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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


Bom Ladrão / Vinicius de Moraes
Bom Ladrão / Vinicius de Moraes

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

Bom Ladrão

 

 

São horas, inclina o teu doloroso rosto sobre a visão da velha paisagem quieta

 Passeia o teu mais fundo olhar sobre os brancos horizontes onde há imagens perdidas

 Afaga num derradeiro gesto os cabelos de tuas irmãs chorando

 Beija uma vez mais a fronte materna.

 São horas! Grava na última lágima toda a desolação vivida

 Liberta das cavas escuras, ó grande bandido, a tua alma, trágica esposa

 E vai - é longe, é muito longe! - talvez toda uma vida, talvez nunca…

Foi outrora… Dizem que primeiro ele andou de mão em mão e muito poucos o quiseram

 E que por ele foi transformada a face da vida e que de medo o enterraram

 E que desde então ninguém se atreve a penetrar a terra bendita.

 É a suprema aventura - vai! ele está lá… - é tão maior que Monte-Cristo!

 Está lá voltado paradamente para as estrelas claras

 Aberto para a pouca fé dos teus olhos

 Palpável para a insaciedade dos teus dedos.

 Está lá, o grande tesouro, num campo silencioso como os teus passos

 Sob uma laje bruta como a tua inteligência

 Numa cova negra como o teu destino humano.

 No entanto ele é luz e beleza e glória

 E se tu o tocares, a manhã se fára em todos os abismos

 Rompe a terra com as mesmas mãos com que rompeste a carne

 Penetra a profundidade da morte, ó tu que jogas a cada instante com a tua vida

 E se ainda assim te cegar a dúvida, toca-o, mergulha nele o rosto sangrento

 Porque ele é teu nesse momento, tu poderás levá-lo para sempre

 Poderás viver dele e só dele porque tu és dele na eternidade.

 Porém será muito ouro para as tuas arcas...

 Será, deixa que eu te diga, muito ouro para as tuas arcas...

 Olha! a teus pés Jerusalém se estende e dorme o sono dos pecadores

 Além as terras se misturam como lésbicas esquecidas

 Mais longe ainda, no teu país, as tuas desoladas te pranteiam

 Volta. Traze o bastante para a consolação dos teus aflitos

 Tua alegria será maior porque há ulcerados nos caminhos

 Há mulheres perdidas chorando nas portas

 Há judeus a espoliar pelas tavernas

 Volta... Há tanto ouro no campo-santo

 Que tua avareza seria vã para contê-lo

 Volta... Ensina à humanidade a roubar o arrependimento

 Porque todo o arrependimento será pouco para a culpa de ter roubado...

 

Porém tu serás o bom-ladrão, tu estarás nas chagas do peito…

 

                                                                                                  Vinicius de Moraes

 

Carlos Cunha Arte & Produção Visual

 

 

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