e colete. Ele é sexy, forte e aos poucos a cor de sua pele se põe a mostra e uma tatuagem que cobre seu peito esquerdo e segue pelo ombro e braço me excita e penso na minha, um pouco maior, mais ousada e nada visível pelo panorama dianteiro.

Sua camisa e colete estão abertos e a gravata está apenas apoiada em torno do seu pescoço. Abro seu cinto e sua calça e deixo que ela desça, ele usa uma boxer... vermelha, céus, que homem é esse? Não interessa, sem nomes! Lembro do propósito da noite.

Ele cheira a perfume amadeirado, leve, nada irritante ou impregnado, pele e dentes bem cuidados, ele é macio e quente, é confortável ser acariciada por ele. Ele solta meus seios e retira minha calcinha e encara o ponto onde estou desesperadamente esperando por ele.

Ele se livra dos sapatos e das roupas, alcança sua carteira no bolso da calça, pega um preservativo e o coloca ao meu lado na penteadeira. Ele se aproxima de mim e minha respiração está entrecortada agora. Ele abre um pouco mais minha perna e olha, concentrado como se apreciasse e eu sinto vergonha por um nano segundo, agradeço a todos os santos existentes por ser fiel a Amarilys, minha depiladora, como ela sempre diz: Não é porque não vai receber visita que não devemos varrer a calçada!

— Passou pela primeira etapa. — ele diz e se encaixa entre minhas pernas novamente e me leva para a cama. Sinto seu pau roçar sobre meu sexo, ele fez isso propositalmente.

— Isso é bom? — pergunto e ele me deita na cama, deslizando seus dedos sobre meus seios enrijecidos e desce, circula meu umbigo e desce, um fino caminho ralo de pelos indicam a direção, mas acredito que ele saiba o caminho, sabe perfeitamente.

Ele afasta minhas pernas e se deita ao meu lado e seu indicador brinca, devagar, quase não encosta e eu me sinto molhada, além do normal.

— Não, não é bom. — ele massageia com dois dedos o ponto sensível do meu sexo. — As etapas vão ficando mais difíceis. — ele pressiona com um pouco mais de força e eu gemo, me contorço e ele está me olhando, apoiado em seu braço, de lado, enquanto brinca com meu orgasmo que já deu sinal de que está próximo.

— Ótimo, achei que apenas você teria expectativas elevadas para atingir essa noite, meu caro anônimo. — retruco e ele enfia os dois dedos em mim.

— Apertada, molhada, quente... preciso ver você gozando. — ele diz calmamente, baixinho, com a boca quase encostando em minha orelha.

— Depende mais de você do que de mim. — o desafio e confesso que desafiar desconhecidos é absurdamente excitante.

Ele aumenta o ritmo e desce sua boca até meu seio, suga, morde, passeia com sua língua e pensamentos libidinosos sobre sua língua me ocorrem de forma incoerente, imagino essa língua lá. Algo dói, não é ruim, é excitante, estou excitada e essa dor é bem-vinda e pode ficar o quanto quiser. Gemo alto sem querer e sei que minha face corou. Estou à beira de fazer sexo com um completo desconhecido, seria uma forma de pagar por ele ter salvo meu rosto de um soco? Não, é apenas sexo e ainda nem começamos.

Ele continua com um pouco mais de ritmo como se soubesse ou conhecesse muito bem cada escala de pulsar de um clitóris, estou quase gozando e ele percebeu isso, ele sabe disso.

— Deixe, eu preciso que você deixe, eu quero. — ele diz e me beija e aumenta exponencialmente o ritmo e eu deliro sob seus dedos, um orgasmo que ele realmente mereceu. Caralho, ele domina essa arte. Talvez tenha chamado a pessoa errada para brincar... ou não.

— Minha vez. — disparo e levanto, obrigando-o a deitar. Caminho em direção a sua gravata, a pego e volto. — Preste atenção, não quero que veja, quero que sinta. — coloco a gravata sobre seus olhos e faço um laço.

Francamente, ele tem um corpo que deveria ser responsável por repovoar a terra, tem um pau perfeito e ele é atento a pequenos detalhes, sem pelos na região e agora está com uma gravata preta sobre seus olhos, e ao meu comando.

Me aproximo e deslizo meus dedos sobre suas pernas, subindo, passando próximo de sua ereção e eu o vejo pulsar, isso me excita. Espalmo minhas mãos sobre seu tórax e inclino meu corpo sobre o dele. Meus seios tocam seu abdômen e ele geme baixinho, me levanto e busco o preservativo e deixo ao meu alcance.

Desço as pontas dos meus dedos sobre sua tatuagem e encontro sua ereção, acaricio, meus dedos quase não se tocam ao envolvê-lo e mantenho um ir e vir, calmo e confesso sentir vontade de engoli-lo. Nunca mais vou ver esse homem, é imprudente... mas eu quero.

Impulsivamente desço minha boca, encosto meus lábios previamente umedecidos em seu membro e ele geme, abro vagarosamente a minha boca e permito que ele entre, macio, ele cheira bem e é gostoso de uma forma diferente. O devoro, cada vez com mais intensidade, com mais vontade e ele bate no fundo de minha garganta e ele delira, pulsa e eu resolvo espiar seu semblante e o que encontro são olhos de lince sobre o meu trabalho, ele havia retirado a gravata.

Mantenho o ritmo e desta vez mantenho meus olhos em sua direção, está em seu rosto que isso vai desencadear seu orgasmo.

— Não quero acabar com nossa brincadeira agora, então, por favor, pare. — ele pede e eu continuo, mas alcanço a camisinha, desfaço a embalagem e assim que preparo o preservativo para vesti-lo solto seu membro e desenrolo sobre ele. São sete anos de relacionamento e durante três anos a camisinha foi necessária, estava proibida de tomar qualquer tipo de remédio por conta de um tratamento, então, Otto me ensinou como fazer esse tipo de serviço.

Termino e verifico o resultado, ele pode estar pensando: Essa mulher é profissional do sexo! Mas também, foda-se! Nunca mais vou vê-lo.

Fico de pé sobre a cama e coloco um pé de cada lado do seu quadril e olho para ele, como se dissesse: Ando até um pedaço do caminho e você anda o outro pedaço. Ele entendeu o recado e colocou seu pau em sentido perfeito, desci, devagar e achei que fosse ser fácil e confortável, mas a verdade é que me senti em desvantagem, ele me penetrou fortemente.

Ele entrou me preenchendo por completa e isso me enlouqueceu, fui até o final e deixei que ele batesse forte lá dentro. Suas mãos percorrem meus seios e eu começo um subir e descer, cada vez mais intenso, mais forte e posso garantir que é fácil gozar assim...sobre ele.

Ele geme alto e eu acelero o ritmo, cada vez mais forte e de repente ele me segura. — Para! — ele diz e eu me assusto. — Para, por que senão eu vou gozar! — ele fala desesperado e sai de mim, me deitando na cama e se enfiando entre minhas pernas. — Meu ritmo, minha cara anônima. — ele entra e sai, ele para, rebola dentro de mim e eu agarro os lençóis, grito cada vez que ele bate forte, dói, eu gosto.

— Mais! — peço e ele vem, com força, certeiro e perfeito. — Vou gozar! — falo gemendo e sinto-o deitar sobre mim.

— Então goze comigo. — ele diz baixinho e me beija, forte, desliza sua língua e seu pau para dentro de mim de forma simultânea e eu nem me lembro quando foi que eu gozei assim. Sinto-o pulsar, ainda forte, duro e sua boca descola da minha.

Ele fica por alguns instantes com sua testa colocada na minha e sua respiração está intensa e a minha quase falha. Quando olho para ele, ele está olhando para mim e não consigo decifrar, não consigo entender seu olhar e analiso o que foi que eu fiz: Transei com um completo desconhecido que nem o seu nome fiz questão de saber... infelizmente.

Ele sai de mim e vai em direção ao banheiro, e logo em seguida ele volta, com uma toalha em torno da cintura. Nenhuma palavra, mas existe uma atração forte entre nós, dois desconhecidos. Vou até o banheiro e faço uma higiene rápida e caminho, nua como se estivesse com meu vestido e ele de terno.

Ele vai até suas roupas, alcança seu celular e pega em sua carteira outro preservativo. Digita algumas coisas na tela do iPhone e o coloca sobre a penteadeira. Me sento na beirada da cama e minha respiração agora é calma, ele anda em minha direção. — É a última, e lamento não ter mais. — ele diz e vem em minha direção, arrancando a toalha e se mostrando pronto. Ele rasga a embalagem, coloca o preservativo e me puxa, beijando forte e mordendo de forma dolorida meus lábios.

Ele me vira e me apoia sobre os joelhos em uma poltrona perto da cama. Ele segura meus cabelos pela nuca e se enfia novamente dentro de mim. Mais forte, mais duro e fico louca com seu jeito explosivo.

Ele entra e sai e eu o sinto, ele puxa meu cabelo para junto do seu corpo e eu rebolo com ele. O desconhecido domina o sexo e eu me entrego, gemendo.

— Isso, boa garota, mas eu preciso de mais, muito mais. — ele fala e eu me levanto. O levo para sentar onde eu estava apoiada. O posiciono na poltrona para facilitar meu trabalho. Me sento sobre ele, de costas para ele e começo um subir e descer, lentamente, e ganho ritmo, ganho força e acelero. — Cristo! — ele diz e eu mantenho, mais rápido, e desço até ele bater dentro de mim novamente, vou me lembrar do desconhecido amanhã.

— Gostosa. — ele dispara com suas mãos em minha cintura e mantenho o que estou fazendo. Está perfeito e eu estou quase lá até que explodo sobre ele e ele geme com meu gemido.

Ele me levanta e me leva até o banheiro, me coloca de frente para o espelho e me apoia, sem nenhuma cerimônia ele entra em mim novamente.

— Olhe, veja como é gostosa enquanto fode. — ele diz e isso me excita, nunca fiz sexo com esse tipo de atitude, com palavras chulas, talvez estivesse vivendo um sexo de alguém de noventa anos. — Olhe para mim! — ele exige e suspende meu queixo puxando meu cabelo pela nuca. — Gostou de cobrir meus olhos, mas eu gosto de apreciar o trabalho em que meu corpo é seriamente envolvido. — ele entra mais forte, bate dolorido dentro de mim e por fim ele goza. Ele tem um rosto lindo, gozando então, é algo que não pode ser enquadrado em parâmetros normais.

Ele sai de dentro de mim e eu me apoio sobre a pia, abaixando a cabeça e tomando oxigênio para os meus pulmões. Ele dispensa a camisinha, passa por mim e me dá um tapa na bunda. — Você sabe brincar. — ele dispara e vai para o quarto.

Fico mais alguns minutos ali e vou para o banho, aliviar a tensão, o tesão. Saio enrolada na toalha e ele está deitado, com a cabeça apoiada em seus braços suspensos.

— Bela tatuagem, deve ter demorado um bom tempo para ficar pronta. — ele diz me olhando dos pés a cabeça. Ele vestiu a cueca e eu caminho em direção ao meu vestido e calcinha.

— Oito sessões, dolorosas, mas compensadoras. — respondo ajeitando as coisas sobre a poltrona e em seguida me deito ao lado dele.

— E no tornozelo? Por que as letras C & M? Alguém importante? — ele pergunta e fica de lado, me olhando.

— Sim, a pessoa mais importante da minha vida, alguém que amo cada dia mais, alguém que com certeza detém meus melhores sentimentos. — respondo e ele olha assustado.

— Olha, minha cara anônima, eu prefiro evitar problemas com maridos e afins, ok? — ele diz sério.

— Tarde demais, caro anônimo, tarde demais. — respondo sorrindo.

— Não brinque com isso. — ele está sério.

— Não sou casada, gentil desconhecido, para ser franca aquele cara que queria me bater é meu ex-noivo, eu havia acabado de flagrá-lo com outra. — desabafo e quase fico triste.

— Por isso evito relacionamentos. — ele se defende prontamente e isso por si só já mostra seu posicionamento diante das mulheres.

— Foram sete anos, e daqui a seis meses subiríamos ao altar, e agora foi tudo pelo ralo. — digo e realmente agora estou triste.

— Então, eu fui um consolo? — ele pergunta sério e eu quase sorrio. Quem dera as mulheres dessa terra poderem contar com consolos como esse. O mundo seria perfeito e traições seriam bem-vindas.

— Possivelmente. — respondo e ele suspende as sobrancelhas, surpreso. — Mas, se isso te deixa feliz, saiba que você foi um bom consolo, você sabe brincar também. — sorrio e acho que ele percebeu que estou triste. Talvez a adrenalina do momento tenha mascarado meu sentimento e agora a ficha caiu de vez. Não é por conta do casamento e tudo que acabou, é por conta do tempo perdido nesse relacionamento, e por conta de tudo que se perdeu nele também.

— Obrigado, me sinto bem melhor. — ele diz e se deita de lado, apoiando-se no cotovelo. Ele tem o cabelo bem cortado e mesmo assim como está agora, todo bagunçado ele está atraente e sexy.

— Quem se casou? — perguntei tentando mudar de assunto e tentando não prestar tanta atenção no desconhecido.

— Um amigo, quase inacreditável, alguém que eu teria certeza que nunca se casaria. — ele diz negando com a cabeça.

— Alguns estão fadados a isso, não é o meu caso. — disparo e olho para ele. — Quero ficar longe de relacionamentos e coisas desse sentido.

— Idem, bem longe. — ele coça os olhos e estranhamente me sinto confortável em estar ao lado dele. Vejo-o coçando os olhos e já passa das quatro da manhã. Tudo está em silêncio e minutos depois escuto sua respiração, profunda, ele deitou sobre o braço agora, sua boca está próxima do meu ombro, não posso olhar muito para isso. O cubro com a manta que havia caído no chão.

Ele não se mexe e eu o observo por alguns instantes. Ele não imagina há quanto tempo eu não tinha um sexo tão incrível, talvez nunca tivesse feito nada próximo a isso.


2

 


Ramon

 

 


“Talvez um dia, eu serei um homem honesto, até agora estou fazendo o melhor que posso”

— Wasting Love — Iron Maiden

 

 


Acordo com meu celular, Iron Maiden toca e eu deveria deixar em um volume baixo. Abro meus olhos e procuro pela desconhecida. Fode bem pra caralho e é gostosa, pernas grossas, bronzeada, cabelo cheiroso, ela é cheirosa e linda, porra, a foderia de novo, facilmente.

Mas, tudo está calmo e a cama está vazia. Me levanto e vou até o banheiro, nem sinal dela ou das coisas dela e me sinto estranho, geralmente não é assim que as coisas funcionam. Olho para minhas coisas e estão exatamente onde deixei, pego minha carteira e o dinheiro está lá. Para de ser ridículo, ela tem uma MacLaren, não roubaria mil dólares.

Caralho, que mulher é essa?, me pergunto e observo meu celular que ainda toca, embaixo dele cem dólares e ao lado um bilhete.

Caro, Anônimo...


Foi um prazer conhecer você, mesmo sem nomes e afins, mas me refiro ao prazer que possivelmente você também sentiu.

Foi uma noite incrível,

Obrigada


P.S — Deixei dinheiro para o taxi, espero que não more em outra cidade rsrsrsrsrs

 


— Que porra é essa? — pergunto alto e ando olhando o bilhete. Demoro muitos minutos para entender o que está acontecendo e olho ao redor, nenhum sinal dela.

Que mulher é essa que me trata exatamente como eu trato as mulheres? Inferno! Filha de uma puta. Não deixou nenhum nome, nenhum telefone, desgraçada, e ainda mete bem, FILHA DA PUTA!

Merda! Me troco e ligo para a recepção, pedindo para fecharem. Olho a minha volta e estou putamente inconformado, esse tipo de coisa não existe, ela deveria estar dormindo ainda, jogada nessa cama e eu com certeza foderia de novo.

— Senhor, a conta já está paga, inclusive com o café da manhã e, se for o seu desejo, o almoço também. — o recepcionista responde e eu fico por mais alguns instantes mudo, esfregando o rosto e tentando encaixar a porra dessa peça, ela não encaixa. Agradeço e desligo. A maldita resolveu pegar minha dignidade e enfiar no meu traseiro, ela deixou tudo pago, inclusive o café do manhã e o almoço.

— ORDINÁRIA! — falo alto e tenho vontade de soltar um soco em cima da penteadeira. Inferno! Olho para o móvel e a vejo ali sentada, molhada... porra!

Só pode ser brincadeira! Desço e saio do hotel, com um ódio mortal dessa mulher, acho que não responderia por mim se eu a encontrasse. Aceno para um taxi e sigo para minha casa.

Domingo maldito, o filho da puta do Sebastian casa, a essa hora deve estar indo para Maldivas, saio do casamento querendo me divertir e até consigo, mas aí, essa cretina faz isso, me trata como um garoto de programa. FILHA DE UMA PUTA ROLIÇA! Se eu pego essa mulher, eu vou fodê-la que ela nunca mais vai pensar em outra coisa na vida dela.

Impossível, como vou encontrá-la? Que merda de final de semana é esse? Alguma maldição.

— Maldita! — falo alto e o taxista pergunta se eu preciso de alguma coisa. Preciso sim, encontrar uma desgraçada que me usou, como ela ousou fazer isso? Não quis saber meu nome e eu também concordei com essa idiotice, mas daí, ela pagar as despesas como se tivesse pagando pelo meu trabalho já é demais.

Meu celular toca, olho para a tela, é Benjamin. Tenho que pegar meu carro, mudo o destino com o motorista e atendo o celular.

— Fala! — atendo ríspido e sem paciência alguma.

— Broxou na noite passada? Que mau humor é esse, latino puto? — ele me sacaneia, bastardo.

— Pior que isso, estou indo para sua casa pegar o carro. — respondo.

— Estou te esperando, acabei de acordar, cheguei estava amanhecendo. — ele diz com voz de urso, saindo da hibernação. Me despeço e desligo.

Por que ela fez isso? Por quê? Claro que nunca pensei em como as mulheres do Clube se sentem, mas elas sabem das regras, é assim que fodemos e ninguém vai amarrado para lá, são instruídas e pagas pelo serviço, elas têm benefícios, pagamos sua comida, sua hospedagem e sua viagem, assim como essa cretina fez comigo hoje e a desgraçada deixou clara as regras: sem nomes!

Maldita, cretina, e ainda me deixa um recado agradecendo e sugerindo que eu senti um prazer como ela. Claro que senti, a foderia outras vezes sem pensar, mas como? Se a desgraçada desapareceu, como encontro essa mulher? Não encontro, não devo, ela é perigosa e eu sei que é, ela já tem uma lista enorme de coisas que eu faria com ela e isso não é bom, pelo menos não para mim.


Subo para o apartamento de Benjamin e me lembro que tive que subir as escadas por causa da cretina, medo de elevador com idade que tem, que vergonha, deveria pelo menos esconder isso e disfarçar.

O elevador para e três senhoras entram reclamando que estão fechando a quinta avenida por conta de algum dia comemorativo de algum país do planeta, só em Nova York que vejo isso. Me distraio com o que as senhoras estão falando e de repente a boca da anônima em torno do meu pau chega em minha memória, ela engoliu com vontade e quando senti o toque em sua garganta eu quase desisti ali mesmo.

Gostosa e filha da puta, será que ela vai sempre ao Jonh Jonh? O elevador para e as senhoras saem e mais dois andares chego ao apartamento de Benjamin.

— E aí, cara, como foi ontem com a mulher quase espancada? — Benjamin me recebe com uma xícara na mão, de roupão e samba canção, uma verdadeira visão do inferno.

— Ainda estou definindo se foi bom ou ruim. — andamos em direção a mesa de café da manhã na varanda e nos sentamos.

— Geralmente é assim mesmo, demoramos meses para avaliar uma foda, se liga Ramon, o que aconteceu ontem? — ele pergunta e eu escuto uma porta se abrindo no apartamento, em seguida vozes femininas e bocejos lindos de criaturas de calcinha andando pelo apartamento de Benjamin. Olho da varanda e vejo duas mulheres, duas louras, altas e gostosas. Lembro do cabelo da maldita, até o ombro, enrolado, cor de bronze assim como seus olhos, e a tatuagem... um dragão que percorre o lado esquerdo, iniciando logo abaixo do seio e termina um pouco antes do joelho, deslizaria minha língua sobre ele, repetidas vezes e depois daria uns tapas nela, por ela ter me usado como usou. — Acorda, Ramon. — Benjamin joga uma uva em mim

— Não é isso, é que, como eu posso te explicar? — coloco suco de uva no copo e bebo um gole.

— Ora, apenas fale, ela tentou fazer um fio terra em você? Ou melhor, ela conseguiu? — ele gargalha e eu não.

— Vai se foder, Benjamin, não é nada disso, é que ela sumiu. — disse e bebi um gole do suco.

— Como assim sumiu? — ele pergunta intrigado e eu nego com a cabeça, merda! Esfrego meu rosto com as mãos e olho sem nenhuma direção para os prédios à minha frente.

— Sumindo, desaparecendo. — respondo.

— Mas sumiu antes, não aconteceu nada, não teve foda, ela te deixou na mão? — ele se ajeita na cadeira e faz um sinal de masturbação e seu rosto está sério como se estivesse ouvindo algum noticiário.

— Pelo contrário, a maldita fez um dos melhores sexos da minha vida, um boquete que merece uma oração e tem um corpo que pelo inferno e todos os demônios, ela é perfeita, mas antes de sairmos da Jonh Jonh ela ditou regras, nada de nomes. — respondi.

— Nada de nomes? Você não sabe o nome dela? O que ela faz? De onde veio? — inquisição desgraçada não deveria ter falado nada.

— É. — balanço a cabeça. — Não sei nada sobre ela.

— Ótimo, ela não vai te infernizar a vida, lembra da mãe dos gêmeos? — ele me sacaneia de novo.

— Não me lembre dessa história, mas não é esse o problema. Ela sumiu e deixou tudo pago, hotel e inclusive o taxi, a cara de pau me deixou isso. — jogo o papel com o recado da desgraçada em cima da mesa.

Benjamin pegou o papel e instantes depois caiu na gargalhada, ele riu de perder o fôlego. Continuei encarando o bastardo e ele disparou.

— Ela te tratou como uma encomenda, a diferença é que das encomendas sabemos o nome e não deixamos nenhum tipo de recado. — e ele voltou a rir, desenfreadamente.

— Acha graça? — pergunto com desprezo.

— Sim, é muito engraçado, um dia da caça outro do caçador. — ele explode em outra risada e eu nego com a cabeça. — Cara, desencana, foi só uma foda anônima, isso seria o mundo perfeito, sem cobranças ou riscos de acontecer o que aconteceu com Sebastian ontem. — faço o sinal da cruz pedindo que Deus me livre disso.

— Eu sei, mas eu queria encontrá-la e recuperar meu orgulho, entende?

— Não, eu não entendo, para mim você quer é repeteco. — ele é direto.

— Também, a foda foi boa e ela não é o tipo de mulher pegajosa, cheia de frescura, ela sabe o que fazer. — acho que elogiei demais.

— Encantado com a mulher sem nome, Ramon Avellar?

— Claro que não, sou blindado, sangue latino, essa merda não acontece comigo. — bebo o restante do suco e levanto me espreguiçando. — Pelo visto sua noite foi bem proveitosa. — falo e jogo a cabeça em direção ao apartamento.

— Sempre é. — ele responde e pega a xícara.

— Por falar em noite, tive a impressão de ver Kim ontem na Jonh Jonh, era ela? — pergunto.

— Ela estava lá, disse um oi rápido e saiu com umas amigas para a pista de dança. Ela ficou pouco no casamento de Sebastian depois da festa, saiu antes de nós. — ele fala com muito desinteresse e eu sei o que rola ali.

— Ben, ela é irmã do Alexander, intocável, mesmo sendo gostosa pra caralho, ela é intocável. — disparo e ele se levanta vindo em minha direção.

— É, ela é irmã do Alec e você não sabe o esforço que venho fazendo, ela tem uma pequena queda por mim e eu tento há muito tempo preservar a amizade com ele, mas não é fácil; ela cresceu e se tornou uma mulher que eu foderia várias vezes, além de inteligente, discreta, é linda, então, não me lembre que o puto do Alec é irmão da gostosa da Kim, porque essa merda surge na minha cabeça toda vez que ela se aproxima e beija meu rosto, meu pau não distingue amigos e muito menos irmãs. — ele dispara passando a mão pela cabeça exasperado.

— Deve ser difícil recusar aquela boceta. — brinco.

— Não use esse tom para falar dela, ela não oferece nada dessa forma. — ele a defende e por já estar com meu domingo comprometido com minhas frustrações de ordem interna, mudo de assunto.

— Recebi um e-mail na sexta-feira passada sobre um coquetel na sede da empresa de Wallace. — falo e volto para a mesa.

— Eu também, confirmei no RSVP. — ele diz.

— Ainda não confirmei, vai ser na terça-feira, ainda não sei como vai ser meu dia. — coloco mais suco no copo. — Vou para Seattle amanhã depois do almoço, tenho que assinar alguns papéis, depois que meu pai passou o bastão da empresa para mim, minha vida tem sido dividida entre encontros com senhores de última idade e aeroportos, e nos últimos anos isso tem piorado. — reclamo.

— Não acha que está reclamando muito? Trepou com uma mulher sensacional que não vai pegar no seu pé, ganha milhões com a Korck Farmaceutics, empresa que seu generoso pai lhe passou em vida, sua irmã ficou com o quê? Uma rede de postos de gasolina no Texas? Pare de reclamar, homem, a vida é bela. — ele suspende a xícara e brinda.

Escuto as vozes novamente, elas se aproximam e invadem a varanda.

— Até logo, Benjamin, foi um prazer. — elas se aproximam e cada uma delas beija a boca de Benjamin e saem.

— Até logo, meninas. — ele sorri e levanta a xícara novamente. — A vida é bela, meu camarada! — ele exclama sorrindo.

— Você não presta, Benjamin.

— Eu sei. — ele responde sorrindo.

— Cara, você traz mulheres aqui e não tem medo que elas possam se tornar perseguidoras? — pergunto.

— Ramon, eu sei quem eu trago e você pelo visto é desinformado. Elas por exemplo não teriam por que me perseguir, são casadas, com homens da política, que passam boa parte do tempo viajando e possivelmente também trepando com desconhecidas, provavelmente homens que são clientes da Accord, é seguro e não atinge meu patrimônio. — ele bebe um gole do que está em sua xícara que desconfio ser algo mais forte do que café, e fala aquilo como se fosse a coisa mais natural do mundo.

— Você é louco.

— Não, eu não sou, eu apenas vivo da melhor maneira possível. — ele sorri.

— Bom, quem sou eu para falar da sua vida de orgias? — pergunto e sorrio.

— Ora, você foi a encomenda de uma gostosa ontem! — ele zomba.

— Seu filho da puta, vou embora, preciso descansar, em qual vaga está meu carro? — pergunto me levantando.

— Na 47, como sempre. — ele gargalha.

— Benjamin, o marido dela ainda vai te jogar daqui de cima e você vai ser primeira página no The Sun. — o alerto.

— Relaxa, o cara nunca está em casa. — ele diz e caminhamos até a porta. — Precisa disso para ir embora. — ele me entrega a chave. — Até que a caranga anda bem, fui até a Batery hoje e acho que precisa abastecer.

— Você é um puto mesmo, ao menos eu chego em casa? — pergunto.

— Claro, a não ser que esteja morando em outra cidade. — ele zomba por conta do bilhete.

— Vai se foder! — saio negando com a cabeça e desço sentido a garagem subterrânea.

Acelero em direção da Upper Side, mais precisamente na Lexington, entre a 78 e 79. Preciso da minha cama, preciso me conformar, fazer o quê? Ela ditou as regras e eu acatei, burro. Onde será que ela está?

Chego ao meu apartamento, jogo as chaves em cima do aparador ao lado da porta e me jogo no sofá mesmo. Penso em alguns detalhes, alguma pista de onde eu poderia encontrar essa mulher. Mas por que diabos eu quero encontrá-la? Foda-se ela, anônima do cacete, conseguiu me irritar.

— Senhor Avellar? — Moh, minha governanta, me alerta.

— Sim. — respondo ainda deitado.

— O senhor quer que eu sirva o café da manhã? — ela pergunta gentilmente. Moh trabalha comigo há quase sete anos, tirei-a da casa dos meus pais em Santa Mônica onde ela prestava seus serviços há mais de vinte anos, ajudou minha mãe a criar minha irmã e eu. Moh faz a melhor lasanha do mundo.

— Não precisa, Moh, obrigado. — me levanto e olho para a mulher de pouco mais de cinquenta anos, baixinha e que antes de ir trabalhar para os meus pais era freira, inacreditável. Desistiu do convento porque se apaixonou pelo jardineiro da igreja, Humberto, que hoje é jardineiro da casa dos meus pais aqui na Upper, na 84. Um belo roteiro de cinema. — Moh, hoje não é a sua folga? — pergunto e ando em sua direção.

— Seria, mais Humberto disse que chegaria algumas coisas na casa dos seus pais e ele está lá, esperando. — ela é baixinha, rechonchuda, sem filhos e tem cabelos negros e curtos. Ela mesma costurou seu uniforme, azul e branco, por mim nem usaria.

— Mas eu não quero você trabalhando aqui hoje. — beijo o seu rosto, vou para cozinha e abro a geladeira.

— O senhor está com fome, vou fazer alguma coisa sim. — ela vem em minha direção chamando minha atenção, baixinha invocada. Lembrei quando éramos crianças, eu e minha irmã escondíamos um dos pés do seu chinelo, ríamos e ela xingava.

— Não precisa, vou dormir. — beijo a testa dela e vou para o meu quarto, tirando meu paletó e puxando a gravata. Meu celular toca e a bateria avisa que está acabando, é Benjamin.

— Fala. — espero que ele faça alguma piada, porque ele é um puto e gosta de perturbar.

— Quer achar a desconhecida? — ele pergunta e meus sentidos me alertam que eu preciso responder que não, que ela não é do meu interesse, mas meu pau discorda de tudo isso e antes que meu cérebro pudesse coordenar a resposta correta, um “é claro” escapou com euforia e Benjamin percebeu isso.

— Esse interesse é para recuperar o orgulho mesmo? Ou em alguns meses estarei sendo sua testemunha assim como fui de Sebastian? — ele faz piada em tempo integral.

— Você só pode estar de brincadeira comigo, quero fodê-la de novo e pronto — mas acho que quero fazer isso várias vezes, não sei... estou confuso.

— Giovani está chegando aqui em casa, esqueci que confirmamos o evento da mãe do Evan, e assim que desliguei o telefone imaginei que ele poderia saber onde está a mulher que fez sua dignidade de bola de basquete e deve estar quicando ela por aí — ele zomba.

— Não acho que seja uma boa ideia — respondo.

— Achá-la ou ir no evento da Rose? — ele ainda faz piada e percebo que ele está bebendo alguma coisa.

— Envolver o Gio, e achá-la, não sei, acho que não deveria descobrir quem é ela — respondo algo que não estou sentindo.

— Depois te ligo — ele avisa e desliga.

— Puto! Penso comigo e vou para o banho.

Por mais que eu tenha dormido, eu precisava relaxar e desde que percebi que sou uma encomenda de alguém que nem sei o nome, não estou conseguindo.

Saio do banheiro e enrolo a toalha na cintura e vou até a cozinha, bebo dois copos de água e imagino que ela deve estar falando de mim para as amiguinhas dela, e se ela soubesse quem eu sou me humilharia nas redes sociais.

Ela deve ser uma filhinha de papai, mimada, não sabe o que é ser responsável por milhares de empregos, não tem ideia do que é encarar horas de reuniões com pessoas que possivelmente não escolheria nem como amigos.

Não acredito que me deixei levar por isso, por sexo sem nomes, eu deveria ter imposto as regras e agora eu deveria esquecer aquela mulher.

Escuto meu celular tocando e é ele, o puto animado e fã de ménage a trois.

— Fala — atendo.

— Me deve um favor. — ele dispara.

— Está bebendo, seu cretino? — pergunto e coloco no viva voz enquanto pego uma roupa limpa.

— Não, mas Giovani está aqui e os titios têm novidades — Benjamin com a voz molenga e nem um pouco digna de participar de algo beneficente diz e eu escuto Giovani me cumprimentando e possivelmente o telefone de Benjamin também esteja no viva voz — Pedi que ele fizesse aquele favor que só amigos fazem, como por exemplo, entrar no sistema de segurança da Jonh Jonh e descobrir quem é a tal mulher que te usou, caralho latino, você deu uma encoxada nela que até o pilar da Jonh Jonh gemeu. — ele gargalha.

— Você é um boca aberta, contou tudo para ele ou conseguiu a proeza de ser menos filho da puta? — pergunto irritado.

— Não, claro que não, disse apenas que preciso descobrir quem era, que fiquei interessado. — ele ri alto. — Tive que contar, Ramon, ele ia assistir as gravações e ver que você saiu de lá com ela, relaxa.

— Sei, e aí, o que descobriu? — pergunto.

— Christen Madson, vinte e nove anos, solteira, número social bla bla bla, herdeira das Industrias Madson de tecidos e fibras, gerencia toda a parte de exportação e, escuta essa, ela é cliente do Evan e do Wallace. A Maccouant cuida da papelada burocrática para que seus tecidos entrem legalmente nos países e Wallace faz o transporte. Renda declarada é de bem mais de um par de milhões.

— Por ano? — pergunto estranhando.

— Não, por semana, ela exporta para mais de vinte países. Caralho! A mulher é poderosa e pelo visto vai se casar, tem uma nota no jornal sobre o casamento da herdeira das Industrias Madson. — Benjamin está parecendo um colunista de jornal de fofoca.

— Não vai mais, flagrou o noivo ontem com outra mulher. — contribuo para o jornal Brandy de notícias sobre a vida alheia.

— Bem informado para uma encomenda, hein, Avellar? — ele zomba.

— Mais alguma coisa? — pergunto.

— Sim, tem muito mais, primeiro, que ela mais viaja do que para em casa, outra coisa é descobrir em qual casa ela fica quando não está viajando, ela tem quatro imóveis aqui na City, um deles é bem próximo de você, fica na Lexington, entre a 71 e a 72, sua vizinha, meu amigo latino; ela tem uma assistente pessoal, o dia todo grudada nela, Rocco Field. — ele resmunga mais algumas informações não tão interessantes. — Ei, escute isso, garota de sete anos fica por mais de cinco horas dentro do elevador do Empire States. Foi na década de oitenta e na reportagem diz que ela estava com os pais e resolveu brincar no elevador. — isso explica algumas coisas.

— Cara, valeu. — agradeço.

— Apenas tome cuidado, lembra do que aconteceu ontem com Sebastian? — ele gargalha.

— Acorda, Benjamin, é sexo, apenas uma foda bem dada e umas palmadas para ela aprender uma lição. — zombo.

— Ou é você que pode acabar aprendendo, Ramon, estou te encaminhando os endereços dela aqui na City. — ele diz. — E outra coisa, confirme sua presença no coquetel do Wallace, assim você passa aqui e me dá uma carona, meu carro vai para revisão na segunda-feira.

— Você é bem folgado, tem mais dois carros aí, mas vou quebrar seu galho. — digo brincando.

— Okay, macaco gordo, quebre meu galho e finja que as informações sobre a tal anônima caíram de bandeja em seu colo. — é um desgraçado mesmo.

— Benjamin?

— Sim?

— Vai se foder! — dou risada e nos despedimos. Em seguida recebo as mensagens e os endereços dela, e tudo que envolve a vida dela e eu preciso foder essa mulher de novo. Durmo pensando na cretina, na tatuagem com suas iniciais e sobre ser a pessoa que ela mais ama, mal sabe o quanto eu a odiei por me tratar como um objeto.


***


Três horas da tarde marca o relógio, o apartamento está em silêncio e eu saio, tenho que caçar essa mulher. Não deveria, o correto seria eu esquecer, ir até o Wall Mart e comprar mais um lote de orgulho e dignidade, mas prefiro recuperar na unha, na base do sexo e devolver a merda do dinheiro dela.

Parto para o primeiro endereço, o mais perto da minha casa, um prédio de luxo, não mais que vinte andares. Estaciono e desço, olho ao redor e pergunto ao porteiro sobre a cretina, mas sou educado e falo o nome dela. Mas ele disse que ela não apareceu essa semana e que é difícil ela ficar por aqui, agradeço e vou embora.

Por lógica analiso os endereços. Se ela tem um trauma com elevadores, o lugar menos provável que eu possa encontrá-la são nos apartamentos. Sigo para a 61, também próximo de onde moro e isso me espanta, como eu nunca encontrei essa maldita por aqui? Como vou encontrá-la por aqui se passo mais tempo viajando do que em casa, preciso de férias.

Estaciono meu carro diante da casa, quatro andares, estilo nova-iorquino, mas ela é branca, uma senhora está regando algumas plantas postas em ordem em cada lado da porta, desço do carro e vou até ela.

Magra e loura, aparência séria, quando me aproximo quase a surpreendo e ela me olha, como se fosse uma intimação.

— Boa tarde, estou procurando por Christen Madson. — tento ser o mais simpático possível, mas ela não esboçou nenhuma reação a não ser pedir para que eu esperasse por um minuto.

Escuto uma música vindo de dentro da casa, algumas vozes e portas se fechando, a música é Bring Me To Life, da Evanescence.

“Eu tenho vivido uma mentira, não há nada lá dentro”, diz a letra.

Observo pela fresta e vejo um movimento de pessoas e sou surpreendido pela mulher antipática, que agora fecha a cara para mim.

— Srtª Madson está viajando, sem data para o retorno. — ela é sucinta e sua roupa toda preta a deixa fúnebre.

— Sim, muito obrigado, se puder fazer a gentileza de entregar esse cartão a ela, eu agradeço. — retiro um cartão com meus contatos e entrego nas mãos da loura chata.

— Como quiser. — ela é intragável.

— Obrigado e tenha uma boa tarde. — me despeço e ando em direção ao carro, escuto a porta se fechando e meu sentido diz que ela está la dentro, possivelmente zombando da minha cara, de novo.


3

 

Christen

 

 

Acordo com uma dor na região uterina. Claro que vai doer e por conta disso não me livro do homem desconhecido, tatuado e gostoso em um nível relativamente perfeito. Me arrasto da cama até o banheiro, lavo o rosto e prendo meus cabelos no alto, posso ouvir a voz de Rocco no andar de baixo, ela vai usar as técnicas do CSI para investigar o que aconteceu, e o que aconteceu eu preciso esquecer, afinal de contas, não é uma história que eu deva sair contando, tipo; oi, trepei com um completo desconhecido! Que ideia de merda foi essa?

Coloco o robe branco que faz jogo com minha camisola e desço até a sala onde fica meu escritório, é lá que Rocco discute com alguém em alemão, sua língua mais fluente. Ela chegou depois de mim, escutei quando ela abriu a porta e subiu a escada xingando por conta do salto que quebrou e pelo visto o café da manhã foram alguns litros de energético.

— Bom dia. — a cumprimento e ela me olha como se estivesse dando à luz a um casal de capivaras. Ela se despede do infeliz que provavelmente fez merda e se levanta cruzando os braços.

Chamo Sue e peço que ela sirva o almoço, são quase duas horas da tarde e mesmo odiando pular refeições, hoje é um caso esporádico.

— Bom dia? Que tipo de merda aconteceu ontem? Não, porque se você for sair por aí quebrando a cara de ex-noivo me avise. Tem ideia que sua foto está em pelo menos quatro tabloides diferentes? — Rocco está de macacão jeans, regata branca e de chinelos, segundo ela domingo é dia internacional de dedos de fora.

— Calma. — peço para minha assistente que cuida além dos meus compromissos, cuida também da minha imagem, que com certeza joguei no lixo ontem. Meu pai vai me matar, espero que ao menos ele tenha vencido o torneio de golfe.

— Calma? Você tem ideia do que é soltar uma nota para a edição de jornal dizendo que foi um mal entendido? Mad! Caralho! Me esforço para que nada atinja sua imagem e você resolve treinar seu boxe na cara do Otto! Ele está puto da vida, com o nariz quebrado e estampando o The Sun! Entenda, eu posso sair por aí rebolando em cima de mesas e balcões, eu não tenho nome nenhum para preservar e meu lema é que tenho uma reputação a ZERAR, quanto a você, lamento, não pode cometer esse tipo de loucura — ela se mantém parada de braços cruzados e isso é perigoso, mais do que possa imaginar.

— Você queria que eu fizesse o quê? O maldito estava quase trepando com a Dill no meio da Jonh Jonh! Eu deveria ter acertado um soco na cara dela também. — bufo e desço os degraus até o último andar e ela vem atrás de mim.

— Claro! Por que não o fez? Afinal, o que seria um peido para quem está de merda até a porra do pescoço? Mad, seu casamento será em seis meses e esse tipo de mídia é totalmente dispensável. — vejo um pingo de paz ao escutá-la me chamando de Mad, mas está paz vai acabar agora.

— Não vai haver mais casamento. — falo e ando em direção a cozinha, abro a geladeira e pego a garrafa d’água. Ela está muda, me encarando, corro riscos agora.

— Christen Madson! — ela briga e a paz já era. — Teremos um baita trabalho, bom, na realidade eu terei... Tudo bem que eu também não quero que você se case com ele, eu nunca gostei dele, mas precisamos ver o que vamos fazer — ela diz e começa a fazer anotações em seu iPad.

— Eu não estou pronta! Já parou para pensar que eu poderia não estar feliz? Olha como estou tranquila, não estou nem abalada, porque sei que dividiria a minha vida com um mentiroso que me traiu e com certeza o fez outras vezes. — rebato.

— Escute, não quero você infeliz, mas vamos ter que pensar na estratégia de como a mídia vai absorver essa merda toda. Você é bilionária, dispensa seguranças, dirige o próprio carro, está sempre em festas e lógico que isso tudo vai mudar porque as pessoas te enxergavam como a doce Mad, e não a boxeadora que jogou o casamento pro alto.

— Rocco, não me importo com o que vão pensar! Tenho vivido uma vida de mentira com Otto, o amor deve ter ficado alguns anos atrás e só restou o péssimo hábito de um ter o outro, tenho muita responsabilidade em minhas costas para assumir mais essa; ser infeliz por conta de tabloides que estarão no lixo amanhã.

— Ok, vamos conversar como Roc e Mad, amigas, é isso que você quer?

— Não, Roc, é isso que eu não quero, não quero me casar sabendo que pode não ser ele o homem da minha vida. Faltam alguns meses até eu completar trinta anos, sou bem sucedida no que faço e gostaria profundamente de ser bem sucedida em minha vida pessoal, mas parece que sempre temos que escolher e você sabe muito bem, tudo entre Otto e eu mudou depois do que aconteceu.

— Eu sei, não deve ter sido fácil e eu entendo a culpa que ele carrega e que depois disso ele se tornou egoísta e mesquinho, mas é uma página que deveria ter sido realmente virada. Claro que é difícil dormir e acordar com tudo isso. — ela se mostra menos dramática.

— Rocco, não acredito que as pessoas se tornam egoístas, elas nascem assim e com o tempo mostram o que realmente são. Ontem, na hora da briga, eu o vi sem máscaras e eu vi tudo que eu não quero para mim, lamento muito por ele, pelo irmão e é algo que vou carregar para sempre. Mas, estou mais aliviada do que preocupada com a mídia e com a porção de coisas que irão falar, todos vão falar, independente do que houve.

— Eu cuido disso. — ela diz e vem em minha direção, me abraça e sussurra que tudo vai ficar bem.

— Eu sei que cuida, vou me trocar e desço para almoçarmos. — dou um beijo em seu rosto e subo para o meu quarto.

Eu sei que deveria estar pensando sobre os anos de relacionamento e tudo que fizemos, mas estou tranquila, é como se eu estivesse precisando de um motivo e ele surgiu com direito a socos e xingamentos e super herói. — Estico meu braço e pego um macacão de linho sem mangas, verde, e calço uma sandália. — Ai! — sinto uma fisgada no ventre quando me sento para calçar a sandália. O super herói deixou sua marca.

Desço e Sue está terminando de servir a mesa, Rocco escuta Evanescence, o volume está relativamente alto, mas eu não me importo. Nos sentamos e ela me passou a agenda da semana, entre uma garfada e outra clicava em seu iPad os compromissos em que eu confirmava presença, quase todos e eu sei que vou sofrer uma inquisição em alguns deles.

Sue sai com o regador e Rocco avisa que a reunião em Vancouver foi adiada para o próximo mês, e eu queria ficar apenas alguns dias na praia, sem celular, sem compromisso, sem agenda atribulada e jornais de fofoca jogando minha vida de um lado para o outro.

— Srtª Madson. — Sue me chama.

— Sim? — limpo minha boca e saio da mesa, a música me distrai e eu ando em direção a sala de visitas.

— Tem um homem que procura pela senhorita. — ela diz isso e eu a olho com espanto. Pode ser Otto, é o único que poderia me procurar aqui. Espio pela janela e tudo que compõe minha região uterina (inclusive a entrada) dispara como sirene e sinto minhas mãos geladas. — Senhorita? Está tudo bem? — Sue pergunta e eu não consigo responder, um flash dos acontecimentos renascem em minha mente e fico presa dentro do meu próprio pensamento.

— Sim, acho que sim. Sue, diga a ele que estou viajando sem data para voltar. — Rocco abre e fecha as portas do armário e vem em minha direção.

— O que está acontecendo, você está pálida, Mad. — Rocco observa e eu coloco o indicador diante da boca pedindo para que ela fale baixo, mesmo Evanescence tocando alto.

— Sim, eu vou avisá-lo. — Sue diz e sai em direção a porta, estou suando e a comida revira em meu estômago.

— Vai me dizer o que está acontecendo? — Rocco questiona cruzando os braços e eu espio pela janela o homem atravessar a rua e entrar em um Volvo prata. Engulo seco e me pergunto como ele me encontrou? Eu paguei a conta do hotel em dinheiro e o check in é confidencial.

— Srtª, ele pediu que lhe entregasse isso. — ela estende um cartão em tom marfim com letras em verde.

Ramon Rodriguez Avellar

Korck Farmaceutics

Atrás os contatos dele, incluído celular e e-mail. Busco na memória a nome da empresa que ele trabalha e não conheço nada desse ramo, meu negócio são tecidos e fibras e tudo agora se torna confuso. Me sento no sofá com o cartão na mão e olho incrédula para Rocco.

— Estou esperando, Mad, me conte! — ela ordena e eu sei que ela não vai reagir muito bem.

— Roc, é complicado e eu estou organizando isso na minha cabeça para poder lhe contar de forma prudente. — me justifico olhando para o cartão. Ele tem cara de Ramon, homem sexy do caralho. Meu útero sorri, mesmo dolorido.

— Ah?! Não se preocupe com isso, haja vista os bombardeios da noite passada, acho pouco provável que eu possa me surpreender com alguma coisa. — ela fala e se senta na poltrona de frente a mim.

— Bom, ontem, logo depois que acertei o nariz do imbecil do Otto, ele resolveu vir atrás de mim e me segurou, querendo acertar meu rosto. — Rocco abre a boca, espantada. — Assim que ele levantou a mão para me bater, esse homem o segurou e evitou que meu nariz também saísse do lugar.

— Ah! Claro e aí você o agradece dizendo seu endereço? Ótimo, é tudo que preciso, um homem te perseguindo ou cobrando por sua ação diante dos jornais, já não basta o homem que você beijou ontem e os jornais fizeram questão de dividir a página com o cara que você quebrou o nariz. — ela protesta.

— Claro que não! E claro que sim, ele é o homem do beijo depois do nariz quebrado. — escuto-a rosnar alguma coisa — Conversamos e decidimos aproveitar a noite sem nomes, sem telefones, em total e absoluto anonimato e foi o que fizemos, saímos de lá e posso garantir que nunca fiz sexo como fiz na noite passada, prazeroso e sem compromisso. — olho para o cartão e sorrio. — Saí de lá, paguei a conta, deixei o dinheiro para o taxi e pronto, uma foda sem nenhum tipo de envolvimento, afinal, eu me dei muito mal com o último.

— Você pirou? Vai sair trepando no anonimato? Você é a porra da Christen Madson! Todo mundo sabe quem é você! — ela ralha e eu volto meus olhos para o cartão.

— Ele não sabia, e foi tudo perfeito, apenas sexo e eu precisava me sentir mulher de novo. Você tem que parar com esse lance de que todo mundo me conhece e que vou ser perseguida, levo uma vida normal, na Jonh Jonh ninguém sabia quem era eu até a briga começar... e é ótimo viver assim.

— Caralho, Mad! Mas o homem descobriu onde você mora e agora deve saber muito mais sobre você. Anda, me deixa ver o nome dele. — ela levanta e pega o cartão da minha mão, ela olha e busca o iPad e digita algumas coisas.

— Vai investigar o cara? — perguntei zangada.

— Claro! Você tem algumas atitudes que beiram a idiotice. — ela dispara e eu a vejo abrir os olhos em explosão. — Porra, Mad! É esse o cara? — ela vira o iPad em minha direção e eu aceno que sim.

Ela lê alguma coisa e volta seus olhos para mim, ela está muda e eu espero o bombardeio de Rocco Field.

— Christen Madson, sua noite de sexo foi com Ramon Avellar, da Korck Farmaceutics, a segunda maior indústria farmacêutica dos Estados Unidos e ele parece ser muito bom no golfe, faz questão de ostentar seus troféus em sua rede social. — ela puxa a ficha dele e eu me levanto e pego o cartão de suas mãos, subo as escadas e ela vem atrás, falando como se o mundo estivesse sendo ameaçado por uma epidemia ou uma grande praga.

— Rocco, adoro você, mas pare com essa sua paranoia, foi sexo e pronto, já o dispensei e com certeza ele veio aqui por algum motivo, por que ele me caçaria? Não fiz nada de errado, pelo contrário, eu acredito que ele não tenha absolutamente nada para reclamar.

— Como ele te encontrou? Como? Se você não deixou pistas. Esse cara pode ser um sociopata. — ela diz e chegamos ao meu quarto.

— Claro que é, inclusive ele veio até aqui para me matar e esconder os restos no porão de sua casa. — nego com a cabeça e me jogo na cama. Ela se senta na poltrona perto da janela e espia a rua e eu leio pela quinta vez tudo que está no cartão. Ele é bom no sexo, muito bom.

— Mad? — Rocco me chama.

— Sim.

— Se você vai sair de um relacionamento, não acho prudente se enfiar em outro assim. Sua imagem... Você pode até ter conseguido ser anônima na noite passada com um homem, mas não para o mundo. — ela diz e eu a olho por um par de minutos.

— Rocco, eu já saí de um relacionamento e se tomei a atitude de não falar para ele nem o meu nome, é porque não estou interessada em me relacionar. Talvez eu esteja fadada ao encalhe, nas vésperas do casamento tudo acabar assim, em uma noite. — algo me deixa triste e eu coloco o cartão sobre meu criado mudo.

— Você vai ligar para ele? — ela pergunta.

— Não e possivelmente não vamos nos encontrar por acaso, ele deve ser um homem ocupado e eu, bom, eu tenho você e uma indústria têxtil para aguentar. — puxo um travesseiro e o abraço.

— Mad, amo você, não quero te ver triste, eu sei do seu fardo e sei que não é fácil aguentar tanta pressão, mas vamos tentar manter a calma e pensar sobre sua agenda essa semana, ok? — ela diz solícita.

— Sim, o que temos para amanhã? — pergunto.

— Amanhã você vai almoçar com Janice Stull e pediu para dispensar sua agenda no período da tarde por conta desse almoço que pode se estender, você sabe o trabalho que me deu conseguir agendar esse almoço. — ela diz e passa para terça- feira. — Na terça-feira você confirmou presença no coquetel do Wallace, ele tem sido um excelente parceiro nos negócios e na quarta-feira temos a festa do editorial que a Vogue fez sobre sua indústria, na quinta-feira sua mãe volta de Aspen e vai fazer o jantar de retorno. — ela diz negando com a cabeça, sei que minha mãe é quase uma desocupada.

— Janice é a melhor, o projeto tem que ser feito por ela, mesmo que eu tivesse que esperar um pouco mais, ela é uma Stull e sabe trabalhar. — massageio meu ventre e sorrio. — Apenas isso? — pergunto.

— Sim, apenas isso.— ela desliza o dedo sobre o iPad. — Bom, sua sexta-feira está livre para sexo sem compromisso e boxe na Jonh Jonh. — ela ironiza. — Me perdoe, mas não perderia essa piada por nada.

— Acho que preciso dormir mais, se importa? — pergunto porque sei que ela via ficar aqui e vai comer a tarde toda.

— De forma alguma, vou assistir um filme e deixar sua vida pronta para amanhã. — ela vem em minha direção, beija meu rosto e desce.

Sei que amanhã vou estar em outros jornais, com outras mentiras, mas honestamente foi libertador. É como se eu estivesse vivendo uma grande mentira, foi tão mecânico escolher vestido, igreja e detalhes, é como se fosse mais uma tarefa de minha agenda e ela seria cumprida em alguns meses. Estico meus olhos até o cartão e olho para o teto. Tento contar quantas bolinhas de cristal tem no lustre suspenso em minha cama, conto até oito e penso no homem desconhecido de cueca, depois sem ela.

Nunca havia feito nada parecido, são sete anos trepando basicamente da mesma forma e por muitas vezes ficamos tanto tempo sem nos tocar, talvez isso possa ter levado Otto a me trair. Alguns erros alheios não justificam os nossos, mas explicam muita coisa.

Doze, conto até a décima segunda bolinha e volto a pensar no meu cabelo enroscado nos dedos do desconhecido. Ele era desconhecido quando fez isso e se enterrou em mim me deixando assim, pensando nele e mesmo que não quisesse meu útero está aqui, dolorido.

Seus dedos brincando com o ponto sensível entre minhas pernas e isso me excita, apenas por pensar causa um choque inevitável e eu me toco, por cima da minha roupa e recordo do orgasmo em seu dedo. Gozei na mão de um estranho, estava exposta e largada à minha própria sorte de fato, ele poderia ser um sociopata, mas um sociopata competente e com uma habilidade incrível.

Flagro-me massageando meu sexo e fecho os olhos, pensando no pau dele, duro, eficiente e cruel, no melhor sentido da palavra. Paro, me levanto e fecho a porta, preciso resolver minha situação.

Arranco meu macacão e minha calcinha, estou nua e antes de me deitar, olho novamente para o cartão e continuo. Tento tocar meu sexo como ele o fez, deslizo meu dedo para dentro de mim e subo, pensando nele fazendo isso, exatamente isso.

“Isso, boa garota, mas eu preciso de mais, muito mais”, ele disse e em seguida me sentei sobre ele, essa recordação me excita ainda mais e eu mantenho o movimento, quando me dou conta estou quase gozando apenas por pensar no desconhecido e pensar nele facilita ainda mais, então eu gozo.

Isso não pode estar acontecendo, preciso pensar em outra coisa ou transar com outra pessoa ou com ele. Acho que desde meus vinte anos eu não fazia isso e agora me sinto uma ridícula, molhada e com vontade de ligar para ele e dizer: escute, você não deveria sair por aí fazendo o que fez!

Mas eu não posso ligar, eu garanti que não iria querer saber dele. Preciso de outra foda, com alguém longe de qualquer semelhança. Isso tudo pode ser uma carência sexual de anos e foi desencadeada por ele, não que precise depender dele a partir de agora.

Me levanto, tomo um banho rápido, visto o mesmo macacão, pego o cartão e desço. Rocco está deitada no sofá assistindo um filme.

— Rocco, vou sair, vem comigo? — pergunto da porta da sala.

— Depende, se envolver pessoas do ramo farmacêutico eu prefiro ficar. — parece que ela adivinha meus pensamentos e é exatamente isso que eu vou fazer.

— Então fique. — alcanço meu celular, minhas chaves e minha bolsa e saio. Escuto-a balbuciar algo sobre imagem, fofoca e suas paranoias sem fim.

Digito os números no meu iPhone e espero até apertar o botão verde. Entro no carro e o ligo, em seguida eu ligo para ele. Toca quatro vezes e, então, eu escuto sua voz, a mesma que pediu meu orgasmo.

— Oi. — respondo o seu alô.

— Oi? — ele diz e fica na dúvida, minha chamada apareceu como restrita.

— Christen Madson, falando, acho que não foi eu quem voltou atrás e decidiu descobrir nomes e afins. — sou catedrática.

— Não descobri, você deixou pistas, e foi deselegante sair sem se despedir. — ele diz sutil.

— Era para ser anônimo. — eu falo.

— Anônimo tudo bem, mas deselegante nunca. — ele diz em um tom amigável e eu não deveria permitir que meu corpo reagisse a ele dessa forma.

— Tudo bem, então me desculpa, não foi a minha intenção e tudo seria mais complicado. Eu não faço esse tipo de coisa, não saio com estranhos e eu acho que estava fora de mim. — tento me explicar, mas eu não devo nenhuma satisfação para ele.

— Então, já que tudo saiu errado, podemos nos apresentar pessoalmente. — não posso querer me masturbar apenas por ouvir a sua voz.

— Não quero nenhum tipo de relacionamento, Sr Ramon. — digo e saio com o carro.

— Não estou te pedindo em casamento, não faria isso, estou pedindo apenas para nos apresentarmos de maneira formal e pessoalmente. — ele é direto e isso mexe comigo.

— Quando? — pergunto.

— Pode ser agora, aproveita que está saindo com o carro. — freio bruscamente e olho ao redor e depois o vejo pelo retrovisor, encostado no capo do carro.

— Você está aí desde aquela hora? — pergunto e nem percebo que me enrolo na mentira.

— E pelo visto você já voltou de viagem. — ele é irônico e eu sorrio. Dou ré e paro poucos metros dele. Saio do carro, desligo o celular e jogo no banco do passageiro pela janela.

— Você costuma perseguir pessoas? — pergunto caminhando em sua direção e ele se mantém com os braços cruzados, apenas me olha. — Está me ouvindo? — pergunto e franzo o cenho. De repente ele desencosta do carro, puxa meu braço e me coloca sobre o capô do carro dele.

— Escute. — ele diz enfiando seu quadril entre minhas pernas e tudo nele me convida. — Não gostei do que fez. — ele coloca uma nota de cem dólares no meu sutien e me beija forte forçando seu quadril contra meu sexo e me sinto uma idiota em aceitar isso. Mas, quando me dei conta estava segurando sua nuca e retribuindo o beijo.

— Sem nomes, caro anônimo, esse era o trato. — eu digo com a boca dele na minha.

— Eu teria respeitado, mas deixar a conta paga e o dinheiro para o taxi foi desaforo, e não sou homem de levar desaforos para casa. — ele retoma o beijo.

— Então, pensando por esse lado me deve o dinheiro do hotel. — ele distancia de mim, vai até o meu carro, o estaciona em frente a minha casa, mesmo sendo proibido. Ele pega a minha bolsa e meu celular, tranca o carro e vem em minha direção.

Ele me entrega as coisas, segura meu braço e me coloca dentro do carro.

— Posso saber onde está me levando? — pergunto contrariada, não sou de receber ordens.

— Além de desaforos, evito dívidas. — ele acelera e minutos depois estamos de novo no The Plaza.

Ele desce do carro e dá a volta e abre a porta, e eu não me mexo, apenas olho através de meus cílios e é um grande desafio. Ele usa calça jeans escura e camiseta branca que deveria em nome de Deus usar pelo menos um número maior, ele está de sapatênis e seu perfume é mais doce, e ele espera com a porta aberta.

— Podemos ficar aqui o dia todo se preferir. — ele protesta.

— Perguntou se eu quero? — respondo malcriada e ele se curva, aproximando seu rosto retangular, com barba rala e hálito doce em minha direção. As pessoas não deveriam agir dessa forma.

— Você não quer? Repita isso para você até se convencer, porque eu quero e eu quero muito mais do que você imagina, então, para com esse jogo e desce do carro, preciso pagar uma dívida. — ele diz e estende a mão em minha direção. Eu a alcanço e ele me puxa para junto de seu corpo. — Escute, srtª Madson, não vou lhe enviar um urso de pelúcia no dia dos namorados, não vou voltar a lhe procurar, então, seja uma boa menina e não tente fingir que não está interessada em repetir o que fizemos essa madrugada. — ele me beija pressionando seu corpo contra o meu. O manobrista sai com o carro e eu não deveria beijar desconhecidos assim, com tanta vontade.

— Christen Madson! — alguém grita e de repente vejo dois homens fotografando a cena que eu deveria ter evitado.

— Merda! — falo e entro no hotel correndo. A Rocco vai me matar agora.

Olho para trás e vejo Ramon me seguindo, assustado e sem entender. Mas agora o que estava ruim acaba de piorar. Não é mais um casamento cancelado na madrugada, a notícia que vai chegar primeiro vai ser da minha traição, afinal, ninguém sabe que o casamento foi cancelado. As fotos do jornal falam do nariz quebrado do Otto e naturalmente nossos nomes são mencionados juntos e fortes. Serão mais fotos minhas beijando um homem do que eu quebrando um nariz de outro

— Merda, merda, merda! — repito e ando de um lado para o outro, pego meu celular e ligo para Rocco.

— O que está acontecendo? — Ramon pergunta e Rocco atende.

— Rocco, fiz merda! — falo e olho para Ramon e de repente me dou conta que fiz outra merda, não deveria ter falado assim, mas agora eu não posso explicar. — Roc, estou no The Plaza. — ela está tensa do outro lado e eu tento da melhor forma explicar que uma possível notícia sobre a traição contra Otto chegará antes nos jornais do que o soco que acertei no nariz dele na noite passada.

Ramon se distanciou e foi até a recepção. Rocco está desfiando um rosário mas está buscando uma solução para que as fotos não cheguem na mídia, mas desconfio que seja impossível. Ela diz que está vindo para cá e eu acato, estou nervosa e Ramon está apoiado na recepção. A recepcionista se aproxima dele e começa a conversar.

Geralmente não sou uma pessoa reconhecida por onde ando, tudo porque evito seguranças e toda pompa que atrairia olhares, mas essa manhã meu nome voltou a ser destaque, já que meu noivo levou um soco no nariz e nossos nomes explodiram na mídia, eu deveria imaginar que estaria muito mais vulnerável.

Desligo o celular e caminho na direção dele, ele me olha ilegível e eu sei que falei o que não devia, mas não foi isso que eu quis dizer e agora tudo está confuso.

— Vamos, eu te levo embora. — ele diz sério e não se aproximou. Ele pede o carro para a recepção e diz que houve um problema, eles acatam o pedido e ele não olha para mim.

— Escute, eu não quis dizer ... — ele me interrompe.

— Não me deve satisfação. — ele diz inconformado e eu engulo seco.

— Não precisa me levar, minha assistente está vindo. — respondo e espero que ao menos ele olhe em meus olhos.

— Desculpe o transtorno. — ele é sucinto e eu quero explicar, mas ele não me deixa brecha alguma para isso. Ele pressiona o maxilar e olha a tela do celular, ele para, cruza os braços e me encara.

— Não precisa se desculpar, o erro foi meu, esse final de semana foi um dos mais complicados de minha vida e não sei bem o que fazer.

— Um problema está resolvido. — ele estende a mão para mim. — Foi um prazer, Srtª Madson, e agora me refiro ao prazer de tê-la conhecido. — ele aperta minha mão e beija o alto da minha face e sai do hotel.

Em menos de dois minutos Rocco entra já soltando palavrões em alemão e vem em minha direção.

— Mad! Sou assistente e não possuo nenhum dom místico que possa evaporar esse tipo de coisa! — ela mostra a tela do iPad e eu estou lá, com Ramon, aos beijos. Agora é uma questão de esperar a merda acontecer de forma colossal.

— Preciso ir embora, Rocco, péssimo dia. — respondo isso e saio do hotel. Rocco vem atrás de mim e aponta o taxi que nos espera.

Não era para eu estar triste. Foda-se a merda que vão dizer, os tabloides de hoje que anunciam um beijo serão os que amanhã vão anunciar a final do Super Bowl, mas estou pensando no que disse, me referir como merda, onde estou com a porra da cabeça?

— Mad, sua foto está em seis jornais diferentes e a chamada é: Bilionária troca de noivo? — ela dispara e minha preocupação tem outro alvo, me sinto mal.


4

 

Ramon

 


Eu sabia que não deveria ter ido até lá, mas o orgulho é isso, caralho! Mas agora foda-se, pelo menos devolvi o dinheiro do taxi e parte de minha dignidade está restaurada. Saco meu celular e percorro a agenda, preciso exorcizar esse tesão. Filha da puta, enquadrar-me como merda? Cretina.

Acho um número que possivelmente me ajudará nesse caso, Jane, a loura de peitos fartos.

— Alô? — falo.

— Oi, Ramon! — ela responde doce e é ela que vai me ajudar. Não posso ficar na situação que estou por conta dessa desgraçada. Pensar que eu iria fodê-la gostoso.

— Ocupada? — pergunto e ela sabe o que eu quero.

— Meu latino lindo, infelizmente estou arrumando minhas coisas, estou indo para Boston, minha mãe está aqui. — merda, penso comigo.

— Na realidade não seria agora, eu queria apenas lhe perguntar se vai ter compromisso amanhã, pensei em jantarmos ou um vinho? — que ideia de merda é essa? De onde tirei isso? A merda do orgulho de ser dispensado por uma e não poder foder com a outra que resolveu viajar dá nisso, merda. Amanhã não vou nem estar aqui.

— Que pena, volto na quinta-feira, pode me ligar? — ela responde e me sinto aliviado, não estou me tornando uma peça sobressalente.

— Claro que ligo. — provavelmente não vou ligar. — Um beijo, minha linda. — digo e espero que ela desligue.

— Outro meu latino, saudade, tchauzinho. — ela desliga e procuro por outra e de repente me vejo olhando a chamada restrita da ordinária.

Sigo em direção a casa do Benjamin, desisto de foder nesse domingo. Ligo para ele e aviso que estou a caminho. O problema é ficar pensando na ousadia dela e na foda que tive com ela e que eu sei que posso fazer mais.

Dez minutos depois chego a casa de Benjamin, ele me recebe com um copo na mão e ainda está com a mesma roupa de hoje cedo.

— E aí, Ramon? — ele diz e caminha na minha frente, indo até a varanda. — Procurou a anônima? — ele sorri e bebe o que está em seu copo. Assim que chego na varanda vejo que ele bebe uísque e já deixou um copo para mim.

— Sim. — sou sucinto e encho meu copo.

— E pelo visto foi uma merda. — ele diz e bebe mais um pouco.

— Literalmente, mas não quero falar sobre isso, fodo com ela depois. — espero, penso comigo.

— Caso você resolva se enfiar nessa coisa, não venha na minha casa, olha aí a epidemia se espalhando, primeiro foi Evan, depois Sebastian, eu não quero ser o próximo, parece que somos peças de dominó enfileiradas, caindo uma a uma.

— Nada a ver! É que fui até lá para devolver o dinheiro dela e recuperar a porra da minha dignidade e quando me dei conta estava sendo dispensado e a coisa só piorou, esqueça. — falo e viro a dose toda.

— O latino sendo dispensado? Preciso me benzer. — ele zomba, como sempre ele zomba.

— Gosto da vida que levo, você sabe, Benjamin, não vou trocar o que tenho por nada e isso nem é cogitado, mas a desgraçada pouco se importa e você acredita que ela mentiu? Pediu à empregada para que mentisse dizendo que estava viajando e mais de uma hora depois ela sai com o carro. — bufo e encho meu copo novamente.

— Cara, relaxa, acontece, nem sempre o tabuleiro está a nosso favor. — ele tenta mas não consegue e eu não deveria estar pensando tanto assim na cretina que conseguiu em menos de vinte e quatro horas me deixar puto da vida como nunca estive.

— Apenas um dia ruim. — falo e termino a dose. Escuto o barulho anunciando a mensagem que chega, um e-mail na realidade, salvo pelo gongo. — Ben, abra seu e- mail, Carl deu o ar da graça, temos um pedido do Clube 13.

— Aquele filho da puta demorou, achei que fosse passar a vez para outro. — Benjamin resmunga e alcança o celular em cima da mesa. Enfim, uma distração.

 

Solicitante: Carl Antony D’Angelo

Características

Cabelos: Escuros

Cor dos olhos: Claros

Altura: Não mais que 1,70.

Pele: Morena.

Peso: Preciso de algo suculento, algo generoso

Nacionalidade: Indiferente

Condição social: Média

Idade: 30 anos

Fluente em línguas: Não.

Escolaridade: Pela idade suponho que saiba escrever o próprio nome, assim evitaremos problemas contratuais.

Casa própria: Indiferente.

Ponto fraco: Não.

Virgem: Obviamente não, não quero trabalho.


Está fácil, 30 dias para entrega.

 

— Impressão minha ou Carl parece distante nas últimas solicitações? — pergunto assim que leio, Benjamin ainda está lendo.

— Ele anda caladão nos últimos tempos, deve estar tendo problemas com a mãe, ele não quis falar muito da última vez que nos falamos, logo ele volta ao normal. — Benjamin diz e coloca mais um pouco de uísque em seu copo. — Cara, amanhã vou enfrentar Violet, a filha da puta é uma gostosa, mas é chata na mesma proporção. Vou para Boston amanhã à noite e volto na terça-feira à tarde para o coquetel do Wall e hoje eu e Gio ficamos alguns minutos no evento da mãe do Evan, fizemos nossa doação anual e minha mãe chegou e com certeza ela estava procurando o momento de me fazer passar algum tipo de vergonha, vim embora e não vou fazer nada hoje. — ele conclui.

— Estou tranquilo amanhã até a hora do almoço e aí o turbilhão começa. Vou para Seattle, vamos começar as negociações e sei que isso se estende por meses. Lembra quando fechamos com a indústria do leste europeu? Meses e muitas reuniões, meu pai feliz e eu exausto. — bebo mais um gole e a noite chega.

— Eu sei, somos bem remunerados, mas sabemos o trabalho que temos, a responsabilidade e toda a pressão. — ele fala e desliza o dedo sobre a tela do celular.

— Cara, eu vou embora, dia cheio. — me levanto e me despeço dele. Benjamin é um cara bom.

Dirijo sem pressa e penso no dia e classifico como dia mais estranho da minha vida. Primeiro porque não sou nem de perto um homem que se preocupa com o que pensam a meu respeito e segundo, não posso admitir que uma anônima me use, isso é permitido quando eu o faço.

Mas é fato que uma mulher fazer o que ela fez é no mínimo intrigante, sem nomes ou afins, seu perfil não é de uma mulher fácil e também nada vulgar. Ela é sexy e maliciosa na medida certa e eu não deveria ficar pensando assim nela e muito menos fazer uma lista de triunfos que a Srtª Christen Madson possui.

Entro na Lexington e dirijo com calma, tem trânsito e uma movimentação natural de domingo à noite. Passo pela portaria do meu prédio e eis que vejo a mulher sexy e maliciosa parada, encostada no capo de sua 650s, uma visão perfeita, duas máquinas.

Paro o carro e desço, ando em sua direção e ela não diz nada. A filha da puta abusa das pernas grossas, a cor da pele, está com um conjunto de regata e shorts, parece linho, é bege e sua pele é dourada, maldita gostosa.

— Oi. — ela diz quase gaguejando.

— Devo me preocupar? Descobriu meu endereço. — falo seco, não vou dar nenhum motivo para ela ficar feliz.

— Sim, sou uma assassina de aluguel e vou ter que te matar. — ela está séria e pelo visto com problemas.

— Isso vai ser com data e hora marcada? Ou costuma agir na surpresa? Perdeu a chance de fazê-lo quando éramos desconhecidos. — sou irônico.

— Quando éramos desconhecidos eu não tinha motivo para isso. — ela é mais irônica do que eu. Não posso nem tentar disfarçar, meu pau está duro só de olhar para sua boca. Ela tem um nariz bonito, arrebitado e sobrancelhas que modelam um olhar assombroso de tão sedutor. Sua boca tem um desenho cor de rosa e está realçado por um brilho. Sinto vontade de beijá-la.

— Você veio até aqui para verificar minha agenda e ver um bom dia para me matar ou decidiu confraternizar com a merda? — sorrio com ironia e cruzo meus braços.

— Vim lhe cobrar, está me devendo a diária do hotel. Já que foi até a porta da minha casa com esse propósito, eu vim até aqui para continuarmos de onde paramos, fazer merda é algo que pelo menos me deixa feliz. — ela tem audácia de vir até aqui e me desafiar, que filha da puta, meu pau está latejando e ela faz isso?

— Escute! — a pego e a empurro contra o capô do carro. — Eu quis pagar, quem desistiu foi você! Então, não venha me provocar, posso fazer você pensar em mim por um bom tempo e isso pode não ser bom. — a beijo com força porque eu quero beijá-la, desde a hora que ela me disse oi.

— Não desisti, estou aqui. — ela diz com a boca colada na minha.

— Então, eu moro no vigésimo andar. — mordo seu queixo. — Vai encarar a escada com esse seu salto? — deslizo minha língua até sua orelha e ela geme.

— The Plaza. — ela diz.

— Não, não volto mais lá, estamos na frente do meu apartamento e não vou sair daqui. — coloco as ordens. — Quero pagar você, mas quero pagar do meu jeito. — forço meu pau contra seu quadril, me encaixando entre suas pernas. — E outra, pode haver fotógrafos por lá.

— Eu subo, mas tem que ser pelas escadas. — ela diz e estou beijando seu pescoço.

— Anda, vou abrir a garagem e você entra atrás do meu carro, pare na vaga ao lado, é minha também. — digo e selo sua boca saindo das pernas dela e entrando no meu carro.

Entro e ela obedece, mas ela está triste. Não sou muro das lamentações, mas posso ter gerado um problema para ela hoje e não era a minha intenção. Estacionamos e assim que ela saiu do carro eu fui em sua direção, antes mesmo que ela saísse a pressionei contra a porta do seu carro.

Me enfiei entre suas pernas e subi sua coxa, deslizando minha mão até seu traseiro, ela é toda firme, cheirosa e tem uma pele macia.

— Foderia você aqui mesmo. — eu digo beijando-a forte e acariciando seu seio. Cristo, que mulher gostosa. — Mas prefiro o conforto do meu quarto. — pressiono ainda mais e roço meu quadril contra o dela — Ficou me esperando? E se eu chegasse apenas pela manhã? — provoco.

— O porteiro me disse que normalmente você volta no domingo e quando não volta, costuma avisar por conta da lavanderia que entrega suas roupas toda segunda de manhã — ela pisca um dos olhos e eu vejo que ela consegue tudo que quer — Escada. — ela diz.

— Não, vamos pelo elevador, tenho problema de coluna e isso pode atrapalhar meus planos com você. — a beijo e a levo para o elevador.

— Odeio elevadores. — ela dispara.

— Eu sei, mas sou um bom acompanhante, não vai nem perceber. — a porta se abre e eu aperto o botão do meu andar. O elevador começa a subir e ela se atraca na minha mão. A mão dela está gelada e eu a abraço, mas dura pouco. Como se algo fosse explodir, eu a encosto na parede do elevador e seguro suas mãos para baixo. Beijo-a com força e mordo seu lábio inferior, ela geme e se solta de minhas mãos e agarra meu pescoço.

— Não sou assim! — ela dispara e eu aperto o botão travando o elevador.

— Mas vai ser. — a encosto no canto e fico de costas para a câmera, suspendo seu corpo e a faço abraçar minha cintura com as pernas. — Não vou foder você aqui, não gosto de câmeras e já estamos deixando assunto suficiente para o porteiro desse prédio, mas eu juro que na hora que chegarmos eu não vou lhe poupar. — disparo e a beijo novamente, apertando o botão e o elevador prossegue.

— Não quero sua piedade. — ela diz e mantém o beijo, meu pau dói.

A porta do elevador se abre e estamos na frente da porta do meu apartamento. Moh já foi embora, ela só chega amanhã depois das dez horas da manhã. Entramos enroscados e tirar a roupa de Christen foi fácil, rápido e indolor. A minha idem.

— Não tem ideia de como estou me sentindo. — falo e a beijo com força e ela agarra meu pau e mantém o movimento. Preciso chegar até o quarto onde estão os preservativos.

— Realmente não tenho ideia. — ela diz e mantém o movimento. Tiro a mão dela de mim e a levo para o corredor.

A encosto na parede e roço meu membro entre suas pernas, sem penetrar, ela está molhada e é difícil segurar essa situação. — Preciso de um preservativo. — digo a beijando e a levo para o quarto presa em minha cintura. — Gostosa. — falo e ando até o criado mudo. A coloco na cama e alcanço um preservativo e o visto.

Ela se deita, abre as pernas e me encara. — Vem — ela diz me chamando com o indicador.

Nunca em toda a minha vida eu pensei que um bendito papai e mamãe fosse ser bom. Me deitei sobre ela e entrei. Comecei forte e fundo, e bater dentro de Christen Madson é explosivo. Mantenho o ritmo apoiado em meus braços e ela me olha, não em meus olhos, ela olha onde a penetro. Ela segura em meu braço e geme, alto, gostoso e vou mais depressa e mais forte e tudo encaixa. Dios Mio! Não pode ser tão bom. Trepar é bom, mas existe uma divisão nítida sobre isso.

Ela sai de mim e pede para eu deitar, ousada, e sabe que isso fode com meus planos. Ela se senta sobre meu pau apoiada em seus pés e começa a subir e descer, devagar e isso é um outro problema. Acaricio seus seios, eles são perfeitos, ela toma sol sem a parte de cima do biquini, vejo só a marca da calcinha.

Preciso pensar em alguma catástrofe, algo longe dessa realidade de uma gostosa sentando no meu pau, porque estou fazendo alguns sacrifícios nesse momento, preciso que ela pare.

— Minha vez. — digo e a levo para frente do espelho do banheiro, a sento sobre a pia e entro sem nenhuma cerimônia. Ela é gostosa em todos os ângulos e agora vejo outra tatuagem, perto de sua orelha, escondida atrás do lóbulo. Uma estrela e tem algo escrito dentro, é uma letra.

— Vou gozar! — ela diz e abre ainda mais as pernas e isso me excita e talvez esteja com problemas de ejaculação precoce. Gozo junto com ela e a beijo. Merda! Preciso procurar um médico ainda essa semana. Onde está a porra do meu vigor e resistência?

Saio dela e a deixo à vontade para o que quiser fazer. Me livro da camisinha e analiso quem foi a última mulher a estar aqui. Foi Kara, há alguns meses, depois disso minha vida sexual se resume as baladas, fodas isoladas e o Clube. Estou trabalhando demais, preciso retomar minha vida sexualmente ativa e privilegiada.

— Posso tomar um banho? — ela pergunta e vejo seu rosto triste. Digo a ela que sim e assim que ela vai até o box, providencio umas toalhas e as coloco no cabide dentro do box.

— Fique à vontade. — digo e saio vestindo a minha cueca que ficou na sala e caminho até a cozinha. São quase nove horas da noite e talvez eu possa preparar um jantar rápido.

Separo manjericão, laranja e alguns bifes. Coloco uma massa dentro da panela com água e escolho um vinho. Tudo simples e tem que ser rápido, essa receita é rápida. Volto para o quarto e o chuveiro ainda está ligado, espio e ela está lá, deixando a água cair.

Por que ela veio me procurar? Não é vulgar, ela é segura de si e penso em sua vida profissional. E por que uma foto a espantou tanto hoje?

Volto para a sala e pego suas roupas e as deixo sobre a pia. Volto para a cozinha e termino de preparar o jantar. Escuto-a saindo do box e uma porta do closet se abrindo. Tudo está em silêncio e eu olho para a direção da porta, de repente ela surge, de calcinha e com uma camiseta minha, branca. Porra! Eu vejo seus seios, redondos, suculentos e enrijecidos.

— O cheiro está ótimo. — ela diz.

— E a visão também. — a encaro. — Está com fome?

— Sim, de fugitiva eu diria. — ela aperta os cachos dos seus cabelos molhados e essa é uma das cenas mais lindas que já vi. Ela está sentada, as pernas estão esticadas e vejo sua calcinha. Ela está com os olhos fechados como se não estivesse ali.

— Está quase pronto. — digo e coloco a carne na panela com alguns temperos e o manjericão. — Posso saber como conseguiu meu endereço? — pergunto.

— Minha assistente conseguiu, Rocco, aquela da Jonh Jonh. Tive que ameaçá-la de morte, ela não é a sua fã número um. — abro meus olhos em sua direção e ela sorri para mim.

— Posso saber o que fiz? — pergunto e o cheiro domina a cozinha, ligo o exaustor e a levo para o sofá a poucos metros dali. Levo o vinho e as taças.

— Nossa foto está em nove jornais diferentes e ela te culpa, por isso eu quis vir até aqui. Amanhã uma mídia desnecessária sobre nós estará em todas bancas e a culpa é minha. — ela está realmente triste.

— Por que tudo isso? Essa perseguição? — pergunto e sento de frente a ela.

— O cara que quase me acertou é Otto Kalil, estávamos noivos há três anos, juntos há sete e tudo foi um grande erro. Estou cometendo outro agora, estou abrindo minha vida pessoal para você, mas não seria justo lhe deixar na situação que você vai ficar sem saber de nada. — ela tilinta a taça de vinho na minha e me olha.

— A minha situação é muito ruim? — pergunto e sorrio, quase tirando sarro.

— Defina ruim — ela fala e bebe uma generosa dose do vinho. — Nunca fiz questão de me isolar do mundo e viver cercada de seguranças, nunca fiz questão de me esconder por conta do império do meu pai e acho que essa acessibilidade deixa as pessoas menos curiosas e, no final, não sou nenhuma celebridade. O que tenho é uma boa quantia em dinheiro e afirmo que trabalho duro para fazer isso render. — ela bebe o restante de sua taça e a estica para que eu a sirva.

Ela é intimidadora, tem segurança no que fala e faz, não estou diante de uma menina mimada, estou diante de uma mulher que parece perdida dentro de sua própria vida rica, largada a uma sorte um pouco azarada diga-se de passagem.

— O cara que me fotografou hoje possivelmente estava sem nada para oferecer para o jornaleco que ele trabalha e eu estava no lugar errado e na hora errada, mas é que essas fotos e mais as fotos do rosto do Otto Kalil vão gerar a fofoca do ano. — ela nega com a cabeça. — Tenho a Rocco que limpa minhas porcarias, apesar que não sou de fazer, mas agora extrapolei; meu nome foi exposto com as fotos de Otto e o nariz quebrado e em seguida estou aos beijos com outro homem.

— Apenas uma foto de um beijo. — justifico e bebo um gole do vinho.

— Não, apenas um beijo na mulher que além de dar um soco na cara do ex-noivo, esqueceu que ele é filho do candidato ao senado esse ano. — ainda não vejo problema.

— Não estou entendendo. — falo e olho esperando um bom motivo porque até agora nada me deixou preocupado.

— Ramon, tem algum acesso a internet fácil aqui? — ela pergunta e eu busco meu iPad e entrego em suas mãos. — Veja. — ela vira a tela para mim e me entrega.

— Caralho! — falo alto.

— Seu nome foi digitado de forma correta abaixo da foto?

— Não, é Avellar com dois eles. — digo corrigindo a falha.— Mas como sabem quem sou eu? — pergunto e ando sem entender.

— Golfe, e infelizmente a internet faz isso, deixa fácil as informações sobre seus torneios e prêmios em Santa Mônica, então, meu caro anônimo, as pessoas sabem quem é você, e você é o cara que chifrou o filho do candidato ao Senado e talvez amanhã mais jornais falarão sobre isso e outras mentiras surgirão sobre isso e até que o assunto seja esquecido eles vão alimentá-lo.

— Vou ter problemas com o Senado por conta de um beijo? — se eles soubessem sobre Madri, eu iria para cadeira elétrica.

— Não, resolvi vir até aqui apenas para avisá-lo sobre nossa foto e um monte de mentiras. — ela se inclina mexendo a taça e o pouco líquido que lhe resta. — Passei por isso há alguns anos. Sofri um acidente de carro, Otto estava dirigindo, seu irmão morreu na hora e na manhã seguinte apontaram o uso de álcool como motivo pelo acidente. — ela conta e olha para o vinho circulando a taça.

— E foi? — pergunto.

— Sim, havíamos discutido antes e ele bebeu, quando entramos no carro o irmão dele insistiu para ir junto conosco, minutos depois estávamos discutindo feio e ele perdeu a direção em uma curva. Seu irmão estava sem cinto de segurança e foi arremessado para fora do carro, eu fiquei inconsciente e demorei vinte dias para sair do hospital, depois disso Otto se transformou em um homem rude e por vezes me culpou; disse que eu provoquei a discussão e, enfim, aconteceu o que aconteceu. — ela conta como se fôssemos amigos de longa data e pelo visto essa notícia foi deletada se não obviamente Giovani a teria visto durante sua investigação — O noivado aconteceu depois da tragédia, uma tentativa errônea de consertar o que nasceu para o fracasso.

— Acidentes acontecem, mas álcool e direção não combinam, lamento pelo seu cunhado. — falo e coloco mais vinho em nossas taças.

— Ex-cunhado, mas ele era um grande amigo. Nesse acidente houve outra perda mas não vem ao caso. — ela me olha — Achei que deveria saber que, por mais que minha regra fosse o anonimato, foi exatamente o contrário que fiz com você, lamento muito. — ela não deveria se preocupar tanto.

— Talvez o erro tenha sido meu, não deveria ter ido te procurar, mas é que você deixar tudo pago e nenhum sinal de quem fosse, foi como digitar um código de busca. Desculpa por não ter cumprido a sua regra, nada disso teria acontecido.

— Culpados então, vamos admitir que você é bem teimoso e eu não deveria ter entrado no seu carro, pronto, assunto encerrado. — ela coloca a taça de lado e vai até a cozinha. — Vai demorar para ficar pronto? — ela é mandona.

— Não, acho que em alguns minutos, ei, você tem ideia e noção de que é bem autoritária, certo? — vou até a cozinha e mexo nas panelas.

— Claro, mas não é por mal, meu trabalho exige isso e confesso que não consigo mais separar as coisas. — ela senta à mesa e eu distribuo os pratos e talheres — Chega um determinado ponto que nos fundimos e tudo se torna único e acho que mesmo sendo nova, estou precisando de longas férias, uma praia, sem telefone ou compromisso. Um lugar onde eu possa andar de biquini, segura do mundo terrível das notícias, onde meu rosto não seja reconhecido e as pessoas não comentem o tamanho da minha roupa de banho.

— Fala como se estivesse esgotada. — sirvo os pratos.

— E estou, o problema é que para onde eu olho tenho compromissos e tarefas e realmente estou esgotada e essa história do casamento, do rompimento, por mais aliviada que esteja eu sei que vou enfrentar os lobos sobre isso. — me sento e ela leva o garfo até a boca. Ela não é tímida ou se faz de rogada, parece bem à vontade aqui e eu gosto de sentir isso, essa liberdade dela em relação a comida, ao meu corpo.

— Obrigada. — ela agradece e eu não entendo.

— Desculpe, mas está agradecendo as refeições? — pergunto tentando desfazer a tensão que ficou no ar.

— Também, mas me sinto bem aqui, com você. Sei que depois de tudo e todos, não vamos nos ver mais, mas eu gostei muito da sua companhia. — ela leva mais um garfo até a boca, ela realmente está com fome. — Hoje, assim que tudo começou a estourar na internet e minha rede social ficou entulhada de gente que não sabe nada sobre mim, eu pedi para Rocco descobrir seu endereço, eu precisava te avisar, não vai ser fácil.

— Logo todos esquecem. — falo e pouco comi.

— Não vão. Vou repetir o nome do meu ex-noivo porque tenho certeza que você não está ligando o nome a pessoa. — ela diz e limpa a boca com o guardanapo. — Eu acertei um soco na cara de Otto Kalil, em seguida você o deteve e ele é filho do candidato ao senado, Jacob Kalil. — ela fala e posso jurar já ter ouvido esse nome antes.

— Nome familiar. — sou sucinto.

— Ramon, eu vim até aqui não somente para te avisar que sua foto vai estar em todos os jornais amanhã, eu vim aqui para te avisar também que o cara de quem estou falando e concorre ao senado, é seu parceiro no golfe em Santa Monica. — Caralho! Aí fodeu!

— Porra! Ele é o dono do campo! Não havia prestado atenção. — passo a mão pelos cabelos e ela bebe mais um gole de vinho entortando a boca e suspendendo a sobrancelha, como se dissesse: viu? Eu disse que era um problema.

— O problema é que a foto do nosso beijo caiu na rede na sequência do soco na cara e agora vem a avalanche. — ela se levanta e recolhe os pratos, fazendo menção em limpar.

— Não se preocupe com isso. — peço que ela deixe a louça.

— Faço questão, você cozinhou e eu lavo os pratos. — ela seguiu com a tarefa e eu penso nas consequências sobre Jacob. Ele não pode fazer nada contra mim dentro do golfe, mas o clima não vai ser dos melhores. Adoro golfe, pratico nesse campo há mais de dez anos.

Observo a mulher sexy que lava os pratos e penso na loucura toda, mal a conheço e estamos assim, dividindo o jantar e bebendo vinho, sem contar que descobri o nome dela por acaso. Ela é linda, conversa muito bem, tem poder, dinheiro e tudo que precisa é ser apenas humana. É isso, ela está feliz lavando pratos, usando uma camiseta simples e quer férias em uma praia.

Ela está cantando alguma coisa e eu não ouço, ela canta para ela, como se estivesse livre da sua vida real e essa coisa simples de louças e vinho na casa de um recém conhecido está fazendo bem a ela.

— Durante boa parte do dia me sinto uma mulher maravilha, lido com pessoas de outros países, outras culturas e outras formas de pensar que geralmente conflitam com a minha. Durante muito tempo eu sei que muitas mulheres gostariam de ter a liberdade financeira e a estabilidade que possuo, mas depois de tudo a gente se acostuma e muitas vezes o resultado do dia é apenas solidão. — ela termina e caminha para perto de mim, estou de braços cruzados olhando-a perto da pia.

— Uma mulher como você não deveria se sentir sozinha. — digo encarando seus olhos.

— Por que uma mulher como eu não pode se sentir sozinha?

— Você tem liberdade, estabilidade, é herdeira de uma indústria renomada, dificilmente pessoas assim ficam sozinhas. — falo e ela abre a geladeira.

— A única pessoa que tenho o dia todo ao meu lado é a Rocco, e posso garantir que não é fácil. — ela retira uma travessa com torta de limão e coloca sobre a mesa. — Ramon, é só dinheiro e um monte de coisas que não fazem sentido. A parte prazerosa do que faço é saber que gero emprego, renda e possibilidade para pessoas que precisam e merecem, do resto, é tecido, jornais e solidão. — ela diz e procura por uma colher, me desencosto do balcão e coloco a colher e um prato para que ela se sirva.

— Bom, não acho que eu vou ter problemas maiores que o seu. Amanhã vou para Seattle e volto na terça-feira, até lá as pessoas já esqueceram. — me sirvo da torta tambem, ela está comendo com tanto gosto.

— Inocente. — ela diz e abocanha a torta. Sinto meu pau tremer por conta disso. — Eu vim até aqui para avisar, não gostaria de ser um problema para você, mas vamos combinar, você foi um problema para mim. — ela pega mais um pedaço e me olha afiado, como se buscasse justiça. Ela consegue fazer meu pau se sacrificar, e que sacrifício...

Saio da cozinha, vou até o quarto, pego um preservativo e já o visto, dificilmente vou desperdiçar essa ereção. Coloco a cueca como se nada estivesse acontecendo, como se eu não estivesse à beira de explodir e vou para a cozinha. Ela está se servindo de outro pedaço, mas sentou sobre a mesa e suas pernas cruzadas, Cristo! Ela não pode fazer esse tipo de coisa.

— Eu fui um problema para você? — pergunto e me enfio entre suas pernas.

— Sim, ainda é. — ela diz e coloca o prato de lado.

— Ótimo. — empurro sua calcinha e me enterro dentro dela. — Gosto de ser um problema. — ela geme e eu entro com força, fazendo os utensílios que estão sobre a mesa se chocarem.

A levo em minha cintura até o corredor e a apoio na parede. Entro com força a beijando forte e mantenho o entrar e sair. Ela é gostosa e me encaixo perfeitamente dentro dela.

— Foda-se se amanhã os jornais terão meu rosto e o seu, o melhor de mim você tem agora. — a levo para o quarto e a deito na cama de bruços. — O que eles vão dizer é problema deles. — entro com mais força e ela grita em um gemido rouco, prazer e tesão. Ela está molhada e olhar seu sexo brilhante e quase gozando me faz mais duro.

— Não pare! — ela pede e eu concedo.

— Não vou parar, quero que goze, quero que se lembre desse momento amanhã, quando os tabloides lançarem suas mentiras. — entro e saio com força e ela se desfaz da camiseta. Rasgo sua calcinha e a subo, mantendo-a apoiada em suas mãos e joelhos.

— Vou gozar! — ela diz gemendo.

— Por favor! — peço e ela rebola. Não consigo conter e a acompanho, enchendo o preservativo.

Por alguns instantes mantemos a mesma posição e em seguida a deixo. Ela se ajeita na cama, nua, exausta e molhada. Vou até o banheiro, me livro da camisinha, pego minha cueca e volto, deito ao lado dela. Ela esta pensativa e distante, quase que inalcançável.

— Não vamos nos ver mais. — ela diz olhando para o teto e eu me deito de lado.

— Tudo bem. — eu digo e deslizo meu dedo sobre seu seio e desço até o seu umbigo, subindo pelo mesmo percurso e ela se vira de frente para mim.

— Era para ser anônimo, mas não foi, então, antes que tudo fique maior e pior, acabamos por aqui. — ela se levanta, se troca e me encara. — Realmente foi um prazer, Ramon, em todos os sentidos. — ela se aproxima e beija minha boca. — Me acompanha até a porta? — ela pergunta e eu me levanto, em silêncio, essa decisão dela não pode me afetar.

Caminhamos pelo corredor e saímos, paro na frente do elevador e a encaro. — Consegue descer sozinha? — me refiro ao medo de elevadores.

— Vou pela escada, preciso apenas que abra a porta da garagem para mim, avise a portaria, por favor. — ela diz e não parece feliz.

— Se eu descer com você fica melhor? — sou gentil. Existe algo entre nós, indecifrável e frustrante de tão intenso e proibido.

— Prefiro a escada, sozinha. — ela diz, beija meu rosto e sai. A vejo caminhando pela porta da escada e algo me incomoda, talvez eu devesse ter insistido e acompanhado-a. Mas a decisão foi dela e minha vida volta ao normal. Minha dignidade foi recuperada, pelo menos parte dela.


5

 

Christen

 

 

Desço cada um dos degraus, são vinte andares, tenho degrau suficiente para deixar tudo isso para trás. Preciso organizar minha vida e deixar tudo em ordem, amanhã será um novo começo.

Chego a garagem e saio, acelero sem direção e assimilo o fim do casamento e os tabloides de amanhã como uma nova etapa. Não é fácil e me sinto mais sozinha, mais perdida. Meu celular toca baixinho, está dentro da minha bolsa que nem retirei do carro. É Rocco e tem mais de dezesseis ligações perdidas.

— Alô? — atendo.

— Posso saber por que não me atendeu? Bom, esquece isso, seu pai está uma fera, surtou comigo pelo telefone e disse que está tentando te ligar. — ela diz apreensiva e a avalanche está começando.

— Ok, estou voltando. — falo e desligo.

Essa merda toda vai me tomar tempo e paciência, já estou ouvindo o sermão do meu pai, falando sobre o elo entre as famílias, que pode não ser bom para os negócios e que um futuro senador em fúria pode detonar algumas bombas. Foda-se!

Acelero e chego em casa, a cara da Rocco denuncia muito mais do que algumas ligações do Sr Frank Madson, meu pai.

— Mad! Olha isso! — ela me entrega o iPad com uma notícia muito maior e pior do que imaginei. Mas Rocco não está temerosa — Mad, eu sei que vou ter muito trabalho e as garrafas de vinho caro que distribuímos para os parceiros serão triplicadas, mas é tão libertador. É como se eu tivesse resgatando alguém de uma campo de refugiados ou adotado uma criança faminta. Sua vida está acontecendo minha amiga, você saiu do modo standby — ela está eufórica?

“Senhorita Christen Madson troca socos com o noivo em nome de um novo amor” — abaixo a foto em que Ramon me beija. “Segundo alguns clientes da boite Jonh Jonh, localizada na área nobre da ilha de Manhattan, Chris Madson teria agredido o noivo e depois de uma intensa discussão, ela saiu acompanhada de um homem” — outra foto e essa estou entrando no hotel e Ramon está entrando atrás de mim. — “Ao que tudo indica, é Ramon Rodriguez Avellar, CEO da Korck Farmaceutics, um dos solteiros de longa data mais cobiçados de Nova York” — repetem a foto do nosso beijo intenso.

— Caralho! — falo alto olhando para o iPad. Estou sorrindo e não sei se deveria, mas estou inapropriadamente feliz.

— E essa não é a única. — ela tira o iPad de minhas mãos e vai para outra notícia e me entrega novamente sorrindo e batendo as mãos diante da boca — Caralho, Mad, em nome dos bolos do jardim de Infância, eu sei que seu pai vai chegar e eu não gostaria de estar na sua pele, mas eu vou estar aqui, te apoiando e confesso ter dado um pontinho positivo para o Latino

Uma imagem das câmeras da Jonh Jonh mostra o momento em que Ramon me agarra dentro da boite — “Christen Madson, acerta o nariz do noivo e se agarra com um desconhecido, minutos depois ela sai da boite Jonh Jonh de braços dados a ele. Seria ele o motivo do soco?” — não sabia que novas fotos surgiriam. Ramon é grande, não posso listar adjetivos para ele, ou devo evitar colocar mais adjetivos em sua lista.

— Meu pai vai me matar! Aos vinte e nove anos estou com medo de levar algumas cintadas! — exclamo.

— Vai morrer por uma causa, se livrou daquele merda e agora é questão de fazermos, quer dizer, de eu fazer uma bela faxina e tudo estará resolvido. Tem mais, quer ver? — ela diz e toma o iPad de minhas mãos e começa a ler em voz alta algumas notícias que por enquanto estão na internet. — “Seria o fim do noivado?” — ela diz e ainda complementa que tem uma foto minha aos beijos com Ramon. Rocco está exorcizando o demônio Otto de sua vida, ela sabe que enfrentará meu pai ao vivo e em cores, que ele vai impor que ela se livre de tudo isso e ela vai tirar de letra

— “Haverá casamento?” — ela dita as fofocas caminhando de um lado para o outro — Claro que não, minha gente! Pelo menos não com esse imbecil do Otto — ela responde a fofoca como se todos estivessem ouvindo. — “Christen Madson e Otto Kalil trocam socos, será que vão trocar as alianças?” Até que essa gente dos jornais sensacionalista são engraçados. Eu sei que estou fazendo piada de tudo e que seu pai com certeza vai chegar com dor no saco por isso, mas minha amiga, tudo tem um bom motivo. É como as La Negras do Jonh Jonh, a primeira impressão assim que elas descem pela garganta é que você vai morrer, mas depois de um tempo você se sente eterna, imortal e invencível. — ela olha com atenção, abre mais fofocas, amplia mais fotos, ri de outras coisas que estão dizendo e retoma o ditado sobre as últimas notícias sobre nós, quer dizer eu e Ramon, ou sobre mim. Estou confusa.

— “Nocaute técnico favorece Christen Madson, que se joga nos braços de Ramon Rodriguez Avellar, CEO da Korck Farmaceutics” — ela chega a dar pulinhos com essa e ri. — Veja bem, Mad, eu disse que você passa despercebida por deixar que as pessoas tenham acesso fácil até você e você não apronta nada há sete anos, e agora eis a prova. — ela vira o iPad para que eu leia a próxima chamada.

“Herdeira das Industrias Madson dispensa noivo à base da porrada e é vista bem à vontade nos braços de Ramon Rodriguez Avellar. Seria o golfe que ele pratica há anos? Ou trata-se de uma jogada de marketing entre duas empresas de grande porte contra o senado?”

— Estou fodida, completamente fodida. — digo e me sento apoiando a cabeça em minhas mãos.

— Sim, minha amiga, eu diria mais que isso. Sua agenda está comprometida e nem posso te tirar da cidade, mas fodida não quer dizer arruinada, morta ou impotente diante da situação, vamos resolver. — ela diz.

— Não sairia, Rocco, não vou fugir. Deve ter um grande motivo para que tudo isso esteja acontecendo. — falo e subo para o meu quarto.

— Você vai continuar com sua agenda normal, eu vou estar nos bastidores tentando controlar os urubus — ela me acalma um pouco com isso.

— Você tem razão eu nunca fiz isso antes, e vou te contar uma coisa, não fiz nada de mais, apenas trepei com um desconhecido logo depois de acertar um soco na cara do meu ex-noivo, então, é tudo novo, notícia nova, fofoca nova e eu saio desse pedestal do inferno que me enfiaram, sou a porra de um humano que erra muito, mas ninguém sabe, porque minha imagem sempre é preservada. — disparo irritada — Mas e a Industria Madson? — me preocupo novamente.

— O que tem a Madson? Ela não vai abrir falência porque resolveu romper um noivado ou porque beijou um homem. Essas coisas que estão falando, são sobre a porra da sua vida pessoal e ela não deveria estar ligada a sua vida profissional e quer saber o que mais? Pouco me importa se amanhã você será a queridinha do The Sun ou a primeira página do Times. Foda-se! Você está livre de algumas correntes — ando em direção ao armário, pego uma camisola e me troco. Me desligo por alguns instantes de tudo e concordo com ela. A Industria Madson fabrica tecidos e não tem nada a ver com a minha vida pessoal.

— Cara, o que aconteceu com você? Usou algo sintético? — ela zomba e se senta na poltrona.

— Vou te contar o que aconteceu, mas vou contar para minha amiga e então faça um esforço e tente entender. Trepei gostoso com um cara, subi vinte andares de elevador ao lado dele e de novo trepamos e sabe o que mais? — ela nega com a cabeça com a boca aberta. — Faria de novo, mas não vou, desci os mesmos vinte andares pela escada e exorcizei esse homem que sabe exatamente o que fazer, e garanti a ele que não nos veríamos mais e que apesar dele ter sido um puta de um problema para mim, eu também fui um problema para ele e problemas precisam ser resolvidos.

— Só eu estou achando que isso não vai acontecer? — ela pergunta incrédula.

— O que não vai acontecer? — pergunto e vou para o banheiro e escovo meus dentes.

— Podemos até tentar fazer com que você não o veja, mas não vejo nenhum tipo de garantia nisso, não tenho poderes mágicos — ela diz sorrindo e confiante, ela me tranquiliza — Tem problemas que precisam acontecer para que outros sejam definitivamente evitados ou resolvidos. De um lado você tem a Madson e do outro, onde deveria estar a sua vida, eu vejo apenas o esboço do filho que seu pai gostaria de ter. Estou do seu lado, ainda tenho o pé atrás com o Latino e o culpo por um monte de coisa, mas ele merece pelo menos meu respeito, ele te livrou do seu destino com Otto. Estou orgulhosa de você e de suas cagadas libertadoras, tem vivido com uma regra muito rígida e eu sei o que você já passou e resolveu guardar para você, por mais que seja loucura, você merece viver. — ela se levanta e me encontra no banheiro. — Vamos resolver isso. — ela diz e eu enxugo minha boca.

— Mesmo que não resolva, estou bem feliz, fodida e feliz. Estou livre e daqui a pouco tudo isso passa e vou rir. Vou me lembrar com orgulho porque tenho uma excelente memória. — passo por ela beijo seu rosto e me jogo na cama. Alcanço o controle remoto e ligo a TV.

— Me lembrei das nossas supostas loucuras aos quinze anos, quando cabular aula para assistir Proposta Indecente era algo perigoso, eis que você participou de uma proposta e mais ainda, feita por você. — ela diz sorrindo.

— Posso garantir que não me arrependo. — passo a mão pelo meu ventre e o sinto dolorido. Sexo bom. — Dorme aqui? O quarto de hóspedes é seu, e eu sei que tem roupas suas por lá. — digo e passo pelos canais.

— Eu vou dormir, são quase onze horas da noite e estou pregada. E você me fez entrar de chinelo no The Plaza, não vou esquecer isso. — ela diz e se deita ao meu lado na cama.

— Poderia ter trocado, tem sapatos seus aqui. — respondo e paro de mudar de canal.

— Estava com pressa e só percebi quando estava no taxi. — ela diz. — Mas, já que aconteceu tudo que aconteceu, me conte, e ele?

— O que tem ele? — a olho estranhando. Ela não colocou Ramon em sua lista de Natal, eu sei, naturalmente ela odeia pessoas que fodem seu caminho, ela deveria me odiar também, mas acho que a remunero muito bem para fazer o que faz.

— Como ele é? — ela pergunta curiosa.

— Ele é agressivo. — respondo sorrindo com a mão em meu ventre.

— E você responde nessa alegria?

— Claro, Rocco, ele é o agressivo mais satisfatório que já conheci. Bom sexo, conhece o corpo de uma mulher e sabe cozinhar. — me pego sorrindo. — Ele é gentil, me tratou muito bem, não tem pudores exagerados e também sabe o que falar.

— Lista extensa de adjetivos sobre um desconhecido, Srtª Madson. — ela observa.

— Ele me defendeu de um belo soco, sou grata, muitos estavam lá, olhando a discussão e ele foi o único que me protegeu e não sacou um celular. Confesso que quando olhei aquela mão gigante e uma abotoadura pensei que Clark Kent havia esquecido de se trocar, mas ele foi um cavalheiro e quando precisou deixou de ser e eu gostei do resultado.

— Você não pode vê-lo tão cedo, está carente e volúvel, uma mistura nuclear! — ela diz me encarando.

— O que você quer dizer com isso? — pergunto me sentando na cama.

— Estou dizendo isso mesmo que você entendeu. — ela responde em tom de protesto.

— Não entendi, poderia ser mais clara? — me sento de frente a ela e agarro um travesseiro.

— Eu explico. — ela diz e olha dentro dos meus olhos. — Você pode se apaixonar por ele, está fragilizada e eu sei que está, porque eu te conheço. Essa carcaça forte que você desfila por aí, esconde uma das mulheres mais doces que já conheci, então, fica longe desse latino. — ela trava a frase abrindo os olhos e desviando-os para o canto do quarto.

— Como você sabe que ele é latino? Nem eu sei disso. — respondo e ela fecha os olhos negando e confessando que fez merda. — Você o investigou? — pergunto irritada e me levanto da cama.

— Eu precisava saber quem é ele e que riscos você estaria correndo — ela se diz. — Mas tudo envolve riscos e eu admito que ele fez bem a você e não estou falando pelo sexo, é por isso que ficar perto dele pode envolver mais do que um ventre com boa memória. — ela diz com soberania.

— Então já que o fez, me conte, de onde ele é?

— Ramon Rodriguez Avellar, trinta e um anos, nasceu na Colômbia, mas se mudou para Nova York ainda criança, tinha quatro anos. Seu pai já afortunado resolveu investir em uma rede de farmácias na época e depois de alguns anos comprou a Korck em sua totalidade. Ele tem uma irmã e dois sobrinhos; mantém dois títulos em campos de golfe, um deles é em Santa Mônica e o outro fica na Espanha, para onde ele viaja com certa frequência. — ela decorou quase tudo. Ela se levanta e alcança o iPad.

— O que mais? — pegunto.

— Solteiro, em sua rede social algumas fotos sobre Golfe e sua queda pelo sexo oposto; ostenta um padrão de vida simples perto do que o dinheiro que possui pode comprar; é parceiro da Super Marathon e colaborador de uma instituição que cuida de crianças com Síndrome de Down e um hospital para crianças carentes, tudo na Colômbia. — ela percorre a tela. — Pratica boxe... Olha, encontrou alguém para treinar. — ela é cínica. — Poucos amigos em sua rede social, porém são nomes de peso como Benjamin Brandy.

— Indústria de Alimentos Brandy? — pergunto.

— Sim, são amigos de longa data pelo visto, sem contar com Sebastian Charper Lousan e Evan Louis Maccouant, e não se assuste, Evan é o dono da Maccouant Import, empresa responsável pela parte burocrática de seus tecidos em outros países, mundo pequeno. — ela diz e mantém a leitura.

— Ele mora perto do meu apartamento na Lexington. — digo.

— Eu sei e quer saber mais? — ela pergunta.

— Sim. — respondo e espero.

— Ramon jogou golfe semana passada com seu ex-sogro. — ela vira e mostra uma foto dele em sua rede social, com o pai de Otto e outros jogadores. — Deveria chamá-lo para uma partida, ele sabe que você joga? — ela pergunta com ironia.

— Não seja intragável, há muito tempo não jogo e ele nem imagina que pratico isso, culpa do meu pai que me obrigou a aprender e depois disso tomei gosto pela coisa. — respondo e me jogo na cama de novo.

— Bom, agora que já sabe muito sobre o latino insuportável, vamos virar a página. Amanhã, depois que terminar seu compromisso com Janice, é bem provável que tenha que ir até a Madson, Carmen enviou um e-mail dizendo que os documentos da Bélgica já chegaram. — Rocco muda de assunto drasticamente, mas eu ainda estou revendo o assunto anterior.

— Sem problemas. — respondo e finjo assistir televisão.

— Vou dormir, se precisar de alguma coisa... de mais alguma coisa, me chame, ok? — ela diz beijando minha cabeça e eu resmungo uma resposta qualquer.

Conheço meus limites, pelo menos os que eu tinha. Passei sete anos vivendo por osmose, acordar às sete, reuniões, compromissos, acordos, demissões, contratações, crises, problemas e por mais que o faturamento compensasse, eu tenho a sensação de que estava agindo como um robô.

Quando concluí minha faculdade de administração eu sabia que seria responsável pela indústria têxtil de meu pai, mas o que eu não imaginava é que para isso eu teria que abrir mão de ser quem eu sou, mas quem eu sou?

Executiva, bem sucedida, ex-noiva e com uma vida pessoal exposta como os quadrinhos da Marvel. Não consigo pensar com alegria nos últimos anos de minha vida e talvez essa vontade de ter ido até a Jonh Jonh e verificar os fatos (coisa que não faço simplesmente por impulso) teria sido um aviso celestial de que minha vida estava uma droga.


6

 

Ramon

 

 


Quando se tem propriedade no que faz, nada pode dar errado. A não ser que em seu caminho tenha uma dúzia de investidores, que mesmo sabendo tudo sobre o mercado financeiro, não entendem nada sobre remédios.

Viagem do inferno essa. Ainda bem que estou de volta, mas tão cedo não quero ir para Seattle. Meu celular toca, é Benjamin. O taxista está com pressa e acelera sem medo.

— Fala, sua puta! — atendo.

— Minha quenga, não esquece que dependo de sua carona, Boston me atrasou além do que deveria. — ele diz sorridente e eu ainda estou entalado com aquele bando de imbecis.

— Os taxis de Nova York sumiram? — zombo da cara de Benjamin.

— Sim, por isso estou solicitando meu motorista particular. — ele faz piada.

— Não vou comentar nada sobre isso, passo às vinte horas para te pegar. — aviso e tem outra chamada em meu celular.

— Valeu, queridão. — nos despedimos e eu atendo a outra chamada, é Anna, encarregada financeira de minha empresa.

— Sim, Anna.

— Senhor, os documentos que solicitou já estão aqui. Fiz uma cópia e encaminhei para o seu e-mail. — eficiente essa mulher, mal sabe que tenho um tesão por ela guardado a sete chaves. Nem pensar em foder com funcionária, não quero problemas trabalhistas e além do mais, o marido dela é fuzileiro e isso poderia gerar problemas de ordem vital.

— Obrigado, Anna, cheguei agora em Nova York, mas não pretendo ir até a Korck, algo de urgente para resolver?

— Não, Senhor. — ela é eficiente e não gosta de conversas via telefone, trabalha comigo há mais de cinco anos. — Apenas isso. — ela se despede e desliga. Meu pau não sabe que ela é casada com um fuzileiro, ele é capacitado, mas não possui um cérebro.

Alguns minutos depois chego em meu santo lar. Moh está tirando algo do forno e isso desperta minha fome.

— Boa tarde, senhor Avellar. — ela diz.

— Boa tarde, Moh, o cheiro está ótimo. — deixo minha bagagem de mão e tiro meu paletó.

— É risoto de queijo e frango grelhado. — ela diz e coloca as travessas sobre a bancada da cozinha. Me sento e olho meus e-mails. — Tem alguns recados sobre o aparador ao lado da porta. — ela diz e uma recente lembrança me ocorre. — Outra coisa. — ela diz apreensiva.

— O quê? — pergunto assustado com a expressão.

— Alguns jornais falam do senhor, estão ao lado dos recados. — ela diz e se mantém discreta.

Levanto e pego os papéis e os jornais. Jane que decidiu voltar antes de viagem e quer uma sessão latina de sexo bem feito. “Estou às suas ordens”, penso comigo. Ligo para ela depois, são quase três horas da tarde e ainda tenho o compromisso com Wallace.

Que merda! Esses tabloides, são oito jornais falando a mesma coisa e de jeitos diferentes. Foi exatamente como ela disse, mídia desnecessária e maldosa. Lembro de Evan e Sebastian expostos.

— Algum problema, senhor? — Moh pergunta enquanto olha para meu rosto apreensivo sobre as notícias.

— Nada de importante, Moh. — respondo e tento não pensar em nada. Ontem quando saí, nem lembrei desse assunto e foi automático, entrar no taxi e tentar resolver minha vida pelo celular.

Vou até meu quarto, coloco uma roupa mais confortável e volto para a cozinha. Moh já arrumou a mesa, me sento e como abundantemente. Não deveria fazer isso. Checo as últimas ligações recebidas e vejo se perdi alguma. Olho a solicitação de Carl e percebo sua indiferença, está nítido que ele estava apenas cumprindo seu dever dentro do Clube.

Peço para Moh retirar meu terno preto da Lello&Co do closet e verificar se precisa ser passado, possivelmente não.

Vou para o meu quarto e deixo a gravata vermelha e o lenço da mesma cor separados, o sapato de bico fino e bem engraxado já está ao lado do balcão do closet, assim durmo tranquilo esse final de tarde.

Coloco meu celular para despertar às dezenove horas e me jogo na cama.

 

***

 

Assim que me troco, saio do apartamento ligando para Benjamin. O puto não atende e eu insisto, não quero que ele me atrase, deve estar em sua refeição comunitária.

Entro no elevador assim que abre a porta e desço. Elevadores não são tão perigosos, penso comigo, e também não sei por que estou pensando nisso. Ela garantiu que não nos veríamos mais e cumpriu sua parte, minha vida está bem, estou tranquilo e obviamente eu a foderia de novo. Caralho, preciso arrumar outra essa noite. Preciso tirar esses pensamentos sobre a ex-anônima e seu medo de elevadores da minha cabeça.

Meu celular toca, é o puto do Benjamin.

— Você me ligou? — ele pergunta e posso estar errado, mas ele me pareceu ofegante.

— Não, foi minha avó Guadalupe, que Deus a tenha, que ligou. — zombo.

— Estava ocupado. — ele diz tomando fôlego.

— Benjamin, essa putaria ainda vai te matar. — sacaneio.

— Se eu morrer e no meu óbito estiver escrito PUTARIA, pode conferir no caixão que vou ser o primeiro defunto sorridente do planeta. — é um cretino mesmo.

— Não vou nem perguntar o que rolou. Chego aí em vinte minutos, está um trânsito do inferno por aqui. — plena terça-feira, tudo parado. Então, percebo que houve um acidente, nada grave, mas em Nova York não precisa de muito para foder com o trânsito.

Tudo parado e para minha distração, o celular. Aumento o volume e deixo que More Than a Feeling, Boston, se solte. Talvez eu encontre a solicitação de Carl na Jonh Jonh, aquele lugar tem mulher bonita e eu não quero trabalho, ter que explicar e aquela coisa toda que faz eu gastar minha lábia, enche o saco. No começo era mais divertido, mas depois de um tempo se torna mecânico, mas os fins justificam os meios.

Volto a olhar para o trânsito e observo os carros ao meu redor, a maioria abaixou o vidro e tenta olhar o fluxo adiante. Não tem fluxo, está tudo parado. Ao meu lado direito um Dodge, tipo SUV, do esquerdo um Aston Martin, grafite, perfeito e com um insufilm tão escuro quanto o meu. Já fui mais interessado em carros, hoje preservo meu Volvo para o dia a dia e está de bom tamanho. Viagens mais longas eu tenho meu X6 e estou satisfeito.

Desço o vidro e permito que o barulho e a luz entrem. Parece que estão retirando os carros que se colidiram e, enfim, vão liberar o trânsito. Meu celular toca, é Alexander.

— Fala aí, moça. — atendo sacaneando.

— E aí, puta latina, vai no coquetel do Wallace? — ele pergunta.

— Estou tentando, mas houve um acidente aqui perto da Lexington, está tudo parado. — respondo e abaixo um pouco o volume.

— Preciso de uma carona. — ele diz.

— Cara, eu passo por aí, mas vou demorar, o que aconteceu com seu carro? — pergunto.

— Com o carro nada, com meu braço, trinquei o pulso esquiando em Aspen. — ele ri da própria desgraça.

— Imbecil, vai se meter em fazer graça com o que não conhece, dá nisso. Vou demorar, mas passo por aí.

— Beleza, fico esperando. — nos despedimos e enfim o fluxo seguiu.

Minutos depois estou na frente do apartamento de Benjamin e ele desce sorridente, como se tivesse ganhado um presente de Natal antecipado.

— Eu imagino o que aconteceu. — falo assim que ele entra no carro.

— Greta. — ele diz e acho que toda a ilha de Manhattan conhece a alegria de Benjamin quando essa mulher aparece. Primeiro, porque ela é gostosa pra caralho e segundo, nunca está sozinha.

— Sei, e ela está lá em cima? — acelero e vou em direção a casa de Alexander.

— Não, foi coisa rápida, ela precisa voltar, o voo “delas” saí as vinte e duas horas. — ele diz sorrindo.

— Delas... já pensou em algum dia fazer um sexo normal, tipo duas pessoas?

— Sim, na próxima vida quem sabe ou se minha vida depender disso, tipo ou isso ou morrer, então, passarei a noite com uma única mulher. — ele ri . — Estou exausto, mas vale a pena, Greta sabe das coisas.

— Imagino que deva saber mesmo. — zombo e acelero. O trânsito por conta do acidente me atrasou em mais de vinte minutos.

Paro o carro em frente a casa do Alexander e Benjamin, que estava mais preocupado com seu Whattsap se assusta.

— O que você está fazendo aqui? — ele pergunta suspendendo as sobrancelhas.

— Vim pegar a Kim, essa noite ela é minha! — sacaneio o Benjamin.

— Vai se foder, Ramon, ela não é para isso! — ele a defende.

— E por acaso ela é para suas Menáges? — zombo a situação.

— Claro que não, ela é irmã do Alec e ele está vindo, muda de assunto. — Alec se aproxima e entra no carro.

— E aí, suas putas. — ele é tão gentil.

— E aí Alec, e Kim? — pergunto para provocar.

— Vai se foder, Ramon, ela não vai. — ele fica bravo e Benjamin não se manifesta, já discutiram antes por causa disso. O problema é como Alexander vai gostar de saber que a irmã trepa com um cara que é sócio de um Clube de putaria? Nem em sonho.

— Relaxa, Alec, estou te sacaneando. — dou risada. — Mas ela foi convidada, certo? — tento conversar de forma amigável sobre Kim.

— Foi, mas ela tem uma reunião agora à noite na empresa. Uns japoneses atrasaram e ela vai ter que esperar. — ele explica e não prolongo o assunto.

— Alexander, você viu a solicitação de Carl? — Benjamin pergunta.

— Eu vi, solicitação rasa e ele estava em um IP diferente, também não me interessei em pesquisar. Carl anda estranho, talvez algum problema familiar. — Alexander conversa enquanto digita.

— Pelo visto ele não vai estar presente no coquetel. — Benjamin diz.

— Ele não vai, avisou Wallace que não iria. — Alexander é bem informado, mas deve ter vasculhado a vida online de Carl.— Ramon, que gostosa é aquela que você esta beijando? Alguns jornais se divertiram com isso ontem, vai declinar assim como Evan e Sebastian? — ele zomba.

— Nada de importante, já foi. — falo e Benjamin me olha de soslaio. Deixo claro que não quero prosseguir com o assunto. Minha dignidade foi restaurada, mas treparia com ela de novo.

Acelero e sigo em direção ao Wall Street, porque Wallace fez questão de ser dentro do prédio que sedia a sua empresa e por mais calado que ele seja, ele sabe como organizar as coisas.

Paro o carro em frente ao prédio e um sistema de manobrista muito ágil nos atende e em seguida entramos. Trata-se de um prédio de sete andares, mas o coquetel é no térreo. Uma empresa de buffet foi contratada e tudo parece funcionar muito bem. Somos atendidos por uma modelo, alta, magra e de uma pele perfeita, cor de jambo. Linda e educada.

Um garçom passa nos servindo, aceito uísque e Alexander está de olho na bela recepcionista.

Wallace se aproxima, discreto. Mesmo sendo alto, ele se mantém em uma postura quase que secreta e pouco fala. A não ser no Clube onde o sinto mais descontraído, mas mesmo assim, Wallace é o mais reservado de todos.

— Wallace. — Benjamin levanta o copo e todos brindam.

— Obrigado por terem vindo. Existe um bom motivo para comemorarmos essa noite, e é bom ter amigos por perto. — ele levanta mais uma vez o copo e eu daria milhões para saber o segredo desse cara.

— Bela festa. — Alexander diz e joga a cabeça para a recepcionista

— Ah sim, Anabeth. — ele olha de cima a baixo a bela morena; seu olhar é como de um assassino ou de um leão faminto. — Única. — ele arremata encarando a bela jovem. A festa vai enchendo. Naturalmente ele se desculpa e pede licença já que outros convidados estão chegando.

Aos poucos a festa ganha um ar mais jovial e uma música mais agitada começa ao fundo. Benjamin entra em detalhes sobre Greta e a amiga, Alexander comenta algo sobre um sistema corporativo que acaba de esboçar em forma de aplicativo.

Giovani chega e se junta a nós, em seguida Bryan que estava calado e não fica por mais de vinte minutos na festa e vai embora. Bryan também anda mais distante. Estamos na terceira rodada de uísque e Benjamin sempre tem as melhores piadas e de repente ele olha para a porta e fica imóvel.

Percebo sua reação e olho e ele só pode estar de brincadeira ou quer morrer. Kim está na porta e agora caminha em nossa direção. Alexander se posiciona e já deixa claro que pode matar lentamente caso haja necessidade. Benjamin apenas sorri, como se fosse uma piada.

Kim está linda, terninho e saltos pretos, altíssimos.

— Reunião cancelada. — ela diz assim que cumprimenta todos e alcança o copo de Alexander. A conversa se estende e ela fala sobre seus acordos internacionais e a queda repentina no mercado e que tudo precisa ser manipulado com estratégia e que é muito fácil perder milhões ao agir por impulso no mercado de alumínio. Inteligente, linda, sexy e gostosa. Benjamin precisa de mais bebida, ele muda quando ela está por perto, é como se ela fosse algo que o enfraquece. Não sei como ele consegue resistir.

Me distraio com a conversa e olho ao redor, vejo o movimento de alguns que acompanham a batida da música. Wallace herdou um bom patrimônio e soube como investir. Olho para a entrada e uma pequena fila se forma e um tipo de burburinho acontece. Kim se despede e vai embora, mas antes de sair Wallace a alcança e segura em seu cotovelo, posiciona seus dedos e eu conheço isso, ele os movimenta lentamente enquanto fala, ele toca em seu corpo em um ponto, mas atinge outro. Ali é perigoso e isso pode ser um problema.

Percebo que Benjamin vira o que está em seu copo e fuzila a cena. Alexander olha e endurece o rosto, ele morre por conta da irmã e mata se for preciso. Entre Wallace e Benjamin, eu não sei qual deles seria menos pior. Wallace aproxima o rosto do ouvido de Kim e pronuncia alguma coisa que a faz rir, ele segura em seu cotovelo e eu conheço esse tipo de pegada. Deus proteja esse lugar, Alexander e Benjamin planejam uma morte bem dolorosa contra Wallace.

Dois idiotas, Wallace não se interessaria por Kim e vice-e-versa, mas eu sei que ele fez isso por conta de Ben, ele está sendo gentil, como sempre. Ele a beija no alto da face demoradamente e ela vai embora. Alexander e Benjamin pronunciam alguns desaforos, e logo esquecem e voltam a conversar.

Volto minha atenção para o bate papo e escuto Alexander soltar um: Caralho! Imagino que seja por conta da irmã que deve ter voltado.

Olho para ele e ele olha para a porta, acompanho sua visão e vejo a minha cara anônima entrar lentamente. Alexander não a reconheceu, no jornal não estava tão nítida a foto e Benjamin agora está mais interessado na recepcionista e pouco se importou com o comentário de Alexander.

Caralho! Linda, vestido vinho tinto colado ao corpo até a altura do joelho. Um decote discreto mas eu sei o que tem ali, ali tem pólvora, das fortes.

Observo Wallace caminhar em direção a ela, ela está sozinha e Wallace se aproxima, beijando a face de Christen, filho da puta. Eles conversam animadamente e sorriem um para o outro. Ele sempre é quieto e isso é perigoso.

Alcanço um copo na bandeja do garçom e observo como ela sorri para ele e ele, apesar de sorrir, se mantém discreto. A cretina está linda, porque ela é uma cretina, daquelas que nos usa e depois pedimos para sermos usados novamente.

— Acorda, Latino. — Benjamin me chama.

— Fala. — respondo ríspido e ele joga a cabeça na direção de Christen. — Coincidência, não nos vimos mais, apenas coincidência.

As pessoas que estão na porta entram e o som fica mais alto, é Angels, do The XX. “O fim chega muito cedo, é como sonhar com os anjos” — diz a letra.

Christen sorri para Wallace e olha ao seu redor e seu olhar encontra o meu. Meu olhar está em você desde que pisou nesse lugar, Srtª Madson. Mas seu olhar se fecha e eu sou o único com entusiasmo nessa conversa entre os nossos olhares.

Wallace diz alguma coisa e a deixa, ela se vira e fica de frente para mim. Um relance sobre nossas fodas e sua boca em torno do meu pau acontece e eu a encaro, como se ela estivesse nua, como se ela me quisesse, mas ela está imóvel e me encara, duramente.

O que foi que eu fiz? Me pergunto e tento analisar se cometi algum erro. Mas por que estaria preocupado com isso? Foda-se se errei, ela desgraçou por algumas horas minha dignidade.

De repente, enquanto nos desafiamos entre os olhares, ela sorri e eu não deveria, mas retribuí da mesma forma. Sinto vontade de fazer sexo com ela novamente e quando me dou conta, dou um passo em sua direção e escuto Benjamin:

— Não faça isso! Ela é uma sereia e essa porra de canto é o da morte! — ele zomba atrás de mim. Mas eu o ignoro e dou outros passos, até chegar perto de Christen Madson, a cretina mais gostosa que já comi em toda a minha vida. Ela não deveria ter ganhado essa posição, fico com medo que ela suba de escala em outros patamares e tudo fuja totalmente do controle.

— Boa noite. — digo.

— Boa noite, Sr Avellar. Coincidência ou andou me investigando novamente? — ela diz olhando para minha boca e eu estou olhando para sua boca e por vezes para o seu decote. Um garçom passa e ela pega uma taça de champanhe.

— Claro que andei te investigando, eu não tenho muito o que fazer. — sou irônico e tilinto meu copo à taça dela, sorrindo.

— Imaginei. — ela sorri. — Está tudo bem ou os tabloides fizeram algum estrago? — ela pergunta e é nessa hora que recupero minha dignidade por completo.

— Para ser honesto eu havia até me esquecido e não chegou absolutamente nada em meus ouvidos, e olha que tenho uma governanta atenta às últimas fofocas. — digo bebendo e sorrindo para ela, e mentindo. Moh comprou todos os jornais e disse ainda que eu estava muito magro nas fotos e precisava me alimentar melhor, mas isso Christen Madson nunca vai saber.

— Mas nós estávamos em muitos tabloides e em diversas formas de notícia. — ela diz quase inconformada por eu estar tão tranquilo e tão alienado ao que ela estava falando. Mal sabe que tudo me revirou por dentro, fiquei como coadjuvante dela em todas as notícias e para piorar, eu, Ramon, que sempre preferiu o anonimato de fato e cheguei a condenar Evan e Sebastian por terem sido as estrelinhas das fofocas nas vésperas de seus casamentos, estava inconformado em ser ressaltado como escolhido e não como quem escolheu.

— Acho que não fez tanto barulho, não ouvi nada. — sorrio gentilmente, estou sendo gentil com ela em todo momento, mas eu não posso é ficar na sombra dela.

— Isso é bom, não atrapalhei sua vida, pelo menos um não está sendo prejudicado com as informações. — ela deixa seus olhos se perderem dentro da taça e parece ter sofrido algum tipo de represália por conta das manchetes.

— E você foi prejudicada com tudo isso? — perguntei solenemente e ela me olha como se quisesse expor uma resposta plausível e fica por alguns instantes em silêncio.

— Prejudicada não seria a palavra adequada. — ela diz e termina sua taça, caminhando para longe da movimentação, eu a acompanho. Andamos até uma área com alguns bancos altos e uma mesa de frios. — Exposta seria a palavra coerente. — ela coloca a taça e eu observo seus movimentos. Seu vestido tem mangas que cobrem parcialmente seus ombros e isso a deixa ainda mais sexy.

— Mas acho que o pior já passou e fico feliz em saber que nenhum desastre aconteceu. — falo e coloco meu copo ao lado de sua taça.

Ela me encara e posso acreditar que está triste. Aconteceu alguma coisa por conta das manchetes, ela foi a principal dessa história curta e isso é novo, pela primeira vez eu não sou o centro das atenções de uma confusão, estou à sombra de uma mulher que se faz de forte, mas é nítido que está aqui apenas para cumprir um compromisso com seu fornecedor. Ela está triste.

— Ramon, em situações como essa, o pior nem sempre passa, nem sempre. — e ela se torna frustrante para mim, sei muito sobre ela e isso quer dizer que não sei quase nada. Ela não me deixa pistas e nem nada muito coerente para entender, ela está parcialmente pensativa, como se analisasse cada uma das respostas.

Ela abre sua pequena bolsa de mão, da mesma cor do seu vestido, e pega o celular. Olha por alguns instantes e suspira. — Existe um mundo perverso contra mulheres bem sucedidas. — ela diz olhando para o celular e a música da festa está baixa onde nós estamos. — E esse mundo impõe uma imagem que devemos manter, sem erros ou deslizes, como se fôssemos programadas para sermos perfeitas em cada passo de nossa vida. — ela guarda o celular e me encara.

— O mundo é cruel. — falo em solidariedade. — Tratar como um erro apenas por conta de um beijo, isso é exagero, não poderia ter tanta relevância. — seu rosto não é feliz e algo a perturba.

— Não é cruel, é severo e o pior é quando expomos nosso ponto de vista, pois eu tive que me defender e meu argumento de defesa foi simples e verdadeiro, mas foi visto como um insulto, talvez nessa programação de mulher bem sucedida, esqueceram de colocar alguns detalhes e isso me permite ser verdadeira, como há sete anos eu não era. — ela fala com um traço sério em seus lábios.

— E qual foi o seu argumento de defesa, se me permite perguntar? — falo e me aproximo dela. O perfume dela é bom e tão convidativo quanto o seu decote discreto.

— Disse que não posso considerar um erro, algo que gostaria que acontecesse de novo. — ela dispara e me sinto quase agredido. Desde o início dessa conversa tentei fingir que nada me atingiu sobre os tabloides e é tudo mentira, porque eu fui atingido, porque olhar aquela porção de fotos sobre nós, meros desconhecidos, me fez ter vontade de saber mais sobre ela. Saber além do que está em domínio público. Me senti curioso em relação a sua comida favorita ou sobre suas cores. Não escondo que o lado perverso sobre o sexo que gosto de praticar também me ocorre, mas sinto que ela tem muito mais do que um lindo orgasmo para me oferecer. Talvez seja esse o momento em que eu deva abandonar essa partida, sou um potencial perdedor e ela, ela está fadada a ter muitos sucessos sobre mim.

— Não posso ser benéfico para você, Srtª Madson, apesar de compartilhar a mesma vontade. — coço meu queixo com o polegar e ela me encara. — Acredito que agora seja uma boa hora para nos despedirmos de forma oficial, não houve sexo, não houve fotos e podemos, apesar de todas as notícias, seguir adiante sem nenhuma lesão mais grave. — beijo o alto de sua face. — Foi realmente um prazer conhecer você, em todo o bom sentido dessa palavra, mas prefiro me retirar enquanto resta algum tipo de domínio em minhas mãos.

Ela acena com a cabeça e se retira, como se tivéssemos acabado de saldar algum tipo de dívida. Ela se despede de Wallace e vai embora. Olho para o bando que estava comigo e Benjamin olha em minha direção e nega com a cabeça. Caminho de volta a eles e chamo pelo garçom, preciso de alguma coisa mais forte.

— Cara, o que está acontecendo? — Benjamin pergunta discretamente e bebe o que está em seu copo.

— Agora não está acontecendo mais nada. — respondo e tento disfarçar minha insatisfação por conta de minha indecisão, mas foi preciso, tenho um acordo que não quero que seja desfeito e talvez eu não esteja pronto para isso.

— Bom, se resolveu é sinal de que não vai rolar o mesmo clima novamente, porque estava nítido o que estava acontecendo entre vocês. — ele bebe mais um pouco. — Lembra de Sebastian? Então, e Evan? Está lá agora, com os gêmeos e tudo porque não conseguiu fugir. — ele diz como se fosse uma catástrofe se apegar a alguém, não que seja o meu caso, mas e se fosse? Estou questionando sobre algo que há uma semana eu tinha plena certeza.

— Não sou homem de fugir e também não tenho motivos para isso, e aliás, meu amigo, o show tem que continuar. — tilinto meu copo ao dele e sorrio. — Temos um encontro em Madri, tenho outras preocupações.

— Isso, garoto! O show não pode parar! — Benjamin sorri aliviado. O som fica mais nítido e a música agora é Don’t Look Back In Anger, do Oasis, e mesmo com Benjamin falando uma porção de coisas, estou atento a letra da música, “Você não sabia que poderia encontrar um lugar melhor para brincar?”

— Não vai parar. — digo confiante e um assunto sobre o Clube surgiu, e mesmo tendo muita importância, Benjamin consegue fazer piada sobre tudo. O assunto em pauta era a última reunião.

Tivemos um problema de ordem técnica, houve um curto circuito e ficamos sem energia por algum tempo. Tudo foi resolvido, mas até que isso acontecesse foi tenso ver as meninas desesperadas dentro de uma sala totalmente escura. Simon resolveu o problema minutos depois com algumas velas e Wallace e toda sua discrição não hesitou em soltar um comentário sobre tesão versos dor, por conta das velas. Sádico.

A conversa se encerra e Giovani se despede e vai embora. Saímos na sequência, tenho que levar os dois embora.

— Cara, que recepcionista gostosa, pena que não encontrei outra opção para o negócio ser completo. — Benjamin diz sorridente entrando no carro.

— Teria que enfrentar Wallace, ou não reparou como ele disse: Única! Ali é foda dele, e talvez ele não fique feliz em saber que você anda querendo mexer nas coisas dos outros, aliás, você anda se metendo demais em lugares que não deve. — Alexander dispara um pouco sem paciência.

— Já conversamos sobre isso, e você sabe que eu respeito a Kim como se fosse minha irmã!— Benjamin se defende.

— Benjamin, não é a toa que é filho único, não sabe o que é amor de irmã, e se tem esse respeito todo por Kim como se ela fosse realmente sua irmã, eu tenho quase por certo que é favorável a prática do incesto. — Alexander fuzila.

— Damas, parem com isso, chega a ser ridículo. Alexander, Benjamin não vai trepar com a sua irmã e Benjamin, tente ser menos puto. — Benjamin sorri e Alexander resmunga uma dúzia de palavrões sobre Benjamin.

Quarenta minutos depois e após muita ladainha entre os dois, eu os dispenso em suas respectivas casas e vou para minha. Tudo volta ao normal.


7

 

Christen

 

 


Encontro-me diante de Rocco, na minha sala na Madson, ela anda de um lado para o outro ditando meus compromissos. Avisa com lamento que minha sexta-feira que estava livre agora pertence ao grupo finlandês que chega em Nova York na quinta-feira para conhecer nossas instalações.

— Mad, posso confirmar a reunião na quinta-feira? — ela pergunta e eu aceno que sim. — Só para evitar acidentes, eu me refiro a essa quinta-feira, amanhã, ok? — ela diz suspendendo as sobrancelhas e eu aceno que sim com a cabeça.

— Mais alguma coisa, Rocco? — pergunto e me levanto da poltrona. Caminho até a minha mesa e pego um memorando para analisar.

— Não, por enquanto é isso, está na hora do almoço, vamos? — ela pergunta e me olha com receio. Não estou para muita conversa hoje e ela percebeu isso desde cedo. Enquanto eu escolhia minha saia lápis e paletó preto, ela mencionou sobre meu humor, ela ressaltou sobre a ausência dele.

— Não estou com fome, pode ir você. — falo e retiro meu blazer, deixando a blusa de renda branca exposta.

— Mad, o que aconteceu ontem? — ela pergunta e se senta na minha frente. Eu não a olho, continuo lendo o memorando e tento fingir que estou interessada no papel e não na conversa.

— Absolutamente nada. — respondo ainda olhando para o papel. Esse é o maldito problema, nada aconteceu.

Obviamente eu queria muito ter falado ontem para Ramon o quanto eu aguentei na segunda-feira, que meu pai antecipou seu retorno e eu escutei tudo que eu não queria e não merecia escutar. Porra, se estou enfiando alguma coisa na lama é minha vida pessoal e tudo porque tenho que manter a Madson no melhor conceito possível e com toda a modéstia de lado eu tenho feito isso.

— Christen Marise Madson! — meu pai entrou em minha casa gritando meu nome completo e isso já era um prenúncio do que estava por vir. Desço as escadas e Rocco desceu do andar acima e foi até a cozinha. Ela ficou ali, parada, e não se preocupou se meu pai iria gritar mais do que estava fazendo.

— Oi, pai, como foi a viagem? — perguntei e tentei me aproximar de seu rosto para dar um beijo, mas não consegui. Disfarcei minha frustração. Por toda a minha vida eu sempre soube que meu pai gostaria mesmo de ter tido um filho homem, já até o ouvi dizendo isso uma vez para um grupo de amigos que estava na casa dele na época em que eu ainda morava por lá.

— O que a senhorita pensa que está fazendo? — ele perguntou agressivo, como se eu tivesse falido sua empresa.

— Do que exatamente o senhor está falando? — pergunto e ando em direção a cozinha. O café da manhã está posto e eu me sento e o convido, mas ele nega de forma ríspida. Rocco não tira os olhos de meu pai que nem se importa se ela está ali.

— Estou falando de você sair por aí distribuindo socos na cara do seu noivo! — ele anda e joga seu paletó sobre uma das cadeiras. — Você tem ideia do que está acontecendo por conta disso? — ele diz e leva a mão até seus cabelos. Meu pai é jovem, quarenta e nove anos, herdou a Madson do meu avô e assim sucessivamente até que um dia eu deixe para meus filhos e talvez isso possa ser um pouco difícil.

— Ex-noivo. — afirmo e coloco leite na xícara e misturo ao chá. — Qual está sendo o problema? — sou mais firme.

— Christen, o futuro senador me ligou questionando que tipo de educação eu lhe dei. Você sabe o quanto seria catastrófico ter um senador contra nossa empresa? — ele ruge como um leão e eu levo a xícara até minha boca.

— Sr Frank Madson, em primeiro lugar, ele é apenas um candidato e não está conseguindo se aproximar do favorito para essas eleições, em segundo, o mundo pode estar contra a Madson, mas se estivermos dentro dos padrões legais nada pode nos afetar. — sou direta e pego um pedaço de pão.

— Christen, quando você age como sua mãe, eu não sei o que fazer com você. — ele se senta e me encara. — Você vai falar com Otto e se desculpar. — ele dispara e eu quase engasgo com o pão. — Os jornais estampando você aos beijos com outro homem, uma vergonha! — ele grita.

— O quê? Em que século estamos? O pai determina o casamento da filha? Flagro meu noivo aos beijos com outra mulher e tenho que ficar calada em nome da moral e dos bons costumes? Qual é o seu medo, Sr Madson? Ver uma nota sobre um casamento cancelado e sua única filha feliz ou um candidato de vida duvidosa que tenta o senado e que nós dois sabemos que as chances dele são quase nulas, usar algo contra o senhor? O senhor tem algo que ele pode usar? Deve algum favor? Então, vamos combinar o seguinte, minha vida profissional não é a mesma da minha vida pessoal e eu nem quero misturá-la, eu estava vivendo uma mentira! — meu tom de voz aumenta gradativamente e ele se assusta ao ver que sua menininha cresceu e sabe se defender.

— Não tenho rabo preso com ninguém, mas você acha prudente cancelar um casamento às vésperas por conta de um mísero beijo? Coisa de homem! — ele profana rudemente e eu me sinto enjaulada por ouvir algumas coisas.

— Coisa de homem? É isso que o senhor faz quando supostamente passa a semana jogando golfe em Santa Mônica? Homem não faz esse tipo de coisa e o que você chama de mísero é o mesmo que aconteceu comigo, a diferença é que o meu mísero beijo foi parar nos jornais. — me levanto empurrando a cadeira que cai e faz barulho. — Estamos diante de um problema sério aqui, tenho poder para comandar sua empresa, mas não posso fazer o mesmo com a minha vida. — meu olhar está em chamas e tudo em mim se revira.

— Existe uma fusão de nomes, Madson e Kalil, entende a proporção de sua birra? Estaríamos aliados ao governo e envolvidos em parte com política e algumas coisas se tornariam mais fáceis para nós. — ele dispara e eu não o reconheço.

— O que está me dizendo? Quer usar minha vida para ter facilidade em quê? Mais fácil do que já é? Veja o que temos nas mãos, o quanto multiplicamos nos últimos anos, será que vovô ficaria feliz em ouvir que seu filho quer facilidade em algo que está crescendo exponencialmente? Será que o direito de pedir facilidade não caberia ao meu avô? Porque quando ele começou o império que você herdou, pouco restava para ele, então, não me venha falar em tornar fácil aquilo que já é didático o suficiente para caminhar sozinho.

— Está querendo dizer que não seria mais fácil se tivéssemos mais aliados? — ele pergunta e alivia a voz, eu sei que ele entendeu o recado.

— Não preciso de aliados, tenho quase mil funcionários que trabalham dia e noite se for preciso; tenho uma equipe sólida que às vezes pede alguns trocados de aumento, não preciso ter aliados, a empresa que represento não tem problemas de ordem jurídica, não devemos nenhum imposto e temos uma receita satisfatória. — ando com as mãos na cintura e paro por alguns instantes encarando seu olhar. — Sr Madson, não estou em uma guerra, não preciso de aliados.

O rosto dele desaparece assim que jogo sobre eles as palavras.

— Está envolvida com esse outro homem? — ele pergunta desviando o assunto.

— Nossa discussão será sobre minha vida pessoal agora? — pergunto de braços cruzados e o encaro friamente.

— Apenas curiosidade, não gostaria de ver você envolvida com alguém de olho em sua herança. — ele dispara sem nenhum conhecimento de causa.

— Seria mais fácil eu estar de olho na herança dele, mas fique tranquilo, não estou envolvida com ninguém e pelo visto você apenas olhou as fotos. — ando até os jornais que Rocco fez questão de trazer e jogo em sua direção. — Leia a matéria e antes de entrar na minha casa e me atacar como se eu estivesse ameaçando a vida na terra, certifique-se das informações — ele abaixa as armas e respira fundo negando com a cabeça.

— Ao menos repense sobre o casamento. — ele insiste de forma mais calma, mas não vai adiantar.

— Não, não vou repensar. Não quero Otto em minha vida. — disparo de forma firme e isso volta a irritá-lo.

— Você está com essa cabeça revoltada desde o acidente! — ele remete ao assunto que tento esquecer.

— Por que você insiste em falar isso? Sempre toca nesse assunto, lembra do último dia de Ação de Graças? Qual é o real motivo em falar sobre isso? Me ferir? Estou à frente de sua empresa há mais de oito anos, tenho sido um exemplo de liderança e você sabe disso. Entrei na Madson carregando o sobrenome, mas como auxiliar administrativo; enfrentava filas de bancos e cartórios, e quer saber? Eu achava o máximo tudo aquilo, porque eu estava aprendendo de onde vinha a vida boa e rica que eu tinha e como tudo funcionava; fiz questão de trabalhar em cada departamento incluindo a produção; fiz hora extra e fui a cabeça de uma greve e você sabe que eles tinham razão naquela época, era vergonhoso uma empresa do porte da Madson não oferecer um seguro de vida e uma assistência estendida para a família e mesmo eu tentando diariamente atingir as suas expectativas, você nunca está satisfeito e agora me joga na cara a maldição daquele acidente. — o encaro sem sair do lugar. Rocco se mantém perto e ela sabe que com ela ele não vai falar absolutamente nada e se falar, temo por ele.

— Ora, nada mais justo você dedicar sua vida à empresa que lhe concede propriedades em Nova York, isso sem citar as que você tem na Europa e no Canadá e você sabe que depois do acidente você anda arisca, rebelde e sem nenhum limite, fechou acordos internacionais e eu só fui comunicado através do meu gerente, quando alguns milhões foram aplicados em meu nome. — ele convulsiona e eu estou explodindo.

— A empresa me concede? Meu salário me concede! Faço jus a ele e o senhor sabe disso. Não seja injusto, para cada propriedade que coloco em meu nome graças aos rendimentos que consigo através das aplicações, outras dez são postas em seu nome, e como mesmo disse, fica sabendo através dos milhões que surgem em suas contas, fácil, não? E mesmo assim busca aliados como se estivesse em uma trincheira e deseja mais facilidade. Não entendo, o quanto mais fácil tem que ficar? Não responda. E quanto ao acidente, eu perdi muito e de repente focar no trabalho com mais entusiasmo foi minha válvula de escape naquela época, eu precisava de uma distração e consegui achar uma. — falo e ele respira fundo, com raiva, eu sei que ele está com raiva.

— Não se esconda atrás de um acidente para justificar essa sua atitude, pelo tempo já deveria ter se conformado e voltado as boas com Otto, pare de ser egoísta e pense que no acidente ele perdeu o irmão! — ele berra e eu explodo de uma única vez. Estou diante de um homem frio e sem nenhum tipo de sentimento, o que aconteceu com o homem fraterno e de bom coração? A política fodeu com tudo isso?

— Ele perdeu o irmão e eu perdi o meu filho! — grito como há muito tempo não gritava, e choro com ódio por ter que sentir o gosto de tudo isso de novo. Sinto minha cabeça queimar e volto para a cozinha. Alcanço minha caixa de primeiros socorros e procuro um analgésico. As lágrimas descem junto com a minha maquiagem.

Meu pai me encara com quase pena, mas ainda está muito longe dele sentir isso por qualquer pessoa. Frank Madson se perdeu em algum ponto assim que promessas políticas em cima de uma possível fusão aconteceram. Ele alcança o paletó e vai embora.

 

— Mad? — Rocco me faz voltar da briga do dia anterior.

— Sim. — respondo firme, não quero descontar em ninguém o que está acontecendo.

— Você está bem? — ela pergunta como se não soubesse a resposta.

— Você acha que estou bem? — pergunto sem olhar para ela.

— Sou sua amiga, quero o seu bem. — ela diz.

— Eu sei, mas agora preciso me concentrar no trabalho. Tenho que encaminhar um contrato para Holanda e ainda não terminei as cláusulas para encaminhar ao advogado. — largo a folha e pego outra. — Pode ir almoçar, Rocco, não estou com fome. — falo, largo a folha e começo a verificar meus e-mails.

— Quer que eu traga algo para você da rua? — ela pergunta.

— Não, obrigada. — continuo digitando e ela se levanta e sai.

Empurro minha cadeira para longe da mesa e me levanto, olhando o movimento através da extensa janela de vidro. Ajeito minha saia e encosto em minha mesa, analisando os últimos acontecimentos.

“Não posso ser benéfico para você, Srtª Madson, apesar de compartilhar a mesma vontade”, ele disse com tanta certeza e não faz ideia do que seria benéfico para mim. Estou à frente de uma corporação e minha vida pessoal se esvai pelo ralo, não acredito que houve algo benéfico para mim durante esses últimos anos.

Foi apenas sexo, não existe envolvimento emocional e eu fico feliz pelos tabloides não terem atingido sua vida. Mas a indiferença dele em relação a isso é que me pune.

“Foi realmente um prazer conhecer você, em todo o bom sentido dessa palavra, mas prefiro me retirar enquanto resta algum tipo de domínio em minhas mãos.” De que diabo de domínio ele se referiu? Tento analisar toda a nossa conversa, mas eu estava com a cabeça ainda na briga do dia anterior com meu pai, que ainda não quer falar comigo e eu francamente não posso me preocupar com isso agora.

Inferno! Não posso pensar em um homem que prefere se retirar, não sou mulher disso e, além do mais, tenho meu trabalho. Meu telefone toca.

— Madson! — atendo.

— Srtª Madson, Sr Grown ligou e confirmou a reunião em Londres; ocorrerá em três semanas. Posso confirmar sua presença e fazer as devidas reservas, ou nomeará um preposto? — Zelda minha secretária avisa.

— Pode confirmar minha presença e, por favor, coloque o voo para pelo menos dois dias antes. — preciso descansar e isso se encaixa perfeitamente ao momento.

— Como desejar. — ela diz e desliga.

É tudo que eu preciso, de paz e sossego, alguns dias longe e pronto, minha vida volta ao normal. Eu acho.

Não gosto de discutir com meu pai, mas ele anda tão diferente do homem de alguns anos atrás, tem passado tanto tempo longe e suas viagens por conta do golfe, não sei, parece que ele empurrou em minha direção o sucesso da empresa e a todo momento me cobro, me puno e penso que posso fazer melhor.

Essa busca incansável pela perfeição, essa necessidade em ser melhor, cada vez melhor, me pego na questão: Estou fazendo por mim? Será que tudo isso é por medo de decepcioná-lo e, então, é lógico que eu esteja fazendo por ele.

Minha mãe está tão focada em causas sociais e de grande repercussão entre a alta sociedade que nem percebe o mundo desmoronando ao seu redor; finge ter um casamento perfeito e tudo está claro para mim, meu pai foge de minha mãe e minha mãe parece ser grata por isso e, enquanto isso, estou no fogo cruzado, socando a cara de um e trepando com outro.

Meu Deus! Parece que estou no olho do furacão e quando penso em uma saída, em algo para aliviar essa tensão, penso que talvez gostaria que meu telefone tocasse e fosse o desconhecido que prefere o resto de domínio que ainda tem em suas mãos, e que tem certeza que não vai ser benéfico em minha vida. Se ele soubesse a quantas anda a minha vida...

Me afundo no trabalho, deixo que o relógio corra e que o tempo possa passar rápido o suficiente para que eu possa lembrar de tudo isso sem sentir meu estômago revirado.

Rocco volta do almoço e mesmo estando dentro da minha sala, estamos distante uma da outra. Não estou propícia para conversas e, para ser honesta, gostaria de ficar um tempo sozinha. Amo a Rocco, mas ela interfere em algumas coisas, mas a culpa é minha, sou eu quem permitiu cada um dos seus acessos em minha vida, ela é paga para isso.

Meu telefone toca, é Zelda confirmando as reservas e eu peço que ela não reserve meu voo de volta, talvez eu estique mais alguns dias. Acertamos mais alguns detalhes e ela desligou.

— Rocco? — a chamo e ela está concentrada em seu iPad.

— Sim? — ela responde olhando para a tela em suas mãos.

— Confirmaram a reunião com Peter, em Londres. — falo e continuo digitando, tenho mais de duzentos e-mails amontoados para responder.

— Okay, quando embarcamos? — ela pergunta e continua olhando para a tela.

— Não embarcamos, eu embarco, preciso de alguns dias. — falo e continuo respondendo aos e-mails. Mas percebo que ela me olha e eu preciso desse tempo. Estamos o tempo todo juntas e isso não está me fazendo bem, não por ela, mas por mim que em todo momento deixo minha vida pessoal e profissional se colidirem, e apenas uma delas vence e a que vence é a que me deixa mais sozinha.

— Fiz algo de errado? — ela pergunta séria. É a primeira vez que ela não vai me acompanhar em uma viagem de negócios.

— Claro que não, Rocco, mas é que vou tirar uns dias para descansar, preciso de isolamento e eu sei que você me entende. — tento elevar seu ego para que ela não se sinta rejeitada. Mas às vezes ela me sufoca, não preciso de tantos cuidados, pelo menos não dela.

— Tudo bem, precisa de algo enquanto estiver fora? — ela pergunta.

— Não, está tudo certo. — falo olhando para ela e uma mensagem de Zelda com todas as datas chegam em meu e-mail.

— Certo, então, vou até a Califórnia nesse período. Minha prima chega na próxima semana e vai direto para lá. — ela diz animada e talvez precise ficar longe de mim por alguns dias também.

— Isso, Rocco, fique livre de mim e dos trabalhos excessivos que lhe causo. — brinco para descontrair e o clima fica ótimo. É isso, não quero mais problema e os que tenho, já estou resolvendo.


A tarde se impõe fria, o sol parece uma brasa quase se apagando, o céu está em um vermelho triste e os raios já não chegam com tanta força. Meu estômago começa a reclamar e eu preciso comer alguma coisa.

— Rocco, podemos ir? — pergunto arrumando minha mesa e alcançando minha bolsa. Pego o celular e a chave do carro.

— Sim, se importa se eu ficar na 5ª? — ela pergunta.

— Sem problema, vai para minha casa depois? — pergunto.

— Não, vou pra minha. Preciso ver se ela não foi invadida, estou há dias na sua casa. — ela brinca e eu fico aliviada. Faz mais de quatros anos que estive na casa da Rocco, foi um pouco antes do acidente, depois disso nunca mais.

— Acho que não corre esse risco. — brinco e saímos da sala. — Mora ainda no mesmo lugar, certo?

— Sim. — ela responde de pronto e descemos para o subsolo.

— Estive pensando, há muito tempo não vou lá, uns quatro anos? Isso é uma vergonha, não visitar a casa de uma amiga há tanto tempo. — brinco e atravessamos o estacionamento da Madson e chegamos até o meu carro.

— Para ser honesta ainda bem que não vai, não sou tão primorosa com minhas coisas e caso queira ir me avise, assim, contrato uma equipe para deixar de acordo para você. — ela responde olhando para a tela do celular e posso jurar que ela está disfarçando sua infelicidade por conta da minha viagem. Prefiro não mencionar nada e isso é muito pouco para eu me preocupar, eu tenho a minha vida e preciso do meu espaço.

Minutos depois a deixo onde pediu e vou para minha casa. Entro e aviso Sue que não quero ser incomodada por ninguém. Peço a ela que me faça uma sopa de legumes e ela acata.

— Paz! — falo alto entrando em minha hidro. — coloco meu iPod do lado e deixo U2 tocar. Preciso relaxar e absorver apenas o que for bom, mas o que é bom? Ordinary Love fala sobre um tipo de amor. “Somos fortes o suficiente para um amor simples”?

Deixo que a água acalme meu corpo, deixo meus pensamentos sobre a espuma e esqueço os problemas, pelo menos alguns deles.

Mas, o evento da Vogue dá duas batidas ao lado da hidro e eu sei que a Rocco vai surgir às vinte horas e eu vou ter que encarar uma multidão de gente que eu até gosto, mas não quero por perto nesse momento.

É uma questão de minutos até que eu decida a roupa, faça a maquiagem e sorria para as fotos, mais fotos. Essas serão mais tranquilas, serão profissionais e obviamente mesmo estando acompanhada de uma porção de pessoas, eu estarei sozinha.

 

***

 

Elise nos recebe com champanhe, ela tem motivos para brindar e eu profissionalmente também tenho. Ela tem feito um excelente trabalho à frente da direção da revista, o resultado tem surpreendido os diretores e eu sei disso, sou amiga de um deles que não poupa elogios em relação ao pulso firme dela.

— Temos uma excelente parceria, mas nos conhecemos antes de tudo isso, sinto que você está aqui fisicamente, mas seus olhos me dizem que está em outro lugar — Elise Del Camparo, a conheci há mais de dez anos quando ela ofereceu um curso de gestão de pessoas e marca, ela é mais velha do que eu mas não parece. Nos tornamos próximas, tomamos muita cerveja juntas e mesmo depois do fim do curso era comum estarmos nos mesmos lugares. Rocco venera a postura de Elise e garante que o mundo deveria ser comandado por uma mulher como ela.

— Está tão nítido assim? — pergunto e bebo quase toda a taça.

— Não para os demais, mas para mim que aprendi a entender sua forma de pedir ajuda está bem claro que há algo lhe deixando triste — ela me leva para um deck montado ao ar livre nos fundos do evento. Rocco que sumiu assim que ela se aproximou de mim e percebeu que poderíamos conversar, apareceu em seguida e disse que estaria no andar superior com o pessoal do marketing.

— Minha vida tomou uma proporção gigantesca e possivelmente administrar tudo isso tenha me sugado mais energia que eu realmente possuo — confesso e sinto a mão dela sobre meus cabelos

— Christen, de todas as pessoas que já conheci em meus quase quarenta anos, você é uma das pessoas que coloco no topo. Desde jovem já sabia mais do que a vida tinha ensinado, será que não seria uma boa hora para colocar isso em prática? — ela diz e a namorada dela surge, como um fenômeno da natureza, se impondo com sua beleza egípcia e sendo mais simpática do que deveria. Elas estão juntas desde sempre. Hary Dunay, gerente de operações financeiras da Corpory, a maior exportadora de componentes eletrônicos dos Estados Unidos.

Ela nos cumprimenta, fala um pouco do que tem feito e eu desejo encontrar alguém que olhe para mim assim como ela olha para Elise.

Não tive que responder a pergunta de Elise, e também não tive tempo, foram mais dez minutos ali e outros assuntos nos impediram de revirar a minha vida.

Rocco apareceu um tempo depois e eu preciso apenas ir para minha casa.


8

 

Ramon

 

 


Esse domingo surgiu com frio e chuva, não tenho vontade de levantar da cama e parece que um turbilhão me engoliu.

Recusei sair com Jane na quinta-feira e escolhi sair com Carlie. Ela estava de passagem pela cidade e Jane, bom, Jane mora aqui e tenho acesso fácil.

A verdade é que não era para eu foder Carlie nunca, mas as malditas apostas aparecem e detonam nossa maturidade. Isso aconteceu há alguns anos e ela se tornou minha foda especial semestral, quando vem para Nova York resolver problemas de seu escritório de advocacia. Na realidade ela mora em Boston, não é tão longe, mas também não é perto o suficiente para pensar em dar um pulinho ali, comer e voltar.

Ela era uma paixonite aguda de César e por uma questão de respeito não fodemos mulher de amigo, mesmo que esse amigo nunca tenha comido. Enfim, estávamos em um Pub perto do Times e ela estava no balcão com mais duas amigas, isso foi o suficiente para que César lançasse o desafio.

— Ei, latino, está vendo aquela morena de cabelos lisos? — ele me cutucou e me mostrou.

— Agora estou. — zombei.

— Aposto mil pratas que você não consegue nada ali. — ele desafia, parece que ela havia estudado com ele e sempre o colocou na zona de amigos fraternos e ele nunca se arriscou em sair. Ele não quis me dizer o nome dela.

— Tenho uma pergunta. — disse e ele já sorriu, achando que eu iria colocar algum empecilho.

— Pergunte, Ramon. — ele disse.

— São notas de cem? Não me venha com dinheiro de igreja. — gargalho.

— Notas de cem, seu puto, vai lá e leve um não, quando voltar eu pago uma cerveja para você. — ele desafia.

— Vamos fazer assim, já me dê as mil pratas, porque não vou sair da companhia dela para vir receber o que é meu. — estalo a língua.

— Vai ter que sair para me devolver. — ele ainda zomba.

— Vamos ver. — estendo a mão e ele coloca as notas sobre a minha palma. Pobre César.

Tomo mais um bom gole da minha cerveja e caminho em direção a Carlie, mas eu não sabia o nome dela e eu sei que César estava me analisando. Me aproximo e encosto ao lado dela, não digo nenhuma palavra, apenas escuto-a conversando com as amigas. Tudo tem seu tempo certo, e ainda não era hora de entrar na conversa.

— E pensar que eu posso não descobrir seu nome, isso me frustra. — disse baixinho em sua nuca e ela hesitou em olhar para trás, mas olhou e eu olhei dentro dos seus olhos, tão negros quanto seu cabelo e vestido.

— De repente sua frustração pode ser algo que me deixaria feliz. — ela tentou ser séria e quase rude. Mas toda mulher deveria aprender que seu corpo dá os sinais de entusiasmo e muitas vezes isso é involuntário.

— Então, eu vou voltar para minha mesa, mas acredite, vou voltar menos frustrado, ao menos lhe causei algo bom. — ajeito seu cabelo atrás da orelha e olho para dentro dos seus olhos e foco na minha imagem dentro deles. — Mas, volto insatisfeito, não gostaria de lhe causar apenas isso. — deixo meu indicador deslizar por sua orelha e ombro nu.

— Posso saber o que gostaria de me causar? — quando eu digo que o corpo dá sinais, eu tenho razão. Primeiro, ela se virou por completa assim que viu meu rosto e segundo, cruzou e descruzou as pernas duas vezes e agora ela está curiosa em saber algo que não vou responder na teoria.

— Posso responder, mas não acho que acreditaria em mim. — faço o mínimo de charme e aproximo meu corpo e deixo que ela ouça meu gemido surdo. Nossas respirações se encontram.

— Costuma mentir? — ela pergunta.

— Com frequência, mas confesso, adoraria ter a chance de mentir para você essa noite. — aproximo meus lábios de sua orelha e encosto, falando em sussurro e ela arrepia.

— Não gosto de mentiras. — ela diz.

— Eu também não, mas é mais forte do que eu. — continuo com a boca em sua orelha.

— Você não deveria falar assim com as pessoas que não conhece. — ela adverte sorrindo.

— Geralmente eu não falo, mas de que outra forma chamaria sua atenção para essa conversa? Talvez você não mereça as mentiras que quero lhe contar. — volto a olhar dentro dos seus olhos.

— Como sabe o que mereço? Não sabe nem o meu nome... — ela zomba e ela é linda mesmo.

— Ainda não sei, mas acho que agora depende mais de você do que de mim. — ela molha os lábios com a língua e eu mantenho minha boca na mesma distância, deixando entender que ela pode e deve me beijar.

— Posso recusar sua oferta? — ela diz e suspende as sobrancelhas em sinal de desdém.

— Claro que pode. — me aproximo de uma vez para junto do seu corpo e suas amigas se espantam com a minha reação — E pode repetir isso para você mesma até se convencer. — a beijo de repente e ela quase me repele, mas se entrega em uma respiração mais intensa.

— Golpe baixo. — ela diz assim que meus lábios soltam os dela.

— Ainda não. — pisco um dos olhos e a levo comigo.

Caminhei para fora do pub e César me mostrou o dedo do meio. Quase gargalhei.

— Sr Avellar? — Moh bate na porta e me desperta das antigas lembranças.

— Sim, Moh. — a atendo. O que essa mulher está fazendo aqui em pleno domingo de novo?

— Preciso ir para casa dos seus pais e vou voltar amanhã depois do almoço. Uma empregada está doente e eles vão fazer um jantar hoje, pediram a minha ajuda, algum problema nisso? — ela pergunta.

— Não, Moh, pode ir. — respondo de dentro do quarto jogado na cama. Moh é quase da família e é uma governanta compartilhada algumas vezes e de novo percebo que hoje é domingo e que novamente ela está trabalhando. Esses jantares que terminam em doses intermináveis de uísque, meu pai é fora do normal. Penso nele e sorrio.

Ela se despede e eu escuto o momento em que ela fecha a porta da sala. Levanto e tomo um banho. Em meu tórax as marcas de Carlie. Odeio marcas em meu corpo, não gosto de lembranças físicas, a não ser as que eu deixo, como marcas de mão em um belo traseiro.

Lembro do tapa que dei na bunda de Christen no The Plaza, ela tem um belíssimo traseiro, gostosa e admito que senti vontade de enrabá-la, pena que não fiz. E também não deveria estar pensando nela, nas coisas que gostaria de fazer e muito menos nas coisas que fiz.

Apesar que não fiz quase nada, deveria ter dado um verdadeiro banho de gato naquela virilha molhada, porra de mulher gostosa. Quando vi seu sexo exposto sem nenhuma marca, nenhum sinal de pelos sobressalentes, deveria ter caído de boca. Mas agora é tarde demais, eu a dispensei alegando querer usar o resto de domínio que ainda estava em minhas mãos. Mas essa talvez não seja a verdade e como eu disse para Carlie na noite em nos conhecemos, eu minto.

Me flagro pensando no que Christen poderia estar fazendo, de repente ela voltou para o ex-noivo ou está em uma de suas incansáveis viagens. A verdade é que não tenho razão para ligar para ela, mas eu gostaria e enquanto trepava com Carlie eu pensei nela, pensei não somente nela nua, pensei nela aqui, jantando e depois lavando a louça, tão simples e mesmo assim linda.

— Inferno, Ramon! Esqueça-a! — falo alto dentro do box enquanto a água cai sobre mim. Meu pau não tem consciência alguma sobre distância e é péssimo em geografia. Olho para ele, duro e falo: Cara, ela está longe! Temos um problema! E eu devo estar ficando louco, parece que eu o escuto respondendo: Então resolva o problema agora! E eu o faço, me agarro e começo uma sessão adolescente para aliviar o tesão. Penso nela com a boca ao meu redor e tudo fica mais fácil e, de repente, como um adolescente, fico feliz em gozar, mas completamente insatisfeito de ter fodido minha própria mão.

Que maravilha! Em plena manhã de domingo me masturbo como um adolescente na puberdade. Faz quatro dias que nos falamos e eu não deveria estar pensando nela assim. Mas é fato que andei pensando nela todos esses dias.

O rosto dela estampou uma matéria da Vogue na quinta-feira e eu não deveria ter ficado na frente da banca, olhando para o rosto dela em um pedaço de papel.

Com qual desculpa eu poderia me aproximar dela novamente?

Não tem como, vou atrás apenas por conta de uma foda? De repente uma conversa despretensiosa? Não tenho mais idade para querer conversar, coisas desse tipo é para quem precisa de um bom preparo pré-foda e a verdade é que nem nossos nomes foram citados quando trepamos pela primeira vez.

Mas ela não me ligou, nem deu sinal esses dias, talvez não queira a mídia massacrando sua vida pessoal, talvez ela tenha me esquecido e isso não deveria me incomodar como está me incomodando.

Saio do banho e me jogo novamente sobre a cama, alcanço o controle remoto e ligo a televisão. Passo pelos filmes, pelos seriados e noticiários. Paro neles, preciso saber o que está acontecendo na City.

Por que ela não me ligou? Penso comigo. Mas eu disse que não seria benéfico, eu determinei essa distância e o que me incomoda é que justamente o orgulho que ela feriu quando me tratou como objeto, agora é o que me impede de voltar atrás e ir até lá.

Pode ter algum fotógrafo de plantão e toda a fofoca desnecessária voltar à tona. Hoje faz uma semana que tudo aconteceu.

Me levanto, vou até o closet, escolho jeans, camiseta preta e tênis, coloco uma jaqueta de couro. Estou sendo imprudente e estou pisando em meu orgulho, mas eu preciso vê-la.

E se houver novas fotos?, penso comigo, alcançando a chave do carro e minha carteira e saio do apartamento em direção ao elevador.

— Foda-se! — falo alto, convencido que pode ao menos haver uma foda de despedida.

 

***

 

Minutos depois paro o carro em frente a casa dela. Respiro fundo e penso em alguma desculpa. Ensaio algumas frases de efeito.

“Oi, você está bem?”

“Tudo bem? Pensei em você e gostaria de saber como você está”

Idiota, Ramon, você pensou nela a semana toda! Puno-me e meu celular toca.

— Alô? — atendo a chamada restrita.

— Ensaiando uma conversa ou está apenas me vigiando? — cretina. Olho para as janelas da casa e a vejo, de robe branco, na última janela do lado direito.

— As duas coisas. — respondo baixinho.

— Terminou de ensaiar? Ou precisa de mais tempo? — ela zomba, e o resto de domínio que pensei estar em minhas mãos se esvai.

— Acho que não, talvez eu não devesse ter voltado atrás, não posso te prejudicar, não posso deixar você exposta. — menciono nossa última conversa, mas na realidade não é apenas isso, não posso oferecer muito, sou sócio de um clube e isso de certa forma atrapalha alguns planos.

— Ramon, podemos conversar o domingo todo pelo celular, para isso você poderia ter ficado em sua casa, mas agora que veio, não acha melhor entrar? — ela é direta.

— Estou com receio de fotógrafos. — zombo.

— Eu não. — ela dispara e me deixa sem jeito. Ela é direta e isso é ameaçador. Não deveria gostar disso como estou gostando. Ela desliga e desaparece da janela. Alguns instantes depois o portão da garagem se abre e eu entendo o recado. Entro, estaciono e no instante seguinte estou diante da porta da sala, e ela surge como uma ameaça, camisola de renda sobre os seios e um robe parcialmente fechado. Pernas grossas, bronzeadas e lindas. Está frio, não deveria se mostrar dessa forma. Entro e olho ao meu redor.

Uma casa confortável, tem luxo na medida certa, tudo é branco, desde os estofados e as poltronas, até os armários da cozinha, é como se fosse um ambiente único separado por um balcão largo e alto, com grandes banquetas ao redor.

— Como vai? — ela pergunta e percebo seus olhos fundos e parece ter emagrecido, pode ser impressão minha. Ela está arrepiada de frio e seus seios surgem como um convite para um sexo forte.

— Estou bem, sua assistente não está? — pergunto do carrapato com cara de dor que fica grudada nela o tempo todo.

— Não, ela está doente, vai ficar afastada por alguns dias, não quero pegar nenhuma doença. Em duas semanas vou viajar e quero aproveitar. — Ela diz com naturalidade e essa informação me incomoda, porque ela é muito independente e ao contrário das outras, de todas as outras, ela não faz charme, ela é determinada e bastante intimidadora.

— Entendo. — respondo e engulo seco.

— Já tomou café da manhã? — ela pergunta e caminha descalça. Aqui dentro está quente, o aquecedor deve ser bom.

— Ainda não. — respondo e ela começa a mexer em algumas coisas, dispensando sobre o balcão largo os utensílios.

— Vou preparar. — ela diz.

— Posso ajudar? — pergunto e tiro minha jaqueta.

— Por favor, já se mostrou bem apto nesse departamento, qual é a sua especialidade quando se trata de café da manhã? — ela está me tratando com tanta naturalidade que chega me irritar.

— Omelete de claras e queijo, posso acrescer bacon, apesar que evito. — vou até a pia e lavo minhas mãos. Ela me entrega um guardanapo de pano.

Ela sai por alguns instantes e sobe as escadas, volta alguns minutos depois com um iPod em mãos. Ela tem um encantamento desnecessário de tão perfeito, ela é segura de si e não mantém atitudes melindrosas, ela não é tão velha, na realidade ela é nova, vinte e nove anos e se mantém em uma postura que me sinto terrivelmente atraído por ela. Tenho vontade de beijá-la.

Ela olha a tela do iPod e seus cabelos agora estão presos em um rabo de cavalo que deixa seus cachos caídos, como se fosse uma criança. Algumas mechas estão soltas em torno do seu rosto. Céus! Ela acabou de acordar e está linda, sem maquiagem alguma, possivelmente lavou o rosto e escovou os dentes, sei porque senti o aroma de menta fresca.

Ela coloca o iPod em uma caixa da Bose® e bem baixinho temos Scorpions para o café da manhã, com No One Like You. Assim que a omelete fica pronta sirvo os pratos e ela coloca suco nos copos. Mesa farta, de comida e de Christen Madson.

“Está cada vez mais difícil ir embora, e se eu tivesse escolha, eu ficaria”, diz a letra.

Ela leva um garfo até a boca e solta um hummmm, aprecia cada garfada, não tem medo de comer, ela fica à vontade e isso é sedutor em um nível que eu nunca vi. Essa mulher é diferente de todas que já conheci, a começar pelo dragão absurdamente sortudo por estar cravado na lateral de seu corpo. “Oito sessões”, ela disse quando perguntei sobre ela e depois falamos sobre C&M também tatuado, mas ela tem uma que ainda não identifiquei. Sei que é uma estrela, mas a inicial que está dentro ainda não sei o motivo.

— Você é muito bom na cozinha! — ela elogia com a boca cheia e isso deveria ser repulsivo, mas vindo dela se tornou encantador. Estou com um problema que não tenho ideia no que pode resultar. Essa semana trepei com uma mulher pensando nela, depois prestei uma generosa homenagem a ela enquanto tomava banho.

— Obrigado, mas acho que preciso diversificar meus pratos. — digo e levo o garfo até a boca.

— É sempre bom ter outras opções, assim não enjoa. — ela come com tanta vontade e eu me lembro desses lábios me devorando. Engulo sem mastigar o omelete em minha boca, para ajudar tomo uma generosa dose de suco importado de caju.

— Como foi a sua semana? — perguntei porque não quero falar de comida, não dessa comida.

— Foi melhor do que esperava, um pouco tumultuada na segunda-feira, mas depois tudo se acalmou. — ela bebe mais um gole de suco. — Tudo nessa vida passa, desde términos de noivados desastrosos até publicidade negativa. — ela sorri como se soubesse de algo que não sei e essa dúvida que ela estabelece em minha vida é atordoante.

— Fico feliz que tudo esteja bem. — termino e descanso os talheres de um único lado do prato.

— Mas, o que lhe trouxe até aqui? Em nossa última conversa, você usou as palavras de forma coerente ao dizer que não seria benéfico em minha vida. — ela é direta.

— E não retiro o que eu disse, mas é que não consegui manter a distância que mencionei e achei que existia algum tipo de domínio em minhas mãos, eu estava enganado, e garanto que eu tenho motivos para ficar longe de você, mas não tenho força. — confesso e de novo, pela segunda vez no mesmo dia, me sinto um adolescente.

— Ramon, nunca ninguém vai ser benéfico em período integral para outra pessoa nessa vida, em algum momento acabamos por magoar as pessoas e geralmente magoamos quem mais estimamos. — ela diz e possui tanta certeza quando fala e eu me sinto um idiota na sua frente.

Chego a conclusão que por mais experiência que essa porra de vida me deu, não aprendi nada sobre mulheres independentes e autoconfiantes.

— Eu sei, mas seria covardia minha, sabendo do mal que posso lhe causar, insistir em ficar próximo de você. — bebo o restante de suco que está em meu copo. — Srtª Madson, não possuo um currículo de relacionamentos sérios, não tenho como base compartilhar o dia dos namorados ou algo nesse sentido, sou péssimo com a rotina e ainda não sei determinar o quanto isso mudou depois de sua proposta indecente e altamente produtiva. O que sei é que algo mudou e mesmo eu tendo um orgulho quase intocável, eis que estou na sua casa, voltando atrás e tentando expor sem nenhuma habilidade minha vontade de ficar mais perto de você. — mais direto que isso só se eu confessar que me masturbei pensando nela.

— Entendo. — ela diz sucinta. Isso me incomoda, depois de confessar tudo ela conclui meu desabafo com uma única palavra.

Não deveria ter vindo, não deveria ser tão claro, mas é isso que dá. Benjamin avisou sobre o canto da sereia, e eu garanti que o show tinha que continuar, mas de novo eu menti. E talvez Benjamin possa realmente estar correto, somos peças de dominó, enfileiradas e caindo, uma a uma.

— Acho que devo ir embora. — falo baixo e ela me observa apoiada em seus braços sobre o balcão. Ela está de frente para mim e consigo ver o desenho perfeito de seus seios. Ela é sexy mesmo com cabelo desarrumado e preso de maneira desajustada e recém acordada.

— Acho que deve primeiro responder se deveria ter vindo, e se a resposta for positiva, pondere se quer ficar, talvez seja eu que não lhe traga nada benéfico. Acabo de sair de um noivado e o que menos quero é outro relacionamento. Apesar que isso você deixou claro, não é homem de coisa séria, mas é homem, assumir isso da forma que assumiu deve ser bastante complicado. — ela diz e mexe no guardanapo à sua frente.

— Christen, normalmente não gosto que as pessoas saibam o que eu sinto. — alcanço sua mão. — Ainda mais quando o que eu sinto é algo desconhecido, entende que o que estou dizendo? É que gosto de ficar perto de você e eu não sei se você sente o mesmo, mas é o que eu sinto nesse momento. — massageio os dedos dela e ela deixa, estou olhando para sua mão e sei que ela está me olhando. — Não sou homem de deixar que os meus sentimentos me dominem. — levanto meus olhos em sua direção e ela me encara.

— Isso deve ser bem monótono. — ela responde quase de forma malcriada e eu como um completo e abestalhado idiota, sorrio.

— Sim, tem sido bem chato, mas desde que lhe poupei de um soco você tem tirado essa rotina chata dos meus dias e agora estou aqui, sendo franco e fraco com você, não sei o que sinto por você, mas só funciona quando estou com você. — ela sorri. — Não estou propondo namoro ou nenhum compromisso sério, sei que seu histórico recente lhe deixa em uma situação complicada, mas eu gostaria imensamente de poder estar com você, livremente.

— Ramon, o problema não é meu histórico recente, é meu histórico completo. — ela segura minha mão. — Pode ficar comigo livremente, mas, infelizmente teremos que manter o anonimato, o sigilo e a discrição. — ela olha para minha mão e engole seco. — Gosto de estar com você e isso é estranho porque quase não estive, é estranho gostar de algo que ainda não aconteceu, mas o que tenho para lhe oferecer é isso.

Ela me olha e eu sorrio, involuntariamente eu sorrio, é mais forte do que eu e mais impetuoso, quase não a conheço e já a vi mais nua do que merecesse, mas essa é a verdade, gosto da companhia desaforada dela, da boca inteligente e de sua determinação. Gosto do seu imperialismo triunfante em cima desse novo Ramon desarmado.

— Não preciso de mais que isso, não preciso de um outdoor com nossos nomes, não quero na realidade que ninguém olhe o que estamos fazendo, quero algo reservado e inexistente aos olhos de quem está de fora. — digo e a puxo para perto de mim.

Ela coloca seus braços em torno do meu pescoço e me beija, sinto o gosto do suco em sua boca, boca gostosa. Ela desliza as mãos por minhas costas e tudo fica melhor, ela é uma boa companhia.

Desfaço o laço de seu robe e deixo que ele caia no chão, seus seios são perfeitos e estão enrijecidos, eles empurram o tecido e se mostram para mim. Tenho vontade de devorá-los. Passo minhas mãos por baixo de sua camisola e os alcanço, perfeitos e macios. Ela é cheirosa, macia por completo. Arranco a camisola e a jogo em um canto qualquer.

Já tive a oportunidade de apreciar um strip-tease de parar o coração, elas eram gregas e perfeitas, vestiam uma lingerie que custava uma fortuna, eu sei porque fui eu quem comprou. Seda pura, macia e cara. Vestiam corpos perfeitos, que rebolavam e sabiam o que fazer com um pau latejante de tão duro. Mas agora, estou diante de uma mulher apenas de calcinha branca, nada sexy, uma calcinha comum, nenhum detalhe, nenhuma renda ou etiqueta que denunciasse quantos pares de dólares foram gastos e ela me deixa singularmente mais eufórico.

O cheiro do hidratante que possivelmente passou em seu corpo antes de deitar está aqui, entrando pelo meu sistema olfativo e me colocando de joelhos. Deslizo sua calcinha e ela cai sobre seus pés. Ela é toda linda, toda certa dentro de suas curvas suculentas, ela é deliciosa no modo como fala, como me beija e como me devora.

Empurro os utensílios para um único lado do balcão e a sento, abrindo suas pernas e apoiando seus pés nos bancos altos com almofadas verdes. Agora ela está exposta, para mim e eu pesei sobre suas dobras molhadas essa manhã quando me masturbei e isso facilitou e muito meu orgasmo.

Desço minha boca até o seu sexo e mato minha vontade dele, ela geme, me distancio por alguns segundos apenas para olhar seu sexo perfeito, ele é perfeito e agora brilha, ela está molhada e minha cueca aperta. A abro com cuidado e percorro minha língua desde sua entrada até o ponto sensível do seu sexo, seu gemido me contamina e eu mantenho o circular de minha língua.

Desço novamente minha língua e agora vou fundo em sua entrada, ela grita um gemido estarrecido, subo novamente minha língua no alto do seu sexo e a sinto pulsar em minha boca.

Ela coloca a mão em minha cabeça e eu sei o que isso significa, ela esta prestes a gozar. Mantenho o movimento porque sei o quanto é frustrante estar à beira de um orgasmo e tudo sumir, nada acontecer, tento evitar esse tipo de desgosto e continuo acariciando seu clitóris e ela geme mais forte e eu sinto sua outra mão e agora é tarde demais, não tem como voltar atrás, ela goza, pulsando e linda em minha boca. Ela joga a cabeça para trás e se entrega, linda e livre.

— Uau! — ela diz baixinho apenas para ela e eu sorrio. Ela volta os olhos em minha direção e minha boca e seu contorno estão molhados... dela.

Me livro de minhas roupas e vou até minha jaqueta, minha carteira e os preservativos estão lá. Volto já o vestindo e ela morde o lábio inferior, ela tem pressa e eu também.

Me enfio entre suas pernas e penetro gostoso em Christen Madson, que não deveria habitar minhas fantasias como vem fazendo. Ela agarra minha cintura com as pernas e eu mantenho o ir e vir, sem força, sem pressa, uma foda calma e apreciativa.

— Mais! — ela pede, eu dou, aumento o ritmo e coloco um pouco de força, de intensidade, me flagro desejando fazer isso sem camisinha e imagino como é senti-la por dentro, sem barreiras.

A puxo para perto com um dos meus braços e com o outro seguro sua nuca, a beijo, porque beijá-la é tão bom quanto fazer sexo com ela.

Intenso e contínuo, e mesmo com a chuva e o vento forte lá fora, existe uma explosão aqui dentro. Ela é quente, é com ela que isso passou a ser melhor. A levo para o sofá e mantenho a mesma posição, de frente a ela, olhando seu rosto ruborizado e perfeito enquanto goza ao meu redor.

Surto com seu gemido e ela sabe como se entregar, ela é tão perfeita nesse momento que posso entender que ela é tão minha nesse instante também.

A penetro com mais força e é tão fácil sentir seu limite, encostar nele ali dentro me deixa tão frágil e suscetível ao orgasmo. Ela me olha, primeiro onde nossos corpos se unem e depois olha em meus olhos, algo se perde e se encontra e eu a beijo, forte, mordendo seu lábio e gemendo dentro de sua boca, pois sou fraco e gozo gostoso dentro dela.

Fico imóvel, respirando fundo e apoiado sobre ela, dentro dela e tento mandar oxigênio para o meu cérebro. Ela desliza as mãos pelas minhas costas e tudo não deveria ser tão bom, não deveria.

Saio de dentro dela e ela indica um banheiro no segundo andar, apesar de estar em dia com meu corpo, acho que nunca fiquei tão exposto quanto nesse momento, nunca subi uma escada nu diante de uma mulher.

— Você tem um belo traseiro. — ela diz sorrindo e se deitando no sofá branco que destaca seu bronzeado.

— Fiquei com medo que não reparasse. — respondo sorrindo com certa vergonha e alcanço o segundo andar.

Predominantemente azul claro, uma paz, um cheiro de planta e uma decoração impecável. Uma mistura de casa de boneca e arquitetura contemporânea. Um tapete alto envolve uma mesa redonda e duas poltronas em um tom de azul céu, da mesma cor que as paredes. Ao lado uma área de luz e muitas plantas, um jardim vertical que adorna a parede e tem um cheiro agradável de flor de laranjeira.

Vou até o banheiro e me livro da camisinha. O banheiro desse andar é azul também e tem uma placa divertida na porta: Verifique se esse é o caminho! Com letras bagunçadas e parece ser um lugar onde ela recebe visitas, será que ela recebe muitas visitas? Lavo minha mão e alcanço uma toalha e a coloco em torno de minha cintura. Estou com vergonha dela? De andar nu na frente dela? Pergunto-me internamente estranhando a reação, geralmente gosto de desfilar meu físico e nunca tive problema com isso, mas me senti encabulado por algum motivo. O telefone da casa está tocando.

Desço a escada e observo um porta retrato na parede, é ela e provavelmente os pais dela. Continuo descendo e ela não está no sofá, ela está discutindo com alguém por telefone.

— É a minha vida, não a sua! — ela esta furiosa — Não me interessa, não tenho nada para falar com você! — ela está com uma das mãos sobre o balcão e aperta, como se quisesse quebrar o tampo de madeira. Observo tudo da escada e paro de descer, ela já vestiu a camisola e a calcinha. — Não tenho medo de você, não tenho medo das suas ameaças e pouco me importo se o seu pai é candidato ao senado ou se é um vendedor ambulante, não tenho medo desse tipo de carteirada. — ela explode — Foda-se, Otto! Acabou e suas ameaças só provam o quanto você é um mimado inescrupuloso! — ela mantém a raiva nas palavras — Depois de tudo que nós passamos? Ora, fui eu quem aguentou sua ira, porque você e sua família estavam de luto, mas eu também estava e ninguém se importou! — algo saiu do controle dela, a vejo chorando e nunca imaginei que ela chorasse, sempre se mostrou uma fortaleza.

Ela grita mais e algo me incomoda, e talvez seja o fato de eu estar vendo-a triste. De que luto ela está falando?

— Me esqueça! Não me arrependo de ter acertado a sua cara! Faria de novo e eu vou desligar, não me ligue mais. Você passou a semana toda tentando fazer da minha vida um inferno, chega! — ela desliga e arremessa o telefone contra a parede. Eu desço e a vejo com as mãos no rosto, chorando compulsivamente.

Desço e vou ao seu encontro, não me sinto bem em vê-la chorar. A abraço e ela segura minha cintura, apoiando seu rosto molhado em meu peito.

— Shhhh. — a abraço mais forte. — Calma, vai ficar tudo bem. — falo e a levo para o sofá, a colocando em meu colo, não quero vê-la assim.

Ela soluça por mais alguns minutos e eu fico em silêncio, apenas acariciando seus cabelos e beijando o topo de sua cabeça. O tempo passa e ela está em silêncio total e absoluto. Me levanto com ela em meu colo e a levo para o seu quarto, deduzindo que seja no último andar da casa, ensaiei um texto para estar com ela como estou agora, mas não nessas circunstâncias.

Chego no último andar e olho ao meu redor, duas portas, uma aberta que mostra uma cama de casal gigante e a outra semi fechada que parece ser um outro quarto, mas está escuro e não dá para ver. Caminho em direção a cama e a deito. O quarto é grande, mas não colossal e aqui mescla um tom de cinza claro e um rosa bem claro e suave, tem o cheiro dela.

Me deito ao seu lado e a coloco sobre meu peito, a abraçando e beijando seu cenho. Acaricio seu braço e sinto o momento em que ela suspira e minutos depois ela dorme, profundamente.


9

 


Christen

 

 


Não é a medida de tempo que conhecemos que faz tudo simplesmente melhorar, ou piorar. Não é o tempo que faz as coisas se tornarem menos amargas do que são. O tempo não tem poder de mudar o sabor de absolutamente nada, ele apenas consegue a façanha de manter em um lugar coerente as coisas que de alguma forma fizeram parte de nossa jornada. O passado pode ser um guarda-volumes ou um templo de sabedoria.

Acordo com uma dor de cabeça terrível, a chuva piorou e o relógio anuncia que são quase treze horas. Acredito que ele tenha ido embora, homens não gostam de mulheres que se despedaçam em lágrimas, mas eu não sou do tipo chorona, sou do tipo que dá soco e desce do salto se for preciso. Mas, existe uma única razão pela qual eu choro e essa é difícil de esquecer, ela está comigo, o tempo todo.

Vou até o banheiro e tento colocar um pouco de vigor no rosto, escovo meus dentes e ajeito meu cabelo bagunçado. A chuva despenca sem trégua e eu desço para a cozinha. Mas antes de chegar, sinto o cheiro de comida, meu estômago ronca apenas por sentir o aroma. Ouço uma música, bem baixinho, é do repertório do meu iPod. Sky Full of Stars, do Coldplay.


“Eu não me importo

Vá em frente e me magoe

Eu não me importo se você o fizer

Porque em um céu, um céu cheio de estrelas

Eu acho que te vi”


Desço rapidamente e eu o vejo, ele está olhando a tela do seu celular, mas está sério. Ele vestiu o jeans e a camiseta, me aproximo e o vejo descalço, ele tem pés bonitos e eu não havia reparado. Ele colocou o guardanapo sobre seu ombro direito.

— O cheiro me acordou! Está pronto? — pergunto com alegria por vê-lo em meu território e confesso ter ficado triste ao pensar que ele pudesse ter ido embora. Gosto da companhia dele.

— Ainda não. — ele sorri e me beija rapidamente. — Acordei há pouco tempo, então, temos mais alguns minutos até que tudo fique pronto. — ele diz e me senta sobre o balcão.

— Mas o que é? O cheiro é convidativo e aguça. — digo e tento olhar por cima das panelas escaldantes, o forno está ligado.

— Não seja curiosa, é uma surpresa. — ele se aproxima e se encaixa entre minhas pernas. — Você tem um belo jardim ali. — ele aponta para a porta da cozinha que mostra um jardim pequeno, mas aconchegante.

— Quando eu comprei essa casa eu disse que iria morar aqui, claro que por conta dos elevadores eu prefiro escadas e, enfim, mas foi por conta desse jardim, ele estava tão maltratado e eu mesma vinha aqui e cuidava, era meu alívio diário. Depois de um tempo, fui deixando a casa com a minha cara e hoje estou satisfeita, é pequena e confortável. — eu olho ao redor e ele está me encarando.

— Gostei da decoração e foi muito criativa em fazer o jardim no segundo andar. Quando descobri quem você era, imaginei aquelas casa com mil empregados e uma piscina gigantesca. — ele ri e mexe em meu cabelo.

— Deus me livre! Primeiro, eu não sei nadar! — dou risada da minha própria limitação. — E segundo, mantenho apenas uma empregada que percorre minhas propriedades e vem aqui duas vezes por semana e um domingo no mês, não gosto de gente me bajulando o tempo todo. Quando ela está aqui facilita minha vida, mas quando não está eu me viro muito bem. — digo e mexo na manga de sua camiseta. Ele tem um braço definido, grande e musculoso. É bom de por a mão.

— Percebi sua habilidade ao lavar a louça outro dia. — ele beija minha testa.

— O maior erro das pessoas é imaginar que o dinheiro nos torna anormais, que deixamos de ser humanos ou que com a fortuna adquirimos poderes especiais. — dou risada pelo que vou falar. — Sou humana, tenho uma TPM desproporcional, sinto dor de barriga, evito falar com as pessoas pela manhã antes de escovar os dentes e sei lavar a minha roupa, tudo normal. Eu lembro quando ainda estava no colegial e meu pai insistia para eu ir e voltar com o motorista e meu sonho era andar naqueles ônibus amarelos junto com os outros estudantes, até que um dia eu fugi do motorista e voltei no bendito ônibus. — dou risada dessa época feliz.

— Imagino o desespero do motorista. — ele sorri e olho de perto o sorriso dele, é bonito e ele tem uma linha perfeita do maxilar.

— Desespero? O ônibus deu uma volta homérica e só cheguei em casa depois de horas, porque eu nem me preocupei com o itinerário dele. Fui parar no sentido oposto de minha casa na época e voltei a pé, quando eu virei a esquina tinha duas viaturas da polícia e minha mãe estava desesperada com algumas fotos minhas nas mãos. — nego com a cabeça e sorrio ao lembrar do meu pai vindo em minha direção e me abraçando. Ele não ficou bravo, ele ficou feliz em me ver bem. Foi uma época boa e agora está onde chamo de templo de sabedoria, às vezes se torna um guarda-volumes, mas só às vezes.

— Imagino a preocupação, afinal, vocês são ricos e imagino que desde sempre, poderia ter sido sequestrada. — ele diz e mexe nos caracóis dos meus cabelos.

— Sabe que sempre quis me misturar, nunca gostei de ser destaque em nada, evitava roupas de marca e andava com os menos afortunados, e mesmo as pessoas sabendo quem eu era, elas não me evitavam ou me tratavam com bajulação. Eu queria ser como eles, eu queria estar com eles e meu dinheiro se tornou um detalhe que muitas vezes foi dispensável em minha vida, eu não dependia dele para fazer amigos. — digo e ele me olha com encantamento, como se estivesse hipnotizado pela minha história, como se fosse importante para ele.

— Sua visão sobre o dinheiro mudou? — ele pergunta e eu sei que ele se refere a minha posição dentro da Madson.

— Não, não mudou, as pessoas não mudam, elas se adaptam a uma nova realidade, a minha realidade era aprender a preservar o dinheiro da família em um primeiro momento e depois multiplicá-lo. — mexo na gola em V de sua camiseta. — Quando comecei a trabalhar na Madson eu era apenas uma auxiliar e fazia questão de almoçar no refeitório com os outros funcionários, isso me fez ver a realidade deles e me adaptar a ela. O tempo passou e naturalmente fui conquistando meu espaço e ainda hoje, sempre que posso, me junto aos funcionários da produção na hora do almoço, essa acessibilidade deles comigo me deixa informada e eles trabalham satisfeitos.

— Se a sua intenção era me impressionar, saiba que conseguiu. — ele diz com olhos espantados e eu sorrio.

— Você eu impressionei, mas meu pai..., para o meu pai isso era uma afronta. Eu por diversas vezes concedi aos funcionários da Madson aumentos fora de época, claro que havia meu interesse, e meu interesse era cumprir prazos e ter gente feliz trabalhando comigo, e é essa frase que uso sempre, eles trabalham comigo e não para mim. — digo e mexo em seu cabelo bem cortado, ele é de um castanho bonito e fica de lado involuntariamente.

— Talvez ele venha de uma época em que funcionários e patrões fossem separados por um abismo e ao ver a filha revolucionando tudo isso se sentiu ameaçado. — ele diz e eu massageio seus dedos e beijo seus nós.

— Talvez. — eu digo e uma sombra triste passa por mim. — Eu sempre estou aquém das expectativas dele, sempre faço algo que o decepciona e por mais que obtenha sucesso, ele vai olhar onde foi que eu falhei e, por incrível que pareça, tenho a sensação de que sempre falho. — assim que falo ele beija a minha boca.

— Apenas insegurança em saber que possivelmente ele não teria o mesmo êxito que você. — ele tenta me consolar e parcialmente ele consegue.

— Escute, me desculpa pelos gritos um pouco antes, não sou assim. Bom, eu sou explosiva, mas não é uma situação constante em minha vida e eu lamento por ter feito você presenciar uma discussão idiota. — eu falo e ele sai do meio das minhas pernas, vai até o fogão e apaga o fogo sob as panelas. Ele volta, me pega e me leva para o sofá. Obviamente isso é uma tarefa fácil para ele, ele é forte, alto e eu não sou um chumbo, pelo menos não estou na época do mês em que me sinto assim.

Ele senta ao meu lado e apoia os braços sobre os joelhos, cruzo as pernas sobre o sofá e espero ele revirar os próprios dedos.

— Christen, seu ex-noivo está te ameaçando? — ele pergunta com uma linha séria e extensa em seu cenho e seus olhos estão diretamente nos meus, intimidador o suficiente para me fazer pensar antes de responder.

— Coisa sem importância. — respondo e ele olha para os dedos.

— Nenhuma ameaça pode ser considerada sem importância, e se torna pior caso ela se torne um fato. Quero que você registre uma ocorrência contra ele. — ele diz em tom autoritário e eu não estou acostumada com ordens ou coisas nesse sentido.

— Ele ameaça, mas não faz nada e outra coisa, está me dando uma ordem? — pergunto cruzando os braços e o encarando com as sobrancelhas amontoadas.

— Bom, você não sabe se ele é capaz ou não de fazer, até porque acredito que essa tenha sido a primeira vez que você acerta o nariz dele e mete o pé no traseiro dele com direito a tabloides noticiando o nocaute. Quanto ao PEDIDO que estou IMPONDO que faça, considere um favor que esteja fazendo para mim. — ele não deveria falar assim, as coisas se movimentam de forma estranha aqui dentro ao ver esse tipo de preocupação comigo. Geralmente sou a que ataco e não a atacada, então, nunca precisei de proteção. Também se precisei eu não reparei, estava mais preocupada em seguir adiante.

— Um favor para você? — pergunto estranhando a posição que ele mesmo se colocou diante de tudo isso.

— Sim, um favor. — ele diz e me olha analisando meu rosto.

— Poderia me explicar como isso se enquadra em um favor para você? — pergunto sorrindo, pois chega a ser engraçado a maneira como ele coloca a situação.

— Com uma ocorrência registrada contra ele, vai ao menos colocar um determinado limite, não vai estar protegida porque quando alguém quer, faz. Mas, ao menos vai fazer com que ele pense duas vezes e não me obrigue a pisar na cara dele uma dúzia de vezes. — mesmo ameaçando esmagar o focinho do meu ex-noivo ele chega a ser encantador, de maneira agressiva, mas totalmente encantador.

— Esmagaria ele assim, como se ele fosse uma barata? — zombo e tento aliviar o clima, o rosto dele está duro e sério.

— Não, pela barata haveria compaixão. — ele pisca um dos olhos e se levanta. — Vem, vamos almoçar. — ele me puxa e antes que caminhemos até a cozinha ele me beija, intensamente, circulando minha língua e mordendo meu lábio inferior.

Obviamente eu deveria estar pensando em cultivar minha vida de solteira junto com minhas plantas, acabei de ganhar um belo chifre e acredito que não tenha sido um caso isolado, mas eu não estou em um relacionamento sério, é apenas sexo e algumas refeições entre uma foda e outra.

Tenho quase trinta anos e já passei da idade de ficar ponderando ou fazendo o típico e irritante charme das garotas de vinte anos. Porra, ele disse que queria distância e voltou atrás, por que a essa altura do campeonato eu iria fazer graça? Pensei na porra desse ex-desconhecido a semana toda, nunca me masturbei tanto em toda a minha vida e, então, ele surge como um sopro aquecido nesse domingo frio e de chuva intensa.

Existe química entre nós e a física se torna ainda melhor. Não existe promessas, é apenas um querendo ficar perto do outro, não existe namoro, nenhum compromisso efetivo, existe apenas o tempo que queremos ficar juntos, ponto.

Não sou o tipo de mulher que cairia na esbornia e viveria “La Vida Louca”, eu me afundaria no trabalho e passaria horas exaustivas ao lado de Rocco e, enfim, chegaria aos quarenta anos lamentando o fato de não ter aberto a porta para ele nesse domingo.

Fodam-se os padrões rigorosos de conquista! Se eles existem não são funcionais, e eu sou a prova consistente e boxeadora disso. Gosto da agressividade dele, da pele na cor certa e macia, gosto de suas mãos e seus dedos, gosto de tudo que ele faz comigo. Ora! Passei a merda de sete anos com um cara que poucas vezes colocou a boca em mim e quando o fez, fez um serviço bem inferior ao dele.

Não estou aqui beijando a boca dele e pensando em nossa vida bem velhinhos e alimentando pombos em uma praça qualquer de Nova York. Estou aqui beijando-o e me sentindo absurdamente viva, como há muito tempo não sentia.

— Você comentou algo sobre férias. — ele disse com a boca na minha e isso treme alguns pontos doloridos. — Férias na praia, sem celular, você acha que consegue? — ele pergunta.

— Por quê?

— É muito difícil para mulheres responderem uma simples pergunta sem responder com outra pergunta? — ele sorri e nega com a cabeça. Acho que gosto mais dele assim, perto e sorrindo.

— Você acha isso? — respondo de novo com outra pergunta e ele cerra os olhos em minha direção. Gargalho e ele me aperta contra ele. — Eu consigo se você me der um bom motivo para esse remanejamento repentino em minha agenda.

— Tenho uma casa em Malibu, e férias é algo que estou almejando há algum tempo. — ele diz e me leva até a cozinha, enquanto ele remexe nas panelas fazendo o vapor de aroma saboroso ganhar minha casa, eu arrumo a mesa.

— Você não parece cansado. — brinco falando palavras carregadas das piores intenções desse mundo, ele parece bem disposto aliás.

Ele ri negando com a cabeça e ele deve ter consciência de sua beleza, claro que tem. Ele tem um nariz bonito e homens com nariz bonito são de suspirar, fino e faz um desenho tão simétrico com suas sobrancelhas, sem mencionar seu maxilar que é de um quadrado estúpido de tão bem desenhado. Latino gostoso pra cacete.

— Do que você está rindo? — pergunto e coloco os garfos ao lado dos pratos.

— De você, estamos apenas nós dois aqui e eu não poderia estar rindo da sua samambaia. — ele zomba. É bom estar perto de gente que nos faz rir sem grandes pretensões. Ele alcança os talheres para nos servir.

— Tudo bem, meu sonho sempre foi trabalhar no circo. — brinco com ele.

— Bom, devo alertá-la que não ficaria desempregada. — ele gargalha e eu olho séria para ele e ele para.

— Faria sexo com uma garota do circo? — cruzo os braços e o encaro.

— Se ela for você, sim. — ele responde sério e eu abro um sorriso. Algumas coisas nos fazem bem sem motivo, apenas fazem.

— Ok, me deixou sem jeito. — ele se aproxima com as panelas e nos serve. — Mas, sobre Malibu, quando seria? Tenho uma agenda cretina que me entope. — comento e alcanço os copos, servindo suco em seguida.

— No próximo final de semana, sexta-feira saímos e no domingo estamos de volta. — ele diz e se senta e eu me sento de frente a ele. — Posso fretar um jato, sempre o faço, prefiro a ter que manter um brinquedinho caro desses. — ele leva o garfo até a boca dele e se pelo menos tivesse mau hálito, mas não, ele tem uma boca gostosa e ainda estou procurando algo nele que não seja suculento e macio.

— Podemos ir com o meu, você empresta a casa e eu o meio de transporte. — digo e levo o garfo até a boca. Ele me olha estranhando e faz uma cara de surpresa.

— Podem pensar que estou lhe aplicando um golpe, geralmente as mulheres não me dão nada em troca. — ele diz.

— Tem certeza? — suspendo uma das minhas sobrancelhas e encaro Ramon que fica sem jeito. Isso mesmo, meu caro, você entra com sua beleza e dinheiro e obtém sexo. Que mulher nesse mundo recusaria trepar com um cara que tem porte de um jogador de rugby e rosto de Hollywood? Odeio falso moralismo, dizer que só porque ele é lindo e gostoso não quer dizer que pegue todas, pega sim, e para ajudar é educado e tem dinheiro. Comeria quem ele quisesse e estou feliz dele ser nesse momento o homem que me fornece refeições bem vantajosas.

— Mas eu acredito que seja essa sua intenção, afinal, você não tem onde cair morto. Possivelmente o proprietário daquela espelunca que você mora deve estar lhe cobrando o aluguel e sua imagem não nega que você passa por sérias dificuldades financeiras e que as abotoaduras da MontBlanc que estava usando na noite em que nos vimos mas não fomos apresentados deve ser de algum coitado recém assaltado e você as comprou no mercado negro. — zombo e ele joga a cabeça para trás rindo. — Não me importo com o que dizem, o que os outros falam e pensam é problema deles e não meu. — bebo um gole de suco.

— Você deveria ser um pouco insuportável, fazer aquelas cenas e perguntas horríveis sobre o meu passado, deveria falar mal da comida, dizer que o filé ao molho madeira não está combinando com o arroz branco e ervas e que a salada está mal temperada. — ele diz apoiando um braço sobre o outro e me encara. — Vamos, pare com essa Christen legal que me obrigou a enfiar o orgulho em uma caixa qualquer e vir até aqui e seja a Christen que segue pelo menos algum padrão de irritação feminina. — ele dispara quase sério.

— É uma pena que você tenha, dentro do que eu vou provisoriamente chamar de relacionamentos, tantas mulheres iguais. Não sou perfeita, tenho para cada qualidade dez defeitos, para cada coisa boa uma porção ruim, isso todos têm, mas você não acha que meu dia a dia já é irritante o suficiente para eu disparar contra as pessoas esse tipo de detalhe sobre mim? O que lhe atraiu até aqui não foram minhas qualidades, o que lhe atraiu até aqui é que eu lhe tratei de maneira diferente, não quis saber nada sobre você, eu segui adiante e você resolveu vir até aqui, então, não me venha dizer que estou fazendo tipo. Eu convidei você para fazer sexo e nem o seu nome eu quis saber, deixei a conta paga e fui embora, possivelmente você já fez isso outras vezes, mas quando se toma uma dose do veneno dos outros tudo muda.

— Eu deveria colocar você em cima desse balcão e fazer sexo com você até essa sua malcriação e impertinência sumirem, mas talvez demore muito tempo e possivelmente nem aconteça. Você é direta e grossa de forma gentil, me usou naquela noite e eu confesso que seria uma questão de honra encontrar você novamente, ou para te atropelar ou para trepar com você. — ele está irritado.

— Ramon, algumas mulheres fazem uma volta muito grande, um charme desnecessário na hora da conquista, ser direta não é ser fácil, eu prefiro viver assim, sendo franca e direta, do que fingir algo que não sou. Fingir que não quero para você vir atrás, ora, quantos anos nós temos? Quinze? — sorrio e levo mais um garfo até a boca.

— Você me deixa sem reação e eu te odeio por isso. — ele diz.

— Olha que maravilha, começamos a ter sentimento um pelo outro, você me odeia e eu odeio não conseguir te odiar, somos uma fábrica de emoções! E o mais engraçado é que possivelmente você seria incapaz de ir embora agora. Talvez você volte para sua casa hoje, mas meu endereço e tudo que me cerca passou a ocupar um pedaço dentro de sua memória, assim como aconteceu comigo em relação a você. — a conversa está séria e eu gosto disso.

— Explique, como assim? Aconteceu com você? — ele pergunta com entusiasmo e eu gostaria muito de fazer birra e ser a mulherzinha perfeita, mas não consigo mais, existem perdas piores e desafios mais preciosos do que um jogo de gato e rato.

— Quando entrei em seu apartamento e observei a sala quadrada de piso marfim e um jogo de sofá vinho, logo observei sua organização e fiquei encantada com a foto de sua família na parede sobre o toca disco antigo, tenho quase certeza que é de família, o retrato e ele formam um conjunto bonito. As cortinas de sua sala é de um tipo de crepe, caro e não foi você quem as escolheu, marfim e verde, e se abrem para uma belíssima varanda. — bebo um gole de suco.— Depois o seu quarto, detalhes também em marfim e os lençóis e uma porção de toalhas lembram o orvalho; sua cor preferida é a verde, você não tem quadros na parede e não ostenta uma vida rica que faria jus ao seu dinheiro, sua comida predileta é carne branca e não toma leite. — disparo minhas observações e ele está com os lábios abertos.

— Como você fez isso? — ele pergunta e um dos lados de sua boca suspende denunciando um sorriso.

— Se eu lhe contar vou ter que lhe matar! — brinco e ele nega com a cabeça. — Passei boa parte da minha vida observando os funcionários da Madson; muitas vezes eles falavam algo mas seus olhos falavam outra coisa e, então, eu aprendi a observar as pessoas e o que as cerca. Tinha um funcionário que reclamava todos os dias, ele já estava na Madson há pelo menos cinco anos e eu estava lá há dois. Um dia, na hora do almoço, eu fui até o refeitório e fiz questão de sentar ao lado dele, ninguém queria, ele reclamava demais. Mas eu fui, peguei minha bandeja e sentei. Primeiro, ele disse que o arroz estava um pouco duro e depois, a salada estava murcha, então, eu percebi que nada do que ele estava falando era verdade, mas ele tinha perdido o amor pela vida; sua esposa havia deixado a casa e levado os dois filhos e naquele almoço a minha única frase foi: Vai ficar tudo bem! E coloquei a mão no ombro dele e ele desabafou.

— Chris. — ele diz e meu semblante fecha.

— Não me chame assim, eu odeio. — falo séria e ele se espanta.

— Tudo bem, não precisa ficar brava. — ele diz e levanta as palmas em sinal de rendição.

— Viu? Você está me achando legal porque é isso que está extraindo de mim, mas acredite, tem bastante coisa não tão legal por aqui. — levo o copo até a boca e em seguida outra garfada. — Quando algo me atrai eu observo tudo que está ao redor, isso é natural, querer saber o que gosta e as preferências, mas eu não podia chegar perguntando, eu estava lá para por um fim em algo que nem começou e eis você aqui, de novo e eu ainda não sei como vou me livrar de você. — sorrio e ele também.

— Estava pensando sobre isso. — ele diz.

— Sobre como eu posso me livrar de você? — brinco.

— Também, mas eu estava olhando a sua casa e aqui tudo indica uma vida feliz e sozinha. — ele diz sério — O que me trouxe até você realmente não foram suas qualidades, foi seu capricho incoerente, sua língua afiada e sua total falta de compaixão em relação a mim. Não tem ideia de como fiquei louco no domingo de manhã, me senti um garoto de programa. — ele diz.

— A intenção foi essa. — falo diretamente olhando em seus olhos.

— Está ouvindo o que está me dizendo?

— Claro, não sou surda, você gostaria que eu dissesse o quê? Vamos, Ramon, eu tirei você de uma boate e fiz sexo com você, nada mais justo eu pagar pelo serviço. — mantenho a seriedade e ele está se contendo.

— Você está falando sério? — ele espalma as duas mãos, uma de cada lado do prato e me encara.

— Vai me bater? — pergunto.

— Deveria!

— Eu não estou falando sério, eu apenas fui gentil, e você estava a pé, pensei que pudesse dormir até tarde. Então, deixei as refeições e sua hospedagem pagas, apenas uma gentileza. — sorrio e ele se perde dentro dos próprios pensamentos.

— Não gostei de ser tratado assim. — ele diz e termina a refeição.

— Talvez seja por isso que agora esteja aqui, tudo tem um motivo. — termino a refeição e começo a remover os pratos e talheres da mesa.

— Acho que foi sua ousadia, seu desacato, não sei. — ele diz e me abraça por trás enquanto ajeito a louça que vou lavar. — Posso saber sobre essa sua tatuagem atrás da orelha? Uma estrela. — ele diz e coloca a mão em meu pescoço. — Com uma letra G dentro. — ele diz.

— A pessoa que me mantém viva e realista. — falo, quase como um sopro. Ele me vira de frente para ele e acaricia meu rosto.

— Tudo bem, mas estou aqui. — ele diz e percebe que não quero falar do que se trata. Lembro da noite em que o acidente aconteceu.

Eu havia discutido com Otto o dia todo, ele precisava se afastar das drogas e da bebida, ele estava arruinando o patrimônio da família e seu irmão me ajudava nessa luta, queríamos interná-lo mas ele não aceitava.

Saímos da casa dos meus pais e minha mãe veio ao meu encontro, me chamando, e eu olhei para trás e ela correu e me abraçou.

— Você está linda, minha filha! — ela disse colocando a mão sobre a minha barriga. Ela estava relativamente grande, quase sete meses e o bebê era saudável, estava grande e acima do peso.

— Obrigada, mãe! Logo Gabriel vai estar aqui! — a abracei e Otto me chamou bruscamente. Não estava morando com ele e nessa época mesmo grávida eu queria deixá-lo, mas ele implorava e eu cedia e eu não deveria ter entrado no carro, mas eu entrei e fomos para uma festa.

O irmão dele ligou e pediu uma carona e era caminho, não custava nada e Otto insistia em dizer que eu tinha um caso com Helton, mas não tinha, eu o amava como amigo. Minutos depois estávamos na festa e Otto bebeu demais e o irmão também, eu insisti para dirigir e ele me enfiou no carro e partiu.

Menos de dez minutos depois eu, que era a única com cinto de segurança estava presa no carro, Otto saiu pela janela da frente e Helton foi arremessado pelo vidro lateral e com a queda quebrou o pescoço.

Otto ficou três meses internado, o primeiro mês em coma induzido. Helton foi sepultado uma semana depois e eu fiquei vinte dias no hospital, saí apenas alguns dias depois na cadeira de rodas para o sepultamento do meu filho e voltei para o hospital.

Depois disso, Otto nunca mais bebeu ou usou drogas. Nós até que ficamos bem durante um tempo, mas fui diversas vezes culpada pelo morte do irmão, porque eu havia insistido para dar a carona. Com o tempo tudo ficou estranho e eu arrastei isso por mais alguns anos.

— Obrigada. — digo para Ramon. Voltando dos pensamentos e uma lágrima desequilibra e rola pelo meu rosto. — Mas não quero falar sobre isso. — falo e volto a lavar a louça.

— Então não fale, mas também não lave a louça, por favor. Escolha a trilha sonora, hoje sou seu escravo, cozinho, lavo e se quiser aceito ser obrigado a praticar sexo com você. — ele sela minha boca.

— Sabe que prefiro você a Sue. — dou risada e ele sorri também.

— Fico realmente aliviado em ouvir isso. Sue parece ser um pouco brava. — ele comenta.

— Ela é, e não brinque com ela, ela é faixa preta em karatê. — ele olha assustado.

— Mentira. — ele afirma.

— É verdade! Ela é brava e quebra narizes melhor do que eu. — digo e ele está espantado.

— Obrigado pelo aviso, vou evitá-la. — ele zomba.

— Mas, e sobre Malibu, aceita minha carona até sua casa de veraneio? — faço piada e vou até o iPod escolher uma trilha sonora adequada para um escravo tatuado e sexy trabalhar.

Olho as opções e deixo Bruno Mars rolando com Treasure e a batida me faz andar ensaiando uma dança despropositada e eu me sento no balcão olhando o belo homem trabalhando para mim.

— Bom, eu vou pensar na carona. — ele diz e vem em minha direção e beija minha boca de repente. — Sexta-feira saímos às oito da noite. Antes disso eu não posso, tenho uma reunião. — ele diz e volta para a pia e lava os pratos. Ele seria um tipo de empregado que eu gostaria de ter por perto por um longo tempo.

— Perfeito. Na outra semana vou para Londres, tenho um compromisso por lá. — digo e ele para por alguns instantes e em seguida me olha.

— Trabalho? — ele pergunta.

— Não, um encontro. — zombo e balanço minhas pernas. Ele sorri e nega com a cabeça.

— Tudo bem, espero apenas que não fique pensando em mim dentro de você quando estiver com ele. — ele se vangloria e ri.

— Fique tranquilo, vou tentar. — ele termina, enxuga as mãos, coloca o guardanapo de pano sobre o ombro e se encaixa entre minhas pernas. Ele me beija, suave e desliza as mãos pelos meus braços.


“Você é tudo que eu vejo em meus sonhos

Eu não teria dito isso para você se não fosse verdade” - Treasure, Bruno Mars.


10

 

Ramon

 


Acho que é verdade

Não sou bom em casos de uma noite só

Mas eu ainda preciso de amor

Pois sou apenas um homem

— Stay With Me — Sam Smith

 


A música chega baixo em meu quarto, é Moh fazendo sua faxina e usando meu iPod. Pela escolha ela desistiu de tentar entender o aparelho e escolheu a música de forma aleatória.

Meu celular anuncia uma mensagem, é manhã de sexta-feira e essa semana passou com a velocidade de uma tartaruga carregando uma javali. Não a vejo desde a noite de domingo quando a deixei dormindo depois de fazer um tipo ousado de sexo para mim, sem puxões de cabelo, sem aberturas extravagantes ou posições desafiadoras. Acredito que tenha sido o sexo mais calmo que fiz em toda a minha vida.

Nos comunicamos por e-mail e algumas mensagens via sms ou Whattsap. Não nego que tive muita vontade de pegar meu carro e ir até ela, mas combinamos e aceitamos o total sigilo sobre isso e os compromissos durante a semana me fizeram esperar, o que torna tudo mais gostoso, sexy e enlouquecedor.

“Suas putas, olha o que encontrei”, Benjamin encaminha uma mensagem e uma foto de sua encomenda. Linda, uma morena de fazer qualquer pau bater continência. Olho a foto por alguns instantes e analiso que faltam apenas duas semanas e que não tenho ideia de onde procurar essa solicitação. Penso com certo desdém sobre essa causa, mas semana que vem resolvo isso.

Meu celular anuncia um e-mail, é de Anna.

Ela avisa que os documentos da reunião de Seattle chegaram e que eu poderia ficar tranquilo, pois o investimento havia sido aprovado. Respondo agradecendo e depois de um longo banho escolho um terno cinza escuro, camisa branca e gravata em um tom de verde bem intenso.

Alcanço meus pertences e aviso Moh sobre a viagem e peço que ela arrume uma pequena bagagem e que eu passo para retirar antes de seguir para Malibu. Tenho tantos compromissos nessa manhã que eu não tenho ideia a que horas vão acabar. Vão acabar a tempo de eu conseguir viajar para Malibu.

Alguns minutos depois chego no escritório da Korck e sou recebido por uma avalanche de recados e assuntos urgentes e imediatos que precisam ser resolvidos. Me perco dentro dessa confusão profissional e quando olho no relógio são quase onze horas e eu nem abri meus e-mails.

O telefone toca incessantemente e em determinado momento me levanto e olho pela janela. O escritório da Korck fica em um edifício empresarial próximo a Wall Street, ocupa apenas dois andares, a indústria é mais distante. Já havia retirado o paletó e agora afrouxo a gravata e desabotoo o botão do colarinho.

Anna avisa por telefone que os documentos que eu estava esperando de Vancouver já estão no meu e-mail e eu abro a caixa de entrada. Mas eu não abro o que me cabe profissionalmente, eu clico sobre a mensagem dela... Christen...


De: Christen Madson

Para: Ramon Avellar

Assunto: Carona

Hora: 11:27


Bom dia, Sr Avellar,

Ainda vai precisar da minha carona? :)


Bj


Christen Madson — CEO — Madson Corporation®

 

***

 

Minha calça se ajusta em meu quadril e é tão excitante saber que estou fodendo uma CEO. Gostosa e inteligente, devo ter morrido e por algum descuido fui parar no céu. Respondo a mensagem.

 

***

 


De: Ramon Avellar

Para: Christen Madson

Assunto: Carona

Hora: 11:30


Excelente dia, Srtª Madson

Caso haja um lugar, humildemente aceito sua carona e serei grato pela gentileza.

(Preciso beijar as suas bocas)


Ramon Avellar — Diretor Corporativo Korck Farmeceutics®


***

 

Envio a mensagem e meu telefone toca, é de Seattle e acertamos alguns detalhes antes do fechamento. Outras ligações surgiram e as horas passam como um relâmpago e falta apenas uma hora para a reunião.

Antes de sair para tentar comer algo em tempo recorde, atualizo meus e-mails e tem uma resposta da Srtª Madson. Meu pau ainda não aprendeu nada sobre distância e geografia.

 

***

 

De: Christen Madson

Para: Ramon Avellar

Assunto: Carona

Hora: 11:49


Tem um lugar no compartimento de bagagens! ;)

(Ansiosa pela sua boca)


Christen Madson — CEO — Madson Corporation®

 

***

 

— Atrevida! — falo alto e sorrio para a tela do meu Macbook. Respondo.

 

***

 

De: Ramon Avellar

Para: Christen Madson

Assunto: Carona

Hora: 14:39


Srtª Madson,

Teria coragem de fazer isso comigo?

(Uma determinada e primordial parte do meu corpo não entende que estamos longe e insiste em lhe chamar)


Ramon Avellar — Diretor Corporativo Korck Farmeceutics®


***

 

Minutos depois chega a resposta dela e eu tenho que ir para a bendita reunião, mas prefiro ler antes de sair.

 


***

 

De: Christen Madson

Para: Ramon Avellar

Assunto: Carona

Hora: 14:57


Tenho algumas coragens absurdas, acredite. Boa parte delas estão direcionadas CONTRA você. Fique grato por isso.

(Idem)


Christen Madson — CEO — Madson Corporation®


***


Filha da puta, ousada! Não respondo, estou com pressa e sigo para minha reunião. Alcanço os papéis e o note e sigo, preciso esquecer por alguns instantes a Srtª Madson, caso contrário corro o risco de falar de sexo sobre a mesa de reunião e hoje a pauta não é sobre comprimidos de ordem sexual.

 


***

 


Saio da reunião e olho no relógio, quase dezoito horas. Tenho pressa e saio da Korck em menos de vinte minutos. Meu celular avisa sobre uma mensagem, é ela via Whattsap.

*Nos encontramos às dezenove horas no JFK* — C&M — 17:48

Sorrio novamente e acelero em direção a minha casa, no caminho aviso Moh para descer minha bagagem, tenho pressa.

De repente me vejo com pressa de encontrar uma mulher que poderia nem estar me esperando se não fosse sua atitude incabível de me tratar como um garoto de programa, um dos mais baratos.

Paro na portaria e vejo Moh com minha pequena bagagem. Me despeço e saio, não posso me atrasar, meu pau não me perdoaria caso eu perca essa carona.

Estaciono e vou em direção ao portão onde marcamos. Estou ansioso para vê-la, um sorriso estapafúrdio surge em meu rosto quando penso nela e na sua boca audaciosa, malcriada e penso como será sem ela. Porque um dia tudo isso vai acabar, ela vai continuar por aí em sua roupa de executiva e espero que não arrume confusão, eu posso não estar por perto.

Mas o mundo terá Christen Madson, com seu caminhar triunfante, mesmo descalça e de camisola, porque ela é toda sensual, mesmo socando ex-noivos malditos. Ela foge dos padrões, suas curvas, seu cabelo cor de madeira, com brilho e cheiro de algo bem doce, sua boca bem desenhada que ela insiste em abrir e me agredir da melhor forma possível.

O mundo terá uma Chris, que não gosta de ser chamada assim e também não gosta de elevadores e que detesta chorar. Ela é toda envolvida com plantas e cores claras; ela perdeu alguma coisa, mas continua soberana. O mundo precisa de Christen Madson, a mulher que entende o mundo ao redor das pessoas, que desvia de sua fortuna e escolhe um afago, que mesmo podendo ser arrogante e estúpida, é gentil com desconhecidos em manhãs anônimas de domingo, e ela mesmo não precisando e possivelmente não me querendo, abriu sua casa para mim, em um domingo frio e chuvoso.

Sim, ela é todo o meu pensamento, desde o momento em que me usou até agora, porque eu vejo um sexo perfeito nela, mas vejo uma menina que gosta de colo e boa conversa. Acho que o mundo não merece Christen Madson, não porque ele seja menos ou inferior a ela, mas é porque eu não gostaria de pensar nela em algum lugar que não fosse comigo.

Então, ela vem ao meu encontro e mantém tanta discrição, ela está linda, mesmo de jeans e camisa fina branca, ela caminha ao meu lado com um salto alto, verde. Ela escolheu o verde, ela não deveria fazer nada para o meu agrado, ela deveria se tornar repulsiva e nojenta e não esboçar um sorriso carregado de coisas boas.

— Oi. — ela disse e olhou para o meu terno e negou com a cabeça. — A última vez que lhe vi assim me salvou de um soco. — ela diz caminhando ao meu lado em direção a sala de embarque reservada. Ela digita no celular e mantém uma distância razoável e eu não gosto.

— Peço por gentileza que não soque nenhum nariz hoje. — digo e ela vira seu rosto lentamente e sorri. Seus cabelos soltos em caracóis perfeitos se movimentam e dão vida ao rosto sem maquiagem e de pele perfeita e amendoada. Ela tem lábios em tom de cereja e seus olhos lembram um intenso chocolate. Sobre a sua sobrancelha direita uma pinta, pequena, e tudo forma um conjunto harmonioso de se olhar. Onde esteve essa mulher que só agora surge em forma de bálsamo em minha vida? E por que estou pensando nela como se ela fosse minha?

— Não está em meus planos quebrar narizes e contar com desconhecidos para um salvamento de urgência. — mesmo zombando ela é inteligente e seu perfume atingiu meu cérebro, o mesmo perfume da noite em que nos conhecemos.

— Fico aliviado, por baixo dessa roupa não existe nenhum uniforme de alguma liga heróica. — sorrio para ela e nossos olhares se perdem e se confundem. Ela deveria mexer comigo apenas em uma região, mais que isso, corro sérios riscos.

Chegamos até a sala e temos que aguardar, estamos adiantados. Eu me sento e coloco minha bagagem na minha frente. Meu celular avisa sobre algumas mensagens e ela se senta ao meu lado.

— Desculpe, mas eu tenho que responder esses e-mails, eles são de Tokio e o fuso horário me atrapalha às vezes. — ela se explica e digita, incansavelmente.

— Fique à vontade. — digo e vejo o meu celular. Inferno! São os putos disparando as fotos de suas encomendas e eu não estou em um momento bom para analisar o traseiro dessas mulheres.

Ela está concentrada na tela, suas mãos tão pequenas digitam rapidamente. Não subestime essa mão direita e delicada, ela quebra um nariz como se quebra um ovo.

— Pronto. — ela diz e me olha. — Desculpe, geralmente não faço isso, mas essa semana fechei um acordo e passei boa parte das madrugadas conversando com eles. — ela vira o corpo todo em minha direção e eu senti saudade dela, do cheiro e desse sorriso que está em minha direção. Senti falta do sexo também, mas prestei sinceras e enaltecidas homenagens a ela, uma delas foi recusar Jane, de novo. Não consegui, não quis e preferi assistir os Três Patetas.

— Oi, Srtª Madson, como foi a sua semana? — pergunto baixinho e estou com muita vontade de morder essa boca que dança na minha frente, vontade de sentir essa língua. Minha calça deveria ser um número maior, isso já evitaria uma situação constrangedora caso eu tenha que levantar.

— Oi, Sr Avellar, minha semana passou lentamente e dolorosamente atarefada e tive a sensação de que essa semana teve pelo menos trinta dias, e a sua? — ela sentiu o peso do tempo que não passava assim como eu, e as coisas não deveriam tomar esse rumo.

— Apenas trinta? Até onde contei quase se foi um ano desde o nosso domingo juntos e tirando a vontade que estou de você, o restante não teve tanta importância. — ela mostra dentes brancos e felizes e retribuo, mesmo sabendo dos riscos, mesmo sendo dois putos à base do sigilo, eu estou feliz por ela estar aqui.

— Estou com vontade de você também. — ela diz e olha para os dedos com unhas claras. — Mais do que deveria e menos do que sou capaz. — a última frase saiu como um murmúrio e eu sorri, mesmo ela não olhando para mim.

Ela não veste uma fantasia de dama ofendida ou de princesa a ser conquistada, ela é isso, um nervo exposto e real. Não passa vontade para obedecer uma ditadura sobre como se comportar. Ela não sai trepando por aí, ela tem uma história, assim como eu tenho a minha.

E mesmo que essas verdades de Christen Madson possam ofender o mundo Disney, essa é a bendita vida real, ela fala e faz o que a maioria gostaria de fazer, mas não faz, por medo da imagem ou por conta de um punhado de coisas que vão falar ou por conta de jornais que vão inventar verdades e na manhã seguinte buscarão outras “Christens”.

Ela é complexa e mesmo assim é simples, de fácil solução. Durante toda a semana conversamos de forma virtual e o que absorvi de Christen é uma alma generosa, que não se deslumbra com sua solteirice e seus milhões e pensa em jogar tudo para ar por conta de um noivado que chegou ao fim de forma desastrosa. O noivado todo foi um desastre, não havia mais cumplicidade e pelo visto sexo havia sido extinto junto com os dinossauros. Ela confessou sua carência e eu apenas fui solidário, ela não estava derramando nos e-mails ou mensagens doses de açúcar ou algo meloso e enjoativo, ela estava sendo franca, desde sua vida profissional, que basicamente exterminou a vida pessoal, até os problemas com o pai.

Ela não me transformou em um muro das lamentações ou buscou minha piedade, ela apenas incluiu algumas informações de sua vida na minha.

— Quero beijar você. — disse baixinho e ela suspendeu os olhos em minha direção. E quero beijar mesmo, até que minha boca desista por exaustão.

— Apenas beijar? — ela sorri com os olhos e por Deus, minha calça denuncia sobre os lugares onde quero beijá-la e com o que vou fazer isso.

Não, Srtª Madson, estou com vontade de me enterrar tão fundo e tão forte dentro de você que por mais que queira, você não vai se esquecer de mim. Quero engolir você e fazer você cansar e quando você estiver exausta, eu vou querer mais e, então, eu vou começar tudo de novo, até que eu me renda, e isso, minha querida, é quase impossível de acontecer, acredite. Penso comigo.

— Talvez. — respondo pensando em seu sexo gozando ao meu redor e na minha boca.

Quando eu era um adolescente esquelético e estudava em uma boa escola, conheci uma garota, Muriel. Ela era a mais linda da colégio e era da Itália. Ela foi a primeira garota por quem meu coração se apaixonou, mas eu tinha dezesseis anos e nessa idade essa magia é quase que instantânea e depois outros caras surgiram e Muriel não era mais tão bonita e o que senti não era tão paixão, era mais curiosidade. E tudo chegou ao fim depois do nosso beijo e de uma noite de sexo inexperiente. Ela saiu com outros caras e eu fui aprender mais sobre sexo com outras garotas.

— Vamos? — ela disse assim que avisaram sobre a liberação do voo, e mesmo tendo um jato, tem alguns procedimentos que precisam ser respeitados.

Caminhamos lado a lado, eu e a ex-anônima, e algo me faz feliz nesse momento, feliz de maneira diferente e eu ainda não consegui me lembrar quando foi que senti isso em minha vida. Me sinto com dezesseis anos, mas agora não é Muriel que faz eu querer algo mais, agora é Christen Madson, que entra primeiro no jato Gulfstream V e me pede para ficar à vontade. É ela a garota mais bonita essa noite.


11

 

Christen

 


Mas, amor, tenho rezado muito

Sentando, sem ficar mais contando dólares

Contaremos estrelas.

Counting Stars — One Republic

 

 

O som do One Republic está baixo e estamos voando a pouco mais de quatro horas, estamos quase chegando e Ramon trocou de roupa durante a viagem. Substituiu o terno sexy por bermuda bege, camiseta polo preta e um sapatenis da Osklen. Mesmo assim continua lindo, o filho da puta é sexy mesmo fantasiado de morador de rua. E eu troquei minhas roupas por um macacão verde água, tenho-o há anos e é super confortável, nos pés minha velha e boa sandália, dedos de unha feita de fora, livres e felizes.

Durante a viagem ele confessou que tem medo de cobra e que já pagou alguns micos por conta disso.

Falou sobre amigos, e avisou que possivelmente seus pais vão estar em Malibu e que isso não era um sinal de relacionamento sério, foi apenas coincidência e que a casa estava em obras até algumas semanas atrás.

Falou sobre suas músicas e sua paixão por golfe, isso me obrigou a confessar que já arrisquei algumas tacadas e ele me desafiou. Talvez seja uma boa disputa, mas estou há muito tempo sem jogar e ele seria o vencedor facilmente.

Ele perguntou sobre como eu me sentia diante de um império e se eu já havia pensado em desistir, respondi que nunca pensei em fazer outra coisa a não ser multiplicar de forma saudável o império do meu avô e ele sorriu, dizendo que talvez outra pessoa desistiria na primeira dificuldade.

— Gosto de dificuldades e acho que já percebeu que encaro uma boa briga. — respondi fechando o punho fazendo menção a minha direita que é capaz de quebrar um nariz. Ele sorriu e eu não deveria sentir esse entusiasmo, porque um dia ele vai voltar para o mundo dele, de viagens para Seattle e de sexo com anônimas e eu vou estar atrás de uma mesa, fazendo o mundo conhecer os tecidos Madson.

E quando ele voltar para esse mundo de mulheres boxeadoras e anônimas, pode ser que eu precise de ajuda, pode ser que ele esteja por perto ou podemos nos perder nesse mundo cheio de heróis e anônimas.

Aterrissamos e um carro a pedido de Ramon nos aguardava. Uma empresa de locação de veículos havia deixado o Cadillac Ats à disposição. Pensei que por ser uma região litorânea ele fosse escolher um conversível, mas ele disse que quando vem para essa região ele evita tudo, celular, carro e roupas de tecido sombrio.

Ele tem uma inteligência divertida ao fazer piada, não é um grosseiro que quer se mostrar e eu imagino ser mais rica do que ele, mas ele não esbanja ou demonstra sua fortuna. Ele apenas vive de forma confortável.

— Vem aqui! — ele disse e me puxou para o seu colo. — Oi! — ele disse colocando meu cabelo atrás da orelha e olhando em meus olhos. Ele aproximou sua boca e parou. — Senti muita vontade de beijá-la essa semana, os dias custaram a passar e agora temo que eles desapareçam — ele me beija, desliza tão macio sua língua sobre a minha e eu penso na vontade que também senti, uma vontade que talvez não seja resolvida em dois dias no paraíso.

— Também pensei em você. — disse com a boca colada na dele e ele sorriu ao ouvir. Ele é um homem que fica feliz em ouvir algumas coisas, ou eu devo ser realmente uma boa candidata ao circo.

Suas mãos são uma espécie de ameaça... à minha calcinha e ao seu conteúdo. — Melhor seguirmos ou eu não respondo por mim. — ele disse e me colocou de volta no banco passageiro.

No caminho até sua casa, enquanto ele dirige, me flagro imaginando quais são seus hobbies, além de golfe, se existe outros interesses. Sei que ele fala um francês perfeito e o espanhol, é claro, mas penso em diversão; o que ocuparia a vida desse homem que mesmo rico, domina a arte de cozinhar e limpar a sujeira tão bem?

— Chegamos. — ele diz e longe dos olhos de todos ele puxa meu rosto e me beija novamente.

— Ele chegou! — uma criança grita da entrada da casa, e que casa.

Saímos do carro e pegamos nossa bagagem. Ele fez questão de levar minhas coisas e confesso covardemente que ver aquele braço com músculos saltados segurando as bolsas é altamente sedutor.

— Ray! — uma mulher de não mais de trinta anos fala colocando as palmas unidas diante da boca e vem em nossa direção. Estamos no caminho de pedras que leva até a sala.

A frente da sala é toda em vidro e tem uma visão extraordinária para o mar, os móveis seguem um padrão luxuoso e sofisticado. Dois jogos de sofás em tom caramelo sobre um tapete de sisal. Uma lareira fica de frente com um dos jogos e duas poltronas giratórias com tema floral estão posicionadas de cada lado da lareira.

Uma mesa para pelo menos vinte pessoas fica na lateral onde se tem acesso visual para a cozinha. Dois grandes lustres estão suspensos, um sobre os sofás e ou outro sobre a mesa. Tudo bem orquestrado.

— Johana, minha irmã! — eles se abraçam e eu estou naquela situação familiar onde se espera ser apresentada.

— Tio Ray! — duas crianças entram correndo entre os irmãos e agarram Ramon pelas pernas. Uma menina de uns cinco anos e um menino um pouco mais velho, não muito.

— Ei, crianças, como cresceram! — ele diz e se ajoelha diante deles e é uma imagem encantadora. Ele todo grande abraçando os pequenos. — Agora esperem um pouco, ok? — ele diz e se levanta.

— Johana, essa é Christen Madson, Srtª Madson, essa é minha irmã Johana. — ele nos apresenta e eu olho para a mulher de cabelos negros e lisos e de olhos cor de mel. Ela é bonita, jovem e pela forma como se trataram estão há muito tempo sem se ver. Ela está de short jeans, regata florida e descalça.

— Muito prazer. — digo beijando seu rosto e ela me olha como se gostasse e estica rapidamente os olhos para Ramon que sorri sem mencionar nenhuma palavra.

— Igualmente. — ela diz e mantém o sorriso, fico sem graça e olho para as crianças que seguram as mãos de Ramon.

— Tio Ray, ela é sua namorada? — o garoto sem camiseta e descalço pergunta deixando meu rosto queimar. Por que estou envergonhada por conta de um comentário de criança? Crianças são assim.

— Tomas! Não seja assim! — Johana o adverte.

— Tio Rey nunca namora! — ele diz colocando Ramon em uma situação delicada e eu escondo a risada atrás dos dedos.

— Ei, carinha, não acha que está sendo muito abusado? — Ramon o pega e leva em seu ombro até o sofá e faz cócegas no garoto.

— Desculpe, crianças, sabe como é. — Johana diz sorrindo e sem jeito. — Tento ser uma mãe que educa, mas acho que estou errando.

— Não se preocupe, eu entendo e tenho certeza que está fazendo um excelente trabalho. — digo e olho para a menininha de cabelos lisos. Ela é bem parecida com a mãe e ela me olha como se eu fosse algo intergaláctico.

— Oi! — eu me abaixo ficando da altura dela e digo baixinho. Ela abre um sorriso vergonhoso e diz um oi quase mudo.

Ela tem olhos negros e uma pele morena, bonita. Ela carrega uma boneca de pano e está arrumada em um vestido vermelho de laços no ombro.

— Você tem o cabelo igual o da minha boneca. — ela diz e tira o chapéu que cobre as madeixas enroladas da boneca.

— Muito obrigada, mas acho que o cabelo da boneca está mais bonito do que o meu. — brinco e estico a mão para que ela me entregue a boneca.

— O seu é mais bonito porque é de verdade, o dela não. — ela diz e me entrega a boneca.

— Mas sua boneca tem um vestido lindo, olha essas flores, qual é o nome dela? — pergunto ajeitando o vestido da boneca enquanto Ramon faz Tomas rir alto.

— Serafine. — ela diz e sorri, percebo que lhe falta um dentinho da frente e ela cobre com os dedinhos.

— Que lindo nome! — digo e finjo que nem percebi. Ela suspende os ombros e eu lhe entrego a boneca. — E você, como se chama? — pergunto e mexo no laço do seu vestido.

— Ariel. — ela diz e sorri sem dentes, ela tem vergonha da janelinha.

— Nome de princesa, é lindo. — digo e deslizo meus dedos em seu cabelo liso e crianças me atraem, mais do que deveria.

Me perco olhando para a pequena de pele invejável, um tom perfeito e cabelos de índia de tão poderosamente lisos. Ela é linda e está com as unhas cor de rosa, borradas, possivelmente ela fez o trabalho.

São minutos olhando e mexendo em seu vestido e percebo um silêncio ao meu redor. Olho em volta e vejo todos me olhando. Ramon sorri em minha direção e sinto em seu olhar uma fagulha solidária.

Me levanto e tento fingir que não houve nada e sorrio para Ramon, que caminha em minha direção. O garoto diz que o deixou fazer cócegas e que ele é incrivelmente mais forte que ele. Coisa de garotos.

— E você, minha princesa, está linda. — ele a pega e beija o rosto todo de Ariel e ela gargalha. Esse é um dos sons mais harmoniosos da terra, risada de criança.

— Eu gostei dela. — ela diz cochichando no ouvido de Ramon e eu finjo que não ouvi, olhando para outra direção.

— Eu também. — ele diz cochichando também, mas eu não esperava essa resposta. Ele a coloca no chão, apanha as bagagens com uma mão e com a outra me conduz por uma escada e nos leva até o segundo andar da casa.

Ele abre a porta do último quarto do corredor e entra. Eu o sigo e vejo uma cama ao centro do quarto e um mosqueteiro que desce do teto e cobre a cama. Ao redor móveis imperiais e uma janela imensa, com vista para o mar. Paraíso, penso comigo.

— Está tudo bem? Quer descansar? — ele pergunta.

— Não estou cansada, está tudo bem. — respondo e ele me puxa para perto dele e me beija.

— Então, vamos descer, pelo cheiro, meu pai já começou os trabalhos. — ele diz e voltamos ao primeiro andar e ele me conduz pela cozinha de móveis planejados, brancos e altos até o teto. Uma ilha bem feita, com um cooktop ao centro da cozinha e banquetas altas ao seu redor.

— Você tem uma bela casa. — digo andando de mãos dadas com ele e isso me surpreende, pois foi ele quem a agarrou.

— Não é minha, invadimos, eu ainda tenho que pagar por um par da abotoaduras que comprei no mercado negro. — ele me alfineta sorrindo.

— Nunca participei de uma invasão antes. — rebato e ele para, me prensando na parede, duro, gostoso e tenho uma convulsão acontecendo sob minha lingerie.

— Escute. — ele me beija. — Não pode ficar usando essa boca para me rebater a todo momento, isso me excita e eu vou ter que esperar, me entendeu? — ele diz beijando e mordendo meu lábio inferior.

— E para o que mais eu usaria minha boca? — pergunto e ele distancia o rosto do meu e olha para as próprias calças e suspende os olhos, jogando de leve a cabeça me convidando a fazer logo mais um trabalho oral. — Posso pensar a respeito. — pisco e ele me beija com muito mais intensidade.

Ele me solta e arrumamos nossas roupas tortas e denunciantes, sob a bermuda dele é nítido que ocorre algo sem controle, o volume denuncia e isso me excita. Não preciso mencionar o estado irreversível que se encontra minha calcinha.

Caminhamos pela lateral da casa e chegamos a área de lazer. Johana está lá e as crianças brincam com alguns bonecos e carrinhos à sua frente, entre a mesa de madeira e as cadeiras.

— Filho! — a mãe de Ramon levanta as mãos para o céu e vem em nossa direção. Ela é uma jovem senhora, não mais que cinquenta e cinco anos e veste legging e camisão azul claro. Seu cabelo está preso em um coque no alto da nuca e ela está descalça.

— Madre! — ele diz lindo e beija a mãe nos lados do rosto. Eles se abraçam por algum tempo e eu observo um senhor na churrasqueira de chapéu panamá e bermuda jeans. Está de camisa branca e também descalço. Ele remexe na carne que assa sobre as brasas.

— Está magro, não anda comendo direito? — ela pergunta e eu respondo internamente: Comendo muito bem, obrigada.

— Se eu comer a proporção que a senhora acha ideal, vou ser obrigado a viajar no baú de um caminhão. — ele ri e eu também. Minha risada atrai o olhar da mãe de Ramon e ele percebe.

— Mãe, essa é Christen Madson, Christen essa é minha mãe, Gabriela Avellar. — ela sorri para mim e eu me sinto bem, muito bem aliás com esse sorriso.

— Prazer em conhecê-la. — ela diz. — Mas vamos colocar ordem aqui. — ela diz e meu sorriso some, fico com certo medo, será que ela ouviu ou viu nossa falta de pudor um pouco antes? Ela percebe que meu rosto ficou pálido e sorri. — Nunca, em hipótese nenhuma me chame de senhora. — ela ri da minha cara de assustada e eu volto a respirar.

— Tudo bem, desde que não me chame também. — brinco com ela e ela sorri amistosamente. Ramon deixa que a mãe vá na frente e volta a segurar a minha mão.

Nos aproximamos da churrasqueira e o senhor de chapéu deu uma boa olhada em mim, não esboçou nenhuma reação, apenas olhou e fixou os olhos em meu rosto.

— Pai, pare com isso, ela vai pensar que o senhor é louco! — o senhor gargalha e agarra Ramon.

— É essa a intenção, meu filho! — ele brinca e meu coração está disparado. — Muito prazer, eu sou Nather, pai desse ordinário. — ele brinca e estende a mão para mim.

— Muito prazer, me assustou. — eu disse.

— Assustei você com meu olhar? — ele brinca com as sobrancelhas de forma engraçada como se eu fosse uma criança.

— Não, me assustou ao chamá-lo de ordinário, achei que fosse um segredo meu e dele. — digo e gesticulo o dedo entre Ramon e eu.

— Ei! — Ramon diz e me abraça beijando minha cabeça. — Não se junte a eles, são perigosos! — ele gargalha e beija meus lábios na frente de todos.

— Achei que estávamos em segredo, nada sério, lembra? — digo baixinho e encabulada com a família me olhando.

— Mas estamos em segredo, não temos nada sério. — ele diz e beija novamente minha boca. Nunca temos controle absoluto de tudo, eu sei disso.

— Eu sabia que ela é namorada do tio Ray! — Tomas fala alto e todos riem do jeito dele em apontar o dedo para nós. Me escondo no tórax (por Deus, que tórax) de Ramon e ele me abraça beijando o topo da minha cabeça.

— Ele é uma criança, não entenderia nossa situação. — ele diz sorrindo e eu suspendo meus olhos em sua direção. Dentro da minha cabeça formulo algo sobre: “Nossa situação”, mas guardo para mim.

Não temos nada sério, nada que possa ser relevante, o que temos são os olhos inocentes de uma criança e isso é tudo e fora isso apenas um bom sexo.

— Então, Tom, já que afirmou sobre a minha namorada, o que me diz? — ele alimenta a imaginação da criança e caminha em sua direção.

— Ora, tio Ray! Ele é muito bonita pra você! — ele para de andar e vejo que inclina a cabeça em sinal de desaprovação. O pai de Ramon quase perde o fôlego de tanto rir, percebo uma brincadeira saudável entre pai e filho, isso é bom de testemunhar.

— Filho, eu disse que meu neto é muito inteligente mas eu não sabia o quanto! — ele se esbalda na gargalhada e eu também. Minutos depois todos estão rindo e Ramon está virando o garoto de cabeça para baixo e fazendo cócegas.

Me sento próxima da Sra. Avellar que nem posso sonhar em chamá-la assim e a irmã de Ramon se aproxima e se senta ao nosso lado. Admiramos a brincadeira do tio com as crianças e o silêncio foi interrompido por Johana.

— Ray adora crianças, sempre gostou. Assim que me casei ele vivia dizendo para não demorar a ter filhos e acho que engravidei mais sabendo de sua vontade do que qualquer outra coisa. — isso me espeta por dentro, mas não dou muita atenção.

— Sim, ele sempre foi um ímã para crianças. Na Colômbia ele financia uma instituição que cuida de crianças com Síndrome de Down, ele as chama de pequenos gênios, aquelas crianças têm verdadeira paixão por Ray. — a mãe dele diz sorrindo ao ver o filho brincar com os sobrinhos. — Alguns anos atrás ele foi procurado por uma mulher que afirmava que os gêmeos que ela havia dado à luz eram dele. Em um primeiro momento ele ficou desesperado, sair de nenhum para dois de uma vez foi um susto. — ouço assustada e olho para ela esperando o desfecho dessa possível paternidade. — Mas, depois de dois DNAs, foi comprovado que não, e de novo em um segundo momento ele se viu de dois, para nenhum. — ela disse triste.

— Ele mandou fazer mais uma porção de exames, muitos achavam que era para provar ao mundo que ele não era o pai, mas na realidade ele tinha esperança de ser pai das crianças. — a irmã dele fala com pesar. — Ele não queria assumir a mulher, que segundo ele nem o nome ele lembrava, mas as crianças ele brigaria pela guarda se preciso fosse. — ela alcança na mesa um copo e bebe um pequeno gole.

— Uma pena, ele seria um excelente pai, olha como as crianças reagem a ele. — digo com algo pressionando o alto do meu estômago.

— Ele vai ser um grande pai! — a mãe diz e massageia meu ombro, sorrindo em minha direção e por Deus eu não queria ter entendido isso. Ela se levanta e vai ao lado do marido. Um casal feliz, sorridente e descalços, simples apesar de afortunados e tento imaginar meus pais na mesma situação, mas não consigo.

— Christen, Ray só tem tamanho, é uma grande criança que por diversas vezes pegou meus filhos e os levou para brincar na praça ou tomar um sorvete. Ele usa de todo seu conforto para ser simples e generoso, ele tem o melhor coração que Deus tinha reservado para suas criações, eu o amo. — ela diz e mudo de: Nunca chorar... para caroço de abacate na goela, engulo e sorrio para ela.

— Ele é grande para comportar o próprio coração. — digo e me levanto colocando refrigerante em um copo vermelho. No dia que o mundo receber Ramon novamente, espero que cuide bem dele.

Volto para o lado de Johana e admiramos as crianças, incluindo Ramon que os colocou cada um em seu ombro. Ele sorri e vejo um lampejo de felicidade em minha direção, ele olha para mim de longe, e pisca um dos olhos.

Não deveria sentir nada por ele a não ser minha roupa íntima pedindo socorro, mas sinto um carinho incalculável por homens que gostam de crianças. Penso com pesar na reação de Otto quando descobriu que eu estava grávida.

— Você vai ter um filho? — ele perguntou como se eu tivesse voltado de um pet shop com um filhote que eu poderia trocar ou devolver.

— Nós vamos! — eu disse e até hoje não entendo por que suportei tantos desaforos dele. Talvez eu quisesse uma família diferente da minha, pais que se amam de verdade e uma criança brincando na varanda. Talvez eu imaginasse que sendo mãe solteira dificilmente encontraria alguém que assumisse a mim e meu filho e por covardia levei adiante uma história que acabou de maneira tão ridícula.

— Você vai! — ele disse e andava como um touro bravo de um lado para o outro na sala. — Você vai engordar, mudar de humor como se muda uma roupa e vai querer cuidar dessa criança em tempo integral. — ele gritava e eu o olhava com pena. Depois desse dia, nossas discussões se tornaram frequentes e meses depois aconteceu tudo.

Quando ele soube da morte do filho, não esboçou nenhuma reação, estava de luto e com culpa pelo irmão e eu insisti em algo que não daria certo.

— Christen, você trabalha com o quê? — o pai de Ramon me salva de um histórico que deveria ser esquecido no meu guarda-volumes.

— Com tecidos. — respondo sucinta. Johana me acompanha assim que eu me levanto e vou mais próxima dele.

— É costureira? — ele pergunta sorrindo e eu sorrio para ele, pela simplicidade dele, pela pergunta inocente e pelo sorriso que ele esboçou ao dizer: costureira.

— Vamos dizer que eu facilito o trabalho delas. — respondo e pego um pedaço de carne que ele acabara de cortar.

— O trabalho faz bem para a alma e quando fazemos o que amamos ele rejuvenesce o coração. — ele diz e mastiga um pedaço de carne, em seguida pega uma long neck de uma marca de cerveja importada e bebe.

— Acho que meu coração fica mais novo a cada dia. — respondo e percebo Ramon se aproximar.— Eu gosto muito do que faço. — sorrio para ele e Ramon para ao meu lado e desce sua mão do meu ombro até minha cintura. Eu engulo e tento não imaginar essa cena de forma sexualmente ativa.

Coloco minha mão ao redor de sua cintura e a deixo escorregar para dentro do seu bolso. Ele tem um belo traseiro e minha mão está bem feliz ali.

Johana aumenta o volume do iPhone e escuto Somewhere Over The Rainbow, na versão de Israel Kamakawowi’ole, uma versão praiana e perfeita.

 

“Eu ouço bebês chorando e vejo-os crescerem

Eles aprenderão muito mais

Do que nós sabemos”

 

Ramon pede licença depois de alguns minutos e me leva para a beira da área de lazer, posso ver as ondas se quebrando e um silêncio absurdo depois disso. Deixo meu copo sobre a pequena mureta ao lado do passeio e andamos em direção a areia, mas antes retiro minhas sandálias e ele o sapatenis. Caminhamos em silêncio, deixando apenas a brisa leve com cheiro de água salgada chegar até nós. Olho através dos meus cílios para ele e ele esta olhando para a imensidão supostamente azul que forma ondas de crista branca e um barulho que se transforma em melodia.

— As crianças adoram essa casa. — ele diz depois de um tempo e me olha, eu já estou com meus olhos sobre ele e sobre a forma carinhosa que ele fala dos sobrinhos.

— Acredito que elas gostam de você, e não da casa, a casa é apenas um detalhe. Elas te olham com amor, como herói, e isso é melhor do que qualquer tipo luxuoso de construção. — digo e ele alcança minha mão e mistura seus dedos aos meus.

— Eu os amo, com toda força que Deus me permite amá-los, como se fossem meus, como se me pertencessem. — ele diz e massageia meu dedão com o dele, é uma forma inusitada de Ramon estar misturado comigo. — Faria e faço qualquer coisa por eles. — ele diz e volta seus olhos para a o mar.

— Eles o ama também, é nítido e lindo de ver. Aprendemos muito com essas criaturinhas, eles possuem uma sabedoria que nós sabemos que eles vão perder e mesmo assim é tudo incrível. — digo com pena sobre o meu não viver isso.

— Johana é viúva há três anos. — ele diz mudando o tom de voz para um nível triste e eu fico em silêncio. — Ele foi baleado durante um assalto e não resistiu. — os olhos dele ficam perdidos e eu mantenho meu silêncio. — Ele não era apenas meu cunhado, ele era meu amigo de infância. Os dois namoraram a vida toda, nunca o vi com outra mulher que não fosse Johana, ele a amava, grandiosamente.

Vou precisar de terapia depois que voltar para Nova York, estou perdendo minha personalidade e sinto que a qualquer momento eu posso desabar em lágrimas; é como se eu estivesse tanto tempo atrás de uma mesa trabalhando que esqueci que o mundo gira e tem seres da mesma espécie que eu, evoluindo, e não estou falando de evolução profissional ou financeira, estou falando de compaixão, amor e lealdade. Estou presa em uma vida de tecidos e recortes e corro o risco de ficar como eles, ser barganhada e exportada para qualquer canto desse mundo. Seguro e engulo qualquer sinal de choro.

— Eu sempre fui ligado as crianças, sou padrinho das duas junto com meus pais, mas depois que Fabian faleceu, eu tentei criar uma categoria entre pai e tio delas, fiz de tudo para que elas não sofressem mais do que suportariam. Ariel era muito nova e depois de um tempo parou de perguntar sobre seu “Papa”, mas Tomas foi difícil, ele ficava no portão, esperando o pai com a bola de futebol na mão e isso é a parte difícil de lembrar. — ele balança a cabeça em sinal negativo. — Algumas dores são inevitáveis, mas olhar uma criança com pouco mais de cinco anos sofrer é como ter noção de que não somos nada nessa vida, não temos poderes especiais.

Ele olha para mim assim que termina a frase e o que encontro em seus olhos é algo anônimo, sem nome, eu pelo menos não conheço. É como se ele fosse o substituto da dor de seus sobrinhos, é como se o que eles sentem, Ramon também sentisse.

— Lamento. — falo e com a outra mão acaricio as costas de sua mão que me segura. — Perdas são irreparáveis, não existe para nenhuma delas uma justificativa plausível que nos faça sofrer menos. A perda é um dos sinônimos da dor e lamentavelmente a dor é a única força real, ela nos obriga a buscar solução e nos dá a sensação da realidade.

Ele para e eu também. Ele se coloca à minha frente e suas mãos colocam as mechas soltas dos meus cabelos atrás da orelha, e beija minha testa. Me olha dentro dos olhos e a lua quase não tem força para nos iluminar.

— Não sou o tipo adequado para relacionamentos, não sei agir como alguém romântico e boa parte do que faço é apenas para seduzir, não sou nem de longe alguém que queira se jogar de joelhos e fazer declarações enjoativas, mas... — ele engole seco e sela a minha boca demoradamente. — Você tem estado constantemente em meus pensamentos. Me flagrei diversas vezes essa semana rodando o garfo em meu prato e quando me dei conta era com você que eu imaginava estar.

Escuto com muita atenção e acho que estou piscando descompassadamente, mas mantenho meus olhos em sua direção.

— Poderia ser mais claro? — pergunto fazendo um pequeno charme ao levantar as sobrancelhas.

— Geralmente mulheres não ocupam minha mente, e você tem andado demais nela. — ele levanta minhas mãos e beija meus dedos. — Sinto sua falta quando você percorre meus pensamentos e confesso ter medo que além de minha mente, você possa dominar meu coração.

— Tem vontade de fazer sexo comigo quando pensa em mim? — pergunto olhando em seus olhos.

— Sim, mas tenho vontade de me deitar ao seu lado e ver você dormir, tenho vontade de preparar uma refeição simples e depois lavar a sua louça, não porque isso lhe agrada, mas porque fazendo isso eu sei que você vai estar por perto. — ele me beija o rosto e eu penso rapidamente sobre suas refeições simples, então, eu sinto seus lábios nos meus, geralmente beijos são apenas beijos e não condutores de energia, ou são?


12

 


Ramon

 

 

Porque beijá-la se tornou importante e inevitável, porque eu não consigo não querer isso.

A levo para mais adiante onde as ondas se chocam contra os rochedos, uma teimosia valente e insistente. Tenho passado os últimos dias insistindo em me convencer que minha vida é perfeita o suficiente e que talvez isso, estar com ela, possa me levar para a prancha de um navio pirata, afinal, tudo começa em algum ponto, e se nosso ponto juntos surgiu na noite em que não sabíamos os nomes e nem as consequências?

Ela caminha olhando o mar e o vento fraco coloca vida em suas mechas de chocolate. Olhar para ela é bom, é como se ela fosse um acalento necessário, como se meu corpo precisasse e naturalmente soubesse onde encontrar. Ela me deixa exposto, mesmo sem querer, mesmo sem saber.

— Aqui é muito bonito. Já estive em Malibu outras vezes, mas não nessa área, você tem um ótimo gosto. — ela diz e eu a pego pela cintura e a coloco sobre uma pedra, as ondas nos alcançam e meus pés sentem a água gelada do mar.

— Quando eu estava à procura de um lugar para minhas férias, não tinha ideia de que um dia eu desejaria morar nesse lugar. — me encaixo de costas entre suas pernas e ela me abraça por cima dos meus braços. — Um dia eu vou morar aqui e espero que não demore, quero aproveitar esse lugar. — digo e ela apoia o queixo em minha cabeça.

— Pelo menos vou ter uma casa para ficar, vou economizar na hospedagem. Bom, caso aceite receber minhas visitas. — ela diz com um charme que não deveria me balançar como me balança, mas ela é esse monte de situações inteligentes e engraçadas e por vezes me pego sorrindo ao lembrar de suas malcriações e desacatos.

— Vou ter que cozinhar para você quando vier? — brinco e sei que ela está sorrindo.

— Obviamente! — ela diz com imperialismo. Me viro para ela vagarosamente e a encaro, ela mexe com meu pau apenas por dizer de forma insolente algumas respostas.

— Isso me enquadraria no parâmetro “empregado”? — pergunto fazendo aspas com os dedos.

— Não, enquadraria na categoria “colaborador” — ela responde também fazendo aspas com os dedos e sorri. — Poderia recompensá-lo. — ela diz e seu rosto de feliz passa a sexy em menos de um par de segundos.

— Como me recompensaria? — pergunto e desfaço o laço de seu macacão atrás do seu pescoço. O tecido desce e me apresenta os seios mais lindos que já vi. Ela está sorrindo e eu os acomodo em minhas mãos. Ela é macia e tudo nela faz meu corpo vibrar.

— Na moeda de sua escolha. — ela diz e umedece os lábios com a língua e eu tenho vontade de fodê-la aqui mesmo. E por que não? Isolado, escuro e meu pau não vai aguentar até chegarmos em casa.

A desço da pedra e a encosto. Seu macacão cai sobre seus pés e água o molha, ela não se importa e me afasta dela. Fico incomodado e perdido, mas ela retira o macacão da areia e depois remove sua calcinha.

Olho para o encontro de suas pernas e vejo um sexo liso, sem nenhum pelo, uma marca menos intensa de bronzeado delata que andou trabalhando mais e vivendo menos. Ela caminha para dentro da água e garante que o frio é apenas no começo e que água está uma delícia.

— O frio poderia prejudicar minha situação, Srtª Madson. — afirmo confessando um problema de ordem masculina em relação ao frio e uma ereção, essas duas coisas não são boas juntas.

— Duvido muito, Sr Avellar! — ela disse e agora ela está com água até a cintura. Linda, sob a lua, seios incríveis e um rosto que não poderia ser levado tão a sério quanto eu estou levando.

Removo minha roupa e coloco junto com seu macacão sobre a pedra e entro, segurando o que precisa ser bem protegido. Meu amigo, me perdoa, mas é por uma boa causa! Penso como se conversasse com meu pau.

Ando em sua direção e ela tem razão, não está tão fria, não que esteja em uma temperatura agradável para a região mais importante do meu corpo, mas está suportável e possivelmente o frio perca a batalha contra a minha ereção. Sim, amigão, é isso que eu espero de você. Agradeço o quão duro ele está apenas por colocar o corpo de Christen colado ao meu.

A beijo e deixo-a deslizar suas mãos em mim, gosto das mãos dela, da boca e do que está acontecendo agora. Porque em todas as fodas da minha vida (não foram poucas) todas foram apenas fodas, e com ela não me sinto confortável em enquadrá-la assim. É um sexo bom pra caralho e não tenho sentido falta de outras alternativas.

A suspenso e a encaixo, estou dentro dela, sem preservativo e sem arrependimento nenhum por isso. Infelizmente o sangue que preciso para raciocinar foi bombeado para o meu pau que está duro dentro dela e ela está livre, deixando eu entrar e sair.

Bom em um nível desconhecido, ela é toda gostosa, beija bem e convence meu pau até em dias de nevasca.

— Deveria me dar isso com um pouco mais de força, eu quero gozar. — ela diz e eu me tornei um otário, a obedeço e realizo seu desejo, mas esqueço de que fazendo isso eu vou abreviar essa situação em pelo menos um terço.

Ela goza e geme alto e eu também. Isso saiu completamente do controle e tento buscar quando foi que eu fiz esse tipo de coisa. Talvez eu não tinha nem vinte anos a última vez que transei sem preservativos, sempre tive medo de doenças que nos fazem morrer aos poucos e o pau cair.

— Muito bem, Sr Ray! — ela disse sorrindo e como eu disse, não está tendo oxigenação o suficiente em meu cérebro, tudo nela se tornou encantador. Merda!

— Muito bem para a senhorita também. — digo com um pouco de mau humor, queria mais e ela me faz isso.

— Algum problema? — ela pergunta e eu ainda estou dentro dela e ela está com suas pernas ao meu redor; a água passa por nós incansavelmente e arrepia ainda mais sua pele, seus seios pedem para serem devorados.

— Não, mas foi rápido demais. — confesso e a puxo para beijá-la e ela segura, não me obedece.

— Foi ótimo, ser rápido não quer dizer que tenha sido com pressa, foi apenas urgente, precisávamos disso, como um ensaio para logo mais. — ela deve ter um profundo conhecimento do manual sobre: o que dizer para um homem!

— Fico feliz em ouvir isso, porque se vai me recompensar com essa moeda de troca exijo muito mais do que um par de minutos. — falo e a levo para fora da água.

— Quando for assim, considere apenas como uma gorjeta. — ela diz assim que saímos da água e eu não resisto a sua bunda, redonda e, puta merda!, que vontade de enrabar essa mulher. — Não deveria bater em quem lhe oferece recompensas! — ela disse pegando sua calcinha e tentando retirar a areia, mas ela olha com pesar para suas roupas.

— Bati em quem me deu apenas umas gorjetas. — digo sorrindo e visto nela a minha camiseta. Ficou imensa, graças a Deus.

— Como vou entrar na sua casa, com a sua família e seus sobrinhos, usando sua camiseta? — ela pergunta esticando a barra da minha camiseta.

— Confie em mim. — peço algo que geralmente não pediria a ninguém.

Ela aceita com a cabeça e eu carrego sua roupa enrolada em minha mão. A olho e vejo-a sorrir, segurando minha mão e brincando com a areia branca com seus pés. Minha mão se prende mais forte a dela e andamos em silêncio. Eu sorrindo ao vê-la sorrir, um alimenta o outro.

Chegamos na casa e vejo todos rindo, meus sobrinhos já foram dormir e escuto o som mais baixo. Está tocando Faith, do George Michael.

“Porém, eu tenho que pensar duas vezes

Antes de entregar meu coração”


Peço que ela espere alguns minutos, afinal, ela pode ser vista nessa situação e isso não seria bom. Ela fica entre a mureta e uma árvore alta de galhos intensos e volumosos. Está escuro e eu entro sozinho pela parte da frente da casa, segurando sua roupa e dou de cara com meus sobrinhos na sala, eles ainda estão acordados e penso no alívio de ter pedido para que Christen esperasse.

Eles perguntam por ela e eu digo que ela está lá fora e eles correm para lá. Subo rapidamente para o quarto onde estão nossas coisas e coloco sua roupa sobre a pia e vou em direção de sua bagagem. Estou diante do universo secreto da bolsa de uma mulher. Abro o zíper e olho suas peças, bem organizadas, cheiram a vanilla, é o cheiro dela e agora esse aroma se instaurou em meus sentidos e associo-o a ela facilmente.

Escolho um vestido, branco e curto. Procuro por uma lingerie e vejo uma pequena sacola de um tecido macio e abro, ali estão elas e eu escolho uma branca e a abro diante dos meus olhos. Ela é pequena, de renda e bem cavada. Meu pau se tornou algo desobediente e guloso.

— Eu sei, cara, ela é gostosa. — converso com minha pélvis. Desço segurando a troca de roupa e encontro minha irmã no fim da escada.

— Ray, onde está Christen? As crianças saíram correndo dizendo que ela estava lá fora. — ela pergunta e involuntariamente sorrio. Não posso dizer para ela que ela está lá fora, vestindo uma camiseta minha e o motivo disso tudo. Mas ela me olha como se soubesse de algo ou que desconfiasse de alguma coisa e ela consegue tudo de mim, mesmo que eu não fale nada, ela sabe.

Mostro a troca de roupa e ela me olha sorrindo, me conhece e sabe que tudo isso é tão novo quanto desordeiro.

— Você está feliz, Ray? — ela pergunta sorrindo e eu correspondo.

— Sim. — olho para a roupa em minhas mãos e penso quando eu faria isso? Nunca, eu diria, eu nunca trouxe ninguém para essa casa. Aqui é meu santuário, onde vivem meus sobrinhos às vezes e meus pais estão sempre por aqui.

— É bom vê-lo assim. Passei muito tempo duvidando de sua sexualidade, não que fosse fazer diferença, mas pensei que talvez mulheres não fossem algo que levasse a sério. — ela diz e eu penso no Clube. Não, minha irmã, eu não levava.

— Ora! Não sou gay e nem tenho trejeitos de um, não me faça rir de sua piada! — dou risada e ela também.

— Eu sei, e estou feliz em saber que seu coração está dando sinais vitais em direção a uma vida que todos buscam. — ela fala sobre meu coração e eu acho que ele ainda não está envolvido nisso. Acredito que seja mais química entre Christen e eu do que qualquer outra coisa.

— Não estou apaixonado se é isso que quer saber. — respondo de pronto mas não olho em seus olhos.

— Tudo bem, mas é uma questão de tempo. — ela diz e busca meus olhos com os dela. — A vida passa a ser mais saborosa quando temos alguém nas noites de sábado e que essa pessoa é a mesma em nossos pensamentos em uma manhã de chuva de uma segunda-feira. — ela se aproxima, sobe dois degraus e fica na minha altura. — Eu te amo, Ray! — ela diz, beija meu rosto e sobe.

Não me sinto confortável em pensar que as pessoas possam ter razão em algo sobre a minha vida que eu mesmo desconheço. Caminho em direção a Christen e a vejo, encostada olhando uma concha. “Manhã de chuva de uma segunda-feira”. A frase dá um giro em meus pensamentos assim que me aproximo dela e entrego sua roupa.

— Obrigada. — ela diz sorrindo e alcança as coisas de minha mão.

Fico em silêncio e analiso a forma sedutora e covarde que ela desfaz de minha camiseta que estava em seu corpo e me entrega. Agora está com o cheiro dela e eu a visto.

Ela está nua e veste sua calcinha e depois o vestido e pede para que eu o feche no alto de sua nuca. Ela suspende os cabelos e eu vejo uma pele linda, contrasta com o branco e eu quase me rendo.

— Ótima escolha, Sr Avellar. — ela diz se virando de frente para mim, mostrando um decote discreto e um sorriso encantador. — Ficou bom? — ela pergunta. Porra, ela ainda pergunta? Isso é de acabar com qualquer fé nessa vida.

— Não, prefiro você sem ele. — a puxo e a beijo, forte e tudo em mim sente que ela é algo imediato, mas não deveria ser assim, não deveria nem existir; eu deveria acordar amanhã e esquecer essa mulher de corpo desgraçado de tão perfeito e essa sua boca inteligente que me cobre tão bem.

Entramos pelo mesmo lugar por onde entrei, subimos e ela mais que depressa entrou no chuveiro. Tudo para evitar observações indiscretas sobre sua troca instantânea de roupa.

Me sento na bancada da hidro e a admiro. Para mim é sedutor ver uma mulher no banho, a espuma descendo, contornando os seios, caindo pela barriga e, enfim, encontrando o nirvana. Ela não tem vergonha de se mostrar para mim e o faz de forma sexy e não vulgar, é despretensioso e atraente, tudo nela se tornou atraente e eu penso sobre sua perda. Ela não carrega isso como uma arma e se põe a chorar simplesmente, ela é forte e se mostra de igual para mim.

— Não quer tomar banho comigo? — ela pergunta e passa a mão para desembaçar o vidro do box.

Respondo apenas com a atitude de tirar a minha roupa rapidamente e dividir a ducha com ela. Ela pede para que eu fique de costas e depois de molhar o sabonete ela começa um passeio feliz pelo meu corpo, é feliz para mim e para o meu amigo que se pudesse sorriria.

Ela me vira de frente e me cobre com espuma e eu divido meu olhar entre suas mãos e seus seios. Ela é linda e agora desce o sabonete, céus! É mais forte do que eu e ela finge que nada está acontecendo, que meu pau não está duro e isso é uma afronta porque eu sei que ele não passa despercebido.

De repente ela ensaboa a mão e desliza sobre ele e toda a região, mãos leves que me fazem contorcer. Fico mais duro e ela continua, mas agora ela me encara e eu a agarro e vamos para debaixo do chuveiro juntos, deixando a espuma ir embora.

A viro de costas e a apoio no cabide de alumínio onde uma toalha branca está pendurada. Abro suas pernas e deslizo meu membro por todo seu sexo e entre suas nádegas. Eu quero muito isso. Penso olhando para sua bunda empinada em minha direção.

Entro devagar mas avanço com força, a sinto, intensa e ameaçadora. Ela rebola e eu vibro com isso, pulso dentro dela e ela pede por mais, ela sempre quer mais e eu o faço.

Seguro em sua cintura e a trago para junto do meu corpo cada vez com mais força, mais vontade e ela avisa sobre seu orgasmo. Nunca imaginei que um orgasmo feminino fosse me trazer tanta satisfação, mas é essa a verdade, o maior tesão masculino está em ver a mulher gozar por nossa culpa.

Ela se entrega e eu saio dela, a virando de frente para mim.

— Quero mais. — ela diz me olhando.

— Vai ter. — eu a beijo com força, desligo o chuveiro e a levo, molhada em todos os sentidos da bendita palavra, para a cama.

Abro suas pernas e me enfio de novo, sem nenhum tipo de malabarismo, eu quero apenas senti-la, molhada com apenas o seu fluído e não com a água do mar ou chuveiro.

Entro e deixo meu gemido de satisfação ao senti-la tão molhada e apertada sair. Ele encontra com o dela. Nesse momento observo seu rosto úmido e seus olhos fechados, ela segura os lençóis com força, ela geme e eu entro e saio, devagar, como uma dança e sinto o fundo do seu sexo.

Tudo nela me excita e escuto-a pedir por mais e assim que entro e saio mais devagar ainda ela implora, e, então, entro e ela goza, geme e eu preciso de um especialista, não consigo resistir ao vê-la assim, a encho, gostoso e gemo me deitando sobre ela.

Nossa respiração está acelerada e eu gosto de vê-la assim, sob mim. Encontro seus olhos em minha direção e selo sua boca.

— Você me deixa sem controle. — aviso em tom sério.

— Apenas gorjetas... — ela sorri e eu beijo seu rosto todo. Descubro que seu riso é ótimo para o meu humor e que junto dela me sinto melhor em alguns sentidos, em outros me sinto um adolescente em plena puberdade.

— Preciso ter mais controle sobre isso. — falo me levantando e ela rola para um dos lados da cama.

— Não precisa mudar nada, está muito bom assim. — ela me elogia e se deita de bruços. Vejo o desenho lateral de seus seios e seu rosto ruborizado em um tom perfeito de cansaço pós foda.

— Está satisfeita com isso? — pergunto do banheiro e volto alcançando uma cueca de dentro da minha bagagem.

— O suficiente para querer dormir um pouco agora. — ela diz com os olhos fechados e a vejo como um anjo, não deveria, anjos não fazem sexo. — Deite aqui comigo. — ela pede e coloca a mão ao lado dela me indicando o caminho. Eu obedeço e tenho consciência de que estou muito obediente ultimamente.

Puxo uma manta leve que está aos pés da cama e a cubro, puxo seu corpo para perto do meu e a deito entre meu peito e meu braço. Beijo o alto de sua cabeça com cabelos molhados e bagunçados lindamente e escuto sua respiração.

Ela respira fundo e eu sinto seu coração acelerado ainda, aos poucos ele vai se acalmando e por fim ela adormece. Escuto minha irmã caminhar pelo corredor e pedir silêncio aos meus sobrinhos, ela avisa que estamos dormindo e que está muito tarde para eles ainda estarem acordados.

Já é madrugada e o silêncio na casa é absoluto, porém, é possível ouvir as ondas e o barulho do mar. A janela está parcialmente aberta e as cortinas se movimentam discretamente. Olho para o rosto de Christen e penso que essa viagem está melhor com ela por perto.

 


“Quero abraçar você e dizer

Nós não podemos jogar isso fora”

Can’t Stop Lovin’ You — Van Halen

 


O som vem da área de lazer, escuto apenas a música e sinto o cheiro de café. Abro meus olhos e estou sozinho na cama, mas não no quarto. Ela está na varanda, com meu roupão e apoiada no parapeito.

Ela observa o horizonte, vejo seu perfil e olhos distantes como se alcançassem o fim do mar. Está pensativa e eu pagaria pelos seus pensamentos, pagaria para saber o que a deixa assim, com o olhar devastado.

Olho as iniciais em seu tornozelo e subo meus olhos para área coberta onde um dragão circunda seu lado esquerdo, desde a altura do ombro até o início do seu quadril. Traço perfeito, sobre a pele perfeita. “Oito sessões”, ela respondeu quando perguntei e então imaginei um homem vendo esse corpo por oito vezes e passei a não gostar desse número.

— Deveria levantar e vir até aqui, tem uma vista linda e o mar está perfeito. — ela diz me surpreendendo e eu sorrio ao ouvi-la.

— A vista daqui também é boa, pena que tem um roupão por cima. — falo e me viro com a barriga para cima, colocando meus braços embaixo da minha cabeça. A observo e ela sem se virar para mim, arranca o roupão e o deixa cair. Filha da puta!

— Não tem medo que as pessoas vejam isso? — pergunto e me levanto, ela me obriga a levantar.

— Não tenho muitos medos, Sr Avellar. — ela diz e vira o rosto para mim, sorrindo. — Bom dia. — ela diz e eu pego o roupão e a cubro. Beijo o alto de sua cabeça e tenho consciência de que uma boa higiene bucal é algo que salva vidas no período da manhã.

— Não mesmo, inclusive aceita ficar na casa de um desconhecido. — zombo dela e ela nega abaixando a cabeça.

— E você também é bem corajoso, aceita carona de mulheres que podem quebrar um nariz apenas com um golpe. — eu deveria evitá-la, há algo além do meu nariz que corre alguns riscos.

— Para tudo você tem uma resposta? — pergunto a abraçando e apoiando meu queixo em sua cabeça.

— Às vezes tenho outras perguntas também. — ela ri e eu a aperto.

— Bom dia, Sra língua afiada! — brinco com ela.

— Bom dia. — ela roça a cabeça como um gato em meu pescoço enquanto olhamos a linha fina que divide o céu do mar. — Gosto de estar onde estou nesse momento. — ela diz e eu lembrei das férias que ela mencionou, que gostaria de dias no mar e sem celular.

— Sim, aqui é muito bom e a vista é perfeita. — digo e não saímos do lugar.

— Sim, aqui é muito bom, mas estava me referindo a seus braços, tenho passado bons momentos nele. Agora, por exemplo, é um deles e a vista é apenas um detalhe. — ela me faz perder um pouco dos sentidos. Muitas mulheres já se declararam, já ofereceram um sentimento desproporcional, mas nenhuma delas me deu uma boa razão. Receio que sorrir como tenho feito seja uma dessas razões.

— Obrigado, tenho recebido algumas gorjetas por conta disso. — brinco para aliviar o clima que tento evitar boa parte de minha vida. Tudo é apenas para seduzir. Ela ri e se aconchega ainda mais em mim, parece não ter pressa de sair do quarto, parece não ter pressa de voltar para a vida real, onde se trabalha muito e as horas engolem nosso fôlego.

Sinto-a suspirar, ela veste o roupão novamente, faz o laço e volta para o meu peito. Seu cabelo está solto, bonito, mesmo amassado de um lado, o lado que estava apoiado em mim. Ela não tenta ser uma vitrine ou um modelo de mulher perfeita; ela contém sua vaidade e mal sabe que mulher bonita é assim, quando acorda, despenteada e mesmo que o humor não seja dos melhores, ainda é linda.

— Eu estava grávida de sete meses. — ela disse me pegando de surpresa e suspira novamente, não sei o que está vindo junto com essa conversa. — Sofri um acidente e ele se foi, levando meu coração, levando tudo que eu tinha, meus sonhos e minha vontade de escutá-lo me chamando pela casa. — ela para como se precisasse de mais oxigênio antes de prender a respiração. — Voltávamos de uma festa e havia sido um dia intenso, com brigas, ele bebeu muito e mesmo eu pedindo para dirigir, ele não aceitou.

Ela se movimenta e volta para o quarto, se senta na cama de frente para a varanda e eu vou até ela. Ela não está chorando, apenas está triste. Puxo uma poltrona e me sento de frente a ela, segurando suas mãos.

— Otto nunca interagiu ou demonstrou carinho por Gabriel — ela coloca o indicador sobre a tatuagem atrás da orelha— Mas eu o amava o suficiente por nós dois, mesmo com Otto desprezando por muitas vezes minha barriga e o bebê que estava dentro dela. Eu tentava não absorver nada e pensava apenas que tudo poderia mudar assim que ele nascesse. — Ela olha para mim e eu não consigo não olhar nos olhos dela. Fico em silêncio e a deixo falar.

— Gabriel morreu e o irmão de Otto também, nesse acidente. A família estava de luto e tentava confortar Otto dizendo que ele não era o culpado, que acidentes acontecem. Como sempre a família dele o protegia mesmo ele estando errado o suficiente para matar pessoas. — ela ajeita meu cabelo e desce a mão novamente.

“Eu o esperava com tanta ansiedade, preparei cada detalhe do quarto, fiz questão de eu mesma pintar as paredes e pregar cada um dos quadros. Comprei o que havia de melhor, desde fraldas até as melhores roupas, tudo que o mundo poderia oferecer de melhor para o meu filho eu comprei, meu dinheiro pode comprar tudo isso, mas não foi capaz de salvá-lo, não foi capaz de deixá-lo comigo. — ela está com os olhos cobertos por uma tempestade, não chora, apenas fala, baixinho.

“Os motivos pelo qual eu insisti nesse relacionamento fadado ao fracasso são inúmeros, mas nenhum plausível o suficiente para me livrar da culpa que sinto até hoje por ter entrado naquele maldito carro. Me condenei durante muito tempo, hoje consigo falar sem desabar, mas durante um bom e longo tempo minha vida se transformou em um inverno. — massageio seus dedos e nossos olhos estão juntos.

“Desculpa ter contado isso, está tudo tão perfeito, é isso que tenho feito, tenho deixado apenas as boas notícias chegarem à tona, mas achei que deveria saber sobre a parte de minha história que me faz triste e incompleta. — ela diz com tanta humildade e eu confesso estar perdido dentro de um labirinto de palavras de consolo, mas nenhuma delas funcionaria.

— Você ainda é nova, tem uma vida inteira pela frente. — escolho algumas palavras do labirinto e falo em sua direção.

— Sim, sou nova e tenho uma vida inteira pela frente, mas definitivamente sem chance alguma de ter filhos. — ela dispara. A olho como se achasse um absurdo ela decidir não ter mais filhos por conta de uma tragédia do passado, ela deveria se dar uma chance. — Ramon, filhos não é uma condição que agora eu tenho escolha, eu tenho apenas uma alternativa. — ela se levanta e vai em direção a sua bagagem. — Tentei engravidar novamente, contrariando as expectativas da medicina, mas eles estavam certos. — ela escolhe uma camisa fina sem mangas branca, pega um biquíni cor de rosa sem estampa, remove o roupão e começa a se vestir, como se fugisse do assunto.

— Tudo pode acontecer. — eu disse tentando aliviar a tensão.

— Claro que pode, menos uma gravidez. Talvez eu tenha ficado ao lado de Otto na esperança de engravidar e ele se retratar, idiotice minha, as duas coisas eram impossíveis. — ela vem até mim apenas com a calcinha do biquíni e vestindo a parte de cima. — Amarra para mim? — ela pergunta de costas e acho que não quer mais falar sobre isso. Deve ser difícil ter que conviver com algumas certezas.

— Lamento sobre sua perda e sobre as consequências. Deus sabe o que faz. — a viro de frente assim que amarro o biquíni e beijo sua testa.

— Eu sei, hoje... eu sei. — ela diz e sorri. Como se doesse ainda, mas havia mais superação e conformismo do que lamentação. Eu não deveria estar tão estupidamente encantado por essa mulher.

Vou até minha bagagem e alcanço minha sunga preta e a visto. É como se nos conhecêssemos há alguns anos, tenho liberdade com ela, e ela também tem comigo, não tem medo de se mostrar e ela é uma mulher de corpo comum, bem torneado, mas nada exuberante, pernas grossas e barriga lisa com um caminho de pelos descoloridos do umbigo até o paraíso. Vou para o banheiro, escovo os dentes, lavo o rosto e saio.

— Já elogiei seu traseiro uma vez. — ela disse passando protetor solar e em seguida vestindo a camisa. Ela faz um rabo de cavalo e vai para o banheiro.

— Eu já elogiei o seu pelo menos uma dúzia de vezes, ou seja, estou em desvantagem. — brinco com ela e ela volta, se inclinando para fora do banheiro.

— Obviamente meu traseiro é mais digno de elogios do que o seu. — ela diz sorrindo e isso me faz bem, muito bem por sinal.

— Tenho que concordar com você. — penso nesse traseiro desde o dia que trepamos pela primeira vez. — Vamos descer, estou com fome. — digo.

Descemos as escadas e Tomas corre com um avião na mão, olho para Christen e ela sorri para ele e ele se abre em felicidade, o bom das crianças é sua curta memória para coisas ruins.


13

 

Christen

 

 

O menino e seu avião. Sorri para Tomas e ele assim que me viu sorriu também. Ele não tem o cabelo tão escuro quanto a mãe e seus traços são diferentes, possivelmente seja mais parecido com o pai.

— Mad, caso demore para voltar do planeta onde está nesse momento eu espero, tenho muito pouco para fazer e minha ausência na semana passada quase não atrasou minha vida. — Rocco me desperta da lembrança do sábado de manhã em Malibu.

— Oi, Rocco. — digo e olho para tela do meu computador, mas não são e-mails que enxergo. Estou olhando Ariel correr com o irmão que leva uma pipa. Eles são uma família de verdade e não é o dinheiro que proporciona isso, facilita algumas coisas, mas outras o dinheiro não tem o poder de carregar. Não conheço um lugar onde se venda carinho e amor por medida e valor pré estabelecido, eles se amam e isso basta.

— Você está sorrindo como uma idiota! — ela balbucia e eu pouco assimilo.

— Para que horas? — pergunto tentando manter um diálogo sabe-se lá do que com ela. Eu vejo sua boca abrindo e fechando e não entendo o que ela diz.

— Para que horas o quê, criatura? Está ficando louca? Não sou paga para ficar colocando camisa de força em ninguém. Sei que ganho bem e longe de mim reclamar, mas se você começar a surtar, eu vou fugir. — ela fala mais alto e eu consigo entender o que ela diz.

— Rocco, desculpe estava concentrada no e-mail de Peter, tenho uma reunião com ele na próxima semana. — improviso uma desculpa e ela se levanta cruzando os braços.

— Mad, sua cabeça está em Malibu, e pelo visto o corpo também gostaria de estar — ela dispara feliz e se senta na cadeira perto da minha mesa. Esta manhã de segunda-feira chuvosa não mexeu com meu humor e estou pensando nele desde o momento em que acordei. Ele dormiu comigo essa noite, e quando eu acordei ele não estava mais lá, mas estava seu bilhete e um pequeno vaso com uma orquídea do meu jardim interno em meu criado mudo.

 


Cara Anônima,

Foi um prazer passar o final de semana com você, e me refiro a todos os prazeres, desde o banho de mar até sua incrível habilidade em lidar com uma família um pouco fora do normal. Não estou deixando o dinheiro para o taxi, mas estou deixando minha vontade de te ver tão logo seja possível.

Obrigado pela carona.

Ray

 


— Mad! — Rocco fala mais grave.

— Oi. — estou sorrindo como uma imbecil.

— Caralho, Mad! Você está apaixonada! — ela afirma e eu engulo, eu não quero me envolver seriamente com ninguém, quero apenas me divertir... com ele, gosto da companhia dele.

— E isso é muito ruim? — pergunto olhando para minha amiga de infância que acredito ter ciúmes de mim.

— Apaixonar-se não é ruim, mas você acabou de sair de um relacionamento e você sabe que Otto está na sua cola, ele pode se revoltar e ele gosta de ameaças macabras. — ela diz e se levanta. — Escute, Mad, você contou para o latino que seu ex-noivo está te perseguindo a semana toda? Contou para ele que Malibu foi uma tábua da salvação? — ela protesta.

— Claro que não, não faço o tipo de dama indefesa do Vilarejo no Sul da França, sei me virar bem e eu sei que despistei Otto pedindo ao Duff sair com meu carro daqui na sexta-feira. — me vanglorio do feito.

— Mad, você está andando para cima e para baixo com pelo menos quatro seguranças, não acha que uma hora ele vai perceber? — ela coça a testa que logo fica vermelha pelas unhas. — Não gosto da porra do latino, ele te deixa com cara de idiota e confesso que sinto falta da minha amiga, mas não é justo você não contar para ele sobre as ameaças de Otto. Sequer fez um registro contra ele, sua teoria de que uma hora ele vai cansar pode estar errada. Eu estava doente e fora a semana passada e quando você me ligou para falar o que estava acontecendo, eu tive vontade de ir até a casa dele e encher a cara dele de chutes e coriza. — ela dá a volta na mesa e segura minha mão. — Não vem com essa de que cachorro que ladra não morde, morde sim e pode matar também. Otto é descompensado, sempre foi.

— Ora, Rocco, não gosta do latino, mas quer que eu seja franca com ele? — questiono e cruzo meus braços olhando para ela.

— Não gosto mesmo, mas você está com a porra de um sorriso no rosto que há muito tempo eu não via e sei que aquele latino é o responsável por isso, então, eu prefiro você assim sorrindo do que se escondendo atrás de uma executiva. Peço apenas para manter sua imagem preservada e tente não sair com ele em público, isso pode alimentar a raiva de Otto. — ela sorri para mim sendo solidaria.

— Estamos em sigilo e não temos nenhum compromisso sério, estamos apenas aproveitando. — digo a ela e me levanto ajeitando meu vestido até a altura do joelho. — Ele não quer relacionamentos e eu estou tentando me livrar do meu último. — digo e tiro os saltos pretos e anda pela sala.

— Estou preocupada com você. — ela diz me olhando com o rosto demonstrando a preocupação.

— Tenho quatro seguranças, não tenho saído de casa nem para academia e nem para a ioga, logo isso passa, ele esquece e arruma alguém para ele. — falo sem nenhuma preocupação e ela nega com a cabeça.

— Bom, ao menos conte ao latino que você está andando com uma escolta e o motivo, não se esqueça que ele pode ser o alvo também caso Otto descubra. — ela diz e eu me preocupo com isso.

— Você acha que ele faria algo contra Ramon? — pergunto.

— Eu não sei, ele pode usar a influência da família e prejudicá-lo de várias formas. Ele também tem seus interesses financeiros, existe uma indústria farmacêutica que ele comanda, eu não gosto de política e muito menos de quem está envolvida com ela. — ela diz e uma sensação ruim me invade.

Não posso permitir que nada aconteça com Ramon por conta de um relacionamento que acabou de forma idiota.

— Obrigada, Rocco. — a olho com preocupação. — Você sempre está comigo. — a agradeço.

— Quase sempre, vai para Londres e não vai me levar, se o problema é o custo, eu pago. — ela enfim confessa que ficou chateada comigo por conta disso.

— Claro que não é o custo, sua tonta. E eu só estava precisando de um tempo, mas e sua prima que quer ir para Califórnia? Não chega na próxima semana? — pergunto pelos planos que ela rapidamente arranjou assim que falei da viagem.

— A desgraçada não vai vir, está de caso com um cara e pelo visto anda por aí com uma cara de idiota assim como você. — ela está brava. — Não entendo como vocês se apaixonam com tanta facilidade! — ela está revoltada.

— Rocco, você é linda e sabe se vestir muito bem, fica ótima nesse conjunto lilás de saia e blusa frente única, você também deve atrair olhares, mas passa muito tempo comigo, temos a mesma idade e nunca ouvi você dizendo sobre algum namorado ou coisa assim. — digo ela me olha com receio. — Anda, Rocco, me fale algo mais além de suas trepadas sem compromisso! — a intimo.

— Mad, não ria. — ela pede e eu concordo com a cabeça fazendo cara séria, mas já com vontade de rir.

— Nem trepo tanto assim, tudo fachada. Faz quase um ano que não sei o que é sexo, namorei um cara por quase um ano, rompemos e depois disso fui para cama com um cara em Londres, lembra quando viajei ano passado? Então...

— Rocco! Eu nunca vi você com ele! — falo espantada.

— E nem podia, nos encontrávamos à noite e nem sempre, ele é médico e seus plantões eram uma bagunça, trepei muito com ele no almoxarifado do hospital onde ele trabalhava. — ela diz e nega com a cabeça.

— Mas por que vocês romperam? Não gostava dele? — pergunto e me sento de frente a ela no jogo de sofá.

— Gostei sim, acho que gosto até hoje, talvez por isso trepar depois dele ficou tão difícil, mas seria complicado continuarmos juntos. — ela diz.

— Por quê?

— Casado e pai de três filhos, eu não deveria remexer muito na vida das pessoas ao meu redor, mas você sabe que se eu não fosse sua assistente pessoal eu estaria invadindo sistemas bancários e distribuindo melhor a renda no país. — ela confessa e eu sei sobre sua habilidade em hackear a vida das pessoas.

— Que canalha! — eu falo em protesto. — Tenho orgulho de você, Rocco.

— Não tenha, desejei a morte da mulher dele inúmeras vezes, até que descobri que ela estava em uma cadeira de rodas há alguns anos, então, eu decidi nunca mais desejar nada de ruim para ninguém. Eu não sei a realidade das pessoas, a realidade dele era carência sexual, mas ele era e ainda é afetivo com a família, possivelmente ele arrumou outras depois de mim, mas estou tranquila em ter desistido assim que soube da minha oponente. — ela é incrível.

— Tenho orgulho sim, e como você foi abandonada pela prima idiota, poderia me fazer companhia em Londres. — falo e sorrio para ela.

— Mad, eu te odiei por longos minutos por você ir sem mim. — ela confessa.

— Eu me odiei por querer ficar sozinha, não estava em um bom dia. — digo e ela vem em minha direção.

— Não gosto do latino, mas eu amo você, então, pode contar comigo para esse seu caso incoerente de escapadas a praias e afins, eu cuido do seu pai e toda essa coisa que ele acha que tem que seguir. — ela me abraça e por alguns dias achei que estava perdendo minha amiga. — Talvez com o tempo eu possa vir a gostar dele, mas não estou prometendo nada, posso odiá-lo cada dia mais também, não se anime. — ela beija meu rosto e retoma seu iPad, ditando os compromissos.

Minha agenda está lotada essa semana e isso não é nenhuma novidade. O problema é que quero encontrar uma brecha para ver Ramon, mas eu tenho que planejar bem esse encontro, não posso deixar que Otto saiba sobre nós.

Me sento na mesa diante do meu computador e atualizo minha caixa de entrada. Um sorriso salta em meu rosto e a voz de Rocco some. Um e-mail dele alegra minha manhã de segunda-feira.

 

***

 

De: Ramon Avellar

Para: Christen Madson

Assunto: Manhã de segunda-feira

Hora: 09:21

 

Bom dia, Srtª Madson

Deveria ter mais cautela com as pessoas, deveria se preocupar se as pessoas que desfrutam de sua companhia não sofrerão com a sua ausência em dias de chuva na manhã seguinte.

Apreciei sua companhia nesse fim de semana, gostaria que não fosse um caso isolado. Estou pensando em suas tatuagens, em sua boca e no tipo de coisa que eu poderia fazer com tudo isso.

Sentindo a sua falta, e talvez eu não devesse.

(Vontade de te ver)

;)

Ramon Avellar — Diretor Corporativo Korck Farmeceutics®

Enviado via Smartphone

 

***

 

Releio pelo menos umas quatro vezes o e-mail e sei que Rocco está falando alguma coisa sobre o evento de quinta-feira, mas pouco me importa isso agora, estou feliz de estar nos pensamentos dele, assim como ele está nos meus.

Me remeto à noite de sábado em Malibu, onde tudo parecia mágico e acredito que tenha sido. O som era Christina Perri, Human. Alcanço meu celular e a coloco de novo.


“Posso segurar meu fôlego

Posso morder minha língua

Posso ficar acordada por dias

Se isso é o que você quer

Ser a sua número um”


— Não gosto de pensar que daqui a quarenta e oito horas eu não estarei onde estou agora. — ele disse e se enterrou com força dentro de mim. Estávamos na varanda, eu estava apoiada com as costas no parapeito e minhas pernas laçavam sua cintura, foi intenso, foi vivo e foi sob as estrelas de Malibu.

— Então não pense. — eu disse e ele entrou e saiu outras vezes, e a cada explosão eu me sentia viva e liberta. Poderia ser com qualquer uma ali, naquela varanda, mas foi comigo e isso por si só faz minha segunda-feira tempestuosa ficar ensolarada como uma tarde de primavera.

Rocco aumenta em um tom a sua voz, ela sabe que não estou presente, apenas meu corpo está ali, meus pensamentos estão nele e em tudo que ele pode fazer comigo.

— Mad, vou pegar um café, espero que volte logo de saturno. — ela diz e sai da minha sala. Clico em responder.

 

***

 

De: Christen Madson

Para: Ramon Avellar

Assunto: Manhã de segunda-feira

Hora: 09:40

 

Bom dia, Sr Avellar,

Deveria ter cautela?

Quanto ao senhor, deveria se mostrar um pouco menos encantador. Estou em dúvida agora, afinal de contas, tudo que você faz é para seduzir... não preciso confirmar se está funcionando, você sabe.

Gostei de ganhar uma orquídea que já era minha e espero poder vê-lo em breve.

Bj


Christen Madson — CEO — Madson Corporation®

 

***

 

Bato com a caneta sobre minha mesa, estalando o metal sobre o vidro. Estou ansiosa por uma resposta, como se eu tivesse quinze anos e o garoto do último ano estivesse me olhando. Alguns minutos depois vejo que ele encaminhou a resposta.

 

***

 

De: Ramon Avellar

Para: Christen Madson

Assunto: Manhã de segunda-feira

Hora: 09:43


Christen,


Eu não sei se minhas técnicas de sedução estão funcionando, quanto às suas...

Ramon Avellar — Diretor Corporativo Korck Farmeceutics®

Enviado via Smartphone

 

***

 

Não faça isso com meu coração, Sr Avellar, ele está suscetível e essas coisas perdem o controle facilmente. Penso e de novo encaminho uma resposta.

 

***

 

De: Christen Madson

Para: Ramon Avellar

Assunto: Gestão de técnicas.

Hora: 09:45


Ray,

Me deixou curiosa quanto às minhas técnicas, eu nem sabia que as tinha, poderia me dizer se estão funcionando ou não?

Preciso saber como gerir essas técnicas adquiridas.

?


Christen Madson — CEO — Madson Corporation®

 

***

 

Mesmo com minha mesa clamando pela CEO responsável por essa papelada que se amontoa, eu fujo para minha caixa de entrada e a atualizo, incansavelmente e de repente surge a resposta dele. Não sou a única que abandonou o trabalho nessa manhã.

 

***


De: Ramon Avellar

Para: Christen Madson

Assunto: Gestão de técnicas

Hora: 09:47


Christen,


Sobre suas técnicas devo ressaltar alguns pontos:

? Sabe o que fazer com sua boca, desde sorrir... até me fazer sorrir

? Possui uma inteligência afiada e isso me dá a nítida sensação de estar falando com alguém que possivelmente vai me derrotar a qualquer momento e eu sou um perdedor confesso

Sobre a funcionalidade de suas técnicas, afirmo que eu não sei, o que sei é que eu deveria estar no meu escritório e não na recepção de sua empresa sorrindo para a tela do meu celular.

Ramon Avellar — Diretor Corporativo Korck Farmeceutics®

Enviado via Smartphone

 

***

 

Levo minhas mãos até a boca e sorrio, como a adolescente tola ao tocar nas mãos do garoto do último ano. Calço meus saltos correndo e vou em direção ao banheiro e olho o reflexo no espelho: Sim, eu estou feliz! E isso é o melhor produto de beleza.

Saio da minha sala e encontro com Rocco vindo em minha direção com dois copos de café, ela me olha com espanto e pergunta o que está acontecendo.

— O garoto do último ano! — respondo sorrindo e indo em direção a ele. Não vejo o caminho, não vejo os rostos, o que sei é que preciso manter a calma e não chegar ofegante ao seu encontro.

Caminho e tento disfarçar o sorriso que se instaurou em meu rosto. Ganhos as dependências e vejo as pessoas me olhando, elas estranham o horário em que estou caminhando pelos corredores. Geralmente eu estaria enfiada na minha sala, providenciando mais trabalho para elas, mas agora estou providenciando algo a meu favor.

Então, eu o vejo. De terno azul escuro e gravata no mesmo tom, ele sorri em minha direção e o que posso dizer é que tudo em mim está feliz, apropriadamente feliz.

— Oi. — ele diz com um sorriso branco e perfeito. Meu corpo vibra e com isso meu coração se alegra.

— Oi. — respondo sorrindo também, porque ele retira de mim o que foi ruim, ele me faz sorrir. Nos afastamos das pessoas e nos isolamos em um canto da recepção.

— Suas técnicas de sedução são covardes e inescrupulosas. — ele diz baixo e guarda o celular no bolso da calça. É inevitável não perceber os músculos sob o tecido de seu terno sob medida.

— Sim. — umedeço os lábios e retomo a frase. — E as suas não estão funcionando. — retruco sorrindo.

— É, eu sei, me esforço para isso. — ele pisca um dos olhos e eu me derreto. Pagaria suas gorjetas em qualquer momento do dia, mesmo que isso me custasse milhões.

— Veio até aqui reclamar sobre seus trocados? — brinco.

— Sim, eu os quero. — ele diz e dá um passo em minha direção e nossos corpos estão a menos de um palmo. — Está linda com esse vestido verde colado em seu corpo, não deveria usar nada que o evidenciasse tanto. — ele faz uma sutil menção ao seu incômodo com minha roupa.

— Não importa o vestido, importa o que ele esconde, e você sabe como é aqui por dentro, tem ficado boa parte do tempo por aqui. — sou direta e ele sorri de lado.

— Sim, eu sei e ouso dizer que gosto muito. — ele cessa e passa a mão pelos cabelos, exasperado. — Eu precisei ver você agora, preciso viajar para Seattle amanhã pela manhã e não sei por quanto tempo vou ficar por lá. — ele se justifica.

Meus pensamentos ficam tristes por isso, por essa falta de previsão e essa viagem repentina, mas ele tem uma empresa para liderar e nós não temos nenhum tipo de compromisso.

— Bom. — falo e espero até que as palavras se coloquem em ordem e eu não saia falando nenhum tipo de besteira. — Espero que resolva. Pelo tom que usou o que tem para resolver parece complicado, o mundo dos negócios é assim. — disparo, mas não estou feliz, isso é certo.

— Meu tom de preocupação não se refere ao que tenho que resolver em Seattle, mas sim ao que estou deixando por alguns dias aqui em Nova York — ele estende a mão e alcança a minha. Eu olho ao redor para ver quantos pares de olhos estão nos analisando. Eu deixo-o me segurar, mas solto em seguida.

— Está deixando uma anônima que fará com que esses dias passem logo, me perdoe. — digo olhando para minha mão longe da mão dele. Não quero que saibam sobre ele, preciso preservá-lo por conta de Otto.

— Eu entendo. — ele diz olhando para nossas mãos distantes. Ele imagina que seja apenas por conta da minha imagem, nem imagina que é a dele que quero proteger. — Vou tentar não pensar muito em você nesses dias, seria autoflagelo. — ele diz, se aproxima beijando o alto da minha face demoradamente e eu fecho meus olhos. Gosto de seus lábios.

— Eu vou optar pela tortura. — admiti covardemente e tudo nele é intenso demais para fingir que não sinto nada além de um tesão sem fim. É mais que corpos gastos pelo sexo, é confidência e imperialismo um sobre o outro.

— Fique bem. — ele diz e sai pela porta, resgatando o celular e olhando para a tela. Isso me fez triste, me fez incompleta, me fez sentir falta dele antes mesmo que ele pudesse colocar alguns passos de distância entre nós.

Fico por alguns minutos olhando-o caminhar sob a chuva, entrar em seu carro e sair do estacionamento. Me perco em nosso final de semana e viajo para a manhã de domingo.


— Christen? — Ariel me chamou e eu estava arrumando minhas coisas, faltava algumas horas para partirmos. Ela estava sentada na cama onde eu e Ramon dormimos, bom, dormimos algumas horas. Ela brincava com sua boneca e dizia que era a boneca que ela mais gostava. Ela remexia, tirava e colocava o mesmo vestido na boneca.

Eu havia brincado muito com ela e suas coisas de criança, sua cozinha fez deliciosos bolos de lama, não experimentamos, mas a aparência estava ótima. Depois fiz uma trança em seu cabelo e ela quis mexer no meu.

Mãos de criança são como um toque de Deus, eu sei que são.

— Serafine tem sorte de ter você! — eu disse me sentando na cama de frente a ela. O sorriso de Ariel é lindo, mesmo faltando um dentinho que ela disse ter ganho um dólar por ele através da fada do dente.

— Eu quero que fique com ela. — ela disse e meus olhos que não são acostumados com lágrimas estranharam o que estava acontecendo.

— Mas ela é sua boneca favorita, a boneca que você mais ama! — eu disse tentando ensinar algo sobre não se afastar de quem se ama.

— Sim, ela é a boneca que mais amo, por isso estou te dando. — ela disse e me estendeu a boneca. — Tio Ray disse que temos que oferecer o que temos de melhor. — por um único instante eu fechei meus olhos e permiti que a lágrima descesse. O que eu tenho oferecido? Seria o melhor de mim? Ou apenas o que sobrou de mim?

— Vou cuidar dela, todos os dias, para sempre. — eu disse e a puxei para o meu colo a abraçando. Por Deus, que abraço bom, Gabriel teria quase a mesma idade que ela.


— Posso saber o motivo de você estar parada na recepção com olhos em outro planeta? — meu pai me acorda do abraço e desfaz meu momento feliz.

— Bom dia, pai. — digo e caminho em direção a minha sala. Ele me segue falando alguns absurdos sobre meu sumiço e sobre um jantar na sexta-feira, ele exige a minha presença e diz ser de suma importância meu parecer sobre o investimento e a fusão que ele quer fazer com uma marca italiana.

Concordo e tento manter o assunto profissional entre nós como única pauta nessa manhã de chuvosa.

— Teremos companhia logo mais — Rocco diz assim que corto um pedaço de torta de chocolate e levo até a boca. São quase três horas da tarde e para variar atrasei meu almoço apenas para adiantar o trabalho todo e tentar sair um pouco mais cedo.

— Quem? — pergunto e Rocco fala com a boca cheia do mesmo doce que eu estou comendo.

— Nick — ela fala e já suspende a sobrancelha.

— Você vai cuidar dele, assunto encerrado, preciso ir embora, tenho um assunto para resolver — ordeno e não deixo nenhuma chance dela me convencer a ficar. Ele já ficava no meu pé quando ainda era comprometida, imagina agora que a notícia sobre meu ex- relacionamento se tornou uma epidemia.

— Eu mereço um aumento por isso — ela diz em tom de brincadeira.

— Eu ofereceria dinheiro para qualquer um que queira me salvar de Nicholas Hedings — empurro meu prato e aceno para o garçom trazer a conta.

— Eu aceito! — ela sorri.

— Rocco — enrolo um pouco e tento buscar uma combinação de palavras para que ela não tenha um ataque de nervos.

— O que você quer, Mad? — ela me olha de lado e deixa o iPad ao lado do prato.

— Consegue salvar minha vida se eu for embora agora? — pergunto diretamente e ela coloca as mãos de cada lado do prato.

— Não — ela diz serenamente.

— Ótimo — jogo algumas notas sobre a mesa — Amanhã eu pego meu carro no estacionamento da Madson, isso vai ser bom, vão pensar que estou por aqui — Me levanto e coloco a minha bolsa no ombro.

— Acho que não estamos falando a mesma língua, eu disse que não vou salvar sua vida — ela fala e eu vou me afastando, e deixo alguns beijos para ela no ar.

— Mad, eu disse não! — olho para ela e ela está sorrindo e eu também.

Aceno para um taxi e assim que entro vou em direção a minha casa. Preciso fazer o que está em minha mente.

Subo para o meu quarto e separo meu sobretudo, ele é branco, felpudo com botões em marrom grandes e eu sou fã do Valentino.

Tomo um bom banho, daqueles que o aroma do sabonete adere na pele, depilo minhas pernas e todos os pontos que não merecem ter nenhum tipo de pelo e deixo meus cabelos mais volumosos com um bom mousse.

Termino a maquiagem, realço meus olhos e deixo minha boca com pouco brilho.

A campainha toca e desço usando apenas o roupão. Tento elaborar o que dizer, como agir, mas não consigo, só de pensar eu sorrio e me distraio com a imagem dele.

Quando chego na sala, vejo um envelope perto da porta e eu imagino o que seja, mas mesmo assim eu o abro e apenas confirmo. Minha espinha gela, meu estômago se retorce e o que sinto não é medo, é ódio.


Puta, mais conhecida como Christen Madson

 

Sabe contar?

Eu também...

Então conte comigo, 10, 9, 8, 7, 6...

Você pode esconder, mas eu posso fazer você sumir

 


Mais uma carta, e eu não posso deixar que isso me abale, é isso que ele quer, e eu tenho certeza que é ele, não tenho problemas com mais ninguém. Subo e a deixo com as outras, mas antes tiro uma foto e envio para Rocco.

Ela responde na mesma hora, dizendo que vai chamar a polícia, mas eu a reprimo e digo que já estou resolvendo... eu minto.

Coloco meu sobretudo, meus saltos altíssimos, pretos e sedutores, e coloco um pouco de perfume em meus pulsos, o mesmo que usei em todo corpo.

Ligo para o serviço de taxi e olho no relógio, são quase seis horas e tudo que preciso agora é saber se ele gosta de surpresas.

Oi, ocupado? – C&M - 17:54 — envio um Whattsap e espero a resposta. O taxi para em frente a minha casa.

Para você nunca, acabei de chegar em casa – Ray – 17:57 — vejo a resposta e sorrio. Vou em direção ao carro e aviso o endereço

Terminou o expediente mais cedo, acho que seu chefe não vai gostar — C&M – 17:58

Meu chefe está no mundo da lua, não para de falar de uma mulher desconhecida que ele salvou, ele nem vai notar a minha ausência – Ray – 17:59

Mulheres... sempre detonando tudo como uma granada – C&M – 18:01

Pior do que isso, somos nós que puxamos o pino e ativamos toda a pólvora – Ray – 18:03

Preciso do meu pino de volta – C&M – 18:04

Ele demora para responder...

Vem buscar – Ray – 18:09 — ele responde e estou na rua do prédio dele. Espero que o taxi pare na frente do seu edifício e respondo.

Abra a porta para mim, mas vou demorar um pouco, vou subir pelas escadas – C&M – 18:14

Paro na portaria onde obviamente não conseguiria passar, é para isso que elas existem. O responsável por ela avisa Ramon que estou aqui e em seguida a mensagem chega.

Fique exatamente onde está, vou descer e subir pelas escadas com você – 18:17 –Ray — Agora sorrio ao ler as ordens dele e eu sei que ele não vai subir pelas escadas.

Olho para o meu reflexo no espelho gigantesco na entrada e gosto do que vejo, eu vejo olhos felizes.

O porteiro me encara e deve estar imaginando que eu seja alguém que cobra por hora. Sorrio internamente e olho para a porta do elevador se abrindo e Ramon vestindo uma camiseta e seus cabelos ainda estão molhados e eu sinto o cheiro do sabonete.

Os olhos dele quase me golpeiam, ele me encara dos pés à cabeça e pelo que vejo em seu rosto não sei se ele está gostando do que está vendo.

— Algum ladrão entrou na sua casa e roubou todas as suas calças? — ele me leva para o elevador e não parece nada feliz.

— Por que eu colocaria calças? Está calor — me justifico e ele aperta o número vinte — Não ia subir pelas escadas comigo? — cobro o que me disse e ele me olha de lado. A porta se fecha e ele para na minha frente e a câmera de segurança também está, mas ele cobre meu corpo totalmente.

— Você está praticamente nua — ele diz com o cenho franzido e o elevador sobe, e ele me encara e há muito tempo não sei o que é alguém ter ciúmes de mim. Mas agora não sei como ele vai reagir ao ver o que tem por baixo.

— Não estou nua, estou vestindo um Valentino e os sapatos são Jimmy Choo, sem contar que a bolsa é uma Channel — zombo e ele inclina a cabeça em total desaprovação e o elevador para.

Caminhamos até a porta do seu apartamento e ele a abre para mim.

Dou sete passos, paro de costas para ele que se manteve longe e, então, jogo minha bolsa sobre a poltrona e desabotoo os botões do sobretudo e o deixo cair.

Me viro de frente para ele...

— Agora sim estou praticamente nua — seu semblante se parte e vejo sua boca abrir vagarosamente.

Ele caminha em minha direção, arranca a camiseta e serpenteia minha cintura com seus braços.

— Você saiu assim da sua casa e eu deveria te odiar por isso, mas o que consigo é bem diferente — ele segura a minha mão e coloca sobre seu membro, duro e totalmente convidativo.

— Assim que eu gosto, me esperando — retruco com uma frase que ele usou na noite em que nossos nomes eram guardados a sete chaves.

Ele me beija e percorre as mãos sobre meu corpo, desliza as pontas dos dedos sobre meus seios e morde meu lábio. Ele me deseja, mas acho que nesse momento o desejo muito mais.

Ramon me conduz até a sala e coloca um dos meus pés sobre a mesa entre os dois sofás e me inclina para frente, fazendo com que eu me apoie no encosto de um dos assentos.

Ele fica atrás de mim e se abaixa. Sinto sua boca beijar atrás de minha coxa, e ele deveria ir com mais calma pois é a perna que está apoiada no chão. Ele passa a língua lentamente e sobe, até encontrar meu ponto íntimo e por lá ele circula e de repente leva sua língua em meu traseiro, isso é surreal.

Ele volta sua boca em meu sexo e desliza sua língua com habilidade e me suga, intimamente, ferozmente e eu poderia concluir nesse momento que ele tem tanta fome quanto eu.

Ele sobe a língua e de novo me atinge totalmente entre minhas pernas e estou exposta e à beira de um orgasmo.

Sinto-o se afastar e ir em direção a cozinha. Escuto-o abrir uma garrafa e o líquido ser colocado duas vezes.

Ele volta e me suspende, me colocando de frente a ele.

— Desculpe, deveria ter servido sua bebida antes de começar a minha refeição — ele me entrega uma taça e bebe um gole da sua antes de colocar sobre a mesa onde meu pé estava apoiado.

Ele se coloca de joelhos à minha frente e abre cuidadosamente minhas pernas. Ameaço largar a taça e ele proíbe.

— Beba e não derrube em mim — ele abre meu sexo delicadamente e percorre sua língua — Beba o Cabernet enquanto eu bebo um pouco de você — ele diz e eu fecho meus olhos, me deixo levar pelo movimento extremamente qualificado de sua língua sobre meu clitóris. Ele lambe e suga com vontade e eu sinto quando ele coloca sua língua dentro de mim. A taça quase cai, quase tomba e eu me mantenho firme sobre meus saltos com mais de dez centímetros até o momento em que deixo o meu orgasmo descer por sua garganta.

Suas mãos agora descem pelo meu traseiro e ele se levanta, se livra de sua calça de malha e cueca e agora o jogo está igual para ambos.

— Preciso colocar essa taça antes que ela salte minha mão e se quebre — ele pega a taça de minha mão e me leva até o sofá e me deita.

Ele segura a taça sobre meu corpo e vira um pouquinho deixando um fio discreto do vinho espirrar sobre meu umbigo. Ele coloca a taça de lado e coloca a boca sobre meu seio, suga repetidas vezes e desce ao encontro do meu umbigo cor de vinho tinto. Ele brinca com sua língua até que o líquido quase desapareça e depois ele segue, novamente para o meu sexo.

Uma de minhas pernas está sobre o encosto e a outra com o pé no chão, é um espécie de delírio, o delírio mais foda que senti em toda a minha vida. Ele desliza a língua em todo meu sexo e a enfia em meu sexo. Sobe e suga meu clitóris arruinando qualquer expectativa minha em sair ilesa daqui essa noite.

Levo minhas mãos para cima de minha cabeça e agarro com força o braço do sofá. Eu vou gozar de novo e ele sabe disso.

Me entrego totalmente e isso não seria diferente, ele tem tudo que é meu.

— Amanhã vou me lembrar disso e não vou conseguir me concentrar — digo e ele coloca seu rosto diante do meu.

— Duas coisas — ele diz.

— O quê? — pergunto.

— Uma, eu não vou me lembrar, porque tenho certeza que não vou esquecer — ele responde e eu sorrio.

— E a outra coisa? — pergunto e ele roça seu membro em meu sexo.

— Amanhã vou fazer isso de novo — ele entra de uma única vez e meu gemido ecoa, batendo nas paredes. Ele entra com força, faz barulho, barulho de corpos se fundindo, fodendo e tudo nitidamente está molhado.

Ele entra repetidas vezes e num único movimento me coloca sentada sobre ele. Apoio meus saltos finos sobre o tecido do sofá e tenho quase certeza que vai rasgar, assim como ele está fazendo comigo nesse momento.

Subo lentamente, quase soltando-o de mim e desço ainda mais devagar e ele joga a cabeça para trás, soltando um gemido forte, tão forte como a maneira que segura cada lado do meu traseiro.

Acelero só um pouquinho meu movimento e deixo que ele bata fundo em mim. Sinto suas pernas se esticarem, ele resiste e eu acelero ainda mais e vejo meu salto abrindo um pequeno rasgo no tecido caro do sofá.

— Estraguei o seu sofá — digo gemendo.

— Não foi só o sofá que você andou estragando por aqui — ele se levanta e me leva atracada com ele até a mesa de jantar e me senta bem na beirada.

Ele abre minhas pernas e começa o vai e vem que me leva com certeza para um tipo de inferno abençoado.

Aproximo minha boca e ele segura meus cabelos, me levando para junto dele, me beijando ardentemente, e eu sinto a estupidez de sua língua e agora entendo como é fácil gozar em sua boca. Me derreto e percebo que ele vai finalizar toda a ação e fecho minhas pernas e impeço que ele continue.

— Não seja malvada — ele diz e eu o tiro de mim.

— Não sou — saio da mesa e me deito sobre ela, de bruços, e estico meus braços alcançando o limite dela e segurando em sua borda — Quero mais de você — dou a entender que preciso dele em todos os pontos do meu corpo.

Sinto-o penetrar mais algumas vezes em meu sexo e sinto-o colocar seu dedo úmido atrás de mim, estou relaxada e eu quero ele exatamente onde o dedo dele está.

Ele me penetra por trás, devagar, com medo de machucar e eu o sinto, forte, me preenche e quase me incomoda. Seu ir e vir é mais calmo, ele geme, e eu fico excitada em saber que ele está mais duro ainda, com mais tesão e eu sei que seu fim está próximo.

Sinto-o me encher e sinto suas mãos descerem pelas minhas costas assim que o último ato se encerra e é hora das cortinas se fecharem.

Ele sai de mim e me levanta com calma e me coloca de frente a ele, como se eu fosse frágil.

— Você está bem? — ele pergunta.

— Melhor do que parece — ele se aproxima e me beija.

— Era para você pegar o seu pino de volta e não puxar o meu — ele volta a me beijar. Mas agora ele me leva para o quarto e me deita em sua cama — Você conseguiu arruinar meus pensamentos e sinto que você vai arruinar algo além disso — ele se deita ao meu lado e me abraça.

— Acho que gosto de saber que estou te arruinando — falo e ele me aperta contra ele.

— Posso saber por quê?

— Porque é isso que você tem feito comigo, estamos quites, meu caro — ele me beija o ombro e não gosto de pensar que isso um dia possa de fato ter um fim.


14

 


Ramon

 

 

O que eu sei é que a porra desse relógio resolveu parar e essa semana se arrastou como um bicho preguiça e por um inferno inteiro nunca esperei tanto uma sexta-feira como esperei por essa. O caso é que a visita de Christen na segunda-feira conseguiu foder ainda mais com meu psicológico, tudo por aqui está fodido e sem controle algum.

Tudo bem, eu sei que perdi a porra do controle em algum lugar entre os telefonemas para Christen e as homenagens que prestei a ela aqui em Seattle, mas foda-se! Me sinto bem assim, não estou agredindo meu corpo e saber que ela se lembrou de mim esses dias me fez feliz. Assumo ser um puto de um perdedor confesso. Sou a nova epidemia daquilo que atingiu Evan, Sebastian, e se Benjamin estivesse aqui ele diria que estamos caindo um a um como dominós enfileirados. Ele sempre diz isso.

Meu celular anuncia mensagens, uma seguida da outra. Termino de fechar a minha bagagem e desço para a recepção do hotel. Me sento na poltrona esperando o taxi que solicitei à recepção chegar.

A primeira mensagem é de Christen.

“Bom dia, não sei para você, mas essa semana teve pelo menos vinte dias a mais. Me sinto tola ao dizer isso, mas “isso” é a verdade sobre mim nesse momento, estou sentindo sua falta” — C&M — 08:33

Respondo como um adolescente, sorrindo e esquecendo as pessoas ao meu redor.

“Você teve sorte. Aqui houve um problema no tempo e ele travou por duas décadas na terça-feira. Me sinto um tolo em dizer isso, mas fico feliz em ter encontrado alguém tão tolo quanto eu” ;) — Ray — 08:36

A outra mensagem é do puto do Benjamin, falando obscenidades sobre a encomenda que encontrei e enviei a foto. Ontem à noite eu havia esquecido dessa merda e no restaurante acabei encontrando alguém com o perfil de Carl, eu não foderia essa mulher, mas ele sim.

Falta uma semana para o encontro em Madri, e essa semana que falta deveria se arrastar como a última se arrastou. Escuto o celular anunciar um mensagem, é ela e eu volto a sorrir.

“Sobre os tolos, os sábios pouco sabem porque pouco vivem” — C&M — 08:39. Sorrio ao ler, e ao entender percebo sobre meu antigo ponto de vista sobre a vida.

“Sobre os tolos... gosto de ser um” — Ray — 08:40

“Esperando pelo tolo, tenho um sobretudo novo” — C&M — 08:41

“Céus, por favor, não ande na rua apenas com ele, ou melhor, não saia na rua nunca mais. Se tranque em sua casa, se esconda do mundo, ele não merece você... Meu voo sai em duas horas, estou a caminho do aeroporto. Beijos” — Ray — 08:42

“Providenciando trancas, cadeados e um salto novo para destruir um novo sofá ;) ...beijos” — C&M — 08:43

A recepção me informa que o taxi chegou e eu sigo para o aeroporto. Abro minha bolsa e busco pelos meus fones de ouvido. Conecto ao celular e olho as opções da minha playlist. Escolho All Of Me, de Jonh Legend.


“As cartas na mesa, estamos mostrando os nossos corações

Arriscando tudo, apesar de isso ser difícil”


Durante todo o percurso tentei imaginar como seria estar no Clube depois de ter conhecido alguém como ela. É como se eu realmente mendigasse por um mísero pedaço de pão, mesmo tendo uma refeição de primeira disponível.

Pela primeira vez em dez anos de Clube, sinto meu corpo e mente rejeitarem minhas decisões do passado. Não é arrependimento, é consciência.

 

***

 

Assim que chego em casa, vejo Moh na sala ajeitando um arranjo de cravos, são vermelhos e bonitos. Minha casa nunca teve flores.

— Olá, Moh. — disse entrando na sala e colocando a bagagem ao lado da porta. — O que o amor não faz? — brinco com as flores que ela recebeu e ela vem em minha direção, beija meu rosto e entrega um pequeno envelope com um cartão dentro.

— Sim, o amor faz coisas incríveis, mas as flores são para o senhor. — ela dá dois pequenos tapas em meu ombro, me avisa que o sofá está com dois pequenos rasgos e sai, me deixando confuso. Me sento no sofá diante do vaso com pelo menos uma dúzia de cravos, vermelhos e intensos.

Abro o envelope e começo a ler.

 

Ray,

Gostaria de ter isso até o aeroporto e certificar-me que chegou bem.

C&M

 

A letra dela é linda e eu não cheguei bem, cheguei querendo ver você, cheguei pensando em você mais do que deveria. Pensei por um nano segundo que pudesse te querer menos estando longe, mas não, tudo piorou e ficou sem cor. Não tive você essa semana me falando sobre gorjetas e técnicas frustradas de sedução, você me fez falta e não deveria fazer.

Não podemos ser um do outro, ou podemos e não devemos. Não sei, o que sei é que era para ser anônimo, sem nomes e afins e agora minha casa tem flores e seu sorriso. Sinto minhas mãos suarem, sinto que quero mais você do que quis qualquer coisa nessa vida e eu não consigo entender essa necessidade tão absurda de querer alguém. Mas compreendo meus amigos que passaram por cima de tudo por conta disso.

Mas eu quero você, quero para matar essa saudade e evitar que ela aconteça de novo. E por mais que eu não mereça ter você, eu quero ter. Pego meu celular e encaminho uma mensagem.

“Gosto das flores” — Ray — 16:11

Espero pela resposta como um tolo, um tolo que está aprendendo a viver esse tipo de coisa, essa mistura de sentimentos estranhos que nos tira e depois nos devolvem o apetite.

Olho para o celular e ela não respondeu. Deve estar ocupada, não posso atrapalhar, não posso ir até lá e correr o risco dela se livrar das minhas mãos. É tudo segredo e isso agora já não me deixa tão feliz. Me levanto e deixo o celular carregando sobre o aparador.

Vou até a cozinha onde Moh prepara um lanche para mim. Mas não tenho fome, apesar de ter mendigado um pedaço de pão nessa última semana. Me sento e observo em silêncio Moh arrumando a mesa, ela faz com tanto carinho que nem comento minha falta de apetite. Ela deixa tudo posto, me dá um beijo no rosto e vai embora, ela só volta na segunda-feira.

Moh me avisa que a correspondência da semana está no aparador junto com as demais.

Giro o aparador de guardanapo de um lado para o outro da mesa. Me sinto perdido e ao mesmo tempo escuto o que meus sentidos dizem, eu só não sei se eles têm razão.

Escuto uma mensagem atrás da outra chegar, corro para o celular e vejo o bando de putos disparando fotos e comentários sobre as encomendas. Absurdos e promessas de melhor sexo, tudo de novo e tão repetitivo. Não leio quase nenhuma delas e percebo que Christen não respondeu.

Volto para a mesa e encaro o lanche de rosbife e o copo de suco de manga. Estou vasculhando algo dentro de mim e não encontro nada a não ser ela sorrindo para mim, para os meus sobrinhos. Ela ganhou Serafine. Me flagro sorrindo e acho que há muito tempo eu não me sentia tão confuso e feliz.

Bebo dois goles de suco e vou para a minha sala de treino, tenho visitado pouco esse lugar. Troco de roupa e descarrego em cima do saco de areia a minha tensão. Por pelo menos trinta minutos eu soco sem parar, até que meus pulsos reclamam. Preciso de um banho e de alguns minutos comigo mesmo e essas flores. Algo não está acontecendo como deveria.

Saio de roupão na varanda assim que pego meu celular, ela ainda não respondeu. Quero ligar, mas não quero parecer desesperado para vê-la, preciso me distrair, ligo para Benjamin e ele avisa que Giovani está com ele, combinamos de nos encontrar no Delorean, um Pub perto da 95, não muito longe de casa.

Ela não responde e eu não posso virar escravo disso. Volto para o meu quarto escolho uma polo vermelha e verde, um jeans e sapatos em tom de marrom.

Caminho até a sala e olho para as cartas que chegaram, no meio das coisas comuns que recebo um envelope me chama a atenção, não tem remetente.

Eu abro e vejo letras recortadas e coladas em uma folha branca


Ramon

Nem tudo que é segredo é secreto.

Coisas nasceram para serem escondidas e depois descobertas.

Tudo agora é uma questão de tempo

 


Associo ao bosta do Otto, mas algo me incomoda e me diz que pode ser pior do que isso. Dobro o papel e coloco na minha carteira. Tento não pensar nisso, pelo menos não agora, tenho outro assunto mais importante para resolver.

Minutos depois estou dirigindo sentido o Delorean.

O Delorean tem história e é um dos melhores pubs de Nova York, isolado, e o dono limita a quantidade de pessoas dentro do ambiente, isso evita confusão. Benjamin e eu temos uma garrafa no clube do uísque, nossos lugares são garantidos segundo as regras dos sócios.

Assim que entro já vejo Benjamin e Giovani levantando os copos. O bar parece que foi feito com madeira velha, tem alguns tonéis suspensos e as mesas estão em sua maioria em desnível. Uma mesa de sinuca e dois casais competem. Algumas mulheres sentadas nas mesas perto da janela com vista parcial da rua e os putos no patamar de cima, perto do telão.

— Cara, em que buraco você se enfiou essa semana? — Benjamin me cumprimenta espalmando minha mão com a dele.

— Você sumiu. — Giovani diz e faz o mesmo.

— Seattle, uma merda de negociação e alguns números, perdi a semana resolvendo isso. — falo e levanto a mão para o garçom e peço mais um copo.

— Bom, pelo menos resolveu, e a garota anônima, tem visto? — Giovani pergunta. Não tanto quanto gostaria, respondo internamente.

— Não mais, nunca mais. — minto.

— Sei. — Benjamin saca na hora a minha mentira, mas eu não estou preocupado, eu quero apenas que ela responda a merda da mensagem.

— Ramon, sabe que se o mundo começou de uma grande explosão ele vai acabar com os hackers invadindo sistemas e descontrolando tudo. — Giovani gargalha. — Como foi o final de semana em Malibu? — ele pergunta.

— Onde você quer chegar? — pergunto sério e o garçom coloca o copo sobre a mesa e me serve do uísque. — Andou me espionando, seu puto?

— Claro que não, latino puto, eu estava no aeroporto, estava indo para Las Vegas. — ele diz sorrindo. — Sou um teimoso irremediável e voltei lá e os detalhes ficam para uma próxima, o que estou falando é que vi o momento em que ela chegou. Eu sei tudo sobre ela, além do rosto lindo, é claro, eu a investiguei depois de saber sobre um lance a respeito de taxis e, enfim, foi fácil descobrir o que ela estava fazendo em uma área reservada para jatos. Mas se eu soubesse que a resposta chegaria caminhando apressado na direção dela eu nem teria perdido meu tempo em invadir o sistema do aeroporto. — ele gargalha.

— Cara, você está apaixonado, olha a merda! — Benjamin sorri e entre nós acabou esse lance de pensar no Clube e na putaria, a gente sabe que é uma merda quando a porra do coração funciona mais do que a cabeça. Deixamos de ser os garotos do ginásio e o Clube tem a sua importância para alguns, inclusive para mim, mas deixou de ser algo intocável.

— Malibu foi melhor do que esperava, não é apenas sexo, isso eu tenho no Clube ou em qualquer esquina, foi a companhia e admito ter passado um bom tempo com ela. Foi terrível chegar perto de uma mulher e falar sobre Hanzel, me senti culpado e em seguida aliviado por ter conseguido achar alguém. — bebo a dose toda do meu copo e eles me olham estranhando.

— Onde ela está? — Giovani pergunta com um semblante feliz, esse cara é do bem, os dois são. Escuto meu celular vibrar e o pego com pressa, os putos percebem. É ela.

“Me perdoe, pensei em você em cada minuto desse dia, mas saí de uma reunião chata e fui direto para outro compromisso, meu celular ficou sem bateria?” — C&M — 22:09 — eu sorrio ao ler. Ela pensou em mim.

— Ramon, você está fazendo cara de idiota, pare de sorrir para o celular. — Benjamin fala e eu mostro o dedo do meio para ele.

“Não perdoo, me puniu, fiquei sem as gorjetas” — Ray — 22:10

“Elas estão comigo, gostaria de entregar ;)” — C&M — 22:11

“Estou com dois amigos no Delorean, conhece?” — Ray — 22:11

“Sim, conheço, estou com a Rocco, então, não teremos problemas, estamos a caminho” — C&M — 22:12

— Ela está vindo para cá. — digo sorrindo e coloco o celular sobre a mesa

— É isso aí, cara, quem diria que você pudesse ser conquistado. — Benjamin brinca — como eu disse vocês estão caindo como peças de dominó. Eu tenho certeza de que estou livre desse tipo de queda.

— Não é paixão, eu gosto da companhia dela e acho que a recíproca é verdadeira. Como você e a Greta. — respondo e Giovani levanta o copo.

— Um brinde aos brutos que também amam! — ele fala alto e gargalha.

— Não é amor. — afirmo.

— Isso é uma questão de ponto de vista, meu amigo. — Gio tilinta o copo ao meu e bebe mais um gole.

Os minutos passam e a conversa sobre o Clube não acontece, sinto que com o passar dos anos essa competição ficou menos agressiva e possivelmente tenha caído na rotina, justo a rotina que nos levou até ele, agora nos expulsa, um a um.

— Não é a toa que está agindo como um adolescente. — Benjamin dispara e olha na direção da porta em minhas costas.

Me viro e observo Christen entrar. Ela veste um macacão colado ao corpo, preto, tomara que caia, ele segue justo até o tornozelo e em seus pés um par de saltos vermelho sangue. Ela carrega uma pequena bolsa de mão e seus cabelos se movimentam conforme seus passos. Estou de pé olhando para ela e analisando cada filho de uma puta imunda desse lugar que está olhando para ela.

— Ô, gracinha! — um cara fala assim que ela passa, ela está olhando para mim e eu me perco nela, mas gravo a cara do cretino que vou arrancar a cabeça assim que eu puder. — Senta aqui comigo! — ele fala mais alto.

— Quer que eu sente aí com você também, seu puto? — falo alto e o cara olha com espanto.

Ele suspende a mão pedindo desculpas, um sinal do tipo: Não sabia que estava acompanhada.

Ela continua seu caminhar e eu nem reparo na sua assistente intragável que está como sua sombra. Ela se aproxima e eu a puxo para junto de mim, ela não deveria ficar longe de mim, nunca mais.

— Oi. — ela diz e eu a beijo, forte, na frente de todos do bar e eu não ligo se amanhã estarei em tabloides ou sendo procurado, eu quero apenas poder beijá-la, assim como estou fazendo.

— Oi. — respondo e encosto minha testa na dela e ela é tão linda e eu sinto-a tão minha nesse momento escondido em um Pub reservado.

Percebo os olhos de Benjamin, Giovani e do encosto da Rocco sobre nós e então eu os apresento. Ela é inebriante, seu perfume está em toda parte e meu pau esquece que estamos em público.

Nos sentamos assim que foram devidamente apresentados. Gio chama pelo garçom e solicita o cardápio, está sendo cavalheiro e não tira os olhos de Rocco. Assim que o cardápio chega, Christen nega e Rocco também. Christen olha para Benjamin e eu sei que ela se lembra dele na noite da Jonh Jonh.

— Quero um copo com duas pedras de gelo. — Christen dispara.

— Quero um suco de laranja com vodca, e por favor, coloque uma colher de café de rum. — Rocco pede desconcertando Gio e Ben.

— Achei que fossem pedir salada e suco natural. — Benjamin satiriza e levanta o copo bebendo uma generosa dose e completando os copos da mesa.

— Meu caro, estamos em um pub e não no Vegan City. — Rocco rebate com ironia e faz menção ao restaurante Vegano que tem perto da Batery Park.

— Eu odeio aquele lugar. — Giovani balbucia para ele mesmo, mas todos ouvem.

— Eu também. — Rocco responde olhando para Giovani que retribui com um sorriso.

— Determinei que salada e suco natural eu aprecio apenas em minha casa e exijo que seja feito por algum especialista. — Christen fala alto, mas está olhando para mim.

— Acho justo, inclusive se o profissional for bem remunerado. — sorrio de lado e ela abre um sorriso lindo. Como eu senti falta desse sorriso. Ela sela minha boca. — Posso saber onde você estava com essa roupa feita de fita isolante? — pergunto baixinho em seu ouvido.

— Estava com alguns italianos. — ela responde séria e isso me incomoda.

— Odeio a Itália. — sorrio e ela também.

— Alguns representantes de uma marca estão interessados em uma possível fusão, a negociação ainda está no início, mas o investimento deles é alto, isso abrilhanta os olhos do meu pai. — o garçom chega com os pedidos e Benjamin que está prestando atenção na nossa conversa coloca uísque no copo de Christen e ela agradece. — Semana que vem tenho que ir para Londres para finalizar uma negociação bem semelhante, mas não na mesma proporção, está praticamente acertado. — ela diz e suspende o copo propondo um brinde.

— Brindemos a quê? — Rocco pergunta.

— Brindemos às novas fusões e os altos investimentos, sejam eles quais forem. — Giovani responde olhando para Rocco.

O celular de Benjamin toca e ele atende sorridente. Fala e gesticula e está feliz em falar com seja lá quem for.

— Você está aqui em Nova York? — ele pergunta se levantando da cadeira. — Estou indo. — ele responde e desliga. — Peço licença, mas preciso ir. — ele olha para todos na mesa e bebe o restante do seu copo. — Ramon, paga a minha parte, é pelo serviço da outra semana ok? — ele fala e sai. Filho da puta.

— Animado esse seu amigo. — Christen observa.

— Não faz ideia do quanto. — respondo e levo meu copo até a boca. Ao fundo toca The Pogues, Love You ‘Till The End.


“Eu só quero te ver.

Quando estiver completamente sozinha

Eu quero apenas ter você se eu puder

Eu só quero estar lá”

 

Porque estar com ela se tornou mais importante, porque ela é desafiadora, inteligente, intimidadora, anônima em alguns sentidos e passou a conduzir boa parte dos meus pensamentos. Estou sentado de frente a ela, ela está entre minhas pernas.

Passei a sentir ciúmes de suas roupas e do seu corpo, não gosto de pensar nela sendo tocada ou admirada por outros homens, não gosto de pensar que o mundo possa receber Christen novamente e que eu não esteja com ela; estar com ela é a única coisa que eu quero.

Ela fala sobre a semana e eu estou atento, olho mais em seus olhos e menos em sua boca, me procuro dentro dela, ela se encontraria facilmente aqui dentro. Gosto dessa filha da puta.

— Quero ficar a sós com você. — confesso em seu ouvido e ela sorri.

— Achei que não fosse pedir, mas eu não trouxe os pães. — ela brinca suspendendo os ombros.

— Aceito apenas a gorjeta. — não sorrio, olho dentro dos seus olhos e seguro suas mãos. — Senti sua falta essa semana, senti falta do seu cheiro e de tudo de malcriado que você faz. — confesso e ela aproxima seus lábios dos meus.

— Foi a pior semana da minha vida. — ela diz e me beija profundamente. — Rocco, fique com meu carro. — ela diz e entrega a chave para a assistente que conversa animadamente com Gio.

Saímos do pub e eu percebo dois homens nos seguindo e eu paro. — O que é isso? — pergunto abrindo meus braços em direção deles, desafiando-os.

— Espere, Ramon! — Christen fala e se põe a minha frente, colocando as mãos em meu peito. — Eles estão comigo. — ela diz e abaixa a cabeça. — É uma longa história, não quero conversar com você na frente deles. — ela diz e olha em meus olhos.

— Vamos para minha casa. — eu falo e tento voltar a caminhar.

— Não, vamos para um hotel, alguém pode nos seguir. — ela está com receio de me falar alguma coisa.

— Não vou discutir com você sobre onde vamos conversar, então decida o lugar e apenas me fale, mas eu não os quero por perto. — falo e ela nega com a cabeça.

— Eles vão nos acompanhar, estão em outro carro. Eu preciso. — ela diz engolindo e abaixa a cabeça.

— Tudo bem, resolvido, vai me contar agora o que está acontecendo, vai me contar aqui mesmo. — falo sério e a olho com tom autoritário.

— Não fiz o que me pediu. — ela fala e eu não entendo.

— O que foi que eu lhe pedi que você não fez? — cruzo os braços e franzo o cenho. Ela está tensa e eu não estou entendendo.

— A ocorrência contra Otto, estou sendo seguida há mais de duas semanas. Algumas cartas estão chegando com ameaças, não tenho como provar que são dele, elas são feitas de recorte e não dizem nada sobre o nosso relacionamento, falam apenas do desejo de me ver morta. — ela está triste e eu a abraço.

— Vem comigo. — a levo para o meu carro, coloco sentada e fecho a porta. — Ei, vocês, estou indo em direção da Batery, Drumond Hotel, vou evitar o trânsito e dar a volta, não vou devagar. Se me perderem de vista é só ir até o Hotel, fale em meu nome, o gerente me conhece. — falo e dou a volta no carro, entro e acelero.

— Não queria envolver você nisso. — ela disse.

— Estou envolvido até a porra do pescoço, e também estou bem irritado. Por que não me disse isso antes? Fui viajar e deixei você sozinha. Inferno, Christen, eu pedi para você fazer a ocorrência.— Acelero e vejo que ela está tensa, olhando pelo retrovisor.

— Isso é um problema meu, eu não tenho o direito de foder com a sua vida porque a minha está fodida; não quero envolver você em um jogo político e sujo. Tudo isso é um jogo político, meu pai quer que eu case com Otto por conta de possível Senado e você pode ser prejudicado, não quero as pessoas apontando para você dizendo que você é pivô de uma separação, colocando em você um rótulo ao meu lado. — ela dispara.

— Em primeiro lugar, pare de olhar pelo retrovisor, não tem ninguém nos seguindo, em segundo lugar, se a porra do problema é seu, naturalmente é meu também e em terceiro lugar, pretende se esconder até quando? — falo ríspido e acelero ainda mais, indo em direção a 147, lado oposto que falei para os seguranças.

— Quero apenas que ele esqueça, que ele canse disso tudo, acho que se eu fizesse alguma coisa contra ele, ele poderia ficar com mais raiva e piorar tudo. — ela coloca a cabeça sobre seus joelhos e está chorando. — Não tem ideia da pressão, então, se puder apenas entender que fiz o que achei coerente, eu agradeço. — ela diz e eu não gosto de vê-la chorando.

Alcanço sua mão e beijo seu dedos. — Estou aqui. — disse e ela me olha e eu me sinto obrigado a protegê-la, de novo. Acelero e chego em minha outra propriedade, um apartamento menos sofisticado, mas igualmente confortável. Ele era da minha irmã quando Fabian ainda estava vivo, eles moravam aqui, depois da tragédia ela não conseguiu voltar.

Passo pela portaria e Ryan me cumprimenta.

— Ryan, não estou, para ninguém, nem mesmo minha família, ok? — dou as ordens e ele concorda com a cabeça.

— Só não me diga que é no último andar. — Christen fala ao entrarmos no elevador.

— Cobertura. — suspendo os ombros lamentando sobre o seu trauma, mas hoje ele é o que menos me preocupa.

— Tudo bem, vou tentar não pensar nisso. — ela diz e me olha como se dissesse: Odeio elevadores e a todo momento estou neles com você!

Assim que o elevador chega na cobertura e abre a porta, eu a fecho e travo no andar.

— O que você pensa que está fazendo? Não é assim que vou perder meu medo! — ela está brava e eu estou adorando isso.

— Vamos ver se não. — me aproximo violentamente dela, por que não tem outro nome. Seguro suas mãos suspensas no ar a fim de simplesmente descer com ignorância esse macacão que deve ser incinerado para ela nunca mais usar e eu o faço.

Desço de uma vez expondo seus seios em minha direção e para minha surpresa ela está sem calcinha.

— Você está sem calcinha? — Pergunto empurrando meu corpo contra o dela, quero que ela sinta o quanto estou duro e puto da vida, vou machucá-la, isso é certo.

— Marca o macacão se eu uso uma. — ela explica e eu a beijo com força e desço minha outra mão em seu corpo. Aperto vorazmente seu seio e desço até seu sexo.

— Não faça mais isso. — falo e mordo com força seu lábio. — Não fique a mostra por aí como se não tivesse dono. — pressiono meu pau sob minha calça contra seu sexo molhado e ela geme.

— Não tenho dono. — ela diz gemendo.

— Tem sim, e não me obrigue a te convencer sobre isso, você já está me causando sérios estragos por ter entrado na minha vida sem nome e sem endereço, então, não me diga que não tem um dono.

Com apenas uma mão eu me livro da minha calça e da minha cueca, estou duro e ela vai sentir o quanto. Solto seus braços e ela até tenta me empurrar, mas eu a subo em minha cintura e me enterro nela, com força, rápido e com a tentativa de amenizar um pouco a falta que ela me fez.

— Viu? O elevador não cai, você vai jogar essa porra de macacão no lixo e sim, você tem a porra de um dono agora, por mais que eu tenha que esconder do mundo, você tem plena consciência disso.

Enterro com força, a sinto por dentro pulsando e de repente ela me beija, suave, e me abraça enquanto estou dentro dela, marcando território. Gozo junto com ela e a beijo por isso.

— Você é meu dono? — ela diz baixinho e eu ainda estou pulsando dentro dela e ela está pulsando ao meu redor.

— Sim. — falo, saio dela arrumo minha roupa e a ajudo a se vestir, destravo o elevador e andamos pelo corredor até o número 913. Preciso subornar alguém sobre essas imagens.

Entra na minha vida, fode meu psicológico, me trata como um objeto e ainda pensa que não posso ter nenhum tipo poder sobre ela? Nem em sonho.


15

 


Christen

 

 

Meu dono? Sorrio ao pensar no jeito mandão e sem limites dele falando. Entro no apartamento e observo uma sala imensa, com três ambientes e uma janela gigante de vidro que revela uma sacada.

— Onde é o banheiro? — pergunto arrancando meu salto e o macacão. Preciso de um banho.

— Segunda porta à esquerda. — ele disse. — Vou pegar uma toalha para você. — ele dispara e sua voz é seca, séria e mexe comigo.

— Bom garoto. — eu digo com malcriação. Entro no banheiro e vou direto para debaixo do chuveiro e deixo a ducha quente cair em minha cabeça. O banheiro é grande, todo marfim, e a bancada da pia desce e faz o contorno da hidro. O box fica ao lado da hidro e o vidro é transparente. Um espelho cobre toda a parede sobre a pia.

— Esse é o problema, tenho sido um garoto muito bom e tudo chegou onde chegou. — ele diz ríspido e coloca suas toalhas penduradas no box. — Quero tudo sobre esse bastardo filho de uma puta. — ele diz e sai do banheiro.

Ele está muito bravo, e eu não sei como agir com ele assim. Fecho meus olhos e a água cai, peço que ela leve pelo ralo tudo de ruim que tem me acontecido.

“Você merece morrer”, dizia a primeira carta e algo me faz pensar que a morte é onde nos igualamos. Estamos todos sujeitos a ela, inevitavelmente a aceitaremos, independente de nossa condição financeira ou a cor de nossos cabelos, todos nós vamos morrer, até quem não nasce morre. Sinto que junto com a água do chuveiro minhas lágrimas descem disfarçadamente.

— Alexander! — Ele fala com alguém no telefone, ele fala alto e ainda está puto da vida. — Descubra tudo, por favor, quero saber tudo que ele faz e se tem feito alguma merda on line. Quero tudo! Quantas vezes ele vai ao banheiro, e eu sei que você pode descobrir tudo isso. — escuto-o andar na frente do banheiro. — Cara, valeu. — ele agradece de um jeito de homens e desliga.

— Escute, Christen, quero todas as cartas, quero tudo que chegou até você, quero saber de cada merda de ameaça, seja ela por carta ou por telefone, você está me ouvindo? — ele diz ríspido entrando no banheiro.

— Sim, você está gritando, não tem como eu não te ouvir. — respondo seca e não abro meus olhos. Seus olhos estão nos meus e isso o incomoda, ele não gosta de mer ver assim.

— Se eu pegar esse filho de uma puta, peço que Deus me ajude, não respondo por mim. — ele diz e eu abro um dos meus olhos. Ele se sentou na bancada e está com a cabeça sobre as palmas.

— Está preocupado comigo, sr Avellar? — pergunto baixo e calmo. Ele se levanta e entra de roupa e tudo dentro do box e segura meus braços.

— Sim, eu estou e eu nunca fico assim, eu nunca fiquei assim por nenhuma mulher nessa merda de vida, então, agora que entrou sem ser convidada, você vai ter que aguentar as consequências. Não sou homem de brincar e quando brinco, o faço como gente grande, está me entendendo, Srtª Madson? — ele diz sério olhando em meus olhos e meu corpo está fora da água.

Me desvencilho de seus braços e começo a remover suas roupas, ele está todo molhado e eu não pronuncio nenhuma palavra, apenas o dispo.

— Vai retirar minha roupa em silêncio? Não vai profanar contra mim suas sinceridades sem educação? — ele diz e eu sorrio para ele, porque ele tem o melhor de mim. Desde que livrou meu rosto de um soco, desde que me levou para dentro de sua casa e me apresentou sua família; naquele dia eu conheci uma família de verdade.

— Estou feliz em pertencer a alguém que tem um nobre coração, alguém que tem estado durante quase todo o tempo em meus pensamentos e conseguiu colocar em minha memória uma centelha feliz, conseguiu de mim algo que eu não estava disposta a oferecer. — beijo seus lábios e ele fecha os olhos. — Estou feliz por ter um super herói em tempo integral comigo, feliz por aprender que existe ainda muitos bons motivos, você é o meu bom motivo. — jogo suas roupas molhadas para fora do box. — Não sou sua dona, não saberia cuidar de você como você tem cuidado de mim, mas me sinto parte de sua vida e isso para essa mera humana cheia de falhas e defeitos, basta.

Ele pega a minha mão e coloca sobre sua tatuagem.

— Está sentindo? — ele pergunta e eu aceno que sim com a cabeça, sinto seu coração sob a minha mão. — Eu não o sentia antes de você chegar. — ele diz e me beija, docemente, sua raiva escoa pelo ralo junto com minhas lágrimas e com tudo de ruim que aconteceu.

Saímos do banho e fomos para a sala, ele preparou dois copos de alguma bebida alcóolica e gelada. Me entregou um e ficou com o outro, estamos enrolados nas toalhas, um sentado de frente para o outro.

— Me conte tudo. — ele ordenou. Então eu bebi uma boa quantidade do copo, respirei fundo e comecei.

— No domingo depois que fui embora de seu apartamento, estava disposta a nunca mais ver você, mas eu não estava com coragem para isso porque em um primeiro momento sua companhia era tudo que eu queria. — bebo mais um gole. — Quando cheguei em casa, Otto estava lá sentado nos degraus da entrada da minha casa. Ele queria conversar mas eu não o queria mais, eu precisava ficar livre dele e de tudo de ruim que ele me fazia lembrar. — paro por alguns segundos. — Estar com ele era rentável para o meu pai e inconscientemente eu continuava com ele para que meu pai não engordasse sua lista de desaforos contra mim. — ele me olha e está atento, mas seu rosto não é agradável nesse momento, está duro e frio.

— Ele entrou na sua casa? — ele pergunta.

— Não e ele não entraria, Sue estava por lá a meu pedido, liguei para ela assim que acordei e ele sabe o que ela pode fazer, mas depois de discutirmos de forma baixa e rude, onde alguns vizinhos compartilharam a cena, ele foi embora e disse: Com meu pai no senado, a Madson passa a sofrer o boicote que preciso para ver você e sua família de merda no chão. Nesse momento eu percebi que já não o amava mais há muito tempo e talvez eu houvesse idealizado o amor perfeito com ele por conta de Gabriel.

Me levanto e deixo o copo sobre o carrinho de bebidas.

— No dia seguinte os tabloides tinham nossos rostos e uma nota grande sobre traição contra o filho do candidato ao senado, meu pai foi até a minha casa e fez o que ele faz de melhor, me deixar triste. — me sento novamente onde eu estava e continuo. — O problema é que naquele mesmo dia chegou a primeira ameaça, e depois a segunda e assim sucessivamente, uma por dia. Rocco mesmo te detestando insistiu para eu te avisar, afinal, você também estava envolvido e poderia ser atingido, mas eu não quis falar, não queria estragar esse tipo de felicidade que nunca havia me ocorrido.

— Você não poderia ter guardado isso para você, achando que ele pode simplesmente esquecer. Um homem com a dignidade atingida é capaz de muitas coisas, acredite, algumas delas imperdoáveis.

— Ramon, isso tudo vai passar, é apenas um noivo com ciúme. — digo e ele me puxa para o seu colo.

— Ex-noivo, srtª Madson e por mim ele estaria morto. — ele diz e beija meus lábios.

— Quando você colocou minha mão sobre seu coração e disse que passou a senti-lo depois de mim, eu imaginei a mesma situação. Quando meu filho foi embora, ele levou meu coração, levou meu coração de mãe, mas deixou um coração aqui dentro. — seguro sua mão e coloco sobre meu peito. — E eu só descobri que Gabriel havia deixado algo aqui quando você surgiu em minha vida. — eu beijo sua boca e ele me aperta contra ele.

— Não vou admitir que ele tente ou faça algo contra você, não acho que ele vai desistir. — ele diz preocupado e me deita em seu colo.

O telefone dele toca e ele demora em levantar para atender, mas o faz.

— E aí, Alexander? — ele pergunta e é o homem que está investigando a vida de Otto. — Sim, ótimas notícias, poderia me mandar por e-mail? — ele pede. — Te devo uma, cara! — ele diz sorrindo. — Até semana que vem. — ele diz e desliga.

— Se esse merda está assustado com uma foto nossa se beijando e não quer que Nova York saiba que ele é um corno, ele não tem ideia do que o espera. — ele sai em busca de uma manta, volta rapidamente. Desliza as engrenagens do sofá deixando ele ainda maior.

— Não quero que você se meta nisso, não quero que seja atingido. — digo e ele beija o topo da minha cabeça assim que me ajeito em seu colo. Estamos sentados de frente para a varanda e ele abriu um pouco as janelas. Tudo aqui está limpo e cheiroso, alguém cuida desse lugar.

— Já estou metido nisso até a cabeça. — ele fala e mexe em meus cabelos. Me ajeito em seu colo e por mais que eu lute, o sono é inevitável.

 

***

 


“Agora deixe- me segurar sua mão

Eu quero segurar sua mão”

I Wanna Hold Your Hand — The Beatles

 

Desperto em uma cama e não me lembro como eu vim parar aqui. O quarto não tem nada além de uma cama e duas portas, uma é o banheiro com um closet anexo e a outra sai para o corredor. Estou nua e sozinha e escuto o som vindo da cozinha.

Levanto e vou para o banheiro, faço tudo que preciso para evitar um susto matinal e alcanço no Closet uma camiseta. Ela é azul clara e cheira a amaciante. Tenho quase certeza que essas coisas são dele também.

Olho por cima das gavetas e vejo uma foto em um porta retrato, ele está com o braço sobre o ombro de outro homem, tão jovem quanto ele e de repente vejo o rosto de Tomas naquele homem.

O riso de ambos na foto demonstra a afinidade. Esse é um outro lado da morte, ela separa pessoas que gostam de ficar juntas, a morte por si só é a maior de todas as comédias, ela finda o que muito tem a começar e inicia um ciclo de autopiedade, quase sem fim.

Eles eram lindos juntos, os rostos dizem tudo e eu lamento profundamente por essa perda.

Caminho pelo corredor e sinto o cheiro de algo que faz meu estômago implorar por um pedaço seja o que for. Escuto Jonh Lennon e vejo Ramon Avellar, de novo ele cozinha para mim.

Encosto no batente do corredor e olho-o cantar junto com a música enquanto vira algumas panquecas sobre o fogo, ele é todo fogo e eu sou toda pólvora. Ele está de calça de malha que pende em sua cintura, ela é branca igual sua camiseta. Ele deveria usar um número maior de roupas, não há necessidade desse tipo de demonstração.

— Gosta do que vê, Srtª Madson? — ele me surpreende e continua fazendo o que está fazendo.

— Não, mas estou sem alternativas. — respondo de modo zombeteiro e ele me olha afiado.

— Quer outras alternativas, Srtª Madson? — ele pergunta sem tom algum.

— Sim. — respondo sorrindo para ele. — Vou precisar de outras alternativas, logo você vai se cansar dessa executiva com um suposto perseguidor e, então, vou ter que arrumar outra confusão, quebrar outro nariz e assim sucessivamente. — vou em sua direção e me sento no balcão que divide a cozinha da copa.

Ele se encaixa no meio das minhas pernas e beija meus lábios. — Posso ser suas alternativas, todas elas, já que não sei se posso ser outra coisa depois que você for embora. — ele tem uma habilidade incrível em me deixar com alguns ovos de avestruz na altura do esôfago.

— Vou analisar os fatores, verificar as possibilidades positivas e repasso o resultado. — respondo e ele me agarra pelo traseiro, me encaixando em seu quadril. — Acho que já tenho a resposta para essa análise. — eu falo e ele me beija. Agradeço por ter encontrado uma escova em um copo no banheiro, espero que não seja a escova usada para lavar o sanitário.

— Quero muito me enterrar em você nesse momento, eu só não vou fazer porque preciso cozinhar a troco de pequenos rendimentos. — ele desce a calça sem me tirar do seu colo e se coloca dentro de mim, eu sempre o quero, sempre estou esperando por ele.

— Não disse que iria cozinhar primeiro e depois os trocados? — digo enquanto ele, sem nenhum esforço, me carrega até o sofá e entra e sai de mim. Isso é melhor do que café da manhã.

— Estou recebendo primeiro. — ele diz e eu não resisto a ele e ele também não resiste a mim. O sinto esvair dentro de mim e nossas testas se chocam, devagar e em seguida ele beija entre minhas sobrancelhas. Ele se levanta e me puxa para junto dele.

— Preciso ir ao banheiro. — digo e aponto o motivo.

— Fique à vontade. — ele diz e me puxa. Passei a depender dos beijos do Ramon.

Faço uma higiene rápida e meu estômago ainda reclama seu pedaço seja lá o que for.

— Ray, onde está minha roupa? — pergunto da sala, procurando atrás das almofadas.

Ele caminha em minha direção com algo na mão, eu reconheço o tecido do meu macacão, foram mais de quatrocentos Euros, eu o reconheceria em qualquer lugar.

— Não gosto do macacão. — ele diz sério, com o cenho franzido e eu acho graça de sua atitude quase que infantil e adorável.

— Por que tanta raiva de um pedaço de pano? — perguntei caminhando descalça até a mesa posta e ajeitando o macacão na altura dos seios.

— Exatamente por isso, por se tratar de um pedaço muito pequeno de pano, já pensou em comprar um número maior, Christen? Porque ontem eu pude ver seu sistema digestivo funcionando através do tecido colado em seu corpo, imagino os italianos olhando e babando em você. — ele está com ciúmes e está lindo assim, e eu posso piorar a situação.

— Por falar nisso — me inclino e pego duas panquecas e coloco em meu prato, ele me olha desconfiado sobre o que vou falar. — Um deles deveria ter trinta e cinco anos ou talvez quarenta no máximo, é poliglota e fez pelo menos umas três faculdades, sem contar que é pós graduado em administração e economia, não parecia ter a idade que falou, bem conservado e inteligente, ele até propôs um jantar qualquer noite dessas. — encho meu copo com suco de laranja e seguro para não gargalhar.

— Que porra é essa? Vem fazer propaganda de alguém que sabe lá de que bueiro saiu? — quase engasgo com o jeito dele.

— É mentira, Ramon! Estou brincando. Ontem eu estava com uma porção de velhos, alguns poderiam ser meu avô! — gargalho.

— Mesmo assim não gosto de pensar em você rodeada de homens. — ele diz e leva um pedaço de panqueca até a boca e mastiga com força. — Aposto que você era a única mulher. — ele bebe um gole do suco. Agressivo em um nível sexual absolutamente aceitável.

— Não! Tinha mais uma! — seguro a risada. — A Rocco e se isso ajuda, tinha a esposa de um deles, acho que ela é centenária, se não for está a caminho. — falo e ele fica sério. — Estava brincando, não estrague seu dia por conta de minhas travessuras sobre seu ciúmes. — alcanço sua mão e a puxo para meus lábios, beijo a ponta dos seus dedos.

— Você merece umas boas palmadas, bem forte e depois um sexo que se lembre de mim toda vez que se mexer ou for se sentar. — ele diz tão lindo e estou me sentindo uma idiota, uma idiota feliz.

— Eu confesso! — falo e levanto a mão. — Eu me lembrei de você no domingo assim que acordei e me sentei na cama, tudo doeu e sabe o que é pior? Eu gostei. — nego com a cabeça e pego mais um pedaço de panqueca, mas agora despejei geleia de framboesa.

— Então, preciso repetir isso com mais força antes de você viajar, assim não vai querer que ninguém chegue perto. — ele fatia mais um pedaço e leva até a boca.

Me levanto, ando até ele e me coloco em seu colo, interrompendo sua refeição.

— Ramon, não vou querer ninguém por perto, e não é porque você me machuca em alguma região do meu corpo, eu não vou querer ninguém por perto porque você cura alguns pontos em mim. — beijo seus lábios. — Estou com você pela cura, me entende? — olho dentro dos seus olhos e me vejo por ali.

Ele me abraça forte e fica alguns instantes com seu rosto próximo de meus seios, ele chega a suspirar.

— Christen, essa semana você vai para Londres e eu vou para Madri. Você vai a trabalho e eu vou resolver uma questão pessoal, algo que precisa ser resolvido. Gostaria muito de lhe contar sobre o que se trata, mas não posso pensar no risco de não ter você mais em minha vida, não gosto de pensar que posso ser esquecido. — ele diz e me assusta.

— Acha que posso não entender? — pergunto e me levanto. Estou preocupada com essa informação e deve ser bem pessoal, a família dele em nenhum momento comentou algo sobre negócios em Madri.

— Dificilmente alguém entenderia. As últimas semanas tenho feito um esforço para entender uma condição que eu mesmo aceitei. — ele diz, eu caminho em direção ao sofá e me sento.

— Conte-me, vou fazer o possível para entender. — digo e massageio meus dedos.

— Talvez tenha que fazer o impossível. — ele diz e caminha em direção a janela. Ele olha pela cortina e vejo seu olhar se perder sobre Nova York.

— Eu faço. — digo sem saber se sou capaz de tal proeza, mas o impossível é apenas uma questão de ponto de vista.

— Christen, faço parte de um Clube, sou membro há dez anos e estou lá desde que tudo começou, desde a primeira noite. — ele diz e vem em minha direção. Sinto medo do que está por vir e agora eu quero a informação até o final.

— Que tipo de clube? — pergunto tentando transparecer calma e maturidade, mas por dentro estou me rasgando. Ele poderia ser mais direto e encerrar de uma vez esse assunto.

— Um Clube de sexo. — ele diz e nossos olhos se chocam. Ele se cala e olha para os dedos entrelaçados. — Eu sei que assim que eu terminar de lhe contar você pode sair por aquela porta e nunca mais saber de mim, mas eu lhe garanto que estou indo até lá para findar essa participação, e eu jurei há quase um mês que nunca me apaixonaria. Na noite em que nos encontramos na boate, eu havia saído do casamento de um dos membros que largou tudo porque se envolveu com uma pessoa e eu o condenei, e isso tudo é como um grande castigo, eu me deixei levar pelo canto da sereia como ele. — ele fala e volta a me encarar.

— Explique melhor. — peço e ele se aproxima, se sentando no sofá ao meu lado.

— Fundamos esse Clube para fugir de certos compromissos, de relacionamentos e de mulheres que insistiam em nos procurar com cobranças incabíveis. — ele está com uma perna dobrada e sentado sobre ela e pouco à vontade em me contar o que está me contando. — Fazemos uma solicitação, escolhemos um perfil e todos os membros seguem o mesmo pedido, se a requisitada for uma morena, então doze, ou melhor, agora são apenas onze e eu saindo serão dez homens, buscam e levam para Madri o que foi pedido.

— Isso é prostituição internacional, Ramon. — estou em estado de choque, acho que nunca pensei que esse tipo de coisa pudesse existir.

— Não é, elas assinam um contrato de entretenimento e depois disso elas obedecem o que os membros lhe pedem. Elas são remuneradas, e não são obrigadas a absolutamente nada. Para ser franco são tratadas como rainha e em dez anos nunca houve um problema de vazamento de informação ou alguma encomenda reclamando em público sobre os serviços prestados, é um comum acordo. — ele explica e percebo que ele não se envergonha, ele apenas quer encerrar esse assunto com minha total compreensão, mas a verdade é que eu não estou chateada por conta dessa organização de fodas, por incrível que pareça estou curiosa para saber como funciona.

— Elas trepam com todos? Na mesma noite? Céus! Eu passei sete anos da minha vida fazendo sexo com o mesmo homem e talvez minha lista de sexo não chegue a dez homens. — falo e o encaro espantada.

— Sim, se for solicitado sim, um dos membros tem uma garota fixa, o outro gosta de um sexo mais dark, outros preferem uma foda mais normal... Escute, eu sei que você pode ficar chateada com tudo isso e ir embora, mas quero que saiba que estou sendo verdadeiro. Nunca em dez anos uma mulher me deu motivos para desembolsar uma grana muito alta e me desfazer do Clube, então, você surgiu e agora estou prestes a assinar um cheque de valor inaceitável de tão alto, mas foda-se o dinheiro. — ele diz olhando em meus olhos e eu não estou com raiva, não estou brava por ele trepar livremente por aí. É como as partidas de golfe do meu pai, mas são buracos diferentes.

— Christen, caso queira ir embora, peço apenas que mantenha sigilo. Existem outros membros e envolve pessoas de poder, temos um acordo entre cavalheiros e estou confiando em você, confiando como nunca confiei em ninguém. — ele pede e o que posso fazer é ficar feliz, ele está sendo franco, ele poderia me esconder isso o resto da vida, mas preferiu me contar. Fico feliz pelo caráter desse homem, ele é exatamente o que a sobrinha me explicou, ele realmente oferece o melhor que ele tem.

— Ramon? — o chamo e ele me olha com dúvida.

— Sim. — ele respira e mexe os dedos impacientemente. — Se quiser eu te levo embora — ele diz e eu vejo em seus olhos uma dor apenas por sentir medo, ele tem medo que eu decida ir embora.

— Gostaria de conhecer esse Clube! — digo e ele me olha como se me jogasse uma pedra, como se me arremessasse gasolina e fogo, ele me queima.

— Ficou louca? — ele levanta em um impulso e grita ferozmente, ele me olha como se eu tivesse ofendido alguém de sua família.

— Não, eu quero apenas ver como funciona, não posso participar? Não precisa de contrato e nem do dinheiro. — falo calmamente e ele se revolta.

— Christen! Você só pisa naquele lugar se eu estiver morto, entendeu? Nunca, em hipótese nenhuma, jamais! — ele está aos berros e de repente solta um soco contra a parede. — Eu não suportaria ver você nas mãos de outros homens, eu não aguentaria ver você atrás de um vidro sendo analisada e escolhida, são tantas possibilidades, você pode ser obrigada a apanhar, ou rebolar até a exaustão em um pole dance. — ele arremessa uma estátua no corredor e está fora de si. — Eu não posso nem pensar nessa hipótese. — ele está ofegante.

— Fiquei curiosa. — digo de forma sucinta e não me abalo com sua reação enérgica — É intrigante o que me contou, homens lindos oferecendo um bom sexo além de dinheiro, acredito realmente que muitas aceitariam facilmente, eu iria, mas não pela grana, pela experiência.

— Eu lhe contei com medo que fosse embora e nunca mais quisesse saber de mim e agora, pela segunda vez, você me coloca no pior lugar, me coloca no lugar das mulheres que levo para aquele lugar. A primeira vez foi quando pagou meu taxi e minha hospedagem. É isso que fazemos com elas a troco de sexo, e agora quer se divertir por lá, como eu posso assimilar esse tipo de coisa sem explodir? — ele despeja outro soco contra a parede e depois outro e deixa a mão fechada apoiada na parede.

Me levanto e fico em pé por alguns segundos, observo a parede destruída e imagino a cara do Otto caso ele o pegue. Caminho em sua direção e coloco minha mão em seu ombro. Ele está fervendo e seus olhos estão vermelhos como brasas e isso me fere.

— Você não gostaria de me ver por lá? — pergunto.

— Não e não posso imaginar essa situação. — ele diz e sua respiração é funda, fazendo seus ombros se suspenderem.

— Olhe para mim, Ramon. — peço e ele se vira, retirando vagarosamente a mão da parede destruída. — Escute. — digo e beijo por cima do machucado de seus dedos. — Vou estar onde te deixa feliz, apenas fiquei curiosa em saber sobre o lugar onde de repente te ensinou a ser tão bom na cama. Mas se isso significa você triste, eu prefiro imaginar que você foi indenizado com essa sabedoria sexual de forma milagrosa. — sorrio para ele. Não me importa sobre o que se trata esse clube, aqui estou analisando a postura dele, a verdade dele e isso para mim basta.

— Você não pode querer ir para um lugar como aquele, não é permitido a entrada de anjos naquele lugar. — ele diz e me beija intensamente. — Você aceita esse Ramon? Porque aqui está a verdade, aqui está o latino sem nenhum segredo ou problema para ser resolvido. O único detalhe que tenho que acertar é a minha saída daquele lugar e para ser franco, lá não é uma escola de sexo, lá é um esconderijo da vida real, uma espécie de fuga e uma competição obscena e sem limites. — ele diz e olha dentro dos meus olhos segurando meu rosto com as duas mãos.

— A pergunta certa seria: É isso mesmo que você quer? Ficar longe de sua casa na árvore e sair do clube dos garotos? A solução para tudo isso depende mais de você do que de mim. — digo e ele sorri como nunca antes e eu acho que posso estar seriamente apaixonada por um membro do clube de orgias.

— Ficar com você, é isso que eu mais quero, é a única coisa que eu preciso e, para ser franco, eu não tenho mais força para seguir adiante sem suas malcriações e gorjetas. — ele fala e eu sorrio para ele. Ele está tão absolutamente exposto que eu poderia arrancar seus pulmões apenas com um sopro.

— Então, Sr Avellar, enquanto eu resolvo uma situação profissional em Londres, você resolve a sua situação em Madri. Nos encontramos em alguns dias, tudo bem para você? — pergunto.

— Não quero ficar longe de você tanto tempo. — ele diz triste.

— Você não vai estar longe. — pego sua mão e coloco sobre meu peito. — Você está dentro do coração que Gabriel deixou pra mim. — ele sorri e beija meus lábios. Talvez eu precise digerir essas informações e esses dias em Londres serão benéficos.


16

 

Ramon

 


“De joelhos, eu pedirei uma última chance para uma última dança

Porque com você, eu resistiria a todo o inferno para segurar sua mão”

Far Away — Nickelback

 


Ela concordou em realmente sair de casa apenas cercada pelos seguranças e no domingo, assim que nos despedimos depois de muito sexo, eu tive consciência de que a mulher que ficou enjaulada comigo em um apartamento longe de tudo e sem o conhecimento de ninguém é a mulher que quero que esteja comigo, e talvez seja para sempre esse tempo.

Sinto mais medo depois de tudo que foi descoberto por Alexander e Giovani. A família Kalil não está nessa maldita terra para ser contrariada. São tantos processos que seria impossível enumerar ou falar sobre eles.

Ela desligou o celular e realmente desapareceu do mapa, mas ela havia desparecido comigo e eu viveria esses dois dias por muitos dias em minha vida. Tudo é secreto até que se resolvam essas ameaças, mas eu me sinto preso e gostaria que o mundo soubesse seu nome e o que ela significa para mim.

Ela embarcou na quarta e eu não pude levá-la ao aeroporto, mas fiquei tranquilo quando ela me enviou uma mensagem de sua chegada em Londres. Espero que ela não repense sobre o Clube e que nunca mais volte a pensar em conhecer aquele lugar.

Paro por alguns instantes e imagino Evan, o primeiro a enfrentar tudo isso e tem provado que tomou a decisão certa, está feliz, e no casamento de Sebastian eu pude ver uma família feliz. Ele e Victoria dançando e sorrindo um para o outro, na hora profanei contra aquilo e agora desejo dançar com Christen, mesmo que os outros profanem.

Sebastian derrubou a segunda mesa e quando eu soube do seu casamento pensei que poderia ser o final da espécie humana na Terra e na realidade é só o começo de uma nova espécie, uma espécie que desiste de objetivos super faturados que são apenas um modo de fugir da porra do mundo coerente.

Não me arrependo pelo clube ou pelo que fiz ou quanto desembolsei pelas minhas trepadas, mas é certo que quero me ver livre disso tudo e poder ser de forma integral dela, a filha da puta anônima que no primeiro momento pegou a merda da minha dignidade e enfiou em um lugar inapropriado para isso.

Confesso que sorrio para cada e-mail que tenho recebido dela, para cada foto que ela está me enviando desde que chegou em Londres e o fato dela não esquecer quem eu sou, já me satisfaz. Tudo nela me alimenta e me sinto renovado por isso, como se tudo até agora só valesse a pena porque ela chegou.

Termino de arrumar minha bagagem, dessa vez coloco apenas uma única troca de roupa, volto amanhã mesmo para Nova York.

Faltam algumas horas para o jato de Giovani decolar, termino e desço, sei que terei a companhia de Benjamin, Giovani e Alexander na viagem e eles sabem da minha decisão. O fato de eu querer ir até Madri é que algumas regras foram modificadas e o novo proprietário resolveu criar um termo de saída do Clube onde precisamos assinar pessoalmente com duas testemunhas. Ele vai estar lá e isso encerra minha participação de forma definitiva no Clube.

Meu celular avisa sobre uma mensagem, é ela.

“Comendo muita porcaria... meu cozinheiro sumiu” — C&M — 13:22

“Poucas gorjetas, Srtª Madson, ambiente ruim de trabalho e submissão em nível de escravidão... ” — Ray — 13:23

“Caso eu lhe pague o taxi, poderia repensar sobre seu antigo cargo?” — C&M — 13:24

“Poderia repensar se me pagasse a hospedagem e oferecesse uma carona até uma casa que tenho por hábito invadir em Malibu” — Ray — 13:25

“Poderia acrescentar nessa lista um trabalho com meus lábios? Isso facilitaria sua aceitação em minha cozinha” C&M— 13:26

— Filha de uma puta! — falo alto dentro do meu quarto, ainda bem que Moh não está.

“Talvez” — Ray — 13:27

“Proposta de trabalho temporariamente removida pelo contratante” — C&M — 13:28

“Estou desempregado? Me colocando à disposição no mercado de trabalho” — Ray — 13:28

“Contratado” — C&M — 13:29

Estou rindo como um imbecil segurando meu celular e eu pouco me importo se isso é ridículo, o que importa é essa sensação boa que nunca senti antes.

“Obrigado, estava preocupado em entrar para a estatística de desemprego” — Ray — 13:30

“Estou embarcando agora, chego em Nova York ainda hoje” — C&M — 13:31


É noite em Madri, chegamos ao Palácio Hanzel e Marcos está com alguns empregados no corredor central. Sofri uma pequena inquisição e suaves tentativas de desistência de minha ideia, mas Giovani se mostrou um excelente advogado. Me defendeu como fez com Evan e hoje eu o entendo.

Entramos e dessa vez tudo foi diferente, eu não fui para o meu quarto. Eu caminhei até Marcos O’Neil, o novo proprietário da Accord Entretenimento e ele sabe que hoje será minha última noite nesse lugar.

— Então, temos uma novidade essa noite. — ele afirma e me leva para longe de todos. Entramos no escritório e ele fechou a porta. Está feliz, está sendo bem remunerado por políticos, astros de cinema e jogadores de futebol. Ele pensa que não sabemos, mas quem tem Alexander e Giovani como amigos, é difícil não estar por dentro dos bastidores.

Foi fácil entender que ele estava lucrando por um outro lado, ele despencou os valores mensais e as multas caíram vertiginosamente, sem contar que o abandono do Clube sai mais em conta do que antigamente.

— Não é mais novidade, o Clube me rendeu ótimas trepadas mas fui severamente abatido em combate. — ele sorriu. Ele sabe que estou envolvido com uma pessoa.

— Eu compreendo, todos nós estamos sujeitos a isso, eu lamento perder um membro, afinal, mudei algumas regras e mais ninguém entra como sócio, ou seja, se continuar nessa tocada em breve meu movimento será apenas pelas rotas alternativas. — ele serve uísque para nós dois e alcança um envelope. — Aqui está o documento que preciso que assine, sabe que não pode mais voltar atrás. — ele faz a observação.

— Não pretendo voltar. — puxo os papéis de dentro do envelope e ele estende sua MontBlanc. — Tenho outros planos. — disparo e assino assim que leio minha carta de alforria.

— Espero que seja feliz, de verdade, aproveite tudo que puder com ela e sobre ela, depois que a morte lhe prega uma peça você se torna frio e azedo. Hoje no cálculo de minha vida o que sobra é um sexo vazio e descartável. — ele fala sobre sua falecida esposa que morreu de causas naturais logo após se casarem.

— Obrigado, Marcos. — aperto sua mão e ele balança em um aperto mais forte. — Bom, mas eu trouxe a encomenda, espero que aproveitem. — digo e deixo o cheque sobre a mesa dele e ele nem se dá o trabalho de conferir.

Ele me acompanha até a sala onde todos os putos estão, a cortina da vitrine está fechada e ao comando de Marcos ela se abre. Vejo o sexo vazio e descartável que também pratiquei e minha mente vai até Christen Madson, a mulher que me pôs na cozinha e eu serei grato a ela enquanto viver, possivelmente seja ela que esteja me encaminhando as mensagens, mas eu não vou ler agora, aqui tem câmeras demais.

— Ei, latino puto, resolveu se aposentar? — Gutemberg zomba rindo com um copo na mão. Pobre homem, tão vazio e não reciclável. — Medo de ficar encalhado? — ele consegue ser repulsivo.

— Para ser honesto acabei de ser efetivamente contratado. — sorrio com satisfação, estou feliz pela minha decisão. Giovani se aproxima.

— Onde está Wallace? — pergunto olhando para os cantos da sala.

— Ele não vem. — Marcos responde de forma sucinta e eu entendo que ele não queira prolongar o assunto. Wallace tem seus problemas de ordem interna e perfil escuro no quesito sexo.

— Ei, cara, sempre fomos amigos, isso aqui é um detalhe, vamos continuar com as cervejas e se for possível, inclua Rocco em nossas reuniões. — ele diz e eu sei bem o que aconteceu entre os dois depois daquela noite no Delorean.

— Não mudou nada, Gio, estou apenas canalizando minha energia para o lugar certo. — falo baixo e escuto o som do Palácio Hanzel ecoar, é Gorillaz, com Clint Eastwood.


Eu tenho raios de Sol numa sacola

Eu sou inútil, mas não por muito tempo

O futuro está chegando


— Cara, espero que seja feliz. — Alexander se aproxima e eu devo um grande favor para esse cara. Ele levantou todos os podres da família Kalil e um passo em falso, uma tentativa de se aproximar de Christen, eu despejo minha fortuna em cima das maiores mídias do planeta e o mundo vai saber quem são eles.

Meu celular vibra, é Christen, com certeza ela já chegou há algum tempo em Nova York e agora é uma questão de tempo. Sinto vontade de ir embora agora e me encontrar com ela.

— Obrigado, Alexander, estou lhe devendo um grande favor. — digo.

— Não me deve nada, foi um prazer revirar o lixo daquela gente. Cuide dela e seja muito feliz. — ele diz e me abraça. Assim um por um, se despede de mim, algumas piadas, algumas felicitações e parecia que eu estava indo me casar e na realidade o que tenho é um relacionamento sigiloso, à base do anonimato e que estou seriamente envolvido.

Me despeço de todos, incluindo Simon, o cara das piadas e que conhece muito bem cada bastardo desse lugar. Ganho as dependências externas e pego meu celular, preciso avisá-la que terá que me aguentar pelo resto dos seus dias.

Deslizo meu polegar sobre a tela e leio a primeira mensagem:

“Cheguei! Quero te ver!” — C&M — 22:00. Ela chegou em Nova York e eu queria muito conseguir um voo agora para lá. Se eu tivesse um jato como ela... bom, se eu tivesse ela não teria me dado carona até Malibu e nossa história teria sido diferente. Vou para a segunda mensagem sorrindo.

“Ramon! Não consigo ligar para você! Christen foi atropelada no estacionamento do JFK e ela não está bem” — Rocco — 22:24 — Meu coração dispara e eu tremo na porta do Palácio Hanzel. Tem outras mensagens.

“Ramon, eu te odeio, mas ela não me perdoaria se descobrisse que não lhe avisei. Retorne essa mensagem” — Rocco — 22:36

“Estamos a caminho do Hospital Preegston, ela está inconsciente” — Rocco — 22:49

Largo minha bagagem e volto correndo para dentro do Palácio. Eles estão no meio do leilão, eu interrompo com uma entrada nada triunfal.

— Giovani! — disparo.

— O que houve? — ele pergunta e as negociações sobre as encomendas cessam.

— Preciso do seu jato, Christen foi atropelada! — disparo exasperado e Giovani antes mesmo de me conceder o jato faz uma ligação e avisa ao piloto que precisa voltar para Nova York.

Alexander se aproxima e ele sabe o que está acontecendo, Benjamin me olha e nega com a cabeça.

Marcos avisa o motorista que me leve até o aeroporto e Giovani apenas diz que o jato está à minha disposição. Agradeço e saio em disparada. Meu coração acelera e eu vou matar aquele filho de uma puta na porrada.

— Eu volto com você! — Giovani afirma subindo para o seu quarto e buscando sua bagagem. Alexander e Benjamin falam e fazem o mesmo e é esse tipo de coisa que fazem os amigos, pelo menos eles. Os demais são solidários e se colocam à disposição, até oferecem um retorno conosco, mas eu não aceito, basta o trio mais próximo.

No caminho até Nova York troco mensagens com Rocco que me informa a situação grave de Christen e que ela ainda corre risco de morte. Caio em um abismo interno e penso no que seria de mim a partir de agora sem tê-la para alimentar.

 

 

***

 

— Onde ela está? — pergunto para Rocco no corredor do hospital assim que entro. Os pais dela estão sentados na recepção, os reconheço do porta retrato da casa dela. Giovani, Alexander e Benjamin estão comigo.

— Na sala de recuperação, o médico disse que ela sofreu uma lesão na altura da têmpora e que precisa que ela acorde para ver o tamanho do problema. Ela ficou quase quatro horas em cirurgia, eles aliviaram uma pressão intracraniana. — ela diz e eu vejo em seus olhos o quanto ela já chorou.

— Obrigado, Rocco. — digo e ando em direção a recepção, só saio desse hospital com ela. Penso comigo.

— Cara, vai ficar tudo bem. — Benjamin percebe meu estado crítico e se aproxima com um gesto solidário.

— Vai ficar, eu vou acabar com a vida daquele filho da puta. — falo enquanto olho o movimento em volta .

— Estou entrando no sistema de câmeras do JFK, mas pelo celular fica difícil, preciso do meu laptop. — Gio diz.

— Podemos usar o sistema da Oracle. — Alexander diz e saca o celular, pede para alguém criar um usuário e senha e mandar pelo celular. — Gio, vem comigo. — ele conclui e os dois vão embora.

— Cara, vocês fizeram muito em voltar comigo, pode ir embora. — eu falo e me sento colocando as mãos como apoio de minha cabeça.

— Não vou embora até um médico vir até aqui e dizer que a mulher que vai te aguentar o resto da vida está bem e assim vamos nos livrar de você. — Benjamin tenta me animar, mas é em vão.

As horas passam e os pais dela me olham como se eu fosse um monte de merda e eu juro que tenho vontade de esmurrar a cara de cretino do pai dela. Não percebeu ainda que sua filha luta para atingir um nível inalcançável de suas expectativas? Não entendeu ainda que ela sabe que não é apenas o golfe que te leva para Santa Mônica e sim sua outra família? Ela sabe que trabalha dia após dia e parte do que ganha na empresa você banca uma mulher que tem uma filha que nem é sua?

— Muita ousadia sua vir até aqui! — a mãe dela dispara. — Você é o culpado de tudo isso, beijar Christen para obter marketing gratuito em tabloides de quinta categoria? — ela me enfrenta na recepção e peço para Deus que me ajude a manter a compostura.

— Bastardo! Ela pode morrer! — o pai dela dispara e eu me levanto indo para cima dele.

— Escute bem os dois, o culpado de tudo isso são vocês. — aponto o indicador na direção dos dois. — Onde vocês estavam enquanto ela sofria ameaças de morte? Deixa eu adivinhar, o Sr possivelmente em Santa Monica, tem interesses por lá e a senhora acredito que estava em Aspen esquiando, enquanto ela estava enfrentando vários leões por dia para manter a porra do império de vocês em pé. — levanto em um tom a minha voz e Benjamin me olha. — Eu não a atropelei, eu trocaria de lugar com ela. Vocês apontam o dedo em minha direção querendo colocar em meus ombros a culpa por algo que realmente eu não tenho, será que estão empurrando a culpa para longe de vocês? O senhor queria que ela ficasse com um cara que pouco se importou com o próprio filho, tem ideia do estrago emocional que ela carrega? Ela não é um escudo, ela precisa de um. — disparo e agora estou mais puto do que nunca.

— Nunca soubemos das ameaças até hoje. — o pai diz.

— Se estivessem mais presentes na vida dela, saberiam que ela tem aguentado sozinha toda a pressão de ser uma executiva bem sucedida e uma mulher que teve seu sonho arrancado. Agora não me venham com esse teatro de família unida e preocupada com ela, porque na verdade quando ela mais precisou de alguém, ela não tinha ninguém. Antes de saírem por aí apontando a porra do dedo em direção dos outros, analisem se não são vocês os responsáveis por ela estar onde está nesse exato momento. — saio do hospital e Benjamin vem atrás de mim.

— Cara, calma, vai ficar tudo bem e logo isso tudo vai passar. — ele diz e observa o meu caminhar exasperado.

— Ela precisa ficar bem, mesmo que a família a impeça de ficar comigo, eu só quero que ela fique bem e volte a ser malcriada e desafiadora. — falo e ele me olha como se estranhasse minha reação.

— Juro que um dia vou entender esse sentimento. — ele diz.

— Eu te explico algo sobre ele. — digo e olho para meu amigo além de putaria. Ele é o cara que está comigo agora, enquanto a mulher que possivelmente tem meu coração na mão está lutando pela vida. — Esse é o tipo de sentimento que te faz respirar melhor, não apenas para te manter vivo. Não me reconheço depois dela, mas o que encontro em mim depois que ela chegou é um Ramon melhor, mais feliz.

— Eu quero entender, mas eu não posso, eu nunca senti isso e você sabe. — ele diz negando com a cabeça.

— Um dia você vai perceber que não precisa de mais nada além de uma única pessoa e, então, você vai saber algo sobre respirar melhor e encontrar um Benjamin feliz. — eu digo e giro voltando para dentro do hospital e encontro com Rocco vindo em minha direção.

— Ramon, ela acordou! — ela fala e por um segundo eu vejo essa madrugada mais feliz. Entro correndo e Benjamin está ao meu lado. — Os pais dela estão lá dentro, e o médico liberou apenas alguns minutos, eu vou entrar com você, latino. — ela diz e pensando bem ela não é um encosto tão grande assim.

— Benjamin, obrigado, cara, vai descansar. — digo para o meu amigo que está com olheiras e já fez muito por mim.

— Me mantenha informado. — ele diz e me abraça, dando alguns tapas em minhas costas.

— Eu mantenho. — digo e ele parte para a saída do hospital.

Olho para Rocco e ela está tensa, esfrega os dedos e seu vestido amarelo tem manchas de sangue. Não gosto de sentir o que estou sentindo, não gosto de ver o sangue de Christen assim, fora dela.

Alguns minutos se passam e os pais dela saem, abraçados e sorrindo. Isso me atinge como um bálsamo, além de saber que ela está bem, os pais, por mais que sejam distantes entre si, estavam unidos por ela. Ela consegue muito de quem está ao seu redor, e não estou falando dos funcionários, da empresa e do mundo empresarial, estou falando de Rocco que passou por cima do pouco apreço que sente por mim e me trouxe até aqui, ela o fez por Christen. Estou falando dos pais que possivelmente não se tocavam há muito tempo e agora estão juntos em um abraço, estou falando de mim, que decidiu caminhar na prancha do navio pirata, que abandonou a tripulação e agora está feliz, mais que isso, estou realizado com minha nobre desconhecida.

Um médico avisa que podemos entrar e eu caminho olhando para os pais dela, eles mudaram a forma como me encaram, não vejo mais uma ameaça, vejo uma declaração concordando com tudo que despejei em cima deles.

Ando atrás de Rocco e tudo está em silêncio. O cheiro de éter é forte e intenso, o hospital é particular e tenho certeza que ela será tratada como uma rainha, ela é uma rainha e eu sou seu súdito. Analiso tudo que sinto ao pensar nela, analiso os sintomas que percorrem minha pele e o entusiasmo enaltecido de meu peito, vejo que minha cor preferida hoje é a cor dela, o tom bronzeado de sua pele, o rubor coral perfeito de sua face quando fazemos amor e... faço amor com ela, concluo sorrindo e sigo Rocco.

Faço com Christen Madson o melhor amor do mundo, faço com ela todo meu amor e por Deus, como isso me basta.

Rocco abre a porta e entra na minha frente, olho para ela, deitada e com um curativo sobre a testa, próximo de sua pinta linda. Ela tem uma faixa ao redor de sua cabeça, seus dedos estão feridos e o lado esquerdo de sua face tem um ralado na altura da maçã do rosto.

— Roc! — ela diz e sorri lentamente. Mesmo ferida ela sorri. Alguns aparelhos estão ligados em seu corpo e eu agradeço a Deus por vê-la viva.

— Mad, não pode sair por aí assim, querendo parar carros com o próprio corpo, você pratica boxe e não faz parte dos X-Men. — Rocco a trata normalmente, sem aquela piedade melancólica em torno de pessoas acamadas.

— Achei que conseguiria. — ela responde de forma cruel e sarcástica, sorrindo. É ela, a mulher intimidadora, que faz o mundo melhor para mim e que mesmo não querendo nada de mim, conseguiu tudo que tenho.

— Mas não consegue, ok? — Rocco a adverte sorrindo e beijando a testa dela. — Consigo ajudar na sua imagem, mas não tenho vidas guardadas para poder repor a sua, não teria outra Christen Marise Madson disponível e aí, o que eu faria de minha vida? Voltaria para aquela droga de Inglaterra? — ela diz e Christen fecha o rosto, como se não entendesse o que a amiga acabou de dizer.

— Como assim? Voltar para Inglaterra? Você não mora mais lá? — ela pergunta como se estivesse perdida no tempo e Rocco se levanta, assustada e a encara.

— Christen, eu não moro mais na Inglaterra. — ela disse séria e esticou os olhos até mim. Estou sério, parado perto da porta e não estou conseguindo assimilar o que está acontecendo.

— Já sei! — ela sorriu e algo me aliviou. — Foi atrás daquele jogador de HandBall? Está morando na Suécia? — ela disse séria, acreditando no que estava falando e Rocco se mostrou perdida, olhando para o chão e em seguida voltou a olhar para mim. Dei um passo em sua direção e ela me olhou, distante e não esboçou nenhuma reação.

— Rocco, trouxe um amigo? Não gostaria que as pessoas me vissem assim. — ela reclama e tudo para ao meu redor. Ela não sabe quem eu sou.

— Mad, esse é Ramon Avellar, não se lembra dele? — Rocco me apresenta a ela e eu espero que ela diga gargalhando que está brincando, mas ela me olha como se eu fosse um completo desconhecido e eu não pensei que poderia doer tanto como está doendo. Volto ao anonimato que sempre desejei, volto para o patamar de desconhecido dentro de sua mente

— Não, é alguém que trabalha na Madson com meu pai? Estudamos juntos no colégio? Não estou me lembrando, me lembro apenas que por esses dias Otto e eu temos uma viagem, eu estava onde quando aconteceu o acidente? Estava comprando um jogo de bolsas para viagem, não foi isso? — Rocco dá um passo em direção a Christen e segura sua mão.

— Mad, me responda, quantos anos você tem? — Rocco pergunta.

— Ora, vinte e quatro! — ela responde sorrindo como se estivesse tudo bem, mas não está tudo bem, ela não sabe quem eu sou e parou em um tempo onde eu não existia para ela. Ela está travada em um tempo onde eu não posso entrar, não participei de sua vida nessa época, mas o filho de uma puta que fez isso com ela, porque eu sei que foi ele, ele sim está lá e ela fala dele sorrindo, fala do cara que quase a matou com amor. Céus! Isso não pode estar acontecendo.

— Mad, ele pode se aproximar? — Rocco pergunta e aponta para mim.

— Pode, já me viu descabelada mesmo, mas não acho que Otto possa gostar disso, por falar nisso onde ele está? Ele já veio me visitar e eu estava dormindo? — ela não tem ideia do quanto está me ferindo e eu sei que essa não é a sua intenção, você nunca me faria mal algum por conta própria, mas agora está conseguindo me atravessar com algo dilacerante e talvez esse seja o tipo de castigo ou justiça que recebemos em vida.

Caminho para perto da maca e estico minha mão em direção a mão dela e coloco minha palma sobre a dela. — Oi. — digo baixinho, olhando dentro dos seus olhos.

— Oi. — ela diz em dúvida e tira a mão da minha. — Não sei quem é você, seus olhos são familiares, mas não consigo me lembrar. — ela sorri sem dentes negando com a cabeça.

— Faça um esforço. — peço ainda olhando para os olhos dela. — Tente, sou Ray, sei cozinhar e você já me deu uma carona. — sorrio para ela e ela se mostra igual, sem nenhuma reação.

— Como eu posso ter lhe dado uma carona? Não dirijo desde que comecei a namorar Otto! — olho para Rocco e eu sei que nesse momento ela não pode me odiar, ela não conseguiria dividir seu coração em pena e raiva por mim. É isso que estou vendo em seus olhos, pena e compaixão e nos olhos de Christen Madson vejo meu reflexo, mas não estou dentro dela, não mais.

Fui arrancado de sua memória e voltamos à noite em que nos conhecemos. Somos desconhecidos, anônimos e agora eu tenho um problema, a porra do carro não me acertou e você está aqui dentro, minha cara anônima Christen Madson, está aqui dentro fazendo parte importante e primordial de minha memória, porque minha têmpora não foi atingida. Mas eu não posso querer te esquecer, não posso querer que seu rosto e nome sumam de meus pensamentos, eu não quero esquecer.

— Preciso que a deixem descansar. — o médico entra dando ordens e vai em direção aos aparelhos.

Me aproximo do rosto dela e encosto meus lábios entre suas sobrancelhas. — Preciso de você. — digo baixinho e ela me olha, tentando entender, mas seus olhos estão perdidos em mim. Saio do quarto e encosto na parede ao lado da porta. Rocco sai em seguida e depois o médico.

— Dr, ela não se lembra dos últimos anos! — Rocco dispara preocupada. Eu levo minhas mãos exasperadas até a cabeça.

— Não sabemos a proporção das lesões que sofreu, isso pode ser um estado temporário. Quando ela acordou fizemos algumas perguntas e ela acredita estar em alguns anos antes. — o médico não nos deixa nenhuma esperança. — Ela pode nunca mais se lembrar, ela pode acordar amanhã e ter recuperado toda a memória, mas isso só o tempo dirá. Ela tem sorte do carro não tê-la pego em cheio e com tanta velocidade, ela não teria sobrevivido. Vocês precisam incluir diariamente e de maneira sucinta as informações sobre seu passado. — ele diz com tranquilidade e algo está estranho aqui dentro, um buraco, um vazio. Saio de perto deles e caminho lentamente pelo corredor do hospital e escuto Rocco me chamando baixinho e me alcança com passos apressados.

— Ei, latino. — ela diz e eu paro. Ela se coloca na minha frente e me olha.

— Sim. — respondo e ela sabe que não estou nada bem. Além de triste por ser um desconhecido aos olhos da mulher que mudou a minha vida, quero matar a base de socos um filho de uma puta.

— Não sou sua fã, pelo menos eu não era, mas desde que você surgiu na vida dela alguns fantasmas foram embora; ela tem sido bem irresponsável, mas está feliz como nunca vi. — ela abaixa a cabeça e nega suavemente. — Achei que ela nunca mais seria feliz depois de Gabriel, o garotinho com nome de anjo que Deus levou, mas surgiu um outro anjo em sua vida e a fez sentir o que a vida tinha de melhor. — ela está com os olhos marejados.

— Agora não importa. — digo sucinto.

— Importa sim, vou fazer tudo que eu puder para que ela se lembre do latino, porque por mais que eu tenha lhe odiado pelo trabalho que me deu, você é importante para ela, mas ela não consegue se lembrar disso, acho até que gosto de você, mas só um pouquinho. — ela diz olhando para mim.

— De que adianta ser importante se estou em um tempo esquecido. — desvio de Rocco e chego a recepção.

— Você está dentro dela. — ela afirma e eu passo a duvidar disso. Me sento na longarina e fico imóvel por longos minutos, olhando para meus dedos entrelaçados e percebo que os pais dela me olham do canto da recepção.

— O que aconteceu, Rocco? — o pai dela pergunta ríspido e percebo que Rocco nega com a cabeça, como se desaprovasse a forma como o pai de Christen pergunta.

— Nada, não aconteceu nada. — ela responde triste e me olha. Eu sei que ela está me olhando e para um homem ser alvo de piedade é sinal de que nada está bem. Tem razão, Rocco, nada aconteceu e esse é o problema.


“Todas as nossas vidas cobertas rapidamente

Pelas marés do tempo”

Wasting Love — Iron Maiden


Meu celular toca. É Alexander e ele quer falar comigo pessoalmente. Fico dividido por um instante. Eu deveria ficar no hospital até que ela se lembre quem eu sou, mas por outro lado, eu preciso enfiar a cabeça desse filho de uma puta no próprio traseiro. Me despeço de Rocco com um beijo em seu rosto e saio do hospital.


17

 


Rocco

 

 

Claro que matar o latino com requintes de crueldade era o que estava em minha mente. As manchetes sobre sua boca engolindo Christen Madson foram cruéis e me deram muito trabalho e o pior de tudo é que foi em vão. As notícias continuaram e foram além.

Em seguida as ameaças e a teimosia de Mad em não levar até as autoridades o que estava acontecendo foram apenas alimentando meu desejo em acabar com Ramon. Mas, então, ela resolve ir para Malibu, desliga o celular e vive intensos dias que a deixaram com um sorriso estúpido no rosto e aí, minha fúria assassina ficou de lado e aos poucos os dias foram encarregados de me fazer esquecer essa ideia que ficaria apenas em minha mente.

Christen se apaixonou e voltou a ter vida em seus dias, vida de gente normal e em nossa estada em Londres eu pude sentir o quanto ela estava feliz pela vida que estava prestes a começar.

— Ele é importante para mim, Rocco! — ela disse enquanto tomávamos um café na Palicari. Ela bebericou um gole de sua xícara e sorriu livremente e isso me fez entender uma porção de coisas que talvez eu não entenderia apenas por ler em livros de romance.

Ela estava seriamente envolvida e acho que nunca esteve assim com Otto; acho que ela nunca esteve perdidamente apaixonada por ele e tudo virou uma tempestade infinita de brigas e tentativas frustradas de reconciliação. Amo Christen e observá-la suspirando por longos minutos era algo que me fazia bem e me fazia esquecer o trabalho com as manchetes.

— Deve ser mesmo! Está enfrentando ameaças e uma possível desavença com o senado, ele deve ser mais do que importante, ele deve ser o seu pensamento na primeira hora do dia. — eu disse e ela sorriu amplamente, alegre, e eu sabia que Ramon era o detentor do primeiro pensamento dela todos os dias desde que se conheceram e mesmo que neste dia ela não soubesse o nome dele.

— Ele é meu último pensamento também. — ela piscou lentamente e levou seus pensamentos até ele. De alguma forma ele exercia nela o poder da felicidade e isso a fazia clamar pela eternidade em muitos momentos.

Quando desembarcamos em Nova York, sua primeira ação foi avisá-lo e eu fui em busca de um taxi enquanto ela pegava nossas malas na esteira. Ela sorria como uma criança ao olhar para a tela de seu celular que se partiu em mil pedaços instantes depois.

— Céus! — falo alto, estou sozinha no quarto de Christen, estou providenciando roupas, ela vai ficar no hospital por algum tempo. Em cima de sua cama a boneca que ganhou da sobrinha de Ramon e tudo faz parte agora de uma recordação que ela não se lembra.

Ela atravessou olhando para o celular, e apesar do limite de velocidade imposto, o carro surgiu do nada e desapareceu em seguida. Corri para junto dela e vi seu rosto, sujo, machucado e pensei que ela se levantaria daquela porra de chão frio e esboçaria um palavrão. Porque Christen Madson é assim, toda cheia de segurança em si e não admite tombos ou escoriações por muito tempo.

Mas ela não se levantou e minutos depois havia um turbilhão de pessoas se amontoando ao redor dela e eu estava com o meu celular na mão avisando o homem que um dia eu quis enforcar com as minhas próprias mãos que Christen havia sido atropelada.

Tudo parecia acontecer em câmera lenta, como se eu estivesse em uma velocidade muito acima e pude assistir com detalhes seu resgate e logo depois chegamos ao hospital. Tudo era confuso até que alguém saísse da sala de emergência e nos avisasse sobre a gravidade. Eu me senti em um limbo e eu sei que minha vida continuaria caso ela partisse, mas seria bem menos interessante, porque viver pela imagem dela é satisfatório. Sou feliz cuidando do que falam sobre ela e ela estava feliz e pouco se importando com o que surgisse a seu respeito.

Ela havia decidido, enfim, viver a própria vida, com direito a trepadas de alto poder de cansaço e um cozinheiro sexy à sua disposição. Ela consegue esses feitos, ela é uma líder que motiva as pessoas a lutarem com ela e por ela.

Mas, agora tudo foi esquecido e estou tentando pensar se dentro do mundo cibernético que vivo de forma clandestina existe um jeito eficaz de trazer para suas lembranças o homem que a fez sorrir de volta.

Houve um homem antes dele, um pequeno homenzinho que não chegou a sorrir para ela, mas a fez completa por sete meses e depois tudo acabou. Ela merece viver o que começou, caso contrário sua vida estará fadada a viver coisas que não ganharão futuro.

— Serão pelo menos duas semanas ou mais de internação. — o médico disse um pouco antes de eu sair. Seus pais ainda estão por lá e confesso que nunca os vi tão próximos, tão abraçados.

Uma cordialidade e compaixão surgiu, um confortando o outro, com copos de café ou um afago entre os dedos. Talvez até a forma como estavam se olhando fosse apaixonada, mas isso aconteceu mediante uma possível tragédia e isso é característica do ser humano, entender alguns valores mediante a perda de outros.

Arrumo as coisas de Christen e o taxi me espera lá fora. Desço uma pequena mala e tento me lembrar de uma oração, faz tempo que não converso com Quem possa resolver isso e eu sei que é vergonhoso, eu deveria agradecer mais, tenho um excelente emprego e amo minha chefe.

Mas de novo vejo outra característica do ser humano, lembrar de Alguém apenas quando precisa. Somos uma fábrica de características falhas e desajustadas, somos uma soma desenfreada de busca e muitas vezes pouco oferecemos.

Entro no taxi e escuto o noticiário, a bolsa teve sua queda, um acidente na interestadual, uma briga entre torcedores de um determinado time e tudo soa como futilidade, como uma forma banal de informação.

No banco da frente alguns jornais baratos. Na primeira página falam de um casal de celebridades que enfrenta uma crise matrimonial e que isso pode interferir no lançamento de um determinado filme, logo acima falam de uma atriz que emagreceu em tempo recorde depois da gravidez e de novo tudo é banal e amanhã, esse jornal vai estar evitando que os pingos de óleo do motor desse taxi sujem o chão de sua garagem e, assim, na outra manhã, teremos outras coisas banais e uma porção de outros anônimos que leem e esquecem essas coisas.

Alimentamos incansavelmente essa mídia que levou minha amiga para aquele hospital, justo ela que pouco se importa se o casal da tv vai se separar, ou se a mulher que engravidou pela enésima vez vai recuperar seu peso ou não.

Christen é mais preocupada com a vida real e com a vida das pessoas que a cerca e isso os jornais não noticiam, porque esse tipo de coisa não vende. As pessoas estão mais interessadas em saber sobre ricos e famosos do que sobre suas próprias vidas enfiadas em casas hipotecadas e cheias de despesas.

Quando chego ao hospital pego um dos jornais do banco do taxi e pago pelo dobro do valor por eles. Estabeleço dois objetivos, o primeiro é que realmente os jornais fabricam notícias e que eu não os alimentaria com absolutamente mais nada, se querem falar de Christen que falem, ela estará vivendo seu grande amor e esse é meu segundo objetivo, trazer Ramon para os dias de Christen.

 

 

Christen

 

 

Olho para Rocco arrumando minhas coisas dentro de minha bagagem e nem posso acreditar que estou indo embora. Foram vinte dias enjaulada e agora quero sair, ver meu namorado, quero saber por que Otto não veio me ver. Parece que sinto falta da obrigação dele em estar aqui e não entendo por que a imagem dele me vem em pensamentos sombrios e não consigo ficar entusiasmada com ele ao pensar sobre nós.

— Está pensando em quê, Christen? Está batendo a escova de cabelo na mão o tempo todo. — Rocco me pergunta e me olha de lado. Estou sentindo falta de um espelho, preciso ver como estou, se Otto aparece e me vê assim, mas se ele não veio em nenhum dia de tantos dias que estou aqui.

— Rocco, Otto não veio me ver nenhum dia. — pergunto e ela olha para mim com um olhar cheio de coisas para falar e me deixa confusa. Já estou confusa, meu cabelo está curto, não me lembro de ter cortado e meus pais parecem que têm medo de me dar alguma notícia.

Ela respira fundo mil vezes, buscando calma e mesmo assim apenas me encara.

— Ele deve estar ocupado. — ela diz rosnando e eu acho que ela não gosta dele, mas deveria gostar, ele é meu namorado, mesmo estranhando essa informação é isso que ele é, meu namorado.

— Poxa, ele não veio nenhum dia, mas aquele seu amigo bonito e alto, como é mesmo o nome dele? — pergunto e continuo escovando meus cabelos. Há alguns dias as coisas surgem como se eu assistisse flashes de um nano segundo e em seguida sinto uma dor de cabeça terrível.

— Ramon. — ela responde triste, será que ela gosta dele e descobriu que ele não gosta dela? Pergunto-me internamente, mas não parece que seja isso, parece que estou com um quebra-cabeças de peças iguais ou de vários cenários diferentes. Tudo tem acontecido de forma confusa e eu tento colocar regras nos pensamentos, mas eles não me obedecem.

— Isso, Ramon! Ele veio todos os dias, cada dia com uma flor e sempre sorrindo! — digo e me sinto como se faltasse algo, ainda não sei. — Apesar que ele não vem há três dias. — penso que ele possa ter desistido ao ver que não ofereci nenhuma esperança.

Insistente, ficava por horas, me olhava como se me conhecesse e como se eu devesse algo para ele, seus olhos me parecem familiares, mas eu não tenho ideia de quem seja.

Vejo que ela fecha o zíper com força, com raiva e fico apreensiva, ela está há muito tempo aqui em Nova York, deve estar perdendo dias de trabalho.

— Escute aqui, Christen Madson, quero que se foda a porra da ordem desse médico dizendo que é para ir com calma, que devemos alimentar essa porra de cabeça devagar. — ela bufa e anda até a mim como uma leoa e seus punhos estão fechados. — Não vou com calma, não é justo! — ela grita.

— O que está acontecendo? — pergunto assustada, nunca a vi assim. Meu Deus o que está acontecendo?, pergunto-me

— Vou te falar o que está acontecendo, a merda desse Otto não pode te visitar, ele está preso, por tentativa de assassinato! — ela explode e impede que eu fale levantando o dedo indicador e sinto que não quero ouvir, quem ele teria tentado matar? — Ao menos se esforce e saia desse tempo em que você parou! — ela fala alto gesticulando, como se estivesse inconformada. Ela pega um jornal e joga contra mim e eu não entendo.

— Do que você está falando? — me levanto e ando em sua direção.

— Christen, quantas tatuagens eu tenho? — ela me pergunta e eu não entendo nada.

— Quinze! Achou que eu não saberia disso, que fiquei louca e esqueci? — zombo dela e ela me olha negando com a cabeça.

— Tenho vinte e sete tatuagens, Christen Madson e você presenciou todas elas. — ela diz com os braços cruzados e fico perdida, porque tinha certeza que eram quinze, eu me lembro de cada uma delas, tenho uma ótima memória.

— Onde você quer chegar com isso? — pergunto com medo da resposta e agora com Otto preso, por que ele tentaria matar alguém?

— Christen, você tem vinte e nove anos, é CEO da Madson, rompeu a porra do noivado com Otto e ele está preso porque tentou matar você! — ela está aos berros e eu nego com a cabeça, não aceito e rejeito essa informação, eu nunca romperia com Otto! O que aconteceu? Por que nada faz sentido? Levo minha mão até a cabeça, onde havia um curativo e ela dói — Olhe a data desse jornal — ela ordena e eu estou confusa e não a obedeço.

— É mentira! — grito e tampo meus ouvidos como se eu fosse uma garota mimada que teve seus caprichos recusados. Mas por que Rocco, minha melhor, amiga mentiria para mim? Nada encaixa, não assimilo as informações e ainda sinto falta de alguma coisa muito importante.

Na primeira manhã em que acordei nesse hospital, eu acordei procurando por Otto e ele não apareceu e assim na manhã seguinte foi a mesma coisa. Mas Ramon estava aqui, segurando na primeira manhã um lírio branco; na segunda, um girassol e na terceira, ele trouxe uma margarida. Mas Otto não, e na semana seguinte eu estava mais acostumada com as flores de Ramon e apenas estranhava a ausência do meu namorado.

Na semana seguinte, Ramon trouxe uma rosa branca e desde então todos os dias têm sido assim, mas daí Ramon também não apareceu e agora tudo ficou estranho e pior e eu não entendo essa sensação de desconforto. É como se eu estivesse vivendo uma grande mentira.

— Não! Não é! É a mais pura e íntegra das verdades! — ela vem em minha direção e segura meus braços. — Não tem espelho na porra do banheiro porque o seu pai mandou tirar! — ela me chacoalha inconformada por eu não aceitar. — Mas, olha eu tenho um! — ela me solta e vai até a sua bolsa e pega um espelho de mão e me entrega.

Ela está muito nervosa e parece que seu coração vai explodir a qualquer minuto.

— Christen, antes de você se olhar nessa porra de espelho, quero que me ouça, e preste muita atenção. Sua falta de memória é benéfica para algumas pessoas, mas para outras é como uma dose de veneno diária. — ela diz e se acalma, em meu olho uma lágrima balança e eu não entendo absolutamente nada do que ela está falando.

— Por que você está tão nervosa? — pergunto e giro o pequeno espelho em minhas mãos.

— Escute, não me interrompa até eu terminar. — Ela diz e eu aceito com a cabeça.— Otto foi preso há dois dias. Ele contratou um homem para atropelar e matar você, mas você é a porra da Christen Madson e ele deveria saber que matar você é algo bem complicado, porque você detêm um poder absoluto em ser forte e determinada e o homem que ele contratou não era páreo para você e mesmo ele com um carro, não conseguiu acabar com a sua vida, mas ele conseguiu acertar outra pessoa naquela noite. — ela está mais calma e se senta na maca.

— Eu juro que não consigo assimilar nada. — eu falo e me sento ao lado dela, estamos de frente para uma janela, é final de tarde e o sol pouco se manifesta.

— Eu imagino que para você é tudo complicado, mas está complicado para outra pessoa também. — ela balança a cabeça e fica em silêncio. — O homem que veio te visitar esses dias e lhe trouxe flores diferentes é o responsável pela prisão de Otto. — ela diz e vejo que ela está profundamente triste.

— Filho de uma puta! — profano contra ele, por que ele fez isso contra Otto?

— Não, ele não é, ele e alguns amigos conseguiram as gravações de alguma forma do aeroporto, e viram o homem que estava dirigindo o carro que te atropelou; minutos antes esse mesmo homem esteve com Otto em um café, Otto entregou um envelope e depois descobriram que dentro desse envelope tinha dinheiro. — ela mexe na barra do seu vestido azul e olha para mim. — Christen, esse cara que você chamou de filho de uma puta moveu um verdadeiro exército e garanto, ele tem aliados fortes. Ele conseguiu levantar todas as informações antes mesmo da polícia e agiu antes dela também. — ela para de falar e isso me deixa tensa. É como se eu tivesse em uma fenda no tempo.

— O que aconteceu? — pergunto.

— Ele foi até Otto e antes mesmo que Otto pudesse se defender, ele desceu um soco atrás do outro na cara dele, como se quisesse esmagá-lo e conseguiu. — ela está com os olhos cheios e isso me entristece. — A família de Otto chamou a polícia para ele, mas o que os pais de Otto não sabiam era que um dos amigos preocupados com a reação dele levou as filmagens e tudo que conseguiram até a delegacia, então, o carro que foi para prender Ramon, acabou levando Otto para cadeia. — ela enxuga o rosto e eu nunca a vi chorando.

“Christen, Ramon esteve aqui todos os dias e não foi apenas no horário de visita, ele dormiu aqui enquanto seus amigos estavam buscando o responsável pelo acidente que tirou ele de sua memória. — ela fecha os olhos e vejo as lágrimas descerem. — Eu nunca imaginei presenciar de tão perto uma cena como essa, ele dormindo na recepção e espiando você durante a noite, foi expulso inúmeras vezes daqui pelos seus pais e mesmo assim insistiu e ficou como se fosse um mendigo esperando um pedaço de pão.

— Eu não lembro. — digo sucinta e me incomoda vê-la assim — Eu não sei quem ele é! — afirmo.

— Sabe sim, mas sua memória ferida não deixa você enxergar. Você está aqui há três semanas e os médicos pediram para incluir em seu cotidiano algumas informações, tudo em doses homeopáticas, mas não está funcionando e tem alguém que não está bem com tudo isso. — ela balança a cabeça. — Por mais que não se lembre, Christen, eu precisava te contar, você precisa saber que Ramon depois de dormir aqui por dias, foi dormir na delegacia e mesmo assim ele tinha esperança que você pudesse se lembrar e tudo teria valido a pena. — ela se levanta e anda até a janela. — Eu queria, do fundo da minha alma, que você se lembrasse dele, que você se esquecesse de mim se fosse preciso substituir suas lembranças, mas que se lembrasse dele, porque ele a fez sorrir como eu nunca vi, ele a levou para um deserto de espírito que você precisava e tudo se tornou melhor. — ela me olha com tristeza. — Um dia eu quis que você se esquecesse dele porque achei que ele pudesse arruinar a sua vida e hoje eu vejo que ele a salvou.

“Um dia eu desejei do fundo do meu coração que ele não existisse e foi isso que aconteceu com ele dentro de você, mas ele deixou de existir para ele mesmo e se um dia eu puder sentir o amor como ele sentiu, porque ele sentiu de verdade e o fez chegar até você, eu serei feliz. — ela chega perto de mim e retira o espelho de minhas mãos. — Um dia você vai sair desse período que você está e vai entender o que estou falando. — ela diz e olha para o pequeno espelho. — Não consigo esperar mais, recebo notícias dele diariamente e ele não pode entrar aqui, não pode porque seus pais o proibiram, o que seus pais não imaginam é que foi ele e um bando secreto de agentes especializados em ajudar um amigo que prenderam o culpado por isso.

— Eu não entendo, porque o que eu sei é que Otto é o meu namorado e agora você despeja um monte de notícias que eu não sei como encaixar, e algo está faltando, como se algo tivesse sido tirado de mim. — vejo um enfermeiro chegar com uma cadeira de rodas e a coloca do meu lado. Não preciso disso, posso sair caminhando, mas eu sei que esses são os procedimentos do hospital.

— Agora vamos, vamos voltar para a sua casa. — ela diz e me leva para fora do hospital em uma cadeira de rodas e logo em seguida estamos no taxi.

No rádio, toca Say Something, de Cristina Aguilera e tudo está triste e vazio, como se faltasse uma parte minha e nada faz sentido.


“Você é a pessoa que eu amo

E estou dizendo adeus”

 

Percebo os olhos de Rocco em uma travessia deserta, é como se ela quisesse gritar pela janela uma porção de coisas, mas ela não pode fazer isso e eu não entendo nada.

Quando chego em casa, sinto como se estivesse na casa de outra pessoa, as cores das paredes, não lembro de tê-las pintado. Sobre a mesa central da sala, um imenso arranjo de flores do campo, subo as escadas e quanto mais depressa, Rocco está comigo. Ela sobe do meu lado e abre a porta do meu quarto, a porta ao lado está fechada.

Entro e observo tudo, e as cores não são as mesmas, nada está igual e eu me sinto perdida dentro da minha própria vida. Rocco me olha esperando alguma reação e eu me jogo sobre a cama, fazendo com que os travesseiros pulassem e caíssem sobre uma boneca de pano que francamente não me recordo dela em minha infância.

— Está com fome? — ela pergunta e se senta ao meu lado. Ela alcança minha mão e me transmite uma sensação de que tudo de alguma forma vai ficar bem.

— Não, quero apenas entender e parar de sentir esse vazio, quero que as coisas façam sentido para mim. — digo e caminho pelo quarto, observando a rua pela janela. Tem um carro parado na frente da minha casa e outro logo atrás, é proibido estacionar ali, penso comigo.

Escuto um celular tocar e vejo Rocco atendendo.

— Oi. — ela diz baixinho e eu sinto a textura da cortina. Fecho os olhos e sinto como se nada fosse real.

— Ela está tentando. — ela responde e acredito que eu esteja mesmo, parece que estou prestes a descobrir algo grandioso. — Ramon gostaria de lhe desejar boa noite pessoalmente. — ela diz com o celular longe da orelha e me olha pedindo em nome do desconhecido.

— Não quero ver ninguém, estou confusa e prefiro ficar sozinha, se não se importa. — peço educadamente que ela saia e ela o faz.

Ela sai do meu quarto falando ao celular, consolando Ramon e eu desisto de pensar, minha cabeça dói. Vou em direção ao banheiro e acendo a luz.

 

Ramon

 


Olho para a mala vazia e me lembro de como aliviei minha alma alguns dias trás...

Acelerei meu carro assim que confirmei que o bastardo do Otto estava envolvido com o atropelamento de Christen e quando meu cérebro, que pouco estava assimilando percebeu, eu estava na frente da casa deles, da família de corruptos que pagou muito dinheiro para não ter o filho assassino atrás das grades; os Kallil evitam escândalos públicos, mas eles convivem com isso todos os dias.

Eles já pagaram propina suficiente para saldar a dívida de um país de terceiro mundo; Jacob Kallil já respondeu dois processos por agressão e uma tentativa de homicídio que foi arquivada por falta de provas, isso significa que pagaram para que elas não existissem. Seu filho Otto segue seus passos, preso duas vezes por porte ilegal de armas e briga de trânsito, e tem alguns boletins de ocorrência onde duas mulheres apresentam queixa de abuso.

Eu deveria ter arrebentado a cara desse filho de uma puta na noite em que ele tentou bater em Christen.

Desci do carro e alguém até que tentou me impedir, mas não conseguiu, a cor que eu enxergava era vermelho, vermelho de sangue.

Escutei alguém pronunciar alguns palavrões e vindo em minha direção, até que para um cara que pensa que vai concorrer ao Senado, deveria ter mais seguranças... mas ele não precisa, ele não chega nem perto do menos favorito, ele tem um histórico complicado, todos ali têm.

— Olha só, quem veio para o jantar — Otto me recebe com palavras, mas eu tive um sério problema com meu vocabulário interno.

Segurei o pescoço dele e o levantei, apliquei toda a força vezes raiva sobre ele e o arremessei no chão, o primeiro soco foi diretamente sobre o olho esquerdo dele. Um óculos de sol pode disfarçar esse pequeno problema nos próximos dias, mas vamos nos ater aos próximos problemas.

— Escute, seu merda, vamos começar tudo isso aqui em ordem cronológica. Gosta de levantar a mão para bater em mulheres, isso denuncia a total e completa falta de habilidade na cama com elas, coisas que seu ralo dinheiro desviado de projetos fraudulentos de seu pai nunca vai conseguir comprar — me aproximo ainda mais e chuto seu traseiro gordo e senti enjoo ao fazer isso, ele poderia sujar meus tênis e eles são de estimação.

— Aquela vaca — ele fala mesmo no chão e tentando fugir de mim, se rastejando, como algo peçonhento. É a cena mais divertida que já vi, ele se arrasta como um nada e isso com certeza vai ser mais uma piada de meu repertorio.

— O chute no traseiro foi em nome de Christen, a mulher que você não tem ideia de como satisfazer e preferiu a mim naquela noite — ando em sua direção me inclino e acerto outro soco, agora no direito para combinar com o outro — Levante-se, preciso que dificulte as coisas para mim.

— Meu pai vai acabar com você — jogo minha cabeça para trás e gargalho alto e preciso me conter para não esquecer o motivo real que me trouxe aqui.

— Papai protege? Seu pai tem tantos assuntos inacabados, tantos processos, com certeza o filhinho que gosta de dirigir embriagado e matar pessoas vai ter que aguentar essa, se conseguir ficar de pé, bata os pezinhos no chão e faça manha, quem sabe não ganha um pirulito, seu filho de uma puta — chego mais perto e o levanto do chão pelo colarinho da camisa que vai ganhar mais vida, vai ganhar sangue. Seguro o tecido e deixo meus dedos se misturarem ao tecido gosmento que ele chamaria de pele, mas ele é muito nojento, é como esmurrar uma gelatina.

Olho para ele caído e o sangue descendo e encontrando o azul claro de sua camisa.

— Esse foi em nome de cartas com algumas ameaças, então, quero que fique tranquilo, não vai apanhar mais do que merece — sorrio.

— Prepare-se para o inferno — ele me ameaça mesmo caído no chão.

— Não preciso me preparar para ele, eu vim de lá — me aproximo e me sento sobre a coisa mole que é o seu corpo, deixo minhas mãos livres e elas estão furiosas — Ela está no hospital, acho justo que você também vá — falo e desço um soco atrás do outro, minha mão chega a ficar dormente e agora tudo fica melhor, não sinto mais dor em bater nesse bosta — Contratou um cara porque você não conseguiria fazer o serviço ou pela covardia mesmo? — desço outro soco e tosse dois dentes para fora — E ainda tem a audácia de me ameaçar? Vamos, repita em voz alta o que me escreveu, seja homem, seu lixo — deixo as minhas mãos acertarem o rosto dele e ele tenta falar alguma coisa .

— Eu não ameaçaria você, seu idiota, você é muito pouco para eu perder o meu tempo, mas aquela vadia mereceu cada osso quebrado — uma espécie de fúria mortal se revirou em meu peito e havia mais vontade ainda de bater, e foi o que eu fiz, golpes incalculáveis, doloridos e altamente satisfatórios.

Me levanto e o arrasto para a porta da casa dele, bem em frente da sala e escuto as sirenes se aproximando, infelizmente meu show vai acabar. Abro a porta da sala, o coloco de frente e chuto violentamente sua bunda, possivelmente ele vai precisar trocar a cueca.

— Você não imagina o que vai ser da sua vida a partir de agora — ele ainda me ameaça.

— É você que vai me dizer ou o papai vai descer aqui para falar comigo? — pego meu celular do bolso e mostro algumas gravações, mesmo de longe — Chantagear pessoas é crime, caso o papai não saiba, avise-o — assim que termino de falar escuto a policia me pedindo para ficar parado e eu obedeço, obedeço todos eles, coloco minha mão sobre a cabeça, me viro lentamente e me sento no banco de trás da viatura.

Foram alguns minutos ali, olhando o brilho vermelho iluminando tudo ao meu redor, tão vermelho quanto a cor que eu enxergava quando cheguei ali. Olhei para o rosto destruído do idiota sendo algemado, olhei para o pai e para a mãe dele que olhavam tudo e tentavam impedir que ele fosse preso e então me dou conta que o único condenado nessa historia toda possa ser eu.

Cheguei a ficar três dias sob custódia da polícia, paguei uma fiança e saí, mas em nenhum momento isso me fez um homem livre. Volto das lembranças e espio por alguns instantes o horizonte torto por prédios diante do meu quarto.

Não sei quando volto, mas eu sei que um dia vou precisar encarar tudo de novo, encarar uma Nova York onde ela existe para mim e eu não faço mais nada além de ser um rosto a mais na multidão.

Escuto meu celular tocando e a maldição de ter me deixado levar pelo canto da sereia é esse, o som de sua voz, Christen, ecoa no lugar do silêncio.

— E aí, cara? — pergunto para Benjamin.

— Alguma notícia? — ele quer saber se ela se lembrou de mim .

— Nada, saí ontem à noite quase de madrugada da delegacia e falei com a Rocco, mas pelo visto eu entrei para a seleta e imensa lista de encomendas realmente, sempre foi assim, pagava pela hospedagem, pela comida e na manhã seguinte eu nunca me lembrava do rosto ou do nome, por vezes nem do sexo, a única coisa que eu sabia é que algum tempo depois eu estaria ali novamente para fazer tudo de novo e esquecer logo depois — desabafo. Benjamin tem se mostrado um amigo e tanto.

Há uma semana Sebastian voltou de sua lua de mel e estava com o sorriso idiota na cara, o sorriso que aprendi a ter e que agora deu lugar a essa sombra triste. Ele ficou sabendo e na mesma hora esteve na minha casa, conversamos e em seguida, Benjamin chegou com Giovani. Coloquei meu coração sobre a mesa, ao lado dos copos e dos celulares incansáveis.

— O que pretende fazer? — ele pergunta e percebo que o telefone está no viva voz e eu realmente não sei a resposta, não estou sabendo de muita coisa ultimamente.

— Vou para Malibu, minha família está na Colômbia e a casa vai estar vazia — eu poderia muito bem pensar que a casa estará tão vazia quanto eu, mas essa não é a verdade. A verdade é Christen Madson preenche tudo aqui dentro e por isso tudo dói.

— Não vou me oferecer como companhia, mas quero que você fique legal, cara, uma hora ela vai lembrar de você, você é muito chato para passar despercebido — Benjamin tem um dos melhores sensos de humor que conheço, ele e Sebastian são bons com o humor.

— Benjamin, se você fosse comigo, transformaria meu refúgio no maior centro de orgias de Malibu, então, por favor, deixe a putaria deste lado dos Estados Unidos — tento entrar no ritmo cômico, mas ainda não consigo.

— Viu como você é chato? Fique tranquilo, Ramon, ela vai voltar e vai se lembrar de como é ruim na cama — ele mantém a piada — Me ligue se precisar de alguma coisa — ele se despede e eu desligo.

Coloco algumas peças de roupa dentro de uma pequena bagagem, faço um check-in on line para o voo de logo mais e giro meu celular até ligar para Rocco novamente e receber as mesmas notícias e ser dispensado por Christen. Gostaria que ela me desse carona novamente.

 


Christen

 

 

Tudo é diferente e estou diante de um espelho imenso que reflete minha imagem e apesar de estar convicta de meus vinte e quatro anos, o que vejo são alguns anos a mais. Estou nessa casa que ainda me parece estranha há mais de vinte quatro horas, os único lugares que entrei aqui foram na cozinha e no meu quarto.

Ando em direção ao closet e não reconheço as minhas roupas, não reconheço as bolsas, eu não me reconheço. A única coisa que sei é que está faltando alguma coisa, sinto um vazio que em todo momento me parece mais dolorido do que qualquer outra coisa.

Vou até a cozinha e vejo a Sue fazendo alguma coisa que vai para o forno. Ela tem estado tanto tempo aqui junto com Rocco e as duas parecem que estão em uma conspiração a favor de um monte de coisa que não conheço.

— Está com fome? — Sue me pergunta.

— Não muita, sinto como se tivesse levado um soco no estômago. É terrível se sentir perdida, não reconheço nada, eu sei quem é você, quando eu estava na minha casa era você que estava por lá, eu lembro — menciono a casa que me lembro, essa daqui eu não conheço, mas agora me soa familiar.

— Você se mudou para essa casa há cinco anos — ela diz e eu não me lembro. — Já andou por toda a casa? — ela me pergunta e eu nego com a cabeça — Então deveria, chegou aqui ontem do hospital, quem sabe olhar ao redor não ajuda — ela diz e me convence disso.

— Vou tomar um banho e desço para o jantar — aviso e subo.

Deixo que a água desça abundantemente e que o vapor quase deixe tudo fora do alcance dos meus olhos, tento forçar a minha mente, mas a única coisa que acontece é uma dor de cabeça.

Saio do banheiro ainda molhada e visto um roupão branco, me sento na beirada da cama e olho para todos os lados. Vejo os quadros, o lustre, a boneca de pano ainda está no chão. Ela deve ter feito parte da minha infância, mas eu não me lembro dela e a minha memória é boa, pelo menos era até eu perdê-la parcialmente.

Percebo meu corpo ficar seco e vou até o banheiro e desembaço o espelho com a palma da mão. Olho para o reflexo desconhecido e espero que ela me diga algo, mas ela tem tanto a dizer quanto eu.

Penteio meus cabelos e tento reconhecer o corte, tento me lembrar em que momento abandonei as mechas longas até a cintura.

Rocco bate na porta e me pergunta se estou bem, ela possivelmente estava tomando banho na suíte de hóspedes.

Não tenho uma boa resposta para essa pergunta, mas digo que estou bem. Ela avisa que está na cozinha e que me espera para o jantar.

Digo um ok sem direção, mas ela escuta.

Viro meu rosto para um lado e analiso, vejo os traços e se tenho vinte e quatro anos, estou aparentando bem mais. Viro meu rosto para o outro lado e olho o ferimento quase imperceptível em meu supercílio e observo um pequeno desenho atrás da minha orelha, puxo o lóbulo e tento entender do que se trata. Acendo a luz que fica sobre o espelho e aproximo meu rosto.

Tudo acontece rápido como uma onda tempestuosa e eu encaro as coisas ao meu redor com espanto, seguro a escova de cabelo e solto, os cremes e o arranjo de flores que sempre peço, desde que escolhi mudar as cores das paredes.

Uma avalanche de lembranças chegam bagunçadas e fora de ordem. Estou perdida e tento apenas assimilar o que acontece nesse momento em minha mente.

Estou tentando encaixar as informações e tudo está se desenvolvendo como um grande filme confuso, uma névoa encobre algumas informações e eu não me encontro. Aproximo meu rosto novamente e olho para a estrela com a letra G em contornos perfeitos.

Tudo chega, me empurrando mais alguns anos de lembrança e vejo minha posse na diretoria da Madson, vejo os olhos dos funcionários e meu pai apertando minha mão como se eu fosse alguém contratado apenas para executar o serviço.

Fecho os olhos e respiro fundo, deixando tudo se organizar, deixo tudo tomar conta dos meus pensamentos e como um solavanco escuto a voz de Rocco.

“Está gravida”, Rocco disse segurando meu exame de sangue porque eu estava com tanto medo que tudo fosse mentira e ela sorriu, se impondo como madrinha e, então, pensamos em mil nomes e tudo era melhor do que esperava.

“Parabéns, Srtª Madson, é um menino”, o médico disse mostrando na tela o sexo do meu filho e tudo se fez em mil encantos e se tornou perfeito e eu agradeci.

Mas assim como as lembranças boas chegam, vêm a desordem e a realidade, vêm as lembranças que eu não queria que existissem.

“Infelizmente, Srtª Madson”, então, as lembranças que surgiram e me fizeram sorrir me trouxeram outras e saio do quarto correndo e abro a porta do quarto ao lado. Tudo se torna negro e perverso e eu sinto o gosto do sangue e o acidente acontece diante dos meus olhos.

Um quarto feito com amor à base de azul e um tom suave de marrom perolado. O berço branco assim como a cômoda e o guarda-roupa, tudo que vejo é o mundo feito para o meu menininho que foi embora e tudo volta a doer e tudo se torna negro e eu prefiro a parte da minha vida que isso não acontece.

Caio sobre meus joelhos e deixo que tudo aconteça dentro da minha mente enquanto as lágrimas saem. Mas eu preciso viver essa dor novamente, preciso sentir cada momento para que tudo tome seu fluxo natural. Coloco a mão sobre minha barriga e desço minha calça de malha e busco a cicatriz da cesárea, mas não tem, eu me lembro, os médicos fizeram um excelente trabalho, como se não quisessem deixar nenhum vestígio em mim e o que ficou é uma linha fina, que passa despercebida.

Mas em meu coração a linha é mais complicada, não tem como remendar ou colocar algo por cima. Gabriel levou um coração, mas mora nesse que ficou.

Tento recobrar os sentidos e me coloco de pé, olhando ao meu redor tocando cada detalhe, cada peça de roupa que comprei pensando nele, tudo está igual, como se eu tivesse acabado de guardar.

Mas minha cabeça ainda gira em torno da confusão que parece querer se por em ordem e então mais uma lembrança se forma.

“Christen, sou eu, a Thyna. Otto está aqui na Jonh Jonh e está aos beijos com uma loura”, ela disse e eu quase não acreditei.

“Filho de uma puta”, eu disse e despejei um soco contra seu nariz e ali chegaria ao fim o meu noivado de fachada para deixar meu pai feliz.

“Vai ficar bem, ou tem mais algum homem que prefere te bater aqui nesse lugar?”, então, o homem das flores perguntou assim que me salvou de um soco. E outra série de momentos com ele chegam de forma apressada e eu o vejo, sorrindo e ele cozinha e precisou de uma carona para Malibu!

Saio do quarto e volto correndo para o meu, resgato a boneca debaixo dos travesseiros e olho para Serafine. “Tio Ray, disse que temos que oferecer o que temos de melhor”.

— Anônimo! — digo com a voz falhada e sinto meu rosto tomado pelas lágrimas e sorrio ao pensar nele. — Ramon! — Falo mais alto e corro do quarto, descendo as escadas com a boneca na minha mão. — Rocco! — grito sorrindo e ela vem ao meu encontro, pálida e olha para cima me alcançando. Estou debruçada no corrimão da escada e sorrio, desenfreadamente.

— O que foi, Christen? — ela pergunta enxugando a mão no guardanapo e sobe em minha direção.

— Rocco, vem comigo? — pergunto e ela sorri com lágrimas em seus olhos.

— Apenas se isso envolver pessoas do ramo farmacêutico! — ela responde e me abraça — Ao menos vista uma roupa para o escândalo ser menor — me troco em dois minutos e volto em menos de um.

— Vinte e sete tatuagens, a última foi a gaivota no tornozelo e agora me leve até ele. — peço e não me importo se estou com um bendito conjunto de malha cor de rosa e tênis branco, não ligo se nos jornais terão uma Christen descabelada e sem maquiagem.

Descemos juntas e eu deixo a boneca sobre o sofá. Saímos em direção a minha garagem e ela está com as minhas chaves na mão. Entramos no carro e ela acelera, meu coração dispara e tudo em mim está nele. Vejo Rocco fazendo uma ligação.

 

 


Rocco

 


— Está caindo na caixa postal — digo e olho para Christen que cutuca o canto da unha com o dente, ela deixou de roer unhas há muito tempo.

— Para quem você está ligando? — ela pergunta e eu suspendo a sobrancelha mostrando o número, nome e a foto do latino.

— Mas está desligado — respondo — Vamos até a casa dele — digo e entramos.

Enquanto dirijo aperto o redial e a mesma informação solta no viva voz via bluetooth do carro.

Disco para Giovani, chama até cair na caixa postal também.

— O que está acontecendo? — fico irritada por Giovani não atender.

— O que foi? — ela pergunta e eu estico a minha mão e tiro a mão dela da própria boca.

— Giovani também não atende — resmungo.

Em seguida meu celular toca é Giovani.

— Oi — ele diz e eu coloco no viva-voz.

— Oi, a desmiolada lembrou de tudo e eu não estou conseguindo falar com o latino — disparo de uma única vez.

— Fico muito feliz, mas não vai conseguir falar com ele agora. Ele estava em Malibu e acabei de vê-lo postando em sua rede social que estava indo para Colômbia. São algumas horas de viagem, não deixe que ela perca a memória novamente — ele diz e Christen sorri.

— Giovani, tem o endereço dele na Colômbia? — Christen pergunta e escuto Giovani limpar a garganta.

— Christen, eu não tenho, o que sei é que ele vai visitar o hospital que ele mantém por lá, mas me dê alguns minutos, vou ver o que consigo — Giovani fala e ela deixa seu rosto ficar triste e eu também fico, porque agora é só uma questão de geografia e não de história.

— Obrigada — ela diz e ele desliga em seguida.

— Mad, vamos voltar para casa — digo e volto os três quarteirões que havia percorrido, entramos em sua casa e ela se sentou na poltrona, encarando a janela e possivelmente pensando em algum plano para mudar a situação, afinal, ela é Christen Madson e esperar não está na lista de coisas que ela faz habitualmente.

 


Christen

 


— Rocco — chamo por ela que estava olhando na tela do celular.

— Sim? — ela responde sem me olhar.

— Não sei você, mas eu vou subir e arrumar minhas coisas. Avise Leopold que preciso do jato para agora e que vamos para Colômbia. Não vou ficar sentada aqui esperando, isso é quase admitir uma doença terminal e eu não admitiria isso mesmo que eu tivesse uma — subo e ela vem atrás.

— Mad, existe uma burocracia, você não pode simplesmente sair dos Estados Unidos assim, o jato é seu, mas o céu não — ela até fala uma porção de coisa e eu percebo que Rocco sempre foi chata, mas eu a amo.

— Então, cuide da parte burocrática, e eu cuido da minha bagagem — falo e entro no meu quarto. Ela está atrás de mim e fala com meia dúzia de pessoas e em alguns momentos tudo parece se complicar e eu continuo colocando tudo dentro da minha mala.

Pedi para ele que deveria ser anônimo, exigi praticamente e tudo em nome da vontade do meu pai em ter uma filha perfeita, mas acho que ele queria mesmo é que eu fosse um homem e, então, todos os escândalos seriam perdoados facilmente. Estamos vivendo uma era tão evoluída e tão primata ao mesmo tempo.

Um homem pode se dividir entre várias mulheres, ele se torna cobiçado, uma mulher desiste de seu noivado e é o suficiente para que seu próprio pai demonstre sua decepção constante.

Se eu pudesse voltaria no tempo, mandaria uma nota para cada jornal desta cidade e deixaria claro que a Srtª Madson foi conquistada por um desconhecido e colocaria nesta nota até o verde preferido de Ramon. Ele se tornou o homem que gosta do meu jardim. Sou apaixonada por ele, por tudo de ruim nele, porque quando penso nele me sinto uma pessoa melhor.

— O que não consegui o seu dinheiro conseguiu, vai ter que pagar algumas taxas de urgência e eu vou com você — Rocco diz e eu me aproximo dela.

— Você sabe que eu te amo, mas as gaivotas eu desaprovo — brinco com ela.

— Não começa com essa história de novo, eu gosto das gaivotas e você me atormentou a sessão inteira para eu não fazer isso — me lembro de tudo, me lembro até do cheiro de álcool e o barulho das motos que estacionavam em frente ao lugar que estávamos.

— Arrume suas coisas e ligue para o seu novo amiguinho hacker, veja se ele encontrou um homem latino perdido por aí — beijo o rosto dela e escuto-a descendo para o quarto de hóspedes falando no celular.

De desconhecido ao homem das flores.

“Está sentindo?”, ele perguntou e colocou minha mão sobre seu coração. “Eu não o sentia antes de você”, ele disse e tudo foi perfeito, mesmo não sendo, pois, estar com ele é algo imediato, precisa ser feito e é tudo que mais quero.


18

 


Ramon

 

 

— Johana, eu acabei de ligar meu celular, e tenho mais de vinte ligações perdidas. Passei o dia na Colômbia com as crianças do hospital, a segunda ala precisa de uma reforma e mais brinquedos lúdicos, mas me fale com calma o que foi que aconteceu na casa — minha irmã parece uma maluca e não para de falar.

— Entraram na casa — ela diz.

— Como assim? Eu desligo meu celular por vinte e quatro horas e o mundo parece que vai acabar — disparo — Já estou a caminho, acabei de desembarcar — desligo e pego um taxi e no caminho olho para as chamadas perdidas.

Giovani me ligou, Benjamin e Rocco, Rocco ligou duas vezes.

Ligo de volta para ela mas vai direto para a caixa postal, ligo para Giovani e eu sei que eles estavam mais próximos e o mesmo acontece, direto para caixa postal.

Ligo para Benjamin e é o único que me atende.

— E aí, latino? — ele me atende animado.

— Vi uma chamada sua, estou retornando — sou direto.

— Eu queria saber quando você pretende voltar. Marquei com Gio de irmos para Aspen na próxima semana — achei que ele pudesse ter uma boa notícia, mas as notícias de Ben sempre tem a ver com algum tipo de putaria.

— Na próxima semana? Estou enganado, mas não é na próxima semana a exposição que Kim está patrocinando, de uma amiga ou amigo, não me lembro — eu sei porque recebi o convite essa semana e ainda não confirmei a minha presença.

— É, mas vamos para Aspen no dia seguinte — ele gagueja, acho que ele está tentando me animar para alguma coisa que nem ele mesmo sabe o que é. Não desconfiava dessa lealdade dele, tínhamos um acordo quando fazíamos, ou melhor, quando eu estava no Clube, mas ele ultrapassou algumas etapas e tem sido um baita amigo.

— Te ligo amanhã — respondo sem ânimo.

— Ok — ele responde e desliga.

Retorno novamente para Gio e depois para Rocco e coloco o dedo sobre a tela para ligar para Christen, mas eu não o faço, eu teria uma chamada dela aqui no meu celular além das chamadas dela aqui dentro do meu peito.

Depois de uma hora chego na minha casa em Malibu. Vejo o carro do meu pai na lateral e deve ter sido algo bem grave para arrastar meu pai aqui em plena quarta-feira.

Olho na tela do celular e vejo os números, dezesseis horas e quatro minutos.

Não escuto as crianças, caminho e vejo minha irmã falando no celular e andando de um lado para o outro.

— O que foi que aconteceu? — entro e coloco minha bagagem sobre a cadeira perto da porta.

— Já resolvemos — ela responde assim que desliga.

— Mas o que diabos aconteceu aqui? — pergunto descarregando tudo em cima dela.

— Algumas pessoas entraram aqui, abriram armários, a geladeira e pelo visto passaram a noite aqui. Fizeram churrasco, como se aqui fosse a casa deles — ela responde e caminha para fora da casa em direção a churrasqueira — Olhe, nem limparam e achamos que alguém possa tê-los ajudado a entrarem aqui — ela fala com suspeita de um dos funcionários.

— Carlos? — pergunto e a sigo, ela caminha em direção a praia.

— Não sei — ela responde e vejo as crianças correndo em minha direção.

— Ainda bem que as crianças não estavam aqui — digo e me ajoelho para poder recebê-las em meus braços.

— Mas quem disse que elas não estavam? — olho para ela e ela está sorrindo — Desconfiamos que elas ajudaram os invasores, sem contar que papai e mamãe também estão envolvidos nisso.

— Mas o que está acontecendo? Pessoas invadem minha casa e vocês acham isso normal? Eles interagem com as crianças e tudo está bem? — as crianças pulam em mim.

— Tio Ray! — Ariel diz e Tomas agarra meu pescoço.

— Vocês podem me dizer o que aconteceu aqui ontem? — pergunto e os coloco no chão. Ariel aponta o dedo para uma mulher branca, muito branca, de vestido curto amarelo que caminha em nossa direção, ao lado dela tem um homem de camisa azul clara e bermuda bege, e eu acho que conheço esse cara, e eles se aproximam e tem mais alguém atrás deles, uma mulher, a mulher que eu reconheceria em qualquer lugar.

Rocco precisa vir mais à praia; Giovani, filho de uma puta, e Christen, a mulher que definitivamente detonou comigo, me usou e me dispensou da maneira mais canalha desse mundo.

Eles caminham rindo e ela nem me olha, talvez estejam aqui para forçarem-na a se lembrar de mim, ela esteve aqui. Eles se aproximam ainda mais e a maldita está com o biquíni minúsculo, cor de rosa, ordinária.

— E aí, latino, bela casa — Rocco diz.

— É, cara, não tinha vindo aqui depois da reforma — Gio aperta minha mão e me puxa para perto dele dando alguns tapas em minhas costas.

— Eu — começo a falar mas não sei bem o que dizer, ela está olhando para as crianças e parece que não se importa com a minha presença.

— Ramon, certo? — ela estica a mão em minha direção, se apresentando para mim, diferente da noite em que nos conhecemos e não falamos nossos nomes e nem nossas cores preferidas.

— Sim — respondo.

— O meu é Christen Madson, e a casa é muito bonita — percebo que Gio, junto com Rocco, minha irmã e as crianças se distanciam e eu não sei o que esperar. Por mim a agarraria e a beijaria, mas ela ainda não sabe quem eu sou.

— Eu sei quem é você — respondo não muito feliz. Mas eu deveria estar, ela está aqui e algo pode acontecer, ela pode se lembrar e voltar a me fazer feliz.

Ela para por longos minutos e me olha fundo nos olhos e eu não sei como ela não percebeu o quanto está aqui dentro.

— Sabe, Ramon, não tive a oportunidade de lhe agradecer pelas visitas no hospital, pelas flores e pela surra que deu no Otto. Não tive a oportunidade de agradecer por ter me salvado de um soco, por ter me feito café da manhã e também não pedi desculpas por ter rasgado seu sofá — meu coração dispara e ela começa a dar sinais de um pequeno sorriso — E antes de mais nada, não tive a oportunidade de dizer que é muito feio invadir a casa das pessoas, e que o dono desta casa deve estar furioso — ela se aproxima de mim e segura a minha mão. — Não vou me perdoar por ter esquecido você, mas eu espero que me perdoe. Gabriel me ajudou a lembrar de tudo, e ele fez questão de me lembrar que dentro do meu coração ele estava dividindo o espaço com você — a puxo para perto de mim e a beijo.

Céus, não acredito que estou beijando essa mulher, não acredito que ela saiba quem eu sou.

— Você me deixou sozinho, sem dinheiro para o taxi — falo e volto a beijá-la.

— Eu sei, mas estou disposta a retomar nosso contato e pagar tudo que está atrasado. Confesso que me sinto excitada em saber que estou me relacionando com um ex-detento. Foi para cadeia por mim, arrumou confusão e foi até para Colômbia — ela zomba e eu estava com tanta saudade dela, do cheiro dela.

— Iria para o inferno e buscaria cada um que machucasse você. Você não estava nos meus planos, não saio por aí defendendo ninguém de absolutamente nada, mas você fez questão de pegar tudo que eu achei que conhecia e jogar no lixo, então, por favor, não esqueça quem eu sou, porque agora, por mais que eu queira, você está mais na minha vida do que deveria — digo e a beijo novamente.

— Estou na sua vida?

— Sim — respondo.

— Isso é bom? — ela sorri e franze o nariz.

— Para mim sim, é como se ela tivesse começado depois que você chegou — ela sela a minha boca e sorri.

— Era para ser anônimo — ela murmura.

— E não era para ser amor.


Epílogo

 

Ramon

 


“Então eu não hesitarei mais, não mais

Não dá para esperar, tenho certeza

Não precisa complicar, o nosso tempo é curto

Este é o nosso destino, eu sou seu”

I’m Yours — Jason Mraz

 


Ela disse sim.

Mas não houve um pedido de casamento, ela simplesmente disse sim... Ela disse quando me procurou naquele domingo e depois em outros.

Tudo era para ser assim, no segredo, longe do perverso mundo de publicações que nada sabem sobre histórias reais. Mas não foi e seu nome se espalhou em minha vida e tudo se tornou complicado e de um avesso estranho, mas é esse lado que prefiro e nele que estou. Eu estou com ela.

Um avesso composto por amigos que descobrem assassinos e é essa a piada que contarei para os meus filhos.

Penso neles rindo do velho que se arriscou na prancha de um navio pirata e foi a melhor de todas as minhas decisões, porque estar com ela significa muito mais do que estar acompanhado, significa ser desafiado a todo instante, ser insultado e pedir por mais, é isso que ela faz de melhor, ela me domina.

Olhar para Christen caminhando descalça sobre essa areia branca, transmitindo essa sensação libertadora, me faz pensar em que tipo de sorte eu tenho por isso; ela é toda essa coisa desrespeitosa, de sexo gostoso e de conversas de horas sem que se tenha vontade de parar.

Mas admito a satisfação em ter esmagado a cara do monte de merda que está na cadeia, e ver seu pai desistindo do senado por conta de algumas informações que por Deus, agradecerei Alexander eternamente.

Sorrio ao lembrar da manhã em que acordei na delegacia, pois eu sabia que Alec e Gio haviam da forma deles espalhado os rumores de um suposto desvio de dinheiro e naquela manhã eu ainda estaria na delegacia, mas a família Kalil era a procurada.

Nesse jogo político eu fico de fora do tabuleiro, é nesse lado que posso observar como Christen é linda e seus olhos refletem o melhor que ela possui. Ela caminha em minha direção e tudo se torna um movimento feliz e completo. Desejo que o mundo saiba disso.

— Deveria entrar na água. — ela diz e se aproxima de mim com seu biquíni minúsculo e eu fico feliz por ela ter enfim aprendido a usar a parte de cima, isso evita mortes desnecessárias. Eu mataria por ela.

— Depende, me faça um proposta. — peço e desço os óculos de sol até a ponta do meu nariz. Malibu está quente e temos mais alguns dias nesse paraíso. Escuto Ariel e Tomas brigando com meu pai por conta de alguma coisa inútil e indiscutível. Minha mãe e minha irmã gargalham. Os pais dela recusaram o convite, para eles o orgulho é uma pedra mais valiosa.

— Eu estarei lá. — ela disse sorrindo e mordendo o lábio inferior. E pensar que ela esqueceu sobre nós, pensar que eu poderia não estar vivendo isso, apenas por pensar fico triste. Ela tem evitado que coisas triste entrem na minha vida.

— É, concordo que realmente é uma proposta razoável. — zombo e ela sorri.

— Sim, claro que é razoável, afinal de contas, eu sou a mulher que vive lhe dando carona para esse fim de mundo e minhas gorjetas são satisfatórias. — ela sempre terá uma resposta e essa resposta sempre me deixará aos seus pés.

— Não viveria sem elas. — digo sério e ela se senta no meu colo, de frente para o mar. Ela beija meus lábios e me olha como nunca ninguém olhou — Não poderia viver sem sua carona, sem suas gorjetas e sem você. Tudo ficou diferente depois de você, tudo ficou exposto. A única certeza que tenho é que nada será anônimo como antes, mas agora eu prefiro assim.

 


Fim.


Aprecie parte do próximo livro da Série Clube 13.


São como peças de dominó enfileiradas,

caindo uma a uma...


DOMINO


Prólogo

 


Benjamin

 


Existem três tipos de humanos, os que crescem da maneira convencional, estudam, não provam nada ilícito e se casam, formando uma família com a mesma expectativa. Tem o tipo de humano que faz todas as loucuras, mas em determinado momento ele resolve seguir as regras do primeiro humano, a fim de recuperar algo que sabe-se lá Deus por que se tornou importante. E existe o tipo de humano que poderia ser classificado como Humano Benjamin: aproveito a vida de todas as formas, não uso nada ilícito e já tenho tudo de importante; uma família boa, tive bons estudos, moro muito bem em uma cobertura na Quinta Avenida que, graças a Deus, não sabe falar e estou olhando para duas mulheres deitadas em minha cama.

Eu sou o tipo de humano feliz, espécie rara e eu diria que se eu morresse com certeza estaríamos extintos.

A de cabelo mais curto e mais alta é Greta. Ela sabe das coisas, uma companheira e tanto para algumas loucuras, um pouco dominadora e às vezes possessiva, mas nada que não possa ser acalmado com uma boa e suculenta sessão de sexo a três, minha especialidade, e é claro que números superiores a esse são extremamente bem-vindos.

A menor foi uma convidada dela, dinamarquesa, cabelos cumpridos, negros. Precisa melhorar a técnica de fazer sexo oral, ela deve ser nova e está perdida em relação ao tempo que se leva em cada um. Porque uma coisa é certa, sexo entre duas pessoas não tem como dar errado, ali é um para o outro, quando essa equação começa a saltar para um número a mais de pessoas, tudo se torna mais complexo e depois de muitos anos e muita prática é que chegamos à perfeição, ou o estilo Benjamin, o que significa a mesma coisa.

Alcanço meu celular e registro o momento das duas, todos os meus momentos com Greta foram registrados e eu sei que posso ser assim com ela, não existe sentimento, o que temos acaba assim que o dia amanhece, somos dois vampiros.

Saio do meu quarto e as deixo lá, elas merecem o descanso. Vou até a cozinha e pego um copo d’água. Suzy, minha empregada, avisa que o café da manhã está posto para uma pessoa como eu solicitei e que minha mãe já ligou sete vezes.

Não são nem nove horas da manhã e minha mãe já está nessa tensão. Vou até o bar e misturo suco de laranja e um pouco de vodka. Bebo o primeiro gole e escuto a porta do elevador se abrir, ela revela a figura mais elétrica que já conheci, minha mãe.

— Benjamin Augustus Brandy, são nove e vinte da manhã e hoje é terça-feira, não deveria estar no escritório? — minha mãe poderia ser pelo menos melhor informada, ou ter tido um segundo filho, assim eu dividiria esse tipo de loucura.

— Mãe, eu te amo, mas precisamos ver essa memória. Não piso no escritório antes do meio dia há mais de seis meses. Posso trabalhar daqui, tenho um escritório com todo o sistema aqui, isso poupa meu tempo e minha energia — explico e escuto a porta do meu quarto se abrindo. Elas estão usando minhas camisas e estão bocejando e falando detalhes que apenas quem estava às quatro e trinta da manhã na minha cama saberia.

— É para isso que precisa poupar tempo e energia, Benjamin Augustus? — sim, mãe, mas negarei para senhora por respeito — Sua sorte é que minha memória age a seu favor — ela se aproxima de mim e beija meu rosto — Semana que vem seu tio vai para Alemanha e eu e seu pai vamos com ele, consegue ficar bem sozinho? — não, minha mãe, mas em todo caso eu tenho pessoas para cuidar de mim. Penso na lista de mulheres que se revezariam aqui na porta do edifício apenas para me servirem um mísero copo d’água.

— Com certeza vou sofrer com a ausência de suas ligações, mas acho que vou sobreviver — beijo o rosto dela e ela se encaminha até a porta e nos despedimos.

— Minha sogra, Ben? — Greta pergunta sentada sobre o balcão da minha cozinha e com Patrizia, a dinamarquesa, entre suas pernas, ambas bebem água e olham para mim. Primeiro que esse termo, sogra, estabelece contato monogâmico o que significa que estaria passando minhas noites com uma única mulher, e como já disse para Ramon, para isso acontecer, minha vida teria que estar em risco.

— Greta, isso seria no mínimo irônico.

 

 

                                                   Barbara Biazioli         

 

 

 

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