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Series & Trilogias Literarias
Saio do barulho da festa e atendo a ligação colocando o fone via bluetooth em meu ouvido.
- Estou ouvindo - falo e fico em silêncio escutando tudo atentamente - Sim, o mais importante é que tudo está acontecendo como planejamos e agora é só uma questão de tempo.
Ouço mais. Viro-me em direção à porta de vidro e observo parte da festa.
- Claro, agora vamos até o fim - falo e desligo.
Tiro meu fone do ouvido e o guardo no bolso interno do meu smoking.
Volto para a festa com um sorriso no rosto, afinal de contas, mais um amigo acaba de se casar e o melhor de tudo: estou cada vez mais perto do que quero... cada vez mais perto...
1
Giovani
Isso! Tire seu vestido. Não que esse tom de rosa não combine com seu corpo curvilíneo e moreno, mas é que ele, literalmente, está atrapalhando a minha visão. Ver seus seios, fartos, e o movimento de seu corpo vindo em minha direção me deixa habilmente pronto.
A peça desliza pelo seu corpo enquanto caminha e quando o tecido toca o chão, o movimento de levantar sutilmente cada uma das pernas me convida a apreciar seu sexo. Vamos foder, não haverá nenhum tipo de envolvimento emocional e, possivelmente, esquecerei tudo isso assim que vestir as minhas calças.
A sala que faz recepção para os quartos é sofisticada como tudo por aqui. Uma grande televisão desligada está na parede e as luzes favorecem o meu deleite sobre o corpo quase nu que caminha em minha direção. Escuto, I Follow Rivers e essa não seria a minha escolha. Na realidade, isso que estou prestes a fazer não precisa de trilha sonora, será breve e não ocupará espaço em meu HD.
Seus olhos estão em meu corpo, mais precisamente na região em que a espera; não me lembro o seu nome, mas seu sorriso é bonito. Não, não foi o seu sorriso que me trouxe até aqui, estou aqui pelo que está abaixo de sua boca, direcionado ao que está abaixo do pescoço. Muito abaixo.
Estou sentado no meio de um sofá longo, branco, e meus braços estão apoiados no encosto. Não quero ter muito trabalho esta noite, e tenho outros planos.
Ela retira a calcinha e deixa que caia escorregando por suas pernas, chegando ao chão. Seus passos ficam mais lentos e eu olho para o encontro de suas pernas, analiso o caminho de pelos ralos, bem aparados; ela saiu para caçar e isso faz de mim, apenas nesse único minuto, sua presa.
Agora, ela para diante de mim e se inclina na tentativa de beijar a minha boca, desvio e saio do sofá, apoiando onde meus braços estavam, ela está de quatro.
- Fique assim - falo e pego um preservativo no bolso da minha calça que está no braço do sofá.
- Não vamos brincar um pouco antes? - ela pergunta, e antes de responder, minha cabeça já recusa.
- Já estamos brincando - falo e assim que termino de desenrolar o preservativo em meu pau, enterro, segurando seus cabelos para que ela não se afaste e eu sinta seu limite.
- Hummmm - ela solta um gemido e eu estou sorrindo. Olho para o relógio e sei que tenho pouco tempo, quinze minutos, então, minha querida morena, nosso ato será breve e obviamente não lhe oferecerei tudo que posso.
Enterro repetidas vezes até que saio dela e a viro para mim. Deito-a no sofá e, dentro dela, coloco meu pau atingindo seu limite e me convidando a abreviar tudo isso. É exatamente isso, preciso que ela goze para que eu possa fazer o mesmo e ir embora.
Percebo seu corpo se entregando e ela novamente tenta beijar a minha boca.
- Não, baby - falo e aproximo minha boca de sua orelha - Não estamos aqui para um encontro juvenil - entro mais forte e ela goza. Isso me deixa livre para fazer o mesmo. Termino e não demoro para me levantar e sair dela.
Ela observa os meus passos indo em direção ao banheiro, onde dispenso a camisinha e volto já colocando a minha roupa sob seus olhos repreensores.
- Você já vai? - ela pergunta surpresa.
- Sim, preciso buscar minha esposa no aeroporto - respondo e vejo a morena se levantar em um único salto.
- Você é casado?
- Sim - respondo e calço meus sapatênis.
- Por que não me disse isso antes? - ajeito meu cabelo e paro na frente dela olhando para os seus seios.
- Porque não perguntou e, agora, não vamos fingir que existe qualquer tipo de culpa por aqui - beijo sua face e ela está indignada - Mas saiba que você é algo que valeu a pena o risco - confiro meus bolsos e sinto minha carteira, meus celulares e meu comunicador auricular.
- Isso não é certo - ela diz e eu caminho até a porta, colocando a mão na maçaneta.
- Eu nunca disse que era - respondo e saio batendo a porta em minhas costas e colocando o comunicador em meu ouvido.
Assim que me aproximo do elevador e entro, escuto a voz em meu ouvido:
- Me largou esperando para trepar, Makenzie - gargalho e escuto a voz do cara que me chama assim desde que nos conhecemos - E da próxima vez, desligue o comunicador para eu não ter que escutar os gemidos - acompanho a gargalhada dele com a minha - Você já sabe o que precisa fazer antes de chegar no cassino - ele me alerta e eu conheço nosso plano. É o de sempre, só que desta vez eu tenho que ser rápido - E que história é essa? Agora finge que é casado ou realmente alguém existe ao ponto de ganhar essa patente? Não se esqueça, meu amigo, eu já tive algumas experiências com o matrimônio e realmente não acredito nessa instituição, foi a época em que mais fiquei sem sexo na vida - saio do elevador disfarçando a risada e caminho para fora do hotel MGM.
- Quais são as minhas chances no Bellagio? - pergunto.
- São boas para eles, e para você...eu não acredito muito, mas dependendo da aposta e de sua rapidez, pode ser que não seja pego - ele provoca - Vai ter que controlar seu impulso em querer acabar logo e sair com um par de milhões no bolso, mas você sabe que não pode entrar lá com essa cara, porque foi com ela que te pegaram contando cartas algumas vezes - ele me lembra do que aconteceu há alguns anos.
- Isso não é crime - pontuo.
- Claro que não, mas eles não gostam de você por isso. Agora, que ideia é essa de querer quebrar a banca? Pense, Makenzie, estou muito longe e não vou conseguir te salvar. Por que não faz como das outras vezes, ganhe seus milhares de dólares e volte para Nova York com alguns trocados? Eu nem sei por que estou te ajudando nisso - ele tenta me convencer e agora estou caminhando em direção à calçada e preciso de um taxi, do contrário, terei que caminhar por vinte minutos.
- Você sabe muito bem que os planos estão tomando uma proporção ainda maior e eu preciso investir nisso, e sobre você me ajudar, é isso o que os amigos fazem - argumento e escuto sua risada.
- Desculpe, mas em que momento você perdeu os seus milhões? - ele tira onda.
- Meu caro amigo, não misturo negócios profissionais com os pessoais - Um taxi para e eu entro - Não deixo rastro para ser investigado - concluo e ele estala a língua desaprovando.
- Não é pelo dinheiro que você está aí, está pelo desafio e por isso já teve problemas no passado e, mesmo assim, vai continuar com isso?
- Sim, vou e vai dar tudo certo. No passado, eu não tinha a paciência que tenho hoje e também não tinha metade das informações e um orientador em meu ouvido, você vai cuidar para que nada dê errado - respondo e olho para a tela do meu celular, vejo a mensagem de quem estou esperando.
“Vou chegar em seis ou sete horas, me pega no aeroporto?”
Respondo com um sim e sorrio para a tela, ela tem me feito sorrir há alguns meses.
- Ainda está aí? - escuto em meu ouvido.
- Estou, e você está trabalhando? - pergunto e vejo o ok da mensagem retornando.
- Claro, quisera eu ser milionário e poder estar em plena quarta-feira em Vegas correndo riscos - solto uma risada e o motorista olha pelo retrovisor.
- Cretino, você é milionário, o problema é que não pode sair por aí dizendo quem é você, tem um passado e é bem complicado caso não se lembre - o lembro de nossos problemas e ele ri mais alto.
- Assim como as pessoas não sabem quem eu sou, minhas ex-mulheres não sabem que sou rico, mas, por que mesmo está em Vegas? Além da sensação do desafio e perigo? - ele insiste.
- Tenho um encontro - sorrio e ele fica em silêncio.
- Amigo, não vá para a luz, volte! - ele faz menção como se eu estivesse morrendo - Fuja para as colinas - ele continua e o taxi para em frente ao meu hotel.
- Não seja ridículo - saio do carro, caminhando em direção à recepção. A bela loura me olha sorrindo e eu sei que ela quer mais, e eu preciso parar com isso.
- Boa tarde, Samira - sorrio e ela tenta conter seu corpo, mas discretamente se inclina e me olha.
- Minha tarde está melhor agora - ela diz.
- Makenzie, controle seu pau - escuto em meu ouvido e sorrio. Samira pensa que é para ela, mas na realidade é dela que estou rindo.
- Algum recado?
- Sim, chegou isso - ela coloca a sacola com uma caixa dentro sobre o balcão e eu pego.
- Você é a melhor - sorrio e pisco um dos olhos para ela e caminho em direção ao elevador.
Subo e assim que o elevador para, caminho para o meu quarto e vejo o que tem na caixa.
- Não acredito que me mandou isso - falo e pego uma peruca e uma barba... loura?
- Você queria um disfarce e a barba densa e longa vai impedir a triangulação do seu rosto, ou você esqueceu que no Bellagio seu rosto está praticamente estampado em todas as paredes? - sorrio e coloco a peruca.
- Estou parecendo um cara do Woodstock - zombo.
- A ideia é essa e não esqueça os óculos quadrados, eles vão disfarçar a cor de suas sobrancelhas e, por favor, tente não usar nada com a grife estampada, você é um hippie dos anos setenta - ele me alerta.
- Pelo visto você já analisou as possibilidades e em quais mesas eu devo apostar - falo e caminho arrancando a minha camisa. Abro o frigobar e pego uma cerveja. Estou no Emperor Suite e olho para o piano ao canto da sala e imagino que deve ser muito triste estar em Vegas e escolher esse instrumento ao invés dos jogos. Fui obrigado a tocar piano por quatro anos e não adquiri o tal gosto que me falaram. O piano que está em minha casa serve apenas para suporte, ou de copos e garrafas ou de mulheres. Fazer sexo sobre um piano é incrivelmente melhor do que dedilhar suas teclas.
- Sim, e você sabe que estarei olhando através das câmeras daqui exatamente vinte e oito minutos, então, não chegue lá antes disso - o aviso é sério e eu dependo dele para entrar sem ser notado.
- Tudo vai ficar bem - sou otimista.
- Espero que sim, porque do contrário, os nossos planos serão severamente atrasados.
- Vou tomar um banho - vou até o banheiro, ligando o chuveiro.
- Makenzie, não esqueça de colocar o comunicador, eu vou estar de olho e te guiar pelas mesas de aposta do Bellagio - alguém o cumprimenta e eu tiro o comunicador do ouvido e desligo.
***
Nunca mais confio no que ele enviar como disfarce, a peruca coça e a barba estou quase arrancando.
- Pare de coçar a cabeça, parece que está com piolho, e isso é culpa sua, por que não foi a outro cassino? Essa coisa de desafio é isso, perucas, coceiras e uma barba medonha - ele ri - Makenzie, você é feio de qualquer jeito e os óculos estão tortos - ele está se divertindo.
- Sabe que não posso falar com você como eu gostaria, agora só me diga onde eu vou apostar - falo e o segurança olha rapidamente para mim enquanto passo por ele e finjo normalidade.
- Passou por oito seguranças, eles cagaram para você, agora vá até a mesa nove e não sente, eu preciso ver as câmeras da central - acato e caminho olhando curiosamente como se não tivesse estado ali por mais de cinquenta vezes - Eles estão de olho em quatro caras da mesa dezenove; sabe que não vai poder apostar mais do que dez mil, esse valor não chama a atenção deles; agora, sente ali e perca a primeira rodada - ele ordena e eu torço o nariz - Não adianta fazer essa cara, estou de olho em você. Esse sistema de segurança deles é uma piada, até um chimpanzé faria melhor - ele desdenha e eu gostaria de rir, mas não posso.
Acato a ordem e perco a primeira rodada. Tudo vai começar novamente.
O croupier me entrega duas cartas e escuto em meu ouvido a conversa entre meu orientador e outras pessoas. Se o mundo é sujo, eu tenho consciência de que contribuo para isso.
- Tem um seis e um cinco, pegue mais uma carta. Ótima pedida para aposta. Mas você é um louco, apostou vinte mil! - ele surta mas recupera a serenidade. Passo o indicador pelo meu queixo e ele sabe o que isso significa, que eu o ouvi. Toco duas vezes com as pontas dos meus dedos sobre a mesa pedindo mais uma carta.
A próxima carta que recebo é um nove e eu encerro passando minha mão sobre a aposta.
- Parabéns, ganhou quarenta mil e, se continuar assim, vai demorar doze horas para o primeiro milhão e com isso não será pego pelos fundos da calça e arremessado para a calçada - ele ri - Preciso saber de uma coisa, é realmente sua última vez no Bellagio? Está disposto a fazer uma loucura? - ele me surpreende e agora coço a minha testa com o polegar assim que recebo duas cartas, um oito e um quatro, e ele entende que estou de acordo com o que ele acabou de falar e para ele ter mudado de opinião é porque viu alguma coisa interessante, alguma mesa deve estar rendendo muito mais - Não vai ter volta - ele fala e eu olho ao redor e busco alguma câmera e coço meu nariz com meu polegar e indicador, afirmando que concordo com ele e que estou disposto. Tenho um plano mais importante do que os trocados do Bellagio - Peça mais uma carta, mas antes dobre a aposta, já que está com um par - ele fala e eu acato. Ganho mais uma rodada e sigo apostando sempre os vinte mil. Eu gostaria de apostar mais, mas existe um limite.
Uma hora depois e diante dos meus olhos já tenho quase trezentos mil e escuto ao meu lado um burburinho.
- Makenzie, coloquei um bug nas máquinas de caça-níquel, perto de você terá uma movimentação maior de seguranças que tentarão conter a euforia. Agora, suas cartas são dois seis, divida a aposta, aposte mais vinte mil e não se distraia, haverá barulho muito perto, preciso tirar o foco dos seguranças que estão atrás de você, você terá menos de dez minutos depois disso para quebrar a banca.
Ouço o que ele diz e faço, ganho sobre a aposta, e sigo mesmo com as pessoas gritando e comemorando - Uma máquina acabou de pagar cento e oito mil dólares, a central está maluca e eles não conseguem nem perceber de onde está vindo o problema, quando descobrirem que foi o próprio servidor que enviou o vírus, terão alguns dias de dor de cabeça.
Ele está movimentando tudo no servidor do cassino, ele é mais louco do que eu. Quando percebo que já consegui meio milhão, pego as minhas fichas e caminho até uma das mesas de Pocker. Agora eu triplico isso.
- Makenzie, não, quando eu disse que não teria volta, eu estava pensando em outra coisa, você sabe que isso que está prestes a fazer será ainda mais arriscado - ele fala em meu ouvido e eu aceno que sim apenas com um leve balanço de minha cabeça - Você é louco, está apostando duzentos mil, você casou a maior aposta da mesa, preciso criar outra distração, mas você sabe que em breve seu rosto estará em destaque na central de segurança. Maluco, o poker é muita ousadia de sua parte, de novo está se levando pela pressa, disse que adquiriu paciência mas pelo visto não é apto a usá-la - ele fala e eu sei que agora vai acessar o que está na mãos dos outros da mesa e a partir de agora sei que vou para casa com pelo menos dois milhões - O cara de verde está blefando, ele está com duas cartas fracas, a mulher está com uma trinca. Estou tentando manter a calma, mas fica difícil com você querendo o Pot, que agora está em dois milhões e vocês ainda estão na Flop, primeira rodada - escuto e tento analisar os participantes, encaro o homem com uma camisa com flores e percebo que ele não se importa em pagar, está um pouco alterado por conta da bebida.
Vamos para o Turn, próxima rodada.
- Makenzie, não quero te deixar desesperado, e eu sei que precisa de atenção, mas você tem menos de três minutos, estão rastreando o problema e estamos a ponto de colocar o sistema do Bellagio em colapso - sorrio ao ouvir e assim que River, última rodada, acontece, sorrio para o meu Royal Straight Flush, o pot, mais de dois milhões vêm para mim e em meu ouvido o desespero aumenta. Peço para trocar as fichas por conta do volume, e agora tudo cabe em meu bolso, mesmo sendo uma quantia extremamente elevada.
Percebo a movimentação e as comemorações eufóricas de quem está ganhando e, como um grande golpe de sorte, muita gente grita de felicidade. É a porra do dinheiro construindo sorrisos de areia.
- Saia daí agora - pego as fichas saindo da mesa e caminho calmamente. Não trapaceei no poker, quem trapaceou foi a voz em meu ouvido - Sua foto está na central, a barba e o cabelo foram descobertos e os óculos não ajudaram em muita coisa - ele fala - vire à direita nas máquinas de caça-níquel, tem dois seguranças do lado esquerdo, abaixe-se e mexa em seu sapato - as coordenadas agora são rápidas e eu sei que não estou na lista de Natal do Bellagio - siga reto pelo corredor, agora, vire à esquerda - acato e chego ao guichê de troca e olho para trás. Não terei tempo de trocar as fichas. Saio do Bellagio e aperto meu passo pela calçada até que eu sumo no meio da multidão.
- Você é maluco? Era para quebrar a banca no blackjack e não no poker, agora está com dois milhões em fichas no bolso - ele está furioso.
- Dois milhões e trezentos mil - o corrijo e sorrio - E são do Bellagio. Você precisa concordar que ganhar tudo isso com apenas dez mil iniciais é uma grande jogada - falo e ele resmunga um punhado de palavrões.
- Travei o sistema do Bellagio, se te pegam lá dentro, chegariam em mim muito mais rápido - ele fala como se fosse possível descobrir onde ele está e quem ele é.
- Acha que podem chegar até você? - pergunto deixando claro que ele é o cara que nunca será pego.
- Só conseguem chegar até mim se usarem você, porque se for para te salvar, eu aviso ao mundo quem eu sou - isso me faz sorrir, amigo é isso.
- Então você está seguro - brinco e arranco a peruca e o cabelo enquanto caminho pela calçada e jogo meu disfarce no lixo.
- Agora me diga, tudo isso por conta de um encontro? - ele fala com o tom mais zombeteiro.
- Um encontro especial - comento e aceno para um taxi.
- Não me diga que estamos falando da... - limpo a minha garganta e ele gargalha.
- Você sabe que é ela - confirmo sem mencionar o nome porque ele sabe exatamente tudo sobre ela. Nós sabemos tudo sobre ela e não há grandes segredos ou uma ficha policial, é tudo muito simples e construído através de estudo.
- Há mais de um ano com a mesma mulher, eu chamaria isso de namoro - ele está tirando sarro.
- Nada disso, eu saio com outras pessoas, e ela também, sem contar que ainda tenho minhas participações ativas em Madri - o lembro sobre a sociedade secreta e sorrio.
- Ela se sente bem com isso?
- Com isso o quê? - o taxi para e eu entro.
- Com suas idas para Madri...
- Eu a poupo de alguns detalhes - ajeito meu cabelo e olho pela janela. Observo na calçada os grupos de turistas, os casais aos beijos sob a luz de Vegas e que naturalmente todos fogem da solidão.
- Um detalhe que suga parte de seu tempo - sua conclusão é óbvia, mas eu não a enxergo de forma negativa.
- Um detalhe que ainda não está me incomodando - sorrio e peço ao motorista que me leve até o aeroporto, ela está quase chegando - Sabemos que tudo nasceu para ter um fim, mas eu ainda não consigo ver o término. O Palácio Hanzel me proporciona algo bom e o investimento tem retorno garantido.
- O que te afastaria de Hanzel? - ele nunca me fez essa pergunta.
- Posso ser franco? - devolvo a resposta com outra pergunta - Se um dia eu sair do Clube 13, tenho plena convicção de que o Clube jamais sairá de mim, e tanto eu quanto você sabemos o motivo - escuto a respiração dele e pego meu celular.
- Você sabe que as coisas têm ficado mais perigosas - o alerta dele me soa mais preocupado desta vez, mas eu sei que as coisas estão vagarosamente saindo do controle, e tudo pode acontecer.
- Eu sei, e por mais que isso pareça sombrio, esse perigo me deixa incrivelmente excitado - vejo um e-mail de Evan perguntando sobre o evento da Power&Heart daqui duas semanas e respondo que estarei lá, eu não faltaria por nada.
- Você está longe o suficiente do Bellagio, certo? - a pergunta é mais afirmativa do que interrogativa.
- Sim, estou a caminho do aeroporto - vejo outro e-mail chegando, agora é de Alexander e é sobre trabalho, e eu estou de folga nesse exato momento.
- Ótimo, assim não terá suas roupas molhadas - ele fala gargalhando e eu já sei o que ele está fazendo.
- Um incêndio?
- Água o suficiente para apagá-lo caso ele existisse - tenho pena das pessoas, das mulheres com seus vestidos caros que nesse momento correm porta a fora fugindo do jato d’água do detector de fumaça.
- Isso é maldade - ressalto.
- Precisava distraí-los enquanto apago os vídeos das câmeras de segurança, inclusive as da rua onde você caminhou. Sem rastros, Makenzie, sem rastros, e agora eu preciso voltar ao trabalho, sou um pobre homem que ganha a vida duramente - ele está de sacanagem.
- Cara de pau - sorrio - Nos vemos em Moscou em algumas semanas. Mas antes, ainda temos que repassar alguns pontos de nosso plano - aviso e ele concorda com um ok - Preciso desligar agora e prometo que não vai ouvir nenhum gemido desta vez.
- Nenhum gemido e possivelmente não ouvirei nenhuma declaração - ele me sacaneia - Está apaixonado e sequer faz questão de esconder isso - ele comenta.
- Estou? Como chegou a essa conclusão? - ele só pode estar louco. Apenas gosto, com grande entusiasmo, de ficar perto dela. Sinto que tenho alguns pontos a serem revelados e trabalhados, ela é meu desafio tanto quanto estar no Bellagio.
- Não precisei chegar a nenhuma conclusão, são apenas alguns dias da semana que você faz questão de visitar um determinado endereço perto da oitenta e sete, virou visitante do museu de história natural?
- Pare de me seguir - falo negando com a cabeça. Mas eu sei que não posso me esconder dele.
- Não estava te seguindo, eu estava seguindo ela - escuto o barulho e eu sei que o cretino desligou o comunicador, faço o mesmo e o guardo em meu bolso. Temos nos falado com mais frequência, existe uma razão para isso, temos um plano, e nada pode sair do controle.
O carro para em frente ao aeroporto e eu o dispenso, sei que ainda tenho tempo.
***
Ela deixa que a água do chuveiro caia sobre seu corpo e eu aprecio os detalhes de uma pele detalhada por desenhos. Por vezes observo a espuma que esconde aquilo que foi pintado com tinta escura, em outras, existe algum tipo de cor e em cada uma delas vejo uma referência pessoal, como se cada partícula de vida fosse transportada para seus desenhos.
Seus cabelos lisos cresceram rápido nos últimos meses e eu gosto do cheiro que eles têm. Depois de seus olhos, foram seus cabelos que intensificaram a presença dela em minha memória.
Sua pele é alva, e desde que a vejo nua, só notei uma única cicatriz, em seu punho esquerdo e eu, apesar de ter toda a coragem do mundo para quase tudo, nunca tive para lhe questionar sobre o motivo que a levara a pensar em tirar a própria vida. Não há nenhum tipo de registro sobre isso.
É nítido que em seus olhos existe um pedaço de seu passado que a machuca, e ela deixa isso claro quando falamos sobre coisas que qualquer família cheia de amor teria vivido, como crianças e uma árvore de Natal ou recolher doces no Halloween. Ela viveu esse tipo de coisa, mas o meu receio é de que ela tenha vivido algo depois disso que a fez querer morrer.
Confesso que já criei minhas teorias sobre ela, sobre o que teria acontecido, e em minhas buscas sobre seu passado, encontrei apenas uma família feliz, rica e que parece ter vivido as datas que as famílias gostam de dividir. Eu sei que diferente da Brooke, ela não manipulou nenhum sistema, ela simplesmente guarda a verdade só para si.
Estou sentado na bancada da hidro e a vejo desligar o chuveiro, puxar a toalha branca e secar seu corpo. Estamos rodeados por um silêncio que geralmente é habitual em minha vida, mas esse silêncio, esse que gosto, só existe quando ela está por perto. E ela tem estado perto, cada vez mais perto.
- Noite de sorte? - ela pergunta e caminha pelo banheiro saindo em direção ao quarto e me obrigando a segui-la. Ela não se enrola na toalha, ela se enxuga e não se importa com a vidraça e os prédios que teriam fácil acesso ao seu corpo nu. Ela é totalmente segura de si, não faz o papel melindre ou de garota fácil, ela é assim e pelo visto é bem resolvida quanto a isso.
- Sim - respondo e a vejo abrir as bandejas do jantar que pedi para ela - Pedi o peixe que você gosta - falo. Ela olha para mim segurando a tampa da travessa e sorri.
- Ainda se lembra das coisas que gosto? - sua questão é envolvida pela mágica que apenas ela consegue fazer. Claro que me lembro, muito do que você gosta passou a ser o que eu gosto.
- Lembrei do nosso jantar há duas semanas e você ressaltou que em uma próxima oportunidade gostaria de apreciar o peixe ao molho branco - respondo e ela mantém o sorriso e, francamente, começo a analisar o que seria mais sensual do que uma mulher nua rodeada de prata e fumaça. Essa é a visão que me faz feliz.
Desde que começamos essa espécie de relacionamento aberto, sem compromisso e sem exclusividade, ela conseguiu me deixar curioso para o próximo encontro. Sempre interessado em ter próximas vezes com ela.
O sexo passou a ser cada vez mais intenso com seu lado dominador. As suas exigências, como não ficar por baixo, nunca, ou simplesmente me acordar no meio da madrugada com sua boceta em minha boca, passaram a ser um vício. Covardemente confesso que muitas vezes ela queria apenas gozar, deixou isso claro e, em todas as vezes, eu acatei.
Ela é a única que me faz obedecer, mas é fato que estou em busca de descobrir o que ela esconde por trás de toda essa dominação e ordem.
Não é uma guerra para ver quem pode mais, quem obedece ou ordena com mais eficiência, é apenas o encaixe perfeito e minha obediência pertence a ela até determinado ponto, porque eu sei que parte de sua pequena entrega é integralmente minha.
- É um ótimo observador - sinto em seu elogio mais do que um adjetivo. Ela tem estado em minha vida e tenho permitido que sua vida, cheia de coisas a serem descobertas, fique ao meu redor. Tenho desejado isso como nunca antes havia feito. Ainda tenho uma vida em Nova York e outra em Madri, mas independentemente de onde eu esteja, de alguma forma tenho o seu sorriso sempre comigo - Sabe que andei pensando sobre isso que está acontecendo entre a gente e cheguei a conclusão de que seria muita loucura eu vir até aqui, mas, ao mesmo tempo, eu imaginei que seria bom - ela se aproxima de mim, incrivelmente sedutora, cabelos molhados e um corpo que me atrai, como se eu precisasse tocar cada uma de suas tatuagens - Amanhã eu tenho uma despedida de solteiro aqui em Vegas, e podemos nos ver novamente antes que a minha vida real bata à minha porta e exija a minha presença - ela coloca as mãos em meus ombros e beija a minha boca me encarando.
- Uma despedida de solteiro? Duvido que se lembre do meu nome depois disso - brinco e ela me encara, seriamente, como se eu a tivesse ofendido.
- Então, meu caro, enquanto seu nome ainda me é bem nítido, por que não me beija? - ela ameaça voltar a me beijar, mas eu me ajoelho aos seus pés.
Espalmo a minha mão em sua barriga, alisando sua pele e o par de asas que tem logo ali, em um traço fino, e desço, deixando que meu polegar alcance seu ponto sensível. Circulo uma única vez e ela abre um pouco mais a perna. Esse é um pedido para que eu continue e eu gosto de olhar para seu sexo. Ela deixou como eu gosto, não há nenhum sinal de pelos e, assim, posso mordiscar e sentir o seu gosto intensamente.
Abro-a intimamente e deixo que minha língua percorra desde a sua entrada até o alto de seu sexo, e ali eu paro e massageio, lenta e delicadamente, até que sinto suas mãos em meus cabelos.
Sugo-a suavemente, em um movimento explícito de extrair dela o prazer para que ela possa se entregar para mim. Mantenho minha boca encaixada e continuo apreciando o pulsar de seu sexo. Paro e, novamente, deixo que minha língua a cubra, e vejo em meus lábios o quanto está molhada me esperando.
- Não pare - seu tom exige minha ação e eu enfio a minha língua em sua entrada e volto ao seu ponto frágil. Agora suas mãos estão em meus cabelos, controlando o movimento enquanto ela rebola acelerando os passos até o orgasmo - Sinta - ela diz e eu já conheço seu corpo, conheço o que cada palavra significa e sei como fazer com que ela atinja um bom orgasmo. Ela dobra ligeiramente os joelhos, e remexe sua boceta em minha boca ainda me segurando. Ela goza, ela me usa e eu ultimamente ando esperando, exaustivamente, por esse momento.
Ela me suspende e beija a minha boca, ela sente o próprio gosto e me leva até a frente do sofá. Ela retira cada peça de minha roupa, seus dedos me encontram e me agarram dentro da última peça. Ela me masturba e beija a minha boca, até que desce a peça preta e me senta no sofá.
Ela coloca cada um de seus pés de cada lado do meu corpo e antes de descer por completo, desliza seu sexo em minha boca - Agora o deixe pronto para mim - seu tom autoritário faz meu pau latejar e eu sei o que ela quer, ela quer que eu o segure para que ela se sente sobre ele. Estou aqui apenas para obedecer.
Ela engole meu pau, mas ela é má. Ela desce lentamente, até que por completo eu a preencho e experimento o seu limite. Ela está molhada e quente.
- Andou pensando sobre nós? - pergunto.
- Sim - ela responde gemendo. Acomodo seus seios em minhas mãos e os trago para minha boca. Eles são lindos, bicos enrijecidos e rosados e eu gosto como eles se encaixam em meus lábios.
Sugo apenas seus bicos, depois, eles quase que por completo e os mordisco. Ela sobe lentamente e desce mais rápido e se eu aprendi sobre o seu corpo, ela sabe todas as minhas senhas.
Vejo-a fechar os olhos. Ela está quase gozando, eu sei, eu a conheço bem para cronometrar, até que ela abre os olhos, se aproxima de minha boca e me beija - Vamos, me ajude com isso - ela agora pede como uma menina indefesa, mas não é assim. Entendo seu recado e a levanto, ainda com meu pau dentro dela, e a sento sobre a mesa, deixando seu sexo exposto para que eu possa enterrar com vontade.
Puxo duas cadeiras e agora seus pés estão bem acomodados. Entro, saio e, quando repito, vou mais forte, bato dentro dela e ela grita, e observa pela vidraça o brilho de Vegas que se tornou ofuscado desde o instante em que ela pisou aqui.
Ela goza e me puxa para perto dela - Acho que sou viciada em você - ela confessa e eu estou sorrindo, mas ela beija a minha boca como se deixasse claro que não quer ouvir nenhum tipo de resposta, ela quer apenas isso, satisfazer o seu corpo. Ela tem regras, tem pedidos especiais e uma necessidade absurda de mostrar que não tem vergonha do corpo.
Volto a enterrar e ela me encara, pede por mais, mas eu não quero fazer mais nada, quero apenas gozar, e levá-la para a cama. Já dormimos tantas vezes juntos que admito sentir falta quando isso não acontece.
Entro e saio, ela mantém seus lábios nos meus e eu me rendo, gozo ainda entrando e saindo e ela serpenteia minha cintura com suas pernas. Não deixe isso tudo mais perfeito, estou tendo problemas para fazer esse tipo de coisa quando não está por perto, perdeu a graça quando não é você.
Pego-a no colo e a levo para a cama, a deito e me encaixo em seu corpo. Ela é menor do que eu, branquinha, e eu sei que é quebrável. Geralmente pessoas resistentes a outras pessoas são assim exatamente por serem frágeis.
Ela fica enroscada em meu braço e apenas o lençol fino nos cobre.
- Você sabe que não vamos dormir, não é? - ela me avisa.
- Eu sei que não, você quer apenas os seus minutos e depois vai devorar tudo que está dentro daquelas bandejas - explico e ela me olha sorrindo.
- Sabe tanto sobre mim, desde como meu corpo funciona até o momento em que meu estômago precisa de alimento - ela fala e seu nariz empinado, a sua boca vermelha e todo o conjunto mandão e revoltante dela me obrigam a confessar que também ando pensando sobre nós, porque no final do dia, ou dos meus retornos de Madri, é exatamente isso que fica, é exatamente isso que tem sido importante: nós.
***
Pego meu celular e vejo que o dia amanheceu. As bandejas estão vazias e ela dorme profundamente sobre a cama. Envio a mensagem e deixo claro que vou precisar de mais uma noite aqui, uma despedida de solteiro a essa altura não é vantagem para mim.
“Está apaixonado” - vejo na tela o que escutei ontem dele em meu ouvido.
- Não, estou apenas cuidando para que isso não acabe - respondo e olho para ela, com o corpo descoberto e totalmente vulnerável - Ela precisa de mim, mas ainda não sabe disso.
2
Giovani
Especialmente hoje, a 1 OAK está mais do que cheia, e isso seria muito atraente se eu precisasse escolher alguém para desfrutar das dependências de um certo palácio em Madri. Mas não hoje.
Esta noite é apenas uma reunião sem fins sexuais. Andrew, que acabou de sentar do meu lado, me entrega um copo com alguma coisa colorida dentro e eu o encaro.
- Que merda é essa? - questiono e, pela cor, eu recuso a beber.
- Comprei para aquela morena, mas ela recusou - gargalho ao ouvir a resposta e ele ajeita sua camisa como se nada tivesse acontecido.
- Ele perdeu o jeito de como se faz, ainda bem que não está tendo grandes problemas em levar as meninas para o Clube - Cesar ri e bebe um gole de sua cerveja.
- E aí? - Bryan chega e se senta ao lado de Cesar - Houve um acidente na Sétima, está tudo parado - ele explica como se precisasse oferecer satisfação.
- Sem contar que tem obras no começo da Quinta - Andrew conclui - Mas, onde é que está Carl? - eu sei onde ele está, porque isso para mim é fácil e os celulares, os rastreadores e tudo mais que facilitam a minha vida mostram que ele está em um lugar de procedência duvidosa.
- Talvez esteja no trabalho - sugiro e pego a minha garrafa, deixando o drink no canto da mesa.
- Pode ser - Andrew responde - Ele está puto comigo porque o convenci a ver alguns carros antigos em Santa Barbara - ele ri.
- Vícios... são eles que nos impedem de fazer o bem - comento e Bryan me encara.
- Por falar em vícios, não o vi em Madri na última reunião - Bryan comenta e eu sorrio ao olhar para ele.
- Estava em Vegas - danço com as sobrancelhas e ele nega.
- Você já arrumou tanta confusão naquele lugar e ainda volta lá - Cesar indaga e Carl chega ajeitando o colarinho de seu paletó. Ele esqueceu de verificar a mancha vermelha em seu pescoço e, pela euforia, com certeza trepou.
- Não arrumei confusão em Vegas em sua totalidade, apenas no Bellagio - justifico e Carl se senta ao lado de Bryan.
- Me lembro dessa confusão, ou teve outra? - Carl comenta e pega o drink que Andrew trouxe e cheira - Que merda é essa? - ele pergunta e And rola os olhos para cima.
- And levou um fora e teve a bebida como prêmio de consolação - Cesar sacaneia e Bryan gargalha.
- Estive outras vezes e fiz outras coisas, mas eu me lembro da sua presença na vez em questão em que eu e Evan fomos pegos contando cartas e quebrando a banca - comento e minha bebida acaba.
- Eu juro que daria dez anos de minha vida para saber como você faz isso - Andrew fala e eu nego com a cabeça.
- Não tem segredo, mas é preciso uma boa memória e concentração. Evan é ótimo com números e eu tenho boa memória, e esse é o segredo para ser barrado na entrada de um dos principais cassinos de Las Vegas - levanto a mão e peço outra bebida - Mas isso serviu só para mim, Evan voltou lá depois e não teve problemas - giro a garrafa vazia na mesa e percebo que todos estão me encarando.
Andrew não tem essa vocação, ele gosta do lado comercial e tem nas veias o sangue Nike, ele ama a empresa que trabalha e sabe como fazer um bom marketing. Percebo que Bryan conversa com Cesar e eu me lembro quando o pai dele o humilhou na nossa frente por ele ser tão dedicado à sua marca e, por conta disso, ter deixado a empresa da família de lado. Bryan sempre teve uma relação gelada com seu pai e, uma vez, ele comentou que não sabia o que era um abraço entre pai e filho.
O tipo de coisa que dinheiro algum consegue comprar. Cesar mostra o relógio para Bryan e depois olha para mim. Esse sim tomou a frente do negócio de sua família. Seu pai fundou, junto com seu avô, a Walker CO. Indústria de borracha e, desde então, esse é o negócio que sustenta a família, e por mais que no Palácio ou em nossas saídas ele liberte um tipo de humano que fica escondido, no dia a dia ele é um homem de família.
- Eu não vou dirigir nenhum cacareco que você comprar nessa porra de ferro velho em Santa Barbara - Carl sacaneia Andrew e, enfim, alguém nos serve - Prefiro dirigir um dos tratores que minha empresa fabrica - ele ri - Pelo menos é mais veloz - Bryan ri alto e Andrew fecha seu rosto.
- Vai se foder, Carl, são raridades - ele explica.
- Claro que são, ninguém quer - a resposta de Carl faz com que todos gargalhem - Da última vez que estivemos em Madri, você queria ver essas quinquilharias em Milão, precisa procurar ajuda com esse seu vício - Carl bebe um pouco da cerveja e deixa tudo no tom certo da piada.
- Carl, acho que deveria ir sim, afinal, ele livrou a sua em Madri recentemente - Cesar solta uma pequena informação que me interessa.
- Andou levando gato por lebre? - sacaneio-o fazendo menção sobre uma vez ele ter elogiado um travesti e desde então eu o infernizo com isso.
- Não vou comentar sobre isso - Carl esquece as piadinhas - Foi culpa daquele filho da puta do Gutemberg, se não fosse ele... - internamente me pergunto por que não soube de nenhum problema em Madri. Por que essa informação para mim é nova?
- Philip é um lixo, não entendo o que ele está fazendo naquele lugar - Bryan comenta e ele tem toda razão. Bryan já precisou sair do clube e escoltar uma menina que se recusou a ficar no Palácio depois de alguns minutos com Philip. Pensar que Victoria poderia ter passado por isso...
- O que aconteceu? - pergunto.
- Philip meteu a cara em um prato de pó e partiu para cima de Carl, Andrew o segurou e o trancou dentro do quarto - Cesar conta.
- Ele deveria ser proibido de pisar naquele lugar - Andrew dispara - Como ele está conseguindo se bancar lá? O Clube custa caro, eu não sei, mas acho que Marco deveria repensar sobre Philip, ele ainda pode trazer problemas maiores - ele conclui e bebe um gole do drink que a morena dispensou.
Gutemberg sempre foi um caso especial dentro de Clube. Sua entrada tinha sido discutida como algo negativo por Sebastian, mas na ocasião, Evan tinha seus motivos para deixá-lo fazer parte. Minhas investigações sabem que ele anda aprontando, mas desde que ele não atravesse meu caminho, ou de qualquer um do Clube, eu não me envolvo.
- As coisas ficaram estranhas em Madri de uns tempos para cá - comento.
- Marco perdeu a noção do perigo que está correndo, ele esqueceu que celebridades atraem paparazzi e, em algum momento, não serão apenas fotos, serão flagrantes e, depois disso, tudo pode desmoronar - Bryan explica e isso me estala como um aviso. Benjamin já havia falado sobre isso e pelo visto existe um problema em uma vertente crescente e que pode estar sem controle.
- Sempre soubemos dos riscos, o que fazemos é divertido, rende boas trepadas, mas a verdade é que o risco que estamos correndo agora pode ser fatal - Cesar protesta e eu sei o que ele está pensando, eu também pensaria... Eles foram ameaçados por terem seus segredos. Todos nós temos segredos, a diferença é como os guardamos. Segredo só existe se ninguém, além de você mesmo, sabe da existência dele.
Percebo que o silêncio na mesa prevalece e, com isso, o som de Philip Philips, com Gone Gone Gone, fica mais nítido.
Ninguém pode prever o que vai acontecer, mas quando se tem as informações sob custódia, ao menos uma reação é possível programar.
“Quando os inimigos estiverem à sua porta, eu te levarei para longe da guerra” - diz a letra.
***
Acordo com o som do meu celular. Atendo ao ver quem é, sei que é importante.
- E aí? - pergunto e bocejo olhando para o lado, observando uma loura e eu não me lembrava que ela ainda estava aqui. Ela se mexe na cama e me encara. Levanto-me e me vejo nu, e se não fosse essa ligação, eu jamais desperdiçaria essa ereção.
Ela se senta na cama e olha para mim como se me pedisse para fodê-la, mas eu não lembro nem seu nome.
- Preciso trabalhar - falo olhando para ela e com meu celular em meu ouvido.
- Tem mulher na sua cama... - escuto em meu ouvido através da ligação.
- Mas hoje é domingo - ela reclama e eu adoraria foder você de novo. Mas infelizmente o dever me chama e o sexo também não foi tudo isso.
- Exatamente por isso - respondo a ela e vou até o banheiro - Você queria que tivesse um homem em minha cama? - respondo para o telefonema e ele ri.
- Bom, eu não ficaria surpreso - ele me zoa, dou descarga e saio do banheiro. Vejo-a colocando seu vestido e admiro seus seios que poderiam ser mais naturais.
- Vou chamar um taxi para você - aviso e ela acena que não.
- Não é preciso, moro a três quadras daqui - ela até que é bonita e espero que o fato de saber meu endereço não a traga aqui deliberadamente.
Ela vai até o banheiro e minutos depois sai, se despede de mim com um selo em meus lábios. Não gosto muito de hálitos matinais sem a devida higiene antes.
Acompanho-a até a porta e a vejo pela janela caminhando pela calçada.
- Até que é gostosa, mas não sabe fazer um oral - comento e escuto a gargalhada.
- São raras as que conseguem fazer isso sem que os dentes estejam ali, nos ameaçando, mas não liguei para saber sobre sua foda. Preste atenção, existe uma movimentação suspeita em doze coordenadas, acredito que ninguém desconfiará de nada - ele fala. Vou para o meu laptop e abro meu e-mail.
- Está enviando essas mensagens para onde?
- Nuvem. Está codificado e será apagado em breve, decore as informações - olho para a mensagem e vejo a situação.
- As outras mensagens que enviou ninguém conseguiria entender e todas levam para um grupo do Facebook sobre receitas de bolo, por que não fez isso agora? - pergunto e deleto o link e mudo o IP de recebimento.
- Porque esse arquivo estava muito pesado - penso nas possibilidades e escuto alguém conversando com ele.
- Não podemos recuar agora, e também precisamos ir devagar, sem pistas, sem desespero, tudo está caminhando como planejamos - tranquilizo-o e, ao mesmo tempo, imagino o que poderíamos fazer na próxima etapa.
- Até podemos, mas que graça teria agora que as coisas estão ficando divertidas? - nós dois rimos.
- Tem alguma informação sobre aquilo que te pedi ontem enquanto estava com os caras? - vou para a cozinha e abro a geladeira. Está vazia.
- Sim, mas eu te passo tudo pessoalmente, mas já adianto que existe um risco - ele fala e eu entendo o que ele fala. Tudo envolve riscos e é por isso que algumas coisas valem a pena.
3
Giovani
Olho para o espelho e não vejo a minha imagem, ele está embaçado por conta do vapor, e o barulho do meu celular que está sobre a mesa no canto esquerdo do meu quarto anuncia que alguém está me ligando e interrompendo a música, Symphony of Destruction, do Megadeth, e eu desisto de passar a mão e tentar analisar a minha barba que deixei de fazer desde que voltei de Las Vegas, há duas semanas.
Aproximo-me e sorrio para a tela. Atendo enquanto passo a toalha em meu cabelo, a colocando em seguida sobre a poltrona perto da janela.
- Oi, pai - escuto a voz de minha mãe no fundo e me sinto feliz por isso. Ela já o interroga para saber se minha voz está boa. Ser filho único é isso.
- Eu e sua mãe lamentamos, mas não conseguiremos ir ao evento da Power&Heart hoje, nosso voo foi cancelado por conta do mau tempo. A tempestade aqui está forte e não tem nenhum indício de que vai parar em breve - meu pai explica e caminho até o closet, onde está meu smoking e meus sapatos.
- Eu sei.
- Imaginei que isso não o surpreenderia, você sempre sabe de tudo - ele fala rindo e acredito que no mundo ele seria o único que não entregaria meus segredos. Obviamente olhei a meteorologia e constatei que essa chuva atrapalharia a viagem.
- Não exagere - falo com um sorriso no rosto.
- Gio, apenas mantenha a palavra de que não vai se meter em um novo problema, estamos muito longe e nosso socorro pode demorar - a frase repetida desde que se mudou para Toscana é quase uma prece. É como se minha traquinagem da adolescência pudesse se repetir a qualquer momento.
- Pai, eu prometo que vou tentar e deveria parar de me pedir isso, não sou mais um adolescente - brinco e ele sorri. Ele sempre me pede para ficar longe de problemas, acho que eu o traumatizei. Escuto a minha mãe pedindo para falar comigo.
- Filho... - ela está emotiva - Você tomou café da manhã? Vi suas fotos e percebi que emagreceu, venha passar alguns meses comigo - todas as vezes que ela pega o telefone para falar comigo, ela chora. Desde que ela e meu pai se mudaram para Toscana, os telefonemas são carregados de culpa por terem me abandonado, segundo as palavras de minha mãe. Parece que fui colocado em um cesto e deixado em uma porta qualquer. E sobre passar alguns meses, isso é praticamente inviável.
- Sim, minha mãe, eu já tomei um excelente café da manhã e a senhora, como está? - minha voz é baixa, expresso cada palavra com todo carinho do mundo e na realidade eu sei que estou mais tranquilo com eles longe de Nova York. Aqui a minha vida já esteve à beira de um precipício muitas vezes. Nada é muito estável.
- Estou com saudade de você, e sei que esteve em Madri de novo e não veio me visitar - ela puxa minha orelha - Eu ainda quero saber o que você viu em Madri que há anos o faz voltar muitas vezes. Não vai me dizer que tenho um neto em Madri? - gargalho - Não ria, Giovani Makenzi, sou sua mãe e se você constituiu família eu preciso saber - ela é louca por crianças e sempre dá um jeito de me lembrar que sou filho único e que serei o único caminho para que ela tenha um neto.
- Fique tranquila, eu prometo que será a primeira a saber quando eu fizer seu neto - gargalho mais alto.
- Não quero saber do momento em que ele foi feito, eu quero apenas a parte em que ele já está pronto - ela agora está rindo e eu paro e analiso sobre sua dúvida, o que foi que eu vi em Madri que me faz atravessar o oceano tantas vezes por ano.
No começo, quando transformamos aquilo em uma Las Vegas particular, tínhamos nossas apostas, estávamos com toda energia a ser aplicada independente de onde fosse. Era legal, desafiador, e eu contava os dias para que algum pedido chegasse e, então, seria a busca, a proposta e, por fim, sexo, muito sexo. Perdi as contas de quantas vezes trocamos de mulher na noite, e a única coisa que espero é que tudo fique lá dentro daquele Palácio, aquelas paredes escondem mais do que homens brincando com coisa séria.
- Estava a trabalho, Alexander e eu temos alguns assuntos em Madri, acho que já te contei isso - eu sei já ter dito isso a ela.
- Sim, mais de mil vezes, mas isso não me convenceu. Se eu souber que esteve em Madri e não teve a dignidade de pegar o seu jatinho e vir até aqui me ver, eu vou ser obrigada a te colocar de castigo - ela fala sério, mas escuto meu pai gargalhando.
- Eu te amo, mãe - sorrio ao me declarar.
- Amo você também - ela retribui e desliga em seguida. Minha mãe não gosta de dizer tchau, ela sempre encerra as ligações dizendo que me ama.
Olho para o smoking e para os sapatos alinhados sobre o balcão do closet, que vou usar logo mais.
Novamente meu celular vibra, mas agora é uma mensagem:
“Enviei uma atualização sobre as movimentações”
Abro as mensagens no celular e analiso as informações, ao menos estamos tendo algum tipo de progresso.
Retorno a mensagem com apenas um ok e esqueço brevemente sobre o plano que está em andamento. Existe um evento beneficente esta noite e eu não posso faltar.
***
Mais de quinhentos convidados pagando caro para estar aqui doando como se isso fosse salvar suas almas. Há pecados que não podem ser perdoados, eles precisam existir, eles são o ponto de equilíbrio.
Este ano a Power&Heart enviará os fundos para as crianças, sempre elas. Esse é o legado da pequena Alice, filha de Gunter, foi ela quem motivou tudo isso a tomar essa proporção. A decoração é diferente a cada ano. As paredes do salão de festas da nova mansão do Sr. e Srª Maccouant foram decoradas com tecidos com rostos de crianças fragilizadas e isso, claramente, comove a todos que passam pela recepção. É natural se sentir motivado a ajudar. É isso que os endinheirados têm em comum na grande maioria das vezes. Eles gostam de dividir o que têm. Talvez alguns pelo desconto no imposto. Muitos fazem apenas pela caridade, pela vontade de ajudar e pelo entusiasmo em olhar para um mundo melhor.
Não, definitivamente não, a grande maioria das caridades exercidas é em prol de um grande disfarce, ainda não acredito no altruísmo humano.
Esta noite, os convidados farão suas doações e a contabilidade do valor será em tempo real, apresentada no telão do lado esquerdo do salão, ao fundo da banda que toca música ao vivo.
O valor para apenas entrar nesse evento é de cinquenta mil dólares, e eu diria ser uma bagatela a preço de hoje, levando em consideração que este foi o mesmo valor cobrado por pessoa em um jantar com um casal de príncipes britânicos, aqui em New York, há pouco mais de dois anos.
Observo Rose em seu vestido turquesa sorrindo ao falar com Victoria e Evan. Vic está linda e o vestido branco combina com o vermelho de seu cabelo. Evan, como sempre, marcando território ao redor de sua esposa. John se aproxima dos pais de Alexander e agora estão ali, sorrindo para as lentes, entre eles, como se o mundo fosse palco de um espetáculo perfeito. Até seria perfeito, se houvesse mais pessoas que pudessem fazer isso, doar. Ano passado, John doou mais de um milhão do próprio bolso para algumas instituições que recolhem crianças vítimas de maus tratos ou que moram nas ruas. Um tipo de caridade anônima, que apenas os mais íntimos, e eu, que tenho acesso à sua conta bancária, souberam. Um tipo de caridade que não alimenta a vaidade e que é rara.
Ajudar o próximo sem tirar uma única e mísera foto para mostrar para o mundo sua benevolência.
Percebo que alguém para do meu lado e pela forma como segura o copo, eu sei que é Wallace. Ele é silencioso e discreto, mas olhando para o seu rosto, vejo que ele encontrou o que estava procurando.
- Não me diga que tem um metro de corda em seu bolso - brinco discretamente.
- Não, está no porta-luvas do meu carro - ele responde com um sorriso sem dentes e seus olhos estão na direção de uma morena de vestido lilás - Acredito que eu possa precisar em breve - agora o sorriso é mais amplo e eu nego com a cabeça.
- Qualquer dia serão seus pulsos que estarão atados - provoco e ele me encara.
- Não acredito nessa possibilidade - ele volta a olhar para a morena e um garçom passa por nós servindo vinho tinto, e eu aceito. Observo o copo de Wallace e ele está bebendo alguma coisa de cor laranja, o que indica nitidamente que nenhuma mulher está amarrada em sua cama enquanto ele está aqui.
Wallace tem um tipo de fetiche que já me perturbou muito no passado, amarrar mulheres, colocar cada uma de joelhos, e algumas vezes ele as deixa por horas à sua espera. Mas depois, eu me acostumei com essa informação e percebi que com toda certeza desse mundo ele tem um motivo para agir assim e eu sei qual é esse motivo. De algum lugar vem o gatilho de querer prender alguém.
Benjamin chega e vem em nossa direção e no caminho pega um copo na bandeja de outro garçom e já chega brindando com nossos copos.
- E aí? - ele pergunta e para à nossa frente.
- Como foi a lua de mel? - pergunto e espero que ao menos ele nos poupe dos detalhes mais sórdidos.
- Além do sexo diário praticado com sucesso pelo deus do ato aqui - ele aponta para si mesmo e sorri -, descobri que também sou magnífico no esqui - ele faz piada com sua falsa prepotência sobre o esporte.
- É mesmo? Mas aquele vídeo que a Kim me enviou pelo Whatsapp não pareceu que você tinha um pingo de intimidade com os esquis - rebato e pego meu celular ameaçando mostrar o vídeo para ele.
- Aquilo foi um treino, fazia muito tempo que eu não esquiava - Wallace nega com a cabeça e sorri.
- Benjamin, você não sabe esquiar - o alerto - Lembra de Aspen? - insulto lembrando-o da vez em que ele foi parar no hospital.
- O equipamento estava quebrado - ele se justifica tomando sua bebida e Wallace faz um sinal para o garçom trazer uma nova para ele.
- Me lembro da ida até o hospital - Wallace comenta e sorri ainda negando com a cabeça.
- Boa memória, Wall, mas poderia não comentar sobre isso? Perdi a aposta com a Kim sobre esquiar e não vou me arriscar novamente - ele remexe o copo e vejo Kim conversando com Brooke; Alexander se aproxima de Evan e Vick, que ainda estão animados com John e Rose.
- Wall, recebeu o último e-mail? Aquela negociação eu tratei pessoalmente, acredito que seu primo, Danthe, tenha lhe respondido sobre o transporte que vai ser necessário para a carga assim que ela chegar na Escócia - Benjamin fala como um adulto em direção a Wallace e isso é assustador. Às vezes sinto falta do irresponsável, mas quando me lembro de suas armações, a saudade passa.
- Sim, recebi, e Danthe já respondeu. Bornel Ward, o advogado, vai cuidar da legalidade da papelada, foi um ótimo acordo - Wallace responde e até hoje nunca vi qualquer deslize de sua parte diante dos negócios. É como sua religião.
Cesar e Bryan chegam e caminham em nossa direção. Bryan já pega dois copos e não perde tempo em chegar contando sobre Andrew discutindo com Carl do lado de fora da mansão.
- Não acredito que estava prestando atenção na briga - Cesar chama a atenção de Bryan e eu tento entender por que estavam discutindo.
- Não estava prestando atenção, eu estava passando perto deles e escutei - Bryan se defende e ri. Olho para a porta e vejo And e Carl entrando e não parecem estar felizes, é como se fossem namorados em eterno conflito.
And se aproxima de nós e sua cara é de poucos amigos.
- Que foi, cara? - pergunto e bebo um pouco de vinho.
- Carl é um filho da puta - ele está revoltado. A cena é engraçada.
Carl chega também bebendo vinho e ri.
- Para com isso, And, foram apenas alguns minutos - a discussão agora é regada com as doses que o garçom repõe para cada um deles. Olho para o fundo do salão e observo Gunter falando ao telefone, ele está sorrindo e isso é raro. Ele não tem encontrado motivos para isso desde que a vida lhe testou bravamente diante de perdas irreparáveis.
- Esse cretino me fez esperar mais de uma hora na frente da sua casa e o bastardo não estava lá. Eu estava trepando e interrompi a foda para não me atrasar e você apronta isso comigo, deve ter tido um bom motivo - Andrew está enfurecido e eu concordo com ele, não existe nada mais revoltante do que uma trepada abreviada.
- Eu não sabia que pegaria trânsito na Oitava Avenida - Carl está gargalhando e ajeita sua gravata, o que me leva a olhar para o seu pescoço. Vejo ali uma marca de alguém que está querendo deixar claro que o território está sendo dominado.
Carl tem andado estranho, faltou em vários encontros em Madri e não parece fazer questão alguma em participar de nossas pequenas orgias. Talvez ele esteja apaixonado e isso, para um membro do Clube 13, é uma condição perigosa. Nosso clube é segredo e deixá-lo é quase enlouquecedor, dependendo do ponto de vista.
- Acredito que como amigo - coloco a mão sobre o ombro de And e olho em seus olhos - Ele teve um bom motivo - agora meus olhos estão em Carl que concorda discretamente. Ali, naquele momento, eu tive a certeza de que ele está apaixonado e talvez ele seja o próximo a sair do Clube. Mais um dominó que cai.
- Sabe de alguma coisa? - And me encara e estou sorrindo.
- O que eu sei é que quando um cavalheiro se atrasa, uma dama pode ser responsabilizada por isso, então, apenas entenda e tente se livrar dessa carcaça pesada de CEO que o obriga a ser tão pontual - percebo que And não está apenas furioso com o atraso de Carl, ele está enfrentando algum tipo de problema.
- Giovani - Andrew me chama -, em alguns momentos eu tenho muito medo de você - ele confessa sorrindo, mas seu sorriso é mais enigmático do que divertido.
- Eu imagino que deva estar sofrendo um tipo de pressão no emprego e tudo que saia do controle, além do âmbito profissional, pode ser o gatilho para alguns desentendimentos como esse - faço o diagnóstico e Wallace concorda serenamente com a cabeça mas não diz absolutamente nada.
Benjamin está com os olhos arregalados e bebe mais um pouco, seja lá o que for que esteja em seu copo.
- Em que momento virou behaviorista? - Andrew pergunta e me olha no fundo dos olhos.
- Conheço vocês há tempo suficiente para saber o que está acontecendo e aqui, nitidamente, o problema não é o atraso de Carl. Você não é desse tipo e não interromperia uma foda para não perder hora com o amigo. Ele é seu amigo e respeitaria seu pau duro - encaro seus olhos e ele recua um passo. Wallace me olha e volta a olhar para a morena que ele quer amarrar logo mais. Alías, ele vai amarrar.
- Alguns problemas no trabalho - ele desabafa negando com a cabeça - Achei que teria uma nova promoção, mas pelo visto tenho um concorrente - sorrio e bato em seu ombro.
- Fará o melhor possível para que a vaga seja sua - falo e ele acena que sim - Mas, mudando de assunto, Sebastian confirmou que vinha e até agora eu não o vi - comento com o propósito de desviar o assunto para algo mais engraçado. Eu sei que Andrew está com medo, depois de anos sendo simplesmente promovido, agora um adversário à altura o faz perceber que se manteve em uma zona de conforto e vai precisar colocar mais empenho. Particularmente eu aprecio os desafiadores. E Sebastian, eu sei que vai se atrasar, seu carro foi guinchado por ter estacionado em local proibido. Ele não me ligou, mas algumas informações aparecem em minhas mãos sem nenhum sacrifício.
- Não o vi também, mas sei que ele confirmou porque me enviou uma mensagem - Benjamin diz e eu vejo Brooke sendo agarrada por Alexander e o beijo é apaixonado. Os olhos deles estão ligados pela chama da novidade, onde tudo é proporcionalmente exagerado e sedutor.
Andrew acompanha com o olhar duas louras que passam encarando Wallace, que não percebe a existência das duas e continua olhando para a morena.
- Wallace, poderia ficar com as duas - Andrew comenta.
- Não, prefiro apenas uma essa noite, ando mais humano ultimamente - o sorriso de Wallace é sarcástico e eu gosto disso.
- Vai lá, And, assim você goza o suficiente para se livrar do mau humor - Carl sacaneia e And o encara fuzilando-o.
- Vai se fuder - Carl sorri e levanta o copo como um brinde.
Sinto meu celular vibrar e o pego. É Evan me chamando para conversar - Senhores, com licença - uso uma educação que geralmente, nos corredores do palácio em Madri, eu jamais usaria. Caminho na direção dele e aprecio as mulheres com seus longos e grifados vestidos que na realidade escondem quase sempre uma necessidade absurda de autoafirmação.
Desvio de um grupo de investidores amigos de John, sei que um deles é Lucien Du Meliot, ganhou milhões junto com o pai de Evan fazendo uma aplicação em energia eólica. O mais alto é Franco Gluglia, um italiano que aprecia um clube bem parecido com o nosso. A diferença é que ele deixa claro que dentro do Magna haverá sexo pesado, mas ninguém no planeta sabe disso, e sua esposa, Georgia, acredita que seus milhões são frutos de investimento no petróleo. Sim, ele ganha dinheiro com isso, mas seu cabaré de alto padrão também é um negócio rentável.
E eu cheguei a pensar que o Clube 13 era algo inovador, a única diferença é que no começo, o Clube era apenas para os amigos e agora se tornou uma bomba relógio.
- Como vai? - pergunto para Evan que aperta a minha mão e bate em meu ombro.
- Meu amigo - ele diz -, vou muito bem. Sei que esta noite é para caridade, mas eu gostaria que desse uma olhada de perto em um novo negócio que estou prestes a iniciar e que obviamente contará com sua segurança da informação - ele comenta e Vick se aproxima.
- Gio! - ela me cumprimenta com um beijo em meu rosto.
- Victoria, como sempre a mais bonita - cochicho em seu ouvido para que Evan não tenha um colapso - Onde estão os gêmeos?
- Esta noite eles estão com a babá e eu espero que ela não desista de Romeo antes da minha chegada, aquele ali vai me enlouquecer - ela sorri e eu vejo como ela ainda tem o brilho nos olhos. Ali, ainda tem amor e acredito que não vai acabar tão cedo. Percebo Evan se mexendo sobre as próprias pernas incomodado com a minha conversa com sua esposa.
- Eu ligo para você para acertarmos uma visita profissional, mas, fora isso, que tal algumas cervejas e um pouco de conversa fiada? - pergunto e ele sorri para mim. Sei que Evan confia em mim e que isso é muito difícil para ele. Por mais que ele esteja muito feliz e com a vida completa, existe uma falha em sua vida. Não sei ao certo o quanto isso o atinge.
- Na hora que quiser. Eu sei que tenho andado muito ocupado, mas estou dividido entre a Europa e Nova York e meu pai realmente não quer mais saber dos negócios, abandonou tudo - ele comenta sorrindo propositalmente e John vira seu rosto procurando de onde veio seu nome.
- Não é abandono, é aposentadoria - John gargalha e me cumprimenta. Rose escuta a risada do marido e se aproxima também - Gio, não acha justo eu poder viver um pouco agora? Viajar com meus netos e aproveitar um pouco os trocados que tenho? - John brinca e eu gosto como ele coloca seu braço em torno da cintura de Rose, que se aproxima de mim e beija meu rosto.
- Como tem passado, Gio? Achei que encontraria seus pais aqui - ela comenta e Rose deve ter alguma fórmula secreta para se manter sempre tão linda. Ela sempre foi de uma doçura ímpar e de uma presença extremamente agradável.
- O voo deles foi cancelado por conta do mau tempo, me parece que a Itália está debaixo de chuva desde o começo da semana e piorou hoje de madrugada - explico e ela alisa meu rosto com sua mão.
- Estou feliz que esteja aqui - ela diz e eu beijo as costas de sua mão.
- É um prazer - olho em seus olhos e ela está sorrindo, assim como John - Faço questão de participar - falo e vejo que John e Rose são apaixonados um pelo outro e amam, incondicionalmente, os netos. As viagens para Disney repetidas vezes e as festas de aniversário que eles fazem questão de comemorar aqui na Big Apple e na Escócia, onde os pais de Vick moram, provam isso. Definitivamente, Cora e Romeo trouxeram um novo sopro para eles.
Vejo um homem se aproximando de John e fala alguma coisa em seu ouvido.
- Gio, se puder me dar licença, temos que fazer a abertura do evento - eles educadamente se despedem e caminham em direção ao palco.
- Meus pais ainda te adoram - Evan comenta enciumado.
- Eu sou apaixonante.
- Não vou comentar sobre isso, mas vamos almoçar na quarta-feira - Evan propõe e eu aperto sua mão concordando.
Uma voz ao microfone interrompe nossa conversa e quando olho para o pequeno palco posicionado ao centro do salão, vejo Rose ao lado de John.
- A primeira vez que nos reunimos com o propósito de unir recursos, queríamos apenas alcançar os mais necessitados. A fome é um castigo inconcebível e claramente ainda assola vítimas - a voz de Rose é branda, calma e a maneira como John olha para ela é completamente encantador - Hoje, anos depois do nosso primeiro encontro, queremos exatamente a mesma coisa, mas desejamos alcançar uma proporção ainda maior - assim que ela fala, as luzes do salão se apagam e vários telões espalhados ao longo do salão mostram imagens.
São crianças machucadas, famintas e abandonadas.
- Essas crianças não tiveram escolha, escolheram por elas e agora não existe muito para se fazer sobre os pequenos, mas sobre a fome nós podemos nos sentir parte da solução. Esta noite, o montante final de todas as doações será revertido para elas e eu e meu marido, John Maccouant, vamos colocar o mesmo valor dobrando a doação final. Esta noite, vamos resolver parte do problema, até que um dia esse problema seja extinto. Obrigada de todo coração pela presença de todos - ela é soberana, humilde e com esse sorriso simples e cheio de bondade, consegue fazer com que os números no telão comecem a crescer. As doações serão online, depositados em uma conta especialmente aberta para esse evento e tudo está sendo auditado. John e Rose são honestos, bons e raros.
Um casal se aproxima de Evan e Vick e os leva, mas antes, Evan volta para perto de mim e aproxima seu rosto - Quarta-feira? - ele aperta a minha mão e eu concordo com a cabeça. Eu sei que há muito tempo não almoçamos, mas mantemos um contato semanal por telefone.
Percebo que alguém para do meu lado e eu sei que é uma mulher, sei quem é esta mulher. Conheço esse perfume, conheço esse vestido e já o tirei algumas vezes. Gosto do que está por baixo da renda vermelha que destaca sua pele branca.
Tem duas semanas que apreciei essa pele, que senti o gosto do seu sexo e pelo mesmo tempo estou pensando quando eu poderia fazer tudo isso novamente. Estar com ela se tornou viciante e tem me feito muito bem.
- Gosto desse vestido - comento olhando para frente e não a encaro.
- Por isso eu o escolhi - ela devolve a resposta e me deixa com um sorriso no rosto - Duas semanas, Gio? - ela pergunta e fica de frente para mim. Olho com muita atenção para o seu nariz fino, arrebitado, e sua boca tão vermelha quanto o vestido. Ainda me lembro da primeira vez que a vi, ela estava dançando sobre uma das mesas da John John. Desde então estamos em uma espécie de encontros marcados pela discrição, sexo e fugas. Ela tem estado presente e admito gostar muito de nossos encontros depois do expediente. Inclusive a ajudei com sua mudança e agora ela está, coincidentemente, a quatro quadras da minha casa. Segundo ela, foi um bom negócio, mas segundo o que eu vi na saída de sua conta, ela pagou um pouco a mais pela casa e acabou hipotecando uma boa parte.
Nada foi programado, sua curiosidade com sistemas de informação e um casal em crise nos uniu, talvez eu tenha passado a acreditar em destino depois disso.
- Duas semanas, Rocco, você está bem? Como foi a despedida de solteiro em Vegas? - olho para sua face, observo suas duas pequenas pintas perto da orelha, seu brinco de rubi, o rubor de seu rosto e o tom escuro de seus olhos. Toda vez que ela está diante de mim, tento memorizar o máximo que posso de seus detalhes e quando acredito que posso falhar, tiro fotos. Não tenho ideia de quantas fotos tenho de Rocco em minha casa, dormindo em minha cama.
- Estou muito bem - sua língua vermelha tem um movimento preciso, sei disso porque a senti em alguns pontos do meu corpo e diversas vezes em minha boca. Escuto a música começando e é Beautiful Girl, do INXS - E você? Muito trabalho? - Rocco sempre se mostrou muito interessada em minha vida, mas pouco me deixa entrar na sua.
Há duas semanas, em nosso encontro em Las Vegas, perguntei sobre a última tatuagem e ela apenas disse que era tão importante quanto as outras, como se cada desenho de seu corpo fosse feito em uma sequência de fatos que ela consegue se conformar, mas o que teria acontecido? Como eu adoraria que ela me contasse mais sobre a sua vida, me falasse sobre a sua infância ou, pelo menos, que facilitasse as coisas para eu poder descobrir mais sobre seus gostos e, quem sabe, eu possa saber por que seus olhos às vezes se perdem em um infinito que não alcanço.
- Estou bem, trabalho é o que não falta - olho para sua orelha que agora sustenta uma fina mecha de seu cabelo parcialmente preso em rabo de cavalo no alto de sua cabeça. Eu sei que tenho pensado exaustivamente nela e as coisas foram ficando mais intensas; sei que nitidamente estou envolvido, e eu só queria saber se posso me arriscar ainda mais e ter o envolvimento dela também. Tenho medo de estar mergulhando sozinho - Algum compromisso depois desse evento? - pergunto.
- Tenho, me desculpa, mas já havia marcado - ela coça a ponta do nariz e eu sei que ela está mentindo.
Quando mentimos, o sangue se movimenta rápido para o cérebro e o tecido do nariz se expande e isso é um dos alertas que recebo sobre o muro que Rocco Field mantém para se proteger, mas por que tanta proteção? Se ao menos eu tivesse encontrado algum registro, algum problema em um dos milhares de lugares que a investiguei, mas não existe nada e isso é a parte frustrante de lidar com ela, porque ela começa a me desestabilizar, mulheres com regras claras e não tão expansivas. Agora, me vejo pensando todos os dias nessa moça magra, de pele alva, cabelos escuros, como se não fosse interessante viver longe dela. Mas nesse momento, é tudo um grande teatro, eu sei que ela está mentindo, e ela sabe sobre isso, ainda mantemos um pouco de nossa vida em sigilo, apesar de não ser o maior de todos os segredos. Fico excitado com essa encenação dela, em me dizer não com a boca e sim com o corpo.
- Talvez pudéssemos ir para minha casa, um bom vinho - ela olha para a ponta de saltos vermelhos e nega com a cabeça. Esse é o sim que eu estava esperando.
Percebo todos os olhos em nossa direção e eu realmente não me importo. Ela olha para mim e pisca um dos olhos, partindo para o outro lado da festa. Ela mentiu e sabe que isso faz com que eu fique excitado. É o tipo de mentira que vale a pena quando descobrimos a verdade.
Deixamos que aos que estavam assistindo nosso pequeno e discreto contato, imaginem o que quiserem. O que importa é que depois daqui, eu terei o prazer de tirar novamente aquele vestido vermelho, beijar aquela boca e fazer o melhor sexo que sabemos fazer.
No telão as doações aumentam, o som fica mais alto e a música convida os participantes a dançar. Espio Rocco do outro lado do salão e ela segura um copo enquanto me olha, me enviando todos os sinais que preciso.
Ela caminha em direção ao banheiro e eu até penso que pode ser apenas fantasia da minha cabeça, mas não, ela para, olha novamente para mim e sorri.
Deus...
Caminho entre alguns convidados e por Wallace, que está conversando com a morena que ele estava observando alguns minutos atrás. Ela será amarrada, fará sexo e com certeza terá um novo parâmetro para isso futuramente e, para ele, bom, para ele será mais uma em sua lista interminável e discreta de fodas à base de bondage.
As luzes se apagam para uma pequena apresentação no palco e agora eu tenho tudo que preciso.
Vejo uma mulher passando pelo corredor e sigo até o banheiro feminino. Eu conheço a Rocco, não é aqui que ela está. Vou até o banheiro masculino e vejo a ponta de seu sapato à mostra na cabine reservada. Aperto o passo e empurro a porta. Ela está nua, segurando o vestido na mão e eu deixo que minha boca se abra e parto rapidamente em sua direção.
- Maluca - falo beijando-a e abraçando sua cintura.
- Eu sei - ela passa as pernas em torno da minha cintura e ela abre o meu zíper. Sei a emergência que ela está sentindo, é a mesma que a minha, e ela sabe disso, porque sua mão está em meu pau, latejando e eu a quero agora.
Ela o coloca dentro de si e eu a apoio na parede e começo o ir e vir lento, mas não tenho o controle que preciso quando estou com ela, começo a entrar mais forte, mais rápido e ela segura com força meu cabelo com suas duas mãos e olha dentro dos meus olhos.
- Achou que eu tinha algum compromisso que você não fizesse parte dele? - ela fala com a boca na minha e eu mordo os lábios dela com mais intensidade.
- Não consigo ter lógica com você - confesso e enterro de uma vez a fazendo bater na lateral - Silêncio - falo sorrindo e ela me aperta ainda mais com as pernas.
- Goza comigo? - ela sussurra dentro da minha boca e eu não preciso concordar, eu a conheço o suficiente para saber que estamos indo com a mesma velocidade e para a mesma direção.
Ela encosta sua testa em minha boca e busca oxigênio. Eu inalo profundamente o aroma de seus cabelos e penso que com ela eu não tenho tanta pressa, aliás, eu não tenho pressa nenhuma.
Quando eu retornei para a festa, ela já havia saído do banheiro e em meu celular vejo a mensagem dela e automaticamente sorrio:
“Estarei na minha cama, te esperando”
O que eu faço com você, Rocco Field?
4
Rocco
Retoco o meu batom olhando para o monitor do computador. Acabei de voltar do almoço e sei que Christen deve estar voltando também. Ela ainda ficou no restaurante com Ramon, que virou seu apêndice nos últimos tempos, e ela está gostando muito disso. Já eu, tenho vomitado arco-íris todas as noites por presenciar os excessos de um com o outro. Na realidade, hoje eu tenho evitado minha amiga e chefe, ela está me interrogando por conta de Gio e pelo que viu ontem no evento da Power&Heart.
Giovani não foi tão discreto e ela percebeu nossa conversa mais íntima e nossa troca de olhares e isso a levou a começar a bateria de perguntas logo de manhã e me seguir até o restaurante. Graças a Deus o latino apareceu e eu pude escapar.
Abro o meu e-mail e vejo as notificações sobre algumas reuniões que preciso agendar para Christen e uma delas será na Europa. Vou precisar falar com o apêndice dela, porque ele queria fazer uma surpresa e estava esperando uma possível viagem dela a trabalho.
Escuto o meu celular tocando e vejo a mensagem de Thaemy, uma amiga que trabalha na bolsa de valores e está me convidando para uma festa na John John. Obviamente aceito, aquele lugar passou a ser o meu favorito.
Enquanto mando outra mensagem para Thaemy sobre o horário que vou chegar, a porta da minha sala se abre e Christen entra cheia de sorrisos discretos e se senta à minha frente.
- Vamos, me conte tudo! - ela exige e eu a encaro como se não estivesse entendendo nada do que está falando. Ajeito a manga do meu vestido e confiro como se sua intimação não tivesse me afetado.
- Você terá algumas reuniões e sua semana está bem cheia, muitos compromissos, sabe? - deixo claro que ela deveria se preocupar com sua agenda e não com minhas trepadas com Gio.
- Anda, Rocco Field, desembucha - ela insiste.
- O que você quer saber? - pergunto ainda fingindo não saber do que ela está falando.
- Há quanto tempo você e Gio estão tendo um caso? - ela é direta e eu sorrio.
- Gio? Quem é Gio? - sorrio e me levanto, caminhando até a jarra d’água e enchendo um copo.
- Eu acho que mereço saber - ela pega meu ponto fraco, porque Christen não merece não saber nada sobre a minha vida, ela é uma parte importante dela.
- Quer a verdade? - pergunto sorrindo para ela e ela se levanta parando de frente a mim.
- É o mínimo! - ela fala sorrindo e me encara.
- Desde que precisou ir até Malibu encontrar com Ramon, logo depois que recuperou a memória - sorrio e ela leva as mãos até a boca e me abraça.
- Isso tem mais de um ano! - ela fala me apertando e eu ainda não entendi essa alegria - Vocês estão namorando! - a felicidade dela é tão eufórica que parece até que eu estava encalhada.
- Que coisa mais adolescente! Não é namoro - solto dela e ajeito meu cabelo. Finjo não pensar nessa palavra - Eu saio com outros homens e ele com outras mulheres - apesar que, de alguns meses para cá, eu tenho saído só com ele. Agora que percebo isso. Ainda bem que tenho uma festa esta noite e posso retomar minhas atividades extras.
- Como assim? Um relacionamento aberto? - ela questiona e vem atrás de mim.
- Não é um relacionamento, são apenas encontros e algumas noites assistindo filme e falando sobre as teorias da vida. Não existe uma relação, existe um momento sem planejamento futuro, e está muito bom assim - volto a me sentar em minha cadeira.
- Vocês combinam, e esse tipo de “coisa” entre vocês, eu não consigo entender muito bem - ela mexe na alça do seu macacão rosa e volta a me encarar.
- Não queremos nenhum tipo de profundidade - comento e vejo mais alguns e-mails chegando - Estou feliz assim, temos um tipo estranho de nos dar bem sem telefonemas no dia seguinte - explico e meu celular toca sobre a mesa e a foto de Gio aparece, chamando a atenção de Christen.
- Sem telefonemas no dia seguinte? Sei... - o sorriso dela é sarcástico e ela joga o queixo para que eu atenda - Vou deixar você atender o telefonema que não era para existir, mas ainda vamos retomar essa conversa - ela sai sorrindo e fecha a porta.
Poxa, Gio, minha credibilidade perdeu dois pontos com essa ligação. Pego o celular e atendo:
- Oi - falo e escuto um barulho de pessoas ao redor dele.
- Oi, a ligação é rápida. É apenas para dizer que o café estava delicioso e que eu deveria enviar um e-mail para a Starbucks por ter caprichado em meu macchiato - ele zomba porque eu não sei fazer nada na cozinha e a humanidade deveria me agradecer.
- Eu acordei atrasada e vi que estava dormindo, achei prudente deixar alguma coisa para que você não se metesse a mestre cuca logo pela manhã - ele ri e isso faz um sorriso brotar em meu rosto.
- Vou te ver hoje? - ele pergunta e isso é novo, ele nunca me liga para saber. Geralmente ele envia uma mensagem e pergunta onde estou e, minutos depois, ele surge como se fosse normal aparecer e me tirar para ir com ele para o alto de um prédio onde não há sinal de celular porque simplesmente quer um beijo sem o barulho nova-iorquino. Nossos últimos encontros têm sido finalizados com promessas de futuros encontros e as coisas perderam o controle, mas de um modo feliz.
- Eu adoraria, mas eu tenho uma festa para ir. Já combinei com a Thaemy - ele a conhece antes mesmo de me conhecer, acho que por conta de algumas aplicações, não me lembro direito.
- Sem problemas, gostei da nossa noite - ele diz e meu sorriso se abre ainda mais.
- Eu sempre gosto de nossas noites, tardes e algumas manhãs. Você sabe realmente como aproveitar uma ereção matinal - ele sabe que sou desbocada e escuto sua gargalhada - Que barulho é esse? Onde você está? - pergunto e vejo os e-mails chegando.
- Na Times - ele responde - Preciso desligar - ele fala, deixa um beijo e desliga em seguida.
Coloco o celular sobre a mesa e lembro do momento em que ele entrou na minha casa, ontem à noite. Escutei o barulho da porta se abrindo e seus passos estavam morosos, quase silenciosos. Então, ele chegou no quarto e eu estava sentada na soleira da janela, com cada pé em cima de uma poltrona e com meu corpo sendo iluminado pela luz da lua.
- Linda - ele disse e caminhou em minha direção, me beijando entre as pernas e permitindo que eu gozasse em sua boca.
A lembrança causa um arrepio que começa no encontro de minhas pernas e sobe até o meu estômago.
O telefone da minha mesa toca e é Christen me chamando até a sala dela. Agora é a vida real e eu preciso não pensar em Gio como tenho pensado.
***
Chego na John John e vejo Thaemy com Eleonore e Zelda, e eu não consigo olhar para Zelda e não vê-la com um chapéu de bruxa só por conta de seu nome. As três juntas são a prova de que Nova York é a maior mistura de espécies do mundo. Thaemy é negra, alta, cheia de curvas e ainda estou para ver uma mulher que saiba tanto sobre economia quanto ela. Eleonore é quase albina de tão branca e é a mais baixinha. Ela trabalha como assistente de edição da Vogue e sua namorada, Kassandra, é médica e com certeza está de plantão esta noite.
Zelda foi a última que conheci das três. Ela é herdeira de uma rede hoteleira, é uma mulher bem determinada e, no começo, eu não consegui gostar muito dela, achava que suas sardas e seu cabelo muito claro eram um disfarce. Confesso que ainda não morro de amores, mas ela é divertida e não me atrapalha em nada.
Aproximo-me do trio e Thaemy, a que tenho mais contato, me agarra e gira segurando uma garrafa.
- Adorei o tubinho azul! - ela elogia meu vestido - Adoro seus vestidos - ela fala e eu lembro quando Gio me disse que era excitante descer o zíper desse vestido. Fica no meio das costas e vai do pescoço até a cintura.
- E você está perfeita nesse macacão preto, está realmente vestida para matar - brinco e em seguida cumprimento a Eleo e a Zelda.
- Vamos? Reservei um camarote - Zelda fala e subimos a escada em arco do lado direito da John John. Pela quantidade de homens sem camisa e corpos esculpidos, desconfio que esta festa seja direcionada apenas para mulheres. Olho ao meu redor e vejo apenas isso, mulheres que indiscretamente babam pelos homens que servem gratuitamente algumas bebidas.
Aprecio um cavalheiro que passa por mim e segura uma garrafa e duas taças, ele me olha e retribuo segurando a taça e deixando claro que quero ser servida. Ele coloca até a metade e aproxima seu rosto do meu - Posso te esperar, e assim que a festa acabar, eu sirvo outra coisa para você - ele fala e caminha entre as outras mulheres e é nítido que ele fará essa mesma proposta para outras, até que uma aceite... ou várias. Orgias são sempre bem-vindas.
O camarote conta com um segurança e eu sei que ele é o segurança de Zelda, dificilmente ela sai sem um esquadrão ao seu redor. Há sete anos ela foi sequestrada e o resgate chegou a casa dos milhões, segundo a imprensa, mas ela nunca comentou se isso era ou não verdade.
Entramos e eu vou perto da barra de alumínio que cerca o camarote e olho para o palco, vejo a movimentação e as cores vermelho e roxo dançando em sincronia, até que um homem, provavelmente enviado do Olimpo, segura o microfone e deseja boa noite.
Uma onda eufórica de mulheres alucinadas pela bebida e pelo tesão reprimido toma conta da John John.
- É realmente um prazer estar aqui - ele fala e eu só consigo ver seu tronco definido, não escuto nada além dele.
De repente as cortinas se abrem e eu acho que vi algo assim essa semana em minha rede social. É uma apresentação que está rodando as melhores boates do mundo, são homens que dançam muito bem e que têm lotado as casas noturnas por onde passam.
As bebidas começam a chegar e esqueço completamente que amanhã eu preciso trabalhar. Tequilas, drinks exóticos, whiskey, vodca e quando percebo estou sobre a mesa dançando ao som de Rehab, de Amy Winehouse.
Sinto as batidas das músicas e jogo meus saltos longe. Escuto o apoio de Zelda e Eleonore, elas gritam e eu continuo apenas ao ritmo da música e esqueço se estão tirando fotos, ou se amanhã terão assunto em minha timeline, porque eu não tenho uma imagem para me preocupar e minha reputação é a mesma desde sempre, uma dança inocente não altera em absolutamente nada.
Meu copo está vazio e eu sinalizo para o homem que está servindo Thaemy, pedindo mais uma dose.
Agora eu não tenho muita nitidez e parece que estou flutuando. Voar é o sonho mais antigo do homem.
Fecho meus olhos e deixo que o timbre entre pelo meu ouvido e me permito apenas ser livre. A liberdade também é um sonho.
Meu copo cai de minha mão e se choca contra a mesa, deixando cacos ao meu redor e alguns voaram em direção às meninas.
- Não se mexa, vai cortar seu pé - Eleonore avisa e um dos homens sem camisa se aproxima e me pega no colo, me colocando no sofá e segurando meus pés, verificando se não me cortei.
- Voxê é xentil, Xiovani Makenxi - falo e o homem sorri.
- Lamento não ser o tal Xiovani - ele fala e me deixa ali, sem conseguir assimilar as palavras, sem saber quem eu sou, até que olho para Eleonore e sei que estou mal. Preciso apenas tentar fazer o mundo parar de girar. Alguém pede um refrigerante para mim e assim que o copo chega, Thaemy coloca o canudo em minha boca.
- Beba - ela diz e eu obedeço, porque também não tenho outra alternativa, já que o canudo está praticamente em minha garganta.
- Não estou bem - falo sorrindo para Thaemy e ela ri.
- Jura, amiga? Quase não percebi - ela zomba e eu sorrio ao olhar para ela - Fique aqui e vamos ver se você melhora, pedi uma porção de fritas para tentar recuperar parte de sua consciência - ela fala e mexe em meu cabelo.
- Pede com queijo.
- Já pedi, conheço seus gostos e me surpreendeu ao beber tanto e dançar por tanto tempo sobre aquela mesa e não cair - ela fala e parece que estou ficando melhor, sinto até que posso voltar a beber.
- Música e dança não podem me derrubar - comento e bebo todo o refrigerante e sorrio para ela. Tento disfarçar um arroto, mas ele sai mais alto e gargalhamos juntas por isso.
Ajeito-me no sofá e uma pessoa que cuida da limpeza chega retirando os cacos e deixando tudo pronto para a próxima rodada.
- Você é maluca - Zelda fala sorrindo.
- Totalmente - Eleonore completa e eu tento me levantar, mas minha cabeça gira em trezentos e sessenta graus e tudo fica turvo, escuro e eu me sento novamente.
- Acho que vou ficar sentada mais um tempo - faço piada da minha própria condição. Pego a minha bolsa e tento achar meu celular. Vejo que tem uma mensagem, mas estou sem coordenação para ler, minha visão está embaçada e eu desisto.
Sinto que estou piorando e acho que agora eu preciso de ajuda.
***
Giovani
Olho para o monitor número dois e a vejo sendo retirada da mesa por um imbecil que faz parte desse bando que infelizmente aceitei dentro do meu estabelecimento para esse show ridículo.
- Por que você fez isso? - resmungo baixinho só para os meus ouvidos e os dois seguranças que estão comigo fazendo o trabalho deles não escutam.
Uma mensagem chega em meu celular e eu leio. Eu sei o que está acontecendo, estou na central de segurança da John John, e desde que cheguei aqui, não vi absolutamente nada que me deixasse contente.
“Gio, estou com um problema, a Rocco bebeu um pouco além e eu não consigo carregá-la. Pode vir a John John?”
Eu sei, Thaemy. Zelda e Eleonore foram embora e te deixaram aí. Amigas... Nunca gostei de nenhuma das duas. Primeiro, Eleonore não tem sal algum. Não gosto de pessoas sem emoção, e Zelda é a vadia que não tem cérebro.
Mando uma mensagem de volta e eu confio em Thaemy, nos conhecemos há mais de dez anos e ela me ajuda com informações privilegiadas dentro da bolsa de valores. Ela sabe que eu e Rocco temos alguma coisa e foi por isso que eu liguei para ela assim que Rocco me disse o que faria essa noite.
“Estou a caminho” - digito e envio a mensagem, saindo da sala de segurança e caminhando até o camarote.
A John John está lotada de mulheres e, mesmo assim, nada disso me atrai. Quero apenas levar a Rocco para sua casa e impedir que outro imbecil coloque as mãos nela.
Não é porque temos um lance mais moderno que estou disposto a assistir de perto outros rodeando a Rocco.
Isso não deveria me incomodar, mas hoje, especialmente esta noite, incomodou e eu chego ao camarote e vejo Rocco sentada com os joelhos dobrados e com a cabeça encostada no encosto do sofá.
- Nossa! Chegou rápido! - Thaemy comenta. Não cheguei, eu já estava aqui antes de vocês chegarem.
- Estava na escada quando me enviou a mensagem - minto porque a verdade não pertence a mais ninguém.
Tiro meu blazer e entrego para Thaemy.
- Assim que eu a pegar, quero que a cubra, esse vestido é muito curto - comento e vejo Thaemy me olhar com ternura. Sim, Thaemy, eu não quero que ninguém veja o que eu vejo.
Assim que pego Rocco no colo, Thaemy coloca o blazer sobre ela.
- Vou com você e levo as coisas dela - Thaemy fala com a bolsa e os saltos de Rocco na mão.
Passo pelo segurança da casa que estava perto do camarote e aceno para que ele abra caminho para mim e ele o faz. Descemos em direção à saída e caminhamos até o estacionamento ao lado da boate.
- A chave está no meu bolso direito - falo e Thaemy pega, acionando o alarme da minha GLS 350. Ela abre a porta de trás e eu a deito. Thaemy coloca os sapatos e a bolsa de Rocco no assoalho do carro e depois fecha a porta - Obrigado - agradeço e caminho em direção à porta do motorista.
- Gio - Thaemy me chama.
- Oi - paro e não olho para ela, olho para o chão porque não estou feliz essa noite.
- Ainda bem que ela tem você - Thaemy comenta, surpreendendo-me.
- Tem como voltar para casa? - pergunto como se não tivesse visto o momento em que ela estacionou o carro na frente da John John e o manobrista o levou para o estacionamento na outra quadra.
- Sim, estou de carro, obrigada - ela acena positivamente em sinal de despedida e caminha para fora do estacionamento.
Entro no carro e acelero em direção à casa de Rocco.
- Por que estou aqui? - ela pergunta com a voz embolada - Eu estava me divertindo - ela resmunga. Mas eu não estava e na realidade não gostei de ter visto o que vi.
- Porque a festa acabou.
- Xio!!! - ela fala meu nome de maneira feliz e com o chiado típico de quem exagerou nas doses - Ainda bem que é você, pensei que tinha entrado no carro de algum desconhecido - também não gosto de ouvir isso.
- Como você está se sentindo? - pergunto e rapidamente espio o movimento de seu corpo se ajeitando no banco de trás.
- Bêbada, mas estou conxiente - ela deixa a frase engraçada - Você é um bom amigo - agora começa a história de bêbados. Pessoas que bebem em demasia ficam milionários de repente e amam todo mundo.
- Rocco, só você para colocar as palavras bêbada e conxiente na mesma frase de maneira positiva - brinco e ela ri. Até bêbada o som de sua risada é gostoso de ouvir.
- Mas eu estou ficando melhor, eu só não posso me levantar, porque aí eu pioro - eu adoraria não achar graça, mas não consigo.
- Então, não se levante, não quero ter que me preocupar com vômitos em meu carro - brinco com ela.
- Tarde demais, Xio - ela fala e eu nego com a cabeça.
- Não acredito que vomitou no meu carro - ralho brincando e escuto a risada dela.
- Estou brincando, seu carro é muito caro para ter restos de salmão e um sanduiche do Burguer King, porque foi isso que comi hoje.
Talvez eu devesse passar mais tempo com ela, assim eu não teria que ver o que eu vi hoje. Eu já tinha visto-a com outros homens, inclusive os beijando, mas isso tem muito tempo e de uns tempos para cá eu não a vejo com outras pessoas, e acho que me acostumei com a ideia de que mais ninguém tocaria seu corpo.
Paro o carro em frente à sua casa e antes de tirá-la, pego a chave dentro de sua bolsa e deixo meu caminho livre para passar com ela em meu colo.
Levo-a para o quarto e a deito na cama, volto, fecho meu carro, a porta da sala e observo-a se encolher em posição fetal sobre a cama.
Por mais que ela queira dormir, um banho é necessário. Aproximo-me dela dobrando as mangas da minha camisa e a puxo de forma que ela fique sentada e eu me abaixo ficando na altura de seus olhos.
- Quero que me escute - ela coloca o indicador sobre meus lábios.
- Preciso fazer xixi - intimidade máxima alcançada com sucesso, eu já a vi fazendo isso, mas a ação nunca foi declarada desta forma.
- Vou te colocar de pé e tirar o seu vestido - falo e ela sorri.
- Voxê gosta dexe vestido, eu sei que voxê gosta desse vestido - ela está rindo do que ela mesma fala e eu aceno que sim.
- Gostava mais antes, mas hoje outro homem colocou as mãos nele, então deixou de ser o meu favorito - ela cerra os olhos em minha direção e dança com a boca em bico lindo.
- Exe vestido me custou mais de quinhentos dólares, voxê deveria amá-lo pelo resto de sua vida - eu a coloco de pé e passo os meus braços em torno de seu corpo, parece um abraço, mas estou apenas descendo o zíper - Voxê está curiosamente cheiroso - ela roça a ponta do nariz em meu pescoço.
- O que seria estar “curiosamente” cheiroso? - pergunto e tiro o vestido olhando seu corpo apenas de calcinha fina e azul como o vestido. Olho para a borboleta que ela tem entre os seios abaixo da linha do soutien.
- Eu definitivamente não xei, eu só xei que o cheiro é bom. Voxê sempre é tão perfumado, tão cheio de coisas boas - ela fala mole e eu sorrio, porque são coisas que ela não fala quando está sóbria. Tiro meus celulares do bolso e coloco ao lado das chaves do meu carro sobre o criado-mudo.
- Vamos - a levo até o chuveiro e abro tudo para que a água saia mais para fria do que quente. Tiro sua calcinha e a coloco debaixo da água.
- Está fria demais - ela reclama e se abraça tentando se aquecer. Observo a pequena asa que ela tem tatuada na lateral de seu indicador direito - Você não está sendo gentil agora - ela fala e seus olhos estão fechados. O chiado de algumas palavras foi embora com o choque frio da água.
- É preciso - eu falo e ela me puxa para junto dela debaixo da água e eu não hesito. Ela me abraça e eu identifico um pedido de proteção cada vez que a sinto tão perto.
A Rocco é frágil, mas tenta disfarçar isso quando realça seus lábios de vermelho e sobe em seus saltos altíssimos.
Não sei há quanto tempo estamos ali, ou quantas vezes a senti respirar fundo e se perder ao me olhar, mas me sinto melhor quando posso tocar em seu corpo, porque sei que posso ser melhor quando estou com ela.
Deito-a na cama assim que coloco seu baby-doll que fica embaixo do seu travesseiro e ela se vira com os olhos fechados e suspira. Tiro a minha roupa molhada e levo até a secadora. Vou até o closet e sei que tenho alguma camiseta por aqui, assim como tenho coisas dela misturadas às minhas em minha casa.
Sento em uma das poltronas de seu quarto e olho para ela, analiso os telefonemas para fodas breves e corriqueiras que recusei nas últimas semanas e chego a conclusão de que todas as vezes que recusei, era porque estava pensando em ficar com a Rocco e não com alguém que pudesse fracassar ao tentar substituí-la.
***
Rocco
Olho para a cama e o vejo em um sono profundo. Ele está de bruços com as mãos embaixo do travesseiro. Já passei as suas roupas e sei que preciso ir trabalhar daqui trinta minutos, mas olhar para ele é tão compensador. Giovani é o tipo de pessoa que consegue transmitir paz, mesmo que ele não esteja se sentindo assim.
Estou segurando uma caneca com café e achei que acordaria pior, mas apenas uma pequena dor de cabeça me incomoda. A bebida é de fácil digestão em meu organismo.
Seus cabelos estão bagunçados, sua barba está maior e agora ela é macia de tocar. Giovani tem belos olhos azuis, belo corpo torneado e sabe fazer sexo, e como se não bastasse, Deus ainda lhe deu a bonificação de ser um excelente cozinheiro.
Sou flagrada pelos olhos dele que se abrem e eu sorrio.
- Bom dia - sorrio e me aproximo com a caneca, me sento ao lado dele que se coloca de lado e pega a caneca da minha mão.
- Bom dia - responde sorrindo.
- Qual é o saldo do prejuízo de ontem à noite? - pergunto zombando e ele está bebendo o café e levanta as sobrancelhas.
- Alto - ele responde e me entrega a caneca.
- Como eu pago? - pergunto colocando a caneca sobre o criado-mudo e tirando meu baby-doll. Ele fica com a barriga para cima. Subo na cama e coloco cada pé de cada lado do seu quadril enquanto ele segura o seu pau e eu me sento lentamente, sentindo-o me preencher completamente e me tocar no meu ponto mais profundo.
Ele fecha os olhos e solta um pequeno gemido, segurando as minhas mãos com os dedos entrelaçados, enquanto subo e desço com ele dentro de mim.
Agora não estou apenas buscando o meu orgasmo, estou matando a saudade que sinto da nossa conexão. Giovani é o único homem que me faz um bem sem saber a proporção disso.
- Acho que vou dormir aqui mais vezes - ele fala e eu gozo ao seu redor. Mantenho o ritmo e ele fecha os olhos, gozando.
Aninho-me sobre seu colo e coloco meu ouvido perto do seu coração, escuto os tuns lá dentro e isso faz os meus tuns serem mais felizes.
5
Giovani
Sohan, meu assistente há oito anos, me encara e espera que eu mude a minha ordem, mas eu fui claro e não costumo voltar atrás de absolutamente nenhuma decisão que tomo.
- Está esperando que eu mude de ideia? - pergunto.
- É como esperar por um milagre, mas acredito que sua ordem não seja tão prudente - ele até tem um pouco de razão.
- É muito simples, apenas fique fora por um tempo, eu te aviso quando e onde vamos nos encontrar. Entendo sua preocupação, mas eu preciso de você em outro lugar nesse momento - meu olhar se divide entre ele e os monitores à minha frente.
- Está correndo riscos - ele me alerta.
- Desde o momento em que nasci, meu caro Sohan - sorrio para ele e volto a analisar a tela.
Sohan acena consentindo com a cabeça e vai em direção à porta.
- Eu posso voltar a qualquer momento - seu alerta me soa preocupado.
- Eu sei disso, por isso trabalha para mim e eu confio em você - deixo o tom de minha voz com a sensação de despedida que ele precisa para abrir a porta e sair.
Olho para a tela de um dos oito monitores que estão na minha frente, dois deles estão sobre a minha mesa e os outros seis devidamente alinhados na parede. Observo com atenção uma movimentação e percebo que se trata de algum hacker querendo comprometer a interface de um de nossos clientes, nesse caso é um dos bancos de maior prestígio dos Estados Unidos.
Gargalho ao perceber que ele falha, claro que ele falha, coloquei a Brooke para cuidar de todas as muralhas que criamos em torno de cada sistema. Se existe alguém no planeta que seria capaz de criar alguma barreira contra hackers, esse alguém é ela, o melhor hacker que já conheci e, obviamente, contratei.
Alguém bate na porta e eu autorizo a entrada, é Brooke e ela está rindo. Seus olhos estão sobre seu tablet e ela caminha em minha direção e como sempre, e depois de toda a liberdade que ela conquistou por aqui, ela se senta com parte de seu traseiro em minha mesa.
- Gio, olha isso - ela põe o tablet sobre a mesa - Posso te mostrar o resultado dessa invasão tosca desse imbecil? - ela aponta para o meu teclado, e assim que aceno que sim com a cabeça, ela o puxa para o seu colo. Antigamente os fios não a deixariam fazer isso, mas isso foi abolido graças a tecnologia wireless.
- É sério isso? - pergunto e gargalho jogando minha cabeça para trás - Ele tentou usar isso para entrar no sistema? - olho para a maratona que o idiota fez para abrir a porta dos fundos e ele poderia ter conseguido entrar tranquilamente pela frente se tivesse neurônios para isso.
- Muito amador, olha lá - ela joga o queixo para os monitores e eu acompanho a obra de arte que Brooke faz em minutos, é como estar diante de uma orquestra sinfônica, sozinho, podendo apreciar cada nota emitida, por cada um dos instrumentos. Brooke é muito boa e é o tipo de pessoa que preciso manter por perto. Ela é perigosa demais para não estar exatamente onde está agora.
A porta se abre repentinamente e é Alexander que já fecha a cara e deixa bem claro que sente ciúme da Brooke. A verdade é que me divirto com isso, gosto de saber que posso impactar pequenas fúrias e Alexander é um alvo perfeito.
- Estou perdendo alguma coisa? - ele questiona e eu gargalharia novamente, porque assim como o hacker, vamos frustrá-lo também.
- Estou aqui para que não perca nada - Brooke se encarrega de deixá-lo ainda mais irritado - Olhe, veja como espantamos os ratos - ela mostra sua habilidade em colocar em destaque o IP que está sendo usado pelo amador que se autointitula como Destroyer.
- Isso é trabalho, e não diversão - ele rosna como um cachorro preso a uma corrente.
- Não sabia - ela responde e olha para ele com um sorriso que o desmonta. Se as mulheres soubessem o quanto nos controlamos diante de um sorriso apaixonado, elas ganhariam o mundo em questão de segundos.
Ele se aproxima e se coloca entre mim e ela, sorrio e me levanto.
- Gio, a Convex marcou uma reunião para segunda-feira com o pessoal da Israia Inc., e agora espero que eles percam a conta. Até onde sei só falta eles serem descartados e com isso teremos mais uma conta, ela vai ser uma das principais.
- A reunião será aqui em Nova York ou em Vancouver? - pergunto e Brooke comemora sua vitória.
- Antony Segali tem vinte e dois anos e acaba de perder tudo que estava em seu HD - ela vibra e vejo nas telas na parede a cara de desespero dele. Ela acionou sua câmera e agora o jovem de cabelos enrolados e óculos esmurra sua mesa de computador.
- Será aqui, na sede da Convex - Alexander responde - Esse moleque estava tentando derrubar o Iron? - Alec pergunta sobre o sistema do banco, que batizamos.
- Exato, e olha só, seu pai é Ronald Hirts, juiz de pequenas causas do estado de Oklahoma; a mãe é uma dona de casa, e pelas fotos quase sem alegria, tudo indica que o marido esteja bem ausente - ela deixa o perfil da mãe do rapaz nas telas em minha parede - A solidão é algo devastador. Esse menino não tem amigos reais e passa horas com jogos online - ela tem a ficha da família nas mãos e mais uma vez eu tenho certeza que Brooke é uma pessoa que preciso ter o mais perto possível.
- Não seja cruel com ele - peço.
- Você tem muita caridade em seu coração. Esse putinho estava tentando derrubar nosso sistema - Alexander se mostra parcialmente irritado.
- Ele é só um garoto - explico com tranquilidade.
- Exatamente, e você já foi um garoto como ele - ele rebate.
- Então, e olha só onde cheguei. Mas devo corrigi-lo, aos vinte e dois anos, eu já movimentava uma empresa e ela já valia pouco mais de cinco milhões - bato em seu ombro e me sento em uma das poltronas de minha sala - Alexander, esse garoto não tem talento para isso, se tivesse, obviamente eu o contrataria, mas isso você já ouviu de mim - sorrio e Brooke me encara - E você, meu amigo, sabe que eu faria isso, gosto de saber que os melhores estão por perto, são peças raras e que não podem ir para a concorrência. Pense comigo, imagina se esse garoto estivesse trabalhando na Israia, a conta já seria nossa - sorrio para ele e o vejo negar com a cabeça e dobrar a manga de sua camisa azul.
- Você tem uma visão perigosa - Brooke comenta.
- Não acho, da última vez que pensei nisso e executei, trouxe para a Oracle a melhor hacker que já conheci e agora ela está sentada sobre o tampo da minha mesa, usando um belo conjunto branco de terninho e calça de alguma grife cara que apenas um salário de um bom profissional consegue ganhar - olho para ambos que agora me encaram - Gosto de gente profissional ao meu lado, isso não me desgasta e faz o meu dinheiro e tempo valerem bem mais - sorrio e Brooke vem em minha direção e fecha o punho, me cumprimentando como se estivéssemos no Bronx.
- Muito bonzinho, por mim ferraria com o tal garoto do porão - ele aponta para a cara do moleque desesperado que aparece em um dos monitores.
Caminho para perto das telas e olho nos olhos do garoto. Comparo minha vida a dele, que está em um porão e sem nenhum tipo de estrutura que me mostraria a fortuna de sua família. Àquela idade, eu já possuía propriedades no mundo.
Já consegui muito dinheiro nessa vida, e agora os meus objetivos são outros, tenho planos mais importantes e um garoto desesperado não está entre eles.
- Alexander, o que você vê quando olha para esse jovem andando de um lado para o outro? - pergunto e aponto para o tal Destroyer.
- Vejo um garoto ferrado - ele responde e Brooke se senta na minha cadeira e assiste o que estamos fazendo. Alexander para do meu lado e encara o pobre hacker sem talento.
- Pois é, ele já é um ferrado, acha justo eu querer ferrar esse coitado ainda mais? Você - coloco meu indicador em seu peito assim que me viro de frente para ele - sabe melhor do que ninguém que eu poderia ferrar até mesmo o juiz, que é pai dele e, nitidamente, tem outra família, caso contrário não trabalharia em Oklahoma e deixaria sua família em Missouri. Eu tenho certeza que ele não dirigiria por mais de seis horas todos os dias e, pelo visto, ele não faz isso todos os finais de semana - caminho para bem perto de um dos monitores, que me oferece detalhes do porão onde o garoto está - Veja - aponto para o canto.
- O que é isso? - Alexander pergunta e Brooke agora se aproxima e tenta enxergar.
- Esse garoto tem a atenção do pai através do passado, olhe as fotos - caminho para a minha mesa e pego o teclado ampliando a imagem - Não tem nenhuma foto atual, apenas fotos de quando o tal hacker ainda cabia nos ombros do pai - mostro um retrato em que o menino segura uma bola de futebol americano no alto e está sentado no pescoço de seu pai.
- Isso é irrelevante, você teve os melhores pais do mundo e fazia o que ele fez - Alexander comenta.
- Me conhece há tantos anos e sabe tão pouco sobre mim - comento com a voz bem baixinha - Nunca roubei ninguém, já fiz ATMs soltarem algumas notas, mas não peguei nada para mim. Esse garoto precisa mostrar que ele pode fazer e eu apenas queria aperfeiçoar a minha técnica. Ele entrou em nosso sistema para desviar dinheiro, já que não consegue atenção. Nunca me escondi em um porão - falo calmamente e Brooke me encara.
- O erro é o mesmo - Alexander justifica.
- Com certeza, mas quando se canaliza para o lado certo, podemos resgatar pessoas, lapidar profissionais e nos tornarmos imbatíveis no que fazemos - comento e coloco o teclado sobre a mesa, enfiando minhas mãos nos bolsos - Brooke é a prova de que um caráter sólido e bem estruturado não pode ser corrompido facilmente, aliás, uma pessoa que possui um bom caráter não se corrompe - olho para o garoto que agora joga a sua cadeira longe - Os pais dele estão se divorciando, ele quer dinheiro para fugir e está enfrentando uma fase ruim e sem amigos, tem ideia do tipo de coisa corrosiva que isso significa? - pergunto olhando para o meu amigo.
- Como sabe sobre isso? Como sabe que os pais dele estão se divorciando? - Alexander pergunta e tenta olhar mais de perto a imagem que os monitores mostram.
- Uma mochila embaixo do criado-mudo, um mapa com tachinhas e uma troca de roupa sobre a cama, ele transferiria o dinheiro e sairia tão rápido que nem mesmo sua mãe, que deve estar chorando por conta da separação, descobriria a tempo de impedir - explico e ele olha os itens que falei.
- Ele pode estar indo para escola - Brooke diz ao se levantar de minha cadeira e se apoiar sobre minha mesa.
- Estamos em julho, Brooke, e ele já passou da idade de fazer um acampamento de verão - sorrio ao explicar e ela se senta novamente em minha cadeira e digita rapidamente algumas informações e, no instante seguinte, aparece o e-mail com o pedido de divórcio do pai que alega estar confuso. Na realidade, ele deve estar apaixonado por alguma advogada estagiária que quer alçar um voo mais alto e para isso vai trepar com os velhotes do tribunal.
- Isso que você faz é fantástico - Brooke me elogia.
- Não é, Brooke, se você se aproximar demais de alguém, não vai conseguir ver os detalhes. São detalhes que nos contam sobre as pessoas - olho para ela que está com a boca aberta.
- Você é perigoso - ela brinca e eu sorrio internamente.
- Não, pelo menos não agora - pisco para ela e Alexander está com uma mão esfregando o queixo e outra, em sua cintura. Ele está tentando entender o cenário que traduzi para ele e isso é outra falha humana, o cérebro dele já captou o que eu disse e agora essa informação vai prevalecer porque ele não pensou sobre isso antes e a minha voz, com os detalhes que apresentei, se tornam plausíveis.
A mente humana é aterrorizante e altamente manipulável.
- Não acha que ele poderia ser um futuro talento? - Brooke me pergunta e eu pego a minha carteira que está em minha gaveta e coloco no bolso interno do meu blazer.
- Não, infelizmente o caráter dele é ruim. Ele queria roubar. Tenho um almoço marcado com Evan, senão olharíamos de perto quantos pequenos furtos ele já fez - falo e coloco o celular em meu bolso também.
- Consegue detectar que ele já roubou antes? - ela está intrigada com minha perspectiva.
- Olhe para o terceiro monitor - a vejo se aproximar e olhar - Dê um passo para trás, se olhar de perto não vai perceber - a oriento e ela se afasta.
- Fale, Gio, como sabe que ele já roubou antes? - ela pergunta e olha para as telas.
- Os móveis são velhos, sua cama é da década de oitenta e deve ter sido dada por algum parente, mas no canto do quarto tem equipamento de esqui, duas bicicletas e uma caixa de um drone em cima do armário. As pessoas deixam pistas sobre o caráter, esse aí eu não consigo recuperar, ele não tem talento e é facilmente corrompido - justifico e ajeito meu cabelo.
- Gio, me desculpa, mas o pai dele é juiz! - ela diz e Alexander cruza os braços e assiste curioso minha percepção sobre o Destroyer.
- Brooke, deixou passar um detalhe - falo e ela olha para mim e, depois, para o monitor.
- Qual?
- O pai dele não é juiz, o pai dele faleceu ou simplesmente foi embora e a mãe se casou com o juiz depois de alguns anos, do contrário, Antony teria o seu sobrenome e ao menos teria dinheiro. Já parou para pensar que o tal Antony pode ter sido rebelde o suficiente para que o juiz não aguentasse e pedisse o divórcio? Talvez com isso o tal padrasto não tenha tido motivação para lhe dar uma vida com mais conforto - concluo.
- É mesmo, o sobrenome é diferente - ela diz.
- Você vai ficar maluca se passar muito tempo com Gio - Alexander diz e abre a porta da sala e espera Brooke se aproximar dele para sair. Antes, ela alcança o tablet e o acompanha - Manda um abraço para o Evan - Alexander pede assim que tranco a minha sala e caminho em direção ao elevador e aceno que sim com o polegar.
Seres humanos, tão previsíveis. O garoto simplesmente pegaria o dinheiro e iria atrás da verdade e contaria para a mãe que estava sendo enganada, ou... apenas roubaria, porque esse é o meio mais fácil de conseguir dinheiro e também o mais eficiente para você se perder.
***
Caminho entre as mesas do Tribecca e, novamente, esse é nosso ponto de encontro. Aqui temos Julian, o garçom que nos serve há tantos anos que nos conhece e sabe que preferimos a mesa ao fundo. Muitos planos já foram concebidos nesse lugar.
Vejo Evan sentado olhando para a tela de seu celular e de repente ele sorri. Talvez seja Victoria do outro lado, enviando alguma coisa que o faça feliz.
Ele recorreu a muitas consultas com Dr. Ethan antes de conseguir ser livre, mas ainda me pergunto até que ponto essa liberdade é realmente existente. Aproximo-me, ele olha para mim e se levanta.
- Meu amigo - ele me abraça e encerra com dois tapas em minhas costas. Eu conheço o peso desse abraço e ainda mais profundamente o peso da palavra amigo. Evan precisou de vários tipos de refúgios nessa vida, quando foi traído por Susan e seu melhor amigo na faculdade, quando se perdeu entre o desejo por Vick e o acordo que tinha com os cavalheiros do Clube 13.
Não sei se foi Paul que ao trepar com Susan moldou o Evan de hoje, mas ele foi o responsável pela desconfiança que Evan passou a ter sobre a humanidade. Jovem, rico, construiu um império e só quando percebeu que seu passado estava prestes a detonar o seu futuro, se deu conta de que a vida é mais do que o saldo de sua conta ou a soma de mulheres em sua cama.
- Muito trabalho? - pergunto e me sento de frente a ele. É possível notar o fator tempo em seu rosto. Estamos envelhecendo... precocemente talvez.
- Não vou reclamar disso, mas tenho tido menos tempo e o pior, Victoria tem sentido minha ausência - ele comenta e Julian se aproxima. Peço um gim com tônica, Evan pede uma água e uma dose de licor de frutas vermelhas.
- E os gêmeos? - pergunto sobre Cora e Romeo. Eu sei que eles são o ponto forte e fraco de Evan. Quando Victoria perdeu o primeiro filho, vítima de uma brutalidade indescritível, ele foi à lona, tentou resgatar a esposa de todas as formas e foi nessa época que eu vi Evan, verdadeiramente, derrotado. Ele abriria mão de toda a sua fortuna por ela.
- Romeo, com sua habilidade numérica e raciocínio rápido, está enlouquecendo Victoria, ainda bem que Cora deixa tudo mais calmo e com mais leveza. Admito que Gunter me ajuda e muito com Romeo, o garoto é louco por ele - Evan explica e nossas bebidas são servidas.
Claro que Gunter seria muito próximo das crianças, suas perdas nessa vida são absurdamente enlouquecedoras e ainda tento descobrir como ele consegue se manter firme em cima das próprias pernas. Primeiro, foi Caroline, sua esposa que morreu lentamente, ele não pôde fazer nada, e depois, ele viu seu anjo, a pequena Alice, partir. A morte da pequena fez Gunter se perder, duas vezes, e quando Victoria engravidou dos gêmeos, ele se encontrou, mas ainda é visível em seus olhos toda a dor do passado. Talvez hoje, essa dor seja brevemente esquecida por conta das novidades que Gunter esteja vivendo, mas se ele está guardando segredo sobre isso, eu não me sinto digno de contar.
- O garoto é genial e Cora é toda delicadeza de Vick em uma versão menor. Estou feliz de estar aqui, temos tido menos tempo e nossas vidas tomaram rumos diferentes - comento e ele segura o copo e me encara.
- Gio, vi uma matéria sobre uma festa no Palácio - agora eu entendi a necessidade dele em almoçar comigo, há tanto tempo não fazíamos isso - Aquele lugar deveria ser destruído e não aparecer como destaque da noite de balada espanhola - ele observa e leva o copo à boca. Essa é a maldição do Clube 13, por mais que ele não faça mais parte de tudo isso, o Clube ainda faz parte dele.
- Eu sei, mas acho que as coisas saíram do controle e Marco ainda não percebeu isso - comento e giro o copo sobre a mesa - O Palácio Hanzel se tornou um perigo iminente.
- Confesso que quando Gunter cuidou da venda da minha parte, passando a presidência para esse tal Marco O‘Neil, eu sequer quis saber o nome dele, mas depois de algumas semanas, foi inevitável não saber de quem se tratava e eu não me perdoaria se alguma coisa acontecesse - ele fala e inclina seu corpo em minha direção sobre a mesa e olha para os lados e analisa se ninguém pode ouvir nossa conversa - Gio, é prostituição internacional disfarçada de entretenimento legalizado e as fotos do Palácio estão na internet - ele está olhando em meus olhos.
- Isso não vai atingir você - pego o copo e ameaço beber, mas antes continuo - Você está livre - falo e bebo apenas uma pequena dose.
- Como não vai me atingir? Eu comecei aquela merda e coloquei meus amigos nisso, você está lá e se alguma coisa acontecer com você, acontece comigo também, somos amigos, não se esqueça disso e isso tem um valor potencialmente crucial para mim - eu sei, meu amigo, e você não faz ideia do quanto tudo ficou bagunçado.
Julian se aproxima e pega nossos pedidos. Em sequência, ele nos deixa e eu percebo no olhar de Evan que ele realmente está preocupado.
- Não se preocupe, o que poderia acontecer de tão grave? - questiono e me ajeito na cadeira bebendo mais um pouco do meu gim. Eu sei exatamente o que pode acontecer de mais grave.
Julian tira os pratos de nossas sobremesas e Evan e eu decidimos continuar por ali e tomar mais algumas doses. Meu celular toca, é Sebastian.
- Alô? - ele está com voz tensa e precisa falar comigo com urgência - Estou no Tribecca, te espero aqui - falo e rapidamente ele desliga.
- O que foi? - Evan pergunta.
- Sebastian. Está vindo para cá. Parece estar com problemas - comento e mexo na colher que ficou no canto da mesa.
- Será que alguma coisa com Vivian ou com a mãe dele? - Evan pergunta e eu realmente não sei.
Sebastian sempre foi o cara divertido. Fazia-se de canalha, mas, na realidade, era um grande disfarce para esse Sebastian que surgiu assim que Vivian chegou em sua vida. Claro que eu poderia ter evitado uma série de problemas para ele, assim que eu descobri quem era Vivian Lake e de quem ela era irmã. Eu pensei em contar, mas ele não teria amadurecido, e por mais que eu cuide muito bem dos meus amigos, algumas dores são inevitáveis. A vida é assim.
- Não acho que seja isso - desconfio do que possa ser, mas guardo essa informação para mim e peço mais um pouco de gim para Julian, e Evan pede para ele também.
- Desconfia de alguma coisa? - Evan me pergunta.
- Não, pode ser qualquer coisa vindo de Sebastian - sorrio e tento descontrair o clima tenso. Eu sei que de carro ele não vai demorar mais do que quinze minutos para chegar aqui.
Meu celular vibra. Pego-o em meu bolso e vejo que é Rocco me enviando mais uma mensagem.
Eu preciso ter mais de Rocco, porque tenho de maneira imprudente entregado boa parte de mim para ela. Sinto-me confuso e perdido, mas mesmo assim eu gosto de estar com ela, eu gosto do cheiro que seus cabelos têm e dos desenhos de sua pele.
Vejo a mensagem mais duas vezes e alguma coisa aperta aqui dentro, talvez seja saudade.
Olho para Evan e ele está me encarando.
- Minha boca está suja? - pergunto, porque ele está olhando para ela.
- Gio, somos amigos há anos, não vai me dizer o que está acontecendo? - ele pergunta e eu preciso conversar sobre isso. Rocco é a mulher que vai acabar me levando para a terapia, suas manias e seu estilo livre e quase rebelde me conquistaram, mas admito que em alguns momentos ela consegue me enlouquecer.
- É que... - sorrio e nego - Tem uma mulher... Bom, ela é especial mas... - vejo que uma cadeira é arrastada bruscamente do meu lado e Sebastian, quase sem ar, conseguiu chegar aqui em menos de dez minutos.
- Olha - ele me entrega um pedaço de papel e eu leio e entrego para ele calmamente.
- Respire, Sebastian - peço.
- Respirar? Foi Carter quem recebeu essa porra junto com uma rosa preta, Gio. Eu continuar respirando não está nos planos dela, acredite.
- Precisa manter a calma, um ataque de histeria não vai ajudar - levo o meu copo até a boca e permito que uma pequena dose atravesse a minha garganta. Analiso o olhar desesperado de Sebastian e os olhos de Evan parecem estar iguais.
- Você sabe tudo, tem olhos em todos os pontos, a gente precisa descobrir quem está fazendo isso - Sebastian está aflito e Julian se aproxima. Sebastian pede um whiskey e, pelo visto, a tensão só aumenta - Não vou voltar para Charper tão cedo, a Carter é mais perigosa do que quem escreveu isso.
- Posso imaginar... - menciono já conhecendo o temperamento de Carter.
***
Sebastian
Saio da minha sala e caminho em direção à Dylan que cuida de mais um projeto de Leonard Colfer. Isso tem sido muito bom para ela, já que ela se tornou uma espécie de queridinha do tal investidor londrino.
Vejo o mensageiro entrar com uma caixa na sala de Carter e esse Josh é um pegajoso, não há necessidade de enviar mais nada para Carter, já não basta o raio do Clube Mundial do Chocolate.
Aproximo-me de Dylan e ela está terminando uma ala gigantesca do que me parece ser uma biblioteca, e eu olho os detalhes.
- Isso está ficando excelente - a elogio e ela me encara.
- Ele é muito exigente - Dylan comenta e percebo que ela está feliz. Funcionário feliz, patrão feliz!
- Preciso que olhe esse projeto, ele faz parte do projeto antigo do estaleiro do Paolo Bastilli e estão ampliando. Como você cuidou dos detalhes do anterior, ele recomendou que você participasse desse - concluo e vejo o sorriso dela se abrir e, com isso, o meu também.
- Charper! - meu sorriso desaparece assim que escuto a voz baixa de Carter me chamar. Regra número um: se ela falar baixo é porque alguém vai gritar e, nesse momento, o alguém em questão sou eu.
Olho para ela e ela está com a porta aberta e me encara, uma mão está na cintura ajeitando o cinto largo de couro preto, não muito apertado por conta da barriguinha de gravidez que já desponta, que combina estrategicamente com seu tubinho preto e espero que não seja uma roupa escolhida para um funeral.
- Poderia, por gentileza, vir aqui por um minuto? - a voz está ainda mais baixa e eu cogito correr na direção contrária que ela está. Mas o que foi que eu fiz? Sou um homem casado e até parei de olhar para a estagiária do prédio ao lado. O marido dela é imenso e meus dentes me custaram muito dinheiro.
Caminho como se estivesse no corredor da morte e entro na sala dela e ela, gentilmente, fecha a porta e aciona o dispositivo que lacra os vidros. Se ela me jogar daqui de cima, ninguém do escritório vai ver.
- Está tudo bem? - pergunto e afrouxo a gravata. Não sei se é o coque no alto de sua cabeça, ou o seu olhar, mas algo me diz que essas podem ter sido as minhas últimas palavras.
- Eu juro por Deus, estou me controlando para não encontrar um cutelo e poupar o trabalho de alguém, então, eu quero apenas que me explique o que é isso - ela me entrega um papel.
Leio e releio e me lembro da conversa na festa de casamento de Alexander.
- O que é isso, Sebastian? Quem está te ameaçando e desde quando isso está acontecendo? - ela me interroga e agora eu não sei bem como responder, mas eu sei que não sou o único e nem o primeiro a receber isso - E para ajudar, uma rosa negra, que diabos de confusão você se meteu? Está saindo com a estagiária do prédio ao lado? Eu te avisei para parar de retribuir o olhar daquela garota. Eu mesma vou cuidar da demissão dela, eu tenho um excelente contato com Giliard, o chefe dela - Carter está furiosa.
- Olha - esfrego a minha nuca e dobro o papel. Guardo em meu bolso e ela percebe que estou prestes a contar algo perigoso -, não sou o primeiro a receber isso - agora vejo os olhos dela mais piedosos, mas não menos perigosos - Não sabemos o que está acontecendo, mas... outros receberam - conto e esfrego meu rosto com as minhas mãos.
- Que outros?
- Outros que conheço... - não sei quais receberam, mas eu sei que receberam e agora sinto o perigo, não da Carter, ela jamais me mataria, isso não quer dizer que ela não me machucaria e usaria com toda certeza requintes de crueldade. Mas ela me defenderia do mundo.
- Isso é grave, isso é sério e eu quero saber se a polícia está cuidando disso - a pergunta dela sai afiada e me atravessa. Deus me livre a polícia saber sobre o Clube. Prostituição internacional me renderia alguns tabloides e anos na cadeia.
- Não podemos envolver a polícia.
- Por quê?
- Porque os outros que mencionei, são os outros do Clube 13 - falo e fecho meus olhos. Mas na hora que abro, posso ver o sangue nos olhos dela e espero que ela realmente não tenha um cutelo.
- INFERNO, SEBASTIAN! - ela fala e agora meu risco é ainda maior. Ela caminha para perto da vidraça de sua sala e olha para a rua.
Desde que se descobriu grávida, Carter vem apresentando uma paz de espírito não muito característica dela... quando o assunto se refere a mim, é claro. Além disso, sua falta de movimentos bruscos claramente indica sinais de periculosidade em altíssimo grau, ela me mataria e desviaria do meu corpo como se eu fosse um pedaço de papel amassado.
- Eu não sei o que está acontecendo, eu não faço mais parte disso - falo e me aproximo dela e ela nega com a cabeça.
- Tem noção da gravidade da situação? Está sendo ameaçado, mas não pode recorrer a quem poderia resolver porque resolver isso de maneira legal significa que você pode ser preso - ela segura a ponte de seu nariz e eu acho que se eu pular daqui de cima a dor é menor.
- Vou cuidar disso.
- Como? - a voz dela sai quase sem som.
- Vamos descobrir quem está fazendo isso, achamos que pode ser uma brincadeira - tento amenizar, mas não está funcionando.
- Brincadeira? Sebastian, em nome de Deus, isso pode ter sido enviado por uma ex-encomenda. Se você soubesse o nojo que me dá falar essa palavra, não por conta das mulheres, porque nenhuma foi obrigada a participar disso, mas porque você fez parte dessa peixaria de quinta categoria, e se realmente for alguma mulher que passou por lá e está querendo dinheiro? Será uma chantagem sem fim, e eu te juro, eu quero muito bater em você; eu sempre falei que esse antro iria dar merda e agora olha só; sem contar que os jornais terão assunto por anos e seu império e sua credibilidade estarão destruídos - ela coloca uma das mãos sobre a barriga e a outra na cintura, e fica de frente para mim - O que eu vou fazer da minha vida se alguma coisa acontecer com você? - eu sei, Carter, eu também te amo e entendo o quanto me odeia quando me coloco em perigo.
- Vou resolver isso, prometo - falo e olho para baixo.
- Estou com tanta raiva de você nesse momento que se o responsável pela ameaça não acabar com a sua vida, eu mesma cuido disso - ela fala e vai para sua mesa.
- Carter - ela levanta o indicador e nega.
- Fale comigo quando ao menos encontrar o culpado ou a solução para isso, do contrário, eu sou mais perigosa do que esse pedaço de papel. E leve essa flor horrorosa daqui, senão eu vou usá-la em seu funeral - ela fala e olha para a tela enquanto digita - Se você se machuca, eu sangro também, resolva isso - ela olha para mim e agora eu vejo que mesmo fora do Palácio existe uma praga para quem já esteve lá.
Pego a caixa e vou para a minha sala, jogo-a no lixo e saio levando apenas a carta em meu bolso.
Alcanço meu celular e faço uma ligação.
Tenho certeza que Gio vai conseguir descobrir quem está por trás disso e espero que seja brincadeira, espero que nenhum dos segredos dos muros do Palácio ganhe as ruas. É tudo muito sujo para passar despercebido.
***
Giovani
- Posso ver? - Evan pede e Sebastian entrega a carta para ele - O que foi feito sobre isso? - Evan pergunta.
- Acho que quem recebeu tem rezado, foi isso que foi feito, porque se chamamos a polícia, podemos ser presos e se não chamamos, podemos ser mortos, são duas opções que não me agradam - Sebastian diz e Julian chega com o copo e pega a garrafa para servir Sebastian, mas Sebastian agarra a garrafa e avisa que vai precisar dela - Precisamos encontrar um jeito de descobrir quem está fazendo isso - Sebastian fala e Evan agora apenas escuta, observa e eu percebo que em alguns momentos, ele me olha com o canto dos olhos. Ele está tentando ler minha expressão corporal, mas foi eu quem ensinou isso a ele.
- Não há muito a ser feito, envolver a polícia não seria bom para os negócios e até agora são apenas papéis e flores de origem duvidosa - respondo com a calma que o momento exige. Temos dois homens tensos e isso também não agrega de maneira positiva.
- Apenas papéis e flores? São ameaças - Sebastian explode e rapidamente a garrafa começa a ficar mais vazia.
- No que exatamente está sendo ameaçado? - questiono e passo meu indicador pelo corpo do garfo ao meu lado.
- Aqui diz claramente sobre segredos - Evan aponta para o papel e tenta não ser irônico, mas ele falha, eu sei que está com medo e isso está tão óbvio em seus olhos. Todos têm muito a perder.
- Mas qual segredo? Eu ficaria surpreso se dissesse que tem apenas um - sorrio com o canto da boca e tiro meus olhos de Evan e olho para Sebastian que coloca mais bebida em seu copo - E você, Sebastian, também tem apenas um segredo? - intimo, ele me olha com desconfiança e eu sorrio - Todos nós temos segredos e com o tempo eles não ficam menores, eles ficam apenas guardados e, dependendo de como os guardamos, eles rendem como se tivessem sido aplicados em algum fundo de investimento - seguro o garfo e coloco meu indicador sobre as pontas dos dentes - Esse é o risco quando decidimos não ficar do lado certo - concluo e coloco o garfo sobre a mesa.
- Fala como se isso não fosse sério - Sebastian rebate a minha colocação.
- Eu nunca disse que não é sério, mas não acho que deva se preocupar tanto assim, talvez seja esse o segredo - suspendo as minhas sobrancelhas e percebo que ambos estão incomodados. Sim, cavalheiros, eu sou calmo.
- Não acha que poderíamos contratar um detetive? - Sebastian sugere, mas infelizmente ele sofre do mesmo mal da humanidade, a grande maioria não pensa nas consequências.
- E falaríamos o que para ele? Que temos um clube de orgias que se enquadra em pelo menos um par de crimes internacionais? Quanto você acha que pagaríamos por sua chantagem futuramente? - encaro Sebastian e o faço pensar que mais ninguém precisa saber sobre isso, já temos culpados demais por aqui.
- Está dizendo que não tem saída? Que o ideal é esperar que o culpado apareça? - Evan pergunta e se inclina para frente enquanto Sebastian se posiciona na cadeira de frente para mim.
- Estou dizendo que ainda não temos como fazer nada, que são apenas papéis e flores e acredito que isso está se tornando repetitivo - minha voz fica mais grave, mais baixa e minha santa paciência está acabando gradativamente junto com o whiskey da garrafa de Sebastian.
- Se deixar para depois pode ser tarde demais - Evan observa e leva as mãos até os cabelos, se encostando na cadeira e deixando o ar de seus pulmões saírem.
- Mas ainda é cedo, não temos um alicerce estruturado e nem ao menos um suspeito - divido meu olhar para ambos e agora eu percebo o silêncio, mas eu posso ouvir seus pensamentos, a tensão de ambos é palpável.
- Talvez você mude de ideia caso receba uma carta como essa - Sebastian ataca e eu entendo a fúria de suas palavras, é normal. Quer saber do que são feitas as pessoas? Comece uma guerra...
- Talvez... - olho para ele e depois para Evan que está com o cenho franzido e me encara - Mas, ainda mantenho a mesma posição, não precisamos de nenhuma artilharia, nenhum conflito foi iniciado - concluo e vejo Sebastian negando com a cabeça.
Pedimos a conta e nos despedimos na porta do Tribecca. Evan caminhou pela calçada, Sebastian entrou no carro assim que Duck parou no meio-fio e eu me certifiquei que estava sozinho antes de pegar meu celular e fazer uma ligação.
- Oi, mais um recebeu a carta e a rosa, chegamos no fim dessa etapa - desligo e agora eu preciso ir para a próxima fase, mas agora é com alguém muito mais importante.
6
Rocco
Observo Ramon e seu pai conversando perto da churrasqueira. A mãe e a irmã estão no centro com os sobrinhos dele, e por mais que eu tenha estado aqui, em Malibu, eu não canso de apreciar a casa. O sábado amanheceu ensolarado e, pelo visto, o sol vai ficar por aqui.
Christen e eu estamos sentadas no banco afastadas o suficiente para que eles não escutem nossa conversa.
Percebo que ela tem algo a me dizer. Ela remexe no tecido laranja de seu vestido e leva o copo com suco de morango até a boca. Eu ajeito meu short jeans e minha regata preta e espio como ela me olha através do canto de seus olhos.
Em minhas mãos também tem um copo, mas é com vodca, creme de leite e um pouco de soda. São dez horas da manhã e eu sei que não deveria beber a essa hora, mas também sei de outras regras e as ignoro com frequência.
Meu celular, que está ao meu lado, vibra por conta de uma mensagem e eu vejo o nome dele... Gio...
- Por que eu não posso saber o que está acontecendo? - Christen pergunta e eu sorrio bebendo um pouco da mistura alcoólica que seguro.
- Você já sabe o que está acontecendo - falo sorrindo e olho para Ramon gargalhando com seu pai.
- Sei? - eu olho para ela.
- Sabe, é isso que está acontecendo, encontros casuais, com intimidade o bastante para um fazer xixi na frente do outro - ela sorri.
- Gosta dele? - sorrio ainda mais ao vê-la sorrir.
- Gosto da companhia dele - respondo sucinta e pego o celular vendo a mensagem.
“Há muito de você por aqui, mas queria mais” - leio na mensagem.
- Sei, gosta da companhia, fazem sexo e a hora do xixi é compartilhado, o nome disso é namoro e quando ele buscar absorventes para você, é porque virou casamento - ela brinca e eu olho para o líquido em meu copo e, depois, para ela.
- Temos uma relação de amigos com benefícios; ele já comprou absorvente para mim e já preparou algumas canjas quando tive crise de cólica - me lembro que ele chegou com bombons suíços de uma viagem em uma semana que eu estava de TPM. Eu ainda morava na outra casa e eram quase onze horas da noite. A campainha tocou e quando abri ele estava lá, com uma bandeira de paz e uma caixa de chocolates. O mundo teria menos guerra se a TPM feminina fosse tratada e compreendida dessa forma.
- Ainda sai com outros homens? - ela pergunta - Eu sei porque há alguns meses eu a vi com um cara na 1 OAK - ela comenta e eu acredito que ele tenha sido o último homem que trepei, e isso tem mais de cinco meses.
- Para ser franca, não tenho tido tanto tempo. Então, coincidentemente, eu acabo ficando com Gio - explico de maneira que ela não perceba que andei tendo uma expectativa elevada a ser atingida, comparo os homens com Gio e, no fim, escolho ele.
Acredito que tudo isso que acontece entre nós só funcione porque não preciso compartilhar com ele a minha vida antes dele, minhas escolhas dificultam um pouco o acesso a essas informações. Sou feliz assim, não preciso remexer o baú de maldições que está em minha memória.
- Coincidentemente? Sei... - ela diz batendo o dente na boca do copo e sorrindo - Então pode ser que tudo isso fique mais sério? - sua questão não tem uma resposta específica. Eu nunca pensei em mudar isso, gosto de saber que sou livre e posso voar em busca de um novo pôr-do-sol.
- Acho que está bom para ambos assim - comento e vejo Ramon atender o celular e olhar para Christen. Ele sorri e desliga o telefone, guardando-o em seu bolso - Eu sei que você e o latino vivem essa coisa mágica, mas acho que se fosse comigo não teria tanta magia, você sabe por quê - meus olhos se perdem e eu não sei exatamente em que ponto eu conseguiria esquecer o que aconteceu.
- Espero que tenha trazido um bom vinho - Ramon fala em direção ao corredor lateral e eu não vejo com quem ele está falando, até que viro meu rosto e vejo Gio. Meu coração dispara e eu me surpreendo com sua presença. Ele está com uma bermuda branca, camisa azul escura e sapatênis. Ele está com os cabelos bagunçados e segura uma caixa, obviamente ele chegaria com vinho e com esse sorriso. Gosto do seu óculos de sol.
- Desculpe, Roc... mas acho que já é mágico o suficiente para entender que pode se entregar um pouco mais - Christen fala, se levanta e caminha em direção a Gio.
Levanto-me e caminho bebendo um pouco da minha mistura, vejo Gio colocando a caixa de vinho sobre a mesa e beijando os dois lados do rosto de Christen.
- Trouxe o vinho, Christen, eu sei que tenho bom gosto - Gio brinca e se aproxima de mim, enquanto ela caminha para perto de Ramon e seu sogro.
- O que você está fazendo aqui? - pergunto e pela lógica, percebo que todos sabiam que ele viria, menos eu. Existe um exército querendo algo mais entre a gente, mas essas pessoas não veem que está perfeito assim. É uma relação de sexo, e só.
- Eu disse na mensagem que queria mais de você - ele beija o canto da minha boca disfarçando como se fosse um beijo no rosto.
- Estavam todos juntos nisso me enganando? - pergunto, sorrindo para ele.
- Não... por que você está pensando isso? - ele levanta os óculos até o alto de sua cabeça e olha fundo nos meus olhos - Eu nunca enganaria você - se aproxima e beija a minha boca com selo gostoso - Vamos, eu sei que é o pai de Ramon que está no comando da churrasqueira e, com isso, sei que a comida é boa - ele segura a minha mão e automaticamente olho para Christen, que está sorrindo para mim, mesmo estando pendurada em Ramon.
Caminhamos em direção a eles e sua mão massageia a minha com seu polegar.
- Saiu de Nova York apenas para ter um pouco mais de mim? - ele sorri e me olha.
- Claro que não - ele olha em meus olhos novamente - Eu vim pelo churrasco também - ele brinca e eu nego com a cabeça sorrindo.
Aproximamo-nos deles, Gio cumprimenta Ramon.
- Fez boa viagem? - Ramon pergunta e o pai dele aperta a mão de Gio e pede licença para atender o telefone da casa que está tocando. Pelo que entendi os empregados estão de folga esse final de semana.
- Sim, mas meu piloto precisou esperar mais do que o indicado, algum problema em uma das pistas - Gio explica como se falasse que o carro enguiçou na Quinta Avenida. Mas ele está falando de um jatinho, de um piloto particular e de uma vida que não é tão simples. As conversas dele são baseadas em milhões gastos em alguma propriedade, milhares de dólares perdidos em festas e sem contar Las Vegas...
Gio tem um padrão de vida caro o suficiente que poderia ser comparado ao PIB de um país de pequeno porte.
- Chegamos ontem à noite. Na realidade, já era começo da madrugada - ele fala e vira os hambúrgueres na grelha da churrasqueira. Olhar Ramon diariamente e Gio com mais frequência que deveria, me deixa acostumada com a beleza de ambos, mas é certo que eles juntos causariam um tipo de furor entre as mulheres - Quando nos falamos ontem, eu achei que viria com a gente - Ramon fala e eu encaro Christen. Ela levanta os ombros se fazendo de desentendida.
- Estava esperando o vinho de bom gosto desde ontem - ela fala e eu encaro-a, depois encaro Gio e cruzo os braços.
- O mais interessante de tudo isso é que Christen não bebe vinho tinto - observo e Ramon se vira disfarçando com a carne na churrasqueira e Christen olha para a própria unha do indicador, enquanto Gio sorri.
- Não? - ele pisca para mim e volta seus óculos em seus olhos.
- Christen, pode me ajudar com os copos? - Ramon a leva para dentro e eu vejo sobre a mesa os copos necessários para pelo menos mais trinta pessoas.
- Vamos dar uma volta? - ele segura a minha mão e me leva em direção à praia.
Tento absorver a ideia de que mais ninguém quis trepar com ele em Nova York e foi isso que o trouxe até aqui. Isso que acontece entre nós só funciona também porque nunca tivemos demonstrações gratuitas de sentimento.
Antes de sair da propriedade, tiro meus chinelos e vejo que ele também fica descalço. Sentir essa areia é revigorante.
- Foi aqui que tudo começou - ele comenta e eu me lembro quando trouxemos Christen para cá. Ela havia recuperado a memória e passou a viagem toda falando de Ramon, de tudo que haviam feito e, eu confesso, senti vontade de jogá-la do jatinho de Gio.
- Foi... - respondo e penso na noite em que passamos aqui. Enquanto Ramon e Christen conversavam sentados na areia olhando as estrelas, Gio e eu caminhamos pela areia deixando as ondas nos acertarem. Ele me perguntou o que eu fazia quando não estava cuidando de Christen e eu respondi que estava cuidando para que nada de ruim acontecesse a ela. Eu queria proteger a minha amiga do mundo, o mundo já havia me dado provas de que ele não vale a pena.
Gio, naquela noite, segurou a minha mão e perguntou se eu gostaria de ver o que acontece quando tomamos as rédeas de nossas próprias vidas. Eu aceitei porque não havia compromisso, aliás, deixamos claro que estávamos interessados em suor, orgasmos e desapego de relacionamentos.
Naquela mesma noite, enquanto voltávamos do passeio, ele parou na minha frente e olhou em meus olhos.
- Gostaria de beijar você - ele falou e eu o beijei como resposta, e ali mesmo, perto das pedras que cercava uma das casas, trepamos sem ao menos nos preocupar com os olhares que poderiam ocorrer. Naquele instante, eu percebi que poderíamos manter esse tipo de coisa, tínhamos o mesmo objetivo e isso me salvava de perguntas idiotas sobre o que eu era antes de tudo isso.
- Rocco - ele me chama e eu volto do passado.
- Oi - retorno e algumas crianças passam correndo por nós, revirando a areia.
- Tenho pensado em você - ele fala e para por um instante como se buscasse dentro de si um vocabulário específico para me dizer alguma coisa. Peço apenas que ele não encontre, não quero estragar tudo, e sei que sou campeã em fazer isso.
- Eu também tenho pensado em você, de como é divertido e de como cozinha bem - tento brincar e quebrar o clima.
- Quero passar mais tempo com você - ele fala e eu quero só entender o que ele quer.
- Como assim? Já passamos muito tempo juntos, nem sei como ainda não enjoou de mim - mantenho o tom da brincadeira e ele sorri entendendo meu jogo.
- Não consigo enjoar de algo que é novo para mim todos os dias - ele coloca um sorriso em meus lábios.
- Mas isso seria como, tipo o lance de sairmos mais vezes na semana? Mais sexo? - falo com péssimas intenções e ele me faz encará-lo.
- Não, seria apenas eu e você, só com você e você só comigo - ele fala e alguma coisa aqui dentro balança, desconfio que seja meu coração tentando me alertar sobre os riscos que devo correr. Mas meu cérebro ainda é o mais poderoso... eu acho... ele está me dizendo o contrário.
- Ah... sei... - sorrio sem graça - Menos espaço... - murmuro.
- Essa não era a resposta que eu estava esperando - ele sorri e mexe em meu cabelo - Não me peça espaço, essa palavra foi inventada por alguém que tem medo de chegar - ele rebate.
- E eu confesso que isso também não era a proposta que eu estava esperando, porque está tudo tão perfeito, tudo do jeito que realmente funciona. Estou confusa...
- É, eu sei, tudo é tão confuso e intrigante, mas admito que pensei muito sobre isso - ele fala e isso quer dizer que tem pensado realmente em mim. Tudo bem, eu também me flagro, diversas vezes no dia, pensando sobre ele, mas nunca pensando nisso, em mudar tudo isso, eu gosto de como tudo acontece entre nós. Não temos que dividir datas importantes, presentes especiais e passados cheios de fantasmas
- Me surpreendeu, então eu posso querer pensar sobre? - pergunto dançando com meus ombros - Você me conhece, sabe que sou cheia de coisas estranhas - brinco mais uma vez.
- Fico feliz que aceite pensar - ele se aproxima de mim e eu sinto seus lábios tocando os meus. O massagear perfeito de sua língua deixa minha calcinha molhada; eu sei exatamente do que essa língua é capaz.
- Combinou tudo com eles apenas para falar comigo sobre isso? - pergunto e ele acaricia meu rosto com as costas de seus dedos.
- Sim - ele passa o polegar sobre meu lábio inferior e mantém o sorriso - Nova York perde um pouco de graça quando você não está lá me dando trabalho por conta de suas doses exageradas - ele volta a me beijar e eu sorrio internamente. Mas, meu apito chamado passado me dá um beliscão e eu sei que tudo isso pode ser encantador, mas, ao mesmo tempo, pode ser destruído. Naturalmente as coisas nunca funcionam bem para mim, a não ser quando sou imprudente e não tenho compromissos.
Afasto-me dele e tento disfarçar, não quero que ele perceba que não tenho interesse em mudar o que temos, isso implicaria em contar coisas para ele que eu me esforço para esquecer.
- Vamos - falo e o puxo de volta para casa - Estou morrendo de fome - sorrio e ele me leva não percebendo que estou travando em minha garganta um pedido para que ele não mude o que temos.
***
O relógio marca onze e quarenta e oito, a noite está estrelada e eu estou na varanda do quarto de hóspedes. Não consigo entender o que levou Gio a me fazer essa proposta; não consigo me animar com isso, envolve muita coisa. Ainda escuto-o no chuveiro. Partiremos amanhã à tarde e isso é outra coisa que me obriga a ficar preocupada, eu não estava esperando essa aproximação.
Gio está envolvido até um ponto que eu ainda não cheguei. Preservo-me exatamente por conta disso, assim eu não corro os riscos que já corri antes.
Escuto-o desligar o chuveiro e, no momento, preciso mais é de algumas doses para tentar digerir tudo isso.
- Está tudo bem? - escuto-o parado atrás de mim.
- Sim - respondo e me viro de frente para ele. Abraço-o e enfio meu nariz em seu pescoço. Ele é todo perfeito em uma demonstração gratuita de músculos esculpidos na medida certa. Ele está com uma toalha em sua cintura e eu o sinto ficar duro, nosso contato causa isso, eu fico excitada e ele idem.
- Estou viciado em você, gosto de ver você assim, de toalha, de banho recém tomado, gosto de olhar para você com a cara amassada e mau humor logo pela manhã - fecho meus olhos e analiso que também estou sofrendo do mesmo mal, a diferença é que sei até que ponto eu posso ir para não correr o risco de me tornar uma dependente irreversível.
Tiro a toalha e abraço-o apertando meus seios contra seu peito. Ele rapidamente me pega, encaixando minhas pernas em sua cintura.
- Você é rápido - brinco enquanto beijo-o e ele me leva até a cama. Ele me deita sobre ela e tem a nítida intenção de se deitar sobre mim, mas meu instinto não deixa e antes mesmo que ele pudesse concluir seu ato, eu saio e o viro engolindo seu pau e deixando-o bater em minha garganta.
Seu gemido me excita. Ele fecha os olhos começando um ritmo como se estivesse fodendo a minha boca. Deslizo a minha língua por toda a extremidade e seu gemido fica mais alto, até que o engulo por completo. Fico molhada com isso, porque deixá-lo à beira de um orgasmo é quase tão bom quanto ter um.
Seguro-o com uma de minhas mãos enquanto a outra desce pelo seu abdômen, por seus músculos.
Ele começa o entrar e sair e surge seu pequeno desespero em cada momento em que ele toca minha garganta.
Olho para ele e ele está com os olhos em mim.
- Não posso esquecer essa imagem - ele fala e, em seguida, geme, e eu o engulo mais intensidade.
Ele solta meus cabelos e me leva por cima dele, segurando seu pau e me fazendo sentar sobre ele.
- Me fode! - peço em seu ouvido. Ele segura cada lado de meu traseiro com força e estoca com vontade, batendo cada vez mais forte e eu gosto dessa sensação de dor que me fará lembrar dele pela manhã.
Gemo mais alto e beijo sua boca, mordendo seu lábio enquanto me sento cada vez mais rápido sobre ele. Ele até cogita se colocar por cima de mim, mas eu o interrompo e ele aceita.
Ele começa a me preencher ainda mais, sei que ele está prestes a gozar, e como um inferno, sei que nosso ritmo em alguns momentos se iguala até que chegamos ao mesmo ponto juntos, somos bom em fazer isso.
Ele me abraça e me encaixar em seu tórax me faz bem, ali eu sei que não há mal no mundo capaz de me alcançar.
Saio dele, me deito apenas puxando um lençol e nos cobrindo. Gosto do cheiro que temos assim, quando misturamos nossa pele. O cheiro de Gio me excita, é como uma maldita droga.
- Gosto disso - ele diz.
- Do sexo? - sorrio.
- Não...
- Não?
- Não... gosto de pensar que não temos apenas isso - ele responde e me aperta contra seu corpo - Prometa que vai pensar, eu ficaria muito feliz em saber que seria apenas nós dois - ele pede e eu respondo com um silêncio. Sou fluente nisso.
Desde que nos conhecemos, temos uma espécie de ligação inexplicável. Já cheguei a vê-lo com outras mulheres e ele me flagrou em algumas situações das quais não me orgulho. Tínhamos uma amizade com benefícios e de uns tempos para cá, não tenho saído com mais ninguém, e até para Las Vegas eu fui ao seu encontro. Mas é como uma provação, quando estou longe dele, imagino que eu possa ser mais carinhosa e menos dominadora, mas de repente, um medo interno sobe meu esôfago e tudo muda, passo a ser uma pessoa fria e, involuntariamente, deixo um abismo entre nós.
***
Se existe algo realmente desconfortável é estar a muitos pés de altura e um homem lindo, sexy e cheio de sexo bom te encarando. Parece estranho, mas estou desconfortável porque ele está querendo saber uma resposta e eu nem me lembro direito por que ele se achou no direito de me fazer aquela pergunta.
- Exclusividade! - ele disse em meu ouvido assim que embarcamos e eu sei que em alguns minutos vamos pousar. Christen e Ramon ainda vão ficar mais dois dias em Malibu e eu decidi voltar com Gio porque tenho trabalho acumulado essa semana.
- Eu disse que vou pensar - respondi com um sorriso amarelo e ele não voltou mais nesse assunto.
- Quer beber alguma coisa? - ele fala agora e eu prefiro esse assunto.
- Aceito um pouco de água - peço e pego um comprimido para dor de cabeça em minha bolsa.
Gio tem um lado perigoso, ele sabe como ficar em silêncio, ele sabe o momento exato de me deixar tensa com sua falta de comunicação e agora ele está me analisando. Acredito que ele já saiba muito sobre mim, o grande problema é o que ele ainda pode descobrir.
- Gostei do nosso final de semana, tudo muito bem armado; uma pena que tenha sido tão rápido - teria sido perfeito se você não estivesse nessa paranoia de exclusividade e blá blá blá...
Ele me olha do seu banco de frente a mim e seu celular avisa sobre uma mensagem. Seu rosto se torna uma incógnita e seus olhos se perdem no infinito mar de informações que é a sua mente. Eu nunca vou conseguir desvendar como ele consegue absorver tantas informações.
- Durou o tempo que precisava - ele sorri rapidamente para mim e volta seu olhar para a tela. O que acontece com ele nesses momentos em que tudo é silêncio e olhar profundamente enigmático é que me deixa sempre com vontade de saber mais sobre ele. É como se eu precisasse estar perto dele, mas seria mais seguro estar longe.
O jatinho pousa e ele me encara.
- Ainda hoje vou ter que fazer uma nova viagem - ele diz sério e eu sei que ele sempre está viajando, mas gostaria de saber o que ele faz quando não está sob mim.
- Está tudo bem?
- Está, mas pode ficar melhor - seu rosto é sério e eu não vejo brecha para desenrolar ainda mais esse assunto.
- Consegue voltar para a festa de Christen na sexta-feira?
- Sim - ele responde com o cenho franzido.
E a pergunta de um milhão de dólares: quem é Giovani Makenzie quando ninguém está por perto?
7
Giovani
Ajeito a minha gravata e olho para o relógio no corredor da minha casa. São oito horas da noite e ainda não tive tempo hábil de responder as últimas mensagens de Alexander. Quero esquecer o pequeno conflito via telefone que tive com Rocco que parece aumentar cada vez mais o muro que a está cercando.
Coloco o convite de Christen no bolso interno do meu paletó junto com meu celular e carteira.
Se Rocco soubesse que ao menos eu tenho com ela um tipo de intenção boa, ela teria sido compreensiva, mas não, ela preferiu apenas desviar do assunto e, depois, arremessar contra mim que eu estava querendo uma resposta rápido demais.
- Por que você não deixa isso para discutirmos quando você voltar? - ela perguntou.
- Por que eu tenho esperado tempo demais - respondi e ela ficou em silêncio e isso não ajudou em nada, até que tentei novamente falar e ela pediu para desligar.
Isso tem dois dias e nenhum dos dois tomou coragem para tentar descobrir em que ponto ficamos depois disso.
Rocco não entende que nada é mais poderoso que a persistência, não existe genialidade nenhuma no mundo que possa superar isso.
Caminho em direção ao meu carro na garagem e acelero para o hotel Astoria, onde Christen reservou uma sala para a festa comemorando a fusão que fechou recentemente.
Meu celular toca e eu atendo via Bluetooth do carro.
- Fala - atendo e eu sei de quem se trata.
- Eu vi que recebeu a minha mensagem, percebeu que a situação se fecha em determinado ponto?
- Sim, e é aí que temos que trabalhar - respondo e ouço a risada.
- Isso virou um novo desafio para você - seu comentário é bem coerente - Isso se tornou seu novo Bellagio.
- Não podemos simplesmente confiar que tudo vai dar certo, todo detalhe é precioso e pode colocar tudo a perder - aviso e ele acata desligando em seguida.
Continuo o percurso e penso que Rocco vai estar lá, mas não gosto de pensar que posso estar em uma situação delicada com ela, isso seria estar em mais uma situação delicada em minha vida.
Paro o carro em frente ao hotel e um manobrista me atende prontamente. Imagino que seja apenas uma festa comemorando mais um contrato, mas quando passo pela porta da recepção do evento, vejo Wallace ao lado de Danthe e isso seria no mínimo perigoso.
Vejo Christen ao lado de Ramon e alguns fotógrafos fazem o que os dois evitaram por muito tempo no início desse relacionamento.
Aproximo-me de Andrew e Carl que estão discutindo sobre algum assunto irrelevante, mas que eles tratam como se fosse salvar o planeta de uma possível extinção.
- Boa noite - os cumprimento e And joga a cabeça na direção de uma ruiva que é de tirar o fôlego.
- Controle seu pau - falo e eles riem. A música do ambiente é Ironic, de Alanis Morissete e, pelo visto, os convidados ainda estão chegando. Tudo indica que o ambiente vai encher.
- Não tem aparecido em Madri - Carl faz uma observação que eu dispensaria, mas já que preciso ao menos manter a polidez de algumas situações, sorrio e tento não parecer um pouco tenso com a pergunta.
- Muito trabalho - respondo e os dois gargalham.
- Sei, um trabalho que tem cabelos negros, pele branca e dúzias de tatuagens, a maldição de Evan caindo sobre cada um de vocês - Andrew comenta sarcasticamente.
- Muito observador - comento - Mas não é isso, muito trabalho - insisto na mesma resposta.
- Vamos fingir que você está falando a verdade - Carl diz e um garçom passa com uma bandeja e nos serve.
- Por falar em muito trabalho - Andrew diz e ao meu lado surge a figura feminina que tem, com muito sucesso, fodido meus pensamentos.
- Boa noite, rapazes - Rocco cumprimenta e Andrew pega o celular do bolso e atende saindo pela tangente e Carl simplesmente pede licença com um sorriso no rosto, correspondido por Rocco.
- Boa noite, Srtª Field - a cumprimento especialmente com um beijo no rosto.
- Como foi a sua viagem? - ela age como se não tivéssemos discutido ao telefone há alguns dias.
- Bastante produtiva - respondo, mas eu sinto que ela quer me perguntar mais alguma coisa - Quer me dizer alguma coisa? - fico mais próximo de seu corpo coberto com um vestido amarelo, altamente chamativo, que vai até os pés.
- Não, queria apenas ter certeza que nossa conversa mais calorosa não trincou nada entre nós - ela fala e eu gosto do enrolado bagunçado de seu cabelo. Rocco é o tipo de mulher que me excita em todas as suas formas.
- Não trincou. Temos algo especial. Amizade, conversas, doses a mais - brinco e sorrio para ela, que corresponde colocando a mão sobre a minha e aproximando seu rosto, deixando seu batom vermelho muito próximo de minha boca.
- E sexo - sua voz é cheia de malícia e isso faz com que comece a pensar em como seria subir esse seu vestido Dior e foder com ela aqui mesmo, sobre uma dessas mesas.
- Não faça isso, Rocco Field - nego - Não me provoque assim.
- Não estou provocando, estou sendo realista, gostamos de fazer sexo e fazemos muito bem - ela está me excitando e talvez o paletó não disfarce - Gosto de sentir seu corpo, gosto de me sentir esgotada e isso é bom, não há necessidade de mudarmos, o time está ganhando, meu querido - agora entendo o que ela está dizendo, ela está recusando minha proposta feita em Malibu, e está fazendo da pior maneira, porque assim eu fico rendido a ela, quando penso nela nua cavalgando sobre mim, não tem como não desejá-la.
- Rocco, há quanto tempo estamos saindo? - mantenho meu rosto bem próximo ao dela.
- Há mais de um ano - ela responde mordendo o lábio inferior e deslizando o indicador sobre as costas de minha mão.
- Por que é tão difícil para você? - sorrio para ela - Qual é o seu medo, Roc? - sou carinhoso e gosto como ela me olha com desejo.
- Gio, eu não quero saber de datas importantes como Natal ou dia dos namorados, eu gosto do que a gente tem porque é diferente, consegue entender o meu lado? É tudo tão divertido do jeito que está - ela pontua e seu ar é divertido, mas eu percebo que ela está aflita. Seu olho esquerdo tremeu sutilmente - Você é livre, tem seu endereço em Madri e pode viajar quando bem entender, por que quer isso? Ser exclusivo implicaria em sua vida estar mudando na direção da minha - ela se coloca extremamente sedutora diante dos meus olhos, mas ela está na defensiva.
- Nunca escondi isso de você. Madri nunca foi um segredo entre nós assim como suas idas à Califórnia também nunca foram um problema para mim, mas isso foi antes - falo e tento manter o timbre da voz amigável e ela agora olha para os lados e eu posso ver com nitidez o desenho perfeito de seu maxilar, o contorno lindo que combina com seu pescoço e sou capaz de descrever cada pedaço de seu corpo. Estou fodido se eu estiver sozinho nessa.
- Eu sei, e nem tenho ido à California, você sabe disso, você sempre sabe de tudo - ela sorri olhando o movimento ao nosso redor e, a essa altura, eu sei que o bando já deve estar colocando todas as hipóteses, mas a verdade é que agora eu não me importo se descobrirem que era com ela que eu estava todas as vezes que deixei claro que precisava sair. Eu passei a preferir ela, sempre.
- Rocco, apenas pense com calma, eu sei que posso fazer mais por você, mas eu preciso que deixe - deslizo meu indicador em sua mão e ela olha, estranhando meu sinal de carinho em público. Por um instante eu vejo em seu olhar uma centelha de felicidade por isso - Vem comigo? - seguro sua mão e ela olha ao redor - Não me importo de olharem, não preciso de nenhum tipo de aprovação - ela tira sua mão da minha devagar e é como tirar lentamente o esparadrapo de um curativo - Eu quero saber mais sobre você, mas eu sinto que você se ofende cada vez que tento fazer isso - chamo sua atenção e ela fecha os olhos e solta o ar.
- Não tem nada de interessante para saber sobre mim, eu sou isso que você vê, Gio. Desculpa te decepcionar, mas não tenho nenhum poder mágico - ela diz e mente novamente, mas agora ela não sabe que está mentindo. Eu sei analisar essa mulher. Seu toque apreensivo quando abraça seus cotovelos revela fragilidade, o modo como sempre deixa um mecha de seus cabelos na frente de seu rosto como se isso a escondesse do mundo ou como apenas deixa claro o medo que sente do mundo quando me aperta enquanto dormimos. Eu sei sobre seus pesadelos.
- Não vou mentir, já tentei me decepcionar com você, e como pode ver, não consegui - falo e ela sorri.
- Nos vemos amanhã - ela diz e agora sinto um pouco de carinho - Vou falar com Christen - ela usa essa frase como despedida e se afasta.
Vejo-a caminhar em direção à sua chefe e noto que alguém parou do meu lado.
- É mais difícil quando não se tem ideia do que a outra pessoa está pensando - é Sebastian segurando um copo.
- O problema é que eu não faço ideia sobre os sentimentos dela, é como se a Rocco fosse feita de camadas e eu ainda não consegui chegar na mais profunda - admito e ele coloca a mão em meu ombro - E você? Como está? Não vi você chegando - falo e me viro de frente para ele. Tento deixar o clima agradável e diferente do nosso último encontro.
- Gio, mesmo se um meteoro caísse aqui você não perceberia, seus olhos estavam totalmente focados na Rocco, e eu estou muito bem, quer conversar sobre isso? - ele pergunta jogando o queixo na direção de Rocco e eu apenas aceito, caminhando em direção ao jardim, ao lado de Sebastian - Está apaixonado - a observação é quase certeira.
- Acho que já passei dessa fase e é aí que o meu problema começa. Passei a me preocupar com ela e tenho recusado algumas coisas que não recusaria, você sabe do que estou falando - comento e um garçom passa por nós e nos serve uma nova dose de bebida.
- A agenda secreta de fodas - Sebastian comenta e é muito estranho ver o quanto esse puto cresceu. Está mais maduro, não apenas porque sua vida era potencialmente ameaçada por Carter, mas porque Vivian chegou mostrando o lado família que ele sempre respeitou. Sebastian é a prova viva de que a humanidade tem salvação.
- Ela mesma...
- Então, está saindo com a Rocco com exclusividade? Qual é o problema?
- Nunca pensei em ouvir isso de você, exclusividade para você era como um câncer e agora sorri ao pronunciar a palavra - brinco.
- Pois é, a porra do coração fodeu com a minha reputação - ele ainda é o brincalhão de sempre.
- O problema é que talvez apenas eu esteja fazendo isso. Acho que enquanto me preocupo com ela, ela está seguindo seus instintos e saindo com outros caras - assumo e bebo uma dose.
- Já pensou em contar isso para ela?
- Ela não vai abrir mão da liberdade, ela quer sexo, nada de compromisso. E pensar que um dia eu pensei sobre isso, mas eu nunca eliminei essa chance da minha vida - ele me encara e sorri.
- E se ela estiver pensando o mesmo?
- Ela não me deixa descobrir isso - comento e olho para o casal que caminha de mãos dadas em direção ao salão - Parecia mais fácil quando não era comigo - desabafo e ele responde sorrindo para mim e colocando a mão em meu ombro.
- Sempre parece mais fácil quando não temos que carregar a metralhadora ou ir para a guerra.
Olho para ela conversando com sua chefe. Estamos aqui em nome dos negócios rentáveis, trata-se de um brinde em nome de uma grande fusão. Eu estou aqui em nome de algumas coisas, por razões pessoais. Muito pessoais.
***
Rocco
Depois de muito tempo sem dirigir, resolvi tirar o meu carro da garagem, não porque estava preocupada com o motor que precisa ser ligado de vez em quando, mas porque acordei atrasada hoje pela manhã e precisei encarar as ruas de Manhattan. Por ser segunda-feira isso não foi tão bom quanto pensei.
A vantagem de estar dirigindo é passar em qualquer lugar que venda coisas nada nutritivas e ir embora com o benefício do lanche estar quente quando chegar em casa.
Deixo meu carro na entrada da garagem com a promessa de depois guardá-lo, estou com pressa de comer. Comprei lanches do McDonalds, um saco cheio deles e agora eu tento encontrar a minha chave dentro da bolsa e segurar os lanches para não caírem.
- Precisa de mais um braço - escuto a afirmação e sorrio. É Gio que fala exatamente atrás de mim.
- Não seria ruim - falo e ele pega o saco com os lanches e eu consigo encontrar a minha chave - Está me seguindo? - pergunto e abro a porta da sala e ele entra carregando o meu jantar.
- Moro a algumas quadras daqui e, como pode ver, estava indo fazer uma corrida - olho para o seu agasalho.
- Sempre animado - comento e tiro meus sapatos enquanto olho para a tela do meu celular, são quase sete horas da noite. Escuto um barulho vindo da cozinha e não me importo, deve ser ele pegando copo para tomar água - Vai ter jogo do Patriots - comento.
- Eu sei - ele fala e agora escuto o barulho de panelas e talheres. Eu sei que estou agindo como se nada tivesse acontecido ontem, mas é assim que me protejo, e eu sei que daqui a pouco ele vai me perguntar alguma coisa.
Caminho em direção à cozinha e vejo-o cortando alguns tomates e uma massa já está no fogo - Eu já tenho o que comer - olho para a bancada procurando meu saco de lanches - Onde está o meu jantar? - ele aponta para a panela.
- Precisa se livrar do fastfood, já perdi as contas de quantas vezes te falei isso - gosto de como ele se preocupa, mas, ao mesmo tempo, eu tenho medo dessa sensação de controle que em alguns momentos deixa muito claro que aprecia.
- Jogou meu lanche no lixo? - ele apenas mexe a colher dentro da panela e me ignora - Custou vinte dólares - falo e ele enfia a mão no bolso e joga uma nota de cinquenta sobre a ilha - Isso foi grosseiro - falo mais alto e ele agora me encara.
- Reembolso, conhece? - ele dança com as sobrancelhas e sorri em minha direção.
- Não - elevo o tom da minha voz e ele cerra os olhos para mim.
- Rocco, por que você não fala tudo? É melhor do que esse impasse de eu estar sempre em dúvida quanto a você - ele rebate e eu caminho até o quarto e arranco o meu vestido - Não fuja! - ele fala mais alto e isso faz com que meu sangue suba e eu volto para a sala de calcinha e soutien e coloco as mãos na cintura. Ele me encara e sorri.
- Qual é a maldita graça, Giovani Makenzie? - respondo enfurecida e ele dá a volta na ilha e rapidamente se aproxima de mim.
- Você é a graça. Me deixa entrar na sua vida, mas eu quero entrar de verdade. Pare de fingir que eu sei tudo sobre você, porque não sei nada e por isso me frustra tocar em você - ele tenta colocar a mão em mim e eu desvio - Por que você faz isso? - infelizmente não tenho uma resposta simples sobre essa questão, Giovani.
- Se eu disser, nunca mais vai me olhar do mesmo jeito - respondo e ele se aproxima novamente.
- Eu nunca deixaria de olhar para você como estou olhando agora, eu gosto do que estou vendo - novamente ele tenta tocar em meu corpo e eu não evito, gosto de como ele me toca. Olho para o chão, mexo meus dedos dos pés e não consigo encontrar uma resposta, não consigo confiar em mim mesma.
- O que você quer de mim? Está estragando tudo! - afirmo e não consigo entender essa necessidade dele em mudar o que já é perfeito.
- Eu quero você, mas parece que se sente ofendida com isso - ele confessa e eu sei que dentro de mim tem um sorriso especial guardado para essa declaração, mas esse sorriso se perde assim que penso em como ele pode reagir se souber de tudo.
- Você tem Madri, e Madri tem o que você precisa, todos os homens querem sexo e vocês conseguiram fazer disso um excelente negócio - o ataco porque esse é o maldito mecanismo de defesa e agora ele me olha com dor. É isso que causo nas pessoas, dor.
- Me ataca como se eu não quisesse fazer você feliz - a frase chega em mim como uma lâmina e agora eu me perco em minha tentativa de mantê-lo longe, mas dói pensar que ele pode simplesmente ir embora e não ficar mais comigo.
- Tenha paciência comigo.
- Quero que me diga, quero que seja franca, se eu lhe propor exclusividade, você me deixa entrar na sua vida como estou pedindo? - meu coração pula e eu engulo seco. O sorriso especial surge discretamente e some no instante seguinte, ele vai ter que saber por que me tornei essa coisa cheia de cascas.
- Exclusividade?
- Sim.
- Exclusividade...
- Exclusividade, Rocco, sabe o que significa essa palavra? - Ele é direto e seco e eu não sei se quero assumir isso. Me levaria a levantar tudo sobre o meu passado e eu gostaria muito de simplesmente apagar tudo que vivi antes de Giovani.
- Por que te incomoda eu querer ficar em local seguro? - meu tom sai mais alto do que deveria e ele segura meus braços. É como se eu tivesse novamente meus catorze anos, diante da primeira vez que tudo começou e começo a tremer. Ali, eu não enxergo o Gio que está preocupado comigo, ali eu enxergo o monstro do meu guarda-roupa, o mesmo monstro que ficou comigo por longos anos.
- Porque essa porra de local seguro é um local que fica longe de mim! - ele me leva para ainda mais perto e quando me dou conta estou tentando segurar a minha bexiga, mas é em vão. Ele segurou meu braço com pouca força, já foi o gatilho para que meu medo do passado voltasse e, com ele, veio junto o que eu fazia diante das ameaças que vivi.
Gio olha para o chão e se afasta, soltando meus braços e me encarando sem entender nada.
- É isso? Está vendo agora? - minha voz sai alta e enfurecida.
- Rocco... - ele tenta se aproximar e eu nego com a cabeça chorando.
- Não quero que me veja assim, vai embora - meu rosto está molhado e ele está assustado - É isso que sou, fraca, tenho uma merda de um passado nojento, é assim que sou! - falo e ele olha sem entender nada.
- Me deixa ficar, eu quero você, com todo seu passado, eu sei que posso fazer você feliz - ele pede sem saber que suas garantias são infundadas. Tudo depende de mim e eu acostumei a ter essa vida sem grandes felicidades.
- Não - nego com a cabeça - Vai embora, Gio, já estou me sentindo humilhada o suficiente - estou envergonhada e ele leva suas mãos até os cabelos.
- Me perdoa se machuquei você.
- Não me machucou, só me fez lembrar de quem fazia isso. Agora, vai embora, me deixe sozinha.
- Não faça isso - ele pede.
- Vai embora, Giovani! - grito e ele vai em direção à cozinha e desliga o fogo. Quando ele volta, encara meus olhos e tenta se aproximar de novo, mas eu nego e ele vai embora.
Escuto a porta batendo e me sento no chão, abraçando meus joelhos e deixando que o choro domine, até que um grito explode em minha garganta e eu queria apenas não ser isso que sou. É, literalmente, um inferno ser eu mesma.
***
Olho para o relógio e são quase onze horas da noite. Coloco um jeans, uma sapatilha e uma camisa longa fina. Pego a minha bolsa e meu destino é o pub que tem a poucas quadras daqui. Preciso de uma bebida, preciso fugir da realidade por alguns instantes.
Chamo um taxi e, mesmo sendo perto, não quero andar. Minutos depois me sento no balcão do pub e peço a primeira dose. Hoje só whiskey para resolver tudo, mesmo que seja uma solução precária e de péssimo gosto.
Viro de uma única vez e peço outra.
Cada vez que o líquido desce pela minha garganta e gradativamente vai atingindo meu cérebro, eu tento apagar as lembranças, tento esquecer o cheiro dele, tento não lembrar da sua voz e, quando percebo, estou na sétima dose e todas as lembranças ficaram mais nítidas.
Peço mais uma e sei que minha voz já sai com nenhuma firmeza e agora tudo gira lentamente. Estou em um carrossel que sempre faz o mesmo percurso e meus momentos de felicidade se misturam com meus gritos de dor em alguns dos meus pesadelos.
Esgoto o meu copo e peço mais uma dose. Agora vejo Gio, ele está sorrindo para mim e ele tem sido meu momento feliz, mesmo sabendo que não posso fazê-lo feliz. Não posso oferecer aquilo que não tenho.
Sinto minha cabeça perder a firmeza sobre o meu pescoço e agora as pessoas me olham, me sinto flutuando e meu corpo levita em direção à rua.
Estou deitada em um carro, tento prestar atenção em quem está ali, mas sinto-me confusa, meu estômago está cheio de bebida e minha cabeça, cheia de recordações que ninguém nessa terra merecia ter.
O carro para e eu tento manter meus olhos abertos, mas agora não tenho mais força para isso. Desisto e deixo que a bebida tome conta de mim.
Alguém tenta tirar minha roupa, não tenho força para impedir. Os botões são abertos, não sinto nada, até que um arrepio toma conta do meu corpo. A água fria me atinge, me agarro na pessoa que está à minha frente e simplesmente choro, choro pelo frio, porque dentro de mim também é frio e eu não sei como me aquecer.
Sinto uma boca em minha testa e, nesse momento, estou no chão, mas não no piso, estou no colo de alguém que me abraça me protegendo do mundo.
- Sou uma mistura de tantas coisas ruins que nem sei por onde começar - desabafo.
- Shhhh...
Escuto o pedido de silêncio e reconheço que estou no colo de Giovani, que não está se importando em ficar molhado. Ele está, de novo, cuidando de mim.
- Veio me salvar - minha voz sai mole e eu suspendo meu rosto olhando para ele, que me aperta contra o próprio corpo.
- Estou salvando a mim mesmo...
***
Acordo sozinha em minha cama e acredito que um grande rolo compressor passou em meu corpo diversas vezes. Olho para mim debaixo do lençol e vejo que estou com um pijama que ganhei de Gio, ele é branco e tem uma nuvem enorme na parte da frente.
Sento na cama e sinto o cheiro de café vindo da cozinha. Sei que deveria estar vomitando, mas meu corpo está apenas cansado até que me dou conta e olho para o meu celular ao lado no criado-mudo. Pego e vejo que são nove e quinze e pelo desespero de ter perdido a hora para o trabalho, salto da cama e entro no Whatsapp. Tem uma mensagem de Christen
“Não tem problema, descanse, minha amiga”
Automaticamente leio a mensagem anterior e entendo que houve um diálogo:
“Christen, não estou muito bem, são quase duas horas da manhã e meu estômago está péssimo, receio que não vou conseguir trabalhar amanhã” - não foi eu quem escreveu isso, mas seja quem for, usou as minhas palavras e, com isso, Christen acreditou. Pelo menos é isso que estou lendo na resposta:
“Quer que eu vá até aí?”
“Não precisa, deve ter sido os quatro lanches do McDonalds que comi”
- Gio? - meu cérebro estala e eu caminho segurando o celular em uma das mãos e a outra esfrega meu rosto. Antes mesmo de chegar na cozinha, escuto-o cantando, Closer, de Kings of Leon. Ele acompanha o som de seu celular.
“Abra bem seus olhos, você continua a chorar, querida”
Apareço na cozinha e ele me encara com um tipo de olhar que contém pena e compaixão.
- Bom dia? - sai mais como pergunta do que como saudação.
- Até que está bom, tirando meu corpo dolorido - esboço um sorriso sem graça e ele me chama para sentar em uma das banquetas. Escuto o barulho da máquina de secar funcionando e ele veste uma roupa que estava em meu guarda-roupa.
- Sente aqui, quero que coma - ele fala com carinho e eu acato, não estou certa de que posso negar alguma coisa.
Ajeito-me sobre a banqueta e ele coloca suco em um copo, uma panqueca com morango e calda em um prato e em um pires, dois comprimidos para o estômago.
- Preciso parar de beber ou ainda resultarei grandes prejuízos - comento fazendo menção sobre minha falta de limite com a bebida.
- Apenas meu carro com um pouco de vômito, nada que água não resolva - ele é caridoso comigo e humanos não são assim, pelo menos não os humanos que conheço.
- Me seguiu até o pub?
- Não, eu já estava lá com um amigo. Estava indo embora quando você entrou pela porta e foi direto para o balcão. Ali eu analisei algumas situações, ponderei seu histórico e decidi que precisaria ficar mais, e fiquei - ele conta e se senta de frente a mim enquanto mastigo a panqueca.
- Te mandei embora e mesmo assim ficou para me ajudar.
- Rocco, eu não conseguiria ir embora sabendo que passaria dos limites - ele explica e bebe um pouco do suco.
- Como sabia que eu passaria dos limites?
- Ninguém chega em um pub e pede uma dose de whiskey sem gelo e em menos de um minuto pede a segunda sem que esteja com a intenção de passar alguns limites - ele fala e estica o braço, limpando o canto de minha boca.
- Por que você faz isso?
- Isso o quê?
- Por que tenta de todas as formas fazer com que eu me sinta importante?
- Porque você é importante para mim.
- Me viu ontem, ali na sala, em uma situação que há muitos anos não acontecia, me sinto envergonhada por isso - desabafo e tento apenas deixar uma bandeira branca entre nós.
- Não se preocupe com isso, quero apenas que coma, não vou tocar em você a não ser que peça ou que precise. Essa noite experimentei o seu sofá e ainda bem que não economizou quando escolheu a peça - ele pega mais um pedaço de panqueca e coloca em sua boca.
- Queria que as coisas fossem mais simples, tenho medo - ele levanta a mão para mim e me interrompe.
- Não, Rocco, vai desabafar comigo quando decidir que posso ficar na sua vida. Não quero escutar desculpas, quero ouvir de você que sou sua solução - ele é direto e agora eu não vejo o Giovani que estava sendo carinhoso comigo ontem, vejo o Giovani racional que conheci quando Ramon e Christen estavam com problemas.
- Está me pressionando - comento baixinho.
- Não, estou apenas deixando claro que eu não vou admitir mais nada que venha de você pela metade. Vamos fazer o seguinte, pense sobre isso, leve o tempo que achar necessário, mas me garanta que quando me procurar, será cem por cento da Rocco - ele exige e eu engulo seco a panqueca que estava mastigando.
- Por que tudo isso? - interrogo sem entender.
- Porque tenho mais interesse em fazer sexo com você do que com as outras, porque você fez boa parte da minha vida ganhar graça desde que chegou. Assim que começamos essa coisa estranha, eu deixei algumas coisas de lado e fiquei feliz por isso, então, agora eu exijo que seja por inteiro - ele me deixa sem palavras, mas ainda temos Madri.
- E Madri? - minha questão aqui não é ciúme, é saber se ele está disposto a abrir mão de seu passatempo do outro lado do oceano.
- Te dou o direito de saber sobre isso quando me der o direito de entrar na sua vida - ele não está sorrindo e agora sinto que estou sendo obrigada a tomar uma decisão.
- Enquanto o mundo caminha para a modernidade dos relacionamentos, você decide recuar alguns séculos - comento com a boca cheia.
- Esse tipo de relacionamento, o de séculos atrás, me causa mais interesse, estou mais interessado em seus segredos - ele está seco e sério e continua comendo como se não estivéssemos discutindo algo muito importante para mim. Parece que sou um desafio para ele e eu sei que ele é movido por desafios.
- Está me colocando em uma situação muito difícil - aviso e pego mais um pedaço de panqueca.
- Acha que a minha é fácil? Ver você como eu vi ontem aqui nessa sala, e depois vê-la bebendo como se precisasse simplesmente esquecer de tudo, como se isso fosse resolver alguma merda de problema? Quer saber o que eu acho? - tenho força apenas para acenar que sim com a cabeça - Respeito sua história seja ela qual for, mas o seu medo não merece meu respeito, meu tempo e tampouco qualquer tipo de compreensão. Estou lhe oferecendo tudo que precisa para seguir adiante, mas parece que lhe traz prazer sofrer pelo passado. Eu sei que alguma coisa marcou você, mas o que está fazendo com isso em sua vida é muito pior - ele pega o último pedaço da panqueca e enfia na boca.
- Não sei por onde começar - murmuro.
- Agora você não vai começar nada. Eu quero que pense sobre eu estar na sua vida, quando tomar essa decisão, quando me disser que será apenas nós dois, então, estou disposto a ouvir, do contrário, estarei aqui caso precise encher a cara e ser carregada, mas eu só coloco a minha mão em você quando tiver certeza de que você confia em mim assim como eu confio em você - nunca o vi desta forma.
- Você confia em mim? Fala sério, Gio - desdenho e ele se levanta espalmando as mãos sobre a ilha da cozinha.
- Que porra de pergunta é essa? Ouviu o que disse? Aliás, você consegue ouvir com clareza qualquer som que não seja o da sua própria voz? Você sabe sobre um clube, sabe de segredos que ninguém sabe e tem coragem de me perguntar se eu confio em você? - ele está furioso e eu nunca o vi bravo, não nesse tom.
- Eu sei... eu sei... é que... é tudo intimidador - ele dá a volta e para do meu lado virando a banqueta de frente para ele e, sem encostar em mim, olha em meus olhos.
- Não quero saber o que te intimida, quero saber quando vou poder ficar na sua vida da maneira que eu quero, da maneira que eu preciso, então, eu analiso o que pode ou não te intimidar, por enquanto é isso - ele se afasta, pega o guardanapo limpa a boca e o joga sobre a ilha caminhando até o quintal dos fundos.
- Está na minha casa e mesmo assim me ameaça? - falo parando atrás dele enquanto ele olha para o jardim feito na pequena área.
- Como se você não tivesse feito isso comigo - ele fala e não olha para mim - Entrou na porra da minha vida e desde então me sinto ameaçado, então tenha um pouco de dignidade e assuma que está com medo assim como eu, mas que quer de alguma forma fazer com que isso dê certo - ele se vira de frente para mim e agora seus olhos são mais duros e intimistas do que antes.
- Fala como se fosse fácil - cruzo os braços e suspendo a sobrancelha.
- Rocco, uma coisa eu lhe garanto, impossível não é - ele desvia de mim, pega suas chaves que estavam sobre o aparador e vai embora.
Ele foi embora! Que merda eu fiz? Por que eu não falei tudo para ele, que eu preciso dele por uma série interminável de coisas que não consigo resolver sozinha e que, acima disso, eu preciso que ele fique por perto, porque eu gosto mais da companhia dele do que da minha?
8
Rocco
Se ele ao menos respondesse as minhas mensagens, mas acho que se eu fosse ele também não responderia. Mas Gio é diferente, ele tem uma alma generosa e não seria infantil ao ponto de me ignorar. Talvez ele esteja ocupado... mas... não nos falamos há quatro dias... será que ele está tão ocupado assim?
Escuto alguém limpar a garganta e vejo Christen me encarando. Estamos na sala de reuniões da Madson e em alguns minutos alguns clientes da Escócia entrarão por aquela porta e eu preciso estar atenta. Sou muito bem paga para isso. Mas a ausência de Gio tem me deixado distraída nos últimos dias.
Sinto falta dele.
- Está tudo bem? - Christen se aproxima de mim e coloca a mão em meu ombro, me olha como se estivesse procurando alguma coisa. Se ela conseguir encontrar, gostaria que me avisasse, porque eu mesma já não consigo me localizar em muita coisa.
- Acho que sim - olho para baixo e nego, estou mentindo - Não está - agora meus olhos estão nos olhos dela e ela espera que eu termine a frase - Agora não é hora e nem o momento de falar sobre mim, só preciso pensar um pouco e tentar achar um norte - explico, mas sei que minha bússola parece um ventilador.
- Roc, somos amigas antes de mais nada, e eu quero poder te ajudar - ela fala e a porta se abre. É a secretária, e com um leve aceno ela pede autorização e, em seguida, entra posicionando cada um dos clientes em torno da mesa de reuniões. Tento analisar cada rosto, cada movimento, mas estou com um problema me distraindo e isso não é bom.
Estou ao lado de Christen e posso ver nitidamente que ela é outra pessoa desde que o latino chegou em sua vida. Sua pele está mais bonita, seu sorriso agora tem uma ligação direta com o coração.
Ela conduz a reunião e eu noto que um dos homens, acho que é Krigher o nome dele, me olha insistentemente. Tento não retribuir. Ele é bonito, cabelos escuros e uma pele clara assim como seus olhos verdes, mas ele não é o cara que está aqui dentro, brigando contra todos os meus instintos. Gio é o homem que faz meu sorriso surgir e, ao mesmo tempo, é o motivo de minhas angústias.
- A distribuição será feita, impreterivelmente, pela Jonnes&Weiser Shipping, e o deslocamento final será feito pela Istok Rute, essa mesma empresa na Escócia cuidará da parte burocrática junto com a Maccouant Import aqui em Nova York - Christen tem o dom da negociação e todos estão hipnotizados por sua liderança, ela é muito boa com pessoas.
A negociação hoje passou da casa dos dez milhões e agora a Madson alcança com mais força mais uma parte da Europa.
Analiso as diretrizes que chegam em meu iPad e organizo tudo que foi acordado aqui. Envio o contrato atualizado e escuto o momento em que Christen os convida para conhecer a empresa. Esse tempo é necessário para que as cláusulas sejam refeitas em alguns pontos. Obviamente ela não abre mão da Maccouant e da Jonnes, e com isso, ela também deixa claro que a Istok Rute, empresa de Danthe, primo de Wallace, também está conectada a toda negociação.
Olho para o relógio no canto da tela e são quase cinco horas da tarde e ele ainda não retornou. Pego o celular e envio uma mensagem:
“Apenas me diga um oi”
Guardo meu celular, recebo o e-mail com o novo contrato e assim que leio, confirmo e peço que imprimam seis cópias.
A partir de agora a minha presença não é mais importante. Assim que a secretária entra com os contratos, eu os disponho sobre a mesa como sempre faço e peço que troquem os copos com água e que sirvam um café ao final da reunião.
Caminho para a minha sala e aviso a Christen que tudo está pronto, ela me dá um ok e eu me sento na minha cadeira. Tudo isso é muito novo para mim. Antes, eu não tinha uma sala, passava o tempo todo na sala dela e apenas cuidava de sua imagem pessoal e alguns trâmites de negociação. Até que um dia vi um salário muito maior em minha conta e uma proposta para ser a assistente geral de negociações internacionais. Ela confia em mim e acho que ela é a única no mundo com essa coragem.
Abro meus e-mails e insistentemente olho para a tela do celular, e nada sobre ele, nenhum retorno, e acredito que o trabalho esteja lhe tomando tempo.
Uma hora depois, a porta da sala se abre e Christen, vestida com um Valentino azul escuro, se aproxima e me encara.
- Vai fugir até quando? - ela intima.
- Do que está falando? - tento fingir que ela não está falando da minha vida pessoal.
- Do seu passado. Gio está interessado em você e, até onde eu sei, ele não colocou nenhuma condição, ele aceita você e acho que isso é ponto mais importante - Christen dispara.
- Por isso ele não colocou nenhuma condição, ele não sabe de nada e é isso que me atormenta, porque eu não consigo me livrar dos pensamentos ruins - falo e me levanto - O que eu faço? - vejo em seu olhar o quanto ela lamenta.
- Conte a ele, não deixe que uma relação comece com alguns poréns, eu conheço seu coração e sei que ele também o conhece - ela fala, beija o meu rosto e espera que eu concorde com ela, mas isso não é fácil, nem perto disso. Sinto-me suja quando penso sobre isso, e me sinto covarde também.
- Ele não responde as minhas mensagens e acho que está em Madri - meu tom é triste e ela se aproxima de mim e coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha.
- Seja mais forte do que um clube de orgias, seja mais forte do que sua melhor desculpa - ela segura a minha mão.
- Obrigada, você nunca desistiu de mim e não me julgou, sou grata por ter você em minha vida - a abraço e sei que o mundo vale a pena porque nele tem pessoas como Christen.
- Vamos, eu te dou uma carona - fala como se ela fosse dirigir e eu sei que Ramon está esperando por ela na recepção. Eles vão para Malibu e desta vez eu não recebi o convite para acompanhá-los. Não existe um plano arquitetado por Gio para que eu vá.
- Preciso fazer compras, do contrário vou acabar com meu estômago com meu impulso por fastfood - comento caminhando em direção à minha bolsa e em seguida saímos.
Olhar para Ramon e Christen juntos me enche de esperança. Ela era uma pessoa sozinha desde que toda a tragédia aconteceu e ele era um homem sozinho perdido em uma multidão de homens tão sozinhos quanto ele.
***
Desci do carro seis quadras antes, exatamente onde fica um pequeno mercado que eu possa comprar alguma coisa mais nutritiva do que lanches com sabor artificial.
Assim que saio do mercado, vejo um taxi parando e duas garotas estão saindo do carro, mais do que depressa eu vou até ele e entro. Sei que são apenas seis quadras, mas são sete sacolas.
Aviso sobre o endereço e mais uma vez pego o meu celular e vejo que não há nada sobre ele.
O carro para e eu deixo uma nota de dez dólares e não me importo com o troco, estou mais preocupada em segurar todas as alças e não esquecer nada dentro do taxi, sem contar que meu vestido subiu dois palmos e mais um pouco é possível ver a minha calcinha.
A porta do carro se abre como mágica e eu vejo o rosto do homem que me deixou esperando por uma mísera mensagem por dias. Ele pega todas as sacolas da minha mão colocando-as no chão, ajeita a saia do meu vestido e me oferece sua mão para que eu possa sair.
Assim que saio e fecho a porta, meu rosto fica a poucos centímetros do rosto dele. Posso apreciar de perto sua barba por fazer, seus olhos azuis e o contorno perfeito de seus lábios carnudos bem desenhados e habilidosos em todos os sentidos.
Engulo seco e respiro fundo, inalando o perfume amadeirado que seu corpo exala, e pela ausência da roupa social, deduzo que não faz muito tempo que ele tomou banho.
- Oi - o som da sua voz é baixinho -Não foi isso que me pediu na última mensagem? - o sorriso dele encerra a frase e ele aproxima seu rosto do meu - Senti sua falta - ele sela meus lábios, gentilmente, e captura de forma íntima a ponta da minha língua.
Quando seu rosto se afasta e eu ainda vejo sorriso, concluo que preciso esquecer o que me faz mal, só assim o bem vai poder entrar na minha vida.
- Oi - respondo e ele beija a minha testa - Comprei comida de verdade - brinco com ele e ele me segura junto com as sacolas. Sei que estou sorrindo.
- Vou conferir de perto o que tem aqui dentro, mas eu prefiro fazer isso em sua casa, pode ser? - agora eu vejo um sorriso ainda maior, amplo, e de alguma forma esse gesto me traz um pouco de paz.
Caminhamos para dentro da minha casa. Como sempre, tiro os meus sapatos perto da porta e coloco a minha bolsa no chão de qualquer jeito. Ele vai até a cozinha e eu desço o zíper lateral do meu vestido e o coloco sobre o encosto do sofá. É exatamente isso que faço todos os dias e ele já está acostumado.
Estou de roupa íntima, vou até a cozinha e pego um pouco d’água. Ele olha para mim de soslaio enquanto esvazia as sacolas. Bebo água da garrafa e ele me encara.
- Precisa de copos? - ele brinca.
- Não! - sorrio - Agora eu preciso apenas de um banho - beijo seu rosto e vou para a minha suíte.
Ligo o chuveiro e assim que dispenso a minha lingerie, vou para debaixo da ducha e deixo que a água acalme meu conflito interno. Mas eu tenho boa memória e os flashes do passado ainda me aterrorizam e a culpa pelas decisões que tomei são como uma tortura. Ainda posso sentir o cheiro de éter e, depois, o cheiro de sangue e, então, o mal já estava feito.
Deslizo o sabonete pelo meu corpo e penso em como contar para ele que tudo que tenho a dizer não é tão agradável e que se ele quiser ficar, vai encontrar uma pessoa bagunçada que se esconde atrás de bebidas e danças sobre a mesa de um bar.
Sou uma soma de coisas absurdas, de sentimentos brutos e de uma alta rejeição em trabalhar cada um deles. Eu sou incompleta desde que escolhi a forma errada de resolver algumas situações.
A espuma vai embora, desligo o chuveiro e prendo meu cabelo com um grampo grande, deixando apenas alguns fios que molharam soltos ao redor do meu rosto.
Caminho até o meu closet, coloco uma calcinha e uma regata, o calor me obriga a não usar roupas em excesso.
Sinto o cheiro de carne sendo grelhada e escuto o som vindo da cozinha, é Close, de Nick Jones, e eu adoro essa música. Paro perto da porta e observo como Gio lida com as panelas e como fica charmoso o guardanapo azul claro em seu ombro. Ele abriu uma garrafa de vinho e mais uma vez está preparando o jantar.
Agora ele destampa uma das panelas e vira um medalhão de carne vermelha, o cheiro faz meu estômago rezar um Pai Nosso de tão formidável e atraente e nesse momento sou flagrada por ele, que segura uma taça em sua boca e pisca para mim.
Caminho até a banqueta alta e me sento, apreciando a sorte que tenho em ter um homem assim, cozinhando para mim, e, de quebra, enchendo uma taça de vinho e colocando em minhas mãos.
- O cheiro está ótimo - falo e ele pega no armário de baixo o que precisamos para preparar a bancada para nossa refeição.
Ele arruma tudo com um pequeno rastro de sorriso em seus lábios e isso me excita. A visão dele dominando o ambiente me desafia e, com isso, sinto que minha calcinha está mais molhada a cada minuto.
Ele desliga o fogo das panelas, serve dois pratos com medalhões, massa fresca fina e um pouco de creme de legumes. É uma heresia eu comer um fastfood, sabendo que posso apreciar esse tipo de refeição com frequência.
Ele se senta e eu vejo seus olhos se fechando e sei o que ele está fazendo, ele está agradecendo. Giovani Makenzie é o tipo de homem que faz uma prece antes das refeições... destas refeições.
Ele abre os olhos e me encontra, ele sabe que estou encantada com sua imagem em minha cozinha, mas não imagina o quanto sou feliz por saber que ele quer estar na minha vida, só estou com medo do que ele possa encontrar por aqui.
Pego os talheres e fatio um pedaço pequeno e levo até a boca e aprecio, deixo a minha língua contemplar o sabor, e eu sempre me surpreendo com Giovani.
- Como você faz isso? Era só um pedaço de carne - o elogio e ele leva a taça até a boca e sorri para mim.
- Se eu te contar não vai precisar de mim por aqui - sua resposta quase me sufoca e de novo engulo mesmo não tendo mais nada em minha boca - E meus planos não são esses - uma bancada nos separa, mas eu a pularia agora, nesse momento, e jogaria tudo isso no chão. Eu não tenho autocontrole algum com ele por perto e ele com toda certeza já sabe disso.
- Tem ideia do que está me dizendo? - minha questão agora é sobre o quanto ele quer e o quanto ele suportaria saber mais sobre mim.
- Não sou um homem que fala sem ter pensado, acho que já deveria saber isso - ele corta mais uma vez a carne e no garfo coloca um pouco da massa e leva até a boca. Se os lábios dele não fossem tão bem desenhados, se sua língua não fosse tão hábil e eu não estivesse tão ridiculamente apaixonada por ele, essa situação seria apenas uma refeição.
- O que você acha que mudaria? Não estava bom antes? - sorrio para ele sentir que não quero discutir novamente.
- Não - ele é seco - Se estivesse bom eu não estaria aqui com você agora - ele bebe um pouco de vinho - E antes que possa dizer mais algum absurdo, não faz ideia de como estou me controlando para não te puxar aqui, sobre essa bancada, e te mostrar exatamente como estou nesse momento - sinto uma fisgada no alto do meu sexo e acho que eu gostaria de saber como ele está nesse momento.
Ameaço levantar e ele levanta o indicador e nega.
- Não - ele ordena - Coma tudo, não gosto de desperdício de comida - arregalo os olhos e mostro minha indignação.
- Mas jogou meu lanche fora!
- Estou falando de comida e não aquela porcaria - ele levanta uma das sobrancelhas e pega mais um pedaço de carne e coloca em sua boca - Agora, termine seu jantar, temos um assunto muito sério para resolver ainda esta noite.
- Mataria a minha fome, mesmo sendo porcaria - o enfrento e ele abaixa a cabeça, e sorrindo, a balança como se dissesse não.
- Rocco, não faz ideia de como suas respostas são excessivamente sedutoras e, sobre matar a fome - ele se levanta e dá a volta na bancada e vira a minha banqueta me deixando exatamente de frente a ele -, coma tudo que está em seu prato e depois de acertarmos alguns detalhes - ele coloca a mão em minha coxa e sobe em direção à minha calcinha, roçando o seu polegar entre as minhas pernas, massageando meu ponto íntimo sob o tecido e me obrigando a abrir ainda mais as pernas -, eu te mostro como se mata uma fome, eu te mostro o meu jeito de matar a fome - ele desliza sua mão coxa abaixo e volta para sua banqueta como se nada tivesse acontecido.
Meu estômago não quer mais nada que está sobre essa bancada, meu corpo pede por ele, porque é esse meu ponto fraco, miseravelmente eu tenho no sexo a minha válvula de escape. É no sexo que desconto e afogo o que tenho de ruim.
Ele desliza a faca lentamente pelo pedaço de carne, e com o garfo, ele passa sobre a pequena porção de sangue e leva até a boca. Meu Deus!
- Me recuso a continuar com você sem saber sua data de aniversário, por exemplo - Acho isso meio difícil de acreditar. Na certa ele sabe de cabeça até o número do meu seguro social. Não gosto de aniversários, os meus nunca foram felizes - Por que você tem medo? - sua indagação me incomoda porque eu tenho muitos medos e um deles é não saber lidar com esse tipo de evolução.
- Não é medo e você sabe a data do meu aniversário, sabe tudo através de seu dom “hackeano” - respondo secamente e ele abre os olhos em sinal negativo.
- Não? Então, o que é? Estou aqui disposto a não ter mais ninguém e você se fecha e me impede de entrar em sua vida. Não sei nada sobre você e o que sei é porque vasculho de maneira ilícita - escuto e imagino que se ele soubesse mais sobre mim, não me olharia com a ternura que sempre me olhou.
- Qual é o seu maldito problema? - por que isso tudo agora?
- O meu maldito problema? - ele se levanta e se apoia na bancada com as duas palmas esbarrando nos talheres - O meu maldito problema é você! - me levanto e caminho até a sala e ele vem atrás de mim - Você acha que é fácil para mim? Enquanto estou querendo mais de você, você prefere se esconder atrás de um monte de coisas que eu não faço ideia do que sejam, eu poderia fazer você feliz - ele se coloca à minha frente e eu encaro seus olhos e nego com a cabeça.
- Sou cheia de coisas ruins, e você é uma pessoa boa, não sei se posso retribuir tudo que você faz por mim - agora eu deixo as minhas palavras em um tom mais baixo - não quero brigar com você. Nunca brigamos até que você começou a insistir em exclusividade - ele se aproxima.
- Eu prometo que terei toda a paciência do mundo seja lá com o que for, também não quero brigar, já tenho problemas o suficiente e discutir com você não é nem de perto o que quero fazer nesse momento - ele coloca suas mãos em meu rosto e me beija calmamente.
- O que mais gosto quando estou com você é que consigo me enxergar em alguns pontos - declaro e vejo seu sorriso se abrir.
- Quer mesmo saber? Eu sinto o mesmo - ele me beija novamente e aqui dentro alguma coisa fica mais calma, como se uma brisa fresca aliviasse o suor do meu rosto - Preciso te confessar uma coisa - ele alisa meus cabelos e olha em meus olhos -Estou há meses sem pisar naquele lugar, tudo perdeu o sentido e me sinto mais feliz aqui, com você e sua rebeldia do que lá, com mulheres que nunca mais verei na vida. Minha vida é muito legal longe de você e eu não vejo nenhuma graça nisso, prefiro você me chateando - eu estou tremendo.
- Vou tentar, mas não prometo... - ele abre um sorriso perfeito e eu não sabia o quanto isso era importante para ele - Eu vou deixar que entre, mas apenas tenha calma, algumas informações são difíceis de serem repassadas - ele me beija com mais intensidade e eu sinto seu corpo mais próximo e ele me deseja, eu sei.
Mas ao invés de fazer o esperado, Giovani me abraça apertado e sem mais palavras, me leva até o sofá, onde deitamos encaixados.
“Minhas palavras rolam de minha língua para seus lábios” - diz Nick na letra da música.
Adormeço com seus dedos mexendo em meu cabelo e eu não me lembro de ter sentido isso com alguém antes dele, porque antes dele não houve muita coisa e agora eu tenho tudo isso.
***
Escuto um barulho na cozinha e sorrio, o dia já clareou e hoje é sábado, posso ficar exatamente onde estou e com quem estou.
Mas, escuto Gio atendendo o telefone e sua voz não está feliz.
- Alec, não podemos simplesmente redirecionar os comandos, isso precisaria de um novo cálculo, prefiro decidir isso com a Brooke, ela analisou a plataforma e ponderou os riscos - ele fala e eu acredito que seja algum problema grave, pelo tom de sua voz. Caminho até a sala lentamente escutando o que ele está falando.
- Vamos manter as coisas como estão - ele continua e eu estou sobre as pontas dos pés - Nenhum erro pode acontecer, são milhões em jogo - olho para ele e o vejo desligar o celular. Ele o guarda no bolso de sua bermuda e apoia suas mãos na bancada olhando para o chão.
- Está tudo bem? - pergunto e ele nega com a cabeça e não fala nada.
- Problemas no trabalho - ele responde e se aproxima de mim rapidamente e me senta sobre o balcão. Ele me abraça pela cintura e consigo ver o Giovani que conheci, enfiado em trabalho e totalmente tenso quando alguma coisa sai de seu controle.
- Alguma coisa muito séria? - pergunto e ele coloca em minhas mãos uma caneca com café.
- Muito, não gosto que mudem meu trabalho ou que questionem o tipo de segurança que aplico em cada plataforma - ele está irritado.
- Vai ter que trabalhar hoje? - sorrio para ele e ele nega com a cabeça.
- Não, a não ser que Alexander me obrigue, e eu não duvido que isso possa acontecer - ele zomba - Vou precisar viajar em algumas semanas - ele murmura e seu maxilar fica rígido. Eu não gosto dessa versão dele.
- Tudo bem - Mordo a língua morrendo de vontade de perguntar onde ele vai. Ele olha fundo nos meus olhos.
- Vou para Madri - ele me informa sabendo que quero saber. Sua resposta é seca e isso me obriga a mudar minha expressão - Preciso que confie em mim, apenas isso, não pedi para ficar na sua vida se não tivesse um bom motivo - ele se aproxima e beija a minha testa e caminha para perto da geladeira.
- Espere - peço e salto da bancada - O que vai fazer em Madri? - não estou feliz com essa viagem e ele percebe isso. Precisei ultrapassar alguns dos meus limites e agora ele me joga essa bomba, eu não me importava com aquele lugar declaradamente, mas desejei várias vezes que tudo fosse para o espaço.
- É muito complicado para eu tentar te explicar, por isso eu acredito que posso pedir para confiar em mim, consegue fazer isso?
- Disse que há meses não vai para lá e agora precisa ir em algumas semanas? - cruzo os braços e vejo seu rosto se fechando.
- Eu não acredito que não ouviu o que acabei de dizer - ele é seco.
- Escutei, vai para Madri.
- Não, não hoje, mas eu vou em algumas semanas e não quero discutir isso com você, eu não quero discutir com você, será que você consegue não estragar tudo?
- Estragar tudo? Escuto você falando que vai para aquele inferno e acha mesmo que sou eu quem está estragando tudo? - uma fúria sobe em minha garganta e eu não tenho controle algum sobre isso porque eu não sabia que Madri me incomodava tanto e agora as palavras saltam da minha boca como um disparo descontrolado.
- Não é inferno, é Madri e eu tenho negócios por lá, e para quem não estava se importando com o meu pedido, não acho apropriado se importar com Madri - percebo que ele também está tenso e é difícil ver Gio assim.
- Eu sei o tipo de negócio que você tem por lá e agora que estou disposta a tentar, você me fala isso... aquele lugar me incomoda sim - Madri é um lugar que não gosto nem de pronunciar o nome e eu acabo de descobrir isso.
- Eu juro que não estou acreditando... Eu venho até você, deixo claro que estar com você é mais importante do que estar em qualquer outro lugar e você me mostra isso, você não confia em mim - ele se aproxima e olha em meu rosto.
- Como eu posso confiar em você? Naquele lugar... - desvio dele e vou para o meu quarto, eu sei que não fui feliz com a minha pergunta.
- Assim como eu confio em você e sei que nunca mais vai subir em uma mesa e dançar até o dia nascer, mas pelo visto, eu sou o único a acreditar que isso poderia dar certo - ele fala enquanto me segue até o quarto - Por que você faz isso? Por que repele quem quer o seu bem? - sua voz sai mais alta e ele se aproxima de mim, encarando a minha alma através do seu olhar.
- Porque eu sou assim - respondo friamente e talvez eu não esteja preparada para tudo isso. Eu não deveria me importar com Madri, eu não deveria me importar com nada, mas eu me importo. Eu tenho ciúmes dele, eu tenho sentimentos reais, únicos e intensos por ele e, agora, nesse momento, eu me odeio por ter admitido que Madri seja uma pedra em meu sapato, nunca vou me perdoar por ter permitido que isso saísse dos meus pensamentos.
- Eu estava errado, eu pensei que poderíamos fazer dar certo, mas não podemos, porque aqui estou diante de alguém que não enxerga um palmo à frente do nariz, e vive de maneira quase deprimente alimentando seja lá o que for do passado - ele vai para a sala e eu vou atrás dele.
- Você não faz ideia do quanto é difícil ter que assumir, mas você está certo, não consigo ver um palmo à frente, não consigo ser diferente e não consigo confiar nas pessoas porque elas nunca me deram motivos para isso - falo ainda mais alto e ele para segurando a maçaneta em sua mão.
- Quando disse que tentaria, mesmo não prometendo nada, assimilei como um sim, como se tivesse deixado claro que eu poderia entrar e ficar, por isso fiquei, mas eu estava enganado... - ele nega com a cabeça e suas mãos passam pelos seus cabelos de maneira exasperada - Acredito que isso seja um adeus.
Ele abre a porta, sai e eu fico estática por dois minutos olhando para a porta, esperando que ele volte e me abrace. Porque eu sou a pessoa que menos merece esse tipo de carinho, mas garanto que sou a que mais precisa.
Inconscientemente caminho até a janela e o vejo ir embora. Me sento na poltrona e puxo meus joelhos para perto do meu corpo.
Se ao menos eu pudesse me livrar dessa coisa que me atormenta, mas eu não consigo. É como se minha maldição fosse ser isso, eu mando embora pessoas que me fazem bem...
Ele disse adeus...
9
Giovani
Alexander entra na minha sala com um sorriso de orelha a orelha, e eu não tenho ânimo para sorrisos essa manhã. Olho para a tela enquanto digito alguns comandos.
- Bom dia, Gio - ele fala e se senta na minha frente - Como foi a viagem? Uma semana fora, eu imagino que tenha sido especialmente produtiva - o tom sexual que ele usa não me deixa menos irritado.
- Apenas negócios. Pelo sorriso deduzo que esteja tudo bem com o pai de Brooke, que foi hospitalizado há alguns dias - respondo e não olho para ele. Adiantei a viagem para Madri em duas semanas e espero não precisar sair do país tão cedo.
- Sim, ele está estável, mas ainda segue internado, e aqui foi tudo bem, já que perguntou sobre a empresa - não preciso perguntar, eu simplesmente sei o que acontece aqui, porque além das câmeras, eu coloquei uma escuta em cada ponto deste andar - Um fato curioso aconteceu, os voos de Vancouver misteriosamente se atrasaram ou foram cancelados exatamente no dia da reunião da Convex com a Entok, não acha isso milagroso demais? - sinto a indireta, mas eu a dispenso. Tenho um outro problema para resolver e atrasar voos é a coisa mais simples de se fazer desde que tenha um cérebro eficiente para isso.
- Milagres acontecem - respondo e ele, enfim, para de sorrir e me encara.
- Você é o cara que está sempre aconselhando, sorrindo e agora eu vejo algo praticamente surreal, seu bom humor foi embora? - ele me provoca.
- Sou humano, Alec, não se esqueça disso - concluo a digitação e o encaro.
- Esse é o problema, você é um dos melhores humanos que já conheci e essa sua cara para mim é totalmente inédita - ele está falando sério e eu me levanto e vou até a porta e a tranco. Vejo em seus olhos que ele estranha a minha atitude.
- É a Rocco - solto o nome dela junto com o ar que estava preso em meus pulmões. Ele sabe que eu estava com ela há um bom tempo.
- Terminaram?
- Quem dera ter terminado, porque isso implicaria em ter começado alguma coisa. Não falo com ela desde que fui viajar - desabafo - Essa viagem não estava em meus planos, mas eu precisava me afastar para ver de longe os detalhes que estão me passando despercebido e a verdade é que não consegui analisar absolutamente nada.
- Alguma coisa em especial fez com que isso acontecesse?
- Tudo, ela não permite nenhum tipo de aproximação e isso é frustrante. Eu realmente tenho interesse em ficar com ela, mas ela não confia, se fecha em uma ostra e me manda para longe - passo as mãos pelos cabelos, ando até perto do sofá e enfio as mãos nos bolsos - Era mais fácil quando eu estava de fora e podia aconselhar sobre isso, mas agora parece que tudo que orientei você e os outros a fazerem, não funciona para mim - agora estou diante de um amigo e deixo claro que eu posso resolver tudo, desde que não esteja ligado diretamente ao meu coração.
- Eu pensei que estava tocando as coisas como sempre fez, mantendo a distância segura para que o Clube 13 permanecesse exatamente onde sempre esteve, não pensei que ela fosse importante ao ponto de acabar com seu humor - Alexander se aproxima de mim e faz menção para nos sentarmos nas poltronas na pequena sala anexa à minha.
- Não foi ela que acabou com meu humor, foi a ausência dela - admito e apoio meus cotovelos em meus joelhos - Não frequento o Clube há alguns meses, estou ocupado demais e estar com ela tem compensado - entrelaço meus dedos e nego com a cabeça como se eu não entendesse como tudo entre mim e ela não funcionou.
- Ainda é membro do Palácio? - a pergunta dele é inquietante e isso causa um novo conflito dentro de mim.
- Sim - respondo mas não olho para ele.
- Por que não se livra daquilo e se arrisca? Garanto que foi isso que disse ao Evan, Sebastian, Ramon e Benjamin - ele se ajeita na poltrona e espera que eu responda o que seria correto, mas Alexander não faz ideia do quanto estar ainda misturado àquele lugar é necessário, eu tenho minhas razões. Existe um propósito para minha filiação ao Clube ainda existir, eu sou um homem de propósitos e alguns desafios.
- Ainda preciso daquele Palácio - respondo e olho para ele. Alexander sempre foi um bom amigo, eu o vi derrotado quando descobriu tudo sobre Brooke, mas essa não foi a sua primeira queda, ele enfrentou algo ruim no passado. Jakov Egor, o primeiro cara a colocar Alexander Von Humbolt na lona, por pouco não perdeu tudo e quase precisou recorrer à fortuna da família. Jakov foi o maior aproveitador e o enganou, roubou sua ideia principal e levou com ele os primeiros e únicos clientes que Alexander tinha na época, e foi aí que eu entrei e comecei a blindar o sistema da Oracle. Criei o que havia de mais avançado e naturalmente derrubei Jakov, que prometeu se vingar, mas desapareceu há muito tempo e isso foi pouco tempo depois de inaugurarmos o Palácio Hanzel.
- Não sinto falta daquele lugar, e depois de um tempo se tornou uma obrigação sem fundamento - eu sei, Alexander, como tudo na vida, o Clube tem prazo de validade para ser interessante, mas isso não quer dizer que podemos nos livrar facilmente dele.
- Mas, mudando de assunto, a Convex entrou em contato? - desvio a atenção dele e novamente o seu sorriso volta.
- Foi por isso que eu vim aqui na sua sala. Parece que a desculpa da Entok não colou, afinal, eles deixaram para viajar no mesmo dia da reunião o que pareceu inconcebível para eles e eles fecharam a conta conosco - ele me encara como se quisesse me perguntar alguma coisa e eu espero que ele pergunte, eu gosto de deixar as questões resolvidas.
- Isso é ótimo - sorrio e me levanto, caminhando até a minha mesa e ele vem atrás de mim.
- Gio, atrasou os voos? - as palavras me parecem punitivas - Porque eu prefiro ganhar as contas por mérito - sinto uma pequena agulhada e o encaro.
- E quando foi que você mudou tanto de opinião? - fico de frente a ele e espero que ele tenha uma excelente resposta.
- Não acho justo simplesmente trapacear - ele comenta e coça a ponta do nariz. Péssimo mentiroso, Alec.
- Mas não achou injusto quando decidiu colocar uma interface falsa no sistema do nosso concorrente na época em que estávamos tentando ganhar a conta da Montreal, e pelo que eu me lembro, a conta na época não chegou nem a duzentos mil - tenho memória, Alec, e eu guardo as informações que preciso.
- Foi uma situação diferente - ele tenta se defender e desvia o olhar do meu.
- Diferente? Então me responda uma coisa, qual a diferença entre roubar cem dólares ou um milhão?
- O valor.
- Nenhuma diferença, Alec, a ação é a mesma, ninguém é condenado pelo valor que roubou e sim, pelo crime, então guarde sua teoria falsa sobre honestidade, porque aqui - ligo nós dois em um gesto com os dois indicadores - enfrentaremos a cadeira elétrica pelo mesmo motivo - seus olhos cerram em minha direção e ele acaba concordando com a cabeça.
- Você está certo - percebo que ele fica sem jeito, mas com Alec, algumas porradas precisam do auxílio de um soco inglês, e eu não poderia perder a conta da Convex, ela cuida de um departamento do qual tenho muito interesse, nunca se sabe quando precisaremos acessar um banco de dados do governo.
- Temos mais alguma novidade nesse período que fiquei ausente?
- Não tem graça, você tem todas as informações na ponta dos seus dedos, você é um maldito hacker, Giovani Makenzi - ele sorri e eu sinto que está tudo bem agora.
- Não diga isso, está dividindo um apartamento com uma hacker melhor que eu - sorrio e ele nega com a cabeça.
- Tenho receio do que vocês dois juntos possam fazer - ele comenta e vai em direção à porta.
- Conquistar o mundo? Não, estou ocupado com um assunto mais interessante - sorrio para ele e volto a olhar para a tela.
- Rocco? - ele pergunta e internamente eu respondo que não, porque existe um assunto que toma mais do meu tempo e é de maior interesse. Levo meu rosto até ele, respiro fundo, contrariando todas as reações da resposta mentirosa que elaboro.
- Exatamente.
***
Rocco
Giovani gosta desse vestido. Ele é justo ao corpo e, segundo ele, combina com as minhas tatuagens. Olho para o reflexo do vidro de minha sala e analiso se está tudo em ordem. O expediente está para acabar e talvez eu consiga vê-lo assim que sair daqui.
Alguém bate na porta e em seguida entra, ela é a única que pode fazer isso, ela é a dona de tudo isso.
- Rocco, você viu que agendaram a minha reunião com a Parise In Door em três semanas? - olho para o seu conjunto social cinza e Christen é bonita mesmo que estivesse vestida com um saco de farinha.
- Sim, fui eu que agendei - retorno e me aproximo dela.
- Mas, eu não queria que fosse assim, porque é na Europa e Ramon e eu estamos tentando conciliar uma viagem de negócios juntos para tirar alguns dias - ela fala triste e eu estou sorrindo.
Alguém bate na porta e eu peço que entre.
Olho para a porta se abrindo atrás de Christen e sorrio amplamente, ela se vira e se surpreende.
- Ramon? - ela diz sorrindo.
- Esperava outra pessoa? - ele pergunta a abraçando pela cintura e beijando-a.
- Nunca esperaria outra pessoa - ela fala com a voz doce e eu rolo os olhos para cima.
- Estão me dando cárie - comento e sento na cadeira atrás da minha mesa.
- Rocco, obrigado por marcar a reunião em três semanas - Ramon me agradece e eu faço um sinal de positivo e sorrio segurando meu queixo com uma das mãos.
- Estavam juntos nas minhas costas armando tudo isso? - Christen pergunta com um sorriso lindo e eu aceno que sim - Por isso eu te amo - ela se aproxima e beija meu rosto.
O celular de Ramon toca e ele pede licença para atender lá fora. Assim que ele fecha a porta, Christen me encara e espera que eu fale alguma coisa. Ontem conversamos até as duas horas da manhã - E o que decidiu? Vai falar para o Gio tudo que me disse? - a intimação é mais séria desta vez.
- O que você quer que eu fale? Que não tenho saído com mais ninguém nos últimos meses? Que estou mais interessada nele do que deveria? Que eu tenho ciúmes da porra de um clube em Madri e eu te garanto que é difícil competir com um cardápio de mulheres? - desabafo e nego com a cabeça.
- Você nem quer tentar. Tenho medo que chegue aos sessenta anos e não admire a vida que decidiu viver, você precisa gostar da obra de sua vida, acho que foi isso que Deus nos pediu quando nos concedeu essa dádiva - ela me olha com a melhor de todas as intenções - Eu vou te confessar uma coisa, viver com medo é como não viver, e eu posso te dizer isso, tenho em meu histórico a horrível trajetória de pavor. Perdi meu tempo sentindo receio e agora eu vejo que os perigos que escolhi viver ao aceitar Ramon em minha vida são os riscos que fazem meu coração ter uma função real. Permita o mesmo, o medo é a ponte que liga nada a lugar nenhum.
- Mas eu vou me machucar! - me levanto e dou a volta na mesa.
- Não mais do que assisti-lo tendo outras mulheres, ou quando se der conta de tudo que perdeu. Está se torturando por orgulho, mas eu tenho que admitir que me parece que existe algo mais do que o medo do tal clube, o que você não quer dividir com ele? - a pergunta agora é bem direcionada, até mesmo porque ela sabe de toda a minha vida e sempre respeitou o meu silêncio.
- Você sabe - falo e olho para o chão e escuto a porta se abrindo.
- Vou te esperar na sua sala - Ramon diz ao ver a cena de nós duas e Christen apenas concorda e se mantém ali, de frente para mim. Ele sai e fecha a porta.
- Vai ter que se livrar disso, já deu um grande passo deixando de sair com homens comprometidos, agora vai precisar exorcizar seus medos. Todo mundo tem um passado, o seu é um pouco diferente, e você precisa admitir para ele que foi com ele que conseguiu dividir a mesma cama, ele merece saber, ele está apaixonado por você - Christen fala como se fosse simples, mas não sei se ele está apaixonado ou apenas curioso sobre tudo que escondo dele.
- Não sei se quero minha vida diferente disso, está bom assim, eu não me machuco e não machuco ninguém - falo e ela se aproxima mexendo em meu cabelo.
- Rocco, não percebe que já está machucada? Vai viver à base de remendos enquanto não souber se reinventar, pare de tentar se esconder atrás desse amontoado de coisas velhas, isso não combina com você - agora foi um sutil puxão de orelha.
- Christen, o que ele vai pensar de mim?
- Vai pensar o que é justo. Estamos falando de Giovani e eu ainda não conheci alguém tão generoso como ele e não estou te reconhecendo, desde quando ficaria preocupada com isso? Foi a sua história e não algo que simplesmente decidiu viver - sua resposta não me ajuda e ainda fico com a dúvida sobre tudo.
- Vou ver o que eu faço - respondo e ela beija meu rosto e caminha até a porta.
- Corre o risco de chegar ao fim da vida e não ficar feliz com a trajetória - ela rebate e eu sinto que ela tem razão, o problema é que não tenho coragem.
- Obrigada por se preocupar comigo - agradeço e ela pisca me deixando ali, cheia de coisas e medos. Tenho medo do que vou encontrar quando chegar aos sessenta anos, talvez eu não encontre muita coisa.
Pego a minha bolsa, saio da minha sala e vou em direção à rua. Todos os dias pego o metrô, mas hoje eu vou embora de taxi, preciso falar com Giovani, são quase duas semanas sem contato e estou enlouquecendo. Talvez eu deva mergulhar de cabeça.
***
Peço para o motorista do taxi parar do outro lado da calçada, estou em frente à casa de Giovani e tomando coragem de ir até lá apertar a campainha e dizer que sim, que podemos fazer isso que ele quer, mas que vou precisar de tempo até me acostumar com a ideia de que alguém realmente se importa comigo.
Analisando minhas reações até esse momento percebo o quanto fui uma idiota, como pude sentir medo de me arriscar? Estar sem ele já é um risco desnecessário.
Seguro a maçaneta e assim que aplico a força para poder abrir a porta, vejo a porta dele se abrindo e de sua casa sai uma morena alta, bem vestida, segurando uma bolsa de grife e sorrindo para ele. Ele está com a mão em suas costas e parecem animados, felizes, e eu acho que as coisas mudaram nesses últimos dias sem contato.
A fila de Gio andou. Claro que andaria, agi como uma derrotada antes mesmo da batalha final. Ela é bonita... Caralho! Parece bem sucedida por conta do carro e de sua postura.
Ele a acompanhou até o carro, abriu a porta para ela e se inclinou, acredito que foi para beijá-la. De onde estou não consigo ver se foi na boca, mas se tratando de Giovani...
Gio está usando a calça de malha preta e sua camiseta de ficar em casa é a que eu dei a ele de presente, já está gasta de tanto ele usar e agora essa vadia, que acabou de sair da casa dele, também a tocou. Assim que puder vou atear fogo na camiseta, de preferência com ele dentro.
Ele volta para dentro de casa e ela vai embora, espero eu que para os quintos dos infernos.
Fico perdida no banco de trás e pego meu celular. Preciso sair, preciso beber alguma coisa e trepar com outra pessoa, preciso tirar esse cretino da minha cabeça.
Não acredito que eu estava prestes a aceitar essa coisa de ser exclusiva. Resmungo em meu cérebro enquanto me atento à tela do celular. Esse filho da puta nem me esperou e já colocou outra dentro de casa.
Olho para os nomes e nego conforme vou lendo, Viny? Não... trepa mal. Cannon? Não, goza rápido... Fred? Pode ser, mas acho que a esposa dele não vai gostar.
- Vamos - alguém diz e eu me assusto fazendo o celular quicar em minhas mãos e cair no assoalho do carro. Olho para quem falou e vejo Giovani com a porta do taxi aberta me encarando. Pego o celular e cruzo meus braços.
- Vamos aonde? - pergunto fingindo não saber do que se trata - Estou aqui esperando um amigo - aponto para a casa branca que o taxi está parado em frente.
- Vai sair com o Sr. Clinton? Acredito que nem pílulas azuis o farão ficar rígido aos noventa e um anos de idade - ele estende a mão para mim e eu saio sem tocar nele, porque ele tocou naquela puta e eu ainda vou dar um soco nele por conta disso.
Paro no meio da rua e cruzo os braços o encarando.
- Não acha melhor entrar e fazer isso lá dentro? - ele pergunta e eu percebo que ele está descalço.
- Tem certeza? Talvez eu possa encontrar alguém lá dentro - minha resposta sai afiada e ele sorri escondendo-se atrás da mão - Qual é a graça? - questiono. Vejo-o pagando o taxi sem esperar o troco e coloca a mão em minhas costas para que eu entre em sua casa. Eu me afasto - Não preciso ser guiada como a fulaninha que estava aí dentro com você - piso duro entrando, observando os detalhes e vejo alguns envelopes timbrados com um símbolo que não reconheço sobre a mesa.
- Quer beber alguma coisa? - ele pergunta e fecha a porta da sala e caminha até a cozinha que fica aos fundos e o sorrisinho dele escondido está me deixando ainda mais irritada. Percebo em seu rosto um sorriso praticamente maligno, perverso e muito sedutor.
- Para mim whiskey sem gelo e para você veneno! - estou puta da vida - A gente fica sem contato por uma semana...
- Duas - ele me interrompe com um sorriso safado na cara.
- Uma, duas, faz diferença? Você já colocou uma vadia aqui dentro da sua casa - jogo a minha bolsa sobre a poltrona e vou atrás dele, e ele com um sorriso lindo colocando vinho em duas taças - Vinho? Não escutou o que eu disse? - pergunto e ele age como se nada tivesse acontecido - Por que você não me disse a verdade? Por que não disse que tinha um prazo para responder? - estou enfurecida e ele me entrega a taça de vinho - Quero jogar isso em você - falo e pego a taça estupidamente e bebo tudo de uma única vez e a coloco sobre a bancada.
- E eu quero fazer amor com você - ele fala baixinho e me encara. Os olhos de Gio transmitem um tipo de informação enlouquecedora, é isso que ele tem feito comigo, a cada dia, ele me enlouquece e eu garanto que nem sempre é no bom sentido da palavra.
- Não tem vergonha na sua cara? Acabou de trepar! - coloco as mãos na cintura e ele vem em minha direção - Não coloca a mão em mim, eu não ligo se tiver que encarar o corredor da morte, eu juro que vou te matar - o ameaço e ele passa por mim e o vejo levando a taça em uma mão e a garrafa em outra. O cretino é lindo. - Está ouvindo o que estou dizendo? - o intimo seguindo-o até a sala.
- Não tenho outra alternativa - ele responde zombando de mim.
- Escute aqui, Giovani - vou para cima dele e ele se vira de frente para mim.
- Não, escute você, estou me controlando para não destruir esse seu vestidinho e não fodê-la agora, bem aqui nesse sofá, então, não me deixe mais excitado do que já estou - ele fala calmamente e isso me obriga a me recompor sobre as minhas pernas e eu vejo sob a sua calça a tal excitação que ele mencionou. Cristo...
- Você tem a ousadia? - pergunto e ele caminha até a mesa de centro de sua sala e coloca a taça e a garrafa sobre ela. Ele volta para perto de mim e olha fundo nos meus olhos e não coloca a mão em mim.
- Veio aqui para deixar meu pau duro apenas, ou vai me dizer o que estou esperando ouvir? - ele me enfrenta.
- Ainda quer ouvir? - pergunto e só tenho tempo de sentir ele me levando para perto da porta e apoiando meu corpo na parede.
- Quero e quero foder você, porque estou há dias pensando nisso, porque sinto seu gosto na minha boca e porque você trouxe para a minha vida todas as dúvidas que eu precisava. Eu jamais pensei em ter qualquer tipo de questão, eu consigo respostas e com você esse jogo mudou, e se for para colocar em pauta saídas extras, vamos falar de Krigher Dunay e o jantarzinho que teve com ele - ele beija a minha boca suspendendo com uma única mão os meus braços e com a outra, ele empurra a minha calcinha de lado e enterra seu pau em mim de uma única vez. Eu deveria evitar, mas eu não consigo, porque eu senti muita falta dele e estava esperando por isso.
Ele enfia cada vez mais forte e eu gemo beijando sua boca. Minhas costas batem na parede atrás de mim e eu sei que vou gozar a qualquer momento, esse tipo de situação me excita, e se tratando de Giovani Makenzie tudo se torna ainda mais explosivo para mim.
Ele goza e enquanto sai do meu corpo, ele morde meu lábio o puxando para junto dele.
Assim que ele me solta e se recompõe com sua roupa, eu vou para o banheiro e volto no instante seguinte.
- Não podemos resolver as coisas com sexo, e como sabe que jantei com Krigher?
- Não podemos? Mas não foi isso que pareceu quando gozou junto comigo e suspirou. E eu saberia com quem janta, seus passos são importantes para mim - ele pega a taça e bebe um gole do vinho - Mas como o encontro não passou de um jantar, deduzo que ele não conseguiu sacudí-la no lugar certo - filho da puta...
- Trouxe outra mulher aqui.
- Uma casa.
- O quê? - pergunto sem entender por que ele está mudando de assunto.
- Uma casa. Marília Braga é a mulher que estava aqui, é a minha corretora de imóveis. Estava de olho em uma casa e a comprei, ela trouxe a documentação para eu assinar, já que o marido dela, com quem ela tem três filhos, não pôde vir. A negociação seria dele porque a casa que comprei não fica nos Estados Unidos.
- Ela é casada? - não sei muito bem o que ele falou por inteiro mas eu fiquei feliz em saber que ela é casada e tem filhos. Apesar de que Giovani Makenzie é um bom motivo para abandonar a família.
- Sim - ele está sorrindo e eu sinto que ele está sendo debochado também, sem contar com o ar de satisfação que agora ele saboreia junto com o vinho.
- Por que não me disse antes? - mostro minha indignação indo até a minha taça e a enchendo.
- Porque eu estava me divertindo com seu ciúme - ele pisca e eu cerro os meus olhos em sua direção.
- Não é ciúme - bebo uma generosa dose.
- Não? Sei... - ele se aproxima de mim e olha no fundo dos meus olhos - Também senti sua falta - ele me beija.
- Me fez uma proposta e eu estou disposta, mas antes eu preciso saber até que ponto vai conseguir entender que no passado eu tomei decisões baseadas em atitudes irresponsáveis e não sei exatamente como vou poder lhe contar tudo; e outra coisa muito importante, desconsidere minha reação ao ouvir sobre Madri e seu clube infame, eu não estava pronta para nada, ainda não estou, mas prefiro arriscar agora, se for para eu dançar sobre a mesa, que seja na mesa da sua casa - admito e ele coloca sua taça junto com a minha sobre o aparador perto da janela e volta ficando de frente a mim.
Ele me abraça e seu suspiro é longo, cheio de alívio e o meu é apenas parcialmente desesperador.
Gio segura a minha mão, me leva até seu quarto aos fundos e me olha assim que ele fecha a porta.
- Não vai dizer nada? Estou aqui sem minha armadura, sem munição e disposta a encarar o maior erro da minha vida, e sei que você pode ser a maior queda que já tive - confesso olhando em seus olhos e ele se aproxima, como se estivesse se preparando para um grande bote.
- Deixa eu fazer amor com você sem esse seu vestido e, de preferência, com você me dando ordens.
10
Giovani
Ela está dormindo.
Deito-me ao lado dela e admiro sua respiração, quando ela desperta e me olha cheia de coisas que jamais descobrirei através dos meus meios tecnológicos. Em seus olhos existe uma ponta afiada que me desafia a ser paciente.
Rocco ensaia algum tipo de conversa e desiste. Ela se levanta, está nua, e caminha até a janela do meu quarto com vista para a piscina. Seu corpo é uma tela, sou curioso por cada um desses desenhos e sei que eles têm um valor especial para ela.
Ela olha para mim e volta a olhar para o horizonte limitado pelas dependências da minha casa. Seus dedos se amontoam e ela olha rapidamente paras as unhas vermelhas e volta a encarar o quintal.
Ela puxa o ar para dentro de seus pulmões e o solta calmamente, como se cada molécula de oxigênio fosse responsável por contruir as palavras que ela ensaia.
- Ele me conheceu em um bar em Nova Jersey - as palavras cessam e seus olhos voltam para os seus dedos - Estava disposta a apenas curtir, mas acabei me envolvendo, me apaixonei por ele - seus olhos se fecham fugindo de algum tipo de dor que ela sente apenas por mencionar o seu passado. Essa é a Rocco frágil, e foi essa mulher, que pode se quebrar tão facilmente, que conquistou um espaço aqui dentro que possivelmente não será de mais ninguém - Então descobri que ele era casado - ela solta e eu me ajeito na cama, não quero interrompê-la, quero só matar esse merda que conquistou o coração dela e, pelo visto, não soube o que fazer.
Novamente o silêncio domina todo o quarto e aqui dentro, no território que agora ela caminha a passos largos, uma espécie de compaixão surge ao observar seus olhos se abrindo.
- Ele prometeu diversas vezes que ficaria comigo, apenas comigo, e eu acreditei. É isso que pessoas apaixonadas fazem, elas confiam e não percebem que um grande e confuso tornado repleto de mentiras e interesses carnais se formam ao seu redor - ela ajeita o cabelo e agora seu corpo é iluminado pelo sol.
Percebo que ela me olha como se cada uma das palavras fosse lâmina passando por sua garganta. Ela respira fundo e olha para seus dedos amontoados como se fossem sua fuga dos meus olhos, mas ela levanta seu rosto e com uma força, estranhamente curiosa, continua.
- Depois de oito meses juntos, descobri que estava grávida e achei, dentro da minha inocência, que esse motivo seria perfeito para ele abandonar a mulher e ficar comigo, já que ele vivia reclamando dela - ela para novamente e agora ela me olha - Ele era médico aqui em Nova York e nossos encontros eram quase sempre no hospital, na sala de equipamentos ou no almoxarifado - Rocco olha novamente pela janela - Ele me disse que ficaria comigo, mas eu precisaria tirar a criança porque isso seria traumático para a esposa que havia perdido a mãe recentemente - pela primeira vez eu vejo os olhos de Rocco se encherem de lágrimas, mas ela segura tudo dentro de si e respira fundo, enchendo seus pulmões, e tenta continuar - Aceitei - ela fecha os olhos e nega com a cabeça - Infelizmente eu aceitei. Ele mesmo fez o serviço. Passou dois dias comigo em um hotel em Los Angeles, onde um amigo tinha o equipamento necessário caso alguma coisa ruim acontecesse, como se pudesse acontecer algo pior do que tirar um filho - ela abre os olhos e morde o lábio inferior. Dentro de mim uma raiva antiga, que senti uma única vez em minha vida explode fazendo meu coração disparar - Ele tirou o nosso filho, o colocou em saco de lixo e entregou para uma mulher que estava lá como enfermeira. Essa não era a especialidade dele e eu estava ciente dos riscos, mas eu estava apaixonada. As pessoas não podem tomar nenhuma decisão baseada na emoção do momento, eu sei disso, tomei decisões que hoje pesam como bigornas sobre os meus ombros.
Ela olha para mim e eu não sei o que dizer, porque não há um tipo de conforto ou punição para isso. Levanto-me calmamente e a abraço, o mais forte que posso, como se eu pudesse colocá-la dentro de mim para que nunca nenhum mal do mundo pudesse atingi-la novamente.
- Quando eu voltei para Nova York, senti que alguma coisa não estava bem e pedi alguns dias de folga para Christen, me isolei de todo mundo e, depois de alguns dias, senti uma dor no abdômen. Procurei por ele, porque ele não estava atendendo as minhas ligações, então, eu descobri que ele não trabalhava mais no hospital e que havia se mudado dos Estados Unidos - beijo sua cabeça e ela me aperta contra seu corpo - Meu estômago revirou e acabei procurando uma médica, amiga de Christen, no dia seguinte. Ela pediu alguns exames e eu demorei um pouco para fazer, até que eu os fiz, quando chegou o resultado, obviamente havia constatado o aborto - ela diz e eu a levo para a cama e a sento em meu colo.
- Claro, deve ter ficado alguma marca - pronuncio tentando amenizar isso que ela está sentindo e eu a vejo negando com a cabeça.
Uma única lágrima desce pela sua face.
- Ele tirou junto com o bebê, o sonho de ser feliz. Tenho um útero doente agora, fragilizado e com poucas, aliás, rara chance de reprodução - perco minha reação e não sinto que posso controlar a raiva que estou sentindo - Ele não ficou comigo, não se preocupou com meu passado, tirou de mim as possibilidades de futuro e me jogou no canto, como se eu fosse alguma coisa velha, sem uso e sem valor - a puxo para perto de mim e beijo sua boca - Me perdoa, mas isso é o ponto final de uma história que tem um começo, mas eu não quero falar sobre isso, não agora, não nesse momento - a abraço ainda mais forte e deixo que seu choro molhe meu corpo.
Eu vou acabar com a vida desse filho de um pedaço de bosta e ele nem vai saber de onde veio. Agora entendo suas reações, seus medos. O passado, literalmente, não tem cura.
- Eu acredito em finais felizes, mas não comigo.
- Não fala isso - peço e a deito do meu lado na cama.
- Minha vida é feita por coisas que machucam, Giovani, por isso eu evito ficar perto das pessoas, eu nunca saio ilesa das relações - ela confessa e eu a cubro para que ela possa dormir.
***
Rocco
Acordo com um pouco de dor de cabeça e escuto Giovani cantando I Found, do Amber Run. Caminho até ele e o vejo andando com as mãos na cintura, ele está com apenas calça de malha.
“ Eu lhe usaria como um sinal de alerta... eu avancei mais do que pensei que poderia”
- Bom dia - falo e ele olha para o meu corpo nu e vem em minha direção.
- Ótimo dia - ele me leva no colo até a cozinha onde tem uma mesa perfeita de café da manhã.
- Estou com muitos compromissos em minha agenda, um deles é receber minha geladeira nova em casa - sorrio para ele, ele se aproxima e me abraça por trás.
- Eu preciso ir para Oracle, preciso definir uma nova diretriz para um cliente - ele fala e seu celular toca. Ele atende rapidamente e é Alexander, um minuto depois ele desliga.
- Pensei que o dia de hoje estaria mais calmo - comento sorrindo enfiando um pedaço de morango em minha boca.
- Trabalho com Alexander, ele é impulsivo e, com isso. já tive muitos finais de semana arruinados.
- Caso não se importe, estarei aqui essa noite - confesso e me aproximo dele.
- Talvez eu demore um pouco para chegar, eu realmente tenho muito trabalho hoje - sinto uma pequena distância entre nós, mas tento não pensar sobre isso - Assim que eu sair eu te ligo, tudo bem?
- Claro, sem problemas - é coisa da sua cabeça, Rocco, ele quer ficar com você. Convenço-me.
***
O grande problema de tudo isso, é que agora me dou conta do quanto estava envolvida com ele e tudo era apenas uma questão de perspectiva. São quase oito horas da noite e até o momento não recebi sequer uma mensagem dele. Talvez o ponto parcial do meu passado o tenha deixado inseguro, e pode ser que ele nem queira ficar comigo como antes.
Vou para o banho, mas antes ligo meu iPod, deixo Ella Henderson com Yours dominar a casa.
“Eu irei encontrar a força que não controla a minha boca quando eu costumava ter medo das palavras”
Saio enrolada na toalha e vou direto à cozinha, deixando o rastro de meus pés molhados pelo corredor.
- Por que uma geladeira tão grande? Quase não coube entre os armários - Gio me surpreende e eu salto com sua voz. Ele está sentado na poltrona perto da janela olhando para a rua.
- Porque eu preciso de mais espaço para comida saudável - ele ri negando com a cabeça e olhando para o chão.
- Debochada. O que eu faço com você? - a pergunta me soa como algo que ele queira, que ele precise solucionar. Estou sorrindo.
- Caso descubra a resposta para isso, me avise, também estou tentando encontrar uma solução para mim mesma - sorrio e ele caminha em minha direção. Seus passos são lentos, sempre me sinto como uma presa na mira de Giovani Makenzie. Eu não deveria estar feliz com isso... mas estou.
Ele segura cada lado do meu rosto e me beija suavemente, sinto o gosto do creme dental, do frescor de seu hálito e o perfume que já se tornou sua marca registrada.
- Você sabe que consigo te analisar por inteira, certo?
- Desconfio...
- E mesmo assim me sinto em dúvida quando tento te entender, a verdade é que eu não me entendo quando me aproximo de você, é como se...
- Seus super poderes não funcionassem? - debocho.
- Sim... - ele ri e me abraça como se estivesse voltando agora de uma viagem que durou alguns anos. Esse é o único efeito negativo de estar envolvido, perdemos o sentido real, buscamos atingir algumas expectativas e, por fim, tudo é mais simples do que havíamos imaginado.
Ele está de bermuda, camiseta e chinelo e com certeza se passaria por um mero mortal vestido assim.
- Posso fazer uma pergunta? - peço.
- Todas.
- Onde comprou uma casa? - ele sorri me levando para o sofá e me colocando em seu colo.
- Em Lisboa.
- Por que lá?
- Porque gosto daquela região e, na realidade, é um presente para minha mãe - ele fala com carinho - Meus pais se mudaram para Toscana, mas a minha mãe adora Portugal - os olhos dele são tão azuis que chegam arrepiar e a maneira doce como ele fala da mãe me causa inveja, porque se minha mãe tivesse tido tato em perceber que eu estava com problemas, talvez eu não tivesse caído nos braços de Guiran, o médico que conseguiu me assassinar pelo menos duas vezes.
Eu não pude contar com a minha família quando eu mais precisei e, depois disso, foram apenas escolhas erradas, decisões estúpidas e uma falha enorme ao administrar a minha vida.
- E você? Nunca fala sobre seus pais - ele comenta me encarando.
- Não moram aqui - me refiro ao meu coração.
- Sei pouca coisa sobre você - Gio, você tem a necessidade de saber tudo que lhe cerca, como se tivesse alergia a surpresas.
- Então sabe que meu pai biológico me deixou um bom dinheiro para estudos e que minha mãe se casou pela segunda vez? - questiono e ele apenas sacode a cabeça em sinal afirmativo.
Gio tem um coração muito bom, esse joguinho dele em vasculhar a vida alheia não faz dele um sociopata ou um criminoso. Ele poderia ter aparecido na minha vida quando eu tinha dezesseis anos e, então, toda essa série de coisas ruins não teria acontecido.
- Agora eu preciso me livrar da geladeira antiga - desvio do assunto e ele olha para a peça que está no meio da minha sala.
- Antes precisa guardar a comida que está em cima da bancada - ele avisa e me coloca no chão me levando junto com ele e caminhamos em direção à cozinha.
Eu observo-o guardando tudo e me sento na bancada alta - Só eu vou trabalhar por aqui? - ele pergunta brincando.
- Esse é um dos benefícios de nossa nova relação, e eu ainda estou de toalha, acabei de sair de um banho quente e corro o risco de um resfriado ao ficar exposta em temperaturas tão baixas - ajeito meu queixo sobre a minha mão apoiada na ilha.
- Então temos uma relação? Porque estou sentindo que sou um escravo - ele sorri com malícia e isso deixa meu corpo em alerta, a qualquer momento ele vai estar aqui, enterrando gostoso e mais uma vez estarei rendida a ele.
- Escravo? Não, apesar que poderia ser sexual - sugiro e ele olha para o iogurte que está em sua mão e depois me encara.
- Sério? - ele pergunta e se aproxima, me sentando sobre a ilha e tirando a toalha. Ele coloca um dos meus seios em sua boca e abre o iogurte - Estou com fome - ele fala e despeja um pequeno fio da mistura de morango que cobre parcialmente o bico do meu seio direito.
Sua boca me suga com suavidade e seus dedos deslizam pela parte interna da minha coxa e encontram meu sexo que o espera.
- Mas agora eu prefiro conversar com você - ele fala e eu me ajeito com o palavrão pronto para despejar contra ele.
- Vai me deixar assim? - aponto para o meu próprio sexo e ele volta a guardar as coisas.
- Molhada? Excitada? - seu tom é como se ele não soubesse, mas é irônico.
- Exatamente...
- Sim.
- Isso não se faz - protesto e ele volta para o meio de minhas pernas e beija a minha boca.
- Agora eu não quero e já negociamos anteriormente como o sexo será aplicado - ele sela meus lábios e sorri sem dentes, debochadamente.
- Acha que esse é o tipo de coisa que se fala? - pergunto e puxo a toalha para me cobrir.
- Sim.
- Giovani Makenzie, tenho um jogo de facas afiadas na segunda gaveta - o ameaço.
- Correção, baby, estão na terceira gaveta - o sorriso dele me desmonta e obviamente ele conhece a minha cozinha melhor do que eu.
- Para cada informação uma trepada, é isso?
- Não. Para cada parte de sua vida para mim, eu faço amor com você - ele pisca e conclui a arrumação de minha geladeira.
- Nunca imaginei que uma vida pudesse ser tão interessante para outra pessoa.
- É porque nunca esteve com alguém que olhasse para você e pudesse ver além de desenhos coloridos em sua pele. Alguém mais atento teria percebido suas pintas na nuca, os dois pontos que levou no joelho, seu hábito de estalar o dedo indicador com frequência. Sua vida é interessante, e se analisarmos de perto, vamos encontrar uma mulher com medo de escuro; sua preferência por comédias românticas, como Mensagem Para Você e A Proposta, mas eu sei que seu favorito entre todos é Uma Linda Mulher, ninguém teria três versões de um filme se não tivesse uma preferência declarada - ele sorri e me leva para o meu quarto.
- Eu não tenho medo de escuro e tem razão quanto ao filme, ele é o meu conto de fadas. Me coloquei no lugar de Julia Roberts todas as vezes em que ela estava no alto da escada e é salva pelo Edward Lewis. Gosto dessa parte, ele a salva, mas ela o salva também.
- Eu sei, já a flagrei assistindo duas vezes o final desse filme em seu celular... Quanto ao escuro, tem certeza que não tem medo? Então é viciada em abajures - ele aponta para os três abajures que tenho no quarto. São peças exclusivas e paguei um valor infame por cada uma delas.
- É que gosto de ler à noite.
- Não tem nenhum livro em sua casa - ele rebate e vai até o closet e pega um vestido e uma calcinha e coloca sobre a cama.
- É que leio no celular - mantenho a postura firme sobre medos que tenho mas não revelo nem sob tortura.
- Mas para isso seria preciso um aplicativo e acredito que não tenha, e se tiver, então o abajur não seria necessário, já que a luz da tela faria o serviço - posiciona a calcinha em meus pés e me veste.
- Como sabe que não tenho o aplicativo? - isso me assusta, mas ao mesmo tempo eu imagino que tipo de informação ele não conseguiria com seu conhecimento genial sobre máquinas e tecnologia? Nada está fora do alcance dele, a não ser aquilo que não foi postado em rede social ou fichado pela polícia.
- Levante os braços - ele me veste com o vestido florido e com a toalha seca um pouco meu cabelo - Não sabia, apenas blefei. Você perderia no poker rapidamente.
- Costuma blefar, Giovani?
- Apenas quando tenho certeza de que vou ganhar.
***
Escuto um celular vibrando e Giovani sai do banheiro enxugando as mãos e o atende.
- Alô? - ele diz e vai até o corredor. Eu saio da cama e vou para a cozinha, estou cheia de fome - Mas o que aconteceu? - a voz dele é tensa - Calma, Sebastian, não há o que ser feito - ele explica e vai até a cozinha e pega um copo d’água - Eu conheço sistemas e não tenho bola de cristal, agora mantenha a calma e dê férias para Carter, assim sua vida volta a ter paz - ele fala e bebe a água em seguida - Então o que você sugere? - ele nega com a cabeça - Sebastian, por que você acha que isso vai ajudar a resolver o problema? Pode ser tudo uma brincadeira - ele está tentando amenizar alguma coisa, mas acho que Sebastian não está entendendo.
Faço um sanduíche e Gio olha para mim e nega com o indicador. Ele vai até a geladeira e separa algumas coisas para fazer o jantar.
- Não tem como seguir nenhuma pista porque elas não existem - Gio começa a se irritar - Tudo bem, quando? - Gio parece odiar o que acabou de ouvir e sua mão vai até a cabeça de maneira exasperada - Ok - ele desliga e bate o celular sobre a ilha da cozinha.
- Tudo bem?
- Sim - ele responde e tenta disfarçar sua irritação.
- Por que está mentindo para mim?
- Porque a verdade é que eu prefiro fazer o seu jantar a ter que falar sobre um bando de bebês chorões - ele beija a minha boca - Agora coloque uma música, abra um vinho e se sente bem ali - ele aponta para a cadeira - Vamos comer algo melhor do que isso - ele joga meu sanduiche cheio de queijo e molho à base de mostarda no lixo.
- Quanta ordem! - brinco.
- Acostume-se.
11
Evan
Vejo a tensão nos olhos de Sebastian e analiso em que ponto tudo isso chegou para eu estar aqui, diante de nove membros do Clube. É como se eu já tivesse vivido isso antes, a diferença é que está faltando alguns membros e hoje não tenho nenhuma intenção de inaugurar um novo clube. Giovani ainda não chegou.
Estamos na sala privativa do Tribecca. Sebastian exigiu e, pelo que posso notar, alguma coisa saiu do controle. Carter deve estar fazendo da vida dele um verdadeiro inferno.
Bryan e Cesar falam sobre possibilidades; Andrew e Carl falam sobre providências; Ramon, Benjamin e Alexander acreditam que possa ser uma grande brincadeira. Wallace está em silêncio olhando para a tela de seu celular, mas eu sei que ele está pensando sobre tudo, a diferença é que Wallace tem uma maneira bem diferente de conduzir as coisas, suas emoções nunca ficam expostas. Mas eu as vi em alguns momentos. Wallace não é o tipo de homem que sorri deliberadamente, ele analisa tudo, ouve tudo e depois apenas sacode sutilmente a cabeça e volta para o seu mundo cheio de coisas que ninguém faz ideia do que sejam.
Robert e Philip não sabem dessa reunião, Robert porque não aparece como membro ativo e está na Austrália, e Philip porque está muito longe e, com certeza, não teria dinheiro algum para pagar pela passagem. A verdade é que foi suposto que as cartas tenham a ver com o Clube, mas alguns não receberam. Eu inclusive.
A conversa muda de rumo e isso me deixa parcialmente tranquilo, mas tenho plena consciência de que até então, o nome de Giovani foi tratado de maneira duvidosa.
- Como conseguiu essa aplicação? - Ramon pergunta para Andrew sobre um valor que ele aplicou no momento certo e recebeu um rendimento acima do esperado. Tentam deixar a conversa mais amistosa.
- Giovani me avisou sobre a possível alta e eu arrisquei - Andrew responde.
- Gio me falou também sobre o grupo europeu que se reuniu semana passada procurando uma marca ligada ao esporte para fazer um investimento, deu certo, tenho uma reunião com eles em duas semanas - Bryan comenta e bebe um pouco de água.
- Ei, Carl, vamos levar sua lancha para minha casa em Malibu, o que me diz? - Ramon oferece e pede para Julian, o garçom escolhido para nos atender e que será devidamente recompensado por isso, trazer uma garrafa de Buchanas.
- Pensei sobre isso, Latino, conversei com And e poderíamos fazer a viagem de carro - Andrew nega com a cabeça.
- Não, você vai querer pegar um dos meus tesouros e enfiar na estrada. Da última vez me deu um prejuízo de quase trinta mil apenas para restaurar o rabo de peixe - And avisa e todos estão rindo.
- Não seja sovina - Cesar brinca - Agora que Gio te ajuda a ganhar alguns trocados na bolsa de valores, o que são trinta mil? - Cesar mantém a brincadeira e eu olho para Wallace que já olhou três vezes para o celular e Sebastian a cada dois minutos olha em direção à porta.
- Sebastian, a Maccouant está cuidando de uma documentação junto com a Istok Rute sobre um material que Leonard Colfer pediu, e é para uma obra que a Charper está cuidando - comento e pego a garrafa d’água e coloco um pouco em meu copo.
- O cara é maluco, mas eu sou feliz por ele ter escolhido a Charper, porque ele não liga para valores e eu adoro lidar com pessoas desapegadas a dinheiro, assim consigo fazer tudo com o melhor que o mercado oferece - ele esquece um pouco a razão que nos trouxe até aqui.
- Ele reservou uma embarcação inteira por dois meses apenas para mudar alguns móveis que estavam em sua antiga propriedade e levá-los para Londres. Excêntrico - pela primeira vez nessa reunião, Wallace esboça um comentário - Parece que Giovani estava cuidando de todo sistema de aplicações financeiras desse cara.
- Deu muito trabalho, precisamos criar pelo menos doze plataformas com múltiplas senhas de interface e Giovani e Brooke trabalharam dia e noite em cima desse projeto - Alexander observa.
- E você, Evan? Está deixando tudo pronto para uma possível mudança para a Escócia? - Benjamin pergunta.
- Victoria tem insistido sobre isso. Ela não se sente segura e o fato de estar sempre com seguranças, os horários dos gêmeos, ela quer mais tranquilidade para que eles possam aproveitar a infância. Ainda é muito complicado para eu deixar tudo assim, mesmo ela insistindo e dizendo que pode acontecer alguma coisa a qualquer momento - bebo mais água - Ela sabe sobre as cartas - falo e todos na mesa me olham assustados - Eu sei, Giovani pediu para eu não falar nada, que seria apenas mais uma preocupação para ela, mas eu não poderia correr o risco. Ela fica em casa mais tempo do que eu e estava avisada caso recebesse alguma coisa assim - explico e Sebastian se levanta - Calma, não recebi nada e ainda acredito que tudo seja apenas uma brincadeira - minha voz é mais séria.
Vejo Sebastian andando de um lado para o outro, Ramon olha pela janela enquanto Cesar e Bryan conversam. Andrew e Carl comparam as cartas através das fotos que tiraram de seus celulares.
- Por que Giovani não chega de uma vez? Está atrasado em quase uma hora - Sebastian reclama.
- Calma, aí, Sebastian, - Benjamin pede - Você está tenso demais - ele observa e Sebastian se senta - Não se esqueçam que, além da carta, quando Kim foi sequestrada, teve uma foto nossa com um recado, se tem alguém aqui que deveria estar nervoso sou eu. Tem ideia do que é convencer a Kim a andar com um brutamontes a tira colo? E outra coisa, Giovani é o cara que consegue saber sobre tudo em tempo recorde, mas ele não foi nomeado Deus e talvez ele não consiga nos ajudar.
- Espera aí - Alexander fala um pouco mais alto - Benjamin tem razão e estamos falando da minha irmã.
- A seriedade da situação é mais tensa do que apenas cartas anônimas, houve um sequestro e Kim saiu ferida, e sobre Giovani, a tranquilidade dele em relação a tudo isso me causa preocupação - Andrew comenta e isso deixa Alexander ainda mais explosivo.
- Não me lembra disso, And, e você está querendo dizer o quê? Que Giovani possa não ser o amigo que tem se mostrado? - Benjamin comenta.
- Eu mataria com crueldade o bosta que fez isso e espero não estar ameaçando Gio - Alexander esmurra a mesa ao declarar sua ameaça.
- Bom dia, cavalheiros - Giovani chega e todos na mesa o encaram.
- Até que enfim - Sebastian fala.
- Giovani, estamos tentando achar um fio que possa conduzir ao remetente das cartas e não estamos conseguindo chegar a uma conclusão plausível - comento, tão logo o recém chegado se senta à mesa.
- Porque não somos da polícia, não sabemos por onde começar e ficar levantando hipóteses só vai deixar a situação ainda pior - Giovani explica calmamente e constato que a suspeita sobre ele aumenta conforme ele esboça imparcialidade, como se não fosse necessário ficarmos em alerta.
- Quem está enviando as cartas sabe os passos de cada um, sabe em que momento elas devem ser entregues e todas seguem o mesmo padrão - Ramon fala e olha diretamente para Giovani.
- E essa informação te leva a pensar o quê? - Giovani indaga uma pergunta de maneira mais defensiva.
- Vamos, Giovani, você é o único aqui que consegue ter todas as informações. Admita que é você por trás dessa brincadeira de merda - Carl fala o que todos estão pensando e estavam comentando antes de Gio chegar. Giovani olha para Julian que entra na sala e lhe entrega o pedido que possivelmente foi feito por Gio antes mesmo de ele chegar a essa sala. Um copo longo com vodca.
- Você tem informações do mundo em suas mãos - Andrew completa após a saída de Julian.
- E não tem frequentado o Clube há alguns meses - Cesar arremata e Gio percebe que em algum momento seu nome já foi cogitado como suspeito.
- Tem feito viagens que não são pertinentes ao trabalho - Alexander coloca sua situação.
- Pediu para o Evan não falar sobre a carta com a Victoria e tem me pedido uma calma que eu não posso ter - Sebastian justifica seu ponto de vista.
Giovani olha para todos o bebe uma dose de seu copo.
- Querem falar de suspeitos? - Gio pergunta e seu maxilar trava em uma fúria que ele consegue controlar em sua garganta. Giovani Makenzie é capaz de analisar todos aqui em menos de dois minutos de conversa, mas ele tem feito isso há anos e agora ele tem controle absoluto sobre a fúria que está presa em seus dentes.
- Queremos, porque até o presente momento tudo leva até você e por falar nisso, você ainda não recebeu a carta, certo? - Bryan diz e mexe com sua taça vazia.
- Então, eu sou suspeito por conta de viagens, informações e porque ainda não recebi a carta?
- Exato - Carl responde e se ajeita na cadeira.
- Então, vamos pensar um pouco mais sobre isso. And, Carl, Evan e Wallace, também não receberam, e todos aqui deixaram um ponto no passado que pode estar voltando com mais força - ele fala e se lavanta caminhando até a cadeira onde está Ramon - Poderia me dizer por onde anda Otto? Você teve um problema muito sério no passado com ele, inclusive o pai dele era candidato ao senado, ele teria poder e razão para infernizar sua vida, porque além de tudo isso, você dorme com a ex-mulher dele.
- Por que ele faria isso? - Ramon pergunta e eu vejo em seus olhos o ódio sobre o tal Otto e sobre Christen ser mencionada como ex.
- Se você pode questionar o motivo que o levaria a fazer isso, eu também posso questionar o motivo que não o levaria a executar, mas agora vamos ver Benjamin. Tem falado com Greta? Ela sabe exatamente tudo que acontece dentro do Palácio, e quando deu a ideia de ter uma foda fixa, todos aqui foram contra, e isso inclui a mim - Giovani tem a voz mecânica nesse momento e isso indica o quanto ele está enfurecido. - Mas não se preocupe, Benjamin - ele fala colocando a mão no ombro de Ben - Temos aqui Andrew que arrumou uma pequena confusão no Clube, junto com Carl. Acho que era Rodrigues o nome do ex-funcionário que foi demitido depois disso. Apenas para refrescar a memória de todos, Rodrigues cuidava do sistema de monitoramento do Palácio e não foi inteligente discutir com ele e muito menos lembra-lo de que ele era apenas um funcionário, porque ele era um funcionário com informações de extrema relevância e isso inclui saber o seguro social de cada um e o quanto cada um enriqueceu desde então.
- Rodrigues recebeu dinheiro suficiente para esquecer o clube - Wallace comenta.
- Meu amigo Wallace, se tem uma coisa que não cansa o ser humano é grana, prova disso é Rhodes - assim que Giovani pronuncia o nome do irmão de Wallace, eu vejo o punho dele se fechar - Por onde anda seu irmão ganancioso, ladrão e que roubou dinheiro suficiente para algumas vidas? - Makenzie olha nos olhos de Wallace e eu não conheço muitos capazes de ter a coragem de fazer isso.
- Giovani - Wallace o ameaça e não é agradável ver Wallace fora de si. Falar do irmão dele é como cutucar o demônio - Eu posso ensinar como Satanás faz o fogo do inferno - os olhos de Wallace estão vermelhos, assim como a cor que ele enxerga agora.
- Não, meu caro Wallace Jones Weiser, fui questionado por ser suspeito, me deram o direito de fazer o mesmo, não é mesmo, Alexander? Jakov teria motivos para infernizar sua vida - o sorriso de Giovani é cheio de sarcasmo.
- Isso foi há dez anos - Alexander justifica.
- Não me interessa, estão desconfiando de um amigo e um amigo pode então desconfiar de quem ele quiser, caso contrário, eu poderia não mencionar sobre o pai de Bryan que pode ter descoberto sobre o Clube e, com isso, seu problema paternal ficou ainda mais exaltado - Gio olha para Bryan - Ou, pode ser, Christopher, primo de Cesar, que tentou ser sócio dele em sua empresa e tudo acabou em uma grande discussão - ele tem tudo afiado em sua língua e isso está deixando todos mais tensos do que o necessário. Giovani sabe tudo sobre todos e isso é letal.
- Calma, Giovani - Sebastian pede.
- Não, você não tem o direito de me pedir isso, peça calma para Zachary, seu ex-funcionário que o roubou e teve acesso a informações do Clube por conta de um diário deixado por Valentina e foi isso que trouxe Vivian do Canadá para Nova York - Sebastian está de frente a Gio e perde, nitidamente, a chance de qualquer tipo de diálogo.
- Gio - o chamo.
- E você, Evan? Acha que eu posso realmente estar aplicando meu tempo em fazer isso?
- Tente entender, tudo leva a pessoa com mais poder de informação - explico.
- Então isso o abona, afinal, não recebeu a carta, mesmo tendo um passado com um punhado de inimigos desde a época da faculdade, que eu não preciso nomear - ele me olha como nunca me olhou antes - Antes de se reunirem para um almoço fraternal como esse, troquem as fraldas. Agora está bem claro o que vocês precisam - seu sorriso não esboça emoção, apenas indiferença e ele encara um por um - Vocês precisam de alguém que não tenha muito a perder e com ótima pontaria, mas eu acredito que não saberão o que fazer com isso - diante dos olhos de todos que, claramente, o acusam, ele sai da sala reservada do Tribecca e deixa um silêncio fúnebre entre todos.
Aqui, todos têm um passado que não vale a pena ser considerado como fonte confiável.
***
Giovani
Passo por Julian e deixo algumas notas em seu bolso de maneira discreta - Obrigado - ele entende o motivo. Ele liberou a minha entrada pela lateral e eu pude ir até a sala de segurança e ouvir a conversa que acontecia antes da minha chegada, e saio colocando o comunicador em meu ouvido.
- Escutou tudo? - pergunto.
- Sim, cada palavra - ele responde - Te espero no ponto de encontro.
- Preciso convencê-los de que não sou culpado.
12
Rocco
Abro a porta da casa de Gio e vejo que tudo está escuro.
Ele está sentado em uma poltrona no canto da sala perto do piano sem uso e se mostra completamente isolado do mundo.
O som é baixo, muito baixo. Está tocando A-Ha, Stay on These Roads, e eu o vejo segurando um copo. Seu olhar é perdido. Ele está sem camisa, de calça jeans e descalço. Sua imagem é de quem foi rejeitado pelo mundo. Eu sei como é se sentir assim.
“Você se sente tão fraca... seja forte”
Analiso a cena diante dos meus olhos e o que posso ver faz meu coração doer.
O reflexo da luz fraca que o ilumina possivelmente não esteja lhe mostrando o caminho que deve seguir. O mundo de Gio é composto por coisas que não consigo entender, uma delas é esse labirinto que ele se enfia.
Tiro meus sapatos, deixo minha bolsa no chão sobre eles e ofereço apenas um passo em sua direção.
Ele se ajeita na poltrona e apoia seus cotovelos em seus joelhos, não existe nenhum som além da música. Mas escuto os estilhaços caindo de seu rosto. Claramente houve um erro, alguma coisa saiu do controle e observo uma muralha desmoronar. Giovani nunca perde o controle e ele nunca desmorona, a não ser esta noite.
Escuto o som do meu coração, minha respiração, e é possível tocar na tensão exposta por ele. É como se ali, naquele canto, ele estivesse se escondendo do mundo ou quisesse apenas destruí-lo. Ele tem poder para isso.
Coloco um pé diante do outro e ensaio o segundo passo. O piso está gelado sob meus pés, assim como ele, escondido no escuro que tenho medo. Olho para ele e ele me flagra no segundo passo. Engulo seco, meu coração acelera e essa versão de Giovani Makenzie não é apenas inédita, ela é intimidadora e terrivelmente piedosa.
Eu não sei exatamente o que compõe esse cenário que veste o homem soberano em quase tudo que faz, mas eu tenho certeza que um de seus alicerces foi devidamente destruído.
No meu terceiro passo ele leva o copo até sua boca e analiso seus cabelos molhados, seu rosto inconformado e não sei o que pode ter fracassado para deixá-lo assim. Giovani não é um homem que coleciona fracassos.
Ele leva os olhos até a janela do outro lado e seu rosto sente a claridade e eu ofereço mais dois passos e observo a garrafa vazia ao lado da poltrona e outra pela metade ao lado de onde está sentado.
Meus olhos esperam que ele me olhe novamente e que permita minha aproximação. Mas ele ainda deixa sua atenção para fora, como se buscasse as respostas que atormentam seus pensamentos. Nesse instante, desejo ter as habilidades que ele tem em analisar as pessoas, eu não sou especialista em nenhum segmento humano, mas ele... Gio conhece as pessoas apenas em cinco minutos e não precisa de conversa. Ele apenas sabe.
Quando chego perto dele, ele vira o líquido de seu copo e o coloca ao lado da garrafa que está pela metade.
Neste momento, existe sua luta interna contra a realidade, tento adivinhar se foi um plano que deu errado ou se simplesmente ele está confabulando uma nova estratégia... mas para quê?
Aproximo meu corpo do dele, mas não o toco, deixo que ele escolha o melhor momento de me incluir em seu universo particular. Ele me coloca de pé entre suas pernas e me abraça em torno da cintura, enfiando seu rosto em minha barriga.
Sua respiração profunda, que emite vários alertas e me atravessa como chamas de um inferno que ele mesmo construiu, aquece meu abdômen e ele me leva para junto de seu penhasco. Sinto-me perdida junto com ele, mas creio que ele não quer ser encontrado, ainda não.
É um pedido, mas eu não sei o que dizer, nem sei se devo falar alguma coisa. Não sei que tipo de palavra levaria fôlego para ele, tenho medo de afogá-lo com qualquer tipo de coisa absurda que minha boca possa emitir.
Ele esfrega seu rosto em meu ventre e só então levo minha mão ao seus cabelos e os aliso, e isso o faz suspirar profundamente. Posso ouvir sua súplica por socorro, mas eu não sei se posso ou tenho habilidade para salvar alguém como ele, porque ele é a fortaleza e fortalezas não precisam de ajuda.
Posso escutar nitidamente os minutos se arrastando. É como se um balé orquestrado por assombrações batesse com a ponta de suas sapatilhas ao nosso redor, ele procura um tipo de esperança no escuro e eu tenho medo dessa falta de luz que agora vem dele.
O movimento de seu corpo, seus braços se moldando ao meu corpo, mostra que ele está confortável em me fazer de escudo e eu estou feliz em saber que ele permitiu minha aproximação. Geralmente as pessoas fortes caem quando estão longe de qualquer tipo de plateia. Minha esperança é que o mundo não tenha mudado o seu coração, Gio.
Torno a alisar seus cabelos, agora com ambas as mãos, como se quisesse ajeitá-los, e sua respiração aquece minha barriga novamente, é ali que está sua boca, seu nariz e seus pensamentos revoltos que não consigo imaginar quais sejam.
Não concebo a ideia de Giovani fracassar, é de sua natureza saber os passos com antecedência e, com isso, ele evita possíveis quedas. Mas a verdade é que eu nunca sei o que está abaixo de sua superfície, mas imagino que haja um oceano... ou dois.
Suas mãos passeiam pelas minhas costas abaixo do tecido, a maciez de seus dedos, a intensidade que ele aplica é como se ele quisesse colocar sobre a minha pele mais um desenho, algo feito por ele exclusivamente para mim.
Seu rosto ainda tenta buscar fôlego em minha pele e me sinto perdendo o ar, é tudo confuso, imediato e quase enlouquecedor.
Suas mãos saem do meu redor e encontram os botões do meu vestido, eu deixo porque eu não sei exatamente do que ele precisa nesse momento e, então, eu decido ser o que ele precisar.
Lentamente ele desabotoa o primeiro botão, mas não me encara, sua testa agora toca a minha barriga. O segundo botão é aberto e ele suspende seu rosto em minha direção e, assim, ele abre o terceiro botão, e depois o quarto, até que meu corpo se mostra por completo para ele. Giovani olha em meus olhos e espalma sua mão direita entre os meus seios e desce lentamente, como se estivesse escorregando para um precipício sem fim. Eu não sei para onde ele está caindo, mas impreterivelmente ele está pedindo a minha companhia.
Ele volta a enfiar seu rosto em minha barriga e em uma espécie de fuga ele se esconde em mim. O ar de seus pulmões sai por completo em um suspiro longo e quase sufocante e é isso que ele está sentindo; sua garganta está se fechando e não há uma saída rápida, sua única chance é ficar exatamente onde está.
Suas mãos empurram as alças do meu vestido e Gio deixa que o tecido caia de meus ombros e toque o chão. Ele volta a me abraçar, pedindo que eu o esconda dos monstros que, possivelmente, ele criou. E eu gostaria apenas de ser esse pedaço que está faltando dentro dele nesse momento, fazendo com que as coisas não funcionem bem.
Seus dedos agora alcançam as laterais de minha calcinha, o tecido desce pelas minhas pernas e ele torna a me abraçar esfregando novamente seu rosto em minha pele.
Ele deixou a playlist do A-Ha tocando, agora escuto There’s Never a Forever Thing.
“Querida, feche seus olhos agora”
Escuto a letra e as mãos dele passeiam em minhas costas. Sinto o quanto ele está quebrado por dentro, é nítido em seus olhos fechados que escondem uma verdade que só pertence a ele. Somos tão parecidos, meu querido.
É como se fôssemos da mesma época e com o mesmo tipo de história para contar. Somos, neste momento, o amontoado de cacos que sobram depois de uma guerra.
Ele se levanta lentamente e para de frente a mim, apoiando uma mão de cada lado do meu rosto. Seus olhos, que atravessam toda e qualquer tipo de barreira, encontram aqui dentro seu reflexo, encontram o que ele colocou. Giovani foi o primeiro que conseguiu ver as flores do meu jardim.
Seus lábios se aproximam como uma tempestade e ele me beija. Sua língua é macia, com gosto do whiskey e sua respiração agora é calma e me enche de oxigênio. Estamos no mesmo mergulho, estamos em queda livre.
Ele me suspende em sua cintura e caminha com minhas pernas ao seu redor até o seu quarto. Não existe a euforia pela situação, existe um pedido interno, silencioso, como um relâmpago que antecipa a chuva. Nesse momento, é apenas o silêncio quebrado por nossas respirações e pela música que quase não se ouve.
Estou de pé, contemplando a profundeza azul de seus olhos que deixam claro o quanto escondem do mundo e o quanto precisa fazer isso.
Em meu peito, existe um tremor, mas existe um tipo de paz, como se o toque de suas mãos fosse o mensageiro de esperança. Recuo um passo e me afasto de Giovani, ele cerra os olhos discretamente e eu recuo mais um passo. Talvez seja esse o segredo do universo, você entrega o que possui de importante para salvar a vida de quem realmente importa.
Deito-me em sua cama e ele fica exatamente ali, olhando em meus olhos até que eu levanto a minha mão e o chamo para continuarmos nossa busca ou para encontrarmos nossa perdição. Observo-o retirando sua calça. Ele estava usando apenas isso e uma armadura feita do escuro de sua sala.
Seus passos são calmos, mas em seus olhos encontro o alívio assim que ele se encaixa sobre mim e me beija novamente.
Seu corpo está apoiado apenas em um de seus braços, poderia contar os contornos de seus músculos, poderia passar dias apenas deslizando meus dedos sobre sua pele devidamente macia. Ele é feito de contornos rígidos, pele suave e pensamentos que claramente não são saudáveis.
Sua outra mão desliza sobre meus seios e por alguns segundos apenas as pontas de seus dedos deslizam sobre meus bicos enrijecidos.
Gio se encaixa entre as minhas pernas e eu sei que está me faltando o fôlego por estar assim, vulnerável sob ele, mas agora eu só preciso ser o que ele precisa. Ele desliza a mão novamente entre meus seios e alcança meu sexo massageando lentamente. Agora não existe a euforia pelo controle ou a busca incessante por um orgasmo, eu quero apenas que ele se acalme e deixo-o usar o meu corpo para isso. Se isso é uma moeda de troca, eu aceito a negociação.
Ele é como um predador nesse momento, com passos precisos, calmos, e seu encaixe entre as minhas pernas é perfeito, permitindo que seu corpo roce o meu e eu o abrace com as minhas pernas. Sua boca novamente está enroscada na minha e ele, enfim, se coloca dentro de mim, em um entrar suave, obrigando o mundo ao nosso redor a simplesmente parar.
Porque ele chegou em minha vida como uma brisa, e se tornou um furacão. É nele que encontro os desastres naturais que preciso.
O movimento é tão calmo como as passadas de língua sobre a minha, ele me toca interna e tão intimamente que me sinto parte dele, uma parte importante que está aqui agora, sem nenhum tipo de exigência ou posição.
Existe apenas o seu ir e vir encontrando o que passou a ser dele.
No primeiro fôlego, as palavras sumiram de minha mente, e assim que o perdi, me encontrei naquilo que tinha medo. Giovani fez o escuro não ser perigoso.
“Está tudo bem, querida” - Internamente concordo com a letra e permito que meu corpo esqueça sua necessidade, agora, neste momento, é Gio que domina o meu corpo, minha mente e meu coração.
Como se estivéssemos em uma dança, uma valsa conduzida pelo cavalheiro, eu permito, porque esse tipo de música só serve para um par.
Seu beijo é mais intenso, acompanha o ritmo de seu corpo e por mais que ele tenha suas necessidades, eu aproveito, e boa parte dos meus fantasmas está indo embora.
Ele olha em meus olhos e ele ganha mais força, tudo é mais intenso, meu gemido sai mais alto e, pelo fato de ele conhecer exatamente como tudo aqui funciona, concluímos juntos. Desta vez houve amor enquanto ele estava dentro de mim. Então, é amor essa parte dele que está aqui dentro, fazendo tudo ter sentido. Só pode ser amor.
Não há sequer o som de sua respiração e ele apenas se acomoda ao meu lado e nos cobre, como se o lençol caro pudesse nos esconder da realidade.
Eu não sei exatamente o que aconteceu com ele, mas comigo foi amor. Fiz amor com Giovani Makenzie e agora não sei se sou capaz de encontrar em outra pessoa o verão que ele trouxe para o meu inverno.
***
Giovani
Ela me olha enquanto caminho com meu indicador e dedo médio na lateral de seu corpo. A bandeja de café da manhã está no chão e já fizemos amor antes mesmo de abrir os olhos esta manhã.
Paro com meus dedos sobre uma tatuagem que ela tem ao lado do seio, está escrito Faith (fé).
- Fiz para não esquecer o que nos motiva a continuar - ela está me contando mais um pouco sobre ela e acho que estou gostando dessa brincadeira.
- A fé move montanhas - comento parafraseando o que o mundo repete incansavelmente.
- Mas sem amor, a montanha sai do lugar e não serve para nada - ela completa e eu coloco o indicador sobre o par de asas na descida de sua barriga.
Ela se deita com a barriga para cima e ajeita o travesseiro embaixo de sua cabeça.
- Transformação. Esperei muito por isso e essa eu fiz na noite em que fui embora de casa - eu não sabia que ela tinha ido embora, não nesse tom de abandono.
Brinco com meu dedo e circulo seu seio e paro sobre a borboleta entre seus seios - Grandes mudanças precisam de grandes períodos de silêncio e transformação, não é fácil mudar, mas é preciso, ainda mais quando ninguém acredita em você - escuto e vejo-a olhando em meus olhos.
- Buscando a perfeição, Rocco Field? - sorrio para ela e ali, naquele sorriso com cara de sono, eu encontro o tipo de paz que preciso, mesmo tendo consciência de que não sei lidar com isso em boa parte do meu tempo. Sou um homem que aprecia um bom tipo de guerra.
- Quase isso - ela responde com um sorriso mais tranquilo - Precisei me transformar em algo muito diferente do que eu era - escuto e tento entender seus desenhos que traduzem sua vida e observo seu corpo por completo. Em seu tornozelo uma gaivota e a beijo sobre o desenho.
- Liberdade - ela diz - Essa foi a última e acho que encerrei um ciclo com ela - sinto seus dedos passarem pelo meu braço e me aproximo dela - Gio - ela fala e segura a minha mão.
- Oi - gosto de como ela pronuncia meu nome.
- Alguns desenhos não dizem nada sobre mim, outros dizem muito, mas a verdade é que na dor da tatuagem, eu aliviava a dor da minha alma - acredito que esteja falando do médico.
- Não quero que se lembre da história que me contou - peço e vejo as pontas de seus dedos se tocarem, é isso que ela usa como fuga.
- Não consigo me lembrar porque não sei como esquecer, mas não é sobre o que te contei, é sobre o que vou te contar - me aproximo ainda mais dela e ela se ajeita ficando de lado, me deito de frente para ela - Sempre tive uma vida de rainha, estudei a infância e começo da adolescência com Christen e, francamente, tudo era mais do que perfeito, até que um dia minha mãe trouxe o seu afilhado para morar conosco. Ele era o filho que ela gostaria de ter em meu lugar e não pense que é ciúme, ela realmente declarou isso - há uma ponta de dor em seus olhos.
- Era sua mãe - falo com condolência porque penso no amor de minha mãe por mim.
- Pois é, isso é a vida real - ela mexe em meus dedos - Ele foi morar na nossa casa quando eu tinha catorze anos, ele tinha quinze e era grandão, o tipo bonitão do Ensino Médio, e eu corria dele. Naquela época, eu ainda tinha a ilusão de me guardar para o cara certo, como Tony Belmo, o mais cobiçado da escola. Coisas de adolescente que se apaixona por pessoas irreais ou impossíveis - ela sorri e tenta disfarçar a dor que está nítida em seus olhos.
- Não gosto do tal Tony - tento brincar e ela ri.
- Ele não foi o problema, meu primo foi - ela para e olha para os meus dedos - Eu nunca pensei que um dia minha vida mudaria tanto e que eu acabaria sem família... Uma noite, Denis entrou em meu quarto e me disse que era para eu ficar quieta, que não iria acontecer nada de mais. Estávamos sozinhos porque meus pais tinham saído para comemorar o aniversário de casamento deles. Não com meu pai biológico; este morreu quando eu tinha seis anos e me deixou um pecúlio estudantil - agora estou com medo daquilo que não consigo acessar em meus passeios por documentos confidenciais.
Olho para ela e não consigo formar uma frase e espero pelo pior.
- Meu primo tirou a roupa dele. Ele tinha levado com ele um taco de baseball e ordenou que eu tirasse a minha. Eu recusei, chorei e por medo de apanhar ou morrer, eu o fiz - ela fecha os olhos escondendo a dor - Ele se deitou sobre mim e de uma única vez entrou e não se preocupou no quanto seria doloroso para o meu corpo e para minha alma - agora eu entendo porque ela, até ontem à noite, não deixou eu ficar por cima.
- Você contou para a sua mãe? - é outro que vou ter que matar, penso comigo.
- Não daquela vez. Primeiro, tive vergonha de dizer a ela e, depois, tive medo das ameaças do meu primo. Ele era dado a rompantes de ira e deixava claro que acabaria com todos da minha família. Eu sei que me acovardei, hoje eu vejo que ele não conseguiria destruir nada além de mim, mas na época, ele ameaçava colocar veneno na nossa comida, ou matar e esquartejar a todos - ela olha em meus olhos e respira fundo - Fui violentada quase todos os dias por dois anos e ele me dava o remédio para nunca engravidar - ela deixa que seus olhos fiquem cheios e me encara com sua boca ondulada em choro - Teve um dia que eu estava tão cansada, tão exausta, que corri para minha mãe e contei tudo. Meu primo desceu e escutou a nossa discussão, minha mãe disse simplesmente que se aquele escândalo vazasse seria a destruição da família. Ela preferiu manter as aparências, ‘o que os vizinhos iriam dizer?’, era no que ela se preocupava, e eu voltei para o meu quarto, aceitei aquele tipo de amor, porque achei que era apenas isso que eu merecia. Me senti fraca, suja, sozinha e profundamente infeliz. Eu estava com quase dezoito anos. Até que uma noite, fugi de casa - ela está olhando em meus olhos e eu adoraria vê-la coçando o nariz em sinal de ser uma grande mentira.
- O que você fez a partir daí? - começo a pensar que tipo de tortura devo usar contra esse lixo.
- Fui para casa de uma prima que morava sozinha desde que seus pais faleceram e ela foi a única que acreditou em mim. O pior foi descobrir pouco tempo depois que, apesar de ele ter me dado pílula para tomar ao longo daquele tempo, de alguma forma eu engravidei, e eu não tinha ideia do que fazer. O dinheiro que estava em meu nome era para estudo e ninguém me daria um trabalho - ela franze o cenho e me encara - Minha prima permitiu que eu ficasse com ela somente até o nascimento do bebê. Numa noite de chuva, quando fui levar o lixo para fora, havia poças nos degraus, eu escorreguei e rolei, e perdi a criança - ela para de falar e me mostra o pulso - Tentei suicídio no dia que fiz dezoito anos e fui salva por um morador de rua. Quando acordei no hospital, eu pensei em tudo que havia acontecido e decidi que minha vida seria livre, eu seria diferente e jamais tentaria novamente uma coisa tão idiota. Decidi não aceitar nada menos do que respeito. Sei que soa estranho eu falar isso quando fracassei ao me envolver com aquele médico, mas acho que aprendi a lição - ela conclui a história e eu fico imaginando o quanto isso é pesado.
- Eu não quero que isso fique aí dentro - a puxo para perto de mim e a abraço na tentativa de escondê-la do mundo.
- Acho que não está mais. Você foi ocupando o espaço de tudo isso e agora, por onde eu olho, eu só vejo você - ela fala e eu fecho meus olhos. Eu também só enxergo você, Roc.
13
Rocco
Eu deveria ir para a minha casa, mas é sábado e comprei a massa fresca que Gio prometeu fazer para mim. Não sei como medir, mas a sensação de poder estar com ele, livre de qualquer coisa do passado, é quase uma graça alcançada. Ele pediu para entrar e eu, que ele ficasse quando lhe contei sobre o que eu era antes de ser extremamente feliz.
O taxi para em frente à casa dele e ele ainda não voltou da sua corrida. Vejo algumas caixas à porta da sala. Saio do carro assim que pago e entro tentando levar tudo em meus braços.
Tem sido dias felizes, mas sei que Gio deve estar com algum problema no trabalho, seu olhar tem se perdido mais vezes e eu o vejo pelos cantos conversando com alguém em seu ouvido.
São conversas fracionadas e isso me deixava tensa, até que percebi que era habitual e passei a não me importar mais.
- Roc? - ele pergunta e vem em minha direção. Escuto o som vindo de seu quarto, é Two Feet, Her Life.
“Mora em sonhos e mentiras”
- Oi, achei que não tivesse voltado da corrida - comento e ele vem ao meu encontro beijando a minha boca e eu deixo tudo sobre a mesa de sua cozinha - Essas entregas chegaram enquanto você estava no banho - falo assim que o vejo enxugando o cabelo - Vai fazer a massa para mim hoje? - mostro a embalagem e ele acena que sim e pega seu celular que estava carregando.
- Se importa? Preciso resolver um assunto - ele comenta sério olhando para a tela do celular e para, olhando para uma caixa que está sob as sacolas da mesa - O que é isso? - ele aponta para uma caixa - Já sei o que é, demorou além do prazo para chegar e acabei esquecendo - ele resmunga e pega uma caixa verde, tirando algumas peças e eu, por mais que entenda um pouco de rede, não sei como as peças se encaixam.
Tiro as sacolas e uma caixa branca cai - E isso? - pergunto e Gio me encara como se eu fosse desintegrar - Também faz parte dessa encomenda atrasada?
- Não... mas acredito estar no prazo certo - ele responde friamente.
- Não vai abrir?
- Não - ele fala e caminha olhando as peças que comprou. Pego a caixa e vejo um envelope preso a ela - Não é algo que mereça minha atenção - sua falta de interesse me deixa mais curiosa e olho para a caixa branca conferindo se não há nenhum remetente.
- Vou abrir - aviso e ele dá de ombros como se realmente não se importasse com isso, mas eu acredito que possa ser importante. A caixa é bonita, o envelope é branco e pode ser alguma coisa relacionada ao trabalho, presente de algum cliente.
Ele sabe o que é e eu não. Abro o envelope, pego o papel e leio.
Meu coração dispara assim que leio e abro a caixa. Uma rosa horrível, preta e eu a solto no chão.
- Gio? - vou atrás dele e ele olha a peça e não se importa com o meu chamado - O que está acontecendo?
- Já estou cuidando disso - ele responde, me deixando desesperada.
- Alguém está ameaçando você - falo mais alto e ele vem em minha direção, mas desvia e vai para a cozinha.
- Já estou cuidando disso - ele insiste e eu sei que ele está fugindo do assunto.
- Como pode estar cuidando disso se isso chegou hoje? E que segredo é esse? - enfrento e ele me encara.
- Outros já receberam - ele fala e abre a geladeira pegando água.
- Que outros? - falo ainda mais alto e ele me encara.
- Vamos fazer o seguinte - ele puxa a carta da minha mão, pega a caixa que está no chão e me encara -, finge que você não viu isso, é uma bobagem - ele está me assustando.
- Giovani, estão ameaçando você e, pelo que disse, os outros devem ser os seus coleguinhas de Clube, por que não está nervoso? Imagina se isso ganha os tabloides? - ele abre a caixa, guarda a carta dentro e cruza os braços na minha frente.
- É só uma maldita carta e alguém com gosto singular para flores - vejo alguma coisa diferente em seu olhar.
- O que você sabe sobre isso? É por conta do Clube, certo?
- Não sei nada sobre isso, e também não sei do que se trata, agora esquece isso, está tudo bem - ele se aproxima e eu não sei, mas tem alguma coisa errada, ele está muito calmo diante de uma ameaça.
- Gio, pode confiar em mim - ele me beija.
- Eu te digo o mesmo - ele pisca um dos olhos e caminha em direção ao seu quarto.
O que está acontecendo?
***
Giovani
Vejo as coordenadas que recebi pelo comunicador que está em meu ouvido e analiso que a movimentação não pode ser triangulada. Só podem estar de brincadeira.
A porta se abre de uma única vez e eu não preciso olhar para saber que é Alexander.
- Precisamos conversar - ele anuncia e tranca a porta antes de se sentar na minha frente e me encarar.
- Precisamos? - pergunto e não olho para ele, olho para a tela do meu computador e ele se levanta me forçando a interromper bruscamente a minha pesquisa.
- Giovani, somos amigos há mais de dez anos, acho que mereço saber o que está acontecendo - ele fala como se tivesse razão para me afrontar.
- Alexander, somos amigos há mais de dez anos e eu tenho o direito de te ignorar - rebato e me levanto. Eu sei seu ponto fraco, na verdade, eu sei o ponto fraco de todos desse grupo e por isso me preservo no direito de ficar em silêncio.
- Você é o único que não está abalado com tudo isso, o que te faz invencível? Por ainda não ter recebido a carta, nos leva a pensar uma série de coisas - ele fala como se a verdade pertencesse a ele e as coisas não funcionam assim.
- O que você e os outros pensam eu não me importo, o problema é quando se reúnem para determinar que têm razão, e vamos combinar uma coisa, foi muito feio o que fizeram. Todos, eu digo TODOS têm a porra de um passado que pode foder com qualquer um, e o único que está livre disso sou eu e, mesmo assim, fui parar no topo da lista de vocês. Vamos, Alexander, desde quando estão reunidos e arquitetando me encurralar?
- Gio, você visitou todos essa semana, como se fosse uma retratação depois daquele almoço que você abandonou por medo, o que foi dizer para cada um?
- O que falei para cada um em particular não interessa a você - sou o mais direto possível.
- PORRA, GIOVANI! - ele esmurra a mesa e eu vejo que alguém tenta abrir a porta. Não admito esse tipo de comportamento e aqui dentro tanto ele quanto eu temos o mesmo tipo de poder, a diferença é que eu sei exatamente como usar o que tenho em minhas mãos.
- Saia da minha sala! - encaro seus olhos, e pelo tempo que nos conhecemos ele deveria ao menos desconfiar que nesse momento não estou disposto a enfrentar um duelo.
- Não!
- Saia agora - caminho até a porta e a abro para que ele saia e com o chamado de Brooke que o tira dali, eu fico sozinho.
Desligo meus monitores, mas não antes de bloquear todos os acessos, zero o HD de minha máquina e saio trancando a porta e escutando Brooke falando algo sobre amizade, com Alexander.
Saio do prédio da Oracle e olho para os lados.
- Escutou a conversa que acabei de ter? Assim como as outras, nenhum é flexível e isso não me deixa outra alternativa - falo e atravesso a rua em direção ao estacionamento que tenho deixado meu carro desde que fui colocado como suspeito número um de ameaças.
- O que pretende fazer?
- Não posso continuar com tudo isso, não posso seguir com nosso plano perto deles.
- Vai fazer o que estou pensando? - sorrio.
- Sim, me mande as coordenadas.
- 55,75697° N, 37,61502° E
- Recebido.
- Assim que chegar lá, te passo as novas coordenadas. Dou um jeito de nos encontrarmos, mas acredito que terá tudo que precisa para finalizar essa história - escuto e entro no meu carro e acelero em direção ao último lugar que preciso visitar.
- Me mantenha informado sobre o grupo.
- Vou manter, e agora? O último alvo?
- Sim, você vai participar da conversa - escuto a gargalhada e sorrio também.
Acelero algumas quadras e estaciono no subsolo da Maccouant Import, e subo até a recepção que me oferece passe livre. É disso que eu gosto, poder ir e vir, e isso serve para todos os aspectos de minha vida.
Chego à sala de Evan e ele abre a porta e me abraça.
- Não vou perguntar como você está, imagino como deve estar sua cabeça - ele fala e eu não posso deixar claro que nunca estive tão tranquilo. Enquanto eles estão preocupados com suas caudas de pavão, eu estou apenas relaxado e aproveitando o momento. Às vezes é bom saber que a paz, a tranquilidade e a reputação podem ser ameaçadas fatalmente, por isso, ser inteligente e não desesperado é a mais sábia decisão a ser tomada.
- Muito tenso, mas estou aqui para me desculpar. Aquele dia fui ignorante com todos e acabei te envolvendo na história - Conheço os passos que dou.
- Esquece, está tudo bem - ele fala e eu escuto um barulho na outra sala, o que parece um estouro e acredito que seja na caixa de distribuição.
Evan se levanta e vai até a porta e eu escuto em meu ouvido agora... eu já sei o que preciso fazer e faço.
- Desculpe - ele diz.
- Não se preocupe, eu preciso ir embora, a Rocco tem entradas para o Chicago Bulls - comento sobre o jogo de basquete.
- Tome um café, vamos conversar sobre outra coisa - ele pede e eu vejo que ele quer ficar mais tempo perto de mim e tentar capturar alguma informação, mas ele está se esquecendo que sou Giovani Makenzie e não há a menor possibilidade, mesmo que remota, de Evan ter sucesso sobre mim.
- Tudo bem, se não for te atrapalhar - esboço o sorriso apropriado para esse momento. Evan é meu amigo e eu sei que as coisas vão ficar mais difíceis.
Ele pede que alguém traga o café e eu vejo-o mexendo em seu celular. Sei o que ele está fazendo, ele quer gravar nossa conversa e, com isso, eu vou dar o que ele quer, e assim que os outros ouvirem, terão que pensar um pouco para chegar a alguma conclusão.
- Tenho uma viagem marcada para a Escócia em alguns dias, e estou trabalhando em dobro, quase não tenho ficado em casa - ele fala com toda naturalidade e eu escuto como se fosse normal ver nos olhos de um amigo de longa data toda desconfiança do mundo, mas talvez ele, especialmente ele, tenha motivos plausíveis para isso. O histórico vivido nunca poderá ser apagado completamente.
- Não estou com nada planejado, andei viajando por conta de meus pais que estão em Toscana e comprei uma casa em Lisboa para minha mãe, fiquei por lá alguns dias e agora estou preso aqui com novos contratos, acho que meu período de férias a cada três meses acabou - tenho uma surpresa para você, Evan, mas ela não será entregue agora.
Uma mulher entra na sala assim que bate na porta e Evan autoriza a sua entrada. São nossos cafés e tudo parece ser um encontro entre dois amigos. Talvez seja...
A copeira nos deixa a sós novamente e ele apenas mexe na alça da xícara.
- Seus pais estavam planejando sair do Estados Unidos desde sempre e acho que agora estão felizes - ele quer me perguntar alguma coisa e deixar gravado ali, para todos ouvirem depois - Gio... - ele me encara com o olhar cheio de compaixão.
- Sim? - levo a xícara até a boca e não bebo.
- Os outros estão com medo.
- Você não está? - indago - Você não teria motivos para ter medo... teria? - viro a xícara sobre o pires e agora eu quero ver até onde podemos ir com tudo isso.
- Não acho que seja motivo para pânico, mas como conversamos em nosso almoço particular, acredito que haja uma razão para todos ficarem em alerta e, com isso, eu me incluo - eu sei que está com medo, Evan, você tem muito a perder. Existe um império com seu nome que pode cair lentamente ou desmoronar de uma única vez.
- São apenas cartas e flores, não vejo toda essa ameaça - falo calmamente e sei que falarão sobre mim, porque é isso que o medo faz com as pessoas, elas se unem no medo e atacam para se defender.
- Gio, você consegue entender a gravidade de toda a situação? - a questão dele deixa claro que o medo o faz pensar sobre a avalanche que pode estar a caminho.
- Obviamente eu entendo. Todos têm muito a perder se o Clube vier a público. Desde sua criação, por você, e sua inauguração, todos cresceram profissionalmente. Dos treze, cinco já constituíram família de alguma maneira. Definitivamente, ter o nome envolvido nessa lama não trará qualquer benefício. Há várias possibilidades, ou nenhuma, se tudo não passar de uma brincadeira que já perdeu a graça. - Meu celular toca e isso me obriga a cessar a conversa - Preciso resolver um assunto - minto, meu celular tocou porque a voz que está em meu ouvido me deu a desculpa perfeita para partir.
- Ok - vejo a decepção dele em não ter conseguido muitas informações.
- Se precisar de alguma coisa me liga.
- Digo o mesmo - ele fala se levantando, vindo em minha direção e novamente me abraçando - Somos amigos, Gio - ele me lembra.
- Sim, não se esqueça disso - murmuro e saio assim que ele se despede de mim.
Vou para o meu carro e acelero. Agora eu preciso de uma foda bem dada com a Rocco e é a vida que segue seu curso natural e perfeito.
- Você estourou a caixa de distribuição da Maccouant? - pergunto subindo a Nona Avenida.
- Você me pediu uma distração e eu não consegui achar nada melhor que isso.
- Vou desligar, a partir de agora o que vai acontecer vai te deixar com muita inveja - sacaneio.
- Vai trepar, seu puto?
- Inventaram coisa melhor? É o que antecede o último ato - tiro o comunicador de meu ouvido, desligo e coloco abaixo do encaixe do volante.
***
Estou na sala da minha casa, seguro o copo com Bourbon e dispenso o gelo. São quase quatro horas da manhã e Rocco está na casa dela e em meu ouvido escuto o que está acontecendo.
- Temos alguma chance de evolução, mas agora tudo está mais delicado - ele fala e eu coloco o copo na boca.
- Acha que podemos colocar tudo a perder?
- Sim, mas a questão agora é manter exatamente como está, não trabalhamos até agora para ver tudo escorrer entre nossos dedos - o alerta me levanta possibilidades e eu penso no que fazer com as informações que recebi dele hoje.
- A possibilidade de resolvermos sem mais envolvimento existe? - tenho esperança sobre isso, apenas para poupar mais trabalho.
- Claro, mas chegamos a um ponto em que qualquer movimento em falso, tudo pode vir a baixo - a explicação dele é lógica e meu celular toca.
- Me dê um minuto - peço e vejo o nome de Alexander na tela - É Alexander - aviso e atendo - Alô - minha voz é firme já que estamos nos tratando como dois desconhecidos há alguns dias.
- Gio... - a voz dele não parece tão boa e um pequeno e sutil alerta me ocorre.
- O que aconteceu? - pergunto e deixo meu tom menos imperialista.
- O pai de Brooke acabou de falecer - ele avisa e eu me sinto aliviado por ter sido isso e não algo pior.
- Onde você estão?
- Estamos no hospital e ela está destruída, e você sabe o motivo - agora nossa diferença por outros assuntos é colocada de lado.
- Eu sei, estou indo para aí - aviso e desligo em seguida.
- O que aconteceu? - escuto em meu ouvido.
- Temos um funeral para participar.
- O pai de Brooke?
- Sim...
- Não conseguiu aproveitar o gosto da vitória direito, ganhou a causa há pouco mais de um mês - ele menciona o julgamento sobre a empresa que o pai de Brooke conseguiu provar que era dele.
- Tenho que lhe agradecer, você foi a peça fundamental nesse processo e foi justo ele ter ganho - comento e vou para o meu quarto pegar uma camiseta e um casaco.
- Apenas consegui de maneira ilegal alguns papéis que provavam tudo e, o mais importante, esse funeral vai fazer com que os outros esqueçam o foco sobre as cartas e um pouco de você, eles não podem atrapalhar - aceno que sim com a cabeça.
- Você sabe que seu trabalho será dobrado assim que nos encontrarmos.
- Estou contando os dias para isso, não aguento mais essa monotonia e conversas sem sentido.
- Pelo menos você tem um emprego e consegue pagar o aluguel - sacaneio.
- E consigo tempo para observar alguns passos...
14
Giovani
São sete dias de paz e sem olhares perturbadores, não porque esqueceram tudo, mas porque Alexander está com Brooke em sua casa e não aqui na Oracle me olhando como se eu fosse acionar um botão para fazer uma grande “liquidação”.
Olho para a minha sala e me certifico de que tudo está ok.
Tranco a porta, dou sessenta e sete passos até o elevador e mais cento e noventa até meu carro. Agora serão oito quilômetros, depois serão faces entristecidas e um plano a seguir.
Paro em frente à casa de Rocco e ela caminha, com um conjunto social todo preto. A garoa que começou se mostra mais visível em seu sobretudo da mesma cor que o conjunto.
Assim como eu, ela está de óculos de sol, mesmo não tendo nenhum raio acalorado por aqui. Ela abre a porta e entra, colocando o cinto de segurança. Gosto quando ela prende o cabelo com um coque no alto da cabeça.
- Você está bem? - ela pergunta se aproximando e beijando a minha boca num selo rápido.
- Estou, ele estava muito doente, lamento pela Brooke - falo e acelero até o cemitério Trinity Church, que fica na Riverside.
- Eu estava preocupada com você, se empenhou tanto no processo dele - ela comenta, e tem razão, me empenhei ao ponto de conseguir informações o bastante para destruir os alicerces de um possível concorrente.
- Estou bem, não se preocupe - mas eu lamento pela Brooke, eu sei a ligação dela com o pai e agora ela tem apenas Alexander e suas toneladas de ciúme e possessividade.
Eu lamento sobre a morte, mas meu lamento é sempre na direção de quem fica.
***
O caixão serve de linha divisória. De um lado estão eles, os cavalheiros do Clube 13, e do outro apenas eu e Rocco. É como se o pai de Brooke dividisse o time de maneira incorreta e os olhares dos engravatados, mesmo com seus óculos de sol, estão sobre mim. Eles estão com o mesmo pensamento e não é sobre o morto. Sobre como eu poderia estar ali, dignamente encarando cada um deles.
Brooke está próxima do caixão e coloca uma rosa vermelha sobre ele e fica ali, com a mão por alguns minutos.
Gosto de plateia, mesmo não sendo um bom local para isso.
Aproximo-me de Brooke e fico de frente a ela, colocando a minha mão sobre a mão dela, mostrando minha compaixão por sua dor. Ela esboça apenas um sinal de entendimento e fica ali comigo por alguns instantes.
Ela se tornou uma amiga e eu gosto de saber que ela está do meu lado nesse mundo cibernético cheio de armações.
- Meus sentimentos, Brooke - falo baixinho.
- Obrigada, devo muito a você - ela fala quase sem som e eu volto para o lado de Rocco, e ela volta para Alexander que a abraça e beija sua cabeça.
Wallace está ao lado de Hawkins, seu motorista. Wallace não frequenta cemitérios, e se está aqui é em nome do amigo, mas ele se mantém bem afastado de toda situação. Hawkings é o único que poderia segurá-lo caso desabasse. Isso aconteceu há alguns anos e apenas o motorista teve permissão para colocar a mão nele e, por Deus, esse é o cara mais cheio de problemas que conheço e o pior, ele não demonstra nenhum.
Bryan e Cesar conversam e Andrew chega e fica ao lado deles. Carl caminha e para ao lado de Evan e comenta alguma coisa através de um sussurro covarde. Eu sei que ele está falando de mim, do contrário não olharia para o chão com tanta frequência e não me evitaria como fez assim que eu o encarei.
Vejo Evan ao lado de Victoria e me lembro de como tudo começou, assim como Sebastian e Vivian, Ramon e Christen, sem contar Benjamin e Kim, que enrolaram mais de dez anos para enfim estarem assim.
Sou o único que está mais perto do caixão, e vejo o padre se aproximar para algumas palavras. A garoa fica mais forte e os guarda-chuvas são abertos em sintonia, apenas o caixão está debaixo do toldo.
- Portanto, visto que os filhos são pessoas de carne e sangue, Ele também participou dessa condição humana, para que, por sua morte, derrotasse aquele que tem o poder da morte, isto é, o diabo. E libertasse aqueles que durante toda a vida estiveram escravizados pelo medo da morte. Hebreus 2:14,15.
A vida é cheia de começos, um amontoado de meios e fatidicamente um fim. O mesmo... para todos.
Todos saíram lentamente assim que o padre finalizou e ali ficou eu, e longe de todos Wallace, me olhando através de seus óculos de sol. Rocco apertou meu braço e eu apenas disse espere, sem som algum, até que Hawkins comentou alguma coisa em seu ouvido e o levou embora.
- Você está bem? - Rocco pergunta e eu olho pela última vez para o caixão e depois para o seu rosto.
- Sim.
***
Estou no escritório da minha casa e Rocco encosta no batente, usando apenas uma camiseta, e me olha como se buscasse alguma coisa. Estou digitando e não estou olhando para o teclado, estou olhando para ela.
- Não tem medo de errar? - ela pergunta jogando o queixo em direção às minhas mãos.
- Não tenho muitos medos - respondo - Vem aqui, vou te mostrar uma coisa - a convido para conhecer o maravilhoso mundo da tecnologia.
Ela se aproxima e eu abro espaço para que ela se sente no meu colo e ela encaixa seu traseiro em cima do meu pau.
- Confortável aqui - ela brinca e olha para a tela.
- Veja isso - mostro a tela preta no canto e digito os comandos que preciso - Gosta de fazer caridade? - pergunto e ela me encara.
- Não entendi?
- Vou te mostrar - abro outra tela e invado o sistema de câmeras dos ATMs de Nova York.
- O que é isso? - ela coloca seu indicador sobre a tela e mostra o mendigo sentado bem em frente à máquina.
- Será que ele consegue se alimentar bem com dez dólares? - pergunto e ela olha para mim.
- Dez dólares no Times? Só se for minha comida favorita, McDonalds - ela ri.
- Então vamos oferecer um jantar no Olive Garden - digito outros comandos e a máquina solta algumas notas.
- Gio! - ela se assusta.
- Ele está com fome - afirmo e o mendigo se levanta, pega o dinheiro e o segura olhando para os lados, ele não percebeu que saiu da máquina.
- Você é maluco?
- Não, isso não é loucura, é caridade - ela sorri.
- E se pegarem você?
- Como assim? Me pegarem agora? - pergunto e a faço se sentar de frente para mim - Vão me flagrar com seu seio em minha boca - levanto sua camiseta e mordisco o seu bico. Minha mão alcança o tecido de sua calcinha e eu massageio seu sexo, a sinto ficar molhada e a coloco sentada sobre a mesa do meu computador.
Desço meu zíper e enterro gostoso dentro dela.
- Então você é um homem que gosta de praticar caridade, isso é alguma demonstração de que merece ir para o céu? - sua pergunta me faz pensar e eu não sei se teria pontos suficientes para conseguir a passagem para o lado celestial.
Puxo seu rosto para perto da minha boca e a beijo mordendo seu lábio.
- Me responde uma coisa... - enterro com mais força e ela geme - O que eu faria no céu? Eu não a encontraria por lá... - ela sorri e apenas concorda com a cabeça.
- Não acha que eu sou uma boa menina?
- Boas meninas não vão para o céu...
15
Rocco
Estou na minha cama e a noite de ontem foi uma das melhores. Fizemos tudo que gostamos e eu ainda sinto algumas partes bem molhadas. Lamento profundamente ter que ir trabalhar, mas é preciso, tenho uma hipoteca para pagar.
Saio da cama, caminho até a cozinha e encontro o café da manhã posto para mim e um bilhete:
“Você trouxe para minha vida mais do que pode imaginar.
Obrigado por nos dar uma chance.
Eu te amo”
- Eu te amo? - ele poderia ter me dito isso e não deixado no bilhete.
Volto para o meu quarto e pego meu celular no criado-mudo.
“Gostaria de ouvir isso de você olhando em seus olhos”
Tiro uma foto do bilhete e envio para ele junto com a mensagem. Meu celular toca e eu atendo animada pensando que é ele.
- Oi - do outro lado escuto muito barulho.
- Srtª Rocco Field?
- Sou eu.
- Aqui é o Rob, sou do financeiro da Madson, eu gostaria de saber se na ausência de Christen, a senhorita é que vai assinar as autorizações? - Rob, por que diabos usa tanta formalidade? Esqueço que Christen está viajando e levou junto seu apêndice latino. Há algumas semanas eles viajaram para curtir as férias que eu ajudei a coincidir, ele queria fazer uma surpresa para ela para comemorar o primeiro ano juntos e agora eu sei que ele agiu por conta própria e decidiu ir com ela novamente. Não é apenas ter dinheiro para isso, é ter poder e saber que tudo vai continuar caminhando com ou sem a presença deles em seus empreendimentos.
- Sim, Rob, e, por favor, me chame de Rocco, já trabalhamos juntos há muito tempo - ele ri e eu também.
- Eu sei, mas acho seu nome lindo para não ser pronunciado dessa forma - ele elogia e eu estou começando a gostar dessa manhã de segunda-feira.
- Alguma emergência?
- Apenas alguns pagamentos que precisam ser efetuados.
- Chego aí em trinta minutos - me despeço e desligo.
Olho para a tela do celular e vejo que Gio ainda não recebeu a mensagem. Vou para o closet, coloco a playlist de meu celular para tocar e troco de roupa.
“Não importa se não sou suficiente para o futuro ou para as coisas que estão por vir, pois sou jovem e apaixonada” - Love, de Lana Del Rey.
Escuto uma mensagem chegando e pego celular rapidamente e vejo.
“Talvez eu fique mais uma semana” - é de Christen e se ela quiser ficar um ano fora não tem problema, porque ela é a herdeira da Madson e isso significa ter muito dinheiro.
Respondo com um ‘divirta-se’, que disfarça a pequena inveja. Coloco meus saltos e saio em direção ao meu carro. Olho novamente para o celular e imagino que ele já possa estar no trabalho e deve estar em alguma reunião, ele mencionou que tinha algumas coisas importantes para fazer essa semana. Espero apenas que ele consiga um tempinho para dizer que me ama olhando nos meus olhos...
***
Olho para o relógio e vejo que já são quase cinco horas e eu ainda não almocei e também não vi o tempo passar. Olho para o celular e não vejo nenhuma mensagem de Gio.
Ligo para ele e cai direto na caixa postal. Nunca vi o celular dele desligado, deve ter acabado a bateria. Ligo para a Oracle e quem me atende é Brooke.
- Oi, Brooke, tudo bem? Sou eu, a Rocco - sinalizo, afinal tem um bom tempo que nos falamos e também não somos amigas próximas. O que eu sei é que Brooke é ovacionada por Giovani que me contou tudo durante o desenrolar da história dela com Alexander, inclusive sua contratação.
- Oi, Rocco, tudo bem? - ela é simpática e também não precisava ser, porque a desgraçada é linda... e inteligente.
- Tudo, eu queria muito falar com o Giovani - encabulo.
- Rocco, eu não o vi hoje e olha que cheguei aqui antes das sete da manhã - ela ainda me dá satisfação, não é a toa que Gio se rasga por conta dela. Admito que no começo eu era enciumada por conta dela, mas depois que a vi com Alexander, tudo passou.
- Tudo bem então, caso ele apareça, só diga que eu liguei - peço e nos despedimos em seguida.
Olho para a tela do meu computador e vejo alguns e-mails que precisam ser respondidos. Tratam-se de acordos e remessas que precisam de um aval e eu sei que tenho carta branca para isso.
Enfio-me no trabalho e esqueço da minha vida fora da Madson. Eu não posso errar, Christen confia em mim.
Respondo e autorizo um por um e sou interrompida por uma entrada brusca em minha sala, salto para trás com a cadeira e vejo que é Sr. Domingos, segurança.
- Desculpe, Srtª Field, mas é que vi a luz acesa lá de fora e vim conferir se havia alguém aqui na sala - meu coração quase para com o susto.
- Ainda vou ficar mais um pouco - sorrio ainda assustada e ele sai olhando os corredores e as salas.
Assim que respondo o último e-mail, saio e vou direto para a casa de Giovani.
Estaciono o carro e vejo a luz da garagem acesa e isso me anima. Abro a porta da sala e corro em sua direção e não vejo nada além de duas caixas no chão.
- Gio? - o chamo pela casa e procuro.
Nenhum sinal dele.
Volto para minha casa e ligo novamente para o celular dele, e cai direto na caixa postal. Eu não lembro se ele me falou sobre alguma viagem essa semana, eu sei que ele iria para Madri, mas isso seria daqui um tempo.
Onde você está?
***
Calço meus saltos e meu destino não é a Madson, porque eu já não tenho estrutura para ficar assim, tanto tempo sem notícias. Acelero em direção a Oracle e assim que peço para a recepção me anunciar, minha entrada é liberada na hora, como se alguém também tivesse pressa em falar comigo.
A porta é aberta por um rapaz que não conheço e Brooke vem em minha direção.
- Oi, Rocco, nenhum sinal dele? - ela pergunta porque sabe que estou aflita, liguei para ela pelo menos três vezes ao dia, todos os dias nos últimos oito dias.
- Nada - falo e ela me leva para uma sala que deduzo ser dela, tem porta-retrato dela com Alexander em alguns lugares do mundo - Eu sei que você é muito boa no que faz, então cace ele, rastreie o seu paradeiro.
- Você acha que já não fiz isso? Olha isso - ela aponta para alguns monitores que estão na parede - Veja, aqui é a última imagem de Giovani, ele está no JFK e caminha em direção ao jatinho. Essa imagem é de segunda-feira, quase cinco horas da manhã - ela acelera um pouco e mostra o jatinho retornando - No momento do pouso, são dez e vinte e três da noite. Olha, ele desce do jatinho e caminha em direção ao saguão - ela vai trocando os monitores e vai me mostrando os passos dele - Até que ele entra nesse carro - uma van branca - E depois disso, eu já o procurei, rastreei o veículo até ele chegar no estacionamento da Oitava com a Nona e não tem absolutamente nada dele. É como se ele simplesmente tivesse saltado do carro - ela explica e Alexander entra na sala.
- Oi, Rocco - ele não parece bem.
- Oi, Alexander.
- Nada ainda? - ele pergunta.
- Não sei mais o que fazer - respondo.
- Se importa se eu fizer uma pergunta? - ele fala e Brooke sai fechando a porta e nos deixando a sós.
- Não - ele percebe que estou triste.
- Giovani estava estranho nos últimos tempos? - a pergunta é disfarçada pelo tom preocupante dele, mas isso me alerta para os sinais que percebi de Gio e com isso ele pode me ajudar a encontrá-lo.
- Não diria estranho, estava tenso, preocupado, até achei que fosse pela carta que recebeu há algumas semanas, mas eu não sei, acho que antes disso - respondo e Alexander anda até a mesa de Brooke e se apoia nela.
- Você viu essa carta?
- Sim, eu que abri porque ele não se importou, disse que não era nada e simplesmente saiu andando e abriu outra correspondência que havia chegado. Aquela rosa era horrível - respondo e o vejo passar a mão pela boca.
- Ele não mostrou medo? Estou lhe perguntando porque todos que receberam duplicaram o sistema de segurança. Aqui, por exemplo, Brooke e eu não andamos mais sozinhos, minha irmã e o marido estão na mesma situação, então, estou achando estranho o fato de ele ao menos se preocupar com você que está aqui agora, sozinha - Alexander não faz ideia do que é ouvir isso.
- Gio não é um homem de demonstrar medo - abaixo a minha cabeça e penso que se minha mãe me virou as costas, por que Gio não viraria?
- Desde que você ligou, pela segunda vez, avisando que Gio havia desaparecido, eu conversei com os outros que estavam em nossa ultima reunião. Gio visitou cada um deles um tempo atrás e, com isso, achei que ele pudesse ter dado pistas de um futuro paradeiro, mas não - ele se aproxima de mim e olha nos meus olhos - Você acha que ele está escondendo alguma coisa?
- Não... ele não teria nada para esconder... eu não sei - eu só queria que ele aparecesse, porque eu preciso dizer para ele que ele também trouxe algumas coisas para minha vida, e uma delas foi o amor.
- A única pessoa que não consegui contato foi com Wallace, ele está viajando e não tem previsão de retorno, dos demais, todos estão avisados sobre o Gio, também estou preocupado - ele fala e pega um cartão em sua carteira. Ele alcança uma caneta e coloca o telefone de Wallace e o endereço dele.
- Obrigada - agradeço e caminho em direção à porta.
- Espera! - Brooke chama de algum ponto depois do corredor e ela surge com um papel na mão.
- O que foi? - Alexander pergunta.
- Veja isso - ela aponta para a foto do Gio no momento em que ele caminha para o jatinho.
- É Giovani - eu falo.
- Ele me ensinou a olhar um pouco mais de longe, mas acredito que ele deixou claro que também devemos olhar de perto e foi isso que fiz, ampliei a foto e encontrei isso - ela fala e eu não consigo entender, estou nervosa demais para charadas.
- Eu disse que era perigoso você perto de Gio por muito tempo - Alexander comenta.
- Olha para a mão dele, a mão que segura o celular. Desde quando Gio tem uma tatuagem no dedão esquerdo? - ela suspende as sobrancelhas e eu olho para a foto.
- Mas é igual a ele, o rosto, o porte - falo.
- Sim, é igual a ele, mas não é ele - ela constata - Ele não entrou nesse jatinho, e, mesmo assim, deixou tudo parecer que tivesse, assim procuraríamos nesse percurso que ele fez: jatinho-decolagem-pouso-van e ele simplesmente sumiu no trajeto, mas na realidade, foi o motorista da van - ela mostra outra foto - que caminhou até o jatinho, viajou até Miami e voltou para Nova York. Nosso cérebro nos enganou. Vimos o que queríamos ver. O cara estava de boné, óculos de sol e barba um pouco grande, absorvemos a presença de Gio por conta de tudo isso e, para finalizar, ele entrou no jatinho, não deixando sequer um segundo para pensarmos em outra coisa - por isso Giovani idolatra essa mulher.
- Então, ele pode estar aqui - falo com entusiasmo - Ele havia comentado que iria para Madri a negócios - lembro de nossa discussão sobre isso.
- Ou em qualquer lugar do mundo, nunca vamos saber - Alexander comenta e caminha para perto de uma poltrona e se senta - Duvido que ele esteja em Madri, os negócios por lá que ele havia fechado foram transferidos para a Bélgica.
-Por que você está falando isso? Como assim em qualquer lugar do mundo? - Brooke pergunta.
- Quantos nomes você acha que Giovani possui? Para cada um, uma documentação completa e tudo isso em duas caixas na garagem de sua casa, com algumas peças antigas de computador por cima - Alexander fala e eu me lembro.
- Eu vi essas duas caixas - falo.
- Aposto que estavam vazias - Alexander comenta.
- Sim...
- Desculpa a minha franqueza, mas Giovani Makenzie é a nossa agulha, mas o problema está no palheiro - Alexander conclui e agora eu imagino que parte de Gio era verdade quando estava comigo.
- Obrigada - agradeço os dois - Mas, por que Giovani sumiria? - deixo a pergunta e seguro a maçaneta da porta.
- Porque ele é Giovani Makenzie e sabe que ninguém o encontraria - Alec responde e eu saio da sala. Caminho até o elevador e faço de tudo para não pensar que Gio possa ser mais uma pessoa que entrou na minha vida para me mostrar que confiar é algo que não vale a pena. Porque essa seria a terceira vez que sou abandonada por alguém que confiei.
Epílogo
Fiquei quatro dias tentando falar com Wallace, e confesso que estou achando que Giovani está junto dele, porque é muita coincidência terem viajado e ficado sem contato no mesmo período. Somente ontem eu consegui a informação com a secretária dele de que ele volta ao trabalho amanhã. Como se a vida de Wallace fosse constituída por um silêncio sepulcral, onde as pessoas se movimentam ou se pronunciam apenas diante de sua autorização.
Estou na frente da casa dele, acabei de apertar a porra da campainha, eu sei que ele está aí dentro e ainda não saiu para o trabalho.
Uma senhora baixinha, de óculos e extremamente educada me atende com um bom dia simpático, mas eu estou aflita.
- Bom dia, preciso muito falar com Sr. Weiser. Meu nome é Rocco Field - peço e ela percebe que estou tensa e pede para eu aguardar e eu fico ali, esperando, até que escuto uma voz grossa falando que o Sr. Weiser está se preparando para o trabalho e que precisarei ser breve.
Assim que ela volta e repete tudo que o outro homem falou, eu acato e ela me coloca em uma antessala com uma poltrona preta, uma mesa redonda de madeira escura e um abajur de chão. Talvez Sr. Weiser também tenha medo do escuro.
Tudo é tão organizado, limpo e cheira a algo cítrico, amadeirado, sei lá, estou confusa com esse cheiro como se ele me tirasse os sentidos.
- Ele vai te receber em dois minutos - um homem alto, forte, cabelos bem aparados e sem nenhum vestígio de barba ou alegria em seu rosto me avisa e eu apenas chacoalho a cabeça e ando de um lado para o outro. É esse homem que estava com Wallace no funeral do pai da Brooke.
De repente escuto alguém descendo uma escada em arco do lado direito que desemboca na sala onde estou. A madeira quase não faz barulho ao sentir cada pisada, mas como tudo está em silêncio, é fácil perceber que alguém está descendo.
- Bom dia - Wallace fala e eu nunca havia reparado nesse homem. Ele é grande, bonito e... sério. Muito sério, ameaçador...
- Bom dia.
Ele caminha para perto da poltrona e me olha dos pés à cabeça, como se alguém tivesse me largado ali por engano. Engulo três vezes e percebo que minha boca parou de produzir saliva.
- Estou intrigado, você não é a secretária da Srtª Christen Madson, e também, namorada de Giovani Makenzie? - ele tem a voz tão grossa que chegou a tremer meus dois rins. Ele está usando terno preto, gravata vermelha opaca e seu rosto me faz entender que ele está com dor. Ou seria repulsa por ter alguém que não foi convidado em sua casa?
- Sim, e é por isso que estou aqui - estou confusa com a presença dele - Você viu o Giovani ou falou com ele nos últimos dias? Estou procurando por ele e não consigo encontrá-lo - falo e ele oferece apenas um passo e coloca as duas mãos no bolso de sua calça. Ele olha para mim como se quisesse descobrir alguma coisa. O outro homem, o da voz grossa, não oferece nenhum tipo de reação e isso me apavora.
- E por que eu saberia se estou diante da namorada dele? - ele é direto, ou grosso, dependendo do ponto de vista. Olho para as minhas mãos e depois deixo que meus olhos o alcancem. Ele denota que estou nervosa e que seu comportamento colaborou muito com isso. Limpo minha garganta e me aproximo dele encarando seus olhos duros, acinzentados e calculistas. Ele sequer altera a respiração e eu tenho certeza que o primeiro sentimento que ele desperta nas pessoas é medo.
- Porque você seria a minha última esperança.
Barbara Biazioli
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