Biblio VT
— Vamos fazer isso da forma mais difícil. Vista-se. E rápido. Quero acabar logo com essa história. Não tenho o dia todo.
— Vou me vestir. Espere lá fora.
— Boa tentativa, mas não vai funcionar.
— Não vou me vestir com você aqui.
— Sim, você vai.
Mia Palmieri recuou, mas a parede estava atrás dela. Com os olhos presos aos da jovem, Matthew Knight pegou a faixa do roupão. Ela lhe deu um tapa. O ex-agente agarrou-lhe os pulsos e, com uma das mãos, puxou os braços de Mia para que ficassem acima da cabeça. A jovem gritaria a qualquer segundo, e ele sabia disso.
— Se emitir um som, vai se arrepender — resmungou Matt.
— Me deixe ir!
Knight a silenciou da única forma que podia, com os próprios lábios...
No alto das montanhas da Colômbia
A floresta era sombria.
O único som era o ruído da cachoeira. A lua havia nascido: um globo opulento, de marfim, que parecia suspenso sobre os galhos frondosos das árvores. A luz da lua iluminava a clareira e a piscina natural. Iluminava Mia, nua sob o véu líquido espumante da cachoeira.
Ele permanecia perto da clareira, observando-a e procurando bem fundo dentro de si a disciplina por meio da qual regrara sua vida. Mas esse era o problema. Não tinha disciplina quando o assunto era aquela mulher. Procurara por Mia e a encontrara. Depois, ele a perdera.
Agora, a capturara. Mia era dele... não, não era. Ela deixara isso claro. O abandonara por causa de outro. Um homem que a quisera de volta mesmo depois de ter dito que a moça o traíra.
Então, por que iria querê-la? Matthew questionara isso no início. Era uma pergunta honesta. Entendia que a mulher era bonita — o homem lhe mostrara uma fotografia dela. Porém, o mundo estava repleto de mulheres belas. O que fazia com que essa fosse tão especial?
O homem ficara embaraçado. Soltara uma risadinha e dissera que a queria de volta porque Mia era mais do que bonita. Era tudo que um homem poderia querer.
Matthew sentiu o corpo agitar-se. Não era verdade. Mia não era tudo que um homem poderia querer. Era mais. Sabia disso agora porque, por um momento, a moça lhe pertencera. Ela era a reencarnação de Eva, Jezebel, Lilith. Podia ser mais impetuosa do que os relâmpagos de verão que riscavam o céu quente ou tão suave e gentil como a chuva de primavera.
Bastava observá-la para atiçar a alma de um homem. O rosto era oval, os olhos, escuros e negros, acima de um nariz aristocrático e uma boca feita para o pecado. Os cabelos eram longos e escuros como o café, caindo pelas costas em cachos que imploravam pelo toque de Matthew.
Mia era alta e esbelta, mas os seios eram bem arredondados e fartos. O rapaz ficou com a respiração alterada só de pensar em tocá-los.
E as pernas... as pernas dela eram próprias para se enroscarem na cintura de um homem. Matthew ainda podia se lembrar de senti-las quando acariciou-lhe as coxas e mergulhou fundo naquele calor.
Matthew estremeceu. Deus, estava perdendo a cabeça? Quem era Mia Palmieri? O que ela era? Era a mulher dele ou de Hamilton? Será que tudo fora um jogo?
Tudo que Matthew sabia agora era que aquela mulher era uma tentação. Entretanto, ele era um guerreiro.
Mia girou na direção dele. Matthew manteve-se firme. Ela não podia vê-lo. Ele permanecia vestido de preto, o tipo de roupa que usava em manobras noturnas nas Forças Especiais e, depois, no Serviço Secreto. Sabia que, assim, se misturava às sombras da floresta.
Será que, de alguma forma, a moça sentiu a presença dele? E por isso inclinava a cabeça para trás, erguendo o rosto para a cortina d'água? Por que levantava as mãos, levando-as aos seios como se estivesse oferecendo a si mesma aos deuses?
Oferecendo-se a Matthew? Estava duro como uma rocha. Tão duro que machucava. Urna vez, prometera levá-la de volta ao homem que o mandara ali para encontrá-la. Hoje à noite, a única promessa era a si mesmo.
Lentamente, Matthew caminhou em direção à área iluminada pela luz da lua que cobria a pequena clareira. O rapaz esperou, os músculos tensos, desejando que a moça voltasse a olhar na direção dele. Por quê? Por que não apenas gritar e deixar que a jovem soubesse que ele estava ali?
A resposta foi um sussurro frio na cabeça do rapaz. Matthew queria ver o que a srta. Palmieri faria quando o avistasse. Será que correria na direção dele? Será que se jogaria naqueles braços másculos? Se fizesse isso... Deus, se Mia fizesse isso...
Mas não fez. A reação dela foi como um soco no estômago. Mia abriu bem os olhos. Os lábios se entreabriram em uma pequena exclamação de surpresa.
Lançou um dos braços sobre os selos e o outro sobre o delta feminino, em um antigo gesto de timidez.
Matthew sabia muito bem que aquilo era um simples reflexo e nada mais, sabia que tinha todas as respostas necessárias... As respostas que não queria reconhecer.
— Não — Mia disse.
Ele não podia ouvir aquela palavra, mas conseguia ver a boca da jovem formando-a.
— Não — Mia voltou a dizer, e Matthew sentiu uma torrente de adrenalina percorrer-lhe o corpo.
Ele esboçou um sorriso típico de predador. Então, descalçou os tênis, tirou a camisa, puxando-a pela cabeça, abriu o zíper das calças e livrou-se delas.
Em seguida, Matthew permaneceu parado, deixando que Mia visse o tamanho de sua excitação. Então, mergulhou na piscina da selva sombria e foi a seu encontro.
CAPÍTULO UM
Cartagena, Colômbia, duas semanas antes.
Matthew Knight estava sentado à mesa, do lado de fora do Café Esmeralda, bebendo cerveja e perguntando a si mesmo o que fazia em Cartagena.
Anos atrás, Matthew teria saído dali e prometido que nunca retornaria. Já estivera naquela cafeteria antes, àquela mesa. Provavelmente, naquela mesma cadeira, de costas para a parede. E os olhos vasculhando a praça cheia, tentando avistar algum problema antes que fosse atingido por um.
Era difícil livrar-se dos velhos hábitos, assim como das lembranças que o acordavam no meio da noite. Melhor não pensar nisso agora.
Estava quente. Mas sempre fizera calor em Cartagena. Nada mudara. Os cheiros, o trânsito. Até mesmo a multidão apinhada na praça. Soldados, polícia, turistas carregados de jóias, carteiras e telefones celulares para manter os gatunos felizes...
Um homem tinha de ser cuidadoso em Cartagena. Knight soubera disso desde a primeira vez. Imaginara-se muito bom nisso, mas se fosse bom... Droga. O passado estava morto. Assim como Alita.
Matthew bebeu a última gota de cerveja da garrafa. Agora, estava ali como um civil, não como um agente do Serviço Secreto onde o preto era branco e o branco era preto, e nada significava o que parecia ser.
Aos 31 anos, Knight estava em sua plenitude. Corpo rígido, 1,93m de altura. A estrutura óssea talhada devido ao fato de a mãe ser uma mestiça da tribo indígena Comanche. E os olhos verde-esmeralda do pai texano. Uma cicatriz feita com uma navalha em uma das maçãs do rosto, recordação de uma noite de inverno em Moscou quando um rebelde checheno tentou matá-lo.
As mulheres enlouqueciam com aquela cicatriz. Além disso, ele era rico. Nem um centavo sequer viera do velho pai, que passara anos ignorando-o. À exceção de quando dizia que o filho nunca conseguiria nada.
O que fez de Matthew um homem rico fora a Knight, Knight & Knight: Especialistas em Gerenciamento de Risco, a empresa que havia fundado com os irmãos. Com um ano de diferença entre cada um, compartilhavam da mesma árdua história.
Uma mãe que morrera quando os filhos ainda eram pequenos. Um pai ávido pelo poder. Rebelião juvenil, alguns semestres na faculdade; as Forças Especiais e o Serviço Secreto. A vida se tornara pura adrenalina. Perigo e mulheres bonitas passaram a ser as drogas de Matthew, embora as mulheres nunca durassem muito. Um guerreiro jamais deixava que as emoções o controlassem.
— Outra cerveja, senhor?
Matthew ergueu o olhar e acenou com a cabeça, concordando. A cerveja era a única coisa que o ex-agente apreciava em Cartagena. Há cinco anos, o Serviço Secreto o havia tornado parceiro de uma agente do Departamento Antidrogas e os enviara para que se infiltrassem em um cartel. De acordo com o disfarce, ambos eram amantes, em busca de algum dinheiro para que pudessem se estabelecer. Apesar de não terem nada um com o outro, Alita gostava de provocá-lo.
Alguém os traiu. Quatro homens armados os agarraram na rua e os levaram de carro até um barracão caindo aos pedaços, na selva. Bateram em Matthew até perdesse a consciência. Quando recobrou os sentidos, Knight e Alita estavam amarrados a cadeiras.
— Agora você vai aprender como um homem dá prazer a uma mulher, gringo, um dos seqüestradores disse, fazendo com que os quatro caíssem na risada.
Alita demonstrou uma coragem típica de uma leoa. Matthew tentou se desvencilhar das cordas que o amarravam, mas estava impotente e não conseguiu impedir o que aconteceu.
Quando acabou, dois dos assassinos arrastaram o corpo de Alita para fora do barracão. O terceiro homem foi com os outros, dizendo que precisava urinar depois de tanto trabalho.
Um bandido ficou para vigiar Matt. Sorrindo, disse que ia se preparar para a próxima rodada de diversão. O homem estava abaixado sobre duas trouxinhas de pó branco quando, finalmente, Matt conseguiu libertar os pulsos.
— Ei, amigo — disse.
O homem virou-se e veio em sua direção. Em um m instante, Matthew colocou uma das mãos sobre a boca do bandido e um dos braços em torno do pescoço do colombiano. Uma rápida torção e o vigia estava morto.
Matt matou dois dos outros com a arma do que morrera, mas apenas feriu o quarto bandido. O sujeito correu em direção à selva. Bom, Matthew pensou, friamente. Um jaguar faria a festa com a carne daquele homem antes que o dia terminasse.
Matthew tinha outras providências a tomar. Como, por exemplo, enterrar Alita. Era uma tarefa árdua. Não apenas porque era difícil cavar um túmulo na terra fecunda, mas porque os olhos se mantinham embaçados devido às lágrimas.
Ali em pé, no túmulo da moça, jurou vingar a sua morte. Voltou a Cartagena, dirigindo o carro dos seqüestradores. Depois, seguiu para Bogotá. Na embaixada-fantasma o interrogaram, lamentaram o ocorrido... E lhe disseram que não haveria nenhuma busca pelo assassino que escapara. Quando Knight exigiu explicações, o chefe dele o mandou de volta para Washington.
Cam e Alex também não tiveram sorte melhor na capital americana. Junto a uma garrafa de uísque, os irmãos compartilhavam a desilusão relacionada ao Serviço Secreto.
Foi assim que surgiu a empresa especializada em Gerenciamento de Risco. Com base em Dallas, os Knight ofereciam aos seus clientes soluções para problemas difíceis — soluções que eram sempre morais se não fossem exatamente legais.
O Serviço Secreto e a Colômbia haviam se tornado lembranças... Até agora. Até o pai de Matthew lhe pedir, como um favor, que se encontrasse com um velho amigo que estava com um problema.
Avery pedindo um favor? As coisas mudaram desde que Cam ficara frente a frente com a morte. Matt não confiava por completo na mudança. Ainda assim, concordara com o encontro. Escutaria o problema do sujeito, talvez oferecesse algum conselho. Não aceitaria de jeito nenhum algo que o mantivesse...
Um homem vinha em sua direção. Matt notou as feições salientes. Norte-americano. Na faixa dos 40 anos. Boa forma física. Sem dúvida, militar, embora estivesse em trajes civis.
— Matthew Knight?
Matt levantou-se e estendeu-lhe uma das mãos, dizendo:
— Sim.
— Douglas Hamilton. Desculpe, estou atrasado.
— Sem problemas, sr. Hamilton.
— Coronel. Sou do Exército dos Estados Unidos. Seu pai não lhe contou?
Matt fez um sinal para que Hamilton se sentasse. Em seguida, acenou para o garçom, pedindo mais duas cervejas.
— Meu pai não me disse nada exceto que o senhor e ele são antigos companheiros.
— Na verdade, a amizade era entre seu pai e o meu. O garçom colocou duas garrafas geladas em cima da mesa. Hamilton ignorou a dele e perguntou:
— Como está Avery?
— Bem — Matt respondeu. E perguntava a si mesmo por que, de cara, não gostara de Hamilton.
— Quero agradecer-lhe por ter vindo aqui tão rápido, sr. Knight. Tirar partido de uma amizade é algo presunçoso, mas eu precisava de uma forma de chegar até você.
Hamilton fez uma pausa e continuou:
— Você e sua empresa têm boa reputação.
— Podia ter telefonado. Estamos no catálogo.
— Não poderia discutir isso por telefone.
— Discutir o quê?
— Vamos direto ao assunto. Gosto disso. Trata-se de minha noiva. Receio que ela tenha cometido alguma imprudência.
— Coronel, presumo que tenha compreendido mal o que nossa agência faz. Não sou investigador profissional. Não lido com problemas pessoais.
— Sei disso. O que estou prestes a lhe contar deve ser mantido em sigilo.
A noiva de Hamilton dormira com outro homem. Isso certamente seria considerado "imprudência". Será que o coronel pensava que podia contratar um criminoso para matar alguém? Algumas pessoas tinham vindo até a empresa de Gerenciamento de Risco com pedidos semelhantes, mas homicídio não estava na lista de serviços dos três irmãos.
— Minha noiva se envolveu em...
— Um romance com outro homem?
O coronel soltou uma risada e respondeu:
— Adoraria que fosse uma coisa tão simples. Hamilton hesitou. Então, aproximou-se e disse:
— Tráfico de drogas. Matthew piscou.
— Ela contrabandeou...
— Cocaína. Como sabe, o correio diplomático não é alvo de investigação para a alfândega. Mia usou meus privilégios na embaixada para enviar cocaína para os Estados Unidos.
Matthew fitou o homem. Era demais para aceitar.
— Ela é usuária?
— Não até onde eu saiba.
— Então, por que fez isso?
— Por dinheiro, acho. Muito dinheiro.
— O que aconteceu ao ser capturada?
— Não foi. Não pelas autoridades. Fui informado antes sobre o que Mia fizera.
— Alguém que lhe devia.
— Pode colocar as coisas dessa forma, se quiser. A questão é: cuidei disso.
Em outras palavras, o coronel recorreu à considerável influência que tinha para abafar o incidente.
— Contei a Mia. Pensei que minha noiva seria grata. Em vez disso, ela ficou horrorizada. E disse que as pessoas, a quem a cocaína pertencia, pensariam ter sido enganadas e viriam atrás dela.
— Bem, é provável que sua noiva esteja certa.
— Eu lhe disse que estaria segura, sob a minha proteção, mas ela não acreditou. Isso foi há quatro dias. Ontem, Mia desapareceu.
— Seqüestrada?
— Talvez. Ou então fugiu. De qualquer forma, Mia está correndo perigo.
— O senhor pediu ajuda às autoridades?
— Não posso. Teria que lhes contar a história toda. Isso comprometeria Mia...
— Comprometeria o senhor também.
O coronel não respondeu. Não tinha de fazer isso. Depois de um minuto, Matt fez um gesto com a cabeça, concordando.
— Entendo seu problema, coronel. Porém, não entendo como pensa que posso ajudá-lo.
— Pode encontrá-la.
— Isso está fora de questão.
— Conhece este país.
— E o senhor parece saber muito a meu respeito. Em vez de responder, Hamilton tirou uma foto do bolso e a colocou em cima da mesa, dizendo:
— Essa é Mia.
Relutante, Matthew pegou a foto e a olhou. Esperava que a noiva do coronel fosse atraente. Um homem como aquele não teria uma mulher que não fosse bonita. Mia Palmieri tinha o tipo de rosto e de corpo que servia de inspiração a pintores e escultores.
A foto fora tirada na praia em um dia de vento. Os cachos negros da cabeleira sensual cobriam o top. A moça usava shorts que revelavam pernas longas. Os olhos eram grandes e escuros, as maçãs do rosto pontiagudas e a boca era feita para o pecado.
— Muito atraente — Matthew comentou.
— É bonita. Mais do que bonita. É tudo que um homem pode querer... e eu a quero de volta.
— Vá às autoridades.
— Acabei de lhe dizer...
— Não pode. Sim. O senhor me disse. E eu estou lhe dizendo...
— Mia está envolvida com o cartel Rosário. Esse nome lhe diz alguma coisa, sr. Knight?
— Por que diria?
— Chequei seu passado. Conheço a história. Perdeu uma parceira. Pode deixar de interferir e deixar que eu perca minha noiva para as mesmas pessoas?
Uma rajada de vento bateu na foto que Matthew deixara em cima da mesa. O ex-agente a pegou e voltou a olhá-la.
— Por que sua noiva tentou traficar cocaína?
— Já disse, não sei.
— Disse que foi por dinheiro.
— Então, por que está me perguntando novamente?
— Talvez tenha sido por excitação, prazer.
— Que importância tem? Mia fez isso, e agora...
— Talvez tenha feito para o senhor. Talvez seja a pessoa que está por trás do contrabando. Ou talvez sua noiva quisesse cair fora do relacionamento e, por isso, partiu.
— Está me acusando?
— Estou dizendo que, se eu começar a revirar essa história, posso encontrar muita coisa.
— Então, faça isso.
Matthew olhou a foto. Desejava que a foto tivesse sido tirada mais de perto. Havia algo nos olhos de Mia Palmieri...
— Quem foi que a viu pela última vez?
— Minha cozinheira. Ela levou o almoço de Mia até a piscina. Quando voltou para pegar a bandeja, o portão dos fundos estava aberto e minha noiva tinha ido embora.
— Quero falar com a cozinheira e cornos outros empregados.
— Obrigado, sr. Knight.
— Não me agradeça até que eu traga sua noiva de volta, coronel.
Matthew olhou para o relógio e comentou:
— Aluguei uma caminhonete. Qual é o seu endereço?
Hamilton deu o nome de uma rua em um dos bairros mais caros de Cartagena. Matt acenou com a cabeça, concordando, e disse:
— Vou encontrá-lo lá.
Dentro do Escalade, o ex-agente pegou a foto, colocou-a em cima do volante e fitou Mia Palmieri. A moça não parecia uma traficante de drogas. Porém, os anos em que Matt passou no Serviço Secreto lhe ensinaram que o velho ditado era verdadeiro. Não se pode julgar pelas aparências.
Ainda assim, havia algo nos olhos dela... Matt fitou a foto por um longo minuto. Por razões que não compreendia, o ex-agente passou um dos polegares pelos lábios entreabertos de Mia. Então, virou a chave, ligando o motor, deu uma guinada de 180 graus e dirigiu-se às colinas.
A centenas de quilômetros de distância, em um quarto de hotel nos Andes, Mia Palmieri se levantava de um sono agitado. Algo tocara os lábios dela.
Com o coração disparado, a moça tocou a própria boca. Não havia nada ali. Mia soltou uma risadinha. A brisa. Era isso. Apenas a brisa vinda da janela.
A moça trancara a porta, colocara uma cadeira embaixo da maçaneta, mas deixara a janela aberta. O quarto ficava no segundo andar. Era bastante seguro.
Um minuto se arrastou. Então, a jovem afastou as cobertas, foi até a janela, fechou-a e trancou-a. "Melhor", pensou. Mesmo assim, ainda levou mais de uma hora até que voltasse a dormir, retomando o sono agitado.
CAPÍTULO DOIS
Onde estava Mia Palmieri?
Teria fugido ou sido seqüestrada? Quando alguém se envolve com traficantes, brinca com fogo. E isso levava à pergunta seguinte.
Por que a moça teria concordado em contrabandear narcóticos? O dinheiro podia ser alto, porém, os riscos também eram. Principalmente da forma como a jovem agira. Ao usar o correio da embaixada, Mia colocara em perigo não apenas a si mesma, mas também o noivo. Hamilton tinha uma carreira brilhante no Exército.
Por que Mia comprometeria o próprio futuro e o do noivo por algo tão arriscado? Matthew tinha as perguntas. Agora, precisava das respostas que, algumas horas depois, começariam a aparecer aos poucos.
A casa de Hamilton não apenas era cara, mas também bem guardada. Porém, isso não era incomum naquela parte do mundo. Um muro com arame farpado rodeava a casa. Um portão eletrônico. Um canil sugeria que, ao menos, um cão de guarda rondava a propriedade, provavelmente à noite.
Matthew se identificou ao portão e, então, entrou. O coronel o cumprimentou e, a pedido do ex-agente, o conduziu por salas elegantes.
— Mia adorava essa casa — o coronel disse.
O relacionamento entre Hamilton e a noiva não era normal. Não de acordo com os padrões de Matthew. Se uma mulher parecida com Mia Palmieri fizesse parte da vida de Knight, o ex-agente teria passado as noites com a jovem em seus braços.
Não agiria como o coronel. Hamilton e a noiva não dividiam o mesmo quarto. Os aposentos de ambos nem mesmo eram interligados. De fato, o da jovem ficava em uma parte da casa e o do coronel, em outra.
— Não dormem juntos?
— Não é da sua conta.
— Tudo é da minha conta agora. Vá se acostumando com isso, coronel.
— Dormíamos juntos, claro. Mas Mia insistiu em ter o próprio quarto.
— Por quê? E, por favor, coronel, não desperdice meu tempo me dizendo que sua noiva queria privacidade.
— Mia é boa em conseguir o que quer por meio do sexo.
— E o que a srta. Palmieri queria do senhor, coronel?
Knight sabia que a pergunta era cruel, mas também deliberada. O ex- agente queria ver a reação de Hamilton.
— Nada em particular. Mia apenas pensava que isso lhe dava o controle da situação — o coronel explicou.
— E funcionou. Sua noiva contrabandeou cocaína bem embaixo do seu nariz — Matt afirmou.
— Mas não deixei que a droga chegasse ao destino final. Eu lhe disse isso.
— Não. Mas também não deixou que a srta. Palmieri arcasse com as conseqüências.
— Não sinto orgulho da minha fraqueza em relação a Mia, mas eu a amo. E a quero de volta.
A cozinheira confirmou que dava a impressão de Mia ter desaparecido no ar. Não houve barulho de luta, nenhuma espreguiçadeira caída no chão, nada.
Alguma outra coisa?
— Sim — disse a cozinheira após alguns segundos. — A senhorita não comeu nada. A única coisa que faltava na bandeja era uma garrafa de água.
Matthew achou aquele dado interessante. Seria possível que uma mulher seqüestrada, sem evidência de luta, tivesse a chance de levar uma garrafa de água consigo?
— Havia mais alguém trabalhando na casa naquele dia?
— Não, senhor — respondeu a cozinheira, enfática. Então, fez uma pausa e lembrou-se que o rapaz da piscina estivera lá. Mas, quando a senhorita desapareceu, o sujeito já tinha ido para a casa ao lado.
Matt seguiu as pistas e encontrou o jovem. Levou alguns minutos. Mas, finalmente, o rapaz lembrou-se de ter visto um táxi passar, talvez se dirigindo à casa do coronel.
O ex-agente foi até a cidade. Parou em um hotel, pegou a lista das empresas de táxi e teve sorte na terceira tentativa. Por dez dólares, o despachante lembrou que havia mandado um táxi para o endereço de Hamilton no dia em que Mia desapareceu. Por cinqüenta dólares, Matt conseguiu o pacote completo: um encontro com o motorista que olhou para a foto de Mia e disse que se lembrava da senhorita. O taxista a levara a uma agência de automóveis.
A atendente da agência de automóveis lembrava-se da senhorita também. A jovem pedira informações para chegar a Bogotá. A atendente tentara convencê-la a desistir da viagem. Era um longo caminho — 15, 16 horas. E perigoso também, principalmente para uma estrangeira. Mas Mia insistira e a atendente indicara o caminho no mapa. "A rota menor", a moça enfatizara. Ao menos, a senhorita fora astuta e concordara com o caminho mais curto.
Meia hora depois, Matt estava saindo da cidade, mas não pela estrada que Mia deveria ter tomado. Até então, o ex-agente estava certo de que a srta. Palmieri fugira. A pergunta era: por quê?
Havia apenas duas razões lógicas. A primeira era que a jovem estava fugindo do cartel porque as drogas que deveriam ter sido contrabandeadas por ela não haviam chegado a seu destino. Isso não os teria deixado felizes.
A segunda razão era que a moça estava tentando não ser capturada porque escondera a cocaína. Isso também não teria deixado o pessoal do cartel feliz. Não era do estilo deles eliminar o intermediário.
Era a única explicação lógica, Uma mulher fugindo, tanto do namorado quanto de um bando de assassinos, teria tomado o primeiro avião. Uma mulher fugindo com cocaína roubada poderia muito bem tentar despistar qualquer rastro, dirigindo até as montanhas.
Pela rota que a moça havia tomado... Das vezes que estivera fugindo, Matt lançara pistas falsas. Talvez a forma de Mia despistar tenha sido dizer que tomaria o caminho mais curto. O ex-agente teria feito isso se estivesse no lugar da srta. Palmieri. Então, Matt decidiu seguir a própria intuição e tomar o caminho mais longo até Bogotá.
A estrada era rudimentar e o tráfego, quase inexistente. Assim, o ex-agente fez o percurso em um bom tempo. Em Cartagena, Knight pegara uma garrafa térmica de café e alguns sanduíches. Quando escureceu, saiu da estrada preparou seu jantar improvisado. Estava cansado, não conseguia lembrar-se da última vez em que dormira ou tivera uma verdadeira refeição. Porém, Mia estava com uma vantagem significativa e Knight tinha de ganhar tempo.
Matt parou em cada uma das cidades, checou nos postos de gasolina e nas hospedagens, descreveu o carro da jovem e mostrou a foto da srta. Palmieri. Ninguém a vira. Algumas horas antes do amanhecer, Knight dirigiu até uma estrada de terra, estacionando o carro embaixo de um arvoredo. O ex-agente certificou-se de que as janelas estavam trancadas, ligou o ar-condicionado e dormiu. No colo, a pistola automática de nove milímetros que o americano sempre carregava consigo.
Quando o sol nasceu, Matt estava de volta à estrada, dirigindo devagar pelas ruas de outra cidade... E avistou o carro alugado por Mia do lado de fora de um hotel que já tinha visto dias melhores.
Matthew se dirigiu a um pequeno pedaço de terra, que se passava por estacionamento, e entrou. O rapaz tocou a campainha que ficava em cima do balcão da recepção. Depois de um minuto, uma porta se abriu e um sujeito se encaminhou na direção dele — o cabelo caindo nos olhos, a camisa meio abotoada, o rosto contorcido por um bocejo gigantesco. O senhor queria um quarto?
— Tenho uma reserva — disse Matt.
O ex-agente queria dizer que já tinha feito uma reserva. Ao menos, a namorada dele tinha, Matt disse e colocou uma foto de Mia em cima do balcão. O problema era que ele não conseguia se lembrar do número do quarto. Também não tinha uma chave, e queria surpreendê-la.
O rapaz do hotel o fitava, sem piscar. Knight tirou algumas notas de um dos bolsos e as colocou em cima do balcão. O atendente colocou uma das mãos em cima do dinheiro e jogou para Matt uma chave que marcava 204.
O ex-agente subiu as escadas. Atravessou um corredor longo e sombrio. Ao chegar ao quarto em questão, Matthew encostou-se, colocando um dos ouvidos à porta. Não ouviu nada. Lentamente, abriu a porta.
Mia não estava ali, mas as coisas de uma mulher sim. Uma bolsa. Uma pequena mala aberta em cima de uma cadeira. Roupas sobre a cama. Entretanto, Knight podia sentir o cheiro da srta. Palmieri. Notara o perfume de Mia no quarto dela, na casa de Hamilton. Uma fragrância feminina suave que o fazia pensar em um campo de flores brancas se estendendo em direção a um horizonte azul-claro.
Matthew fechou a porta. Não havia muita coisa na mala. Nenhum pacote de cocaína. Apenas algumas camisetas ainda com as etiquetas. O mesmo em relação a um par de calças brancas. Algumas roupas íntimas. Calcinhas brancas de algodão. E um sutiã branco também.
Será que Hamilton gostava de vê-la assim? Ou será que a moça gostava que o noivo a visse dessa forma? Se Mia fosse mulher de Matt, o ex-agente a faria usar seda.
Matt sentiu-se enrijecer. Que inferno, não precisava de fantasia com relação a uma mulher que havia fugido e deixado o amante se perguntando se estaria morta ou viva. Knight não gostava de Hamilton, da arrogância e da sinceridade forçada do coronel. Porém, nenhum homem merecia ser tratado daquela forma.
Matt arrancou tudo de cima da cama, checando embaixo do colchão e o chão. Abriu as gavetas da penteadeira. Vazias. O mesmo com relação à única gaveta da mesinha-de-cabeceira. Não havia nenhum armário, apenas uma prateleira com uma aranha enorme.
Se a srta. Palmieri tivesse alguma droga escondida, ou estava com ela ou no carro. Knight checaria o veículo. Depois, ficaria na caminhonete à espera...
Passos vindos do corredor. Matt foi até a porta e a trancou. Então, encostou-se à parede. Os passos estavam mais próximos. Cessaram do lado de fora. A porta se abriu. Ágil como uma pantera, Matt a fechou, trancando-a. E, antes que tivesse tempo de reagir, a vítima ficou presa em seus braços.
Deus...
A respiração de Mia estava acelerada. Braços de um homem poderoso a pegaram por trás e a ergueram. Ela tentou gritar, mas uma das mãos dele tapou-lhe a boca. O homem disse algo, mas a jovem estava horrorizada demais para entender o que fora dito.
Mia lutava pela vida. Os dois cambalearam pelo quarto, os pés dela a uns 30cm do chão. Contorcendo-se, virando-se, a jovem lhe deu uma cotovelada no estômago. Nada. Mia tentou novamente. Dois socos dessa vez e, embora Matt tivesse resmungado, continuou segurando-a firme.
A moça chutava, e conseguiu atingir a mesa. Uma lamparina fez certo estardalhaço ao cair no chão, mas ainda não seria suficiente para fazer com que alguém corresse até ali, não em um lugar como aquele.
Outro chute. O calcanhar dela atingiu a canela de Matt. Depois, o joelho. Isso fez com que o ex-agente grunhisse novamente devido à dor, mas tudo o que a jovem conseguiu foi que o homem a segurasse com mais força ainda. Mia se jogou contra Matt e os dois bateram na estrutura de ferro da cama.
— Droga — rugiu Knight, e apenas o som daquela palavra aumentou o horror que a moça sentia. O sotaque daquele homem era de um americano. Isso significava que não havia chance de ele ser um ladrão local. Era o homem enviado para matá-la.
Mia mordeu a mão de Knight. Ele xingou. A moça voltou a mordê-lo, sentiu gosto de sangue. O ex-agente pressionou com um dos joelhos a base da coluna da jovem, puxando-a para trás, de forma que o corpo dela ficasse arqueado. Matt colocou uma das mãos sobre o nariz e a boca de Mia, dizendo:
— Pare com isso! Não vou machucá-la.
Então, por que a seguira desde Cartagena, invadira o quarto, escondera-se atrás da porta e pulara em cima dela? Por que os movimentos daquele homem eram como os de um assassino profissional?
Se ele pensava que por lhe assegurar isso a jovem se tornaria dócil, aquele homem estava muito enganado. Mia passou a lutar ainda mais.
Matt abaixou uma das mãos com força. O quarto começou a ficar cinza. A moça agarrou-lhe um dos braços e lutou um pouco mais. O ex-agente ergueu uma das mãos e a jovem respirou um pouco, antes de Knight voltar a deixá-la sem ar.
— A escolha é sua, querida. Quer viver ou morrer? Posso acomodá-la das duas formas — disse Matt ao ouvido de Mia.
O ex-agente estava mentindo. A moça morreria assim que aquele homem acabasse de lutar com ela. Ainda assim, se a jovem continuasse jogando, poderia ganhar algum tempo. Então, Mia balançou a cabeça, concordando.
— Garota esperta — disse Matt e a soltou.
Mia caiu, deslizando até o chão, e encostou a cabeça na parede. Respirar era o que importava naquele momento. Depois de algum tempo, quando parou de arfar, ergueu o olhar em direção ao homem que havia sido enviado para encontrá-la.
Matt havia se dirigido até a janela e ali se encontrava de braços cruzados. A luz do sol da manhã brilhava nos olhos da jovem. Mia não conseguia vê-lo direito. Tudo que sabia era que ele era grande e forte.
— Você está bem?
Mia queria rir, considerando que quase a matara. Todavia, não fizera isso. Não teria serventia se estivesse morta. Tinha de se lembrar desse detalhe. O homem faria qualquer coisa para mantê-la viva até entregá-la a quem o contratara.
Mia não respondeu. Matt a observou por alguns segundos. Então, foi até a pia, que ficava em um canto, encheu um copo com água e o trouxe para ela.
— Beba isso.
Mia pegou o copo e o esvaziou. Depois, devolveu-o a Matt. A moça entraria naquele jogo, fingindo-se passiva. Talvez isso lhe desse alguma vantagem.
Os dedos de Knight tocaram os dela quando a jovem devolveu-lhe o copo. A pele do ex-agente estava quente, quase escaldante. Já a de Mia estava congelada. Mas isso era o que acontecia quando uma pessoa se acalmava depois de passar por uma situação de muita adrenalina. E ela usava apenas um roupão fino de algodão.
— Então, quer me contar algo? — Matt indagou.
— Contar o quê?
— Não vamos perder tempo com joguinhos. Por que simulou o próprio seqüestro?
— Não sei do que está falando.
— Seu namorado está angustiado. O coronel pensou que algo tivesse lhe acontecido. E, todo o tempo, o que aconteceu foi que você decidiu abandoná-lo. A única pergunta agora é: onde está o pacote?
O coração da jovem bateu acelerado. Mia forçou-se a não reagir com nenhum tipo de linguagem corporal.
— Ficar muda não vai ajudar. Fiz uma pergunta.
— Não estou jogando. Não estou entendendo a pergunta.
— Tudo será mais fácil se você me contar.
Mais fácil? Mia quase riu. Uma vez que arrancasse as informações dela, a moça não lhe seria mais útil.
— Já disse. Não sei do que está falando.
Matt se aproximou. Deus, ele era tão alto! Mais de l,90m. E ali estava ela, no chão. Teria de superar a desigualdade, ao menos, psicologicamente. Ser passiva era uma coisa. Ser submissa era outra. Aos poucos, se levantou e disse:
— Preciso me vestir. Estou com frio.
— Aqui é a Colômbia. Estamos praticamente na linha do Equador. Nunca faz frio.
— Acabei de tomar uma ducha. A água estava fria e as toalhas eram finas, e estou...
— Molhada.
A moça abaixou o olhar. Sentiu medo. Precisava acalmar a situação, identificar o inimigo. Não era uma das coisas que teria de fazer? O treinamento fora muito breve. Mas, ao menos, aprendera alguma coisa.
— Não me disse seu nome.
— Isso importa?
— Sim. Você invade meu quarto, revira minhas coisas, me acusa de sabe-se lá o quê...
— E você nem pergunta o porquê. Interessante, não acha?
Mia podia vê-lo claramente agora. Era esbelto, forte. Os ombros, sob a camiseta azul-marinho, eram largos. O abdômen era liso. Os quadris, estreitos, as pernas, longas, escondidas sob os jeans ligeiramente desbotados.
Ela ergueu o olhar até o rosto dele. Era difícil não reagir. Esperava um monstro. Em vez disso, uma beleza máscula. Cabelos negros espessos. Olhos verdes. Um nariz longo e elegante. Uma boca esculpida.
Mia conteve uma risada histérica. O assassino contratado não era feio. Ela valorizava o tipo de homem que podia arrasar corações assim como quebrar pescoços. A jovem precisava ter uma idéia, e logo.
— Você enganou Hamilton.
— Quem?
— O que foi que lhe disse? Não fique calada. Isso só me irrita. Mas não me engana. Logo imaginei. Fugiu com pouca coisa para não levantar suspeitas.
O coração de Mia voltou a bater acelerado. Fora cuidadosa ao copiar a lista. Colocara a original de volta onde a encontrara. Talvez ele não soubesse e estivesse procurando.
— Está errado. Não trouxe nada. Deixei Douglas porque ele não me deixaria romper o relacionamento.
— De uma hora para a outra, você sabe quem é o velho Dougie.
— Esperava que eu admitisse isso logo? Invadiu meu quarto, me atacou...
— O que vou fazer com a senhorita? Está mentindo. Se não tivesse se livrado do seu namorado, você estaria nos Estados Unidos agora. Teria tomado o primeiro avião de volta para casa.
— Hamilton teria feito com que vigiassem os aeroportos.
— É um coronel. Não é Deus.
— Tente lhe dizer isso.
— Para ser franco, não dou a mínima para os seus sentimentos com relação a esse homem. Quero o que roubou. Vai me dizer onde está?
— Onde o quê?
— Vamos fazer isso da forma mais difícil. Vista-se. E rápido. Quero acabar logo com essa história. Não tenho o dia todo.
— Vou me vestir. Espere lá fora.
— Boa tentativa, mas não vai funcionar.
— Não vou me vestir com você aqui.
— Sim, você vai.
Matt a alcançou. A jovem recuou, mas a parede estava atrás dela. Com os olhos presos aos de Mia, o ex-agente pegou a faixa do roupão. Ela lhe deu uma tapa. Knight agarrou-lhe os pulsos. Com uma das mãos, puxou os braços da moça para que ficassem acima da cabeça dela. E, com a outra mão, desfez o laço do roupão.
A jovem gritaria a qualquer segundo. Matthew sabia disso. A mulher era como uma gata selvagem, lutando, debatendo-se, recusando-se a admitir que fora capturada.
— Se emitir o menor ruído sequer, vai se arrepender — resmungou Matt.
— Deixe-me ir.
Knight a silenciou da única forma que podia, com a própria boca. A moça gritou por entre os lábios dele, tentou se desvencilhar daquele homem. Mas Matt se aproximou, apertando-lhe ainda mais os pulsos e reforçando o beijo.
Excitada, Mia lamuriava, o coração acelerado. A moça estava aterrorizada. Agira de forma estúpida e perigosa, o que deixara Hamilton louco. Roubara narcóticos. Dirigira por aquelas colinas repletas de bandidos.
Mia era o tipo de mulher que usava a própria aparência para conseguir o que queria. Como poderia ter o gosto do paraíso? A realidade ficou embaçada. Com uma das mãos, Matt prendeu os dois pulsos da jovem. Então, o ex-agente mudou o ângulo do beijo, intensificando-o.
A srta. Palmieri arfava e lutava contra Knight. Então, emitiu um sussurro. O som que uma mulher faz quando se entrega a um homem. Matt soltou-lhe os pulsos e passou as mãos pelos cabelos da jovem. Depois, ergueu o rosto de Mia, voltando ao intenso beijo...
A moça reagiu, batendo nele com os punhos. Então, ergueu um dos joelhos e mirou o ponto mais vulnerável daquele homem, e teria feito muito estrago se Matt não tivesse reagido tão rápido. O ex-agente agarrou-lhe as mãos, prendendo a jovem ao encostá-la na parede.
Ambos se fitaram por um longo minuto, com a respiração acelerada. Então, lentamente, ainda segurando as mãos da jovem, o ex-agente recuou.
O roupão dela se abrira durante a luta. Matt abaixou os olhos para ver o que tinha sido descoberto. Seios claros, cor de nata. O ventre firme.
Knight lutou para que o próprio rosto não demonstrasse nenhuma emoção. Porém, a moça tinha de ser cega para não ver que aquele homem estava rígido como uma pedra, muito excitado.
Matt pensou em tomá-la. Ali mesmo, contra a parede. Não importava o quanto Mia tentasse negar, também sentira desejo. O ex-agente percebera isso no beijo dela, na resposta em forma de sussurro. Ainda podia ver, nos olhos enevoados de paixão.
Tudo que o ex-agente tinha de fazer era despir os jeans e erguê-la. Se a jovem protestasse, isso duraria apenas alguns segundos até que os dois corpos se fundissem, até que a moça gemesse e...
Meu Deus, será que havia perdido a cabeça? Aquilo era um trabalho. Um trabalho que Matt não quisera. Mia estava contrabandeando narcóticos ou os roubara de quem quer que fosse que a tivesse abastecido. E Knight passara anos odiando pessoas como aquela mulher.
Além disso, Mia era mulher de outro homem. Que fosse para o inferno com aqueles gemidinhos. Uma mulher podia fingir isso. Essa aqui podia e fazia, o tempo todo. E, provavelmente, agira dessa forma com Hamilton.
Os olhos de Matthew ficaram sombrios. O ex-agente sentia aversão por si mesmo e por aquela mulher nua na frente dele.
— Foi assim que manteve o pobre Dougie cego ao que você fazia? Fazendo-o pensar que o deixaria ter isso algum dia?
— Não sei o que...
Mia prendeu a respiração. Uma das mãos do ex-agente acariciava-lhe um dos seios. A moça não era virgem. Um homem já acariciara os seios dela antes, mas nunca ninguém a fizera sentir pavor e algo muito mais sombrio.
— Não conseguia imaginar como um cara tão astuto poderia ser tão facilmente enganado. Então, vi a casa dele. Os quartos separados. E pensei que o homem era um tolo, deixando-a dormir sozinha. Agora, tudo começa a fazer sentido. Você o provocava, atiçando-o, dando-lhe pistas do que ele poderia ter caso se comportasse.
— Você é maluco! Nunca... — Mia conteve a respiração quando Matt voltou a acariciar-lhe um dos seios.
— A questão é: Dougie não sabia como lidar com você. Mas eu sei.
De repente, Matt recuou. Mia cambaleou, agarrando as lapelas do roupão.
— Vista-se. E faça isso rápido. Ou eu mesmo farei por você.
Fitá-lo era como fitar uma geleira. Nenhuma suavidade, nenhum sentimento, nada, a não ser uma força incontida.
Matt caminhou até a cadeira e sentou-se, cruzando os braços. Mia notou que o ex-agente usava botas. Então, ficou de costas e deixou que o roupão deslizasse pelos ombros.
CAPÍTULO TRÊS
O robe deslizou devagar pelos ombros de Mia, revelando-lhe as costas, e parou na base da coluna. Mesmo desse ângulo, Matthew podia ver que a jovem era bonita.
A pele era de um dourado-claro. Os cabelos, uma cachoeira de chocolate com toques avermelhados devido à luz que entrava pela janela.
A srta. Palmieri poderia ter sido uma pintura de Monet ou Renoir. Mulher se vestindo. As pessoas fixariam o olhar em uma tela, em um famoso museu, vendo não tanto as pinceladas e o talento do pintor, mas a beleza da mulher em si.
Mia tinha uma pequena marca de nascença em um dos ombros e outra dois ou quatro centímetros abaixo. Matt poderia beijar a primeira marca e trilhar o caminho até a segunda com mais beijos.
Qual seria o gosto se a beijasse nas costas, de cima até embaixo? O que Mia faria se o rapaz fosse até ela, colocasse as mãos em seus ombros e a beijasse no pescoço? Será que a jovem se curvaria a Matt? Será que fecharia os olhos de prazer enquanto o ex-agente abaixava o roupão, desnudando-a, e a puxasse contra si de forma que ela pudesse senti-lo excitado?
Que inferno! Matt não era um voyeur. Despir uma mulher era um prazer masculino. Assim como observar-lhe o rosto enquanto se despia.
Aquilo ali era negócio. Não tinha escolha a não ser observá-la... Matthew respirou fundo. A quem estava enganando? Observá-la era uma forma de deixá-lo ligado. Quando foi a última vez que tivera uma mulher? Há muito tempo, obviamente, caso contrário...
A jovem se esticou para pegar algo em cima da cama, arqueando o corpo. Ah, Deus, Matt estava petrificado! Mas tinha de observá-la. Não fizera uma busca completa. Por tudo que sabia, a moça tinha uma arma escondida.
Tudo bem. Mia encontrara o que quer que fosse que estava procurando. A moça se endireitou. Depois, ficou em pé, em uma perna só. A jovem estava vestindo as calcinhas usando o roupão como tela.
Inteligente. Não tanto, um pensamento zombeteiro afirmava. Não importava o que fizesse, em algum momento, teria de deixar o roupão cair.
Matt cruzou os braços. O olhar dele moveu-se novamente era direção a Mia. Não fazia sentido fingir que não estava gostando de vê-la. Era uma mulher que nascera para excitar um homem. Mesmo agora, o ex-agente podia fechar os olhos e ver o rosto dela, uma perfeição de inocência. Os seios. A pele lisa.
Não era de admirar que Hamilton tivesse se deixado enganar. Matt quase sentiu pena daquele homem. Quem poderia resistir a um feitiço daqueles?
Mia ficara quieta. Havia tensão em cada linha daquele corpo feminino. Era o momento da verdade. A jovem precisava se livrar do roupão para acabar de se vestir.
— Não vai ao menos ficar de costas?
— Não, não vou.
A jovem resmungou algo que Matt não conseguiu entender. O rapaz conteve um sorriso. Tinha de dar crédito a Mia. Era corajosa.
Alguns segundos se passaram e, então, a jovem deixou que o robe caísse ao chão. Knight ficou com a boca seca. Mia vestira as calcinhas brancas de algodão.
As mulheres que Matt conhecera usavam seda ou renda. O ex-agente gostava do tecido suave sensual, em cores que contrastavam com a delicadeza da pele como preto e vermelho.
Algodão era para camisetas e shorts de ginástica... E, que inferno, como aquelas calcinhas de algodão podiam parecer tão sensuais? Talvez porque caíssem à perfeição naquela pele dourada? Ou a simplicidade e o fato de saber que o que escondiam dos olhos dele eram os segredos mais doces daquele corpo feminino?
O que aconteceria se Matt chegasse por trás de Mia? Abaixasse a cabeça e a mordiscasse suavemente no pescoço enquanto passava uma das mãos por dentro daquele tecido de algodão, acariciando-a intimamente no ponto que guardava a feminilidade dela?
Que inferno. Matt estava com problemas. Ela pegara algo que estava na cama. Um sutiã. Mas logo o colocou. Bom. O ex-agente podia respirar novamente. O próximo passo seria vestir uma camiseta...
Em vez disso, levou as mãos aos próprios seios. E, embora Matt não pudesse ver o que a jovem estava fazendo, podia imaginar. Mia ajeitava os seios no sutiã, tocando a pele sedosa que Knight ansiava saborear...
O ex-agente levantou-se é disse:
— Ande rápido. Arrume logo suas coisas.
A moça vestiu as calças brancas de algodão. Depois, uma camiseta cinza. Calçou as sandálias e virou-se na direção dele. Dava até para ver as unhas dos pés pintadas de rosa-claro.
Matt teve de se conter para não se aproximar dela e jogá-la na cama. Era aquela situação, era isso. Perigo, risco, o desconhecido. Adicione uma mulher atraente, misture bem e isso resulta em muito calor.
Mia recuperou um pouco a cor. Matt não queria isso, e sim a jovem assustada. Assim, seria mais fácil lidar com ela e fazer com que lhe dissesse o que o ex-agente queria saber.
— Venha aqui.
A jovem apontou para a mala e comentou:
— Mas você disse...
— Sei o que eu disse. Venha aqui.
Mia aproximou-se de Matt, lentamente, o olhar fixo no rosto dele. Olhos enormes, da cor de café. Entretanto, dependendo da luz, o ex-agente podia ver manchas verdes e douradas na íris.
— Ponha as mãos espalmadas na parede e dê um passo para trás.
— O quê?
— Você tem problema de audição? Ponha as mãos na parede e dê um passo para trás.
A boca da moça começou a tremer. Por alguns segundos, Matt quase lhe disse para esquecer aquilo. O rapaz a vira nua, sabia muito bem que a jovem não tinha uma arma... Mas isso não tinha a ver com armas, e sim com controle.
— Faça isso.
Mia colocou as mãos na parede e deu um passo para trás... E claro, teve de abrir um pouco as pernas para manter o equilíbrio.
Matt se aproximou. Tocou-a nos seios. Mas o rapaz se certificou de que o toque fosse impessoal. Ainda assim, ela pulou, como se o ex-agente a tivesse tocado com ferro quente.
— Permaneça quieta.
— Não! Não pode fazer isso. Não tem esse direito.
— Uma pequena correção. Tenho todo o direito.
— Vá para o inferno. Não tem direito algum.
Matthew sorriu. Puxou a arma que estava nas costas dele e viu quando Mia ficou com os olhos bem abertos ao fitar a pistola.
— Isso me dá qualquer direito do qual eu precise. Agora, vire-se e coloque as mãos na parede.
— Você é um porco.
— Isso realmente despedaça meu coração.
Matt a revistou rapidamente, passando as mãos pela barriga, pelas pernas, pelas coxas e pelos tornozelos da jovem. O ex-agente hesitou. Então, passou as mãos por entre as pernas de Mia.
A moça emitiu um som de desespero. Knight imaginou como poderia mudar aquele som para um sussurro de desejo. Tudo que tinha de fazer era acariciá-la. Mia o detestava. Porém, a lembrança daquele beijo lhe dizia que ela também o desejava.
Seria mil vezes mais fácil lidar com Mia se o ex-agente fizesse amor com ela. Matt fechou os olhos. Uma das razões para ter deixado o Serviço Secreto fora por saber que estava perdendo a habilidade de separar o que era moralmente certo do que era prático e conveniente. Seria possível que 24 horas na antiga vida o tivessem transformado naquele tipo de homem novamente?
Não. Não podia. Aquilo estava certo, e era conveniente. Mia Palmieri estava traficando drogas. E Matt faria todo o necessário para detê-la. O ex-agente deu um passo para trás e disse:
— Tudo bem. Vire-se.
Mia virou-se na direção dele. Os olhos duros e frios como âmbar. Bom. De agora em diante, a jovem se comportaria. Matthew tinha de decidir o que fazer com ela. Hamilton só havia pedido que Knight descobrisse o que havia acontecido com a srta. Palmieri. Bem, Matt descobrira. Mia fugira. Teoricamente, o americano podia deixá-la continuar fugindo.
Mas não se a moça tivesse cocaína consigo. Knight gastara tempo demais e suara muito detendo traficantes de drogas para agora deixar que aquilo acontecesse de novo. Alita morrera. E deixar Mia Palmieri ir embora não era uma opção, não se a moça estivesse traficando narcóticos.
Se Matt encontrasse a droga... Bem, isso lhe daria outras opções. Poderia jogar a cocaína no vaso sanitário e dar a descarga. Aí, então, deixaria Mia ir embora. Knight não era um policial. Não era nem mesmo mais um espião. Não tinha obrigação alguma de entregar a srta. Palmieri à justiça.
Se Mia estivesse fugindo do cartel... Lidaria da mesma forma com a situação. Livrar-se-ia das drogas e a deixaria ir embora. Talvez o pessoal do cartel a encontrasse. Porém, isso não seria mais problema dele.
A srta. Palmieri era problema de Hamilton. E mulher dele. Por que será que isso deixou Matt com o estômago embrulhado? O ex-agente franziu as sobrancelhas. Uma coisa de cada vez. Primeiro, precisava descobrir se a moça estava carregando drogas. Depois, decidiria o que fazer.
— Acabou de arrumar suas coisas?
— Sim — respondeu Mia, fechando a mala.
— Ouça com cuidado porque não quero erros. Vou abrir a porta. Vamos descer as escadas juntos, eu vou colocar um de meus braços ao redor de você. Vamos parecer um dos casais mais felizes desde Romeu e Julieta.
— Aonde vamos?
— Aonde quer que eu diga. Tem certeza de que não esqueceu nada?
— Sim.
— Porque, se esqueceu, considere perdido.
— Já disse, não esqueci nada.
Bom. A droga não estava no quarto. Ninguém, não importa o quanto esteja assustado, deixaria para trás um pacote que vale uma boa grana.
Matt agarrou-lhe um dos pulsos. A moça tentou se libertar, e ele colocou um dos braços em seu pescoço.
— Namorados, lembra-se? Romeu e Julieta. Mia esboçou um sorriso cínico e disse:
— Romeu morreu.
A réplica imediata seria lembrá-la que Julieta também. Entretanto, Matt não disse isso. Por alguma razão, o sofisma estava repleto de presságio. Apesar do sangue indígena comanche, não era adepto de prever o futuro. Porém, tivera um pressentimento ruim ao sair do quarto.
Um dos braços estava em torno da cintura de Mia. O outro, perto da arma. Assim, o ex-agente fez com que ela descesse as escadas, saísse do hotel e alcançasse a rua. Havia uma cafeteria do outro lado.
— Café-da-manhã — disse Matt.
Mia o olhou como se ele estivesse maluco. Talvez. Porém, se Matthew não colocasse alguma comida no estômago, cairia.
A cafeteria cheirava a gordura na chapa. Mas o quanto poderia ser ruim a combinação de café, ovos e salsicha? Muito ruim, como deu para comprovar. Após algumas mordidas, Matthew colocou seu prato de lado. Mia não pedira nada exceto café. E ele imaginou que ela fizera uma escolha sábia.
Depois da segunda xícara, o ex-agente debruçou-se sobre a mesa e perguntou:
— Já recuperou o juízo? Voltou a pensar com clareza?
— Sobre o quê?
— Sobre me entregar o que roubou.
— Já disse. Não sei do que está falando.
— Não seja estúpida. Pense no que vai acontecer se não me contar a verdade.
A moça ficou pálida, mas não respondeu. Matt pegou algumas notas de dentro de um dos bolsos, jogou-as em cima da mesa e levantou-se, murmurando:
— Vamos.
O rapaz agarrou-lhe um dos braços e a mala, e conduziu Mia até o carro.
— Abra — ordenou Matt.
— O que quer que seja que esteja procurando... Não tenho. Não importa o que faça comigo...
— Abra o maldito carro.
A moça tirou as chaves de dentro da bolsa e abriu a porta. Matt a empurrou para dentro do veículo, ordenando:
— Sente-se.
Quando a moça obedeceu, Knight tirou-lhe as chaves, sentou-se ao volante e cantou pneu ao sair do estacionamento. Vinte minutos depois, o ex-agente encontrou o tipo de lugar do qual precisava: uma estrada secundária que ia até um lago. Havia garrafas de cerveja vazias espalhadas ao redor, mas parecia que há um bom tempo ninguém estivera ali.
— Saia.
Mia não se mexeu. Matt a puxou para fora do carro e tirou o próprio cinto. Os olhos dela se encheram de lágrimas. A refém começou a tremer. O ex-agente esperava que a jovem implorasse, mas ela não fez isso.
Mia era determinada e corajosa, tudo bem. Knight tinha de admitir. O ex-agente amarrou o cinto em torno dos pulsos da moça e a arrastou até uma árvore.
— Pense no que está fazendo. Não vai resolver nada me matando — a jovem disse.
Knight a fitou, surpreso. A moça falava sério. Quem Mia pensava que Matt era? Algum capanga do cartel, mesmo depois de o rapaz lhe ter dito que Hamilton o mandara atrás dela?
Matthew podia lhe contar a verdade: que não estava envolvido com o cartel, nem iria matá-la... Mas, se era o que a jovem pensava, melhor deixar as coisas assim. O medo a tornaria maleável*
— Farei o que tiver de fazer — disse Knight, friamente. Então ele a beijou ardentemente. A boca de Mia era suave. E agora tremia de medo e estava molhada devido às lágrimas.
O desejo tomou conta de Matt. Ele xingou, recuou e usou o cinto para prendê-la à árvore.
— Comporte-se e você sairá bem. Pela última vez, onde está?
Mia não respondeu. Knight balançou a cabeça, dirigiu-se ao carro e começou a revirar e a desmontar tudo. Primeiro, os lugares óbvios: o porta-luvas, o console, o porta-malas. Nada.
Em seguida, os acolchoados dos bancos. Matt os rasgou com o próprio canivete. Então, furou o estepe, tirou tudo de dentro do porta-malas. Nada ainda.
Havia outros lugares para guardar drogas. Dentro dos almofadados das portas. Em compartimentos secretos no chão. Mas se tratava de um carro alugado. Não existiriam compartimentos secretos, e Mia não tivera tempo de adaptar os almofadados das portas.
Matthew voltou a fitar o veículo revirado. Recolocou tudo no porta-malas. Então, caminhou até o local onde deixara Mia. Precisava chocá-la, perturbá-la, mas como?
Uma ameaça... Prisão. Uma prisão colombiana. Não levaria um cachorro abandonado sequer a um daqueles presídios que vira. Será que ela sabia disso? Matt apostava que sim.
— Tudo bem. Fiz o possível. Você me deixou sem escolha. Terei de levá-la de volta.
— Para Hamilton? — indagou a moça, pálida.
— Certamente. Foi o coronel quem me pediu para encontrá-la.
— Não. Por favor, não faça isso. Não sei quem você é ou o que pensa que eu fiz, mas eu lhe imploro que não me mande de volta para Hamilton.
A moça parecia aterrorizada. Matthew disse a si mesmo que aquilo não valia nada. Mia era boa atriz, apenas isso. Bastava ver como a jovem enganara o próprio noivo.
— Não quer que a mande de volta? Então me diga onde está a droga.
— Que droga?
—Vamos lá, querida. A cocaína. Conte-me onde a escondeu e eu a deixarei ir. O que aconteceu entre você e o coronel é problema seu. A droga é problema meu.
— Não tenho drogas! É loucura achar que tenho. Você revirou meu quarto, meu carro. Até me revistou. Se eu tivesse cocaína, você teria encontrado.
— Então, por que fugiu?
— Já lhe disse. Douglas não me deixaria romper o relacionamento.
— Certo. Então, o que o coronel iria fazer? Trancá-la no quarto e jogar a chave fora? Você sabia muito bem lidar com o velho Dougie. Quartos separados, nada de sexo... Estou certo, não? Nada de sexo.
— Eu...
— Responda à pergunta, droga. Dormia com o coronel?
— Claro que dormia com Hamilton. Era meu noivo. Por que não faria isso?
— Achei que provocando-o poderia ter chegado tão longe.
— Sente-se bem insultando uma mulher?
— Quero saber por que fugiu.
— Já disse. Douglas não...
— Isso é besteira. Fugiu porque pegou algo que não era seu.
— Não peguei nada — disse Mia, mas estava mentindo. Matt viu isso na rápida contração das pupilas dela. E, ao mesmo tempo, o ex-agente soube que fora atraído para um jogo no qual a única regra era a sobrevivência.
Rapidamente, Knight a soltou e a levou de volta ao carro, empurrando-a para dentro do veículo. Depois, ligou o motor e partiu.
O ex-agente largou o carro a uns cem metros da velha hospedaria. Quem quer que o encontrasse naquela cidade esquecida por Deus, sem dúvida, veria isso como um presente dos céus. O carro nunca voltaria a ser visto.
— O que está fazendo? Quem é você? O que quer de mim? — Mia perguntou enquanto Matt a mandava entrar na caminhonete.
— Para começar, alguns minutos de silêncio.
—- Não. Responda às minhas perguntas. Diga-me quem você é e o que quer.
Involuntariamente, os olhos de Knight foram do rosto da moça para os seios dela. Mia ficou corada e o ex-agente soube que ela estava se lembrando do que acontecera no quarto do hotel.
— Eu faço as perguntas. Você dá as respostas.
— Tenho o direito de saber seu no...
— Não tem nenhum direito, querida. A única coisa que precisa saber é que vou descobrir o motivo pelo qual fugiu. O que roubou. Aonde estava indo...
O telefone celular dele tocou. O som o surpreendeu. Os irmãos sabiam que Matt estava fora do país. Não ligariam, e poucas pessoas tinham aquele número. O ex-agente atendeu.
— Sim?
— Sr. Knight.
Era o coronel. Como posso entrarem contato com você?, Hamilton perguntara, e Matthew dissera o número do celular.
— Sim?
— Espero que tenha progredido em sua procura pela minha noiva.
Matthew olhou para Mia. Os olhos da jovem tinham um brilho de desafio assim como de medo.
Uma palavra para Hamilton e aquela história acabaria. Nem precisava retornar a Cartagena. O coronel arrumaria alguém para ir ao encontro do ex-agente e pegar a moça.
— Sr. Knight? A ligação está ruim? Perguntei se teve algum progresso.
— Ouvi, coronel.
— Já encontrou Mia?
— Não, não a encontrei.
O ex-agente desligou o celular, jogou-o de volta no bolso e ligou o motor da caminhonete. Então, no que talvez fosse o ato mais ilógico de sua vida, Matt beijou Mia ardentemente.
Momentos mais tarde, a hospedaria e a cidade ficaram para trás, perdidas em uma nuvem de folhas e poeira.
CAPÍTULO QUATRO
O homem enviado para encontrá-la dirigia como um louco.
Mas por que não faria isso? Os assassinos não eram loucos por definição? E era isso que aquele homem era. Um assassino. "Encontrá-la" era apenas uma tentativa de esconder a verdade.
Mia arriscou uma olhadela em Matt. A moça já encontrara assassinos antes. Alguns homens estiveram na casa de Hamilton tarde da noite. Nenhum veio e disse:
— Olá, faço parte da folha de pagamento do cartel como um assassino.
Porém, a jovem sabia que eram. E, para a maioria, tirar a vida de alguém não seria um problema maior do que matar um inseto com um tapa.
O seqüestrador tinha boa aparência. Era um homem belo, bem másculo. Matt a fazia lembrar-se da estátua de David que ela viu naquela viagem a Florença, no último ano da faculdade...
Ou de um gato grande e exótico. Um predador poderoso e magnífico. Matt não desperdiçara tempo em mostrar isso à jovem. A forma como a tratara, fazendo-a ficar nua diante dele, observando-a vestir-se, tocando-a.
Um formigamento percorreu o corpo todo da jovem. Que coisa horrível Matt fez ao tocá-la tão intimamente. Fingira que a revistava para acariciar-lhe os seios. Tocara-a entre as coxas.
A jovem estremeceu. Mia o detestava... E odiava a si mesma por ter correspondido, por querer gemer tanto quanto queria chorar. Por querer fechar os olhos, recostar-se, sentir aquele corpo rígido sustentando o dela. Aqueles braços másculos, aquela boca...
Mia virou-se e fitou a paisagem. Sabia o motivo de o rapaz ter feito aquilo. Tratava-se de poder, dominação. Era uma forma de deixar claro que ele estava no comando. A moça até sabia... Mia fechou os olhos. Depois, voltou a abri-los. Sabia por que tivera tais reações loucas quando aquele homem a tocou.
Em situações como aquela, o medo poderia dar lugar a algo mais sombrio. Uma ligação entre a vítima e o seqüestrador. Isso poderia beneficiá-lo, tornando-a condescendente, submissa.
Ou beneficiá-la. A menos que tivesse interpretado mal, aquele homem estava atraído por ela. Engoliu em seco. Falsa modéstia era sinônimo de estupidez em um momento como aquele. Ele estava mais do que atraído. Matt a queria. Talvez sexo e violência fizessem parte da mesma coisa na cabeça dele.
Compreender essa situação talvez pudesse lhe dar poder. Talvez Mia pudesse usar o desejo que aquele homem sentia. Manipulá-lo. Lidar com ele de forma inteligente. Que Deus a ajudasse a seduzi-lo se fosse preciso.
E era provável que tivesse de fazer isso. Se Matt a levasse de volta para Cartagena... Mia morreria.
Hamilton a teria matado. O que a moça suspeitara sobre o coronel a tornara perigosa. O que descobrira e o que levara antes de ir embora a marcaram para ser eliminada. Mas ao menos tinha alguma chance com o homem que a raptara.
— Sabe que está errado — disse Mia.
— Sério?
— Você sabe meu nome. Eu deveria saber o seu.
— Está querendo dizer que esqueci minhas boas maneiras? Por que não? Sou Matthew Knight.
— E trabalha para... ?
— Não trabalho para ninguém.
— Trabalha por conta própria.
— Deveria dizer que estou aqui fazendo um favor para o seu namorado.
— Hamilton não é meu namorado.
— Desculpe. Seu noivo.
A moça começou a lhe dizer que também estava errado em relação àquela afirmação. Mas por que se importar? Matthew Knight continuaria pensando o que quisesse.
— Pensei que fosse colombiano. Você fala espanhol como um nativo.
— Não perca tempo tentando me agradar.
— Foi apenas um comentário. Você é americano?
— Da última vez que chequei, Dallas era nos Estados Unidos, América do Norte.
— Como conheceu Douglas?
— Por intermédio de um conhecido em comum. A determinação da jovem de jogar com frieza, calma, evaporou.
— Droga, nunca diz nada que faça sentido? Matthew a fitou e comentou:
— O céu está azul hoje. Não há nenhuma nuvem. Mia queria bater no americano.
— Ao menos me diga aonde está me levando.
— Já disse. Para um lugar calmo no qual possamos conversar.
Uma caverna? Um barracão nas montanhas? Um lugar onde ninguém pudesse ouvi-la gritar? Mia respirou fundo e disse:
— Se me deixar ir, ninguém precisa saber de nada.
— Eu saberia. Assim como seu namorado.
— Já disse, Hamilton não é meu namorado.
— Tente dizer isso a ele.
— Além disso, Hamilton não saberia. Eu, certamente, não lhe diria nada. Nem você.
— E o que me daria se eu a deixasse ir?
— O que você iria querer?
— Não sei, querida. É você quem está fazendo a oferta.
Mia podia oferecer-se a Matt. Não era nisso que estava pensando? Não podia fazer isso. Mas dormir com aquele homem seria algo excitante. Knight não a machucaria, não na cama. Por mais que isso parecesse uma loucura, ela sabia disso. O que aquele homem a faria sentir podia ser perigoso mas, ao mesmo tempo, prazeroso.
E Matt estaria no comando. Mesmo quando a procurara, ela notara do senso de comedimento do ex-agente. Como seria fazê-lo perder o controle? Fazê-lo esquecer de si mesmo nos braços dela?
— Estou esperando.
— Eu poderia lhe pagar.
— Quanto?
— Quanto você quer?
— Oh, não sei. Deixe-me pensar. Que tal um bilhão de dólares?
Knight riu. Mia sentiu-se ficar corada e comentou:
— Acha isso divertido?
— Não pode me comprar. Não perca seu tempo tentando.
Matthew não era estúpido. A moça tinha de se lembrar disso, assim como precisava lembrar-se de que era uma agente treinada. Uma agente semitreinada, ela pensou, e conteve uma risada histérica.
— Poderia dizer a Douglas que escapei.
— De mim?
— Sim.
— Ninguém acreditaria nisso.
Uma colina crescia à frente deles, com árvores que pareciam estar ali há centenas de anos. Matthew reduziu a velocidade da caminhonete em uma curva fechada. E, de repente, um vale surgiu diante do casal. Árvores altas. Samambaias exuberantes. E uma casa grande, que parecia ser toda de vidro.
— É esse o lugar para o qual está me levando? Nenhuma resposta. Mia sentiu um nó na garganta.
— É aqui?
— Apenas recoste-se e relaxe.
— Mas... Onde estamos?
— Onde ninguém vai nos incomodar — respondeu Matt, e Mia se deu conta, naquele instante, de que o velho clichê era verdade. Era possível gelar de medo.
A estrada para o vale não havia mudado: estreita, sinuosa. Um declive vertiginoso de um lado e uma parede verde do outro. Matthew amara aquele lugar quando o vira pela primeira vez, tantos anos atrás. O ex-agente passara um fim de semana ali, cortesia de um ricaço, oficial do Departamento de Defesa, dono daquelas terras. "Minha esposa é colombiana. Ela herdou o terreno do tio, mas vou me desfazer da propriedade. Não vale a pena manter isso aqui, no meio do nada", dissera o sujeito.
O fato de a casa ser no meio do nada era o que atraía Matthew. Um inimigo determinado poderia encontrá-lo em qualquer lugar. Porém, ali, o trabalho se tornava dez vezes mais difícil. E havia a beleza primitiva da floresta, o rio e a piscina escondidos em uma clareira que Knight pensava não ter recebido nenhum humano até a chegada dele.
De volta a casa, o Serviço Secreto era apenas uma lembrança ruim. O dinheiro se acumulava com o novo negócio. Então, Matt telefonara para o sujeito do Departamento de Defesa e perguntara se ainda havia interesse em vender aquele terreno.
Sim, havia, e o sujeito deu um preço que parecia adequado. De fato, qualquer preço teria parecido adequado. Matthew ainda acordava, no meio da noite, com imagens de Alita sendo violentada.
De uma forma ou de outra, o ex-agente pensara em ir para a casa que agora era dele e, assim, livrar-se dos demônios. Matt ficaria em um lugar no qual o tempo e a maldade não tinham significado algum.
Nunca descobriu se isso era verdade. Retornar à Colômbia passou a significar voltar para um pesadelo. Agora, o vale parecia o único lugar seguro.
Algo estava errado naquela história. Ninguém lhe contara a verdade. Você se acostuma a isso quando está em uma terra de capa-e-espada. Mas Knight não estava mais nesse mundo.
O coronel lhe pedira para achar a noiva. Parecia algo simples. Mas a moça insistia que não era noiva do coronel. E Hamilton parecia menos preocupado com o que poderia ter acontecido à mulher — que supostamente ele amava — do que se Matt a encontrara.
Não seria o bem-estar da jovem algo importante? Tratava-se de um país grande, bonito. Porém, havia locais perigosos.
Como era possível que o coronel nunca tivesse demonstrado preocupação quanto ao fato de Mia estar ali sozinha? E como era possível que a srta. Palmieri tivesse tentado traficar drogas? Por que fugia? Se a resposta fosse a cocaína, Matthew a encontraria agora.
E, finalmente, a pergunta de um milhão de dólares. Como era possível que o ex-agente só pensasse em ter Mia nua em uma cama?
Knight parou a caminhonete do lado de fora da garagem. Tirou as chaves da ignição, achou a que era da porta da frente e saiu do carro.
— Fim da linha. Todo mundo fora — disse o ex-agente.
Mia nem piscou. A moça permanecia sentada, imóvel, as mãos entrelaçadas no colo, os olhos fixos no que estava à frente dela. Será que cada passo seria uma batalha?
Knight deu a volta e abriu-lhe a porta da caminhonete, dizendo:
— Vamos negociar. Você sai e anda, ou vou puxá-la e jogá-la em cima de um de meus ombros. Como estou cansado, com fome e irritado, não serei gentil. Mas a decisão é sua.
Matt quase riu diante do olhar que Mia lhe lançou, mas a moça não era estúpida. Ela tirou o cinto de segurança e começou a sair do carro. Knight a pegou nos braços e comentou:
— Não quero que se machuque.
— Obrigada por tanta preocupação.
Aquelas palavras eram como ferroadas de abelhas, afiadas e prontas para machucar. Porém, o ex-agente esperava aquele tipo de comportamento rude da jovem. Mentalmente, quanto mais Mia se distanciava do choque de encontrá-lo no quarto dela naquele hotel, mais forte se tornava.
Knight precisava mudar aquela situação. "Não era uma coisa boa ter descoberto a forma de fazer isso?", o ex-agente pensou. Então, agarrou-a e a beijou.
Não era o tipo de beijo que um homem dá em uma mulher que mexe com o coração dele. Era o tipo de beijo que um homem dá em uma mulher que ele quer dominar. Um beijo selvagem.
Mia reagiu com medo, como Matt queria. Se contorceu, bateu com os punhos fechados nos ombros do ex-agente. Mas Knight foi implacável, segurando-a com tanta força que os esforços violentos da jovem apenas aumentaram o contato dos seios e das coxas dela com o corpo do americano. De alguma forma, a moça conseguiu libertar a própria boca. Foi o tempo suficiente para tomar ar e xingá-lo.
A blasfêmia ainda estava nos lábios dela quando Matt voltou a beijá-la. Quando o beijo acabou, o ex-agente colocou as mãos no rosto da jovem e a fitou. Aí, então, viu o que queria: o desespero e a rendição.
O que Matthew viu nos olhos de Mia foram lágrimas de uma mulher assustada. E era assim que ele a queria: assustada, indefesa, pronta para lhe contar o que precisava saber...
Em um segundo, tudo mudou. Mia começou a tremer, mas de uma forma que Knight entendia. Agarrou-se ao ex-agente e emitiu aquele som que quase o havia deixado de joelhos da última vez. Então, permitiu que o americano a beijasse, deliciando-se com a quentura da boca aveludada.
Matt estava perdido. Perdido no calor daquela mulher, na doçura, na sensação de que ambos estavam sozinhos no planeta e que nada tinha importância exceto aquele momento. Nada a não ser...
Knight parou de beijá-la. Deus, o que o ex-agente estava fazendo? Matt a afastou. A respiração dele era de alguém que tivesse corrido um quilômetro e meio. E deixou que a raiva aflorasse ao perceber que a jovem estava tentando seduzi-lo. Sentia raiva de si mesmo por ser um alvo tão fácil.
— Você está sempre oferecendo e, mais cedo ou mais tarde, vou aceitar — disse Matthew.
A moça empalideceu. Então, Knight a forçou a levantar a cabeça até que os olhos de ambos se encontrassem, e disse:
— Está brincando com fogo. E, se você se queimar, não me culpe.
Obediente, Mia o seguiu, entrando na casa. Não que tivesse escolha. Matt a segurava por um dos pulsos. Ficara evidente que a moça não era tão boa em seduzir um homem quanto pensara ser. Um beijo, e o ex-agente soubera o que a jovem estava fazendo...
A verdade era que Mia deixara de lutar contra Matt porque passara a desejá-lo. A reação dela não fora planejada, apenas acontecera. A boca daquele homem parecia bem macia. E, sendo honesta, mesmo quando Knight forçara os beijos, mesmo quando lutara contra o ex-agente...
Mesmo naqueles momentos, Mia já o queria. Sentia-se como se todo o corpo estivesse pegando fogo, de uma forma que nunca sentira antes. Queria que Matt a carregasse para dentro da casa, encostasse em uma parede e a tomasse ali mesmo...
— ...café?
Piscou, confusa. Só ouvira o final do que o ex-agente dissera. Será que requeria uma resposta? Mia comentou:
— Não escutei o que disse.
— Eu disse que há uma cozinha no final do corredor. Sabe fazer café, ou seus talentos começam e terminam na cama?
Pela segunda vez em poucas horas, Mia quis avançar e bater naquele homem. Mas sabia o quanto isso seria inútil. Matt era muito grande, poderoso e terminaria rindo dela.
Ainda assim, estava grata pelo que Knight dissera. Era o lembrete perfeito de que as fantasias sexuais com relação àquele patife eram doentias.
— De fato, adoraria uma xícara de café. Mostre-me onde fica a cozinha e vou preparar um pouco. Se tiver sorte, pode ser que sobre para você.
— No final do corredor, à direita. O café está no congelador. O açúcar está no armário junto com algumas caixas de leite.
— Uma última coisa. Onde você guarda o veneno de rato? Odiaria deixá-lo esperando enquanto procuro por isso — disse, sorrindo.
— Continue assim. Veja até onde consegue ir antes que eu chegue com tudo.
Mia esperava que Matt fosse atrás dela, mas o ex-agente não fez isso. Até pensou tê-lo escutado rindo, mas devia ter sido um equívoco.
Foi fácil achar a cozinha — um cômodo grande, repleto de utensílios de aço inoxidável e engenhocas suficientes para satisfazer a alma de qualquer homem. O café estava onde Matthew dissera que estaria, assim como o açúcar e o leite.
De quem era aquela casa? A moça se perguntava enquanto coava o café. Mia foi até as portas de correr, que eram de vidro, e que davam para um deck rodeado de arbustos floridos.
Um lugar tão bonito como aquele não pertenceria a um assassino. Mas era isso que Matthew Knight era. Ele a levara até ali de modo que pudessem ficar a sós. Então, poderia fazer o que quisesse para arrancar-lhe a verdade.
Mia estremeceu. O que estava fazendo? Café?! Matt a deixara sozinha. Tudo que havia entre ela e a liberdade era uma porta de vidro...
— Nem pense nisso.
A moça virou-se. Knight estava bem atrás. Como um homem daquele tamanho poderia andar tão silenciosamente?
— As portas e as janelas têm sistema de segurança. Toque em uma delas e todas vão se trancar. E sirenes vão tocar de forma que não haverá chance de escapar de mim. Em outras palavras, você está presa.
Presa em uma armadilha. Aquilo era amedronta-dor, mas Mia não deixaria que Matt soubesse. Desviou-se dele e pegou o pote de café.
— Estou impressionada. Sistemas de segurança de alta tecnologia, todo esse terreno... Quem é o dono desse lugar?
— Eu.
A expressão dela deve ter demonstrado sua surpresa.
— Quer ver a escritura? É minha, belezura. Por completo.
— Não me chame assim. E por que estamos aqui?
— Já lhe disse. Para termos paz e...
— Droga, pare de brincar comigo. O que quer que seja que vá fazer, apenas faça e acabe logo com isso.
A máscara de uma pessoa tranqüila havia caído. Matthew sentira o medo na voz dela e também o vira em seus olhos. Mia pensava que o ex-agente iria machucá-la a menos que contasse a verdade.
Por pouco, Knight não se aproximara e a tomara nos braços, dizendo-lhe que não importava o que tivesse feito, ele não a machucaria. E não deixaria ninguém machucá-la...
Mas essa insanidade havia passado. Mia estava no ramo de drogas. E era a mulher de outro homem. Nada com relação a ela era bom, exceto senti-la em seus braços, o gosto daquela boca... Matt fechou os olhos e forçou-se a respirar fundo. Depois, disse:
— Conversaremos mais tarde. Agora, quero jantar.
— Conversar? Quer que eu acredite nisso? Que me trouxe aqui para termos uma conversa civilizada?
Matt a puxou, beijando-a e colocando uma das mãos por baixo de sua camiseta para acariciar-lhe um dos seios.
— Nada do que sinto por você é civilizado. E não gosto disso. Entendeu? Estou cansado da senhorita me tomar por tolo. Pare com isso antes que eu seja forçado a tomar alguma providência com relação a essa história.
— Não — disse a moça, com a voz alta e ofegante.
— Não o quê? Não faça isso? — Knight a acariciava e Mia tentou sufocar o gemido que ecoava na garganta, mas o ex-agente o ouviu e ficou feliz.
— Droga, eu a quero e você me quer — disse Matthew.
— Não. Não quero!
Knight segurou-a pela nuca, os dedos entrelaçados nos cabelos da jovem, e a beijou sem piedade. Até que, finalmente, a moça se rendeu ao ex-agente e a si mesma, soluçando o nome dele.
— Matthew, oh, Matthew... — sussurrou Mia. Era a primeira vez que dizia o nome do ex-agente, e aquele som vindo dos lábios de Mia invadiu a corrente sangüínea do americano. Nunca ninguém dissera o nome dele da forma como Mia o fizera.
— De novo. Diga meu nome mais uma vez. Como Mia não atendeu ao seu pedido, Matt a beijou com força suficiente para saborear o sangue quente e salgado. De um dos dois, não tinha importância. O que importava era o cheiro, o toque, o gosto daquela mulher.
— Droga, diga meu nome — resmungou Knight.
— Matthew, Matthew... — sussurrou.
Mia estava se desfazendo nos braços dele. A jovem o beijava, passava as mãos por baixo da camisa de Matt, acariciando-o. Então, o ex-agente a empurrou de encontro à pia da cozinha. Pegou o decote da camiseta dela e o rasgou até embaixo. Depois, abaixou a cabeça e mordeu suavemente um dos mamilos cobertos pelo sutiã de algodão. Quando a jovem gemeu, Knight voltou a mordiscá-lo.
Isso não era suficiente. O ex-agente precisava do sabor doce do seio desnudo. Matt levantou a cabeça, beijou-a e, desajeitado, manuseou o fecho do sutiã, quebrando-o ao meio.
Os seios de Mia eram bonitos. Redondos como maçãs e cor de nata. Matt queria que seus olhos se deleitassem com aquela mulher, mas não agora. Não agora, quando podia saborear um daqueles seios delicados. Que gosto maravilhoso! Flores silvestres e mel!
— Você é linda. Nunca quis uma mulher como quero você — sussurrou Knight, acariciando-lhe os seios.
Mia tremia. Segurava-o com força, remexendo os quadris contra os dele. Então, Matt pegou uma das mãos da moça para que sentisse o quanto o ex-agente estava excitado.
Com um gemido suave, ela tocou o tecido de brim. Por um segundo terrível, Knight teve medo do resultado daquele toque, daquela lamúria feminina de desejo.
— Matthew, por favor... — disse, desesperada. Seus joelhos se curvaram e ela caiu nos braços dele. Matt voltou a beijá-la enquanto deslizava uma das mãos por entre suas coxas, indo àquele lugar secreto e doce entre as pernas femininas. Então, Knight parou de beijá-la e a fitou, observando-lhe os olhos enevoados de paixão.
— Me diga.
Mia ficou com os lábios entreabertos, mas as palavras que Matt precisava ouvir não lhe saíram da boca. O ex-agente entendeu a razão. Ela sabia que aquilo era loucura, sabia que não devia estar acontecendo...
— Vamos, diga — ordenou Knight.
A jovem estremeceu. Colocou uma das mãos no rosto dele e sussurrou:
— Por favor, Matthew, por favor... Me leve para a cama.
Um triunfo puramente masculino tomou conta de Matt. O ex-agente começou ali mesmo e Mia colocou as mãos ao redor do pescoço dele. Tentou enterrar o rosto quente em um dos ombros do americano. Porém, Knight não deixou. Preferiu beijá-la até que suas bocas se fundissem de paixão. E, exatamente naquele segundo, o alarme disparou.
CAPITULO CINCO
O ruído do alarme chocou Mia, trazendo-a de volta à realidade.
A moça lutou contra o abraço de Matt. No lugar de colocá-la no chão, o ex-agente intensificou o abraço e, rapidamente, caminhou pelo corredor, indo para um cômodo com estantes de livros.
Um toque com uma das mãos e uma parte da estante se afastou, revelando um pequeno quarto. Matt a colocou no chão e disse:
— Há um botão na parede ao lado da porta. Funciona como a tranca do lado de dentro. Pressione aquele botão, logo.
— Mas...
— Nada de mas, droga! Faça como lhe digo e rápido.
Matt a empurrou para dentro do quarto e pegou a arma que estava na cintura dos jeans, dizendo:
— Tranque a porta.
— Não. Matthew... Knight a fitou e disse:
— Você agora é um perigo.
Mia ficou com os olhos cheios d'água. A fisionomia de Matt não mudou, mas ele abaixou a cabeça e a beijou.
— Tranque a porta — disse Knight e recuou.
Mia apertou o botão. A porta, tão pesada quanto a de um cofre de banco, fechou, interrompendo seu contato com o mundo e com o som estridente do alarme.
Um silêncio assustador tomou conta do lugar. Mia abraçou a si mesma. Os dentes rangiam. O que estaria acontecendo lá fora? Colocou um dos ouvidos junto à porta e sentiu o toque frio do aço em sua face. Tudo que ouvia era a própria pulsação.
Mia recuou. Que tipo de quarto era aquele? Porta e paredes de aço. Nada de janelas. Um teclado numérico eletrônico, luzes piscando em diversas cores. Um relógio que mostrava a hora em todo ó mundo, monitores de TV, celulares, algo que parecia um fax. E outros equipamentos eletrônicos que não conseguia identificar.
Armários ao longo de duas paredes. Mia os abriu e viu latas de comida, garrafões de água, suprimentos para primeiros-socorros... E armas — pistolas, rifles automáticos, munição.
Tudo isso, além da arma que Matthew tirara da cintura. Mia começou a tremer. Por que a surpresa? Sabia quem ele era. Mesmo que, de alguma forma, tivesse se esquecido disso por alguns instantes, Knight não esquecera. Você agora é um perigo.
Mia voltou a estremecer. Estava frio. Quanto tempo ficaria presa naquele lugar? E se algo acontecesse a Matthew? O botão ativava a tranca, o ex-agente dissera, mas e se algo desse errado? O que aconteceria se não...
Um barulho na parede. Mia girou e colocou um dos ouvidos à porta. Seria possível que o coração batesse daquela forma sem explodir?
O ruído voltou. Com uma lentidão agonizante, a porta se abriu. Matthew estava diante dela, as mãos nos quadris, olhos indecifráveis.
Nenhum ferimento. Nada que Mia pudesse ver. Era errado sentir tamanho alívio. Errado querer se jogar nos braços daquele homem. Mas começava a entender as coisas bizarras que o estresse podia causar a uma pessoa em situações como aquela.
— Pode sair agora.
— O que aconteceu? Por que o alarme disparou?
— Foi um acidente. Evalina...
— Evalina?
— Sim. Evalina viu a caminhonete atravessando o povoado, depois, virando para pegar a estrada. Ela decidiu ver se era realmente eu, mas não digitou o código de segurança a tempo.
Evalina, Mia pensou, e odiou a si mesma pela onda de raiva que a invadia.
— Veja, Evalina sabe que não venho aqui há muito tempo. Então, quando viu a caminhonete...
— Evalina estava emocionada demais para pensar direito. Que bom para... — Mia começou a se movimentar, impaciente.
— Qual o problema, belezura? Com ciúmes?
— Triste. Uma mulher fica tão emocionada ao vê-lo que entra em sua casa.
— Você está com ciúmes — disse Matt, abrindo um largo sorriso.
— Isso é o que você diz.
— Evalina é minha empregada.
A empregada. A explicação trouxe uma onda de alívio, e isso a deixou ainda mais irritada. Por que Mia se importaria?
— Evalina vem uma vez por semana, limpa a casa, faz o que for preciso.
— Não é da minha conta o que ela faz ou quem é.
— Você está certa. Não é. Apenas nos entendemos... Se ela fosse minha amante, eu não lhe esconderia isso. E não teria me aproximado de você.
— Um incidente lamentável.
— O fato de eu ter me aproximado de você? Ou o fato de você ter correspondido ao meu movimento?
Matt podia ver pelo rosto ruborizado que ela sabia muito bem a resposta e não precisava dizer nada. Em vez disso, Mia o afastou. O ex-agente deixou que fizesse isso. O que acontecera antes era apenas o que Mia dissera, um incidente infeliz. Knight não deixaria que se repetisse. E a melhor forma de garantir isso seria manter as mãos dele longe daquela mulher.
— Presumo que queira se lavar. O banheiro é ali. Vou esperar por você — disse o ex-agente.
— Não precisa me esperar.
— Claro que preciso. Um cavalheiro sempre acompanha uma dama para jantar.
— Há algum cavalheiro aqui? Não notei. Além disso, não estou com fome.
— Tem medo da comida feita por mim? Não tenha. Evalina está fazendo o jantar.
— Já disse, não estou com fome.
— Bom. Pode sentar-se e me observar comer.
— Não vou fazer isso.
— Sim, vai. Vai sentar-se quando eu me sentar, andar quando eu andar, fazer o que eu fizer, ou vou amarrá-la, mantê-la aqui e desativar o botão de saída. É uma sala de segurança — disse Matt, lendo a pergunta nos olhos de Mia. E complementou: — Pense nisso, talvez seja onde eu deva mantê-la.
— Pensando bem, estou com um pouco de fome.
— Sim, foi o que imaginei.
Havia uma sala de jantar separada da cozinha. Porém, Matt disse que ambos comeriam no recanto do café-da-manhã. O rei, pensou Mia, brincando de ser humilde perante os súditos... Embora parecesse que Evalina o tratava sem qualquer formalidade.
A criada era uma mulher gordinha, alegre, que tagarelava incessantemente enquanto preparava e servia a refeição. Mia só conseguia entender parte do que Evalina dizia. Tivera aulas de espanhol durante dois anos na faculdade e em um curso entediante antes de trabalhar para Douglas, na Colômbia. Porém, o que as pessoas diziam nos restaurantes sofisticados e nos escritórios de Cartagena tinha pouco em comum com o dialeto indígena da empregada.
Matthew, por outro lado, entendia com facilidade. E Evalina ficava corada de satisfação cada vez que o patrão sorria e também ria. Era fácil perceber que a criada tinha uma queda por Knight.
Se ao menos soubesse quem Matthew realmente era, Mia pensava enquanto comia. E jantou bem, apesar do que dissera. A comida estava maravilhosa e a moça, faminta. Desde a véspera à noite, tomara apenas uma xícara de café.
E agora, a noite voltava. Mia suspirou, aliviada. Agradeceu a Deus por Evalina. Sabendo que a empregada dormiria sob o mesmo teto, Matthew se manteria longe... O que a criada estava fazendo?
— Evalina, espere...
Tarde demais. Um aceno de mão e a empregada foi embora, saindo pela porta da cozinha. Mia fitou Matthew e indagou:
— Aonde ela foi?
— Para casa.
— Evalina não mora aqui?
— Mora em um povoado perto daqui.
— Mas pensei...
— Sei o que pensou. Lamento desapontá-la, belezura, mas teremos de passar a noite sozinhos.
O homem que fizera piadas com Evalina, que a elogiara pela comida, desaparecera. E fora substituído por um estranho que raptara Mia há algumas horas, tirando-a de um quarto sombrio e sujo e levando-a para uma vila desconhecida. Mia forçou-se a fitá-lo e disse:
— Se tentar alguma coisa, eu o mato.
— Com o quê? Com as próprias mãos? — indagou Matt, sorrindo.
Se fosse uma agente de verdade, poderia. Agentes aprendiam coisas assim. Mas ela fora treinada em menos de duas semanas, arrancada de sua mesa no escritório da Inteligência e jogada em um pesadelo.
Ainda assim, não era preciso ser um espião para saber que desistir de um desafio era quase sempre um erro.
— Farei o que tiver de fazer — respondeu Mia, com o que pensava ser uma frieza considerável.
O sorriso de Matt desapareceu quando o ex-agente afastou a cadeira e se levantou, dizendo:
— Nesse caso, vamos começar.
Knight agarrou um dos ombros da jovem, que tentou não estremecer devido à pressão.
— Levante-se, Mia.
— Não. Eu juro, se você...
— Levante-se!
A dor era quase insuportável. Rangendo os dentes, Mia obedeceu. Matt a fez sair da cozinha, caminhar corredor abaixo e voltar à biblioteca. O coração da jovem disparou. Será que iria trancá-la na sala de segurança?
— Sente-se.
Mia sentou-se, quase caindo da cadeira em frente a uma enorme lareira de pedra. Matt foi até um dos armários. Pegou uma garrafa e encheu dois copos, oferecendo-lhe um. Ela fitou a taça como se esta pudesse explodir em chamas a qualquer minuto.
— Pelo amor de Deus, é conhaque. Veja.
O ex-agente levou um dos copos aos lábios, bebeu e depois fez o mesmo com o outro que lhe oferecera antes. Só então devolveu-lhe o copo, dizendo:
— Beba. Talvez isso ajude a fazer com que você recupere a cor.
Mia aceitou a taça e tomou um pequeno gole. O conhaque era maravilhoso, quente e saboroso. Fechou os olhos e deixou que o fogo da bebida escorresse garganta abaixo. Então, passou a língua pelos lábios para tirar o gosto do conhaque.
Ao erguer os cílios, Mia viu Matthew observando-a. Os olhos do rapaz encontraram os dela.
— Bom? — perguntou Matt, com a voz rouca. Mia balançou a cabeça, concordando. O ex-agente sentou-se de frente para ela, rolando o copo por entre as palmas das mãos para esquentar o conhaque, antes de beber um gole.
— Hora de começarmos a falar de negócios.
— Não temos nenhum negócio.
— Errado. Temos.
O copo que estava nas mãos dela começou a tremer. O que teria de fazer agora seria manter-se calma e impressioná-lo com sua honestidade.
— Veja. Entendo que Douglas o tenha contratado para me encontrar. Bem, você me encontrou. Diga isso a ele. Ligue para o coronel, diga-lhe que fez o que ele mandou. E, então, avise-o que não quero voltar para Cartagena. Depois, você me deixa ir embora.
— Você vai embora e eu volto para Cartagena de mãos vazias.
— Hamilton vai pagar pelo serviço. Quero dizer, ele verá que você fez seu trabalho.
— O coronel não está me pagando.
A moça abriu bem os olhos, surpresa, e comentou:
— Então, por quê...?
— Por que você fugiu?
A moça se levantou e respondeu:
— Já falamos sobre isso. Eu o deixei.
— Você fugiu. Há uma diferença. Quero saber a razão.
— Não é da sua conta.
Matthew levantou-se. Um segundo depois, havia encostado Mia contra a parede, pressionando-lhe os ombros.
— O coronel bateu em você?
— Não.
— Abusou de você?
— Não, droga. Me deixe.
— Foi por isso que você se tornou uma ladra?
O coração de Mia acelerou. A moça pensou no pequeno CD, escondido no estojo de maquiagem, em sua bolsa, e na informação lá contida.
— Não sei o que quer dizer.
— Dá um tempo, belezura. Hamilton me contou tudo. O coronel a pegou usando o correio da embaixada para contrabandear cocaína. Arriscou o próprio pescoço, acobertando-a, e você retribui fugindo. Ele não sabe o motivo, mas eu sei. Você fugiu com um pacote de cocaína.
Era para rir? Ou para chorar? O que era melhor, que Matthew pensasse que ela roubara drogas? Ou que soubesse que o que Mia de fato roubara colocaria Douglas Hamilton e um chefão das drogas em um presídio federal para sempre?
Não importava. Mia não podia lhe contar nada. Além disso, por que ele se importaria com isso? O trabalho dele era encontrá-la e levá-la de volta a Cartagena. Porém, ela não voltaria de jeito nenhum. Sabia, e muito bem, o que a esperava lá.
— Onde está a droga? Onde a escondeu?
— Douglas mentiu. Ele lhe contou essa história para que você me encontrasse e me levasse de volta, mas não é verdade. Não há drogas. Fugi porque ele não me deixaria abandoná-lo.
— Aqueles quartos separados. Que inferno, quem podia culpá-lo? Você é noiva dele.
Mia engoliu em seco. Talvez a verdade, até onde i pudesse revelar, funcionasse.
— Eu trabalhava para Hamilton nos Estados Unidos. Quando vim para Cartagena como assistente pessoal do coronel, ele disse que tinha uma casa enorme com muitos quartos vazios, e seria mais simples se eu morasse lá.
Mais simples para Mia também, como o Serviço Secreto queria. Porém, a jovem não revelaria isso.
Seria verdade? Matthew fechou um pouco os olhos. Isso explicaria os quartos separados, mas o ex-agente não havia nascido na véspera e comentou:
— Boa história.
— Foi o que aconteceu. Foi bom por um tempo. Mas aí o coronel começou a dizer e a fazer coisas.
Isso também era verdade. Só de lembrar, ela sentia arrepios. E agora era chegada a hora de começar a florear a história.
— Eu disse que o denunciaria.
— E?
— E Douglas disse que ninguém acreditaria em mim. Não sou ninguém. Ele é um coronel do Exército, com uma carreira brilhante.
Matt a soltou e cruzou os braços, dizendo:
— Então, você decidiu fugir.
— Sim.
— Viajar de carro por uma área repleta de bandidos e rebeldes.
Um músculo de uma mandíbula se contraiu, e Matt acrescentou:
— Exatamente como a maioria das mulheres faz, quando os noivos sugerem um comportamento desonesto.
— Escutou alguma palavra do que acabei de lhe dizer? Hamilton não é meu noivo.
Knight sorriu. Não acreditava nela. Bem, por que acreditaria? Estava certo. A história dela estava repleta de furos. Porém, o que mais ela podia lhe contar? Já chegara perto de esquecer que Matthew Knight trabalhava para o homem que queria o que a jovem tinha a ponto de ser capaz de matá-la.
Matt estava brincando com Mia. Bom policial. Mau policial. Ninguém nunca disse que um ator pudesse aceitar dois papéis... Principalmente se Knight descobrisse que a prisioneira tremia a um toque dele.
De repente, tudo se tornou evidente. A escuridão aumentava. O silêncio. A floresta aparentemente interminável e as montanhas que os separavam do resto do mundo. O homem em pé, a alguns centímetros dela, de braços cruzados, de forma que cada músculo do torso permanecesse saliente.
O coração de Mia bateu acelerado. Ela recuou e disse:
— Está tarde e estou exausta. Você planeja me deixar dormir um pouco? Ou esse interrogatório vai durar até que eu desmaie?
— Interrogatório? Belezura, você não sabe o significado dessa palavra. Estamos conversando.
Matt olho para o relógio e comentou:
— Mas você está certa. Sim, já é hora de encerrar a noite. — O rapaz inclinou a cabeça na direção do corredor e acrescentou:
— Vamos para a cama.
Dessa vez, o coração dela pulou, indo até a garganta.
— O que isso quer dizer?
— Por que, docinho? O que acha que quer dizer? O sorriso dele era, em parte, sensual, em parte, um tormento. Matt segurou-lhe um dos cotovelos, mas Mia se recusou a mexer-se.
— Não vou dormir com você, sr. Knight.
— Não consegue dizer meu nome, belezura? É Matthew. Quero dizer, considerando as circunstâncias, seria tolice agirmos com formalidade.
— Eu disse...
— Sim. Ouvi o que disse. Parece-me que já falamos sobre isso. Você vai fazer o que eu mandar.
— Não. Não vou dormir com...
—Ande.
— Matthew. Por favor...
— Basta — resmungou Matt, pegando-a e jogando-a por cima de um dos ombros.
Tremendo, Mia bateu com os punhos nas costas dele. Matt a ignorou, carregando-a pela casa escura até um enorme quarto onde a colocou no chão e acendeu as luzes.
— Meu quarto. Espero que as acomodações agradem à senhorita.
— Não faça isso! Você não é o tipo de homem que eu...
— Não sou? — Matthew trancou a porta. Então, virou-se para Mia, os olhos frios, e continuou:
— Até agora, você me acusou de ser tudo, desde um monte de músculos de aluguel até um assassino. Por que não ficaria feliz em acrescentar estupro à sua lista?
— Porque...
— Não importa. — comentou Matt, passando por ela, caindo em cima dos travesseiros arrumados ao longo da cabeceira da cama. — Estou cansado demais para besteiras. Se quiser considerar isso um estupro, problema seu. — Knight bocejou, cruzou os braços atrás da cabeça e descalçou as botas que caíram no chão. — O chuveiro é ali. Vá primeiro.
— Se acha que vou me arrumar para...
— Querida mãe de Deus — rugiu Matthew. Mia recuou. Tarde demais. O ex-agente a empurrou para dentro de um banheiro enorme e ligou o chuveiro.
— Tire as roupas.
— Não vou fazer isso. Já disse...
— Então, eu vou fazer.
Mia ergueu os punhos, mas Matt desviou as mãos dela como se fossem insetos. Então, despiu-a com eficiência, tirando-lhe a camiseta, descalçando-lhe as sandálias, desabotoando e tirando-lhe as calças.
Ela lutava, batia, chutava, gritava e o xingava. Bem, Knight não podia culpá-la. Mas o americano estava exausto e irritado. E pior: Matt parecia ter esquecido como se pensava com exatidão. O ex-agente tentava descobrir se Mia era o que Hamilton dissera ou se era outra coisa.
E já estava farto de tentar descobrir como continuava beijando aquela mulher quando tudo a apontava como um problema. Como era possível que a sensação daquela pele feminina, sob suas mãos, mexesse tanto com ele, mesmo agora? O cheiro dos cabelos também, aquele cheiro de flor...
Knight a deixou de calcinha e sutiã. Basta, a mente dele o avisou. E, dessa vez, Matt a ouviu e largou-a.
— Tudo bem. Minha vez.
Matt começou a tirar a camisa. A jovem soluçou e girou em direção à porta.
— Pelo amor de Deus — exclamou Matt, e virou a tranca. Então, pegou-a e a colocou embaixo do chuveiro. Mia teria de passar por ele se tentasse escapar. E, de jeito nenhum, Matt deixaria que isso acontecesse.
O americano jogou a camisa de lado. Tirou os jeans, mas permaneceu de cuecas. Então, entrou no chuveiro e fechou a porta de vidro fume.
Mia estremeceu e recuou. A expressão da jovem quase o fez rir. Da vez que estivera ali, no quarto de hóspedes, o oficial que era o dono da casa acordou de manhã cedo com um grito que nenhum homem crescido deveria dar.
Todos vieram correndo. Encontraram o homem naquele mesmo chuveiro, encostado à parede, uma cobra do tamanho do Amazonas no chão. A expressão do sujeito era a mesma de Mia agora.
Matt passou por ela. O ex-agente pegou um sabonete da prateleira e o mostrou à moça. Depois, esticou-se em direção às esponjas. Mia não se mexeu. Tudo bem. Iria deixá-la jogar do jeito dela. Matt ensaboou uma das esponjas e esfregou o rosto. Depois, o corpo, tirando a poeira da estrada e o suor do dia.
A jovem o observava. Da forma como aquele homem se apresentava, um antropólogo pensaria estar observando um ritual tribal. Matthew pegou o xampu e fez bastante espuma. Depois, ele o tirou. Porém não como gostava, cabeça para trás, olhos fechados. Se fechasse os olhos ali diante da mulher, provavelmente ganharia uma joelhada.
Quando acabou de se lavar, Matt entregou-lhe o sabonete e a outra esponja. Com a boca seca, olhos semicerrados, Mia pegou o que lhe era oferecido, sem agradecer. Esfregou o sabonete na esponja. E começou a se lavar. O rosto. O pescoço. Os braços.
E, durante todo o tempo, a água jorrava, caindo em sua pele. O sutiã branco ficou ensopado e transparente. Matthew podia ver os seios da jovem. Baixou o olhar. A calcinha estava ensopada também. Dava para ver-lhe a feminilidade.
E o perfume do sabonete... E como o cheiro nela era diferente? Saia do chuveiro, Matthew, a mente lhe dizia. Agora, seu tolo.
Em vez de sair, a viu lavar os cabelos. Viu a massa escura cair pelas costas enquanto ela erguia os braços, jogava a cabeça para trás e levantava o rosto em direção à água.
Matthew gemeu. Mia abriu os olhos. A jovem o fitou. Depois, baixou o olhar e o viu excitado. Em seguida, a moça ergueu os olhos, chocada, deixando o xampu cair.
— Eu pego — Matt avisou.
O rapaz abaixou-se, pegou o vidro, levantou-se... E colocou o xampu de volta na prateleira. E, que inferno, a única forma de fazer aquilo era aproximando-se dela.
— Você deixou cair um pouco.
— O quê?
— Deixou um pouco de espuma em um dos ombros.
Mia não se mexeu. Matt se aproximou e, com a ponta dos dedos, tirou a espuma do ombro dela. Depois, abaixou a cabeça e beijou-lhe a pele, molhada e perfumada. O som que veio da garganta dela era tão suave quanto um sussurro do vento.
— Sabe por que havia sabão em seus ombros? Mia balançou a cabeça, o olhar fixo no dele.
— Porque você não pode tomar uma chuveirada direito se estiver vestida.
Matt se aproximou e abriu o fecho do sutiã. A jovem começou a tremer enquanto ele abaixava as alças lentamente, pelos ombros dela. Os seios de Mia eram belos. Knight abaixou a cabeça e beijou-lhe o pescoço. Depois, um dos seios.
Mia gemeu, ergueu os braços e colocou as mãos espalmadas no peito de Matt. Ele enganchou os polegares no cós da calcinha. Gentilmente, abaixou-a. Depois, agachou-se diante da moça de forma que pudesse tirar-lhe a roupa íntima.
Knight beijou-lhe os pés, os tornozelos. Ergueu o rosto e beijou-lhe as coxas. Então, encostou o rosto na feminilidade de Mia, sentindo o cheiro do sabonete, da mulher, do desejo.
— Mia — Matt sussurrou e a beijou intimamente. Ela gemeu, um som alto e selvagem tão excitante quanto o gosto dela. Suas mãos estavam nos cabelos de Knight. Seus quadris balançavam. Mia estava chorando.
Matt se levantou. Colocou as mãos no rosto de Mia e a beijou profundamente, deixando-a sentir os sabores mesclados do desejo de ambos. Então, fechou a torneira, pegou-a nos braços e dirigiu-se ao quarto.
CAPÍTULO SEIS
O luar iluminava a cama.
Matthew deitou Mia em um mar de linho branco. Ela abriu os braços e o ex-agente sussurrou o nome dela. Depois, beijou-a. Aquele gosto de mel o fazia sentir-se pleno. Podia beijá-la para sempre, e nunca ficaria entediado.
Matt mordiscou o lábio inferior de Mia. A moça arfava e ele abrandou o machucado com beijinhos. Mia soltou um gemido. Aquele som delicado, o corpo arqueado na direção dele, tudo isso fez com que o rapaz fechasse os olhos diante de tanto prazer. Os seios dela encostados em seu peito. Matthew acariciou-os e exultou ao ver a excitação da jovem.
— Gosta quando toco seus seios? — Knight perguntou.
A moça respondeu beijando-o. Para Matt, sexo era prazer, mas não a ponto de perder o controle, não até o último segundo de libertação. E, ainda assim, estava prestes a perder o controle naquele momento. Podia sentir isso acontecendo. A realidade estava escapando. Podia escutar o sangue pulsando nas veias.
Knight estava tão excitado que chegava a doer. Nunca, em toda a sua vida, quisera uma mulher como queria Mia. Ainda acariciando um dos seios da jovem, Matthew o beijou. O gemido da moça ecoava na noite silenciosa.
— Matthew — Mia sussurrava.
Rolou por cima dela, passando uma das mãos por todo o corpo da jovem. A pele sedosa perfumada de desejo. E Matt a fizera sentir-se daquele jeito. Era o responsável, ninguém mais.
Ela o acariciava também — ombros, tórax, abdômen e mais abaixo. Knight prendeu a respiração. Mia o tocou intimamente. Matt jogou a cabeça para trás e gemeu, excitado com a carícia.
Ele quase não conseguia suportar. Matt tinha de detê-la, pensou, e fechou uma das mãos ao redor dela... Em vez disso, o ex-agente mostrou-lhe como enlouquecê-lo. Então, pegou uma das mãos da jovem, levou-a à boca e beijou-a.
— Ainda não, querida.
Matt prendeu-lhe os pulsos, colocando os braços dela acima da cabeça. Então, beijou a pele macia que deixara exposta. Mordiscou-a até voltar aos pulsos novamente. Até voltar aos seios. Até acariciá-la com a mão, que estava livre, por entre as pernas de Mia.
O gemido quase o fez chegar ao clímax. Aquele som continha a gloriosa rendição feminina, a sensação do calor úmido na palma da mão, tudo isso quase o descontrolou.
Matthew fechou os olhos e lutou para manter a compostura. Mia estava tremendo embaixo dele. Soluçava seu nome. Contorcia-se.
— Mia — Knight disse, intensificando a carícia íntima.
A moça perdeu o controle, tentando alcançar a boca de Matt para mordê-lo, lutando para libertar os braços.
— Não — Mia soluçava.
— Sim — disse Matt, erguendo-a de forma que a moça ficasse vulnerável.
Mia era tão bela, frágil... Matt a beijou intimamente e sentiu a intensidade da reação, os gemidos, os sussurros. E, quando ela se perdeu em seus braços, Knight sentiu algo acontecer dentro dele, algo que não tinha muito a ver com sexo, e sim com alegria.
Matt a ergueu, segurando-a firme. Então, beijou-a na boca. E, quando os olhos dela encontraram os seus, quando viu os lábios de Mia formando seu nome, os corpos de ambos se tornaram um só. Mia ergueu os quadris e prendeu as pernas em torno da cintura do ex-soldado.
— Matthew — disse, e ele começou a se mexer. Devagar. Profundamente. Indo ao encontro do calor sedoso daquela mulher. Depois, recuando. E o ritmo de fazer amor acelerou. Os gemidos da jovem se tornaram ofegantes e Matt sentiu a incrível tensão, a energia, a longa escalada até o topo, e o instante em que ele se equilibrou no ponto mais alto do mundo...
Mia começou a tremer e agarrou os braços de Matt. Então ele viu os olhos da jovem enevoados com o que estava acontecendo a ambos... Só então, o ex-agente jogou a cabeça para trás e ecoou o grito dela enquanto caía no precipício.
Ambos permaneceram em um emaranhado de linho e à luz do luar, dois estranhos abraçados.
Um ar fresco vindo das pás de um ventilador de teto os atingia. Talvez por isso, de repente, Mia sentiu frio... Ou talvez tenha sido o atordoado retorno do juízo.
Abriu os olhos e fitou as sombras no teto, e sentiu o poderoso peso do corpo de Matthew em cima dela... O sangue gelou. Perdera o juízo? Até então, Mia dormira apenas com dois homens. Um rapaz com quem namorara na época da faculdade e um homem de quem quase fora noiva. Conhecia cada um muitos meses antes de deixar as coisas irem assim tão longe.
Entretanto, Mia conhecera Matthew Knight há menos de 24 horas. E ele não era um rapaz de faculdade, de expressão doce, ou um pretendente apaixonado. Era um monte de músculos de aluguel, contratado para levá-la de volta para Cartagena. Contratado por um homem que queria muito o que ela tinha no estojo de maquiagem, o suficiente para vê-la morta.
Mia deve ter feito algum barulho, porque Matthew ergueu a cabeça e a olhou, perguntando:
— Qual o problema?
— Nenhum.
— Sou muito pesado para você — disse Matt e rolou na cama, soltando-a. Mia começou a se mexer, mas ele a puxou para os seus braços.
— Ei — disse Knight, com suavidade.
— Ei, você — retrucou Mia, forçando um sorriso. Matt lhe deu um beijo suave. Como um homem como esse poderia ser tão carinhoso?
— Tem certeza de que está bem?
— Sim.
— Porque se foi rápido demais...
Não foi. Havia sido maravilhoso. Sexo incrível com um homem que a raptara...
— Não, foi tudo bem.
— Entendi. Você está bem, e o sexo foi bom. Então, vamos ver, em uma escala de um a dez, qual a marcação? Uns quatro?
— Não. Só quis dizer...
— Você quis dizer que não sabe que diabos está fazendo aqui, deitada nos meus braços.
Mia sentiu-se corar. Besteira. Qual o motivo para ficar corada, considerando o que haviam acabado de fazer?
— Não quero falar sobre isso.
— Bom. Nem eu, porque também não tenho respostas. — Matt a puxou, segurando-lhe os pulsos, os olhos tão luminosos quanto uma esmeralda à luz da lua.
— Tudo que sei é que queria fazer amor com você desde que a vi.
— Isso foi antes ou depois de invadir meu quarto? Matt soltou-lhe uma das mãos, segurou-lhe o rosto de modo que Mia não tinha escolha a não ser fitá-lo, e disse:
— Sim. Invadi. E a forcei a vir comigo. E você ainda tem algo que pegou em Cartagena. Não sei o que é. Nem mesmo sei quem você é. Mas nunca quis uma mulher da forma como a quero.
— É uma fala charmosa. Sempre fun...
Mia arfou quando Matt a beijou ardentemente. Mia lutou, mas ele não teve misericórdia até que ela se entregasse àquele beijo.
— Está vendo? Você também sente o mesmo. — Matt sussurrou, acariciando-a.
— Não! Não quero você...
Matt voltou a beijá-la, agora com suavidade.
— Tenho sido soldado a vida toda. Vivo segundo um código. Chame isso de código de honra, disciplina, tudo significa a mesma coisa. Eu honro meus compromissos.
— Isso quer dizer: não espere um tratamento especial apenas pelo que nós...
— Isso quer dizer que foi a primeira vez que quebrei o código. Não devia ter feito amor com você.
Matt deu-lhe um beijo tão suave que Mia sentiu o coração derreter.
— A verdade é que não sei o que vai acontecer. Só sei que conversando não se faz nada — o ex-agente disse e, com uma das mãos, acariciou-lhe um dos seios. — Mas isso faz — complementou Knight, a voz baixa e ardente.
Voltou a beijá-la até que ela soubesse que estava certo. Nada importava a não ser aquele homem e a forma como ela se sentia quando Knight a tocava. A forma como gemia sob as carícias dela. O gosto daquele homem poderoso, sal e paixão, quando Mia o beijava.
Quando os dois corpos voltaram a se fundir, Matt a conduziu de modo que ficasse cega a tudo, exceto ele mesmo. O suor brilhava nos ombros do ex-agente. Mia beijava a pele salgada e erguia os quadris, indo ao encontro dos impulsos poderosos de Knight.
A onda de excitação aumentava. A moça implorava para que ele terminasse com aquilo. E Matt cedeu. Ambos gemiam quando Mia caiu nos braços dele. A jovem chorava de alegria, desespero, tantas emoções que ameaçavam destruí-la.
— Mia — disse Matt.
Ela, porém, balançou a cabeça. Não pensaria em nada. Não agora. Em vez disso, Mia o beijou. Depois, adormeceu nos braços dele.
A moça acordou quando a lua estava indo embora. Apenas uma luz suave no quarto. Mais adiante, além da cama, a porta da varanda permanecia aberta aos sussurros suaves da floresta e da noite.
Matthew dormia de bruços. Permanecia com um dos braços em torno da cintura de Mia, uma das coxas sobre as dela. A respiração era suave e os cabelos sedosos faziam cócegas na face da jovem.
Mia fechou os olhos e pensou no que havia acontecido ali. Na forma como se entregara àquele homem, repetidas vezes. Oh, Deus, o que aconteceu comigo?
Aquela paixão selvagem a atordoara. Nunca se sentira daquela forma. Nunca.
Pensou nos dois amores do passado. Dois homens bons, normais. Um estudava para ser professor. O outro era advogado com um escritório e uma vida normal.
Mia soubera de tudo que era preciso saber sobre os dois. Onde moravam, quais livros liam, que música escutavam. Sabia tanto sobre ambos que, quando dormiu com eles, nada, nem mesmo o sexo, parecera novo.
O que fizera com Matthew, o sexo... A verdade era que nunca sentira tanto prazer até essa noite. Tudo o que fizera com aquele homem era novo, excitante e perigoso, assim como ele próprio.
Matt era um belo animal, selvagem e incapaz de ser domado. Mia não conseguia imaginá-lo preso, atrás de uma mesa em um escritório, das nove da manhã às cinco da tarde.
O americano dissera ter passado boa parte da vida como soldado. Porém, ela não conseguia vê-lo desempenhando aquele papel, usando uniforme, marchando, recebendo ordens e fazendo continência.
Matthew Knight era um homem que raptara uma mulher. Revistara-a. Forçara-a a obedecê-lo. Exceto que não a forçara a ceder ao toque dele. Não a forçara a nada na cama.
Mia tinha sido uma participante ativa, trocando carícias e beijos. Ficou corada só de pensar nas coisas que fizera, na forma como implorara para que Matt a tomasse e a levasse em uma viagem que jamais fizera.
Sentiu um nó no estômago: medo. Mia dormira com um estranho. Fizera coisas que desejava poder esquecer. E o que realmente sabia sobre aquele homem era que ele fora enviado para levá-la de volta para a morte certa nas mãos de quem o contratara... Ou para fazer o serviço ele mesmo.
O frio que sentia na barriga se transformou em gelo. Mia voltou a observar Matthew. Ele continuava dormindo. Parecia tranqüilo e belo. O rosto, o corpo. Era um anjo misterioso e, ainda assim, o toque dele podia ser suave, a boca, doce.
Contendo a respiração, Mia mexeu-se, libertando-se do braço másculo. Endireitou uma das pernas até conseguir tirá-la de baixo da dele. Então, sentou-se e afastou a colcha que Matthew colocara sobre ambos. E, com cuidado, levantou-se da cama.
Onde estavam as roupas dela? No banheiro. Sentiu-se enrubescer ao lembrar-se de Matt despindo-a, de como a forçara a ficar nua na frente dele, no quanto fora terrível...
Oh, Deus, como havia sido excitante! A forma como a despira a deixara molhada. Depois, como tirara as roupas íntimas dela. Então, fizeram amor. Mia nunca havia acreditado que o sexo pudesse ser tão poderoso.
Será que era por isso que estava fugindo? Para salvar a vida dela? Ou para salvar a própria alma? Para abandonar um homem que podia machucá-la? Ou para escapar do que ele a havia ensinado sobre si mesma? Sobre sensualidade, e como era ser acariciada até ronronar como uma gatinha.
Há um ano, a moça levava uma vida normal. Levantava-se, vestia-se, ia para o escritório onde era secretária em um monótono departamento do governo que lidava com o Serviço de Inteligência. Porém, tudo se resumia a estatísticas surpreendentes.
Mas "normal" e "monótono" estavam bem para a jovem. A infância não fora nem uma coisa nem outra. O pai era jogador, a mãe estava sempre doente...
Fechou os olhos. A verdade era que a mãe era uma alcoólatra. E Mia, à medida que crescia, nunca soube o que o dia seguinte traria. A menina ansiava por uma vida calma, previsível, e encontrara uma.Então, certa manhã, o chefe disse que queriam a presença dela no sexto andar. Tome o elevador de carga, o homem disse. Mia achou aquilo estranho, mas agiu como havia sido instruída. E entrou em um mundo que nem sabia existir.
Era um mundo chamado Serviço Secreto. Uma mulher em um terno de seda preto a cumprimentou e a conduziu pelo corredor até um enorme escritório. Então, apresentou-a a um homem a quem tratava por diretor.
O diretor conversou por alguns minutos. Então, a expressão dele tornou-se grave.
— Srta. Palmieri — ele disse — você trabalhou para o Coronel Douglas Hamilton durante o ano em que ele esteve aqui, em Washington.
— Sim — Mia respondeu —, está correto, trabalhei.
— De acordo com nossos registros, o coronel Hamilton ficou muito satisfeito com você.
— Com o meu trabalho? — Mia perguntara, porque a verdade era que Hamilton não estivera feliz com outras coisas. Por exemplo, a forma como ela evitava trabalhar até tarde da noite porque algo no jeito como o coronel a olhava a deixava desconfortável. — Acredito que sim — a jovem retrucou.
— Srta. Palmieri — o diretor dissera —, vou lhe oferecer uma oportunidade de servir a seu país.
Mia estremeceu. Mas o país dela não a servira. Descobrira que era descartável. O homem com quem dormira era a prova final. E a moça fizera amor com ele... Sexo. Não amor. Não sabia por que a distinção era importante, mas era.
A pequena mala estava na cadeira, mas Mia não arriscaria acordar Matthew de seu sono leve com o farfalhar da maleta.
O armário ocupava uma parede inteira. Ela conteve a respiração ao abrir as portas, mas o ex-agente não se mexeu. Havia roupas dobradas nas prateleiras. A jovem pegou uma camiseta e calças de moletom. Teria de ficar sem sapatos.
Quase sem respirar, pegou a mala e a bolsa, e saiu do quarto na ponta dos pés. Atravessou o corredor, chegando ao vestíbulo. Ali estava a porta da frente. Será que o alarme estava armado para disparar mesmo que alguém estivesse deixando a casa? Mia esperava que não. Do contrário, teria de rezar para conseguir alcançar a caminhonete antes que Matthew viesse correndo.
O ex-agente deixara as chaves em uma mesinha perto da porta. Porém, ao chegar lá, Mia descobriu que não havia chave alguma. Impossível. Tinha certeza de tê-lo visto colocando as...
O lustre de cristal do vestíbulo acendeu-se. Ela gritou e, com uma das mãos, protegeu os olhos daquele clarão... Então, viu Matthew a menos de dois metros de distância. O ex-agente usava apenas jeans e estava encostado à parede. A fisionomia dele a lembrava do quanto aquele homem era perigoso.
— É isso que está procurando? — Matt perguntou, erguendo uma das mãos e balançando as chaves.
CAPITULO SETE
Matthew a surpreendera.
Bom. Era o que queria. Momentos antes, quando acordara e sentira Mia se movendo ao seu lado, sua reação fora máscula e instantânea. Mesmo depois de fazer amor com a jovem duas vezes, Matt acordou ávido para tomá-la novamente.
Knight sabia que aquilo não fazia sentido. Ela era prisioneira dele, uma ladra que lidava com drogas. Hamilton apenas lhe pedira que a encontrasse. Porém, Matt a queria. O fato de terem feito amor não havia saciado sua fome, apenas a aumentara.
Havia tantas coisas que não tinham feito. Coisas que queria fazer enquanto observava o rosto dela. Queria ir mais lentamente, beijar-lhe o corpo inteiro, procurar por todas as partes sombrias e explorá-las.
Podia parecer loucura, mas fazer amor com Mia fora diferente. Ela se mostrara inocente e desamparada, terna e selvagem e, nos últimos minutos, quando os dois corpos se fundiram, quando a jovem começara a tremer, Matt se sentira como se tivesse alcançado o limite do universo.
Não. Nada daquilo fazia sentido. Porém, Matt era um homem de ação, não de introspecção. Por que tentar descobrir o que havia causado tal atração sexual?
Viver essa atração era o que importava. Matt estivera à beira de fazer isso há alguns minutos. Quase a puxara para perto dele e a beijara. Porém, algo o detivera. Talvez o jeito cauteloso de Mia. Se comportava como se fosse feita de vidro. Matt dissera a si mesmo que estava reagindo de forma impetuosa. Ela pensava que ele dormia. Não quisera acordá-lo. Talvez quisesse ir ao banheiro, e estivesse tentando sair da cama sem perturbá-lo.
Errado. Ao se desvencilhar de um dos braços dele, a jovem não se dirigiu ao banheiro, e sim ao armário. Com os olhos quase cerrados, o ex-agente a observara enquanto escolhia uma camiseta, um moletom e os vestia.
Foi então que Mathew compreendeu tudo. Mia estava se arrumando para fugir e deixá-lo. Matt disse a si mesmo que era uma forma louca de definir aquela situação. Ele a raptara, a levara até ali contra a vontade dela. Tratava-se de uma guerra entre os dois. E a primeira obrigação de um prisioneiro era tentar escapar.
Tudo fazia sentido, exceto que Mia não era mais uma prisioneira. Era... Droga, o que ela era? Uma mulher que Matt levara para a cama, apenas isso. Fizeram sexo. Nada mais, nada menos. E o ex-agente agira como um tolo ao adormecer com ela nos braços como se ambos fossem amantes, em vez de amarrá-la, como havia planejado.
Mia o deixara seduzi-la. Ou talvez tenha sido o contrário. Talvez tudo tenha sido deliberado. Quis que Matt baixasse a guarda e ele, idiota, consentira. E, ainda assim, quando a seguira pelo corredor, uma parte tola dele esperava que a jovem só estivesse indo à cozinha em busca de um copo d'água, uma xícara de chá.
Certo, pensou, ao observar a expressão de horror de Mia ao vê-lo ali. Definitivamente, uma mulher não iria em busca de um copo d'água com a maleta em uma das mãos.
— Matthew. Você acordou. Ele não respondeu.
— Eu estava apenas...
— Eu sei o que você estava “apenas" — retrucou Matt, sacudindo as chaves. — Você estava apenas procurando essas chaves.
— Não, não estava. Por que eu iria...
Mia arfava e caiu para trás quando Matt veio em sua direção. Bateu com as costas na parede e ele a pegou pelos ombros.
— Não sei. Diga.
— Eu estava procurando minha bolsa. Pensei que você a tinha deixado em cima da mesinha e...
— Essa bolsa que está pendurada em um de seus ombros?
— Veja. Sei o que parece, mas...
— O que isso parece, Mia? Diga.
— Há uma explicação simples. Se me der um minuto, eu...
Mia gritou quando Matt a levantou do chão.
— Matthew, você está me machucando.
— Geralmente, não é o cara que é acusado de chegar, resolver o problema, e dizer, obrigado, madame?
A jovem enrubesceu e disse:
— Isso é vulgar.
— E não iríamos querer vulgaridade, certo? Quero dizer, isso não se aplica ao tipo de mulher que transa com um homem na esperança de torná-lo descuidado.
— Nojento!
— Estou apenas dizendo como é. Fomos para a cama juntos, você revirou meus miolos...
Mia lhe deu uma tapa. Matt agarrou-lhe um dos pulsos, arrastando-lhe um dos braços de modo que ficasse atrás das costas. Em seguida, puxou-a para perto dele.
— Gosta de jogar duro? Que inferno, belezura, topo, se é isso que quer.
— Me largue!
— Certo. Assim que eu a tiver em algum lugar bom e seguro.
Matt seguiu pelo corredor, arrastando-a. Então, fez com que ela entrasse no quarto e acendeu as luzes. Depois, pegou a maleta, a bolsa e a empurrou de encontro à cama.
Knight podia ver o pavor nos olhos dela. Bom, ele pensou. Mia devia estar aterrorizada.
— Vá para a cama.
— Por favor, Matthew...
— Vá para a cama. Ela obedeceu.
— Um movimento, apenas um, e vai se arrepender.
— Se ao menos me escutasse...
— Se me causar problemas, vou trancá-la na sala de segurança. Depois de tirar todas as armas de lá, claro. Então, eu a tranco do lado de fora. E aí, quem sabe, querida? Posso esquecer que coloquei você lá.
Mia correu até a porta da varanda, que estava trancada, e disse:
— Abra.
Gritou quando os braços de Matthew a prenderam. Ele a carregou de volta para a cama, jogando-a lá e deixando um par de algemas em cima da mesinha-de-cabeceira.
— Não, Matthew... — pediu a moça, soluçando.
— Deite-se e coloque as mãos acima da cabeça.
— Matthew. Eu lhe imploro. O que quer que Douglas lhe tenha dito...
Knight levantou a cabeça. Mia nunca vira olhos tão vazios quanto os dele.
— Esse é o problema. Esqueci o que o velho Dougie me disse sobre você e seus joguinhos.
— Não é verdade. Nunca...
— Nunca aplicou nenhum de seus truques com ele? Faça um favor a nós dois, querida. Não me aborreça com mentiras. Sei tudo sobre essa história. É muito ruim que não me tenha lembrado disso mais cedo. — Matt pegou as algemas e acrescentou:
— Estique as mãos.
Mia não se mexeu. Matthew xingou, agarrou o pulso esquerdo da jovem, prendendo-o com uma das algemas. Em seguida, fez o mesmo com o pulso direito. O barulho das algemas sendo fechadas era semelhante ao da porta de uma prisão sendo batida.
— Eu juro... — disse Mia, as lágrimas escorrendo pelo rosto.
Implacável, Knight colocou as mãos da jovem acima da cabeça, prendendo uma corda às algemas e amarrando-a à cabeceira da cama.
— Isso vai funcionar.
Era terrível a sensação de estar amarrada. Mia começou a chorar quando Matt se dirigiu à porta do quarto e a fechou.
— Matthew, por favor! — Soluçava enquanto o ex-agente se aproximava.
Knight despiu os jeans. O ex-agente estava excitado e não deu a mínima se ela o via assim ou não. Que inferno, Matt queria que Mia o visse assim e tivesse medo dele.
A moça se encolheu quando Matt deitou-se na cama.
— Não — ela sussurrou.
— Não o quê? Não faça isso?
Com os olhos fixos nos dela, Matt acariciou-lhe um dos seios. Depois, passou uma das mãos por entre as coxas macias. Mia soltou um gemido. Não como antes. Não era de desejo, e sim de medo. Tudo bem para Matt.
— Fique quieta ou vou tampar sua boca — disse ele, apagando as luzes.
Mia fitava a escuridão. Até conseguia ver aquela massa bruta ao lado dela. Matt tamparia a boca da jovem. Sim, o ex-agente faria isso. Ela ficou calada e sufocou os soluços.
Knight mexeu-se. Deitara-se perto de Mia, que, pouco depois, ouvia o som suave da respiração dele. O seqüestrador adormecera.
Matthew dormiu como planejara. Vinte minutos. Nem um segundo sequer a mais, nem a menos. E acordou refeito, como se tivesse dormido a noite inteira. Aprendera a fazer isso nas Forças Especiais. Cam fora o primeiro a aprender coisas do Oriente. Exercícios de respiração. Tai-chi da mente, o irmão dizia, e Matthew e Alex riam, até verem que funcionava.
Matt explorara mais e descobrira diversas técnicas Zen. Uma ensinava a separar a mente do corpo. Isso o ajudara a preservar a própria sanidade mental, naquele mesmo país, quando ele e Alita foram torturados.
A outra era um exercício da mente que induzia ao sono. Um sono profundo, o tipo necessário quando tudo que se tinha eram minutos em vez de horas.
Isso havia funcionado. Matt estava descansado. E tinha de estar, porque, quando amanhecesse, precisaria de um plano. Qual seria a forma mais efetiva de forçar a prisioneira a dizer a verdade? E era o que ela era, uma prisioneira. Como podia ter se iludido e tê-la visto como outra coisa?
Mia não era uma mulher bonita que Matt conhecera em uma festa. Era uma criminosa, ou teria sido, se o amante não a tivesse protegido. O fato de ter esquecido isso provava o quanto estava afastado dos dias em que era um espião.
Tudo bem. Knight cometera um erro, mas não cometeria outros. Permaneceu deitado no escuro, sentindo a força que fluía por todo o corpo, as teias de aranha sumindo da mente. Estava bem agora.
Ela era o assunto, uma tarefa e... E que som era aquele? Mia estava chorando baixinho. Que chorasse! Ela o usara, e Matt não gostara disso. Ou talvez não tenha gostado de si mesmo, por ter sido idiota o suficiente para deixar que aquilo acontecesse.
De uma forma ou de outra, a deixaria chorar. Matt a manteria deitada ao lado dele, os braços em uma posição que não causaria danos, mas que era desconfortável. Permitiria que a imaginação de Mia trabalhasse, pintando imagens vividas do que faria com ela... Ou do que já fizera.
Matt a tomara nos braços. Beijara-a, sentira a doçura de sua boca. Beijara e acariciara os seios, as coxas. Sentira, em sua mão, o orvalho quente da feminilidade da jovem. Quando os dois corpos se tornaram um só, exultara ante os gemidos, os gritos, o jeito como aquela mulher soluçava o nome dele... Droga! Knight sentou-se e virou-se na direção de Mia.
— Pare com esse choro.
Podia ver que Mia estava tentando obedecê-lo, mas não conseguia. Bem, e daí? O choro de uma mulher nunca matou ninguém. Exceto, talvez, o homem que o ouvia.
— Ouviu o que eu disse? Pare de se lamuriar. Isso me irrita e, acredite, você não vai querer me irritar mais ainda.
Ela tentou conter as lágrimas, mas não adiantou. O choro se intensificou. Então, Matthew levantou-se, cruzou o quarto e entrou no banheiro, batendo a porta.
Permaneceu um longo tempo de cabeça baixa e com as mãos na beira da pia. Então, acendeu a luz e mirou-se no espelho. Parecia um homem que tivera uma rápida visão do inferno.
Ligou o chuveiro. Primeiro, uma ducha bem quente, o máximo que podia suportar. Depois, uma ducha gelada. Baixou a cabeça, deixando a água cair no pescoço e nos ombros. Em seguida, ligou as duchas laterais e deixou que o jato atingisse os músculos das costas e dos quadris.
Parecia que estivera naquele mesmo chuveiro há cem anos, quando vira Mia diante dele. E observara a água transformando os cabelos da jovem em seda, vendo o sutiã ficar transparente...
Matthew xingou. Que tudo aquilo fosse para o inferno! Precisava de um plano. Não importava se ela tinha drogas consigo ou não. Depois, decidiria se a levaria de volta para Hamilton ou a mandaria para os Estados Unidos ou...
Besteira! Matt desligou o chuveiro e se secou. Respirou fundo. Então, enrolou a toalha na cintura e abriu a porta do banheiro.
A luz invadira o quarto. Viu Mia, deitada como a deixara, os braços acima da cabeça, os pulsos algemados. A cabeça estava curvada, mas, assim que a luz a tocou, a jovem ergueu o queixo. O rosto estava marcado pelas lágrimas, mas o velho jeito provocativo retornara. Manifestava-se pela saliência do queixo e pelo brilho dos olhos inchados.
Matt caminhou até ela e tirou-lhe as algemas. Mia choramingava. Não teria se incomodado com aquilo na época em que trabalhara no Serviço Secreto. Mas não fora essa uma das razões pelas quais Knight deixara aquele trabalho? Porque o Serviço Secreto era um buraco negro que quase lhe sugara toda a humanidade?
A reação dele não tinha nada a ver com Mia. Teria sentido isso por qualquer pessoa. Sim. Certamente, teria. Matthew pigarreou e disse:
— Isso vai passar em alguns minutos.
Mia não respondeu. Matt agarrou-lhe os ombros. Ela tremia e tentou se afastar.
— Não seja tola. Deixe-me ajudá-la a fazer com que a circulação volte. Você se sentirá melhor.
Gentilmente, Matt esfregou-lhe os braços. O tremor passou, mas ainda havia lágrimas nos olhos de Mia. Como era possível que aquelas lágrimas o deixassem com um nó na garganta? Matt tocou os pulsos esfolados e comentou:
— Não devia ter lutado contra as algemas.
Mia não respondeu. Bom. Matthew conseguira o que queria, assustando-a a ponto de deixá-la submissa. A verdade era que não precisaria mais das algemas hoje à noite. Ela seria dócil. Além disso, Matt estava bem acordado. Iria vigiá-la.
— Melhor?
Nenhuma resposta. Knight pegou as mãos de Mia. Estavam geladas. Não estava frio no quarto. O ventilador de teto estava funcionando, refrescando o quarto sem esfriá-lo.
Matt colocou uma das mãos no rosto dela, que também estava gelado. Choque? Choque físico completo? Não. Ela não tinha nenhum dos outros sinais.
Então, choque emocional. Isso fazia sentido e explicava o tremor, o consentimento... E aquelas lágrimas nos olhos.
— Que inferno! — Matt resmungou.
Ele a abraçou. E Mia voltou à vida em um segundo, empurrando o peito e os ombros dele. Para quem deveria ser dócil..., o ex-agente pensou, e quase riu ao perceber o quanto lhe fazia bem vê-la brigar ao se recobrar.
— Calma. Não vou machucá-la.
Mia conseguiu libertar uma das mãos e tentou lhe dar um tapa, mas não tinha força. Porém, ela o atingiu no queixo.
— Droga! Eu disse que não ia machucá-la!
Matt pegou a mão dela e a colocou entre os dois enquanto puxava o lençol e a coberta. Mia continuava tremendo. Nervosismo, raiva, medo... O que quer que fosse, era necessário deter aquilo.
Knight a puxou contra si. A jovem lutou, contorcendo-se. Porém, ele a manteve presa, acariciando-lhe as costas. Aos poucos, Mia parou de lutar. Matt sentiu o corpo dela se aquecendo, os tremores diminuíram. E, por Deus, o ex-agente sentiu o milagre de tê-la nos braços novamente.
Matthew fechou os olhos, abaixou a cabeça e sentiu o perfume dos cabelos sedosos. O aroma fez com que a corrente sangüínea disparasse. Uma garrafa de champanhe Dom Perignon não teria um efeito mais poderoso.
O coração de Mia batia acelerado. Uma vez, anos atrás, quando Knight tinha 8 ou 9 anos, ele e os irmãos andavam a cavalo na fazenda. Os três brincavam, fingindo que eram guerreiros comanches, descendentes da tribo da mãe, de quem mal se lembravam.
Então, o cavalo de Matthew empinou. Mesmo assim, Matt foi um bom cavaleiro. Equilibrou o animal, checou ao redor. Cascavéis eram sempre uma ameaça e os cavalos tinham pavor delas. Foi quando o menino viu um ninho pequeno, comum, feito de galhos e folhas secas. Porém, continha um milagre. Um filhote de passarinho indefeso, incapaz de voar.
Matt apeou. Com cuidado, pegou o filhote nas mãos e sentiu o coração dele bater, aterrorizado. Nenhum dos três sabia o que fazer. Finalmente, Matthew colocou o ninho em uma árvore, pegou algumas minhocas e colocou-as lá dentro, ao lado do passarinho. Dois dias depois, quando Matt voltou, o filhote permanecia imóvel. O coração havia parado de bater.
Agora, tantos anos depois, o coração de Mia batia acelerado de medo, assim como o do passarinho. Talvez ela fosse tudo o que Hamilton dissera. Ou talvez existissem razões para explicar o que a jovem fizera. Quem sabe tudo que Matt precisasse fazer fosse perguntar-lhe...
Matt engoliu em seco. Talvez aquilo não tivesse importância. Não era perfeito, fizera coisas que nem mesmo admitiria para si mesmo.
— Mia, querida, me desculpe se a apavorei.
— Douglas mentiu para você.
— Não importa. Não tenho o direito de julgá-la.
— Você teria todo o direito se eu tivesse tentado traficar drogas. Mas não fiz isso. Nunca trafiquei drogas. Nunca!
— Silêncio.
Matthew colocou as mãos no rosto da jovem e beijou-lhe as lágrimas que estavam nos olhos. Depois, beijou-a suavemente nos lábios. Então, puxou-a para perto e a embalou.
Podia sentir a tensão se desfazendo. Outro beijo. Queria apenas segurá-la e acalmá-la. Mia estava quente, suave.
Mais um beijo. Só mais um e, se por acaso, a boca da jovem se prendesse à dele, se Mia suspirasse e colocasse os braços em torno de seu pescoço...
— Mia, querida — sussurrou Matt.
As mãos dela se aproximaram devagar do tórax do ex-agente, alcançando os ombros, depois a nuca. Quando ele a beijou, foi correspondido.
Antes que Matthew pudesse pensar, uma das mãos dele estava embaixo da camisa de Mia, acariciando-lhe um dos seios. Ela gemeu e o beijo se aprofundou.
De repente, a jovem se afastou. Os olhos, repletos de dúvidas, encontraram os dele.
— Não sei quem você é nem o que é. Isso é loucura. Não podemos. Não devemos...
Mia interrompeu a fala. Em um soluço desesperado, o beijou com paixão, incendiando-o. Tiraram juntos as roupas dela. E Matt mergulhou naquele corpo feminino sedoso. No final, Mia chorava de felicidade. E ele se sentia pleno, feliz.
CAPÍTULO OITO
Momentos antes, Matthew adotara uma antiga técnica de meditação para tirar uma soneca repousante. Agora, tudo de que precisava era fazer amor com Mia e depois vê-la adormecer em seus braços.
Havia ainda muitas perguntas sem respostas... Mas, naquele exato momento, tudo o que importava era Mia, quente e suave, abraçada a ele.
Matt sentiu o corpo da jovem relaxar. Beijou-a e a ouviu suspirar, a cabeça ainda apoiada em um de seus ombros. Knight a puxou para perto dele. Todas aquelas perguntas, pensou... E ambos adormeceram.
Sob a fraca luz prateada, antes do amanhecer, com os suaves pios de aves na floresta, Mia acordou nos braços de Matt. A boca do rapaz estava próxima à nuca da jovem. As mãos dele cobriam os seios dela.
Mia começou a tentar virar aqueles braços másculos, mas Knight não deixava. Em vez de soltá-la, ele a tomou. Sem preliminares. Não havia necessidade. Ela estava pronta e desejava ser dele.
Gritou quando ele começou a se mexer, cada vez mais rápido. E, quando Matt gemeu e a mordiscou, ela viajou com ele em direção ao sol.
Momentos mais tarde, Matt tomou-a nos braços. Os olhos de Mia ardiam.
— Matthew — ela sussurrou e colocou uma das mãos no rosto dele. Matt levou-a à boca e a beijou.
E permaneceu deitado, observando-a, segurando-a até que ela voltou a dormir.
Knight deve ter dormido também, porque só se lembra de ter visto depois o sol em seu apogeu. Mia continuava nos braços dele. Fios de cabelo estavam no canto de sua boca. Então, com a ponta de um dos dedos, Matt os afastou, beijando-a depois.
Era tão bom segurá-la daquele jeito... Estar com Mia naquela casa que, uma vez, esperara amar. E, em vez disso, odiara.
Que besteira! Uma casa era apenas uma casa, Matt compreendia agora. Se um homem tinha pesadelos, isso não tinha nada a ver com o lugar onde estava. Os sonhos ruins continuariam chegando até que ele os perseguisse e os expulsasse da própria mente.
O fato de Mia estar ali com ele o fizera sentir-se diferente em relação à casa, até mesmo em relação à Colômbia. O problema era que Matt ainda se sentia da mesma forma em relação a si mesmo.
Alita. O nome veio até Matt como ocorria com freqüência. Não fora capaz de salvá-la. Seria capaz de salvar Mia? Ela estava fugindo de algo. Porém, ele não podia protegê-la até que soubesse do que se tratava. Mia não era uma ladra, nem traficava drogas. Knight apostava a própria vida com relação a essas duas coisas.
Então, por que Mia estava fugindo? Por que correria risco por causa do cartel? Se não havia nada entre ela e Hamilton, por que o coronel a queria de volta? Por que mentira e dissera que havia?
Matthew suspirou. Algumas peças do quebra-cabeça estavam faltando. A única certeza que tinha era que faria o que fosse preciso para proteger a mulher que estava ali em seus braços. Mia precisava da proteção de Knight.
E Matt... Não. Que inferno! Não precisava dela. A queria, sim, mais do que jamais quisera qualquer mulher. Mas precisar dela? Nunca precisara de ninguém. E não precisaria.
Matthew franziu as sobrancelhas. Com cuidado, tirou um dos braços, que estava embaixo dos ombros de Mia. Fitou-a mais uma vez e, então, levantou-se. Pegou um short de brim e saiu do quarto.
Mia estava sonhando. Caminhava por um corredor, escuro e estreito, com Matthew. Aonde vamos? perguntara, mas o rapaz permanecera calado.
Havia um homem no final do corredor. A moça não conseguia ver o rosto dele, mas sabia quem era. Por favor, disse a Matthew, não me faça ir para ele. Matt continuou caminhando, a mão apertando a sua.
Com o coração acelerado, acordou. A luz do sol entrava pela janela, iluminando parte das pétalas cor-de-rosa da orquídea que estava no travesseiro a seu lado.
Os últimos vestígios do pesadelo desapareceram. Sorrindo, Mia pegou a orquídea e a levou aos lábios. O que importava era o que havia acontecido na noite anterior. O sorriso esmaeceu. A não ser que também tivesse sido um sonho...
Mas não era. Mia soube disso assim que tomou uma ducha e se vestiu. Depois, seguiu o aroma de café fresco que vinha da cozinha. Então, viu Matt de costas, à porta do deck, que se encontrava aberta. Vestia shorts e camiseta, as mãos dentro dos bolsos.
O coração de Mia acelerou. Aquele homem belo, forte e incrível era amante dela. Matt virou-se e a viu. Olhos indecifráveis, maxilar contraído. A incerteza voltara. Ambos haviam explorado o corpo um do outro. Ainda assim, ela não sabia nada a respeito dele. Ou por que Douglas o escolhera para caçá-la...
— Bom-dia — disse Knight, com suavidade, e tudo mudou: os olhos, a expressão. E, quando abriu os braços, a moça parou de pensar e correu para aquele abraço.
— Lamento ter dormido até tão tarde — disse Mia, sorrindo.
— Deve mesmo lamentar. Graças a você, estou faminto — comentou Matt, intensificando o abraço.
— Você devia ter tomado o café-da-manhã sem mim.
— Não estou falando do café-da-manhã — e a beijou.
Conduziu-a até o deck. Ontem, ela só o vira de relance. Agora, podia observar que acompanhava a extensão da casa, com muro de pedra. O ar estava perfumado com a fragrância das flores que transbordavam dos canteiros de terracota.
— Isso aqui é maravilhoso — disse Mia.
— Pensei em tomarmos o café-da-manhã aqui fora.
— Sim. Seria perfeito.
Ambos fizeram a refeição sentados a uma mesa de vidro, protegida do sol por um enorme guarda-sol azul. Evalina tinha ido ao mercado local, mas deixara tudo pronto para os dois: ovos mexidos, bacon e tortillas — um tipo de pão ázimo, feito de farinha de milho ou de trigo.
— Que lugar é esse? Onde estamos? — perguntou Mia.
— Estamos nos Andes, em uma cadeia de montanhas chamada Cordilheira Oriental.
— É como se estivéssemos no topo do mundo.
— O povo local chama esse lugar aqui de Cachalu: Terra do Céu.
— E é toda sua?
— Não toda, mas boa parte.
— Mas você é americano.
— Passei algum tempo aqui, anos atrás.
— Aqui? Quer dizer, nesta casa?
— Eu estava no país e passei alguns dias aqui, a trabalho. Na época, o dono era outro.
— Um amigo?
— Apenas um conhecido. Não alguém que eu pudesse chamar de amigo. Um sujeito que conheci no trabalho.
— Pensei que tivesse dito que era soldado.
— Fui. É uma velha história.
— Desculpe. Não quis ser intrometida. Matthew pegou uma das mãos de Mia, entrelaçando os dedos nos seus, e disse:
— Não, querida. Eu é que lamento. Na verdade, o tempo que passei aqui não foi... Não gosto muito de reviver o passado, entende? Além disso, por que falar de mim quando podemos falar sobre você?
Não podiam falar sobre Mia. Ele faria perguntas que ela não poderia responder. Não sem estar totalmente certa do real motivo pelo qual o ex-agente estivera à sua procura. E, se o coração de Mia estivesse certo, se Matthew não soubesse a verdade sobre Douglas, contar-lhe muita coisa o colocaria em risco também.
— Não há muito o que falar sobre mim — comentou a jovem, sorrindo.
— Aposto que sim. Qual o seu sorvete favorito? Gosta de futebol americano? Consegue entender uma palavra do que Bob Dylan diz? Como se sente com relação a Mahler?
— Mahler? — perguntou a moça, erguendo as sobrancelhas.
— Sim. Gosta de futebol americano... ou não? Mia riu e respondeu:
— Chocolate. Sim. Não muito. Matthew abriu um largo sorriso e comentou:
— Uma mulher com personalidade. Gosto disso.
— E sobre você?
— Morango. Sim. Não...
— Eu quis dizer, por que Douglas o contratou para vir atrás de mim?
Mia não tencionava perguntar aquilo, mas as palavras saíram instintivamente. Piscou e viu o sorriso do americano desaparecer.
— Matthew, não quis dizer...
— Tudo bem. Direto ao ponto. Que inferno, por que não? Por exemplo, o que a fez vir para a Colômbia?
A jovem o fitou. A verdade veio parar na ponta da língua. Explicaria que, num dia, era secretária; no outro, uma desconhecida agência do Serviço Secreto a transformara em espiã.
— É uma pergunta simples, querida. Que tal responder?
Matthew continuava sorrindo. Porém, seus olhos cerraram um pouco. Mia sabia que aquilo significava que ele estava analisando cada palavra. Tudo bem. Ela lhe contaria a verdade — o máximo que pudesse.
— Eu era secretária em Washington. Então, meu chefe me disse que havia uma vaga em Cartagena. E perguntou se eu estaria interessada.
— E você aceitou.
— Sim.
— Você havia solicitado transferência?
— Bem, não.
— Tem fluência em espanhol?
— Não sou fluente, mas...
— Mas, mesmo assim, seu chefe decidiu enviá-la a Cartagena. Estou certo?
Os dedos de Mia continuavam entrelaçados aos de Matt. Ela queria se sentir livre. Parecia errado estarem de mãos dadas quando a voz e os olhos dele voltaram a ser os do estranho que a raptara.
— Não fale comigo nesse tom — disse.
— Só estou tentando entender as coisas. Quero dizer, que inferno, é como se você fosse aquela personagem Dorothy, de O Mágico de Oz, presa em um tornado, sabe? Aquela velha frase, Acho que isso aqui não é mais Kansas, Totó. Um dia, Washington D.C. No outro, Cartagena. Trabalhando como assistente pessoal de Hamilton e vivendo naquele mausoléu enorme e luxuoso, nas colinas.
— Eu já havia trabalhado para Douglas antes, quando ele serviu em Washington.
— Então, Hamilton fez uma solicitação especial. O coronel pediu a Washington que a desse para ele.
— Ninguém me "deu" a Douglas.
— Não vamos ficar dando voltas, tudo bem? Hamilton solicitou você.
Mia conseguiu soltar a mão que estava presa à dele e perguntou:
— O que isso importa?
— Nada, apenas uma conversa amigável. Só estou tentando compreender como uma mulher nomeada para trabalhar na capital federal acabou na América Latina.
— Lembra-se do que disse sobre a Colômbia? É linda, mas perigosa.
— Cartagena é uma cidade no litoral em que o principal problema do dia é qual clube visitar à noite.
Mia empurrou a cadeira para trás e se levantou. Matt logo fez o mesmo e perguntou:
— Aonde está indo?
— Já disse, não gosto de seu tom de voz.
— E não gosto de gente que pensa que pode me deixar falando sozinho.
Mia virou-se e encaminhou-se para a casa. Matt foi atrás dela, puxou-a por um dos braços e virou-a de forma que o fitasse.
— Há alguma coisa entre você e Hamilton?
— Já respondi isso.
— O coronel pensa que há.
— Não posso fazer nada com relação ao que Douglas pensa.
— Não dormiu com o coronel?
— Se dormi, você não tem nada a ver com isso. Matt apertou ainda mais o braço da jovem e disse:
— Tenho sim.
— Não, não tem. Você e eu passamos a noite juntos. Isso não lhe dá o direito de me fazer perguntas sobre as pessoas comas quais dormi.
Matthew a fitava. Os olhos de Mia irradiavam rebeldia. Estava irritada e tinha todo o direito de estar. Tinha razão. O passado de Mia só interessava a ela... Mas Matt se desesperava só de pensar que ela estivera com um homem como o coronel.
— Você tem razão. Seu passado não é da minha conta. Mas, de agora em diante, se olhar para outro homem...
Matt a beijou. Por um segundo, Mia recuou. Depois, ficou na ponta dos pés e colocou os braços em torno do pescoço dele. Matt pensou no que acabara de lhe dizer, da loucura de reivindicar algo de uma mulher que nem conhecia.
Então, parou de pensar e a carregou até uma espreguiçadeira, em um canto isolado do terraço. Os dois se despiram e seus corpos se tornaram um só.
No calor do meio-dia, eles desciam por uma trilha estreita que avançava por uma área repleta de carvalhos. Matthew carregava uma mochila em um dos ombros. Mia levava uma garrafa d'água.
Matt não lhe dissera aonde iam, exceto que era um lugar especial e muito bonito. Ainda assim, quando deixaram as árvores e chegaram a uma clareira, pequena e exuberante, Mia arfava, surpresa.
— Oh. Você estava certo. É maravilhoso.
— Sim. Imaginei que você fosse gostar.
Mia olhava tudo ao redor, as árvores, a grama, a cachoeira que formava uma piscina de água natural.
— É como o Jardim do Éden.
— É tranqüilo e intacto. O tipo de lugar onde você pode se sentir seguro.
Ela o olhou. Logo soube que Matthew Knight lhe dera uma vaga idéia dele mesmo, que era mantida oculta de todos. Parecia que o ex-agente compreendera isso, porque lançou um sorriso rápido, embaraçado. Então, colocou a mochila embaixo de uma árvore e tirou a camiseta.
— Tudo bem. O último a entrar na piscina vai ter de lavar a louça do jantar.
—Vai nadar naquela água?
— Certamente.
— Mas e as cobras? O ex-agente tirou as sandálias e perguntou:
— O que tem as cobras?
— Matthew...
— Ainda não vi nenhuma sucuri. Mia ficou pálida.
— Uma sucuri?
— Sim. Talvez uns seis metros de comprimento, uns sessenta centímetros de largura... Querida, estou brincando. Nada de sucuris, crocodilos, jacarés. Estamos nas montanhas. O rio Amazonas está bem longe daqui.
— Não trouxe maio. Matt riu, tirando os shorts.
— Vamos nadar nus.
O olhar de Mia percorria o corpo do amante. Matthew era espetacular, magnífico. Pura masculinidade. Aqueles ombros. O tórax. Aquele corpo surpreendente...
— Não é justo.
— O quê? — a moça indagou.
— Você está me observando. Mas não está me dando a mesma oportunidade.
— Claro, eu...
— Exatamente. Estou nu. Você está vestida. Deixe-me ajudá-la a despir-se, querida.
— Posso fazer isso.
— Posso fazer melhor.
Tinha razão. Oh, sim, podia fazer muito melhor. Era bom sentir aquelas mãos másculas nos braços enquanto ele lhe tirava a camiseta. O toque dos dedos no abdômen enquanto abria-lhe o zíper do short. O sussurro em seu pescoço ao baixar a cabeça e abrir o fecho do sutiã.
— Você é tão bela! — disse Knight e a beijou. Mia retribuiu o beijo. Seus dedos se entrelaçaram nos cabelos sedosos e espessos na base do pescoço de Matt, os seios nus contra o peito musculoso.
Os dois tinham feito amor várias vezes e, ainda assim, estava pronta para ele novamente. O lugar secreto entre as coxas estava quente e úmido. E Knight também estava pronto para Mia. A excitação dele era a prova.
Lentamente, ela se ergueu, movendo os quadris na direção dos dele. Matt voltou a beijá-la com intensidade.
— Bruxa — sussurrou.
Saber que a queria tanto assim era algo eletrizante. Mia não tinha experiência, mas não era tola. Sabia que Matthew podia ter qualquer mulher que quisesse... E ele a queria.
Mia riu e perguntou:
— É isso que sou?
— Sabe que é.
A jovem colocou os braços ao redor do pescoço de Knight. Ergueu uma das pernas e a enroscou em uma das dele. O ex-agente gemeu de desejo, e isso a fez sentir-se poderosa.
— Continue assim. Vou encostá-la em uma árvore e tomá-la aqui mesmo.
— Faça isso.
Tudo nele havia mudado. Os olhos ficaram sombrios, a boca afinou. Por um momento, Mia teve medo do homem que se tornara seu amante... O homem que pensava que viera para matá-la.
— Matthew?
As mãos dele agarraram os ombros da jovem. Knight a ergueu, colocando-a na ponta dos pés, e a beijou enquanto a empurrava de encontro a um enorme carvalho à beira da clareira.
— Matthew, espere...
Tarde demais. O grito de Mia se perdeu em meio ao som da cachoeira enquanto os dois corpos se tornavam um só. E ele a levou ao paraíso.
Ficaram juntos por longos segundos, corpos suados, pulmões quase sem ar. Então, Knight estremeceu e puxou Mia.
— Querida, desculpe.
A moça balançou a cabeça e disse:
— Oh, não. Não tem por quê.
— Eu a machuquei? Deus sabe que eu não queria. Apenas...
— Você não me machucou. Isso foi...
— Maravilhoso.
— Sim.
Matt a fitou e a beijou. Mia retribuiu o beijo e repousou a cabeça no peito dele.
— Eu nunca soube...
— Não, nem eu.
Knight a manteve perto dele até sentir que os corações de ambos tinham desacelerado. Então, se afastou e a observou. Os cabelos dela estavam embaraçados. Pedacinhos de folhas presos ao corpo. O rosto brilhava, a boca inchada por causa dos beijos...
— Mia, eu...
— O quê? — Perguntou e esperou. A floresta parecia esperar com ela. Todas as criaturas que moravam ali se calaram para ouvir palavras que nem Mia nem Matt poderiam ser loucos para dizer ou sentir.
— Estou contente por ter encontrado você.
A moça ergueu os olhos na direção dos dele e disse:
— Também estou feliz por me ter encontrado. Matt a beijou várias vezes. Até porque havia mais a dizer, mas ainda não estava pronto para isso.
— Hora do banho — disse o ex-agente, rindo.
— Não. A água deve estar fria!
— Pronta ou não — falou e correu em direção à piscina. Rindo, carregou-a para a parte mais funda. Mia chutava, gritava e ria, o suficiente para que Matt desejasse congelar aquele momento e mantê-lo assim, para sempre.
— Mia...
— Matthew — a jovem sussurrou e o beijou.
A boca quente daquele homem contrastava com a água fria da piscina natural, aquele corpo másculo estava rígido contra o dela. E, finalmente, Mia soube que não fazia sentido mentir para si mesma. Entre ontem e hoje, se apaixonara por Matthew Knight.
CAPÍTULO NOVE
Dias e noites transcorriam.
Não havia relógios para olhar, nenhum mundo externo para observá-los, nenhuma regra para obedecer. Os amantes riam e conversavam. E banqueteavam-me com as refeições que Evalina preparava e deixava para os dois. Bebiam o vinho estocado na adega. Nadavam na piscina atrás da casa e se deleitavam na banheira de hidromassagem, no deck.
Caminhavam pela floresta e dirigiam pelas estradas estreitas que serpenteavam as montanhas. Divertiam-se com jogos e assistiam a filmes de terror tarde da noite, via satélite. Isso é, faziam essas coisas quando não estavam se amando.
— Gosta disso? — Matthew perguntava, abaixando a cabeça em direção aos seios da moça.
— E disso? — sussurrava, afastando-lhe as pernas.
— E disso? — indagava, enquanto os dois corpos se tornavam um só.
Os suspiros, os gemidos dela lhe diziam tudo o que o precisava saber. Tudo, exceto o real motivo pelo qual a jovem fugira de Cartagena.
Agora, Matt a conhecia. Mia era bela e feminina, caminhando na direção dele, nua, enquanto saía da piscina no meio da floresta. Poderia ter sido pintada por Botticelli.
Mas era forte em todos os sentidos. Knight não conseguia vê-la fugindo de Hamilton, não importava o quanto fossem indesejáveis as atenções do coronel. Ela teria fitado o patife e dito o que pensava a respeito dele. Mas fugir?
Quanto mais conhecia Mia, menos aquilo lhe parecia possível. Mas desistira de ficar pedindo que ela lhe contasse a verdade. Saber que não lhe contaria o magoava. Porém, imaginava que ela deveria ter um bom motivo para nada dizer. Quando estivesse pronta, compartilharia aquilo com ele.
Enquanto isso, ambos estavam em uma sensual viagem de descobertas. Mia, desinibida na forma como reagia às carícias de Matt quando faziam amor, a princípio, era reservada ao explorar o corpo dele.
— Diga-me o que lhe dá prazer — ela sussurrou, e Matt lhe disse que ela era o que lhe dava prazer.
E era verdade. Bastava vê-la pentear os cabelos ou entrar na banheira para que ficasse excitado.
— Me diga — insistiu a moça.
— Toque em mim e você vai descobrir — retrucou Matt, e ela o fez.
Uma noite, no terraço, tendo apenas a lua como testemunha, Mia despiu-se para Matt. Não deixou que a ajudasse, nem que a tocasse. Mia fez aquilo sozinha. Devagar, com toda a habilidade inata de Eva. No momento em que a última peça de roupa caiu ao chão, ele estava quase fora de si. Então, Knight começou a tirar a camisa. Mia o deteve e disse:
— Meu trabalho.
A jovem tirou-lhe a camisa, os jeans. Acariciou-o. Saboreou-o. Mia o conduzia, a cabeça para trás, os olhos fechados, em êxtase. E Matt deixou que pensasse que estava no comando até que, com um grunhido primitivo, fez com que a jovem ficasse embaixo dele. Knight prendeu-lhe os braços acima da cabeça e a conduziu até que chorasse e implorasse por misericórdia.
— Por favor, Matthew... — sussurrava a jovem.
Knight soltou-a e a beijou. Em seguida, mergulhou fundo naquele corpo feminino enquanto a moça gritava o nome dele. O ex-agente desfaleceu sobre ela. Sabia que era grande demais, pesado, mas não conseguia nem queria se mexer. E Mia também não desejava que se mexesse. Finalmente, quando Matt se agitou, ela o segurou firme.
—Fique — sussurrou a moça.
Knight a beijou na boca, nos olhos, no pescoço. Depois, manteve-a junto ao peito. Mia suspirou, fechou os olhos e adormeceu.
Os últimos dias haviam mudado o americano. Anos atrás, uma mulher com quem se envolvera ficara irritada com o que chamava de “abandono". Segundo ela, Matt era um lobo solitário.
Era verdade. Exceto com relação aos irmãos, o ex-agente sempre gostara de estar sozinho. Não mais. Que inferno, agora, só ficava feliz quando estava com Mia. O que isso significava? Matthew pensava e recusava-se a procurar pela palavra.
Outro dia longo e perfeito. Os dois foram de carro até um vilarejo nos Andes. Comeram tortillas e empanadas, um tipo de pastel de forno. Beberam cerveja gelada e dividiram uma casquinha de sorvete.
Matt comprou uma boneca de palha para Mia. E a moça comprou um amuleto pendurado em um cordão de couro. O vendedor dissera que era um pedaço de osso de uma das criaturas mais bravas do mundo: a águia.
— Uma águia para um homem que usa uma — Mia disse enquanto colocava o cordão em Matt, que enrubesceu.
— Realmente achava que eu não havia notado sua tatuagem? É linda como você.
Matthew ficou ainda mais corado e comentou:
— Vai me pagar por tudo isso.
— Assim espero.
A expressão dele a fez rir. Mia segurou um dos braços dele quando voltaram a caminhar e perguntou:
— Fez a tatuagem quando estava no Exército?
— No... Quer dizer, quando eu era soldado? Não. Antes disso. Coisa de menino. Tenho dois irmãos.
— Mais velhos? Mais novos?
— Mais velhos. Nascemos todos com um ano de diferença de um para outro e sempre fomos muito próximos. E na noite antes de Cam, o mais velho, ir embora para a faculdade, agimos de forma um pouco estúpida.
— Quer dizer, vocês se deram conta de que iriam se separar, provavelmente pela primeira vez, e isso os deixou tristes. Acho isso bastante doce.
— A verdade é que estávamos muito bêbados. De repente, alguma lembrança, algo que pudéssemos compartilhar, parecia certo. Então, fomos de carro até esse pequeno lugar do qual Cam ouvira falar, passamos um tempinho discutindo se deveríamos fazer tatuagens de uma águia ou de uma caveira e ossos cruzados, símbolo de morte...
— Fico contente de que a águia tenha vencido.
— Sim, eu também. De qualquer forma, isso era apenas coisa de garoto.
— Uma coisa boa.
— Você acha?
— Eu sei. Quando eu era criança, teria dado tudo por irmãos ou irmãs. Além disso... A águia é muito sexy.
— Você é que é sexy — Matthew disse e a beijou ali mesmo, na rua, para o mundo ver.
Uma loja chamou a atenção de Mia. Matthew viu a forma como ela olhou para o vestido cor de damasco que estava na vitrine.
— Vamos entrar e olhar mais de perto.
Mia balançou a cabeça. Tudo ali devia ser caro.
— Não, é adorável, mas... .
Matthew pegou-lhe uma das mãos e a puxou para que entrasse. Uma mulher sorrindo apressou-se a vir na direção do casal.
— Bom-dia.
— Bom-dia, senhora. Queremos comprar um vestido, o da vitrine.
— Não! — Mia sorriu para a dona da loja. Depois, virou-se para Matthew e disse:
— Não quero comprar o vestido. É muito caro — sussurrou a jovem.
— Eu quero comprá-lo — disse Matt.
— Não posso deixar que faça isso.
— Ah! Discriminação! Sorvete pode, mas vestido não!
— Matthew! Isso é besteira.
— Ela discrimina, e agora me calunia. — O ex-agente virou-se para a dona da loja, que observava ambos e sorria.
— O que um homem deve fazer com uma mulher como essa, senhora? A menos que...
Matt olhou para Mia e disse:
— A menos que não goste do vestido.
— Claro que gosto. É lindo, mas...
— Ou acha que não é seu tamanho. De fato, parece um pouco pequeno.
— Não é muito pequeno.
— Tem certeza?
— Honestamente, Matthew...
— Honestamente, Mia, vou comprar o vestido. — Matt colocou as mãos na cintura da jovem e a puxou para si. A senhora sorriu e ocupou-se em um balcão repleto de lenços de pescoço, de seda, em cores brilhantes.
— Quero vê-la nele. Depois, quero tirá-lo de você. Todos esses botões minúsculos...
Os olhos de Mia ficaram sombrios, do jeito que sempre ficavam quando os dois faziam amor. Knight abaixou a cabeça e a beijou. Então, afastou-se e os dois se olharam.
Minha, Matt pensou, com uma ferocidade repentina. Minha, para sempre. O ar ficou preso na garganta quando o ex-agente se deu conta de que o impossível acontecera. Ele estava apaixonado.
Mia trocou-se no provador. O vestido era belo. Nunca usara nada parecido. O decote era baixo, mostrando a curva dos seios. O olhar voltou-se para os pequenos botões que iam até a bainha e a jovem estremeceu de prazer, imaginando Matthew abrindo-os, um por um.
Uma batida à porta. Surgiu uma mão masculina e acessórios delicados caíram no ladrilho. Sandálias douradas de salto fino. Uma bolsa dourada. Um xale preto, de renda.
O coração de Mia disparou. As emoções que tomavam conta dela pareciam frágeis demais para serem reais. Encostou a testa na porta e disse, sussurrando:
— Matthew, não posso...
— Vamos jantar em um restaurante que esta senhora me garante merecer toda essa elegância. Como podemos desapontá-la?
De fato, como?
A dona da loja tinha razão. O restaurante era perfeito. Pequeno e à luz de velas; um grupo de músicos tocava ao fundo. A mesa deles, no canto, oferecia uma vista compartilhada apenas por um condor andino, que pairava nos ares, a uns trezentos metros acima das montanhas. E, ainda assim, a única visão que deleitava Matthew era a de Mia.
Estivera certo com relação ao vestido cor de damasco. Parecia ter sido feito para Mia. A pele da moça, os olhos, os cabelos, tudo parecia combinar com o tom dourado.
Matt pediu bifes, salada e uma garrafa do vinho chileno cabernet sauvignon para ambos. Mia disse que tudo estava maravilhoso e ele acreditou, mas não conseguia saborear nada. Ela o satisfazia por completo. Knight a amava.
E o que faria em relação a isso? Será que um homem deveria dizer a uma mulher que a amava quando esta carregava consigo um segredo e recusava-se a compartilhá-lo com ele? Porque o que Mia lhe dissera sobre deixar Hamilton era mentira.
Não o deixara porque o coronel não aceitaria não como resposta. Havia mais do que isso. Por que Mia não contara a verdade a Matt? Saber que não confiava nele o bastante o angustiava... Mas quem era ele para julgar?
Matt tinha os próprios segredos. Dissera a ela que fora soldado. Tudo bem. Era verdade, mas havia mais coisas. Fora um espião, um agente para uma agência do governo, sem identidade. Ainda que acreditasse no próprio país, certas vezes fez coisas...
Como ela se sentiria se soubesse que Knight tinha um passado que ainda o assombrava? Se soubesse que fora incapaz de salvar Alita, ou mesmo incapaz de vingar a morte dela?
Tantas perguntas. Tão poucas respostas. E, ainda assim, apenas uma importava. Quando dissesse a Mia que a amava, será que ela lhe diria que o amava também?
Matt pegou uma das mãos da jovem. Primeiro, a verdade sobre si mesmo. Diria isso a ela agora.
— Mia?
— Sim?
— Mia, querida, dança comigo? — perguntou Matt, empurrando a própria cadeira para trás.
Mia foi para os braços dele como se estivesse ali por toda a vida, como se fosse estar para sempre. E estaria, o ex-agente pensou, fechando os olhos ao puxá-la para perto. Mia seria dele, sempre.
— Feliz? — indagou Knight.
Mia acenou com a cabeça, concordando. Estava quase com medo de falar. Era bobagem, sabia, mas sentia as lágrimas brotando. Como era possível que as mulheres chorassem quando estavam felizes? Como aquele vôo aterrorizante para Cartagena poderia ter levado a tal contentamento?
Eram perguntas sem respostas, mas e daí? Tudo o que importava era aquele momento. Estar nos braços de Matt e saber que o amava. Não importava no que havia acreditado sobre aquele homem, inicialmente. Agora, confiava nele.
E era a hora de lhe contar a verdade — tudo, do início ao fim. Mia lhe contaria que trabalhava para um lugar sem identidade, conhecido como Serviço Secreto.
Contaria que fora enviada para Cartagena como assistente pessoal de Hamilton, de forma que pudesse descobrir se ele mudara de lado e estava trabalhando para o Cartel Rosário. Douglas cada vez se tornava mais suspeito. Sem admitir nada, o coronel a acusou de espioná-lo. A jovem negou, e ele decidira destruir o que chamava "seguro".
O coronel arrumou tudo para que desse a impressão de que ela tentara contrabandear cocaína para os Estados Unidos. Então, reprimiu a suposta tentativa.
— Faça qualquer coisa estúpida e vou entregá-la às autoridades locais. Imagine como será passar alguns anos em uma prisão colombiana — dissera o coronel, sorrindo.
E deixou claro que parte do preço que a jovem pagaria para manter-se longe da prisão era aquecer a cama dele. Foi quando Mia decidiu fugir.
A moça encontrou uma lista dos contatos de Douglas no cartel e as quantias pagas ao coronel, tudo escondido no computador dele. A jovem gravou a lista em um minidisco compacto e fugiu.
Se conseguisse chegar a Bogotá, Mia dissera a si mesma, chegaria até a embaixada... No entanto, Matthew a interceptou. E, apesar de Douglas tê-lo mandado encontrá-la, a jovem acabara por confiar em seu seqüestrador.
— Matthew, tenho que falar com você.
Mia percebeu que Matt havia compreendido. Ela não queria falar sobre o tempo, ou o vinho, ou a comida. Queria falar sobre o que os unira... E sobre o que os separava. Knight acenou com a cabeça, concordando, e disse:
— Isso é bom, porque também há coisas que quero lhe dizer.
Matthew a conduziu de volta à mesa. Mia colocou o xale nas costas e pegou a bolsa enquanto ele tirava um maço de notas da carteira e o deixava para o garçom.
Dirigiram de volta, em silêncio. Quando chegaram em casa, Matthew ajudou Mia a descer da caminhonete e a beijou com carinho.
A lua pairava acima da floresta, estendendo um caminho cor de marfim por entre as árvores, até a clareira, a piscina cor de safira, a cachoeira. Até o lugar que pertencia apenas a ambos.
A noite estava calma, silenciosa. Até mesmo as criaturas que caçavam nessas horas escuras estavam quietas. Quando o casal chegou à clareira, Matthew virou Mia na direção dele e disse:
— Mia.
De repente, a jovem pensou, não ainda. Então, comentou:
— Você disse que queria me ver neste vestido. Agora é hora de me ver fora dele — sussurrou ela.
Os olhos de Matt ficaram sombrios. Disse o nome dela, puxou-a e a beijou. Primeiro, com suavidade. Depois, cada vez com mais intensidade e desejo. Mia retribuiu o beijo da mesma forma, como se ambos tivessem medo do que pudesse vir em seguida.
Lentamente, Matt desabotoou-lhe o vestido. Quando este caiu aos pés de Mia, ele sentiu o coração palpitar. Ela sorriu.
— Era um segredo entre mim e a dona da loja — sussurrou.
O sutiã e a calcinha eram de renda, da mesma cor do vestido. De encontro à pele dourada, sob a luz suave da lua, Mia poderia ser um presente dos antigos deuses para Knight.
Beijou-a na boca, no pescoço, enquanto abria o fecho do sutiã. Então, beijou-lhe os seios.
Mia tirou-lhe a jaqueta cinza, desabotoou-lhe a camisa. Ele era bonito, musculoso, pele bronzeada. Ela beijou-lhe os lábios, os ombros, o peito. Depois, acariciou-lhe os braços e o abdômen. Foi quando Matthew pegou-lhe um dos pulsos e disse:
— Mia, você é tudo para mim. Quero que saiba disso. Não importa o que vai acontecer depois.
Ela ficou na ponta dos pés e o beijou. Então, colocou uma das mãos dentro das calças e o acariciou intimamente. Matt voltou a beijá-la. E a hora de conversar virou passado. Ele mesmo tirou o resto das roupas de ambos.
Seu nome estava nos lábios da jovem quando ele a deitou na grama suave e os dois corpos se tornaram um só.
— Matthew — sussurrou Mia, o ventre pleno, assim como o coração.
— Você estava certo com relação a esse lugar. Eu me sinto segura. E desejaria que nunca tivesse que sair daqui.
— Essa clareira sempre vai pertencer a nós dois, querida. Onde quer que estejamos, o que quer que aconteça, apenas feche os olhos e estará aqui de novo.
Seria verdade? Repentinamente, Mia teve a sensação de que nunca voltaria a ver aquela clareira. A jovem estremeceu, apesar do calor da noite, e os braços de Matthew a apertaram ainda mais.
— O que é querida?
— Nada. Só estou sentindo frio.
— Vamos. Vou acender a lareira, tomaremos um pouco de conhaque...
— E conversaremos.
—Sim.
— Porque tenho que lhe contar a verdade sobre mim e Douglas.
— Assim que chegarmos em casa.
Vestiram-se. Então, Matthew colocou um dos braços nos ombros de Mia enquanto caminhavam de volta para casa.
Porém, seu sorriso era forçado. Mia tinha de lhe contar a verdade sobre ela e Hamilton, ela dissera. Por que aquilo soara tão ameaçador?
CAPITULO DEZ
Mia tropeçou enquanto os dois subiam as escadas para o deck. Matthew a impediu de cair e perguntou:
— Você está bem?
— Sim. Meu tornozelo prendeu, só isso. Acho que não estou acostumada a saltos tão altos.
Matthew sorriu e comentou:
— Sim, não são maravilhosos?
A moça riu enquanto o ex-agente a beijava. Mia pensou: E a última vez que você vai estar aqui, rindo por uma bobagem com o homem a quem ama...
— Deixe-me soltar as correias das sandálias...
— Eu faço isso. Vá em frente e acenda o fogo.
— Tem certeza?
— Positivo. — Ela o tocou no rosto, sentindo a aspereza da barba de fim de dia, lembrando-se do quanto gostava de senti-la contra os seios.
— Matthew...
— Sim?
Eu amo você. De repente, Mia teve medo de dizer essas palavras.
— O que é, querida?
— Nada. Apenas acenda o fogo e sirva um pouco de conhaque. Volto em um minuto.
Knight a beijou. Depois, abriu as portas de correr e entrou. Ela sabia o que ele estava fazendo agora: desativando o sistema de segurança, tirando a jaqueta, caminhando até a lareira...
— Olá, Mia.
Uma mão tampou-lhe a boca, impedindo-a de gritar. Era Douglas. Ele estava ali.
— Sem barulho — disse o coronel e a apertou com mais força. Depois, voltou a dizer:
— Nem uma palavra sequer, entendeu?
Ela balançou a cabeça, concordando. Douglas ergueu a mão. Lentamente, Mia se virou e o fitou.
— Como você está, queridinha? Não precisa responder. Posso ver como tem passado. Parece uma vadia feliz.
— Douglas...
Mia arfava quando o coronel apertou-lhe o queixo.
— O que foi que eu disse? Eu falo. Você apenas balança a cabeça. Agora, queridinha, aqui está o que nós vamos fazer.
— Mia?
— Responda — sibilou Douglas. Algo duro e metálico a apertava embaixo dos seios. — Finja que está tudo bem...
— Um minuto, Matthew.
— O fogo está aceso, querida. Estou servindo o conhaque.
— Já vou.
— Querida, que encantador — ronronou Douglas e pressionou ainda mais o cano da arma contra a pele da moça.
— Parece que o destemido sr. Knight fará qualquer coisa por você. A pergunta é: você fará qualquer coisa por ele?
— Douglas, por favor, eu imploro...
— Você vai voltar para Cartagena comigo.
— Não!
— Você vai dizer que a idéia é sua. Que tivemos uma discussão de namorados, mas que acabou e que você está emocionada por eu ter vindo a seu encontro. — O cano da arma moveu-se até um dos seios da moça. — Faça isso e com convicção, ou vou matá-lo. Primeiro, vou atirar nele enquanto você assiste. E não haverá nada que possa fazer para ajudá-lo. Entendeu?
Mia conteve um soluço.
— Isso é um sim?
— Sim — sussurrou a jovem.
— Excelente. E no caso de pensar que ele pode ter alguma chance contra mim... Não estou sozinho. Dois dos homens de Rosário estão lá fora, no escuro. Se alguma coisa der errado, eles vão assumir o controle. Entendeu?
A jovem compreendera e acreditara plenamente. Os homens do cartel eram assassinos frios, assim como Hamilton. O disco ainda escondido no estojo de maquiagem continha todas as provas disso.
As luzes do deck se acenderam. Hamilton colocou um dos braços ao redor da jovem. Uma das mãos estava no bolso da jaqueta, segurando a arma.
As portas se abriram. Matthew foi até o deck e ficou paralisado, chocado. Hamilton? Ali? O ex-agente não podia acreditar. Ninguém, exceto os irmãos, sabia sobre aquele lugar.
— Boa noite, sr. Knight. Bom vê-lo novamente. E por que Mia estava tão perto do homem de quem fugira? Por que um dos braços do coronel estava ao redor dela? Matthew deixou de olhá-la e fitou Hamilton, perguntando:
— O que está fazendo aqui? O coronel sorriu e respondeu:
— Não acho que acreditaria na história de que, por acaso, eu estava por perto...
— Saia da minha propriedade.
— Sr. Knight, aqui estamos, companheiros americanos em terra estrangeira. Pensei que seria mais hospitaleiro, principalmente com o homem que o contratou.
— Não me contratou. Não há nenhum dinheiro envolvido aqui.
— Correto, sr. Knight. Entretanto, você concordou em achar Mia... E aqui está ela.
— Mia? — Matthew olhou paia a mulher a quem amava. Ela estava pálida. Que choque levara ao encontrar Hamilton ali!
— Mia, venha para mim, querida — disse Knight.
— Ela está muito feliz onde está, sr. Knight. Não é? Bem, ela não vai responder. Mia pediu que eu resolvesse isso.
— Mia, afaste-se dele agora — ordenou Matthew.
— Não gosto de ouvi-lo dando ordens à minha noiva.
— Ela não é sua noiva.
— Foi isso que ela disse? — O coronel balançou a cabeça e continuou:
— Mia, por que faz esses joguinhos?
— Douglas, por favor...
— Hamilton, solte-a. Agora — ordenou Matthew. O coronel ergueu as sobrancelhas e murmurou:
— Realmente, sr. Knight...
— Agora — gritou Matthew.
Hamilton deu de ombros. Uma cotovelada leve da pistola e o coronel se afastou de Mia, dizendo:
— Certamente, se é isso que prefere. Mas receio que não vai mudar nada. Mia compreende a situação. Não é, queridinha?
Mia acenou com a cabeça, concordando. Ela compreendia. Uma das mãos de Hamilton estava no bolso, agarrada à arma. Em algum lugar, mais além do deck, dois homens que matavam tanto por prazer quanto por dinheiro tinham as armas apontadas para o homem a quem amava. O homem cuja vida Mia só podia salvar se despedaçasse os corações de ambos.
— Mia, venha para mim. Eu a protegerei — disse Knight, fitando-a.
— Não há nada do que me proteger, Matthew. Sei que é difícil para você acreditar, mas estou bem.
Sabia que Matt estava dizendo a si mesmo que ela estava mentindo, talvez até imaginando a verdadeira razão para aquilo. Mia não podia deixar Knight fazer nada. Talvez ele tivesse alguma chance contra Douglas, mas os homens além do deck atirariam nele em um instante.
Mia respirou fundo, aproximou-se do coronel e forçou-se a colocar um dos braços ao redor de um dos dele.
— Mia. Que diabos está fazendo? — Matt indagou.
— Eu... — A expressão de Knight a estava consumindo.
— Tudo bem, queridinha. Eu resolvo isso. Como vê, Knight, esperava que pudéssemos nos encontrar a sós. Dois homens do mundo, debatendo um problema, sem a presença de Mia para complicar a situação.
— Bom. Vamos fazer isso. Saia da minha propriedade e ligue para marcar uma hora — disse Matthew, sem desviar os olhos de Mia.
— Fiz isso. Diversas vezes. Parece que não tem monitorado suas mensagens. Mas entendo. A srta. Palmieri pode ser uma diversão maravilhosa. Suponho que essa seja a razão para tanta hostilidade. Não é o modo correto de um agente secreto do governo agir.
Mia disse arfando:
— O quê?
— O coronel está mentindo. Eu trabalhava para eles, mas não faço mais isso. Que droga, Hamilton, o que está acontecendo aqui?
— Knight está certo. Não trabalha mais para eles. Agora trabalha por conta própria, para quem pagar mais. Você sabe. Checa situações difíceis. Encontra meios para conseguir os produtos de pessoas consideradas não-confiáveis por aqueles que o contratam. Pessoas como você, Mia.
— Hamilton está mentindo, droga! Ele pediu que eu a encontrasse! Não tenho nada a ver com o governo. Mia? Fale comigo!
— Deixe-me explicar, queridinha. Como vê, sr. Knight, Mia veio para Cartagena como minha assistente pessoal. Mas era muito mais do que isso. Nós nos apaixonamos em Washington, e queríamos estar juntos.
— Mia? — disse Matthew, e a jovem sabia que sempre se lembraria do desespero na voz dele enquanto vivesse.
— Mas nossa garota resolveu dar um passeio pelo caminho selvagem. Tráfico de drogas pelo correio da embaixada? Tudo verdade, lamento. Como minha assistente pessoal, Mia tinha acesso e cobertura. Porém, descobri o que fez. Senti pena e disse que não a entregaria se voltasse para os Estados Unidos imediatamente.
Matthew, Mia pensou, oh, Matthew, meu amor...
— Estou envergonhado de dizer, confiei na pessoa errada. Ela fugiu da minha casa com uma lista de todos os agentes secretos federais em Cartagena. Eu tinha que pegá-la de volta, mas não podia dizer isso a ninguém.
— Não sem que isso o implicasse no que fez para acobertá-la.
Hamilton balançou a cabeça, concordando.
— Exatamente
Matthew virou-se para Mia e disse:
— Diga que Hamilton está mentindo.
— Sim, queridinha. Diga a Knight o que ele quer ouvir... E que se danem as conseqüências.
O aviso era claro. Hamilton tramara uma mentira monstruosa. Mia suspirou fundo e disse:
— Não posso lhe dizer isso, Matthew.
— Você tentou traficar drogas?
— Sim — sussurrou a moça.
— Você roubou uma lista de agentes secretos? Estava pronta para entregá-los a pessoas que os matariam?
Matt correu na direção dela, segurando-a pelos cotovelos. Com os olhos negros de raiva, o ex-agente a levantou, de modo que ela ficou na ponta dos pés, e perguntou:
— E você era essa mulher nojenta?
Mia não respondeu, mas sabia que Matthew interpretaria o silêncio dela como um sim.
— E por que dormiu comigo? Que inferno, não me amole tentando inventar uma resposta. Eu sei qual é. Dormindo comigo, eu não contataria Hamilton nem faria com que você voltasse e fosse punida pelo que fez.
— É triste, mas é verdade, lamento. Mia é muito boa em conseguir que os homens façam a vontade dela — disse o coronel.
Matthew o ignorou e disse a Mia, como se estivessem sozinhos:
— Uma última chance. Não é tarde demais. Diga-me que não era uma mentira. Tudo que aconteceu na minha cama, tudo que compartilhamos... Diga que é Hamilton quem está mentindo. Diga isso, e eu acreditarei em você.
Mia queria abraçar Matt, beijá-lo e dizer-lhe que o amava, que o adorava, que o amaria até o fim dos tempos...
— Diga, droga — gritou Knight.
Ela não respondeu. Os olhos do ex-soldado pareciam vazios e frios. Matt a soltou e recuou. O homem por quem Mia se apaixonara havia desaparecido, substituído pelo estranho perigoso que a raptara do hotel dias antes.
— E agora? — A pergunta foi dirigida ao coronel, que suspirou e respondeu:
— Vou levá-la de volta a Cartagena. Mia vai devolver o que roubou e vai se comportar de hoje em diante. Dessa vez, vou informar meus superiores, mesmo que isso signifique que eu seja julgado por acobertá-la.
Hamilton fez uma pausa e continuou:
— Lamento. Eu devia ter imaginado que Mia iria... É o tipo de mulher que não consegue evitar... Bem. Não importa. Mia? Presumo que você tenha aquela lista de agentes, certo?
Mia acenou com a cabeça. Diante disso, o coronel segurou uma das mãos da jovem e cumprimentou Matthew, dizendo:
— Adeus, sr. Knight. Obrigado por sua ajuda.
Matt olhou para a mão estendida de Hamilton. Então, colocou as próprias mãos dentro dos bolsos da calça e disse:
— Saia da minha propriedade, coronel. Se eu voltar a vê-lo, é um homem morto.
Mia sentiu a fúria de Hamilton na forma como ele segurava-lhe a mão, mas a voz dele não demonstrava nada.
— Vamos, queridinha. Causamos problemas ao sr. Knight. Vamos deixá-lo a sós.
Os pés de Mia não se mexiam. Hamilton a arrastou escada abaixo.
— Matthew — sussurrou Mia.
O coronel a segurou ainda com mais força, mas Mia virou-se e olhou o amor de sua vida pela última vez, dizendo:
— É a mesma coisa que escolher a caveira à águia... O fim sempre justifica os meios.
— Mais uma palavra e você estará assinando a sentença de morte dele — sibilou Hamilton.
Não importava. A tentativa patética de avisar Matthew que Hamilton a forçara a ir com ele falhou. O ex-agente já tinha virado as costas e se afastado do deck. Mia o perdera para sempre.
O coronel a arrastou até o local onde o motorista os esperava. Uma vez lá, Hamilton amarrou as mãos da moça e a empurrou para que se sentasse no banco traseiro do carro. Depois, sentou-se ao lado dela.
O motorista ligou o motor e o carro ganhou velocidade na estrada. Mia esticou o pescoço, tentando ver lá fora pelo retrovisor. Então, disse:
— Dispense os homens que estão com você. Hamilton riu e comentou:
— Não foi uma excelente história? Adorei que tenha acreditado. Mal posso esperar para tê-la em casa novamente. Vamos nos divertir muito.
Mia não pensou, agiu. Deu uma tapa no rosto do coronel. Hamilton grunhiu, mas nada importava agora. Nada importaria, sem Matthew.
O som do motor do carro desapareceu e o silêncio voltou à floresta. Matthew permanecia no deck, imóvel, fitando a noite escura enquanto xingava a si mesmo, Hamilton, e o governo... E Mia. Como ele pudera ser tão tolo?
Knight sabia o quanto um homem podia julgar de forma errada a situação quando estava sob estresse, o quanto podia ser facilmente desviado da verdade. Havia infindáveis truques em uma operação secreta. Mentiras, invenções, tacadas em falso. Agentes duplos, homens que olhariam para você e jurariam dizer a verdade. Mulheres graduadas na arte da fraude, na armadilha.
O ex-agente cerrou os punhos. Como pudera ser um alvo tão fácil? Matt tinha ido atrás de Mia sabendo quem era. Porém, de uma forma ou de outra, aquela realidade fugiu-lhe da mente.
Era inocente, ela dissera. E ele acreditara. Mia nem se esforçara muito para convencê-lo. Alguns beijos apaixonados — algumas noites na cama dele, pensou Matt, friamente — e o ex-agente se convenceu por conta própria.
Se havia algum conforto em toda aquela história, era que não tinha sido totalmente tolo. E se Matt tivesse dito que a amava? Imagine só se ele tivesse ficado ali no deck, tomado a jovem nos braços e dito, Mia, eu amo você.
No entanto, Knight não fizera isso. Recuperara o juízo a tempo, porque a verdade era que não a amava nem nunca a amaria. Pensar que a amava havia sido uma mentira que contara a si mesmo.
Talvez tivesse a ver com a forma como os dois se conheceram. Matt como o caçador e a jovem como a presa. Havia algo sexy naquilo, não? Ou talvez fosse o jeito como ela tremia nos braços dele, Como erguia o rosto quando ele a beijava...
Que inferno, o que importava? Tudo havia acabado. E Knight não ficaria se lamentando. Entrou em casa, pegou os dois copos de conhaque e foi até o aparador. O que sentira por Mia fora luxúria...
— Que droga!
O rosto dele se contorceu. Matt girou na direção da lareira e arremessou os copos no fogo. Então, pegou a garrafa de conhaque e bebeu um longo gole.
Pensou em tudo o que deveria ter dito antes de deixá-la ir embora. Deveria ter dito que dormir com ela não havia significado nada, que dormira com muitas outras mulheres que haviam sido melhores na cama do que ela esperava ser. E que segurá-la nos braços ao longo daquelas noites fora apenas parte do jogo.
Knight bebeu outro gole. Tudo tinha sido um jogo. Tudo bem. Que inferno, depois de um tempo, talvez até se transformasse em uma boa história: como o bem-sucedido ex-agente secreto passara algumas semanas fantásticas na Colômbia, transando com uma mulher que acabara manipulando-o.
Mais um gole de conhaque. E outro, e mais outro, até a garrafa chegar à metade. Então, apagou o fogo da lareira, pegou a jaqueta e certificou-se de que tinha as chaves, a carteira, o passaporte.
— Hora de ir para casa — disse. Hora de voltar à vida em Dallas.
CAPÍTULO ONZE
Era surpreendente o que o dinheiro podia comprar.
Matthew era rico. Crescera assim, mas aquele dinheiro era do pai. Nunca quisera nada.
A agência dos especialistas em Gerenciamento de Risco fizera com que enriquecesse por conta própria. Porém, nunca havia parado para pensar nisso. Comprara um apartamento dúplex e uma Ferrari. Matt vivia bem, viajava, comprava o que queria, dava presentes caros às mulheres com as quais se relacionava.
Agora, pela primeira vez, sabia o que o dinheiro podia fazer. Era possível deixar uma parte da própria vida para trás. Knight deixou o vale e encaminhou-se para um pequeno aeroporto. Dirigia em alta velocidade e não se incomodava. A verdade era que não se importava com o que aconteceria. Foi assim que começou a se sentir antes de deixar o Serviço Secreto.
Matt sobrevivera aos momentos sombrios no passado e sobreviveria àquele agora também. Era quase meia-noite quando o ex-agente chegou ao aeroporto. Não havia ninguém lá. Porém, havia um número de telefone no portão: em caso de emergência, o aviso dizia em inglês e em espanhol.
Knight decidiu que se tratava de uma, pegou o celular que estava no bolso e ligou. Alguns telefonemas, e conversava com um sujeito sonolento que tinha um Learjet 60. Sim, poderia levar o senhor aos Estados Unidos. Mas não agora. Era impossível. Não podia sair de Cachalu à noite. A escuridão, as montanhas... Era muito perigoso. De manhã e pela tarifa justa...
— Qual é a tarifa justa? — indagou Matthew.
— Cinqüenta mil dólares — respondeu o piloto.
— Leve-me embora daqui agora e eu pago o dobro.
Uma hora depois, ambos estavam no ar. E, cinco horas mais tarde, o ex-agente não estava em casa, mas em Houston.
O pai abriu a porta. Avery estava com a barba por fazer e com os olhos embaçados. Ainda eram seis horas da manhã. Matthew ligara quando o avião pousou, acordara o velho homem e avisou que estaria lá em meia hora.
Um homem que envia você para uma confusão ligada ao Serviço Secreto, sem avisá-lo primeiro, não merecia preocupação com boas maneiras em relação a ele.
— Café? Acabei de fazer — perguntou Avery. Matthew seguiu o pai até a cozinha. O café estava forte e quente, e o filho colocou açúcar na própria xícara. Alta dose de cafeína, açúcar urgente... O rapaz precisava das duas coisas.
— Como foi em Cartagena? — perguntou o pai, sentando-se diante dele à mesa.
— Difícil.
— Bem... Presumo que tenha se encontrado com Douglas Hamilton, certo?
— Sim, eu me encontrei com o coronel. Me diga, pai, quando me pediu para que eu o ajudasse, sabia que tipo de homem ele era?
— Que tipo de...
— Hamilton é um canalha.
— É? Nunca o conheci. O pai dele é que era meu amigo.
— Hamilton queria que eu caçasse a mulher dele.
— Era isso que ele queria? Desculpe, filho. Se eu soubesse, nunca o teria incomodado.
Matthew sentiu parte da raiva esmaecer. A perplexidade de Avery não podia ser falsa. E quando é que escutaria o velho chamá-lo de "filho" ou pedir desculpas?
— Sim, bem, eu a encontrei.
— Então, por que parece tão aflito?
Matthew fitou o pai. Não é da sua conta, o rapaz ia começar a dizer... Porém, o que saiu foi algo diferente.
— Eu me envolvi com ela. A história toda acabou se tornando pessoal, e isso não devia ter acontecido.
— Gostar de uma mulher pode complicar as coisas.
— Não gostei dela. Eu disse que me envolvi com ela, só isso. Eu apenas...
Os olhos do filho se encontraram com os do pai. Depois, desviaram-se e Matthew acrescentou:
— Fui um idiota. Droga, devia saber antes!
— Não é possível saber quando se apaixona.
— Pai, continuo a dizer que...
— Foi o que aconteceu comigo quando conheci sua mãe.
Matthew ergueu as sobrancelhas. Não conseguia se lembrar do pai falando sobre a mãe antes.
— Eu a amava tanto que tinha medo de demonstrar. Sua mãe mudou minha vida e pensava, se ela parasse de me amar... Mas nunca aconteceu isso. O amor dela era a única coisa constante em meu mundo. Quando sua mãe morreu, fiquei perdido. Mergulhei no trabalho e... negligenciei você e seus irmãos. Lamento isso até hoje, mas...
— Sim. Você fez isso. Mas estou contente que me tenha dito a razão. Quero dizer, posso entender o quanto tê-la perdido deve ter deixado você arrasado...
O filho pigarreou e acrescentou:
— Não é a mesma coisa. Essa mulher não me amava. E eu não a amava.
Avery acenou com a cabeça, concordando, e disse:
— Claro que não.
Pai e filho beberam o café em silêncio. Então, Matthew suspirou e levantou-se, dizendo:
— Tenho que ir para o escritório. Avery o acompanhou até a porta e disse:
— Com sorte, filho, um dia, você vai olhar para trás e achar algo de bom nessa história. O tempo ensina.
O pai sorriu e acrescentou:
— Você sabe. Não chore pelo leite derramado, uma coisa de cada vez...
O filho sorriu também e disse:
— Sim. E o fim justifica os meios.
Pai e filho se entreolharam. Então, um pouco sem jeito, trocaram o que parecia ser um abraço. Matthew foi embora e entrou no táxi que o esperava.
— Para o aeroporto — Matt falou, mas continuou pensando no que acabara de dizer ao pai.
O fim justifica os meios. Por que aquelas palavras martelavam na cabeça dele?
O vôo para Dallas levou menos de uma hora. No meio da manhã, Matthew estava à mesa do escritório, vendo a correspondência que se amontoara desde que viajara... Tentava não pensar em Mia, em Hamilton, no que o coronel estava fazendo com ela.
Os irmãos também estavam no escritório. Cam disse que isso não era comum, e era verdade. Geralmente, ao menos um deles estava fora, a negócios.
Ao meio-dia, Alex perguntou pelo interfone:
— Que tal almoçarmos?
— Boa idéia — respondeu Cam.
Matthew disse que não podia perder tempo naquele momento. Mais tarde, por volta da uma, Cam sugeriu o almoço. Alex concordou. Matthew disse que estava sem fome.
Às duas da tarde, Alex e Cam se encontraram na sala de conferências. A voz de Matt não parecia boa, o irmão mais velho murmurou. Sim, e ele também não parece bem, acrescentou Alex. Algo estava acontecendo, mas o quê?
Cinco minutos depois, os irmãos entraram na sala de Matt.
— Hora de almoçar — disse Cam, com firmeza.
— Nesse exato momento — acrescentou Alex, de modo igualmente firme.
Matthew olhou para os irmãos. Os dois estavam em pé, um de cada lado da mesa, braços cruzados, dentes cerrados.
Matt suspirou e disse:
— Qual a questão aqui? Vamos almoçar ou tenho que decidir pelos dois?
— Está vendo? Eu disse que ele tinha um cérebro funcional — disse Alex, sorrindo para Cam.
— Vamos embora — sugeriu o irmão mais velho. Matthew pensou que talvez um pouco de exercício pudesse melhorar o humor dele. Porém, os irmãos pareciam preocupados. Matt voltara a suspirar e empurrou a cadeira para trás, perguntando:
— Como sabiam que eu estava ficando com fome? Todos foram a um bar. a algumas quadras dali. Era um lugar onde era possível comer um bom hambúrguer e beber uma cerveja. Os irmãos sentaram à mesa e fizeram os pedidos à garçonete.
Alex comentou sobre o tempo. Cam falou sobre o trânsito. Matthew não disse nada. Então, o irmão mais velho pigarreou e indagou:
— Então, como foi lá na Colômbia?
— Tudo bem.
Silêncio. A garçonete trouxe as cervejas. Cam ergueu uma sobrancelha para Alex, querendo dizer: Sua vez, camarada.
Alex pigarreou também e perguntou:
— Resolveu o que o velho queria?
Matthew levou o copo até os lábios e respondeu:
— Uh-huh.
Mais silêncio. Mais olhares entre Cam e Alex.
— Acho que sou o único que não recebeu um pedido de nosso estimado pai — comentou Alex.
— Dê um tempo — disse Cam.
— Sim. E, quando ele pedir, tome cuidado.
Sete palavras inteiras e seguidas, pensou Cam. Quase um recorde para o dia.
— Por quê?
— Porque você deve ser esperto e dizer: de jeito nenhum. Se precisar de algo, faça você mesmo.
— Olha, eu me dei bem. Quero dizer, se não tivesse dito “sim" ao que o velho pediu, não teria conhecido Salomé.
— Você acabou indo parar na UTI — comentou Matt.
— O que conta foi que encontrei a mulher que amo.
— Sim, a armadilha do amor... — Matt ergueu as mãos, pedindo desculpas, diante do repentino olhar de raiva do irmão mais velho, e disse:
— Desculpe. Fico contente que isso tenha acontecido com você. Adoro minha nova cunhada. Sabe disso. Mas não quer dizer que o a-m-o-r não seja besteira para noventa por cento das outras pessoas.
Outro longo olhar entre Alex e Cam.
— Estamos falando de uma mulher em particular? — perguntou Alex.
— Quem disse que estávamos falando de uma mulher?
— Bem, ninguém disse, mas você falou que o amor era...
— Sei o que disse. E não, não estamos falando de nenhuma mulher em particular.
— Bom, porque se estávamos...
— Pareço o tipo de idiota que se apaixonaria por uma mulher e a deixaria que me fizesse de tolo?
Sim, os dois irmãos pensaram. Olhando agora para Matthew, ambos podiam ver uma mistura volátil de emoções em seus olhos: raiva, dor, desespero e algo mais...
— Não. Mas, por outro lado, se você passou por uma situação que o chocou ou o ameaçou na Colômbia... Bem, você sabe, talvez queira falar sobre isso — disse Cam.
— Posso ter agido como um idiota, mas isso não significa que estou pronto para uma terapia em grupo — comentou Matt.
— Claro que não, mas...
— Acham que sou alguém que se encolheria em um sofá e se esquivaria dos próprios problemas?
— Não. Ainda assim...
— Ou talvez pensem que eu me interessaria por uma belezura que não conhecesse bem? Uma mulher que tentou traficar drogas? Que pertence a outro homem? É isso que acham? — Matthew bateu com um dos punhos na mesa.
E,.antes que os irmãos pudessem responder, Matt lhes contou toda a história. Tudo, desde o encontro com Hamilton até a caçada atrás de Mia, até descobrir que se apaixonara por ela e que fora enganado. No entanto, omitiu o fato de ter se apaixonado. Dissera que "se enrabichara".
Alex suspirou, aliviado, e comentou:
— Tudo bem. Tenho que lhe dizer, por um momento, você nos deixou preocupados.
— Não há nada com que se preocupar. Só não gosto de ser feito de palhaço — resmungou Matt.
— Sim, mas agora que nos contou a história, você vai ficar bem — disse Cam. Então, olhou ao redor e pediu outra rodada de cerveja.
— Tudo que tinha a fazer era trazer os detalhes à tona. Quero dizer, um cara se interessa por uma moça bonita que tem a moral de uma vadia...
Antes que Cam terminasse de falar, Matthew agarrou o irmão mais velho pelo colarinho e perguntou:
— O que ia dizer?
— Não faça nada que nós dois possamos lamentar — disse Cam, detendo os pulsos do irmão mais novo.
— Você fez um comentário sobre Mia. Quero ter certeza de que ouvi direito.
— Ei. Vamos lá. Relaxem. Matt, você disse algumas coisas que talvez tenhamos entendido errado. Cam, Matt está chateado. Todos podemos ver isso.
— Não estou chateado — disse Matthew por entre os dentes... Então, olhou para os irmãos, largou Cam e sentou-se, comentando:
— Deus, o que está acontecendo?
— Você está apaixonado — comentou Cam. Matthew acenou com a cabeça, concordando, e retrucou:
— E não é a coisa mais triste que você já ouviu?
— Bem... Talvez as coisas não sejam tão ruins quanto parecem. Talvez ela não seja... Talvez ela não fosse...
— Mia era. Que inferno, nem tentara negar as coisas que Hamilton disse. O coronel a chamou de ladra, de traficantes. Disse ainda que ela roubara informações secretas e que iria vendê-las, que me fizera de idiota...
— E ela não disse nada?
— Não mais do que meia dúzia de palavras até ir embora com Hamilton. Então, o que Mia disse não fazia sentido porque se referia a algo pessoal, algo sobre mim.
— O quê?
Matthew riu e explicou:
— Mia se referiu a essa tatuagem idiota que todos nós temos, acreditam nisso? E ainda entendeu errado. Ela disse algo como escolher a caveira e não a águia, o fim justifica os meios e... — O rapaz empalideceu e sussurrou: — Meu Deus!
— Matthew?
— Ela sabia que era o contrário. Conversamos sobre isso apenas algumas horas antes. Mia perguntou pela tatuagem e eu contei como discutimos se faríamos uma caveira ou uma águia. E como a águia tinha vencido, e ela sabia disso!
Cam e Alex se entreolharam, aturdidos.
— E? — perguntou Alex.
— E eu estava ocupado demais, com pena de mim mesmo, para compreender a mensagem — respondeu Matt.
— Sim, bem, explique, porque não entendemos também.
— Mia me ama — disse Matthew com convicção, e acrescentou: — Ela não é a mulher que Hamilton disse que era... E meu Deus, eu deixei aquele patife levá-la embora!
Matt se levantou, pegou algumas notas e deixou-as em cima da mesa. Já estava no meio do caminho rumo à porta quando os irmãos o alcançaram.
— Do que está falando? — indagou Cam.
— Vai nos contar o mistério?
— Não foi Mia quem me enganou, e sim Hamilton. E eu caí nessa armadilha, deixando que o coronel a levasse — Matt disse isso, correu para o meio-fio e chamou um táxi. — Só Deus sabe o que o coronel vai fazer com Mia, ou já fez — comentou o rapaz.
— Espere um minuto...
Matthew entrou no táxi. Era um veículo pequeno. Qualquer pessoa em sã consciência teria dito que três homens do tamanho dos Knight não caberiam no banco traseiro, mas todos couberam.
O Learjet que Matthew fretara para levá-lo de volta para casa permanecia no aeroporto. O piloto estava se aprontando para voltar à Colômbia.
— Sem problemas — o colombiano disse quando Matthew entrou em disparada no terminal particular da aeronave, gritando que queria fretar o Lear novamente.
Os irmãos foram junto. Matthew pegou o celular e discou um número que nunca esquecera. A mesma voz impassível do passado respondeu. O ex-agente disse o código. Segundos depois, falava com o homem conhecido como diretor. Quando a conversa terminou, a expressão dele era cruel.
— Patife! Eu deveria saber. Nada mudou. Preto é sempre branco e branco é sempre preto no mundo do Serviço Secreto.
— Mia não traficava drogas? — perguntou Alex.
— Ela era secretária, trabalhava para o Departamento de Defesa. Uma secretária! Mas não se importaram. Ficaram sabendo que Hamilton podia estar sujo, reviraram os arquivos e descobriram que Mia havia trabalhado para o coronel. Então, eles a chamaram e lhe disseram um monte de bobagens sobre a obrigação patriótica de desmascará-lo. Aí, mandaram-na a Cartagena para trabalhar como assistente pessoal de Hamilton.
— E ela conseguiu a prova que eles queriam.
— Sim. E ele o vira-casaca, o traficante. Mia conseguiu os nomes dos contatos. Foi por isso que ela fugiu e o motivo de o coronel querê-la de volta.
Cam esbravejou e comentou;
— Vamos levar umas cinco ou seis horas até chegar a Cartagena.
— Uma eternidade. Eu contei ao diretor o que estava acontecendo e ele disse ter o suficiente para atacar de surpresa a casa de Hamilton.
— E?
— Ele vai atacar... Mas não em menos de 24 horas. Disse que é o tempo de acionar o Serviço Secreto, o Departamento Antidrogas e a polícia colombiana.
— Isso demora muito.
— Aposto que sim. Não faço parte do Serviço Secreto, nem do Departamento Antidrogas, tampouco sou policial. Vou dar alguns telefonemas, arrumar algum equipamento — disse Matt.
Ninguém perguntou a que tipo de equipamento Matthew se referia. Os irmãos sabiam: armas, alicates de corte, material elétrico. Fosse o que fosse, ele iria colocá-los dentro da casa de Hamilton e tirar Mia de lá.
— Posso pegar Hamilton assim que pousarmos. Porém, quero que vocês voem de volta para casa. Ter os dois aqui comigo agora é maravilhoso, mas...
— Mas não quer que participemos da coisa boa — disse Alex para Cam.
— O que esperava? Matthew sempre foi egoísta. Nunca compartilharia coisas divertidas conosco — comentou Cam.
— Como o triciclo dele.
— Ou o trenzinho.
Alex e Cam olharam zangados para Matt. O irmão retribuiu o olhar. Então, todos os olhares brilharam de forma suspeita.
— Vocês são...
— Os melhores — completou Cam.
Os irmãos sorriram. Os sorrisos esmaeceram e transformaram-se em olhares de homens experientes, severos. Matthew esboçou um desenho da casa do coronel. Depois, ficou ocupado ao telefone. Cam e Alex arquitetaram um plano.
CAPÍTULO DOZE
Os irmãos disseram que, se ele continuasse na mesma velocidade, Matthew acabaria indo a pé para a Colômbia.
O caçula sabia que os irmãos estavam tentando amenizar a tensão, mas a única coisa que poderia acalmá-lo seria trazer Mia de volta. Lembrou-se da expressão dela na última vez em que a viu. E só de pensar que se afastara da moça quando esta mais precisara, o consumia.
Como havia acreditado em Hamilton? Devia ter imaginado a verdade, que Mia nunca teria feito as coisas das quais o coronel a acusava. Se ela estivesse morta...
Não pensaria nisso. Mia estava viva. Tinha de estar. Matt saberia se a moça não estivesse.
Deixaram um envelope para Matt no balcão de serviços do aeroporto. Dentro, um recibo de estacionamento e as chaves para uma caminhonete. E, no porta-luvas, outro envelope com um pedaço de papel, no qual um endereço fora escrito às pressas.
Matthew dirigia, pois conhecia as ruas de Cartagena melhor do que os irmãos. Momentos depois, parava do lado de fora de uma casa caindo aos pedaços, em uma das favelas mais perigosas da cidade. Um homem os deixou entrar, alguém que o ex-agente conhecera anos atrás. Não se cumprimentavam pelos nomes, apenas diziam "amigo".
— Não me disse muita coisa. Consegui o que foi possível — explicou o homem em inglês.
Sub-metralhadoras Uzis. Pistolas Walthers. Pistolas automáticas Berettas. Pequenos aparelhos de comunicação. Um par de alicates de corte. Meia dúzia de outras ferramentas, um pequeno frasco de comprimidos para dormir e meio quilo de carne cortada em pedaços. Jeans, suéteres de gola alta, máscaras e tênis para os três Knight. Tudo na cor preta.
Aquilo serviria. Matthew e os irmãos esvaziaram as carteiras. Porém, claro, o dinheiro não era suficiente. O homem pegou a pilha de notas, sorriu e guardou tudo, dizendo:
— Seu crédito é bom, amigo.
Era uma velha piada entre eles, baseada em anúncios pendurados nas vitrines de lojas baratas em Cartagena, assim como em algumas lojas em Dallas. Mas o melhor que Matthew conseguia era um aceno com a cabeça.
— Obrigado, amigo.
Finalmente, os três estavam na estrada que os conduziria até a casa de Hamilton.
O plano era simples. Estacionariam a uns oitocentos metros da casa e esperariam até a meia-noite. Atrairiam o cachorro e, pelo portão, jogariam pedaços de carne com as pílulas para dormir. Escalariam o muro, cortariam o arame farpado... E, aí, fariam o que tivessem de fazer.
As cinco para meia-noite, os três deixaram a caminhonete e se aproximaram da muralha da casa, arrastando-se pelo terreno enorme e vazio que ficava junto à propriedade. Quando chegaram aos muros, Cam assobiou. Imediatamente, ouviram ruído, de patas de animal.
— Um cachorro. Grande. Um rottweiller, talvez, ou um pastor alemão — sussurrou Alex.
Cam acenou com a cabeça, concordando, e esperou até que o cachorro estivesse perto do muro. Então, arremessou a isca. Os três ouviram o barulho do cão cheirando, depois, mastigando. Então, escutaram o animal deitando, seguido pelo ronco inconfundível.
— Vamos entrar — sussurrou Matthew. Escalaram o muro. Cortaram o arame farpado.
Caíram na grama suave, do outro lado, sem fazer barulho. Sinais com as mãos eram tudo do que precisavam para se comunicar. Haviam trabalhado muitas vezes juntos no passado. Cada um sabia muito bem o que o outro pensava.
Havia cerca de meia dúzia de veículos estacionados em frente à casa. Matthew esperava que todos estivessem dormindo àquela hora, mas parecia que havia uma reunião ali. Isso dificultava as coisas, mas também significava que podiam pegar muitos peixes, isto é, muita gente envolvida com o cartel.
Matthew bloqueou a mente em relação a pensamentos sobre Mia. Se pensasse nela, sabia que seria incapaz de trabalhar.
Os irmãos se moveram a um sinal dele. Escalaram as paredes da casa. Entraram por uma janela no segundo andar. Checaram todos os quartos, encontrando-os vazios. Começaram a descer furtivamente pelas escadas de serviço, rumo à cozinha.
Com uma das mãos, Alex tampou a boca da cozinheira. Depois, com fita adesiva. Com cordas, Cam amarrou-lhe as mãos e os pés. E sussurrou que não iriam machucá-la se ela se comportasse.
Os três chegaram à copa. Ouviram à porta que dava para a sala de jantar, onde pessoas ceavam. Ouviram ao menos meia dúzia de vozes, muitas risadas, piadas obscenas.
Matthew reconheceu a voz de Hamilton... E outra. Sentiu a pele formigar. Era a voz do homem que fugira depois de matar Alita, a voz que ouvira em seus pesadelos durante todos aqueles anos. Matt respirou fundo e fez um sinal para os irmãos. Armados, os Knight invadiram a sala de jantar.
Seis homens sentados à mesa de jantar. Seis seguranças em pé, encostados em uma parede. A surpresa foi total. Então, um dos seguranças agarrou Matt pela cintura. Foram segundos que pareceram horas, como sempre ocorria em momentos como aquele.
Quando tudo acabou, três seguranças mortos e três feridos. Dos homens à mesa, dois estavam deitados no chão, imóveis. Os outros quatro permaneciam sentados, pálidos.
De fato, todos eram peixes grandes. Juan Maria-Rosario, o chefe do cartel. Coronel Douglas Hamilton, um dos maiores distribuidores norte-americanos de cocaína. E o desconhecido que escapara de Matthew após a morte de Alita. O homem olhou para Matt e empalideceu.
— Você? — perguntou ele. Matthew sorriu e respondeu:
— Eu.
O homem se afastou da mesa, dizendo:
— Ouça. Não foi nada pessoal. Relaxe, tudo bem? Vamos conversar...
Na última palavra, ele pulou da cadeira com uma automática em uma das mãos. Mas Matthew foi mais rápido. O americano disparou e o assassino de Alita caiu morto.
Matt olhou para o corpo. Para você, Alita, o ex-agente pensou, e sentiu um peso sair do coração.
Enquanto Cam falava ao celular com o diretor e Alex amarrava os prisioneiros, Matthew encaminhou-se para o coronel. Agarrou-o pela camisa e o jogou ao chão.
— Onde ela está?
Hamilton estava pálido de medo.
— Não me mate. Tudo isso é um eq...
— Onde ela está?
— Não sei.
Matt apertou o pescoço do coronel, dizendo:
— Pela última vez, patife. Onde está Mia? Os irmãos o afastaram.
— Você vai matá-lo, o mundo vai se livrar dele... Mas não encontrará Mia — alertou-o Cam.
— Onde está Mia? — grunhiu Matt.
— Não sei — respondeu o coronel.
— Mentiroso!
— É verdade. Ela não está aqui. Procure pela casa. Aquilo era verdade. Os três haviam procurado no andar superior da casa. Agora, Alex entrava na sala de jantar e balançava a cabeça. Mia também não estava no térreo.
— Ela está morta. Você a levou para a selva e... — disse Matthew.
— Não fiz isso. Mia foi embora. Não quis ficar comigo.
— O quê?
— Ela veio para casa comigo, mas mudou de...
— Mentiroso! Ela não veio com você. Você a forçou.
— Sabe como ela é. Mia joga. Ela...
O coronel gritou quando Matt pressionou-lhe o pomo-de-adão.
— Ela estava trabalhando para o Serviço Secreto — disse Knight.
— Sim, estava. Mas mudou de lado. Eu lhe disse isso — retrucou Hamilton.
Matthew fitou o rosto vermelho do coronel... Como seria fácil matá-lo. Só mais um pouco de pressão...
— Acha que eu mentiria para você agora? Quando minha vida está em jogo? Ela me deixou. Juro, é verdade.
— E a lista de agentes secretos que você disse que ela roubou? Suponho que Mia tenha entregado a você antes de partir.
— Claro! Ela sabia que não tinha escolha se quisesse que eu não dissesse nada.
Matthew o pressionou ainda mais. Hamilton balbuciou. Isso não podia ser verdade. Não com relação a Mia... E ainda assim... Ela o deixara sem protestara
Sim, ela invertera a idéia das tatuagens, mas e daí? Não era como se tivesse interpretado de forma errada a teoria da evolução.
— Matt?
Mas e o que ela dissera sobre o fim justificar os meios...
— Matt!
O rapaz olhou para os irmãos, um de cada lado dele.
— Ò Serviço Secreto pode conseguir tirar muita coisa de Hamilton. Acabe com o coronel e o que ele sabe sobre o cartel morre junto — explicou Cam.
Treinamento. Disciplina. O código de honra pelo qual Matthew vivia foi mais forte. Ele soltou as mãos que estavam presas à garganta de Hamilton e recuou.
— Vou encontrá-la — avisou Matt a todos.
— Bom. Apenas espere o pessoal do Serviço Secreto chegar para fazer a limpeza e iremos com você.
Matthew balançou a cabeça negativamente e disse:
— Vou sozinho.
— Espere por nós. Nem mesmo sabe por onde começar a procurar.
— Vou sozinho. É assim que tem que ser.
Os Knight esperaram pelo pessoal do Serviço Secreto, que faria a limpeza. Eles cuidariam de tudo, como sempre faziam.
Uma hora mais tarde, Matthew saiu da casa do coronel com os irmãos. Cam esfregou o rosto e bocejou, dizendo:
— O que preciso é de um bife, um bule de café... E um avião para me levar de volta para casa.
Alex acenou com a cabeça, concordando, e disse:
— O mesmo para mim. Ambos olharam para Matthew.
— O que preciso é de algumas respostas — disse o irmão caçula.
— Matt, às vezes, uma coisa não sai do jeito que se espera, entende? — comentou Cam.
— Tenho que saber a verdade.
— Quer dizer, se ela está morta...
— Não está. Eu saberia se estivesse — disse Mat.
— Então, o que Hamilton disse sobre Mia ir com ele de bom grado... — comentou Alex.
— Sei o que o coronel disse.
— Mas não acredita nisso.
— Não quero acreditar.
— Sim, mas não é a mesma coisa — suspiro Cam.
— Não é. Os irmãos ficaram em silêncio. Então, Alex falo
— Mia tem o número do seu telefone celular Quero dizer, se ela tem e não entrou em contato...
— Ela não tem o número. Mas sabe meu nome que sou de Dallas.
As conclusões eram claras. Se Mia quisesse contatá-lo, podia ter feito isso.
— Nesse caso, venha para casa conosco. Desista. Não dê mais valor a essa história.
— É isso que fariam? — indagou Matthew.
O silêncio era a resposta da qual precisava. Então abraçando os irmãos, Matt disse:
— Vamos lá. Vou comprar os bifes, colocá-los em um avião...
— Escute o que ele está dizendo. Conversa fiada de um homem que gastou o último dólar comprando brinquedos de um bandido chamado amigo — comentou Alex.
— Não é bandido. E tenho um cartão de crédito.
— Sim. Promessas...
Os irmãos riram e passaram as horas seguintes juntos. Todos evitavam qualquer discussão acerca de Mia Palmieri. No aeroporto, os sorrisos esmaeceram.
— Tome cuidado — disse Alex.
— Se as coisas complicarem, por favor, nos chame — pediu Cam.
Matthew disse que faria isso e os irmãos embarcaram no Learjet. Então, entrou na caminhonete e começou a dirigir pela mesma estrada que tomara antes e que o conduziria até Mia.
Matt estava certo disso. Se Hamilton lhe dissera a verdade, se Mia tinha ido embora, ela desejaria ir para algum lugar seguro onde pudesse planejar os próximos passos sem ter de se preocupar com o cartel, ou com Hamilton, ou com as autoridades.
Mia teria medo de tentar voltar para os Estados Unidos. Por tudo o que sabia, o coronel ou o governo a teriam impedido. Tinha de haver um paraíso seguro, um lugar aonde Hamilton não pensaria que a jovem pudesse ir, um lugar cuja existência as autoridades desconhecessem.
Eu me sinto tão segura aqui, Mia dissera sobre a casa dele em Cachalu. E estaria segura. Era esperta.
Deveria imaginar que Hamilton pensaria que aquele lugar seria o último onde poderia procurá-la, presumindo que o coronel a procurasse. Por que ele pensa ria que ela retornaria ao local onde fora encontrada da primeira vez?
Mia devia imaginar também que Matthew tinha voltado para os Estados Unidos. O ex-agente fizera serviço, encontrando-a. De qualquer forma, era fácil checar isso. Bastavam alguns telefonemas para a casa dele, para o escritório em Dallas.
Matt sabia onde Mia estava — nas montanhas. Tinha esse pressentimento, o de um comanche, alguém ainda ligado às antigas tradições.
Mia estava na Terra do Céu. E, em breve, estaria também. Seguiria direto para lá. Se os irmãos estivessem ali com ele, ambos diriam que Matt estava exausto. Mas quem precisava dormir quando corria com a adrenalina a mil?
Encontraria Mia e faria algumas perguntas. E se ela não tivesse as respostas... Agarrou o volante ainda com mais força. Não pensaria nisso agora.
Estava completamente escuro quando o ex-agente saiu da estrada principal e tomou a trilha em direção à casa. Nenhuma luz nas janelas. A primeira dúvida pairou na mente de Matthew. Talvez Mia não estivesse ali... Não. Ela estava. Tinha de estar. Ele sabia disso.
Apagou os faróis. Dirigiu um pouco mais. Então estacionou e saiu da caminhonete. O resto do percurso, cerca de oitocentos metros, faria a pé. Estava vestido para isso, ainda com a roupa preta que usara no ataque à casa de Hamilton, em Cartagena.
Algo voou e passou pelo rosto de Matt. Sentiu o toque das asas contra os próprios cabelos. Apenas as criaturas da noite estavam ali fora agora. Era a hora de os predadores famintos atacarem sorrateiramente suas presas.
O coração de Knight batia acelerado. A respiração parecia superficial. Era assim que sempre se sentia em ataques noturnos, a excitação pulsando por todo o corpo, cada sentido em alerta.
Matt subiu as escadas sem fazer barulho. Então, colocou a chave na porta e a abriu. E, rapidamente, digitou o código de segurança.
Havia uma lanterna na mesa da biblioteca. Knight a acendeu, mantendo a intensidade fraca, mas não viu nenhum sinal de Mia. Espere. Havia um sinal. O perfume dela estava ali. O aroma que sempre o fazia lembrar-se de um campo de flores brancas. Mas ela não estava na casa. Ele checou todos os quartos.
Então, Matt entendeu. Não era a casa o local onde Mia se sentia segura. Era a clareira da floresta, o lugar onde fizeram amor tantas vezes, onde ele compreendera que a amava, ou que pensara que a amava...
Matt apagou a lanterna, foi até o deck, desceu as escadas e tomou a trilha por entre as árvores. Logo, veria Mia. E lhe perguntaria pela verdade. Então, se fosse preciso, terminaria com aquela história de uma vez por todas.
CAPÍTULO TREZE
No alto das montanhas da Colômbia
A floresta era sombria.
O único som era o ruído da cachoeira. A lua havia nascido: um globo opulento, de marfim, que parecia suspenso sobre os galhos frondosos das árvores. A luz da lua iluminava a clareira e a piscina natural. Iluminava Mia, nua sob o véu líquido espumante da cachoeira.
Ele permanecia perto da clareira, observando-a e procurando bem fundo dentro de si a disciplina por meio da qual regrara sua vida. Mas esse era o problema. Não tinha disciplina quando o assunto era aquela mulher. Procurara por Mia e a encontrara. Depois, ele a perdera.
Agora, a capturara. Mia era dele... não, não era. Ela deixara isso claro. O abandonara por causa de outro. Um homem que a quisera de volta mesmo depois de ter dito que a moça o traíra.
Então, por que iria querê-la? Matthew questionara isso no início. Era uma pergunta honesta. Entendia que a mulher era bonita — o homem lhe mostrara uma fotografia dela. Porém, o mundo estava repleto de mulheres belas. O que fazia com que essa fosse tão especial?
O homem ficara embaraçado. Soltara uma risadinha e dissera que a queria de volta porque Mia era mais do que bonita. Era tudo que um homem poderia querer.
Matthew sentiu o corpo agitar-se. Não era verdade. Mia não era tudo que um homem poderia querer. Era mais. Sabia disso agora porque, por um momento, a moça lhe pertencera. Ela era a reencarnação de Eva, Jezebel, Lilith. Podia ser mais impetuosa do que os relâmpagos de verão que riscavam o céu quente ou tão suave e gentil como a chuva de primavera.
Bastava observá-la para atiçar a alma de um homem. O rosto era oval, os olhos, escuros e negros, acima de um nariz aristocrático e uma boca feita para o pecado. Os cabelos eram longos e escuros como o café, caindo pelas costas em cachos que imploravam pelo toque de Matthew.
Mia era alta e esbelta, mas os seios eram bem arredondados e fartos. O rapaz ficou com a respiração alterada só de pensar em tocá-los.
E as pernas... as pernas dela eram próprias para se enrascarem na cintura de um homem. Matthew ainda podia se lembrar de senti-las quando acariciou-lhe as coxas e mergulhou fundo naquele calor.
Matthew estremeceu. Deus, estava perdendo a cabeça? Quem era Mia Palmieri? O que ela era? Era a mulher dele ou de Hamilton? Será que tudo fora um jogo?
Tudo que Matthew sabia agora era que aquela mulher era uma tentação. Entretanto, ele era um guerreiro.
Mia girou na direção dele. Matthew manteve-se firme. Ela não podia vê-lo. Ele permanecia vestido de preto, o tipo de roupa que usava em manobras noturnas nas Forças Especiais e, depois, no Serviço Secreto. Sabia que, assim, se misturava às sombras da floresta.
Será que, de alguma forma, a moça sentiu a presença dele? E por isso inclinava a cabeça para trás, erguendo o rosto para a cortina d' água? Por que levantava as mãos, levando-as aos seios como se estivesse oferecendo a si mesma aos deuses?
Oferecendo-se a Matthew? Estava duro como uma rocha. Tão duro que machucava. Uma vez, prometera levá-la de volta ao homem que o mandara ali para encontrá-la. Hoje à noite, a única promessa era a si mesmo.
Lentamente, Matthew caminhou em direção à área iluminada pela luz da lua que cobria a pequena clareira. O rapaz esperou, os músculos tensos, desejando que a moça voltasse a olhar na direção dele. Por quê? Por que não apenas gritar e deixar que a jovem soubesse que ele estava ali?
A resposta foi um sussurro frio na cabeça do rapaz. Matthew queria ver o que a srta. Palmieri faria quando o avistasse. Será que correria na direção dele? Será que se jogaria naqueles braços másculos? Se fizesse isso... Deus, se Mia fizesse isso...
Mas não fez. A reação dela foi como um soco no estômago. Mia abriu bem os olhos. Os lábios se entreabriram em uma pequena exclamação de surpresa. Lançou um dos braços sobre os seios e o outro sobre o delta feminino, em um antigo gesto de timidez.
Matthew sabia muito bem que aquilo era um simples reflexo e nada mais, sabia que tinha todas as respostas necessárias... As respostas que não queria reconhecer.
— Não — Mia disse.
Ele não podia ouvir aquela palavra, mas conseguia ver a boca da jovem formando-a.
— Não — Mia voltou a dizer, e Matthew sentiu uma torrente de adrenalina percorrer-lhe o corpo.
Ele esboçou um sorriso típico de predador. Então, descalçou os tênis, tirou a camisa, puxando-a pela cabeça, abriu o zíper das calças e livrou-se delas. Em seguida, Matthew permaneceu parado, deixando que Mia visse o tamanho de sua excitação. Então, mergulhou na piscina da selva sombria e foi a seu encontro.
Mia trilhara o caminho até a piscina com todos os sentidos em alerta. Havia animais que caçavam por ali à noite. Mas estava sozinha. Sozinha para o resto da vida, pensava... E, então, de repente, sentiu uma presença humana.
Matthew, Mia pensou, o coração pulou, mesmo sabendo que isso seria impossível. Knight tinha ido embora. E ela voltara à casa dele porque era o único lugar , onde estaria segura. Douglas nunca pensaria em procurá-la no mesmo local onde já a encontrara uma vez.
Mia rezara para que Matthew ainda estivesse lá, embora soubesse que não. A casa estava vazia. Ainda assim, havia indícios do ex-agente por ali. Na cozinha, uma xícara de café na pia. No quarto, o cheiro dele no travesseiro.
Dormira ali, na cama de Knight, segurando o travesseiro. Uma noite se passara. Um dia. Então, nesse entardecer, Mia sentira algo. Uma fenda no tempo e no espaço. O que quer que fosse, isso a arrastou até ali, até a piscina iluminada pela lua, o lugar onde ela e Matthew haviam feito amor.
Agora, tinha a sensação de estar sendo observada. Será que Douglas a havia encontrado? Então, uma figura saída das sombras se materializou. Matthew.
A alegria inundou seu coração. O homem que amava estava ali. Mas, quando viu o rosto dele, tão frio, feroz, soube que ele ainda acreditava em todas as mentiras de Douglas.
— Não — disse Mia, e como se Matt a tivesse escutado, os lábios dele esboçaram um sorriso frio. Era um sorriso que se aplicava ao que Douglas lhe dissera sobre o ex-agente.
— Seu amante é um assassino. O sr. Knight tem sangue nas mãos — comentara o coronel.
Matt não era um assassino. Era gentil, adorável e... Oh, Deus! Atônita, o via despir-se. O rosto esculpido. O corpo poderoso, excitado.
Mia começou a tremer. Não havia nada sutil na mensagem. Matt queria que ela o visse naquele estado masculino primitivo, selvagem, antes de se vingar dela.
Matthew mergulhou na piscina. Mia virou-se, subiu nas pedras e começou a correr.
Mia corria. Matthew saiu da água. Bom. Queria que ela tivesse medo. Queria que a jovem soubesse como era ter medo da punição dele.
Nada o deteria. Fora treinado para correr até que a presa caísse. Agora, Matt estava atrás dela. Movia-se rápida e silenciosamente, evitando os galhos das árvores.
E lá estava Mia. Apressou o passo, diminuiu a distância entre ambos, pegou-a nos braços e a virou. Ela estava ofegante; os cabelos, emaranhados. E Matt disse a si mesmo que a alegria que sentia era apenas a de um caçador quando agarrava a presa.
— Olá, Mia.
— Matthew. O que quer que pense...
— O que quer que eu pense é errado. Não era isso que ia dizer?
— Sim. Sei o que Douglas disse. Mas...
— Mas Hamilton mentiu.
— Sim. O coronel e eu nunca tivemos nenhum envolvimento. Como eu poderia ter dormido com um homem a quem desprezo?
— Talvez da mesma forma que dormiu comigo. Como se tudo fizesse parte de um jogo que você tivesse que ganhar.
— Eu estava jogando com Douglas, não com você.
— Então, por que não me contou a verdade? Tudo que tinha que dizer era: "Matthew, estou fugindo porque trabalho para o Serviço Secreto. Fui enviada a Cartagena para espionar Douglas Hamilton. É por isso que o coronel me quer de volta. Sou uma espiã."
— Como poderia lhe contar isso? Não o conhecia. Não sabia nada sobre você, exceto que estava trabalhando para Douglas.
— Eu disse que não estava.
— Mas estava. Douglas lhe pediu para que me encontrasse e me levasse de volta para ele, e era o que estava fazendo. Como poderia confiar em você e contar a verdade sobre mim?
— Posso aceitar isso. Mas depois as coisas mudaram entre nós. Um homem espera que uma mulher seja sincera depois de ele tran...
Mia conseguiu soltar as mãos e deu um tapa em Matt, dizendo:
— Nem ouse falar dessa forma. Fizemos amor. Sabe disso.
As lágrimas rolaram pelo rosto da jovem. Melhor deixá-la chorar, Matthew pensou. Isso não mudaria nada.
No entanto, tudo havia mudado. Os soluços dela eram sofridos. Knight já tinha visto mulheres chorarem, mas nunca assim. Se aquilo era uma encenação, Mia merecia o Prêmio da Academia. A bela, corajosa, incrível Mia.
— Não chore — disse Matt.
— Odeio você.
— Assim como odeia Hamilton.
— O que quer? A verdade ou as mentiras que o coronel lhe contou?
— Estou ouvindo.
— Fui secretária dele alguns anos atrás, quando Douglas servia em Washington. O Serviço Secreto desconfiou que ele havia mudado de lado, mas precisava de provas. Como eu o conhecia, eles me pediram para ir para a Colômbia como...
— Assistente pessoal do coronel. Conheço a história. E aí você viu uma forma fácil de ganhar muito dinheiro. Traficar drogas...
— Não!
— E podia quebrar a promessa que fizera ao Serviço Secreto e ao pessoal do Departamento Antidrogas.
— Não! Realmente acha que eu poderia fazer isso? Matthew a fitou. Sentiu a quentura suave dela em seus braços. Algo dentro dele parecia se esfacelar. Era o muro que havia construído ao redor do próprio coração, Knight pensava. Depois, abraçou-a com mais força e respondeu, sussurrando:
— Não, querida, sei que não.
— Matthew...
Mia ergueu o rosto e ele a beijou apaixonadamente, saboreando não apenas a doçura da boca daquela mulher, mas a bondade inata daquela alma.
— Conte-me tudo, querida — murmurou Matt.
E Mia lhe contou, como Hamilton a havia encontrado por acaso vasculhando os arquivos dele. E como o coronel armou para que parecesse que a moça havia tentado traficar drogas.
— Douglas me ameaçou. Ele disse que me deixaria trancada em uma prisão colombiana antes mesmo que eu pensasse em contatar alguém, a menos que eu voltasse e lhes dissesse que estavam errados em relação a ele. E disse que a única forma de eu garantir que me comportaria seria dormindo com ele.
Matthew ficou furioso. Hamilton, seu patife, eu devia tê-lo matado.
— Eu disse que sim, mas implorei que me desse algum tempo. Na manhã seguinte, fui ao seu computador e encontrei uma listagem com todos os contatos no cartel e na embaixada...
— Na embaixada também?
— Sim, foi por isso que não enviei a listagem para Bogotá. Não sabia em quem confiar. Então, copiei a listagem para um minidisco compacto e fui embora.
— Sem um destino em mente?
— Tudo que eu sabia é que tinha de ir embora com aquela listagem. Escondi o CD em meu estojo de maquiagem.
— Isso é brilhante — comentou Matt.
— Só quero saber o que vão pensar no Serviço Secreto quando o estojo de maquiagem chegar.
— Você o enviou para o Serviço Secreto?
— Sim. Ontem. Evalina veio aqui. Pensava que você ainda estava aqui, mas... Bem, perguntei se ela sabia onde havia uma agência FedEx.
— E?
— E ela me disse que havia uma na cidade vizinha, que o marido dela passava por lá todos os dias quando ia para o trabalho. Então, coloquei o estojo de maquiagem em um envelope que encontrei em sua escrivaninha. Espero que não se importe.
— Claro que não.
— O marido dela o enviou para mim. Evalina me trouxe o recibo esta manhã.
Matthew lhe deu um beijo longo e profundo.
— Você é uma mulher surpreendente, Mia Palmieri.
Ele apertou o abraço da jovem e disse:
— Vamos voltar para a casa. Vou acender a lareira. Você poderá me contar o resto da história quando estiver aquecida novamente.
— Estou bem — protestou Mia. Porém, ele sabia que não estava. Ela tremia; a pele estava fria e úmida.
Mia estava a um passo de entrar em choque térmico. E Matt sabia, sem sombra de dúvida, que, se perdesse aquela mulher, sua vida não teria significado algum. Matthew a pegou no colo e a carregou até a casa. Enrolou-a em um cobertor, vestiu calça de moletom e acendeu o fogo na lareira. Então, serviu um pouco de conhaque para ambos e puxou-a para perto dele.
— Quase enlouqueci quando você deixou que Hamilton a levasse embora.
— Não tive escolha.
— O coronel a ameaçou?
— Sim.
— O patife disse que a machucaria a menos que fosse com ele?
— Não. Douglas disse que mataria você, que havia outros homens, escondidos, e que iriam matá-lo se eu não...
Matthew xingou, puxou-a e a beijou novamente. Ela era a mulher mais corajosa que jamais conhecera. Mia teria sacrificado a própria liberdade, a própria vida, por ele. Isso era um presente inesperado.
— Mas escapei.
— Como? Mia riu.
— Ah, você foi surpreendentemente astuta — disse Matt.
— Surpreendentemente desonesta, você quer dizer. Estávamos no carro há uma meia hora. Eu estava desesperada. Sabe, havia um menino que morava na casa ao lado, quando eu tinha talvez 6 ou 7 anos...
— Não me diga. Ele é meu rival?
— Ele era meu melhor amigo. Eu queria fazer tudo que ele fazia. Então, ele me ensinou algumas coisas.
— Que coisas? — Matthew começou a sentir-se agitado, excitado. O desejo que sentia por Mia havia sido sufocado pela angústia da história dela. Mas agora, com a jovem segura, ali em seus braços, o desejo que sempre sentira por ela voltava. E Mia sabia disso também.
— Matthew. Não quer ouvir como escapei? — perguntou. Porém, mexia-se no colo dele, excitando-o.
— Sim, claro.
— Bem, esse garoto que era meu vizinho...
— Mia. Fique quieta.
— Por quê? — perguntou Mia em tom de inocência. Então, riu e o beijou, dizendo: — Tudo bem. Serei boazinha, por algum tempo.
— O que tem seu vizinho? O que ele lhe ensinou?
— Coisas importantes: como pegar vaga-lumes, como fazer bombas d'água.
— Um cara como eu.
— E me ensinou a arrotar.
— Ele o quê?
— Ele me ensinou a arrotar. Você sabe, você engole um pouco de ar e então...
— Sim, sei. — Matt beijou-lhe a ponta do nariz. Como vivera até ali sem aquela mulher ao lado dele? — Então, o que isso tem a ver com o fato de você ter fugido de Hamilton?
— Bem, estávamos no carro de Douglas, na parte traseira. E eu estava desesperada. Então, engoli ar. Muito ar. Depois, soltei um arroto enorme, nojento, e um som de alguém que está com náuseas. Aí, eu disse: Oh, meu Deus, Douglas, tenho que vomitar!
— Você não fez isso.
— Douglas não suporta nada sujo. Ele mandou o motorista sair da estrada. Estávamos passando por uma que corta essas cidadezinhas, sabe?
— E?
— Saí do carro. E fiz alguns barulhos horrendos. Douglas virou as costas e se afastou, e eu corri.
— Correu? Até a cidadezinha? Por todas as vielas no escuro?
— Não tinha escolha. Levei algumas horas. Mas, finalmente, cheguei aqui. Entretanto, você já tinha ido embora. Rezei para que voltasse, mas...
Matthew a silenciou com um beijo, e disse:
— Mia? Lembra-se da última noite em que estivemos juntos? Eu disse que queria falar com você.
— E eu disse a mesma coisa. Eu ia lhe contar a verdade, que eu trabalhava para o Serviço Secreto e que estava espionando Douglas. Porque aí, então, eu já confiava em você.
— Eu também. Era isso que eu queria lhe dizer naquela noite. Eu amo você.
— Eu o amo também — disse a moça e o beijou.
— Quer se casar comigo, Mia Palmieri?
— Sim, meu amor.
Um beijo demorado. Mia estremeceu e deixou que o cobertor caísse. Matt a tomou nos braços, carregou-a até o tapete em frente à lareira e deitou-se ali com ela.
— Você é linda. E corajosa. E minha, para sempre — disse Matt.
— Sua, para sempre — suspirou e abriu o coração e os braços para o homem a quem adorava.
Sandra Marton
O melhor da literatura para todos os gostos e idades