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Poesia & Contos Infantis

 

 

 


AS PECAMINOSAS NOITES DE UM NOBRE/Jillian Hunter
AS PECAMINOSAS NOITES DE UM NOBRE/Jillian Hunter

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Durante uma encantadora festa romântica no campo inglês, Lorde Devon Boscastle, um dos mais evasivos solteiros de Londres, tenta fazer com que uma dama, disposta e atrevida, queira compartilhar uma noite de pecado. Assim está encantado em aceitar um misterioso convite que lhe chegou para um encontro a meia-noite.
A senhorita Jocelyn Lydbury, uma recatada debutante, pôs seu coração na proposta de matrimônio de certo cavalheiro respeitável. Convidada a um encontro secreto, espera finalmente conhecer seu admirador de longo tempo.
Para sua consternação, é o arrebatador Devon quem está à espera de sua dama à meia-noite. Antes que o casal possa desmascarar quem os enganou, são descobertos em um apaixonado abraço e forçados a se casarem.
Embora Devon deixe claro que não mudará seus costumes libertinos por ninguém, uma vez de retorno a Londres se surpreende ao descobrir que sua tímida esposa se converteu em uma atraente tentadora e não desconfia que Jocelyn jurou domar seu formoso libertino... No salão de baile e no dormitório.

 


 


CAPÍTULO 01

Inglaterra 1815

Aparentemente, a festa anual de Lorde Alton Fernshaw no campo do Essex era um assunto solene. Se alguém perguntasse a um hóspede qualquer por que ele ou ela saía desde Londres à propriedade do castelo, a mais provável e fictícia resposta que daria seria: para desfrutar dos concertos, das rifas extravagantes, dos elaborados eventos esportivos que traziam de volta a glória da Idade Média.

Poucos, na realidade, assistiam à festa de Alton pela elevação cultural que oferecia, ou para participar de competições atléticas e vigorosas. Era a busca da paixão o que atraía os jovens cheios de energia do beau monde. Para a sobremesa do jantar na noite da sexta-feira dia no qual começou a festa, a maioria dos convidados tinham escolhido que cavalheiro ou dama desejavam perseguir. Para a manhã do sábado, Eros, o filho de Vênus, tinha descarregado quase todas suas flechas de ouro. Alguns corações já tinham começado a sangrar.

Alguns tinham alçado vôo.

Os bem experimentados criados da propriedade, do velho mordomo às jovens criadas, estavam preparados para aceitar subornos por causa das conquistas amorosas. As antecâmaras; poderia trocar-se com total discrição a qualquer momento, as portas abertas a seu desejo. Um lacaio com muito gosto servia como fiel guarda durante um encontro no jardim durante um sem fim de horas.

Lorde Devon Boscastle e seus conhecidos não tinham nenhuma vergonha em admitir por que aceitaram o convite anual de Fernshaw.

Devon planejava se sobressair em mais um jogo provocador que uma justa, em um torneio simulado, as pretensões cavalheirescas ao diabo. Já tinha selecionado sua parceira e, a julgar pelos tentadores olhares que lhe lançava através do abarrotado salão, a senhora Lily Cranleigh estava tão ansiosa por uma

aventura como ele.

Ela ergueu sua taça de champanha para ele como em um brinde, e sorriu.

Antes de poder responder, ela se voltou sobre seus calcanhares e se dirigiu à porta sem olhar para trás, seu vestido cinza de seda, de meio luto, ajustando-se a seus quadris exuberantes, sua estola de cetim imperial cobria um ombro branco e perfeito.

Bom, essa era a oportunidade se alguma vez tivesse sido provido de uma.

Esperou vários minutos antes de segui-la. Não havia nenhuma vantagem em parecer muito ansioso, embora tanto ele como a viúva licenciosa estivessem sem compromisso.

Que a senhora ardesse um pouco mais. Discretamente, esteve perseguindo-a há semanas. Agora era sua vez de provocar, deu a volta, imerso em pensamentos agradáveis, e se achou inesperadamente cara a cara com outra hóspede feminina, muito menos amável. Uma jovem do campo com quem compartilhou uma transitiva e, por acaso, vergonhosa historia.

Jocelyn Lydbury.

Era uma vez, antes de Devon ter arruinado por completo sua própria reputação, o General Sir Gideon Lydbury, pai de Jocelyn, tinha lançado um olhar sobre Devon como possível marido para sua única filha.

Devon foi convidado à ancestral edificação campestre para um esplêndido jantar. O problema foi que se esqueceu por completo de ir porque estava na farra nos bairros do submundo de Londres. Além disso, acabava de alistar-se na cavalaria e pensava que era muito possível que acabasse morto ou ferido no primeiro ano. Não viu razão alguma para planejar seu futuro.

Sir Gideon, que não compartilhava deste ponto de vista fatalista, imediatamente deixou que toda Londres soubesse que ele não tinha apreciado o insulto social, com guerra ou não. O assunto poderia ter se acalmado se o homem não tivesse ascendido a uma cadeira no Parlamento e ganhado o apoio político do irmão mais velho de Devon, Grayson, o marquês de Sedgecroft.

Inclusive agora, de vez em quando Sir Gideon recordava a Grayson que não

tinha esquecido o desprezo.

E, é claro, Grayson, por sua vez, recordava a Devon.

Devon avaliou a mulher diante dele com um olhar experiente. Seu cabelo não era o comum castanho que tinha pensado que era, mas sim de um profundo tom dourado favoravelmente penteado limpando seu rosto, em um elegante coque. Seu rosto, com os anos, ficou mais atraente do que recordava. Seus olhos escuros sustentavam seu olhar.

— Jocelyn – disse com um ensaiado sorriso — que agradável surpresa.

Não percebi que era uma das convidadas de Fernshaw — em sua mente era uma debutante pouco sofisticada, que provavelmente deveria permanecer protegida das atrevidas investidas que se esperava em uma festa como esta. — Não está aqui sozinha, verdade? — Perguntou com curiosidade. — Não vi seu irmão em nenhuma parte. Parece-me recordar que a segue como uma sombra.

O olhar cético dela o atravessou chegando à porta por onde Lily Cranleigh fazia sua incitante saída.

— Ele está em algum lugar. Você estava muito absorto vendo a célebre viúva, imagino. — Dirigiu-lhe um triste olhar. — Algumas pessoas parecem que nunca mudam, e obviamente você é uma delas. Boa noite, Devon, e adeus.

— Você mudou? — Perguntou ele, desafiando sua frieza.

Respondeu-lhe com uma honestidade surpreendente.

— Espero que sim. Por um lado, eu gosto de pensar que sou melhor juiz de caráter do que era há uns anos. Não convido qualquer um para jantar nestes dias, pelo menos. Sou mais exigente a quem convido a me desprezar. É isso o que estava perguntando?

— Suponho que mereço isso — disse com um triste sorriso.

Ela riu suavemente.

— Bom, não espero que obtenha tudo o que merece.

— Agora, isso foi cruel.

— Foi realmente amável. Não acredito que homens como você saem deliberadamente fazendo coisas que ferem.

Ele negou com a cabeça. É claro, não quis feri-la, mas estava claro que o tinha feito. Deus sabia que ela estaria ainda pior se tivesse aceitado o convite de seu pai e, de fato a tivesse cortejado. Ele achava que nunca poderia ser a o tipo homem que pudesse estar à altura da noção de amor de uma jovem decente.

O que não queria dizer que teria se oposto a compartilhar seus pontos de vista sobre esse tema com ela. Surpreendeu-se gratamente pelo toque de cinismo que sentiu por debaixo de seu suave discurso. O que a tinha deixado assim?

Perguntou-se. Não era seu pai e seu irmão do tipo super protetor?

— Quanto tempo passou desde que a ofendi? — Perguntou em voz baixa.

— E não há nada que possa fazer para emendar as coisas?

A última pergunta lhe escapou espontaneamente. Ele não sentiu nenhum desejo prévio de espiar seu comportamento passado. Por que diabo se incomodava agora? Por Jocelyn Lydbury.

De perto, era muito tentadora para uma planta do campo. Quatro anos sem dúvida tinham feito uma diferença para melhor nela, ou talvez fosse só sua perspectiva que tinha amadurecido.

Não era de um atrativo exuberante no sentido flagrante, como era sua viúva. Mas havia algo nela, uma qualidade sutil, mas intrigante, que o fez se perguntar o que perdeu.

Uma distante, intocável jovem. Virtude contra seu vício, recato contra sua decadência. Uma linhagem de boa criação para dizê-lo cruamente. Sempre tinha pensado nela como a garota de algum dia, o tipo de garota em que um homem pensa casar-se em um futuro longínquo, quando e se alguma vez tivesse o impulso de estabelecer-se.

O que Devon não desejava.

Além disso, ela estava muito melhor sem um homem como ele, sem importar o que ela ou seu pai pudessem ter pensado. Ela claramente não se recuperou de sua falta, e além de pedir desculpas, não havia nada mais que pudesse fazer por ela.

Sua pergunta seguinte, entretanto, levou-o a perguntar-se se havia

supervalorizado seu lugar na vida dela.

— O que o faz pensar que me ofendeu? — perguntou-lhe, com maliciosa diversão.

Suas escuras sobrancelhas se ergueram em resposta. Talvez devesse ter prestado mais atenção no passado. Ela tinha pernas longas, um corpo magro que tinha curvas suaves em todos os lugares corretos para abrir o apetite de um homem. Estava certo que não tinha mostrado este sentido intrigante de si mesma nas poucas vezes que se encontraram.

— Sei que desprezá-la foi grosseiro — disse. — Mas a guerra estava em marcha, e...

Ela lançou um olhar ao redor do ombro dele, aparentemente distraída por algo na sala.

— Desprezou meu pai — disse com uma risada desdenhosa. — E não tem que fazer nada para reparar o dano, exceto...

Ele sentiu uma espetada de curiosidade bastante irritante e se perguntou se tinha acostumado muito às conquistas fáceis.

— Exceto o que?

Ela o olhou desapaixonado, continuando, sussurrou:

— Exceto me deixar ir agora. Devon eu não quero ofendê-lo, mas realmente está em meu caminho. Permita-me passar. Não quero que me vejam conversando com você.

— O que?

— Feriu-me antes, se isso o faz sentir-se melhor.

— Por que me faria sentir-me melhor? — Perguntou levemente indignado.

— Não posso acreditar...

— Acredite — interrompeu-o. — Já não estou zangada. Só quero... Não conversar com você. Honestamente, tudo está bem. Acabou se, é tudo. Já o perdoei.

Ele a estudou com um sorriso relutante.

Sabia que deveria deixá-la ir a sua inocente direção, e o faria, mas não

estava em sua natureza Boscastle permitir que uma ofensa contra uma dama ficasse sem resposta. A tinha ferido, o irrefletido bastardo que foi.

Não tinha certeza de que fosse melhor agora, mas nestes dias tentava pensar mais em suas ações.

Era certo que ainda se permitia prazeres pecaminosos, mas com um pouco mais de discrição, razão pela qual ele foi à festa de Alton...

A ideia gerou outra possibilidade.

— Tem um encontro, Jocelyn? — inquiriu em voz baixa.

Uma delicada sobrancelha se ergueu.

— É em tudo o que pensa?

— Bom, no que pensa você? — perguntou consciente de que tinha evitado a pergunta.

— Em coisas mais finas. Na integridade e na literatura, e... Não quero falar sobre isso. Menos com você. Vai me meter em problemas, e sabe disso.

Ele teve que sorrir, a reprimenda era devidamente merecida, mas inesperada. Não estava disposto a forçar um casulo a transformar-se em flor, sem importar quão prometedor fosse, embora provavelmente não lhe importasse descarregar-se em meio de muitos, se não houvesse sentido que merecia uma repreensão. E se ele não percebeu que a atenção de Jocelyn estava concentrada em Lorde Adam Chiswick, um bonito e loiro oficial de cavalaria, que tinha servido em um regimento diferente ao do Devon, mas que não tinha um cérebro em sua formosa cabeça.

Ele sorriu, murmurando:

— Há mais coisas no ar que partículas de pó no salão de minha avó.

Dirigiu-lhe um sorriso de cumplicidade.

— Falando nisso, sua viúva não vai esperar para sempre. Vários de seus amigos estão procurando sua companhia na festa. Há uma feroz competição por seu favor. Acredito que deveria intensificar a caçada se não quiser perdê-la.

Ele se endireitou. Ela inclusive tinha os dentes brancos, uma quase imperceptível cicatriz na curva da maçã direita do rosto e uma maneira direta de

falar que não deveria lhe atrair, mas o fez.

— Não me esperou, não é querida?

— Não — disse suavemente — tão difícil como pode ser acreditar para um Boscastle. Mas deixemos de albergar maus sentimentos. Já disse, perdoei-o.

— E esqueceu?

—Sim — ela mordeu os lábios. — Bom, quase.

Ele se moveu para o lado. Ela o roçou ao passar a seu redor, seu corpo magro tão visivelmente tenso que, naturalmente, queria acalmá-la.

— Talvez não queira ser esquecido — disse ele em voz baixa, agarrando seu cotovelo com a mão.

Ela começou a rir com incredulidade.

— Talvez não tenha escolha.

— Está me desafiando? — perguntou ele, seu olhar de pálpebras pesadas sustentando o dela.

— Só se as armas forem pistolas ou espadas.

— Tome cuidado com Chiswick, sim? — murmurou enquanto lhe soltava o braço. — Acredito que você possa ser muito para ele controlar — fez uma pausa. — É possível que necessite um homem com mais experiência prática.

Devolveu-lhe o olhar com outro levemente condescendente.

— Como se quisesse aceitar o conselho de um cafajeste como você.

Ele começou a rir, nem o mínimo ofendido. Ela poderia havê-lo convencido de sua falta de interesse se não tivesse ouvido um ligeiro tremor em sua voz.

— Jocelyn, só porque sou um cafajeste estou qualificado para lhe dar um conselho.

— Adam é um perfeito cavalheiro.

— Esse é o pior tipo.

— O que quer dizer? — perguntou com cautela.

— Toda a perversão se acumula nesse tipo de homem. Olhe-o. Agora mesmo garanto-lhe que está fervendo interiormente como um vulcão.

— É isso verdade? — disse com um sorriso cínico.

Ele se arrumou para parecer completamente sério.

— Confie em mim, se um homem não deixar que escape um pouco de vapor, aqui e ali, está suscetível a explodir e causar a todos a seu redor uma desagradável queimadura.

— Eu não gosto de desafiar sua profunda teoria sobre a acumulação de...

Paixão, Devon, mas nem todos os homens estão tão cheios de vapor como você e seus irmãos.

— Poderia lhe expor a teoria em privado se lhe interessa — disse em voz baixa.

— Antes ou depois de Lily Cranleigh?

Hesitou surpreso, mas não a ponto de admitir que Lily fosse á coisa mais longínqua de sua mente. Seu inesperado encontro com Jocelyn o tinha absorvido completamente.

— Considere minha oferta — murmurou, e nem ele mesmo tinha certeza do que queria dizer, mas deixando a porta aberta. E encontrou-a bem fechada em sua cara.

— Não quero ser ferida de novo — respondeu ela com um sorriso triste.

— E eu não quero feri-la.

Ele apoiou o cotovelo contra a parede. Onde estava parado, quase podia sentir a calidez de seu ombro e de seus suaves e incitantes seios.

Imaginou que quase podia ver um mamilo rosado de meia lua debaixo de seu vestido, e embora fosse apenas sua imaginação se fez água na boca. Os lábios dela se abriram um pouco, mas o padrão de sua respiração não mudou.

Ela se virou, então parou, olhando para trás, para ele. Seus olhares se encontraram, enlaçaram-se, retiraram-se. Quanto inocente era? Perguntou-se ele com curiosidade.

Chiswick e ela eram amantes há muito tempo, ou era sua noite de iniciação? As festas de Fernshaw eram famosas por acender tórridos romances.

Encolheu os ombros frente à reflexão. A quem entregava ela sua virtude,

ou quando, certamente não era assunto dele. Tinha renunciado a qualquer posse há quatro anos.

— Foi agradável voltar a vê-la, Jocelyn. Realmente está mais formosa do que me recordava.

— Obrigada por dizer isso, Devon — replicou ela, seu sorriso implicando que pelos menos poderiam separar-se em termos amistosos. — Também é reconfortante saber que é um cafajeste pior do que recordava.

E que ela tinha escapado. Não teve necessidade de dizer em voz alta o pensamento para que ele adivinhasse que era isso o que estava dizendo.

Ele sorriu. Ela estava certa, também, Deus a guardasse. Não era um homem para o matrimônio há quatro anos, e menos agora.

 

 

CAPÍTULO 02

 


Jocelyn não podia imaginar como o sorriso de um homem podia oferecer tal beleza angelical e decadente ao mesmo tempo. Ou por que, sabendo que o destino tinha posto tão injustamente um coração licencioso em sua magnífica moldura, ela sentisse inclusive a menor atração pelo diabo. Disse a si mesma, como o fez centenas de vezes, que agradecesse sua boa estrela que Devon Boscastle a tivesse rejeitado quatro anos atrás e, portanto tivesse lhe evitado uma vida de lágrimas solitárias e vergonha.

Sim, tinha chorado quando ele não aceitou o convite de seu pai. Mas então seus olhos de debutante se apaixonaram em segredo por Devon.

Talvez bem dentro dela sempre ficasse uma tênue nostalgia dessa emoção.

Mas nem sequer estava certa de acreditar no amor. Tantos anos sendo testemunha do matrimônio infeliz de seus pais, tinham-lhe esmagado lentamente suas esperanças. Era terrivelmente mal visto que uma mulher tivesse uma visão tão cínica da vida. Mas a crueldade de seu pai tinha acabado com suas esperanças mais queridas.

E uma vez quis ser a noiva de Devon.

Era bastante claro que o evasivo pecador não tinha melhorado nem um pouco sua vida licenciosa. Sentiu-se presunçosa e amadurecida ao descobrir que era capaz de paquerar e depois separar-se dele, sem afetar-se.

Bom, ao menos ele não notou que ao vê-lo seu coração começou a bater em um ritmo irregular.

Felizmente, seu coração estava pulsando calmamente agora, apesar de ter visto Lorde Adam Chiswick no final do corredor. Ela se voltou e examinou as tapeçarias flamengas que cobriam as paredes.

Foi à festa, inesperadamente a instâncias de seu pai, para conseguir uma proposta matrimonial. E Adam era o primeiro homem, depois de anos, em

ganhar a aprovação de Sir Gideon Lydbury.

Seu pai era um homem que se impressionava com o poder e a comodidade de uma vida privilegiada. E ao parecer não deixaria que sua idade o dissuadisse.

Escoltava suas amantes em Londres como emblema de suas proezas. Vários anos antes tinham desejado uma união com a família Boscastle, e tinha cortejado o apoio do marquês, tanto para seus fins políticos como pessoais.

Mas até o dia de hoje, Gideon não tinha esquecido o insulto que Devon tinha feito a sua filha, nem tampouco tinha permitido que sua filha o esquecesse.

Na realidade a afronta durou muito mais que a ela.

Quando Devon foi capturado no ano passado depois de uma tentativa fracassada de assalto à carruagem de uma cortesã em uma brincadeira de mau gosto, seu pai se deleitou, e predisse a queda de Devon a quem quisesse escutá-

lo. Especialmente Jocelyn, que se achou como uma espectadora cativa durante seus frequentes passeios em carruagem de ida e volta ao campo.

— Não a adverti que era o mais selvagem da família? — Ele dizia, esquecendo que foi ele quem escolheu Devon como marido potencial, e não Jocelyn. — Não está contente agora que não o forcei?

Ao que Jocelyn só suspirava ou assentia, ou ambos, enquanto olhava fora a um mundo que a chamava cada vez mais. Seu pai podia ser cruel tanto física como emocionalmente.

Ele não batia nela agora como o fazia quando era uma menina, mas raramente continha seu assalto verbal.

Era evidente que Jocelyn não tinha alternativa que escapar. E o matrimônio era a opção mais conveniente, embora não albergasse nenhuma ilusão a respeito da felicidade matrimonial.

Adam tinha prometido lhe fazer uma surpresa antes que terminasse a festa de Lorde Fernshaw. Suas amigas mais próximas predisseram que estava a ponto de lhe fazer a proposta tanto tempo esperada. Antes ele só havia dito indiretas a respeito de atar o nó, mas agora ela achava que estava a ponto de comprometer-se.

Uma das vantagens de ter passado seus anos de debutante como uma planta, era que teve tempo e oportunidade para estudar toda a gama de romances.

Viu como várias amigas que previamente eram tranquilas tinham caído presas de cavalheiros à espreita.

Inclusive ela poderia ter sido do tipo capaz de sucumbir à sedução, se seu próprio pai não tivesse sido tão descaradamente infiel a sua última esposa, a mãe de Jocelyn.

Para indignação de Jocelyn, ele continuou com seus namoricos até depois da morte de sua mãe.

Inclusive agora ele não escondia o fato que atualmente mantinha duas amantes, uma das quais esperava um filho. Outro filho. De qualquer maneira, não importava o cruel ou superficial que fosse; seu pai nunca foi um homem que evitava sua responsabilidade, e tinha que admitir que seu protesto encolerizado fosse o melhor para preparar Jocelyn para o futuro.

As melhores preceptoras. Os melhores internatos. O melhor guarda-roupa.

O melhor noivo. Ou o segundo melhor, já que o Boscastle escolhido quatro anos atrás a tinha desprezado de forma inesquecível.

A segunda melhor escolha subitamente tratava de aproximar-se às escondidas por trás. E ela tentava agir surpresa quando o braço de Adam a pegou pela cintura, e a virou com estupidez.

— Aqui está — murmurou ele, e tentou esconder seu nariz no cabelo dela.

— Mmm, cheira a manjar branco. Acredito que terei que voltar para a mesa a procurar mais sobremesa. Dá-me fome cheirá-la.

— Essa sim é uma confissão romântica — disse ela rindo. — É essa a forma de me dizer com tato que derramei comida na roupa?

— Fez isso? — Seu queixo proeminente lhe roçou a face. — Que repugnante ficou, Srta. Lydbury. Teremos que comprar um babador e alimentá-la com colher dentro em pouco.

Ela levantou o rosto para o dele, enrugando o nariz. Podia ser que ele não fosse tão emocionante como um dos irmãos Boscastle, pelo qual ela deveria

estar agradecida.

Não lhe inspirava paixão, e uma dama de verdade não desejaria um pretendente que o fizesse. Mas ao menos podia deixar a guarda baixa quando estava em sua companhia. E confiava nele. Adam era qualquer coisa exceto um rompe corações de nascimento.

Não se parecia em nada á Lorde Devon Boscastle.

— Quando vai dar-me a surpresa que prometeu? — Disse-lhe ela em voz baixa.

— Não depois de amanhã de manhã.

Ela suspirou.

— Não antes?

— Duvido.

Ela desceu o olhar.

— O que está esperando?

— Não posso dizer, — mas se inclinou para ela, seus olhos cinza se escurecendo. — Posso dizer que a surpreenderá.

Ela sentiu o impulso mais horrível de rir. Ele estava tentando ser sério.

Mas que injusto era que de repente ela comparasse sua maneira agradável despretensiosa, com a masculinidade de certo patife. Só o fato de notar a diferença entre os dois homens, a fazia sentir que estava traindo Adam. Ele podia evitar cair no aborrecimento? Era culpa dele se a ela não acelerava o coração?

— Vai beijar-me como os outros libertinos da festa? — sussurrou ela.

Ele hesitou. Era claro que não percebia que ela estava brincando.

— A quantos libertinos beijou?

Ela o teria feito enraivecer-se um pouco mais, o céu sabia que ele podia ficar sombrio, se uma voz familiar profunda e inquietante, não tivesse se deslocado pelo corredor.

— Parece que interrompemos uma pequena conversa, Sra. Cranleigh. Pode imaginar? Uma vista que envergonha nossos olhos inocentes. Um par de

pombinhos roubando bicadas em um canto. Aonde vai parar o mundo se os jovens da aristocracia se torceram nesta direção repugnante?

— Não seja mau — disse sua companheira, embora Jocelyn fosse rápida em perceber mais diversão que censura em sua voz. — Vai envergonhá-la.

Ele limpou a garganta.

— Oh, bom. Mas quem diabos são, em todo caso?

Jocelyn respirou fundo e se voltou. Percebia perfeitamente pelo brilho dos olhos dele, que a tinha reconhecido. Adam, para pesar dela, parecia absolutamente não ter ideia de que estavam zombando dele. Adam se afastou dela tão rápido, que quase puxou um telescópio apoiado na parede.

— Chiswick — disse Devon em uma voz tão depreciativa, que ela se viu obrigada a saltar em defesa de Adam. — É tão torpe como foi na escola de esgrima.

— Ele não é nada torpe — disse ela enquanto ele se endireitava desgracioso depois do tropeção humilhante com o telescópio.

— Não?

O olhar perceptivo de Devon avaliou sua expressão culpada e a postura incômoda de Adam, até que Jocelyn teve vontade de lhe dar uma cotovelada. Por que agora, de todos os momentos, tinha que retrair-se nessa submissão? Ele foi um oficial suficientemente valente durante a guerra. Por que a espetada brusca de Devon Boscastle o tinha transformado nesta... Nesta torre de melaço indefeso?

Instantaneamente ela chamou a atenção de si mesma pela analogia cruel.

Imaginar o homem com quem queria casar-se como um pedaço de pudim incapacitado parecia-lhe pérfido. Mas, não deveria defender-se ele mesmo? Por que permitia que Devon o alterasse?

— Sinto muito, Boscastle — disse Adam com uma elegante voz serena que Jocelyn teria aplaudido. — Não tinha ideia de que tinha reservado este corredor para uso pessoal.

Deu-lhe um sorriso de orelha a orelha e sussurrou.

— Bem feito.

Devon levantou seus magníficos ombros com rabugice.

— Está bem Chiswick. — Seu olhar foi direto para Jocelyn, por um momento breve, mas significativo. — Já usei o corredor esta noite. Parece-me justo compartilhar.

Ela voltou a cabeça para responder ao olhar inquisitivo de Adam.

— Acredito que estou pronta para respirar o ar fresco que mencionou.

— Que ar fresco?

Golpeou-lhe suavemente com o cotovelo e o levou pelo corredor, resistindo ao impulso de reconhecer o sorriso tolerante de Devon.

A Sra. Cranleigh lhe deu um sorriso de má vontade, e ela sorriu apesar de saber que a viúva tinha uma reputação de ser malvada, que certamente Devon exploraria durante a festa.

Vários passos depois percebeu que Adam não a tinha acompanhado.

Ela se virou, soltando uma respiração aguda, ante a cena que se desenvolvia frente a ela.

Devon parou ao lado de Adam e o tinha segurado por um braço. Seu perfil escuro estava sobreposto ao de Adam, em uma atitude maliciosa inconfundível.

— Adam? — perguntou ela calmamente. — Vem comigo, ou devo ir por minha conta?

Ele não respondeu. Olhava para Devon, como se lhe acabasse de dar o Arca da Aliança. O leve sorriso fascinado em seu rosto era decepcionante. Como também foi perceber como era; baixo e grosso à sombra de Devon.

Ou se tratava de que Devon por ser tão alto e puro músculo, fazia com que os outros homens simplesmente se encolhessem ao compará-los?

Aproximou-se devagar umas polegadas para escutar a conversa. Mas imediatamente desejou não tê-lo feito.

— Lembre-se — dizia Devon com voz autoritária. — Mão firme. Como oficial da cavalaria, posso dizer com segurança, que esse é o segredo, a única forma de dirigir alguém como ela. — E golpeou uma de suas fortes mãos contra

a outra para demonstrar seu ponto. — Mão firme quando lhe puser as rédeas.

Uma vez que confie em você, a monte o mais frequentemente possível, até que se submeta.

— Mão firme — repetiu Adam.

— E monte-a frequentemente.

Devon levantou a cabeça para dar à Jocelyn um olhar de segurança em si mesmo imperturbável.

— Nos perdoe, ficamos discutindo a égua árabe de nosso anfitrião.

Chiswick me confiou que está considerando comprá-la. Pensei lhe dar uns quantos conselhos sobre como domá-la.

Adam lhe lançou um olhar de gratidão.

— Lembra que Devon também serviu na cavalaria, não é verdade?

Jocelyn fez uma pausa antes de responder.

— Sim. Mas não me lembro de você ter expressado interesse pelo cavalo árabe de Alton.

— Bom, um homem nem sempre quer discutir esses detalhes pouco delicados com uma dama. — Devon se estirou, de maneira que Adam se encolheu umas quantas polegadas. — Depois de tudo a maioria das mulheres fala mais de seus vestidos, em vez de cavalos.

— Oh, Jocelyn gosta bastante de cavalos — disse Adam com astúcia, sem perceber. — É uma perita, sabe. Alguém pode perguntar quase qualquer coisa sobre... Sobre...

Ela tossiu forte antes que Adam fosse arrastado mais profundamente no jogo de Devon. Não podia acreditar quão fácil o pegavam, e com essa sátira de olhos azuis, como se não tivesse instigado tudo. O mais curioso de tudo era que ela nunca antes tinha visto Adam tão confuso. Geralmente era engenhoso; de fato uma de suas melhores qualidades era permanecer calmo, enquanto todos seus amigos se comportavam como tolos.

Era claro que Devon Boscastle era uma má influência. A julgar por esse brilho ímpio em seus olhos, na realidade Jocelyn tinha escapado de um destino

horrível, quando ele não apareceu para jantar anos atrás.

Qualquer mulher que se casasse com Devon, não teria um momento de paz. Mas uma voz verdadeiramente indesejável sussurrava atrás de sua mente, essa mulher não conheceria também o prazer e estaria disposta a pagar o preço?

Ela deu um suspiro quando por fim Adam caminhou para seu lado.

Não era culpa dele que o tivesse feito parecer como tolo. Devon tinha chegado a ser o professor do mau gosto sob a tutela de seus irmãos mais velhos.

Ainda assim, ela esperava mais do homem com quem iria se casar.

— Por que o deixou jogar dessa forma com você? — perguntou-lhe diminuindo o tom enquanto caminhavam.

— Meu Deus, não tinha ideia. Não está zangada comigo, não é verdade Jocelyn?

Deu-lhe um longo olhar de esguelha. Era atraente. Preocupava-se com seus sentimentos. Não era um canalha nem jogador. Para uma moça podia acontecer pior, e ela não tinha precisamente uma fila de pretendentes pedindo sua mão.

— Não, não estou zangada.

E enquanto dobravam uma esquina para passar entre duas estátuas de mármore de Vênus e Vulcano, ela olhou para trás involuntariamente ao homem que acabavam de deixar.

Devon Boscastle.

O destino ao qual ela tinha escapado, e não era afortunada? Ele era o que merecia sua raiva. Com uns poucos comentários descuidados, fez Adam aparecer débil, e inclusive um pouco estúpido. O que não era uma avaliação justa de seu caráter.

Adam parou sem aviso.

— Que grosseiro de minha parte — disse virando-se. — Quer você e a Sra.

Cranleigh unirem-se a nós para passear, Boscastle? Jocelyn disse que necessita ar.

— Oh, por Deus — murmurou ela. — Não o inspire. É que o diabo não está à espera de um convite?

— Só estou sendo bem educado — sussurrou Adam. — Ele esteve ao meu lado no colégio umas poucas vezes. Mantinha aos valentões longe você sabe.

Não, não sabia. Na realidade não estava desejosa de atribuir nenhuma boa qualidade a Devon, que a passou calmamente nesse momento com um débil sorriso.

— Está bem, Chiswick. A Sra. Cranleigh e eu planejamos exercitar outras opções esta noite.

— Não escute. — murmurou. — Não, não o escute.

— Disse algo, Srta. Lydbury? — Devon perguntou.

— Engasgou com algo — replicou Adam com uma má desculpa. — Uma dessas pastilhas de violeta que as moças usam para adoçar a respiração.

Devon levantou a mão esquerda.

— Lembre-se Chiswick. Mão firme. Mostre-lhe quem é o amo.

— Sim. Farei isso.

— E monte-a frequentemente.

Adam ficou vermelho como um tijolo, e olhou de esguelha para Jocelyn com um grande sorriso de cordeiro.

Apertando os dentes, ela o pegou pelo braço e o puxou adiante.

— Quer passear comigo no jardim? — perguntou-lhe sem olhá-la.

— O que acha Adam?

— Eu...

Uns poucos minutos depois, com a caminhada esquecida, reuniram-se com seus amigos para beber champanha e um jogo improvisado de charadas.

Naturalmente, Jocelyn e Adam escolheram um ao outro como companheiro, e terminaram pondo a pantomima da cena do balcão de Romeu e Julieta.

Jocelyn subiu à galeria em cima do salão, e parou no corrimão, enquanto Adam lhe suplicava com gestos silenciosos de baixo. É claro todos adivinharam os papéis que estavam representando, mas era divertido e inclusive romântico ver o casal atuando, até que Adam tropeçou em um banquinho, e fez rir a gargalhadas o público, incluída Jocelyn.

Ela soube que era o homem perfeito para ela. Um Romeu torpe que a respeitasse valia muito mais que cem patifes pouco confiáveis com suas ofertas indecentes. E só podia ter esperança que a amizade fosse um pilar suficientemente poderoso para o matrimônio sólido no qual ela tinha posto seu coração.

Deixe às Lily Cranleigh de Londres envolver-se em namoricos destinados a terminar mal.

Jocelyn aspirava a uma vida tranquila. Matrimônio. Família. Segurança.

Auto-estima. Escapar das constantes condenações e a vaidade insuportável de seu pai. Em seus sonhos não havia lugar para um patife, não importava quanto tinha desejado antes que fosse de outra maneira.

 

 

CAPÍTULO 03

 


Devon apoiou o ombro contra a enorme escultura de mármore de uma carruagem puxada por um leão que dominava a galeria superior. Era um lugar afastado. Daí podia olhar a atividade abaixo no salão principal, sem que o vissem. Um sorriso amplo aprofundou as leves linhas a cada lado da boca.

Inclusive podia rir forte se quisesse. E de fato, havia bastante do que rir.

Chiswick acabava de tropeçar e cair sobre seu traseiro, o Romeu mais pouco elegante em toda a história do teatro aficionado. Jocelyn tinha descido apressadamente as escadas para resgatá-lo. O olhar de Devon seguia vagamente sua graciosa descida.

Ela estava se agachando para recolher o banquinho que Adam tinha derrubado. Adam estava alcançando o traseiro de Jocelyn.

Devon soprou quando o homem abaixo lhe deu uma palmada encoberta.

Vá, vá. Iria a doce Jocelyn dar uma bofetada mandando-o de volta ao chão?

Devon apoiou o antebraço na balaustrada de ferro negro para olhar. O que faria ela?

Nada.

Ele negou com a cabeça. Talvez nem sequer houvesse sentido a furtiva palmada. Talvez tivesse sido quase uma carícia. Uma palmada no ar e não no traseiro arredondado de Jocelyn. Talvez, refletiu, Adam interpretou esse gesto sem efeito com o que Devon quis dizer por mão firme.

Nunca vai montá-la a esse ritmo, pensou tristemente. E por um instante se dedicou a imaginar-se como seria dar prazer na cama à longínqua Jocelyn. Ele se encarregaria de achar a forma que ela percebesse.

Mas poderia conseguir que o perdoasse? Que realmente o perdoasse?

Só agora lhe voltou á lembrança da razão principal que o tinha feito rejeitar esse convite há tanto tempo, e era que lhe desagradava seu pai e o ar de

ordem arrogante do homem. Devon não tinha conhecido Jocelyn suficientemente bem para dizer se ele teria desfrutado de sua companhia ou não.

Perguntou-se como ela tinha conseguido enfrentar o caráter ditatorial de Sir Gideon. Os soldados que tinham servido sob o comando dele, desprezava o homem, o que não o fazia necessariamente um mau líder.

Mas havia sussurros sobre crueldade sob o comando de Gideon, é claro, que foram suprimidos antes de ser substanciados.

A Devon não importava se tinha acontecido uma ou outra coisa.

Realmente não lhe importava. Jocelyn parecia capaz de manter-se.

E de manter o interesse de Devon, maldição. Por que agora, de todos os momentos, o instinto Boscastle de seduzir e proteger tinha que aflorar e ameaçar danificar a diversão decadente que tinha planejado? Se Jocelyn necessitava amparo, era de homens como ele.

No fundo era um selvagem e achava que era muito tarde para mudar.

De todos os irmãos Boscastle, ele era o que tinha sofrido mais com a morte de sua mãe e as mudanças de humor de seu pai. Drake foi o que tinha recebido a maioria dos arrebatamentos físicos de Royden Boscastle.

Devon aprendeu bem cedo a fazer o papel de pacificador e se não fosse pelo enorme apoio de suas irmãs e irmãos, facilmente teria ido à deriva pela vida, sem âncora e sem carinho.

Sua alma tinha vagado muito longe por tanto tempo que não tinha esperança de que pudesse redimir-se.

— Espiando algo interessante?

Olhou para o lado, para Lily que subia as escadas, e lhe respondeu com um sorriso.

— A atuação não planejada dentro do programa, um dos momentos memoráveis da noite. — Ele deixou que seu olhar percorresse a figura dela envolta em seda. — Pelo menos por agora. Estou aberto a uma obra privada.

Lily foi parar ao lado dele na balaustrada.

— Por que faz todo o possível para deixar mal a Chiswick? Não parece

você mesmo. Ou me equivoco?

Seu sorriso aumentou.

— Não tenho nada contra o velho Chinny. Faço de brincadeira só para incomodar Jocelyn.

Ela ergueu seu leque, e como em um duelo, dirigiu-o a seu ombro.

— Por quê? O que fez para ofendê-lo?

Ele desviou o leque com um pequeno movimento de seu pulso.

— Não sei. Nada realmente, embora sua família deixasse bem claro que eu os ofendi.

— É uma história que possa desfrutar?

— Sir Gideon Lydbury me convidou para jantar a muitos anos, obviamente me convidando a cortejá-la. Não só tive a desgraça de não aparecer, mas, além disso, me esqueci completamente de enviar depois uma desculpa.

— Ela não o atraía? — perguntou-lhe Lily com um sorriso cético.

— O matrimônio não me atraía — respondeu. — E até hoje não me atrai.

Afastou-se da balaustrada e se foi pelo corredor que conectava as duas escadas. Não tinha vontade de discutir sua vida privada com Lily, que nem ele mesmo entendia.

— Assim vocês dois compartilham um passado — refletiu ela, uns poucos passos mais atrás na longa sombra dele. — Um segredo humm?

Ele parou para rir um pouco divertido.

— Estou mais interessado nos prazeres atuais, como quem compartilhará minha cama este fim de semana, e acredito não ter feito nenhum segredo disso.

Ela deu uma lânguida meia volta, sua forma voluptuosa dourando-se à luz da tocha. Sua postura indicava uma calma indiferença à confissão dele.

Mas ele sabia.

Ela olhou acima à pele de tigre desdobrada na parede.

— Você gosta de caçar? — perguntou-lhe com curiosidade.

— Só quando o outro é selvagem e me iguala em destreza — respondeu malicioso.

Ela traçou a borda de seu leque de marfim com a ponta de seu fino dedo.

— Isso soa positivamente...

— Sim?

— Fascinante.

— Verdade? — Perguntou-lhe com as pálpebras meio fechadas Por um momento nenhum dos dois disse nada. Devon permitiu que o silêncio se expandisse antes de acrescentar.

— Acredito que esta é a primeira conversa ininterrupta que temos desde que nos conhecemos.

As comissuras da boca dela se elevaram, e ele notou as finas linhas esculpidas em sua pele imaculada. Dizia-se que ela era cuidadosa em sua escolha de amantes, e era muito perseguida como amante por muitos homens com título; e segundo o mesmo rumor, era uma mulher muito desinibida sob os lençóis. O

fato que nenhum fosse propenso a apaixonar pelo outro, fazia-a mais atraente.

— A primeira vez que o vi — lhe disse ela com tom sensual e zombeteiro.

— Foi em um piquenique. Pedi a nossa anfitriã que nos apresentasse, mas desapareceu antes misteriosamente. Disseram-me somente que era o irmão mais novo de Drake Boscastle, e que isso só deveria me servir como um aviso de perigo se o perseguisse.

— Então também deveriam tê-la avisado que não há nada pequeno em mim — disse ele com um sorriso atrativo e honesto.

Os lábios dela se entreabriram, os seios cheios se levantaram sob a seda cinza de seu vestido de cintura alta. Antes que qualquer deles pudesse falar novamente, o golpe de passos na escada arruinou o momento.

Devon deixou escapar o ar irritado, não só porque o tinham interrompido em um momento crucial, mas sim porque o intruso era o irmão mais velho de Jocelyn, o Coronel Jason Lydbury. Seus lábios finos se curvaram em uma leve careta desdenhosa ao reconhecer Devon. Era um homem de peito amplo, atraente, que com uniforme se parecia como o abusador de seu pai.

E aparentemente, em sua antipatia por Devon. Deus, os Lydbury eram

piores com seus rancores que os selvagens dos Boscastle.

— Bom, não é isto uma surpresa? Um irmão Boscastle abandonando à dama mais bela da festa.

Os olhos de Devon se escureceram em sinal de advertência.

O olhar de Lily se acendeu com humor perverso.

— Se só tivesse pensado em trazer minha tia.

— O mais provável é que ela tampouco estaria livre da sedução, madame

— disse Jason com um tom de voz seco.

Deu a Devon um olhar apagado de crítica.

— Verá, parecem existir inclusive entre a aristocracia, certos nobres que não pensam duas vezes em insultar pessoalmente uma dama.

Ah, outro aviso de como Devon tinha menosprezado a irmã de Jason. Ele suspirou, ofereceu o braço a Lily.

— Parece que outra vez esqueci minhas boas maneiras. Posso escoltá-la à sala dos refrescos?

— Muito bem. — Ela aceitou descendo os olhos recatadamente só para levantá-los alarmada, enquanto outra mulher subia apressadamente a escada para chegar ao corredor.

— Por Deus — murmurou com resignação. — Acredito que a festa veio a nosso encontro.

Desta vez a intrusa era Jocelyn, com as faces levemente rosadas, os olhos escuros com uma gama de emoções indecifráveis. Exceto pelo olhar de recriminação a simples vista, que deu a Devon ao passar.

Ele respondeu com um sorriso amplo. Não sabia por que, mas subitamente pensou que a má opinião que ela tinha dele, era bem merecida.

Ou a demonstrar a si mesmo que ele não só era letal para uma moça como ela, mas lhe tinha feito um grande favor ao estar fora de sua vida.

— Há uma emergência? — perguntou-lhe Jason com a boca apertada de recriminação.

Jocelyn lançou um olhar curioso para Lily. Devon poderia jurar que se

tratava da antiga rivalidade feminina de sempre, embora não se podiam comparar. Lily era prazer fugaz. Jocelyn, bom, era muito doce e sem sofisticação para que ele a arruinasse.

— Queria saber se alguém viu Lorde Chiswick — disse ela.

— Por quê? — perguntou Devon, incapaz de resistir a irritá-la. — Está procurando-o sua mãe?

Jocelyn se recusou a levar em conta o comentário.

— Adam e eu temos que jogar "ossos do diabo" acima. Estávamos juntos, mas desapareceu.

— Oh, jogo de dados. — Lily se endireitou. Seu corpo exuberante roçou o quadril de Devon, com uma pressão persistente que ele sabia não era acidental.

— Que divertido. Eu adoro jogar.

— Eu também — disse ele em voz baixa, de maneira que só ela pudesse ouvi-lo. — Mas em uma mesa privada. Fixe a hora e o lugar.

E então não soube por que seu olhar que passou sobre ela, onde Jocelyn estava olhando o intercâmbio com uma expressão de desprezo mal ocultos, com seus grandes olhos castanhos. Não era possível que ela os tivesse escutado, mas pelo olhar parecia ter adivinhado que ele não estava discutindo jogo de dados com Lily. Deu-lhe vontade de rir forte.

A Sra. Cranleigh não se dignou a responder seu comentário. Não havia necessidade. Ele percebeu sua aceitação no momento que pôs seus olhos nela. Só tinha que esperar que o mandasse procurá-la. E estava certo que não teria que esperar muito.

Sir Gabriel Boscastle, oficial e autodenominado cavalheiro imperfeito, chegou à festa durante o tardio jantar baile. Era seu primeiro convite à festa de Lorde Fernshaw, embora seus primos Boscastle fossem muito populares e ocupassem a parte superior da lista de convidados todos os anos.

Infelizmente, seu oponente Drake Boscastle não estaria ali para que Gabriel o provocasse. Drake e sua esposa preceptora, aparentemente planejavam desfrutar do leito matrimonial por um período indefinido.

Gabriel não culpava seu primo. Sentia-se ressentido. Não ter Drake para envolver perdia a metade da diversão de tortura.

Em vista da retirada de Drake da má vida, Gabriel não tinha mais que compartilhar e pecar com o resto dos Boscastle solteiros. Era muito estranho, mas finalmente tinha começado a gostar de seu papel de rival externo. Sua entrada ao mundo de Londres de sua família de má fama, tinha-lhe aberto avenidas sem fins de entretenimentos que previamente lhe tinham sido negados.

E tinha intenção de desfrutar de um prazer hedonista de uma vez.

Afastando-se, permitiu à criada que lhe tirasse dos ombros o casaco negro de lã. O olhar persistente de aprovação dela lhe assegurou que não teria que dormir só.

Deu-lhe um sorriso encantador que prometia tudo e nada ao mesmo tempo.

— Será isso tudo, Senhor? — perguntou ela.

— Por agora.

Enquanto ele se afastava pelo vestíbulo, ela ficou agarrando seu casaco, enquanto outra criada correu a seu lado para fazer perguntas sobre o recém chegado tão bonito.

— Dois homens Boscastle ao mesmo tempo, — disse uma sussurrando suficientemente forte para que ele escutasse. — É muito para que meu coração resista.

Gabriel riu muito.

Por certo que ele não tinha nada contra dormir com uma criada, mas não foi até Essex, para ficar com as criadas de seu anfitrião. Seu olhar estava em uma meta mais desafiante: a sedução de Lily Cranleigh. A bela viúva tinha deixado claro que desejava sexo, e amparo, mas não dentro da servidão matrimonial.

Tampouco necessitava de riqueza. Seu último marido a tinha deixado com suas necessidades materiais bem satisfeitas.

Ela outorgava os mesmos favores sexuais a seus amantes.

É claro, o fato conhecido de que Devon Boscastle a desejava, só aumentava a atração dela para Gabriel. Talvez nem sequer se interessasse em

deitar-se com ela, se Devon não tivesse anunciado que estava interessado em fazê-la sua amante. Gabriel às vezes pensava que necessitava a rivalidade para sobreviver.

Ele nem sequer se voltou para ver se a criada continuava olhando-o.

O olhar ficou aguçado ao ver uma silhueta de curvas deliciosas e cabelos castanhos dourado de outra mulher. Não era Lily, mas definitivamente uma possibilidade para os próximos dias. Esta jovem dama tinha esse ar inato inalcançável que o desafiava; apostaria sua alma miserável que nunca se encontraram antes. E quem era esse gigante estirado a quem ela passava dando olhares furtivos? Que Deus o ajudasse.

Não era Chiswick, verdade? O oficial de cavalaria que parecia um autêntico cavernícola, mas que visitava religiosamente sua avó todos os domingos.

— A viúva é minha, no caso de... Como está, Gabriel?

Deu meia volta ao reconhecer a voz profunda que vinha por um ombro.

Não se surpreendeu ao descobrir que se tratava de seu primo Devon Boscastle.

Será que o irmão mais novo de Drake tinha tomado a luva da rivalidade amistosa entre Drake e Gabriel? Eles se insultavam sempre.

Competiam pelas mesmas damas. Mas que Deus ajudasse ao homem que ameaçasse um Boscastle.

Encolheu os ombros.

— Reclamou-a? — Perguntou inocentemente, sabendo muito bem que o tinha feito. Em Londres todos falavam de Lily e Devon quando saiu.

— Pergunte-lhe — disse Devon com um grande sorriso.

Um arrogante sorriso de segurança em si mesmo se instalou em seus limpos traços esculpidos. Ao Gabriel lhe ocorreu que Devon poderia ser o mais novo dos varões Boscastle, mas levava o diabo dentro assim como seus outros irmãos.

Amistoso, peralta, Devon sempre se envolvia em um escândalo ou outro, conhecido por seu encanto conciliador e proezas sexuais. Realmente seria

insensato subestimar um rival. E Gabriel tinha aprendido cedo na vida a cuidar das costas.

— É minha — acrescentou Devon com uma segurança que o libertino em Gabriel só podia admirar. Depois de tudo ele e Devon tinham uma relação sanguínea, mas...

— Quer apostar que cama primeira a viúva esquenta? — perguntou antes que pudesse deter o impulso.

Devon lhe lançou um olhar desafiante que confirmou as suspeitas de Gabriel. Com toda sua reputação de um jovem seguidor de Eros, Devon parecia mais que preparado para continuar a infâmia de seus irmãos.

— Eu aposto, já que vai perder.

Devon lhe deu uma amistosa palmada em um ombro, que teria feito desequilibrar-se qualquer homem mais débil.

Gabriel manteve a aposta rindo muito com genuína antecipação. Não tinha nada a perder, e apesar de si mesmo, sempre tinha gostado de Devon, um fato que de maneira nenhuma o deteria em fazer tudo o que estivesse em seu poder para ganhar a aposta.

— Já veremos.

Devon acabava de despedir seu valete essa noite, quando viu uma nota que tinham deslizado sob a porta de seu dormitório. Debateu se saía para ver quem era o mensageiro, mas desistiu. As notas entre admiradores não era um fato estranho em um sofisticado caso da Sociedade.

As brincadeiras nas pequenas festas improvisadas dentro da festa principal da casa eram a razão principal pela qual a maioria dos convidados da alta sociedade assistia em primeiro lugar, embora nunca o admitissem.

Tinha declinado com tato um punhado de ofertas discretas, durante o curso do jantar baile. A última conversa que teve com Lily, tinha-lhe deixado sem dúvida nenhuma que a capitulação dela estava ao alcance de sua mão. O fato de Gabriel a desejar não importava nada.

E não se tratava de que qualquer deles estivesse apaixonado por ela, nem

ela, por algum deles.

Entretanto, pensou que ela adiaria sua entrega pelo menos por outro dia.

Na experiência de Devon, um lento prelúdio à relação sexual, fazia a entrega da dama muito mais agradável. Ele era um homem que gostava de saborear cada suspiro de sua amante, e valorizava a amizade e a confiança tanto como a paixão.

Entretanto, não iria ofender a Sra. Cranleigh fazendo-se de evasivo, porque a semana seguinte prometia um prazer sem restrição.

Mas para sua surpresa, não foram os encantos evidentes de Lily o que lhe veio à mente, outra tentação involuntária lhe dava voltas, recusando a passar despercebida.

Uma mulher cujos olhos castanhos o tinham olhado com desconfiança divertidos. Uma mulher que ele tinha deixado deslizar entre seus dedos anos atrás, e esta noite, ironicamente, fazia com que lhe doessem os dedos por uma oportunidade para tocá-la.

Jocelyn Lydbury não pertencia a uma festa como esta, pensou. Adam era uma pobre desculpa como protetor. De fato se ele estivesse fazendo bem seu trabalho de guardião, nunca deveria tê-la deixado; sozinha nem sequer um minuto com um patife como Devon.

Cruzando a estadia, agachou-se para recolher o papel dobrado, e ao romper o selo ainda suave. A mensagem cuidadosamente escrita confirmava sua crença de que a dama estava mais impaciente por uma noite de amor, que o que sua paquera na festa lhe tinha indicado.

Meu querido Diabo,

Ambos somos suficientemente maduros para permitir, e suficientemente jovens para fazer realidade nossos desejos. Apesar de minha reputação, sou uma mulher discreta de coração. Se sua perseguição por minha atenção é mais que uma tentação passageira, me encontre esta noite um quarto de hora passada á meia noite na torre oriental, onde desfrutaremos da privacidade para revelar nossas intenções.

Confio em não ter interpretado mal suas intenções.

Poderia usar seu infame dominó para mim? L.

O papel tinha um aroma fortíssimo a lilás, a fragrância de seu nome.

Mas curiosamente um perfume que ela nunca tinha usado em sua companhia. Parecia pouco sutil empapar a nota em colônia, quando ela quem o perseguiu por mais de um mês.

Deixou cair á nota na escrivaninha enquanto ia ao armário de carvalho.

Tirou descuidadamente a jaqueta de noite, para vestir o dominó, a capa com capuz negro de assaltante de caminho com máscara, que o tinha transformado em um dos escândalos favoritos de Londres. Não estava seguro se Alton havia dito que um baile de máscaras seria parte do entretenimento este ano, mas Devon levou o disfarce no caso de acontecer.

Tinha esperado que Lily Cranleigh encontrasse sua curta carreira como assaltante de caminhos um afrodisíaco. Ela tinha feito várias referências a seu passado quando conversaram. De qualquer maneira, quem teria pensado que um único interlúdio lamentável provocasse tantas fantasias nos corações das mulheres dispersas por toda a Inglaterra, à maioria das quais nem sequer conhecia?

Balançou a cabeça com resignação divertida. Muito para impressionar as damas com seu engenho sutil e uma reputação bem ganha pela originalidade sexual. Dificilmente parecia justo que devesse colher os contínuos lucros por cometer um crime que preferia esquecer.

Mas aí estava o fato. Como mascarado tinha posto de joelhos muitas damas distantes, o que só era uma prova de que realmente não havia descanso para os perversos.

Ou para os Boscastle se a pessoa decidisse reconhecer a diferença.

 


CAPÍTULO 04

 


Para Jocelyn pareceu levar uma eternidade encaminhar-se pelos solitários vestíbulos do castelo, para tomar depois uma alta escada para chegar á torre do leste. Os sons da farra na ala oeste se enfraqueceram, as notas musicais de um tipo de pistão ecoavam de maneira comovedora na escuridão. Quando tinha recebido pela primeira vez a nota de Adams umas horas antes, pensou que a idéia de um encontro a meia noite soava romântica e aventureira.

Quem teria adivinhado que seu apropriado pretendente era capaz de um gesto tão apaixonado?

Ou que ele proporia um longo caminho para chegar a seu encontro.

Senhor, ela já devia ter percorrido uma milha através dos pátios interiores do castelo, antes de começar a exaustiva subida até a escada de pedra.

Deveria dizer que se a proposta para um encontro na torre tivesse vindo de qualquer dos outros jovens na festa, ela não teria tido a mínima tentação de aceitar. Ninguém lhe tinha feito jamais uma oferta tão má antes.

O fato de o convite ser para reunir-se em segredo o fazia ainda mais irresistível. A julgar por sua fina letra, ele estava tão nervoso; a respeito de um encontro ilícito como ela. Mas Adam era ao mesmo tempo; um oficial valente e um homem de honra e tinha dado a entender que tinha a intenção de pedir sua mão na festa. Se não tivesse estado convencida de que uma proposta de matrimônio estava no horizonte, lhe teria jogado seu convite na cara. Embora em privado, Jocelyn estivesse um pouco contente por ele estar mostrando esta veia imprudente. Nenhuma só vez tinha adivinhado que esta faísca viva ardia debaixo de seu previsível íntimo.

E ele a tinha pedido que usasse uma máscara para proteger-se de ser identificados no caminho, bendita fosse sua educação de cavalheiro. Pelo menos, tinha escolhido um lugar onde era pouco provável que fossem descobertos por um hóspede errante. Um lugar muito isolado.

Um pouco afastado para seu primeiro encontro.

Mas iriam se casar. Isso fazia uma diferença, assegurou a si mesma.

Tudo estava bem se terminava bem.

De repente parou frente à porta de arco alto da torre. A ansiedade tinha começado a diminuir seu sentido da antecipação. E se ela e Adam fossem surpreendidos?

Ele estaria obrigado a precipitar-se em seu matrimônio, e ela não seria capaz de ter o casamento de conto de fadas que tinha sonhado. Podia ser que não fosse o final de sua vida, mas certamente seria uma vergonha.

Nunca tinha feito nada como isto em sua vida.

Antes que pudesse mudar de opinião a respeito de continuar com o encontro, a porta se abriu e se encontrou olhando o aposento. Sua primeira impressão foi de uma figura vestida de escuro sobre um fundo de sombra ainda mais escuro. A escassa luz da lua se filtrava através da janela de chumbo.

— Tome cuidado — advertiu uma voz de barítono que soava estranhamente familiar e mais masculina que a de Adam, exceto nas raras ocasiões quando deu a impressão de Wellington como um favor a seus partidários.

Ela levantou a mão timidamente a sua máscara. Foi surpreendente descobrir quão atraente parecia Adam na escuridão. A cortina de fundo escura lhe fez parecer varonil e um pouco ameaçador, de uma maneira estranhamente atraente.

— Está tão negro como...

Uma mão de ferro se fechou ao redor de seu pulso e a levou sem esforço para a sala. A porta se fechou atrás dela com um ruído surdo que ressoou no silêncio.

Mas tropeçou, e logo sentiu que se estabilizara de novo pelo afeto firme.

— Este foi um inferno de lugar para encontrar, — comentou secamente, com a boca contra sua face. — De momento não há nem sequer uma cama para...

— Uma cama? — Ela sussurrou.

Sua voz. Soava bem, céus, não era de estranhar, sua voz era tão inesperadamente profunda e rouca, levava não só uma máscara, mas também um formoso manto negro com capuz que o envolvia da cabeça até a metade da panturrilha. E devia usar um novo par de botas que aumentavam sua altura.

Tinha que admitir que estivesse encantada em segredo por seu traje atrevido.

Adam não se parecia absolutamente a si mesmo. O traje trazia para fora sua masculinidade? Seu lado autoritário?

Um lado que ela não tinha sonhado que existia?

Nunca imaginou que um disfarce pudesse fazer tal diferença.

Seu corpo grande a arrastou para trás contra a parede.

Respirou fundo quando ele perguntou:

— Vou ter que tomá-la como prisioneira? Ou se entregará a mim sem uma luta?

Ela riu com incredulidade.

— O que?

— Quer ser minha refém? — perguntou-a em um sussurro divertido. —

Não tive suficiente tempo para fazer os preparativos para seu cativeiro. —

Voltou á cabeça como se avaliasse a escuridão. — Suponho que poderia haver uma borla de tapeçaria que poderia utilizar para submetê-la.

Sua voz. Um calafrio percorreu todo seu corpo. Oh, Meu Deus! Quando Adam tinha se tornado tão horripilante e malvado?

— Submeter? Sua refém?

— Pode ser incômodo neste frio chão de pedra, mas posso pôr minha capa debaixo de você — disse galantemente, como se tivesse participado de dezenas de encontros antes. — Você gostaria que a atasse pelos pulsos ou os tornozelos?

Sua voz. Sua garganta se fechou. Perguntou-se se este era o começo de um desmaio. Atar-lhe... Pelos pulsos ou tornozelos? Não podia ter ouvido bem.

Ele não tinha feito essa pergunta.

— Ou as duas coisas? — ofereceu mais educadamente. — A escravidão é

um de meus jogos favoritos, mas estou só para agradá-la.

— Não disse que tinha a intenção de me obrigar com uma borla — disse ela em tom de voz baixa.

— Uma bola. Uma borla. O que importa? Desde que não deixem marca indicadoras sobre esta carne formosa. Não queremos que ninguém na festa adivinhe o que estávamos fazendo.

— Quem é? — Ela sussurrou as palavras grudadas em sua garganta.

— Não lhe permito conhecer minha identidade — respondeu em um sussurro. — Não é isso o que queria? Ser tomada por um estranho?

Ela sacudiu sua cabeça, tremendo outra vez. Não podia decidir se seu desconcerto se derivava do choque ou do fato de que seus dedos enluvados havia começando a se a mover vagando desde suas faces até os ombros, só para atrasar-se no vale de seus seios e perversamente rodear seu mamilo.

Uma onda de calor varreu sobre ela.

Os colchetes e as casas de seu vestido, que tinham levado à criada da casa um dedicado quarto de hora para abotoá-los, saltaram abertos como pelo toque de um mago. Um sopro de ar frio misturado com o toque quente do sussurro de couro acariciou sua pele.

Meio nua, pensou. Um homem com máscara tinha afrouxado seu vestido e acariciava seus seios. E seu corpo tinha respondido. Seus mamilos apertados formigavam. Sua voz trêmula, disse:

— Este jogo foi muito longe.

— Então, jogarei qualquer jogo que queira — respondeu ele, sua boca firme movendo-se furtivamente à parte superior de seus seios. — Quer que a segure, ou que a domine? Poderia ter escolhido, por certo, um lugar melhor adaptado à paixão. O que a fez querer me encontrar na torre?

Essa voz. Não pertencia a Adam, amortecida ou não. Nem o toque conhecedor que brincava com seus seios antes de deslizar-se pelo ventre até o espaço úmido debaixo de onde só se toca quando se...

— Você não é Adam — disse ela, seus ossos pareciam dissolver-se no

instante em que pronunciou as palavras, apesar de que, em algum lugar profundo dentro dela soube desde o momento em que a tinha tomado em seus braços.

Nenhum disfarce poderia transformar um homem cavalheiro em um demônio.

Ele parou a ironia vibrando em sua voz de veludo amortecida.

— E você claramente não é Lily Cranleigh, apesar de acreditar que não utilizarei isto contra você.

— Lily? — Repetiu ela com voz débil.

— Estou adulado, na realidade, que tenha tomado todo este trabalho para combinar um encontro. Mas se me desejava anjo, não havia necessidade de engano. Era mais que provável que tivesse vindo por curiosidade. Ou para satisfazer a sua.

— Não sei do que fala — sussurrou.

— A menos que a intriga seja o elemento que a excita — acrescentou.

Seus olhos brilhavam através das frestas da máscara como se quisessem zombar dela. Um suspiro se ergueu em sua garganta. A seguinte coisa que soube foi que ele a inclinava para trás, por cima de seu musculoso antebraço, em uma posição de subjugação. Os duros músculos de aço de suas coxas apertadas contra ela, e encerrando-a nele. Seu corpo atraído a um ângulo mais próximo, até que sentiu seu escuro eixo contra seu ventre.

Sua dura boca desceu sobre ela em um profundo e devastador beijo, que a teria silenciado, se tivesse sido capaz de dizer duas palavras juntas em uma frase coerente.

De fato, ela mergulhou tão profundamente nas sensações para poder empreender uma defesa. Queria... Queria o que suas mãos e sua boca a estavam fazendo. Suave. Desumano. Irresistível. Uma pessoa desconhecida, e, entretanto, estranhamente conhecida por suas sombras na meia noite. Beijou-a; na garganta, ombro logo deslizou sua boca para a ponta de seus seios.

Ah, o prazer. Pecaminoso, mas doce, que lhe cravou em seu ventre e despertava um desejo físico que lhe doía em ânsias de satisfazer. Sentia a umidade filtrar-se entre suas pernas; quente; vergonhosa.

Em algum lugar de sua mente, ela insistiu em parar, mas nunca foi um pensamento expresso, não podia decidir se, se submetia a sua habilidade ou se estava muito aturdida para opor resistência.

Não havia dúvida de que ele sabia como tirar proveito de sua indecisão.

Sua boca se mantinha dura e com segurança, passando de seus seios a sua garganta, e logo aos lábios em um beijo que parou seus pensamentos. Não era Adam. Não era Adam, disse a si mesma quando ele a atraiu para baixo sobre o piso. Só sabia que estava caindo.

O que, em nome do céu, estava ele fazendo? Não, não era uma coisa celestial absolutamente. Talvez fosse melhor não perguntar o que ele tinha em mente, seus motivos eram flagrantemente evidentes, inclusive para alguém com seu passado irrepreensível.

— Abra-se para mim — sussurrou. Ele soprou seu fôlego quente nos mamilos doloridos e úmidos pondo sua face contra seu peito. — Dê-me tudo o que tem.

Algo dentro dela queria lhe obedecer. Alguma incauta parte dela queria culpar à escuridão que os envolvia. Mas inclusive as trevas não lhe permitiam seguir pretendendo que o corpo forte moldado ao dela pertencia ao homem que tinha vindo encontrar.

Era o momento de desmascarar o impostor que tinha tomado seu lugar.

Devon não podia recordar nenhum momento no qual estivesse estado tão excitado por este tipo de jogo. Ela estava ofegando suavemente, sem fôlego, como se nunca tivesse sido beijada antes. Agora que pensava, havia um desconhecimento em sua forma de mover-se contra ele que rompeu através da bruma escura do desejo. Ou ela estava se afastando dele?

Fechou os olhos e convocou a toda sua força de vontade. Tinha ouvido que a viúva gostava do sexo duro, rápido e sem inibições. Como uma questão preferivelmente pessoal, Devon tinha desfrutado de muitas horas de matizes e jogos prévios, era um brincalhão que se distinguia por fazer com que sua companheira gemesse e tremesse antes da consumação.

Naturalmente, poderia adaptar-se a seu gosto. Podia jogar com Lily se, dessa maneira, excitava-a.

Salvo que a mulher trêmula entre seus braços não era Lily Cranleigh, e sabia disso.

Seu aroma. Sua voz. Reconheceu-a, e não o disse. Sua genuína resposta o atordoava de uma forma que de maneira nenhuma lhe recordava à sofisticada companheira de cama que tinha procurado. Entretanto, o tinha convidado a ir ali.

Teria sentido medo de assinar o convite com seu próprio nome? Teria temido que sua nota pudesse cair nas mãos equivocadas? Ou que não fosse favorável a um encontro se soubesse sua identidade de antemão?

Isso realmente não importava. Ela estava tremendo deliciosamente em seus braços. Tinha-lhe desejado o suficiente para arriscar-se a este encontro, e sabia como dirigir o resto.

— Vamos tirar nossas máscaras, de acordo? — Murmurou. — Na realidade vamos tirar também o vestido que leva.

— É você — disse com voz afogada.

— É claro que sou eu — murmurou.

Não era necessário que Jocelyn lhe perguntasse seu nome. Máscara ou sem máscara, ela sabia.

Quem dos assistentes da festa poderia enganá-la o suficiente para atraí-la à torre usando como chamariz o nome de um cavalheiro respeitável? Mas que professor da imoralidade e a da persuasão sutil não só se atreveria, mas também, além disso, teria êxito?

— Devon Boscastle — Ela olhou seu rosto sedutor enquanto ele arrancava o capuz e tirava a máscara. Sua formosa boca curvando-se em um sorriso.

— Jocelyn — Acrescentou lenha ao fogo, rindo. — É você.

— É claro que sou eu — disse, endireitando-se com indignação. — Como se você não houvesse me trazido aqui.

— Isto é uma surpresa agradável — disse, e o dizia a sério. — Não tinha idéia de que me desejava, ou que era uma garota travessa.

— Não — disse ela rapidamente. — Não o sou.

Devon a estudou com desconcerto, sem saber se devia continuar com seu jogo ou, pelo contrário, correr por sua vida. Agora que tinha recebido uma amostra do que lhe tinha sido negado alegremente no passado, queria obter todo o prazer possível dela, embora não quisesse as inevitáveis repercussões que acompanhavam ao seduzir uma jovem de sua inexperiência. Não tinha pensado que ela tivesse tomado sua oferta da tarde anterior a sério. Se soubesse, bem, teria insistido em que se reunissem em um lugar melhor.

Mas o olhar em seu rosto lhe advertiu que ela não esperava que seu encontro secreto fosse tão longe. Tão adoravelmente desejável como a achou, não estava seguro de apreciar, entretanto, que lhe convocasse à torre de maneira fraudulenta. É claro, podia lhe convencer de ir mais longe se realmente lhe falasse. Não era um homem que guardava rancor contra uma mulher, especialmente contra uma tão tentadora como ela.

Sua voz quebrou seu sonho.

— Como pode ser tão arrogante e oculto para me atrair aqui de maneira fraudulenta?

Levantou a sobrancelha surpreso.

— Para que iria enganá-la?

— Não me diga isso, Devon, é muito vergonhoso. — Ela esfregou seus antebraços com força. — Quero dizer, uma mulher não poderia admitir tais pensamentos em voz alta, e suas ações falaram com toda clareza, fazendo coisas que me parece impossível de descrever.

Ele soltou um grunhido.

— Mas uma mulher pode atrair a alguém à torre para um encontro?

— Então, admite — disse ela em sinal de triunfo.

— Não admito nada. E deixa de tremer dessa maneira desconcertante. Se fosse comê-la, já o teria feito.

— Não estou tremendo porque tenha medo de você — replicou ela, abaixando as mãos. — O que passa é que aqui está tão frio como uma cripta.

— Por que está aqui? — Perguntou sua voz aguda com recriminação.

— Não para o que deseja, asseguro-lhe.

Olhou-a durante uns instantes, logo começou a rir.

— Pensei que tinha me convidado.

Ela abriu muito os olhos.

— Um de nós está completamente equivocado. Tentou ou não tentou me perverter a somente um minuto?

— Muito bem — admitiu facilmente. — Tentei seduzi-la. Permito-me indicar, em minha própria defesa, que não tentou, exatamente, liberar a batalha do Armagedom para me deter.

Abriu a boca para objetar, mas tudo o que surgiu foi um grasnido mais que incoerente. Ela não tinha brigado. Seria uma hipócrita se protestasse por sua participação depois do ocorrido.

— Bom, não sabia que era você — disse por fim, ao menos, essa era uma verdade irrefutável.

Ele encolheu os ombros, continuando, procedeu a seguir confundindo-a dizendo.

— Eu tampouco sabia que era você.

— Asseguro-lhe que nunca me pus em circunstâncias tão angustiantes antes.

Deu-lhe um sorriso exasperante.

— Então, o que quer?

— O que queria o que quero — disse ela, retrocedendo torpemente para a porta. — É fingir que isto nunca aconteceu.

— Acredito que é uma boa idéia.

— Obrigada — disse.

— De nada.

— E adeus. Uma vez mais.

— Espere — Ele suspirou e pôs sua grande mão sobre a dela antes que pudesse abrir a porta. — Permita-me.

— Que te permita o que? — Perguntou ela com desconfiança.

— Assegurar-me de que vá segura.

— Certamente, isto não é um lugar seguro para que fique aqui, com você,

— disse ela, saindo de seu caminho. — É...

— Cale-se um momento. Ouvi algo.

Ela afastou o rosto. O que ele muito provavelmente ouviu era o tamborilar irregular de seu coração. Que homem tão ladino era. Que descarado, descarado.

Ela cruzou os braços com força através de sua blusa desabotoada enquanto ele fazia uma pretensão de pressionar a orelha contra a porta de carvalho. De agora em diante, até o ar que respirava, devia considerar-se com suspeita.

— Maldição — murmurou ele.

Ela começou o complicado processo de voltar a fechar a parte posterior de seu vestido, de maneira nenhuma uma pequena façanha na escuridão sem uma criada, nem espelho para guiar suas mãos.

E pensar que tinha sido atraída ali com a esperança de uma proposta de matrimônio adequado. E pensar que lhe havia... Não, isso não merecia pensar.

Adam consideraria, compreensivelmente, tomar este engano com horror.

Ele poderia tomá-lo tão mal para desafiar Devon a um duelo. Se Jocelyn não acabasse com ele primeiro.

Uma possibilidade que era mais que tentadora no momento.

O objeto de suas reflexões homicidas se endireitou bruscamente, sua voz como o fio de uma inquietação contagiosa.

— Ouvi alguém subindo a escada.

— Bom, feche a porta de novo — disse ela com urgência.

E justo com a mesma urgência, ele respondeu.

— Não há ferrolho, em caso de não percebido.

Ela se afastou dele em pânico.

— Como poderia ter notado? Estava sendo sustentada por um salteador de caminhos.

— Maldição — murmurou sua voz profunda e inquietante.

— Não fique aí amaldiçoando — sussurrou. — Faça algo útil. Esconde-se.

Ele fez um gesto de aborrecimento.

— Que brilhante estratégia. Tem alguma sugestão quanto aonde?

— Tem que haver um armário ou um guarda-roupa aqui. — Seu olhar posou em um volumoso e pesado baú contra a parede. — Isso dali é um cofre.

Vamos.

Moveu-se para frente simultaneamente e se inclinaram para abrir a caixa de latão com dobradiças, olhando suspeitosamente em um espaço que não teria contido a cabeça e os ombros de Devon, e muito menos seu corpo desajeitado.

— Talvez se ficasse enrolado em uma bolinha como um ouriço — disse ela, mordendo o lábio. É claro, ele seria decapitado e desmembrado no processo, mas essa não era sua preocupação.

Deixou cair a tampa com desgosto.

— Inclusive se pudesse fazê-lo, teria que explicar o que estava fazendo sozinha na torre. Disse a alguém que iria encontrar-se comigo?

Sua voz se ergueu. Assim como, infelizmente, o som de passos que se aproximavam.

— Como poderia dizer a alguém que iria encontrá-lo quando não sabia nem eu mesma? Fui enganada com este encontro secreto.

— Isso faz com que fôssemos os dois, não é verdade?

— E se for Adam? — Perguntou, olhando à porta com medo.

— Adam poderia ser preferível a determinadas terceiras pessoas que me vêm à mente — replicou ele.

— Oh, me perdoe! Talvez seja apenas Lily, a outra mulher que pretendia seduzir esta noite. Convidou-a aqui, também?

— Nunca convidei ninguém — disse secamente. — E seremos condenadamente afortunados se for qualquer um deles.

Engoliu saliva. Seu pânico parecia ir aumentando enquanto ele se tranqüilizava, ou talvez, já tivesse se resignado ao que viria. Possivelmente para ele esta situação era um fato cotidiano.

— Possivelmente um lacaio, não acha? — Sussurrou. — Os lacaios de Lorde Fernshaw patrulham os vestíbulos há todas as horas durante uma festa.

Não acredito que ninguém de seu pessoal se atreveria a interromper um... O que for isto. Não acha?

Não lhe respondeu. Estava, de fato, preparando sua defesa contra a inevitável desgraça sem precedentes que poderia vir através da porta. Não podia pôr seu dedo na chaga, mas seus verdadeiros instintos; os que tinham profundamente arraigados, e que tinham salvado seu traseiro mais de uma vez durante a batalha; acautelavam-lhe que havia muito mais forças demoníacas no assunto que lacaios obedientes.

— Por favor, Devon — disse Jocelyn, aparentemente detectando o desastre também. — Faça algo. Não posso ser descoberta em sua companhia.

— Particularmente tampouco desejo ser descoberto na sua.

— Necessitam-se dois para um encontro, sabe.

— Só recorde que você disse isso.

— Não vou poder esquecer nada desta noite.

Caminhou; diante dela para a janela, os altos vidros inclinados eram muito estreitos para permitir uma fuga, inclusive durante os dias Jacobinos, e não estavam a ponto de alongar-se, nem sequer agora. Golpeou com o punho uma das costuras de chumbo, mas o vidro não se rompeu.

Voltou-se e a olhou fixamente.

Não importa quão desejável ela tinha demonstrado ser a uns minutos, esta era a mulher que lhe daria com a maior probabilidade seu golpe de graça, e alguns diriam que este era um golpe tardio e apropriado do destino.

Ela. Ela. De todas as mulheres com quem terminar. Com que propósito ela teria feito esta brincadeira a ele? Teria passado quatro anos idealizando-o? Tinha paquerado com ela antes, expressou seu interesse nela como mulher. Tinha enviado ela a nota para encontrá-lo, mas lhe tinha dado medo assinar com seu nome?

Se soubesse que ela queria vê-lo a sós, não teria negado, mas teria se

assegurado que o faziam em um lugar de sua escolha. Salvo que ela negava que queria reunir-se com ele absolutamente. E de repente se perguntou se seu pai tinha feito isso. Vingança. Uma montagem.

— Aqui — disse aproximando-se, chegando a ela com grande rapidez para dar-se pressa em colocar os colchetes aos que ela não tinha sido capaz de chegar a suas costas. Sentiu-a tremer como reação a seu toque e jurou por dentro. Não importava o resultado desta situação, ela como mulher sairia pior.

Ela levantou seu rosto ao dele.

— Não posso ser pega com você.

— É muito tarde — disse mais seco do que quis, dando um passo adiante dela. — Devia ter pensado nisso antes de me convidar para encontrá-la aqui.

Deveria ter pensado nisso, para o caso. Mas pensou que a ninguém importaria se ele e Lily fossem capturados nesta situação.

— Eu não...

A porta se abriu. Não era um lacaio. Era muito pior. O irmão de Jocelyn apareceu ante eles, uma vela na mão. Olhou, com semblante grave, de sua irmã a Devon, que se esforçou para apresentar-se como... Como um espectador inocente?

Fez uma careta em seu interior. Como se tal postura fosse remotamente possível, ou, inclusive, certa. Gostasse Devon de admitir ou não, sabia que não tinham sido os seios super grandes e perfumados de Lily os que ele tinha beijado com ardor imperdoável durante o que, tinha começado de repente a parecer toda uma vida.

Outra vida. Sua vida passada. Bom, não havia nada que fazer sobre isso.

— Isto — anunciou Jason quando parecia que tinha encontrado, por fim, a voz para sublinhar seu olhar de choque — é inclusive pior que o que tinha imaginado.

— Entretanto? — Devon perguntou.

Jason sacudiu a cabeça com desconcerto.

—Tinha-me enganado na crença de que você também tinha mais princípios

que isto, Devon. Quanto a você, Jocelyn. Só posso dizer que nunca senti tanta vergonha.

— Quem lhe disse onde me achar? — Perguntou ela com voz cortante.

— Isso não importa. Não é algo que queira discutir com nenhum dos dois.

— Por que diabos não? — Exigiu Devon. — Insisto em que ao menos me ilumine, já que parece que estou na escuridão.

— Não está em uma posição de insistir em nada — disse Jason com desdém, continuando, aparentemente reconsiderou e colocou a mão no bolso do colete para tirar, com dramático floreio, o papel dobrado que tinha uma semelhança suspeita com o que Devon e ele tinham recebido cedo na noite.

— Voilá — disse Jason com voz tensa.

— Voilá o que? — Perguntou Devon aborrecido.

— Escreveu este convite para que viesse a seu encontro, não?

— Descobri-o na penteadeira de minha irmã.

— Eu não escrevi nada — respondeu Devon. — Eu era o convidado aqui, a verdade seja dita.

Jason lançou um olhar a sua irmã.

— Jocelyn, talvez pudesse explicar esta preocupante situação.

— Não é claro? — Ela arriscou um olhar de indignação na direção de Devon.

Ele teria rido se não tivesse tido alguma idéia de como acabaria isto.

Sabia como se deveria ver. A única coisa evidente, por desgraça, era o aspecto vagamente despenteado e muito tentador de Jocelyn.

E a capa de Devon. Senhor amado, ela estava em pé no meio dela, e qualquer tentativa de recuperá-la de sua parte, só serviria para justificar as suspeitas de Jason, apesar do justificável que essas suspeitas fossem.

Inclusive se Devon não a tivesse convidado a reunir-se com ele, ele teria estado perfeitamente disposto a continuar o encontro se não o tivessem interrompido. Ela o deixou absolutamente selvagem, fora de seus sentidos.

— Fui induzida a vir aqui — disse.

Soava tão acreditável que Devon se viu obrigado a admitir, a contra gosto, que havia mais que probabilidades de que ambos tivessem sido enganados.

— Ao que parece, fomos enganados — disse misteriosamente.

Ela bufou.

— Tudo o que sei — continuou — é que me fez acreditar que me reunia com Adam na torre.

Devon esfregou o rosto. Deus, ele a tinha seduzido, e ela pensou que era Chiswick?

Jason reconheceu esta afirmação com um gesto cínico.

— Salvo que Adam não está aqui. Ele está, de fato, neste momento muito angustiado buscando você por todo o castelo.

— E tudo o que sei — interveio Devon; sentindo-se mais obrigado cada minuto que passava a defender-se, — foi o que me levou a acreditar que me reunia com a senhora Cranleigh.

— Quem tampouco está presente — Jason murmurou a testa enrugada em especulação. — Seja como for, entretanto, não explica por que Jocelyn está em pé sobre sua capa, Boscastle.

A mente masculina saltava a uma conclusão muito desagradável.

Em seguida se produziu um momento de silêncio sombrio que, poderia ter se ampliado ainda mais tempo, se não fosse por um alvoroço surgido atrás da porta parcialmente aberta.

As vozes ressoaram na escada da torre, vozes que balbuciam preocupação e entusiasmo. Uma verdadeira torre de Babel pensava Devon, e inutilmente desejou uma taça grande de vinho, preferentemente misturado com um pouco de algum veneno rápido, mas suave, de qualidade, e um banco para sofrer um colapso sobre ele de modo que pudesse encontrar sua morte comodamente.

Entretanto, as Parcas, cuja benevolência Devon tinha dado por sentado até esta noite, pareciam ter renunciado a seu favor, já que uma voz masculina preponderou.

Devon não pôde identificá-la imediatamente, embora Jocelyn e seu irmão

parecessem reconhecê-la com toda clareza. Seus rostos refletiam o horror mútuo que trouxe para sua mente a aqueles amigos que, durante a guerra, tinham sobrevivido à morte e tinham jurado que no momento crucial, várias cenas de sua vida tinham passado ante seus olhos como os atos de uma peça de teatro.

De fato, quando a porta foi empurrada abrindo-se completamente, Devon pensou que o quadro tinha todas as marcas de uma tragédia de Shakespeare. Ou comédia. Ou as duas coisas.

Sir Gideon Lydbury se aproximou de sua filha em completo silêncio.

Era um homem de boa aparência, de cabelo prateado, seu corpo se ajustava enganando os efeitos de sua idade. Não levantou a voz com ira.

Não blasfemou o que Devon poderia ter confundido como um sinal alentador, se não tivesse percebido de outra maneira.

— Devia ter imaginado que estava comprometido, Boscastle.

Devon devolveu o olhar sem pestanejar.

— Então lamento que não me tenha advertido de antemão. Eu não imaginava isso.

— Foi um mal entendido — disse Jocelyn. — Não nos encontramos...

Sir Gideon se voltou, com a mão levantada para golpeá-la, e algo se rompeu dentro de Devon. A disciplina era uma coisa, e seu próprio pai nunca tinha regulado a vara para Devon. Entretanto, bater em uma mulher com raiva, bom, lhe dava vontade de golpear a alguém por isso.

Por desgraça, esse alguém era o pai de Jocelyn, quem provavelmente pensava que sua ação era merecida. De repente parecia irrelevante a Devon como ele ou Jocelyn se acharam presos nesta situação. Ele poderia duvidar de acreditar em sua reclamação de inocência. Talvez ela fizesse esta travessura por que... Não podia pensar em uma razão suficientemente forte para que ela jogasse este jogo a menos que procurasse vingar-se de um insulto passado.

Mas uma vingança calculada desta natureza, depois de tantos anos, parecia não só plausível, mas também mais oculta do que poderia lhe atribuir. Inclusive se o tivesse enganado deliberadamente, ela ainda era um membro do sexo fraco,

e seus instintos naturais para defendê-la afligiram suas inclinações menos dignas.

— Não a toque. — Bloqueou a mão do homem mais velho com seu braço direito e levantou seu esquerdo para proteger o rosto de Jocelyn do golpe iminente.

Não que ela apreciasse o gesto. Ela afastou seu braço para um lado com um bom empurrão e o fez virar a seu redor para ficar de frente a seu pai, embora o tremor em sua voz o fizesse duvidar que esta fosse a primeira vez que teve que defender-se contra os abusos. Seu irmão, que percebeu não fez nada para protegê-la.

— Castigar-me-ia ante os outros? — Perguntou ela, uma pergunta que levou Devon a perguntar-se até que ponto, a reputação de seu pai, sobre o castigo corporal se estendera além da disciplina dos soldados.

Esperou que lhe pedisse para intervir.

Sir Gideon desceu lentamente a mão, ignorando-a, posando seu olhar em Devon.

— Interpreto sua ação de me bloquear não só como uma admissão de culpa, mas sim como uma de aceitar a responsabilidade.

O estranho resplendor de triunfo em seus olhos refrescou a suspeita anterior de que Gideon tinha armado a armadilha. Mas... Não, ainda não tinha sentido. Este argumento todo cheirava a uma represália mais pessoal.

Levantou a cabeça e respondeu com austera resignação.

— Foi minha culpa. Enganei-a fazendo-a acreditar que iria haver uma busca de tesouro na torre.

Jocelyn o olhou fixamente como se tivesse perdido seus sentidos. E

provavelmente tinha razão.

— Uma busca de tesouro?

— Por favor, não me interrompa, querida — disse Devon sem olhá-la de novo. — Não vou evitar qualquer responsabilidade que me corresponda.

Sir Gideon assentiu com a cabeça.

— Então vou fazer os acertos para seu casamento.

 

 

CAPÍTULO 05

 

Jocelyn sentia como se tivesse sido convertida em pedra. Sem dúvida, suas pernas não se moveriam se as levantasse e tratasse de escapar. Seu pai, aqui.

Como? Por quê? Quando tinha chegado? Quando tinha se dignado jamais a assistir a uma festa em que não se encontrasse um aliado político?

Quem era o cérebro desta conspiração?

Seus pensamentos se interromperam repentinamente quando Adam entrou na torre e a olhou ferido, condenando-a. Adam. Seu Adam. Oh, o idiota! Iria negar que ele á tinha enviado essa nota? Sim, sim, quando tinha começado a perceber que ele não a tinha enviado? Seria suficientemente agudo para defendê-

la de todo modo, ou iria permitir que ela sofresse sua desgraça sozinha?

Não exatamente sozinha, pensou com um calafrio, lançando um olhar de esguelha a Devon, embora pudesse sentir seu olhar fixo. Ela e esse diabo formoso de cabelo negro estavam juntos nisto, qualquer coisa que isto fosse.

Pelo menos Devon teve a decência de defendê-la da intimidação de seu pai, apesar de que decentes não era como ela teria descrito as ações de Devon uns poucos minutos antes.

Ou dela mesma.

Seu coração ainda clamava, sem vergonha, no interior de seu peito, por seus beijos. Entendia muito bem agora por que as mulheres jovens sonhavam ser uma noiva Boscastle. Sabia por que estas chegavam a extremos ridículos para capturar um momento da atenção de Devon no parque, ou nas festas. Sua fama como libertino e magnífico amante não parecia ser exagerada. Tinha medo de pensar no que poderia ter ocorrido se seu irmão não tivesse chegado para salvá-la de si; mesma.

Entretanto, nunca aspirou converter-se na amante de um libertino.

Tinha a intenção de casar-se com um homem respeitável, e aquele homem não era certamente Devon, embora o tivesse desejado desde há muito tempo. Ao

que parecia, não estava sozinha em sua consternação, parecia ainda mais infeliz que ela por serem descobertos.

Então como tinha acontecido isto? Tinha sido este encontro secreto uma de suas apostas selvagens? Ririam seus amigos, os doentes, de como isto tinha terminado?

E como terminaria?

— Jocelyn — disse Adam, movendo a cabeça como se tivesse despertado de um sonho, — não entendo. Como se chegou a isto?

— Não sei — disse miseravelmente, encontrando-se com seu olhar desconcertado. — Pensei que o encontraria aqui.

— Encontrar-me-ia? Na torre. Por que a convidaria a este lugar desolado?

— Pensei... Pensei que fosse propor...

— Na torre? Bom Deus.

Era evidente que ele não iria achar os meios para resgatá-la desta desgraça.

Tampouco podia jogar toda a culpa em Devon Boscastle, embora o desejasse.

Ninguém a tinha obrigado a ir à torre. Ninguém a tinha obrigado a responder aos beijos de Devon.

Disse a seu pai que se casaria com ela, mas com certeza iria mudar de opinião. No calor do momento ele a tinha defendido. Mas pela manhã ele teria reconsiderado.

Ela, como mulher, nunca seria capaz de escapar às conseqüências.

E se ela entendia todos os fundamentos cruéis da sociedade, essas conseqüências seriam a rápida execução de seus sonhos.

O rosto de Devon escureceu quando descobriu seu primo Gabriel em pé fora da porta da torre, e com ele uma das melhores amigas de Jocelyn, a Senhora Winifred Waterstone. Se tiver albergado alguma esperança de uma tranqüila solução, teve que renunciar a ela. As testemunhas certamente selavam seu destino. Sacudiu-se ao redor de seu primo.

— A interferência não é bem vinda, Gabriel.

Gabriel o olhou astutamente da porta da torre.

— Vim ajudar. Parece que precisa de ajuda.

Mas Devon não estava de humor para ser comovido por sua amostra de preocupação. De fato, agora que estava suficientemente afastado da situação para refletir, pensou que era pouco provável que Jocelyn e seu pai tivessem participado de sua armadilha. Ocorreu-lhe, entretanto, atribuir uma conspiração desta natureza a um delinqüente comprovado como seu primo. Não foi advertido por seus irmãos que Gabriel não era de confiança?

— Por favor, me diga que não arrumou este encontro secreto, Gabriel —

disse devagar, procurando o rosto de seu primo — Ou que isto é sua idéia de uma brincadeira.

Por que tinha estado tão seguro Gabriel de conquistar à senhora Cranleigh?

Em suas suspeitas de montagem, lembrou-se de que tinha sido Gabriel, quem tinha levado a preceptora prometida de Drake a um bordel antes de seu matrimônio com a esperança de provocar dano sem nenhum propósito aparente.

Gabriel negou com a cabeça de novo.

— Vim aqui para ajudar, isso é tudo.

— Como sabia onde me achar?

— Segui o pai de Jocelyn. Ele e Adam estavam em uma caçada de bruxas quando parecia que tinham desaparecido. A única coisa que sabia era que seu nome foi mencionado, e não podia localizar você.

— E sabe por que agora?

— Encontrou uma debutante mais de seu gosto? — Gabriel hesitou. —

Admito que valha a pena uma segunda olhada.

Devon lhe deu um sorriso cínico.

— Mais que um segundo olhar, eu temo. Sua vida está arruinada, Gabriel, se me caso ou a abandono.

— Sou um Boscastle, também, Devon. Vou tentar ajudar.

Devon olhou.

— Podemos falar disto mais adiante. Este não é o momento.

O que tinha sido feito, tinha sido feito. Inclusive se ele a tivesse enganado,

ninguém lhe tinha obrigado a sentir o que havia sentido quando tinha sustentado Jocelyn em seus braços. Ninguém tinha feito doer seus ossos de desejo e tinha confundido seu cérebro de modo que durante uns poucos e irrevogáveis momentos nada no mundo tinha importado, mais que possuí-la. E agora, para bem ou para mau, fá-lo-ia.

 

*****
Era, é claro, impossível para Devon dormir essa noite. Bem poderia aceitar a mão que lhe tinha sido dada ou tentar desmascarar a quem tinha aprontado para desonrá-lo. Não tinha inimigos conhecidos. Ofendeu alguns homens, menos dos que o mereciam.

O que lhe recordava que tinha sido injusto ao acusar Gabriel, seu primo e lhe devia uma desculpa. Saiu de seu quarto, decidiu fazer as pazes.

O quarto de Gabriel se achava no outro extremo do corredor em cima da galeria, raiada pela longa janela do castelo. Como não tinha criados à vista, tomou a liberdade de bater silenciosamente, continuando, entrou ao não haver resposta.

Uma vela de cera ardia sob a mesinha de noite. Com um sorriso irônico ficou de costas à parede e esperou a que o homem nu e a mulher entrelaçada na cama se desenredassem e se vestissem.

O homem não se incomodou. Rodando sobre seu flanco, apontou com uma pistola na direção de Devon e saltou nu do lado da exuberante ruiva que jazia ainda dormindo em sua cama.

— Jesus, Deus — disse Gabriel com irritação. — Quase atiro em você, Devon.

Devon viu o traseiro branco de a mulher desaparecer no outro lado da cama.

— Boa noite, Lily. Espero que não a tenha pegado em um momento difícil.

Amaldiçoou do chão e arrancou a colcha de seda debaixo do traseiro de Gabriel.

— Cheguei a um momento inoportuno? — perguntou Devon, divertido.

Gabriel se levantou e caminhou sem o menor sinal de inibição pelo quarto.

Jogando em sua boca um sorriso resignado, reuniu a roupa de Lily em sua mão e a jogou em sua forma encolhida.

— Aqui, Lily. Não queremos que pegue um resfriado desagradável.

Ela colocou seu vestido e se levantou.

— Ambos são uns filhos da puta, sabem. Está no sangue.

Devon levantou sua testa, permitindo passar ao seu redor.

— É um maldito aborrecimento ser pego, querida.

A porta se fechou com um clique decisivo, e voltou sua atenção à forma da sombra de Gabriel.

— Ganhou a aposta. Felicidades.

Gabriel acendeu um charuto e começou a rir.

— Estava a ponto de ganhá-la quando interrompeu.

Devon sorriu.

— Mau momento?

— A nós dois nos parecia isso — Gabriel soltou um suspiro.

— Permita-me. Asseguro-lhe de novo que não tive nada que ver com o que aconteceu esta noite.

— Suponho que também vai negar que Lily estava em sua cama? —

Perguntou secamente Devon.

— Isso é diferente. Fizemos uma aposta. Você e eu sabemos que ela e Jocelyn são diferentes.

— Não conheço Jocelyn absolutamente, se quer saber a verdade.

Gabriel balançou a cabeça em simpatia.

— É a sorte do diabo o que aconteceu esta noite. Não estou seguro de que eu tivesse me comportado como o fez.

Devon se apoiou na porta. Estava amanhecendo.

— Suponho que fica por ver quão bem vou fazer frente ao que vem depois.

— Eu desapareceria pela manhã se fosse você.

Hesitou.

— Talvez o faça.

Mas sabia que não o faria, e não só pela honra ou porque tinha dado sua palavra. Ainda agora a memória do batimento do coração, do sangue de Jocelyn, provocava dentro dele, uma antecipação que desafiava à razão.

Doce, um pouco malvado. Suaves olhos marrons e um pai que não a perdoaria pelo que tinha feito.

Ele não se iria pela manhã. Era um homem que enfrentaria o que se jogasse em seu caminho.

Jocelyn despertou com o som das pombas que se reuniram em sua janela.

Sentou-se e olhou fixamente à máscara que tinha caído em seu toucador. Quando teve a esperança de que a noite anterior tivesse sido um sonho? Não tinha adormecido o suficiente para pretender enganar-se inclusive a si mesma. As palavras de despedida de seu pai lhe tinham açoitado durante toda a noite.

— Vai aceitar as conseqüências de sua má conduta com graça e integridade.

Tinha saído da casa antes que outros convidados tivessem sido alertados de sua presença. Apesar de sua discrição, Jocelyn era plenamente consciente do tema das intrigas nas mesas do café da manhã, embora talvez Devon tivesse fugido já, e Jocelyn ficaria sozinha para sofrer o escândalo.

Deixou-se cair sobre a cama, perguntando-se quanto tempo se podia ocultar no quarto antes que se visse obrigada a sair. Passou uma hora enquanto considerava seu futuro imediato. Seu estômago grunhiu com a fome, e mal tinha amanhecido. Como nunca negou a si mesma uma só refeição que ela recordasse logo se fez evidente que não podia ficar ali indefinidamente, cedo ou tarde teria que enfrentar a sociedade. E a Devon.

Uma lenta descarga de calor se apoderou de seu corpo. Como podia saber que ficaria tão indefesa com o toque de um homem? Sua primeira experiência da paixão.

O pior não era que se rendeu a ele tão facilmente. O pior era que quis mais.

Doía-lhe profundamente, plenamente consciente do que tinha despertado.

E Devon sabia. Ele vivia e respirara a sedução. Tinha o poder de um bruxo à hora do prazer.

E seu pai o estava obrigando a casar-se com ela.

Ainda era cedo, inclusive depois de se lavar e vestir-se. Muitos dos convidados ficavam na cama até o meio dia, tomando chocolate e respondendo à correspondência.

Mesmo assim, ela não sabia como iria explicar que ela e Devon se comprometeram durante a noite quando a sociedade inteira sabia que ela estava apaixonada por Adam.

Teria que voltar a confrontar o orgulho ferido de Adam. Mas não havia nada para ele. Ela tinha que cobrir-se de aço para confrontar o que trouxesse o dia.

Tão preparada como podia estar para defender-se da calúnia, não tinha reunido a coragem suficiente para enfrentar o homem que tinha contribuído para sua ruína.

Mal deu um passo fora de sua porta quando o viu no corredor. A vista desse homem pecaminoso rondando a tomou por surpresa. Ele ficou em pé, recém vestido, muito formoso para ser contemplado pela manhã tão cedo. Sem poder preparar-se para ocultar suas emoções, ela disse o primeiro que lhe veio à mente.

— Está de volta de outro encontro? — Como se o mero pensamento não lhe revolvesse o interior. Como poderia uma mulher de lícita sensibilidade casar-se com um malandro que zombava da idéia de fidelidade e amizade?

— Está você a caminho de um? — Brincou lhe devolvendo à pergunta.

— É claro que não. — Seus olhos azuis acesos de malícia desenfreada.

— Estive em uma a noite passada.

— Sim, fez isso. E olhe onde estamos agora.

— Isso é realmente pelo que estou aqui — disse.

Ela retrocedeu um passo, subindo a voz uma oitava.

— Ah, sim?

Poderia jurar que sabia que ela esteve pensando nele toda a manhã.

Que ele sabia que seus olhos faziam vibrar seu corpo e seus pensamentos eram um matagal dentro de sua cabeça. Devia estar acostumado a que as mulheres se derretessem sob seu encanto. Perguntou-se de repente se ele iria pedir sua ajuda para romper o compromisso.

— Acredito que devemos planejar a melhor forma de resolver o que vem.

— Baixou sua cabeça.

Ela se apertou contra a porta. Ele tinha um modo sutil de falar, o que forçou o fôlego fora de seus pulmões. Se casasse com ele, teria que dar um jeito de controlar a si mesma. Não podia deixar de respirar cada vez que ele entrasse em um aposento.

— Está me pedindo para chegar a uma solução para evitar o casamento?

— Sussurrou.

Ele piscou surpreso.

— Se a abandonasse a sua desgraça — disse com cautela: — Ficaria marcado como um canalha e corruptor de mulheres. Estive marcado por muitas coisas em meu dia, note, mas não por algo tão mau.

— Eu seria etiquetada de algo ainda pior — disse ela em voz baixa, sentindo um pouco de vergonha de si mesma por acusá-lo de ter motivos tão baixos. Mas ela só tinha sua própria família como um exemplo do que era, ou não, o amor.

— A que tipo de plano se refere então? — Perguntou-lhe depois de uma longa pausa.

Limpou a garganta, seu sorriso malvado provocou um suspiro nela.

— Um plano para nos defender do que as pessoas vão dizer sobre nós.

— Refere-se às pessoas da festa?

— Para começar — Ele se inclinou sobre o batente da porta, levantando o braço por cima de sua cabeça. Seus olhos eram do azul do mar durante uma tormenta. — Seu pai alguma vez a ameaçou com a força física antes de ontem à

noite? — Perguntou de forma inesperada.

O pânico explodiu em seu interior. Como podia saber? Ele não podia saber.

Ninguém sabia. As explosões violentas de seu pai eram um segredo de família bem guardado, pouco freqüente, suficientemente espaçado para que passassem meses e meses nos quais Jocelyn se convencia de que nunca tinham acontecido realmente.

— Por que pergunta uma coisa assim? — A indagou com um sorriso perplexo.

Olhou-a fixamente nos olhos como se sua resposta evasiva, não lhe tivesse enganado nem por um instante. Nunca tinha conhecido a ninguém como ele antes, e estava muito envergonhada para responder com a verdade. Ela orou para que não insistisse na questão e a obrigasse a lhe mentir, porque não podia lhe dizer a verdade.

— Pergunto-me — murmurou. — Parecia tão rápido para levantar sua mão que não pude deixar de notar.

— E veio em minha defesa.

— Não pude evitar, tampouco — disse pensativo, passando seus dedos por um cacho errante em sua face.

Agora o prazer se mesclava com o pânico. Ele era tão puramente masculino e protetor que ela quase não podia suportar.

— Ouvi as palavras que você e seu primo trocaram ontem à noite — disse em um esforço desesperado de desviar sua atenção. — Acha que foi ele quem nos enganou?

Ele a olhou com um sorriso que lhe dizia que sabia que tinha evitado sua pergunta.

— Não tenho certeza que isso seja importante — Ele moveu seus quadris, e se achou de repente fundida com seu corpo duro, angular. — Por que pelo menos não admite que desfrutou do que aconteceu ontem à noite entre nós antes que fôssemos descobertos? — perguntou, passando os dedos do antebraço até sua garganta.

— Porque não sabia que era você — sussurrou um fato que parecia anular algo que ela pudesse ou não ter sentido nesse momento. Ou o que sentia agora.

Pequenas rajadas de calor sob seu ventre aceso, enviando palpitações de calor às profundidades de seu corpo.

Era vagamente consciente de que a outra mão se instalava ao redor de sua cintura, e de que ela não tinha feito esforço algum para afastá-la.

Sua entrega falava por si mesma, como sem dúvida sabia.

— Acha que Chinny poderia fazê-la tremer quando lhe desse um beijo? —

perguntou sussurrando. — Eu o fiz.

— Já lhe disse — falou ela, sua voz tão baixa e rouca que não a reconhecia. — Pensei que me estava beijando...

Antes de poder terminar, ele abriu a porta de seu dormitório e a empurrou dentro, segurando-a contra a parede. Ela fechou os olhos. Seu beijo foi breve, mas potente, uma provocação desafiante a sua afirmação de que ele não a tinha feito estremecer. Tinha seu rosto entre as mãos e zombava de seus lábios abertos com sua língua, sua boca encantadora com uma fome primitiva, meteu-se dentro dela, em alguma parte profunda, que nunca soube que existia.

Uma malvada explosão de emoção explodiu no mais profundo de seu ventre. Parecia-lhe muito pior que a beijasse a plena luz do dia, em seu dormitório, que na noite anterior quando ela não percebeu quem era.

Mas ela sabia agora. Sabia o que era o desejo. No momento em que a tocou de novo, sua vontade se dissolveu em uma morna escuridão. Estava enjoada, avermelhada, e nervosa quando ele rompeu seu beijo, enterrou seu rosto no pescoço dele. Sua mão deslizou pelo lado de seu vestido acariciando o tentador caminho a seus seios. Ela sentiu um calafrio de antecipação, apoiada em seu corpo duro, tão devastada que não se atrevia a olhá-lo.

Então, de repente ele pareceu recuperar a compostura, e a soltou.

Estavam em pé uma vez mais fora do aposento. Percebeu aturdida que ele estava olhando-a meio sorrindo, com seu olhar perversamente atraente e indiferente. A única coisa em que ela podia pensar era em evitar que suas pernas

não a sustentassem.

— Não pensou que fosse Chinny, verdade? — Perguntou em voz baixa.

— Não — disse ela. — Por um lado, Chinny nunca quero dizer, Adam, nunca se comportou tão mal.

Ele passou seus dedos através de sua boca molhada pelo beijo e sorriu.

— Então ele é um maldito louco e nunca saberá o que perdeu.

Ela negou com a cabeça. Sentia-se mais débil e necessitada de comida.

— Vai tomar o café da manhã?

— Provavelmente não seja uma boa idéia. Seria responsável por estrangular a primeira pessoa que me felicitasse por colocar grilhões em minhas pernas, ou me perguntar como podia ter sido tão estúpido para ficar a sós com uma jovem decente.

Ela franziu os lábios. Que pena que fosse um homem que açoitava com suas palavras!

— Talvez peça uma bandeja em meu quarto e me livrarei da humilhação.

Esfregou a parte de trás de seu pescoço.

— Talvez fosse melhor se eu confrontasse todo mundo em primeiro lugar.

— E lhes dizer o que? — Perguntou-lhe com hesitação.

— Não decidi ainda. Suponho que depende do que digam de mim primeiro. Seu pai já informou a nosso anfitrião sobre nosso compromisso surpresa.

— A surpresa não parece adequada para descrever o enredo de nossas vidas, — disse com ironia.

O castelo tinha começado a despertar. Os criados iam apressadamente daqui para ali com as jarras de água para assear-se, bolas de sabonete de lavanda, e as mensagens para ser entregues nos aposentos privados. O primeiro dos eventos esportivos estava programado para a tarde. Como Jocelyn há muito tempo se resignou ao fato de que tinha sido dotada com uma figura e uma constituição mais adequada para o atletismo que para o Almacks, previa acabar a partida com ao menos um dos generosos prêmios de Lorde Fernshaw.

Não tinha esperado, compreensivelmente, perder o decente homem com quem tinha esperado casar-se para pôr em seu lugar a um libertino diabólico e resistente. Devon começou a bordejar o corredor, seu olhar se cruzou com o seu.

Evidentemente, nenhum deles desejava uma repetição da humilhação da noite anterior, embora parecesse pouco provável que alguém se escandalizasse aos descobri-los juntos agora, que já tinham sido descobertos. Eles não podiam acreditar que se encontrassem nesta situação.

— Teremos que caminhar através desta prova com dignidade, —

murmurou, retrocedendo atrás de sua porta.

Fez uma reverência. O efeito deste gesto refinado se viu infelizmente comprometido pelo brilho profano que se detectava em seus olhos quando se endireitou.

— Dignidade — disse. — Agora há um conceito novo. Terei que te dar uma oportunidade.

 

 

CAPÍTULO 06

 


Ela virtualmente se derrubou sobre a cama. Talvez ele fosse fugir.

Talvez fosse se unir à Companhia das Índias Ocidentais para escapar dela.

Jocelyn ficaria humilhada e irremediavelmente solteira; como resultado. Uma parte de sua natureza rebelde insistia que era preferível essa humilhação a um marido que não a desejasse. Um que podia fazer alarde de uma sucessão de cortesãs por toda Londres. Não havia nenhuma razão para que ela supusesse que ele estaria disposto a abandonar seu antigo modo de vida.

Entretanto, apesar do que o futuro tivesse previsto para Devon e ela, ainda ficava suportar o resto da festa. A dignidade ia ser sua estrela guia.

Resolveu manter a costa reta e conduzir-se com a maior dignidade possível. Só sorriria misteriosamente e encolheria os ombros quando alguém lhe perguntasse como se apaixonaram ela e Devon.

Supunha-se o amor que era misterioso, não? Bom, este assunto cumpria com tal condição. Era um mistério como tinham terminado juntos na torre, para não falar de como se arrumariam se tivessem que casar-se.

Entretanto, sempre podia esperar que por um milagre sua família, os Boscastle, e os convidados de Lorde Fernshaw possivelmente pudessem decidir esquecer o assunto e seguir com a festa como se nada anormal tivesse ocorrido.

Isso, entretanto, era muito pouco provável.

O capitão Matthew Thurlew se sentou em um banco da igreja do vilarejo, com a cabeça inclinada em atitude de piedosa contemplação. Sem saber o imbecil do pároco rural, seu sermão da manhã do domingo era muito apropriado, embora a declamação fosse a extremo longo e soporífero até os ossos.

— Babilônia caiu, caiu!

A boca de Thurlew fez uma careta agraciada. O idiota retumbante bem poderia ter gritado: "Boscastle caiu, caiu!" Todos os que conheciam lorde Devon

entendiam que um matrimônio de conveniência seria um golpe fatal para sua liberdade.

Olhou de esguelha a seus companheiros pecadores, só três dos quais tinham escapado do café da manhã de domingo de Alton para apaziguar qualquer sentido de quão moral pretendessem possuir. Por uma hora ou algo assim, poderiam fingir piedade antes de retornar a seus pecados. Isso o adoecia.

Não representavam a grandeza da aristocracia inglesa, mas o abuso flagrante do privilégio e do poder.

Enquanto Lorde Devon exercia suas prerrogativas senhoriais, o único irmão de Matthew adoecia em uma prisão da Cornualha à espera de um julgamento por roubo.

Era provável que o moço fosse deportado, se não enforcado.

Matthew estava convencido de que Daniel se deixou enganar por nada menos que Lorde Devon Boscastle. Quase um ano atrás, Boscastle, Daniel, e outro amigo havia, como uma brincadeira, detido uma carruagem, em cujo interior achavam que estava uma jovem cortesã que tinham conhecido mais cedo essa noite.

A carruagem tinha pertencido a um banqueiro. Um lacaio se feriu acidentalmente. Na opinião de Matthew, Devon tinha se livrado do assunto com um simples puxão de orelhas.

O nome Boscastle era uma chave que abria as portas da influência.

Mas Daniel Thurlew tinha sido incapaz de resistir á tentação. Tinha caído vítima de uma vida criminosa, enquanto seus amigos de alta linhagem continuavam seus caminhos pecaminosos.

Fechou os olhos uma vez mais em contemplação enquanto o pároco, um homem devoto, erguia a voz.

— Caiu á grande Babilônia, caiu... Porque ela fez beber todas as nações do vinho da cólera de sua fornicação...

Não houve anuncio oficial no dia seguinte dos esponsais não antecipados de Lorde Devon Boscastle e a senhorita Jocelyn Lydbury. A declaração oficial

iria acontecer mais tarde nessa noite. As especulações, é claro, multiplicaram-se.

Certa jovem disse ter sabido todo o tempo que Devon e Jocelyn tinham estado desfrutando de um tórrido romance em segredo. Em apoio a esta suspeita, um ou dois convidados idosos comentaram uma antiga intriga concernente a uma ausência no jantar de compromisso anos atrás.

Lorde Devon, ao que parecia, não estava interessado na notória Lady Cranleigh absolutamente. Sua atenção à viúva tinha sido mais provavelmente uma tela para ocultar sua verdadeira paixão.

Agora que os dois insólitos pombinhos tinham sido surpreendidos no ato pelo indignado pai de Jocelyn, seu ardor um pelo outro se revelou, para o deleite de todos na festa, da mais jovem criada até as matronas idosas.

Um escândalo ao estilo Boscastle.

Os convidados, inclusive poderiam ter se conformado com a história de um simples matrimônio por amor se não tivesse sido pelo peculiar comportamento entre os dois atores principais depois de seu encontro.

Pareciam estar-se ignorando.

Estavam pretendendo ser discretos?

Teriam brigado?

Devon estava evitando Jocelyn por respeito a ela, ou tinha um motivo mais sombrio?

— Provavelmente estão envergonhados de terem sido surpreendidos —

especulou a esposa de Lorde Fernshaw sobre seu café da manhã de torrada e arenques. — Acho que é terrivelmente romântico. Quatro anos e ainda desejando-se.

Alton balançou a cabeça.

— Não acredito que seja tão fácil envergonhar um Boscastle, ou esperar quatro anos para satisfazer seus desejos, mas esse pensamento estava implícito.

Os outros Boscastle presentes na festa se negavam a dizer uma palavra sobre o assunto. Sir Gabriel Boscastle, cuja reputação era um pouco menos imaculada, afirmava não saber nada, não era um segredo que tinha levado uma

vida dura e nem sempre tinha estado perto dos outros Boscastle, mas ainda assim se mantinha fiel à postura.

Ninguém tinha a coragem de fofocar a respeito de Devon com Emma Boscastle por temor a uma letal reprimenda. Sua protegida, Charlotte Boscastle, mal tinha deixado seu quarto quando estalou o escândalo e, portanto não podia oferecer uma opinião.

Lily Cranleigh parecia estar de um humor de cães. Lorde Chiswick parecia necessitado, e Lady Winifred Waterstone, confidente de Jocelyn, hesitava sequer em falar sobre o assunto.

Não era surpreendente que Devon tivesse seduzido a uma jovem na festa.

Mas ninguém tinha esperado que o pegassem e a pergunta do momento era se iria escapar da armadilha do casamento. A menos, claro, que tivesse entrado nela por sua conta.

A fortuna, como era de esperar, nesse dia continuava olhando com maus olhos para Jocelyn. De fato, depois de um café da manhã incômodo, durante o qual mal pôde comer, ou inclusive enfrentar o olhar de Devon através da mesa, a fortuna aparentemente decidiu que não tinha sofrido bastante humilhação.

De acordo com a tradição, Lorde Fernshaw tinha decretado que seus convidados se juntassem em casais para participar de um jogo enérgico de raquete e volante.

Por processo de eliminação só os melhores jogadores seriam considerados dignos de formar uma equipe na competição final.

Era um jogo no qual Jocelyn se destacava. Esperava levar para casa o primeiro prêmio deste ano por sua habilidade, um par de esplêndido apoio de livros de minotauro. Por desgraça, ela e Adam tinham sido escolhidos como casal. Contra Devon e Lily.

Ante seu olhar angustiado, Alton a levou à parte para lhe sussurrar:

— Escolhemos os nomes na tarde de sexta-feira, antes que você e Devon...

Bem, antes.

Sim, antes. Entendia a incapacidade de Alton para expressar exatamente o

que deveria ter vindo depois. Mas o que ela sabia era que de repente não estava em um estado de ânimo esportivo; Adam se via tão absolutamente miserável, que ela só podia esperar que não se vissem obrigados a jogar absolutamente, porque Devon tinha desaparecido imediatamente depois do café da manhã, e ninguém podia dizer onde estava.

Apareceu uns instantes mais tarde. Nem sequer teve que olhar ao redor para saber que tinha chegado. As conversas se detiveram, as cabeças se voltaram, e por tudo o que sabia os pássaros cessou seu canto feliz.

Olhares femininos observavam por debaixo de seus chapéus de palha de aba longa. Os jovens sorriram e se deram cotoveladas entre si, para celebrar a chegada do nobre pecaminoso.

É claro, quando Devon cruzou o pátio e, de fato chegou à grama, as conversas começaram como uma dúzia de fontes borbulhantes.

Ninguém se atrevia a olhá-lo diretamente, à exceção de Jocelyn, quem decidiu que não iria ajudar à causa de sua dignidade ou ignorá-lo.

Seu rosto parecia mais duro e mais profundamente sombrio do que mais cedo nesse dia, embora não pudesse dizer que parecia especialmente preocupado ou inclusive perturbado porque a vida que tinha desfrutado tinha chegado a um final inesperado.

Ou talvez não tivesse a intenção de pôr fim a sua existência prazerosa, absolutamente.

Aos competidores lhes permitiam vinte minutos de prática com seus parceiros. Como Adam virtualmente a ignorava, Jocelyn se achou golpeando com força seu volante com sua melhor amiga Winifred, quem não ocultava sua consternação pelo recente giro dos acontecimentos.

— Por que não me disse que era a Devon a quem desejava? — sussurrou enquanto tomavam suas posições.

Jocelyn bateu sua raquete no ar.

— Enganaram-me para me reunir com ele, e ele afirma que era à Lily que queria seduzir.

Winifred desceu a raquete.

— Sedu...

— Damas e cavalheiros — gritou Lorde Fernshaw de seu estrado na grama. — Por favor, reúnam-se com seus parceiros. A competição começou.

Jocelyn parou insegura ao lado de Adam, enquanto um grupo de jovens, Devon em primeiro plano, alinhava-se à borda da grama. Vestia só sua camisa arregaçada e uma calça de tecido negro. Era uma boa cabeça acima inclusive do mais alto dos convidados; seu corpo ágil se movia com uma fluida elegância que fazia parecer com seus companheiros tão torpes invertebrados como marionetes de madeira.

— Está pronta para jogar? — perguntou Adam com rigidez, negando-se sequer a olhá-la.

Olhou com pesar seu perfil, seu longo queixo.

— Estou preparada. Adam.

— Tome sua posição, Jocelyn — disse, dando um passo a seu redor.

— Este não é o lugar para um falatório corriqueiro.

Falatório.

Oh, ele a desprezava.

Nem sequer se atrevia a olhá-la. Ela partiu para frente, com o braço erguido. O que lhe importava uma competição estúpida quando sua vida estava arruinada? O que...?

Achou-se de repente parada cara a cara com seu oponente, a Sra. Lily Cranleigh. Dignidade recordou-se. Este era o momento de mostrar dignidade.

Mas logo Lily deixou cair a raquete no chão, e quando Devon foi recolhê-la, dirigiu à Jocelyn um olhar tão malicioso que a dignidade deixou de importar.

Lily pôs uma mão sobre o ombro dele quando se endireitou.

A partida começou.

E, de repente, Jocelyn não pôde controlar a força que se apoderou dela.

Abriu caminho através de toda sua refinada educação. Consumiu-a tão completamente que quase lhe fez acreditar na posse sobrenatural da alma de uma

pessoa.

Em um momento estava voando pelo pátio para manter alto o volante de cortiça e penas de ganso que Adam tinha enviado descuidadamente voando por sobre sua cabeça.

E no seguinte, Lily e ela estavam correndo uma para a outra em uma louca carreira para batear seus diferentes volantes, mais alto que a outra.

Pela extremidade do olho vislumbrou um sorriso bem malvado no rosto de Devon. Então ouviu Lily murmurar:

— Não se preocupe Devon. Sei como me encarregar de minha competição.

Demonstrarei a sua pequena flor.

Sentiu um fugaz momento de incerteza. Era uma ameaça? A viúva a via como sua competidora pelos favores sexuais de Devon?

Bom, é claro. Ela era um passarinho ingênuo por pensar o contrário.

O fato de que Devon se estava vendo obrigado a casar-se com Jocelyn, não queria dizer que de modo algum tivesse a intenção de mudar seus hábitos.

Ou a viúva de mudar os seus, como a rameira ambiciosa de homem que era.

— Eu também sei como me encarregar de minha competição — murmurou em voz baixa, os músculos de seu ombro esticando-se de antecipação.

— O que? — perguntou Lily, seu braço congelando-se.

A voz de Jocelyn soou tão ameaçadora e pouco própria de uma dama, que Lily a olhou com surpresa. Seguiu um breve instante em que Jocelyn na realidade se sentiu envergonhada de si mesma. Quase deu um passo atrás como mostra de cortesia.

Mas então um dos convidados masculinos começou a rir. E embora possivelmente não fosse Devon, pôde imaginar quão divertido deviam parecer Lily e ela a seu olho cínico, uma, a mulher que ele desejava, a outra, a que não, embora tivesse que casar-se com ela, lutando por um pedaço de cortiça com penas.

De repente não lhe importava. Toda a Inglaterra poderia estar observando,

e não lhe importava. Era uma mulher obcecada com um só objetivo. Era uma mulher cujo irmão uma vez lhe disse que podia esmagá-lo em uma corrida mais rápida que todos os exércitos de Boney juntos.

Os dois volantes viraram para cima, para o sol, a seu e o de Lily, competindo pela mesma corrente de ar, competindo por um prêmio não reconhecido nem sequer claramente definido.

— Meu. — Murmurou Lily com um braço levantado, o outro dobrado à altura do cotovelo para empurrar Jocelyn. — É meu glutona.


Jocelyn apertou os lábios, e sua visão se fez imprecisa nas bordas. A resposta de uma dama teria sido retirar-se, dar à Lily a oportunidade de golpear primeiro seu volante.

Mas não o fez. Não pôde. De fato, nem sequer podia ver bem para dizer exatamente o que estava fazendo.

— É minha cortiça. — Disse com uma voz bastante aterradora.

Lily soltou um grunhido.

— Ao diabo que é. Esse é meu volante.

— Não, não é.

— Sim, é.

Jocelyn estirou o braço para o sol. E saltou no ar para balançar sua raquete.

Seu cotovelo se chocou com os grandes e agitados seios de Lily. E sua raquete conectou, com um golpe forte e sólido, com o perfeito nariz esculpido de Lily.

Lily baixou o olhar enquanto um fino fio de sangue fluía sobre seu lábio superior. Seu grito de dor e indignação rompeu o silêncio fascinado como um raio.

— Ela me atacou! Meu Deus eu estou sangrando. Oh, Meu Deus! Há sangue por toda parte... Em todas as partes. Vou desmaiar. Vou...

— Por Deus! — gritou um jovem cavalheiro. — Vai desmaiar! Que alguém a agarre.

— Veio para mim como um meteoro — bradou ela, surpreendentemente forte para uma mulher que estava para desmaiar.

Um convidado masculino empurrou Jocelyn a um lado.

— Não se preocupe senhora Cranleigh.

— Meu nariz! Meu nariz! Estou desfigurada?

— Atrever-me-ia a dizer que o golpe lhe passará em umas poucas semanas, — consolou-a o cavalheiro.

— Semanas? — gritou ela.

As pessoas corriam por toda a quadra de esportes. Serventes com guardanapos umedecidos, homens sem compromisso que se matavam pela oportunidade de consolar à viúva aflita e ferida. Jocelyn cambaleou para trás e mal sentiu o corpo masculino que a sacudiu antes que ficasse sozinha.

— Meu Deus, Jocelyn — Murmurou Adam, tirando seu próprio lenço do bolso de seu colete. — Não tinha necessidade de golpeá-la. Entendo que esta situação a deixou muito alterada, mas, de verdade!

— Não o fiz de propósito — disse, embora ninguém lhe prestasse atenção.

Toda a atenção dos jogadores estava concentrada no nariz maltratado da senhora Cranleigh, e o alvoroço compreensível que estava fazendo pela agressão de sua oponente, imprópria de uma dama.

— Oh, por piedade — disse Lady Winifred quando a viúva se deixou cair nos braços dos dois primeiros homens a seu alcance. — Pensaria que foi golpeada por um rifle não uma raquete.

Um homem robusto, de cabelo loiro, que levava um ar de autoridade, passou por trás de Jocelyn, seu bonito rosto levando uma careta.

— Ela está exagerando sobre essa maldita raquete, sei.

— Sinto-me muito mal — sussurrou Jocelyn.

— Não tão mal como ela; suponho — disse seu irmão Jason enquanto abria caminho através do tumulto. — Por que diabo fez isso, Jocelyn? Não é nada esportivo.

Winifred lhe deu um pequeno empurrão.

— Foi só um jogo. Todo mundo sabe que pode sair machucado jogando.

O recém chegado de cabelo loiro grunhiu:

— Talvez a possamos enviar em um navio lento a Pequim. Tenho um ancorado no porto a ponto de zarpar. Uma longa viagem por mar lhe daria tempo para sarar.

— Acredito que sou eu quem deve tomar um navio para a China. —

Jocelyn retrocedeu uns passos mais. Logo outro e outro, até que se encontrou sozinha à margem da multidão.

Uma grossa gota de chuva caiu em sua testa. Por que não pôde ter chovido uma hora antes para que o miserável jogo nunca acontecesse?

Como se supunha que compensaria seu comportamento impróprio, mais que de uma amazona? Que impulso sobrenatural á havia possuído?

Moveu-se torpemente incapaz de escutar os soluços de Lily por mais tempo. Infelizmente, não pôde obter a fuga despercebida que tinha esperado.

Devon estava diretamente em seu caminho, seu olhar desviado.

Oh. Agora ele estava tão envergonhado que não podia nem olhá-la. E se dissesse algo sobre o nariz de sua amante, simplesmente seria capaz de golpeá-

lo, também.

— Por favor, me deixe passar — disse com toda a serenidade que pôde reunir.

— Espere um momento — murmurou ele, logo se inclinou para recolher algo do caminho.

— Se vai zombar de mim — disse a sua cabeça agachada — pode ao menos ter a amabilidade de não fazê-lo em minha cara. Sofri todas as humilhações que posso suportar.

— Repartiu sua parte, também. — Disse. — E não estava zombando de você. — Endireitou-se; seus olhos dançando com perverso regozijo.

— Olhe. Só vou te dar isto.

Ela olhou sua mão. Dentro da sua grande mão estava um volante com penas de ganso. Seu volante, para ser preciso, que ela tinha estado segura que Lily roubara.

O sangue desapareceu de seu rosto, e não pôde pronunciar uma palavra.

Pensar que tinha lutado em público por uma cortiça, e nem sequer era sua cortiça.

— Bom, não importa — disse ele olhando a seu redor, para assegurar-se que ninguém estivesse olhando. Depois deslizou o volante dentro de sua jaqueta de corte longo.

— Será nosso segredo. É o menos que posso fazer, tendo em conta...

— Tendo em conta? — perguntou ela com hesitação.

— Marido e mulher estão destinados a estar do mesmo lado, não? — disse com picardia na voz.

Ela engoliu em seco. Como podia proteger seu coração deste homem quando dizia coisas assim? Perguntou-se melancolicamente.

— Desejaria que alguém me tivesse detido antes que fizesse um espetáculo de mim mesma.

— Não houve tempo — disse ele, sacudindo a cabeça. — Lançou-se pela grama como uma bala — fez uma pausa. — Nunca vi nada igual. Estava muito impressionado por sua iniciativa.

Ela conteve a risada.

— Agora está zombando de mim.

— Deus não o queira. Não zombo. Nunca zombaria de uma mulher com um braço como o seu.

Ela se afastou dele. Os outros convidados se aproximavam, Lily entre eles.

— Talvez devesse consolá-la — disse torpemente.

Ele olhou ao redor.

— Parece que tem suficiente companhia no momento.

Ela assentiu com a cabeça, meio se virando para escapar.

— Realmente quero ir para meu quarto agora.

— Espere um minuto — pegou-a pelo pulso.

— Devon...

— Mostrar-lhe-ei um desvio se não quiser encontrar-se com ninguém no caminho.

Ela suspirou.

— Depois do que acabo de fazer, não quero voltar a me encontrar com ninguém...

Ele a atraiu para trás de uma alta grade coberta de hera.

— Isto não se parece com um desvio — disse ela hesitando, erguendo o olhar para ele.

Ele sorriu, murmurando:

— Não é, mas alguém vem.

Havia espaço apenas suficiente para ocultar-se, e menos lugar para alguma distancia entre eles. Ela parou olhando através da hera, Devon a suas costas, com a mão apoiada em seu ombro. Sua mão cálida e forte, lentamente a virou para enfrentá-lo. Seu sensual olhar capturou o dela, seduzindo-a com a promessa de escuros prazeres. Ela engoliu um gemido.

Então o braço dele se fechou ao redor de sua cintura e a esmagou contra seu peito e suas coxas musculosas.

Ela fechou os olhos, sem lutar contra seu abraço. Por acaso arqueou como se estivesse convidando a mais, embora a que, ela não tinha certeza.

Ao coração dele.

A sua força. A tudo o que era.

Ainda podia ouvir as vozes no caminho mais à frente da grade. Respirou, abriu os olhos vacilantes.

Ele sorriu e apertou seu abraço, negando-se a libertá-la, seus olhos brilhando tentadores.

As vozes que se aproximavam logo se apagaram. A tentação queimava. Ela se rendeu a essa tentação.

Devon abaixou a cabeça para beijá-la, e ambos, o céu e o azul pecaminoso de seus olhos eram um borrão quando ela abriu os lábios. A antecipação percorreu sua coluna.

Seu beijo a seduziu. Uma frouxidão perigosa tomou posse de seu corpo, de sua mente. Era consciente da excitação dele, a grossa coluna de músculo que

pressionava através de sua roupa como um ferro de marcar.

Deixou de respirar, a boca dele devorando a dela. Só existia este momento.

Este homem.

E logo as vozes penetraram na bruma de prazer. Dois homens estavam caminhando mais à frente da grade. Uma das vozes soava familiar.

Com um olhar pesaroso, Devon ergueu a cabeça para escutar.

— Deus, que espetáculo foi. Ela quase deixou inconsciente à senhora Cranleigh. O que fez a mulher a ela?

— Se sua cabeça não estivesse na poncheira a metade do tempo, saberia.

Jocelyn é a amante de Boscastle, e ele foi pego com ela na torre e agora tem que casar-se com ela.

— Surpreendeu-o o pai dela?

— Sir Gideon mesmo. E tudo o que posso dizer é que Jocelyn deve ter herdado sua nervura violenta. Meu tio me disse que ele costumava golpear...

As vozes se desvaneceram. Jocelyn se afastou de Devon, sentindo-se doente por dentro. Ela poderia ter corrigido esse cavalheiro, ao menos em um ponto. Realmente havia muito mais que se poderia dizer a respeito de seu pai, mas esperava que nunca se dissesse em sua presença, ou que Devon o ouvisse.

Ela se moveu lentamente rodeando-o.

Ele se voltou rapidamente, olhando-a preocupado.

— Jocelyn...

— Está bem.

— Maldição, o que acontece com o desvio? — disse atrás dela.

Ela se limitou a sacudir a cabeça e se voltou às cegas para a fila de altos ciprestes que conduzia ao castelo. Alegrou-se de que ele não piorasse tudo, tratando de segui-la.

Viu-a ir-se com a dignidade de uma princesa real, uma princesa rodeada por um tribunal de sujeitos vergonhosos. Esteve totalmente preparado para ignorar ou defendê-la contra as observações ferventes que tinham ouvido. Mas Jocelyn não lhe tinha dado a oportunidade de reagir de uma ou outra maneira.

E agora que pensava nisso, não tinha certeza do que lhe tinha causado tão evidente angustia: os rumores a respeito de Lily e ele ou a referência a seu pai.

Não lhe tinha dado muitos indícios.

Entretanto, tinha visto a humilhação em seu rosto antes que tivesse fugido, e o Boscastle nele quis sair em sua defesa. Mas podia defendê-la contra as feridas do passado? A verdade era que ele mesmo havia se sentido doente ao escutar que a estavam degradando. E ele era pelo menos em parte culpado.

Ouviu Lily subir pelo caminho, sua risada suave indicando que não tinha sido ferida mortalmente depois de tudo. Como cavalheiro, sem dúvida, deveria sair de seu esconderijo e perguntar por sua lesão.

Mas não se moveu. Não podia, quando ainda podia ver a magra figura de Jocelyn ziguezagueando entre as árvores. Queria correr atrás dela. Teria feito isso se soubesse o que dizer para consolá-la. Só sabia que odiava vê-la tão angustiada.

Um pouco depois nessa mesma tarde, entretanto, em um combate de boxe improvisado que se iniciou no jardim ornamental, ele "acidentalmente"

nocauteou contra uma sebe os dois homens que estiveram discutindo sobre Jocelyn no caminho. Continuando, desfez-se em desculpas pelo par de olhos negros que os dois aturdidos cavalheiros levariam de noite.

É claro, só um idiota teria acreditado que foi um acidente. Mas ninguém se atreveu a dizer uma palavra, à exceção de seu irmão mais velho, Grayson Boscastle, quinto marquês de Sedgecroft, que tinha assumido a responsabilidade como chefe da família, de guiar seus irmãos longe dos pecados que uma vez ele tinha cometido. Neste caso, entretanto, Grayson parecia aprovar a explosão pugilistica de Devon.

— Muito bem — disse Grayson. — Um homem deve defender à mulher com quem tem intenção de casar-se.

A mulher com quem tem a intenção de casar-se. Só a idéia deu a Devon uma dor aguda direta entre as têmporas. Assim saiu do jardim sem olhar atrás, a jaqueta no ombro.

— Posso assumir por seu mórbido silêncio que o que Emma me disse é verdade? — perguntou Grayson, seguindo-o de perto. — Foi pego em uma posição comprometedora com a filha de Sir Gideon, e aceitou se casar com ela?

Devon andou mais devagar em quando chegaram ao pátio interior do castelo.

— É verdade — disse distraidamente.

Grayson exalou através de seus dentes.

— Bom, tenho que admitir que isto seja uma comoção... E que a dama sem dúvida sabe como apontar sua raquete.

Devon sorriu a contra gosto.

— Ela não esperava apontar o nariz de sua oponente.

— Como aconteceu? — perguntou Grayson em voz baixa. — Como em nome de Deus se deixou apanhar?

Ele sacudiu a cabeça.

— Não sei. Fizeram-me acreditar que iria me reunir com outra mulher.

— Essa não seria a mesma, cujo nariz agora está torcido como uma salsicha?

— Tudo o que posso dizer é que Jocelyn e eu fomos enganados aparentemente para que nos encontrássemos.

— Tem alguma idéia de quem pôde ser?

— A princípio pensei que poderia ter sido Gabriel.

Grayson franziu o cenho.

— Uma conjetura razoável, tendo em conta que esteve em competição com Drake durante anos. Entretanto, enquanto Gabriel viveu uma vida dura e desfrutou de suas pequenas torturas, continua sendo um de nós.

— Já sei. — Disse Devon.

— Se estivéssemos tratando com qualquer outro papai indignado que Sir Gideon — disse Grayson — sugeriria um suborno...

Devon ergueu a mão.

— Não fui à torre sem a compreensão inerente de que um encontro,

inclusive um planejado, implica certo risco.

— É o elemento do risco que torna o encontro irresistível — concordou Grayson.

— O problema com esta linha de raciocínio, por desgraça, é que assumi que todos os riscos incorridos seriam fáceis de corrigir. Não sabia que me iria encontrar com Jocelyn.

— Sinto muito, Devon — disse Grayson. — Ao menos ela tem certo encanto.

— Sim — admitiu. — Teria sido agradável, entretanto, se nos tivéssemos conhecido um pouco melhor antes de caminhar para o altar.

Levantou os olhos para a torre leste do castelo, pensando como parecia elegante e benigna com a luz do dia.

— Depois de ter sido tão idiota para cair em uma armadilha — disse em voz baixa — não tenho mais remédio que aceitar a responsabilidade, embora só seja na aparência. Todo mundo assume que vou sair fugindo, mas estou absolutamente disposto a lhe dar meu nome.

— E nada mais? — perguntou Grayson depois de uma pausa reflexiva.

— Não sei o que tenho para dar — disse Devon com um sorriso de auto desprezo. — Ela provavelmente não vai conseguir a melhor parte do trato. E

suponho que, bem, um homem pode ocupar-se de seus romances privados depois de seu casamento, não é verdade?

— Muitos homens o fazem — disse Grayson, assentindo com a cabeça.

— Não se sentiu tentado a ser infiel? — perguntou Devon.

Grayson sorriu.

— Nunca entrou em minha mente nenhuma só vez. Sinto-me mais que satisfeito com Jane, em nossa cama e em sua companhia.

— Talvez isso se deva a tê-la escolhido.

— Sim, talvez, embora deva recordar que nosso noivado foi algo pouco tranqüilo.

Devon continuou caminhando pelo pátio. Não tinha que amar Jocelyn ou

lhe fazer nenhuma promessa em privado que não tivesse a intenção de cumprir.

Não tinha que mudar seus hábitos para adaptar-se a seu acerto. Poderiam chegar a um compromisso.

A honra estaria satisfeita ao menos.

Menos de duas horas mais tarde, o irmão de Jocelyn encontrou Devon na biblioteca com um grupo de outros convidados varões e em voz baixa lhe informou que tinha recebido uma mensagem de Sir Gideon; insistindo em que o casamento se realizasse dentro de uma semana a fim de desalentar a especulação.

Devon encolheu os ombros. Depois de haver se resignado ao inevitável, a hora e o lugar não pareciam importar.

— Ele preferiria — acrescentou Jason — que a cerimônia tivesse lugar na capela de Lorde Sedgecroft em Londres pelo bem da privacidade.

— Se Lorde Sedgecroft estiver de acordo, é claro.

Grayson olhou para seu irmão.

— Isso é adequado para mim, Devon. Você se aborrece?

Devon sorriu com ironia.

— Não — e por estranho que parecia, era verdade.

 

 

CAPÍTULO 07

 


O pai de Jocelyn também tinha solicitado que o compromisso se anunciasse mais tarde nessa noite na festa diante das testemunhas. Apesar de não se apresentar, tinha pedido a seu filho Jason que se fizesse seu representante. Era evidente que pensava que um compromisso público uniria Devon com sua filha.

E também pareceria uma promessa vazia.

Parecia pouco provável, de fato, que Devon se limitasse a visitar o salão somente para prazer de Sir Gideon, especialmente tendo em conta o fato de que seus amigos estavam em cima fazendo apostas sobre quantas horas duraria antes de escapar. Tinha estado ausente no jantar, deixando Jocelyn com desculpas que ninguém acreditou.

— Talvez só necessitasse tempo para acostumar-se à idéia — disse Winifred em um sussurro consolador enquanto as duas mulheres caminhavam pelo corredor de caracol ao salão.

— Talvez necessitasse mais tempo para recolher sua roupa — disse Jocelyn com um sorriso reluzente.

Pegou a saia de seu vestido rosa pálido e ouro e ficou diante da pequena multidão que estava em pé nas portas do salão. A luz resplandecente do castiçal do interior jogava uma luz de brilho em seu espectador rosto. Soube imediatamente que Devon não se achava entre o grupo de hóspedes. Talvez não aparecesse em seu anúncio de compromisso matrimonial. Talvez o passado se repetisse.

Ela em pé como um soldado de madeira enquanto seus amigos brindavam por seu compromisso com um homem que a tinha arruinado e estava pensando seus sentimentos a respeito de casar-se com ela, diante de todos.

Seu irmão balançou a cabeça em uma aparente confluência de simpatia e ressentimento. Não disse nada, porque realmente não havia muito que dizer. A

ausência de Devon era dolorosamente eloqüente.

Adam a olhou com um ardente silêncio, exceto por um forte suspiro ocasional que brincou com os já tensos nervos de Jocelyn. Não importava o mal que se sentisse, era consciente de que ele não tinha mencionado nada sobre oferecer sua mão. Era melhor. Ele nunca confiaria de novo nela depois do que tinha feito. Nem sequer ela estava segura de poder confiar em si mesma.

Lily não se apresentou, tampouco, mas então a futura noiva virtualmente a tinha atacado com uma raquete e a viúva a tinham levado até sua cama com uma compressa fria. Apesar do nariz inflamado, a falta de entusiasmo da Senhora Cranleigh por este anúncio se entendia, embora os assistentes da festa tivessem a esperança de presenciar outro conflito entre as duas mulheres em competição pelo coração de Devon.

Depois de quase passado duas horas, os convidados estavam notavelmente inquietos. Quão decepcionante seria que o drama que todo mundo tinha antecipado não acontecesse?

Apaixonara-se Lorde Devon por Jocelyn? Tinha começado a amá-la?

Seu fracasso para compartilhar esse momento com ela como lhe sugeriu, não aconteceu.

Grayson foi ao quarto de Devon meia dúzia de vezes para buscá-lo, só para retornar com um breve sorriso e uma triste brincadeira que podia ser outra das brincadeiras que conhecia seu irmão para fazer.

Gabriel se ofereceu para procurar seu desaparecido primo pelos jardins.

Emma em silêncio, assegurou a Jocelyn que Devon cumpriria com seu dever, mas a pontualidade nunca foi um de seus pontos fortes.

— Qual é o ponto forte de Devon? — Grayson ouviu Gabriel perguntar a Emma sobre sua taça de vinho.

Ela sorriu, mas seu preocupado olhar vagou até a entrada.

— Seu atrativo.

— Então eu gostaria de ver como seu atrativo o tira deste embrulho —

murmurou Gabriel.

Grayson lançou um olhar furtivo por todo o salão. Um embrulho, certamente. Jocelyn desabou na cadeira com uma expressão petrificada em seu rosto bonito quando disse que lhe importava nada se seu irmão se apaixonasse por ela ou tinha caído da face da terra. Aparentemente se endireitou de repente, havia recordado como Devon tinha reagido às crises passadas. Teria ficado assim quando sua mãe e seu irmão menor morreram? Teria subido em seu cavalo para viajar durante horas e horas?

Um jovem sendo selvagem consigo mesmo, Grayson não tinha prestado especial atenção aos problemas de seus irmãos quando eram crianças. Agora, como o patriarca da família, achava-se a si mesmo tendo que oferecer orientação quando só tinha começado a entender o significado de sua própria existência. A mera existência de sua esposa e filho.

— Perdoem-me outra vez — murmurou à assembléia em geral. — Voltarei com meu irmão ou não voltarei jamais.

Três minutos mais tarde estava caminhando através da propriedade familiar pelo prado e estábulo. Seu irmão vinha rapidamente na nebulosa luz da lua brumosa enquanto Grayson esperava, tentando não perder o controle.

Compreendia a paixão de Devon pelos cavalos, mas não entendia seu comportamento taciturno.

— Onde diabo esteve? — Exigiu quando Devon finalmente puxou as rédeas de lado, com seu rosto anguloso indiferente. — Seu compromisso se anunciou faz umas horas.

— Não se desculpou por mim? — perguntou Devon, desmontando.

Grayson cruzou os braços sobre seu peito. Devon se erguia ainda mais alto que ele, e de repente Grayson se perguntava se alguém sabia bem o que faria o jovem diabo escuro, ou o que ele mesmo faria no lugar de Devon.

— Todo mundo está no salão esperando por você. Não sabia como explicar...

Devon tirou uma de suas luvas negras de montar.

— Fui procurar um presente de compromisso.

Grayson levantou as mãos.

— Terá que ser uma maravilha de presente para que ela o perdoe por isso.

Devon mostrou seu sorriso.

— Assim é. Pelo menos nisso acredito.

Grayson reduziu seu olhar.

— Jóias?

— É de se esperar menos de um Boscastle?

Seus olhos azuis dançavam, Devon indicou uma bolsa volumosa de veludo azul em seu bolso da jaqueta.

— Você e Drake são os que me ensinaram o poder de uma quinquilharia no coração feminino.

— De que tipo de quinquilharias estamos falando?

Devon começou a rir.

— Uma tiara de diamantes.

— Alguém está brincando. Onde em Essex se encontra uma tiara de diamantes?

— Dentro da mansão de uma de nossas adoradas tias.

— Cavalgou todo o caminho para a casa da arrogante tia Catherine para pedir sua tiara?

— Fiz isso.

— A tiara que jurou levar a seu próprio funeral?

— Bom, não disse que foi fácil.

Grayson sacudiu a cabeça com admiração.

— É o único demônio que conheço que poderia convencer à velha de deixar a tocha de guerra e desprender-se de seus diamantes. O que o possuiu para pensar nisso, em primeiro lugar?

Devon desviou o olhar. Não podia mentir a seu irmão, mas não podia confessar a verdade, tampouco. Só entendia que Jocelyn foi ferida no dia de hoje e seu instinto lhe havia dito bom, não estava certo de que seu instinto lhe houvesse dito que saísse de caça atrás de uma tiara no meio de um nada, mas

isso era o que tinha feito. E se sentiu satisfeito de si mesmo por ter tido êxito.

— Chloe sempre costumava dizer que cada moça deveria ter uma tiara de diamantes. — Disse como se isso fosse suficiente como explicação.

Grayson desceu o olhar.

— A tia Catherine casualmente não terá outra tiara à mão, não é verdade?

Devon hesitou.

— Por quê?

— Para Chloe — disse Grayson em voz baixa.

Devon engoliu em seco. Chloe era sua vivaz irmã de cabelo negro que se casou com Dominic Breackland, visconde Stratfield, no verão anterior. Ela e Devon tinham sido sempre bons amigos, embora ele não a tivesse visto recentemente.

— Não é seu aniversário — disse franzindo o cenho. — Por que quer lhe dar um presente?

— Parece que perdeu o filho que levava. Vim à festa, na realidade, para lhe dizer isso, mas parece que já tinha suficientes problemas por sua própria conta.

— Está bem? — perguntou com preocupação.

— Acredito que sim, embora não está no melhor de seus momentos.

Devon balançou a cabeça.

— Não tinha idéia de que estava esperando um filho.

— Eu tampouco — replicou Grayson, claramente aflito tanto como Devon se sentia pela notícia.

— Ela está com Jane agora na casa de campo. Supunha-se que íamos retornar todos juntos a Londres. Se você e Jocelyn terminam casando-se em minha casa, pode ser que Chloe deixe de pensar em seus próprios problemas.

— Não tenho certeza de que o matrimônio faça com que meus problemas desapareçam — disse Devon sem pensar.

Grayson sorriu quando um moço se aproximou deles para tomar o cavalo.

— Depois de ver o dano que sua futura esposa pode infligir com uma raquete, não estou disposto a me opor.

Um ou dois dos convidados idosos já se retiraram para passar a noite.

Inclusive Lorde Fernshaw pareceu aceitar que Devon não tinha um aspecto superficial, com muito tato fez a sugestão de transladar a festa ao Conservatório para um relaxante recital musical a suave luz da lua. Talvez, disse a sua esposa, um concerto de violino facilitaria a decepção dessa noite.

Jocelyn se levantou de sua cadeira de espaldar alto. Não podia tolerar nem um minuto mais este absurdo e mortificante momento.

— É passada meia noite.

Era muito consciente de que vários dos convidados mais considerados tinham estado esperando até que ela reconhecesse a derrota.

Lady Cordelia Fernshaw, a jovem esposa de Lorde Alton, puxou-a pela mão.

— Bom. Estou esfomeada. Deveríamos ter uma recopilação de meia noite no conservatório. Lorde Alton está organizando tudo para mostrar suas habilidades com o violino. Aconselho a todos a trazer um pouco de lã de cordeiro e ouro, mas não revelem a meu marido que fui eu quem o sugeriu.

Jocelyn lhe sorriu com irônica gratidão. Não era nenhum segredo que a recopilação de meia noite teria sido a celebração de seu compromisso com Devon.

— Estou faminta. — Disse.

Surpreendentemente, era verdade. Havia uma estranha liberdade que encontrava sendo rejeitada em frente a amigos. Tinha sobrevivido.

Como se fosse o momento justo Lorde Alton e Gabriel Boscastle deram um passo adiante para lhe oferecer seus braços. Jocelyn teria rido de sua galanteria se não tivesse desejado simplesmente fazer uma saída tranqüila. Adam tinha se afastado dela em um aparente esforço por distanciar-se de sua contínua desgraça. Seu irmão estava com o olhar imponente em seu rosto.

De muita má vontade se achou caminhando com a mão no braço de Gabriel Boscastle. O homem era um escândalo para si mesmo. Entretanto, os mendigos supunham-se, não podiam escolher.

— Mantenha sua cabeça erguida, mesmo se deseja estar morta — disse

com voz profunda.

Ela começou a rir.

— Acho que meu coração continua pulsando. Não desejo estar morta, mas seu primo...

Desceu o olhar para ela. Ela viu uma grande semelhança com Devon em seu rosto, mas o seu era mais duro, com o semblante mais preocupado.

— Conheço maneiras de avivar o espírito de uma senhora que teve uma grande queda.

Ela parou, erguendo sua testa ante esta observação.

— Talvez devesse caminhar sozinha, depois de tudo — murmurou.

— Relaxe, Jocelyn. Só queria lhe recordar que há outras opções disponíveis se meu primo não cumprir com sua obrigação.

Estudou seu duro rosto. Estava além de um rosto marcado.

— Supõe que posso ser...

— Minha amante? — sorriu para ela com encanto desenvolto. — Está interessada?

— Estou muito aturdida para responder a essa pergunta — respondeu ela, tentada a rir de sua audácia. — Não posso acreditar que sugeriu tal acordo quando estou envolvida com seu próprio primo.

Começou a rir.

— Talvez o fato de Devon ser meu primo tenha algo que ver com minha sugestão.

— Quer me usar como uma arma?

— Uma arma? Não. É um prêmio a ganhar, não uma arma. — Fez uma pausa. — De fato, parece-me que eu não gosto de meus primos.

Ela levantou os olhos de repente. Um profundo silêncio tinha caído sobre o salão.

Jocelyn estremeceu antes de se voltar e encontrar com a causa.

— Caminharei por mim mesma, Sir Gabriel — disse ela com supremo cuidado.

— Não, não o fará — disse uma voz de barítono atrás dela. — Obrigado por manter um olho sobre ela, Gabriel. Que bom saber que posso contar com sua decência em minha ausência!

Seu pulso se acelerou enquanto se voltava para olhar para cima ao escuro e melancólico rosto de Devon. Apesar de sua oferta, percebeu que ele não a olhava absolutamente, ele e Gabriel pareciam estar envolvidos em um silencioso choque de vontades que enviou um calafrio a seus braços.

Parecia claro que sua rivalidade não estava no mero fato de Gabriel ter sido encontrado junto a ela, embora ela não estivesse de tudo certa de onde tinha surgido esta discórdia. Tinha algo a ver com Lily Cranleigh? Winifred lhe tinha informado sobre a aposta entre os dois homens.

Sentia-se um pouco como uma princesa presa entre os enfrentados fogos de dois grandes dragões. Mas então Gabriel encolheu os ombros e se afastou divertido com uma suave risada. A escura tensão diminuiu do rosto de Devon.

Os impulsos perigosos que carregaram o ar de repente se dispersaram. O que esperava Devon quando tinha tudo e a abandonou, de todo modo?

— Tenho uma desculpa — disse com uma breve olhada a seu irmão.

— Tanto se for suficientemente boa ou não para merecer o perdão, será Jocelyn quem dirá.

Ela o enviesou com um cínico olhar quando ele levantou a mão para sustentar ante ela uma bolsa de veludo azul. Os convidados da festa se fecharam em um círculo ao redor deles, a curiosidade afligia a cortesia de lhe permitir obter uma reunião privada. Tinha muita curiosidade.

— O que é? — perguntou, mordendo o interior de sua bochecha.

A voz de Devon era intencionalmente indiferente.

— Uma quinquilharia para pedir seu perdão.

— Uma o que? — perguntou.

Pela extremidade do olho percebeu que seu irmão Grayson estava em pé na porta. Ergueu as sobrancelhas para Devon.

— Não seja modesto Devon. Isso é algo mais que uma simples

quinquilharia.

— Vou ver para decidir por mim mesma — disse secamente Jocelyn.

Devon sorriu.

— Claro. Estenda suas mãos.

Ela franziu os lábios, nervosa, depois obedeceu. Esvaziou o conteúdo da bolsa nas enluvadas palmas de suas mãos. Houve um coletivo suspiro de assombro dos convidados que os rodeavam.

Jocelyn olhou para Devon, não em um estado de ânimo para ser impressionada. Por que iria pensar que uma mulher como ela se compraria com adornos? Perguntou-se. Nunca esteve muito impressionada com miçangas no passado. Por que iria começar agora?

Com essa pergunta foi olhar para sua mão para descobrir a tentação do diabo brilhando em forma de uma tiara de diamantes mais deliciosa que tinha tido a alegria de contemplar. Suas pedras delicadas irradiavam o fogo de todas as facetas postas sobre uma banda de ouro belamente lavrado. Na verdade, seu presente a fazia sentir-se como uma princesa. Uma desgraçada, mas não obstante, princesa.

— Como sabe que sempre quis ter minha própria tiara? — perguntou antes que pudesse deter-se.

Encolheu os ombros. Ela levantou os olhos e de repente notou as minúsculas gotas de suor que brilhavam em seu cabelo. Seu olhar desceu.

Havia uma mancha de barro na parte superior esquerda de sua bota.

Como demônio tinha feito para comprar uma tiara desta qualidade no entorpecido povoado de Essex? É certo que os Boscastle exerciam tanto poder e encanto persuasivo que a pessoa não podia resistir, mas...

Nenhum homem que conhecia tinha lutado alguma vez mais de um duelo por Jocelyn, ou a presenteado com tais extravagâncias. Ninguém a distinguira antes ou lhe prestou tanta atenção. Não estava muito segura de como reagir, ou o que Devon esperava que dissesse.

Olhou-o diretamente nos olhos. Seu inquebrável olhar aumentou seu ritmo

cardíaco e por um ofegante momento pensou que poderia ver algo em seu interior que nem ela mesma podia perceber. Convenceu-se de que não se apresentaria esta noite. Certamente não esperava um presente como este.

— Como encontrou isto em tão pouco tempo?

— É de seu gosto? — perguntou como se sua existência dependesse de sua resposta.

Malandro engenhoso. Estampava petulância para a posteridade se lhe negasse seu reconhecimento. E, com efeito, o fato, sem importar os motivos que o tinha inspirado, motivou sua gratidão. Para falar a verdade, estava aflita.

— É o mais belo que jamais tive.

Ele estalou em um sorriso a sua resposta. Poderia ter jurado que escutou seu irmão Grayson suspirar de alívio. E embora só fosse por esta noite queria acreditar que seu matrimônio não era mais que o resultado final de um baile de máscaras, mas algo mais.

 

 

CAPÍTULO 08

 


Devon se manteve a seu lado, enquanto seu irmão anunciava o compromisso matrimonial de sua irmã com um dos nobres mais cobiçados de Londres. As esperançosas debutantes presentes sussurraram que seus corações se romperam pela perda de seu cafajeste de olhos azuis. Os variados grupos de amigos de Devon pareceram pouco entusiasmados com o anúncio oficial. Ele ignorou ambos os bandos e se concentrou em prestar atenção em Jocelyn. Era um dever mais fácil do que tinha esperado.

Sem dúvida, não o feria a sua causa que tivesse respondido a ele com tanta paixão, quando tinham se reunido na torre. Recordar o suave prazer de seu corpo enviou um agudo desejo, apunhalando suas costas. E queria mais. O sorriso, que curvava sua própria boca finamente moldado enquanto as felicitações estalavam ao redor dele, brotava com mais facilidade do que tinha esperado.

Voltou-se para pôr seu braço ao redor de sua cintura.

— Talvez devesse me dar um beijo para celebrar nosso compromisso.

— Não diante de todos — disse ela com voz fraca.

Mas a beijou de todo modo. Sua mão cálida e dura deslizou desde seu ombro até sua nuca, e seus dedos apertaram ali quando inclinou sua boca sobre a dela e a beijou como se não houvesse outra pessoa no mundo.

Tinha a intenção de que fosse só um abraço simbólico, nada mais.

Mas então sentiu a mão dela pressionada contra seu peito. Ouviu o suspiro profundo que lhe escapou, e uma dor desconhecida se apoderou de seu coração.

— Já está — se retirou sem prévio aviso, sua mão lhe acariciando as costas.

Ela levantou o olhar escuro para o seu. Algo feroz se agitou em seu interior. Um desejo desenfreado, o dever de proteger, aquilo entendia. O que o confundia era a emoção indefinível que sentia quando estava com ela.

Ele deslizou a mão de lado.

Ela sorriu, mas não se moveu, murmurando:

— Suponho que pensa que acaba de demonstrar algo com esta cena.

E o tinha feito.

Ela não podia enganar, apesar de que aplaudia em silêncio sua habilidade para dissimular. Ele reconhecia quando despertava o desejo em uma mulher.

Sentiu o calor sexual que se acendeu entre eles. Seu sangue quente antecipando o que outros fogos poderiam despertar em seu corpo exuberante.

— Foi um beijo para selar nosso compromisso — disse, exalando com satisfação. — Ninguém sequer se surpreendeu.

— Como diz — replicou ela, avançando diante dele para as portas do salão para o jantar de celebração.

Devon a seguiu com um sorriso relutante, parando na porta para lançar um olhar a seu irmão.

— Redime a sua satisfação?

Grayson olhou à figura de Jocelyn afastando-se.

— Não é minha satisfação que precisa ser redimida, embora me parecesse que ela já...

Devon olhou em direção ao grito suave que emitiu Lady Winifred.

Estava parada atrás de Jocelyn no extremo do corredor iluminado por luz das velas, fora do salão.

A princípio não viu a razão pela qual as duas mulheres pareciam estar congeladas em seus caminhos.

Então olhou pelo corredor na direção do olhar de Jocelyn, e o que viu fez com que seu sangue gelasse subitamente. Apoiada entre duas urnas de pedras enormes erguia-se um ataúde de mogno, no qual jazia o famoso dominó de veludo negro de Devon e debaixo dele uma coroa de plantas mortas e flores secas. Um velho crânio servia de cabeça.

Na base do ataúde estava uma áspera tabuleta em forma de uma lápide que dizia:

Lorde Devon Boscastle

Melhor Morto que Casado

Dirigiu-se ao lado de Jocelyn, sua mandíbula apertada com fúria incontrolável. Captou um brilho de dor em seu olhar, que ocultou rapidamente antes que ela soltasse uma calada risada artificial.

— Não tenho nada a ver com isto — disse ele, virando-a na direção oposta.

— Mas é verdade, não? — perguntou suavemente.

Ele permitiu que sua irmã Emma passasse a seu lado para segurar o braço de Jocelyn.

— É só uma brincadeira tola — disse Emma com voz cortante. — Não deixe que a incomode.

Jocelyn assentiu lentamente.

— É claro que não.

Ele apertou o maxilar.

— Não acho absolutamente divertida.

Jocelyn sorriu fracamente, sacudindo a cabeça à pequena multidão que se congregou para presenciar sua reação ante este insulto sem precedentes.

— Só quero saber onde está o ataúde da noiva, e se pudesse, por favor, selecionar o vestido de minha morte. Não tenho nenhum dominó.

O escuro olhar de Devon percorreu os rostos de quem os rodeava.

— Se chegar a saber quem fez isto, prometo que o ataúde terá seu uso.

Tocou-lhe o braço.

— Vamos jantar Devon. Não se fez nenhum dano real, e ninguém vai confessar a você, ameaçando cometer um assassinato.

Ficou quieto sua ira aumentando enquanto ela passava diante do horrível ataúde, Emma e Winifred como anjos da guarda a seu lado. Sabia que ela só estava tentando ser razoável, e se alguém queria fazer uma brincadeira a ele, podia agüentar. As brincadeiras eram parte de uma festa, mas isso não significava que ela merecesse ser objeto do malicioso senso de humor de

alguém.

— Maldição, tenho que saber quem fez isto — disse, virando para olhar os convidados restantes que não tinham sido capazes de afastar-se da sombria surpresa.

Os criados de Lorde Fernshaw tiraram as damas amável e rapidamente por uma porta lateral.

Seu olhar se estreitou no rosto escuro e sério de seu primo.

— Não fui eu — disse Gabriel rapidamente. — Confie em mim, tenho melhores maneiras de passar o tempo.

Devon sacudiu a cabeça.

— Assim percebi no salão.

— Não era consciente de que fosse tão possessivo — disse Gabriel com cuidado. — Só estava ocupando seu lugar.

A boca de Devon se afinou. Era perfeitamente consciente de que Gabriel não era capaz de este tipo de crueldade, mas que o condenassem se sabia quem era.

— Cavalheiros — disse Grayson, pondo uma mão firme sobre o ombro de cada homem. — Não demos à sociedade nenhuma outra razão para falar. Se tiver tanta energia que gastar, conserve-a para o torneio de Alton. Ou melhor, ainda, unam-se à Jocelyn no jantar.

Gabriel olhou para Devon e assentiu com a cabeça.

— Amigos, primo?

Devon assentiu com a cabeça a modo de desculpa.

— Ajude-me a tirar esse maldito ataúde antes que alguém mais tropece nele.

Gabriel assentiu com a cabeça.

— Posso fazer algo melhor. Por que não fazer uma visita à funerária do povoado e perguntar se venderam algum ataúde ultimamente?

Jocelyn se surpreendeu pela atenção que lhe prestaram na mesa do jantar.

Patifes e homens sem compromisso que nunca se atreveram antes a aproximar-se

de uma jovem de seu caráter inoxidável, faziam-lhe a corte.

Brindes aduladores se fizeram em sua honra. Em um dado momento, ela inclusive deu por si mesma e o ataúde vazio, terminando seu elogio a Devon com a promessa de que ela "ressuscitaria em sua noite de bodas".

Adam sacudiu a cabeça ante sua pouca característica demonstração de humor, encurvando-se em sua cadeira. Era claro que sua opinião sobre ela estava caindo rapidamente.

Seu irmão sorriu sem compreender. Um par de convidados mais amáveis sussurraram que a visão do ataúde tinha sido muito para a senhorita Lydbury suportar. Estava-o desmoronando pela pressão.

— Acho que bebeu mais que sua habitual dose de clarete — lhe sussurrou Winifred ao ouvido com o pretexto de deixar cair o garfo.

Jocelyn se inclinou debaixo da mesa para lhe sussurrar também:

— Por quê? Não sobrou para você?

— Uma de nós deve continuar sóbria, não lhe parece? — Sussurrou Winifred em um tom de recriminação.

Jocelyn assentiu.

— Boa idéia. Eu me ocuparei de beber, e você, querida Winifred, se ocupará de pensar.

— Ele lhe deu uma tiara de diamantes, Jocelyn.

Ela ergueu uma mão para estabilizar o anel dourado que ameaçava deslizar sobre um olho.

— É formoso, não? Ele é formoso, também. Mas alguém pensa que ao casar-se comigo sua vida terminará.

Lady Winifred franziu o cenho enquanto um desenfreado coro de risadas estalou ao redor da mesa.

— Nunca pensei ver o dia em que se sentiria atraída por... Por...

— Está se tornando uma velha dissimulada — disse Jocelyn, erguendo a cabeça.

— Partiu o coração de Adam — disse Winifred alterada.

— O que estava procurando a senhorita Lydbury debaixo da mesa? —

gritou de sua cadeira, a voz alegre de um de seus novos admiradores.

Winifred dirigiu a Jocelyn um olhar irônico.

— Sua dignidade. Parece ter desaparecido.

O jovem riu mais forte.

— Bom, nesse caso, percamos a dignidade. É um maldito aborrecimento, de todos os modos — se levantou da mesa para aproximar-se da cadeira de Jocelyn. — Ou deveríamos procurá-la juntos?

Ela riu se estivesse em seu estado com seus cinco sentidos, teria percebido antes o silêncio fascinante que caiu sobre a mesa. Uma mão inquietantemente familiar cobriu a dela e firmemente lhe tirou a taça que segurava. Devon tinha retornado de seu triste dever de tirar o ataúde do castelo.

— Não me diga que esteve brindando por nosso compromisso sem mim, querida — disse, apoiando o queixo contra sua nuca. — Pensei que me tinha perdoado por ter chegado tarde.

Ela inclinou a cabeça para olhá-lo. Não parecia justo que três taças de clarete não a tivessem deixado menos imune a sua presença. Seu coração ainda se acelerava quando seu olhar a percorria. Essa terrível tensão na garganta ainda tornava difícil respirar. E ainda recordava com muita clareza a marca a sua boca pecadora sobre seus seios nus. A idéia das liberdades que lhe tinha permitido fazia com que o sangue cobrisse seu rosto.

— Imagino — murmurou. — Olhe quem voltou de entre os mortos.

Seu sorriso manteve uma aresta dura que a fez retorcer-se em seu assento.

— Alguém vai desejar a morte, prometo-lhe.

— Só se tratava de uma brincadeira, não? — perguntou lentamente.

Ele a olhou nos olhos.

— Achou graça?

— Em um sentido macabro — admitiu. — Seria mais divertido se não me sentisse pessoalmente responsável por colocá-lo nessa tumba.

Ele afastou com uma cotovelada o baronet de ávidos olhos, que estava

sentado a seu lado esquerdo e moveu seu corpo à cadeira vazia.

— Vejo-me morto para você? — perguntou em voz baixa, sua fronte arqueada.

Ela suspirou.

— Não, Devon. Nada.

Segurou seu pulso e a arrastou da cadeira.

— Não dançamos juntos ainda.

— Por favor, não esta noite.

Lançou lhe um apreciativo olhar enquanto a conduzia à pista de baile.

— Sim, esta noite. Demonstrará a todos que não lhe importa o que pensam de você.

Ela se surpreendeu ao ver que era capaz de mover-se através das figuras do cenário. Surpresa por suas tranqüilas palavras lhe infundir coragem.

Quanta vez dançou e paquerou jovens com a esperança de uma proposta?

De amor? Este homem não a amava absolutamente, e não tinha certeza do que sentia por ele. O único alívio era que parecia fácil confiar nele, uma surpresa tendo em conta o engano que os tinha unido. Desejo e confiança. Era suficiente para construir um matrimônio?

Percebeu de repente que ele estava olhando-a, estudando seu rosto como se fosse a primeira vez que se encontrassem. Ele tampouco sorria, e a escura faísca de sensualidade em seus olhos enviava pequenas descargas através de seu corpo.

Que bonito era. Esses perversos olhos azuis, seus ossos cinzelados, seu queixo forte, fendido. A beleza de um arcanjo. Que fácil seria apaixonar-se perdidamente por ele.

— Sinto o que acaba de acontecer — disse sua mão no ombro, insistindo em aproximá-la.

Parecia injusto que seu contato pudesse fazer com que tudo parecesse aceitável. Não fez nenhum esforço de afastar-se. De fato, sentia como se estivesse magnetizada á seu corpo duro e poderoso. Atraída para ele e despojada por completo de suas defesas.

— Seus amigos estão fazendo apostas sobre se ainda me esperará no altar,

— disse, lançando um olhar furtivo a seu rosto.

— Esses não são meus amigos.

Mas iria esperar? Perguntou-se ela.

Ele olhou além dela, para a porta. Jocelyn se perguntou se veria Lily Cranleigh parada atrás dela caso se virasse. Pelo contrário, olhou resolutamente para Devon.

A dança terminou. Ela se retirou, seu olhar se moveu involuntariamente pela sala até a porta. Se Lily estava esperando por ele, já não estava. E sem importar o que fosse que Devon pudesse ter sentido pela senhora Cranleigh; a quem todo mundo sabia que tinha perseguido, ele não se afastou do lado de Jocelyn até que o céu começou a clarear e os hóspedes cansados procuraram suas camas à espera dos escândalos que pudesse trazer o dia seguinte.

Estava nublado na manhã seguinte. Jocelyn permaneceu em seu quarto até que o café da manhã terminou. Então, quando pensou que não havia mouros na costa, desceu e foi dar; uma revigorante, caminhada pela propriedade mastreada.

Alguns dos convidados estavam na cama, apesar do aborrecimento dos martelos golpeando e os homens gritando da clareira onde na quinta-feira, em três dias mais, celebrar-se-ia o torneio anual. Tendas de campanha com bandeirolas ondulando e sianinhas com borlas douradas, construíam-se ao redor do campo de justas. Da colina onde ela estava escondida, podia ver vários homens a cavalo praticando.

Não viu a alta figura de Devon entre os praticantes, apesar de dificilmente poder ignorar seu primo Gabriel trovejando pela grama em um musculoso corcel negro. Ele puxou as rédeas e a saudou, demonstrando que não estava bem escondida como queria.

Fingiu não vê-lo, e desceu a ladeira para retornar ao castelo, então parou.

Um homem parecia estar rondando pelo grande bosque, que ela tinha atravessado para evitar se chocar com alguém que a conhecesse. Não havia absolutamente nenhuma maneira de evitar topar com ele. Segurou a respiração e

continuou apressada.

Seu coração se afundou quando ele se virou para ela.

— Adam — disse, achando de repente difícil engolir. — Está a caminho de praticar para o torneio?

— Se eu participasse o mais provável é que dirigisse minha lança para o coração negro de Devon Boscastle — disse sem rodeios.

— Já vejo.

— De verdade?

— Acredito que sim — disse em voz baixa.

— Bom, maldição, eu não.

Ela tampouco, não realmente. Nada disto tinha sentido. E nunca, nunca admitiria isto a Adam, mas casar-se com Devon Boscastle não era nem de longe tão angustiante como deveria ser. De fato, era a coisa mais maravilhosa que lhe tinha acontecido. A única coisa maravilhosa.

Olhou a seu redor. Ninguém no campo de justas podia vê-los, embora não pudesse ter certeza da vista das janelas do castelo. Tinha temido o inevitável momento em que enfrentaria Adam a sós, mas pelo menos lhe devia uma conversa final. Uma conversa que aparentemente estava destinada a levá-la ela mesma.

Ele a observou em silencio com o cenho franzido por tanto tempo, que ela começou a cantarolar e a afastar-se com cuidado. Parecia como se ele não tivesse dormido há dias. Seu rosto estava um pouco pálido, e o tamanho de seu queixo mais pronunciado. Não o culpava por odiá-la, mas desejava lhe fazer entender pelo menos que nada disto foi obra sua.

— Adam — começou vacilante — eu...

— Na mesma noite em que se encontrou com Devon na torre —

interrompeu com voz afogada — acabava de pedir a seu pai sua mão. Queria surpreendê-la — fez uma pausa, para deixar que sua confissão fosse assimilada.

— Mas, maldição — disse, erguendo a voz. — Surpreendeu a todos nos mandando ao diabo, não?

— Não entende.

Ele negou com a cabeça.

— Quis ser correto e receoso. Não tinha idéia de que fosse uma mulher que se deixasse seduzir por um homem como Boscastle.

— Pensei que iria encontrar-me com você! — Exclamou.

Ele a contemplou com um cenho franzido.

— Por que iria fazer algo tão insensato como a convidar para um encontro na torre? Há ratos em lugares como esses sabe.

— Pensei que poderia querer se declarar em um ambiente romântico.

— Os ratos não são no mínimo românticos — examinou-a com uma expressão bastante magoada — Queria lhe dizer em privado que estou disposto a desafiar Boscastle pelo que lhe fez.

— Fala sério? — perguntou ela, horrorizada. — Nunca se bateu em um duelo antes. Ele sim.

Pelo menos tinha ouvido rumores nesse sentido. Não havia mais que ver os dois homens juntos para saber que Adam nunca seria melhor que Devon em um campo de duelo.

— Estou muito consciente disso — disse zangado. — E não quero desafiá-

lo particularmente, mas sinto como se tivesse sido terrivelmente ofendido.

— Também ele.

— Não por mim, não. Certamente não acredita em todas essas tolices de que alguém lhe enviou uma nota em meu nome, e que Devon resultou também ser convidado. É um conhecido libertino, Jocelyn. Sempre está enredado em um romance ou outro.

— Eu acredito — disse ela, só percebendo isso agora. — Ele... — levantou os olhos de repente. — Ele vem. Céus, ele é quem vem até nós através das árvores, agora. — E não sabia por que ela devia sentir esta sensação repentina de pânico misturado com antecipação, mas era assim.

Os olhos de Adam aumentaram com alarme.

— Não fique tão perto de mim.

— Há um abismo virtual entre nós — disse ela baixo e se obrigou a não saltar de novo como se na realidade tivessem feito algo ruim.

Não é que ela ou Adam tivessem alguma razão para sentirem-se culpados, a menos que tivesse percebido o fato de que estiveram discutindo sobre matar Devon.

Pelo olhar cínico que lhes lançou, poderia ter escutado a parte incriminadora da conversa.

— Bom, olhe — disse, parando, como se fosse tomado totalmente de surpresa. — Se não é minha futura esposa. E Chiswick. Juntos. Devo lhes deixar a sós para que lamentem o que poderia ter sido?

Jocelyn franziu os lábios.

— Lamentarei em privado, obrigada. Já ia embora.

— Também eu — disse Adam, rígido.

— Bom, não deixe que os espante — disse Devon. — Continuem com sua conversa. Acredito que ouvi dizer meu nome em relação a um duelo. Há algo que devo saber? As pessoas podem morrer nos duelos, sabem.

Adam ficou de um tom tão branco como a cera, que Jocelyn pensou que poderia desmaiar. Não tinha mais remédio que ir a seu resgate.

— Só estávamos discutindo quem desafiaria a quem no torneio deste ano.

Devon estirou os braços ao ar, atraindo o olhar dela para as linhas afiadas e magras de seu torso.

— Ah, sim, o torneio. Tenho muita vontade de uma boa briga este ano, por alguma estranha razão. Espero que quem me desafie esteja preparado para ser golpeado.

Parecia capaz de fazê-lo, também, pensou ela com pesar. Em forma. Viril.

Musculoso. Um homem jovem no topo de sua capacidade.

— Veio aqui para dizer a Adam o bem que se sente? — perguntou ela sem rodeios.

Ele flexionou seus ombros e sorriu de novo.

— Importaria de praticar comigo, Adam? — Não tinha certeza, porque não

se atrevia a olhar em sua direção, mas pensou que Adam poderia ter cambaleado sobre seus pés. — Fernshaw disse estar oferecendo um espetacular prêmio este ano — acrescentou Devon no último momento.

— Escutei que é um cavalo muito fino.

Adam tinha recuperado sua cor, mas não sua confiança.

— Se dá no mesmo para você, irei à prática na tarde.

Devon encolheu os ombros descuidadamente, depois olhou para o céu escuro.

— Não me importa, embora pareça que vai haver uma tormenta — desceu os olhou diretamente para Jocelyn. — Talvez devesse voltar para o castelo antes que comece a chover. A menos, claro, que Chinny e você não tenham terminado sua conversa.

Ela negou com a cabeça. Não podia pensar em nada mais que dizer, sem piorar a situação.

— Acredito que terminamos.

Devon posou um agudo olhar sobre Adam.

— Você terminou Chinny?

Adam endireitou os ombros, seu queixo saliente.

— Completamente.

— Então, por que não vai embora? — perguntou Devon em voz baixa.

E esse foi o momento em que Jocelyn percebeu que apesar de todo seu encanto lúdico, havia muito mais em Devon Boscastle do que deixava ver. Se não era o mesmo arquiinimigo, tinha que ser um de seus filhos prediletos, e sem importar quão despreocupado atuasse, era pouco o que escapava a sua percepção.

 

 

CAPÍTULO 09

 


Devon se dirigiu para a clareira nos subúrbios do castelo onde se realizava o torneio. Os carpinteiros martelavam os postos improvisados para os espectadores.

Algumas das damas mais audazes se reuniram para ver os jovens convidados praticando suas habilidades com a montaria e o manejo da espada atrás da barreira de madeira levantada para a justa.

Lily estava sentada sobre um fardo de palha com um vestido de seda verde e uma capa. Voltou o rosto quando viu Devon e ficou olhando absorta para Gabriel galopando pelo campo. Devon não podia dizer se o inchaço de seu nariz tinha diminuído ou não. Estava muito preocupado com seus próprios pensamentos para prestar atenção de uma maneira ou outra.

Tinha-a encontrado com seu traseiro nu sob os lençóis com seu primo, e enquanto ele não pudesse dizer com honestidade que se surpreendeu, não lhe tinha ocorrido nesse momento avaliar o tamanho de seu nariz. Tampouco lhe importava perder uma aposta ou não, ela não valia o trabalho.

O que lhe incomodava nesse momento era a conversa que acabava de escutar entre Jocelyn e Adam. O par de inocentes estava totalmente inconsciente de que esteve escutando atrás das árvores antes de circular de novo pelo caminho.

A princípio tinha pensado que seu encontro era divertido. Mas algo no tom furtivo de sua conversa o tinha provocado, e seguia provocando-o agora. Não por Adam estar considerando desafiá-lo a um duelo, Devon entendia a honra masculina. O que lhe irritava era que Jocelyn tinha tentado acalmar o idiota.

Talvez devesse ter animado Adam para que fugisse com ela. Teriam resolvido todos os problemas de Devon. Inclusive poderia ter pretendido ficar com o coração partido como resultado de sua fuga. Bom, talvez isso fosse levar a

reação muito longe. Ninguém acreditaria que uma mulher lhe tinha partido o coração.

Mas tinha que admitir, embora só fosse para si mesmo, que tampouco era de tudo indiferente a ela. Ninguém o tinha obrigado a galopar para as colinas para lhe pedir a sua velha tia sua tiara apreciada. Ou ficar ao lado de Jocelyn quase toda a noite. Para sua surpresa, não queria separar-se dela.

Certo, estava sendo obrigado a este matrimônio, mas não necessitava nenhum incentivo para levá-la a sua cama. Desejava-a mais cada vez que a via.

De fato, converteu-se em uma provocação dominar sua resposta sexual ante seu encanto. Tendo em conta sua inexperiência, tomaria especial cuidado para seduzi-la.

Infernos não se; enganaria. Estava morrendo por deitar-se com ela, e quando chegasse o momento teriam uma maldita sorte se pudesse resistir; nos poucos momentos que levaria para despirem-se. Sabia que ela não fazia de propósito, mas de uma maneira sutil, porém desconcertante, tinha-o cativado.

Por que mais teria passado a última hora ou algo assim, explorando os terrenos do castelo com a esperança de encontrá-la? E enquanto estava tranquilamente tentando fingir que não a estava procurando, ela estava sozinha com Adam.

Parou e jurou em voz alta. A forma como o casal saltou a um lado quando revelou sua presença, não só o tinha incomodado, mas também o tinha feito sentir-se como um vilão sombrio de um conto de fadas que tinha arrebatado uma princesa de seu verdadeiro amor.

Devon nunca antes tinha interpretado o papel de vilão na vida de ninguém.

Mas, quem sabe? Talvez possuísse um talento sem explorar para o mal.

Certamente, não se sentia no mínimo heróico neste momento.

— Devon!

Deu meia volta ante o grito, sem mover um músculo enquanto Gabriel desacelerava o galope de seu cavalo a um ritmo de passeio. Em seu estado de ânimo atual, Devon estava propenso a dar uma surra em seu arrogante primo.

— Chega tarde à prática, Belo Adormecido — disse Gabriel, lançando um olhar à Lily. — Vamos. Necessito de um objetivo.

Devon enganchou um braço sobre o anel.

— Surpreende-me que tenha a força para sequer levantar-se esta manhã, e muito menos montar um cavalo — disse com um sorriso zombeteiro.

Gabriel lhe dedicou uma careta grosseira.

— Minha resistência é notável.

— Descobriremos quanto é extraordinária durante o torneio — Replicou Devon, lhe devolvendo o sorriso. — É curioso, não tinha idéia que Fernshaw estivesse permitindo participar os camponeses no rodeio deste ano. Não lhe atribuíram varrer o esterco?

— Quer varrer comigo?

Devon começou a rir.

— Contra quem vai participar da justa, de qualquer modo?

Gabriel apeou e jogou as rédeas a um dos cavalariços.

— Talvez devesse prestar mais atenção a sua competição.

— Por quê? — Devon não só tinha servido como oficial de cavalaria, mas ganhou todas as justas em que tinha participado dos torneios de Fernshaw. —

Ninguém pôde me vencer.

— Talvez sua sorte tenha mudado.

— Talvez não seja sorte — Devon saltou sobre o corrimão, de repente com o ânimo para a descarga física que lhe tinha inspirado seu primo zombeteiramente.

— Devo confessar uma coisa — disse Gabriel, caminhando a seu lado. —

Não foi por convite que Lily veio a meu quarto na noite anterior. Conheço-o e tinha feito uma aposta, mas decidi que não era necessário jogar-lhe na cara sua perda de liberdade. Ao que parece, ela também me desejava.

Devon começou a rir outra vez.

— Se isso era uma desculpa, já está esquecido.

Gabriel negou com a cabeça.

— Não estava me desculpando. Só lhe disse isso, para que quando vencê-

lo amanhã, compreenda que não tem nada a ver com uma mulher.

— Gabriel, quando arrancar sua arrogante cabeça de seus ombros, pode estar certo de que Lily será a última coisa que estará em minha mente.

Gabriel esperou uns instantes antes de responder.

— E fosse Jocelyn em minha cama?

Devon balançou a cabeça.

— Realmente quer que lhe baixem as fumaças, não?

— Se alguém me superar, Devon, que seja você.

Devon sorriu a contra gosto.

Gabriel diminuiu a voz.

— Inteirei-me ontem à noite que o ataúde foi roubado, não vendido.

— Esperava muito.

— E — continuou Gabriel — se alguém no castelo sabe quem está por trás disto, mantêm-no em segredo.

— Agora, não é esta uma vista que enternece meu frio coração? — disse uma voz atrás deles arrastando as palavras. — Atrevemo-nos a esperar que este frio no ar entre os dois primos pressagie um derramamento de sangue? Já era hora.

Devon olhou a seu redor. O capitão Thurlew e um grupo de amigos avançavam através do tecido carregando paus de vassouras e lanças embotadas sobre seus ombros.

— Para que demônios são os paus de vassoura? — perguntou Devon divertido. — Para varrer aos oponentes fora do campo?

— Não sabe? — perguntou Gabriel com um sorriso. — Será o primeiro evento no qual se utilizarão paus de vassoura em uma justa, Fernshaw teme que os hóspedes aficionados possam machucar-se.

— Nesse caso — Devon arrebatou uma das vassouras debaixo do braço de Thurlew, — deve começar a praticar. Em guarda.

Gabriel se agachou, então pegou o pau de vassoura que o cavalariço lhe

tinha arrojado.

— Isso está melhor — disse, rindo, e o fez virar para o torso de Devon.

Devon se esquivou com graça ágil e deu seu próprio golpe, acertando Gabriel na coxa. Gabriel simplesmente sorriu.

— Isso foi muito perto de um lugar sensível. Importa-se manter seu pau de vassoura longe de minhas jóias?

— Minhas desculpas — disse Devon, rindo. — Não sabia que tinha alguma.

— Pergunte à Lily.

— Não, obrigado.

Uma multidão se reuniu. Devon notou que Lily ficou em pé, provavelmente com a esperança de presenciar uma violenta cena. Adam ficou uns metros atrás dela, mas Jocelyn não estava em sua companhia.

Teria seguido seu conselho de voltar para o castelo? Teriam acordado ela e Adam reunirem-se em segredo mais tarde?

— Maldição — um golpe seco no cotovelo trouxe sua atenção de novo a sua batalha com Gabriel.

— Sinto — disse Gabriel com um encolhimento de ombros não muito sincero. — Espero que não seja o braço que usa para a espada. Mas talvez devesse prestar mais atenção ao que um aficionado pode fazer.

Chovesse ou trovejasse, o torneio anual de Lorde Alton Fernshaw se realizaria.

Ao amanhecer, o último rastro de bruma se evaporou dos terrenos da justa.

Os assentos de madeira estavam repletos de sonolentos, mas emocionados espectadores desejosos de presenciar a cavalaria revivida. Ou, se a cavalaria fracassasse como acontecia freqüentemente em tais circunstâncias, a pessoa secretamente podia esperar presenciar que uma autêntica luta estalasse entre os competidores.

Este ano, devido ao imprevisto escândalo que rodeava os dois dos cavalheiros mais carismáticos da sociedade, parecia haver uma oportunidade

decente para que estas expectativas sedentas de sangue se cumprissem.

Com este fim, as apostas se colocaram em privado em uma batalha pessoal entre os dois primos Boscastle. Gabriel estava atendendo um lábio inflamado de sua prática com Devon no dia anterior, um defeito que só o fazia mais atraente para suas admiradoras. Devon tinha uma expressão distraída tão diferente a seu habitual semblante despreocupado, que suas entusiastas seguidoras penavam por lhe oferecer consolo.

Essas apostas por Devon se faziam sobre a base de suas habilidades na cavalaria e seu temperamento audaz. Era jovem duro e selvagem no coração.

Gabriel parecia um pouco mais forte, mais duro nas bordas. Seus partidários afirmavam que, como um par de Boscastle, não tinha nada a perder.

A verdadeira pergunta do dia, entretanto, era qual dama tinha alimentado esta rivalidade?

A previamente irrepreensível Senhorita Lydbury, ou a infame, mas desejável, Lily Cranleigh?

Poderiam ser ambas as mulheres?

Também se fizessem apostas sobre este assunto, com Lily à cabeça, e uns poucos jogadores assinalando que não tinham visto Jocelyn nas práticas.

Jocelyn não teria perdido o espetáculo por nada; tinha renovado sua decisão de aceitar seu destino. Depois de tudo, foi à festa de Alton, com a esperança de uma proposta de matrimônio. Não importava que Devon Boscastle distasse muito do marido respeitável que tinha tido em mente. Às vezes, os planos melhor traçados reservavam algumas surpresas.

Ela e Lady Winifred tomaram seus assentos enquanto os histriões perambulavam recitando poesia e serenatas às donzelas nos degraus com clássicas canções de amor dos trovadores do século XIII.

Todos os assistentes chegaram disfarçados. Jocelyn usava uma túnica fluída de seda violeta com um dourado cinto ligado, que pendia sobre seus quadris.

Depois de muita fanfarra, Lorde Fernshaw apareceu e se dirigiu a seu

estrado com dossel.

Anunciaram-se as regras da justa, os participantes recordaram que todas as armas serviam para avivar o espírito amistoso do torneio. O cavalheiro de honra cortou as cordas do tecido, e um arauto gritou:

1

— Laissez-alle!

O torneio tinha começado.

Prometia ser um evento divertido.

O grande prêmio que se concederia ao ganhador do torneio deste ano era um garanhão de sangue andaluz.

Não havia um combatente no campo que não cobiçasse o cavalo para seus próprios estábulos. Ou para simplesmente montá-lo em Rotten Row para impressionar as damas de Londres.

Resplandecente em seu traje de cavalheiro, Devon Boscastle apareceu, facilmente a figura mais impressionante da jornada ao cruzar o campo montado em seu brioso corcel. Sob um espartilho de cetim azul pavão usava uma cota de malha de prata, e seus olhos azuis brilhavam com intenção diabólica através da viseira de seu elmo de aço. Comandava seu cavalo com tal magistral facilidade que provocou palpitações a mais de uma dama na audiência.

Jocelyn o viu entrar na arena, então olhou para outro lado, seu coração retumbando inexplicavelmente. Se ele reconhecesse Lily em lugar dela, provavelmente o desafiaria a uma justa ela mesma. Parecia um salto lógico de loucura, depois de atacar uma rival com uma raquete. Ela sabia que ele não gostou de encontrá-la com Adam. Mas Adam era tão cômodo como uma cadeira velha, Devon não era cômodo absolutamente. Fazia-a sentir-se sem fôlego, torpe, e dolorosamente ingênua.

— Jocelyn — sussurrou Winifred.

— Não me diga que está dando um espetáculo de si mesmo diante dessa mulher outra vez.

— Não. Mas ele está fazendo um espetáculo de si mesmo diante de você.

Um muito bonito, tenho que dizer.

— Não zombe de mim. Não estou de humor.

— Jocelyn — Winifred lhe deu uma cotovelada no flanco, continuando a olhar deliberadamente na arena.

Jocelyn voltou a cabeça. Diretamente debaixo delas, Devon estava sentado elegantemente escarranchado sobre seu corcel dançante, um espetáculo formoso, embora odiasse admitir.

— Um favor de tua parte, a mais formosa de todas as mulheres, para levar comigo à batalha — disse ele alegremente, estendendo uma mão enluvada em atitude de súplica.

Engoliu a saliva, dizendo a si mesma que não se fundiria em um atoleiro por um gesto bonito.

— O que se supõe que devo lhe dar? — sussurrou a Winifred.

— Um sapato?

— Meu sapato?

— Bom, então, uma liga.

— Não vou dar uma liga.

— Aqui todo mundo pensa que lhe deu muito mais que isso.

Jocelyn ruborizou, continuando, desatou o cinturão de seda, unido ao dourado cinto que era uma parte muito incômoda de seu traje. Jogou-o no ar.

Devon o pegou na ponta de sua lança e fez uma demonstração de beijá-lo antes de incitar a seu cavalo a fazer uma reverência para saudá-la.

— Que ato cavalheiresco — exclamou Winifred, batendo as palmas.

Jocelyn tentou não sorrir.

— Que ator, quer dizer.

— Bom, se isso for um ato, eu gostaria de estar em sua obra. Oh, Deus, esse é Sir Gabriel quem está por combater?

O outro combatente acabava de entrar na arena em um grande cavalo cinza de guerra. Um elmo negro com penas ocultava seu rosto, mas estava sentado na borda da sela com uma arrogância que deixava fácil identificá-lo. Cavalgou para

os degraus para pedir um favor à Lily Cranleigh, que levantou o joelho e lhe jogou sua liga, sem nenhuma hesitação absolutamente.

Mas Devon lhe tinha pedido honra, e embora dissesse a si mesma que provavelmente não era nada mais que uma comemoração simbólica, sentia-se satisfeita de todos os modos.

Poderia ser só para o espetáculo. Ele poderia não ser mais seu campeão no coração do que ela era uma princesa, apesar da tiara de diamantes.

Percebeu que o tinha tomado por defeito. Pelo que sabia, ou não queria saber, ele ainda estava competindo pela atenção de Lily a portas fechadas. Mas se podia parecer em público ser um noivo fiel, então, na verdade parecia justo que ela fizesse o mesmo. O curioso era quão fácil para ela era fingir devoção por esse vagabundo.

Devon incitou seu corcel a um passo calmo quando as cordas se romperam. Ele e seu primo galoparam em um véu de redemoinho de pó que levantavam os cascos. Gabriel era uma figura impressionante, o bastardo, em seu ensurdecedor cavalo cinza.

Mas Devon tinha nascido sendo um cavaleiro. Sua constituição espigada e angulosa se prestava mais à agilidade e a velocidade que a força resistente de seu primo.

Levava uma pesada lança na mão esquerda e a apontou para o centro do escudo de Gabriel, que se aproximava. Se golpeasse com força suficiente, o faria cair do cavalo, mas esperava não se machucasse.

Sua pontaria foi certeira.

Por desgraça, Gabriel ficou sentado firmemente na sela como o arrojado patife que era seu escudo acolchoado tinha absorvido o golpe.

— Vamos, primo — zombou Gabriel quando fez trotar seu cavalo ao redor para o próximo percurso. — Não tome a peito sua perda. Todas as garotas sabem que Lorde Devon prefere se sobressair no dormitório que no campo de batalha.

Devon fez retroceder a seu corcel com uma habilidade que era como uma segunda natureza. Poderia montar em círculos ao redor de Gabriel até dormindo.

— Não escutei nenhum conto de sua valentia nas batalhas.

— Isso é porque os homens com quem lutei estão mortos e não podem falar — gritou Gabriel por cima do ombro. — É só um jogo, não?

Era só um jogo, mas a Devon não importava nada. Tinha perdido de vista esse fato no momento em que tinha elevado o olhar e viu Jocelyn.

Não a impressionaria exatamente se perdesse. Seus olhos se estreitaram, concentrando-se, enquanto ele e Gabriel voltavam a entrar no campo em um tranqüilo galope que desmentia sua rivalidade.

Jogo ou não, iria ganhar.

Mas desta vez... Desta vez...

Cavalgou firmemente seguro na sela, posicionando o braço, enquanto que o cavalo de Gabriel trovejava para ele. Sua concentração deu seus frutos. Uns momentos depois sua lança deu um golpe demolidor no escudo de Gabriel, seu

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primo saiu disparado da sela e caiu de costas no chão. A vitória marcou o atteint

ganhador.

O público rugiu de aprovação. Alguém jogou uma coroa de hera na arena.

Os arautos apregoaram, anunciando que Lorde Devon era o ganhador. Só tinha que ganhar dois eventos mais.

Olhou para seu primo divertido.

— Deveria encarregar-se de sua complacência por um dia ou dois.

Gabriel ficou em pé e arrancou o elmo.

— Deveria estar agradecido.

— Agradecido? — soprou Devon. Rios de suor corriam pelos lados da barra protetora do nariz de seu elmo. — Por quê?

Gabriel sorriu.

— Porque o deixo ganhar para que não seja desonrado diante de sua noiva.

Devon jogou para trás a cabeça e riu.

— Agora já escutei tudo.

Gabriel fingiu parecer ferido.

— Sacrifico meu orgulho, e ri de mim?

— Sabe o que penso Gabriel? Acredito que é um mau perdedor. Não tem um osso em seu corpo que seja capaz de sacrificar-se.

Gabriel não negou isso tampouco.

Devon cavalgou diretamente para os degraus, apeou, e se inclinou ante Jocelyn. Ela o olhou durante vários segundos, como se não estivesse segura do que dizer.

Ele sabia que por alguma razão inexplicável, havia se sentido obrigado a golpear seu primo, e era de supor que tinha sido mais uma questão de orgulho masculino que de querer ganhar um formoso cavalo.

Jocelyn, entretanto, não parecia uma mulher muito impressionada por suas habilidades no torneio.

Gabriel se aproximou por trás e lhe deu uma palmada no ombro, murmurando:

— Eu tiraria o máximo proveito disto se fosse você. Peça-lhe que beije sua lança.

— Vou dar algo para beijar.

Jocelyn se levantou do banco acolchoado. Devon pôde sentir que a atenção de seu primo era imediatamente atraída por sua figura esbelta, e um novo aborrecimento se acendeu através de sua fadiga. Ela limpou a garganta. Lady Fernshaw estava parada junto a ela, apressando-a a falar.

— Lorde Devon — começou com estupidez, — sua valentia foi...

Foi o que? Perguntou-se irritado. Uma perda de tempo? Seu olhar se desviou de seu rosto a sua figura de novo. Esse traje medieval moldava seu corpo como se acariciasse cada curva. Deu-lhe vontade de levá-la a um lugar privado e despi-la. Era estranho que há uns segundos estivesse doendo por toda parte e sentindo-se mal humorado.

Agora ainda lhe doía, mas era uma queixa mais profunda, mais familiar.

Queixa do cru desejo.

Sacudiu a cabeça e tentou concentrar-se no que ela estava dizendo e não no

que gostaria de fazer com ela quando estivessem sós. De repente percebeu que ela tinha deixado de falar e olhava além dele, para a arena.

Gabriel estava zombando dele as suas costas? Virou-se, seu casco sob o braço. Mas agora Gabriel não estava olhando para Jocelyn para nada.

De fato, ele estava observando um dos lacaios de Lorde Fernshaw, que estava vestido como um escudeiro medieval, apressando-se para os degraus.

— Trago uma provocação pessoal de um combate único para Lorde Devon

— gritou o lacaio, parando a seu lado.

— Quem o enviou? — exigiu Devon cansativamente ao mensageiro ofegante.

— Lorde Chiswick o fez, milorde.

— Chinny? — perguntou Gabriel com um grunhido de incredulidade. —

Chinny quer brigar com você?

— Ele pediu um combate corpo a corpo — acrescentou o criado com voz duvidosa quando ergueu o olhar à figura imponente de Devon.

Devon se queixou.

— Tudo o que quero fazer é tirar este traje ridículo.

Gabriel acariciou o queixo.

— Sempre pode recusar.

Devon levantou seu escudo e rodou os ombros, como era seu costume quando ia entrar em batalha.

— E então pareceria um valentão e um covarde.

— É complicado, não? — murmurou Gabriel. — Se fosse eu, seguiria adiante e lutaria contra ele. Ela está olhando, sabe.

— Sim — disse Devon secamente.

— Vi a forma como a olha — acrescentou Gabriel, pensativo.

— Vi a forma como você a olha, também.

— Mas eu não vou me casar com ela. Se esmagar Chinny, ela poderia ter medo de levar um bruto para sua cama.

Devon teve que inalar ante isso.

— Não se preocupe como vai ser na cama. Não tive nenhuma queixa ainda.

É claro que tampouco se casou ainda, nem tinha tratado com as complexidades de um acerto permanente. Tinha confiança em suas habilidades como amante, mas com o amor em si? Sempre se perguntou por que um homem em seu juízo perfeito se submeteria a tão prolongada tortura.

E, entretanto seguiu adiante e aceitou o desafio. Fazer outra coisa ia contra seu competitivo espírito Boscastle. Não se degradaria por afastar-se de uma briga.

Três minutos mais tarde estava parado frente a seu rival, mais baixo que ele e com o rosto sombrio. Sentiu que sua resolução se desmoronava.

Não podia machucar Chinny. Seria como chutar um cachorrinho aborrecido que constantemente mordia o tornozelo de alguém.

Depois de tudo, Adam tinha direito a sentir-se ofendido. Devon roubou Jocelyn de seus braços, sem importar que ele não tivesse tido a intenção. Adam tinha que manter sua honra também.

— Não quero machucá-lo, Adam — disse em voz baixa, quase sem olhar ao escudeiro que lhes trazia suas espadas romanas.

Adam projetou seu enorme queixo.

— Bom, maldição, eu quero matá-lo.

— Não, não quer — Devon teria rido se o pobre Chinny não parecesse tão decidido. — Somos velhos amigos. Isto supõe que seja um manejo amigável de espadas.

— Tudo é um jogo para você e seus malditos irmãos, Boscastle. Guerra, mulheres. Minha mulher, ou ao menos o era.

Devon virou sua espada em um arco.

— Não sabia que era capaz de tanta paixão, Chinny.

Viu o olhar de Adam passear por diante dele aos postos e resistiu a tentação de virar-se. Só podia imaginar o que Jocelyn esperava: que o bárbaro de seu noivo não fizesse mal a seu heróico defensor. Devon decidiu que iria

surpreender aos dois.

Seria um cavalheiro e entregaria o combate, para que Chiswick parecesse um herói. Realmente era um jogo. Isso...

O sólido golpe da espada de Adam através de seus ombros o sacudiu lhe chamando a atenção. Apertou a mandíbula e se endireitou.

Foi um golpe baixo, pouco cavalheiresco, mas o que incomodou a Devon mais que a constatação de que Adam se aproveitou de sua equidade, foi a constatação da dor. Foi um bom golpe. Por desgraça para ele, doeu.

Por desgraça para Chiswick, também soltou o temperamento de Devon.

Tomou fôlego, fez uma finta, e fez virar sua espada para que o plano da folha alcançasse Adam sob seu pulso e enviasse sua espada voando ao chão. A ponta Romana de sua espada passou através do escudo acolchoado do peito de Adam até seu coração.

— Sinto muito, velho amigo — murmurou, engolindo saliva ante o olhar de orgulho ferido que cruzou o rosto do outro homem.

Adam assentiu com a cabeça.

— Não tem importância. Nunca teria sobrevivido a escola sem você me defendendo dos valentões. Devia-lhe isso, Boscastle.

O arauto apregoou sua vitória. Devon desceu a espada e sacudiu a cabeça com pesar.

— Agora fizemos dois idiotas de nós mesmos. Não acredito que alguém ficou impressionado.

Adam se endireitou.

— Talvez, mas pelo menos, sinto que cumpri com meu dever. De fato, sinto-me melhor sobre isto em todos os aspectos.

— Então isso o faz um de nós — disse Devon com um olhar reticente para os espectadores dos degraus.

Só Deus sabia o que Jocelyn tinha pensado deste espetáculo. Meio esperava que uma dama com sua educação tão protegida; fosse desmaiar.

Ou soluçar abertamente, porque ele tinha derrubado seu defensor. Poderia

haver economizado o problema de perguntar.

Ela tinha ido embora. Nem sequer podia estar certo de que o viu dar uma surra em Adam. O que fosse que ela sentiu sobre o torneio teria que esperar até uma explicação privada. Talvez ela pudesse achar mais sentido a seu comportamento que ele.

 

 

CAPÍTULO 10

 


Jocelyn ficou na porta até que finalmente divisou Devon voltando para seu quarto. Percebeu que estava de péssimo humor, não como costumava ser.

Decidiu lhe dar tempo para que se recuperasse de seu mau humor antes de aproximar-se dele em privado.

Possivelmente ele e Gabriel estiveram brigando hoje por certa viúva.

Mas o fato era que ele tinha brigado por ela hoje. Sabia que foi apenas uma batalha fingida, e a farsa parecia descrever o matrimônio que se abatia ante ela.

Mas de qualquer maneira Devon tomou uma posição e tinha brigado sem vacilação. Parecia ser a maneira Boscastle.

Ela nunca foi muito combatente, mas bom, tinha pouco por que lutar.

Era fácil empurrar para um canto uma jovem tímida. Sua mãe foi um camundongo assustadiço que nunca se atreveu a opor-se a ninguém. Seu pai acreditava que era seu dever esmagar qualquer resolução com a qual não estivesse de acordo com o caráter obediente de sua única filha.

Para bem ou para mau, essa determinação estava aparecendo agora, e Jocelyn não tinha a menor idéia de como pará-la. Aparentemente não era a jovem obediente que ela acreditava ser.

Encorajada pela conduta de seu campeão resistente, decidiu pela primeira vez em sua vida que brigaria pelo que queria.

E queria ser a esposa de Devon Boscastle, mas não só de nome, porque isso não era nada. Queria ser a esposa de seu coração, em sua totalidade, de maneira que não importasse que mulheres como Lily Cranleigh existissem. E

com certeza, se hoje ele pôde lutar contra um amigo por ela, por que não seria possível que ele a amasse?

Suspeitava que esta conclusão não viesse de um pensamento lógico, mas tampouco era completamente alheia ao domínio da razão.

Entretanto, o problema imediato era que não tinha nem idéia de como represar um homem desafiante como Devon. Era um macho animal que vivia como tinha vontade, até que o pegaram com ela nesse encontro secreto.

Um par de criadas passou conversando, arrastando baldes pesados de água quente pelo corredor. As duas entraram no quarto de Devon, mas só uma saiu com os ombros caídos com decepção.

Subitamente Jocelyn se viu caminhando pelo corredor e parou vacilante frente à porta. Simplesmente não podia entrar no dormitório dele, noiva ou não.

Então se lembrou que Lily Cranleigh não teria essas reservas. Além disso, havia uma criada dentro.

Ela bateu na porta.

Devon abriu um olho e viu a criada faladora examinando a espada que tinha usado para derrotar Adam no torneio.

— Cuidado ao tocar isso, moça.

— Por Deus, não sabia que as espadas eram tão grandes hoje em dia —

disse a descarada, olhando com prazer a figura nua de Devon. — Excluindo a presente.

Ele riu.

— Já pode ir, moça desavergonhada.

— Observação, isso é tudo.

Ele fechou os olhos.

— Apostaria que há muito que observar em uma festa como esta.

Ela se ajoelhou ao lado da tina para lhe ensaboar os ombros.

— Não brinca nem um pouco. Encontro com o cônjuge alheio, pulos acima, abaixo e nas escadas.

— Suponho que não escutou quem me mandou o convite á esse encontro da torre.

— Ninguém sabe — disse sombriamente. — E é verdade.

— E o ataúde? — Removeu-lhe firmemente a mão de seu corpo. — Pode deixar que eu mesmo faça isso, obrigado.

Ela parou com um profundo suspiro.

— Alguns pensam que foi Sir Gabriel que trouxe o ataúde á casa. Não foi por isso que lutaram hoje?

Ele franziu o cenho.

— Nós dois nos demos uma surra. E espero que esteja tão dolorido como eu neste momento. Entretanto, ele não teve nada a ver com esse ataúde.

— Dão calafrios, uma coisa como essa.

Devon contraiu a mandíbula, ao recordar á pena nos olhos de Jocelyn quando se confrontou à macabra imagem, e como tinha resistido com graça, o resto da noite.

Mas talvez ela estivesse um pouco acostumada a resistir. Crescer com Sir Gideon não deve ter sido muito agradável para uma moça cujas inclinações naturais, o mais provável, despertavam a desaprovação dele.

E se Devon descobrisse que ela tinha tolerado algo desagradável no passado, se encarregaria de apagar qualquer memória sombria que a perseguisse.

Uma vez que se casassem, Sir Gideon seria bem vindo somente quando, ou se, ela quisesse vê-lo.

Ele balançou a cabeça. Não sabia que diabo estava lhe passando.

Em um momento planejava seduzi-la, e em outro assumia o papel de seu protetor. Bom, não podia negar sua herança Boscastle. Foi testemunha da mesma tortura agridoce de seu irmão. Simplesmente não percebeu que agora era seu turno de sofrer.

A voz travessa da criada terminou com suas meditações.

— Posso lavá-lo todo, se quiser. — Ofereceu. — Mas teria que usar a toalha. O pano não é suficientemente grande para um homem como o senhor Ela olhou enquanto a porta rangia vacilante. Devon a ouviu, mas não moveu um músculo. Se o intruso fosse seu primo Gabriel com a esperança de igualar o marcador irrompendo quando Devon estava nu, iria afogar o bastardo na tina.

A criada se afastou da tina, evidentemente silenciosa.

Devon manteve os olhos fechados enquanto se familiarizava com a outra presença na sala; definitivamente não era Gabriel, pensou divertido.

O sangue lhe revolveu enquanto escutava o sedutor sussurro de seda aproximando-se da tina.

— Bom menina — disse impaciente sorrindo para si mesmo. — Vamos, me lave então. A água não permanecerá quente para sempre, e tenho os músculos duros.

Ele escutou como a porta se fechava suavemente, e assumiu que a criada se foi. O peito lhe apertou com agradável surpresa, ao sentir o tato da mão de outra mulher em seu ombro, depois através dos músculos contraídos de seu peito. Com uma delicadeza excitante, lhe ensaboou o musculoso bíceps.

Dedos refinados, suaves, procurando. Ele inalou antecipando e pretendendo não notar a diferença. Mas seu corpo também notou, e respondeu com uma ereção que rompeu a superfície da água e pôs a prova sua habilidade como ator.

— Estupendo — Puxou o braço para segurar o cotovelo de sua assistente.

— Mas se importaria de me lavar um pouco mais abaixo?

Abriu os olhos quando ouviu o suave grito abafado, e sorriu.

Jocelyn lhe jogou o trapo em seu ereto pênis.

Jocelyn recuou.

— É a encarnação do diabo, Devon Boscastle.

— Jocelyn! — exclamou com surpresa fingida. — Era você. Vá, que surpresa. É a última pessoa no mundo que esperaria encontrar lavando minhas partes íntimas. A isso veio?

Ao entrar no dormitório de Devon, Jocelyn tinha decidido pegar o touro pelos chifres. Teve uma grande impressão ao perceber quão grande era seu touro, e que o tinha encontrado sem roupa, mas felizmente, em nenhum ato indiscreto com a moça que o atendia.

A criada ao lado da tina lhe tinha dado um olhar sobressaltado. Jocelyn levou um dedo aos lábios para que ficasse calada.

A moça sorriu em compreensão, e passou o sabão à Jocelyn.

Devon mesmo parecia estar relaxando em seu banho com os olhos fechados. Por um momento ficou olhando indiscretamente sua forma nua.

Ou o que podia ver. A pele lhe formigava com o prazer ilícito da beleza que observava.

Seu cabelo grosso negro se encrespava molhado em seu poderoso pescoço.

Os músculos de seus ombros notoriamente marcados brilhavam com a água, assim como o fazia seu peito duro como o aço. Agarrando o sabão ela se atreveu a dar um passo mais se aproximando da tina, só para arrojar a pequena toalha sobre seu órgão viril e que lhe tinha pedido impudicamente que o lavasse, quando sabia todo o tempo que era ela.

Era para isso que ela tinha ido, na realidade.

Ele surgiu de repente como uma deidade marinha durante uma tormenta, lançando ondas por todos os lados enquanto sacudia a água de seu corpo longo e firme.

E parou diante dela antes que pudesse aproximar da porta. O diabo espreitava nesse sorriso que lhe deu. Ele piscou com assombro descarado e zombeteiro.

— Por Deus, fez-me saltar — exclamou. — Não senti você vir. Golpeou?

Deu três passos e correu o ferrolho da porta, a água jorrando de seu grosso membro aos músculos tensos das coxas. Ela virou cegamente e lhe arrojou a toalha que estava em um tamborete do outro lado. Quando tinha passado um momento suficiente para que ele recordasse o pudor e se cobrisse com a toalha, ela o olhou refletido no espelho.

Desconsertadamente ainda estava em estado natural, o pudor aparentemente não era uma de suas prioridades. Tinha a toalha pendurada no pescoço. E mais parecia um lenço que apenas lhe cobria os largos músculos do peito e dos flancos. E essa parte flagrante de seu corpo que sobressaía do escuro ápice de pêlos... desafiava toda descrição, embora o adjetivo que lhe veio à mente foi bem favorecido, antes que ela fechasse os olhos.

— Por favor, ponha algo — lhe disse com voz débil.

— Dê-me um minuto. Não estava esperando companhia.

Ela abriu os olhos e franziu o cenho.

— Tinha companhia.

— Trabalha aqui, querida. — Secou-se com a toalha com uma lentidão exasperante.

Jocelyn lançou um olhar a suas nádegas apertadas e sem gordura, enquanto se agachava secando os pés. Apertou-lhe a garganta com o que via.

— Não se preocupe comigo — disse sem fôlego.

Ele ficou atrás dela com o peito nu e os quadris envolvidos em nada.

— Perdão.

— Isso me pensava — respondeu ela, com o sangue zumbindo perigosamente.

Sorriu-lhe através do espelho.

— Importa-se?

— Importa-me o que? — perguntou engolindo em seco.

— Mover minha mão em suas pernas?

Os olhos dela voaram aos dele.

— Que diabos...?

— Está em cima de minha camisa.

Ela respirou e rapidamente ficou de lado para que ele pegasse sua camisa.

Embora ele não a vestisse. Em vez disso, deslizou seus braços sobre os ombros dela e a voltou para ele. A cabeça lhe dava voltas com o magnífico corpo viril dele. Subitamente sentiu necessidade de reclinar-se em um sofá com ele.

— Jocelyn? — perguntou com toda sua diversão nua. — Sinto muito por irritá-la, não pude evitar. Mas tenho que perguntar o que está fazendo em meu quarto?

Era uma pergunta justa. Ela se perguntou o mesmo antes de recuperar a calma, finalmente. Tinha ido agradecer por ter sido seu campeão no torneio de hoje, embora por certo não tivesse previsto expressar sua gratidão com ele

estando nu.

— Queria... — ela cometeu o engano de lhe olhar sua boca. Esses lábios firmes e sensuais que lhe tinham dado o primeiro gosto do pecado. E a faziam desejar mais. — Pensando bem, o que quero dizer pode esperar. Pelo menos até que esteja mais decente.

— O que queria? — perguntou ele suavemente passando seus longos dedos pelos ombros dela com uma delicadeza que dava calafrios.

— Isto pode te surpreender, mas não tenho o hábito de conversar com outra pessoa nua.

— Posso despi-la se estiver sentindo-se em desvantagem — Ele se inclinou e lhe mordeu o ponto mais sensível do pescoço. Rapidamente aliviou com a língua a ardência prazerosa que ela sentiu.

Ela gemeu os seios subitamente inchados no corpo do vestido.

— O que quis dizer é que você deveria se vestir, demônio, como sabe muito bem.

— Por quê? Não tenho nada do que me envergonhar. Este é meu quarto e não vou pretender ser um monge.

Ela tremeu enquanto ele a mordiscava deixando um traço inquietante até o ombro.

— Duvido muito que alguém possa confundi-lo com um monge, Devon Boscastle.

Ele levantou a cabeça e sorriu.

— Não veio me salvar, não é verdade?

Ela decidiu que não iria permitir que sua virilidade nem seu encanto licencioso a pusessem em desvantagem. Ela tinha se atrevido a fazer esta visita para dizer o que pensava, e nada, nenhuma criada promíscua, nem a falta total de inibições de seu futuro marido, sem mencionar a roupa, á iriam distrair de sua tarefa. Se ela não fosse casar-se com ele, teria que ser capaz de resistir a ele. É

claro que resistir e dissuadi-lo, eram duas coisas completamente diferentes.

— Vim expressar meu agradecimento pelo que fez hoje.

Ele a fez retroceder com esse passo solto de quadril dos cavaleiros mestres.

— Eu gosto como soa.

— Bom, eu não posso dizer que eu gosto desse olhar em seus olhos.

— Que olhar seria esse?

Não estava segura se ele a pôs na cama ou se ela simplesmente desabou em um ataque de nervos super estimulados. Tudo o que sabia era que se afundava com bastante impotência sob o peso de seu duro corpo masculino, e que os seios, e talvez seu coração acelerado terrivelmente, jaziam esmagados sob o peito poderoso e molhado dele.

Entretanto quando ele a beijou parecia natural, talvez imperativo, que ela se submetesse. A posição dele que a fazia prisioneira, tirou-lhe até a última resistência dos ossos. Ele introduziu sua língua profundamente na boca dela, e gemeu quando ela ergueu seus braços ao pescoço.

— Eu devo dizer que nunca ninguém foi meu campeão antes — sussurrou ela. — Me comoveu a honra que me fez hoje.

— Eu também me sinto bem comovido neste instante, mas não poderia dizer que tem a ver com a honra.

Ela esgotou os olhos.

— Eu falava do que fez no torneio.

— Fala da surra que dei em Chinny? — perguntou com um grande sorriso.

— Não significa que desfrutei vendo-o vencido, mas agradeço o que fez por mim.

— Poderia fazer algo por você agora, se me deixasse.

— Devon.

— Quão agradecida está?

— O suficiente para deixar de lado as regras e vir a seu quarto.

— E quer recompensar meu valor?

Ela hesitou.

— Não vou lhe perguntar o que quer dizer.

— Teria esmagado-o se soubesse que você gostaria.

— Isso não é precisamente o que eu gosto.

— Por que não procuramos o que você gosta?

Ela tragou ante a escura sedução de seus olhos.

— Tampouco acredito que deva responder a essa pergunta.

— Não acredito que precise — disse ele suavemente, lhe mostrando por que com outro beijo intenso e voraz que lhe deixou a cabeça dando voltas, e o corpo desejando mais.

Ele instalou seus quadris contra seu ventre de maneira que sua excitação dura como rocha lhe esfregasse o monte em cima das coxas apertadas dela.

Horrorizada ela retorceu para deslocar o peso; ele simplesmente flexionou suas costas e rodou seus quadris muito lentamente, e seu corpo musculoso a manteve imóvel.

Ela umedeceu os lábios e lutou por respirar.

— Isto é...

— O que um marido e uma esposa fazem — sussurrou rouco.

— Exceto que ainda não trocamos votos.

— O que importam uns poucos dias? — perguntou suavemente.

Ela não pôde evitar rir.

— E isto vem de um homem que jurou que nunca faria o caminho ao altar?

— Se estou fazendo esse caminho, desfrutarei muito do que vem depois.

Ela estava perdendo a batalha, sem controlá-lo e nem a ela. Como iria saber que o corpo de um homem iria provocar um deleite tão absoluto?

E necessidade.

Que o céu a ajudasse, a fricção de seu enorme pênis fazia com que sua parte feminina chorasse de necessidade. Sentia que seu interior estava alagado de um líquido quente com a estimulação rítmica dele.

Ela se pegou a seus ombros em uma desesperada tentativa de distraí-lo.

— Não o esperam na festa dentro de pouco? — perguntou ela, arqueando as costas involuntariamente, sentindo os seios preparados e sensíveis.

Ele riu rouco.

— Tenho em mente festejar com outra coisa esta noite. Algo suculento e doce.

Ela teve pouco tempo para sopesar essa declaração vergonhosa embora surpreendentemente excitante, pois subitamente lhe tinha soltado o corpo do vestido e exposto seus seios a um escrutínio faminto.

Os olhos dele dançavam perversamente enquanto seus dedos chegavam a um mamilo sensível até deixá-lo duro.

— Você gostou de ver-me brigar por você — disse divertido descendo sua boca ao peito sensível.

— Pensei que se comportou com valentia, e sim, agradou-me olhá-lo —

sussurrou ela. — Percebo que exerceu uma grande moderação no que lhe fez, ou não fez a Adam, no torneio.

— Acredite que agora estou sendo muito mais moderado.

— Devon, Por Deus — disse ela em uma voz instável. — Como vamos explicar isto se nos pegam juntos novamente? Você está nu em cima de mim.

— Ao menos não pode dizer que desta vez a enganei com um disfarce —

disse malicioso.

— Não acha que deveria vestir-se para o banquete?

— Prefiro despi-la.

— Parece que já o fez.

— Então deveria terminar.

Convencida de que faria o que dizia, ela se voltou para seu lado para sair da cama, mas de algum jeito o movimento a deixou em uma estimulante posição de vulnerabilidade sexual, com o joelho dele entre suas coxas. Seus braços fortes a rodearam pelas costelas; suas mãos seguravam os seios que tinham ficado fora do vestido.

— Ao inferno o banquete — exalou contra o pescoço dela. — O que é isso que tem na cintura?

— Chama-se bandagem — ouviu a si mesma responder. — E não seria má idéia ter trazido o cinturão de castidade que vai com esta peça.

A mão livre dele acariciou o lado para baixo e deslizou entre as pernas dela como por pura casualidade, para lhe separar as dobras avultadas. Enquanto ela ficava sem fôlego, ele sussurrou

— Se posso entrar e sair de uma armadura; posso desatar qualquer peça de vestuário que use.

E como prova de sua duvidosa destreza, desatou a bandagem de aros dourados e lhe subiu a fina saia ao redor dos quadris, lhe deixando o sexo pulsante exposto para prazer dele.

Ela fez um esforço final para levantar-se, só para encontrar-se lançada contra o corpo dele.

— Assim está melhor — disse ele, brincando com os cachos úmidos da área genital dela.

— Devon...

A respiração quente dele atingiu com sua orelha. O calor dominante do corpo duro, musculoso dele, apoderou-se dos sentidos dela. Ela sentiu como cedia dolorida, com seu sexo pulsando desconfortavelmente. Ela mordeu o lábio para reprimir um gemido.

Ele sussurrou:

— Isso está melhor ainda. Separe as pernas um pouco para mim.

— Para que?

— Isto.

Ela deu um grito abafado quando ele deslizou um dedo longo entre os rosados lábios molhados. Os músculos dela se apertaram contra ele. O ventre se contraiu, e se ela não estivesse na cama, cairia no chão como se não tivesse ossos.

— Está tão molhada — lhe disse com a boca junto à orelha — E apertada como um casulo. — Ele deslizou outro dedo na passagem sensível dela e mostrou sua aprovação com um gemido.

Ela soltou um grito suave enquanto ele empurrava seu dedo mais profundo, medindo até que encontrou a resistência à invasão.

— Doce Jocelyn — murmurou. — Tentarei ser cuidadoso quando chegar o momento.

Quando chegar o momento. E o que era isto? Perguntou-se desconcertada.

Os músculos se contraíram contra os dedos, e teria soluçado forte se ele não a tivesse girado rápido e não tomasse sua boca em outro beijo luxurioso.

Ele a apertou mais contra seu corpo. Seus dedos se aceleraram entre as dobras úmidas femininas, até levá-la a um clímax tão intenso que parecia que seu coração iria deixar de pulsar.

Aturdida enterrou seu rosto no ombro dele e escutou o rápido pulsar do coração dele. Qualquer que fosse a devastação incrível que lhe tinha ocasionado, ele não tinha ficado sem perturbar-se. Sua respiração era irregular. Sua mão enorme lhe dava batidinhas com prazer ambíguo. Ela voltou a tremer nos braços dele. E sorriu para si mesma antecipando mais momentos como este que viriam mais adiante. Ela nunca imaginou, mas agora que foi introduzida ao mundo de Devon, tinha que experimentar mais.

— Talvez devesse brigar em batalhas como seu campeão — meditou ele com voz sonolenta de desejo.

— Eu...

Um golpe brusco na porta o interrompeu.

— Devon eu posso entrar? — Perguntou uma forte voz masculina. — Sou eu, Adam. Eu gostaria muito de um encontro de homem a homem.

— Como em um combate? — Devon murmurou franzindo o cenho. —

Céus devia tê-lo matado quando tive a oportunidade.

Jocelyn levantou a cabeça horrorizada. Sentia o corpo pesado, e mais até com Devon em cima.

— Não pode nos encontrar assim.

Devon lançou maldições em voz baixa e a segurou pela cintura com seus braços para que não saísse correndo. Seus olhos azuis ardiam com frustração.

— Vá embora — grunhiu. — Me pegou nu na banheira.

— Dói-lhe? — perguntou Adam preocupado.

Devon suspirou e olhou com aberta luxúria à mulher que jazia debaixo dele.

— É uma agonia. Entre parênteses, não está me ajudando em nada.

— Não queria perder o controle hoje — explicou Adam torpemente. —

Nem sequer queria desafiá-lo para falar a verdade.

Jocelyn tentou dissimuladamente descer a túnica com uma mão, mas Devon a segurou e enlaçou seus dedos com os dela.

— Não se mova — ordenou em voz baixa. — Ninguém vai entrar neste quarto.

— Nem sequer pode se mover? — Adam perguntou alarmado. — Ao que parece não conheço minha própria força. São as costas o que dói?

— Por aí perto — Devon respondeu malicioso. — É mais um pouco de contração muscular que outra coisa.

— Posso tentar estirá-lo? — perguntou Adam hesitante.

Devon se sentou com o rosto sombrio pela irritação.

— É isso o que veio perguntar?

— Eh, não — replicou Adam. — Tinha pensado que seria um bom ato de galanteria se nós três aparecêssemos juntos na festa, como amigos. Tendo brigado juntos antes seria bom.

Devon se agachou para beijar Jocelyn enquanto descia o vestido tampando as partes de seu corpo que tinha estimulado e satisfeito com uma destreza consumada.

— Nós três? — perguntou ausente, sentando-a e movendo-a para frente para lhe amarrar o vestido. — Imagino que a terceira pessoa a que se refere é Jocelyn?

Pobre e confiante Adam. Soou completamente desconcertado enquanto respondia.

— Não, quis dizer que você, eu e Gabriel deveríamos nos apresentar como os três mosqueteiros; se acha isso.

— Não o farei — Devon murmurou e em seguida subiu a voz. — Por

todos os infernos, disse Gabriel?

— Está aqui comigo, se pode acreditar.

Devon grunhiu.

— Não me diga que ia passando por meu quarto ao mesmo tempo em que você?

— Como adivinhou? — disse Adam surpreso, em seguida vacilou. —

Suponho que não sabe aonde foi Jocelyn?

Gabriel limpou a garganta.

— Adam acredita que nossa briga de hoje a assustou. Voltou a desaparecer.

Devon inclinou-se para trás apoiando-se nos cotovelos e sorriu.

— Acha que deveríamos procurá-la? — Adam perguntou ansioso.

— Seria tão amável? — respondeu Devon colocando uma mão no joelho de Jocelyn. — Estou moído com os golpes que me deu.

— Compreendo — Adam disse com tal gravidade que Devon moveu a cabeça com pena divertida. — Deve estar mau. Foi uma grande briga, não é verdade?

— Espero me recuperar — Devon respondeu com calma. — Raramente entro em uma batalha mais desafiante.

— Se encontrar Jocelyn antes que você quer que lhe dê uma mensagem?

— perguntou Adam depois de uma pausa embaraçosa.

Devon hesitou, com uma expressão tão perplexa que ela temeu que a entregasse. Mas ele se inclinou e a beijou com insinuação de sensualidade ardente.

— Acho que é melhor entregar a mensagem em pessoa, Adam —

murmurou.

— Mas não está ressentido? — inquiriu novamente Adam com voz febril.

Ao que Devon respondeu tão baixo que só Jocelyn pôde ouvir.

— O que responde a isso? Estou ressentido?

Vinte minutos depois estava vestido com um traje de noite formal fazendo guarda no corredor para que Jocelyn fosse às escondidas pelas escadas á seu

quarto.

Ela escapou bem a tempo.

O castelo começou a encher-se com os convidados que voltavam para seus aposentos para trocar seus trajes medievais pelos trajes para o suntuoso banquete no Grande Salão. Os criados se apressaram em levar água quente para que se lavassem, e entregar a roupa recém engomada, e os bilhetes de amor perfumados.

A festa de Lorde Fernshaw assinalava o fim das festividades em sua casa.

Sabia-se que os convidados ficavam acordados até entrada da manhã e dormitavam de maneira intermitente durante a viagem de volta a Londres.

Era uma noite para flertar, jantar, dançar e dizer adeus a um amante, para atribuições futuras.

E para contemplar o futuro.

Devon se sentou na enorme mesa do banquete bebendo seu vinho, rindo com as brincadeiras e os brindes vulgares que sua presença inspirava.

Entretanto, nenhum dos sarcasmos tocava seu compromisso matrimonial.

Ninguém na festa ofenderia abertamente Jocelyn depois do que tinha acontecido no dia de hoje. Ele não só tinha deixado muito claro onde estava sua lealdade, mas tinha demonstrado que brigaria por ela.

Mas se alguém lhe tivesse dito há uma semana que deixaria a festa; comprometido para casar-se, teria denunciado essa pessoa como mentirosa e a teria golpeado ali mesmo.

Casado. Com Jocelyn Lydbury.

A jovem dama cujo convite para jantar ele se negou a aceitar, e olhem-no agora. A oferta deixada de lado voltou aumentada na forma de um matrimônio muito rápido. Que Deus o ajudasse. Seria muito mais fácil o contrário, que tivesse aceitado o jantar original.

E acabou que ele jantaria o resto de seus dias com ela.

Observou-a com interesse reticente, recordando que sua serena flor de campo, ocultava uma natureza bastante apaixonada. Seu corpo suave e flexível

lhe esquentava o sangue; o encanto quente e sutil que ela mostrava cada vez que se encontravam talvez fosse o mais atraente. Perguntou-se como se supunha que iria dormir ao lado dela todas as noites pretendendo ser indiferente as suas próprias necessidades.

Não era possível. Nem tampouco tentava abster-se das delícias da cama matrimonial. Mas quanto a que mais qualquer um deles pudesse esperar depois da troca de votos, ele não podia predizer.

Os olhos deles se encontraram ele levantou sua taça e bebeu um gole longo, engolindo a risada quando ela franziu o cenho levemente.

Entretanto quando houve outro brinde em honra a ele, ela foi a primeira a levantar sua taça.

Era como se a crueldade da crítica social os tivesse forçado a uma aliança.

Eles podiam se queixar entre eles, mas pareciam ter feito um pacto tácito de apresentar boa cara frente aos demais.

Os de mentalidade cruel ou os simplesmente curiosos que esperavam ver uma rachadura na fachada do escandaloso casal levantaram-se da mesa decepcionados nessa noite. Com toda a aparência de nobreza negligente, a força de caráter de Devon estava forjada de aço Boscastle, e reforçada com a bengala de seu pai. A cavalaria o tinha feito homem. Suas irmãs se asseguraram que soubesse como tratar uma dama em público.

Deixaram-no a ele e a Jocelyn batalhar seu próprio acerto na privacidade do dormitório quando chegasse o momento. Não havia necessidade que ninguém soubesse por seu comportamento quais eram seus sentimentos.

Nem sequer ele mesmo os conhecia totalmente, para ser honesto.


Quanto à Jocelyn, seu encanto tranqüilo de campo inglês, deixava-a em bom pé. Ela sorria, dizia pouco, e dava segundos pensamentos a aqueles que se perguntavam quanto tempo passaria antes que seu Boscastle se perdesse.

Contudo, a maioria dos convidados estava de acordo que Devon e Jocelyn não só formavam um casal atraente, mas o desenvolvimento de seu romance secreto tinha elevado a festa anual na casa de Alton à categoria da melhor

aventura a que eles jamais tinham assistido.

 

 

CAPÍTULO 11

 


Iam se casar na capela da residência em Park Lane de Grayson Boscastle, na manhã seguinte à volta para Londres. Emma Boscastle tinha prometido encarregar-se de todos os acertos. De qualquer maneira Jocelyn estava muito nervosa desde o momento que a carruagem da Viscondessa chegou a Eppin Road, com Devon, Gabriel e Grayson cavalgando atrás.

As damas chegaram há Londres vinte minutos antes que seus cavalheiros guardiões, e desde esse momento não houve tempo para preocupar-se com nada.

O coração apaixonado da família Boscastle absorveu Jocelyn.

De fato, ela e Devon só passaram alguns minutos juntos nas escadas da Mansão de Grayson na noite que chegaram, e mesmo então foram em direções opostas.

Ele subia correndo para procurar um de seus primos revoltosos que estava lançando bolas de papel mastigado aos criados. Ela vinha descendo de uma prova apressada com a costureira de Lady Jane para alterar o vestido de noiva que iria usar na manhã seguinte.

A casa estava cheia de Boscastle que se apressaram em chegar a Londres para o casamento surpresa e ao jantar da véspera para celebrar o acontecimento.

Com tantos parentes reunidos, era quase impossível conversar sem ser constantemente interrompidos de uma maneira emotiva embora exaustiva.

— Bom isto é uma surpresa — disse Jocelyn parando, com esse salto agradável, mas doloroso do coração, que lhe acontecia cada vez que o via.

Bonito, sedutor Devon Boscastle. Como era possível que fosse dela.

— Pensei que podia ter escapado quando vinha para aqui.

— Sinto muito decepcioná-la — zombou ele, lhe dando um grande sorriso.

— É algo infernal descobrir que alguém tem honra em momentos como este.

Também pensei que tinha escapado — disse aflito.

— Nunca escapei de nada na vida — disse ela tranqüila.

— Eu tampouco — Os olhos azuis peraltas brilhavam.

Ela assentiu de repente sem saber o que dizer. Ele se casava com ela sem querer fazê-lo.

— Bom, então aqui estamos, embora um de nós ainda possa fugir-se antes que chegue a manhã.

Mas nenhum deles o fez.

Quando ela despertou na manhã seguinte, o primeiro que ouviu, foi sua voz profunda no andar de baixo. Ele e seus irmãos riam a gargalhadas.

Estava descobrindo que era uma família bastante desinibida, propensa a rir com freqüência. Só esperava que este bom humor durasse e que ambos tivessem causa para rir juntos no futuro.

Nunca teve muitas razões para rir em sua própria casa. Tinha sido uma agonia observar a sua mãe prisioneira nesse matrimônio tão infeliz.

E agora... Mordeu o lábio. Não queria ficar presa em um matrimônio infeliz, e tampouco queria que Devon se sentisse preso.

Era um dia que se supunha que uma mulher desfrutava. Uma noiva era o centro da atenção, sentia-se formosa, e era muito querida. Vestiu-se com a ajuda da esposa de Grayson, e ele caminhou com ela pelo corredor para entregá-la, porque seu pai e irmão na última hora decidiram não ir.

Não estava tão nervosa como supunha que estaria. Passou a cerimônia com um curioso sentimento de distância, como se estivesse no camarote de um teatro, observando dois atores estranhos pretendendo fazer suas promessas.

Quem era esse estranho de cabelo negro como corvo tão alto ao lado de sua noiva despretensiosa? Tudo era entristecedor. A beleza escura da família Boscastle, todos cheios de uma essência vital que a remexia até sua própria alma, á fazia sentir-se como se tivesse estado dormindo até este momento.

— Bom — disse Devon, tossindo em seu punho enluvado — parece que ambos estamos aqui.

— Sim — Ela escondeu um sorriso involuntário.

— E seu pai e irmão...?

Ela balançou a cabeça, proibindo-se demonstrar que lhe importava.

Para falar a verdade, era um alívio que seu pai tivesse recusado aparecer.

Não haveria nenhum comentário desagradável que empanasse o dia de suas bodas.

— Não vêm.

— Ah. — Contraiu-se um músculo na face dele. — Suponho que não sentirá falta deles nesta multidão.

Por um momento incômodo, ela temeu que ele fosse afundar mais.

Não tinha nenhuma explicação, nem para ele nem para ela. Ainda ela não tinha uma resposta por que seu pai tinha sido tão insensível, tão cruel.

Ela disse a si mesmo que Devon não era como ele.

Para seu alívio e deleite, ele disse simplesmente.

— Está muito bonita hoje, entre parênteses. Mais que bonita.

O resplendor escuro de seus olhos lhe fez acreditar que o dizia de verdade.

— Obrigada — murmurou. — E você está muito bonito — Mas ele sempre era assim. — Dormiu bem? — perguntou.

— Nem um pestanejo sequer, e você?

— Menos que um pestanejo.

Ela respirou profundamente e apertou seu pequeno ramo de campainhas brancas de inverno.

— Estamos planejando ir à recepção juntos? — perguntou ele como se não soubesse que mais dizer.

— Não é uma tradição?

— Eu... Eu não vou a muitos casamentos, mas imagino que estaremos obrigados.

Obrigados. Que palavra tão pesada e sombria.

— A menos que não queira ir — acrescentou ele.

Ela olhou à frente. Duvidava que alguém que os observasse pudesse adivinhar que sua conversa em sussurros não se tratava de brincadeiras pré-

núpcias e declarações subjacentes de amor, mas sim de concessões práticas de dois generais militares obrigados a juntarem-se e declararem uma trégua. Eles eram algo mais que dois estranhos parados no altar.

— Me ocorre que um de nós ainda pode fugir-se depois do casamento —

disse ela pensativamente.

— Só se nenhum de nós concebeu um filho — disse ele imperturbável.

Ela o olhou surpresa.

— O que acaba de dizer?

Ele encolheu os ombros, com um sorriso travesso espreitando em seus olhos.

— Bom, é de esperar.

— Que mais é de esperar? — ela sussurrou depois de um momento.

Ele se viu perdido.

— Se alguma vez lhe for infiel, prometo que não ouvirá nada, e serei discreto.

Ela lançou fumaça por outro momento.

— Se me for infiel, ouvirá de mim, e provavelmente terminará morto, sem discrição.

Ele olhou para baixo com uma sobrancelha levantada.

— Não tínhamos acordado que este seria um matrimônio de nome somente?

— Não me lembro que algum dos dois tenhamos tido muitas oportunidades para nos pôr de acordo em algo.

Ele voltou sua atenção de novo ao altar, assentindo como avaliando.

— O que me aconteceu para acreditar alguma vez que era tímida?

— Não recordo que tenha se fixado o suficiente em mim para que percebesse como sou.

— Terei que prestar atenção agora — murmurou.

— Que tipo de atenção?

— Você sabe — respondeu com uma voz perversa. — O tipo de atenção

que uma dama gosta.

Os dedos dela se curvaram dentro das luvas de pelica branca. Um matrimônio de conveniência, sem amor, poderia ser aceitável ante os olhos de sua mãe. Por certo, mais de uma esposa era cega aos namoricos de seu marido.

Talvez se Jocelyn tivesse passado a fazer parte de uma família convencional através do matrimônio, resignaria a aceitar um destino nada tentador.

Mas um dos traços admiráveis, embora escandaloso dos Boscastle, era ir contra a corrente.

E assim o faria ela. Embora não imaginasse como.

O ministro parou diante deles, com seu livro aberto. Houve um ruído sussurrante atrás deles, enquanto todos se acomodavam atentos.

— Provavelmente ainda poderia achar um navio para a Índia se apressar-se para chegar ao cais — disse ela em voz baixa.

— Provavelmente. — Segurou sua mão com firmeza. — Mas não é uma viagem agradável.

— Acha que a viagem diante de nós será mais calma?

— Não sei. Nunca o fiz.

Não quero amá-lo, pensou ela. Não posso. Não o farei. Nego-me.

Então o ministro lhe deu um sorriso alentador, e ela disse que sim, fá-lo-ia.

Pelo menos era sua voz a que respondeu. E foi seu coração o que se acelerou quando os lábios de Devon tocaram os seus desencadeando um feroz tremor de desejo na base de sua coluna vertebral. Só esperava que ninguém percebesse que seus lábios se abriram em um grito apagado involuntário quando ele a beijou.

Ele o notou, seu marido. Sua mão forte lhe pressionou a parte baixa das costas. Os olhos perceptivos dele cintilaram durante um breve reconhecimento, antes que a convenção os separasse. Bom, talvez não fosse propriamente uma convenção, mas a família Boscastle em massa.

O clã lhe deu boas vindas tão calorosas que quase se esqueceu que seu pai e irmão tinham decidido não assistir.

Houve muito pouco tempo para lamentar sua ausência, como Devon, seu

marido, havia dito.

Em resumo, beijaram-na, abraçaram-na, cravaram uma vez por um tio de meia idade cheio de travessura amorosa, abraçada por querubins de rostos pegajosos, e arrastada a um traje de gala geral de desordem e desejos sinceros de felicidade.

Assim começou seu primeiro dia como uma noiva Boscastle, um dia de confusão agradável e aceitação calorosa, de desejo silencioso e incerteza.

Mas em sua noite de núpcias tomou suficientes goles de vinho que lhe davam uma sensação falsa de coragem quando Devon lhe sussurrou que era hora que se fosse para casa. Casa. Um lugar que não tinha visto nunca.

Seu marido. Um homem com quem tinha feito um compromisso hoje.

Ficava por ver quão sério ele tinha tomado as promessas dela. Sempre era diferente para uma mulher, não é? Mas ele tinha demonstrado ser um homem de honra e de paixão.

Tomou-a nos braços no vestíbulo de sua casa e a subiu pelas escadas com aparente facilidade.

— Meus criados estão agitados. Ninguém lhes avisou que traria uma esposa para casa.

Ela enlaçou os braços ao redor de seu pescoço. Cheirava deliciosamente a sabonete, amido e champanha, e esteve a seu lado ante Deus e os homens.

— Nem ninguém avisou a você — sussurrou ela escondendo o rosto em seu ombro para que ele não visse seu sorriso.

Levou-a para cima a seu quarto e a deixou em sua cama. A última vez que saiu desta casa, não tinha pensado que voltaria com uma residente permanente.

Talvez não tivesse pensado nada.

Mas não podia evitar notar quão natural Jocelyn parecia sobre sua cama de quatro postes. A cama deles agora se corrigiu em silêncio. Ia-lhe tomar um longo tempo acostumar-se a ter uma esposa.

E, entretanto ela tinha uma maneira cálida. Sem mencionar o que fazia a temperatura de seu corpo subir. Na realidade ele esperava com ansiedade sua

união sexual, depois do que aconteceu entre eles na última vez no castelo. Ela o tinha seduzido com sua reação, e sendo suficientemente idiota para cair em uma armadilha, não tentava perder o tempo com lamentações.

Ele sabia bem como passar o tempo.

Voltou-se para tirar o colete e parou ao ouvi-la levantar-se da cama.

Um momento depois sentiu suas brancas mãos suaves deslizando ao redor de sua cintura aos botões da camisa. Ele segurou o fôlego e esperou.

Ela o surpreendia agradavelmente a cada momento.

— Posso ajudar? — perguntou ela, atarefada já em despi-lo.

Ele ficou imóvel, com seu órgão masculino endurecendo-se ante o entusiasmo dela em participar. Esta era uma mulher bem vinda, que estava muito longe da mulher que se negou a conversar quando estava nu no banheiro.

— Bem vinda — murmurou ele levando a mão ao cinto da calça negra apertada. — Mas não pare na camisa.

Ela titubeou por um instante, então obedeceu, com a respiração evidentemente irregular enquanto a desabotoava. Depois com bastante torpeza lhe puxou a calça sobre os quadris estreitos para que caísse no chão. Seus olhos piscaram ante a ereção e depois subiram rapidamente ao rosto dele. Os lábios dela se abriram úmidos, convidativos. Ele notou o rubor que cobria sua pele cremosa.

— Agora se dispa para mim — instruiu-a.

Ela hesitou antes de recuar, ao biombo. Ele parou sobre sua roupa tirada, e a segurou pelo cotovelo.

— Não. Não atrás disso. Eu gostaria de ver como é minha esposa.

Ele foi para a cama e esperou.

Ela desceu os olhos e lentamente tirou o vestido de noiva de gaze marfim.

Depois desabotoou a camisa e o pequeno espartilho. Os seios saltaram livres, os mamilos se contraíram ante o exame desavergonhado dele.

— Pode ficar com as ligas e as meias. Tire os sapatos e venha para mim.

— É tímido para dar ordens, não é verdade?

— Não serei nada tímido quando tiver que lhe dar o que necessita — lhe respondeu, examinando-a com um olhar ardente e crua sensualidade. — Venha aqui e me deixe lhe mostrar.

Ela ficou olhando-o fixo o sangue lhe pulsava espessamente entre as pernas.

— Posso esperar toda a noite — murmurou ele. — Depois de tudo estamos casados. Posso esperá-la para sempre.

Jazia estirado através da cama, apoiado em um braço, em uma pose lânguida, a resposta de seu corpo à vulnerabilidade nua dela, não andava nem perto de quão distanciada parecia sua voz. Duro como o aço. Seu marido. Ele tinha licença para ser licencioso, e ela tinha prometido obedecê-lo há umas horas atrás.

Foi lentamente para a cama, os seios contraídos, o corpo lhe formigava com antecipação.

— E agora? — perguntou suavemente, encontrando o olhar dele.

Ele estirou seu corpo longo e se sentou com suas poderosas coxas separadas.

— O que vai fazer — lhe disse com os olhos ardendo de luxúria — é aprender sobre o amor.

Abriram-se os olhos dela.

— Á seus pés?

— Ou aos seus — disse erguendo os ombros com autoridade. — Não tenho nenhuma objeção a que nos alternemos. Desfruto de qualquer quantidade de posições, e estou certo que assim o fará você.

O prazer flagrante que implicava fez com que Jocelyn se perguntasse quanto tempo mais iria ser capaz de suportar seu escrutínio antes de perder totalmente a habilidade de estar em pé. Uma pergunta a que não se viu forçada a responder. Sem aviso ele esticou os braços e puxou-a pelas suaves esferas de seu traseiro pondo-a debaixo ele com uma determinação que pôs fim ao dilema dela.

Uma vez mais, quase não lhe deu oportunidade a que conservasse um

mínimo sequer de modéstia. Sempre muito lentamente, ele deslizava a ponta de seus dedos por seu rosto, traçando a artéria que pulsava em sua têmpora, suas maçãs do rosto e queixo. Ela suspirou de prazer, seduzida por seu contato.

Quentes e fortes, com o poder subjugado assim deveriam sentir-se sempre as mãos de um homem quando tocava uma mulher.

— Feche os olhos, Jocelyn — instruiu-a com uma voz lânguida.

Fez isso, desejando mais. Os dedos dele percorreram sua garganta e os ombros. Ela esperou que lhe acariciasse os seios, o resto do corpo.

Soltou um pequeno gemido de impaciência.

Ele riu suavemente antes de tomar sua boca em um beijo.

— Sei o que deseja.

— E?

A respiração dele estremeceu contra a dela.

— Eu o desejo muito mais até que você.

Ela abriu os olhos. O desejo nos olhos dele lhe mandou uma descarga elétrica que desceu por sua espinha dorsal. Fez com que lhe inchassem os seios, e o sexo se umedecesse com a expectativa. Os quadris dela se moveram, e ele sorriu diabolicamente.

Como se fosse o ato mais natural do mundo, e para ele talvez fosse, deslizou seus dedos entre as coxas dela e lhe acariciou os lábios.

— Molhada — murmurou satisfeito. E pressionou os dedos brilhantes contra sua boca. — Delicioso. Não tenho que fazer nada para excitá-la.

Ela apertou os dentes para suprimir um gemido, mas não pôde suprimir o calafrio de puro desejo que a percorreu. Ele era um homem altamente sexual, experiente nas artes eróticas e não pedia desculpas pelo fato; ela não devia surpreender-se que ele soubesse como desarmá-la. Seus receios pulsavam antecipadamente com o prazer que ele prometia.

— Jocelyn — disse rouco, permitindo que seu corpo duro como ferro se instalasse sobre ela. — Como treme. Poderia fazê-la alcançar o máximo sem nenhum esforço.

Ela levantou a cabeça.

— Espero poder lhe dizer o mesmo algum dia.

— Pode ser que esteja mais perto do que você acredita. Até então, parece que ainda a tenho sob minha mão.

E para provar que sua perversa afirmação tinha mérito, acariciou lhe a ponta dos seios com seus dedos calosos, até que ela ficou quase ofegando, desesperada por alcançar um alívio. Acariciou lhe o ventre, puxou-lhe desavergonhadamente os pêlos de sexo e o botão sensível escondido, até que ela reconheceu que ele era o professor e que ela faria algo pelo prazer que tinha em suspense.

Ele se inclinou para beijá-la suavemente nos lábios, sussurrando:

— Como está desfrutando da lição até agora?

Ela voltou a rosto para o travesseiro.

— Meu professor é o mais cruel dos professores.

— Mas uma estudante diligente não se queixa da prática.

Muito versado nas formas da luxúria, zombava dela sem compaixão, e explorava cada sinal de vulnerabilidade que lhe revelava. Ela não podia resistir a seus beijos devoradores, nem podia evitar responder ao tato dessas mãos poderosas sobre seu corpo. Ela afastou as coxas sem nenhuma inibição e levantou os seios convidando-o à sedução, perguntando-se se ele se horrorizaria pelo que seu corpo lhe pedia que fizesse, sabendo pelo gemido profundo de satisfação, que não tinha sido assim.

Ele estava belo, excitado, e dedicado a excitá-la.

Era o tipo de homem a cujo encanto magnético ela tinha resistido constantemente desde que se apresentou em sociedade. E pensar que ela tinha desprezado às mulheres que tinham sucumbido ao encanto de um patife. Casara-se com um, e não podia esperar nenhuma onça de compreensão de sua família nem de suas amizades. Na realidade, tinha conhecido algumas próximas que invejariam seu destino.

Era a esposa de um homem pecador, um dos perversos irmãos Boscastle de

sangue quente. Olhou o rosto dele nas sombras e sentiu que o coração lhe apertava com o sombrio erotismo de seu olhar.

— Quero conhecer tudo — sussurrou ela.

Por um momento acreditou que o tinha aborrecido; ele não reagiu por tanto tempo, que se perguntou se uma mulher não deveria admitir seus desejos tão livremente, enquanto um homem não tinha tal restrição.

Então ele se levantou sobre ela com um olhar tão feroz que a ela lhe parou a respiração. Antes de perceber que lhe tinha produzido esta perda de controle, lhe colocou as pernas sobre seus largos ombros, tomou seu traseiro e começou esfregar a ereção grossa contra suas dobras cheias.

Ela levantou seu corpo para ele com um entusiasmo sem restrições.

Ele deslizou uma mão por seu ventre, no espaço entre suas coxas e lhe cravou com destreza a pérola sensível de carne sobre o sexo. Os nervos dela se retesaram com a sensação crua, e ela sentiu como lhe sorria, embora ela tivesse fechado os olhos apertados, envergonhada do prazer que a inundava.

— Eu acredito que você me ensinará umas quantas coisas de sua própria colheita, antes que acabemos — murmurou ele.

A respiração dela se acelerou; ele desceu a cabeça e a beijou, tomando o suave grito dela, afundando sua língua muito dentro de sua boca, enquanto aliviava seu pênis inchado na camada úmida dela. Ela se sobressaltou com a dor aguda. A pressão a retesou tanto que acreditou que iria se partir em pedaços.

Para seu alívio, seu corpo pareceu acomodá-lo bem. A dor foi transformada em uma fricção ardente, não de todo desagradável. Uma parte dela parecia ansiosa de aceitar a invasão.

Ele tomou vantagem do leve descontentamento sem fôlego dela e a perfurou de um só empurrão, penetrando-a com tanta força que ela congelou debaixo dele. Suas mãos o apertaram em protesto. Ela não deveria ter se surpreendido considerando que ele tinha introduzido um órgão tão grande em um espaço tão apertado. Não podia dizer como um ato único se podia sentir ao mesmo tempo carnal escandaloso e tão necessário para seu ser.

Não importava. Era um ato desenhado pela natureza. Ela era sua esposa, e seu corpo de mulher lhe dava as boas vindas, movia-se contra ele com um instinto que ela não podia negar. Seus músculos o apertaram, contraíram-se, induziram-no a que a penetrasse mais profundo. Ele empurrou com tal força que ela sentiu o impacto até sua espinha dorsal.

Perdeu-se em seu marido. Sua mente nadava, seus músculos se enrolavam, seus quadris se levantavam, e ainda lhe doía, e desejava mais. E mais. Os movimentos dele se aceleraram. A frustração dela aumentou.

Pensava que ele deveria entender como sofria ela. Ele gemeu e arqueou as costas, pressionando-a até mais na cama. Os calcanhares dela se afundaram nas nádegas dele.

Ele bombeou mais duro e mais rápido, e o mundo se dissolveu enquanto ele também, convulsionando, cobria o corpo dela com o seu.

Ela se rompeu em pedaços, não podia respirar. Tinha medo de mover-se.

Medo de abrir os olhos e que ele não revelasse o mesmo que sentia ela. Passaram uns momentos antes que ele rodasse e ficasse de costas com um braço através de seu ventre e uma paz mais doce que tudo o que tinha conhecido até agora, embargou-a, acalmando as dúvidas e perguntas que se amontoavam atrás em sua mente.

Uma esposa muito satisfeita em sua noite de núpcias. Sua reputação como amante não era exagerada, embora mesmo para uma mulher tão inexperiente como era ela até este momento, era claro que também lhe tinha dado prazer.

Ele jazia na cama revolta e olhava os primeiros raios de luz sobre o ombro de sua esposa. Sua esposa. Ele pronunciou a palavra em silêncio e descobriu que não lhe era familiar, mas tampouco tão desagradável como tinha antecipado.

Na realidade nada lhe tinha desagradado.

Ela era completamente diferente das reprimidas que se entregavam aos desejos perversos dele e voltavam por mais. Não é que nunca jogasse com as debutantes.

Tinha-o feito.

Mas com as inocentes era outro jogo. Havia regras a seguir e conseqüências a considerar. Um homem podia terminar casando-se.

Esticou a mão para lhe acariciar o lugar iluminado pelo sol no ombro. Era esta a mesma jovem ingênua que ele tinha evitado quatro anos antes? Quem era esta mulher de sangue ardente que se transformou em uma tentadora, sua esposa?

Quem quer que fosse, era perigosa. Deliciosa, às vezes tímida, outras, audaz, sem medo de entregar-se completamente a ele.

Muito breve aconteceria, teriam um filho. Depois de fazer amor na noite anterior, depois de anos de evitar que ocorresse uma gravidez, seria idiota não reconhecer a possibilidade. Não podia imaginar. Não se vangloriava tanto para pensar que a natureza se interromperia por sua falta de previsão.

Ela se moveu com um suspiro. A colcha se enrugou em suas costelas, revelando um seio cremoso. Ele pôde ver as evidências impressas das mordidas de amor no pescoço.

Ele engoliu em seco, e voltou o olhar a outra parte, subitamente com a boca seca de desejo.

No passado, era estranho que ele ficasse com uma amante até as primeiras horas da manhã. O amanhecer oferecia intimidades mais perigosas que a escuridão. Tinha-lhe dado seu nome. Tinha cumprido seu dever. Ninguém podia pedir mais de um homem que nunca tinha considerado assentar cabeça. Ele achava que tinha que pagar; umas quantas dívidas antigas, passar o tempo em busca de prazeres inúteis, antes de chegar a isto.

Mas lhe tinham tirado a possibilidade das mãos, e se achava não só compartilhando a cama, mas também sua vida, com esta mulher despretensiosa, que na noite anterior lhe tinha demonstrado o antigo adágio que as aparências enganam.

Levantou-se e se vestiu silenciosamente para não estar presente quando ela despertasse. Pensou que era possível que ela dormisse algumas horas mais; e que realmente seria uma vergonha se ela esperasse mais do que lhe tinha oferecido.

Todos sabiam que era um libertino, só respondia ante si mesmo, e que tivesse sentido de honra não significava que tinha coração.

 

 

CAPÍTULO 12

 


Tinha transcorrido aproximadamente uma hora desde que seu marido abandonou o leito nupcial, quando Jocelyn despertou. Sua figura nua estava coberta por uma colcha, jogada a seu redor, que desenhava o contorno de sua silhueta. Sua cabeça descansava em um macio travesseiro. Não achou nenhuma nota sob os lençóis de seu desaparecido marido. Ignorava o que se esperava que fizesse com o passar do dia.

Vestiu-se sem chamar nenhuma criada, ao menos podia empregar seu tempo em atender suas próprias necessidades. Pensou que talvez seu marido pudesse esperá-la ao pé das escadas, mas quando o chamou só lhe respondeu o silêncio, lhe indicando que estava sozinha no salão.

Era uma dona de casa que desconhecia os cômodos de seu lar, e tampouco sabia os nomes dos serviçais.

Ignorava o que devia fazer. Decidiu que explorar os aposentos de seu novo lar e ir conhecendo as pessoas que ali trabalhavam e dar-se a conhecer, depois de seu inesperado matrimônio, seria um bom começo.

Perguntava-se como poderia ganhar a lealdade dos que ali viviam.

Por sorte suas dúvidas resolveram-se satisfatoriamente minutos depois, enquanto descia as escadas, ouviu como batiam persistentemente à porta.

Parou, duvidando de como devia proceder, quando apareceu um homem alto com calção curto. Era o mordomo que chegava correndo para abrir a porta, enquanto do fundo as suas costas ouviu como uma mulher sussurrava nervosa.

— Corre antes que ela desperte. Deus nos ajude se for outra dessas prostitutas. Estive expulsando-as toda a manhã.

— Já me apressei senhora Hadley, — replicou. — Mas se for uma dessas prostitutas agradecer-lhe-ei que se encarregue. Não considero que seja minha responsabilidade me desfazer delas.

Prostitutas? Pensou Jocelyn horrorizada.

A governanta esteve perseguindo-as toda a manhã? Quantas haveria ao redor da casa? E o que queriam?

— São elas, — murmurou o mordomo antes de abrir a porta.

Jocelyn decidiu sentar-se na escada para observar o que acontecia.

De seu esconderijo, escutou como três jovens senhoras batiam a sua porta sem a devida escolta e sem nenhum decoro, nem comportamento adequado segundo as regras de etiqueta. Todas mostraram sua incredulidade, inclusive um direto enfrentamento, ao saber que seu favorito descarado, viu-se obrigado a casar-se com uma simples mulher, que ninguém considerou uma digna rival para ser sua esposa.

Pensou que essas jovens eram muito atrevidas a seu entender, procurando descaradamente seu marido e decidiu cortar rapidamente esse costume de bater à sua porta. Mas parou quando escutou do patamar uns dolorosos comentários, cheios de rancor.

O mordomo continuava em pé, totalmente aturdido tentando contê-las, depois de lhes haver assegurado que seu amo não estava em casa. As mulheres não deixaram de protestar e amaldiçoar.

— Durante o café da manhã, ouvimos um horrível rumor sobre Lorde Devon.

— É certo que se casou com Jocelyn Lydbury?

O mordomo se apoiava no bengaleiro exausto.

— Talvez pudessem apresentar-se em outro momento.

— Eu nunca ouvi falar dela, — soprou outra jovem.

— Então talvez, — comentou outra senhora, mordazmente, — Devon se casou com ela pela cavalgada.

— Obrigaram-no a casar-se com enganos.

— Ela atacou Lily Cranleigh com uma raquete.

— Acaso não é no mínimo que essa mulher merecia? — Respondeu uma corpulenta mulher com um enorme avental branco, enquanto cruzava a entrada.

— Eu lhes peço que deixem de cacarejar agora mesmo, para não incomodar à senhora. Sir Devon deixou ordens expressas de que devíamos deixá-la descansar, depois de sua primeira noite na casa. Disse que estava esgotada e acredito entender o significado de suas palavras.

Se por acaso as desavergonhadas não tinham entendido a mensagem, Jocelyn decidiu descer as escadas, desfrutando da comoção que causou sua aparição ante os três rostos que havia na entrada.

— Estou acordada Senhora Hadley. Por Deus quem está na porta?

Algumas mendiga? Não sabem que devem ir pela escada de serviço, pela parte de trás?

A senhora Hadley, cuja moralidade tinha sofrido freqüentes ofensas pela indecorosa atividade de Lorde Devon, abriu a porta com um firme gesto.

— Desejaríamos não voltar a ver nenhuma de vocês por esta casa, de fato estaríamos muito contentes se não voltarem a aparecer nenhuma de sua índole por este lar.

— O mesmo digo — reiterou Jocelyn, suspeitando que acabasse de ganhar a primeira aliada, na guerra que tinha a intenção de ganhar o amor de seu marido.

Embora Devon tivesse jurado que fora deliberadamente, quis demonstrar-se que seguia mantendo o controle sobre sua vida, fazendo suas atividades habituais. Durante a semana seguinte manteve seus costumes, assistiu às

corridas e o Box no Gentleman Jackson de manhã e à noite visitava seu clube, embora sempre retornasse ao leito junto a sua esposa.

Desejava-a por cima e além do que jamais pensou que fosse possível.

Quando ocasionalmente Jocelyn comentava suas ausências, sugeria-lhe que convidasse seus amigos ou que fosse fazer compras. Recordava-lhe que ele não tinha escolhido casar-se e se não gostava como agia, alegava que nunca prometeu mudar sua forma de vida.

Não o fazia por crueldade, mas sim por costume, como já lhe advertiu antes de fazer seus votos. Não pretendia ser desumano com sua esposa.

Inquieto desde seu nascimento, não podia permanecer em um lugar por um período muito longo, nem com a mesma mulher, embora desde que aceitou Jocelyn em seu leito, não tinha desejado a nenhuma outra. Ele não queria interpretar o que isto podia significar.

Ainda tinha que descobrir a identidade de quem conspirou contra ele e combinou uma reunião privada com seu irmão mais velho Drake, à tarde, para que o ajudasse a catalogar os possíveis culpados. Possivelmente a opinião de uma pessoa que não estivesse envolvida pessoalmente, seria de muita ajuda. E

Drake era uma pessoa reservada, cínica e desconfiada por natureza.

Seu irmão o esperava na biblioteca do andar térreo, folheando as torres de livros desordenados, que se alinhavam nas estantes, até o teto. Só tinham mantido uma breve conversa durante o banquete de seu casamento.

Devon sabia que era questão de tempo, antes que Drake exigisse saber a história completa de seu romance.

Drake virou seu cínico olhar azul, decidido a divertir-se.

— Jurou que preferia ser enterrado vivo antes que se casar. Acaso Jocelyn é uma benevolente proprietária de uma funerária?

— Ao que parecem ambos caímos em uma armadilha sem importar nossas opiniões.

— Sério?

Devon se sentou em uma das duas cadeiras frente à lareira.

— Suponho que Grayson já lhe explicou, detalhadamente, todo o escândalo e Emma terá acrescentado sua reprovada versão dos fatos. Não há nenhum secreto escondido, em como aconteceu tudo, o mistério é por que e por quem fomos enganados.

— Pôde ser a própria dama? — Disse Drake que sempre tinha um lado mais cético e soterrado e um temperamento mais tenebroso que seus irmãos.

— Inicialmente suspeitei de Gabriel.

Drake assentiu com a cabeça.

— Recordo que acompanhou a minha esposa a um bordel, com o pretexto

de ajudá-la a tranqüilizar-se.

— Sempre se diverte quando nos atacam, — refletiu Devon. — Mas com que finalidade?

— Talvez para demonstrar que inclusive um marginalizado pode exercer poder sobre um de nós. Entre nossos antepassados nunca houve invejosos e pessoas com más intenções.

Drake o estudou em silêncio.

— Você não acredita no que acaba de dizer realmente, não é verdade?

— Totalmente, — confessou Devon. — Ou é um fantástico mentiroso ou estou me enganando.

— Teremos que averiguar. Mas concordo com você e tampouco acredito que Gabriel seja nosso suspeito.

Devon balançou a cabeça.

— Acredito que devo levar isto a minha maneira. Roga a Deus que não tenha que ir solicitar a participação de nossos irmãos mais velhos.

Drake desviou o olhar, seu sorriso irônico rememorava velhas lembranças.

Seus irmãos mais velhos eram em ordem cronológica, seus formidáveis irmãos Grayson, Heath e Emma.

Até seu recente matrimônio, Devon tendia a ir por aí livre ou permanecer em terra neutra com respeito aos assuntos familiares. Chloe, Devon e seu falecido irmão Brandon, compunham o conjunto mais jovem dos Boscastle.

Estes três jovens brotos Boscastle, geralmente se uniam para fazer frente a seus irmãos mais velhos.

O sexto deles, entretanto, jamais duvidou em oferecer sua força para lutar contra o mundo.

— Já considerou a possibilidade de que o pai de Jocelyn tivesse lhe estendido uma armadilha, não é? — Perguntou cautelosamente Drake.

Devon franziu o cenho.

— Duvido. — Embora Sir Gideon mostrasse seu interesse em sua pessoa como possível pretendente. — Bom tudo é possível.

— Embora pouco provável, — opinou Drake. — Se sua estratégia tivesse falhado, Jocelyn teria ficado socialmente arruinada. Talvez sua esposa saiba mais do que está disposta a nos revelar.

— Não foi Jocelyn — rebateu, com um tom protetor. — Indaguei e se murmura que Sir Gideon tem tendências violentas, sabe se é verdade?

— Com suas tropas? Acredito com total segurança. Embora acaso esteja se referindo a que é agressivo com os membros de sua família? — Perguntou aborrecido Drake. — É responsável por maltratar sua esposa?

Devon hesitou antes de mencionar suas suspeitas.

— Não será jamais um convidado a nossa casa. Não pisará ali nunca.

Desde que nos casamos, ela não o mencionou nenhuma só vez.

— O passado e toda sua dor ficaram enterrados, — sussurrou seu irmão.

Devon respirou aliviado ao poder compartilhar suas desagradáveis acusações, embora lhe adoecesse a possibilidade de que fossem verdadeiras.

Machucar a uma filha, uma irmã, uma esposa, ou qualquer mulher era impensável para qualquer homem da família Boscastle.

Drake limpou a garganta.

— Esta conversa alterou os dois. Voltemos para a questão de quem lhes estendeu uma armadilha na festa. Nunca suspeitei que pudesse ter inimigos. De fato tem muitos mais amigos que a maioria dos cavalheiros que conheço.

Embora por desgraça nenhum deles valha mais de dois pennies.

Drake tinha atingido totalmente a verdade com suas observações, embora naquele momento Devon não percebesse. Não mudaria de atitude frente à pessoa que se enfureceu com ele, é claro, embora não deixaria passar a oportunidade de vingar-se da ignomínia que tinha mudado o curso de sua vida.

 

 

CAPÍTULO 13

 


Seu marido se reincorporou as suas atividades anteriores durante os dias seguintes, fugindo de Jocelyn, embora todas as noites ia a sua cama.

Não podia sonhar com um amante mais apaixonado para suas noites, mas pela manhã, era muito consciente de que seu marido ocultava seu coração.

Aparentemente sua indiferença não passou despercebida a sua cunhada Chloe. A jovem e vibrante viscondessa que estava se

recuperando

de

um

aborto

involuntário que tinha sofrido recentemente, á tomou sob seu amparo e lhe ofereceu todo seu apoio ante a atitude negligente de seu marido. Jocelyn tinha poucos amigos verdadeiros em Londres e tentava consolar-se com os móveis novos que Devon tinha comprado e por ter abandonado os encontros com prostitutas mantendo uma vigilância constante na porta. A governanta, a senhora Hadley, lhe foi muito útil em ambos os aspectos.

Em meio a estes esforços, Chloe tinha escoltado Jocelyn em várias excursões, saíram às compras, visitaram um museu e foram a uma perfumaria parisiense, assim como a uma festa para almoçar que se prolongou até bem entrada á tarde.

Hoje, sua cunhada insistia em que fossem ao parque e embora a princípio Jocelyn se negasse; de repente percebeu que todo o esforço que estava realizando para encher suas horas vazias era consciente de sua solidão e o fato de que a falta de atenção de Devon era evidente inclusive para sua própria família.

— Realmente não quer passear hoje pelo parque, Chloe, mas foi muito amável em vir me convidar.

Chloe, uma Boscastle até a medula, insistiu.

— Virá e vai paquerar a vontade até que tenha se exibido ante todos.

— Não deveria me importar que meu marido me ignore? — Perguntou-lhe com um triste sorriso. — Mas sim me importa. Preocupo-me muito por ele e ele

sabe.

— Então, virá?

— Sim, — suspirou. — Mas só para evitar que siga insistindo sem cessar até que te acompanhe.

Devon chegou ao parque à hora mais concorrida junto a seus buliçosos amigos, ficando surpreso ao encontrar sua esposa e Chloe passeando junto a vários dos jovens fascinados por sua irmã antes que se casasse e que, aparentemente, ainda lhe mostravam sua admiração.

Apoiou-se contra uma árvore, observando em silencio a sua esposa, esperando que percebesse sua presença. Entretanto, foi Chloe quem o viu primeiro e separando-se de seus fiéis acompanhantes, se aproximou.

— Vá, nos honras com sua presença.

Com um débil sorriso, perguntou-lhe:

— Como se sente?

— Bastante bem. — Respondeu-lhe, fugindo seu olhar.

Devon evitou continuar falando da perda do bebe sofrida por sua irmã.

— Foi sua idéia trazer aqui Jocelyn? — Perguntou-lhe depois de uma longa pausa.

— Sim — respondeu alegremente. — E estou feliz de ver quão bem encaixa em nossa sociedade. De fato paquera bastante bem, não acha o mesmo?

— Jocelyn?

— Não o notou, Devon? Ninguém a ignora como aos "vasos". Perco a um de meus seguidores cada vez que saímos juntas.

Devon levantou o olhar, fingindo uma olhada casual a sua mulher, a verdade é que desde que tinha chegado, não pôde lhe tirar os olhos de cima.

Sabia muito bem que Chloe era dada ao exagero e que estava tentando fazê-lo sentir-se culpado por sua falta de atenção por Jocelyn, mas...

Com quem diabo estava conversando? Há um momento a tinha visto caminhar sozinha pela margem do lago e agora havia um homem a seu lado.

Acaso esse galante cavalheiro de largos ombros que a olhava encantado

não sabia quem era ele? Viu como deixava cair sua cabeça para trás enquanto ria.

Seu acompanhante se inclinou como se adorasse o ar que ela respirava.

Desviou seu olhar com uma desagradável linha em seus lábios.

Reconhecia uma sangüenta sedução quando a via, mas não esperava que a praticassem com sua esposa ante seu nariz. Não gostava de ser o centro da atenção de todos os que os observavam, embora estivesse igualmente zangado se continuassem com esse flerte a portas fechadas.

— Vai ignorá-la sempre? — Sussurrou-lhe sua irmã de sua posição no outro lado da árvore.

— Parece ter conseguido já suficiente atenção — lhe respondeu com um tom de voz enganosamente indiferente.

— Mas não a sua.

— Deixemos as conferências de Grayson e Emma à parte — disse com seu sorriso mais sedutor. — Você e eu estamos do mesmo lado, recorda?

Ela hesitou com um olhar evidentemente cheio de preocupação.

Ambos tinham se aliado para esmagar a seus irmãos em sua infância.

Sabia que apesar de sua insistência, tinha as emoções mais que nunca a flor de pele depois da perda de seu filho.

— Não vou lhe fazer um sermão. — Suspirou. — Se não se importa que tome um amante. Por que deveria me preocupar eu neste caso?

Franziu o cenho com seu olhar distante, ao longe, enquanto se dirigia para seus amigos. Importar-lhe-ia que Jocelyn tivesse um amante? Acaso podia ser esse idiota que acabava de conhecer e que a perseguia? Acaso ela não tinha passado todas as noites em sua cama? Acaso não a estava empurrando a procurar o afeto e cuidados de outro homem, já que ele os negava?

Em um instante acabava de perder de vista Jocelyn. Não podia ter se desvanecido no ar. Ela não podia deixar-se convencer por um estranho, nem sequer se tivessem combinado um encontro para a meia noite.

Sacudiu a cabeça ante a ridícula situação que estava vivendo. Um homem que espiava em segredo sua esposa era uma cena que tinha jogado com muita

freqüência no passado. Era uma conseqüência de suas ofensas que também repercutiam em sua mulher. Perguntava-se como reagiria ela.

Esperou-a enquanto se desfazia de seu admirador. Estava dando um giro para o outro lado. O maldito louco a seguia. Franziu novamente o cenho.

Acabava-lhe de oferecer seu braço a esse louco ou lhe estava sussurrando palavras alentadoras?

Já tinha percebido que seu marido estava a poucos passos de distância?

Seu admirador não parecia ter a mínima idéia.

E certamente antes de casar-se não tinha usado jamais esses vestidos que se agarravam a seu corpo. Onde estava sua capa de todo modo? Algum desses dandies a tinha podido tirar deslizando-a por seus brancos ombros?

Ele tinha muita experiência em desatar facilmente o manto a uma dama.

Que deliciosa sensação senti-la tremer como uma pena enquanto deixava suaves beijos do pescoço a seus brancos seios.

Endireitou seus ombros. Também conhecia os gemidos de Jocelyn depois que na noite anterior lhe mordiscou seus mamilos e seus brancos e redondos seios. Não podia imaginar outro homem tocando-a. Não poderia suportar.

Jocelyn ergueu os olhos e ele soube que sua esposa era consciente que a estava observando. De fato se tivesse sido qualquer outra mulher, estaria convencido que sua atitude era para lhe provocar ciúmes.

Estava ciumento? Não. Sim. Maldição, sim estava ciumento. Estava ardendo dos pés a cabeça. Mas tentou tranqüilizar-se se assegurando que era um sentimento de posse compreensível sem nenhuma outra implicação mais profunda. Só porque lhe desgostava que outro homem jogasse com a mulher com quem ele tinha sido obrigado a casar-se não significava que...

Não significava nada.

Não queria que significasse nada. Ninguém podia lhe obrigar a sentir algo que se negava a sentir. Não tinha nenhum sentimento de qualquer natureza que fosse duradouro.

Nada pelo menos que o fosse mudar de ser um libertino sem coração a um

devoto marido. Novamente ergueu o olhar para Jocelyn e esse homem. O nó inesperado que oprimiu seu coração zombou de seu auto-engano ante essas emoções que surgiam.

Lutaria, já tinha começado a mudar.

 

 

CAPÍTULO 14

 


— Não estive em Londres há muito tempo — o cavalheiro de boa aparência explicava à Jocelyn, que só lhe tinha sorrido em primeiro lugar porque tinha a aparência inofensiva e amigável de um de seus primos do campo.

Mas era cada vez mais evidente até para uma dama tão inexperiente como ela nas artes amorosas que ele tinha a intenção de ser muito mais amigável do que lhe permitiria.

O bom senso lhe advertiu que os lobos foram investigar, para aproveitar-se de qualquer debilidade que ela pudesse revelar.

Pois bem, ela tinha seu próprio lobo para domesticar, e por que Devon partiu deixando-a defender-se sozinha? Sabia que esteve observando-a, embora ela não soubesse que ele pensava ir ao parque. Tinha sentido uma descarga de prazer que percorreu sua coluna vertebral ao descobri-lo recostado à sombra escura de uma árvore, estudando-a em enervante silêncio.

Entretanto, enquanto ele esteve à vista, ela se sentiu segura de que poderia manter sob controle este cavalheiro atacante.

Ergueu uma sobrancelha ante o toque de uma mão enluvada no ombro.

— Entendo — ele disse — que seu marido compete com uma equipe muito rápida e divertida.

Ela se afastou um pouco.

— Não posso responder por seus amigos — ela respondeu. — Como vê, na realidade nunca conheci...

Ele sorriu, deslizando os dedos desde seu antebraço até seu pulso.

— Não me interessam os amigos de seu marido.

Jocelyn ficou olhando a mão como se fosse algum inseto molesto que tinha caído de uma árvore. Percebeu que estava na moda paquerar, pois já tinha observado que sua cunhada Chloe tinha talento para o jogo. De fato, Chloe

parecia capaz de fazer brincadeiras aos cavalheiros que a admiravam e aceitar todos seus elogios com descuido sem dar convite ou ofensa em troca.

— Estou em chamas — seu admirador anunciou com paixão quase aterradora.

Jocelyn o estudou por um momento.

— Gostaria que o empurrasse ao lago para apagar suas chamas?

Ele fechou seus olhos.

— Engenho e beleza em uma mulher. Caio de joelhos e morro.

— Então nos faça um favor aos dois — Ela afastou sua mão livre de seu inoportuno aperto. — Morra aos pés de outra pessoa. Já tenho a reputação de pôr homens no ataúde.

Pareceu, entretanto, que o teimoso cavalheiro tomou sua rejeição como uma provocação. Com uma alarmante ausência de propriedade ele a perseguiu ao redor do banco que tinha esperado poria distância entre eles.

— Faça o favor de comportar-se — ela resmungou. — Meu marido observa. Reclamará se você continuar com seus disparates.

— Seu marido não está observando — ele disse com uma voz diabolicamente ardilosa. — Foi-se com seus amigos. Não seja tão tola, querida.

Todo mundo sabe que seu matrimônio foi arranjado, e que nestas situações desafortunadas, alguém se vê forçado a achar prazer em outra parte.

Ela se voltou, enfurecida porque não suportava ser considerada uma cabeça de vento, porque o que disse a respeito de seu matrimônio era certo, mas mais porque Devon aparentemente se afastou e a tinha deixado a mercê de um completo idiota. Gabriel estava repentinamente em pé sob a árvore onde seu marido tinha estado.

— O que me vejo obrigada á fazer — ela disse, arrancando a mão que ele tinha colocado outra vez sobre sua pessoa — é chamar a meu marido para me liberar de sua indesejada presença.

Seus finos lábios se ergueram em um sorriso malicioso de satisfação.

— Converter-se-á na mulher mais solitária se espera sua atenção. Com

certeza em uma semana estará buscando a mim ou a outro para aliviar seu desejo. Todo mundo sabe que seu matrimônio não foi por amor.

— E todo mundo também sabe — disse uma voz zombadora e profunda proveniente do atalho, — que um cavalheiro que impõe sua atenção a uma dama plantou um pé em sua tumba.

Jocelyn olhou aliviada a seu redor embora soubesse que seu escuro salvador não era Devon, mas seu primo Sir Gabriel.

Não era seu marido, que tinha desaparecido no momento preciso que ela mais o necessitava.

Entretanto, à luz da aversão de Devon para protegê-la deste encontro desagradável, agradeceu a intervenção de Gabriel. Deu-lhe a pausa que necessitava para dirigir uma graciosa retirada.

Ela se virou, olhou para cima, e se achou diretamente em frente a seu marido. Pelo menos parecia ser Devon, embora ele não soasse ou se parecesse com o diabo indiferente que tinha conhecido e desejado. Este homem de voz baixa exsudava uma agressão hostil que a obrigou a dar um passo atrás em defesa própria. Nem sequer a olhou.

Gabriel passeava atrás dele.

A voz de seu marido congelou o ar com um frio imponente.

— Chloe esteve esperando sua volta, Jocelyn. E, você, senhor — Deu um passo ao redor dela para confrontar ao homem que estava diante dele com a cara branca e apreensiva. — Não acredito ter tido o desgosto de conhecê-lo.

Amavelmente dê-me o nome do homem a quem desejo matar.

Devon não era um homem que se zangasse facilmente. Entretanto, repentinamente se encontrou enfrentando um homem cujo rosto não reconheceu, mas a quem tinha um desejo irracional de assassinar.

Uma voz firme falou atrás dele.

— Quer que fique ou levo às damas? — Devon não se voltou ao reconhecer seu primo.

— Leve-as para casa. Exijo uma retribuição desta pessoa que se atreveu a

pôr as mãos sobre minha mulher.

Jocelyn o olhou com alarme.

— Não foi nada.

— Não foi nada. Vi-o — Devon se aproximou de modo ameaçador do outro homem, quem a este ponto já não mantinha sua máscara de fanfarronada.

— Ele a tocou. Vi-o com meus próprios olhos. Maldição. Ele a tocou.

— Eu simplesmente removi uma folha de seu ombro — o galã balbuciou.

— Não quis ofender nem a você ou a sua esposa.

Um músculo se apertou na face de Devon.

— Maldito estúpido. Vou remover sua maldita cabeça...

— Não aqui — Gabriel se meteu entre os dois homens com voz urgente.

— Teve suficientes problemas no ano passado em certo incidente de treinamento segundo me lembro.

— Isto é diferente — Devon disse entre dentes. — Pensei que já tinha partido.

— Por favor, Devon — disse Chloe que acabava de chegar e tomou o braço de Jocelyn. — Há crianças no parque. E seus amigos, bem, todo mundo pode ouvi-lo.

O trêmulo galã tirou um lenço de seda de seu bolso e o passou através de sua fronte.

— Aceitaria minha desculpa? Confundi a amabilidade da senhora com alguma outra coisa.

Devon lançou um olhar involuntário em direção a Jocelyn. Mal notou que seus amigos se aproximaram.

— Por que você se atreveria a procurá-la?

O homem moveu a cabeça com desconcerto.

— Não estou certo. Tinha ouvido o rumor de que ela era...

O olhar de Devon se escureceu.

— Ela era o que?

— Só que ela não estava acostumada às maneiras de Londres, como eu...

Como eu — ele concluiu com pouca convicção.

Devon lhe lançou um olhar assassino.

— Então possivelmente você deva retornar a seu lugar de origem até que aprenda por você mesmo sobre os costumes londrinos, um homem não toma liberdades com a esposa de outro.

— Com sua permissão, sua Senhoria, eu... Acredito que o farei.

Jocelyn não podia decidir a melhor maneira de romper o tenso silêncio que caiu sobre o pequeno grupo enquanto seu ofensivo admirador escapava entre um par de preceptoras e suas jovens pupilas.

Gabriel estava olhando para o chão, com uma expressão indecifrável.

Devon permaneceu com os braços cruzados sobre o peito, com os olhos ardendo de ira.

— Bem — Chloe disse com uma tentativa incerta de risada — este foi um passeio infeliz. Parece que não podemos deixar sozinha sua encantadora esposa

— brincou, com um braço ainda protegendo Jocelyn, e o outro estendido para Devon. — Estou realmente impressionada com seu autodomínio. E senso comum.

— Bem feito, Devon — Gabriel disse, assentindo com a cabeça em sinal de aprovação. — Espero que não lhe incomode minha interferência.

Devon se limitou a negar com a cabeça.

Chloe o olhou preocupada.

— Por que nós...?

Devon virou sobre seus calcanhares e se afastou antes que ela pudesse terminar. Jocelyn o seguiu com ô olhar cheia de preocupação.

Como diabos uma tarde comum tinha terminado tão desagradavelmente?

Lamentou não ter dado o empurrão no lago àquele odioso homem quando teve a oportunidade. Certamente Devon não acreditaria que não lhe tinha dado asas.

— Não se preocupe Jocelyn — Chloe disse, em tom alegre, seus olhos denotando uma emoção mais obscura. — Devon terá que aceitar que é atraente para outros homens, e este pequeno escândalo estará esquecido até amanhã.

Devon se apoiou contra a mesa de bilhar em sua biblioteca, tentando compreender seu comportamento de hoje. Deixou o parque sem dar nenhum tipo de explicação, meio esperando topar com esse arrivista impertinente outra vez e poder tirar a raiva que a contra gosto tinha reprimido.

O que o bastardo tinha alegado em sua defesa?

Que tinha escutado um rumor a respeito de Jocelyn. Que ela não estava habituada às maneiras de Londres. E essa débil razão tinha dado a outro homem a autoridade para aproximar-se dela?

Ele não o toleraria. Não lhe importava se só tivesse sido um flerte inofensivo. Não o toleraria.

Quanta vez riu de seus amigos que se haviam visto envolvidos em duelos quando os ciúmes tomaram conta deles? Por que se achava por cima de enredos emocionais? Por alguns aterradores minutos hoje, a razão não tinha podido penetrar sua raiva. Pensou que tinha escapado à maldição de sua apaixonada linhagem Boscastle, mas isso só esteve adormecido em seu interior todo o tempo, esperando o momento adequado, a mulher adequada, para emergir.

Recolheu o taco e estirou a cintura para dar uma olhada. Com sua visão periférica viu uma figura vestida em seda verde clara deslizar na sala com seu cabelo capturando brilhos de luz das velas.

— É valente ao entrar na guarida do leão — disse sem voltar-se.

— É o leão um perigo para mim? — Jocelyn perguntou em sua suave e atraente voz.

Afundou a bola no bolso central e se endireitou com o olhar indo à deriva sobre ela.

— Nunca para você. — Fez uma pausa. — Havia algo em seu ombro hoje?

Ela sorriu a contra gosto.

— Apenas sua mão.

Jogou no chão o taco com um estrépito e amaldiçoou.

— Devia tê-lo golpeado as malditas entranhas quando quis. Por que todo mundo tentou me deter?

— Estávamos no meio do parque, Devon.

— Não me importa — exclamou. — Nenhum homem vai tocar...

Ela caminhou lentamente para ele. Sentiu o calor arder na medula de seus ossos, um calor que lhe fez esquecer o que estava a ponto de dizer.

Apoiou seu quadril contra a mesa, esperando. Disse a si mesmo que poderia resistir a ela se tivesse vontade.

Então ela perguntou com uma voz sedosa que fez em migalhas suas intenções.

— Quer vir acima comigo?

E soube que não poderia resistir absolutamente.

Estava decidida a aprender mais a respeito de seu marido. Entretanto, por momentos parecia que descobria algo desconhecido a respeito de si mesma enquanto Devon continuava sendo um mistério desconcertante.

Não era tão ingênua para supor que o prazer sexual ou uma união arrumada igualariam ao amor. Ao menos sabia que em Devon havia tanta decência como indecência.

Tinha aprendido que era muito mais fácil incitar a luxúria de um homem que seu amor eterno, mesmo se ele incitasse ambas em seu interior.

Não podia dizer exatamente o que ocupava seu tempo quando estava longe dela. Possivelmente não queria sabê-lo. Mas quando ele vinha a sua cama, era dele, e estava determinada a que logo ele não querer ir-se.

Tinha decidido depois de deixar o parque hoje, que havia mais esperança para seu matrimônio do que ela tinha pensado a princípio. Certo, seu pai tinha insistido em que Devon seria correto. Mas sua carta de influência tinha sido jogada.

O resto correspondia a ela.

Possivelmente seria útil olhar sua situação como uma operação militar.

Bem poderia atrair a seu marido ao redor de seu acampamento ou cercar uma batalha às cegas contra ele em seu território. E o mais provável é que perderia.

Uma estratégia era não só desejável se não essencial.

Perguntou-se que arma poderia utilizar. Contava com Chloe e a senhora Hadley como seus aliados até agora. Não se pode empreender uma guerra desta natureza sem armas ou com um fraco apoio e esperar ganhar.

É claro, não tomou muito tempo decidir que armas; deveria usar. Só tinha que seguir seus instintos.

Entretanto, com instintos ou não, estava um pouco insegura de si mesma essa noite em seu quarto, quando ele tirou seu casaco forrado em seda, o colete, e a pesada camisa de musselina. Ela contemplou suas costas maravilhosamente esculpidas enquanto se voltava para fechar a porta com chave.

Apoiou-se na janela, ansiando oferecer-se a ele. Decidiu que memorizaria as musculosas cristas intercaladas com pequenas cicatrizes brancas em seu torso assim como fazia tempo o tinha feito com a constelação de inverno. Seu olhar seguiu o rastro de pêlo escuro que diminuía gradualmente desde seu ventre plano até a calça que ele tinha começado a desabotoar.

Ele levantou os olhos dessa maneira diabólica que tinha a forma que desestabilizava as funções básicas de fala pensamento, e a mera capacidade de respirar.

— O que está olhando, Jocelyn?

Não podia confessar que tinha perdido todo raciocínio, assim, virou seu olhar para a janela e respondeu:

— As estrelas.

— O que? — Perguntou divertido.

— Costumava estudar as constelações de minha janela no campo — disse, olhando-o por cima de seu ombro.

Ele empurrou para baixo sua calça e a roupa interior de linho para ficar nu diante dela.

— Possivelmente nós estudemos alguma outra coisa esta noite.

Uma cascata de calafrios começou em sua nuca e se estendeu através de seu corpo. Como podia pretender ocultar sua própria fome dele quando ele só tinha que despir-se para imobilizá-la com uma pontada tão imperdoável de

desejo? Que presunçosas, pensou repentinamente, eram as exigências sobre uma mulher casada. Entretanto, essas demandas deviam ser satisfeitas. Seu marido tinha certas necessidades, e ele era uma obra prima de homem. E... Ela o tinha convidado a subir as escadas.

— Qual constelação estava observando, de qualquer modo? — Ele perguntou com voz pensativa.

Ela disse a primeira coisa que lhe veio à mente.

— Touro?

— O touro? — Ele perguntou rindo.

Ela fingiu olhar pela janela outra vez. É claro, sendo uma noite nublada as estrelas estavam completamente obscurecidas.

— Talvez Orion.

Uma mecha de cabelo negro azulado caiu sobre sua maçã do rosto enquanto ele começou a rir outra vez.

— O caçador? Realmente pode vê-lo da janela?

— Bom, eu... Acredito que o fiz há um momento.

Ele se aproximou por trás dela, envolvendo os braços ao redor de sua cintura.

— Não vejo uma condenada estrela no céu, mas quem sabe?

Possivelmente se ficarmos juntos na cama o tempo suficiente, veremos uma chuva de meteoros.

 

 

CAPÍTULO 15

 


Devon resistiu à tentação de ficar na cama, depois de fazer amor com sua esposa. Adormecida e satisfeita, estava aconchegada docemente ao redor de seu satisfeito corpo. Satisfeito?

Sereia pensou enquanto beijava seu ombro. Feiticeira. E sentiu um forte desejo, queria lutar para controlar-se, antes que morressem os vestígios de sua vida anterior.

Levantou-se da cama e silenciosamente se vestiu, dirigindo-se silenciosamente com as botas para a porta.

De algum jeito sentia que era mais seguro caminhar pelas ruas nebulosas de Londres arriscando sua integridade, do que permanecer ao lado de Jocelyn.

Debateu-se entre a opção de ir ver algum de seus irmãos.

Mas seu estado de ânimo não podia suportar nesse momento, que zombassem de seu matrimônio, como tampouco podia responder às perguntas bem intencionadas que suas irmãs, judiciosamente, queriam lhe fazer sobre sua esposa.

Sem perceber, tinha chegado a seu clube, onde esperava que esse familiar refúgio masculino, afastasse de sua mente tudo aquilo que ameaçava seu instinto básico de sobrevivência.

Entrou no santuário, iluminado pela luz das velas, esperando ser tentado pelas diversões habituais. Entretanto, em lugar de parar, simplesmente saudou com uma inclinação de cabeça aos três cavalheiros que se achavam sentados indolentemente em suas poltronas; ante uma mesa redonda. Um deles era o capitão Matthew Thurlew, irmão mais velho de seu velho amigo Daniel. Outro era Lorde Burnham, terceiro filho de um conde conhecido por sua libertinagem.

Estavam enrascados em uma discussão, enquanto repassavam as páginas de um livro cheio de desenhos sobre um Cipriano com uma grande destreza e energia

sexual.

Sua aura refletia seu descontentamento e cansaço do mundo, fazia-o sentir como se olhasse seu impreciso reflexo, em um longínquo espelho.

— Por Deus, se é Boscastle — murmurou Thurlew com um brilho malicioso em seu olhar. — Acaso veio pecar?

— Quer apostar esta noite, Devon? — Perguntou-lhe Burnham, enquanto o observava através de seus olhos entreabertos.

— Idiotas, ainda se encontra em sua lua de mel — protestou Thurlew.

— Bom, poderia ganhar as apostas ao ser o primeiro diabo a passar sua lua de mel em uma mesa de jogo.

Os jogos de azar. Gabriel gostava de jogar. Devon soube imediatamente, que tinha encontrado a distração que procurava. Tinha um assunto pendente com seu primo.

Chamou um garçom.

— Sir Gabriel veio esta noite? — perguntou.

— Não milorde. Se aparecer devo lhe mencionar que o estão procurando?

— Sim — respondeu Devon livremente, enquanto apertava seus lábios.

— Alguma outra mensagem?

— O resto ô entregarei; eu em pessoa.

Saiu à rua, voltava para sua antiga reserva de caça. Mas descobriu que Thurlew e seus dois companheiros tinham decidido segui-lo.

Tropeçaram com sua carruagem que impedia o passo.

— Quer que o levemos a algum lugar? — Perguntou-lhe Thurlew.

Lorde Burnham riu.

— Talvez ao Tamisa? Mas seria muito má sorte que o descobrissem ali.

Sua esposa deve ser muito aborrecida se fugiu tão cedo para procurar outras diversões.

Uma resposta instantânea cruzou sua mente. Não, ela é tão condenadamente atraente que escapei para manter minha própria prudência.

— Para onde vão uns idiotas como vocês, de qualquer forma? —

perguntou.

— Dirigimo-nos à casa de Audrey Watson — disse Thurlew. — Pensamos arrasar Babilônia.

Começou a rir.

— O bordel mais exclusivo de Londres, não admitiria jamais este trio de personagens tão desagradáveis.

— Exatamente estava pensando nisso — disse o mais jovem enquanto dava uma cotovelada em Devon, esperando sua cumplicidade. — Se vamos escoltados por um Boscastle conseguiremos um convite para entrar.

Devon negou com a cabeça.

— Ela terá chutado seus bêbados traseiros, antes que tenham podido bater a sua porta. Mas vou com vocês de toda maneira. Acabam de me dar uma idéia a respeito de onde posso localizar Gabriel.

Jocelyn tinha caído em um agradável sono, depois de terem feito amor.

Não se haviam dito nenhuma palavra. Deitada a seu lado, tinha a sensação de ser como o conteúdo que seu marido saboreava em sua cálida intimidade, sem mentiras. Sem dúvida esta proximidade serviria como um objetivo para seu matrimônio.

Ela abriu um olho, enquanto seu marido saía da cama e se vestia saindo às escondidas pela porta, com as botas na mão.

Sentou-se desconfiada na cama. Muita intimidade, mas muitos obstáculos.

Seu marido tinha tomado impetuosamente o prazer que lhe ofereceu e o devolveu com acréscimo, só para deixá-la uma vez que a paixão se apagara sem olhar atrás.

Por uns instantes deixou que sua indignação se cozinhasse a fogo lento até que uma faísca a iluminou e viu tudo com uma estranha clareza.

Acaso importava que ele tivesse maior experiência sexual? Embora ignorasse aonde ia a essas horas da noite, sabia que era impossível que tivesse deixado sua cama em busca de outra.

Como não podia voltar a dormir, decidiu tomar um banho e descer para

esperar sua volta.

Pouco depois, abriu a porta depois de ouvir que chamavam com um suave golpe. Totalmente surpresa, ergueu seu rosto para olhar ao não menos surpreso rosto de seu primo Gabriel.

Nunca abria a porta ela mesma.

Não estava vestida adequadamente para receber visitas, pôs a toda pressa um vestido de renda, sem meias e levava o cabelo solto.

— Vá, Sir Gabriel, pensei que fosse Devon, ou não teria jamais aberto a porta vestida...

— Ele não está em casa?

Aproveitando seu momento de desconcerto, ele transpassou a entrada e se plantou no meio do corredor. Jocelyn não pretendia lhe impedir a entrada, mas tampouco queria jogar mais lenha ao fogo de sua velha rivalidade.

— Espero que minha feliz chegada a seu refúgio, não a tenha importunado

— disse em um tom resistente, como se fosse um cavalheiro pesaroso.

Jocelyn admirou seu aprumo. Afastou-se a um lado sem pensar que lhe permitia o acesso a seu lar. Os criados demorariam outra meia hora, mais ou menos, em sair de suas camas. Não tinha nem idéia de quando voltaria seu marido. Não tinha esperado ter que entreter a ninguém mais.

Atreveu-se a colocar um vestido de seda branca brilhante como a opala, sem nenhuma regata, meias nem espartilho, debaixo. Escandalizou-se quando se observou no espelho e viu refletidas suas formas, com toda clareza. Com o vaivém de seus quadris se mostrava sua imagem nua contra a luz. Inquieta e secretamente encantada, queria receber seu marido na porta com um sensual convite que não poderia resistir.

Mas não teve nenhuma intenção de receber seu diabólico primo, com um traje tão inadequado. Só podia rezar para que não percebesse o que tinha posto.

— Poderíamos nos retirar a um lugar mais privado? — perguntou-lhe Gabriel, o mais receoso possível.

Ante tal descaramento, não pôde evitar emitir um gemido evasivo, que

interpretou como um assentimento e cruzou rapidamente o vestíbulo.

Meu Deus. Todos os homens desta família mostram um instinto entristecedor de auto-posse. Mas era a esposa de Devon e não iria permitir que a ultrajassem ou pudessem acusá-la de qualquer atitude inapropriada.

— Sir Gabriel. Acha inteligente sua visita a nossa casa, depois da briga hoje no parque?

Parecia que ele meditava sobre sua pergunta, mas ao virar-se viu que sua imagem refletida no espelho do vestíbulo não deixava nada à imaginação e ele estava estudando sua silhueta sem espartilho com um sorriso lupino.

Quando voltou a virar-se seu rosto não refletia nenhuma má intenção.

Entretanto, ela não podia esquecer seu olhar através do espelho, não podia confiar nele. Foi um reflexo de seu verdadeiro eu ou era uma imagem falsa de Gabriel?

— Ao que parece Devon foi esta noite ao clube para me buscar —

respondeu. — Em lugar de nos perseguir por toda Londres, pensei que faria um favor a ambos e vim a sua casa a esperá-lo.

— Oh! — sentia-se aliviada ao saber que seu marido não tinha saído para procurar nenhuma relação ilícita.

Ela se perguntava se Gabriel mantinha uma relação com Lily Cranleigh e se a viúva iria atrás de Devon por tentar caçar a Gabriel.

Pensou que nesse momento, o primo Gabriel não parecia ser o maior vilão da sociedade.

— Então, não se importa se fico esperando?

Antes que pudesse reagir, desprendeu-se de seu casaco e a conduziu ao salão privado do primeiro andar, reservado para a família.

O seguinte que recordava era que estavam enrascados em uma conversa sobre sua última visita a Paris. Jocelyn ficou muito surpresa ao descobrir que era um mecenas das artes. Preferia pensar que ele, junto ao resto dos homens Boscastle, considerava o l"amour como uma arte pessoal de seu trabalho.

Surpreendentemente, transcorreu voando outra hora, ante a agradável

conversa. Já quase se esquecera da roupa informal que levava.

Entretanto, mantinha suas suspeitas de que Gabriel ocultava algo diabólico e no momento em que Devon apareceu na sala, desapareceu a imagem inocente que mostrava.

Foi consciente imediatamente de seu descuidado aspecto e de que ambos estavam sentados no sofá ombro com ombro.

Lançou lhe um olhar aborrecido. Não tinham estado tão juntos durante todo esse tempo e agora Gabriel se aproximara perigosamente.

O canalha tinha reduzido as poucas polegadas que os afastavam, no instante que Devon entrou pela porta. Era um desafio para seu marido.

Embora parecessem viver para provocarem-se uns aos outros. É claro, se o acusasse de suas más intenções, só serviria para que seu marido fixasse sua atenção na imagem que estavam mostrando.

Se Devon não tinha caído no jogo oculto que levava seu primo, seria prudente, em interesse pelas relações familiares não insistir sobre sua atitude.

Naturalmente, ele percebeu ao entrar. Parecia que fazia um escrutínio de sua primeira relação estável, enquanto avaliava as rendas e o provocador olhar de seu rival sobre a roupa informal de sua esposa.

Então seu olhar se concentrou nas duas taças sobre a mesa.

Entretanto, sua irritação se centrava apenas em Gabriel.

Jocelyn se levantou de um salto e ficou entre ambos para tentar apaziguar a situação.

— Que amável de sua parte retornar a casa antes do amanhecer, Devon.

Seu primo foi uma amena companhia enquanto o esperava.

— Que diabo faz em minha casa Gabriel? — Exigiu, enquanto cravava a vista em seu primo por cima da cabeça de sua esposa.

Jocelyn pigarreou antes de continuar.

— Entendi que o estava procurando.

Gabriel mantinha sua mandíbula apertada, mas lhe respondeu.

— Só pensei em lhe economizar o trabalho de ir atrás de mim.

— E eu só estive este tempo junto a ele, até que voltasse.

Devon a tirou do caminho, para terminar enfrentando o nariz de seu primo.

Gabriel recordou sua direita e o risco que corria.

Bom, pensou Jocelyn, dando um passo atrás de uma cadeira no caso de acontecer algo. Podia seguir tentando acalmar a situação dali. Se ambos os homens estivessem decididos a se matarem, ela podia muito bem tomar as precauções oportunas para proteger-se. Não tinha nenhuma intenção de ser capturada em seu fogo cruzado.

— Só vim aqui, porque no clube me disseram que queria ver-me — disse Gabriel friamente.

Devon hesitou, como se o tivesse esquecido ante as presentes circunstâncias.

— Sim, é certo, mas não disse que desejava que seduzisse minha mulher, não é verdade?

— Desculpe-me? — disse Jocelyn. Embora soubesse que não era prudente intervir, não podia permitir que seu marido trouxesse à luz, novas acusações.

Parecia que estava se convertendo em uma mulher sedutora. — Sir Gabriel não fez nada pelo estilo.

Devon lhe lançou um olhar desdenhoso sobre seu ombro.

— Não é isso o que parece. Sei como funciona sua mente.

— Bom, eu gostaria de saber como funciona a sua — disse Gabriel. —

Deram-me uma mensagem que tinha perguntado por mim. Acredito que se não fosse por isso, não teria vindo aqui por nenhuma outra razão, embora acabasse sendo um encontro muito agradável graças a sua encantadora esposa.

Devon olhou para Jocelyn, novamente.

— Importar-se-ia de nos deixar a sós?

— Com muito gosto — rodeou uma cadeira, consciente de sua pele nua sob o suave vestido. Os homens fizeram ver que não percebiam sua imagem enquanto permitiam sua graciosa saída. Foi uma cortesia que não poderia aliviar sua vergonha, em muito tempo. Uma coisa era jogar para tentar seu marido em

privado e outra muito diferente quando se tratava de outro homem.

No momento que sua esbelta figura desapareceu atrás da porta, Devon virou seu frio olhar para seu primo.

— Primo ou não — disse. — Se voltar a se sentar tão perto dela outra vez, eu lhe...

Gabriel levantou a mão em um gesto conciliador.

— Admito que fosse uma provocação deliberada de minha parte, e peço desculpas. Apoderaram-se de mim más intenções, quando o ouvi entrar na casa.

Jocelyn é inocente ante qualquer maldade e não percebeu, eu não significo nada para ela.

— Já sei, — soprou Devon — mas suponho que não estou de humor para nossas costumeiras brincadeiras.

Gabriel brincava distraidamente com seu relógio de bolso.

— Muito bem.

Devon se sentou em uma cadeira em frente ao sofá.

— Na realidade queria lhe agradecer.

— Me agradecer? — Perguntou-lhe, enquanto apertava fortemente a corrente do relógio. — Temo que ouça mal.

— Sobre sua ajuda hoje no parque — lhe respondeu Devon. — Meu mau humor tinha tirado o pior de mim.

— É compreensível.

— Deus, nos escute. Que par. Estamos discutindo sobre situações morais

— resmungou Devon, fazendo uma careta.

Gabriel ergueu uma sobrancelha.

— A honestidade não é sempre valorizada, nem apreciada.

— Mas não assim a falta de honra — refutou seu primo.

— Isto significa que por fim percebe que eu não fui a pessoa que o enganou, com o encontro com Jocelyn na torre? — perguntou-lhe Gabriel.

— Nunca achei.

— Talvez chegasse o momento de descobrir a verdade, — disse Gabriel,

com um novo propósito em seu olhar. — Cumpriu seu dever com Jocelyn e agora pode procurar sua vingança pessoal.

— Meu agradecimento não lhe dá, sob nenhum conceito, carta branca para conhecer minha esposa — respondeu Devon, notando que retornava seu bom humor.

Gabriel sorriu e recolheu sua capa.

— Pelo que vi hoje, não precisa preocupar-se neste sentido.

— Simplesmente não tenho nenhuma razão para me preocupar com você

— replicou Devon.

 

 

CAPÍTULO 16

 


— Por que lhe permitiu entrar em casa esta noite quando era tão tarde? —

Perguntou Devon a sua esposa, na intimidade do dormitório, enquanto desabotoava a calça e se dirigia para a cama.

— Por um lado — respondeu-lhe com um tom pausado — Gabriel é um membro de sua família e, como tal, não me sinto em uma posição suficientemente segura para lhe fechar a porta em seu nariz. O que se supõe que deveria fazer? Não me teria atrevido a deixar fora Drake ou Grayson, tampouco.

— Abrir as portas de minha casa a Gabriel e encontrá-la sentada em seu colo no sofá, são duas coisas diferentes.

— Não vou discutir sobre isto — replicou enquanto se levantava para ajudá-lo a tirar o casaco de seus ombros. — A verdade é que Gabriel não esteve sentado tão perto de mim, até você aparecer.

— Não a estou acusando, mas poderia começar a me preocupar um pouco, se outros homens se... Bom, quero dizer que outros homens comecem a procurar sua companhia.

— Talvez devesse me ensinar como fazer para que me deixem em paz —

respondeu com um provocador sorriso.

— Talvez...

Ela cruzou seus braços por baixo de seus seios, não usava espartilho, a tentação ao ver com todo detalhe o contorno de seus seios, que se discerniam com suficiente clareza contra a luz, fez com que seu ventre se apertasse pelo desejo.

— O que aconteceu com seu espartilho? — Perguntou-lhe olhando-a assombrado.

— Meu...

Interrompeu-se rindo enquanto abaixava os braços e ele olhava de rápida e

completa, assinalando com suas mãos, seus seios e sua parte inferior.

— Nada — disse com a voz escandalizada. — Isso é verdade.

— Não se cubra — disse Devon com um tom desavergonhado em sua voz.

Voltou-se para olhá-la totalmente fascinado.

— Não usa nada debaixo desse vestido?

— Quando me vesti, não pensei que teria que abrir a porta e receber alguém — respondeu desgostada.

Seus olhos a recorreram várias vezes.

— Está me dizendo que entreteve meu primo vestida ou despida desta maneira todo o tempo?

— Não esperava receber nenhuma visita quando desci as escadas.

— Meu Deus. Não é de estranhar que Gabriel estivesse sentado tão perto de você.

— Não foi minha culpa.

— Bom, pois de quem então?

Ficaram observando-se em silêncio, com uma grande carga emocional a seu redor, durante essa fração de segundo. Devon não sabia se acabava de abrir o olho da tormenta. Nunca tinha começado uma provocação, usando um argumento tão tolo, com nenhuma de suas amantes do passado. Incomodava lhe enormemente sua perda de controle, quase tanto como recordar Gabriel sentado no sofá, junto a sua esposa sem espartilho, admirando seus encantos. Encantos que ainda estava ele mesmo em processo de começar a admirar.

Com a lembrança voltaram suas dúvidas.

— Podia ter bom senso — respondeu — embora fosse por uma ameaça de modéstia, de pôr um penhoar sobre esse vestido, enquanto sentavam os dois juntos.

— Oh! Um clamor à modéstia saindo de seus lábios — replicou. — Sim, uma capa teria sido uma boa idéia, mas não quando foi de surpresa que me pegou sua chegada.

— Tem sorte de que fosse a única surpresa. A próxima vez pergunta antes

de abrir a porta.

— Bem — disse enquanto colocava suas mãos em jarras sobre seus quadris. — Quer sua roupa de dormir?

Ele percebeu que estava destrambelhando sobre seu indecoroso vestido, quando ele só vestia a camisa e as meias.

— Andei nu por meu dormitório durante anos e tampouco me importa.

Além disso, estava me preparando para ir à cama. Ainda quero saber para o que serve esse vestido que mostra mais de você do que deveria.

Ela desatou os laços de seu vestido e deixou que deslizasse de seus ombros a seus pés. Desceu seu olhar e deixou que a observasse antes de responder.

— Para você.

Sua garganta se fechou. Meu Deus como o tentava essa mulher.

Um homem só poderia tomar uma parte, só poderia pretender conseguir uma parte, não tudo. Viu-a caminhar nua para a cama, seus quadris balançando, com uma sensualidade que fazia com que seus ossos gritassem desesperados.

Logo, conseguiu continuar com a conversa.

Seu olhar sombrio a percorreu novamente.

— O que quer dizer? — Perguntou ansioso.

— Saiu de minha cama. Não sabia onde tinha ido, mas queria lhe dar as boas vindas na porta quando retornasse.

Ele a olhou compreendendo o que tentava lhe dizer.

— Queria me esperar, vendo você de forma tão desejável como o faz? —

Perguntou, com todo o calor e satisfação refletida em seu tom de voz.

Lutando para esconder um sorriso, Jocelyn lhe respondeu.

— Está admitindo que me acha desejável?

— Está admitindo que pretendesse me seduzir? — Perguntou-lhe com seus olhos completamente abertos, cheios de perverso prazer.

Lambeu os lábios antes de reconhecê-lo.

— Essa esperança, possivelmente, cruzou meus pensamentos.

Ele sorriu e sem prévio aviso, puxou-a por cima de seu ombro e dando um

salto a aprisionou debaixo de si na cama.

— Conheço a maneira de fazer as pazes, depois de uma discussão —

sussurrou.

Ela fechou os olhos, ofegando depois de ser capturada.

— Simplesmente tivemos uma discussão?

Ele afastou sua cabeleira de seu ombro. Ouvia sua respiração compassada, sentia o calor que emanava de seu corpo, logo notou como se endurecia. Sua cálida e sensual mulher.

— Diga-me de novo que estava me esperando para me seduzir.

— Não... Está bem. Sim, queria seduzi-lo.

Seus dentes brancos resplandeceram em um brilhante sorriso.

— Querida, se incomodaria se primeiro seduzo eu a você?

— Parece como se já tivesse decidido isso.

Inclinou-se sobre ela e a beijou profundamente, com cuidado, sua mão acariciava seu rosto e seus ombros. Adivinhou-o ela? Tinha alguma idéia de quanto a desejava?

Não importava o muito que se esforçasse para parecer calmo e deliberadamente tranqüilo porque seu corpo o traiu. Não podia ocultar a urgência com que seu corpo clamava por ela, o muito que a desejava.

Como tinha chegado a desejar o prazer que apenas Jocelyn podia lhe dar?

Seu olhar percorreu seu formoso corpo nu, suas belas formas, e um olhar triunfal se refletiu em seu rosto.

— É minha — disse em um sussurro. Notou a resposta em seu ardente olhar, seus olhos o convidavam a seguir. Soube que ela já o tinha seduzido, embora se fosse necessário, lhe rogaria de joelhos para conseguir suas atenções.

Entretanto, sabia como fazer estremecer uma mulher até que lhe rogasse.

Pouco a pouco, com delicadeza foi acariciando seus seios, seu ventre, suas nádegas suaves, e entre suas coxas, até que ela não pôde mais e ergueu seus ombros. Seus dedos se perdiam languidamente entre seus cachos molhados, roçavam seus lábios inchados, olhando-a enquanto se retorcia, enquanto a fazia

gemer, enquanto estremecia por ele.

— Trata de me torturar — lhe sussurrou, enquanto ele deslizava suas grandes mãos por seu traseiro e a levantava.

— Estou torturando a mim mesmo, acredite — respondeu com a voz entrecortada pelo desejo. Então lhe afastou mais as pernas e colocou seus ombros e sua cabeça entre suas coxas.

Ficou congelada ante a surpresa do que seu marido estava fazendo, durante vários segundos não pôde reagir ante a incredulidade do que acontecia, mas logo se apoiou em um cotovelo e o observou em estado de choque total.

— O que está...

Voltou a empurrá-la suavemente até que suas costas se recostaram na cama.

— Quer me seduzir sim ou não?

— Eu...

Não podia recordar o que queria lhe dizer. O toque ardente de sua língua marcando seu sexo ao vermelho vivo roubou-lhe o pensamento. Ela gemia com impotência, estava lambendo-a, mordiscando, sugando os lugares mais íntimos de seu corpo. Não podia ter imaginado jamais que o despertar da paixão fosse assim.

Notou como se distendia, como soluçava, mas não parou. Sua língua continuou lambendo-a e penetrou em seu sexo uma vez após outra até que se retorceu em um clímax que a destroçou até a medula.

Depois do fantástico clímax que deu a sua esposa, deixou descansar sua cabeça entre o sedoso espaço de suas coxas, gozou ao sentir sua pele de seda sob seu rosto e inalou profundamente seu aroma almiscarado depois de tanta paixão.

— Dormiu? — Sussurrou.

Sentiu sob sua pele, como o corpo de Jocelyn ainda tremia pela paixão compartilhada minutos antes.

— Devon?

Ele olhou seu rosto emoldurado por sedosas mechas castanhas escuras.

— O que lhe passa?

— Disse que queria te seduzir.

— E você...

Ele rodou sobre suas costas e de repente ela estava escarranchada sobre seu marido. Foi deslizando por seu ventre até que seu rosto se aninhou entre suas pernas.

Devon sentiu como seu coração retumbava em seu peito.

— O que pretende fazer?

— Quero lhe dar o mesmo que você acaba de dar a mim.

Seu membro se endureceu imediatamente ao ouvir suas palavras.

— Tem certeza de o que deseja?

— Ensina-me o que devo fazer — disse em um sussurro.

— Recoste-se entre minhas pernas, sobre a cama.

Obedeceu imediatamente, sentia como seu coração pulsava desenfreado, embora estivesse insegura de poder seguir suas indicações mostrava-se decidida a pôr todo seu empenho em agradá-lo, poder lhe dar o máximo de prazer possível. Soube, ao notar sua excitação, que os homens gozavam enormemente sob o prazer que lhe tinha proposto, mas duvidava de sua atuação e eficácia.

Com certeza sua inexperiência se veria eclipsada ante qualquer cortesã profissional.

— E agora o que devo fazer? — Perguntou com voz trêmula.

— Tome-o em sua boca e imite o ato de fazer amor — animou-a enquanto erguia suas musculosas pernas e as colocava sobre seus ombros.

Fazer amor. Sabia que seguiam um ritmo, era um dar e receber que levava a ambos a seu máximo prazer. Ele o segurou com uma mão, e guiou a protuberância de seu endurecido eixo para sua boca. Ela fechou os lábios e o sugou com suavidade, seu tamanho a incomodava embora se esforçasse em introduzir uma maior parte de seu membro até quase sua garganta, despertando um desejo novo em seu interior. Gostava de seu sabor salubre, almiscarado e cheio de paixão. Apoiou-se melhor em seus cotovelos para poder lamber com a

língua, toda a ponta de seu membro, rodeando-o lentamente, sem pressa.

— Basta! Para ou chegarei ao clímax e encherei sua boca — disse ele, ficando de novo sobre seus cotovelos, ofegando.

Ignorando seus pedidos, apertou seus dedos marcando um ritmo rápido e forte, parecido ao que lhe tinha dado seu marido antes para que estalasse seu próprio prazer.

Emocionava-lhe sua resposta crescente, sua debilidade sob o poder que ela tinha sobre ele, nesse momento. Com seus inexperientes lábios e suas lambidas indecisas, sua ingenuidade e torpeza sentiu o maior prazer, tinha medo de machucá-lo, embora tendo em conta o tamanho de seu membro, parecia mais provável que fosse afogá-la.

— Sente-se bem? — Sussurrou-lhe sobre seu palpitante pênis a ponto de explodir.

Sentia-se bem?

Devon afastou ainda mais suas pernas, enquanto tentava engolir outro gemido, pelas carícias que os lábios de seda davam a seu prepúcio.

Sentia como o sangue golpeava freneticamente em sua virilha e resistiu à tentação de mover seus quadris. Sua tímida esposa iria matá-lo, se não parasse.

Ela segurou suas coxas com dificuldade.

— Mais que bem — conseguiu gemer, consciente de que ela ainda esperava sua resposta, mas meu Deus! Como pretende que um homem fale com esses delicados lábios e sua sedosa boca chupando-o tão docemente?

Sua língua continuava lambendo em círculos sua palpitante ereção, mas de repente ela se retirou, soltou seu fôlego, enquanto seu corpo se esticava, até que adivinhou que sua esposa esperava novas instruções. Sua mulher não podia sonhar que apesar de sua inexperiência, poderia ganhar uma fortuna em qualquer casa de prazer. Doce Jesus! Ele mesmo estaria disposto a lhe pagar para repetir seu estremecido prazer.

Ergueu seus olhos até que seus olhares se encontraram e deixou de sugar para lhe perguntar.

— Estou fazendo bem?

Só pôde assentir com a cabeça. Tremia, não tinha forças nem para achar sua voz.

Antes que Devon pudesse fazer algum outro movimento, Jocelyn voltou de novo para seu encargo, negando-se a parar até que notou como seu ventre estremecia e terminou derramando sua semente dentro de sua boca.

Quando pôde mover-se de novo, inclinou-se, limpou-lhe o brilho de seu queixo com a palma e estreitou seu rosto entre as mãos. Sorriu-lhe.

Devolveu-lhe o sorriso.

Só Deus sabia o que até então lhe tinha acontecido e o destino sabia o que ainda lhe faltava para chegar. Só sabia que uns fios invisíveis tinham tecido uma teia de aranha que o envolvia astutamente a seu redor, e que cada vez tinha menos desejo de escapar. E embora sua vida se ficasse ao reverso, não lhe importava.

Jocelyn acariciou o peito do pé de seu marido com os dedos de seus pés.

Seu pé esquerdo ascendia perigosamente por sua coxa, dirigindo-se perigosamente para sua ardente virilha. Com os olhos ainda fechados, não pôde evitar sorrir com deleite e com seus braços aprisionou amorosamente seus quadris... Ela se aninhou contra seu peito nu. Sua barba de um dia raspou seus ombros antes de afundar-se entre seus seios.

— Tem um ar maravilhosamente perverso sem barbear — sussurrou-lhe.

Ele afastou com seu joelho suas coxas, para abrir suas pernas.

— E você gosta dos homens perversos, não é verdade?

— Parece que tenho fraqueza por um em particular — ela estremeceu, enquanto lhe acariciava as costas. — Apesar de nunca me atrever, sempre quis perguntar-lhe se é verdade que em uma aposta recente, exigiu beijos a uma cortesã enquanto treinava introduzir fichas em seu interior?

Inclinou sua cabeça para trás enquanto um arrepiante sorriso apareceu em seu rosto que estremeceu todo o corpo do Jocelyn.

— Quer que ponha uma máscara e uma gravata na cama?

Ela hesitou se devia cair em sua provocação.

— É uma das provas em que você manda? — Perguntou com picardia.

— Tenho um dominó sob minha cama se por acaso quer praticar a prova.

Olhou a seus sorridentes olhos azuis, que já a tinham seduzido em corpo e alma. Uma coisa era conhecer os rumores de seu passado libertino e outra confirmarem que eram verdadeiros e ter evidências de seus escândalos amorosos em sua cama...

— Aceito, mas que este não seja o mesmo dominó que usava na noite em que nos descobriram juntos na torre.

Não duvidou em lhe responder com descaramento.

— Que diferença há se tiver ao menos uma dúzia?

— Que diferença...

Com um profundo beijo sossegou seus protestos.

— Funcionou não é verdade? — Perguntou sem piedade. — Acudiu essa noite, sem vacilação, para encontrar com seu amante mascarado e cair em seus braços.

— Pensei que era Adam — sussurrou imprudentemente, embora quisesse incomodá-lo ante sua arrogante segurança masculina.

Ao qual ele respondeu aprisionando-a entre seu corpo duro como o aço e a cama.

— E aposto que depois não pensou em estar em seus braços de novo.

Jocelyn não se incomodou em negar.

 

 

CAPÍTULO 17

 


Passava já do meio dia quando desceram ao andar inferior para tomar o consistente café da manhã que a senhora Hadley, muito oportunamente, tinha mantido quente em sua cozinha. Devon e sua resplandecente esposa se atrasaram pelas vezes que fizeram amor em sua cama e pelas carícias e profundos beijos compartilhados enquanto se vestiam. Para lhes mostrar sua aprovação, a governanta lhes serviu rapidamente um enorme café da manhã.

Poderia tomá-lo como um ritual e aprender a desfrutar das novas circunstâncias, pensou Devon. Amanhecer fazendo amor apaixonadamente com sua esposa, tomar um tardio café da manhã juntos. Depois classificar seu correio enquanto tomavam o chá e liam os jornais e revistas de fofocas que, há essa hora, já teriam entretido a um bom número de anônimos londrinos que se teriam divertido com uma boa dose de intrigas antes de começar seu dia.

— Algo interessante? — perguntou enquanto deixava sua xícara de café e a olhava com olhos sonhadores. Depois de uma noite de amor suas pupilas tinham um delicioso brilho e, agora se perguntava: por que tiveram a idéia de descer quando podiam ter desfrutado de um café da manhã compartilhado na cama?

— Como se não soubesse — lhe respondeu com uma voz ferida pela incredulidade que não soava nada como a de uma mulher que momentos antes o repreendia entre risadas para que se comportasse na mesa. Acaso pegou sua xícara favorita? Tinha esquecido seu aniversário? Porque seu aniversário de casamento era impossível.

— O que acontece? — Perguntou desconcertado.

— Não me faça dizer.

— Perdão?

— Esta foi á última vez que mentiu para mim... Mentiroso.

Desceu seu olhar à revista. Esperava que sua esposa estivesse lhe fazendo

uma brincadeira. Essa mulher que lhe ocultava o olhar não era sua mulher, doce e apaixonada.

Parecia sentir-se traída e sem dúvida por ele.

— O que se supõe que fiz agora?

— Nem sequer se incomoda em negar. — Respondeu do outro lado da mesa do café da manhã, no preciso momento que um criado colocava entre eles uma bandeja de prata cheia de rangentes torradas, pão doces quentes de manteiga.

— Exatamente o que publicaram? — Perguntou cautelosamente, enquanto ela não deixava de agitar sua colherinha de prata com tanto ênfase contra a taça que parecia colocar em perigo a integridade da elegante peça de fina porcelana chinesa.

— A intriga corre por toda Londres. A fofoca de ontem à noite. O...

— Intriga — disse ele inclinando-se para trás, apoiando um cotovelo na cadeira. — Não necessito que martele com uma colherinha em meu cérebro as palavras para que possa as entender. De que pecado me acusa agora?

Ele pensou que uma lágrima brilhava em seus olhos. Sua voz, entretanto continuava soando zangada enquanto lançava o jornal sobre seu prato.

— Rogo que leia você mesmo.

— E o que é o que se supõe que devo ler?

— Puseram-lhe o encantador título de "Esposas e concubinas".

Pegou a folha, com o cenho franzido, e leu o artigo várias vezes.

Podia notar como Jocelyn estudava seu rosto como se pudesse interpretar todos os matizes de sua reação. Teve que fazer demonstração de todo seu controle para ocultar seu próprio mal estar.

Um anônimo correspondente descrevia com detalhes suspeitos as ações de Devon do dia anterior e de boa parte da noite. Incluía uma versão do encontro no parque entre Jocelyn e seu galã.

Elogiava-se a cavalheiresca intervenção de tal "Senhor G" ante o abandono de seu marido, já que, parecia que seu marido tinha deixado de manter seus

deveres conjugais. E para complicar mais sua falta de responsabilidade, o nobre pecador tinha visitado um infame bordel horas mais tarde, sendo recebido pessoalmente pela proprietária do exclusivo estabelecimento de Bruton Street.

Compreendeu que foi seguido, era um autêntico ataque em primeira pessoa. Seu sangue bulia a fogo lento.

Entretanto, percebeu que sua esposa o acusava pelas últimas linhas.

— Não fui exatamente a um bordel — disse, embora realmente não fosse a melhor defesa que podia apresentar.

— Se não era um bordel — lhe respondeu Jocelyn, golpeando novamente a xícara com a colher — então o que era?

— Era mais um clube exclusivo que um bordel. E não importa o que era não fui ali por prazer. Vim para você, estive com você.

— Há mulheres sem nenhuma moral em um bordel, Devon.

— Há mulheres sem nenhuma moral vá aonde vá — respondeu imprudentemente.

— E pensou em visitar essas mulheres promíscuas, depois de ter se casado há uma semana somente?

— Não é esta a razão pela qual estava ali. Fui à busca de Gabriel.

Levantou-se visivelmente aborrecida, o tremor em sua voz o refletia quando lhe falou.

— Saiu de minha cama ontem a noite para ir a um bordel?

— Audrey Watson é uma amiga da família.

— É uma seguidora de Vênus, Devon.

— Não negarei o que é, mas só fui a sua casa para procurar Gabriel.

Jocelyn engoliu saliva antes de continuar.

— Mas o artigo diz que esta mulher Watson te levou a seus aposentos privados para te entreter.

— Bom, não exatamente. Fomos a seu quarto para conversar. Audrey não costuma conversar ante uma audiência.

— Mas esteve a sós com ela.

Levantou-se de sua cadeira bruscamente.

— Vim para você ontem à noite, Jocelyn. Tão somente falei com Audrey.

Ela se afastou da mesa. Devon se sentia horrivelmente culpado porque Jocelyn continuava sem atender as razões, não escutava o que lhe estava dizendo.

— É o mesmo que meu pai sempre contava a minha mãe. Não me recorde isso. Já me advertiu sobre isso no casamento.

Olhou-a fixamente, seu coração se retorcia ante a situação.

— Jamais te pretendi dizer nada desse tipo.

Jocelyn assentiu lentamente.

— Não tem culpa. Sei que não queria se casar comigo.

Devon a olhava impotente, não sabia o que fazer. De repente compreendeu ou acreditou entender tudo, embora nesse momento se sentisse insultado ao ver que o comparava com Gideon, mas não podia fazer nada a respeito. A dor em sua voz lhe recordou que não tinha crescido em um lar muito feliz.

— Não sou como seu pai — lhe sussurrou. — Nem sequer me pareço com meu próprio pai, para o caso. Estive com você ontem à noite. Desejava-a...

— Devon, está bem.

— Maldição! Isto não está bem. Não, a menos que acredite no que estou lhe dizendo.

Sua esposa o olhava mordendo o lábio.

— Diga. — Apressou-a. — Diga-o, diga-me.

Jocelyn queria partir. De repente, abriu-se bruscamente a porta e Devon se virou disposto a mandar embora a gritos o criado por sua interrupção. Mas a pessoa que tentava entrar na sala não era outro senão seu irmão mais velho, Grayson e enquanto conseguia entrar na sala, sua esposa conseguia escapulir pela porta e escapar.

— Chego a um mau momento? — perguntou Grayson dirigindo um triste olhar na direção em que fugiu sua cunhada.

Devon encolheu os ombros enquanto se aproximava.

— Por que pensa isso? Recebi a maior difamação nos jornais e minha esposa pensa que sou a encarnação de seu pai.

Grayson tirou as luvas.

— Posso lhe sugerir que talvez, uma visita privada a minha joalheria em Ludgate Hill poderia ajudar?

— Neste momento — murmurou Devon depois de ouvir uma porta batendo no andar de cima — duvido que lhe dê de presente todas as jóias da Coroa me ajudaria.

Devon não foi atrás de sua esposa para oferecer outra desculpa sobre um delito que não tinha cometido.

Além disso, havia um assunto mais premente que atender. Se, no passado já tinham murmurado e fofocado sobre sua pessoa, mas nunca com intenções tão maliciosas como agora, iria se encarregar que jamais acontecesse de novo.

Grayson o seguiu ao vestíbulo.

— Aonde vai?

— Vou descobrir quem me calunia.

— Isso soa como passar uma animada tarde, com bastante entretenimento.

Importa-se que o acompanhe?

Devon hesitou. Sabia que seu irmão tinha boas intenções, mas ter Grayson pendurado em seu ombro como uma gárgula de pedra, só dificultaria seus instintos mais baixos. Se Devon achasse o culpado, iria querer estrangulá-lo e não queria que seu irmão interferisse.

— Podemos chamar à família, excluídas as mulheres, para discutir o assunto mais tarde.

— Quer se encarregar sozinho do assunto? — Perguntou-lhe Grayson com seu magistral tom de Marquês e patriarca da família.

— Fui sozinho à guerra não é verdade?

 

 

CAPÍTULO 18

 


A Viscondessa de Lyon chegou para visitar Jocelyn só meia hora depois que Devon tinha deixado a casa. A julgar pela sensível posição dos delicados ombros de Emma, Jocelyn chegou à conclusão de que sua cunhada tinha lido o jornal da manhã e não lhe agradou.

Apesar do comportamento de Emma, muito próprio de uma dama, sentia uma ira de rainha guerreira quando olhou o jornal condenatório, que ainda estava no prato de ovos onde Jocelyn o tinha deixado cair.

— Isto — anunciou Emma, tomando um canto do papel entre seus dedos polegares e indicador, como se fosse uma barata viva — deve ser queimado a toda pressa.

Jocelyn sorriu fracamente ante esta amostra de apoio e observou a marcha da viscondessa para o fogo da lareira.

— Deve haver centenas de onde veio — disse com tristeza, sem saber se referia- se ao documento em si, ou aos rumores viciosos que continha.

Emma balançou a cabeça com consternação.

— Confesso que é triste, mas conheço Devon. Não é culpado destas acusações. Como estou certa de que lhe disse.

— Sim. Negou qualquer infidelidade.

O que deveria ter sido o final do assunto. De fato, Emma a olhava como se estivesse esperando que Jocelyn anunciasse que assim era. Deveria ter sido. No fundo, Jocelyn sabia que não era justo julgar Devon pelo que seu próprio pai tinha feito.

Emma franziu o cenho, e se tinha alguma noção da confusão mental de Jocelyn, era muito compassiva para questionar.

— De todos os numerosos pecados que obscurecem a alma de meu irmão, nunca o vi mentir. Se ele disse que é fiel, então é. E embora me doa admiti-lo, a

senhora Watson se mostrou como uma verdadeira amiga de minha família. Não comigo, é claro — acrescentou a toda pressa. — Nunca procurei sua companhia em minha vida.

Jocelyn olhou à rua, à fileira de carruagens, carros e vendedores empurrando carrinhos de mão sobre os paralelepípedos. Londres era uma cidade desconcertante para alguém pouco acostumado as suas correntes ocultas e palpitantes de vida.

— Talvez — disse, olhando ao redor de Emma, — seu irmão só necessita tempo para adaptar-se ao matrimônio.

Emma vacilou.

— Sim, talvez. Enquanto isso tenho uma proposta a lhe fazer. Estou terrivelmente com falta de pessoal na academia, e as garotas estão montando uma representação teatral a favor de nossos patrocinadores. Já solicitei a assistência da esposa de Drake, Eloise, a quem uma vez tinha esperado contratar.

Bem, meu irmão me roubou ela. Importaria de prestar sua supervisão a minha causa?

Jocelyn não podia achar as palavras para negar-se. Reconhecia um favor quando lhe oferecia. Emma, assim como sua irmã Chloe, claramente estava tentando tomá-la sob sua asa protetora. Ali estava a oportunidade de formar parte da família de seu marido, assim como de conseguir outra aliada.

De fato, uma das primeiras lições que tinha aprendido sobre os Boscastle era que realmente não existia nada que lhes pudesse negar uma vez que o pediam. Acaso ela não tinha caído sob o feitiço de seu marido?

Além disso, ela era uma Boscastle agora, embora só de nome. Seus filhos levariam a ascendência de seu pai em suas veias. Parecia claro que por necessidade se tornaria irresistível, ou morreria na tentativa.


Devon tinha se proposto rastrear a fonte do calunioso artigo até os limites da terra, que em termos do submundo de Londres significava que provavelmente se veria obrigado a revistar nos antros mais baixos dos subúrbios de St. Giles.

Não lhe importava. Não podia esquecer o olhar de Jocelyn. Não podia voltar para casa até que tivesse feito todo o possível por demonstrar que tudo que estava escrito nesse jornal era uma mentira. Ele não tinha pensado em outra mulher desde que se casou com ela.

A dor em seus olhos depois que ela leu esse maldito artigo, tinha arruinado a manhã mais perfeita de sua vida.

O lar.

Impulsionou seu cavalo através das ruas lotadas, freando quando um mascate empurrando um carrinho de mão se interpôs de improviso em seu caminho. Amaldiçoou em voz baixa. Desde quando tinha começado a desejar as comodidades do lar? No passado, sua residência de solteiro tinha servido como uma casa de hóspedes para os amigos bêbados, um lugar de descanso entre batalhas e entretenimentos, e inclusive um refúgio para a academia de sua irmã.

Mas nunca tinha pensado nela como um lar.

— Maldição — disse uma voz familiar a seu lado. — Vai atropelar todo mendigo da rua?

Olhou ao cavaleiro escuro, largo de ombros, sentado escarranchado sobre seu alazão castrado com a mesma comodidade que Devon o fazia sobre o seu.

— Não tenho tempo para uma reunião familiar, Drake.

Seu irmão mais velho balançou a cabeça.

— O que se sente ao estar no extremo receptor da interferência Boscastle?

— Eloise já lhe permite sair de casa? — perguntou em referência a jovem esposa de Drake.

— Jocelyn o expulsou da sua? — replicou Drake com um brusco sorriso.

— Parece-me recordar que não faz muito tempo não podia me livrar de sua companhia.

— Vá á merda.

Os ombros de Drake se sacudiram com a risada.

— Não tem um humor muito agradável agora que sou eu quem está bancando a babá desta vez, não é? O que se sente ter um irmão que o incomoda

sem cessar?

Devon parou abruptamente seu cavalo.

— Isto é um assunto pessoal. Dou-me conta de que Grayson deve tê-lo enviado atrás de mim. Mas não há perigo de uma natureza física envolvida.

Inclusive se o houvesse, eu gostaria de dirigi-lo sozinho. Maldição acossou-me desde o momento de seu nascimento. Sozinho.

Drake assentiu relutante.

— Como quiser. Mas lembre-se que estou mais que disposto a ajudar.

Durante três séculos a Rua Fleet tinha proporcionado residência á impressores, livreiros e editores por igual. No momento da chegada de Devon Boscastle, indecentes pasquins e reimpressões de obras de Shakespeare circulavam por suas tavernas e cafés circundantes.

Devon fez uma pausa para perceber que os clientes da taverna saciavam seu gosto pela fofoca com os rumores desagradáveis de sua vida privada, rumores que só eram verdades pela metade. Eram seus assuntos de verdade tão provocadores que os estranhos pagavam uns cêntimos para ler a respeito deles?

Levou mais de cinco horas ameaçando uma série de imprensas de Grub Street, antes de rastrear a procedência da coluna difamatória. O último editor que enfrentou que nunca admitiu sua culpa, insistia em que o anonimato de seus correspondentes devia permanecer protegido.

Devon retorceu ao redor de seu pulso o peitilho da camisa manchada de tinta do homem. Tardiamente, desejou a presença de seu irmão Drake, embora só fosse para evitar que cometesse um homicídio.

— Tudo o que quero saber é quem lhe deu essa informação errônea.

— Eu o diria se soubesse milorde — balbuciou o homem baixo, suado, quando Devon ô fez retroceder até uma de suas salas de trabalho abarrotada de papéis. — A maioria de minhas fontes provém de notas deslizadas sob a porta bem entrada a noite.

Devon considerou isto enquanto via que o nariz venoso do homem mudava para vários tons de púrpura.

— Então se assegura o anonimato, mas não a fidelidade?

— A fidelidade tem pouco que ver com o negócio da edição, milorde.

Devon ficou olhando para o rosto púrpuro do homem.

— Então, qual é exatamente o propósito de seu negócio?

— Entreter as massas.

— Eu poderia pensar em uma forma muito criativa e violenta para entreter as massas neste preciso momento — disse Devon, apertando a camisa suja do homem para enfatizar a ameaça.

Um aprendiz com um avental saiu de um aposento traseiro. Lançou um olhar para Devon, que tranquilamente estava asfixiando seu patrão, e deixou cair o molho de folhas que estava levando.

— Quero sua palavra de que nunca manchará meu nome de novo — disse Devon. Depois sacudiu o editor um par de vezes como um furão, para se certificar.

— Por minha humilde vida, juro-lhe que não o farei, milorde. E não sei quem foi á fonte, mas se descubro, o direi, ou que Satanás me fira com uma sarna maligna.

Devon o deixou em liberdade com desgosto. O jovem aprendiz que presenciou o encontro cambaleou contra a parede com sua mão apertada sobre sua têmpora.

— Golpeá-lo-ei eu mesmo se descobrir que mentiu.

— Não o fiz.

Devon se inclinou sobre o balcão e olhou com frio desapego o chão onde o editor se caiu, prostrado sobre um montão de dispersas folhas de jornais.

— Bem. Que tenha um dia agradável.

O homem trêmulo seguia em sua humilhante posição até que se convenceu que o diabo Boscastle tinha desaparecido, de volta ao inferno que o tinha engendrado.

— Bom, não fique aí parado como um idiota — gritou a seu ajudante petrificado. — Revise os jornais e encontre qualquer referência ao maldito

demônio insolente e elimine-o.

Sem razão suficiente, Devon teria golpeado qualquer homem que assinalasse que este valor prepotente indicava que poderia estar se apaixonando por sua esposa não escolhida. Ele teria replicado que no passado havia feito o mesmo para defender suas próprias irmãs.

Teria negado com veemência que havia uma razão para ler um significado em seu comportamento. Ou que, em segredo, via sua esposa como uma incipiente deusa de prazer sexual, um espinho no flanco de sua decadência em vias de desaparecimento.

Teria defendido qualquer criada cuja angústia tinha sua atenção.

Tinha-o feito no passado e continuaria em sua velhice. Os homens Boscastle eram notoriamente protetores do sexo fraco.

Jocelyn pertencia a ele, não? Era sua esposa. Mas e se tivesse dado seu carinho por sentado? Tinha lhe advertido no altar do casamento que o que ele queria era um matrimônio só de nome. Realmente, nunca lhe deu a oportunidade de expressar seus desejos.

Bom, exceto para lhe fazer saber que ela não iria tolerar a infidelidade.

Como se pudesse olhar para outra mulher. Como se pudesse passar toda noite de sua vida em sua cama e não morrer como um homem completamente satisfeito.

O que ele queria de seu matrimônio?

A ela.

Ele a queria a ela.

Não voltaram a falar do pasquim, mas para alívio de Devon, á noite, Jocelyn era sua esposa cálida e amorosa. Talvez levasse uma eternidade fazê-la esquecer a dor que lhe tinha causado seu pai. Talvez se necessitasse toda uma vida.

Na manhã seguinte a levou a uma festa de café da manhã nos subúrbios da cidade. Sabia que vários de seus velhos amigos assistiriam e que se esperava que explicasse como e por que tinha terminado casado.

Depois de passar uns minutos com eles, entretanto, logo percebeu que sua

companhia o aborrecia. Tinha perdido de vista a sua esposa, um fato que o irritava, porque tinha feito realmente um esforço por mantê-la à vista.

Não estava nem perto de lhe permitir acreditar que a descuidava, não depois do ocorrido no parque. Não depois de que os jornais fizessem com que sua vida privada parecesse mórbida.

Caminhou pela grama e a descobriu sob um toldo de seda azul com várias outras mulheres jovens e um imigrante francês, bastante pedante, o conde de Vauban, e sua irmã Solange, bela, mas carente de princípios. Ele poderia ter escolhido melhor companhia para Jocelyn. Tinha chegado a apreciar sua integridade, em comparação com seus amigos enfastiados do mundo.

Avançou lentamente para seu círculo. Inclusive viu em um instante desconcertante, que sua esposa estava se convertendo em uma delicada tentadora. Com o coração encolhido, admirou a postura de seus ombros graciosos, sem artifício, que ela deu em resposta a algo que Solange sussurrou sua risada sedutora quando se voltou a repreender o taciturno conde francês; um aristocrata que se dizia que preferia homens jovens como seus amantes, e que criticava abertamente às damas inglesas.

No momento que Devon alcançou o grupo, Monsieur o Conde estava exercendo seu encanto.

— Solange e eu convidamos a ambos ao château este verão — anunciou Vauban quando ergueu o olhar e viu Devon.

Devon olhou mais à frente do aristocrata francês de cabelos prateados e depois para sua mulher que de repente estava um pouco animada. Pensava que ele não aprovaria que saísse de sua concha?

— Ela aceitou?

O conde soprou com desaprovação.

— Ela disse que tinha que lhe perguntar primeiro. Mas estou certo de que não será capaz de resistir a seu pedido. O corso melhorou os caminhos para a viagem.

— É claro, o château foi destruído pelos cossacos — indicou Solange.

O conde franziu o cenho.

— Pelo menos as macieiras continuam em pé.

— Parece uma longa distância para viajar pelas macieiras — murmurou Jocelyn, lançando a Devon um olhar de soslaio.

Seu coração parou por um momento. O brilho coquete de seus olhos o fez querer pô-la em pé e arrastá-la a casa para ele mesmo. Ela estava pensando sobre a noite anterior? Por que havia levado ela para este dia de campo, de todos os modos? Não podia lhe ter prestado atenção em casa?

O conde deixou cair seu monóculo.

— As árvores das hortas de minha família produzem o fruto proibido. Não há nada mais doce em minha opinião.

Devon ficou olhando o rosto de sua esposa, à espera de sua reação.

Para seu alívio, limitou-se a rir e se levantou. Ela era a coisa mais doce que jamais tinha visto, e não necessitava de outro homem para fazê-lo consciente do fato. Talvez tivesse sido negligente em seus deveres como marido, mas iria mudar.

Jocelyn e ele não falaram da festa de volta a casa. Mas provocou Devon imensamente. Era possível que ela sempre houvesse possuído este encanto sedutor, mas ele não esteve disposto a admitir?


Sabia muito bem que ela tinha estado disposta a amá-lo em sua noite de núpcias. Tinha posto seu coração na mão, e ele resistiu, negando-se a sentir algo pelo tempo que pudesse.

Os benefícios de seu direito de nascimento lhe tinham feito dar suas conquistas amorosas por sentado. Mas, como um homem empreendia a conquista de sua esposa?

Porque isso era o que queria. Queria conquistá-la por completo, seduzir seu espírito, ganhar sua confiança.

— Vi-o pouco na festa de hoje — comentou-a, entregando suas luvas a Thistle mal ela e Devon entraram na casa da cidade. — Desfrutou com seus amigos?

Ele olhou lentamente sua figura afastando-se enquanto subia as escadas.

Percebeu que ela não tinha esperado realmente sua resposta.

Poderia ter sido a pergunta educada feita a um conhecido, não a um marido. Ela estava adequadamente equânime, distante... Sedutora.

— Malditamente estupendo. O melhor.

— Oh, que bom — disse alegremente. — Eu mesma passei um momento muito encantador. Os franceses têm esse apreço pela vida.

Seguiu-a ao pé das escadas, percebendo que o que tinha nesse momento era uma avaliação por sua esposa e um pouco mais.

— O conde não gosta de mulheres, sabe.

Ela olhou para trás, seu sorriso zombeteiro e malicioso.

— Assim ouvi.

— Não gosta. De verdade. É um fato.

— Se o diz, Devon.

Se o diz, Devon?

Ele ficou imóvel enquanto ela desaparecia no corredor de cima.

Importava-lhe um nada o que ela dizia, Vauban tinha amantes masculinos.

A menos que... Ele passou a mão pelo rosto, sorrindo com ironia. Negou-se a pensar no "a menos". Se sua esposa estava zombando dele, não podia suportar.

Nessa mesma noite a acompanhou a um tranqüilo jantar organizado por um velho amigo da família, o duque de Dunhill. Sua graça ficou viúvo há onze anos e não mostrava sinais de substituir sua amada esposa do campo, fosse por outra esposa ou por uma amante. A política e as causas sociais, principalmente campanhas contra a escravidão e a reforma penitenciária, abrangiam seu tempo.

Era um aristocrata áspero, de sessenta e dois anos, que se tornava um pouco mais rude e mais solitário cada vez que Devon o via, o que felizmente não era muito freqüentemente. Devon admirava sua política, mas em geral, evitava sua companhia.

Dunhill previsivelmente ofendia a todos os convidados de sua casa, Devon temia que Jocelyn não soubesse como tomar suas maneiras ásperas.

— O Duque — advertiu-a enquanto esperavam na entrada da casa — não gosta nem de homens nem de mulheres.

— Do que gosta, então? — perguntou ela.

— Ser desagradável.

— Mas ele nos convidou para jantar.

— Só para discutir.

— Assim finalmente o pegaram jovem patife — disse Dunhill a modo de saudação, com um regozijo malicioso, a Devon e Jocelyn em seu salão com correntes de ar.

Era um miserável que não gastava uma vela, nem um pouco de carvão.

Enganchou Jocelyn pelo braço, quando outros hóspedes saíram ao corredor em direção ao jantar.

— O que sabe dos cães, senhora? — exigiu, agachando-se para um cão, que chegou correndo pela sala para farejar as sapatilhas dela.

O cão realizou um giro acrobático de seu corpo compacto com o fim de farejar os dedos oscilantes de Jocelyn quando ela se sentou para acariciá-lo.

— Sei que prefiro uma boa quantidade deles á certas pessoas.

— Como pegou o jovem Boscastle?

Ela levantou os olhos como se uma flecha tivesse atravessado seu coração.

Miserável velho bastardo.

— Talvez ele me pegasse.

— Não, não o fez. Conheço toda a história. Trata-a bem?

— Acompanha-me regularmente e me dá um presente de vez em quando.

Ele soltou um grunhido.

— Lança-lhe um suculento osso de vez em quando?

— Perdão?

— Os jornais mencionaram que passou uma noite com essa bonita alcoviteira de Bruton Street. Audrey Watson.

As faces de Jocelyn flamejaram, mas por pura força de vontade não desviou o olhar.

— Os jornais também disseram que esvazia seu pinico sobre as carruagens que passam só por diversão.

— É verdade. Odeio à aristocracia. Sempre fiz. As pessoas mais mal educadas do mundo.

Ela desceu o olhar para os olhos expressivos do cão e sorriu com um pouco de tristeza.

— Imagino — disse antes que pudesse impedir o impulso — que o senhor não está exatamente perpetuando a noção de uma grande aristocracia ao esvaziar seus produtos de refugo sobre as cabeças inocentes da população. Deveria ver as expressões de seus rostos quando lhes chega á primeira descarga.

Ela deixou que o cão lhe farejasse o cabelo antes de levantar-se.

— Cãozinho tolo — murmurou. — Faz soprando. Acredito que poderia me apaixonar por sua cara acolhedora.

O duque arrancou o sapato e o jogou sobre a cabeça do cão. O cachorro se lançou para frente para recuperar o couro caro e o deixou cair imediatamente aos pés de Jocelyn como uma oferenda de amor, inclinando a cabeça suplicante.

— Ninguém lhe disse que é impróprio da parte de uma mulher ser direta?

Não lhe ensinaram que não se ofende ao responder a alguém?

Ela suspirou.

— Mais vezes do que posso contar.

Ele a olhou fixamente.

— Detesto as mulheres diretas.

— Sua graça só posso pedir desculpas...

— Recordam a minha esposa.

Ela encontrou seu olhar.

— Sua esposa?

— A única pessoa nesta terra miserável suficientemente valente para me dizer a verdade. É estranho, veja deveria ter ido antes dela.

— Sinto muito.

— Oh, merda. Como pode sentir sobre uma mulher que nunca conheceu?

Jocelyn balançou a cabeça e se voltou para a porta para achar-se em pé diante de Devon, que tinha se separado dos outros convidados do jantar para procurá-la.

Lançou lhe um olhar curioso antes que se voltasse a olhar a seu anfitrião, agora deitado no sofá.

— Obrigado por fazer companhia a minha esposa, sua graça — disse com uma voz que inclusive Jocelyn reconheceu como mais reflexiva que seu habitual tom profundo.

— Estarei maldito por uma semana desde domingo — comentou o duque.

— Como fez para conseguir uma esposa de sua classe?

— Talvez tenha uma maldita sorte — disse Devon, colocando Jocelyn com firmeza atrás dele.

— Cuide-a bem — disse Dunhill, com um suspiro. — Sua esposa é uma mulher de certo engenho.

Devon fez uma pausa.

— Sim.

— Perceba que disse engenho, e não beleza. A beleza não perdura.

— Acho que ela é bela também — disse, sem nenhuma hesitação.

— É claro que é — replicou o duque, empurrando o cão longe de seu pé.

— Tem sorte de tê-la encontrado, e é um maldito cérebro de asno se não perceber. Bem merecido o teria, se ela se converter em uma libertina.

— Sua graça — disse Jocelyn consternada.

— Agradecerei se não se referir a minha esposa dessa maneira —

exclamou Devon sem se importar se ele rompia ou não algum velho laço familiar.

— Eu não disse que é — o duque olhou para Devon com o cenho franzido.

— Ainda.

Devon estudou Jocelyn em um silêncio contemplativo na cambiante escuridão da carruagem. Quando a luz da lanterna capturou seu rosto, ela parecia como o que sempre tinha suposto que era, uma formosa senhorita de campo com

um atrativo sutil. Mas quando as rodas golpearam um buraco e as sombras dançaram, converteu-se em uma beleza difícil de alcançar, e cuja companhia não podia resistir e que ele não merecia.

Uma dor aguda, irreconhecível se apoderou dele. Sentia algo assim como desejo, salvo que isto era pior, e esteve se construindo em seu interior com uma intensidade que achava intolerável desde...

Desde que voltou a se encontrar com Jocelyn na festa.

— Fez outro aliado esta noite — disse, para romper a tensão de seus próprios pensamentos. — Tinha medo de tê-la deixado sozinha e sem defesa, e, entretanto, quando retornei...

Ela pegou seu lábio inferior entre os dentes. O gesto inconsciente o cativou, e, entretanto, a voz dela era completamente inocente quando respondeu:

— Não posso adivinhar por que. Só comentou sobre seu hábito de esvaziar seus conteúdos privados sobre os transeuntes.

Ele ergueu as sobrancelhas. Em um momento ela era uma tentadora, no seguinte simplesmente era sua simples Jocelyn.

— Ele admitiu isso?

— Com um orgulho antinatural — disse com o cenho franzido.

— Ah — apoiou a cabeça no assento.

Ele não iria tocá-la até que chegasse a casa. Sem importar o muito que o desejasse. Sem importar que estivesse olhado; toda a noite, que não podia recordar o que tinha comido no jantar, ou se tinha comido algo sequer.

Sentia como se pudesse viver em sua companhia unicamente, com sua voz, seu sorriso. E ao perceber isso, sacudiu-o até a medula.

Sem dúvida teria ajudado sua causa se lhe pudesse ter demonstrado estes sentimentos em alguma forma tangível nos seguintes dias.

Dificilmente poderia fazer uma conquista estando ausente.

Entretanto, a sorte quis que visse pouco a sua esposa na semana seguinte, embora não por sua própria vontade.

Nessa mesma noite, quando ele e Jocelyn retornavam à casa do jantar,

achou uma mensagem esperando-o. Um dos oficiais de seu antigo regimento tinha morrido, a presença de Devon se requeria respeitosamente para prestar tributo.

O funeral iria se celebrar em Brighton, o que significava dois dias indo e vindo. Por muito que Devon tivesse acolhido com satisfação a companhia de Jocelyn na carruagem, o oficial tinha morrido solteiro.

Nenhuma outra mulher tinha sido convidada à cerimônia comemorativa pelo mar.

Os dias separados de sua esposa só aguçaram o que sentia ou os sentimentos que tinha negado. Era como se quando estivesse afastado dela, o calor lentamente desaparecia de sua vida. Seus velhos amigos pareciam ser meros fantasmas de sua existência passada.

Ele riu com eles. Condoeu-se pelo falecimento de alguém que tinha lutado com ele. Mas sobre tudo tinha vontade de cumprir com esta obrigação tão triste para poder voltar para casa para ficar com sua esposa durante toda a noite e, bom, simplesmente ser ele mesmo.

Quando retornou a Londres, depois de ter viajado durante a noite, decepcionou-se ao ver que não estava em casa para lhe dar as boas vindas.

Toda a viagem de volta a tinha imaginado esperando na porta por sua volta. Imaginou perseguindo-a até seus aposentos. Em seu lugar, entrou em uma casa tranqüila e se sentou só na mesa do café da manhã onde um pote de café recém feito e o jornal da manhã esperavam para seu prazer.

— Onde está minha esposa? — perguntou à governanta que revoava além da mesa.

A senhora Hadley hesitou.

— Acredito que ela foi à academia cedo esta manhã, milorde. Ao menos isso é o que disse.

— Bom, se isso é o que disse, suponho que é onde está não?

— Eu não poderia dizer.

— Então, o que...?

— Perdoe milorde — murmurou á senhora Hadley, afastando-se da mesa.

— Acho que seu pão torrado cheira a queimado.

Seu afã por escapar deveria tê-lo alertado de que algo estava acontecendo.

A forma como seu criado entrou nas pontas dos pés ao redor da mesa um minuto depois para lhe levar sua torrada queimada foi á segunda pista.

O aspecto detestável de seu mordomo, Thistle, irmão de Weed, o intimidante e ilustre lacaio do marquês, proporcionou a terceira pista e a final.

— Por que todo mundo nesta casa parecem estar tão morbidamente servis esta manhã? Alguém mais morreu durante minha ausência?

Thistle endireitou sua coluna vertebral com tal precisão que a Devon doeu vê-lo.

— Uma pessoa morre todo dia, milorde.

— E o que significa isso exatamente?

Thistle murmurou uma resposta incoerente e abandonou a sala.

Quando Devon leu o jornal da manhã, achou a resposta a sua pergunta, e não lhe agradou absolutamente.

A esposa de "Lorde D" tinha sido acusada de ter uma relação adúltera sob seu próprio nariz. Devon leu a acusação três vezes antes de perceber que Jocelyn era a esposa infiel que se aludia no artigo e que o seu era o nariz ignorante. O

jornalista não identificado se dedicou a escrever que a esposa camponesa de

"Lorde D" não só tinha capturado o interesse de um duque viúvo, mas também secretamente teve uma tarde uma aventura com um galês instrutor de latim na casa da irmã de seu ignorante marido.

O ofensivo artigo não foi impresso pelo detestável editor do Grub Street que Devon tinha ameaçado recentemente. Esta fofoca desagradável a tinha publicado um fofoqueiro rival do Whitefriars, um fato que levou Devon a outra conclusão preocupante. Ou, efetivamente, tinha um inimigo anônimo que tinha a intenção de arruiná-lo, ou, Deus não quisesse, Jocelyn estava tendo uma aventura.

— Ela não — pensou em voz alta.

— É claro que não — murmurou à senhora Hadley, tirando o prato de pão torrado sem tocar da mesa. — Mentiras maliciosas, isso é o que são.

E embora ele não achasse Jocelyn capaz de traí-lo, apesar de que ele a tinha repreendido e insistido a ignorar o que estava escrito nos jornais sensacionalistas, ainda doía.

Esta intriga acusava Jocelyn de adultério.

Ele não toleraria.

E então ficou em pé tão abruptamente que o lacaio presente quase deixou cair á bandeja.

— Vai sair milorde? — perguntou, recuperando seu prato e engenho, ao mesmo tempo.

— Sim.

— Acompanho-o?

— Não.

Iria fazer a sua esposa uma visita surpresa, e Deus ajudasse aos dois se descobrisse que havia motivos para a intriga da manhã, porque a próxima história impressa dele seria que ele tinha cometido um assassinato em Mayfair.

E seria verdade.

Sua irmã Emma lhe concedeu só um superficial, embora previsivelmente cortês saudação quando a chamaram de sua aula de conduta para admiti-lo no estúdio da casa de seu irmão mais velho. Lorde Heath Boscastle e sua esposa, Julia, estavam visitando uns amigos na Escócia, Emma tinha mudado sua escola para sua casa até que retornassem.

— Espero que as garotas não o vejam, Devon — disse desapaixonadamente. — Sabe que a metade delas se achava apaixonadas por você. Não posso tê-las suspirando e desmaiando durante todo o dia quando estou tentando que prestem atenção.

Ele sorriu.

— Deus as abençoe.

— E as proteja de bonitos e jovens demônios como você. — ela

tamborilou seus dedos afiados contra sua escrivaninha. — E agora que oramos juntos, pode-se saber o que está fazendo aqui, no meio da tarde?

— Eu gostaria de ver minha esposa.

— Sua esposa? — repetiu sem expressão.

— Sim, por favor. Preciso falar com ela por um momento — devolveu-lhe o olhar como se estivesse balbuciando tolices, e, de fato, sentia-se como o rei dos idiotas. — É a respeito do que se imprimiu no jornal esta manhã —

acrescentou em voz baixa.

Ela fechou os olhos.

— O que fez nossa família desta vez?

Sua boca se afinou.

— Nada. E não tem nada a ver comigo, assim, por favor, não pergunte.

— Bom, graças a Deus. O que...?

— Onde está minha esposa?

— Foi com Charlotte em busca de fantasias no velho baú de roupa que doaram à academia.

— Está com Charlotte — repetiu ele para tranqüilizar-se. É claro, Jocelyn não seria capaz de alguma tolice, não com Emma na casa. Por que deixou que um pouco de rumores o pusessem como um idiota? Deveria saber. Tinha repreendido Jocelyn por acreditar em intrigas. Por que não podia fazer caso de seu próprio conselho?

— Posso ouvi-las fazendo barulho agora — acrescentou Emma. — Devon, está bem?

Ele sorriu. Sua esposa estava com Charlotte, e não havia nada alarmante ou adúltero a respeito.

— Deveria ajudá-las então, se por acaso o baú for pesado — parecia que agora teria que achar uma desculpa para explicar o que estava fazendo ali. Que o condenassem se admitiria à Jocelyn que se alterou com a intriga quando ele a tinha repreendido pela mesma reação.

— Enviei o Sr. Griffin para ajudá-las com o trabalho pesado —

acrescentou Emma, ainda olhando-o com preocupação.

— O galês?

— Sim.

Ele engoliu em seco.

— Não é o instrutor de latim?

— Entre outras coisas — disse Emma, lhe dirigindo um sorriso perplexo.

— É muito qualificado em muitos temas, se quer saber.

Enviou um olhar secreto à escada vazia. Não podia escutar nenhum dos golpes anteriores, mas definitivamente detectava risadas, e estalos de risada desenfreada seguidos pela voz profunda e cadenciosa de um homem.

— Soa como se alguém estivesse divertindo-se — comentou com ironia.

— Talvez alguém esteja se divertindo muito para seu próprio bem —

replicou Emma. — Tenho medo de que seu sangue Boscastle esteja exercendo seu efeito.

— Ela se casou comigo — disse. — Uma mulher pode estar influenciada pelo mau comportamento, mas Jocelyn não é uma relação de sangue.

Ela o olhou fixamente.

— Referia-me à Charlotte, Devon — disse suavemente. — Nossa prima.

— Sei quem diabos é Charlotte — mas ele não sabia quem era ele nesse momento, ou no que se estava convertendo.

Emma se levantou de sua escrivaninha.

— Tenho que voltar para as aulas. Perguntará a sua esposa e a Charlotte a respeito de sua busca com mais tranqüilidade?

Um momento mais tarde estava parado fora da porta da biblioteca do primeiro andar, levantando a mão para golpear. O som suave de Jocelyn, a voz refinada o fez vacilar.

— "... como o beliscão de um amante. / O qual dói, e é desejo".

O desejo, ao caralho.

A parte racional dele percebia que não havia com o que preocupar-se e se fosse razoável, não tinha mais que continuar batendo até que o ouvissem.

Mas outra parte, por desgraça, o instinto dominante pelo que seus esquecidos antepassados tinham seqüestrado e encerrado sob chave a suas mulheres para seus fins lascivos, demonstrou ser mais forte.

Abriu a porta sem bater.

Sua esposa, bom, a parte posterior dela, estava inclinada sobre o baú transbordante de acessórios de vestuário e peças de vestuário. Apoiado contra o ombro dela estava um homem jovem que se parecia com um cigano com uma camisa vaporosa e calça de veludo negro.

Tossiu. Nenhum deles o escutou.

— Pegos no ato. — disse em voz alta, apoiando seu cotovelo contra a porta para observá-los.

Jocelyn se virou com surpresa.

— Sim. No quinto ato, segunda cena de Antônio e Cleópatra, para ser preciso — seus olhos se iluminaram. — Devon, é você. Quando chegou em casa?

Seu companheiro se endireitou imediatamente, a alegria brilhando em seus olhos negros como o carvão. Uma bola de corda rodeava seu pulso.

— Estávamos à caça de uma serpente para usá-la na obra, milorde.

Devon sorriu com pouco entusiasmo, em resposta a calidez do galês.

— Não acredito que ela tivesse que ir muito longe.

O Sr. Griffin quase deixou cair á corda. Jocelyn se endireitou, seu cabelo despenteado, com um favorecedor rubor em suas faces.

Evidentemente, tinham percebido o desgosto de Devon, mas ele mal teve tempo para decidir se era merecido, antes de perceber que havia outra pessoa na sala. O que significava que tinha havido uma terceira testemunha de sua própria conduta.

Era sua prima Charlotte, vestida com um lençol que ele supunha que tinha a intenção de ser uma toga, e uma fita dourada sobre sua testa. Ela levava uma cesta de algo que se parecia com umas velhas ameixas passas.

— Que diabo faz vestida assim? — perguntou antes que pudesse deter-se.

— Estou fazendo o papel de Charmian, a escrava da Cleópatra.

O Sr. Griffin limpou a garganta, lançando um olhar vacilante em direção a Devon.

— Talvez devesse ir lá embaixo para ajudar lady Lyon.

— Talvez devesse — disse Jocelyn suavemente.

Ela se voltou lentamente para olhar a Devon. O jovem galês fez uma sábia saída. E Charlotte simplesmente olhou através do aposento com a ridícula fantasia e não disse nada, apesar de seu agudo olhar parecer absorver tudo.

Devon levou a mão ao rosto.

— Acho que acabo de fazer uma áspide de mim mesmo.

Jocelyn compartilhou um olhar divertido com Charlotte.

— Deve parecer muito estranho...

— Não parece estranho absolutamente — disse ele, seu olhar sobre o rosto dela.

Ela afastou o cabelo dos olhos.

— Me alegro que tenha voltado Devon.

Sorriu-lhe, desejando que estivessem sozinhos.

— Me alegro de ter voltado, também.

Jocelyn não podia decidir o que tinha mudado em Devon na última semana ou algo assim. Tinha sentido falta dele terrivelmente, enquanto ele esteve fora, é claro, especialmente á noite, embora sua família se assegurasse de ocupar todas as horas de seus dias.

Esteve tão ocupada na academia, desfrutando de trabalhar com Emma e Charlotte, que não era até mais tarde durante a noite que se lembrou que Devon não deveria voltar para casa por outros dois dias.

Percebeu depois que jantou sozinha e leu os jornais, que ele devia ter retornado cedo de Brighton e se dirigido imediatamente à casa de Heath.

E o que tinha visto?

Sua esposa enterrada em um baú, e o pobre Sr. Griffin com um ar de culpa quando não tinha feito nada mau absolutamente. E então lhe ocorreu que Devon

estava com ciúmes. Que ele tinha entrado na biblioteca como se tivesse esperado encontrar...

Bom, quem sabe o que tinha esperado achar? A sua esposa envolvendo-se em uma aventura? Só a idéia lhe provocou gargalhadas silenciosas. Ela mesma não tinha permitido que um jornalista despertasse suas suspeitas? Era isso o que tinha acontecido? Devon tinha retornado à casa de Brighton e leu as intrigas que se publicaram a respeito de Jocelyn e o Sr. Griffin?

Toda a situação com o Sr. Griffin foi inocente. O jornal sensacionalista tinha mentido. E, entretanto, não era algo que ela devesse admitir, mas ela tinha saboreado esse breve momento em que pareceu que ela e seu marido vagabundo tinham trocado os papéis.

Se Devon se precipitou na casa para vê-la... Se ele apressou-se para chegar à casa de Heath para lhe dizer que estava de volta, e ela estava ombro a ombro com outro homem... Recostou-se em sua cadeira com um profundo suspiro de satisfação.

Não por nada tinha provocado em seu marido uma demonstração de sentimentos por ela. Mas ela tinha visto o olhar em seu rosto quando se virou surpresa do baú.

E se via como um homem que estivera lutando uma espécie de batalha privada e perdendo miseravelmente. Por que não podia ter estado ela mesma em casa quando ele tinha retornado?

Agora ele se fora de novo e ela estava sentada sozinha. Inclinou-se para frente com decisão e chamou à senhora Hadley, quem perdia pouco do que ocorria na vida de seu patrão, aprovasse ou não.

— Meu marido leu os jornais sensacionalistas desta manhã, senhora Hadley? Eu tinha entendido que os tinha jogado fora.

— De fato, fiz isso, senhora — respondeu a governanta desgostosa. —

Pensei que tinha tirado da casa esses que viu, mas algum instigador do mal, aparentemente escondeu um entre os documentos pessoais de Lorde Devon.

— Por quê? — perguntou Jocelyn.

— Não tenho nem idéia. Talvez seja uma dessas prostitutas com a esperança de causar problemas em seu matrimônio. Prometo-lhe que nunca voltará a acontecer. Thistle e eu resolvemos a partir de agora ler todos os documentos que cheguem a casa, evitando as correspondências pessoais, é claro.

— Obrigada, senhora Hadley.

A governanta se dirigiu à porta e olhou para trás hesitante.

— As pessoas fofocam a respeito desta família todo o tempo, senhora.

— Meu Deus não posso imaginar por que.

— O que não pode imaginar? — perguntou Devon da porta.

Ela se levantou de sua cadeira quando ele entrou na sala.

— Perdeu o jantar, Devon — disse em voz baixa. — Eram cordeiro e ervilhas frescas. Posso pedir à senhora Hadley que lhe traga algo antes que se vá à cama se tiver fome.

— Não. Tudo está bem. Jantei com Chloe e Dominic há um momento. Não tinha a intenção de fazê-lo, mas parei para vê-la, e fiquei.

Ela o olhou nos olhos, ajudando-o a tirar seu casaco. Uma das coisas que adorava nele era que se preocupava com sua família.

— Como está ela?

— Melhor, acredito. Deveria lhe ter enviado uma nota avisando que me atrasaria. Não quis preocupá-la. Mas pensei...

— Sim?

Ele se voltou lentamente, tomando-a em seus braços.

— Pensei que estaria zangada comigo pelo que aconteceu hoje.

— Nem sequer sei o que aconteceu! — exclamou.

Pegou seu queixo entre seus dedos.

— Não?

— Leu o jornal? — perguntou ela suavemente.

— Diga-me que tudo era mentira.

Ela sorriu.

— Cada palavra.

Inclinou a cabeça para beijá-la.

— Já sei.

— Tem certeza que não deseja jantar? — perguntou ela enquanto a boca dele capturava a sua em um beijo profundo, apaixonado.

Ele riu contra seus lábios.

— Não me importa se nunca como outra comida outra vez em minha vida.

Desejo você.

 

 

CAPÍTULO 19

 


Grayson, Marquês de Sedgecroft, tinha decidido dar um pequeno baile de máscaras em sua casa de Park Lane a instância de sua irmã Emma.

Em regra geral não necessitava uma razão para fazer festas nem tipicamente cumpria com os pedidos da Ditadora Delicada, como a família chamava carinhosamente Emma.

Com os anos tinha chegado a ser um perito em ignorar as sugestões socialmente iluminadas de Emma. Deus sabia que ninguém desfrutaria da vida se a pessoa escutasse os conselhos de Emma. Desde a morte da mãe, ela assumiu o papel da consciência maternal dos Boscastle. Se não do mundo inteiro. Onde havia algo incorreto, ela sentia que deveria corrigir.

Tinha boas intenções, mas, maldição, deixava seus irmãos meio loucos com sua interferência.

Emma expressou sua preocupação, com sua maneira sensível, sobre a dor persistente da irmã Chloe, que sofreu uma perda na primeira gravidez; assim como sua própria observação que o matrimônio recente de Devon e Jocelyn pudesse necessitar de um pouco de apoio de todos eles para suportar a avalanche de rumores que os tinha assaltado há uns poucos dias.

Um pouco de ânimo da família, sugeriu Emma, poderia ser tudo o que necessitavam para que Devon e Jocelyn percebessem que eram feitos um para o outro.

Grayson não podia discutir nenhum dos pontos, pois sua esposa, Jane, que era muito mais sábia que ele nessas coisas, compartilhava a mesma opinião.

Ironicamente, resultou que Jocelyn não queria ir particularmente ao baile, nem tampouco seu irmão Devon, pelo que ele podia ver. Isto fazia bem difícil para Grayson planejar uma festa com a esperança de estreitar a união deles.

Entretanto ninguém, incluídos os membros da família, podia recusar ao

marquês, e se esperava que uma vez que ele emitisse o convite, seria aceito.

Jocelyn desceu da carruagem de seu marido e discretamente arrumou a decoração pesada de seda dourada que levava na cabeça. Talvez disfarçar-se de Cleópatra não foi muito inspirador para a festa de seu cunhado, mas era o que tinha à mão e como Devon avisou na última hora, não pôde escolher outra fantasia. Ele se sentia tão resistente a ir à festa como ela.

Ela não entendia por que se sentia tão esgotada e reticente a sair. Sua menstruação nunca tinha sido regular e se atrasou este mês. Esta irregularidade parecia contribuir a seu sutil cansaço, e se perguntou se teria a ver com suas mudanças de humor.

Cada vez que Devon a olhava, sentia-se irracionalmente tentada a começar a chorar. E quando não a olhava, sentia-se com mais vontade de soluçar.

Para piorar, ele desapareceu tão logo entraram no elegante lar de seu irmão e foram anunciados. Teria se sentido mais ofendida pelo abandono se sua cunhada não a tivesse levado de lado para lhe confiar que Devon e seus irmãos se reuniram para tomar um brandy privado no estúdio de Grayson como era o costume cada vez que a família se reunia.

— Eles o chamam conversa masculina — explicou-lhe Jane enquanto a levava a um hall atrás do salão de baile. — O que significa que se reúnem para brincadeiras vulgares e grunhidos com grandes golpes no ombro como se fossem ursos e não irmãos. Faz com que alguém se pergunte sobre o curso da civilização humana.

Jocelyn só podia invejar a facilidade com que a marquesa aceitava os costumes e conduta peculiar de seu marido. Mais que isso, invejava os olhares cálidos que Jane e Grayson tinham compartilhado no salão de recepção enquanto recebiam seus convidados. O matrimônio não tinha diminuído a paixão do casal.

— Essa é uma fantasia provocadora — disse Jane pelo ombro referindo-se ao vestido branco egípcio de Jocelyn. — Cleópatra?

— Sim, — Jocelyn franziu o cenho. — Sinto-me bem nua, mas era tudo o que tinha à mão.

— Por que Devon não se vestiu de Marco Antonio? — Jane perguntou. Ela estava etérea e adorável como ninfa do bosque com um vestido de seda diáfana verde-acobreado com folhas de seda entre o cabelo. Grayson estava vestido incongruentemente de gladiador romano.

Jocelyn seguiu Jane pelo longo vestíbulo à sala dos refrescos.

— Não me ocorreu perguntar.

— Pelo menos não se disfarçou de assaltante de caminhos — disse Jane divertida.

Jocelyn parou.

— Conhecia-o quando...?

Antes que Jocelyn terminasse a pergunta, um grupo de convidados descobriram Jane e correram para reclamar sua atenção. A marquesa rapidamente se transformou em uma das anfitriãs mais populares de Londres, e ser reconhecida pessoalmente por ela em uma de suas festas, era um sinal de importância.

Jocelyn se sentiu perdida até que viu uma de suas cunhadas, Chloe, lhe fazendo gestos para que se aproximasse e se juntasse com o resto da família no salão de baile.

Ela avançou só para sentir um corpo duro roçar o seu. Sobressaltada deu uma olhada ao redor. Um homem alto disfarçado de monge inclinou seu rosto encapuzado, agarrando na mão o crucifixo que usava.

— Perdão, dama.

— Está bem. Acho que fui eu quem me interpus em seu caminho.

Pela extremidade do olho viu o lacaio chefe de Grayson, Weed, examinando-a através de seu largo nariz curvo. Por um momento humilhante, pensou que o lacaio iria lhe chamar a atenção por sua estupidez. Estava acostumada às reuniões mais informais do campo onde era muito mais freqüente que os convidados chocassem entre si, a que não o fizessem.

Teve a sensação desagradável de uns dedos ásperos, estranhos lhe agarrando o pulso. Percebeu-se alarmada e tentando soltar-se.

— Quantas milhas há para Babilônia? — perguntou-lhe o monge antes de soltá-la e voltou a desaparecer no grupo de convidados.

Quantas milhas há para Babilônia? Que tolice era esta? Esses olhos duros reluzentes. Conhecia-o? Se fosse assim, não podia ser uma relação agradável.

— Posso-a servir em algo, Senhora? — outra voz lhe perguntou atrás.

Ela olhou sem vontade. O lacaio chefe com rosto de pedra se inclinou ante ela, embora seu olhar ardiloso seguisse o monge que cruzava rapidamente o salão.

Ruborizando-se, perguntou-se se talvez Weed tivesse lido as folhas dos escândalos e a considerava indigna da família que ele servia, ou se talvez sua estupidez social fosse óbvia inclusive a um lacaio.

— Vou ao salão de baile.

— Posso escoltá-la? — perguntou-lhe em uma voz inexpressiva.

— Não é necessário.

— Como quiser Senhora — murmurou com uma inclinação rígida.

Devon acabava de sair do estúdio de Grayson com seu irmão Drake, quando reconheceu o lacaio Weed escoltando a um homem alto de cabelo crespo, a um corredor privado.

— Maldição.

— Este cavalheiro pediu para vê-lo, Sua Senhoria — disse Weed. —

Tomei a liberdade de recebê-lo. Insistiu em lhe falar esta noite.

— Sr. Griffin — disse Devon em voz baixa. — Se está aqui para discutir o que aconteceu hoje, então me deixe ser o primeiro a dizer algo sobre o assunto.

Estava completamente equivocado ao assumir que...

— Mais tarde poderemos nos desculpar — disse o homem jovem de uma forma que Devon poderia ter interpretado como impaciente se não percebesse do pânico que se encerrava. — Vim aqui a respeito de sua esposa, Sua Senhoria.

— Minha esposa? O que acontece com ela? — perguntou firmemente, sem gostar que Drake estivesse escutando com claro deleite.

— Por favor — disse o professor de latim seriamente. — Não acredite que

eu de algum jeito fomentei o que estou a ponto de lhe mostrar. — Colocou a mão no bolso de seu colete. — Nem acredito por um instante que sua esposa escreveu isto.

Devon tomou ar. Podia sentir Drake a suas costas olhando, enquanto o Sr.

Griffin tirava com mão trêmula uma nota dobrada e a passou. Ele tomou e a leu.

Deve saber que meu coração lhe pertence, embora deva pagar o lamentável engano de meu matrimônio. Falou da beleza de Gales com tanta paixão, que desejo escapar lá com você. Desafiará meu marido por nossa liberdade?

Sua Cleópatra.

J.

— Juro-lhe por minha alma — disse o jovem com voz séria. — Eu não a animei...

Devon olhou para cima com um brilho de emoção, percebendo que o tipo tinha medo que o acusasse de adultério. Bom, com razão depois da forma como Devon se comportou com ele hoje. Mas se uma vez se equivocou com uma falsidade, agora conhecia a letra de Jocelyn, e não o enganariam outra vez.

— Minha esposa não escreveu isto. Acha por um momento, que seria enganado tão facilmente?

O Sr. Griffin desabou de alívio.

— Quem poderia conspirar contra uma dama de tão bom coração. Quem deseja destruir pessoas inocentes?

Fez-se silêncio. Devon olhou distraidamente à rua pela janela enquanto um fanático estava parado frente à mansão de Grayson fazendo soar um sino para murmurar um aviso aos convidados servidores do inferno, lá dentro.

Os seguidores religiosos tinham tomado à família Boscastle como alvo desde que ele tinha memória, geralmente em vão. E não lhe tinha escapado que o professor de latim tinha comentado o bom coração de Jocelyn, não o de seu marido. Bom, era uma omissão bem merecida.

— Como caiu do céu. Oh, Lúcifer, filho da manhã! — Gritou o fanático

fora da casa. — Como há...

A figura com capa mal tinha começado o sermão quando dois lacaios com libré Boscastle o seguraram pelo sovaco e sem nenhuma cerimônia o lançaram à noite.

— Sou o mensageiro de Deus...

— Bom irmão de Lúcifer — disse Drake divertido a Devon depois de um momento longo. — Parece que realmente tem um inimigo.

Devon deixou de olhar a janela. Mensageiro de Deus. As palavras ressoavam. Uma lembrança se removeu.

— Não tenho nenhum inimigo — disse negando com a cabeça. — Só tenho amigos, você mesmo disse.

— Quem? — Perguntou Drake em voz baixa. — Pense muito. Revise cada momento em sua memória para uma resposta.

— Um mensageiro de Deus — Devon disse lentamente. — Esposa e concubinas. É o que dizia o diário do escândalo de nossa família, e não acredito que seja uma frase original.

— É da Bíblia, Sua Senhoria — o Sr. Griffin disse. — O Livro de Daniel, segundo lembro. Poderia este malfeitor ter conexões com a igreja?

— As maiorias dos conhecidos de Devon entram na igreja só quando são elogiados depois de uma morte prematura — comentou Drake.

Devon franziu o cenho.

— Entretanto acredito que o Sr. Griffin tem razão. E também acredito saber quem é o malfeitor. O que diz se derrubarmos a Babilônia?

Alguém tossiu muito forte atrás deles. Devon olhou distraidamente a seu redor e viu Gabriel vestido com a roupa ampla azul real de um mago medieval.

— Se Babilônia caiu — disse Gabriel evidentemente sem entender a conversa — certamente vão me jogar a culpa disso, embora não estive em Londres nos últimos dias. Alguém sentiu falta de mim enquanto estive fora?

Drake riu.

— Pareceu-me que a cidade estava mais tranqüila agora ultimamente. A

que se dedicou? Ou não deveria perguntar?

Devon avançou e tomou Gabriel pelo braço.

— Não importa.

— Por que não? — exigiu Gabriel com falso alarme.

— Porque você vem comigo.

— Sim? — Perguntou Gabriel surpreso, abaixando sua bengala de salgueiro retorcido. — Deixe-me assegurar que entendo. Está me pedindo ajuda?

O rosto anguloso de Drake se escureceu.

— Pelo inferno, está fazendo isso. Se alguém vai ajudá-lo, esse sou eu.

— Necessito-o aqui Drake, para que fique de olho em minha esposa.

Devon deu uma cotovelada em Gabriel para a porta.

Drake o olhou assombrado.

— O que?

— Não se ofenda, — disse Devon. — É um homem felizmente casado, e não confio deixar Gabriel sozinho com minha esposa um momento sequer.

Gabriel sorriu levemente.

— Eu tampouco confiaria em mim, com ela.

Da casa de Grayson, foram-se na carruagem de Gabriel ao sudeste de Londres à Rua St. James. Gabriel não queria fazer perguntas desnecessárias, mas estava desejoso de oferecer seu apoio. Devon pensou fugazmente, que não sabia muito de Gabriel, exceto que seu primo aparentemente tinha passado mal uns quantos anos. Gabriel nunca falava de si mesmo ou de seu passado.

— Agradeço-lhe que me ajude — disse quando a carruagem parou na rua empedrada. — Não posso pensar em outra pessoa a qual podia pedir ajuda, e que estivesse de acordo sem perguntar por que.

— Mais vale um diabo conhecido?

— De um diabo a outro — concedeu Devon.

Gabriel assentiu de bom humor.

— Vou tomar como um cumprimento a meu caráter. Não recebo muitos nestes dias.

— Posso supor que será meu cúmplice se cometer um assassinato?

Gabriel encolheu os ombros.

— Pergunta-me como se fosse á primeira vez.

Devon balançou a cabeça.

— A quem estamos caçando esta noite? — Gabriel perguntou.

Os lábios de Devon se enroscaram em uma careta.

— O Capitão Mathew Thurlew.

— O filho mais velho do pastor? — perguntou Gabriel depois de um momento.

— Sim.

— Bom, que me caia morto. Não foi seu irmão Daniel seu cúmplice naquele fracassado assalto de caminho, não faz muito?

Devon grunhiu de desgosto consigo mesmo.

— Preferiria que não me recordasse isso. Mas sim. Tem razão.

— Sabia que se dedicou a assaltar carruagens para ganhar a vida até que o pegaram três meses atrás? — Gabriel perguntou quase coloquialmente. —

Escutei que matou o empregado de um banco em Crawley Downs, dizem que o maldito idiota será executado.

Devon voltou a balançar a cabeça.

— Isso não sabia. Mas agora sei que Mathew Thurlew deve me culpar por ter feito com que seu irmão se desencaminhasse, embora Daniel nunca tenha mostrado muita consciência social, depois de tudo.

Era um jovem vândalo, divertido, mas amoral, quando Devon o tinha conhecido. Nunca teriam permanecido amigos por muito tempo sob nenhuma circunstância.

— Em minha opinião — comentou Gabriel enquanto caminhavam para a entrada do clube, — não há nada pior que esconder os próprios pecados atrás do escudo da religião.

— Eu me aventuraria a dizer que você e eu não nos incomodamos muito em esconder nossos pecados — disse Devon.

— Talvez se tivéssemos unido nossas cabeças — continuou Gabriel, —

teríamos percebido que Thurlew estava tentando o destruir todo o tempo.

Inclusive poderia ajudá-lo.

Devon grunhiu.

— Ajudou a si mesmo com Lily Cranleigh, ou não?

— Realmente achei que não se importaria.

— Não me importou — Fez uma pausa, arisco. — Mas minha esposa é outra coisa.

— Thurlew deve ter posto essas coisas nas páginas de escândalo.

— Isso eu espero — Devon murmurou.

— E os convites à torre.

Devon assentiu com gravidade.

— Sim.

Gabriel lhe deu uma olhada.

— Foi Thurlew quem pôs o ataúde na festa de Fernshaw.

Devon assentiu outra vez, com o rosto de pedra, e começou a caminhar para o clube.

— Ponhamos um fim a suas travessuras de uma vez por todas.

Mas para sua frustração o Capitão Thurlew não foi visto nos dois últimos dias, segundo os garçons, um dos quais informou a Devon em privado que o capitão tinha mudado recentemente seu alojamento em um endereço mais decente na Rua Downing.

— Lembro-me que se queixava da chusma de seu antigo bairro, Sua Senhoria. Dizia que lhe ofendia a moral.

— Moral — refletiu em voz alta Gabriel enquanto saía com Devon do clube e estavam novamente parados na vereda. Deu uma olhada a seu primo.

— Está apaixonado por sua esposa?

— E o que importa a você se o estiver? — Devon perguntou indignado, a pergunta o tinha pegado totalmente despreparado.

Gabriel soltou uns risinhos roucos.

— Imaginei que estava.

— Corte-o, certo?

 

 

CAPÍTULO 20

 


Jocelyn sorriu a cada convidado que se apresentou no seu baile de máscaras na casa de Grayson, até que lhe doeram os lábios de fazê-lo.

Pediu desculpas pela ausência de Devon até que ficou sem fôlego e convicção. Não tinha idéia de como explicar seu desaparecimento, ela só sabia que seu irmão mais velho, Drake estava a olhando como se aproximasse alguma tragédia.

Bom, qualquer que fosse a razão pela qual Devon tinha desaparecido, havia definitivamente algo peralta trabalhando dentro de seu corpo. Não estava presente, percebeu em meio a uma valsa com um dos primos de Devon. Sentia-se enjoada e tentada a chorar de repente, o que levou a seu jovem parceiro de dança a olhá-la com preocupação.

— Talvez deva comer algo — sugeriu-lhe em voz baixa. — Eles nunca se alimentam o suficiente nestes assuntos formais. Todo este baile abre até o apetite.

— Talvez um bocado ou dois ajudasse — admitiu ela, surpresa pelo modo como o pensamento sobre comida soava.

— Vamos procurar Jane — disse ele segurando sua mão. — Não há diversão em dançar valsa com o estômago vazio.

Uns minutos mais tarde, Jane encontrou Jocelyn na sala de refrescos.

— Por que não me disse? — Perguntou-lhe com um sorriso de preocupação, assinalando os lacaios ali pressente para que fechassem a porta.

Jocelyn deixou a taça de geléia de rosas que estava em processo de acabar.

— Dizer-lhe o que?

— Eu ansiava por gelatina como um demônio quando estava grávida de Rowan — Jane sussurrou. — E bolo. E mingau.

— Mas não posso estar... É muito cedo.

— Não, não é — disse Jane com um sorriso nostálgico. — Como fato importante que é, poderíamos anunciá-lo ao final do encontro. Grayson adora esse tipo de surpresas, embora pensando bem, talvez não devesse fazê-lo. No momento.

— Quando saberei? — perguntou-se em voz alta Jocelyn.

— Muito em breve, acredite — respondeu Jane. — Pergunto-me se terá um filho ou uma filha. Há um farmacêutico na cidade que jura que pode saber o sexo do bebê antes de nascer. Mas requer passar água em uma caçarola de cinzas, temo. Nunca disse a Grayson que fui, imagine. Fiz Weed guardar o segredo.

Jocelyn liberou seu fôlego. Grávida. Tinha concebido um filho, um com um apetite luxurioso pelo visto. Ao menos isso explicava sua reação ao comportamento caprichoso de Devon, mas não explicava seu comportamento absolutamente. Ele não estava grávida, chorosa e comendo como um batalhão de soldados. Ele simplesmente não estava aqui.

— Não seria agradável compartilhar este tipo de notícias enquanto Chloe está ainda sofrendo sua perda — disse pensativa.

Jane assentiu com a cabeça.

— E a gente nunca sabe. Os primeiros meses são precários já que o bebê se afiança ao útero. Oh, Jocelyn, estou feliz por você. Gostaria de vir ao quarto das crianças e se sentar com meu filho? Vou enviar a babá à cozinha buscar massas e chocolate para uma celebração privada.

Jocelyn não podia rejeitar a oferta de sua cunhada, mesmo se os bolinhos parecessem um pobre substituto da presença de Devon.

— Deixe-me dizer primeiro a Drake aonde vou. Tomou conta de mim com tanta diligência que temo que Eloise foi bastante ignorada.

De fato, Drake a observava da porta enquanto empreendia seu caminho através da sala cheia de pessoas para lhe informar de seus planos. Jocelyn tinha a sensação de que não a tinha fora de sua vista nem por um minuto.

Entendia que a família Boscastle só queria protegê-la, para cobrir a

ausência de Devon, mas toda sua atenção só aumentou sua ansiedade porque não tinha idéia de onde tinha ido seu marido. E então escutou um grupo de jovens convidados falando na mesa de refrescos, e sua preocupação parecia multiplicar-se.

— A tudo isto, onde está Devon?

— Ele e Gabriel foram ao clube.

— E deixou sua esposa, parecendo tão encantadora com esse traje?

— Condenado e arrogante demônio. Está procurando que ela tenha uma aventura.

— Bom, ele nunca guardou segredo que nunca se considerava um homem para o matrimônio. A pessoa não esperaria que ficasse acorrentado á seu lado.

Jocelyn retrocedeu diretamente aos braços de seu cunhado Drake. Lançou uma olhada aos convidados que permaneciam em pé ao redor da mesa. O grupo se manteve em um silêncio incômodo.

— Algo vai mal? — Drake perguntou, estreitando seus olhos enquanto a guiava para a porta.

— Não. Estou... — Não confiava em que pudesse comportar-se durante um minuto mais. Estava zangada, preocupada com seu marido, e lhe preocupava que pudesse estar demonstrando ser um estorvo para a família Boscastle. — Se não se importa, vou levantar minha bola e a corrente ao andar de cima ao quarto das crianças e tirar minha opaca presença da festa.

— Como desejar, Jocelyn — Enviou um olhar fulminante por cima do ombro aos convidados que ainda não tinham reatado suas conversas na mesa. —

Embora não acredito que seja sua presença que deva ser eliminada.

— Eu gostaria que parasse — sussurrou enquanto começava a caminhar para a escada.

Ele franziu o cenho.

— Parar o que?

— Velar por mim como se algo ruim estivesse acontecendo. Não há nada errado, não é verdade?

Ele parou na parte inferior da escada.

— Devon e Gabriel foram enfrentar o homem responsável pelos ataques pessoais a você e a ele. Ele está levando a cabo a honra, não outra mulher, se isso é o que a pergunta.

— Não estava pensando nisso... Conheço essa pessoa?

— Duvido — disse Drake sombrio. — Seu nome é Matthew Thurlew.

Procurou em sua memória só um momento antes que outro pensamento a reclamasse.

— Não haverá uma confrontação física entre eles, não é? — Perguntou, recordando como Devon tinha ficado no parque. — Não deveria ter ido com ele em lugar de velar por mim?

Ele a conduziu à escada, um homem evidentemente à vontade com as mulheres tratando de tranqüilizá-las.

— Haverá uma confrontação física? Surpreender-me-ia se não houvesse.

Deveria ter ido com ele.

— Ele entendeu que era mais importante que ficasse com você — Seus olhos azuis ardiam com humor negro. — E tão profundamente como me dói admitir acredito que com Devon e Gabriel unindo suas forças, só estaria no meio.

Devon e Gabriel chegaram ao sudeste aos estabelecimentos da Rua Thurlew Downing só para descobrir que sua presa não estava na residência, mas sim um de seus amigos comuns, um inofensivo dandy chamado Gilbert Amherst, estava dormitando no sofá. Abriu os olhos e engoliu com horror sem palavras ao ver que um par de pistolas estavam apoiadas e preparadas em ambos os lados de sua cabeça.

— Não tenho dinheiro em efetivo — sussurrou. — Tampouco jóias à exceção do anel com uma pérola de minha avó.

— Cale-se, imbecil — disse Devon entre dentes. — Onde está Thurlew?

— Boscastle? — Piscou e o olhou pela extremidade dos olhos tentando reconhecê-lo. — É Boscastle? Somos amigos, não? Nunca lhes fiz nada de mau.

Não somos todos amigos?

Devon abaixou a pistola com desgosto.

Gabriel começou a rir.

— Isso depende. Sabe onde está Thurlew?

Gilbert engoliu em seco.

— Não está aqui?

— Não — disse Devon grosseiramente. — Ele não está, mas se sabe onde está maldição, é melhor me dizer.

— Deve ter ido ao baile de máscaras — disse Gilbert mansamente, apoiando sua cabeça para trás no sofá.

Devon lhe arrancou os babados do peitilho.

— Que baile de máscaras?

— O da casa de seu irmão. Você o convidou, não? — Seu lábio inferior tremia. — Não deveria estar ali?

Devon o deixou em liberdade imediatamente e ficou em pé, com Gabriel logo atrás.

— Tem razão. Deveria ter ficado com ela.

— Drake está lá.

— Assim como uma centena de pessoas mais, um deles Matthew Thurlew.

E ninguém convidou ao filho da puta, tampouco.

Drake escoltou Jocelyn até o quarto das crianças com um olhar para dentro observando à senhorita O'Brien dormitando em sua cadeira junto ao fogo, e Rowan adormecido em seu berço. Havia uma panela de chocolate e um prato de bolo de nata de laranja na mesa de dois níveis.

Ele sorriu.

— Não são exatamente os ingredientes de uma noite emocionante, mas parece bastante seguro.

Jocelyn sorriu.

— Não me importa o silêncio.

— Bom, só tome cuidado já que a senhorita O'Brien é propensa a cantar

canções de berço, quando o capricho lhe bate. Jane e o bebê acham seu cantarolar agradável. Grayson não.

Jocelyn se sentou no tamborete que estava junto ao berço.

— Estou bastante sonolenta tal como ela está. Odeio a mim mesma, que vergonha dormitando como um cão velho.

— Outra advertência — acrescentou Drake, vacilante na porta. —Rowan é um infame bastardo.

— Um o quê? — Perguntou.

Esfregou o lado do nariz.

— Um pequeno descarado, não é comparável a ele. Não quero que se assuste. Esteve a ponto de apagar todas as luzes de gás na cidade não faz muito tempo.

Levantou-se, tentando não rir. Parecia tão ofuscado.

— Terei que ficar totalmente alerta.

— Muito bem então. Suponho que isto é suficientemente seguro. Vou enviar-lhe Weed ou outro lacaio para estar fora se por acaso o necessitar.

— Sem fazer ruído, por favor — disse com um olhar divertido à babá imóvel. — Não queria despertar a nenhum deles.

Fechou a porta sem fazer ruído e voltou para o berço. Não podia explicar, talvez fosse porque realmente estava grávida, mas os olhos de Rowan, em toda sua gordinha inocência, atraíam irresistivelmente o olhar sobre ele.

Um menino. Olhou por cima do berço aos azuis olhos de Rowan.

Suas pálpebras foram à deriva para baixo como se estivessem lutando contra o sono. Perguntava a si mesma se o bebê de Devon seria um menino ou uma menina, e como iria reagir à notícia. Acaso não lhe advertiu sobre a possibilidade no dia de seu casamento?

Inesperadamente, Rowan voltou a cabeça e a olhou com um sorriso encantador. Levou um dedo aos lábios, sussurrando:

— Ssshhh. Não queremos despertar a sua babá. Ela...

Com a menção de seu nome, a senhorita O'Brien gemeu e fez uma débil

tentativa de elevar o braço. A taça na qual esteve bebendo caiu de seu colo no chão.

A pele de Jocelyn se arrepiou em sinal de alarme.

— Senhorita O'Brien? — Sussurrou, voltando a cabeça para a mulher que desabou. — Está bem?

A babá respondeu com outro gemido, um tremor profundo surgiu de sua garganta. Jocelyn levou a mão instintivamente ao peito, estudando as sombras do aposento. Algo... Alguém... Estava ali.

As cortinas de damasco de ouro pregadas, com a luz do fogo refletindo-se nas profundas dobras. Jocelyn virou de lado para pôr-se diante do berço de Rowan. O movimento da sombra não era como ela esperava sua imaginação.

Havia alguém na janela. Inclusive se pudesse voltar para a porta e gritar para pedir ajuda, não podia deixar o bebê e a senhorita O'Brien a mercê de quem estava escondido no quarto.

Disse a si mesma que devia manter a calma.

Jane ou uma de suas cunhadas viria em um minuto para comprovar como estava Rowan. Todas as mulheres da família adoravam o querubim de Grayson.

Nenhuma mulher podia resistir a um varão Boscastle.

E acaso Drake não tinha prometido enviar um lacaio para montar guarda na porta?

É claro, ele mal tinha desaparecido e embora se apressasse mal teria tempo de descer as escadas, o que a deixava sozinha para defender ao bebê.

E ao menino que levava.

Deteve seus pensamentos ante o horror. Talvez só fosse um convidado bêbado que se afastou para cima por engano, ou que ansiava um pouco de paz.

Passava todo o tempo nas festas. Mas ninguém se aproximava de um quarto de crianças por engano. Não havia nada aprazível em um menino que chora e babás que vigiam.

— O que quer? — Exigiu em voz baixa.

Na verdade, sua garganta estava constrangida pelo que foi um milagre que

pudesse pronunciar as palavras, e muito menos continuar falando como se tivesse um pouco de coragem.

A figura encapuzada se desprendeu das cortinas. Seu coração começou a pulsar com força ao levantar os olhos para o rosto zombeteiro de um homem a quem só conhecia vagamente de severas advertências de seu irmão a respeito de como evitar as más companhias nas festas.

— Capitão Thurlew — disse. — Seu nome é Matthew Thurlew.

Detectou um brilho de metal entre as capas de sua volumosa manga e sua roupa. Não podia discernir se tratava de uma adaga ou uma pistola.

Certamente, qualquer que fosse o objeto, não fazia parte do traje de um homem piedoso.

Mantenha a calma, pensou, assim como seus nervos gritavam e a tensão dos músculos se atava ante a imobilidade. Era estranho que agora, depois de todo o tempo, fosse a voz de seu pai quem a aconselhava.

Mantenha a calma, menina, quando se aproximar de um indômito cavalo...

Por que era a memória de seu pai que lhe dava força? Ele fez sempre com que se sentisse fraca. Não, ele queria fazer com que se sentisse fraca e acovardada facilmente. Mas tinha fracassado. Sua intimidação a tinha obrigado a ficar em pé por si mesma.

— Está talvez perdido, capitão Thurlew? Posso lhe ajudar a encontrar seu caminho?

Começou a rir.

— Para Babilônia? Posso chegar até ali com a luz das velas?

Ela se manteve firme, apesar do fato dele estar se movendo para ela, seu coração estava trovejando e Rowan enrugava o rosto como se estivesse a ponto de chorar.

— Este é o quarto das crianças, capitão.

— E essa é a babá — disse com um gesto zombeteiro na direção da senhorita O'Brien. — Veja como dorme roncando. Bebeu todo seu chocolate misturado com láudano como uma boa garota.

Drogada. Isso explicava tudo. Tinha drogado à senhorita O'Brien. Incapaz de parar olhou para trás com horror ao menino no berço. Não teria drogado ao bebê, não é?

Rowan parecia tão em alerta e acordado.

— Você não...

Não se atrevia a perguntar. Estava aterrorizada para desviar sua atenção para Rowan. Melhor atraí-lo fora do aposento antes que tivesse em sua cabeça a idéia de ferir o indefeso herdeiro Boscastle.

Onde estava Drake?

Onde estava o lacaio que lhe tinha prometido?

Por que não tinha vindo Jane ver seu filho?

Por que não estava Devon ali?

Rowan abriu seus inocentes olhos azuis e gorjeou. Ela abaixou o olhar para ele sem perceber só para procurar e achar Thurlew diretamente ante ela.

— Se sente rancor por mim ou meu marido, senhor — conseguiu sussurrar.

— Rogo transladá-lo a um lugar mais cômodo que o quarto das crianças para discutir.

— Rancor?

Engoliu a saliva. Tempo. Necessitava tempo.

— Não foi você quem escreveu essas cartas na festa de Alton, capitão?

Nesse momento a senhorita O'Brien lançou um suave gemido gutural e deu um pontapé espasmódico com seu pé esquerdo contra a tela da lareira.

Cambaleou e caiu no chão estrepitosamente.

Thurlew lançou uma maldição e pegou pelo cotovelo a Jocelyn.

Rowan gemeu em sinal de protesto. Levou a mão livre de novo para consolá-lo, um gesto para que o menino respondesse com um gemido forte que certamente atrairia a atenção de quem se aproximasse pelo corredor.

— Tem razão, é claro — Thurlew se afastou do berço. — Vamos ter que ir a um lugar mais privado, ou esta prole do diabo vai despertar a toda a casa.

Estava tão agradecida de que não parecia interessar-lhe fazer mal algum a

Rowan o que foi seu temor desde o começo.

— Rapidamente — disse. — Está a ponto de acordar.

— Mais vale que não — disse bruscamente.

— Vai fazê-lo tanto se gostar como se não.

Tinha-a arrastado ao outro lado do quarto das crianças antes que percebesse que seu destino não era a porta do corredor principal utilizado pela família.

De fato, só quando a forçou contra a parede percebeu uma porta de serviço oculta atrás das cortinas, onde esteve escondido.

Estremeceu quando a franja de pesadas cortinados de damasco ameaçou afogar seu rosto.

Um grito de raiva, de medo bruto aumentou na garganta.

— Não o farei — sussurrou com dureza, empurrando-a para frente.

Ela retorceu seu pulso e lhe golpeou na face. Levantou sua mão, estremeceu, pensando que poderia golpear suas costas. Continuando, toda a corda que tinha usado como cinturão a colocou de repente ao redor de seu pescoço para submetê-la.

Ao não poder ver seu rosto, exigiu indignada:

— O que é estas coisas ao redor de meu pescoço? Para onde vamos? Por que faz isto? O que...?

Empurrou-a e ela tropeçou, seus sentidos desorientados, seus pensamentos confusos.

Por uns momentos de autêntico pânico lutou contra a sensação de queda ao vazio antes que desse um passo difícil recuperando o equilíbrio, percebeu que estava na parte superior da escada de serviço, que pelo aroma de umidade que ofendia seu nariz, tinha pouca utilidade nos últimos meses.

Ele puxou a corda para pô-la em movimento.

— Cada príncipe real tem sua rota de escape secreta.

Engoliu saliva contra a banda que tinha sua garganta constrangida.

— Você vai à forca por isso — disse ela, com a captura dos pés na borda

de sua túnica. Na medida em que era capaz, levantou o joelho entre suas pernas, mas ele se afastou, frustrando a esperança de que o incapacitasse.

Sua voz ressoou no vazio.

— Seu marido é a quem devem pendurar. Sua família inteira deve ser pendurada por seu abuso de privilégio e poder.

— O que fez Devon para que você o odeie?

Apesar de lhe perguntar, recordou os rumores sobre o irmão mais novo de Devon e de Thurlew. Os jornais de intrigas tinham prosperado em suas brincadeiras, o caos se desatou na cidade de Londres, o incidente mais destacado era seu infame marido e sua temporada fugaz como um salteador de caminhos.

Em sua lembrança um lacaio foi ferido, mas tinha sobrevivido.

O escândalo tinha se seguido, mas não achava que se produzira nenhuma outra violação da pessoa ou da propriedade. Devon e seus amigos tinham retido a carruagem equivocada no curso de uma brincadeira mal planejada. Tinha pensado que todo o assunto tinha terminado.

— Senhora — o disse sua voz sem inflexões — seria melhor que perguntasse o que me proponho fazer com você para reparar os danos que causou seu marido.

 

 

CAPÍTULO 21

 


Devon não perdeu um momento para parar e explicar aos curiosos por que se precipitava através da casa de seu irmão em meio de um sofisticado baile de máscaras.

Vários dos convidados disfarçados entre os quais voou simplesmente puseram-se a rir com indulgência e se afastaram como se sua entrada selvagem fosse parte do entretenimento da noite. Alguns dos assistentes mais idosos o olharam com carinhosa decepção e murmúrios sobre jovens senhores Boscastle.

Alguns pareciam estar muito surpresos para reagir de um modo ou outro, sobre tudo quando quatro ou cinco lacaios se aproximaram correndo atrás de Lorde Devon, um deles brandindo uma espada antiga que só uns momentos estavam penduravas na parede.

— Um cenário — murmurou uma matrona de rosto branco — deve ser um objeto de cenário para uma atuação surpresa. Esta família fica mais selvagem cada ano.

Não que Devon percebeu especialmente, ou que se desculpou.

Irrompeu na casa como o inferno desatado com Gabriel lhe pisando os calcanhares e gritando a quem quisesse escutar.

— O bastardo está na casa em alguma parte, disfarçado de monge!

Detenham-no assim que o virem.

— Jocelyn foi ao quarto das crianças faz só uns minutos — respondeu uma voz feminina, e Devon não lançou nenhum olhar para ver quem tinha falado.

Soava como sua irmã Chloe. Inclusive quando não parou para reconhecê-la, a informação se manteve em sua mente.

O quarto das crianças. Sem dúvida, o quarto das crianças era o lugar mais seguro em toda a casa. A babá não deixaria Rowan desatendido até que outro empregado ou um membro da família, em geral Jane, chegasse.

Era uma regra absoluta da casa. De sentido comum.

E não tinha posto Devon, Jocelyn aos cuidados de seu intimidante irmão Drake? Todo mundo no lar Boscastle tinha tido medo de cruzar-se com Drake em sua idade adulta. Sempre dizia a si mesmo que Drake não permitiria que ninguém machucasse Jocelyn. Havia algo escuro e feroz em Drake.

Todos os Boscastle tinham um pouco de medo de Drake. Todos os homens Boscastle protegiam a sua família, ou morreriam ao fazê-lo.

Deveria ter ficado protegendo sua esposa. Ela era inocente desde o começo, e a tinha feito pagar pelas dívidas de seu próprio passado esbanjado.

Seus pensamentos poderiam ter seguido correndo nestes círculos auto tortuosos indefinidamente se Jane não tivesse aparecido nas escadas ante ele.

— Onde está minha esposa, em nome de Deus? — Perguntou com assombro.

O angustioso rosto de Jane não lhe ofereceu nenhum consolo.

— Não está no quarto das crianças. Acredito que foi levada pelas escadas de trás através do beco de serviço. Weed já bloqueou todas as saídas possíveis e Drake foi atrás dele. — Ela fechou os olhos. — E Grayson.

A escada de serviço. Essa foi á única frase que parecia entender.

Voltou-se e alguém, querido Jesus, a quem reconheceu vagamente como seu cunhado Dominic, empurrou uma pistola com detalhes de prata para ele, ficando Dominic com sua companheira em sua própria mão.

— O beco traseiro — disse ele.

Virou-se outra vez e achou Gabriel diante dele.

— Nossa velha rota de escape.

Mas, é claro, nem Gabriel nem Dominic se criaram nesta casa para entender o que queria dizer, e não teve tempo de explicar.

Nos velhos tempos, um túnel percorria a cozinha através do jardim a uma porta que levava a rua, por onde os servos podiam entrar e sair, sem incomodar os que serviam.

Devon sabia que era costume de Grayson manter as principais portas da mansão custodiadas durante uma de suas freqüentes festas, pois era uma prática

comum para a população pedir a entrada ou pelo menos dar uma olhada em suas festas de luxo.

O que não sabia era se seu irmão se lembrava da porta que tinham utilizado para suas escapadas secretas quando eram crianças.

Ou se não seria muito tarde para lhe dar importância absolutamente.

Para Jocelyn o tempo não parou, mas sim se reduziu simplesmente, como se estivesse marcado pelo ritmo de um metrônomo invisível. Seus membros se moviam como se estivessem carregados de chumbo. Cada momento que era arrastada parecia uma eternidade, ou talvez só desejasse que assim fosse.

Ao final deste horrível interlúdio, o mais provável era que morreria.

O fato de que seu seqüestrador, um homem alto com ameaçadora falta de definição na escuridão, chamado Mathew Thurlew, poderia lhe tirar a vida por um capricho louco, encheu-a de uma cólera que não podia ocultar.

— Arrastar-me-á como uma dócil vaca ao mercado? — Sussurrou ela, com uma voz de mulher maníaca, gritante e rabugenta. — Coloca uma corda ao redor de meu pescoço e droga uma mulher inocente que cuida de um bebê?

Por um momento parecia um pouco surpreso de que uma senhora pudesse fazer uma defesa tão feroz.

— Disse-lhe que fechasse o bico — disse entre dentes.

Ela começou a tremer, nem tanto de medo agora, como por todas as emoções que tinha dentro. Seu pai poderia ter lutado para submeter a rebeldia de sua alma, mas tinha falhado. Para melhor ou para pior, ela era a filha de um soldado, e não se renderia sem luta.

Tinham chegado quase ao final da escada. Não estava segura aonde conduzia a porta de baixo. Sabia, entretanto, que uma vez que Thurlew conseguisse estar fora da casa suas possibilidades de ser resgatada, de manter-se com vida, se veria muito diminuído. Com todo o ruído da festa, ninguém prestaria atenção a duas pessoas alheias.

Ouviu que Thurlew torpemente pegava o trinco da porta, o pesado roce de seu fôlego. Esperava que encontrasse a porta fechada, embora a possibilidade de

estar presa sozinha com ele em uma escada escura não reforçasse sua minguante coragem.

— Abra — ele murmurou. — O...

Ela balançou para cima seu cotovelo e lhe deu no ombro um golpe forte, e nesse momento, a porta se abriu a um beco não iluminado. Ele não reagiu absolutamente, tampouco ela tentou golpeá-lo outra vez. Estava mais preocupada em descobrir um modo de escapar. Pareciam estar em pé em um túnel situado sob a copa e a cozinha.

Podia sentir o pó de cinza sob seus pés.

Talvez um criado pudesse estar perto. Podia ouvir o eco das pegadas e a conversa no andar de cima da câmara. Se pudesse gritar pedindo ajuda, alguém poderia pelo menos sentir a tentação de investigar.

— Ninguém nos pode escutar aqui — disse Thurlew como se tivesse adivinhado seus pensamentos. — Inclusive se alguém se aventurasse no porão, não ficaria o tempo suficiente para que lhe importe.

A vida ou a morte. Vingança. Misericórdia. A recompensa dos céus, ou a ameaça do inferno. Um momento único, um fato ao acaso poderia mudar o curso de sua vida.

E sua esposa. Nunca deveria tê-la deixado. Por que não esperou até a manhã? Por que tinha sido tão condenadamente impaciente para demonstrar que equivalia a um herói quando deveria estar protegendo-a?

Não sabia o que esperava encontrar quando corria pelo jardim até a porta de madeira pequena, mas certamente não era a visão de Jocelyn sendo arrastada com uma corda ao redor de seu pescoço. Manchas de sujeira ou pó manchavam seu traje branco e seu cabelo caia em enredos por cima do ombro. Uma corda.

Ao redor de sua formosa garganta.

Ele parou seu sangue rugindo.

Sua mente não parecia funcionar. O instinto primitivo tomou conta.

Tinha um só pensamento: o homem que a tinha machucado e degradado não merecia viver. A vida ou a morte. Vingança. Misericórdia. Céu ou o Inferno.

Poderia não ter chegado a tempo para salvar sua vida, e se não pudesse...

Esperou até que tivesse um tiro claro e sem possibilidade de golpeá-la antes de levantar sua arma. Com uma oração sem palavras em seu coração, apontou.

Depois, em um ato instintivo, que parecia tão vital para ele como a elaboração de seu próximo fôlego, apertou o gatilho, disparou e esperou. Parecia como se o momento que suspendeu a pistola levasse um tempo infinito para atirar.

Nem sequer estava seguro de que Jocelyn sabia que estava em pé atrás dela, mas por um instante brutalmente satisfatório viu o capitão Thurlew virar-se e olhá-lo diretamente no rosto. A bala golpeou Thurlew no peito, ele sabia quem tinha disparado. Ele sabia que estava pagando o preço do que tinha feito à esposa de Devon.

Soltando um gemido suave, Thurlew levantou a mão e caiu, debaixo de uma antiga estátua sem cabeça de Hermes. Fortuitamente, as sombras do deus alado o ocultaram da surpresa Jocelyn.

Devon se jogou para tomá-la em seus braços.

Olhou para seu rosto com um alívio que lhe parou coração.

— Veio — levantando as mãos para tirar a corda ao redor de seu pescoço.

Ele a pegou, finalmente capaz de respirar, agradado pelo calor de seu corpo no seu. Ela parecia uma escultura de gelo. Esfregou-lhe com suas grandes mãos os ombros e as costas, dizendo-se a si mesmo que tinha chegado a tempo, que ele a segurava.

— Estava preocupada com você — sussurrou, com o rosto ainda escondido no seu ombro.

— Deveria ter estado aqui — disse com ferocidade.

— Mas chegou — sussurrou de novo.

Sacudiu a cabeça, acariciando seu cabelo despenteado.

— Apenas a tempo.

— Devon...

Olhou para o céu, lutando para manter o controle. Podia sentir o calor entrar de novo em seu corpo, e com isso um pouco de seu próprio frio medo começou a ir-se.

— Devon — disse em voz baixa — não podemos ficar aqui.

Assentiu com a cabeça. Inclusive agora, estava tentando cuidar dele.

— Nunca devia tê-la deixado. E não vou fazê-lo nunca mais.

Ela retrocedeu um pouco. Seu rosto estava pálido e as lágrimas brilharam em seus olhos castanhos.

— Acha que está morto? Vem gente.

— Importa-me um demônio quem vem — disse com voz entrecortada. —

Só me preocupa você.

— Mas se estiver morto, vamos ter que explicar por que.

— Espero por Deus que esteja morto — disse desapaixonadamente, e queria dizer exatamente isso.

— Por favor, Devon — sussurrou. — Não acredito que possa falar com ninguém sobre isto ainda.

Deixou cair a pistola na erva quando sua suplica, finalmente, penetrou em sua mente. Não iria mentir a ninguém. Não sentia nenhuma vergonha pelo que tinha feito ou por quem o tinha visto.

Se não tivesse matado Thurlew, seria só por acidente ou objetivo defeituoso.

Thurlew merecia morrer pela degradação que tinha infligido a Jocelyn. De fato, agora que Devon se convenceu de sua segurança, teve que conter-se para não pôr outra bala no filho da puta. E depois outra.

Mas um instinto mais forte que o incentivou a ter em conta seus sentimentos, era imperativo que de repente a tirasse do pomar, antes dela ser sitiada pelos curiosos hóspedes.

Ouviu passos no outro extremo do caminho, e viu seu irmão mais velho, que corria para eles. Quando Grayson se aproximou, Devon rapidamente ajudou Jocelyn a tirar a ofensiva corda ao redor de seu pescoço.

Viu como seu irmão, com cuidado, guiou-a fora da vista de Thurlew deitado na erva. A seguir razoavelmente, fez gestos a um lacaio para que montasse guarda ao lado do corpo.

No momento seguinte Devon viu Drake e Gabriel correndo para eles.

Chutou a corda na erva. Que qualquer homem pudesse abusar e intimidar a sua esposa como se fosse um animal feriu-o.

Ficou as suas costas, não querendo separar-se dela outra vez.

— Rowan está bem? — Perguntou ela a Grayson com voz ansiosa. — E a senhora O'Brien? Ele envenenou o chocolate da pobre mulher. Escondia-se no quarto das crianças.

Devon tinha só uma vaga noção do que queria dizer. De fato, parecia que sua mente tinha começado a funcionar de novo, enquanto que seu coração nunca poderia voltar a ser o mesmo.

A menção de veneno e do filho de Grayson crispou-o, e se sentiu muito aliviado ao escutar Grayson tranqüilizá-la.

— Rowan está muito bem, graças a sua presença, Jocelyn. E a Sra. O'Brien sobreviverá para nos atormentar a todos por muitos anos com suas infernais canções de berço.

— Graças a Deus — disse.

Devon teve a sensação de desejar, uma vez mais, que sua vingança poderia ter-se prolongado. Este desejo descaradamente brutal desvaneceu uns segundos mais tarde, quando ouviu Gabriel murmurar.

— Maldição. Não está morto. Olhe. O porco está movendo a mão.

Drake deu um passo sobre o pulso de Thurlew.

— Já não é assim.

Ao que Gabriel respondeu em voz baixa enquanto se agachava debaixo da estátua sem cabeça.

— Será melhor revistá-lo, de todo modo, para assegurar-se de que não tem uma arma escondida em seu traje.

— Só o leve o mais longe possível da casa — disse Grayson com um olhar

de desprezo em direção de Thurlew. — Ou remata-o na realidade. Os lacaios podem atirá-lo junto às outras coisas no Tamisa.

— Vamos para dentro — insistiu Devon com sua esposa, envolvendo seus braços ao redor dela com força outra vez. Os homens de sua família tendiam a ser bruscos quando seus seres queridos eram ameaçados. Não o desaprovou. De fato, teria participado com muito prazer, era a forma Boscastle. Simplesmente preferia que ela não o visse.

— Não está morto? — Perguntou ela, voltando a cabeça na direção do Hermes decapitado.

Não porque ele não tinha tratado de matá-lo, pensou Devon, insistindo em levá-la na outra direção.

— Venha para casa comigo, por favor, antes que os convidados de Grayson estejam convencidos de que o entretenimento está aqui fora.

— Vá com ele, Jocelyn — disse Grayson. — Deixa seu marido consolá-la esta noite. Vou tratar dos assuntos aqui.

E, é claro, fez isso.

Com a delicadeza de um homem nascido para dominar seu entorno do momento de sua concepção, Grayson Boscastle, o Muito Honorável Marquês de Sedgecroft, conseguiu convencer seus convidados que o corpo a corpo no jardim não era mais que outra travessura de sua família. Na verdade, a maior parte de seus convidados não tinha esperado menos de uma festa Boscastle.

Nenhuma palavra disso chegou às más línguas, já que se o Marquês afirmava que nada de interesse tinha ocorrido em seu jardim, então devia ser assim. Ao final, Boscastle se fez encarregado de sua própria conta.

Irmão, irmã. Marido e mulher. Devon não tinha mais que permitir que sua verdadeira natureza o guiasse a partir de agora.

Estava profundamente agradecido de não ser muito tarde para outra oportunidade.

 

 

CAPÍTULO 22

 


Para surpresa de Devon, Jocelyn dormiu na carruagem na viagem de volta a casa e não despertou quando ele a levou escada acima, ao dormitório de sua casa da cidade. Evidentemente alertados antes de sua chegada, Thistle e a senhora Hadley trouxeram brandy e mantas quando viram o rosto sombrio de seu amo, logo discretamente se desvaneceram com preocupação tácita. Devon assentiu com a cabeça para eles com gratidão, não achava que fosse dormir absolutamente.

Tinha uma profunda alegria em sustentá-la simplesmente contra seu ombro, lhe fazendo promessas na escuridão que tinha a intenção de manter.

Teria a consolado se ela se movesse, mas só se moveu uma vez, sem sequer um murmúrio, afundando-se de novo em seus braços.

Rezou para que seus sonhos fossem tranqüilos em relação ao ocorrido esta noite, mesmo que seus próprios pensamentos lhe doessem profundamente.

Possivelmente amanhã poderia dormir.

Em uma semana ou algo assim, poderia ser capaz de fechar os olhos e não ver sua esposa sendo conduzida com uma horrível corda ao redor de seu suave e branco pescoço, ao qual ele tinha acariciado com um carinho grande.

Possivelmente poderia ser capaz de esquecer seu próprio cru medo de que ele pudesse chegar muito tarde.

Talvez de manhã achasse as palavras para explicar-lhe o que sentia. Ou talvez sussurrasse seu amor por ela enquanto ela dormia.

Como devia estar rindo o destino de sua arrogância, ele que tinha jurado que nunca se apaixonaria. Havia realmente acreditado que sua preciosa liberdade significava que podia viver uma vida sem sentido?

Parvo imprudente por assumir que quando, se alguma vez, ele caísse apaixonado, escolheria o tempo, o lugar, e a mulher.

Por que não lhe tinha explicado alguma vez alguém que não se tinha nenhuma opção?

Isso não importava.

Ele não teria escutado. Talvez lhe tivessem dito mil vezes antes e as palavras nunca penetraram na espessura de seu crânio.

Suspirou ante a vaidosa lógica que tinha seguido como seu credo durante muitos anos. Não havia nada que fazer por seu comportamento, salvo pedir desculpas pelos enganos que tinha cometido sem saber.

Se pudesse ter previsto que ela seria castigada em seu lugar, estaria ali para protegê-la. Se não tivesse sido um asno tão cego, cabeçudo, estaria a seu lado, onde pertencia. E onde ficaria.

Exalou, sorrindo fracamente com a idéia. Sua esposa não ia ser capaz de desfazer-se dele agora, e certamente nunca estaria em uma festa sozinha de novo. Ele iria ser seu amante, amigo e protetor para o resto de seus dias.

E quando ela despertasse iriam abaixo para um dos grandes cafés da manhã, que o faziam gemer, da senhora Hadley, e ririam se alguém os mencionasse nos jornais de novo, porque a mera sugestão de qualquer infidelidade seria ridícula.

Ela se mexeu.

— Que horas são? — Ela se ergueu sobre um cotovelo para contemplar em aparente confusão o aposento. — Como cheguei à cama?

— Dormiu na carruagem no caminho para cá — disse ele franzindo o cenho de preocupação. — Levei-a em meus braços. Não se lembra?

Seu silêncio lhe fez doer seu peito com ira.

— Lembro-me de dormir. Mas não... De vir aqui. Para casa. Não penso que queira partir alguma vez.

— Jocelyn — disse ele com voz rouca e com seus braços apertados a seu redor. — Foi minha culpa. Tudo foi minha culpa.

— Foi? — Questionou ela em voz baixa.

— Sim.

Percebeu que ela não discutiu. Bom, ele decidiu que merecia isso também.

— Não acredito que tudo fosse sua culpa — reconheceu-a zombando dele.

— Não?

Ela sorriu, estudando-o em silêncio.

— Um pouco.

Ele começou a rir.

— Mas não tudo.

Ele fechou os olhos.

— Obrigado.

— Não o culpo, Devon — disse em voz baixa.

— Bom, concedo a culpa a mim mesmo. Se a tivesse perdido... —Engoliu, com o coração em seus olhos. Amava-a.

Ela escutou em sua voz o que não disse. Seria precioso que ele confessasse. Ela desejava que ele pronunciasse as palavras.

Entretanto, tinha visto o medo marcado em seu rosto quando ele disparou a pistola. Lembrava-se de como a tinha defendido no torneio de Alton, e como ela quis com todo seu coração que sua declaração de devoção se tornasse realidade, pois já se apaixonou por ele, então, embora nunca o houvesse dito.

Esta noite respondeu a seu desejo de uma maneira particularmente gráfica, talvez, mas ele mesmo resultou ser seu campeão em todos os sentidos da palavra.

Ele era tudo o que sempre quis, e agora a queria.

Segurou seus braços ao redor de seu pescoço fortemente e o puxou para baixo sobre a cama. Ele pareceu titubear, sem dúvida por consideração ao que ela tinha sofrido. Percebeu que não podia entender como ela necessitava seu toque para fazer retroceder o pesadelo de Matthew Thurlew.

Necessitava-o. Necessitava suas carícias para desterrar a memória vil, e não podia afastar as mãos dele absolutamente. Acariciou seus largos ombros, os músculos das costas. Seu campeão. Tinha sido dela todo o tempo. Ele a tinha defendido.

Ele a amava.

— Tudo está bem agora — sussurrou ela, enterrando seu rosto debaixo de seu queixo para beijar seu pescoço forte. Ele parecia requerer algum consolo para si mesmo.

Ele apertou seu braço ao redor dela e esfregou sua face sem barbear na face dela.

— Machucou-a... De qualquer forma física?

Ela franziu o cenho, ressentindo com a intrusão de Thurlew em seus pensamentos, quando percebeu que a pergunta exposta esteve corroendo Devon desde que a tinha encontrado no jardim.

— Não — disse ela com rapidez.

— Então, posso...?

— Não pensei que tivesse que perguntar.

— Temia que pudesse ser muito cedo — disse timidamente.

— Não pode ser suficientemente cedo. Estou descontrolada por ti, Devon.

— Já sei — Ele lançou um profundo suspiro. — Não tenho certeza do porque, entretanto. Fui um idiota. Deveria ter suspeitado de Thurlew. Seu irmão era um tipo estranho. Deveria ter prestado mais atenção na festa.

— Como se pode entender o mal? — ela sussurrou, beijando um caminho por seu ombro. — É suficiente para superá-lo. E não foi sua culpa. Por favor, Devon, ninguém lhe reprova por isso.

Ele descansou seu queixo sobre o alto de sua cabeça quando ela pressionou suavemente, depositando beijos sobre seu ombro e depois em seu peito. Ele tinha se despido para ir a cama, desprezando as botas, a jaqueta e o colete, tudo à exceção da camisa de musselina branca, adaptada expressamente para seu corpo.

Ele a soltou de sua cômoda posição e a acomodou debaixo dele.

Enquanto se inclinava para beijá-la, ela enganchou um braço ao redor de sua cintura. O outro caiu em seu traseiro e o ventre para acariciá-lo com seus dedos. É claro, seu membro respondeu, e a pele de seus testículos se apertou com seu toque delicado.

Não tinha sido capaz de resistir a ela desde a noite de seu não planejado encontro na torre.

Ele a quis então.

Ele a queria ainda mais agora. Ele...

Ele gemeu e moveu seu corpo, cobrindo-a o seu.

— Jocelyn.

— Tudo o que preciso é você — disse ela, recuperando a voz finalmente.

— Quero que estejamos juntos desta maneira, sempre.

— Sempre — prometeu ele.

— Devon — sussurrou. — Sempre — Sustentou sua cabeça entre as mãos e lhe entregou seu coração em um profundo e comovedor beijo atrás de outro. —

E tenho que senti-lo dentro de mim — lhe disse quando pôde respirar.

Deus, como a entendia. Ele necessitava a reafirmação física talvez mesmo mais que ela, sem dúvida, mais do que podia admitir. Ele a necessita para sentir-se seguro de novo, e ele necessitava... A ela. Foi um alívio admitir a verdade a si mesmo, perceber que tinha outra oportunidade.

Beijaram-se de novo e se colocaram um sobre outro como um casal de amantes perdidos há muito tempo, que estiveram separados durante anos e não só umas horas mais cedo na tarde.

A possibilidade de perdê-la esta noite o tinha obrigado a fazer frente á quão insuportável seria sua vida sem ela. Ela tinha um lugar em seu coração que ninguém mais podia sustentar.

Retrocedeu brevemente para tirar sua camisa.

Um momento depois ela estava em seus braços, gemendo docemente a seu toque. Ali poderia ter bombeado seu duro membro, mas por agora ele a deixaria marcar o ritmo. Não tinha idéia dos atos com os quais Thurlew poderia havê-la ameaçado durante seu seqüestro. Uma fúria negra se apoderou dele, porque não estava a seu lado para evitar a terrível experiência.

Mas ele estava com ela agora, por Deus, e ninguém poria uma mão sobre ela outra vez, exceto ele.

Acariciou seu corpo com suave posse para selar a promessa que tinha feito.

Ela arqueou as costas como resposta. Pouco a pouco a mão dele se deslizou sobre suas costelas a seu ventre.

Sentiu-a avançar quando ele roçou a palma da mão sobre seu abdômen brando, mas ele estava muito excitado para se perguntar por que.

Sua boca se fechou ao redor de um tentador mamilo e sua língua o provocou até que se converteu em um pico de tensão. Com um delicioso gemido dela chegou a beliscar o broto encapuzado que estava escondido debaixo de seu ninho de cachos. O botão de nervos sensíveis cresceu tenso com sua carícia. Ele o acariciou preguiçosamente, como se tivesse todo o tempo do mundo.

Ela abriu a boca e as pernas para ele, tremendo sem poder fazer nada.

Apertou sua outra mão contra seu gordinho monte para mantê-la imóvel.

Seu hábil tato lhe afastou os lábios molhados e trabalhou com um dedo uma vez dentro de sua fenda.

— Sempre está molhada quando jogo com você, não? — Sussurrou ele com sua voz cheia de desejo.

— Então, venha jogar mais — sussurrou ela virando seus quadris ao ritmo de seus dedos.

Todo seu corpo tremia em antecipação. Que mulher tão apaixonada com quem se casou. Levantou a cabeça de seus seios sobressalentes e a cutucou com um olhar exultante.

— Há regras ou restrições que devo obedecer?

Ela se moveu para cima para olhar para baixo em seu rosto moreno, bonito.

— Nenhuma.

Deu-lhe um sorriso.

— Não diga mais tarde que não pediu isto.

— Peço por...

Ele voltou a provocar sua pérola com o polegar e moveu com cuidado outro dedo dentro de sua molhada passagem. Uma e outra vez ele a levou ao

limite e apertou os dentes para não derramar sua semente sobre a cama.

Ela corcoveou seus quadris. Amaldiçoou-o. Suplicou, assim como ele reteve seu toque para voltar para seu lugar molhado em seu jogo de tortura sensual.

Ela gemeu.

— É cruel... Oh, meu Deus. É um monstro sem coração. É o pior homem.

É...

Seus músculos internos se contraíram ao redor de seus dedos como uma luva quando as convulsões do clímax romperam sobre ela.

Devon a olhou fixamente com uma luxúria calma, os dedos cobertos com o doce almiscarado de seu clímax. Ver a desinibida resposta dela deu o golpe final a suas defesas. Poderia tê-la devorado de um só bocado malvado.

Ela caiu de novo nos travesseiros, seus soluços se acalmando.

— É um descarado, Devon. Pensei que iria morrer.

— Mais, querida — Ele moveu seu corpo grande e pesado sobre o dela, seu sorriso era de decadência masculina, o gesto de dominação foi só um prelúdio.

Ela o observava enquanto sua respiração voltava lentamente a seu ritmo.

— Todo mundo me advertiu sobre o homem pecador com quem iria me casar.

— Oh, sim — Inclinou a cabeça para beijá-la nos lábios. — E se eu soubesse o quanto era uma pecadora, teríamos nos casados há anos quando seu pai procurava fazê-lo.

— Só pense no que perdemos.

— Faço-o — replicou ele. — E tenho a intenção de compensar o tempo perdido — Ele exalou. — Enquanto estiver disposta a me dar a oportunidade.

— Diz isso como se tivesse renunciado a você.

— Eu o teria feito em seu lugar.

Jocelyn se deu um pouco de tempo para refletir sobre sua confissão de boas vindas. Ao que parecia, preparado para procurar seu próprio alívio,

enganchou os joelhos dela sobre seus largos ombros e guiou a seu desenfreado pênis com sua mão a sua fenda. Ainda lhe doía gratamente do ataque anterior, mas o instinto superou seu desconforto, e levantou seus quadris da cama para que entrasse em seu interior.

— Atormento-o como você me atormentou? — Sussurrou ela apertando-se contra sua longitude de seda.

O sorriso decadente que lhe deu o advertiu que não estava disposto a reconhecer a derrota.

— Já veremos — disse em voz baixa.

Ela quis demonstrar que não podia ser tão facilmente tomada, mas a promessa sedutora nos olhos dele penetrou em sua resolução. Inclusive sua voz a debilitou. Teve que morder o interior de sua face para impedir retorcer-se contra ele como uma lasciva. Mas só olhá-lo a enchia de nostalgia. Seu rosto recordava um pecaminosamente formoso príncipe do Renascimento, que tinha visto uma vez em um quadro. Seu corpo poderia ter tentado ao mesmo artista capacitado para capturar a luz e a sombra dos contornos musculares e graça ágil, de ossos largos.

Ele se inclinou um pouco mais abaixo, e seu corpo se apertou em expectativa.

— Quer algo? — sussurrou para ela.

— Pare... De zombar de mim.

— Acho que não a ouvi.

— Diabo.

— É esse meu nome?

— É possível que sim.

Ele sorriu.

Ela se moveu, impaciente, mas ele aliviou a protuberância de seu congestionado eixo dentro de sua fenda. Não era suficiente. Ela necessitava todo ele. Esta pequena tortura só lhe fez ansiar mais por ele. Gemeu de frustração e deslizou sua mão abaixo, para seu ventre para dirigi-lo a sua fenda molhada.

Ele sorriu e se retirou, esfregando toda a longitude de seu pênis entre seus lábios grossos com uma sexualidade manifesta que a fez tremer.

— Profundo — lhe disse, arqueando as costas.

— Quão profundo? — sussurrou.

— Quero senti-lo...

— Até onde?

Ela soluçava.

— Demônios, Devon. Durante todo o caminho...

Ele recuou antes que pudesse terminar, empurrando com uma força que levou o fôlego de seu corpo.

Felicidade. Veludo negro. Um prazer tão intenso que açoitou seus sentidos e a levou à beira do esquecimento. Entregou-se a ele.

E ele a levou sem piedade até que todo o resto deixou de existir, e ambos lutaram por aferrar-se à prudência, só para desfazer-se nos braços do outro, cansados, os beijos sem fôlego.

Ela fechou os olhos, rendendo-se a seu esgotamento contente. Segura.

Protegida. Saciada. Quente. Ele a amava...

Quando por fim Devon relaxou sua vigilância o suficiente para conciliar o sono, foi só por duas horas, ou menos, antes que uma comoção na planta baixa se filtrasse em sua consciência. Sentou-se, rígido, e sorriu a seu reflexo no espelho. Seu torso nu, a imagem com uma ligeira barba lhe devolveu o sorriso, o braço direito de Jocelyn ao redor de sua cintura.

Um raio de luz solar andante caia sobre o tornozelo nu de sua mulher. Seu traje egípcio estava em uma exibição obscena sobre o tapete.

Ele gemeu quando as vozes de baixo começaram a assumir um tom muito familiar.

Jocelyn se agitou, levantando a face avermelhada do travesseiro murmurando:

— Alguém está embaixo. É muito cedo para visitantes, não é?

Ele soltou um grunhido. Não ansiava nada mais que arrastar-se por

debaixo dos lençóis a seu lado e voltar a dormir.

— Sim.

— É a autoridade? — Perguntou ela alarmada, ao parecer acordada. —

Matou Thurlew ontem à noite?

— Sim — disse tristemente a sua primeira pergunta. — As autoridades estão aqui. E só posso esperar que Thurlew esteja morto.

Ela se sentou, um peito coquete aparecendo sobre o lençol.

— Se forem fazer perguntas, não acha que ao menos deveria se barbear?

Vestir a calça? Um roupão?

Ele se deixou cair junto a ela com seu braço livre cruzado atrás de sua cabeça. Não tinha nenhuma pressa especial por correr escada abaixo e enfrentar seus visitantes, não convidados, embora duvidasse que pudesse esperar para sempre.

Tinha reconhecido as vozes como as de Grayson e Emma, dois dos três mais velhos da família. Supunha que devia estar agradecido de que Heath se encontrasse na Escócia.

— Vai haver perguntas — disse com resignação.

Sua esposa se moveu.

— Talvez eu devesse falar primeiro com o juiz — disse ela aumentando seu pânico. — Poderia lhe explicar como Thurlew drogou a Sra. O'Brien, e depois me seqüestrou, e como temia que fosse prejudicar o herdeiro Boscastle.

Mas como, que, assumindo... — parou no meio da frase. — Não acredito que esteja levando isso a sério. Ao menos poderia fingir mostrar um pouco de respeito pelo processo judicial.

Ele estendeu sua flexível figura, os músculos de seu ventre ondulando como aço líquido.

— Por quê?

— Não sei como responder a isso, Devon — disse com exasperação. —

Embora entenda que seja justificado seu tiro em Thurlew e não se apresentará ante um júri, nem será condenado ao cárcere, nem nada, ao menos deve assumir

uma atitude de gravidade. Assim como se vestir por completo — Ela balançou a cabeça. — Parece completamente dissoluto.

Ele bocejou.

— Vou voltar para a cama. Pare seu falatório e me dê um beijo.

— Ao diabo se o farei.

Ele abriu um olho para presenciar seu salto da cama, seus seios balançando-se enquanto ia para o guarda-roupa por roupa apropriada. Seu olhar se desviou a sua nudez iluminada pelo sol. Devido a sua consternação, lhe concedeu uma amostra deliciosamente impudica de sua forma curvilínea.

Ele sentiu nova ansiedade por sexo quando contemplou os globos brancos firmes de seu traseiro levantados no ar, enquanto ela se dobrava para recolher uma meia.

Sua virilha se apertou. Debateu-se em tomá-la sobre suas mãos e joelhos diante do espelho naquela posição, mas com pena se decidiu contra isso. Podiam deixar-se levar e bater sobre alguns dos móveis no frenesi da luxúria, alarmando assim os visitantes de baixo. Só podia imaginar como explicar este tipo de ruídos a Emma.

Jocelyn se endireitou sem prévio aviso, agitando seu colete diante dele.

— Está esperando que me vista antes de convocar seu valete? Ou vai ficar todo o dia com esse sorriso lascivo em seu rosto?

Ele se inclinou para frente, tentando que sua dolorosa ereção diminuísse.

— É possível que seus seios ficassem maiores nesta última semana, ou é que nunca me permiti o prazer de examiná-los à luz do dia antes?

Ela deixou cair o colete entre seus pés.

— Quer levar o assunto de meus seios ante o juiz?

— Não, a menos que você goste de ser testemunha de como lhe disparo ao coração, também.

— Ficará sério, por uma vez?

— Estou muito sério a respeito disto.

— Sobre o tamanho de meus seios?

— Sim.

— Devon, pelo amor de...

Ele se estirou para frente, em um movimento sinuoso, capturando a mão dela e apanhando-a entre suas musculosas duras coxas.

— Seus mamilos estão mais escuros também, não? — Ele roçou seu nódulo através de um de seus sensíveis bicos. — Certamente não foi falta de atenção. Deixe dar uma olhada mais de perto.

Ela estremeceu quando, com essa ternura que poucas mulheres podem resistir, a formosa besta tomou seus seios em suas mãos e os sopesou em suas mãos, como pêssegos maduros no mercado.

— Por que não me disse? — Perguntou-lhe simplesmente, levantando o olhar a seu rosto.

Ela balançou a cabeça, inundando-se nas profundidades de seus olhos azuis e em sua voz acariciadora baixa. Não deveria ter lhe surpreendido de que um homem Boscastle percebesse os primeiros sinais de gravidez, sendo as criaturas sexuais que eram.

Entretanto, francamente ela não gostava de perceber de que seu marido tinha experiência nestes assuntos quando ela só tinha uma vaga compreensão dos fatos da reprodução em si mesma.

— Como pode dizê-lo? — Perguntou-lhe um pouco ressentida.

Deu-lhe um sorriso inocente.

— Como posso dizer o que?

Ela engoliu saliva, com suas emoções de repente em estado de agitação.

— Jane disse que é má sorte falar de minha condição até que estejamos seguros de que é verdade.

— Bem — Ele pôs sua ampla palma protetora contra a curva de seu ventre.

— Não o direi a ninguém. A menos que me perguntem, é claro.

Ela abaixou o olhar para a cabeça escura, seu coração pulsava com força.

Como o amava.

— E o que lhes dirá se lhe perguntarem?

— Não penso que deveria mentir, não é verdade?

— Hmm. Talvez não. Quero dizer, este não é o tipo de segredo que alguém pode manter indefinidamente. Talvez por um pouco mais.

Ele rompeu um sorriso.

— Ao diabo manter em segredo. Vamos dizer a todos agora mesmo.

Iremos ao parque e parar na esquina, informaremos aos transeuntes ao acaso.

Farei erigir um monumento para proclamar nossas notícias, se por acaso alguém não me ouvir gritar.

— Então está contente? — Perguntou ela, mordendo o lábio.

— Estou absolutamente fora de mim pelo deleite.

Ela suspirou com alegria e enredou seus dedos em seu cabelo negro e espesso.

— Não deveríamos nos vestir agora para confrontar o magistrado?

Ele a olhou com um sorriso triste.

— Não a corrigi? É o marquês quem está embaixo, não o magistrado.

— O marquês? — Sussurrou ela com alarme, olhando sobre seu ombro à porta. — Como Grayson?

— Deus, há outro? O marquês e seu maior general.

— Seu quem?

— A delicada ditadora da família. Emma.

Ele se levantou da cama, os ossos e a musculatura de seu corpo eram uma comemoração à juventude e a força aguerrida.

— Depois que ela tenha me repreendido por não ser um protetor adequado para você, sem dúvida nenhuma, lamentarei não ter confrontado um magistrado e sido enviado a um cárcere solitário.

— De modo que eu deveria criar nosso filho sozinha? — ela brincou.

Saindo da cama lhe passando a calça que tinha arrojado sobre uma cadeira.

— Sozinha? Nesta família? Querida, quase não terá que temer isso. —

Vestiu-se, fazendo uma pausa para lhe dar um beijo antes de vestir o casaco. —

Não há temor de que abandone á nosso filho, tampouco. Os Boscastle têm seus

defeitos com acréscimo, e não pretendo procurar a absolvição de todos meus pecados, mas a família sempre é o primeiro, inclusive entre os piores de nós.

— Emma o entenderia bem, sabe.

— Sei. E ela em geral tem sempre a razão, o que faz com que todo o resto de nós seja lamentável em comparação.

Ela assentiu com a cabeça, sentindo vontade de chorar de repente, outra vez. Isto não serviria de nada, desvanecer-se com o marquês e sua irmã esperando pacientemente no andar térreo. A lealdade apaixonada com a qual Devon falou era talvez a faceta dele que primeiro tinha amado, e o que mais amava agora. Não havia duvida em sua mente que sua capacidade de devoção era um legado de sua ascendência dinâmica.

Ela pensava que o menino que tinha concebido herdaria com maior probabilidade a má fama de sua nobre linhagem.

— Ao menos que eu lute para intermediar primeiro. — Pensou ela em voz alta.

Ele se virou na porta.

— Disse algo?

Ela o considerou com um sorriso pensativo. Poderia ser um pecador, mas ao menos tinha conseguido vestir-se e apresentar um aspecto decente enquanto ela se estendia mais ou menos como algo semelhante a uma fulana entre seus desalinhados lençóis.

Ele limpou a garganta e deu a sua limpa e engomada gravata um puxão final.

— É possível que deseje vestir-se antes de lhes fazer frente.

— É uma idéia esplêndida — lhe disse secamente.

Ele caminhou ao lado da cama e a olhou fixamente, o diabo em seus profundos olhos azuis.

— Pensando melhor, possivelmente não queira vestir-se absolutamente.

Começou a soltar sua gravata.

Ela começou a rir, escandalizada.

— O que vai dizer a seu irmão?

Seus olhos brilhavam.

— De algum jeito acredito que Grayson vai entender. Deus sabe que escreveu um livro sobre sedução.

Ela se estendeu de novo entre os lençóis.

— Não se sentirão ofendidos se os ignoramos?

— Não, se pusermos seu nome em nosso primogênito em sua honra —

respondeu, arrojando sua capa de novo na cadeira.

— E se for uma menina?

— Então a chamaremos Emma.

— Emma não o entenderá — Fez uma pausa, com olhos cada vez maiores enquanto ele tirava sua calça e ficava diante dela. — Emma — ela continuou, embora de repente sua mente já não estivesse em sua cunhada. — Não acharia que nosso comportamento figura na etiqueta adequada de meia amanhã em qualquer das regras pelas quais ela vive.

Ele se sentou sobre a cama para beijá-la.

— Então digo que deveríamos escrever nosso próprio livro sobre o assunto.

— Um esforço literário? Agora isso poderia considerar, mas que a redação do mesmo seja sem roupa...

— Jocelyn — Ele pôs sua testa contra a dela. — Cale-se um momento, sinto-me inspirado. Tenho uma idéia de como deveria ser a primeira linha.

— Era uma vez...

— Amo você — ele disse.

Ela se aferrou a ele, deixando que as palavras penetrassem. Ele não tinha necessitado dizer-lhe, mas ela se alegrou de que o fizesse.

— Com um começo assim, não há duvida de como deve terminar a história, — disse ela em voz baixa.

— Como? — Sussurrou.

— Amo você, também.


Ele apoiou as costas na cama.

— Então tudo o que fica é cuidar a parte do meio de nossa história.

— E não acredito que nenhum de nós tenha que procurar muito para encontrar inspiração.

 

 

                                                   Jillian Hunter         

 

 

 

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