Biblio VT
Series & Trilogias Literarias
Eu nunca me senti confortável voando. Minha natureza desconfiada supunha que a mágica que mantinha os aviões suspensos no ar iria deixar de existir de acordo com o desejo de um mestre. Ouvir o zumbido do propulsor a jato mudando de velocidade – ou experienciar os misteriosos bolsões de ar te sacudindo de um lado pro outro – equivalia à morte iminente em uma geringonça de alumínio destinada a problemas. Eu passei o voo todo com minha mandíbula travada, as mãos apertando os apoios de braços, e os olhos grudados no assento em frente a mim, esperando impacientemente que o guardião da cripta não reivindicasse outra vítima. Apesar de meu estranho talento com qualquer coisa mecânica e de Nana D sempre dizer que eu era brilhante, eu era completamente cético desse tipo de transporte. Meus instintos diziam que eu estaria mais seguro despencando sobre as Cataratas do Niágara sem roupas e dentro de um barril.
Depois de aterrissar no Aeroporto Internacional de Bufalo, Niagara nessa triste tarde de fevereiro, eu aluguei um Jeep para cruzar outros noventa quilômetros ao sul em direção ao interior da Pensilvânia. Vários centímetros de uma neve densamente compactada e gelo encardido cobriam a única rodovia que dava acesso à reclusa cidade da minha infância. Braxton, um dos quatro charmosos vilarejos completamente cercados pelas Montanhas Wharton e pela Floresta Nacional Saddlebrooke, era quase impenetrável por forças externas.
Enquanto eu trocava de pista para evitar uma parte escorregadia, o número de minha irmã iluminou a tela do meu celular. Eu pausei o Maroon 5 na minha playlist do Spotfy, aceitei a ligação e reclamei:
– Diz pra mim por que é que eu vim para cá?
– Culpa? Amor? Tédio? – Eleanor disse, seguida por uma alta risada.
– Estupidez? – desejando algo substancial o suficiente para acalmar os barulhos irradiando de meu estômago, eu peguei um cookie de chips de chocolate de um saco no banco do passageiro. O mocha de caramelo salgado extragrande – grátis, cortesia de uma bonita barista de cabelos ruivos que havia descaradamente flertado comigo – não seria o suficiente. – Por favor, me salve dessa tortura.
– Isso não vai acontecer, Kellan. Você deveria ter ouvido a mamãe quando eu sugeri que podia ser que você não chegasse a tempo. “Ele sempre tem alguma desculpa para não vir para casa mais vezes. Essa família precisa dele aqui!” Mas não se preocupe, eu a acalmei. – Eleanor gritou por cima do som de vários pratos e copos tinindo no plano de fundo.
– Será que ela já se esqueceu de que estive aqui no Natal? – outro cookie encontrou seu caminho até minha boca. Eu preciso confessar, sou completamente indefeso contra doces, também conhecidos como minha criptonita, portanto, é por isso que eu sempre pensei que eles deviam fazer parte do maior grupo de alimentos. – Duas visitas dentro de seis semanas é uma a mais do que minhas contas permitem.
– Como foi que os nossos irmãos encontraram desculpas aceitáveis para pular o grande evento social da temporada? – Eleanor disse.
– Eu? Eu deixei de tentar competir com eles há anos. É mais fácil sair ileso das coisas quando eles não estão desapontando nossos pais como o resto de nós.
– Hey! Não me leve junto só porque você não pode escapar da estranha síndrome do filho do meio. – Eleanor colocou minha ligação na espera enquanto lidava com a reclamação de um cliente.
Minha irmã mais nova havia feito trinta anos no mês passado e estava infeliz sobre isso, já que ela ainda não havia encontrado o homem certo. Ela também insistia que não estava virando a nossa mãe, apesar de a cada hora, todos os dias, ficar constantemente colocando aqueles filamentos de imaginação no esquecimento. Verdade seja dita, Eleanor era a imagem cuspida de Violet Ayrwick, e daquela maneira onde todo mundo consegue perceber, menos as duas. Gêmeas, como Nana D sempre disse com aquela doce melodia de sua voz. Eleanor vai definitivamente estar na festa de aposentadoria do nosso pai, já que não havia a menor chance nesse mundo de eu ir sozinho nessa perda de tempo de festa. O convidado de honra havia sido o presidente da Faculdade Braxton nos últimos oito anos, mas ao fazer sessenta e cinco anos, Wesley Ayrwick se afastou do cobiçado cargo.
Eleanor voltou à linha:
– Emma ficou tranquila com você nos visitando sozinho dessa vez?
– Sim, ela está com os pais de Francesca. Eu não podia tirá-la da escola novamente, mas nós vamos usar o Facetime todos os dias enquanto eu estiver fora.
– Você é um pai maravilhoso. Eu não sei como você faz tudo isso sozinho. – Eleanor respondeu. – Então, quem é a mulher que você pretende encontrar enquanto nos agracia com sua presença neste final de semana?
– Abby Monroe. Ela completou várias pesquisas para meu chefe, Derek. – eu disse, xingando o grudento e festeiro produtor executivo de nosso programa de televisão premiado, Realidade Sombria. Quando informei ao Derek que precisava voltar para casa para uma obrigação familiar, ele generosamente sugeriu que eu pegasse alguns dias extras para relaxar, antes de tudo explodir na emissora, então designou que eu entrevistasse sua última fonte. – Já ouviu o nome?
– Soa familiar, mas eu não consigo saber exatamente de onde agora. – Eleanor disse entre os gritos de pedidos para o cozinheiro e falando pra ele se apressar. – Qual é a sua próxima história?
Realidade Sombria, um tipo de show no estilo de exposição, adicionando um drama aos crimes da vida real, ia ao ar semanalmente e tinha vários episódios com continuação, ao estilo de programas de reality show e novelas. A primeira temporada destacou serials killers, Jack o Estripador e O Vampiro Humano, fazendo com que o programa ficasse no topo no debut da série. – Eu tenho uma enorme bíblia de pesquisa da segunda temporada do show para ler esse final de semana... caça aos fantasmas e queima de bruxas no século XVII da cultura americana. Eu realmente preciso de um novo emprego. Ou matar meu chefe.
– Uniforme de listras não ia ficar bem em você. – Eleanor disse.
– Não se esqueça, eu sou muito bonito.
– Eu não vou cair nessa. Vamos deixar Nana D julgar isso antes de eu te bater por dizer algo tão patético. Talvez Abby seja normal?
– Com a minha sorte ela vai ser outra vítima amarga e desprezada, com razão, na busca por justiça por qualquer trauma colossal que Derek causou. – eu respondi com um suspiro. – Eu acho que ela é mais uma perda de tempo.
– Quando você vai entrevistar ela? – Eleanor perguntou.
Eu pretendia marcar um almoço para conhecer o básico de Abby, mas mal tinha conseguido pegar o voo naquela afobação de última hora.
– Com sorte amanhã, se ela não estiver longe demais. Tudo o que Derek me disse é que ela mora no centro da Pensilvânia. Ele não tem noção de espaço ou distância.
– Está ficando cheio por aqui, eu tenho que ir. Não vou conseguir te encontrar para jantar hoje, mas te vejo amanhã. Não cometa nenhum assassinato até que a gente converse novamente. Beijos e abraços.
– Só se você não envenenar nenhum cliente. – eu desliguei a ligação, implorando aos deuses para me transportarem de volta à Los Angeles. Não consegui mais aguentar o stress e devorei os dois últimos cookies. Devido à minha obsessão por sobremesas, a academia nunca tinha realmente sido uma opção pra mim. Eu fazia algum tipo de exercício diariamente, a não ser que eu estivesse doente ou de férias, o que essa semana certamente não seria. Não haveria nenhuma praia, cabana ou “mojitos”. Portanto, eu não iria aproveitar muito num futuro imediato.
Eu naveguei pela rodovia sinuosa com o aquecedor de assento no máximo e o limpador de para-brisa no modo maníaco passivo-agressivo para manter o para-brisa limpo de gelo e neve. Era o pior do inverno, e meu corpo inteiro tremia, o que não era uma coisa boa quando meus pés precisavam estar prontos para pisar no freio caso aparecesse um veado ou cervo. Sim, eles eram comuns nessas partes. Não, eu não tinha atropelado nenhum. Por enquanto.
Não havia hora melhor para ligar para Abby e sugerir um encontro. Quando ela atendeu, não fiquei surpreso com a inocência dela em relação à abordagem secreta de meu chefe.
– Derek nunca me disse nada sobre me encontrar com alguém mais. Você tem um sobrenome, Kellan? – Abby queixou-se depois que eu já tinha explicado quem eu era no primeiro minuto da ligação.
– Ayrwick. Eu sou Kellan Ayrwick, um diretor assistente da segunda temporada do Realidade Sombria. Eu pensei que nós pudessemos revisar a pesquisa que você preparou para Derek, e discutir sua experiência com o trabalho da indústria televisiva.
Houve alguns segundos de silêncio no telefone.
– Você disse Ayrwick? Como... bem... não tem alguns deles trabalhando em Braxton?
Eu fiquei momentaneamente surpreso sobre como uma garota groupie podia saber qualquer coisa sobre Braxton, mas então pensei que ela podia estar atualmente frequentando a faculdade, ou tendo frequentando a faculdade anteriormente com algum dos meus irmãos.
– Vamos almoçar juntos amanhã para discutir isso. O que você acha de marcamos para uma da tarde?
– Na verdade, não. Eu não estava preparada para conversar nesse final de semana. Pensei que iria pegar um voo nos próximos dias para me encontrar com Derek. Não é uma boa hora.
– Será que não podemos nos encontrar para uma breve introdução? – Derek com certeza sabia como pegar os mais dramáticos. Eu podia imaginá-la mexendo no cabelo e piscando os olhos, apesar de não saber como ela se parecia.
– Eu estou no meio de um furo de reportagem que vai expor sobre um crime acontecendo aqui no Condado de Wharton. Isso pode ser algo que vai servir para Derek... bem, ainda é cedo para dizer qualquer coisa. – a voz dela, de repente, ficou fria e hesitante. Ela provavelmente havia se esquecido de como usar o telefone ou acidentalmente me colocou no mudo.
– É isso que você mencionou para ele sobre tópicos para uma futura temporada do Realidade Sombria? Eu estou mais interessado em crimes reais e reportagem investigativa. Talvez eu pudesse te ajudar nesse campo. – assim que percebi que ela estava no mesmo condado que eu, tentei de todas as formas arranjar um encontro.
– Você é filho de Wesley Ayrwick. Eu ouvi dizer que ele tem um monte de filhos.
Meu queixo caiu uns dois centímetros. Nana D teria contado as moscas enquanto elas voavam para dentro e para fora da minha boca devido ao tempo que ela ficou aberta. Quem era essa garota que sabia algo sobre a minha família?
– Eu não vejo por que isso seja relevante, mas sim, ele é meu pai. Você frequenta Braxton, Abby?
– Frequentar Braxton? Não, você tem que aprender algumas coisas se nós vamos trabalhar juntos. – ela riu histericamente, chegando a gargalhar.
– Ótimo, então podemos nos encontrar amanhã? – o tom daquela mulher havia me incomodado, mas talvez eu a tenha julgado mal, baseado no gosto usual de Derek com mulheres. – Mesmo que seja apenas trinta minutos para que possamos estabelecer uma relação. Você conhece a Lanchonete Pick-Me-Up? – Eleanor cuidava do local, então eu teria uma desculpa para me afastar se Abby fosse difícil de lidar. Minha irmã poderia arranjar que um dos garçons derrubasse uma tigela de sopa em Abby, então trancá-la no banheiro enquanto eu escapava. Não havia nada que eu desprezasse mais do que pessoas tolas, sem noção ou insípidas. Eu já havia tido o suficiente de encontros com garotas de irmandades anos atrás. Se eu encontrasse mais alguma Garota de LA, consideraria deixar a família de Francesca, os Castiglianos, tomar o controle da situação. Apague isso, eu nunca disse essas palavras em voz alta.
– Não, me desculpe. Eu vou estar ocupada por algumas horas investigando toda essa loucura que está acontecendo por aqui. Mas te vejo no campus amanhã de noite.
Eu sacudi minha cabeça em frustração e confusão. Eu ouvi claramente ela reprimindo uma risada desagradável novamente. Se ela não era uma estudante, por que estaria no campus?
– O que você quer dizer com amanhã à noite?
– A festa celebrando a aposentadoria do seu pai. Nada é o que parece, não é mesmo? Você pode se apresentar apropriadamente e arranjar um tempo para conversarmos. Eu espero que isso seja bom.
Derek ia ficar me devendo uma com toda essa coisa. Se ele não se cuidasse, eu daria a ela o verdadeiro número do celular dele, e não o falso que ele dava para as pessoas na primeira vez que se encontravam.
– Como exatamente você conhece meu... – a próxima coisa que ouvi foi o clique quando ela cortou a ligação.
Eu continuei na estrada principal entrando diretamente no coração de Braxton, soando a buzina enquanto passava pelo Rancho Danby, a fazenda e pomar orgânicos da Nana D. Eu era especialmente próximo da Nana D, também conhecida como minha avó, Seraphina, que faria sententa e cinco anos no final do ano. Ela ficava ameaçando colocar o vereador da cidade, Marcus Stanton, no colo dela, dar umas boas palmadas, e ensinar ao tolo como as coisas deviam ser feitas nesse mundo moderno. É meu segundo emprego sempre dar uma checada nela depois do incidente onde ela, supostamente, ficou trancada na cadeia durante uma noite. Sem nenhum registro oficial, ela podia continuar a negar isso, mas eu sabia melhor, já que fui eu quem teve que convencer a Xerife Montague a soltar a Nana D. Eu esperava nunca mais ter que encarar tão de perto a nossa sempre charmosa mantenedora da ordem, mesmo se fosse necessário ter que salvar Nana D. Eu tinha uma certeza que essa era uma carta que podia ser jogada apenas uma vez.
O sol desapareceu enquanto eu parava na casa de meus pais, estacionava o Jeep, e andava até o porta malas para pegar minhas coisas. Já que a temperatura havia caído até números de um digíto, e a neve gelada castigava meu corpo, eu tentei o meu melhor para correr até a porta da frente. Infelizmente, o destino optou por vingança contra alguma indiscrição passada e voltou com uma vingança de milhares de pragas. Não depois de muito tempo, eu derrapei ao longo de uma camada de gelo como uma atrapalhada bailarina usando sapatos de palhaço e caí com tudo de costas no chão.
Eu tirei uma selfie enquanto ria no chão congelado, para avisar a Nana D que eu havia chegado a Braxton. Ela adorava receber fotos e me ver sendo um tolo. Não consegui decifrar a resposta dela já que meus óculos haviam embaçado, e minha visão era pior do que uma criança cegueta do Mr. Magoo. Eu procurei por um pedaço da minha camisa de flanela que não tivesse sido molhada pelo gelo ou pela minha vergonhosa queda, e os limpei. Uma olhada na foto que havia mandado fez com que uma gargalhada absurda saísse da minha garganta. Meu cabelo loiro e curto geralmente limpo estava cheio de folhas, e a barba de quatro dias em minhas bochechas e queixo estava coberta de neve. Eu me limpei e corri para a proteção da varanda coberta para ler a mensagem dela.
Nana D: Isso é um pano molhado na sua cabeça? Você está vestido como um arruaceiro. Coloque um casaco, está frio do lado fora.
Eu: Obrigado, Capitã Obvia. Eu caí na calçada. Você acha que eu sou normalmente todo esse desastre?
Nana D: E você é o inteligente? Você desistiu da vida, ou ela desistiu de você?
Eu: Continue, e eu não vou visitá-la esse final de semana. Você devia ser uma avó doce e adorável.
Nana D: Se é isso que você quer, vá até a casa de seus pais e consiga alguma companhia. Talvez vocês dois possam dividir um pouco de purê de ervilhas, gelatina verde, e um delicioso copo de Ovomaltine. Eu mesma pago.
Depois de ignorar a atitude de Nana D, passei um par de mãos geladas pelo meu cabelo numa tentativa de parecer um pouco apresentável, e entrei no hall de entrada. Apesar da estrutura original da casa ser claramente uma cabana de madeira, meus pais haviam acrescentado vários ambientes ao longo dos anos, incluindo uma ala leste e uma oeste, de cada lado da estrutura massiva. O teto do hall de entrada tinha pelo menos três metros e meio de altura, e era coberto com inúmeras placas de cedro com nós em todos os lugares certos. Um belo verde escuro cobria três das paredes para onde a entrada se abria, chegando a uma enorme sala de estar. Ela era ancorada por uma lareira de pedra e adornada com móveis antigos feitos à mão, que meus pais haviam viajado o estado inteiro à procura. Meu pai era apaixonado por manter a autenticidade de uma verdadeira cabana de madeira, enquanto minha mãe exigia todas as conveniências modernas. Se os Irmãos à Obra pudessem ver o resultado combinado do estilo deles. Eleanor e eu nos referíamos a ele como o Real Cabana-Chic.
Eu coloquei minhas malas no chão e gritei:
– Tem alguém em casa? – meu corpo deu um pulo quando a porta do escritório de meu pai se abriu, e a cabeça dele apareceu pela abertura. Talvez eu tivesse o paranormal e o oculto em minha mente sabendo que a próxima temporada do Realidade Sombria estava, infelizmente, no meu futuro próximo.
– Sou só eu. Bem vindo de volta. – meu pai respondeu, esperando eu me aproximar do escritório. – Sua mãe ainda está em Braxton fechando a lista final de admissão para as turmas futuras.
– E como está o feliz aposentado? – eu perguntei, andando pelo corredor na direção dele.
– Eu ainda não estou aposentado. – meu pai disse com um esgar. – Terminei de escrever meu discurso para a festa de amanhã de noite. Interessado em ouvir uma prévia?
Dizer não me faria ser um mau filho. Eleanor e eu tinhamos prometido, um para o outro no Natal, de que nós tentaríamos mais. Mas eu realmente queria ser um filho mau hoje.
– Claro, deve ser emocionante. Você teve uma carreira abundante pai. É indiscutivelmente o exemplo perfeito da excelência em oratória. – ele sempre adorava quando eu esticava minhas habilidades de vocabulário para me alinhar com as dele. Eu encolhi os ombros pensando nos concursos de soletração de anos atrás.
– Sim, eu realmente acredito que seja. – meu pai estreitou os olhos e coçou o queixo. Sem dúvidas ele estava julgando minha aparência descuidada. Eu havia esquecido de me barbear e havia sofrido o clássico mergulho ao chão. Me processe. Às vezes eu preferia a aparência bagunçada. Aparentemente, a barista do aeroporto também!
Eu andei até a mesa, estudando as rugas extras se formando ao redor dos lábios dele.
– Está tudo bem, pai? Você parece um pouco estressado.
– Sim... algumas coisas em mente. Nada que você tenha que se preocupar, Kellan. – ele assentiu e apertou minha mão, o cumprimento masculino padrão dos Ayrwick. Com um metro e oitenta de altura, meu pai tinha apenas uns dez centímetros a mais que eu, mas os genes dominantes Ayrwick faziam com que ele parecesse gigantesco em comparação. Magro e alto, ele nunca havia se exercitado em sua vida, mas também nunca havia precisado. Seu metabolismo era mais ativo do que um puro-sangue, e ele só comia o mais saudável dos alimentos. Eu tinha sorte suficiente de ter herdado os genes recessivos dos Danby, mas vou deixar mais sobre esses legados crueis para mais tarde.
– Eu sou um bom ouvinte, pai. Conte-me o que está acontecendo. – eu senti a mão ossuda dele recuar e observei o corpo dele se acomodar na cadeira de couro amarelo mostarda e bem usada, em frente à estante de livros. Provavelmente era a única coisa que minha mãe ainda não havia trocado, e isso era puramente porque ele havia ameaçado divórcio se ela tentasse. – Já faz algum tempo que nós conversamos.
Meu pai olhou pela janela. Eu esperei que a sobrancelha direita dele tremesse sinalizando o ataque numa batalha, mas ela nunca se arqueou.
– Nós estamos tendo alguns problemas em Braxton com um blogster tentando causar problema. Um monte de artigos ou postagens, qualquer seja o nome que eles tenham esses dias... lixo é o que eu gostaria de chamá-los. – ele fechou os olhos e se recostou na cadeira. – Não foi assim que imaginei as últimas semanas antes da aposentadoria.
Eu segurei uma risada, esperando não colocar outro obstáculo entre nós. Ele havia se aberto um pouco mais do que o comum, e não importava que ele tivesse usado os termos incorretos tentando explicar qualquer que fosse o tipo de propaganda falsa que estava acontecendo em Braxton.
– O que o blogueiro está dizendo?
– Alguém tem algo a dizer sobre a forma que eu estive apoiando certas partes da faculdade. Ele diz que eu estou favorecendo o departamento de esportes ao dar mais verba nesse mandato. – ele respondeu.
Meu pai cruzou as pernas e juntou as mãos. Suas calças de veludo azul marinho e os mocassins marrons pareciam fora de lugar, mas talvez ele estivesse levando a sério a aposentadoria. Eu normalmente o via em ternos ou ocasionalmente vestindo um par de calças cáqui e pólos de manga curta quando se encontrava com amigos no country club para jogar um pouco de golfe. Eu sinceramente esperava que isso não significasse que ele fosse começar a usar jeans. O choque da súbita normalidade tomada poderia me colocar no túmulo antes que aquele maldito avião.
– O blogueiro está caindo em cima de você especificadamente, ou da administração de Braxton no geral?
Meu pai rapidamente digitou algumas palavras no teclado do iPad e me entregou o dispositivo.
– Essa é a terceira mensagem em duas semanas. Os links para as outras estão no final.
Não é normal meu pai ficar se preocupando com esse tipo de bobagem, mas talvez ele tivesse ficado mais sensível às opiniões das pessoas conforme foi ficando mais velho. Parecia o oposto do que pensei que geralmente acontecia quando envelhecíamos. Nana D era a primeira a falar o que estava em sua mente ou a rir quando outros diziam qualquer coisa negativa sobre ela. Ela quase se deleitava com as críticas ao seu comportamento. Eu mal posso esperar para ficar velho e dizer qualquer coisa que quiser assim como ela faz!
Eu deslizei pela postagem mais recente. O que me alarmou mais era o porquê parecia explicitamente dirigido ao meu pai.
Wesley Ayrwick, em suas maneiras arcaicas e egoístas, deu um novo golpe ao erradicar o verdadeiro propósito para a existência de Braxton nesse mundo. Seu apoio contínuo ao fraco departamento de esportes, enquanto neglicengia educação adequada para os nossos amados estudantes da faculdade, tornou impossível que eu continuasse quieta. Uma recente doação de seis dígitos foi descuidadamente feita ao Complexo Esportivo Grey para melhorar a infraestrutura tecnológica da unidade esportiva, trocar o gramado do campo de beisebol, e colocar no seguro um ônibus mais moderno para os jogadores usarem ao viajar para estádios rivais. Ao mesmo tempo, os departamentos de comunicação, recursos humanos e música sofrem com softwares ultrapassados, equipamentos deteriorados e falta de locais modernos para apresentações ao vivo. Quando perguntado sobre a decisão de dividir a doação anônima em noventa por cento a dez por cento em favor dos times de esporte, o Presidente Ayrwick comentou que eles estiveram esperando por mais tempo e estavam com o risco de não serem capazes de competir nos próximos eventos da temporada esportiva. Essa é a terceira ocorrência do favoritismo dele nos últimos dois meses, o que claramente explica porque a petição para retirar Ayrwick mais cedo do que no fim do semestre está ganhando destaque. Vamos esperar que possamos dizer adeus para esse velho encolhido, antes que o navio de Braxton tenha velejado à deriva para longe demais de seu curso. Aposentadoria já deve estar na mente desse velho pateta, ou talvez ele seja um dos piores presidentes que nós já tivemos. Meu desejo mais sincero é que a memória de Wesley Ayrwick seja enterrada e para sempre esquecida ao final desse mandato.
– O que você acha disso? – meu pai perguntou. A hesitação na voz dele quase me fez engasgar.
Uma rápida leitura das postagens anteriores revelou sentimentos semelhantes, fixados em meu pai, por uma sensação de desequilíbrio e injustiça com as generosas doações concedidas a Braxton. A última linha parecia com uma ameaça de morte, mas isso poderia ser minha imaginação indo longe, desde que fiquei sabendo da alarmante verdade sobre o lado da família Castigliano.
– Quem foi o doador anônimo? Você é o responsável por decidir onde vão alocar os fundos?
Meu pai encolheu o nariz e ergueu a sobrancelha.
– Não, você sabe muito bem disso. Quando é anônimo, nem eu mesmo sei quem é. Algumas vezes o benfeitor tem um pedido específico de onde eu devo distribuir o dinheiro. Eu posso oferecer meu insight e sugestões, mas o Conselho de Curadores e o comitê de orçamento tem a decisão final de para onde os fundos irão.
– Eu só quis dizer que você provavelmente tem alguma influência. – eu respondi. Meu pai parecia aborrecido quando não recebia meu apoio logo de cara. – Deveria mesmo ter sido colocado no departamento de esportes? – eu fui até o corredor deixar minhas chaves e carteira no banco mais próximo.
– Sim. Embora eu concorde que o propósito de uma faculdade seja preparar sua vida no mundo real, para estudar e aprender um ofício ou uma habilidade, também é sobre desenvolver as relações interpessoais e abrir seus olhos e mentes mais do que acumular fatos. – ele foi até a janela, sacudindo a cabeça de um lado para o outro enquanto pensava em algo. – Esportes desenvolvem a camaradagem, trabalho em equipe e amizades. Ele providencia oportunidades para que a faculdade e a cidade se unam em apoio aos seus estudantes. O que eventualmente leva a uma base mais forte e um futuro para todos os que estão envolvidos.
Eu não podia discutir com a lógica dele e me peguei pensando se no passado eu chutava meus sapatos para longe no hall de entrada.
– Você colocou tudo isso de uma forma boa. Eu acredito em você, pai. Não querendo mudar de assunto, mas eu tenho uma pergunta a você sobre Abby Monroe. Ela mencionou frequentar ...
Eu não acho que ele me ouviu já que a porta de seu escritório se fechou com um estrondo antes que eu terminasse de falar. Eu estava em casa há apenas dez minutos e já tinha metido os pés pelas mãos. Entre nossas trocas extremamente inteligentes, arrogantes e teimosas, nenhum de nós dois se curvava o suficiente para desenvolver qualquer tipo de relacionamento normal. Eu acho que nunca aprendi a criar um laço afetivo com o indomável Wesley Ayrwick. Pelo menos eu podia contar com minha rápida sagacidade e beleza para fazer as coisas parecerem melhor!
Eu carreguei minha bagagem até meu antigo quarto, o qual minha mãe se recusava a mudar por causa de uma ideia tola de que talvez eu pudesse voltar a morar lá algum dia. Será que ela realmente pensava que um cara de trinta e dois anos iria querer dormir em um quarto que ainda tinha papel de parede do Jurassic Park e do Exterminador do Futuro? Antes de me acomodar para a noite e digerir alguns dos materiais para o show que Derek havia enviado, eu segui até o andar térreo para arranjar uma refeição leve. O incidente no escritório me deixou com nenhuma vontade de comer o jantar com meus pais naquela noite. Eu havia acabado de virar em um canto quando ouvi a voz do meu pai falando ao telefone fixo da casa.
– Sim, eu li a última postagem. Estou ciente da nossa situação, mas nós já discutimos isso. Despedir um funcionário não é uma opção no momento. – meu pai disse.
Parecia que as postagens estavam causando todo tipo de problemas, mas meu pai havia agido anteriormente como se não soubesse quem estava por trás do blog.
– Eu entendo, mas não tenho intenção de revelar esse segredo. Eu só estou quieto por causa do beneficio que isso tem para Braxton. Se a verdade for descoberta, nós vamos descobrir a melhor solução. Por hora, eu posso lidar com um pouco de água quente. Você precisa se acalmar. – meu pai disse.
Isso parecia que o blogueiro estava dizendo a verdade sobre o subterfúgio secreto. Será que meu pai estava envolvido em alguma situação ilegal ou não ética em Braxton?
– Você deveria ter pensado nisso antes de tomar uma abordagem tão tola... agora espere um minuto... não, você me escute... não me ameace, ou isso vai ser a última coisa que fará. – meu pai disse com raiva.
Quando ele desligou o telefone, eu me abaixei para dentro da cozinha. Entre as conexões indiscritíveis de Abby Monroe com Braxton, o impiedoso blogueiro denunciando meu pai publicamente, e a ligação hostil que havia acabado de escutar, esse final de semana poderia se mostrar mais surpreendente do que o esperado.
Capítulo 2
Quando eu acordei no sábado de manhã, minha boca estava seca, o quarto estava escuro, e um baixo ruído emanava de um canto distante. Eu me sentei ereto na cama e bati minha cabeça em uma viga de madeira, e fiquei com medo de que durante a noite eu tivesse ficadocego e que um gambá tivesse entrado nas paredes. Logo consegui determinar que o som desagradável era o assobio do radiador entregando o calor tão necessário para o quarto.
Assim que o choque inicial com meus arredores havia passado, estiquei minhas costas, grunhido com o estalo que minha coluna deu devido a ter dormido em um dos colchões mais firmes conhecidos pelo homem. Por causa do jet lag e da diferença de horários, eu fui dormir cedo, mas acordei várias vezes durante a noite. Peguei meu celular só para descobrir que já era quase meio-dia. Foi então que também vi uma mensagem do meu pai me castigando por não ter trazido Emma comigo. Baseado no horário da mensagem, ela havia sido mandada na noite anterior, logo após eu ter escutado escondido a ligação de telefone dele. Será que ele sabia que eu estive escutando?
Wesley Ayrwick não reclamava com frequência, e se ele dicidisse reclamar, era apenas sobre tópicos importantes. A última vez que eu o pressionei para saber o que ele pensava sobre algo vital, ele me revelou o quanto desgostava da minha esposa, Francesca. Isso ocorreu quando eu pedi a sua ajuda para planejar o funeral dela, depois que seu carro sofreu um acidente por causa de um motorista bêbado em West Hollywood, há pouco mais de dois anos. Eu e Francesca haviamos saído da casa dos pais dela no Dia de Ação de Graças, em carros separados já que ela estava morando com eles enquanto eu trabalhava em um projeto para um filme fora da cidade. Eu sempre seria agradecido à mãe de Francesca, Cecilia Castigliano, por ela ter colocado Emma na cadeirinha de segurança do meu carro naquela noite. Pensar no cenário alternativo constantemente me fazia chorar. Eu não estou nem um pouco preparado para falar sobre perder minha esposa tão nova, nem sobre ser um pai solteiro, então vamos deixar isso quieto por um pouco mais de tempo.
Depois de escovar meus dentes, eu liguei para saber de Emma, mas ela estava nadando na piscina dos vizinhos. Os avós dela iriam me ligar assim que ela voltasse para casa. Eu só estava fora por vinte e quatro horas, mas ainda assim parecia que perdia um pedaço de mim cada vez que ficavamos longe. A conexão parecia confusa, quase como se a distância me impedisse de saber, de verdade, se a minha filha de seis anos estava bem. Eu não sabia o que faria sem ela. Eu também deixaria de comer vários doces para poder balançá-la em meus braços nesse exato momento. Ou assistir ela dançando enquanto assitia algum desenho bobo em seu iPad. Meu coração derretia cada vez que eu via a naturalidade e a pura inocência de seu sorriso.
Antes de reunir a coragem para começar o dia, eu vesti algumas roupas e fui fazer um bule de café. Andar pela casa com apenas as minhas cuecas boxer pretas não era uma opção. Apesar de que, se tivessemos algum vizinho, seria um show e tanto. Eu desci a escada dois degraus de cada vez, andei até a cozinha, e encontrei minha mãe preparando o almoço. Eu ainda precisava descobrir os planos detalhados para a festa de aposentadoria de hoje à noite.
– E como a melhor mãe do mundo está se sentindo? – eu dei um abraço bem apertado nela, a única forma que um filho pode relembrar à sua mãe que ela é amada. O cabelo castanho, na altura dos ombros dela, estava preso atrás com uma presilha de jade em forma de borboleta o qual Eleanor a havia presenteado no Natal, e seu rosto parecia que havia começado a colocar maquiagem em um lado, mas havia se esquecido da outra metade. Eu podia apostar dinheiro hoje que a aparência descuidada era resultado de algo que Nana D havia feito.
– Oh, Kellan! Eu queria ter voltado cedo para casa ontem à noite, mas... o ensaio para a festa... a conversa com a organizadora sobre os lugares marcados... foi quase um desastre. Você sabia que ela havia colocado a Nana D sentada ao lado do Vereador Stanton em uma mesa da fileira de trás? Eu disse mais de dez vezes para a organizadora que Marcus vai fazer um discurso importante e precisa estar sentado na mesa principal com seu pai. Nana D não pode ficar perto dele de jeito nenhum, baseado na última discussão pública que eles tiveram onde ela o chamou de...
Eu tive que interromper antes que ela tagarelasse por horas.
– Entendi. Isso faz todo o sentido. Você fez a coisa certa, mas eu pensei que Nana D tivesse recusado o convite para a festa? – eu subitamente me lembrei de ler uma mensagem um pouco antes de dormir, onde Nana D indicava que preferia passar a tarde com sua boca cheia de fatias de limão, seus dedos espetados por milhares de pequenas agulhas, e seus pés colados dentro de uma colméia, do que ter que participar de mais um evento da Braxton pelo meu pai. – E o que é esse louco retrato-de-uma-senhora-com-duas-faces? – eu inclinei minha cabeça para o lado, alcancei a cesta de frutas no lado mais distante da ilha da cozinha, e me afastei alguns passos, certo de que ela iria me bater pelo comentário.
Minha mãe, com cinquenta e poucos anos, havia sempre sido obcecada pela sua aparência desde que eu me lembrava. Apesar de meu pai lhe dizer que ela era bonita, ou de como ele tinha que impedir todos seus amigos de darem em cima dela, ela sempre encontrava maneiras de se colocar para baixo. Mesmo quando meu pai havia contado como todos os seus amigos do golfe o chamavam de ladrão de berço, por causa da diferença de idade entre os meus pais, ela ainda assim saiu numa busca de duas semanas, ao redor do mundo, pelos últimos tratamentos anti-idade e contra rugas.
– O queee? Essa mulher vai me matar um dia desses. Ela me ligou enquanto eu estava me maquiando e queria saber se seu pai havia mudado de ideia sobre se aposentar. Ela havia ouvido um rumor sobre o que ele realmente tinha em mente, então perguntou quem estava escrevendo aquele lixo de blog. Alguma ideia sobre o que ela estava querendo dizer? – ela entrou no lavabo e aplicou uma sombra colorida em seu olho.
– Vamos deixar a conversa para depois que você terminar. A beleza vem primeiro. – eu respondi mudando de assunto, e comecei a fazer um sanduíche. – Então, a Nana D não vai? Isso vai deixar essa festa bem menos interessante.
A falta de conhecimento por parte de minha mãe sobre as postagens do blog me surpreendeu. Ela lia tudo sobre Braxton que estivesse ao seu alcance, era importante saber o que estava sendo dito sobre sua faculdade para estar preparada para quaisquer perguntas que alunos, ou futuros alunos, pudessem fazer. Mas então, podia ser que ela estivesse me testando para saber do que eu sabia e não havia contado. Por várias vezes a pequena charada que nós todos da família Ayrwick costumavamos fazer, podia ficar complicada – ficava entre um jogo de Quem Vai Primeiro? e Roleta Russa.
Minha mãe estalou os lábios.
– O que você estava dizendo, Kellan?
– Nada, estou contente por estar em casa. – Eleanor teria que concordar que eu estava sendo um ótimo filho.
Ela sorriu e se retirou para o banheiro enquanto eu devorava o sanduíche. Quando ela reapareceu, seu rosto estava completo. Era melhor a Eleanor se cuidar, ou então as pessoas iam começar a perguntar qual das duas era a irmã mais velha. Talvez eu mesmo comece o rumor. Já fazia um bom tempo desde quando eu tinha dado uma boa provocada em Eleanor.
– Quais são os planos para hoje à noite? – eu engasguei com a última mordida do meu sanduíche.
– Nós vamos estar lá cedo para receber os convidados para o coquetel que começa às cinco horas. Seu pai vai ser homenageado com um prêmio por serviços prestados, e alguns amigos vão fazer discursos entre as seis e as sete horas. O jantar vai ser servido entre as sete e as oito. Então todos podem se confraternizar por uma hora antes do final. – ela fez uma pausa para respirar, então colocou um morango na boca. – Eu preciso levar esse sanduíche para seu pai. Por favor, tente chegar cedo porque eu sei que ele quer te apresentar para as pessoas.
– Eleanor e eu estamos planejando chegar exatamente às cinco. Pode riscar mais essa preocupação da sua lista. – eu tinha que instruí-la algumas vezes, ou então ela ficava louca com as pequenas coisas. – Nós vamos nos comportar no nosso melhor.
Minha mãe me deu um beijo na bochecha antes de subir as escadas para levar o almoço do meu pai.
– Eu vou sempre me preocupar com meus filhos. Até mesmo com Gabriel, apesar de não ter notícias dele por mais de sete anos. Abraços e beijos.
Enquanto ela saía, vi meu reflexo na janela e revirei os olhos por causa das marcas de batom que ela havia deixado. Se eu sobrevivesse à noite, iria me vingar de Nana D por ter escapado de tudo isso. Eu mandei uma mensagem para ela, para lembrá-la de que ela havia prometido me trazer uma torta de cerejas para o café-da-manhã, de amanhã. Não havia nenhuma sobremesa melhor, especialmente do jeito que Nana D a fazia, com cerejas no topo e a massa apenas no fundo. Ela colocava pequenos donuts de massa no lado, então nós podíamos arrancá-los e mergulhar no recheio de cereja. Hmmmm, era deliciosa. Não me faça começar uma torta.
Nana D: Chegue às 10. Se divirta sem mim hoje à noite. Por favor, irrite o seu pai por mim.
Uau, ela realmente estava irritada. Eu voltei ao meu quarto e mergulhei de volta na grossa bíblia que era o roteiro do show, que estava na minha mesa de cabeceira. A página seguinte era um email da Abby enviado para Derek, datado da semana passada. Nele estava escrito:
Eu estou tão feliz que você tenha me escolhido para fornecer a pesquisa para a próxima temporada do Realidade Sombria. Eu recebi o contrato e vou mandar uma cópia assinada na semana que vem. Quando podemos nos encontrar novamente? Eu me diverti muito bebendo coquetéis com você no mês passado. Você está adorável naquela foto recente que você me mandou do Taiti.
Eu tenho várias coisas para compartilhar sobre o nascimento dos pactos de bruxas na Pensilvânia e a Maldição Enganadora de 1689, matando centenas de pessoas quando a terra foi inicialmente ocupada. Será que eu deveria reservar um voo para Hollywood em breve? Será que o canal pode cobrir uma passagem de primeira classe? Eu posso dizer que esse é o começo de uma parceria duradoura. Eu também encontrei algo de controverso acontecendo na minha cidade, que pode servir para uma futura temporada da nossa série de TV, mas ainda tenho que investigar mais. Eu vou mantê-lo informado.
A propósito, eu sempre caio na caixa de mensagem quando te ligo. Será que você podia tentar entrar em contato comigo hoje à noite? Eu vou estar em casa esperando por sua resposta. Se você precisar, meu número de celular é...
Sim, Derek tinha novamente se metido em problemas. Sempre o patife talentoso, Derek era conhecido por jogar suas loucas groupies pra cima de colegas, e também por sempre mandar alguém fazer seu trabalho por ele. A última garota, que ele havia assegurado que teria uma parte no set de filmagens do Realidade Sombria, havia pulado uma série de cordões vermelhos durante a festa de estreia da série, dizendo que Derek havia lhe prometido um lugar na primeira fila. Quando a equipe de segurança finalmente o chamou, meu chefe olhou bem nos olhos dela e disse: “Nunca me encontrei com essa mulher na minha vida. Tirem ela daqui.” Eu estava lá. Eu vi a confusão estampada no rosto dela. Também percebi que ele piscou duas vezes, então seus lábios tremeram. Derek tinha um tique que eu havia percebido desde o primeiro dia que nos encontramos.
Entre a ligação de ontem e esse email, uma imagem clara de Abby Monroe surgiu em minha mente – vinte e seis anos, loira, corpo de ampulheta, animada e cheia de vida. Ela nem mesmo havia percebido que Derek a havia ignorado e me colocado no meio dessa bomba atômica prestes a explodir. Eu procurei pelo número de Derek e pacientemente esperei a ligação se conectar. Precisava saber no que estava me metendo antes de me encontrar com Abby Monroe. Apesar de eu ter feito quase todo o trabalho na primeira temporada, meu nome não estava listado em nenhum lugar nos créditos, e nem minhas contribuições haviam sido reconhecidas por ninguém dentro da emissora. Já que eu era mais experiente e mais inteligente – ou talvez uma palavra melhor fosse mais talentoso – do que Derek, eu iria aprender tudo o que precisava para ganhar meu próprio prêmio e escapar desse drama.
– E aí? Você devia ver as ondas nesse horário. Incrível. – Derek gritou ao telefone.
Eu havia me esquecido de que ele estava no Havaí, e rapidamente fiz as contas sobre o fuso horário, antes de perceber que o sol estava ainda se levantando sobre incontáveis praias de tirar o fôlego. Por algum motivo, eu havia sido agraciado com a habilidade de reter muita informação inútil.
– Oh, espero que eu não o tenha acordado.
– Eu nem fui pra cama ainda, Kel-baby. Nós estamos indo alugar pranchas de surfe. Você devia estar aqui, cara.
Quaisquer vestígios de culpa que eu tivesse sobre despertá-lo de um sono feliz desapareceram, sabendo que foi ele quem me enviou nesse desvio tolo.
– Isso não é possível, Derek. Tentar entrar em contato com a sua fonte tem se provado bem difícil. Qual é a ligação de Abby Monroe com Braxton?
Alguns segundos se passaram com apenas o som das ondas batendo com força contra a areia, enquanto ele murmurava sobre o pagamento das pranchas de surfe. Algum dia eu iria aprender a me livrar de situações como essa, mas até lá, era melhor não pegar o mau humor dele. Da última vez que nós tivemos diferenças criativas, ele havia contratado um substituto para ficar na minha cola o dia todo, ameaçando me dispensar se eu não me acostumasse como as coisas funcionavam por lá.
– Tudo o que sei é que ela é uma beleza e tanto, não é mesmo? Eu nunca teria pensado que Abby tinha aquela aparência. Você já se encontrou com ela? Obrigado por cuidar dessa, Kel-baby. – ele igonorou a pergunta sobre Braxton.
– O nome é Kellan. – eu já havia lhe dito para não me chamar de Kel-baby. Fazia-me lembrar de uma namorada que eu tive no ensino médio que me fez assistir todos os episódios de Saved by the Bell durante um verão, enquanto tentava melhorar sua atuação. Eu já tinha tido o suficiente do duo Kelly Kelly, e não deixaria ninguém nunca mais me chamar de Kel ou Kelly como apelido. – E como é a Abby? Esse é mais um daqueles desastrosos encontros do Tinder que eu deveria saber?
– Cara, eu sou inocente, eu juro. Ela é sexy para uma mulher mais velha. E já está mais do que na hora de você ter ...
– Pode parar aí mesmo. Minha vida pessoal está fora dos limites. – ele conseguia irritar até a mais paciente das pessoas. – O que você sabe sobre essa Abby?
– Eu ia dizer um pouco de atenção. Você anda muito santinho ultimamente, e já é hora de você tirar essa auréola e se divertir um pouco. Se solte um pouco e se arrisque enquanto a emissora está pagando pela sua viagem. Eu tenho que ir. Minha parceira está ficando agitada, e essas ondas estão bravas.
– Espere, responda a minha pergunta sobre Abby.
– Eu mal a conheço. Nós nos conhecemos quando eu estava em uma conferência em Nova Iorque no mês passado. Eu dei a ela meu número e meu email. Você não leu a bíblia do show com todas as perguntas no final? Abby precisa responder todas aquelas questões. Eu estou contando com você, Kel-baby. Até mais.
– Você quer dizer que deu seu número falso pra ela, não é? – eu estava formulando vários métodos de vingança na minha mente. Eu queria relembrar Derek-baby sobre o que as pessoas diziam sobre a lei do retorno, mas na metade da minha resposta espirituosa, ele havia desligado.
Derek era a segunda pessoa que desde que eu havia chegado a Braxton havia escolhido aquela rota. Será que eu estava fazendo algo errado? O que aconteceu com as boas maneiras? Havia regras. Uma pessoa começava o ritual da despedida, e a outra esperava para compartilhar qualquer último pensamento. Existe aquele momento estranho de como terminar uma ligação, e então ambos se despedem ao mesmo tempo antes de desligar. Eu coloquei isso na minha lista mental de coisas para perguntar a Nana D na próxima vez que a visse. Apesar da idade dela, ela sempre tinha todas as respostas para o novo sisterma de etiqueta das pessoas da minha geração.
Esperando desestressar da conversa com Derek e aliviar os nós nas minhas costas, eu saí para correr durante uma hora no ar fresco de montanha que tinha em Braxton. Muitas partes da cidade – que tinha no máximo cerca de três mil habitantes – ofereciam uma beleza natural e intocada que todos haviam protegido por cerca de trezentos anos. Pouco antes da Pensilvânia se tornar oficialmente um estado, meus ancestrais designaram uma terra protegida, onde o Rio Finnulia desaguava no Lago Crilly, na base das montanhas Wharton. Apesar da vista ser intoxicante, eu tinha pouco tempo sobrando antes do início da festa. Voltei para casa e me vesti para o evento.
Prontamente às quatro e meia, eu estava parado do lado de fora da Biblioteca Memorial, supondo que Eleanor se atrasaria. Inevitavelmente, haveria algum tipo de crise na lanchonete, uma chave de carro perdida, ou uma mudança de roupas de última hora. Era uma sorte que a minha irmã fosse a pessoa mais inteligente, leal e cuidadosa na minha vida, ou seus constantes atrasos e indecisões me deixariam louco e me mandariam correndo na direção oposta. Uma vez nós nos atrasamos quarenta e cinco minutos para a Missa de Páscoa porque ela não conseguia se decidir se levava ou não um guarda-chuva. Quando nós finalmente chegamos, ela se juntou à fila da Comunhão agindo como se tivesse ficado todo esse tempo lá. Não havia importado que a previsão do tempo dissesse que não haveria chuva.
A Biblioteca Memorial foi originalmente erguida pela família Paddington, antes que um incêndio danificasse o primeiro andar no fim dos anos 1960, durante um protesto contra a Guerra do Vietnã, que de alguma maneira havia saído de controle. Por algum motivo, os que estavam no poder naquela época decidiram se rebelar contra o charme do mundo antigo e a preservação da história. O resultado foi uma reforma barata da estrutura antiquada e uma adição institucional e utilitária, que fazia com que todos se lembrassem de uma cafeteria de escola que tinha dado errado. Ela precisava ser demolida e redesenhada mais do que o governo da nossa cidade.
Enquanto eu esperava por Eleanor, uma mulher passou por mim explicando para alguém em seu celular como ela já tinha terminado de avaliar a prova, e estava indo colocar os resultados no seu livro de notas. Parecia que era um estudante descontente que estava tentando mudar a sua nota com o professor. A última frase que eu entendi, antes que ela tivesse longe demais, me fez rir ao pensar o quão longe alguém podia chegar para exigir uma nota melhor. “Sim, venha ao meu escritório às oito e meia para discutirmos isso uma última vez. Mas confie em mim, não há nada que você possa fazer para mudar minha mente. Nada. Zilch. Você está simplesmente me matando com essa pressão persistente e as múltiplas táticas de desvio”, ela reprimiu.
Meu olhar foi para a direção de vários alunos entrando e saindo da Biblioteca Memorial, me deixando surpreso em como ela era popular num sábado à tarde. Apesar de eu ter sido um estudante decente durante o tempo que passei em Braxton, os finais de semana haviam sido reservados para festas de fraternidades, excursões para arranjar problemas fora do campus, e extenuantes visitas com minha família. Sábados à noite na biblioteca não eram uma coisa legal há uma década. Parecia que muito havia mudado.
Eu pensei em seguir um dos estudantes lá dentro para dar uma olhada na triste decoração interior, mas parei quando algumas bolas de neve acertaram meu ombro. Não sendo alguém que recusa um desafio, eu rapidamente me agachei para pegar um monte de neve, e me preparei para jogar uma poderosa bola curva. Será que um estudante imaturo havia tirado vantagem da minha distração, ou era a professora me usando como uma maneira de expressar sua frustração com o aluno que ficava ligando? Eu me virei pronto para a luta.
– Então, ele realmente pode se arrumar para uma ocasião apropriada. – minha irmã me provocou, se preparando para jogar outra bola de neve. – Eu apostaria que você estaria vestindo seus jeans usuais e uma camiseta cinza hoje à noite.
Não, meu terno preto caro e meu sobretudo pareciam bastante elegantes. Eu revirei meus olhos na direção dela várias vezes, com ênfase suficiente que eles quase ficassem vesgos na última vez.
– Muito engraçado! Eu teria apostado que você não estaria aqui até as cinco e meia, então você poderia dizer à nossa mãe que era minha culpa por estarmos atrasados.
Eleanor veio até mim e me deu o abraço mais apertado, desde a última vez que eu estive na cidade.
– Eu estava com tantas saudades. Por que você tem que me deixar aqui nessa tundra ártica chata junto com nossos pais? Será que você não consegue arranjar uma maneira de trabalhar aqui em Braxton por meio... okay, tudo bem, eu vou parar. As estrelas estão me dizendo para eu não te provocar mais essa noite.
Eu concordava sobre a parte do ártico. Eu nunca me acostumaria com isso de novo depois de olhar as palmeiras e ouvir o som das ondas em Los Angeles. Quando nós nos separamos, eu a olhei de cima a baixo com um pouco de choque. Eleanor tinha feito uma completa transformação. Seu cabelo cacheado e de um loiro escuro estava preso para o lado com um laço vermelho escuro combinando com a cor de seu vestido. Ela estava usando salto alto, o que raramente acontecia por dois motivos – um, porque ela era um pouco estabanada, e dois, porque ela dizia que isso a deixava mais alta do que os homens em potencial que poderiam se interessar por ela. Nós tinhamos a mesma altura, mas com seus sapatos brilhantes Christian Loubotin que ela havia escolhido, eu não conseguia chegar na altura dela mesmo que ficasse na ponta dos pés.
Eu só conhecia o tipo e a marca de sapatos porque Francesca tinha me ensinado bem. Nós tinhamos passado vários domingos à tarde olhando as vitrines da Rodeo Drive, adivinhando os preços de tudo o que ela gostava, mas se recusava a pagar o preço total. Apesar de sempre ter tido dinheiro, ela adorava uma boa barganha.
– Você sempre pode se mudar para a costa leste se não consegue mais morar por aqui. – eu sorri sobre como minha irmã mais nova parecia uma mulher crescida em seu vestido vermelho requintado. Ela tinha um senso de moda único, colocando sua própria personalidade em cada roupa. Hoje, era uma faixa cinza-escura que ela vestia ao redor dos quadris. Eleanor sempre havia sido consciente por herdar a estrutura óssea dos Danby, e sempre encontrava uma maneira de acentuá-la ou escondê-la, o que quer que a fizesse parecer melhor, dependendo do traje ou da posição da lua naquele dia. Ela era fanática com relação à horóscopos, astrologia e numerologia. – Ou então consultar aquela sua bola de cristal pra ver o que seu futuro lhe reserva.
– Ohh, cale a boca. Algum dia nós vamos morar um perto do outro, as cartas já decidiram isso. Diga, quem você acha que vai estar lá hoje à noite, além dos colegas habituais e amigos? Eu tenho uma premonição de que algo obscuro vai acontecer. Não tenho certeza de quem está com problemas, mas tem alguém com a aura escura.
Quando ela disse essa última frase, um trovão soou perto das Montanhas Wharton. Nós dois nos assustamos. Nossos olhos se arregalaram com um choque crescente.
– Yeah, é melhor nós irmos para a festa antes que você invoque algum tipo de maldição antiga sobre nós. Você tem tido a pior das sortes ultimamente.
Capítulo 3
Eleanor pegou minha mão e nos levou até o portão principal de Braxton. Enquanto caminhavamos, contei a ela sobre as postagens incendiárias referentes ao nosso pai e sobre a sua misteriosa conversa ao telefone.
– Eu espero que esse blogueiro não apareça ou que não faça nada para envergonhar nosso pai hoje à noite. – Eleanor disse.
– Ele pode cuidar de si mesmo. – nós concordamos em não confrontá-lo sobre a ligação já que não era assunto nosso.
O campus de Braxton se estendia por duas partes da cidade, e era ligado por um charmoso e antigo teleférico que cobria a distância de um quilômetro. O sistema de transporte funcionava como um carrinho de aeroporto indo de terminal a terminal — saindo do Campus Norte a cada trinta minutos, para fazer a viagem de volta de um lado para o outro até o Campus Sul. Quando o clima cooperava, era uma caminhada de quinze minutos até o outro lado. As ruas estavam alinhadas por lojas exóticas, um bar acadêmico e os alojamentos para estudantes.
– Apesar dos principais prédios acadêmicos e dos dormitórios dos estudantes estarem no Campus Norte, eu sempre achei o Campus Sul mais idílico – eu disse. Além de abrigar os escritórios executivos e a cafeteria do campus, a The Big Beanery, o Campus Sul era também o lugar dos departamentos de música, humanas e comunicações. O Centro Recreativo Paddington e o Salão para Concertos Stanton eram as grandes atrações de entretenimento que me impediam de ficar entediado na época que fui um estudante.
Eleanor assentiu.
– Estou ansiosa pra ver o que nossa mãe andou fazendo hoje à noite. Ela pensou que seria uma boa ideia reorganizar todas as mesas no Salão para Concertos Stanton, para que todas encarassem o centro da sala. Até mesmo colocou uma pista de dança temporária e uma plataforma mais alta para os discursos.
Eleanor me contou sobre seu dia animado na Lanchonete Pick-Me-Up. O time de beisebol de Braxton causou um tumulto durante o horário de almoço.
– Foi estranho quando a equipe de líderes de torcida também apareceu. Eles deviam estar discutindo estratégias para vencer o jogo de abertura. – Eleanor disse.
– Ahhh, você ficou com ciúmes? Isso te impediu de ficar flertando com os jogadores? – estava com tudo hoje.
– Me poupe, Kellan. Nem mesmo o Técnico Oliver conseguiu controlá-los quando entregou as novas jaquetas para o time. As cores burgundy e azul marinho ficaram boas com o design. – Eleanor disse quando o teleférico chegou.
Eu supus que o motivo real, pelo qual a chegada do time havia incomodado Eleanor, havia sido porque os estudantes, sem muito dinheiro, eram conhecidos por não deixarem gorjeta. Quando todos os passageiros desembarcaram, nós embarcamos pela porta da frente. Eleanor e eu nos apertamos em dois bancos perto do fundo, cheio de postêres da Marvel. A cada ano, a turma de formandos oferecia um presente à faculdade para redesenhar o teleférico como sua marca de despedida de Braxton.
– Isso te traz alguma lembrança, homem-gladiador? – Eleanor perguntou.
Eu tenho vergonha de admitir que, na minha época, a minha turma havia escolhido o tema Esparta, já que o filme 300 havia acabado de ser lançado nos cinemas. Na cerimônia de revelação, eu havia sido forçado a vestir uma túnica extremamente curta e justa, enquanto segurava um escudo e lança de plástico. Quase morri de vergonha quando o tecido se rasgou no momento em que ajoelhei para tirar uma foto. Eu não tinha uma aparência tão boa quanto tenho agora.
Nós chegamos ao Salão para Concertos Stanton, nomeado em homenagem a Lavinia Stanton, uma anciã solteirona ancestral de Marcus Stanton, que havia deixado suas economias inteiras para Braxton no início do século XX. Eu fui cumprimentado por um segurança com grandes lábios, que escaneou minha carteira de habilitação, tirou minha foto e digitou alguns comandos em um teclado. Trinta segundos depois, ele me entregou minha carteira, e um cartão de identificação com vários códigos e símbolos.
– Será que você pode fazer a máquina explodir quando estiver fazendo o crachá da Eleanor? – eu disse para o segurança. Infelizmente, ele não me achou muito engraçado, e o processo finalizou sem nenhum problema.
A lista de convidados contava com duzentas pessoas entre colegas, membros da família e amigos. Conhecendo o gosto de Derek, Abby seria bem fácil de identificar no meio da multidão. Eu vasculhei pela sala pensando que poderia achá-la, mas ninguém combinava com minha descrição imaginária.
Minha mãe tinha se superado dessa vez. O salão havia sido transformado em uma atmosfera completa para festas, com autênticos meio-postes antigos de iluminação que foram transformados em mesas altas, onde as pessoas poderiam conversar e comer os inúmeros aperitivos, ornamentados carrinhos de bebida passavam pelo salão, carregados por garçons vestidos de branco e preto como pinguins, que serviam algum tipo de bebida azul borbulhante, e uma névoa fina aromatizada de jasmim caía do teto. Eleanor foi procurar nossos pais enquanto eu experimentava aquela mistura aquosa que todos pareciam estar gostando. Era um pouco azeda para meu gosto, mas eu podia entender o apelo.
Enquanto me misturava, eu encontrei um ex-professor de arte e apertei as mãos do Vereador Marcus Stanton — a mão dele estava tão pegajosa que eu nunca conseguiria me livrar de todo aquele suor. O aperto de mão também era muito fraco para um político. Não era de se imaginar porque Nana D tinha algo contra ele.
Quando percebi a vibração de uma mensagem de texto, eu esperava que fosse Abby dizendo que estava pronta pra me encontrar, mas era da minha filha, Emma. Ela havia voltado do vizinho e queria me dizer que me amava e sentia minha falta. Eu mandei um vídeo de um papai urso abraçando seu bebê. Era nossa maneira de nos abraçarmos quando não estavamos juntos. Ela era inteligente e intuitiva para a idade, e amava o nosso peculiar relacionamento. De seis para dezesseis era a melhor maneira de descrevê-la.
Antes de guardar o celular, eu mandei uma mensagem para a assistente do meu pai, perguntando onde ela estava se escondendo. Lorraine Candito havia sido a mão-direita do meu pai nos últimos vinte anos, incluindo tê-lo seguido quando ele deixou sua antiga posição na Faculdade Woodland, que ficava do outro lado do rio. Eu tinha certeza de que ela era o único motivo por eu receber cartões de aniversário pelo correio, ou pelos frequentes pacotes enviados por meu pai. Minha mãe era muito ocupada e tinha sua própria maneira de mostrar o quanto ela se importava, mas Lorraine era aquele tipo de tia com quem você sempre podia contar. Meu celular vibrou com a resposta dela:
Lorraine: Vamos nos encontrar depois do jantar. Preciso pegar seu presente. Eu o deixei na minha mesa.
Fiquei curioso com relação ao que ela queria dizer, e então eu me lembrei de algo relacionado a um presente quando eu estava aqui no Natal. Ela provavelmente havia me comprado algo com a nova logo de Braxton que Eleanor havia me falado. Eu respondi a mensagem com uma confirmação e vi meu pai se aproximando da pista de dança.
– Deixe-me apresentá-lo a alguém, Kellan. – ele começou a falar enquanto uma mulher com um cabelo meio grisalho, curto e espetado, se aproximava. O cabelo naturalmente preto dela havia começado a clarear e ao invés de tingi-los, ela havia aceitado o gracioso processo de envelhecimento. Eu a admirei, pois sabia que se a cor do meu cabelo começasse a mudar, eu seria o primeiro na fila do cabeleleiro. Apesar de seu cabelo chamar atenção, eram os seus lábios finos e olhar frio que focaram a minha atenção.
– Olá. – eu disse, estendendo minha mão para ela. Com sorte, o suor da mão do vereador já havia se dissipado, ou então ela teria seu próprio choque desagradrável. – É um prazer conhecê-la... Senhora... senhorita...
Meu pai continuou falando quando ela não respondeu.
– Essa é a Dra. Myriam Castle. Ela é professora no nosso departamento de comunicações e já está em Braxton há ... o que, três anos agora?
Enquanto ela assentia, eu senti a temperatura cair entre nós. Não era apenas o terno forte e firme moldado contra sua estrutura fina. A gola pontuda de sua camisa rosa cobria todo seu pescoço e tinha um pequeno broche de prata preso acima do primeiro botão. As linhas dos ombros, mangas e das pernas da calça eram tão afiadas quanto uma faca, mas os saltos pretos me convenceram de que ela não era uma garota sem sentido.
– Sim, três anos no começo desse último período. O que você está achando da festa que a faculdade pensou tão cuidadosamente em fazer para você? Deve ter custado uma boa soma de dinheiro, mas você é adorado por aqui pela sua... generosidade. – ela respondeu com uma acidez que só expemerimentamos quando comemos algo realmente azedo. – “Os maus constumes dos homens vivem no bronze; suas virtudes são escritas na água”.
Eu olhei dela para meu pai, esperando uma resposta inteligente e punitiva. Eu acreditava que ela havia citado Henrique VIII de Shakespeare em sua petulante escavação sobre virtudes. Será que poderia ser ela a blogueira que meu pai estava tão preocupado sobre? O tom ácido das palavras dela combinava com o perfil do vilão anônimo.
– Oh, Myriam, sempre a mais inteligente. Eu adoraria conversar, mas tenho que me preparar para meu discurso. Espero que você se divirta, apesar de isso não ser muito natural para você. – meu pai respondeu.
Enquanto ele se afastava, eu percebi uma careta se formando nos lábios dele. Talvez eu fosse me divertir nessa festa.
– Percebi que você usou de bastante ironia. Posso confiar que é tudo de bom humor.
– Wesley Ayrwick e eu temos um entendimento. Ele está ciente das minhas contribuições para a faculdade. Eu estou ciente de que ele vai ser iminentemente substituído. – quando um garçon passou, a Dra. Castle colocou seu copo vazio na bandeja e pegou um novo. – Então, como você conhece o nosso ótimo presidente? Você trabalha para a faculdade?
Foi naquele instante que eu percebi que ela não sabia que eu era filho dele. Eu pensei em deixar esse fato de fora pelo futuro imediato, para ver o que mais eu poderia saber dela.
– Sabe de uma coisa, eu não consigo me lembrar da primeira vez que nos encontramos. Foi há anos atrás, mas está tudo um pouco confuso, por algum motivo. Para responder a sua última questão, não, eu moro em Los Angeles e estou de volta à Braxton por alguns dias. – eu considerei minhas opções para estender a conversa sobre a opinião dela sobre meu pai, então percebi que deveria tirar vantagem das oportunidades que surgiam. Eu tinha pouco tempo antes que os discursos começassem. – Dra. Castle, você por acaso conhece uma Abby Monroe?
Minha nova amiga pigarreou e colocou os óculos na ponta do nariz.
– Minha noite continua ficando melhor. É por isso que você veio à festa? Você é um dos convidados da Monroe?
– Pelo contrário. Eu nunca me encontrei com essa mulher. Será que você pode apontá-la para mim? – eu podia dizer que a Dra. Myriam Castle era uma mulher expressiva. Todos os gestos dela eram exagerados, e suas palavras ofereciam dois ou até três significados. – Isso se você souber quem é ela.
– Eu tive o infeliz privilégio de encontrar Monroe várias vezes. Eu não sou o tipo de pessoas que empurra minhas opiniões para os outros, Sr.... – ela falou rápido antes de parar brevemente.
Ela esperava que eu dissesse meu sobrenome, mas era mais divertido deixá-la do lado mais curto do pavio.
– Oh, mas eu adoraria ouvir as suas opiniões. Por favor, sinta-se à vontade para dizer o que estiver em sua mente. – eu percebi um breve momento onde a Dra. Castle considerou minhas palavras, então viu meu pai subir no palco.
– Monroe acha que ela é muito importante e deixou claro para todo mundo em Braxton como conseguiu seu emprego. Eu pensaria que um jovem rapaz como você, que parece ser inteligente e experiente, vai facilmente reconhecer que o elevador não chega até o topo da cabeça daquela mulher. – enquanto ela se virava para se retirar, o microfone fez um som alto.
Eu achava engraçado como ela chamava aquela mulher de Monroe.
– Foi um prazer conhecê-la, Dra. Castle. Eu espero poder conversar novamente em breve, mas nós precisamos ir para o centro da pista. – eu estendi minha mão na direção do palco e observei a cabeça dela se erguer mais alguns centímetros e seu nariz se enrugar como se algum odor desagradável tivesse surgido.
– Confie em mim e fique longe dela. Enquanto você estiver na cidade, também tenha cuidado para não se associar demais aos Ayrwicks. Eles podem estar no topo agora, mas isso não vai durar muito, tenho confiança nisso.
Eu encolhi os ombros e segui na direção contrária. Espere só até eu contar para Eleanor e Nana D tudo sobre a Dra. Castle. Elas devem saber de alguma fofoca sobre a mulher. Eu precisava saber sobre o que era essa briga. Mandei uma mensagem de texto para Abby perguntando quando poderíamos nos encontrar.
O discurso do meu pai foi melhor do que eu esperava, assim como as palavras breves, mas memoráveis, ditas pelo Vereador Stanton. Talvez eu pudesse ignorar o frágil aperto de mão se suas habilidades verbais fossem um forte contrapeso. O jantar foi relativamente quieto. E saboroso. Frango condon bleu, arroz pilaf e aspargo cozido ao vapor. Vi um prato vegetariano em algumas mesas também. Eu devia os parabéns à minha mãe por se lembrar das necessidades e preferências das outras pessoas. Desde quando ela desenvolveu uma alergia a frutos do mar, ela começou a prestar muito mais atenção à escolha dos alimentos. Abby me respondeu que nós poderíamos nos encontrar no hall de entrada às nove horas, quando a festa acabasse.
Eu já havia tomado um daqueles drinks azuis borbulhantes e uma taça de champanhe, e agora estava parado ao lado de um bar portátil, contemplando um terceiro, quando minha irmã se aproximou pelas minhas costas.
– Advinhe com que eu acabei cruzando? – ela cantou em um tom estranho e jovial. – Não se vire. Eu vou te dar três chances.
Eu pensei ter conhecido todo mundo na festa, já que havia sido apresentado diversas vezes naquelas últimas horas, exceto é claro por Abby, a única pessoa que eu queria encontrar. Será que minha sorte poderia estar finalmente mudando?
– Hmmm... a Rainha? Meryl Streep? – ela era a minha atriz favorita. Um cara podia sonhar, não é mesmo? – Pink? – eu tinha uma queda por ela havia anos, ainda assim era altamente improvável que ela fosse aparecer para uma festa de aposentadoria. Agora que tinha acabado com minhas três chances, eu podia terminar com esse jogo tolo e me virar.
– Errado. É a Maggie Roarke. Você se lembra dela, não é mesmo? – Eleanor disse enquanto pulava como um tolo coelho da Páscoa.
Por um momento, pensei que o salão havia parado, e eu havia sido transportado para uma década antes. Até mesmo a música tocando ao fundo me fazia sentir como se tivesse voltado no tempo e estava sentado em um sofá grande e confortável na The Big Beanery com Maggie, ouvindo Michael Bublé cantar enquanto nós bebíamos cappuccinos e comíamos biscoitos. Eu não via minha melhor amiga e ex-namorada desde a semana anterior à nossa graduação da faculdade, quando havíamos rompido.
– Maggie, eu não consigo acreditar que não notei você mais cedo. Você está... você está... – eu queria dizer fantástica e maravilhosa, mas depois de dez anos, isso nao parecia apropriado.
– Eu estou bonita, Kellan. Está tudo bem, você pode dizer isso. – seu cabelo castanho liso e luxurioso estava puxado para um lado. Havia um brilho radiante que a deixava mais atraente hoje do que quando nós tinhamos vinte e poucos anos. Ela parecia confiante e forte, traços que sempre quis encontrar dentro de si mesma, mas que havia tido dificuldades no passado. – Você está tão bonito como sempre.
Eu me inclinei para abraçá-la, mas nossos rostos se encontraram e o instinto tomou a frente. Antes que eu percebesse, eu havia beijado sua bochecha e senti meu corpo ser inundado com um calor incomum, mas ainda assim familiar. A pele de alabastro brilhava e os olhos castanhos olhavam de volta para mim, fazendo com que ela se parecesse com uma estátua ou uma elegante peça de porcelana.
– Me desculpe, foi uma surpresa encontrar você. Uma surpresa bem vinda.
Eleanor deu uma desculpa, talvez ao perceber que ela devesse nos dar um momento às sós.
– Oh, lá está nossa mãe. Eu estava procurando por ela. Volto já. – enquanto ela se afastava, eu senti uma pequena beliscada em minha cintura, e sabia que ela havia planejado todo o esquema. Provavelmente era uma retaliação aos meus comentários anteriores sobre a bola de cristal dela para advinhar o futuro. Um ponto para Eleanor hoje à noite, pelo menos ela estava no time jogador.
– Eu concordo. – Maggie respondeu. – Você deve estar bem animado que seu pai está se aposentando. Sua mãe vai se aposentar em seguida? Eles deveriam viajar pelo mundo depois de terem trabalhado tão duro em Braxton. Eu vou sentir falta de vê-los.
Maggie e eu havíamos nos separado quando escolhemos diferentes faculdades para cursar a pós-graduação. Nós tentamos manter uma amizade, mas acho que ambos estávamos secretamente chateados um com o outro por não tentarmos fazer o relacionamento à distância funcionar. Trocamos alguns emails naquele verão, mas assim que ela foi para Boston, toda a comunicação havia parado. De repente, eu me lembrei do que ela disse sobre sentir falta dos meus pais.
– Não me entenda mal, é ótimo vê-la novamente, mas o que te trouxe para a festa, Maggie?
– Oh, você não sabe? Eu comecei a trabalhar nesse semestre em Braxton. Eu sou a nova bibliotecária-chefe. Voltei de Boston recentemente quando perdi meu emprego. Você se lembra da Sra. O’Malley? – Maggie sinalizou que o som estava muito alto perto das outras pessoas. Nós nos afastamos para um canto.
A Sra. O’Malley havia sido a bibliotecária-chefe por mais de trinta anos quando nós frequentávamos Braxton — uma figura que conhecia tudo e todos no campus. Uma vez ela havia flagrado eu e Maggie nos beijando atrás de uma máquina de micro-fichas e ao invés de nos repreender pela intimidade em locais públicos, ela nos envergonhou por termos escolhido a máquina mais velha do prédio como nosso local de encontros românticos. Eu me lembro dela nos contando quando ela foi inteligente o bastante para levar o Sr. Nickels, o engenheiro do teleférico, até a seção de referências no andar debaixo, aonde ninguém nunca ia. Imagine uma mulher apaixonada, de sessenta e poucos anos, apontando o dedo para dois veteranos da faculdade por causa daquilo.
– Eu não havia pensando nela há tanto tempo. Acho que ela deve ter se aposentado. – eu disse. Eu não sou um caçador de vovós, mas sentia uma estranha atração pela Sra. O’Malley depois que ela havia nos contado sobre o seu caso ilícito.
– No último outono eu recebi uma ligação muito estranha dela. Nós havíamos mantido contato nos últimos anos, e ela queria que eu soubesse dos seus planos para deixar Braxton. A Sra. O’Malley foi o primeiro motivo pelo qual eu consegui meus diplomas avançados adiantados em estudos bibliotecários e entrei nessa profissão. Ela me convidou para voltar um final de semana e conversar sobre as mudanças acontecendo na Biblioteca Memorial, então fez com que eu encontrasse com seu pai para discutir a posição. Três semanas mais tarde, eu dei aviso prévio no meu emprego em Boston e voltei para casa.
Eu não conseguia acreditar no quanto a Maggie havia mudado. O pequeno rato que eu havia conhecido havia ido embora, e bem, se eu for honesto, que eu adorava. Eu sempre me perguntava o que poderia ter acontecido se eu e Maggie tivessemos tomado uma decisão diferente naquele dia.
– Isso é ótimo. Eu estou animado e também um pouco chocado por meu pai nunca ter mencionado isso pra mim.
– Ou a sua mãe. Eu e ela nos encontramos para tomar um café algumas vezes durante a semana, quando eu posso tirar um tempo da biblioteca ou quando ela precisa ir para longe dos potenciais estudantes pressionando-a para conseguir uma vaga. – Maggie tirou uma mecha de cabelo de seu rosto belo e macio. – Você não sabe sobre a nossa caminhada semanal do Campus Sul para o Norte junto à Alameda dos Milionários?
Atrás da rua principal entre os dois campus, havia grandes casas onde famílias como os Stantons, Greys e Paddingtons moravam. Ela havia sido apelidada de Alameda dos Milionários há muito tempo atrás e era a principal atração em Braxton para visitantes e novos estudantes que gostariam de saber da história da riqueza da cidade.
Eu sacudi minha cabeça.
– Eu vou perguntar sobre isso mais tarde à noite. Agora que sei que você voltou para Braxton, talvez nós pudessemos tomar um café. Eu vou ficar na cidade por uma semana, talvez mais. – nós conversamos sobre o que havia acontecido com nós dois na última década, e descobri que ela havia ficado viúva quando seu marido havia morrido tragicamente por causa de um aneurisma há alguns anos atrás. Meu coração ficou pesado por ela ter passado pela devastante perda de um marido, mas também foi um momento onde nossa conexão floresceu como quando nós namorávamos na faculdade. Foi naquele instante que eu tive uma sensação de segurança sobre o futuro novamente, quase como se ao reestabelecer a amizade com Maggie pudesse me ajudar a encontrar uma maneira de seguir adiante.
Eu olhei em direção ao salão onde a assistente do meu pai entrava. Mesmo a essa distância parecia que tinha algo errado. O vestido azul de Lorraine estava levemente desarrumado, e seus olhos disparavam ao redor. Ela estava claramente agitada e procurando por alguém. Com a distração, eu não entendi a resposta que Maggie me deu.
– Kellan, onde você foi? – ela perguntou enquanto cutucava meu ombro. – É claro, eu adoraria te encontrar na The Big Beanery para passarmos mais tempo colocando a conversa em dia. Emma parece adorável.
Meu olhar se voltou para Maggie, e eu sorri.
– Nós devemos fazer isso. Definitivamente. – eu dei a ela o número do meu celular. – Você conhece a assistente do meu pai, Lorraine?
Maggie assentiu.
– Sim, ela é tão adorável. Eu me pergunto se ela está planejando se aposentar agora que seu pai vai deixar Braxton ao fim do semestre.
Ocorreu-me que eu não conseguia me lembrar de meu pai comentando qualquer coisa sobre os planos futuros dela.
– Ela está vindo para cá e parece um pouco agitada. Eu espero que a comida não esteja fazendo mal às pessoas.
Maggie e eu nos viramos em direção à entrada e esperamos pela chegada de Lorraine. Eu falei primeiro.
– Lorraine, é maravilhoso encontrá-la. Está tudo bem?
– Seu pai ... o corpo... – Lorraine lutou para falar, e então caiu ao chão.
Capítulo 4
Enquanto eu segurava o braço esquerdo de Lorraine, Maggie a ajudou a se apoiar em uma mesa.
– O que aconteceu? Você está doente? – eu estava preocupado que ela pudesse estar tendo um derrame ou infarto. Ela estava praticamente catatônica.
– Eu temo que seu pai ... você viu eeellleee? – a respiração dela ficou mais forçada, e um olhar de terror tomou conta de seu rosto. Apesar da pele dela ser geralmente bem pálida, ela estava quase transluzente.
O que ela quis dizer com o corpo? Ela havia envelhecido quase dez anos nesses poucos minutos. Peguei meu celular e apertei um botão para ligar para meu pai.
– O que está acontecendo, Lorraine? – Maggie havia se afastado e voltava com um copo de água. As pessoas estavam começando a deixar a festa. Meu celular mostrava que eram exatamente nove horas. A ligação caiu na caixa de mensagens. Não deixei uma mensagem, já que não tinha ideia do que dizer.
– Eu vi... hmmm... alguém precisa... ir conferir... – ela apontou pela janela e cobriu a boca. Expressões exageradas marcavam muitas rugas na testa dela. – Me desculpe... é um choque tão grande.
– O que? – eu comecei a ficar com mais medo do que ela podia ter visto. – Aconteceu alguma coisa com meu pai?
Maggie acariciava as costas de Lorraine tentando confortá-la em seu pânico.
– Fale conosco.
Lorraine terminou de beber o restante da água.
– Eu voltei para o escritório para buscar o seu presente de Natal. Era tão adorável, e... mas então eu...
Eu assenti.
– Isso foi muito gentil, obrigado. Mas certamente não é por isso que você está tão chateada. – eu não tinha ideia do que a tinha feito ficar naquele estado. – E quanto ao meu pai?
– Eu não consegui encontrá-lo, é por isso que vim até você. Fui até a porta dos fundos... perto da minha mesa... trabalhando lá temporariamente... terminar toda a reforma. – Lorraine fez uma pausa e soltou um suspiro. Seus olhos castanhos estavam arregalados de pânico. – Eu peguei a chave para destrancá-la... vi que ela estava parcialmente aberta.
Eu não tinha certeza do que ela queria dizer com estar temporariamente trabalhando em outro lugar, mas não queria interromper a linha de pensamento dela.
– Okay. Você entrou lá?
– Não, eu não pude. Eu tentei empurrar a porta para abri-la... ela não cedeu. Apenas se moveu cerca de dois centímetros... a abertura não era suficiente para colocar minha cabeça para dentro. Foi então que eu corri para frente do prédio... usei a entrada principal.
– Continue falando, nos conte tudo o que aconteceu. – Maggie disse, então me olhou com um olhar confuso.
Lorraine começou a se recompor.
– Eu cruzei o hall indo em direção aos fundos do prédio. Eu pensei que talvez pudesse abrir a outra porta que levava para a escadaria pelo lado de dentro, mas ela também não se moveu. Havia algo no patamar que impedia ambas as portas de serem abertas.
– Certo. É um espaço pequeno, duas pessoas não podem abrir as duas portas ao mesmo tempo, pois ambas abrem para dentro. – Maggie respondeu. – E então?
Lorraine explicou como ela havia ido até o segundo andar para olhar a escadaria e tentar ver o que estava do outro lado das portas. Enquanto ela dolorosamente nos contava todos os detalhes, provavelmente ela estava sofrendo de ansiedade ou choque com o que havia visto, eu não conseguia não me perguntar o porquê de meu pai ter saído da festa. Será que ele havia ido se encontrar com alguém? Por que ele não atendia minhas ligações? Será que realmente havia um corpo?
– Alguém caiu nas escadas. Eu pude ver o sangue. Eu aaachoo que ele pode ter batido a cabeça. Pode estar mortooo. – Lorraine disse com um tremor.
Maggie abafou um grito. Seu corpo se contorcia com a tensão. Ela estava se apoiando em mim enquanto tentávamos confortar Lorraine.
– E quem era? – ela perguntou.
Os olhos de Lorraine ficaram ainda mais arregalados.
– Eu fiquei com muito medo de descer e ir olhar. Será que vocês poderiam ir conferir no prédio ao lado?
Maggie disse que ela ficaria e tomaria conta de Lorraine enquanto eu ia ao outro prédio. Meu estômago era um buraco por causa do medo de que algo horrível tivesse acontecido com meu pai.
– Não, eu tenho que ir com você. – Lorraine sussurrou. – Eu tranquei a porta da frente depois que saí. Eu... eu... não sabia o que fazer e então vim correndo para cá.
Eu esperava que Lorraine tivesse apenas tomado vários daqueles drinks azuis borbulhantes, ou que ela estivesse imaginando coisas no escuro, mas minha intuição me dizia que ela estava genuinamente assustada por causa de algo real. Meu encontro com Abby teria que esperar mais um pouco para acontecer. Eu instiguei as senhoras a correr mais rápido, de tão ansioso que eu estava para ver se algo havia acontecido com meu pai ou com alguma outra pessoa.
– Eu estou indo o mais rápido que posso. – Lorraine comentou.
Eu podia sentir o peso em meu peito e uma dor aguda em meu estômago. Por favor, que não seja meu pai. Eu não estou pronto para ele ficar doente ou morrer.
Quando Maggie, Lorraine e eu chegamos ao prédio, ficou claro para mim que ela estava se referindo ao Hall Diamante, onde eu havia passado várias horas participando de palestras sobre literatura, arte e meios de comunicação. Eu não havia percebido que quando Lorraine disse o prédio ao lado, ela queria mesmo dizer o prédio ao lado do Salão para Concertos Stanton. O escritório de meu pai ficava no prédio mais longe, perto da estação do teleférico Será que ele havia se machucado? Ele iria ficar bem? Será que aquela ligação que eu havia escutado na noite passada era realmente tão séria?
O Hall Diamante era uma mansão no estilo colonial antigo que havia sido convertida em várias salas de aula e escritórios dos departamentos, algumas décadas antes. A fachada de pedra calcária, retirada da pedreira local Betscha nos anos de 1870, cobria todos os três andares do edifício impressivo. A entrada principal era bem cuidada, com um caminho sinuoso de ardósia, possuía venezianas de cor de vinho adornando grandes janelas cruzadas de treliça e arbustos gigantes de rododendro crescendo nos jardins da frente. No primeiro andar havia quatro grandes salas de aula, cada uma com capacidade para trinta alunos, dois banheiros individuais, e um pequeno armário de suprimentos. Na entrada principal havia uma escadaria localizada entre duas paredes centrais que levava os visitantes para os andares superiores, e na parede dos fundos havia outra escadaria menor — que anteriormente servia de acesso aos empregados — e que permitia acesso direto dos professores aos seus escritórios sem terem que passar pela área principal com as salas de aula.
– Mostre-me exatamente onde você acha que viu um corpo, Lorraine. – eu a instruí com um tremor crescente em minha voz. – Nós deveríamos ligar para a polícia, mas eu gostaria de verificar o que você viu antes que nós...
– É um corpo. Eu sei o que vi, Kellan. – Lorraine respondeu. Sua voz estava muito mais calma depois de ter conseguido contar o que havia visto. – Sigam-me.
Nós todos corremos para o segundo andar, onde havia dez ou doze escritórios com formatos irregulares — tipicamente o centro de discussão de vários professores bem vocais dizendo que mereciam um espaço maior. Enquanto não havia uma escadaria levando ao terceiro andar saindo dos fundos do prédio, havia uma escada estreita na frente que levava a uma aconchegante biblioteca e a uma área aberta para os estudantes trabalharem em grupos ou professores fazerem alguma atividade especial de tempos em tempos. Baseado no que Lorraine havia me contado enquanto caminhávamos, meu pai tomou conta do terceiro andar durante as reformas em seu escritório. Devido ao andar superior ser grande o bastante apenas para seus móveis, por causa do teto inclinado e das estantes embutidas da biblioteca, Lorraine ficava sentada na área central aberta no segundo andar, entre as duas escadarias.
Meu estômago se revirava de dor. Havia uma boa chance de que meu pai pudesse estar no fim das escadas. Nós cruzamos pelo segundo andar, passando pela mesa de Lorraine e olhamos para a porta que dava para a escada dos fundos se movendo em vaí e vem.
– Você a deixou aberta? – eu perguntei.
Ela sacudiu a cabeça.
– Eu pensei tê-la fechado, mas talvez eu tenha saído correndo e não prestei atenção. O corpo está lá dentro. Você tem que entrar no vestíbulo e olhar para baixo e para direita.
Eu havia visto alguns cadáveres antes. Isso nunca havia me incomodado até o dia que fui chamado ao mortuário para verificar a identidade de Francesca, no dia de Ação de Graças. Eu ainda me lembro dos poucos minutos antes que eles levantassem o lençol. No fim, eu não consegui fazer aquilo e saí daquela sala fria, grato ao meu sogro por tomar a responsabilidade de identificar o corpo dela. Eu tinha que ser corajoso e determinar se Lorraine estava ficando louca ou se havia alguma verdade no que ela dizia ter visto. Entrei no vestíbulo na ponta dos pés e com meus olhos fechados, me virei para a direita, e senti uma fraqueza. Inclinei minha cabeça em um ângulo que pensei que iria se alinhar com o patamar no fundo, e então abri meus olhos.
A maneira como o corpo estava no chão e todo contorcido era a parte mais terrível. As duas pernas estavam dobradas debaixo da parte superior da pessoa, e a cabeça estava presa entre o que parecia ser dois braços e mãos retorcidos. Foi então que deixei escapar um suspiro de alívio. Não era o meu pai. Era a mulher que eu havia visto do lado de fora da biblioteca falando ao telefone enquanto eu esperava pela minha irmã.
Eu acho que eu havia ficado em silêncio durante tempo demais. Maggie falou em uma voz alta e aguda:
– O que está acontecendo, Kellan?
Eu espiei pelo canto da parede e vi Maggie e Lorraine abaladas e de mãos juntas.
– Sim, tem alguém ali embaixo. Eu não consigo saber se ela está respirando.
– Por favor, Kellan, vá checar isso. Ela pode estar machucada. – Lorraine me implorou enquanto mexia sem parar em seus braceletes.
Eu assenti para elas e comecei a descer os degraus. Algo me dizia que quem quer que fosse aquela pessoa lá embaixo, ela já havia partido. Quando cheguei ao patamar inferior, não havia muito espaço para eu me mover por ali, mas consegui esticar minha mão trêmula para tocar o pescoço da mulher.
– Ela está viva? Devo ligar para a emergência? – Maggie perguntou.
– Não, eu acho que ela está morta. Não sinto pulso, mas nós precisamos ligar para eles de qualquer forma. – eu respondi.
Lorraine gritou de volta para mim.
– Eu estou descendo. Sinto-me bem o bastante para ajudar.
Eu podia ouvir Maggie ligando para a linha de emergência e explicando a situação pelo viva-voz. Quando Lorraine chegou ao último degrau e ficou parada a poucos centímetros de mim, ela agarrou meu cotovelo.
– Será que você pode virar a cabeça dela? Eu acho que sei quem ela é.
– Eu não acho que isso seja uma boa ideia, Lorraine. Se ela ainda está viva podemos acabar causando algum dano à coluna espinhal. – essa não era a noite que estava esperando. Eu queria algo melhor do que uma festa chata onde ficaria escutando discursos e encontraria os amigos e colegas insípidos de meu pai, mas não, ter que lidar com um cadáver.
Lorraine se inclinou por cima dos meus ombros. Eu a avisei para evitar a mancha de sangue nos degraus. A mulher devia ter batido com força seu crânio quando caiu, por isso estava sangrando daquele jeito. Quando eu pensei que Lorraine iria se afastar, ela arquejou.
– Ai meu Deus! Eu realmente a conheço.
Eu não estava com vontade de confortar alguém pela morte de outra pessoa, especialmente se elas eram próximas. Eu meramente queria dar o meu depoimento e sair dali para encontrar-me com Eleanor.
– Hmm, quem você acha que ela é, Lorraine?
– É a Abby Monroe. – Lorraine guinchou, com uma série de choros de “Não pode ser, não poder ser”.
Maggie gritou para nós do topo da escadaria.
– A ambulância está a caminho. Eu acho que a polícia também. Eu deveria ligar para Connor.
Quando a ouvi falar Connor, meu pensamento imediato foi sobre meu outro antigo melhor amigo e irmão de fraternidade, Connor Hawkins. Ele e eu havíamos parado de conversar mais ou menos quando nos formamos, há dez anos.
– Espere Maggie. Lorraine acha que ela sabe quem é essa mulher. – a noite estava ficando bizarra com todas essas coincidências.
– Sim, eu tenho certeza. Eu não podia dizer quando estava lá em cima, mas eu a vi anteriormente na festa vestindo essa mesma roupa. A Reitora Terry havia apontado como aquela blusa azul safira combinava bem com os olhos dela. E aquela saia, Abby sempre vestia saia-lápis. – Lorraine disse, mexendo nervosamente em seus cachos loiros.
– Você tem certeza? Eu estive procurando por Abby Monroe durante toda a noite. – eu disse.
Lorraine ficou em pé e sacudiu a cabeça. Baseado na expressão peculiar de seu rosto pálido, minha fala a havia deixado confusa.
– Por que você iria se encontrar com ela? Talvez nós devessemos esperar pelos policiais lá em cima. Eu me sinto um pouco estranha ficando tão perto de... você sabe... hmm...
– Do corpo? – eu respondi, encolhendo os ombros. As coisas não estavam indo muito bem desde minha volta à Braxton. – Eu vou explicar mais tarde sobre o porquê de eu querer me encontrar com ela. – enquanto nós subíamos as escadas, Lorraine me deu um sorriso estranho de volta.
Quando nós chegamos, Maggie colocou uma mão na testa.
– Connor vai estar aqui a qualquer minuto. Ele havia acabado de ir à festa de aposentadoria para cumprimentar seu pai.
– Hmm, quem é esse Connor? – pelo número de vezes que eu já havia sido surpreendido naquela noite, com Maggie retornando à Braxton, descobrir Abby nos fundos de uma escadaria, e conhecer a peculiar Myriam Castle, eu tinha uma forte impressão de que o Connor de Maggie seria o nosso Connor de anos atrás.
– Connor Hawkins. Será que você não se lembra de ninguém, Kellan? – ela me deu uma resposta afiada. O drama da descoberta de um corpo estava fazendo com que todos ficassem irritáveis e de pavio curto.
– Será que eu escutei meu nome? – uma voz profunda ecoou pelo corredor. Um homem de pele escura e um pouco mais alto que eu, passou pela área central da administração e abraçou Maggie. Eles sussuraram algo e compartilharam uma conexão íntima.
Sim, era o mesmo Connor. Mas também era um Connor extraordinariamente diferente. Esse Connor, obviamente passava seu dia fazendo exercícios na academia ou tomando esteroides.
– É realmente você? – eu perguntei em confusão, olhando dele para a escadaria que escondia o corpo sem vida de Abby.
– Kellan, o que você está fazendo aqui? – ele respondeu enrugando a testa e inclinando a cabeça para o lado.
– Bem, yeah, isso parece um pouco óbvio já que é a festa de aposentadoria do meu pai. – eu não tinha a intenção de soar como um idiota, mas estava um pouco abalado com tudo o que acontecia naquela noite.
– Eu sei disso, Kellan. Eu quis dizer aqui no Hall Diamante. – Connor disse com um tom autoritário.
Tudo o que eu podia pensar era sobre uma sensação desesperadora de perda ao meu redor. Connor, Maggie e eu havíamos sido inseparáveis durante a faculdade. Quando Maggie e eu terminamos, ele ficou do lado dela e me disse o quanto eu era estúpido por deixá-la partir. Eu e ele também perdemos contato naquele verão. Eu não conseguia me lembrar de alguma vez ficar sabendo sobre o que aconteceu com ele depois de Braxton.
Eu respondi:
– Lorraine encontrou o corpo e foi procurar por ajuda. Eu acho que fui a pessoa mais próxima que ela conseguiu encontrar. – visões dos últimos momentos de Francesca invadiam minha mente. Eu não conseguia pensar direito.
Connor estava agora parado a alguns centímetros de Maggie e Lorraine. Ele parecia desconfortável em seu terno claro e a gravata listrada de Braxton, mas era um contraste poderoso contra sua pele da cor de cacau. A mãe dele era do Caribe, e seu pai um marinheiro sul-africano que estava de licença da marinha quando eles se conheceram. Connor havia herdado as melhores qualidades de ambos e sempre foi considerado charmoso e bonito pelas garotas, que se derretiam toda vez que ouviam seu sotaque. Nos tempos da faculdade, ele havia estado em forma, mas agora ele podia se passar como um gêmeo de Adonis.
– Eu não consigo acreditar que você está aqui. E Abby está lá. Como isso ...
Maggie bateu seu pé e se colocou no meio da conversa.
– Apesar de ter certeza de que vocês dois querem colocar a conversa em dia, talvez o diretor de segurança de Braxton possa dar uma olhada rápida no corpo que está lá, parado no fim das escadas?
– É a Abby Monroe, a chefe do departamento de comunicações. – Lorraine disse.
– Eu vou lá olhar. Você tem certeza de que ela está morta? – Connor disse com um olhar fixo.
Eu assenti.
– Certeza. Você é um guarda de segurança agora?
– Não, ele é o diretor de segurança que seu pai contratou para a faculdade. Você também não sabia disso? – Maggie disparou. O choque estava começando a nos sufocar.
Eu mordi minha língua e engoli meu orgulho ao mesmo tempo. Meus pais tinham algumas coisas para me explicar.
– Vamos deixar isso pra outra hora. Será que ela tropeçou e bateu com a cabeça? – ninguém me respondeu. Enquanto Connor descia os degraus, eu me voltei para Lorraine. – Você está bem? Você conhecia bem a Abby?
Antes que ela pudesse responder, outras duas pessoas caminhavam pelo espaço do escritório no segundo andar.
– Olá, eu sou Maggie Roarke. Vocês chegaram rápido.
Uma mulher familiar, loira e com trinta e poucos anos, vestida com calças jeans escuras, um casaco de tweed e botas padrão para patrulhas, respondeu:
– Eu sou a Xerife Montague. Nós recebemos uma ligação sobre alguém ter caído das escadas? – ela se virou para seu colega, um policial com um corte de cabelo militar, um nariz enorme que deve ter sido quebrado várias vezes, e um par de abafadores de ouvido. – Esse é o Policial Flatman.
– Eu estou no andar inferior, Xerife Montague. – Connor gritou.
Enquanto os dois recém-chegados seguiam a voz de Connor até o corpo para discutirem a situação, eu pensei sobre o que a morte de Abby significaria para os planos de Derek para a segunda temporada do Realidade Sombria. Eu deveria ligar para ele agora mesmo, mas não tinha outra informação a não ser que ela havia morrido. Então, tentei ligar para meu pai, mas ele não atendeu a ligação de novo. Liguei então para minha mãe.
– Kellan, eu estive procurando por você na última hora. Por favor, não me diga que você já foi embora. – minha mãe falou com uma voz aguda. Ela deveria ser uma atriz, ao invés de ser a diretora de admissões de Braxton.
– Não, eu estou... do lado de fora. Por acaso o pai está por perto? Eu preciso falar com ele sobre algo... importante. – eu não queria alarmar minha mãe devido a ela já estar bastante agitada desde que eu havia chegado em casa.
– Eu mesma estou procurando por ele, mas ele foi chamado para uma reunião urgente e disse que me encontraria em algum momento. Você conhece seu pai, mesmo prestes a se aposentar, ainda se sente na obrigação de ser um workaholic.
Eu murmurei alguma coisa para minha mãe, fazendo-me soar como se concordasse com ela e lhe disse que voltaria à festa assim que possível. Eu me voltei para Maggie e Lorraine para ver o que elas estavam fazendo. Lorraine conversava com alguém ao telefone, mas eu não consegui determinar com quem. Era algo sobre retornar a ligação com urgência naquela noite para discutir sobre o que ela havia encontrado.
Maggie estava sentada em uma cadeira no lado oposto da mesa de Lorraine e brincava distraída com sua orelha. Ela sempre havia feito isso quando estava nervosa ou preocupada com alguma coisa vital.
– É horrível saber que ela caiu nas escadas, e ninguém estava lá para ajudá-la. Eu espero que ela não tenha sentido dor.
Eu desejava o mesmo. Estava prestes a colocar meus braços em volta de Maggie quando Connor voltou a entrar na sala.
– Okay, então a Xerife Montague pediu para nenhum dos três deixar esse local por enquanto. Ela tem algumas perguntas sobre a ordem dos eventos de hoje à noite, mas ainda está examinando o corpo. Definitivamente é Abby Monroe. Eu a vi saindo do Salão para Concertos Stanton mais cedo nessa noite, cerca de oito e quinze, enquanto estava fazendo minha ronda noturna pelo campus.
Lorraine terminou sua ligação telefônica.
– Ela está realmente... morta? – um rastro de máscara de cílios manchava sua bochecha.
Connor assentiu.
– Sim, Srta. Candito. O médico legista vai chegar em poucos minutos, mas eu diria que ela está morta a pelo menos uma hora. Eu já vi vários desses casos antes.
A resposta de Connor me deixou curioso sobre o que ele fez nos últimos dez anos. O que havia entre ele e Maggie? Minha concentração quebrou quando Lorraine começou a chorar. Maggie se aproximou para confortá-la.
Connor veio em minha direção. Eu não sabia se pegava seus dedos usando nosso cumprimento secreto da fraternidade ou se apenas ficava parado lá em silêncio. Fiquei grato quando ele fez o primeiro movimento — um aperto de mão normal, nenhum aperto duplo com soco como nos velhos tempos.
– Que maneira de nos encontrarmos novamente que foi hoje, não é mesmo?
– Yeah, isso parece um pesadelo. Isso com um professor caindo nas escadas e morrendo. – eu disse.
Connor esfregou suas têmporas.
– Trágico, mas é pior do que isso. Não foi apenas uma queda nas escadas.
Eu pensei ter ouvido mal meu antigo melhor amigo, mas sua expressão em pânico revelou que eu não havia.
– O que você quer dizer? Como qualquer coisa pode ser pior do que a morte?
– Não foi um acidente. – Connor me encarou, pesando sobre o que deveria ou não revelar.
Meus olhos se arregalaram como os de um veado pego pelas luzes de um farol.
– Você acha que ela tentou se matar? – eu perguntei me sentindo burro e tolo pela pergunta, mas eu mal sabia qualquer coisa sobre a mulher. Se ela havia saído com Derek, havia uma boa chance de que ela não era muito certa da cabeça.
– Não, não é isso que eu quis dizer. A Xerife Montague não iria querer que eu dissesse isso, mas o sangue no chão vem de um corte profundo atrás da orelha de Abby. Havia algumas farpas de metal presas ao cabelo dela no meio da ferida.
– Isso não poderia ser de quando ela bateu nos degraus? – eu perguntei, olhando ao redor da sala com nenhum motivo além da tensão de estar perto de outro cadáver.
– Não. Ela tem um calombo gigante na frente da cabeça onde bateu nos degraus. A ferida na parte de trás foi um golpe muito mais forte. Além disso, não há nada nos degraus ou no chão que tenha alguma parte de metal. É tudo feito de mármore sólido. Eu estou bastante certo de que nós estamos olhando para um assassinato essa noite, Kellan.
Capítulo 5
– Talvez seu velho pai tenha tirado seu disfarce e matado a mulher maldosa? – Nana D disse enquanto eu comia uma garfada de torta de cereja com minha boca cheia de saliva. Por causa dos policiais terem me mantido no campus até às duas da manhã, eu tinha dormido quase nada. Fiquei surpreso de ter conseguido chegar ao Rancho Danby a tempo.
– Meu pai, o presidente assassino de Braxton! No canal de notícias do Condado de Wharton às onze horas. – eu disparei entre as mordidas com uma grande risada. Nana D pegava no pé do meu pai desde que eu conseguia me lembrar, mas ela também era igualmente ácida com minha mãe, sua própria filha. – Mas você não deveria saber que foi assassinato. Eu não acho que a Xerife Montague queira que as pessoas saibam.
– Escute aqui, eu sei de tudo o que acontece nessa cidade. Eu sabia antes de você que isso era assassinato. – minha avó de um metro e meio de altura provocou enquanto colocava outro pedaço de torta em meu prato. – Coma tudo.
– Como isso é possível? – será que ela me dizia que ela tinha habilidades psíquicas como minha irmã? Tudo o que precisávamos eram duas delas na família. Talvez elas pudessem ter seu próprio show, como o Médium de Long Island!
– Eu tenho meus meios. Tudo parte do meu plano maior. Ficar atenta às notícias, ficar conectada para ouvir todas as fofocas, ou descobrir o que está acontecendo pela cidade. – Nana D bebericou seu café enquanto prendia sua longa trança de quase um metro de comprimento, em um coque no topo da cabeça. Ela variava entre usar suas mechas vermelhas soltas ou amarrá-las em uma trança acima da cabeça, dependendo das suas atividades para o dia. Ele devia ser tingido, mas o palpite de Eleanor era que ela usava henna.
– Por que você a chamou de mulher maldosa? – eu perguntei, me lembrando da conversa que havia escutado sobre as notas de um estudante, quando Abby havia estado a poucos centímetros de mim na noite anterior.
– Eu nunca me importei muito com aquela mulher rude. Do tipo sorrateira. Ela me incomodou por causa do preço de um alqueire de maçãs. Eu aposto que ela encheu os bolsos no mercado dos fazendeiros na semana passada.
Nana D adorava fofocar e dava o melhor que podia para descobrir os segredos de todo mundo. Eu não sabia como ela fazia isso, ou quem ela subornava, mas se havia alguma informação para ser descoberta, Nana D era a primeira da fila.
Ela era como a Mata Hari[1] das Américas, eu até tinha certeza de que ela sabia dançar. Nana D havia empurrado suas fronteiras desde que minha mãe a pressionou a pegar uma semi-aposentadoria do Rancho Danby, ao invés de administrá-lo sozinha. Na época da colheita, a fazenda era o negócio mais produtivo e gerador de renda de todo o condado, mas conforme a indústria mudou e os custos de manutenção aumentaram, ela vendeu parte para uma empresa imobiliária, que por sua vez construiu o Willow Trees, um complexo residencial para cidadãos da terceira idade. Com a nova liberdade em mãos, minha avó tinha tomado o papel de cão-de-guarda da comunidade, se assegurando de que todos ficassem na linha. Eu juro que ela carregava uma arma de choque, algumas vezes só pra assistir as pessoas dançando para seu próprio deleite.
– Assassinatos são coisas engraçadas, Kellan. Algumas vezes ele é premeditado, mas então, existe aquele assassinato do calor-do-momento quando você não consegue controlar suas emoções. Eu pensei em matar o seu avô algumas vezes. Passar com o trator por cima dele ou apunhalá-lo com o forcado enquanto arrumava o feno. Mas no fim, ia ser sempre uma grande bagunça pra limpar, então deixei ele vivo. – ela pegou um pedaço da massa da torta e mergulhou no recheio. – Hmm, eu me superei novamente.
Ela nunca havia realmente pensado em matar meu avô. Eles haviam sido namorados desde que se apaixonaram aos treze anos em um cinema drive-in.
– Foi muito gentil de sua parte não matá-lo. Eu teria sentido falta de passar todos aqueles verões com o vovô, se você o tivesse matado antes que ele tivesse aquele ataque do coração.
– Eu sinto falta daquele homem delicioso todos os dias. As coisas que ele podia fazer com meu corpo apenas piscando para mim. Eu já te contei daquela vez que ele...
– Pode parar, Nana D. Eu não quero ouvir isso. – eu disse enquanto soltava o garfo para tampar meus ouvidos antes que eles sangrassem incontrolavelmente. – E quanto a Abby?
– É isso que está errado com vocês hoje em dia... sempre tão politicamente corretos e sensíveis sobre fazer amor. Perderam suas emoções. – Nana D começou a lavar nossos pratos na pia que ficava no canto da sua cozinha pitoresca e charmosa. Ela havia costurado as cortinas, pintado os armários e instalado o encanamento. Não havia nada que ela não pudesse fazer quando colocava alguma coisa na mente.
– Foco, Nana D. Eu estou curioso sobre o que você sabe sobre a Abby e quem poderia querer ela morta.
Nana D enrugou o nariz e estreitou os olhos.
– Ela era o tipo que irritava as pessoas mais perigosas deste mundo fazendo perguntas demais. Alguém a empurrou escada abaixo para calar a boca dela, tenho certeza disso.
– Eu não sei como você sabe dessas coisas, mas eu confio em seus instintos. – eu consenti, então peguei um pano de prato e comecei a secar.
Eu contei a ela sobre os eventos da festa antes de encontrar Abby Monroe na escadaria. Nana D planejava começar uma petição para remover o vereador do cargo por causa de suas mãos suadas. Ela já havia tentado de tudo para tirar Marcus Stanton do escritório, desde que ele a convocou pela remoção inadequada dos resíduos da fazenda. Nana D pode ter jogado um balde cheio de estrume, que estava na pá frontal de seu trator, por cima da cerca no quintal dos fundos dele, dizendo que a máquina estava com problemas. Infelizmente, isso aconteceu durante o churrasco do Dia do Trabalhador, e eles estavam parados do outro lado da cerca quando aconteceu. Eu ainda não tenho certeza de como ou do por que dessa guerra entre eles ter começado.
– Eu tenho que ir até a cidade no escritório do Xerife do Condado de Wharton para assinar algumas declarações. Quais são seus planos para hoje, Nana D? Incomodar o Vereador Stanton? Passar um trote para a Srta. Paddington novamente?
Nana D colocou a língua para fora e fez reclamações infantis.
– Eu não te contei que comecei a dar aulas de música de novo? Tenho que pegar o meu antigo clarinete antes que ela chegue. – Nana D cobriu a torta com papel alumínio e a colocou na geladeira. – Eu me mantenho jovem passando tempo com essas crianças da faculdade.
– Sério? Não, você não me contou. Eu estava pensando em ensinar a Emma a tocar clarinete. Talvez ela siga os seus passos.
– Bem, você nunca conseguiu tocar coisa nenhuma, não é mesmo? – Nana D correu até mim e bateu em minhas bochechas até ficarem doloridas. – O talento deve ter pulado algumas gerações, mas você certamente puxou a aparência de seu avô. Provavelmente você também deixa as garotas doidas por você. – Nana D e meu avô costumavam oferecer concertos no Rancho Danby, como entretenimento para os visitantes e funcionários, todos os finais de semana. Ela havia desistido disso quando ele faleceu, dizendo a todos que era uma coisa que eles faziam juntos e tudo o que era bom eventualmente chegava a um fim.
– Talvez. – eu respondi quando a campainha tocou. – Quer que eu atenda?
– Sim, por favor, deve ser a Bridget. Vá até lá e se apresente enquanto eu vou pegar o clarinete e fazer uma ligação sobre um encontro que tenho mais tarde. – Nada D respondeu. Ao mesmo tempo, ela piscou e deu um sorriso maroto.
– O que você vai aprontar hoje? – eu estreitei meus olhos e inclinei minha cabeça na direção dela. – Mais problemas? – eu imaginei os repórteres aparecendo na porta de meu pai perguntando por que ele matou um de seus professores, ou então um falso aluno da faculdade ligando para minha mãe em casa dizendo que havia se apaixonado por ela e que faria qualquer coisa para frequentar Braxton. Nana D havia pregado várias peças neles no passado. Eu tinha certeza de que eles estavam prestes a cair em outra em breve.
– Vá atender a porta, Kellan. Seja útil e pare de ser um estraga prazeres, querido. – Nana D despareceu pelo corredor enquanto eu passava pela sala de estar e abria a porta da frente.
Parada na varanda havia uma garota com uma expressão estranha em seu rosto, uma mistura de confusão real e de um elfo irritado e insolente. Não que eu já tenha visto um elfo na vida real, mas as orelhas dela eram pontudas, e ela tinha esses olhos grandes e brilhantes que pareciam reluzir. Eu temia que ela mudasse de forma na minha frente.
– Olá. – eu disse curta e cautelosamente.
– Você não é a Seraphina. – o elfo questionou. – Eu estou adiantada novamente?
Eu encolhi os ombros já que não sabia que hora ela deveria chegar. Ela vestia uma legging listrada de vermelho e branco e uma jaqueta verde bem maior que seu tamanho. Tá certo que estava congelando do lado de fora, mas a roupa dela realmente me fazia lembrar do Elfo-na-Estante que aparecia todo Natal na mansão dos Castiglianos para minha filha, Emma. Eu queria perguntar por que o elfo não podia usar a magia para responder sua própria pergunta, mas já que não a conhecia, isso poderia soar um pouco desagradável de minha parte. Eu também não tinha certeza se ela era um elfo do bem ou do mal. Eu já tinha azar o suficiente e não precisava da vingança de um elfo malvado. Já que Nana D esperava alguém para suas aulas de música, havia uma boa chance de que essa era Bridget.
– Não que eu saiba. Entre.
O elfo entrou pela porta esperando que eu dissesse algo mais.
– Hmm, então ...
– Você está aqui para as aulas de direção na Vespa? – eu perguntei. Talvez eu tivesse herdado muito do humor ácido da Nana D. – Nós estamos fazendo as bandagens do último estudante, mas não se preocupe... nós já colocamos o lince de volta na jaula.
– Se isso é humor, eu sinto mal por você. – o elfo removeu seu casaco. – Eu sou Bridget. Quem é você?
Bridget era uma garota pequena que parecia ser capaz de se defender. Além de sua roupa de elfo, tinha o cabelo castanho claro preso em um rabo de cavalo, olhos verdes esmeralda e quase não usava maquiagem. Ocorreu-me que essa podia ser outra tentativa de me arranjar um encontro romântico. Nana D havia tentado me acertar com uma cuidadora de cavalos itinerante nas férias do Natal, até que nós ficamos sabendo que não só a mulher já havia sido casada, mas que ela estava sendo procurada em dois outros estados por bigamia.
– Você é real ou isso é só parte de um jogo da Nana D? – eu tinha que ter certeza de que minha avó não estava jogando comigo. Ainda poderia ser cedo o suficiente para convencer Bridget, o elfo, a se juntar ao meu time.
Bridget pendurou seu casaco no armário, me empurrou para entrar na sala de estar, e colocou sua mochila na mesa de centro.
– Você é estranho. Deve ser o Kellan. Seraphina me contou sobre você na semana passada quando estive aqui para minha aula.
Então, o elfo era mais esperto do que parecia.
– Sim, eu acho que você deve ser normal, se ela lhe contou sobre mim. Há quanto tempo você tem tocado o clarinete?
– Eu tenho vinte e um anos. Comecei a tocar quando tinha nove. Eu tenho certeza de que você consegue fazer as contas. – enquanto ela se sentava no sofá em frente a mim, ela pegou várias partituras. – Você vai ficar escutando assim como está me incomodando também? Porque eu não me inscrevi para ter uma plateia super julgadora.
Sacudi a cabeça. Eu tinha lugares para ir e precisava dar um update ao Derek sobre o que havia acontecido com Abby. Com o fim da festa de aposentadoria e sem mais nenhuma fonte para a segunda temporada, talvez eu pudesse voltar mais cedo para Los Angeles. Apesar do viciado em romances policiais em mim, querer fazer minha própria investigação sobre o assassinato de Abby, isso era secundário a escapar de meus pais.
– Não. Só estava visitando minha avó por algum tempo. Eu vou sair assim que ela voltar.
– Então, vejo que vocês se conheceram. – Nana D disse, enquanto segurava o clarinete atrás de nós. – Está se comportando, Kellan?
Eu fingi um olhar de choque com as palavras dela.
– É claro, como eu sempre faço.
Nana D olhou para Bridget, que então respondeu.
– Ele está sendo um perfeito cavalheiro. Posso ver a semelhança entre vocês dois. Ele tem o seu senso de humor e seu nariz. Como um pequeno botão, eu diria. – Bridget riu nervosamente para si mesma e então pegou sua bolsa.
– Bem, eu preciso fazer algumas ligações, Nana D. Eu falo com você mais tarde. Alguma coisa com seus encontros vespertinos que eu precise estar preparado? – eu perguntei com uma crescente sensação de angústia e curiosidade.
– Nem um pouco, querido. Eu não estou aprontando nada, pelo menos nada que sua mãe precise ficar preocupada.
– E com meu pai? Eu fiquei sabendo que ele está um pouco abalado com o ... problema ... da última noite. – eu respondi, subitamente me lembrando de que não deveria estar falando sobre isso, de acordo com a Xerife Montague.
– Nada que ele precise se preocupar, também. Agora dê o fora, por favor. Eu tenho aqui pessoas mais importantes para passar o tempo. – Nana D me empurrou para fora da porta antes que eu pudesse me despedir de Bridget.
Eu dirigi até o escritório da xerife e assinei o meu depoimento oficial confirmando tudo o que eu havia visto e que já havia contado para eles. No Condado de Wharton, havia um xerife e poucos detetives para cobrir todas as pequenas cidades, incluindo Braxton. A polícia local de cada pequena cidade assegurava que pequenos crimes fossem cuidados e ordens menores fossem obedecidas, enquanto o xerife cuidava dos crimes maiores, em particular assassinatos e grandes furtos. A xerife estava fora em uma entrevista, mas o Policial Flatman, que havia estado no campus na noite anterior, estava contente em ajudar. Afastando-me da mesa dele, eu vi uma anotação em um post-it sobre entrar em contato com Alton Monroe. Eu me perguntei por que ele e Abby tinham o mesmo sobrenome. Será que era o parente mais próximo dela?
Quando voltei ao meu carro alugado, mandei uma mensagem para Eleanor, que me provocou dizendo que tinha um maravilhoso prato de comida esperando por mim assim que eu chegasse. Dez minutos depois, eu estava sentando em uma cabine de canto na Lanchonete Pick-me-Up e devorava minha omelete de claras com queijo e presunto, e com abacate acompanhando. Eu precisava de algo saudável para compensar as duas fatias de torta que já havia comido para o café-da-manhã. A irmã relaxada e que vestia um lindo vestido, havia sido substituída por uma trabalhadora séria vestindo um par de calças cáqui manchada, Keds e uma camiseta pólo preta desbotada. O cabelo dela ainda estava preso para cima, mas ela quase não usava maquiagem hoje. Eu supus que trabalhar em uma lanchonete era uma coisa complicada para se manter uma aparência limpa e elegante.
– A mãe e o pai estavam indo se encontrar com o diretor de relações públicas para falarem sobre o acidente. O pai me contou um pouco sobre Abby. Pobre mulher, eu não consigo acreditar que ela caiu nos degraus e morreu.
– O pai a conhecia bem? – eu considerei revelar o que Connor havia compartilhado a mim sobre isso não ter sido um acidente. Já era ruim demais o fato de Nana D ter descoberto, eu não podia deixar isso escapar novamente.
– Ela havia sido a chefe do departamento de comunicações por vários anos, mas eles não se davam muito bem. Depois de poucos meses trabalhando com ela, o pai decidiu que ela não representava apropriadamente Braxton. Mas então, ela já havia sido garantida na posse, o que significava que não seria fácil se livrar dela. – Eleanor disse.
Uma garçonete retirou os pratos tentando impressionar sua chefe ao fazer um show limpando a mesa, perguntando como havia sido a comida, e sugerindo diferentes opções de sobremesas. Eu recusei, sabendo que já teria que correr duas vezes mais longe naquela tarde.
– E quais são as notícias sobre o lado bem sucedido na nossa família? – eu perguntei para Eleanor. Ela mantinha contato com nossos irmãos mais velhos muito mais do que eu tinha.
– Hmm, Penelope parece estar feliz, apesar de que tem dias que eu me pergunto se ela não está procurando uma desculpa para ter a crise da meia-idade mais cedo. – Eleanor respondeu.
– Ela tem suas mãos ocupadas com as crianças, eu suponho. Mas ama tudo isso e eu não posso imaginá-la desistindo de qualquer parte de sua vida. – eu secretamente sabia que Penelope esperava comprar uma participação maior na empresa imobiliária para a qual ela trabalhava. – E quanto ao seu irmão?
– Hampton também é seu irmão, não importa o quanto vocês dois briguem. – ela respondeu. – E com Gabriel se recusando a falar com qualquer um de nós, bem...
Eu assenti.
– Bem, eu deveria agir mais como um irmão com o Hampster. – nem mesmo me pergunte por que eu o chamo desse jeito, já faz muito tempo que esse é o seu nome. Hampton, dois anos mais velho do que eu, é um advogado em Tulsa e casado com uma herdeira do petróleo que nunca o deixa ir a lugar algum.
– Ele está vindo em breve para a cidade para dar as notícias. – Eleanor disse. – Eu aposto que a mulher dele está grávida de novo.
Eu me encolhi com o pensamento de quatro crianças com menos de seis anos.
– Por falar no pai, será que a mãe sabe para onde ele desapareceu na noite passada? Eu tentei entrar em contato com ele. Ele nunca atendeu o celular. – era estranho o fato de que ele nem mesmo me mandou uma mensagem de volta, mas eu pensei que ele estivesse ocupado em controlar qualquer informação a ser liberada para a mídia. – O Connor pensou...
– Não, eu saí de lá assim que a festa terminou e vim até aqui dar uma olhada nas coisas. – Eleanor ficava peculiar quando seu rosto se enrusbescia em um vermelho profundo. Será que ela sabia de algo que não estava me contando?
– Entendi. E quanto ao Connor estar trabalhando em Braxton? Eu fiquei surpreso ao saber disso.
Eleanor se remexeu no banco da cabine.
– Yeah, grandes mudanças, não é mesmo? Bem, eu preciso dar uma olhada em algumas coisas na cozinha, o que significa que você precisa ir embora. Falo com você mais tarde. Beijos e abraços.
Nós nos despedimos, o que foi um pouco estranho pela maneira em como ela saiu correndo para fora da cabine. Eu mandei uma mensagem para Maggie, perguntando se ela queria me encontrar para jantar, mas ela já tinha planos. Ao invés disso, ela sugeriu que eu passasse na Biblioteca Memorial no dia seguinte. Eu confirmei, então resolvi ligar para Derek.
Surpreendentemente, ele atendeu ao primeiro toque.
– Hey, como está indo a pesquisa?
– Não muito bem. Houve um incidente. – eu disse, sentindo minha angústia aumentar. Eu não podia contar a ele que ela havia sido assassinada, mas de repente passou na minha mente um pensamento de que ele tinha jogado ela para mim por algum motivo. Será que as coisas poderiam ter ficado feias entre eles, e de alguma maneira ele estava envolvido com a morte dela?
– Conte logo. Você sabe que estou contando com você para arranjar esse material de apoio, então podemos começar esse projeto o mais rápido possível, certo? – Derek estava sempre focado no show, nada mais importava para ele a não ser seu sucesso.
– Abby morreu na noite passada. – eu ponderei qual tipo de resposta eu iria receber com essa notícia. Será que ele ficaria nervoso? Aliviado? Frio e recolhido?
Derek riu histericamente.
– Essa é ótima, Kel-baby. Essa é a primeira vez que eu escuto essa desculpa para se livrar de um trabalho. Ótima maneira de me fazer rir, cara.
Essa não era uma das reações que eu havia considerado.
– Sério, hmm... parece que ela caiu um lance de escadas.
– Espere, você não está brincando, está? – ele respondeu.
– Não. – eu expeli uma baforada de ar quente.
– Isso é insano. Você não conversou com ela ontem? – ele parou de rir e me escutou.
– Era para nós termos nos encontrado na noite passada, mas então eu, junto com uma amiga minha do campus, tropeçamos no corpo dela. – eu contei para Derek sobre Abby estar trabalhando como professora na faculdade, sobre o que Myriam Castle e Nana D havia dito sobre ela, e o pouco que soube em minha visita ao escritório da xerife naquela manhã.
– Faça o que você precisar para conseguir as anotações de pesquisa dela. Eu mandei uma mensagem mais cedo para ela pedindo que as desse para você. – Derek não parecia abalado pela morte dela, mas ele também achava que eu teria acesso às coisas pessoais dela. – Eu acho que não vou receber uma resposta, não é? – ele riu novamente, mas dessa vez com um tom mais sinistro.
– E como exatamente eu devo fazer isso? – talvez eu devesse perguntar onde ele esteve na noite passada.
– Você é o aspirante a repórter investigativo, Kel-baby. Talvez consiga entrar no escritório dela, ou dizer aos policiais que ela deixou algo para você sobre um projeto no qual estão trabalhando juntos. Eu preciso que essa seja a sua mais alta prioridade. Nós temos que começar a filmar a segunda temporada o mais cedo possível, cara.
Eu pensei sobre as exigências de Derek e meu desejo de ter meu próprio show. Eu precisava sair de perto dele o quanto antes. Ele era exatamente o tipo desonesto que me fazia duvidar de minha carreira em Hollywood nos últimos meses.
– Escute Derek, eu sei que isso é importante. Vou ver o que posso fazer. Eu acho que vou voltar à Los Angeles mais cedo do que planejamos.
Derek ficou incomumente silencioso no telefone antes de finalmente responder.
– Acho que você deveria ficar para o funeral. Talvez você possa conhecer alguns dos contatos dela ou descobrir para quem mais ela trabalhava. Tome vantagem da situação. Tenha uma excelente história secundária para o show. Professora de pesquisa cai para a morte enquanto trabalhava para o Realidade Sombria. Pense nas avaliações, Kel-baby!
Seu último comentário acendeu um fogo em mim para terminar meu contrato com ele o mais rápido possível.
– Yeah, bom plano. Que hotel você está hospedado? Estou pensando em visitar o Havaí no mês que vem. – eu não tinha nenhuma intenção de visitar as ilhas tropicais em um futuro próximo, mas fiquei realmente curioso para saber se ele estava onde dizia estar. Quanto eu conhecia sobre esse homem fora do espaço de trabalho?
– Royal alguma coisa, ou outro, não consigo me lembrar. Eu vou mandar pra você quando descobrir o nome. Foi bom conversar com você, tenho que ir. Pegue aquela pesquisa. O seu emprego depende disso!
Antes que eu tivesse a chance de responder, Derek desligou. Que idiota! Eu precisava sair daquele emprego, mas estava perto de conseguir meu nome nos créditos da temporada inteira, e isso seria exatamente o bônus para conseguir uma chance de ter meu próprio show no futuro. Não seria tão difícil de olhar se Abby tinha algumas anotações em seu escritório. Eu deveria ir ao funeral com minha família numa boa demonstração de fé, certo?
Desde que encontrar Maggie estava nos meus planos para o dia seguinte, eu também iria visitar Lorraine. Talvez ela tivesse alguma informação sobre o planejamento do funeral de Abby. Também queria me encontrar com Connor, e saber o que ele tinha feito nos últimos dez anos, eu não tinha percebido o quanto sentia falta das minhas amizades. Desde que Francesca faleceu, eu havia deixado de lado todos os nossos amigos de Los Angeles e passado meu tempo livre com Emma. Eu não havia conversado com um grupo de caras desde meus tempos de fraternidade. A morte de Abby me fazia pensar muito em como eu havia ficado perdido desde que minha mulher havia falecido há dois anos, e talvez fosse uma chance de me reconectar com alguns antigos amigos enquanto eu estivesse na cidade e uma oportunidade de solucionar um crime!
Capítulo 6
Quando terminei de tomar meu banho depois da minha corrida de cinco quilômetros naquela tarde, eu encontrei meu pai sentado em seu escritório e bebendo um copo de uísque Macallan, assistindo o pôr-do-sol sobre as Montanhas Wharton. Parecia que era a garrafa que eu o havia presenteado no Natal, pelo menos metade vazia, o que significava que pelo menos uma vez ele gostou de um presente meu. Recusei quando ele me ofereceu, já que beber uísque depois de uma corrida nunca me fazia muito bem. Eu também estava faminto e precisava comer algo antes que desmaiasse.
– Talvez numa próxima. Eu estou indo à cozinha para esquentar algumas sobras da festa de ontem pro meu jantar. Você está com fome?
– Eu comi um pouco mais cedo com sua mãe, antes de ela voltar para o campus. O prazo final para notificar os estudantes que foram aceitos para o próximo semestre é nessa semana. Não vou ser eu quem vai recebê-los em Braxton dessa vez. – ele respondeu em um tom sombrio enquanto bebia um grande gole do uísque. Eu podia ouvir a melancolia em sua voz.
Nunca ocorreu, em meu cérebro cansado e distraído, que ele pudesse estar triste por se aposentar. Se eu tivesse trabalhado incansávelmente durante quarenta anos, ficar sentado sem ter nada para fazer durante alguns meses seria uma mudança bem-vinda. “Esse é o problema com a sua geração. Não conseguem trabalhar um dia inteiro sem reclamar,” Nana D provavelmente provocaria depois disso. Talvez ela estivesse certa, mas ela não estava aqui, então eu podia pensar o que eu quisesse nesse momento.
– Queixo pra cima, pai. Você tem bastante para ficar animado sobre o que esperar depois do grande dia. Eu tenho certeza de que o novo presidente vai querer que você fique por perto para ajudá-lo a se ajustar, certo?
Ele assentiu. Eu esperei que ele continuasse falando, mas o uísque e o silêncio na sala impediram a possibilidade dele liderar a nossa conversa.
– Algum resultado com a procura para um novo presidente?
– O Conselho terminou todas as entrevistas e me pediu para encontrar com os dois canditados finais novamente nessa semana. Como você sabe, eu não tenho a liberdade de lhe fornecer detalhes, mas eles estão considerando uma opção externa e uma interna. Eu sou parcial a um dos candidatos, no entanto, nós vamos fazer duas pequenas reuniões de grupos com ambos amanhã antes de podermos tomar a decisão final – ele puxou a cadeira para longe da janela e olhou na minha direção com os olhos apertados. – Por quanto tempo você está planejando ficar por aqui desta vez, Kellan?
Eu estava pensando desde que eu havia retornado dois dias atrás, quando ele iria me perguntar isso. Ele havia sugerido algumas vezes durante as férias de Natal, que seria benéfico para Emma ficar por perto de ambos os avós. Eu pensei por um momento que ele havia descoberto os segredos sujos da família da minha falecida esposa, mas se isso era verdade, ainda não havia dito isso para mim.
– Eu estou tentando descobrir. Tenho um trabalho para fazer que pode me manter por aqui até o fim da semana.
– Entendo. – ele respondeu, estalando a língua no céu da boca.
– Então, eu tentei entrar em contato com você na noite passada depois da descoberta do corpo de Abby no Hall Diamante.
Meu pai pigarreou.
– E o que, Kellan? Meu celular estava no silencioso, então eu poderia aproveitar a festa em paz. Eu não percebi que você estava desesperadamente tentando me encontrar. – ele respondeu em um tom amargo enquanto se servia de mais uma dose e abria seu notebook.
Aaai! Eu não tinha certeza se o que eu tinha dito merecia essa resposta afiada, mas eu havia obviamente o chateado.
– Eu não estava desesperado, apesar de que o fato de eu ter encontrado um cadáver não ser um motivo para ficar desesperado, eu não tenho mais certeza do que seria nos dias de hoje. Você não concorda?
Meu pai me dispensou com uma combinação de encolhidas de ombro, erguendo as sobrancelhas, e me ignorando enquanto ele digitava no computador. Eu queria descobrir onde ele esteve e quem ele havia ameaçado por telefone na noite em que cheguei, mas entendi o recado e fui comer meu jantar sozinho na cozinha. Havia algo de estranho em toda essa situação. Eu precisava descobrir se me afastava ou mergulhava um pouco mais fundo para proteger alguém que eu conhecia.
***
Eu havia caído no sono na cama durante a noite enquanto usava a internet e lia novamente a bíblia roteiro do show, mas pelo menos havia conseguido descobrir vários fatos interessantes sobre a falecida professora, ou Monroe, como Myriam Castle se referia a ela. Eu também havia pesquisado sobre aquela mulher grosseira.
Abby havia passado a maior parte de sua vida se especializando nos estudos sobre broadcast e mídia, seguido por um caminho de pós-graduação semelhante ao meu, só que em instituições diferentes. O mais aproximado que consegui descobrir com meus cálculos, Abby era pelo menos quinze anos mais velha do que eu. Apesar de eu já ter chegado a Hollywood, ela esteve trabalhando no mundo acadêmico durante toda sua carreira adulta, indo de faculdade em faculdade, até se estabelecer em Braxton há quase dez anos. Ela deve ter começado logo após eu ter me formado e ter sido promovida a chefe do departamento de comunicações quando o anterior se aposentou. Em Braxton, o Departamento de Comunicações incluía os cursos de mídia e broadcast, literatura, teatro, escrita, relações públicas e arte. Abby ensinava em três matérias nesse semestre — Introdução aos Filmes, História da Produção Televisiva, e Transmissão de Escrita.
Eu fiquei um pouco surpreso ao descobrir que Myriam Castle era um dos professores que trabalhavam para Abby no departamento de comunicações. A especialidade dela era literatura e produções de teatro, o que fazia sentido dado suas expressões exageradas na festa de aposentadoria. No papel, a Dra. Castle era claramente mais qualificada para liderar o departamento, mas Abby havia sido colocada no cargo antes que a Dra. Castle se juntasse à Braxton. Não era de se imaginar que houvesse tensões entre as mulheres. Isso seria uma discussão interessante com meu pai quando ele graciosamente descesse de seu pedestal e falasse comigo novamente.
Eu também encontrei um website onde Abby era referenciada como co-autora de alguns artigos, em um jornal amplamente publicado, juntamente com seu marido, Alton Monroe. Essa notícia combinava com aquele pedaço de papel que eu havia visto na mesa do Policial Flatman no escritório da xerife. Será que Alton poderia me ajudar a conseguir uma cópia de qualquer anotação restante que Abby ainda tivesse para o Realidade Sombria? Eu conferi os nomes com diretórios online e descobri um endereço no lado norte do condado. Fiz uma anotação mental para passar por lá enquanto estivessse no campus para me encontrar com Lorraine e Maggie mais tarde.
Enfrentei a temperatura quase congelante quando saí de casa, e me desviei de alguns pingentes de gelo que começavam a cair do beiral do telhado enquanto entrava no Jeep. Vinte minutos depois, eu tive sorte ao encontrar uma vaga de estacionamento na rua do outro lado do escritório do SCB (Segurança do Campus Braxton).
A última vez que estive lá foi depois que uma fraternidade rival, a Omega Delta Omicrons, fez uma reclamação de que nós estavamos dando uma festa com barulho demais durante nosso último ano. Eu havia passado quarenta e cinco minutos tentando convencer o antigo diretor de segurança a não nos denunciar para Fern Terry, a Reitora de Assuntos Estudantis, mas ele não queria ceder. Eu havia saído do escritório dele depois de algumas palavras nada gentis naquele fim de tarde, e recebi uma reprimenda na manhã seguinte quando a Reitora Terry me disse que eu a havia desapontado pessoalmente pela minha escolha de palavras infantis. Será que ela era uma dos dois canditados finais ao cargo de presidente de Braxton? Talvez eu devesse dar uma visitada no escritório da administração para ver se ela ainda trabalhava no campus. Eu não a tinha visto na noite anterior durante a festa, ainda assim supunha que ela teria ido se ainda trabalhasse em Braxton.
Enquanto eu andava pelo caminho de pedras, considerei que tipo de diretor de segurança Connor seria. Ele sempre havia sido o mais certinho, que nos aconselhava a não deixar a fraternidade ficar com problemas, mas ao mesmo tempo, ele se imporia para impedir que eu caísse sozinho quando nós eramos pegos fazendo alguma coisa errada. Não que esse tipo de coisa acontecesse com frequência, mas Connor era um cara com quem se podia contar e era muito honroso. Em teoria, fazia certo sentido que ele tivesse ido trabalhar no ramo da segurança, ainda assim eu tinha dificuldades em imaginá-lo sentado no prédio oposto à administração da faculdade.
Eu entrei no hall de entrada do prédio de um andar da segurança, e dei uma olhada em tudo. Muito pouco havia sido mudado, possivelmente uma nova demão de tinta e uma série de novas câmeras digitais e sistemas de computador. Connor saiu de seu escritório poucos minutos depois. Ele não parecia mais desconfortável em um terno bege e a gravata de Braxton, ainda assim, estava quase explodindo em seu casaco esportivo e jeans.
– Kellan, eu não esperava te ver hoje. O que está acontecendo?
– Tem um tempo para tomarmos um café? Por minha conta. – eu sugeri, esperando que ele recusasse minha oferta. Quando ele assentiu e disse a um estudante para chamá-lo se surgisse qualquer problema, percebi que Connor havia se tornado um adulto responsável e admirável.
Ele sugeriu que fossemos à The Big Beanery, no Campus Sul. Eu fiquei mais do que feliz por visitarmos nossos antigos pontos de encontro. A volta de carro durou menos de cinco minutos, provavelmente porque estávamos em um carro do SCB e todos paravam para deixá-lo entrar primeiro nas ruas. Devia ser bom ter esse tipo de poder — talvez isso pudesse ser útil um dia se eu precisasse da ajuda dele.
Quando nós chegamos à cafeteria, Connor escolheu uma mesa enquanto eu pedia dois cafés pretos. Eu gostaria de um pouco de creme no meu, ou até mesmo de um cappuccino, mas quando ele murmurou algo sobre a quantidade de açúcar, eu decidi segui-lo e sentei em uma cadeira em frente a ele.
– Então, trabalhando com segurança em Braxton. Isso é um pulo e tanto das coisas que nós costumavamos fazer no Campus dez anos atrás, não é?
A risada dele foi calorosa e profunda.
– Dez anos é um longo tempo, Kellan. As pessoas amadurecem. Eu posso ver que você também mudou. Parece até mesmo estar indo à academia.
– Bem, sem comparação com você, cara. Você parece com uma parede de tijolos! – e ele realmente parecia. Aposto que ele poderia me jogar até o outro lado da sala se fosse preciso. Não que eu fosse fazer algo para encorajar isso, mas ficaria feliz de tê-lo ao meu lado em qualquer briga de bar ou na rua. Eu tinha uma vontade enorme de chamá-lo de 007.
– Eu sempre me perguntei sobre o que havia acontecido com você. Nós meio que perdemos contato, huh? – ele pergutou depois de tomar um grande gole de seu café. Eu observei os olhos dele constantemente vasculhando espaço atrás de mim, como se estivesse procurando por alguém. Provavelmente era uma coisa normal para o chefe de segurança, sempre escanear seus arredores. – Tenho que admitir, eu fiquei com raiva quando você saiu da cidade naquele verão. Eu sei que você foi atrás da sua pós-graduação, mas você era o meu melhor amigo naquela época.
– Yeah, eu me senti mal por aquilo. A vida tem uma maneira engraçada de tomar decisões que você não consegue entender naquela hora. Quando olho para o passado, vejo que eu tinha algum amadurecimento para fazer, não tinha? – eu suspeitava que Connor tivesse algum ressentimento com o passado. Eu poderia ter mais dificuldade para reestabelecer a amizade do que tinha esperado.
Alguns estudantes acenaram para ele. Parecia que uma das garotas estava tentando flertar. Se ele havia percebido, a ignorou. Nós conversamos durante alguns minutos sobre as nossas vidas durante os últimos anos. Connor havia passado um ano vivendo em Anguilla, com a família de sua mãe para reconstruírem as casas, após uma série de furacões destrutivos haverem prejudicado as pessoas vivendo nas ilhas próximas. Ele também havia trabalhado como policial na Filadélfia durante vários anos, então havia deixado a força depois de muitas brigas de gangue violentas e de mortes. Foi a um ano que ele tinha ficado sabendo sobre a vaga aberta em Braxton, e resolveu pegar a oportunidade.
– É casado, algum filho? – ele perguntou.
Eu sempre odiava aquela pergunta. Nunca era fácil de contar a alguém que você havia perdido sua esposa para um motorista bêbado. Eles inevitavelmente se sentiam desconfortáveis pela pergunta, e então você se sentia estranho por ter dado as terríveis notícias. Ninguém devia se sentir mal, exceto o idiota que havia entrado no carro depois de tomar todas e pensar que estava totalmente bem para dirigir. Até hoje, eles nunca haviam conseguido pegar o motorista que a atingiu e fugiu.
Nós conversamos sobre mais algumas coisas básicas. Ele ainda era solteiro, havia tido várias namoradas ao longo dos anos, mas nada sério. Eu tive a distinta impressão de que quando o tópico sobre Maggie surgiu, de que ele estava apaixonado por ela desde que ela havia voltado de Boston naquele semestre. Enquanto eu não tinha nada em mente a não ser considerar retomar minha amizade com Maggie, de alguma maneira o pensamento dela estar com outra pessoa não me fazia muito bem. Eu mudei de assunto e perguntei se ele tinha alguma notícia sobre a morte de Abby.
– Eu não tenho certeza se eu sei das últimas. Assassinato é jurisdição do Condado de Wharton. A Xerife Montague entrou em contato para discutir protocolos, mas nós não estabelecemos todas as fronteiras. – Connor disse. – Eles estão procurando por quaisquer sinais de luta, além daquele corte na cabeça de Abby.
– Verdade. Eu apenas quis dizer como você estava lidando com isso pela perspectiva de Braxton. – eu sinalizei para uma garçonete limpando a mesa ao lado que nós queríamos mais dois cafés. Se Connor fosse compartilhar qualquer informação, eu sabia, por experiência, que ele precisava se manter cafeínado.
– A Xerife Montague quer que todos pensem ter sido um acidente. O departamento de relações públicas de Braxton ficou mais do que satisfeito com essa abordagem. – Connor disse enquanto tomava o último gole de seu café.
– Um assassinato não vai ajudar com o novo ciclo de admissões. – eu disse com uma risada. – Você a conhecia?
– Encontrei-a em alguns eventos da faculdade. Ela vinha falar comigo para discutir algumas coisas de tempos em tempos. Abby tinha colocado na cabeça dela, que pelo fato de eu vir do Caribe, que minha família praticava vudu. Ela queria que eu a conectasse com meu xamã. Mais que louca! Eu nem mesmo sei o que é um xamã.
A garçonete trouxe nossas xícaras de café, e perguntou:
– Quem você acha que vai liderar o grande jogo de sábado, Diretor Hawkins? Striker é o nosso homem? Ou você acha que Jordan vai superá-lo?
Eu não tinha certeza de que esporte eles estavam conversando sobre, até que me lembrei da história de Eleanor sobre o time de beisebol na Lanchonete Pick-Me-Up.
– Esses são as duas escolhas para os arremessadores? – eu fiz minha pergunta, apesar do olhar dela mal ter deixado os lábios de Connor.
Connor respondeu:
– Sim. Striker foi a estrela da última temporada, mas seu colega de time, Jordan, de repente, entrou na corrida por causa de sua nova bola curva nos jogos da pré-temporada. É uma disputa acirrada.
Quando fui entregar a ela uma nota de dez dólares, ela me dispensou.
– Nah, nós não cobramos do Diretor Hawkins. Ele vem dar uma olhada em nós de tempos em tempos para se certificar de que estamos bem. – ela recuou quase tropeçando nos próprios pés, porque não conseguia tirar seu foco de Connor. Eu ainda estava sendo ignorado.
– Alguém acha que você é bem querido, não é mesmo? – eu provoquei.
– Deixe disso, Kellan. Ela é uma criança.
– Eu sei. Parece que você é o rei do pedaço por aqui ultimamente. Eu estou feliz por você.
– É, eu não pedi por isso. Só estou fazendo o meu trabalho. Tenho que voltar. Você precisa de uma carona?
Eu recusei, já que pretendia encontrar a casa de Abby, e a rua de acesso até o bairro dela era mais próximo do Campus Sul.
– Antes de você ir, acha que teria alguma chance de eu poder dar uma olhada no escritório da Abby? Isso vai soar estranho, mas era pra eu ter me encontrado com ela para conseguir algumas informações para meu chefe, e eu não consegui fazer isso antes dela morrer. Nós achamos que provavelmente está em algum lugar da mesa dela. – eu me sentia terrível por pedir um favor ao Connor depois de todos esses anos, mas não estava fazendo nada errado demais. Abby fez aquela pesquisa para nós, então de uma maneira, nós estavamos pegando de volta algo que pertencia à nossa emissora. Eu não consegui convencer a mim mesmo que não estava justificando demais, especialmente já que o contrato nunca havia sido assinado.
– Eu não tenho nenhum problema com isso, desde que a Xerife Montague permita. Ela pode querer que um policial esteja presente. – Connor se levantou, então sorriu enquanto alguém se aproximava da mesa. – Por falar do diabo. – ele disse.
– Diabo? Isso é algo que você queira explicar, Connor? – A Xerife Montague perguntou. Os braços dela estavam cruzados em frente ao corpo, e ela tinha o olhar de uma mulher prestes a atacar. Se o ataque era para beijá-lo ou castigá-lo, eu não conseguia dizer. Baseado na aparência dela, ela era cerca de dois ou três anos mais velha do que nós.
Connor se desculpou, indicando que eu teria que dar a explicação. Eu observei-o sair pela porta lateral da The Big Beanery. Enquanto eu apontava para a cadeira vazia na minha frente, a Xerife Montague se sentou e disse:
– Esse é um ótimo homem.
Eu cuspi um gole de café, então pedi desculpas dizendo que era por causa da temperatura.
– O que Connor quis dizer, Xerife Montague, era que eu preciso coletar alguns papeis do escritório de Abby para um projeto que nós estavamos trabalhando juntos. Será que eu consigo entrar lá logo?
A xerife havia se mudado para Braxton a apenas dois anos atrás. Eu nunca havia tido a chance de conhecê-la. Será que ela se lembrava de mim daquela vez que paguei a fiança da Nana D? Não parecia que ela tinha feito essa ligação ainda, mas eu pensaria que alguém na posição dela como xerife do condado não esqueceria muitos rostos, especialmente não daqueles associados com a frequentemente conhecida Seraphina Danby. Eu consegui minha resposta bem rapidamente, depois de me secar do café derramado e me impedir de comentar sobre o cabelo dela marcado pelo capacete da moto.
– Você deve pensar que a sua família tem algum controle sobre Braxton, Pequeno Ayrwick, deixe-me assegurá-lo de uma coisa, eu não vou ser pressionada a dar qualquer circunstância ou favores especiais. Eu tenho uma investigação de assassinato para liderar, e vou passar por cima de qualquer um que estiver no meu caminho. – quando ela terminou, ficou me encarando como se eu pudesse ser o jantar daquela noite. Eu não tinha certeza se molhava minhas calças ou entrava na briga.
– Você não poupa palavras, xerife. Desculpe-me se eu falei de maneira equivocada. Quando ficou claro que não era apenas um acidente, fiquei preocupado que isso tivesse alguma coisa a ver com a pesquisa que Abby Monroe estava fazendo para meu show de televisão, Realidade Sombria. Será que você já ouviu falar?
Surpreendentemente, isso quase a fez perder a atitude.
– Aquele é o seu show? Eu assisti toda a primeira temporada. Minhas amigas e eu não conseguimos parar de assistir. – ela respondeu em um tom meloso enquanto seus olhos se arregalavam.
Uau, eu tinha dado sorte nesse departamento. Se eu jogasse bem as minhas cartas, talvez eu conseguisse fazer a Xerife Montague ser minha aliada.
– Yeah, definitivamente, eu poderia conseguir para você alguns ingressos...
– Corte essa bobagem, Pequeno Ayrwick. Eu não assisto ao show. Tenho coisas melhores a fazer do que queimar meus olhos assistindo ao lixo dos reality tv. Nenhuma ofensa a você, se é o que gosta de fazer.
Ai, eu tinha entendido mal essa!
– Você me pegou. – eu respondi com meu rabo entre as pernas. – Mas falando sério, eu vou ajudar na investigação de qualquer maneira que puder. Você já tem algum suspeito?
– Alguns. – a Xerife Montague respondeu. – Eu não estou aqui para lhe dar uma dura. Vou aceitar toda a ajuda que conseguir, mas você é um cidadão privado. Nós geralmente não estamos no negócio de dar esse tipo de informação. – ela juntou as mãos, então estralou os dedos de ambas, considerando minha oferta enquanto isso. – Nós estamos focando em algumas pessoas que tinham os meios e a oportunidade. Ainda estamos procurando pelo motivo. Eu estou indo me encontrar com uma testemunha que afirma ter ouvido uma briga entre Lorraine Candito e a vítima.
Eu não pude esconder meu choque.
– Lorraine? Ela não faria mal a uma mosca. Eu a conheço há vários anos, e posso garantir por ela. Ela é mais gentil do que uma escoteira mirim ou um filhote recém-nascido. Ela pode mordiscar de vez em quando, mas isso deve ser algum mal-entendido.
A Xerife Montague sacudiu a cabeça vigorosamente.
– Uma estagiária que Connor encontrou essa manhã disse ter ouvido as palavras: “por sobre o seu cadáver” vindo dos lábios de Lorraine Candito.
Eu estava certo sobre o medo no rosto de Lorraine ser genuíno. Será que era por causa de culpa?
– Eu vou me encontrar com Lorraine essa tarde. Posso perguntar a ela se você quiser uma segunda opinião.
– Deixe a investigação conosco, Pequeno Ayrwick. Eu vou entrar em contato sobre o acesso ao escritório de Abby Monroe. Tenha um bom dia. – ela ajustou uma de suas mangas, me olhou uma segunda vez com um olhar feroz, se assegurando que eu havia entendido a mensagem, então seguiu em direção ao balcão para pedir algo para viagem. Seu andar pesado e sua abordagem minimalista para se vestir e não usar quase nenhuma maquiagem, claramente mostravam que ela não se importava muito com sua aparência. Seria errado que eu pedisse para Eleanor dar um makeover nela, na esperança que ela ganhasse a afeição de Connor? Eu não podia pensar em ninguém melhor para colocar um sorriso no rosto da xerife.
Eu queria avisar Lorraine, mas pensando melhor, isso não me colocaria em um bom lugar com a xerife. Parecia ser mais vantajoso dar algum tempo para April Montague se encontrar com a estagiária e com Lorraine, antes que investigasse mais fundo. Eu já havia irritado pessoas mais do que suficiente desde que havia retornado a Braxton. Era hora de deixar meu espetacular charme de apelação descansar um pouco, antes que eu acabasse indo morar do outro lado da cidade em uma casinha de cachorro. Em dez anos, eu havia conseguido esquecer o que realmente acontecia em cidades pequenas.
Capítulo 7
Localizar a casa de Abby se provou menos difícil do que eu havia antecipado. Era apenas uma caminhada de vinte minutos se eu me mantivesse no caminho ao longo da margem do rio. Apesar de ainda estar bastante frio, qualquer resquício de neve no chão já havia derretido, e já que eu provavelmente não conseguiria ir à academia naquela tarde, o exercício extra é mais do que bem vindo. Quando eu cheguei à rua dela, segui pelo lado direito e vaguei pelas primeiras casas até finalmente encontrar uma que tivesse número. A maior parte das casas, na vizinhança mais imediata, eram casas de três quartos em pequenos terrenos cercados na frente, com quintais ao fundo para crianças e cachorros brincarem sem se preocuparem com bolas rolando pela rua, ou animais selvagens vindo das montanhas. Um lince havia sido visto há anos atrás, mas conforme a área foi ficando mais urbanizada, a vida selvagem havia se retirado para o interior das florestas das Montanhas Wharton.
A casa de Abby era a penúltima do lado esquerdo, uma casa charmosa com fachada de tijolos, persianas verdes e uma porta branca. Conforme me aproximava da entrada, um sedã azul de quatro portas saía da garagem. Eu me abaixei e fingi estar amarrando minhas botas. O motorista abaixou o vidro e esticou o braço para a caixa de correio, então subiu novamente a janela e seguiu pela rua, indo na direção oposta da qual eu estava vindo. Ele havia deixado a correspondência na caixa. Será que ele havia estado na casa?
Eu estimei que ele tivesse cerca de quarenta e poucos anos. Estava começando a ficar careca, e experimentar com os pelos faciais. A barba era quase cheia, numa mistura de castanho e cinza ao redor da boca e queixo. Talvez o cavanhaque estivesse de volta à moda, ou talvez ele tivesse esperando liderar a matilha. Será que era um irmão? Colega de casa? Será que esse era o marido, Alton? Eu não tinha visto nenhuma foto do esposo de Abby, mas pelo menos eu havia dado uma boa olhada enquanto o homem checava o correio.
Eu não sabia o que esperava encontrar dando uma olhada onde Abby vivia. Se as anotações para o Realidade Sombria não estivessem em seu escritório, era possível que estivessem na casa dela. Não era como se eu fosse o tipo de cara que invadiria o local apenas para encontrá-las. A Xerife Montague provavelmente me levaria à cadeia apenas para que pudesse rir e se vingar de mim. Quando tive certeza de que o sedã azul tinha virado a esquina, eu me levantei e casualmente limpei minhas calças. Estava prestes a dar uma olhada em qualquer coisa de interessante no quintal dos fundos quando alguém me assustou.
– Posso ajudá-lo? – uma mulher encorpada, vestindo um grande vestido cor de pêssego, me perguntou com uma voz rouca. Estava um pouco frio do lado de fora para ficar sem casaco, mas mais poder para ela por ser mais corajosa do que eu.
Eu precisava de uma desculpa para convencê-la de que eu não estava criando nenhum problema. Meus olhos dardejaram para a correspondência que ela tinha nas mãos, e tentei ler o nome dela. Mesmo com meus óculos, eu pude apenas decifrar algumas letras.
– Você deve ser a Mrs. Ackerman, a vizinha que minha amiga Abby sempre fala sobre.
Ela recuou um pouco confusa, então sorriu.
– Abby fala de mim? Que gentileza dela! Sou a Mrs. Ackerton, bonitão. E você é? – ela estreitou os lábios e estufou o peito.
Uau! Eu estava grato pelo meu rápido pensamento e golpe de sorte.
– Oh, eu sou o Justin. Nós trabalhamos juntos na faculdade. Eu só vim dar uma olhada na correspondência, enquanto ela está fora.
A Sra. Ackerton sacudiu a cabeça e fez um som de tsk-tsk com a língua.
– Isso explica porque não a tenho visto ultimamente. Eu estava começando a ficar preocupada com ela, especialmente depois que vi o carro de polícia por aqui ontem. Não houve nenhum roubo, não é mesmo? – a Sra. Ackerton fechou a tampa da sua caixa de correio e ajustou um dos cachos de seu cabelo. – Desculpe, eu não estou muito arrumada agora.
– Nenhum roubo que eu tenha ficado sabendo. – parecia que ela não estava ciente que Abby havia falecido no final de semana, mas estava acordada o suficiente para flertar comigo. – Eu vi um carro sair enquanto amarrava meus cadarços, e pensei que havia deixado de encontrar ela ou o marido. – eu respondi, ignorando o brócolis no dente dela.
– Não, o marido dela não mora mais por aqui. Eu percebi esse carro algumas vezes, mas não acho que eu tive a oportunidade de dar uma boa olhada para saber quem é a pessoa que está dormindo aí. Se eu vir a Abby, vou mencionar que vi você por aqui, Justin. – ela esticou o braço e agarrou meus bícepes. – Eu amo um homem forte.
– Você acha que era um amigo de Abby? – eu perguntei, tentando conseguir alguma informação. – Ela não me falou que teria alguém por aqui enquanto estivesse fora. Eu meio que pensei que eu fosse o único ...
– Oh, eu não sei se era alguma coisa romântica. Eu não acho que um dia vou conseguir entender os relacionamentos de atualmente. Suponho que se manter por perto é parte do jogo, não é? Eu espero que ela não esteja pisando em você, Justin. – ela me cutucou algumas vezes antes de voltar para sua casa.
Será que ela pensava que eu iria estar me encontrando com alguém como a Abby? Eu pensei em responder, mas essa mulher não sabia de nada sobre mim, e seria melhor deixar as coisas desse jeito. Nós nos despedimos, e eu comecei minha excursão de volta ao campus para me encontrar com Lorraine. Durante o caminho, pensei sobre a possibilidade da morte de Abby ter sido uma briga amorosa que deu errado. Talvez seu marido houvesse descoberto que ela tinha um caso, ou seu namorado tivesse ficado bravo por ela não deixar o marido, e então ele a matou. Foi então que percebi que não sabia como ela havia morrido além de que havia caído de um lance de escadas. Connor havia me contado sobre o corte na cabeça. Mas isso não poderia ter sido feito pelos degraus. Havia outro objeto que a havia nocauteado primeiro. Talvez eu conseguisse convencer a xerife a me contar o que haviam descoberto no local.
Antes que eu percebesse, me vi chegando ao Campus Sul, no Hall Diamente, e prestes a entrar pela entrada principal. Minha mãe estava saindo do prédio e acenou para mim.
– Hey, mãe. Que engraçado te encontrar por aqui. Você estava visitando o pai? – eu perguntei, percebendo o quão fofo era o fato deles ainda passarem parte do dia juntos no campus. Ela iria sentir falta dele quando ele se aposentasse.
– Eu pensei que Lorraine pudesse me dizer onde ele estaria, então eu poderia fazer uma surpresa para o almoço, mas aparentemente a Xerife Montague pediu que ele voltasse para a delegacia novamente. Eles parecem ter várias perguntas sobre o relacionamento dele com Abby Monroe.
– Você conseguiu descobrir onde ele esteve no final da festa de aposentadoria? – eu esperava que talvez ela pudesse me dar a informação que meu pai havia convenientemente deixado de fora.
Minha mãe fez uma pausa antes de dar uma resposta estranha e não muito convincente.
– Você conhece o seu pai. Ele não quer me contar sobre onde esteve. Eu tenho ficado bastante preocupada com ele ultimamente. Algo não está muito certo.
– O que você quer dizer? Isso tem a ver com a aposentadoria dele? – eu pensei sobre a ligação telefônica.
– Bem, não exatamente. – ela respondeu, parecendo visivelmente esgotada e precisando de uma folga. – Ele e Abby não tinham exatamente a melhor das relações. Seu pai tentou sem sucesso, retirá-la do cargo de chefe do departamento, e ela sabia disso. Eu temo que a Xerife Montague ache que seu pai tenha alguma relação com que o que aconteceu à mulher. Foi perto do escritório dele, você sabe. – depois de olhar para as janelas do prédio, ela cobriu a boca com a mão, como se estivesse chocada de dizer algo em voz alta sobre o incidente.
– O pai é realmente difícil de lidar algumas vezes, mas ele nunca machucaria alguém fisicamente. Se tiver alguma coisa, ele é um mestre dos insultos verbais. – eu pensei sobre o comportamento dele nos últimos dias, e ela estava certa. Ele havia ficado mais estranho, pensativo, e fechado, apesar da minha primeira conversa com ele. – A Xerife Montague acusou ele de alguma coisa, ou você está lendo nas entrelinhas?
– Talvez você precise conversar com ele, Kellan. Eu não consegui entender o sentido de nada disso. – minha mãe disse, inclinando a cabeça dela. Eu pude ver os olhos dela se enchendo de lágrimas.
– Ahh, não chore mãe. Tudo vai ficar bem. – eu a puxei para um abraço e acariciei as costas dela. Era uma coisa rara ver minha mãe desabar.
– Era pra você ter se encontrado com Abby, não é mesmo? Você podia fazer sua própria investigação. Ver o que ela estava fazendo ultimamente ou talvez descobrir alguém mais para aquela detetive incomodar.
– April Montague não é uma detetive, mãe. Ela é a Xerife do Condado de Wharton. Eu tenho certeza de que ela sabe como fazer seu trabalho. Fazer mais perguntas ao pai pode simplesmente ajudá-la a encontrar outros suspeitos. – eu disse, incerto se acreditava em minhas próprias palavras. A Xerife Montague tinha algo contra minha família no passado.
– Por favor, Kellan. Eu não peço muito a você. Sei que fico implorando para você voltar para casa, mas o mínimo que você podia fazer já que está aqui, é dar uma olhada nas coisas, certo? Não é isso que você faz para viver? Pesquisa? Descobrir o que aconteceu em um crime e então escrever um show sobre isso?
Enquanto isso era uma explicação superficial sobre meu trabalho, ela estava certa. Eu tinha meus motivos para descobrir mais sobre Abby Monroe.
– Claro mãe. Vou ver o que consigo descobrir fazendo algumas perguntas... começando por Lorraine. É ela quem estou indo encontrar agora. Ela estava muito ocupada?
Minha mãe assentiu e tremeu por causa do vento.
– Sim, um pouco agitada. Eu tive a impressão de que ela sabia de algo, mas não estava confortável para me dizer agora. Tenho certeza de que você pode conseguir fazê-la falar. Lorraine sempre gostou de você.
– Existe alguma coisa que você se lembre da noite da festa que pode nos ajudar a descobrir com quem Abby estava indo se encontrar no Hall Diamante? – ela havia adiado o encontro para conversar comigo até às nove da noite, eu havia suposto que era para dar tempo de se encontrar com um aluno para discutir as notas às oito e meia.
– Eu não sei se isso tem alguma relação com a morte de Abby, mas vi alguém caminhando pelo lado de fora do prédio. Eu havia acabado de sair para procurar seu pai quando eu reparei no Técnico Oliver.
Era a segunda vez que eu ouvia aquele nome, mas não conseguia me lembrar porque.
– Quem é o Técnico Oliver?
– É o nosso diretor de esportes. Ele cuida dos times da faculdade, das práticas de campo, espaços atléticos e do Complexo Esportivo Grey, que é o nosso principal espaço esportivo. Ele é um cara legal, mas se você me perguntar, aquele homem me parece um pouco obcecado em ganhar todos os jogos, ao invés de manter os estudantes focados em seus estudos.
O que era típico, na minha humilde opinião. O trabalho dele era assegurar que Braxton tivesse os melhores jogadores, e vencesse todos os campeonatos.
– A que horas você o viu?
Minha mãe bateu o pé contra os degraus de concreto. Eu podia ver as engrenagens girando dentro da cabeça dela enquanto pensava sobre os eventos daquela noite.
– Cerca de oito e meia da noite. Eu acenei para ele, mas ele estava ao telefone. Parecia distraído. Eu tenho certeza de que ele planejava ir à festa, mas nunca apareceu.
– Me mostre exatamente onde você o viu. – eu a instruí. Ela apontou para o canto mais distante, perto de um carvalho e de um banco no estreito caminho que levava a um dormitório de estudantes. O Técnico Oliver havia estado perto da entrada dos fundos do Hall Diamante, onde a iluminação é fraca.
– Certamente você não está pensando que ele tem alguma relação com a morte de Abby, não é? – uma expressão sombria passou pelo rosto de minha mãe enquanto ela gemia de maneira exagerada.
– Eu não sei o que pensar. Tudo o que sei é que a mulher com quem eu deveria me encontrar está morta. Você está preocupada que a xerife esteja pensando que o pai esteja envolvido. E agora você me diz que viu alguém perto de onde Abby morreu em circunstâncias suspeitas. Você contou isso à Xerife Montague?
Um olhar vazio e distante me disse que ela não havia.
– Não, eu não acho que tenha contado para o policial que me interrogou. Será que devo ligar para ela?
Eu sacudi minha cabeça. Não parecia haver nenhum motivo para compatilhar essa informação. Eu encontraria uma maneira de ver se isso tinha alguma importância antes de colocar outro membro da família em frente da persistente xerife. Depois de se recuperar de suas preocupações, minha mãe foi em direção ao teleférico para voltar ao Campus Norte.
Era exatamente do que eu precisava, outro motivo para me colocar na linha de fogo da xerife. Fiquei curioso para saber se o Técnico Oliver tinha alguma coisa a ver com a postagem do blog ou com aquela ligação que eu havia escutado no escritório do meu pai.
Eu subi os degraus e entrei no Hall Diamante. Uma fita amarela bloqueava a entrada para a escadaria levando ao segundo andar. Um cartaz indicava que todas as aulas haviam sido relocadas para a Biblioteca Memorial durante a semana. Lorraine me chamou do outro lado do hall.
– Kellan, eu estou aqui.
Lorraine explicou que a Xerife Montague havia isolado o segundo e terceiro andares pelo resto da semana. Apesar de terem retirado o corpo de Abby e da equipe de limpeza ter ternimado de esterelizar a escada mais cedo naquela manhã, a xerife não queria ninguém nos andares superiores enquanto eles procuravam por potenciais evidências. Não era permitida a entrada de nenhum estudante, exceto alguns estagiários que ajudavam Lorraine com a administração diária do departamento de comunicações.
– Então, nenhuma notícia por enquanto? – eu perguntei.
Lorraine se aproximou para sussurrar:
– A Xerife Montague está lá em cima agora, olhando o escritório de Abby. Eles não me contam nada. É terrível.
Eu acho que não me seria oferecido a oportunidade de ver os pertences de Abby. Eu não esperava que a xerife aceitasse minha proposta, apesar de deixar as coisas muito mais fáceis.
– E o que está sendo dito aos estudantes?
Lorraine comentou que a posição oficial de Braxton era ainda a de total cooperação com a força de polícia local para descobrirem como Abby Monroe havia caído tragicamente para sua morte no sábado anterior. Para continuar com a investigação, o prédio estava fora dos limites aos estudantes até o próximo final de semana.
Lorraine reclamou de como essas mudanças haviam deixado seu trabalho ainda mais difícil. Aparentemente o motivo real pelo qual a assistente de meu pai estava trabalhando em um espaço no segundo andar do Hall Diamante era porque Siobhan, a gerente do escritório do departamento de comunicações, havia saído de licensa maternidade mais cedo naquele ano. Ao invés de colocarem um substituto pelos três meses que Siobhan estaria fora, foi pedido à Lorraine que ela ajudasse meu pai e os demais professores, enquanto estivesse temporariamente trabalhando no Hall Diamante. Sabendo que a aposentadoria do meu pai iria significar menos trabalho, Lorraine havia concordado em lidar com as responsabilidades adicionais e trabalhar da mesa de Siobhan.
– Eu sinto muito por você ter ficado presa com tantas coisas. Está aguentando bem com a xerife? – eu perguntei.
– Eu nunca havia encontrado um corpo antes. Fiquei contente por você ter estado aqui para me ajudar, Kellan. Eu não tenho conseguido dormir muito. – suas mãos se fecharam juntas, enquanto ela esfregava as palmas com os dedos nervosos.
– Lorraine, alguém mencionou ter escutado uma conversa recente que você teve com Abby. Algo sobre você possivelmente ter feito uma pequena ameaça contra ela. Eu não estou inteiramente certo sobre o que isso queria dizer, mas queria te perguntar diretamente. – eu disse casualmente.
Lorraine suspirou alto.
– Foi uma tolice minha, realmente. Não foi nada. Honestamente, a estagiária simplesmente entendeu errado o que eu disse.
– O que você quer dizer? – eu tinha que conseguir uma explicação dela.
– Eu acho que você vai descobrir de qualquer maneira. Isso não era de conhecimento geral, mas eu conhecia Abby Monroe fora de Braxton. Nós estavamos discordando sobre algo... pessoal. Isso não tem nada a ver com a morte dela. Eu nunca machucaria ninguém. – ela olhou para o lado e mexeu nervosamente em alguns papéis.
– A Xerife Montague acha que você fez algo com Abby? – eu indaguei. Minha mãe parecia estar sob a impressão que meu pai era um suspeito. Será que Lorraine também era uma? – Como você conheceu Abby?
– Meu irmão, Alton, havia entregado a ela os papéis do divórcio, mas ela se recusou a assiná-los durante um ano. Abby era uma mulher vingativa.
Lorraine me contou sobre a história deles. Abby e Alton haviam sido casados durante cinco anos, e então ele havia ficado cansado da atitude egoísta dela. Ele tentou recuperar o relacionamento, e até mesmo Lorraine havia conversado com Abby sobre os problemas. No fim, Alton determinou que o melhor seria se separarem. A discussão que Lorraine teve com Abby na semana passada havia sido sobre o divórcio. Abby havia ameaçado pedir uma grande soma de pensão alimentícia se Alton não desse a ela os direitos de um livro a ser lançado e que ambos haviam planejado de co-autorar.
– Alguém me escutou dizendo “vai ser só por cima do seu cadáver que eu vou deixar você tirar mais alguma coisa do Alton”. Mas eu não quis dizer literalmente, Kellan. Você tem que me ajudar a descobrir o que aconteceu com a Abby. – as bochechas fundas dela estavam coradas, e ela bateu sua cabeça contra a mesa.
Havia algo no tom de voz de Lorraine, o medo iminente sobre o que poderia acontecer se os policiais não conseguissem descobrir o verdadeiro assassino de Abby. Ela sempre seria uma suspeita do crime. Até onde eu sabia, ela não tinha marido ou filhos. Alguém precisava protegê-la de quaisquer acusações feitas contra ela.
– Eu não sei a hora exata que Abby foi morta, mas certamente a Xerife Montague vai entender que você só saiu da festa por alguns minutos para ir ao seu escritório.
– Pelo que a xerife disse, Abby foi morta entre oito e vinte e cinco e oito e quarenta e cinco daquela noite. Ela só havia morrido há pouco tempo antes de eu ter encontrado seu corpo. Eu não consigo encontrar ninguém que tenha me visto na festa depois das oito da noite.
– Vai ser mais difícil de provar que você não fez isso, é verdade. Você sabe pelo que eles estão procurando lá em cima? – a arma do crime devia ser parte da busca. Eu realmente queria saber qual teria sido.
– Eu escutei um dos policiais dizendo que eles haviam vasculhado todo o local e não conseguiram encontrar nada. Ainda não entendo pelo que estão procurando. Ela não foi empurrada escada abaixo?
Lorraine não sabia sobre o corte da parte de trás da cabeça de Abby, devido a um golpe brutal. Ou ela estava se fingindo de burra ou ela genuínamente não sabia que alguém havia acertado Abby na cabeça antes que ela caísse. Eu não achava que era minha responsabilidade de contar, então mudei de assunto.
– E o seu irmão está aguentando bem?
– Alton é meu meio-irmão, nós temos apenas a mesma mãe. É por isso que nós temos sobrenomes diferentes. Eu não consegui entrar em contato com ele. Ele saiu na semana passada para uma viagem de pesquisa e parece estar em algum lugar remoto onde não há sinal de celular. – Lorraine disse, secando seus olhos inchados com um lenço de papel. – Não tenho certeza se ele sabe que Abby está morta.
Se Alton estava realmente fora da cidade, então ele não podia ser o responsável pela morte de Abby. Eu tinha certeza que a xerife iria conferir o álibi dele. O cara perto da casa de Abby voltou à minha cabeça.
– Abby estava se encontrando com alguém novo, recentemente? Se ela estava se divorciando de Alton, talvez tenha algum novo homem na história.
Lorraine sacudiu a cabeça.
– Eu não ficava prestando atenção na vida amorosa dela. Alton também não se importava, ele só queria ficar longe. Eles tentaram manter uma amizade, mas ela era muito egoísta para isso.
Eu disse a Lorraine para ela pensar positivamente e cooperar o máximo com a xerife durante a investigação. A verdade surgiria em algum momento, e a Xerife Montague iria perceber que Lorraine não tinha relação com a morte de Abby. Eu não conseguia imaginá-la como a assassina. Infelizmente, isso siginificava que a xerife ainda poderia suspeitar de meu pai.
Eu olhei a hora e percebi que ainda não havia visitado Maggie e nem comido meu almoço. Depois de parar na cafeteria do campus, iria à Biblioteca Memorial. Eu precisava saber o que Maggie sabia sobre o diretor de esportes, pensando se ela conseguiria uma maneira de me apresentar ao Técnico Oliver.
Capítulo 8
Eu peguei o teleférico para voltar ao Campus Norte. Estudantes compartilhavam fotos e tweets em seus celulares, discutindo sobre qual arremessador deveria começar naquele sábado. Eu havia sido um louco por beisebol durante anos, mas morar em Los Angeles não era fácil para um fã dos Phillies. Eventualmente, eu havia desistido de discutir sobre beisebol e ao invés disso, resolvi escolher o futebol como esporte preferido. Enquanto o teleférico parava, uma lâmpada se acendeu em minha mente e eu soube como poderia me apresentar ao Técnico Oliver sem fazer parecer muito estranho.
Saí do teleférico e peguei o caminho mais curto até a cafeteria no prédio da união estudantil. O fluxo de pessoas almoçando estava diminuindo, então eu poderia entrar e sair rapidamente, mas não havia uma grande seleção de itens para viagem. Encontrei dois croissants de frango e um pacote de batatas sabor sal e vinagre, a favorita de Maggie.
Ninguém no balcão da recepção da biblioteca me impediu de entrar no prédio. Era ocupado por estagiários, que provavelmente estavam ocupados demais estudando ou olhando coisas impróprias nos computadores de referência. Eu virei à direita na seção de história, e encontrei Maggie sentada atrás de sua mesa no canto do escritório. Ela sorriu quando ouviu a minha batida na porta, e apontou para uma cadeira a sua frente.
– Eu trouxe um lanche, se você estiver com fome. – eu disse, notando que a decoração precisava, realmente, de uma modernizada.
– Você é meu salvador! A reunião de funcionários foi mais longa do que o esperado, e me esqueci de trazer meu almoço hoje. Eu pensei que iria sobreviver de iogurte da máquina de vendas e um Snickers. Por favor, me diga que isso é chips de batata?
– Isso vai ter um preço. – eu disse com um grande sorriso. – Meus honorários aumentaram desde o último ano da faculdade.
– Eu sei, nunca me esqueci das suas brincadeiras bobas, Kellan. Você sempre sabia como me fazer relaxar depois de um dia cansativo. – ela colocou alguns livros para o lado de sua mesa e abriu um espaço para nós podermos comer. – E qual é o preço de hoje? Guias de estudo para alguma prova? Escrever um artigo para você?
Maggie e eu havíamos nos encaixado bem um dia. Ela odiava estatística e tentaria qualquer coisa para que eu fizesse as tarefas dela. Muitas vezes eu me esquecia de verificar o nosso plano de estudos com a programação das datas das provas e inevitavelmente me lembrava apenas no dia que a prova estava marcada para acontecer. Eu implorava a Maggie para me mostrar as anotações dela e oferecia pagar pelo almoço durante uma semana em retorno.
– Inflação querida. Nós estamos falando de uma garrafa de champanhe de cem dólares, ou no mínimo, de uma cópia adiantada do último romance de Follet. Eu sei que você tem seus contatos sendo bibliotecária.
– Como se eu fosse dar a você antes que eu tivesse uma chance de lê-lo. Eu dificilmente acho que um pacote de chips de sal e vinagre vale tanto esforço de minha parte. – ela respondeu. Os olhos dela pestanejaram na minha direção, e por um momento, pensei que ela tinha me visto encarando-a.
– Verdade, eu acho que exagerei com esse pedido, não foi? Okay, hoje é por minha conta, mas da próxima vez esteja preparada. Eu não vou pegar tão leve com você.
Nós conversamos sobre o novo papel dela na Biblioteca Memorial. Ela iria dar um grande baile à fantasia no fim do semestre para quaisquer residentes de Braxton participar. Parte da esperança dela era que eles pudessem receber mais doações se o resto da cidade soubesse das mudanças que planejava executar em Braxton. Apesar de sua antecessora ter sido uma fantástica bibliotecária, a Sra. O’Malley não havia abraçado a tecnologia o quanto deveria. A faculdade tinha uma falta severa de acesso aos últimos hardwares e softwares para bibliotecas.
Enquanto terminávamos de comer, Maggie me surpreendeu trazendo o assunto da morte de Abby.
– Connor me disse que eles planejam anunciar hoje, mais tarde, que estão perto de identificar o assassino. Eu acho que eles vão ter que revelar que foi assassinato em breve, não é?
Eu não sei se estava mais preocupado que eles pudessem prender alguém que eu conhecia, ou sobre o fato de Maggie ter demonstrado o quão próximos ela e Connor haviam ficado nas últimas semanas.
– Sério? Eu conversei com ele essa manhã. Ele não mencionou nada sobre uma prisão. – eu contradisse.
– Ele me ligou há alguns minutos atrás. Fico feliz por nós termos nos reconectado esse ano. – ela disse com um certo brilho.
Um estagiário apareceu para perguntar se ele poderia sair quinze minutos antes, para um treino de beisebol não planejado. Maggie o deixou ir e desejou sorte no jogo de sábado.
– Então, o que exatamente você e Connor são nesses dias? – era melhor eu saber do que sentir que havia sido deixado no escuro.
Maggie tossiu e tomou um grande gole de água.
– Eu e Connor? Nós somos... bem, por que você está perguntando, Kellan? – eu já tinha visto essa expressão no rosto dela antes, apesar de que no passado era muito mais inocente.
– Yeah, quero dizer, vocês dois perderam contato assim como nós dois. Vocês são amigos novamente? São colegas que conversam de tempos em tempos? Você sabe o que quero dizer... – eu não queria perguntar diretamente. Já havia sido claro suficiente com uma questão aberta, mas ou Maggie não tinha certeza ou não se sentia confortável discutindo isso.
– Eu diria que nós somos amigos. Bons amigos. Ele tem sido de grande conforto desde que voltei. Connor tem me ajudado a descobrir como seguir em frente sem meu marido ao meu lado. – Maggie brincou com os livros em sua mesa, então se levantou. – Eu deveria voltar ao trabalho. Fico contente por você ter vindo hoje.
Aii! Eu estava sendo chutado para fora novamente, mas de uma maneira, fiquei impressionado sobre como Maggie havia se tornada direta e confiante.
– Nós temos que fazer isso novamente em breve. Eu tenho que ir também. Preciso passar no Complexo Esportivo Grey e falar com o Técnico Oliver.
Maggie inclinou a cabeça para o lado.
– Sobre o que é todo esse encontro?
– Oh, apenas para me apresentar. Minha mãe disse que eu deveria encontrá-lo. Só isso. – eu menti. Não era que eu não confiasse em Maggie, mas não tinha certeza de que isso fosse ajudar, devido aos momentos estranhos que tivemos. – O que você acha dele?
– Ele é um bom técnico. Ama seu trabalho, mas não é um grande apoiador de todo o propósito educacional para os estudantes matriculados em Braxton. É por isso que eu deixei aquele arremessador sair mais cedo. Se Jordan chegasse atrasado, o Técnico Oliver iria penalizá-lo na frente de todo o time.
– Isso é cruel. – não é de se imaginar que eu tenha ficado longe dos esportes na época da faculdade. Eu não teria aceitado isso, e provavelmente teria me metido em um monte de problemas. Posso ter tido um pouco de problemas com figuras de autoridade na minha adolescência e começo dos vinte anos, a desvantagem de ser inteligente demais pro nosso próprio bem.
– Um pouco, mas ele está tentando instigar um pouco de disciplina no time. Eles tiveram um ano difícil, e ele quer conseguir colocar alguns deles nas grandes ligas depois da graduação.
– Eu não concordo com a abordagem dele, mas talvez seu coração esteja no lugar certo. – eu disse.
– Viu, Kellan, seria legal jantar com você antes de você sair da cidade. Me ligue quanto tiver uma noite livre. Isso é bom pra você? – quando ela pegou minha mão, eu senti um choque passar pelo meu corpo.
Eu dei o meu maior sorriso desde que havia voltado a Braxton.
– Definitivamente. Eu vou te ligar em breve, Maggie.
– Eu nunca consegui resistir aos seus belos olhos azuis. – ela disse com uma piscadela que me deu arrepio.
Dez minutos depois, eu estava parado do lado de fora do Complexo Esportivo Grey, uma série de prédios de três andares, todos interligados por uma grande entrada central. Acima das portas da recepção no segundo andar, havia um grande pátio fechado com uma estátua de três metros de altura do fundador da faculdade, Heathcliff Braxton. Apesar de você conseguir ver o topo da estátua estando no chão, o jardim calmo que a rodeava — usado pelos estudantes na primavera e outono para palestras de educação física — só era acessível pelo segundo andar.
Eu ensaiei o plano da minha conversa com o Técnico Oliver. Eu sou um profissional, consigo fazer isso, disse a mim mesmo enquanto entrava pela recepção. Havia dois sofás e uma mesa, três portas além da qual eu tinha entrado, e uma tela de televisão mostrando as imagens de várias câmeras espalhadas pelo complexo. Eu pude ver o campo de beisebol, uma piscina, o que parecia ser uma quadra de tênis ou vôlei — a câmera estava num ângulo estranho — e a academia. Olhei ao redor da área de recepção tentando determinar para onde ir, mas alguém me parou no meio do caminho.
– Posso ajudá-lo?
Eu ouvi a voz, mas não consegui encontrar o corpo de onde ela tinha vindo. Eu olhei ao meu redor na sala pequena, mas estava sozinho.
– Hmm, eu adoraria me apresentar, mas onde exatamente você está?
– Por favor, diga o seu nome e quem você gostaria de encontrar.
Alguém foi bem mais rude do que precisava ser.
– Kellan Ayrwick. Estou aqui para ver o Técnico Oliver. Sério, onde você está se escondendo?
– Estou avisando o Técnico Oliver. Por favor, aguarde. – a moça que falava não estava em lugar nenhum daquela sala, me fazendo questionar minha sanidade.
Eu fiquei incomodado do porque ela não queria se apresentar. Tentei todas as três portas, mas elas estavam trancadas. Dois minutos depois, a porta do meio foi aberta. Depois de eu caminhar cerca de seis metros pelo corredor, outra voz me perguntou:
– Posso ajudar?
Ah, não de novo. Eu estava prestes a dizer algum palavrão, mas então percebi que dessa vez eu realmente ouvi uma voz masculina. Talvez ele pudesse me ajudar a encontrar o Técnico Oliver. Quando fiz uma curva e alcancei os degraus, eu vi um homem familiar se aproximando. Era o mesmo cara que estava sentado no sedã azul do lado de fora da casa de Abby Monroe. Todos os meus mundos estavam colidindo naquele momento.
Depois de passado o choque inicial, meu plano inteiro para encontrar com o diretor de esportes foi pela janela. Eu tentei a primeira coisa que consegui pensar.
– Oi. Havia uma voz que falou comigo na recepção. Eu não sou louco, ou pelo menos acho que não, mas eu disse à moça que eu estava procurando pelo Técnico Oliver.
O homem riu e estendeu a mão.
– Você veio ao lugar certo. Esse seria eu.
A sorte deveria estar ao meu lado hoje, mas isso só ligava alguns pontos para mim no meu quebra-cabeça. Eu estendi a mão e me apresentei.
– Ah, que ótimo. Então acho que estou seguindo na direção certa. Eu sou Kellan Ayrwick. Será que você poderia me explicar o que aconteceu lá atrás?
– Ah, sim. Nós estamos testando uma nova tecnologia. Ao invés de pagarmos para um estudante ficar sentado lá na frente durante o dia inteiro, e conferir os cartões de identificação de quem entra no prédio, nós instalamos um novo sistema de reconhecimento facial. O sistema não sabia quem você era então, pediu que você se identificasse. Quando eu ouvi você dizer seu nome, destranquei a porta para você poder entrar. – o Técnico Oliver me disse para segui-lo até o terceiro andar.
Eu me lembrava do blogueiro ter mencionado algo sobre uma nova tecnologia para o departamento de esportes.
– Isso é para os times esportivos? Eu vi algo similar na festa do meu pai na outra noite.
O Técnico Oliver respondeu:
– Ah, você é o filho deles. Sua mãe falou para usarmos esse sistema como uma maneira de controlar a entrada na festa de aposentadoria. Nós esperamos eventualmente usar por toda a faculdade, mas inicialmente nos jogos para ajudar a controlar o acesso e melhorar a segurança.
Enquanto o que ele dizia fazia sentido, eu ainda não conseguia entender completamente como isso funcionava.
– Então, isso quer dizer que eu estava falando com um robô ou computador lá naquela sala?
– Sim, uma câmera tira a foto quando alguém entra no edifício. Nós comparamos com os arquivos do sistema para garantir o acesso. Eventualmente, nós vamos gravar todos os seus movimentos dentro do nosso espaço atlético, mas por enquanto, o software de reconhecimento facial só está instalado na área da recepção. – chegamos ao terceiro andar nesse ponto, e ele virou à esquerda por um corredor. – Nossa nova academia é pelo corredor da direita.
– E o que mais vocês já instalaram até agora?
– Nós temos uma câmera perto da academia e várias ao redor do Campo Grey. Eles estão arrumando os controles por voz para a iluminação do terceiro andar no meu escritório e na sala de conferências. Apenas o mínimo até que nós terminemos os testes na próxima semana. O sistema ainda não está completamente funcional.
– Sistema legal. – eu respondi, sem estar convencido do seu valor potencial para o campus. – Braxton parece ser uma faculdade pequena para precisar de todos esses sistemas avançados.
– É uma maneira de avançarmos ao século XXI com a nossa tecnologia limitada. Precisamos parecer que estamos à frente se queremos ser notados pelas pessoas certas. – ele respondeu hesitante e com a respiração mais pesada.
– Está feliz com isso? – eu perguntei, pensando em quem ele esperava que os notasse. Potenciais estudantes?
– Todos sempre se esquecem de seus cartões de identificação. O reconhecimento facial tem nos ajudado em algumas de nossas operações, apesar de algumas pessoas terem conseguido entrar sem acesso apropriado. Acho que estão trapaceando. Eu apenas uso as ferramentas do sistema para controlar o desempenho dos jogadores e interagir com patrocinadores em potencial e empresários de gerenciamento de esportes.
– Como você conseguiu apoio financeiro para uma tecnologia tão cara? – eu me senti como o blogueiro pegando como alvo qualquer um que apoiasse o departamento de esportes.
– Não tenho certeza. Eu acho que o Conselho de Curadores conseguiu uma maneira de arrecadar fundos. – o Técnico Oliver havia começado a suar quando chegamos ao escritório dele. Será que foi por causa dos dois lances de escada ou por causa das perguntas sobre o dinheiro?
– Essas doações anônimas devem ter ajudado com todos os melhoramentos nos espaços atléticos, não é mesmo? – enquanto o Técnico Oliver pensava no que eu havia dito, eu pude ver que ele não dormia a algumas noites.
– Não tenho ideia sobre quem doou o dinheiro, e nem posso dizer muito sob o lado da segurança sobre isso. Talvez o nosso diretor de segurança possa explicar pra você. Como eu posso ajudá-lo hoje?
Ah, verdade. Eu tinha um motivo para encontrá-lo antes de perceber que ele era o mesmo cara que eu vi na casa de Abby.
– Eu vou ficar na cidade por alguns dias e sinto falta de fazer exercícios, mas não há nenhuma academia por perto. Pensei que talvez eu pudesse usar a academia da faculdade enquanto estou em Braxton. Eu não gostaria de pedir, mas ...
– Ah, sim, isso não vai ser problema. Seus pais são boas pessoas, eu faria qualquer coisa para ajudá-los. Seu pai é um grande apoiador do departamento de esportes. Eu ficaria feliz de garantir seu acesso com seu cartão de identificação e uma conta, então você pode usar a academia. Nós estamos abertos vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. – ele pegou seu celular e digitou alguns comandos enquanto me levava até a academia pelo corredor. – Você vai assistir ao nosso jogo de abertura nesse sábado? Estamos esperando casa cheia. – a excitação nas palavras dele voava de sua boca. Para alguém que havia potencialmente matado Abby, ou apenas perdido sua amiga, isso era curioso. Ou ele era um grande ator ou havia algo mais por detrás das cenas nesse mistério.
– Eu ouvi algo sobre uma rivalidade entre os dois arremessadores. Os nomes deles são Striker e Jimmy? – eu mantive meu tom simples, tentando parecer desinteressado e ao mesmo tempo como se fosse uma conversa normal.
– Jordan Ballantine. Ele era o arremessador reserva no ano passado. Eu costumava colocá-lo na sétima ou oitava entrada[i], quando Striker ficava um pouco cansado ou perdia muitas bolas. Eu passei bastante tempo com Jordan durante o verão. A sua nova bola curva foi uma surpresa. Ele chegou perto de cem quilômetros por hora. Ele tem chances de conseguir ir para as grandes ligas, mas Striker está por cima agora.
– Parece ser uma competição saudável. Já decidiu quem vai começar?
– Temos mais um treino nessa semana, então eu vou fazer o grande anúncio na sexta durante a reunião. – o Técnico Oliver respondeu. – Eu tenho que terminar de trabalhar em algumas coisas. Você pode vir à academia a qualquer hora. Essa é uma unidade top de linha, temos alguns novos equipamentos que vão fazer maravilhas nos seus músculos. – ele bateu na parte de trás dos meus ombros com força suficiente para me empurrar alguns centímetros.
Eu não podia deixá-lo ir assim facilmente.
– Eu aprecio isso. Minha mãe pensou que você gostaria de ajudar. Ela ficou chateada porque não te viu durante a festa. Ela pensou ter visto você caminhando naquela noite, mas você estava olhando para o outro lado, ou algo assim. Eu acho que você não conseguiu ir, não é mesmo?
O Técnico Oliver parecia uma raposa pega dentro do galinheiro.
– Ela me viu? Sério? Hmmm... eu fui até a festa e encontrei sua irmã, Eleanor, no lobby... ela estava saindo...
Eu fiquei quieto, deixando ele se contorcendo um pouco. Quando pareceu que ele não ia dizer nada mais, ajudei a memória dele.
– Eu acho que ela disse ter te visto do lado de fora do Hall Diamante.
– Ah, sim. – o Técnico Oliver disse com um tom ligeiramente mais alto. – Eu acabei de me lembrar. Eu estava atrasado para entregar minha programação para a próxima semana. O Presidente Ayrwick, quero dizer, seu pai, gosta de ter uma cópia da programação final dos futuros jogos toda sexta, então ele pode planejar as coisas de acordo. Eu encontrei com a assistente dele, que se ofereceu de entregar para mim.
Lorraine não havia mencionado isso para mim, o que era estranho. Certamente o Técnico Oliver não iria mentir sobre algo que eu poderia checar facilmente. Eu não queria aliená-lo, então assenti e tentei acalmar a conversa. Talvez ele admitisse conhecer Abby.
– Ah, então isso faz sentido. Meu pai é bem rigoroso com a programação dele. É uma vergonha o que aconteceu com aquela professora.
O Técnico Oliver disse:
– Definitivamente. É sempre difícil de ouvir sobre o falecimento de alguém, mas saber que ela teve um acidente em uma idade tão nova. Ela ainda era cheia de vida.
Já que ele havia aberto a porta, eu resolvi que podia entrar um pouco mais.
– Eu presumo que você a conhecia bem?
– Não, eu não diria isso. Eu encontrava por acaso com ela de vez em quando. Ela havia participado de um ou dois eventos. Coisas dos funcionários. Isso é tudo que me lembro. Tenho que correr, Kellan. Espero que você se junte a nós para o jogo de sábado.
– Obrigado novamente. – eu disse enquanto ele corria pelo corredor. Eu definitivamente o havia deixado desconfortável, e o peguei em pelo menos uma mentira, talvez duas. Dei uma espiada na academia e rapidamente determinei que os novos equipamentos haviam custado bastante dinheiro. Eu frequentava uma academia cara em Los Angeles, e mesmo o equipamento deles tinham alguns anos de uso. Eu tinha que concordar com o blogueiro que havia algo de incomum sobre as doações anônimas e sua distribuição para o Complexo Esportivo Grey.
Mandei uma mensagem para Nana D perguntando se ela estava por perto e queria companhia. Eu queria passar o máximo de tempo possível com ela enquanto estava por aqui.
Nana D: Estou ocupada. Eu tenho uma vida. Diferentemente de algumas pessoas.
Eu: Por que nós não marcamos um almoço por esses dias?
Nana D: Vá arranjar alguma vaca pra ordenhar ou uma pilha de tijolos para arrumar se você está entediado. Ou ligue para a Bridget.
Eu: Talvez você esteja forçando as coisas um pouco rápido demais?
Nana D: Não me ignore. Você tem que seguir em frente. Eu digo isso com amor.
Será que todos eram tão sarcásticos? E por que Nana D sentia que tinha que me arranjar com mulheres estranhas? Que tal uma mulher normal só pra variar... como Maggie... espere, será que eu estava pronto para começar a sair com uma mulher novamente?
Capítulo 9
Na terça de manhã, eu acordei cedo e me forcei a ir visitar o Complexo Esportivo Grey para fazer meus primeiros exercícios em cinco dias. Eu notei Jordan, o estagiário que trabalhava na Biblioteca Memorial e que era o novo concorrente do Striker, correndo em uma das esteiras. Havia também uma bela loira pedalando furiosamente. Quando passei por ambos, eu ouvi Jordan dizer alto “Você vai bater o seu recorde, gostosa!”. Ela sorriu para ele, e ambos voltaram aos seus exercícios.
Ao invés de focar em uma parte específica ou em um grupo de músculos, eu testei vários dos novos equipamentos e fiquei familiarizado com eles. Apesar de não pretender ficar em Braxton por muito mais tempo, era melhor eu tomar vantagem da oportunidade enquanto a tinha.
Quando cheguei em casa, eu arrumei um almoço mais adiantado — milk-shake de proteína sabor chocolate com leite de amêndoas, manteiga de amendoim, morangos e linhaça. “Não recuse isso até provar,” eu me lembrei da propaganda do preparador de sucos dizendo isso. Desde aquela apresentação, isso havia se tornado meu novo almoço padrão em dias de treino. Eu desbloqueei meu iPad, abri o aplicativo de FaceTime e liguei para minha filha. Como esperado, ela aceitou minha ligação, provavelmente sem a ajuda da avó, e acenou um olá para mim.
– Olá, minha preciosa. Bom dia para você.
– Papai! Como você está? – ela respondeu. Apesar de ela saber como segurar apropriadamente o dispositivo, para que a câmera filmasse o rosto dela, ela não conseguia parar de pular no sofá de tanta animação.
– Calma, querida. Eu vou acabar ficando tonto.
– Desculpa, papai. Mas se você também pulasse, talvez fosse parecer como se nós dois estivéssemos parados.
Eu não encontrei muitas falhas na lógica dela sobre não ficar tonto. Talvez ela estivesse no caminho certo.
– O que você tomou de café da manhã? – eu perguntei, percebendo as manchas de mirtilo nos lábios dela. Ela adorava comer frutas e não ligava muito para doces. Eu me perguntava com frequência se ela era mesmo minha filha.
– Bear berries. Hmm, a vovó disse que nós podemos ir ao zoológico. Eles têm um novo bebê girafa.
Emma estava na fase de ficar obcecada com animais e queria ir ao zoológico todo final de semana. Eu tentava sugerir outros lugares, como o planetário ou a praia, mas nada havia substituído o zoológico em meses. Em algum momento, você tem que ceder se quer manter sua sanidade como pai.
Eu contei a Emma sobre Nana D tocar clarinete há muitos anos. Ela pediu para ter algumas aulas depois da próxima visita ao zoológico. Quando o desenho dela começou a passar, ela jogou o iPad para a avó. Cecília acenou um olá e perguntou quando eu estaria de volta. Mais uma pessoa para acrescentar a minha lista de agravos.
Enquanto o fato de que os pais de Francesca eram ótimos avós, eles eram sogros terríveis. Será que eles ainda eram meus sogros se eu não era mais casado com a filha deles? Se eu me casasse novamente, não que eu esteja remotamente pronto para considerar isso por enquanto, tenho certeza de que eles não seriam mais meus sogros. O ponto é... eles foram incríveis com Emma quando Francesca faleceu. Mas alguns meses depois do enterro, assim que a vida começou a se acalmar novamente — o tão normal que pudesse ser para um viúvo de trinta e dois anos com uma filha de quatro — eu comecei a notar mudanças infelizes. Vincenzo e Cecilia Castigliano apareciam sem avisar em minha casa com um pedido para que Emma dormisse com eles, dizendo que sentiam falta da filha deles e queriam senti-la mais perto. Uma tarde, a Creche Happy Tots ligou para dizer que os avós de Emma queriam pegá-la para uma tarde fora. Eu tentei manter uma mente aberta sobre as mudanças de comportamento dos Castiglianos, mas no aniversário de um ano da morte de Francesca, Vincenzo entrou quieto em meu escritório para me informar que ele e Cecilia haviam decidido que seria melhor que Emma morasse com eles. Eu sempre soube que Vincenzo tinha alguns negócios obscuros acontecendo, mas nunca soube da extensão até aquela noite quando a irmã de Francesca desabou em prantos e revelou que o pai delas fazia parte de uma gangue de Los Angeles. Eu comecei a perguntar pelas vizinhanças, e um colega meu comentou que a família Castigliano não fazia apenas parte de uma gangue de Los Angeles. Eles eram a principal família que mandava na gangue de Los Angeles.
Apesar de eu geralmente não entrar em confronto, precisava da ajuda dele já que eu era um pai solteiro e não planejava me mudar de volta à Pensilvania. Eu tive que deixar claro que Emma nunca deveria ser colocada em qualquer situação perigosa por causa do negócio de família dele. Vincenzo encolheu os ombros, grunhou e disse: “Eu não sei sobre o que você está falando. Nós temos um adorável negócio de importação e exportação. Muito calmo e seguro.” Acho que nós chegamos a um acordo, mas se eles saíssem da linha, eu não teria medo de tomar uma decisão mais drástica.
Depois que eu terminei a ligação com Emma e Cecilia, recostei minha cabeça contra o balcão e fechei meus olhos. Eu estava esgotado e precisava de um momento de silêncio. O ruim é que isso não ia acontecer.
– Boa tarde, Kellan. Já era hora de você estar acordando. – meu pai comentou enquanto estava parado com um copo de água e um prato com migalhas de torrada integral nas mãos.
– Eu estou acordado desde as oito. Não se esqueça de que isso quer dizer quase cinco da manhã para mim, por causa da diferença de horário. Eu ainda não me ajustei. – eu gostaria de saber se ele estava falando sério ou só me provocando.
– Você é jovem suficiente e isso não deveria importar. Na sua idade, eu já tinha...
– E o que você está fazendo em casa? – eu não aguentava mais as comparações das nossas vidas. Ele sempre vencia. – A sua aposentadoria já começou?
– Como a sua mãe e Lorraine lhe contaram ontem, eu não posso voltar ao meu escritório até que a xerife termine as buscas no prédio. É mais fácil fazer a maior parte do trabalho em casa pela manhã, então vou para o campus durante a tarde para algumas reuniões. Eu não vou mais usar o escritório temporário e pedi ao departamento para colocar meus móveis em um depósito até que a reforma termine.
– Lorraine te conta tudo o que eu converso com ela? – eu perguntei. Eu teria que ser cuidadoso com o quanto eu falava o que realmente pensava na frente dela no futuro. – Ela por acaso te contou o quanto está preocupada com o que a Xerife Montague quer de você?
– Nada com o que você precise se preocupar, Kellan. A xerife e eu estamos em um bom terreno nesse desastre todo. Eu estou confiante de que eles vão fazer a coisa certa e logo. – ele respondeu. – Enquanto você está aqui, preciso conversar com você sobre algo.
Ah, ótimo. Se ele me perguntasse novamente quanto tempo eu pretendia ficar, eu iria fazer minhas malas naquela tarde e pegar o próximo voo, não importando o preço ou o destino, mesmo que Derek me demitisse. Por falar em Derek, provavelmente eu estava devendo uma atualização.
– O que você tem em mente? Eu também tenho algumas perguntas para você, pai.
– Pode ir primeiro. – meu pai se sentou em um banco da cozinha e me encarou.
– Para onde você foi na noite da sua festa de aposentadoria? A mãe está preocupada com você. Tem algo de muito estranho por aqui. – eu não queria falar sobre a conversa telefônica que havia escutado, por enquanto.
– Bem, já que você colocou isso de forma tão eloquente, Kellan, eu estava fazendo meu trabalho. Nem todos nós temos a liberdade de ir e vir ou escolher os projetos nos quais queremos trabalhar. Tive uma reunião de emergência com o Conselho de Curadores sobre algo urgente que surgiu perto do fim da reunião deles.
– Eles tiveram uma reunião no sábado à noite? – eu perguntei julgando. – Quem faz isso?
– Se você quer saber, eles estavam discutindo as recomendações finais sobre o novo presidente antes das entrevistas. A reunião deles foi pausada quando todos foram à minha festa. – ele virou suas palmas da mão para cima, então as puxou de volta ao corpo e as cruzou no colo.
Eu tive uma súbita vontade de imitá-lo, mas não o fiz porque isso não teria me conquistado nenhum favor.
– E alguma novidade sobre o blogueiro? Eu não consegui me lembrar do nome do site para poder conferir por mim mesmo.
– Sim, teve outra postagem no domingo falando sobre a opulência da minha festa de aposentadoria. – ele ficou pálido enquanto falava, o que me fez debater se ele era mais humano do que eu havia pensado. – Sua mãe e eu pagamos aquela festa do nosso bolso. O Conselho queria cobrir todos os custos, mas nós insistimos que eles já haviam me dado um maravilhoso presente de despedida e não precisavam gastar mais nenhum dólar em gratidão pelos meus anos de serviço em Braxton. – ele me entregou o celular dele para que eu lesse a postagem:
Se você não participou da grande cerimônia do sábado à noite, perdeu uma recepção digna da realeza. Entre aromas exóticos e o execesso de comidas diferentes, eu achei a admiração de todos por Wesley Ayrwick algo doentio. Não consegui me forçar a ficar por muito tempo. Eu esperava compartilhar fotos, mas um segurança que nos tratou como criminosos proibiu qualquer foto ou gravação de vídeo. Será que nós devemos nos curvar para nosso rei? Talvez ele devesse falar menos sobre os novos uniformes do time de beisebol e mais sobre a questionável fonte das doações anônimas que foram frivolamente gastas em todos os lugares errados. Dei uma passada no Complexo Esportivo Grey e descobri quais foram os novos e ridículos sistemas que foram integrados ao nosso amável complexo esportivo. Eu consegui escutar uma conversa sobre um visitante especial ao campus que estaria chegando, e um cidadão bem conhecido vai ficar tremendo em suas botas assim que eu revelar o que está acontecendo por detrás das nossas costas. Aguarde minha próxima postagem para revelar todos os segredos dessas travessuras obscuras.
Quando perguntei ao meu pai se ele sabia sobre o que a postagem estava falando, ele tentou mudar de assunto. Comentou como os estudantes pensavam que o blogueiro era uma distração engraçada, mas davam pouca consideração às suas mensagens. Eu relembrei da conversa que meu pai teve com Myriam naquela noite, onde ela o acusou de gastar o dinheiro da faculdade de maneira que provavelmente não deveria. Ele deixou que ela acreditasse que todos os custos da festa haviam sido cobertos pela Braxton, e nem mesmo havia tentado se defender. Talvez ele estivesse aprendendo a não discutir tanto com as outras pessoas, só não comigo.
– Você acha que Myriam Castle pode ser quem está fazendo esta cruzada contra você?
– Duvido. Myriam e eu podemos soltar umas faíscas de vez em quando, e ela não gosta particularmente de mim. Mas ela geralmente não é uma pessoa de se esconder atrás de palavras. Ela viria na minha cara e me acusaria.
Ele tinha um bom ponto sobre o porquê ela iria ter um blog anônimo e ainda assim acusá-lo de coisas similares em encontros públicos, onde qualquer um poderia ter escutado a conversa.
– E quanto a nova tecnologia sendo instalada no Complexo Esportivo Grey? Como conseguiram fundos para isso?
– Eu não sei de todos os detalhes do que acontece detrás das cenas em Braxton. Isso foi decidido pelo Conselho de Curadores. Talvez você devesse conversar com o Vereador Stanton sobre isso. Ele está no Conselho. – ele respondeu. – Isso é tudo?
Nana D seria a pessoa perfeita para perguntar ao vereador. Já que eu não conseguia encontrar uma maneira de trazer o assunto da conversa telefônica, pulei para outros assuntos que tinha que conversar com meu pai.
– Por que você não me contou que Maggie e Connor estavam trabalhando em Braxton? Eu estava aqui em dezembro passado, e você poderia ter me dito algo. Ou pegado o celular uma hora dessas e me contar.
– Eu não achei que fosse importante. Você não os havia mencionado em uma década. Eu supus que você tinha perdido contato e não se importava muito sobre o que havia acontecido com eles. Você nunca foi do tipo que se reconecta com o passado.
Ai. Os golpes estavam de volta com força total.
– Isso é um pouco injusto, pai. Eu posso ter perdido contato, mas a mãe faz caminhadas semanais durante o café com a Maggie. Connor é o seu diretor de segurança.
– Eu pensei que você ficaria feliz que contratei seus amigos. Alguns podem dizer que isso é nepotismo.
Por que ele sempre sabia o que dizer para me fazer ficar quieto? E por que eu sempre me sentia com cinco anos quando estava perto dele? Já que fazer pirraça não era uma opção, controlei minhas frustrações e passei para o grande tópico.
– Quem você acha que matou Abby Monroe?
– Isso é um assunto para a Xerife Montague. Eu posso lhe dizer que não fui eu e nem a Lorraine. Já deixei isso claro. O que a xerife vai fazer em seguida, eu não sei, mas espero que ela me escute sobre esse assunto.
– O que significa ... – sério, será que alguém mais tinha esses problemas com seus pais?
– Nós tínhamos um relacionamento complicado. Eu gostava de Abby como pessoa, mas ela não estava qualificada para a posição que ocupava. O Conselho de Curadores estava preocupado com os possíveis processos judiciais se nós tentássemos demiti-la. Ao invés disso, mantivemos controlado o poder dela. – ele disse enquanto cruzava os braços e franzia a testa. – Eu tinha uma boa fonte que dizia que ela estava procurando por emprego antes daquele incidente de sábado, então eu não estava muito preocupado sobre quanto tempo mais ela iria ficar em Braxton. A mulher havia feito inimigos e estava passando por um divórcio complicado. A xerife planeja investigar esses ângulos e com sorte colocar um fim nesse caso todo. Podemos agora discutir o que eu queria te falar?
Claramente era sobre Abby quem meu pai estava conversando naquela ligação que eu havia escutado. Eu considerei tudo o que ele havia me falado e concluí que talvez ele tivesse uma boa teoria sobre a investigação.
– Sim pai, vá em frente. Estou ouvindo. – eu supus que isso tinha alguma coisa a ver com Emma ou com minha mãe.
– A morte de Abby deixou um buraco no departamento de comunicações. Tem apenas outra professora que tem experiência nos estudos da mídia, mas ela está cobrindo algumas das reponsabilidades administrativas de Abby para o Reitor Mulligan. Nós não temos ninguém que possa ensinar as aulas dela durante algumas semanas até encontrarmos um substituto adequado. – ele fez uma pausa e esperou para ver se eu tinha alguma reação. Se eu me lembrava corretamente, o Reitor Mulligan, o chefe da Abby, era quem controlava todos os departamentos acadêmicos.
Eu suspeitava de onde ele estava querendo chegar com aquela conversa, mas queria que ele me perguntasse diretamente, antes que eu metesse os pés pelas mãos.
– Eu imagino que esse é um dilema e tanto. Você já solucionou problemas maiores antes.
– Isso eu certamente já fiz. Eu também devo anunciar o novo presidente na semana que vem e fazer a transição das minhas responsabilidades, ajudar a xerife e Connor a minimizar o impacto dessa tragédia no resto do campus, e aceitar todas essas mudanças na minha vida. Eu não estou ficando mais jovem, Kellan, e apesar de parecer que posso fazer tudo de uma vez, eu não posso.
Uau. Eu acho que nunca ouvi meu pai admitir uma potencial fraqueza antes.
– Eu não sei, você é bem forte e persistente.
– Enquanto isso pode ser verdade, já é hora de deixar alguém mais tomar esse papel na nossa família. Como um começo, eu gostaria que você assumisse a responsabilidade das aulas de Abby até que o Reitor Mulligan possa decidir como lidar com a potencial reorganização do departamento e encontrar um substituto para ela.
Depois que um vazio de quinze segundos ocupou todas as noções de vida dentro da minha cabeça, eu encontrei a coragem para responder.
– Eu aprecio sua fé em mim, pai, e eu estou honestamente tocado por você...
– Eu ainda não terminei. Deixe-me colocar isso pra fora. – ele respondeu se afastando do balcão e indo em direção à janela aos fundos. – Você está cansado de todos te perguntando por quanto tempo você vai ficar ou quando você planeja se mudar de volta. Você mencionou sentir a falta de seus amigos. Sua mãe quer passar mais tempo com Emma. Assim como eu quero. Você tem se mantido distante dessa família por um motivo, e eu não posso mais deixar isso acontecer.
– Pai, por favor, não diga mais nada. Eu não quero ter essa conversa. – eu sabia onde ele estava querendo chegar. Ele já tinha tentado isso antes. Nós tivemos uma grande briga quando eu saí no Natal dois anos antes depois de acusá-lo de afastar todos seus filhos.
– Kellan, eu não estou dizendo que você está certo ou errado. Estou dizendo que você tem feito as coisas do seu jeito desde que Francesca faleceu. Eu sei que eu não estava lá quando aconteceu. Admito que nunca me importei muito com ela. Mas ela era sua esposa, e a mãe de Emma, e eu deveria ter sido um pai melhor. – ele colocou a mão em meu ombro. Eu não havia escutado ele se aproximar nesses poucos segundos abaladores. – Tudo o que estou te pedindo são três semanas a um mês.
Eu disse a meu pai que precisava do resto da semana para pensar sobre a proposta dele e que lhe diria minha decisão no final de semana. Eu o deixei na cozinha e corri para a garagem. Não sabia para quem me voltar no momento, mas as palavras dele tinham acertado bem perto do meu coração.
Eu passei o resto do dia dirigindo por Braxton e pensando sobre todos os bons tempos que tive no passado com meus amigos da faculdade e família, incluindo quando Francesca e Emma vieram comigo durante algumas viagens. Havia muita história na minha cidade natal, e parte de mim queria estar de volta agora que as coisas tinham uma chance de serem diferentes. Mas pegar um trabalho temporário talvez significasse arriscar a oportunidade de conseguir meu próprio show de televisão para escapar de Derek, e conquistar algo que eu havia sonhado durante anos. Eu tinha que pensar muito mais antes que pudesse tomar qualquer decisão definitiva.
Não querendo piorar o meu humor conversando com a xerife, eu deixei essa tarefa para o dia seguinte. Também precisava contar ao Connor como o Técnico Oliver havia mentido para mim sobre o quão bem ele conhecia Abby. Independentemente do relacionamento deles, ele estava olhando a correspondência dela quando eu estava parado lá. Se ele estava mentindo para mim, talvez também estivesse mentindo para a xerife. Primeiro eu precisava dormir um pouco, e então iria lidar com todos esses problemas quando acordasse na manhã seguinte.
Capítulo 10
Quando a quarta-feira chegou, eu me senti mais forte e vivo. Ter ido à academia no dia anterior me ajudou a ficar motivado para pensar no futuro. Eu decidi retornar para ver se conseguia gastar um pouco da minha frustração e raiva. Estava ainda mais quieto do que no dia anterior, pois havia somente mais uma pessoa fazendo exercícios peitorais como se o peso somado não fosse mais do que o de um travesseiro.
Eu me aproximei da máquina de LAT que estava à direita dele, ajustei a altura do banco, e escolhi o peso que eu conseguisse aguentar. Estava prestes a começar quando o outro cara falou comigo.
– Hey, será que você poderia me ajudar com os pesos por alguns minutos? Não teve mais ninguém por aqui a manhã inteira. – ele usava um boné de beisebol e uma camiseta de manga longa da faculdade com o número três escrito.
Eu não tinha certeza de que podia levantar o mesmo peso que ele podia, mas iria tentar.
– Sem problemas. Você está no time de beisebol? – eu supus, me baseando na roupa e no logotipo que ele vestia. Interpretei o grunhido dele enquanto erguia o peso como um sim, então fiz mais perguntas entre as séries.
O cabelo escuro dele estava cortado curto, e ele não se barbeava há alguns dias.
– Sim, meu nome é Craig Magee, mas todos me chamam de Striker. Eu sou arremessador do time. – ele respondeu. – Você é um estudante daqui?
O famoso Striker. Será que ele sabia quem iria começar arremessando no jogo de sábado? O Técnico Oliver disse que ele não revelaria a decisão até sexta-feira para o público.
– Eu? Ex-aluno, mas obrigado pela massagem no meu ego, cara. – eu gostava de saber que às vezes podia me passar como tendo vinte anos. – Eu sou Kellan. Ouvi um pouco sobre você. O que significa o número três?
– O número de lançamentos que eu preciso para tirar todos os batedores da jogada. Três strikes de uma vez e eles sempre saem. – ele disse com um grande sorriso.
– Esperto. Está pronto para o jogo de sábado?
– É por isso que estou aqui hoje. O último treino antes da pré-temporada é amanhã, e então o técnico vai tomar sua decisão sobre quem vai jogar. – ele não ficava sem fôlego, não importava quanto peso fosse acrescentado.
– Eu tenho certeza de que todo esse foco extra será útil. – eu respondi enquanto Striker terminava sua terceira série, aumentando o peso em dez a cada vez. Eu estava chegando ao meu limite sobre o quanto podia aguentar, mas não queria parar o momento dele. Eu poderia me forçar a segurar mais se necessário.
– Sim, acho que tenho tudo sob controle, mas não é apenas sobre o treino de amanhã. Eu estou esperando algumas notas para ter a confirmação se vou poder jogar. O Reitor Mulligan começou a ficar de olho nas minhas notas e ameaçou tirar minha bolsa se minhas notas caíssem abaixo de 3.0 no fim do semestre.
– E como você planeja consertar isso? – eu perguntei me lembrando da conversa que ouvi Abby tendo com alguém ao telefone em frente à Biblioteca Memorial. Será que ela estava falando sobre se encontrar com Striker às oito e meia daquela noite?
– Eu estava bem no limite, mas o reitor disse que eu podia jogar contanto que eu mantivesse o conceito “B+” durante todo o semestre. Estou esperando por duas notas da minha aula de biologia e da Professora Monroe.
– Monroe não é aquela professora que teve o acidente no final de semana passado? – eu perguntei me fingindo de tolo para ver o que mais ele iria revelar. Eu não tinha percebido que vir à academia poderia ser uma conexão útil nessa manhã. Parabéns pra mim por fazer a coisa certa. Nana D estava certa, eu era brilhante.
– Yeah. – ele resondeu, antes de se secar em uma toalha. – Eu estou confiante de que fui bem na prova de biologia. Devo ficar sabendo nessa manhã. Nós não temos certeza se a Professora Monroe entregou as notas antes... – ele fez um som de BOOM e deixou a cabeça cair para o lado.
Eu estava lidando com alguém tão maturo quanto eu havia sido um dia.
– Você acha que a Professora Monroe te deu uma nota boa?
– Duvido. Por algum motivo, ela não gostava muito de mim durante o semestre passado. Foi ela quem me reprovou. É por isso que peguei aulas com ela de novo em Introdução aos Filmes. É uma das minhas matérias eletivas e infelizmente era a única que combinava com a minha agenda entre o beisebol, trabalho e as outras aulas. – Striker me cutucou para fazer minha própria série de levantamentos. – Vá em frente, é a sua vez.
– Se você precisar de ajuda com a matéria, eu posso lhe dar aulas. Eu era um estudante de comunicações aqui a alguns anos atrás, e estou bem familiarizado com o currículo de broadcasting.
– Sério, você me ajudaria? Eu mal conheço você. – a cordialidade e o sorriso dele eram contagiantes.
– Você parece um cara legal. Além disso, eu conheci o Técnico Oliver ontem. Ele está contando com você para levar o time ao campeonato este ano, até mesmo te levar para as grandes ligas, tenho certeza. – eu não queria alimentar as esperanças do Striker, mas ele podia ser a ligação no que estava acontecendo entre o Técnico Oliver e Abby. Ou será que ele poderia ter sido a pessoa que nocauteou Abby na cabeça e a empurrou escada abaixo.
Quando nós terminamos de nos exercitar, eu dei a ele meu número de celular e lhe disse que ficaria na cidade durante alguns dias. Ele mencionou que iria me contar sobre as notas dele.
– O Técnico Oliver era amigo da Professora Monroe? Eu me pergunto se ele tentou falar com ela sobre te ajudar com as aulas. – parecia incomum que aqueles dois tivessem algum tipo de relacionamento quando havia uma estrela do beisebol no meio. Eu também me lembrei de minha mãe mencionando sobre a política de relacionamentos pessoais entre certos departamentos depois de um escândalo no ano passado envolvendo um membro da equipe acusado de abusar de alguém. Será que o Técnico Oliver era o culpado?
– Não sei dizer. Eu tentava ficar o mais longe possível da Professora Monroe. O Técnico Oliver disse que me ajudaria como pudesse, mas eu não sei se ele tentou algo depois que ela me reprovou no semestre passado. – Striker bebeu água no bebedouro, então limpou o banco com uma toalha molhada. – Eu vou aos chuveiros. Tenho aula daqui a trinta minutos. Obrigado por me ajudar hoje.
– Sem problemas. Boa sorte, Striker.
Depois que ele saiu, eu terminei meus exercícios e refleti sobre tudo o que havia ficado sabendo nos últimos dias. Será que a Xerife Montague havia conseguido as mesmas informações e decidido como esse misterioso quebra-cabeça chegou ao assassinato?
Quando peguei meu celular para ligar para ela, eu vi que tinha um novo email de Derek com o nome de um hotel e uma cópia do registro de check-in dele. Eu percebi que ele havia dado o check-out no dia anterior, o que significava que ele estava de volta a Los Angeles. Disquei o número para reservas e fingi ser ele pedindo a conta final. Enquanto eu escutava uma bela, mas irônica, versão de Smooth Criminal do Michael Jackson, fui até o vestiário para pegar uma toalha antes de tomar banho. A recepcionista voltou à linha e confirmou as compras que eu havia feito no quarto no sábado e domingo, bem como a taxa extra contra danos que eu havia feito no quarto no dia anterior. Ela mencionou que foi a primeira vez que tiveram que trocar um colchão devido ao mau uso por um hóspede. “Oops, foi mal”, eu disse, tentando soar como Derek sentindo uma sensação de falsa culpa pelo que ele havia feito.
A não ser que Derek tivesse enviado alguém ao Havaí em seu lugar, permitindo que ele viesse a Braxton, um lugar do qual ele provavelmente nunca havia ouvido falar, ele provavelmente não havia matado Abby. Eu me senti melhor sabendo que não estava trabalhando para um assassino, mas ainda tinha que ligar para ele. Depois de tomar um banho e perceber uma melhora na definição dos meus músculos, liguei para ele no FaceTime, para confirmar o que ele havia dito. Apenas para colocar um sinal de confirmado no álibi dele, aproveitei e perguntei se ele conhecia alguma boa loja de colchões, dizendo que eu estava no mercado tentando encontrar um novo. Pela situação do que eu dormia atualmente, isso não estava muito longe da verdade.
– Cara, eu não sei, mas ligue e pergunte naquele hotel. De alguma forma, eu e minha companheira conseguimos quebrar as molas. Eles ainda tiveram a audácia de cobrar uma taxa extra! – ele nem piscou e nem tremeu o lábio. Havia contado a verdade.
Com o álibi agora confirmado e meu estômago protestando, eu o atualizei sobre a morte de Abby estar sendo considerada oficialmente como assassinato. Ele respondeu:
– Kel-baby, você tem uma história e tanto. Talvez nós pudessemos fazer uma reestruturação da nova temporada para ser sobre a morte dela. Descubra tudo o que você conseguir hoje. Essa é a sua prioriadade. Faça o que precisar.
– Sim, vou fazer isso. – dessa vez eu desliguei a ligação, sentindo um pouco de orgulho e um sentimento de realização. Eu ainda queria saber o que ele havia feito com aquele colchão, mas então, era melhor não saber! Agora eu tinha vários motivos para me manter envolvido no caso.
Eu liguei para a delegacia para saber se a Xerife Montague estava no escritório dela, mas o Policial Flatman me disse que ela havia ido até Braxton para se encontrar com Connor. Perfeito, eu poderia conversar com ambos ao mesmo tempo, isso é, depois que eu passasse na The Big Beanery para pegar a propina — eu quis dizer um gesto carinhoso com eles.
Vinte minutos mais tarde, eu estacionei em uma vaga para visitantes a algumas quadras de distância e corri para o escritório do SCB. Quando cheguei, eu vi a careta se formando no rosto da Xerife Montague do lado de fora.
– Boa tarde. – eu disse através da porta, então a abri e entrei no hall de entrada. – Eu pensei em parar por aqui para visitar meu velho amigo Connor. Que coincidência te encontrar por aqui. – eu coloquei os três copos de café e os donuts no balcão em frente a eles. – Por acaso eu tinha um copo extra se você estiver interessada, Xerife.
– Pequeno Ayrwick, você está me testando... Flatman já tinha me mandado uma mensagem sobre você estar procurando por mim. O que você quer? – ela tinha aquela clássica aparência irritada dos detetives, as mãos nos quadris, blazer de tweed muito apertado nas costas que empurrava seus ombros para cima, lábios apertados, e francamente, o mesmo olhar que Nana D tinha quando comia ameixas demais.
– Eu pensei que você iria querer ouvir algumas coisas que fiquei sabendo nessa semana. Talvez você pudesse me dar um update sobre o acesso ao escritório da Abby, ou sobre qualquer coisa relacionada ao caso? – eu dei um passo para trás, no caso dela começar a querer me bater, mas ou ela tinha se segurado com um enorme esforço, ou estava considerando minha oferta.
– Algo me diz que você não vai sair daqui até que eu escute o que essa sua mente tem pra me dizer. Se você tem alguma informação útil para compartilhar, talvez me sinta obrigada a retornar o favor. O que foi que fez essas calcinhas de renda roxa subirem...
Dessa vez Connor cuspiu seu café.
– Ih cara, ela tá de olho. É melhor você tomar cuidado.
A interrupção dele pelo menos a impediu de terminar de falar. Por mais que a atitude dela me incomodasse, eu gostava quando faziam brincadeiras comigo. Se ela soubesse que uma vez eu tive que usar calcinhas de renda roxa depois de perder uma aposta com Connor no nosso primeiro ano. Será que eu e April Montague poderíamos ser amigos em outro universo? Quando eu pensava em ter que olhar para aquele horrível blazer de tweed enquanto tomávamos uns drinks ou em um jogo de futebol, eu encontrei a resposta óbvia. Eu me impedi de vomitar.
– Bem, eu fui até a casa da Abby para ver se ela tinha algum colega de casa ou marido que pudesse me deixar entrar, mas quando eu cheguei lá... – eu recontei tudo o que havia descoberto até o momento. – Pode ter sido apenas uma coincidência, ou a reunião na noite do assassinato de Abby pode ter mudado de horário. Apenas senti que era minha responsabilidade de compartilhar as notícias.
A Xerife Montague sorriu por um minuto inteiro.
– Nada mal para alguém sem experiência, metendo o nariz por aí. Você descobriu algumas coisas que meus detetives ainda não conseguiram. Eles vão sofrer, obrigada. Nós sabíamos sobre a vizinha dela e que Abby tinha sido vista com alguém, mas não sobre esse alguém ser o Técnico Oliver. Eu aprecio as dicas, mas nós estamos conferindo as ligações telefônicas dela. Da próxima vez... um, não fique me enrolando antes de me contar, e dois, fique fora do meu caso. Você já foi avisado para não interferir.
– Espere um minuto! Eu fiquei sabendo de fonte segura que você quase completou as buscas no escritório da Abby, ainda assim não recebi nenhuma ligação me dizendo quando e onde eu poderia ir. – eu provavelmente estava abusando da minha sorte, mas o que ela poderia fazer com o Connor parado lá como testemunha?
– Essa é uma informação correta, exceto que eu não prometi nada a você. Eu disse que levaria isso em consideração. E eu o fiz. Escolhi também seguir o protocolo de maneira correta. Algo que você parece ter um pouco de dificuldades para fazer. – ela pegou dois dos donuts e o copo de café restante, permitindo que eu confirmasse que ela não usava aliança. – Obrigada pelo lanche, Pequeno Ayrwick. Vou entrar em contato se precisar de assistência adicional do garoto de recados e salvador de Seraphina Danby, ou se eu souber qual de vocês dois ganhou o prêmio de mais nova lavadeira de Braxton que gosta de tagarelar. – ela se voltou para Connor. – Eu sei que você não tem controle sobre ele, e nada disso está direcionado a você. Eu valorizo a sua ajuda como diretor de segurança de Braxton.
Eu ignorei o grande sorriso no rosto de Connor. Ele claramente ainda não tinha visto o crush que a xerife tinha nele. E Nana D e eu definitivamente não merecíamos aquele comentário sobre tagarelice.
– Espere, você não disse que compartilharia algo contanto que eu lhe desse alguma informação útil? Qual é, Connor, você ouviu isso também? E quanto à arma do crime? Alguma pista?
Eu juro que pequenos corações voaram dos olhos da xerife na direção de Connor.
– Você meio que disse isso. – ele respondeu. – Mas eu posso ter ouvido errado.
– Meninos, e eu quero dizer menino para um de vocês, não é esse o jogo que nós estamos. Deixe-me lavar, enxaguar e repetir para aqueles de vocês que parecem terem gasto todo o estoque de gel do mercado. Assassinato não é um jogo. Eu aprecio que você queria fazer a sua parte. Não acho que você tenha más intenções, Pequeno Ayrwick. Eu preciso proteger a evidência e as pistas de papel nesse caso, então nós podemos certamente colocar o nosso criminoso atrás das grades. Mantenha as suas patas sujas com você. Eu só vou pedir educadamente uma vez.
Eu assenti, já que ela tinha um bom ponto.
– Eu não estou esperando receber nenhum favor especial dessa vez. Talvez você pudesse me manter na jogada. Eu vou compartilhar imediatamente qualquer coisa que ficar sabendo e ficar fora do seu caminho. Eu juro!
– Nós ainda estamos fazendo os testes para identificar a forma e tamanho da arma do crime. Eu não lhe dei acesso ao escritório de Abby porque ainda não recebi autorização para isso. Preciso de autorização de seu parente mais próximo e da equipe de Braxton. Eu falei com seu pai agora a pouco. Vou me encontrar com o outro em pouco tempo. – ela se despediu de nós dois e seguiu para a porta. – Espere uma ligação amanhã, pequeno Ayrwick.
Enquanto ela ia embora, eu me virei para bater no ombro de Connor com toda a força que consegui depois de ter sido esvaziado e emasculado pela Xerife Montague.
– Você poderia ter me apoiado, cara.
Connor riu.
– Eu trabalho o tempo todo com aquela mulher. Não quero ficar no lado mal dela.
– Oh, e tem outro lado dela que você quer ficar? – eu provoquei, me esquecendo de quanto combustível ele havia comido, e de como eu poderia facilmente ir ao chão com um soco. Eu nunca aprenderia minhas lições, ou será que conseguiria?
– Vou ignorar isso. Mas eu também gostaria de apontar que você perdeu uma revelação chave aqui, Sr. Sem Noção. Além do fato dela não gostar do seu cabelo, bonitão. – o comentário da xerife obviamente era para mim, já que eu tinha cabelos longos e ondulados. O corte curto de Connor parecia estar fora de limites para ela.
Eu sacudi minha cabeça para ele. Que pista eu tinha perdido?
– Eu não tenho certeza do que você... ohhhh! – se a xerife estava indo se encontar com o parente mais próximo de Abby, então Alton Monroe havia sido localizado. – O marido está de volta à cidade!
– Sempre o primeiro a descobrir, não é mesmo, Kellan? Escute, eu preciso terminar um trabalho antes de ir me encontrar com Maggie. Vá com calma, Kellan. – Connor respondeu enquanto enfiava um donuts na boca.
Connor desapareceu em seu escritório, me deixando parado sozinho e desapontado na área frontal do edifício. Por que ele iria se encontrar com Maggie? Coloquei minha mão dentro do saco para pegar um donut, mas não havia mais nenhum.
– Sacanagem! Você teve a melhor sobre mim, várias vezes hoje, Connor. Não me faça começar uma guerra.
Depois de Connor ter me vencido, eu passei o resto da quarta-feira trabalhando em ítens urgentes que Derek precisava que eu entregasse para o Realidade Sombria. Agendas de promoções, contratos de negociações com os atores coadjuvantes, e edições no script para introduzir o tópico de Abby Monroe na segunda temporada. Apesar de não termos a história completa, ele queria o plano atualizado para mostrar para seu chefe na emissora. Eu juntei rapidamente algumas linhas revisadas e algumas taglines, me sentindo um pouco nervoso de usar a morte de Abby como plano de programa.
Capítulo 11
Depois de cuidar dos assuntos mais urgentes, eu saí para correr na quinta-feira pela manhã e parei intencionalmente na Lanchonete Pick-Me-Up para ver Eleanor. Enquanto eu entrava, Eustacia Paddington pegou meu braço e sacudiu sua cabeça loucamente.
– Você tem que fazer algo com aquela sua avó perversa, Kellan. Ela está fora de controle! – mechas de cabelo grisalho saíam em todas as direções por debaixo de um chapéu azul felpudo três vezes maior que a frágil cabeça dela.
Eustacia Paddington tinha frequentado a escola secundária com minha avó. Elas são meio inimigas desde então. Qualquer coisa que a Srta. Paddington fizesse, minha avó tinha que ir um passo além em sua busca para incomodar uma a outra. Da última vez, Nana D contratou seis voluntários para revezarem-se durante uma semana na limpeza da neve na vizinhança de Willow Tree, uma comunidade de cidadãos de terceira idade, onde Eustacia Paddington morava. De alguma maneira, todos os voluntários tiveram a impressão de que eles podiam jogar os montes de neve no terreno da esquina. O terreno de Eustacia. E Nana D havia dito para todos que o lugar estava vazio durante o inverno porque o morador estava na Flórida. Mas ela não estava fora, o que significou que a Srta. Paddington não pôde sair de casa durante uma semana.
Eu não estava ansioso para ouvir sobre a última batalha.
– Bom te ver também, Srta. Paddington. Essa cor azul faz os seus olhos brilharem. Como você está?
– Eu sei quando estou sendo enrolada. Nem pense em tentar o jogo de você-consegue-pegar-mais-com-mel-do-que-com-vinagre comigo. Sua avó é a mosca que pousa numa ferida infeccionada, querido. – ela bateu sua bengala de madeira no chão e fez com que uma foto pendurada na parede caísse. – Ela está tentando roubar Lindsey Endicott. Todos em Willow Trees sabem que nós estamos saindo há meses. Você diz a ela...
– Eu não acho que ela esteja tentando roubar ele de você, Srta. Paddington. Nana D não parece nem um pouco interessada em encontros. – eu comecei a falar, mas fui interrompido antes que pudesse completar meus pensamentos. Será que Nana D realmente estava se colocando disponível no mercado novamente? Depois do fiasco do que aconteceu com o irmão de Eustacia Paddington, Nana D ficou tão brava que eu pensei que ela ia fazer um voto de castidade e virar freira.
– Aquela mulher está querendo me pegar. Você diz a ela para não começar algo que não vai poder terminar!
Enquanto ela saía, tudo o que pude ver foi a imagem borrada da jaqueta rosa gigantesca dela no estacionamento, como aqueles tubos infláveis, que as pessoas colocavam do lado de fora de lojas, anunciando promoções para capturar a atenção do comprador. Ela parecia com a velha avó de Gumby precisando de um suprimento de oxigênio.
– Sabe, a Nana D provavelmente flertou com ele. – Eleanor disse enquanto fechava a caixa registradora. – Ela estava aqui a pouco falando sobre colocar a lã sobre os olhos de alguém.
Minha irmã estava certa. Eu não duvidava disso, mas não podia deixar Eustacia Paddington saber que eu sabia dos jogos de minha avó.
– Por falar em pessoas astuciosas, por que você estava me evitando ontem?
Eleanor levantou a tampa do balcão e passou para a área de espera principal. Pelo menos ela tinha trocado a roupa manchada de molho de dois dias atrás por um par de calças e uma blusa vibrante.
– Apenas ocupada. Às vezes você leva tudo pro lado pessoal, Kellan. Se eu não te conhecesse melhor, eu pensaria que meu irmão mais velho ficou magoado. – ela beijou minha bochecha e colocou dois cardápios de volta na cabine da entrada, enquanto cantarolava uma música de algum show psíquico.
Revirei meus olhos para ela. Essa aparentemente era minha marca registrada.
– O que suas cartas de tarô dizem?
– Touché. – ela provocou. – Me desculpe por eu ter saído correndo no outro dia. Tem sido semanas atarefadas. Todos estão um pouco assustados com a morte da professora. – Eleanor tinha o hábito de se fechar quando algo a incomodava, ao invés de se abrir para mim ou para qualquer outra pessoa. Eu presumi que minha mãe tivesse dito ou feito algo que a tinha incomodado. As gêmeas saem ao ataque!
– Me conte sobre isso. Eu estou em casa há menos de uma semana, e tudo parece ter mudado. – eu disse enquanto a seguia até o escritório dos fundos. – Hey, você percebeu alguma coisa acontecendo entre Maggie e Connor? Eu não tenho certeza se senti uma vibe estranha ou...
– Não, por quê? – ela respondeu abruptamente.
– Eu acho que ela já se encontrou duas vezes com ele desde que eu voltei. Sempre que eu os vejo juntos, é quase como se eles arregalassem os olhos... - eu não consegui novamente terminar meu pensamento. Parecia que as pessoas gostavam de me interromper. Talvez eu precisasse ser mais assertivo.
– Eu tenho certeza de que eles estão apenas sendo amigáveis já que ambos trabalham em Braxton agora. – enquanto ela se sentava, o telefone tocou, e eu a ouvi discutir com um fornecedor sobre uma entrega atrasada.
Eleanor destroçou minha teoria sobre ter algo acontecendo entre Connor e Maggie. Ainda assim, me perguntei, por que eu me importava? Eu tinha coisas mais importantes para me preocupar. Conferi meus emails no celular, mas não havia nada de Derek. Eu estava olhando meu calendário quando Eleanor desligou.
– Não há nada entre eles. Eu tenho certeza disso. – ela respondeu. – Desculpe por isso, estou tendo problemas com a lavanderia que não está limpando suficientemente bem os guardanapos, e mesmo quando limpam, sempre entregam um dia depois do que eu preciso.
Algo me dizia que havia algo mais acontecendo que Eleanor não estava disposta a revelar por enquanto. Já que eu não estava pronto para insistir mais, decidi deixar de lado a situação de Maggie e Connor.
– Talvez você pudesse trocar de fornecedor. Talvez o lugar que a mãe usou para ajudar na festa do pai pudesse se provar uma opção alternativa.
– Eu sou capaz de dar um jeito nisso sozinha, Kellan. Você precisa de algo ou só passou por aqui para fazer a sua boa ação do dia? – ela perguntou antes de se levantar e me dar a distinta impressão de que já era hora de eu ir embora. Toda a cor havia sumido do rosto dela.
– Bem, eu acho que devo ir. – eu respondi, me inclinando para abraçá-la. – Eu te amo, Eleanor, e quando você quiser conversar, vou deixar tudo de lado por você. – saí do escritório dela e voltei para o Jeep. Antes mesmo que eu ligasse o motor, ela havia me mandado uma mensagem de texto.
Eleanor: Me desculpe. Vamos jantar juntos no sábado e conversar.
Eu sabia que tinha algo acontecendo, e agora precisava ser paciente e esperar que ela revelasse o que a estava incomodando tanto. Eu dirigi em direção ao campus para ver se eu conseguia alguma informação sobre o acesso ao escritório de Abby no Hall Diamante. Quando cheguei, pude ver que as coisas não estavam mais com cordão de isolamento, por mais que o cartaz indicasse que as aulas ainda estavam acontecendo em outro lugar. Eu subi as escadas pensando que alguém poderia tentar me impedir, mas cheguei ao segundo andar sem nenhuma interrupção. Eu chamei em voz alta.
– Tem alguém aí? – será que a Xerife Montague estava lá dentro? Eu não estava preparado para uma batalha de gracejos oportunos e suas falas brutais.
Um homem com cerca de quarenta anos, com o cabelo loiro encaracolado e uma recente queimadura de sol estava parado atrás da mesa quando cheguei. Ele estava vestido casualmente e não parecia ser um membro da força policial.
– Boa tarde. Posso ajudá-lo? – ele disse.
– Eu sou Kellan Ayrwick e talvez eu assuma as aulas da Professora Monroe. Eu pensei em passar por aqui para ver se... – eu realmente deveria ter me preparado melhor. Não pensei que poderia entrar no escritório e revirar as gavetas sem perguntas serem feitas. Minha preocupação com a xerife tinha me deixado despreparado.
– Oh, Kellan. Era pra eu ligar para você nessa tarde. É bom te conhecer. Eu sou Alton Monroe. – ele respondeu enquanto sinalizava para eu entrar na sala. – A Xerife Montague mencionou que talvez você precisasse dar uma olhada em alguns dos arquivos da Abby.
Então esse era o futuro ex-marido e meio-irmão de Lorraine. Eu agora conseguia perceber uma pequena semelhança entre Lorraine e Alton em suas orelhas levemente pontudas, cor do cabelo e maxilar estreito. Ele não parecia perigoso. Eu estava grato por finalmente poder olhar as coisas de Abby, apesar da Xerife Montague nem mesmo ter pego um minuto para me avisar. Apertei a mão dele e me encostei contra o batente da porta. Eu não queria sentar e dar a ele a oportunidade de se sentar do lado do dono da mesa.
– Obrigado, eu aprecio isso. Eu acredito que você acabou de voltar para a cidade, depois de ter visitado algum lugar... – eu fiz uma pausa, esperando que ele terminasse minha frase.
– Uma vila remota na fronteira entre o Alaska e a Rússia. Eu saio em caminhadas na natureza de vez em quando, para uma revista online para a qual eu escrevo sobre animais em risco de extinção. – ele continuou falando sobre uma espécie de pássaro cuja população estava declinando lentamente na última década, me dando uma chance de olhar ao redor do escritório.
Abby tinha um dos maiores espaços do andar, provavelmente porque ela era a chefe do departamento. Havia duas pequenas cadeiras de madeira ao longo de uma grande mesa de mogno. Eu estava agora perto de uma delas, e o que eu presumi ser a maleta de Alton Monroe estava ocupando a outra. As paredes estavam cobertas por centenas de livros em prateleiras. Em um espaço de parede aberto estavam os diplomas de Abby, confirmando as faculdades que eu havia visto no perfil dela durante minha busca. Alguns papéis espalhados cobriam a mesa, a cesta de lixo havia sido recentemente esvaziada, e o que parecia ser um livro de notas estava no canto da mesa próxima a uma luminária de leitura. Eu tinha certeza de que Striker adoraria colocar as mãos dele nisso. Fiquei curioso se ele havia descoberto sua nota e recebido permissão para jogar no jogo de sábado. A sala era bem organizada, mas sem nenhuma personalidade a não ser a tonelada de livros. Abby preferia um espaço de trabalho mais limpo.
De repente, eu percebi que Alton havia parado de falar. Esperava que ele não tivesse me feito uma pergunta enquanto eu perdia o interesse na história dele e focava em olhar pela sala. Não era que eu não me importasse com a situação difícil do albratoz-de-cauda-curta, mas eu tinha coisas mais importantes para me concentrar no momento.
– Muito interessante, parece que foi uma boa viagem. Eu, hmm, ouvi que você ficou sem acesso a internet por um tempo. Deve ter sido um choque receber as notícias sobre a sua esposa.
– Futura ex-esposa. – ele respondeu com auto-satisfação. – Apesar de que eu suponho que isso não seja mais importante agora. Abby e eu estavamos tentando salvar nossa amizade, mas, eu temo que as coisas tenham esfriado entre nós meses atrás.
– Eu não estava ciente. Me desculpe. – eu improvisei novamente. Eu não tinha o hábito de mentir, mas se isso pudesse me ajudar a conseguir informações diferentes de uma fonte em potencial, eu podia cruzar a linha confortavelmente. Na maior parte, eu era um cara honesto e direto. Pode perguntar para Eleanor. – O funeral vai ser na semana que vem. Eu vou te encontrar por lá?
– Até onde eu saiba, Abby não tinha mais nenhuma família. Eu me sinto na obrigação de ir, talvez para um último adeus.
– Sim, posso imaginar. Isso é bom para você. – eu pausei novamente, esperando ele me dar mais alguma informação. Em entrevistas passadas, sempre me pareceu que pessoas de natureza como a dele ficavam desconfortáveis com o silêncio, subitamente compartilhando coisas que elas não diriam normalmente até que o silêncio as colocasse no limite.
– A Xerife Montague mencionou que você queria procurar por alguns papéis nos quais estava trabalhando com Abby. Eu estive aqui nos últimos vinte minutos fazendo a mesma coisa. Ela estava planejando me passar alguns direitos de autor, mas acho que agora a morte dela muda as coisas do divórcio, não é mesmo? – isso era um pouco insensível para mim, mas se ele realmente esteve batalhando por diversas vezes com ela, ele poderia querer que tudo se resolvesse rapidamente. Ele me disse que tinha encontrado o livro de notas preso entre e mesa e a parede. Eu presumi que ou ele havia caído acidentalmente ou teria sido jogado para lá durante uma luta na reunião das oito e meia.
– Você já teve a oportunidade de descobrir o que vai acontecer com os bens dela agora? Será que ela deixou um testamento? – eu não tinha certeza se ele iria responder, mas não havia nenhum motivo para eu não perguntar isso.
– Não que eu saiba. Mudei o meu no ano passado quando nós finalmente nos separamos. Como eu disse, ela não tinha outra família. Eu suponho que isso significa que eu fico com tudo, mesmo se ela não tivesse nada com o que se preocupar. – Alton pausou por alguns segundos para levantar os papeis da mesa dela. – Aqui também tem alguns materiais de aula. – ele disse apontando para o canto mais longe da mesa. – Seu pai mencionou que você pode precisar deles.
Meu pai já estava contando às pessoas que eu iria assumir a responsabilidade das aulas de Abby mesmo quando eu ainda não tinha lhe falado da minha decisão? Eu suponho que minha aparência confusa foi uma pista para Alton.
– Ele e eu nos encontramos brevemente alguns minutos atrás. Eu tinha que pegar a chave com a assistente dele, e ele queria expressar suas condolências. Ele mencionou que talvez você passasse aqui para pegar os materiais de aula.
Uma voz vinda das escadas assustou a nós dois. Quando me virei, Lorraine caminhava pelo corredor vindo na minha direção.
– Kellan, é ótimo te ver. Meu irmão já foi embora?
– Não, ele está ali dentro. – eu disse, me afastando para o lado para que Lorraine pudesse entrar.
Eu rapidamente vi um olhar de choque e vergonha no rosto de Alton quando ele percebeu que eu sabia de sua relação com Lorraine. Eu fiquei curioso para saber o quão sólido era o álibi dele, e fiz uma anotação mental para investigar isso. Ele tinha várias coisas valiosas a ganhar com a morte de Abby.
– Você já está pronto para ir? – ela perguntou ao irmão, então se virou para mim. – Alton e eu temos algumas coisas para conversar, Kellan. Estou pensando em pegar um advogado já que a xerife fica voltando sempre com mais perguntas para mim sobre a noite do acidente. – ela mordeu o lábio em frustração.
– Eu tenho certeza de que ela só está investigando todos os pontos. Eu mesmo estou fuçando em alguns ângulos. Eu dei a xerife umas informações úteis sobre a ligação de Abby com outra pessoa do campus.
Lorraine tentou sorrir.
– Oh, essas são ótimas notícias. Eu espero que eles consigam solucionar isso rapidamente. Está drenando seu pai. O pobre Alton nem pode seguir adiante com o processo dos bens dela. E eu gostaria de sair da linha de fogo. – ela tremeu e cruzou os braços em frente ao corpo. – Nós devíamos ir, Alton.
Depois que Alton e Lorraine foram embora, eu vasculhei o escritório de Abby. O livro no canto da mesa dela era realmente o livro de notas atual. Sujeitar-me à presença da Dra. Castle para me ajudar a decifrá-lo não iria me oferecer nenhum conforto ou sentimentos felizes.
Tudo o que eu encontrei potencialmente interessante na gaveta foi uma chave de formato estranho, o contrato não assinado entre Derek e Abby, e finalmente, as pastas com as anotações de pesquisa para o Realidade Sombria. Derek iria finalmente conseguir o que tanto queria. Eu os coloquei em uma caixa vazia que encontrei no chão em um canto. Fui até as prateleiras na parede oposta e olhei o título dos livros. Na maior parte, eram todos sobre teatro, mídia e livros acadêmicos. Abby era difinitivamente uma fã de shows de reality TV e paranormais.
Quando um grande livro com a capa vermelha e sem título ou autor capturou meu interesse, eu o tirei da prateleira. Percebi que ele era parcialmente oco, mas ainda assim havia algo dentro. Pelo fato de haverem muitos livros, a busca da Xerife Montague provavelmente não incluiu a conferência de todos os livros. Será que a Xerife Montague não era tão habilidosa quanto Braxton precisava que ela fosse? Eu gostei de pensar sobre como eu poderia usar esse erro contra ela no futuro. Talvez a falha dela fosse ser minha vitória... significando que eu finalmente poderia colocar a xerife em xeque-mate.
Havia um diário encadernado em couro e trancado dentro do livro falso. Eu peguei a chave que havia encontrado na gaveta e testei. A tranca se abriu, e tive acesso aos pensamentos pessoais de Abby Monroe. Será que eu podia invadir a privacidade dela? Eu me permiti uma rápida olhada pelas páginas mais recentes. Então, resolvi deixar o diário dentro da caixa, decidindo ponderar o quão confortável eu me sentiria cruzando essa linha. Eu coloquei o livro de notas e várias cópias dos materiais das aulas atuais também dentro da caixa. Eu tinha alguma leitura para fazer naquela noite. Talvez eu fosse aprender um pouco mais sobre a vida não-tão-secreta de Abby.
Antes de voltar para casa para fazer algumas análises, eu conectei meu celular no viva-voz do Jeep e liguei para Nana D. Ela atendeu ao segundo toque.
– Por onde você andou nesses últimos dias? Eu pensei que você viria aqui para mais um pedaço de torta ou para conversar sobre Bridget Colton. – ela disse laconicamente.
Então o elfo tinha um sobrenome. O fato de minha avó trazer novamente ela ao assunto me deixou preocupado que isso era uma armação.
– Encontrei sua melhor amiga nessa manhã, Nana D. A Srta. Paddington tinha uma informação interessante para compartilhar comigo. Eu acho que é hora de eu e você tomarmos um chá da tarde, você não acha? – eu tinha certeza de que ela podia ouvir o sarcasmo em minha voz, mas se ela o ouviu, resolveu ignorar.
– Vixi. Aquela mulher só fala bobagem. É pior do que o irmão dela, e depois do que ele fez comigo, eu não tenho mais tempo para esses Paddingtons. Causadores de problemas, é isso o que eles são. – ela me censurou. – Eu não posso tomar chá hoje... talvez amanhã? Por que você não passa por aqui por volta das três da tarde? Eu já devo estar de volta do mercado dos fazendeiros e pronta para ouvir alguma fofoca.
– Não, Nana D. Eu não tenho nenhuma fofoca. É a sua vez de contar. – eu disse em uma voz firme. Eu tinha que pressioná-la, senão ela cruzava a linha todas as vezes.
– O que? Desculpe, a conexão está ruim. – ela respondeu. Eu ouvi distintamente ela fazendo som de estática. Eu sabia disso porque ela teve que parar para cortar o som do que parecia ser uma bola de pelo no meio de tudo.
– Ótimo. Eu passo aí amanhã. – eu continuei com a charada dela, então perguntei se ela sabia qualquer coisa sobre o papel de Marcus Stanton no Conselho de Curadores. – Eu preciso entender se ele sabe quem fez as doações anônimas para Braxton e quem autorizou todos os novos gastos no departamento de esportes. O que você sabe sobre ele?
– Eu vou me encontrar com o Vereador Stanton amanhã. Vou ver o que consigo descobrir. Nós temos algumas coisas para acertar, e esse homem vai ter que me escutar dessa vez, nem que seja a última coisa que eu faça. – ela murmurou ao fundo antes de beber algo que a fez gritar. – Ah, isso funcionou.
Eu sacudi minha cabeça e ri enquanto ligava o aquecedor do Jeep. Ela sempre me fazia sorrir.
– O que ele precisa ouvir de você?
– Stanton está usando os fundos do Condado de Wharton em todos os lugares errados. Eu pretendo provar que ele é um sem noção.
Eu estava surpreso de ver como Nana D estava atenta com as coisas acontecendo sobre a decisão do uso dos fundos do condado. Mas então, ela sempre foi muito atenta aos pequenos detalhes. Talvez ela pudesse me ajudar a descobrir o que estava acontecendo nesse caso do assassinato de Abby.
– Eu me pergunto se Stanton tem algum filho frequentando Braxton. – eu perguntei, de repente me lembrando de que eles teriam mais ou menos a idade certa. – Eu não sabia que ele estava no Conselho de Curadores até o pai me contar.
– Sim, aquele lançador famoso, Craig Magee. Você provavelmente já ouviu falar do Striker. Mal posso esperar para ver o jogo no sábado. Esta cidade precisa de uma animação.
– Espere, o que você disse sobre o Striker? Eles têm sobrenomes diferentes. – eu fiquei confuso.
– Striker é o enteado dele. Ele se casou com a mãe do Striker anos atrás quando a criança era pequena. Ela faleceu de câncer mais ou menos na mesma época que a Francesca morreu. Era uma boa mulher também.
Hmm, talvez eu devesse ir ao jogo de sábado para descobrir todos os jogadores nesse quebra-cabeça.
– Você precisa de companhia para o sábado? – eu me perguntei se era o vereador no telefone com Abby do lado de fora da Biblioteca Memorial. Será que eram eles que iriam se encontrar às oito e meia daquela noite? Eu precisava me lembrar de quando ele saiu da festa, mas provavelmente era a mesma hora da reunião de emergência do conselho que meu pai foi.
Nana D e eu confirmamos nossos planos para o chá no dia seguinte. Ela também me contou que ela se encontraria comigo depois do jogo, pois iria com outra pessoa, mas não queria me dizer com quem. Eu suspeitei que Eustacia Paddington não ficaria muito animada com o potencial encontro que Nana D teria se o nome dele fosse Lindsey Endicott.
Dirigi até a casa de meus pais pensando sobre meus próximos passos. Eu precisava olhar o diário e os papeis de Abby, não que fosse uma coisa justa ler seus pensamentos pessoais. Poderia dá-lo à Xerife Montague, ou, eu me convenci, poderia conferir casualmente algumas páginas para ver se havia algum motivo para compartilhar o que eu havia encontrado. Eu não iria esconder nenhuma pista vital, mas não era justo gastar o dinheiro dos pagadores de impostos ao forçar a xerife a ler o diário se não houvesse nada de interessante, não é mesmo?
Capítulo 12
Depois de passar algum tempo com Nana D, eu marquei um jantar com Eleanor no sábado depois do grande jogo de beisebol. Ela geralmente tinha as noites de sábado de folga, então tinha pelo menos uma noite de final de semana como uma opção para possíveis encontros. Infelizmente, o cara com quem ela esperava sair naquele sábado não tinha feito o pedido, o que significava que ela estava precisando de companhia. Eu passei o resto da noite lendo os materiais para o Realidade Sombria que havia pegado de Abby, então eu poderia tirar Derek das minhas costas sobre a pesquisa que ela havia feito, antes de mergulhar em algo mais.
Conversei com Emma antes de dormir, então coloquei em dia o tão merecido descanso. Quando acordei na sexta-feira, eu me concentrei em ler todas as páginas do livro de notas de Abby, o que me deu uma noção de como a falecida professora mantinha os registros dos estudantes. Enquanto os semestres anteriores haviam sido bem organizados como evidência das anotações semanais de Abby, o semestre atual estava na maior parte em branco. A falta de conteúdo não parecia fazer muito sentido inicialmente, mas eu teorizei que ela tivesse ficado mais focada em se conectar com Derek para a segunda temporada do Realidade Sombria, o que fez com que ela rebaixasse seus padrões.
Eu virei até a página do semestre atual para conferir as notas, e fiquei sabendo que o outro arremessador, Jordan Ballantine, tinha conseguido um “B+” na primeira prova. Virei mais algumas páginas e encontrei um “A+” para Carla Grey, e me perguntei se ela era parente do estúpido juiz do condado com o qual eu me encontrei uma vez. Eu localizei a página de Striker, e inicialmente pensei que não havia nenhuma entrada, mas quando olhei melhor, ele tinha um “F” que havia sido parcialmente apagado ou rasurado. Segurei a página contra a luz da minha mesa de cabeceira e pude ver claramente as marcas de uma nota ruim. Enquanto um “F” não era bom para Striker jogar no próximo jogo, o fato de que estava parcialmente apagado me fez pensar que foi por isso que Abby havia sido assassinada.
Já que Lorraine estava ajudando a gerenciar o departamento nesse semestre enquanto a outra funcionária, Siobhan, estava de licensa maternidade, talvez ela tivesse alguma ideia do que estava acontecendo com o processo de notas. Eu também estava interessado em conversar com Lorraine sobre as aulas de Abby, caso eu aceitasse o pedido de meu pai, ou oferta, seja lá o que tiver sido, para assumir a responsabilidade por algumas semanas. Lorraine concordou em se encontrar comigo ao meio-dia, então organizei minha manhã de maneira a conseguir fazer um rápido exercício na academia, tomar um banho e trocar de roupa, e então seguir para o Hall Diamante.
Quando cheguei, Lorraine estava fazendo cópias do material para aulas. Eu me juntei a ela ao lado da máquina e perguntei sobre o irmão dela.
– Como Alton está lidando com a morte de Abby?
Lorraine encolheu os ombros.
– Ele se sente mal sobre isso, e apesar de que ele nunca desejaria que nada acontecesse com ela, Alton está melhor assim. Eu não quero parecer fria, mas aquela mulher realmente fez a vida do pobre homem muito difícil.
– Ele não parecia muito abalado ontem. Ele já tinha voltado a algum tempo da viagem? – eu esperava conseguir detalhes sobre o álibi dele e seu retorno para casa.
– Apenas um dia ou dois. Quando a xerife finalmente conseguiu pegar uma pista do cartão de crédito dele, ela foi capaz de localizar um policial local do Alasca que entrou em contato com ele sobre o que havia acontecido. – Lorraine desligou a máquina de cópias e foi em direção a sua mesa. – Você está bastante interessado no Alton. Você não acha que ele tem alguma coisa a ver com isso, não é mesmo? Ele tem um álibi, Kellan. – ela parecia preocupada que eu pudesse estar desconfiando do irmão dela, mas para falar a verdade, eu não sabia muito sobre ele. Ele não pareceu um assassino baseado na nossa conversa de dez minutos, no entanto, tanto Nana D quanto Connor achavam que esse havia sido um crime do calor do momento.
– Não, eu só estou tentando juntar todas as peças. Eu podia usar da sua ajuda, Lorraine. – sentindo que o álibi de Alton provavelmente estava correto, eu peguei o livro de notas e perguntei à Lorraine se ela o reconhecia.
– Material padrão. A maioria de nós os parou de usar, mas alguns professores gostam de manter um registro manual antes de fazer o upload das notas no sistema. Onde você encontrou esse? – Lorraine já tinha se sentado à mesa e estava organizando as fotocópias em uma pasta com o nome de Material para Segunda-feira.
– Pertencia à Abby Monroe. Alton e eu encontramos ontem. Eu o levei para aprender um pouco mais sobre as aulas dela. Você sabe que meu pai sugeriu que eu...
– A substituísse? Sim, ele me perguntou o que eu achava que você iria decidir. – ela juntou as mãos sobre mesa. – Se você pegar o trabalho, essa pasta é para você. O que você vai fazer?
Lorraine já havia se adiantado e preparado os materiais para mim. Eu já tinha decido que era uma oportunidade bem valiosa, já que Derek queria que eu ficasse por aqui para descobrir mais conteúdos para o show.
– Eu vou ao jogo de beisebol amanhã para observar alguns dos estudantes. Ver como eu me encaixo.
Lorraine parecia estar assentindo e concordando comigo, mas eu podia ver que ela estava distraída.
– É muito importante para seu pai. – os olhos dela pareciam distantes e vazios, e seus lábios estavam secos e rachados.
Tudo era importante para ele.
– Eu sei. – eu respondi em um tom de compreensão. Lorraine queria dizer alguma coisa, mas não sabia como. – Isso é a única coisa que você tem em mente?
– Você sempre foi tão perceptivo, Kellan. Eu estou preocupada com essa situação. Parece que estou no centro de tudo.
Foi então que eu me lembrei do Técnico Oliver e a programação de eventos. Talvez ele pudesse provar o álibi dela.
– Você disse que ninguém te viu depois das oito horas naquela noite? – eu continuei depois que Lorraine assentiu. – O Técnico Oliver mencionou ter te entregue uma programação do lado de fora do Hall Diamante. – eu respondi, observando casualmente as reações. Eu confiava nela, apesar de ter um estranho sentimento de que ela não estava me dizendo algo.
– Ah, é verdade, eu me esqueci. – Lorraine disse. Ela parecia estar levemente desconfortável, mas isso não era muito alarmante. – A troca toda aconteceu tão rápido, apenas alguns segundos depois de eu sair da festa de aposentadoria. Isso não ajudaria a provar muita coisa. – o olhar dela parecia criar buracos no chão.
– Você pode querer mencionar isso para a Xerife Montague. Minha mãe viu o Técnico Oliver. Há também a possibilidade de que ele tenha percebido alguma coisa ou alguém sem se dar conta. – eu descansei minha mão no ombro dela.
– Sua mãe viu o técnico? Eu vou contar para a xerife. – ela alisou as marcas de sua blusa.
Lorraine estava escondendo algo. Eu aposto nisso. Eu teria que esperar até que ela estivesse confortável o suficiente para me contar o resto.
– Você saiu da festa para pegar algo para mim, certo? Você conseguiu encontrar? – eu não estava preocupado, a não ser que o presente pudesse ajudar a provar o álibi dela.
– Não, isso é parte do que está me incomodando. Não consigo encontrar seu presente em lugar algum. Eu poderia jurar que o havia deixado em minha mesa. Eu pretendia embrulhá-lo antes que eu saísse na sexta-feira, mas fiquei ocupada demais. Planejava encontrar um papel de presente no armário de suprimentos, então entregar a você na festa. – Lorraine não me dava mais detalhes, a não ser dizer que estava chateada por isso. Ela queria fazer algo especial para mim.
Eu não conseguia me lembrar dos detalhes, mas achei que descobriria em breve.
– Onde ele poderia estar?
– Eu gostaria de saber. Não é a única coisa que está desaparecendo em pleno ar. Uma estudante reportou ter perdido algo nessa semana. Eu também não consigo encontrar a nova... ai, deixa pra lá. – ela disse, jogando as mãos ao ar. – Três coisas diferentes não saem simplesmente andando por aí sozinhas, Kellan.
Isso ativou um alarme em minha mente.
– A Xerife Montague já sabe sobre os roubos?
– Eu não mecionei isso quando conversamos.
– Você vai informar ao Connor? Alguém deveria saber sobre isso. – eu disse.
– Para ser honesta, eu pensei que talvez, com tudo acontecendo entre a mudança temporária de escritório, o trabalho extra por causa da Siobhan estar de licensa, e os planos da festa de aposentadoria, que devo ter colocado seu presente em outro lugar. Eu ainda estou procurando pelos dois outros items desaparecidos, mas vou olhar na mesa de seu pai. Podem ter sido colocados em uma das gavetas antes de terem sido mandados para o depósito. Isso não era prioridade na minha lista essa semana. Me desculpe. Vou encontrar logo para você. – ela respondeu, então digitou alguma coisa no teclado. – Parece que eu tenho uma reunião daqui a pouco tempo. Posso ajudá-lo com algo mais?
Eu não pude evitar pensar se esses itens desaparecidos tinham alguma relação com a morte de Abby. Com apenas poucos minutos restantes, eu pedi que Lorraine descrevesse mais sobre o processo de notas. Também mencionei a rasura que encontrei perto do nome do Striker no livro de Abby.
– Isso é bizarro. – ela disse. – Quando o semestre começou, eu me encontrei com os professores e pedi que eles dissessem como gostariam que eu os ajudasse com as operações do dia-a-dia enquanto Siobhan estivesse de licensa. Quase todos disseram que adorariam que eu lidasse com todo o trabalho de computador para eles.
– Mesmo, até mesmo Abby? E quanto aos últimos dias, houve algo de diferente? – eu perguntei, pensando que havia encontrado algo potencialmente importante.
– A maior parte dos professores colocavam as notas nas provas e testes, então me entregavam os documentos impressos com suas anotações para escanear e fazer o upload antes de devolver aos estudantes. Alguns professores registravam as notas em livros no caso dos estudantes perguntarem antes que eu tivesse a chance de colocar os detalhes no computador. Abby não queria ajuda para colocar as dela online. Ela me disse especificamente para ficar fora do caminho dela. Eu supus que ela era mais tradicional e não gostava de mim por causa de tudo envolvendo Alton e o divórcio.
– Lorraine, isso é útil. Você tem alguma ideia de onde eu posso encontrar as provas dos estudantes das aulas de Abby nesse semestre? – uma ideia começou a ser formulada em minha mente. Se Abby estava envolvida de alguma maneira com o Técnico Oliver, será que ela teria mudado as notas do Striker para assegurar que ele jogasse na partida desse sábado? Isso iria esclarecer como os dois estavam relacionados, mas não porque Abby foi morta. A não ser que ela tivesse mudado de ideia, e o Técnico Oliver, Stanton ou Striker a tenha matado por vigança. Eu precisava focar nas notas do Striker e na decisão de qual arremessador iria começar jogando. Parecia um lugar para um motivo à espreita.
– Não, como eu disse, Abby mantinha tudo para si mesma. As únicas tarefas que ela me pediu para fazer era organizar as correspondências dela e marcar os horários de reuniões com alunos. Eu tenho que ir, Kellan.
Assim que Lorraine saiu do escritório, eu me sentei no topo das escadas processando tudo o que havia escutado. Eu precisava conseguir acesso ao sistema de computador para saber se Abby havia dado entrada nas notas de algum estudante. Decidi pedir ao meu pai antes de contatar outra pessoa sobre a minha preocupação com as notas. Eu liguei para o celular dele quando não o encontrei em casa. Deixei uma mensagem de voz e uma mensagem de texto dizendo que precisava encontrá-lo assim que possível. Então, peguei o teleférico de volta ao Campus Norte animado para encontrar algo que pudesse identificar o assassino de Abby.
No caminho de volta ao Jeep, eu dei uma olhada nas entradas do diário dos últimos dois meses. Havia uma entrada da semana anterior a ela ser assassinada dizendo que ela esperava que Derek ligasse logo para falar sobre o contrato com o Realidade Sombria. Havia uma entrada do começo de janeiro dizendo como ela estava animada para uma noite com W. A.. Eu passei mais algumas páginas só para ler que as coias com W. A. tinham ficado complicadas, ela podia estar começando a ter sentimentos por ele, mesmo sabendo o quão errado isso era. Nada de nome completo ou pistas mais claras. Então eu li como Abby queria se vingar e expor W. A. pelo que ele tinha feito a ela. Esse devia ser a história exclusiva que ela havia falado por email com Derek e comigo na ligação.
Fiquei encucado com a identidade do misterioso W. A., eu já estava prester a desistir quando uma ideia nauseante surgiu em minha mente. W. A., Wesley Ayrwick. Meu pai estava agindo estranho ultimamente. Várias noites ele não queria mencionar para onde estava indo ou o que estivera fazendo. Ele disse que sua relação com Abby era complicada. Será que meu pai estava tendo um caso? Traindo minha mãe com a Abby? Eu fiquei sentado no banco por mais vinte minutos tentando me convencer de que devia haver alguma outra explicação. Por que meu pai não estava me ligando de volta? Em que tipo de situação ele havia se envolvido? O que isso tinha a ver com a ligação que eu havia escutado em seu escritório na noite que cheguei em casa?
Alguns estudantes passaram correndo dizendo que estavam atrasados para as aulas, o que me fez lembrar que eu precisava ir ao Rancho Danby. O chá era pontualmente às três da tarde, e Nana D iria beber estando eu lá ou não. Eu joguei minha mochila no banco de passageiros e dirigi pela cidade com a mente um pouco enevoada, debatendo se eu deveria falar sobre o diário com Nana D. Eu estacionei na calçada da Nana D, acenei para o gerente de operações da fazenda que estava descarregando um carrinho de mão com composto perto do pomar, e entrei pela porta lateral na cozinha.
– Eu estou aqui, Nana D. O que está acontecendo com você nessa tarde?
Nana D desligou o telefone. Ela ainda tinha um daqueles modelos antigos de cor amarela e fio enrolado, instalado ao lado da geladeira. Eu sempre amava imaginá-la parada de pé na cozinha, enrolando o fio nos dedos enquanto conversávamos ao telefone quando eu estava em Los Angeles. Ela tinha os modelos sem-fio em outras partes da casa, e o celular, mas preferia que sua cozinha tivesse um toque do passado.
– Bem vindo de volta, meu brilhante neto. Eu estava ao telefone com sua mãe. Ela está preocupada novamente. – Nana D murmurou enquanto conferia o chá. – Gostei de ver que você ainda saber ler as horas.
– É claro. Você não achou que eu me atrasaria, não é? – eu provoquei. – Qual é o problema da minha mãe?
– Ooh, um pouco disso e daquilo. Essa minha filha nunca conseguiu lidar com o stress. – Nana D descobriu um prato de doces no balcão. – Eu fiz biscoitos com cobertura de limão e pequenas tortas de pecã. – ela estava muito bem vestida, em uma saia justa cinza, blusa e um blazer preto.
As tortas pareciam deliciosas. Com certeza eu iria comer algumas delas. Ela tinha feito pelo menos três dúzias de tortas suficientemente pequenas para colocá-las entre meus lábios, e grandes o suficente para manter minha boca fechada e não dizer algo que não deveria.
– A mãe parece estar indo bem com o que está acontecendo, pelo menos até onde eu percebi. Só uma pequena agitação. O que aconteceu hoje?
– Uma briga com Eleanor por causa do emprego dela na lanchonete. Seu pai parece ter feito algo que não a deixou muito feliz ontem à noite. Eu acho que ela tem uma unha encravada também. – Nana D encolheu os ombros, terminou de servir o chá e carregou a bandeja até a mesa, uma bela bandeja de carvalho feita de uma tora que meu avô havia cortado de uma das árvores da fazenda. Ela a moldou, lixou e ervenizou, e até mesmo deixou algumas das bordas queimadas recortadas e inclinadas para lhe emprestar um charme de coisa antiga. Eu tinha feito com que Nana D prometesse não dá-la a ninguém mais no futuro. Ela me acusou de desejar que ela fosse para o túmulo cedo, mas eu a assegurei que eu só queria a bandeja se e quando ela não mais tivesse motivos para mantê-la. Eu acho que aquilo me tirou de problemas, mas nunca se sabe com Nana D, a maior detentora de rancores sem sentido de Braxton.
– Alguma ideia do que meu pai fez? – perguntei, preocupado que minha última teoria pudesse ser verdadeira. Eu comi minha primeira mini-torta de pecã. Ninguém fazia tortas como minha avó. O nível de suculência no recheio e da crocância da massa... era de morrer! – Eleanor tem estado um pouco mal-humorada também. Eu percebi que isso está incomodando a minha mãe.
– Eu estou fora disso. As gêmeas podem resolver seus próprios problemas. Você falou com Eustacia sobre eu não estar tentando roubar o pretendente dela? Não vou mais ao jogo de beisebol com Lindsey Endicott, então você vai ser meu acompanhante. A cidade toda está louca sempre pensando que estou atrás deles. – Nana D se serviu de alguns doces e se sentou ao meu lado. – Coma logo, eu tenho outro compromisso daqui a pouco.
Entre mais três tortas de pecã e dois biscoitos de limão, eu bebi algumas xícaras de chá e perguntei a Nana D sobre o encontro com Marcus Stanton.
– A propósito, como foi a sua discussão de mais cedo com o nosso querido vereador? – eu me preparei para uma lista de seus últimos crimes e contravenções.
– Oh, eu estou de olho nas indiscrições dele. O artista disse que não tem ideia de quem doou o dinheiro. Ele disse que todo o conselho queria que o departamento esportivo fosse beneficiado. Ele está escondendo alguma coisa, mas ainda não consegui descobrir o que. Ele também não tinha nada de legal para falar sobre Abby Monroe. – Nana D disse enquanto checava todas as suas anotações da discussão com ele. – Stanton pensa que ela tinha alguma coisa contra Striker e o reprovou de propósito. Talvez ele a matou!
– Eu não posso imaginar um vereador matando uma professora por causa de uma falta de acordo sobre as notas de seu enteado e jogos de beisebol. – até onde eu conseguia me lembrar, Marcus saiu do Hall para Concertos Stanton na noite da festa para participar daquela reunião do Conselho, mas eu não podia ter certeza de todos os movimentos dele. O motivo para o crime não estava fazendo um sentido completo baseado no que eu sabia até agora.
– Você ouviu um boato sobre um olheiro da Grande Liga de Beisebol vindo assistir ao jogo?
Nana D me deixou chocado com essa notícia.
– Esse é certamente um motivo pelo qual alguém ficaria suficientemente desesperado para cometer um assassinato!
Por mais que eu amasse o local, Braxton não era uma das faculdades top e nem era conhecida pelos seus programas de esportes. Por que um olheiro da Grande Liga de Beisebol viria para cá?
Nana D disse que ela continuaria atrás do vereador para ver o que podia descobrir. Eu a atualizei sobre o meu progresso com a investigação sobre Abby Monroe, deixando de lado os meus temores sobre meu pai ou as iniciais. Ela ficou bem intrigada pelos três objetos desaparecidos de Lorraine, um dos quais poderia ser a arma do crime.
– A mim me parece que você precisa se sentar com o Técnico Oliver, e então conversar novamente com a Xerife Montague. Não gosto da maneira como o Técnico Oliver age quando está perto de mulheres. Eu não descartaria a idéia de que ele possa ter colocado alguma pressão em Abby por causa das notas. Antes que eu o imagine como o assassino, nós precisamos saber mais sobre sua pequena aventura na casa da mulher. Tudo parece demais como Tanya Harding versus Nancy Kerrigan para mim.
Nana D estava correta, nós não sabíamos qual era a relação entre o Técnico Oliver e Abby. Se Abby estava saindo com W. A., será que ela também estaria envolvida romanticamente com o técnico?
– Eu acho que você pode estar certa sobre a Xerife Montague, apesar de que ela não fica nem um pouco feliz quando eu me meto no caso.
– Você paga o salário dela, Kellan. Ela deveria ficar feliz por conseguir uma ajuda de graça. Aquela mulher sempre teve algo de maldoso nela, especialmente depois...
– Eu não moro em Braxton, Nana D. Você pode pagar o salário dela, mas eu não. – eu respondi, percebendo tarde demais que esse era exatamente o tópico de conversa que Nana D estava tentando falar. Pelo grande sorriso dela, eu podia dizer que havia metido os pés pelas mãos novamente. Eu deveria cobrar uma entrada. Exceto que estaria pagando a mim mesmo. Melhor deixar quieto.
– Por falar em onde você mora, o que você acha de aceitar aquela minha oferta e vir morar aqui na fazenda? Eu poderia ter alguém com quem conversar durante o dia. – Nana D colocou as xícaras vazias e pratos na bandeja, então foi até a pia e começou a lavá-los. – Seria legal tagarelar a noite toda!
Talvez a xerife estivesse certa sobre Nana D. Eu embrulhei os biscoitos e tortas restantes, colocando dois em meu bolso para o caminho até em casa, então me juntei a ela na pia.
– Eu posso ter algumas notícias para lhe dizer amanhã, sobre ficar em Braxton, quando vier te buscar para o jogo. Às doze horas está bom?
– Venha às onze. Eu preciso me encontrar com algumas pessoas antes que o jogo comece. Eu espero que você tenha limpado as migalhas para aqueles dois biscoitos que caíram acidentamente dentro do seu bolso, Kellan. – Nana D começou a cantar Kenny Rogers, The Gambler, enquanto desligava a torneira, então saiu dançando pela cozinha. – Eu daria um tapa na sua bunda boba se não deixasse você se safar de tudo, querido.
Eu sacudi minha cabeça para ela. Ninguém nunca controlaria minha avó. Eu a abracei e me despedi, então dirigi de volta para casa me perguntando com quem ela iria se encontrar naquela tarde. Então, percebi que era hora de planejar várias entrevistas que eu teria que fazer para descobrir o assassino de Abby. Havia se tornado uma busca pessoal solucionar o caso antes da xerife. Talvez também para tirar Derek do meu pé.
Enquanto eu entrava na garagem da casa dos meus pais, meu pai saiu pela calçada indo em direção ao seu carro.
– Não posso conversar agora, Kellan. Estou indo me encontrar com sua mãe para um jantar adiantado.
Eu não ia deixar que ele me evitasse ainda mais.
– Não, nós precisamos conversar hoje à noite, pai. – eu disse através da janela, então estacionei e corri até o carro dele, mas ele já tinha fechado a porta. Para crédito dele, ele abaixou o vidro. – Está quase congelando aqui fora, filho. Fale rápido.
– Ouça, pai. Eu acho que você precisa saber de algo que descobri sobre Abby Monroe hoje.
– Eu entendo, mas não posso me atrasar para encontrar sua mãe. Ela não está sendo ela mesma desde que eu comecei a planejar minha aposentadoria. Estou tentando fazer de tudo para deixá-la feliz. – ele respondeu antes de fechar a janela.
Com apenas algums centímetros e ainda menos segundos para chamar sua atenção, eu grunhi para o pequeno espaço.
– Café-da-manhã. Amanhã. Às nove horas. Não falte!
Ele sorriu e saiu da garagem. Havia algo de estranho acontecendo com a minha família e em Braxton. Quanto mais as pessoas tentavam esconder, mais fundo eu queria cavar. Derek e eu trocamos poucas mensagens.
Kellan: Entrei no escritório de Abby. Eu encontrei algumas anotações de pesquisa em uma pasta. Estou revisando-as nesse fim de semana.
Derek: Maravilha. Meu chefe está revisando os materiais que você me mandou. Não tive tempo de contar a ele que eles eram seus, mas tenho certeza que ele sabe como você trabalha duro.
Uff! Eu precisava ligar para Emma para saber como ela estava e dizer que ela viria para Braxton durante algumas semanas. Precisava mapear tudo o que havia descoberto na investigação até agora. Então precisava de uma garrafa de vinho. Essas eram as únicas três coisas que eu pensei que poderiam melhorar minha noite. Ou talvez o restante dos biscoitos da Nana D. Sim, esses seriam os meus únicos planos para a noite.
Capítulo 13
Minha mãe saiu cedo na manhã seguinte para um dia de spa com as amigas. Todos os meses, elas passavam um sábado se cuidando no Spa Woodland no outro lado do Rio Finnulia. Inevitavelmente, ela iria retornar parecendo renovada e radiante, e então tentaria convencer meu pai a ir com ela da próxima vez. Ele geralmente dispensava os convites de minha mãe com seus compromissos de trabalho. Agora que iria se aposentar, será que ele ainda conseguiria fazer isso?
Eu havia feito um bule de café, descongelado alguns bolinhos de mirtilo da Nana D, e colocado algumas salsichas de peru na frigideira. Se meu pai fosse pontual, ele chegaria a qualquer momento para o café-da-manhã que eu sugeri, no dia anterior, que ele participasse. Assim que eu comecei a colocar a comida no prato, o grande relógio da sala de estar confirmou que eram nove horas. Meu pai empurrou a porta vai-e-vem da cozinha. Aquele homem tinha uma pontualidade impecável.
– Bom dia, Kellan. Eu acredito que você tenha exigido a minha presença nessa manhã. – ele disse.
Será que ele estava tentando ser engraçado?
– Sim, eu exigi. Nós temos algumas coisas para discutirmos. Você vai ao jogo de hoje? – eu entrei nesse tópico para evitar criar tensão tão cedo.
– De fato. Eu ainda sou o presidente da faculdade, e esse é o primeiro jogo de beisebol. Estou ansioso para Striker começar a temporada. – ele carregou seu prato até o canto de café-da-manhã e se sentou no banco mais perto da porta dos fundos. Eu suponho que ele planejava uma saída rápida.
– Isso significa que o Técnico Oliver decidiu quem vai começar? – com toda a confusão, eu havia me esquecido da reunião de preparação na noite anterior. Eu me juntei a ele na mesa e dei uma mordida em um dos bolinhos. O sabor dos mirtilos era tão intenso que eu tive que fechar meus olhos para apreciar completamente.
– Eu acho que isso responde minha pergunta sobre você assumir algumas aulas. Se você estiver verdadeiramente interessado em ajudar, deveria estar de olho nas grandes notícias da faculdade nessa semana. – meu pai disse, saboreando seu café-da-manhã, o que significava que eu ainda não o havia perdido totalmente.
– Não, isso não é exatamente verdade. Você acha que o beisebol é a grande notícia de Braxton nessa semana. – eu sacudi minha cabeça, impressionado em como ele havia facilmente dispensado um assassinato apenas para focar na rivalidade de Striker contra Jordan. – Nós vamos chegar à oferta de trabalho. Primeiro, algo surgiu na noite passada. Eu não pensei em conferir quem o Técnico Oliver havia escolhido para arremessar. Segundo, eu vou ao jogo hoje com a Nana D.
Ele grunhiu e soltou a faca. O som do barulho do metal contra a porcelana deixou o nosso silêncio mais estranho.
– Eu suponho que deveria ter sabido que hoje era o Dia do Julgamento.
– Mesmo, pai? Você precisa parar essa guerra com a Nana D. Eu acho que você tem coisas mais importantes com que se preocupar dada a nossa última conversa. – eu terminei dois bolinhos e quase todas as salsichas do meu prato durante o silêncio dele, então mudei de assunto novamente. – E mais alguma postagem no blog?
– Nada. A última foi do dia depois da festa. – ele respondeu.
Eu fiquei cada vez mais certo de que Myriam era quem estava por trás disso. Eu tinha certeza de que ela também queria que Abby fosse despedida. O que Myriam estava esperando conseguir com todas essas ilusões e distrações?
– Eu tenho algumas perguntas sobre Abby para você. – eu disse.
– Vá em frente. Estou ouvindo. – a sobrancelha de meu pai tremeu.
– Eu encontrei alguns materiais no escritório de Abby que me ajudaram a entender o currículo de cada uma de suas aulas. Mas quando olhei no livro de notas dela, algumas coisas não faziam sentido. – eu disse.
A expressão azeda no rosto de meu pai relaxou, mas seus ombros ainda estavam tensos.
– Eu vejo isso como um bom sinal se você estava pesquisando sobre as aulas dela.
Eu expliquei o que tinha visto sem dar nenhum nome específico. Ele não conseguiu me dizer muito sobre o processo. Havia deixado os detalhes de como as notas de um estudante eram finalizadas a cargo de cada chefe de departamento e do Reitor Mulligan.
– Eu raramente tomo alguma medida com relação ao desempenho de um estudante específico, a não ser que seja um assunto para uma potencial suspensão ou um prêmio. Myriam pode te ajudar com essas particularidades se você decidir vir a bordo por algumas semanas.
– Entendo. Nós vamos chegar nisso daqui a pouco. Você tinha alguma ideia de como estavam as notas do Striker? – eu apostaria que ele estaria prestando atenção nas notas se um olheiro da Grande Liga de Beisebol estivesse vindo ao campus hoje.
– Sim. – Wesley Ayrwick provou que ele não era um homem de muitas palavras.
– Será que você por acaso saberia o que mudou para que permitissem que o Striker jogasse hoje? A não ser que ele tenha conseguido um “B+” na aula de Abby, a suspensão para os futuros jogos ainda se aplicaria.
– Por que essa súbita obsessão com as notas de um jogador de beisebol, Kellan? – ele saiu do canto de café-da-manhã para se servir de mais café. Eu assenti quando ele perguntou se eu também queria mais.
Gostei de saber que Striker poderia jogar. Eu havia gostado dele quando nos encontramos na academia, mas o “F” que eu tinha visto no livro de notas de Abby fez soar alguns alarmes. Era muita coincidência que ele tivesse reprovado nas aulas dela no semestre passado e ela houvesse marcado um “F” para a primeira prova desse ano, e então tudo estava de volta ao normal para ele jogar hoje.
– Eu estou um pouco preocupado que tenha alguma coisa errada com a maneira que Abby estava dando as notas para seus alunos.
– Converse com Myriam. Ela pessoalmente se certificou de que os resultados dos exames de Abby estivessem no sistema no começo da semana. Leva alguns dias para elas serem aprovadas, então os estudantes podem checar as notas online.
– Okay. Para responder sua pergunta, eu vou ficar por aqui para assumir as aulas de Abby durante quatro semanas. Preciso falar isso com meu chefe, mas ele já havia me dado algumas tarefas indicando que ele está feliz que eu fique em Braxton por enquanto. – eu respondi. – Eu tenho algumas condições.
Meu pai pareceu ficar exaltado com as notícias.
– Isso é maravilhoso. Fico feliz por você ter mantido sua mente aberta. – as sobrancelhas dele se ergueram inquisitivamente.
Expliquei a ele que queria manter isso o mais privativo possível, ele podia informar apenas àqueles que precisariam saber que eu estaria assumindo as aulas de Abby por enquanto. Eu podia ver a notícia se espalhando e as pessoas começando a pensar que eu já havia me mudado de volta para casa. Também pedi a ele para me explicar tudo o que sabia sobre a vida pessoal de Abby.
– Eu estava passando mais tempo com ela ultimamente do que eu gostaria. Ela estava pedindo muitas folgas, discutindo mais comigo do que o comum, e causou alguns problemas com Lorraine no campus.
– Era com ela que você estava conversando em uma ligação a algumas noites atrás? No dia que eu cheguei em casa? Eu escutei você, e soava como...
– Você estava me espionando? Eu te criei melhor que isso, Kellan. – meu pai pegou suas chaves e a carteira, murmurando para si mesmo sobre o declínio do futuro da sociedade.
– Não, eu havia descido para ir até a cozinha e escutei parte da conversa. Quem estava na ligação?
– Não é assunto seu, Kellan. – ele estava bem calmo e seguro, mas obviamente incomodado.
Eu não podia abusar demais da minha sorte se queria fazer a pergunta mais difícil.
– E o quão bem você conhecia Abby? Vocês dois se socializavam depois do trabalho?
– O que? Não, nós nos encontramos algumas vezes na casa dela, para que pudessemos ter uma conversa mais honesta sobre o futuro dela. Foi assim que fiquei sabendo que ela ia sair de Braxton em algum período durante esse ano.
Ele tinha que ser W.A. no diário dela. As iniciais de Alton eram A.M., as do Técnico Oliver teriam que ter algum O. A vizinha viu o carro de alguém na casa dela. Será que eu poderia perguntar se ele teve um caso com ela?
– Pai, como estão as coisas entre você e a mãe? Ela parece preocupada com você e não tem sido ela mesma ultimamente. Eleanor pensou que vocês tivessem brigado.
– Sua mãe está sob muito stress. Você sabe que essa época do ano é a mais atarefada para ela. – ele colocou a caneca vazia dentro da pia e lavou as mãos. – Eu ficaria feliz se você fizesse um favor para mim. Vou ligar em breve para Myriam para avisá-la que você aceitou e assim ela vai te ajudar a se situar. Eu preciso sair e ir me encontrar com os caras. O Juiz Grey provavelmente já está no quarto buraco agora.
Meu pai pegou a jaqueta dele e caminhou em direção à garagem. Enquanto ele pressionava o botão para abrir o portão, eu o parei.
– A mãe descobriu o que estava acontecendo entre você e Abby? Eu não queria bisbilhotar, mas eu encontrei uma entrada no diário de Abby que dizia...
– Como você ousa pensar que eu faria algo assim com sua mãe? Pensei que nós estavamos virando uma página hoje, mas não sei mais no que acreditar agora. Será que você nunca vai crescer? – ele gritou antes de bater a porta da cozinha.
Meu primeiro pensamento foi de que ele não respondeu minha pergunta. Meu segundo era sobre como eu deveria consertar a situação. Não queria deixá-lo mais bravo, mas meu pai sabia de algo que não estava me contando. Eu decidi que iria deixá-lo respirar nesse final de semana. Uma hora depois, busquei a Nana D no Rancho Danby. Ela havia se vestido com uma jaqueta de Braxton Bears, uma calça cinza justa e um boné de beisebol. O urso era o mascote do time e mais do que certamente descrevia a maneira como o time normalmente jogava. Nas primeiras entradas, eles sempre pareciam um pouco sonolentos e quietos. Por volta da terceira entrada, eles saíam da hibernação e começavam a pontuar. Eu tinha muitas esperanças para o jogo de hoje, mas Nana D não estava convencida.
– Striker é um bom garoto, mas ele não está preparado. Eu o vi na reunião de preparação na noite passada. Estava difinitivamente empolgado por ter sido escolhido, mas ele parecia preocupado com algo. – Nana D disse. Ela trocou de estação de rádio para sua favorita de música country e me forçou a escutar sua música.
– Ele passou na última prova da Abby. Isso deveria deixá-lo feliz. – eu disse, enquanto entrava no estacionamento do Campo Grey. Nós estavamos uma hora adiantados, mas Nana D queria conferir a festa no estacionamento. Fazia anos que eu não ia a uma, e achei que ela fazia aparições regulares baseado nas instruções que me deu sobre onde estacionar, o que trazer e quem iriam participar.
– Sim. Ele estava feliz, mas também mencionou sobre uma garota estar dando problemas com relação a algo. – Nana D deu um sorriso tolo para mim. – Eu suponho que era a namorada dele, mas ele não disse muito. Garotas, shhh!
Por que um estudante da faculdade falaria com ela sobre sua vida pessoal?
– Você parece estar em todos os lugares ultimamente, Nana D.
Ela fez um sinal de positivo quando estacionamos o carro, então saiu rapidamente.
– Eu vou estar de volta em trinta minutos. Preciso ser vista. – esqueci-me de perguntar a ela sobre o encontro antes da reunião de preparação.
Aparentemente, ela tinha uma vida social mais ativa do que a minha. Enquanto Nana D andava por aí, eu fui até o estádio de beisebol e assisti os jogadores treinarem durante alguns minutos. Eu parei perto da cerca para ver os arremessadores se aquecendo. Quando Striker terminou, ele passou em direção ao banco dos reservas onde o Técnico Oliver falava com outros membros do time.
– Kellan, é você? – Striker me chamou.
– Parabéns. Parece que saiu tudo bem com suas notas. Você deve estar bem animado para se encontrar com o olheiro hoje. – eu respondi. Nana D estava certa. Eu ainda conseguia ver uma névoa sobre os olhos dele e esperava que isso não tivesse relação com a morte de Abby.
– Sim, eu passei. O Técnico Oliver ligou para me avisar. Jordan não levou isso muito bem, mas eu acho que ele entendeu que ele teria uma virada mais tardia nessa temporada. – Striker respondeu, colocando sua luva embaixo do braço e arrumando a manga de seu uniforme. Enquanto ele virava o braço, percebi um grande arranhão perto de seu cotovelo.
– Isso parece estar doendo. – eu não tinha visto isso enquanto ele estava na academia, mas ele estava usando uma camiseta de manga longa naquele dia. Certamente, a xerife teria encontrado o DNA dele no corpo da Abby se isso fosse resultado de uma luta.
– Oh, isso, é... eu não me lembro. Quer conhecer minha namorada? – ele disse enquanto uma bonita líder de torcida loira e de olhos azuis caminhava em nossa direção. – Essa é Carla Grey. Ela está aqui para me apoiar hoje.
Carla sorriu e jogou seus pompoms no teto do banco de reservas.
– Oi. Pronto para um grande jogo? Quem é o seu amigo bonitão, Striker? – a maquiagem vibrante e o uniforme curto e decotado chamavam a atenção.
Striker explicou quem eu era. Enquanto eu gostava de elogios, fiquei distraído tentando me lembrar de onde eu a havia visto antes, e fiquei curioso sobre o sobrenome dela.
– Você é parente do Juiz Grey?
Carla assentiu nervosamente.
– Yeah, hmm... ele é meu avô. Você o conhece?
Eu o conhecia, já que meu pai jogava golfe com ele o tempo todo. Ele também havia sido o juiz do condado por quase trinta anos. Todos tinham medo dele. De repente, eu me senti mal pela pobre garota.
– Eu não tive o prazer de encontrá-lo pessoalmente, mas certamente o conheço dos meus dias de faculdade.
Carla pegou os seus pompoms.
– Eu tenho que ir. Temos que começar a animar a torcida logo, não é mesmo? Vejo você por aí, Kellan. – quando Striker foi beijá-la para se despedir, ela virou a bochecha. – Não estrague a maquiagem!
Carla foi embora, e o humor de Striker piorou. Eu disse:
– Está tudo bem? Você parece um pouco distraído hoje. Achei que você estaria animado de encontrar o olheiro.
– Está tudo bem. Problema com garotas. Meu padrasto no meu pé. Eu só espero que eu vá bem. – ele murmurou.
Striker retornou para seu aquecimento quando o técnico o chamou. Eu voltei para encontrar-me com Nana D, que já estava em seu segundo cachorro-quente naquele momento. Ela estava conversando com várias senhoras da câmara de comércio sobre histórias dos tempos de ouro dela e de meu avô.
Quando nós encontramos nossos lugares, ela se aproximou de mim e disse:
– Vê aquela meretriz ali. Eustacia acha que ela ganhou de mim ao fazer Lindsey Endicott trazê-la para o jogo. Eu vou dar um jeito naquela mulher! Dá pra acreditar naquela roupa que ela se enfiou? Honestamente, uma mulher na idade dela colocando um uniforme de beisebol apenas para impressionar um homem.
Até onde eu via, a Srta. Paddington e minha avó estavam vestidas similarmente.
– Hmm, você e ela não tem mais ou menos a mesma idade, Nana D?
Eu senti o beliscão no meu rabo antes que ela tivesse começado a me assaltar verbalmente.
– Eu sou três meses mais nova do que aquela jezebel, e você não tem ideia do que está falando. Você nem mesmo vestiu qualquer coisa para apoiar nosso time hoje, e se eu não soubesse melhor, pensaria que você está do lado da Eustacia. Nenhum neto meu deveria fazer isso comigo, seu pequeno...
O narrador interrompeu a briga dela para pedir que todos ficassem em pé para o hino nacional. Eu sorri para Nana D, mas isso não ajudou muito.
– Nada de tortas para você durante duas semanas, Kellan.
O resto do jogo foi de roer as unhas, assim como minha trégua temporária com Nana D, que concordou em esquecer meu comentário, dizendo que ela não queria nenhuma tensão no ar para interromper a sorte de Braxton. Eu fiquei chocado em descobrir o quanto espírito acadêmico aquela mulher tinha. Em um momento, ela tentou chutar para o alto junto com as líderes de torcida, mas depois de quase cair sobre a Reitora Terry, Nana D se acalmou.
O Braxton Bears liderava o jogo por quatro a três quando a sétima entrada começou. Striker tinha ido bem, mas eu podia ver que ele estava começando a se cansar quando ele desistiu das últimas duas corridas no tempo antes do intervalo. Eu vi o Técnico Oliver aquecendo Jordan Ballantine. Fiquei preocupado sobre o que isso significava para as chances de ambos os jogadores com o olheiro.
Nana D foi pegar mais alguns cachorro-quentes para nós. Eu me encontrei com Fern Terry, a mesma mulher que havia sido a reitora quando eu frequentava Braxton. Fern era extremamente alta com um cabelo curto grisalho. Não havia mudado nada desde que a conhecia, nem seus ombros largos e rosto inchado. Eu sempre pensei que ela ficaria melhor com um cabelo longo, mas então, o que eu sabia? Ela se lembrava muito bem de mim pelas diversas vezes que sentei no escritório dela para defender minha fraternidade.
– Eu escutei que eles estão perto de escolher um novo presidente para Braxton. Ainda não consigo acrreditar que meu pai esteja se aposentando esse ano. – eu disse, esperando pegar uma pista se ela estava entre os dois últimos candidatos.
– Sim, segunda ou terça vai ser o grande dia. Eu fiquei sabendo de fontes confiáveis que o candidato vai ser notificado da decisão do Conselho. – ela disse com um tom intimidante. Quando a Reitora Terry olhou para o cercado, eu percebi um esgar substituindo seu sorriso anterior quando ela olhou para o Técnico Oliver.
– Eu imagino que eles escolheram duas pessoas que serviram a faculdade fielmente por anos e sabem como fazer Braxton continuar a excelência, assim como meu pai tem feito nos últimos oito anos. – eu sorri para ela como se eu fosse o gato que tivesse pegado o pequeno rato.
– Definitivamente. Tenho certeza de que esse é o caso. – a Reitora Terry assentiu, então caminhou em direção ao campo. – Eu preciso conversar com o Técnico Oliver. Por favor, me dê licensa. – ela grunhiu.
Eu pensei que era estranho ela estar no jogo, já que os esportes nunca foram algo que estivesse em sua lista de prioridades no passado. Havia algo acontecendo entre aqueles dois, mas eu também tinha certeza de que ela era um dos dois candidatos à presidência, o que significava que alguém de fora estava sendo considerado, pelo que eu tinha ficado sabendo. Eu forcei meu cérebro para tentar descobriu quem poderia estar na disputa, mas a não ser que fosse alguém das famílias Paddington, Stanton ou Grey, eu não tinha ideia.
Nana D retornou.
– Peguei para você um hamburguer de peru com abacate em um pão de broto de alfafa. Experimente.
– Hmm, eu já os experimentei antes, e desde quando eles começaram a servir comida saudável em jogos de beisebol? – fiz uma expressão de como se o mundo estivesse acabando. Eu geralmente comia saudavelmente, não que ela tivesse percebido.
– E quando foi a última vez que você esteve em um jogo de beisebol? – ela me provocou.
Eu refleti por alguns segundos, o que aparentemente foi tempo demais para Nana D.
– Foi o que pensei. Apenas coma isso, ou eu não vou acabar com aquele castigo de duas semanas sem torta. – Nana D me cutucou com o cotovelo, então riu. – Eu encontrei a Bridget Colton enquanto estive lá fora.
Eu sabia que Nana D queria me colocar em problemas de novo.
– E como está a minha pequena elfa?
Nana D me calou.
– Você é estranho. Apenas pensei que você gostaria de saber que ela estava aqui. Talvez você pudesse dizer um oi a ela depois do jogo. Bridget não conhece muitas pessoas na cidade.
Eu não iria lidar com as maquinações românticas de Nana D hoje.
– Oh, olhe, o jogo está começando.
– Sim, parece que Striker está fora. Marcus vai brigar com ele por isso.
Striker jogou a luva dele na cerca. O Vereador Stanton e o Técnico Oliver estavam discutindo sobre algo, mas eu estava longe demais para saber o que estava acontecendo. A Reitora Terry saiu de lá com uma expressão perplexa no rosto.
– Jordan acabou de ir para a posição de arremessador. Parece que você estava certa. – eu disse.
– E quando eu não estou certa? – Nana D inclinou a cabeça e abaixou os óculos de sol. – E quanto a Bridget...
Eu a dispensei com um encolher de ombros, falei para ela se focar no jogo e prometi que iria visitá-la na manhã seguinte para o brunch se ela não falasse mais daquele tópico. Nana D ficou contente em saber que pelo menos eu concordei em visitá-la novamente.
Jordan arremessou no restante do jogo e só desistiu de uma corrida quando o Woodland Beavers empatou a partida. Para a sorte deles, os Braxton Bears acertaram um triplo na entrada final e venceram o jogo por sete a quatro. A torcida foi à loucura quando os jogadores foram até o estacionamento para celebrar, animados que haviam vencido o primeiro jogo da temporada. Isso significava que Braxton poderia ter uma chance de vencer o campeonato desse ano.
Nana D foi embora assim que o jogo terminou, indicando que iria pegar uma carona para casa com um de seus amigos. Eu me misturei com os outros fãs e aproveitei a atmosfera da faculdade. Quando fui fazer minha pós-graduação e obter meu doutorado na Universidade da Califórnia do Sul, eu não morava no campus. Eu também estava trabalhando o dia inteiro, havia acabado de me casar, e Emma nasceu pouco tempo depois disso. Já fazia quase uma década desde que eu havia sentido aquele eletrizante espírito acadêmico com força total. Era bem fantástico ver toda a cidade junta para apoiar os Braxton Bears.
No caminho para casa, fiz planos para me encontrar com a Dra. Castle na segunda pela manhã para assumir a responsabilidade das aulas. Ela havia sido grossa ao telefone e não queria discutir nada até que nos encontrássemos pessoalmente. Pelo menos eu tinha marcado aquele encontro, e eu poderia descobrir mais sobre o sistema de notas de Braxton, talvez até mesmo verificar o horário e a data que as notas do Striker haviam sido colocadas no sistema.
Capítulo 14
No final da tarde, saí para minha corrida diária escolhendo a Alameda dos Milionários para admirar a vista. Todas as casas eram grandes e ficavam altas entre a Rua Principal e as Montanhas Wharton no plano de fundo. Era uma visão impressionante para qualquer recém-chegado a Braxton, e sempre me fazia perceber o quanto minha cidade natal era bonita. Eu coloquei meu alarme para despertar e tirei um curto cochilo antes de me encontrar com Eleanor para o jantar. O ar fresco enquanto assistíamos ao jogo deve ter me deixado sonolento.
Quando acordei, me lembrei que não havia compartilhado com Connor minhas notícias sobre as entradas no diário de Abby sobre o W.A.. Como já estava ficando atrasado, isso teria que ser deixado para o domingo. Encontrei meu jeans escuro favorito, acrescentei uma camisa cinza-clara e uma jaqueta preta esportiva ao look e deslizei os meus pés para dentro de um par de botas pretas, já que havia um pouco de neve no chão devido à que havia caído durante à tarde.
Eu me encontrei com Eleanor em um restaurante italiano ao lado da margem do Rio Finnulia. Alguns lugares novos haviam sido abertos no ano passado, mas eu só tinha sido capaz de visitar um quando estava em casa para o Natal. Ela havia feito as reservas e conseguiu uma mesa no fundos do restaurante, com vista para as margens do rio banhadas pela luz da lua.
– Conheço a dona. Nós treinamos juntas em um outro restaurante. – ela disse enquanto eu puxava a cadeira para ela. Eleanor havia se vestido um pouco melhor do que sua roupa normal de trabalho, mas não estava nem perto de como havia sido na festa de aposentadoria. Eu fiquei feliz de ver que ela havia mantido a paleta de cores quentes, já que seus olhos e cabelos brilhavam mais quando ela vestia vermelho e amarelo. Assim como os meus!
– Eu fico feliz por você ter se acalmado naquele dia e sugerido esse jantar. – eu não iria ficar de rodeios com relação à atitude dela anteriormente. – Obrigado por ter largado a frente fria, Anna Wintour.
– Me desculpe por aquilo, Sherlock Holmes. Eu não sabia como reagir a algo que você tinha dito. – ela explicou enquanto olhava o cardápio, então sugeriu alguns aperitivos para dividirmos.
Eu pedi duas taças de champanhe para deixar a noite mais relaxante. Forcei meu cérebro a se lembrar sobre qual assunto sensível eu havia conversado.
– Será que você pode me dar uma pista? Não consigo me lembrar agora.
– Connor.
Eu não esperava por isso.
– Ele estava pegando nos meus nervos ultimamente também. O que ele fez com você?
Eleanor bateu seus dedos na toalha de mesa branca e brincou com seus talheres.
– Hmm, bem, não é um assunto fácil para eu falar com você.
Eu comecei a descobrir o que ela estava prestes a dizer antes que as palavras saíssem da boca dela. O Connor e minha irmã? Eu estava dividido entre a raiva por ele ter considerado sair com Eleanor sem perguntar para mim primeiro, e o reconhecimento de que isso significava que não havia nada entre ele e Maggie.
– Alguma coisa aconteceu entre vocês dois antes?
– Não realmente.
– Citando Nana D, isso é um monte de estrume. Vocês dois saíram juntos?
– Uma vez. Talvez duas. Mas não aconteceu nada, eu juro. – Eleanor respondeu enquanto suas bochechas ficavam mais vermelhas que sua blusa. – Nós viemos aqui para jantar dois meses atrás.
Entre a garçonete nos servir nossos coquetéis e os aperitivos, eu consegui saber que Connor havia parado na Lanchonete Pick-Me-Up no outono anterior de eu vir para a casa nas férias de inverno. Eleanor não havia visto ele durante anos, mas ficou intrigada pela mudança dramática na aparência dele quando ambos se encontraram novamente. Eles saíram para tomar drinks juntos numa noite depois do trabalho dela, e ela pensou que havia tido uma conexão, mas não podia ter certeza. Então, ele a havia chamado para jantar, e o encontro havia sido fantástico. Algumas semanas depois, eles se encontraram para um almoço pouco antes do Natal, e então ele ficou frio nas últimas seis semanas. Ela estava nervosa demais para perguntar a ele o que havia acontecido.
– Eu teria gostado que alguém tivesse me contado isso antes. Sinto que todos se esquecem de me informar sobre o que está acontecendo. – eu falei em um tom agravante, algo entre um urso faminto e um amante abandonado.
– Não é como você tivesse perguntado alguma coisa sobre meus outros encontros antes. Eu não sabia o que fazer, mas então você mencionou o quão próximos ele e Maggie pareciam estar, e bem...
Eu havia começado a entender a preocupação dela.
– Você acha que ele te deixou para sair com Maggie?
Eleanor assentiu.
– Eu não sei o que mais poderia ser.
Eu considerei os fatos. Connor e minha irmã haviam saído juntos várias vezes. Então, ele começou a ficar mais próximo de Maggie, ajudando-a para se acostumar a trabalhar em Braxton e deixar as lembranças de seu falecido marido.
– Por acaso, você alguma vez conversou com Connor sobre mim? – eu havia perguntado por um motivo específico, mas também queria saber melhor se ele havia ficado chateado com a perda da nossa amizade também.
– Até parece! Por que eu conversaria sobre você quando nós estavamos em um encontro? – Eleanor disse com desdém. – Eu tenho certeza que eu mencionei sobre você estar vindo para o Natal, mas nós não falamos realmente sobre você.
– Como ele reagiu quando você disse meu nome? – enquanto Eleanor refletia, eu terminei minha taça de champanhe e pedi para a garçonete nos trazer mais água. Eu já havia bebido álcool demais durante a semana, pelo jeito de como minhas calças estavam apertadas agora. Não poderiam ter sido os doces.
– Pensando nisso agora, ele realmente ficou um pouco quieto. Quando ele me deixou em casa, parecia bem distante. – ela inclinou a cabeça para o lado e limpou os lábios no guardanapo. – Alguma ideia?
– Eu fiquei me perguntando se ele havia se sentido um pouco estranho por estar saindo com você, já que você é minha irmã e tal, logo após você ter mencionado que eu estaria vindo para casa. E então, ele provavelmente ouviu que eu voltaria para a festa de aposentadoria do papai. – Connor se sentiu culpado. Eu sabia disso.
– Ele me ligou uma outra vez, e nós conversamos sobre nos vermos novamente. Nada disso se materializou.
Eleanor e eu jogamos três rodadas de Pedra, Papel, Tesoura para ver quem se prepararia a pedir a conta desta vez.
– Aha! Eu sempre venço você, Kellan. – Eleanor me cutucou com o garfo. – Você está acabado por hoje!
E ela estava certa. Eu estava exausto naquele momento e pedi a conta. Enquanto nós esperávamos para pagar, conversamos sobre tudo o que eu havia ficado sabendo durante a investigação do assassinato. Eleanor estava certa de que o W.A. no diário de Abby não era o nosso pai. Ela pensou que Connor podia conhecer opções possíveis e me encorajou a perguntar isso quando eu trouxesse o assunto da Maggie.
– Não diga a ele que você sabe sobre os dois encontros que nós tivemos! – ela gritou enquanto eu fechava a porta do carro.
***
Eu havia dormido até mais tarde do que havia pretendido e iria me atrasar para ir à Nana D. Não queria entrar em problemas ou ser penalizado por qualquer motivo, então eu excedi o limite de velocidade em algumas ruas tentando chegar a tempo. Era domingo, e a maior parte das pessoas estaria na igreja àquela hora. Enquanto eu virava o carro para entrar no Rancho Danby, eu ouvi as sirenes. Se eu não tivesse má sorte naquela manhã, eu não teria nenhuma.
Segui até o acostamento e esperei pelo policial vir até meu carro.
– E o que te fez andar a cinquenta em uma zona de trinta por hora? – uma voz familiar perguntou.
Eu olhei para cima e percebi meu novo melhor amigo olhando para mim. Ele não devia ter nenhum irmão mais velho, já que eu nunca havia ouvido sobre ele ou conhecido alguém da família dele.
– Policial Flatman, eu sinto muito. Eu não estava pensando. Totalmente minha culpa. Eu não queria me atrasar para encontrar com minha avó.
– Oh, é você. – ele respondeu com a sombra de um sorriso. Seus braços redondos moviam ao redor mecanicamente. – Você devia saber melhor. Como a Sra. Danby se sentiria com seu neto tomando uma multa por excesso de velocidade?
Eu estudei o olhar no rosto do Policial Flatman. Ou ele iria me servir uma fatia irônica da torta da humildade, o único tipo de torta que eu não gostava, ou iria me deixar saber que entendia minha situação.
– Eu suponho que não tenha uma maneira de você olhar para o outro lado.
O Policial Flatman pediu minha carteira de habilitação e documentos, então me disse para esperar por um minuto. Enquanto ele saiu, eu pensei em perguntar a ele sobre as últimas notícias da investigação da morte de Abby. Ele poderia estar tão animado para me dar uma multa que deixaria alguma informação escapar. Eu determinei minha abordagem antes que ele voltasse e me entregasse meus documentos.
– Eu acho que nós podemos deixar essa passar, Sr. Ayrwick. Mas se eu vir você dirigindo um quilômetro acima do limite, ou não conseguindo parar totalmente, não vai haver uma segunda chance. Você me entendeu?
– Eu prometo. Estou eternamente grato a você, Policial Flatman. Você deve estar ocupado com a investigação. A xerife fala tão bem sobre o seu trabalho coletando evidências. Essa papelada não deveria ser algo a entrar no seu caminho. – eu respondi com grave sinceridade. “Mate-os com gentileza”, a Nana D sempre dizia.
– Ela disse isso? Uau, eu estava me perguntando se a Xerife Montague valorizava meu trabalho. Especialmente depois que descobri um furo no álibi de Fern Terry. – ele respondeu com felicidade quando seu rosto começou a corar.
Oh, isso poderia estar funcionando.
– Definitivamente. Você é de grande ajuda. E quem saberia que você era um cara tão metódico. Talvez algum dia você consiga ser um detetive, hein?
– Essa é a minha maior esperança. Tornar-me o Detetive Flatman antes dos meus trinta anos. Eu ainda tenho alguns anos, mas...
Não, eu precisava interrompê-lo se queria pegá-lo desprevenido.
– O álibi da Reitora Terry, sim, eu ouvi sobre isso. Eu não sabia que ela era uma suspeita. – eu não tinha ideia de como a Reitora Terry poderia estar envolvida no assassinato de Abby. Foi um choque ouvir o nome dela. – Imagine ela sendo...
– Fern foi vista saindo da festa de aposentadoria às oito horas, mas disse que havia saído às nove. – o Policial Flatman disse. – Eleanor viu a mulher saindo muito mais cedo, logo após Myriam também ter saído.
– Você conseguiu descobrir o que aconteceu? – eu perguntei. Se Myriam havia saído antes de Fern, a fã de Shakespeare não podia verificar o relato dos eventos da minha irmã; será que alguém mais a havia visto?
– Não, eu acho que Fern deve estar errada sobre a hora. Eu estou esperando para saber o que a Xerife Montague conseguiu descobrir sobre o que aconteceu entre o horário que ela saiu da festa e o horário que ela chegou em casa, às nove e quarenta e cinco. – o Policial Flatman sorriu, então pareceu que ele havia percebido ter falado demais.
Eu não conseguia me lembrar de tê-la visto, mas na maior parte do meu tempo estava focado em Maggie naquela última hora.
– Bem, eu aprecio você ter me ajudado hoje. Eu tenho que ir para a Nana D.
– Absolutamente, Sr. Ayrwick. Tenha um bom dia. – ele respondeu. Enquanto ele se afastava, eu pude vê-lo rindo histericamente pelo espelho retrovisor. Estranho, já que tinha sido eu quem havia se livrado da multa. Não querendo arriscar minha sorte, eu agradeci aos poderes-maiores por terem me dado misericórdia e me assegurei de não passar dos trinta quilômetros por hora enquando dirigia o caminho de terra até a fazenda da Nana D.
Quando estacionei, ela estava na varanda em uma cadeira de balanço.
– Três minutos atrasado, Kellan. Você teve sorte de que eu estava em uma ligação que me impediu de terminar de preparar o café-da-manhã em tempo.
Talvez minha sorte estivesse mudando hoje, duas de uma vez.
– Eu sinto muito, eu encontrei um pouco de... trânsito na estrada. – ela não precisava saber que era apenas um carro no meu caminho para chegar até aqui em tempo. O vento me acertou por trás, me fazendo lembrar de que hoje estava mais quente do que o comum, mas ainda não o suficiente para ficarmos do lado de fora. – Vamos entrar?
Nana D continuou se balançando para frente e para trás. A trança dela estava desfeita hoje, e ela parecia bem satisfeita consigo mesma. Um vago sentimento de um gato-que-comeu-o-rato pareceu me acertar.
– Certamente. Você não vai me perguntar quem me manteve tanto tempo ao telefone?
Ela iria falar novamente sobre Bridget.
– Eu tenho certeza de que era importante. Vamos comer aquele café-da-manhã delicioso, que você estava preparando. O que é, ovos e bacon? Biscoitos caseiros? – eu esfreguei meu estômago quando a fome começou a doer. Se ela tivesse feito geleia de laranja, eu beijaria o chão aos pés dela.
– Eu vou te seguir para dentro. Estou grata pelo Policial Flatman ter sido generoso o suficiente para me contar sobre o trânsito que você pegou. – enquanto a porta se fechava atrás dela, ela soltou uma gargalhada digna de Fran Drescher.
Eu fiquei vermelho. Não era Bridget ao telefone. Flatman tinha rido por último, aquele porco!
– Você não fez isso?
– Eu fiz. Se tivesse algum tipo de dívida entre mim e você com relação a minha visita à cadeia do condado, certamente foi paga agora.
Tudo o que eu podia fazer era assentir. Repetidamente. Trinta minutos mais tarde, eu continuei a engolir meu orgulho enquanto ela me provacava sobre eu estar atrasado e ter sido parado pela polícia.
– Eu não posso ter pessoas dizendo coisas negativas sobre minha família. Nós já temos algumas manchas por causa desse assassinato que seu pai deixou acontecer. Não siga os passos dele e acrescente outro olho preto. Não vai me ajudar no futuro.
– Te ajudar com o que? – eu murmurei enquanto enfiava metade de um biscoito na boca.
– Não importa. Você entendeu o que eu quis dizer. – ela respondeu e se afastou da mesa.
Sabendo o quanto ela adorava uma fofoca, eu troquei alguns segredos para me tirar dos problemas. Nana D queria ser a pessoa a perguntar para Connor se eles tiveram um encontro, mas eu a persuadi a deixar a situação quieta.
– Você tem que conseguir convencer a Lorraine a reportar os itens perdidos ao Connor. E descobrir sobre as notas com Myriam. Eu vou atrás do Marcus Stanton e perguntar para um amigo. Ninguém está fazendo muito para resolver esse problema. Eu preciso de uma cidade livre de crimes. Isso não está parecendo bom para nós agora.
– Estou nisso. Por que é tão importante... – a campainha me impediu de terminar. – Eu vou atender.
– Obrigada, Kellan. Eu realmente fico feliz que você não perdeu suas boas maneiras. – ela disse com um suspiro audivel.
Quando eu abri a porta, tive um déjà vu. O elfo estava de volta!
– O que você está fazendo aqui?
Bridget entrou e começou a desabotoar o casaco, pelo menos ela não estava com aquele grande casaco verde, já que o dia estava mais quente.
– Não conversamos sobre isso na semana passada? Eu tenho aulas com Seraphina nos domingos pela manhã. Hoje é domingo. Alguma ideia do por que estou de volta?
Parecia que minha pequena elfo amiga gostava de discutir. Ela obviamente havia sido bem treinada pela Nana D. Foi então que eu percebi o porquê de Nana D ter deixado para lá o assunto sobre eu ir encontrar Bridget na festa do estacionamento depois do jogo. Quando eu me voluntariei para vir para o café-da-manhã hoje, Nana D sabia que Bridget iria estar aqui para as aulas de clarinete. Ela era um diabo, não uma avó inocente.
– Aulas de música. Estou de volta ao jogo, sem problemas. – eu respondi, feliz por ela ter escolhido uma roupa diferente hoje, uma roupa normal. Bridget vestia um suéter de tricô branco e um par de calças jeans skinny que pareciam modernas e chics. – Por falar em jogo, eu ouvi que você estava no Campo Grey ontem.
– Sim, eu sou uma grande fã. Eu apoio os times da faculdade sempre que posso, mas sempre tive uma conexão mais forte com o beisebol. Meu pai me instigou isso quando eu era uma garotinha. – ela respondeu.
– Você estuda com ou conhece algum dos caras do time? – eu não conseguia me lembrar se ela havia mencionado a faculdade na última vez.
Bridget encolheu os ombros.
– Yeah, eu conheço alguns deles. Eu conheço o Craig por ter parado no departamento de comunicações no semestre passado. Estou no curso de biologia com ele e Carla Grey este ano. Todos os outros o chamam de Striker, mas eu não gosto dessa coisa de apelidos.
Enquanto Nana D continuava estranhamente ausente, eu fiquei sabendo que Bridget havia ficado orfã quando bem nova, e foi criada em lares temporários. Quando ela fez dezoito anos, recebeu uma bolsa de estudos para Braxton e estava lá há quatro anos já, o que significava que ela iria se formar em alguns meses. Ela estava estudando para se tornar uma professora com o foco em literatura inglesa e educação musical. Bridget parecia ser uma garota legal, mas bem mais nova, e eu não tinha certeza no que minha avó estava pensando ao me arranjar com alguém dez anos mais nova que eu. Isso pode ter funcionado para meus pais, mas eu não via isso funcionando para mim.
Foi quase ao fim da nossa sessão de conhecer um ao outro que percebi que ela havia mencionado Striker visitando o departamento de comunicações com frequência.
– Como você sabe que Craig Magee ia ao Hall Diamente tão frequentemente?
Bridget riu.
– Oh, eu trabalho lá. Eu sou uma das estagiárias no departamento de comunicações. O trabalho paga pelos meus suprimentos e livros, então eu não tenho outros tipos de despesas.
– Uma das estudantes ouviu uma briga entre Lorraine e Abby? Foi você ou uma estagiária diferente? – eu perguntei.
Bridget se remexeu em seu assento e destrancou a capa do clarinete. Ela olhou além de mim, provavelmente esperando que Nana D chegasse logo.
– Fui eu, mas não queria causar problemas para ninguém. Aquela xerife me entrevistou porque eu trabalho no prédio e queria saber se eu tinha visto alguma coisa no passado.
– Me desculpe. Eu não quis te deixar desconfortável. Ouvi que foi uma discussão bem alta, e fiquei curioso para saber como havia começado. – eu acrescentei, me sentindo culpado de que ela provavelmente só estava tentando fazer a coisa certa e provavelmente causou um pequeno problema no departamento. – Eu tenho certeza de que Lorraine sabe que você estava apenas dizendo o que ouviu. Ela é uma mulher compreensível.
– Yeah, tem sido um pouco estranho, mas eu tenho certeza de que vai ficar melhor. Eu não acho que Lorraine tinha a intenção, mas às vezes ela era rude com a Professora Monroe. Eu a vi pegar o pulso da Professora Monroe e sacudi-la violentamente. Isso tinha a ver com algum tipo de documento legal. Eu não ouvi toda a conversa. – quando Bridget terminou de falar, Nana D entrou calmamente na sala como se não estivesse planejando nada disso.
– Eu sinto muito por ter deixado vocês dois esperando. Eu tive que guardar toda aquela comida. Você quer alguma coisa, Bridget? – Nana D perguntou docilmente.
– Eu tenho que ir. – eu disse enquanto dava um olhar afiado na direção de Nana D. – Foi ótimo conversar com você, Bridget. Talvez se minha filha a visitar aqui no futuro, você se interesse em ensiná-la a tocar clarinete. Isso poderia ser um dinheiro extra no seu bolso. – eu tinha dois motivos para fazer essa oferta, além de genuinamente querer que Emma ficasse mais envolvida com instrumentos musicais. Eu precisava de uma oportunidade para descobrir mais de Bridget sobre como as coisas funcionavam no departamento de comunicações. Também queria que Nana D pensasse que seu plano para empurrar eu e Bridget a ficarmos juntos estava funcionando, na esperança de que ela nos deixasse em paz. Também havia uma pequena parte de mim que apreciava tirar a oportunidade da Nana D ensinar Emma tocar clarinete. Sabendo o quanto ela adoraria passar tempo com sua bisneta, eu tinha que criar algumas maneiras de revidar Nana D por sempre me vencer nos nossos pequenos jogos. Nós realmente gostavamos de provocar um ao outro.
– Que ideia adorável. – Nana D disse. – Eu tenho certeza de que vocês três vão aproveitar muito a suas tardes juntos.
– Excelente. Eu espero que você possa emprestar para Emma o seu clarinete, Nana D. Eu não quero comprar um até saber se vai ser algo que ela vai usar.
Nana D se virou para Bridget.
– Você encontrou o seu clarinete desaparecido? Eu gostaria de dar o meu ao Kellan. Bridget sacudiu a cabeça.
– Ainda não. Eu encontrei a maleta do meu clarinete, mas o instrumento ainda está desaparecido. Estou bem chateada com isso também. Não sou feita de dinheiro!
Eu fiquei sabendo que Bridget havia esquecido seu clarinete no Hall Diamante na semana anterior, mas quando ela voltou para buscá-lo quando os policiais a deixaram entrar no prédio vários dias depois, ela encontrou a bolsa vazia. Ela reportou isso à Lorraine, o que fazia sentido já que Lorraine me disse que havia vários itens desaparecidos. Eu teria que perguntar qual era o terceiro. A explicação dela me fez pensar se o clarinete ainda estava desaparecido porque alguém o havia usado para bater Abby na cabeça. Fiz uma anotação mental para perguntar ao Connor se isso poderia ser a arma do crime, antes de deixar Bridget preocupada. Eu não queria que ela pensasse que algo seu havia matado Abby, quando os estudantes ainda pensavam que a morte de Abby havia sido acidental. Eu tinha que admitir que parecesse peculiar um ladrão levar apenas o clarinete ou que o assassino não descartaria tanto a maleta quanto o clarinete usado para matar alguém.
Capítulo 15
A Mãe Natureza abençoou Braxton durante a noite ao mandar a sua poeira para cobrir a Floresta Nacional de Saddlebrooke. Os gigantescos abetos estavam lindos com seus galhos verdes e robustos cobertos por flocos brancos. Eu parei no estacionamento da The Big Beanery para me encontrar com Myriam para um café-da-manha na segunda de manhã. Depois de ficar debatendo sobre o que fazer, parecia mais apropriado chamá-la de Myriam ao invés de Dra. Castle já que nós seríamos colegas durante o próximo mês.
Myriam havia escolhido uma calça de alfaiataria marrom escura e uma camisa de gola aberta laranja vibrante. Ao invés de colocar uma gravata ou um broche, ela havia enrolado um elegante lenço de seda ao redor do pescoço. O cabelo dela, no entanto, não havia mudado desde a última vez que a tinha visto, o que me fez pensar se ela tinha uma coleção de perucas com o mesmo penteado. Não havia nenhum fio de cabelo que parecia estar apontando para uma direção diferente do que da última vez. Trabalhando com televisão e pesquisa, minha mente havia começado a funcionar como uma memória fotográfica e foram muitas noites passadas analizando a continuidade entre os episódios. Eu controlei a vontade de descolar uma seção do cabelo de Myriam para ver se tinha a Segunda-feira escrita em algum lugar. Afinal, ela era uma professora do departamento de teatro.
Quando Myriam escolheu uma xícara de chá herbal e uma salada de frutas, eu pedi um espresso duplo e uma fatia de bolo de café, precisando de um boost extra para passar pela manhã.
– Eu aprecio você ter conseguido arranjar um tempo para me situar sobre as aulas de Abby. Eu ensinei para algumas turmas da escola quando estava fazendo meu doutorado em...
– Sr. Ayrwick. – ela me interrompeu. – Eu estou mais do que feliz em fazer minha parte para assegurar que os estudantes de Braxton não fiquem mais impactados do que já estão. No entanto, seu pai certamente o trouxe por fora do radar. Ele poderia ter me contado durante a festa de aposentadoria que você era filho dele. O que foi que Brutus disse para Julio César... “O abuso da grandeza é quando ela separa o remorso do poder,” eu acredito.
Ela estava correta na citação, mas também devia sentir alguma culpa sobre os comentários depreciativos que ela havia dito sobre meu pai.
– Talvez. Meu pai tenha uma visão limitada nessas circunstâncias e faz o mínimo para... – e ela fez de novo. Eu estava criando um complexo por causa das frequentes interrupções.
– Não que isso teria mudado qualquer coisa que eu disse. Eu mantenho minhas palavras, e esse é outro caso de Wesley Ayrwick pensando que ele pode brincar de Deus. – Myriam respondeu bebendo alguns goles de chá. Ela pressionou um lenço de algodão, que havia pegado de seu bolso, sobre seus lábios, então se sentou ereta no banco.
– Bem, ao invés de ficarmos falando do passado, o que você acha de focarmos nas aulas que eu vou assumir nessa manhã? – eu tinha terminado de ler todos os materiais na noite passada e estava animado para revisar alguns dos conteúdos introdutórios que havia há muito esquecido.
– Eu estou disposta a supor que você pode lidar com esse material de aula. Eu revisei suas qualificações, e enquanto estou descontente com a maneira que seu pai te colocou em Braxton, estou satisfeita que você tem bem mais experiência do que Monroe. Enquanto você não tem o papel de professor de graduação em seu currículo, provavelmente pode dar um jeito nisso por causa de tudo o que conquistou em sua carreira. – ela enfiou o garfo em um pedaço de grapefruit que eu juro que ouvi se encolher quando entrou na boca dela. – E isso nao é um elogio. Apenas uma observação e comparação. Eu espero que quando nós contratarmos um professor em tempo integral, venhamos a ser mais rigorosos em nossa busca pelo candidato.
Essa seria uma batalha digna de Átila o Huno. Myriam e eu passamos uma hora discutindo tudo o que ela sabia sobre as aulas atuais de Abby e futuras entregas de trabalhos dos estudantes. Entre nossas conversas e discussões, encontrei uma maneira de trazer o assunto do processo de notas.
– Monroe não fez o upload das notas daquela primeira prova, fui eu. Houve algum tipo de confusão no meio de toda aquela movimentação quando a xerife estava vasculhando as coisas na semana passada. – Myriam disse enquanto jogava o lixo fora. – Quando recebi acesso ao prédio novamente, eu encontrei a pasta com todas as provas no correio do meu escritório. Parecia que a mulher já havia dado a nota para todas, mas ainda era necessário dar entrada no sistema.
– Você não deu a pasta a mais ninguém? – em primeiro lugar, era estranho que ela tivesse encontrado a pasta.
– Eu normalmente as entrego para a gerente do escritório, mas já que era muito tarde, eu mesma dei entrada nessas provas para previnir atraso dos resultados aos estudantes. Eu as aprovei na quarta-feira de noite.
Alguns estudantes de Braxton se sentaram em outras mesas ao redor. Cumprimentei Connor enquanto ele fazia o pedido de sua dose de café matinal. Eu me voltei para Myriam, então disse:
– Você encontrou a prova do Striker?
Myriam encolheu o nariz.
– Eu não estou familiarizada com esse nome.
Ela estava falando sério? Todo mundo sabia sobre a rivalidade no time de beisebol.
– Craig Magee, eu creio, é o nome verdadeiro dele. Ele estava tendo problemas com as aulas de Abby no ano passado, e essa era a segunda chance dele.
– Sim, seu pai me pediu especificadamente para dar uma olhada naquela prova. Parece que ele conseguiu aulas particulares ou decidiu focar em seus estudos mais no que na carreira esportiva. Eu não entendo porque seu pai permite que aquele diretor esportivo coloque tanta pressão...
Era a minha oportunidade de interromper dessa vez.
– Você conhece o Técnico Oliver? Ele visitava regularmente o departamento de comunicações? – eu estava convencido de que ele tinha algo a ver com a nota sendo trocada na prova do Striker. Eu tinha certeza de que Striker havia tirado um “F” baseado na entrada no livro de Abby. Alguém deve ter pegado a prova dele para se assegurar que ele fosse bem o suficiente para jogar o jogo.
– Eu mal conheço aquele Neandertal. Como eu disse, o ponto dos programas atléticos de Braxton é insignificante para mim. Ainda estou chocada sobre quantas doações eles recebem. – Myriam respondeu enquanto bebia o resto de seu chá.
– Você está familiarizada com o blog que também tem muito a dizer sobre a disposição das doações para Braxton? – eu perguntei, esperando deixá-la um pouco desconfortável e para confirmar minhas suspeitas.
Myriam bufou e se levantou da mesa.
– Fiquei sabendo sobre isso. Eu geralmente não leio blogs anônimos, mas esse certamente acertou em cheio, você não acha? Sr. Ayrwick. – ela juntou suas anotações e colocou de volta em sua maleta. – Eu vou te encontrar mais tarde para saber como foi o seu primeiro dia dando aulas. Se você precisar de mim, estarei em meu escritório preparando decisões finais sobre a nossa próxima produção de Rei Lear. Eu pensei que seria uma seleção perfeita para a mudança de liderança nesse ano.
Enquanto Connor se aproximava da mesa, Myriam foi embora. Se tivesse tido tempo de responder, eu a lembraria de que Lear era um dos personagens mais amados na época que a peça foi encenada, assim como, perguntaria em quais das filhas de Lear ela havia tomado inspiração para se modelar. Eu certamente tinha meu voto gravado em pedra.
– Kellan, hoje é o seu primeiro dia. – Connor disse, ao invés de perguntar. Eu supus que ele tinha que atualizar as minhas autorizações de acesso ao campus o que explicava como ele sabia que eu estava trabalhando em Braxton.
– Sim, estou indo para o Hall Diamante agora que nós podemos ter acesso novamente às salas de aula. – eu fiquei feliz que Connor veio até mim, apesar de que o assunto que eu tinha para conversar me deixasse nervoso.
Ele se juntou a mim na caminhada até as salas de aula.
– Eu tenho certeza de que você vai se sair bem. A Xerife Montague liberou todo o Hall Diamente ontem de noite. Eu acho que ela está pronta para fazer uma prisão amanhã.
Eu tinha certeza de que eles haviam encontrado evidências suficientes para haver uma grande decisão no caso.
– Ela conferiu os registros telefônicos para ver com quem Abby se encontraria? Você tem alguma ideia do que foi usado para matar Abby? Talvez um clarinete?
– Eles completaram os testes em alguns objetos e verificaram o tamanho e a forma geral da arma. A ligação que você escutou veio de alguém no Complexo Esportivo Grey. Estou trabalhando com o grupo de tecnologia para descobrir a localização exata. As coisas não estão muito bem para Lorraine. – Connor olhou seu celular e respondeu a uma mensagem dizendo que estaria no escritório em dez minutos.
Baseado na explicação dele, Lorraine deveria ter reportado os itens desaparecidos. Eu também esperava que Lorraine houvesse contado para a Xerife Montague sobre ter encontrado com o Técnico Oliver no campus naquela noite
– Não tem como ela ter feito isso, Connor. Eu tenho certeza de que isso tem alguma relação com a mudança das notas para assegurar que um certo membro do time de beisebol pudesse jogar o grande jogo. Lorraine não tinha motivo para se preocupar com quem iria começar arremessando no último sábado.
– Eu acho que a Xerife Montague é inteligente o bastante para não prender Lorraine sem evidências. Você sabe que Lorraine estava brava com Abby pelo tratamento que ela estava dando ao seu irmão, Alton.
– E quanto à falta de um álibi da Reitora Terry?
O choque no rosto de Connor revelou que ele não sabia.
– Ela tem um motivo?
A pergunta dele era importante. Além de alguns olhares estranhos na direção do Técnico Oliver durante o jogo, eu não podia pensar em nada suficientemente peculiar.
– Mas ela mentiu para a xerife sobre o seu paradeiro.
– Muitas pessoas não se lembram dos seus movimentos exatos naquela noite, Kellan. Eu tive que ajudar a interrogar todos, e ainda tem algumas pessoas que não têm um álibi para aquela janela de trinta minutos de quando Abby foi morta. – ele fez uma cara de quem estava ficando chateado comigo.
Apesar de ele ter razão, eu não estava pronto para desistir. Me lembrei de perguntar a Connor sobre as iniciais no diário.
– Isso pode ser verdade, mas Abby estava se encontrando com alguém com as iniciais W. A.. Será que você conhece mais alguém aqui no campus que poderia estar envolvido com ela?
Connor pensou durante alguns segundos.
– Além do seu pai?
– Sim. Alguém mais? – eu respondi, esperando que ele não ficasse distraído com pensamentos sobre Abby e meu pai juntos. Isso já me deixava mal. – E também, você tem acesso para revisar as entradas no sistema de segurança dos estudantes? – eu repeti o que Myriam havia me dito sobre o dia e a hora da entrada das notas no sistema.
– Kellan, precisa ficar fora dessa investigação. Você tem teorias demais na sua cabeça. A xerife sabe o que ela está fazendo. Você não pode voltar a Braxton de soslaio e se colocar no meio de tudo apenas porque quer. – ele disse isso com mais do que um traço de frustração na voz.
Eu comecei a pensar que a atitude dele ia além do que o meu interesse na morte de Abby Monroe.
– Eu aprecio o conselho. Está bem, vou deixar isso quieto por enquanto. Você tem visto a Maggie ultimamente? – ele não ia ser mente aberta sobre a investigação, então mudei de assunto. Eu não tinha planejado em ser tão brusco, no entanto.
Connor parou de caminhar e pegou meu ombro. Por um segundo, eu me preocupei sobre o próximo movimento dele, mas então ele deu um passo para trás e respirou fundo.
– Maggie e eu temos saído em alguns encontros. Eu não tenho certeza de onde isso vai dar, mas tem uma química. Sempre houve uma química. – Connor disse antes de se virar para longe de mim e pegar o celular.
– Sempre houve? – eu disse, dispensando a dor no meu lado.
– Yeah. Eu nunca te disse isso antes, mas agora você sabe. – Connor respondeu.
Eu fiquei sabendo, quase doze anos depois, que quando nós éramos todos amigos em Braxton no nosso terceiro ano, Connor gostava de Maggie. Ele a havia chamado para sair no mesmo dia que eu, mas ela havia lhe dito que precisava pensar. Ele nunca entendeu o porquê até que alguns dias depois eu anunciei que nós eramos um casal. A dor em meu lado ficou pior quando reconheci o quanto ele havia mantido para si mesmo todos esses anos atrás.
– Por que você não me disse algo? Eu nunca percebi que você tinha sentimentos tão profundos por ela. – eu respondi sentindo uma pontada de culpa. – Você nunca parecia chateado quando nós saíamos sem você.
– Confie em mim, eu estava com raiva. Mas nós éramos melhores amigos. Eu não queria perder nenhum de vocês, então engoli meu orgulho e me foquei na faculdade. – Connor disse, procurando pelas chaves do carro no bolso dele.
Eu me lembrei dele nos dando espaço no nosso último ano em Braxton, mas não fiquei sabendo dos motivos.
– Me desculpe cara. Eu queria ter sabido.
– Foi por isso que eu não mative contato depois da graduação. Quando você terminou com ela, isso quase me matou. Eu devia ter lutado por ela naquela época, especialmente se você fosse descartá-la pela primeira oportunidade de sair de Braxton. – Connor respondeu. Eu percebi a frustração volátil crescendo dentro dele.
Tudo se tornou mais óbvio quando eu pensei sobre a última conversa que tivemos no campus naquele dia.
– Então, foi isso que o levou a essa mudança dramática na sua aparência?
Connor assentiu.
– Eu precisava esquecer tudo e focar no meu futuro. Eu me joguei nos exercícios físicos e na área de segurança... parecia ser o melhor lugar para concentrar os meus esforços.
– Mas quando você e Maggie acabaram trabalhando juntos em Braxton, você decidiu... – Dar uma chance. – ele completou. – Ela é uma mulher maravilhosa. Eu não queria perder a chance duas vezes.
Eu tinha que perguntar, mesmo se a resposta machucasse.
– Foi por isso que você parou de ligar para Eleanor?
– O que? Não. – Connor olhou novamente para o celular. – Eu tenho que ir. Algumas vezes você consegue ser um idiota total.
Enquanto Connor caminhava de volta para o veículo da SCB, minha dor finalmente aliviou sabendo que havia algo realmente acontecendo entre ele e Maggie. Eu não fiquei feliz com isso, mas pelo menos não estava mais escondido. Então, fiquei preocupado sobre o quão sério isso era e o que iria significar para Eleanor. Infelizmente, eu tinha aulas para dar e não podia ficar pensando em minhas preocupações.
Subi as escadas ignorando a sensação gelada que tomava conta do meu corpo quando entrei no vestíbulo onde nós havíamos encontrado o corpo de Abby. Eu deixei minha maleta no escritório dela, meu espaço de trabalho temporário, e fui até área principal do andar para encontrar Lorraine. Ela estava ao telefone, mas acenou e disse que me encontraria depois da primeira aula.
Poucos estudantes já estavam por ali conversando quando voltei pelas escadas e me sentei numa mesa do canto na sala de aula perto da entrada do edifício. Eu disse olá e que eu estaria com eles em alguns mintuos, então reconheci Jordan Ballantine mandando mensagens em seu celular. Enquanto preparava minhas falas introdutórias, os estudantes restantes entraram, incluindo Striker e sua namorada, Carla.
– Não conseguiu aguentar no sábado, Striker? – Jordan disse, erguendo a cabeça. Seus olhos castanhos profundos estavam focados em seu competidor. Com seus ombros retangulares e peito estufado, ele parecia um pouco ameaçador. Jordan estava confiante em seu talento e voz, e claramente não tinha medo de mostrar isso.
– O que você disse? – Striker respondeu. – Eu tenho certeza de que o Técnico Oliver apenas me tirou da partida para te dar uma oportunidade de ser visto pelo olheiro. Ele se sentiu mal por ter me escolhido ao invés de você.
– Não foi assim que aconteceu. – Jordan gritou. – As suas notas magicamente...
– Meninos, qual é? Vocês deveriam ser amigos, parem com essa idiotice. – Carla disse. – Fiquem felizes que ambos tiveram a chance. E nós vencemos! Isso é o que importa. – os lábios cheios dela estavam em um biquinho.
E foi então que eu me lembrei de onde havia visto Carla antes. Ela era a garota sorrindo para Jordan na academia enquanto pedalava. Não tinha certeza se a minha conversa com Connor havia impactado meu julgamento, mas parecia que havia alguma coisa escondida acontecendo na sala de aula.
– Sim, nós vencemos porque eu salvei o jogo no final. Striker não deveria estar jogando. Ele está em provação acadêmica. – Jordan disse enquanto colocava o celular no bolso dos seus jeans de marca. – Acho que algo deve ter mudado, hein? – ele provocou.
O rosto de Carla se iluminou rapidamente.
– Yeah, talvez ele tenha estudado duro e passado. Deixe-o em paz.
– Exatamente. – Striker respondeu. – O Técnico Oliver não teria me deixado jogar se eu não tivesse passado na prova.
– Ou algo assim. – Jordan disse. – Tudo parece um pouco engraçado sobre como as coisas melhoraram rápido depois que a Professora Monroe morreu. Eu deveria ter começado!
Quando Striker se levantou e mirou o punho na direção de Jordan, eu elevei minha voz e falei:
– Bem vindos de volta ao Hall Diamante, pessoal. Eu tenho certeza de que vocês estão curiosos sobre quem eu sou...
Eu falei meu discurso de apresentação, o que pareceu aquietar a sala, mesmo que não tenha me aquietado. Se os estudantes falavam sobre a peculiaridade das notas do Striker terem mudado tão rapidamente, havia algo de substancial por trás da minha intuição. Eu teria que voltar a vasculhar assim que terminasse as aulas de hoje.
A primeira aula correu tudo bem. Eu falei sobre uma linha do tempo genérica de como a indústria filmográfica evoluiu no fim do século XIX e no primeiro quarto do século XX. Quando dispensei a turma, Carla correu atrás do Striker, seguida por alguns outros estudantes. Eu aproveitei a oportunidade de me apresentar para Jordan enquanto ele guardava suas coisas.
– Bom te conhecer, Professor Ayrwick. Você é parente do presidente? – ele perguntou.
Eu confirmei, então perguntei a ele o que havia acontecido antes da aula iniciar.
– Eu percebi um pouco de tensão entre você e alguns outros estudantes. Alguma coisa que eu deva ficar preocupado?
Jordan fungou.
– Nós somos todos amigos, apenas incomodando um ao outro. Striker e eu estamos bem.
– Eu vi você arremessando no último sábado. Você tem uma bola cuva fantástica. Eu tenho certeza de que o olheiro da Grande Liga de Beisebol ficou impressionado. – eu acrescentei. E era verdade, Jordan definitivamente salvou a abertura do campeonato.
– Obrigado, senhor. Eu aprecio isso. – ele fechou um botão de sua camisa xadrez que havia aberto.
Senhor? Ele me chamou de senhor. Nem mesmo Derek me chamava de senhor.
– Pode me chamar de Professor Ayrwick. Eu ouvi que você tem algumas preocupações sobre como as notas foram determinadas. Isso é algo que você queira discutir?
Jordan mudou o peso de perna e balançou a cabeça.
– Nah. Se ele passou na prova, tenho certeza de que foi legitimamente, quero dizer, a não ser que talvez Striker tenha feito algo... deixa pra lá, é só que, você sabe...
– Não Jordan, eu não sei. Sou novo aqui, então se você tem uma informação para compartilhar, eu apreciaria isso. – eu disse. Parecia que ele queria me contar mais, mas eu podia ver que ele estava nervoso.
– Eu vou me atrasar para minha próxima aula. – ele fez uma corrida louca até a estação do teleférico.
Eu tinha uma hora antes de minha próxima aula, então resolvi ligar rapidinho para a xerife. Já fazia alguns dias, e eu precisava agradecê-la por ter me deixado ter acesso ao escritório de Abby. O Policial Flatman atendeu.
– Sr. Ayrwick, como foi sua visita a sua avó ontem?
– É sempre um prazer vê-la. Apreciei você ter-me liberado tão facilmente. – eu respondi, não querendo deixá-lo saber que eu sabia que ele tinha levado a melhor sobre mim. – Ela preparou um delicioso café-da-manhã. Alguma chance de a xerife estar disponível?
– Excelente. Fiquei feliz por ter te encontrado ontem. Eu não posso dizer com certeza o porquê, mas meu dia certamente melhorou depois disso. – ele disse antes de me deixar em espera. Será que eu tinha ouvido um sotaque sulista?
Alguns segundos depois, a Xerife Montague atendeu a ligação.
– O que você quer agora?
– Apenas dar os meus mais sinceros agradecimentos por ter me garantido o acesso ao escritório de Abby Monroe. Fez com que ensinar nas aulas dela hoje ficasse muito mais fácil. – enquanto explicava meu novo trabalho temporário, eu fiz uma lista das coisas para mencionar sobre o caso se ela tentasse desligar rapidamente. Isso estava sendo uma coisa recorrente na minha vida ultimamente.
– Parece que você conseguiu se misturar nas coisas, Pequeno Ayrwick. – a xerife respondeu. – Tenho uma prisão para fazer em breve. Estou apenas esperando o resultado sobre umas fibras que nós encontramos nas unhas da falecida. Fale rápido, por favor. – se haviam fibras, isso queria dizer que houve uma briga antes que Abby tivesse sido acertada na cabeça com a misteriosa e desaparecida arma do crime.
– Absolutamente. Eu ouvi que Lorraine Candito lhe avisou sobre a perda do presente que ela pretendia me dar, assim como os outros items roubados do Hall Diamante. Eu fiquei pensando se você descobriu alguma coisa. Estou ansioso para descobrir o que ela me deu. – eu disse, enquanto cruzava o andar em direção às escadarias.
– Nós não encontramos esse item em particular, mas quando nós troperçarmos na sua pequena bugiganga, você vai ser o primeiro a saber. Se isso é tudo... – o tom cáustico dela não deixou espaço para discussões, mas isso não iria me parar.
– Não, na verdade xerife, tem outras coisas. – eu confirmei, enquanto me preocupava que ela não estava levando a sério o aviso de Lorraine sobre os itens desaparecidos. – Eu por acaso encontrei o diário pessoal de Abby enquanto olhava o escritório dela.
– E você me ligou para me contar que ela tinha um crush por algum ator? Que fofo! Mas eu estou no meio de... – o sarcasmo infantil pingando do tom da xerife era extremamente desagradável. Se não estivesse sendo direcionado a mim, eu poderia tê-la achado engraçada, de uma maneira ridícula.
– Se esse fosse o caso. Abby mencionou estar em um relacionamento com alguém. Eu fiquei curioso se você pudesse saber quem era. – eu não queria ainda revelar sobre as iniciais.
– Não, eu vou mandar alguém buscar o diário. Eu segui sua pista sobre o Técnico Oliver ter estado perto da cena crime. Lorraine confirmou a história dele, mas isso ainda deixa tempo para qualquer um dos dois ter matado Abby naquela janela de tempo. Enquanto eu aprecio que você me avise sobre essas pequenas notícias aleatórias...
– Entendi. A não ser que você queria compartilhar os resultados sobre o local exato da ligação para o telefone de Abby que alguém no Complexo Esportivo Grey fez, acho que já terminei por aqui. – eu respondi, percebendo que ela não seria de nenhuma ajuda. Não tenho certeza de quem desligou primeiro já que eu estava pensando sobre meu próximo movimento. Eu não recebi resposta sobre a ligação telefônica.
Enquanto subia os degraus para encontrar Lorraine, mandei um email para o departamento de tecnologia perguntando a eles para me confirmar se havia ou não alguma entrada no sistema de notas dos estudantes indicando quem mudou os registros. Algumas vezes não se tratava de descobrir diretamente o culpado, mas sim eliminar todos os seus suspeitos até que sobrasse apenas um. Quando cheguei ao topo, Lorraine sorriu para mim por detrás de sua mesa. Eu abri minha boca para dizer olá, mas meu celular vibrou. Por que as pessoas não podiam me deixar em paz para investigar esse crime? Eu o peguei e li a mensagem de Eleanor.
Eleanor: Já conversou com o Connor? Isso está levando tempo demais.
Eu: Estou em progresso. Vou te contar em breve.
Eleanor: Se apresse, por favor. Gostaria de saber se ele ainda está interessado. Eu não tenho tido muita paciência ultimamente.
Eu: Tenho aulas para dar hoje. Vou à lanchonete amanhã para almoçarmos.
Eleanor: A posição da lua de hoje à noite não está ao meu favor, mas amanhã parece ótimo.
Eleanor não iria ficar feliz com o que eu havia ficado sabendo. Eu esperava conversar com Connor novamente para entender o que aconteceu entre ele e minha irmã antes do nosso almoço no dia seguinte. Eu podia sentir o stress voltando e precisava desesperadamente de um ou quatro dos brownies duplos da Nana D.
Capítulo 16
Lorraine e eu caminhamos ao redor do Campus Sul. Eu não podia ir muito longe, pois tinha outra aula começando em trinta minutos. Ela parecia desgastada, quase pronta para se render a toda essa pressão ao redor dela.
– Sinto muito que você tenha que passar por todo esse drama. Eu queria poder fazer a Xerife Montague se concentrar em alguém mais além de você. – eu disse, colocando meu braço ao redor dela como uma demonstração de apoio. – Talvez você pudesse me ajudar a decifrar algo que encontrei enquanto lia o diário de Abby.
– Posso tentar. – Lorraine disse quando nós paramos em um banco próximo. – Eu tenho sido bem inútil ultimamente. Alton acha que preciso de umas férias, mas me disseram para não sair da cidade.
– Espero encontrar logo a verdade. – eu acrescentei, me sentando ao lado dela. – As iniciais W. A. significam agluma coisa para você? Abby mencionou ter saído em alguns encontros com alguém com essas iniciais.
Enquanto passava seus dedos pelo cabelo e tirava a franja da testa, Lorraine considerou minha questão.
– Tem o seu pai, é claro. Minha mãe era uma W. A. antes de ter se casado com meu pai, mas duvido que Abby escrevesse sobre ela, já que faz tempo que ela se foi.
– Alguém no campus? Um membro da equipe docente, ou talvez um estudante que Abby conhecesse? Eu pensei depois de ter visto o Técnico Oliver na casa dela, que talvez eu tivesse confundido as iniciais, mas conferi duas vezes.
Lorraine sacudiu a cabeça, então um olhar de medo se materializou. Os olhos dela se arregalaram e ela rangeu os dentes. Ela mudou rapidamente de uma filhotinha adorável para uma besta furiosa.
– Não pode ser! Aquela megera.
– O que? Você sabe quem é? – eu observei os olhos dela se encherem de lágrimas e a puxei para um abraço. – Fale comigo Lorraine. Talvez isso ajude a provar sua inocência.
– O nome completo do técnico é W. A. Oliver. Os pais dele não eram muito inteligentes e preencheram incorretamente o primeiro nome e o do meio na certidão de nascimento dele apenas com suas iniciais, W. A.. Ele tinha vergonha quando criança por não ter um nome real e disse a todos para chamá-lo de Oliver. Quando ele começou a dar treinos, ficou Técnico Oliver, e é assim que a maior parte das pessoas se refere a ele agora.
– Como Abby sabia? E o que elas significam? – eu perguntei, pensando em várias alternativas.
– Eu não tenho certeza, ele não conta a ninguém qual deveria ser o seu nome. Eu ouvi Abby chama-lo de W. A. na cafeteria uma vez. – Lorraine respondeu. – Eu acho que é sobre ele que ela estava se referindo no diário.
– Isso faz sentido já que eu o vi na casa dela na semana passada, mas como você sabia sobre isso. – eu percebi o rosto de Lorraine mudando de triste para com raiva, quase enfurecida. – O que tem de errado?
– Oh, Kellan. Eu venho mantendo esse segredo escondido de todos, mas não posso mais fazer isso se aquele safado estava me enrolando. – Lorraine secou as lágrimas e bateu seus punhos contra o banco.
Lorraine explicou que ela e o Técnico Oliver estavam saindo juntos nos últimos meses. Ele implorou que ela mantivesse o relacionamento apenas entre eles dois, porque era contra a política da faculdade dois colegas entrarem em um relacionamento amoroso sem informar à direção. Depois de um processo que o Técnico Oliver havia se metido no meio, a chefe dos funcionários apresentou um memorando interno notificando a todos, que se eles iniciassem um relacionamento com algum colega que preenchesse poucos dos critérios da nova política, haveria uma obrigação de assegurar que isso fosse formalmente informado à faculdade para proteger todos os envolvidos. O Técnico Oliver foi insistente de que ninguém poderia saber sobre ele e Lorraine estarem juntos, com medo de que ele fosse despedido imediatamente por causa de seu processo anterior. Eu pensei que a coisa toda era uma invasão de privacidade, mas certamente faria a situação entre Maggie e Connor muito mais dificil se eles continuassem o relacionamento.
– Lorraine, você pode conseguir coisa muito melhor do que o Técnico Oliver. Você é claramente um prêmio grande e ele é apenas... bem, ele não vale seu tempo. – eu queria consolá-la, mas se o que ela havia dito fosse verdade, seria um laço perfeito para o caso da Xerife Montague contra ela.
– Eu preciso falar com ele agora mesmo. – ela gritou, fechando os punhos. – Eu vou matá-lo.
Eu fiquei um pouco alarmado, mas sabia que ela havia sido surpreendida pelas minhas notícias.
– Eu acho que é melhor você escolher suas palavras cuidadosamente. Pelo que está acontecendo no momento, isso não é algo que você queira que alguém mais escute.
– Quando eu terminar com ele, ele vai desejar nunca ter me conhecido. Me desculpe por ir embora, mas tenho que resolver isso agora mesmo. – Lorraine me agradeceu por ter compartilhado o que encontrei no diário de Abby e caminhou com força pela calçada, um pé em frente ao outro.
Foi então que percebi que havia esquecido de perguntar quais eram os três itens desaparecidos que ela havia contado para a xerife. Eu desesperadamente queria ir com ela para impedi-la de fazer algo do qual se arrependeria, mas minha próxima aula iria começar em minutos. Não poderia correr o risco de chatear meu pai e Myriam no meu primeiro dia. Segui de volta para o Hall Diamanete e me preparei para a segunda aula de Abby. Eu não conhecia nenhum dos estudantes da turma de História da Produção Televisiva, mas era uma matéria fácil de ensinar. Falei bastante sobre o foco recente em se colorizar antigos shows como I Love Lucy, mas quando metade da turma me olhou como se eu tivesse acabado de chegar de outro planeta, minha animação temporária evaporou.
Precisando de energia, quando a aula acabou eu fui até a The Big Beanery e pedi um macchiato duplo com caramelo e flocos crocantes. Depois de sair e virar a esquina, eu percebi a Reitora Terry conversando com Jordan Ballantine do lado de fora do Centro Recreativo Paddington. Apesar de que isso não pareceria estranho normalmente, depois de saber que a Reitora Terry tinha um álibi aberto e não ia com a cara do Técnico Oliver, então ter ouvido Jordan reclamar sobre Striker ter jogado mesmo estando em provação acadêmica, eu não pude evitar ter minhas suspeitas. Conforme eu me aproximei, a conversa deles terminou. Ambos caminharam até a estação do teleférico. Eu teria que descobrir em algum ponto do futuro sobre o que aquilo era.
Já que segui-los não era uma opção, eu usei meu tempo livre para contar ao meu pai sobre como estava sendo meu dia até agora. Eu não havia conversado com ele desde que o acusei de trair minha mãe. Quando ele não atendeu, deixei uma mensagem de voz dizendo que as duas primeiras aulas haviam passado sem esforço e que eu estava prestes a começar a terceira. Conferi meu email e encontrei a localização do funeral de Abby naquela próxima quarta-feira. Mandei uma mensagem de texto para minha mãe dizendo que sentia a falta dela, e ela imediatamente me respondeu dizendo o quanto estava orgulhosa de mim por estar seguindo os passos dela e de meu pai trabalhando em Braxton. Sério, era por apenas três semanas... ela transformava cada pequeno monte de terra em uma montanha.
Quando voltei ao Hall Diamante, meu celular vibrou com dois alertas. O pacote que eu havia mandado para Emma havia chegado. Eu mal podia esperar para ver o olhar no rosto dela quando ela visse os ursos de pelúcia de Braxton que eu mandei. Havia três no conjunto, uma bailarina, um jogador de beisebol e um médico. Ela precisava de várias opções que pudesse encontrar, para escolher sua futura carreira. Eu secretamente esperava que não fosse a do médico, já que o pensamento dela cuidando de mim quando eu fosse velho ou eu tendo que pagar a escola de medicina não eram muito atraentes. Lorraine também me mandou mensagem dizendo que Técnico Oliver estava em algumas reuniões fora do campus, mas que estaria de volta ao escritório às quatro e meia, quando ela iria confrontá-lo.
Enquando eu caminhava pelo caminho até as salas de aula, Connor se juntou a mim dizendo:
– Hey, eu estava procurando por você. Queria me desculpar sobre meu comportamento anterior.
Eu estendi minha mão em um gesto de amizade.
– Desculpas aceitas, mas com o risco de acabar com a trégua mais curta do mundo, posso lhe fazer uma pergunta sobre minha irmã?
– É por isso que estou aqui. Você merece uma explicação. – Connor disse.
Alguns estudantes passaram por nós.
– Eu tenho apenas dez minutos.
– Eu deveria ter dito algo sobre Eleanor mais cedo. Quando ela mencionou que você estaria de volta para o Natal, eu me senti tolo sobre tudo isso e me afastei dela.
– Você está me dizendo que você estava interessado em... hmm... levá-la em outro... ou que você tinha sentimentos... – eu me atrapalhei com as palavras. – Eu não tenho certeza de como dizer isso. Ela é minha irmã.
– Sim. Quando nós nos encontramos, eu senti algumas faíscas. Pensei que talvez nós tivessemos a chance de conhecer um ao outro novamente sem ter você no meio do caminho. – ele respondeu.
Era a primeira vez que eu via Connor hesitante e ansioso. De alguma forma, isso me fez sentir melhor sobre a coisa toda.
– Resumindo, você ainda está interessado na minha irmã? – eu me encolhi, não querendo ouvir a resposta, mas também sentindo que precisava proteger Eleanor. – Ela está confusa sobre o que está acontecendo entre vocês dois. E agora ela tem a impressão de que você está saindo com a Maggie. Assim como eu também tenho.
– Ai, por que você não podia ter continuado longe, Kellan? Então, essa coisa toda seria dez mil vezes mais fácil! – o corpo de Connor ficou tenso quando ele se encostou contra uma das colunas segurando a cobertura.
Eu fiquei preocupado que ele pudesse derrubar a coisa toda.
– Eu não acho que essa deveria ser a pergunta que você tem que fazer. Independentemente se eu vim para casa ou não, você não pode sair com as duas, não é mesmo? Você precisa descobrir o que você quer, cara.
– Eu vou pensar mais antes que eu faça qualquer coisa drástica, Kellan. Se você está me dizendo que não odiaria completamente a ideia de eu sair com sua irmã, eu vou ligar para ela para conversarmos.
– Eu acho que é um ótimo primeiro passo. – descobrir a verdade tinha sido útil, mas isso ainda significava que nós quatro estavamos presos em algo mais complexo do que eu tinha tempo ou interesse, já que ficaria na cidade por apenas mais algumas semanas.
Connor concordou.
– A propósito, eles estão tentando identificar algumas fibras encontradas sob as unhas de Abby. Se eles encontrarem algum DNA, vão seguir em frente contra alguém.
– Obrigado por me contar. Será que você pode me dizer quais são os objetos desaparecidos do escritório?
– Eu sei apenas sobre o clarinete. A Xerife Montague não está pronta para revelar todos os detalhes. Desculpa. – Connor falou. – Ela não me conta tudo.
– Okay, obrigado. Eu tenho que ir, mas Lorraine me disse algo que eu acho que você precisa saber.
– Claro, e o que é isso? – ele perguntou.
Eu lhe contei sobre a revelação dela sobre W. A. e como ela estava se encontrando secretamente com o Técnico Oliver.
– Eu sei que isso a faz parecer ainda mais culpada, mas se você visse o olhar no rosto dela quando ela percebeu que ele a estava enrolando ela e Abby Monroe, ela poderia ter...
– Matado alguém? – Connor interrompeu com um suspiro audível.
– Bem, sim, mas isso me diz que ela não sabia sobre isso antes. Não é o motivo pelo qual Abby morreu. Lorraine é inocente. – eu me sentia compelido a defender a assistente de meu pai e a mulher que havia sido tão gentil comigo durante anos.
– Eu tenho certeza de que você sente dessa forma, mas as pessoas podem fazer as coisas mais estranhas sob circunstâncias difíceis. Você entende que a Xerife Montague precisa ser informada sobre isso, não é? – Connor disse. Quando eu assenti, ele continuou. – Deixe-me fazer isso. A Xerife não confia em nada que venha de você agora. Talvez eu possa compartilhar as notícias de uma maneira que ela não prenda Lorraine imediatamente. Ela é uma boa mulher.
– Lorraine ou April? – perguntei de súbito. Então, percebi que se Connor reconhecesse que a xerife tinha um crush nele, talvez a coisa toda da minha irmã versus Maggie fosse embora.
– Ambas. Eu conferi seu email. Localizei as entradas no sistema daquelas notas que você mencionou.
– Obrigado. Vamos nos encontrar mais tarde. Eu preciso dar a minha última aula de hoje. – Connor veio falar comigo. Eu comecei a me sentir positivo sobre reconstruir nossa amizade.
Connor foi embora, e eu ensinei durante três horas sobre Escrita para Broadcasting. Ao invés de dar três aulas de uma hora por semana, Abby havia optado por uma aula mais longa onde eles podiam asssistir vários programas e comparar estilos de escrita e formatos. Foi uma sessão divertida e fácil, onde os tipos mais criativos procuram polir suas habilidades de comunicação antes de se graduar e procurar por empregos.
Depois que as aulas terminaram às quatro e meia, o Policial Flatman chegou para pegar e identificar o diário de Abby. Quando voltei ao meu escritório, eu entrei online e examinei as entradas que Connor havia mandado. Elas confirmaram que Myriam havia feito o upload das notas na quarta-feira de noite. Não havia entradas anteriores ou mudanças posteriores, o que significava que se Abby havia originalmente colocado a nota da prova do Striker como “F”, alguém havia feito algo com a cópia física entre o tempo que Abby havia dado a nota na prova na sexta-feira antes que ela fosse morta, e quando as provas apareceram misteriosamente em uma pasta na caixa de correios de Myriam. Myriam havia encontrado a versão com um “B+” e concordado com quem havia marcado a prova do Striker com aquela nota.
Eu coloquei minha cabeça para dentro do escritório de Myriam, onde ela havia mencionado que estaria até uma aula de auto-defesa que havia sido marcada para os funcionários no Complexo Esportivo Grey.
– Eu espero que você aproveite a aula. É sempre bom manter o corpo e a mente em um lugar saudável, não é mesmo?
– “O mal que o homem faz vive depois dele, o bem é frenquentemente enterrado com seus ossos”. – ela resondeu com um sorriso sinistro. – Execeto que eu prefiro a companhia de mulheres genuínas em Braxton do que as dos homens fracos que parecem tão abaixo dos padrões em todos os sentidos da palavra.
Não havendo outra resposta a não ser ignorá-la, eu deixei o escritório percebendo que não havia comido o meu almoço. Peguei um sanduíche de presunto e queijo suíço da The Big Beanery e decidi ir para casa e mapear, em detalhes, tudo o que fiquei sabendo sobre o caso. Eu havia apenas começado a minha viagem para casa quando meu celular tocou. Era de um código usado apenas na faculdade, mas não reconheci o número.
– Kellan falando.
– É Lorraine. Eu preciso conversar com você urgentemente.
– Hmm, claro. Eu acabei de sair do Campus Sul e estou na estrada. Está tudo bem, Lorraine? Eu estou preocupado com você.
– Eu disse ao Técnico Oliver que eu não podia ficar com alguém que estava me traindo, mas ele jurou por tudo que nunca saiu com Abby.
– Homens mentem, Lorraine. – eu disse.
– Eu sei, e é por isso que terminei com ele. Mas eu preciso te encontrar para falar sobre outra coisa.
– Okay, eu posso te encontrar do lado de fora do Complexo Esportivo Grey. – eu fui para o acostamento da estrada.
– Não, está tudo bem. Estou saindo daqui e voltando ao Hall Diamante para terminar algumas coisas. Vou pegar o teleférico em alguns minutos e te encontrar na The Big Beanery às seis horas.
– Claro. – eu disse. Eu realmente queria organizar todas as minhas suspeitas sobre as pessoas envolvidas com a morte de Abby, mas isso era de alta prioridade. – Alguma chance de que o que você ficou sabendo possa ajudar a descobrir o assassino de Abby?
– Pode ser que sim. Quando o Técnico Oliver e eu terminamos de conversar, ele saiu do escritório primeiro. Eu precisava de alguns minutos para me acalmar. Fui até o vestiário feminino no outro corredor para lavar meu rosto, mas no meu caminho de volta, eu vi alguém saindo do escritório dele. Pensei ter reconhecido quem era, mas isso não fazia sentido. Eu voltei ao escritório dele, para que eu pudesse te ligar e lhe dar um update. Foi então que encontrei esse bilhete na mesa dele. Eu acho que você precisa lê-lo.
– Traga-o com você para o Campus Sul. Nós precisamos conversar também sobre os três itens desaparecidos.
– Okay, se a pessoa que saiu correndo é quem eu acho que é, posso ser capaz de ligar alguns pontos.
– Isso tem alguma coisa a ver com as últimas notas do Striker? – eu perguntei.
– Bingo! Eu vou te dar todos os detalhes assim que te encontrar daqui a pouco.
Eu disse a Lorraine para tomar cuidado, então voltei ao Campus Sul animado para ouvir as notícias. Quando cheguei à The Big Beanery faltando quinze minutos para as seis horas, os clientes do dia já haviam diminuído. A maior parte dos estudantes ou estavam comendo o jantar na cafeteria ou se encontrando com os amigos em alguma outra parte do campus. Eu havia ouvido algo sobre um grande evento de snowboard no cume oeste das Montanhas Wharton. Pedi uma limonada, já que eu já havia tomado café suficiente para um dia, e escolhi uma mesa perto da entrada para pegar Lorraine assim que ela entrasse pela porta.
Pensei novamente no crime que Abby havia mencionado ao telefone quando nós nos falamos pela primeira vez. Fazia sentido que ou o Técnico Oliver fosse o culpado, ou que ele sabia quem poderia ser. Eu não conseguia entender por que Abby havia escrito em seu diário que seus sentimentos por ele haviam mudado, mas agora que eu tinha a confirmação de que ele era o W. A., eu mesmo poderia perguntar ao Técnico Oliver por que ele havia mentido sobre seu relacionamento com Abby. O que um homem estava disposto a contar para sua namorada, versus o que ele contava para outro cara, geralmente eram duas coisas bem diferentes. Se eu tinha alguma esperança de fazer o Técnico Oliver contar a verdade, precisava fazer parecer que eu estava do lado dele.
Enquanto esperava, meu pai retornou minha ligação.
– A maior parte do dia foi tranquila, pai. Eu gosto dos estudantes, e Myriam me ajudou. Ela tem uma língua venenosa, mas se você ignorar essa parte, ela até que é tolerável. – eu olhei meu relógio e percebi que Lorraine iria chegar a qualquer minuto.
– Myriam faz questão de compartilhar sua opinião. Eu gosto de nossas conversas na maior parte das vezes, mas em algumas ocasiões, ela corta fundo com suas palavras. – meu pai respondeu. Por um breve e momentâneo momento, um pensamento estranho de que nós estavamos tendo uma conversa normal brotou dentro de mim.
– Ela está chateada sobre como você me colocou em Braxton mesmo apesar de eu...
– Deixe isso de lado. Apenas não a chateie, e você vai ter sucesso em seu período de experiência. – ele respondeu.
Período de experiência? Do que ele estava falando?
– Hmm, você deveria estar preocupado sobre ela me incomodar e estar postando nesse blog sobre você. Ela citou outra frase hoje sobre homens fracos quando eu estava indo embora.
– Vamos continuar essa discussão quando você chegar em casa à noite, Kellan. Eu acredito que sua mãe esteja ansiosa para saber sobre o seu dia. – depois que ele cortou a ligação, eu grunhi e repeti para mim mesmo em voz alta várias vezes... Eu não sou uma criança morando com meus pais novamente.
O sol havia terminado de se pôr o que me fez perceber o quão tarde já era. Meu celular mostrava que eram seis e quinze, e Lorraine ainda não havia aparecido. Eu liguei e mandei mensagem, mas não obtive resposta nos minutos seguintes. Comecei a ficar preocupado e liguei para Connor.
– As entradas que eu te enviei confirmaram o que a Dra. Castle lhe contou mais cedo? – ele disse quando atendeu o celular.
– Sim, confirmaram. Eu estou grato por isso, mas não é por isso que estou ligando.
– O que aconteceu? Você parece ansioso.
Eu contei ao Connor tudo o que havia acontecido. Ele me instruiu a pegar o teleférico de volta ao Campus Norte para encontrá-lo no Complexo Esportivo Grey. Ele pensava que talvez eu a encontrasse durante o caminho se não fosse dirigindo. Quando cheguei ao Campus Norte às seis e quarenta e cinco, vários estudantes estavam em fila esperando pelo teleférico. Carla estava bem perto de Jordan no fim da fila. Eu teria parado para falar com eles, mas eu precisava chegar ao Complexo Esportivo Grey. Enquanto corria, me lembrei de que essa era a segunda vez que os via juntos sem o Striker. Jordan havia mencionado que eram todos amigos, mas parecia que esses dois passavam mais tempos juntos do que eu me sentiria confortável se ela fosse minha namorada. Talvez isso fosse parte do que Nana D queria dizer quando ela me contou que o Striker estava tendo problemas com garotas.
Quando cheguei ao Complexo Esportivo Grey, Connor não estava em nenhum lugar lá pela frente. Eu entrei na recepção e conferi os monitores na parede oposta. A academia no terceiro andar estava lotada com um grande grupo de estudantes se exercitando. Tentei localizar Lorraine entre eles, mas a única pessoa que reconheci foi Striker, malhando intensamente.
Depois de mostrar meu rosto para a câmera, eu entrei pela porta do meio procurando o escritório do Técnico Oliver no terceiro andar. Quando cheguei ao escritório dele, a porta estava aberta, e as luzes estavam acesas, mas não havia ninguém lá dentro. Quando eu me virei para andar no corredor em direção à academia, Connor me chamou.
– Kellan, eu não consigo encontrá-la em lugar algum. Eu olhei todo o primeiro andar. Será que ela poderia estar presa no trânsito? A não ser que você realmente acredita que algo possa ter acontecido com ela.
Lorraine não era do tipo que exagerava ou fazia alguém ficar esperando. Se ela tinha algo importante para me contar, teria chegado à The Big Beanery em tempo, atendido minhas ligações, ou me contatado para explicar porque estava atrasada.
– Definitivamente tem algo errado. Vamos olhar o resto do edifício, e se nós não conseguirmos encontrá-la, então precisamos encontrar o Técnico Oliver. Lorraine estava com ele antes de me ligar.
Connor desceu as escadas para olhar o segundo andar no caso de Lorraine estar se escondendo em uma das salas vazias. Eu fiquei no terceiro andar e segui pelo outro corredor para ver se ela não estava na academia, talvez escondida das câmeras. Quando cheguei lá, coloquei minha cabeça para dentro, mas como eu havia visto pelas câmeras, ela não estava por lá. Striker acenou para mim enquanto se preparava para outra série de exercícios. Ou eu estava suando de correr por aí, ou a temperatura do prédio estava alta demais.
Saí da academia e voltei ao outro corredor onde ficavam o escritório do Técnico Oliver e a sala de conferências. Eu duvidava que Lorraine estivesse sentada lá, mas havia uma janela na sala de conferências que dava para a frente do edifício. Ela me daria uma vista completa da estação do teleférico. Talvez Lorraine estivesse esperando pela próxima viagem ao Campus Sul. Já eram sete horas.
Eu abri a porta e entrei na pequena sala de conferências apenas para sentir imediatamente uma brisa gelada vindo em minha direção. Ou alguém havia deixado a janela aberta ou o aquecimento havia parado de funcionar naquela sala. Eu procurei pela parede tentando encontrar o interruptor, mas não consegui encontrá-lo. Lembrando-me que o Técnico Oliver havia dito que eles estavam instalando um novo sistema de comando por voz, eu me perguntei se funcionaria se eu dissesse acender a luz. Dois segundos depois, o brilho de três lâmpadas escondidas iluminaram a sala.
Percebi imediatamente duas persianas voando contra a parede exterior perto de uma grande janela. Quando Connor entrou na sala atrás de mim, eu quase pulei no ar. Ele disse:
– Eu não encontrei Lorraine lá embaixo. E quanto a você?
Eu me virei, respirando fundo para me recuperar.
– Ainda não, mas olhe todas essas cadeiras reviradas. – eu andei até a janela, percebendo que ela havia sido empurrada até o teto. O espaço aberto tinha cerca de um metro e vinte de largura por um e oitenta de altura. Quando coloquei minha cabeça para fora, ela dava para um pátio fechado na frente.
– Alguma coisa? – Connor disse enquanto se aproximava pelo meu lado direito. O perfume dele era bem forte.
Havia vários estudantes cruzando a frente do prédio, mas não Lorraine. Era difícil de dizer na escuridão, então percebi algo de estranho na base da estátua no pátio.
– Você tem uma lanterna? – quando ele assentiu, eu mostrei a ele para onde apontar o feixe de luz.
Alguns segundos depois, ele confirmou minhas suspeitas usando um tom frio e direto que eles lhe haviam, provavelmente, ensinado na academia de polícia.
– Tem um corpo no chão próximo da estátua, não é?
Capítulo 17
Eu engoli seco e fechei meus olhos desejando que eu não tivesse visto quem pensei ter visto. Nós saímos correndo da sala de conferência procurando a saída mais próxima. Eu pude ouvir Connor ligando para a Xerife Montague enquanto corria atrás de mim. Nós saímos no segundo andar em direção à entrada do pátio.
Connor gritou para eu esperá-lo enquanto me segurava. Depois que eu fiz o que ele pediu, ele foi até perto da estátua. Eu o observei se ajoelhar e conferir o pulso de Lorraine. Quando ele se virou de volta para mim, pude dizer que não eram boas notícias pela expressão sombria em seu rosto.
– Ela está morta? – eu disse sentindo o peso do meu corpo afundando rapidamente.
– Sim, o pescoço dela quebrou quando ela colidiu com a estátua depois de cair da janela. – Connor respondeu.
– Tem que ter sido o Técnico Oliver. Lorraine me disse ao telefone que ele estava fazendo algo ilegal. – eu senti meu sangue começando a ferver enquanto eu corria até a estátua. Como isso podia acontecer?
– Ela realmente usou essas palavras? Eu não estou dizendo que isso não parece suspeito, mas nós temos que ser completamente claros sobre os fatos.
– Não exatamente. – eu respondi, tentando me acalmar. – Quando eu perguntei a ela o que ela pensava que estava acontecendo, ela definitivamente disse que isso tinha relação com o Técnico Oliver e com as notas do Striker.
Depois que a xerife chegou, Connor contou rapidamente a ela o que eu já havia lhe dito sobre minha ligação com Lorraine. Eu esperei que eles terminassem de discutir a situação. Os paramédicos chegaram e verificaram que não havia nada que pudessem fazer. A Xerife Montague pediu que sua equipe trouxesse o legista para o local, enquanto Connor ligava para meu pai para informá-lo sobre o que havia acontecido. Eu não estava preparado para dar essas notícias, e a xerife queria ouvir diretamente de mim o que Lorraine havia me contado.
– Por acaso ela soava como alguém que podia querer se machucar? – a Xerife Montague perguntou.
– O que? Não, isso é loucura! Ela estava assustada e queria me encontrar na The Big Beanery. Não tem como ela ter dicidido pular da janela. Lorraine não faria isso! – eu estava irado com a maneira que a xerife havia sugerido que Lorraine pudesse ter perdido o desejo de viver. – Além disso, ela viu alguém que não esperava ver por lá. Alguém a matou, assim como mataram Abby.
– Fique calmo. Eu estou tentando entender os fatos. Vai ser bem mais fácil se você confiar em mim. – ela disse, sentando ao meu lado no banco. – Havia um bilhete.
Mais fácil dizer do que fazer. A Xerife Montague não havia me dado nenhum motivo para acreditar que ela estava do meu lado no passado.
– E o que o bilhete dizia?
– Eu não consigo pegá-lo sem mover o braço dela. Eu quero que a equipe termine a análise inicial antes de nós tocarmos no corpo. – a Xerife Montague explicou. – Nós vamos descobrir o que aconteceu, eu prometo. Tem alguém que você possa pensar com quem Lorraine e Abby tenham brigado recentemente?
Eu considerei todos que eu havia encontrado no Hall Diamante e disse os nomes para a xerife. Era uma lista curta, mas também poderia haver várias pessoas de antes de eu ter voltado para Braxton sobre quem eu não saberia. Eu terminei de contar o meu relato sobre toda a tarde quando Connor nos disse que havia conversado com meu pai.
– O Presidente Ayrwick está vindo, xerife.
Eu sabia o quanto meu pai confiava em Lorraine, e por mais retraído que ele pudesse ser, a morte dela iria devastá-lo. Estava me devastando. Connor e a xerife se afastaram para discutirem algo. Por mais que eu quisesse colocar a culpa dos crimes no Técnico Oliver, não fazia sentido que ele tivesse matado as duas mulheres com quem supostamente estava saindo. O comportamento da Reitora Terry estava me deixando confuso. A presença de Carla e Jordan juntos na fila do teleférico era suspeita, mas qualquer culpa que eu tenha reconhecido no rosto deles poderia ter sido o resultado de alguém tê-los visto próximos demais. Será que eles tinham álibi para a noite do assassinato de Abby? Outra pista para seguir.
Eu sabia que minha mente estava esgotada quando comecei a me perguntar se Connor poderia ser o responsável. Apesar de ter sido eu quem encontrou o corpo de Lorraine, essa coisa toda poderia ter sido parte do plano dele para encobrir o que havia feito. Tirei esses pensamentos de minha mente, pois sabia que meu antigo melhor amigo não era um assassino duplo. Eu precisava ir para casa para dormir e lidar com essa última perda.
A Xerife Montague retornou ao banco que eu estava usando como lugar para recuperar-me do choque de ver uma amiga morta no chão.
– Está aguentando bem? Eu não posso imaginar que encontrar dois corpos dentro de um período de tempo tão curto seja uma coisa normal para você.
– Não, não é. – eu respondi, mantendo meu olhar no chão. – Eu gostaria de sair daqui.
– Você está livre para ir, mas sabe o que acontece a partir de agora. – a Xerife Montague sugeriu um horário para nos encontrarmos para revisar meu depoimento por escrito. Quando eu me afastei, ela chamou meu nome. – Eu não posso lhe dizer o que estava escrito no bilhete, mas não era uma nota de suicídio. Nós podemos discutir isso amanhã.
– Você mencionou anteriormente que havia fibras sob as unhas da Abby. Será que pode me contar alguma coisa? – eu perguntei.
– Nenhum DNA. Parece que as fibras combinam com as novas jaquetas do time de beisebol. Mas nós não terminamos de realizar todos os testes, então, por enquanto, mantenha isso só para você.
Eu assenti e segui em direção ao teleférico para chegar ao Campus Sul, encontrar meu Jeep, e dirigir para casa. Eu deveria ter ficado para apoiar meu pai, mas precisava ficar sozinho por algum tempo. Lorraine havia confrontado o Técnico Oliver por que eu havia perguntado a ela sobre as iniciais W. A. no diário de Abby. Será que eu havia de alguma maneira, mandado Lorraine para a morte?
***
Eu devo ter desabado ao chegar em casa porque mal me lembro de ir para cama. Eu me revirei a maior parte da noite enquanto estava de luto pela perda de Lorraine, mas quando acordei na terça-feira, o desejo de punir o assassino estava no foco dos meus pensamentos. Saí para uma corrida, então me encontrei com minha mãe que estava indo para Braxton no mesmo horário que eu. Meu pai havia saído muito mais cedo para falar com o Conselho dos Curadores sobre o incidente da noite passada, então ela foi de carona comigo até o campus. Algumas vezes você precisava de sua mãe para deixar as coisas um pouco melhores.
– Kellan, todos iremos sentir muita falta dela. – ela disse enquanto eu saía da garagem. – Não consigo entender por que ela pularia para sua própria morte do Complexo Esportivo Grey, mas se ela estava vivendo em tanta dor, só espero que esteja em um lugar melhor agora. Você acha que ela matou Abby?
Minha mãe não sabia nada sobre o relacionamento de Lorraine com o Técnico Oliver. Enquanto eu tinha certeza de que Lorraine não havia cometido suicídio, minha mãe sentia de outra maneira, provavelmente baseada no que meu pai havia lhe contado na noite passada.
– Eu acho que alguém a empurrou, mãe. Talvez por causa de algo que ela sabia sobre a morte de Abby. As mortes delas devem estar conectadas.
– Nós nunca tivemos assassinatos em Braxton antes. Entre esses dois terríveis eventos e esse blogueiro maníaco, a aposentadoria do seu pai está lhe causando tanto stress. – minha mãe pegou no pequeno apoio no teto do Jeep quando eu fiz uma curva próxima ao rio rápido demais.
– Ele disse recentemente alguma coisa sobre o blog? Tenho suspeitas de que seja a Myriam. – eu comentei.
– Ele sabe quem está por trás disso. Não pode me contar agora, mas nós conversamos sobre isso ontem. Eu tenho certeza de que Connor está em cima disso. Não houve nenhuma postagem nova desde aquela depois da festa.
Eu deixei minha mãe no prédio de admissões no Campus Norte, então dirigi ao Campus Sul para começar meu dia. Quando entrei no Hall Diamante, as caixas de Lorraine no primeiro andar encorajaram a dor a correr novamente por meu corpo. Ela iria se mudar de volta para o escritório reformado no próximo final de semana. Eu fui ao segundo andar para ter alguns minutos de solidão e planejar o ataque do dia. Ao invés disso, encontrei uma mulher com cabelos ruivos, vestida com jeans e moletom grande do time de beisebol Braxton Bears sentada na mesa vazia de Lorraine.
– Posso perguntar o que você está fazendo aqui? – eu questionei. Por causa dos dois assassinatos, eu precisava falar com Connor sobre como a segurança estava sendo operada no campus, se pessoas aleatórias podiam entrar no prédio e mexer na mesa de alguém.
Quando ela levantou a cabeça, a expressão assustada e a quantidade de maquiagem que estava no rosto dela fazia com que se parecesse com um palhaço.
– Eu poderia lhe fazer a mesma pergunta. Quem é você? – ela disse.
Eu não estava acostumado a ser questionado de tal maneira quando sabia claramente quem estava certo.
– Eu sou Kellan Ayrwick. Trabalho aqui, e essa mesa pertence à outra pessoa. E quanto a você?
A mulher se afastou da mesa e sorriu.
– Oh, é um prazer te conhecer. Me desculpe por ter sido um pouco rude. Eu não esperava ninguém vir aqui enquanto deixava as coisas preparadas para o departamento. Eu sou Siobhan.
Eu conhecia o nome, mas não conseguia lembrar-me de onde no momento.
– Você é temporária?
– Não, eu estava de licensa maternidade nos últimos dois meses. O chefe dos funcionários me ligou na noite passada e me perguntou se eu podia passar por aqui hoje para ajudar com algumas coisas. Aparentemente, houve um acidente, e Lorraine Candito não virá pelo resto da semana. – o sotaque irlândes dela era bem pesado.
Era isso! Siobhan era a gerente do escritório cujas responsabilidades Lorraine estava cobrindo.
– Eu acredito que posso lhe dar os parabéns. – eu respondi. – Menino ou menina?
– Um de cada, são gêmeos. – ela respondeu, enquanto pegava o celular para mostrar milhares de fotos dos gêmeos vestidos com roupas verdes. Siobhan e eu conversamos por vários minutos durante os quais eu fiquei sabendo que ela estava trabalhando na faculdade há cinco anos e havia se mudado para Braxton depois que veio visitar uma amiga que havia feito intercâmbio durante um semestre em uma faculdade de Dublin, cidade natal de Siobhan. Ela havia decidido no ano anterior fazer uma fertilização in-vitro, nunca esperando que os dois óvulos fossem feritlizados ao mesmo tempo. Ser uma mãe solteira de gêmeos não era fácil como ela havia pensado.
Eu expliquei meu trabalho temporário ao assumir as aulas de Abby. Siobhan não tinha muito a dizer sobre a falecida professora, indicando que não preferia falar mal dos mortos.
– Siobhan, eu estava me perguntando se você sabe quem tem acesso ao sistema dos estudantes. Eu tive uma breve explicação da Myriam, mas queria ter certeza de que eu poderia dar entrada das notas dos meus estudantes de uma prova que vou dar na semana que vem.
– Os professores apenas tem acesso aos seus próprios cursos. Eles não conseguem ver nada sobre seus estudantes a não ser informação de contato, e nós mantemos isso no mínimo. Eu tenho privilégios avançados, mas apenas posso dar entrada ou mudar as notas das aulas se o professor me deu acesso para isso.
Eu agradeci Siobhan pela ajuda e segui para meu escritório. Ela me seguiu, perguntando se eu precisava de algo, mas não tive a chance de responder. Nós encontramos Myriam saindo do escritório dela.
– Siobhan, eu vejo que você conheceu o Sr. Ayrwick, nosso causador de problemas residente.
Eu? O que eu havia feito?
– Bom dia, Myriam. Por acaso eu fiz alguma coisa que te ofendeu? – eu perguntei com o maior sorriso que consegui dar enquanto entrava no escritório. Siobhan se retirou para a área principal do andar, para a mesa dela. Ou ela já havia experienciado a acidez da língua de Myriam antes, ou não queria me deixar envergonhado enquanto eu recebia a minha dose.
– Você quer dizer além de ter contado para a Xerife Montague que eu havia brigado com Monroe e com Lorraine para tentar me fazer parecer culpada de algo? Honestamente, a coragem que você tem de espalhar fofoca por aí depois de apenas um dia de trabalho. – Myriam gritou enquanto deixava suas bolsas caírem ao chão. – “As dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que muitas vezes não conquistamos por medo de tentar”.
Outra citação estranha.
– A Xerife me perguntou se havia no campus alguma pessoa com quem tanto Lorraine quanto Abby tinham contato. Eu mencionei o seu nome, mas não te acusei de nada. – respondi, com um crescente desdém pela mulher. – A não ser que você seja a autora daquele blog maldoso contra o meu pai. – eu não queria ter dito essa acusação em voz alta. Definitivamente, eu suspeitava dela, e as constantes referências da mulher a Skakespeare estavam começando a me irritar.
– Eu não tenho nada a ver com isso, posso te assegurar. Percebo que você não é diferente de seu pai, Kellan, e eu vou me certificar de dizer isso ao próximo presidente. Nós não podemos continuar permitindo que homens pomposos trabalhem nesse campus. – ela grunhiu enquanto me empurrava para o corredor.
– Como você ousa dizer algo assim... – eu parei de falar quando ouvi outra voz.
– Talvez vocês dois pudessem manter isso mais baixo? Os estudantes estão chegando para as aulas lá embaixo e podem ouvir tudo. – Connor disse. – Talvez nós possamos nos sentar como seres humanos civilizados e ter uma discussão racional? – ele estendeu a mão em direção ao escritório de Myriam, e nós todos entramos. – Qual parece ser o problema aqui?
– O Sr. Ayrwick está sob a impressão de que sou uma assassina a sangue frio, blogueira impiedosa, e eu nem consigo imaginar o que mais vai sair da boca dele. – Myriam respondeu. – Eu vou reportar o comportamento dele ao Conselho de Curadores, e ao Reitor Mulligan. Você é uma testemunha dessa instigação não provocada por parte dele.
– Eu não fiz nada disso, Connor. Você estava lá, você ouviu tudo o que eu disse na noite passada. – eu deixei de lado a parte onde eu a acusei de ser a blogueira, mas a mulher já tinha falado. Enquanto eu recapitulava minhas frustrações, percebi a escolha de roupa de Myriam para hoje. Eu não conseguia não admirar o quão polida e equilibrada ela estava com seu terno de alfaiataria azul escuro. Era a camisa dourada por baixo que fazia toda a roupa chamar a atenção. Deixe-me conferir essa peruca para ver se está escrito terça-feira.
– Dra. Castle, ele está falando a verdade. A xerife perguntou por qualquer coisa que viesse à mente dele. Kellan, no entanto, não te jogou na frente do ônibus... – depois de esperar por Myriam se acomodar em sua cadeira, Connor continuou. – Eu também acho que todos estão mais ressabiados depois das duas mortes inesperadas no campus. Por que nós não concordamos em deixar isso passar?
– Está bem. – Myriam respondeu ajustando seus óculos com armação de casco de tartaruga em seu rosto hostil. – Eu estou disposta a aceitar que isso não foi uma insubordinação intencional.
Insubordinação? Será que eu trabalhava para ela, e se sim, como eu havia ficado sem saber disso? Abri minha boca para reclamar, mas Connor me interrompeu.
– Vamos andar um pouco, Kellan. Eu tenho algumas coisas para discutir com você.
Myriam nos expulsou de seu escritório, então fechou a porta. Eu segui Connor pela escadaria dos fundos, evitando a multidão de alunos começando a se reunir no primeiro andar do Hall Diamante. Quando nós chegamos à porta, eu murmurei em voz baixa.
– Eu nunca deveria ter voltado para cá.
Connor riu.
– Cara, ela tá contra você. Deixe isso pra lá. Eu tenho umas notícias para te contar que podem te animar um pouco. No entanto, não são notícias completamente positivas.
As palavras dele me deixaram intrigado, mas logo entendi porque as notícias eram uma mensagem misturada. A Xerife Montague autorizou que ele me mostrasse uma cópia do bilhete encontrado sob o corpo de Lorraine. Ele dizia:
Eu espero que você aprecie o quanto tenho feito para ajudar o time de beisebol chegar ao campeonato esse ano. Eu entendo o quão importante é impressionar o olheiro da Grande Liga de Beisebol. Vou me certificar de conferir o resultado das provas da semana que vem também, então não vai ter nenhuma chance do nosso jogador estrela ficar de fora.
– Isso combina com o que Lorraine havia me contado ao telefone antes de ser morta. Tinha algo para me mostrar. Ela pegou o Técnico Oliver ou outra pessoa escrevendo o bilhete para o Striker. – eu disse.
Connor assentiu.
– Certamente parece que esse pode ter sido o motivo pelo qual ela foi empurrada pela janela. A xerife também não está pensando mais em suicídio. – ele respondeu com uma pausa hesitante na voz. – Mas por que o Técnico Oliver escreveria algo assim? Você não acha que ele puxaria o Striker para um canto e lhe contaria que havia cuidado de tudo? E por que o técnico colocaria em seu próprio escritório?
Eu considerei o argumento de Connor como válido. Quando juntei tudo o que havia ficado sabendo, eu tive outra teoria.
– Eu não tenho dúvidas em minha mente de que o Técnico Oliver está de alguma maneira, envolvido nesse esquema da troca de notas. E se alguém estivesse tentando fazer com que Striker parecesse parte do esquema? Eu tive a distinta impressão a partir de uma conversa com Jordan ontem, que ele tinha algo contra o Striker.
– Então, você acha que ele mudou as notas com a esperança de que isso faria Striker parecer culpado e assim expulsá-lo do time?
– Talvez. – eu disse. – Eu estou pensando que a Reitora Terry também está envolvida. Eu a vi conversando com Jordan no campus ontem em uma área mais reservada.
– E agora você suspeita da reitora da faculdade? – Connor perguntou quando chegamos ao Complexo Esportivo Grey. – Tanto o Jordan, quanto o Striker, não estavam ambos sendo treinados para ser arremessadores estrelares?
– Você tem um ponto válido. – eu reconheci – Nada disso faz sentido, mas tudo parece suspeito e combina com o que aquele blogueiro está dizendo. Preciso ver o quanto o Técnico Oliver está chateado com a morte de Lorraine. A Xerife Montague já o interrogou?
– Na noite passada depois que você foi embora. Ele voltou ao prédio dizendo que estava assistindo vários treinamentos no Campo Grey depois que Lorraine parou no escritório dele. Disse que retornou apenas por alguns minutos para pegar sua maleta e ir para casa. Parecia bastante abalado pela morte de Lorraine.
– Ele é um mentiroso. – eu discuti, enquanto me preparava para ir embora. – Eu vou provar isso logo após lhe fazer uma visitinha.
– Eu admito que você estava certo sobre Lorraine não ser a assassina de Abby, especialmente agora que ela também está morta. A xerife acredita que Lorraine lhe contou sobre a briga dela com o Técnico Oliver, mas não tem provas. – Connor explicou que precisava ir a uma reuninão que não podia perder, mas que estava trabalhando com o departamento de tecnologia para pegar todos os vídeos das câmeras de CCTV e acesso de entradas no Complexo Esportivo Grey.
– Eu aprecio isso. Talvez eles descubram, por aquele sistema de computador que sabe de tudo, exatamente quem estava naquele espaço atlético. – eu respondi, sentindo algum encorajamento pelas palavras dele.
– Apenas não cause mais problemas. Você já incomodou um membro importante da faculdade com aquele seu ataque contra Myriam. Tente não ficar no lado ruim de ninguém, Kellan.
Eu prometi a ele que iria pegar leve com o Técnico Oliver, ignorei a voz computadorizada me cumprimentando na recepção, e segui em direção ao escritório do diretor esportivo. Ele desligou o telefone quando eu cheguei.
– Nós precisamos conversar. – eu disse no meu tom de voz mais sereno, imitando a voz de Connor.
– Não são notícias terríveis? – o Técnico Oliver me recebeu em seu escritório e esperou que eu sentasse na cadeira oposta a ele. – Lorraine era uma funcionária exemplar dessa faculdade.
– Nem mesmo tente me distrair. Lorraine me contou que vocês dois estavam saindo há alguns meses. Eu sei que ela lhe confrontou na noite passada. – eu despejei todas as minhas frustrações com ele. Não iria contar a ele exatamente o que ela havia me dito, na esperança de que ele me revelasse alguma coisa sem perceber.
– Não vamos pular para os julgamentos. Eu não sabia que Lorraine havia lhe contado sobre nós. Nós deveríamos informar à faculdade já que haviam sido mais do que alguns encontros. Eu só queria protege-la. – ele respondeu. Havia uma estranha tristeza acompanhando sua voz enquanto ele fechava os olhos e coçava seu cavanhaque.
Enquanto o Técnico Oliver parecia genuinamente chateado com a morte de Lorraine, eu não estava lá para confortá-lo, especialmente quando ele dizia que estava protegendo-a. Era ele quem havia ficado com problemas no passado por causa de assédio.
– Qual era exatamente o seu relacionamento com Lorraine?
– Eu vou lhe contar, mas você tem que acreditar que isso soa muito pior do que era. – ele respondeu, brincando com uma caneta entre seus dedos. – Três meses atrás, eu fui chamado ao escritório do seu pai para conversar sobre trazer um olheiro da Grande Liga de Beisebol para Braxton. Sempre que eu passava por lá, Lorraine e eu tinhamos a oportunidade de nos conhecermos melhor.
– Ela mencionou a mesma coisa para mim, mas isso não explica como Abby se encaixa nisso. – eu o confrontei, me sentindo um pouco enjoado com o que eu poderia ouvir a seguir do Técnico Oliver. – Ou por que um olheiro de beisebol estaria interessado em Braxton.
– No fim do último semestre, Abby e eu discutimos o baixo desempenho do Striker nas aulas dela. Ela me pediu para sairmos para um drink, apenas para me dizer que iria reprová-lo. – o Técnico Oliver disse com remorso escondido na expressão nervosa de seu rosto. – Eu tentei convencê-la a dar para Striker uma outra chance. Queria eu mesmo ajudar o garoto, mas não sei nada sobre comunicações ou a história da televisão. Pedi que Abby desse aulas particulares a ele, mas ela não queria.
– Lorraine disse que você negou que qualquer coisa tenha acontecido entre você e Abby. Eu vi você saindo da casa dela na semana passada. – quando o Técnico Oliver desviou o olhar, eu não consegui saber se ele enganou Lorraine sobre a extensão de seu relacionamento com Abby.
– Você sabe como essas coisas são. Coisas acontecem. Ela era uma mulher atraente. – o Técnico Oliver falou. – No início era apenas puramente profissional. Nós nos encontramos algumas vezes para discutirmos sobre como manter o Striker no time. Abby deu a entender que ela pegaria leve com Striker quando ele voltasse às aulas com ela nesse semestre se eu, bem... – aele hesitou, então sorriu e balançou a cabeça algumas vezes. – Você sabe o que eu quero dizer. Eu tenho certeza de que você já foi colocado nessa posição antes, Kellan.
– Sim. – eu dissse, mentindo através dos dentes. Eu nunca havia estado naquela posição antes, mas queria respostas e não iria dizer ao homem que ele era um tolo nojento. – E por que Abby escreveu no diário dela que os sentimentos dela por você haviam mudado? – eu não tinha certeza se ele sabia sobre as entradas, mas queria pegá-lo fora de guarda. Eu também não queria revelar o plano dela para expô-lo.
O Técnico Oliver ficou duro com um arquejo de choque.
– Oi? Era só diversão. Nada sério. Eu realmente gosto da Lorraine. – ele disse depois de suspirar alto. – Eu acho... quero dizer... eu gostava da Lorraine.
Apesar da expressão dele ter ficado melancólica como se ele tivesse finalmente aceitado a morte de Lorraine, eu tinha que pressioná-lo.
– Abby tinha alguma coisa contra você?
– Abby sabia que eu estava saindo com Lorraine. Ela havia ficado escutando atrás da porta e ouviu parte de uma conversa sobre eu e Lorraine sairmos de novo em algumas semanas. Algumas vezes ela me ignorava, outras vezes me pressionava para passar mais tempo com ela e lhe contar sobre todas as novas vantagens e tecnologias que o espaço atlético estava recebendo. Foi durante apenas algumas semanas onde algo realmente aconteceu entre nós. – o Técnico Oliver ficava mudando de posições. Eu tinha certeza de que ele tinha alguma informação vital. Ele também havia evitado qualquer explicação sobre o porquê do olheiro ter escolhido Braxton.
– Quando foi a última vez que você conversou com ela? – eu perguntei.
– Na sexta-feira antes de ela morrer. – ele respondeu. Algo sobre a maneira que ele disse as palavras me disse que ele estava mentindo. – Abby me ligou para dizer que ele tinha reprovado novamente na primeira prova.
Isso explicava por que eu havia encontrado o “F” no livro de notas dela.
– Mas no fim, ela o aprovou, certo?
– Eu supus que Abby havia decidido cumprir sua promessa. – o Técnico Oliver respondeu com um sorriso malicioso.
Por mais que eu quisesse colocar a culpa dos dois crimes no pervertido, não conseguia ligar todos os pontos. Ele era culpado de algo, mas podia não ser de assassinato.
– Eu aprecio você estar contando essa versão da história para mim. Você tem alguma ideia de quem pode ter matado Abby ou Lorraine? Será que o Striker poderia ser o responsável?
O Técnico Oliver sacudiu a cabeça.
– Não, Striker é um bom garoto. Ele pode não ser capaz de passar nas provas por si só, mas é um arremessador maravilhoso com um futuro destinado às grandes ligas. Eu não consigo pensar em ninguém que tinha um motivo. Talvez dois assassinos diferentes?
– Eu duvido disso. Nem Braxton e nem o Condado de Wharton tiveram assassinatos como esses antes. Existe pouca chance de que duas mortes acontecendo tão perto uma da outra não tenham uma ligação. – eu respondi. – E quanto à Braxton? Por que o olheiro viria aqui?
– Eu acho que nós tivemos sorte. Não tenho certeza. – ele disse hesitantemente.
Eu decidi parar de questionar o Técnico Oliver por enquanto. A melhor coisa que eu poderia fazer a seguir seria dar uma pesquisada sobre o paradeiro do Striker nos momentos em que Abby e Lorraine foram mortas, mas primeiro, era hora de encontrar minha irmã.
Capítulo 18
– Estou tão chocada. – uma Eleanor exasperada disse enquanto conversávamos no escritório dela na Lanchonete Pick-Me-Up. – Lorraine era uma pessoa tão amável.
– Ela era uma alma genuína. Eu tenho que descobrir quem poderia ter feito algo tão terrível contra ela.
– Eu entendo. – Eleanor fez uma pausa para agradecer a garçonete que nos serviu dois grandes pratos da nova receita de ensopado de carne que o chef estava experimentando para a semana seguinte. Quando a garçonete foi embora, Eleanor perguntou: – A Xerife Montague tem alguma ideia do que aconteceu?
– Eu não falei com ela hoje, mas vou até a delegacia mais tarde. Falei com Connor mais cedo. Ele vai olhar todas as fitas das câmeras e entradas de segurança nesta tarde. – eu engoli uma grande colher do ensopado, então rapidamente peguei um copo de água. Estava quente demais para comer, mas o breve sabor que tocou minha língua antes que ela começasse a queimar era delicioso. – Talvez um pouco demais de vinho tinto?
– Vou dizer a ele. O Chef Manny gostava de ser um pouco extravagante às vezes. – ela riu e fez um sinal de que ele gostava de sua bebida um pouco demais. – Por falar no Connor, alguma chance de você ter conversado com ele?
– Sim, Connor estava preocupado sobre eu estar voltando para casa. – eu respondi cautelosamente. Tinha que ser honesto com Eleanor, mas precisava ser cuidadoso observando aquela linha tênue entre revelar tudo e dizer apenas o suficiente para que ela pensasse no que eu havia dito.
– Então, você estava certo. Ele está esperando a sua aprovação para sair comigo? – Eleanor perguntou enquanto experimentava seu ensopado e me disse que estava menos quente. – Você não vai impedir isso, não é?
Eu não tinha certeza de que estava no controle.
– Tem algo a mais além de eu dar minha permissão.
Eleanor afundou na cadeira e afastou seu prato da borda da mesa.
– Tem algo acontecendo entre ele e Maggie agora. Estou atrasada, não é mesmo? – toda a exuberância normal desapareceu do rosto angelical dela. Eu queria fazer alguma mágica e fazer toda essa situação desaparecer, mas isso não era provável. – As estrelas não têm me mostrado nada ultimamente.
Por falar em mágica, isso me fez perceber que eu não havia conversado com Derek sobre a segunda temporada do Realidade Sombria. Ele ficaria animado de ouvir sobre o último assassinato. Eu estiquei meu braço pela mesa para pegar a mão de Eleanor, mas ela estava longe demais. Em um estranho momento de silêncio, nós olhamos um para o outro, e eu relaxei de volta na minha cadeira.
– Ele saiu com Maggie algumas vezes, mas não tem ideia do que está acontecendo. Connor quer fazer a coisa certa. Ele suspeita gostar de vocês duas.
– Sério? Você não acha que ele está me deixando de lado muito facilmente. – ela disse, animando-se de sua tristeza anterior.
Eu assenti.
– Possivelmente. Você mesma vai ter que conversar com ele sobre isso, mas eu não lhe contaria como fora do jogo por enquanto. Você é um pacote completo, quem não iria querer sair com você? – talvez eu estivesse no ramo errado. Será que eu deveria mudar meu emprego para dar coaching de relacionamentos?
O humor de Eleanor melhorou, e ela prometeu deixar essa história descansar por alguns dias, e então ligaria para Connor para sugerir um encontro para um café de tarde.
– Eu acho que você deveria fazer a mesma coisa com a Maggie.
– Eu não estou pronto para sair com alguém agora. A Nana D já está tentando me arranjar com uma de suas alunas de música, Bridget Colton. Você sabe alguma coisa sobre ela? – eu me lembrei de entrar em contato com Bridget para ver se ela tinha algo mais para me contar sobre como o departamento de comunicações funcionava internamente. Talvez ela tivesse visto algo estranho e não tivesse percebido que era uma peça importante do quebra-cabeça.
– Não, eu não conheço a Bridget. Nana D não a mencionou para mim. – Eleanor disse enquanto terminava seu ensopado. – Acrescento ao cardápio ou peço ao Chef Manny para tentar novamente?
– Esse fica. – eu confirmei enquanto entregava a tigela a minha irmã. Quando Eleanor desapareceu com os pratos, eu olhei meu celular procurando por novas mensagens.
Nana D havia me mandado mensagem para descobrir quando eu iria passar lá para jantar. Eu sugeri na quinta-feira, o que ela concordou contanto que fosse às sete horas, porque ela tinha uma reunião com a união dos mineiros locais e o chefe do centro cívico naquela tarde. Eu sabia que ela estava aprontando alguma coisa, e esperava que isso não acabasse em desastre. Ela ainda estava falando com cada membro do conselho sobre as doações anônimas.
Quando retornou, Eleanor fez um som de como se fosse vomitar.
– Será que nós já fomos tão jovens assim?
Ela me disse para espiar pela janela do corredor ao lado da cozinha.
– Olhe o canto mais distante dois amantes se beijando. Eu entendo sobre estar apaixonado, mas fazer tudo isso no estacionamento de uma lanchonete. Nós poderíamos ser fechados por causa desse tipo de comportamento.
Eu realmente duvidava que a Lanchonete Pick-Me-Up seria fechada por causa de duas pessoas se beijando do lado de fora, e suspeitava ser como minha irmã se sentia sobre quaisquer pessoas compartilhando um momento romântico nesses dias. O ciúme poderia ser parte da frustração dela. Quando eu espiei pelo canto, senti uma dor no coração por alguém que havia conhecido recentemente. Pobre Striker! Carla e Jordan estavam no meio de um abraço apaixonado.
– Uau! Olhe para aqueles dois. Eu acho que ela e o Striker não estão mais saindo juntos. – eu disse quando voltei ao escritório de Eleanor.
– Não é a primeira vez que eu os pego no ato. – minha irmã respondeu enquanto colocava o cabelo para trás e suspirava. – Eles tem se escondido aqui atrás, algumas vezes tarde da noite fazendo a mesma coisa.
– Sério? Eu pensei que ela era a namorada do Striker, mas suspeito que possa ter alguma coisa acontecendo entre ela e Jordan.
– Isso tem que estar relacionado com o que você acha que está acontecendo com as notas do Striker e sobre quem jogou no jogo de abertura, certo? – Eleanor perguntou.
Eleanor e eu discutimos as diferentes possibilidades de como os três estudantes poderiam estar envolvidos no esquema de mudança das notas. Havia uma grande chance de Abby ter flagrado um deles e ter sido morta, para que então ela não pudesse contar a mais ninguém.
– Tudo o que eu sei é que quando Myriam pegou a prova do Striker alguns dias atrás, ela havia concordado com a nota “B+” antes de dar entrada no sistema dos estudantes. Cada nota de um estudante combinava com o que estava escrito no livro de notas da Abby, exceto a do Striker, eu mesmo as conferi. – eu respondi, percebendo que horas eram. Enquanto eu me levantava para ir embora, outra opção surgiu em minha mente, e por mais que parecesse tola, tinha que mencioná-la. – A não ser que Myriam esteja mentindo e tenha arrumado as respostas dele, então ela poderia dar a nota “B+”. O que eu duvido muito que seja o caso.
Eleanor riu.
– Sem chance. O pai diz que Myriam é extremamente rigorosa com relação a isso. Talvez a pessoa que mudou as notas não seja a mesma pessoa que matou Abby e Lorraine. Eu suponho que isso poderia não estar relacionado. Você ainda não sabe especificadamente o que cada mulher sabia sobre as discrepâncias entre as notas antes de elas morrerem.
Apesar de Eleanor ter um ponto válido, eu tinha certeza de que os dois crimes estavam conectados. Eu precisava olhar a prova que Myriam havia dado a nota quando eu voltasse para o campus, para ver se eu também daria um “B+” e não um “F”. Era hora de discutir as últimas notícias com meu pai, já que isso claramente indicava que havia algo acontecendo nos bastidores de Braxton.
– Eu preciso descobrir quem escreveu aquele bilhete que Lorraine tinha com ela quando caiu pela janela. São várias as possiblidades, baseado em como estava escrito de forma vaga. – eu abracei minha irmã por me lembrar sobre o bilhete e parti para o escritório da xerife. – A Xerife Montague precisa que eu complete o meu depoimento.
Para minha sorte, o Policial Flatman estava em patrulha. A xerife me escoltou até o escritório dela para cobrir os detalhes finais dos eventos de ontem à noite.
– Como você está aguentando, Pequeno Ayrwick? – ela perguntou. O blazer de tweed estava de volta hoje, mas dessa vez estava junto com um par de calças de corduroy e botas pesadas de escalada.
– Eu estou okay, mas ficaria um pouco melhor se você me chamasse de Kellan. Eu acho que já estamos além das formalidades, April, e isso poderia ser o começo de uma amizade. – eu sugeri, esperando que isso fosse funcionar, apesar do penteado dela.
– Pode me chamar de Xerife Montague por enquanto. – ela respondeu com uma calma provisória. – Eu prefiro manter uma linha rígida entre negócios e prazeres e não acredito que nos consideraríamos como amigos.
Eu não tinha outra escolha a não ser aceitar a decisão dela. Pelo menos sabia que tinha que falar com ela cuidadosamente hoje. Eu não ia conseguir respostas se pressionasse demais.
– Eu ficaria feliz em ler e assinar o depoimento final. Tem alguma pista que você possa me contar? Lorraine Candito era uma amiga próxima da família.
A Xerife Montague suavizou um nível na escala da amizade.
– Eu tenho certeza de que foi um grande choque para todos vocês. Acredito que Connor tenha lhe contado o conteúdo do bilhete? – ela continuou depois que eu assenti em confirmação. – Ele está checando as entradas de segurança agora, e vai me dar um update dentro de uma hora. Espero que assim que ele terminar, nós possamos saber um pouco mais sobre quem estava dentro e fora do Complexo Esportivo Grey.
– Você tem alguma estimativa da hora em que ela foi empurrada pela janela? – eu perguntei.
– Entre as cinco e quarenta e as seis e quinze. – a Xerife Montague respondeu. – Minutos depois que a sua ligação com ela terminou. Ela morreu imediatamente depois de bater na estátua. Houve pouca dor, se alguma, se isso lhe faz se sentir melhor.
– Faz sim, obrigado. – eu cruzei minhas pernas e relaxei no sofá do escritório dela. Eu esperava que estivéssemos tendo uma conversa aberta, mas não tinha certeza do quanto ela revelaria. – Você chegou a pensar sobre o que eu lhe falei das mudanças das notas? Eu estou começando a suspeitar de alguns estudantes que estavam convenientemente no meio do que aconteceu com as duas mulheres.
– Eu não estou na liberdade de lhe dizer o que descobri, mas aprecio como você tem sido capaz de recolher informações que nós não encontraríamos necessariamente. – ela se inclinou por sobre a mesa e me entregou o depoimento que a equipe dela havia preparado. – Eu não estou dizendo que você tenha qualquer liberdade para se envolver na investigação, mas talvez, ter alguém como você do lado de dentro tenha sido útil. Isso me levou a algumas outras descobertas.
Eu sorri e supus que isso queria dizer que eu poderia continuar cutucando por aí em áreas diferentes. Depois de rapidamente ler o depoimento detalhando tudo o que eu havia visto na noite passada, e fazendo pequenas mudanças para corrigir a gramática incorreta que o Policial Flatman tinha empregado, eu o assinei.
– Obrigado. Não estou tentando intervir. Está completamente claro o quão importante é não atrapalhar a coleta de evidências ou arriscar quaisquer problemas quando apreendendo um suspeito.
– Estou feliz que estamos na mesma página aqui – ela disse antes de se levantar. – Se eu ficar sabendo de alguma coisa importante da pesquisa do Connor nas entradas de segurança, e eu acredite que você possa me dar algum insight sobre isso, entrarei em contato. Por enquanto, tenha cuidado com o que você conta aos estudantes enquanto dá suas aulas. Nós podemos estar lidando com um pessoal esperto. – pelo menos ela tinha escolhido usar um par de botas mais estiloso hoje.
Eu tomei o silêncio dela como minha dica para sair, o que eu estava mais do que feliz em fazer, já que parecíamos ter chegado a um entendimento um com o outro. Eu não tinha certeza do quanto acreditava que ela desejasse separar as coisas pessoais das profissionais. Eu não achava que a Xerife Montague, se recusando a me chamar de Kellan, mas ainda assim se referindo ao meu antigo melhor amigo como Connor ao invés de Diretor Hawkins, era o exemplo perfeito da linha rígida dela. E nem havia sido aquele comentário que ela havia feito na The Big Beanery sobre como Connor era um ótimo homem.
Eu queria ir até a academia, mas não tinha vontade de voltar ao terceiro andar do Complexo Esportivo Grey, pelo que havia acontecido lá. Dentro do carro, troquei minhas roupas por uma calça de corrida e uma camisa termal de manga longa, ainda estava um pouco frio, e coloquei meus tênis de corrida. Senti-me novamente como uma criança quando eu me abaixei no banco de trás do Jeep quando passou alguém por perto. Eu não precisava ser pego em minhas cuecas ou sem a camisa, mas não queria pedir a Xerife Montague se eu podia usar o banheiro do escritório dela para mudar de roupas. Enquanto eu corria pelas ruas perto da base das montanhas e do Lago Crilly, eu compilei uma lista de maneiras pelas quais eu poderia checar os álibis de Carla, Jordan e Striker sem perguntar diretamente a eles. Se eles fossem responsáveis, quaisquer perguntas diretas os deixariam alarmados. Se não estivessem envolvidos nos assassinatos, pareceria um pouco bizarro um professor perguntando onde eles estavam naquelas noites.
Assim que terminei minha corrida, eu parei na garagem de meus pais e entrei na casa. Tomei um banho e me troquei enquanto minha mãe esquentava o jantar, então segui para o andar térreo para ver se eu podia ajudar. Parecia que ela havia acabado de seguir as instruções da empregada sobre como esquentar o lombo de porco com mel, purê de abóbora e vagens. A sorte estava ao meu lado já que ela já estava começando a servir a mesa. Nós todos nos sentamos e conversamos sobre o nosso dia.
– Isso parece delicioso, mãe. Você superou suas habilidades de chef hoje à noite. – eu comecei.
– Não é tão difícil seguir as instruções escritas num pedaço de papel. – ela riu.
– Você veio com esse talento. – eu respondi.
– Eu suponho que poderia ganhar o prêmio de cozinheira do ano, não é? – ela provocou.
– Você está preparado para as aulas de amanhã? – meu pai perguntou, não interessado em se envolver com nossas pequenas provocações sobre a falta de habilidades culinárias da minha mãe.
– Eu tenho alguns materiais para ler durante a noite, mas sim tudo parece estar no lugar. – eu confirmei. O molho de alecrim no lombo de porco tinha um sabor fenomenal.
Eu expliquei tudo o que havia descoberto sobre as notas do Striker para meu pai. Também contei a ele sobre eu ter contado à Xerife Montague sobre todos os estudantes em questão.
– É alarmante pensar que alguém em Braxton seja responsável por duas mortes. Eu não quero admitir que nós temos um assassino andando pelo campus. – meu pai disse. – Vou pedir que Myriam compare os resultados da provas do Striker com as provas antigas e ver se há algum motivo para acreditar que não seja o trabalho dele.
– É assustador, mas espero que a Xerife Montague solucione isso logo. – minha mãe respondeu. – Que bom que Kellan a está ajudando.
– Eu não iria tão longe, mãe.
– Eu vou também atualizar o Conselho de Curadores hoje à noite. Eu acho que é hora dos nossos advogados se envolverem. Espero que Connor tenha alguma coisa que possa limpar qualquer irregularidade por parte da faculdade. – meu pai disse.
– O que você quer dizer, pai?
– Se existem quaisquer inconsistências com o nosso processo de avaliação ou alguém de nossa equipe esteja envolvido com alguma coisa ilegal, isso não vai ser bom para nós. O olheiro de beisebol definitivamente não vai escolher alguém de Braxton, nem vamos conseguir a aprovação final para os planos para... deixa pra lá. Não tenho que falar demais.
As preocupações do meu pai abriram meus olhos para alguém que havia deixado passar. Isso poderia ser maior do que tirar o Striker do time, para que Jordan pudesse jogar. E se isso fosse para se assegurar que Braxton parecesse boa aos olhos do olheiro? Eu perguntei ao meu pai, mas ele disse que eu precisaria conversar com o Técnico Oliver sobre esse ângulo, o mesmo Técnico Oliver que havia sido impreciso sobre o seu paradeiro durante ambos os assassinatos.
Meu pai acrescentou:
– O Técnico Oliver pode parecer um pouco rude, mas ele não é o responsável pelos assassinatos. Algumas vezes as pessoas não podem ser muito específicas sobre seus álibis.
Eu queria perguntar o que o Técnico Oliver havia feito no passado para fazer com que houvesse mudanças na política sobre assédio sexual no lugar, mas eu não deveria saber sobre isso. Minha mãe me interrompeu quando eu comecei a limpar a mesa.
– Sente-se, Kellan. – ela disse, então olhou seriamente para meu pai. – Você não tem algo para discutir com nosso filho, Wesley?
Enquanto ela saía com os pratos, meu pai começou a falar.
– Eu acho que ela quer dizer que eu tenho que lhe contar sobre onde eu estava na noite do assassinato da Abby. – ele bebeu um gole de água para ter tempo de pensar.
Eu não estava esperando essa conversa hoje à noite.
– Eu acho que é importante saber onde você foi.
– Você poderia dizer isso. – meu pai respondeu. – O Conselho de Curadores está preocupado sobre eu deixar Braxton, especialmente quando eles estão contemplando um programa acadêmico inteiramente novo.
– Isso soa como uma boa oportunidade. Tenho certeza de que eles poderiam ajudar a fazer isso acontecer sem a sua presença. – eu respondi, arriscando um palpite sobre quais novos campos eles poderiam estar considerando.
– Você já perguntou a ele? – minha mãe disse enquanto trazia uma torta de pêssego. – Nana D trouxe isso para você mais cedo hoje.
Eu tinha a melhor avó do mundo.
– O pai havia começado e me contar algo, mas eu não sei o que você quer dizer sobre ele me perguntar alguma coisa.
– Deus, Violet, será que você poderia me dar alguns minutos? Não é como se isso fosse uma ocorrência diária. – meu pai disse, afastando sua cadeira alguns centímetros. – Você não precisa fazer café?
– O que está acontecendo? – eu perguntei, não estando disposto a esperar mais enquanto cortava um grande pedaço de torta.
– Nós estamos completando um estudo durante esse último ano, trabalhando com doadores generosos sobre a possibilidade de Braxton ter cursos de pós-graduação. O Conselho de Curadores já deu a palavra final para obter a aprovação para converter a Faculdade Braxton na Universidade Braxton. Nós vamos começar com três campos de estudo, mas o plano é expandir nossas ofertas acadêmicas para incluir diversas opções de MBA e programas de extensão de Ph.D. dentro do campo médico. A terceira vai ser uma reorganização completa do departamento de comunicações que nos permitiria ser a escolha primária dos estudantes procurando construir uma carreira na indústria televisiva.
Minha mãe percebeu o olhar de surpresa no meu rosto.
– Isso não é tudo. Conte a ele agora, Wesley.
– Você não consegue ficar quieta, não é mesmo, Violet? – meu pai se virou para mim com uma grande surpresa prestes a sair de seus lábios. – Eu concordei provisoriamente em liderar toda a campanha de mudança de imagem e da construção da nova universidade enquanto meu sucessor dirige a faculdade existente. Com o tempo, eu vou entregar os componentes expandidos para o novo presidente, mas são coisas demais para apenas uma pessoa lidar com tudo de uma vez.
Eu sabia que ele não ia se aposentar. Essa não era a abordagem de vida do meu pai. Ele não poderia ficar sentado quieto mesmo que sua vida dependesse disso.
– Eu acho que posso lhe dar os parabéns?
– Bem, eu tinha uma condição. – meu pai disse, olhando para minha mãe e cobrindo a mão dela com a dele. – E isso envolve você, Kellan.
Eu não gostava da direção para onde as coisas estavam indo.
– Entendo.
– Eu só vou aceitar esse papel se você concordar em voltar para casa e aceitar a posição de professor assistente sob o novo chefe de departamento e novo presidente, assim como um papel no comitê para montar o novo departamento de comunicações dentro da Universidade Braxton. Eu estou falando em desenvolver relações com os maiores canais televisivos, os times de produção de elite em Hollywood, esses canais a cabo e por assinatura, como a Netflix, ou qualquer outro nome que você conheça.
Eu enchi minha boca com um grande pedaço de torta e fechei meus olhos. Isso não pode estar acontecendo...
Capítulo 19
Depois da bomba que meus pais haviam jogado sobre mim durante o jantar, eu pedi licença para considerar as notícias. Não apenas isso seria uma grande mudança de vida, mas meu pai precisava de uma resposta até o fim da sexta-feira, para que pudesse trabalhar com o Conselho de Curadores para então, estruturar o anunciamento que eles fariam em Braxton na próxima segunda-feira sobre o novo presidente. Eu queria dormir cedo e tentar esquecer todo o drama e as preocupações. Na quarta-feira de manhã cedo, eu coloquei de lado todos os medos atormentadores, saí para uma corrida, e apareci em tempo para as aulas.
Deixei minha maleta sobre mesa, peguei um quiz que eu havia criado para verificar o quanto os estudantes haviam prestado atenção à aula da segunda passada, e coloquei uma cópia virada para baixo em cada uma das vinte mesas. Por um momento, pensei que uma pequena parte da personalidade de Myriam Castle havia me invadido, pelo fato de eu estar dando um teste surpresa para a turma, mas foi apenas passageiro. Eu não conseguiria ser tão mal quanto ela era. Quando os estudantes entraram na sala, eu pedi para eles não virarem os papéis. Striker e Carla entraram e se sentaram juntos. Eu olhei pela sala e vi apenas duas pessoas faltando. Uma estudante havia me informado anteriormente que não estava se sentindo bem, mas a outra falta era do Jordan.
Eu dei aos estudantes trinta minutos para completar o quiz. Se eles terminassem antes, estavam livres para ir embora, mas teriam que apresentar suas visões gerais de um trabalho a ser entregue em duas semanas, ou poderiam ficar por ali para escrevê-lo durante o tempo restante da aula. Apesar da maioria dos estudantes ter preferido dar suas visões gerais e ir embora, Carla entregou seu quiz e voltou para a mesa. Eu supus que ela estava escrevendo seu trabalho, mas não conseguia ver de tão longe. Talvez eu precisasse de novos óculos. A idade não tinha relação com isso.
Alguns minutos depois, Striker saiu do seu lugar e me entregou seu quiz.
– Será que você podia dar uma olhada agora? Estou curioso para saber como eu me saí. – algumas gotas de suor se acumulavam em sua testa.
Eu disse a ele que se sentasse enquanto eu lia suas respostas. Era uma combinação de questões de múltipla escolha e algumas de resposta aberta, dando aos estudantes a chance de me surpreenderem com o que se lembrassem da aula de segunda. Apesar de ter errado algumas fáceis, ele conseguiu outro “B+” nesse quiz. Quando eu olhei para frente, ele e Carla eram as duas únicas pessoas restantes na sala.
Eu entreguei as boas notícias sentindo-me feliz que não haveria nenhuma preocupação sobre as notas da prova de hoje.
– Você deveria estar orgulhoso. Olhe o que você consegue conquistar se se mantiver focado.
Carla piscou para mim.
– Talvez você seja um professor melhor que os outros.
– A bajulação pode te levar a todos os lugares, Srta. Grey, mas eu estava falando sério. É uma pena o que aconteceu com a Professora Monroe. Você também não era uma fã dela?
– Eu preferia não dizer. Ela era... difícil. – Carla comentou antes de se voltar para o Striker. – Você está pronto?
Striker ficou em pé.
– Yeah, muito horrível que ela tenha morrido. Você a encontrou, certo, Professor Ayrwick?
– Não é uma das minhas lembranças preferidas. – eu pensei ter descoberto minha rota para descobrir o álibi deles. Enquanto Striker guardava suas coisas na mochila, aproveitei minha oportunidade. – Você sabe, eles sempre dizem que você consegue lembrar exatamente de onde estava quando alguma coisa ruim acontece. E quanto a vocês dois?
Carla sorriu estranhamente para Striker.
– Nós estavamos juntos. Passando tempo no meu dormitório. Certo, babe?
– Yeah. – ele assentiu. – Eu tinha um monte de tarefa de casa, e Carla estava me ajudando a estudar para algumas aulas.
– Em um sábado? – perguntei. De alguma forma, eu não acreditava que eles estivessem em casa estudando. – Essa é uma maneira diferente de aproveitar o final de semana do que quando eu estudava aqui.
Carla tossiu, então encolheu os ombros.
– Ugh, é, acho que você nos pegou. Nós estávamos no dormitório dele, só nós dois, mas pode ter havido alguns drinks e menos estudo envolvido, sabe?
– Isso parece mais com minhas lembranças. – eu disse.
– Eu acho que nós deveríamos ter sido honestos desde o começo. Eu não faço vinte e um anos daqui mais algumas semanas, então não queria ficar com problemas. – Carla comentou. – Mas você vai manter o nosso segredo, certo, professor?
– Nós temos que correr. Eu tenho aquele horário com o Reitor Mulligan. – Striker pegou a mão de Carla e seguiu com ela para fora do Hall Diamante. Eles estavam bem próximos sussurrando alguma coisa enquanto eu os observava pela janela. Quando chegaram ao fim do caminho, Carla puxou sua mão e saiu na direção oposta de Striker.
Como eles haviam ido embora, eu decidi conferir o Jordan. Eu olhei a informação de contato e liguei para o dormitório dele. Ele atendeu no primeiro toque.
– Yo, quem fala?
– Jordan? É o professor Ayrwick. – eu respondi, me sentindo um pouco estranho. Quando foi que eu virei aquele professor maldoso que liga para os estudantes quando eles faltam um dia de aula? – Eu estava conversando com todos para ver se tinham alguma pergunta sobre a próxima prova do semestre. Apenas conferindo se você já determinou em qual tópico vai focar?
– Desculpe, eu perdi a aula. Eu estava com o Técnico Oliver falando sobre o olheiro da Grande Liga de Beisebol. Parece que eu vou arremessar nesse sábado. – Jordan estava animado para compartilhar suas notícias.
– Oh, bem, isso é fantástico. Coisas acontecem, não se preocupe. Perder uma ou duas aulas em cada semestre é aceitável. Você pode responder ao quiz a qualquer momento entre agora e sexta-feira. – então eu parei, incapaz de pensar em uma maneira fácil de perguntar a ele sobre o álibi para as noites dos assassinatos.
Nós concordamos em um horário para o reteste e desligamos. O que havia mudado na mente do Técnico Oliver para ele começar com Jordan ao invés do Striker? Eu teria que perguntar a ele quando o encontrasse. Eu ponderei sobre se ele iria aparecer no funeral de Abby naquela tarde.
Eu olhei minhas anotações para a segunda aula do dia, então peguei algo para comer. Assim que havia terminado, Connor me ligou.
– Kellan, eu queria te dar um update sobre o que fiquei sabendo depois de ver as entradas de segurança. – ele disse.
– Pode mandar. O Técnico Oliver é culpado?
– Existem apenas poucas câmeras instaladas no Complexo Esportivo Grey, mas nós temos uma boa visão da entrada da academia no terceiro andar. – ele disse, enquanto o som de páginas sendo viradas no plano de fundo preencheu o silêncio. – Tenha em mente que não tem nenhuma câmera perto da sala de conferências, então nós podemos apenas dizer quem foi visto naquele andar do prédio.
Eu imaginei o layout da melhor maneira que pude a partir da memória, reconhecendo que isso não seria exatamente uma confirmação sobre quem havia tido acesso.
– Havia muitas pessoas na academia quando nós chegamos.
– Sim, mas o Policial Flatman e eu assistimos a gravação de vídeo mostrando a partir das quatro e trinta até às sete horas, o que cobre o período completo para alguém ter saído da academia, encontrado Lorraine, empurrado-a da janela onde ela caiu para sua morte, e entrar novamente ou escapar sem ser pego. Apenas duas pessoas saíram da academia que eu não pude encontrar em lugar nenhum mais. Isso não significa que não exista a possibilidade de alguém mais ter estado no hall externo ou chegado à sala de conferência, mas pelo menos nós podemos eliminar todos os que ainda estavam dentro da academia quando isso aconteceu.
– Entendi. Quem foi embora?
– Jordan Ballantine saiu cerca de dez minutos depois das cinco, mas eu não o vejo em lugar algum das câmeras. Então tem o Craig Magee. Ele apareceu às cinco, discutiu com Jordan, então saiu cinco minutos depois. Ele retornou às seis.
– Você sabe onde ele esteve durante esse tempo? – eu perguntei, curioso sobre por que ele iria embora no meio dos exercícios. Eu o havia visto fazendo levantamentos na academia pouco antes das sete horas.
– Eu olhei as outras câmeras no edifício, mas não consegui encontrá-lo em lugar algum. Ele pode ter usado o banheiro, ou feito uma ligação entre seus exercícios.
– Ou ele pode ter matado Lorraine. E quanto às aulas de autodefesa? – eu disse.
– Nós não temos uma imagem de câmera de onde o professor estava ensinando, mas ele providenciou uma lista dos funcionários e confirmou que houve apenas uma falta. Ninguém saiu mais cedo, e ele não aceita pessoas chegando atrasadas. A aula vai das cinco e meia às seis e meia. Eu vi todos saindo do prédio quando cheguei.
– Quem não foi na aula?
– A Reitora Terry, mas ela foi vista entrando no prédio durante a janela de tempo na qual Lorraine foi morta. Vou falar com ela hoje para descobrir por que ela não foi à aula de autodefesa. – Connor respondeu. – Isso parece suspeito.
– Isso é interessante. Então onde isso nos deixa?
– Estou cruzando os dados da lista das pessoas que foram filmadas pela câmera frontal entrando ou saindo com quaisquer pessoas que nós possamos eliminar, baseados em outras câmeras ou que estavam na academia ou na aula de autodefesa. Isso vai provavelmente nos deixar com cerca de vinte pessoas, cujo paradeiro nós não conseguimos identificar como estando dentro do prédio entre as quatro e meia, quando Lorraine apareceu para confrontar o Técnico Oliver, e as sete e meia, quando a Xerife começou a falar com todos que ainda estavam no local. Então nós vamos conversar com eles até o final de semana para documentar os álibis.
– Isso é bem útil. Algo mais que você possa falar agora? – eu perguntei.
– Nós não conseguimos verificar o paradeiro do Técnico Oliver durante a última parte daquele período. Ele disse que estava no Campo Grey em um treino de vôlei, mas nós temos pouca cobertura das câmeras naquela área. Jordan e Carla também estavam no Complexo Grey durante aquele tempo, mas você os viu às seis e quarenta e cinco, quando o teleférico chegou no Campus Norte. Estranhamente, Alton Monroe se encontrou com sua irmã, Lorraine, do lado de fora do prédio antes que ela encontrasse o Técnico Oliver às quatro e meia.
– Bom progresso, obrigado por me contar. – um sentimento de alívio começou a preencher o espaço vazio dentro de mim. Eu ainda estava de luto por Lorraine e preocupado com quem a havia matado, mas pelo menos nós ficaríamos sabendo em breve. Era curioso que o irmão dela tivesse aparecido por lá. Eu precisava encontrar tempo para perguntar a ele sobre isso.
Eu terminei a ligação e então liguei para Cecilia, a avó de Emma. Precisava saber como estava a minha menininha, e ouvir sobre o dia dela na escola faria me sentir melhor. Então eu disse que não voltaria por mais algumas semanas, pois estava fazendo um favor ao meu pai. Cecilia ficou infeliz quando eu a informei que ela precisava colocar Emma em um avião para Braxton e concordou apenas quando eu aceitei que ela viesse junto com minha filha. Para minha sorte, ela pretendia apenas ficar tempo o suficiente para deixar Emma aqui, então planejava visitar Nova Iorque para uma viagem de compras com as amigas.
Eu liguei para Derek e deixei uma mensagem sobre o segundo assassinato. Era estranho que ele não tivesse atendido minha ligação, mas eu tinha compromisso. Depois de chegar ao local do funeral, desliguei meu celular e saí do Jeep. Da última vez que estive em um lugar assim, havia sido o funeral da Francesca. Eu não queria vir hoje, mas era um mal necessário.
Quando eu me aproximava da entrada principal, quase colidi com duas mulheres descendo as escadas.
– Oh, me desculpe. Minha cabeça não fica muito boa nesses tipos de lugares. – quando olhei para cima para ver quem era, me senti ainda pior.
– Eu estava me perguntando se você iria aparecer. – Myriam respondeu. – Como foi o seu segundo dia de aula?
Eu cumprimentei minha terrível colega. Mesmo de luto, ela estava tão elegante quanto possível. Também era a primeira vez que eu a via vestindo algo diferente de calças e ternos. O casaco cinza dela estava aberto e revelava um vestido longo e preto embaixo de seu tecido pesado. Uma corrente de diamantes que estava ao redor de seu pescoço brilhava na minha direção, ao invés do seu sorriso. Ela tinha uma expressão amarga, que supus ser pelo fato que estavamos em um funeral, mas eu tinha que reconhecer que das quatro ou cinco vezes que eu a havia encontrado, ela sempre parecia ter a mesma expressão.
– Foi bom, obrigado. Eu estou me sentindo bem integrado e conectado com vários estudantes. – eu disse, estudando a companheira dela, sabendo que a reconhecia de algum lugar, mas não como e nem por que. Ela era mais alta do que Myriam, e nos seus saltos altos, chegava facilmente a minha altura. Enquanto Myriam tinha uma expressão azeda e características físicas muito gritantes, essa mulher projetava uma compostura etérea, era a única descrição que me vinha à mente. Seu cabelo ondulado e loiro fluía pelas suas costas, e seus olhos verdes e amendoados brilhavam. Eu pensei que talvez já tivesse sido modelo, e que eu a havia visto na capa de uma revista, mas meu cérebro não era capaz de lembrar agora.
– Essa é Ursula Power. – Myriam acrescentou, inclinando a cabeça na direção da mulher. – Ela encontrou Monroe algumas vezes no último semestre em alguns eventos do campus, e queria prestar seus respeitos.
– É um prazer conhecê-lo, Kellan. Você conhecia bem a Abby? – a deusa na minha frente respondeu.
Eu estava hipnotizado sobre como a beleza da mulher ia além do normal, mas então me ocorreu que Myriam não havia dito meu nome quando nos apresentou. Como ela sabia quem eu era?
– Eu não a encontrei pessoalmente. Eu deveria tê-la entrevistado no mesmo dia que ela infelizmente morreu, mas bem...
– “Aquele que morre paga seus débitos.” – Myriam respondeu antes que eu pudesse terminar. Havia uma expressão de superioridade no rosto dela quando ela disse as palavras.
Eu posso ter estado distraído e não interpretei a linguagem corporal dela da maneira mais justa, já que não tinha os melhores sentimentos com relação a ela. Eu também não tinha ideia do que a citação dela queria dizer, mas estava mais focado em saber como Ursula sabia o meu nome.
– Me desculpe, mas nós já nos encontramos antes?
– Eu não acredito que tenhamos, mas ouvi muito sobre você.
O que Myriam havia contado a ela? Eu tive pouco tempo para fazer quaisquer outras perguntas, pois o Técnico Oliver subiu os degraus da frente e nos interrompeu. Myriam olhou para ele quando começou a falar.
– Olá. É um motivo tão trágico o que nos reuniu hoje. – ele comentou antes de se apresentar para Ursula.
Myriam respondeu:
– Eu suponho que você tenha ficado sabendo do meu pedido ao Reitor Mulligan e à Reitora Terry para suspender Craig Magee até que a investigação sobre as notas dele do começo do semestre tenha sido completada. Depois de revisar a última prova que ele fez para Monroe, não tem como aquele ser o resultado de seu esforço. Outra pessoa completou aquela prova ou trocou os resultados com um estudante diferente.
– Sim, é exatamente por isso que eu parei para falar com você agora. Quem você acha que é para interferir no sucesso do meu time de beisebol? A Professora Monroe deu a ele um “B+” e você verificou que era uma nota passável. Striker estava pronto para jogar essa semana. Jordan iria apenas ajudar se ele precisasse. Agora eu tenho que começar tudo de novo e tudo por que você meteu seu nariz onde não deveria estar. – o Técnico Oliver sacudiu com raiva o dedo na frente do rosto de Myriam. Enquanto as narinas dele se abriam, eu mal pude conter minha animação de ver as duas pessoas de quem eu menos gostava discutindo bem na minha frente.
De repente, fez sentido por que Jordan havia me contado que ele iria ser o arremessador no próximo jogo. Eu assisti o Técnico Oliver e Myriam brigarem até que Ursula se meteu na conversa.
– Eu não acredito que essa é a hora ou o lugar para vocês dois terem esse debate. Independentemente de como vocês se sentem sobre Abby Monroe ou sobre quem deve começar arremessando nesse sábado, esse é um funeral de uma mulher que foi assassinada a sangue frio. – ela respondeu com uma elegância pura e impressionante. – Eu sugiro que vocês guardem seus sentimentos pessoais para amanhã quando podem ter uma conversa civilizada sobre a investigação das notas dos estudantes.
Myriam se afastou e se acalmou. Ursula certamente causou uma impressão no Técnico Oliver também. Eu adicionei meus dois centavos para não me sentir fora da conversa, mas também continuar o assunto sobre como se comportar em público.
– Eu concordo, Srta. Power. Esse definitivamente não é o local e nem o horário. – eu olhei seriamente para Myriam como se essa tivesse sido a primeira vez que eu pude rebater sem qualquer retaliação.
– Eu acho que é hora de irmos embora. Vamos, Ursula... – Myriam respondeu, se afastando. Eu não tinha certeza se isso era uma questão ou afirmação. Ursula indicou que ela estava ansiosa por me encontrar novamente. Ambas as mulheres caminharam em direção ao estacionamento. Então uma BMW escura saiu nervosamente do local do funeral. Myriam tinha que ser a motorista. Eu tinha certeza.
– Aquela Ursula não é uma coisa e tanto! – o Técnico Oliver assobiou e entrou no prédio com uma expressão presunçosa que deveria ser rapidamente tirada do rosto dele.
Apesar de eu ter mais perguntas para o decadente diretor esportivo de Braxton, elas teriam que esperar até uma hora mais apropriada. Eu segui o Técnico Oliver para dentro do local do funeral para prestar meus respeitos à Abby Monroe.
Depois dos usuais cumprimentos e meio-sorrisos desconfortáveis com poucos estudantes e membros da faculdade que eu havia previamente conhecido, procurei por qualquer membro da minha família ou por Alton Monroe, então poderia usar melhor meu tempo. Eu encontrei Alton quando ele se afastou do caixão e foi em direção a alguns arranjos de flores.
– Oh, Kellan, não é mesmo? – perguntou Alton, estendendo a mão na minha direção. Sua expressão claramente indicava que ele queria escapar daquela sala cheia de pessoas que ele mal conhecia. – É muito gentil você vir quando nem mesmo conheceu Abby pessoalmente.
– É claro, isso parecia a coisa certa a fazer. Eu verdadeiramente sinto muito pela morte de Lorraine. – eu acrescentei. Apesar de sua relação tênue com Abby, o luto em seu rosto era aparente. Perder tanto sua irmã e sua quase ex-esposa havia cobrado seu preço. Mas então, enquanto eu não pensasse que ele fosse responsável pelos assassinatos, eu não estava pronto para riscá-lo da minha lista ainda e fiquei preocupado que eu tivesse confundido por luto o que era culpa. Eu precisava descobrir por que ele estava no Complexo Esportivo Grey quando Lorraine foi empurrada pela janela.
– Eu quase não vim, mas seu pai pensou que seria melhor ter algum representante da família de Abby. – ele respondeu enquanto caminhávamos até um canto afastado da sala onde estava mais quieto.
Meus pais estavam envolvidos em uma conversa com a Reitora Terry e o Reitor Mulligan que parecia ser bem desconfortável. Minha mãe assentia quietamente para os reitores enquanto meu pai sorria irritantemente. Eu teria que pedir ao meu pai sobre o que era aquilo quando eu tivesse a chance. Eu percebi Connor e a Xerife Montague entrando na sala quando Alton começou a falar novamente.
– Os melhores de Braxton. – ele gracejou. – Eu passei a maior parte da minha manhã com ela discutindo meu paradeiro durante a infeliz morte da minha irmã. Eles são bem persistentes sobre as especificidades de datas, horários e locais, não é mesmo?
As palavras de Alton aumentaram minha curiosidade e abriram a oportunidade que estava procurando.
– Eu suponho que eles tenham perguntado por que você estava no campus no dia que Lorraine foi morta?
– Exatamente. Contei a eles que ela havia me ligado para ajudá-la a se acalmar sobre um cara ter traído ela. Eu a encontrei na frente daquele espaço atlético para lhe dar a coragem que ela precisava para dar o fora no cara. Perguntei se ela queria que eu ficasse por ali, mas ela disse que precisava confrontar o homem sozinha. O motivo para alguém pensar que eu poderia ser o responsável por machucar minha irmã está além de mim. É assustadora a forma como eles te interrogam sobre as mínimas coisas.
– Eu tenho certeza de que você encontrou com alguém depois daquilo, alguém que poderia confirmar seu paradeiro, certo? Isso iria esclarecer o seu álibi.
Ele sacudiu a cabeça.
– Infelizmente, nada vai. Lorraine e eu conversamos por cerca de trinta minutos, mas eu fui embora logo após as quatro e meia. Eu não tinha passado muito tempo no campus antes, então caminhei por alguns dos campos esportivos, e depois voltei ao meu carro às seis e meia. Não há nada para confirmar onde eu estava entre esse período.
Enquanto Alton tinha um álibi supostamente perfeito para o assassinato de Abby, talvez eu não tivesse todas as últimas informações da xerife.
– E qual motivo eles possivelmente tem para suspeitar de você?
– Minha irmã tinha investido em várias ações durante toda a sua vida e conseguiu um lucro inesperado na recuperação do ano passado. Eu fui notificado nessa manhã que ela deixou quase duzentos mil dólares para mim. – Alton respondeu parecendo calmo sobre a herança, o que me fez pensar que ele era ainda menos culpado do que eu achava antes.
– Eu nunca teria imaginado isso pela forma como Lorraine agia ou vivia. – eu disse. Apesar dela sempre ter se vestido bem e dirigir um bom carro, ela não tinha nenhum ar de riqueza ou atitude. – Ela foi uma amiga maravilhosa para mim nos últimos anos.
Alton assentiu e indicou que ele concordava comigo sobre a generosidade de Lorraine.
– Aquela xerife parece convencida de que a morte de Abby está ligada com algo no campus, mas não me dá muitos detalhes. Você conseguiu encontrar o que estava procurando nos arquivos do escritório dela?
– Sim, não era tudo, mas nós temos a última parte da pesquisa dela para o show de televisão. Eu também encontrei algumas coisas estranhas no livro de notas, e é por isso que eu concordo com a xerife que a morte dela possa estar relacionada com algo acontecendo por baixo dos panos em Braxton.
Quando Alton pareceu interessado, expliquei o básico sobre o que eu havia encontrado nas notas do Striker, e o que o Técnico Oliver havia dito sobre Abby oferecer mudá-las se ele concordasse com as exigências dela. Inesperadamente, fiquei sabendo de algo por Alton.
– Abby pode ter burlado algumas das regras menos importantes da vida para ter acesso a uma história, mas ela nunca faria algo antiético ou imoral com relação às notas dos alunos. Ela também tinha um desgosto severo pelo setor esportivo da faculdade estar usurpando o tempo de um estudante ao invés de estarem sendo preparados para suas carreiras futuras.
– Fico feliz em saber desse lado dela, mas eu não consigo saber por que o Técnico Oliver iria mentir sobre isso.
– Eu posso ser capaz de explicar agora que você me contou algumas coisas. Abby e eu nos encontramos algumas noites para fazer o acordo de divórcio. Eu não sei se foi o vinho ou uma trégua momentânea, mas naquelas noites, parecia como nos velhos tempos. Abby me contou que ela havia começado a sair com alguém e que estava satisfeita que nós dois pudéssemos encontrar uma maneira de acertar as coisas. Estava pronta para finalizar o nosso divórcio, então tudo desmoronou. Abby percebeu que o cara estava saindo com ela apenas na esperança de que ela mudasse de ideia sobre as notas de um estudante. Ela aparentemente percebeu que uma nota havia sido trocada antes, mas pensou que havia cometido um erro, e então quando isso aconteceu novamente, sabia que havia algo de pior acontecendo. Ela estava pronta para expor alguém por causa de uma fraude sobre algo que havia descoberto.
O Técnico Oliver estava parecendo muito mais culpado. Talvez a Xerife Montague estivesse aqui para finalmente prendê-lo.
– Abby realmente mencionou sobre um crime acontecendo no Condado Wharton, talvez tenha sido isso que ela estava dando pista na ligação que tivemos. Você sabe o que era?
– Infelizmente não. Ela e eu não nos conversamos muito depois. Além de irritar o sujeito, ela também me feriu ao recusar o acordo que fizemos naquela noite para assinar os papéis do divórcio. – isso explicava a briga de Abby com Lorraine no dia antes de ela morrer.
Alton pediu licença e foi se despedir do meu pai. Eu estava no meu caminho para encontrar Connor e a Xerife quando ouvi meu nome sendo chamado. Nana D havia aparecido no funeral. De alguma maneira, eu não achava que isso fosse acabar bem.
Capítulo 20
– O que você está fazendo aqui, Nana D? – eu perguntei, cruzando a entrada do salão de funerais.
– Eu tinha algumas coisas para fazer pelo centro hoje. Apenas pensei já que eu estava pela área, deveria aparecer por aqui. – ela disse. Nana D estava com sua roupa padrão para funeirais, um vestido estiloso e vintage um pouco abaixo dos joelhos, e com uma bainha branca. – Eu também precisava conversar com você sobre a Bridget.
Eu não conseguia acreditar no quanto ela era persistente sobre me arrumar com aquela garota. Uma coisa é que ela queira nos colocar juntos, mas ser tão insistente em um funeral.
– Nana D eu acho que você...
– Oh, vá com calma. Eu pensei que você precisava ouvir algo que ela me contou mais cedo hoje, quando liguei para mudar o nosso horário da aula de domingo.
Ela parou de falar comigo como se eu tivesse entendido o que ela estava tentando dizer.
– Continue, Nana D.
– Não me apresse. – ela respondeu enquanto se sentava perto da entrada. Depois de se servir com alguns biscostos e uma xícara de chá, ela olhou para mim com uma expressão satisfeita. – Okay, agora eu posso continuar minha linha de pensamento. Eu devo estar fazendo coisas demais, estou começando a me sentir um pouco mais madura ultimamente.
– Descanse um minuto se você precisar. Não estou indo a lugar algum.
– Mas eu estou. Eu vou me encontrar com Marcus Stanton em vinte minutos. Aquele homem me deve a sua decisão final, e se ele não recuar, não vai saber o que o acertou. – Nana D bateu seu punho no braço da cadeira, fazendo com que a bandeja de biscoitos fosse para perto demais da borda da mesa. – Onde nós estávamos?
Eu impedi que a bandeja caísse e dispensei minha mãe quando ela estava prestes a correr para cá.
– O que você precisa me contar?
– Bridget tem algumas notícias interessantes. Aparentemente, ela escutou uma conversa escândalosa entre alguém do campus e aquele olheiro de beisebol.
Minha imaginação começou a ficar cheia de curiosidade.
– O que ela ficou sabendo?
– O olheiro disse que ele estava fazendo o seu melhor e não poderia ficar preso no meio. Que a decisão está fora das mãos dele.
– Quem Bridget viu que estava conversando com o olheiro?
– Eu não disse que ela os viu. Ela os escutou. – Nana D respondeu de volta.
– Okay, Bridget sabia com quem ele estava conversando?
– Você vai me deixar terminar de contar a história, Kellan?
Eu mantive minha boca fechada e deixei que Nana D contasse a conversa dela com Bridget. Enquanto Bridget estava almoçando dentro do prédio da união estudantil, o olheiro estava numa mesa perto conversando no telefone. Ela o reconheceu da reunião de preparação e do jogo de beisebol da semana passada, mas não tinha certrza de quem estava do outro lado da linha. O olheiro disse que ele já havia feito a recomendação para a posição e que se tudo saísse bem, haveria um lugar na organização da Grande Liga de Beisebol depois que o semestre terminasse em Braxton. O olheiro também disse que ele não podia fazer mais nada para ajudar, então desligou.
– Sobre o que você acha que era isso tudo? – eu não conseguia pensar em quem mais poderia estar naquela ligação a não ser o Técnico Oliver. Será que ele estava procurando um emprego fora de Braxton? Será que era por isso que ele estava tão inflexível sobre ter um bom resultado nessa temporada de beisebol?
– Bridget não entendeu o que o olheiro quiz dizer, mas pensou que isso era peculiar. Por isso mencionou para mim. Eu devo estar fazendo a ela várias perguntas sobre o que os estudantes pensam das mortes de Abby e Lorraine.
– Por que você está se metendo no meio dessa investigação? – eu disse.
– Escute aqui, xícara. Essa chaleira aqui já te contou que estou preocupada com o condado. Já que a faculdade é o que faz essa cidade se movimentar, é importante que eu preste atenção. – Nana D ficou em pé, indicando que era hora de ir embora.
Eu não podia discutir com ela, já que também havia me metido na busca pelo assassino, ou assassinos. Nana D disse que tinha mais uma reunião para descobrir quem era o doador anônimo, e então foi embora. Enquanto eu caminhava até o hall de entrada, Connor se aproximou de mim.
– A sua avó certamente sabe como fazer uma entrada e uma saída. Eu acho que ela pode ter me beslicado quando passou por mim.
Eu senti minha pele queimar pelo pensamento de minha Nana D fazendo isso com Connor. Eu ia perguntar onde ela o havia beliscado, mas pensei que era melhor não.
– Deve ter sido um acidente. Ela estava apressada.
– De alguma maneira, eu não concordo com isso. Eu sei que ela não é a maior fã da xerife, mas isso não iria ganhar nenhum ponto com ela. – ele respondeu, sorrindo. – April está esperando o resultado de alguns testes hoje. Eles conseguiram algumas fibras que estavam sob as unhas de Lorraine. Ela espera que elas combinem com as mesmas amostras encontradas sob as unhas de Abby também. Eu não posso te contar mais nada por enquanto.
Eu ignorei temporariamente o fato de que ele chamou a xerife pelo primeiro nome. Connor certamente estava tirando vantagem de suas admiradoras ultimamente. Eu disse a mim mesmo que isso não era ciúmes, mas o júri ainda estava deliberando sobre isso.
– Isso é bom de saber. Espero que lhes dê uma otima pista. – eu contei a ele sobre o que Alton e Nana D haviam me contado agora há pouco.
– Você vai contar para a Xerife Montague o que você descobriu? – ele perguntou.
– Eu pensei que poderia ter uma chance de conversar com ela aqui, mas ela foi embora enquanto eu conversava com Nana D. Eu posso passar no escritório dela no meu caminho para casa. – considerei minhas opções, e ainda assim me encontrei reticente de ser o cara que sempre entrega as notícias para ela. As duas informações haviam caído no meu colo. Eu não saí por aí procurando por pistas. Será que a responsabilidade de contar à Xerife Montague não eram do Alton e de Bridget? Afinal de contas, April me disse que eu era apenas um civil e que deveria ficar fora disso.
Depois de Connor seguir de volta para Braxton para terminar alguns dos interrogatórios das pessoas vistas nas fitas da CCTV, eu contei para Derek tudo o que havia ficado sabendo nos últimos dias. Quando terminei de falar, ele mencionou que iria contar os novos detalhes para os executivos da emissora na manhã seguinte, quando os encontrasse. Eles haviam solicitado uma reunião urgente sobre o Realidade Sombria, mas ele não tinha certeza sobre o que seria essa reunião. Ele pediu meus conselhos sobre como lidar com a reunião, pois não estava tendo uma sensação boa. Essa era a primeira vez que eu o ouvia ou via agindo nervosamente e pedindo minha opinião, diferentemente do normal que seria ele me informar o que eu tinha que fazer. Parte de mim queria dizer para ele não se preocupar, mas como contar o que eu havia ficado sabendo para a xerife, não era responsabilidade do Kel-baby, eu precisava deixar as coisas acontecerem sem a minha interferência no mundo de Derek. Parecia que eu havia encontrado uma maneira de me posiocionar com meu chefe e deixar que aquele cara sabe-tudo, com vinte e quatro anos de idade, aprendesse uma lição por si mesmo, isso era um passo na direção certa.
***
A quinta-feira pela manhã passou rapidamente, já que a maior parte do meu tempo foi passada convencendo a professora da primeira série de Emma, e alguns administradores, sobre o porquê de eu ter que tirá-la das aulas durante três semanas. Então, briguei com minha antiga sogra para defender minha posição sobre Emma precisar ficar comigo até que eu terminasse minhas responsabilidades como professor temporário. Assim que resolvi isso, nós coordenamos a compra das passagens para Cecilia e Emma chegarem a Braxton na segunda-feira pela tarde, quando eu tivesse terminado de dar minha última aula do dia. Eleanor iria encontrar Cecilia na casa dos nossos pais para assegurar que meu atraso não atrapalhasse o horário do motorista dela para chegar em Manhattan naquela noite, para o jantar dela com suas melhores amigas em um restaurante com estrelas Michelin. Oh, as vantagens de ser uma Castigliano e ver o mundo colocar quase tudo aos seus pés para lhe impressionar. Ou para assegurar que eles não apagassem a sua existência da face da terra.
Depois de uma corrida e um almoço simples, eu parti para Braxton para preparar as aulas do dia seguinte e para encontrar com os dois estudantes que iriam fazer a prova do dia anterior. A primeira estudante chegou e terminou o quiz em menos de vinte minutos. Quando Jordan chegou, eu aproveitei a oportunidade de conhecê-lo um pouco melhor antes que ele completasse o quiz.
– Se preparando para o jogo de sábado? – eu perguntei enquanto esperava que ele se sentasse.
– Yeah. Eu passei a maior parte da manhã trabalhando na minha bola curva com o Técnico Oliver. O olheiro também estava lá para nos observar durante alguns minutos. Eu não sabia que ele era o melhor amigo do Técnico Oliver.
Enquanto Jordan procurava em sua mochila por uma caneta, tentei não parecer chocado com o que ele havia acabado de me contar. Não era de se imaginar que o Técnico Oliver estivesse tão focado para fazer seu time se sair bem. Eu coloquei isso na lista de coisas para analisar mais tarde quando eu tivesse mais tempo.
– E como você está lidando com ter que ficar tão perto do local do acidente que aconteceu no Complexo Esportivo Grey na terça-feira? – eu perguntei, me lembrando de que Jordan era uma das pessoas listadas dentro do prédio quando Lorraine foi empurrada da janela do terceiro andar.
– Dois acidentes no mesmo mês. Isso é bem assustador, né? – ele afundou ainda mais na cadeira e destampou a caneta. – Eu não consigo acreditar que vi a Srta. Candito poucos minutos antes do que aconteceu.
– Sério, eu não sabia. Você deve ter sido uma das últimas pessoas a vê-la com vida. – eu fiquei surpreso por ele ter me dado essa informação livremente, mas ele deve ter sido interrogado pela xerife ou pela equipe de segurança do campus. – Você já conversou com o Diretor Hawkins?
– Yeah, ele me apertou a pouco tempo atrás. – Jordan respondeu.
Eu tirei a prova da minha pasta e me inclinei por sobre a mesa principal da sala. Não queria que ele começasse ainda, então continuei fazendo mais perguntas.
– Onde você viu a Srta. Candito?
– Eu queria conversar com o Striker sobre um problema nosso enquanto nos exercitavamos, mas o Técnico Oliver não estava no escritório dele. A Srta. Candito estava ao telefone falando com alguém. Eu me senti terrível. Queria ter feito algo para impedi-la de pular daquela janela. – parecia que ainda não havia sido dada a notícia que havia sido assassinato.
– A que horas foi isso? – será que ele teria visto o assassino? Ou será que era ele?
– Tinha que ser um pouco antes das cinco e quarenta e cinco. Eu estava apressado para ir ao meu grupo de estudo. Eu mencionei isso para o Diretor Hawkins, mas não conversei realmente com a Srta. Candito. Acho que ela nem mesmo me viu.
– E qual era o problema com o Striker? – Jordan deve ter visto Lorraine falando comigo ao telefone.
– Hmm, Striker estava fazendo exercícios enquanto eu estava na academia. Nós discutimos algumas coisas. Eu não queria causar mais nenhum problema. – Jordan disse franzindo a testa e gemendo alto.
Eu o fiz confirmar a que horas esteve lá. Jordan disse que apareceu por lá às quatro e quinze, e treinou até as cinco, quando Striker entrou. Depois da discussão, Striker foi embora. Jordan terminou seus exercícios, então foi para o vestiário às cinco e quinze para tomar banho e se trocar.
– Mas eu pensei que você tivesse mencionado ser amigo do Striker naquele outro dia durante a aula. O que aconteceu?
– Depois da aula outro dia, Carla disse ao Striker que ela não tinha mais certeza se queria namorar com ele. Ele ficou bravo e me confrontou sobre isso. Eu queria dar a ele espaço para respirar, acho. – Jordan disse.
– E por que ele iria confrontar você? – enquanto ele estava conversando, eu aproveitei a oportunidade para saber o máximo que pudesse sobre o que estava acontecendo entre os três.
– Eu acho que Carla, finalmente, contou a ele que alguma coisa aconteceu entre mim e ela na noite que a Professora Monroe caiu das escadas. Striker me acusou de dar em cima da garota dele, mas não foi assim que as coisas aconteceram. Honestamente. – Jordan se sentou reto e colocou as mãos na mesa. – Será que eu posso fazer o meu quiz agora?
Eu estava prestes a dar para Jordan a prova quando me lembrei de que Striker e Carla previamente me disseram terem passado a noite juntos bebendo nos dormitórios. Alguém estava mentido.
– Claro, em um minuto. Eu não quero ser enxerido, mas vi você e a Carla juntos algumas vezes. Não pareceu muito para mim que você fosse completamente inocente, Jordan.
– Nós fomos ao cinema naquela noite juntos como amigos. Carla disse que precisava de uma folga de todo o trabalho e o drama do Striker com o padrasto dele pirando sobre quem iria ser o primeiro a arremessar naquele jogo de abertura. Na metade do filme, ela começou a pegar minha mão, então perguntou se eu queria sair mais cedo. No caminho de volta, ela me beijou. Eu disse que queria sair novamente com ela, mas não até que ela terminasse com o Striker. Sei o que isso parece, mas ela veio pra cima de mim, Professor Ayrwick.
– A que horas vocês saíram do cinema? Vocês encontraram algum outro amigo ou outra pessoa? – eu precisava descobrir se ele tinha um álibi real para a noite do assassinato da Abby.
– Eu deixei a Carla no dormitório dela. Ela prometeu pensar sobre o que eu havia dito, então fui para casa. Eu acho que isso foi entre as oito e cinquenta e nove horas. Fiquei sozinho no meu quarto e peguei o final do jogo treino dos Phillies. Ah sim, e minha tia veio me visitar um pouco para conversar.
– E quanto à Carla? Você falou com ela novamente naquela noite? – se ele tivesse conversado com a tia, isso lhe daria um álibi. Eu também sabia sobre o jogo de treinamento dos Phillies, porque eu havia visto algumas partes importantes no dia seguinte. Ou ele estava falando a verdade, ou havia ensaiado seriamente sua explicação para o caso de alguém perguntar do seu paradeiro naquela noite.
– Striker havia ligado para ela quando estávamos voltando. Eu acho que ela foi encontrá-lo. Eu não falei com nenhum dos dois até a aula de segunda-feira. Você tem um monte de perguntas, Professor Ayrwick. Por que isso? – Jordan estava ficando irritado com a minha técnica de perguntas rápidas. A maneira perceptiva dele significava que o interrogatório precisava diminuir de velocidade.
– Oh, eu só estou preocupado que tudo isso esteja saindo de controle. Eu estive no seu lugar antes. É difícil quando você tem sentimentos pela garota do seu melhor amigo. Eu acho que essa foi a única vez que algo aconteceu entre vocês dois, certo? – eu me lembrei de Eleanor ter comentado que viu os dois se agarrando no estacionamento da Lanchonete Pick-Me-Up recentemente.
– Não, nós nos encontramos algumas vezes para conversar sobre a conexão entre nós dois. Nós nos beijamos e bem, você sabe como as coisas acontecem. – Jordan sacudiu os ombros e estendeu a mão para pegar o quiz.
Ele soava como um mini Técnico Oliver. Eu não poderia continuar incomodando-o sem alguma resposta. Deixei-o pegar o quiz e pensei sobre tudo o que ele havia revelado para mim. O álibi da Carla e do Striker não combinava com o que Jordan havia mencionado. Jordan tamém se colocou na lista de suspeitos ao dizer que estava possivelmente sozinho depois das oito e quinze, a não ser que sua tia pudesse provar parte de seu álibi. Connor tinha que ter os registros de segurança daquela noite de todos os estudantes entrando nos dormitórios, a não ser que lá também não tivessem câmeras. Jordan terminou o quiz e saiu apressado, sem perguntar sobre os resultados. Enquanto eu levava a prova dele de volta ao meu escritório, tive sorte de encontrar outra pessoa com quem eu precisava conversar.
– Boa tarde, Myriam. – eu disse, enquanto bloqueava o caminho dela até as escadas. – Estou feliz por termos nos encontrado assim. Você tem um minuto?
– Eu tenho uma aula para dar. O que posso fazer por você agora? – Myriam parecia ter-se esquecido que eu havia testemunhado seu encontro com o Técnico Oliver na casa funerária, mas era crucial para mim, trazer esse assunto de volta.
– Eu estou curioso sobre a sua decisão de pressionar a suspensão do Craig Magee do time de beisebol por causa das notas dele. Será que você pode me dizer o que aconteceu?
– E por que isso seria da sua conta, Sr. Ayrwick?
– O estudante está em uma das aulas que ministro. Se houver algum problema com o desempenho dele em provas passadas, acho que é importante que eu saiba sobre isso agora. Você não concorda?
Myriam assentiu e então retirou seus óculos.
– Depois que você expressou suas preocupações sobre o processo de notas desse departamento, eu olhei as cópias das provas antigas do Magee. Não apenas a letra era diferente, mas a estrutura da sentença e as escolhas de palavras também. Existe pouca chance de que tenha sido ele quem fez a última prova da Monroe, e eu pretendo descobrir o que aconteceu. Enquanto isso, até que nós saibamos a verdade, ele não deveria representar Braxton no time de beisebol, e nem sua provação acadêmica deveria ser retirada.
– Eu concordo com você, presumindo que algo estranho tenha acontecido com aquela última prova. – respondi. Eu suspeitava que essa seria uma das poucas coisas que eu e Myriam Castle iríamos concordar. – Será que você poderia me dizer quem está cuidando disso agora?
– Baseado em uma conversa com seu pai, Magee foi colocado em provação por uma semana enquanto a Reitora Terry, o Reitor Mulligan e eu investigamos as provas dos outros estudantes para ver se isso é um incidente isolado ou está acontecendo com vários alunos nas aulas da Monroe ou em outras aulas do departamento de comunicações. – Myriam parecia estar com bastante raiva sobre a situação enquanto se afastava.
– Eu vou ficar feliz em ajudar de qualquer maneira que puder. – eu comentei. No meu caminho até a estação do teleférico, eu encontei a Reitora Terry. – O que te traz ao Campus Sul? Não é sempre que te vejo por aqui.
– Estou indo me encontrar com seu pai, Kellan. Nós temos algumas coisas para trabalhar antes do anúncio do novo presidente na segunda-feira. Ele perguntou se eu poderia me juntar a ele nessa tarde para uma discussão com o Conselho de Curadores no escritório executivo. E ele é o atual presidente, certo? – ela disse isso com um sorriso curioso e um pouco nervoso.
– Eu suponho que grandes mudanças estejam a caminho. – eu disse.
A Reitora Terry sacudiu a cabeça e suspirou pesadamente.
– Nem me fale. Pelo menos nós podemos ficar orgulhosos sobre todos os impactos positivos que os jogadores de beisebol trouxeram para Braxton este ano. Nós deveríamos agradecer pela maré de sorte que abençoou o time e pela presença do olheiro em campo nesse ano. Os programas de esportes tem sido uma grande fonte de conforto e animação para a comunidade, apesar da preocupação dos estudantes sobre as duas mortes chocantes que nós tivemos recentemente.
A Reitora Terry pediu licensa e saiu para encontrar meu pai enquanto eu subia no teleférico para o Campus Norte. Eu nunca teria imaginado que ela fosse tão interessada no programa esportivo da faculdade. Quando eu era um estudante, a Reitora Terry estava focada nas sociedades de honra e nos estudantes do governo, ao invés de nos esportes e fraternidades de estudantes. Acho que uma década podia mudar uma pessoa.
Já que dessa vez eu havia me lembrado de trazer minhas roupas de academia, decidi dar uma passada por lá para me exercitar antes de voltar para casa. Quando cheguei, desviei meus olhos do segundo andar, já que isso me traria muitas lembranças de Lorraine deitada sem vida aos pés da estátua. Depois de alguns minutos esticando meus músculos, eu foquei em trabalhar minhas costas e pernas já que a cama na casa dos meus pais estava destruindo meu corpo. Uma hora depois, eu ouvi uma conversa entre duas estudantes que haviam acabado de entrar na academia e se sentaram lado a lado em um dos aparelhos de musculação.
– Minha chefe acabou de voltar do escritório executivo e mandou todo mundo para fora do escritório. Ela estava totalmente irritada.
– O que a Reitora Terry disse?
– Ela estava brava com a escolha do novo presidente.
– Yeah, dia estranho. Os policiais estavam por aqui hoje entrevistando os estudantes que estavam no Complexo Esportivo Grey na segunda. Eu lhe disse que algo estranho aconteceu com aquela professora e com a assistente do presidente que bateram as botas.
– Sério? Eu pensei que ambas haviam caído.
– Não seja tão idiota. Duas pessoas caindo e morrendo em datas tão perto uma da outra não pode ser uma coincidência. Até mesmo a sua chefe estava tentando encobrir isso quando pedi que ela falasse algo para o jornal da faculdade. Eu tive a distinta impressão de que ela estava escondendo algo. Depois que a pressionei um pouco, ela me avisou que às vezes as pessoas se machucam quando fazem perguntas demais.
Quando meu celular tocou, as duas garotas olharam na minha direção. Já que não queria que elas soubessem que eu estava escutando escondido, e nem queria atrapalhar os exercícios de ninguém, eu fui até o corredor para atender a ligação. Eu tinha pouco tempo restante para saber o que Emma achava de uma possível mudança permanente para a Costa Leste.
Capítulo 21
Emma havia acabado de voltar da escola e estava animada para visitar Braxton na próxima segunda-feira. Eu prometi a ela um passeio por algumas fazendas locais para ver alguns cavalos, ovelhas e cabras. Quando terminei de explicar sobre a potencial mudança de emprego que estava considerando, a pura animação de Emma foi contagiante. Ela astutamente admitiu que enquanto fosse sentir falta da Vovó Cecilia, ela quase nunca via meus pais. Emma então pensou que nós deveríamos voltar para morar na Pensilvânia durante seis anos, já que ela havia morado em Los Angeles durante seis anos.
– Isso é justo, papai, certo? Dividir meu tempo entre meus dois pares de avós? – Emma disse com a confiança de uma menina muito mais velha.
– Sim, querida. Eu acho que você está olhando as coisas da maneira certa. – quando desliguei, agradeci aos poderes superiores por me abençoarem com a filha mais maravilhosa do mundo. Agora que eu tinha a opinião dela, estava pronto para tomar minha decisão.
Enquanto eu tomava banho e me trocava antes de seguir de volta para a casa de meus pais, processei a conversa que havia escutado na academia. O que tinha feito a Reitora Terry ficar tão brava que ela chutou todos para fora do escritório e ameaçou uma estudante por fazer perguntas demais? Eu estava certo de que ela havia ido encontrar com meu pai achando que ela seria a nova presidente, mas devido à reação dela, isso não parecia mais lógico. Eu tentei ligar todos os pontos, mas era hora de ir me encontrar com Nana D.
Entre a nova receita de paella que ela estava testando e a deliciosa torta de creme de coco, eu fiquei quase em coma de tanta comida durante o resto da tarde.
– Nana D, talvez eu tenha que ficar por aqui hoje à noite. Eu não acho que consiga dirigir para casa do jeito que estou me sentindo. – mencionei enquanto esfregava meu estômago e me enrolava em um cobertor no sofá dela. Enquanto me enrolava, eu carinhosamente me lembrei das tardes aconchegantes de verão que passamos com ela e meu avô quando éramos crianças.
– Eu tenho lhe dito que já é hora de você voltar para casa e vir morar comigo. Não estou ficando nem um pouco mais jovem, e a sua filha precisa da minha orientação. – ela sorriu enquanto colocava uma xícara de chá na mesa perto de mim. – E essas quatro semanas como professor temporário que seu pai te colocou não vão ser suficientes, meu querido.
– Eu sei o que você quer dizer. Tem alguma coisa acontecendo em Braxton que pode ser um motivo para eu continuar aqui por mais tempo. O pai não quer que eu fale sobre isso. Eu respeito a necessidade dele de manter essa informação em segredo por um pouco mais. Mas é uma decisão difícil, Nana D.
– Você deve estar falando sobre esses planos para a expansão da faculdade, não é? Não pense que eu não ouvi falar disso. – Nana D respondeu enquanto afundava na sua poltrona reclinável à minha frente. – Não que seus pais tenham pensado em mencionar isso para mim. Eu tenho meus meios de me manter na jogada.
– Eu tenho que supor que você pegou pistas de algum lugar. Nem mesmo vou perguntar como dessa vez.
Nana D bebeu de sua xícara parecendo exorbitantemente satisfeita consigo mesma.
– Bom garoto. O que você acha que vai fazer sobre a nova universidade? A oferta é grande o suficiente para te convencer a ficar?
– Eu estou animado com a oportunidade de construir todo um programa estudantil que poderia colocar nossa cidade no mapa algum dia. Mas então, não estou muito animado de trabalhar para meu pai. Nós temos batalhado muito para nos darmos bem no passado. – eu estava considerando entre todas as minhas atividades, me manter focado na investigação de assassinato, mas no fim, cheguei aqui causando uma grande brecha na família.
– Coloque alguns limites para o homem. Fale a ele o que você vai fazer e o que não vai. Se ele não concordar em obedecê-los, então vai saber que isso não vai funcionar. Mas se ele disser que irá, você tem uma oportunidade que a maior parte das pessoas nunca vai ter. Eu imagino que isso poderia ajudar a lançar sua própria carreira e conseguir um daqueles shows de televisão também. – Nana D disse.
Eu tendia a concordar com Nana D sobre o novo papel ajudar a me colocar no holofote com os caras de Hollywood. Eu poderia usar essas conexões para encontrar suporte e fundos para meu próprio show de crimes reais. Talvez o foco do primeiro episódio fosse sobre o que estava acontecendo em Braxton durante esse semestre.
– Eu acho que deveria dormir e pensar sobre isso. Eu prometi ao pai que lhe daria uma resposta amanhã, já que segunda-feira é o grande anúncio do novo presidente da faculdade e dos planos de extensão.
– Nesse caso, me diga o que está acontecendo com a investigação. Já descobriu quem matou essas mulheres? Eu perguntei à xerife ontem, mas aquela mulher tem os lábios mais selados do que esse novo adesivo de dentadura que estou usando. – Nana D bateu seus dentes juntos, então provou que não conseguia removê-los facilmente.
Ela estava com tudo essa noite.
– A Xerife Montague não gosta de correr riscos. Eu posso entender isso, mas estou planejando encontrá-la amanhã. Connor mencionou que eles tem o resultado da análise do que encontraram sob as unhas de Lorraine e de Abby.
– Eu finalmente consegui a verdade vinda de alguém do Conselho de Curadores. Ela está confiante de que as doações anônimas vieram do próprio Marcus Stanton, é por isso que ele tem mantido tanto segredo. Se ele é quem está pressionando para fazer todos os melhoramentos no espaço atlético e no time, então provavelmente é a pessoa de quem o blogueiro está atrás. Não o seu pai, por mais que eu goste de ver alguém falando mal dele. – Nana D disse.
Nana D e eu conversamos por mais uma hora, apesar de não termos chegado a nenhuma conclusão específica. Quando não conseguimos encontrar nenhuma razão pela qual Marcus Stanton quisesse esconder sua doação, decidimos encerrar a noite. Nana D já tinha arrumado um dos quartos de visita, e eu desmaiei dentro de poucos minutos depois de cair no colchão. A oferta para que eu morasse no Rancho Danby com ela fazia toda a ideia de voltar para casa muito mais tolerável. Dar o mesmo tipo de experiência para Emma que eu tive quando criança era um pensamento reconfortante.
***
Depois de uma noite de sono pesado, eu fui para o escritório cedo na sexta-feira pela manhã para fazer o máximo possível. Assim que terminei de avaliar os quizzes, deixei-os com Siobhan que havia ido ao escritório para passar algumas horas. Ela planejava escaneá-los e dar entrada no sistema dos estudantes para mim, então devolvê-las na minha mesa, para que eu pudesse entregar para a turma na semana seguinte.
Apesar de eu ter tentando encontrar uma maneira de conversar com o Striker depois da aula, ele foi um dos primeiros estudantes a saírem pela porta. Eu fiquei preso respondendo perguntas de uma das estudantes mais faladoras, que queria me dizer que ela havia assistido Realidade Sombria na noite anterior e amou os meus episódios. Eu apreciei os elogios, mas entre meu desejo de encontrar Jordan e Carla e a necessidade de evitar os bajuladores, queria terminar essa conversa o mais rápido possível. Na hora do almoço, eu tinha uma nessessidade desesperadora por uma pausa e algo para comer. Eu tinha comido apenas um pequeno pedaço de bolo na Nana D e agora estava faminto.
Maggie estava em uma reunião de equipe novamente. Minha mãe estava atolada com a revisão dos perfis dos estudantes que eles finalmente escolheram para a admissão. Ela precisava verificar se todas as regras estaduais haviam sido cumpridas, então haveria um novo equilíbrio na diversidade da futura sala de aula. Com ninguém por perto, decidi visitar o Complexo Esportivo Grey para o caso do Técnico Oliver ainda não ter comido. Eu não estava ansioso pela ideia de me sentar para almoçar com ele, mas seria uma oportunidade para conseguir mais alguns fatos. Conforme comecei a entrar no corredor do terceiro andar, ouvi vozes altas no escritório do Técnico Oliver.
– Eu não fiz isso. Eu juro. Você tem que acreditar em mim. – o Técnico Oliver estava firmemente se defendendo de algo, mas eu não conseguia saber quem estava com ele.
– Se você não cooperar comigo, vou ficar muito feliz em fazer uma prisão formal de uma maneira mais pública. Estou te dando a chance de fazer a coisa certa e vir para a cidade de boa vontade comigo, mas se você insistir em ficar gritando, eu vou te prender aqui e agora. – a Xerife Montague respondeu. Ela estava calma e racional em sua abordagem apesar do comportamento do Técnico Oliver.
Eu virei o canto da parede e encontrei o Policial Flatman e Connor do lado de fora da porta. No escritório, o Técnico Oliver estava apontando seu dedo para a xerife e se recusando a sair, todos se viraram e olharam para mim quando cheguei.
– Bem o que nós precisavamos. Uma audiência com propensão a ser a Miss Marple. – a Xerife Montague disse.
– Eu prefiro pensar em mim mesmo como Hercule Poirot, se preciso ser comparado com um personagem literário de quase cem anos atrás, April. – quando ela franziu o cenho para mim, eu dei de ombros e me voltei para o Técnico Oliver. – O que está acontecendo aqui?
– Você tem que dizer a ela que eu sou inocente, Kellan. Eu não matei a Lorraine e a Abby. Estou sendo acusado injustamente.
Connor me puxou de lado enquanto o Policial Flatman e a xerife colocavam mais pressão no Técnico Oliver para que ele parasse de resistir. Ele explicou os resultados dos testes das fibras encontradas sob as unhas e de um segundo teste que fizeram no carro do Técnico Oliver. Eu não sabia que esse último estava sendo feito, mas então, eu suspeitava que a Xerife Montague não se sentia compelida a me dizer qualquer coisa sobre o caso. Depois que a xerife fez algumas descobertas no diário de Abby, e confirmou que a ligação de Abby para discutir uma reunião às oito e meia havia vindo do escritório do Técnico Oliver, mais o fato da ligação de Lorraine para mim acusando o Técnico Oliver de alguma coisa e do bilhete suspeito nas mãos de Lorraine quando ela foi morta, e que o Técnico Oliver admitiu estar saindo com as duas mulheres. Ele disse que quando Lorraine o confrontou, eles discutiram e ela foi embora. Quando os resultados das fibras vermelhas sob as unhas de Abby definitivamente combinavam com as jaquetas do time de beisebol, a Xerife Montague convenceu o Juiz Grey a emitir um mandado de busca para a casa e o carro do Técnico Oliver, por causa de sua relação com as duas mulheres e sua potencial presença em ambas as cenas de crime. Foi então que a xerife encontrou evidências fortes que não podia ignorar.
Algumas gotas de sangue no banco do passageiro no sedan azul do Técnico Oliver combivam com o DNA de Abby. Eu tinha suspeitado do Técnico Oliver desde o começo, e por mais que eu quizesse culpá-lo pelos crimes, não estava confiante de que tinhamos toda a história, especialmente com as notícias de que Marcus Stanton era o doador anônimo. O Técnico Oliver certamente era parte do esquema de mudança de notas, mas havia mais acontecendo do que qualquer um sabia nesse ponto. Eu tinha que encontrar uma maneira de provar isso.
– E quanto à Lorraine? Existe alguma evidência de que ele a empurrou da janela? – eu inquiri.
Connor sorriu, e então respirou fundo.
– Também havia fibras sob as unhas de Lorraine. Eu suspeito que ambas as mulheres tentaram impedi-lo e agarraram a jaqueta dele. Talvez tenha havido uma pequena briga no escritório de Abby onde ela agarrou a jaqueta do assassino, então correu em direção às escadas. No caso de Lorraine, ela provavelmente tentou pegar o assassino antes que ele a empurrasse pela janela. No processo, as fibras foram transferidas. A xerife também encontrou fragmentos de pele sob as unhas de Lorraine. Se forem do Técnico Oliver, a xerife vai prendê-lo esta noite.
– Mas essas jaquetas não podem ser compradas por qualquer pessoa na loja? – eu sabia que elas eram para o time de beisebol, mas não era como se elas fossem exclusivas ou dadas apenas a indivíduos selecionados. – Eu pensei que isso poderia ser o presente que Lorraine estava procurando.
– Esse não era o presente, Kellan, mas era o terceiro item supostamente desaparecido do Hall Diamante. O Técnico Oliver disse que entregou uma nova jaqueta para Lorraine no dia da festa, depois que ele recebeu a entrega, mas ela nunca a viu. Essas eram as novas jaquetas feitas apenas para a nova temporada de beisebol. Pouquíssimas foram dadas ou vendidas. – Connor explicou. – Apenas o Técnico Oliver tinha a posse delas, exceto pelos jogadores e líderes de torcida. A Xerife está checando com todos que receberam a jaqueta para ver se tem algum rasgo ou dano nelas.
– Então o que acontece agora? – enquanto eu fazia a pergunta, a Xerife Montague levou o Técnico Oliver com algemas para fora da sala.
– Estou levando-o em custódia, para então convencermos ele a nos contar tudo. Quando eu souber de algo mais, vou lhe contar, Pequeno Ayrwick. Por enquanto, eu apreciaria que você não contasse a ninguém sobre isso. Eu confio que você possa seguir essas instruções. – a xerife disse com um olhar feroz que me deu arrepios.
– Sim, eu entendo. – eu respondi para a xerife, então me voltei para Connor e contei os detalhes da conversa que Bridget havia ouvido do olheiro.
– Isso certamente dá mais motivos para o porquê de ser tão importante para o time de beisebol se sair bem esse ano. Se o Técnico Oliver estava possivelmente tentando conseguir um emprego na organização da Grande Liga de Beisebol, ele precisava se mostrar bem para seu melhor amigo, o olheiro, enquanto ele estivesse por lá. O Técnico Oliver estava tentando, provavelmente, fazer qualquer coisa que pudesse para manter Striker no time e também trabalhando com Jordan para ser substituto. – Connor entrou no escritório e conferiu o progresso do Policial Flatman, e disse: – Eu vou precisar de uma lista de tudo o que você encontrar e retirar do escritório. Essa pode ser uma investigação de assassinato, mas ainda é propriedade da faculdade. Pode haver informação confidencial por aqui.
O Policial Flatman aceitou o pedido de Connor.
– Nós podemos começar com esse bilhete que eu encontrei debaixo da mesa dele.
Eu coloquei minha cabeça para dentro do escritório para ver sobre o que eles estavam conversando.
– Um bilhete?
– Sim, o Técnico Oliver o estava segurando quando entrei, mas quando a xerife colocou as algemas nele, o bilhete caiu no chão. Ele o chutou para debaixo da mesa tentando escondê-lo.
Quando Connor pediu para ver o bilhete, o Policial Flatman entregou para ele. Ele leu em voz alta:
Você é um jogador de beisebol maravilhoso que merece ser o arremessador do começo da partida nesse sábado. Espero que eu possa fazer isso acontecer para você. Estou com você até o final e não vou te decepcionar novamente. Acredito em você e vou fazer qualquer coisa para te ajudar a ficar na liderança.
Connor e eu nos voltamos um para o outro. Eu estava certo de que ele teve o mesmo pensamento que eu.
– A letra é idêntica, não é? – eu perguntei.
Connor pegou a imagem que ele havia me mostrado no celular no começo da semana. Nós comparamos os dois bilhetes e sorrimos.
– Exatamente a mesma.
– Mas o que isso significa? – não fazia sentido o Técnico Oliver estar com esse bilhete. Seria muito estúpido por parte dele escrever uma mensagem para um estudante de maneira tão aberta, o que significava que provavelmente ele não era o autor. Isso também poderia ser sobre Striker ou Jordan. Talvez a pessoa que escreveu o bilhete estivesse tentando encontrar uma maneira de consertar as notas do Striker para fazer com que ele tivesse permissão para jogar novamente, ou para ajudar Jordan ao forçar o Striker para fora do time permanentemente por causa de trapaça.
Connor instruiu o Policial Flatman a entregar o bilhete para a xerife o mais rápido possível. Ele se virou para mim e falou:
– Além do Striker, quem mais ficaria bravo se ele não jogar?
– Meu primeiro palpite seria o Marcus Stanton, mas ele estava presente na festa de aposentadoria ou na reunião do Conselho quando Abby foi morta. Nana D confirmou que ele estava em uma reunião quando Lorraine foi empurrada pela janela. Carla Grey tem algumas explicações para fazer a respeito de sua confusão sobre quem apoiar entre o Striker e o Jordan. – eu respondi. Era hora de chegar ao fim do jogo que ela estava fazendo.
– Enquanto nós esperamos pela equipe da xerife catalogar qualquer evidência adicional, você tem uma amostra da letra da Carla? – Connor perguntou.
– Eu posso ter. – hesitei enquanto tentava me lembrar do que estava em minha possessão. Depois de me lembrar de que eu havia deixado todos os meus materiais de aula no Hall Diamante, disse a Connor que iria olhar no meu escritório. Concordamos em nos encontrarmos mais tarde para montarmos um plano de jogo.
Eu fui andando meu caminho de volta para o Hall Diamante, onde, após chegar, vasculhei por todos os papéis na minha mesa, mas não consegui encontrar o quiz recente. Então, eu me lembrei de que os havia deixado com Siobhan para escanear, colocar as notas no sistema, e me devolver antes das aulas na segunda-feira seguinte. Eu pensei que isso era estranho e rapidamente olhei meus emails para ver se ela havia me mandado uma mensagem. E ela havia. Siobhan havia levado os quizzes com ela para casa, para então terminar durante o final de semana enquanto os bebês dormiam. Já que eu não tinha o número de telefone dela, respondi ao email de Siobhan pedindo que ela fizesse o upload do teste da Carla o mais rápido possível, e para me enviar uma cópia. Também deixei uma mensagem urgente para Myriam para ver se ela podia me mandar o número da Siobhan.
Duas horas depois, eu havia completado todas as minhas aulas, mas ainda não tinha nenhuma notícia da Siobhan ou Myriam. Antes de ir embora, mandei uma mensagem para Connor sobre o meu status atual. Ele estava saindo de Braxton para a noite depois que a equipe da xerife havia terminado a busca no Complexo Esportivo Grey. A xerife mencionou que não iria prender o Técnico Oliver até que pudessem rever todas as evidências durante o final de semana. O Técnico Oliver estaria livre para deixar a delegacia mais tarde naquela noite.
Quando eu cheguei em casa, me ofereci para cozinhar o jantar, já que minha mãe estava atrasada por ter visitado Eleanor. Enquanto ela se trocava, eu fiz pão de alho e montei um prato de massa com abobrinhas, tomates, pimentões e um molho branco cremeso. Já estava ficando tarde e eu não queria ir dormir de estômago muito cheio. Seria importante conseguir descansar o suficiente, em preparação para o jogo de amanhã e a descoberta do assassino.
Eu mencionei minhas preocupações ao meu pai sobre o que eu havia escutado na academia e com relação ao medo dos estudantes com as mortes recentes. Ele ficou surpreendentemente grato e compreensivo ao mesmo tempo. Depois de me lembrar de que eu não havia ouvido mais nada sobre o blogueiro misterioso, eu disse:
– Eu não vi mais nenhuma postagem nova sobre você. Será que a Dra. Castle está se comportando?
– Como eu mencionei anteriormente, o blogueiro não é a Myriam. De fato, toda essa situação já foi resolvida. – meu pai pegou mais um pedaço de pão de alho e provou o vinho que eu havia servido para o jantar. – Não vão mais haver postagens em blogs sobre mim.
– Será que você pode me dizer quem era? – eu inquiri. Se não era Myriam, eu não tinha outros suspeitos em mente, a não ser que esse tenha sido o motivo para ele ter chamado a Reitora Terry ao escritório dele. Será que ela estava mentindo para mim ao dizer que apoiava o programa esportivo? Ou jogando confusão em lugares diferentes?
– Ainda não. Depois de segunda-feira eu posso lhe contar. A Xerife Montague está convencida de que isso tem relação com as duas mortes e me pediu para não discutir isso com mais ninguém.
– Isso está ficando muito assustador. – minha mãe falou. – Estou começando a me perguntar se Nana D não estava certa quando falou que esse crime está demorando tempo demais para ser solucionado.
– Sua mãe é uma fofoqueira, Violet. Ela não está feliz a não ser que tenha algo ou alguém de quem reclamar. Isso é só mais material para ela se aproveitar. – meu pai respondeu.
– A Nana D está certa, pai. Amanhã já vai fazer duas semanas, e a xerife não fez muito progresso. Hoje ela levou o Técnico Oliver para prestar algumas declarações, mas eu tenho dito a ela, desde o começo, para investigar mais a fundo os álibis dele para ambas as noites.
– Kellan está certo, Wesley. Ele está mais no topo disso do que a Xerife Montague. – minha mãe disse.
– Vamos concordar em deixar isso quieto por enquanto. Assassinato não é um assunto para a hora do jantar. – meu pai falou, empurrando seu prato e mudando de assunto. – Finalmente posso me mudar para meu escritório regular amanhã depois do jogo de beisebol. Os carregadores vão colocar a minha mesa e meus pertences de volta no prédio executivo. As coisas vão finalmente voltar ao normal.
– Eu tenho certeza de que se mudar de um lado para o outro foi difícil pai. – tudo era sempre sobre as inconveniências dele.
– E por falar de mudança, acredito que você me deve uma resposta.
– Eu acredito que você esteja correto. E você me deu até o fim do dia de hoje, certo?
Ele assentiu.
– Ainda tenho algumas horas restantes.
Meu pai se levantou, ergueu seu dedo como se quizesse me dar um sermão, mas pensou melhor e saiu da sala murmurando consigo mesmo.
– Você realmente acha que é assim que vai resolver os seus problemas, Kellan? – minha mãe perguntou, enquanto limpava os restos de comida dos pratos para levá-los até a cozinha. – Eu não vejo como vocês dois vão trabalhar juntos se são tão similares e gostam de aborrecer um ao outro o tempo todo.
Similares? Do que ela estava falando? Eu não era de maneira alguma igual ao meu pai. Ou será que era? Depois que me retirei para meu quarto, me senti como uma criança que havia levado bronca de sua mãe por ter feito algo ruim. Mas eu não tinha feito nada de errado. Foi-me dado até o final do dia. Agora era apenas a hora do jantar. Eu sabia que precisava tomar minha decisão. Quando já era quase meia-noite, e eu ainda não tinha chegado a nenhuma conclusão, aceitei que ela estava provavelmente certa.
Capítulo 22
Eu continuei a me enrolar com a minha decisão de aceitar ou não o novo papel, apesar de ter grudado um bilhete na porta do escritório do meu pai precisamente um minuto antes da meia-noite. Passei a maior parte da noite ouvindo o vento passando pelos galhos das árvores enquanto ficava deitado acordado e olhando para o teto. Depois de um rápido café-da-manhã, eu verifiquei que minha decisão não estava mais colada na porta, o que significava que ele havia lido o meu pronunciamento. Alguns podem dizer que eu deveria ter contado a ele pessoalmente, mas ele estava dormindo quando cheguei à minha conclusão, e eu não queria realmente conversar mais sobre isso na noite passada. Empacotei minha bolsa de ginástica e dirigi para o Complexo Esportivo Grey.
Após minha chegada, fui até o escritório do Técnico Oliver para ver se ele havia retornado da delegacia ou estava se preparando para o jogo daquela tarde. Fiquei surpreso em encontrá-lo descansando a cabeça sobre a mesa. O Técnico Oliver grunhiu para mim:
– Você foi de alguma ajuda ontem. Eu acabei meu cochilo há poucos minutos atrás. Agora tenho que descobrir como motivar o time quando me sinto como se tivesse sido atropelado por um caminhão – as olheiras embaixo dos olhos dele me provaram que ele passou a noite toda acordado.
– Talvez seja hora de você se abrir comigo, Técnico Oliver. Tem algo que você está escondendo. Por que não revelar tudo? Talvez você se sinta melhor – eu tinha que seguir meus instintos. A xerife não o teria liberado se ela achasse que o Técnico Oliver fosse o assassino. Eu estava provavelmente seguro sozinho com ele no escritório. – Vamos começar sobre o porquê eles não te prenderam?
– Meu advogado me aconselhou a não discutir isso com ninguém. – ele encolheu os ombros e tensionou o queixo, então relaxou. – Está bem, eu acho que posso contar se você prometer que vai me ajudar. – o Técnico Oliver esperou que eu concordasse, o que eu fiz sabendo que eu poderia dar para trás se tivesse algo ilegal acontecendo. – Meu DNA não combinava com o que eles encontraram sob as unhas de Lorraine. O sangue que encontraram no meu carro combianava com o da Abby, mas a vizinha enxerida dela foi capaz de confirmar que ela havia visto a Abby se cortar ao entrar no meu carro um dia enquanto eu ainda estava dentro da casa dela em uma ligação. Não havia mais nada para me segurar lá.
– Eu acho que isso é bom para o seu caso, mas você ainda não tem álibis válidos para ambos os assassinatos, não é? Eu não acredito que você estava indo entregar a programação de jogos para o meu pai na noite em que Abby morreu. Você estava no Hall Diamante para se encontrar com ela, não estava?
– Está bem, sim. Ela concordou em se encontrar comigo às oito e meia para discutir as notas do Striker. – o Técnico Oliver explicou que ele estava prestes a entrar no prédio quando Lorraine o chamou. Quando Lorraine o levou até um banco próximo, ele entregou para ela a programação e eles conversaram por cerca de dez minutos. Assim que ela voltou para o prédio, o Técnico Oliver saiu e tentou ligar para Abby, mas ela nunca atendeu o celular. Ele foi para a festa de aposentadoria achando que Abby ligaria de volta em algum ponto, então encontrou Eleanor às nove horas quando a festa estava terminando. Minha mãe havia visto ele depois que Lorraine havia ido embora. – Aquela xerife não tem ideia do que está acontecendo e quer encerrar o caso, então ela não vai ficar parecendo tão tola. – o Técnico Oliver comentou.
Eu concordava com ele, mas falar sobre a inteligência da Xerife Montague não iria me ajudar.
– Eu tenho certeza de que eles estão investigando outros suspeitos além de você. E quanto àquele bilhete embaixo da sua mesa?
A cabeça do Técnico Oliver foi para trás em alarme. Eu o havia pegado fora de guarda e ele ficou temporariamente sem fala.
– Ah, eu não tenho certeza exatamente. Não vou tentar negar. Eu sei que aquele policial me viu tentando escondê-lo.
– É ilegal tentar esconder evidência. Eu tenho certeza de que você está ciente de que podem te condenar por algo assim. – eu comentei, esperando que eu o deixasse assustado e ele falasse mais. – Você deve ter contado a ela algo sobre o bilhete, se o Policial Flatman o viu.
O Técnico Oliver explicou em como tem encontrado esses bilhetes, desde que o semestre começou e vindo de alguém que dizia que o Striker deveria ser o arremessador desde o início. A pessoa havia previamente deixado um para o Striker, indicando que eles haviam feito algo para se assegurar que as notas dele fossem boas o suficiente para tirá-lo da suspensão. O Técnico Oliver havia roubado os bilhetes, já que ele não queria que Striker ficasse preocupado ou tivesse problemas. Ele esperava que fosse só alguém fazendo uma brincadeira. Ele ficou alarmado quando encontrou um segundo bilhete e as notas do Striker não combinavam com o que Abby havia lhe dito anteriormente sobre um “F”. Ele sabia que elas haviam sido mudadas, mas não como e nem por quem.
– Eu não entendo. Por que é tão importante que o Striker seja o lançador? – eu perguntei enquanto sacudia minha cabeça. Eu decidi testar uma teoria que eu estava considerando desde que a Nana D me contou sobre aquela conversa que Bridget havia escutado. – Isso tem alguma relação sobre o rumor do olheiro estar ajudando alguém de Braxton a conseguir um emprego na Grande Liga de Beisebol? E que você por acaso é o melhor amigo do olheiro?
O Técnico Oliver ficou branco como um fantasma.
– Como você sabe sobre isso?
Na mira, eu pensei comigo mesmo.
– Você estava esperando que ao se assegurar que o Striker jogasse você teria uma melhor chance de conseguir aquele emprego na organização da Grande Liga de Beisebol? Essa é uma posição executiva? Com acesso a todos os times da grande liga?
– Não, você entendeu tudo errado. – o Técnico Oliver gritou enquanto caminhava de um lado para o outro na sala. – Desde o começo, eu queria que tanto Striker quanto Jordan jogassem. Eu me importo com os caras e quero que eles consigam um contrato com os times da Grande Liga de Beisebol depois que se formarem em Braxton. É por isso que eu dei treinos particulares para ambos no semestre passado e encorajei a competição entre eles. Eu queria que meu amigo visse como os dois jogam bem e que os colocasse dentro da liga.
– Então você está dizendo que o emprego na liga não é para você? Que é inteiramente para os jogadores?
– Isso, eu não quero sair de Braxton. Amo trabalhar aqui, mas estava sendo chantageado.
– Eu não entendo o que você está dizendo. – eu respondi, pressionando-o para que contasse toda a história.
– No último outono, Marcus Stanton se aproximou de mim dizendo que ele sabia que eu precisava de melhoramentos no departamento esportivo. Ele ofereceu comprar novos equipamentos para a academia, trocar a grama do campo de beisebol, e fornecer fundos para qualquer tecnologia que eu precisasse.
– E isso não é uma coisa boa? – eu perguntei, de repente colocando as peças juntas. Era o Marcus Stanton ameaçando meu pai naquela ligação que eu havia escutado. Ele não queria que ninguém soubesse que ele havia feito a doação anônima, mas não conseguia saber o porquê. Isso poderia parecer um pouco egoísta se ele doasse dinheiro que iria ajudar o seu enteado, mas não era o suficiente para tanto segredo.
O Técnico Oliver me explicou como Marcus iria fazer uma doação anônima indicando que a maior parte precisaria ser alocada em qualquer coisa que o Técnico Oliver dissesse que era prioridade para o Complexo Esportivo Grey. Marcus tinha apenas uma condição. Ele queria que seu enteado fosse a única estrela, o Técnico Oliver teria que convencer seu melhor amigo, o olheiro da Grande Liga de Beisebol, a recomendar o Striker para se juntar a um time depois da graduação. Quando o Técnico Oliver disse que não poderia fazer isso, Marcus Stanton revelou que sabia da relação secreta dele com Lorraine Candito. Ele planejava expor o Técnico Oliver se ele não concordasse com o acordo. Chantagem era um motivo muito melhor para manter a anonimidade de sua doação, então pareciam duas transações muito diferentes.
– Eu me importava tanto com a Lorraine e não queria que ela se machucasse, além disso, eu não queria entrar em problemas novamente. Eles iriam me demitir, eu ficaria sem emprego e nenhuma chance de ser contratado novamente. Essa política estúpida foi colocada em funcionamento por minha causa, e eu não deveria estar saindo com ninguém da faculdade. Finalmente concordei em encontrar uma maneira de fazer meu amigo recomendar Striker para um time da grande liga.
O Técnico Oliver explicou que quando Striker reprovou no semestre passado, Marcus exigiu que ele encontrasse uma maneira de consertar as notas dele. O Técnico Oliver tentou convencer Abby a não reprová-lo, mas isso não funcionou. Ele tentou, mais tarde, sair para beber e jantar com ela, o que começou a fazê-la mudar de ideia. Ela considerou pegar mais leve no Striker usando um método de avaliação diferente para ajudá-lo a passar, mas quando Abby descobriu sobre Lorraine e o Técnico Oliver, percebeu que ele a estava usando. Quando ela ameaçou denúncia-lo para o Conselho de Curadores e para o meu pai, ele revelou o esquema de chantagem do Vereador Stanton. O Técnico Oliver queria encontrar Abby na noite que ela morreu para encontrar uma maneira de aprovar o Striker e impedir que ela expusesse toda a situação.
Eu reconheci as similaridades entre a explicação do Técnico Oliver e a conversa que Alton teve com Abby antes que ela morresse. Ela havia descoberto tudo isso por acaso e pensou que poderia escrever uma matéria expondo a situação dos esportes e da política nessa cidade pequena.
– Eu ainda não tenho certeza do por que ele estava tão preocupado com as doações serem no nome dele. Ele também tem álibi para ambos os assassinatos, a não ser que ele tenha contratado outra pessoa.
– Marcus não queria inteferir com o Juiz Grey, que havia sido o doador primário que financiou o espaço atlético no passado, e é por isso que o local tem o nome da família dele. Stanton também vai se candidatar a prefeito na próxima eleição. Ele queria que tudo parecesse completamente limpo. Ele não é um assassino. Se as pessoas pensassem que ele estava pagando propina para mim ou para o olheiro a fim de colocar o enteado em um time da Grande Liga de Beisebol, as pessoas nunca votariam nele. – o Técnico Oliver falou.
– Elas provavelmente vão tirá-lo do cargo de vereador também. Isso é absolutamente tudo o que você sabe? Você já mentiu várias vezes antes. – eu disse com uma cara fechada. Por mais escorregadio que ele tivesse sido antes, eu acreditava nele dessa vez.
– Sim, Marcus não pode mais me machucar agora que Abby e Lorraine se foram. Eu não tenho nada a perder. Ele não revelaria nada que o pudesse prejudicar também. – o Técnico Oliver respondeu enquanto me levava até a porta. – Eu preciso me preparar. Meu amigo está vindo assistir o Jordan jogar, já que Myriam não liberou o Striker da provação. Pelo menos eu posso dar a um dos jogadores a chance. Talvez com Jordan finalmente conseguindo essa oportunidade, a Reitora Terry não vá me dar mais nenhum daqueles olhares maldosos e interferir no jogo de hoje.
Eu parei no meio do corredor.
– Espere, o que você disse?
– A Reitora Terry tem participado de todos os jogos desde o ano passado. Ela sempre parece chateada com as minhas interações com o Jordan. – o Técnico Oliver respondeu. – É como se ela quisesse que eu mostrasse favoritismo por ela ser tia dele. Eu estou tão cansado desses jogos que a mulheres fazem. – quando ele finalmente fechou a porta, eu me encontrei sozinho no corredor e mais atordoado do que quando havia chegado.
Se o sobrinho da Reitora Terry tivesse uma chance de ser o lançador inicial do jogo e fosse percebido pelo olheiro, quanto será que ela manipularia por trás das cenas para se assegurar de que ninguém tirasse essa oportunidade dele? Será que a Reitora Terry estava tentando fazer o Striker parecer culpado por colar nas provas ou mudar suas notas, para que então ele fosse suspenso? Eu saí do Complexo Esportivo Grey e caminhei até o escritório da SCB procurando pelo Connor. Eu queria que ele estivesse comigo quando eu ligasse para a Xerife Montague, mas ele não estava por ali. Um estagiário mandou um rádio para Connor, que indicou que ele estaria fazendo sua rotina de checagem no lado oeste das arquibancadas às onze e meia.
Eu fui até a cafeteria comprar um copo de café e entrei no sistema de estudantes para conseguir a informação de contato da Carla e do Striker. Eu precisava me encontrar com os dois antes que o jogo começasse, para saber o máximo possível sobre as atividades verdadeiras deles na noite da morte de Abby. Striker atendeu minha ligação e me disse que estava saindo do dormitório e indo para o campo para se encontrar com o Técnico Oliver. Apesar dele não estar autorizado a jogar, Striker tinha que apoiar seus companheiros de time e aquecer o banco de reservas para o caso de algo mudar sobre sua provação. Eu pedi que ele me encontrasse às onze e quinze, antes que seu treino começasse. Quando ele concordou e desligou, eu tentei encontrar Carla, mas ela não atendeu ao telefone do dormitório. Eu teria que tentar novamente depois de me encontrar com Connor e Striker no campo.
Dei uma olhada nos meus emails, mas não havia nada da Myriam ou Siobhan, o que significava que eu ainda não podia comparar a letra da Carla contra o bilhete que encontramos no escritório do Técnico Oliver. Eu saí da cafeteria e comecei minha caminhada pelo Campus Norte até o campo de beisebol. Peguei o caminho mais longo, já que tinha vários minutos antes de me encontrar com Striker. Alguns passos depois de ter passado pelos últimos prédios acadêmicos, eu ouvi meu nome sendo chamado. Virei-me e vi que a Reitora Terry estava correndo na minha direção. Eu olhei ao redor e percebi que estava no lado mais longe do campus, bem longe de qualquer outro prédio. Era uma caminhada de meio quilômetro até chegar ao estacionamento dos campos esportivos. O que siginificava que iria ficar junto com a Reitora Terry por tempo demais. Apesar de eu poder me defender, duas mulheres já haviam sido mortas. Eu estava potencialmente me colocando perto demais do assassino.
– Reitora Terry, o que te traz por esse caminho? É um pouco fora de mão para ir ao Campo Grey. – eu disse, mantendo distância. Tudo o que eu havia ficado sabendo poderia ser uma coincidência, eu me lembrei.
– Oh, eu estava me preparando para ir ao jogo. Esse vai ser importante. – ela disse. A Reitora Terry estava um pouco sem ar pela corrida até me alcançar. A testa dela estava franzida. Ela mordeu o lábio inferior. – Então eu vi você passando por aqui, e bem, tinha que segui-lo.
– Sim, grande jogo. Eu nunca teria pensado que você era fã de esportes. Quando eu era estudante aqui, esse não parecia ser um dos seus focos principais. – eu pensei em enrolar pelo tópico para ver o que ela me falava antes de eu fazer qualquer pergunta mais direta.
– Eu sei, eu também não achava. – ela disse, então a mão dela pegou meu cotovelo. – Eu acho que precisamos conversar. Você tem alguns minutos para voltar ao meu escritório?
– Hmm, acho que não. Eu vou me encontrar com algumas pessoas no Campo Grey. Não quero que elas esperem desnecessariamente por mim. – eu tentei me afastar, mas o aperto dela era bem forte.
A Reitora Terry respirou profundamente.
– Eu sei que você está ciente, Kellan. Preciso de alguns minutos do seu tempo.
O que ela estava prestes a confessar? Ou seria uma maneira de também me manter em silêncio?
– Eu não tenho certeza do que você está falando. Talvez nós pudessemos conversar no campo depois que eu terminar o que tenho para fazer? O Diretor Hawkins está me esperando a qualquer minuto. – eu pensei que ao mencionar o nome dele era ficaria mais recuada, como se tivesse tentando alguma coisa. Eu não gostei do olhar distante e aborrecido que ela estava me dando.
– Nós podemos conversar mais tarde, mas não é preciso ficar andando na ponta dos pés sobre esse assunto, Kellan. O Conselho de Curadores não me escolheu como sucessora do seu pai. Seu pai havia me indicado, e eu não podia contar a ninguém até o anúncio oficial na segunda-feira, a não ser para o Conselho e para você. Eu acho que isso quer dizer que você está ciente dos planos de extensão também. Eles me disseram que eu deveria me sentir honrada ao me ser oferecido um papel maior na nova Univesidade Braxton. Acho que é um prêmio de consolação, não é mesmo?
Foi então que percebi que a Reitora Terry não havia me parado para conversar sobre o papel dela no esquema de mudança de notas ou sobre os assassinatos.
– Ohh, eu não sabia que eles deram a presidência para o outro candidato. Eu pensei que eles fossem te escolher. – eu não tinha certeza exatamente do que estava acontecendo, ainda assim pensei que era melhor eu ficar do lado bom dela. – Eu sinto muito. Você sabe quem eles escolheram?
– Não sei. Eles não quiseram me contar. Obrigada por entender. Eu fiquei aborrecida no outro dia, quando descobri que não era a primeira escolha. Quando te encontrei, realmente pensei que eles fossem me oferecer o emprego. Eu fui uma verdadeira bruxa quando cheguei ao meu escritório depois daquilo. Tenho que me lembrar de me desculpar na próxima semana, com todos que me viram de cabeça quente.
A conversa das estudantes que eu havia escutado fazia sentido agora. Eu sentia que podia fazer algumas perguntas sobre o Jordan sem causar muita suspeita.
– Eu fiquei sabendo que seu sobrinho vai ser o arremessador de hoje. Você deve estar animada?
A Reitora Terry assentiu.
– Sim, estou muito orgulhosa de como ele está se saindo. Eu me sinto mal pelo Striker ainda estar de provação. Eu até mesmo tentei convercer a Myriam, hoje mais cedo, de que não existem provas de que o Striker esteja envolvido na mudança de notas. Enquanto nós temos suspeitas de que a prova não foi respondida por ele, Braxton não tem evidência suficiente para expulsá-lo. Mas ela não cedeu. Aquela mulher é bem difícil.
– Você está me dizendo que não queria colocar o Striker em provação acadêmica? Eu havia pensado que você concordava com a Myriam. – eu fiquei satisfeito que ela havia admitido abertamente que Jordan era seu sobrinho, mas o apoio dela ao Striker me deixava confuso.
– Não, eu pedi urgência para completarmos a investigação e com uma análise meticulosa, mas isso já está demorando tempo demais. – ela respondeu. – Sem Striker no time, o Técnico Oliver é muito mais exigente com Jordan do que o normal. Eu prefiro quando ele divide o foco entre os dois. Eu sei que o técnico está tentando deixá-los mais fortes, mas ele é um monstro quando grita com eles e os manda trabalhar mais duro.
– É por isso que você tem lançado olhares maldosos para o Técnico Oliver?
A Reitora Terry explicou que ela nunca havia pensado que o Jordan tivesse alguma chance de entrar na grande liga quando ele estava na escola. Ele era uma criança difícil e com pouca disciplina. Nos últimos anos, ela finalmente o viu provar o quão bom arremessador que ele era. Foi então que ela começou a se interessar mais pela carreira dele no beisebol, assim como mudou de opinião sobre os esportes em geral em Braxton. O Técnico Oliver não gostava que ela se envolvesse no campo dele e interpretou erroneamente as intenções dela para ficar mais por dentro das operações do departamento.
– Uau, eu queria ter sabido disso antes. Nunca percebi que você era tia dele. A propósito, você visitou o Jordan na noite da festa do meu pai? Jordan mencionou que você passou por lá. – eu disse hesitantemente.
– Sim, eu havia esquecido que tinha saído da festa para dar um pouco de encorajamento nele. Ele havia chegado ao dormitório pouco tempo antes que eu apareci por lá às nove horas. Ele tinha ido a um encontro e havia deixado a garota no dormitório dela. – ela respondeu. Se isso era verdade, então Carla e a Reitora Terry confirmavam o álibi dele. A Reitora Terry pode ter tido tempo de sair da festa, matar Abby, então ter ido visitar o Jordan, mas isso não parecia provável.
– E como está sendo as aulas de autodefesa? Eu queria participar qualquer dia desses. – eu disse. Ela provavelmente não entenderia por que eu estava perguntando, mas isso poderia acabar com o problema de álibi dela.
– Nunca cheguei a ir. Seu pai me fez uma ligação urgente e eu acabei aparecendo atrasada por lá. Havia uma placa na porta dizendo que não eram aceitos atrasos, então eu voltei ao meu escritório. – ela disse. Sabendo que isso limpava a confusão e provavelmente siginificava que a Reitora Terry não era uma assassina, eu desejei sucesso a ela com a expansão de Braxton. Mudei de assunto dizendo que eu não sabia sobre os planos para a nova universidade, já que ela não precisava saber que eu estava me juntando ao projeto. Enquanto as explicações dela deixaram pouca dúvida sobre sua culpa, a possibilidade dela ser a assassina não fazia sentido. Eu estava deixando passar alguma coisa, mas não sabia o que poderia ser. Saí em direção ao campo de beisebol deixando um longo suspiro escapar por eu não ter sido a terceira vítima. Então meu celular tocou, era a Myriam.
– Eu não estou acostumada a ser convocada em um sábado com outro problema crucial da faculdade, Sr. Ayrwick. Pensei que com o seu pai tendo identificado o blogueiro nessa manhã, você estaria ocupado tentando descobrir o porquê daquilo. Certamente, você deve ter um bom motivo para me perturbar?
Myriam sabia quem era o blogueiro.
– Meu pai não mencionou ainda nenhum nome. Vou perguntar para ele assim que possível.
– Era a Abby. Aparentemente, ela o estava pressionando para dar explicações sobre as doações, mas ele não havia colocado as peças juntas até que você começou a perguntar sobre quem havia decidido instalar toda a nova tecnologia no Complexo Esportivo Grey. Ela era uma tola clássica digna dos bobos da corte de Shakespeare.
– E como Abby postou aquele último artigo depois que ela morreu? – isso não fazia sentido.
– Essa foi a última coisa que ela fez. Ela estava escrevendo para o blog enquanto caminhava pela festa, colocou para ser postado automaticamente no dia seguinte, e então voltou para o escritório dela. Eu conferi a data e a hora, e isso confirmou que a postagem havia sido salva às oito horas daquela noite.
– Como você sabe disso? – eu perguntei.
– Quando eu recebi os materiais do escritório dela, encontrei o nome de usuário e a senha para o blog. Eu tentei fazer o login, e funcionou. Assim que eu confirmei que a conta era dela, pude ver todas as postagens. Foi então que contei ao seu pai, à Xerife e ao Connor sobre isso. – Myriam parecia muito presunçosa na explicação dela.
O que Myriam estava me contando explicava por que meu pai estava tão ocupado nessa manhã.
– Eu peço desculpas. Apenas contatei você por causa de um assunto policial urgente. Eu preciso conseguir a cópia de algumas provas que Siobhan levou para casa para colocar as notas no sistema para mim.
– Você está bem obcecado com essas notas. Você era um mau estudante quando frequentou Braxton? Será que você sente a sua autoconfiança melhorar quando descobre que as notas de um estudante foram alteradas?
Já que ela havia trazido o assunto à tona, eu decidi perguntar sobre qual era a análise dela.
– A Reitora Terry disse que ela recomendou que a invetigação fosse fechada e que Striker tivesse permissão para jogar hoje.
– Sr. Ayrwick, eu entreguei tudo para o Reitor Mulligan. Todos no conselho discutiram sobre isso uma hora atrás. Vai ser tomada uma decisão na segunda-feira. Desculpe se isso significa que o seu pequeno amigo, Craig Magee, não possa jogar hoje. Existem mais coisas na vida do que jogar uma bola de um lado para o outro durante algumas horas.
– Eu aprecio sua sinceridade, vou manter isso em mente. – eu disse educadamente. – E qual é o número da Siobhan?
– “Todas as infecções que o sol absorve. Dos pântanos, dos atoleiros e frouxos, sem prosperidade, os faça. Lentamente adoecer!” – Myriam disse grunhindo.
– Certamente você não está me comparando com uma doença. Essa é a citação mais apropriada que você conseguiu se lembrar, Myriam? – ela me disse o número de telefone e desligou sem se despedir.
Capítulo 23
No caminho até o campo, Siobhan retornou minha ligação e disse:
– Desculpe por não ter visto o seu email, Kellan. Eu tenho ficado tão ocupada com os gêmeos e trabalhando em escanear todas aquelas provas, não tive tempo de olhar a minha conta.
– Sem problemas, eu entendo. Se isso não fosse importante, eu não teria te incomodado no final de semana. – eu respondi.
Siobhan me disse que ela iria voltar online quando chegasse em casa naquela noite e me enviar um email com a cópia da prova. Quando eu perguntei a ela qual era a programação para as próximas semanas, ela mencionou que eles haviam contratado uma temporária enquanto tudo se encaminhava para a escolha do novo chefe de departamento.
– Eu vou estar por lá três vezes por semana para ajudar com a transição de tudo. Também vou pedir às estagiárias para trabalharem algumas horas extras. Eu tenho certeza de que elas gostariam de algum dinheiro extra, já que seu pai liberou os gastos extras por algum tempo. – Siobhan me deixou à espera quando um dos bebês chorou.
Eu havia esquecido sobre as estagiárias no departamento de comunicações até que Siobhan as mencionou. Quando ela retornou, eu perguntei:
– Eu conheci uma das estagiárias, Bridget. Eu acho que não sei quem é a outra.
– Sim, eu não estou surpresa. Bridget é fantástica, muito entusiasmada. Eu não fiquei muito contente quando mandaram a outra garota ir trabalhar conosco no último semestre. Ela está sempre atrasada e quase não faz nada.
– E por que você não pede uma substituição? Ou a demite? – isso parecia lógico para mim. Eu preferia não ter que lidar com alguém incompetente pelas próximas semanas enquanto eu assumia as aulas da Abby.
– Não tem como nós demitirmos a Carla. Você pode imaginar a fúria do Juiz Grey se eu demitir a sua neta? Isso poderia me custar o meu emprego, Kellan. – Siobhan riu em voz alta antes de continuar. – E com os dois pequenos em casa, isso não é uma opção.
Uau! Como eu não havia ficado sabendo disso? Eu desliguei com Siobhan, e corri para me encontrar com o Striker. Ele estava parado encostado na parede quando eu cheguei ao estádio de beisebol do Campo Grey. Pelo fato de ele estar vestido e pronto em seu uniforme, eu não tinha a coragem de lhe contar que baseado pelo que a Myriam havia me contado, ele não tinha chances de jogar hoje. Eu me senti horrível guardando aquela informação, mas sabendo que sua namorada, ou ex-namorada, poderia ser a pessoa que matou a Abby e Lorraine parecia muito pior.
– Eii, Striker, como está seu aquecimento? – eu perguntei.
Striker tentou sorrir, apesar de seu rosto se recusar a isso.
– Eu estou em boa forma. Parte de mim quer voltar para casa, mas o técnico não quer me deixar ir embora. Ele disse que eu preciso mostrar ao olheiro que sou um competidor.
– Ele está certo, você sabe. Eu tenho certeza de que o olheiro já encontrou estudantes em provação acadêmica antes. Ele se importa com sua consistência de arremessos e sua atitude dentro do campo. E não sobre o que o reitor diz sobre os resultados de uma prova. – eu acrescentei, sentindo que a minha parte que gostava do garoto me pedia para animá-lo. Eu esperava que ele não fosse o assassino.
– Eu não entendo o que aconteceu com aquela prova. Eles não me mostram o papel, mas a Dra. Castle diz que ela tem motivos para acreditar que a versão que foi avaliada não era a minha. Como isso aconteceu?
Eu pedi ao Striker para esclarecer exatamente o que ele se lembrava de ter ocorrido durante a execução daquela prova. Striker explicou que a Professora Monroe havia prometido dar as notas durante o final de semana e deixá-lo saber do resultado antes do treino seguinte. Então ele ouviu que ela tinha caído das escadas, e todos estavam procurando pelas provas. O Técnico Oliver ligou para ele na última sexta-feira à tarde para dizer que ele havia conseguido um “B+”, o que significava que ele poderia jogar. Na palestra de preparação, todos estavam animados que ele ainda podia jogar. Então o Reitor Mulligan pediu uma reunição durante essa semana e lhe disse que havia uma suspeita de que aquele resultado fosse realmente dele. Eu não tinha motivos para suspeitar do Reitor Mulligam, mas eu poderia dar uma olhada no álibi dele quando tivesse uma chance.
– Eu vou me encontrar novamente com o reitor na segunda-feira para olhar a prova que eles estão dizendo que não é minha. – Striker completou. – Meu padastro vai me matar se eu não conseguir ir para a grande liga.
– Eu tenho certeza de que eles vão dar um jeito logo. Vou ver se posso participar da reunião. Isso iria lhe ajudar?
Striker assentiu.
– Você tem sido realmente legal sobre isso. Queria que você tivesse sido meu professor desde o começo.
Todos me queriam em Braxton ultimamente.
– Striker, eu tenho que lhe fazer uma pergunta meio delicada. Eu não perguntaria se não tivesse um bom motivo, mas preciso compartilhar algo confidencial com você. Posso confiar que você não vai contar a mais ninguém?
– Sim. Nessa altura, você é a única pessoa do meu lado. É claro que eu vou responder qualquer coisa que você quiser. – Striker respondeu.
Eu perguntei ao Striker por que ele havia ido embora e então retornado à academia no dia que Lorraine morreu. Ele explicou que não queria ficar perto do Jordan, então mencionou que algumas pessoas o viram na sauna e que poderiam confirmar que ele ficou por lá até voltar para a academia. Eu iria verificar isso mais tarde, se necessário.
– Por acaso você já viu, ou alguém já lhe deu algum bilhete que dizia sobre alguém estar te ajudando a passar nas aulas, para que você pudesse jogar no time de beisebol? Ou o Técnico Oliver os mencionou para você? – eu estava hesitante em revelar o que a xerife não queria que fosse compartilhado, mas pensei que isso poderia me dar uma boa ideia sobre as coisas.
Striker se afastou com uma expressão chocada.
– Bilhetes? Como emails ou mensagens de texto?
– Não exatamente. Talvez um pedaço de papel colocado no seu armário do vestiário do Complexo Esportivo Grey? Ou talvez algo pelo correio?
– Não. Eu não tenho ideia do que você está falando, cara. Alguém falou que eu recebi?
– Ninguém disse que você fez qualquer coisa, Striker. Estou tentando juntar algumas peças de um quebra-cabeça bem peculiar. Então, você não sabe de ninguém alterando as suas notas, ou dizendo a você que eles fizeram alguma coisa, ou compartilhando qualquer tipo de comunicação dizendo que você merecia jogar no time de beisebol?
– Sério, eu não tenho ideia. Esse está sendo um último ano terrível. Primeiro, eu não posso jogar beisebol. Então Carla terminou comigo. Eu só quero ir para casa.
– O que você quer dizer com Carla ter terminado com você? Esse era o problema com garotas que você teve no começo da semana?
– Eu não posso acreditar que me apaixonei por ela. Tiveram muitos problemas com garotas na semana passada!
– O que você quer dizer, Striker? – um alarme soou na minha cabeça, mas eu não conseguia saber por que.
– Eu vou lhe contar. Ela é quem está errada, não eu. – Striker chutou a terra e uma nuvem de poeira ficou entre nós. – Carla só estava interessada em mim por causa do olheiro. Quando ela pensou que eu tinha uma chance de entrar na grande liga, se jogou em mim no último semestre. Ela e meu padrastro ficaram me pressionando para eu fazer melhor, então eu conseguiria um grande contrato. Mas assim que fui colocado em provação acadêmica e o olheiro parecia estar olhando para outro lado, Carla começou a se distanciar de mim.
– Não estou surpreso. Tenho que admitir que não tive um sentimento positivo quando eu vi vocês dois juntos no jogo da última semana ou durante a aula nessa semana. Ela flerta bastante com outros caras.
– Eu estava distraído demais com tudo. Não percebi isso. Foi por isso que eu menti para você, na semana passada, sobre onde eu e ela estávamos quando a Professora Monroe morreu. Carla e eu realmente bebemos nos dormitórios, mas foi muito mais tarde do que eu falei. Eu estava na academia a maior parte da noite. Nós nos encontramos às nove e meia.
– Eu não entendo por que você não pôde dizer isso quando eu perguntei. – eu expliquei ter percebido que Carla estava parecendo muito mais suspeita.
– Eu não queria contradizê-la na sua frente, já que nós estávamos brigando o tempo todo. Achei que se concordasse com ela, ela não iria começar a brigar novamente. Ela me disse que te contou que estávamos juntos porque todos estavam dizendo que a morte da professora não havia sido acidental. Ela não queria que ninguém pensasse que eu havia matado a mulher por causa das minhas notas ruins. Eu acho que Carla estava apenas tentando encobrir o fato de que ela estava me traindo com o Jordan naquela noite. – Striker disse.
– Eu acho que você está parcialmente correto. Quando foi que ela terminou com você?
– Quando eu fui colocado em provação novamente e não podia jogar para o olheiro, Carla me disse que ela precisava de espaço para pensar se ela podia se envolver com alguém suspeito de colar nas provas.
Baseado no que Striker havia me contado, nem ele e nem a Carla tinham um álibi completo para a janela de tempo na qual Abby foi morta. Striker explicou que aquele arranhão no braço dele havia sido Carla, quando eles brigaram por causa da provação acadêmica. Ele estava contente de não ter que lidar mais com os frequentes ataques físicos que Carla fazia toda vez que algo não saía como ela esperava. Assim ele que seguiu para o banco de reservas, eu segui até a barraca de cachorro-quente mais próxima das arquibancadas oeste e localizei Connor.
– Tudo liberado para o jogo de hoje?
– Sim, nós estamos em boa forma. Com dois assassinatos no campus, estou sendo mais cauteloso que o normal.
– Eu tenho que admitir, parece haver uma falta de segurança por esses lados. Eu não quero ofendê-lo com isso, mas parece que qualquer um pode entrar e sair dos prédios acadêmicos. O Complexo Esportivo Grey tem câmeras de segurança e leitores de cartão em apenas alguns lugares. Notas e resultados de provas estão sendo mudados. – eu estava correndo o risco de ir contra Connor, mas isso tinha que ser dito.
– Você está absolutamente certo. Esse é parte do motivo de seu pai ter me contratado. O diretor de segurança anterior era um pouco relaxado com os protocolos. Também tem havido uma série de mudanças nos requerimentos nacionais para segurança de escolas e universidades por causa de todos aqueles ataques nas escolas. Nós temos um plano de dois anos para colocar tudo nos padrões.
– Você tem um trabalho feito para você.
– Eu estou feliz de ter sua ajuda, Kellan. Apenas seja cuidadoso sobre o quão perto você fica envolvido. Eu fiquei no meio de algumas guerras complicadas no passado. Não gostaria que você se colocasse na linha de fogo. Sobre o que você precisa conversar comigo?
Eu contei ao Connor sobre todas as minhas conversas. Enquanto ele ligava para a xerife, olhei ao redor do estádio. Bridget estava falando com a Reitora Terry nas arquibancadas na terceira linha de base. Ela estava com aquela grande jaqueta verde novamente, mas para sua defesa, a temperatura havia começado a cair rapidamente. A última previsão do tempo mencionava outra nevasca vinda do norte em alguns dias. Provavelmente iria começar antes do que eles esperavam. Eu olhei pela multidão procurando por mais alguém que eu conhecesse. Nana D estava a algumas fileiras para trás, conversando com Marcus Stanton. Eu observei eles interagirem por alguns minutos, e conforme o tempo passava, a discussão se tornava mais e mais exaltada. Quando o jogo começou, o vereador havia jogado a sua bandeja com batatas fritas ao chão e subiu rapidamente os degraus para a saída.
Então, Derek me ligou para me contar o resultado da sua grande reunião com os executivos. Eles não estavam felizes com os planos dele para a segunda temporada. Ao invés de dar a ele uma segunda chance, eles o demitiram. Enquanto Derek já havia encontrado para si outra vaga, ele me disse para ficar preparado para notícias sobre o meu futuro vindo da emissora. Já que nós éramos o time da casa e estavamos na frente entrando na nona entrada, quando os Millner Coyotes não coseguiram corridas adicionais durante a primeira metade, o jogo havia terminado. Os Bears haviam ganhado ambos os jogos dessa temporada, e os torcedores estavam bem animados. A Reitora Terry estava torcendo, Nana D estava fazendo algum tipo de dança, e Jordan estava sendo carregado para fora do campo pelos seus companheiros de time. Era exatamente o que o campus precisava para manter sua mente fora da investigação de assassinato.
Com o evento chegando ao final e os fãs começando a voltar para o estacionamento e para as festas pós-jogo, Connor e eu ligamos para a xerife para contar as últimas notícias. Nós procuramos por uma área quieta no estádio e encontramos uma mesa sob um toldo coberto onde não havia mais quase ninguém.
– Eu aprecio a sua ajuda, Connor. Nós passamos outra ronda aqui na delegacia olhando os álibis de todos que foram registrados entrando ou saindo do Complexo Esportivo Grey. O Policial Flatman vai deixar uma cópia no seu escritório hoje à noite para fazer uma comparação final e ver o que não está combinando.
– E quanto à Carla Grey? Tem alguma chance de você se lembrar de ela estar incluída? Agora que nós sabemos que ela estava mentindo sobre o seu paradeiro na noite da morte de Abby, ela está claramente no topo da lista. – eu disse, incapaz de me conter. Connor havia pedido que eu não falasse, mas não consegui manter minha boca fechada.
– Sim, ela está naquela lista, Pequeno Ayrwick, assim como pelo menos outras seis ou sete pessoas que podem ter ou não álibis para a noite do assassinato da Abby. Cruzar referências não é tão fácil quanto parece. Também não quero provocar a ira do Juiz Grey ou do Vereador Stanton se não tivermos um caso perfeito contra algum dos alunos.
Connor então comentou:
– Então, April, como você quer lidar com a conversa com o suspeito?
– Eu acho que a nossa melhor chance é fazer Carla se encontrar comigo. Se ela pensar que isso é sobre sua última prova ou algo relacionado com as aulas, ela pode deixar algo escapar quando eu perguntar algumas coisas sobre as noites dos assassinatos. – ela estava escondendo alguma coisa. Eu podia sentir isso. Nana D diria que é um sexto sentido único dos Danby, mas eu não estava tão certo. Eu era bom em ler pessoas que tinham algo a esconder.
– Eu concordo que perguntar à Carla sobre a vida amorosa dela ou o que ela faz enquanto trabalha no departamento de comunicações vai ser algo melhor se feito por você. E ela não iria correr para o avô dela porque você pediu para encontrá-la – a Xerife Montague respondeu.
– Exatamente, e é por isso que...
– Mas. – ela continuou. – Verficar o álibi dela para ambas as noites é algo que meu escritório deve estar envolvido. Estou disposta a aceitar que isso é algo que o Diretor Hawkins poderia perguntar como parte da revisão do controle de acesso ao campus. Eu vou fazer um acordo com você. Enquanto vocês dois conversam com ela, eu quero estar presente. Vou ficar sentada por perto e escutando, então eu posso impedi-lo se você fizer algo para arruinar o meu caso.
Connor tentou falar, mas eu o interrompi.
– Connor já foi um policial. Eu tenho certeza de que ele está qualificado para manter minha conversa com Carla longe de causar qualquer problema para o seu caso.
– Esse não é o meu ponto. É o meu que está na reta aqui. Se algo der errado, vou ser considerada responsável por permitir que vocês fizessem isso. – a xerife disse. – Eu não quero ser acusada de chamar uma testemunha e então não ser capaz de fazer a prisão.
– Você está dizendo que não confia em mim? – eu provoquei.
– Eu não confiaria em você nem que você fosse a última pessoa no planeta e eu precisasse da sua ajuda para sobreviver. Eu preferiria deixar os zumbis me comerem viva do que pedir sua ajuda. Estou apenas lhe dando essa chance porque Connor vai estar lá.
Ouvi distintamente a gargalhada desagradável do Policial Flatman ao fundo. Connor teve a decência de reprimir a sua. Eu a havia pego se referindo a ele novamente como Connor. Esse profissionalismo certamente ia e vinha assim como o sotaque britânico falso da minha tia Deidre. Ela havia se mudado para o Reino Unido anos atrás e era conhecida por usar o sotaque sempre que iria lhe dar alguma vantagem, mas sumia completamente quando começava a beber.
Depois que todos fizemos nossas concessões, o plano era convidar a Carla para me encontrar na The Big Beanery na manhã seguinte para discutir o trabalho semestral. Enquanto eu discava o número dela, Connor recebeu outra ligação e se afastou. Quando Carla atendeu, eu mencionei que queria encontrá-la para falar sobre o trabalho.
– Minha agenda está lotada para a semana que vem, e eu sei que isso é de última hora, Carla. Eu estava esperando que talvez você não se importasse de me encontrar amanhã.
– Claro, pode ser às dez horas? Eu só posso ficar por trinta minutos. Geralmente me encontro com meu avô para o brunch dos domingos, mas ele mora na Alameda dos Milionários, o que não é tão longe.
– Isso é fantástico. Pode levar qualquer anotação que você já tenha escrito. Isso vai nos ajudar a fazer o plano completo do seu trabalho. Eu aprecio isso.
– Está bem. É sempre difícil dizer não para um cara bonito. – ela respondeu com uma voz melosa.
Eu tinha conversado com ela apenas uma vez fora da sala de aula, mas nunca tive esse flerte direto comigo antes. Ela estava realmente agindo assim com o seu professor? Eu pensei em deixar isso quieto por enquanto.
– Excelente, Srta. Grey. Vejo você amanhã. – eu desliguei, ansioso para contar ao Connor sobre a ligação. Quando ele voltou à mesa, eu percebi sua expressão confusa. – O que aconteceu?
– Você nunca vai acreditar quem era.
– Bem, não me deixe no suspense. Coloque pra fora. – eu respondi. Se fosse a Nana D com outro jogo ou meu pai tentando causar algum problema, eu iria gritar em frustração.
– A equipe da faculdade estava movendo a mesa do seu pai para fora do depósito. Já que todos estavam no jogo hoje, eles iriam terminar a realocação e seu pai poderia ter o escritório de volta na segunda-feira.
– Uau, maravilha. Quem poderia pensar que uma mudança de escritório iria te deixar tão cansado?
– Pare com o sarcasmo, cara. Eles acidentalmente bateram com a mesa no corrimão enquanto subiam os degraus. Não conseguiram segurar, e ela saiu deslizando pelas escadas.
– Ah não. Não a antiga mesa de mogno dele. Aquela que ele encontrou naquele leilão histórico anos atrás?
– Sim. – Connor sacudiu a cabeça de um lado para o outro, e então me lembrou de que meu pai havia pedido que sua mesa fosse colocada no depósito assim que a xerife isolou os andares superiores do Hall Diamante. Depois da Xerife ter dado uma rápida olhada na mesa no dia seguinte, ela liberou para que o departamento de reparos colocasse os móveis no depósito. Hoje era a mudança final depois da renovação do escritório dele.
–Hmm, okay... e o que te deixou tão nervoso? – eu perguntei, ficando preocupado sobre o que ele poderia dizer.
– Por acaso seu pai toca clarinete como um de seus hobbies, Kellan?
Eu sabia que a resposta era não. Mas também me lembrei de que o clarinete da Bridget estava desaparecido há duas semanas.
– Tem sangue nele?
– É isso que estou indo descobrir. – Connor disse.
Capítulo 24
Depois que Connor foi em direção ao escritório para encontrar com a equipe de manutenção, eu retornei ao Hall Diamante para pegar minha maleta e fazer o download dos emails que Siobhan havia me enviado. Quando eu comparei a foto do bilhete que nós encontramos no escritório do Técnico Oliver com a letra da Carla no quiz, algumas das letras eram quase idênticas, mas algumas na prova da Carla eram muito maiores e mais arredondadas. Eu precisaria do sistema de segurança avançado do Connor para ter certeza, mas ele estava ocupado conferindo a descoberta da potencial arma do crime. Ele me mandou uma mensagem dizendo que enquanto o clarinete apresentava alguns danos, isso poderia ter sido causado pela queda e não por ter sido usado contra Abby. A equipe da xerife tinha pegado o instrumento e fariam alguns testes durante a noite. Ele me daria um update no dia seguinte antes de nos encontrarmos com Carla Grey.
Eu fui para casa só para encontrar meu pai trancado em seu escritório e não em uma posição para conversar. A Xerife Montague já estava lá. Eu não me atreveria a interromper aquela conversa não importasse quanto eu quisesse ser uma mosca na parede. Enquanto eu acreditava que deveria haver uma explicação racional para a presença do clarinete desaparecido na mesa dele, sabia que meu pai não estava em condição de ser interrogado, já que sua adorada mesa antiga havia sido destruída. Assim que ouvi a xerife indo embora, conversei com minha mãe, que me pediu para deixar esse assunto quieto até a manhã seguinte.
Eu verifiquei com Cecilia que Emma estava animada para começar a fazer as malas para sua viagem. Liguei para Nana D para avisá-la que pretendia passar por lá no dia seguinte. Nós concordamos em fazer um brunch mais tardio, já que ela tinha algo a me dizer sobre uma decisão que havia tomado. Será que ela finalmente iria se aposentar totalmente do Rancho Danby? Enquanto a maior parte dos funcionários lidava com as tarefas do dia-a-dia, ela ainda ia diariamente para o mercado dos fazendeiros, decidia o que plantar a cada ano, e encontrava maneira de reutilizar e reciclar tudo o que pudesse na fazenda para ajudar a proteger a terra. Seu último foco havia sido no estudo da compostagem, e enquanto eu aplaudia os esforços dela, a última vez que estive lá recomendei mover a pilha para um pouco mais longe da porta dos fundos. Não era o melhor dos cheiros, e não importava o quanto ela era boa em fazer bolos e tortas, nada conseguia superar o aroma extremamente doce das frutas apodrecendo.
Também tive tempo para procurar restaurantes e escolher o que pensei ser um local perfeito perto do rio, então eu e Maggie poderíamos ir lá jantar na terça-feira à noite. Eu confirmei o horário com ela e fiz uma reserva, ainda contemplando se deveria ser para dois ou para três. Se eu levasse Emma, a conversa seria muito mais fácil e leve, mas isso também significaria que Maggie e eu passaríamos o tempo conhecendo um ao outro novamente, ao invés de discutir o que poderia ou não estar acontecendo entre ela e Connor. Enquanto eu puxava as cobertas da cama, fechei meus olhos e preparei minha conversa com Carla na manhã seguinte.
***
– Lívido. Essa é a única palavra que eu consigo pensar agora. – meu pai disse enquanto batia seus punhos em algo dentro da cozinha no domingo de manhã. – Eu vou ter que encontrar um especialista para restaurar a mesa, e isso vai levar semanas, se não meses. E agora, o que eu devo fazer, Violet?
Eu estava parado no corredor ouvindo a crescente discussão deles durante os últimos minutos, debatendo se eu deveria entrar casualmente e surpreendê-los ou fazer barulho suficiente, então eles saberiam que eu estava prestes a entrar.
Eu decidi fingir que havia batido meu dedão na porta da cozinha e fazer uma grande entrada como se eu estivesse com dor. Isso me faria sentir melhor sobre interromper a conversa deles, e deixar que eles se acalmassem rapidamente, então não haveria constrangimento por causa da discussão. Até onde eu podia dizer, minha mãe queria que meu pai contratasse um advogado, mas ele insistia que não tinha nada a esconder.
– Aaai!! Não consigo fazer nada antes de tomar café. Por que eu sempre tropeço nas coisas? – eu choraminguei enquanto entrava na cozinha. O ambiente estava bem frio quando me aproximei do balcão para me servir de uma xícara e dizer bom dia.
– Você precisa ser mais cuidadoso, querido. – minha mãe disse enquanto estava parada ao lado da porta dos fundos e olhava para o quintal. – E colocar algum sapato. Então você não vai mais se machucar.
Eu assenti, concordando com ela.
– E como foi a noite de todos?
– Estou indo para Braxton. Preciso ver os danos por mim mesmo, e descobrir se há alguma esperança de reparo. – meu pai disse, saindo da cozinha.
– Ele está um pouquinho mal-humorado, não é? – eu disse enquanto procurava algo para comer.
– Seu pai se recusa a admitir que a Xerife Montague possa estar atrás dele. E ele não quer cooperar com a investigação. – minha mãe se sentou no canto para café-da-manhã e suspirou.
– O que aconteceu? – eu espalhei a geleia de framboesa da Nana D em um muffin de milho e dei uma grande mordida.
– Seu pai está cansado com a mudança do escritório de um lado para o outro por causa da reforma, a realocação, e a eventual saída quando ele se aposentar da presidência. Eu disse a ele para colocar a mesa no depósito até que tivesse tomado a decisão final sobre algumas coisas. Ele estava preocupado que algo pudesse acontecer quando finalmente ficasse aparente o quão fácil é para um assassino andar pelo campus. Nada sinistro.
– E o clarinete? – eu perguntei secamente. – Eu suponho que poucas pessoas soubessem do esconderijo.
– Lorraine sabia, mas o melhor palpite dele é que alguém está fazendo algum jogo ao esconder coisas. Ele não sabe como descobriram sobre isso. – minha mãe disse com desespero crescente. – Isso tem que acabar, Kellan.
– Eu sei, mãe. Tem sido duas semanas difíceis. Eu tenho um pequeno experimento pronto para ser executado e que pode nos ajudar a trazer isso para um fim logo. Eu tenho certeza de que o pai está dizendo a verdade. A xerife vai descobrir isso em breve. – eu sabia que essa conversa matinal com a Carla seria frutífera, e esperava que tudo se resolvesse até o final do dia.
– Eu aprecio isso, Kellan. Tenho que me arrumar para a igreja. – minha mãe beijou minha bochecha e saiu da cozinha com um peso que doeu meu coração.
Uma hora mais tarde, depois de uma rápida corrida e de um banho, eu parei no estacionamento da The Big Beanery. Localizei Connor, então nós poderíamos comparar anotações.
– Não havia nenhum vestígio de sangue no clarinete. – a angústia na voz do Connor era preocupante.
– Eu não entendo. Isso significa que ele não é a arma do crime? Isso é tudo uma coincidência? – eu perguntei. Tinha que haver alguma explicação lógica, mas ainda não estava óbvio para mim.
– Isso poderia ter um número de motivos. Talvez o assassino o tenha limpado e escondido lá pensando que alguém iria descobrir o clarinete perdido e pensar que era uma brincadeira. – Connor sacudiu a cabeça e respirou profundamente. – A Xerife ainda não me contou tudo.
– Tem aqueles roubos também. Eu suponho que isso poderia não estar relacionado com os assassinatos. – eu completei, então olhei meu relógio. – Carla vai chegar dentro de dez minutos. Onde está a April?
– Uma pequena mudança de planos. A Xerife Montague encontrou algumas evidências adicionais nessa manhã e queria conferi-las. Ela colocou o Policial Flatman para nos monitorar. – Connor apontou para um canto onde um homem com um chapéu para neve e um grande casado peludo estava sentado. – Vê ele?
Levei um minuto, mas finalmente consegui reconhecê-lo com o disfarce. O Policial Flatman parecia um cliente comum da The Big Beanery tomando uma xícara de café e lendo um jornal no domingo de manhã.
– Okay. Eu acho que é um bom sinal de que ela confia em nós.
– Ela confia em mim. Eu tenho instruções específicas para mantê-lo de boca fechada se você passar do limite com a Carla. – Connor disse com um tom autoritário. – Não me faça usar a força contra você se eu precisar.
Eu reconheci o sarcasmo dele, então mandei Connor para fora do café, para que ele pudesse fazer sua entrada só depois que a Carla chegasse. Eu pedi uma xícara de café no balcão, caminhei até a mesa do canto atrás do Policial Flatman.
– Como é aquele artigo sobre ponto-cruz? – eu sussurrei para ele quando me sentava.
– Cale a boca, Sr. Ayrwick. Ela acabou de entrar. – ele respondeu.
Carla acenou e se aproximou. Enquanto ela tirava o pesado casaco de inverno, eu disse que ela podia fazer o pedido no balcão, e eles iriam entregar junto com o meu em alguns minutos. Enquanto eu esperava por ela, dei um palpite de que sua saia longa e suéter azul-claro mais conservativo eram para o brunch que ela teria com seu avô mais tarde. As pérolas balançavam gentilmente ao redor de seu pescoço enquanto ela caminhava de volta à mesa.
– Obrigada por comprar um café para mim, Professor Ayrwick.
– Era o mínimo que eu podia fazer por pedir que você me encontrasse em um domingo de manhã. – eu respondi enquanto ela se sentava. – O que você achou do jogo de ontem? Você deve ter ficado chateada que o Striker não jogou.
Um sorriso se formou nos lábios dela.
– Nah, Striker teve a chance dele, mas ferrou com tudo. Eu estou com o Jordan agora. Ele foi incrível ontem. Tenho certeza de que o olheiro vai encontrar um lugar para ele na grande liga.
Vapor subia da xícara dela. Enquanto ele se dissipava perto da bochecha, eu considerei sobre como mantê-la conversando sobre o time de beisebol até que o Connor chegasse. Ela parecia relaxada para alguém que poderia ter cometido dois assassinatos.
– Ohh, eu acho que entendi errado. Eu não havia percebido que as coisas entre vocês dois haviam acabado. Me desculpe.
– Está tudo bem. Ele não era o cara certo pra mim. Quero ficar com alguém que tem futuro. Alguém que possa impressionar o meu avô. – ela disse. A mão de Carla seguiu até a metade da mesa, mais perto da minha xícara.
– Eu acho que isso explica por que eu vi você e o Jordan juntos algumas vezes durante a semana lá na... hmm... lanchonete. – essa era uma maneira estranha de um professor mencionar que viu seus estudantes se agarrando, e nem isso era assunto meu, mas faria com que ela me contasse mais. Enquanto eu pegava minha xícara, Carla colocou a mão dela sobre a minha.
– Oh, aquilo... yeah, nós estávamos começando a sair juntos. Você sabe como é. Algumas vezes eu acho que deveria estar com alguém um pouco mais velho, mais estabelecido. – Carla sorriu e apertou minha mão.
Eu rapidamente puxei minha mão de volta e fingi um bocejo, para que ela não me tocasse. Ela estava claramente flertando comigo, ao mesmo tempo em que me dizia por que havia trocado o Striker pelo Jordan.
– Você é tão jovem. Eu imagino que existam várias coisas que você queira explorar um dia. Deve ter sido um choque quando o Striker foi colocado em provação novamente. Eu estou tentando ajudá-lo a sair dessa na próxima semana quando ele se encontrar com o Reitor Mulligan.
Meu celular vibrou. Quando olhei a tela, era a Nana D. Eu não podia atender a ligação e mandei para a caixa de mensagens. Eu iria sentir a ira mais tarde, mas isso era mais importante. Ela eventualmente entenderia.
– Alguém precisa ajudá-lo. Eu tentei estudar com ele, mas o estudo não é a praia dele, entende? – ela disse batendo um dedo contra a têmpora. – Mas eu posso dizer que você...
Para minha sorte, Connor interrompeu.
– Kellan, Srta. Grey, as duas pessoas que eu queria encontrar.
– Oi Connor. O que nós podemos fazer por você? – eu perguntei. Carla se virou na direção dele e sorriu.
– Estou tentando completar as entrevistas com as pessoas que estavam perto do Complexo Esportivo Grey no dia do acidente da Lorraine Candito. Estava pensando se poderia fazer algumas perguntas a vocês dois. Vai levar apenas alguns minutos – Connor era bem suave, deixando óbvio o porquê de ele ter entrado no ramo da segurança.
– Claro, só que nós não temos muito tempo. Carla e eu estávamos olhando o trabalho semestral dela, e ela vai encontrar o Juiz Grey daqui a alguns minutos.
Depois que ele pegou uma cadeira, Connor olhou primeiro para Carla.
– Eu vou fazer isso rápido. Então, você entrou no prédio por volta das quatro e quarenta e cinco, pelo que a câmera de segurança registrou. Você se lembra de ter visto a Srta. Candito? Estou tentando descobrir se alguém sabe como estava o humor dela naquela hora. Talvez ela estivesse triste ou chateada, e isso a levou a tomar aquela drástica decisão.
Carla sacudiu a cabeça e arregalou os olhos.
– Isso é tão terrível, mas eu ouvi que pode não ter sido suicídio. Tem alguma verdade nesse rumor?
– Eu não tenho certeza do que a Xerife pensa. Estou tentando criar uma linha do tempo para o caso de que tenha havido algo que Braxton pudesse ter feito. Será que você pode esclarecer o tempo que esteve no local? Eu presumo que você não a encontrou?
– Não. Vamos ver... eu corri na pista interna por uma hora, das cinco às seis horas. Me limpei e fui ao prédio da união estudantil para conferir meu correio por volta das seis e meia, então encontrei meu namorado, Jordan. Nós não vimos vocês na estação do teleférico por volta de seis e quarenta e cinco, Professor Ayrwick? – Carla respondeu bebendo de sua xícara e se sentando na cadeira.
– Sim, eu pensei tê-los visto, mas não pude parar, pois estava indo me encontrar com Lorraine. Eu acho que você não a viu, não é?
– Eu teria dito olá e a ajudado se ela estivesse chateada. Eu trabalhava com ela no Hall Diamante. – Carla disse, parecendo triste com a morte de Lorraine, não como alguém que poderia tê-la matado.
Meu celular vibrou com outra ligação da Nana D. Eu mandei novamente para a caixa de mensagens. Com sorte, ela se lembraria de que eu tinha uma reunião importante nessa manhã e pararia de me ligar. Se não, eu desligaria meu celular até que nós tivéssemos terminado.
Connor fingiu me fazer algumas perguntas, então disse:
– Eu aprecio isso. Isso tira mais duas pessoas da minha lista. Tem alguma coisa mais que você queira compartilhar, Srta. Grey?
– Eu acho que não. Tenho que terminar de conversar com o Professor Ayrwick sobre meu trabalho semestral. – ela pegou uma nova cópia da bolsa dela e a colocou sobre a mesa. – Tem algumas mudanças com relação aos filmes iniciais do Hitchcock.
Eu percebi que havia várias anotações à mão nas margens. Eu olhei para Connor que sorriu.
– Ohh, isso é ótimo. Eu tenho algumas ideias para você também.
Connor interrompeu.
– Será que eu posso dar uma olhada? Sou um grande fã do Hitchcock. Sobre o que é o seu trabalho?
Enquanto Carla explicava algumas coisas, Connor fingiu olhar algo em seu celular. Eu sabia que ele estava vendo as imagens do bilhete que nós havíamos encontrado. Ele olhou para mim e sacudiu a cabeça rapidamente. Eu não tinha certeza do que isso significava, e levantei meus olhos em confusão.
– Parece que você tem uma ótima ideia aqui. – Connor disse enquanto guardava o celular. – Eu não acho que combinou com as minhas expectativas sobre o que pensei que você fosse escrever, mas tenho certeza de que você vai se sair bem.
Ele estava tentando me dizer que a letra não combinava. Eu estava preocupado que ela pudesse ter sido suficientemente esperta para disfarçar a letra nos bilhetes.
– Bem, eu acho que você tem tudo o que você precisa, Connor? Algo mais que nós podemos lhe ajudar?
Meu celular vibrou novamente. Dessa vez era uma mensagem de texto da Nana D.
Nana D: Por favor, me ligue o quanto antes, ou vou lhe dar uns tapas mais tarde. Eu descobri algo crucial.
A urgência da Nana D poderia ser qualquer coisa, desde um episódio secreto dos Caçadores de Mitos até uma nova receita de bolo de chocolate alemão. Eu ligaria de volta para ela assim que terminasse com a Carla.
Já que Connor estava indo embora, eu poderia dar à Carla algumas dicas no trabalho dela e terminar essa charada. Nós não havíamos ficado sabendo de nada, exceto que provavelmente ela não era a culpada do assassinato. Culpada por ter usado o Striker e o deixado por uma oportunidade potencialmente melhor. Culpada de flertar com cada homem possível. Mas não havia motivo para ela estar envolvida com a mudança das notas. Ela só queria encontrar um cara para impressionar o avô e estava até mesmo me considerando, não que houvesse alguma chance disso acontecer.
– Não, eu vou voltar ao meu escritório e contar a todos o que eu descobri hoje. Vou entrar em contato se precisar de mais alguma coisa. – Connor disse antes de sair pela porta.
O Policial Flatman saiu alguns segundos depois para comparar impressões antes de conversarem com a Xerife Montague. Eu me voltei para Carla.
– Bem, isso foi estranho. Sobre o que nós estávamos conversando quando ele entrou?
– Eu estava dizendo que alguém precisa ajudar o Striker a aprender como estudar. E que eu estava feliz de ter a sua ajuda com o meu trabalho. – Carla respondeu, tentando pegar minha mão novamente. Para minha sorte, fui bem rápido e consegui pegar minha xícara de café.
– Eu imagino que o Striker não aceitou muito bem o término de vocês, não é mesmo? – eu precisava fazê-la parar de flertar comigo. Se ela falasse sobre o Striker, talvez eventualmente se sentisse culpada pelo que havia feito.
– Ele já é bem grandinho. Pode cuidar de si mesmo. Eu tenho certeza de que tem garotas fazendo fila para ficar com ele. Por falar em garotas fazendo fila por alguém...
Se eu não cortasse isso logo, eu ia ter grandes problemas.
– Srta. Grey, eu preciso te deixar ciente de que suas tentativas de flertar comigo hoje não é algo que eu possa corresponder. Você é uma das minhas estudantes, eu tenho uma política de nunca me envolver com nenhum deles pessoalmente. Isso também é contra as regras de conduta de Braxton...
– Oh, relaxa, Professor Ayrwick. Estou só brincando. Garotas flertam o tempo todo. Se você soubesse o que eu tive que aguentar para mantê-las longe do Striker no passado. A obsessão que uma delas tinha! Tão ridículo.
– O que você quer dizer? – eu perguntei. Talvez Connor e o Policial Flatman tivessem ido embora cedo demais.
– Ugh, essa garota está apaixonada por ele desde sempre. Ela vai a todos os jogos e fica olhando para ele o tempo todo. É meio bizarro, se você me perguntar. – Carla disse, colocando o trabalho dela na bolsa. – Ela foi até ele no jogo de ontem e não pareceu feliz com a resposta do Striker. Eu os vi conversando durante a sétima entrada. Ele praticamente teve que a mandar embora para que ela o deixasse em paz.
– Você sabe quem ela é? – eu perguntei à Carla para descobrir o que ela sabia. Isso era a melhor pista para o caso que eu precisava.
– Yeah, eu trabalho com ela. Ela sempre age como se eu não existisse e esquecia-se de me contar sobre o que os professores precisavam de propósito. Escute, tenho que ir encontrar meu avô. Talvez nós pudéssemos conversar novamente outro dia?
– Espere aí. Você não está falando da Siobhan, não é?
– De jeito nenhum! Bridget Colton é a louca apaixonada pelo Striker.
Capítulo 25
Meu cérebro estava acelerado processando toda a informação que eu tinha conseguido apreender nos últimos dias. Eu não conseguia acreditar o quão óbvio isso era.
– Conte-me tudo o que você sabe.
– Ela está sempre entrando escondido no dormitório dele para conversar. Ela quase pegou a mim e Jordan juntos quando nós voltávamos do cinema na noite da morte da Professora Monroe.
– O que você quer dizer? Onde você a viu? – eu sentia meu coração acelerado quando tudo começou a se encaixar.
– Jordan me deixou no meu dormitório e estava prestes a me dar um beijo de despedida. Bridget entrou correndo parecendo louca. Eu pensei que ela nos viu quando derrubou a maleta do clarinete. Eu me lembro de ter rido quando percebi que ela estava vestindo uma das novas jaquetas do time de beisebol. Elas não iriam ser colocadas à venda na livraria da escola até a outra semana para a nova temporada, e ela já tinha encontrado uma maneira de comprar uma. Aquela garota é completamente obcecada!
Nana D ligou novamente para o meu celular, e por causa do choque, eu atendi.
– Eu não posso falar...
– Kellan, estou tentando falar com você. Por que você não atendeu? – Nana D soava exasperada.
– Estou com uma estudante. Posso te ligar mais tarde? – eu tentei impedir Carla de vestir o casaco.
– Não. Isso é importante. Eu encontrei algo. – Nana D gritou.
Carla jogou sua bolsa por cima do ombro e acenou para mim.
– Professor Ayrwick, eu preciso ir. Vou me atrasar e meu avô vai ficar bravo.
– Não, espere. – eu sussurrei para Carla. – Nana D, aguarde um pouco, por favor.
– Kellan, eu estava limpando a pilha de compostagem depois que você reclamou sobre o cheiro. Eu acho que encontrei a arma que usaram para matar a Abby. – Nana D gritou. – Por favor, venha para cá o mais rápido possível.
Meu estômago afundou sabendo que tinha sido Bridget o tempo todo. Ela trabalhava no departamento de comunicações. Ela tinha um crush no Striker. Ela havia dito que seu clarinete havia sido roubado.
– Okay, Nana D, só alguns minutos. Não desligue ainda.
Eu me virei para Carla.
– Eu posso precisar ligar para você em algum tempo. Você pode atender a ligação, por favor? Eu preciso saber se tem mais alguma coisa que você se lembra sobre a Bridget.
– Isso é tudo o que consigo pensar, mas claro. – enquanto Carla anotava o número de celular na minha mão livre, minha mente começou a explodir com as conexões.
Quando Carla saiu, eu ouvi Nana D falando ao telefone, então um grande barulho.
– Bridget, o que você está...
– O que está acontecendo? – eu gritei em pânico.
Alguns segundos depois, eu ouvi Nana D dizer:
– Não vamos nos apressar, querida. Nós podemos conversar sobre isso. – e então o telefone ficou mudo. Bridget deve ter entrado e visto o que a Nana D encontrou na pilha de compostagem.
Eu peguei minha jaqueta e liguei para Connor, para contar a ele tudo o que eu fiquei sabendo. Ele iria ligar para a Xerife e nos encontrar no Rancho Danby. Eu dirigi o mais rápido que pude para salvar minha avó. Se alguma coisa acontecesse com ela, eu não sei o que eu faria. Eu amava meus pais, mas a ligação que eu havia construído com a Nana D sempre seria a mais forte. Ela havia aparecido em Los Angeles algumas semanas depois do funeral da Francesca, montou acampamento na nossa pequena casa de três quartos para cuidar de mim e de Emma até que estivéssemos prontos para começar a nossa nova vida sozinhos. Durante os primeiros dias, Nana D havia entretido Emma e a ensinado a cozinhar. Havia dias que eu não conseguia sair do quarto. O pensamento da Nana D sendo pega na teia de mentiras da Bridget era demais para suportar.
Eu pisei no freio e desliguei o motor do Jeep. Nem mesmo me importei de fechar a porta e corri para a casa da Nana D, quando cheguei eu as ouvi conversando na cozinha. Eu parei na porta quando percebi Bridget segurando uma faca contra a Nana D perto do balcão.
– Por favor, não a machuque, Bridget. Nós podemos dar um jeito nisso. – eu disse quase sem fôlego.
– Eu sinto muito. Não quero machucá-la. – Bridget respondeu. Lágrimas corriam pelo rosto dela com um genuíno medo e preocupação pelo que estava fazendo. Ela devia saber que estava perdendo o controle.
– Por que você não nos conta o que aconteceu? Nana D é uma ótima ouvinte. Ela sempre me ajudou a resolver as coisas. – eu precisava mantê-la conversando até que Connor e a xerife chegassem. Quanto mais pessoas para pará-la, melhor seria.
– Só aconteceu. Eu nunca quis matá-la. Você tem que acreditar em mim. – Bridget segurou Nana D com mais força pela cintura, enquanto outra mão pressionava a faca contra a garganta da minha avó.
– Você está falando da Professora Monroe ou da Lorraine? – eu perguntei.
Bridget fechou os olhos e mordeu o lábio.
– A Professora Monroe me pegou naquela noite mudando o resultado da prova do Striker no livro de notas dela. Eu estava tentando ajudá-lo. Eu o amava. Queria que ele pudesse jogar na partida, então o olheiro da Grande Liga de Beisebol o escolheria.
– Conte-nos o que aconteceu, Bridget. Me leve com você nas suas lembranças. - eu observei Nana D lutar um pouco, mas ela parecia relativamente calma para alguém sendo mantida refém.
– Fiquei com tanta raiva quando ela o reprovou no semestre passado. Eu havia mudado a nota dele antes, mas de alguma maneira a Professora Monroe viu e pensou que havia cometido um erro. Eu pensei que se eu pudesse mudar a nota dele mais uma vez para aquela primeira prova, ele teria permissão para jogar no jogo de abertura. Não achei que alguém fosse descobrir a troca até muito tempo depois. E então, Striker já teria impressionado o olheiro, e tudo seria esquecido. – Bridget puxou Nana D para mais perto, e a ponta da faca entrou um pouco na pele da Nana D.
– Eu vi o “F” original no livro de notas. Como você estava fazendo as mudanças?
Bridget explicou que ela havia parado por lá na noite da festa de aposentadoria para mudar a nota da prova, mas ficou distraída pela jaqueta que o Técnico Oliver havia deixado lá para Lorraine. Ela vestiu a jaqueta, fingindo que havia sido o Striker quem havia dado para ela como se eles fossem namorados.
– Eu tinha uma cópia em branco da prova, e copiei sobre algumas das respostas dele, então alterei algumas para assegurar que ele tivesse um “B+” ao invés do “F”. Eu já tinha colocado a nova versão de volta na pasta para Lorraine dar entrada no sistema dos estudantes. Estava mudando a nota no livro de notas da Professora Monroe quando ela me encontrou no seu escritório. – Bridget engoliu em seco com a memória de seu crime.
Ela não havia pensado no cenário completo. Mesmo que Abby não a tivesse pegado naquela noite, Abby eventualmente teria percebido quando desse a entrada das notas dos estudantes no sistema. Bridget não sabia que Abby nunca deixava que outra pessoa tivesse acesso aos seus materiais de aula ou provas dos estudantes.
– Está tudo bem, querida. – Nana D a acalmou. – Você queria ajudar o seu amigo Striker. Isso é tudo?
– Sim, ele sempre foi legal comigo no começo. Eu odiava a maneira como a Carla Grey o tratava. Ela é tão maldosa. Pensei que ele iria perceber isso e terminar com ela. Ficar feliz que eu o estava ajudando. Eu deixei para ele todos aqueles bilhetes, mas ontem ele me disse que nunca os leu.
O Técnico Oliver havia escondido de propósito os bilhetes do Striker, para que o garoto não pudesse ser acusado de saber o que estava acontecendo. Eu aplaudi os esforços do técnico para proteger os jogadores, mas se ele tivesse contado a alguém, nada disso teria saído do controle.
– O que aconteceu quando a Professora Monroe encontrou você no escritório dela? – quando eu me aproximei, Bridget segurou Nana D com mais força.
– Ela ficou com muita raiva e me acusou de estar trabalhando com o Técnico Oliver e o Vereador Stanton para subornar o olheiro. Eu não tinha ideia do que ela estava falando. A Professora Monroe pegou o telefone para ligar para a segurança do campus. Entrei em pânico. Eu não queria me meter em problemas e disse a ela que não faria novamente. Mas ela não queria me ouvir. Ela disse que eu precisava ser punida, e que ela faria isso.
– Foi então que você fez algo contra ela? – eu perguntei enquanto percebia pelo canto do olho a Xerife Montague se aproximando da porta dos fundos. Ela colocou o dedo sobre os lábios e apontou para o lado. Eu supus que ela tinha reforços com ela.
– A Professora Monroe começou a discar no telefone. Eu a empurrei para ela parar. Nós lutamos por alguns minutos, e foi então que ela rasgou a jaqueta que eu havia roubado da Lorraine. Ela devia ter ficado assustada e tentado ir embora. Eu a segui pelo corredor implorando que me desse outra chance, mas ela não me escutava. Enquanto ela descia as escadas, algo veio em minha mente. – Bridget chorou. – Eu não tenho mais ninguém, e ela iria tirar a única coisa que tinha me restado.
– O que você quer dizer? – Nana D perguntou, tentando pegar algo atrás dela no balcão.
– Meus pais estão mortos. Eu não tenho amigos de verdade. Eu tinha apenas o Striker e a faculdade. A Professora Monroe teria contado sobre o que eu tinha feito. Eu seria expulsa. Peguei aquele troféu estúpido da mesa da Lorraine e corri atrás dela. Eu bati na cabeça dela, pensando que tinha que fazê-la parar, então ela caiu pelas escadas.
Quando Bridget começou a chorar, a Xerife Montague entrou pela porta. Nana D conseguiu pegar uma torta de cerejas que havia deixado no balcão para esfriar. Quando Bridget percebeu o que estava acontecendo, Nana D já tinha jogado a torta na cara dela. A Xerife Montague a jogou no chão. Eu peguei a faca da mão de Bridget durante a confusão e me afastei.
O Policial Flatman entrou pela porta da frente e colocou as algemas em Bridget. Connor entrou correndo pela porta dos fundos. Eu abracei a Nana D, finalmente sendo capaz de respirar novamente.
A Xerife Montague disse.
– Nós temos a confissão dela sobre o assassinato da Abby Monroe. Só precisamos descobrir o que aconteceu com a Lorraine Candito.
– E o que acontece depois? – eu me senti mal sabendo que a Bridget estava desesperada e não tinha ninguém para apoiá-la. Estava furioso por ela ter matado alguém que eu me importava demais, mas isso não traria Lorraine de volta.
– Vou levá-la para a delegacia. Ela pode não querer falar até que seu advogado chegue. Se ela não puder pagar, o condado vai definir um defensor público. – a xerife respondeu.
– Não há esperança para mim agora. Eu pensei que o Striker finalmente me daria uma chance agora que ele e a Carla terminaram. Mas ele me rejeitou no jogo ontem. Eu não tenho mais nada, e posso te contar tudo agora. – Bridget sussurrou. O Policial Flatman a estava levando pela porta dos fundos para ler os direitos dela quando ela o parou.
– Você deveria esperar pelo advogado. – Nana D respondeu, ainda querendo proteger alguém de quem havia se afeiçoado nas últimas semanas. – Eu estou desapontada com você, mas não se meta em ainda mais problemas, querida.
Bridget se recusou a esperar pelo advogado para explicar os detalhes. Tudo fez sentido quando ouvi a saga completa. Depois que Abby caiu das escadas, Bridget entrou em pânico. Ela ouviu Lorraine e o Técnico Oliver conversando do lado de fora da porta, e correu de volta pelas escadas para esconder a arma. A primeira coisa que encontrou foi a maleta do clarinete. Ela se lembrou de ter visto Lorraine esconder uma garrafa de whisky para o meu pai atrás de um painel secreto na mesa dele, então foi até o terceiro andar e colocou o clarinete no esconderijo. Então ela colocou o troféu, que tinha um tamanho similar ao clarinete, dentro da maleta e se escondeu por lá.
Quando Lorraine saiu correndo depois de ter descoberto o corpo da Abby, Bridget foi embora com a maleta do clarinete pensando que poderia pegar o instrumento na manhã seguinte. Ela correu pelo campus e voltou ao dormitório, onde se convenceu de que tudo ficaria bem e de que todos pensariam que a Professora Monroe havia caído na escada e batido a cabeça. Ela não pensou que o troféu teria deixado uma ferida e fragmentos no corpo. Na manhã seguinte, voltou para pegar o clarinete, mas viu que a polícia havia isolado o prédio. Ela transferiu o troféu para sua mochila e saiu para sua aula de música com a Nana D, onde pediu se poderia pegar o clarinete emprestado. Quando a aula terminou, ela jogou o troféu no fundo da pilha de compostagem, pensando que ninguém iria encontrá-lo, e se encontrassem, não poderia ser ligado a ela.
– E eu acho que quando você voltou para pegar o clarinete, você reportou que o havia perdido? – eu disse.
– Eu pensei que todos iriam apenas pensar que alguém estava brincando comigo, ou que havia um ladrão pegando algumas coisas do prédio. – Bridget chorou.
Depois que a Xerife anunciou publicamente que a morte da Professora Monroe havia sido acidental, Bridget pensou que havia se dado bem. Apesar de se sentir horrível, não havia nada que pudesse fazer, além de eventualmente recuperar o clarinete e dizer que ele havia sido devolvido a ela. Bridget então explicou o que aconteceu com Lorraine. Quando Striker foi colocado em provação acadêmica depois que nós descobrimos que sua prova era falsa, Bridget foi até o Complexo Esportivo Grey para deixar outro bilhete para ele e o Técnico Oliver, dizendo que havia consertado novamente. Enquanto Lorraine estava no vestiário, Bridget colocou o bilhete na mesa e saiu do escritório dele. Ela estava caminhando pelo corredor quando Lorraine voltou de repente ao escritório.
– Você se escondeu na sala de conferências e escutou minha conversa com Lorraine? – eu perguntei, percebendo que Jordan provavelmente não tinha visto a Bridget por causa de um ou dois minutos.
– Eu pensei que havia sido pega. Estava tão quente lá dentro, precisava abrir a janela. Eu não podia ligar as luzes. Foi então que tropecei nas mesas e cadeiras. Lorraine deve ter ouvido o barulho depois que ela terminou a ligação com você, e então ela entrou na sala. – Bridget falou.
– Você a empurrou pela janela? – eu perguntei, esperando que Bridget não fosse tão cruel assim.
– Não, foi um acidente. Lorraine se aproximou de mim enquanto eu estava do lado da janela. Nós lutamos no escuro. Quando eu a empurrei para tentar me afastar dela, ela caiu pela janela. Eu não queria matá-la. – Bridget chorava e tentava cobrir seu rosto, mas o Policial Flatman segurava bem firme as mãos dela.
– Bridget era um dos últimos nomes da minha lista para investigar. Eu fiz uma conexão entre a jaqueta desaparecida, Bridget entrando no Complexo Esportivo Grey pouco antes da hora do assassinato, e como ela trabalhava no Hall Diamante. Então, tudo fez sentido, especialmente depois que eu conversei com a Dra. Castle nessa manhã. Era por isso que eu não pude te encontrar na The Big Beanery. – a Xerife Montague disse.
– Myriam sabia sobre a Bridget ser a responsável pelos assassinatos?
– Não, o nome da Bridget ficava aparecendo em diferentes conversas depois que a Dra. Castle compartilhou a prova fraudulenta. A Dra. Castle pegou algumas outras provas dos estudantes de outras turmas e pensou ter encontrado uma que combinava com a que havia sido adulterada. Eu não acho que ela suspeitava mais de Bridget do que apenas estar trocando algumas notas de vez em quando.
Assim que a maior parte da equipe dela havia ido embora, a Xerife Montague se aproximou de mim.
– Você fez um ótimo trabalho hoje, Pequeno Ayrwick. O Policial Flatman me disse que você seguiu todas as minhas regras mais cedo hoje de manhã. Obrigada.
– Não há de que. Eu nunca esperei que a Carla revelasse alguma coisa sobre a Bridget estar flertando com o Striker. Assim que Connor e o Policial Flatman foram embora, pensei que nós terminaríamos de conversar sobre o trabalho dela. Eu tive sorte.
– O que você quer dizer com isso? – a xerife perguntou. – Não tenho certeza se eu entendi.
– Carla começou a flertar comigo. Eu chamei a atenção dela, e ela fez um comentário sobre como as garotas ficam flertando o tempo todo. – eu disse, pensando sobre como a Xerife Montague havia conversado com o Connor recentemente.
– Nem todas as garotas se comportam como Carla Grey, Pequeno Ayrwick. Algumas são muito mais sutis quando estão interessadas em um homem. – a Xerife Montague olhou brevemente para o Connor, então se voltou novamente para mim.
Eu não acho que Connor tenha percebido. Se ele percebeu, não estava deixando transparecer.
– Eu gostaria de pensar que sim. Quando ela mencionou uma garota que ficava flertando com o Striker, eu fiz algumas perguntas, e foi então que tudo se encaixou no lugar.
– É uma coisa boa que você esteja bem esperto nesse jogo, Pequeno Ayrwick. O Escritório da Xerife do Condado de Wharton agradece pela ajuda não solicitada, mas eu tenho que lhe lembrar de que no futuro você fique fora das minhas investigações. Como você pode dizer, sou mais do que capaz de resolver as coisas, sozinha. – a Xerife Montague pediu que Connor a acompanhasse até o lado de fora, onde poderiam conversar sobre algumas coisas.
Enquanto a Xerife tinha descoberto que a culpada era a Bridget durante as mesmas vinte e quatro horas que eu havia descoberto, isso não teria sido possível se eu não tivesse ficado pressionando-a para procurar por suspeitos alternativos e descoberto o problema com as notas. Mas eu nunca conseguiria crédito por isso. Teria que me contentar com a pequena concessão dela quando disse que o Escritório da Xerife do Condado de Wharton estava grato pelos meus serviços não solicitados.
Quando eu vi a arma do crime sendo identificada e colocada em um saco, meu peito doeu quando me lembrei da conversa que Lorraine tinha falado para mim no começo da semana. Eu havia esquecido sobre o quanto eu havia contado para Lorraine, ao telefone, no dia depois de ter perdido o troféu pelo meu trabalho na primeira temporada do Realidade Sombria. Eu havia ligado para meu pai para revelar que Derek havia ganhado, e não eu, achando que seria melhor ele ouvir isso de mim. Ele não estava disponível, então desabafei com Lorraine sobre tudo o que aconteceu, pouco antes do Dia de Ação de Graças. Geralmente não estou nos meus melhores momentos perto dessa data, e estava tendo dificuldades de acalmar minhas emoções. Lorraine havia sido muito querida comigo ao telefone. Ela me disse que eu era o único motivo pelo qual ela assistia ao show e que eu merecia vencer daquele Derek qualquer-coisa. Parecia que ela tinha conseguido mandar fazer uma réplica exata do troféu com meu nome. Eu apreciei o sentimento, sabendo o quanto ia sentir falta daquela mulher.
Nana D estava bem, só um pouquinho abalada. Ela estava fazendo um chá e descongelando rolinhos de canela enquanto eu e a xerife conversávamos.
– Eu acho que não vamos poder comer a torta de cereja que eu havia assado! – eu ri, sabendo que teria mais no futuro. Depois que todos foram embora, Nana D disse: – Ficar flertando com garotas da faculdade não é bom para você, Kellan. Eu pensei que tinha te criado melhor do que isso.
– O que? Era você quem estava tentando me arranjar com a Bridget. Na última vez tinha sido com uma bigamista dupla, e agora com uma assassina dupla. – eu me lamentei. Que tipo de dedo ela tinha pra escolher alguém?
– Ugh. Eu nunca fiz isso. Eu sabia desde o começo que a Bridget era problema, foi por isso que aproximei vocês dois. Pensei que você descobriria isso eventualmente, mas você ainda está um pouco devagar, meu querido. Talvez da próxima vez. – Nana D conferiu os rolinhos de canela e disse que eles estavam prontos.
Eu revirei meus olhos para ela.
– Para sua informação, eu nunca me interessaria por alguém como a Carla Grey.
– Eu espero que não, Kellan. As coisas já estão suficientemente feias para nossa família. – um sorriso desonesto formou no rosto da Nana D. – Nem mais nenhuma ligação ruim, por favor. Nós temos coisas a conquistar.
– O que você sabe agora?
– Eu ouvi um rumor de que o Vereador Stanton está planejando anunciar sua campanha para concorrer à prefeitura do Condado de Wharton na próxima eleição. – ela respondeu. – O papel dele nesse crime foi a gota d’água.
– Yeah, e o que tem isso? – eu podia sentir as minhas entranhas começarem a tremer. Ela não faria isso.
– Ele não é bom. Alguém precisa se opor contra aquele homem.
– O que isso significa exatamente, Nana D? – ela possivelmente não poderia.
– Eu estive pesquisando por alguns lugares da cidade, e bem...
– Nana D, você não pode!
– Oh, mas eu posso. Eu tenho uma coletiva de imprensa marcada para uma hora antes da dele. – ela bateu em seu quadril e começou a dançar. – Vamos. Venha e me ajude a escolher algo para eu vestir para dar as minhas grandes notícias! Prefeita Seraphina Danby, isso soa muito bem, não é mesmo?
Capítulo 26
Passei o resto da tarde de domingo respondendo as perguntas para a xerife, revivendo toda a experiência com a Eleanor, e preparando as aulas de segunda-feira. Nós precisávamos contar a verdade para todos no campus, mas isso teria que esperar até que o departamento de relações públicas organizasse os detalhes para a declaração para a imprensa. Eu fui dormir cedo pensando que havia recebido choques o suficiente desde que descobri que a Bridget era a assassina e que a Nana D iria concorrer para prefeita do Condado de Wharton. Pouco eu sabia que a segunda-feira seria o dia onde as revelações chocantes me deixariam à beira de um ataque de nervos.
Eu terminei de ensinar a minha primeira aula sobre broadcasting pela manhã. Eu concordei apenas com um contrato para um ano com potencial para renegociações. Ainda não tinha certeza do quão bem eu e meu pai iríamos trabalhar bem juntos, mas estava confortável o suficiente para dar uma chance, já que a faculdade não permitiria que alguém trabalhasse diretamente para seu familiar ou esposo. Eu só seria capaz de trabalhar com meu pai na conversão para a Universidade Braxton porque teria alguém entre nós, assim que mais funcionários fossem contratados. E eu precisava desesperadamente daquele mediador até que ficasse sabendo sobre o meu futuro dentro do Realidade Sombria, por parte do pessoal da emissora. Eles haviam dito para esperar durante duas semanas até que decidissem meu destino.
Entre as aulas, eu conversei com Alton Monroe para confirmar os detalhes do funeral da Lorraine mais tarde naquela semana. Nós havíamos nos juntado para fazer um serviço funerário memorável para a mulher que nós dois iríamos sentir tanta falta. Lorraine havia sido como uma tia para mim, o que me fazia pensar o quanto eu havia perdido contato com minha família nos últimos anos. Prometi a mim mesmo fazer um melhor trabalho em entrar em contato frequentemente com todos, até mesmo organizar uma reunião familiar naquele verão.
Da última vez que eu conferi, o Conselho de Curadores iria se encontrar com o novo presidente para determinar se haveria ou não alguma ação formal contra o Técnico Oliver, por causa de seu papel ao esconder informação e iludir Braxton durante as discussões com o olheiro da Grande Liga de Beisebol. Infelizmente para Striker e Jordan, o aspecto antiético de como o olheiro acabou indo visitar o campus, impediu que fossem oferecidos contratos para se juntar a um dos times através da organização da Grande Liga de Beisebol. Carla terminou com Jordan quando isso aconteceu e já estava à procura da próxima vítima. Striker e Jordan me contaram que estavam focados em terminar o semestre com suas cabeças erguidas e uma prece para ser aceito em outros times.
A coletiva de imprensa da Nana D revelou para o condado inteiro a candidatura dela para concorrer à Prefeitura do Condado de Wharton. Eu pude ver várias pessoas, incluindo Eustacia Paddington, torcendo na televisão. Eu esperava que isso significasse que a guerra delas com relação ao Lindsey Endicott estivesse numa trégua, ou que pelo menos, elas planejassem se comportar como duas cidadãs seniores civilizadas competindo pela atenção do homem. Nana D prometeu a todos que se fosse eleita, haveria grandes mudanças. Mais empregos. Menos fita vermelha. Nada de acordos obscuros por trás dos panos. E sorvete grátis aos domingos no Parque Wellington. Eu não conseguia entender o porquê disso, mas a última promessa dela deixou as pessoas mais animadas.
Conversei com o Connor para descobrir o que iria acontecer com a Bridget Colton, depois da perspectiva única dela de como programar uma curva acadêmica dentro do sistema de notas de Braxton.
– Ela foi acusada de ambos os assassinatos. Baseado em todas as evidências e do pedido do defensor público dela, Bridget vai ser detida na ala psiquiátrica do Hospital Geral do Condado de Wharton para mais análises. – ele respondeu enquanto a ligação estava no viva-voz. A Xerife Montague estava falando no fundo, o que significava que ela havia passado no Escritório do SCB para visitá-lo.
– Obrigado, Connor. Eu não teria solucionado isso sem você. – eu respondi em voz alta, esperando que a xerife também ouvisse. Não pude evitar. De alguma maneira, eu iria conquistar aquela xerife com um sarcasmo inequivocamente adorável. – É uma coisa boa que nós mantemos o Escritório do Xerife do Condado de Wharton na linha, não é mesmo?
– Escute aqui, Pequeno Ayrwick, mais um comentário desses e eu vou te prender por...
– Pelo que, Xerife? Por falar a verdade? – eu respondi com uma risada audível enquanto provocava a mulher.
– Tente exposição indecente. Connor me contou aquela história de uma certa calcinha roxa de renda...
– Okay, trégua. Eu cansei! – eu disse derrotado. Não havia necessidade de conversar sobre aquilo. Eu iria ter que falar umas boas para o Connor por ele ter contado a verdade sobre aquele pequeno constrangimento para ela.
Depois que nós desligamos, eu caminhei até a Lanchonete Pick-Me-Up para ter um rápido almoço com minha irmã. Quando cheguei, havia uma grande placa que dizia Sob Nova Direção. Por um breve momento, preocupação correu por dentro de mim, me perguntando se isso queria dizer que Eleanor perderia o emprego.
Enquanto eu fechava a porta, o sino soou acima de mim, e ela veio correndo.
– Nós estamos fechados por alguns dias nessa semana... ohh, é você. – minha irmã gritou.
Se ela ainda estava lá, era um bom sinal de que Eleanor não havia perdido o emprego.
– O que está acontecendo?
Eleanor sorriu para mim.
– Bem, parece que meu antigo chefe cansou de ficar no ramo das lanchonetes depois de trinta anos. Ele e a esposa decidiram se aposentar e mudar para a Flórida.
– Você já conheceu os novos donos? – por que ela não me contou nada das últimas vezes que nós nos encontramos ou conversamos? O lugar estava vazio, e havia alguma reforma acontecendo perto da cozinha.
Maggie saiu da cozinha vestida com um macacão jeans e um capacete de obras amarelo. Havia uma quantidade decente de poeira em seu braço esquerdo e perna.
– Kellan, o que você está fazendo aqui?
Uma onda de excitação correu pelo corpo com a visão de Maggie vestida daquele jeito. Era a primeira vez que eu tinha uma verdadeira reação física ao pensar em outra mulher, mais do que como amiga, desde que Francesca havia falecido no acidente de carro.
– Eu acho que não podemos mais manter segredo, Eleanor. – Maggie respondeu.
Depois que ambas terminaram de rir, minha irmã explicou que Maggie havia parado na lanchonete para pegar algo para comer. Uma coisa levou a outra, e elas fizeram dois acordos naquela tarde. Os donos haviam perguntado se Eleanor queria comprar a lanchonete deles, mas ela não podia arcar com os custos sozinha. Maggie sempre gostou do local e pensou que seria uma aventura divertida para se arriscar. Ambas haviam economizado dinheiro suficiente para dividir os custos, conversaram com um banco local sobre um empréstimo, e optaram por fazerem o negócio juntas. Eleanor iria cuidar do dia-a-dia do lugar, e Maggie seria uma parceira silenciosa, ajudando quando não estivesse trabalhando na Biblioteca Memorial. O outro acordo que haviam feito era sobre o Connor. Eleanor e Maggie concordavam que elas eram primeiramente amigas, e se Connor queria sair com ambas, poderiam encontrar uma maneira de aceitar isso por algum tempo. Nenhuma delas iria interferir no relacionamento da outra, mas assim que ele tivesse escolhido, elas respeitariam a decisão.
Isso era um desastre esperando para acontecer! Uma coisa era ter um negócio com um amigo. Você poderia ter alguma briga, mas geralmente existe uma maneira de trabalhar a tensão. Acrescentando o drama de ambas estarem saindo com o mesmo homem, Braxton poderia se tornar o centro da Terceira Guerra Mundial. Eu sabia que não conseguiria fazê-las mudar de ideia, então dei apenas os parabéns, confirmei que Eleanor ainda iria se encontrar com Cecilia para pegar a Emma, e ouvi os planos de reforma delas.
Quando elas terminaram de me contar sobre a nova lanchonete, eu tinha que voltar ao campus para dar a minha aula final antes do grande anúncio do novo presidente. No caminho de volta, eu percebi que não apenas isso significava que Maggie e Eleanor estavam saindo com o mesmo cara, mas significava que eu e Connor possivelmente estaríamos saindo com a mesma garota. Eu ainda não havia decidido se meu jantar com Maggie seria um encontro oficial ou uma refeição relaxante com uma amiga, mas sabia que meus antigos sentimentos haviam sido mexidos.
Como se não fosse o suficiente para arruinar a minha tarde, eu também não havia pegado meu almoço com minha pequena excursão à Lanchonete Pick-Me-Up. Eu peguei um pacote de chips de sal e vinagre da máquina de doces e rapidamente os coloquei na boca. O que eu tinha feito comigo mesmo? Seja lá o que fosse, não pude me desviar quando os alunos começaram a entrar na sala de aula para minha última aula do dia. Três horas depois, a faculdade inteira estava reunida no Salão Recreativo Paddington para o grande anúncio. Meu pai havia reservado um assento para mim perto do palco, onde eles estariam publicando tanto o meu novo papel quanto o dele. Eu procurei ao redor pela minha mãe, mas ela estava ocupada em uma conversa com a Reitora Terry. Eu suspeitava que meu pai tivesse pedido que ela mantivesse a reitora distraída já que ela estava bem chateada por não ser a nova presidente de Braxton.
Quando finalmente cheguei à primeira fileira, encontrei com a Myriam. Ela estava vestida muito bem e tinha o maior dos sorrisos no rosto. Eu honestamente pensei que ela devia ter acabado de sair do cirurgião plástico. Senti um certo tremor dentro do meu estômago com medo de que ela fosse nomeada a nova presidente, mas eu tinha certeza de que era um candidato de fora que foi escolhido com a proeminente posição.
– Boa tarde Myriam. Você parece animada de estar aqui. – eu disse, esperando manter a conversa civilizada. Eu já tinha tido o suficiente das palavras dela durante os últimos dias por uma vida inteira. Também não queria trazer o assunto da descoberta que ela havia feito sobre a Bridget ter alterado as notas.
– Kellan, eu não esperava te ver por aqui hoje. Pensei que você iria ficar por apenas algumas semanas. Já que o novo chefe do departamento de comunicações foi selecionado, eu tenho certeza de que vamos encontrar um susbtituto para o lugar da Abby nos próximos dias, e você pode voltar para Los Angeles. – assim que Myriam terminou de falar, a deusa que eu havia encontrado no funeral da Abby se juntou ao lado dela.
– É Kellan, certo? – Ursula perguntou com um brilho nos olhos.
Eu não estava atraído por ela tanto quanto fiquei impressionado com sua elegância e porte. Eu estava admirado pelo que eu suspeitava ser o mais perto da perfeição que uma pessoa pudesse ser.
– Sim, e você é Ursula Power. Nós nos encontramos no funeral da Abby na semana passada. Estou um pouco surpreso de te ver aqui hoje. – a não ser que ela fosse a nova chefe do nosso departamento, o que a faria ser tanto a minha chefe quanto a de Myriam. Teoria interessante.
– Ursula é minha esposa, Kellan. Eu pensei que seu pai já houvesse lhe contado isso. – Myriam respondeu. O sorriso dela ficou ainda maior, não que eu pensasse que isso fosse remotamente possível dada à elasticidade da boca humana. Mas então, acho que ela era parte monstro.
Uau! Eu nunca teria adivinhado que Myriam e Ursula fosse um casal. Uma ranzinza e uma deusa. Se Ursula era a esposa da Myriam, não tinha como ela ser a nova chefe do departamento. Eu ainda não entendia porque ela estava presente na grande reunião do meu pai. Bem quando eu estava prestes a responder, alguém no palco pediu que todos se sentassem, então o presidente poderia começar a falar. Eu me inclinei para Myriam enquanto nos sentávamos.
– Você sabe quem é o novo chefe de departamento?
– Sim.
– Você vai dividir as notícias comigo? – é errado bater em uma mulher. Até mesmo na Myriam Castle.
– Eu sou temporariamente sua nova chefe, Kellan. – Myriam respondeu com um olhar sinistro em seu rosto.
Eu não pude fazer nada a não ser afundar em minha cadeira, desejando desaparecer em um buraco no chão ao pensamento dela ser minha nova chefe. Não apenas eu teria que obedecer ao meu pai na nova Universidade Braxton, mas enquanto estivesse dando aulas na faculdade existente, Myriam iria ter controle sobre tudo o que eu fizesse.
Meu pai pegou o microfone e começou seu discurso. Depois de agradecer a todos por comparecerem ao local, ele disse que o Conselho de Curadores havia passado por uma longa e árdua busca pelo novo presidente. Ele mencionou como foi uma decisão apertada, e que o segundo lugar era um candidato maravilhoso e brilhante, mas que no fim escolheram outra pessoa para assumir a liderança como o próximo comandante de Braxton.
– É o meu privilégio dar as boas vindas a nossa nova presidente, Ursula Power, que...
Agora eu entendi por que ela estava aqui. Não como esposa da Myriam. Nem como um novo membro do corpo docente. Mas como a nova presidente da faculdade. Até mesmo com a Myriam sendo promovida a chefe do departamento de comunicações, Myriam ainda se reportava ao Reitor Mulligan, então isso não violava nenhuma política. No fim, o reitor se reportava ao presidente e ao Conselho de Curadores, o que significava que naquele nível, não havia muitas preocupações sobre os relacionamentos das pessoas. Eu parei de prestar atenção ao discurso do meu pai enquanto refletia sobre todas as repercussões das mudanças em Braxton. Quando fiquei alerta novamente, eu percebi uma mudança de assunto no palco.
– E isso me dá o maior prazer de anunciar quem irá trabalhar comigo para liderar a nova Universidade Braxton. Por favor, venham ao palco, o Professor Kellan Ayrwick e a Reitora Fern Terry. – meu pai disse.
Enquanto eu ficava em pé, eu percebi o sorriso incômodo da Myriam finalmente começar a diminuir. Encontrei forças para me juntar à Reitora Terry, e juntos nós marchamos os degraus para o palco e encaramos a multidão. Tudo o que eu podia pensar no momento era que eu tinha me enfiado fundo demais no erro estúpido e ridículo de voltar a morar em Braxton. Como tantas mudanças poderiam ter acontecido dentro de apenas duas semanas? A Reitora Terry pegou o microfone primeiro compartilhando a animação dela sobre a futura direção de Braxton.
– Algumas vezes a vida te joga uns limões. E então todos lhe dizem para você fazer uma limonada. Geralmente, ela é doce demais. Outras vezes, azeda demais. Quando a vida me jogou uma bola curva do tamanho de um limão, eu jogo de volta ao universo e esqueço sobre isso. Meio como o nosso incrível time de beisebol que tem ganhado todos os jogos até agora. Os fracassos dos últimos anos são as vitórias deste ano. Eu tenho infinitos planos para a expansão da nossa maravilhosa instituição, e nada vai nos impedir de chegarmos à grandeza.
Eu admirava a habilidade dela de se recuperar das armadilhas e seguir em frente, apesar dos contratempos iniciais. Será que eu deveria seguir o exemplo dela de como lidar com o limão azedo e ranzinza da minha vida, também conhecido como Myriam Castle? Será que a Reitora Terry estava me motivando a misturar a limonada e colocar sobre minha inimiga que virou minha chefe? Enquanto eu imaginava as possibilidades, ela me entregou o microfone. Por favor, não me deixe estragar tudo isso!
– Eu estou honrado por estar aqui. Antes que eu diga qualquer coisa, me deixe chegar ao óbvio logo de cara, certo? Vocês estão provavelmente pensando... não outro Ayrwick metido comandando o show em Braxton. Eles são como coelhos aparecendo em todos os lugares... – eu peguei ambos meus pais olhando para mim com o medo em suas expressões. Então ouvi a risada da plateia. – Ou talvez vocês estejam preocupados que eu não esteja muito comprometido com esse novo papel? Deixe-me assegurar a vocês, eu não tomo decisões por impulso, e nunca digo não para um desafio. De que outra maneira eu poderia sobreviver sendo o filho do meio de Wesley e Violet Ayrwick?
Minha mãe segurou meu pai enquanto ele se aproximava do centro do palco. Eu assenti para ele e sussurrei “Confie em mim” o que pareceu segurá-lo por um pouco.
– Meus pais me deram todas as suas forças, e estou confiante de que eu aprendi com os melhores. Estou ansioso para servir a todos vocês enquanto nós pegamos os limões da Reitora Terry e mandamos eles para fora de campo. – a sala irrompeu com um grande aplauso, e por um momento, eu me senti no topo do mundo, apesar de tudo o que havia acontecido ou do que eu havia perdido nos últimos dias.
Assim que os anúncios terminaram, eu fui até os bastidores para ter um momento sozinho. Queria ficar por ali para conversar com algumas pessoas, mas Emma iria chegar a qualquer minuto, e ela era exatamente do que eu precisava para me sentir melhor e encontrar alguma normalidade novamente. Eu ouvi meu celular tocar e o retirei do meu bolso. Era Eleanor.
– Hey, por favor, me diga que Emma está aqui, e que tudo no mundo está no lugar novamente. – eu disse.
– Sim, mas nós temos um problema, Kellan.
– O que tem de errado? Eu fiquei preocupado que Emma não tivesse se sentindo bem ou que Cecilia estava se fazendo de difícil sobre a estadia longa em Braxton. – eu saí dos bastidores e entrei em um camarim para ouvir melhor a ligação.
– Eu não tenho certeza de como dizer isso. – Eleanor respondeu.
– Corta essa. Se for sobre minha filha, não me deixe no suspense. – Eleanor podia, às vezes, ser extremamente dramática. Eu já tinha tido o suficiente por um dia hoje.
– Ela não está sozinha.
– O que você quer dizer? – eu perguntei, tentando conter meu aborrecimento crescente com a minha irmã.
– Francesca está aqui também. Parece que sua falecida esposa não estava assim tão morta no final das contas.
[1] Mata Hari foi uma dançarina exótica acusada de espionagem durante a Primeira Guerra Mundial.
[2] A alternância de um time entre a defesa e o ataque é chamada de entrada. Os jogos profissionais são constituídos de nove entradas ou innings.
James J. Cudney
O melhor da literatura para todos os gostos e idades