Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


AUTO DA ROMAGEM DOS AGRAVADOS / Gil Vicente
AUTO DA ROMAGEM DOS AGRAVADOS / Gil Vicente

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                   

 

 

Gil Vicente

 

 

 

 

Esta tragicomédia seguinte é sátira: seu nome é "Romagem de Agravados". Foi representada ao mui excelente príncipe e nobre Rei Dom João, o terceiro em Portugal deste nome, na cidade de Évora, ao parto da muito esclarecida e cristianíssima rainha dona Catarina, nossa senhora, e nascimento do ilustríssimo infante dom Felipe, na era do Senhor de 1533.
FIGURAS: FREI PAÇO JOÃO MORTINHEIRA (vilão) BASTIÃO (seu filho) COLOPÊNDIO  BERENISO MARTA DO PRADO  BRANCA DO REGO CERRO VENTOSO FREI NARCISO APARICIANES GIRALDA (sua filha) DOMICÍLIA DOROSIA HILÁRIA  JULIANA


 #
#
#

#
#


(Entra logo Frei Paço com seu hábito e capelo e gorra de veludo, e luvas e espada dourada, fazendo meneios de muito doce cortesão, e diz)
 
FREI PAÇO Quem me vir entrar assi com estes jeitos que faço, cuidará que endoudeci, até que saiba de mi que sou o padre Frei Paço.
 
fidalgos
regateiras
freiras
pastoras
 
Deo gratias não me pertence, nem para sempre nem nada, senão espada dourada, porque muito bem parece ao Paço trazer espada.
 
Eu sou fino da pessoa, e por se não duvidar fiz uma cousa mui boa, leixei crescer a coroa: sem nunca a mandar rapar.
 
E portanto vos não digo Deo gratias se atentais nisto, nem louvado Jesu Cristo, inda que trago comigo hábito que é muito disso.
 
E sou tão paço em mi, que me posso bem gabar que invejar mexericar são meus salmos de Davi que costumo de rezar.
 
Falo mui doce cortês, grã soma de comprimentos: obras não nas esperes, senão que vos contentes com palavrinhas de ventos.
 
Sou favor e desfavor, mestre mor dos namorados, engano dos confiados sou templo do deus de amor, inferno de magoados.
 
Porém não como soía é já a lei namorada, e porque tudo se enfria, amo assi de sesmaria, e suspiro de empreitada.
 
 
O auto que ora vereis, se chama irmãos amados, Romagem dos Agravados, inda que alguns achareis que se agravam de abastados.
 
E pera declaração desta obra santa et cetra, quisera dizer quem são as figuras que virão, por se entender bem a letra.
 
Porém é perder maré e dilatar a viagem, que per mui clara linguagem cada um dirá quem é e a causa da romagem.
 
Entrará logo um vilão, chamado João Mortinheira, agravado em grã maneira. Quero ver sua paixão assentado nesta cadeira.
 
(Vem João Mortinheira com seu filho Bastião e diz)
 
JOÃO MORTINHEIRA Oh descreio não de são, renego da sementeira! esta é forte canseira, que me tira a devoção de rezar inda que queira.
 
Ca não vou pera rezar, pesar de minha madrasta, que rezar arrenegar, maldizer e contemplar, não podem ser duma casta.
 
Porque a pessoa agravada não lhe rege a devoção.
 
FREI PAÇO De que te queixas vilão?
 
JOÃO MORTINHEIRA De Deus, que é cousa provada que me tem grande tenção.
 
FREI PAÇO Que te faz, que te querelas?
 
JOÃO MORTINHEIRA Faz-me com que desespero.
 
FREI PAÇO Quê?
 
JOÃO MORTINHEIRA Que chove quando não quero, e faz um sol das estrelas, quando chuva alguma espero.
 
Ora alaga o semeado, ora seca quanta i há, ora venta sem recado, ora neva e mata o gado, e ele tanto se lhe dá.
 
Eu que o queira demandar por corisco e trovoada, por pedrisco e por geada, buscai quem o vá citar que lhe acerte com a pousada.
 
Não tem prema de ninguém, e fará quanto quiser. Podia-me Deus fazer bem sem nisso dar perda a alguém mas do demo que ele quer.
 
E com estas cousas tais, que eu vejo desta maneira, digo que me tem cenreira, e não cureis vós de mais, que craro se vê na eira.
 
FREI PAÇO Cuidas que não dizes nada, e que mora Deus contigo?
 
JOÃO MORTINHEIRA Vedes vós? Eu, padre, digo que tempere a invernada e leixe criar o trigo.
 
Mas ele de tençoeiro, sem ganhar nisso ceitil, vai dar chuvas em janeiro, e geadas em abril, e calmas em fevereiro.
 
E névoas no mês de maio, e meado julho pedra. Eu trabalho atás que caio:
 
pardeus ele que é meu aio cada vez mais me desmedra.
 
FREI PAÇO Olha tu pela ventura se lhe pagas bem o seu.
 
JOÃO MORTINHEIRA Bem me dizimaria eu, se ele de birra pura não danasse o seu e o meu.
 
FREI PAÇO Rezas-lhe tu alguns dias que te livre dessa afronta?
 
JOÃO MORTINHEIRA Muito faz ele ora conta das minhas Ave Marias! rezo-lhe mais do que monta.
 
Não sei a quem ele sai, mas é feito a seu prazer. Ele me matou meu pai, e meu dono e então vai fez morrer minha mulher.
 
Tomai-lhe lá conta e vede porque matou minha tia que mil esmolas fazia, e leixa os rendeiros do verde que me citam cada dia.
 
FREI PAÇO Dizem que não pode ser maior dom que bom conselho, faze o que te eu disser:
 
conforma-te co que Deus quer, e do siso faze espelho.
 
JOÃO MORTINHEIRA Conforme-se ele comigo er também no que é razão, que eu sou pobre coma cão, e cada dia lho digo, e folga se vem à mão.
 
Não me presta nemigalha oferta nem oração: ora dá palha sem grão, ora não dá grão nem palha, senão infinda opressão.
 
Por isso quero fazer este meu rapaz de igreja, não com devoção sobeja, mas por que possa viver como mais folgado seja.
 
Quereis-mo, padre, ensinar, e dar-vos-ei quanto tenho?
 
FREI PAÇO Se o ele bem tomar.
 
JOÃO MORTINHEIRA Para tudo tem engenho, e tem voz pera cantar.
 
FREI PAÇO Toma este papel na mão e lê esses versozinhos.
 
BASTIÃO Isto é pera cominhos, ou hei de ir por açafrão?
 
FREI PAÇO Ainda não sabes nada.
 
BASTIÃO Sei onde mora a tendeira.
 
JOÃO MORTINHEIRA É mais agudo que a espada, não há i cabra na manada que não tenha na moleira.
 
FREI PAÇO Ora sus, sem mais debate dize: A B C D E.
 
BASTIÃO Arre arre cedo é.
 
FREI PAÇO Dize: A X.
 
BASTIÃO Assis era um alfaiate que morava ali à Sé.
 
JOÃO MORTINHEIRA Se tu vives, Bastião, serás um fino letrado.
 
BASTIÃO Parece que andou o arado per estas que quer que são.
 
FREI PAÇO Hás mister bem examinado.
 
E no latim te quero ver dize ora: beatus vir.
 
BASTIÃO Pouco é isso de dizer: vi ora três ratos vir.
 
JOÃO MORTINHEIRA Vede lá esse saber.
 
FREI PAÇO Dize ora cantando: amém, por ver se sabes cantar.
 
BASTIÃO Oh que cousa pera errar! A bem.
 
FREI PAÇO Alto, alto, amém. (Assovia em lugar de amém) Não cureis de debater: nem no quero ensinar mais, digo que embalde cansais, que este nunca há de aprender.
 
JOÃO MORTINHEIRA Segundo o vós ensinais.
 
BASTIÃO Pai, pai, que senhor é aquele que vem cá quase mortal?
 
JOÃO MORTINHEIRA Colopêndio se chama ele. e tão grande amor deu nele que o trata bofé mal.
 
Vem agravado por isso e descontente de si, ele e logo Bereniso, fidalgos de grande aviso.
 
(Vem Colopêndio e Bereniso, e diz)
 
COLOPÊNDIO Pois amor o quis assi, que meu mal tanto me dura. Não tardes triste ventura que a dor não se dói de mi, e sem ti não tenho cura.
 
Foges-me, sabendo certo que passo perigo marinho, e sem ti vou tão deserto, que quando cuido que acerto, vou mais fora de caminho.
 
Porque tais carreiras sigo, e com tal dita nasci nesta vida em que não vivo, que eu cuido que estou comigo, eu ando fora de mi.
 
Quando falo, estou calado; quando estou, entonces ando; quando ando, estou quedado; quando durmo, estou acordado; quando acordo, estou sonhando.
 
Quando chamo, então respondo; quando choro, entonces rio; quando me queimo, hei frio; quando me mostro, me escondo; quando espero, desconfio.
 
Não sei se sei o que digo, que cousa certa não acerto, se fujo de meu perigo, cada vez estou mais perto de ter mor guerra comigo.
 
Prometem-me uns vãos cuidados mil mundos favorecidos, com que serão descansados, e eu acho-os todos mudados em outros mundos perdidos.
 
Já não ouso de cuidar, nem posso estar sem cuidado, mato-me por me matar, onde estou não posso estar sem estar desesperado.
 
Parece-me quanto vejo tudo triste com razão: cousas que não vem nem vão, essas são as que desejo, e todas pena me dão.
 
Eu remédio não no espero, porque aquela em que me fundo, pera mi que tanto a quero, tem o coração de Nero pera me tirar do mundo.
 
BERENISO Quem sofrimentos vendesse quanto ouro ganharia! Que eu por um só lhe daria a vida se a tivesse, como quando Deus queria.
 
Porque é tal meu padecer, sem ninguém de mi ter dó, que as pragas de Faraó não se houveram de escrever, nem os agravos de Jó.
 
COLOPÊNDIO Ai de mi que estou em tal risco de penosa confusão, que tenho já o coração feito pedra de corisco, e meu espírito carvão.
 
Minha alma com tal perigo deseja ser de animal porque de mi lhe vem mal, meu bem pesa-lhe comigo, e eu quero-lhe mal mortal.
 
BERENISO Ó irmão, onde te vás?
 
COLOPÊNDIO Juro às dores que sustenho, que não sei se vou se venho tu senhor meu mo dirás, que eu de mi novas não tenho.
 
BERENISO Se fosses bem namorado, entre os teus termos mortais terias vivo o cuidado, mas amor desacordado é desacordo e nô mais.
 
COLOPÊNDIO Se amasses onde eu e servisses a quem sirvo, pasmarias como vivo, e mais terias de teu os desacordos que digo.
 
BERENISO Pois que tu mesmo reclamas que não sabes onde estás, nem sentes se vens se vás, como sabes tu a quem amas, ou por quem suspirarás?
 
COLOPÊNDIO Pois falas isento assi, certo a mi se me afigura que nunca chegou a ti o ímpeto que contra mi tomou a desaventura.
 
Sabe certo que é, senhor, meu desacordo de sorte, que ele esforça minha dor pera outro mal maior, que está aquém de minha morte. Assi que meu desmaiar per tal jeito se ordena, que não se me passa pena por sentir nem por chorar, nem dor grande nem pequena.
 
BERENISO Eu sou o mor namorado homem que nunca se achou: porém um excomungado que o diabo excomungou, nunca foi tão desamado.
 
A dama cujo nasci, o maior prazer que sente, é dizerem mal de mi, se venho foge dali, se me vou fica contente.
 
Ela pedia mosteiro agora quer-se casar, por que eu me vá enforcar no mais alto sovereiro que eu mesmo per mi buscar.
 
FREI PAÇO E Frei Paço estar calado!
 
BERENISO Frei Paço, sois de verdade?
 
FREI PAÇO Senhor, a vosso mandado.
 
BERENISO Quanto eu à minha vontade o paço em frade tornado, nem é paço nem é frade.
 
FREI PAÇO Irmãos, haveis de notar que o paço é flor das flores, pasto de grandes senhores e mais é um grande mar com soma de pescadores.
 
Uma grandeza sumária de virtudes e nobrezas, floresta mui necessária, linda escola sibilária, onde se aprendem grandezas.
 
COLOPÊNDIO Padre muito bem dizeis que também suas donzelas são figuras das estrelas, e imagens de Deus os reis, que dão luz a todas elas.
 
FREI PAÇO Porém onde caminhais, falai, senhores, comigo.
 
COLOPÊNDIO Cada um leva consigo agravos tantos, e tais, que ouvi-los, corres perigo.
 
Eu já amo e desespero, nunca de queixar me leixo, e ando tão fora do eixo, que eu mesmo busco e quero os males de que me queixo.
 
BERENISO Sabe Deus e as estrelas que minhas coitas amaras buscá-las me são mais caras mil vezes que não sofrê-las.
 
Que a saudade sentida me lastima de tal sorte, que com vontade acendida me faz ir ver minha vida, por que vá buscar a morte.
 
FREI PAÇO Se isso assi conheceis, que vós per vós vos matais, culpados a quem culpais? Mortos que vida quereis, ou de que vos agravais?
 
COLOPÊNDIO Padre Paço, bem sentis. Digo que amo a uma donzela mais bela que frol de lis, por que tanto mal me quis, pois nasci cativo dela?
 
FREI PAÇO Porque foi nascer co ela não vos ter em dous ceitis. E quanto vós presumis não no estima por ser bela, nem quanto lhe referis.
 
COLOPÊNDIO Deo gratias ouvi-me padre e se meu serviço atura?
 
FREI PAÇO Digo ora eu pela ventura, que não sois à sua vontade, obrigá-la-eis por escritura.
 
Que dous conformes amores num amor é de ventura, e se só por formosura se vencem os amadores, será amor mas não de dura.
 
COLOPÊNDIO Depois se praticará o mais de que sou agravado: Branca do Rego vem lá, e também Marta do Prado, regateiras do pescado, escutemo-las de cá.
 
MARTA Olha cá, Branca do Rego.
 
BRANCA Que me queres, Marta do Prado?
 
MARTA Tu tens tudo emburilhado, pera que é falar galego, senão craro e despachado?
 
BRANCA E bem, em quê? Andar embora, feito é o forno da telha.
 
MARTA Se tu não deras à golhelha, nunca o nosso agravo fora, nem eu torcera a orelha.
 
Não a não, mas tu andar dá-lhe, dá-lhe, dá-lhe, dá-lhe, urdir, torcer, ordenar... tu não duravas em vale com pressa do mau pesar.
 
Casade-a ora, ui, casade-a ora, que é um mancebo de rosas, antes que se afaste afora e por isso nas más horas nos agravamos agora.
 
BRANCA Ora olhai, ouvi, ouvi, que me foi a rodear! Havias tu de buscar com que pôr a culpa a mi, e queres-te a ti salvar.
 
Por que não contas agora as práticas saborosas do cachopinho de rosas com que sias cada hora?
 
MARTA Contarei as suas prosas.
 
FREI PAÇO E de que ides agravadas nesta santa ladainha?
 
BRANCA Tínhamos uma sobrinha, que tinha um conto aosadas, e tudo se tornou tinha.
 
Sai-nos um casamento com um moço da câmara del-rei casarei não casarei tão doce, tão açucarento... Jesu! como o contarei.
 
Luva vai e luva vem, e alvalá de filhamento fazemo-lo casamento com o carrapato de Ourém, moço da câmara do vento.
 
FREI PAÇO Tem de casamento tanto, e moradia sabida.
 
MARTA Ui! pela sua negra vida, ele é dos do livro em branco, e da esperança perdida.
 
BRANCA O alvalá que nos mostrou com tanto de filhamento, tanto de acrecentamento, não sei quem lho despachou
 
MARTA Damião Dias, ou alguém, lhe houve ele o negro alvalá, Cristóvão Esteves também, ou quiçais, sabe Deus quem... André Pires não será.
 
BRANCA Nem o conde do Vimioso. Fernão de Álvares seria, ou o conde de Penela, que é muito dadivoso. Já sei quem lho haveria: o dom Rui Lobo em Palmela...
 
Ou o Lourenço de Sousa, ou não sei se o veador, se o mesmo Pero Carvalho, se foi bispo, se doutor, que nos deu tanto trabalho.
 
MARTA Mau quebranto que os quebrante, por que vão aportunar, para ajudar a enganar uma cachopa anarante com um rascão do mau pesar?
 
BRANCA Eles são os presidentes e os mesmos requerentes, e se lhes dizeis que é mal tornam a culpa ao sinal e eles fazem-se inocentes.
 
MARTA Pois já isto anda tão baixo, haverei co esta cautela um alvalá de donzela, então casar no Cartaxo, ou na raia de Castela.
 
FREI PAÇO A honra só vos abasta se o moço é de boa linha, seu pai será de boa casta e fidalgo mui asinha.
 
BRANCA Atada fica a canasta.
 
Fidalgo! assi seria fidalgo por seu dolor, que sabe a Brívia de cor e não acerta a Ave Maria.
 
Andava ele namorado!
 
E por, má-hora, dizer ai, dezia-lhe guai… e por dizer minha senhora, chamava-lhe minha sinoga… Este é o negro de seu pai.
 
MARTA Ouvides vós, Frei Cigarra, onde vai aqui a estrada per u os agravados vão?
 
FREI PAÇO Eu não vos acho razão, nem sois agravadas nada.
 
MARTA Por quê?
 
FREI PAÇO Porque os casamentos todos são porque hão de ser, e com quem, desde o nascer, e a que horas e momentos assi há de acontecer.
 
E assi as religiosas nasceram pera ser freiras, e vós pera regateiras, outras pera ser viçosas, e outras pera canseiras.   MARTA E vós mano frei trogalho, em que perneta nascestes, que má-hora cá viestes? Dizei padre frei chocalho, tudo vós isso aprendestes.
 
Cebolinho e espinafre, já vo-la barba nasce. Ora ouvide-lhe o sermão, e tangede-lhe o atabaque, não caia ponde-lhe a mão.
 
O que as pernetas fazem, é porque nós o causamos, e se fortunas nos trazem, é porque nós as buscamos, que os erros de nós nascem.
 
Então quer frei bolorento falar comigo aravia?
 
BRANCA Vamos nossa romaria, que é grã perda perder tempo, e mais vai-se a companhia.
 
Ou crê-me, Marta do Rego, este casamento é feito, já a burrinha jaz no pego, enterrado é João Galego, não temos nenhum direito.
 
Porventura, foi por bem. Rogo-te ora como amiga, que não tomemos fadiga, nem nos ouça mais ninguém. Cantemos uma cantiga.
 
Ensaemo-nos per i, pera irmos lá bailar, tu dali e eu daqui, ou tu daqui e eu dali. Mas tu hás de começar.
 
(Cantam ambas e bailam ao som desta cantiga)
 
Mor Gonçalves, tão mal que me encarcelastes.
 
Nos paços del-rei, e na câmara da rainha, du bailava el-rei, e com dona Caterina
 
Mor Gonçalves, e tão mal que me encarcelastes.
 
MARTA Embaixadas do Mondego! Ou, que momos são ora estes, que cá vem com frei galego?
 
BRANCA Eu to direi muito prestes.
 
O frade é frei Narciso, e vem cá muito queixoso, porque o não fizeram bispo, o outro é Cerro Ventoso, grã cabecinha de pisco.
 
Ambos vão muito agravados, demos-lhe, mana, lugar, queixar-se-ão de seus agravos, sem lhes nada aproveitar queixumes mal consirados.
 
(Vem Cerro Ventoso e Frei Narciso)
 
CERRO VENTOSO Onde is, padre?
 
FREI NARCISO Vou cá também nesta romaria.
 
CERRO VENTOSO Também à santa Maria? Eu assi vou pera lá, vamo-nos em companhia.
 
FREI NARCISO Vamos, nome da trindade.
 
CERRO VENTOSO Sempre aos religiosos tenho mui boa vontade.
 
FREI NARCISO Quem visse essa humanidade aos príncipes poderosos.
 
CERRO VENTOSO Padre, eu sou dos agravados, porque não tenho de renda senão quatro mil cruzados, fez-me el-rei dos mais privados, mas não dá com que me estenda.
 
FREI NARCISO E eu prego a generosos príncipes singularmente, e vivo mui austinente, marteirando a carne e ossos, como cá meu corpo sente.
 
Estudando, maginando, trabalhando por privar, sem vontade jejuando, senão somente esperando se posso mais arribar.
 
E por parecer miselo, e toda a corte em mi creia, Defumo-me co este zelo, e faço o rosto amarelo com muita palha centea.
 
E tudo isto padeci por haver algum bispado, quase assi arrezoado, e porque tardava, o pedi, e saí bispo escusado.
 
CERRO VENTOSO Assi que pescastes níchel: mui mal olhado foi isso.
 
FREI NARCISO Já fizessem-me ora bispo sequer do ilhéu de Peniche, pois sou frade pera isso.
 
Que, sem saber ler nem rezar, vi eu já bispos que pasmo, e não sei conjecturar como se pode assentar mítara em cabeça de asno.
 
CERRO VENTOSO Que tendes vós, padre meu, de renda?
 
FREI NARCISO Tenho lazeiras, oitenta mil tenho eu.
 
CERRO VENTOSO Dixe, e quem isso tem de seu não pedirá pelas eiras.
 
FREI NARCISO Dizei-me, Cerro Ventoso, não hei de ter uma mula?
 
CERRO VENTOSO Se for bem estudioso, por que quer um religioso andar sempre xula xula?
 
FREI NARCISO Por isso peço eu bispado, que possa ter dez rascões, e um escravo ocupado, que sempre tenha cuidado dos cavalos e falcões.
 
CERRO VENTOSO Esse estado tão bispal a dita vos pode dá-lo, mas São Jerônimo é tal, que inda que era cardeal, nunca se pinta a cavalo.
 
Mas vós, padre, sois do Paço, e São Jerônimo do ermo, e não dobrais vosso braço, açoutando o espinhaço, nem trazeis o peito enfermo.
 
FREI PAÇO E vós de que vos queixais?
 
CERRO VENTOSO Eu do Paço me agravo, que o servi como escravo.
 
FREI PAÇO Sequer vós que assi medrais, não devíeis de ir tão bravo.
 
Porque entrastes nesse jogo mais prove do que eu estou, e a dita vos terçou, mas não quero dizer logo que a soberba vos cegou.
 
CERRO VENTOSO Corpo de mi co a contenda, nem com quanto vós falais! A dous contos de reais não me chegarão de renda.
 
FREI PAÇO Não sei em que vos fundais. Dous contos! por quê? per onde?
 
CERRO VENTOSO Digo-vos sem mais arengas. como quem vos nada esconde. Que eu me fundo em ser conde, sequer conde das Berlengas.
 
FREI PAÇO Tão largamente cortais, que entender-vos não posso, sei que tendes bem de vosso. E pois vos não contentais. Vem-vos de Cerro Ventoso.
 
Aparicianes vem  com sua filha Giralda, lavrador que fala bem: não nos estorve ninguém, nem percamos dele nada.
 
APARICIANES Eu soía a ser que cantava com os bois e sem bois ainda, também quando caminhava, sempre à ida e à vinda, nunca de cantar cessava.
 
Jamais canseira sentia nem per calma nem per lama, e ainda cantaria, mas pobreza e alegria nunca dormem numa cama.
 
Grande bem, se não me enleio, é lembrar o mal passado depois de ser acabado, porém eu que estou no meio, vivo mais desesperado.
 
Vou nesta triste romagem um dos mais atribulados, e pera justa romagem minha era a pilotagem, per maior dos agravados.
 
FREI PAÇO Corpo de mi com o vilão, como fala cerceado! Onde vás?
 
APARICIANES Per esse chão.
 
FREI PAÇO Queres bailar?
 
APARICIANES Bofá não.
 
FREI PAÇO Por quê?
 
APARICIANES Vou agravado.
 
FREI PAÇO Agravo pode i haver. Que agravo seja em ti?
 
APARICIANES Perdoai, Frei Alfaqui, que vós não sabeis comer. Pois falais isso assi.
 
Porque eu tenho dous casais dos frades de apanha porros, e com os fortes temporais, são as novidades tais, que não chegam pera os foros.
 
E os padres verdadeiros cartuxos de santa vida. Apanham-me os travesseiros com mais ira que os rendeiros. Sem me razão ser ouvida.
 
Cuidei que eles me esperaram. Por não ficar em camisa.
 
E o com que me consolaram. Foi dizer que não tomaram espera por sua divisa.
 
Não lhes rogo mal, nem nada, porque são santas pessoas: mas praza à paixão sagrada que lhes deem tanta seixada, que lhes quebrem as coroas.
 
Quero ora perder rancor. E não ir com isto ao cabo, perdoe-lhes polo amor de Deus nosso salvador. Encomendo-os ó diabo. Como vos chamais?
 
FREI PAÇO Frei Paço.
 
APARICIANES Frei Paço? Santa Guiomar! Frei Paço, tendes espaço pera poder xaminar esta cachopa um pedaço?
 
É da serra da Lousã, moça de muito boa fama, trago-a cá pera ser dama, quero que seja paçã.
 
FREI PAÇO Amigo, a dama prezada há de ser rica e formosa, muito sentida, assossegada, cortês mansa graciosa.
 
APARICIANES Tudo isso Giralda tem.
 
FREI PAÇO Ponhamos-lhe ora um trançado, vejamos como lhe vem.
 
APARICIANES Dai, dai ó demo o toucado, que não é pera ninguém.
 
FREI PAÇO Tu, vilão, queres dizer que isto não é pera a sega, e pera o paço há mister.
 
APARICIANES Isso é rabo de pega, e não é pera mulher… Nisso está ora Apariço.
 
FREI PAÇO Pois não lhe estava ele mal.
 
APARICIANES Viu nunca o demo pardal ter o rabo no toutiço.
 
FREI PAÇO Não lhe vejo bons caminhos.
 
APARICIANES Por quê?
 
FREI PAÇO Não tem pera isso ar.
 
APARICIANES Pisou uvas no lagar, e tem nódoas nos focinhos mas ela se irá lavar.
 
E er também per razão que ela assi é pertelhoa, lhe merquei eu em Lisboa dum que chamam solivão, que faz luzir a pessoa.
 
E merquei-lhe dum judeu duns torrões brancos que i há, não sei que nome é o seu, alvaiade creio eu que o ele chamam cá.
 
E merquei-lhe das tendeiras rebiquelhe genovês: dum que põe pelas trincheiras lhe merquei eu dez salseiras, que lhe avondarão um mês.
 
FREI PAÇO Ora faça uma mesura vejamos que ar lhe dá.
 
GIRALDA Pera cá ou pera lá?
 
FREI PAÇO Olhai-me aquela doçura pera a doçura de cá.
 
Senhora dama das cabras, haveis de fazer assi. Atentastes pera mi?
 
E dai assi as passadas. Entendeis este latim?
 
E olhareis deste jeito, assi com um recacho oufano, vosso corpo mui direito, pouco riso e mui bem feito, forrado de honesto engano.
 
De quando em quando o falar cousa é que muito contenta, não amar nem o leixar, e por vos mostrar isenta, guardai-vos de suspirar.
 
GIRALDA Tudo isso que dizeis farei eu senão de flores.
 
FREI PAÇO Quereis vós falar amores, por ver que respondereis aos vossos servidores?
 
Senhora, há já mil anos, que vos quisera falar, e por vos não anojar, padeço já tantos danos, que os não posso calar.
 
GIRALDA Que má-hora cá viestes, como eu folgo co isso tal.
 
FREI PAÇO Se vós folgais com o meu mal o meu mal vós o fizestes ó meu bem angelical.
 
Que em pago do bem que vos quero se não vós, quem me feriu com o vosso lindo cutelo?
 
GIRALDA Disso estais vós amarelo do sangue que vos saiu.
 
FREI PAÇO Ó senhora que matais a todos quantos feris, e a ninguém perdoais.
 
GIRALDA Quão docemente mentis todos quantos bem falais!
 
FREI PAÇO Senhora, quem amansasse vossas iras de matar!
 
GIRALDA Quantos mortos que eu matasse, ajudastes a enterrar?
 
FREI PAÇO Ao menos eu agora sem remédio de conforto, já minha alma é de mi fora pois memento mei, senhora, lembre-vos que ando morto.
 
Morto me tendes aqui, e morto desesperado.
 
GIRALDA Quanto a se isso fosse assi espantar-me-ia eu de mi, não pasmar de homem finado.
 
Como? Fantasma sois vós?
 
FREI PAÇO Oh como estais graciosa!
 
GIRALDA Digo que sou tão medrosa dos mortos (livre-nos Deus!) que não creio a morte vossa.
 
Se morto, como falais? Se defunto, como ouvis? Sem alma, como sentis? Sem sentidos, que pedis? Finado vós, que buscais?
 
FREI PAÇO Sou morto, e vivo em tormento; sou finado, e ando em pena.
 
GIRALDA Porém vosso enterramento? Quando embora se ordena e se cumpre o testamento?
 
APARICIANES Frei Paço, já bem está, escusada é mais linguagem. Quero ir minha romagem que isto mui bem se fará, porque a moça é de avantagem.
 
FREI PAÇO Umas freiras que cá vem, são naturais da Sicília Dorosia e Domicília são os seus nomes que tem.
 
E de mal aconselhadas, e tocadas da ignorância, vão queixosas e agravadas, porque as fazem encerradas, e viver em observância.
 
(Vem Domicília e Dorosia, freiras, e diz Domicília)
 
DOMICÍLIA Certamente infindos são, cousa pera não se crer, os queixosos que cá vão, se eles todos tem razão, mas isto não pode ser.
 
DOROSIA Por que há i tantos agravados, mais agora que soía?
 
DOMICÍLIA Porque nos tempos passados, todos eram compassados e ninguém se desmedia.
 
Mas a presunção isenta, que cresceu em demasia, criou tanta fantasia, que ninguém não se contenta da maneira que soía.
 
Tudo vai fora de termos, deu o ar na recovagem.
 
DOROSIA Será bem não nos determos, andemos quanto pudermos, cumpramos nossa romagem.
 
Roguemos a frei Narciso que vá em nossa companhia, fá-lo-á com boa vontade.
 
DOMICÍLIA Irmã, bom seria isso, e eu bem o outorgaria, mas abasta-lhe ser frade. E bem narciso aosadas!
 
DOROSIA Pois com quem iremos nós?
 
DOMICÍLIA É melhor que vamos sós, que não mal acompanhadas.
 
DOROSIA Por quê?
 
DOMICÍLIA Isso vede vós.
 
DOROSIA Deo gratias, padre Narciso.
 
FREI NARCISO Pera sempre aleluia.
 
DOROSIA Pois is nesta romaria, assi Deus vos dê o paraíso que vamos em companhia.
 
FREI NARCISO Iria mui ledo em cabo, melhor que pera o mosteiro, mas o amor é tão ligeiro, que o dai vós ao diabo, e temo seu cativeiro.
 
DOROSIA Iremos, padre, rezando, sempre de noite e de dia.
 
FREI NARCISO Já disse que folgaria, mas temo de ir suspirando. Mais vezes do que eu queria.
 
DOROSIA Pois como havemos de ir sós daqui a quarenta jornadas?
 
FREI NARCISO De que ides vós agravadas?
 
DOROSIA De quê? Coitadas de nós que razão temos aosadas.
 
FREI NARCISO Tamanha é a importância, que assi vos desterrais?
 
DOMICÍLIA Padre, éramos craustais, e fazem-nos de observância e pera sempre jamais.
 
FREI NARCISO E disso vos agravais?
 
DOROSIA Disto nos queixamos nós.
 
FREI NARCISO Pois que haveis medo de ir sós, pera que vos arredais da companhia de Deus?
 
Cuidais que is bem aviadas? Pois eu, senhoras, me fundo que quanto mais encerradas, tanto estais mais abrigadas das tempestades do mundo.
 
Ca sempre os sábios disseram, pois do falar vem os perigos conversação afastá-la.
 
DOMICÍLIA Dizei que mal nos fizeram os parentes e amigos, para lhes tolher a fala.
 
E se formos visitadas de mãe, ou tias, ou dona, por que males ou erradas lhes falaremos tapadas, coma bestas de atafona?
 
FREI NARCISO Estas pastoras ouçamos, saberemos seus agravos.
 
(Vem Juliana e Hilária, pastoras, e diz Juliana)
 
JULIANA Hilária, mui pouco andamos, pera segundo levamos os corações agravados.
 
HILÁRIA O meu Silvestre anda morto, porque me querem casar com o filho de Pero Torto.
 
JULIANA E o meu Brás quer-se enforcar porque me casam no Porto.
 
HILÁRIA Silvestre há de fazer um desatino de si.
 
JULIANA E Brás há de endoudecer, pois Deus não há de querer que eu nada faça de mi.
 
HILÁRIA Juliana que faremos?
 
JULIANA Bofé, Hilária não sei.
 
HILÁRIA Sabes, mana, que eu farei?
 
JULIANA Dize, rogo-to, e veremos.
 
HILÁRIA Escuta que eu to direi...
 
Direi que andando a de parte com o meu gado em Alqueidão, me apareceu uma visão, que me disse: moça guarda-te de chegares a barão.
 
E assi me escusarei deste negro casamento, e depois andando o tempo, outra visão acharei, que case a contentamento.
 
JULIANA Eu direi que um escolar me tirou o nascimento e disse: o teu casamento, se no Porto hás de casar, amara vida te sento.
 
Cá serás demoninhada esses dias que viveres.
 
HILÁRIA Quê Com essa emborilhada ficarás desabafada, casarás com quem quiseres.
 
A fortuna todavia nos tem que farte agravadas andemos nossas jornadas cheguemos à romaria e seremos descansadas.
 
JULIANA Rogo-vos João da Mortinheira, que nos vades acompanhar.
 
JOÃO MORTINHEIRA Cachopas hei de levar? Per essa mesma maneira me darão muita madeira nas costas a meu pesar.
 
JULIANA Por quê?
 
JOÃO MORTINHEIRA Porque há i rascões e outros de Paço, e as cachopas dão-lhes de azo entances buscai per i, e tomai raposa em laço.
 
JULIANA Nós somos doutro lameiro, e de casta mais sisuda.
 
JOÃO MORTINHEIRA Tudo isso pouco ajuda, que uma cachopa se muda como o tempo em fevereiro.
 
Pardez que nom há que fiar, que os caranguejos na eira e as moças na carreira, quem as houver de guardar, bofás tem assaz canseira.
 
Crede que fazem por elas todolos escudeirotes, e ainda os sacerdotes poucas vezes fogem delas. Deixemos ora estes motes!
 
Pois que vos querem casar, pera onde is aviadas?
 
JULIANA Porque somos agravadas nos imos desagravar, bem tristes e bem cansadas.
 
Eu não sei por que respeito nossas mães e nossos pais nos trazem maridos tais, tanto contra nosso jeito, que os diabos não são mais.
 
As cabeças como outeiros, os cabelos carcomidos, louros coma sovereiros, penteados de ano em ano, maus chiotes de má pano: folgai lá com tais maridos.
 
HILÁRIA E o meu é por seus pecados vesgo o mais que nunca vi, tem os olhos enfrestados se lhe falares ou assi, não saberás se olha a ti, se olha pera os telhados.
 
JOÃO MORTINHEIRA Vós outras sois uma relé bofá de forte alimento: ora olhai vós que cousa é, que vós remais coma galé, e andais melhor que o vento.
 
Casai earamá com siso, e dai ó demo a afeição, que se seca logo isso, e quem casa com aviso acha em casa a descrição.
 
JULIANA Como casam?
 
JOÃO MORTINHEIRA Muito asinha.
 
JULIANA De que modo?
 
JOÃO MORTINHEIRA Digo eu: Juliana, eu sou teu… Ora dize tu que és minha, e mais quanto Deus te deu.
 
JULIANA Não é mais… E isso avonda?
 
JOÃO MORTINHEIRA Não é mais, nem mais se deve. Porém a cantiga é breve, mas a grosa muito longa.
 
FREI PAÇO Agravos que não tem cura procurai de os esquecer, que impossível é vencer batalha contra ventura quem ventura não tiver.
 
Não deve lembrar agora agravos nem fantasias, senão muitas alegrias. À rainha, nossa senhora, que viva infinitos dias.
 
Cantemos uma cantiga, ao mesmo infante bento, e ao seu bento nascimento, por que a rainha não diga que somos homens de vento.
 
(Ordenaram-se todas as figuras como em dança, e a vozes bailaram, e cantaram a cantiga seguinte)
 
Por mayo era por mayo ocho días por andar, el infante don Felipe nació en Évora ciudad. Ua! ua! Viva el infante, el rey y la reina como las aguas del mar.
 
El infante don Felipe nació en Évora ciudad, no nació en noche escura. Ni tampoco por lunar. Ua! ua! Viva el infante, el rey y la reina como las ondas del mar.
 
No nació en noche escura ni tampoco per lunar nació cuando el sol decrina sus rayos sobre la mar. Ua! ua! Viva el infante el rey y la reina como las aguas del mar.
 
Nació cuando el sol decrina sus rayos sobre la mar, en un día de domingo, domingo pera notar. Ua! ua! Viva el infante el rey y la reina como las ondas del mar.
 
En un día de domingo, domingo pera notar, cuando las aves cantaban cada una su cantar. Ua! ua! Viva el infante el rey y la reina como la tierra y la mar.
 
Cuando las aves cantaban cada una su cantar. Quando los árboles verdes sus frutos quieren pintar Ua! ua! Viva el infante el rey y la reina como las aguas del mar.
 
Cuando los árboles verdes sus frutos quieren pintar alumbró Dios a la reina con su fruto natural. Ua! ua! Viva el infante el rey y la reina como las aguas del mar.
 
(E com esta música e dança se saíram, e fenece esta última tragicomédia do livro terceiro)

 

 

                                                                  Gil Vicente

 

 

              Voltar à “Página do Autor"

 

 

                                                   

O melhor da literatura para todos os gostos e idades