Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites
RELATOS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
As Divisões Russas aproximam-se de Varsóvia
Luta na Frente Oriental
Fim da guerra na Finlândia
Derrota alemã na Estônia
Ataque russo à Prússia
Ataque russo rumo à Varsóvia
No mês de outubro de 1944 as relações entre o Alto-Comando alemão e as autoridades húngaras, frias já há algum tempo, alcançavam o seu máximo ponto de tensão. Os alemães suspeitavam, não sem fundamento, que os húngaros faziam jogo duplo; além disso, o moral de combate das tropas do aliado balcânico se convertia gradualmente num fator cada vez mais inseguro, dificultando muito o rendimento na frente de batalha.
No Comando Supremo da Hungria encontrava-se, como regente da coroa, o Almirante Miklos Horthy von Nagybanya. Horthy, consciente da inevitável derrota da Alemanha, vinha realizando gestões para safar-se de uma aliança que poderia conduzir a Hungria ao desastre. Em meados de outubro as diligências de Horthy tinham entrado na fase final e definitiva. O almirante húngaro desejava concluir rapidamente um armistício, conseguindo que os ingleses e americanos ocupassem o país e permitindo, ao mesmo tempo, que os alemães se retirassem livremente.
No fim de setembro de 1944 o marechal húngaro Laszlo Farago, o Conde Geza Teleki e Domonkos von Szent-Ivanyi atravessaram as linhas do 6o Corpo de Exército húngaro e se transladaram a Moscou, onde o Barão Aczel Ede já efetuara conversações preliminares.
Cumprindo os planos estabelecidos, o Almirante Horthy nomeou o General Farenc von Farkas comandante da cabeça-de-ponte de Budapeste. Este, que seguia a orientação de Horthy, teria a missão de constituir um governo favorável à paz com os soviéticos. Poucas horas depois da nomeação de Farkas, Horthy proclamou a separação entre o Hungria e a Alemanha. Esse fato, contudo, não chegou a ocorrer.
Pouco antes da citada proclamação, no dia 15 de outubro, na Alemanha, no Comando das SS, o Reichsführer SS Heinrich Himmler manteve uma entrevista com o Coronel Skorzeny e com seu chefe de Estado-Maior, Radl. A missão que Himmler solicitou de Skorzeny foi, de certo maneira, semelhante à cumprida por ocasião do resgate de Mussolini. Agora tratava-se de um seqüestro: o de Horthy. Himmler, manifestando total desconhecimento da matéria, relatou sua intenção de lançar seus oficiais e alguns homens, de pára-quedas, sobre Budapeste. O Coronel Skorzeny, porém, solicitou liberdade absoluta para agir e planejou pessoalmente a operação.
O seqüestro se efetuou no dia 16 de outubro. Nesse dia, nas primeiras horas da tarde, dois automóveis rápidos, levando vários oficiais alemães, entraram na cidadela fortemente defendida por tropas húngaras, onde se encontrava a sede do comando do Almirante Horthy. Um dos oficiais, alegando urgência, solicitou ser recebido de imediato pelo almirante, para quem tinha uma mensagem do ditador alemão. Horthy, imprudentemente, recebeu os "emissários". Cinco minutos depois, "'pálido porém muito sereno, deixava a cidadela escoltado por dois oficiais alemães. Após subir a um dos automóveis, este e o outro afastaram-se a grande velocidade. Skorzeny e Radl acabavam de cumprir a missão que lhes fôra confiada. Horthy estava em poder dos alemães.
Depois disso; os integrantes do setor pró-Alemanha apoderaram-se do governo. Apoiados pelas unidades alemãs na Hungria, neutralizaram os partidários de Horthy e comunicaram ao povo a decisão de continuar a guerra ao lado da Alemanha.
Os acontecimentos de 16 de outubro provocaram profunda comoção nas fileiras do exército húngaro. Diversos grupos de oficiais planejaram lançar as tropas sobre Budapeste e desalojar o governo pró-alemão de Szalassy e também os contingentes alemães. O General Miklos Bela, comandante-chefe do 1o Exército húngaro, assim como outros generais, decidiu romper com os alemães e iniciar negociações com os soviéticos. Nos outros exércitos a maioria dos comandos terminaria aceitando o fato consumado, admitindo o novo governo e a continuação da luta ao lado da Alemanha em lugar de correr o risco de cair nas mãos de um governo imposto pela União Soviética, o que seria inevitável se se tratasse da rendição e permitisse a entrada dos russos.
Os acontecimentos, portanto, não atingiram o nível de catástrofe, como supunham os dirigentes alemães. Na Hungria, de fato, não se repetiram os episódios ocorridos na Romênia. O Marechal Vela von Dalnoki-Miklos e o General Johannes Voros, chefe do Estado-Maior, passaram para as fileiras inimigas e lá constituíram um grupo de oposição ao governo. Em Kecskement, 80 km a leste de Budapeste, produziu-se um levante comunista. Em Budapeste, porém, reinava a calma. O governo de Ferenc Szalassy era obedecido e o grosso das tropas húngaras continuou lutando junto aos aliados alemães.
O assalto soviético
A esta altura a luta se tornou violentíssima e adquiriu aspetos tremendamente dramáticos. As tropas russas da Segunda, Terceira e Quarta Frentes da Ucrânia, comandadas por Malinovski, Tobulchin e Petrov, coordenadas pelo Marechal Timoshenko, lançaram-se ao assalto com todo o peso dos seus elementos. Eram legiões intermináveis de combatentes excitados, instigados pelos seus chefes a combater sem pausa, sem trégua, valentemente, sem pedir quartel nem oferecer perdão ao vencido. A eles se uniam os antigos aliados da Alemanha que agora combatiam contra os que tinham sido seus camaradas. A Romênia, em verdade, lançava na batalha, ombro a ombro com os russos, os seus Exércitos, sob o comando de Anatasiu, o 4o, de Avramescu, e o 5o, dirigido por Racovitza. Os efetivos da Terceira Frente da Ucrânia, que tinham cruzado a fronteira romeno-iugoslava, avançavam, enquanto isso, vencendo toda a resistência das esgotadas forças alemães, rumo à capital da Iugoslávia, Belgrado, situada apenas a 70 km da fronteira. No dia 15 de outubro, por fim, as unidades de Tolbuchin chegaram aos arredores da capital. Apoiados por importantes núcleos de guerrilheiros que obedeciam Tito, os russos cercaram a cidade, tomando-a pouco depois. Os alemães, com suas reservas esgotadas e praticamente sem abastecimentos e munições, tiveram que bater em retirada, apesar de haver lutado tenazmente para conservar a cidade. Nesse mesmo dia 15 o Grupo de Exércitos Sul recebia ordem de Hitler para evitar, "empenhando todas as forças", tanto o cerco que o ameaçava como a esperada investida russa sobre Budapeste.
A ordem de Hitler, porém, era praticamente impossível de ser obedecida. A missão ordenada não tinha nem remota relação com as forças disponíveis. A situação, por outro lado, agravara-se em virtude da defecção do 1o Exército húngaro. Esse exército tinha seus efetivos distribuídos na parte norte da frente de luta, enfrentando as tropas da Quarta Frente da Ucrânia. No entanto, com a mudança de governo em Budapeste, seu comandante decidira passar para o lado soviético. A conseqüência não se fez esperar: uma parte das tropas o seguiu, enquanto outras unidades continuaram a lutar contra os russos. Muitas debandaram, abandonando as trincheiras. Para os alemães, indiscutivelmente, era um fato gravíssimo: a desorganização do 1o Exército húngaro deixava o Grupamento Wohler desguarnecido, ameaçado de um cerco iminente lançado pelo norte.
No dia 17 de outubro os efetivos da Segunda Frente da Ucrânia iniciaram uma segunda tentativa para penetrar na retaguarda do Grupo de Exércitos Sul. O comando alemão ordenou rapidamente que os contingentes do Grupamento Wohler, que combatiam na retaguarda soviética, lançassem um contra-ataque em direção oeste para fechar o caminho à ponta-de-lança russa. Foi então que travou-se, entre os dias 23 e 29 de outubro, a segunda batalha de tanques, na qual os soviéticos foram batidos novamente, perdendo praticamente três corpos blindados. Enquanto isso, no norte, o Grupamento Wohler, diante do avanço da Quarta Frente da Ucrânia, recuou para trás do rio Theiss evitando momentaneamente o cerco.
Os russos, fracassando sua intenção de cortar o Grupo de Exércitos Sul no setor leste do Theiss, decidiram tentar a empresa na região oeste do rio. Ali a ameaça para Budapeste era ainda maior, já que a distância era menor e nenhum obstáculo se interpunha entre a cidade e os russos. Diante da grave situação o comando alemão ordenou que quatro das cinco divisões blindadas do Grupo de Exércitos Sul atacassem no dia 27 de outubro, batendo o inimigo e estabelecendo ligação com o Grupo de Exércitos F. Este avançaria para o norte, deixando suas posições a 300 km ao sul de Budapeste.
Essa manobra, porém, não chegou a ser executada, pois os russos da Segunda Frente da Ucrânia atacaram no dia 30 de outubro e dispersaram as unidades do 3o Exército húngaro, distribuídas a 200 km de Budapeste como barreira entre a capital da Hungria e as vanguardas soviéticas. Diante dos russos, portanto, ficava aberto o caminho para o coração da Hungria. Os alemães, sem perda de tempo, deslocaram duas divisões blindadas para atacar os soviéticos. As forças, equipadas com poucos tanques e canhões autopropulsados, mas combatendo tenazmente, puderam deter a investida soviética e fizeram com que o comando russo desviasse a direção do avanço para o norte, evitando a marcha sobre Budapeste.
No dia 11 de novembro, por fim, uma batalha foi disputada com extrema violência nas planícies que se estendiam entre Budapeste e Tokai, separadas por 200 km. Quarenta e nove divisões de atiradores russos, apoiadas por quarenta grandes unidades blindadas e por dez divisões de cavalaria, combateram durante quatorze dias enfrentando forças alemães aproximadamente dez vezes inferiores em número e armamento.
Os alemães, empenhando-se decididamente na batalha, conseguiram manter-se firmes, impedindo o rompimento e freando o avanço dos efetivos russos. Em fins de novembro a frente ficara estabilizada.
A situação, por outro lado, complicara-se bastante em virtude da derrocada da Finlândia.
Paz no extremo norte
O pequeno país do Báltico, exaurido por anos de luta, desejava abandonar a guerra. A 1o de agosto de 1944, o seu presidente, Risto Ryti, renunciou ao cargo para manter aparentemente válido o seu pacto com Ribbentrop e para que ao mesmo tempo Helsinque ficasse com "as mãos livres".
Ryti foi sucedido pelo Marechal Mannerheim, que incrementou as negociações interrompidas desde abril com Alexandra Kollontai, embaixadora russa em Estocolmo. As exigências de Moscou, como condição imprescindível para a concessão do armistício, eram as seguintes: o governo finlandês deveria romper relações com a Alemanha; o 20o Exército de montanha alemão, que operava na Lapônia, deveria retirar-se; todas as tropas alemães que se encontravam no território finlandês no dia 15 de setembro deveriam ser desarmadas e confinadas.
Mannerheim já estava decidido a um acordo com a União Soviética e assim rompeu em princípios de setembro as relações diplomáticas com a Alemanha, expondo numa nota enviada ao Führer as razões que determinavam semelhante atitude: "A Alemanha... não morrerá... mesmo que a sorte das armas lhe seja adversa...". E acrescentava: "Para a Finlândia, para seus quatro milhões de habitantes... uma derrota militar significará o fim e o extermínio dos mesmos...".
Pouco depois cessava o fogo na frente de combate russo-finlandesa. Era o dia 5 de setembro de 1944.
Dois dias mais tarde, a 7 de setembro, a comissão finlandesa encarregada do armistício, integrada pelo Ministro de Assuntos Exteriores Antti Hackell e pelos Generais Rudolf Walden, Erik Heinrichs e Oscaer Enckell, partiu para Moscou onde teve que esperar ainda uma semana até que Stalin apresentasse as suas exigências, em forma de ultimato, por intermédio de Molotov.
As condições russas reclamavam a entrega da região de Porkkala. Stalin e Molotov mantiveram-se inflexíveis no tocante à fronteira de 1940; as indenizações de guerra foram fixadas em 300 milhões de dólares americanos, que a Finlândia deveria pagar no prazo de seis anos. A Rússia exigia ainda, enquanto durasse a guerra, a utilização dos campos de aviação e dos barcos mercantes. O exército finlandês, também, seria desmobilizado num prazo de dois meses e meio, depois de expulso, desarmado e confinado o exército de montanha alemão.
Mannerheim apresentou as condições russas ao gabinete finlandês e deixou a decisão final nas mãos da Assembléia Legislativa, que as aprovou por grande maioria. O acordo definitivo foi firmado, finalmente, no dia 19 de setembro de 1944.
A paz, contudo, ainda não chegara para a Finlândia. O 20o Exército alemão, por determinação de Hitler, recebeu ordem de conservar o seu setor e constituir uma posição defensiva voltado para o sul. No dia 14 de setembro os alemães intimaram a guarnição finlandesa de Suursaari à rendição e, diante da negativa, atacaram imediatamente. A partir desse instante a Alemanha e a Finlândia estavam praticamente em guerra.
Enquanto na Hungria os russos e os alemães se entrechocavam violentamente e na frente russo-alemã continuava a trégua - não tratada mas aceita por ambas as partes - o comando russo retomou suas operações na ala norte da Frente Leste com o fim de aniquilar o Grupo de Exércitos Norte, cuja retaguarda chegava ao mar Báltico.
Derrota na Estônia
O Capitão-General Heinz Guderian e o Marechal-de-Campo Ferdinand Schorner, após minucioso exame da situação, chegaram à única conclusão possível: era necessário evacuar as tropas da Estônia. Diante deles crescia a imagem do exército vermelho no apogeu do seu poderio, deslocando centenas de divisões de todas os armas e sustentado pela torrente ininterrupta que vinha das fábricas nos distantes Urais e da ajuda americana. Intermináveis colunas de infantaria, em plena carga, seguiam o caminho aberto por milhares de tanques em marcha. No ar, numa demonstração de força dificilmente superável, os soviéticos tinham alcançado o domínio dos céus, varrendo a debilitada Luftwaffe em todas os frentes do leste.
Do lado alemão pouco se podia fazer contra tal esbanjamento de forças. A infantaria, esgotada, exausta, mal armada e quase sem munições ou abastecimentos, combatia com tenacidade e decisão. Porém, sem esperanças. As forças blindadas, reduzidos à expressão mais simples, tinham suas divisões integradas por escassos tanques em condições de operar. A maioria dos blindados, por outro lado, tivera sua ação paralisada pela falta de combustível e de peças sobressalentes. As reservas eram praticamente nulas tanto em homens como em materiais. A situação portanto não podia ser menos alentadora. A posição dos comandos alemães, recuando os efetivos para novas linhas, era por conseguinte a única que podia ser adotada. No entanto, os preparativos para a execução dessa medida, a ser executada com a maior presteza, ainda não contavam com a aprovação de Hitler. A Estônia era o país mais ameaçado pelo avanço dos exércitos russos. Era o mais setentrional dos países bálticos; tinha superfície de 47.500 km² e população de 1.200.000 habitantes, a maioria de origem húngaro-finlandesa. Em 1219, conquistados pelos dinamarqueses, foram cristianizados e durante quinhentos anos estiveram sob domínio da Dinamarca, da Suécia e da Ordem dos Cavaleiros Alemães. Entre 1721 e 1918 foi uma província russa; em 1919 constituiu-se em Estado novamente, e em 1940 a Rússia ocupou o país. Uma grande parte da sua fronteira com a Rússia era estabelecida pelo lago Peipus, de 3.500 km² de superfície e 18 metros de profundidade. A capital, Reval, com 147.000 habitantes, possuía um bom porto.
A 14 de setembro começou a grande ofensiva russa no Báltico. As unidades das três frentes do Báltico (Primeira, sob o comando do Marechal Ivan C. Bagramian; Segunda, sob as ordens do Marechal Andrei I. Jeremenko, e Terceira, comandada pelo General Ivan J. Maslennikov) avançaram com todos os seus efetivos. Diante das unidades russas distribuíam-se os soldados do Grupo de Exércitos Norte, sob as ordens do marechal-de-campo alemão Ferdinand Schorner. Os combatentes alemães, em evidente inferioridade, tiveram que suportar o violento entrechoque com a poderosa massa de soldados russos. O Alto-Comando alemão, então, para aliviar a pressão sobre as linhas atacadas, ordenou ao Grupo de Exércitos Centro, com seus contingentes na Prússia sob as ordens do General Georg Hans Reinhardt, que atacasse com as divisões blindadas que ainda se encontravam em Schaulen, 100 km ao sul do golfo de Riga.
Os efetivos russos estacionados ante os homens das divisões blindadas, em Schaulen, eram da Primeira Frente do Báltico, de Bagramian. Contra eles chocaram-se os esforços dos alemães, que apenas conseguiram alguns êxitos parciais.
Mais ao norte, no setor da Terceira Frente do Báltico, de Maslennikov, os russos conseguiram, a 17 de setembro, romper a frente alemã. A penetração produziu-se na região de Dorpat, nas proximidades do lago Peipus.
A cunha introduzida pelos russos em Dorpat revelou-se como manobra evidentemente perigosa destinada a isolar e posteriormente aniquilar os alemães do Grupamento de Exércitos Narva. O comando alemão, em conseqüência, vendo o perigo iminente, ordenou o imediato recuo das unidades da Narva que se encontravam no norte da Estônia. Deveriam dirigir-se para o oeste e sudoeste rumo às costas do golfo de Riga; os elementos motorizados rumariam para o sudoeste, em direção ao porto de Pernau, enquanto as tropas restantes, menos móveis, iriam para oeste, até Reval, sendo ali embarcadas e evacuadas da zona de perigo. As forças, salvas desse modo do desastre, podiam ser empregadas de imediato na frente de Riga, no extremo sul do golfo. A pressão russa alcançara um nível tal que exigia o esforço de todos os homens disponíveis. Mesmo assim, somente dezenove divisões alemães conseguiram ser formadas para enfrentar a extraordinária massa de efetivos soviéticos que se agrupavam em cento e uma divisões de atiradores, três corpos blindados, dois mecanizados e dezoito unidades blindadas independentes.
Os contingentes alemães estavam praticamente condenados ao aniquilamento. Os abastecimentos e as munições escasseavam também, de modo extremamente agudo. Já estava previsto o final, quando, a 24 de setembro, os russos, surpreendentemente, sem que nada o fizesse prever, suspenderam a ofensiva e detiveram suas tropas.
A trégua manteve-se até o dia 29 de setembro. Nessa data os serviços de informações alemães notificaram uma novidade importante: no setor da Primeira Frente do Báltico estava sendo realizada uma mudança no dispositivo operacional rumo ao oeste, em direção ao 3o Exército blindado.
A situação se resolveu a 5 de outubro, quando os efetivos da Primeira Frente se lançaram ao assalto das posições do 3o Exército blindado alemão. Os alemães, não resistindo à massa de combate soviética, tiveram suas linhas perfuradas em diversos pontos por onde irromperam os russos, num avanço em duas linhas principais: para oeste, rumo ao Báltico, e para o sul, contra o flanco do Grupo de Exércitos Centro. Embora lutando tenazmente, os alemães foram obrigados a ceder aos poucos o terreno. Por fim, o 3o Exército blindado, com a ajuda de um corpo blindado de pára-quedistas enviado do Reich, conseguiu estabelecer nova frente à altura da localidade de Tilsit e ao longo do rio Memel. Enquanto isso, na costa do Báltico, a guarnição alemã fôra completamente cercada pelos efetivos russos. Era o dia 12 de outubro de 1944.
Guderian insistiu mais uma vez com o Führer no sentido de autorizá-lo a ordenar a retirada das forças ameaçadas. Hitler manteve irredutível sua posição, salientando que cada núcleo de tropas em combate na região embora cercado ou ameaçado, contribuía para entreter grande número de tropas soviéticas, afastando-as de outras manobras. Esse argumento, válido em outras circunstâncias, carecia de significação naquele momento porque a inesgotável fonte de reservas do exército vermelho tornava inútil a pretensão de Hitler. Os exércitos alemães, por outro lado, esgotados pela luta, eram as únicas vítimas da tática do Führer. Faltavam-lhes forças realmente combativas, forças essas que deviam ser empregadas na ação direta e não em ações de entretenimento de unidades inimigas.
Hitler, no dia 18 de outubro de 1944, dirigiu uma proclamação ao povo alemão. O Führer declarava: "No momento em que o inimigo acredita ter chegado a hora de desferir o golpe final, estamos firmemente decididos a reunir de novo todas as forças do nosso povo. Devemos e podemos, de fato, como em 1939 e 1940, fiados exclusivamente em nossas próprias forças, não somente torcer a vontade dos inimigos que se dispõem a nos destruir, mas também rechaçá-los e manter a integridade do Reich até que seja possível a paz que garanta o porvir da Alemanha, dos seus aliados e de toda a Europa".
Após concluir seu discurso o Führer anunciou a criação do Volkssturm, a milícia popular que agruparia todos os homens em condições de empunhar uma arma.
Ironicamente, no momento em que Hitler falava de "manter a integridade do Reich", os efetivos alemães abandonavam os países bálticos, os soviéticos estavam prestes a penetrar na Prússia e a confusão e o desconcerto começavam a se apoderar até mesmo daqueles que mais firmemente tinham apoiado e orientado a luta do Alemanha.
Um claro exemplo da evidente consciência do desastre que muitos começavam a vislumbrar é dado pela entrevista mantida a 16 de setembro, um mês antes do discurso do Führer, entre o Reichsführer SS Heinrich Himmler e o general russo Vlassov. Nessa ocasião os dois personagens se reuniram em pé de igualdade e não como prisioneiro e captor. Para Himmler, evidentemente, Vlassov representava a possibilidade de abrir uma "nova frente" diante do poderio esmagador da União Soviética. Tarde, muito tarde, o chefe alemão compreendera que o velho general russo tinha condições de organizar e comandar uma legião de combatentes russos para a luta, não contra o povo russo, mas contra os líderes do regime soviético e seu aparato repressivo.
Himmler recebeu a Vlassov e escutou as ponderações deste. Imediatamente aceitou todas as condições. Um comitê de libertação seria organizado; um exército nacional seria formado, reagrupando ao comando de Vlassov as unidades russas distribuídas ao longo da extensa frente, em número de cinco divisões. Himmler agarrou-se a Vlassov como à possibilidade que talvez fosse a última. O general russo representava uma esperança de sublevar o povo soviético contra seus chefes, e Himmler sabia que somente isso poderia salvá-los naquela luta que já começava a converter-se em catástrofe para a Alemanha.
Porém a catástrofe já criara raízes. Crescia lento, porém firmemente. Seu maior indício era a desistência dos aliados da Alemanha, que iam abandonando o barco...
O 3o Reich constituíra uma série de Estados-satélites que formavam verdadeira muralha isolando-o da União Soviética. Em alguns casos esses Estados tinham aderido aos alemães por obra de dirigentes que corroboravam a política nazista; noutros, a existência de minorias alemães justificara a anexação pura e simples. Porém, tanto uns como outros, na hora da iminente derrota da Alemanha, apressavam-se a desfazer a aliança e buscar desesperadamente a paz. Um a um, durante o fim de 1944, foram abandonando o 3o Reich. A Romênia, a Finlândia, a Bulgária, a Hungria, sucessivamente, rendiam suas forças diante dos poderosos exércitos russos que avançavam inexoravelmente.
Rumo à Prússia
A 16 de outubro de 1944 os contingentes da Terceira Frente da Rússia Branca iniciaram uma operação de duplo significado: militarmente era uma continuação da triunfante campanha que os exércitos soviéticos desenvolviam; politicamente significava a penetração de tropas russas em território alemão propriamente dito.
Nesse dia a massa das unidades soviéticas lançaram-se ao ataque contra o 4o Exército alemão, na fronteira da Prússia Oriental. Naquela data, ao começarem as citadas ações, os efetivos russos encontravam-se apenas a 100 km de Koenigsberg e da costa do mar Báltico. As unidades soviéticas totalizavam trinta e cinco divisões de atiradores e dois corpos blindados. À sua frente, distribuídos e esperando o choque desigual, entrincheiravam-se nove divisões alemães de infantaria e uma brigada de cavalaria.
O ataque russo, no momento inicial, deu os resultados esperados. O violento rompimento não pôde ser contido e Gumbinnen e Goldap caíram nas mãos dos soviéticos. Desse modo o caminho para o oeste parecia ficar livre. Os efetivos alemães, porém, reforçados com unidades do 3o Exército blindado, lançaram-se ao contra-ataque em Gumbinnen assediando a ponta-de-lança soviética pelo norte e pelo sul.
Após encarniçada batalha, afinal, a 22 de outubro, os efetivos russos foram rechaçados e tiveram que bater em retirada. Nos primeiros dias de novembro, pouco mais tarde, a cunha russa em Goldap sofreu a mesma sorte.
A esta altura dos acontecimentos, embora o rompimento na Prússia tivesse sido evitado, a situação do Grupo de Exércitos Centro continuava extremamente grave. Mais ao sul, nas cercanias de Varsóvia, em ambos os flancos de Pultusk (cidade situada 50 km ao norte do capital da Polônia), os soviéticos lançaram-se ao assalto e conseguiram romper as linhas alemães nos dois pontos. A penetração ameaçava o Grupo de Exércitos Centro numa nova direção, o sul, e levantava a possibilidade de toda a Prússia Oriental ficar cercada.
Contudo, os comandos alemães, baseados nas informações que chegavam da frente e da retaguarda russa, compreenderam que os exércitos russos encontravam-se praticamente esgotados e logo seriam obrigados a dar uma pausa às tropas. Por outro lado os comandos alemães também compreenderam que a manobra russa desejava comprometer o maior número possível de unidades alemães, enquanto que as operações na Hungria eram levadas o cabo com grande intensidade.
O levante polonês
A proximidade das forças soviéticas no coração da Polônia agitou a possibilidade, longamente acalentada pelos patriotas poloneses, de erguerem-se de armas na mão, maciçamente, contra a dominação alemã. A luta dos poloneses, sustentada heroicamente durante longos anos, estava agora prestes a converter-se numa batalha de grande envergadura, onde, armados e organizados, seus homens passariam a desempenhar papel de primeira ordem na derrocada do regime alemão.
Já no princípio de 1943, por ocasião de uma viagem de Anthony Eden a Moscou, as autoridades polonesas de Londres solicitaram ao mesmo que atuasse como mediador, possibilitando a realização de um pacto com os russos. Eden, interessado na possibilidade de ajuda do exército vermelho ao Exército da Pátria polonês, prometeu abordar o assunto com o maior interesse. Posteriormente, já na capital da Rússia, Eden recebeu de Molotov a seguinte resposta às suas gestões: "O governo soviético gostaria de discutir o restabelecimento das relações diplomáticas, porém unicamente o faria com um governo polonês de atitude favorável para com a União Soviética. Nem o governo polonês em Londres nem o comandante-chefe, General Sonskowski, demonstram tal atitude".
Em apoio às suas observações, Molotov falou mais uma vez da "inatividade" e da "passividade" do Exército da Pátria frente aos alemães. Acusações semelhantes fez Stalin dois meses depois perante o Presidente Roosevelt e o Primeiro-Ministro Churchill. Nessa oportunidade Stalin declarou que o General Sonskowski e o governo da Polônia em Londres estavam contendo deliberadamente a ação do Exército da Pátria contra os alemães e dirigindo todos os seus esforços contra as guerrilhas soviéticas. Tais afirmações por parte das mais altas autoridades de uma potência aliada tinham evidente tendência a inspirar dúvidas nos estadistas ingleses e americanos com relação ao Exército da Pátria, principalmente em vista da circunstância de que nem a Grã-Bretanha nem os Estados Unidos possuíam observadores na Polônia naquele momento.
A campanha soviética pelo rádio e pela imprensa ia, naturalmente, muito mais longe. O General Sonskowski foi acusado de enviar uma ordem secreta ao Exército da Pátria proibindo a ação contra os alemães. Uma publicação oficial soviética chegou a afirmar que o exército secreto polonês não era mais que um pequeno grupo de agentes a serviço da Gestapo... A realidade era que, nesse momento, o Exército da Pátria contava com cerca de 360.000 combatentes.
Mensagens de Londres, em janeiro de 1944, notificaram os patriotas poloneses de que Stalin e Molotov continuavam garantindo que eles "não faziam nada contra os alemães" e que "sua única atividade era a liquidação das guerrilhas soviéticas". A chamada "União de Patriotas Poloneses", com sede em Moscou, transmitiu ao mesmo tempo notícias fantásticas acerca do assassinato em massa de comunistas que estaria sendo realizado pelo Exército da Pátria da Polônia. Os russos, evidentemente, com suas falsidades, criavam uma barreira que impedia a retomada de relações diplomáticas com a Polônia. Por outro lado qualquer colaboração do Exército da Pátria com os soviéticos era impossível sem uma prévia aliança diplomática. Portanto os poloneses só tinham duas possibilidades: fazer com que todas as atividades de combate dependessem da retomada de relações diplomáticas com a Rússia e paralisar todas as ações até esse dia, ou continuar a luta contra os alemães, sem levar em conta a atitude política e militar adotada pelos russos. Os poloneses, como salienta em suas "Memórias" o General Bor Komorowski, não tinham possibilidade de hesitar entre as duas alternativas. Diz o general: "Tínhamos que correr o grande risco de entrar em ação abertamente, sem nenhuma coordenação com o comando do exército vermelho, sem sequer uma indicação sobre qual seria a atitude dos novos ocupantes para com as unidades do exército polonês que tivessem derivado do Movimento Secreto... Para mim, o objetivo da política soviética já se tornara bem claro. O velho imperialismo czarista mudara meramente de indumentária e se tornara ainda mais perigoso sob sua máscara de cinismo. Os novos métodos submeteram ao jugo as nações conquistadas e os Estados por meio da anarquia e da corrupção internas. E o que é mais, eu estava muito bem familiarizado com os seus métodos de ação secreta, métodos que não tinham base moral nem escrúpulo algum. Eu não tinha ilusões sobre o que visava a atitude da Rússia Soviética... Toda a comunidade, com exceção de um grupo insignificante de comunistas, associava o futuro regresso do nosso governo de Londres, depois da libertação do país, com suas esperanças de independência. Para eles esse governo era símbolo da liberdade e da continuidade legal do nosso Estado. Essa era a razão do apoio fiel de que gozava o governo em todo o país. Esse apoio ao governo de Londres era como uma instituição independente da influência e da autoridade dos Aliados ou de qualquer membro do mesmo. Todos sabiam muito bem que, voltando, nosso governo teria o direito de mudar ou substituir à sua vontade qualquer de seus membros. Não ignoravam que Moscou queria impor outro corpo governamental "favoravelmente disposto para com o União Soviética" e que esse corpo poderia aparecer nas pontas das baionetas das forças vermelhas; ninguém tinha dúvida alguma sobre a impossibilidade de provocar mudanças ou substituições dos membros de um governo como esse...".
Anexo
"É preciso romper o cerco"
Os soldados alemães que defendiam a cidadela de Answalde eram na maioria restos de unidades que pouco a pouco, ao longo dos anos de guerra, foram vendo suas possibilidades esgotarem-se. Com esse resíduo de seções, divisões, etc., e alguns soldados entre 15 a 16 anos, formou-se um grupo de combate que teria de frear o avanço soviético, contra-atacar e, se possível, avançar.
Havia 8.000 feridos nos hospitais de sangue da cidade. Eram os últimos dias de 1944 e o exército vermelho triunfava em todas as frentes da Europa Oriental.
O Coronel Franki analisou as possibilidades até chegar a uma conclusão: o único jeito era tentar romper o cerco e evacuar os feridos. Porém, eram muitas as dúvidas; tinha uns 3.000 homens experientes e 400 "garotos", como costumava dizer. Finalmente tomou a decisão: "Meus 3.000 veteranos, sem armas e sem equipamentos, valem por uma divisão completa".
O coronel sabia que isso não era bem verdade; tratava-se de uma fanfarronada, porém não existia outra saída. Emitiu então as ordens. Por falta de veículos, os carros das cozinhas ambulantes puxaram os morteiros; a munição foi carregada no braço e todos rezavam para que os russos demorassem o ataque, a fim de que pudessem dar o golpe primeiro.
Para os russos a queda de Answalde não era problema. Em vez de atacar preferiam reorganizar suas unidades e reforçar os pontos fracos, tudo isso sem muita pressa. Os alemães já não atacavam mais...
Às quatro da madrugada os alemães lançaram o assalto. Os morteiros abriam brechas no cerco por onde os soldados se lançavam disparando os fuzis automáticos. Duas horas mais tarde o cerco estava rompido e os soldados defendiam desesperadamente um pequeno atalho por onde começaram a evacuar os feridos. Perto do meio-dia Franki já conseguira evacuar 6.000 feridos. Porém era preciso apressar o movimento, pois a brecha tendia a fechar novamente pela pressão dos russos. Quando o último contingente saiu, a passagem fechou-se totalmente. Dos 3.000 veteranos, 200 ficaram para sempre dentro de Answalde sitiada. Franki, porém escapara com a maioria, levando mais de sete mil feridos aos hospitais da retaguarda.
Racionamento para cães
Talvez um dos elementos que tenham permitido que a Alemanha subsistisse até ao final da guerra foi a sua organização férrea, salvadora, mas ao mesmo tempo estéril. Graças à sua estrutura, as fábricas elevaram sua produção em 1944, no momento em que o bombardeio aliado foi incrementado; os escritórios públicos continuavam funcionando em seus horários habituais; algumas cidades, embora transformadas em montões de ruínas, como Berlim, possuíam jornais, rádio, concertos sinfônicos, etc. Porém essa ordem chegava às vezes ao cúmulo da aberração e então se presenciavam fatos absurdos. Durante a retirada da Rússia, regimentos inteiros de soldados, enregelados e maltrapilhos, passavam junto a galpões repletos de capotes e abrigos que não podiam ser distribuídos pela falta da autorização correspondente. No plano alimentício chegou-se até a planejar as cotas de proteínas para os cachorros. As rações determinadas foram de 6 quilos mensais e o seu controle garantido por meio de bônus. Cada proprietário apresentava-se no escritório correspondente para registrar o animal. Recebia um cartão onde constava o seu nome, o tipo de cão que possuía e, divididos em picotes, bônus correspondentes a um ano. Mensalmente o interessado apresentava-se à seção de racionamento e recebia as rações.
A aparição desses cartões deu margem à formação de um novo tipo de mercado negro: rações para cães. Alguns cidadãos registraram animais que não possuíam e venderam os bônus. Outros foram falsificados. A polícia interveio, porém seus esforços foram infrutíferos, em parte porque altos membros do Partido Nazista estavam implicados na manobra e em parte porque a crescente escassez de alimentos fez com que os cartões de racionamento perdessem o seu valor real.
Opinião independente
O General Adolf Heusinger, pertencente ao Alto-Comando do Exército alemão, foi o chefe da Divisão de Operações até 20 de julho de 1944 - data em que foi encarcerado pela Gestapo por ter emitido em relação a Hitler uma opinião independente, considerada injuriosa. Atribui a derrota alemã na Rússia a estas razões:
1o) A fé de Hitler na sua infalibilidade e no seu gênio, que o impedia de comprovar a realidade crua. Vivia um mundo irreal, em que acreditava poder forçar os acontecimentos segundo sua vontade, mesmo quando o bom-senso indicava o contrário. Recusava conselhos. Os integrantes do Alto-Comando que o cercavam davam-lhe razão e, infelizmente, confirmavam suas convicções, sem tentar persuadi-lo de nenhuma maneira.
2o) A desproporção constante que existia entre o espaço e o tempo, entre os efetivos e os fins determinados, que escamoteava a realidade e alongava desmedidamente as operações. A tarefa estava acima das forças da Alemanha.
3o) Aos métodos de comando de Hitler e à desconfiança do exército e de seus chefes, que condenavam todas as operações ao fracasso. Em vez de nomear um comandante-chefe na frente oriental, Hitler encarregava-se pessoalmente de todos os detalhes, mudava os comandos dos exércitos a seu bel-prazer e permitia à Gestapo intervir nos assuntos do exército.
4o) A subestimação total da força do inimigo, que o conduziu constantemente a deduções falsas e a aberrações.
5o) As considerações econômicas e políticas e às necessidades da propaganda, que se impuzeram em muitas ocasiões às necessidades militares.
6o) Ao tratamento cruel inflingido aos países ocupados, que provocou por trás das linhas alemãs a formação de exércitos irregulares hostis. Um pouco de benevolência com relação aos povos desses países teria granjeado aliados para a Alemanha.
Em resumo: a tarefa empreendida era demasiado vasta. O método aplicado para o seu cumprimento não tinha relação com a sua amplitude. Foram cometidos graves erros materiais. O resultado foi a derrota dos exércitos alemães na frente do leste."
O esforço agrícola
"No campo da agricultura, o esforço da URSS no transcurso da guerra foi, sob todos os aspectos, comparável ao realizado no campo industrial. Aí também procurou-se, aumentando a produção das províncias do leste, compensar as perdas causadas pela invasão de uma parte importante do território.
"Mein Kampf" (Minha Luta) já tinha revelado as intenções de Hitler com relação às ricas terras da Ucrânia. Foi a Ucrânia que em 1938 assegurou à URSS um dos primeiros lugares na produção mundial de cereais (31% para o trigo; 56% para o centeio; 31% para a aveia; 24% para a cevada).
A invasão da Ucrânia durante o verão de 1941 privou a URSS de cerca da metade de suas colheitas normais. Por outro lado, dos 90.000 tratores que os colcozes ucranianos dispunham, somente 6.000 puderam ser evacuados a tempo. Hitler também presumiu que a fome contribuiria para abater o espírito de resistência das povoações e conseqüentemente o moral dos exércitos soviéticos.
De fato, embora a população fosse submetida a um severo racionamento, o exército foi, até o fim, perfeitamente alimentado. Enquanto no curso da guerra 1914-1918 a requisição dos bens foi feita à custa de enormes dificuldades, o sistema colcoziano, que permite ao Estado, em tempos de paz armazenar a maior parte da colheita, facilitou a distribuição dos cereais e de outros bens agrícolas necessários não somente ao exército, mas também às populações das cidades e dos centros industriais. Presenciou-se durante os primeiros dois anos de guerra um aumento considerável dos cultivos nas províncias do leste; depois, a partir de 1943, a uma rápida restauração dos colcozes saqueados pelos alemães na retirada. Diversos meios foram postos em ação ao mesmo tempo:
- formação em grande escala de quadros de especialistas agrícolas (engenheiros, chefes de equipes, motoristas de tratores e de caminhões e mecânicos), sendo a maioria do novo pessoal constituída de elementos femininos;
- modernização dos meios e processos de cultivo nas planícies siberianas, segundo celeiro do trigo da URSS depois da Ucrânia;
- fertilização do solo;
- drenagem das terras lacustres.
Além disso, todos os meios de cultivo, mesmo os mais primitivos, foram postos em ação nos colcozes que não dispunham de material moderno.
Para a URSS a produção agrícola, como a industrial, era questão de vida ou morte. Os resultados foram proporcionais ao esforço. Cultivaram-se, em 1942, 1.700.000 hectares, e, em 1943, mais 600.000 novos hectares. A partir de 1944 a restauração agrícola das regiões libertadas foi acelerada graças aos progressos levados a cabo no leste, que permitiram o imediato translado de material agrícola e de gado para aquela região.
Deve-se salientar finalmente os resultados obtidos no cultivo do "Koksaguis", a planta da borracha; estes resultados permitiram aos soviéticos, juntamente com a produção de borracha sintética, enfrentar as necessidades dos primeiros anos da guerra, esperando a manifestação da ajuda dos Aliados."
A. Guillaume "O Esforço Agrícola"
Superioridade numérica
A população da URSS, que em 1941 elevava-se a 193 milhões, era três vezes superior à da Alemanha. Esse elevado número proporcionava ao seu exército uma possibilidade de recrutamento impossível para qualquer outra potência, com exceção da China. Porém, contra a massa perfeitamente homogênea de 70 milhões de alemães, a URSS contrapôs um mosaico de povos diferenciados pelas raças, línguas e costumes, do qual o povo russo não constituía senão o esqueleto.
Em 1939 os russos vermelhos representavam dois terços dos russos e 5 % da população total. Os ucranianos, 17%. Os russos brancos, 3 %. Em 1941 a URSS não pôde utilizar, a não ser parcialmente, os recursos dos países bálticos da Ucrânia polonesa e da Bessarábia, recentemente ocupados, ainda mais porque a rapidez do avanço alemão impediu a evacuação a tempo de todos os homens mobilizáveis. O recrutamento valia para todos os 170 milhões com que contava a Rússia em 1939. Dessa população porém os 20% representados pela Ucrânia e pela Rússia Branca passaram em 1941 e 1942 à ocupação alemã. Sobravam 136 milhões, dos quais desconta-se a população da Criméia e a das províncias da Grande Rússia, incluídas na zona de operações.
Quando a URSS, logo depois dos desastres do verão de 1941 e da retirada de 1942 teve que formar novos exércitos, não pôde contar senão com uma população de 130 milhões, composta, numa parte não desprezível, de povos asiáticos. Nesse mesmo momento o recrutamento alemão dispunha não somente das províncias do Reich, como também da Áustria. A Itália, embora lutando na África, ainda enviou um exército inteiro para a frente soviética. Os novos satélites, romenos, húngaros e finlandeses, colocaram cinqüenta divisões à disposição da Alemanha.
Além disso é preciso admitir que fora do núcleo sólido, homogêneo e profundamente patriótico da Grande Rússia, a URSS contava com umas cinqüenta nacionalidades que povoavam as províncias do norte da Rússia, da Sibéria, da Ásia Central e do Cáucaso. Os êxitos do exército alemão em 1941 e 1942 fizeram com que um grande número delas abandonasse a luta. A república autônoma dos alemães do Volga foi suprimida em outubro de 1941 e a sua população (1.400.000 em 1939) transferiu-se na maioria para o leste. Foram também mudados os nomes das localidades com nomes germânicos.
Os povos muçulmanos que em grande parte permaneciam hostis ao regime comunista acabaram sendo sensibilizados pelos apelos da propaganda islâmica de Berlim. Aqueles cujos territórios foram alcançados pela marcha rumo ao Cáucaso, iam atraiçoando um após outro a causa soviética. Foi este o caso dos calmucos, cuja república autônoma foi suprimida e transformada na região administrativa de Astracâ. O grupo étnico dos balcars teve o mesmo destino. Os carachai, da vertente norte do Cáucaso, guiaram os caçadores alpinos alemães até ao cume do Elburz, e perderam também a sua autonomia.
Os tártaros da Criméia e os checheninguch (Cáucaso do norte) não se contentaram em fornecer voluntários para as fileiras alemãs; formaram bandos que depois da retirada das tropas alemães investiram contra a retaguarda soviética. O governo russo, depois da guerra, castigou-os ao dispersá-los pelas diversas regiões da URSS e ao anexar o seu território ao da República Federalista da Rússia.
Entre os prisioneiros de povos de outras raças, sobretudo asiáticos, os alemães recrutaram efetivos para reforçar suas unidades entregues à defesa do "Westwall" ou à luta contra os guerrilheiros nos países do oeste. Entre eles, os elementos usbeques, tártaros e outros, chamados "mogules" pelos franceses, criaram uma sinistra reputação de ferocidade.
Os prisioneiros ucranianos chegaram a formar batalhões inteiros, utilizados na França, mas desertaram aos primeiros combates.
Tantos exemplos provam que apesar da admirável fidelidade demonstrada pela maioria dos povos soviéticos, o governo não podia contar de forma absoluta com o patriotismo de todos os elementos da população.
A. Guillaume ("Por que Venceu o Exército Vermelho?")
Bacharelato militarizado
Durante a Segunda Guerra Mundial formavam-se nos estabelecimentos de ensino superior da União Soviética "oficiais e suboficiais de reserva, disciplinados, experientes e instruídos nas práticas militares".
A direção dessa preparação era assegurada pelo Comissariado do Povo da Defesa (atualmente Ministério das Forças Armadas) e pelo Comitê das Escolas Superiores, anexo ao Conselho dos Comissariados do Povo. A formação compreendia cursos seguidos nas escolas e dois períodos de dois meses no exército durante as férias.
O número de horas consagradas aos cursos era de 450 horas nas escolas superiores com cinco anos de estudo, e de 360 horas nas escolas de quatro anos.
Ao terminarem os cursos e os períodos de instrução militar, os estudantes prestavam exames. As nomeações em diferentes postos eram estabelecidas de acordo com o resultado das provas.
O pessoal do ensino era selecionado entre os oficiais-generais e oficiais do serviço ativo e da reserva. Em todos os estabelecimentos de ensino superior de mais de 500 alunos existia um cargo de Diretor de Estudos Militares.
Essa orientação foi evoluindo durante os primeiros dias da guerra e graças a ela foi possível preparar cada ano dezenas de milhares de oficiais e suboficiais de reserva.
Os engenheiros
Tanto a Rússia como a Polônia e a Alemanha são cruzadas por grandes rios geralmente orientados de norte a sul, que representaram para os alemães e para os soviéticos sérios obstáculos para atravessá-los ou para utilizá-los como linhas de defesa.
Os Panzer alemães, ao começar a campanha em 1941, conseguiram transpor muitos deles, de surpresa; mas em 1942, ao avançar sobre Stalingrado, foram retardados mais de um mês no Don. Além disso nunca conseguiram cruzar o Volga.
Entre 1943 e 1944 o exército vermelho, ao contra-atacar e depois avançar, cruzou os rios que anos antes utilizara como defesa; agora, porém, com uma agravante: a margem ocidental é, quase sempre mais elevada que a oriental. Essa circunstância proporcionava aos alemães excelentes condições de observação e tiro.
É surpreendente constatar que dispondo dessas possibilidades os alemães não tenham conseguido deter mais tempo o exército russo. Talvez a explicação esteja na enorme extensão da frente que não permitia organizar uma defesa compacta e que impedia uma vigilância efetiva.
Os soviéticos aproveitaram essa circunstância para fazer a travessia de surpresa. A este fator acrescentava-se outro: velocidade. A primeira linha atravessava o rio, estabelecia cabeças-de-ponte e instalava-se na margem oposta. Não se preocupava em limpar os bolsões de resistência. Fazia o trabalho pesado e deixava à segunda linha a missão de limpeza e consolidação.
Enquanto isso, a artilharia tomava posição na sua margem, adiantando o alcance dos tiros à medida que a primeira linha avançava. Logo depois chegavam os engenheiros, aperfeiçoavam os primeiros trabalhos e preparavam a passagem de tanques, carros e artilharia.
A quantidade de êxitos prova que o sistema, nessas circunstâncias, era bom apesar de na maioria dos casos realizar-se debaixo do fogo inimigo.
Como regra geral procurava-se por todos os meios que os corpos de engenharia não desperdiçassem a sua ação em tarefas que podiam ser realizadas por corpos auxiliares. O trabalho de restabelecer definitivamente as comunicações depois da passagem do exército foi confiado, por exemplo, a tropas rotineiras que dependiam do comando da retaguarda e contavam com enormes recursos humanos e materiais.
As normas dos corpos de engenharia eram:
a) efetuar somente trabalhos que pelo caráter técnico não podiam ser confiados à infantaria ou a outros corpos;
b) na medida do possível, teriam que ser unidades constituídas e sob as ordens de engenheiros.
Nas ofensivas de 1944 e 1945 as formações de engenharia, transportadas por caminhões e providas de minas antitanque, deslocavam-se com as unidades de artilharia antitanque para semear campos de minas em regiões perigosas, voltando a recolhê-las uma vez passado o perigo.
Apesar da amplitude das tarefas confiadas, as tropas de engenharia soviéticas não estavam dotadas ao começar a guerra de material técnico moderno. Durante o transcurso e até ao término da contenda, a situação não variou se a compararmos com o esforço realizado pela indústria em benefício da artilharia, dos blindadas e da aeronáutica.
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