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Matthew MacBrown havia iniciado há três anos seus estudos na faculdade de Direito, na cidade de Nova York. Ele pertencia a uma família americana tradicional da época. Naqueles tempos, com o coração aberto para o amor, ele havia se apaixonado por uma atriz e dançarina francesa, dez anos mais velha, cujo nome artístico era Louise Claviere. Louise vivia nos Estados Unidos desde sete anos antes do início da Primeira Guerra Mundial.
E por que seria esse um amor complicado? Simplesmente pelo fato de que o pai de Matt era um homem rigoroso e jamais admitiria que seu filho, um rapaz de família nobre, se relacionasse com uma atriz sem família, sem fortuna e imigrante. Mulheres artistas não eram bem vistas no início do século XX, muito menos perante as famílias mais tradicionais. Porém nada impedia que o amor dele por Louise crescesse cada vez mais.
Matthew não perdia um só espetáculo de Louise, que sempre aconteciam em um dos teatros da Broadway. Em todos os finais de semana lá estava ele nas primeiras fileiras, apreciando as apresentações de sua amada com quem já se relacionava há dois anos. Ela sentia- se envaidecida, e mal podia esperar pelo momento de ter mais uma vez seu amor nos braços.
— Louise, querida, você esteve incrível no espetáculo desta noite! — Matthew afirmou.
— Que surpresa você aqui em meu camarim. Como te deixaram entrar? — Louise se mostrou surpresa ao vê-lo.
— Eu dei um jeito. Trouxe essas flores, espero que goste. — Ele estendeu o buquê em direção a ela.
— Que rosas lindas e perfumadas! Muito obrigada, Matt. — Ela agradeceu.
— Temos que comemorar o seu sucesso de hoje! Que tal jantarmos no melhor restaurante de Nova York? — Ele a convidou.
— Não sei. Seus pais podem não gostar de saber que você esteve comigo. Podem até pensar que você está à toa por aí, perdido com uma mulher mais velha. Alguém pode nos ver e contar a eles. Conheço seu pai. Não quero te prejudicar. — Louise disse, sorrindo.
— Com meus pais eu me entendo depois. O importante é estarmos juntos nesta noite tão linda. Vou aproveitar que não há ninguém pra nos censurar agora e vou te dar um beijo. — Ele a beijou rapidamente.
— Você é louco, Matthew!
— Sim, sou louco de amor por você!
— Tudo bem. Vendo você aqui tão atencioso, não posso recusar o convite. Me espere no carro, na saída do teatro. Vou colocar meu melhor vestido para o momento — Louise afirmou com olhos brilhando de admiração.
— Sim. Te espero lá fora.
Louise ficou o mais linda que pôde, especialmente porque a ocasião exigia. Seu aniversário de trinta e um anos se aproximava e Matthew era seu primeiro amor verdadeiro, o melhor namorado que ela havia tido. Dentro do carro ele a esperava com semblante de felicidade, como se tivesse algo importante a revelar.
— Entre, depressa, minha amada. — Ele disse.
— Já entrei! Fiquei surpresa em ser convidada pra jantar hoje. Não esperava. Andava sempre com medo da reação dos seus pais.
— É que agora é diferente, esta noite é especial. — Ele garantiu.
— Estou muito curiosa pra saber o motivo de tanta alegria no seu olhar. Mas mudando de assunto, qualquer dia você me ensina a dirigir seu carro? — Ela quis saber.
Ele sorriu.
— Ensino sim. Faz só seis anos que temos carros na família. Meu pai quase não se acostumou com a novidade, ele sempre foi muito apegado às carruagens antigas. Ele tem um motorista, mas eu prefiro dirigir sozinho meu Daimler Benz 1910! — Matthew exclamou, segurando no volante e dando a partida em seguida.
— Tenho muita vontade de aprender a dirigir, no entanto eu sou mulher e mulheres não dirigem. Além do mais, eu não tenho um carro, custa muito caro. Meu salário de atriz cobre apenas minha moradia e poucas regalias. — Louise disse.
— Não diga isso, logo tudo que é meu será seu.
— Como assim, Matt? Tudo que é seu será meu? Que história é essa? Explique-se melhor! — ela perguntou atônita enquanto ele dirigia.
— Quando chegarmos ao restaurante você vai saber! — ele afirmou, sorrindo.
O restaurante francês Goumard estava lotado naquela ocasião. Depois de pedirem o prato principal, Matthew olhou nos olhos de Louise e pronunciou as palavras de uma declaração de amor:
— Louise, eu quero te perguntar uma coisa. — Ele iniciou a conversa.
— Pergunte! Está me deixando aflita. O que tem de tão importante pra me dizer?
Ele respirou fundo, tirou uma caixinha do bolso do paletó, encarou-a.
— Louise, quer se casar comigo? — Matthew revelou seu maior desejo, mostrando o anel de noivado que havia comprado pra ela.
Louise abriu os olhos, surpreendida pelo pedido, ao ver aquele anel quase faltou-lhe o fôlego, parecia ser caro, mal podia acreditar nas palavras de seu amado.
— Matt, o que está dizendo? Casar? Confesso que estou surpresa com seu pedido. Me sinto feliz por saber que esse é o seu desejo, entretanto seus pais são contra o nosso relacionamento e seria muito mais contra o nosso casamento. Eu nunca deixarei de ser atriz só pra agradar seu pai. Ainda estou construindo minha carreira artística e, além do mais, sou muitos anos mais velha que você. Sua família não aceita isso. Quer ser deserdado? — Louise respondeu com as palavras da realidade.
— Eu não me importo com meus pais, e não quero que você deixe de ser atriz. Se você me ama de verdade, o que poderia impedir nosso casamento? Você me ama? Já nos relacionamos há dois anos e penso que já é hora de estarmos juntos de verdade.
— Claro que eu te amo! Mas como acha que poderemos nos casar contra a vontade de seus pais?
— Meus pais não precisam saber de nada, aliás, ninguém precisa.
— Está me dizendo que vamos nos casar escondidos?
— Sim. Você não tem pai nem mãe, e eu já sou adulto. Louise, não precisamos de autorização de ninguém para casar.
— Eu não sei se é correto afrontar seus pais dessa maneira. E depois que todos descobrirem?
— Depois disso já estaremos casados e não poderão fazer nada para nos separar.
— Isso é algo precipitado. Você ainda é tão jovem, vai perder a chance de amar outras mulheres mais novas, mulheres da sua classe, de família nobre.
— Eu não quero as mulheres da minha classe, nem de família nobre. Não quer se casar comigo?
— Matt, eu quero muito. Mas eu acho isso arriscado, pode ser uma escolha imponderada no momento.
— Vamos nos casar apenas no civil e pronto.
— Eu preciso pensar antes. Casar não é algo tão simples assim, muito menos nas condições em que faremos.
— Louise, eu quero viver a minha vida ao seu lado e sem ter que esperar mais por isso.
— Nada me faria mais feliz do que ser casada com você. Mas do que você vai trabalhar? Ainda não terminou a faculdade. E se tivermos filhos? Não é fácil sustentar uma família. Agora vive do dinheiro dos seus pais, mas quando nos casarmos não terá mais nada.
— No momento estou em um estágio não remunerado no setor jurídico da empresa do meu pai, por isso já tenho experiência. Continuarei estudando até concluir o curso, enquanto isso, posso trabalhar como estagiário do meu professor na universidade e no escritório dele também. Eu estudo com uma bolsa. Não terei despesas pra concluir os estudos, falta pouco tempo. Logo serei um advogado de renome.
— A realidade pode ser diferente. Com a empresa do seu pai não poderá contar mais. E onde vamos morar?
— Alugaremos um apartamento.
— Preciso de alguns dias pra pensar. Marcamos um encontro e te darei minha resposta.
— Está certo, eu espero ansioso por esse dia.
— Guarde o anel, agradeço, mas ainda não posso aceitá-lo.
— Sei que logo o verei em seu dedo.
— Talvez. Acho que agora temos que jantar.
— Sim, eu te trouxe aqui para comemorarmos. — Ele mantinha o brilho no olhar.
Nos dias que se seguiram Matthew mal conseguira dormir, de certa maneira a chance de Louise não aceitar o pedido de casamento o inquietava, o angustiava. Marcaram um encontro no Central Park, que aconteceu em um fim de tarde.
Pouco antes do horário combinado, Louise já estava lá, esperava inquieta pela presença de Matthew.
Ele chegou um pouco atrasado, naquele dia havia ficado até mais tarde no escritório em que estagiava.
— Louise. É bom te ver aqui. Peço desculpas pelo atraso. Hoje trabalhei um pouco mais no estágio, te trouxe essas flores.
— São lindas, obrigada.
— Não consegui dormir direito durante esses últimos dias pensando em sua resposta.
— Imagino. Eu refleti muito sobre nosso relacionamento e já tenho uma resposta pra você
— Então, sem mais mistérios, minha amada, me diga logo. Você aceita se casar comigo?
Louise pensou em silêncio por alguns instantes, respirou fundo e respondeu:
— Sim, Matthew. Eu aceito me casar com você.
— Louise, meu amor, eu sabia que aceitaria estar ao meu lado pra sempre. — Ele comemorou abraçando-a com força.
— Mas há uma condição. — Ela disse em tom de voz firme.
— Que condição? — perguntou sério, depois do abraço.
— Eu me caso com você só depois que concluir seus estudos na universidade, começar a trabalhar com seu professor e alugar o apartamento onde vamos morar. Eu ajudarei nas despesas, mas a vida de um homem casado exige mais responsabilidade, exige uma estabilidade. Você me entende?
— Sim, meu amor, eu entendo, farei tudo isso, em pouco tempo eu concluo meus estudos. Inclusive quero que você vá para o apartamento onde viveremos assim que eu o alugar. Mas não deve se preocupar, o meu carro é minha propriedade, meu pai me deu de aniversário, tenho os documentos comigo. Posso vendê-lo por um bom preço e viveremos bem por muito tempo. — Matthew ficou atônito de tanta alegria ao receber a mais desejada resposta de sua vida.
— Sabemos que não é fácil vender um carro assim tão caro, e até que isso seja uma realidade precisamos de garantias de que você terá uma profissão. Estou muito feliz porque seremos uma família, mas antes de qualquer coisa temos que ser prudentes e planejar tudo. Seu pai pode perfeitamente tomar esse carro de volta. — Ela sorriu, segurando as mãos dele.
— Como você quiser, Louise. O que mais me importa é estar ao seu lado todos os dias. — Matthew afirmou, abraçando-a em seguida.
Na mansão da família MacBrown todos estavam sentados à mesa: Andrew MacBrown, Glenda, Violet e o Matthew.
— Violet, como foram as aulas no colégio? Conte-nos o que aprendeu, minha filha — Glenda perguntou, olhando para o rosto da jovem.
— Aprendi um pouco de história da arte e ciências. Falamos sobre os autores de quadros importantes e também autores de peças teatrais. Mãe, eu já assisti no teatro a uma das peças que eu li. A atriz Louise interpretou o papel principal — Violet respondeu com entusiasmo.
Andrew, o chefe da família, iniciou seus comentários, já sentado à mesa:
— Não sei por que perdem tempo ensinando essas coisas pra vocês no colégio. Por que mulheres têm que aprender artes e ciências? Bastava apenas saber ler, escrever e tocar piano para serem boas esposas e mães, como era nos meus tempos — Andrew questionou.
— Ora, pai, não seja radical. O mundo está evoluindo e as mulheres já desempenham outros papéis na sociedade além de mãe e esposa. Outro dia o senhor foi conosco ao teatro e adorou a peça que a Louise interpretou. — Matthew defendeu sua amada.
— Sim, meu filho, eu fui ao teatro, mas isso não significa que eu considere ser admirável a profissão de atriz, por exemplo. Assim como é uma perda de tempo ser um escritor ou mesmo um pintor de quadros. Eu jamais aceitaria que uma filha minha ou filho meu fossem artistas. Esse tipo de atividade não é para as pessoas de nossa classe social, que continue sendo praticada por outras pessoas que não os membros da minha família. — Andrew se mostrou enfático.
— E se uma filha ou filho seu quisesse se casar com um artista ou com uma atriz? — Matthew questionou o pai, para testá-lo.
— Que bobagem é essa que está me perguntando, Matthew? Por acaso está apaixonado por alguma artista? — Andrew se mostrou descontente com a pergunta.
— Não é nada disso! Apenas questionei porque faz parte do assunto que estamos discutindo — Matthew se justificou.
— Essa é uma pergunta absurda! Eu jamais aceitaria um filho meu casado com uma atriz, fosse ela rica ou pobre. E se não fosse atriz e fosse pobre eu não aceitaria do mesmo jeito — Andrew respondeu em tom de voz alterado.
— Querido, não se exalte, estamos apenas conversando. Acredito que não devemos ser tão radicais, não digo quanto ao casamento, mas ser artista é algo tão encantador. Nossa filha pinta quadros lindos, meu amor. — Glenda tentou acalmar o marido.
— Quanto aos quadros que Violet pinta por mero passatempo, não me importo! Mas ela que não queira vendê-los nem expô-los em galerias, nem em qualquer outro lugar. Não deve tornar pública essa atividade — Andrew disse com voz firme.
— E por que não, pai? Por que não posso tornar pública minha arte? Eu amo estudar e pintar meus quadros — Violet perguntou ingênua, mas quase indignada.
— Violet, minha filha, já conversamos sobre isso, pare de aborrecer seu pai. Eu também acho muito lindos os quadros que você faz, mas entenda que eles devem permanecer guardados aqui em casa. Pode até dar de presente para as pessoas da nossa família, e nada além disso!
— Acho que é melhor mudar o assunto da conversa. — Andrew disse.
— Pai, então quer dizer que as mulheres não podem bordar, não podem nem mesmo tocar piano nas festas? Música também é arte.
— É claro que podem. Eu falei em bordar ou em tocar piano?
— É que bordar é uma arte, pai! E música também é — Violet relembrou-lhe.
— Filha, se você se sentar ao piano e compuser uma música eu não me incomodo, se você se trancar no quarto e pintar quadros eu não me incomodo, se você escrever um livro eu não me incomodo. Você pode fazer arte, contanto que não torne públicos seus quadros, suas músicas nem seus livros. A arte, principalmente para mulheres, deve ser apenas um passatempo particular, de divulgação no máximo entre a família, uma maneira de se distrair, sem publicidade, sem divulgações.
— Qual é o problema em divulgar a arte, pai? — Matthew estava com olhos vermelhos de indignação.
— O problema é que a sociedade tradicional não vê com bons olhos mulheres artistas. Isso prejudica um bom casamento no futuro. Entende o que eu quero dizer, minha filha? — Andrew tentou explicitar seu ponto de vista.
— Sim, entendo perfeitamente o que o senhor quer dizer — Violet demonstrou conformação.
— E você, Matthew, entendeu? Nada de atrizes, nem dançarinas. — Andrew reforçou as regras.
— Por que não mudamos de assunto? — Glenda quis pacificar a discussão.
— Eu o conheço muito bem, pai, e não sei por que diz isso. Por acaso eu estou de casamento marcado com alguma atriz ou dançarina? — Matthew perguntou.
— Não sei, mas percebo que você não sai daquele teatro, tem assistido a todos os espetáculos. Será que não se apaixonou por alguma personagem? — Andrew mostrou que estava vigilante quanto à vida dos filhos.
— Eu? Apaixonado? Não, não mesmo. Eu vou ao teatro apenas para me distrair e dirigir meu carro pela cidade, afinal o senhor não me deu esse maravilhoso automóvel pra continuar guardado na garagem, não é mesmo?
— Nesse ponto você tem razão, meu filho. Deve exibir seu poder por toda a Nova York, porque você é filho de um dos maiores industriais americanos. As mulheres das melhores famílias nova-iorquinas desejarão se casar com você.
— Sim, eu sou — Matthew concordou sem graça. Suspirou de cansaço depois do discurso do pai.
O tão sonhado dia do casamento de Louise e Matthew se aproximava. Como ele havia prometido à sua amada, começou a trabalhar como estagiário na universidade e também alugou um apartamento em Nova York. Até mesmo procurou um comprador para o carro.
O dinheiro que Louise ganhava como atriz e dançarina não era muita coisa, apenas o suficiente para que ela sobrevivesse, portanto seu futuro marido deveria ser autossuficiente o bastante para manter uma família sem a fortuna do pai.
Violet amava música clássica e artes plásticas. Obedecendo às ordens de seu pai, ela começou a compor músicas em segredo, sem divulgações nem publicidade. De vez em quando, tentando demonstrar que era um pai tolerante e moderno, ele passava ao lado do piano e perguntava se as músicas já tinham nome.
— Pai, e se depois que eu morrer alguém encontrar minhas partituras e fizer publicidade das minhas músicas? E se me fizerem conhecida no futuro?
— Se isso acontecer, eu já não estarei mais vivo pra ver, por isso não me importará.
— Então comporei ainda mais. Quero deixar coisas boas paro o futuro.
— Minha filha, não pense no futuro, não perca tempo pensando naquilo que ainda não existe.
— Sim, pai, tem razão. É melhor pensar no agora!
Em um almoço com seu professor e amigo Kelvin Stuart, o jovem Matthew teve que confessar a verdade sobre seus planos e desejos.
— Matt, muito me surpreendeu o fato de você querer começar a trabalhar comigo, afinal, você é tão rico, e poderia até obter um ótimo emprego na indústria de seu pai.
— Mas eu devo trabalhar na minha área, que é a jurídica, afinal sou um estudante de Direito.
— Não sei por quê, mas você anda estranho ultimamente.
— Estranho?
— Sim, estranho, como se estivesse escondendo um segredo.
— E você está certo.
— Está escondendo um segredo?
— Sim.
— Qual?
— Eu vou me casar.
— Casar?
— Sim, casar!
— Não ouvi rumores sobre casamento nem nada parecido. Essas coisas costumam se espalhar rápido. E quem é a dama da alta sociedade?
— Ela não é da alta sociedade.
— Não é?
— Não. Ela é uma atriz e dançarina francesa que ganha um salário razoável, ainda está construindo a carreira. Seus espetáculos acontecem toda semana em um teatro na Broadway.
— Uma atriz? E seus pais aceitaram esse casamento?
— Não. Meu pai jamais aceitaria que eu me casasse com uma atriz, que, além de tudo, não é de família rica.
— E então?
— Vou me casar escondido.
— Escondido? Você está louco! Vai perder toda a sua herança e a boa vida por causa de uma atriz!
— Acontece que eu a amo muito. Já está tudo preparado, o nosso apartamento, o meu trabalho e o casamento marcado no cartório. Vou vender meu carro para termos mais dinheiro guardado.
— Meu amigo, devo reconhecer que agora você está se tornando um homem de verdade.
— Eu tenho um pedido a fazer.
— Faça.
— Kelvin, você e sua esposa poderiam ser minhas testemunhas de casamento?
— Fico feliz com o convite. Seremos suas testemunhas com muito prazer e guardarei segredo, com certeza.
— Obrigado, meu amigo. Eu sabia que poderia contar com a sua ajuda — agradeceu sorrindo.
Aquele dia foi o mais lindo para Louise e Matthew. Enfim eles haviam se casado no cartório de Nova York City. O vestido dela era dourado, cheio de detalhes e bordados, lindo.
Louise chorou emocionada. Agora era uma mulher casada com o homem que amava.
— Matthew, meu amigo, estou feliz por você. Quando pretende contar à sua família que você se casou? — Kelvin perguntou.
— Não quero demorar muito. No próximo mês eu vou contar tudo. Por enquanto eles acreditam que estou viajando a trabalho com você. Eu não queria ter que mentir, mas, nesse caso, a Louise é mais importante do que tudo pra mim. Agora estamos juntos pra sempre.
— Pelo que vi, você ainda não vendeu o carro.
— Ainda não, está estacionado lá fora. Vou com ele pra minha nova casa.
— Não vai viajar em lua-de-mel?
— Não. No momento não podemos gastar dinheiro com viagens.
— Então, seja feliz, meu amigo. Seja feliz, Louise! — Kelvin desejou-lhes. Sua esposa Josephine o acompanhava naquele momento.
— Sejam muito felizes. Você está linda, Louise. — Josephine felicitou-a com um abraço.
— Obrigada, Kelvin e Josephine. Venham nos visitar qualquer dia desses. Agradeço muito por terem vindo ao nosso casamento e serem nossos padrinhos.
— Nós é que ficamos contentes por participar deste momento, Louise — Kelvin ressaltou.
Os recém-casados seguiram para o apartamento novo, onde passariam a noite de núpcias e todas as outras noites de suas vidas.
— Louise, estou tão feliz por agora sermos marido e mulher. Esse carro também é seu, pelo menos até eu vendê-lo — Matthew disse sorrindo, enquanto dirigia até seu novo lar.
— Estou feliz também, mas ainda me preocupo com a reação do seu pai. Sei que sua mãe não se importa, nem sua irmã.
— Fique tranquila, meu amor. Eu resolverei tudo com eles.
— Tudo bem, mas antes de você vender o carro quero que você me ensine a dirigir.
— Sim, eu ensinarei.
Ao chegar a seu novo apartamento, Matthew sentiu-se pela primeira vez em seu verdadeiro lar. Estava tudo pronto e impecavelmente preparado por Louise. Ele deixou as bagagens no chão da sala e ficaram se olhando fixamente, sorrindo. Seu maior desejo se realizava naquele momento.
— Louise, meu amor, agora que está tudo pronto, quero que dance comigo, tenho um presente escondido atrás das cortinas.
— Um presente? O que é? Estou curiosa.
— Abra as cortinas.
— Matt, é um gramofone Paillard! Que lindo! E os discos com as músicas, você também comprou?
— Claro que eu os comprei. Aqui estão os discos! Comprei dez! Cada um tem apenas uma música.
— Eu nunca tive um gramofone. Essa é a primeira vez. Custa tão caro! Por que foi gastar? Não precisava! Vamos colocá-lo naquela mesa, bem ali — ela disse, colocando o gramofone na mesinha do canto.
— Agora vou tocar a música que eu quero dançar com você. — Ele ligou o aparelho, colocou o disco e a música começou a tocar. Era de Johann Sebastian Bach, “Air On The G String”.
Matthew beijou sua esposa com todo amor enquanto dançava com ela a doce canção. Sorriam e se abraçavam como se todo o amor que sentiam um pelo outro jamais pudesse ter um fim.
Louise fez seu primeiro espetáculo depois de casada, uma apresentação com dança. Com todo o vigor de uma nova vida, estreou seu sorriso de mulher amada e plenamente realizada. Ela estava maravilhosa e divina. Matthew sentou-se à primeira fileira contemplando todo o talento de sua linda esposa.
Um mês havia se passado e enfim chegara o momento de Matthew assumir seu casamento perante seus pais.
Ao entrar na mansão ele já não se sentia mais em casa.
— Matt, meu filho. Você voltou! — Sua mãe o recebeu com um sorriso sereno e um abraço carinhoso.
— Mãe, aqui estou, de volta. Onde está o papai? — Olhou para os lados, intencionando encontrar Andrew ali.
— Seu pai está no escritório da fábrica. Como sempre trabalhando muito.
— E Violet, onde ela está? Quero abraçar minha querida irmã.
— Ela está no colégio, volta mais tarde. Onde estão suas malas? — Glenda se mostrou em dúvida.
— Quase esqueço que ela ainda frequenta o colégio. É uma moça tão evoluída que nem precisaria de escola. Então só me resta falar com você primeiro, mãe. Saindo daqui eu vou à fábrica falar com o papai.
— O que tem para me dizer? Onde está sua bagagem? No carro? — questionou-o preocupada. Seu semblante já não era mais de uma mãe alegre ao ver o filho.
— Mãe, eu não voltei pra ficar nessa casa.
— Não?
— Não, mãe. Eu me casei em segredo com a atriz Louise Claviere, já faz mais de um mês. Estamos muito felizes em nosso novo lar.
Glenda sentiu uma leve vertigem, colocou as mãos na cabeça, respirou fundo, tentando não desmaiar com a notícia trágica que acabara de receber.
— O quê? Meu filho, você enlouqueceu? Seu pai jamais aceitará uma coisa dessas! Está brincando, não é mesmo?
— Sei que ele nunca aceitará. E eu não me importo. Estou feliz com ela e eu só quero viver a minha vida em paz, afinal já sou um adulto.
— Não sei o que dizer. Espero que você seja feliz, mesmo sabendo que seu pai ficará furioso. Ele sentirá muita raiva. Se ao menos sua esposa deixasse de ser atriz, talvez ele a aceitasse algum dia.
— Minha esposa é uma grande artista e jamais deixará de sê-lo.
Matthew dirigiu até a fábrica de seu pai. Ansioso, adentrou o escritório para dar-lhe a notícia.
— Matthew, meu filho, que bom que voltou! Como foi a viagem? — Andrew perguntou ingenuamente.
— Pai, tenho uma grande notícia e, apesar de saber que o senhor vai odiá-la, quero que saiba que estou muito feliz pela decisão que tomei.
— Notícia? Que notícia? Que decisão? Explique-se melhor.
— Eu não estava viajando.
— Não? Onde estava?
—- Eu me casei escondido e durante todos esses dias eu já estava vivendo em meu novo lar com minha esposa.
— Que loucura é essa, meu filho? Como você pôde se casar sem avisar a sua família? Sem que os seus pais soubessem? Você enlouqueceu? Por que fez isso?
— Porque o senhor jamais aceitaria minha esposa.
— E quem é a sua esposa?
— Eu me casei com a atriz Louise Claviere.
— O quê? Isso não pode ser verdade. Você é meu filho e jamais se casaria com esse tipo de mulher. E, pra piorar tudo, essa atriz é muito mais velha que você.
— Mas eu me casei com ela sim, e estou aqui apenas para lhe avisar que não volto mais pra sua casa porque agora moro com minha esposa.
— Matthew, se isso é verdade, então você não é mais meu filho a partir de agora. E esqueça todo o meu dinheiro! — Andrew MacBrown declarou arrogante, com olhar furioso.
— Eu não quero o seu dinheiro. Apenas lamento muito não ser mais seu filho. Adeus! — Matthew disse transtornado, saindo dali com lágrimas nos olhos.
O jovem universitário saiu do escritório do pai de cabeça baixa. As duras palavras do homem que lhe havia dado a vida fizeram-no se entristecer. Agora era órfão. Não era nada fácil deixar para trás toda a sua família em nome de um grande amor.
Com lágrimas correndo pelo rosto, Matthew entrou em seu carro. Estava nervoso. Na verdade, ele ainda era apenas um rapaz imaturo que jamais estivera preparado para ser um bom marido nem assumir uma família. A sensação de não ser mais filho de ninguém perturbou-lhe a mente de tal maneira que, ao cruzar a movimentada avenida Staten Island, onde passavam dezenas de carros e vários bondes elétricos, distraiu-se. Não foi capaz de enxergar mais nada à sua frente, pois se lembrava apenas da rejeição e desprezo de seu pai. Ao atravessar os trilhos, chocou-se com o bonde. Atirado para longe, o carro de Matthew bateu em mais dois automóveis. Seu corpo foi lançado para fora, bateu a cabeça e estilhaços e pedaços de ferro feriram seu corpo.
Outros também foram lesados. Havia sangue no chão. O pior aconteceu. Matthew MacBrown estava morto.
A morte de Matthew foi uma verdadeira tragédia. Ao receberem a notícia através de uma autoridade policial, Glenda e Violet entraram em pânico a ponto de desmaiarem. Não podiam acreditar que aquilo era verdade. Andrew, no entanto, recusou-se a ir ao velório do próprio filho, porque lá estaria também a atriz viúva tão desprezada por ele.
Louise, arrasada, vestida de preto, inconsolável, concordou em sair do velório por uns minutos. Josephine e Kelvin acompanharam-na até os fundos da igreja. A manobra era apenas para que Andrew MacBrown pudesse se despedir de seu filho sem encarar Louise.
— Obrigada por entender meu marido, Louise. Eu sei que meu filho te amava muito. Você foi o grande amor da vida dele desde sempre, nunca houve outra. — Glenda agradeceu-a com um abraço sincero.
— Senhora MacBrown, eu não tenho mesmo condições de continuar aqui nesse velório por muito tempo. Irei ao fundo da igreja para que seu marido se despeça do seu filho, depois virei dar meu último adeus. Em seguida voltarei ao meu apartamento. Não quero presenciar o enterro, não suportaria. Irei para minha casa pensar no que farei da minha vida. Enterre seu filho ao lado de seu marido e de sua filha. Eu já não tenho mais nada a fazer aqui — Louise afirmou, retirando-se amparada por Josephine, que a levou para os fundos da igreja.
— Meu filho! Por que fez isso? Me perdoe! — Andrew lamentou sobre o caixão de Matt.
Ele voltou para casa. Retornaria no dia seguinte para o enterro. Louise despediu-se para sempre de seu grande e talvez único amor. Sobre o caixão de seu falecido marido ela derramou suas últimas lágrimas. Kelvin e Josephine levaram-na de volta ao apartamento, agora tão frio e vazio sem seu amor. Louise se jogou na cama e chorou por várias horas sem parar. O que ela faria de sua vida agora?
Tudo não poderia ser pior. Um mês depois da morte de Matthew, a jovem Louise descobriu que estava grávida. Não poderia haver destino mais cruel para aquela jovem mulher. Ela não tinha condições de ser atriz e criar uma criança ao mesmo tempo. A própria gravidez a impediria de atuar.
Andrew MacBrown entrou em um estado de profunda depressão depois da morte de seu filho. Glenda adoeceu devido à uma tuberculose e morreu cinco meses depois. Andrew se viu sem saída, vendeu a fábrica e mudou-se para Londres com sua filha Violet.
Andrew vendeu sua mansão com todos os seus pertences e fotografias; não levou nada consigo, nada que lembrasse o seu passado.
George Bennett, um viúvo de cinquenta e sete anos, foi o comprador da mansão da família MacBrown. Era um imigrante inglês que há meses chegara à Nova York a procura de um novo lar. Ele só não entendeu por que os antigos donos daquela mansão não levaram consigo seus pertences. Havia fotos e quadros nas mesas e paredes. As roupas todas estavam nos guarda-roupas dos quartos.
George achou por bem deixar tudo como estava, afinal, se retirasse os retratos e os quadros, ficaria tudo tão vazio. Ele era um senhor sozinho e preferia ver lembranças da vida de outras pessoas do que lembrar de sua própria solidão. Contratou duas empregadas, Darla e Corine, o motorista Josh e o jardineiro Andy.
Passaria ali os seus dias vazios, exceto pelas vezes em que seus amigos empresários de Nova York o visitariam. George vivia de aplicações financeiras e da fortuna que havia herdado de seus pais na Inglaterra. Por vezes visitava as fábricas em Nova York, das quais tinha ações.
Louise deu à luz uma linda menina a qual chamou de Brigitte. A atriz estava desesperada, pois não tinha condições de criar nem educar decentemente sua filha. Não desejava àquela menina uma vida de pobreza nem de privações, pois queria que Brigitte pudesse, no futuro, estudar nos melhores colégios e quem sabe cursar uma faculdade.
O pior de tudo aconteceu quando o dono da companhia de teatro demitiu Louise logo no quarto mês de gravidez, momento em que já não dava mais para disfarçar o tamanho da barriga.
Louise enrolou sua filha em um xale, levou a bebê consigo dentro de um cesto e decidiu abandoná-la na porta da mansão da família MacBrown. Ela nem sabia que a família MacBrown não morava mais lá. No cesto, com o bebê, ela apenas deixou um bilhete escrito “Cuidem de nossa filha Brigitte, ass.: Louise Claviere”.
O cesto com a criança foi deixado na porta da mansão.
George passava pela sala quando percebeu um choro de criança. Achou que estava ouvindo coisas e seguiu para a cozinha. Não adiantou nada. O choro continuava, vinha da porta. Ele ficou apreensivo. O que estaria acontecendo?
Abriu a porta, olhou para baixo e se surpreendeu com o que viu.
— Um cesto! Com um bebê! Meu Deus! O que isso significa? — ele questionou a si mesmo assustado.
Logo percebeu que o bebê era uma menina, pois usava um vestido rosa e um laço de fita na cabeça.
— Quem pode ter abandonado essa criança aqui na minha porta?
Ele leu o bilhete que estava no cesto e compreendeu que se tratava de um abandono, mas não imaginava que aquela criança era neta dos antigos donos da casa. George cogitou que talvez o antigo dono da mansão pudesse ter tido um romance com a ex-atriz, mas logo descartou essa ideia, tendo em vista que o senhor Andrew demonstrou ser um homem honrado.
George recolheu a bebê do cesto e seu coração comoveu-se. Sensibilizado, como se algo novo tocasse seu coração, ele decidiu adotar a menina. Brigitte Claviere Bennett, esse seria seu nome depois da adoção.
O que pareceu estranho foi o fato de um homem de 57 anos decidir ser pai. Era uma idade, digamos, avançada para a época. George não quis procurar por Louise, não fazia sentido para ele, ela havia abandonado a criança. Em uma rápida investigação, soube que se tratava de uma atriz não muito famosa e que já não mais atuava na cidade.
Ao contrário do que todos podem pensar, George não fez questão de contratar uma babá. Ele cuidou de Brigitte pessoalmente, com a ajuda das empregadas. Dava-lhe de comer, banhos, trocava as roupas, colocava-a para dormir. Estava sendo um verdadeiro pai.
Ele viu sua vida mudar de repente. Já tinha um filho adulto chamado Steve Bennett, que era casado e residia em Londres, mas este não mantinha contato com o pai por nunca ter aceitado o divórcio de George com sua mãe, a primeira esposa dele. George era viúvo de sua segunda mulher.
Brigitte se tornou tudo na vida de George. Ele lhe contou algumas vezes como a havia encontrado, mas, passados os anos, preferiu enterrar aquela história. Não queria incitá-la a ir atrás da mãe biológica, que certamente tinha uma ligação com a família do antigo dono da casa.
O quarto de Brigitte era lindo. Ela amava suas bonecas de vestidos coloridos.
Quando completou seis anos de idade, foi matriculada no melhor colégio da cidade, o mais caro e mais tradicional de período integral. No fim do dia o motorista a levava para casa novamente. Ela era uma ótima aluna.
— Como foi a aula hoje, minha filha? O que aprendeu? — perguntou George, demonstrando interesse pela vida dela.
— Foi muito boa, pai. Tivemos aula de literatura, matemática, artes. Eu já sei ler — ela contou-lhe animada.
— Brigitte, vá até a cozinha.
— Por quê?
— Há uma surpresa lá que eu mandei preparar especialmente pra você.
Brigitte correu até a cozinha e se deparou com uma mesa repleta de pães, doces e um lindo e delicioso bolo de chocolate.
— Então, filha, gostou?
— Adorei! Mas nem é meu aniversário, pai.
— Mas você tem sido uma criança dócil e educada. Merece seus doces e seu bolo favorito — George disse, abraçando-a com ternura.
— Eu te amo, pai! — Ela sorriu, retribuindo o carinho.
Era o ano de1926, Brigitte contava seus quinze anos de idade, naquele dia, depois de voltar do colégio, ela se deparou com seu pai passando mal no escritório da mansão.
— Pai, o que está acontecendo? Vou chamar a ambulância! — ela estava assustada.
— Filha, não estou passando bem, sinto dores no meu coração.
— Eu vou chamar um médico. Fique aqui sentado, não se mexa. Vou pegar o telefone na lista que está na mesinha.
Brigitte foi ao telefone e chamou o médico.
O doutor Andersen examinou cuidadosamente George. Em seguida, chamou Brigitte na sala e explicou-lhe tudo que estava acontecendo:
— Brigitte, seu pai já é idoso e tem problemas no coração. Ele teve um princípio de infarto. Você precisa estar preparada, porque a qualquer momento ele pode morrer. — doutor sentenciou.
— O quê, doutor? Está me dizendo que o meu pai vai morrer? Deve existir algum tratamento. Se não aqui, quem sabe na Europa.
— No caso do seu pai é inútil. Eu mesmo fiz os exames dele no hospital ainda nesta semana. Os resultados são claros, não há o que fazer.
— Mas, doutor, se meu pai morrer, o que será de mim? Ele é a única pessoa que eu tenho na vida. Eu o amo muito.
— Brigitte, seu pai quer vê-la no quarto — Corine interrompeu, avisando-a.
— Obrigada, Corine, eu já vou.
Ela dirigiu-se tristemente até o quarto de George, que já contava com mais de setenta anos de idade. Por muitas vezes Brigitte ficava nos outros quartos observando os porta-retratos da família MacBrown e se perguntava por que haviam deixado tudo ali.
— Pai. — Ela entrou, aproximando-se da cama.
— Filha, preciso falar algo importante.
— Diga, pai. Mas antes quero que saiba que eu te amo muito e sou muito grata por ter me adotado. Jamais seria feliz vivendo com outra família como eu sou com você. — Afagou os cabelos de George com carinho e olhos lacrimejantes.
— Eu também te amo, minha filha linda. O doutor te contou que eu vou morrer logo?
— Sim, me contou. E estou muito triste.
— Brigitte, escute bem, a metade dos meus bens ficará pra você. Seu irmão Steve receberá a parte dele em dinheiro. Enviei cópia do meu testamento para Londres.
— Eu não me importo com dinheiro. Só lamento que meu irmão Steve tenha vindo aqui apenas uma vez em todos esses anos. Ele mal se importou com você, papai. Ele não merece nem um centavo da herança.
— Brigitte, preste atenção: você ainda é menor, e não tem idade suficiente para administrar seus bens. Sendo assim, você precisa de alguém de confiança ao seu lado que te ajude a administrar tudo.
— E quem seria essa pessoa?
— Eu entreguei a sua tutela para o meu amigo advogado, o doutor Joseph Koller. Ele será seu tutor e cuidará de seus bens até que atinja a maioridade e tome posse dos seus bens. Eu peço que você o receba bem nesta casa.
— O doutor Joseph? Mas, pai, eu já sou uma jovem, não preciso de homem nenhum pra cuidar de mim. Meu único pai é você.
— Existem coisas sobre a vida e os negócios que você ainda não é capaz de entender, Brigitte, e outras tantas que ainda não está preparada pra viver. Joseph virá para esta casa ainda hoje e passará a morar conosco. Quando eu partir, ele já estará aqui com você, pra te apoiar — esclareceu os detalhes de sua decisão.
Brigitte sentiu-se apreensiva com a notícia, não esperava por aquilo. Joseph era um jovem advogado de vinte e cinco anos, alto, magro, sempre elegante aos olhos das mulheres. Ele já trabalhava para George há sete anos. Era um homem de total confiança.
— Sinceramente, pai, não entendo porque esse homem tem que vir pra essa casa, mas, seja como for, eu nunca aceitarei isso . — Brigitte saiu irritada do quarto.
Ainda naquela noite houve uma reunião na casa de George. Foram reunidos os empregados da casa, Brigitte e Joseph. O novo morador foi apresentado oficialmente aos demais. George permaneceu deitado na cama, pois estava muito fraco. Todos ficaram ao redor dele.
Por um momento Brigitte, que permaneceu o tempo todo em silêncio, sem cumprimentar o novo hóspede, se dirigiu à biblioteca da casa, ficou olhando através da janela e pensando em como seria sua vida ao lado de um estranho depois que seu pai morresse. Joseph seguiu-a. Sabia que, aos olhos de Brigitte, não era bem-vindo naquela casa.
— Brigitte — Joseph chamou-a ainda de um jeito mais formal. Adentrou em passos lentos a biblioteca.
— Senhor Koller. — Ela virou-se em direção a ele.
— Por favor, não me chame de senhor, apenas de Joseph.
— Desculpe, só costumo chamar pelo nome pessoas com quem tenho intimidade.
— Como quiser. Brigitte, fique tranquila, eu vou cuidar de você e do seu patrimônio, ninguém te fará nenhum mal. Estou aqui para administrar sua vida até que atinja a maioridade.
— Agradeço a sua gentileza, mas nada pode me consolar agora. Meu pai está morrendo e nada pode mudar isso.
— Ele viveu muitos anos com você e foi feliz quando te adotou. Em algum momento as pessoas têm que partir para descansar.
— Eu só não entendo uma coisa: por que você tem que morar aqui? Não é casado? Não tem família?
— Não! Eu ainda não sou casado, e meus pais moram na Califórnia.
— Pois deveria ser, Joseph. Um homem da sua idade já deveria ser um pai de família.
— Tive uma noiva, mas ela desistiu do casamento.
— Que pena! Eu estou muito cansada. Vou dormir. Tudo isso perturba a minha mente. Com licença. — Ela saiu depois que o encarou com olhos de desconfiança.
— Boa noite — ele desejou-lhe, sem ser retribuído com palavra alguma.
Apesar de ensolarada, aquela manhã foi a mais triste na vida de Brigitte. Ela acordou e foi direto ao quarto do pai. Infelizmente George não havia acordado, nem nunca mais acordaria. Estava morto!
— Pai, acorde! Pai! Não, não pode ser, você não pode morrer! Não! — Brigitte começou a gritar desesperada sobre o corpo de seu pai falecido.
Imediatamente os empregados e Joseph correram até o quarto.
— Brigitte, o que houve? Por que está gritando? — Darla perguntou, ofegante.
— Meu pai morreu! Ele não acordou.
— Sim, está sem pulso e não respira. Eu sinto muito, Brigitte — Joseph manifestou-se depois de verificar o pulso de George.
Debruçada sobre o corpo do pai, ela chorou como nunca havia chorado em toda a sua vida. Aquela foi a sua maior perda. Agora sim ela estava completamente sozinha em um mundo perigoso, cheio de enganos.
Duas semanas depois da morte de seu pai, Brigitte ainda se sentia sem forças e sem ânimo para voltar ao colégio e exercer suas atividades do cotidiano. Ela permanecia jogada na cama o dia todo, lastimando sua solidão. Não recebeu nem mesmo suas amigas, das quais ela tanto gostava.
Naquela tarde Joseph pediu licença e entrou no quarto dela. Decidiu assumir suas vezes de tutor responsável. Precisava convencê-la a voltar para o colégio, a seguir em frente com a vida.
— Brigitte.
— Joseph! O que você quer?
Ele se aproximou dela na cama.
— Eu sei que não é fácil sentir-se sozinha no mundo. Perder alguém que amamos é horrível. Mas de nada vai adiantar você ficar trancada nesse quarto o dia inteiro, sem sair, sem se alimentar direito. Estou aqui para cuidar de você, essa era a vontade de seu pai. Pelo seu próprio bem, quero que amanhã mesmo volte às aulas no colégio.
— Não quero voltar ao colégio.
— Entenda que a vida precisa continuar. Sou responsável por você e me preocupo de verdade, ainda que eu te conheça tão pouco. Você é uma moça tão bonita e inteligente, não pode continuar trancada dentro desse quarto. Tem que viver, mesmo carregando com você essa dor. Vou abrir as janelas e cortinas. — Ele abriu as janelas para arejar o quarto.
— Eu agradeço, mas não precisa se preocupar comigo. Cuide apenas dos meus bens.
— Brigitte, pedirei que a empregada prepare seu uniforme do colégio para vesti-lo amanhã. Levante-se bem cedo que o motorista já estará te esperando. Não sente falta das suas amigas? Garanto que elas estão preocupadas e desejando que você volte. A Rachel sempre telefona pra cá perguntando por você. Esteja pronta amanhã cedo. — Joseph foi enfático em suas ordens. Ele saiu do quarto.
Brigitte sentiu-se indignada por receber ordens de um homem que tinha idade para ser seu irmão mais velho. Mas sem saber por quê, no dia seguinte ela obedeceu às ordens de seu tutor e foi para o colégio. Logo na entrada, sua amiga Rachel avistou-a e correu a seu encontro.
— Brigitte!
— Rachel!
— Amiga, que bom que voltou! Telefonei tantas vezes, mas você não atendia. Fui em sua casa naquele dia e você nem quis me receber. Falei com seu tutor, o Joseph.
— Eu estava de luto, afinal, meu pai morreu. Nem me fale nesse tutor.
— Por quê? Ele é tão lindo e simpático! Você tem sorte.
— Pare de falar bobagens! Eu não gosto daquele homem! Quem ele pensa que é? Meu pai? Acredita que ele foi ao meu quarto ontem e me deu ordens pra voltar às aulas no colégio? Ele disse que eu sou muito bonita e inteligente. É muita ousadia da parte dele.
— E me conta uma coisa: você o acha bonito?
— Que pergunta é essa? Eu sei lá, nem reparei. Ele é um homem jovem, alto, inteligente, persuasivo e muito impertinente, inconveniente. Eu o detesto. O pior é que eu vou ter que aguentá-lo até completar a maioridade.
— Posso almoçar com você amanhã? Quero ver mais de perto seu novo pai.
— Pare de besteiras, Rachel! Ele não é meu pai, ele é meu tutor.
— Seja lá o que ele for, quero conhecê-lo mais de perto.
— Tudo bem, Rachel, você pode levá-lo pra você ou então trocar de lugar comigo.
— Mal posso esperar pelo dia de amanhã.
— Ah! Você é tão oferecida.
— Você que é uma boba, Brigitte.
Ao voltar da escola, depois de mais uma manhã de aula, Brigitte esbarrou com Joseph no corredor da mansão. Ela seguia em direção ao quarto e ele estava indo para o escritório da casa. Olharam-se por alguns instantes.
— Brigitte, fico feliz que esteja indo ao colégio.
— É o meu futuro. Quero cursar uma faculdade para administrar os meus negócios.
— Faz muito bem.
— A Rachel vem almoçar aqui amanhã.
— Que bom. É muito salutar que suas amigas voltem a frequentar essa casa para te fazer companhia. Podem estudar juntas.
— Sim. Com licença.
— Toda.
Joseph sentiu-se feliz por ver que Brigitte melhorava seu estado emocional e aos poucos voltava a viver. Mesmo em tão pouco tempo, ele sentia uma preocupação especial por ela.
No dia seguinte, depois da escola, Josh levou de carro Rachel até a casa de Brigitte, para almoçarem juntas.
— Boa tarde, Rachel. Seja bem-vinda.
— Boa tarde, senhor Joseph.
— Não precisa me chamar de senhor, apenas de Joseph.
— Sim, Joseph.
— Meninas, deixem as bolsas no quarto e fiquem à vontade. Espero vocês na sala de jantar.
— Sim, Joseph. Daqui a pouco estaremos lá — Brigitte assegurou.
Joseph retirou-se. Elas seguiram para o quarto.
— Brigitte, o seu tutor é lindo demais! Sorte a sua! — Rachel comentou, animada.
— Rachel, pare de dizer bobagens! Sorte minha por quê? Como você é exagerada! Até parece que nunca viu um homem bonito.
— Como Joseph eu nunca vi não. Então você admite que ele é lindo?
— E por que não? Feio ele não é. Eu estudo tanto, não tenho tempo de reparar nessas coisas.
— Não seja tão radical. Se eu fosse você, eu aproveitaria.
— Basta, Rachel! Chega dessa conversa idiota! Vamos descer logo, almoçar e depois meu motorista te leva em casa. Você está me importunando.
— Desculpe, amiga, mas é que eu consigo perceber como você é uma garota de sorte. Prometo que não digo mais nada. — Rachel tentou se redimir.
Embora não quisesse admitir, Brigitte passou o resto daquele dia pensando nas palavras de Rachel a respeito de Joseph. Ele era um homem lindo e elegante. Não à toa, muitas mulheres da alta sociedade o rodeavam nas festas e eventos públicos. Aos quinze anos de idade, Brigitte ainda não havia tido nenhuma grande paixão, ainda não havia descoberto o amor em sua vida.
Os meses se passaram muito rapidamente. Brigitte acostumou-se a ter a companhia constante de Joseph em sua vida. Tornaram-se amigos, iam juntos ao parque de diversões, foram duas vezes ao cinema e tiveram suas primeiras fotos juntos. Após dez meses de convivência, era como se nunca tivessem sido desconhecidos um para o outro.
Mas algo inesperado e frustrante aconteceu. Uma certa noite foi diferente de todas as outras, pois Joseph voltou do trabalho acompanhado por uma mulher. Ela era alta, usava roupas impecáveis, tinha vinte e quatro anos de juventude e beleza. Chamava-se Anelise Clarkson e era a nova namorada de Joseph Koller.
— Brigitte, quero lhe apresentar Anelise Clarkson, minha nova namorada! Ela jantará conosco esta noite. — Joseph disse sem saber o peso de suas palavras.
A jovem tutelada quase engasgou com a própria saliva ao ouvir a enfadonha notícia. Como assim namorada? Ele nunca havia comentado nada sobre aquela tal Anelise. Brigitte sentiu uma leve vertigem. Não podia acreditar que Joseph estava namorando aquela estranha.
— O quê? — Brigitte perguntou, sem saber como agir.
Anelise entrou na sala de jantar, se aproximou de Brigitte e cumprimentou-a.
— Prazer em conhecê-la, Brigitte! O Joseph fala muito sobre você. É praticamente uma irmã pra ele. — Anelise demonstrou gentileza forçada.
— Sim, irmã! É claro, somos praticamente irmãos, e gêmeos! O prazer em conhecê-la é meu, Anelise. O jantar já está servido. Podemos nos sentar à mesa. — Brigitte encurtou a conversa desejando que aquele momento acabasse logo. Sentaram-se à mesa.
— Joseph, antes que eu esqueça, a Rachel me convidou pra dormir na casa dela hoje. Irei pra lá depois do jantar. Amanhã passaremos o sábado preparando nosso trabalho para a feira de ciências.
— Tudo bem. O Josh tem que levar Anelise para casa depois do jantar. Ele aproveita e leva as duas.
— Está certo — Brigitte concordou, mas por dentro estava furiosa, era o ciúme.
O silêncio foi absoluto na mesa. Entreolhavam-se sem assunto.
— Está bom o jantar, meu amor? — Joseph iniciou a conversa com Anelise.
Brigitte arregalou os olhos ao ouvir seu tutor chamar a namorada de meu amor. Quis levantar-se da mesa imediatamente, mas preferiu evitar uma cena constrangedora.
— Sim, a comida está ótima. — Anelise respondeu.
— Temos uma excelente cozinheira. Corine faz pratos excelentes — Joseph comentou.
— Sim, a Darla também cozinha muito bem — Brigitte comentou.
— E você, pretende casar-se logo, Brigitte? Tem namorado? — Anelise perguntou, tentando familiarizar-se.
— Eu? Mas é claro que não. Sou uma moça dada aos estudos. Essa coisa de namoro não me interessa. Quero terminar o colégio e cursar a faculdade. Pretendo ser plenamente capaz de administrar meus negócios. Paixão e amor são besteiras pra mim, sou muito moderna, talvez feminista. Mas o fato é que não nasci para ser doméstica. — Brigitte respondeu movida pelo impulso de defender seus sentimentos.
— Faz muito bem. Deve ser independente — Anelise concordou.
— Brigitte ainda é menor, não tem idade para ser cortejada, mesmo que quisesse — Joseph ressaltou, em tom de advertência.
— Não seja radical, Joseph. Todos temos paixões na juventude. E a Brigitte já tem dezesseis anos, ela já pode ter um namorado — Anelise o contradisse.
— Concordo com a Anelise, Joseph. Eu já não sou mais tão criança. A conversa está ótima, mas eu tenho mesmo que ir para a casa da Rachel. Ela está me esperando e não quero que fique muito tarde. O Josh me leva agora e depois volta para buscar a Anelise. Tenham uma boa noite.
Incomodada Brigitte deixou a mesa. Não teve forças nem pra subir ao quarto e pegar suas coisas. Foi direito para a cozinha, onde encontrou Josh e deu a ordem:
— Josh, me leve agora mesmo para a casa da Rachel.
— Agora? Mas, o senhor Koller autorizou?
— Sim, autorizou. Você me leva agora e depois vem buscar a Anelise. Depressa! Não quero demorar mais nem um minuto aqui! Estou incomodada com essa situação.
— Tudo bem. Eu levo você. Mas não vai pelo menos pegar seus cadernos, seus livros, roupas? Precisa disso pra estudar na casa da sua amiga.
— Quero ir agora.
— Está bem, senhorita. Vamos.
Entraram no carro. Na metade no caminho para a casa da amiga, Brigitte já estava chorando discretamente. Tentou disfarçar, mas não conseguiu. Em frente à casa de Rachel dispensou o motorista:
— Pode ir, Josh. Eu telefono amanhã.
— Sim, senhorita. — Ele partiu.
Brigitte tocou a campainha. Rachel nem imaginava que sua melhor amiga estaria ali aos prantos.
— Brigitte! O que faz aqui? Por que está chorando assim? Entre, amiga. Meus pais já estão dormindo. Eu fiquei aqui na sala até mais tarde ouvindo rádio. Estava sem sono. Sente-se e me explique o que aconteceu. — Ela acomodou a amiga no sofá.
— Rachel, estou muito nervosa. Aguentei até agora, mas não vou suportar a situação.
— Que situação?
— O Joseph levou a namorada dele pra jantar hoje lá em casa.
— Agora entendi tudo.
— Estou com medo de perdê-lo.
— Brigitte, você tem que contar logo que é apaixonada por ele.
— Eu não tenho coragem! Se você visse aquela mulher! Eu tive vontade de avançar no pescoço dela e sufocá-la. Sabe o que ela foi capaz de me dizer?
— O quê?
— Ela disse que o Joseph me tem como uma irmã. E, pra piorar, na mesa do jantar falávamos sobre namoro quando o meu querido tutor foi capaz de dizer em alto tom de voz que eu ainda sou muito nova e não posso namorar! É um absurdo! Quem ele pensa que é pra querer mandar em mim?
— Não exagere. Agora você terá uma mãe. O pai você já tem.
— Pare de falar bobagens, Rachel! Deus me livre daquela mulher ser minha mãe! Estou angustiada. Meu coração acelerou. Estou desesperada.
— E o que pretende fazer?
— Quer saber de uma coisa? Vou devolver na mesma moeda!
— Como assim, Brigitte?
— Eu vou namorar também. Pronto!
— Quem?
— O Steven! Na escola ele sempre me perseguiu e já me pediu em namoro várias vezes. Amanhã mesmo vou aceitar. E na semana que vem vou levá-lo pra jantar lá em casa. Eu só quero ver a cara do meu tutor quando souber que eu tenho um namorado.
— Olha lá, hein. Não vá machucar o Steven.
— Não se preocupe. Farei tudo direitinho. Vou explicar para o Steven que é um namoro de mentira. Só por um tempo.
— Sei lá, acho que isso não está certo. Vai dormir aqui?
— Sim, não suportei nem mais um minuto a presença daquela mulher intrusa. Eu disse pro Joseph que você me convidou pra dormir aqui porque amanhã passaremos o dia todo preparando nosso trabalho para a feira de ciências.
— Tudo bem. Vamos até meu quarto. Lá conversaremos melhor.
Steven Garyn era um rapaz robusto e sagaz, o suficiente para entender o motivo real de Brigitte ter aceitado ser sua namorada. Ele não recusou a proposta; acreditava que teria ao menos um tempo para convencê-la de que ele sim era o homem ideal, que a faria feliz.
— Estou ansioso para ser oficialmente apresentado como seu namorado para o seu tutor.
— E eu mais ansiosa ainda. Steven, obrigada por me ajudar.
— É um prazer. Mas, se estamos namorando, temos que fazer o que os namorados fazem. Deixe-me segurar sua mão.
— Sim, pode segurar.
— Por que não passeamos na praça?
— Eu acho ótimo. Vamos.
Na semana seguinte, ao chegar do trabalho, Joseph foi surpreendido por uma cena que fez seu coração bater mais forte de tanta angústia. Steven e Brigitte estavam ali, sentados no sofá, de mãos dadas, conversando e sorrindo.
Ao vê-lo, o jovem casal levantou-se e Brigitte apresentou-lhe:
— Joseph, que bom que já chegou. Este é Steven Garyn, meu namorado.
— O quê? Namorado? Como assim?
— Vou refrescar sua memória. Quando um rapaz gosta de uma moça ele começa a cortejá-la, então assim ele se torna um namorado. Ele vai jantar conosco.
— Depois conversaremos, Brigitte. Estou sem fome, jantem vocês.
Ele retirou-se nervoso e foi direto para o quarto. Sua mente de tutor estava completamente confusa. Não suportou a novidade de ver sua linda moça de mãos dadas com o namorado, o que era algo totalmente contraditório, porque ele já tinha uma namorada.
O dia estava ensolarado. Era hora do almoço. Joseph quis fazer uma surpresa para Brigitte, por isso foi buscá-la na escola. Para sua surpresa, naquele instante em que estacionou o carro em frente ao Gregory High School, viu a cena que jamais desejou presenciar. Brigitte estava de mãos dadas com Steven dando-lhe um beijo.
Imediatamente, furioso e pronto para brigar, Joseph saiu do carro, seguiu em direção ao casal de namorados e exclamou em tom de voz totalmente alterado:
— Brigitte! O que é isso? Onde pensa que está? Uma moça de família não deve se comportar assim!
— Joseph! Você por aqui? — ela soou irônica.
— Olá, Joseph. Eu e Brigitte somos namorados. Estávamos nos despedindo — Steven justificou-se.
— Brigitte, entre agora no carro. Eu quero conversar a sós com o Steven.
— De jeito nenhum. Eu vou ficar aqui. Você não manda em mim. Quem você pensa que é? Meu pai? — Ela demonstrou revolta.
— Você não é o pai dela! Não deve interferir no nosso relacionamento — Steven protestou.
— Relacionamento? Enxergue-se, rapaz! Você ainda é um moleque, e eu não aprovo esse namoro do que jeito que está. Brigitte, vá para o carro — Joseph deu a ordem.
— Eu já disse que não vou. Deixa o Steven em paz. Em casa conversamos mais tarde. — Brigitte demonstrou-se resistente.
— Brigitte, esse seu tutor é mal-humorado, hein! — Steven riu.
— Só não te dou um soco agora mesmo porque não quero ir preso por agredir um menor — Joseph esbravejou.
— Eu não tenho medo de você não, valentão. Pode vir se você é homem! — Steven desafiou-o.
— Não, rapazes, sem mais brigas. Steven, eu vou com ele, depois telefono pra você. — Brigitte apaziguou.
— Tudo bem, meu amor. Mas isso não vai ficar assim. — Steven se retirou.
— Vamos, Brigitte! — Joseph pegou-a pelo braço.
Ela entrou no carro feliz por seu plano estar dando certo.
— Quero ter uma conversa séria com você, mocinha. Não é legal namorar em frente à escola.
— Eu não estava namorando, apenas dei um beijo de despedida.
— Brigitte, você não pode namorar o Steven!
— Por que não?
— Porque...
— Por quê?
— Porque você ainda não tem maturidade. É muito nova, pode atrapalhar seus estudos. Eu sou responsável por você, estou aqui para interferir em suas escolhas erradas. — Joseph concluiu quase sem saber o que dizer. Na verdade, ficou possuído de ciúmes ao ver a garota que amava nos braços de outro.
Os dias transcorriam sem que todos os sentimentos fossem completamente revelados. Brigitte já havia terminado seu namoro de mentira, mas Joseph mantinha seu compromisso com Anelise.
Naquela manhã fria de outono, mas ensolarada, Brigitte passeava pelo jardim. Relembrava os bons momentos que havia vivido ali com seu pai. Não se conteve e começou a chorar sem parar. Caiu de joelhos sobre a grama que foi molhada por suas lágrimas. Ela olhou para cima e viu a figura do homem que estava ali para cuidá-la.
— Querida, por que está chorando? Levante-se! — Joseph estendeu as mãos pra ela.
Naquele momento Anelise chegou sem avisar. Pretendia fazer uma surpresa para seu namorado, mas decidiu observar a cena, escondida atrás de um arbusto. Ela queria entender qual era a verdadeira relação entre o tutor e a moça órfã.
— Joseph, você aqui? — Brigitte demonstrou ter sido surpreendida.
— Estou aqui pra cuidar de você. Não quero que sofra. Levante-se. Essa grama está fria.
Ela segurou nas mãos dele. Levantou-se e explicou:
— Eu passeava pelo jardim quando me lembrei do meu pai. Sinto tanto a falta dele.
— Eu entendo o quanto é difícil perder a única pessoa que você tinha em sua vida. Mas eu estou aqui. Olhe pra mim. — Ele ergueu o queixo dela com a mão.
— Até quando?
— Até quando você quiser.
Joseph envolveu Brigitte em seus braços e a abraçou com a mais profunda ternura, de um jeito que nunca havia feito antes.
— Joseph, não me deixe sozinha, por favor. Eu preciso de você! — Brigitte o abraçou ainda mais forte.
Anelise observou tudo atentamente. Seu coração estava partido. Lágrimas de decepção molharam sua face de tristeza. Ela admitiu a si mesma:
— O Joseph ama essa órfã com toda a sua alma. Ele nunca me abraçou assim. Ele nunca me consolou assim. Ela também o ama. Perdi meu tempo com ele. Vou embora e não volto aqui nunca mais! — Anelise saiu dali aos prantos, desiludida, destruída.
O jardineiro Andy presenciou ambas as cenas de longe. Viu o momento em que Joseph consolou Brigitte e também o momento em que Anelise flagrou-os escondida.
— Vamos entrar. Pedirei a Darla que prepare um leite quente pra você. Precisa descansar. — Ele a guiou segurando-a pelos braços e entraram na mansão.
— Senhor Joseph — Andy chamou-o.
—- Sim, Andy — Joseph virou-se em direção ao empregado.
— Preciso falar com o senhor. — Andy estava sério.
— Eu vou para o meu quarto descansar. Até mais tarde, Andy! — Brigitte saiu dali.
— Até, senhorita. — Andy fez sinal positivo com a cabeça.
Brigitte subiu as escadas e Andy continuou a conversa com o patrão.
— Diga, Andy, o que aconteceu? — Joseph percebeu a expressão de preocupação de seu empregado.
— Falarei sem rodeios. Sua namorada esteve aqui — Andy iniciou o relato.
— Anelise esteve aqui? Quando? — Joseph se mostrou surpreso.
— Ainda há pouco. Ela entrou pelo jardim e viu o momento em que você consolou a senhorita Brigitte. Sua namorada ficou arrasada, chorou e foi embora. Acho que ela percebeu que o senhor é apaixonado pela senhorita Brigitte.
— Isso não poderia ter acontecido. Obrigado por me avisar. Irei agora mesmo falar com ela. Não aconteceu nada, foi só um abraço.
— Me desculpe pelo que vou dizer, senhor Joseph, mas aquele não foi um simples abraço. Foi muito mais que isso: uma verdadeira demonstração de amor.
— Chame o Josh. Quero que ele me leve à casa de Anelise.
— Sim, senhor!
Joseph estava com o coração aflito. Não queria magoar Anelise, mesmo que não a amasse. Devia-lhe uma explicação. Ele tocou a campainha e a empregada da casa atendeu.
— Preciso falar com a Anelise.
— Ela está no jardim dos fundos. Vá com calma, ela está muito magoada.
— Sim.
Ele se aproximou devagar. Tentava encontrar palavras para justificar a demonstração de amor que deu à Brigitte.
— Anelise.
— Joseph! O que faz aqui?
— Precisamos conversar.
—- Não há mais nada a ser dito. Eu vi tudo com meus próprios olhos.
— Não houve nada, foi só um abraço.
— Um abraço de amor! O jeito que você olhava pra ela, o jeito como tocou o rosto dela. Isso tudo é amor. Aquele abraço demorado... Você parecia querer entrar no corpo da Brigitte. Sabe, eu nunca aceitei o fato de você ser tutor de uma moça linda e morar na casa dela. É inevitável esse sentimento de vocês.
— Eu sinto muito, Anelise. Nunca quis te fazer sofrer.
— Está tudo bem. Eu vou superar. Logo estarei partindo para a Europa. Agora vá embora, Joseph. Por favor, não volte a me procurar.
— Adeus — ele disse quase friamente retirando-se dali.
Anelise caiu mais uma vez em prantos. Era a sua vez de chorar.
Aquele sábado amanheceu com a luz do sol adentrando livremente todos os cômodos da mansão. O céu azul sorria para comemorar o aniversário de dezessete anos de Brigitte. Joseph organizou uma festa surpresa com as amigas dela do colégio. Teria que ser um momento inesquecível.
Brigitte passou metade do dia na casa de Rachel. Tudo fora devidamente combinado para que não desconfiasse que uma festa estivesse sendo preparada. As duas amigas colocaram os discos na vitrola e por horas dançaram charleston, o ritmo do momento.
— Rachel, você tem que me emprestar seus discos. Sempre me esqueço de comprá-los. Adoro dançar charleston trancada no quarto.
— Sinceramente! Você tem um homem lindo em casa pra dançar charleston com você, Brigitte, e ainda assim prefere dançar trancada no quarto sozinha. Você é louca! Agora temos que ir pra sua casa. Seu tutor pediu que fôssemos agora. Meu motorista vai nos levar.
— Mas ainda é tão cedo. A noite ainda tarda a chegar.
— Brigitte, não discuta comigo. Vamos.
— Está certo, vamos — concordou, sorrindo.
Elas chegaram à casa de Brigitte por volta das dezesseis horas. Todas as suas amigas já as estavam esperando. Joseph também.
— Parabéns pra você! — todos cantaram depois que Brigitte entrou.
— Que surpresa! Sinceramente, eu não imaginava que fariam uma festa pra mim. Que bolo lindo! É de chocolate! Meu favorito. — Brigitte se emocionou.
— Brigitte, agradeça ao seu tutor. A festa foi ideia dele — Elsa ressaltou, apontando o dedo para Joseph, que estava tímido no canto.
— Joseph, muito obrigada. Está linda a festa! — Brigitte exclamou sorridente e o abraçou.
— Você merece! Tem sido uma boa moça e uma excelente estudante.
— Vamos comer o bolo! Não sei como não sou gorda! Eu adoro bolo de chocolate! Meninas, se preparem! Eu trouxe os discos da Rachel para dançarmos charleston. Agora mesmo nesta sala vamos fazer um baile.
— Falando em música, como eu também sei que você adora dançar, Brigitte, tem um presente pra você lá no seu quarto — Joseph disse sorrindo com ternura, os olhos brilhando.
— Joseph! Você me deixa tão ansiosa. Quero ver o presente. Meninas, esperem um momento, vou até meu quarto e já volto — Brigitte exclamou, empolgada.
— Vá logo! Deve ser algo muito especial — Rachel disse, encorajando a amiga.
— Venha comigo, Brigitte. Tenho certeza de que vai adorar. — Joseph pegou-a pela mão e juntos subiram até o quarto.
Ao entrar e ver o presente perto de sua cama, Brigitte exclamou:
— Um rádio novo! Lindo e enorme. Obrigada, Joseph. Há tempos eu pedia um rádio só pra mim. Temos várias vitrolas, mas o rádio antigo quebrou e fiquei sem poder ouvir minhas músicas e programas preferidos.
— Agora já tem companhia em seu quarto e poderá dançar suas músicas em frente ao espelho.
— Olhe pra mim, Joseph! Hoje você não escapa, não vai fugir. Vamos para a sala. Você vai dançar charleston comigo diante de minhas amigas! Vamos! — ela disse, quase saltitando.
— Espere!
— O que foi?
Ele aproximou-se mais dela.
— Não me obrigue a dançar Charleston. Você sabe muito bem que eu não levo jeito pra dançar. Eu nem sei a coreografia.
— Não exagere. Eu te ensino, é tão fácil. Aprenda comigo, vamos ensaiar. Primeiro você coloca uma perna à frente e a outra atrás, os braços acompanham, um a frente e o outro atrás. Assim. Depois tem que dobrar um pouco os joelhos e fazer desse jeito. Entendeu? — Ela dançou lentamente para que ele aprendesse a coreografia naqueles poucos segundos.
— Assim? — Ele demonstrou desajeitado.
—- Isso, assim mesmo. Está ótimo. Vamos, porque as meninas estão nos esperando.
— Tudo bem, você venceu, Brigitte! Mas dance comigo o tempo todo para que eu não me sinta perdido.
— Está certo. É só comigo que irá dançar na minha festa. Você tem sido o melhor tutor do mundo e o mais lindo também. Esse é o melhor aniversário que eu já tive! O mais divertido! — Brigitte olhou fixamente para Joseph. Ela o admirava.
— Não precisa me agradecer. Você que é tão linda, inteligente e carinhosa. — Joseph concentrou seu olhar nos olhos dela, afagou os cabelos da jovem, tocou no rosto dela em sinal de carinho.
Por um instante apenas se encararam. Aos poucos, suas faces se aproximaram ainda mais, seus lábios se tocaram e, sem que percebessem, já estavam se beijando, um beijo doce e singelo, mas cheio de amor.
— Brigitte, me desculpe. Eu não deveria ter feito isso. Me perdoe. — Joseph sentiu-se desnorteado, um pouco constrangido.
— Não tem que me pedir desculpas.
— Não posso mais esconder meus sentimentos por você, Brigitte.
— Há tempos eu espero por esse momento. Agora vamos descer, minhas amigas estão nos esperando. — Ela pegou nas mãos dele e, com o sorriso cheio de felicidade, desceram as escadas.
As moças aguardavam ansiosas pela dança.
— Meninas, estão preparadas? Joseph, coloque o disco na vitrola. A festa vai começar agora! — Brigitte exclamou, irradiando alegria.
Rachel se aproximou da aniversariante e perguntou discretamente, já sabendo a resposta:
— Conte-me logo em detalhes o que acabou de acontecer naquele quarto que fez você ficar tão radiante.
— Como você é curiosa, Rachel. Não aconteceu nada que não devesse ter acontecido. Eu ganhei um lindo rádio de presente. Agora, me deixe dançar charleston com o tutor mais lindo do mundo, se é que você me entende. Depois iremos ao meu quarto ver o rádio — Brigitte disse, com mais um sorriso de entusiasmo.
— Se é assim, está certo então. Já entendi muito bem o que aconteceu.
Brigitte dançou animada com Joseph, e suas amigas estavam muito empolgadas.
No início da noite as garotas foram embora, mas Rachel ficou. Ela estava muito curiosa para saber em detalhes o que acontecera no quarto da amiga.
— Rachel, esse é o meu rádio novo! O que acha?
— Seu rádio novo é lindo, mas eu quero mesmo é saber o que aconteceu nesse quarto entre você e o Joseph.
— Você não vai acreditar.
— O que aconteceu?
— O Joseph me beijou!
— Beijou?
— Sim.
— Não acredito!
— Mas aconteceu!
— Brigitte! Você é uma moça de sorte. No seu aniversário de dezessete anos ganhou o melhor presente de todos: um beijo do tutor mais lindo do mundo! Que inveja que eu tenho de você! E como foi? Você gostou? Me conte tudo!
— Amiga, eu nem sei o que dizer! Foi maravilhoso, foi doce, delicado.
— E será que ele está apaixonado por você?
— Ele disse que não pode mais esconder os sentimentos dele por mim.
— E você?
— Eu o amo e estou completamente apaixonada. Apenas ainda não sei dizer ao certo o que farei desse sentimento.
— Eu tinha certeza que isso aconteceria e sei que seu pai também pretendia que isso acontecesse. Aposto que ele entregou sua tutela pro Joseph só pra você se casar com ele algum dia.
— Eu não sei. Antes desse beijo eu já tinha visto o Joseph sair para encontrar outras mulheres.
— E o que isso importa? É você que ele beijou hoje e, além do mais, se ele estivesse apaixonado por outra mulher, não teria feito isso.
— Vendo por esse lado você pode ter toda a razão.
— O amor é tão lindo! Essa sua história com seu tutor é inacreditável. Que inveja. Agora vou pra minha casa. Você e seu amado têm muito o que conversar. — Rachel suspirava de emoção como se aquela história de amor pertencesse a ela.
No dia seguinte Joseph agiu o tempo todo como se nada tivesse acontecido no dia anterior no quarto de Brigitte. Parecia até que nunca havia beijado, como se nunca tivesse sentido a emoção de estar amando.
Na mesa de jantar, Brigitte iniciou uma conversa sobre os antigos donos daquela casa:
— Joseph, você nunca mais teve contato com o senhor Andrew MacBrown, o antigo dono dessa casa?
— Não. Depois que eu entrei em contato com ele lá na Europa, pra resolver questões documentais desta casa, eu nunca mais tive contato.
— Alguma notícia do meu irmão?
— Sim. Ele finalmente conseguiu vender o imóvel de Londres e fará a transferência dos valores para sua conta bancária. Estou cuidando de tudo.
— Sabe, voltando a falar do antigo dono dessa casa, eu até hoje acho muito estranho que ele tenha deixado tudo aqui, que tenha ido embora sem levar as fotos, sem levar as roupas. A família dele foi destruída.
— Sim. Depois que o filho morreu em um acidente, a esposa morreu em seguida.
— Que história estranha. Por mais que tenhamos guardado tudo em armários, às vezes eu me deparo com fotos deles dentro de livros na biblioteca e dentro das cômodas.
— Sim, o trauma pela morte do filho abalou muito a família MacBrown. O que eu acho mais estranho é sua mãe ter abandonado você justamente nessa casa.
— Eu penso muito nisso também. Como eu queria encontrar a minha mãe... Você poderia procurá-la de novo. Poderia tentar encontrá-la mais uma vez.
— Brigitte, sua mãe era uma atriz e dançarina que usava nome artístico. Depois que ela te abandonou, provavelmente começou a vagar pelo mundo, foi esquecida. Estou tentando conseguir alguma informação sobre o nome verdadeiro dela, mas não é fácil. Solicitarei judicialmente que o teatro libere documentações antigas de contratos que possam ter formado com ela. O que acho improvável, pois a maior parte dos contratos feitos com atrizes em início de carreira era verbal. Além disso, já faz muitos anos. Mas farei tudo o que eu puder para localizar sua mãe biológica. Eu prometo.
— Obrigada, Joseph. Minha mãe assinou aquele bilhete que meu pai adotivo encontrou, intencionando que eu soubesse ao menos quem havia sido ela.
— Acredito que sim. Ela queria que você tivesse ao menos uma informação sobre ela.
— Meu pai adotivo nunca quis investigar nada. Acho que ele tinha receio que, se eu soubesse quem eram meus pais biológicos, eu o deixaria.
— Sim, seu pai George tinha mesmo esse medo. Eu me ofereci várias vezes pra descobrir o paradeiro de sua mãe, mas ele não queria.
— Se eu soubesse quem é o meu pai biológico, ou o nome dele, talvez tudo fosse mais fácil.
— Não se preocupe com essas coisas. Eu vou continuar investigando isso pra você.
— Você é meu tutor preferido. — Ela sorriu.
No escritório de Joseph, seu melhor amigo, o advogado Arnold Willis, foi ao seu encontro para uma conversa particular. O tutor precisava desabafar.
— Joseph, meu amigo, acredito que algo de muito importante está acontecendo em sua vida para me chamar aqui. O que é? Tem a ver com a sua linda órfã, não é mesmo?
— Arnold, pode parecer loucura, mas eu estou muito apaixonado pela Brigitte. Sei que sou o tutor dela, no entanto eu a amo muito.
— Eu tinha certeza de que isso aconteceria. E o que pretende fazer? Aconteceu algo entre vocês? Não me esconda nada.
— Eu a beijei na festa de aniversário.
— Você não perde tempo mesmo, Joseph.
— Foi apenas uma vez. Porém todos os dias ficamos nos olhando e quase nos beijamos de novo em várias ocasiões. Estou resistindo pra não cometer nenhuma bobagem. Eu descobri que ela é a mulher que eu amo.
— E será que ela também te ama ou, para ela, você é apenas uma paixão de juventude? Brigitte é muito nova. Será que ela está pronta pra se casar, ser mãe, cuidar de uma família?
— Eu não sei, não falamos sobre isso. Se fosse o caso, eu esperaria ela ficar mais velha pra se casar comigo.
— Mas não vivendo na mesma casa.
— Daqui a um ano ela completará a maioridade, então deixarei de ser seu tutor.
— Primeiro acredito que vocês precisam assumir o que sentem um pelo outro e depois vejam o que farão. Não há outra solução imediata.
— Você tem razão.
— Por que não pede ela em namoro?
— Ficaria estranho.
— Estranho é vocês estarem na mesma casa nessa situação. Por que você não entrega logo a tutela dela para a empregada da casa? Assim, deixando de ser seu tutor, vocês ficariam mais livres agora, sem precisar esperar mais um ano pra namorarem. Poderão até se casar com a autorização da nova tutora.
— A ideia não é má. Mas receio um pouco, porque o pai dela só confiava em mim pra ser seu tutor e administrador.
— Mas você sempre me disse que a empregada, a Darla, é uma senhora de confiança.
— Sim. Posso tentar.
— Converse primeiro com a Brigitte e depois faça isso se ela concordar. Abra seu coração sem medo.
— Obrigado, Arnold, por suas palavras tão sábias.
— É pra isso que servem os amigos. E não se esqueça de me convidar para o casamento.
— Não esquecerei! — Eles riram.
Depois de algumas horas de estudo na biblioteca da escola, Brigitte decidiu ir direito até o escritório de Joseph, na Quinta Avenida. Ela queria conversar sobre o baile de formatura do colégio, que aconteceria dali uns meses. Na verdade, foi só um pretexto para estar mais perto dele naquela tarde. O que Brigitte queria mesmo era ouvir que era amada.
No andar térreo do escritório havia um bar que servia deliciosos cafés. A secretária Annabelle convidou Joseph para tomar um chocolate quente naquela tarde esplendorosa. Ela era muito apaixonada por ele. Até tiveram um namoro rápido depois que Joseph terminou com Anelise, mas não foi nada sério, porque ele não a amava. Porém Annabelle insistia incansavelmente, pretendia conquistá-lo a qualquer custo. Muitas vezes até se jogava pra cima dele tentando beijá-lo.
Naquele mesmo instante em que Brigitte se aproximava do escritório, pôde ver claramente Joseph sentando à mesa do bar na companhia de Annabelle, que o atacou com um beijo inesperado. Brigitte não aguentou ver o homem que amava beijando outra mulher. Sentiu-se extremamente perturbada, traída. O pior de tudo era que ela era uma mulher mais velha, que com certeza estava pronta para se casar e ter filhos.
Justamente quando ele estava decidido a conversar com Brigitte sobre o amor que sentia, isso teve que acontecer.
— Joseph! — Brigitte exclamou indignada ao ver a cena pelo vidro do bar.
Através do vidro ele avistou sua amada com lágrimas de decepção sendo vertidas.
— Brigitte! Não vá! Espere! Não é nada disso que você está pensando! — Joseph gritou sem saber o que fazer. — Annabelle, você está demitida. Pegue suas coisas e suma daqui o mais rápido possível. — Quase cuspiu no rosto da secretária, que manteve um sorriso cínico.
A órfã solitária correu desesperada pela avenida movimentada. Queria estar o mais longe dali que pudesse. O tutor, assustado pelo medo de perder e magoar sua amada, correu atrás dela para tentar explicar o que havia acontecido, esbarrando-se nas pessoas que circulavam pela calçada. Sem tempo para gentilezas, mal pedia desculpas por quase derrubar os pedestres pelo caminho. Aos gritos, continuou a busca pela amada:
— Brigitte! Espere!
Ela estava muito nervosa e decepcionada. Seu coração acelerado e sua mente confusa impediram-na de enxergar tudo com clareza. Atravessou a avenida sem olhar para os lados. Um carro Rolls Royce cor de vinho, em velocidade normal, aproximava-se da moça, que praticamente jogou-se sobre o automóvel, que freou a tempo de não passar por cima dela.
Brigitte caiu desmaiada no meio do asfalto devido ao impacto com o carro.
— Brigitte, minha amada! Acorde! Alguém chame uma ambulância! — Joseph disse, agachando-se diante dela no asfalto.
Os pedestres se aglomeraram ao redor da vítima.
— Já chamaram, senhor. Eu não tive culpa. Ela entrou na minha frente, quase nem pude frear. Essa garota é louca, praticamente se atirou em cima do meu carro — o motorista se defendeu, assustado.
A ambulância chegou em poucos minutos. Brigitte foi levada para o hospital Mount Sinai. Joseph foi em seguida com seu carro.
Na emergência, ele aguardava ansioso para que o médico aparecesse e desse notícias.
O doutor Stefanson surgiu no corredor depois de uma hora.
— Então doutor, como está a Brigitte?
— O senhor é parente dela?
— Sou tutor legal dela.
— Ela está fora de perigo, mas torceu a perna direita, quebrou um braço e machucou o pescoço. Vai precisar ficar de repouso por um mês ou dois até se recuperar. Em dois dias ela poderá ir para casa. Já foi medicada com analgésicos. Está com o pescoço imobilizado, perna enfaixada e braço engessado. Por sorte o carro freou a tempo de não lhe causar um dano maior.
— Graças a Deus, doutor. Posso falar com ela?
— Sim, pode. Me acompanhe.
Ao entrar no quarto de hospital e ver Brigitte enfaixada, Joseph exclamou, se aproximando do leito:
— Brigitte, minha amada, como você está?
— Com muita dor, mas o doutor disse que eu vou ficar bem.
— Sim, vai. Cuidarei de você até ficar completamente curada das fraturas.
— Por que me chamou de minha amada? Joseph, eu vi você beijando a Annabelle no bar.
— Ela foi quem se jogou pra cima de mim e me beijou contra a minha vontade. Já não a suportava mais. Foi demitida por mim. Eu jamais a perdoaria se algo de pior te acontecesse.
— Não precisa mentir. Eu sei muito bem que ela já foi sua namorada — relembrou com voz fraca.
— Isso foi no passado. Eu não quero mais nada com ela. Eu só quero ficar perto de você. Quando voltar pra casa, conversaremos melhor sobre nós, sobre o que sentimos e o que faremos.
— Eu já nem sei mais se é correto você continuar morando na minha casa.
— Eu entendo. Primeiro você tem que se recuperar e depois decidiremos o que fazer. O doutor disse que em dois meses poderá voltar pra casa.
— Peça para Rachel vir aqui ao hospital me fazer companhia.
— Eu já a avisei que você está aqui. Provavelmente ela também avisou aos seus colegas da escola. Ainda hoje suas amigas virão pra te ver. — Pegou na mão dela em um gesto de carinho.
Sem que ninguém imaginasse, Steven entrou no quarto com um buquê de flores nas mãos. Logo que soube do acidente, correu para o hospital ao encontro da garota por quem ainda era apaixonado.
— Steven. Que surpresa! — Ela demonstrou alegria ao vê-lo ali, mesmo estando fraca.
— Vim logo que soube. Eu lhe trouxe essas flores.
— Que gentileza, Steven. Muito obrigada. Você é um verdadeiro cavalheiro. — Ela sorriu gentilmente para o amigo.
Joseph engoliu seco ao presenciar aquela cena, em que a mulher que ele amava era cortejada por outro.
— Joseph, poderia me deixar a sós com Steven? — Brigitte pediu.
— Sim, claro. Tenho que resolver alguns assuntos referentes à sua internação. Com licença. — Joseph saiu dali com semblante de insatisfação por ter que deixá-la nas mãos do inimigo.
— Brigitte, fiquei tão preocupado com você. Como foi que aconteceu? — Steven perguntou.
— Eu vi algo que me deixou transtornada e acabei atravessando a avenida sem olhar para os lados. Fui atropelada. — ela explicou.
— O que você viu que te deixou tão perturbada? -ele se mostrou curioso.
— Eu vi o Joseph beijando a secretária no bar.
— Uau! Você o ama? - Ele quis saber.
— Sim, eu o amo. - Ela afirmou para a decepção do rapaz.
— Mas ele não te ama. Brigitte, ele não é o homem certo pra você.
— Ele disse que me ama e que foi a secretária que se jogou pra cima dele.
— E você acredita no que esse seu tutor diz?
— Eu preciso acreditar.
— Está perdendo o seu tempo amando esse homem. Eu ainda vou te convencer de que ele não te merece. — Steven assegurou.
Joseph escutava tudo atrás da porta. Estava confuso sobre o futuro do amor que sentia por Brigitte. Foi até a mansão comunicar aos empregados sobre o que havia acontecido. Todos ficaram preocupados e ao mesmo tempo aliviados por nada de pior ter se abatido sobre aquela pobre moça.
Darla viu Joseph chorando no jardim. Como uma mãe zelosa, aproximou-se do jovem advogado e iniciou a conversa:
— Joseph.
— Darla.
— Eu já preparei as roupas e outras coisas da Brigitte pra você levar ao hospital.
— Obrigado.
— Eu sei bem o que está acontecendo.
— Sabe?
— Sei sim. Eu vi tudo acontecer desde o dia em que ela era apenas um bebê e foi abandonada na porta dessa mansão.
— E que o acha que devo fazer, Darla?
— Joseph, não é prudente que você continue morando nesta casa com ela, pelo menos enquanto não se casarem. As coisas têm que acontecer da maneira correta.
— Você tem toda a razão. Por isso eu decidi que vou transferir a tutela dela pra você. Assim posso namorá-la sem conflitos de interesses. Farei minhas malas. Quando Brigitte voltar do hospital, não estarei mais morando aqui.
— Não fique triste, doutor. É pra sua felicidade. Será melhor assim. Poderá nos visitar quando quiser. Eu serei tutora dela com muito prazer. Cuido dela desde que era uma criança e posso muito bem continuar cuidando até o próximo ano quando já for adulta e até o casamento de vocês, e enquanto eu viver.
— Muito obrigado, Darla. Você é uma mulher de confiança. Sei que Brigitte estará em boas mãos. — Ele suspirou, encontrando o alívio para seus pesares.
Rachel entrou preocupada no quarto do hospital onde a amiga estava internada, já dizendo:
— Brigitte, o que aconteceu? Soube que foi atropelada! Que horror! Está toda enfaixada!
— Fui sim atropelada, mas já estou melhor.
— Como você pôde atravessar uma avenida sem olhar para os lados?
— Rachel, eu fui até o escritório do Joseph pra falar sobre a formatura e o flagrei beijando a secretária.
— Jura?
— Ele me disse que ela é quem se jogou pra cima dele.
— Acredite nele então.
— Eu saí nervosa e atravessei a avenida sem olhar pros lados. Quebrei um braço, torci a perna e machuquei o pescoço.
— Não faça isso nunca mais. Se ficou tão nervosa, é porque ama o Joseph.
— Sim, eu o amo mais do que eu gostaria. Estive pensando e acredito que não é correto ele continuar morando na minha casa.
— Se vocês forem se casar, ele não deve mesmo morar com você até o casamento.
— Casar? Você ficou louca? Eu só tenho dezessete anos. Não me sinto preparada pra casar nem pra ter filhos. Ainda cursarei a faculdade. Não, casamento não! — Brigitte reforçou sua convicção de modo enfático.
— E você acha que o Joseph esperaria um pouco mais pra casar com você? Pergunto porque você sabe como são os homens, eles não aguentam muito tempo, se é que me entende.
— Eu não sei, Rachel. Sinceramente, eu ainda não conversei com ele sobre isso porque ele ainda não teve coragem de se declarar de maneira mais direta. Agora eu só quero pensar em me recuperar completamente da minha fratura.
— Que estranho. Ele deve ter se acomodado por ter você o todo tempo naquela casa e não tomou nenhuma atitude.
— Sim, mas ele me disse que, quando eu voltar pra casa, em dois dias conversaremos.
— Então melhore logo, amiga. Você não pode perder esse homem.
— Rachel! Do jeito que você fala, até parece que o Joseph é o único homem do mundo.
— Se ele é o homem que você ama, deveria esquecer tudo e se casar com ele de uma vez.
— Ainda não estou preparada pra me casar.
— Tudo bem, então não se case, mas não depois não vá lamentar e chorar pelos cantos.
— O médico disse que em duas semanas poderei voltar ao colégio.
— Não se preocupe. Eu levarei pra você as lições para que estude todos os dias até retornar às aulas.
— Obrigada, amiga — Brigitte agradeceu a Rachel com um sorriso.
Os dias passaram tranquilos e ao mesmo tempo inquietos para o coração de Joseph, que já não suportava mais viver tão perto e tão longe da mulher que amava. Ele preferiu esperar que Brigitte se recuperasse da fratura para então sair da mansão. Estava protelando o inevitável.
Quinze dias depois ela voltava do colégio, ainda com o braço engessado, mas já se sentia bem melhor, pronta para enfrentar seus sentimentos e inseguranças. Esbarrou com Joseph na entrada da cozinha.
— Joseph, que bom te encontrar aqui. Achei que estivesse no escritório.
— Hoje eu não tenho expediente.
— Eu quero falar sobre a minha festa de formatura. Eu acho que não vou, eu não tenho acompanhante. Você sabe, o Steven foi embora e eu não conheço nenhum outro rapaz aqui em Nova York que possa me acompanhar à festa e ser meu par. Sei que é uma bobagem, porque ainda faltam uns meses, mas eu só queria comentar isso com você. Todas as minhas amigas têm um namoradinho. E eu continuo sozinha.
— Sozinha?
— Sim, continuo sozinha.
— Eu irei com você ao baile de formatura. Isso é certo.
— Não sei se isso seria prudente. Você é meu tutor. Não ficaria estranho?
— Não sou mais seu tutor, Brigitte.
— Não?
— Não!
— Como assim?
— Transferi sua tutela para Darla.
— O quê?
— Hoje estou saindo desta casa. Minhas malas já estão arrumadas no canto da sala. Depois eu volto pra pegar o restante das minhas coisas. Chegou a hora de termos aquela nossa conversa.
— Sim, tenho certeza. Vamos até a biblioteca, lá poderemos conversar em particular, sem que os empregados nos escutem.
— Sim. Vamos.
Entraram na biblioteca e fecharam a porta.
— Brigitte, a verdade é que eu te amo e não é mais conveniente que eu more aqui em sua casa. Não é mais conveniente que eu continuasse sendo seu tutor — Joseph esclareceu, acariciando o rosto dela.
— Eu sei de tudo isso. E será melhor assim.
— A Darla será sua tutora por mais alguns meses até você atingir a maioridade e tomar posse de seus bens. Então poderemos nos casar. A Darla já me disse que consente que fiquemos noivos em breve.
— Noivos? — Brigitte perguntou sentindo seu coração disparar.
—- Sim.
—- Joseph, me desculpe, mas creio que eu ainda não estou preparada para me casar logo, nem para ser mãe. Tenho outros sonhos que são opostos aos seus planos. — Brigitte revelou suas verdadeiras vontades, contrariando as expectativas de Joseph.
— Desculpe, Brigitte, achei que essa fosse a sua vontade, acreditei que você me amasse.
— E amo, amo muito. Mas não posso mentir prometendo que me casarei logo com você. Muito obrigada por ter cuidado de mim. Sou muito grata. Sentirei sua falta nesta casa. Mas não é porque eu te amo ou porque estou apaixonada que eu sou obrigada a me casar imediatamente com você. E os meus sonhos? Quero ter uma carreira, e, mais do que tudo, ainda não estou preparada para ser esposa, muito menos pra ter filhos. — As palavras de Brigitte foram uma faca afiada no coração de Joseph que apesar de ser mais velho mantinha a ilusão acesa em seu coração.
— Então não há mesmo esperanças de ficarmos juntos. Eu também sentirei muito a sua falta. Eu sei que você ainda é muito jovem e imatura, mas pensei que, com o tempo, você se sentiria mais segura para se casar. Quem sabe em um ou dois anos você esteja pronta. — Ele demonstrou esperança aproximando seus lábios dos lábios dela.
Joseph afagou os cabelos de sua amada. Seus olhares se encontraram, seus lábios se tocaram e, mais uma vez, depois de tanto tempo, se beijaram.
— Joseph! É melhor você colocar suas malas no carro e ir para seu apartamento logo — Brigitte exclamou nervosa por perceber seu coração mais acelerado e sem graça por sentir que o amava mais do que imaginava.
— Olhe pra mim, meu amor. Vai ignorar que acabamos de nos beijar? Por que tem medo de se casar? — Ele tocou o rosto dela, levantando seu queixo de modo delicado.
— Não, não vou ignorar. É que enquanto você morar nessa casa eu não terei resposta para o que está acontecendo — Ela tentou se justificar.
— Então que isso não seja um pretexto pra protelar sua decisão. Vou sair dessa casa agora mesmo.
— Tudo bem. Outro dia conversaremos melhor. — Ela o observou Joseph seguir para a sala, pegar suas malas e ir embora para o apartamento solitário que o esperava.
Brigitte sentiu um aperto no peito, mas era necessário. Passou o resto do dia no quarto, pensando deitada na cama.
Darla entrou no quarto de Brigitte. Precisava conversar com sua jovem protegida.
— Brigitte, querida.
— Darla, entra.
— Precisamos conversar.
— Eu sei. — respondeu cabisbaixa.
— Entendo que pra você não foi fácil ver o Joseph sair dessa casa hoje. Vocês estavam sempre juntos, ele cuidou de você nos momentos em que mais precisou. Ele te ama. Mas é melhor assim. Vocês são namorados apaixonados um pelo outro. Não era correto ele continuar morando aqui. Não fique triste. Logo estarão noivos e, quando se casarem, ele voltará. — Darla a consolou.
— Esse é o problema. Enquanto ele era o meu tutor e morava aqui eu o tinha comigo sem precisar me casar com ele. Agora não o terei mais por perto porque não quero me casar. Não estou preparada para o matrimônio e tenho outros sonhos e planos pra minha vida. — Uma lágrima caiu dos olhos da jovem.
— Você não o ama?
— Eu o amo muito, ao menos sou muito apaixonada por ele. Mas mesmo o amando tanto, me sinto extremamente incapaz de querer me casar tão jovem, de ser mãe. Não sou como as outras moças que sonham em se casar logo. Não quero isso agora, e também não sei se ele está disposto a esperar que algum dia eu queira. Darla, eu estou sofrendo tanto. — Ela chorava, enquanto Darla abraçava-a em um gesto de consolo.
Joseph passou alguns meses na Califórnia cuidando dos negócios de seu pai. Foi o tempo que ele precisava para pensar sobre o amor que sentia por Brigitte e se estava disposto a ter toda a paciência do mundo para esperar pela decisão dela. Escreveu-lhe cartas; na maioria das vezes ela as respondia. Houve telefonemas, conversavam quase toda semana.
No dia do baile de formatura, sentada no sofá da sala, Brigitte ouvia triste suas músicas no rádio que havia ganhado de Joseph. Há meses não se viam. Seu coração doía de saudade.
O telefone tocou e Brigitte atendeu:
— Alô!
— Oi, Brigitte. Sou eu, a Rachel.
— Ah, Rachel, é você! Pensei que fosse o Joseph.
— Sinto muito por não ser ele, mas eu preciso saber se você vai ao baile de formatura hoje à noite. Podemos ir juntas. Eu consigo um acompanhante pra você, apesar de que seu acompanhante deveria ser o Joseph.
— Amiga, eu não tenho vontade de ir ao baile. Eu não vou.
— Sinto muito por você que vai perder a grande festa de nossas vidas. Estamos nos despedindo do colégio.
— Eu sei, mas eu não quero ir, amiga.
— Tudo bem, só não vá se arrepender depois. — Rachel desligou o telefone.
Brigitte sentou-se novamente na poltrona e continuou pensando, triste por tudo.
— Brigitte, o que há? — Corine questionou-a ao vê-la tão triste.
— Nada, Corine.
— Está assim por causa do Joseph?
— Não sei. Sinto falta dele, no entanto não quero enganá-lo. Ele disse que me ama, porém eu ainda não me sinto preparada pra me casar nem ter filhos. Eu tenho planos de cursar uma faculdade. Sei que não sou como a maioria das garotas da minha idade que sonham em se casar logo e nem se preocupam com os estudos.
— Eu entendo você. Saiba que a minha mãe se casou aos catorze anos de idade. Eu sou a filha mais velha. Hoje em dia, Brigitte, a maioria das moças se casam com a sua idade. Se seu pai estivesse vivo, com certeza ele desejaria que você já estivesse casada ou prestes a se casar, depois que termina o colégio o destino das moças é o casamento.
— Então se meu pai estivesse vivo travaríamos uma guerra, pois eu não aceitaria me casar agora, fosse com quem fosse.
— Se o Joseph te ama, você deveria dar uma chance a ele e namorar por um tempo pelo menos.
— Você acha?
— Sim. Depois podem decidir se casam ou não.
— Talvez.
— E você quer que eu prepare um vestido pra você ir ao baile hoje à noite?
— Baile? Eu não vou. Não tenho companhia e nem vontade. Além do mais, eu não mandei fazer nenhum vestido especial para a ocasião. Agora já é tarde. Não terei a lembrança da grande noite do meu baile de formatura da escola.
— Brigitte, ouça: tem uma surpresa pra você em seu quarto. Se eu fosse você, iria correndo até lá, agora mesmo! — Corine avisou-a, sorrindo.
— Surpresa? Pra mim?
— Sim! Acabaram de entregar. Eu coloquei em cima da sua cama. E tem um bilhete. O que está esperando? Vá logo ver o que é!
— Vou agora mesmo! — Brigitte subiu correndo as escadas até o quarto.
Brigitte mal pôde acreditar no que viu. Havia sobre sua cama um lindo vestido dourado com pedrinhas de cristal, uma tiara reluzente, sapatos de camurça que combinavam com o vestido, junto com o presente havia um bilhete que dizia: “Brigitte, esse é seu presente de formatura, um vestido especial para usar no baile desta noite. Com todo amor, Joseph.”
— Que vestido lindo! É o mais lindo que eu já vi! E essa tiara é maravilhosa! — ela exclamou feliz.
— Brigitte! — Darla chamou-a ao entrar no quarto.
— Darla, olha só o que o Joseph me enviou! É lindo.
— Sim, é lindo. Esse homem te ama muito. E então, vai ao baile? O motorista já está avisado, vai te levar ao salão de festas do colégio.
— Sim, eu vou. Em pouco mais de uma hora eu me arrumo e já poderemos ir. Avise o motorista.
— Fico feliz que vá ao baile, Brigitte. Esta será uma noite especial que nunca mais se repetirá.
— Obrigada, Darla. Você é maravilhosa. — Agradeceu a empregada, abraçando-a.
— Não precisa me agradecer. O Joseph é que fez tudo pra você.
Brigitte chegou sozinha ao baile. Todas as suas amigas já estavam lá, inclusive Rachel, que logo exclamou surpresa:
— Brigitte, você veio! Não imaginava que viesse hoje. Que vestido lindo! Onde comprou?
— Rachel, não se faça de boba. Sabe muito bem que foi o Joseph que me enviou esse vestido de presente de formatura.
— E por que acha que eu deveria saber de alguma coisa?
— Você o ajudou a escolher, não é mesmo?
— Está certo, eu escolhi o vestido. O Joseph me pediu ajuda.
— É lindo.
— Você é a mais linda do baile, Brigitte.
— Mas estou sem acompanhante — Brigitte disse, cabisbaixa.
— Eu tenho o meu acompanhante da noite, e se você olhar para trás perceberá que também não está sozinha, amiga. — Rachel disse, apontando o dedo na direção oposta.
Brigitte olhou para trás e teve a grande surpresa. Joseph havia chegado ao baile minutos antes. Estava elegante em seu novo terno azul escuro.
— Rachel, é o Joseph. O que eu faço? — Brigitte exclamou, nervosa.
— Não faça nada, espere ele vir até você.
— Rachel, ele está vindo pra cá.
— Aja naturalmente e sorria. Agora eu vou para o meu canto. Boa sorte, amiga. — Rachel desejou-lhe.
— Obrigada.
Joseph aproximou-se de Brigitte e disse:
— Esse vestido ficou ainda mais lindo em você.
— Obrigada, Joseph. Eu pensei que você tivesse me esquecido.
— É impossível esquecer você, minha amada. Dança comigo?
— Sim, eu danço. E daqui a pouco dançaremos charleston.
— Depois de tanto me ensinar, eu aprendi finalmente. Ah, olha o que eu trouxe.
— A sua máquina fotográfica portátil! — Brigitte exclamou, surpresa.
— Sim, vou tirar várias fotos nossas. Inclusive quero uma foto com você agora mesmo. Você está linda! Temos que registrar este momento.
— Então, está bem! Rachel fará a foto pra gente. Vou chamá-la.
Depois de tirarem várias fotos juntos, Joseph pegou Brigitte pela mão e dançaram durante todo o baile.
Já passava da meia-noite quando Joseph levou Brigitte de volta para casa em seu carro.
— Foi uma noite inesquecível, Joseph. Obrigada por tudo.
— Eu é que te agradeço. Fiz tudo isso porque eu te amo.
— Eu sei. Você poderia me acompanhar até a sala?
— Até a sala?
— Sim.
— Claro que posso.
— Eu sei que já é tarde, mas tenho algo a lhe dizer.
— Tudo bem. Vou estacionar o carro e já entro. Pode descer, já está começando a chover. — Joseph disse com um breve sorriso.
— Sim, te espero lá dentro. — Ela seguiu para dentro.
Sentada no sofá da sala, ela o esperou. Logo que ele entrou, ela levantou-se e disse:
— Joseph.
— Fale, estou aqui para te ouvir. — Ele estava diante dela.
— Eu sei que você me ama.
— E você, me ama?
— Sim, eu te amo muito, mas acontece que eu ainda não me sinto preparada pra me casar e ter filhos. Me desculpe, eu não quero mentir pra você nem te enganar. Você já passou dos vinte e sete anos de idade e deve estar louco pra casar logo e ter seus filhos, não é mesmo? Então eu só quero te dizer que você pode ficar com outra mulher e se casar com ela. Eu sou sim muito apaixonada por você, mas não posso exigir que continue sozinho esperando a minha decisão.
— É por isso que eu te amo tanto, porque você é honrada e sempre diz a verdade. Saiba que nada me traria mais alegria do que me casar com você e ter filhos. Porém, se a mulher que eu amo ainda é muito jovem e não está preparada para ser mãe e esposa, eu estou disposto a esperar até quando você quiser. Eu não quero outra pessoa, eu quero você. Será que você consegue entender isso?
— Está falando sério?
— Sim, tanto que o mais importante é estar perto de você.
— Não sei nem o que dizer, Joseph.
— Não diga nada, apenas me ame! — Ele aproximou seu rosto do rosto dela, tocou a face de sua amada e mais uma vez se beijaram. De repente, um forte raio interrompeu aquela manifestação de carinho. Eles se assustaram com o estrondo e com a luz dos relâmpagos que atravessou as janelas de vidro.
Uma forte tempestade iniciou-se. A chuva era intensa, torrencial, muitos raios e trovões surgiam.
— Brigitte, já é tarde, eu vou pra minha casa. Amanhã nos falamos. — Ele se dirigiu até a porta.
— Espere, não vá agora. Está uma tempestade horrível lá fora, não é seguro dirigir um carro nessa chuva torrencial. É melhor você passar a noite aqui. Seu antigo quarto ainda está lá e tem roupas suas no armário. Sempre fica alguma coisa.
— Não esperava o seu convite. Será que a Darla não se importa?
— A Darla? Com certeza não! Eu explico pra ela amanhã o que houve.
— Vamos fazer assim: eu durmo aqui no sofá da sala, é melhor. Tenho certeza de que a sua tutora prefere dessa forma.
— Em pouco tempo serei adulta, mas uma adulta insegura, muito jovem pra escolher. Tudo bem, como quiser. Vou pegar um cobertor pra você. Esta será uma noite fria.
— Obrigado, minha amada. Amanhã pedirei a Darla permissão para cortejar você oficialmente. Agora vamos até o fim.
Brigitte trouxe o cobertor para Joseph. Eles sentaram-se lado a lado no sofá, conversaram,se beijaram, acabaram adormecendo ali mesmo. Estavam muito cansados de tanto dançar no baile de formatura. Aquela havia sido uma grande noite.
Ao amanhecer, Brigitte assustou-se quando percebeu que estava com a cabeça no colo de Joseph, que, por sua vez, estava recostado no braço do sofá.
— Oh, Joseph, dormimos no sofá — comentou, ainda zonza de sono.
— Parece que sim. Minhas costas doem. Acho melhor eu ir pra minha casa.
— Não! Já que está aqui, tomará café comigo. Podemos passear pela cidade hoje.
— Pode até ser, mas vou precisar trocar de roupa, tomar um banho.
— Eu já disse, tem roupas suas aqui ainda.
— Está certo. Hoje passaremos o dia juntos e podemos almoçar no meu apartamento se você quiser. Você vai adorar conhecê-lo. Eu tenho uma empregada em casa, chama-se Gertrudes. É uma senhora de confiança e cozinha muito bem. Você vai adorar a comida dela.
— Vou pensar se aceito o seu convite. — Brigitte sorriu.
Naquele mês Brigitte já havia completado a maioridade, tomou posse de seus bens, decidiu os rumos de sua vida. Estava decidida a entrar pra universidade. Em uma de suas tardes de leitura na biblioteca de casa, Brigitte decidiu subir em uma cadeira e remexer os livros mais antigos que estavam no topo da estante. Na verdade, ela pretendia jogar os livros fora se estivessem mofados ou até quase apodrecidos pelo tempo.
De repente, um exemplar escapou de suas mãos e caiu no chão. Ao descer para pegá-lo, percebeu que vários papéis caíram de dentro do livro. Curiosa, pegou os papéis e começou a lê-los. Eram envelopes dentro dos quais havia cartas para Matthew MacBrown, o filho dos antigos donos daquela casa. As cartas estavam assinadas por Louise Claviere, a mãe de Brigitte.
O coração dela acelerou. Naquele mesmo instante, Brigitte entendeu que Matthew MacBrown era seu pai, pois em uma das cartas Louise dizia que estava muito ansiosa para que chegasse logo o dia do casamento dela com Matthew e que era uma pena terem que manter o matrimônio em segredo. Nas cartas, Louise falava sobre sua vida como atriz e em uma delas estava escrito seu nome verdadeiro. Louise se chamava Margot Lamartine. Brigitte entendeu de uma vez por todas que o relacionamento de seus pais não era aceito por seus avós.
— O tempo todo eu vivi na casa da minha própria família e não sabia! Por isso minha mãe me deixou aqui. Ela acreditava que meus avós ainda moravam nesta casa. Mas será que meu pai George nunca soube que minha mãe foi casada com Matthew Macbrown? — questionou a si mesma.
Ela telefonou para Joseph.
— Alô!
— Joseph, sou eu, Brigitte. Venha agora mesmo aqui em casa, é urgente.
— Tudo bem, eu vou. Estou me despedindo de um cliente e já chego aí.
Brigitte andava nervosa de um lado para o outro, até que Joseph entrou na sala.
— Meu amor, o que aconteceu? Por que está tão nervosa?
— Joseph, ainda bem que você chegou.
— O que aconteceu?
— Eu descobri quem é meu pai.
— Descobriu? Como?
— Eu sei por que minha mãe me abandonou nesta casa.
— Por quê?
— Porque ela pensava que meus avós ainda moravam aqui.
— Espere, está me dizendo que o senhor Andrew MacBrown, antigo dono dessa casa, é seu avô?
— Sim.
— Então você é filha de Matthew Macbrown?
— Sou. Eu estava arrumando uns livros na biblioteca quando, de repente, um deles caiu no chão. Vários envelopes com cartas caíram de dentro do livro. As cartas eram para Matthew MacBrown e foram assinadas por Louise Claviere, minha mãe. Às vezes ela passava meses se apresentando em outras cidades e enviava cartas e cartões postais. Em uma das cartas minha mãe menciona a data do casamento, fala sobre a vida dela como atriz, lamenta ter que viver um romance proibido com meu pai e ainda menciona seu nome verdadeiro. Revirei mais livros antigos e encontrei mais cartas e até fotos. O nome dela é Margot Lamartine.
— Brigitte, eu conseguirei o registro de casamento dos seus pais, descobrirei o paradeiro de sua mãe. Agora entendo tudo. Ela te abandonou aqui porque achou que seus avós ainda moravam nesta casa.
— Exatamente.
Joseph abraçou sua amada.
— Vou agora mesmo ao meu escritório. Quero localizar o paradeiro de sua mãe.
— Eu vou com você.
— Então vamos logo. — Segurou a mão dela. — Meu amor, fico feliz por ter descoberto as suas origens.
— Obrigada por estar me ajudando. Agora quero encontrar a minha mãe. Ela deve ter muitas coisas para me dizer.
— Com essas novas informações, poderei localizá-la de maneira mais fácil.
— Brigitte, eu descobri onde está sua mãe! — Ele entrou no quarto dela, alegre por poder dar a notícia. Ela, por sua vez, lia um romance de época naquele instante.
— Joseph! Encontrou?
— Sim! Sua mãe não chegou mesmo a fazer seu registro de nascimento. Depois que ela te abandonou, foi embora para Los Angeles, onde, há dez anos, casou-se com um cineasta em ascensão. Brigitte, sua mãe chegou a atuar em algumas produções utilizando o nome verdadeiro dela. Há um tempo ela se tornou roteirista dos filmes. Não está mais atuando.
— Cinema? Achei que ela fosse só do teatro. Eu nem vou ao cinema, talvez por isso eu nunca a tenha a visto em nenhum filme. No entanto, mesmo se eu a visse, eu não a reconheceria, não tinha fotos dela. Eu só não entendo por que ela não veio me buscar se melhorou de vida.
— Talvez porque o atual marido não aceite que ela tenha uma filha. Ela pensa que os MacBrown criaram você.
— Eu quero ir a Los Angeles encontrá-la.
— Você é quem sabe.
— Por favor, marque esse encontro. Eu preciso falar com ela.
— Nós podemos ir a Los Angeles de trem. Serão três longos dias de viagem, paradas em várias estações, mas, se está disposta, posso intermediar seu encontro com sua mãe.
— Eu quero, quero muito. Será incrível essa viagem. Obrigada! — Saltitante, ela o abraçou.
Brigitte e Joseph partiram juntos para Los Angeles. A viagem foi longa.
Em um dos hotéis em que se hospedaram nos intervalos da viagem, conversaram.
— Boa noite, Brigitte. Vou pro meu quarto. Como eu gostaria de já estar casado com você. Ainda tenho esperança que em breve isso aconteça. Toda vez que eu te olho, que te sinto, tenho vontade de te dar o meu amor de verdade. Queria poder dormir e acordar do teu lado todos os dias — Joseph disse, afagando os cabelos dela de maneira delicada
— Eu sei, mas já conversamos sobre isso e você aceitou que as coisas sejam assim.
— Não estou reclamando, apenas manifestando a minha vontade.
— Tudo bem. Com você eu descobri o amor de verdade — ela declarou, sorrindo.
— Eu juro que te amo! — Ele a abraçou fortemente.
Novamente Joseph e Brigitte se beijaram de maneira doce.
A chegada em Los Angeles foi tranquila e cheia de expectativas para Brigitte. Ela e Joseph ficaram hospedados no clássico hotel Millennium Biltmore.
— Eu fui obrigado a enganar a sua mãe. — Joseph entrou no quarto dela ainda na hora do café.
— Enganou? Como assim? — Brigitte perguntou.
— Eu telefonei para o estúdio e disse que era um jornalista e queria entrevistar seu padrasto.
— E onde vai ser a entrevista?
— Que entrevista? Eu nem sou jornalista.
— Eu quero dizer: onde será o encontro?
— Na casa deles.
— Não posso acreditar! Tomara que ele não atrapalhe.
— Acontecerá amanhã de manhã. Prepare-se para enfrentar sua mãe e seu padrasto.
— Vou me preparar.
Joseph e Brigitte seguiram de táxi para a casa de Louise. O tempo parecia não passar e a ansiedade da moça, que já não era mais órfã de mãe, fazia seu coração bater descompassado.
— Chegamos, meu amor, sua mãe mora aqui. — Joseph parou o carro em frente à casa.
— Que lugar lindo!
— Sim, é uma pequena mansão. Linda mesmo. Vamos entrar.
Tocaram a campainha. Um empregado abriu os portões. Entraram e foram até a sala, que já estava preparada para a entrevista.
O padrasto de Brigitte foi o primeiro a aparecer e logo se apresentou:
— Bom dia! Eu sou Leonard Clark, um dos melhores cineastas de Hollywood.
— Bom dia, senhor Clark. Sou Joseph Koller. Gostei muito de seus filmes. São geniais. — Tentou demonstrar interesse e simpatia.
— Joseph, qual jornal de Nova York você representa mesmo?
— Onde está Louise? — Brigitte perguntou nervosa.
— Senhorita, qual é seu nome? — Leonard perguntou, como quem quisesse saber o que aquela estranha estava fazendo ali.
— Logo você vai saber meu nome e minha identidade — ela respondeu, misteriosa.
— O quê? — Leonard estava cada vez mais confuso.
Naquele momento Louise entrou na sala.
— Bom dia, senhor Joseph e senhorita... Eu não sei seu nome — Louise disse, desculpando-se.
— Meu nome é Brigitte! Brigitte Claviere! — revelou.
— O quê? — Louise quase não conseguiu acreditar.
— É isso mesmo que ouviu, senhora Margot Lamartine. Esse é meu nome! Brigitte Claviere!
— Que brincadeira é essa, moça? — Louise se mostrou confusa.
— Senhora Clark, eu explico — disse Joseph. — Brigitte e eu não somos jornalistas, eu sou advogado e fui o tutor dela por três anos. Tivemos que mentir para que você nos recebesse. Esta mulher é a sua filha, que você abandonou na porta da mansão da família MacBrown. Acontece que, quando deixou Brigitte lá, seus sogros não moravam mais naquela casa. Então Brigitte foi adotada pelo novo dono da mansão. Entretanto, ela sempre quis te conhecer. Eu procurei informações sobre o seu paradeiro por muitos meses, mas foi difícil te encontrar, pois tínhamos apenas seu nome artístico, Louise Claviere.
— Meu Deus! Minha filha Brigitte! E como descobriu meu nome verdadeiro? — Louise aproximou-se de Brigitte, abraçando-a.
— Mãe, por que você nunca me procurou? — Brigitte a questionou, demonstrando certa mágoa.
— Porque eu achei que você estivesse bem com seus avós. Eles nunca me aceitaram porque eu era atriz. Eu não queria que você passasse vergonha tendo uma mãe artista.
— Mãe, por acaso eu encontrei as cartas que você escreveu pro meu pai. Os meus avós foram embora, mas deixaram todos os pertences na mansão. Fotos, livros, cartas, roupas, está tudo lá. Só agora eu descobri essas cartas reveladoras, que estavam dentro de livros muito antigos, no topo da estante. Foi através delas que descobri que você foi casada com meu pai e pude saber seu nome verdadeiro.
— Brigitte, me perdoe! Eu posso te dar mais um abraço, minha filha?
— Sim, mãe.
Elas se abraçaram e choraram.
— Brigitte, você não sabe como eu sofri por ter que te abandonar. Mas não tive outra escolha, eu não tinha condições de te criar, nem de te sustentar. Queria que você estudasse em bons colégios, por isso te deixei lá para seus avós ficarem com você.
— Eu terminei meus estudos na escola há poucos meses. Quero cursar uma faculdade.
— Parabéns, filha! Eu te amo e sempre te amei. Acontece que eu tinha me conformado em te perder.
— Muito bonito tudo isso! Mãe e filha finamente se reencontraram. No entanto, eu, como marido de Louise, ou melhor, da senhora Margot Lamartine Clark, mereço explicações. Onde estão as provas de que esta moça é de fato a Brigitte que minha esposa abandonou? — Leonard questionou, autoritário.
— Senhor Leornard, nós temos aqui as cartas trocadas entre os pais de Brigitte, e todas as provas de que ela foi abandonada naquela casa. Vejam, confiram. Está tudo aqui. Essas cartas foram escritas por você, senhora Clark? — Joseph dispôs as cartas sobre a mesinha de centro.
— Leornard, acha mesmo que eu não seria capaz de reconhecer minha própria filha? Eu a reconheço pelo olhar. Sim, essas cartas foram escritas por mim. Eu até pensei que o Matthew tivesse as jogado fora, mas todas estavam todas na mansão. Meu falecido marido só pode ter as esquecido dentro dos livros, ou nem se importou em tê-las consigo — Louise respondeu com lágrimas nos olhos.
— Então você é mesmo filha da minha esposa — Leonard se conformou.
— Sim. Meu pai adotivo ainda fez questão de colocar em meu nome o sobrenome artístico da minha mãe. Olhem meus documentos, me chamo Brigitte Claviere Bennett.
Louise e Leonard analisavam as cartas, papéis e documentos que estavam sobre a mesinha.
— Margot, precisamos conversar sobre como será tudo daqui pra frente. Afinal, Brigitte é sua filha e herdeira. Peço que vocês, Brigitte e Joseph, voltem amanhã para decidirmos juntos o que será feito.
— Estamos de acordo, Senhor Clark. Amanhã voltaremos. — Joseph concordou com semblante de satisfação por ter ajudado sua amada a reencontrar a família.
— Mãe, eu voltarei amanhã.
— Volte. Eu estarei aqui te esperando. — Louise estava emocionada.
De volta ao hotel, Joseph e Brigitte conversaram.
— Então você finalmente encontrou sua mãe. Não é maravilhoso, meu amor?
— É muito bom, mas não sei se ela está tão disposta a me ter ao lado dela. O senhor Clark com certeza vai interferir em tudo.
— E se ela disser que você pode ficar? Se ela disser que sim, fique aqui com ela, pelo menos por esses meses. Mando trazer suas coisas de Nova York. Meus pais moram aqui na Califórnia, posso voltar a viver com eles.
— Mas e o escritório em Nova York?
— Verei ainda o que farei. Tenho muitos clientes, terei que voltar amanhã para resolver meus negócios.
— E nós? Ficaremos longes um do outro?
— Só por uns dias. Talvez eu tenha que ficar lá por uns meses ainda. Mas eu posso vir aqui duas vezes por mês pra te ver. Prometo que telefono todos os dias para conversarmos. Você passou a vida inteira longe da sua mãe. É justo que fique aqui por um tempo para conhecê-la. Eu até posso tirar dois meses de férias daqui uns dias e então ficamos todos juntos. Estou mesmo precisando descansar. As praias de Los Angeles são fantásticas. Vamos nos divertir muito.
— Joseph, você é um homem íntegro e honrado! Eu te amo muito por isso e não quero ficar longe de você nem por um minuto. Mas mais uma vez repito, você está livre pra ficar e se casar com outra mulher por mais que isso me machuque e me torture.
— Eu não quero me casar com outra mulher. Eu quero você e não falamos mais sobre isso.
— Tudo bem.
— De qualquer maneira, eu teria mesmo que voltar a Nova York para resolver questões do escritório, buscar suas coisas, conversar com os empregados da casa. É questão de uma ou duas semanas e eu estarei de volta. Preciso mesmo de férias. Prometo.
— Está certo. Só não esqueça que eu te amo e quero você aqui comigo. — Ela o abraçou.
No dia seguinte, Margot já esperava pela filha nos jardins da casa.
— Brigitte, que bom que voltou. Leonard e eu conversamos e ele disse que você pode ficar aqui conosco o tempo que quiser.
— Mãe, isso é maravilhoso! Como já eu terminei meus estudos em Nova York, quero sim ficar aqui com a senhora por uns meses, para nos conhecermos.
— Será uma felicidade muito grande poder te conhecer melhor, minha filha. E seu amigo, não fica conosco?
Todos se entreolharam.
— Não, senhora — respondeu Joseph. — Eu tenho que voltar a Nova York para resolver meus assuntos de trabalho. Sou um advogado ocupado, tenho muitos clientes me esperando, mas pretendo voltar daqui a poucos dias para passar férias nessa linda Los Angeles. As praias daqui são maravilhosas. — Ele mal conseguia conter sua alegria por saber que Brigitte estava feliz.
— Nisso você tem razão. As praias de Los Angeles são fantásticas.
— Senhora, eu e sua filha Brigitte somos namorados, e só não somos noivos porque ela não quer. Tem medo de se casar. Ela diz não estar preparada para ser mãe nem esposa.
— Por favor, Joseph, não me chame de senhora, me chame apenas de Louise ou Margot. É claro que eu percebi que você e minha filha são namorados, pelos olhares que você lança pra ela. Eu sei reconhecer um homem apaixonado. E, quanto ao casamento, não se preocupe. Eu convencerei Brigitte de que o casamento é a melhor coisa desse mundo. E volte logo para passar férias conosco aqui na mansão — Margot afirmou, simpática.
— Tem toda a razão, Margot. Eu voltarei logo e espero que você convença sua filha a se casar logo comigo. Serei eternamente grato por isso.
— Minha filha Brigitte só pode estar doente por demorar tanto pra se casar com um homem tão lindo e inteligente como você, Joseph, que também é um jovem advogado bem-sucedido. Você é o sonho de todas as moças. — Margot manifestou seu desejo de tê-lo como genro.
— Agradeço suas palavras. Poderia anotar aqui o número do seu telefone? Eu vou telefonar todos os dias para falar com a minha namorada — Joseph pediu à futura sogra.
— É bom que você telefone mesmo, Joseph. Eu vou morrer de saudade até você voltar — Brigitte confessou.
— Sentir saudade é bom, é sinal de que amamos de verdade — Margot concluiu mais uma vez.
— Agora preciso ir. Vou deixar mãe e filha a sós. Têm muito o que conversar. Quanto mais rápido eu for, mais rápido eu volto. Tchau, meu amor. Cuide-se. — Ele despediu-se de Brigitte dando-lhe um beijo e um carinhoso abraço.
— Aqui está Joseph. Esse é o número do meu telefone. Ligue quantas vezes quiser.
— Obrigado e até logo. — Ele despediu-se.
— Até logo, Joseph. — Margot o admirou enquanto ele partia.
Brigitte descobriu o amor da maneira mais pura possível. No entanto, ainda tinha novos desafios e sentimentos controversos a serem superados.
Jamila Mafra
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