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Series & Trilogias Literarias
Roswell, Novo México; USA.
Junho de 1947.
À primeira vista os céus pareciam ter se iluminado tamanha fora a explosão. William “Mack” Brazel, vivendo num enorme rancho, escutou o barulho que acompanhou a iluminação no meio da noite de 14 de junho. Da varanda de sua casa ele ficou a tentar entender o que vira. Dia seguinte a 12 quilômetros do rancho, ele encontrou o que parecia ser destroços dos quais não deu valor. Mês seguinte dia 04 de julho, encafifado pelo o porquê de seus animais não se distanciarem da sede principal ele, sua mulher e a filha Bessie de catorze anos, encontraram em suas terras o que pareciam restos de um objeto parcialmente destruído pela queda ocorrida. Brazel ficou a pensar se talvez o objeto iluminado e a explosão daquela noite, não era o que ali via. Levou para seu celeiro pedaços de um material que parecia alumínio, mas se dobrava e desdobrava adquirindo sua forma original, além de pequenas lâminas que ele não encontrava em sua memória nada como referência, contendo inscrições que Brazel, em seu pouco conhecimento, tomou como hieróglifos.
À noite, em conversa com vizinhos, gravada ilegalmente em fitas magnéticas por uma polícia misteriosa, Brazel relatou o que vira o que encontrara.
Então, dia 07 de julho, encorajado pelos amigos, levou na sua camionete um pouco do material, ao xerife George Wilcox.
O xerife telefonou para o Major Jesse Marcel acionando o 509° Grupo Bombardeiro do Oitavo Quartel da Força Aérea – Campo Aéreo Roswell, que averiguou que os destroços encontrados eram de um balão meteorológico. Mas já havia muita especulação na época, desde quando voando em uma cadeia perto do Monte Rainier, Washington, em 24 de junho de 1947, Kenneth Arnold avistou nove objetos incomuns voando ao lado de sua aeronave, no que chamou de um ‘voo de naves que planavam feito pedras ou pires escorregando sobre a água’. A imprensa logo os apelidou de ‘discos voadores’ e o nome pegou. Havia prêmios de jornais locais que pagavam até 3.000 dólares por provas de tais UFOs, Unidentified Flying Objects.
O que poucos souberam é que houve na verdade, dois acidentes em 1947; o primeiro, na planície de San Augustin, próxima a cidade de Socorro, alguns dias antes do acidente em Roswell. E a polícia misteriosa também esteve lá, no local, com agentes de campo paramentados; químicos, assiriólogos e arqueólogos, climatólogos e também cientistas da matemática que viria a se chamar computação.
Lá, quatro corpos; três carbonizados e um com vida, com resquícios de implantes no cérebro. Também restos do que se parecia com um disco voador, e outros utensílios não identificados se encontravam espalhados. Removeram a terra a fim de esconder a marca do acidente, mas lá nenhuma vegetação jamais brotou.
E agentes da polícia misteriosa recolheram muito mais que a história contou.
Numa das fitas resgatadas por curiosos transcrevia-se:
— Houve a queda de um UFO, mas rapidamente a área foi isolada. Recolheram todos os destroços e aparentemente quatro tripulantes de um disco voador. Os destroços do disco eram indestrutíveis, não podiam ser queimados nem entortados e acredita-se que um dos tripulantes foi retirado com vida. Notícias desencontradas chegam-nos contando que tudo não passou de um balão meteorológico, mas talvez tenha sido uma manobra muito grande para apenas recolher pedaços de um balão.
Estava armado o circo conspiratório.
Todos os envolvidos foram levados a esquecer do ocorrido, manchetes chegaram ao jornal e se foram dizendo ser este um balão, posteriormente algo parecido, caído.
Bonecos antropomórficos e muita mentira. Toda uma gama de informações desencontradas escondeu a verdade. Porém, alguns não foram silenciados, e vozes ainda falavam do ocorrido.
Nascia a ufologia.
“Avistamos objetos luminosos dançando em volta da cápsula”- Gherman Titov - Tripulação da Espaçonave Vostok 2 - 1961.
“Tem uns corpos estranhos e luminosos seguindo a nave” - John Glenn Jr. - Tripulação da Espaçonave Mercury 6 - 1962.
“Estação de Baikonur! Estamos sendo seguida por um objeto oval” - Valery Bykovsk - Tripulação da Espaçonave Vostok 5 - 1963.
“Há objetos fazendo acrobacias ao lado da nave” - Valentina Tereshkova - Tripulação da Espaçonave Vostok 6 - 1963.
“Estamos sendo seguidos por UFO em forma de charuto, com protuberâncias semelhantes a braços” - James McDivitt - Tripulação da Espaçonave Gemini 4 - 1965.
“Vimos UFOs, mas não podemos comentá-los por ser assunto proibido para os astronautas da NASA” - Richard Gordon - Tripulação da Espaçonave Gemini 11 - 1966.
“Por favor, estejam informados de que Papai Noel existe” - James Lovell - Tripulação da Espaçonave Apollo 8 - 1968.
“É incrível. Certo. Sempre soubemos que havia uma possibilidade. O caso é que fomos avisados. Nunca houve dúvida sobre uma estação espacial ou uma cidade na Lua... Não posso entrar em detalhes, exceto para dizer que as naves deles eram muito superiores às nossas, tanto em tamanho como em tecnologia. E, meu Deus, como eram grandes e ameaçadoras!” - Louis Armstrong - Tripulação da Espaçonave Apollo 11 - 1969.
“Avistamos um objeto que estava estático com relação a nós e parece rolar sobre si mesmo. Nós já o vimos ontem e parece que busca contato conosco” - Charles Conrad - Tripulação da Espaçonave Apollo 12 - 1969.
“Houston, we have a problem!” - James Lovell - Tripulação da Espaçonave Apollo 13 - 1970.
“Compartilhem ou não, o certo é que os ETs estão aí fora, só não enxerga quem não quer ver” - Edgar D. Mitchell - Tripulação da Espaçonave Apollo 14 - 1971.
“Da janela vimos uma nave não identificada que se movia sem usar jatos (...). Mesmo de perto, não denotava nenhum deslize na sua superfície suave, uniforme, prateada. Havia uma série de 24 janelas, em três níveis, e, três cabeças de aparência humana; seres que usavam capacetes leves, parecidos com capuzes apertados, rostos parcialmente cobertos... Tinham sobrancelhas compridas, grossas e narizes retos, enormes olhos azuis, duas vezes maiores que os dos humanos, fixos, sem mostrar o menor sinal de emoção.” - Vladmir Kovalyonok e Viktor Savinikh - Tripulação da Espaçonave Salyut 6 - 1977.
“Todos os voos das missões Apollo e Gemini foram seguidos, de perto e de longe, por espaçonaves de origem extraterrestre” - Maurice Chatelain - Chefe de comunicações da NASA - 1979.
“Houston, aqui é a Discovery. Temos uma astronave alienígena sob observação” - James Buchli - Tripulação do Ônibus Espacial Discovery - Space Shuttle STS-29 - 1984.
“Houston, tem à nossa frente um grande objeto voador não identificado” - Catherine Coleman - Tripulação do Ônibus Espacial Columbia - Space Shuttle STS-73 - 1995.
1
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de gerenciamento.
12 de agosto; 09h55min.
Uma nova rajada de vento alcançou os 250 km por hora, erguendo todos os coqueiros de uma das mais de dezessete mil ilhas da Indonésia. Num outro extremo da paradisíaca ilha secreta, o pessoal da área de tecnologia cibernética lotava a Sala de Controle Ala Cinco no segundo andar do Complexo A. Estavam muito ansiosos e atentos à tela onde Spartacus, o satélite de observação construído pelos cientistas da Computer Co. para a Polícia Mundial, reagia mal ao comando que tentava girá-lo e posicioná-lo, a fim de restabelecer contato com um chip de Codinome: Cruzador Solar.
O oficial responsável da área, Major Henrique Loyola, saía da Sala de Controle Ala Cinco naquele momento. Ele havia atravessado as fileiras de computadores para alcançar o corredor extenso, bem iluminado e refrigerado, que levava às salas anexas, no setor de gerenciamento. Tinha o semblante carregado acentuando mais ainda seu estrabismo.
Suas últimas notícias não eram agradáveis.
Henrique alcançou a penúltima porta próxima aos elevadores. Bateu, esperou a autorização, entrou e entregou suas últimas diretrizes sobre Spartacus e o chip de Codinome: Cruzador Solar.
— Você tem certeza Major Henrique? — falou o militar, chefe das operações, General Arthur La Hera, com o semblante carregado, e puxando os poucos cabelos brancos que ainda teimavam em permanecer em sua acentuada careca.
— Infelizmente, General Arthur. Não podemos simplesmente fechar os olhos e acreditar que nada está acontecendo. De uma forma ou de outra, isso está interagindo com a raça humana.
— Não estamos fechando os olhos Major. Só não queria chegar a fazer um relatório vazio de suporte.
— Não será vazio se lembrarmos do incidente da sonda soviética Phobos 2 em 1989, quando se preparava para sua última etapa da missão em Marte, e colidiu com uma estrutura cilíndrica de 20.000 km de comprimento.
— Acha que há... — e houve um breve silêncio. Como se o silêncio fosse capaz de resolver algo, dissolver os nós que os amarravam cada vez mais; que os enforcavam, também. — Acha que há... — Arthur tentava retomar o assunto.
— Em 25 de março de 1989, uma fotografia infravermelha ‘acima de ultrassecreta’, e supostamente tomada pela sonda soviética Phobos 2, mostrava um objeto aproximando-se da lua marciana. Estimativas dizem que era um UFO com aproximadamente 25 quilômetros de comprimento. De acordo com Zecharia Sitchin em seu livro ‘Gênese Revisitado’, o boato circulando era de que a espaçonave soviética teria encontrado esse UFO gigantesco enquanto estava em órbita marciana, e que a teria atingido. Nos ofícios foi divulgado que ‘alguma coisa’ deixou a sonda rodopiando descontroladamente até que perderam contato. A partir disso tudo é possível, General.
Os olhos de Arthur correram o papel nervosamente outra vez.
— Seja lá o que atingiu Spartacus, eu não vou poder tomar decisão alguma, sozinho, Major Henrique — suspirou o General Arthur. — Compreende?
O magro, alto e ainda belo Major Henrique escorregou os olhos para o lado como quem teme encarar a verdade; a sala escura, o cheiro de charuto que a sufocava, e as fotografias na mesa atrás de Arthur. Henrique não sabia por que se incomodava com aquilo, mas aquilo, aquelas fotos no porta-retrato o incomodavam. Entrava e saía muitas vezes, sempre incomodado pelas fotos da sala de Arthur La Hera.
— Em parte, General Arthur — foi só o que falou.
— Vou comunicar a corporação de inteligência. Esteja preparado para o pior — e o General Arthur o dispensou.
O Major Henrique abaixou a cabeça e saiu.
E fechou a porta tão tenso, que todo seu corpo branco e magro o fez ter câimbras. Sabia que preparar-se para o pior era metafórico; eles já estavam na pior.
Henrique olhou em volta. Chutou um pó que não existia no chão e recomeçou a andar. Atravessou novamente o corredor, entrou num dos três elevadores ali parados e desceu até o térreo, alcançando o hall de entrada envidraçado, com o vidro se misturando às gotas de chuva que os alcançava. Ficou ali observando os ventos quase os erguerem no ar, num céu tomado por uma aurora boreal que lhe dava medo toda vez que a Poliu fazia aquilo.
O Major Henrique Loyola alisou cada ruga da pele branca, limpou os óculos e respirou pesado passando a imaginar quantos segredos o Universo ainda guardava dele, logo dele, um estudioso, um desbravador.
“A Poliu vai ter que decidir!”, pensou enfim, não muito certo de que aquilo fosse a melhor saída.
Computer Co. House’s; São Paulo, capital; Brasil.
23° 36’ 19” S e 46° 41’ 45” W.
12 de agosto; 16h59min.
Sean Queise era um jovem bonito, inteligente, que lutava para se manter no competitivo mundo da informática, e que lutava contra ele mesmo, contra um dom paranormal que o perseguia, consumia, impelia a ter uma vida normal.
Porque o jovem Sean não era normal, ele admitia.
Com uma infância sofrida, carregada de vidas que não lhe pertenciam, que ele via, ouvia. Vidas que vinha a conhecer depois, vidas que jamais conheceria, vida sua, vivida nas estranhas da Rede Internet, onde dedicava às muitas horas de suas noites, a hackear à obscura corporação de inteligência Poliu, sob o comando de Mr. Trevellis, que conhecia todos seus dons.
E os conhecia, pois, Mona Foad, ex-espiã psíquica da Poliu, o havia preparado, preparado o dom que pulsava nas suas veias, que o fazia saber que algo acontecia nos porões da espionagem, no mundo de Mr. Trevellis, homem de pele jambo que sempre visitava seu pai Fernando Queise atrás de apoio.
Sean nunca soube se era um apoio financeiro, e nem o porquê de seu pai se prestar àquilo, mas Fernando Queise sempre se dobrava as exigências de Mr. Trevellis, sempre calado perante as perseguições dele a seu filho, e se talvez não fosse aquele, proteger Sean, o motivo pelo qual Fernando se dobrava, pagava caro.
Porque Sean sabia que os dons que corriam dentro dele era dons paranormais genéticos da família Roldman, de Oscar Roldman, que amava sua mãe Nelma. E que era um amor doentio, que os adoecia, que faziam os quatro sofrerem. E que todos sofriam, pois Fernando amava Nelma que amava Oscar Roldman, que amava Nelma que amava seu filho Sean Queise.
E Mr. Trevellis se aproveitava de tudo aquilo, da amizade de juventude entre Fernando, Nelma, Oscar e ele, que usava de chantagem para conseguir de Sean Queise o que ele mesmo procurara; porque Sean se tornara um espião psíquico da Poliu.
Por isso ele sabia que havia algo interferindo na ordem da corporação de inteligência chamada Poliu, algo que movimentavam seus agentes acima do esperado, algo que acontecera antes do acidente do satélite de observação Spartacus, projetado por um jovem Sean Queise de quinze anos, e os melhores cientistas do mundo, os cientistas da Computer Co., indústria de computadores que herdara, que acreditava estar envolvida com a Poliu, que ele hackeava.
E tudo aquilo também o fazia sofrer a ponto de saber antes de todos, que Spartacus sofrera um acidente, que os computadores de bordo do satélite de observação classificaram como um choque direto com uma tectita. À Computer Co., só chegou um memorando tempos depois explicando que um chip de Codinome: Cruzador Solar, um chip de memória interativa que estava no espaço para testes de resistência física de seus materiais, e que já havia custado aos cofres de seus proprietários muitos bilhões de dólares, estava instalado na segunda asa espelhada do satélite de observação Spartacus; um hospedeiro naquilo que Sean considerava ‘seu satélite’.
E que viviam em total harmonia até serem atingidos.
Sean e seus cientistas da Computer Co., comunicados, tiveram que resgatar as últimas informações dentro do banco de dados do satélite tentando uma ponte com o banco de dados do chip. E mesmo com anomalias nos raios solares quase estragar a precária comunicação entre os mainframes da Computer Co. e o satélite, Sean recuperou o comando de Spartacus. Porém, o problema da comunicação entre seus mainframes e o chip não puderam ser resolvidos, deixando o chip de Codinome: Cruzador Solar permanecer fora de controle.
Foi dias tensos, que nem todo o apoio de Kelly Garcia, sua bela sócia, conseguia aliviar. Logo Kelly que era mais que sua ex-secretária e agora sócia; era sua amiga, a presença que o acalmava. E nem os catorze anos que os separavam, apagavam a chama de ambos, porque havia ali um amor verdadeiro, a estabilidade que mantinha a sanidade dele nos conturbados anos que se seguiram ao suicídio de Sandy Monroe, sua noiva.
Sean havia saído de casa, desistido da faculdade e os amigos, os poucos que ainda tinha, e passado a trabalhar incessantemente. Mas fechado também, para o amor, Kelly viu fracassar uma após a outra, uma aproximação mais física. Porque cada vez mais frio e calculista, ele só procurava aquilo que o ajudasse a destruir o inimigo, Mr. Trevellis, atual chefe da Poliu, que não dava trégua, incitando a Polícia Mundial, mais precisamente o todo poderoso Oscar Roldman, a controlar Spartacus a partir de uma base, numa paradisíaca ilha ao sul de Bali, na Indonésia, a qual não constava no mapa.
Oscar como seu pai Fernando também ficavam sob pressão, pressionando Sean Queise a abrir mão do satélite de observação a fim de resgatarem o chip. E permitir que destruíssem Spartacus, minava as forças de Sean; psicológicas, físicas, emocionais, paranormais.
Os mesmos dons paranormais que agora avivados avisavam, por exemplo, que o telefone ia tocar na mesa da secretária Renata Antunes, além das paredes que os separavam. Telefonema que vinha da paradisíaca ilha na Indonésia, avisando-o que a Poliu havia decidido trazer o satélite de observação de volta ao planeta Terra com ou sem a ajuda da Computer Co..
Sean abriu a porta tão rápido que Renata não sabia se fora o susto do assunto tratado no outro lado da linha ou a face deformada do patrão ao observá-la.
Renata só sabia uma coisa, ele sabia. Só não podia saber o quanto, quando o telefone foi arrancado de suas mãos.
Sean gritava, não sabia ao certo com quem, que a decisão da Polícia Mundial em retornar o satélite de observação Spartacus ao Planeta Terra era uma ‘atitude insana’, que ele não acreditava em coincidências, mas coincidentemente Spartacus fora atingido pela tectita após ter sido direcionado para fotografar estranhas anomalias solares que vinham interferindo magneticamente nos computadores de bordo do satélite de observação, e isso lhe cheirava conspiração para destruir o satélite.
E esse mesmo alguém encerrou a ligação.
— Desgraçados!!! — gritou para Renata que ainda não havia se recuperado do susto de vê-lo ali ao seu lado. — Todos desgraçados, Renata!!! — e Sean voltou para dentro de sua sala sem muita vontade de explicar-lhe que sabia que era algum agente da Poliu naquele telefonema.
Fechou a porta e continuou ali, encostado na porta, olhando sua sala, sua vida, sua maneira de agir e pensar.
Talvez como Nietzsche, pensava que as verdades eram ilusões, das quais se esqueceu de que o eram, metáforas que se tomaram gastas e sem força sensível, moedas que perderam sua efígie e agora só entravam em consideração como metal, não mais como moedas; mentiras.
Aquilo só fez aumentar a desconfiança de Sean Queise para com a corporação de inteligência envolvida em algo, em alguma verdade mentirosa; porque ele sabia que a Poliu mentia, que os valores estavam vazios de autoridade e ele não acreditava em coincidências.
2
Computer Co. House’s; São Paulo, capital; Brasil.
23° 36’ 19” S e 46° 41’ 45” W.
13 de agosto; 07h07min.
A porta foi aberta pela mão feminina adornada de belos anéis e Sean só levantou os olhos do computador. Acordara cedo para preparar um programa de hackeamento que resolvera instalar somente no seu computador de mesa, longe dos mainframes da Computer Co., e longe de um provável alcance da Poliu.
— Eu sei que está me vendo aqui patrãozinho — falou charmosa a sócia Kelly Garcia.
Mas a única coisa que ouviu dele foi um suspiro de quem perde a paciência com aquela maneira de ser chamado.
Só que Kelly não era de desistir, entrou e ficou ali, observando-o. De pele apessegada, cabelos castanhos até a cintura, ela era uma beleza espanhola de trinta e três anos, que se apaixonara por Sean Queise desde a primeira vez. Qual primeira vez foi, ela já nem se lembrava, porém não esquecia o quanto o amava; e o quanto lhe custava manter aquele sentimento.
Sean se isolava cada vez mais; amigos, funcionários, ela.
— Pode se mover, Kelly — continuou a digitar.
Mas Kelly não se moveu, porque a porta não fora aberta com seus dons paranormais como fazia sempre, quando ela se aproximava da porta, da maçaneta, provável do escritório dele.
E aquilo significava um Sean abalado.
— Vai viajar não?
— Não lhe parece provável?
— Minha Nossa... Renata me disse que você ficou descontrolado com um telefonema da ilha, Sean. Sabe que não pode fazer isso.
— Renata, minha secretária, lhe faz relatórios?
Kelly não acreditou no que ouviu.
— Renata, nossa secretária, está assustada com você. Preocupada, também — ela o viu levantar os olhos, olhar a imensidão da sala e voltar os olhos para as teclas que digitava sem parar. — Como eu, Sean.
— Ahhh... — escapou de sua boca. Ele se virou e viu o quanto belo era o corpo de sua sócia, o quanto seu corpo ficava bonito naquele tailleur alaranjado comprado com esmero em ruas de lojas fashion. Sabia que tudo aquilo era para ele. — Perdão... — soou de várias maneiras.
Naquilo Kelly acreditava.
— Vai viajar? Vai enfrentar o Sr. Roldman mesmo sabendo que é Mr. Trevellis quem quer enfrentar?
Sean percebeu o quanto ela o conhecia.
— Preciso entende? — levantou-se e olhou Kelly ainda parada. — Entende não Kelly? Ao menos você, por favor? — caiu sentando sentindo-se cansado, com medo de pesadelos que o perseguiam.
— Você já foi lá?
— Traduza lá!
— Na ilha da Polícia Mundial.
— Sabe que já...
— Falei de viagens astrais Sean... — Kelly até parecia ter dons também. — Porque sei que anda saindo do corpo, se lançando sabe-se lá aonde, contaminando sua alma, meu amor, atrás de respostas que sabe, não vai encontrar em parte alguma.
— Por que faz isso comigo Kelly? Por que logo você?
— Faço o que Sean? Alertá-lo? Protegê-lo? Amá-lo?
Daquilo Sean não gostou, de que ela o lembrasse daquele amor, do amor que não podia, queria, mas não podia.
Abaixou a cabeça e agora abriu a porta com seus dons para ela sair. Kelly sentiu dor naquele dom dele, porque ele a expulsava da sua vida.
— Kelly... — e Sean a viu parar já do lado de fora, quase fechando a porta. — Sabe que eu preciso, não? Que algo me alerta nesse acidente com Spartacus, que o satélite de observação é tudo o que tenho de concreto nessa vida — e viu Kelly colocar o orgulho de lado e voltar à sala.
— Um satélite é tudo que tem de concreto nessa vida? — riu nervosa. — Você tem dezenove anos e conquistou um mercado inteiro, o comando da maior indústria de computadores do mundo, construiu grandes bancos de dados aos quinze anos e me diz que um satélite é tudo que tem Sean?
— Por que está falando tudo isso?
— Porque estou tentando entender o porquê desse maldito satélite ser tão importante assim.
— O que há com você? — se ergueu da cadeira. — Por que está...
— É ela, não? É Sandy e o porquê dela ter se matado?
— Não faça isso Kelly... Não você!
— Eu não o que? Fazer o que? Ver você afundando cada vez mais rápido porque o satélite é tudo que lhe importa?
— E ele é tudo o que me importa Kelly! — exclamou nervoso, irritado, sabendo que aquilo era ciúme, que ela não acreditava que ele superara o suicídio, que ele só estava defendendo sua obra.
E que ela tinha que entender tudo aquilo porque o amava.
Mas Kelly o amava, por isso não podia deixar vê-lo fazer aquilo, se destruir.
— Então já que Spartacus foi colocado acima de todos nós, vá em frente. Mas vá muito à frente de tudo isso, porque no final Sean, vai ver que a única coisa que precisava ser feito era ter salvado sua alma — e se virou para sair e voltou. — Ou até sua honra e brio deixaram de ser importantes? — e saiu batendo a porta.
Sean podia sentir o coração dela disparado, angustiado pelos corredores da Computer Co.. Cada pulsação acelerada no corpo da bela espanhola que o amava, que ele amava, e que ele não podia amar.
3
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
16 de agosto; 10h16min.
— Sr. Queise? — chamou uma roliça e atarracada moça de uniforme militar num sotaque nitidamente caipira, do interior americano; com cabelos lisos, sorriso grande e pele branca e bem cuidada, e que lhe sorria.
Sean saiu do jato da Polícia Mundial que acabara de aterrissar na moderna pista construída a noroeste da ilha secreta, ao sul de Bali. Olhou para trás arrumando a gola do costume negro que vestia, arrumando os óculos espelhados para vê-la.
Alto, loiro, de corpo malhado, Sean Queise era lindo. Chegava, porém, com a barba mal feita e os olhos cansados, segurando a pequena mala que trazia com muita mais força do que o costumeiro necessário.
— Senhorita?
— Boa tarde! — deu-lhe uma pequena mão para ser cumprimentada. — Sou a Tenente adjunto Nadir Berthand, e trabalho subordinada ao Major Henrique Loyola. Foi uma surpresa a sua vinda, Sr. Queise.
— Me chame de Sean, Tenente adjunto Nadir — pediu. — Sabe que a Poliu me chama de ‘Senhor’ para me irritar.
— Ah... — ela achou graça sem saber se era para achar. — Então me chame de Nadir — falou outra vez num inglês carregado de sotaque.
— Podemos ir? — falou ele com secura apontando para o carro, o único, ali parado.
— Sim, é claro! — olhou-o. — Quer que carregue sua mala de mão?
— Não! — Sean viu que ela continuava a observá-lo de lado. — Algum problema, Srta. Nadir?
— Oh! Desculpe! Não havia percebido que era tão... Tão mais...
— Jovem?
— Bonito... — e a voz dela se perdeu no ar.
O tempo estava cada vez mais carregado, uma chuva forte parecia se aproximar e talvez um Tufão a acompanhasse. Sean tirou os óculos espelhados e um par de olhos azuis observou o céu que se fechava. Até podia ser que não fosse uma das piores tempestades, mas a ideia que podiam ser erguidos em pleno ar não agradava o jovem mega empresário da área da informática.
Ele passou a dobra da camisa no vidro da janela do carro e Nadir ofereceu-lhe um lenço de papel.
— Obrigado! — respondeu polidamente outra vez limpando o embaçado que impedia uma melhor visualização do lado de fora do carro.
— Quer que diminua o aquecimento do carro, Sr. Queise?
— Não, obrigado. Já disse para me chamar de Sean.
— É que todos o chamam assim — Nadir olhou para o lado. —, para irritá-lo... — soou mecanicamente da boca dela. Ela olhou para fora tentando desviar-se do deslize. — A chuva está atrapalhando tudo — divagou.
Sean a observou de lado. Nadir não parecia deixar escapar nada, nenhuma essência, nada que ele pudesse traduzir com seus dons paranormais.
— Saberia me dizer por que escolheram uma ilha secreta?
— “Secreta”, Senhor?
— Quando não consta nos mapas e o Google Maps não a ‘enxerga’, a ilha tem outro nome? — falou sarcástico.
Nadir sentiu-se mal.
— Não sei nada sobre isso Sr. Queise — respondeu temerosa.
— Quando estive aqui dois anos atrás fiz a mesma pergunta a um dos cientistas e também ninguém sabia.
— Já esteve aqui?
— Sim. Quando me chamaram para conhecer o projeto da nova Sala de Controle Ala Cinco. Parece que a Polícia Mundial não confia na Computer Co. controlando sozinha Spartacus — Sean falou irônico percebendo que a Tenente adjunto Nadir começava a sentir-se visivelmente incomodada. — Também só tinha o prédio A e um galpão. Vi quando o avião sobrevoou que há novas construções — prosseguiu ele.
— O galpão agora é chamado de Complexo B. Todos os prédios da ilha são chamados de complexos. O Complexo C e o Complexo D foram construídos há pouco tempo.
— Quem construiu? A Polícia Mundial? Para que serve?
— Não sei responder Sr. Queise — Nadir não entendeu bem a pergunta.
— Oscar já chegou?
— Amanhã. Pelo que sei.
— E Spartacus vai mesmo retornar? — bombardeava Sean, a roliça e atarracada mulher.
— Já disse que nada sei além do que sabe.
— E o que é que eu sei Nadir? Por que acha que sei algo? Por que sempre acham?
“Sempre acham?”; Nadir se perguntou em pensamento.
— Falta pouco para chegarmos Sr. Queise, é... Sean... É... Poderá então perguntar a algum de meus superiores — e ela continuou a olhar para frente, onde o motorista observava os dois pelo espelho.
Sean o encarou com olhos de pouca vizinhança seguindo a linha do pensamento que leu de Nadir. O motorista voltou a observar o trajeto e Sean Queise dele nada conseguiu ler.
“Espiões psíquicos”; soou em seus pensamentos.
Sem sabia que não iria tirar muita coisa deles ali se eram agentes da Poliu, treinados por espiões psíquicos, capazes de lê-lo e também bloqueá-lo.
— Desculpe-me! Não estou autorizada a falar — respondeu Nadir enfim.
Sean a olhou havia algo nela que lhe chamou a atenção. Algo com ela, com o jeito dela falar caipira.
— Eles te preveniram que eu faria perguntas? — sorriu cínico.
— Eles me preveniram que o Senhor seria capaz de tudo para alcançar o seu objetivo, inclusive estudar as coisas.
— “Estudar as coisas”? — Sean caiu em gargalhada, teve que fazê-lo. — Mas você sabe que coisas eu estudo, não Nadir? Porque sabe mais até do que lhe fazem pensar que sabe.
— Não estou mentindo, Sean — Nadir o olhou sem compreender. — Nada sei. Já disse.
Sean fez um som que mais parecia uma risada metálica.
— Friedrich Nietzsche era um filósofo que mais defendia a mentira e a entendia como verdade, porque tudo era uma ilusão e nada continha a verdade, Senhorita. Porém, Nietzsche também entendia que o mentiroso se prejudicava por perder a credibilidade social, podendo até ser excluído da sociedade por causa das mentiras.
— Por que está me dizendo isso?
— Porque para Nietzsche, o mentiroso se utilizava dela, de uma maneira egoísta e prejudicial, ao ponto da sociedade não confiar mais nele e o excluir de si próprio.
Aquilo Nadir entendeu, sabia que a Poliu a usava para muito mais até do que Sean viesse, a saber. Mas a Poliu era sua guia e ela acreditava naquela mentira; e mentia para se manter ali.
— Preciso; entende? — ela esperou Sean voltar a olhar o motorista e então se virar para ela. — Como Arthur Schopenhauer.
— ‘Mentiras de legítima defesa’! — sim, Sean também entendeu.
Ela abaixou a cabeça e ele voltou a olhar para fora, calado.
Durante aquela última semana, nas poucas horas de folga que se permitira ter em meio às inúmeras tentativas de recuperar o chip, o jovem Sean Queise dormia com receios de perder o satélite. Mentia a si próprio que tinha como salvá-lo, que sabia como, mas sabia que verdades e mentiras se confundiam naquele mundo de espionagem, poder e dinheiro. Sonhava sempre com fugas mirabolantes onde penetrava uma antiga casa de piso de mármore branco, paredes caiadas, com quadros e retratos de estranhas pessoas parecidas com polvos, com tentáculos saindo de suas cabeças. Sean atravessava grandes portas que não davam para lugar algum, acordando assustado, suado, estressado, sem alternativas a não ser estar ali, naquela ilha, tentando argumentar algo com Oscar Roldman, talvez a desistência da destruição de Spartacus.
Sean agradeceu, porém, não ter precisado dormir na viagem.
O portão de segurança nº 3 já se aproximava e ele voltou a limpar o embaçado do vidro agora com o lenço vendo o céu escurecer mais rapidamente.
Também havia algo ali, nas nuvens carregadas, na tempestade, que fez Sean encolher-se, dobrar-se sobre o próprio estômago.
— O Senhor está bem? — a voz de Nadir chegou com atraso aos ouvidos dele; primeiros os lábios da robusta jovem, depois o som da voz carregada de sotaque lhe perguntando de novo. — Está bem?
— Acho... — olhou as nuvens se fechando. — Sim... Estou... — Sean tinha certeza que não.
Mas a mentira era sua legítima defesa.
A cancela levantou depois de verificada a identidade de cada ocupante e o carro passou, parando num puxado de telhas coloridas. Sean olhou em volta antes de entrar no Complexo A e voltou a sentir o aperto na boca do estômago, com medo não soube do quê.
O motorista foi embora com o carro os deixando na entrada.
— Coloque as mãos no leitor Sr. Queise... Ah... Sean... — pediu Nadir.
Sean o fez.
— Identificação das linhas da mão arquivadas. Insira identificação da leitura de íris — pedia uma voz eletrônica por detrás da parede metálica. Sean obedeceu outra vez. — Identificação da leitura de íris arquivada.
Uma grande porta de vidro se abriu em duas e escoou para dentro das paredes de concreto reforçado. Eles entraram e uma jovem moça ficava à entrada numa recepção que lembrava um casulo. Ambos andaram um longo corredor de granito preto e paredes revestidas de folhas de aço escovado, e alcançaram três elevadores.
Entraram num deles e Nadir acionou o andar.
— Por que fui chamado antes de Oscar chegar? — Sean tentou mais uma vez. — Oscar sabe que eu não gosto de me envolver com políticos e o General Arthur La Hera é um político antes de tudo — mas Nadir nada falou. — Droga! Essa ilha... — suspirava incomodado. —, nunca entendi por que tanto segredo... — ele viu que Nadir só o olhava no que chegaram ao segundo andar e ela bateu numa porta de um dos corredores laterais à saída dos elevadores.
— Com licença, General Arthur La Hera?
— Entre! — respondeu uma voz rouca de lá de dentro.
— Por favor! — Sean foi convidado a entrar por Nadir, que fechou a porta após sua passagem sem, porém entrar.
A sala estava enfumaçada pelo charuto que era queimado. Uma penumbra estava a esconder o rosto enrugado por detrás da mesa de carvalho escuro. E não eram somente rugas, era toda uma velhice ali carregada no semblante austero, de homem que exerce certo poder.
— Boa tarde, Sr. Queise. Fez uma boa viagem?
— Na medida do possível.
— Bom! Sente-se! — Arthur esperou Sean se sentar na cadeira indicada, e o couro macio afundou pela pressão de seu corpo. — Sabe que o conheço desde pequeno?
— Não... — Sean foi vago, sabia onde a conversa chegaria. — Meu pai recebe muita gente estranha. Não dá tempo de saber quem é.
General Arthur gostou dele apesar da ironia.
Já Sean observou o General Arthur; ele era quase careca, gordo, com braços de quem já malhara muito ferro, e tinha algumas tatoos escapando da manga curta da camisa social que vestia. Parecia mais um velho marinheiro, cansado da labuta que um homem que decidiria o futuro do ‘seu’ satélite de observação.
— Sou o General Arthur La Hera — jogou o corpo grande para trás fazendo a cadeira balançar. — Estive na sede da Computer Co. do Brasil enquanto ela ainda estava sob o comando de seu pai, Fernando Queise, como percebeu.
— É amigo de meu pai?
— Sou amigo de Oscar Roldman. Então não posso ser amigo de seu pai, não é mesmo? — foi direto.
Sean sentiu aquilo lhe ferir. Parecia que o General Arthur conhecia seus pontos fracos.
Todos eles.
— Sabe Sr. Queise...
— Não me chame assim. Sei que a Poliu me chama de ‘Senhor’ por causa da minha idade.
— Isso lhe incomoda? Ter apenas dezenove anos?
— Por que incomodaria?
— As responsabilidades... Você é responsável, não?
Sean sorriu cínico.
— Ninguém melhor que a Poliu para conhecer minhas ‘responsabilidades’, General, e o quanto sou ‘responsável’ por elas.
— Não sou da Poliu!
— Quando estive aqui na ilha, há dois anos, você não era o superior direto — Sean não deixou prolongar o drama.
— Não era não. Saí do Pentágono no início do ano e Oscar Roldman me trouxe à sua equipe. Tenho certo prazer em revê-lo — falou o General Arthur estranhamente de repente. —, porque diferente da Poliu, que sabe que eu conheço apesar de tudo, lhe considero uma mente brilhante, um exímio empresário apesar da pouca idade, e também porque tem se tornado um homem imensamente perigoso no seu meio.
— Traduza ‘meio’? — Sean o olhou profundamente.
O General Arthur riu e Sean não compartilhou da mesma alegria, continuando quieto; confuso e quieto.
— Está estranhando a sua vinda aqui? — ele viu Sean olhar em volta. — Sabe que precisamos de sua ajuda para trazer Spartacus de volta a fim de resolvermos problemas.
Sean agora ergueu o sobrolho e desviou sua atenção para Arthur.
— Spartacus não tem problemas...
— Não estou querendo sua opinião, Sr. Queise! — mas o General lhe cortou a fala. — Quero trazer Spartacus de volta!
— Como eu ia dizendo e fui interrompido — e Sean ficou a observar a carranca que se formou no rosto envelhecido do General Arthur. —, Spartacus não está com problemas. Não vejo preocupante o fato de um tipo de tectita se chocar com ele se nada em Spartacus foi afetado, pelo menos não seus computadores.
— Temos motivos para trazê-lo. Só isso basta!
— “Basta”? Mas eu já voltei a me comunicar com o banco de dados do satélite, e isso, claro, com todo o empenho da Sala de Controle Ala Cinco em me ajudar — recostou-se na cadeira sentindo que fora cruel também.
Arthur cerrou os olhos a quase fechá-los e Sean permaneceu irredutível; e que nisso ele era bom.
— Sr. Queise... — sorriu. —, teve dificuldades para conectá-lo.
— Mas conectei. Continuo a não ver uma razão direta para a Polícia Mundial destruí-lo… — desafiava Sean quando algo o fez parar.
Alguns porta-retratos colocados à beira da mesa, estrategicamente mostrando a quem quisesse ver uma família feliz, fizeram Sean perder a linha de pensamento. Nos porta-retratos, a esposa do General e suas três filhas sorrindo para a máquina que flagrou aquela felicidade.
O olhar fixo de Sean foi para a moça loira à esquerda da foto.
— Algum problema, Sr. Queise?
Sean o olhou novamente tentando se situar. Passou a mão por madeixas douradas que lhe escorriam nos olhos azuis.
— Família feliz... — soou da sua boca.
— É! — exclamou o General Arthur, estranhamente ao olhar o porta-retrato.
Sean ficou confuso, ficou a tentar entender alguma coisa que pareceu lhe escapar naquele momento. Uma sensação de erro que o dominaria dali para frente.
— Eu pensei... Pensei que tinha uma reunião com Oscar, que juntos iríamos discutir o futuro de Spartacus... Nadir falou que ele só chega amanhã...
— Oscar Roldman é um homem ocupado dentro da Polícia Mundial, pediu-me para que conversasse com você primeiro. Garantiu-me que você compreenderia.
— General... General... — Sean girou os olhos, balançou a cabeça. — Oscar não poderia lhe ter dito isso.
Parecia ficar cada vez mais sério os caminhos por onde a conversa era levada, e Sean lá chegara com atitudes definidas e blindadas, em sua decisão de não trazer o satélite à Terra.
O General Arthur suspirou profundamente sabendo disso, sabendo que a pouca idade dele não ajudava em nada.
— Entenda Sr. Queise, Sean, ou como queira ser chamado — inclinou-se quase se deitando em cima da mesa mostrando os bíceps tatuados. —, o satélite de observação Spartacus e o chip de Codinome: Cruzador Solar são um só agora. Perdemos o contato com o chip e o satélite vai ter que vir junto para que possamos resgatá-lo.
— Já disse que se trouxer Spartacus, ele vai se desintegrar! — soou forte. — Sua estrutura não foi preparada para retornar.
— Terá a oportunidade de consertá-lo! — tentava argumentar, o General Arthur La Hera.
— Você o conserta!!! — gritou Sean, esticando os dedos na cara dele.
Arthur ia revidar, mas se controlou lembrando-se de quem ele era e como aquilo o irritava. Logo ele, um General de sua extirpe, tendo que se controlar por causa de um moleque rico, filho de poderosos; e Arthur realmente pensava no plural.
Aquilo chegou a Sean que sentiu seu sangue ferver.
— Consertamos, fazemos outro, restauramos... — e o General Arthur viu Sean se levantar, a porta abrir e ela bater; tudo tão rápido que ele não assimilou realmente a cena toda. — Seguranças?! — gritou o General Arthur de dentro da sala sem que o som saísse já que as paredes de tripla proteção impediam o som de sair.
Mas Sean pôde ouvir aquela explosão com seus dons, ainda parado no mesmo lugar, com o coração pulando no peito, chegando à garganta que secava. Torceu o pescoço de uma maneira que conhecia ser seu sinal de nervosismo, porque andava nervoso, irritado, sem paciência. Virou-se e a porta se abriu sem que outra vez tocasse na maçaneta. Ficou ali, a observar o General Arthur ainda sentado na cadeira, tremendo de raiva, com os olhos esbugalhados para a maçaneta que não foi tocada por mãos humanas, girar e se abrir.
— Isso significa que vai me impedir de sair? — falou Sean com ironia.
Arthur percebeu como a porta foi aberta, que aquilo não o devia ter surpreendido, mas o surpreendeu; Sean era filho de ‘poderosos’.
— Ainda não terminamos nossa conversa... — e outra vez não pôde terminar perante a confusão que se armou no corredor.
— General Arthur?! General Arthur?! — gritavam pelos corredores.
Sean e o General Arthur se olharam, e um dos três oficiais de segurança, gritava histérico. Sean afastou-se da porta quando o grande e atarracado Arthur chegou nela.
— Que gritaria é essa?! — gritava ele, nervoso com o oficial de segurança ao sair da sala.
— O objeto, General Arthur! Spartacus o viu outra vez!
“Outra vez”, ecoou por todo o corpo de Sean.
— A Sala de Controle Ala Cinco acha que o chip gravou algo! — terminou de falar o oficial de segurança histérico.
— “Gravou algo”? Mas não disse que o chip estava... — e Sean não teve resposta.
Os olhos do General Arthur brilharam ao ganhar o corredor a passos largos como se Sean já não mais estivesse ali. Ele segurou sua mala de mão com força e seguiu-os até ser brecado na entrada da sala de comunicações. Encarou o oficial de segurança e ele largou-lhe, porém firme em não deixá-lo entrar.
Sean leu acima de sua cabeça – “Sala de Controle Ala Cinco”.
Recordava-se da construção daquela sala quando foi praticamente empurrado por meia dúzia de homens e mulheres uniformizados, em meio a mais oficiais de segurança que ali surgiram. Sean viu Nadir, viu também a moça loira da fotografia da sala do General Arthur, sabendo de alguma forma, que aqueles homens e mulheres pertenciam à equipe do chip.
Na grande tela da grande Sala de Controle Ala Cinco, o espaço, Spartacus, imagens distorcidas do que julgou ser o Sol, e o oficial de segurança o segurou pelo braço indicando um novo rumo para ele tomar. Sean foi levado mais três andares acima por um elevador rápido.
Lá, no quinto andar, foi lhe dado um quarto pequeno, porém confortável.
— Seu quarto-sala, Sr. Queise! — explicou o oficial de segurança da ilha à frente dos outros três oficiais de segurança que o acompanhavam.
Sean nada falou entrando e fechando a porta. As malas retiradas do avião que o trouxe estavam pousadas no chão, alguém começara a desmanchá-las. Viu também que a porta do armário na parede oposta estava entreaberta denunciando algumas camisas já penduradas.
— Será um convite? — e olhou em volta novamente. — Não! É uma ordem! — suspirou.
Tinha tudo o que precisava; uma cama, uma mesa lateral, duas cadeiras, um tapete discreto, uma pequena geladeira abastecida, um abat-jour de vidro verde, um interfone, uma televisão; porém nenhuma linha telefônica. Também sem qualquer acesso ao wireless da ilha, Sean não poderia navegar pela Internet. Ele ainda testou seu celular, e ali havia algum dispositivo de bloqueio. Testou mais uma vez e percebeu que um poderoso sinal Jammer estava impedindo as bandas GSM, CDMA, 3G, 4G, GPS, WIFI, DCS e PHS.
Estava ilhado, literalmente.
Complexo A; setor de alojamento.
16 de agosto; 15h33min.
Como mal conseguira tempo de tomar um banho decente, comer, ou dormir direito desde o incidente com o satélite de observação Spartacus, Sean Queise aproveitava a chance de caprichar quando um toque forte, porém único foi feito na porta do quarto-sala dado.
— Entre!!! — gritou ele de dentro do banheiro enquanto fazia a barba.
Como não houve respostas ao seu grito, Sean foi verificar.
— Boa tarde, Sr. Queise... — falou uma voz suave por detrás dele.
Sean teve um sobressalto.
— Ah... Não achei que alguém fosse entrar sem bater.
E os dois se mediram.
— Eu bati! — sorriu a encantadora mulher loira. — Disse “entre!”, Sr. Queise.
— Disse? — de camisa social arregaçada, com metade do rosto coberto de espuma, Sean a fez rir. — Desculpe-me por isso — ele passou a toalha pelo rosto.
— Vai ficar um lado liso e outro áspero — apontou charmosa.
— Fica diferente... — brincou.
— Já é uma pessoa bastante diferente — voltou a rir.
— É... — mas Sean não a entendeu; tentou, mas não a entendeu.
A bela e encantadora, de cabelos loiro-platinados era jovem, não tão jovem quanto ele, era bem verdade, mas tinha lá seus vinte e seis anos.
E eram muitos os encantos que desfilavam pela sala, em pernas moldadas, pouco escondidas na saia curta que colocara propositalmente, com a blusa do uniforme entreaberta mostrando seios fartos, e prováveis, perfeitos.
Sean abriu a boca e fechou.
— Queria me dizer algo, Sr. Queise?
— Acho que não ia dizer nada mesmo que quisesse — riu sem graça.
Os dois voltaram a se medir.
— Ainda não me apresentei — ela adiantou-se. — Sou a Tenente-Coronel Adriana — Adriana esticou a mais delicada mão que Sean tocara nos últimos tempos.
— Pensei que fosse filha do General Arthur La Hera — Sean lembrou-se da fotografia, no porta-retrato da sala abafada.
Adriana brilhou os olhos, que pareceu a ele, serem muito astutos.
— Somente nas horas vagas, Sr. Queise — sorriu. — Aqui na ilha, para todos, sou a Tenente-Coronel Adriana.
— Ãh? — e mostrou o banheiro e a barba para Adriana. — Posso?
— Claro! — ela indicou a passagem.
Sean sorriu gentil, porém entrou no banheiro arisco não fechando a porta totalmente. Algo nela, na beleza estonteante de repente não lhe inspirou confiança. Ele preferiu acatar seus dons e acreditar que havia algo errado com a mulher loiro-platinada e bela no seu quarto.
— Gosto do seu sotaque... — falou ele de dentro do banheiro voltando a fazer barba, disfarçando a desconfiança.
— Meus avôs paternos e meu pai são espanhóis, o sobrenome La Hera é originário de Las Encartaciones de Vizcaya. Meus avôs maternos são porto-riquenhos e minha mãe é polonesa — a Tenente-Coronel Adriana La Hera desfilava pelo quarto-sala. — Meu inglês é confuso?
— Não, mas é uma mistura e tanta — riram os dois. — O que faz aqui nessa ilha Tenente-Coronel Adriana? — Sean parou e olhou para ela no seu quarto-sala.
— Saí da Caltech ligada a NASA ano passado, e agora estou aqui encarregada de alguns projetos.
— Encarregada de Spartacus, suponho.
— Também — ela sorriu de uma maneira evasiva.
Sean voltou ao espelho tentando fazer mais que barbear-se. Mas só tentou, porque outra vez não conseguiu ler-lhe os pensamentos. Sabia que ainda não dominava aquele tipo de invasão, uma que permitisse desbloquear o que os psi de Mona Foad criaram; dons paranormais que brecavam dons paranormais, preparando cérebros de seus agentes, de sua cúpula de poder para não serem invadidos.
“Ou dominava?”; se perguntava naqueles últimos anos.
— Sabe que depois do tal acidente tiraram o controle do satélite de minhas mãos, não sabe? — virou-se para ela.
— Achei que os mainframes do satélite ainda fossem os mesmos mainframes da Computer Co.?
— São! Mas já não direciono senhas de acesso, se me entende? — Sean piscou cínico e Adriana o observou de cima a baixo.
Ele se incomodou, virou-se outra vez para o espelho, confuso por achá-la tão parecida com Sandy Monroe.
“Droga!” escapou em pensamentos sabendo que não se recuperara do suicídio da noiva.
— É um cargo muito importante o seu não é?
— Está querendo dizer que sou muito jovem para estar nesse cargo? — falou Adriana, remexendo as madeixas clareadas recentemente, soltas do comum coque militar que usava.
— Sabia que a idade da juventude era a idade da filosofia?
— Como disse?
— Disse que os jovens e as crianças que ainda não perdiam a curiosidade estavam aptos a ela.
— Realmente não entendi Sr. Queise.
E Sean se aproximou tanto que até o perfume de rosas brancas, o preferido de Sandy, invadiu-os.
— David Hume célebre por seu empirismo radical e seu ceticismo filosófico escreveu o Tratado da Natureza Humana aos 23 anos, Friedrich Nietzsche dos 14 aos 24 anos escreveu nove autobiografias, e Karl Marx aos 17 anos escreveu Reflexões de um jovem perante a escolha de sua profissão. Mas será mesmo, Senhorita, que o jovem tem poder de escolher a vida em todas as circunstâncias?
— Ser jovem parece lhe incomodar?
— Incomodo pelo quê? Por me lembrarem de que sou dono da maior fábrica de computadores do mundo? Ou por que me lembrarem de que gerencio banco de dados com informações que me escapam a compreensão, sendo um ‘Senhor Queise’ de dezenove anos? — e foi um sorriso cínico.
Adriana piscou algumas vezes antes de falar. Porque algo a fez ficar irritada consigo mesma.
— O jantar será servido às dezenove horas! — soou como uma ordem.
— Estou mesmo sendo convidado a ficar?
— Já ficou Sr. Queise! — olhou o guarda-roupa ainda aberto. — Não percebeu? — e Adriana saiu.
Sean ficou a olhar a porta fechada lembrando mais uma vez que a fotografia na sala de Arthur lhe incomodava.
E foi só Adriana atingir o fim do corredor que ela foi interpelada:
— Adriana? — chamou a voz rouca do tatuado General Arthur, que viu a Tenente-Coronel estancar de imediato. — Ele fica?
— Por que achou que não?
— Vá com calma! Sean é mais inteligente até do que faz pensar.
— Não quero controle sob minhas ações — se aproximou de uma maneira evasiva. — Sei onde piso! — e a Tenente-Coronel Adriana se aproximou mais. — E se quiser realmente que ele coopere, coopere você comigo.
— Falhou com Bruno.
— Eu não falhei! — toda sua face iluminou-se. — Bruno é um idiota que não se controla mais. Ainda acho acertado minha proposta de trocá-lo pela Tenente adjunto Nadir. Ela é mais dócil e mais obediente.
— Não sou eu quem decide quem vai ser ou não, Adriana.
Adriana se virou e andou alguns centímetros retornando até um Arthur pensativo.
— Vão ter que contar, digamos… — Adriana desamassou uma inexistente ruga na saia curta. —, certas coisas ao Sr. Queise?
— “Certas coisas”?
— Coisas que vão me permitir dominá-lo.
— E por que você acha que conseguirá dominá-lo? — riu.
— Não tem mais a certeza de antes, papai... — e a sua boca foi brecada, violentamente.
— Isso menina obediente! — o General Arthur segurava a boca dela com força. — Continue assim enquanto estivermos aqui dentro.
Ele a soltou e o rosto dela ficou marcado. Ela se afastou irritada e o General Arthur La Hera ficou lá, no corredor, deixando transparecer uma calma muito falsa, deixando chegar à Sean, no seu quarto-sala cada palavra dita, cada emoção sentida, cada vibração emitida.
Sean terminou de fazer a barba tentando deglutir os pensamentos que vagaram por ali, todos os pensamentos que captara no corredor, todos os que seus dons levaram até ele.
Complexo A; setor de alojamento.
16 de agosto; 20h20min.
— Repita a música! — ordenou o General Arthur ao oficial de cozinha que arrumava a mesa para o jantar.
— É mesmo uma bela canção, não acha? — falou o Major Henrique a prestar uma atenção e tanta na bela morena ali com eles.
Já a loiro-platinada Adriana estava impaciente.
— Acho que ele dormiu — falou ela sentada no sofá, olhando insistentemente ao relógio enquanto esperavam Sean para o jantar. — Já passam das vinte horas.
— Você é muito exigente na hora de convidar, Adriana — o General Arthur baforava seu charuto ao falar com ela; a sala ficou nublada. — Ninguém janta às dezenove horas.
O Dr. Ítalo Piieno sorriu amarelo, sentindo-se asfixiado pela fumaça. Era um conhecido engenheiro mecatrônico, cientista da robótica, e tinha um semblante carregado de angústia, com os cabelos brancos parecendo flocos de neve. Com Doença de Dupuytren nas mãos, o que causava deformidade nos dedos que se contraiam e se dobravam para dentro da palma, Ítalo esparramava no sofá os seus quase cento e oitenta quilos em seus mais de sessenta anos.
O Major Henrique Loyola por ser um homem extremamente magro, destoava quando ao lado de Ítalo. Henrique era belo, mostrando que já fora belo desde sua juventude; um engenheiro mecatrônico, quarentão e charmoso major de carreira, que acumulara durante a vida, prêmios como cientista robótico, deslocado para trabalhar com o Dr. Ítalo.
Ao lado de Henrique, o porto-riquenho Dr. Santos Vasquez, radioastrônomo de Arecibo. Era de estatura mediana, nem magro nem gordo, e com uma corcunda proeminente, mas para uma lesão pelas horas sentado à frente de um grande telescópio que para uma deformidade genética. Estava na fixa dos cinquenta anos, mas sem um único fio de cabelo branco, que pelo visto, era pintado periodicamente de preto.
Ao lado de Santos, a bela morena porto-riquenha Dra. Carminna Clemente, PhD em assiriologia, Carminna Clemente, com seus cabelos negros e compridos, que contrastava com os cabelos loiro-platinados de Adriana. Carminna era uma mulher na faixa dos trinta anos, inteligente, de seios fartos e belas pernas roliças, à mostra no vestido curto.
Ao lado de Carminna, o indiano Dr. Noah Ravayad, radioastrônomo do SETI – Search for Extra-Terrestrial Intelligence. Jovem, na faixa dos trinta anos, de baixa estatura, magro, bonito, e com leve estrabismo, Noah era calado, arredio, considerado mente brilhante no mundo ufológico.
Ao lado de Noah, o brasileiro franzino e nerd Gyrimias Leferi, cientista sênior da Computer Co. do Brasil, que o havia emprestado para monitorar Spartacus enquanto resgatavam o banco de dados; ele chegara fazia já uma semana, e pouco ou nada se entrosara. Gyrimias era um jovem de vinte e quatro anos, Q.I. de gênio e peça importante nas tramas de Sean Queise em sua busca por vingança.
Ao lado de Gyrimias, a Tenente adjunto Nadir, engenheira acústica, especialista em comunicações, e responsável pelo chip de Codinome: Cruzador Solar, que Sean pouco ou quase nada conseguiu captar ali, em pensamentos, no meio daqueles que juravam não pertencer a Poliu, mas que tinham suas mentes e pensamentos bloqueados pela corporação de inteligência.
Já o Tenente Bruno Pierre, Doutor engenheiro de comunicações e um dos cientistas envolvidos com o chip Cruzador Solar, fora convidado para o jantar, mas outra crise abalara seus nervos após uma discussão a tarde com Adriana e a equipe, o que ocasionara sua dispensa.
E Adriana e Carminna se observavam de vez em quando. As duas mulheres poderia se dizer, era água e vinho, não só pela cor dos cabelos e pele, mas pelo estilo de vida e pensamentos.
Adriana voltou a olhar o relógio, irritada com a demora de Sean Queise, já saindo da sala quando foi brecada.
— Vá chamá-lo, Nadir! — falou o General Arthur de repente, acordando quase todos, irritando Adriana.
— Mas...
— Vá Nadir! — Arthur voltou a ordenar à moça que ficou num entra e sai. — Chame o Sr. Queise!
O Major Henrique adorou ver a empolada Adriana odiar o General. Carminna também demonstrou entusiasmo na bronca de Arthur, que notou a indiferença da assirióloga para com a sua filha.
Só demorou alguns minutos para que Nadir retornasse, mas para Adriana durou uma eternidade.
— Perdão! — falou Sean encantador ao chegar, chamando a atenção imediata da Dra. Carminna; todo o Sean que adentrou na sala. — Eu peguei no sono e...
— Era só o que faltava! — falou Adriana irritada ao consultar propositadamente o relógio da parede.
— Faltava o quê, Tenente-Coronel? — questionou Sean ao abaixar as mãos e todos na sala pararem para olhá-la. — Desculpe-me pelo atraso; foi sem querer — Sean lançou-lhe todo charme vestindo camiseta branca, jeans rasgado no joelho, botinas pretas desgastadas, jaqueta grossa e pesada.
Adriana por sua vez colocara um vestido justo, curto, decotado, vermelho, cabelos soltos, perfume forte; olhou para ele com desdém.
— Não se incomode — falou o General Arthur como para que se desculpar. — É um jantar entre amigos, Sr. Queise.
— Já percebi — olhou cínico, em volta, indo cumprimentar seu funcionário. — Olá, Gyrimias. Como vai?
— Parcelado meu cansaço, estou bem. E é um prazer revê-lo, Senhor Sean Queise — respondeu Gyrimias Leferi.
— Por favor, Gyrimias! Chame-me de Sean.
— Boa noite, então, Sean — falou a Dra. Carminna Clemente se precipitando para frente de Gyrimias. — Sou Carminna.
Sean impactou. A morena que se apresentava tão solicita era realmente chamativa; provável balzaquiana, só sorriso, vindos de uma arcada dentária perfeita, que se projetava maior ainda no entusiasmo de vê-lo, conhecê-lo.
— Não sabia que a ilha tinha uma funcionária tão bonita — Sean percebeu Adriana e Nadir sentirem-se incomodadas pelo elogio. Ele prosseguiu ao alcançar a mesa, onde leu o nome da dama na placa, em frente a um dos pratos. — Doutora em quê, Carminna Clemente? —
— Sou PhD em assiriologia!
— Wow! — Sean ergueu o sobrolho. — O que uma assirióloga faz na equipe da Sala de Controle Ala Cinco?
— Vim auxiliá-lo Sean.
— Me auxiliar? — Sean depositou o olhar no General Arthur que olhou para o Major Henrique, que fixava um olhar profundo em Sean que percebeu estar sendo observado atentamente por ambos.
E Henrique não lhe era estranho.
“Poliu!”; soou por todo ele.
— E preciso ser auxiliado em assiriologia, por que Doutora? — Sean sorriu maravilhosamente bem. — Se todos sabem que estudo coisas sobre a Suméria, depois Assíria...
— E acha que sabe estudar algo por acaso? — atentou Adriana.
— Sei estudar história, Senhorita — Sean sorriu cínico outra vez com Carminna ainda em seu campo de visão. — Como, por exemplo, sobre os assírios serem famosos desde os tempos antigos pela crueldade e pelo talento guerreiro. E que ao contrário do que pensavam os arqueólogos inicialmente, os deuses egípcios derivam dos sumérios.
— Nossa! — Adriana era puro desprezo.
Sean sorriu de lado adorando saber que a perturbava. Mas só esperou o som das cadeiras no piso cessarem e continuou:
— Sei também que os assírios se destacaram pela habilidade na construção de grandes cidades e edifícios monumentais, como nos lembram das ruínas encontradas em Nínive, Assur e Nimrud — Sean voltou-se para a Dra. Carminna. —, e que os textos sumérios e acádios não deixam dúvidas de que o povo do antigo Oriente Médio, estava convencido que os deuses do céu e da terra eram capazes de se erguer da terra, e ascender até aos céus, assim como de vaguear à vontade pela atmosfera terrestre. O que nos leva a crer que eles sabiam voar.
E Sean provocou um mal estar ali.
— Voar como Senhor Sean Queise? — Gyrimias acordou.
— Talvez em UFOs? — e todos riram. — Voar como eu não sei Gyrimias, mas ao contrário das gravações planas ou baixos-relevos da época, Inanna está numa representação tridimensional, em tamanho natural, com seu traje de época.
— “Inanna”? — Adriana parecia mesmo perdida.
— Inanna, a deusa Suméria mais importante da antiga Mesopotâmia, adorada principalmente como a deusa do amor, da fertilidade e da guerra; na cabeça não usa nenhum chapéu da moda, mas um elmo especial em que Zecharia Stichin diz que está adaptado às orelhas, parecendo um objeto que faz lembrar os fones de um piloto — e um Oh! surgiu ali.
— Interessante Sean — Nadir buscava chamar sua atenção, a começar pela intimidade do chamado.
— Sim, Nadir, interessante. Em seu pescoço e na parte superior do tronco, Inanna usa um colar de muitas e pequenas pedras, e debaixo de uma blusa de tecido transparente, duas fitas paralelas percorrem o peito ligando-se atrás, e mantendo no lugar uma caixa de forma retangular que lembra um paraquedas ou um tubo de oxigênio, do tipo que astronautas usam quando caminham no espaço.
Outro ‘Oh!’, e Sean tentava desesperadamente ler pensamentos ali sem conseguir. Porque aquilo tudo significava Poliu, uma Poliu que preparava seus agentes para não serem invadidos, pelos mesmos psi que invadiam outros, e que não deixavam para trás suas formas-pensamento.
“Droga!”
— Contudo o que quer que a caixa possa ter no seu interior parece ser, com certeza pesada — Sean prosseguiu mesmo assim. —, uma vez que o dispositivo é ainda suportado por duas almofadas largas nos ombros. E isso tudo acrescido de um tubo que se liga à sua base por um fecho circular.
E Adriana gargalhou só parando com Arthur a fuzilando.
— Mas isso está exato mesmo Sr. Queise... — sorriu Carminna vendo aquilo.
— Me chame de Sean — foi o charme em pessoa.
— Exato Sean... — sorriu-lhe. — Uma das deidades Sumérias de nome Inanna, é descrita por Zecharia Stichin vagando pelos céus sobre várias terras, situados distante umas das outras, o que só seria possível voando, e que ela própria fala, numa outra ocasião, sobre seu voo — sorria Carminna a bela arcada dentária. — E sim, Zecharia Stichin diz que o paralelo entre os sete objetos requeridos por Inanna para suas jornadas aéreas, e o vestido e os objetos envergados pela estátua de Mari, que provavelmente estava na estátua mutilada, encontrada no templo de Ishtar, em Ashur, facilmente provado.
— Então Inanna voava? — questionou Noah.
— Inanna, em suas jornadas aéreas, usava um vestido, um ‘traje PALA’, que significava ‘veste de governante’, e na cabeça usava um elmo ‘SHU.GAR.RA’, que significava literalmente, ‘aquilo que faz andar longe pelo universo’.
— Um UFO Dra. Carminna?
— Se quiser pensar assim, Sr. Queise.
— Sean... — soou sensual.
Carminna gostou daquilo.
E outros Oh!, e conversas paralelas, e Adriana não queria saber daquilo, não queria saber de Carminna e seus conhecimentos. Ela, que até então tinha sido um peso morto ali, deveria continuar assim.
— O termo sumério é na verdade um exônimo, não? — prosseguiu Sean no charme, na sensualidade. — Os sumérios se chamam como sag-gi-ga ou ‘o povo de cabeças negras’, e chamavam sua terra de Ki-en-gi, ‘o lugar dos senhores civilizados’ — Sean sorriu para a assirióloga que retribuiu.
— Encantada pela sua memória, Sr. Queise — sorriu-lhe a Doutora.
— Me chame de Sean.
— Me chame de Carminna — e Carminna deixava transparecer seu interesse fazendo Adriana sentir-se realmente incomodada com a morena.
Aquilo despertou interesse em Sean que sentiu toda a confluência outra vez no ar, um monte de pensamentos que enfim, começavam a tomar forma. Porque considerando que toda e qualquer ação e todo e qualquer pensamento, fica registrado na memória vital do espírito e no éter-cósmico, podem-se caracterizar as formas-pensamento como concretizações de pensamentos, se depositando no éter-cósmico, podendo colar-se ao indivíduo estudado, causando-lhe até prejuízos psíquicos e físicos.
Um vinho tinto frisante foi servido, ele o tomou num gole já esticando a taça para ser cheia novamente. O ambiente parecia descontraio apesar de todos ali saber que não havia descontração no momento vivido.
— Os sumérios são na verdade algo incrível — Nadir sentiu necessidade de falar, e de chamar a atenção de Sean que se virou para ela. — Digo, acho incrível, os sumérios saberem sobre o Planeta Plutão descoberto somente em 1930, e ainda dizerem que na verdade ele não era um planeta e sim uma lua do Planeta Saturno que se desprendeu.
— Mais incrível ainda, Nadir, é em 1983 o IRAS - Satélite Astronômico Infravermelho, fotografar um grande objeto no espaço profundo e que provavelmente fazia parte de nosso Sistema Solar — o belo Noah sorriu-lhe e Nadir gostou. — Em 1987, a NASA anunciou que provável era o Planeta X dos sumérios.
— “Planeta X”? Fala do décimo planeta de Zecharia Sitchin, Dr. Noah? — perguntou Ítalo.
— Falo do décimo planeta dos sumérios, que segundo consta faz parte de nosso Sistema Solar, e que com uma órbita irregular se aproxima a cada 3600 anos trazendo morte e destruição — Noah olhou Sean que olhou Noah.
— “Morte e destruição”? — repetiu Henrique mecanicamente.
Todos se olharam.
— “E depois veio o dilúvio e após o dilúvio a realeza tornou a descer mais uma vez do céu” — falou Sean vendo todos lhe olharem. — É um escrito sumério cuneiforme.
— Sim — a voz de Carminna atingiu a todos. — O termo dilúvio vem de uma grande quantidade de chuvas capaz de inundar e devastar toda uma região. E é interessante encontrarmos o termo dilúvio em tantas mitologias, o que nos leva a observar se talvez não aconteceu algo que provocou um aumento da temperatura elevando a carga pluviométrica na época.
— “Aumento da temperatura” — escapou da boca de Adriana. — Não há evidências científicas que comprovem o caráter universal do dilúvio, Doutora — Adriana não parecia estar gostando de ela estar ali.
— Mas o dilúvio também é descrito em diversas fontes — respondeu Carminna imediatamente. — Há o dilúvio judaico no Gênese, há o dilúvio sumério no Gilgamesh, há o dilúvio hindu de Vishnu, há o dilúvio grego de Poseidon, há o dilúvio do povo Mapuche, há o dilúvio do povo da Ilha de Páscoa, há o dilúvio asteca, no manuscrito denominado como Codex borgia, há o dilúvio do povo Uro e também há o dilúvio na mitologia dos Incas onde Viracocha destruiu os gigantes com uma grande inundação e duas pessoas repovoaram a Terra, os Manco Capac e Mama Ocllo.
— “O homem está sempre disposto a negar aquilo que não compreende”; Luigi Pirandello — Sean foi outra vez o centro das atenções. — Ah... Também gosto das histórias de como a religião dos assírios em muitos pontos, comum à dos babilônios e sumerianos, era antropomórfica; todas as divindades tinham formas humanas e não de animais, mas estranhamente foram achadas estatuetas de forma que estão longe de ser humanas.
— Longe de ser humanas, Sean? — questionou Nadir outra vez gostando da voz dele.
Todos voltaram sua atenção à ele.
— Sim! Há uma estatueta Suméria representando um antigo matrimônio, Nadir, que se pudesse traduzir em palavras a imagem do noivo, diria que ele está ali forçado a se casar, visto que sua noiva é uma mistura clara de uma raça que está longe de ser humana — Sean falava olhando Carminna. — Seu rosto parece de um animal e como disse, sabemos que os sumérios não representavam seus deuses com formas de animais, repteis, anuros ou qualquer coisa assim do totemismo, então a noiva era um claro parentesco entre o clã e uma espécie animal ou vegetal — Sean monopolizava os olhares.
— Mas longe de ser humana quanto?
— Não sei dizer Nadir. Mas ela parecia ter um rosto de polvo.
— “Polvo”? — quase explodiu Adriana de tanto rir. Só parou na forma fria como que Sean a olhava. — ‘Polvo’ Sr. Queise?
— Era um rosto com tentáculos, Tenente-Coronel Adriana; e só sei dizer que o noivo casou-se com uma mulher polvo — sorriu cínico.
Todos acharam graça e Adriana havia instalado um clima tenso entre eles dois, em desacordo com o que o Arthur desejava para aquela noite.
Já Sean tinha algo maior na mente, porque passou a ter medo dele próprio, do que sonhava, do que via. Lembrou-se da casa dos sonhos, com a fuga da casa de retratos de seres com cara de polvos.
— Polvo humano como o Cthulhu de Lovecraft? — perguntou Henrique.
— Quem? — Nadir quis saber.
Mas foi Gyrimias quem se adiantou.
— Cthulhu é uma entidade cósmica criada pelo escritor de terror H. P. Lovecraft em 1926. A primeira aparição dessa entidade foi no conto The Call of Cthulhu, Senhorita Nadir.
— Há outras antiquíssimas estátuas com outros membros dessa estranha raça sugerindo que existiu mesmo, e houve miscigenação com os sumérios, já que uma delas está segurando uma ‘criança’ dotada de rosto de inseto, obviamente de origem não terrestre — Carminna pareceu não querer que o assunto morresse, sorrindo maravilhosamente para Sean que observava Henrique os observando.
Porque Henrique não estava gostando da forma como Carminna sorria para Sean.
— Mas ‘polvos’? — Nadir pareceu não se dar por vencida.
— Na verdade Nadir, os povos antigos, alguns sem e alguns com uma escrita não muito definida, se utilizavam de desenhos, imagens, situações do dia-a-dia para gerar informações, contar histórias, fabular. Provável houve algum acontecimento em que polvos estavam envolvidos, e os temendo, os transferiram para uma ordem de demônios ou coisa assim — Sean viu Henrique realmente incomodado, e que parecia passar longe de um ciúme qualquer pela bela Carminna. — Como Ezequiel, na Bíblia, por exemplo, que falava de Deus vindo num UFO ao Planeta Terra — e Sean podia contar quantos batimentos e quais corações os batiam perante o silêncio ali presente. —, e representava os homens que via lá dentro como ‘homens de quatro cabeças’, usando uma cabeça pertencente ao ser humano, outra cabeça de leão que era a representação do poder, outra cabeça como uma águia o único animal conhecido por ele que voava tão alto, e a quarta cabeça como a de um touro porque era a força motriz conhecida na época.
— É verdade... — a voz de Ítalo se perdeu.
— “UFO”? — já a voz de do Dr. Santos parecia ter soltado a língua do céu da boca.
— Algo de metal afogueado, que girava em torno de si próprio, com quatro asas, e pés como as solas de um bezerro; uma longa história... — Sean teve prazer em deixar o resto daquilo tudo no ar.
— Vejo realmente que gosta de histórias, Sean — sorriu Carminna. — Histórias, diria, conflitantes.
— Não... Não... Gosto mais das mulheres historiadoras.
Carminna caiu em sonora gargalhada e Sean encantou-se com a beleza balzaquiana dela.
A sala parou para olhá-los e Sean recuou.
— Há um pequeno busto, originário de um período mais tardio, que retrata uma criatura com feições um pouco mais humanizada, é verdade — piscou Carminna. —, mas sugerindo sim que ocorreu um cruzamento de espécies desconhecidas e misturadas aos humanos, dando assim origem a uma nova cultura.
Mais vinho circulou pela mesa. Sean sentia-se animado pela bebida e pela companhia. Arthur permaneceu de sobreaviso com ele.
— Disse ‘espécies desconhecidas e misturadas’, porque os sumérios contam que nós, seres humanos, somos obra de experiências genéticas alienígenas, não?
Arthur e Gyrimias acharam graça. Já Noah, Santos e Carminna começavam a conhecer Sean.
— Falando assim, Sean, percebo que não lhe disseram — a Dra. Carminna disparou.
— Não me disseram?
— Achei que lhe haviam dito sobre meu amigo indiano Noah Ravayad — Carminna apontou para o homem ruivo e bonito que se sentiu atingido agora. — Ele é um radioastrônomo, um amante da ufologia sumeriana — Carminna pareceu ter tido gosto em desafiar os olhares inquisidores de Adriana. —, porque se alguém pensou que a antiga Suméria e os Ufos não tinham nada em comum, estão completamente errados.
Gyrimias arregalou os olhos, e Sean temendo aquilo o mandou ficar quieto com um ‘Não fale!’ que chegou até ele como num pensamento.
E Gyrimias nada falou.
— Ufologia, você disse Carminna?
— Eu faço parte do SETI, Sr. Queise, que desde 1984, o SETI se dedica a monitorar sinais de rádio em busca de vida inteligente fora do Sistema Solar — foi o próprio Noah quem respondeu.
— Só falta apresentar os outros dois — Sean apontou para o gordo Dr. Ítalo e o baixinho Dr. Santos. —, como agentes da Poliu — gargalhou. —, interessados por ufologia, claro.
O Major Henrique Loyola não gostou da insinuação. Olhou profundamente o General Arthur que correu às apresentações.
— Sr. Queise, deixe-me apresentar o Dr. Santos Vasquez, radioastrônomo de Arecibo, em Porto Rico.
Sean o cumprimentou.
— É um prazer Sr. Queise.
— O prazer é todo meu. Tenho ouvido falar de seu trabalho pelas listas de ufologia que faço parte — Sean esperou o Dr. Santos falar algo que ele não falou. — Desculpe-me pela brincadeira sobre a Poliu.
— Ah! Não... Não foi nada.
Sean achava que tinha sido, e que ele a conhecia.
— Esse é o Dr. Ítalo Piieno — prosseguiu Arthur nas apresentações. — Foi ele quem idealizou o chip de Codinome: Cruzador Solar.
Sean o cumprimentou sem dessa vez não pedir desculpa pela brincadeira. Ele lia mentes e já conhecia fotos de Ítalo Piieno da Internet.
— É um prazer Sr. Queise.
— O prazer também é meu.
— Eu não acredito em alienígenas! — soou forte do outro lado da mesa.
Sean olhou para o interlocutor, e viu um homem quarentão, bonito, que ele sabia pertencer a Poliu.
— Acho que não fomos apresentados, fomos? — falou Sean sabendo quem ele era.
— Não se lembra de mim? — o belo Henrique sorriu-lhe gentil, estranhando aquilo. — Estou mesmo bastante grisalho, não? — esticou as mãos sobre os talheres a fim de ser cumprimentado. — Sou o Major Henrique Loyola, Sean! — sorriu.
“Sean?”, Sean percebia a intimidade como fora tratado.
— “Loyola”? — cumprimentou-o. — O cientista brasileiro que participou da construção do primeiro ônibus espacial experimental no MIT?
— Sim, sou eu mesmo aquele matemático de cabelos pretos que trabalhou no Instituto de Tecnologia de Massachusetts — sorriu-lhe gentil. — Está sempre bem informado, não é Sean?
— São os meus computadores que vivem recheados de informações, ‘Henrique’.
— Nossos computadores, Sean — sorriu.
— Não Henrique, meus computadores não são seus, são meus computadores — falava com ironia. — Alugo os mainframes.
Henrique ia retrucar quando Noah soltou um grunhido, algo parecido a um desdém.
— Quem nos dias de hoje, no meio científico, não acredita em alienígenas, Major Henrique? — Noah viu todos se olharem. — Até mesmo os sumérios tinham conhecimentos astronômicos incrivelmente avançados, e em suas observações obtinham cálculos do ciclo lunar que diferiam em apenas 0,4 segundos dos cálculos atuais.
Noah pareceu mesmo estar debochando de Henrique em meio aos olhares que voltaram a acontecer.
— Eu não disse que...
— Ah! Você é um debunker, Major Henrique! — Noah outra vez soltou aquele grunhido fazendo Henrique parar de falar.
— “Debunker”, Senhor? — Gyrimias esticou o olhar para todos e depois para Sean.
— Debunker é um termo usado na década de 20 para um desmistificador Gyrimias, intimamente associado a investigações céticas de temas controversos — Sean sorriu para Henrique que não gostou daquele sorriso. —, como criptologia, UFOs, teorias conspiratórias, ou a mais pseudocientífica de todas as ciências, a paranormalidade.
— Não sou um debunker — a voz de Henrique ficou rouca e rápida. — só não acredito em alienígenas inteligentes conversando conosco muito menos ensinando abrigos antiaéreos, livros sobre química, estudos aprofundados sobre o universo e seus corpos celestes, e cálculos matemáticos extremamente avançados para a época.
— Está equivocado Major Henrique. Isso não é mistificação, Zecharia Sitchin encontrou um raro cilindro de pedra num museu de Berlin Ocidental, com uma imagem de um deus dando um arado para a humanidade. O cilindro continha um detalhado mapa celeste, mostrando os planetas com o Sol no centro. No total, o mapa continha 12 planetas, porque incluía o Sol e a Lua. Então como os sumérios poderiam conhecer as informações acima em tempos tão remotos, se não tinham nem telescópios e nem satélites? Alienígenas, claro.
E Henrique riu no que Carminna acabou de falar.
— Minha cara, se os alienígenas estão mesmo chegando ao Planeta Terra, em bandos ou não, hoje ou ontem, é porque tem um interesse escuso.
“Em bandos?”; Sean não gostou do que ouviu.
— Nada ou quase nada foi averiguado... — pigarreou Ítalo.
— Porque nos esconderam. Porque nos escondem tudo — Noah se alterava, não se preocupando muito com a situação delicada.
— Ninguém esconde nada Dr. Noah! — Henrique se alterava para desgosto de Arthur.
— Pois a gravação feita entre a Apolo 11 e o Centro de Comando em Houston, enquanto o astronauta Collins permanecia no módulo lunar Columbia, orbitando a 110 km da superfície lunar, mostram os astronautas Aldrin e Armstrong recolhendo amostras de rochas — emendou o baixinho Dr. Santos. —, quando perceberam que não estavam sozinhos, sendo essa transmissão vetada ao meio de comunicação.
— O que sempre acaba vazando em listas de ufologia, não? — e foi a vez de Sean ver que o brasileiro Henrique se virou furioso para ele, vendo a intimidade indo embora. —, e que mais tarde um grupo de radioamadores, com equipamentos sofisticados, segundo eles, lhes permitiram interceptar o sinal e registrar o diálogo como ‘esses bebês são enormes’, ‘estou dizendo-lhes que aqui há outras naves espaciais’, ‘não temos mais filmes agora, temos apenas três tomadas de OVNIS ou o que sejam, mas podem ter velado o filme’ ou ‘estão pousados aqui e estão nos observando’.
— Acredita nisso Sean? — a voz de Carminna era um doce ali.
— Se realmente fomos à Lua — e Sean riu incomodando Noah também.
— Então você também não acredita Sr. Queise? — Noah inquiriu Sean.
E foi a vez de Henrique soltar um chiado que mais parecia um assovio:
— Talvez eu devesse mesmo dizer que se eles existem, devíamos temê-los.
— Temer por quê? — Sean olhou Henrique com interesse. — Colisteiros dizem que a maior prova de que existe vida inteligente no Universo é que eles ainda não entraram em contato conosco.
Agora a sala toda riu; menos Henrique e Noah.
— Pode ser Sean... — e a intimidade voltou no que Henrique retomou o equilíbrio. —, parafraseando Stephen Hawking, ‘só precisamos olhar para nós mesmos para ver como a vida inteligente pode se desenvolver e resultar em alguma coisa que não gostaríamos de encontrar’ — e Henrique viu que calou a sala. —, pelo que andamos nos tornando Sean, nessa mescla de armas e mortes, que quanto mais evoluídos pior ficamos.
— E por isso os alienígenas não nos quer conhecer?
— Pelo contrário Dra. Nadir — Henrique prosseguiu. —, porque percebemos que os alienígenas são nômades tentando conquistar e colonizar nosso planeta, porque acabaram de destruir os deles; e podemos ver, que o mundo devia se preparar para o fim — e encarou Sean.
— Para o fim? Wow! Para quem não acredita em alienígenas…
— Gosta de arroz Sr. Queise? — e o General Arthur interrompeu Sean.
— Gosto do que me oferecer General — prosseguiu Sean sem ainda tirar os olhos do Major Henrique e seu medo em invasões alienígenas.
— Estamos em pé de guerra, Sr. Queise? — o Major Henrique voltou a lhe lançar um olhar frio.
— O que aconteceu com o ‘Sean’? Deixamos de ser íntimos, outra vez ‘Henrique’? — devolveu-lhe.
Mas o Major Henrique riu nervosamente e o General Arthur deu a ordem para uma música ser tocada. Todos se olharam incomodados outra vez e Sean agora se lembrava de muita coisa sobre o Major Henrique Loyola; até muito mais do que dissera.
E o ambiente não se aliviou, Sean começou a desgostar daquilo, dele, de tudo o que ele falava. Havia algo embutido ali e ele não conseguia entender, ler.
“Espiões psíquicos!”; agora tinha certeza do porque não conseguir ler a mente de muitos ali, de Henrique Loyola.
Mas Sean acordou ao sentir a mão de Adriana em cima da dele, na mesa, exposta ao pai. Recuou as tirando antes mesmo de tentar entender tamanha atenção dela, quando de repente algo lhe espetou o braço, avermelhando rapidamente. Ele olhou em volta; o espaldar da cadeira, o anel na mão de Adriana, o broche do cinto do vestido que ela usava. Não conseguiu identificar onde havia se arranhado quando foi a vez da Dra. Carminna colocar sua mão em cima da dele; Sean realmente não entendeu o interesse de ambas.
Ficou até achando que ele era alguma espécie de disputa ali.
Talvez fosse.
— Eu soube que veio para trazer Spartacus para a Terra — proferiu o Dr. Ítalo.
— Soube? É mesmo? Enganou-se! — respondeu Sean friamente.
— Mas eu pensei...
— “Pensou”? — Sean o encarou.
O Dr. Ítalo se encolheu para seu tamanho e deformidade.
— Desculpe Sr. Queise, mas achei que soubesse do encontro deles — completou o Dr. Santos perdido no tiroteio.
— “Encontro deles”? — Sean também se sentiu perdido de repente lendo a mente de Gyrimias, sabendo que seu funcionário nada sabia então a Computer Co. estava fora de algo, talvez de uma diretriz da Poliu.
— Falaremos disso após o jantar, está bem Dr. Santos? Está bem, Sr. Queise? — correu Adriana, a comandar o assunto, outra vez.
Sean a encarou.
— Como queira, Senhorita — respondeu ele sem querer fazê-lo.
Mas Adriana estava no comando.
— Está bem para o Doutor também?
— Sim! — e o Dr. Santos mais nada falou.
O jantar se resumiu em talheres se chocando. Havia um silêncio incomodativo. O vinho frisante dançou pela mesa com fartura e uma carne quase assada foi servida com batatas.
— Afinal, teve o tufão? — lembrou-se Sean de perguntar.
— Ele passou muito longe da ilha, Sr. Queise — respondeu Nadir.
— Mas eles acham que um maior ainda possa aparecer — emendou Dra. Carminna.
Sean sorriu mais uma vez para a assirióloga com interesse. O General Arthur observava-o com interesse também, começava a conhecer Sean Queise.
— Há sempre tufões?
— Por que a pergunta? — Adriana se enervou com algo.
Sean não entendeu o nervoso dela.
— Uma pergunta como qualquer outra Senhorita Adriana.
— Tenente-Coronel Adriana! — corrigiu-o.
— Wow! Desculpe-me Tenente-Coronel Adriana.
Outro silêncio incomodativo.
— Uma sobremesa, Sr. Queise? — perguntou Arthur após mandar que os pratos fossem retirados, vendo que Adriana não alcançava a química com ele.
Daquilo Sean teve medo, ele havia ouvido os pensamentos de ambos no corredor.
— Não, obrigado General. Um café, talvez — e se levantou sentindo a sala pesar sobre ele outra vez. — Um de verdade, pelo amor de Deus — riu baixinho, sentindo-se embebedado. Esperou o Dr. Ítalo sentar-se no sofá e foi atrás dele. — Como funciona o chip?
— Na verdade, sua existência remonta a... — ia explicar o Dr. Ítalo quando se alertou com Adriana se aproximando deles. — E não é um chip exatamente... — e parou outra vez.
Adriana havia se colocado entre os dois, os obrigando a se afastarem, no que todo o perfume de rosas brancas usado pela Tenente-Coronel Adriana invadiu Sean Queise, sua camiseta, a jaqueta grossa e pesada que tirou pelo calor provocado pelo vinho, pela proximidade dela, mostrando a camiseta que colava em músculos definidos.
Todos se sentaram nos sofás.
— Como foi a viagem, Gyrimias? — perguntou Sean para o cientista da Computer Co., ainda incomodado com o corpo de Adriana colado ao dele no sofá, e mais nervoso ainda por ela ter interrompido o Dr. Ítalo.
— Foi uma boa viagem, Senhor! — respondeu Gyrimias. — Desculpe insistir, mas vamos ter que trazer Spartacus, Senhor?
— Gostaria de não precisar ver Spartacus voltar, Gyrimias.
— Não é um caso de precisar ou não, Sr. Queise — Adriana se intrometeu. — A ordem já foi dada!
— Por quem? — falou Sean se levantando.
— Sr. Queise... — Adriana ia tocá-lo, fazer-lhe sentar novamente.
— Me larga! — foi frio.
Adriana não gostou e Carminna viu algo estranho com a Tenente-coronel; mulheres se decifravam.
— Acalme-se Sr. Queise! — falou o Major Henrique.
— A Poliu não se mete! — respondeu descontrolado.
Todos se olharam, e um mal estar voltou à sala naquele momento.
— Não sou da Poliu! — respondeu o Major Henrique em resposta.
— É! — Sean disparou outra vez.
— O Sr. Queise está se excedendo! — Adriana também se levantou.
— Estou o quê?
— Acalmem-se Senhores... — tentava o Dr. Santos se encontrar na situação.
— Sinto Sr. Queise, a ordem já chegou! — Adriana mantinha o controle. — Amanhã de manhã Oscar Roldman assina a petição! Spartacus retorna mesmo!
Sean fuzilou a Tenente-Coronel Adriana no que ela terminou de pronunciar todas aquelas exclamações. Saiu da sala num rompante de fúria, batendo a porta numa velocidade só. E o maior choque talvez tenha ficado por conta que Sean não tocou na maçaneta para abri-la, nem na porta que se fechou sozinha. Correu sem nem mesmo saber ao certo para onde, descendo alguns andares, nem contando quantos, adentrando num corredor com algumas salas trancadas, impedindo sua entrada.
“Sr. Queise?!” gritava Adriana de longe ao segui-lo.
— Droga! — Sean esbravejava perdido.
Olhou para trás tonto pelo vinho frisante e recomeçou a correr. Algo que lhe fez lembrar a casa de seus sonhos, do mármore extremante branco e reverberante, das paredes caiadas, dos quadros assustadores de gente polvo, da sensação de fuga, e de que fugia talvez de uma realidade que não queria enfrentar.
“Sr. Queise? Onde está?” falava Adriana cada vez mais longe.
Uma tênue linha de suor surgiu, Sean não soube onde Adriana estava, nem sabia onde ele próprio poderia estar.
— Droga! — Sean desceu de escada mais andares, entrava e saía de corredores do grande Complexo A.
“Sr. Queise?”, se ouvia agora muito longe.
Sean não sabia em qual dos sete andares estava, desceu as escadas outra vez, lembrando-se que subira dois andares a partir do seu andar para chegar à área reservada do General Arthur e sua equipe. Chegou ao térreo e percebeu ainda de longe uma secretária na recepção da entrada. Recuou percebendo ter errado seu quarto-sala.
O elevador da esquerda estava desligado no andar térreo e os outros dois elevadores estavam no 7º andar. Sean viu uma porta de aço mais à frente, e avançou outro jogo de escadas.
Paredes pintadas de amarelo faziam um caminho em linha reta, seguiu-se uma rampa que ele desceu, avançando o que imaginou serem quase três andares abaixo da terra.
Câmeras de circuito fechado se viravam em sua direção, a cada passo dado.
Ele as notou uma após a outra.
Sean era vigiado sem, porém ser brecado. O recado fora entendido; queria que ele continuasse, ele o fez.
Um novo corredor se fez, logo após o corredor se bifurcou e carrinhos de locomoção estavam estacionados, as chaves deliberadamente na ignição. Ligou um deles e o dirigiu pelo corredor de número 2. Era extenso, frio e úmido, provocando a sensação de estar numa nova descida. Sean sentiu sua pressão cair aos poucos, ao descer o nível do mar.
Quatro homens fortemente armados o esperavam. Nada foi dito, não precisava. Os reconheceu como os oficiais de segurança que lhe mostraram seu quarto-sala na sua chegada. Sean desceu do carrinho e os acompanhou, sendo levado para uma nova porta envidraçada. Lá, mais dois oficiais de segurança impecavelmente uniformizados, enfiaram uma chave na reentrância ao mesmo tempo. O oficial de segurança do seu lado direito digitou oito números. Sean os guardou na memória. Depois esticaram as palmas de suas mãos, e a luz do scanner leu cada linha.
Seguiu-se a leitura da íris no globo ocular.
“Aqui tem que ser dois?”, pensou Sean quando uma porta de aço se abriu, correndo para dentro da parede.
— Entre! — falou um dos oficiais de segurança.
— Aonde vou?
— Entre! — voltou a insistir.
Sem alternativas, Sean ouviu as portas se fecharem atrás dele. Ficou estático num pequeno e apertado corredor.
— Ahhh! — um jato de ar comprimido o tomara de supetão.
Outra porta se abriu e ele entrou. Roupas de descontaminação estavam à sua disposição. Sean vestiu uma delas e levou algum tempo para saber como fazê-lo. Percebeu que eram presas por longos canos de ar comprimido por onde alimentava o ocupante da roupa com oxigênio, que por sua vez eram presos a tubos de aço pintado em uma tonalidade verde, brilhante, cheia de números escritos.
Uma nova porta voltou a se abrir e fechar. E quando a última porta se abriu, um espaço claro machucou sua vista.
— Boa noite, Sean querido!
Sean tentou fixar o olhar e seus olhos azuis delinearam a esguia figura do homem nórdico à frente dele, dentro da roupa de descontaminação.
— Oscar? — Sean Queise não acreditou.
4
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo B; laboratórios.
17 de agosto; 05h55min.
A manhã estava nublada, Sean nem percebera que chovera a madrugada toda. Estivera trancado no imenso laboratório subterrâneo nível 4, no Complexo A, esperando conversar a sós com Oscar, que não imaginava ter chegado.
— Por que não senti sua presença na ilha?
Oscar sorriu apenas.
“Droga!” Sean sabia que ele tinha dons, que podia bloqueá-lo, provável também podia lê-lo.
Oscar Roldman era mesmo esguio em sua magnificência, parecia mais alto do que era dentro daquela roupa de descontaminação. Os óculos de grossas lentes se embaçavam uma vez ou outra, enquanto respirava dentro do capacete.
Oscar continuava um homem bonito.
— O General Arthur sabe que você está aqui? — questionou Sean.
— Sim — respondeu enfim.
Oscar lia alguns apontamentos entregues em suas mãos por um oficial de carreira.
— A filha do General Arthur também sabe? — falava pelo intercomunicador da roupa de descontaminação.
— Todos sabem!
— Só o idiota aqui é que ia saber no café da manhã? — Sean não precisava de dons para saber que ele não ia responder. — Droga! Estava me esperando não?
— Não! Não imaginava que ia se alterar tanto num jantar entre amigos — Oscar Roldman parou para ver a careta que certamente Sean estava fazendo.
Sean olhou para os lados e todos o observavam. Depois ficou a observar Oscar melhor, percebendo que o velho conhecido da família aos poucos se entregava aos deveres da idade.
Oscar Roldman era de origem nórdica, um poliglota. Homem inteligente havia chegado ao comando da Polícia Mundial, comando que lhe custou o amor de Nelma Queise, que após um tumultuado casamento, rompera com Fernando Queise e se envolvera com Oscar Roldman. Mas o grande empresário dos computadores, Fernando Queise, não deixou computar por muito tempo aquela perda. Num insistente pedido de perdão, levou Nelma novamente para o seu lado; junto foi uma criança no ventre.
E talvez por isso, Oscar viajasse ao Brasil numa frequência assustadora, tão assustadora quanto era saber que o motivo das viagens era ele; ilegítimo, bastardo como Mr. Trevellis gostava de atingi-lo.
E o atingia por causa de Spartacus, que Mr. Trevellis nunca aceitou estar sob o comando e controle dos mainframes da Computer Co., dos cientistas dela, de Sean, um ‘moleque hacker’, com poderes nada normais em relação as máquinas, em relação a qualquer coisa, sabendo, acessando todos os grandes segredos da corporação de inteligência, como a vinda de alienígenas ao Planeta Terra, acobertado, financiado provável por ela, a Poliu e seus espiões psíquicos espalhados pelo mundo, preparados para se comunicar com outros sóis.
— Por que o nível 4? Há presença de microrganismos de alto risco letal aqui?
— Não!
— O que há Oscar? Roupas com filtros de ar especial, portas duplas e automáticas e todo esse processo de descontaminação.
— Não faça perguntas Sean querido. Só deixei você chegar até aqui porque estava perdido.
Agora Sean riu debochadamente.
— Sabe que não me perdi.
— Cuidado! Aqui tudo tem seus quinze minutos de fama.
Sean olhou em volta e outra vez se viu o centro das atenções.
“Droga!” soava insistente.
Oscar então se dirigiu até a saída.
— Vamos conversar lá fora — falou Oscar de dentro do capacete.
— Não sei se quero conversar, Oscar. Não sei se quero estar aqui, com essa gente — e apontou o salão. — O que são esses laboratórios aqui embaixo?
— Não reconhece seus mainframes, Sean querido?
Sean arregalou os olhos azuis, pensando se talvez não lhe tivessem tirado o chão de seus pés. E não era nada metafórico.
— Não sei do que está falando. Nunca projetei nada desse tipo... — e Sean foi empurrado por Oscar para dentro do corredor de despressurização. — O que é tudo isso?
— Um cérebro artificial. A maior loucura que a ciência imaginou.
— Achei que a ciência não tivesse limites em se tratando da Poliu...
— Agora não Sean! — e Oscar cortou-lhe o fim da frase.
Complexo A; setor de gerenciamento.
17 de agosto; 08h01min.
Os dois atravessaram as quase intermináveis antecâmaras para ir embora dali.
Ambos chegaram ao segundo andar do Complexo A.
— Pode entrar! — falou alguém por detrás da porta da sala em que Oscar bateu.
— General Arthur La Hera! — Oscar Roldman esticou a mão para cumprimentá-lo.
— Sr. Oscar Roldman. Mas que... — e Arthur arregalou os olhos ao ver Sean entrar na sala logo atrás de Oscar, imaginando o quanto ele já contaminara Oscar Roldman. — Ah! Vejo que já se encontraram. Sente-se também, Sr. Queise.
— Nós nos encontramos no laboratório — falou Oscar dando a deixa para o General Arthur.
— Mas que droga está acontecendo aqui, afinal? — explodiu Sean nervoso. — Estão me escondendo alguma coisa ou o quê?
— Acalme-se Sr. Queise. Não precisa se alterar — tentou o General Arthur. — Acho que devemos mesmo uma explicação se nós vamos trabalhar em equipe.
— “Vamos”? — perguntou com ironia.
— Spartacus se chocou com um... — e Arthur parou.
— Do choque eu já sei! — falou Sean impaciente.
— Os computadores de Spartacus informam que ele se chocou com uma tectita; um micro meteoroide.
— O computador de bordo do satélite de observação mostra que ele tem um buraco de quase sete milímetros de diâmetro num dos painéis espelhados que fornecem energia. Foi mesmo muita sorte não termos que ir ao espaço trocar a asa inteira — Sean olhou Oscar de lado. — Achei que Spartacus, tinha instalado painéis de proteção contra impactos de lixo espacial e micro meteoroide.
— E tem Sean querido. Spartacus tem instalado o que chamamos de ‘Detector de fragmentos espaciais’. Seu pai incluiu isso.
— ‘Meu pai’? Meu pai não teve acesso a construção de Spartacus — encarou Oscar que nada falou e Sean respirou pesado antecedendo uma enxaqueca. — Teve? — e Oscar continuava quieto. — Droga! — Sean afundou na poltrona. — O que mais meu pai fez?
E Oscar teve realmente de responder àquela pergunta.
— A Computer Co. incluiu alguns novos equipamentos ao longo dos anos.
— Como assim ‘ao longo dos anos’? Por que eu nunca tive acesso a esses ‘novos equipamentos’?
— Acalme-se Sr. Queise!
— Não me mande acalmar, General.
— Sean...
— Nada de ‘Sean’ Oscar. Eu... — e algo o brecou. —, a Computer Co. instalou um painel de proteção constituído por quatro condensadores que armazenam energia elétrica. Cada condensador consiste em dois terminais ligados a duas placas separadas por um dielétrico, um tipo especial de material isolante, que não conduz a eletricidade — e continuou a encarar Oscar. — E fui eu quem escreveu o programa para que Spartacus detectasse fragmentos espaciais.
Mas Oscar desviou-se do olhar dele. Sabia que Sean tentava lê-lo, com receios, porém.
— Nossos especialistas dizem que quando um micro meteoroide se choca com o detector, ele provoca uma perda do poder isolante do dielétrico, e o condensador perde toda a sua energia elétrica — Arthur tentava manter-se ali.
— Seus especialistas? — voltou Sean a ironizar.
— O tamanho do micro meteoroide é então calculado, medindo a quantidade de corrente necessária para recarregar o condensador; quanto mais corrente, maior o micro meteoroide.
— O que por si só é estranho, General — falou Sean agora a observar Arthur atentamente. — Meteoro vira meteorito quando alcança o solo, e tectita também é rocha transformada, então se alguma tectita se chocou com Spartacus no espaço, é porque algum pedaço de meteoro entrou em alguma órbita e saiu dela depois.
— Que órbita, Sr. Queise?
Sean não soube responder ao General Arthur. E não gostava de ficar sem responder, sem saber responder, porque também não podia responder como instalaram algo em Spartacus sem ele saber.
E porque ele podia saber.
— A Sala de Controle Ala Cinco está averiguando outra informação que nos chegou antes de sua entrada nos dados do satélite de observação para consertá-lo — foi a vez de Oscar. — Spartacus arquivou uma intensidade de luz fora do comum, Sean querido.
E Sean odiava aquela maneira dele chamá-lo, da maneira que o deixava pequeno, infantil, um moleque controlado por Fernando, Nelma, Oscar e Mr. Trevellis; o ‘quarteto fantástico’.
— Comunicaram isso à imprensa ou mentiram num relatório?
— Não é o caso de mentir; apenas omitir — respondeu Oscar rapidamente àquela insinuação.
— Ah! ‘Omitir’? — Sean riu. — Nem Nietzsche acreditaria nisso.
— A Poliu decidiu que uma minoria muito restrita saberia.
Sean balançou a cabeça, ficou confuso.
— A “Poliu”? O que tem a Poliu haver com isso? Aqui ninguém é da Poliu, não? Não me dizem isso desde quando cheguei?
— Sean... — tentava Oscar em vão acalmar-lhe os ânimos.
— O choque foi... — mas os ânimos de Sean se exaltavam. — O choque foi... — Sean balançou a cabeça, nervoso. — Não compreendo Oscar. Quando o satélite de sensoriamento remoto da ESA estava no espaço ele teve um aviso, e foi manobrado para não se chocar com uma aeronave russa desativada. Spartacus tem o mesmo sistema de giro e defesa — argumentou.
— E por que não girou? — questionou Oscar.
— Eu... Eu não sei por que não funcionou — falou Sean confuso.
— Não se culpe Sr. Queise.
— Me culpar? Não estou me culpando de nada. Sou o melhor! — e Sean viu Arthur olhar Oscar que olhou Arthur. — Apesar de Spartacus ser geossíncrono ou geoestacionário, e obrigado a se manter a uma distância de 35.786 km da Terra onde a força centrífuga e a força centrípeta do planeta se anulam. O satélite sofre perturbações orbitais tanto gravitacionais como as atrações da Lua e do Sol, como as forças não inerciais, tanto a pressão da radiação solar quanto as irregularidades do campo gravitacional terrestre, que obrigam que a posição seja periodicamente corrigida, através de giros e manobras orbitais.
— E por que não girou? — questionou Oscar novamente.
E Sean calou-se.
— Talvez porque o micro meteoroide o tivesse pegado de surpresa, Sr. Queise?
— Monitora o lixo espacial acumulado há mais de quarenta anos, General, e não percebem tectitas quando se aproximam?
— É sobre isso que estamos tentando falar Sr. Queise. Em pelo menos três missões espaciais os ônibus espaciais experimentais foram manobrados, e isso graças ao rastreamento feito por uma rede de telescópios óticos e radares de superfície. E até agora nada foi rastreado próximo ao satélite de observação Spartacus.
— Nada foi rastreado porque não existem tectitas no espaço — Sean perdia a paciência com o General Arthur. — Só quando a rocha entra na órbita de algum planeta, aquece e vira tectita. Falo grego ou alienígena?
— Não sei que língua fala, nem porque falaria língua alienígena, Sr. Queise, mas algo não funcionou direito.
— Wow! Agora vão dizer que os computadores de Spartacus não funcionaram — Sean dirigia um olhar direto a Oscar Roldman, já que o General Arthur não lhe dava o devido valor; e ele era o melhor.
— Algo aconteceu lá em cima, Sean... Precisamos saber o que foi...
Aquilo alertou Sean, Oscar falava em entrelinhas.
— Tudo o que as câmeras de Spartacus veem o chip de Codinome: Cruzador Solar também vê e grava em sua memória — explicava o General Arthur La Hera para um Sean Queise que tentava desesperadamente decifrar os pensamentos de um Oscar Roldman que já não ligava de ser decifrado.
Sean recuou com medo, ele era seu pai.
“Droga!” ficou em pensamentos.
— Por isso é tão importante para nós sabermos o que o chip gravou — a voz de Arthur acordou Sean Queise.
— E o chip pode gravar algo na memória e enviar tal informação sem estar conectado a algo? — questionou com ironia. — Disse que se Spartacus perdesse alguma informação o chip gravaria? Como?
— Eles estão conectados entre si, através de uma pequena porta serial, numa área baixa da segunda asa direita onde se fixam as placas de iluminação solar.
— Porta serial na placa solar? Uma RS-232 na placa de Spartacus? Mas… — e Sean teve medo de continuar. —, os sistemas novos aboliram a porta serial completamente, colocando em seu lugar conexões USB — e encarou Oscar calado. — Isso porque meu pai, que não teve acesso a construção de Spartacus, teve acesso às placas de energia? As placas que a Poliu culpou Sandy de roubar informações? — e o silêncio. — Droga Oscar! Eu não projetei uma porta serial no seu satélite de observação, projetei? — ele viu Oscar responder com um profundo olhar para o General Arthur que devolveu o olhar para Oscar. — Droga! A Computer Co. projetou uma porta na placa de energia solar que Sandy foi culpada de roubar?
Sean se sentiu tocando em terreno instável. Sandy Monroe era dor em suas lembranças, em seu coração dilacerado pelo suicídio dela; de Sandy Monroe, sua noiva.
— Não quero falar sobre Sandy, Sean querido.
— Não sou seu querido.
Oscar ergueu os olhos dos óculos de lentes grossas, quis argumentar, mas a presença de Arthur ali não era propícia.
“Droga!” explodiu por todo ele, provocando azia.
Sean se contorceu de dor e Oscar nada disse.
Ele prosseguiu mesmo assim.
— Qual foi a última voltagem do chip?
Arthur ficou momentaneamente perdido.
— Não entendi Sr. Queise?
— A tensão nos pinos do conector da porta serial pode estar em dois estados General; ligada ou desligada, ou seja, valor binário 1 para ‘ligado’ porque o pino está transmitindo um sinal entre -3 e -25 volts, e valor binário 0 para ‘desligado’, quando o pino está transmitindo um sinal entre +3 e +25 volts.
— Desligado, é óbvio.
— Nada me parece óbvio General. Disse ontem que o chip havia se comunicado?
E Arthur ficou perdido outra vez.
— Não… É que no espaço também testávamos seus materiais físicos, deformidades pelo impacto, condições da falta de oxigênio, despressurização, enfim, todos os testes viáveis para avaliá-lo antes de ser colocado num cérebro humano — o General Arthur falou numa velocidade só e só teve tempo de ver Sean arregalar os olhos azuis. — Cruzador Solar é um chip de memória interativa que vem sendo estudado há quase sessenta anos...
— “Sessenta anos”? — Sean cortou a fala do General que começava a perder a paciência. — Meu pai não tem sessenta anos.
— Sr. Queise! — exclamou Arthur agora com força, perdendo realmente a paciência. — O chip de Codinome: Cruzador Solar será implantado num cérebro humano para comandar os computadores com a vontade de sua mente e isso...
— Deixe de baboseira, General! — e Sean voltou a falar com Oscar tirando a autoridade de Arthur. — Há chips em cérebros há muito tempo, há chips que estão fazendo o homem tetraplégico voltar a andar, a chips controlando computadores, e há chips que nos seguem por satélites de observação — Oscar virou-se sabendo que Sean não lia sua mente, que ele chegava naquilo por outro motivo. — Não é Oscar?
— Do que ele está falando? — Arthur inquiriu Oscar Roldman perante o jogo de entrelinhas, mas nenhum deles deu-lhe ouvidos. — Sr. Queise! — Arthur dessa vez se alterou. — Fale comigo apenas! Sou eu quem está no comando de...
E Oscar voltou a olhar Arthur sabendo que Arthur jamais teria Sean ao seu comando, e que explodiu.
— Quer realmente saber de uma coisa, Oscar?! — alterou a voz. — Eu estou muito cansado de tudo isso, de toda essa parafernália, de toda essa droga. Cansado de ter trabalhado tanto, de ter perdido minha adolescência — e se levantou.
— Sean…
— Não Oscar! E só espero realmente, que ninguém toque um dedo nos meus funcionários, nem nos meus mainframes — e a porta se abriu.
— Não saia Sr. Queise. Spartacus vai ter que retornar... — e Arthur viu Sean sair e fechar a porta. Ele olhou Oscar sentindo o coração explodir na garganta. — Ele vai voltar não Oscar? Alguma coisa importante se chocou com o satélite e o chip memorizou — voltou o General a falar.
E a porta da sala se abriu novamente.
— O que está importando afinal? A integridade física do chip de sessenta anos ou o objeto que se chocou com ele?
Agora Oscar sabia que Sean sabia de algo, porque ele não poderia ter escutado por entre as paredes duplas, porque a mente de Arthur talvez não fosse tão preparada para bloquear espiões psíquicos; não um Roldman.
— Não sabíamos até então se o chip Cruzador Solar iria funcionar, mas funcionou para um chip a base de DNA.
— “DNA”? — Sean ficou extasiado, voltando a se sentar. — Quero dizer... Imaginei que no futuro alguma cooperação entre esses dois recursos seria viável, se pensarmos que o DNA pode ser representado por um banco de dados, ainda que complexo e grande, mas daí ser possível...
— O chip conversou com a tectita e está tudo arquivado digitalmente em seus componentes, Sr. Queise.
E houve um silêncio ali. Porque Sean não conseguiu formular perguntas.
— Está querendo me dizer que um chip feito de DNA ‘conversou’ com uma tectita?
E a porta foi aberta num rompante, com a Tenente-Coronel Adriana adentrando a sala. Sean nem precisou abrir a boca, todo seu perfume de rosas brancas o perturbava profundamente.
— Por favor, Tenente-Coronel Adriana! Estamos em reunião particular! — Arthur chamou-lhe a atenção.
— Desculpe a minha entrada repentina, General Arthur — respondeu a seu superior. —, mas o XSLC já está com o nosso ônibus espacial experimental preparado.
Sean olhou Arthur profundamente, olhou para Oscar profundamente, olhou para Adriana profundamente, que abaixou a cabeça, agora vestindo um uniforme de corte impecável, de saia abaixo dos joelhos e nenhum único botão aberto para mostrar os seios fartos dela.
— XSLC? O Centro de Lançamentos de Satélites de Xichang? Enlouqueceram? Não podem tocar no satélite de observação ativado. Vão ter que desligá-lo primeiro ou todos os dados já arquivados serão destruídos. E isso realmente é pior do que trazê-lo de volta, não?
— Sean... Dois pilotos irão até Spartacus tentar resgatar o chip. É a única chance que temos de não destruir o satélite de observação.
— Mas se o satélite de observação não for desligado corretamente... Droga! Se os computadores estiverem ligados quando tocarem nele... Sabe que qualquer interferência magnética do Sol, fora das coordenadas já vem provocando distúrbio... Oscar por favor... — Sean colocou as mãos parecendo sentir que a cabeça ia explodir. — Se o Sol alterar as linhas de comando... Droga! Droga! Você sabe o quanto venho lutando contra com os neutrinos!
— Sinto!
— Sente?! — gritou. — Besteira!
— Acalme-se ou teremos que contê-lo a força, Sr. Queise! — proferiu o General para Sean com Adriana ainda na porta.
— Tenta! — provocou Sean. — Tenta mesmo, General! — e voltou a encarar Oscar. — Se Spartacus for danificado é o fim, Oscar. Não espere mais nada de mim.
— Sabe que não é assim que funciona.
— Não é assim o quê? Que espécie de dívida tenho com você? Ou será que é meu pai quem tem dívidas com você, ‘Oscar querido’?
— Não se atreva Sean! — e Oscar levantou-se violentamente.
Saiu deixando Sean perdendo a chance de salvar cinco anos de pesquisas da Computer Co..
Jardim dos complexos.
17 de agosto; 10h01min.
O tempo se fechava novamente, ventava muito. Ambos chegaram ao lado de fora do Complexo A, afundando na relva molhada. Porque Sean havia ido atrás de Oscar pelos corredores, elevador, por onde ele fosse.
— Acha que Spartacus registrou algo fora do comum?
Oscar parou de andar e o vento deixava seus cabelos em desalinho
— Algo do tipo?
— Do tipo que enfim comprovaríamos que há vida noutros planetas, luas, sóis? Não digo visitas esporádicas de alienígenas de um lugar distante ou alienígenas escondidos nas entranhas de uma Terra oca, digo um planeta inteiro, com espécies minerais, vegetais, animais, outros de nós?
— A Poliu tem tantas informações arquivadas Sean querido, que também fico imaginando o que já não se misturou, o quanto de contaminação de informações ela possui realmente.
— E que tipo de contaminação de informações arquivadas, a Poliu tem?
— Contaminação após tantos anos, tantos envolvimentos, mitos... — e Oscar voltou a andar se dirigindo para outro complexo.
Sean ficou lá parado, com ideias pulando na cabeça dele, porque sabia que havia algo nas entrelinhas e que Oscar o conhecia, que ele se informava a seu respeito, de suas atitudes com Spartacus, da sua busca desenfreada para atingir Mr. Trevellis, a Poliu, e seus segredos sobre a vinda de alienígenas ao Planeta Terra.
Sean voltou a andar atrás dele, tentando preencher as lacunas sem entrar na mente dele, porque temia talvez as verdades lá depositadas.
— “Aqui, os homens do Planeta Terra pisaram pela primeira vez na Lua. Viemos em missão de paz, em nome da humanidade” — Sean viu Oscar para de andar novamente e lhe olhar. —, missão Apollo 11.
— Por que isso Sean?
— Para saber para quem as palavras do astronauta Buzz Aldrin foram dirigidas.
— Eu perguntei por que isso, Sean, por que essa busca? O que quer encontrar?
— Respostas.
— Sobre o que?
— Quem somos?
— E quem acha que somos?
E o vácuo. Porque Sean teve medo de completar aquilo.
Oscar voltou a andar e Sean ir atrás dele.
— Ufólogos dizem que numa transcrição de Neil Armstrong, Edwin Aldrin e Michael Collins, eles disseram que observaram um UFO. Um relato o qual ninguém nunca propôs algum outro tipo de explicação. Provável por pressão da Poliu.
Oscar realmente parou de andar. E realmente não gostou de ouvir aquilo.
— Aonde quer chegar com a Poliu?
— Eu? Chegar? Não acha estranho que depois de tantos avistamentos e quedas de UFOs, e resgates de corpos, e autópsias secretas ficamos mais espertos?
— “Espertos”?
— Veja a queda de um UFO em Roswell, e outro, dias antes em Socorro. Mentira? Ficção? Confusão mental? Ou Teoria de Conspiração? — Sean viu Oscar paralisado, pregado ao piso do jardim da paradisíaca ilha secreta da Indonésia afundando na relava úmida, ambos, com os coqueiros se inclinado de um lado a outro. — Não é de se admirar que tudo começou ali, não Oscar? Depois da ‘queda’ de 1947 milhares de progressos científicos na área da eletrônica, como os transistores, mecânica e por que não a espacial? Os russos lançaram em 1957 o Sputnik, em 1969 os americanos foram a Lua. Será que a queda do UFO nos ativou? Nos fez ficar mais inteligentes? — os olhos arqueavam nervosos. — Ou será ainda que absorvemos mais que ficção científica no mês de junho de 1947, Oscar querido?
— Não devia falar essas coisas...
— Coisas como, ‘nós terráqueos proliferarmos aqui e não em outros mundos’? Outras dimensões? Outros universos?
— Acredito que algum tipo de vida deva existir lá fora, é claro, mas nada como nós — tentou Oscar Roldman outra vez. — Existem muitos casos inexplicáveis na história.
— Como as pirâmides? Os UFO-nazis? O caso Varginha? Ou os sumérios, por exemplo?
— Lá vem você com suas teorias conspiratórias... — continuou indo embora.
— Você é um deles? — riu. — Um debunker? — e Sean viu Oscar andar mais rápido. — Não tem medo, Oscar? — Sean o seguia nervoso. — Medo de que estejam escondendo coisas de você?
— Você não... — o estômago de Oscar ardeu, mas ele não cedeu. — Você não invadiu... — e parou de andar.
— Invadi o que? Os computadores da Poliu na China ou a mente daquelas pessoas durante o jantar?
“Daquelas pessoas” soou como um aviso a Oscar que imaginou Sean, na noite anterior, se alimentando mais do que Arthur e sua filha Adriana serviram no jantar.
— Oh! Sean! O que você fez?
— Formas-pensamento!
— Formas… Meu Deus Sean… Quantas vezes já fez isso?
— Fiz o que?
— Não brinque comigo Sean. Sabe que a autoscopia projetiva ou aparecer para si mesmo, observando-se projetado é uma forma-pensamento.
— Não uso fenômenos projeciológicos para alcançar as formas. Elas se moldam e eu as vejo, simplesmente.
— Você… Você…
— Não me tenho bilocado se quer saber.
— Você me mete medo.
— “Medo”? Pois medo hobbesiano, tenho eu das coisas estranhas que nos rodeiam. Estranhas, como um grupo de ufologistas terem recebido na lista de e-mail, através de um colisteiro de apelido ‘Fim do mundo’, fotos de anomalias solares.
— “Fotos de anomalias solares”? — Oscar percebeu o silêncio dele.
— A Poliu tem em seu banco de dados confidenciais, uma pasta intitulada ‘Fim do mundo’, o mesmo nome que o colisteiro usa na lista de e-mails. E essa pasta foi criada em junho de 1947 — Sean viu que Oscar voltou a caminhar com dificuldades, sem nada falar. — Acredita em coincidência, Oscar? Eu não! — e Sean viu que Oscar que dessa vez não parou de andar.
“Droga!” Sean odiou-se por não conseguir ter Oscar ao seu lado, aceitando sua forma de pensar, agir.
— Ou acreditaria que é coincidência a Poliu ter uma pasta sobre um estudante de geologia russo, que descobriu tectitas no Deserto de Karakum, República do Turcomenistão, em 1975? — falava Sean, extasiado. — Anomalias no Sol, Spartacus atingido por tectita e Cruzadores Solares do espaço profundo... — e Sean sabia que Oscar não ia parar, que ele estava acelerando o passo, fugindo. — O que faz uma assirióloga aqui para ‘me auxiliar’?
— Diga-me você!
— Não! Diga-me você o porquê de Spartacus fotografar o Sol antes do contato com a tectita, se o satélite SOHO da NASA passa esses tipos de informações à comunidade científica?
— Chega Sean...
— Ou diga-me então o porquê do radioastrônomo Noah do SETI, especializado em comunicações alienígenas estar aqui?
— Achei que tinha ido a um jantar de amigos.
— Wow! Arthur disse isso ontem; ‘Jantar entre amigos’ — e Sean acelerou o passo para acompanhar Oscar que havia mudado o itinerário e voltava ao complexo A. — Não adianta fugir Oscar. Não vou descansar até provar que a Poliu e seu governo oculto tentam manipular as massas escondendo informações sigilosas, tentando destruir ufólogos e suas carreiras sólidas e confiáveis. Porque a Poliu criou aquele grupo de espiões psíquicos com muitas mais intenções que vigiar terráqueos, que bloqueá-los, porque eles sabem que só aquele que mantiver a mente aberta, que vibrar na mesma sintonia poderá ser contatado...
— E você vibra? — Oscar cortou-lhe a frase.
— Como todos os espiões psíquicos, preparados para se comunicar.
E Oscar estancou com peso e raiva.
— Aquela louca... — Oscar se descontrolava. — Foi Mona Foad quem lhe ensinou ‘vibrar’ ou como chame se comunicar telepaticamente com alienígenas, atrás de respostas que sabe não vai encontrar em parte alguma!
“Que sabe não vai encontrar em parte alguma”; Sean sentiu dor no que ouviu, Oscar repetia Kelly e ambos o conheciam como ninguém.
Oscar foi embora e Sean ficou momentaneamente perdido. Seguiu-o em silêncio até a porta de vidro.
A porta correu para dentro da parede abrindo o hall de entrada, onde a mesma mulher secretária se encontrava atrás da coluna, sentada, os observando.
— Vai ajudar, não vai?
E Oscar se virou para ele, para um Sean pequeno, frágil perante tamanha perda; seu trabalho, horas de dedicação prestes a sumir.
— Sei que investiu anos de trabalho à Polícia Mundial para construí-lo, Sean — e Oscar queria mais que ficar o olhando, queria poder-lhe dar o amor de pai que Fernando anos a fio dava.
Sentiu-se impotente, sem poder ajudar seu filho.
— Não construí Spartacus para a Polícia Mundial! — foi forte, e precisou ser forte ao ver Oscar o encarar. — Sabe que entrei na construção de Spartacus porque meu pai me obrigou, porque Trevellis infernizava a vida dele por ser eu um hacker. E terminei a construção de Spartacus por mim, para provar a Trevellis que eu era capaz de gerenciar a Computer Co. quando ele teve a coragem de ir outra vez provocar meu pai, dizendo temer minha idade, minha irresponsabilidade em noivar com uma ladra. E mantenho Spartacus sob meu controle para provar a Trevellis que não tenho nada a provar a ele! — exclamou tão forte que Oscar não soube como continuar a conversa.
— Sean...
Mas Sean ergueu a mão pedindo que Oscar parasse de falar.
— E Spartacus significa para mim os anos que perdi trabalhando pela Computer Co., anos que perdi tentando provar a tudo e a todos do que sou capaz, anos que venho tentando provar a mim mesmo que sou capaz de algo mais que trocar coisas do lugar, abrir e fechar coisas sem tocá-las.
— E em troca disso você faz o quê? Faz o que?! — foi a vez de levantar a voz e a secretaria ali perto se retirar. Sean e Oscar pareciam que esperavam ela sumir dali. — E o que faz Sean? Desafia a corporação de inteligência hackeando seus mainframes atrás de informações?
— Oscar... — e Sean ia outra vez cortar a fala de Oscar quando ele próprio se excedeu.
— Não Sean! Agora você vai me escutar! E vai escutar porque sabe que construiu Spartacus para desafiar a Poliu sim, a força dela, usando Mona Foad para desenvolver seu poder de abrir e fechar coisas…
— Porque é um dom genético! — completou enfim derrubando Oscar e sua aparente estabilidade emocional. Oscar se virou, andou poucos metros e parou de andar percebendo Sean paralisado atrás dele, no mesmo lugar. — Sabe que amo aquele satélite, não? Que ele é tudo o que me sobrou depois de Sandy...
— Sinto Sean... — completou Oscar Roldman com dificuldades em terminar aquela conversa, que sempre fora difícil àquela aproximação, qualquer uma.
Entrou no elevador e foi embora o deixando lá confuso, com mais perguntas que respostas que não encontraria.
Complexo A; setor de alojamento.
17 de agosto; 10h47min.
A Dra. Carminna Clemente havia recebido seu desjejum no quarto. Aquilo era uma afronta, sabia que Adriana não a queria no café da manhã com Sean Queise, mas ela não se dobraria.
Preparava-se para descer quando ao abrir a porta de seu quarto-sala deu de encontro com um jovem e belo Sean Queise parado nela.
— Ah! Sr. Queise? — Carminna olhou as pernas da calça jeans dele ensopadas. — Assustou-me! — ela então olhou para o corredor vazio.
— Não tem ninguém.
— Como? — ela o olhou com interesse.
— No corredor.
— Ah! — ela ficou confusa com Sean que parecia perturbado. — Quer entrar? — Carminna ficou na duvida apontando para seu quarto-sala.
Sean entrou a observar que a decoração não diferia muito da dele.
— O que uma assirióloga faz aqui? — disparou.
Carminna fechou a porta e ficou a observá-lo atentamente.
Sean era realmente belo.
— Você já me perguntou isso, Sr. Queise.
— Me chame de Sean.
Carminna sorriu maliciosa.
— Já me perguntou isso ‘Sean’.
— É que talvez não tenha encontrado uma explicação lógica.
Carminna sorriu sentando-se numa poltrona que se inclinou com o peso dela. A assirióloga era uma mulher de beleza mediana e charme europeu, mas muito chamativa. Proprietária de belas pernas roliças cruzou-as para chamar a atenção dele.
Sean percebeu.
— Interessante! Vejo que estranha minha presença aqui, mas não estranha a presença do Dr. Santos e muito menos de Noah — sorriu cínica.
— Ah! Sim! Noah, o radioastrônomo que caça alienígena — ambos riram. — Parece-me também, que minha presença nas listas de ufologias nunca foi um segredo bem guardado.
— Não! Nunca foi! — descruzou e cruzou as pernas novamente. — Noah comentava sobre o jovem mega empresário da informática que usava suas ‘habilidades’ em favor de eventos ufológicos, só para provocar a corporação de inteligência Poliu.
— Wow! “Habilidades”? — Sean traduziu como hackerismo. — Noah disse isso?
— Noah falou alguma incoerência? — Carminna riu.
Sean começou a sentir uma coceira incontrolável no braço.
— Não, não falou.
— Você não tem medo do que faz?
— “Medo”? — Sean até achou graça. — Traduza medo do que faço Carminna?
— Soube que você teve problemas para assumir a Computer Co. das mãos de seu pai, porque a Poliu interveio em seu hackerismo adolescente.
Sean não sabia bem onde pisava com ela.
— “Adolescente”? Acho que realmente não entendi.
— Ser jovem… Quanto? Dezenove anos? Um belo jovem loiro, de musculatura bem traçada… — e ela viu Sean achar graça no que encarou seu tórax. — Ou talvez fossem seus outros dons que o tivessem impelido.
— “Impelido”? — Sean já não sabia qual o caminho que ela traçara para levar adiante aquele diálogo. — Quem é você, Doutora? — olhou-a agora com todo seu interesse masculino.
— Por que quer saber, Sean? — devolveu com todo seu interesse feminino.
— Para saber por que a Poliu precisa de suas habilidades? — foi à vez dele. Carminna fitou-o por mais alguns instantes, impressionada mesmo com a beleza dele, percebendo que não deveria ser só ela a achar aquilo. Sean percebeu-se observado, medido, estudado. — Acho que não ouvi sua resposta — falou simpático.
— Pensei que podia ter qualquer uma — Carminna riu charmosa que era, sabendo que ele não conseguiria ler a mente dela, porque a mente dela fora programada para ele jamais conseguir lê-la.
— Talvez as mentes preparadas eu não possa Carminna — devolveu o sorriso charmoso e a informação. — Não ainda...
— “Ainda”? — ela riu com gosto relaxando. — Não sei por que a Poliu precisa de mim, Sean.
Foi a vez de Sean gargalhar com gosto.
— Claro! Atravessou o oceano para não saber o que faz aqui.
— Sério! Não sei. Mas deve ter algo ligado às minhas habilidades em assiriologia — ambos começavam a se estudar nitidamente. Ele sorriu-lhe e Carminna devolveu outra vez. O clima estava feito. — Quer tomar algo? — ela apontou para a mesa. — Já fez seu breakfast? Esse chegou... — apontou para a bandeja na mesa. —, mas pensei em tomar outro lá embaixo — levantou-se. — Um café talvez?
— Um de verdade? — ambos riram.
— Café brasileiro na Indonésia?
— Posso sonhar não?
— Sonhar pode... — ambos riram novamente.
Havia uma química no ar e Sean soube aproveitá-la. Inclinou-se na cadeira, para mais perto de Carminna que gostou da aproximação. Tivesse ele, a idade que tivesse, com certeza Sean era um colírio naquela ilha isolada; em qualquer ilha.
— Você é escritora. Escreveu o livro Os sumérios e os alienígenas, não foi? Estivemos no mesmo evento ufológico no México, há dois anos?
— Logo após o suicídio de sua noiva.
Sean agora sentiu onde pisava.
— Sabe muito mais do que diz não Doutora?
— Sei, por exemplo, que era muito jovem para noivar, que seu noivado não fora aceito por seus pais, e nem pela instável ligação da Computer Co. com a Poliu, de onde sua noiva saiu — Carminna viu que Sean não gostou daquilo, da forma como foi dito. — Desculpe-me querido, estou sendo grosseira e impertinente. Só disse o que ouvi pelos corredores da Poliu, que percebeu já me contratou algumas vezes. Mas realmente achei estranho que a Poliu me chamasse aqui, para o resgate desse chip.
— Mais estranho que a Poliu, numa ilha onde a Polícia Mundial montou base para controlar o satélite de observação Spartacus, com um chip de DNA preso a ele?
Carminna levantou-se novamente e serviu-se de café sabendo que a conversa talvez fosse ser difícil. Sean aceitou uma xícara.
— Não sei o que responder. No princípio achei que tinha haver com meus livros. Escrevi três livros com minha colaboradora sobre os sumérios e sua ligação com o Cosmo; Os sumérios e os alienígenas, Tectita – Um segredo Russo, e Reinterpretação da Lei de Bode. Mas desde que cheguei o que encontrei foi muita confusão envolvendo o satélite de observação que você projetou para a Polícia Mundial, e nada da minha área de trabalho.
— “Colaboradora”? Quem é sua colaboradora?
— Os mitos sumérios estiveram presentes nas obras de escritores de ficção como H.P. Lovecraft, assim como fazem parte do trabalho do escritor Zecharia Sitchin, que escreveu o 12º planeta — Carminna não respondeu exatamente o perguntado.
Sean não insistiu.
— O 12º planeta que o telescópio Hubble descobriu e que chamam de Planeta X, enquanto a NASA o chama de Sedna?
— Os sumérios chamavam Sedna de Nibiru, que significa ‘planeta da passagem’ ou travessia, e o planeta era designado pelo signo da cruz. Meu trabalho também se baseia em Zecharia Sitchin, um erudito especialista na história e na arqueologia do Oriente Médio e do Velho Testamento, que traduziu o cuneiforme e outras linguagens antigas.
— Sitchin, juntamente com Erich von Däniken e Immanuel Velikovsky, constituem a Santa Trindade dos fazedores de mitos pseudocientíficos sobre a história antiga.
— “Pseudocientíficos”? Os mitos antigos não são mitos, mas sim textos históricos e científicos; e Immanuel Velikovsky também acreditava que Vênus havia saído da órbita de Júpiter até estabilizar-se, o que provocou muitas catástrofes na Terra, batendo com eventos bíblicos. E o que os sumérios contavam com a vinda de Nibiru.
— Não estou duvidando, mas... — Sean se inclinou percebendo que Carminna gostava da aproximação com ele. —, ou todos os outros estudiosos leram mal as tábuas ou Sitchin é de fato o único que lê as tábuas Sumérias, que revelam que os deuses do Planeta Nibiru, e que orbita o nosso Sol a cada 3.600 anos, chegaram à Terra há 450.000 anos e criaram os humanos através de engenharia genética em ‘macacas’.
— Não exatamente ‘macacas’ — e Carminna tinha todo o interesse dele. — Sitchin tinha o aval de grandes cientistas, filósofos e teólogos como Monsenhor Corrado Balducci do Santo Ofício do Vaticano.
— Wow! Monsenhor Corrado Balducci... Aquele que diz que os ‘Aliens são irmãos’ — sorriu-lhe cínico. — Mas me diga então, Doutora, como nenhum cientista descobriu o porquê destes descendentes dos deuses se autodestruírem com armas nucleares a 4.000 anos? Sitchin ergue-se sozinho, como um caso isolado, quando, por exemplo, olha para uma tábua suméria e vê que os antigos construíam foguetes, cruzadores Solares… — e Sean nem precisou atravessar o éter atrás de pensamentos delas que por ventura lá estivessem, para saber que ela estava nervosa, porque ela estava, mas tais pensamentos não estavam lá.
Sean desconfiou que Carminna tivesse realmente alguma técnica para bloquear a leitura dele.
— Mais café?
— Não, obrigado Carminna. No entanto, me diga... Esse outro livro segundo livro, Tectita – Um segredo Russo, a Poliu tem uma pasta sobre um geólogo russo que fala sobre tectitas.
Carminna mais uma vez sentiu-se confusa em falar.
— Em janeiro de 1975, um estudante de geologia encontrou no Deserto de Karakum, um deserto frio e arenoso, pequenos pedaços de vidro verde-escuro, do tamanho de uma noz, pensando que fosse vestígio de uma cidade de quatro mil anos descoberta pouco tempo a leste do Mar Cáspio. Levaram amostras para Moscou, e provaram que eram tectitas contendo diversos metais, inclusive berilo que se transforma em silício quando exposto a alta temperatura.
— Eu tive uma discussão interessante com o General. Ele teima que Spartacus tenha se chocado com uma tectita, um micro meteoroide, e que o chip conectado a ele tenha gravado algo — e sorriu de uma maneira que Carminna sabia que Sean estava lá em busca de algo, capaz de pagar por essa informação.
— É estranho, com toda razão, uma tectita ter se chocado com seu satélite. As tectitas se formam sob altíssima temperatura, acima de 2500 graus, e contêm isótopos radioativos. Em suma, são originárias de explosões nucleares.
— Tectitas descobertas na Rússia segundo as listas de ufologia eram asteroides, e os asteroides são fragmentos que orbitam no chamado anel de asteroides, entre Marte e Júpiter, a uma distância equivalente a quase três vezes a da Terra ao Sol — ele viu Carminna o olhar com um sorriso no canto da boca. — É aí que entra seu terceiro livro? — Sean arriscou.
— Provável Sean. Porque de acordo com uma teoria nunca confirmada, mas nunca negada, estes asteroides têm uma órbita que, segundo a Lei de Bode, pertence a um planeta que deveria realmente estar lá.
— Um planeta que deveria estar lá? Lá aonde? Entre Marte e Júpiter?
— Sim. A lei é interessantíssima em muitos aspectos. Veja, ela foi enunciada pelo astrônomo alemão Johann Elert Bode e se pronuncia “Iorram ilert bôd”, em 1772. Valia, obviamente, para os planetas conhecidos na época, ou seja, aqueles visíveis a olho nu. Sua base de formação é a seguinte... Inicialmente ele fez uma progressão geométrica de razão dois iniciando com zero e três, então ele fez, 0 – 3 – 6 – 12 – 24 – 48 – 96 – 192 – 384 – 768. Depois somou quatro a cada termo; então ficaram 4 – 7 – 10 – 16 – 28 – 52 – 100 – 196 – 388 – 772. E a seguir, dividiu esses valores por 10 e obteve 0,4 – 0,7 – 1,0 – 1,6 – 2,8 – 5,2 – 10,0 – 19,2 – 38,8 – 77,2. Estas são as distâncias aproximadas dos planetas até o Sol, em UA - Unidades Astronômicas.
— E uma UA, Unidade Astronômica, é a distância média da Terra ao Sol que vale aproximadamente 150 milhões de quilômetros cada.
— Exato! Comparando com as distâncias medidas pelos astrônomos, ele observou que faltava o planeta correspondente a 2,8 UA. Mas nove planetas ao todo.
— Então seria Mercúrio igual 0,4. Vênus igual 0,7. Terra igual a 1,0. Marte igual 1,6 e Júpiter igual 5,2.
— Viu que falta ‘alguém’? — sorriu encantadora. — Pesquisando o céu os astrônomos descobriram nesta distância 2,8 o cinturão de asteroides, que acreditamos serem pedaços de um planeta que se desintegrou. O que levava a corroborar que talvez um planeta, que existiu entre Marte e Júpiter, se desintegrou devido a explosões termonucleares, produzidas talvez por uma civilização avançada.
— E diz que não sabe o que a Poliu quer com você? — sorriu.
— Não vejo ligação de meu segundo livro com essa pasta sobre um geólogo russo que fala sobre tectitas. Porque se denominam tectitas curiosas formações geológicas, espalhadas por quase toda a face do nosso planeta, notadamente naquelas regiões onde os livros sagrados e tradicionais indicam ter havido confrontos e grandes batalhas entre Deuses. E esse nome vem do grego tektos, que significa rocha derretida.
— Então se uma tectita se chocou com Spartacus é porque saiu do cinturão de asteroides, entre Marte e Júpiter, restos de uma explosão que destruiu um planeta lá existente... — olhou Carminna o olhando. — O acadêmico russo Sergei Orloff batizou-o de ‘Phaeton’, ou ‘fantasma’.
— Há anos eles consideravam que este planeta, Sean, quase uma duplicata da Terra, orbitou ao redor do Sol, nas imediações de Marte, antes que uma violenta explosão o destruísse.
— E por que acredita que as entradas de meteoros estejam relacionadas a grandes catástrofes da Bíblia? Como os dilúvios...
— Pelo que sei, são abundantes, por exemplo, na região do Mar Morto, onde se situavam as devassas cidades de Sodoma e Gomorra, que conforme os relatos bíblicos foram destruídos pelo ‘Fogo do Senhor’ como forma de castigo.
— Forma de castigo? Então esse planeta fantasma também foi destruído como forma de castigo? Então acha que há um Deus castigador, Carminna?
— Acho que não precisamos de Deus nos castigando Sean. Destruímo-nos sozinhos.
Sean achou graça concordando com aquilo.
— Então os sumérios, a Bíblia, os gregos, criaram os mitos, uma maneira deles passarem em forma de contos e lendas o que lhes acontecia sem saber ao certo o que lhes acontecia? Como a arte Suméria e os polvos? Como Ezequiel e seu UFO? — sorriu galanteador.
— Sim, Sean. Por isso não vejo o porquê de tanto segredo.
— Não sei. Talvez algo tenha causado interesse na Poliu, algo nos mitos que a assustou.
— Também é conhecida no âmbito esotérico, a destruição de um planeta amarelo conhecido como Maldek ou Marduk. De qualquer forma, os sumérios chamavam o planeta de Tiamat.
— Tiamat é uma deusa das mitologias babilônia e Suméria, não?
— Sim, Sean. Ela tem a forma de um dragão e representa o caos aquoso primordial. Dela se originou tudo que existe, incluindo os deuses. Tiamat personificava a água salgada enquanto seu esposo, Apsu, era a personificação da água doce.
— Os sumérios... — Sean divagou. — Então voltamos ao seu primeiro livro.
O olhar de Carminna brilhou. Ela jogou elegantemente os cabelos negros para trás. Sean a achou até mais chamativa que na noite anterior, mas não tão bonita como Adriana, porque algo na Tenente-Coronel Adriana o fazia lembrar-se de Sandy Monroe.
— Os sumérios descreviam nosso Sistema Solar como um conjunto de 12 corpos celestes significativos, Sean. Na linguagem zodiacal, estes astros são todos chamados ‘planetas’, embora, incluíssem a Lua e o Sol. E também os misteriosos Urano e Saturno e o longínquo Plutão, hoje desbancado de seu status planetário, e que não faço a mínima ideia, como os enxergaram. E incluía o procurado 12º planeta, que os sumérios denominavam de Nibiru.
— Nibiru é o Planeta X do nosso tão conhecido Sistema Solar enquanto Tiamat era o planeta explodido, quando Nibiru se chocou com ele... Faz sentido.
— Fazendo um pouco de matemática, o ano de Nibiru corresponderia a três mil e seiscentos anos terrenos... E essa seria a prova definitiva de veracidade da tradição Suméria, o reconhecimento científico de um décimo planeta no Sistema Solar, ou seja, a descoberta de Nibiru com tamanho, órbita e outras características descritas nos registros da Mesopotâmia.
— Como a Poliu a contatou, Doutora?
— Na verdade o contato foi feito com o Dr. Santos que é chefe de Noah em Arecibo. Noah trabalha para o SETI e o Dr. Santos é chefe de operações do radiotelescópio. O Dr. Santos chamou Noah que me chamou, sendo eu PhD — ela levantou-se e serviu mais café.
O café o esquentou das calças ainda úmidas. Ele sorriu e tirou o sapato molhado. Carminna levantou-se e ofereceu-lhe uma pantufa, que ele aceitou.
— Obrigado… — soou tímido.
Carminna voltou a se sentar e disparou:
— Algo maior lhe incomoda, não Sean?
Sean suspirou:
— Spartacus antes de ser atingido, fora reprogramado pela Polícia Mundial para fotografar anomalias solares que estão cada vez mais constantes. Achei até que o Dr. Santos aqui, se encaixava nisso — Sean riu sem jeito. — Mas não é só isso. Há certa movimentação nas listas de ufologia, porque alguém usando o apelido ‘Fim do mundo’ vem agitando todos com fotos de anomalias solares, grande caos e destruição pelo Sol.
— Desculpe-me! Nada entendo de Física… — e uma pancada na porta os fez levantarem.
Sean pediu que não denunciasse sua presença ali, sabia que era a Tenente adjunto Nadir atrás dele. A Dra. Carminna atendeu a porta sem contestar ou perguntar como ele sabia, mas era mesmo Nadir procurando Sean Queise. Carminna disse que não o havia visto e ela se foi sem mais nada falar. Carminna fechou a porta e sorriu para Sean sem nada perguntar. Ele esperou mais uns cinco minutos e saiu agradecendo a conversa animada com um beijo no rosto dela.
Desceu de elevador usando as pantufas e carregando os sapatos molhados, enquanto Nadir, escondida na porta da escada de emergência, o viu sair sorrateiro do quarto-sala da Dra. Carminna.
Aquilo com certeza iria para seu relatório, um relatório que Sean não tinha acesso já que tudo, ou quase tudo ficava bloqueado à sua telepatia. Mas a voz de Mona o alcançou, uma voz cheia de sotaque, árabe, que lhe dizia coisas que ele não entendia.
Frases, pessoas, cheiros, cores e muita movimentação de coqueiros em meio à chuva e gritos. Sean mentira para Oscar, ele se bilocava, se teletransportava, e via outros lugares sem sair do lugar.
Pediu seu almoço no quarto-sala e lá ficou até o final da tarde, até outro relatório ser feito, ser levado à Oscar Roldman em seu quarto-sala, avisando que Sean Queise havia sequestrado o jato da Polícia Mundial e sumido da ilha no começo da noite.
5
Kuta, Ilha de Bali; Arquipélago da Indonésia.
8° 44’ 0” S e 115° 10’ 0” E.
18 de agosto; 02h45min.
Sean Queise desceu do jato da Polícia Mundial apenas portando sua mala de mão. Deixou o piloto com a promessa que ele ficaria de lábios selados ou iria ter muitas dificuldades pela frente. Sean achou mesmo que não iria fazer nada daquilo, mas um pouco de temor ajudara na fuga. Tomou um táxi e partiu na bagunça que estava a movimentação de turistas.
Mas Sean estava ali por outro motivo; motivo que ele ainda não compreendia, não dominava. Sensações de perda, dor e tempestade, com ele na tempestade, em meio a muita água que afogava pessoas que lhe pareciam conhecidas, em meio a imagens da casa dos seus sonhos que inclinava cada vez mais.
“Ou seria a casa dos meus pesadelos?”; pensou.
Do ponto de vista psiquiátrico, existem zonas cerebrais que quando estimuladas provocam as chamadas visões autoscópicas, aparecer para si mesmo, consideradas alucinatórias. Mas Sean sabia que aquilo eram dons e poderes, que lhe faziam sair do corpo, se ver em meio a raios e relâmpagos, ventos e vozes que lhe diziam para estar ali, em Kuta, em Bali.
O táxi parou na frente do hotel, Sean foi recebido em meio a belos jardins com floridos colares e sorrisos de balinesas mais belíssimas ainda.
Localizado na privativa Segara Beach, o Sandi Phala Hotel tinha quartos que abriam suas portas-balcão para o mar, em meio às tradições antiquíssimas de Bali, coloridas festividades e cerimônias, que faziam a colocação ideal para experimentar a natural magia daquela ilha, onde a praia de areia branca, pôr do sol e os famosos frutos do mar ao longo da praia atraíam turistas de todo o mundo.
Uma música tocava em todos os alto-falantes apesar da hora.
— Selamat Malan! Apa kabar? — perguntou uma local.
— O que disse? — Sean virou-se para ela.
— Oh! Desculpe-me! — sorriu a bela balinesa, encantadoramente. — Disse “Boa noite! Como vai você?”.
— Vou bem, obrigado; tendendo a melhorar... — sorriu um Sean magnífico.
— Selamat Malan! — outra balinesa esticou um drink que Sean sorveu tão rápido que sentiu algo explodir na sua garganta.
— Wow! Devia ter perguntado primeiro?
Ambas o acharam lindo tossindo com lágrimas nos olhos azulados.
— O Senhor tomou arak! — ambas riram. — É uma bebida local feita de palmeiras; é muito forte Senhor...
— Sean; meu nome é Sean — sorriu novamente esticando a mão.
— Desculpe-nos! — as duas olharam para os lados e o cumprimentaram. — Não podemos ficar conversando com os hóspedes na entrada, mas podemos falar sobre o Hotel.
— Comecem...
As duas riram charmosas outra vez.
— O Sandi Phala Hotel tem luxuosas suítes — elas riram charmosas e Sean gostou daquilo. — O Restaurante Ma Joly serve pratos da culinária francesa e internacional. E você pode relaxar em nossa piscina — apontaram. —, com vista para o Oceano Índico, e fazer compras na nossa butique ou ir ao Discovery and Kuta Square Shopping Malls — e as duas iam embora quando uma delas retornou. — Ah! Meu nome é Rani — e se foi.
— Prazer Rani! — Sean também se foi, para o seu quarto, achando que se o paraíso era ali, então ele estava feito.
Dormiu o sono dos justos.
Sandi Phala Hotel; Kuta, Ilha de Bali.
8° 44’ 53” S e 115° 10’ 3” E.
18 de agosto; 18h41min.
Sean acordou sonado e recebeu a encomenda de três livros comprados ainda no jato da Polícia Mundial. Sem ainda se habituar à proximidade do nível do mar, pagou uma gorjeta e o mensageiro o deixou a sós.
“Agora vamos ver os segredos que tem escondido nas mangas, Dra. Carminna”, pensou ao abrir o pacote contendo os livros Os sumérios e os alienígenas, Tectita – Um segredo Russo e Reinterpretação da Lei de Bode.
Sean se concentrou no primeiro livro e leu:
— “No texto babilônico Enuma Elish, que se traduz como ‘Quando nas alturas’, é o texto mais antigo do mundo. Foi encontrado pela arqueologia nas escavações da Biblioteca de Assurbanipal. Originalmente escrito nos cilindros sumério-babilônicos em escrita cuneiforme, nele, Tiamat é a deusa irada que decide destruir os outros deuses criando um vasto exército de demônios. Os outros deuses com medo, chamam Marduk que aceita matar Tiamat se for eleito o deus supremo. Marduk então mata Tiamat e para criar o céu e a terra divide seu corpo em dois...” — Sean lia o livro interessado. — “Sitchin diz que Marduk é o 12º planeta chamado Nibiru, onde Tiamat é o planeta que após a colisão com Nibiru foi divido em dois, criando o nosso Planeta Terra de um lado e o cinturão de asteroides do outro...” — Sean parou de ler. — Interessante pensar que cientistas dizem que algum protoplaneta se chocou com uma Terra ainda jovem também, e desse choque, fragmentos formaram a nossa Lua... Uma Lua com bases alienígenas... — e um som do outro lado da sua porta o alertou.
Sean abriu-a num supetão e um funcionário o encarou.
— Boa noite, Senhor — e se foi.
Sean voltou a fechar a porta e voltar a ler.
— “Curiosamente o símbolo de Marduk era uma espada, um Mushhushshu, que protegia os deuses supremos...” — Sean avançou até a ‘Tábua IV’ do Enuma Elish, das sete tábuas da criação. — “E o conselho dos deuses testou os poderes de Marduk que reuniu as suas armas, os quatro ventos, e ainda os sete ventos da destruição, e seguiu para o confronto” — olhou para cima e a noite caía num tempo que se fechava. — Ventos? — se perguntou ficando algum tempo a pensar. Levantou-se e viu que a vista da sacada era belíssima e a noite parecia mágica. Alguns hóspedes animados namoravam e dançavam na praia; Sean preferiu olhar as estrelas. — Deus... Quantos segredos... — uma certeza tinha, porém; a Poliu tinha que estar envolvida.
6
Sandi Phala Hotel; Kuta, Ilha de Bali.
8° 44’ 53” S e 115° 10’ 3” E.
19 de agosto; 18h44min.
Sean havia acordado, tomado café e almoçado no quarto, exausto psicologicamente, mas contente de não ter precisado sonhar. A noite chegava e ele parou de trabalhar no notebook, em fórmulas mirabolantes para como desligar Spartacus e uma porta serial que não se usava mais, e mesmo com todo seu alcance paranormal para com o satélite, ele sabia que era arriscado fazer isso da Terra; desligá-lo.
Foi até a piscina externa ainda agitada no começo da noite e reabriu o notebook.
— Selamat Malan! Boa noite! Aceita um aperitivo, Senhor? — perguntou o garçom com a bandeja lotada de drinks coloridos e enfeitados.
— Sim, obrigado! — afastou o notebook do colo para cima da mesa, e tomou num gole do coquetel de champagne e licor de laranja.
Alguns casais começavam a se recolher, mas os jovens, que eram maioria, continuavam em volta da piscina brincando embalados pelos coquetéis coloridos. Sean sentiu-se só de repente, percebendo como sua vida o havia afastado de todos de quem gostava, da vida em si, com tão pouca idade.
Alguns jovens correram perto dele, estavam tomados pela areia que saía por todos os poros, e Sean teve inveja, inveja da juventude que perdia.
Abaixou os olhos e suspirou. Olhou o notebook aberto e percebeu que novamente o colisteiro ‘Fim do mundo’ provocava desconforto nas listas, insuflando medo e pavor, incitando todos a tomarem cuidado com o Planeta X e seus Cruzadores Solares que se aproximavam da Terra, trazendo a desordem e o caos.
“Droga!”.
Mas gritos, jovens gritando, voltaram a alegrar a piscina enquanto o garçom se inclinava com a bandeja para voltar a oferecer mais uma bebida. Sean virou-se para dizer algo ao garçom e viu uma figura esguia por detrás. Esticou o pescoço para vê-la melhor.
O garçom também se virou para ver quem era; Rani os observava enquanto servia a mesa ao lado.
— A conhece?
— Rani, Senhor? Começou ontem.
— Ontem? Ah! — Sean sorriu-lhe. — Isso quer dizer que não a conhece?
O garçom sorriu sem jeito, e foi até Rani falar-lhe algo que a fez largar a bandeja e a mesa que servia, e ir servi-lo.
— Selamat Malan!
— Vai sempre falar comigo em balinês? — Sean ficou a delinear as curvas generosas dela, expostas pela canga colorida.
— Disse “Boa noite”!
— Ótima noite, Rani! — sorriu cínico. — Ah! De onde vem toda aquela areia naqueles turistas? Da praia em frente? — Sean apontou a turma animada que estava mais para carne empanada do que para gente, e Rani achou graça. — Você pode sair? — olhou para o movimento da praia iluminada pela noite.
— Benijunan... — Rani sorriu para o garçom que a pouco o atendia. —, ele me dispensou.
— E por que Benijunan fez isso?
— Talvez seja um homem gentil.
— Ah! “Gentil”? Entendi! — Sean entendeu foi nada.
Também não queria entender. Estava cansado de ler a noite toda, de trabalhar o dia todo, e de saber que seu trabalho ia ser destruído.
E estava com muita vontade de ficar ao lado daquela figura feminina um bocado exótica.
— Vamos? — ela apontou o caminho.
Sean fechou o notebook e guardou-o na bolsa que colocou a tiracolo. Ambos atravessaram a extensão que separava o hotel da praia.
Nada se falavam sob uma noite que aumentava a dose dos ventos, fazendo os cabelos longos e encaracolados dela subirem e descerem, irem de um lado a outro.
— Teilhard de Chardin disse que se um dia o homem dominasse os ventos, as ondas e a gravidade, então pediríamos a Deus as energias do Amor. E então, pela segunda vez na história do mundo, o homem teria descoberto o fogo — Sean olhou para cima, olhou para ela lhe olhando encantada, voltou a observar o céu, e alternar sua visão para o sarongue de Rani, que era encantador nela. — O que é aquilo ali adiante? — apontou para uma turma reunida ao redor de uma grande fogueira.
— Um luau de aniversário — e Rani olhou para o corpo dele.
Daquilo ele também gostou.
— Isso quer dizer uma festa privé?
— Não necessariamente. Quer ir? — Rani estava realmente encantadora no sarongue colorido que pouco escondida suas curvas, no meio da ventania que parecia querer os carregar. — O que faz Senhor...
— Sean.
— Senhor Sean.
— Não, somente Sean — ele a delineou novamente, gostando de ser observado também, enquanto Rani aceitava dois coquetéis de frutas enfeitados com lindos adornos de papel crepom, que uma das moças do luau servia numa mesa improvisada, ao lado de um carro com as caixas de som ligadas em altos decibéis. — Eu sou técnico em computação — sorriu bebendo.
— Eu sou uma balinesa com muita vontade de trabalhar — bebeu também.
— Benijunan disse que você começou ontem.
A feição de Rani mudou.
— É verdade. Neste hotel é a primeira vez — ela olhou em volta e localizou duas cadeiras vazias, um pouco afastados do grupo. — Vamos? — apontou.
— Sim! — Sean a acompanhou.
Lá ficaram minutos intermináveis a falar de nada, de tudo, sobre o mar, a dança, o calor, os ventos, a música, as ondas; Rani era uma dançarina de Barong.
— Quando você vem a Bali você deve assistir pelo menos uma de nossas danças, que na verdade é uma mistura de dança e teatro, e cada uma delas conta uma história que é dramatizada pelos atores dançarinos.
— As danças balinesas são ricas em figurinos, não?
— Apesar de parecer um musical, há uma perfeita combinação de músicas, coreografias e dramaturgias históricas, e como disse, belos figurinos. E um clima de fantasia faz com que as danças de Bali, sejam simplesmente encantadoras, como a famosa Dança do Barong — Rani surpreendeu Sean a olhando com interesse. — Ah... Também sou uma surfista profissional.
— Wow! Gostaria de surfar um dia. Dominar as águas; entende?
— Quer beber mais um coquetel de frutas? — Rani era pura linguagem corporal e Sean adorou lê-la. — Posso pedir aos jovens...
— Você me acompanha?
— Não posso beber mais...
— Não falo do coquetel — Sean jogou todo seu charme de homem bonito. — Falo?
— Não fala? — Rani gostou de ver Sean se aproximar de seu corpo ainda sentado na cadeira ao luar, com a brisa violenta, o som agora distante, e ele se permitindo convidar a tudo aquilo.
Ele retirou o notebook do ombro e se inclinou até ela.
— Como começaríamos?
Rani arregalou os olhos, confusa.
— “Começaríamos”, Senhor?
— A surfar! — Sean riu.
— Ah! — ela gargalhou jogando o pescoço para trás. — Levante-se! — ela viu Sean obedecer. Depois o colocou em posição como que se inclinando sobre o pé direito, fazendo de conta que estava em cima de uma prancha. — As pranchas não lhe darão tanto equilíbrio quando estiver sobre uma de verdade. Elas são mais inclinadas... — e Rani o inclinou segurando-o pela cintura. Sean gostou de ser seguro, de ser tocado por ela, deixando as coisas acontecerem. — Mais um pouco... Mais um pouco...
E Rani levava Sean a se inclinar, tocando-o na cintura, fazendo todos seus corpos se eletrizarem, com um Sean a decifrando naqueles segundos de toque.
— Assim? — sorriu ele.
— Equilibre-se para cá... — ela sorriu também. —, com esse braço esticado, e agora para lá com o outro braço... — e a cintura dele era tocada, girada, com Rani sentindo as mãos se aquecer ao tocá-lo, toda a musculatura trabalhada, viril, gostando do que tocava. — As ondas podem surgir altas até formarem um tubo. Nessa hora todo o equilíbrio ditará se vai ficar em cima da prancha ou não... — e Rani se inclinou colada a ele.
Sean a olhou de bem perto se inclinando uma vez para lá outra para cá em meio às ordens dela, mal tendo tempo de associar a imagem à balinesa, e foi a vez de seus lábios se tocarem. Um beijo molhado pela bocarra dela, pelos lábios úmidos dele, da mistura com a areia que teimava em avançar sobre eles, trazida pela ventania que os dominava totalmente.
Ele virou-se sobre a prancha imaginária e engoliu os lábios de Rani para dentro dele outra vez, e Rani se entregou no calor do momento num compasso como há muito ela não fazia, que não se permitira ter. Porque tinha que admitir, Sean era muito mais do que ela imaginava ser.
Ela desceu as mãos decididas em tirar-lhe a blusa. Sean não temeu também em tirar-lhe o sarongue a deixando de maiô no bater das ondas, as verdadeiras, alcançando os pés de ambos e Sean sentindo-se molhado de muitas formas de prazer.
Rani lançou a blusa dele longe do corpo, acariciando a pele lotada de areia que arranhava no toque preciso, desafiador dela. Ele também não se deu por vencido, com suas mãos caminhando pela pele lisa, perfumada, bem cuidada da balinesa que na ponta dos pés alcançava a boca dele.
Sean sentiu uma paz só ameaçada pela intensidade da visão aterradora que quase fez seus olhos azuis pular das órbitas.
— Boa noite Sr. Queise! — soou a voz forte da Tenente-Coronel Adriana.
— Wow! Isso é o que eu chamo de surpresa.
— Se divertindo? — Adriana fez a pergunta olhando Rani só de maiô.
— Bastante! — e Sean escorregou um olhar atrás da sua camiseta. — E você? Também tirou férias?
— “Férias”, Sr. Queise? — Adriana o encarou.
Rani sentiu-se demais ali.
— Com licença... — e se foi deixando Sean uma fera, visivelmente uma fera.
Ele deu alguns passos e pegou a camisa jogada na areia, e a colocou após sacudi-la em meio à areia que levantava nos ventos que aumentavam.
— Não seja ridículo, Sr. Queise — falou Adriana no que a balinesa se afastava. — Achou mesmo que ia poder se esconder em Bali?
— “Ridículo”? Eu? — olhou para o mar que se aproximava mais com o cair das horas, com a ventania que ameaçava os levantar do chão. — Eu não estou escondido. Estou descansando.
— “Descansando” ou se cansando? — Adriana foi puro fel ao ver Rani de longe.
Ele se aproximou dela sem que ela notasse. Adriana sobressaltou ao sentir o perfume dele invadi-la.
— Trabalhei muito resgatando Spartacus para ser destruído — Sean estava praticamente colado nela. — Não mereço férias Senhorita?
— Não sei o que merece Senhor, mas vai ter que discutir férias com meus superiores — Adriana viu Sean pegar o notebook e se sentar na cadeira vazia se fazendo de desentendido. — Seus superiores também, Sr. Queise. Não se iluda! — começava a ficar nervosa, em pé, ao lado dele. — O hidroavião nos espera no cais! Tenho ordens para levá-lo...
— Tem o quê?! — levantou-se num rompante gritando. — Você tem ordens para mim?! Quem você pensa que eu sou Tenente-Coronel?! Quem você pensa que é?! — mediu-lhe de cima a baixo no mesmo uniforme comportado do Complexo A, abandonando-a na praia após carregar seu notebook na bolsa a tiracolo, e fazer seus pés levantarem alto a areia macia.
— Gritar comigo não resolve o problema!!! — gritou no que a areia que ele levantava se misturou aos ventos que ameaçavam se tornar um ciclone tropical. E Adriana não gostou do clarão que tomou conta dos céus de Bali. — Sr. Queise?! — Adriana o seguiu sem opções.
Sean caminhava até o hotel com ela em seu encalço.
O som dos trovões, o som dos ventos nos coqueiros, balançando folhas e fios elétricos, e cadeiras que começaram a ser arrastadas na areia que levantava.
Sean a viu o seguindo.
— Me deixa!!!
— Não vou deixá-lo!!! Sabe que vim buscá-lo porque sabe que Spartacus tem que retornar!!! — Adriana mantinha-se controlada apesar de sentir seu corpo sendo jogado de um lado para outro pela velocidade dos ventos. — Sabe que o satélite não pode vir ligado ou sua conexão com o chip pode ser destruída!!!
— Conexão que a Poliu colocou, não eu!!! — Sean nem olhava para trás, atravessando todo trajeto, sentindo que seu corpo também era arrastado para os lados pelo intenso fenômeno meteorológico.
— Não sei quem fez o quê?! — gritava cada vez mais alto, no que o som parecia sumir perante os ventos que aceleravam que alcançavam 100 km/h. — Minhas ordens são para levá-lo de volta e desligar Spartacus para retornar!!! — Adriana o seguia a passos largos.
— Pare de me seguir!!! — Sean desafiou-a, estancando os passos.
— Não posso!!! — e os cabelos loiro-platinados de Adriana ameaçavam se soltar do coque militar. — Tenho ordens...
Sean recomeçou a andar nervoso para estancar de repente, fazendo ela se chocar com seu tórax, fazendo algo acontecer a ambos no choque, com Sean podendo sentir o calor dela, os seios grandes, quentes e macios no contato. Ficou sem graça, lembrando-se da foto na mesa do Coronel num lampejo. Recuou balançando o pescoço nervoso, olhou em volta, e o Sandi Phala Hotel se moldava à sua frente e sumia perante o movimento violento de seus coqueiros subindo e descendo, em meio aos ventos que pareciam querer atingir a ilha agora como uma tempestade tropical intensa, que até começaram timidamente nos 57 km/h e que alcançavam os 117 km/h.
— Quem é o colisteiro ‘Fim do mundo’ Senhorita?!
— Não sou Senhorita!!!
— É!!! Tenente-Coronel Adriana!!! Sabe quem é o colisteiro ‘Fim do mundo’?!
— Não sei!!!
— Você sabe!!! Sabe sobre os Suncruiser, sobre os Cruzadores Solares, naves interplanetárias que a Poliu monitora no Sol, Tenente-Coronel Adriana!!! — Sean falava forte, exclamando, com força.
— Sun… — Adriana perdeu o contato com o chão e o Planeta Terra.
— Um Suncruiser é uma gigantesca estação espacial que orbita o Sol, que mantém dimensões constantes de 42.000 km apesar das labaredas solares de violentas explosões solares a engolirem vez ou outra, quando se aproximam para abastecer?!
— Abastecer…
— Falo alienígena?! Porque nenhum material da Poliu poderia resistir a tal aquecimento, então só nos resta civilizações alienígenas superiores para tal tecnologia, já que astrônomos puderam ler elementos de magnésio e carbono nas imagens do Suncruiser. E fotos tiradas pelo SOHO só reforçam isso?!
— Senhor... O Senhor já devia ter crescido, não?! — gargalhava descontrolada na agitação do tempo. — Porque naves interplanetárias deviam ter ficado em suas brincadeiras de infância?! — descontrolava-o.
E Sean chegou tão perto que Adriana teve mesmo que se segurar para não cometer um erro.
— Pois fique sabendo, Senhorita Tenente-Coronel Adriana La Hera, ou seja, lá qual mais nome tenha, que já sou crescido o suficiente para muita coisa!!! — e ele viu Adriana pensar muito coisa. — Crescido o suficiente para isso também!!! — e a deixou lá, confusa com quais pensamentos ela não teve tempo de brecar em meio a cadeiras, pessoas e toda Kuta que se deslocava do chão.
— Sr. Queise?! Sr. Queise?! Temos que ir embora antes da tempestade!!! Sr. Queise?! Sr. Queise?! — mas Sean não respondia. — Já disse que recebe ordens, Sr. Queise!!! — gritou ela com ele que se afastava cada vez mais rápido, em meio a relâmpagos e água que começava a despencar sobre eles. — Spartacus vai ser desligado se o Senhor...
— Spartacus não pode ser desligado daqui da Terra, Tenente-Coronel Adriana!!! — Sean viu que Adriana quase o alcançava, quando ele atravessou os floridos jardins que pareciam levantar do chão, berrando a quase perder a voz. — E sabe por quê?! Porque toda a cúpula da Poliu sabe que vão perder o que mais querem lá!!! — e Sean entrou sozinho.
Bateu a porta de sua suíte tão nervoso, que por pouco não a arrancou antes do Tufão que atingia 211 km/h, a arrancar.
Quando saiu do banho vinte minutos depois, não havia Adriana lá, nem um único sinal de tempestade nos céus de Bali.
“Ventos!”, algo muito ruim ele sentiu.
Sandi Phala Hotel; Kuta, Ilha de Bali.
8° 44’ 53” S e 115° 10’ 3” E.
19 de agosto; 23h51min.
O restaurante Ma Joly localizado no centro do hotel estava lotado àquela hora, com turistas atônitos pelo Tufão que sumira do mapa, literalmente. Sean havia interfonado para a gerência do hotel, e pedido que trouxessem algumas roupas da butique até o quarto dele. Entrou tão colorido que chocou. Os hóspedes que havia se vestido a rigor para um jantar especial o estranharam.
Adriana riu atrás dele.
— Parece que anda precisando de aulas de moda Sr. Queise.
Sean se virou para Adriana, tão linda quanto os cabelos loiro-platinados soltos, perfumados, caindo por sobre os ombros nus, que Sean sentiu por segundos indeterminados a sensação de está-la, desejando.
— E você, Tenente-Coronel? — Sean a olhou novamente. — Teve tempo de trazer sua coleção de vestidos de altas-costuras para a Ilha de Bali? — Sean viu Adriana sentir-se incomodada, com a frequente animosidade dele para com ela. Ele se virou e se dirigiu à mesa reservada percebendo dois pratos arrumados nela. — Garçom? — Sean chamou o garçom quando Adriana sentou-se na cadeira à sua frente.
Ele arregalou os olhos, ela arrumava o guardanapo no colo quando ergueu a sobrancelha cínica para ele usando os cabelos loiro-platinados e perfumados.
— Senhor? — questionou o garçom confuso.
— Traga-me a carta de vinho. Parece que tenho companhia para cear — a olhou de cima ainda sem sentar. Depois olhou o restaurante lotado, o observando.
Lembrou-se que era um homem público em qualquer lugar do mundo que fosse.
“Droga!”, sentou-se contra a vontade.
Já Adriana parecia estar muita a vontade, sentindo-se dona da situação. Aquilo o irritou como nunca.
— Chegou rápido, não Tenente-Coronel?
— Ao restaurante? — Adriana olhou para o lado como desentendida.
— A Bali! — exclamou ele com raiva.
— Ah! Imaginei onde estaria.
— Imaginou? Claro! Sou realmente uma pessoa bem óbvia — falava irônico.
— Eu soube que fez uma visita simpática à Dra. Carminna antes de sair em ‘férias’. Foi para se desculpar da sua saída ridícula do nosso jantar?
— Não! Foi para dormir com ela.
Adriana levantou tão rápida a cabeça que Sean gargalhou.
Adriana tentou se recompor arrumando as costas.
— Leu os livros dela? — Adriana bebeu a taça de vinho que o garçom servia após Sean a ter experimentado e aprovado.
Sean a observou percebendo que não fora só em Bali que Adriana o vigiava. Temeu estar sendo seguido pela Rede Internet também.
— Li! São realmente muito interessantes.
— Carminna fala muito sobre ‘O Planeta maldito’ — Adriana comeu um pedaço de pão torrado com uma mistura de berinjela e azeite balsâmico.
— “Planeta maldito”? — Sean preferiu beliscar kani de salmão; e ele agora a observava com interesse. — Já que faz tantas perguntas, deixe-me também lhe perguntar algo, Srta. Adriana? Ah... Tenente-Coronel Adriana... — ele a viu só o olhar. — Astrônomos do Instituto de Tecnologia da Califórnia, Caltech, afirmaram ter detectado o que pode ser o décimo planeta do Sistema Solar, encontrado a uma grande distância dos outros planetas pelo telescópio espacial Spitzer, onde o novo planeta foi batizado como Sedna, nome da deusa dos oceanos dos Inuit. Será que também é o planeta das profecias Sumérias, Nibiru?
— Leu os livros ou não? — foi a resposta que deu.
— A Dra. Carminna não fala nada de ‘Planeta maldito’.
— Mas você sabe do que falo — Adriana desafiou-o.
— Provável... Eu brincava de naves interplanetárias quando criança — Sean voltou ao cinismo, porém sentindo ‘pisar em ovos’ com ela. — Há pouco mais de vinte anos o sensitivo inglês Wilson Brown provocou polêmica ao divulgar uma suposta mensagem que lhe chegara de um ser alienígena, morto há mil séculos, habitante do Planeta maldito que girava entre as órbitas de Marte e Júpiter, e que explodiu pelo uso indevido de armas atômicas — sorriu cínico e Adriana devolveu-lhe o sorriso. — Não imagino por que você ligaria o Planeta maldito à Doutora e os sumérios e suas tábuas? — ele quis saber.
Mas a Tenente-Coronel Adriana riu realmente com gosto.
— Bem... Para aqueles que acreditam nesse tipo de comunicação, não é Sr. Queise?
— Você não acredita Tenente-Coronel? O aviso de Brown hoje parece uma profecia perante o aperfeiçoamento recente de bombas termonucleares.
— Isso foi um embuste.
— Talvez você seja um debunker, também — ele viu que Adriana não gostou de ouvir aquilo. — De qualquer forma, mentiroso ou não, o inglês Brown pode ter chegado bem perto de uma realidade terrível, já que como a Dra. Carminna fala em seus livros, a própria ciência oficial admite a existência passada de um grande planeta girando a 400 milhões de quilômetros do Sol. E ainda procura, após dois séculos de buscas, uma explicação natural razoável para o seu desaparecimento.
Adriana sentiu Sean um pouco mais comunicativo, mesmo que visivelmente nervoso com ela.
— Foi o astrônomo alemão Johann Elert Bode quem levantou o problema pela primeira vez.
— Bode era diretor do Observatório de Berlim e um irrestrito admirador daquilo que definia como ‘maravilhosa harmonia matemática do Universo’, com sua crença em que os astros moviam-se num fantástico concerto de números, e que por isso dedicou sua vida profissional à tentativa de encontrar uma chave capaz de desvendar o código matemático dessa harmonia, tal qual o filósofo Aristóteles, antes de Cristo.
— Carminna falou sobre ele com você?
— Como sabe que ela falou?
— Falou? — ela viu Sean não gostar que talvez Carminna fizesse relatórios. — Porque já li sobre Bode, Sr. Queise. E Bode numa série de cálculos diz que Mercúrio dista do Sol 0,4 unidade astronômica, Vênus - 0,7; a própria Terra - 1 unidade astronômica. Marte - 1,6; Júpiter - 5,2; Saturno 10 unidades astronômicas — comia enquanto dissertava. — Os outros planetas foram descobertos mais tarde - Urano, Netuno e Plutão, que agora fora excluído da lista por ser muito pequeno.
— Por que a Poliu contratou a assirióloga Carminna se sabem ler as tábuas?
Adriana levantou os olhos do prato que comia.
— Não sei.
— Para que Carminna foi levada à Sala de Controle Ala Cinco?
— Por que a pergunta? Não teve tempo de perguntar já que é ‘crescido o suficiente’ para certas coisas? Ou dormiu antes? — Adriana desfiou um veneno que Sean não sorveu, porque ele gargalhou com gosto, a deixando confusa. — Você a deseja?
— E o que é o desejo Tenente-coronel Adriana? Um artifício para ocupar lacunas existenciais? Porque para Santo Agostinho e Descartes o desejo estava ligado às decisões e ações; práticas erradas que levaram Santo Agostinho ao pecado, Descartes ao erro.
Adriana gargalhou com gosto.
— Mas veja que aberrações eventualmente cometem pessoas imaturas e cabeças de vento quando leem os filósofos.
— Cabeças de que?
— Muito bem, Sr. Queise! Vamos ser mais específicos quanto sua vinda a Indonésia! — Adriana resolveu dar um basta nas divagações dele. No fundo temia escutar que ele realmente desejava a Dra. Carminna. — Recentemente, alguns satélites automáticos atravessaram o cinturão de Marte e mediram a frequência de destroços que cruzam em suas proximidades, e o número medido era bem próximo do valor dado por Bode. Calou a boca dos incrédulos, mas não resolveu o mistério.
— Por que estamos tendo essa estranha conversa sobre planetas malditos, sumidos e destruídos, Tenente-coronel Adriana depois de me ver desejando algo mais?
Adriana sentiu que perdia o fio condutor.
— Dr. Santos pode responder essa pergunta muito bem. E não vai precisar dormir com ele.
Foi a vez de Sean gargalhar gostando dela, da ironia dela.
— Ah! Que bom, não? Mas me diga, Dr. Santos responderia isso porque ele é o especialista da Poliu? — foi a vez de Sean envenenar a noite. — Especialista no fragmentado cinturões de asteroides onde Bode calou os incrédulos? — Sean viu que Adriana não faria o jogo dele. — Ou especialista em bombas nucleares suficientemente poderosas para produzir um resultado assim?
— Um o quê? Isso é absurdo, se não uma ilusão para a maioria dos cientistas. E o Dr. Santos não foi contratado para explodir planetas Sr. Queise.
— E para o que ele foi contratado para explodir?
E Adriana brilhou os olhos, com algo passando pela cabeça dela, e Sean tentando captar, mas não conseguindo.
— O que fez naquele jantar Sr. Queise?
— Me alimentei! — sorriu cínico. — Você não?
E ela viu Sean a olhando com interesse.
Adriana chamou o garçom e fez o pedido do jantar. Sean ficou ali, quieto, esperando ela mandar nele.
— Não estou contradizendo nenhuma ciência, Sr. Queise, nem a filosofia que poucos entendem — ela viu a erguida de sobrancelha dele. — Só digo que as pessoas gostam de analisar as coisas que lhes dão medo, para olhar para elas e dar nomes. Os religiosos procuram a Deus, os cientistas procuram evidências, ambos estão tentando resolver o mistério para se livrarem do medo. A questão da origem de nosso planeta é delicada; de um lado temos a ciência de outro a religião.
— E onde um planeta explodido entra no seu empirismo? Porque os grandes pensadores já se debateram, filósofos que perceberam que a ciência possui crenças, enraizadas na fé, que ‘Credo ut intelligam’ é um princípio da ciência. E embora o ceticismo de David Hume fosse de uma qualidade e caráter, diferente do vulgar ceticismo dos que apenas duvidam por duvidar, Hume, Kant, empiristas do século passado diziam que a fé não era ontológica como previa Santo Anselmo, a existência é uma questão de fato, a decidir com base em evidências empíricas, e não algo que se possa provar por argumentos ‘a priori’ em cabeças incompletas — sorriu. — De vento... — soou cínico.
— Está bem! Parece que sua cabeça incompleta entende de filosofia. E daí? É uma corrente de pensamento ameaçado.
— Não é uma corrente, é Teoria de conspiração.
— Não tanto Sr. Queise.
E os pratos foram servidos. E ambos pareciam estar ali, gostando de estar ali.
— Giordano Bruno morreu uma morte ‘sem sangue’, na fogueira, porque acreditava em outros mundos. A igreja se sentiu ameaçada porque outros mundos requeriam outros deuses e toda a estrutura papal viria abaixo. Nada mudou Senhorita. Vamos ver mortes ainda por muito tempo toda vez que a tal ‘corrente de pensamento ameaçado’ se sentir ameaçado.
— Se é ameaçado, se deve a pessoas absurdas como Carminna, inventando que alienígenas destruíram uma segunda Terra onde vivíamos nós humanos, híbridos, absurdamente seres ‘misturados’ com o DNA desses alienígenas...
— Ah! Os sumérios também falam sobre os alienígenas Anunnakis, que significa ‘aqueles que vieram do espaço para a Terra’, provável em seus Cruzadores Solares, e aqui na Terra chegaram com sua tecnologia genética, nos gerando — Sean olhou para os lados e o restaurante cheio o irritou. — São os sumérios o verdadeiro interessante da Poliu, não Tenente-Coronel? Os sumérios e seus estudos de DNA?
— Não sei do que está falando e não conheço a Poliu. Responda você!
— O que te faz pensar que eu conheço a corporação de inteligência?
— Tirando o ódio mortal entre vocês dois? Você e a Poliu? — Adriana sabia o que falava.
— Não conhece a Poliu, mas sabe que ela existe ao ponto de me odiar.
— E ela o odeia, sabe por quê? Porque faz perguntas demais, Sr. Queise; questionando suas agentes na cama com perguntas demais, Sr. Queise.
— Wow! “Agentes na cama”? Então, Carminna, que é uma agente da Poliu, lhe disse sobre minha questão sobre...
— Me disse que você a questionara sobre sua estada ali! — cortou a frase dele e a brincadeira que não queria brincar.
Sean respirou pesado. Adriana realmente dizia que Carminna fazia relatórios.
Mas Sean sentia que Carminna não contara a ninguém sobre suas perguntas, então ficou confuso, sem ter muita certeza do que havia lido no éter.
— Alguns colisteiros dizem que há uma polícia misteriosa, vestida de terno preto, que vem escondendo algo há muito, muito tempo.
— Teoria da conspiração! — foi a vez dela.
— Roswell, Chupas-cabras, homens de terno preto...
— Teoria da conspiração, Sr. Queise! — se aproximou da mesa. — Não foi o que disse?
— Mas Carminna falou...
— A Doutora fala demais! — Adriana viu Sean calar-se. — Porque muitas vezes alguns autores se apropriam de pesquisas originais para criarem outras histórias, para atraírem público para si. Se a original já é espetacular por conta própria, estragam tudo criando estas outras ramificações; é o que acaba tornando tudo tão desacreditado.
Sean percebeu a alfinetada de Adriana no trabalho de Carminna Clemente, quando viu Rani radiante no sarongue vermelho se aproximando da mesa dele, não percebendo os cabelos loiro-platinados e soltos na cadeira em frente.
Rani inclinou-se com a bandeja e toda sua graça e Sean sorriu-lhe gentil.
— Não queremos mais nada Rani! — Adriana cortou a graça dos dois.
Sean arregalou os olhos azuis no que a Tenente-Coronel terminou de falar.
— “Não queremos mais nada Rani”? — Sean olhou para a balinesa e Rani abaixou a cabeça querendo ter podido explicar sua situação, mas não pôde, Adriana era uma superior. — Ela... — Sean olhou para Rani que esse afastava rapidamente.
— Ela começou ontem? — Adriana destruiu-o.
Sean arregalou os olhos azuis a quase deformar a face. Se não pelo fato de Rani, uma subordinada de Adriana, mas pelo fato dela saber que Sean a questionara sobre sua estada ali, de que ele fora mandando a Kuta, àquele exato hotel pela voz confusa de Mona Foad.
Teve medo da vida.
— Quem você está pensando que é? Quem você pensa que sou eu?
— Um subordinado como Rani!
Sean ergueu-se tão violentamente que não ficou lá parado, a balançar o pescoço nervoso, irritado demais até para levar em conta sua beleza.
E odiou-a, isso fora claro.
Amarrotou seu guardanapo, jogou-o em cima da mesa, se virou e foi embora para então girar no calcanhar, voltar à mesa e se inclinar sobre ela e toda sua beleza.
— Pascal dizia que o único esforço da razão era reconhecer uma infinidade de coisas que a ultrapassavam. De graças por isso, Senhorita — e se foi tão bravo quanto havia se aproximado.
E havia se aproximado tanto que por pouco Adriana realmente não comete um erro.
— Uma boa noite para o Senhor também, Sr. Queise! — ela disse depois dele se afastar.
Já Sean atravessou os corredores e alcançou sua suíte.
— Ahhh!!! — berrou para as portas que se abriram e se fecharam batendo, para depois se abrirem e baterem, se abrirem e baterem e se abrirem e baterem outra vez; tudo com a raiva paranormal dele, que não tocou em nenhuma delas no exercício empreendido.
Sean arrancou a roupa colorida e deitou-se agitado, acabando por ter pesadelos com aquela casa, a de mármore branco; a casa dos seus sonhos na qual fugia para lugar nenhum enquanto ela inclinava, inclinava, inclinava.
Acordou de repente todo suado.
Andava tenso, saindo do corpo, se desgastado mais que o normal.
7
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de alojamento.
20 de agosto; 03h03min.
— Oscar... — falou Sean Queise, baixinho, ao lado do travesseiro. Oscar Roldman se sobressaltou, levou algum tempo até ver que ele invadira seu quarto, que ele voltara à ilha, que estava ao seu lado; ou tudo aquilo era um sonho. — Você não está sonhando, Oscar. Acorde!
Oscar acordou naquela ordem.
— Sean querido, o que houve? Há quantas horas está desaparecido? Como chegou?
— Pare de fazer tantas perguntas! Não pode trazer Spartacus!
Oscar levantou a cabeça e o corpo de vez. Arrumou-se nos travesseiros para ouvi-lo melhor. Sabia o quanto ele era insistente.
O conhecia como ninguém.
— Ela te trouxe mesmo — colocou os óculos. — Onde você estava? Como Adriana sabia onde você estava? Rastrearam seu cartão de crédito?
— Sei lá como age a Tenente-Coronel Adriana. Pare com esse interrogatório, Oscar! — balançou o pescoço agitado. — Só sei que ela deve estar ocupada até agora tentado saber como o hidroavião que a levou a Bali foi parar no fundo do cais.
— “Bali”? Você... Você afundou...
— Eu não! Os amigos de Rani. Ela me devia favores.
— “Favores”? — Oscar nada entendeu. — Quem é Rani, Sean? Que amigos são esses? Como chegou até aqui? — olhou em volta, viu Sean de blusa colorida, com a barra das calças molhadas.
— Não entende, não é mesmo? A Poliu foi ela, eu sei. Colocaram esse chip na asa do satélite sem o consentimento da Computer Co.. Eu verifiquei.
— Você o que? Invadiu os computadores da Sala de Controle Ala Cinco?
— Fiz mais que isso. Eu ouvi tudo o que ficou lá, cada palavra, som e discussão que se perdeu no éter. Cada frase dita por cada um que ali esteve ontem.
— “Ontem”? Mas você não estava aqui ontem Sean. Meu Deus, meu filho. O que você...
— Formas-pensamento! — e Sean só esperou Oscar erguer o sobrolho. — Sabia Oscar, que para Carl Jung, podemos ter percepções intuitivas por meio da exploração do inconsciente coletivo? Formas-pensamento, Oscar — Sean viu Oscar acordar de vez. — Formas-pensamento causadas pelo pensamento atuante que gera uma forma, formas que ficam no éter, plasmadas, porque pensamentos tomam vida, pensamentos dão origem a uma série de vibrações, pensamentos que atuam na matéria do corpo mental, pensamentos que podem matar — Sean viu Oscar erguer-se da cama. — Porque você sabe que se um homem pensa algo de alguém, fortemente, esse pensamento cria no éter-cósmico uma forma-pensamento própria desse sentimento.
— Está dizendo que essa... Essa forma-pensamento pode se depositar no éter-cósmico?
Sean calou-se.
Andou de um lado para outro do quarto-sala de Oscar Roldman em círculos, e então se sentou.
— Alguns estudiosos da parapsicologia afirmam que objetos não guardam informação, o que contraria conceitos do espiritismo que acreditam que o inconsciente é portador de conhecimento além das possibilidades de tempo e espaço, e dele pode-se obter então acontecimentos, que podem gerar formas-pensamento, como as que ficaram plasmadas na Sala de Controle Ala Cinco.
— O que leu lá, Sean?
— “O que era aquilo no Sol? Um Sun Flare?”, disse A. “Não acho que aquilo fosse um ‘Vento Solar’. É um sangramento de pixels, um efeito eletrônico, relacionado com o sensor da câmera. O raio segue as linhas de coleta de carga do sensor, e por isso é perfeitamente vertical em relação à imagem”, disse B. “Mas supondo que não tenha sido uma fraude, o que penso não ter sido, então foi provavelmente um defeito comum em câmeras baratas, como aquelas em celulares”, disse C. “Não, não, não. Foram apenas exemplos de sangramento de pixels. Ele ocorre quando as fontes de luz excedem a capacidade do sensor da câmera. A sobrecarga vaza para pixels adjacentes, comumente seguindo a trilha de canais elétricos do sensor. Trilhas estas que são perfeitamente perpendiculares e retas”, voltou a dizer B. — Sean viu Oscar arregalar os olhos, já que ele próprio tinha olhos vidrados. — “Um vídeo praticamente idêntico, em que os raios foram causados pelo mesmo defeito do sensor, foi capturado em Bandenburgo, Alemanha, há alguns anos”, disse D. “O defeito é corriqueiro em imagens capturadas por sensores digitais, e por isso mesmo, fonte de muita confusão; e alguma exploração por parte de mistificadores”, disse C rindo. “Há alguns anos, por exemplo, um grupo inglês fez barulho alegando que imagens de um satélite da NASA mostravam enormes discos voadores próximos do Sol, que por algum motivo sempre eram fotografados de perfil; eles os chamavam de Suncruiser, ou Cruzador Solar”, disse E.
— Sean...
Mas Sean ergueu a mão o calando.
— “Um UFO?”, voltou a dizer A. “Sim. Um grande UFO, uma nave interplanetária do tipo ‘nave mãe’”, disse E. “Isso. Isso. Há algum tempo atrás, este tipo de imagem fez furor entre os ufólogos do mundo inteiro, os objetos nelas contidos eram chamados de Cruzadores Solares. Parecia que finalmente se tinha conseguido uma prova oficial de que existiam naves extraterrestres, mas tudo foi desmentido”, voltou a dizer B — e Sean parou para respirar. — Depois o entusiasmo diminuiu quando descobriram que qualquer astro ou planeta refletindo a luz solar, gerava imagens semelhantes àquelas naves divisadas pela análise espectral — e Sean parou de falar no que Oscar perdera a fala.
— Sean... — foi só o que conseguiu voltar a falar perante tudo aquilo.
Oscar realmente temeu no que seu filho se tornava.
— Quem desmentiu o que, Oscar? Foi a Poliu? Sorrateira? Canalha desgraçado! Trevellis esperou seis meses para ativar aquele chip. O ativou para que eu nada soubesse sobre a porta serial, entendeu? Porque um garoto de quinze anos jamais saberia! Droga! Até quando Oscar? Até quando Trevellis vai me desafiar?
— Não bastou invadir a mente de todos na Sala de Controle Ala Cinco, também invadiu os computadores de Trevellis Sean?
— Meus computadores!
— Não Sean! Você invadiu o controle de lançamento situado na Cidade de Xichang? — apavorou-se. — Não vê o que faz? Que Trevellis o provoca? Que você vai perder o controle dos mainframes da Computer Co. como perdeu as senhas de acesso a Spartacus?
— Você me tirou as senhas!
— Não fiz nada! Foi seu pai quem proibiu você de usá-las.
— Meu pai... — e Sean sentiu todo sua estabilidade ruir. Mr. Trevellis mandava em seu pai. Provável em Oscar. — Vocês todos me enganaram... — prosseguia Sean. — Como acho que me sinto? Um idiota é como me sinto! — e se levantou. — Porque eu sei que a Poliu o quer destruído.
— Sean até quando vai levar essa guerra com a Poliu?
— Até eles pagarem pelo que fizeram a Sandy!
— Sandy era uma ladra, uma agente dupla. Enterre-a!
— Não! Não! Não!
— Eu sinto Sean, mas a própria Poliu investigava Sandy há muito tempo. Muito antes de você a conhecê-la. E ela foi colocada dentro da Poliu por alguém externo.
— Não! Não! Usaram minha amiga Mona para segui-la...
— Mona era uma espiã psíquica, Sean. Ela mentalizou, perseguiu Sandy até a Computer Co., e a viu copiar coisas. Até Kelly acreditava...
— Eu não acredito nisso! — Sean cortou a fala dele. — Armaram para Kelly, armaram para mim, estão armando para você, Oscar, como armaram para Mona.
— Do que está falando? Acha que Mona pode ser enganada?
Aquilo doeu nele. Era verdade, Mona era uma espiã psíquica, com a chamada visão espiritual, que a permitia enxergar objetos e pessoas fora do meio físico.
Que se utilizava da telepatia, pelo qual adquiria informações providas da mente de outra pessoa, como usava a clarividência, atrás das informações que provinha dos objetos.
Sean voltou a andar em círculos.
— Eu vou!
— Como assim, “Eu vou!”?
— Vão mentir para os jornais sobre essa viagem, não vão? Ah! Claro! Não é mentir é omitir — ironizou e viu Oscar fazer uma careta. — Invente que uma das lentes precisa ser corrigida, e mandará esse tal ônibus espacial experimental até lá. Eu irei, junto.
— “Junto”?
— Ele está pronto no Centro Espacial de Xichang, na República Popular da China. É o local de lançamento da maioria dos satélites comerciais estrangeiros. E uma vez no espaço, posso desligar os computadores da Computer Co., e controlar Spartacus manualmente. Posso alterar algumas linhas de comando no programa e redirecionar a asa ocupada para liberar o chip no espaço, sem danificar o satélite de observação por causa dos neutrinos, e isso, Oscar querido, todos eles sabiam quando me trouxeram para cá — debochou pela última vez.
Saiu pela porta que abriu não tocando na maçaneta para abri-la.
Oscar chamou o General Arthur pelo telefone.
Tinham muito a conversar.
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; Sala de Controle Ala Cinco.
20 de agosto; 09h00min.
Oficiais de segurança e cientistas estavam tensos com o novo rumo dos acontecimentos. Sean Queise foi apresentado a todos, mas não conseguiu saber quem gerara as tais formas-pensamento.
Conheceu o Dr. Yàn Zhu, cientista em computação que controlaria os computadores de bordo do ônibus espacial experimental em que eles viajariam; experimental quanto, Sean não sabia. Acreditava mesmo que a Poliu vinha desenvolvendo naves que pudessem ir mais longe que todos já foram.
Zhu era de nacionalidade chinesa, de estatura pequena, de trejeitos que acentuavam, quando ele tentava enxergar através da inclinação dos óculos de lentes tão fortes que Sean diria ser ‘fundo de garrafa’.
Conheceu o Dr. Schumann Goethe, engenheiro genético que ficaria encarregado do controle do DMARS, um software de supervisionamento de suprimentos de oxigênio e alimentação.
Schumann era de nacionalidade alemã; moreno, alto, magro, de cabelo liso e arrepiado. Era de uma beleza nórdica, e estava na casa dos cinquenta anos, considerado um homem de humor imprevisível.
Conheceu Andrea Bardini, engenheiro mecatrônico. Ele também estaria no controle do DMARS.
Andrea era de nacionalidade italiana, ruivo, com heterocromia, um olho castanho e outro azul, extremamente mal-humorado, encarregado do suprimento de energia do ônibus espacial experimental.
Conheceu o Dr. Bruno Pierre, engenheiro de comunicações, encarregado dos computadores de voo e de Terra.
Bruno era de nacionalidade francesa, de pele extremamente branca, com cabelos loiros e ralos apesar de ser muito jovem, 22 anos, detentor de uma carreira fulminante na área das Comunicações e Multimídia do MIT. E apesar de ainda pouco recuperado da última crise de nervos, e embora Adriana o achando debilitado, fora designado sem que ela pudesse interferir.
Conheceu a Dra. Stella Kovács, cientista das matemáticas que em conjunto com Bruno, controlariam os computadores após o chip ser colocado numa caixa gelada propriamente desenvolvida, para manter materiais delicados longe das fortes temperaturas de uma reentrada.
Stella era de nacionalidade húngara, uma mulher bonita, extremamente magra e apática, diziam, assexuada.
Conheceu Dra. Hanna Cahs, engenheira robótica, assistente de Ítalo que costumava usar perucas das mais diversas tonalidades.
Hanna era de nacionalidade norueguesa, e havia se envolvido em uma confusão com a Tenente-Coronel Adriana por causa de um grupo especial de agentes da Poliu, que Adriana fizera parte no passado e que ela, Hanna, gostaria de sair bradando aos quatro ventos se não fosse a advertência recebida pelo General Arthur.
Sean realmente gostaria de saber mais sobre Adriana e sua rede de informações eficiente ao ponto de saber o que ele e Carminna conversaram, mas nada conseguia. E era eficiente ao ponto de manter os dois separados, ocupando Carminna desde aquela manhã em que ele voltara de Bali, trancada num laboratório.
Lá, Carminna ficou sem ver praticamente a luz do dia, decifrando uma tábua cuneiforme que Sean não conseguiu ter acesso.
O Dr. Santos trabalharia interligado à Arecibo e Noah trabalharia nos sinais radioastronômicos, ambos supervisionados pela Tenente adjunto Nadir, encarregada das comunicações auditivas da expedição.
A Tenente-Coronel Adriana ficaria encarregada do controle das comunicações visuais entre a Sala de Controle Ala Cinco e o ônibus espacial experimental; e isso incluía as câmeras externas que também ficariam no comando de sua tela.
O Major Henrique por fim supervisionaria Zhu, Schumann, Andrea, Bruno, Stella, Hanna, Santos, Noah, Nadir e Adriana, sendo que ainda outros oficiais de segurança trabalhariam no resgate sem que estivessem diretamente ligados a Sala de Controle Ala Cinco.
Já a Dra. Carminna Clemente e o Dr. Ítalo Piieno apenas observariam.
Enquanto isso, o Centro Espacial de Xichang se preparava para uma viagem do ônibus espacial experimental da Poliu, em direção a Spartacus. Após o lançamento, o controle ficaria a cargo da Polícia Mundial na Sala de Controle Ala Cinco da paradisíaca ilha secreta.
O piloto designado para ir ao espaço seria o conceituado Comandante Alpheu Smith, experiente em viagens espaciais. Apesar de Sean achar seus cabelos avermelhados um tanto estranho, o currículo do Comandante era invejável; cinco viagens com os extintos foguetes tripulados ao redor da Terra e uma ida à Lua.
O piloto assistente seria o Major Clarck Johnson, um baixinho de mãos finas e cacoetes nos olhos, conhecido exímio cientista em computação. Oscar havia lhe dito que o Major Clarck seria o responsável direto pelo resgate do chip, por estar mais acostumado com o espaço.
Clarck estava encarregado de flutuar até o satélite de observação e trazer o chip para dentro do ônibus espacial experimental após a sua liberação da segunda asa direita de Spartacus.
Da Poliu, nada se falou e nada se falava, comumente. A corporação de inteligência era um segredo para a maior parte do mundo.
Já Oscar Roldman havia, desde as primeiras horas do raiar do dia, ido para o Centro de Lançamentos de Satélites de Xichang. A base de lançamento continha o Centro de Operações, Centro Técnico, Centro de Comunicações, Centro de Comando e de Controle, Estação de Rastreamento, bem como demais instalações de apoio. A base de lançamento estava subordinada ao Controle Central de Lançamento e Rastreamento de Satélites. Costurava o já tão remendado ofício que leria para a comunidade científica, e já havia muitos repórteres de plantão para receber o todo poderoso homem da Polícia Mundial em seu pronunciamento; estavam ansiosos para saber o porquê de uma nova e tão repentina viagem ao espaço.
Oscar se encaminhou para dentro da sala receptiva onde havia no auditório, quinze jornalistas, e Sean não ficou sabendo de nada da tal reunião, mas acreditava que, em se tratando dele muita mentira rolaria por lá.
— Ah! É omissão! — riu se corrigindo.
Aos poucos, em meio a toda aquela tensão, Sean começava a ter uma pequena noção da dificuldade de sua missão.
O General Arthur ainda não viera falar com ele desde seu retorno à ilha. Dele, só a ordem que acabava de chegar à pancada que se fez à porta do seu quarto-sala, na qual descansava após a sua saída da Sala de Controle Ala Cinco.
— Com licença Sr. Queise — falou o oficial de segurança da ilha secreta. —, o Dr. Jofre o espera.
Sean o seguiu já avisado sobre os exames médicos.
Complexo B; laboratórios de teste.
20 de agosto; 15h55min.
Sean fez o mesmo caminho para os laboratórios BSL-4, Biosafety Level 4, mas virou dessa vez à esquerda. O carrinho de locomoção andou bastante, provável o túnel por onde trafegava com o oficial de segurança, interligava o Complexo A ao Complexo. B.
Ele desceu quando o oficial de segurança parou e entrou numa sala espaçosa, iluminada, cheia de aparelhos de ginásticas e mais alguns aparelhos que Sean nem imaginavam para o que serviam.
— Bom dia Sr. Queise. Sou o Dr. Willian Jofre, mas pode me chamar só de Dr. Jofre — esticou uma mão enluvada.
— Me chame de Sean, Doutor.
— Ótimo Sean. Serei eu quem encaminhará um parecer favorável ou não o Centro Espacial de Xichang, sobre sua viagem ao espaço. Sinto informar que se não passar nos testes não poderá ir — completou Dr. Jofre com uma gordura espalhada pela barriga que fazia qualquer um pensar numa bexiga inflada. Óculos no rosto suado, cabelos oleosos e uma perna mais curta que a outra, o fazia um personagem de desenhos animados.
— Está querendo dizer que se for reprovado não irei Doutor? E eles trarão Spartacus e o destruirão na reentrada? — e Sean ficou olhando o rosto controlado do Dr. Willian Jofre. — Tenho alguma alternativa? Suborná-lo, talvez?
— Sente-se, por favor! — apontou-lhe a poltrona não gostando da ironia. — Irá passar por uma batelada de exames e alguns exercícios de esforço físico serão feitos.
Sean apenas observava, sabia que passaria horas naquela agonia.
Por fim o Dr. Willian Jofre anunciou.
— Parece que fisicamente não tem nada.
— “Parece”? Como assim? Estou doente? — Sean se olhou preso a eletrodos.
— Está estressado, e isso não é bom — o Dr. Willian Jofre leu na tela do computador. — Pode ter um colapso sob efeito de psicotrópicos.
— Então não serei dopado?
— Não; é claro que não. Ou não suportaria o impacto da falta de gravidade sobre seu coração. A falta de gravidade enfraquece a musculatura e sob a pressão do momento vivido, Sean, pode acreditar, a musculatura do seu coração não resistirá.
Sean inclinou o pescoço para a direita, estava nervoso.
— Eu sempre ouvi sobre isso.
— O coração costuma diminuir de 20 a 30 % de seu tamanho. O músculo do coração não encontrando gravidade não cola nas paredes cardíacas.
— O que propõe Dr. Jofre?
— Hipnose! Passará a acreditar que tem mais peso do que realmente tem e tentará ‘anexar’ um pouco mais de carne a seus ossos.
— Nunca ouvi falar nisso.
— Desculpe-me, não tenho autorização para falar sobre experiências secretas — e prosseguiu com a seringa vendo que Sean sentiu um embrulho no estômago.
— Isso é necessário?
— Não se preocupe. São apenas vitaminas. As anfetaminas estão proibidas e também as... — e o Dr. Willian Jofre parou de falar quando o General Arthur entrou na sala seguido da Tenente-Coronel Adriana, que Sean olhou assustado; aquela fotografia voltou a perturbá-lo.
— Não se preocupe com nada, Sr. Queise, seus computadores ajudarão na viagem — General Arthur riu com gosto antes mesmo de cumprimentá-lo, vendo Sean limitar-se a olhá-lo. — Não acha estranho, ter sua vida nas próprias mãos?
Sean sentiu um frio no estômago, não gostava daquele corpulento homem.
— Sean precisará fazer a cultura de urina. Se não apresentar nenhuma anomalia poderá viajar em seguida — falou Dr. Willian Jofre enquanto mancava de um lado para outro. — E será a última resposta a dar, General Arthur.
— Está bem Dr. Jofre. Esperaremos ansiosos.
— Como será feita a hipnose, Dr. Jofre? — questionou Sean sem ainda trocar palavra alguma com os recém-chegados.
— Calma, Sean, um passo de cada vez.
— Calmo? Claro! Estarei, afinal, entre uma cruz e um Mushhushshu — e direcionou um olhar a Arthur que o odiou por aquilo; Sean falava por metáforas.
Já Adriana ficou a observar Sean Queise sem camisa. Gostou do que viu, do que talvez ele fosse crescido para fazer.
— Ficará em estado de imersão, Sean. Será hipnotizado, e uma vez sonado, dormirá todo o trajeto. Ficará condicionado dentro de uma das estações de sono, preso por correias a um painel. O controle será feito pelo computador que trará informações diretamente de seu corpo, através de eletrodos colocados na sua cabeça, e que por sua vez o ligarão a um polissonograma.
— Polissonografia, exame do sono.
— O polissonograma testa e monitora três parâmetros; EEG ou eletroencefalograma, o EOG ou eletro-oculograma, e o EMG ou eletromiograma sub-mentoniano. Sensores de movimento nos membros inferiores contribuem para o diagnóstico de doenças relacionadas ao sono, e o registro gráfico dos impulsos elétricos mostrará a atividade de seu cérebro — explicou-lhe, Dr. Willian Jofre.
— Então os impulsos elétricos ainda são estáveis quando deixamos nosso corpo, Doutor? — Sean voltava desafiar o General.
— “Deixamos nosso corpo”? — Dr. Willian Jofre não entendeu. — Como assim?
— Quando saímos do corpo, viajamos pelo astral alcançado níveis superiores de inteligência, Doutor, uma dimensão mais próxima da física, é verdade, mas uma dimensão que envolve e permeia o nosso mundo como uma enorme malha mental, absorvendo e guardando todos os pensamentos do perispírito — Sean viu o Dr. Willian Jofre escorregar um olhar a Arthur.
— Acho... Acho que nunca testei ninguém no astral Sean.
Sean riu gostando dele, vendo que Adriana o olhava de uma maneira diferente.
Já o Dr. Willian Jofre nada percebeu, virou-se para arrumar alguns instrumentos e Sean começou a tirar os eletrodos.
— Acha... — e Jofre não sabia mesmo como continuar. —, que tudo que pensamos, guardamos em algum lugar?
— O Sr. Queise está cansado Dr. Jofre — Arthur tentou parar aquilo.
— Acho Doutor... — Sean não gostava que lhe dissessem quando parar. —, que existe um lugar onde todas as formas-pensamento se convergem, se encontram, driblam batalhas — e Sean olhou Adriana. — Conteúdo criado pela consciência coletiva da mente do mundo.
— “Consciência coletiva da mente do mundo”? Isso é mesmo interessante! — o Dr. Willian Jofre parecia pensar em algo. — Acha que tudo que pensamos tomam formas, Sean?
— Formas-pensamento num local mágico onde todos os pensamentos, lembranças, fantasias e sonhos de toda e qualquer coisa viva nesses mundos, aqui e afora, criados por Deus, estão arquivados, Doutor? Sim. E também o amor, a saudade, e a dor.
E Adriana o amou naquele momento.
Sean sentiu aquele amor. Recebeu a mensagem, porém, totalmente confuso.
Ela se virou e foi embora e o Dr. Willian Jofre viu alterarem-se os batimentos de Sean vindos dos eletrodos ainda presos a ele.
— Está se sentindo mal Sean?
Sean olhou Adriana sumir de sua vista de vez.
— Estou bem...
— Ótimo! Não há mesmo nada com o que se preocupar Sean. Estará preso ao seu peito uma de nossas últimas aquisições. Um decodificador que ouvirá, pode-se dizer assim, as batidas de seu coração e calculará a quantidade de sangue que circula por ele.
— Um decodificador?
— Isso fornecerá uma informação da pressão sanguínea que ocorre dentro de seu organismo, sem precisar estar preso a qualquer computador caso...
— Caso estes falhem — sorriu o General Arthur, irônico, cortando o final da explicação do Dr. Willian Jofre que também desgostava dele ali.
— Não se preocupe Sean. Fará testes gravitacionais aqui na ilha, por uns três dias. Isso diminuirá o impacto.
Sean pegou a camisa que depositara sob a cadeira, encarou Arthur antes e depois de vestir-se e quebrou o silêncio.
— Posso ir?
— Sim! Está dispensado, Sean!
8
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
23de agosto; 22h00min.
Sean ficou sem comunicação com qualquer componente da Sala de Controle Ala Cinco ou seu funcionário Gyrimias por três longos dias. Estava cansado, exausto mesmo. Nunca pensou que brincar de astronauta provocasse tanto cansaço.
Dentro da máquina que simulava o espaço, ele caminhou por aqueles longos três dias. Era o que chamavam de EVA, Extra-Vehicular Activity ou Atividade Extra-veicular; um passeio fora do veículo espacial, uma caminhada espacial.
Sean sentia-se estranho dentro da roupa recheada de oxigênio. Não compreendia o porquê dos testes se não ia sair do ônibus espacial experimental.
Olhava insistente para o mostrador de cristal líquido colocado sobre seu peito, controlando o tempo todo a quantidade de combustível da cadeira voadora em que acoplado, lançando jatos de nitrogênio líquido, a fim de se mover.
Por outro lado estava extasiado, não sabia que aquela ilha possuía equipamentos de tamanha complexidade. Não recordava da última vez que lá estivera de saber algo sobre laboratórios subterrâneos, ou área de testes.
Voltou para seu quarto-sala meio zonzo, receando a viagem que faria, decidido nada falar a Kelly ou ela não aprovaria aquilo. Ela nunca aprovava suas decisões.
Sean adormeceu.
9
XSLC, Centro Espacial de Xichang; Província de Sichuan, República Popular da China.
28° 14’ 45.66” N e 102° 1’ 35.6” E.
24 de agosto; 11h11min.
Um jato particular o levou para Sichuan, situada na parte ocidental da China, cuja capital é Chengdu. Sean fez rápidas e seguras viagens apesar do tempo carregado por sobre o Pacífico. Porém os pesadelos com aquela casa voltaram, um atrás do outro; aquilo começava a irritá-lo. E o irritava nas várias horas que passava pensando, porque nunca havia se sentido assim tão absorto.
Também pensava na dor, na perda de Sandy Monroe, no quanto sentia sua falta, no quanto se culpava pela morte tão prematura, saindo do corpo a se lançar no éter mesmo quando não se deitava, tentando encontrar o tal espaço depositário onde as formas-pensamento ficavam ali, vagando.
Queria desesperadamente se comunicar com Sandy, pedir-lhe perdão, não enterrá-la.
Passeava pelos jardins do Centro Espacial de Xichang sempre a observar o céu sobre sua cabeça. Lá, também, reencontrou alguns amigos, também antigos funcionários da Computer Co.. Somente com Kelly Garcia, Sean não falou, não quis falar. Sua secretária Renata recebeu todas as diretrizes a serem tomadas naqueles dias de sua viagem.
Kelly chorou muito por ter sido excluída da vida dele, mas Sean a amava de uma forma tão desesperadora, que o fato de amá-la o adoecia. Porque ele sabia que tal decisão faziam ambos sofrem, mas era necessário. Pela segurança dela, da unidade dos pais e a Computer Co., que não podia mais ser afetada por suas escolhas amorosas, de um moleque hacker que não sabia o que era amar.
Os dias passaram bem rápido, Sean mal pôde acreditar quando lhe foram chamar para a partida do ônibus espacial experimental.
— Sr. Queise? — chamaram à sua porta. — Está preparado?
Sean sorveu a última dos milhares de xícaras de café que tomara.
— Tenho opção? — perguntou ao seguir o oficial de segurança do Centro Espacial de Xichang que não respondeu.
O Cosmo o esperava.
10
35.786 km; órbita geoestacionária.
27 de agosto; 08h17min.
O salto do sapato marcava o mármore de Carrara branco. O som era estridente, não cessava enquanto corria.
E Sean corria, corria, corria sem parar.
Um brilho dourado se fez logo à frente. Um elevador metálico em forma de abóbada que abriu suas portas. O garoto bonito se atirou dentro dele no mesmo momento que armas disparavam em seu sonho, explodindo feito fogos de artifício.
O ar rareava e ele sentia dificuldades para respirar.
“Socorro!!!”, gritou Sean sem que sua voz parecesse se propagar.
A porta se fechou enquanto encolhido, enquanto crescia, enquanto virava homem, ficava adulto, abrindo andar acima.
O ar parecia voltar a seus pulmões e o corpo ágil, agora grande, se jogou para fora. E voltava a correr, correr, e correr sem parar.
Moderna a casa, enquanto sua fuga modificava. Envelhecia, amarelava. Pessoas estranhas brincavam à sua volta em meio a luz forte, escondidas em máscaras, em fantasias estranhas, de outras eras, de outras paragens, com música suave que tocava, pessoas que lá também conversavam cantavam, iam e vinham mascaradas, fantasiadas, volitando, sem que seus pés tocassem o chão sem que Sean as reconhecesse, compreendesse.
“Quem são vocês?”, se perguntava a olhar para os lados, para a luz que tentava cegá-lo.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO... — alguém sussurrou, mas Sean não entendeu o que lhe foi dito.
E as pessoas pareciam felizes, pareciam estarem em harmonia quando tudo cessou; a música, a luz, o ar. Tudo escureceu e Sean também tentou respirar, mas não conseguiu. As pessoas à sua volta morriam, caindo seus corpos estranhos no chão, uma após a outra, com pés e mãos se transformando em tentáculos murchos, envelhecidos.
Sean tentava alcançá-las, ajudá-las e acudi-las, mas não saía do lugar, sem respirar, morrendo também.
A luz voltou a aparecer e Sean conseguiu soltar-se do piso; correr, correr, e correr insistia a seus pés, enquanto portas se seguiam à sua frente e a casa inclinava, inclinava, inclinava.
Mas sua mão se ergueu até a fechadura da porta, que abriu antes mesmo de tocá-la. Portas que ficavam mais altas, com alto, também ficando o pé-direito, onde o lustre de designer moderno virava cristal, luzes substituídas por velas e o suor que escorria pela fuga, o cegava no grande salão repleto de corpos mortos, estranhos corpos com membros em forma de tentáculos.
E Sean corria, corria, corria.
“Socorro!”; ecoou a voz estridente de Sandy pela velha casa.
“Sandy?”, Sean estancou.
Encostou-se à parede que voltava a erguer-se, ficar em 90°, enquanto, a voz dela pedia socorro.
“Socorro!” voltou Sandy a sofrer.
Portas e mais portas e Sean tentou as abrir. Estava desesperado, tentando encontrá-la, ajudá-la, enterrá-la.
Mas estavam trancadas, trancando-o.
“Sandy?!”, gritou Sean.
“Socorro!”, Sandy sofria.
“Não Sandy!!! Tire-me daqui!!!”, voltou sua voz ecoar por corredores de mármore Carrara, de pessoas mortas.
“A PORTA DO FUNDO...”; sussurraram ao seu ouvido.
Mas não era a voz de Sandy que lhe falava, não era a voz da noiva morta que sofria.
“A PORTA DO FUNDO...”; sussurraram ao seu ouvido outra vez.
Sean outra vez sentiu-se como o filósofo Thomas Hobbes, com medo, procurando sem encontrar a voz que lhe sussurrava.
Correu, correu, correu e uma grande porta se moldou; as chaves penduradas, os ferrolhos trabalhados em bronze puro, a seda dependurada nas maçanetas, e a porta que se abriu sozinha.
Sean virou-se para trás e todas as outras portas por onde passara haviam sumido, virou-se para frente e a grande porta o esperava, aberta.
“A PORTA...”; sussurraram outra vez.
Sean se viu entrando, volitando pelo mármore branco, abrindo armários, invadindo com mãos trêmulas os espaços preenchidos por roupas grandes, vestidos e bolsas, perucas e complementos afastados por ele sem que conseguisse identificar seu proprietário.
O quarto era gelado, e Sean só compreendia que fugia de algo, de algo ruim que se aproximava; podia pressentir.
“Quero acordar!”, implorava.
“AINDA NÃO É HORA!”; respondia a voz desconhecida em seu inconsciente.
“Não!!!” e a cápsula do sono abriu.
O corpo de Sean Queise envolto em lençol brilhante se atirou no vácuo do ônibus espacial experimental. Imóvel, penso no ar que não existia, hipnotizado.
Ilha da Polícia Mundial.
Complexo A; Sala de Controle Ala Cinco.
27 de agosto; 22h55min.
— Major Henrique Loyola?! — gritou Gyrimias Leferi na Terra, na Sala de Controle Ala Cinco, ao ler a tela de seu computador. — A estação de sono abriu!
— Que estação? — perguntou a Tenente-Coronel Adriana confusa, dentro da Sala de Controle Ala Cinco, controlando a equipe da Terra.
— A estação de sono do Senhor Sean Queise... — falava Gyrimias ofegante, com olhos esbugalhados. — O computador avisou que ela foi aberta!
Todos se olharam perante o silêncio que se fez dentro da Sala de Controle Ala Cinco e olharam Gyrimias no controle, porque Sean havia telefonado do Centro Espacial de Xichang, e orientado Gyrimias Leferi pessoalmente.
Não confiava em mais ninguém.
— Impossível! — exclamou a Tenente-Coronel Adriana de imediato. — Deixe-me ver isso! — ela empurrou Gyrimias com mãos fortes.
— Saia Adriana! Eu vejo isso! — proclamou o Major Henrique sentando, e a tela do computador de Gyrimias escureceu.
— Meu Deus! — exclamou Dra. Carminna nervosa, sentada entre Gyrimias e Noah, vendo a tela negra. — Isso é um vírus nos computadores?
— Como? Como? — tentava Adriana entender.
— Calma! De nada adianta o desespero! — falava o Major Henrique que se levantou e voltou a seu computador, digitando ordens ao computador do ônibus espacial experimental, que também desligou subitamente. O Major Henrique olhou para o lado confuso. Levantou-se num rompante, e agora empurrando Noah, arrancou o microfone das mãos de Nadir para tentar um contato. — Comandante Alpheu Smith? — chamou o Major Henrique ao piloto do ônibus espacial experimental pelo microfone.
Apenas um ruído foi escutado.
— Estamos sem comunicação com o ônibus espacial experimental! — exclamou o engenheiro de comunicações Bruno, incrédulo.
— Também não consigo ouvir mais nada — completou a Tenente adjunto Nadir, também encarregada da comunicação.
Todos se olharam.
— O que está acontecendo? — falou o General Arthur ao ser chamado por Adriana, amarrando o cordão do robe na larga cintura.
Foi seguido por Oscar que correu até a Sala de Controle Ala Cinco nem soube com que forças.
— O Senhor Sean Queise está solto no compartimento da tripulação.
— Como solto? — perguntou Oscar olhando Gyrimias, olhando para toda a Sala de Controle Ala Cinco tentando entender.
— As correias da estação de sono abriram e o Sr. Queise está hipnotizado, flutuando — explicou a Tenente-Coronel Adriana.
— E isso é perigoso? — correu Oscar Roldman, a questionar, enquanto arrumava os cabelos esbranquiçados totalmente em desalinho.
— Ele pode se chocar com alguma coisa e se machucar, fora isso, não acredito num mal qualquer — respondeu o engenheiro de comunicações Bruno.
— E essa estação de sono era segura?
— Sim, Sr. Roldman! Como não tem gravidade dentro do ônibus espacial experimental, as camas não precisam de colchão. Os astronautas dormem preso por correias a um painel. Não compreendo como poderia ter se soltado sozinho. Só o computador ou alguém do lado de fora poderia ter acionado as correias para se soltarem — completou um Dr. Schumann incrédulo.
— Por que Sean não acordou, então? — estranhou Oscar vendo o Dr. Santos digitando algo como louco no final da Sala de Controle Ala Cinco.
A Tenente-Coronel Adriana também percebeu que o Dr. Santos trabalhava em algo.
— É mesmo muito estranho porque o tempo de hipnose já deveria ter terminado. Só que meus monitores ainda o mostra relaxado — explicou Dra. Stella.
— Sr. Queise está dopado! — exclamou a Tenente adjunto Nadir de cabeça baixa.
— Nadir! — exclamou Adriana furiosa, até demais. Instalou-se um silêncio total na Sala de Controle Ala Cinco. Adriana olhou para os lados perdida. — Achamos melhor medicá-lo quando chegou ao Centro Espacial de Xichang — explicou ela sob pressão de olhares superiores.
O Dr. Jofre arregalou os olhos, não entendeu como aquilo escapara dele.
— Sean não tomaria nada de estranho — pensou Oscar, em voz alta.
— Ele não sabia. Tomava sempre no café que levavam a ele — respondeu a Tenente adjunto Nadir sem olhar para trás.
— Sr. Queise tomou cafeína? — falou o Dr. Jofre horrorizado.
Oscar agarrou o General Arthur pelo pescoço.
— Eu não... — Arthur não respirava. — Eu não sabia...
O Major Henrique precisou intervir rapidamente, soltando o General dos punhos fortes de Oscar, que precisou de alguns minutos para se recompor.
A Tenente-Coronel Adriana prosseguiu, ainda cabisbaixa:
— Misturamos o café a alguns psicotrópicos que agiriam sobre o psiquismo, como estimulante. Não podíamos dar-lhe a chance de desistir.
— “Não podíamos”? — Oscar se descontrolava. — Quem não podia o quê?! — esbravejou.
— Parcelada qualquer atitude de interferência minha, Senhor — interveio Gyrimias a Oscar. —, tenho que avisar que isso pode provocar perturbações psíquicas no Senhor Sean Queise.
— “Perturbações?!” — gritou Dr. Jofre. — A quantidade de psicotrópicos poderá matá-lo! — agitava-se chocado por terem passado por cima de suas ordens.
— A cafeína aumenta os níveis de dopamina no organismo, o que também contribui para o seu efeito estimulante — tentava Adriana justificar-se.
— Poderiam ter provocado uma parada cardiorrespiratória ou até uma embolia cerebral.
— Chega! Nada disso vai acontecer! — e Oscar se ergueu da cadeira fuzilando o General Arthur no que o Doutor acabou de falar. Oscar andava sem rumo. Depois girou sobre os calcanhares e colou no Dr. Jofre. — Sean terá visões perturbadas como as provocadas pela cocaína?
— A dopamina é um neurotransmissor, precursor natural da adrenalina e da noradrenalina. Tem como função a atividade estimulante do sistema nervoso central...
— Por quanto tempo? — Oscar cortou qualquer explicação.
— Vai depender o quanto de café ‘batizado’ ele tomou! — Dr. Jofre estava uma fera.
O Major Henrique que observava, apenas, se assustou com a voz aguda do chinês quebrando o silêncio.
— Eu não entendi — falou o Dr. Yàn Zhu, encarregado dos computadores de bordo do ônibus espacial experimental, tentando enxergar a Sala de Controle Ala Cinco com seus óculos ‘fundo de garrafa’. —, desde que o Sr. Leferi deu o alerta sobre a soltura do Sr. Queise, que os computadores travaram.
— “Travaram”? — Henrique quis saber. — Todo o comando?
— Sim Major — foi à vez do Dr. Santos se pronunciar. —, mas antes as câmeras registraram uma alta intensidade de energia.
— Que tipo de energia, Dr. Santos?
— Luz, Major! Igual ao dia do segundo encontro com a... — Santos pausou. —, com a tectita.
Todos olharam o Dr. Santos com o mesmo impacto que Sean presenciara do lado de fora da Sala de Controle Ala Cinco, pela transparência das paredes de vidro, das formas-pensamento que ele captou.
— Os dois pilotos? — perguntou o Major Henrique para Adriana. — Onde estão o Comandante Alpheu Smith e o Major Clarck Johnson?
— Constava que ainda dormiam enquanto tínhamos contato com os computadores. Já devem estar acordados — respondeu ela de imediato.
— Algum contato visual?
— Não!
— Tentem chamar o ônibus espacial experimental outra vez! — deu Oscar, a ordem.
— Sim, Senhor! — e Nadir apertou algumas teclas e soltou sua voz caipira. — Comandante Alpheu aqui é da Sala de Controle Ala Cinco, responda! — e só um ruído se ouvia. — Comandante Alpheu aqui é da Sala de Controle Ala Cinco, responda!
Oscar colocou a mão no coração, sentindo um aperto. Sabia que Sean estava em perigo.
— Sente-se meu velho — General Arthur amparou-o com uma cadeira.
Oscar o afastou com força.
Estava tomado pelo desespero.
— Nadir! — o General então a chamou. — Traga um pouco de café para Oscar.
— Sim, General Arthur.
— Um sem batismo... — sussurrou Dr. Bruno.
Oscar só o olhou.
— Sr. Gyrimias? — chamou a Tenente-Coronel Adriana tentando aliviar a tensão entre os dois. — Tente os computadores de Spartacus. Sei que você pode se conectar e fazer uma ponte até os computadores de bordo do ônibus espacial experimental.
— Não posso! — Gyrimias foi firme. — Senhor Sean Queise deu-me ordens para que...
— Faça Gyrimias!!! — gritou Oscar fuzilando Gyrimias.
— Está bem, Senhor Oscar Roldman — Gyrimias se voltou para a tela.
— Falta energia no painel principal do satélite de observação! — avisou Dr. Andrea.
— Foi desligado? — Gyrimias teve um sobressalto. — Como pode? Não fui eu! — falou atônito. — Juro! Parcelado tudo aqui... Não fui eu.
— O satélite de observação Spartacus está desligado?
— Não… — Dr. Andrea fez todos se virarem para ele. — O DMARS arquivou queda de temperatura na fuselagem antes de travar — comunicou. — Acredito que algumas partes do ônibus espacial experimental tenham se congelado.
— Congelado... — soou da boca de um Oscar cada vez mais nervoso.
— Talvez algum tipo de sobrecarga no sistema? — apostou a Dra. Carminna.
— E o satélite de observação Spartacus, Gyrimias? Também congelou?
— Só vou saber depois que religá-lo, Senhor Oscar Roldman — Gyrimias tremia.
— Comandante Alpheu, aqui é da Sala de Controle Ala Cinco, responda! — tentava Nadir, novamente ao voltar ás comunicações.
— O ônibus espacial experimental está em funcionamento ou são apenas nossas transmissões com ele que falharam?
— Não sabemos exatamente. Para nossos computadores, os computadores de bordo estão acenando que foram desligados — explicou o Dr. Schumann. — O DMARS perdeu o controle do suprimento de oxigênio dentro do ônibus espacial experimental.
— Meu Deus! Eles estão sem oxigênio?
— Não... Não sabemos — Andrea estava sem o que responder.
— O que acha realmente que aconteceu, Zhu? — Oscar retomou a situação.
— O ônibus espacial experimental tem o que chamamos de sistema esperto, Sr. Roldman, que efetua pequenas mudanças na posição do ônibus espacial experimental, e que pode ser comandado por piloto automático, o que pode ter provocado uma sobrecarga.
— E por que o ônibus espacial experimental precisaria fazer tal manobra? — inquiriu a Tenente-Coronel Adriana.
— Para abordar algo — arriscou-se o Dr. Ítalo, enfim.
— “Abordar”? O ônibus espacial experimental se aproximou muito do satélite?
— Não! Todos estavam receosos de uma aproximação muito grande do satélite de observação com o ônibus espacial experimental, então foi dada uma distância segura — explicou Andrea.
— O telescópio de Arecibo não viu nada chegar perto de Spartacus — engatou Noah, numa explicação.
— Não foi nisso que eu pensei — disse Dr. Ítalo para a Dra. Hanna que franziu o sobrolho.
Oscar ficou de sobreaviso com Hanna, algo nela que ele captou.
— O computador do ônibus espacial experimental falhou Gyrimias?
— Não sei como, Senhor Oscar Roldman. Temos sempre a famosa redundância de hardware que faz com que se um componente falhe, outro entre em ação para que o sistema todo não seja comprometido, e prossiga operando normalmente através de máquinas fall back — completou Gyrimias.
— Todo sistema em tempo em real é tolerante a falha, Gyrimias — Zhu emendou.
— Não os computadores da Computer Co., não os mainframes que o Senhor Sean Queise escreveu.
Oscar gostou de Gyrimias, sorriu para ele que quase adivinhou o que significava aquele sorriso.
— O que é ‘fall back’ Gyrimias? — Carminna pareceu tê-lo trazido de volta.
— Fall back é um clone do computador que está ativo, Doutora Carminna Clemente. Esse clone entra em operação assumindo a tarefa do principal no caso de falha.
— Mas lembre-se Gyrimias… — falou a Dra. Carminna estranhamente. —, que a Sala de Controle Ala Cinco teve dificuldades nesses últimos dias com aquela estranha anomalia solar — e Carminna viu Gyrimias prestar atenção em Adriana, que olhou para Henrique, que olhou para Arthur, que olhou para Oscar, que cerrou os olhos. — E os neutrinos que tanto preocupavam Sean, quase destruíram a comunicação com Spartacus — Carminna prosseguiu deixando muitos atônitos.
Oscar se interessou pela Dra. Carminna também.
— Isso! “Neutrinos”, Doutora Carminna Clemente! — Gyrimias virou-se para sua tela e seu teclado, e começou a digitar. — Parcelado meu conhecimento, uma carga extra de neutrinos poderia ter deixado os computadores fora do ar, sim — Gyrimias digitava algo para o comando de Terra de Spartacus que ainda funcionava na Computer Co..
— O que faz agora? — Arthur quis saber.
— Estou a procura de Stubs, General Arthur.
— “Stubs”? O que ele disse? — Arthur olhou Adriana.
— Stubs são partes ou como queira General Arthur La Hera, fragmentos de algoritmos, que provêm da abstração de uma chamada local de procedimento — Gyrimias olhou Arthur mais aturdido ainda. — Parcelado o que os neutrinos destroem no método fazendo a ligação deste com o mecanismo de comunicação, alguns stubs sobrevivem e o stub do código que faz a chamada remota, se utiliza da rede cliente e servidor — sorriu satisfeito por saber que era inteligente.
— Comandante Alpheu, aqui é da Sala de Controle Ala Cinco, responda! — voltou Nadir a chamar pelo intercomunicador e só estáticas lhe eram devolvida. Nadir viu Oscar olhar-lhe como quem pede explicações. — Os chiados provem do módulo que tem dois sistemas para se comunicar com o pessoal em Terra, Sr. Oscar Roldman; a ‘Faixa S’ para voz, comandos, telemetria e arquivos de dados e a ‘Banda Ku’, largura de banda maior, para vídeo e transferência de arquivos de informação em duas mãos — foi sua vez de ser entendida em algo ali. — Mas a ‘Banda Ku’, apesar de ser internacionalmente mais popular é suscetível a interrupções causadas pela chuva, Senhor, como na tempestade que atravessamos hoje.
E chovia muito do lado de fora da ilha, em toda Indonésia.
— É verdade, dependendo da intensidade da chuva, uma interrupção ou degradação do enlace via satélite pode ocorrer, indisponibilizando o serviço — Gyrimias se expressou.
— Tempestade que a Poliu...
— Cale-se Bruno! — Adriana foi firme.
Oscar tentou entender aquilo a tempo, mas Adriana era a melhor agente que Mr. Trevellis tivera até então. E como dissera Sean, as formas-pensamento se formavam no éter, desmanchando após serem plasmadas, se os psi estivessem por perto.
Oscar olhou em volta, os muitos computadores, a grande tela apagada, as cabeças ali trabalhando contra o desconhecido, a chuva lá fora causada pela Poliu, e seu filho incomunicável.
Tudo interligado.
“Trevellis...” soou em Oscar.
— Comandante Alpheu, aqui é da Sala de Controle Ala Cinco, responda! — insistia Nadir cada vez mais tensa.
Todos esperavam uma resposta que não veio.
Adriana suspirou profundamente, lembrou-se do quanto achava Sean interessante nos jornais, de como gostaria de ter feito sexo com ele, nas muitas tentativas de ir até seu quarto-sala e lá ficar parada, na porta, sem coragem de entrar.
— Houve alguma comunicação, verbal quero dizer, desde a chegada do ônibus espacial experimental? — perguntou Oscar perante o silêncio da Sala de Controle Ala Cinco.
— Não, os astronautas dão uma pausa para economizar oxigênio e não se cansarem tanto até se estabilizarem, e se acostumarem à falta de gravidade — respondeu Zhu.
— E até então tudo ia bem? Com os computadores, quero dizer?
— Sim para os computadores de bordo! — responderam Zhu e Stella.
— Sim para os computadores de Terra! — respondeu Bruno retificado por Andrea e o Major Henrique logo depois.
— Sim, Senhor! — completou Gyrimias se referindo a Sean Queise e suas funções vitais controladas por ele.
35.786 km; órbita geoestacionária.
27 de agosto; 19h00min.
O espaço é escuro, de cor azulada. Haviam contado isso a Sean Queise desde sua infância. A forma da Lua, as marés subindo, os animais no cio. E a Lua, tão brilhante vista da Terra, era agora tão opaca.
“Onde estou?”, pensou Sean ao olhar o infinito pela escotilha envidraçada do compartimento dos tripulantes.
No quarto pavimento do ônibus espacial experimental de cinco andares, ficava o alojamento, quando uma forte luz branca em forma de um polvo, o cegou de repente.
— Ahhh!!! — Sean gritou fazendo seu corpo acordar em meio a sua mente, que ainda achava estar em hipnose profunda.
Sean tentou erguer os braços e se proteger, mas suas ações eram lentas, seu corpo não obedecia a contento. A iluminação que irradiava por todo o compartimento parecia estar do lado de fora, parecia estar do lado dentro. Tentou entender, franziu o sobrolho e uma luz branca em forma de um polvo diminuiu sua intensidade, delineando-se numa figura meio humana com cabeça de polvo; um corpo feminino com braços e pernas em forma de longos tentáculos. Sean se lembrou das pessoas na casa dos seus sonhos, fantasiadas com tentáculos a escapar da fantasia que usavam.
A luz branca em forma de um polvo tocou seu corpo, Sean fechou os olhos voltando a abri-los devagar, sentindo uma onda de choque arrepiar cada pelo de seu corpo, achando ainda estar sonhando. Ela cintilava, flutuando à sua frente, e ele ergueu a mão, para alcançá-la quando a luz branca em forma de um polvo se deslocou e voltou a brilhar.
— B!!! — uma estridente buzina o acordou de vez.
A luz branca em forma de um polvo sumiu e a energia, sons e luzes voltaram ao ônibus espacial experimental. Sean tocou-se percebendo ainda estar com o decodificador de pressão sanguínea preso em seu peito, porém desligado. O retirou após soltá-lo do esparadrapo e flutuou pelo compartimento do quarto pavimento, se projetando até o corredor de acesso. Desceu ao terceiro pavimento onde ficava a cabine de comando de voo, com as três poltronas que viajaram vazias, e também lá dois banheiros.
Mas um silêncio profundo caía sobre o ônibus espacial experimental.
— Comandante Alpheu? — nenhuma resposta e todos os botões desligados. — Como pode o computador não estar funcionando? — Sean olhou em volta. — Comandante Alpheu?! — gritava sem, porém fazer eco. — Major Clarck?! — e as luzes do ônibus espacial experimental rarearam outra vez fazendo-o lembrar-se da casa de seus sonhos; queria sair de lá também.
Flutuou até a escotilha da sala de comando, lá fora só o infinito e Spartacus; podia vê-lo afinal. Uma emoção muito forte tomou conta de seu peito e ele o sentiu apertar. Encolheu-se dolorido, não sentindo o ar chegar a seus pulmões.
“Sean meu amor?” a voz de Kelly chegou até ele.
E se era a voz dela, a saudade que batia no peito apertado, ou o sorriso dela lhe dando forças, ele não sabia. Sean voltou a se arrastar pela cabine e se lançou para o segundo pavimento, onde componentes tinham cristais de gelo.
Sean sentiu sua mão congelar só pelo toque.
No segundo pavimento havia uma pequena cozinha. Lá, também ficava uma espaçosa câmara estanque fechada dos dois lados por portas herméticas. Sean girou para abri-la quando um repuxo de ar o sugou o lançando num espaço irrespirável. Levou a mão ao rosto, segurou o ar nos pulmões, e viu o corpo do Major Clarck jazendo no vácuo, envolto pelo macacão espacial preso a uma canaleta folhada a ouro, volitando.
O tubo de alimentação de oxigênio estava congelado, rompeu-se na força empreendida por ele. Sean puxou para si o corpo do Major Clarck que girou escapando de suas mãos quase dando um nó na tubulação. Sean agarrou-se nas laterais desesperado, arrancou a roupa da canaleta e voltou a fechar a porta, já não conseguindo mais segurar a respiração; sabia que tinha de 30 segundos a apenas um minuto para repressurizar a câmara. Dr. Jofre havia lhe ensinado que o sangue e os fluidos corporais entrariam em ebulição e congelariam, em virtude de não haver pressão atmosférica para manter seu sangue e seus fluidos corporais em estado líquido. E como o processo de ebulição os faria perder rapidamente a energia térmica, os fluidos congelariam antes que evaporassem totalmente.
E Sean sentiu muita dor quando o ar entrou nos pulmões.
Levou o Major Clarck para a cabine de comando de voo no terceiro pavimento, e abriu o capacete quando um jato de vômito e sangue o atingiu.
A figura retorcida do Major Clarck espumava uma gosma amarela, tinha os olhos esbugalhados, desprendidos do globo ocular; fios de sangue que flutuavam para todos os lados, em meio à língua roxeada, ainda presa aos dentes que quase a arrancaram.
Sean teve vontade, agora ele, de vomitar.
Olhou em volta e viu o líquido amarelado e o sangue flutuarem, espalhando-se por toda a cabine de comando de voo, voltou a fechar o capacete enfiando a cabeça do Major para dentro.
“Cadê o outro?”, pensava desesperado.
Sean largou o corpo morto do Major Clarck no espaço e se lançou para o quinto pavimento, onde havia uma grande cúpula transparente que permitia ver o espaço de uma poltrona em frente a um grande computador de bordo.
— Comandante Alpheu?! — e a luz do ônibus espacial experimental piscou e se firmou. — Comandante Alpheu?! — um ruído foi ouvido e Sean desceu de novo até o terceiro pavimento, passando pela cabine de comando de voo e o corpo morto do Major Clarck flutuando, e desceu ao segundo pavimento quando uma mão tocou seu ombro. — Ahhh! Graças a Deus! — e Sean abraçou Alpheu.
— O que aconteceu Sr. Queise? — estranhou a atitude do jovem.
— Major Clarck... — apontava Sean para cima, enquanto falava em descompasso. — Está morto…
O Comandante Alpheu girou a cabeça, deu um impulso para o pavimento acima e se aproximou do corpo largado.
— Aqui é da Sala de Controle Ala Cinco! Comandante Alpheu Smith responda! — a voz da Tenente adjunto Nadir enfim se fez.
O Comandante Alpheu apontou o microfone.
— Aqui é Sean.
Gritos foram dados na Sala de Controle Ala Cinco.
— Graças! Vocês estão bem?
— Não, Nadir. O Major Clarck está morto! — respondeu Sean sendo socorrido pela explicação mais plausível do Comandante Alpheu.
— Ele teve uma parada respiratória. Os computadores estão... — Alpheu olhou em volta. —, com defeito.
— “Defeito”? — Sean arregalou os olhos azuis.
O Comandante Alpheu completou:
— Os mostradores mostram que ficamos sem oxigênio muito tempo dentro dos pavimentos — falou ao microfone.
— Mas a roupa dele estava presa às canaletas de distribuição de oxigênio — falou um Sean confuso, apontando para o andar abaixo, parecendo estar falando sozinho. — O que ele fazia dentro da roupa, Sala de Controle Ala Cinco? O Major Clarck ia sair?
— Quem ia sair Sean? — perguntou Oscar mais confuso ainda.
— Não sabíamos que o Major Clarck ia sair Sr. Queise — respondeu Dr. Andrea.
— Nem para o quê — emendou o Major Henrique olhando o General Arthur que era observado pela Dra. Carminna.
— Faltou oxigênio nos pavimentos, Comandante Alpheu? — questionou o Dr. Schumann na Terra.
— Parece-me que sim — Alpheu olhou em volta.
— Mas então como estão vivos? — perguntou o General Arthur em seguida.
— Eu sobrevivi porque fiquei preso na unidade de dejetos — Alpheu viu Sean olhar-lhe. — No banheiro — explicou Alpheu. — O ar não faltou lá porque carreguei antes de entrar e os computadores falharem.
— Como podem ter falhado? — perguntava-se Sean olhando em volta. — Como sabe que falharam?
— Então estava acordado Comandante? — questionou Major Henrique ao Comandante Alpheu Smith.
— Sim; e provavelmente o Major Clarck também.
— Estranho! — falou Dr. Jofre lendo os picos cardíacos na sua tela. — Os computadores antes da paralisação, não indicavam seus movimentos, Comandante Alpheu; nem os do Major Clarck.
— Só sei o que fiz! — respondeu Alpheu, secamente.
— Mas a estação de sono do Senhor Sean Queise abriu e ele não se sufocou. Tinha oxigênio no compartimento dos tripulantes? — foi a vez de Gyrimias insistir.
Sean ia falar algo, mas foi cortado pela rispidez da voz do Comandante Alpheu.
— Sobrevivemos! É o que conta!
Sean olhou para o Comandante Alpheu no espaço. Oscar olhou para o General Arthur na Terra; profundamente.
— Nossos equipamentos ainda não estão cem por cento, Comandante Alpheu. Dá para verificarem suas pressões através do aparelho de bordo? — pediu o Dr. Jofre.
Sean observou o Comandante Alpheu sentar-se na poltrona de comando de voo, e colocar o dedo polegar dentro do que parecia um clipe de roupa. A tela do computador ao lado da poltrona de voo acendeu e apagou.
— Não está funcionando perfeitamente — concluiu o Comandante Alpheu.
— Meus sensores mostram realmente uma falha de energia, ocorrida — falou o Dr. Schumann.
— O DMARS está assumindo agora. Está digitando novas instruções aos computadores de bordo. A energia começa a ser recarregada — falou o Dr. Andrea.
— Menos mal — respirou Oscar, aparentemente aliviado.
E Sean viu as luzes voltarem com força total.
— Gyrimias... — Sean o chamou e o cientista da Computer Co. era todo ouvido ao patrão. —, o que acha que pode ter ocorrido?
— Parcelada minhas opiniões, não sei ao certo, Senhor — olhou em volta e todos na Sala de Controle Ala Cinco o olhavam. — O Sol está instável.
— Os neutrinos? — quis Sean saber.
— A Doutora Carminna Clemente havia proposto ter havido uma emissão de neutrinos acima do normal, Senhor Sean Queise — emendou Gyrimias a olhá-la.
Carminna apenas sorriu lânguida.
— Você sabe por que o Sol está tão instável, Sr. Queise? — perguntou a Tenente-Coronel Adriana interessada na conversa.
— Só sei que tempestades solares são perigosas, e podem afetar satélites de comunicação e linhas de transmissão elétrica na Terra. Não as imagino desligando o ônibus espacial experimental.
— Mas os neutrinos são partículas elementares eletricamente neutras — o Dr. Zhu se intrometeu.
— Acha que houve alguma atividade? Uma intensidade de luz na transformação dos neutrinos? — divagava a Tenente-Coronel Adriana.
— “Uma intensidade de luz?” — Sean repetiu-a temendo falar sobre a luz branca em forma de um polvo, que lembrava em seus contornos, algo feminino.
— Algo a dividir Sr. Queise?
— Não! E você? — um silêncio na Terra, outro no espaço. — Só que os neutrinos vindos do Sol estão interagindo com a matéria das camadas internas da Terra, transformando-se num outro tipo de neutrino que... O DMARS nada avisou? — Sean lembrou-se de perguntar.
— O DMARS se desligou quando os computadores se desligaram Sr. Queise.
“Deus!”, Sean teve medo do que pensou.
— O que encontrou nos stubs, Gyrimias?
— Não encontrei Senhor. Nenhum stub.
— Como? Qualquer mudança em qualquer programação deixa rastros... — Sean olhou Gyrimias pela tela. — Nenhum arquivo de LOG?
— Não Senhor.
— Então não era um computador, não Gyrimias?
— O que quer dizer Sean querido? — Oscar viu Gyrimias o olhar profundamente.
— Quero dizer que era impossível que um computador não deixasse arquivos de sua utilização. Podemos não pegar o invasor, mas temos histórico dele lá.
— Algo a dividir Sr. Queise? — Adriana voltou.
— “Deserto inimaginável estende-se além das estrelas. Lá, em condições diferentes das de vosso planeta, novos mundos revelam-se e desdobra-se em formas de vida, que as vossas concepções não podem imaginar, nem vossos estudos comprovarem”.
A Sala de Controle Ala Cinco em peso se olhou, Sean falava de pluralidade de mundos, de outros mundos habitados.
Adriana também não gostou de ouvir aquilo, Sean era inteligente demais para o gosto dela, para a atual situação de todos ali.
— Sean? — Dra. Carminna cortou a linha de pensamentos de muitos, após ter se lembrado de algo. — Ainda estava preso aos eletrodos quando foi solto da estação ou apenas desligado do decodificador?
“Sean?”, Adriana viu a intimidade dela para com ele.
— “Eletrodos”? Que eletrodos? — Sean se olhou. — Eu tinha apenas aquele aparelhinho no peito — falou Sean ao microfone.
— Viajou preso a eletrodos que por sua vez estavam ligados ao polissonógrafo. Ele estava controlando as atividades elétricas do seu cérebro, Sr. Queise — manteve Adriana, uma voz bem distante.
— Acordei solto dentro do compartimento dos tripulantes quando... — e parou de falar achando que não conseguiria mesmo explicar o que viu.
— Antes dos computadores falharem, a tela mostrou que suas amarras haviam sido soltas. Quem o fez Sr. Queise? — Dr. Noah teve vontade de perguntar.
Sean olhou para o Comandante Alpheu Smith que negou com a cabeça.
— Bem, se foi o Major Clarck será tarde para perguntar, Dr. Noah — Sean completou com sarcasmo.
— Senhor Sean Queise? — perguntou Gyrimias como quem fala para si mesmo. — O polissonógrafo o mostrava em sono REM. Estava tendo pesadelos?
Sean agora tremeu, lembrou-se da casa de seus sonhos, lembrou-se da sensação de fuga, lembrou-se das estranhas figuras fantasiadas, para então lembrar-se da figura feminina, sobre-humana com cabeça de polvo; e por fim lembrou-se do corpo do Major Clarck morto. Olhou em volta, temeu estar com fobia.
Nada respondeu e Gyrimias não insistiu.
— Temperatura da nave estável, cápsulas de purificação de ar intactas, oxigênio normal, níveis de congelamento dos frízeres, Ok! A comida não está deteriorada e a água pode ser conseguida nos tanques de hidrogênio e oxigênio. A energia está sendo processada normalmente por isso terão como produto final, água potável — explicou Dr. Schumann.
— Isso pode voltar a acontecer? — perguntou Sean ao alto-falante aberto para o ônibus espacial experimental.
— Não sabemos o que houve Sr. Queise, não podemos prever se acontecerá novamente — respondeu a Dra. Stella.
— Deus... — Sean olhou em volta e voltou a falar ao alto-falante. — Gyrimias? E as máquinas fall back? Por que o clone do computador não foi ativado?
— Nem Spartacus funcionava Senhor Sean Queise.
— Não funcionava? — Sean fez uma careta.
— Pode tentar ver sua pressão e sua temperatura agora, Comandante Alpheu Smith? Sr. Sean Queise? — implorava Dr. Jofre, nervoso.
Os dois obedeceram.
— Está tudo normal a não ser sua pressão Sean, que está um pouco alterada. Pode manter-se com o decodificador da próxima vez? É para sua segurança — insistiu Dr. Willian Jofre.
Sean tirou o decodificador fechado por velcro do bolso do pijama; nem percebeu que os havia guardado nem que estava de pijama.
O colocou de volta preso a um esparadrapo transparente contra sua vontade e o reativou.
— Aproveite e veja como estão os trajes espaciais e as unidades de manobras tripulada, Comandante Alpheu — pediu o Major Henrique que se manifestou depois de silêncio total.
Ambos desceram até o segundo pavimento e Alpheu carregava o corpo morto do Major Clarck.
— Roupas de nº 1 e nº 2 normais. Desajuste de oxigênio na roupa espacial de nº 3. As MMU, as mochilas espaciais estão em conforme.
Sean só tinha olhar para o corpo morto, agora sendo preso pelo Comandante Alpheu, a uma cinta na lateral direita do ônibus espacial experimental. Jogou o pescoço para o lado com tanta força, que o resto do corpo foi junto acabando por se chocar com a parede traseira. Sean tentava se equilibrar e pensar um pouco, mas o corpo do Major Clarck morto o desestruturava.
— Ahhh! — exclamou Sean após dar 360º de giro. — Ahhh! — olhou para os lados, estava frente a frente com Clarck. — É... Será que há outro lugar para colocarmos o corpo do Major Clarck?
— No primeiro pavimento, onde fica o braço mecânico há uma segunda câmara estanque para ser aberta para o espaço. Lá, a esquerda fica o compartimento de carga e o freezer preparado para receber o chip numa temperatura baixa — explicou a Dra. Stella. — Coloque o no freezer, Comandante Alpheu. Talvez mantenha o corpo em bom estado até sua volta.
— “Bom estado”? — Sean fez uma careta.
— Sim! Terão que guardá-lo num saco vedado, dobrado! — ordenou o Major Henrique.
— “Dobrado”? — Sean arregalou os olhos azuis.
— Sim Sr. Queise — falou Dr. Willian Jofre. —, ou haverá dilatamento das vísceras e poderá começar a feder.
— Deus...
— E assim liberariam a roupa de nº 3 para consertos. Não é bom ficarem sem roupas de emergência — concluiu a Tenente-Coronel Adriana.
“Emergência” agora ecoou na cabeça de Sean, que começava enfim a perceber a frieza da mulher.
— Vou fazer isso agora mesmo! — e o Comandante Alpheu entregou-se ao trabalho.
A comunicação foi desligada e Sean projetou-se até o quarto pavimento, para o compartimento dos tripulantes. Não queria ver aquilo acontecer com o corpo de Clarck. Jogou-se até sua estação de sono onde viajara condicionado e percebeu que os eletrodos haviam sido enrolados, colocados em seus lugares de origem e guardados com esmero e precisão.
Sean olhou em volta, se trocou com dificuldades sem entender quem poderia ter feito aquilo nem como estava de pijamas; não se lembrava de ter viajado de pijamas.
— Vamos comer algo, Sr. Queise? — o Comandante Alpheu interrompeu seus pensamentos.
Sean se assustou com a aproximação dele. Não gostava dele. Também não sabia por que não gostava de tanta gente naquela missão.
— Talvez não seja uma má ideia — desceram até a cozinha no segundo pavimento. — Me chame de Sean, Comandante. Sabe que fora meus funcionários somente agentes da Poliu me chamam assim.
Alpheu se incomodou com aquilo. Ficara claro que Sean sabia de algo.
— Como quiser Sean — apontou algumas gavetas e retirou algumas caixas.
Alpheu apertou o bastão dentro de uma pequena gaveta de acrílico transparente e a pasta flutuou solta lá dentro. Ele viu Sean rir ao ver sua comida voar na sua frente.
— Wow!
— Adicionamos água aos alimentos liofilizados e às bebidas desidratadas, em uma estação de reidratação que fornece água quente e fria — mostrou-a.
Sean começou a se alimentar; na caixa de papelão havia estrogonofe de carne, ovos mexidos, macarrão com queijo e pudim de chocolate.
— Uhm... — achou o gosto estranho.
— Sem gravidade, os aromas dos alimentos se dissipam antes mesmo de chegarem ao olfato. E quando não se consegue sentir o cheiro da comida, também não se consegue saboreá-la.
Alpheu viu que Sean experimentava aquela sensação na careta que fez. E sentia a comida descer como se nada tivesse sido engolido.
— Wow! — voltou a exclamar.
— Pimenta, sal, mostarda, maionese e ketchup... — apontou. —, podem ajudar a realçar o sabor dos alimentos — Alpheu viu Sean experimentar passar maionese e depois se odiar pela escolha.
Sean se limpou não muito satisfeito e um sono começou a bater.
— O decodificador está lendo uma queda na pressão do Senhor Sean Queise — avisou Gyrimias na Terra. — Ele está com sono.
— Mande-o fazer exercícios de esteira, ele não pode comprometer a musculatura do coração — ordenou Dr. Jofre.
Ele recebeu a ordem pelo alto-falante, e o fez a contra gosto; queria dormir, queria até ter pesadelos.
O Comandante Alpheu terminou sua refeição e foi ver os computadores de bordo no quinto pavimento. Tinha muito trabalho.
Já Sean terminou os exercícios na esteira e voltou para o compartimento dos tripulantes. Pensou em dormir na estação de sono, mas descartou a ideia inicial de ficar amarrado sob as ordens de computadores. Ficou pensando em quão frágil era na verdade sua ligação com aquelas máquinas.
A escotilha no centro da nave mostrava um pedaço de Spartacus através da pouca iluminação. Sean lembrou-se o quanto gostava dele.
— Meu ‘pedaço de lata’ — brincou o jovem mega empresário com sua energia vital voltando ao seu corpo. Porém sem ânimo para trabalhar naquele momento, ficou lá contando cada placa de captação de energia solar do satélite de observação, tentando visualizar o chip. Sabia que estava na segunda asa direita, mas o imaginava mesmo muito pequeno para caber dentro do cérebro de um ser humano. — Meu Deus, que loucura. Vão invadir a mente humana.
— EU INVADO A SUA! — falaram por trás dele.
— Quê? — perguntou Sean distraído para o vazio do compartimento dos tripulantes. — Comandante Alpheu? — chamou olhando para os lados. para as câmeras paradas. — Falou comigo, Sala de Controle Ala Cinco?
Nada! Só o silêncio. Sean voltou a olhar a imensidão achando que ficava maluco. Depois olhou o compartimento dos tripulantes de rabo de olho, mas nada se moveu.
Atirou-se no vácuo, entrou na estação de sono, tirou o decodificador de seu peito e guardou no pequeno armário acima de sua cabeça. Desistiu de lutar contra o sono e se trancou com as amarras.
E apesar de não ter colocado os eletrodos, digitou a máquina para soltá-lo depois de uma hora.
35.786 km; órbita geoestacionária.
27 de agosto; 23h30min.
— SEAN? — não demorou muito para que fosse perturbado pela mão suave que o tocava; doce, sutil, elétrica, quase transparente.
Sean abriu os olhos, viu os tentáculos que se arrastavam para fora de sua visão.
— Comandante?! — Sean gritou desesperado. Olhou para os lados tentando enxergar o compartimento dos tripulantes; nada nem ninguém. Olhou para cima, o computador tinha as luzes a piscar, sinal de que tudo ia bem, sinal de que estava amarrado, ainda. — Me tire daqui!!! — e outra vez uma luz se formou ao lado de sua cabeça. Sean apavorou-se com sua aproximação, lembrou-se da casa dos sonhos. — Quero sair daqui!!! Comandante?! Socorro!!!
— SEAN... — ouviu falarem no seu ouvido.
— “Sean”? Quem está aí? — perguntou em descompasso, amarrado a estação de sono. — Quem está aí, responda? — Sean respirou profundamente, arrependido de não ter ligado os eletrodos ao seu corpo, de ter tirado o decodificador para Gyrimias monitorá-lo. — Droga! — olhou o relógio do computador, faltavam cinco minutos para as amarras se soltarem quando a luz aumentou de repente e uma claridade fez seus olhos lacrimejarem. — Não! Por favor, não! — implorou.
E a luz diminuiu.
Sean viu sua sombra se desenhar sobre tantos equipamentos, imóvel por mais de dois minutos.
Algo de aspecto instável, luminoso, algo realmente parecido com um ser humano com cabeça de polvo e tentáculos.
“Quem?”, pensou.
— EU! — responderam.
— Ah! Meu Deus! Estou delirando! — agitava-se em frenesi. — Falta oxigênio, falta oxigênio; socorro!!! — e as amarras se soltaram no tempo certo.
A luz escapava da fuselagem do ônibus espacial experimental, alcançando o espaço sideral, e Sean se movia freneticamente dentro da estação. Foi jogado no vácuo com a força empregada, acabando por se chocar com as paredes, ficando tonto pela dor.
Sean alcançou a escotilha, e viu a luz branca em forma de um polvo contornando os holofotes externos do ônibus espacial experimental, se misturando a eles. Projetou-se até a cabine de comando de voo no terceiro pavimento e enfiou o dedo no clipe da poltrona.
Gyrimias levou um susto.
— Senhor Sean Queise? — questionou. — O que há?
— O que houve Gyrimias? — uma voz feminina por detrás dele se alterou.
— Não sei Tenente-Coronel Adriana.
— O Senhor está bem, Sr. Queise? — perguntou ela ao microfone.
— Estou... Não sei... Delirando... — tentava Sean falar olhando em volta.
— Comandante Alpheu? — chamou Adriana pelo microfone, ela agora se sentava ao lado de Gyrimias monitorando Sean. — Socorra o Sr. Queise! Comandante Alpheu? — a voz dela invadiu todo o ônibus espacial experimental, chegando a ficar estridente.
O Comandante Alpheu desceu do quinto pavimento e ainda teve tempo de segurá-lo antes que Sean desmaiasse e saísse se chocando com as paredes.
11
35.786 km; órbita geoestacionária.
28 de agosto; 06h00min.
— Você está bem, Sean? — perguntou o Comandante Alpheu quando Sean abriu os olhos mais uma vez.
Ele demorou em responder, suas ideias não se concatenavam. Olhou em volta e se viu amarrado à estação de sono.
— Isso é mesmo necessário? — fechou e abriu os olhos. — Acho que começo a ter claustrofobia.
— A reação de claustrofobia é normal quando se está trancado num ambiente fechado — Alpheu não esperou os agradecimentos. — Está preparado para a MMU?
— “MMU”?
— Vai abordar Spartacus não vai?
— “Abordar”? Do que está falando?
— O Major Clarck morreu se ainda não percebeu — Alpheu viu Sean se irritar. — Alguém tem que ir lá fora pegar o chip Cruzador Solar. O braço mecânico pode simplesmente esmagá-lo numa ação dessas.
— E você?
— Quem controla o ônibus espacial experimental?
— Mas nunca... Quero dizer... Nunca...
— Compreendo sua posição, mas viemos aqui com uma missão Sr. Queise. Temos que resolver isso o mais rápido possível. A ideia de ficar sem energia outra vez não me agrada.
— Eu não... Não sei se consigo.
— Treinou a falta de gravidade na ilha, vai se sair bem.
— Chama aquilo de treino? Ficar batendo o tempo todo nos colchões da parede de testes? Deus! — girou os olhos balançando a cabeça freneticamente. — O que eu fiz para merecer isso?
O Comandante Alpheu não respondeu, desamarrou-o para que ele pudesse sair.
— Abordaremos Spartacus quando liberar seus computadores.
— Não tenho acesso às senhas.
— Isso serve? — e Alpheu entregou-lhe um papel preso a uma prancheta de acrílico. — A Sala de Controle Ala Cinco lhe enviou. — e Alpheu viu Sean olhando o papel enviado atentamente. — Faremos isso à noite para o Sol não ser refletido pelos espelhos e queimá-lo.
— Posso beber água? Tenho sede.
— Tome cuidado para depois não acabar vomitando no capacete. Pode morrer asfixiado com seu próprio vômito.
— É — Sean lembrou-se do Major Clarck. —, eu já sei disso — e o seguiu.
Sean subiu sozinho para os computadores de bordo no quinto pavimento e transferiu o comando dos mainframes do satélite de observação Spartacus para seu notebook com as senhas dadas. Desligou Spartacus que por sua vez desligou seu banco de dados com a Sala de Controle Ala Cinco.
Gyrimias suspirou profundamente ao ver sua ligação com Spartacus encerrada.
Com os mainframes no Brasil ainda funcionando no notebook, Sean fez uma ponte e aproveitou as senhas abertas para mudar algumas linhas de comando do satélite de observação. Quando a Polícia Mundial ou a Poliu percebessem a mudança, Sean já havia conseguido instalar rootkits, espiões lá dentro. Reorganizou funções, e leu todas as informações contidas nos arquivos de texto de Spartacus desde seu encontro com a tectita. Estranhou muitas informações haverem sido erroneamente criptografadas.
— “Leitura de uma forte intensidade plasmática” — repetiu o que descriptografara. — “Plasmática”? O que significa isso?
Sean não encontrou qualquer foto do ocorrido gravado, nada que mostrasse tal leitura, porque os espelhos ficaram turvos e as imagens havia se deletado por falta de foco.
Ele não sabia como os espelhos poderiam ficar turvos e voltar ao seu estado normal. Nem havia programado Spartacus para deletar nada.
Também ficou tentando saber como alguém da Terra conseguira alterar seu banco de dados, uma vez que as fortes tempestades solares estavam cada vez mais intensas, e por isso Sean criara sinais de alerta a qualquer modificação no satélite de observação.
Algo escapara dele, estava visível.
“Droga!”, agora ficara claro que só o chip Cruzador Solar tinha arquivado as fotos, e por isso a Poliu estava disposta ao gasto exorbitante de trazer Spartacus de volta à Terra, e pagar pelo custo.
E o que mais Spartacus apagou, e só o chip continha, ele também ia ter que pagar para ver.
Sean reescrevia e compilava as informações quando sentiu um movimento estranho no ônibus espacial experimental; um som metálico de motor que quase o ensurdeceu. Sensações de perda, de medo, de morte; gritos que invadiram seu tímpano, imagens vermelhas de sangue que invadiram seu orbe, imagens de Mona Foad tocando o satélite de observação, seguindo Sandy Monroe no éter, acusando-a de roubo, e o ônibus espacial experimental se afastava de Spartacus.
— Comandante Alpheu?! — gritou Sean descontrolado.
Quando Alpheu subiu até o quinto pavimento, estava branco feito papel.
— Estamos... — Alpheu mal respirava. — Estamos viajando...
— “Viajando”? — Sean quase gritou.
E a Sala de Controle Ala Cinco também entrou em pânico.
— O ônibus espacial experimental acionou os foguetes! — avisou o Dr. Schumann.
— Como é que é? — Adriana pareceu não ter ouvido direito, largou a xícara de chá mate e correu ao computador do engenheiro Dr. Schumann.
— Ele está dando outro giro? — questionou Oscar ao lado de Gyrimias que não tinha mais contato com Sean Queise.
— Não! Alguma coisa redirecionou o ônibus espacial experimental e eles estão sendo puxados.
— “Redirecionou”? — perguntou Hanna com a face parecendo ter sido achatada por uma pedra.
— “Puxados”? — perguntou o Major Henrique com a face tão amassada quanto Hanna, ao ser chamado de um cochilo.
— “Puxados”? — foi à mesma pergunta que um Sean incrédulo fez ao comandante do ônibus espacial experimental.
Os dois desceram até o compartimento de carga no primeiro pavimento e o fecharam, trazendo o braço mecânico para dentro, já que estava sendo preparado para se aproximar do satélite de observação.
— Alguma coisa nos está puxando para a órbita de Marte — Alpheu tentava entender o que acontecia.
— O cinturão! — foi só o que Sean falou.
— O que disse?
— Não é para Marte que estamos indo... — Sean deixou no ar as demais explicações, e subiu outra vez até a cabine de comando de voo do ônibus espacial experimental no terceiro pavimento, apertando o comunicador sem sucesso.
— Não adianta! — Alpheu subiu atrás dele. — Estamos sem comunicação com a Sala de Controle Ala Cinco outra vez.
— Sabe pilotar isso aqui sem a Sala de Controle Ala Cinco, Comandante?
— Sim, mas...
— Eu transferi os mainframes que controlavam Spartacus para o notebook.
— Foi você quem acionou o ônibus espacial experimental?
— É claro que não! Estou dizendo que posso inverter o comando, e fazer os mainframes da Computer Co. controlarem o ônibus espacial experimental através de uma ponte.
Alpheu pareceu gostar daquilo.
Gyrimias levou um susto quando a tela da Computer Co. abriu-se na sua frente.
— O que é isso? — questionou Adriana quase sem fôlego.
— A Intranet da Computer Co..
— E por que ela está aqui na tela do seu computador?
Gyrimias arregalou os olhos, e temeu acharem que ele havia feito algo errado.
— Eu não fiz nada... Nada. Foi o Senhor Sean Queise quem transferiu o controle do ônibus espacial experimental para seus mainframes — apontou trêmulo.
— Sean pode fazer isso? — encantou-se a Dra. Carminna chegando de seu quarto-sala onde não conseguia dormir.
“Sean?”, Adriana voltou a não gostar da intimidade, vendo Carminna usando um roupão que quase não escondia a bela camisola florida.
— Senhor Sean Queise pode fazer qualquer coisa Doutora Carminna Clemente.
— O que vai fazer Gyrimias? — Adriana tentou retornar ao problema.
— Fazer o que ele está me mandando fazer, Tenente-Coronel Adriana La Hera. Transferir a ponte que o Senhor Sean Queise fez para o DMARS mover o ônibus espacial experimental pelos thrusters, que auxiliam no processo de posicionamento do satélite.
— E o DMARS vai usar os comandos do satélite de observação para comandar novamente o ônibus espacial experimental?
— A priori, isso.
— Mas o Sr. Queise já havia desligado o satélite.
— A priori, sim, mas havia ainda algo conectado ao notebook dele.
— O que, por exemplo?
— Os mainframes da Computer Co. do Brasil.
Agora Adriana entendeu que Sean fazia lição de casa na aula.
— E como Sean está fazendo isso Gyrimias? — Carminna abusava de intimidade sabendo que irritava Adriana e o alto comando, já que ela não tinha que estar ali.
E Adriana sentia ciúme dela, não gostando de saber que a Doutora e Sean começaram uma amizade de desejos, já que ele era crescido para aquilo.
— Como Spartacus está sempre precisando ser reajustado quando deslocado por ventos solares, e por forças gravitacionais e eletromagnéticas, o Senhor Sean Queise tem acesso ao programa… — e Gyrimias olhou Oscar Roldman lhe olhando. — Tinha acesso ao programa — e calou-se.
Mesmo porque Oscar sabia que senhas enviadas pela Sala de Controle Ala Cinco haviam sido redundantes.
— Já estou no comando outra vez! — avisou o Dr. Schumann, agora ele, impressionado com as habilidades do jovem mega empresário brasileiro.
O Comandante Alpheu no espaço viu que a Sala de Controle Ala Cinco retornava ao comando do ônibus espacial experimental.
— O que aconteceu afinal? — Oscar e todos direcionaram a atenção para o engenheiro.
— Um erro foi inserido! — explicou o Dr. Schumann.
— Um o quê?
— O DMARS diagnosticou uma mudança de rota!
— Rota para onde?
— O cinturão de asteroides! Entre Marte e Júpiter!
“O cinturão!”, pensou a Dra. Carminna tal qual Sean já fizera.
— Foi Sean? — perguntou Oscar com medo.
— Não! Mas o erro também não foi inserido daqui, Senhor Roldman! — Dr. Schumann foi categórico.
— Mas se não foi Sean nem a Sala de Controle Ala Cinco, quem? — Oscar viu todos se olharem outra vez.
— Não sabemos!
— Havia combustível para o ônibus espacial experimental ir até o cinturão? — Oscar também quis saber.
— Não, Senhor Roldman. Eles morreriam no espaço sem comida e oxigênio antes de chegarem lá.
Oscar sentiu dor no coração como se ele pudesse doer, enquanto Sean no espaço digitava quase duas horas, se estafando rapidamente.
Contudo Sean e o Dr. Schumann conseguiram depois daquele tempo todo, refazer as transferências e a Sala de Controle Ala Cinco voltou a comandar o ônibus espacial experimental na sua totalidade, o trazendo de volta ao local especificado, e retomando as comunicações.
Sean ficou achando que as coisas começavam a dar errado por influência sobre-humana.
E ficou com medo do que pensou.
O Comandante Alpheu, sem entender muito como Sean Queise fizera aquilo, avisou que o ônibus espacial experimental estava um pouco mais próximo de Spartacus do que antes, por causa da força gravitacional da Terra.
Já Sean, mesmo com receios, voltou às suas atividades anteriores. Naquele momento desligava Spartacus outra vez, e seus mainframes, ficando com seu notebook sozinho, sem acesso a mais nada, no quinto pavimento quando o computador travou.
Sean apertou as teclas que não responderam.
— Ah! Não... De novo não... — e a tela ficou tomada por pequenos desenhos, algo que consumia a memória do computador patinando o disco rígido, fazendo-o perder o controle.
Sean achou que mais uma vez um erro fora inserido, mas na tela, um mapa de bits estava sendo carregado pelo programa aberto.
“Uma foto?”, viu que o arquivo aberto pertencia aos mainframes da Computer Co..
— Sr. Queise? — a voz de Alpheu explodiu no alto-falante.
— Ãh? — se assustou.
— Tudo bem até agora?
— Sim... — mentiu, porque ficou tentando entender por que a câmera CCD de Spartacus salvou aquela imagem de bitmap após o contato com a tectita. — É uma das fotos que o colisteiro ‘Fim do mundo’ mandou para a lista de ufologia? — estava incrédulo. — Mas como ‘Fim do mundo’ conseguiu essa foto nos arquivos de Spartacus? — vasculhava nervoso quando a foto outra vez se desmembrou em código binário; 7 linhas, 11 colunas, 0 e 1, 1 e 0, 1 e 0; parecendo estar viva no seu notebook.
Mas o silêncio deixou Alpheu arisco.
— Sr. Queise? Mais algum erro inserido?
— Ãh? A Sala de Controle Ala Cinco pode me liberar uma linha de comunicação para que eu possa voltar a ter acesso aos meus bancos de dados na Terra?
— Achei que ia desligar todos os seus mainframes, Sr. Queise?
— É que... Desliguei, na verdade, mas vou ter que religar por uns instantes para conseguir uma permissão.
— “Permissão”?
— Sim. Uma permissão de controle. A atividade solar está muito intensa, estamos passando por um novo temporal espacial. Gyrimias sabe como fazer.
— Mas se a coroa solar interfere nas comunicações...
— Sim — cortou o resto da frase dele. — Eu correrei o risco... — um silêncio se fez e a glote de Sean pulsava com o coração a parecer bater ali.
— Vou ver o que posso fazer.
Foi a Dra. Carminna quem estava de plantão, ela liberou a linha sem fazer perguntas.
— Quando terei uma linha Comandante Alpheu?
— Demos sorte Sr. Queise. A Sala de Controle Ala Cinco está liberando a linha de número dois.
“Sorte? Alguém lá embaixo me ama” pensou.
— Obrigado, Comandante Alpheu — Sean agradeceu procurando rapidamente a porta de comunicação acessando a Terra, o Brasil, São Paulo, capital, Computer Co., seus mainframes, ocultando com pressa a foto que parecia viva. Depois entrou nos arquivos da Poliu atrás do colisteiro. Mas o que Sean hackeou o deixou em pânico. — Fim do mundo! — foi só o que exclamou, desconectando-se de seus mainframes, liberando a linha de número 2, liberando os dados de Spartacus, apagando as luzes do satélite de observação, desligando o notebook.
E Alpheu se entregou ao pequeno braço robotizado, guiando-se apenas pelo computador de bordo. Um ruído forte invadiu o ônibus espacial experimental novamente, sinal que o braço trabalhava no agrado. Quando a noite chegou, receberam o sinal positivo.
Sean foi se colocar dentro da roupa espacial de nº 2; fixou-se na MMU e ligou a câmera de 35 mm acima de seu ombro direito. Abaixou o protetor da viseira escurecendo-a, e se colocou em posição de saída. Um frio interno percorreu-lhe o corpo. Olhou para dentro do ônibus espacial experimental como se numa última vez, sabendo a extensão do passo que daria.
A porta da câmara estanque se abriu e ele lançou-se no infinito, começando a se afastar do ônibus espacial experimental, disparando jatos de nitrogênio líquido instalados nos braços da poltrona. Apesar da pouca distância do ônibus espacial experimental e do satélite de observação, Sean teve que caminhar em espaço aberto, controlando cada movimento no mostrador preso em seu peito.
Não perdia contato com as informações de combustível e energia, que por sua vez eram controlados pelo DMARS.
Ao acionar com as mãos mais jatos, iniciou uma volta no ônibus espacial experimental. Spartacus se desenhava à sua frente e seus olhos azuis brilharam, fazendo uma emoção tomar conta do rosto do belo mega empresário.
— Como está se sentindo, Sr. Queise? — perguntou o Comandante Alpheu pelo pequeno intercomunicador do capacete.
— Leve!
— Bom! Pode ver a segunda asa direita de Spartacus? Pode ver o chip ao lado? Amarrei-o a fios de fibra óptica para que brilhe; assim não vai perder o chip de vista.
— Ainda estou distante — Sean olhou para cima, para os lados, para baixo; viu a Lua, viu uma parte da Terra, o Sol distante por detrás do planeta.
Voltou a se aproximar de Spartacus e apoiou-se na lataria de proteção tentando não se encostar aos espelhos, ou suas luvas fariam marcas; uma sujeira, e as lentes do satélite de observação não mais enxergariam corretamente. Também procurou não se aproximar das placas de vidro, que captavam a luz do Sol a transformando em energia para o satélite de observação.
Começou a procurar o chip se aproximando como pôde e sabia da segunda asa direita e sentiu a garganta enrolar, Gyrimias Leferi recebeu o aviso pelo monitor da Sala de Controle Ala Cinco.
— A pressão do Senhor Sean Queise está subindo rapidamente! — alertou Gyrimias.
— É muita emoção... — falou a Tenente-Coronel Adriana ao vê-lo pela câmera externa do ônibus espacial experimental.
— Tente respirar mais devagar, Sean. Está alterando o nível de gás carbônico dentro do capacete — falou Dr. Jofre pelo intercomunicador.
— Fácil... falar… — respondeu ele compassado sentindo-se estranho de repente, com a sensação de que algo compartilhava seu corpo com ele.
— Sim, Sean. Difícil fazer também — a voz do Dr. Willian Jofre chegou até ele.
Sean acionou um pouco mais os jatos se aproximando dos fios de fibra óptica, os vendo brilharem com o reflexo da luz do ônibus espacial experimental.
Ficou imaginando como o braço fez aquilo se qualquer coisa podia esmagá-lo.
— Diminua um pouco a intensidade Comandante Alpheu — pediu Sean.
— Que intensidade, Sr. Queise? — questionou Alpheu.
— Do que ele está falando? — perguntou Henrique para Adriana.
— Não sei — respondeu ela.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO... — uma espécie de zumbido se fez no microfone da Sala de Controle Ala Cinco.
— O que disse Sr. Queise? — questionou a Tenente adjunto Nadir outra vez, com a voz arrastada e cheia de sotaque quando nervosa.
Noah olhou Nadir, ele também não compreendeu o que Sean falara, enquanto o Dr. Andrea vinha se debatendo com mais uma queda de energia no outro extremo da Sala de Controle Ala Cinco.
— Diminua as luzes do ônibus Comandante Alpheu! Eu não falei para aumentar! — pediu Sean outra vez quase gritando.
— Estou diminuindo! — respondeu Alpheu.
— Do que Sean está reclamando afinal? — questionou Oscar desesperado.
— Não sabemos — verificou o Major Henrique em seus computadores. — As luzes realmente foram diminuídas. Eles estão quase no escuro.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO...
— O que disse Sr. Queise? — questionou a Tenente adjunto Nadir, ao intercomunicador, de repente. — Continuo sem compreender o que disse Sr. Queise? — insistiu a Tenente adjunto Nadir ao pensar ter escutado o zumbido pela terceira vez.
— Não disse nada Nadir, por que insiste em perguntar? — falou Sean enfim pelo intercomunicador do capacete.
— O que Sean disse? — questionou Oscar para Nadir.
— Não entendi Senhor.
Já Sean pegava o chip com a mão direita. Largou a mão esquerda da poltrona e abriu o compartimento que levava preso à sua roupa, e colocou o chip lá dentro após soltá-lo dos fios. Fechou o velcro com cuidado e sentiu um aperto dentro da roupa.
— Ahhh!!! — gritou Sean, parecendo que outro corpo ocupava o mesmo espaço, literalmente.
Seu corpo todo foi espremido e a luz o cegava.
— Sr. Queise?
— Abaixe a luz Comandante Alpheu?! — gritou Sean. — Abaixe a luz!!! — chacoalhava a cabeça dentro do capacete.
— Já estamos quase no escuro Sr. Queise.
— Sean saiu da minha câmera — disse a Tenente-Coronel Adriana. — A câmera do ombro direito dele se apagou.
— Abaixe a luz!!!
— Não grite Sr. Queise! Menos luz que isso e não enxergará nem Spartacus — se afligiu Alpheu.
— Não!!! Não!!! Está me cegando!!! — gritava Sean descontrolado ao colocar as mãos no capacete, a tentar tampar a luz de seus olhos.
— A pressão está caindo muito rápido! — avisou Gyrimias.
— Ele vai morrer!!! — berrou Nadir. — Não ouço sua respiração!!!
E Sean desmaiou. Ficou ali, com as mãos soltas, planando no infinito.
— Sr. Queise, responda! — tentou Nadir.
Só o silêncio.
— Sr. Queise, responda! — tentou Noah.
Só o silêncio.
— Sr. Queise? Está ouvindo? — tentou Bruno.
Só o silêncio.
— Comandante Alpheu o que houve? — questionou Andrea.
— Eu não sei, parece que o Sr. Queise está desmaiado.
— Ele vai morrer! — falava Nadir.
— Cala a boca, infeliz! — explodiu Adriana.
— Calma! Calma! Mas o que é tudo isso afinal? — falava o Major Henrique digitando números. — Isso não devia estar acontecendo... — falava como que para o computador.
— Concorda, então? — questionou Oscar com ironia tão peculiar quanto a de Sean. — Muita falha para uma missão bem sucedida?
O Major Henrique se esquivou de respostas das quais não tinha.
— Pode vê-lo Comandante Alpheu? — correu a Tenente-Coronel Adriana ao perder Sean de sua mira, nem ligando para o mundo a sua volta. — As câmeras externas estão no escuro.
— Acenda a maldita luz!!! — acabou por explodir Oscar Roldman.
— Taxa de oxigênio do Senhor Sean Queise em queda elevada! — completou Gyrimias.
— Sean está... — Dra. Carminna estava temerosa. —, realmente desmaiado.
— Tem controle da poltrona, Comandante Alpheu? Pode trazê-lo de volta?
— Não, Tenente-Coronel Adriana! Ele está solto.
— “Solto”? Por que não o amarrou ao cabo de oxigênio para segurança dele próprio? — questionava Oscar com a mão no coração.
— Não sabemos!
— Comandante Alpheu? Por que o Sr. Queise não está... — e um chiado tirou as comunicações do ar. — Comandante Alpheu? Comandante Alpheu? Inferno! — explodiu Adriana.
— Ele só tem oxigênio no subsistema primário — falou Andrea.
— Acalme-se Oscar! Nada de desespero! — completou o General Arthur com frieza.
— Sr. Queise? — insistia Adriana no intercomunicador da Tenente adjunto Nadir quando a câmera à direita do ônibus espacial experimental religou.
A Sala de Controle Ala Cinco viu o corpo de Sean Queise vagando, o corpo preso à poltrona, o chip preso à ele, ambos soltos no espaço.
— Meu Deus! Sean?! — gritou Nadir?
— Ele pegou o chip Cruzador Solar? Ele ao menos pegou o chip? — questionava o General Arthur desesperado.
— Vejo que você é o único aqui que não está preocupado com Sean, General? — descontrolou-se, Oscar erguendo a camisa de Arthur que se amassou pela força.
O Dr. Zhu correu a soltar o General.
— A pressão está caindo rapidamente! — anunciou Gyrimias. — Ele está morrendo!
— Não!!! Sean?! — gritava Oscar.
— Senhor Sean Queise? Senhor Sean Queise? — também chamava Gyrimias Leferi.
“Senhor Sean Queise... Senhor Sean Queise...”, ecoava na sua cabeça.
Sean queria responder, mas não sabia como fazê-lo. A casa de mármore branco se inclinava e ele corria, corria, corria. Estava sonhando novamente. Morrendo também.
Uma morte filosófica, musa inspiradora, estopim da situação existencial de um lugar no mundo. Sean sabia, sentia a morte, a marca do desamparo humano, estampando o futuro improvável, o fim, alcançando a sensação do esquecimento derradeiro.
“Sean!” exclamou a voz doce por detrás do corpo de homem bonito.
“Quem?”, Sean olhou para trás e uma mulher jovem, bela, de face quase angelical lhe sorria.
Seu vestido era branco, esvoaçante, seu cabelo loiro, platinado, preso num coque elegante. O colar de pérolas foi o que mais chamou a atenção dele. Sean também viu que mais mulheres a acompanhavam.
Vestiam batina branca.
“Sandy? O que faz aqui nessa casa?”
“Vim te buscar, Sean”.
“Oh Sandy… Procurei tanto esse essa dimensão”, e Sean sentiu-se vazio de repente, triste mesmo.
Pensou que talvez Martin Heidegger tivesse razão, dá-se muita ênfase ao sentimento de angústia do homem diante da facticidade da morte.
“Você tem que vir comigo!” e Sandy o tocou.
Sean sentiu-se leve, elétrico, indo embora às dores, a sensação de falta de ar que há pouco sentia. Uma sensação de paz que lhe tomou por completo. Foi a vez de pensar que talvez Jean Paul Sartre é quem tivesse razão, a morte é mera facticidade.
“E aonde vamos?”
“Voltar!”
— Não!!! — berrou Sean a quase deixar todos surdos na Sala de Controle Ala Cinco.
— Sean?! — questionou Oscar. — Sean querido, está vivo?
Sean tossiu, vomitou sobre sua própria respiração. O capacete se encheu, começou a se asfixiar.
O perfume de rosas brancas tomou conta de suas narinas com a casa de mármore branco se desinclinando novamente.
— Sr. Queise? Volte a si! — ordenava a Tenente-Coronel Adriana.
— O... ar... não... consigo... — tentava falar, tentava arrancar o capacete.
— Sean querido, tente! Pelo amor de Deus, meu filho, tente!
— Sr. Queise, acione os jatos! — Adriana se agitava mais que o costume. — Largue os controles do ônibus espacial experimental Comandante Alpheu, tente alcançá-lo! — deu as ordens. — Comandante?! Comandante?! — olhou um, olhou outro dentro da Sala de Controle Ala Cinco lhe olhando.
Mas Alpheu já vinha se preparando para sair desde antes do grito de Sean. Adriana o agradeceu em pensamentos por sua presteza.
O corpo do Comandante Alpheu já havia invadido o espaço dentro da roupa de nº 1 e sua respectiva mochila espacial. Em menos de um minuto alcançara Sean que tinha uma coloração verde, que tinha seu corpo jogado, flutuando outra vez.
Alpheu Smith arrancou as presilhas do capacete e seu rosto se inflou pela pressão da rara atmosfera espacial. O vômito se congelou e seus olhos ameaçaram saltar das órbitas. Suas veias inflaram, endureceram e Sean achou que ia explodir.
O Comandante Alpheu desprendeu-o da poltrona, o puxou para perto de seu corpo colocando um capacete extra em seu rosto, conectando-o ao cabo de ar, abrindo-lhe o oxigênio. E apesar do novo capacete, Sean não sabia respirar naquela estranha situação. Foi carregado até o ônibus espacial experimental numa maior potência de jatos, entrando quase morto, agora pela falta de oxigênio.
A câmara estanque foi pressurizada. Sua coloração voltava a normalizar e Sean tentava assuar o nariz, mas sangue misturado a mais vômito saía por todos os lugares. O ar começou a penetrar no pulmão e ele sentiu dores fortes na coluna parecendo que uma espada havia lhe perfurado as costas; essa sensação nunca mais o abandonaria.
O Comandante Alpheu auxiliou-o na retirada da roupa espacial e Sean agradeceu-o. Afinal não era tão mal assim o salvador da sua vida.
Ele foi levado ao compartimento dos tripulantes e amarrado novamente à estação de sono, e conectado ao computador de bordo. Tomou alguns medicamentos e nem se dera ao trabalho de perguntar para que serviam, confiando na competência do Dr. Willian Jofre e na presteza do Comandante Alpheu, que com seus cabelos ruivos mal tingidos, davam a Sean uma sensação de falsidade.
Adormeceu sob um fraco zumbido ao seu lado.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO...
12
35.786 km; órbita geoestacionária.
29 de agosto; 04h00min.
Sean acordou e viu o teto do ônibus espacial experimental na penumbra. Sentiu ardência na vista direita que voltava a lacrimejar.
— Comandante... — Sean chamou-o com uma voz fraca. Alpheu flutuava ao seu lado anotando algumas coisas. — Obrigado!
— Não foi nada — Alpheu colocou-lhe um tapa-olho embebido em algum tipo de medicamento. — O que houve lá afinal? — Alpheu cortou o silêncio.
— Como o que houve? — Sean realmente não entendeu.
— Eu a vi quando me preparei para sair atrás de você — foi frio e direto.
Sean o observou atentamente e Alpheu se projetou para outro lado do compartimento dos tripulantes voltando a escrever na prancheta de acrílico, amarrada a um fio.
— Podem nos ouvir? Digo... Sala de Controle Ala Cinco pode nos ouvir?
— Não!
— Droga! — explodiu Sean.
Alpheu só o observou. E Sean sabia que só podia ser observado, que falar seria complicado, não sem achá-lo com problemas mais sérios que o mercado financeiro achava que ele tinha.
E ele tinha.
— Vou preparar mais antibiótico — anunciou Alpheu largando a prancheta.
— O que disse que viu lá fora, Comandante?
— Não sei ao certo, e se vai me perguntar se vou escrever no relatório a resposta é não.
— Acha que foi isso então? Alucinação?
— Não disse que era alucinação.
— Mas não vai colocar no relatório com medo que digam que teve falta de oxigenação. Então me deixe falar algo Comandante — Sean se mexeu como pôde na estação de sono. —, alucinação não provoca enchimento do macacão, e alguma coisa estava lá dentro da minha roupa, ocupando o mesmo espaço físico que eu, literalmente.
— As roupas estavam com defeito, foi isso.
— Você as conferiu quando saímos da Terra, era sua obrigação. O Major Clarck morreu dentro de uma delas e você voltou a verificá-las por ordens de Adriana.
— Aonde quer chegar, moleque?
— Minha roupa falhou, eu vomitei tal qual o Major Clarck. Dá para explicar tudo isso?
— Faltou energia no ônibus espacial experimental com o desligamento dos computadores.
— E por que desligaram Comandante?
— Já disse que não sei; uma pane talvez. Apesar dos seus dezenove anos… — e riu. —, o ‘Senhor’ é o especialista aqui.
— Tem toda razão Comandante Alpheu e posso lhe afirmar como ‘especialista de dezenove anos’ que não foram falhas. Os computadores foram simplesmente desligados, como quem desliga um interruptor, e ao contrário de você, isso constará do meu relatório, sim.
— Está me acusando?
— Quem controla o oxigênio das roupas? E por que não faltou ar na estação de sono nem no seu banheiro?
— Moleque atrevido! Eu salvei sua vida. Se quisesse lhe matar o teria deixado no espaço com aquela coisa. E não me importa quantos pais importantes você tenha — Alpheu perdia o controle emocional. — Enquanto você usava fraldas eu já viajava para a Lua... — enlaçou a mão no pescoço de Sean para enforcá-lo quando foi jogado contra a fuselagem por uma força descomunal. — Ahhh!!! — e desmaiou.
Sean Queise arregalou os olhos, sabia que não havia sido ele quem jogou o Comandante longe. O impacto fez o Comandante Alpheu perder os sentidos e seu corpo inerte ficou flutuando quando uma sombra se arrastou pelo chão de metal; algo meio humano com tentáculos de polvo, de textura brilhante, de preenchimento duvidoso, de aspecto mais escuro que das outras vezes.
Sean fechou os olhos sentindo que mesmo escura, a luz era capaz de atravessar as suas pálpebras cerradas, exalando certo odor forte. Encolheu-se temendo pela sua vida até que um cheiro doce seguiu-se ao fedor tomando conta do compartimento dos tripulantes. Sean sabia que não era o perfume de rosas, o perfume que antecedia a presença do espírito de Sandy, dela lhe avisando o quanto se arriscava, o quanto ele lhe devia algo. E o quanto ela ainda o amava apesar da morte do corpo físico.
Mas ali, era uma luz mais clara, uma calma que o absorveu como num milagre. Sean parecia querer adormecer, adormeceu sem querer. Quando Sean acordou, estava solto pelo compartimento dos tripulantes do ônibus espacial experimental outra vez.
Ele retirou o tapa-olho e olhou para os lados não encontrando o Comandante Alpheu Smith.
— Comandante? — se olhou. — Sala de Controle Ala Cinco não vê o que acontece aqui? — se questionou ao avistar as câmeras presas na fuselagem. Sean se projetou para fora do compartimento dos tripulantes ainda meio zonzo, subiu para o segundo pavimento e nada do Comandante Alpheu Smith na sala de controle. — Sala de Controle Ala Cinco? — chamou pelo microfone e nenhuma resposta; apenas um ruído, um pequeno chiado.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO...
E algo tocou seu corpo.
Sean sentiu cada centímetro do toque.
— Quem está aí? Comandante Alpheu Smith? — girou os olhos para os lados sem se mexer, porém não viu nada.
Sean não se deteve pelo pavor que tomava conta da sua mente, e avançou para a ala que separavam os compartimentos da área de saída do ônibus espacial experimental olhando pela escotilha.
Mas a área de estanque estava vazia.
Também procurou na área de defecção, procurou na cabine de comando de voo, cozinha, sabendo que não havia muitos lugares para se esconder.
“O clipe de pressão!”, lembrou-se.
Sean enfiou o dedo fazendo um pequeno alarme soar nas quatro telas de Gyrimias, que deu um pulo da cadeira, onde quase dormia em cima da mesa de controle.
— Senhor Sean Queise? Responda! — o som invadiu os alto-falantes do ônibus espacial experimental.
— Graças a Deus, Gyrimias! A comunicação tem um ruído forte aqui.
— Não escuto este ruído... Espere! A Sala de Controle Ala Cinco está vazia. Todos descansam se preparando para o retorno do ônibus espacial experimental.
— Que vai fazer?
— Vou acessar a mesa de controle e trazer as comunicações da tela da Tenente adjunto Nadir para a minha. Pronto! Agora podemos falar melhor.
— Não encontro o Comandante Alpheu Smith.
— Como... — os óculos caíram no susto. — Como assim? — Gyrimias se apavorou.
— Não sei onde ele está. Ele desmaiou no compartimento dos tripulantes enquanto eu estava preso, e eu desmaiei em seguida — Sean se tocou. — Quando acordei, não o encontrei.
— Como pode ter desmaiado? Não há registros da sua estação de sono, Senhor.
— Me soltei, já disse.
— Como? Sozinho? Outra vez?
Sean recuou na resposta achando melhor não falar, depois ficou receoso de não voltar à Terra, nunca mais.
— Eu vi uma luminosidade. Primeiro uma luz negra, uma luz enegrecida quase ultravioleta na verdade. E eram duas luzes, Gyrimias, tenho certeza que eram duas luzes. Depois a outra luz, branca, com cabeça de polvo.
— O que quer dizer com ‘cabeça de polvo’ Senhor?
— Nada.
— Ah! Bem... Parcelado, quando o chip Cruzador Solar e o satélite de observação se chocaram com a tal tectita, uma intensa luz foi relata, mas Spartacus apagou as fotos da memória.
— É! Tudo deletado... — ficou no ar. — Sabe se a Sala de Controle Ala Cinco também recebeu a mensagem ou foi só o chip que as tem arquivado?
— Não sei de nada, Senhor Sean Queise. Sei apenas que o Doutor Santos Vasquez deixou escapar que todos na Sala de Controle Ala Cinco viram uma luz. Ele disse, “Igual ao dia do segundo encontro com...” e parou de falar. Posso averiguar, a sala está vazia.
— Faça isso, Gyrimias.
— Mas antes pode colocar o decodificador ao seu corpo?
— Claro! — Sean colocou-o e Gyrimias percebeu as oscilações de humor, começava a conhecer seu patrão. — Depois de averiguar isso, guarde nos meus arquivos particulares. Não quero você correndo riscos desnecessários.
— Tome certas precauções, Senhor Sean Queise. Sua vista direita está muito dilatada. Doutor Willian Jofre estava até achando que teria deslocamento da retina quando foi solto do capacete no espaço.
— Antes de buscar essas informações pode localizar qualquer alteração dentro do ônibus espacial experimental, Gyrimias?
— Vou trazer para minha tela o comando do DMARS. Pronto! Desliguei a mesa de controle do Doutor Schumann Goethe e do Doutor Andrea Bardini. Vou transferir os dados de seus computadores para o meu. Pronto! Deixe-me ver... — Gyrimias espremia a vista suada para enxergar melhor. — É, tem uma pequena alteração de temperatura no primeiro pavimento, no compartimento de carga.
— É onde está o freezer, não é? — e Sean já se dirigiu para lá.
— Sim! Vou desligar a mesa de controle do Doutor Bruno Pierre. Pronto! Agora estou acessando a planta de construção do ônibus espacial experimental. Deixe me ver, procurando vida no ônibus espacial experimental... — Gyrimias mordeu a unha, nervoso. — Bem, localizo presença de sangue quente nas proximidades das prateleiras cinco e seis, nível verde.
Sean olhou em volta, lendo as plaquetas de identificação.
— Sou eu!
— O computador mostra outra pequena alteração de temperatura dentro do freezer. Ou ela está falhando ou está muito fraca.
— Meu Deus! Dentro do freezer, Gyrimias? — Sean flutuou por entre os corredores do compartimento de carga, uma sala de estoque com prateleiras lotadas de alimentos e outras caixas que não imaginava o que continham.
Alcançou o freezer no final do último e estreito corredor, tentando girar a grande maçaneta que o fechava, mas estava dura; sem atmosfera sua força de nada valia no espaço.
— Tudo bem por enquanto, Senhor Sean Queise?
— Sim — respondeu Sean se aproximando da porta do freezer. — Comandante?! Pode me ouvir?! Droga! — exclamou nervoso. — Pode localizar os batimentos cardíacos do Comandante Alpheu, Gyrimias?
— Posso tentar Senhor Sean Queise — Gyrimias olhou para os lados, e começou a escutar vozes no lado de fora da Sala de Controle Ala Cinco. Gyrimias desligou o som dos alto-falantes e os transferiu para o microfone acoplado ao seu fone de ouvido, desligando assim os computadores da Tenente adjunto Nadir e Noah de vez. — Pode me ouvir, Senhor Sean Queise... — sussurrava. — Falarei assim baixinho... — Gyrimias não esperou Sean saber por que. — Não sei se é o Comandante Alpheu Smith, mas se for e estiver com o decodificador preso ao seu peito, então realmente tem algo oscilando dentro do freezer. Acredito não ser o Major Clarck Johnson — Gyrimias chacoalhou a cabeça quase fazendo os pequenos óculos pularem.
— Pode me ajudar a abrir a porta?
— Posso tentar. Parcelado... Os controles do computador não a estão alcançando. Acho que a maçaneta foi fechada em algum código especial para segurança do chip lá dentro.
— Droga! — Sean exclamou nervoso se jogando para o lado.
Tentou alcançar um pedaço de metal, forçando a porta, mas a peça estraçalhou. Sean cobriu os olhos e Gyrimias Leferi percebeu pelo decodificar uma alteração na pressão dele.
— Senhor Sean Queise... — sussurrou. — Tudo bem?
— Agora sim, Gyrimias — esfregou os olhos, sentindo uma ardência maior na vista direita. — A peça de metal se estourou em pedacinhos.
— A falta de gravidade faz com que as moléculas não se rejuntem, e isso provoca fissuras e a quebra do material.
— Uma ideia brilhante seria recebida de bom agrado, Gyrimias — Sean falava já nervoso.
— Tem máscaras de oxigênio no compartimento de carga, prateleira seis, nível amarelo. Coloque-a, por favor! Vou tentar despressurizar o ônibus espacial experimental, abrindo a carga de ar comprimido nos tubos ao lado do freezer. Isso talvez force as portas cederem um pouco.
— A 800 quilômetros de altura da Terra, Gyrimias, não há como fazê-lo.
— Teremos de tentar diminuir a microgravidade, Senhor — e Gyrimias começou a digitar.
O Dr. Bruno, Dr. Santos e o Dr. Schumann acabavam de entrar na Sala de Controle Ala Cinco.
— Bruno? — chamou Adriana que só esperou ele se aproximar e não haver ninguém por perto. — Nunca mais faça aquilo!
— “Aquilo”? Aquilo que vai nos matar, não?
— Cale-se! — a exclamação dela fez Gyrimias os olhar. — A tempestade não vai nos atingir.
— Vocês enlouqueceram! A Poliu enlouqueceu e enlouqueceu vocês! Sabe que entramos em nível 3 de periculosidade, e sabe que se os ventos forem fortes levantando a água como um tsunami, os casulos inundarão.
— Cale-se! Cale-se! Cale-se! — Adriana avermelhou o rosto bonito. — Não quero mais você falando isso! Não quero mais você participando disso!
— E me tirar do jogo vai nos salvar?
— Cale-se! Já disse! Os casulos não inundarão!
— Mas Adriana... Sabe que estamos nos arriscando cada vez mais alterando o...
— Cale-se!
— Tirar-me do jogo ou calar-me não vai mudar a situação. Se a Poliu perder o controle dessas experiências, vocês vão matar mais gente do que querem proteger, Adriana.
— Não sou eu quem decido Bruno. Como pode perceber. Agora volte a seu posto e vamos continuar com as antenas. Com menos carga, mas vamos continuar com as antenas, entendeu? — e Adriana viu Bruno só a olhar. — Entendeu?
— Sim.
— Ótimo! — e Adriana deu um basta quando ela e Bruno olharam-se, ao perceber Gyrimias Leferi digitando com tanto empenho.
— Gyrimias?! — gritou Bruno ainda muito longe dos computadores dele. — Tudo bem?!
Gyrimias Leferi gelou.
— Sim, Senhor — concordou com um movimento de cabeça.
Adriana foi embora e Gyrimias Leferi passou a olhar para a tela grande ainda desligada. Ninguém sabia o que acontecia no ônibus espacial experimental, nenhum aviso do que acontecia havia sido comunicado pelos computadores de bordo. Ele também começava a ficar apavorado com a ideia de sabotagem.
Gyrimias rapidamente acionou o comando, e uma força descomunal invadiu o rarefeito ar do ônibus espacial experimental após o ato.
O vácuo criado projetou Sean para cima das prateleiras.
— Ahhh!!! — gritou de dor derrubando tudo que tinha a sua volta.
Tentou se agarrar com uma mão enquanto a outra segurava a máscara de oxigênio que ainda não havia prendido ao seu rosto. Sua vista voltou a doer com o excesso de ar.
Abriu-as e fechou várias vezes, alcançando a porta do freezer. Gyrimias tinha razão, a força do ar criara certa pressão, e Sean sentiu certo peso no corpo, o que permitiu os seus pés empurrassem a maçaneta que cedeu pelo impacto. Um ar gélido invadiu o ônibus espacial experimental quando Sean entrou no apertado freezer, e enjoou ao ver o corpo do Major Clarck Johnson amarrado dentro do saco de plástico. Viu também a caixa de acrílico presa nas mãos congeladas do Comandante Alpheu Smith. As soltou de sua mão após empregar muita força, colocando a caixa que guardava o chip no lugar programado anteriormente.
Sean encontrou a caixa trincada, travando sua recolocação com um novo encaixe. E digitando “close”, puxou o Comandante Alpheu Smith para fora do freezer, o segurando como podia, tentando fechar a agora pesada porta.
— Senhor Sean Queise, tudo bem? — falava Gyrimias Leferi baixinho.
A Sala de Controle Ala Cinco começava a ficar lotada, e ele entrou em pânico.
Gyrimias tentava segurar o aro dos óculos que teimava em escorregar no rosto molhado de suor e o Dr. Santos religava seu controle com o telescópio de Arecibo, começando a trabalhar novamente.
— Senhor Sean Queise? Vou ter que recolocar os comandos de volta... — comia unha atrás de unha. — Senhor? — Gyrimias não viu opção a não ser estabilizar o ônibus espacial experimental, correndo contra o tempo.
“Espero que tenha dado certo”, pensou Gyrimias ao estabilizar o nível de oxigênio fazendo a microgravidade voltar.
A Tenente adjunto Nadir sentou-se à sua mesa de controle no mesmo momento que Gyrimias Leferi devolvia-lhe a comunicação auditiva de seus computadores.
Ela nada percebera.
Já o Dr. Bruno também se acomodou em seu lugar, apertou os botões dos controles do voo, mas seu computador não funcionou. Gyrimias Leferi digitava feito louco quando Bruno olhou outra vez para trás, e viu o cientista da Computer Co. a trabalhar freneticamente.
Desconfiando dele, voltou a chamar os computadores de bordo, mas outra vez não responderam. Bruno então chamou a Dra. Stella, mas ela conversava animada com a Dra. Carminna e não o ouviu.
Já Gyrimias Leferi devolvia o DMARS aos controles de Schumann que por sua vez, nem percebera nada ao sentar-se em sua mesa de controle. Os computadores de Bruno também voltaram a funcionar e ele se esqueceu de questionar Gyrimias.
Já a Tenente adjunto Nadir voltava a falar.
— Sr. Queise? — Nadir chamou-o pelo seu intercomunicador, agora com um pouco menos de intimidade.
Gyrimias arregalou os olhos sem, porém encarar a sala, nada mais podia fazer. Encerrara sua comunicação com todos os computadores que invadira devolvendo todos os comandos.
Carminna Clemente sentou-se a seu lado ao vê-lo suar. Ia perguntar, mas deteve-se pelas mãos geladas do rapaz que a impediu de falar.
— Sr. Queise? — insistia a Tenente adjunto Nadir pelo intercomunicador.
— Sim, Nadir? — perguntou Sean ofegante.
— Pronto para voltar, Sr. Queise? Tudo sob controle? — perguntou-lhe docemente.
— Claro Nadir. Por aqui... — suspirou Sean. —, tudo sob controle.
Gyrimias Leferi respirou aliviado sob os olhares inquisitivos de Carminna que nada entendia.
Ele havia conseguido ela não sabia o quê.
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de gerenciamento.
29 de agosto; 11h11min.
Num outro extremo do corredor da Sala de Controle Ala Cinco um homem adentrou a sala do General Arthur La Hera. Era grande, de pele jambo, vestindo uma jaqueta italiana marrom sobre uma camisa bege de corte preciso.
Era robusto, não gordo; era idoso, não velho; era educado, porém temido.
— Mr. Trevellis? — Arthur se assombrou.
— Por que tanto susto, General Arthur? — os olhos verdes brilharam. — Ou achou que não viria depois de tudo?
— Claro que depois que o Sr. Queise quase pôs tudo a perder, achei mesmo que a Poliu viesse saber algo sobre Codinome: Cruzador Solar.
— Achou?
— Sim... Mas ele... Ele é quase um garoto ainda. E bem... Ele conseguiu.
Mr. Trevellis gargalhou com gosto desenrolando seu charuto cubano ainda em pé.
— Intimidado por isso, Arthur? — e o fogo seguido pela fumaça tênue se espalhou pela sala.
— Inti... Não! Claro que não!
— Pois deveria! — a exclamação, a entonação e o semblante de Mr. Trevellis aterrorizou-o. — Sean é algo especial até para seu conhecimento.
— Entendo!
— Não entende! Não vai entender! Não algo sobrenatural como ele.
— Sobre... — e Arthur não terminou. — Mas ele é jovem...
— Não o subestime pela idade. Isso faço eu! — e caiu em risada sonora, parecendo mesmo estar se divertindo.
— Claro! Claro! Só não achei que o Senhor sairia da guarda.
— Acalme-se General Arthur, não quero chamar tanta atenção assim — pronunciava rouco, aquelas palavras. — Vai me convidar a sentar? — Mr. Trevellis apontou para a cadeira em frente ao General.
— Ah! Claro! Quer tomar algo, Mr. Trevellis?
— Uísque!
— Quer gelo?
— Quero Oscar Roldman!
Arthur tremeu. Encaminhou-se até o intercomunicador esquecendo até do copo que começara a servir. Chamou a secretária no mesmo momento que a porta se abriu.
— Começava a ficar com ciúme — falou Oscar parado na porta que se abriu sem que ele a abrisse. Arthur viu algo de DNA ali. — Achei mesmo que não iam me convidar para esta reuniãozinha.
Mr. Trevellis riu com gosto.
— Sabe que não preciso lhe convidar, não é Oscar amigo velho? — questionou Mr. Trevellis, o todo poderoso da Poliu.
— É verdade! Eu sinto seu cheiro nas redondezas — respondeu Oscar, o todo poderoso da Polícia Mundial.
— “Cheiro”? É alguma técnica nova nos seus dons genéticos, Oscar?
— Cale-se Trevellis! — Oscar agora se irritou.
Mr. Trevellis caiu em gargalhada outra vez vendo Arthur de olhos arregalados.
— Alguma informação de seu protegido?
Oscar sentiu sua boca secar.
— O último boletim da Sala de Controle Ala Cinco dá como certo seu retorno amanhã, as precisas 07h00 — Oscar sentou-se na poltrona de couro macio.
— Ótimo para ele! — respondeu com secura.
— Se preocupando com Sean, Trevellis?
— Não vejo motivos para que não. Nada tenho contra o garoto.
— Sean já é um homem, provou isso ao assumir a Computer Co. contra a sua... — insinuou. —, vontade.
— Repito que nada tenho contra ele — começava a arrastar a voz com uma intensidade maior que as anteriores, sinal de irritação de Mr. Trevellis.
E o General Arthur o conhecia como ninguém, voltando a ficar temeroso.
— Quer beber algo, Oscar? — tentou o General aliviar a tensão do ambiente.
— Pode nos dar licença, General Arthur? — falou Oscar não tirando Mr. Trevellis uma única vez de seu raio de visão.
Arthur saiu e a porta nem se quer pareceu ser fechada perante o silêncio.
— Por que não insistiu em trazer Spartacus, Oscar?
— Porque iria destruí-lo.
— Sean Queise o convenceu disso?
— Sabe tão bem quanto ele...
— Eu não sei de nada! Nunca sei de nada se tratando dele! — Mr. Trevellis se impôs erguendo a voz e o corpo da cadeira. — Dei uma ordem e não foi cumprida. Financiei uma boa parte de Spartacus para que pudessem levar ao espaço o chip Cruzador Solar. Você sabia que o projeto era audacioso, que as autoridades não podiam saber o que encontramos naquele deserto...
— “Encontramos”? — cortou a explicação. — A Poliu encontrou. Eu não era nascido.
— Fugir não vai…
— Não me meta nisso Trevellis! E principalmente não arquive nada sobre isso ou Sean vai descobrir.
— Ainda permitindo que ele hackeie?
— “Hackeie”? — sorriu. — Você não faz ideia do que Sean vem se tornando, Trevellis.
— Ok! O que ele não hackeou dessa vez? — Mr. Trevellis debochou.
— Formas-pensamento.
Agora Mr. Trevellis teve medo, e ele não tinha medo de nada.
— Está falando sobre... Formas-pensamento são ideias projetadas pela mente humana e materializadas no mundo espiritual, que sabemos Oscar amigo velho, fica noutra dimensão. Sean não poderia atingi-las.
— Se pôde atingi-las ou não, nunca saberemos, mas ele resgatou todos os pensamentos da Sala de Controle Ala Cinco numa só jogada.
— Todos os pensamentos... Numa só... — e Mr. Trevellis não conseguiu terminar. — As formas-pensamento são energias que podem construir um ser vivente. Se algum dia Sean conseguir dominá-las, pode absorver qualquer coisa e dar vida a elas. Isso é surreal. Nossos espiões psíquicos nunca conseguiram materializar nada.
— Porque seus espiões psíquicos nunca tiveram acesso às formas-pensamento da Sala de Controle Ala Cinco.
— E o que o faz pensar que Sean teve acesso?
— ‘Fim do mundo’!
Mr. Trevellis sentiu lhe atingirem outra vez. Porque não passou despercebido a Oscar que houve uma pausa antes dele se pronunciar.
— Não vou discutir sobre isso, Oscar. Quero o chip Cruzador Solar de volta e intacto, como nós o encontramos, sem que Sean acesse nada dele, entendeu?
— E você Trevellis? Entendeu? Entendeu no que Mona transformou Sean? — e antes que Mr. Trevellis abrisse a boca e o charuto caísse, Oscar prosseguiu. — Agora você entendeu.
— Não pode... Não pode... Quando um pensamento é criado, ou alguém pensa num objeto, pessoa, caneta, carro, uma cidade inteira formasse na parte superior de seu corpo mental; uma pequena imagem do objeto, que flutua e segue para o éter, para outra dimensão onde fica arquivado. O tempo de duração desse arquivamento sempre foi ponto de discussão entre os parapsicólogos, porque a intensidade da imagem e a força do paranormal têm que estar conectada, vibrando nas mesmas frequências — Mr. Trevellis olhou Oscar o olhando. Ele abaixou a cabeça num movimento inédito, de quem sabe que foi derrotado. —Infelizmente sabíamos que quem possuísse dons da grandeza de uma Mona Foad, poderia alcançá-los, lê-los e ouvi-los; e também criá-los, do nada.
Um silêncio incomodativo se instalou ali.
— Você é ridículo Trevellis! Sabia que Sean estava lá, nos porões da Poliu, debaixo de suas ordens!!! — gritou.
— Não!!! — berrou de volta. — Sean não teve tempo para desenvolver tamanha grandeza!!!
— Com Mona lhe preparando todos os dons genéticos que eu lutei para ele não ter?!
Mr. Trevellis riu com gosto.
— Ah! O que é isso Oscar amigo velho? Você sempre quis o que eu sempre quis, o controle das máquinas. Por isso mandou Nelma voltar com ele na barriga... — e Mr. Trevellis foi lançado no chão duro pelo soco que Oscar diferiu nele.
E só o estrondo e o impacto dos muitos quilos no chão reverberaram ali.
— Nunca mais, entendeu?! — Oscar berrou a salivar o chão. — Nunca mais levante o nome de Nelma!!! Não me faça parecer ser igual a você, Trevellis; você e as suas filhas espiãs!!!
— É mesmo? É mesmo Oscar amigo velho? — Mr. Trevellis parecia ter voltado ao controle. — Você cuida melhor dele do que eu? Ou o que faz com ele lá em cima é algum tipinho novo de proteção? — gargalhou se levantando do chão, e enterrando o charuto no cinzeiro. — Só vou lhe dizer uma única coisa mais. Se Sean conseguir saber o que Carminna faz aqui, ou o que as tectitas do Deserto de Karakum significam... — e Mr. Trevellis não deixou Oscar falar quando ergueu a mão e o calou. —, ou se ele descobrir sobre o chip de Codinome: Cruzador Solar estaremos encrencados, Oscar amigo velho. Porque diferente das minhas filhas, seu filho vai pôr a boca no trombone e contar o que realmente existe naquele DNA — e saiu.
Oscar socou a mesa que tremeu derrubando a foto da alegre família La Hera. Ele ficou alguns minutos tentando realmente absorver aquilo.
35.786 km; órbita geoestacionária.
29 de agosto; 21h21min.
O ônibus espacial experimental estava na penumbra. Dessa vez a coisa se invertera e era Sean Queise quem estava ao lado do corpo amarrado do Comandante Alpheu Smith, que abriu os olhos após Sean lhe injetar uma seringa contendo antitérmicos e estimulantes, estabilizando sua temperatura.
Sean ainda não o ligara aos eletrodos, não podia dar a deixa para que o pessoal da comunicação da Sala de Controle Ala Cinco descobrir o que estava acontecendo.
Porém vinha seguindo todas as ordens. Religara os computadores de Spartacus e suas câmeras voltaram a ser ativadas, fazendo com que Gyrimias Leferi gerenciasse novamente o satélite de observação da sua mesa de controle.
O Major Henrique Loyola pediu também que economizassem energia no ônibus espacial experimental, e Sean disse a todos que Alpheu se resguardava para a longa viagem.
— O que... — Alpheu acordou de vez.
— Estava desmaiado dentro do freezer, congelado, quase morto. Sabe me dizer o que fazia lá?
As sobrancelhas do Comandante Alpheu Smith estavam arqueadas, sua face denotava certa brancura, parecendo fazer um esforço descomunal para se lembrar.
— Não sei…
— Imaginei que fosse me responder isso — falou Sean irritado.
— Não tenho motivos para mentir — sentiu a garganta seca. — Quero água.
— Quero respostas!
— Já disse que não sei.
— Vamos retornar daqui a quatro horas e quero uma resposta antes de todo mundo, ou vou ter que contar que foi até o freezer pegar o chip Cruzador Solar.
— Eu não fiz nada disso.
— Você estava congelado com a caixa de acrílico solta de seu suporte. O que ia fazer com ela, Comandante? Destruí-la? Foi isso que tentou fazer o tempo todo? Destruir a missão de resgate?
O Comandante Alpheu mudou de cor, sua face embranqueceu mais ainda, ficando como que doentia. Suas mãos tremiam até o descontrole.
Sean o encarava friamente, o sabia ser.
— Não sei, não sei — Alpheu se amedrontava. — Não consigo saber o que fazia ali. Juro que não ia pegar o chip.
— Alguma ordem secreta da Sala de Controle Ala Cinco?
— Não, não me lembro. Estávamos aqui discutindo — olhou em volta. — Lembro-me de ter sido arremessado para longe de sua estação de sono...
— Quem bom que se lembra, porque foi arremessado depois que tentou me enforcar.
— Enfor... Não... Não...
— Não entre em pânico, Comandante. Ainda teremos oportunidade de conversar, e o faremos pode acreditar. Agora vou ter que religá-lo aos eletrodos — preparou os eletrodos, os adesivos, e conectou-o.
Depois se virou para avisar a Sala de Controle Ala Cinco.
— Eu vi algo em forma de um polvo quando fui buscá-lo no espaço; algo iluminado.
Sean estancou as mãos no ar. Surpreendeu-se com aquelas palavras.
— O que era afinal?
— Não sei... Uma força seguida de uma claridade e depois a forma de polvo com tentáculos — e Alpheu calou-se quando a voz de Nadir invadiu os alto-falantes, era a ordem para que entrassem nas cápsulas de sono.
Sean não insistiu e acabou de conectar-se aos eletrodos e depois ao polissonógrafo.
— Mandaram nos vestir com roupas parcialmente pressurizadas e uma mochila de paraquedas. Espero que eles não estejam esperando o pior — Sean levantou o pescoço do Comandante. — Tome esse remédio. Mandaram nos dopar. Vamos ser levados por piloto automático. Espero mais que tudo que os computadores aguentem — e Sean se aproximou do ouvido do Comandante. — Tenha uma boa viagem — entrou na sua cápsula, conectou o polissonógrafo ao painel, apagou todas as luzes internas, e preparou a máquina para fechar-se em quinze segundos.
13
XSLC, Centro Espacial de Xichang; Província de Sichuan, República Popular da China.
28° 14’ 45.66” N e 102° 1’ 35.6” E.
30 de agosto; 11h11min.
— Contagem regressiva! — falava o oficial de segurança em terra. — Reentrada na atmosfera terrestre prevista em vinte segundos! T menos 19s... T menos 14s... T menos 11s... T menos 9s... T menos 7s... T menos 4s, T menos 3s, T menos 2s, T menos 1s... Ônibus espacial experimental na atmosfera terrestre! Controles perfeitos! Aproximação em quinze minutos! Contagem regressiva... Aproximação do ônibus espacial experimental! Preparação de luzes na pista acionadas! O modulo está a 610 metros do chão! Abaixar trens de pouso! Piloto automático sob controle! O ônibus espacial experimental vai encostar-se à pista em vinte segundos! Parte traseira tocou a pista em velocidade aproximada de 350 km/h! T menos 19s... T menos 14s... T menos 11s... T menos 9s... T menos 7s... T menos 4s, T menos 3s, T menos 2s, T menos 1s... Ônibus espacial experimental na pista! Paraquedas acionado! Freios acionados! O ônibus espacial experimental está parando! Aterrissagem completada! Perfeita! — comunicava ao intercomunicador.
Gritos eufóricos se espalharam por toda a longínqua Sala de Controle Ala Cinco.
Oscar Roldman estava feliz com o retorno de Sean Queise e Adriana também, ele viu a emoção aflorar na pele da bela mulher. E Oscar não gostou do que viu, a encarando.
Adriana ao perceber se conteve enquanto Carminna observava os dois. Aquilo lhe deu algumas ideias. Precisava conversar com Sean Queise no seu retorno a ilha.
Na pista de Sichuan, um jatinho esperava a ambulância que fora resgatar do ônibus espacial experimental que aterrissara, Sean Queise, o Comandante Alpheu Smith, o corpo morto do Major Clarck, mais a caixa contendo o chip Cruzador Solar, para serem todos levados à ilha secreta, na Indonésia.
14
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de alojamento.
03 de setembro; 17h40min.
Adriana entrou no quarto-sala de Sean, dias depois, e ele a viu em meio à pequena escuridão do fim de tarde.
— Como está sua vista direita, Sr. Queise? — ela foi direta; fria e direta.
— Ainda doe... — ele viu que seu uniforme continuava discreto, que seus cabelos estavam no coque militar. — O colírio vem dilatando minha pupila, deixando tudo embaçado. Contudo o oftalmologista disse que é normal.
— Posso entrar? — apontou para o chão.
Sean riu.
— Tem a estranha mania de perguntar depois de já ter feito.
Adriana se aproximou, porém séria. Ele percebeu que a Tenente-Coronel estava realmente diferente. Sean olhou em volta, e sentiu-se mal ao lado dela. Era a primeira vez que se falavam desde seu retorno à ilha há quatro dias. Era também a primeira vez que voltava a dormir no seu quarto-sala depois do tempo, já que foi obrigado a permanecer numa sala vedada para descontaminação.
Sean pouco entendeu o porquê daquela precaução.
— Folgo realmente saber que retornou bem. Não tivemos muitas oportunidades de nos falarmos.
— Ninguém foi me ver no quarto de descontaminação.
— Ninguém tinha permissão para isso, Sr. Queise.
Em plena frieza da conversa, Sean não contou sobre a visita de Nadir, das três horas que lá permaneceu ‘batendo papo’, contando sobre sua infância na fazenda, sua infância difícil na fazenda sendo ela uma criança especial, com dons paranormais que moviam cadeiras e objetos de lugar, levantava e fazia vacas volitarem, e o quanto se divertia por todos terem medo na região das coisas que aconteciam sem saberem que fora ela. E que tentara entrar para a Poliu, para desenvolver seus dons, mas fora desclassificada pelo baixo desempenho. E claro; Sean também percebeu que Nadir estava interessada nele.
— Onde está o Comandante Alpheu, Tenente-Coronel Adriana? — Sean retomou o assunto.
— Também saiu do quarto de descontaminação ontem.
— Como ele está?
— Dorme.
— Ainda? Estranho! Tenho certeza que apliquei apenas o necessário de medicamentos.
— Ninguém está duvidando Sr. Queise. Mais vinte e quatro horas e tentarão reanimá-lo.
— O que será que aconteceu? — começou a ficar temeroso.
— Não sei. Tudo está errado nessa missão — e Adriana se sentou enfim na cadeira em frente a Sean. — Sabe por que a caixa do chip Cruzador Solar estava trincada?
Sean nada deixou transparecer.
— “Trincada”?
— O chip está com um dos seus componentes danificados.
— O chip não vai funcionar?
— Não sabemos. Teremos que esperar para vermos os resultados.
— Por que um chip de DNA? Um método que utiliza ácidos nucleicos que foram imobilizados sequencialmente na superfície do chip para formar oligonucleótidos, e o outro método que envolve DNA complementar de um indivíduo, com uma mutação genética conhecida como uma fonte de oligonucleótidos pré-fabricados.
— Parece que sabe mais do que diz.
— Vai me responder?
— O chip funciona como um Transistor de DNA. Uma membrana de silício é colocada verticalmente em uma câmara cheia de solução, dividindo-a em dois. Os fios de material genético são colocados num lado da câmara, e cargas eléctricas são aplicadas; negativos na parte da câmara onde residem os fios genéticos, e positivos no outro lado, desenhando um fio de material genético em uma pequena abertura da membrana, ou nanopore.
— Mas há um problema na forma de ligar o DNA aos ácidos nucleicos ou DNAc ao chip, não?
— À medida que o cordão passa através da abertura, a combinação das cargas eléctricas e a composição da membrana tem o efeito de trincar o cordão através de um cordão de material genético, um de cada vez. Este mecanismo permite ler de forma precisa e rápida a composição genética da cadeia.
— Wow!
— Por que a descrença?
— Os chips de DNA são microssistemas miniaturizados com base na capacidade do DNA para encontrar, e ligar espontaneamente a sua sequência complementar de uma forma altamente específica, e reversível, conhecida como hibridação.
— Exato! As moléculas de DNA marcadas numa amostra são analisadas por sondas de DNA amarradas em locais distintos num suporte sólido. A composição da amostra de DNA é então deduzida pela análise do sinal gerado pelos marcadores presentes em cada local da sonda. Em campos ambientais e agroindustriais, as microplaquetas de DNA são muito promissoras para testar rapidamente o teor de microrganismos, contaminação ou patogenicidade.
— Não brinque Adriana — Sean viu Adriana não gostar da intimidade.
— Não sou mulher de brincar Sr. Queise.
— Um chip de DNA não podia receber tamanha carga de dados.
— As dimensões de chip de DNA oferecem locais de hibridização na gama de 50-200 micrómetros, produzindo matrizes que variam de 100 a 1.000.000 de sondas diferentes por cm2.
— Então me explique por que portas seriais?
— Como é que é? — Adriana ergueu-se nervosa. — Portas seriais eram os sistemas operacionais em uso na época.
— Antes de cada byte de dado, uma porta serial envia um bit de partida, start bit, que é um bit único com o valor 0; hoje e ‘naquela época’. Após cada byte de dado, ela envia um bit de parada, stop bit, que indica que o byte está completo. Ela pode enviar também um bit de paridade. O nome serial vem do fato de que uma porta serial serializar os dados, ou seja, pegar um byte de dado e transmitir os 8 bits de byte, um por vez.
— Aonde quer chegar com a aula Sr. Queise?
— Aonde? Na vantagem da porta serial necessitar de apenas um fio para transmitir os 8 bits, já que uma porta paralela necessita de 8.
— Não entendi.
— As portas seriais, também chamadas de portas de comunicação, COM, são bidirecionais, Tenente-Coronel, onde a comunicação bidirecional permite que cada dispositivo receba e envie dados. A Poliu devia estar recebendo dados há muito tempo, provável desde a época que Spartacus chegou lá em cima — levantou-se sentindo tudo embaçado; até Adriana ele não enxergava direito. — Contudo, as portas seriais dependem de um chip controlador especial, um UART, Universal Asynchronous Receiver/Transmitter, para funcionar adequadamente. A UART então transforma em serial a saída paralela do barramento do computador, para realizar a transmissão via porta serial. Não existe isso num barramento de DNA.
— E?
— ‘E’ o que? Impossível que esse chip à base de DNA funcione. Porque para funcionar de maneira mais rápida, a maioria dos chips UART possui um buffer embutido entre 16 e 64 kilobytes. Esse buffer permite que o chip armazene um cache de dados proveniente do barramento do sistema.
Adriana sorriu de uma maneira incógnita e passou a mão pelo uniforme impecável.
— Deveria ter pesquisado melhor Sr. Queise — e Adriana abriu a porta para sair.
— Isso quer dizer que já o implantaram? Por que insistiram em implantá-lo em Bruno mesmo congelado?
Adrian se virou de supetão.
— Como sabia que o chip estava congelado?
— Estava no espaço frio... — Sean tentou escapar do deslize. — Depois no freezer.
— Ele estava bem acomodado na caixa. O congelamento foi como o esperado. Não era para a caixa ter trincado.
— Mas o frio...
— O frio da câmara não deveria ter chegado dentro da área em que a caixa estava presa e muito menos no chip.
Sean balançou a cabeça, começava a ficar preocupado.
— Por que não testaram o chip primeiro, Tenente-Coronel Adriana?
— O gasto com o chip foi muito grande. Os investidores querem resultados.
— E a Poliu quer as respostas dele.
— Não sei nada sobre isso! — e saiu.
— Vai fugir da conversa?
— Não estou fugindo de nada! — Adriana voltou.
— Por que escolheram Bruno para implantá-lo?
— Ele é inteligente, seu Q.I. comporta o montante de informações que possam ser obtidas pelo chip Cruzador Solar.
— Por que sua escolha por Nadir foi recusada? Desclassificada por baixo desempenho?
Adriana não o imaginou sabendo aquilo. Olhou-o sem saber o que falar.
— A Poliu não levou em conta minhas diretrizes quanto o humor inconstante de Bruno.
— Perguntei sobre Nadir? Ela aceitaria que abrissem seu cérebro sem cogitar?
— Somos cientistas acima de tudo, Sr. Queise — ela se aproximou dele. — Lutamos por aquilo que acreditamos, pela ciência que nos guia.
— O cérebro humano é nosso último refúgio, Adriana. Se nem lá tivermos paz...
— Poético Sr. Queise, mas pouco funcional.
— Pouco funcional e os investidores querem resultados… — e os lábios dela colaram em seu rosto carinhosamente. Sean se assustou com os lábios dela tão próximos e Adriana voltou a se aproximar e Sean a recuar. — Por que recuou Sr. Queise?
— Não acho que devemos! — respondeu com a mesma frieza usada por ela. Levantou-se indo para o banheiro quando teve a sensação de que a intensidade da luz do quarto-sala aumentara. — O que foi isso? — se virou.
— Isso o quê?
— A luz... Impressão!
“Alucinação!”, queria ter dito.
— Janta comigo essa noite? No meu quarto-sala?
Sean encarou-a. Adriana não era o tipo de mulher que se sujeitava a fazer tais convites.
— Por que não Tenente-Coronel Adriana? — foi o que disse.
— Ótimo! — ela sorriu apenas e saiu sem dessa vez impor horário.
Sean deu um tempo, se levantou e se trocou. Tinha uma visita estratégica antes de jantar com Adriana. Foi atrás da Dra. Carminna Clemente, que ele foi. Algo nos livros da assirióloga a ligava a Sala de Controle Ala Cinco, ele agora tinha certeza.
Uma batida à porta dela e a Dra. Carminna parecia estar lhe esperando. Uma mesa com chá de camomila e petit four o esperava.
— Posso entrar? — falou confuso, da porta, vendo a mesa posta.
— Claro! O esperava.
— Me esperava? — Sean a olhou e Carminna apontou uma das duas poltronas. Ele entrou e sentou-se na poltrona vazia à direita da porta. — Como sabia que voltei ao meu quarto-sala?
— As notícias correm rápidas por aqui — sorriu-lhe.
— Não tenho duvidas disso... — Sean agradeceu a simpatia. — Então como sabia que eu vinha aqui? As notícias correm rápidas? — brincou.
— Acredita mais em falhas ou sabotagem, Sean?
Sean gostou de ser chamado com intimidade. Porém, ela era tão direta quanto a Tenente-coronel Adriana La Hera.
— Não sei o que pensar Carminna.
— Gyrimias lhe disse?
— Sobre suas desconfianças dos Sun Flares? As imagens que Sala de Controle Ala Cinco acreditava serem as tais anomalias solares? Arrisco a dizer que pertencem às fotos que o colisteiro ‘Fim do mundo’ envia às listas.
Carminna riu encantada em como ele era rápido.
— Uma explosão solar ocorreu na tarde de ontem, e foi produzida na região da mancha solar ativa AR1520, que está voltada diretamente ao nosso planeta. Com a explosão, detectores a bordo de satélites geoestacionários mediram a intensidade da radiação no comprimento de onda dos Raios-X entre 1 e 8 ångström e a classificaram em X 1.4.
— Wow! Tormentas de Classe X são muito fortes. Durante os eventos de maior atividade podem provocar blackouts de radiopropagação, que podem durar diversas horas ou até mesmo dias. Colapsos em sistemas de distribuição de energia elétrica, panes em satélites, destruição de transformadores e circuitos eletrônicos, mas não movimentam ônibus espaciais experimentais para o cinturão de asteroides — e Sean percebeu a luz rarear. —, nem provocam intensidade de luz — olhava para cima.
— Uhm! Eu ia dizer a mesma coisa! — exclamou Carminna, sem entender a ‘intensidade de luz’. — Porém, de acordo com dados chegados, as partículas ejetadas durante a explosão atingiram a magnetosfera da Terra causando fortes tempestades geomagnéticas.
— Aonde quer chegar Carminna?
— E você Sean?
— Só quero respostas.
— Do tipo?
— Do tipo que tenta entender chips de DNA que sobrevivem a neutrinos e tormentas Classe X.
— O major Henrique nos explicou sobre seu material estar no espaço para testes.
— O major Henrique fala demais…
E Carminna achou graça de algo.
— O major Henrique anda mais falante ultimamente, diria até um tanto excitado com as tempestades solares. E qualquer pessoa familiarizada com imagens solares, como a Sala de Controle Ala Cinco, vão imediatamente reconhecer o filamento que se estende desde a superfície do Sol, sendo uma proeminência solar, mas em 25 de Março de 2010, aproximadamente às 08h00min foi captada pelo SOHO a imagem de um UFO no Sol.
— Avistamentos de supostos UFOs em imagens espaciais não são novidade.
— Dizem que uma nave em forma de planeta foi vista na coroa do Sol. Cientistas correram a dizer que são nuvens de plasma fresco, encapsulados em tubos longos de magnetismo. Mas você não é um debunker, não Sean?
— Não estou duvidando de você, Carminna, mas ‘nave em forma de planeta’? O que? UFOs se camuflam em planetas e sóis, para nossos telescópios não os verem? Planetas são objetos com massa real abaixo da massa limite para fusão nuclear do deutério, cores e brilhos que emitem permitem sabermos se são planetas ou...
— Em 08 de março, 14h00min, o SDO, Solar Dynamics Observatory, iniciou a filmagem de um enorme UFO se abastecendo no Sol.
— UFO roubando energia para viajar? UFOs de tamanho de planetas, UFOs em forma de triângulos, UFOs em forma de uma enorme sonda espacial...
— Dormiu com Adriana? — foi direta.
— Como é que é?
— Dormiu?
— Wow! — brincou ele se levantando e trancando a porta.
Quis, mas não entendeu porque ambas se preocupavam com quem ele dormia.
— Dormiu? — insistiu Carminna sentada charmosa na ponta da poltrona à esquerda da porta, indicando outra vez a poltrona para que ele voltasse a se sentar.
Sean percebeu que Carminna usava um vestido curto. Não extravagante era verdade; mas mais curto do que imaginara que ela estaria acostumada.
— Não! — sentou-se.
— Não imagina o desespero dela ao vê-lo quase morto no espaço.
— Carminna...
— E se eu tiver algo maior para barganhar, Sean? Isso lhe interessa?
— “Maior quanto”? — ficou perdido com a insistência.
— Já ouviu falar de um programa chamado HAARP?
— High Frequency Active Auroral Research, ou Programa de Pesquisa de Alta Frequência Ativa Auroral. As listas falam...
— Há evidências maiores que falatórios, Sean, que falam que talvez outros HAARPs tenham sido criados.
— E foram. Há um HAARP no Alaska, um na Noruega e outro na Rússia, que basicamente lançam através de antenas de alta frequência, ondas que aquecem a ionosfera e criam uma aurora artificial tão aquecida, que pode gerar elevação nas temperaturas em determinadas localidades do planeta, e provocar tsunamis ou provocar uma nova ‘Era do gelo’ — Sean esperou Carminna piscar e riu. — Estou brincando...
— E está? Porque a Poliu não brinca Sean…
E Sean não sabia se continuava achando graça naquilo.
— Estudos relacionados à manipulação da ionosfera por ondas de rádio não são novos, Carminna, o inventor sérvio Nikola Tesla fez as primeiras experiências em 1899 e o mundo não congelou.
— A identificação de ondas escalares foi mencionada em 1899 por Nikola Tesla, mas em 1904, Tesla havia desenvolvido transmissores para aproveitar a energia escalar de um transmissor para outro, indetectável, ignorando tempo e espaço. Então, como só podia materializá-la de um lugar para outro através do hiperespaço, sem o uso de fios, um transmissor e em um feixe eram direcionados para outro transmissor. Por falta de apoio financeiro, o uso da energia escalar não pôde ser reconhecido pela física regular. E esse foi o erro de Tesla — Carminna se alterava. —, acreditar que as ondas escalares são pulsos de elétrons comprimidos em um meio longitudinal, enquanto elétrons podem ser percebidos por um receptor elétrico.
“Formas-pensamento” Sean sentiu todo seu corpo se arrepiar.
— Está falando de conceitos de ondas escalares utilizados por holísticos, como uma energia atemporal formadora da consciência?
— E situada em dimensões quânticas, além da terceira dimensão, que a partir dos conceitos de ondas escalares, fizeram surgir rumores de sua utilização como armas de guerra e armas de manipulação cerebral.
E Sean sabia que devia ter investigado Carminna melhor.
— “Manipulação cerebral”? Wow! A definição padrão de ondas escalares, Carminna, é de que são criadas por um par de ondas idênticas ou replicantes, nomeadas geralmente de onda e anti-onda, e que está na fase espacial e fora da base temporal. Equivale dizer, que as duas ondas são fisicamente idênticas, mas 180° fora da fase em termos de tempo. Como não possuem frequência, as ondas escalares não podem ser utilizadas para individualizar cérebros específicos, e dessa forma, não podem ser utilizadas como tecnologia de controle cerebral remoto.
— Concordo! Por isso a única forma de se utilizar as ondas escalares como um meio de se manipular cérebros à distância, é utilizando implantes e microchips, e com isso a tecnologia deixa uma evidência no corpo da vítima que pode ser identificada por exames de Raios-X e dessa forma rastreada.
— Implantes… Wow! A possibilidade de controlar a mente e condicionar populações inteiras por meio de ondas eletromagnéticas é absolutamente aterradora.
— Concordo outra vez! Só que parece que você não entendeu toda a extensão, Sean. Funcionando como projetores de raios de partículas, os HAARPs são capazes de gerar um escudo global, onde íons de alta velocidade podem destruir os sistemas elétricos de qualquer UFO que tente entrar na atmosfera da Terra.
— Tempestades criadas para que UFOs não venham a Terra? — Sean realmente não gostou de ouvir aquilo, a corporação de inteligência chamada Poliu era capaz de tudo.
— A Poliu é capaz de tudo.
A luz rareou e ambos olharam para cima quando a luz voltou ao normal.
— O HAARP foi feito para projetar mais de 1.7 giga watts de energia radiada na ionosfera… — Sean estava um pouco menos cético. —, a conhecida camada eletricamente carregada que está acima da atmosfera da Terra, e que tem esse nome porque é bastante ionizada, ou seja, perde e ganha elétrons com facilidade, a deixa em constante carregamento elétrico. Então, o grande agente ionizador da ionosfera, o Sol, irradia muita carga na direção da Terra. Contudo meteoritos e raios cósmicos também influenciam bastante na presença dos íons.
— Basicamente, o aparelho é o inverso de um radiotelescópio onde apenas transmite ao invés de receber. Ele ferve a parte superior da atmosfera após aquecer e interferir com a ionosfera.
— Mas como sistema de evitar UFOs? — riu vendo que Carminna não achou aquilo engraçado; parou de rir outra vez. — Não... Não sou um debunker, sei aonde quer chegar Carminna. Teóricos da conspiração dizem que o HAARP foi construído para alterar e controlar o clima, que ele não só cria grandes vórtices como podem ser desmanchados se os cientistas desejarem.
— Assustador tal poder, já que as ondas escalares, enquanto elétrons comprimidos podem ser direcionados a um local específico gerando força suficiente para provocar terremotos, erupções vulcânicas, furacões e tsunamis.
“Ventos…”; voltou a ecoar sobre ele.
Sabia que havia ido a Bali porque vozes o alertavam sobre os ventos, sobre as tempestades solares, talvez outras tempestades, como o tufão que veio e foi. No fundo temeu que Carminna falasse mais do que ele estava preparado a ouvir.
— Como sabe tudo isso Carminna?
— Amigos influentes.
E ambos riram. Sean então olhou em volta e viu o quarto arrumado, cama com lençóis de seda despontando.
Não gostou do que viu.
— O que os Sun Flares e um alterador de clima têm haver com a Sala de Controle Ala Cinco e um chip bilionário à base de DNA? É por isso que Noah e Santos, seus amigos influentes, estão aqui, Carminna? Dra. Stella Dra. Hanna e Dr. Ítalo? Por causa de um HAARP que a Poliu tenha criado para controlar implantes de chips de DNA?
— Acha o mesmo?
— Estou mesmo tentado a achar que a Poliu... — e voltou a olhar a cama com lençóis de seda. —, que a Poliu pode tudo — sorriu. — Fale sobre essa tábua de argila encontrada na Mesopotâmia e que você foi chamada para analisar.
Carminna riu com gosto percebendo que ele lera sua mente. Nem se deu ao trabalho de perguntar como ele soube, porque fora ela quem permitira que ele lesse sua mente, que soubesse o motivo da Poliu lhe ter levado até a ilha secreta, e queria pagamentos por aquilo.
— Então será só isso? Trabalho? — prosseguia Carminna direta ao ver o silêncio dele. — Nem ao menos algum tipo de ‘barganha’? — ela trocou as pernas de lugar, sensualmente, mesmo sabendo que ele só tinha dezenove anos. — Entendo! Sem querer entender, se me entende? — levantou-se e parou na frente dele.
— Carminna, eu...
— Quieto! — ela colocou o dedo nos lábios dele, o impedindo de falar.
Carminna então se inclinou o beijando no rosto; de um lado de outro, caminhando pelos lábios dele até a sua boca o absorver de uma vez.
Sean não sabia o que realmente fazer com aquela situação.
— Os sumérios... — ele a olhou o beijando. —, estavam realmente tão adiantados assim?
— Ah! A Suméria… — ela parou de beijá-lo e sentou-se no colo dele que se enrijeceu todo. —, o berço de todas as grandes civilizações… — ela suspirou ao mexer nos cabelos loiros dele. — Concordo falarmos sobre ela — sorriu-lhe. Ela então se ergueu e foi até a mesa servir-lhe chá. — Porque para você ter uma ideia, Sean, eles conheciam a roda, carros, carruagens e possuíam barcos para o comércio. Os sumérios usavam nas suas construções um tipo de concreto armado, misturado à argila úmida. Construíam os seus arranha-céus, usando vãos em arco. A Suméria promoveu a Idade dos Metais com a invenção de fornalhas com grandes temperaturas controláveis.
— Incrível!
— Seus artesões trabalhavam as suas joias, o ouro, o cobre e compostos de prata há seis mil anos — e Carminna voltou ao colo dele.
— Como a Poliu conseguiu essa tábua?
— A Poliu já a tinha — Carminna sabia que Sean não se dava por vencido. — A tábua não foi encontrada na Mesopotâmia, e sim encontrada num acidente aéreo — olhou Sean a olhando. —, num acidente aéreo de UFO — Carminna se levantou e deixou o vestido ir ao chão, uma lingerie cinza se moldou aos olhos arregalados de Sean perante ambas as revelações.
— Wow! Uma tábua suméria numa queda de UFO; deixe-me completar... 1947! — ele viu Carminna só sorrir-lhe. — E o que dizia?
— Dizia que houve manipulação genética para se criar o terráqueo, mas só conseguiram produzir quimeras, aberrações. Há registros sumérios desses seres defeituosos, monstruosos... Polvos-humanos.
“Polvos-humanos”; aquilo soou por todo ele.
— Então a Poliu está interessada em polvos-humanos?
Implantes, chips de DNA, portas seriais e Spartacus, tudo envolvido com explosões no Sol e grandes UFOs se abastecendo nele. Sean sabia que uma assirióloga e tábuas mostrando polvos-humanos não pareciam pertencer ao contexto, mas pertenciam.
— Mas os Anunnaki/Nefilin criaram uma segunda raça — prosseguia Carminna. —, a que conhecemos hoje, humana, manipulando o Homo Erectus geneticamente, que era o verdadeiro produto da evolução terrestre; o ‘Elo Perdido’ que Charles Darwin não conseguiu encontrar. Depois voltaram ao seu mundo.
— E por que voltaram?
— A tábua não diz.
— E os tais Anunnaki/Nefilin voltaram ao planeta de origem com os polvos-humanos, ou os deixaram aqui, num mundo de sapiens sapiens?
— Não sei dizer, mas à primeira colônia deram o nome de E.RI.DU, ‘casa na lonjura construída’. Para dirigir a ocupação e os trabalhos que iriam ser desenvolvidos, o governante de Nibiru enviou um dos seus filhos, Enki, cientista e engenheiro genético para retirar ouro de minas africanas. A arqueologia moderna já identificou estas minas na África, datadas de 35.000, 46.000 e 60.000 anos, na Idade da Pedra.
— Wow! Uma viagem e tanto — Sean pensou alto, não acreditando muito naquilo. —, já que físicos e geólogos disseram que a vinda de alienígenas a Terra atrás de minerais é furada, se todos os planetas se aqueceram e se esfriaram após o Big Bang, e produziram ouro em seu interior. As supernovas produzem ouro, como também todos os elementos químicos pesados encontrados na Terra.
— Não sei responder a isso, mas os sumérios disseram que houve sim uma revolta, quando após quarenta anos, o povo Anunnaki trabalhando no fundo das minas africanas resolveram realizar um motim se recusando ao trabalho, o que os obrigou à essa manipulação genética.
— E o que diz sobre a segunda tábua que ainda estuda? — ele sorveu toda xícara e devolveu-lhe vazia após sorrir-lhe.
Ela caminhou até a mesa e Sean percebeu o corpo bem tratado dela.
— Quem lhe disse sobre essa segunda tábua, Sean? Que como percebeu, isso não deixei você saber.
— Não, não deixou. Mas eu não leio pensamentos que me deixam saber, Doutora. Leio pensamentos que ficam no éter, lá onde encontrei coisas sobre sua vinda para a ilha, sobre os estudos de tábuas encontradas no acidente de UFO em Socorro, em Karakum, para então você me mandar a Bali, depois do jantar ‘entre amigos’.
Carminna riu mais nervosa que antes.
— Você foi... Você foi... Você foi a Bali, Sean?
— Wow! As notícias não correm rápidas por aqui?
— Eu não sabia... Não sabia que havia ido a... — foi até a mesa e serviu-se de mais chá, nervosa como deixou transparecer. — Eu não o mandei lá. — Carminna não sabia como continuar aquilo.
— Mas alguém mandou…
Ela sorriu não muito convencida daquilo e esticou a mão esperando que Sean a seguisse.
— A segunda tábua dizia que de fato houve um dilúvio que engolfou a ‘terra habitada por gigantes’ — sorria ainda com a mão estendida e Sean percebeu que a cama seria sua próxima parada, que havia algo embutido.
— Ah... Os dilúvios... — pegou a mão dela e se levantou. — Grandes mudanças no clima! Grandes tempestades! Inundação!
Ela o levou até a cama onde ambos sentaram. Carminna então se inclinou e deitou-se ao lado dele fazendo a lingerie cinza se mover do lugar, quando a luz voltou a mudar de intensidade.
— Sim, um dilúvio que os sumérios escreveram milhares de anos antes do dilúvio bíblico de Noé acontecer — ela viu Sean a olhando com interesse.
— Mas Sitchin já havia decifrado isso. Então por que a Poliu precisava de você aqui? — olhou-a e ela voltou a se acomodar sobre ele. Sean engoliu a seco o que ia falar. Queria respostas das quais Carminna só daria daquele jeito. — Quando o Gênesis bíblico se refere ao ‘Adão’... — Sean tentava retornar o assunto. —, refere-se, genericamente ao Terráqueo, e esse é o híbrido? Por que escreveu que os alienígenas eram polvos-humanos? E onde estão os polvos?
— Nos mitos! — Carminna fez uma careta.
Ergueu-se de sobre ele e tirou o sutiã. Sean imaginou que até o final da conversa ela já estaria nua. E ele sentiu todo seu corpo aquecer-se quando Carminna deitou de braços cruzados sobre seu peito, colando à sua camiseta.
— Carminna...
— Sean… — Ela aliviou o abraço. —, muito se fala sobre a imagem do alienígena como reptiliano, cinzento, ou até loiro de olhos azuis como você — ambos riram. —, mas há uma classe de ufólogos que contam que alienígenas são parecidos com polvos.
— Polvos são moluscos marinhos da classe... — e Sean parou, e parou como se todo mundo tivesse desabado sobre ele. — Fala de Cthulhu? Dos mitos de H. P Lovecraft que Henrique levantou a questão no jantar?
— Exato menino bonito! — ela viu Sean achar graça. — Quando se estudam as mitologias no mundo, aparecem diversos panteões com muitos monstros diferentes, mas quando se constata que os nomes diferentes têm o mesmo significado, estamos falando de Anunnakis.
— Droga! Cthulhu é descrito como um monstro verde, híbrido de polvo, com tentáculos saindo do rosto, e asas de dragão. Lovecraft conta que os ‘Grandes Antigos’ vieram de outros planetas e estabeleceram residência na Terra. Quando as estrelas estavam em posições erradas eles não podiam viver, assim eles dominaram o clima e desapareceram sob o Oceano Pacífico Sul — sentiu-se mal. — Mas mitos também contam que eles voltaram aos seus mundos de origem, onde usavam poderes telepáticos para comunicar-se com o homem que deixou aqui, através dos sonhos... — e Sean parou de falar, nunca as formas-pensamento lhe apavorou tanto, nunca ele lhe apavorou tanto.
Levantou-se e ficou vendo a luz rarear outra vez. Sean ergueu a mão e sentiu que o ar era pesado, quase tocável.
— Parece confuso, Sean?
Estava confuso, sim, ao perceber o resto de lingerie dela voar sobre ele e a luz voltar a aumentar sua intensidade. Virou-se e a viu nua na cama, tentado a dizer mais do que sobre sua nudez, tentado a falar das luzes e do porque sentir que a iluminação oscilava daquele jeito.
— Não... Não quero dizer nada.
— Gosta ao menos? Gosta do que vê? — Carminna levantou-se e serviu-lhe mais chá com o par de seios balançando pelo exercício empregado, e Sean não se lembrava de já ter tido aulas daquela maneira. — Lovecraft usou as mitologias sumérias, egípcias e gregas como base de criação de seus semideuses. E o conceito de alienígenas disfarçados como deidades, existiu de uma forma ou de outra ao longo dos séculos. Já vimos isto na Bíblia, por exemplo, com anjos vivendo nos céus, ou sermos criados à imagem do criador. E muitas histórias que claramente vem dos contos sumérios, assim como a história de Moisés nos juncos, uma história contada sobre um rei sumério muito antes da Bíblia — Carminna sorriu-lhe. —, ou dos UFOs de Ezequiel.
— Se os arquétipos da religião precisaram de uma saída nova para permanecerem atuais, então tais mudanças fundamentariam a teoria de deuses astronautas, não? — Sean viu Carminna aproximar-se, se erguer um pouco nos pés a fim de alcançá-lo, e o beijar novamente.
Seus olhos trocaram informações nada confidenciais e ela tocou-lhe o peito. Sean pensou em recuar não o fazendo.
— Sean... — ela sorriu-lhe de lado percebendo e voltou a caminhar as mãos até sua calça.
Sean fechou os olhos e foi tocado.
— Ahhh... — sabia que barganhava algo; as informações dela no que Carminna o tocava sem pudor. — Carminna... — ameaçou segurá-la.
— Não Sean! Não se mexa!
Ele não se mexeu.
— Acha que... — Sean não conseguia se concentrar, mesmo sob ordens. — Ahhh... Carminna não... — tentava manter o cérebro funcionado quando a oscilação de luz no quarto-sala da Dra. Carminna voltou a deixá-lo preocupado.
Mas ela atingiu seu sexo com mais força, por dentro da calça.
— Deite-se comigo! — Carminna tentou mais uma vez o empurrando para a cama.
— Não! Não posso!
— Por causa dela?
— ‘Dela’ é um tanto genérico não?
Mas Carminna largou-o e voltou a se deitar nua na cama.
— Deite-se comigo!
Sean pesou sua honra e brio e se deitou, sabia que não funcionaria de outro jeito. E foi ela sobre ele, o tocando, sabendo que ele não tinha saída.
Carminna beijou-o intensamente, descendo, até o zíper que abriu, a underware que afastou, o sexo que engoliu. Sean gostou daquilo, da mulher madura que o deixava maduro. Mas Carminna parecia querer mais, e Sean recuou.
Algo no seu íntimo que o fez se recompor, deixando-a sem saber seu próximo passo. Mesmo ele ainda tendo muitas questões.
— O que mais as tábuas lhe falaram?
— Falaram que eles, os Anunnaki, estiveram aqui. Agora se eles ainda vão voltar aqui, é que venho me perguntando.
— E eles ainda vão voltar Carminna? Por quê?
— Os calendários Maias que estão atrelados às crenças mesopotâmicas de que o ‘Grande’ se foi prometendo voltar, davam a data do ano de 2012!
— Mas nada voltou! Nada aconteceu! Então como acha que vão voltar para nos destruir? Por quê? Vingança?
— Mas há uma nova data, chamada ‘data limite’.
— Está falando da data limite do médium Chico Xavier? Wow! Chico durante uma entrevista no Programa ‘Pinga fogo’, em 1971, disse que se durante 50 anos, a Terra não usasse armamentos bélicos, em 2019 seríamos compensados com um futuro brilhante, com avanços em todas as áreas do conhecimento e desenvolvimento, como a cura de doenças.
— E que alienígenas teriam então, a permissão para nos contatar formalmente. Mas será que esse dia chegará? Porque não sei o que o poder da Terra anda fazendo, Sean — e Sean sabia que ‘o poder da Terra’ significava Poliu. — Deite-se comigo.
Sean olhou Carminna nua na cama, insistindo.
— Não posso — sorriu-lhe.
— Ela não deixa?
— “Ela”?
— Adriana!
— Claro que não!
— Então é a outra?
— Outra?
— Sua sócia!
Sean agora não gostou daquilo; daquilo não.
— Quem...
— Venha! Deite-se!
E a luz oscilou.
— Amanhã volto ao Brasil.
— Sabe que não vão liberá-lo, Sean.
— É... — a olhou de uma maneira vaga. — Eu sei...
E um grande suspiro a fez abaixar a cabeça.
— Vá Sean! — Carminna sorriu-lhe enfim. — Precisa descansar.
E a luz cedeu.
— É... — se virou e viu que não havia nada ali além de Carminna, nem sombras nem formas-pensamento. — Preciso descansar...
Carminna Clemente levantou-se e colocou um robe de seda. Sean a olhou e Carminna esperava que ele ao menos a beijasse. Mas ele realmente não sabia como agir depois de tudo, depois de lembrar-lhe de Kelly e o quanto a amava. Carminna abriu-lhe a porta sabendo aquilo e Sean saiu, com um silêncio se fazendo atrás dele.
A porta fechou e Sean olhou o corredor vazio, à meia-luz. Olhou para a porta fechada, podendo sentir o coração de Carminna acelerado, o corpo todo em frenesi o amando, o desejando.
Ele foi embora se sentindo confuso com o que realmente podia fazer.
Complexo A; setor de alojamento.
03 de setembro; 19h00min.
Mas outra vez Sean não foi embora totalmente, se dirigiu ao quarto-sala de Gyrimias Leferi, três portas adiante, tocando a campainha três vezes, alertando o cientista da Computer Co..
O ambiente estava na penumbra e os óculos teimavam nunca ficar onde ele os deixava. Quando chegou a porta, Gyrimias atendeu-a aos tropeços.
— Senhor? — estranhou-o.
— Se vista! — Sean ordenou.
Ele olhou-se de pijama de flanela e o relógio.
— Aonde vamos? — foi só o que teve tempo de falar porque Sean já se dirigia a um dos três elevadores.
Gyrimias queria ter perguntado sobre a viagem, sobre sua saúde. Sean havia sido separado de todos desde sua chegada, mas saiu de pijamas mesmo.
— Conhece o projeto HAARP, não Gyrimias? — e Sean olhou a câmera do corredor que se deslocou do encaixe ficando dependurada.
— Ahhh! — Gyrimias se assustou com aquilo sabendo, porém que fora Sean quem fizera aquilo.
Olhou-o de lado e nada falou.
— Conhece Gyrimias? — insistiu agora descontrolado.
— Sim, Senhor. O HAARP e outros também.
— Quantos “outros também”? Acha que a Poliu possa ter criado um modificador de clima desses para ela? — e Sean olhou para a outra câmera do corredor que também se desligou, ficando dependurada.
— Ahhh! — Gyrimias outra vez assustou-se. — Como... Como assim “criado um modificador de clima desses para ela”, Senhor?
— Não sei Gyrimias. Ainda está tudo muito confuso — e Sean chamou um dos elevadores; tudo isso sem tocar em nada até então.
Gyrimias escorregou um olhar de lado para o patrão, e a porta do elevador abriu. Percebeu que Sean usava seus dons de uma maneira que até então não expunha.
— Por que a Poliu criaria um modificador de clima, Senhor?
— Não sei, mas Carminna acha que o Dr. Noah está aqui por algum motivo maior; arrisco a dizer que é algo que o Dr. Santos vem fazendo — ele percebeu que Gyrimias o olhava de rabo de olho outra vez. — Algum problema, Gyrimias? — estancou vendo Gyrimias sem cor. — Ótimo! Agora me diga, se a densidade dos íons livres é variável e apresenta alterações de acordo com vários padrões temporais, e hora do dia e estação do ano são os principais pontos de variação da ionosfera, então como a Poliu criaria um HAARP aqui na ilha?
— Ah...
— Onde estão as antenas?
— Parcelado... Há um fenômeno interessante, Senhor, que ocorre a cada onze anos, quando a densidade dos elétrons e a composição da ionosfera mudam drasticamente.
— Que acabam bloqueando qualquer comunicação em alta frequência. Eu sei disso Gyrimias. Quero saber onde estão as malditas antenas.
— Não sei Senhor… Parcelado o que sei, ou a Poliu usa os fenômenos naturais das explosões solares, ou existem mesmo antenas, e elas podem estar enterradas em algum lugar da ilha, bloqueando algo.
Sean olhou em volta a procura desse ‘algo’, mas nada, nenhuma informação estava no éter.
— Eu viajei para Kuta, em Bali, Gyrimias — Sean entrou no elevador. — Viajei depois daquele jantar — e as duas câmeras, à entrada das portas do elevador, foram deslocadas do encaixe, desligando-se, desligando as imagens, alertando toda a segurança do complexo.
— Depois daquele jantar, Senhor? — Gyrimias levou outro susto, agora em silêncio.
Voltou a arrumar seus óculos olhando as câmeras dependuradas.
— Eles não podem nos ver. Não se preocupe.
— Ah... Não... Não me preocupo... — foi só o que falou. — Mas é que achei que depois do jantar, havia brigado com a Tenente-coronel Adriana La Hera, Senhor.
— E eu briguei! Com a Poliu toda!
— Mas ‘Bali’, Senhor? Eu realmente não fiquei sabendo.
— É que as notícias não correm rápido por aqui Gyrimias — riu sem que o funcionário entendesse. — Eu fui a Bali porque durante o jantar, Carminna ficava enviando pensamentos para que eu fosse a Bali. Sonhos que se seguiram e que me mandavam a Bali. Vozes estranhas me mandando a Bali, porque lá encontraria as respostas... — Sean viu Gyrimias escorregar os olhos para ele. —, mas eu ainda não havia formulado pergunta alguma Gyrimias — ele viu Gyrimias pensando. — E pior... Carminna diz que não me enviou nada, que não sabia que eu havia ido, e provável ela não queria que eu tivesse ido a Bali.
— Mas por que ouviu a voz dela se ela nada falou? — Gyrimias o olhou em silêncio. — Quero dizer Senhor, porque Carminna enviou uma informação mentalmente se não era ela?
— Porque não era ela.
— Ah... Extremely Low Frequency waves? Ondas EFF?
— Carminna levantou essa hipótese, ondas escalares, ondas magnéticas que situam-se no mesmo espectro de frequência das ondas cerebrais, podem provocar tonturas, náuseas, vertigens, fadiga, dores de cabeça, vômitos e mesmo disfunções permanentes e irreversíveis, como ser capaz de matar.
— Mas o potencial das ELF não fica nisso Senhor, é possível através de diferentes frequências, controlar os estados psíquicos humanos, desde a histeria à passividade, da euforia à depressão, e mesmo induzir uma espécie de hipnose nas massas.
— Espécie de hipnose? Acha que a Poliu está tentando criar um HAARP para controlar massas, Gyrimias?
— Se dentro de uma Gaiola de Faraday, um detector de ondas escalares identificarem a presença da onda, e o analisador de espectro de radiofrequência não indicar qualquer outra onda dentro da gaiola, basta utilizar um bloqueador de ondas escalares que bloqueie os pulsos concentrados de elétrons, permitindo desabilitar alguém.
— Wow! Alguém funcionou como uma Gaiola de Faraday, Gyrimias, porque era uma pessoa, provável um espião psíquico se fazendo passar por Carminna, usando suas formas-pensamento — e Sean viu Gyrimias arregalar os olhos realmente não entendendo nada, e sentiu o funcionário temendo-o. — O que está acontecendo? — e Sean estancou o elevador sem tocá-lo. — Fale!
— É... Não sei. Falaram... Parcelada minha opinião, Senhor, as pessoas aqui falam que... Falam que faltou oxigênio no ônibus espacial experimental e tal — Gyrimias viu Sean se virar para ele totalmente confuso.
— Acha que estou louco?
— Não... não... Eu não Senhor. Mas o Comandante Alpheu Smith já está sendo considerado em “adiantado estado alucinatório”; foram as palavras do Doutor Willian Jofre.
— O Comandante Alpheu? Adriana disse que ele estava em coma.
— Ah! Perdão! — Gyrimias ainda estranhava a câmera caída. — As pessoas falam.
Sean voltou a funcionar o elevador e ele parou no andar térreo.
— Sinto muito Sr. Queise! — dois oficiais de segurança os interpelaram. — Não pode andar pela ilha sem autorização! — um dos oficiais de seguranças entrou no elevador e viu as duas câmeras inutilizadas. — Nem estragar sua segurança, Senhor!
Sean não gostou daquilo. Porque todas as advertências foram feitas a ele, porque sabiam que só ele poderia estragar e inutilizar algo.
— Isso quer dizer que não podemos ir à cozinha? — ainda tentou manter uma falsa ação.
Os dois oficiais de segurança se olharam.
— “À cozinha”? — o outro segurança falou. — Acompanharemos, então!
— Obrigado! — Sean sentiu a respiração de Gyrimias ficar mais forte. — Seria mesmo muito incomodo nos perdemos por aqui, não acham? — Sean seguiu os dois oficiais de seguranças sem trocar um olhar se quer com Gyrimias, que tinha certeza que não era à cozinha que o patrão o levaria depois de danificar quatro câmeras ao longo de todo trajeto, e acionar o elevador com o poder da mente.
A cozinha ficava no fundo do corredor, os quatro passaram pela biblioteca sem Sean deixar nada transparecer. Alguns funcionários estavam em plena movimentação onde o turno da noite iniciava o jantar.
Alguns oficiais de cozinha estranharam as quatro figuras. Gyrimias de pijama então, não combinava com o ambiente de funcionários uniformizados.
— Quer algo, Gyrimias? — Sean prosseguiu.
— Sim. Chá de camomila, Senhor.
— Choveu? — os chás estavam expostos numa mesa no canto do refeitório. Ainda tinha bolachas e bolos servidos à tarde. Os dois oficiais de segurança não davam trégua para Sean que não conseguia se comunicar com Gyrimias. — Choveu Gyrimias?
— Ah... Sim Senhor. Enquanto estava no espaço, Senhor — Gyrimias temeu algo ao ver os dois oficiais de segurança os olhando. —, e houve ameaça de um tsunami. A ilha entrou em alerta nível 3 e podíamos ver a aurora boreal criada, Senhor.
Sean não precisou olhar os dois oficiais de segurança como fez Gyrimias, e nem usar seus dons para saber que o assunto iniciado, começou a alertá-los. O intercomunicador de um deles tocou, o oficial de segurança avisou que estavam no refeitório. Algo ele ouviu que não gostou, Sean sabia que havia algo errado com os ventos, com os níveis de alerta; só ainda não sabia o que.
— Podemos retornar ao seu andar, Sr. Queise? — questionou um dos oficiais de segurança irritado. — Tenho ordens de levá-lo! Agora!
— Sim — Sean trocou olhares com Gyrimias quase dizendo ‘as notícias correm rápido’. — Já terminamos aqui.
Gyrimias entendeu que o patrão desistira de algo e os dois foram escoltados, cada um ao seu aposento. Sean fechou a porta furioso, não conseguira chegar até a biblioteca com Gyrimias e não tinha como ir ao quarto-sala de Adriana.
Complexo A; setor de alojamento.
03 de setembro; 21h21min.
Sean tomou um banho tentando tirar o perfume das mãos de Carminna dele, e de tudo que caía sobre sua mente quando uma nova pancada forte no seu quarto-sala o fez ficar de sobreaviso.
— Posso entrar? — questionou o General Arthur na porta que Sean abriu dessa vez girando a maçaneta.
— Claro! Já que não me deixam sair!
Arthur viu um blazer bege de corte italiano em cima da cama.
— Mas vejo que estava de saída.
— Estava indo jantar com sua filha — falou friamente sem esperar o impacto que aquelas palavras causaram no General Arthur. Sean estranhou-o. — Espero que não tenha nenhum problema, General.
— Não! — falou Arthur rapidamente. — Problema algum.
— Ótimo! — Sean sorriu cínico achando que sim. O General continuou parado na porta de seu quarto-sala. — Problemas comigo, General?
— Não! Podemos conversar outra hora — falou ainda parado.
— Mas se é tão importante...
Os dois se encararam.
E olhares foram trocados.
— Sobre Spartacus... Queria lhe dizer que era meu dever... — olhares foram trocados outra vez. —, para com a Poliu.
Sean se ergueu todo, balançando o pescoço nervoso.
— Por que está me dizendo isso, General?
— Achei que precisava saber — e o General Arthur entrou fechando a porta. — O chip, entende? Temo que não estejamos preparados para ele.
— Você disse que...
— Eu sei o que eu disse! — cortou-o. — Mas nada sabemos sobre como um chip do tipo do Cruzador Solar reagirá numa pessoa.
— E não foi por isso que o implantaram? Para entender tais reações?
— Uma vez tentaram o stimociever. Nada é preciso, compreende?
— “Stimociever”?
— Sabe quem sou eu Sr. Queise?
— Um alto oficial da ilha, suponho — respondeu Sean irônico.
— E sabe quem é você? O que fazemos na Terra? — ele sabia que Sean entendera a pergunta. Virou-se e abriu a porta. — Vou dispensar sua segurança e permitir que vá até o quarto-sala de Adriana. Tenha um bom jantar, Sr. Queise.
O General Arthur sorriu diabólico indo embora e Sean começou a desgostar daquela sensação. A repentina saída do General deixou mais perguntas do que ele queria.
“Por que Alpheu tentou destruir o chip?” “Por que Adriana e o General Arthur não queriam Bruno para o transplante?” “O que é o chip Cruzador Solar?” “Por que a Poliu interferiria no clima?” “E Deus... quem sou eu?”; pensou tudo aquilo ao se vestir, abrir a porta sorrateiro e olhar para o corredor vazio.
Segurou com força o notebook debaixo do braço e dessa vez congelou as imagens das câmeras antes mesmo que elas as gravassem. Se podia realmente colocar tudo o que Mona ensinara a ele, então seria uma boa hora para testes.
Como havia resolvido descer as escadas, alcançou a porta da biblioteca do andar térreo, se trancado lá dentro. Ele ficou ainda um tempo tentando ouvir a movimentação do lado de fora, até sentir-se seguro. E sabia que as imagens congeladas logo alertariam a Poliu, mas não o imaginavam ali, justamente ali.
Sean olhou em volta, a biblioteca estava às escuras. Ele percorreu-a pelos cantos tocando cada móvel, alcançando uma escrivaninha num canto distante da janela, e fora do alcance da porta. Acendeu a discreta luz do abat-jour, conectando seu pequeno computador a um cabo de Internet, e um sinal Wireless se fez, navegando por mares conhecidos.
Acionou o comando de entrada, inseriu todas as senhas devidas, abriu o banco de dados da Computer Co. acessando primeiro seus arquivos particulares, revendo os arquivos de Spartacus. Sean escondia tudo dentro de arquivos aparentemente inofensivos, arquivos garbages. Uma sujeira de arquivo aqui, outra lá, e Sean Queise colocava dados dentro de arquivos de pouca atenção.
— Foto... — balbuciava. — Onde ela está? — franziu a testa enquanto o HD patinava atrás de informações. Quando a foto carregou, ele não entendeu o que significava aquela imagem borrada. — Mas o que é isso? A câmera CCD costuma ser tão precisa... Será um Sun Flare? Será a tectita? — Sean coçava o queixo, não percebendo que algo começava a ganhar o chão da biblioteca, algo que se arrastava por debaixo do tapete, no tapete.
“Por que Spartacus apagaria essa foto?”, pensou confuso.
Um rápido apagar de energia e voltar de bateria, e os arquivos se reorganizaram sozinhos, fazendo o notebook se ajustar. Sean verificou que bateria do notebook havia sido consumida. Ele o conectou a tomada de energia e voltou a se perguntar como o colisteiro ‘Fim do mundo’, conseguira exatamente aquela foto apagada, quando a foto se desmembrou em códigos binários.
Ele ficou lá a observá-la, sem perceber que fosse o que fosse aquilo no piso da biblioteca, já alcançava a escrivaninha onde estava sentado, até que de repente sentiu que não estava sozinho. Sean se ergueu de supetão e ficou olhando em volta; prateleiras lotadas de livros, computadores desligados, poltronas vazias.
Balançou a cabeça confuso, resolvendo se arriscar mais ainda. Voltou ao notebook e invadiu os computadores da Poliu em meio às ideias sobre explosões solares e modificadores de clima, agitando-o.
Palavras-chave como ‘Cruzador Solar’, ‘imagens da sonda espacial não-tripulada SOHO’ e ‘UFOs no Sol’ invadiram a busca feita, e uma foto de um Cruzador Solar feita pelo SOHO ao redor do Sol, que lembrava ser um grande UFO se moveu. Sean não soube dizer se havia alguém on-line manipulando os arquivos do SOHO ou a foto tinha vida.
Outra vez olhou em volta; prateleiras, sofás e cadeiras e o piso que pareceu se mover. Sean ergueu-se outra vez de supetão e ficou olhando o piso, o tapete, e novamente o piso.
“Faltou oxigênio e tal...” ecoou por todo ele.
— Droga! — balançou a cabeça e voltou a sentar-se.
Girou na cadeira outra vez olhando a foto viva, que se duplicou; cinco, seis, nove, onze UFOs.
“Uma frota?” foi o que pensou quando o computador travou.
— Droga! — Sean apertou várias teclas e nenhuma resposta.
O computador desligou e religou sozinho, mas o teclado não respondia a seus comandos.
Apenas uma frase era escrita sem auxílio algum:
— O TECLADO É MEU CORPO!
— O teclado é o quê? — Sean arqueou as sobrancelhas.
Sean desligou a conexão Wireless e a Internet caiu.
— O TECLADO É MEU CORPO! — insistiu o teclado escrevendo na tela.
Sean arregalou a bela face não acreditando no que lia na tela do notebook. A frase continuava lá e alguém invadia seu notebook.
Ele sabia que as informações poderiam ser hackeadas via ondas de rádio, mas alguém acessar seu notebook, sem rede, era impossível.
— O TECLADO É MEU CORPO! — insistia. — DIGITE-O COM CARINHO!
Sean olhou em volta mais apavorado ainda. Aquilo com certeza não poderia ser hacker.
“Espiões psíquicos!”, soou por todo ele escorregando novamente os olhos em volta, mas nada se moveu.
Sean se concentrou invadindo o éter, mas não havia nenhuma energia escalar ali, nenhuma forma-pensamento. Só talvez um espião psíquico treinado, talvez Nadir não tão ‘desclassificada’ assim, pela Poliu.
— Basta Nadir! — Sean exclamou levantando-se. E como levantou, foi sentado. — Ahhh... — Sean se viu grudado na cadeira, girado e colado de frente à tela do notebook.
— O AHHH! SERÁ MEU SUSSURRO... — pausa no teclado. — O EHHH! MEU ÊXTASE MAIOR... — pausa no teclado. — O S! O SEXO QUE PENETRA! — pausa no teclado.
Sean voltou a olhar em volta. A sensação de ar pesado, o invadiu. Ele ergueu a mão com dificuldades e tocou o que supôs ser o ar que respirava. Recuou assustado, sabendo que aquilo não era um espião psíquico.
— Formas-pensamento... — foi o que falou apavorado.
— SOU O QUE QUER! O QUE PROCURA! — pausa no teclado.
— E o que eu procuro? — voltou a perguntar.
— SEXO!
— Ahhh... — e Sean se excitou, não soube nem explicar como, nem com que tamanha rapidez.
— BATYOETHGYUIPOLRMNYGVAEDRTHUJI... — pausa no teclado.
— O que é isso? — engoliu a seco sua própria excitação. — Não sabe mais o que falar? — e o computador não respondeu.
Sean escorregou os olhos para os lados; prateleiras, computadores, poltronas e seu notebook outra vez com suas teclas sendo tocadas por algo, alguém.
“Nadir?” chamou-a pelo pensamento, mas nada recebeu de volta.
Fosse o que fosse aquela coisa, ela bloqueava ondas Alfas, provável, Betas.
— Isso é um jogo? Quer jogar comigo? — o computador outra vez não respondeu. Sean riu e insistiu. — Quer jogar comigo pelo teclado?
— CONSEGUE EXERCER SUA IMAGINAÇÃO? — pausa no teclado.
Sean engoliu a seco tamanha provocação. Ficou em silêncio buscando outra forma de se comunicar com alguém, mas nada conseguiu.
— O que você quer?
— CONSEGUE EXERCER SUA IMAGINAÇÃO? — pausa no teclado. — ENTÃO?
— Então?
— ALCANÇA MEU SEIO COM TEUS LÁBIOS MOLHADOS! — pausa no teclado. — MORDE O BICO! — pausa no teclado. — ENTÃO? — pausa no teclado.
Sean arregalou os olhos azuis.
— Então? — Sean começou a jogar.
— VOU TE GUIAR POR UMA ESTRADA NUNCA PERCORRIDA! — pausa no teclado.
— Wow! — exclamou Sean olhando para os lados, rindo, tudo aquilo junto.
A luz apagou-se e Sean estancou a mão que ia religar o abat-jour quando o teclado voltou a mover suas teclas, sozinho.
“Nadir?” Sean ainda tentou em pensamentos, mas só conseguir irritar mais ainda alguma coisa.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO!!! — e a escuridão foi invadida por uma forte luz.
— Ahhh!!! — Sean gritou de dor. Sua vista se dilatou pela intensidade e a sala ficou turva. — A luz! Diminua a luz! — e a luz diminuiu a intensidade.
Sean ficou em silêncio tentando saber se acordara alguém nos complexos.
Mas o silêncio só foi quebrado pelas teclas se movendo sozinha.
— ABRA AS PALMAS DE TUAS MÃOS! — pausa no teclado.
Sean resolveu não mais provocar aquilo, abrindo as palmas das mãos.
— A PALMA DIREITA TOCARÁ O SEIO DIREITO! — pausa no teclado. — A PALMA ESQUERDA ENGOLIRÁ O SEIO ESQUERDO! — pausa no teclado. — SÃO GRANDES, PESADOS, PERFEITOS! SUA TEXTURA É MACIA! SEU VOLUME É CONSTANTE, APETITOSO... — continuavam as letras a marchar pela tela.
Sean encarou a tela, sentiu seus lábios penderem de excitação. Continuou navegando por aquelas palavras sentindo-se insano, entorpecido.
— Nadir? — voltou a chamar e nada sentir no éter.
Não era ela, não era ninguém, nada humano.
— VEM...— insistiu o teclado ou que quer que fosse. — EHHH! CHEGA MAIS PERTO! EHHH! ESTUDA O CONTORNO!
Sean estudou. Por entre as lembranças que tinha de um belo par de seios, ele o estudou.
— ISSO MESMO... — pausa no teclado. — PENSE! ISSO MESMO! PENSE!
— Penso!
— MAIS! PENSE MAIS! SE ELEVE ATÉ ONDE OS PENSAMENTOS VAGAM!
— Ahhh... — e Sean invadiu a dimensão onde as formas-pensamento se encontravam depositadas.
— PERCEBE AS LINHAS? O SANGUE QUE FLUI?
— Sim — falou extasiado não reconhecendo o lugar onde estava.
— TOQUE-OS! TOQUE OS SEIOS QUE LHE DESEJAM!
— Ahhh!!! — gritou pela luz que lhe cegou e abriu os olhos.
— ME ENCONTROU?
E Sean a encontrou; encontrou a mulher que lhe desejava.
Ela era loiro-platinada como Adriana, como Sandy. Era bonita na camisola sensual. Em torno dela nada, sob ela, uma cama de veludo macio, vermelho, perfumado. Acima o lustre de cristal, de velas acesas, abaixo nuvens que seu pés, volitando, não os tocava.
Mas Sean foi tocado, no seu íntimo.
— Ahhh...
— EHHH! — pausa no teclado. — TOQUE-OS! OS SEIOS! EHHH! ASSIM MESMO! — pausa no teclado. — SENTE A RIGIDEZ?
Sean voltou à Terra, à ilha, à biblioteca, à tela que corriam as letras, que o excitava.
— Sim — repetiu. — Sinto...
— PASSA TUA BOCA NELE! — pausa no teclado.
— Ahhh!!!! — Sean estava de novo nas nuvens, na casa de seus sonhos, iluminado pelo lustre de cristal de velas acesas, tocado pela bela dama na cama de veludo vermelho.
— AHHH! ISSO... NÃO PARE! NÃO... — pausa no teclado. — AHHH! INVADE... SENTE O PRAZER QUE EMANA! A LUZ QUE CEGA! — pausa no teclado.
— Sim! Sim! — Sean sentia a luz que se exaltava, que o cegava, que o tocava sem pudor.
— EHHH! EHHH! EHHH! — pausa no teclado. — OUVE O SOM DA MÚSICA?
E uma música invadiu os tímpanos dele.
Suave, melosa, sensual.
— Ouço...
— OS SEIOS QUE CANTAM? QUE CLAMAM POR TUA BOCA?
— Sim...
— TOQUE-OS! EHHH! TOQUE-OS! — ordenou a luz branca que tomava a forma de um polvo.
— Ahhh... — e Sean sentiu dor, sentiu prazer na dor que sentiu.
— TOQUE-OS! EHHH! TOQUE-ME SEAN!
E o zíper dele abriu-se sozinho. Sean voltou a biblioteca e viu sua camisa sendo deslocada do lugar de costume, o blazer bege de corte italiano retirado e jogado num canto qualquer.
Olhou-se, olhou em volta; cadeiras, poltronas, tapetes.
—! — Sean, sem saber como agir, digitou um ponto de exclamação, permitindo-se dizer que havia feito.
— AHHH! ISSO! — e a luz aumentou. — AGORA POSSO SENTIR TEU SUOR ESCORRER, MOLHAR TEU ROSTO JOVEM, BONITO! ESCORREGAR ATÉ TOCAR-ME!
Ele abriu os olhos quando a claridade estava quase extinguindo, e viu-se molhado de prazer, sentindo a pouca roupa que lhe colava o sexo.
Lá, lençóis macios numa cama de veludo vermelho, um ar perfumado por rosas brancas, sob o cristal iluminado de velas que cintilavam, dentro do corpo macio; estava de novo na casa dos seus sonhos, dentro do sexo da bela mulher loiro-platinada.
E Sean enterrou-se, tocado muitas vezes, por diversas mãos, que escorregavam por cada centímetro de sua pele.
— Ahhh... — Sean viajou no que algo, alguém, alguma coisa lhe consumiu. Algo quente, úmido, que comprimia toda sua masculinidade naquela consumação. — Ahhh...
— ISSO! EHHH! CONTINUA! AHHH! AHHH! AHHH!
— Ahhh... Ahhh... Ahhh... Ahhh... Ahhh... — Sean gemia todo.
— ISSO! TOCA OS LÁBIOS ÚMIDOS QUE LHE SORVEM! ISSO! S! VAMOS! SEU S! OUTRA VEZ!
— Ahhh... — Sean se sentiu zonzo, sem controle de si mesmo, sentindo seu sexo penetrando algo que não via, mas que sabia estar ali, sentindo suas ideias e sexo, entrando pela primeira vez em território nunca explorado.
— COMO PODE FAZER SEM SE ENTREGAR?
— Entregar-me?
— VEM! EHHH! REDUZ-SE A PÓ! EHHH! DEIXA-ME PENETRAR TEUS PENSAMENTOS! Ehhh! TEU CORPO! TEU SEXO!
E foi a vez de Sean sentir-se penetrado.
— O que está fazendo... — frente e verso, de todas as maneiras cabíveis. — Ahhh!!! — gritou achando que fosse enlouquecer de prazer. — Não… Ahhh…
— TUA ALMA... S! TEU CORPO... S! TEU SEXO OUTRA VEZ... S!
— Não... Não... Chega...
— SENTIR TEUS SEGREDOS, TUA FORÇA MOTRIZ, TUA ALMA MAIS INTERNA!
— Não... — Sean estava totalmente dominado, excitado pela aquela coisa. — Pare... — implorou. — Pare...
— AHHH! AHHH! AHHH!
— Não... Não...
— DEIXE-ME... S! — as letras corriam pela tela. — S! DEIXE-ME ROUBAR TEU CALOR... S! TEU AMOR... S! TEU AR...
— Minha respiração está... Não... — levou as mãos à garganta sentindo o ar faltar. — Por favor... Pare...
— NÃO!
Sean virou os olhos; algo penetrava seu corpo, tocava-lhe seus segredos, invadia seu sexo, sua alma.
— Não me toque... Não por aí... Não!!! — e sua alma foi tocada; como se aquilo pudesse ser possível.
— S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! S! ISSO! PASSAGEM SÓ DE IDA... — escrevia na tela, o estranho ser.
Sean não teve tempo de gritar antes de se entregar ao destino.
Adrenalina pura era seu corpo, queda vertiginosa, êxtase total.
Até desmaiar no chão da biblioteca.
15
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; biblioteca.
04 de setembro; 07h34min.
A roupa aberta, escancarada, lhe colava. Um calor indescritível se apossara de seu corpo. Sean olhou em volta e o dia começava a clarear. Tentou espremer a vista, mas sentiu-se cansado; muito mesmo. Voltou a desabar sem, porém fechar os olhos, encarando o teto da biblioteca ainda distante.
A bateria do notebook avisou que enfraquecera, e levou muito tempo para se concentrar, para lembrar-se dela.
Sua garganta seca, seu corpo molhado, sua mente entorpecida.
— Deus! — exclamou rindo da estranha sensação.
O refeitório não ficava distante, ele ouviu o tilintar dos copos, da porcelana se chocando. Levantou-se do chão, tentou ao menos. Achando-se um idiota, esperou ouvir todos entrarem no refeitório para se recompor e sair da biblioteca para se arriscar pela rampa de faixa amarela.
Lembrou-se da existência das câmeras e voltou. Não conseguia concentrar-se, desligar a energia, escapar das câmeras. Sentou-se nas escadas longe de olhares alheios e procurou por uma tomada para ligar o notebook, mas nada havia ali.
Sean tocou as paredes e uma energia correu por todo seu corpo, cada centímetro dele. Ele tirou a mão da parede assustado. Voltou a tocá-la e imagens surgiram; bitmaps da construção do Complexo A. Ele tirou a mão da parede e tudo cedeu.
Voltou a tocar as paredes, e imagens de engenheiros, arquitetos e construtores chegaram até ele; imagens da planta-baixa, da construção, da reforma, de cada canto projetado.
Agora era ele um hacker paranormal.
Outra vez se concentrou e agora câmeras, oficiais de segurança, corredores e todo mapa de localização se desenhou em sua frente. O mapa então girou, esquadrinhou e se expandiu, para então girar, enxugar-se e expandir-se; em suas visões Sean se viu, ali, na rampa.
— Câmera um está a um metro da câmera dois e a cinquenta centímetros da câmera três. A câmera cinco a dois metros da câmera oito... Câmera dez, onze e quatorze na mesma direção — desejava, imaginava, lia, e Sean chegou ao mapa do nível térreo que mostrava em sua mente cada localização, cada posição das câmeras, suas atividades e sua mesa de controle na sala da segurança, acessando a mesa dos oficiais de segurança que de costas para os computadores, faziam o desjejum.
E Sean saiu em disparadas pelas escadas, correndo pelo corredor de faixas amarelas, descendo a extensa rampa, seguindo o mesmo caminho da noite de sua chegada.
As câmeras viravam em sentido contrário toda vez que ele se aproximava, toda vez que seu calor era sentido. Sean teve realmente medo do que fazia quando alcançou os carrinhos, dirigindo para os laboratórios onde uma porta dupla se fez à sua frente.
— Sem oficiais de segurança? — estranhou de longe após abandonar o carrinho fora do alcance das câmeras.
Sean digitou a senha gravada em sua mente. Seguiram-se as linhas da retina, arquivos gravados no banco de dados da segurança da ilha, que ele transferiu para ali pelo poder da mente, com cópias das formas-pensamento que por ali, se encontravam e Sean plasmou os dois seguranças e suas palmas da mão.
A porta abriu-se e ele entrou na ala de despressurização onde jatos de ar foram lançados sobre ele.
Protegeu o computador por dentro da roupa ainda molhada de suor, sentindo-se extasiado com aquela invasão; até então só sentia prazer em invadir computadores.
Não havia ninguém no laboratório, tudo estava calmo.
“Onde estão todos?” “Onde está Bruno?”, pensou nervoso.
Sean deixou o notebook escondido, não podia se arriscar em perdê-lo. Colocou-o num armário atrás dele trancando-o em códigos escolhidos, e preparou-se para entrar na roupa de descontaminação ao adentrar o último dos corredores.
A sala estava limpa e arejada, pôde ver a temperatura marcada em muitos termômetros presos às paredes. Os mainframes funcionavam e Sean se aproximou do teclado, tentando invadir os computadores.
— Meus mainframes! E pensar que a Computer Co. estava envolvida — as fitas de dados giraram sem, porém responder ao comando dele. — Droga! — tentou mais uma e outra vez, e nada; Sean olhou em volta, não tinha tempo para usar todo seu conhecimento para quebrar senhas de entrada, e não havia formas-pensamento ali para ele plasmar outro oficial com permissão.
Muitas portas vinham do corredor detrás dos computadores, Sean puxou o tubo de ar preso à sua roupa e deslizou-o pela canaleta de ar para poder andar melhor, abrindo a primeira porta e outro laboratório subterrâneo desenhou-se à sua frente. Ficou um tempo imaginando como se entrava com aquela roupa, e fechou a passagem de oxigênio, desconectando sua roupa da canaleta de fora, para conectá-la à canaleta de dentro.
Notou que alguns animais, na maioria macacos, se agitaram na sua entrada; Sean procurava câmeras, sabia que elas estavam lá. Alguns ratos esverdeados se encontravam numa caixa de acrílico, gafanhotos com grandes orelhas pelo corpo descansavam no formol. Mas um macaco com duas cabeças e oito olhos o fez estancar de repente.
Voltou a caminhar e um novo espaço se abriu à sua frente. Desceu a escada de três degraus com cuidado controlando o tempo todo, aquela canaleta de oxigênio que mais parecia uma cauda presa à pesada roupa de descontaminação que já começava o incomodá-lo, quando um apito ligou a tela do computador da entrada o assustando; o computador avisava que a energia havia sido acionada automaticamente dentro do laboratório.
Algumas portas ao fundo demonstravam serem frízeres, e algumas prateleiras estavam lotadas de cérebros; pedaços deles, de todos os tamanhos. Desenhos também se espalhavam por uma enorme prancheta, que se inclinou para ler o título da pasta – ‘Fim do mundo’.
Sean recuou imaginando muita coisa mesmo.
Algumas fotos de cérebros, de tamanhos e formatos bizarros, com vários tipos de implantes estavam presas a uma parede de cortiça.
“Implantes?”, se perguntou.
Algumas pastas haviam sido espalhadas pelas mesas de vidro, e Sean se inclinou para lê-las quando uma mão pesada tocou seus ombros.
— Sr. Queise! — o Dr. Ítalo Piieno tinha a face deformada pelo ódio. — Acaba de cometer uma grande tolice.
Complexo A; setor de alojamento.
04 de setembro; 12h33min.
Oscar Roldman estava uma fera, havia sido chamado com urgência no quarto-sala de Sean Queise.
— O que houve aqui? — foi logo perguntando ao ver tudo revirado. — O que eles queriam?
Oscar viu Sean sentado numa poltrona estraçalhada, no canto direito do quarto-sala, com as mãos nos lábios e olhar tenso.
— Sabia que o cérebro humano possui e usa formas de vibrações para se comunicar com todo o corpo? Que possuímos quatro tipos de ondas cerebrais; Beta, Alfa, Teta e Delta? E que a energia escalar amplia e estabiliza a frequência das ondas alfa no cérebro? Fazendo-o ressoar na mesma vibração do campo de energia da Terra?
— Os movimentos expansivos e circulares da energia escalar formam um campo de escudo protetor em torno do corpo que remove e cancela os efeitos nocivos das frequências de 60 Hz sobre o corpo humano, reforçando as defesas naturais do organismo.
— Wow! — bateu palmas. — Ora veja… Achei que tinha herdado a inteligência dos Queise…
— Chega Sean! — exclamou com força, muito bravo mesmo com ele, suas atitudes, e insinuações. — O que houve aqui?
— Não parece obvio para você? Procuravam o meu notebook.
— E onde ele está?
— Não trouxe.
— Esqueceu as cuecas também? — Oscar não se conteve e Sean o fuzilou não respondendo. Oscar se inclinou sobre ele com uma voz séria. — Invadir computadores, Sean querido, é uma coisa, mas invadir os laboratórios da ilha...
— Não sou seu querido — cortou sua frase.
— Não. Não parece ser — Oscar devolveu-lhe e Sean a sentiu mais que imaginava. — Você mudou as câmeras do trajeto, alterou as linhas de códigos de todas as entradas da ilha, você bagunçou todos os arquivos de segurança; como Sean?! — berrou descontrolado.
— Não imagina como?
— Sean... — e a mão de Oscar e o tapa ficaram no ar. Sean arregalou os olhos azuis, nunca se imaginou apanhando de um pai que nunca foi seu pai, se seu pai nunca lhe bateu. — O General Arthur La Hera está uma fera — abaixou a mão que tremia.
— E a Poliu? — Sean ainda olhava a mão que lhe foi levantada.
— Sean! — se irritou mais ainda. — Onde está?! — gritou.
— Não grite comigo!
— Então não me tire do eixo! Se não trouxe o notebook, qual o maldito computador da ilha você acessou?
— Nenhum!
— Sean?!
— Não acessei nada! Foi minha mente!
E Oscar parou de andar, provável parou de respirar, também.
— Você... você... Você não fez isso.
— Fiz o que? — desafiava-o. — Toquei as paredes atrás do projeto de construção do Complexo A? Materializando-a?
— Sean... — e a voz não saiu, não conseguiu sair. — Deu vida ao mapa?
— Dei?
— Sean! Sean! — Oscar balançou a cabeça, mais nervoso ainda. — Eles vão verificar os computadores, Sean, e se acharem...
— Não sei como… — deu de ombros. —, achariam algo… — voltou a dar de ombros. — A não ser que abram minha mente como a de Bruno... — Sean ria com vontade.
— Deu vida às formas-pensamento?
— Incrível seu sangue, não?
— Seu sangue!
— É! Meu sangue... — Sean viu Oscar desistir, sentando-se na poltrona estraçalhada após tentar arrumá-la, ficando a olhar o chão acarpetado. — Quem danificou as roupas espaciais, Oscar? Alpheu? — Sean sabia que ele não responderia. — Droga Oscar! Por que sempre me deixa no escuro?
— Porque não sabemos se alguém da Sala de Controle Ala Cinco ajudou.
— Acha que... — ficou temeroso, não disse o que pensou. — Eu preciso de você, Oscar. Preciso que vá buscá-lo no laboratório.
— Buscar o quê?
— Meu notebook — Sean viu Oscar o encarar. — Está no armário central, nº 7, e o código é ‘Codinome: Cruzador Solar’.
Oscar saiu sem responder, bateu a porta até estremecer as paredes. Sean cerrou os olhos, ficou sem saber se ele o faria, se ele o ajudaria a recuperar seu notebook e as fotos do Cruzador Solar que Spartacus gravara. Entrou e saiu do banho, se assustando quando Oscar voltou.
— Como sabia que o nº 7 era meu armário, Sean? Nem eu recordava do número.
Amarrou a toalha na cintura com força e se aproximou dele molhando o carpete.
— Oscar querido! Preciso mesmo responder a isso? — brincou enquanto pegava o notebook das mãos do todo poderoso homem da Polícia Mundial, ficando sério depois. — Eu não dopei Alpheu, não compreendo o porquê de ele estar em coma.
— O Comandante Alpheu Smith tentou se enforcar na enfermaria — Oscar respirou pesado, Sean percebeu.
— Adriana disse que ele não conseguia acordar e Gyrimias me disse que ele estava louco.
— O Comandante Alpheu Smith está em estado inicial de loucura, sim.
Sean arregalou os olhos azuis novamente.
— A que tipo de loucura se refere? Alucinações com luzes? Alienígenas com cabeça de polvos?
Oscar gargalhou ao se sentar no sofá que tivera suas almofadas arrancadas pelos oficiais de segurança da segurança durante as buscas ao notebook.
— Você também viu, não viu Sean querido?
Sean balançou o pescoço nervoso e Oscar Roldman reconheceu aquele estranho trejeito.
— O que contém aqueles mainframes, Oscar? Por que o Dr. Ítalo estava tão irado com minha presença nos laboratórios?
— Não faça isso, Sean. Pelo amor de Deus, você está mexendo com coisas confidenciais.
— A pesquisa... O tal chip de DNA modificado... Foi a Poliu que o encontrou, não foi? O DNA é alienígena, não é? — Sean viu Oscar estar a ponto de explodir. — É onde se encaixa o tal geólogo russo, não é? Ele achou outro chip? Estava no mesmo local onde a tectita — e Sean encarou Oscar que começava a ficar impaciente. —, foi encontrada com uma das tábuas que Carminna estuda?
“Droga!”, Sean teve medo da frieza de Oscar e mais medo ainda de estar lendo sua mente.
— Por isso tanto segredo? Por isso que não existem dados sobre o chip de Codinome: Cruzador Solar nos arquivos da Sala de Controle Ala Cinco?
— Sean...
— Nada de ‘Sean’. Como tábuas cuneiformes foram encontradas em acidentes aéreos com UFOs? O que tem realmente nas tábuas sumérias que a mente de Carminna não me permite invadir?
— Estou falando sério, Sean.
— Wow! Você quer falar coisas sérias? Será? Então vamos falar sobre o porquê de Alpheu ser o único a poder gerenciar o ônibus espacial experimental e sobrar para mim, ir lá fora?
— “Lá fora”? — Oscar ficou o olhando com interesse. — Do que está falando?
— Alpheu disse que se eu não fosse lá fora buscar o chip, o braço mecânico ao resgatá-lo poderia esmagá-lo, destruí-lo, mas teve a precisão exata para soltá-lo da porta serial e amarrá-lo em fios de fibra óptica — Sean ligou o notebook, começou a digitar sem parar. — Eu preciso te contar uma coisa que aconteceu comigo quando fui liberado da estação de sono — Sean o encarou. — Eu fui abduzido.
— Você o quê? — Oscar mal teve tempo de respirar.
— Abdução, Oscar, de o verbo abduzir. A ufologia usa esse termo para identificar alguém que foi sequestrado por alienígenas, ou sofreu um contato imediato com eles, geralmente um contato entre o CE-3 ou terceiro grau e o CE-4 ou quarto grau. Alguns ufólogos tratam ainda, um contato telepático como um CE-5 ou um contato de quinto grau — falou como que para si mesmo. — Acho que fui até muito mais que isso — ele viu Oscar perder o fôlego. — Quando eu estava do lado de fora do ônibus espacial experimental, fui abduzido por uma luz.
— “Uma luz”? Você teve uma despressurização dentro da roupa, faltou-lhe oxigênio...
— Não!!! — berrou nervoso. — Eu fui abduzido antes de desmaiar!
— Alucinação, como as do Comandante...
— Luzes, Oscar!!! — gritou. — Luzes como as que Alpheu viu em suas ‘alucinações’!!! Luzes, Oscar, que acendem e apagam. Luzes que preenchem corpos. Luzes que falam e escrevem no computador.
— Você está... — Oscar parou de andar.
— Louco? Louco quando uma luz forte que quase me cegou entrou na minha roupa não me deixando respirar? Ou quando desmaiei e acordei na casa dos meus sonhos com vozes me chamando, e Sandy falando...
— “Sandy falando”? Meu Deus, Sean. Sandy está morta e...
— “E”? E o quê? Por que me olha assim? — Sean ficou mais nervoso. — Eu tentava tocá-la, mas ela me mandou voltar, disse que não era hora de morrer, quando Alpheu arrancou o meu capacete.
— Meu Deus, Sean, isso tudo pode não ter acontecido. Você foi hipnotizado, e mesmo assim saiu da orla hipnótica, soltando-se das amarras da cápsula de sono, sem que a Sala de Controle Ala Cinco saiba como — Oscar levantou-se num rompante. — Lhe deram café.
— “Café”? — Sean viu Oscar dar voltas. — Você sabe que eu saio do corpo Oscar.
— Não Sean. Você faz mais que isso. Mais do que alguém sabe, porque ninguém sabe que você se preparou para encontros alienígenas, que Mona Foad desenvolveu em você um... — e Oscar parou de falar no que viu Sean sorrir-lhe e voltar a digitar algo.
— Eu não sei do que está falando… — e Sean deletou a foto do colisteiro ‘Fim do mundo’ dos arquivos. —, mas sei de uma coisa que talvez nunca imaginasse saber Oscar, o porquê de eu saber contatá-los.
— “Contatá-los”? Fala de alienígenas?
“Fala de alienígenas?” “Fala de alienígenas?” “Fala de alienígenas?”, e a voz de Oscar Roldman ecoava aos ouvidos de Sean e por toda a sala de comunicação da segurança.
Mr. Trevellis observava a discussão de Sean pela pequena câmera e microfone, escondidos dentro da luminária, do abat-jour verde. Isso permitia que ele visse e ouvisse tudo o que acontecia dentro do quarto-sala de Sean Queise.
A fita do gravador rolava solta, cada detalhe minuciosamente gravado pela Poliu.
— Ela... Acho que não posso explicar como... — Sean fez uma careta. — Você duvidaria, mas eu posso atraí-la de alguma forma, sei que posso. Wow! Precisava ver como ela comanda os computadores...
— Sean...
— Não Oscar! Sabe o ar que não me sufocou no ônibus espacial experimental? Foi ela Oscar, eu sei. Droga! Não sei com que força, mas os controla sim. Os teclados, as letras no teclado... — Sean riu. — A alienígena de luz branca poderia dizer, o que o chip Cruzador Solar tem em seus arquivos sem precisarem de Bruno, Oscar.
— Trevellis tinha razão... Você sabia o que fazia, porque os queria ver, se comunicar com eles, não Sean?
— Viu?! Viu?! — gritou. — É você o culpado, Oscar... — Sean tremia. — É você quem defende Trevellis... Você e meu pai são culpados por... — e ele paralisou no que Oscar enfim o esbofeteou.
Sean realmente parou impactado. Piscou, piscou, piscou e voltou a si totalmente chocado com o bofetão, virando-se e fechando o notebook. O levou para o banheiro e o enfiou na máquina da hidromassagem. Voltou ao quarto e vestiu-se com uma calça de moletom, camiseta, meia e tênis.
Tudo em silêncio.
Estava nervoso demais com o que pensava, com o que ouvia, com o que fazia de sua vida, para falar sobre aquilo, sobre ele lhe bater como se fosse seu pai.
Oscar levou um susto com a pancada da porta, também estava em choque com o que fizera. Seguiu-o até alcançá-lo no corredor.
— Aonde vai? — questionou Oscar no corredor indo atrás dele.
— É minha vez de precisar de ar! — Sean viu Oscar andando. — Sozinho! — Sean foi embora e Oscar não o seguiu sentindo dor naquilo.
Mas não foi bem ‘ar’ que Sean foi buscar.
Complexo A; setor de alojamento.
04 de setembro; 14h08min.
Yàn Zhu era um jovem homem cheio de manias. Sofrendo de TOC, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, a arrumação de seu quarto-sala era comentada nos longos breakfast.
Conceituado professor catedrático nas ciências da computação, um dos melhores projetista de sistemas, muito querido na China. Era peça importante no projeto de reconstrução do Codinome: Cruzador Solar, e era a ponte entre a Polícia Mundial e a CNSA, a Agência Espacial Chinesa.
Sean bateu na porta.
— Quem é?
— Sean Queise!
— Ni hao! Olá! Boa tarde! — traduziu ao abrir a porta. — Entre Sr. Queise, sempre quis conhecê-lo melhor.
— Wo bù shuó zhong wén.
— Ah! Você não fala chinês? — riu. — Percebi Sr. Queise. Por favor, sente-se!
— Xiè xiè! Zhu — agradeceu. — Posso chamá-lo assim, não? Então serei Sean para você — Sean viu Zhu mostrando as quatro cadeiras arrumadas meticulosamente no canto esquerdo do quarto. — Não se preocupe, não vou demorar. Só vim aqui saber o que é “stimociever”, Zhu?
— Aonde ouviu isso?
— Isso não vem ao caso.
Zhu ficou temeroso em falar, pesando as consequências antes de responder.
— Bem, o ‘stimociever’ não é nenhum segredo de Estado, acho. Qualquer texto falando sobre ele pode ser copiado na Internet, e pode acreditar, é real.
— E?
Zhu viu Sean esperando mais do ‘real’.
— O stimociever é um aparelho inventado na década de 50 como uma estimulação eletrônica do cérebro, uma miniatura de eletrodo colocado dentro do cérebro que recebe e transmite ondas FM de rádio. Dizem que o stimociever é um aparelho que pode controlar qualquer ser humano como se faz com robôs.
— E pode?
— Pesquisas provaram que com a introdução do stimociever no cérebro, surtiam diversas variedades de efeitos como sensação de flutuação e visões coloridas... — e não terminou.
— “Sensação de flutuação e visões coloridas”? — aquilo era para se temer.
— Sabe algo sobre, Sean?
— Ao longo do tempo, centenas de pesquisadores mapearam o funcionamento das ondas eletromagnéticas no cérebro, e conseguiram identificar quatro conglomerados básicos de frequências de ondas cerebrais, cada um deles associado a um estado mental específico. Ondas beta de 13 a 30 hertz, ondas alfa de 8 a 13 hertz, ondas theta de 4 a 7 hertz e ondas delta de 0,5 a 4 hertz.
— Zhùhè! Congratulações! — traduziu. — Esses estudos dizem que o primeiro grupo de ondas beta fica associado a um nível normal de consciência, mas se ficar num nível superior, pesquisadores identificaram estados de agitação, cólera e medo, além dos efeitos da tensão, qualquer um dos quais pode prejudicar as habilidades de pensamento e de raciocínio.
— Como pesadelos?
— Como realidades paralelas, Sean. Pensamentos que podem tomar formas.
— Thomas Hobbes dizia que sua mãe havia parido gêmeos; ele e o medo — ambos riram. — Eu devia estar com medo de tudo isso, não Zhu?
— Sim, Sean. Mas o segundo grupo de ondas alfa está associado mais aos estados de espírito mais tranquilos. Enquanto o terceiro grupo, de ondas theta, têm sido associadas à formação de imagens mentais ou de metáforas, com acesso a memórias profundas e com foco mental interno, como ocorre na meditação.
— Está dizendo que num estado tetha podemos criar formas-pensamento a partir de mitos, Zhu? Imagens de metáforas como falou?
— Sim, já que o quarto grupo tem amplitude das mais baixas de frequências mentais do cérebro humano, as ondas delta, extremamente lentas, abrangendo de 0,5 a 4 hertz, que são associadas ao sono profundo.
“Sono profundo”, aquilo parecia mais perturbador ainda.
— Você fala de um implante que controla o cérebro, mas ele pode controlar algo mais?
— Algo mais como, Sean?
— A temperatura, Zhu.
Zhu ergueu-se todo, riu sem graça, e olhou Sean de lado. Não esperava que a visita fosse tão explícita.
— Não estou...
— Está entendendo sim! — Sean cortou-o. — Entendendo tanto, que sabe que sei que a Poliu criou um HAARP — e ele viu Zhu voltar a sentar. — Ainda não consigo captar toda a extensão dessa atitude, mas tem haver com as luzes que você viu Zhu. Então quero saber o que você viu quando eu ainda não havia chegado aqui na ilha, porque quero saber por que Spartacus deletou isso! — Sean viu o sensato cientista chinês cair sentado na cadeira vazia, quando o notebook de Zhu ligou e uma foto surgiu.
— Como conseguiu enviar isso ao meu notebook Sean?
— Não enviei. Sempre esteve aí.
— Eu havia deletado.
— Nada se deleta, não é mesmo Zhu?
— Mas ninguém podia tê-la recuperado.
— Ninguém? — sorriu Sean cínico. — Porque agora mais próximo de você, posso dizer que sei que você é ‘E’.
— Sou quem?
— “Há alguns anos, por exemplo, um grupo inglês fez barulho alegando que imagens de um satélite da NASA mostravam enormes discos voadores próximos do Sol, que por algum motivo sempre eram fotografados de perfil; eles os chamavam de ‘Suncruiser’ ou ‘Cruzador Solar’”.
— Aonde... — e mal conseguiu falar. — Aonde ouviu isso?
— No éter.
— Formas-pensamento... — escapou de Zhu com os olhos mais arregalados que sua constituição facial permitia. — Agora entendi sua visita.
— Que bom! Assim não vai haver interferência em seu pensamento.
— Então lê pensamentos, Sean? Ouvi dizer que ninguém podia encontrar nossos pensamentos no éter.
— Ouviu dizer? — Sean levantou, andou poucos passos e voltou a se sentar pesado, nervoso. — Ok! Zhu... Vamos ao que interessa. Você é o especialista da Poliu em se tratando de modificadores de clima, porque sei que você já esteve envolvido em muitos experimentos particulares de Trevellis, e que a última tempestade tropical que atingiu as ilhas ao nosso redor, se transformou num poderoso furacão. Então não vai querer que uma corte penal do tipo de HAIA, venha, a saber, o que uma polícia secreta, numa ilha secreta, faz com o clima, vai?
— Por que se arrisca Sean?
— Porque só me restou isso.
— Especialista da Poliu... — soou sombrio.
— Vamos! Eu sei que você é um exímio cientista da computação Zhu, e que... — e Sean viu Oscar lhe olhando, porque Sean podia saber que Oscar estava em algum lugar, se concentrando neles, indo até o quarto-sala de Zhu, estando ali sem precisar estar. Nada comentou. — Parece que não só a Poliu se interessa por hackers paranormais — riu. — Então me diga realmente o que acontece aqui, porque como deve também saber, não consigo saber tudo.
Zhu estava em choque. Não imaginava que Sean podia aquilo tudo, mas percebeu que ele podia sim, muito mais. E dizer que não conseguia saber tudo era ilógico.
Mas tudo o quanto Sean podia saber, ele não sabia, era verdade, porque sabia que até os espiões psíquicos da Poliu eram limitados.
— Do ponto de vista das formas que os pensamentos criam, podemos classificar a sua composição em dois tipos Sean — Zhu foi em frente, porém. —, as formas de pensamento puro e as formas de pensamento composto. Do ponto de vista das formas que os pensamentos criam, há três tipos de ação: Formas de pensamento que gravitam em torno do seu próprio criador, as que gravitam em torno dos egrégoras compatíveis com o seu padrão energético, e...
— “Egrégoras”? — aquilo alertou Sean.
— Egrégora é uma forma-pensamento, um ente formado pela ação comum de pensamentos de membros de um grupo que o cria. Todo pensamento dá origem a uma série de vibrações que atuam ao mesmo tempo na matéria, quanto no corpo mental. Pode ser para o bem ou para o mal.
Sean lembrou-se dos dois oficiais de segurança que ‘criou’, que gerou as senhas de acesso.
— H.P. Blavatsky afirmava que o pensamento, ou seja, a atividade mental, focalizada e intensificada sobre um objetivo específico, era capaz de plasmar uma forma, uma porção de essência, respectiva àquele pensamento. Muitos cientistas achavam tal afirmação absurda, visto que o pensamento é um produto de simples combinações bioquímicas do cérebro. Droga! Começo a achar que o medo de Hobbes é realmente contagioso.
— Nossos pensamentos são criações vivas, e adquirem comportamentos peculiares, com características de quem o criou, Sean... A distância também parece não apresentar problemas para a forma-pensamento plasmada, com exceção da eventual perda de força à medida que se afasta de sua fonte emissora.
— Então só podemos dar vida a algo enquanto próximos de nós?
“Deu vida ao mapa...” soou Oscar naquele momento.
— Se nossos pensamentos não são meras combinações de reações químicas, ocorridas num órgão principal chamado cérebro, então ao andarmos pelas ruas, ao adentrarmos no ambiente de trabalho, ao estarmos em locais estranhos, podemos sofrer ataques de formas-pensamento que nos são emitidas?
— Sim, Sean. Sentimo-nos mal subitamente e não sabemos o porquê. Atribuímos a alguma disfunção física, mas sabemos que isto é a consequência de um desarranjo energético.
— Tipo?
— O tipo, não sei, mas a causa provável pode ser a emissão de ondas, dessas ondas que falei, capazes até de criar mentalmente um ser artificial para nos atingir.
“Ser artificial criado mentalmente...”, ecoou apavorante.
— Vejo que não sabe realmente o que Mr. Trevellis anda realmente criando, não é mesmo Sean?
“Não sei o que o poder da Terra anda fazendo...” foi a vez de ecoar Carminna em suas lembranças.
— Sabe algo sobre o implante do chip em Bruno, Zhu?
— Não exatamente, mas acho que conheço alguém que talvez possa ajudá-lo — falou Zhu.
— Ajudar-me? Wow! Precisarei de ajuda?
— Sim, Sean. Dr. Lawrence Pagni é físico nuclear e astrônomo, e tem trabalhado muitos anos interpretando material fotográfico recolhido através de sondas e satélites de observação — Zhu viu Sean entendendo a ajuda. — Hoje Dr. Pagni é a atual sumidade no quesito ‘vidas em outros sóis’ — sorriu e continuou a olhar para Sean. — Além do mais, cedo ou tarde você ia saber que o Dr. Pagni de repente passou a trabalhar para a Poliu em estudos sobre implantes, do tipo que está na cabeça de Bruno, para mais que de repente ainda, abandonar a corporação de inteligência e se tornar um ferrenho incitador das ditas ‘teorias de conspiração’.
Sean sentiu-se extasiado momentaneamente.
— Wow! Pode trazê-lo aqui?
— Acredito que ninguém venha a ilha sem autorização.
Sean levantou-se e Zhu levantou-se também já se preparando para se despedir dele.
Tocou na maçaneta e Zhu se pôs atrás dele, esperando ele sair.
— Choveu hoje Zhu?
Sean sentiu todo corpo de Yàn Zhu atrás dele sorver aquela pergunta, cada poro que se alterou pelo medo.
— Parece-me... Que um pouco...
— Nada que atingisse o nível 3, não é mesmo Zhu?
— Não... — Zhu olhou Sean na sua frente. —, nada como um nível 3.
— Que bom não é Zhu? — Sean se virou para ele e para todas as formas-pensamento que ali vagavam. — Não íamos querer que algo ruim acontecesse, não é mesmo? — sorriu cínico vendo Zhu, naquele momento, conhecendo o medo hobbesiano.
Saiu precisando realmente de ar. Mas outra vez precisava de um ar diferente, feminino, que sabia estava trabalhando trancada no Complexo C. Sean foi atrás de Carminna.
Jardim dos complexos.
04 de setembro; 14h47min.
Sean alcançou a parte externa dos complexos e a vista do Sol vermelho, morrendo nas águas cristalinas, era surreal.
A ilha onde estavam instalados possuía grandes caminhos livres e encharcados, Sean aproveitou todos. Precisava tirar duvidas com Carminna.
Algumas câmeras instaladas nos postes se deslocavam pelo caminho. Ele prestou atenção quando as câmeras seguiram seus passos. Os oficiais de segurança não se importavam com aquilo, vigiavam cada passo dele quando algo os alertou.
— Ahhh!!! — Sean girou 360º no ar para então cair na relva molhada, com o estalar de seu corpo viril. — Ahhh... Deus... — tentou se erguer. — Que foi isso? — teve a sensação de um tapete sendo puxado sob os pés.
Chacoalhou a cabeça tentando arrumar os cabelos em desalinho, e prosseguiu o passeio, que não era exatamente um passeio, porque Sean queria tirar todas as dúvidas surgidas nas muitas formas-pensamento que captava ao longo de todo Complexo A. E como sua mente não se desligava dos acontecimentos passados, realmente estranhava que desde seu retorno à Terra, não mais havia sonhado com aquela casa.
Até achava que começava a gostar da casa de seus sonhos, onde sabia poder encontrar a noiva.
“Sandy? O que foi tudo aquilo afinal?”, vinha se perguntando enquanto atravessava a distância do Complexo A, não imaginando o que poderia ser o Complexo D, no projeto arquitetônico da ilha que deu vida, quando uma sombra se projetou à sua frente.
Sean estancou e a sombra desapareceu. Ele arregalou os olhos tentando compreender, e a sombra voltou a aparecer e desaparecer. Ele ofegava enquanto tentava pensar, olhar em volta, se situar, mas só a relva molhada, o Complexo A, o Complexo D.
Recomeçou a andar, acelerar o passo no que um sopro de vento fenomenal o arrastou metros para trás.
— Ahhh!!! — Sean era arrastado, sujo, levado.
Tentava desesperado segurar os tufos de grama que iam sendo aos poucos arrancados do solo, quando foi erguido no ar, com seus pés longe de ter uma força da gravidade a segurá-los, numa cambalhota e mais outra, e ainda mais outra, girando no espaço como se a gravidade fosse mesmo zero.
Complexo C; cabine de controle.
04 de setembro; 14h57min.
— Está vendo o que o Sr. Queise está fazendo? — apontou para a tela, um oficial de segurança ao outro.
Mais dois oficiais de segurança dentro da cabine de controle se aproximaram da tela e olharam. Fizeram uma careta, olharam-se, não compreenderam o que acontecia.
Sean esticava as pernas, plantava bananeira, ficava de ponta cabeça. Seus cabelos tocavam a grama, enquanto seus olhos viam tudo de cabeça para baixo, para ser abaixado, erguido, abaixado e erguido de novo, tentando desesperadamente respirar, raciocinar, sair daquela situação, quando sua calça moletom saiu do corpo o deixando de cuecas, para depois voltar ao corpo invertida, o fazendo sentir toda a umidade tocar suas pernas.
A camiseta deu-lhe folga e Sean se viu pendurado no ar, poucos centímetros da grama úmida.
— Socorro!!! — ecoava pelos alto-falantes.
— Mas que diabo é isso? — questionou o oficial de segurança após ver Sean na tela dando piruetas no gramado da ilha.
— Não sei — respondeu o outro oficial de segurança.
Os oficiais de seguranças na sala de controle voltaram a se olhar, não compreendendo o que acontecia. Ligaram todas as câmeras, vasculharam por todos os computadores.
— Nenhuma presença capitada pelos infravermelhos. Nenhuma alteração no tempo ou no ar.
— As antenas? — ainda questionou outro oficial de segurança.
— Não! Teríamos sido avisados se as antenas fossem emitir radiação na ionosfera.
— Então como explica essa ventania o arrastando? — apontou o oficial de segurança para Sean Queise, que parecia estar sendo mesmo arrastado por uma ventania particular.
O telefone bateu sua campainha ao lado da cama de Oscar que descansava.
— Sr. Oscar Roldman? — chamou um dos oficiais de segurança do Complexo C ao telefone. — Desculpe incomodá-lo Sr. Oscar Roldman, mas é o Sr. Sean Queise. Ele está agindo de forma estranha.
— Sean? — Oscar acordou. — O que ele tem?
— Ele está... Bem, ele agora está descalço, sem camisa, de ponta cabeça, com o rosto enterrado no gramado.
Oscar arregalou os olhos, achou que ainda estava dormindo.
— “Enterrado”, você disse?
— Sim! Primeiro ele saltou no ar fazendo cambalhotas, depois ficou sem roupa... Para então a roupa voltar ao corpo enquanto ele gritava e rolava pela grama.
— Disse que a roupa voltou ao corpo? Como assim ‘voltou’?
— Estamos na duvida se devemos chamar Mr. Trevellis.
— Já estou indo para lá! — Oscar acordou de vez.
— O Sr. Sean Queise... — cortou mais qualquer ação de Oscar Roldman. —, ele está na área do Complexo D, no setor dos casulos Senhor.
— No setor dos casulos? — Oscar teve medo do que Sean ia fazer lá ou se ele sabia sobre as antenas. — Sean chegou a entrar?
— Não Senhor. Ele não teve tempo de se aproximar do Complexo D.
— Graças...
— Posso pedir para que algum oficial de segurança vá até lá antes que ele se machuque, Sr. Oscar Roldman? Ou ainda... — o oficial de segurança deu uma parada no que ia dizer. —, ou antes que ele descubra o que tem lá?
— Faça isso! — ordenou Oscar Roldman.
— Sim, Senhor! — e o oficial de segurança voltou a olhar Sean na tela sendo arrastado pelo gramado. — Câmbio! Alguém no setor dos casulos? Câmbio!
— Câmbio! Aqui é o oficial de segurança sênior! Câmbio! — respondeu o oficial ouvindo as ordens dadas. — Quer que eu faça o quê? Está bem! Não vou discutir. Câmbio! Vou fazer! Câmbio!
E o oficial de segurança sênior fez uma careta ao pegar uma corda e se dirigir com o carrinho de locomoção para o gramado externo.
Jardim dos complexos.
04 de setembro; 15h20min.
Sean rolava metros a fio, dava saltos recusando a lei da gravidade, sendo erguido e abaixado, girando como num tubo a fazer todos seus sentidos bagunçarem.
Sua camiseta foi rasgada ao meio, seus braços esticados, amarrados pelo tecido.
— Me soltem daqui!!! — Sean era levado ao total desespero quando a camiseta se soltou dos braços dele, partiu para o pescoço, chegou ao rosto o embrulhando para presente. — Ahhh... — Sean sentiu o ar faltar-lhe quando seu rosto foi enterrado na grama, os tênis voaram cada um para um lado, as meias dançavam pelo corpo até estacionarem muito longe dali. Seu coração disparado e à sua volta, a ilha secreta, o céu avermelhado, uma calma a qual não fazia parte. Sean estava dependurado, sujo, confuso, e então um novo vento fenomenal, vindo não sabia de onde, o arrastou metros e metros. — Ahhh!!! — Sean berrava no vento que o arrastava, com ele tentando arrancar gramas, se segurar em algo. — Não!!! Socorro!!! — e era arrastado, levantado, girado, enterrado na grama úmida, e erguido e arrastado por todo o gramado, numa ventania só sua.
Seu corpo se projetava de um lado para outro, girando 360º, 720º, 1080º. Ele até tentou abrir os olhos. Tentou, mas não conseguiu porque uma luz branca em forma de um polvo quase o cegou o fazendo desistir de vez, com terra e grama na sua boca, nos seus cabelos, no seu corpo todo. Sean já havia perdido os tênis, as meias, a camiseta, havia sido arrastado só com a calça do moletom que usava do lado do avesso.
E rolou tanto que parou aos pés de um oficial de segurança sênior, às portas do Complexo D.
— Sinto muito Sr. Queise... — o oficial de segurança sênior o olhou temeroso. —, mas me mandaram amarrá-lo e dopá-lo Senhor.
Sean cuspiu a terra e a grama.
— Quê? — foi o que tentou em vão, entender.
16
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo C; setor de gerenciamento.
05 de setembro; 06h47min.
Sean abriu os olhos e seu corpo foi erguido com carinho. Nadir lhe sorria atenciosa ao passar uma toalha úmida no rosto.
— Sente dores, Sr. Queise? — perguntou depois de desamarrá-lo.
Porque Sean foi dopado e amarrado.
— Eles... eles me amarraram...
— Eu sei. Eu sei. Todos sentem por isso — e Nadir olhou a cadeira vazia.
— Sentem nada! A Poliu mandou... — e Sean gelou ao ver a opulenta figura morena de Mr. Trevellis na porta entreaberta.
Mr. Trevellis o encarava sem nada falar, indo embora sem entrar. Sean imaginou que não era hora para confrontos.
Adriana foi a próxima a aparecer na porta e dessa vez entrar.
— Você está bem, Sr. Queise? — manteve a frieza.
Nadir recolheu a tolha que acariciava o rosto dele no primeiro timbre da voz fria dela.
— Não! — e recuou ao ver Nadir incomodada. — Sim...
— Tem mesmo certeza que está bem? — Adriana o viu sem camiseta, sem meias, sujo de terra, com a calça de moletom do lado do avesso.
— Acho...
— ‘Acho’ não é uma palavra muito convincente — Adriana continuou tão gélida que Nadir recolheu a toalha e tudo o que havia trazido, e saiu sem se quer dizer nada. — Por que eu não sabia que as vestia assim, do lado do avesso? — Adriana apontou para a calça de moletom dele.
Sean se olhou.
— Porque não as visto assim, está bem? — foi o que Sean falou.
Porque não ia mesmo encontrar uma maneira lógica para explicar como sua calça havia sido tirada e recolocada invertida. Levantou-se da cama, percebendo estar suado, que colara ao lençol durante a noite. Abaixou-se e vestiu o tênis sujo, sacudiu a camiseta rasgada que torceu, tirando ainda gotas de uma água barrenta, recuperada no gramado pelos seguranças e vestiu-a, tudo sob fortes olhares dela.
— Está com problemas Sr. Queise, já deve ter percebido — falou Adriana nada constrangida.
— Que problemas? Está achando que fiquei maluco? — tentou se levantar e sentiu uma tontura forte.
Adriana disse algo e tentou segurá-lo quando ele quase caiu.
“BRUNO...”; ecoou.
— Como disse?
— Disse o que Sr. Queise? Que não o acho maluco?
— Não! Não! — balançou freneticamente a cabeça. — Disse ‘Bruno’.
— Não disse nada.
— Não... — e Sean teve medo do que ela não disse. —, não me acha maluco?
— Kelly Garcia, sua secretária, ligou!
— Kelly Garcia, minha sócia, ligou!
— Não sei o que ela é! — Adriana viu a mudança na face dele. — Ela se identificou como sua secretária, Sr. Queise, e o mandou retornar. O que acredito não seja possível porque não terminou seu trabalho.
— Não terminei meu trabalho? — Sean olhou para os lados e gargalhou nervoso, era percebido. — Do que é que está falando Tenente-coronel Adriana? Já disse que não sou seu subordinado — e se aproximou tanto que Adriana teve que dar um passo para trás se quisesse respirar. — Quer... Mas não sou seu subordinado.
Adriana se absteve de comentar aquilo, se virou e foi embora como veio.
E Sean só conseguiu respirar quando ela saiu.
Olhou em volta, não sabia bem onde estava, mas as portas de aço do armário no fundo da sala refletiam um Sean Queise jovem, porém sujo, rasgado e desorientado quando um grande estrondo se fez por toda ilha.
Seguiu-se um alarme que soou ensurdecendo a todos.
Sean caiu no chão sentindo tudo tremer, e não foi nada metafórico. Ele levantou-se e projetou sua cabeça, para fora da porta da sala a que fora levado, e uma correria desenfreada de oficiais de segurança iniciava-se, com eles armados, pelo corredor de muitas portas agora abertas.
“BRUNO...”, ecoou novamente.
E Sean teve realmente a sensação de ter ouvido o nome do engenheiro de comunicações Dr. Bruno Pierre ser sussurrado. Correu para fora da sala quando muitos oficiais de segurança pareciam não mais se preocupar com sua presença. Alcançou uma porta externa, chegando ao gramado dos jardins externos, onde muitos carrinhos de locomoção estavam sendo desviados. Subiu num vazio se dirigindo para a parte de trás do Complexo A após constatar intensa movimentação.
Os portões de carga e descarga estavam abertos e o alarme soava sem descanso; algo muito ruim ainda acontecia.
Sean desceu do carrinho e o chão voltou a tremer na explosão que reverberou por toda ilha, derrubando tudo o que havia ali. Ele e mais homens ergueram-se do chão, e correram. Sean evitou a grande porta aberta ao ver que alguns oficiais de segurança se postavam nela, armados até o pescoço. Mais homens correndo para todos os lados e ele não imaginava que havia tanta gente militarizada naquela ilha.
“BRUNO...”; sussurravam ao seu ouvido, novamente.
Sean olhou para trás em meio ao caos, e ninguém perto o suficiente para lhe terem falado.
“Estou maluco!”, concluiu.
Ele seguiu para os laboratórios de pesquisas, nos subterrâneos do Complexo A, mais precisamente para os laboratórios subterrâneos do chip Cruzador Solar.
Lá, mais caos se desenhava à sua frente, com muitos homens caídos.
Sean recuou.
Um tiroteio recomeçava um pouco distante, e ele se abaixou, rastejando perante outros, todos fortemente armados. Gritos ouvidos e algumas portas ao seu lado foram sua saída. Sean entrou juntamente com mais dois oficiais de segurança, escapando da terceira explosão que destruiu o corredor.
— Ahhh!!! — Sean foi projetado para longe, jogado para cima de balcões de química, rolando ele, provetas, bastões, condensadores, béquer e pipetas de vidro, que estouravam pela pressão do ar espalhando poeira no ar.
Estava em meio a vidros triturados, não conseguindo enxergar direito, quando um odor de lodo se infiltrou em suas narinas.
“BRUNO...”; sussurravam.
Sean tentou em vão respirar, mas o ar carregado de enxofre o enjoava, provocava tonturas, quando uma quarta explosão chacoalhou as estruturas dos subterrâneos, elevando seu corpo no vácuo criado pela pressão que explodia em sequência tudo que se via pela frente, fazendo uma nuvem colorir o teto, o projetando de novo ao chão com toda força.
— Ahhh... — sentiu suas costas vibrarem pela dor.
Um conhecido oficial de segurança caiu morto aos pés dele, e um pânico o tomou por completo. Sean verificou sua respiração, mas ele estava morto.
“Droga!” Sean se ergueu e se dirigiu para a porta no fim do grande laboratório, com vidros estraçalhados pelo chão e nenhuma janela, agora nenhuma iluminação, quando o gerador foi ativado, falhou logo depois, e tentou voltar a funcionar, com uma rara iluminação se instalando no ambiente.
Sean forçou uma porta emperrada, tentou mais outra que cedeu ao contato, projetando o corpo para dentro no mesmo instante da quinta explosão.
— Ahhh!!! — gritou em meio às migalhas de vidro que lhe cortavam o tecido da calça de moletom vestida do avesso, fazendo seu sangue fazer um rastro.
Sean foi outra vez ao chão, com o supercílio aberto e a vista embaçada. Ergueu-se e correu como pôde tentando atravessar o laboratório até que um corredor interno se seguiu, com a sensação que as paredes se inclinavam.
“A casa...” Sean encarou o corredor que realmente se inclinava.
— Ahhh!!! — e foi lançado contra a parede na sexta explosão, o deixando desacordado.
Sons e gritos se sucederam, Sean achou que estava sonhando em meio a odores incognoscíveis que sentiu quando abriu os olhos, e as paredes vibravam realmente, parecendo querer derrubar-se sobre o laboratório.
Sean deu um jogo de corpo e rastejou-se, tentando se erguer apoiando-se na pia do outro laboratório que alcançara, procurando pelas paredes o interruptor que acendeu, fazendo uma fraca luz iluminar o ambiente, fazendo um ruído elétrico se seguir. Ele se virou tropeçando, e pisou o vidro esmigalhado em cima do corpo do Dr. Piieno morto. Sua garganta havia sido perfurada pelo vidro quebrado, seus olhos, dilacerados, arrancados. Sean vomitou as paredes quando uma mão ensanguentada encostou-se em seu ombro esquerdo e ele olhou para a mão sem se refazer do choque, e um homem de rosto deformado e tomado por sangue, o observava.
— Alpheu? — e Sean o segurou no que o corpo desfigurado caiu no vácuo. — Olhe para mim! — chacoalhava-o sem sucesso. — Socorro!!! Seguranças?! Homem ferido, seguranças?!
“BRUNO...”, sussurravam em meio ao caos e um estampido seco fez Alpheu cair dos seus braços no chão do laboratório.
Sean viu Alpheu baleado e levantou os olhos para o fim do corredor, vendo a arma ainda apontada na sua direção, demonstrando o ato; o Dr. Bruno Pierre acabara de atirar no Comandante Alpheu Smith.
— Bruno... — foi só o que saiu de um Sean em choque, vendo Bruno com a cabeça enfaixada, vestindo-se com trapos de roupas espaciais que se soltavam pelo corpo.
— ÓDIO!
E a exclamação chegou até Sean num tom de voz aterrador, vendo o Dr. Bruno de olhos esbugalhados, indicando um ódio fora do normal.
Os dois se encararam e Sean sentiu que a arma se engatilhava novamente quando tudo se ergueu do chão; vidros, sangue, cadeiras e mesas espedaçadas que amortizaram cada projétil que saiu da arma.
Bruno arregalou os olhos para aquele dom, para o dom de Sean Queise e algo na forma grotesca de um polvo-humano, com braços, com tentáculos saindo do seu rosto se fez atrás de Bruno, o absorvendo.
— Deus... — e Sean não conseguiu dizer mais nada, porque tudo que seus dons paranormais haviam erguido do chão, a fim de protegê-lo, foi lançado longe pelo dom agora daquela coisa monstruosa.
A saliva de Sean Queise mal desceu pela garganta e o polvo-humano, com braços, com tentáculos saindo do seu rosto, se rastejou pelo sangue ainda úmido e vidros quebrados, em sua direção.
— ÓDIO! — a mão de um Bruno absorvido ainda era nítida dentro do polvo-humano, que outra vez ergueu a arma e o gatilho foi acionado.
Mas outra luz forte se mostrou na forma de outro polvo-humano, com longos cabelos negros azulados, num corpo cada vez mais feminino, para então mudar a cor dos cabelos, que se platinavam num loiro conhecido, se enrolando num coque militar, para então também penetrar no corpo de Bruno, e as luzes cegarem Sean Queise.
— Ahhh!!! — quando Sean abriu os olhos não havia mais ninguém ali. — Deus... — soou agora mais nonsense que antes, para então gritos histéricos o fazer voltar à realidade.
Era Nadir quem gritava.
Sean reconheceu a voz fina e estridente da oficial aonde quer que fosse, e correu até onde havia muito material de construção espalhado pelas explosões.
Debaixo dos escombros, o corpo da Dra. Carminna Clemente morta.
Ao lado, Nadir chorando.
17
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de alojamento.
06 de setembro; 06h00min.
— Alguém me deve uma explicação! — falou Sean rapidamente logo que Adriana abriu a porta de seu quarto-sala, se virou e largou a porta aberta.
Nem ele teve coragem de entrar nem ela tampouco o convidou.
Sean havia tomado banho, se vestido, feito curativo e dormido; tudo em total estado de choque.
— Sinto pela Dra. Carminna — foi o que ela disse ao ver Sean a olhar como que vazio. — Sinto mesmo! — ela insistiu.
— Também sinto! — Sean a olhou mais profundamente.
Os olhos de Adriana demonstravam que passara a noite inteira acordada, chorando, quando Sean de repente viu a desordem no quarto-sala dela; cadeiras viradas, roupas arrancadas dos armários jogadas para todos os lados, vidros quebrados, vasos destruídos, fotos rasgadas.
Percebeu serem as suas e engoliu aquilo a seco.
— Vai entrar? — foi fria como de costume.
— Talvez não mereça mesmo explicação alguma.
Adriana seguiu o olhar dele.
— Não fui eu quem rasgou as suas fotos — respondeu Adriana rapidamente, com frieza tamanha.
Ela viu Sean a encarando.
— Prossiga!
— Quando entrei, elas já estavam rasgadas no chão — olhou-o novamente. — Foi Bruno!
Sean tentou compreender.
— Por que ele rasgaria minhas fotos de jornais — olhou para o chão novamente. —, antigos?
— Eu as colecionava, se vai me perguntar — prosseguia Adriana com a mesma voz gélida. Também viu Sean a encarar totalmente confuso. — Coleciono tudo sobre você.
— Eu devia ter medo dessa frase Senhorita?
— Responda você.
— Não! Responda você porque colecionava fotos minhas com minha noiva?
— Ex! Imagino! — Adriana foi má.
— É! Ex! Já que ela se suicidou por causa da Poliu.
— Não trabalho para a Poliu, Sr. Queise. Não entendo por que teima em insistir.
— Você e Bruno?
Ela se sentou na cama bagunçada.
— Já faz algum tempo.
— Para você ‘imagino’ — sorriu irônico. — Porque ele não parece ter se esquecido com a mesma facilidade
— Bruno está fora de controle, Sr. Queise.
— Eu percebi Srta. Adriana. Nós nos encontramos... — não prosseguiu e mudou de assunto. — Conhecia Mr. Trevellis?
— Conheço a Poliu há algum tempo.
— Não sei por que não me assusto com isso — suspirou.
— Vai entrar afinal?
— Vou! — entrou fechando a porta atrás dele. — Afinal! — passou a chave.
— Isso não quer dizer que...
— Acabo de presenciar Oscar nervoso com seu pai — Sean mudou o assunto. —, e Mr. Trevellis tentava apaziguar a discussão — ele esperou Adriana levar um susto. — Devia gargalhar, não é? — ele voltou a olhar em volta. — Porque duvido que Trevellis consiga acalmar Oscar conhecendo-o como eu o conheço.
— Gosta dele, não? — ela viu Sean estancar e sentir que toda a respiração dele modificar. — Gosta de Oscar, Sr. Queise?
— Não entendi a pergunta, Srta. Adriana.
— Gostava da Dra. Carminna, também? Afinal, ela ficou nua para você.
— Onde ouviu...
— “Ouvi”? — ela foi puro fel.
— Não tive nada com ela.
— Não teve nada? — gargalhou.
— Não acho que seja hora de...
— Não disse que dormiu com ela? — insistiu.
Sean sentiu-se ofendido.
— Ela está morta Srta. Adriana. Tenho respeito pelos...
— Vai continuar parado no meio do quarto? — Adriana cortou a melancolia dele.
Sean nada falou e Adriana limpou uns trapos que tinham em cima de uma cadeira e a ofereceu. Ele sentou-se extremamente irritado com ela, com a vida, e mais com ela que com a vida.
— Já sabe que o Dr. Ítalo também está morto, Senhorita?
— Tenente-coronel Adriana! — corrigiu-o vendo ele não gostar da correção. — Sim. Dr. Ítalo Piieno está morto. E como ficamos?
— Diga-me você, ‘Tenente-Coronel Adriana’. Diga-me como Bruno conseguiu?
— Quem disse que foi Bruno? — ela se arrumou na cadeira como quem tentava se sentir confortável. E era uma situação difícil de alcançar. — Inferno! — explodiu. — Bruno odiava o Dr. Ítalo por ser o idealizador do chip de Codinome: Cruzador Solar.
— “Idealizador”? Foi ele mesmo quem o inventou? — ele viu que Adriana pensou algo, e não gostou do que chegou até ele. — O que foi realmente encontrado em 1947, em Socorro, a 226.87 km de Roswell Tenente-coronel Adriana? — e Adriana o fuzilou. — Ou devia perguntar, o que foi realmente encontrado em 1975, no Deserto de Karakum, no Turcomenistão, além da tectita, Tenente-coronel Adriana?
— Não sei...
— Ora vamos, Adriana! — foi a vez dele explodir, se erguendo do que restou da cadeira oferecida. — A Dra. Carminna está morta e não pode me responder.
— E você acha que vai ter que dormir comigo para lhe contar?
— Não sei. Vou?
— Não estou gostando desse assunto Sr. Queise.
— Então me diga ‘de graça’ como poderia haver tectita no espaço para se chocar com Spartacus? De onde vieram as tectitas? Onde elas sofreram derretimento? Entre Marte e Júpiter?
— Você... — e Adriana realmente ficou sem fala. Não tinha mais para onde fugir. Sentiu sua compostura desabar. — Falou com Mr. Trevellis?
— Não costumo falar com ele.
— Falou com Oscar?
— Ele não me responderia. E eu não me atreveria penetrar sua mente, Senhorita Tenente-coronel.
— Então como... — e parou porque sabia que ele sabia que ela sabia sobre Mona. — Conhece Karakum? — foi só o que Adriana falou.
— Dos livros de geografia?
— Não brinque Sr. Queise.
— Acha que brinco então?
— Agentes da Poliu encontraram curiosas formações geológicas, espalhadas por quase toda a face do nosso planeta, notadamente naquelas regiões onde os livros sagrados e tradicionais indicam ter havido confrontos e grandes batalhas entre ‘deuses’ — Adriana sorriu-lhe de uma forma que Sean decifrou como desafiadora. — Isso! Grandes batalhas, grandes desastres. Caos e desordem!
— Traduza ‘Agentes da Poliu’?
— Sabe a tradução, Sr. Queise. Espiões psíquicos, vestindo ternos pretos, treinados para se comunicar com alienígenas. E me parece que todos nós lemos os livros da Dra. Carminna, porque me parece que todos nós mentimos um pouco — Adriana viu Sean erguer o sobrolho. —, porque o livro da Doutora era a descoberta que a Poliu precisava, para ligar a tectita de Karakum ao planeta desaparecido.
— “Planeta desaparecido”? Está falando das inscrições dos sumérios sobre o Planeta X ou Nibiru que explodiu no contato com Tiamat?
— Sim, a maior parte dessa teoria sobre a explosão de Tiamat fundamenta-se em tectitas encontradas na Austrália, Filipinas e Tchecoslováquia. Os cientistas consideravam que apenas uma enorme explosão, seria capaz de produzi-las e arremessá-las à Terra, mas não foram encontradas até então.
— Até então…
— Sim! Soubemos que os cientistas soviéticos ficaram encorajados pela descoberta do que chamavam de ‘Planeta fantasma’. A tese de Aleksander Zavaritsky de que a vida em Phaeton era semelhante à terrestre, dentro de nossos limites de calor, água, densidade do ar e conteúdo de oxigênio deflagrou uma série de ideias, que talvez a vida lá tenha produzido humanoides semelhantes à forma humana.
— Mas a importância de se trazer Carminna aqui foi além, não?
— Sim! Foi!
— Porque encontraram tábuas de argila Suméria lá também, em Karakum, junto às tectitas.
— Gostei do ‘lá também’, Sr. Queise, porque já vi que sabe que houve uma queda de UFO em Karakum tal qual Socorro e Roswell — Adriana mantinha o ar gélido. — Só não esperávamos que a Dra. Carminna morresse tão prematuramente antes de dizer-nos se as tábuas que estavam com os alienígenas diziam se voltariam.
— Mas morrer ‘prematuramente’, não foi.
— Não foi?
— O que Adriana? Alguém não obedeceu às suas ordens, já que ainda não haviam conseguido arrancar dela, as respostas que queriam antes de matá-la.
— Ninguém pensava em matar ninguém Sr. Queise. Só disse que não conseguimos arrancar nada dela, porque como percebeu, a Doutora não pareceu ter tido química com nenhum de nossos outros cientistas — sorriu para ele. —, até agora — viu o olhar dele.
Sean não gostou de ouvir sobre uma Carminna nua, contando sobre suas aulas sobre os sumérios, nem que outros cientistas tenham tentado algo com ela.
— Os sumérios diziam que Tiamat, que possuía uma estranha forma de um ‘8’... — ele tentou reaver o fio condutor da conversa. —, explodiu criando a Terra e a Lua, e os arremessando do quinto lugar para o terceiro lugar, onde orbitamos agora.
— Ou pode realmente ser que a Terra já existisse, e Tiamat foi arremessada para cá com o choque de Nibiru, arrancando um pedaço de uma Terra em evolução, que formou a Lua, se desintegrou se reintegrando à Tiamat, aniquilando os dinossauros de Tiamat no choque.
— Wow! — Sean ficou extasiado, Adriana parecia estar falando sério, não mais fazendo comentários ácidos sobre o trabalho da agora morta, Carminna. — E o resto de Tiamat é hoje o cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter, que os sumérios chamavam de Ceres, para onde o ônibus espacial experimental nos levava.
— O que também de certa forma explicaria a extinção de quase todos os dinossauros, que viviam com outro tipo de força de gravidade, com outro tipo e nível de oxigênio — ela o viu erguer o sobrolho.
Sean estava mesmo extasiado com o que ouviu. Aquilo lhe parecia realmente possível.
— Isso reforça que os dinossauros foram mortos, em grande parte pela explosão de algo que se chocou com uma Terra primitiva — olhou-a. — E acredita nisso? — desafiou-a.
— O quê Sr. Queise? Não posso divagar de vez em quando? Ou saberia explicar então como um pterodátilo alçava voo na nossa força de gravidade? Espécies dos ares Jurássicos como Arqueoptérix, Dimorfodonte, Laopteryx, Pterodátilo e Ranforrinco, e dos ares cretaceanos como os Baptornis, Dzungaripterus e o Pterossauro, que tinham quase 100 quilos de peso e 12 metros de envergadura.
E Adriana trocou de pernas como Carminna uma vez fizera.
— Wow! — escapou dele. — Alguns cientistas dizem que os pterodátilos com asas de envergadura voavam morro abaixo. Como hoje fazemos com as asas-deltas e os parapentes.
— Mas eles não conseguiriam alçar voo do chão, Sr. Queise. Se os pterodátilos ou pterenodontes só voassem morro abaixo, como faziam para ir morros acima com aquelas asas descomunais dobradas sob o corpo? Se fizermos os cálculos, me parece que para poder se mover sobre a Terra, um animal de mais de cinco toneladas precisaria ter quatro pernas de quase um metro de diâmetro. Ou naquela época a força de gravidade era menor?
— Não sei dizer. A Terra teria que perder uma massa igual a da Lua para diminuir em 1,6 a gravidade da Terra, e se a densidade da atmosfera fosse muita alta, os animais iriam poder nadar nela. Droga!
— A influência da gravidade entre os dois corpos é proporcional às massas dos corpos, Sr. Queise, mas é inversamente proporcional ao quadrado das distâncias entre eles.
— Wow! Isso significa que a atração gravitacional do Sol diminuiu rapidamente com a distância, com um Planeta Tiamat agora mais próximo do Sol — Sean riu das suas próprias ideias. — E se Nêmeses ou Nibiru chocou-se com Tiamat onde dinossauros existiam por causa da gravidade, os dinossauros que não morreram no choque acabaram morrendo pelas consequências.
— Cientistas dizem que os próprios pterodátilos não eram dinossauros. Os verdadeiros pássaros evoluíram dos dinossauros. Não se sabe ao certo que tipo de criatura eles eram, mas não são os tatatatatataravôs das nossas aves. Talvez os pterodátilos fossem aves de Tiamat que foram trazidas para cá.
— Teriam morrido na reentrada. Isso afeta a Teoria da panspermia, também.
— Não sei o que dizer sobre isso, mas o que matou o resto dos dinossauros foi a força da gravidade que aumentou na mudança de posição da nova Terra — e Adriana se aproximou tanto de Sean que o perfume dela invadiu-o. —, não permitindo que eles se locomovessem que fossem atrás de comida, ou fugissem dos pequenos raptores, que mataram os grandes, simplesmente por que não podiam fugir — e Adriana quis beijá-lo.
Aquilo Sean também pegou no ‘ar’.
— Como sabe sobre isso? Teóricos da conspiração?
— Não! Carminna conseguiu traduzir uma das sentenças da tábua, que dizia que os Anunnakis contaram aos sumérios que haviam danificado a atmosfera de seu planeta — e se afastou dele. — Não dizem como isso aconteceu, mas que precisavam de outro planeta e de outros materiais para restaurá-la.
Sean ficou alerta do porque não descobrir aquilo em Adriana, antes. Ela de repente parecia acreditar em Carminna, talvez até tenha tido envolvimento com suas pesquisas, com seus livros.
“Escrevi três livros com minha colaboradora sobre os sumérios e sua ligação com o Cosmo...”; Sean olhou Adriana com afinco.
“Colaboradora?”
— Por que a Poliu mantém contato com um colisteiro de apelido ‘Fim do mundo’, Adriana?
Adriana demorou outra vez para responder. Sean havia mudado a linha de seu pensamento muito rápido.
E ela ficou pensando se talvez quando pensava nele, algo escapava de seu controle.
— Eu não sei...
— Sabe por que Bruno estava vestindo roupas espaciais quando matou Alpheu? — agora Sean viu Adriana calar-se de vez. — Porque eu vi Bruno matar Alpheu com um tiro — a Tenente-Coronel Adriana ainda nada falava. — E uma vez me disse que Bruno não era a pessoa mais adequada para receber o chip — e o silêncio. — Então por que persistiu, Adriana?
— Só sei que ele me odeia. Pode fazer uma ideia, não? — desconversou ao mostrar o quarto-sala com mãos tremulas se pondo a chorar novamente.
— E isso te afeta?
Adriana o encarou em meio às lágrimas. E pareciam ser verdadeiras.
— Passei muito tempo da minha vida sendo odiada; não gosto dessa sensação.
— “Odiada”?
— Tenho pena de Bruno, está bem? Ele era fraco, eu sempre fui contra. Meus relatórios não foram considerados, está bem? Ninguém escutava quando eu dizia que ele era um depressivo, ninguém me...
— Bruno escapou Adriana.
— O quê?! — gritou erguendo-se. — Isso não pode ser! Não compreende? Todos correm perigo!
— Todos quem?
Adriana ia falar; se segurou.
— Para onde Bruno foi Sr. Queise?
— Não sei. Ele matou o piloto do jato de Oscar e fugiu sumindo do radar. A Sala de Controle Ala Cinco chamou a Poliu, o resto dela — Sean a desafiou.
— Já disse que não sou...
— Se é ou não é não me interessa! Mas se prepare Adriana, porque seus subordinados vão ter trabalho por um bom tempo para colocar essa bagunça em ordem — e foi a sua vez de se aproximar dela. — E você... — ele viu Adriana de muito perto. —, mesmo achando que minha parte não terminou, minha parte terminou com Spartacus — se afastou ameaçando sair do quarto-sala dela.
— Não acabamos aqui Sr. Queise.
— Eu acabei! Fiz o que pude e o que eu sabia, e acho que o que não sabia, eu fiz também — Sean virou-se e saiu sem que ela o detivesse, torcendo, porém que ela o brecasse.
E Sean correu até seu quarto-sala, jogou um pouco de roupa numa mochila e resgatou seu notebook na casa de máquina da banheira. Tudo tão rápido que só respirou quando alcançou o corredor e se lançou escada abaixo torcendo mesmo, que com a confusão, o sistema de câmeras estivesse danificado. Alcançou o quarto da Dra. Hanna Cahs que mal percebeu a porta ser aberta, fechada e Sean estava lá, a encarando, com uma mochila nas costas.
— Não o vi... — Hanna usando uma peruca colorida olhou a porta fechada e a mochila dele. — Vai viajar Sr. Queise?
— Você vai? — devolveu o olhar para a mala aberta e roupas jogadas dentro. Não sou mais importante para a Sala de Controle Ala Cinco.
Mas já foi importante não? A ponto de receber uma advertência de General Arthur pela confusão com a Tenente-Coronel Adriana e ainda continuar aqui.
— Como soube sobre isso? Nem Adriana nem Arthur falariam — riu. — Eles não teriam coragem de assumir tal erro.
— Que erro?
— O implante de um chip à base de DNA depende de bactérias para transferir uma parte de DNA para outro genoma, algo que já foi comprovado ser tão arriscado quanto realizar esta transferência por cruzamento de espécies.
— Wow! Cruzamento? — olhou em volta zonzo. — Wow!
E Sean sabia que deixara escapar algo, um Bruno Pierre híbrido.
— Mesmo os mais avançados computadores não conseguem superar a sofisticação do cérebro humano, Sr. Queise. Estas máquinas funcionam de forma linear, transferindo informação entre chips e um processador central por meio de uma rede. Já um cérebro funciona de forma totalmente interconectada, com uma densidade de conexões que superam em muito a de um computador, mesmo um Computer Co..
— Arthur não deixou nem você nem o Dr. Ítalo estudar o chip, não é?
— Venho estudando chips neumórficos, que simulam a arquitetura cerebral e aumentam exponencialmente a capacidade de um computador processar informações e reagir, mas nada os interessaram.
— Eu sinto muito pelo Dr. Ítalo... — Sean não demorou a falar, e ela só afastou a franja da peruca colorida dos olhos molhados. —, mas gostaria de saber o porquê de Bruno o matar.
— Bruno o matou? — Hanna mal acreditou no que ouviu.
— É a segunda pessoa que duvida disso.
— Oh… Então o que o Dr. Zhu disse sobre Bruno… Então… — e encarou Sean. — Bruno foi uma péssima escolha, sofrendo de repetidas depressões — ela completou.
— Todos sabiam que Bruno é um híbrido?
E Hanna pensou duas vezes sobre o que ia responder.
— Não… A menina Nadir já havia sido preparada quando descobriram isso. Uma equipe da Poliu então foi chamada a fim de analisar a possibilidade do DNA alienígena de Bruno ser compatível com o chip, como se os alienígenas fossem uma coisa só. Adriana, Arthur e Ítalo concordavam que seria arriscado tal escolha, mas aquele metido do Henrique dava as cartas finais.
— E Henrique Loyola é sinônimo de Poliu, não é? — falou irritado.
— Não sei do que fala — terminou a Dra. Hanna Cahs dando de ombros, apagando o cigarro que acabara de acender com mãos trêmulas. — E eu sempre disse que precisávamos alguém de pulso firme, alguém corajoso, decidido, audacioso.
— Não acha que explodir uma ilha e arrancar os olhos de um homem requer um pouco de audácia, Doutora? — perguntou Sean com ironia.
— Não é Bruno, é o chip Cruzador Solar.
— O chip?
— As fraquezas humanas ainda serão as mesmas, a parte humana de Bruno, mas as decisões são tomadas pelo chip.
— Está dizendo que um chip de DNA quis explodir a Sala de Controle Ala Cinco?
— Não compreende mesmo, Sr. Queise? A maneira como foi encontrado no Deserto de Karakum? Como a Poliu lidou com ele?
— Me diga uma coisa... Quando nós trouxemos o chip à Terra, os mainframes lá embaixo foram ativados?
Hanna gargalhou.
— Está querendo saber se retiramos todas as informações do chip Cruzador Solar antes de instalarmos em Bruno? — Hanna se ergueu.
— Quer que eu acredite que colocaram um chip de DNA alienígena, contendo toda a sabedoria adquirida nesses milhares de anos, esperando que Bruno acordasse um belo dia e contasse tudo a todos?
— Como sabe que o chip... — e parou de falar outra vez.
Ela sabia como ele sabia, ficou temerosa que a Poliu a culpasse por não fechar sua mente, mas percebeu que Sean lia mentes numa velocidade assustadora. Contudo Sean se virou e saiu do quarto da Dra. Hanna Cahs tão sorrateiro quanto entrou; não se utilizando das mãos para abrir e fechar nada.
Desceu até o térreo, acessou as escadas, se dirigiu aos laboratórios abaixo do Complexo A e avistou Mr. Trevellis em meio aos seus homens lotados de curativos. A ideia de Nadir, uma espiã ‘desclassificada’ sendo preparada há muito tempo o alertou outra vez; a Poliu estava envolvida na queda do UFO em Roswell, provável, dias antes em Socorro.
Sean não pensou duas vezes quando saiu correndo a se lançar sobre ele. Oscar o viu de longe, mal tendo tempo de segurá-lo e Sean Queise desfechou uma direita certeira no queixo quadrado do homem forte da Poliu.
Mr. Trevellis caiu atordoado.
Quando Mr. Trevellis olhou para cima, Sean estava sendo contido pelos seguranças à sua volta.
— Você sabia que o General Arthur La Hera vinha preparando Nadir para que ficasse sob o controle dele, não sabia Trevellis?! — berrava ele descontrolado.
— Chega Sean! — Oscar foi categórico quando os alcançou.
Oscar gritava com Sean algo que Mr. Trevellis não conseguia entender de imediato, porque toda sua mandíbula latejava.
— Você não podia ficar nas mãos do General Arthur, não é Trevellis?! — berrava Sean outra vez.
Mr. Trevellis enfim conseguiu ouvir a voz dele.
— Chega Sean! — Oscar viu que Sean tinha uma mochila cheia nas costas, e deu ordens aos oficiais de segurança para o soltarem.
— Chega? Chega? — mas Sean encarava Oscar Roldman. — Não entende? Trevellis não podia ver Adriana e Nadir estarem nas mãos de um desertor! — exclamava com a mão forte de Oscar o pressionando. — Está me machucando! — tentou largar-se das mãos dele.
— Quer morrer, não quer? — Oscar olhou no fundo de seus olhos. — Não quer Sean?! — gritou Oscar paralisando o passo, nervoso e oficiais de segurança voltaram para cima de Sean por ordem de Mr. Trevellis. — Chega Trevellis! — Oscar se virou para ele e viu Mr. Trevellis querendo fazer Sean sentir dor. Mas Sean empurrava, socava, e dois oficiais de segurança o seguraram com mais força. — Chega! — Oscar exclamou e tudo saiu do chão e voltou a ele com seguranças paralisados, sem conseguir respirar.
Todos pararam e até Mr. Trevellis no chão, mal se moveu.
— Vai matá-los sem oxigênio Oscar amigo velho — foi só o que disse
Oscar arrastou Sean como uma criança para fora do corredor, e os seguranças caíram desmaiados pela hipóxia cerebral.
— Wow! — Sean era praticamente empurrado para fora do Complexo A, para os jardins. — Vai me ensinar o truque? — Sean era uma criança nas mãos do pai firme e controlador. — Sabe que isso é perigoso, não é? — mas ele nada ouvia. — Estudos médicos relatam que a redução do teor de oxigênio leva a perda da memória de curto e longo prazo, cegueira parcial, temporária ou permanente, incapacidade mental, além…
— Chega! — Oscar o largou fazendo o corpo dele balançar no ato.
Alguns helicópteros de grande porte estavam no gramado recolhendo feridos e corpos para levarem a hospitais, a outras ilhas próximas. Oscar o deixou sozinho e se aproximou de oficiais de segurança dando uma ordem fechada; Sean foi colocado num deles sendo enviado para o Brasil como um pacote de entrega.
Ele sabia que Oscar sabia que ele já tinha o que precisava na mochila; seu notebook.
Mas não foi para o Brasil que Sean se dirigiu. Numa manobra, Sean fez dois oficiais de segurança desmaiarem por falta de oxigenação, afinal ele era um Roldman. Depois fez três oficiais de segurança feridos em macas, sentirem que seus lábios foram colados, e fez o piloto e copiloto se transformarem numa espécie de zumbi, controlado pela mente de um Sean Queise, que afinal era um Roldman, escapando ao controle no que o helicóptero o deixou no aeroporto de Jacarta, em Java, sem que lembrassem onde estiveram onde deixaram Sean, com todas as coordenadas de Spartacus que o seguia, embaralhadas; afinal, ele era um Roldman.
Mas aquele Oscar Roldman ficou mais que furioso ao saber das atitudes inconsequentes de seu filho. Ainda mais quando precisou dar satisfações do paradeiro dele para Nelma e Fernando Queise.
Oscar odiou sua educação mimada.
Já Sean não se achava tão mimado assim, era um adulto tomando decisões adultas, o levando a fazer uma visita estratégica, se realmente queria entender tudo aquilo.
Voou de Jacarta para Los Angeles, Califórnia.
18
Jet Propulsion Laboratory, Pasadena; Los Angeles; Califórnia.
34° 11’ 58” N e 118° 10’ 28” W.
07 de setembro; 15h55min.
O tempo ruim ameaçava outra vez uma nova onda de chuvas e ventos, para o fim da tarde em que Sean Queise chegou ao JPL, Jet Propulsion Laboratory, em Pasadena, Califórnia; administrado pela Caltech, seguido por Spartacus.
— Bom tarde! Conversei com vocês ontem pelo telefone e o Dr. Lawrence Pagni me espera. Meu nome é Sean Queise, da Computer Co. do Brasil.
— O Dr. Lawrence Pagni o espera, Sr. Sean Queise. Por favor, me acompanhe até a sala de reuniões. Ele já irá encontrá-lo.
O corredor que se seguiu era de granito amarelo, pé-direito alto e suntuoso; o Jet Propulsion era um marco nas atividades espaciais. De lá saíram os mais avançados satélites de observações do mundo. Muitas peças de Spartacus foram confeccionadas no Jet Propulsion, e também de lá saíram os ônibus espaciais, inclusive o experimental em que viajou, e que Sean tinha certeza pertencer a corporação de inteligência chamada Poliu.
Uma sala revestida de carvalho americano, com algumas poltronas de couro amarelo desbotado, encostadas na parede do fundo, e ele se afundou em uma delas, só se levantando quando um simpático Senhor chegou.
Sua idade beirava os oitenta anos.
Lawrence Pagni, fora professor de física nuclear na turma de Oscar Roldman quando ainda fazia parte da Poliu, agora desligado da corporação.
— Que prazer, Sean. Oscar falava muito de você; bastante até — o Dr. Lawrence Pagni piscou e Sean sorriu sem graça vendo como fora chamado, e da piscadela dada. Suas dúvidas quanto Oscar querer ter sido o pai que lhe criaria, se afloraram naquele instante. — Oscar me ligou pela manhã cedinho.
— Oscar ligou? Deus! O que escapa dele? — Sean fez uma careta. — Mas estou aqui por outro motivo, acredito. Quero saber por que o Dr. Yàn Zhu mandou-me vê-lo, Dr. Pagni.
— Eh! Conheço Zhu há certo tempo. Ele ainda trabalha para a Poliu? — ele viu o sorriso enigmático dele. — Essa informação não lhe espantou?
Sean voltou a sorrir.
— Não se preocupe Dr. Pagni, nada mais me espanta. Não depois das aulas de assiriologia que tive — riu consigo mesmo.
— Eh! Zhu sabe muito a meu respeito. Sabe, por exemplo, que em 1947 eu estava na Poliu como um ‘jovem promissor’, quando Mr. Hawgths, chefe de operações da Poliu na época, me procurou sobre implantes encontrados em Socorro, Novo México. Ele e sua equipe de assiriólogos, químicos e matemáticos estavam atrás de algum funcionário da corporação que compreendesse um pouco de implantes alienígenas, e eu já tinha uma adiantada pesquisa nessa área.
— “Socorro”? Assiriólogos em Socorro? 1947? — por essa, Sean não esperava.
— Eh! O Dr. Jèsus Miranda Clemente era o chefe capacitado na época.
— ‘Jèsus Miranda Clemente’, pai de Carminna Clemente... Não, nada mais me espanta — riu. — Mas eu pensei que o chip de Codinome: Cruzador Solar tinha sido encontrado em Karakum?
— O primeiro chip de DNA foi encontrado na queda de um UFO em Socorro, Novo México, em 01 de Junho de 1947. O segundo foi encontrado em Karakum, na Rússia, em 1975 em meio a algumas tectitas, e não se sabe quando caiu lá. E fui eu, inclusive, quem ajudou a Poliu a colocar o chip Cruzador Solar no satélite Spartacus.
— Então são dois chips? — olhou para os lados. — O que me pode dizer sobre o chip Cruzador Solar encontrado em Socorro, nesses escombros da queda de UFO, Dr. Pagni?
— Em 1947, Mr. Hawgths era o gerente de operações da Poliu que encontrou, após uma relatada queda de aeronave, na cidade de Socorro, alguns artefatos em meio ao que se dizia ser um UFO, um disco voador, caído. Em meios a esses artefatos, foi encontrado quatro corpos; três mortos e um ainda vivo, que também dizem, era uma espécie de engenheiro de comunicações, e que ensinara coisas incríveis. Mas o mais incrível foi encontrarem nos três corpos mortos, implantes.
— Que tipo de implantes?
— Na época, os estudos sobre o DNA engatinhavam, e nada sabiam sobre o que era aquilo, que tinha a aparência de chips modernos. Logo depois, quando houve nova queda de aeronave, dessa vez em Roswell, nenhum corpo com chips implantados foi encontrado.
— A Poliu esteve em Roswell também?
— Eh! Em meio a aqueles que acharam muito e esconderam tudo — Dr. Pagni achou graça de sua própria graça. Ele viu Sean voltar a observá-lo. — Claro que Mr. Trevellis nem era nascido ou nascia nesse tempo; Mr. Hawgths era o chefe de operações na época. Mas muita coisa que a Poliu tem hoje, foi aperfeiçoada dessas peças.
Sean teve medo do que ouviu.
— Na lista de artefatos encontrados em Socorro ou no rancho de Brazel, também incluíam tábuas de argila?
Dr. Pagni percebeu que Sean era antenado com seu tempo.
— Por que disse ‘também’, Sean?
— Arthur temia que eu soubesse que a Dra. Carminna fora levada a Sala de Controle Ala Cinco, para estudar tábuas de argila suméria, encontradas em ‘queda de aeronaves’, provável em quedas em que seu pai, Jèsus Miranda Clemente, participou.
— E o que o Coronel Arthur temia?
— Fala como se o conhecesse bem para saber que ele temia mais coisa... — Sean viu o Dr. Pagni fazer uma cara engraçada, nada comentou. — Carminna me disse que uma tábua de argila, também foi encontrada em Karakum, em 1975, provável com as tectitas e um chip do tipo moderno. Agora percebo que ela foi instruída a mentir.
— E ela mentiu?
Sean riu.
— Sabe que não posso invadir mentes de gente preparada pela Poliu, não?
Dr. Pagni se aproximou dele.
— Fui incluído nessa lista?
— Foi?
Dr. Pagni apenas sorriu e voltou a encostar-se à poltrona.
— Fale-me sobre essa tábua encontrada em Karakum, Sean.
— Não a vi! Carminna contou-me que alienígenas chamados de Anunnakis pelos sumérios, vieram a Terra e aqui criaram por engenharia genética, um povo de polvos-humanos, com forças sobrenaturais que acabaram por não servir aos propósitos dos Anunnakis, que então, em uma segunda tentativa, criaram o que somos hoje; humanos sapiens sapiens. E que esses Anunnakis foram embora, levando tais aberrações de polvos-humanos, que ainda se comunicavam com alguns humanos sapiens sapiens por telepatia. Mas que ao voltar ao planeta de origem, ou não tão de origem assim, também foram considerados aberrações, produtos de engenharia genética alienígena e acabaram sendo escravizados — Sean viu que Pagni nada deixava transparecer. — Minha questão é... O que está acontecendo com a Poliu para precisar de todos aqueles especialistas da Sala de Controle Ala Cinco, numa ilha secreta da Polícia Mundial, se tudo isso me parece mais mito que ficção científica? — Sean prosseguiu no que Pagni só riu. — E por que há uma pasta intitulada ‘Fim do mundo’ sobre tectitas, em que um demente que também se intitula como ‘Fim do mundo’, lança fotos nas listas de ufologia sobre UFOs no Sol?
— Você também tem recebido fotos via e-mail? — viu o efeito.
— “Também”? O que está tentando me dizer Dr. Pagni?
— Nêmeses, o Sol negro? — os olhos de Pagni brilharam de entusiasmo. — Eh! Para os escatológicos, que acreditam no fim do mundo, Nêmeses seria uma estrela escura, hipotética obviamente, companheira do nosso Sol, e que a cada 30 milhões de anos passaria através da nuvem de Oort, perturbando-a de tal forma, que cometas e todo tipo de meteoros que lá existem, seriam disparados para dentro do Sistema Solar. Estes poderiam então colidir com a Terra, e deste modo, Nêmeses, talvez fosse a responsável — e Pagni viu que Sean fez uma careta como se algo explodisse por dentro.
— Provocando extinções em massa periódicas como o dilúvio, Sodoma e Gomorra, com tectitas encontradas nos locais... Droga! O medo hobbesiano me assola, Doutor.
— Hobbes e seu medo da guerra. Guerras que travamos em buscas da paz, não Sean?
— Em busca da paz... — ficou no ar. — Diga-me Doutor, este objeto no Sol, jamais foi detectado ou provado existir?
— Existem astrônomos que pensam que a órbita sugerida para Nêmeses, seria demasiada instável para permitir que a estrela regressasse tantas vezes. Embora, creem que Nêmeses ou ‘estrela da morte’, se algum dia chegou a existir, deve ter desaparecido no espaço profundo há muito tempo, ou foi despedaçada pelo Sol.
— Ou ela vive no Sol, não Doutor? UFOs em forma de planetas que abastecem suas naves de energia solar — riu dele próprio. — E já que até hoje muitos imaginam erroneamente nove planetas em órbitas circulares, igualmente distribuídas sobre um plano imaginário, com o Sol no centro, então...
— É verdade, Sean, nem todos percebem que o Sistema Solar é um conjunto intrincado de planetas, satélites, cometas, asteroides e uma vasta quantidade de pequenas partículas, em órbitas mais ou menos elípticas, pouco estáveis, com as mais diversas inclinações umas em relação às outras.
— “Grandes batalhas, grandes desastres. Caos e desordem!” — Sean falou em voz alta lembrando-se do que Adriana falara.
Lawrence Pagni se alertou com aquilo.
— Por que se arrisca assim Sean?
— Já me perguntaram isso — sorriu entendendo o recado.
— Você é tão jovem, Sean, não devia bater de frente com a Poliu, não sozinho.
— Não estou sozinho, Doutor. Nem eles me acharam jovem quando me fizeram construir Spartacus, não me acharam jovem quando me fizeram assumir a Computer Co., e não me acharam jovem quando me levaram até aquela ilha secreta na Indonésia, Doutor, se não acreditassem na minha idade, não é?
— “Eles”? A Poliu querendo seu trabalho? — no fundo Pagni sabia que Mr. Trevellis era esperto o suficiente para saber que Sean tinha algo em potencial. — Seu pai sabe disso?
— Qual deles?
E o Dr. Pagni sorriu já não tão confortável assim.
— Fernando Queise sabe que trabalha para a Poliu?
— Não trabalho para a Poliu, mesmo meu pai Fernando Queise, sempre querendo — e Sean viu o espanto nele. — Assustado com a inversão de valores? Porque minha mãe pagava aulas de Krav maga, para que eu fosse um agente do meu outro pai, Oscar Roldman.
E a face do velho Dr. Lawrence Pagni se iluminou. E foi pela iluminação de um não tão jovem assim, Sean Queise, que sabia onde pisava.
— Eh! Está bem! Vamos em frente, Sean, porque quero saber por que acha que a Poliu tem pastas confidenciais sobre tectitas? — mudou o assunto.
— Mas não são as tectitas que interessam a Poliu, elas só provam que algo entra e sai de órbitas carregando material, e aquecendo-o. O foco deve ser outro, só não descobri ainda qual. E o foco todo se concentra em 1947, junto a uma tábua suméria que fala mais do que fala, junto um chip de DNA que provável também estava implantando num cérebro que não era alienígena.
— Um chip implantado em um cérebro humano, em 1947, encontrado num acidente de UFO? E conseguiu essa informação...
— Não acreditaria no tipo de caçador de informações no qual me tornei, Doutor.
— Entendo! — o Dr. Pagni o observava com interesse.
— Dizem nas Listas de Ufologia que frequento, que alienígenas que caíram em Roswell eram do tipo grey; pequeno, cinzento, de olhos repuxados. Mas houve duas quedas em 1947, e portanto outros corpos alienígenas encontrado em Socorro. Se você trabalhava na Poliu, chegou a ver como eram?
— Seres com seis dedos nas mãos e pés, nariz e orelhas pequenas, braços com comprimento proporcionais ao corpo, com aparência mais humana, se me entende.
Sean esperava outra resposta, ficou um tanto decepcionado. Esperou mesmo que ele fosse falar algo sobre um Cthulhu.
— Deixaram você participar da tão famosa ‘autópsia’?
— Não, nada se falou depois da queda. Até os jornais foram silenciados — Pagni apenas sorriu. — A Poliu, você sabe, não? Nada se sabe, não é?
— Conheço bem o ‘nada se sabe’.
Ambos riram.
— Mas fiquei sabendo que um homem que se identificou como Jack Barnett, filmou a autópsia, e que especialistas dizem que os 22 rolos de filmagem são verídicos.
— Já foi a Bali, Dr. Pagni? — Sean viu que aquilo alertou o Dr. Pagni, e não foi a troca de assunto. — Já foi a Bali para saber que todo esse tempo estivemos enganados? Que seitas escatológicas espalhadas pelo mundo não estiveram totalmente erradas?
O Dr. Pagni se recostou na poltrona, sentindo-se cansado. Sabia que Sean não desistiria.
Teve medo, e era um medo da guerra.
— Consta sobre Nibiru, Sean, que ele foi desviado de um sistema binário e capturado pela gravidade de nosso Sol. Esse tal Planeta X/Nêmeses/Nibiru viajou em nosso Sistema Solar, abaixo da elíptica, passando por Netuno e Urano. Como seu campo magnético era muito intenso, ele deslocou Urano para seu lado quando passou por ele, e veio a colidir com um planeta fantasma, chamado pelos sumérios por Tiamat, entre Marte e Júpiter, que se deslocou até atingir um protoplaneta, a Terra — Pagni disparou a falar.
— Estudos recentes das sete amostras de rochas trazidas pelas missões Apollo 12, 15 e 17, com rochas vulcânicas do manto terrestre, constataram que todos os isótopos de oxigênio encontrados nas amostras vindas da Lua são exatamente os mesmos que existem na Terra, corroborando o violento impacto de um hipotético planeta contra a Terra há 4.5 bilhões, que de tão intenso, fundiu as duas massas em um único objeto. A parte ejetada resultou em uma bolha de magma que posteriormente deu origem à Lua.
— Sei que parece fantástico demais para ser considerada verdade, mas se tais seitas escatológicas que acreditam no fim do mundo estiverem certas, então devíamos nos preparar para uma nova reentrada de Planeta X/Nêmeses/Nibiru — se inclinou e encarou Sean. — Você disse a Oscar que a alienígena de luz branca é um polvo-humano? Com braços?
— A Dra. Carminna falou sobre o Cthulhu de H. P. Lovecraft, algo meio humano com tentáculos de polvo. Mas quando fui ao espaço, a alienígena de luz branca entrou no meu corpo, como fez com Bruno e eu passei a ver Sandy, minha noiva morta — Sean leu mais na mente de Pagni, ele achava aquilo tudo muito inusitado. — Acredito que os dados de Spartacus que falavam em atividades plasmáticas, estavam se referindo a presença da alienígena de luz branca se materializando quando algo se chocou com Spartacus. E acredito que a tal tectita era na verdade essa alienígena plasmada que ‘conversou’ com o chip alienígena.
— Então não houve tectitas se chocando com o satélite de observação?
— Não!
— Eh! A palavra plasma vem do grego ‘formação ou modelação’. A aurora boreal é um exemplo de plasma de baixa temperatura e baixa densidade.
— Auroras criadas por HAARP, não?
Agora Pagni se ergueu, com todo corpo e idade. Sean foi obrigado a levantar-se sabendo que o assunto terminara, que ele tocara em algo muito maior que o Dr. Lawrence Pagni estava proposto a falar.
Sean sorriu, pegou a mochila com seus pertences e foi embora de Pasadena sem ouvir a resposta. E nunca mais ia tornar a vê-lo. O corpo do cientista foi encontrado afogado na banheira de seu apartamento naquela mesma noite.
O laudo que saiu logo após o corpo ser encontrado pela empregada, dera como sua morte, enfarto fulminante.
Oscar localizou Sean pelo telefone celular, pediu que ele fosse a Miami, Flórida. O esperava na suíte 55 do Miami Biltmore Country Club.
Precisavam conversar; e muito.
19
Miami Biltmore Country Club; Coral Gables, Flórida.
25° 44’ 28” N e 80° 16’ 45” W.
08 de setembro; 14h07min.
O avião aterrissou no Miami International Airport e lá estava a Tenente adjunto Nadir.
Dessa vez Sean estranhou sua presença lá.
— Olá, Sr. Queise. O Sr. Oscar Roldman me mandou buscá-lo...
— Permitiria que abrissem seu cérebro de bom agrado? — foi direto.
— Sou uma profissional, uma cientista! — terminou Nadir de falar, com secura.
Pela primeira vez Sean a viu recuar numa aproximação, pela primeira vez sentiu algo meio estranho com a doce e gentil mulher. Porque se Bruno era o candidato ao chip, e se Bruno era um híbrido, então Nadir também devia ser um.
Um carro os esperava na porta do Aeroporto. De lá seguiram para o Miami Biltmore Country Club, em Coral Gables, sem tocarem no assunto.
Oscar abriu a porta da suíte 55 com o cenho franzido, e mal esperou fechar, e descarregou problemas sobre Sean que percebeu uma quarta figura na reunião, Adriana La Hera, que se levantou da cadeira onde até então estava, para recebê-lo.
Sean começou a não entender mais nada, nem a cumprimentou também.
— Sente-se Sean! — falou Oscar. — Encontraram Dr. Lawrence Pagni morto! Um enfarto fulminante!
— O quê? Eu conversei com ele ontem. O deixei bem apesar da idade — Sean arregalou os olhos azuis, encarou o chão acarpetado da suíte 55. — Foi ela!
— “Ela”? — Oscar não compreendeu.
— A Poliu! Ela tem medo da informação, da reação popular, do caos que essa invasão vai gerar.
— Você enlouqueceu? Que caos? Que invasão?
— Planeta X! Nibiru! Nêmeses! — Sean falou olhando mais Adriana do que Oscar.
Ela sentou-se atordoada sem, porém nada falar.
— Você... — mas foi Oscar quem perdeu a fala, sentindo o coração apertar no peito.
Sentou-se porque as pernas já não sustentavam seu peso.
— O Senhor está bem? — perguntou Nadir preocupada.
Mas Sean não teve pena de Oscar, disparou tudo o que vinha acumulando.
— Nêmeses, a estrela da morte, está voltando.
— Nêmeses não existe!
— Não! Não! Os dados enviados pelo satélite infravermelho IRAS, revelaram um número altíssimo de objetos celestes até então desconhecidos. O IRAS fez um estudo completo na faixa de comprimentos de onda e constatou objetos mudando de posição nesse curto período de tempo, indicando que estavam relativamente próximos. As características físicas e orbitais de Nêmeses justificam o fato dela ainda não ter sido descoberta.
— Está falando dos mesmos dados do IRAS, que revisados e analisados com mais profundidade, contestam a existência de qualquer objeto celeste que possa se enquadrar como Nêmeses, Sean — Adriana interveio.
— Não me chame de ‘Sean’. Não somos íntimos — ele viu Adriana recuar a aproximação. — Oscar! Presta atenção! Lembra-se da pasta da Poliu? A... — parou ao ver a luz da suíte 55 rarear. —, a pasta confidencial ‘Fim do mundo’? Consta que Trevellis, e antes Mr. Hawgths descobriram outro Sistema Solar semelhante ao nosso, a 4,3 Anos-Luz do Sol, um... — e voltou a parar de falar.
— Por que parou de falar Sean?
Ele encarou Oscar e nada respondeu.
— Um sistema triplo formado por uma Anã Vermelha muito fraca, e uma estrela alaranjada de brilho equivalente ao do nosso Sol — falava Sean descompensado, nervoso, excitado. — Nêmeses, Oscar, poderia ser essa estrela anã vermelha, muito comum em nossa galáxia, sem que a percebêssemos — tentou outra vez respirar na afobação em que estava.
— Temos que nos concentrar num problema muito maior do que ficar cogitando vida alienígena, Sr. Queise — Adriana falou agora com voz estridente, autoritária, já sem a tal ‘intimidade’. — Bruno está na cidade de Miami. Ele invadiu a companhia de central telefônica, e estragou a maior parte dos circuitos eletrônicos de comunicação na orla de Miami Beach.
— Como sabem sobre Bruno? — Sean viu Oscar virar-se tão rápido que quase engole a figura de Adriana na frente de todos. — Como sabem? — insistiu.
— A Poliu o filmou dentro da companhia de telefones há pouco tempo — completou a Tenente adjunto Nadir.
— Como os seguranças da companhia de telefones sabiam que ele era Bruno?
— A cabeça dele já não funciona mais, Sr. Queise. O chip de DNA não foi preparado para receber ordens, e Bruno tem suas próprias vontades como que desligadas — Nadir falava e Sean nada ouvia.
Ele só deu dois passos em direção de Adriana que recuou número igual de passos para longe dele.
— Foi da mesma maneira que me localizou em Katu, Adriana? Bruno é tão óbvio quanto eu?
— Ele não sabe ao certo o que quer e nem sabe o que é certo ou errado — tentou Nadir a se explicar.
Mas Sean ainda se debruçava sobre Adriana.
— Como explodir uma ilha secreta? Arrancar olhos humanos? Brigar com a ex? — Sean quis atingir Adriana. — Não Nadir… — se virou para ela. —, Bruno está sendo seguido e monitorado como eu fui, já que que ele tem um implante nele.
— Fala do Cruzador Solar?
— Falo de outro Nadir?
E o silêncio se fez ali. Silêncio suficiente para Sean saber que tinha mais ali.
— A Dra. Hanna Cahs disse que o implante do chip Cruzador Solar foi perfeito, apesar de um dos setores do chip estar danificado — tentava Nadir se fazer ouvida.
— Qual é a tua Adriana? — Sean não tinha paciência com Nadir então resolveu atacá-la. — Sabe que Bruno está fora de controle, mas que alguém pode controlar o chip. E sabem tão bem quanto eu, que alguém está tentado resgatar o comando de um chip alienígena dentro de um humano-alienígena — olhou para os três, e outra vez o silêncio. Sean odiou Oscar mais que todos. — Como funciona o chip Cruzador Solar, Adriana? Eu sei que meus mainframes o ligavam a Spartacus, mas quem controlava os mainframes que abastecia o chip afinal?
— Não foi a Computer Co. — a voz de Oscar soou emotiva.
Aquilo fez Sean descontrolar-se.
— Então quem está enviando as informações ao chip, Adriana? Quem mandou Bruno vir a Miami e destruir as comunicações, Adriana? E por que destruir logo comunicações em Miami, Adriana? Hein?! — berrava.
— Não fale comigo nesse tom de voz!
— Falo como quiser! Não sou seu subordinado como Rani!
— Ah! Então é sobre ‘Rani’? Gostou dela, não?
— Não me desafie Adriana! Não te dou esse direito!
— Pois eu não sei do que está falando, Sr. Queise...
— Sabe sim!!! — gritou novamente agarrando seu braço e a girando para ficarem tão pertos, que um roubou o ar do outro. — A Poliu tem sua sede em Miami, Adriana. Era a Poliu que Bruno tentava destruir de alguma forma, porque alguém o mandou vir aqui, e a Poliu sabia onde ele estava. Como Adriana?! — berrou.
— Levantar a voz comigo é mais que insubordinação, Sr. Queise. É inútil!
— “Inútil”? — gargalhou extremante descontrolado. — Como eles sabiam que eu fui a Bali, Oscar? — perguntou sem tirar Adriana de sua visão.
— Não sei...
— Mas ela sabe, não? — voltou a se aproximar dela. — O que foi? A cadeira? Seu broche? Algum tipo de implante alienígena ainda não catalogado pela Poliu, Adriana?
— Você está delirando... — Adriana gargalhou sabendo que ele a provocava chamando seu nome sem as referências de posto.
— Vamos lá, Oscar. O que controla os malditos implantes? Não pode ser Spartacus, eles não se atreveriam. Então qual é o satélite antigo, de entradas seriais, que faz a ponte entre meus mainframes e o chip alienígena no meio da cabeça de Bruno?
— Sean...
— “Sean”? É o melhor que consegue? — riu descontrolado. — Vou perguntar melhor, Oscar querido... Qual é o satélite que controla as antenas do HAARP que a Poliu construiu para derrubar UFOs? UFOs que as tábuas dizem que vão voltar? Hein?! — berrou. — UFOs como o que caiu em Socorro, Roswell e provável em Karakum?! — berrava. — UFOs que segundo a testemunha Bill Brazel conta, foram derrubados após intensa tempestade magnética que produziu um único e enorme raio, que caiu em um único lugar, provocando uma única e enorme explosão, com assiriólogos, químicos e matemáticos da Poliu em Socorro?!
— Seu descontrole...
— Cale-se Adriana!!! Cale-se!!! — Sean começou a suar frio. — Que satélite afinal Oscar? Por que se não percebeu ainda tem uma frota de ‘Cruzadores Solares’ abastecidos no Sol!!!
— MX-1! — falou Adriana.
— M o quê? Outro brinquedinho da Poliu? Algo haver com HAARP? Algo haver com o chip? Algo haver com Rani?
“Algo haver com Rani”; aquilo sim ressoou feito um sino.
Adriana sabia que Sean chegaria aonde não podia chegar, mais cedo ou mais tarde. Tinha que fazer algo e rápido. E tinha que ser algo que o mantivesse calado, do lado dela, apoiando-a.
— Sr. Queise... Quanta incoerência... — riu Adriana, porém visivelmente descontrolada. — O chip de Codinome: Cruzador Solar é um chip a base de... — ia Adriana falar.
— O chip Cruzador Solar é um implante à base de DNA alienígena, encontrado na cidade de Socorro, num cérebro alienígena em 1947, quando um UFO caiu! — Sean fuzilou Adriana, Adriana fuzilou Sean. — E tiveram que arrancá-lo de lá com a ajuda do Dr. Pagni, quando o chip começou a se deteriorar — jogou as mãos para o alto. —, porque o Dr. Pagni estava velho demais para bloquear-me.
Oscar entendeu aquilo.
— Sean… — e abaixou a cabeça como num ato de derrota.
— Oscar? Então vamos! A Poliu sempre existiu e tudo sempre existiu desde que a Poliu existia, inclusive contatos alienígenas com humanos e contatos sexuais com humanos gerando híbridos. Então, em 1975, em Karakum, a Poliu encontrou outro chip, em outra queda de UFO, de forma e provável igual teor de Socorro, mas dentro de um cérebro humano abduzido, e que estava calcificando, o que provocou levarem o chip ao espaço, em testes que me fogem a razão, no tal satélite de observação MX-1. Então, quando tiveram a oportunidade de construir Spartacus, que talvez tenha sido criado para isso, a Poliu colocou o chip no satélite de observação através da porta serial! — alteravam-se, seu corpo e sua voz.
— E sabe tudo isso como?
— Porque talvez eu tenha crescido o suficiente para saber, Adriana, que máquinas funcionam de forma linear, transferindo informação entre chips e um processador central por meio de uma rede. Já um cérebro funciona de forma totalmente interconectada, com uma densidade de conexões que superam em muito a de um computador — e se virou para Oscar. —, mesmo um computador Computer Co..
— Por isso chips neumórficos são mais eficientes neste aspecto e mais poderosos, funcionando como uma rede de neurônios, Sean — a voz de Nadir tentava o acalmar.
Sem resultados.
— Droga!!! — explodiu Sean.
— Carminna teve tempo...
— Cale-se! — e Sean calou Adriana. — Só não contavam que dessa vez havia uma tábua de argila diferente em Karakum, não Adriana? Uma tábua diferente das historinhas de que Carminna tanto gostava de contar nua, confirmada suméria, dizendo sobre a volta dos tais alienígenas que enfiaram aquele implante no humano encontrado morto, provavelmente um escravo deles, porque estavam acostumados a criar ‘aberrações’ — olhou Oscar, Nadir e Adriana de olhos arregalados.
— Como conseguiu... — agora Adriana estava em choque de como Sean podia saber aquilo.
— Formas-pensamento! — exclamou Oscar Roldman.
Aquilo foi o suficiente para Adriana desmoronar.
— Você conseguiu... Você conseguiu dar formas aos pensamentos de quem?
— Consegui? — e Sean sentiu o perfume de rosas brancas que Adriana usava que o entorpecia.
Teve raiva de Adriana por querer se passar por ela, por fazê-lo lembrar-se da noiva que ele sabia, ajudara a matar. Porque diferentemente do que Kelly pensava, Sean se apaixonara foi por ela, a bela espanhola catalã que veio ser sua first, seu apoio emocional, provável escolhida a dedo por um dos quatro; Fernando, Nelma, Oscar ou Mr. Trevellis. E quando Sandy apareceu, Sean buscou fugir do amor impossível pela bela funcionária Kelly, 14 anos mais velha.
Sean virou-se totalmente arrasado e saiu da suíte 55.
— Sean?! — gritou Oscar com o pouco de força que tinha.
Sean escutou do corredor, mas havia tomado uma decisão e não voltaria atrás. Oscar não pensou duas vezes, mandou Nadir e Adriana segui-lo.
Mas foi Nadir quem o encontrou primeiro. Ou diria, foi Sean quem a encontrou.
— Ahhh! — gritou Nadir no que seu braço foi quase deslocado do encaixe. Sean a arrastou para um canto do corredor do hall de entrada após ela segui-lo noutro elevador. Adriana passou por eles sem vê-los e Sean esperou ela ficar longe, ainda segurando o braço de Nadir com força. — Está me machucando...
— Deveria fazer mais que isso, Nadir.
— Não é em mim que deve descarregar sua raiva Sean.
— E é em quem? Ou enfim resolveu falar-me algo?
Sean e Nadir entraram no salão contíguo.
— Você falou de... Quero dizer... — balançava a mão nervosa. — Caos, invasão, Nêmeses e tábuas avisando de voltas.
— E? — Sean esperou ansioso pela continuação.
— Na verdade, a história nos conta que seres de um planeta distante vem nos influenciando há muito tempo. Zecharia Sitchin afirma que na antiga Suméria, alienígenas transmitiram aos homens o dom da civilização, os Anunnaki, “aqueles que do céu à Terra vieram” e que foram com certeza reverenciados como deuses.
— Conversou com Carminna?
— Ela disse que quando ficou sabendo que eu era a escolha original para o chip Cruzador Solar, resolveu que era hora de falar-me certas coisas.
— Que certas coisas?
— É curioso que parte dos livros de diversas tendências, fale de uma luta entre o bem e o mal. Até mesmo os manuscritos do mar morto, de autoria dos essênios, falam da mesma batalha cósmica entre os ‘Filhos da Luz e os Filhos das Trevas’. E Carminna desconfiava que não era o conhecimento dentro do chip Cruzador Solar o que interessava a Poliu, e sim, a corporação precisava desesperadamente do chip para dominar os Anunnaki.
— O chip pode controlar alienígenas? Como?
— Carminna não teve tempo de me dizer como, nem por que.
Sean impactou.
— A luz branca em forma de um polvo e a luz negra... Droga! Acho que o que Carminna me disse sobre guerras bíblicas tinha mais peso e valor do que dei ao fato.
— Sr. Queise?! — chamava a Tenente-Coronel Adriana aos berros pelos ricos corredores de entrada do Miami Biltmore Country Club.
— Não deixe Adriana lhe ver aqui! — Sean empurrou Nadir para detrás da cortina do grande salão, contíguo ao hall de entrada. — Diga-me... Era você a colaboradora de Carminna?
— Não, mas Carminna me disse que Noah tinha um colaborador aqui em Miami. E que ele sabia muito mais do que andava dizendo.
— E como Carminna sabia disso?
— Não sei, mas Carminna estava desconfiada de alguém na Sala de Controle Ala Cinco, alguém com necessidade de vê-lo morto no espaço.
— Sr. Queise?! — chamava a Tenente-Coronel Adriana outra vez.
— Ok, Nadir! — virou-a. — Você nunca teve essa conversa comigo! — ordenou Sean a empurrando, no que Nadir sumiu.
Sean saiu para o corredor no que Adriana passou pelo corredor paralelo, se chocando com ele.
— Ah! Assustou-me!
— Não sei o porquê — foi cínico.
Sean se virou para ir embora.
— Sabe que terei que segui-lo.
— Seguir-me? — Sean gargalhou com gosto. — Aonde pensa que vou? Aprender a surfar em Bali, Senhorita?
— Se você sair do hotel, serei obrigada a... — e calou-se no que Sean voltou a ficar tão perto dela, que quis realmente beijá-lo em meio toda confusão vivida.
— Como Oscar, você e Nadir sabiam que Bruno ia atacar Miami antes de Bruno atacar Miami?
— Como é que é?
— Ou acha que não percebi que já estavam em Miami, Senhorita, horas antes de Bruno atacar? — e ganhou as ricas ruas de Coral Gables sem a companhia dela.
Adriana outra vez não gostou do que ouviu.
Miami Children’s Museum; Miami, Flórida.
25° 47’ 4.91” N e 80° 10’ 35.47” W.
08 de setembro; 18h57min.
Sean havia alugado um carro e deslizava pelas ruas de Miami até o Children’s Museum, Museu das Crianças, localizado na MacArthur Causeway, em frente ao Jungle Island. Moderno, embora de aparência estranha, o museu possuía 56.500 metros quadrados, que incluía 14 galerias, salas de aula, um centro de recursos para pais/professores, um restaurante subterrâneo e um auditório com 200 lugares, onde Sean marcou um encontro com Gyrimias Leferi, que havia deixado a ilha secreta da Polícia Mundial, e chegava naquele momento com seu andar tímido, trazendo um desconhecido.
— Com licença Senhor Sean Queise — Gyrimias foi logo falando. — O Senhor pediu para trazê-lo — apontou o desconhecido.
— Muito prazer Dr. Leôncio Consuelo — Sean apontou uma das poltronas giratórias à sua frente. — Sente-se, por favor.
Leôncio era baixinho, cabeludo e com um cacoete nos olhos impossível de não ser notado; e usava um rabinho de cavalo com a cabeça de um ET de plástico o adornando.
— Percebo agora o quanto é rápido Senõr Queise — sorriu Leôncio animado. —, seu funcionário Senõr Leferi ligou-me e me pegou na saída do Miami Outboard Club.
— É... Gyrimias é mesmo muito rápido — Sean olhou o funcionário com um ar de confuso. — Tão rápido que Oscar o mandou a Miami porque sabia que eu precisaria dele — Sean viu Gyrimias o olhar extasiado como ele conseguira saber daquilo. E o patrão realmente havia telefonado a ele, quando o avião aterrissou de manhã em Miami após Oscar o mandar até lá. — Miami Outboard Club, você disse? — se virou para Leôncio. — É um ancoradouro, não? Tem um barco ancorado lá?
— Si! Um CAT FLASH 35; Catamarã de cruzeiro rápido, fácil de velejar, superconfortável e espaçoso, tanto fora, no cockpit quanto dentro, na cabine — Leôncio viu Sean lhe sorrir. — O que quer de mim Senõr Queise, não foi para falar de barcos de luxo. Porque acredito que seus conhecidos métodos de trabalho possam lhe prover qualquer tipo de duvida.
— Sou tão óbvio assim? — brincou.
— No! Mas é bastante conhecido no mundo underground da Rede Internet. Bastante prestigiado, eu diria, no mundo dos hackers Black hat — piscava sem controle.
Sean gargalhou e Gyrimias continuou só na observação.
— Eu acompanhei agora pouco na Internet — Sean prosseguiu. —, um Chat da UFOontheWORLD sobre abduções, Dr. Leôncio, em que você participava.
Leôncio olhou Gyrimias que não fez nada a não ser olhá-lo de volta.
— É proibido em Miami participar de Chats ufológicos, Senõr Queise?
— Não... — riu. — Acho que não… — os três riram. — Também já li e reli seus livros uma dezena de vezes — Sean viu Leôncio voltar a sorrir satisfeito. — O Senhor diz que como um hacker, gosta de ufologia e que têm uma paixão especial pelo Cosmo.
— Mas eu não sou hacker, Senõr Queise — agora Leôncio riu desconfortavelmente.
— Ótimo! — Sean sorriu mais para cínico que para gentil. — Então vamos direto ao assunto, Dr. Leôncio. Queria que me falasse sobre contatados, abduzidos e implantes.
— Interessante diferenciar um contato de uma abdução, nem todos veem a diferença.
— Porque há, não?
— Si! Abduzidos são aqueles que ao contrário dos contatados, puderam ter suas experiências confirmadas. Homens e mulheres, às vezes de uma mesma família, filhos de abduzidos, que foram levados a bordo de uma nave involuntariamente por alienígenas, em situações que fugiram ao seu controle. Pena que só dez por cento desses casos pôde recordar das experiências conscientemente.
— Isso inclui abduzidos com implantes?
— O propósito das abduções ainda é desconhecido, tudo o que temos são suposições. Mas há um vasto material sobre implantes, e minhas experiências com abduzidos contam que geralmente um implante é colocado na vítima para uma futura localização e monitorização.
— Como?
— O procedimento é dos mais padrões; uma agulha longa e fina, com o implante na ponta, enfiada através da narina até o cérebro.
— Entendo... Poderia então me vender o material que fez para a Poliu, sobre informações colhidas sobre uma estrela chamada Ípsilon Andrômeda, num Sistema Solar triplo, através de informações tidas com suas experiências com abduzidos, hackeando meu satélite de observação Spartacus?
Sean teve a sensação que o Doutor fosse implodir. Leôncio tossiu tanto que Gyrimias saiu correndo a lhe oferecer água gelada.
— Eu... Eu... — Leôncio olhou Gyrimias confuso. — Eu não sabia que Spartacus...
— Não sabia que Spartacus me pertencia? — Sean mantinha-se frio. — Por favor, sem encenação, Dr. Leôncio. Esqueceu-se da minha ‘obviedade’?
— No, Senõr Queise! Só pensei que os dados da Poliu fossem seguros... — Leôncio olhou Gyrimias cada vez mais extasiado e mais calado ao seu lado. — A Poliu sabia que eu investigava alguns abduzidos sob hipnose, e que alguns resultados coincidiam com contatos com alienígenas vindos da estrela chamada Ípsilon Andrômeda, que possuem trinta por cento mais massa, que o nosso Sol.
— “Trinta por cento mais massas que o Sol”?
— Si! Seus corpos eram feitos de energia, entende? Fótons; entende? Luzes; entende?
— Luzes! Isso! Entendemos tudo, Dr. Leôncio! — exclamou Sean satisfeito. — A emissão massiva de neutrinos é a prova que outro Sol está por perto, não é?
— “Outro Sol”? — naquele momento Leôncio sentiu que estava perdido, Sean havia o rastreado com certeza. Tomou todo o restante de água do copo. — Eu... — Leôncio encarou agora um Gyrimias extasiado e pasmado. — Eu descobri através de contatados, e posteriormente usando o... — olhou Sean. —, seu satélite, que o sistema possui três pequenos planetas artificiais na órbita de um grande planeta.
— “Planetas artificiais”? Droga! Ele os mantém separados? — Sean viu Gyrimias sem nada entender e Leôncio a entender tudo.
— O Planeta Yka onde vivem as alienígenas fêmeas, o Planeta Ykaro onde vivem alienígenas machos, e o Planeta Okay onde os bebes são gerados por engenharia genética, e criados até a fase adulta.
“Gerados por engenharia genética”; Sean teve medo do que ouviu.
— Soube tudo isso sob hipnose? E isso é confiável?
— Si! Venho trabalhando com hipnose a mais de trinta anos, Senõr Queise. Tenho minha parcela de certeza. E a mais importante evidência, é a convergência das memórias que os abduzidos têm sobre o momento, processo e estrutura dos sequestros. São pessoas de diferentes lugares, religiões, status sociais. Seria muita coincidência terem relatado as mesmas coisas.
— Não se preocupe Dr. Leôncio. Não acredito em coincidências — sorriu o cínico que era. — E eles tinham implantes?
— Si! Tinham! As cicatrizes eram iguais, mas o local onde havia sido implantado divergia algumas vezes. Entenda Senõr Queise, os implantes são mais difíceis de catalogar, expliquei isso a Poliu quando ela me trouxe um chip encontrado em 1975 no Deserto de Karakum.
Aquilo alertou Sean e Gyrimias quase se levanta no susto. Sean o puxou e ele sentou-se em alerta.
— Quando a Poliu lhe procurou, Dr. Leôncio?
— Hoje de manhã.
— Desgraçados! Por isso Oscar e Adriana chegaram a Miami e por isso Trevellis está tentando ativar o chip de Karakum... — divagou Sean.
— Todos os implantes ou chips que analisei, foi pela técnica de imersão de densidade em tolueno, determinação de elasticidade e dureza; usamos até um microscópio de varredura eletrônica. O grande problema é que os elementos químicos encontrados no Universo são basicamente os mesmos encontrados na Terra, em Marte, na Lua ou em Ípsilon Andrômeda.
— E o que há de tão especial nesse chip de Karakum, para a Poliu desistir tão rápido do chip de Codinome: Cruzador Solar, encontrado em Socorro?
— Não sei o que entendeu Senõr Queise, mas o chip de codinome Cruzador Solar é o chip encontrado em Karakum.
E Sean olhou Gyrimias que olhou Sean.
— Então… — e Sean percebeu ali algo escuso em Adriana La Hera. — Então se a Poliu lhe trouxe o chip Cruzador Solar para avaliar, então… Então o que Bruno tem dentro dele? — e Sean olhou Gyrimias assustado o olhando. Sean sentiu algo explodindo dentro dele. — E por que arriscar destruir Spartacus se não usaram o chip Codinome: Cruzador Solar?
— Como sabia que eu sabia sobre o implante no Tenente Bruno Pierre, Senõr Queise?
— Isso não é importante agora — Sean viu Leôncio voltar a olhar Gyrimias quieto. — E o que descobriu sobre o chip Cruzador Solar de Karakum?
— Ter sido encontrado num cérebro humano — e Leôncio percebeu que aquilo não era novidade para ele. — E como o chip de Karakum estava calcificado, não que não fosse normal, afinal é um corpo estranho entrando num organismo, apesar do chip ter DNA injetado, ainda é uma peça de cristal de silício, extraído da areia da praia, e...
— Prossiga Dr. Leôncio. Porque sabe mais do que diz.
Si y No. Sei que junto ao pedaço de cérebro humano que a Poliu achou em Karakum, havia uma tábua de argila Suméria que valia ‘muchas pesetas’ — Leôncio voltou a olhar para Gyrimias para então voltar a encarar Sean. — e que a Poliu estava pensando levar ao espaço o chip para testar seus componentes.
— Por quê? Por que no espaço?
— Porque foi de lá que ele veio. Não lhe parece coerente?
— Nada é coerente Doutor. Como saber que você hackeava a Poliu junto com seu colaborador Noah — Sean viu Leôncio ficar tão impossibilitado de respirar, que sua boca secou. Gyrimias precisou abastecê-lo de água, novamente. — Interessante Dr. Leôncio, porque eu hackeei a Poliu e não havia nada sobre as tábuas, nem sobre Noah no SETI, nem sobre você. E Trevellis não é de deixar de anotar nada.
E pela primeira vez Leôncio relaxou.
— Eu os enganei Senõr Queise — riu.
— Enganou a Poliu? Parabéns!
— Gracias! Gracias! Porque foi muita sorte eles não notarem, que eu havia decifrado a tábua de Karakum, escrita em cuneiforme, e que contava a história sobre um objeto que era colocado nas ‘ideias e vontades’ para controlar o tempo. E não falo do tempo/horas, falo do tempo/temperatura, mas que sumiu — Leôncio viu Sean arregalar os olhos azuis, enfim.
— “Sumiu”? Mas se a tábua sumiu, como Trevellis, Adriana, e o colisteiro ‘Fim do mundo’ sabiam sobre os lugares de quedas de implantes? E se a tábua de Karakum... — e algo explodiu dentro dele calando-o. — Então se Carminna me deixou saber que foi levada à ilha para estudar a tábua de Karakum... — e Sean olhou Gyrimias. — E se a primeira tábua falava sobre... — e Sean olhou Leôncio. — Não falava, não é mesmo?
— No falava Senõr Queise.
— Mas Carminna sabia sobre o HAARP, ela o barganhou comigo porque só ela poderia barganhar comigo... — e algo voltava a explodir dentro dele. —, já que outros tentaram e não conseguiram levá-la para a cama... — e algo começava mesmo a fazer sentido. —, porque Mr. Hawgths encontrou uma tábua suméria na queda do UFO de Socorro, em 1947... — e voltou a olhar Gyrimias. — Mas houve outra queda, depois, em Roswell, em 1947... Deus! — exclamou extasiado. — Quando Carminna disse sobre eu ter descoberto formas-pensamento sobre a segunda tábua, é que era a segunda tábua mesmo, a que foi encontrada em Roswell, em meio a coisas que Brazel recolheu, e ficou fora do conhecimento da Poliu porque Jèsus comprou de Brazel, ou roubou de Brazel, sumindo com ela. E é nessa segunda tábua que estava arquivada as rotas das naves que já vieram ao Planeta Terra, mostrando onde houve pousos e por ventura, quedas e chips.
E Sean olhou Gyrimias tão extasiado quanto ele.
“Droga!” Sean se odiou por amar tanto Kelly e não se permitir se envolver com outras mulheres. Carminna tinha algo a barganhar com ele.
— Jèsus contou à filha Carminna, e por isso ninguém sabia, porque ninguém conseguiu dormir com Carminna para que ela contasse a verdade — Sean ergueu-se e ficou olhando a imensidão de poltronas vazias. — Então a segunda tábua contava sobre os alienígenas Anunnakis, que fizeram experiências genéticas para criar o homem, para trabalhar nas minas de ouro, como também contava sobre a criação errônea que criou monstros Cthulhu, e que foram levados de volta ao planeta deles, local e distância, e rotas, e entradas e saídas com esses monstros, rotas de embarque e desembarque de aeronaves alienígenas, e que foram separados dos Anunnakis porque eram aberrações em planetas artificiais de Ykas e Ykaros.
— Isso mesmo Senõr Queise.
— Então, a primeira tábua contava que eles iriam voltar, porém sem as rotas, porque aqui deixaram humanos com implantes, rastreáveis, escravos que mantinham seu povo avisado de tudo o que acontecia. E essa primeira tábua suméria de Socorro, contava que os chips era intrincados bancos de dados, contendo informações sobre projetos de construção e manutenção de naves espaciais, UFOs. Mas que aparentava aos estudiosos da Poliu, espiões psíquicos e cientistas mais, planos para ataques de UFOs em massa.
— Isso mesmo Senõr Queise. Mui bem!
— Mas a Poliu achava que tinha mais, e como não teve acesso a tudo, desconfiava que Jèsus a tinha sob o poder dele, porque muita coisa vazou através dos psi, mas o que realmente, não souberam diluir. Então quando imagens do Sol e UFOs se abastecendo chegaram até o conhecimento da Poliu anos atrás, ela começou a achar que os mitos e os vazamentos tinham razão. E levaram Carminna para ler a terceira tábua suméria achada em Karakum, que contava sobre o domínio dos Anunnakis sobre o tempo/temperatura, com a esperança que com a proximidade dela, permitiria aos espiões psíquicos lerem suas formas-pensamento, achando que ela diria sobre a segunda tábua, porque Carminna não quis entregar o jogo a mando de seu pai, que imaginava que ela e ele teriam uma garantia de vida se soubesse algo mais.
— Parcelado o que penso, por que mesmo assim, mataram a Doutora Carminna Clemente? — falou Gyrimias.
— Não sei Gyrimias. Algo saiu do controle da Poliu que vinha aperfeiçoando seu próprio HAARP, para abaterem a frota de Cruzadores Solares quando entrassem na Terra, porque essa segunda tábua suméria falava sobre rotas e datas, não? — olhou Gyrimias e Leôncio. — Droga! Eu não percebi que Carminna falava de três tábuas — e voltou a olhar Gyrimias em êxtase. — Três quedas, três tábuas, e prováveis três chips e três implantes... Ah... Droga! Alguém já teve um chip implantado no cérebro, antes mesmo de Bruno. O chip de Roswell que provável sabe e conhece as rotas que os Cruzadores Solares vão usar no plano de invasão à Terra.
— “Plano de invasão” Senhor? — temeu Gyrimias.
— Estou certo Jèsus?
— Si! O chip de Socorro encontrado por Mr. Hawgths e o Dr. Jèsus estava muito danificado, e eles o guardaram. Semana seguinte outra nave tentou sair da Terra e caiu em Roswell após tempestade magnética, e destroços foram recolhidos pelo Senõr Brazel. Só que lá havia apenas um chips em corpos mortos.
— Pobre idiota do Trevellis. No fim das contas, os livros de Carminna só serviram de teorias de conspiração, que abasteciam seitas escatológicas mundo afora, falando sobre ataques alienígenas por aqueles que já ‘vieram do céu para a Terra’ e que voltariam. Por isso só Carminna podia estar naquela ilha. Trevellis não queria uma assirióloga qualquer, queria a filha de Jèsus para descobrir se seu pai havia escondido algo, a segunda tábua.
— Mas Senhor... — Gyrimias parecia lembrar-se de algo. — Por que ela disse no jantar que estava na ilha para auxiliá-lo?
— Acho que no fundo ela queria ser sarcástica, Gyrimias. Porque sabia que Trevellis estava desesperado por respostas ao ponto de levar-me lá, porque no fundo sabe que posso acessar formas-pensamento.
— Mas por que precisar da segunda tábua se houve um segundo chip também?
— Não sei Gyrimias, mas deve ser por isso o HAARP. A Poliu precisava se defender antes mesmo de obter as respostas sobre uma invasão de alienígenas polvos-humanos de Ípsilon Andrômeda à Terra.
— Mr. Trevellis está sempre um passo à frente da humanidade. Que medo Senhor!
— Medo hobbesiano Gyrimias. Porque aposto que o nome dado a essa defesa pela Poliu, para seu próprio HAARP, era ‘Codinome: Cruzador Solar’ antes mesmo de sair do papel e das ideias e sonhos de Ítalo Piieno, que provável foi recomendando pelo Dr. Pagni, assassinado como Jèsus, como queima de arquivo.
— Que medo Senhor — se repetiu.
— Medo hobbesiano teve a Poliu quando a tectita alienígena se comunicou com o chip capaz de provocar nível 3 de tempestade — Sean viu Leôncio olhando Gyrimias esperando que ele o tirasse de lá. Antecipou-o olhando as infindáveis fileiras de poltronas. — Pode ir, Dr. Leôncio. Você não é mais útil para mim. Provável não seja mais útil para a Poliu, também. Por isso o Catamarã de cruzeiro rápido, fácil de velejar, superconfortável para fugir, não? — sorriu cínico.
O Dr. Leôncio sabia que Sean podia saber, que sua vida de nada mais valia. Precisava fugir sim, só não sabia para onde. Levantou-se da poltrona num rompante e saiu sem nada mais a falar, caminhando no silêncio do auditório com medo hobbesiano de ser o próximo arquivo a ser queimado.
Gyrimias olhou confuso para a porta fechada e Sean pegou no bolso da calça um papel dobrado, uma foto que acabara de imprimir.
— O... O que é isso, Senhor? Um borrão no Sol? O foco do SOHO anda borrando?
— Não, Gyrimias. Isso não é um borrão do SOHO porque o SOHO não borra imagens. São naves espaciais cruzando o espaço profundo. Uma frota inteira estacionada no Sol há muito tempo pronta para atacar.
— Mas... Mas parcelado... Nossa! Por que nunca vimos isso Senhor?
— Porque até 1992 não tínhamos muitos recursos para observar o Sol, e olhar para ele está um pouco fora de cogitação se não quisermos ficar cegos. Mas quando o satélite Ulisses chegou próximo ao Sol, em 1994, percebeu uma diminuição dramática no campo gravitacional até o Sol não mais aparentar Polo Sul e Polo Norte, para então em 1998, o Sol se chocar com dois corpos cósmicos, causando a explosão de 30 a 35 Labaredas Solares ou Sun Flares, que fez o Sol recobrar sua polaridade. Labareda capaz de danificar todos os sistemas eletrônicos da Terra, já que o próprio satélite SOHO ficou inoperante por dois meses.
— E o que acha que seja os tais ‘dois corpos cósmicos’, Senhor Sean Queise?
— Cruzadores Solares, Gyrimias. Ou ainda não entendeu? Eles, os alienígenas, mudam a distância dos planos orbitais, a velocidade orbital, o raio orbital, interagindo com a superfície do Sol, provocando a erupção das gigantescas labaredas que provável abastecem a energia das suas naves, dos Cruzadores Solares; e toda essa informação devia estar num dos dois chips, o que prova que os alienígenas vem à Terra desde a antiguidade — respirou e andou alguns passos retornando para um Gyrimias embranquecido. — Eu revi as imagens Gyrimias. Há realmente algo lá no Sol. Não sei se são cubos negros como alguns afirmam, ou naves em forma de planetas, mas há algo lá. E cientistas ao redor do mundo declararam que existem UFOs orbitando o Sol, muitos maiores do que a Terra. Ou ainda algo maior que seus pensamentos em me achar louco Gyrimias?
Ele se esticou todo sabendo que Sean o lia, que o podia ler.
— Não Senhor... Não... Não Senhor... Não o acho louco…
— Será que não, Gyrimias? Será que não estou realmente louco? Que faltou oxigenação no meu cérebro? Porque fico me perguntando se falta mais algum indício de que algo de grande magnitude está prestes a ocorrer, ou é alarmismo de minha parte, já que trabalhamos com hipóteses.
— Parcelado, não está me parecendo algo do tipo hipótese, Senhor.
— Porque não é, Gyrimias. Porque vivemos em meio a ocultação de informações, pesquisas realizadas em cima de espólios de civilizações há muito desaparecidas, povos que foram aniquilados para enterrar a verdade sobre o futuro, em meio a homens de terno preto que somem com testemunhas, para silenciar ou queimar arquivos.
— Mas por que isso Senhor? Para esconder algo maior?
— E se Nibiru não for um planeta errante? E se for algo manufaturado? Um objeto artificial manufaturado, que orbita uma estrela Anã marrom, binária de nosso Sol, juntamente com seu próprio Sistema Solar, contendo pequenos planetas, que a orbitam? Como os planetas artificiais Yka e Ykaro? E se o Sol é uma estrela da morte, no estilo ‘Star Wars’, criada artificialmente, num trágico cumprimento das profecias da Bíblia? Isso Gyrimias; grandes desastres, caos e tempestades bíblicas.
— Grandes eventos destruindo nosso clima? — Gyrimias teve medo do que tentava entender para então cair em gargalhada. — Parcelado meu susto, Senhor... — e Gyrimias parou de rir perante a seriedade no rosto do patrão. — Não, Senhor... Não estou achando isso...
— Mas alguém está achando exatamente isso, Gyrimias. E não só acham que sou louco, como acham que me comunico com os alienígenas os incentivando vir à Terra.
Gyrimias só teve tempo de arregalar os olhos.
— Quem acha isso Senhor? — mas Gyrimias levantou-se da poltrona pelo susto e impacto, de ver Sean também se levantar e sair. Ele correu atrás dele. — Senhor? Talvez eu não parcele o que vou dizer, mas... — e ele viu Sean parar. —, desde o acidente com Spartacus, Senhor, que não descansa e não se alimenta direito, e não fala com...
— Kelly reclamou?
— Não ela Senhor. Seus pais.
Agora Sean desabou, e foi um desabar emocional. Porque ele vinha assim há muito tempo, desde a morte de Sandy, culpando sua mãe por querer controlá-lo, seu pai por exigir dele cada vez mais coisas que ele não se permitia, e por ver ambos obrigando Kelly, vigiá-lo.
E agora Gyrimias, porque estava claro que houve comunicação por parte deles, que eles queriam saber o que acontecia. Sean havia ido ao espaço, sumido da Computer Co., e estado esse tempo todo em contato com Oscar Roldman.
Aquilo tudo era um fardo muito grande para todos.
— Não posso parar Gyrimias. Não agora.
— E por que não agora Senhor? E por que não antes? Por que se envolver com coisas que deviam ter ficado nos mitos?
E Sean se virou para ele.
— Me faça um favor, Gyrimias. Volte ao Brasil e cuide da Computer Co. para mim. Redobre a segurança de Kelly e meus pais. A Poliu e todos aqueles computadores na Sala de Controle Ala Cinco estavam estudando o verdadeiro ‘Codinome: Cruzador Solar’, o HAARP da Poliu que pode controlar o tempo/temperatura. E a Poliu o faz, para lutar com os alienígenas que podem controlar esse tempo/temperatura, e que estão vindo barganhar a Terra.
— Nem posso parcelar o susto que levo... Mas...
— ‘Mas’ nada, Gyrimias. Noah descobriu que a Poliu enviou ao espaço, junto com Spartacus, o chip de Karakum calcificado, e não o de Socorro danificado. E Noah sabia que o chip ‘Cruzador Solar’ era um HAARP que podia controlar o tempo/temperatura através do poder da mente, retirado de um abduzido humano encontrado na queda de Karakum, e que a Poliu podia controlá-lo através de um satélite chamado MX-1.
— “Poder da mente”? Ah... Parcelada minha ignorância, isso significa o fim do mundo? E a Poliu vai deixar isso acontecer Senhor?
— Não acredito na Poliu nos proporcionando segurança, Gyrimias, mas acredito numa Poliu procurando sua própria segurança.
— Então esse MX-1 era na verdade a porta serial que se comunicava o chip? Então porque precisar que o Senhor fosse ao espaço?
— Não sei Gyrimias, o por que de Trevellis e Oscar quererem me ver lá em cima, ainda é uma incógnita — e se virou para ir embora e voltou. — Ou não, porque Carminna disse que o HAARP Cruzador Solar podia destruir a entrada de uma nave na ionosfera, e a segunda tábua que esteve sob poder de seu pai Jèsus, podia identificar rotas e vindas de alienígenas a Terra… — e parou de falar.
— No que está pensando Senhor?
— Em como Leôncio sabia que foi Jèsus, pai de Carminna, quem conseguiu esse segundo chip das rotas, se nem Trevellis, Adriana e o colisteiro ‘Fim do mundo’ sabiam sobre as rotas.
— E nem nós sabemos Senhor...
— Pois deveríamos Gyrimias. Afinal, não foi você quem disse que Carminna estava lá para me auxiliar? — e Sean ganhou os estacionamentos atrás de seu carro.
Sozinho.
Blue Sea Delano Hotel, Collins Avenue; Miami, Flórida.
25° 47’ 31.68” N e 80° 7’ 43.53” W.
08 de setembro; 23h51min.
Sean se instalara no Hotel Delano, na MacArthur Causeway, uma autopista toda iluminada em tons de rosa neon.
Fez check-in e subiu para um andar alto.
Ele havia pedido a Gyrimias que utilizasse programas hackers criados por ele, e instalados somente em seu computador de mesa, na Computer Co., a fim de investigar a família do Major Henrique Loyola, e que fizesse mesmo parecer uma investigação particular porque queria que aquilo chegasse até o major Henrique, já não se importando se Gyrimias ia ser bombardeado por uma Kelly Garcia furiosa. Que também investigasse Adriana La Hera, Nadir Berthand e Bruno Pierre, mas que fizesse dessa vez sem ninguém perceber. E que também fosse atrás de informações em Arecibo, Porto Rico, sobre as ações do Dr. Santos Vasquez.
E foi jantar.
Quando voltou ao quarto, as informações que chegaram ao banco de dados de Sean, enviados por Gyrimias, o fizeram sorrir de satisfação. Porque ele desconfiava de alguma coisa o tempo todo, apesar de não imaginar aquilo, saber que o General Arthur La Hera tivera duas filhas e não três; Laura e Pamella, falecidas com sua mulher num acidente de carro, há quatro anos, e que fora novamente casado.
— Trevellis desgraçado! — socou a mesa balançando tudo em cima dela, ecoando no corredor em meio a outro som de diferente timbre.
Sean alertou-se, levantou-se e abriu a porta do quarto. No corredor, nada que justificasse o que fora ouvido. Olhou um lado, outro e nada; mas havia algo, ele podia sentir. Voltou a fechar a porta e demorou-se ali parado, olhando o computador baixando novas mensagens de Gyrimias; ele havia encontrado indícios de uma pesquisa que o Dr. Santos fazia com sua equipe na ilha secreta da Polícia Mundial. Sean sabia que na tal equipe, constava a Dra. Carminna Clemente, Dr. Noah Ravayad, e o próprio Dr. Santos Vasquez.
— Desgraçada! — Sean riu. — Carminna sempre soube o que queriam com ela, e só ia me dizer se dormisse com ela.
A pesquisa continha estudos eletromagnéticos feitos pelo Dr. Santos numa jovem de 22 anos, que afirmava possuir dons psíquicos, e que podia ler a mente das pessoas.
“Dr. Santos e Mona amiga, juntos?”
Sean ficou com o interesse dobrado. Ainda não sabia como encaixar aquela informação, mas agora conhecia seu peso e valor.
Leu as anotações do Dr. Santos feitas no ano de 2006:
— “Sintonizei primeiro em um sinal de 1080 MHz, que estivera estudando por um mês. Percebi que quando a jovem fazendeira, criadora de vacas leiteiras em uma rica fazenda, e que chamarei de ‘Marina’, de vinte e dois anos, ficava perto de antenas, o sinal aparecia” — Sean parou para fazer contas. — Vinte e dois anos em 2006...— e Sean não gostou do que pensou. Prosseguiu, porém: — “Quando ela ficava distante, o sinal desaparecia. Era como se o transmissor daquele sinal estivesse na antena e não nela. Mas eu sabia que este não era o caso, porque estivera captando o mesmo sinal por toda a estrada até chegar onde se situava sua fazenda. Tão logo comecei a investigação eletromagnética do local, imediatamente encontrei o sinal de 1080 MHz, e também encontrei o sinal de 435 MHz que rotineiramente emana das vizinhanças de Montauk, onde Marina vivia”.
Sean ficou extasiado. As listas de ufologia há muito vinha falado sobre o ‘Projeto Montauk’, ou o que Mona chamava de um projeto de controle de mentes, para prepará-los para se viajar no tempo; algo tão complexo como conduzir o ser humano e a sua alma ao ponto zero de referência para facilitar a viagem no tempo, e era um tempo de datas, separando a mente do corpo.
Sean voltou a ler o relatório do Dr. Santos:
— “Encontrei também uma forte transmissão em ELF, mais baixa do que meu equipamento podia captar, cerca de 50 a 400 kHz perto do curativo” — parou de ler tentando entender o ‘curativo’. — “O sinal de Montauk em 435 MHz era particularmente interessante, porque sempre que o captava, ele se separava” — Sean olhou um lado e outro do quarto. — “Quando Marina se movia para dentro e para fora de sua casa na fazenda, eu percebia mudanças sutis no visor padrão, para o sinal de 435 MHz. Ela dava voltas, e onde quer que se posicionasse, uma mudança sutil se mostrava no visor, ficando perceptível também nos receptores. A seguir, voltei a sintonizar o sinal de 1080 MHz, e tentei a mesma coisa. Havia definitivamente, captado os campos eletromagnéticos aberrantes, os sinais em 435 MHz e 1080 MHz. Com certeza havia um UFO nas redondezas e ele se comunicavam com Marina através da mente. Ficou claro que o chip Codinome: Cruzador Solar de DNA modificado era o mais indicado para isso”.
— “Para isso?”
Sean levantou-se e abriu uma vodca, precisava manter-se aberto a tudo.
— “Ficou claro que o implante de Marina funcionou, que atraiu alienígenas e de alguma forma ela foi abduzida e levada a ser monitorada pelas naves através dos sinais de 435 MHz e 1080 MHz”.
— Droga! Queria ter podido ter tido acesso a isso há mais tempo, muita coisa estaria resolvida na minha cabeça.
Gyrimias também havia encontrado um trabalho do Dr. Noah que estudava partículas.
— “Como as partículas se aceleram a velocidade da luz, vastas quantidades de energia são liberadas. O projeto Codinome: Cruzador Solar está intimamente conectado ao HAARP ou High-frequency Active Aurora Research Project, conhecido projeto de controle do clima, e que nos permitiu captar os sinais de 435 MHz ligados ao chip, o que indica que uma função de controle da mente está sendo empregada por Marina”.
— HAARP e o controle da mente?
“Droga!” explodiu por todo ele, nervoso por ter sido enganado. Ficara claro que Mr. Trevellis investira num implante, que a tal ‘Marina’ tinha um implante encontrado em uma queda.
— Qual chip? — foi o que se perguntou já que o chip de Karakum estava comprometido, e que talvez não fosse só MX-1, mas também uma mente, com outro chip implantado, se comunicando com o chip Cruzador Solar, enquanto estava no espaço, conectado a Spartacus. Sean girou na cadeira e ficou momentaneamente confuso tentando entender algo, entender sua própria área, a computação e suas portas seriais. — Mas se Codinome: Cruzador Solar vai além do chip... — suspirou.
“Droga! Trevellis voltou a usar espiões psíquicos”.
Sean prosseguiu a ler o trabalho de Noah.
— “Sinais de alta frequência desenvolvidos através de nosso HAARP Cruzador Solar são projetados para ionizar a alta atmosfera, a qual consiste primariamente de nitrogênio. O nitrogênio ionizado, oN2, então, age como um translador, o qual literalmente converte a transmissão de partículas de 435 MHz em outra de 1080 MHz. Isto é bastante engenhoso, porque torna os satélites desnecessários. Acredito que Codinome: Cruzador Solar seja a mais nova tecnologia de ‘Guerra nas Estrelas’ da Poliu” — escreveu Noah.
Agora teve medo do que leu, Hobbes e o medo da guerra que traria a paz. Sean não acreditava na paz e imaginava ou o satélite de observação Spartacus mais envolvido que o necessário, ou sendo desnecessário de repente.
O vidro da janela tilintou pela velocidade dos ventos. Sean ergueu-se e foi até à janela onde um vento forte trazia a cortina de voil até o meio do quarto. Os cabelos dele ficaram em desalinho e Sean teve dificuldades em empurrar a janela de vidro para fechá-la, tamanha era a força do vento.
“Ventos... Dilúvios...”, ecoava por todo seu corpo.
Sean ficou olhando a ponte iluminada da janela fechada. Suspirou cansado, havia sem sucesso acessar os arquivos do necrotério do Hospital Municipal Lanver, onde o corpo do Dr. Lawrence Pagni estava guardado, e como sempre, desconfiava de algo muito maior, quando foi a vez de um som de vidro tilintar não muito longe dali.
Sean olhou, olhou e olhou o quarto, nada viu, mas chegou tão rápido na porta que o garçom caiu com a bandeja em meio ao vinho e as taças que Sean salvou antes de chegar ao chão.
— Oh! Senhor. Desculpe-me! Eu quase quebrei...
— Quem mandou esse vinho? — Sean não quis saber de desculpas.
— Fui eu! — Adriana estava bela no vestido de musseline vermelho, corte sensual, que marcava o corpo vantajoso, e expunha como nunca toda sua anca e pernas no recorte mais sensual ainda.
O garçom ainda caído nos pés de Sean o olhava. E Sean também o ergueu tão rápido, que ele só teve tempo de ver algumas notas na bandeja e sair com ela pelo corredor.
As duas taças e o vinho caro estavam nas mãos dele que ainda olhava Adriana na porta.
Ele apontou para dentro do quarto, e ela entrou.
— Você ainda teve tempo de trazer seus vestidos de alta coleção para Miami, Tenente-coronel Adriana?
— Adriana...
Sean ergueu o sobrolho.
— Adriana... — voltou a olhá-la tentando decifrar a pouca musseline vermelha que desfilava no seu quarto. Ela se virou e sorriu-lhe. Sean tinha que admitir, ela era linda. — O que quer comigo… — olhou sua própria mão. —, com duas taças para um caro vinho, Adriana?
E Adriana sorriu-lhe, com todo corpo acompanhando.
‘“Wow!”, Sean já não sabia se queria saber algo.
Encaminhou-se até o bar e abriu o vinho. Tudo sob a visão de uma bela Adriana que ele agora sabia, não era filha do General Arthur La Hera.
— Alguma notícia de seu pai?
Adriana demorou a responder.
— Não! — exclamou evasiva.
Sean sorriu mornamente imaginando que Nietzsche adoraria conhecer a mentirosa Adriana ali, perfumada, bela.
O vidro da janela se movimentou bruscamente; ambos se assustaram, se olharam, e nada disseram. Ele entregou a taça de vinho, tão vermelho quanto a roupa dela e ela sorriu-lhe pegando a taça cheia.
Ele só a olhou tomando a taça toda.
— Por que mentiu Adriana?
— Menti? — foi charmosa ao sentar-se na beirada da cama e cruzar as pernas como Carminna já fizera.
— Você não é filha do General Arthur La Hera. Mas havia uma Adriana, casada com Arthur, nos anais da Poliu — ele a viu descruzar as pernas. — Uma jovem platinada que ajudou a Poliu, a livrar o General de acusações sobre roubo de informações valiosas, não foi? Ninguém provou nada, mas mesmo assim, Arthur conseguiu ser encaminhando para o Pentágono e de lá, ir para a ilha secreta da Polícia Mundial, onde o caso foi abafado.
— Eu não abafei nada.
— Não! Claro que não! Você teve que voltar a fazer seu papel. Mas qual papel Adriana? O de esposinha? O de filhinha? Ou o papel em que Oscar querido lhe paga mais?
— Sem ironias Sean, devo minha vida a Oscar. Tenho-lhe em alta estima. Por isso, voltei ao papel de ‘filhinha’, para conseguir informações privilegiadas sobre o ‘esposinho’ Arthur e seus comparsas.
— Wow! E o que quer aqui vestindo, ou diria, pouco vestindo esse vestido vermelho, Senhorita? Conseguir informações privilegiadas comigo? — Sean não gostou de Adriana se abstendo de falar. — Quando o chip se chocou com o micro meteoroide e saiu do ar, a Poliu desconfiou que o General Arthur estivesse por trás e retirou a Tenente adjunto Nadir, anteriormente escolhida por ele, não?
E o silêncio.
“Droga!”
— Então Arthur resolveu fazer outro jogo, e o Dr. Ítalo, comparsa dele, colocou o jovem híbrido Bruno no lugar de Nadir, passando por cima de suas ordens, das ordens da Polícia Mundial, não? Porque no final das contas, tudo aquilo é investimento da Poliu, que manda na Polícia Mundial, porque Trevellis manda em Oscar e no meu pai, porque há um segredo caro ali, não? — Sean não se deteve no silêncio dela. — E então você voltou a seu papelzinho para convencer a Poliu que ainda estava ao lado de Arthur, mas acabou descobrindo a fraqueza de caráter em Bruno, e isso alertou Trevellis. Mas manteve-se por ter Oscar em alta estima. Então me pergunto, Senhorita Adriana, afinal nem a Poliu nem a Polícia Mundial queriam Bruno; por que?
— Já disse que Bruno...
— E por que precisar de Bruno ou Nadir e um chip que precisou ir ao espaço, e voltar e custar aos cofres bilhões de dólares, duas mortes lá em cima... — apontou para o teto. —, dezenas de mortes aqui embaixo… — apontou para o chão. —, se já tinham um chip no cérebro de Marina? — Sean pôde ouvir o coração de Adriana explodir. — Quem é Marina?
— Não sei nada sobre Marina ou outro chip implantado Sean...
— Sean... Íntimos não? — Sean voltou a encher a taça de vinho que Adriana esticou a ele. — Por que se fez parecer com Sandy?
— Para chamar-lhe a atenção.
Sean a odiou.
— O que quer de mim Adriana?
— Por que acho que quero algo Sean?
Ele teve que rir.
— Onde deixou sua frieza? Oscar mudou suas ordens? Ou foi a Poliu?
— Não conheço a Poliu, Sean...
E Sean diria que foi o ‘Sean’ mais excitante que uma mulher havia lhe dito. Tomou todo o vinho, agora ele, e voltou a abastecer a sua taça novamente. A mistura com a vodca começava a dar resultados e ele sentiu-se tonto.
— Onde está Bruno?
— Não sabemos.
— Perderam o sinal do implante?
— Sim.
— Que chip tem Bruno instalado nele?
— De Roswell.
— Foi Jèsus quem entregou a Poliu?
— Sim.
— E a tábua?
— Ele disse que não havia mais nada ali, só o implante no cérebro de um ser cinzento, grey.
— E os polvos-humanos?
— Nunca vi nenhum.
— Porque mitos não existem — os dois sorriram cínicos um com o outro. E Sean também não gostou daquela Adriana sincera. — Bonito seu vestido.
Adriana levantou-se, se aproximou dele e o olhou de muito perto. Ele quis, mas não conseguiu ler-lhe seu próximo passo.
— Já jantou? — ela foi até a janela fechada.
Lá fora, uma ventania crescia.
— Você sabe que sim — ele a viu se virar para ele. — Provável estava me vigiando no salão do terceiro andar — se aproximou dela e colocou mais vinho na taça que ela segurava, quando uma gota escapou do cristal e banhou os dedos dela.
Sean inclinou-se e parou. Olhou-a e voltou a inclinar-se para então, olhá-la lhe olhando até acabar por inclinar e lamber o líquido que escorria pelos dedos dela, pulso, braço perfumado por rosas brancas. E ele não se deixou levar pela referência, erguendo-se e olhando-a, quase imprensada no vidro da sacada, para então voltar a se inclinar e inclinar e lamber-lhe o pescoço branco, suave, de pele bem tratada.
— Sean...
— O que? Não a estou encabulando, estou? — sorriu cínico. — Não é disso, não é mesmo? — se aproximou colando seu corpo no dela enquanto Adriana parada erguia a taça até a boca, que voltou a escorrer o líquido vermelho.
Adriana nada disse nada movimentou nada atentou. Sean não se fez de rogado, lambeu-lhe os lábios úmidos uma vez, outra, e uma terceira vez, e o corpo dela imprensado no vidro gelado, não parecia querer fazer perguntas, mesmo porque Sean não parecia querer que ela fizesse.
Largou sua taça em cima da mesa e avançou mais, colocando suas mãos nas pernas expostas de Adriana, por entre os rasgos de tecido, sentindo a musseline vermelha deslizar pelos dedos viris, sentindo a pele dela enrijecer, arrepiar-se depois.
Olhos nos olhos. Nenhuma palavra. Adriana inclinou-se e Sean voltou a beijar o pescoço a mostra, sob as ordens da inclinação. Adriana inclinou-se para o outro lado, e ele avançou outro pouco, sorrindo cínico, deslizando os lábios sem censura pelo pescoço perfumado.
Ele era crescido para aquilo também.
A taça escapou das mãos de Adriana caindo no chão, estilhaçando, enquanto ela foi virada violentamente para uma Miami iluminada, ventosa, para então ele caminhar pelas costas do vestido que aos poucos era aberto.
Adriana tentou se virar, tentou alcançar a boca dele, mas Sean não deixou. Ela ainda tentou beijá-lo uma segunda vez, mas Sean a virou contra o vidro agora com mais força ainda.
— Ahhh... — ela sentiu o impacto, o gelo do espesso vidro na sua boca, enquanto a boca dele descia, lambia o creme de seu corpo agora, em total domínio da gravidade. — Sean...
— Calada!
O silêncio reinou, e ele não se deteve ao avançar mais, subindo, a virando com a mesma velocidade e raiva contida, a jogando contra o vidro, tocando-lhe os seios, os engolindo com a boca em meio à musseline do vestido fazendo o bico duplicar de tamanho.
Sean a virou novamente de costas para o vidro e a imagem de um Sean belo, cada vez mais excitado se fazia atrás dela. Adriana viu seus pés serem erguidos; junto, foi sua imaginação. Sean levantava também sua lingerie, a subindo e a descendo numa velocidade que o elástico, a fina seda, rompeu-se.
Adriana mostrava suas intimidades, Sean demonstrava sua malícia no que tirou o vestido, mostrando no pouco reflexo do vidro uma Adriana nua, sedenta, sendo consumida, em meio às mãos hábeis dele, percorrendo todo o sexo da bela moça; dentro, fora, dentro, fora outra vez.
— Ahhh... Ahhh... Ahhh... — sussurrava Adriana em êxtase, se deliciando de tesão, abrindo as pernas, as fechando quando tentou se virar, arrancar a camisa dele, rasgar-lhe, quando ele próprio a tirou.
Ela o abraçava como podia, como sabia, arrastando-o para o meio do quarto, para a cama, onde caíram, onde seus corpos alcançaram-na em uníssono.
Sean tirou suas calças e Adriana gostou do que ele fez. O sexo masculino entrava em mares não tão proibidos, desejados até, e Adriana se virava se desvirava, girava com ele ainda dentro dela, tentando dominá-lo.
— Não!
E Adriana nada fez.
— Sean... — foi só o que conseguiu, o que ele permitiu.
E Sean a beijava lambia, se debruçava sobre o corpo roliço, sobre os cabelos loiros platinados que cheiravam a Sandy, que o entorpeciam, que atingiam seu palácio de memórias, de lembranças de um sexo bom, proibido.
— Ahhh... — ele também tentou falar algo mais concreto que aquilo, mas o corpo da Tenente-Coronel não permitia que palavras fossem compostas, ditas, porque talvez sua honra e brio deixaram de ser importantes.
Sean sentiu que o domínio era ambíguo, que ambos se desejavam naquele momento mágico, que o sexo aconteceria até o amanhecer.
Nada a perturbá-los se não a imagem da noiva morta no corpo da alienígena sentada na cadeira, que ele percebera desde o momento que tocara os seios de Adriana, vendo-a pelo reflexo do vidro, com seu formato a se desenhar no quarto.
E a alienígena de luz branca o estudava, estudava cada movimento feito, moldada em Sandy Monroe, sendo desafiada a sentir ciúme, porque Sean sabia o que queria, e que conseguiria mesmo que a tivesse ali, parada, olhando-os o tempo todo no ato sexual.
20
Blue Sea Delano Hotel, Collins Avenue; Miami, Flórida.
25° 47’ 31.68” N e 80° 7’ 43.53” W.
09 de setembro; 07h22min.
— Bom dia! — soou uma voz suave por detrás do travesseiro de Sean. Ele abriu os olhos, e se virou para Adriana sorrindo. Ficou impressionado com a semelhança. — Obrigada por ontem a noite.
— Adriana... Eu...
— Não fale...
— Eu... Eu não sei mesmo o que falar... — e Sean viu a alienígena de luz branca que também parecia Sandy, ainda sentada na cadeira. — Deus...
— O que foi? — olhou Adriana, em volta.
— Nada! — correu a corrigir. — Estou com fome.
— O salão do primeiro andar já deve estar servindo o café da manhã. Vou buscar algo para nós dois — e Adriana saiu.
— ELA NÃO TE AMA!
Sean saltou da cama se escorando na parede.
— Você não fala através do pensamento? Wow! Fala como se...
— ELA NÃO TE AMA! — repetiu a alienígena de luz branca.
— Quem falou em amor?
— VOCÊ SE ENGANA! NÃO VÊ QUE ERA ISSO O QUE QUERIAM DESDE O INÍCIO?
— Queriam o quê? Por que diz isso?
— A MOÇA ADRIANA! ELA NÃO É A IMAGEM VIVA DE SUA NOIVA MORTA? — e a alienígena falava com a voz de Sandy.
“Formas-pensamento”; soou por todo ele.
— Ela ou você?
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO!!! — e alienígena de luz branca, irritada, acionou sua luminosidade o cegando.
— Ahhh!!! — Sean gritou ao cobrir os olhos. Ele a atingira, ele sabia. — Por favor, diminua a luz — a luz cedeu. — Está bem! Eu senti algo estranho desde que vi sua foto na mesa do General. Ali, tão a mostra, tão feliz. Já havia percebido a semelhança no porta-retrato.
— NÃO É NÃO! ELES QUEREM TE CONTROLAR, TE TER EM SUAS MÃOS!
— Você se expressa bem, não?
A alienígena prosseguiu após o comentário.
— USARAM TUA NOIVA PARA SABER TUDO A SEU RESPEITO! ESTÃO USANDO ESSA TAMBÉM!
— A Poliu usou Sandy?
— ELES CRIARAM SANDY MONROE PARA ISSO!
— “Criaram Sandy”?
— DEVERIA LER MAIS MENTES! AS MENTES CERTAS A SEREM LIDAS!
Sean arregalou os olhos azuis.
Temeu ouvir aquilo.
— A Poliu usou...
— ADRIANA FAZ TE LEMBRAR DE SANDY MONROE? ADRIANA TE RECORDA ISSO O TEMPO TODO? A FALA, O PENTEADO; O PERFUME DE ROSAS BRANCAS; TUDO PARA PARECER IGUAL? — a alienígena de luz branca parecia querer aumentar a intensidade.
Por vezes o rosto de Sandy se delineava por entre o estranho rosto de um polvo, por vezes o rosto de Adriana se delineava perfeitamente.
— Eu queria poder falar com você... — mas a alienígena de luz branca não estava suscetível.
— ELA SE PROPÔS A ISSO! NÃO VÊ? SÃO ORDENS QUE VOCÊ OBEDECE!
— Isso é ridículo! — explodiu. — Estou aqui porque quero! Porque minha honra e brio deixaram de ser importantes.
— E VOCÊ VAI PRECISAR SE REPETIR ISSO O TEMPO TODO!
— Eu ou...
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO!!!
— Ahhh!!! — e a luz o cegou para depois apagar e desaparecer de vez.
Sean sentiu a ardência, sentiu tonturas também, achando que fosse desmaiar no chão do quarto.
Desmaiou.
“Porque no final Sean, vai ver que o que precisava ser feito era ter salvado sua alma”, Sean acordou na voz de Kelly, soando em lembranças e algo se arrastava não muito longe dali.
Sean levantou-se totalmente alertado, em guarda, porque sabia que havia cometido um erro.
Vozes chegaram e se foram; e havia vozes não muito longe dali, no corredor, no hotel, em Miami. Sean teve medo do que pensou, do que iria ver. Aproximou-se da porta e a abriu, se lançando fora do quarto; sabia que homens de terno preto logo viriam atrás dele, porque o corredor estava vazio, mas as vozes estavam ali.
— Quem está aí? — ainda perguntou; portas, tapetes persas, obras de artes nas paredes e sons. — Quem está aí? — Sean perguntou novamente no que a claridade do corredor se extinguiu.
Ele sobressaltou no escuro e correu de volta a seu quarto, até a mala, até a pistola automática de calibre .40 que havia trazido, engatilhando-a. O gerador foi acionado e Sean apontou para o teto quando uma luz fraca se fez e o vidro da sacada quase explodiu pela força dos ventos, que tomavam conta de Miami. Ele se aproximou para ver que pessoas nas ruas corriam; calçadas lotadas, pessoas que abandonavam seus carros pela água que invadia comércios e carros, que tomava conta dos céus matutinos de Miami, em manga pesada de chuva, iluminada pela aurora boreal.
“Deus!” agora sim teve medo do que pensou, do que viu, do que ouviu, dos tiros e gritos que tomaram conta dos corredores do hotel.
— Adriana?! — Sean foi até a mala, vestiu uma camiseta sobre o short com que acordara, e calçou um tênis, correndo com a pistola automática em punho, lançando-se no corredor de luz fraca quando um som de porta bateu atrás de si.
O coração acelerado, a respiração em descompasso, e ele desistiu do elevador se lançando pela porta de incêndio, apontando a pistola automática para um lado e outro, descendo escadas abaixo, iluminado apenas pela fraca iluminação dos geradores.
E degraus e degraus eram consumidos aos trancos, caindo no intervalo dos andares, se levantando para cair de novo, sentindo um repuxo na perna direita; sabia estar sob pressão.
Com ainda cinco andares a descer, passos se lançaram atrás dele. Sean entrou no andar em que se encontrava, tentando não bater a porta, correndo nem sabia para onde, apontando a pistola automática para um lado e outro, com as janelas hermeticamente vedadas e o ar desligado o sufocando.
Sean invadiu um salão desativado, e mesas e cadeiras amontoadas o barraram, fazendo estancar sob a mira do soco que o levou ao chão de granito negro, fazendo sua boca romper-se, a lançar um fio de sangue, fazendo-o perder a pistola automática calibre .40 que caiu de sua mão.
“NÃO VÁ ATRÁS DELE!” a voz da alienígena de luz branca chegou até Sean, que ouviu quando o homem opulento que o atacara fugiu.
Sean tentou identificar quem era, mas não tivera tempo. Mas também não era ideia sua obedecer uma alienígena. Sua adrenalina a mil, sua pulsação fora do controle, sua respiração acelerada e a escuridão local, o fez correr, atravessar a porta e se lançar sobre o homem opulento. Seus corpos rolaram com o impacto e Sean o socou, e socou, e socou para então correr sendo agarrado pela perna, socado outra vez no rosto pelo homem opulento, e mais uma e mais uma, até sentir sua boca voltar a sangrar. Sean enrolou suas pernas no pescoço do homem opulento e num giro lançou a cabeça dele no granito conseguindo se desvencilhar dele.
— Bruno... — soou de sua própria voz no que relâmpagos seguidos de trovoadas iluminaram o salão desativado, em meio a uma Miami que inundava, mostrando que o homem opulento era Bruno Pierre, que tinha os olhos amendoados, verdes como esmeraldas e tentáculos saindo de seus poros.
Sean recuou momentaneamente em choque e Bruno lançou-se sobre ele novamente, que caiu no chão duro enquanto um tiro foi dado pela arma de alguém, fazendo o projétil passar de raspão pelos dois. Sean conseguiu se desvencilhar da força do jovem e opulento Bruno, quando novos disparos não muito longe dali foram seguidos por um grito de homem. Bruno sumiu e Sean ficou lá, em choque, vendo que os tiros vinham de um dos oficiais de segurança da ilha ali parado, que agora descarregava sua arma nele próprio. Provável era um dos homens de terno preto atrás de Sean Queise.
A porta bateu e Sean voltou a si pegando sua pistola automática calibre .40 do chão, e correu atrás de Bruno deixando para trás as respostas do porque o segurança atirar nele próprio quando alcançou novamente as escadas de incêndio, ouviu uma porta bater andares acima.
— Droga! — Sean voltou a subir atrás de Bruno alcançando o 7° andar, ainda tentando entender por que o segurança se suicidara.
“Ou não foi ele?”, alcançou o corredor do sétimo andar para então entrar em choque.
O corredor se abria para um grande salão de festas, lá, corpos ocupavam quase toda extensão do piso. Nunca um sonho fora tão real para ele. Corpos de homens, mulheres e crianças, humanos, jaziam mortos. Sean engoliu todo seu medo e se inclinou, havia réstia de incêndio saindo deles.
— Eletrocutados... — foi só o que conseguiu falar olhando o salão sem janelas, sabendo que não fora relâmpagos exatamente que os eletrocutaram.
“BRUNO!” voltou a soar.
Uma porta se trancou no fundo do salão. Sean passou pelos corpos e tentou abri-la, mas não conseguiu. Olhou para trás e uma carga de luz negra, ultravioleta entrava pela porta da entrada.
Não havia uma forma definida, só uma distorção no campo gravitacional mostrando que havia algo escuro ali.
Sean tentou mais uma vez abrir a porta, mas estava trancado, pego na armadilha, na mira de alguma coisa.
Um odor de enxofre tomou conta do ar.
— Sr. Queise?! — a voz de Adriana de repente se fez ouvida por perto, após o estrondo de mais tiros repercutirem pelos corredores.
Sean viu que uma sombra se arrastava ali, e se jogou com todo seu peso contra a porta, no entanto ela não abriu. Atirou uma, duas vezes na maçaneta e o alienígena de luz negra se aproximava rápido. Sean atirou a terceira e a quarta vez e a maçaneta se partiu em pedaços como acontecera no espaço. Ele não parou para as lembranças, se jogou na porta trancada derrubando-a, lançando-se para outro salão, por sobre mesas, cadeiras, e mais o que tinha pela frente.
Alcançou outro corredor e o odor se intensificava. Um jogo de escadas de emergência e Sean a desceu em descompasso, alcançando o salão de café da manhã que ficava no 1° e 2° andar, encontrando o salão do 1° andar lotado de pessoas que estavam ali, debaixo das mesas, se escondendo.
— Vamos!!! Vamos!!! — Sean gritava. — Temos que sair daqui!!! — empurrava um e outro.
— Não! Não temos para onde ir! — um homem apontou a janela mostrando uma Miami inundada.
— Estão atirando para todos os lados!
— Mas a cidade está inundada!
— Não! Não! Precisamos sair! — Sean se desesperava levantando um e empurrando outro sem conseguir. — Precisamos procurar outro lugar. Isso aqui vai... — e todas as paredes envidraçadas explodiram pela pressão dos ventos que se tornaram furacão.
Primeiro e segundo andares, invadidos pela ventania e água.
— Ahhh!!! — gritos e enxofre invadiram os andares, o salão, e o alienígena de luz negra outra vez não se moldava em nada.
Sean ergueu-se em meio aos vidros estilhaçados se jogando porta fora, alcançando o corredor em meio a tudo que era invadido pelas águas em fúria, pelo vento fenomenal que inundava corredores, salas e quartos do hotel, provável todos os hotéis de Miami.
As pessoas nadavam, levantavam e caíam na água fria, suja que se misturava a sangue e lágrimas, que inundava tudo.
Sean atravessou portas atrás de portas, sabendo que o alienígena feito um borrão de luz negra podia alcançá-lo mais rápido se quisesse.
“Ele está me testando?”, pensava incoerente quando o gerador de emergência foi desativado dentro dos salões os deixando no escuro.
Novos gritos ecoaram pelo hotel.
— Sean?! — chamava Adriana cada vez mais perto.
— SEAN? — alguma coisa também o chamava.
Sean temeu a voz, o escuro, o medo, e tudo mais que havia ali. Correu sem rumo sabendo que o alienígena o seguia, quando mais corpos se fizeram à sua frente, em meio ao caos, água fria, vidros, mesas e cadeiras viradas.
E cada vez mais pessoas corriam, gritavam caíam umas sob as outras, com Sean saltando entre uma e outra.
— Adriana?! — Sean a chamou.
— Sean?! — ela respondia.
— Adriana?! — e a imagem de algo escuro, em meio ao sangue e pessoas mortas e feridas o fez estancar; uma imagem que distorcia o campo gravitacional. — O que é você?
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO!!! — gritou o alienígena de luz negra fazendo quadros, mesas, cadeiras, toalhas, talheres e pessoas serem erguidas do chão.
— Ahhh!!! — gritou Sean pelo susto de ver tudo se dirigir para cima dele, arremessados contra ele feito flechas lançadas.
Sean ergueu a mão e tudo parou no ar, desenhou seu contorno, passou por ele, não o atingindo. Adriana viu aquilo acontecer no que alcançou o caos, viu as coisas passarem por ele, extasiada com os dons dele, sabendo que aquilo era só uma amostra.
Mas Sean tinha problemas maiores.
— AAAAUUUURRRRIIIITTTTOOOO!!! — gritou o alienígena e todo piso roeu.
Sean correu no que o piso trincava, se abria. Jogou-se no elevador vendo o alienígena de luz negra desaparecer no que a porta fechou. A casa de seus sonhos o alcançava e Sean desesperava-se em apertar todos os botões. Mas o elevador estava descendo, provavelmente para o térreo, para a água.
Agarrou-se nas laterais do elevador no que esse estancou levantando água, fazendo um som característico de algo mergulhando nela. Sean socou o teto e abriu o compartimento, fazendo a água inundar o elevador. Prendeu a respiração e deu um jogo de corpo saindo do elevador na piscina de água fria que se formou o compartimento do elevador.
Alcançou uma escada de ferro colada as paredes dos elevadores quando o ar já se esgotava nos pulmões, e subiu a escada no que contou dez andares.
Atravessou o vácuo e forçou a porta de metal que se abriu no décimo andar, avançando molhado pelo corredor, voltando às escadas agora congestionadas por hóspedes e pessoas que erroneamente no hotel se refugiavam, e subiu mais e mais andares alcançando o andar de seu quarto, atrás do notebook.
Entrou em total exaustão arrancando o resto de roupa que estava na mochila, e enfiando o notebook num saco plástico da lavanderia, guardou-o na mochila. Colocou um tênis e roupas secas e saiu novamente escadas abaixo até o quinto andar, onde sabia havia uma grande varanda. Queria alcançar alguma rua que ainda por ventura não houvesse sido inundada, e de lá fugir atrás de socorro.
— Adriana... — recordou-se da Tenente-coronel.
“Droga!”, Sean desceu novamente ao terceiro andar para ver se conseguia vê-la do Átrio, já que o segundo andar estava sob as águas, mas lá, em meio à água e caos, só havia seguranças do hotel e socorristas de Miami, que recolhiam pessoas afogadas, e salvava as pessoas feridas, as atendendo.
A luz de emergência acendeu e voltou a rarear, Sean olhou para cima, olhou para baixo, e somente seguranças e socorristas. Olhou novamente para cima, e uma luz esverdeada, uma aurora boreal penetrava pelos vãos antes ocupados pelas janelas, agora quebradas.
— Não!!! — arrancou o notebook a tiracolo e saltou na água feito uma piscina. — Saiam!!! Saiam!!! — gritava e empurrava os seguranças e socorristas para a escada interna, quando outra vez os ventos ininterruptos de 165 nós formaram um furacão, que levantou todos, mortos e vivos, os lançando ao terceiro andar, e explodindo todos os vidros de todos os andares, de todo o hotel.
Sean os sentiu passar por ele, por sua roupa que rompeu, por seu corpo que sangrou, caindo ajoelhado sentindo que os vidros havia realmente levado toda sua energia.
Caiu desacordado.
21
Jackson Memorial Hospital; Miami, Flórida.
25° 47’ 29.49” N e 80° 12’ 45.27” W.
10 de setembro; 16h55min.
— Sean... — a voz de Adriana parecia longínqua.
Sean abriu os olhos. Viu a luz no teto do quarto do hospital para onde fora levado.
Adriana lhe fazia um carinho na testa. Lá, também, um grande curativo.
— Onde...
— Não fale muito. Fomos resgatados pelo Corpo de Bombeiro de Miami Beach.
— Eu... — Sean tentou levantar e caiu de novo na cama.
— Não fale. Consegui uma ambulância para levá-lo a uma clínica particular.
— “A uma clínica particular”? Para que preciso...
— Está ferido. Precisa de um lugar seguro.
— Estou bem — tentou se levantar e voltou a cair; ficara claro que não estava nada bem.
— Não adianta agora.
— O que não adianta Adriana?
— Seus dons. Você não os usou.
— E por que acha que não usei?
— Deixou os vidros lhe cortarem depois de desviá-los anteriormente.
E Sean não soube realmente o que pensar daquilo.
— Não sei usá-los sob pressão Senhorita. Não fui preparado para isso.
Mas Adriana sabia que ele fora preparado, e que por algum motivo, Sean desligou seus dons.
— Está bem! Vamos! Depois discutimos isso!
E tudo aquilo sou como ordem.
— Você vem?
— O seguirei em outro carro. Não posso ser vista entrando na mesma ambulância que você ou os homens da Poliu me reconhecerão.
— Poliu?
— Estão por toda parte — e Adriana o colocou numa cadeira de rodas e ambos sumiram do quarto.
— Eu vi Bruno!
— Eu também o vi. Cheguei logo após o primeiro andar do hotel ser tomado pelas águas. Na cabeça desvairada dele, somos todos inimigos.
— Você é minha inimiga também? — sorriu cínico vendo ser levado por um hospital estranhamente vazio. — Preciso ficar na duvida se quiser sobreviver, não? — Sean chegou à ambulância que estacionava de ré.
Homens de mãos ‘molhadas’ por uma grana fácil o colocaram ainda na maca.
— Leve-o! — ela deu a ordem no bater da porta da ambulância.
A ambulância começou a andar e Sean percebeu que as amarras que o prendiam à maca estavam frouxas; soltou-as ainda vendo Adriana se afastar para a outra extremidade do estacionamento, e entrar num carro Honda enquanto viravam a primeira quadra. Ali também, Mr. Trevellis parado na porta do estranho e vazio hospital, fazendo todos os pelos do corpo dele se erguerem.
“Que lugar ideal para se sumir com alguém!”, olhou a ambulância o levando para um lugar do tipo seguro.
Olhou em volta, a ambulância era bem equipada. Sean abriu algumas gavetas encontrando ataduras, esparadrapos cirúrgicos, alguns pequenos tubos de plásticos fortes o bastante para resistir a um esforço empreendido, e uma pequena janela de vidro que separava os dois enfermeiros da área traseira da moderna ambulância arrebentou em cima do rosto do ajudante de enfermeiro, que desmaiou. O impacto fez com que o enfermeiro motorista fizesse a ambulância sair da pista.
Buzinas se ouviram ao longo da larga avenida que acabavam de alcançar, e o enfermeiro motorista tentou reaver o controle da ambulância, apesar do susto com o jogo de corpo do jovem empresário que passara pela janela quebrada, e agora tentava amarrar seu pescoço com os finos tubos que encontrara.
A ambulância voltou a se descontrolar, subindo em cima da calçada, erguendo sacos de lixo que explodiram para todos os lados, e o enfermeiro motorista socou Sean que se projetou para cima do ajudante de enfermeiro desmaiado.
Sean sentiu que sua testa e o curativo nela se encharcaram de sangue.
— Desgraçado! — e Sean ainda caído, chutou o estômago do enfermeiro motorista.
Um carro que entrava na rua foi colhido pela ambulância na contramão. Os dois carros se arrastaram por distâncias consideráveis, enquanto Sean tentava arrancar o bravo enfermeiro motorista do controle da ambulância, e um caminhão de combustível se desenhou na sua frente; eles o viram pelo reflexo no vidro.
— Ahhh!!! — gritaram uníssonos.
Sean puxou o volante e a porta se abriu fazendo o ajudante de enfermeiro, desacordado, ser jogado para fora, projetado para cima do capô do carro que corria ao lado.
Adriana viu tudo acontecer, mas acabou presa no congestionado formado por carros batidos pela ambulância ainda desgovernada, que se chocava com mais carros, atravessando sinais fechados, levantando caixas pelas calçadas.
— Solta desgraçado!!! — tentava Sean chutar o enfermeiro motorista.
— Vá para o inferno!!! — berrava o enfermeiro motorista.
Sean lutava sem conseguir arrancar o volante quando um soco o jogou novamente no chão da ambulância. O enfermeiro motorista saltou sobre ele para alcançar o porta-luvas. Sean prendeu a mão dele e a arma que ia ser pega, caiu no chão. A ambulância desgovernada subia e descia de lombadas, calçadas, carros estacionados, em movimento.
Sean ouvia os gritos do lado de fora.
O enfermeiro motorista socou a cabeça de Sean uma vez, duas vezes o fazendo sentir que ia desmaiar. Sean tentou se recuperar e num lance, jogou a arma para o outro lado da cabine.
O enfermeiro motorista se levantou, e ele aproveitou a chance de jogar-se sobre ele quando foi a vez de Sean o socar, uma, duas, três vezes, e ambos lutavam enquanto o volante girava solto, quando uma escola que ficava no fim da rua se fez, com peruas escolares descarregando crianças, e pais e professoras tomando conta de tudo.
Os olhos azuis de Sean se arregalaram e ele não teve alternativa a não ser sumir com a ambulância, ele e o enfermeiro motorista, teletransportando-os. A ambulância que sumiu em meio a gritos de crianças, pais e professores, reapareceu milímetros do muro, como se nunca tivesse saído dali, e a polícia acionada, chegava no susto de todos.
Sean fugiu percebendo que o corte na testa havia reaberto; uma fina linha vermelha que escorria pelo rosto bonito.
Entrou numa pequena vila de casas comerciais com o coração acelerado, com dons nada desligados, e as pessoas se espantando ao vê-lo de camisola branca, ensanguentado, correndo pela rua enlameada pelos estragos do furacão que sumira tão ilogicamente quanto aparecera.
Desconhecedor do bairro e das calçadas por onde fugia, resolveu entrar em ruas menores e menos chamativas, quando um estranho odor tomou conta de suas narinas e ele estancou seus pés.
Uma figura opulenta se deslocava em sua direção e Sean arregalou os olhos azuis mais do que já fizera, mal podendo acreditar no que via.
“Cthulhu!”, só teve tempo de pensar.
Um ser animalesco, bestial, com mais de dez metros, lembrando a forma de um grande dragão verde com asas, tentáculos que saíam por todos os poros e contornos do rosto, braços que se arrastavam atrás dele e Sean pôs-se a correr, nem sabendo como que forças quando uma tontura o tomou por completo, gritos começavam a se aproximar;
Ele viu o chão da calçada ficar branco, viu que pisava em mármore Carrara, que seus sonhos o alcançavam agora acordado.
“Sean?” ecoou.
Sean se apavorou, olhou para frente em meio à casa de seus sonhos.
— Quem?
“Sean?” voltava a chamar, a bela morta.
— Sandy? — balbuciou tonto. — Não pode... Não pode ser...
“Querido! Venha!” esticava suas mãos.
E Sean segurou a cabeça, sentindo que iria explodir, se desprender do pescoço.
— Não!!! — gritou ao se ajoelhar no frio da calçada.
A casa dos sonhos sumira e uma voz rouca tomou seu tímpano.
— VENHA! — ecoava a voz modificada, por entre o alienígena de luz negra que o alcançava, aumentava de tamanho, tomava a altura de quase quinze metros.
— Não!!! — berrou Sean ao se arrastar, já não conseguindo se erguer, dominar as imagens que o alienígena incutia no seu cérebro.
— VENHA!!! — berrava.
Sean olhou para trás. Bruno também se delineava por dentro do horrendo alienígena, quando a alienígena de luz branca apareceu em outra luminescência, e lançou-se para dentro do alienígena Cthulhu, fazendo as duas forças se chocar, lutarem até. O grande monstro tomou a forma de um polvo-humano de dois metros de altura e Sean só teve tempo de arregalar os olhos e correr, porque só aquilo que conseguia fazer naquele momento.
Um vento forte se fazia, um vórtice se seguia, e árvores eram arrancadas na flatulência, na ventosidade; rajadas sem tamanho que fez o corpo de Sean girar, e girar até ser jogado a muitos metros distantes.
— Ahhh!!! — se apavorou ao estatelar no chão para então se arrastar outra vez, correr sem compreender o que acontecia, o que lhe acontecia quando outra rajada de vento subiu seu corpo e Sean foi lançado por cima do alto muro caindo no quintal de uma casa. — Ahhh!!! — suas costas reclamaram da queda, até ele achar que não funcionariam mais.
Por entre as folhagens em que caíra, tentava se erguer, mas tudo doía. Num último jogo de corpo, se ergueu e fugiu quando tentáculos do polvo-humano se agarraram aos tijolos do muro, e Sean viu o alienígena em forma de polvo-humano voltando a crescer, provável pela perda da força da alienígena de luz branca, e ultrapassava a pilha de tijolos, para então a alienígena de luz branca reaparecer, crescer numa altura muito maior, tomando o alienígena de luz negra, a quase envolvê-lo e fazê-lo voltar à forma de polvo-humano.
Sean não parou para entender; caiu se levantou e voltou a cair.
O sangue escorria da boca, da testa. Ele olhou para suas mãos totalmente assustado, sem saber ao certo o que acontecia com os dois alienígenas, nem como ela o dominava daquela maneira.
Voltou a correr e acabou por entrar numa casa de largos portões de ferro, percebendo que não tinha mais como fugir, que o ferro trançado e trabalhado lhe encurralava, que o alienígena o trançara no seu corpo, aprisionara-o, e que ia morrer.
Um barulho seco se seguiu de repente, Sean olhou para trás, e não viu os alienígenas. Olhou para frente e todos os ferros do largo portão se retorceram em sua direção. Sean ergueu as mãos e tocou-os fazendo o ferro voltar ao estado natural. Arregalou os olhou e voltou a olhar para trás não vendo os alienígenas.
Tocou o ferro e eles se envergaram. Voltou a arregalar os olhos, agora sabendo que ele também podia retorcer portões de ferro, e correu. Naquele momento diria que tinha mais mesmo dele próprio do que qualquer medo hobbesiano que lhe surgisse dali em diante.
Uma buzina do outro lado da rua o chamou a atenção, um pequeno carro branco que parava para deixar um bando de jovens numa casa; jovens que chegavam de algum lugar. O homem ao volante pendeu a cabeça para o lado como desmaiado, abriu a porta ainda em estado catatônico e se postou em pé, com a porta aberta e o carro ligado. Sean estava ali, ao lado dele, controlando-lhe a mente, testando tudo, desejando que o homem saísse do carro, que fosse embora.
O homem sem saber o porquê, correu e Sean entrou no carro e acelerou quando uma chuva torrencial desabou novamente e a água barrenta inundou tudo e todos. A água subiu, tomou conta dele no carro, de tudo, da rua inteira.
Sean olhou para os lados desesperado, se afogando e a alienígena de luz vestindo o vestido de chiffon branco que Sandy Monroe usara na noite do noivado, o olhava, criando uma bolha de ar que tomou conta deles, e o carro se pôs em movimento dentro da bolha na rua alagada.
Sean olhou para os lados, extasiado com o poder dela em manter o oxigênio ali, e o poder do carro em se locomover embaixo da água, sabendo que dessa vez os poderes não eram os dele.
E a alienígena de luz branca que compartilhava do mesmo carro, na mesma bolha de ar, ficou lá, quieta, cordata, sentada ao lado dele ao longo de todo trajeto de fuga.
22
Shopping Aventura Mall, Biscayne Blvd; Miami, Flórida.
25° 57’ 29” N e 80° 8’ 35” W.
12 de setembro; 10h00min.
O todo poderoso Oscar Roldman mal acreditou quando Sean Queise ligou pedindo para encontrá-lo na loja de departamentos mais tradicional de Miami. Há quase dois dias, que Oscar o procurava sem encontrá-lo, depois de saber sobre a inundação do hotel, da sua ida ao hospital, do seu sumiço.
E Sean aproveitou para avisá-lo, ainda pelo telefone, que ‘ela’ estava lá.
Oscar entrava no momento que as portas giratórias da loja de departamentos trabalhavam num eterno vai e vem, abarrotada de gente por uma liquidação anual, que acontecia em parte, graças à procura das pessoas em roupas perdidas no inusitado furacão, que nem teve tempo de receber um nome.
Sean estava no 2º andar, encostado em uma das colunas espelhada, olhando a multidão. Fez um sinal discreto e Oscar o localizou; o encontraria em meio qualquer multidão.
— Olá, Oscar! — sorriu Sean maroto, no que ele chegou. — Isso é o que eu chamo de abdução — saiu da frente da moça que se escondia atrás dele.
— Sandy? — Oscar Roldman paralisou pelo que viu.
— Não é o que pensa estar vendo Oscar. Somos nós que os imaginamos assim, porque damos vida às formas-pensamento.
E Oscar olhou Sean e voltou a olhar aquela coisa, escondida num vestido de bolinhas. Seus olhos mal se delineavam, parecendo uma figura vista por dentro de uma parede canelada, opaca.
— Mas ainda sim é Sandy Monroe? — tentava Oscar entender.
— Não é não! — explicou Sean. — Acredite! Não vai querer ver como são na verdade.
— Que coisa extraordinária! — Oscar delirava. — E quando? Como chegou aqui?
— Invadindo computadores! — Sean viu Oscar se erguer. — Todos! Inclusive os seus computadores, Oscar querido! — Sean o desafiava e o nível da conversa tomava outro rumo.
As pessoas começavam a estranhar a luminosidade, pura luminescência de átomos, que escapava das roupas da bela mulher.
Olhavam-se, cutucavam-se, comentavam.
Sean percebeu o quanto a alienígena de luz branca se controlava, percebendo que sua força estava na luz; quanto mais intensa, mais forte a criatura era.
— Não podemos ir a algum lugar mais reservado, Sean? A loja está lotada.
— Não! Acho que o alienígena de luz negra não pode se expor a um público tão grande. Aqui estamos seguros.
— Não entendi.
— Os alienígenas de luzes negras, como ele, temem grandes multidões porque suas luzes incorporam, absorvem um corpo muito rápido. Pessoas com certa facilidade de absorvê-los, que vibram na mesma sintonia fariam com que eles se desmanchassem em várias partes, e isso diminuiria sua força.
— “Vibram”? Quer dizer sensitivos? — Oscar viu Sean afirmar com a cabeça. — Mas ela está aqui, controlada — Oscar apontou.
— Eu a controlo.
Oscar enfim entendeu.
— Mona o ensinou não?
— Não sei. Nunca entendi o que Mona fez comigo.
— Então como...
— Há uma tênue separação de nossa dimensão de outras, Oscar. Tênues branas que vibram feito as cordas de um violino. Se elas vibrarem e se encontrarem, então muitos pensamentos armazenados, divagações, formas-pensamento farão com que os controlemos. Com Sandy no meu pensamento, a tenho sob controle.
— Mas os alienígenas podem se reconstituir outra vez? Após serem controlados?
Sean olhou para a alienígena de luz branca
— SIM! — sua comunicação não era nada telepática.
Oscar deu um salto para trás.
— Não chame atenção, Oscar. Cuidado!
— Ela... — apontou. — Ela falou comigo?
— Isso não é fantástico? — brilhou os olhos.
Oscar Roldman percebeu o êxtase que Sean vivia, olhou em volta.
— Precisamos sair daqui! — olhou o movimento em volta. — Alguém pode nos escutar.
— Não vamos a lugar algum Oscar.
— “Não vamos”? O que é isso? Insubordinação?
— Não sou seu subordinado, Oscar. Nem de Adriana. E você não é meu pai para mandar em mim.
— Como pode... — e Oscar avançou sobre ele recuando no que a alienígena avançou sobre ele.
Oscar engoliu aquilo sem querer ter engolido.
— Vamos ao que interessa?
— Sim, Sean querido. Vamos ao que interessa! — Oscar era inteligente, preferiu uma abordagem mais controlada. — De onde essas luzes, são?
— Não pode adivinhar? — perguntou cínico sabendo que ainda mantinha o poder ali.
— Ípsilon Andrômeda!
— A alienígena de luz branca disse que não sabe como explicar seu nome. Então resolvi chamá-la pelo nome de seu planeta, Yka.
— Yka? O planeta de alienígenas fêmeas.
— Percebo que andou lendo as tábuas, Oscar querido. E falo tábuas no plural.
Oscar o olhou sem saber se havia entendido.
— Você...
— Eu o que? Descobri sobre as três tábuas? Ou hackeei os hackeamentos que pagou ao Dr. Leôncio para fazer nos mainframes da Computer Co.? Mainframes alugados à Poliu? — Sean viu Oscar só erguer o sobrolho.
— Kelly não podia ter dito isso.
— Kelly? Desgraçado! Você usava Kelly sem ela saber? Controlando-a pela mente? Não é homem suficiente para hackear as senhas dela?
— Sou homem suficiente para muita coisa, inclusive não prejudicar a mulher que ama.
E a luz de Yka aumentou.
— Eu não falaria isso de novo Oscar querido. Não vai querer saber que ele só aceita Sandy porque está morta.
— Ela só aceita?
— Não vou falar sobre isso. Sobre isso não! Mas vou querer saber o que conseguiu? Porque sabia sobre o Dr. Leôncio e sua invasão ao meu satélite Spartacus... — Oscar agora nada falou e Sean arregalou os olhos azuis. Porque havia algo se desenhando à sua frente. — Desgraçado duas vezes! — Sean exclamou no que Oscar sorriu cínico. — Foi você quem contratou o Dr. Leôncio, para então oferecê-lo a Poliu que buscava desesperadamente por respostas. Por isso eu não soube nada sobre a invasão a Spartacus, meu pai havia aberto o canal para Kelly, para você invadir Kelly, porque ele era o único que podia lhe deixar fazer isso.
— Isso! — Oscar arrumou os óculos. — O único que podia. Porque seu pai que não lhe deu a educação merecida.
— Então se prepare para algo pior que minha educação, Oscar querido, porque o que o Dr. Leôncio hackeou sobre as tábuas não está completo. E o Dr. Leôncio também não fez o trabalho como devia, porque não tinha tanta inteligência para interpretar o que tinha em mãos, porque o chip de codinome Cruzador Solar é na verdade um chip HAARP, encontrado em Karakum num cérebro humano abduzido, junto a terceira tábua que conta que o chip pode alterar e controlar o tempo/temperatura, provocando ventos, dilúvios e furacões capazes de alertar a ilha a nível 3. Mas isso você já sabia, não? Você e Trevellis e meu pai. Porque os três juntos sabiam o que faziam quando construíram Spartacus.
— Sean…
— Não! Mas deixe-me dizer uma coisinha que a Santa Trindade não sabe... — Sean viu Oscar ficar bravo. —, os poderes de Yka estão muito além da nossa compreensão. Eles dominam todas as forças da natureza. Água, ar, luz, máquinas; inclusive… — pausou para provocar. —, Spartacus e os chips.
— Você me saiu melhor do que a encomenda, não Sean querido?
Sean riu.
— Deve estar no gene.
Oscar sentiu o coração parar por alguns segundos perante a pressão da frase.
— A Poliu... Trevellis sabe que você está aqui?
— Você não sabia Oscar, então ninguém mais sabe.
— Como?
— O GPS na minha pele... — mostrou o curativo. —, eu hackeei o computador que o tinha conectado, e instrui todos os satélites da Poliu a seguirem coordenadas paralelas sempre que minha localização fosse requerida.
— Fez o que?
— Fiz com que a geometria do GPS provocasse um erro matemático. A Poliu não saberá que há algo errado com os satélites e eles darão uma localização pouco aproximada para me dar tempo de fugir.
— Você é louco! Você não retirou o nano chip?
— Não! Eu tentei nesses dois últimos dias procurá-lo com uma ressonância magnética, mas passar por uma pequena cirurgia avisaria a Poliu do que fiz. A única coisa que consegui foi escanear sua serial.
— Por que se arrisca?
— Arriscar-me? Temo o que com minha amiga Yka ao meu lado?
Oscar a olhou novamente, aquela aparência de Sandy o fazia mal. Sentia-se de certa forma, culpado pela morte dela, tanto quanto Sean.
— YKARO! — falou de repente. — LUZ NEGRA! LUZ DO MAL!
— “Luz do mal”? Do que ela está falando, Sean?
— O MUNDO SE ESCURECERÁ! AS ALMAS NÃO TERÃO MAIS COMO ATRAVESSAR O BREU E SE PERDERÃO! A TERRA FICARÁ AOS CUIDADOS DE YKARO, LUZ DAS TREVAS!
— “Almas”? Do que ela está falando Sean? Isso é insano.
— ENTÃO MORRERAM MUITOS! E PELA BARCA SERÃO LEVADOS AO INFERNO PORQUE AS PASSAGENS PELOS TÚNEIS DE LUZ JÁ NÃO MAIS EXISTIRÃO!
Oscar viu Sean no seu mais controle emocional. Não entendeu o porquê de ele nada refutar.
— “Inferno”? — perguntou Oscar.
— Nêmeses! — respondeu Sean.
— Meu Deus do céu... — Oscar mal pôde terminar.
— NINGUÉM REENCARNARÁ! NÃO HAVERÁ REPOSIÇÃO DA LUZ, DO BEM, DOS BONS! SÓ RETORNARÃO OS MAUS, OS ENEGRECIDOS PELA FALTA DE FÉ!
— “La grand estoille par sept jours bruslera. Nuê fera deux soleils apparoir; le gros mastin’ toute nuict burlera quand grand Pontife changera de terroir” — Sean citara Nostradamus para depois olhar Oscar com o terror estampado no rosto. — “O cometa brilhará durante sete dias. O céu mostrará dois sóis; o chefe inglês berrará toda a noite quando o Papa mudar de país”.
— Então Nostradamus viu alguma coisa após a morte do Papa? Qual Papa, Sean? — Oscar desesperou-se.
— Não era um cometa. Na Centúria III, Quadra 17, Nostradamus diz, “Quando o Sol ficar completamente eclipsado passará em nosso céu um novo corpo celeste. O monstro, que será visto em pleno dia; os astrônomos interpretarão os efeitos deste corpo de outro modo; por isso ninguém terá previsões, em face da penúria”. Nostradamus foi o único que compreendeu a vinda de outro Sol, o Planeta X, Nêmeses, Nibiru; o mesmo Nibiru que uma vez esteve nos céus como o 10º planeta, 12º para os sumérios que contavam o Sol e a Lua junto aos dez planetas.
— Sean... Você não pode acreditar nisso...
— Não? Nibiru é o mesmo astro para todos esses videntes, exploradores, místicos, que enxergaram o nosso fim, o apocalipse.
— Escatologia, Sean? Os videntes precedem à chegada de um planeta assassino, assassino por sua excentricidade?
— O Planeta maldito! — e Sean e Oscar não perceberam que estranhos se aproximavam. — Você não está entendendo, não é Oscar?
— Não estou?
— Não! Ykaro é o nosso fim. Uma frota de Ykaros que orbitam o Sol e lá se escondem, esperando o retorno de Nibiru/Nêmeses para jogar a Terra, mais uma vez contra o Universo, e se apoderar do planeta de uma vez. O ainda de qualquer outro planeta em que possam fazer sua nova casa, sua colônia.
— “Colônia”?! — quase gritou.
— Sim. Somos indesejáveis para os polvos-humanos Ykaros. Assim como o alienígena escravo encontrado em Karakum com um implante.
Oscar não sabia mais o que pensar.
— Como eles podem dominar Nêmeses e o tirar dessa órbita tão próxima, e jogá-lo contra nós, Sean?
— Codinome: Cruzador Solar.
— O chip Cruzador Solar sabe?
— Não o chip Cruzador Solar, Oscar, o projeto todo, o projeto Codinome: Cruzador Solar, controlador de clima e de todas as forças da natureza. O HAARP que controla o tráfego de UFOs porque uma segunda tábua foi encontrada em Roswell e escondida pelo Dr. Jèsus, pai de Carminna — Sean sabia que Oscar sentiu o chão sumir-lhe. — A 1° tábua contava sobre os alienígenas Anunnakis, que fizeram experiências genéticas para criar o homem. O chip instalado em Bruno, e falo do primeiro chip instalado em Bruno, e que foi encontrado em Roswell em 1947, porque Bruno deve ter mais idade do que nós dois juntos, porque Bruno é um híbrido encontrado na queda de Roswell.
— Formas-pensamento Sean?
— Todas que pude compreender. Porque também compreendi que Bruno saiu do controle emocional, e nada avisou a Sala de Controle Ala Cinco, além da vinda de alienígenas Anunnakis à Terra e a criação de Cthulhus. Então a Poliu tirou o chip, e se voltou ao chip de Karakum, batizado de Cruzador solar, avariado e calcificado, e que enviou ao espaço a fim de estudarem através de um satélite de observação MX-1, como o chip Cruzador Solar se comunicava com esses alienígenas, já que meu pai, envolvido mais do que dizia com a construção de Spartacus, não abriu mão dos mainframes da Computer Co..
— Sean...
— Sean?
— Você não fez, fez?
— Fiz? Só fiz-me compreender que força espetacular tinha os chips que os alienígenas trouxeram à Terra, não Oscar? Durante esse tempo no espaço, a Poliu descobriu sobre o HAARP e construiu uma réplica para entender como tudo acontecia. Porque pode imaginar agora o que significaram destruições anteriores? O dilúvio da Bíblia, dos sumérios... A Poliu queria essas informações, Oscar, essas e mais algumas. E conseguiram através de Noah, que vendeu à Poliu uma informação sobre a família Clemente até então desconhecida da corporação de inteligência, e de que havia ali dons paranormais não desenvolvidos. Então, a Poliu foi até a fazenda de Jèsus Clemente, em Mountak, para estudar os dons psíquicos de sua filha Carminna, ou Marina se quiser assim — Sean sabia que Oscar, no fundo não queria acreditar que ele sabia. — Mas o Dr. Santos descobriu que na verdade Carminna era mais que uma jovem estudiosa de assiriologia, bem dotada aos seus 22 anos e com dons paranormais; era a experiência viva de seu pai, que como Bruno, era uma hibrida encontrada na queda de Roswell, com um chip.
— Carminna tinha um chip instalado nela?
— Não sei. Não dormi com ela para saber... — se divertia. — Mas Carminna tinha a segunda tábua, do acidente de Roswell.
— E o que Trevellis fez?
— Ofereceu uma colaboradora a Carminna, para que ela escrevesse livros, esperando que ela contasse algo.
— Sean... Meu Deus...
— “Deus”? Não... “Trevellis”! Um semideus que acha que o mundo gira em torno dele, provável até gire porque ele conseguiu levar Carminna à Sala de Controle Ala Cinco, e lá forçá-la a entregar a tábua sumida, a tábua das rotas. E Carminna sabia que estaria numa enrascada se desafiasse a Poliu, porque resolveu entregar. Mas sendo ela uma hibrida, só ela podia ler a tábua porque o implante do segundo chip já estava no seu cérebro desde pequena, o implante que ‘lê a tábua’; provável até que seu pai Dr. Jèsus fez da sua filha para aquilo. E Trevellis sabia, que Carminna sabia sobre as rotas que a tábua contava, mas os livros nada falavam. Então Henrique tentou, mas nenhum homem arrancou toda verdade na ‘cama de Carminna’, e então vocês precisavam do meu dom, provável do meu corpo para arrancar tal verdade dela. E sabe como vocês fizeram isso?
— Eu não fiz...
— Cale-se!!! — Sean gritou agitando mais ainda o interior da agitada loja de departamentos. — Vocês disseram que iam destruir Spartacus sabendo que eu não deixaria isso acontecer, e vocês sabiam que os astronautas podiam alcançar o chip, como, aliás, puderam, ao soltá-lo de Spartacus sem o danificar, mesmo porque Spartacus nunca se comunicou com o chip; vocês tinham MX-1 para isso, e tinham Nadir com o implante do primeiro chip que não deu certo em Bruno, reinstalado nela, para se comunicar com MX-1. Droga!
— Eu sinto muito meu filho que você...
— Sente! Claro! Mas Carminna morreu antes de contar a Nadir e a vocês. E sabe o irônico de tudo isso Oscar? — riu nervoso. — Não havia nada a ser contado. Não há datas, locais de ataque, quantidades de cruzadores; nada! Só mitos! — Sean viu Oscar arregalar os olhos por detrás das lentes grossas.
— Então ela lhe disse...
— Disse! Em entrelinhas! Que há cálculos, como os de Lescarbault, que dizia no ano de 1860, após calcular uma órbita para o objeto, um período de 19 dias e sete horas, distância média do Sol de 0,1427 UA, inclinação de 12º 10’, e no do ascendente a 12º 59’, então temos menos de uma semana até o retorno de Nêmeses! — exclamou furioso. — Mas não há Nêmeses!!! — gritou. — E Ykaro e os Cruzadores Solares não sabem disso!!!
— Não sabem... — Oscar olhou Sean, olhou Yka e voltou a olhar Sean. — Meu Deus do céu... — Oscar voltou a encarar Yka e a imagem de Sandy que realmente o perturbava. — Então os Ykaros vão nos atacar porque acham que… Como podemos deter os tais Ykaros?
— As tábuas Sumérias nos contam que outros deuses queriam exterminar Tiamat então chamaram Marduk, que aceitou matá-la se fosse coroado Deus supremo.
— E quem é Marduk, Sean?
— Rani, a agente de Adriana; agente da Poliu que foi emprestada a Carminna como colaboradora a fim de descobrir algo.
— Quem é Rani?
— Droga Oscar!!! — explodiu. — Você sabia sobre Rani! A balinesa, vivendo em ilhas próximas a sua ilha paradisíaca, chamada pela Poliu para matar Carminna após descobrir que não havia nada na maldita tábua!
— Eu não sei quem é Rani! — exclamou Oscar nervoso.
— Mas sabe sobre Bali, não? — enervava-se. — Sabe que Adriana e mais alguém da Poliu tinham uma base de estudos lá, próxima a ilha da Polícia Mundial, e que lá mora a agente Rani, uma física teórica, ou como os cientistas chamam, uma cientista do apocalipse, escatológica; “Bem aventurados aqueles que leem, ouvem e guardam as profecias deste livro, pois o tempo está próximo”.
— E por que Rani é importante?
— Porque ela sabia sobre alienígenas abastecendo suas naves no Sol!
— Acha que Ykaro está...
— YKARO MAL! — Yka enfim falou.
— Como você e Ykaro chegaram até aqui?
— NA NAVE DE SEAN! — Yka olhou para Oscar como que deslumbrada por Sean Queise. — FIZ BOLHA DE AR NA CASA DE SEUS SONHOS! NO CARRO TAMBÉM, POR RUAS ALAGADAS!
Oscar ergueu o sobrolho para ele.
— Por que veio Yka?
— PRECISAVA VIR, ENTENDE? AVISAR DA INVASÃO DE YKARO! PARA EQUILIBRAR!
— Vocês precisam um do outro para haver equilíbrio, é isso?
— IMPOSSÍVEL YKARO FICAR SEM YKA! IMPOSSÍVEL YKA FICAR SEM YKARO! FORÇA EU TENHO! CONTROLO A MALDADE DE YKARO!
— Controlam maldade, bondade e todas as forças da natureza — Sean completou. — Controlam ‘Tales’, ‘Anaxímenes’, ‘Heráclito’ e ‘Xenófanes’, os filósofos pré-socráticos que acreditavam que as coisas tinham por trás de si um princípio físico, material, chamado arché.
— Meu Deus Sean... Tem mais deles aqui na Terra? — Oscar perguntou.
E Sean não pôde responder porque gritos ecoaram por toda loja de departamentos.
Yka sentiu-se tonta.
— YKARO ESTÁ ME CHAMANDO! — e começou a segui-lo.
— Não, Yka! — agarrou-a. — Ahhh!!! — um choque fez o braço de Sean soltá-la e seu corpo ser lançado longe.
Alguns clientes da loja olharam-no no que Sean foi arremessado em cima das araras de vestidos. Oscar correu e ajudou-o a se levantar e homens de terno preto, agentes da Poliu se aproximaram também.
— Sr. Oscar Roldman! Sr. Sean Queise! — os dois se olharam. — Me acompanhem sem chamar atenção! — insistia um dos homens de terno preto armado.
Yka, envolta no vestido de bolinhas, volitava. Sean viu os belos sapatos usados pela Sandy imaginária se soltarem ao longo do caminho. Viu ainda uma espécie de tentáculos se arrastando pelo carpete da loja.
— Meu Deus! — exclamou Sean extasiado.
O chapéu de Yka caiu, e uma forma de rosto translúcido apareceu. Uma mulher na multidão gritou quando a força de Yka aumentou, e todas as atenções se dirigiram para a gritaria que começava quando Sean escapou das mãos dos agentes da Poliu.
— Sr. Sean Queise, espere! — tentou um dos homens de terno preto segurá-lo.
Yka irradiava uma potência cada vez maior e um tumulto se iniciou dentro da loja. Um cheiro de enxofre penetrou nos tubos do ar condicionado central e Ykaro irradiava sua força, sugando a luz de Yka.
Gritos foram dados na porta da loja, Ykaro parecia inchar, dilatando seus enormes tentáculos, começando a se soltar de Bruno que caiu no chão desmaiado. Ykaro já não mais precisava dele, tinha Yka ao seu alcance, que tinha Sean sobre controle.
— SEAN? — chamava Yka. — AJUDE-ME!
— Yka?! — berrava Sean junto às pessoas por onde tentava passar, alcançando a escada rolante em meio há muita dificuldade.
— SEAN? — chamava Yka desesperada. — YKARO! DOMINANDO-ME!
As pessoas tentavam se afastar da luz que desmanchava o corpo da bela mulher. Sean a tinha em seu campo de visão, corria a descer pela escada rolante que subia, tentando alcançar Yka, que acabava de chegar ao andar térreo.
— Yka?! — Sean gritava. — Sandy?! — e Sean viu Ykaro o encontrar naquele nome.
Seu rosto esverdeado, seu corpo de dragão delineava-se na mesma proporção do de Yka, e gritos se espalharam, com algo invisível atravessando corpos, tentando chegar a ele.
“Laser!” e Sean viu pessoas caindo à sua frente.
Sean deu meia-volta, começou a subir outra vez sentindo o cheiro de pele queimada atrás dele. Duas mulheres caíram aos seus pés, mortas, aniquiladas pela força da luz, e ele olhou em volta atordoado, enquanto gritos de terror ecoavam pela loja toda.
— Sean, cuidado! — Oscar num descuido dos homens de terno preto da Poliu, correu para as escadas rolantes, estancando após ver o corpo de Sean ser pego pelo grande tentáculo.
Sean foi erguido e arremessado para longe, caindo no outro extremo da grande loja de departamentos.
Ykaro voltou a incorporar o corpo de Bruno.
— ÓDIO!!! — berrava. — IRA!!!
Seus tentáculos ultrapassavam os quatro metros de altura iniciais se esticando por toda a loja, arrastando tudo e todos.
Ykaro tentava alcançar o corpo de Sean que outra vez fugia aos tropeções, em meio às araras de roupas, enfiando mãos em roupas, voltando à casa de seus sonhos, vendo que já não havia pessoas, gritos, nem roupas, que pisava mármore branco que não reverberava. Em volta dele, pessoas com tentáculos saindo do rosto, sorrindo-lhe num grande salão para então asfixiarem-se, caírem mortas no chão, sem ar.
Sean voltou à loja, aos gritos, à morte, sabendo agora que fora Ykaro quem provocou a morte do próprio planeta alienígena e de seus habitantes polvos-humanos, que provável, os Cthulhus Ykas e Ykaros seguiram Ykaro em Cruzadores Solares e que estavam no Sol, esperando.
Ykaro lançou mais uma vez os tentáculos para o alto, atingindo alguns spots presos a uma grande grade de iluminação, fazendo-a despencar dois metros a partir do teto com a força empreendida, e lá ficar dependurada, provocando o incêndio que se seguiu após explodir todas as lâmpadas alógenas da grande loja de departamentos.
O pânico e o caos cresciam exponencialmente pela grande loja de departamentos, e a grade de iluminação balançou outra vez, trincando numa das barras de proteção, lançando-se no espaço atingindo o manequim ao lado de Sean, que arregalou os olhos.
Havia muito mais que uma barra atravessada no manequim, havia réstias de calor, de laser, no que outro tentáculo se arrastou em sua direção, e Sean ergueu-se e correu como pôde e conseguiu.
— Yka?! — berrava Sean. — Tire a força dele!!! Você pode!!!
Ykaro ouviu aquilo, enraivecendo cada vez mais. Havia liberado Bruno outra vez e Sean viu o corpo dele ser levado por homens de terno preto que acabara de reconhecer.
— Sean?! — chamou Oscar.
— Oscar?! — gritou para ele, apontando.
Oscar já desvencilhado dos primeiros agentes da Poliu percebeu o que Sean queria, viu o híbrido Bruno ser levado para as portas de vai e vem, e correu atrás enquanto os tentáculos de Ykaro se chocavam incessante pela estrutura da loja, parecendo não ter limites.
— IRA!!!
Rachaduras começavam por toda à parte. Os vidros se estilhaçavam, e as roupas eram jogadas a esmo na ventania fenomenal.
Yka se concentrou e toda a força usada, fez Ykaro desmanchar-se num polvo molhado, gelatinoso e enfraquecido. Sean aproveitou e correu, mas Ykaro tirou a força de Yka num jogo muito mais rápido e foi ela quem se desmanchou no chão.
— Yka?! — gritou Sean a vendo morrer. — Não!!! — se lançou para a corda que sustentara uma vez a grande grade de iluminação da loja, mas tentáculos de Ykaro se enlaçaram em sua cintura num último esforço, e as mãos de Sean escorregaram das cordas de sustentação até ir ao chão da loja, ferido, desmaiado pela queda e emoção.
Mais homens de terno preto da Poliu invadiram a loja fechando todas as portas, começando a dispersar todos para fora, com sirenes se espalhando por todo o bairro, em meio a câmeras de televisão que chegavam também.
A Poliu correu a cobri-los com uma grande capa preta.
23
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
Complexo A; setor de alojamento.
15 de setembro; 11h11min.
Sean acordou e percebeu que voltara para a ilha secreta; no mesmo quarto-sala, na mesma cama conhecida, no quinto andar, setor de alojamento do Complexo A.
“Mas que droga!”, pensou sentindo dores pelo corpo todo, e apesar de estar dias dopado, a queda o havia machucado até mais que supunha.
Tentou se levantar com dificuldades, se apoiando nos móveis tentando se locomover, mas um tombo o levou ao chão. Junto, tudo que estava sobre a mesa quebrando a luminária, mostrando a câmera e a escuta escondida, que vieram ao chão. Sean arregalou os olhos azuis, e os fios ainda estavam entrelaçados em seus dedos quando descobriu afinal.
A Poliu sabia o tempo todo sobre os alienígenas.
— Desgraçados! Carminna nunca fizera relatórios! — se levantou agora com sucesso.
Chegou até a porta, agora sem ser visto pela câmera que acabara de destruir.
Complexo A; laboratórios subterrâneos.
15 de setembro; 11h33min.
— Mr. Trevellis? — chamou o oficial de segurança na mesa de observação, apontando para a câmera desligada. — Ele descobriu! Sr. Queise descobriu a câmera escondida na luminária.
— ‘Filho de Oscar!’ Mas que inferno! — esbravejou Mr. Trevellis saindo do laboratório subterrâneo onde Hanna e Noah trabalhavam paramentados, chegando ao corredor, ao carrinho de locomoção, às escadas, ao térreo do Complexo A, e ao quarto-sala de Sean após notável corrida. — Vazio! Inferno! — e Mr. Trevellis correu e voltou a descer aos laboratórios subterrâneos. Dra. Hanna Cahs o viu gritando. — Fechem os vidros!!! — ele sacudia os braços para o alto. — Fechem!!! Fechem os vidros!!!
Todos se olharam, os oficiais de segurança apertaram muitos controles e uma parede de vidro começou a se fechar escondendo, agora, o laboratório onde Hanna, Schumann, Santos, Noah, Nadir e Andrea, trabalhavam.
Os cinco se olharam, olharam para os dois alienígenas presos numa Gaiola de Faraday e nada disseram.
Complexo C; setor de gerenciamento.
15 de setembro; 11h33min.
Uma chave de braço e Sean dominou o oficial de segurança ainda na porta principal do Complexo C. Caminhou o corredor estreito, e viu o Major Henrique Loyola passar por duas salas, e entrar numa terceira porta, sentar-se na sua mesa sem perceber o convidado inesperado.
— Que susto! — Henrique pôs a mão no peito.
— Sua sala particular ficava neste setor? Nunca soube — Sean olhou em volta como quem interessado na decoração.
— O que faz... — olhou para os lados sem compreender. —, aqui.
— Estou te sequestrando! — riu irônico. — É bom falar a mesma linguagem do inimigo.
Henrique Loyola gargalhou.
— Não sou seu inimigo, Sean.
— “Sean”? Desde quando voltamos a ser íntimos? — Sean viu o Major Henrique voltar a rir. — Não vai achar tanta graça depois que eu te contar que vai gastar um pouco de seu dinheiro e tempo para viajar... — sorriu cínico. —, para o Sol, para devolver os Cthulhus — Sean viu Henrique Loyola voltar a rir. — O que? Achando que estou louco? — e foi a vez de Sean rir. — Até pode ser, mas você vai levantar voo, sim.
— Acha que vai tirar o carro da garagem, Sean? — estalou os dedos. — Fácil assim?
— Não vou a nenhum lugar, Henrique. Você não entendeu; não, não, não. Você vai devolver aqueles dois alienígenas, vai consertar o estrago que o chip Cruzador Solar de alguma forma fez! — vociferou.
Henrique ficou segundos preciosos tentando decifrar o olhar de Sean, o tom ácido da sua voz.
Não conseguiu, porém.
— Ainda achando que o chip se comunicou com uma...
— Foi a Poliu, Henrique! — Sean agora viu o magro e esguio Henrique não saber o que falar. — Mais precisamente, foi o Dr. Santos e seu pupilo Noah — Sean sorriu cinco. — Eles conseguiram fazer o chip enganar Yka e Ykaro de alguma forma, já que estudavam ondas cerebrais em abduzidos como Marina, ou diria, Carminna, com quem dormiu?
— Está louco — Henrique riu já não com a mesma força.
— Sabia que Noah descobriu que os ‘Suncruiser’ estão ao redor do Sol esperando algo, mas não entendeu a real situação disso tudo?
— “Esperando algo”? — repetiu.
— O que, major? Você não sabia de nada? Não sabia, por exemplo, que o General Arthur La Hera participava da jogada? — Sean deu pausa. — Que preparou Rani pessoalmente para que ela, através de seu conhecimento sobre o fim do mundo e uma enlouquecida seita de escatológicos chamada ‘A Última Sentença’, explodissem um centro de compras em Bali, para provocar tumulto, trazendo assim interesse para o apocalipse? Não sei se Rani ainda faz parte da seita, mas ela sabia, assim como Carminna sabia, interpretar algo que escapou da Poliu de Mr. Hawgths, algo na tábua de Socorro, a primeira tábua, onde havia dizeres em escrita cuneiforme sobre um UFO do tamanho de um planeta, estacionado no Sol, com muitos Cruzadores Solares dentro.
— Com… Dentro…
— Sim! E com muitos Cthulhus dentro, e com muita IRA! dentro, prontos para assumir o Planeta Terra.
— A queda lhe afetou... — gargalhava Henrique.
— Me afetou mesmo, foi quando descobri que uma vez que destruíram seu planeta e seus habitantes Anunnakis, aqueles que os fizeram aberrações genéticas aqui, na época dos sumérios, estão prontos para destruir-nos por vingança.
— A queda realmente lhe afetou!
— Me afetou! E quando caio descubro que os mesmos dizeres que Brazel achou inscritos nas barras de metal, que encontrou em seu rancho após a queda de um UFO em Roswell, em 1947... — Sean ouviu Henrique rir outra vez. —, já não são mais necessários, Major, porque Yka e Ykaro se comunicam conosco.
— “Conosco”? — repetiu.
— Porque eles contam-nos coisas.
— “Contam-nos coisas”? — repetiu.
— Algum problema de comunicação, Major? Falo outra língua que não fale, já que não falo alienígena? — estava tremendamente nervoso. — Eu disse que a Poliu pode conseguir informações diretamente com os alienígenas Yka e Ykaro, para fazer só Deus sabe o quê, porque sempre tiveram alguém aqui na ilha, uma psi preparada para se comunicar com os alienígenas; Nadir Berthand! — Sean viu a estabilidade de Henrique ruir. — Incrível Nadir, não? Uma híbrida nada desclassificada como ficou provado — foi a vez dele rir. — E era a híbrida Nadir e não a híbrida Carminna quem se comunicava com MX-1 — Sean viu o suor escorrer de Henrique. — Não, não li sua mente, não se preocupe. É que quando fui arrastado pelos gramados, num ataque de ciúme de Yka, Nadir veio aqui passar uma toalha quente no meu rosto, e ela viu Yka comigo, sentada na cadeira vazia, que não estava vazia — Sean pôde ouvir a aceleração do coração de Henrique. — E agora eles estão lá, Hanna, Schumann, Santos, Noah, Nadir e Andrea, trancados com Yka e Ykaro, sob as ordens de Trevellis, que mandou fechar as paredes do laboratório para que eu não descobrisse os alienígenas na Gaiola de Faraday — gargalhou. — Ok! Agora eu li isso na sua mente — gargalhava com muito gosto.
— Quem é... Quem é Yka e Ykaro?
— Não os conhece? Wow! Você é o único na Poliu que não leu a tábua de Roswell que falava sobre Anunnakis, genéticas, macacas e Cthulhus? — riu. — Ah! Deve ser porque Carminna escondeu e só disse o que queria dizer a menos que dormissem com ela — riu. — Mas você tentou dormir com ela, não foi Henrique? E acabou como os que muito tentaram e nada conseguiram — gargalhava com mais gosto ainda.
— Você está louco, faltou oxigênio no seu cérebro.
— Não, faltou não!!! — gritou e tudo sobre a mesa, na estante, e provável em mais outras salas tombaram pela fúria paranormal dele. Henrique viu os porta-retratos caídos em sequência e o encarou. — Mas vocês bem que tentaram! Prepararam o caminho quando me hipnotizaram!
— Isso é loucura! Como acha que a Poliu traria o chip Cruzador Solar sem precisar passar pela Sala de Controle Ala Cinco em peso?
— Não sei, talvez copiando? — Sean sorriu cínico, o sabia ser. — Dra. Hanna Cahs tem cópias das informações do chip Cruzador Solar sabia? Ela tem todas as informações sobre o conteúdo do chip, tirados de MX-1 através de Nadir — e ele viu que Henrique Loyola não respondeu; nenhum movimento, um músculo se quer. Sean cerrou os olhos. — Sabia das cópias, não é? Droga! Sabia que o General Arthur La Hera tentaria algo, então a Poliu fez a Dra. Hanna copiar antes através da mente de Nadir, as informações dentro da cabeça de Bruno. Por isso o Dr. Santos estava tão bravo com minha entrada nos laboratórios subterrâneos. Ele temia que eu achasse o que Gyrimias achou para mim hackeando meus próprios mainframes; as pesquisas feitas em Marina/Carminna, Rani, e a psi Nadir que agora tem três chips enfiados no cérebro dela — Henrique fez uma mesura e Sean quis socá-lo. O Major Henrique recuou temeroso e Sean prosseguiu. — E sabe qual a ironia de tudo isso Henrique? É que vocês deviam ter me deixado lá, sossegado no meu escritório, com uma bela espanhola trazendo café para mim, imaginando qual seria a próxima roupa que ela compraria para ficar mais bela que já é, esperando que um dia eu enxergasse tudo aquilo.
E tudo o que havia caído voltou a seu lugar. Henrique viu peça por peça, sabendo que os dons dele não eram só aquilo, nem que Sean ficava quieto no seu escritório esperando Kelly e sua próxima compra fashionista.
Porque Sean era muito mais perigoso que aquilo.
— O que quer de mim?
— Acesso a seita escatológica de Rani, já que você é o colisteiro ‘Fim do mundo’ que abastece toda aquela loucura — e Sean quase ensurdece com o arrastar da cadeira de Henrique, sem saber se havia ou não, feito conexão com ele. — Você me estudou, não Henrique? Me perseguiu pelos porões da Rede Internet, sabendo sobre meus encontros ufológicos, porque passei boa parte da minha vida achando faltar algo na Cosmologia Ummita, Henrique. Elementos vitalmente importantes sobre viagens interestelares e interuniversais — suspirou. — Não me pergunte por que faço parte daquelas listas de ufologia... — olhou em volta. —, porque talvez eu só busque abrir minha mente, para como dizia Einstein, nunca mais voltar ao tamanho original.
— Devo aceitar isto como mais um dos seus exercícios de imaginação?
— Exercícios de imaginação como referências sobre Universos gêmeos de matéria e antimatéria? E que tal pensar em Universos contíguos de matéria similar, invisível por um espaço de antimatéria?
— Exercícios de imaginação!
— Você sabia que os alienígenas se comunicavam, que Ykaro estava no Sol, que ele veio preparar terreno para a grande invasão, para o ataque final, para o retorno de Nêmeses, não é? Para o apocalipse! E sabia quando e como, porque conseguiu sim, dormir com Carminna, sem contar para a Poliu e assim poder entregar tal conhecimento ao mundo através de teorias de conspiração e listas ufológicas abastecendo seitas malucas.
— Enlouqueceu! Nêmeses não existe!
— Ah! Sim! Nêmeses não existe! Só esqueceu-se de avisar isso a Rani.
— Não conheço Rani alguma. Porque insiste em...
— Ah! Mas você devia conhecê-la. Um mulherão, diga-se de passagem. Andava com Carminna e tal...
— Não sei quem é Rani! — exclamou se aproximando.
— Sabe sim!!! — berrou o afastando. — Rani, uma estudiosa que usa as referências para ajustar Nêmeses perfeitamente ao tal Planeta X.
— Está doente Sean. A viagem lhe fez mal.
— Mal quanto? — cruzou os braços ao se sentar à frente dele. — Mal quando leio formas-pensamento ou quando leio mentes? — Sean viu Henrique não se mexer. — Mal quando hackeio banco de dados de uma corporação de inteligência escusa, quando hackeio banco de dados da Computer Co.? Ou seria mal, que é como eu fico, quando sei que meu pai, e digo os dois, me envolvem nisso? — apontou para os lados. — Nessa vida de espionagens e falsidades? — arrastou a cadeira para perto dele. — Ou ainda achando que eu acho que o UFO que caiu em Roswell caiu porque não era um veículo hipersônico destinado a viagens interestelares? Pois lhe digo que era uma nave de reconhecimento, um UFO chamado de Orb, e que caiu porque algum HAARP em seus primeiros passos acionou uma tempestade magnética e o derrubou; e eu sei porque leio mentes, formas-pensamento e hackeio os que mais amo.
— Eu... — e Henrique não sabia o que mais falar.
— Você, Henrique, colisteiro ‘Fim do mundo’, quem achava que o mundo havia sido enganado, saiba que é assustador a parte mais alta desta hierarquia, Ykaro, ser nosso inimigo irreconciliável. Porque se acha que a Poliu espera que os Ykaros forneçam a tecnologia que eles próprios já superaram, errou. E errou, porque se os alienígenas nos derem algo Henrique serão migalhas! — Sean prosseguiu no que o Major Henrique suspirou. — E se Yka não conseguir dominar Ykaro, morreremos todos! Agora mesmo! Aqui nessa ilha! — exclamou tudo aquilo.
Houve um silêncio quase mortal, até Henrique lembrar-se como respirar.
— O que quer que eu faça Sean?
— Dizem que as balinesas são ‘Hot’!
O Major Henrique Loyola segurou o queixo com o pulso ao se virar para a mesa, e discar números ao telefone. E pareceu dessa vez não pensar muito antes de tomar tal decisão.
Sean sumiu da ilha e outra vez a cúpula da Poliu veio abaixo, como quando a Tenente-coronel Adriana soube.
E Adriana avançava naquele momento sobre Henrique que caiu no chão duro. Ela o dominou numa sequência de socos e rasteiras.
— Onde está Sean?! Onde ele está?! — gritava.
Henrique não conseguiu se defender a tempo, nem tão pouco entender como ela adentrara sua sala, como Sean, sem ele ver.
— Chega Adriana! — Oscar chegou logo atrás, invadindo também a sala do Major que sangrava no chão.
Ele previra que Adriana ia fazer o que fez com os mesmo dons que Sean.
— Não! — e Adriana não parecia querer parar, pegou Henrique do chão que mais parecia um boneco esfarrapado nas mãos dela. — Ele vai me dizer onde está Sean!!!
— Chega Adriana! — insistiu Oscar ao ver Adriana socar Henrique novamente. — Sean está em Bali!
Adriana o olhou.
— Com...
— Com Rani! — Oscar teve gosto de falar aquilo e viu Adriana arregalar os olhos e largar o corpo de Henrique, que fez um estrondo ao cair. — Sean está em Bali investigando a seita, Adriana.
— “Filho de Oscar”! — debochou Mr. Trevellis não gostando do que ouviu, ao chegar por detrás de Oscar na sala do Major, no Complexo C. — Falei para dar um jeito de sumir com Rani, Adriana — Mr. Trevellis sentou-se com todo seu peso e graça, rindo da situação. — Mas você gostava de manter a mente do filho de Oscar ocupada, não minha cara?
— Não fale assim de Sean, Trevellis! — Oscar se enervou.
Mr. Trevellis olhou Oscar.
— Sabia sobre ela, Oscar amigo velho? Sabia que se Sean chegasse à seita, estaria com seus dias contados?
— Está achando que mandei meu filho a Bali para ser morto?
Mr. Trevellis ergueu-se tão furioso que por pouco não derruba Oscar.
— Alguém mandou… — se preparou para fumar um dos seus charutos cubanos, aparentemente calmo quando explodiu. — Porque você foi atrás de Mona, Oscar! Você mandou-a construir formas-pensamento enquanto me alertava que Sean podia as captar!
— Eu não sabia que ele as captaria como captou até ele voltar de Bali e me contar sobre a Sala de Controle Ala Cinco — Oscar estava descontrolado. —, sobre formas-pensamento que contavam segredos sobre o Sol. — olhou Adriana, olhou Henrique ferido, e voltou a olhar Mr. Trevellis fumando. —, porque Sean me saiu melhor que a encomenda — e saiu da sala.
— E você sabia que ele se interessaria por ela, não Adriana?
— Chega!!! — foi a vez de Adriana gritar. — Sean não pode estar com Rani! Não depois de ir para a cama comigo! — vociferava outra vez.
— Dormiu com Sean? — Mr. Trevellis caiu em sonora risada. — O que há com o filho Oscar? Na cama perde seus poderes? — riu.
E Adriana saiu dando de encontro com Oscar no corredor, com Oscar temendo que Mr. Trevellis não se abalasse, que nada fizesse por seu filho, que Adriana estivesse apaixonada por Sean, que aquelas investidas fossem além do ‘sexo sob ordens’.
24
Vilarejo de Batubulan; Ilha de Bali, arquipélago da Indonésia..
8° 35’ 8.02” S e 115° 16’ 32.29” E.
16 de setembro; 09h00min.
Coordenadas 8° 35’ 8.02” S e 115° 16’ 32.29” E; avisava Spartacus. Com erro ou não no GPS implantado nele, Sean estava em Bali, se dirigindo para o Vilarejo de Batubulan. Contudo, saiu da ilha paradisíaca com a promessa do Major Henrique de só contar que ele escapara no lugar de Zhu, em seu voo de retorno ao China, após duas horas de sua saída, se imaginar que Adriana ia afetar tal ordem.
Sean chegou a Batubulan, nome de uma das vilas de artesãos de Ubud, no interior da Ilha de Bali que significa ‘Lua de pedra’, outra vez extasiado com a beleza local, avistando Rani de longe, em meio à multidão. Ela estava vestida a caráter, dançando. Suas roupas coloridas eram compotas por um justo maiô dourado, com uma longa túnica verde e vermelha por cima, que se soltavam uma da outra enquanto dançava; sua maquiagem era pesada e seus braços eram adornados por largas pulseiras e braçadeiras douradas. Na sua cabeça, uma espécie de coroa grande e dourada, entrelaçada por flores de margaridas.
Outros dançarinos e dançarinas vestiam roupas mais exóticas que Rani, num espetáculo para os olhos de muitos turistas que se amontoavam na praça, para a dança Barong & Kriss; uma dança que representavam a luta eterna entre o Bem e o Mal.
“Yka e Ykaro”; soou como lembrança.
A bela balinesa sobressaltou ao vê-lo. Todos ao seu redor estranharam quando ela parou de dançar e Rani caminhou até ele como que hipnotizada.
— O quê? — Sean sorriu seu melhor sorriso. — Achou mesmo que eu não vinha tirar satisfações? — ele viu que Rani nada falou, que passou por ele furiosa, e se dirigiu para uma pequena loja de estátuas. Ele foi atrás dela, para dentro da loja vazia. — Vai fazer de conta que eu não estou aqui?
Rani se virou nervosa.
— O que quer comigo Sr. Queise?
— Napoleão Bonaparte dizia que há duas forças que unem os homens: medo e interesse.
Rani só o olhou.
— Qual é sua força, Sr. Queise?
— Ambas! Se bem que é o medo da guerra de Hobbes que me move desde o começo, Senhorita — Sean viu Rani se virar e deixá-lo lá. — O que queria você comigo, Rani, me levando para surfar aquela noite?
Ela parou de andar.
— Já sabe que foram ordens, não sabe?
— Ah! Claro! Ordens da toda poderosa Adriana La Hera, esposa de Arthur La Hera.
— Ex-esposa pelo que me consta. Ou melhor, ex-amante.
— Wow! Tudo isso?
— Pena Sr. Queise, que não deu o devido valor a uma mulher como Adriana.
— ‘Wow!’ duas vezes... Nossa! Realmente não imaginava você a defendendo — Sean viu Rani só o olhar. — O quê? — gargalhou. — Adriana não lhe contou, que nossa noite de sexo regado a vinho caro em Miami foi...
— Cale-se! — exclamou com raiva voltando até ele. — A Tenente-Coronel Adriana é a figura mais inteligente que conheço Sr. Queise, e como cientista e pesquisadora, digo que conheço muitos poucos como ela.
Sean paralisou.
— E mesmo assim...
— E mesmo assim lhe ajudei a sair de Bali quando ela veio lhe buscar, não foi?
— E por que fez aquilo, Rani?
E Rani olhou o redor.
— Onde está hospedado?
— Bhanuswari Resort & Spa Hotel. A 10 minutos de carro de Ubud, como deve saber.
Rani nada falou se virando para o final da loja; e voltou de lá com uma pequena bolsa bordada, vestindo apenas o maiô bordado.
— Belo maiô. Vai continuar o entretenimento? Mais ordens? — foi puro fel.
— Não tenho nenhuma ordem nova, Sr. Queise. Talvez Adriana nem saiba que está aqui.
— Vai contar?
— Não! Vou a noite ao hotel Bhanuswari me encontrar com o Senhor. Vestindo roupas. Temos realmente muito a conversar desde que Adriana perdeu o rumo das coisas.
— “O rumo das coisas”? Por que passei a ter medo de você, Senhorita?
— Porque devia ter mesmo medo; medo e interesse — e saiu.
Mas Sean não esperou ela se afastar muito.
— Acredita na escatologia, Rani?
Ela parou o andar, paralisando os passos. A música ao fundo, os dançarinos e ela ali, paralisada pela pergunta.
— Você não Sr. Queise?
— Perguntei primeiro.
— Pois então respondo primeiro, porque como uma ousada humanista, sou cética de certas alegações, mas existem vários aspectos na interpretação da metafísica, fora do fenômeno UFO, que deve ser considerada antes de rejeitá-la fora de contexto.
— Interessante! A visão imperialista espanhola se expressava, no fim do século XV, por meio de uma linguagem metafísica e escatológica que explorava velhas crenças sobre o domínio do mundo, o fim dos tempos e o triunfo do cristianismo. Sabia que um dos grandes problemas do homem primitivo era o de se libertar do domínio da natureza? Mostrando talvez a impotência do ser humano perante as leis da natureza, perante suas forças? Já teve medo Rani? Medo de ver o homem dito racional, natural como dizia Hobbes, controlando o tempo, o vento, as chuvas?
— Aonde quer chegar Sr. Queise?
— Perguntei se acredita na escatologia de uma seita maluca, que explode gente inocente, para dizer que alguns inocentes vão explodir, na passagem de um cometa.
— Não sou a favor do terrorismo! — se empertigou toda no que Sean brecou sua saída. — Por esse motivo e outros mais que saí da ‘A Última Sentença’.
— Quem é o cabeça?
— “Cabeça” de que? — Rani tentava passar e Sean a brecava.
— Quem está à frente da seita ‘A Última Sentença’, Rani? Da seita que o colisteiro ‘Fim do mundo Henrique’, em seus devaneios, incendiou tais pensamentos? Benijunan?
— O que pergunto eu? Hackeou ou leu meus pensamentos?
— Wow! — Sean impactou, Rani era mesmo uma agente da Poliu.
Ele olhou-a, olhou-a e virou-se agora ele para ir embora.
— Aonde vai Sr. Queise? Vai me deixar aqui falando sozinha?
— O que você acha?! — gritou da multidão.
— Acho que está na mira de muitos inimigos — olhou em volta. — Devia se cuidar mais.
— Teme que a mira seja apontada para você também? — continuava a andar sem se virar para trás.
Rani, maquiada e fantasiada com o maiô bordado só fez um girar de olhos, que indicava o quanto estava brava com tudo aquilo, e segui-o pelas ruas apinhadas de turistas.
— Está dizendo que estou me defendendo, o largando?
— Fez isso no restaurante do hotel, na simples presença de Adriana. Por que não faria agora? — estancou.
— Eu não podia lhe defender — e Rani também estancou sobre o salto altíssimo. — Além do mais, ela disse que você conseguiria.
— “Ela disse”?
— Mona... — Rani viu Sean arregalar os olhos azuis. — Oscar não confiava em Adriana, então consultou Mona Foad.
— “Oscar”? Você disse… ‘Oscar’? — Sean ficou olhando Rani em meio aos muitos flashes disparados pelos turistas, em meio a danças que ainda aconteciam ao redor deles, em meio a vida que parou para ele. — O que Oscar fez?
— Pediu conselhos a Mona Foad. Mona disse que me procurasse.
— Mona sabia que eu vinha a Bali? Deus... — sentiu-se confuso. — As vozes não eram de Carminna... Eram formas-pensamento criadas por Mona para que eu não soubesse que era ela quem me mandava vir...
— Eu não podia... — tocou-o no rosto. — Peço perdão...
Sean levou um susto pelo toque, pelo pedido. As mãos macias de Rani desceram e acertaram em cheio seu peito viril.
Ele se virou e a deixou-a lá sozinha. Foi embora ganhando a praça movimentada atrás de um táxi, em meio a milhares de motos que passavam por ruas mais movimentadas ainda.
Bhanuswari Resort & Spa Hotel; Ilha de Bali.
8° 30’ 24.75” S e 115° 15’ 44.49” E.
16 de setembro; 19h00min.
Sean foi acordado após o estridente sinal do telefone. Procurou o aparelho na mesa de cabeceira, à direita de seu travesseiro.
— Sim? — atendeu.
— Senhor? Uma Senhorita local o espera no saguão — falou o gerente. — Pediu-lhe que viesse vestido para um jantar.
“Jantar?”, sorriu cínico.
Desceu com uma das poucas roupas que enfiou numa mochila na ilha paradisíaca. Não estava de viagem, estava em fuga, mas entrou no saguão vestindo seu lado ‘bad boy’ outra vez.
Já Rani gostou do que viu. E apesar de todos os temores de Adriana para com ela e Carminna, as três sabiam que era difícil recusar o corpo perfeito que desfilava na calça jeans surrada, adornada com camiseta branca de puro algodão, mostrando músculos para lá de trabalhados.
— Selamat Malan! — ela olhou os trajes dele. — Achei que tivesse dito roupas para um jantar.
Sean olhou Rani de vestido de cetim vermelho e altíssima sandália.
— Parece que Adriana também ensinou algo sobre alta costura em ilhas paradisíacas.
Rani não entendeu. Não quis entender. Virou-se esperando ser seguida.
E Sean a seguiu.
— Se gosta de locais despojados Sr. Queise… — olhou-o de rabo de olho. —, então não me importo em mudar de roupa também — e Rani ergueu todo o vestido de cetim vermelho, parando momentaneamente o fluxo de carros e pessoas na entrada do Bhanuswari Resort & Spa Hotel, ficando de maiô justo e preto para depois amarrar o vestido de cetim vermelho na cintura, alcançando o pescoço, numa sarongue estilizada.
Sean começou a achar que Rani e a professora que dava aula nua é que eram para lá de despojadas, entrando no carro pequeno que ela lhe indicou.
— Aonde vamos mesmo?
— Tomar um helicóptero. Eu o havia preparado apenas para amanhã de manhã, mas jantar com você numa ilha deserta não será de todo mal.
— “Ilha deserta”? — Sean começou a não mais achar graça nas despojadas dela.
O carro chegou a uma pequena pista de pouso alguns quilômetros do hotel e Sean não voltou a insistir sobre o passeio.
Lago Bratan, Vilarejo de Bedugul; Ilha de Bali.
8° 16’ 48” S e 115° 7’ 4” E.
16 de setembro; 19h50min.
Voaram por cinquenta minutos até verem luzes abaixo deles.
— O Vilarejo de Bedugul! — apontou Rani. — Fica a 1.400 metros acima do nível do mar e é cercado pelo Lago Bratan.
— Aonde vamos? — arriscou outra vez ao ver o helicóptero tomar outro rumo.
— David nos levará ao Templo de Ulun Danu. É uma belíssima obra de arte dedicada à deusa do Lago Bratan, uma manifestação do Brahman como Wisnu, o preservador, do outro lado do vilarejo — o helicóptero desceu em meio a uma noite cerrada, carregada pela neblina. — A pesca, esqui, mergulho e parapente ficam para amanhã de manhã.
— Não vim passear em Bali, Rani — Sean a esperou olhá-lo. — Vim buscar você para ir a Montauk, ler a tábua que o Dr. Jèsus Clemente roubou.
Rani teve um repuxo ao se virar tão rápido para ele.
O piloto David só os olhou.
— Ler o quê?
— Você era a colaboradora de Carminna Clemente. A colaboradora que ela não quis dizer quem era. A física teórica que entendia de Bode e sua estranha matemática. E eu sei que a tábua que a Poliu tinha ou pensava ter sido entregue por Carminna foi trocada há muito tempo pelo pai de Carminna, na queda de 1947 em Roswell, quando ele, o único assiriólogo capaz de ler o que leu, apavorou-se a ponto de fazer de uma híbrida, sua filha, e preparar ela e algumas colaboradoras — fez charme ao se aproximar do pescoço dela e beijá-la. — E a tábua provável ainda está na fazenda de Carminna.
Rani nada respondeu e saiu do helicóptero. Sean a seguiu e o piloto ficou incomodado pela decisão dela.
— Chefe? — o piloto David insistiu ao vê-la se afastar cada vez mais, e Rani ficou notoriamente irritada pela interrupção. — Uma tempestade tropical se aproxima, chefe.
Sean se assustou mais pela maneira de como ela era chamada do que pelo assunto tratado.
— O céu está limpo e as temperaturas amenas, David.
Os três olharam para cima e o piloto David não gostou do que viu. Sean se lembrou de descerem sob forte neblina.
— Há ventos de monções se aproximando. Talvez levantar voo em condições de chuvas...
— Estaremos bem, David — soou mais com uma ordem. O piloto fez uma mesura quase de hierarquia e se afastou. Sean nada falou, foi atrás de Rani que com certeza não ia visitar templo algum. — Diga-me Sr. Queise... — Rani grudou nele o maiô preto, o sarongue vermelho e tudo mais que a cobria. —, por que foi a Bali depois de brigar com Adriana e toda a cúpula da Poliu naquele jantar? Mona mandá-lo ir a Bali é uma coisa, você ir parar justamente no hotel em que eu começava a trabalhar é outra.
Sean riu.
— O quê? Não acredita em coincidências, Rani? — foi cínico à porta do bangalô no qual entrou atrás dela correndo a vista; uma mesa de jantar com frutos do mar cozidos, e algumas bebidas numa grande tigela de pedra cheia de gelo, o fizeram ter ideias.
Estavam sozinhos se não pelo piloto David que ficara próximo ao helicóptero.
— Ia levá-lo para conhecer G-land, localizada na Ilha de Java, dentro da floresta de Plengkung, mas desisti — acionou lâmpadas que iluminaram a cabana, iluminando um Sean Queise não muito a vontade com aquela desistência. Ela aprontava algo. — A ilha é praticamente virgem e possui três ‘surf camps’. Intensos tubos acontecem lá. Sabe o que é um tubo, não?
— Sim — sorriu. —, uma curva da onda. Você me ensinou.
— Sim — os olhos de Rani brilharam. — Vale lembrar que é bem perigosa quando o swell está pequeno. Nos dias sem onda, a turma faz passeios turísticos, e...
— Está me enrolando Rani! — Sean cortou-a. — É até Adriana me localizar como já fizera antes? Contou a Adriana que estou aqui?
— Já disse que não. Alugo essa choupana aqui no Lago Bratan quando preciso pensar.
Sean voltou a olhar a bebida, a comida, o sofá cheio de almofadas de cetim bordado.
— E precisa pensar no que? — Sean viu Rani tirar o sarongue improvisado e ficar de maiô e altíssima sandália vermelha preparando uma bebida. Sean se acomodou num espaçoso sofá com muitas almofadas de cetim bordado sobre ele. Seu corpo se enterrou em meio a elas e ele recuou. Talvez na cama ele fosse mais vulnerável como previra Mr. Trevellis em seus devaneios.
Ela esticou um copo de arak a ele.
— Uma bebida!
— Ah! A bebida forte feita de palmeiras... — Sean falou de uma maneira que Rani dessa vez entendeu.
— Acha mesmo que estou ganhando tempo?
— Sim… — Sean bebeu sentindo tudo arranhar na passagem. —, enquanto a Poliu trabalha em Yka e Ykaro, trancados numa Gaiola de Faraday, atrás de respostas que não vão encontrar, mas que você irá tentar tirar de mim.
E o silêncio.
— Quem é Yka e Ykaro? Os planetas fêmea e macho? — Rani se serviu.
— Não, os alienígenas que vieram de lá.
— Eles... Oh... — sentiu-se mal deixando o copo cair das mãos. — Eles vieram então... — sentou-se atordoada, com o vidro e bebida esparramada a seus pés.
— No ônibus espacial experimental.
— Oh... Eles tinham razão. Adriana foi mais displicente do que jamais sonhei que seria.
— Quem tinha razão, Rani?
Uma trovoada atingiu todo o solo e Sean se levantou no impacto.
O piso de areia batida pareceu estremecer na ação, e Rani olhou-o olhando o céu da janela aberta.
— Estou extremante nervosa desde a morte de Carminna, Sr. Queise. Não acredito que Adriana não esteja envolvida.
— Adriana matou Carminna? — Sean continuava em pé, olhando o céu limpo, de temperaturas amenas, fechar.
— Se não matou, abriu caminho para que a matassem.
— E quem devia matá-la? — Sean olhou-a de lado, confuso com o que ela falara enquanto cinco trovoadas quase os ensurdeceram. — Vamos Rani! Não podemos esconder mais nada. Não mais.
— Bruno a mataria. Ele fazia parte da seita escatológica ‘A Última Sentença’.
— Wow! Um híbrido fazendo parte dos conspiradores?
— A seita nunca soube.
— Porque a Poliu nunca permitiu.
— Isso também.
— E por isso Ykaro vibra na mesma frequência dele. Não é o chip de Codinome: Cruzador Solar que o atrai, porque ele foi implantado em Bruno e retirado. São seus pensamentos e ideais, formas-pensamento que atraíram o alienígena desde o começo, já que é um deles — o arak começava a ganhar efeito no seu corpo.
Sean sentiu-se tão quente quanto o tempo que carregava monções para Bali.
— Um deles?
— E o vi Rani, com olhos amendoados e verdes, com tentáculos saindo de seus poros.
E o silêncio quebrado pela descarga de água que desceu sobre eles, uma água grossa que tomou conta do Lago Bratan.
— Não se preocupe Sr. Queise. Isso é algo natural por aqui. Não foi fabricado.
Sean gostaria de ter entendido aquilo a tempo, mas o barulho da chuva, vistas pelas janelas sem janelas, roçando no teto de piaçava, trazendo para todos os lugares o cheiro de mata úmida, não o acalmou.
O arak tomava mais forma e tamanho no seu corpo e formas-pensamento começaram a se moldar; imagens de Carminna escondendo algo de sua colaboradora Rani, que não confiava em Adriana, que era amiga de Carminna, amiga de alienígenas.
— Deus... — soou da boca perfeita enxergando tudo afinal. Rani o olhou e Sean mudou a tática, ele era crescido para aquilo também. — Estava linda essa tarde dançando aquela dança exótica.
Rani foi pega de surpresa.
— Bariong! A história faz parte da mitologia de Bali — ela se aproximou dele com a altíssima sandália vermelha tentando alcançá-lo, a altura dele, mas Sean, porém não moveu nenhum músculo a fim de ajudá-la. Rani ficou na duvida se aquilo havia sido só um elogio ou Sean falava em entrelinhas. — Fale-me sobre os alienígenas, Sr. Queise... — e o beijou, lábios que se encontraram e se separaram. — Acha que o mundo está preparado para saber que nada disso é ‘teoria de conspiração’? Que depois dos homens de terno preto inflar pensamentos errôneos em mentes perturbadas, a fim de que verdadeiras máquinas de morte ficassem escondidas atrás de profecias e códices, o que está prestes a acontecer era esperado? Que depois de tanta paranoia, uma verdade dessas contagiando o planeta, personalidades ilustres, cientistas de renome, enfim, sendo confrontados com o fim do mundo?
Sean teve medo de cada palavra dita, de cada frase formada ali pela balinesa que tentava seduzi-lo passando a mão pelo corpo dele, tentando abrir o zíper de sua calça jeans, beijando cada pedaço de tecido do algodão de sua camiseta.
— Por que acha que Yka deixará o mundo acabar? — Sean deu sua última cartada.
— “Yka”? Fala como se fossem íntimos?
— Exatamente Rani. Somos íntimos o suficiente para ver que não acreditava em Carminna.
— Como é que é? — ela se afastou dele indo até a mesa e despejando todo o arak da garrafa goela abaixo.
— Sua roupa sensual, seus beijos sensuais, toda essa cabana sensual — Sean viu Rani o olhar com algo mais naquele olhar. — Por que vem aqui, Rani? Pensar em como arrancar de mim as coordenadas de MX-1? O satélite da Poliu?
Rani riu mais tensa, era visível.
— Sean... Sean... Não entende mesmo, não? Eu tenho que fazer algo, já que Adriana perdeu o controle da situação.
— Traduza ‘situação’, Rani?
— Caos e desordem!
— E qual mesmo é a base da seita escatológica ‘A Última Sentença’ que o garçom Benijunan faz parte?
Rani temeu responder aquilo.
— 21/12/2012.
— Os códices maias? “Em dezembro de 2012, o Sol do solstício, vai se alinhar com o centro da nossa galáxia na via láctea”. Mas nada aconteceu Rani, só um raro alinhamento cósmico, que ocorre uma vez a cada 26 mil anos; 25 mil e 800 anos para ser preciso.
Só um? Você diz só um raro alinhamento? Pois saiba que em 2015, observações feitas pelo VLT, Very Large Telescope, do ESO, no Chile, revelaram alinhamentos nas maiores estruturas já descobertas no Universo, eixos de rotação dos buracos negros centrais supermassivos e os quasares encontrando-se paralelos entre si, ao longo de distâncias gigantescas e até inimagináveis, com os eixos de rotação desses quasares alinhando-se com as grandes estruturas de rede cósmica.
— Meu Deus Rani, você é um deles, louca o suficiente para acreditar em Benijunan, achando que a tábua suméria que Carminna escondeu, dizia isso — Sean sabia que Rani nada responderia. — Porque o pai de Carminna só mostrou à filha a tábua de Roswell, porque ele sabia que você repassaria cada informação colhida, à seita escatológica de Benijunan.
— Do que está falando? Jèsus morreu antes mesmo de Adriana me convocar para fazer parte da Poliu.
— Não Rani, Jèsus era uma espião psíquico, o único capaz de conversar com alienígenas, que criou o HAARP para a Poliu, porque tinha dons de telecinese, de teletransporte, viajando para o futuro e passado, movendo objetos e mudando pensamentos.
— Você sabia sobre...
— O gerador de clima da Poliu? O que você acha? — e o céu clareou pelas trovoadas e Rani se serviu de mais arak. A coisa começava a fazer efeito nela também. — Foi assim o dilúvio, não, Rani? Os sumérios disseram que os alienígenas tinham o poder de Deus, controlar a natureza, furacões, tsunamis, terremotos, dilúvios. Foi assim que os Anunnakis promoveram o dilúvio da Bíblia? Que o alienígena Ykaro promoveu o Furacão de Miami? — Sean a viu beber e encher seu copo mais uma vez. E Rani lhe olhava com interesse. — Está achando que sou culpado por todas aquelas mortes de Miami, Rani? Achando que o alienígena Ykaro só queria me atingir, não? Porque sou culpado, sou culpado, sou culpado — Sean estava em choque. — Era eu o tempo todo o intento de seu trabalho, agente Rani? Saber o que eu sabia? Porque como Jèsus eu também posso conversar com eles? — e Sean desviou-se das mãos dela quando sua mão tentou acariciar seu rosto.
— Não faça isso Sr. Queise!
— Não fazer o que? Dizer que fui preparado pela Poliu para saber? Que eu e meus poderes sabíamos que os Anunnakis já estiveram aqui no passado, se misturando, nos criando. Que após o pouso, não havia como retornar.
— Eles podem ter estabelecido uma colônia de habitantes das cavernas, conscientes de que esta era a única possibilidade de sobrevivência, e podem ter acabado por cometer o erro de retornar com suas fabricações defeituosas, sem que elas se adaptassem por lá, mas... — Rani tomou todo seu arak e gritou. — Ahhh!!! — e jogou tudo em cima da mesa do chão, sacando a arma de disparo simples que atingiu Sean no ombro.
— Ahhh... — Sean foi ao chão ferido.
— Eles tinham razão... — soou da boca da balinesa. — Você é culpado! Culpado por aquelas fabricações defeituosas, voltarem!
Sean viu a arma ainda apontada para ele quando seu ombro se tomou de sangue.
— “Fabricações defeituosas”? — riu sentindo tanta dor que só rir foi o que conseguiu. — É assim que a seita escatológica os vê, Rani? Ykas e Ykaros sofrendo descriminação em mundo que não os aceitou, num mundo que não era deles porque eram ‘fabricações defeituosas’? — espremeu todo o rosto.
— Você os protege!
— Eu não protejo nada, Rani, mas entendo a raiva de Ykaro, provocando caos, querendo se vingar de todos nós porque, todos nós evoluímos, melhoramos e hoje... — apontou para todos os lados. —, hoje somos o que somos porque nossa fabricação deu certo.
A chuva aumentava de intensidade e Sean começou a achar que a choupana ia inundar e que nada ali era natural, nem eles.
— Não Sr. Queise, você os protege!!! Você os apoia, não?! — berrava descontrolada. — Você se comunica com os alienígenas!!! Você, e seus computadores, e seu satélite de observação preparando a vinda deles!!!
— Você ficou louca Rani! — e tentou se aproximar das pernas dela que começavam a ser tomada pela água que subia do piso.
— Não se aproxime! — e Rani voltou a apontar a arma para ele.
— Abaixe a arma Rani! — e Sean se abaixou, mostrando que não ia a lugar algum.
— Você os trouxe!!! Você os trouxe Sr. Queise!!! — berrava descontrolada. — Benijunan tinha razão!!! Você é culpado!!! Culpado!!! Culpado!!! — surtava.
— Não... Não... — e Sean foi beijado por Rani que o arrancou do chão ferido, e jogou-o no chão deitando-se sobre ele, que em meio às almofadas umedecidas, via que água subia cada vez mais rápida.
Rani colocou a arma na têmpora de Sean e engatilhou. Ele não esperou engolir aquilo, e deu um golpe nela que caiu de cima dele, mergulhando na água, atirando para o teto.
— Sr. Queise?! — berrou furiosa no que tirou o rosto da água.
Sean correu e saiu da choupana para a chuva. Correu em meio à lama e cascalho que descia da encosta para então ver que o local onde o helicóptero deveria estar não estava mais.
— O helicóptero? — Sean arregalou os olhos azuis.
— Sr. Queise?! — gritava Rani atrás dele. — Não entende Sr. Queise?! Tenho que eliminar as arestas, antes do fim!!!
“Fim?”; Sean só teve tempo de ver a luz do próximo tiro, quando o projétil passou por ele e arrancou a lasca da árvore próxima a sua cabeça.
Correu também não sabia para onde.
A chuva os atingia em meio a um vento que faziam cabelos molhados irem para todos os lados. Rani mal o enxergava quando o percebeu correndo à sua frente.
Atirou a esmo e o tiro por pouco não o atinge outra vez.
— Sr. Queise?! Não fuja de seu destino! Você foi o culpado de todas aquelas mortes! ‘A Última Sentença’ já o sentenciou! Vamos o encontrar aonde for! Seus familiares, seus amigos e funcionários... — e Rani foi ao chão, na água que se formava e crescia, no golpe que Sean deu nela.
Ela se ergueu e saltou sobre a arma, mas Sean a chutou. Água e arma se distanciaram dos dois. Rani saltou sobre ele, mas caiu na água no que Sean correu com dificuldades, com a água subindo, em mais de quinze centímetros.
Estavam dentro da água literalmente, quando ela saltou sobre ele novamente, e Sean deu-lhe uma gravata e a lançou na água. Seus corpos ensopados e a chuva que caía os esfriavam cada vez mais rápidos.
— Por que ‘A Sentença’ quer me matar?! — gritava.
— Você os trouxe!!! Você é o culpado pelo fim do mundo!!! — Rani tentava se soltar do braço forte que a dominava.
— Como vocês souberam que os alienígenas vieram, Rani?!
— Bruno!!!
— Não, Rani!!! Bruno está fora do controle há muito tempo, entre dias bons e ruins até que teve outra crise. Há mais um informante nesse meio todo. Alguém quem eu julgava inocente; Zhu! — Sean sabia que não lia os pensamentos de Rani, que teve seu treino pela Poliu. Sabia que chegava a verdade porque entendia enfim tudo aquilo. — Acho que Trevellis vem esperando Yka e Ykaro há muito tempo. E acho que Zhu sabia como ativar os poderes dos alienígenas, já que é um ‘hacker psíquico’ trabalhando há muito tempo com Nadir!
— Você também, não é? Preparado para se comunicar com eles! — e Rani deu um golpe no estômago de Sean que caiu de joelhos na água.
Ela deu outro chute no ombro baleado dele para então girar as pernas, e chutá-lo fazendo Sean também girar e mergulhar na água.
— Ahhh... — Sean achou que ia desmaiar pela dor.
E Rani voltou a procurar a arma enquanto a água subia cada vez mais rápida. Porque Sean sabia que Rani não ia deixa-lo viver. Levantou-se em meio à dor insuportável e correu; e tentou correr porque outro chute de Rani o derrubou com a cabeça dentro da água, com os pés dela empurrando-o, tentando afogá-lo em meio a trovoadas, e uma aurora boreal se formou.
Uma grande aurora que tomou conta do Lago Bratan.
Rani agora teve medo, largou Sean e se virou para correr quando foi ao chão, com os pés pegos por Sean que a derrubou. Ela se ergueu, e tirou a arma recém-recuperada das águas apontando para Sean que viu todo o céu esverdeado tocar o chão.
— HAARP... — foi só o que Sean conseguiu falar.
E junto a um céu esverdeado a água se moveu como num escoamento giratório, que levantou a água do chão numa parede de movimentos espirais ao redor de um centro.
Ambos arregalaram os olhos, míseros segundos que pensaram que sabiam que se o redemoinho alcançasse o chão, a repentina queda na pressão atmosférica e os ventos de alta velocidade, iriam destruir tudo o que encontrasse no caminho.
Eles inclusive.
— Ahhh!!! — e o redemoinho tocou o chão fazendo a terra tremer feito terremoto, num movimento giratório que tomou o corpo de Rani que se ergueu do chão. — Ahhh!!! — berrava ela girando.
Sean levantou, correu, caiu e se levantou novamente. E caía e se levantava, agarrando-se no que conseguia, com Rani girando descontrolada, quando desejou e o vórtice desmanchou-se, soltando-a, fazendo-a cair ao chão, a fazendo perceber que Sean tinha poderes até maiores que sonhara.
Sean agarrou-a pelas mãos, mas ela correu dele.
Rani sentia todo seu maiô sendo rasgado, feridas que sangravam, mas correu de volta a cabana.
— Não Rani!!! — Sean gritava atrás dela quando micros vórtices do redemoinho se soltaram do grande vórtice, e a água que jorrava dele, os atingiu. Sean sentiu chibatadas de água gelada que foram trazidas das montanhas que levantavam as águas do Lago Bratan. — Ahhh!!! — Sean foi ao chão pela dor, pelo sangue arrancado.
— Ahhh!!! — Rani também foi ao chão, caindo o corpo quase nu sobre restos dos mais variados.
Sean desejou e os vórtices se desmancharam outra vez.
E ele não parou para entender aquilo, voltou a correr atrás dela quando seu corpo foi pego por mais um micro vórtice, com seu corpo subindo, girando, e sendo lançado longe.
— Ahhh!!! — Sean gritou por todo trajeto, caindo estatelado sobre pedras e pedregulhos inundados pela água.
Um novo micro vórtice se formou e começou a seguir Rani que foi lançada longe.
— Ahhh!!! — foi a vez dela gritar.
Sean se ergueu nem soube como e tentou alcançar Rani caída quando uma nuvem de relâmpagos se formou fazendo mais e mais outro micro vórtice, que tocaram o chão, agora sob as ordens dele. Rani entendeu enfim que Sean Queise era especial, que ele podia os controlar; que podia controlar tudo e todos. E sabia que Sean não podia sobreviver, mesmo o amando, mesmo ele tendo a salvo, não depois de vê-lo dominando o redemoinho de vento e água e destroços.
Com suas últimas forças, Rani correu de volta à cabana e deu de encontro com Sean na porta da cabana, ensopado, sangrando, teletransportado, lhe olhando.
Rani engoliu aquilo.
— O que aquela louca da Mona fez com você... — e apontou-lhe a arma. — Não pode entender, não? Você não pode sobreviver, Sean meu amor. Eles vão se comunicar com você sempre, sempre estarão ao seu lado, tentando algo. Seja amigo ou inimigo, você vai se comunicar com os alienígenas, Sean... — e atirou.
Mas a água que caiu feito chicote acertou a mão dela, desviando o projétil que se instalou na madeira próximo a ele. Os dois se encararam e Rani sabia que fora ele quem fez aquilo, que aquela frieza ali parado à sua frente tinha um sobrenome, Roldman, quando o telhado de piaçava ruiu.
Sean só ouviu o grito de Rani e o silêncio posterior, no que outro vórtice se formou sobre eles.
“Perdão!” soou sincero dele que correu com a água já nas coxas não sabendo para onde correr, porque água e mais água descia, e o alcançava cada vez mais rápido.
Sean percebeu que suas coxas mergulhadas na água fria o congelava, quando tropeçou em algo e mergulhou, enxergando corpos debaixo dela. Submergiu e havia corpos espalhados por todos os redores do Lago Bratan. Não os reconheceu, mas reconheceu Benijunan, o garçom. A seita os havia realmente seguido, havia ido lá matá-lo caso Rani falhasse.
Mais sete micros vórtices foram criados e a força de Sean se esvaecia na mesma frequência que seu corpo sangrava, que tentava fugir em meio à água quando foi atingido.
— Ahhh!!! — suas mãos eram cortadas pela força da água, e enfrentá-los dilacerava sua pele.
Sean não podia lutar contra, mergulhou tentando nadar e nadar e nadar quando seu corpo foi retirado da água, erguido no ar, girado até que quase seus olhos saltassem das órbitas, e o céu se abriu. Uma aurora boreal que cedeu a água, as chuvas que secaram, e ele mal pôde entender o que fez.
Helicópteros desciam vindos de todas as partes do Lago Bratan e Sean se olhou sangrando, volitando acima da floresta destruída, acima de corpos mortos e desmembrados.
Ele caiu desmaiado, mergulhando na água fria, em meio ao som ensurdecedor de hélices, que giravam feito os micros vórtices assassinos que dominava.
FINAL
Ilha da Polícia Mundial; Arquipélago da Indonésia.
1° 37’ 0” S e 108° 53’ 0” E.
17 de setembro; 15h30min.
Sean abriu os olhos. Outra vez não se conformou de ter sido levado à ilha paradisíaca. Não sabia há quanto tempo estava ali, contudo, sabia que dessa vez o rombo no seu coração era maior.
Uma pancada e a porta foi aberta. Sean se ergueu e Mr. Trevellis tinha o semblante carregado, não parecendo um homem com seus humores sob controle.
— O que pensava querer os enfrentando sozinho, filho de Oscar?
— Não te dou o direito de...
— Cale-se! Cale-se Sean! — Mr. Trevellis viu todo o jovem Sean Queise retesar. — O que achava que ia fazer enfrentando ‘A Sentença’? Salvar o mundo sozinho?
— Você sabia que eu sabia, não Trevellis?
— Seu pai... — e Mr. Trevellis entrou no quarto fechando a porta. — Oscar não quer acreditar no que vem se tornando, mas eu sei quem você é, do que é capaz, e do que ainda vai fazer, porque deixei você se tornar nisso! — exclamou com força, esticando e apontando todos os dedos para Sean, que não gostou daquilo também. — E sei que isso em que você se torna, sabia desde o começo que aquela destrambelhada da Rani, ia nos dar dor de cabeça; ela e aquela seita de fanáticos que nos persegue, que insufla terror na mídia, atrapalhando nosso trabalho.
— E que trabalho seria, hein Trevellis? Incitar a guerra que você tomaria sob julgo? O que? Não consegue começar a guerrear sozinho, Trevellis? Precisa de ajuda?
— Nunca quis a guerra, filho de Oscar! — Mr. Trevellis estava furioso. — Mas sabe que eu precisava fazer algo quando aquela imagem, daquele maldito Cruzador Solar se abastecendo no Sol, mostrou que eles se preparavam filho de Oscar, que os alienígenas se preparavam para um combate abastecendo aqueles malditos UFOs no Sol!!! — espumava pela boca.
— Não pode querer tomar as decisões de um mundo todo, sozinho Trevellis! Você não é Deus!
— Não sou quê?! — berrou. — E quem é Deus, filho de Oscar?! Aquele que já terminou pelo fogo, cidades inteiras?!
— Não vou discutir isso com você Trevellis. Mesmo porque você é o último que procura a paz no conflito.
— Sabe muito melhor que eu, filho de Oscar, que sem a guerra não encontraremos a paz.
— Hobbesiano demais, Trevellis.
Mr. Trevellis e todo seu peso e tamanho riram com gosto.
— Thomas Hobbes sabia filho de Oscar, quando criou a teoria que fundamentava a necessidade de um Estado Soberano como forma de manter a paz civil, e sabia que esperar que um mundo natural, um Estado Natural onde as pessoas tomassem as rédeas de suas próprias vidas, traria o caos e a destruição delas próprias, porque se manteriam em estado de guerra constante.
— Matar quem pode vir a matar antes de matar! Claro! Como os escatológicos de Benijunan, que justificavam a guerra pela guerra.
— Não, filho de Oscar! Isso justifica que sem punho, sem Estado e governantes seriam todos os pensamentos os válidos, cada um fazendo o que quer, e a paz nunca chegaria às vias de fato! Porque se cada um achar que está certo no que faz, que ao contrário das formigas e abelhas que formam sociedades por instinto, pessoas buscarão seu caminho às cegas, pela razão, como os escatológicos de Benijunan. E a consequência deste Estado Natural é a ameaça da manutenção da humanidade filho de Oscar, que leva os homens a pactuarem entre si, transferindo o direito de autodefesa existente no Estado Natural para o Estado, que garante a efetividade do contrato!
— Guerrear é...
— Não!!! — vociferou. — Evitar é a palavra chave, evitar o pior! Como o que vinha a ‘A Sentença’ tentando fazer à maneira dela, lhe destruindo, filho de Oscar, para evitar o que todos sabiam que aconteceria, a comunicação deles com você — apontou metaforicamente para o teto. —, preparado por Mona.
— Mona não... Mona não... — mas Sean sabia que Mona sim, ela o havia preparado, sob seus desejos e sob as ordens de Mr. Trevellis.
E Sean abaixou a cabeça se rendendo.
— Inferno! — explodiu Mr. Trevellis.
— Eu precisava detê-los, Trevellis; Rani e os escatológicos de Benijunan — e ele viu Mr. Trevellis o encarando furioso. — Porque eu sabia que Carminna estava escondendo algo e não era da Poliu, então tinha que ser de alguém muito próximo. Desconfiei de Adriana, mas deixei de enxergar, pelo medo de enxergar, que meus dons havia me levado exatamente ao hotel em que Rani começava a trabalhar, porque era ela meu medo hobbesiano. Depois, quando Carminna se assustou ao saber que eu estive em Bali, tudo ficou claro. Dali em diante só guiei-me pelas minhas desconfianças. Como disse o mesmo Hobbes, todos nós somos iguais no medo recíproco, na ameaça que paira sobre a cabeça de cada um, da morte violenta. Os homens igualam-se neste medo da morte, Trevellis — e lágrimas caíram do rosto bonito.
E Mr. Trevellis nada mais fez ou falou no que sentiu o perfume de rosas brancas de Adriana atrás dele, na porta do quarto-sala de Sean aberta, sabendo que ela fazia aquilo para culpar a ele, Sean, Oscar e toda a Poliu pela morte de Sandy Monroe.
Sean também entendeu aquilo. Entendeu que Adriana de alguma forma conhecia ou se identificava com as ordens dada a Sandy Monroe, espiã da Poliu; ordens para amá-lo.
Mr. Trevellis saiu deixando Sean abalado e Adriana permaneceu ali, na porta, sem outra vez saber se devia entrar, entrando. Porém Adriana temeu confrontar Sean, não se sentia mais bem vinda; estava enciumada, com raiva.
Viu as mãos dele enfaixadas, no rosto bonito, lágrimas.
— Chorando por Rani, Sr. Queise?
Sean direcionou-lhe sua fúria e a porta bateu contra o batente levantando o único fio do cabelo preso no coque militar.
— Você sabia que eu estava com ela, não? Fez Nadir direcionar MX1 para criar a aurora boreal e os vórtices que mataram os escatológicos de Benijunan. E de quebra se livrar de Rani e de mim.
Adriana recuou.
— Nunca quis lhe atingir, mas Rani sabia onde se meteu quando foi com você para o Lago Bratan. Sabia que você seria ferido por eles. E sabia o que fazia quando se meteu com aqueles escatológicos que não enxergam um palmo à frente deles.
— Você sabia que a seita de Benijunan me atacaria Adriana?
— Você sabia! — exclamou com força. — Você sabia Sr. Queise, e mesmo assim foi atrás dela novamente.
Sean avançou sobre ela, e Adriana deu-lhe uma chave de braço o derrubando no chão acarpetado de seu quarto-sala, com todos os curativos e a cicatriz do ferimento à bala.
— Ahhh!!! — Sean sentiu-se sendo dobrado.
— Você, Sr. Queise, e somente você, colocou-se em risco.
Sean a encarou no que ela o soltou. Ela se virou para sair e Sean, como com Rani, jogou suas últimas cartas.
— Não foi o HAARP da Poliu, Adriana — e Sean a viu paralisar. — Não foi você no comando do projeto Codinome: Cruzador Solar, nem MX1, nem Nadir, nem chip algum que criaram os vórtices em Bali — Sean sabia que a havia paralisado. — Foi Ykaro! Porque Bruno, Nadir e MX1 não são nada perto do poder dele!
— E Ykaro fez isso por quê? Para lhe matar?
— Não!
E Adriana teve medo virando-se em choque para ele.
— Por que Ykaro criaram os vórtices? Matar Rani e os escatológicos?
— Com medo? — e Sean forçou mais ainda. — Porque não pense que prender Ykaro ou Yka naquela Gaiola de Faraday os deterão, Adriana. Porque vamos morrer. E avise Trevellis que vamos morrer mesmo sendo ele o Estado Mandante. Porque Ykaro não vai obedecê-lo, porque Ykaro é o Estado Natural e não obedece ninguém; e Ykaro chamou os outros alienígenas, uma frota de Cruzadores Solares que se abasteceram no Sol no dia 08 de março!
— Como é que é?
— Carminna disse que em 08 de março, 14h00min, o SDO, Solar Dynamics Observatory, iniciou a filmagem de um enorme UFO se abastecendo no Sol.
E Adriana voltou a se virar para a porta.
— Precisa descansar Sr. Queise!
— O que vocês queriam com o projeto Codinome: Cruzador Solar, Adriana? Controlar o mundo? A ionosfera talvez? Seu plasma? Raios e trovões? Inundar cidades inimigas? Derrubar as naves espaciais? — e Sean pôde ver um pequeno detalhe que não havia visto em Adriana até então; o poder total. Ela era o poder natural, mandante. — Droga! Era você o tempo todo, Adriana? O poder nessa ilha, o poder de controlar quem morria e vivia, em controlar os híbridos Nadir e Bruno, e MX1.
— Tinha duvidas, Sr. Queise? — se virou para ele deslumbrante, com seus cabelos loiro-platinados se soltando.
— Tinha! — falou como que sozinho. — Não tenho mais! — e Sean viu a porta sendo trancada, com Adriana encostada à porta, lhe olhando de uma maneira que não gostou de ser olhado. — Yka tinha razão... Você se deitou comigo sob ordens; ordens suas em me dominar.
— Quem é Yka? As luzes usam o nome de seu planeta, é isso? Qual é a luz fêmea?
— Foi você quem encomendou a pesquisa ao Dr. Leôncio e foi Oscar quem o recomendou a Poliu, usando Spartacus? Para enganá-los?
— Qual é a luz fêmea? — Adriana insistiu.
— Por que não levanta a saia dela e descobre?
— Continua de bom humor apesar de tudo? Ótimo!
Sean balançou o pescoço, ‘bom humor’ não era bem a palavra, estava era se descontrolando.
— Deixe os alienígenas partirem e conversaremos melhor! — disparou Sean.
Adriana achou realmente graça.
— Uhm! Está barganhando algo?
— Sabe que sou melhor que Nadir. Que posso controlar os satélites sem implantes, porque sei que a Poliu implantou o chip de Socorro, Roswell e Karakum em Nadir.
Sean viu Adriana arregalar os olhos.
— Achei que os malditos psi de Mona soubessem bloquear-nos.
— Nadir foi me visitar quando voltei do espaço sem saber ao certo o que fazia. Porque eu fiz as formas-pensamento dela irem até mim sem saber o porquê dela ter ido até mim — e foi sua vez de olhá-la de uma maneira que Adriana não gostou de ser olhada. — E as formas-pensamento de Leôncio confirmaram que os implantes entram pelo nariz até o cérebro e não requerem cirurgia.
Adriana se aproximou.
— Sabe qual foi o meu único erro, Sr. Queise?
— Nascer?
— Te amar!
— Ah! Amor? Por favor, Senhorita, me prive disso! Você induziu Bruno que era controlado pelo chip de Socorro a matar Carminna que me seduzia. Induziu a seita de Benijunan a se livrar de Rani que me seduzia. Acredito que você levou Sandy ao suicídio porque me ela me seduzia.
— Não sei do que está falando.
— Tantos anos trabalhando para Oscar e Trevellis, colecionando minhas fotos, usando o perfume de rosas brancas dela, e vai me dizer que não estava presente na decisão dos espiões psíquicos sobre Sandy, sobre seguir Sandy, sobre Mona tocando o satélite de observação atrás de Sandy, Srta. Adriana?
— Chega! Sandy era uma traidora!
— E você o que é? Traiu-me! Traiu minha confiança! Você se deitou comigo!
— E daí? Você deitou com Carminna e Rani.
— Tenho até medo de pensar do que é capaz ‘dona Poliu’, mas não me deitei com nenhuma das duas. Porque diferente de você, tenho honra e brio — e o rosto de Sean foi virado pelo bofetão que lhe acertou em cheio. Adriana, porém gostou do contato físico. O amava, era certeza. — Ainda está em tempo de consertarmos nossos erros, Adriana.
— “Consertarmos nossos erros”? — riu. — E o que acha que devemos fazer? Hein? Hein? Enviá-los de volta, Sr. Queise? Para uma colônia de férias? Para algum outro planeta que eles com certeza destruirão?
— Leve-a, Adriana! Solte-a no espaço! Deixe Yka seguir seu caminho. Ela não é má.
— Sabe o que está me pedindo? Sabe que Ykaro a seguirá, que ele voltará mais furioso ainda, e com seu exército atacará a Terra.
— Eles não vão nos atacar a menos que Nêmeses volte. Estão lá em cima há muito tempo esperando algo que não existe. Nêmeses não existe, Adriana. Por isso nunca nos atacaram. Eles foram enganados pelo chip, por Jèsus, Santos, Carminna, Noah, Nadir, Bruno e a Poliu, desde Mr. Hawgths... — e tentáculos saíram do corpo de Adriana.
— Ahhh!!! — gritou Adriana ao ser dominada por YKARO.
Sean tentou fugir, mas os tentáculos cresceram e o imprensaram contra a parede.
Sean desmaiou.
Complexo A; setor de alojamento.
17 de setembro; 16h40min.
Seus abriu os olhos azuis e seus pés estavam descalços. Dessa vez os sons do mármore branco da casa de seus sonhos não ecoavam como antes. Estava despojado de todas as armas, procurando por Yka, sabendo que ela estava lá.
As paredes estavam fixas não se movendo nem se inclinando mais; ninguém o perseguia também.
Olhou-se, não estava mais ferido. Seus passos eram firmes ao caminhar pela casa, cômodo após cômodo.
Sean abriu os olhos azuis, viu-se deitado no quarto-sala, entendeu que o fio de prata, etéreo, que mantinha sua alma presa ao corpo durante a viagem astral, ainda estava lá. Havia conseguido se projetar para fora do corpo e retornar.
Projetou-se outra vez até a casa, tentando abrir os chackras, expor-se seguro de si, quando um estrondo ele ouviu. Ficou na duvida se havia sido na ilha ou na casa, mas a casa dos seus sonhos inclinava rapidamente, tombava, se desmanchando à sua frente.
Um turbilhão de ar se fez dentro do quarto-sala de Sean Queise, com o chão se pondo a tremer, e a cama trepidou com o forte vento que carregou seu corpo ainda projetado.
Sean sabia que estava sendo levado por uma força poderosa, e deixou-se erguer da cama, perder o peso, volitar.
Abriu os olhos, fechou, e voltou a abri-los; acabara de voltar à casa que envelhecia, dominando seu subconsciente.
E as paredes despencavam; tecidos, madeira, mármore, tudo diluindo.
Uma porta se abriu, não pôde saber ao certo onde. Mas gritos ecoaram e Sean abriu os olhos azuis, erguendo a cabeça e encarando o quarto-sala vazio. Voltara outra vez ao quarto-sala viajando na sua própria loucura, fazendo realidade e ilusão se mesclarem.
Sua cama havia se transformado numa grande cama de carvalho, de pitões que apontavam para o teto, de grandes dosséis de tules que escorriam sobre eles. Sean viu Sandy adormecida ao seu lado, sobre flores brancas.
O perfume penetrou suas narinas; o perfume da mulher morta.
“Ahhh!!!”, Sean sentiu dores nas costas, sentiu a espada que atravessava o corpo dele.
Era o tentáculo de Ykaro em forma de espada, um Mushhushshu, o símbolo de Marduk, que esvaecia o sangue dele, manchando a imaculada mulher de branco, que o olhava.
“Sean?”.
Sean sentiu dor, chorou lágrimas que doíam, corroíam sua alma.
“Perdão Sandy...” ecoou da sua boca.
Sean tentou se levantar ferido, mas o Mushhushshu estava enterrado em seu peito. E fosse o que fosse aquilo, Sean sangrava de verdade, porque formas-pensamento criaram aquela espada.
Caiu no chão do quarto-sala muito ferido.
“NÃO DEIXE QUE YKARO O MATE!”, tentava Yka alcançá-lo ainda presa na Gaiola de Faraday do laboratório.
— Ahhh!!! — gritava Sean pela dor, pela perda da noiva, pelos muitos erros cometidos para chegar até ali, sangrando no chão do quarto-sala. — Não...
“NÃO! SEAN! NÃO!”, Yka sabia que Sean se entregava que se sentia culpado por ter desenvolvido aquele dom, por chamá-los, por eles matarem gente inocente.
Sean desmaiou outra vez.
Complexo A; laboratórios subterrâneos.
17 de setembro; 17h17min.
— Ahhh!!! — gritou o Dr. Santos se encolhendo pela ardência provocada em sua vista e correu ao telefone. — Mr. Trevellis? — falava o Dr. Santos quase cego. — O alienígena macho... — e foi só isso, Santos caiu no chão do laboratório desacordado.
Ykaro entrava em uma espécie de transformação, e a Gaiola de Faraday se mesclava ao laboratório, sumindo. Dra. Hanna Cahs sentada ali, em choque, trocou olhares significativos com Andrea e Mr. Trevellis, que chegou logo após ser chamado, já não sentindo que dominava a situação.
No laboratório agora, só Yka presa na Gaiola de Faraday. Mas Yka também não estava lá, era só formas-pensamento criadas em todos, para acharem que ela estava lá.
Os dois alienígenas estavam soltos pelos complexos, com Yka indo atrás de Ykaro.
“ÓDIO!!!”
“NÃO!”, implorava Yka.
“MORRER DOIS, YKA!!!”, insistia Ykaro. “PRECISAM MORRER!!! PARA TERRA INVADIR!!!”.
Complexo A; setor de alojamento.
17 de setembro; 17h20min.
Tentáculos em forma de espada, Mushhushshu, atravessavam o corpo de Sean em sonhos, rasgando o tecido de seu corpo etéreo, sua alma, ainda jogado no chão do quarto-sala da ilha secreta, sangrando.
“ACORDE SEAN!”, e a ordem de Yka o acordou.
Sean abriu os olhos azuis sentindo o carpete macio tocarem-lhe os lábios frios, intumescidos pela dor.
— Não... — olhou para a cama do seu quarto-sala. — Não consigo...
Um perfume penetrou suas narinas mostrando o perigo eminente. Ele não estava sozinho, alguém de carne e osso estava lá.
“Adriana?”, pensou.
Sean olhou para cima, Adriana sentava-se na cama o observando. Ele se tocou, achou ter se tocado. Percebeu que estava sangrando, mas vivo, e que Ykaro tentava fantasiar o que sonhava.
— VENHA QUERIDO... — se insinuava Adriana ao abrir as pernas. Ela abria também os botões do vestido e Sean viu Adriana dominada pelo estranho timbre de voz; a voz de Ykaro. — PRECISAR... VOCÊ...
— O que quer de mim, Ykaro? O controle dos computadores?
— PRECISAR... VOCÊ... — repetia Adriana a fazer suas mãos crescerem até alcançar o corpo imóvel dele.
Ela então puxou Sean, o arrastando pelo carpete até colocar sua cabeça com força, colada ao seu corpo, até que a boca dele quase se afogou em seus seios.
E Sean precisou respirar fundo, para se controlar.
— O que quer de mim, Ykaro?
— NECESSITAR... FAZER ENTENDER?
Adriana esfregava o rosto dele pelos seus seios rígidos.
“Não!”, tentava Sean gritar sem que agora sua voz saísse.
— QUER SALVÁ-LA? — Adriana tinha o olhar diabólico.
Sean traduziu ‘ela’ como Kelly Garcia, sabia que Ykaro usava suas formas-pensamento, suas lembranças, seu amor por ela.
— Não faça isso Adriana! — implorava. — Acorde Adriana!
— A QUER, NÃO? — ria. — A QUER E NÃO A TEM? — Adriana lambia sua orelha.
Sean tentou se desvencilhar da força de Ykaro.
— Pare com isso Adriana! Concentre-se!
— A QUER COMO ELA O QUER! — Adriana balançava a cabeça descompassadamente. — A QUER... A SÓCIA... QUER SEXO COM ELA...
— Lute Adriana! Não deixe Ykaro lhe dominar! — implorava.
— VOU MATÁ-LA! A SÓCIA! — gargalhava. — SENTIR OUTRA VEZ! PERDER GRANDE AMOR!
Sean arregalou os olhos azuis percebendo o quanto perigoso Ykaro era, tudo minuciosamente estudado. E Ykaro ia fundo em seus pensamentos quando Kelly sofreu. Sean a viu na Computer Co., caída, sem oxigênio, morrendo.
— Não!!! Por favor, não!!! — Sean viu que todo seu amor por Kelly, todas suas lembranças dela se plasmavam, formas-pensamento que se materializaram com seu dom. — Não!!!
Ykaro usava o dom paranormal dele para plasmar uma Kelly que no fundo, era ele quem matava.
— TODOS MORRER!!! — ela gritou em seu ouvido.
Sean tentava tocar Adriana.
— Adriana? Pare... Por favor, acorde! Adriana acorde! Não deixe essa luz negra te dominar... — e Sean percebeu seu próprio sangue escorrer cada vez mais pela camisa.
Temeu não estar sonhando, temeu estar realmente morrendo.
— MATAR TODOS! MORRER TODOS! TERRA MORRER TODOS! — a voz de Adriana, por entre as palavras cada vez mais mal construídas, fazia Sean experimentar, da pior forma, o nível de seu poder paranormal.
Porque ele permitira Ykaro alcançar Kelly Garcia no Brasil, matando-a.
— Não!!! Kelly não!!!
— LUZ! PRECISAR FORÇA DA OUTRA! FORÇA DA OUTRA! EQUILIBRAR VIDA, SE NÃO UNIVERSO EXPLODIR!
— Nada vai explodir, Ykaro! Juro!
— NÃO!!!
— Nada vai explodir, Ykaro! Nêmeses não vem!
— NÃO ENTENDER? NÃO PODER ROMPER UNIVERSO!
— Nada vai romper Ykaro! O chip Cruzador Solar mentiu, entende? Eles programaram o chip para mentir através de Nadir! A Poliu instruiu Nadir para que vocês pensassem que a corporação de inteligência era poderosa, que vocês não a venceriam em caso de invasão!
— ELES ACHAR INVASÃO?
— Isso! Isso! Trevellis achou que vocês iam invadir! Ele foi enganado por imagens borradas, enganado por Santos e Noah! E o chip mentiu para ambos porque Nadir não era capacitada para ele, porque Nadir já fora desclassificada antes e Arthur sabia, mas se aproveitou da situação para roubar e ganhar mais dinheiro, vendendo tudo isso no mercado negro.
— CHIP CRUZADOR SOLAR NOSSO! CHIP CRUZADOR SOLAR NÃO MENTIR! POVO NOSSO CONSTRUIR CHIP CRUZADOR SOLAR! CHIP CRUZADOR SOLAR FALAR VERDADE! UNIVERSO ACABAR!
— Não, não. O chip não era de seu povo. Os Anunnakis maus, Ykaro. Fez vocês monstruosos.
— ISSO!!! ELES MAL!!! FIZERAM MONSTROS!!! NÍNGUEM NOS QUIS!!! — Ykaro laçou Sean pelo pescoço com seu tentáculo e o atirou contra a parede.
Ykaro saiu e o corpo de Adriana foi ao chão, catatônica.
— Adri... — Sean se arrastou até ela. — Adriana?! Adriana?! — a chamava e ela não respondia. — Droga! — Sean se lançou porta fora com a blusa se tomando de sangue.
Complexo A; laboratórios subterrâneos.
17 de setembro; 17h42min.
As câmeras do gramado captaram Sean correndo, sangrando, se dirigindo aos Complexos C e D, enquanto Hanna e Noah morriam pela força de Ykaro, que voltara a Gaiola de Faraday, no Complexo A, com Yka sem nada poder fazer.
Nadir se refugiava em vão, mas seu cérebro derreteu pelos chips, na ordem de Ykaro.
Mr. Trevellis conseguiu se esgueirar para fora dos laboratórios e Schumann alcançou o alarme geral fazendo um som estridente atingir toda a ilha secreta.
Sean ouviu o alarme vindo dos laboratórios subterrâneos do Complexo A.
“SALA DE CONTROLE ALA CINCO”; ecoou em seus pensamentos.
— Droga! — voltou correndo até o Complexo A sentindo dor, alcançando a portaria com a funcionária da recepção morta, e a porta que dava para as escadas que levavam aos andares superiores, arrancada da parede.
Sean correu para as escadas internas a fim de subir ao segundo andar, sentindo que não ia conseguir quando Ykaro, já dentro da Sala de Controle Ala Cinco, enlaçava todos os funcionários que via pela frente, asfixiando-os pela pressão, esmagando-os.
Mr. Trevellis também chegou a Sala de Controle Ala Cinco.
— Mr. Trevellis?! — berrava um oficial de segurança pelo corredor. — Não entre aí!!!
— Onde ele está?! Onde?! — atentava Mr. Trevellis contra o corpo que teimava em brecá-lo.
— Por favor, não entre Mr. Trevellis!!!
— Não me diga o que tenho que fazer idiota!!! Onde está aquele monstro?!
— Na Sala de Controle Ala Cinco!!! — apontou para frente. — Estão todos mortos!!!
Mr. Trevellis estancou, olhou para trás para encarar o oficial de segurança machucado, mas viu Sean correndo em sua direção, viu também Adriana o seguir. Num impulso entrou e se trancou na Sala de Controle Ala Cinco.
— Oficiais de segurança?! Abram essa porta!!! — gritava Adriana para homens da Poliu que chegavam.
— Não Trevellis!!! — gritava Sean do lado de fora. — Deixe-os ir!!!
— Ninguém vai a lugar algum!!! — gritava Mr. Trevellis do lado de dentro.
— Não Trevellis!!! Eles querem voltar, não entende?! — batia Sean na porta envidraçada da Sala de Controle Ala Cinco.
Mas Mr. Trevellis caiu em sonora gargalhada.
— E eles acham que vão como, filho de Oscar?!
— Os textos sumérios e acádios não deixavam dúvidas, Trevellis, de que os ‘deuses do céu e da terra’ eram capazes de se erguer da Terra, e ascender até aos céus, assim como de vaguear à vontade pela atmosfera terrestre?!
— Um alienígena Cthulhu voando?! — ria.
— Não Trevellis!!! Inanna, em suas jornadas aéreas, usava um elmo ‘SHU.GAR.RA’, que significa literalmente ‘aquilo que faz andar longe pelo universo’?! — e Sean viu Mr. Trevellis paralisado, por algo. — Não entendeu ainda?! Eles podem plasmar um UFO a partir de nossas formas-pensamento?!
— Filho de Oscar…
— E vão nos matar com tudo que já criamos até então, porque podem plasmar tudo, Trevellis?! Inclusive o seu HAARP que Ykaro usou?!
Mas Mr. Trevellis nada respondia, paralisado de pavor a se ver sozinho com o alienígena que o encarou na forma de um Cthulhu, com as asas batendo, os tentáculos se movendo freneticamente no rosto. E Mr. Trevellis viu todos os controladores da Sala de Controle Ala Cinco mortos.
— O que vai fazer Trevellis?! — gritava Adriana para o vidro. — O que ele vai fazer Sr. Queise? — olhava Sean ferido. — Leia a mente dele!!! — gritou histérica.
— Não faça nada Trevellis!!! — tentava Sean argumentar. Mas Mr. Trevellis nada respondia. Acreditava mesmo que não sabia o que ia fazer. — Trevellis?! Trevellis?! — mas ele não respondia. Sean então se virou para Adriana. — Não consegue ver que eles precisam partir?
— Não, Sr. Queise! Está fora de cogitação!
— Deixe-os ou Ykaro vai matar a todos nós... — e Sean foi arrancado da porta. — Ahhh!!! — a dor do corte era imensurável. — Não Adriana!!! — tentava.
Mas a porta foi derrubada pelos muitos oficiais de segurança que ali chegaram, após empregar massa explosiva. Invadiram em meio a tiros direcionados para cima de Ykaro, que encarou Sean mais que a todos.
Sean pôde ver o rosto de Mr. Trevellis se delineando na coisa. Olhou para os lados, e não mais viu Mr. Trevellis, que estava dominado pelo alienígena.
— Matem-no!!! — Adriana berrou para os oficiais de segurança ao perceber também que Ykaro incorporara Mr. Trevellis. — Atirem em Trevellis!!!
— Não!!! — tentou Sean ao ser empurrado para o lado.
— Está defendendo Trevellis?!
— Basta de mortes, Adriana!!!
— Matem-no!!! — berrou descontrolada.
Os oficiais de segurança de Adriana atiraram quatro vezes no corpo encolhido de Mr. Trevellis que caiu fazendo Ykaro perdê-lo.
— Droga! — Sean se encolheu pelo ato de ver Mr. Trevellis sangrar.
E Adriana continuava descontrolada.
— Matem o alienígena!!! — Adriana dirigia agora, a mesma ordem, para Ykaro.
— Não!!! Yka morre junto!!! — Sean agarrou a Tenente-Coronel Adriana.
— Não me interessa!!! — tentava se desvencilhar das mãos dele. — Matem-no!!!
— Não!!!
— Ainda temos o chip Cruzador Solar, Sr. Queise!!! Não precisamos deles!!!
Mas Ykaro arrebentou a parede da Sala de Controle Ala Cinco, se esgueirando para fora do Complexo A, alcançando o gramado no sobrevoo que deu. Adriana correu e engatilhou uma arma Glock 380 e apontou para os tentáculos que ainda se esticavam.
— Nada mais te interessa, não é Adriana?! Sua vida se restringe ao poder, não é?! Ao controle do clima!!!
Adriana desengatilhou a Glock 380 e se virou para Sean.
— Yka lhe contou como controlar o clima? — ela viu Sean se virar para sair. Avançou e o agarrou usando de toda a sua força contra ele que sentiu a ferida aumentando, caindo no chão quase sem forças. — Vou te matar se não me contar! — colocou a Glock 380 na sua têmpora.
E Sean viu Sandy Monroe na figura de Adriana.
— Nunca duvidei disso!
Sean e Adriana se encararam; Sean sob a mira da Glock 380.
— O fato de amá-lo não vai me impedir Sean! Nem tente me enganar!
— Enganá-la?
— Conte-me!!! — gritou descontrolada. — Sabe criar vórtices de ar ou não?! — berrou.
— Por que acha que não? — e o vento soprou na Sala de Controle Ala Cinco, um micro vórtice particular que se aproximava agora pelo chamado de Yka.
Adriana mal conseguiu abrir os olhos na ventania, o chão tremeu e as pernas de todos acompanharam; cadeiras, telas de computadores, mesas e tudo o que tinha em cima foram ao chão. Yka entrava na Sala de Controle Ala Cinco em forma de um polvo-humano, fazendo as mãos trêmulas de Adriana perder a Glock 380 que foi derrubada.
Adriana arregalou os olhos e viu Sean dentro Yka. Não o dominando, mas fazendo parte, como um todo.
— Mona Foad fez realmente algo com você, não? — foram suas últimas palavras.
E Yka não permitiu que ela continuasse. Os olhos de Adriana saltaram das órbitas, provocando suas veias se desenharem no rosto bonito e seus dentes trepidarem, a fazer seu rosto tremer junto.
— Não!!! Vai matá-la?! — gritou Sean por dentro de Yka.
Mas Yka fora implacável. O chão ainda tremia quando Adriana caiu morta, com o corpo desmembrado.
Um odor de morte invadiu a grande Sala de Controle Ala Cinco e Sean ainda olhava o corpo dela no chão, enquanto Yka se arrastava para fora da Sala de Controle Ala Cinco após o ter tirado de dentro dela, alcançando o jardim da ilha secreta em forma de um Cthulhu, se dirigindo para o Complexo D, atrás de Ykaro.
Sean entendeu enfim que ela também era uma alienígena e que não temeria matar humanos em prol de sua raça.
“Droga!”
O Major Henrique entrou na Sala de Controle Ala Cinco e Sean o agarrou.
— O que tem lá naquele Complexo?! — apontou para a grande tela que mostrava os jardins do Complexo D. Sean esperou e o Major Henrique nada respondeu. — O que tem naquele maldito Complexo D, Henrique?!
— Antenas! — respondeu calmamente ao ver o corpo morto de Adriana no chão e o corpo de Mr. Trevellis mais adiante, morrendo, em meio à poça do próprio sangue.
Sean largou Henrique e correu, saindo do Edifício A agora parcialmente destruído. Corria pelo gramado se dirigindo para o Edifício D, ficando a imaginar se Ykaro queria alcançar o controle das antenas.
O Major Henrique ainda estava na Sala de Controle Ala Cinco quando Oscar ofegante pela corrida, chegou vindo do laboratório subterrâneo destruído.
— Meu Deus... — viu o corpo morto de Adriana no chão, próximo a ele e Mr. Trevellis sendo socorrido. — Onde está Sean? — Oscar viu o Major Henrique apontar para a grande tela da Sala de Controle Ala Cinco, em choque. Oscar viu Sean correndo pelos gramados em direção ao Edifício D. — Sean está ferido?
— Sim!
— Droga! — Oscar olhou Henrique e alguma informação foi trocada naquele momento. — Mas que droga!
Sean corria atravessando os extensos jardins, quando um estrondo sob seus pés o impactou. Algo começava a se mover e Sean viu as catapultas, os casulos se projetando para fora. Olhou-se, olhou em volta, estava em meio a uma estação HAARP, e algo explodiu dentro da sua cabeça, uma informação ali guardada, talvez.
Um som agudo e um único raio subiram para o céu, para um céu tomado por uma aurora boreal. Sean correu o máximo que suas pernas permitiram, e desejou que a grande porta do Complexo D se abrisse com senhas e biometrias transmitidas por formas-pensamento ali geradas, quando um som agudo iniciava algo.
— Ahhh!!! — Sean gritou pelo som que estourava tímpanos, e foi de joelhos ao chão que começava a se umedecer pela chuva que se precipitou sobre a ilha. — Nível 3! — exclamou ao entender tudo. — Não!!! Oscar não!!! — e Sean saiu, invadiu o gramado outra vez, e meio aos casulos abertos, correndo de volta ao Complexo A, com todas as forças que ainda tinha.
Ykaro estava na Sala de Controle Ala Sete, controlando a mente de oficiais de segurança, em frente às várias telas de comando do HAARP Cruzador Solar.
Mas Henrique Loyola juntamente com Oscar Roldman, na Sala de Controle Ala Cinco, já haviam decidido. Não poderiam correr mais riscos, que segredos letais viessem à tona, ou muitos mais poderiam morrer. E Henrique tentava resgatar a Sala de Controle Ala Sete para a Sala de Controle Ala Cinco sem sucesso.
— O satélite de observação não responde Oscar. O HAARP está atrapalhando as comunicações.
— Onde está Sean, Henrique?
Henrique olhou as câmeras de vigilância.
— Adentrou o Complexo A.
— Sean está aqui dentro?
— Sim! Sim!
— Tem certeza? — falava com uma calma que descontrolava Henrique.
— Do que está falando Oscar?
— Sean está aqui dentro? Seguro? — Oscar perguntou mais uma vez.
Henrique acionou o GPS dentro de Sean Queise.
— O computador o mostra dentro do Complexo A!
— Mas Sean fez Spartacus desviar as coordenadas.
O Major Henrique levantou-se e o viu pelo circuito interno.
— Sean está chegando aqui, na Sala de Controle Ala Cinco.
— Acione a antena principal!
E Sean ouviu um estrondo do lado de fora. Derrubou a porta da sala que outrora fora de Arthur com a força da mente, e alcançou a janela, vendo que o teto do Complexo D se abria, e uma grande antena se projetava para fora abrindo sua estrutura, inclinando à procura de certa coordenada.
— Spartacus... — Sean mal conseguiu falar.
Mas Ykaro leu os pensamentos de Sean Queise, percebeu que ia ser destruído.
— IRA! — e um tufão de vórtice desproporcional foi produzido arrastando tudo do lado de fora dos complexos.
A água do mar ficou revolta, molhando as areias que invadiu segredos militares, começando a inundar os casulos de projeção dos mísseis terrestres.
— Não!!! — gritou Sean ao correr para Sala de Controle Ala Cinco. — Não!!! Oscar, não!!!
A grande tela da Sala de Controle Ala Cinco, mostrava enfim a localização de MX-1; seria ‘clima’ contra ‘clima’.
Ykaro continuava a manipular os oficiais de segurança na Sala de Controle Ala Sete, para redirecionar as antenas nos casulos; queria destruir Spartacus com uma corrente magnética tão forte que derreteria cada circuito lá usado.
— O desgraçado alienígena vai destruir Spartacus!!! — gritou o Major Henrique para Oscar. — O desgraçado alienígena vai destruir Spartacus!!!
Oscar era rápido em suas decisões.
— Então destrua o Complexo D!
Henrique pareceu não ter ouvido.
— O que disse?
— Destrua!!!
— Mas temos homens lá...
— Destrua!!! — berrou o todo poderoso Oscar Roldman com todo seu pulmão.
O Major Henrique engoliu a seco a ordem e começou a digitar feito louco.
“Eles já estão todos mortos mesmo”, foi só o que Oscar pensou.
O Major Henrique chamou o controle de Spartacus através do clone dos mainframes da Computer Co. criados pela Poliu. Spartacus chamou MX-1, e um feixe de energia foi carregado ainda no espaço.
As direções dadas o ativaram para cima da paradisíaca ilha secreta, Sala de Controle Ala Sete, Complexo D. Sean ainda do lado de fora da parede de vidro da Sala de Controle Ala Cinco, viu na grande tela os casulos no gramado lançarem um feixe de energia, que se extinguiu na mesma velocidade extraordinária que se iniciou.
Sean arregalou os olhos azuis no impacto e o perfume de Sandy Monroe se fez forte, presente.
— Não!!! — berrou o jovem empresário quando uma grande explosão chacoalhou a ilha, o fazendo ir contra a parede.
Uma nuvem única de poeira eletromagnética se espalhou ao vento que desmanchou o vórtice, e calaram os casulos que se fecharam.
O Complexo D, oficiais de segurança, Yka e Ykaro já não existiam mais. Marduk havia destruído Tiamat.
Sean atravessou a parede de vidro como se ela nunca tivesse existido, e se materializou na frente de Henrique em choque pelo que via.
— John Kennedy disse que se a humanidade não pusesse um fim à guerra, a guerra poria um fim à humanidade! — e Sean e toda sua força paranormal, fez erguerem-se no ar todas as cadeiras e mesas, enquanto as telas dos computadores mostravam logaritmos enlouquecidos.
— O que está fazendo?! O que está fazendo Sean?! — Henrique berrava. — Não pode apagar tudo!!! — e se virou para Oscar. — O que ele está fazendo?! O que ele está fazendo Oscar?!
Henrique desesperava-se vendo Sean apagando todas as informações nos discos rígidos, porque tudo o que queria se plasmava, tomava forma ali dentro da Sala de Controle Ala Cinco.
Pessoas de todas as épocas, alienígenas de todo Universo profundo, informações data-base, hieróglifos, naves e quedas, e armas, e cientistas da computação, e avanços escritos em tábuas Sumérias.
Tudo se autodestruindo, sendo deletados; imagens, eventos sumérios e Anunnakis, com Cthulhus; tudo ali se desenhando, plasmando, tomando vida e desaparecendo.
Oscar só o olhava maravilhado, quando Sean se virou para ele, sangrando, sentindo que também morria.
— Acabou!
— Seu idiota!!! — berrou Henrique horrorizado. — Bruno, Nadir e Carminna estão mortos, e enterrados com eles tudo o que sabemos sobre o Universo, sobre Nibiru/Nêmeses e seus Anunnakis!!!
— Eles vão te procurar Sean meu filho — foi só o que Oscar disse.
— Não duvido! — e Sean se virou indo embora.
— Volte aqui Sean!!! Volte aqui!!! Você vai me contar tudo sobre aquelas malditos alienígenas... — e Henrique e toda sua magreza levantou-se da cadeira para ir atrás dele.
— Não me siga Henrique! — exclamou Sean nervoso indo embora.
— Não lhe seguir? Não lhe seguir?! — berrou descontrolado. — Quero saber se ela advertiu sobre as calamidades que o Planeta Terra irá passar?! — mas Henrique prosseguiu inflamado. — Rastros de humanos gigantes, quando associamos os anjos e as luzes no céu, que são mencionados na Bíblia?! — e o seguia. — Com os contatos imediatos que temos hoje constantemente e contam...
— Cale-se Henrique!!! — Sean apontou para a mesa de controle de Henrique e tudo que sobrou ali entrou em curto-circuito.
Henrique entrou em choque:
— Oficiais de segurança?! Matem-no!!!
Oficiais de segurança avançaram sobre Sean e uma parede invisível os brecou, os lançando junto a mesas e telas de computadores adiante, destruindo tudo, explodindo tudo, cada cristal líquido que se espalhou pelo piso, que atravessou oficiais de segurança, que caíram sangrando.
— Não faça isso Sean!!! — agora foi Oscar quem gritou.
Oficiais de segurança se levantaram e foram atrás dele, mas Sean estava ferido, sangrando, com seus dons fora de controle, e foi a vez de Oscar Roldman os fazer sumir da Sala de Controle Ala Cinco.
Henrique Loyola se apavorou e abriu uma gaveta com sua biometria, e de dentro tirou uma caixa de acrílico como aquela que o chip Codinome: Cruzador Solar foi armazenado.
Correu tentando fugir quando Sean ergueu o seu corpo abraçado à caixa por metros de altura, até que ele fosse largado e de lá caísse.
— Não Sean! — e Oscar o segurou no ar, impedindo que a queda o matasse.
Sean então deu poucos passos e se aproximou de Henrique volitando com a caixa abraçada a ele, e tocou-a, fazendo-a sumir.
— Para onde... Para onde... — e Henrique não conseguiu terminar porque Sean já havia mudado seu rumo.
— Para onde a mandou, Sean? — Oscar fez a mesma pergunta sobre a caixa de acrílico.
— Um quarto chip? — e Sean viu Oscar em silêncio. — Quantos mais Oscar? Quantos mais vão morrer por isso? — e Sean socou Oscar Roldman que não esperava tal reação, com Henrique caindo de seu controle paranormal. — Por Sandy! — e Sean socou Oscar Roldman outra vez que nada fez para detê-lo.
Sean então encarou Oscar Roldman agora com lágrimas nos olhos, por odiá-lo, por amá-lo, por saber que Oscar, Adriana e Mr. Trevellis eram iguais, que só o poder interessava, e que por isso ele tinha sido trocado, deixado para Fernando Queise criá-lo, porque o poder era o que Oscar Roldman buscara a vida toda.
Sean Queise se foi sabendo que o mundo até não havia terminado, não ainda, mas havia muito mais coisa embutida ali, outra caixa de acrílico, com outros chips, de outras quedas; tudo embutido na história, nos mitos, na ida e vinda constante da noiva morta, sempre o alertando.
E Sean Queise se foi sabendo que tinha que mudar tomar outro rumo na sua vida, talvez se empenhar mais no trabalho, nos computadores, na busca por vingança.
“Por todo o espaço há energia! E será uma mera questão de tempo, para o ser humano conseguir conectar seus equipamentos ao mecanismo que move o próprio Universo”.
Nikola Tesla.
Marcia Ribeiro Malucelli
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