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Series & Trilogias Literarias
Quando seu dever é se casar com uma herdeira, é melhor não se apaixonar por uma senhorita que não é
Nos últimos seis anos, a Srta. Lizzie Doherty teve exatamente zero propostas. Não porque não seja atraente, ou de uma boa família, ou não tem amigos bem conectados, mas simplesmente porque é pobre. Ou assim a Sociedade acredita. Convidada para uma festa no campo, sua jornada toma um rumo inesperado durante a tempestade quando seu condutor a leva para a propriedade errada. Ao entrar na casa, ela logo é se esconde atrás de uma máscara e jura segredo. Nunca Lizzie experimentara um evento tão estranho e intrigante, então ela brinca para ver até onde a noite a levará.
Lorde Hugo, Visconde de Wakely vive pelo pecado, por qualquer coisa escandalosa, e por festas que envolvem todas essas coisas. Pelo menos era como costumava levar a vida. Mas imagine a surpresa dele quando a protegida de um de seus melhores amigos, Srta. Lizzie Doherty, inocente e frequentadora da Temporada há seis anos consecutivos, chega na última festa libertina a que ele irá frequentar. Ou quando um beijo escandaloso e improvisado vira sua vida de cabeça para baixo.
Lizzie decide ficar para a festa que durará uma semana. Máscaras mantêm as identidades dos convidados em segredo, mas Lizzie reconheceria Lorde Hugo Wakely em qualquer lugar. E um beijo escandaloso e sem prenúncio diz a ela que ele é o Visconde certo para ela... Ele só não sabe ainda.
J. Smith & Filhos, Advogados — Londres, agosto de 1812
Lorde Hugo Blythe, o quarto visconde Wakely, olhava em silêncio para o seu advogado de muitos anos, o Sr. Thompson. Ele piscou, lutando para compreender o significado por trás das palavras do cavalheiro.
Que meu pai queime nas profundezas do inferno.
Se ele já não estivesse morto, Hugo poderia tê-lo matado por tal palhaçada.
— Perdão, mas poderia repetir quais são os termos no testamento do meu pai? Não tenho certeza se está fazendo sentido para mim. Disse que eu devo me casar dentro de um ano? Esta parte estou um pouco confusa.
Como ele desejava ter realmente se confundido.
O Sr. Thompson, um cavalheiro corpulento e mais velho, com a linha do cabelo recuada e caráter honesto lançou um olhar de pena para Hugo e, em seguida, voltou a olhar os papéis:
— O testamento explica que, por direito de nascença, você herda o título de visconde de Bolton Abbey, junto com a casa de Londres e as propriedades em Cumbria e na Irlanda. No entanto, o dote que de sua mãe, de quando ela se casou com seu pai, será estornado para a família dela, caso você não se case até o seu trigésimo aniversário. Acredito que falta menos de doze meses.
Descrença fez um buraco dentro de Hugo, como uma pedra pesada.
— Pois é. 23 de julho, para ser exato. — disse ele, passando a mão na mandíbula.
Como o pai pôde fazer isso com ele? Ele assume que sempre tiveram muitas desavenças, sim, discussões sobre ele se divertir e vaguear pela cidade sem qualquer intenção de contrair matrimônio, mas fazer isso com ele, forçá-lo, estava além da crueldade.
O advogado largou os papéis e voltou a olhar diretamente para ele.
— Eu sugiro que encontre uma esposa antes do final da próxima temporada. Caso não cumpra essa cláusula, o dinheiro será enviado ao seu tio em Nova York como instruído por seu pai. Seu tio foi notificado dessa condição, e está receptivo a reivindicar o dinheiro que sua mãe trouxe com o casamento. A cláusula é bastante sólida, e não pode ser destituída. Uma das coisas claras aqui é que, ao olhar para as movimentações financeiras de sua herança, se perder esse dinheiro, restará muito pouco para manter as propriedades em funcionamento. Pode ter que alugá-las por tempo indeterminado, pois será incapaz de vendê-las por serem vinculadas ao título.
Um peso caiu sobre os ombros de Hugo, e ele recostou-se na cadeira, não sabia que a situação era tão catastrófica.
— Meu pai deixou instruções acerca de com quem eu devo me casar?
Seus gritos além-túmulo eram tão altos, que era possível que houvesse regras a serem seguidas quanto ao que seria uma noiva aceitável.
— Quanto a isso... — o Sr. Thompson disse, mexendo-se no lugar e parecendo um pouco desconfortável pela primeira vez durante a reunião. O peso nos ombros de Hugo dobrou. — Seu pai estipulou que você não apenas deve se casar antes dos trinta anos, mas também é obrigado a se casar com uma mulher de fortuna, como ele. O dote da moça não pode ser inferior a trinta mil libras. Seu pai escreveu que exige tal valor para que o nome da família esteja assegurado, assim como o sustento de todos os que vivem e dependem de suas terras para sobreviver. Ele também escreveu que acredita que você é mais do que capaz dessa tarefa, e deseja-lhe felicidades e alegria em seu futuro casamento.
Hugo encontrou o olhar do advogado, incapaz de entender o que estava sendo dito. Ele pensou que teria mais tempo antes de se estabelecer. Ele gostava muito de ser um solteiro elegível, mas as festas seletas e muito escandalosas a que ele estava acostumado precisariam ser esquecidas se ele quisesse encontrar uma esposa. Que chato. Uma esposa. Sua vida estava acabada.
O Sr. Thompson se levantou, segurando uma cópia enrolada do testamento, amarrada com fita rosa escura. Hugo a agarrou, o desejo de amassar o papel em um bola e jogar na lata de lixo, era uma ideia constante.
— Boa sorte, Lorde Wakely. Se tiver mais alguma dúvida, não hesite em me chamar. Estou à sua disposição sempre que precisar.
Hugo apertou a mão dele, pegou o chapéu e as luvas, e caminhou até a porta.
— Obrigado, senhor. Depois de encontrar a pobre vítima que se tornará minha esposa, entrarei em contato.
E seria uma vítima de fato, pois um casamento feito às pressas, e apenas por exigir fundos, nunca seria um bom casamento. Ele sempre admirou os casamentos resultantes de casais apaixonados, sabia que ele também desejava tal conexão para si. Ainda não.
Ele parou na calçada e bateu com o chapéu de castor na cabeça.
Droga.
Se o que o advogado disse era verdade, e não havia dúvida de que era, ele carregava a prova em mãos, então era imperativo que ele encontrasse uma esposa. Cerca de onze meses até que seu tempo acabasse. Precisavas que o tio atravessasse o Atlântico e recuperasse o que era, por direito, de Hugo. O direito de primogenitura dele.
Bem, ele não o teria. Ele seguiria a cláusula, mas também desfrutaria de seu último ano como um cavalheiro solteiro. Não havia nada que ele detestasse mais do que fazer tudo o que o pai mandava. O fato de seu pai ter conseguido isso até de debaixo da terra não era algo que ele pensava capaz de fazer, mas infelizmente ele estava errado.
Ele xingou. Onze meses, e só então ele encontraria uma herdeira disposta, que desejasse um casamento de conveniência, e daria fim a esse episódio.
Em todas as temporadas anteriores, ele falhou em encontrar alguém que o inspirasse outra coisa senão luxúria. Sendo assim, na próxima temporada, ele se casaria com uma herdeira fácil de ser controlada para garantir suas propriedades. Um plano conveniente e perfeito para variar.
Sob nenhuma circunstância ele estaria disposto a perder as terras, ou ter que arrendar as propriedades e viver com poucos recursos pelo resto da vida. O nome dele seria arruinado. Ele seria um lorde de quem todos teriam pena. Os Wakely nunca precisaram pedir dinheiro, e ele não seria o primeiro a fazê-lo.
Ele estremeceu.
Ah não, isso nunca poderia acontecer. Ele sairia a caça de uma herdeira. Bem, em onze meses, para ser mais exato.
Capítulo Um
Dez meses depois. — Uma festa em um jardim, Londres
— Diz aqui, em Orgulho e Preconceito, que um cavalheiro em posse de uma grande fortuna deve sair à procura de uma esposa. — Lizzie Doherty fechou o livro com força e notou a prima por casamento, a condessa de Leighton, estudando-a com um olhar de diversão. — Quais são as chances de meus sentimentos serem confirmados nesses romances? O que acha, Kat?
Katherine riu, balançando a cabeça.
— Lizzie, sinto dizer que nem sempre é verdade, mas também, quando é, o homem costuma cometer o erro catastrófico de se casar com alguém com quem não se importa, ou nem mesmo gosta. E você não é um homem, é uma mulher que possui uma grande fortuna, não é tão conhecida na sociedade, portanto, é você quem está procurando um marido.
Lizzie olhou para seu exemplar de Orgulho e Preconceito, pensando nas palavras da prima, e em como sua última temporada na cidade comprovava as palavras dela. Apesar de suas conexões, ninguém havia pedido sua mão, nem sugerido que poderiam fazê-lo em nenhum dos bailes que ela compareceu. O fato até começou a frustrá-la, e ela não era do tipo que fica irritada com as decisões ou ações de outras pessoas. Mas ser pária por uma razão desconhecida parecia peculiar. E agora, ela já estava farta.
Lizzie vinha de uma família com ótimas conexões, mesmo que estivessem no lado pobre dos Dez Mil. Sua própria situação só melhorou quando o primo Hamish, o Conde de Leighton, concedeu a ela um grande dote, cerca de seis anos atrás, e que só havia crescido em valor naquele tempo devido aos investimentos dele, ou assim ele havia afirmado. Ela deveria receber cerca de setenta mil libras ao casar-se ou no vigésimo quinto aniversário. Uma bela quantia que qualquer futuro marido ficaria feliz em receber. Se alguém, ao menos, fizesse a proposta.
Lizzie sorriu. Agradecia todo santo dia pela decisão de sua mãe de mandá-la para a cidade, há muitos anos, para passar a temporada com a mãe de Lorde Leighton, mesmo que ela não fosse a mulher mais agradável de se ter por perto.
Ela suspirou quando a mãe veio se juntar a elas, fechando o leque com um estalo.
— Ó, pelo amor de Deus, Lizzie, pare de ficar aqui sentada com Lady Leighton e vá caminhar pelo gramado com as jovens da sua idade. Você é o epítome de uma solteirona neste exato momento.
Lorde Leighton achou melhor que não contassem o fato de Lizzie agora ser uma herdeira para nenhuma de suas mães, devido à incapacidade de ambas em guardar segredos. A última coisa que queriam era torná-la um alvo de caçadores de fortunas. E assim, em piqueniques como o que eles fizeram hoje, Lizzie precisava tolerar o falatório de sua mãe por não ter conseguido um marido. Mas era mais difícil do que poderia imaginar, ainda mais quando todos os homens da região acreditavam que você era pobre.
— Vejo que sua amiga Sally chegou, Lizzie. É melhor você ir dizer olá. — disse Katherine, piscando para ela.
— Devo sim, obrigada. — disse ela, levantando-se e partindo na direção da amiga.
Ela observou os convidados no piquenique de Lorde e Lady Hart. Ela descobrira que muitos dos cavalheiros queriam apenas uma esposa rica, ou pior, estavam apenas festejando e vendo se as viúvas agradáveis estariam dispostas a dar um passeio impertinente em suas carruagens. É claro que Lizzie não deveria saber o que se passava atrás das portas fechadas da cidade de Londres, mas somente um simplório pensaria que todos aqueles que ali estavam faziam visitas domiciliares e demonstravam tanta solicitude em locais públicos apenas por serem angelicais.
Um sussurro distinto ecoou entre os convidados, e Lizzie se virou para ver Lorde Hugo Blythe, visconde de Wakely, se juntar ao piquenique, cumprimentando os anfitriões antes de caminhar em direção ao duque e duquesa de Athelby.
Lizzie aproveitou a oportunidade para observá-lo, atitude não muito diferente de tantas outras mulheres ali. Mas quando alguém se depara com a forma esbelta e atlética de Lorde Wakely, é imperativo parar e admirar a vista.
Sua Senhoria exalava a delícia proibida sobre a qual ela não deveria saber nada. Mas se alguém escutasse com atenção suficiente nos bailes e festas, você sempre poderia pegar fragmentos acerca do que a sociedade estava aprontando. Quem estava tendo um caso com quem, quem era um amante terrível ou tinha vícios na mesa e nos cavalos. As coisas que Lizzie ouvira em sua primeira temporada na cidade, há muitos anos, seriam suficientes para fazer sua mãe ter síncope nervosa se ela os divulgasse.
Agora, seis anos depois, ela já não era uma flor de estufa, era a própria estufa. Um navio encalhado há tanto tempo que ninguém ousava cortejá-la. Não que isso importasse, devido ao dote considerável que ela receberia em caso de casamento ou no vigésimo quinto aniversário. E como ela estava mais perto de completar os vinte e cinco do que de se casar, o fascínio da ideia de não se casar se apoderou de sua mente e parecia cada vez mais tentador.
Havia coisas piores na vida do que ser solteira, como se casar com o tipo errado de homem ou ter um casamento sem amor. Casar-se com um homem que buscava conforto em outras pessoas, mesmo depois de proferir os votos de casamento. Ela preferia permanecer só, e se tornar uma solteirona do que cometer um erro tão imutável e catastrófico.
Lorde Wakely sorriu de forma diabólica para um grupo de debutantes risonhas, mas, apesar de suas provocações e alegria, nem uma vez vacilou em seu comportamento cavalheiresco. E, no entanto, Lizzie se perguntou o que realmente estava acontecendo por trás de seus olhos azuis escuros e tempestuosos. Qual seria a real opinião dele sobre ser um dos solteiros mais procurados de Londres? Ele gostava da atenção ou apenas a tolerava? Afinal, Sua Senhoria ainda era capaz de fazer Lizzie vibrar por dentro. Seu coração batia mais rápido sempre que seus olhares se cruzavam.
Era uma reação que ela nunca experimentou com mais ninguém em todos os seus anos dançando nos salões de Londres. Ela o conhecia há alguns anos, seu primo os apresentou na sua segunda temporada. Embora ela não pudesse dizer qual o efeito dela sobre ele, se houvesse, Lizzie perdeu o fôlego um pouco no dia em que se conheceram e nunca o recuperou. Ele parecia ter nascido com os cabelos escuros mais maravilhosos que ela já vira. A pele morena dele era de um tom bonito, não era o branco pastoso como de tantos outros cavalheiros ingleses.
Ela tomou um gole de champanhe, esquecendo-se de ir até a amiga e, em vez disso, permaneceu de pé junto à mesa de bolos, olhando para ele. Ela apertou os lábios, imaginando se havia algum sangue espanhol na família dele, a linha da mandíbula dele parecia capaz de cortar vidro, sem mencionar o nariz de proporções perfeitas.
Um dia alguém o conquistaria, o faria se apaixonar com total desespero, e que dama sortuda esta mulher seria ao acordar todas as manhãs ao lado de um homem assim seria celestial.
Sua amiga Sally a viu e acenou.
Tirando Lorde Wakely da cabeça, Lizzie se juntou a ela no momento em que a mulher com quem Sally estava falando, Lady Jersey, desejou um bom dia.
Lizzie beijou Sally na bochecha e aceitou uma taça de champanhe fresca de um lacaio que passava.
— Eu gostaria que mamãe parasse de me fazer participar desses eventos em que nós somos mostradas como gado em Tattersalls. Estou ficando velha demais para me preocupar com homens e casamento, e minha mãe tem a tendência enervante a me jogar no caminho de todos os jovens ricos, mesmo quando é óbvio que eu sou velha demais para eles e que eles não têm absolutamente nenhum interesse em mim.
Sally riu, os olhos brilhando de alegria.
— Você não é muito velha. Se fosse um homem, nem sequer seria visto como no auge. Debutou bem jovem, com apenas dezessete anos, não se admira que esteja cansada de todos esses joguetes e vai-e-vem de cortejos.
Lizzie assentiu, concordando com tudo o que Sally dizia. Sua amiga sempre falava a verdade e sem exageros. Ela era realmente a melhor pessoa que Lizzie conhecia, além de seu primo Hamish.
— Você está certa, é claro. E preciso admitir que essa história de "temporada" está ficando obsoleta. Anseio por aventura. Vou contar algo para você Sally, porque sei que você é minha amiga e tão silenciosa quanto um túmulo, mas, se eu pudesse, compraria uma casa para mim, me mudaria para longe de mamãe e adotaria um gato. Ou melhor ainda, muitos gatos. Ficarei satisfeita quando todas essas três metas forem alcançadas.
Sally balançou a cabeça, sorrindo.
— Eu não acredito em você por um segundo. Sei muito bem que há um certo cavalheiro que a faria se esquecer desses planos em alguns segundos caso a cortejasse. Que pena que ele é tão esquivo, apesar de bastante educado conosco, jovens mulheres inexperientes. Contudo, segundo alguns sussurros que ouvi por aí, ele esteja em busca de uma esposa. Talvez você esteja entre as possibilidades...
Lizzie riu quando compreendeu as palavras da amiga.
Ela olhou ao redor dos jardins e o encontrou sem problemas, e suspirou por dentro por quão charmoso ele era em todos os sentidos.
— Como ele é bonito. Acha que ele sabe que todas as mulheres de Londres nutrem uma paixonite por ele? Gostaria de saber se ele tem algum sangue espanhol na família. Ele tem a pele mais linda que eu já vi.
— Sim, acho que você está certa. Se não me falha a memória, acredito que a avó dele era de Portugal. Talvez seja daí que ele herdou essa bela aparência morena. — sua amiga o estudou um momento antes de complementar. — Lorde Wakely poderia se passar por pirata: robusto, tocado pelo sol e muito travesso, pelo que afirmam as fofocas
Ela sorriu, e tomou um gole de sua bebida.
— Os traços externos dele devem ser louvados, mas ele também é bom de coração. Por que, no ano passado, ele fez uma doação considerável para a Sociedade de Socorro de Londres que a Duquesa de Athelby e a Marquesa de Aaron administram. E ele sempre dança com as debutantes na cidade, o que garante um bom início de temporada para elas. Ele nunca é cruel. Na verdade, nunca ouvi uma palavra ruim sobre ele, nem de suas maneiras ou temperamento. Que pena que há rumores de que ele está atrás da senhorita Edwina Fox. — só a menção dessa debutante fazia os dentes de Lizzie doerem. — Ela foi apresentada este ano e é o assunto de todos, já que o tio é parente do duque de Athelby. Bem conectada e rica... exatamente o que todo jovem cavalheiro procura em uma esposa, não é?
— Suas palavras pingam sarcasmo, Lizzie. Talvez você deva ser menos exigente quando estivermos juntas. — sugeriu Sally. — Está animada para as festividades na residência rural de Lady Remmnick? Partimos amanhã de manhã cedo. Meu pai deseja chegar bem antes da tarde. Com tantos convidados, duvido que ainda restem muitos na cidade.
Lizzie mal podia esperar para voltar ao interior, ao ar fresco e aos passeios a cavalo que poderia fazer com mais frequência.
— Estou ansiosa e não sei como agradecer à sua mãe o suficiente por me oferecer tutela. Só que devo chegar depois de amanhã com minha dama. Mamãe irá para casa em Bellview Manor, e eu viajarei para a propriedade dos Remmnick de lá.
Sally apertou o braço dela, caminhando pelas margens do gramado.
— Estou bem animada para participar. Arthur estará lá. Será que ele por fim me pedirá em casamento, caso consiga me arrastar para longe da mamãe por um momento?
O marquês de Mongrove, ou Arthur para Sally e Lizzie, já que o conheciam desde a infância, era um recém-nomeado marquês e, finalmente, era capaz de decidir o próprio futuro. Não a mãe dele, fato com que Lizzie podia simpatizar, já que ela também tinha uma mãe autoritária. Ele havia sido uma criança agradável e se tornara um cavalheiro adorável que combinava com Sally, que tinha um temperamento honesto e complacente. Uma combinação perfeita para a amiga em todos os aspectos.
— Tenho certeza de que sim. De fato, olhe para ele agora ansiando por você, ali embaixo do olmo. Quão triste ele parece por não ter o amor dele ao seu lado, suspirando a cada palavra e idolatrando o chão que você pisa.
Sally deu um tapa no braço dela.
— Pare de brincar. — ela sorriu. — Ele é adorável, devo concordar, e se me pedir em casamento, direi sim na mesma hora e solicitarei um casamento para muito em breve. Estou pronta para que minha vida como esposa e mãe comece. Não vejo sentido em esperar antes de fazermos nossos votos, se você entende o que digo.
Lizzie sorriu com o rubor leve que tomou as bochechas da amiga.
— Você será uma noiva linda e uma esposa perfeita e amorosa. Lorde Mongrove terá sorte em ter você.
— Obrigada, querida. — Sally lançou um pequeno aceno à Sua Senhoria, encantando-se quando ele acenou de volta. — Não consigo mais esperar um único dia e, portanto, acho que esta festa chegou em um momento perfeito. Todos nós precisamos de uma pausa dos problemas da vida.
Lizzie não podia concordar mais.
— Sem mencionar — continuou Sally, voltando a atenção para ela. —, estaremos longe da cidade e ficaremos sob o mesmo teto. Quanta diversão teremos. E mesmo que eu já tenha meu par, não significa que você não possa encontrar alguém para amar.
— Existe apenas um cavalheiro que eu quero, e ele nem sabe que eu existo. Sou apenas a prima de um de seus amigos mais próximos, pouco notável e esquecível no melhor dos cenários. E, como afirmei antes, não me casarei com ninguém com o único intento de procriar e cumprir meu dever de mulher. Com quem quer que eu me case, será por amor. Um amor profundo, doloroso e que consuma tudo é a única opção que me afastará dos meus sonhos de minha própria casa, longe de meus pais e cheia de gatos.
— Eu gosto desse plano. Combina bem com você, e você sabe que não quero nada além do melhor. — declarou Sally, com um tom sério.
— Sabe dizer se lorde Wakely estará na festa em casa dos Remmnick? — Lizzie perguntou, tentando, sem sucesso, esconder a esperança que marcou seu tom.
Ó, deus, ela estava mesmo desesperada e desejosa de ver este homem. Se ao menos pudesse conter o entusiasmo por ele e ver outros cavalheiros pelo seu valor. Se aparecer alguns, é claro.
Sally fez uma careta, e Lizzie conseguiu sua resposta antes mesmo de amiga emitir algum som.
— Infelizmente, ele não estará presente, embora me tenham dito que ele estará no condado, participando de outro evento. Não muito longe da propriedade dos Remmnick, na verdade.
Lizzie mordeu o lábio e se perguntou o que seria esse outro evento, e quem estava presente. O círculo social de Sua Senhoria era a elite da sociedade. Somente cavalheiros de extrema riqueza e com pouquíssimas preocupações no mundo podiam entrar. Cavalheiros que amavam as frivolidades da vida social, o estilo de vida luxuoso e as mulheres desimpedidas que seu status lhes proporcionava. Não eram permitidas regras nem esposas.
Não era para os fracos de coração, e certamente nada do que acontecia era imaginável para Lizzie, caso ela fosse um homem e capaz de ingressar em uma associação assim. Não que ela devesse saber alguma dessas coisas, mas algumas fofocas eram muito atraentes para serem ignoradas.
— Não vou negar que estou um pouco decepcionada com essa notícia, mas ele nem sabe que eu existo, então que importa de qual evento ele participa?
Sally apertou o braço dela e a abraçou um pouco.
— Não fique abatida, querida. Há um cavalheiro por aí com seu nome escrito na testa dele. E você irá se casar com ele e amá-lo loucamente quando o encontrar.
Lizzie riu, nem mesmo capaz de imaginar essa possibilidade, mas a desejando mesmo assim. Nem que apenas para fugir de sua mãe, que às vezes poderia ser sufocante ao extremo, antes de seu aniversário de vinte e cinco anos.
— Suponho que só o tempo dirá.
Não que ela fosse contar a Sally, mas Lizzie estava contente enquanto esperava o presente de Hamish, porque era muito mais provável que ela recebesse esse dote do que fosse notada por certo visconde. Se ele tivesse algum interesse nela, teria deixado as intenções claras anos atrás.
— Você verá, minha querida, e quando acontecer, será uma ótima história para ouvir.
Capítulo Dois
Kent — dois dias depois
A carruagem balançava de forma assustadora, e Lizzie agarrou a alça ao lado da janela com as duas mãos para não cair no chão. Sua dama de companhia soltou um guincho quando a carruagem escorregou na pista lamacenta pela segunda vez. As duas balançavam como folhas ao vento.
— Ó senhorita Lizzie, isso é terrível. Se não chegarmos em breve, temo que nunca conseguiremos.
Era um medo que a própria Lizzie sentiu várias vezes desde que partiram da propriedade da família naquela manhã. O clima típico do sul as atingira tão rápido que, quando deixaram a última estalagem após uma troca de cavalos, era tarde demais para voltar.
Um uivo zumbiu através da porta, e Lizzie estremeceu.
— Tenho certeza de que a tempestade passará em breve. Não se preocupe, Mary. Estaremos lá em breve, prometo.
Lágrimas brotaram nos olhos da criada, e Lizzie olhou para fora. A noite estava caindo depressa e ainda não havia sinal de luzes, nenhum sinal de segurança nessa terrível tempestade. A carruagem parou e depois afundou quando o motorista pulou. Lizzie abriu a porta e foi puxada pelo vento uivante que atingia a lateral da carruagem com tanta força que a janela bateu no assento da carruagem.
A criada gritou, e ela xingou.
— Senhorita Lizzie, estamos em uma encruzilhada, e a tempestade arrancou a placa que mostrava a direção da propriedade de Lady Remmnick! — gritou o condutor, a chuva forte dificultando entender o que era dito.
Ela estremeceu, apertando os olhos quando a chuva atingiu seu rosto.
— Vá para a esquerda e torçamos pelo melhor.
— Você que manda. — disse ele, fechando a porta e deixando-as sozinhas mais uma vez.
Lizzie enfiou a mão sob o assento da carruagem e puxou um cobertor, entregando-o à sua acompanhante.
— Empurre o vidro com isso e tentaremos bloquear um pouco a janela.
A moça fez o que ela pediu e, com um pouco de dificuldade, conseguiram impedir que as intempéries adentrassem o veículo com tanta força. Porém, sem muito sucesso, e quando a carruagem chegou à uma propriedade, Lizzie e Mary estavam encharcadas e tremendo de frio.
Um lacaio correu de dentro da casa bem iluminada, um paraíso muito bem-vindo após a provação. Lizzie desceu e correu para dentro de casa junto com sua dama. Lá dentro, uma mulher que ela nunca havia visto na vida caminhava na direção deles, com determinação e graça serenas, o oposto de como Lizzie parecia e se sentia naquele exato momento. De fato, ela tinha certeza de que estava deixando uma terrível poça de água no chão de mosaicos.
— Bem-vinda, você chegou bem a tempo.
Lizzie mergulhou em uma reverência, imaginando onde Lady Remmnick estaria, pois essa mulher certamente não era Sua Senhoria. Uma criada passou por uma bandeja de champanhe e, através de uma porta entreaberta, Lizzie viu os convidados com máscaras, mesmo que a dama à sua frente não tivesse uma.
— Muito obrigada pelo convite, mas devo pedir desculpas pelo atraso. O clima lá fora está atroz e quase perdemos o rumo.
— Chegou na hora certa. Se me seguir até lá em cima, vou mostrar o quarto que poderá usar para se trocar.
— Obrigada. — disse Lizzie, olhando e vendo a casa.
O silêncio era ensurdecedor, e ela franziu a testa. Em geral, as festas residenciais no interior eram animadas, com pessoas circulando por todo o lugar. Os convidados na sala adjacente estavam estranhamente quietos.
— A propósito, sou a Srta. Lizzie Doherty, e você é? Suspeito que Lady Remmnick esteja ocupada com os convidados que já estão aqui.
A mulher parou, colocando um dedo nos lábios e balançando a cabeça em silêncio.
— Ninguém usa nomes aqui. Não pelos próximos três dias, pelo menos, minha querida.
Lizzie parou no último degrau da escada, a testa franzida da dama refletindo seus próprios pensamentos.
— Posso perguntar a quem pertence esta propriedade?
A senhora riu, um som abafado que causou inquietação no sangue de Lizzie.
— Essa informação também é um segredo, embora eu tenha certeza de que você esteja apenas brincando já que, afinal, recebeu um convite. Precisa ter um para se estar aqui. A localização é secreta. — a mulher fez uma pausa, virando-se para encará-la. Lizzie encontrou sua inspeção e se perguntou se ela parecia tão patética quanto se sentia diante dessa deusa dourada. — Você recebeu um convite, sim?
— Recebi, mas...
— Bem, então você pode me seguir e se juntar à festa depois de se lavar. Há não muito tempo, instalaram água corrente no andar de cima em todos os quartos; de modo que pode tomar um banho, se desejar. Os vestidos adequados para esta noite estão no seu armário, e o requisito de cores de hoje é verde, portanto, escolha um modelo adequado. Sua dama encontrará uma máscara apropriada na cômoda alta.
Lizzie seguiu sem dizer uma palavra, sua mente um zumbido de pensamentos. Seria um novo evento que Lady Remmnick havia introduzido para suas festividades? A abordagem era realmente intrigante. Lizzie iria, por enquanto, seguir as coordenadas, mas quando encontrasse Sally, perguntaria sobre os detalhes.
Uma risada familiar soou, e ela olhou por cima da balaustrada a tempo de ver Lorde Wakely saindo de uma das salas no andar de baixo. Seu passo e voz eram tão familiares quanto os dela própria, e por isso ela o reconheceria em qualquer lugar, mesmo que agora ele tivesse uma máscara preta cobrindo metade do rosto.
Ele não deveria estar na festa de Lady Remmnick. Clareza floresceu na mente de Lizzie quando se deu conta de que era ela, e não ele quem estava na festa da casa errada.
Ela mordeu o lábio, tremendo por dentro ante o conhecimento de ele estar ali. Deve ser a festa da qual sua amiga Sally estava falando. Aquela que era cobiçada por todos que tinham uma posição proeminente na sociedade. Um evento exclusivo.
O se fazia aqui que demandava tanto segredo.
— Este é o seu quarto, minha querida.
Com um floreio, a mulher mostrou a Lizzie o quarto, situado no final de um longo corredor. Um frisson de excitação a percorreu por ela estar realmente aqui. Mesmo que ela não devesse estar. Que sorte a atividade desta noite ser uma mascarada.
Lizzie entrou no quarto e ficou maravilhada com os belos móveis e decorações por toda parte. Uma cama grande de dossel estava posicionada diante das janelas. Ela nunca havia visto uma disposição de móveis assim antes, mas não se importava nem um pouco. Na verdade, parecia ótimo. Havia uma banheira grande junto de um lavatório e uma tigela. Duas cadeiras com o encosto alto estavam diante do fogo, o forro de um verde profundo que combinava com o piso de madeira escura e a colcha verde na cama. Não era nem muito feminino, nem excessivamente masculino. Na verdade, era um quarto agradável e acolhedor.
— Bastante aceitável. Obrigada. — disse Lizzie, pousando o chapéu na escrivaninha.
— Vou mandar uma das minhas criadas para mostrar à sua garota o que você deve vestir e quando. A vejo em uma hora, lá embaixo, para o jantar.
Lizzie assentiu, tentando o máximo possível não demonstrar nervosismo com o que estava prestes a vivenciar. A qualquer momento, ela poderia ser pega e mandada para casa, arruinada para além do recuperável por não estar acompanhada.
Assim que a porta se fechou atrás da mulher misteriosa, Mary virou-se para ela, com os olhos tão redondos quanto a lua.
— Srta. Lizzie, você não pode ficar aqui. Esta casa, esses convidados... bem, você viu o cavalheiro que estava lá embaixo? Ele estava com uma máscara, cobria-se por algum motivo. Sinto que essa festa não é como as que você está acostumada.
Lizzie olhou pela janela, e uma noite negra e tempestuosa a cumprimentou. Se essa festa fosse como ela supunha, de má reputação e libertinagem, havia pouco que ela pudesse fazer, à essa altura, para mudar sua situação. Ela estava aqui, quer quisesse ou não, e não havia como sair para a festa dos Remmnick naquele clima.
Um vendaval sacudiu a janela como se estivesse de acordo, e Lizzie fechou as pesadas cortinas de veludo para manter o temporal longe. Mas ela também não pôde deixar de agradecer à providência por ter chegado a essa porta em vez da de Lady Remmnick. Durante anos, houve rumores: histórias libertinas acerca das festas que Lorde Wakely participava. Agora ela teria a chance de decidir por si, o que era ficção e o que era verdade.
— Vou tomar um banho e vestir o que desejam, usar a máscara e, na primeira oportunidade que aparecer pela manhã, partiremos. Ninguém vai adivinhar quem somos se você ficar aqui na sala ao lado, e eu vou manter minha identidade em segredo. Algo que acho que eles desejam que façamos, já que não devemos usar nomes ou mostrar nossos rostos.
— Bem, você não pode andar pela casa como uma sem nome. Que nome você deve usar se for solicitado?
Boa pergunta.
Lizzie franziu a testa. Ela sempre gostou de Eve como nome, e seria uma opção caso fosse necessário.
— Se alguém perguntar, me chame de Sra. Eve Jacobs, uma viúva de Cumbria. É longe o suficiente para que ninguém conheça o nome.
— E seu marido morreu como?
Uma batida leve soou na porta e sua criada deu as boas-vindas a outra jovem. A jovem mostrou a Mary como preparar o banho e onde as roupas estavam guardadas antes de estender o vestido de Lizzie para a noite e mostrar a Mary onde as máscaras eram guardadas.
Assim que estavam sozinhas de novo, e Lizzie estava se despindo para o banho, ela disse:
— Um tumor na barriga foi o que matou meu marido. Não que eu espere que alguém pergunte, ou que a criadagem pergunte, mas apenas por precaução. Tenho certeza de que já participaram desse tipo de evento antes, em que não se deve fazer perguntas.
— Farei o que você pedir, senhorita Lizzie. Eu prometo. — disse Mary, fechando a torneira.
A água quente do banheira foi um deleite acolhedor após a jornada gelada a que foram submetidas. Ela mandou Mary embora e fechou os olhos. Imagens de Lorde Wakely encheram sua mente. Sua máscara o fazia parecer proibido, perigoso, e ela sentiu os mamilos enrugarem em resposta. Ela passou o sabão pelo corpo, imaginando ser as mãos de Sua Senhoria, e um desejo pesado doeu entre as pernas. Por tanto tempo, ela quis se jogar para ele, e ver se teria alguma resposta, algo tão visceral como a que ela sempre teve perto ele.
As calças de cetim dele e as botas brilhantes acentuavam sua forma atlética. Ele certamente não era um homem sedentário. O corpo dele era delineado demais. Quanto ao casaco e gravata perfeita, os fios de cabelo sobressaindo na máscara, ela só podia concordar que o que Sally dissera sobre ele parecer um pirata realmente parecia verdade.
Talvez ele me pilhasse.
Ela riu de suas próprias imaginações nada dignas de uma dama e enxaguou-se. Encarando a situação com seriedade, ela deveria considerar o que estar ali poderia significar para o futuro dela. Seu primo poderia ter prometido uma quantia generosa, mas não vinha sem certas obrigações a serem cumpridas. Hamish havia estipulado que falaria com quem ela desejasse como marido e, se o considerasse genuíno e apaixonado por Lizzie, daria a bênção ao casamento e, assim, abriria o caminho para que ela recebesse sua fortuna. Se Hamish não chegasse a essa conclusão ao encontrar o pretendente, ele não permitiria que o casamento prosseguisse.
Para manter sua reputação, era essencial que ninguém descobrisse que ela estava aqui. E se ela se aproximasse de Lorde Wakely, ele teria algum interesse nela? Ou ele a mandaria embora?
Lizzie suspirou, tocando nos lábios e se perguntando se o beijo dele seria tão doce e envolvente quanto ela imaginava. Ele era um canalha de renome, então certamente saberia o que fazer...
Ela jogou o sabão na água, decidida. Ela desceria disfarçada e veria como a noite decorreria. A tempestade impossibilitava sua partida, mas nem por isso ela ficaria trancafiada no quarto. Se Lorde Wakely gostasse dela mesmo com a máscara, ela poderia desfrutar de um ou dois beijos roubados, e nada mais. Ela nunca colocaria seu futuro em risco. Não quando estava tão perto de ter acesso à sua fortuna, para si e sem mais ninguém a dominar pelo resto da vida.
Se ela não conseguisse encontrar um marido que a amasse, ela amaria tudo o que sua fortuna poderia lhe dar.
Capítulo Três
Hugo estava ao piano ouvindo a anfitriã tocar. Lady X como gostava de ser chamada, embora todos os presentes soubessem que ela era realmente Lady Xenia Campbell, uma viúva cujo marido havia morrido durante uma corrida de carruagem. Ela escolhera uma música tranquila e agradável de Mozart que não interferia nem distraía enquanto os convidados conversavam. Amante da música, Hugo inclinou-se sobre o piano e examinou a sala e todos os convidados que haviam chegado no último dia.
Todos estavam ali para realizar algumas travessuras e queriam escapar dos limites impostos pela Sociedade Londrina, do que se esperava de cada um deles. Todos queriam estar aqui para ceder aos prazeres da carne sem censura ou culpa. Ele havia participado de alguns desses eventos ao longo dos anos e, às vezes, até se dispunha aos jogos que aconteciam, mas, infelizmente, esta seria sua última presença. Após o último decreto de seu pai, já em testamento, Hugo tinha apenas até o dia 23 de julho para arranjar uma esposa, ou ficaria sem fundos para continuar a vida a que estava acostumado.
Sua reação inicial ao descobrir que deveria seguir ordens de um morto foi de rebelar-se, e ele fez tudo o que pôde para não procurar uma esposa. Mas as últimas semanas o deixaram inquieto, andava desiludido com os jogos e intrigas da alta sociedade. Ele havia decidido que a senhorita Edwina Fox, filha de um cavalheiro sem títulos, mas com uma fortuna que se adequaria aos termos da vontade de seu pai, faria muito bem ao seu bolso. Ela era honesta, não parecia ser uma jovem tola, talvez um pouco fria e distante, mas um casamento com ela podia ser bastante tolerável. Ele não a amava, mas com certeza gostava muito dela. E com o pouco tempo que lhe restava, ela teria que servir. O tempo era curto demais para sair em busca de outra noiva aprazível.
A porta da sala se abriu, e ele se ergueu, quase derramando o uísque ao fazê-lo.
O que diabos Lizzie Doherty estava fazendo aqui?
Ele a devorou com o olhar, como um homem faminto. O vestido esmeralda escuro destacava a pele creme e perfeita dela e fazia seus cabelos ruivos e brilhantes brilharem. Sem mencionar que os seios estavam amplamente a mostra. Ele fechou a boca com um estalo. Ele nunca a viu se vestir de maneira tão provocadora, como se esperasse ser tomada. Ela não se mexeu depois de entrar no salão, e o ar nos pulmões dele congelou enquanto sangue quente corria em suas veias.
Ela era magnífica. Um pequeno sorriso torceu seus lábios. Como ele não podia admirá-la por ser tão ousada, tão corajosa, quando a mãe da moça era uma mais rigorosas de toda a Inglaterra?
Hugo absorveu a reação da sala e franziu a testa, não gostando do fato de que todos os cavalheiros presentes a admiravam, alguns com uma fome que correspondia à sua. Ele não deixaria nenhum deles tocar um fio de cabelo dela. Ela era dele, e só dele. Se alguém iria arrebatar a inocência dela, seria ele.
Ele respirou com calma, voltando à realidade. O que ele estava pensando? Ele não podia tocá-la também. Mesmo porque, o simples fato de imaginar fazê-la dele seria uma quebra de confiança impossível de ser restaurada entre ele e o amigo, Lorde Leighton. Ele apertou as mãos, lutando contra si devido à parte do corpo que havia endurecido só de vê-la, mesmo sabendo quem ela era.
Graças ao Senhor, bom Deus pelas máscaras que usavam, máscaras bem pensadas que garantiam que a identidade de ninguém fosse absolutamente óbvia. Mesmo que a maioria dos convidados já soubesse quem eram todos, nem sempre era assim, como parecia agora com Lizzie. Sim, ele a reconheceu, mas era algo compreensível para quem apreciava a ágil, delicada e, ainda assim, abundantemente talentosa Lizzie.
Com uma força que Hugo sempre soube ela que possuía, ela endireitou as costas, levantou o queixo e encarou os convidados que a cobiçavam.
Lorde Finley caminhou até ela, e Hugo rangeu os dentes. O cavalheiro tinha mãos viscosas como a pele de uma enguia e era frequente nessas festas. Sempre disposto a enfiar o pau em qualquer coisa que concordasse.
— Amiga sua, milorde?
Hugo virou-se para a anfitriã e balançou a cabeça. A última pessoa a quem ele contaria era Lady X. Ela era tão intrometida quanto seu pai às vezes, e ele não precisava de mais pessoas interferindo em sua vida.
Lady X riu enquanto continuava a tocar.
— Srta. Lizzie Doherty, acredito. Não que eu vá contar a alguém aqui, veja bem. Mas eu a cumprimentei no final da tarde, quando ela chegou. Soube por meu mordomo que a carruagem dela foi atingida pela tempestade desta tarde, e eles chegaram aqui, em vez da festa na casa de Lady Remmnick, a cinco quilômetros de distância. Se ela mantiver a identidade em segredo, nenhum dano será causado a ela.
Então foi assim que ela chegou aqui. Ele não achava que Lizzie era dada ao estilo de vida que a maioria das pessoas presentes gostava. Não, a menos que ela estivesse vivendo em um mundo que ele nada sabia.
— Você deveria ter dito a ela para ficar no quarto e não sair. Sabe muito bem o que acontece nesses tipos de festas. Inferno, ela parece uma sobremesa pronta para comer.
— E você gostaria de comê-la, milorde? — a anfitriã sorriu para ele, com um olhar diabólico. — Algo me diz que sim.
Hugo não negaria a acusação, nem responderia a essa pergunta. Ele queria devorar a deliciosa Lizzie? Para o inferno que sim, ele queria... e queria faz tempo. Ao longo dos meses em que se encontraram devido a suas amizades mútuas, e o relacionamento dela com o conde e condessa de Leighton, ele se viu perdidamente apaixonado por ela. Se ela não fosse uma parente pobre do conde, Hugo a teria cortejado em vez da senhorita Fox. Ele decerto que gostava dela mais do que qualquer outra moça que ele já conhecera, e descobriu que ela provocava nele uma fome que ele nunca havia tido antes com qualquer outra mulher.
Certamente, ele gostava demais dela para permitir que se perdesse na conversa bonita e nas falsas promessas que o atual Lorde Finley estava, sem dúvida, sussurrando em seu ouvido.
— Não conte a ninguém que ela está aqui. Vou garantir que ela volte para a festa campestre de Lady Remmnick amanhã mesmo.
Lady X assentiu.
— Acredito que seja o melhor.
Hugo passeou pela sala, voltando o olhar, de vez em quando, para Lizzie. Como ela estava linda hoje à noite no vestido império, verde e revelador. O vestido parecia ser um tamanho menor, e seus seios, que sempre foram generosos, enchiam a parte superior da roupa mais do que deveriam. Ele deixou o olhar vagar sobre o corpo esbelto, os sapatos prateados e escorregadios aparecendo por baixo da bainha.
Sem ser óbvio, dirigiu-se para o lado de Lizzie, embora, quando chegou, sua paciência diminuta, já que seu temperamento fervia ao ver a atenção que a pequena atrevida estava recebendo de quem não deveria. O pior era que Hugo sabia que, mesmo que alguns dos cavalheiros que a cortejavam agora tivessem consciência de quem ela era, não faria nenhuma diferença. Eles ainda desejariam seduzi-la, tê-la e desfrutar de tudo o que ela poderia dar, e ir embora deixando-a para se recompor sozinha.
Ele fez uma reverência, pegando a mão enluvada dela e beijando-a em boas-vindas.
— Não acredito que fomos apresentados.
Lorde Finlay virou-se para ele ante a interrupção, mas não comentou, simplesmente ficou parado, em silêncio. Os olhos dela se arregalaram, e o interesse dele aumentou. Ela sabia quem ele era? Ela fugiria ou ficaria se soubesse?
Lizzie mergulhou em uma perfeita reverência, seus lábios vermelhos levantando um sorriso. Desejo correu por suas veias e, sem dúvida, Hugo confirmou suas suspeitas. Ele a queria. Na cama dele. Dele e somente na dele. O que, ele se lembrou, não podia fazer. Ele não poderia se casar com uma mulher sem dote. Talvez ela estivesse aberta a um beijo roubado antes que ele a mandasse para casa... Era algo que valia a pena ser considerado.
— Milorde. — disse ela sem nem um pingo de medo na voz.
— Milady. — disse ele, embora soubesse que ela não tinha título para ser chamada desta forma. Nessas festas, o acordo era e sempre seria de que nomes não seriam dados. Todos eram tratados da mesma forma neste ambiente. Mesmo que o comportamento que apresentassem não fosse, nem de longe, o adequado.
— Você é nova em nossas pequenas reuniões. Está gostando da noite até agora?
Ela sorriu, e não houve mais dúvidas em sua mente acerca de quem estava diante dele.
— Sim, estou. Parece-me bastante agradável até agora.
Lorde Benedict se aproximou e curvou-se sobre a mão dela, colocando um beijo um segundo longo demais em seu pulso.
— E talvez a noite termine com prazer para você também, milady... se me escolher, é claro.
A necessidade de espancar Lorde Benedict e deixá-lo aspirando a poeira do tapete Aubusson era quase demais para resistir. Mas ela era nova nesses eventos e, portanto, todo cavalheiro e algumas senhoras iriam se interessar por seu mistério. As bochechas de Lizzie ficaram vermelhas, e Hugo a pegou pelo braço, afastando-a dos presentes.
— Talvez um pouco de vinho. — ele disse, virando as costas para o Lorde confuso.
— Obrigada. Receio não estar acostumada a tais... entretenimentos.
— Então nunca participou de uma dessas festas antes? Achei mesmo que era nova. Eu teria me lembrado de você. — ele estava flertando, e o sorriso coquete dela o fez querer provocá-la ainda mais, mesmo que apenas para ver mais daquele sorriso.
— Não nunca. — ela pegou a taça de vinho que ele ofereceu e, para a diversão dele, a bebeu quase imediatamente.
— Refrescante?
Ela riu, colocando a taça na bandeja de um lacaio que passava antes de pegar outra.
— Está mais para necessidade de coragem.
Hugo riu e assentiu em concordância.
Se o elixir da bebida a ajudava a relaxar no ambiente que ela agora se encontrava, quem era ele para negá-la? No entanto, ele permaneceria ao lado dela e garantiria que nenhum dano chegasse à sua reputação, e que nenhum libertino dos que agora agraciava a sala, chegasse a um metro perto dela. A menos que fosse ele, é claro. Era o mínimo que ele podia fazer, sendo um amigo da família. Ou assim ele continuava a repetir para si.
Algumas horas depois — horas deliciosas e emocionantes — Lizzie caminhou em direção ao quarto, o corpo muito consciente da silhueta alta e masculina andando ao seu lado. Hugo recuou quando ela chegou à porta, e Lizzie desejou que a noite não terminasse. O que ele faria se ela o convidasse? Ele a afastaria, ou a tomaria nos braços?
Ela lambeu os lábios ante o pensamento de ser abraçada por ele como desejava. Depois de todos os meses que passou cobiçando esse cavalheiro, tê-lo diante dela, a sós e sem a preocupação de serem pegos, já que essa festa tinha este propósito, era uma tentação que ela queria explorar.
Ela estendeu a mão e tocou as lapelas do casaco dele. Lorde Wakely ficou rígido debaixo das palmas das mãos dela. Depois de assistir as outras damas esta noite em uma dança de sedução com os senhores de sua escolha, Lizzie teve algumas ideias. Ela se inclinou para frente, colocando o corpo perto do dele mais do seria socialmente permitido, e os olhos dele escureceram de fome.
Ele passou a noite toda ao seu lado, garantindo a ela todo conforto, então ele garantiria que todos os seus desejos também fossem realizados? Com certeza, significava que ela estava prestes a ser beijada. Seu primeiro beijo, e com um homem que ela admirava há tanto tempo , e que também desejava. Não que ela estivesse disposta a jogar a virgindade pela janela, mas um beijo não faria mal.
— Espero que você tenha gostado da sua primeira noite. — ele a indagou, encostado na soleira da porta, a gravata desamarrada e pendurada no pescoço. Ela ansiava por arrancá-la e deslizar as mãos sobre o peito dele, não apenas as lapelas, mas sentir os músculos responderem ao seu toque.
— Gostei, obrigada. Foi muito divertida e esclarecedora também.
Como quando vira a condessa de Éden, cuja máscara escorregara durante um beijo apaixonado com um dos cavalheiros que cumprimentaram Lizzie em sua chegada. Eles haviam saído do salão e não voltaram. Lizzie tinha uma boa ideia acerca do que o casal estava fazendo naquele exato momento. Calor enrubesceu suas bochechas, e ela mordeu o lábio, agradecendo à providência que Sua Senhoria não conseguia ler mentes.
— Costuma ser o caso nessas festas. — ele fechou o espaço entre eles ainda mais, de modo que os seios dela roçaram o peito dele e enviou espirais de calor para seu ventre.
Ele a beijou na bochecha e os joelhos dela tremeram. Sem pensar, ela se inclinou mais no abraço, fechando os olhos quando o cheiro de sândalo intoxicou seus sentidos. Lorde Wakely fez uma pausa, sua respiração era como sussurros em um idioma estrangeiro contra o pescoço dela.
— Você vem muito a festas como essas, milorde? — a pergunta saiu sem fôlego e ela xingou, sabendo que ele estaria ciente do que a proximidade deles fazia com ela.
A fazia querer coisas que nenhuma mulher respeitável nem ousaria pensar. Ansiava pelo toque de um homem em detrimento da respeitabilidade ou decoro. Ela segurou forte nas lapelas, mantendo-o perto.
— Esta é a minha última. — ele beijou o lóbulo da orelha dela, e ela estremeceu.
— E por que isso?
Ele beijou a orelha mais uma vez, e ela reprimiu um gemido. Céus, ele a fazia sofrer, a fez querer tanto. A atenção dela se voltou para os lábios dele. A mão dele apertou a nuca dela, os dedos emaranhados nos cabelos dela. Era isso. Bem aqui e agora, Lorde Wakely iria beijá-la. Mostrar a ela tudo o que sentira falta todos esses anos. O corpo tremia de expectativa, e ela se ergueu na ponta dos pés para encontrar melhor a altura dele. Ele se afastou, cortando a proximidade deles, e ela tropeçou um pouco antes de se endireitar. Ele a observou por um momento, um músculo tremia na mandíbula dele.
— Essa, minha querida, é uma conversa melhor em outro dia. — ele fez uma reverência. — Estarei do outro lado do corredor, caso precise de ajuda.
Lizzie observou Sua Senhoria fugir dela como se ela estivesse com catapora, a porta dele se fechando com mais força do que o necessário. Ela caiu contra o batente da porta, franzindo a testa. Por que ele fugiu assim? Essas festas deveriam terminar com sedução e prazer, ou pelo menos um beijo apaixonado que faria os dedos dos pés dela se curvarem dentro das sapatilhas.
A menos que ele soubesse quem ela era e não a tocasse por causa de seu primo, Lorde Leighton, um de seus melhores amigos? Se ele suspeitasse de quem ela era, significava que a presença dele naquela noite fora apenas para garantir que ela permaneceria segura e que não seria abordada pelos outros cavalheiros presentes. Decepção a apunhalou. Que mortificante caso fosse verdade. E ela se jogou para cima dele como uma tola desesperada. As bochechas dela queimavam, e lágrimas embaçaram sua visão.
Mary estava esperando por ela quando entrou no quarto e, com a ajuda da criada, Lizzie logo estava na cama, revivendo a sensação dos lábios dele em sua bochecha e depois em sua orelha. Um pequeno zumbido perturbador batia entre suas pernas com a lembrança, e ela rolou, apertando as coxas para aliviar a necessidade que a percorria.
Como ele poderia provocar tal reação dentro dela se ela não significava nada para ele? Os homens poderiam ter reações parecidas às mulheres? Importava mesmo quem aquecia a cama deles, desde que alguém o fizesse? Se ele nunca nem esteve interessado em beijá-la, por que ele a beijou no pescoço?
Não fazia sentido.
Seriam os homens capazes de tanta inconstância?
O som da chuva batendo na janela a embalou por um tempo, mas fez pouco para acalmar suas expectativas não resolvidas. Quando ele a procurou no início da noite, ela sentiu-se esperançosa de que a noite terminaria com um beijo. Que ele a acharia interessante e encantadora. Ela só podia concluir que ele sabia quem ela era e estava sendo um cavalheiro, um bom amigo para o primo. O abraço antes do boa noite não passou de um deslize na armadura dele. Nada mais. Ele poderia até ter feito isso para tentar assustá-la, dizer sem palavras que essa festa não era para ela, e que ela não deveria estar aqui.
Pois se havia uma coisa que ela sabia, e com total certeza, de Lorde Wakely, era que ele pegava o que queria. O porquê de ele não a ter "pegado" era que ela precisava saber.
Assim como em sua rotina em Londres, aqui na festa de Lady X, ela era indesejável. Uma virgem em vias de se tornar uma solteirona. Bem, pelo menos ela teria seus gatos como companhia e muito dinheiro. Era melhor que nada.
Capítulo Quatro
Lizzie rolou na cama e olhou para o teto do quarto. Imagens de homens e mulheres em posições muito comprometedoras a atormentavam, seus sorrisos e olhares de satisfação zombavam dela e de sua incapacidade de seduzir o homem que ela queria. E queria a eras.
Aqui estava ela, na festa mais esperada da temporada, e ela não conseguiu ganhar nem um beijo, e de um homem que era famoso por seduzir. Ela olhou para a máscara descartada que usara na noite anterior. Ninguém deveria tê-la reconhecido, mas Lorde Wakely não era todo mundo.
Ele sabia quem ela era? E se sim, mesmo que ele não a tivesse beijado, por que ele não a mandou fazer as malas no momento em que percebeu quem havia chegado a esta festa escandalosa? Apesar de muitas vezes se comportar como canalha; sendo um cavalheiro, ele consideraria essa tarefa apenas correta e honrosa.
Mas ele não o fizera. Na verdade, ele flertou com ela a maior parte da noite. A atenção que ele deu a ela antes do jantar era reveladora, assim como os olhares quentes durante a refeição, sem mencionar aquele beijo antes de dizer boa noite. Bem, um beijo casto na bochecha, orelha, pescoço...
Ela suspirou, olhando as cortinas ainda bloqueando o sol da manhã. Levantando-se, ela caminhou até elas e puxou uma para contemplar a paisagem diante dela. Este lado da casa ostentava uma área de relvado que corria como um mar verde para a floresta de carvalhos, um pouco distante. Dali, ela conseguia distinguir o telhado de uma casa de veraneio escondida no meio da floresta. Havia muitas folhas e pequenos gravetos caídos no chão devido à tempestade da noite anterior, e ela observou por um momento um jardineiro tentar limpar o máximo que pudesse.
Sentindo a movimentação no terraço abaixo, ela olhou para baixo e viu o cavalheiro que assombrava seus sonhos fumando um charuto enquanto se inclinava casualmente contra a balaustrada. De onde estava, ela conseguia distinguir muito pouco de seus traços, e ainda assim a altura e formas o denunciavam.
Ele estava parado ao ar livre, coberto apenas por uma camisa branca fina que não escondia os músculos que se flexionavam sob a camisa com a menor quantidade de movimento. Lizzie suspirou, admirando as coxas musculosas que hoje estavam envoltas em calças de cor bege, apertadas. Não era a primeira vez que ela sentia ciúmes de quem acabaria se casando com ele.
Ele caminhou pelo terraço, olhando para o terreno também, e ela percebeu que ele não usava botas. Ela nunca havia visto os pés de um homem antes, e ver os de Lorde Wakely a deixou ansiosa para ver mais da pele dele.
Ela passou o dedo pela vidraça. Que pena que homens como Lorde Wakely nunca se interessavam pelas jovens mansas e gentis que emperiquitavam o Almack com as mães a tiracolo. Algo que, para sua infelicidade, ela ainda fazia já que a mãe dela não estava a par de seu dote. Apenas mais dois anos, e o dinheiro que o primo lhe dera seria dela, o casamento não seria mais uma necessidade. Nesta data, sua mãe poderia ser informada de que não havia mais nada que pudesse fazer por ela. Até lá, Lizzie estava feliz em se comportar e fazer o que ela mandasse.
Homens como Lorde Wakely gostavam de mulheres, casadas ou não, como as presentes nesta festa. A única função de suas esposas era agraciar e conquistar salões de bailes com elegância de modo a trazer orgulho para as famílias deles, mas nunca as amariam ou suspirariam por elas. A menos que eles fossem dados a extravagâncias, como seu primo Lorde Leighton, como o duque de Athelby ou o marquês de Aaron, que eram as exceções a essa regra.
Um desejo de saber a realidade do que acontecia entre marido e mulher assaltou Lizzie, e com isso veio uma vontade de dar na cara dele. Na noite passada, ela deveria ter pressionado ele por mais, tomado o que queria e dane-se as consequências.
Ela deveria ter deixado os medos de lado e o beijado, sem preocupar-se com o que ele diria e faria. Então, se ele a enviasse para casa sem tocá-la, sem agraciá-la com um primeiro beijo, bem, não teria sido sem nem ao menos tentar. De qualquer forma, a rejeição dele a machucava, mas pelo menos se tivesse sido corajosa, o teria beijado, por mais casto que fosse, antes de receber boa noite.
Agora, ela parecia ter perdido sua chance. Se os rumores eram verdadeiros, ele estava cortejando a Srta. Fox — uma mulher com herança ducal no sangue, que traria ao casamento numerosas propriedades e dinheiro. Muito dinheiro. Ele gostava daquela mulher? Foi por isso que se afastou? A fofoca que percorria a alta sociedade era de que seria apenas um casamento de conveniência, mas talvez não fosse. Tal possibilidade a deprimiu. Ela não queria que Lorde Wakely gostasse de mais ninguém.
A lembrança do beijo no pescoço dela sugeria que a união era de fato uma conveniência, o que a deixava se perguntando por que ele queria a Srta. Fox como esposa. Sua Senhoria estaria em busca de uma mulher rica? E se sim, por quê? A família Wakely sempre foi rica.
Se Sua Senhoria precisava de fundos e, por algum milagre, ele voltasse suas atenções para ela, era imperativo que ele não descobrisse o dote. Ela não suportaria nenhum homem que se casasse com ela só por dinheiro. Assim como o primo declarou há alguns anos, se um homem se apaixonasse por ela, mesmo ela sendo tão pobre quanto aparentava ser, então ele seria um homem digno de seu coração e de sua fortuna.
Lizzie sentou-se no canto da janela. Depois de ver o primo, o Conde de Leighton, se casar com o amor de sua vida, Kat, ela nunca poderia se contentar com um casamento de conveniência. Não, ela queria muito mais que isso. Paixão era o que ela desejava. Paixão e amor. E sem nenhuma dessas emoções, ela nunca se casaria, não importava o que sua mãe tivesse a dizer.
Uma batida na porta soou, e ela deu um salto. Um momento depois, sua criada entrou com uma bandeja de café-da-manhã cheia de deliciosas comidas que fizeram seu estômago roncar.
Lizzie seguiu sua rotina matinal, lavou-se e comeu antes que a criada a ajudasse a vestir um vestido de algodão creme com fitas de seda que permeavam a bainha. Mary arrumou seu cabelo com cachos e, quando colocou o último alfinete no lugar, a lady que a recebera no dia anterior entrou. Sua criada fez uma reverência e seguiu para o quarto adjacente, dando-lhes privacidade. Lizzie ficou de pé.
— Bom dia, senhora X.
A mulher não sorriu, apenas ficou parada diante dela, as mãos cruzadas na frente, uma ligeira linha de expressão franzindo sua testa.
— Devo me desculpar, Srta. Doherty, por ter cometido uma injustiça muito grave e uma que devo remediar. Eu estava um pouco área por causa do champanhe que tomei pela maior parte da tarde de ontem, e nunca deveria ter me feito de desentendida e permitido que você se juntasse a nós na noite passada. Tenha certeza de que estou fazendo tudo o que posso para garantir sua ida em segurança para as festividades de Lady Remmnick, que é o local em que você deveria ter chegado ontem à tarde. Prometo que farei tudo o que puder para manter sua reputação intocada depois que você for embora.
Rubor floresceu nas bochechas de Lizzie, e ela se encolheu ao ser pega.
— Sou eu quem devo pedir desculpas. Eu deveria ter dito imediatamente que não era quem você esperava, e contado o que havia acontecido conosco na tempestade que nos desviou para cá. Espero não a ter incomodado com a minha presença. Não foi de propósito.
Lady X se aproximou e apertou as mãos de Lizzie.
— Você não me incomodou nem um pouco, mas colocou a própria reputação em risco extremo. Minhas festas não são como... bem, digamos que são pecaminosas. Tenho certeza de que você viu o tipo de ocorrência que se apresentou. Pensei que seria uma brincadeira permitir que participasse por uma noite e depois enviá-la para o destino correto hoje, mas eu estava errada. E agora, mantê-la aqui como uma pequena distração para mim pode ter colocado você em sério risco.
— Por que diz isso, minha senhora? — perguntou Lizzie. — Vamos só preparar a carruagem e eu seguirei viagem. Nenhum mal foi feito.
Sua Senhoria suspirou.
— Existe um caminho pelo qual todos os veículos devem passar para sair e entrar na propriedade. E por mais terrível que seja, está inundado no momento. Portanto, você ficará aqui conosco por pelo menos três dias. Eu sinto muitíssimo.
Uma variedade de emoções percorreu Lizzie ante as palavras de Sua Senhoria. Lorde Wakely se afastou do interlúdio. Ter que enfrentá-lo outra vez e não poder sair e se esconder, ter de fingir nunca ter estado aqui e ignorar o fato de ter se oferecido como um presente, era humilhante. Por outro lado, outra noite sob o teto de Lady X poderia ser a chance de fazê-lo mudar de ideia... Ele cedeu um pouco e beijou seu pescoço. Ela conseguiria levá-lo a fazer mais do que isso, se soubesse que ela estava disposta?
Deveriam usar máscaras o tempo todo, então o anonimato estava assegurado. Mesmo que ele suspeitasse dela, não havia como ele provar que ela estava aqui, e ela nunca admitiria. Não para ninguém. Outra noite na companhia de sua senhoria poderia ser um golpe de sorte que ela jamais pensou que teria.
— Pode se sentar, minha senhora? Gostaria de dizer algo e talvez seja melhor estar sentada ao ouvir.
A mulher levantou uma sobrancelha, mas fez o que Lizzie pediu. Ela pousou as mãos nos joelhos após sentar-se em uma cadeira próxima.
— O que tem a me dizer? Sou toda ouvidos, minha querida.
Lizzie respirou fundo, tentando acalmar os nervos que a atormentavam por dentro.
— Não há realmente nenhuma maneira educada de dizer o que desejo, por isso vou ser sincera. Na verdade, estou muito feliz por estar presa aqui, e mesmo sabendo que isso deve chocá-la, gostaria de seguir socializando na festa, participar e aproveitar o tempo que me resta.
Sua Senhoria ergueu uma sobrancelha.
— Não acredito que minha festa seja o lugar certo para você, minha querida. E se se souberem que você está presente? As reputações de nós duas serão colocadas em risco, a sua por inocência perdida e a minha devido à incapacidade de as pessoas comparecerem de forma anônima. — ela mexeu as mãos no colo. — Você não tem acompanhante e não quero fazer parte de uma trama que termina com a ruína de um inocente. Tenho vergonha de ter permitido que essa farsa começasse.
— Mas é aí que você está errada. Este é o lugar perfeito para mim. Se eu continuar usando a máscara, ninguém saberá minha identidade. E não vou perder minha inocência para ninguém presente, se é o que a preocupa. Existe apenas um cavalheiro para mim, alguém de quem gosto mais do que qualquer outra pessoa. Tenho esperança de que você veja que o interesse dele também se voltará para mim, mesmo sabendo que não tenho chance.
— O homem em questão está presente? Isso me faz querer ainda mais afastá-la e salvaguardá-la. — Lady X disse com um olhar cansado.
Algo na voz de Sua Senhoria fez Lizzie ficar alerta, e ela se perguntou se a mulher já suspeitava de quem era o cavalheiro. A maioria das pessoas iria desconfiar depois do jantar da noite anterior e dos olhares que Lorde Wakely havia lançado aqui e ali. Olhares que foram suficientes para fazer os dedos dela se curvarem dentro das sapatilhas.
Ele nunca a notara na cidade, ou pelo menos nunca havia o flagrado observando-a.
— Ele está presente. — disse ela. — O cavalheiro é um homem do mundo, conheceu muitas amantes e não tenho dúvidas de que, se eu não estivesse aqui, ele nunca olharia para mim. Não tenho nada além da minha pessoa para oferecer a ele, e como com a maioria dos cavalheiros da sociedade, nunca será o bastante. Mas aqui, atrás de uma máscara, eu não tenho nome. Não importa se tenho fortuna ou não. Não importa se minha família tem título ou se é proveniente do comércio. A atração aqui é baseada no desejo mútuo, em uma conexão. Quero experimentar tal conexão e aprender tudo o que puder antes de voltar para minha mãe e para a vida que ela quer que eu leve.
— Hm. — Lady X bateu no queixo. — Não vou fingir e negar saber que você está falando de Lorde Wakely, mas este fato me enche de preocupação. Que você gosta dele ficou óbvio ontem à noite e, por sua vez, acredito que ele também gosta muito de você, pelo menos da sua versão de máscara. Mas ele é um libertino de renome, um homem que teve muitas amantes, muitas que estão presentes nesta festa. Você não acha que seria melhor que, assim que for possível, nós a mandássemos de volta para a festa em que deveria estar, de modo a começar um flerte com Sua Senhoria quando retornarmos à cidade? Eu nunca tive um convidado que perdesse a reputação por estar aqui, e não vou começar agora. E se Lorde Leighton descobrir que você está aqui, ele me aniquilaria. Eu nunca me recuperaria na sociedade, e você também não.
— Você, de todas as pessoas, deve entender as restrições pelas quais as mulheres em nossa sociedade vivem. Você não teria começado a hospedar festas restritas como essas se não pensasse o mesmo. Você não pode só fechar os olhos nos próximos dias? Por favor, Lady X. — Lizzie implorou.
Sua Senhoria mordeu o lábio, franzindo a testa ao refletir.
— Não presuma que não entendi suas preocupações, porque não é verdade. — continuou Lizzie. — Apenas escolhi ignorá-las por uns dias. Esta é a minha única chance de viver um pouco. Longe de todos. Vou usar a máscara, e minha criada me ajudará a me arrumar de forma que ninguém me reconheça. Eu prometo a você que continuarei no anonimato.
Lady X permaneceu em silêncio, e Lizzie lutou para não se mexer enquanto esperava sua resposta. Ela a deixaria estar presente na festa hoje à noite e aos outros eventos como todo mundo, ou a manteria escondida até que pudesse jogá-la na carruagem e se livrar dela?
— Muito bem. — Lady X suspirou. — Você pode ficar, mas deve redobrar seu esforço para esconder sua aparência. Uma alteração de voz pode ser necessária às vezes, e o que quer que faça, não deslize, não mencione amigos ou familiares durante as conversas. — os olhos de Sua Senhoria se estreitaram em Lizzie. — Estou curiosa para saber sua idade, senhorita Doherty. Por que você ainda não está casada, minha querida?
— Vinte e três. Quase uma encalhada para os padrões de Londres.
Não que fosse uma preocupação forte para Lizzie. Quanto mais perto chegava da idade de receber o dinheiro, mais perto de escapar da mãe e de viver uma vida própria. Ela poderia fazer o que quisesse então, e a sociedade e os homens que haviam ignorado sua presença por causa da falta de dinheiro, poderiam ir para o inferno. Lizzie lembrou a si mesma que deveria agradecer a Hamish de novo por salvá-la de caçadores de fortunas na próxima vez em que o visse.
— Se você ficar, pretende tentar a sorte com Lorde Wakely? Não tenho certeza de que sua mãe a tenha avisado dos riscos que corre se persistir nesta paixão. Nenhuma máscara salvará você de uma gravidez indesejada.
As palavras de Lady X foram bruscas, e era um ponto que Lizzie teria que levar em conta. Se ela ficasse e tentasse a sorte com Sua Senhoria, teria que garantir que não passasse de beijos, e talvez algumas carícias escandalosas. Por mais que ter um filho fosse algo que ela ansiasse, ela não queria um fora do casamento.
— Fique tranquila que nada para arriscar minha virtude. Sei que estou colocando minha reputação em risco, mas um risco que estou disposta a correr.
Pensar em Lorde Wakely a abraçando, nos deliciosos lábios pecaminosos junto aos dela, provocando-a e fazendo sua carne queimar, o sangue correr as veias, fez seu estômago apertar de prazer.
— Se eu quiser atrair Lorde Wakely para um beijo, saberia como eu conseguiria tal feito? Como sabe, nunca fui beijada.
Lady X soltou um suspiro, mas um pequeno sorriso levantou seus lábios.
— Eu posso ajudá-la, talvez guiá-la no que deve vestir hoje à noite, dizer como seduzir um homem com os olhos e fazê-lo comer da sua mão como um cachorrinho perdido e faminto. Mas nada mais. Está de acordo?
Lizzie assentiu.
— Quando podemos começar?
Lady X sorriu.
— Agora mesmo.
Capítulo Cinco
Mais tarde naquele dia, Lizzie desceu as escadas. Pouco antes, sua criada entregara um bilhete de Lady X pedindo que todos os convidados se reunissem na sala. Havia duas alternativas para o prazer dos convidadas naquela manhã: um jogo de bilhar ou charadas. Lizzie já havia se decidido a jogar bilhar, pois nunca foi boa com charadas.
Antes de entrar, verificou mais uma vez se a máscara cobria a parte de cima e o nariz, só permitindo que seus lábios fossem vistos. A maioria dos convidados já estava presente na sala e, felizmente, seu passo não vacilou quando avistou Lorde Wakely sentado no braço de um sofá. Uma bela de cabelos escuros estava ao seu lado, seu corpo virado para ele em um convite aberto, mas a atenção dele não estava na mulher, estava nela...
Um frisson de consciência a percorreu quando seu olhar sombrio e enevoado a percorreu, e ela se sentou entre dois cavalheiros que se mostraram bem felizes por usa escolha de se juntar a eles
Lady X bateu palmas, ganhando a atenção de todos. Hoje, como na primeira noite, ela não usava máscara, e Lizzie precisava respeitar Lady Campbell por se atrever a não seguir suas próprias regras em relação ao anonimato. Ela supôs que não funcionaria para a anfitriã ser desconhecida, muitos problemas durante os eventos, só para começar.
— Como sabem, as opções de entretenimento de hoje são bilhar e charadas. Eu me reservei o trabalho de emparelhar vocês de modo que se divirtam. Conforme eu caminhar pela sala, se eu tocar em você, preste atenção ao próximo a ser tocado, este será seu parceiro.
Lizzie captou o olhar travesso de Lady X e lutou para não sorrir. Sua Senhoria a faria parceira de Lorde Wakely? Após a recusa dele em beijá-la na noite passada, ela não deveria querer estar perto dele novamente, não deveria querer dar outra chance de corrigir seu erro e beijá-la. Mas era o que ela queria acima de tudo, por mais paspalha que fosse por isso.
A máscara garantia que sua identidade permanecesse um segredo, e o lembrete reforçou sua confiança. A menos que ela contasse a ele, não passariam de achismo os palpites dele acerca de quem ela era. Ele não poderia provar isso a menos que arrancasse a máscara do rosto dela. E ele nunca faria isso. Então ela poderia correr ou de volta para o quarto e se esconder por tentar seduzi-lo na noite anterior, ou aproveitar os poucos dias que ainda restavam ali para tentar se divertir um pouco com ele.
O cavalheiro ao lado dela inclinou-se em sua direção e sussurrou pensamentos apreciativos em relação ao vestido dela. Ela escolheu um vestido império de seda vermelho-sangue que trazia um decote bem baixo. O vestido que ela usara mais cedo em seu quarto não serviria para esta festa. Sua pobre criada quase teve um ataque apoplético quando o passou sobre a cabeça, mas Lizzie adorou.
Sim, o busto era muito baixo. Mas se ela jogaria bilhar e queria seduzir um certo visconde que continuava a observá-la, como o cavalheiro ao seu lado, o vestido vermelho era simplesmente perfeito.
Lady X percorreu a sala, tocando as pessoas no ombro. Por fim, ela parou à frente de Lizzie, tocou-a e depois se virou e examinou a sala. Lizzie lutou contra uma risada enquanto Sua Senhoria passeava diante de um grupo de cavalheiros que ainda não havia conhecido. A expressão invocada no rosto de Lorde Wakely a deixou reticente.
Ele não gostaria que ela fosse parceira de algum deles? Significava que ele queria ser pareado com ela? Lady X seguiu em frente e foi em direção a Lorde Wakely. De onde Lizzie estava sentada, ela o viu lançar um olhar de advertência para Lady X antes de tocar seu ombro. Sem mover um músculo, ele encontrou seu olhar desde o outro lado da sala, e ela estremeceu com a fome que leu nos olhos dele. Talvez ele não fosse tão indiferente, afinal.
Depois que todos haviam sido escolhidos, Lizzie se levantou e foi para a sala de bilhar, sem esperar por Lorde Wakely. Em questão de um segundo ele estava ao lado dela, colocando o braço dela sobre o dele.
— Acho que vamos jogar bilhar então? — ele disse sem olhar para ela.
— Achou certo. Gosto de bilhar e jogo com frequência, por isso, se temos que jogar com os outros, é provável que eu vença. Como é seu jogo, milorde? Suas habilidades são satisfatórias?
— Minhas habilidades são satisfatórias em tudo. — disse ele, sorrindo.
Ela sorriu.
— Bom, porque eu odeio perder.
A sala de bilhar era do tamanho de um salão de baile e ostentava não uma, mas três mesas. As dez pessoas que Lady X havia reunido estavam em torno da mesa que ficava no meio, discutindo quem jogaria contra quem. Lizzie e Lorde Wakely se juntaram a eles, e logo ficou decidido que como casal, eles jogariam contra outro casal. Lizzie jogaria contra a dama, e Lorde Wakely contra o cavalheiro.
Foram até a mesa mais distante da porta, e Lorde Wakely entregou um taco a cada um deles e, em seguida posicionou um par de bolas brancas e uma bola vermelha para cada um. Os dois homens jogaram primeiro, e Lizzie sentou-se em uma cadeira com a mulher com quem ela deveria jogar. Sua oponente bateu palmas em momentos diferentes, quando seu parceiro conseguiu realizar um Canon ou um Hazard, mas a partida foi muito acirrada, os dois homens fizeram tacadas difíceis para tentar forçar uma falta do adversário ou bater uma bola na outra. Infelizmente, embora o esforço de Lorde Wakely fosse louvável, ele perdeu a partida.
Lizzie levantou-se, pegou o taco e verificou se a suela de couro na ponta estava bem colocada para dar o atrito necessário à bola.
— Melhor sorte da próxima vez, milorde. — disse ela, sorrindo para ele. Os olhos dele se estreitaram, e ele ficou muito perto para o conforto dela, segurando o taco e puxando-a para mais perto ainda.
— Não cante vitória muito cedo, milady, você ainda está para provar o seu valor.
Lizzie envolveu o pescoço dele com uma das mãos. Os olhos dele se arregalaram atrás da máscara antes que ela sussurrasse contra a orelha dele:
— Meu valor é altíssimo, milorde. Como você descobrirá em breve. — as palavras não eram inteiramente sobre o jogo, mas se referiam a ela mesma também.
Ela se afastou, verificou o posicionamento das bolas e avaliou sua oponente. A pobre mulher nem parecia saber como acertar a bola, ou segurar o taco da forma correta, e muitas das tacadas que deu não deram pontuação alguma. Lizzie se inclinou sobre a mesa, mirou e conseguiu uma carambola dupla na primeira tacada. Ela olhou para cima e encontrou o olhar de Lorde Wakely. Ele se encostou na parede, braços cruzados, mas a atenção não estava no jogo, mas nela.
Lizzie ignorou a distração que Sua Senhoria representava e concentrou-se. Desse ponto em diante, a competição se tornou inexistente. Depois de apenas alguns minutos, Lizzie inutilizou a bola da sua oponente e finalizou o jogo. Ela aplaudiu, triunfante em sua vitória. A mulher fez beicinho e recebeu um beijo de consolo de seu cavalheiro admirador por seu esforço.
Lizzie colocou o taco na mesa e se juntou a Lorde Wakely, sorriu para ele.
— Graças a mim, ganhamos. Se quiser alguma dica para jogar melhor, estou mais do que disposta a ajudá-lo.
Os lábios dele se contraíram.
— Você é sempre tão divertida?
Ele a levou para fora da sala e por uma grande passagem presente nos fundos da casa. As janelas grandes davam para a parte de trás da casa e a extensão do gramado que cercava a propriedade.
— Quando eu quero ser, eu sou. Embora minha mãe pense que rir em público seja vulgar.
Uma rajada de medo a atravessou quando percebeu que havia mencionado a família, o que prometeu a Lady X que não faria. A mãe dela era conhecida como uma das maiores megeras da sociedade, e mencionar seus ideais rígidos poderia denunciá-la. Se Lorde Wakely ainda tinha alguma dúvida sobre quem ela era, claro.
— Você tem sorte de ainda ter sua mãe. Perdi a minha quando menino. Acho que daria tudo para ouvi-la me castigando mais uma vez. — ele lançou um olhar divertido a ela, mas algo em seus olhos falava da dor escondida em seu âmago.
Lizzie não sabia como Sua Senhoria havia falecido e não gostou do efeito que teve ao pensar em Lorde Wakely sem a mãe ainda menino. Que triste para ele. Seu coração deu uma pequena sacudida.
— Tenho certeza de que sua mãe também daria qualquer coisa para poder fazê-lo, milorde. Você a amava muito.
Ele limpou a garganta.
— Eu fiz, mas a vida é assim. — ele pareceu se afastar da conversa e perguntou: — Onde você aprendeu a jogar bilhar assim? Acho que até eu poderia perder para você e sempre me considerei um jogador acima da média.
Lizzie se encolheu um pouco com o elogio.
— Meu pai mantinha uma mesa de bilhar em nossa residência no interior. Sempre que meus pais saíam para a temporada, antes de eu debutar, eu me distraía jogando. Costumava competir com nossos funcionários, e alguns eram excelentes jogadores, aprendi assim. Era muito divertido, e sempre que consigo fugir para lá, eu jogo. Em geral preciso esperar que minha mãe se retire para seus aposentos antes de reunir alguns dos criados para jogar.
— Você joga bilhar com seus criados? — ele cuspiu, as palavras cheias de choque.
Ela riu.
— Claro. Não há muito o que fazer em... — ela se interrompeu antes de revelar onde morava.
Ele balançou a cabeça, rindo.
O som era profundo e enviou um frisson de consciência através dela. Ele estava rindo do segundo deslize dela ou da própria história? Para isso ela não obteve resposta, e lutou para desviar a conversa de informações pessoais que poderiam denunciá-la. Ela viu um gato dormindo na janela e, afastando-se de Lorde Wakely, foi até lá, acariciou o pequeno animal sob as orelhas antes de dar um beijo em sua cabeça.
— Você gosta de gatos? — ele perguntou, se aproximando e dando uma coçadinha no animal.
O frajolinha ronronou nos braços de Lizzie, e ela sorriu.
— Eu amo gatos. Quando eu... isto é, quando eu puder... — ela estava prestes a dizer "quando eu atingir a maioridade". Sério, ela precisava se lembrar que não deveria anunciar quem ela era. — Vou encher minha casa com eles. Eu simplesmente os adoro. E você?
Ele deu um tapinha na cabeça do gato.
— Prefiro cães, mas tolero gatos.
Lizzie colocou o gato de volta onde estava deitado e encarou Lorde Wakely. A pergunta que estava queimando sua mente desde a noite passada era poderosa demais para negar um momento a mais.
— Por que você não me beijou ontem à noite? E quero dizer beijar de verdade, como um homem beija uma mulher com paixão.
Hugo lutou para encontrar um grão de verdade no porquê de ter negado aos dois o que queriam. No momento em que a viu entrar na sala esta manhã, sua mente só conseguia conjurar formas dos dois estarem juntos. Ele se xingou por não a beijar, por não dar o que ela queria. Só podia culpar o último fragmento de comportamento cavalheiresco: sua amizade com o primo dela, Lorde Leighton, por suas ações.
Mas não mais.
Ele não negaria a nenhum dos dois o que queriam. Nos poucos momentos em que ele pensou que Lady X escolheria outro idiota para par dela, ele quase teve apoplexia diante dos convidados. Ninguém queria ver um homem adulto dar chilique pela escolha da anfitriã, mas se tal criancice significasse garantir Lizzie como parceira dele, ele estava disposto a fazer qualquer coisa. Até agir como um tolo. Isso por si só não era um comportamento normal dele, o que era realmente revelador.
— Não sei dizer o motivo, eu quis. E muito. — ele confessou, incapaz de dizer a ela que era porque sabia quem ela era de verdade, e sabia que o primo dela o faria em pedaços, caso soubesse que andou beijando sua parente em uma festa de má reputação.
Mas esse não era o único motivo, nem o pior de todos. Apesar de todos os atributos de Lizzie Doherty, ela não era uma herdeira e não era capaz de satisfazer a cláusula do testamento de seu pai. De alguma forma, parecia errado beijá-la nessas circunstâncias. E mesmo que ninguém conhecesse, em tese, a identidade de ninguém nessas festas, Hugo reconheceria Lizzie em qualquer lugar. Algo no modo como ela confiava nele e falava com cautela com ele, dizia que talvez ela também sabia quem ele era.
Ela se recostou na parede de uma forma bem similar a dele durante o jogo de bilhar dela. Ela balançou sobre os calcanhares, observando-o.
— Vai me beijar agora?
O corpo dele rugiu de desejo. Ele eliminou o espaço que havia entre eles e sem pensar em mais nada a beijou. No instante em que seus lábios tocaram os dela, ele gemeu. No minuto em que a viu entrar na sala da Lady X, ele sabia que eles terminariam nessa posição.
O beijo dela deixou nítida sua falta de prática, e ele apertou o queixo dela, deslocando-a um pouco para permitir que ele aprofundasse o abraço. Ele mordeu o lábio inferior dela, e ela ofegou. Era a oportunidade perfeita para apresentá-la à sua língua, e ele tocou a dela, meio tímido. Em seus braços, ele a sentiu amolecer, tornar-se flexível. As mãos dela envolveram seu pescoço. O corpo dela era macio e moldou-se contra o dele.
Nesta posição, seu desejo por ela era claramente óbvio, mas ela não parecia se esquivar. De qualquer forma, a pequena ondulação de seus quadris dizia que ela estava gostando do interlúdio tanto quanto ele.
O gongo do almoço flutuou na direção deles, e Lizzie se afastou. Os olhos arregalados com uma nova consciência.
Ele sorriu.
— Você gostou do meu beijo? — ele perguntou, inclinando-se para dar outro beijo nela antes de prosseguirem.
Ela assentiu lentamente, o foco todo na boca dele. O que ela estava pensando era claro. Era o mesmo que passava na própria cabeça. O quanto ele gostou de beijá-la naquele momento, e não apenas isso, o quanto ele gostou da manhã na companhia dela, jogando bilhar e conversando sobre todo o tipo de coisas, até sobre os gatos.
Ele pegou a mão dela e a puxou de volta para onde eles vieram e para a sala de jantar.
— Venha, vamos nos sentar juntos para o almoço.
Capítulo Seis
Lizzie quase que flutuou escada abaixo no dia seguinte. Ela dormiu até tarde e fez o desjejum no quarto mesmo. O beijo de Lorde Wakely preencheu seus sonhos, e o dia de hoje começava com a promessa de mais coisas deliciosas por vir. Ele a beijaria de novo? Ela não conseguia evitar de ansiar que sim. Nesse momento, era tudo o que ela queria em todo o mundo.
O vento uivava lá fora, a tempestade se recusava a se dissipar. Lady X havia deixado um bilhete na bandeja do café-da-manhã que dizia que a estrada para fora da propriedade ainda estava inundada, então Lizzie teria que ficar mais um dia. Não seria um martírio, não se significasse que poderia dar continuidade à sedução de Lorde Wakely.
Ela se sentiu revolta por dentro. Se ele suspeitava de quem ela era, o que tal suspeita significaria para eles quando retornassem à cidade? Ele gostaria de revê-la, cortejá-la até?
Lizzie desceu as escadas e parou quando o homem em questão saiu da sala. Ele veio direto para ela e, pegou em sua mão e a carregou para a direção oposta daquele cômodo.
— Venha, preparei outra atividade para nós.
Lizzie se esforçou para não pensar muito no fato de que ele segurava a mão dela, estava procurando por ela e apenas por ela. Eles atravessaram o vestíbulo e entraram em uma sala banhada por inteiro pelo sol da tarde. Mesmo com o tempo chuvoso e revolto do lado de fora, a sala ainda estava iluminada, fora decorada com tons pastéis e verdes. Havia várias cadeiras ao redor, e de frente a cada uma havia um cavalete e uma série de tintas para uso dos hóspedes.
— Vou pintar você hoje. — disse Lorde Wakely, sorrindo e puxando-a em direção a uma cadeira perto de um canto da sala que contava com janelas dos dois lados. — Você pinta, milady? — ele perguntou, ajudando-a a se sentar e ajeitando as dobras do vestido para que estivesse pronto para o retrato improvisado.
— Tive aulas quando criança, mas nunca fui muito boa. Desenho melhor do que pinto. Há algo sobre misturar as cores da maneira certa que nunca consegui fazer do modo correto. Minhas pinturas acabavam parecendo abstratas e grosseiras.
— Está tentando me dizer que o retrato que fará de mim hoje terá aparência moderna? — Lorde Wakely sentou-se e posicionou seu pergaminho.
Ele deu instruções de como ele queria que ela posasse e, fazendo o que ele pediu, ela olhou para as janelas e observou a tempestade lá fora.
— Sim, estou. Não sou nenhum Thomas Gainsborough. Mas vejo que eles têm lápis, então vou renunciar à tinta e desenhar você.
Ele a pintou em silêncio por um tempo, e por toda a duração Lizzie pôde sentir seu olhar, a atenção dele queimando contra o corpo dela como ferro em brasa. De vez em quando ela notava em que parte do corpo ele estava se concentrando, e sua pele esquentava.
— Acha que capturou bem a semelhança dos meus seios, milorde? Você parece bastante focado nessa parte da minha pessoa.
Ela lutou para não rir do pigarro dele.
Era muito emocionante para ela, mas se aproveitasse a oportunidade enquanto estava protegida pelo anonimato, faria todo o possível para provocá-lo. Lorde Wakely era tão instruído na arte do flerte que somente em pequenas oportunidades como esta que ela tinha a menor chance de responder à altura de tais habilidades.
Ele largou o pincel, mas ela não se virou para ver o que ele estava fazendo. O coração dela trovejou no peito quando ele se levantou, trouxe o rosto dela para perto dele e a beijou. O beijo demorou e, sem pensar, ela o beijou de volta. Ele era impossível de resistir, não que ela quisesse. Ela aceitaria tudo o que ele poderia dar enquanto ela estivesse sob esse teto, até certo ponto. Sua virgindade não estava em debate.
Com a mesma velocidade que ele começou a pequena indiscrição, ele voltou a sentar-se e recomeçou a pintar. Lizzie lutava para controlar as emoções, lembrando-se de acreditar que ele não sabia quem ela era, e por isso que estava interessado. A outra opção; de que ele suspeitava dela, dava muita esperança, e ela não permitiria que sua mente fugisse para fantasias dos dois se casando e tendo uma horda de filhos juntos.
— Posso lhe fazer uma pergunta, senhor?
Lizzie observava um velho olmo soprar ao vento do lado de fora e esperava que a majestosa árvore sobrevivesse à tempestade.
— Claro. — ele estendeu a mão e ajeitou o vestido dela. Ela engoliu em seco quando a mão dele permaneceu em sua perna. — Você pode me perguntar qualquer coisa.
— Presumo que pelo fato de você não ter passado tempo com outras pessoas aqui nos últimos dias, que não está interessado em mais ninguém. O que fez você me escolher?
Ele suspirou, recostando-se na cadeira.
Ela se virou para observá-lo, querendo ver os olhos dele enquanto ele explicava suas ações.
— Acho que foi o vestido, junto com seu lindo cabelo vermelho e ardente. No momento em que você entrou por aquela porta, eu a quis na minha cama. Todas as outras empalideceram em comparação com a sua beleza. E tendo passado algum tempo com você, acredito que seja bem madura e inteligente. Então, agora que eu sei que você também tem esses aspectos positivos... bem, não deixarei que mais alguém tenha você.
— E se eu não dormir com você, milorde?
Ele lançou um olhar diabólico para ela.
— Talvez você não durma. Mas não significa que eu não possa me divertir tentando fazê-la mudar de ideia.
Lizzie mordeu o lábio. Céus, ela não conseguia desviar o olhar dele. Seu corpo queimava com uma necessidade não satisfeita e, sem pensar, ela se levantou, caminhou até ele e se sentou no colo dele.
— Eu posso ser uma bruxa feia e cheia de verrugas sob essa máscara. Talvez não queira dormir com uma fraude.
— Não somos todos uma fraude aqui? — as mãos dele apertaram seu quadril, mantendo-a firme contra ele. Lizzie conseguiu sentir o desejo dele por ela, e mesmo que externamente ela não mostrasse sinais do que ele estava fazendo com suas emoções, por dentro ela era uma profusão de sentimentos e pensamentos. — Eu não deveria querer você tanto quanto quero. — ele murmurou, os olhos escuros de desejo.
— Não é esse o objetivo dessa festa? Querer e depois anteder seus desejos. — Lizzie enfiou a mão nos cabelos dele, adorando como era macio e sedoso ao deslizar entre seus dedos.
— Claro que sim, mas essas festas não devem ter conversas tão longas quanto a que estamos tendo. As interações devem ser de outros tipos.
Lizzie sorriu.
— Por tudo o que vale, meu senhor, obrigada por me fazer companhia e por ser um cavalheiro o tempo todo. Eu sei que se esperaria mais de uma participante desses eventos e, embora eu esteja mais do que disposta a tentar algumas coisas, não posso tentar de tudo.
A mão dele esfregou as costas dela, e ela estremeceu sob o toque dele. O que havia nesse homem que a fazia reagir de tal maneira? E que pena que o interlúdio deles precisasse acabar no momento em que ela fosse para casa. Se ele não suspeitasse de quem ela era, ela nunca poderia confrontá-lo em Londres sobre o tempo que passavam juntos. Mas se ele sabia quem ela era, ele a procuraria?
— Eu nunca vou me forçar a nenhuma mulher, então está bem segura comigo. E estou mais do que disposto a ensinar outras coisas que você pode fazer com um homem sem levá-lo para sua cama.
Ela sentiu o calor subir por suas bochechas e, contudo, mesmo assim ela ficou intrigada.
— Você pode me ensinar coisas? Como o quê?
Ele meio rosnou, meio suspirou.
— Você percebe que expressar em voz alta o que podemos fazer é torturar um homem. Me fará querer você ainda mais.
— Conte-me. — ela insistiu, querendo saber tudo enquanto ele estava disposto a falar.
Nenhum cavalheiro jamais falaria com uma mulher solteira de maneira tão aberta e franca se estivessem na cidade. Lizzie sempre suspeitou que o primo e a esposa dele, quando reunidos com os casais de amigos, falavam dessa maneira, mas na sociedade em geral as conversas eram, no mínimo, nada estimulantes nem muito mundanas. Chatas era uma boa palavra para descrever tais conversas.
— Eu tiraria esse vestido de você, para me permitir ver este seu corpo delicado que agora está escondido atrás de tanta seda. — o dedo dele roçou o decote do vestido dela, traçando a carne dos seios.
— Daria atenção à seus seios, me demoraria um pouco em seus mamilos. — o dedo dele traçou um por cima do vestido, e ela ofegou, as mãos agarrando o cabelo dele.
— Então, enquanto eu beijasse seu corpo, eu engancharia suas pernas nos meus ombros e a beijaria aqui em baixo. — disse ele, cobrindo seu monte com a mão, sobre o vestido.
Lizzie fechou os olhos, mordendo os lábios enquanto ele mantinha a mão ali, acariciando-a. Ela gemeu e, antes que percebesse, ele a estava beijando, arrebatando sua boca. A mão dela cobriu a dele, mantendo o toque dele, deliciando-se com o sentimento que o toque provocava nela.
Ele interrompeu o beijo, a respiração irregular, os lábios vermelhos pelo beijo.
— Eu a tomaria com a boca, lamberia sua doce carne até você se lançar contra o meu rosto e encontrar prazer.
Lizzie estremeceu, seu corpo não era o seu, mas todo o dele.
— Que tipo de prazer?
— Você vai ver... — ele disse, beijando-a novamente e fazendo-a esquecer quem era, e onde estava.
Capítulo Sete
No dia seguinte, Hugo estava relaxando em uma cadeira ao lado da lareira na sala, seu sangue tão quente quanto a madeira no fogo. Lizzie estava literalmente levando-o à distração. Depois do interlúdio na sala de pintura no dia anterior, onde ele a fez gozar em seus braços, ele quase arrancou as duas máscaras e parou de fingir. Mas ele não podia. Ela estava aqui desfrutando de um pouco da liberdade que tão raramente era dada às mulheres de sua posição, e ele não arruinaria o tempo que ainda restava a ela expondo-a.
Ele queria para si uma última incursão em devassidão, mas nunca imaginou que tais dias seriam com Lizzie Doherty, uma mulher que o fez rir e ansiar por tantas coisas que ele não pensava querer. Ter um casamento de conveniência já não tinha tanto brilho quanto antes. De fato, não havia apelo algum.
A risada dela chegou até ele, e ele olhou para cima, espiando a pequena atrevida no assento da janela com Lorde Finley, as mãos do homem muito perto da coxa dela para o gosto de Hugo. A determinação sedutora que ele leu nos olhos do trapaceiro foi suficiente para fazê-lo ferver, sentir-se tentado a espancá-lo.
Nos poucos dias em que ficaram presos nesses festejos, Lizzie se transformou em mulher. Ela deveria ter partido dessas paredes no dia seguinte após sua chegada, mas, por um golpe de talvez sorte, ela ficou presa aqui com todos eles.
Ele pensou que ela se esconderia no quarto e permaneceria lá, como uma boa garota. Em vez disso, ela se aventurou na festa com um entusiasmo que o deixou em maus lençóis na tentativa de manter a compostura. A princípio, ele a observava e via uma garota adorável, mas agora... agora ele não via nada além de uma mulher, uma mulher apaixonada e inteligente que fazia seu sangue pulsar rápido e com força em suas veias. Ele queria estar perto dela, discutir todos os tipos de coisas, coisas que nunca quis, nem se interessou antes,
Nessas festas, a perseguição, a atração de ter alguém que ele quis por semanas, era o que o fazia comparecer. Ele não precisava se preocupar em cortejar ou conversar, nem se divertir com nada além dos prazeres da carne. Mas não mais. Agora ele mal podia esperar para voltar à cidade, onde veria o rosto de Lizzie de novo, desta vez sem máscara.
Hugo inclinou-se para frente e quase jogou o copo de cristal sobre a mesa diante dele. Ele não poderia cortejá-la, a menos que, de alguma forma, tivesse uma maneira de impedir que a fortuna da mãe voltasse para seu tio. O primo de Lizzie a vigiava como um falcão, e se ele soubesse o que Hugo já havia feito com sua protegida, ele o atacaria.
Uma vozinha zombou dele, que ela nunca seria dele, não sendo tão pobre como ela era, e ele poderia agradecer ao pai por tal destino. Havia pouca chance de convencer seu tio a permitir que ele mantivesse a herança e, por causa de sua necessidade de encontrar uma esposa rica, algo que Lizzie não era, ele a perderia. Ele olhou para ela novamente e suspirou para si. Ele talvez ansiasse por tê-la como esposa.
Lady X bateu palmas, ganhando a atenção de todos.
— Nós vamos jogar um jogo. Senhoras, peço que saiam da sala, e homens fiquem. Os cavalheiros girarão um objeto com uma seta desenhada. Para quem a seta apontar, será presenteado com uma mulher à porta. Vocês então serão obrigados a partilhar o beijo mais apaixonado que conseguirem elaborar.
Alguns dos cavalheiros riram, e as mulheres riram e deram vivas ao jogo. Hugo localizou e sustentou o olhar em Lizzie que estava do outro lado da sala, e determinação aqueceu seu sangue. Enquanto todos se preparavam para o jogo, ele agarrou o braço de Lady X:
— Pode garantir que eu seja surpreendido com o que eu quero? Ficarei muito desapontado se ela precisar estar com algum dos outros homens aqui presentes. Eles não merecem ser presentados com um beijo dela.
Lady X olhou para ele com diversão nos olhos.
— Ah, e você merece? Você deve ter um interesse enorme na dama para me pedir tal coisa. — ela deixou essa pequena declaração pairar no ar por um momento antes de dizer: — Você pode pedir, milorde, mas eu não preciso conceder seu desejo. Você terá que esperar e ver como a Dona Sorte vai brincar.
— Tenho certeza de que você e a sorte garantirão que sim.
Ele a deixou ir sem outra palavra. Quando se tratava de Lady X, ninguém sabia se a ajuda viria ou não. Ela era excêntrica, com certeza, mas, com esperanças, sabendo que Lizzie era inocente, muito mais inocente do que qualquer outra pessoa presente, ela cuidaria da jovem. E por Deus, se ele não pudesse se casar com Lizzie, ele pelo menos sentiria seus doces lábios em todas e quaisquer oportunidades que surgissem.
Depois que as mulheres deixaram a sala, os homens sentaram-se em torno de uma mesa redonda. Lorde Benedict, um convidado frequente desse tipo de evento, pegou o objeto e girou. Ao parar de rodar apontou para Lorde Stratford, um homem que acabara de ganhar uma grande fortuna e viscondado.
— Parece que você é o primeiro afortunado. — disse Lorde Benedict, sorrindo e empurrando o jovem rapaz em direção à porta.
Uma senhora em um vestido vermelho-sangue que pingava sedução estava diante da porta quando Lorde Stratford a abriu. Houve quase nada de hesitação entre eles antes de se tocarem, e algo disse a Hugo que os dois já haviam estado juntos durante a festa. Eles deixaram a sala sob uma onda de gritos e gargalhadas masculinas.
Cavalheiro após cavalheiro girou o pequeno objeto, e senhora após senhora entrou, e em apenas alguns instantes saiam com o par da noite. Quando Hugo tornou-se o único cavalheiro que restava, Lady X apontou para a porta.
— Você também pode abrir, senhor. Tenho certeza de que encontrará a mulher que procura atrás do limiar.
Ele pulsava de expectativa enquanto atravessou a sala e abriu a porta, apenas para encontrar ninguém do outro lado. Perplexo, ele ficou lá por um momento, antes que uma risada soasse atrás dele.
— Parece que sua presa escapou.
Ele suspirou.
Por que ela foi embora? Bem, ele poderia imaginar. Ela não ficaria à espera de ser atacada pelo sexo oposto sem a certeza de que seria ele a fazer o ataque, alguém com quem ela aproveitaria o beijo. Era esperado que Lizzie fizesse uma saída apressada.
— Parece que sim. — disse ele, saindo da sala e indo em direção aos fundos da casa, onde ficava a sala de bilhar.
Ele daria algumas tacadas antes de se retirar para a noite. Ele passou pelo armário da escada, e não percebeu que a porta estava parcialmente aberta antes de um braço ser esticado e pegar o seu, puxando-o para o pequeno depósito.
Hugo não teve chance de reagir antes que os lábios mais macios que ele já sentira tocassem os dele com delicadeza. Desejo ondulou através dele, e sua respiração ficou entrecortada.
— Então, você desejava um beijo, afinal. — disse ele quando ela se afastou. — Achei que havia desistido quando abri a porta e não estava lá.
Ele sentiu o sorriso dela mais do que viu e, desejando-a com uma necessidade que o deixava sem fôlego, ele a puxou com força contra o peito.
— Podemos tentar aquele beijo outra vez? Por mais tempo, talvez? — Lizzie passou os dedos pelos ombros, pelos cabelos dele. — Eu arrisquei e tive esperanças de que você viesse nessa direção. Quão sortuda sou eu por adivinhar tão bem? — os dedos dela apertaram as mechas dele. — Estou à sua disposição, milorde.
Nenhuma outra palavra foi necessária. Hugo a pegou pelo queixo e a beijou, deixando-a saber, em termos inequívocos, o quanto ele a queria. Ela ofegou, então sua língua hesitante tocou a dele, e ele lutou pelo controle.
Maldição, ela era a mulher mais adorável que ele já abraçou.
Ela se ajustava a ele com perfeição, como um par de luvas de couro feito sob medida para suas mãos. Não se esquivava de seus avanços e se mostrou uma participante bem disposta. Ele conseguia escutar o sangue bombeando em seus ouvidos, e gemeu. Como em apenas alguns dias ela se tornou seu único objetivo?
Ele participava desses eventos para se perder, para desfrutar de mulheres que gostavam de jogos e estavam livres das regras da sociedade enquanto sob esse teto, mas com Lizzie tudo era diferente. Seu corpo reagia de maneira diferente ao toque dela, seus suspiros o fizeram ansiar por mais. Ele queria agradá-la, fazê-la rir e vê-la morder o lábio inferior quando ele a deixava envergonhada.
Eu a quero... e não da maneira bíblica.
— Seu beijo é pecaminoso. — ela ofegou, inclinando-se ainda mais nos braços dele, os seios contra o peito dele.
Hugo endureceu, uma dor deliciosa em seu pênis enevoando sua mente. Ela queria aventura, não perder a inocência. Ele lutou com a mente confusa para se lembrar desse fato. Apertou o quadril dela, e a empurrou contra a parede. Risos abafados soaram no corredor do lado de fora, passos e criados, mas nada disso importava. Certamente não no tipo de festa em que se encontravam.
— O seu também é. Você me colocou sob seu feitiço, milady. — ele murmurou, nunca tendo dito nada mais verdadeiro em sua vida.
A mão dela, tímida, contra sua bochecha quase desfez sua decisão de não a provocar ainda mais, e exigir mais dela antes que eles se separassem, não apenas aqui na casa de Lady X, mas em Londres.
— Então não pare. — disse ela, apertando suas lapelas e puxando-o para beijá-la novamente.
Lizzie se inclinou e beijou Hugo, pegando tudo o que ele poderia oferecer ali. A dureza que empurrou contra sua barriga a deixou plena de certeza de que ele a desejava tanto quanto ela o desejava. Tonta com expectativa e necessidade, ela o envolveu, beijando-o com tanta força quanto podia.
Tendo aprendido um pouco durante os encontros anteriores, ela aprofundou o abraço, retomando um pouco o controle, e o suspiro dele contra os lábios dela foi retribuição o bastante. Ela desejava ouvir tal som outra vez. Queria ser a única mulher a deixá-lo em tal estado.
Ela se abaixou e apertou o sexo dele, querendo tocá-lo de forma tão íntima quanto ele a tocara no dia anterior. A deliciosa dor entre as coxas dela vibrava, e os olhares que testemunhara entre o primo e a esposa dele de repente foram esclarecidos.
Ele ergueu as pernas dela para a cintura dele e os trouxe mais perto do que jamais estiveram. Ainda assim, não estavam perto o suficiente. Ela o queria, todo ele, e quando ele ondulou contra seu sexo, ela viu estrelas. Ó sim, era isso que ela desejava. O coração dela batia forte em seus ouvidos, e ela ofegou quando ele provocou os dois, dando mais prazer do que ela jamais pensou ser possível.
— Eu gostaria de saber o seu nome. — ela ofegou, beijando-o rapidamente. — Sinto uma urgência em gritá-lo.
Ele sorriu, observando-a enquanto empurrava contra o sexo dela.
— Talvez um dia sejamos apresentados formalmente.
Lizzie riu.
Quão perversa ela estava sendo, e quão maravilhoso era estar nos braços de Lorde Wakely daquela forma. Ele a beijou com uma ferocidade que a deixou cambaleando, e ela apertou seus ombros. As sensações a consumiram e a fizeram pensar em como ela continuaria na vida sem vivenciá-las de novo.
E então, como no dia anterior, seu corpo voou, e ela se desfez nos braços dele, ofegando em meio a um beijo no instante em que o prazer arrasava seu núcleo e se espalhava por todas as partes de seu corpo.
Com a respiração irregular, ele a baixou devagar e se afastou. Ela estremeceu, já sentindo falta do calor dele.
— Posso acompanhá-la de volta ao seu quarto, minha bela dama? — ele pegou a mão dela, deu um beijo breve e a pousou em seu braço.
Lizzie mordeu o lábio com o doce gesto.
— Eu... sim... Você pode.
Na manhã seguinte, Lizzie acordou aturdida quando a criada entrou no quarto.
— Senhorita Lizzie, o rio estará transponível por volta do meio da manhã, ou assim o jardineiro declarou, então devemos arrumar suas coisas e voltar para a pousada antes que alguém descubra que você estava aqui.
Lizzie sentou-se assustada.
Partir?
Ela não queria ir embora dessa festa, não quando podia beijar Hugo em armários escuros e silenciosos quando quisesse e sem ter que se preocupar com o que alguém viesse a ver ou pensar. Não quando, pela primeira vez em sua vida, ela podia ser livre para se apaixonar por um homem com tantos talentos sensuais.
Inferno.
Mas daí, se ela não partisse, sua reputação estaria em ruínas caso alguém descobrisse que ela estava aqui. E já fazia alguns dias que ela estava ali. Se os convidados de Lady X haviam ficado presos devido ao rio estar inundado e as estradas muito enlameadas, era razoável acreditar que outros membros da festa de Lady Remmnick agora fossem até lá para verificar o paradeiro dela. Mesmo agora, poderia haver uma carta, à caminho da casa de sua mãe, perguntando se ela chegou em casa em segurança depois de não comparecer à festa. Ela teria que sair, voltar para a estalagem e fingir que foi onde permaneceu o tempo todo.
— É claro. — disse ela, jogando os cobertores e correndo na direção da criada, que segurava um vestido de viagem esmeralda.
Ela ajudou Mary para se vestir o mais rápido que pôde, depois checou o quarto quando fechou as malas para garantir que ela não deixaria nada para trás. Foi uma hora de loucura. Colocando a máscara, ela saiu do quarto e parou na porta.
A porta do visconde permanecia fechada a uma hora tão precoce. Não era provável que acordasse por um tempo ainda. Decepção a apunhalou ao perceber que jamais o veria em circunstâncias tão relaxadas. Esses últimos dias na casa de Lady X foram escandalosos, sim, mas muito divertidos e despreocupados. O completo oposto de Londres.
Lizzie apertou os lábios, insegura de quando veria Lorde Wakely novamente. Será que ele iria falar com ela quando os caminhos deles voltassem a se cruzar, ou o momento de loucura dos últimos dias fora apenas um breve divertimento para Sua Senhoria, e agora o trato com ela terminara?
Isso se ele a reconhecera ao longo desses últimos dias. Ele nunca mencionou o nome dela, mas algo dizia a ela que ele sabia quem ela era. Ele era amigo do primo dela, portanto, isso explicaria o porquê de ele ter ficado a rondando e mantido os olhos nela. Talvez a atração que ela acreditara ver entre eles estivesse só em sua imaginação, e Lorde Wakely só a abordara para manter sua virtude protegida dos outros libertinos presentes, mas não dele, ao que parece.
Respirando fundo, ela continuou em direção às escadas. Lady X estava parada no Hall de entrada e sorriu, Lizzie sorriu de volta.
— Obrigada por me receber, e devo me desculpar por sair com tanta pressa, mas, bem... tenho certeza de que entende o porquê.
Lady X a acompanhou até o lado de fora, em direção à carruagem:
— É claro que eu entendo, querida, e por mais que eu goste da sua companhia, este não é o lugar para uma jovem tão adorável como você. Mas nos veremos na cidade, onde poderemos conversar sem essas máscaras tolas.
Lizzie apertou a mão de Sua Senhoria.
— Vou gostar muito disso.
Ela deu um último olhar apreciativo à casa onde por um tempo seu sonho com Lorde Wakely se tornou realidade e entrou na carruagem. Ela se preparou para rever a mãe, e para as muitas perguntas que enfrentaria com relação à seu paradeiro nos últimos três dias.
Capítulo Oito
Ao voltar para a cidade, Lizzie se deparou com Londres e todos os bailes e festas da mesma forma, se não um pouco mais tediosos e inofensivos, após suas descobertas na festa em casa de Lady X. Na semana em que ela voltou, não vira Hugo em nenhum lugar, embora os sussurros sobre a corte à Srta. Fox tivessem dobrado e se falasse em um anúncio iminente do noivado. Lizzie afastou o desapontamento que surgiu em sua cabeça, não queria pensar nisso. A ideia dele com outra mulher, ele beijando outra pessoa, levando-a para sua cama, era insuportável para dizer o mínimo.
Seu estômago revirou, e ela respirou fundo para conter a náusea.
— Bom dia, querida. Como você está hoje? — perguntou sua amiga Sally, sentando-se em uma cadeira ao lado da penteadeira de Lizzie e tirando as luvas.
Lizzie franziu a testa.
— O que você está fazendo aqui tão cedo? — ela verificou a hora. — Você não costuma se levantar até depois do almoço. Deve ter algo extremamente importante para dizer ao estar aqui neste momento.
Sally riu e depois dispensou a dama de Lizzie.
— Você nunca vai adivinhar quem voltou para Londres em uma fáeton ontem à tarde.
Lizzie balançou a cabeça, sem ter ideia de quem Sally poderia querer dizer, embora uma pequena parte dela se animasse pela possibilidade de que poderia ser Hugo. Ela pensou que ele já estava de volta à cidade, e mantendo uma boa distância, mas talvez não fosse o caso. Assim como os rumores em torno do possível noivado, talvez a sociedade estivesse errada nos dois aspectos. Talvez ele não estivesse atrás da Srta. Fox, talvez ele apenas estivesse fora da cidade, e as pessoas estivessem inventando histórias para se ter o que conversar.
Certamente não seria a primeira vez que isso aconteceria.
— Quem? — ela perguntou, checando o cabelo e achando o penteado agradável e, para a sua felicidade, um pouco lisonjeiro. Mary estava se tornando uma criada muito talentosa.
— Lorde Wakely. E há boatos de que ele arruinou uma senhorita jovem e inocente e terá que casar com ela.
— O quê? — Lizzie se levantou, fazendo com que a cadeira da penteadeira caísse para trás. — Quando isto aconteceu?
Sally lhe deu um olhar curioso.
— Em uma festa no condado, embora os detalhes sejam muito incompletos no momento, mas é. Imagine se fosse verdade? Eu me pergunto quem é a mulher em questão.
Lizzie olhou horrorizada para a amiga, odiando o fato de que essa mulher arruinada pudesse ser ela. Ela havia sido tão cuidadosa ao voltar para a estalagem e foi encontrada mais tarde naquele dia por Lady Remmnick, que estava fora de si de tanta preocupação. Mas Lizzie havia explicado que não conseguiu continuar a viagem para a propriedade devido às estradas intransitáveis e ao pequeno rio que precisava atravessar para avançar, então simplesmente ficou na estalagem com a criada.
Ninguém além de Lady X sabia que ela esteve na outra festa. Os demais participantes adivinharam sua identidade? Afinal, Lorde Wakely também sabia quem era? É claro que, no primeiro dia em que ela chegou, sem ter ideia de que estava no local errado, era possível que alguém a tivesse visto entrar na casa antes de ser escoltada para o quarto, onde máscaras a aguardavam para esconder sua identidade.
Ó Céus, que desastre!
Sua mãe a mataria e a colocaria em um convento se descobrisse sua pequena escapada. Qualquer chance de obter um marido adequado e seguro também seria perdida, quanto mais encontrar alguém que a amasse. Sua chance de se casar por amor seria um sonho inatingível devido à sua própria estupidez. Ela seria completamente arruinada!
Lizzie sacudiu o pânico que ameaçava tomar conta. Lorde Wakely era um patife, disso ela não tinha dúvida. Talvez depois que ela partiu, ele encontrou outra pessoa para se divertir, e essa mulher arruinada, quem quer que fosse a pobre alma, era inocente. Lizzie revirou os olhos, sabendo muito bem o quão absurdo isso parecia. Não, a jovem neste último escândalo era ela. Ela seria uma idiota estúpida por se iludir do contrário.
— Com a reputação dissoluta do visconde, poderia ser qualquer uma. — disse ela. — Ele é um patife, afinal. Não vamos nos preocupar mais com isso. Tenho certeza de que ele fará a coisa certa e se casará com a garota e salvará a reputação moça, se ele tiver, de fato, agido de forma tão baixa.
Sally sorriu.
— Mal posso esperar para descobrir quem se casará com esse homem. Ele é muito bonito e rico, e sem dúvida, acredito que ele manteria qualquer mulher ocupada e feliz. — Lizzie foi na direção da lareira, precisava de calor. — Duas noites atrás, no teatro, houve uma conversa sobre o namoro com a Srta. Fox. As fofocas dizem que o tio dele, que mora na América, deve chegar dentro de um mês, sem dúvida, para participar do casamento. Achei esse novo boato escandaloso e tão divertido. Obviamente, ele vai se casar com a Srta. Fox e adicionar sua fortuna à dele. Talvez eles tenham dado uma escapadela e se pública.
— Talvez você esteja certa. Mesmo assim, as próximas semanas na cidade serão muito interessantes. — disse Sally, com os olhos brilhando de alegria.
Lizzie sorriu, mas a dor irradiava dentro de seu peito.
Que tola foi, mas ela acreditara que haviam tido uma conexão. Os beijos dele decerto a desconcertaram, a seduziram totalmente a fazê-la fantasiar com um futuro para os dois, juntos. Ela havia sido ingênua? Uma garota tola que imaginou mais do que o que havia? Talvez Lorde Wakely nunca soube quem ela era e apenas se divertira com uma mulher em uma festa, como havia feito muitas vezes antes.
Sally levantou-se e foi até o armário, passando rapidamente pelos vestidos de Lizzie.
— Toda a cidade vai participar do baile dos Lefroy hoje à noite, e você também. Agora... — ela disse, pegando seu vestido favorito, ouro e prata. — é este que você deve usar hoje à noite. As cores combinam com seus cabelos vermelhos.
— Que importância tem o que visto? Não tenho ninguém para impressionar. Pelo menos, não mais.
Sally colocou o vestido na cama e foi procurar luvas.
— Não tem nada a ver com impressionar. Todos que são alguém estarão lá, sem dúvidas, e para ver Lorde Wakely. Eles vão querer ver se o interesse dele pela Srta. Fox ainda existe, ou se esses novos rumores apontam para outra mulher.
Lizzie tocou a campainha da criada.
— Muito bem, farei o que você pede, mas, na verdade, não me importo com quem Sua Senhoria venha a se comprometer. Tampouco desejo ver a sociedade se voltando para esta mulher arruinada, se houver alguma, e despedaçar seu caráter com suas opiniões todo-poderosas.
— Bem... — disse Sally, pegando as luvas e vestindo-as . — Não estamos cortantes esta manhã? Agora, descanse um pouco, pois esta noite será longa e emocionante, e espero que você me faça companhia até as primeiras horas da manhã.
Lizzie suspirou.
— Como você está tão interessada em minha presença, eu a encontrarei às portas da sala de jantar às oito.
— Nos veremos lá então.
Lizzie observou Sally se virar e sair no momento em que Mary chegou.
— Vou ao baile dos Lefroy hoje à noite. Por favor, arrume para que um banho seja preparado no final da tarde, também providencie para que o jantar seja trazido ao meu quarto mais cedo.
— Você não vai querer comer no baile, senhorita Lizzie?
— Prefiro não comer muito em tais saídas.
E se os nervos que revolucionavam seu estômago eram alguma indicação, comer no baile hoje à noite seria quase impossível.
Hugo observou a entrada do salão de baile dos Lefroy como um homem sedento que procura uma fonte de água Na última semana, ele pensou em nada além de Lizzie Doherty e o tempo que passaram juntos na propriedade de Lady X. Sem mencionar os beijos deliciosos que haviam trocado. O fato de a pequena atrevida ter retornado a Londres no dia seguinte não era o que ele esperava descobrir ao acordar, depois de uma noite muito inquieta pensando em nada além de seus doces lábios.
Ele esfregou a mandíbula, lembrando a si que era para o melhor que ela tivesse partido. Suas interações se tornavam cada vez mais carnais ao longo dos dias em que estiveram juntos, e algumas vezes ele teve que se conter para não implorar para ir além.
Ele partiu para sua propriedade no mesmo dia em que ela saiu, determinado a seguir em frente com seu plano de se casar com a Srta. Fox antes que o tio pudesse reivindicar a herança. O tempo estava se esgotando para ele encontrar uma esposa rica, e a Srta. Fox havia mostrado que estava aberta a esse arranjo. Portanto, ele tirou Lizzie da cabeça. Eles estavam na festa de Lady X disfarçados, afinal, para que ele pudesse esquecer o fato de que sabia quem ela era no momento em que entrou na sala naquele dia. Ele não fez promessas, nenhuma declaração de amor eterno.
O que quer que amor fosse.
Um sonho em ouro apareceu, rindo de algo que a amiga estava dizendo antes de fazer uma reverência aos anfitriões e entrar no salão de baile. Seu coração perdeu o compasso quando ele a admirou, saboreando cada movimento, cada gesto que ela fazia sem perceber que ele a observava.
Tomando um gole de conhaque, ele ignorou as risadas sobre seu último escândalo. Bem, na verdade eram dois escândalos, mas com a reputação que ele ostentava, não eram novidade. Se a sociedade soubesse de verdade quem era a dama que, em tese, ele arruinou, seria diferente. Como eles achariam deleitável tal informação. Não que se importassem que ele não a tivesse arruinado de alguma forma. Embora ele não pudesse negar que o pensamento passou pela cabeça dele várias vezes durante os poucos dias que passaram juntos.
Nunca sentira um desapontamento tão agudo quanto na manhã em que acordara e descobrira que ela deixara a festa. O dia só foi piorando a partir daquele momento. Ele ordenou que seu criado guardasse suas coisas e, na hora do almoço, ele já estava a caminho de sua propriedade rural. Ele ficou lá por alguns dias, conversando com o seu administrador e garantindo que tudo estivesse em ordem antes de voltar para Londres para atender ao final da temporada. Sem mencionar garantir a Srta. Fox e suas trinta mil libras antes do final do mês.
Nesse instante a megera chamada Lizzie Doherty passou direto por ele sem nem um oi, e seu aborrecimento dobrou. Não só com ela, mas com ele mesmo. Ele deveria estar feliz por ela não estar exigindo nada dele, que permitisse que ele corteje a Srta. Fox e, portanto, resolvesse todos os seus problemas financeiros. O fato de ela não o procurar o deixou a contemplar o fato de que ela nunca reconhecera a identidade do cavalheiro que a beijara sem pudores na festa de Lady X.
A ideia de que Lizzie beijaria qualquer homem de tal maneira fez seu sangue gelar. Sua determinação de permanecer distante dela, deixá-la por conta própria, guerreava com o desejo de falar com ela de novo. Estar perto dela e ouvi-la rir. O primo dela, Lorde Leighton, era um de seus amigos mais próximos, então não era totalmente estranho que eles fossem vistos juntos em um baile. A sociedade não veria nada mais do que ele sendo educado com a prima de um de seus melhores amigos.
Hugo a observou.
Ela é tão bonita...
E era um prazer vê-la mais uma vez sem máscara. Sua risada fez com que calor corresse pelo sangue dele, e seus olhos vibrantes simplesmente iluminaram uma sala. Mas ela não era uma opção para ele. Ele precisava se casar com uma herdeira com um dote substancial, e teria que ser em breve. Infelizmente, Lizzie Doherty era uma parente do lado pobre da família do Conde de Leighton e, por causa disso, os anos passavam e ela não encontrava um marido. O que a deixava diante da possibilidade de jamais encontrar um.
Hugo entendia por que seu pai havia estipulado tal cláusula no testamento. Ele conhecia o estilo de vida do filho, as infinitos amantes e seus gastos com as coisas que ele valorizava: cavalos, jogos de azar e viagens ao exterior. Mas agora seus vícios o impediriam de ir atrás da mulher a quem ele estava certo de que mais lhe convinha nesta sociedade. Agora, seu próprio passado imprudente significava que Lizzie Doherty estava perdida para ele, e que ele teria que se casar com a fria e distante Srta. Fox.
E ele se casaria com ela porque era a única opção que lhe restava, era o que precisava fazer para dar segurança aos seus inquilinos no interior, e seus funcionários em suas muitas propriedades. Mesmo assim, a brasa que esquentava dentro dele só crescia enquanto observava Lizzie, não diminuía. Não havia diminuído nos dias desde que a vira pela última vez, e algo lhe dizia que não importava quanto tempo passasse, não se extinguiria. Ela provocou um fogo em seu sangue do qual ele não queria se afastar. Mas como ele poderia tê-la se torná-la sua esposa significava perder tudo?
Ele afastou a questão, pensaria nisso outro dia.
Era algo egoísta, devastador, mas ele queria prová-la de novo. Ele a queria em sua cama, se contorcendo de prazer. Ele queria beijar cada centímetro de sua pele branca e sedosa. Sugar seus mamilos até que eles se enrugassem tornando-se pequenos picos que imploravam para serem lambidos. Ouvi-la gemer o nome dele quando seu pau liberasse todo o prazer dela.
Ele se afastou da parede e a seguiu até o final da sala. Ela estava de costas para ele, com alguns cavalheiros e amigas a cercando, e a conversa deles era audível quando ele se aproximou. Discussões sobre as últimas atualizações.
Ele.
Ele sorriu quando a conversa parou... todos, menos Lizzie, era isso. Incapaz de negar a si a sensação dela perto dele mais uma vez, ele deslizou o dedo pela espinha dela quando ficou ao lado dela, seu próprio corpo escondendo o toque inadequado.
— Boa noite. — disse ele, capturando os olhos assustados de Lizzie com os seus. — Você está muito bonita esta noite, senhorita Doherty. — ele se curvou em uma reverência, apertando a mão dela e beijando-a.
Um rubor profundo floresceu nas bochechas dela, e ele se afastou, rindo por dentro ao perceber que ela conseguiu beijá-lo com tanta paixão apenas uma semana antes, tocar e falar com ele abertamente, mas agora sentia vergonha. Isso se ela estivesse ciente de quem ele era na festa em casa.
Mas algo em sua reação agora lhe dizia que ela sabia que ele foi aquele homem que esteve com ela no interior, que também sabia que ele conhecia o nome da diaba que torturava as memórias dele.
Outras pessoas o cumprimentaram enquanto algumas das senhoras presentes riam e puxavam seus leques, acenando-os a frente de seus rostos. Ele se virou na direção de sua presa e apontou para a pista de dança.
— Acredito que a próxima dança seja uma valsa, senhorita Doherty. Você me dará esta honra?
Ela lançou um olhar nervoso para a amiga Sally, antes de assentir, os olhos arregalados como pires.
— Obrigada, sim.
Hugo a levou para o centro do salão enquanto a dança anterior chegava ao fim. O tremor na mão dela denunciava seu nervosismo, e ele a puxou para mais perto do que deveria. Poucos dias haviam se passado os separando, e ele já não se lembrava mais como era não a ter. Então agora, tê-la em seus braços, prestes a dançar uma valsa, onde eles poderiam conversar... o deixou desconcertado para dizer o mínimo.
De alguma forma, a pequena flor de estufa que olhava para ele com apreensão havia cativado sua alma.
— Você gosta de dançar, senhorita Doherty?
Ela assentiu.
— Sim, quando me convidam.
A dança começou, e eles deslizaram pelo salão. O baile estava lotado, mas mesmo com a multidão de convidados, Hugo não deixou de notar os olhares curiosos que estavam sendo lançados na direção dos dois.
— Eu não acredito que haja algum homem aqui presente que não gostaria de dançar com você.
Ela ergueu uma sobrancelha, o olhar dela demonstrava cansaço.
— Você nunca me convidou antes. Alguém talvez até se pergunte o que o fez me convidar agora.
Ele se assustou e quase perdeu o equilíbrio.
Ela estava certa também, para aborrecimento dele. Ele nunca dançou com ela antes, mesmo que estivessem muitas vezes na companhia um do outro.
— É um lapso que pretendo remediar a partir desta noite.
— Mesmo? — disse ela, olhando por cima do ombro dele. — E por que isso?
Ele deslizou a mão um pouco mais pelas costas dela, parando logo acima das nádegas. Ele encontrou o olhar dela, querendo se perder nas profundezas azuis daqueles olhos.
— Porque depois do que você fez comigo embaixo da escada na festa de Lady X, há pouco em que pensar, além de estar com você. Estar perto de você. Beijar você até que não possamos nem nos manter de pé.
Lizzie ofegou e tropeçou.
Hugo a colocou de volta na posição correta e continuou a valsa.
— Vejo que o disfarce que precisei usar não funcionou com você.[
Ela parecia irritada, e ele riu.
— Embora eu acredite que os outros participantes ainda desconheçam sua verdadeira identidade; não, eu não fui enganado. Mas, repito, conheço você há algum tempo e reconheceria sua figura deliciosa em qualquer lugar, imagino. E o seu cabelo, que é um tom que nem sempre é visto na sociedade.
— Você, senhor, está sendo muito atrevido, e devo admitir, rude. Você não deveria falar de mim dessa maneira.
Ele zombou.
— Por que não deveria? O que eu digo é a verdade. — ele a puxou para um giro rápido.
A lembrança de tê-la contra a parede, seu corpo flexível contra o dele, ondulando em seu próprio ritmo na busca de prazer, bombardeou sua mente. Ele gemeu com o pensamento.
— Você está se sentindo mal, meu senhor?
— Hugo, por favor. E não, não me sinto mal, mas não significa que não estou sofrendo.
Dor insuportável aliás e, felizmente, a valsa ainda tinha alguns movimentos musicais para salvar sua reputação. A última coisa que qualquer um aqui presente precisava ver era seu pênis ereto e glorioso implorando por atenção.
— Sério, e a que tipo de dor você se refere, Hugo? — ela frisou o nome dele, zombando um pouco, e o diabo sentou-se no ombro dele.
— Você realmente quer saber, Lizzie? — ele perguntou, frisando o nome dela em retorno.
Ela não respondeu, apenas ergueu a sobrancelha.
— Muito bem, senhorita Doherty, vou contar. Estou com dor sim, como vê. — ele sussurrou. — Porque desde o momento em que você me beijou, e os poucos dias em que ficamos separados, você, minha querida, foi o único objeto dos meus pensamentos. Minha consciência pondera sobre você o tempo todo, desejando um beijo tão doce e emocionante quanto o último, e não tenho vergonha em admitir que a quero. — ele se inclinou ainda mais para garantir a privacidade. — Quero você na minha cama.
Ele estava se condenando ao inferno por falar tais coisas. Querer uma mulher que ele não poderia ter, a menos que ela se tornasse uma herdeira como por milagre, ou que seu tio recusasse o dinheiro de sua mãe. Nenhuma das opções eram verossímeis, e ele não deveria estar aqui, dando esperança a ela, mas também precisava saber se o que eles compartilhavam era real, não uma invenção da imaginação dele. Lizzie Doherty era a primeira mulher com quem ele realmente se importava?
Lizzie fechou a boca com um estalo. Ele a queria em sua cama! Ó, que escandaloso e tão tentador! Ela sorriu para ele, não tendo pensado que ele seria tão honesto com ela, mas adorando que ele tenha sido.
— Deseja me arruinar, meu senhor?
— Hugo. E sim, completamente.
Sua Senhoria a puxou para um giro antes de voltarem para os fundos do salão de baile. Nos últimos dias, estar separada de Hugo também foi torturante para ela. Seu corpo não parecia mais seu, e agora nos braços dele, calor e expectativa latejavam por seu sangue e outros lugares também.
Mas trilhar este caminho significava ruína, em especial porque ele não fazia promessas a ela. Não havia pedido sua mão em casamento. Seria melhor mantê-lo longe, ver se o desejo dele por ela o levaria a dar um passo mais sério, antes de permitir que qualquer coisa que modificasse sua vida ocorresse. Ainda assim, não significava que ela não poderia se divertir um pouco com ele nesse meio tempo. Um beijo roubado aqui e ali nunca machuca ninguém.
— Depois dessa dança, Hugo, vá para o topo da escada e vire à direita, depois siga o corredor até o fim, onde você verá um cômodo à sua esquerda. Entre e espere por mim.
Os olhos dele se arregalaram, e um pequeno triunfo a atingiu por ter sido ela quem provocou algum choque desta vez.
— E o que pretende fazer comigo quando estivermos nesta sala?
Ela passou a mão sobre o ombro dele, interrompendo-se perto da nuca dele.
— Tudo. Pretendo fazer tudo com você.
Por sorte, a dança chegou ao fim e, fazendo uma reverência enquanto Hugo se curvava, Lizzie se despediu dele. Ela se juntou a Sally, que estava em uma profunda discussão sobre a terrível tempestade que ocorrera enquanto participava de uma festa no campo, a mesma que fez com que Lizzie chegasse ao local errado.
— Sally, estou com uma leve dor de cabeça, acho que voltarei para casa se você estiver de acordo. Vou pedir a carruagem, mas a envio de volta para você usá-la quando estiver pronta para ir.
Sally franziu a testa e pegou as mãos da amiga.
— Está bem, minha querida? Deseja que eu a acompanhe? Eu não me importo.
Lizzie afastou as preocupações da amiga.
— Não, fique e aproveite o restante do baile. É uma pequena dor de cabeça, e vai passar. Nos vemos amanhã. — ela foi em direção ao hall de entrada e pediu que um lacaio pegasse o xale dela antes de esperar a carruagem chegar.
Não demorou muito para que a ajudassem a entrar no veículo, e logo estavam se afastando da casa. O que aconteceu depois foi um borrão, mas antes que a carruagem ganhasse muita velocidade, a porta se abriu e Hugo se jogou no chão diante de seus pés sem chinelos.
— O que você está fazendo? — ela ofegou, observando-o rolar, sentar-se e bater a porta da carruagem. Ele foi notado em sua pequena estripulia e, quando a carruagem diminuiu a velocidade, Lizzie gritou ao condutor para continuar.
— Você está fugindo de mim. Mais uma vez. — ele olhou para ela de onde se sentava no chão, os cabelos tão revoltos quanto a gravata, que estava bem baixa, deixando visível o seu delicioso pescoço.
— Por mais que eu tenha gostado do nosso tempo na festa de Lady X, Lorde Wakely, não vou ser uma conquista fácil para você.
Apesar do fato de ele estar sendo tão adorável perseguindo-a, entrando na carruagem e assustando-a até a morte. Ele pareceu um pouco chocado com a declaração dela, e ela riu.
— Onde está a diversão em uma conquista fácil? Não me importo de persegui-la por Londres se você me der migalhas de atenção aqui e ali. Digo, um beijo aqui e ali.
Ele se aproximou e sentou-se ao lado dela, que sentiu os nervos descontrolarem-se sob a pele. Ele era tão imponente, tão mundano, e ela não era nada disso. Por que diabos ele estava mesmo na carruagem dela, sentado ao lado dela, ela não conseguia entender. O visconde estava cortejando a Srta. Fox. Astúcia e frieza eram adjetivos que a sociedade havia usado para a pobre mulher. Mesmo que ela não fosse nada pobre. Portanto, por que ele a queria?
— Por que você está aqui, Hugo? — ela perguntou, não querendo ser o brinquedo de ninguém, por mais que pudesse se distrair com beijos.
Ela se casaria por amor e nada mais, e até onde Sua Senhoria sabia, ela não tinha um tostão. Não era alguém que os homens da esfera deles desejassem ter algo a ver. Então, por que ele se interessava por ela?
Ele a estudou por um minuto, a carruagem balançando-os com vagareza, a iluminação trêmula das luzes da rua revelando a seriedade dele de tempos em tempos. Lizzie não disse outra palavra, apenas esperou por qualquer que fosse a resposta dele.
— Eu gosto de você, mais do que eu jamais pensei que gostaria. Sim, nos conhecemos de passagem devido ao seu primo, mas nunca a enxerguei de verdade. Sinto que no tempo que passamos juntos, sem as regras da sociedade, meus olhos se abriram e... bem, agora eu a vejo.
— Eu não vou dormir com você. Jamais serei mais uma de suas conquistas, por mais que eu tenha desfrutado do tempo que passei na propriedade de Lady X.
Ele pegou a mão dela, puxando-a em sua direção.
— Quando você me beijou, a impressão foi de que você havia acordado de um sonho. Um ciclo interminável de nada. Quando estou perto de você, sinto calma, mas também um vislumbre de loucura. Eu sabia que se não voltasse a vê-la, com certeza ficaria louco.
— Você é um provocador, meu senhor. — disse ela, afastando-se. — Não gosto de jogos em que eu sou o brinquedo.
— Eu não sou um provocador, não importa o que você possa pensar de mim ou possa ter ouvido. Eu sempre digo a verdade absoluta.
Ele franziu a testa, e ela se perguntou no que ele estava pensando. Se não era um jogo para ele, o que era? Ele a via como uma noiva em potencial ou havia se apaixonado por ela depois de um fim de semana na festa na casa de Lady X?
Lizzie não sabia a resposta para essas perguntas. Ela estava disposta a se colocar em uma situação em que poderia se machucar? Não apenas seu coração, mas também sua reputação. Ela sempre gostou de Lorde Wakely, e deveria permitir que ele permanecesse perto dela, será que poderia se apaixonar por ela e falar de casamento?
Era um risco, certamente, mas, ao encontrar seu olhar cinza-azulado escuro, ela já sabia que arriscaria tudo se significasse uma chance de ter esse homem em seus braços como marido.
— Existem rumores em toda a cidade de que você está prestes a propor casamento à senhorita Fox. É verdade?
Ela precisava saber, mas quando ele se recostou e voltou o olhar para a Londres que passava do lado de fora da janela da carruagem, uma rocha de dúvida a devastou por dentro.
— A sociedade quer que você acredite que eu estou sempre cortejando alguma debutante ou solteirona da sociedade. Mas a sociedade pode ir para o inferno, porque é com você que eu quero estar. Deixe-me, pelo resto da temporada, ficar com você o máximo que pudermos.
Lizzie observou aquele olhar, desejava acreditar no que ele dizia, e ainda assim uma pequena parte dela se indagava. Mesmo que ela o tivesse visto em bailes e festas com a Srta. Fox, que ele tivesse dançado mais de uma vez com ela, a escoltado para peças de teatro e ópera com os pais dela, tudo apontava para um compromisso e, no entanto, aqui estava ele, implorando que ela permitisse que ele a cortejasse.
— Não vou negar que aprecio sua companhia, e você pode dançar e falar comigo em qualquer baile ou festa em que nos encontramos, mas, mais do que isso, devo recusar. Caso se prove digno, e se o que você diz é verdade, e não esteja cortejando a senhorita Fox, então até o final da temporada, nós saberemos.
Um músculo saltou na têmpora dele, e um silêncio ensurdecedor preencheu a carruagem. Ela o insultou? Era possível, mas agora ela precisava pensar em si, e o fato de Lorde Wakely ser um libertino poderia arruinar suas chances de encontrar um homem que a amasse por quem ela era, não pelo que possuía. Sem mencionar que seu primo não concederia o dote se ela fosse arruinada.
Mais dois anos, e ela poderia viver como quisesse. Onde ela quisesse. Arriscar seu futuro, para qualquer que seja a direção dele, mesmo por causa de uns beijos deliciosos e muito travessos embaixo de uma escada, era um risco que ela não estava disposta a correr. Ainda não pelo menos.
Ele bateu no telhado, e a carruagem parou ao lado da estrada.
— Eu nunca desejaria fazer algo que lhe causasse dano. À luz do que acabou de dizer, continuaremos como antes, amigos que socializam. Não vou pedir mais do que isso a você, mesmo que agora... — ele se inclinou para ela. — eu não deseje nada mais que beijá-la.
Ele estava tão perto que a vibração da respiração dele atingiu os lábios de Lizzie. Sem pensar, ela umedeceu os lábios e se deliciou pelo fato de a atenção dele se voltar para a boca dela.
— Você deseja me beijar? — ela disse, as palavras apenas um sussurro, mas até a própria Lizzie podia ouvir o desejo ecoando de sua voz.
Necessidade pulsava entre eles, invisível e, no entanto, os atava como um pedaço de corda. Ele era demasiado perigoso para os planos dela. Homens como o visconde só tinha casos, e se casavam pelo que podiam acrescentar ao bolso, não pelo que podiam acrescentar ao coração. Se ela se casasse, e estamos falando de um grande "se", seu casamento seria um casamento de amor, e nada mais a influenciaria. Caso contrário, ela morreria uma solteirona rica e velha que viajaria pelo mundo e adotaria tantos gatos quanto seu carregador pudesse segurar.
— Mais do que tudo, mas não vou. — ele suspirou, então abriu a porta e saiu do veículo. — Você vai ao baile dos DeVeres amanhã à noite?
Lizzie assentiu.
— Sim, vou. Lorde e Lady Leighton me acompanharão. Mamãe pegou um resfriado e deseja permanecer na nossa propriedade rural por enquanto.
Ele se curvou, fechando a porta com um baque.
— Bem, lá nos veremos. Boa noite.
Ela sinalizou para o condutor prosseguir.
Ó, o que ia fazer com ele?
No entanto, ela deveria permanecer casta, quando com apenas um olhar ele a derretia como o gelo no sol de um dia quente de verão?
— Boa noite, Lorde Wakely. — disse ela, rindo quando ele gritou na rua "Hugo" antes que o veículo virasse uma esquina, e ela o perdesse de vista.
Capítulo Nove
Lizzie ficou ao lado de Sally no baile dos DeVeres e observou Lorde Wakely dançar um minueto com a Srta. Fox. Que mulher bonita ela era — alta, cabelos escuros, sua pele perfeita como o leite. E, no entanto, quando alguém se aproximava o suficiente dela, não havia como negar que seus olhos eram tão frios quanto gelo.
Por um momento, ela se perguntou se havia feito a escolha certa ao dizer para Sua Senhoria que eles poderiam permanecer amigos, mas nada mais. Se ele não propusesse a ninguém antes do final da temporada, ela saberia que as palavras dele eram verdadeiras, e talvez eles pudessem recomeçar.
O marquês de Mongrove curvou-se diante da amiga e logo eles partiram para dançar o minueto. Lizzie ficou sozinha por um tempo antes de seu primo Lorde Leighton se juntar a ela, com a esposa Katherine ao seu lado.
Sua Senhoria ofereceu uma taça de champanhe que ela pegou com gratidão.
— Você parece terrivelmente abatida, minha querida. Algo errado? — ele perguntou, franzindo a testa um pouco.
— Com toda a honestidade, estou preocupada. E se ela não falasse com alguém sobre o assunto logo, ela ficaria louca com de dúvidas.
— O que foi, Lizzie? — Kat perguntou, puxando-a em direção a um pequeno sofá encostado na parede e fazendo-a sentar-se.
Lizzie tomou um gole de champanhe encorajador.
— Tenho certeza de que não escapou de seu conhecimento de que ninguém está me cortejando. Temo que, a menos que saibam da fortuna, minhas circunstâncias não mudem, e eu não sei mais o que fazer. Não quero um caçador de fortunas, mas também não quero me casar velha.
O minueto terminou, e Lizzie viu Lorde Wakely escoltando a Srta. Fox até os pais dela, que pareciam ansiosos demais por tê-lo por perto.
— Como eu disse seis anos atrás, o homem que se casar com você sem dote se casará com você por causa de quanto ele a ama, e não pelo valor de sua poupança. Confie que o homem certo jogará tudo para o alto para ter você como esposa. Você vale mais que sua fortuna. — declarou Lorde Leighton, ganhando um pequeno sorriso de sua esposa.
— Eu concordo. — disse Kat, pegando a mão dela. — E devo admitir que não faz sentido que você não tenha recebido convites. Por que, na semana passada, Lorde Lumley perguntou a seu respeito e, pelo que sei desse cavalheiro, ele tem fortuna própria.
Lorde Leighton olhou para elas, uma carranca no rosto.
— Agora que você mencionou, é muito estranho, não é? Seis anos desde sua apresentação e nenhuma proposta de casamento. Deixe-me fazer algumas perguntas e ver se consigo descobrir por que você não está sendo cogitada como possível esposa.
Lizzie ofegou, não esperando que o primo fosse tão franco.
— Hamish, isso foi cruel. Peça desculpas a Lizzie.
As palavras da esposa pareceram tirá-lo de seus devaneios, e ele voltou-se para olhá-la nos olhos.
— Ó, desculpe, minha querida. Eu não quis chateá-la. Mas as mulheres se casam com homens o tempo todo mesmo sem fortunas, e sua família é bem relacionada, por isso não pode ser esse o motivo. Então, deve haver algo mais que esteja a deixando à margem.
Lizzie deu de ombros, depois olhou para cima e viu Lorde Wakely conversando com um grupo de jovens, sendo um deles Lorde Lumley, que seu primo acabara de mencionar. Hugo encontrou e sustentou seu olhar desde o outro lado do salão, e ela estremeceu. Ele era muito intenso, seus olhos quase gritavam de tanta intensidade, e de onde ela estava, até ela podia sentir o ardor.
Ela desviou o olhar de Lorde Wakely.
— Prometa-me que, se eu não encontrar o homem certo para ser meu marido, você me permitirá fazer o que quiser com minha fortuna. Depois de seis anos como um flor decorativa do Almack, acho que é o mínimo que você pode prometer. — disse Lizzie, apenas brincando.
Lorde Leighton fez uma reverência, sorrindo.
— Você pode, minha querida. Eu não negaria seu pedido.
Lizzie viu Lorde Wakely pedindo licença aos amigos, antes que virasse e andasse até onde eles estavam com propósito. Ela sentiu-se revirar por dentro, e assentiu em boas-vindas. Ele se curvou, pegou a mão dela e deu um leve beijo.
— Nos encontramos novamente, senhorita Doherty. Sua Senhoria apertou a mão de Lorde Leighton e fez um cumprimento breve a Katherine.
— Boa noite, Lorde Wakely. Vejo que se afastou de seus amigos a tempo de nos cumprimentar. Que sorte a nossa. — disse Katherine, sorrindo para o cavalheiro.
Lizzie sorriu, gostando do fato de que Kat só falava a verdade, mesmo que fosse franca.
— Ah, sim, estive ocupado, mas estou aqui agora e, com a permissão de Suas Senhorias, gostaria de acompanhar a senhorita Doherty no jantar.
Lorde Leighton deu consentimento, e Lizzie se levantou, não vendo mal algum na ação. Afinal, eles deveriam ser amigos, ela fez o lembrete a si.
— Gostaria disso, obrigada.
Lorde Wakely pegou o braço dela, e eles seguiram em direção em que seria servido o jantar antes que a outra metade do baile começasse. Ela posicionou a mão sobre o braço dele, e ele a segurou com firmeza com a mão livre, eliminando qualquer chance de ela escapar. Não que ela estivesse planejando ir a lugar algum.
Lizzie assimilou o traje fino e elegante dele, que em sua memória cobria um corpo bem definido e duro. As calças pretas de cetim e meias brancas acentuavam suas pernas. A jaqueta superfina, de cor azul escuro, com cauda, exaltava seus ombros fortes e consideráveis que eram capazes de levantá-la sem um momento de hesitação. E já haviam feito isso embaixo da escada da casa de Lady X antes que ele a colocasse contra a parede.
Ele olhou para ela e a manteve ali presa, ela lutou para se lembrar por que havia dito a ele que continuariam amigos até que sua sinceridade fosse comprovada.
Uma tosse discreta interrompeu Lizzie, e ela fez uma reverência quando a duquesa de Athelby parou diante deles, com um sorriso divertido nos lábios. A mãe de Sally estava ao lado de sua graça, as duas senhoras inspecionando Lorde Wakely de maneira inescrutável. As duas representavam influências formidáveis na sociedade e, nos últimos anos, Lizzie passou a confiar nos conselhos da duquesa sempre que precisava de uma opinião diferente.
— Sua Graça, Senhora Darwin, conhecem Lorde Wakely. Ele estava apenas me escoltando para o jantar. Gostariam de se juntar a nós? — ela ofereceu, não querendo que as duas damas pensassem mais dessa caminhada em conjunto do que já sabia estarem pensando.
Eles eram amigos, e assim permaneceriam. O fato de terem compartilhado um beijo apaixonado não significava absolutamente nada.
Ele fez uma pequena reverência com a cabeça, mas nunca se aventurou a tirar a mão da dela no braço. A duquesa lançou um olhar conhecedor ao toque, antes de erguer uma sobrancelha perfeitamente arrumada.
— Lizzie, estou tão feliz em vê-la hoje à noite. Já faz muito tempo. Espero que Lorde Wakely esteja sendo uma escolta atenciosa para jantar. Eu odiaria ouvir o contrário. — disse a duquesa, as palavras amigáveis, mas o tom era afiado como aço.
Lizzie afastou as preocupações da duquesa.
— Claro que ele é. Estávamos conversando sobre rissóis de lagosta dos DeVeres, que são os melhores e serão servidos neste jantar. E que devemos nos apressar para garantir que não ficaremos sem.
— Tenho certeza de que você não tem nada com que se preocupar. O jantar ainda não foi anunciado, então vocês estão adiantados.
A duquesa fez um movimento sem rumo com o leque que trazia nas mãos, e Lizzie desejou ter um, já que suas bochechas estavam com certeza quentes e ficando mais quentes a cada minuto. A Sra. Darwin voltou a atenção para Lorde Wakely, estreitando os olhos pensativa.
— Ouvi um boato dos mais estranhos sobre você, lorde Wakely. Que está prestes a se casar, e que seu tio já está atravessando o Atlântico enquanto falamos. Há algo que você queira nos contar? Gostaríamos muito de ser os primeiros a saber.
Hugo ficou tenso sob o toque de Lizzie, e não pela primeira vez ela se perguntou se ele estava de fato cortejando a Srta. Fox ao mesmo tempo que dava atenção à ela. Mas então, eles eram amigos. Talvez apenas gostasse da companhia dela, pois pareciam se dar muito bem quando estavam juntos. Ela não tinha nenhum direito a reivindicá-lo, embora soubesse que amaria tê-lo se ele se provasse merecedor.
— Não estou comprometido, nem há nenhum acordo. Apenas estou aproveitando a temporada. E estou ansioso pela visita do meu tio. Como você sabe, com a morte de meu pai, há doze meses, não me restou nenhum parente próximo na Inglaterra.
Lizzie sentiu uma pontada de tristeza ante a resposta de Sua Senhoria. Ela também havia perdido o pai e, por mais intrometida e irritante que sua mãe fosse, pelo menos ela ainda tinha um dos pais por perto. Lorde Wakely estava sozinho? Foi por isso que ele procurou a companhia de festas com as de Lady X, onde sabia que teria uma boa companhia tanto em público quanto em privado?
— Estou feliz por saber que se tio está vindo. — a duquesa disse com sinceridade. — Estamos ansiosas para conhecê-lo quando ele finalmente chegar.
A Sra. Darwin sorriu para Lorde Wakely antes de dizer:
— Sentimos sua falta na festa campestre de Lady Remmnick, mas, ao voltarmos a Londres, paramos em uma agradável pousada e achei que o vi trocando de cavalo. Você estava por perto?
Sua Senhoria lançou um olhar divertido para a Sra. Darwin, e Lizzie sentiu calor subir pelas bochechas.
— Eu estava participando de outra festa no interior, sim. Posso supor que o afastamento da agitação de Londres tenha sido bom para Sua Graça?
A atenção da duquesa alarmou Lizzie, e ela ergueu o queixo, não querendo parecer tão culpada quanto se sentia.
— Foi muito agradável. E a sua festa, meu senhor? — a duquesa perguntou, observando-os com tanta inquisição nos olhos, que Lizzie não pôde deixar de sentir que a duquesa sabia que algo estava sendo escondido dela.
— Foi muito esclarecedora e agradável, Sua Graça. — o aperto de Lorde Wakely na mão de Lizzie aumentou, e ela sentiu o calor que a assolava descer até seu núcleo. Ela engoliu em seco, lutando contra a necessidade de fugir, de fugir de todas essas perguntas. — Vamos encontrar uma mesa, Senhorita Doherty? — perguntou Sua Senhoria.
A duquesa e a Sra. Darwin se afastaram, e os dois seguiram em frente.
— Que sorte que acabamos na mesma festa. Gostou das festividades tanto quanto eu? Eu nunca perguntei antes. — suas palavras sussurradas fizeram cócegas na lateral do pescoço dela, lembrando-a dos beijos dele bem naquele ponto.
— Talvez eu tenha gostado. — ela respondeu sendo sincera.
De fato, os poucos momentos que passara nos braços de Lorde Wakely eram algo que nunca esqueceria. Mesmo agora, o desejo de ficar sozinha com ele, beijá-lo uma vez mais, tocá-lo e desfrutar de todas as nuances que compunham quem ele era, era quase impossível de ignorar.
O visconde riu, cobrindo o riso com uma tosse.
— Talvez? Você está tentando me dizer que minhas artimanhas de sedução possuem falhas? Nesse caso, é preciso remediar tal situação. Você só precisa dizer a palavra, e eu estarei à sua disposição.
Lizzie controlou suas feições para se mostrarem menos chocadas. Ela mordeu o lábio quando a sensação avassaladora de brincar com fogo e com um homem que era demasiado libertino tomou toda a vastidão de sua mente.
— Outra hora, talvez. Vejo que os rissóis de lagosta vão ser servidos hoje. Você mencionou antes que está desesperado por prová-los mais uma vez. — ela disse dissimulada.
Ele forçou uma parada e virou-se para olhá-la.
O ardor que ressoou da atenção dele a fez tremer. O que havia nele que provocava essas emoções maravilhosas, mas estranhas, que a bagunçavam por dentro? A mandíbula cinzelada, A tez de um tom de oliva perfeito, e os cabelos escuros faziam dele um dos patifes mais avassaladores da sociedade. E agora sua atenção estava fixada nela. Lizzie engoliu em seco, o olhar deslizando para os lábios dele.
— Não vou deixá-la se esquecer desta afirmativa, Srta. Doherty.
Ela assentiu, incapaz de fazer qualquer outra coisa.
Como alguém respondia tal declaração sem revelar o quanto ela queria que ele a cobrasse? E se ele não o fizesse, ela mesma daria um jeito de cumprir o subentendido. Pois uma coisa era certa: Ela beijaria Lorde Wakely outra vez, nem que fosse a última coisa que ela faria.
Capítulo Dez
Visitas vespertinas não eram algo que Lorde Wakely fazia. Jamais. E, no entanto, na tarde seguinte, Hugo se viu diante da casa de Lorde Leighton, prestes a ser conduzido para dentro de casa para participar de uma hora de discussões frívolas sobre nada de seu interesse particular, além da Srta. Doherty, que lhe interessava muito.
De alguma forma, depois do tempo que passaram juntos no interior, ela acordou uma parte dele que ele nunca imaginara existir. Ele era um visconde com uma reputação terrível. Se ele queria manter a fortuna que herdara, deveria estar batendo na porta da senhorita Fox neste exato momento e cortejando-a. Mas ele não conseguiu se forçar a fazê-lo. Havia algo entre ele e Lizzie, mais do que uma atração física, embora isso certamente estivesse lá também.
Ela o fazia rir, e conseguia ver graça nas mesmas situações que ele. Era uma alegria se divertir um pouco. A presença dela na festa da casa da Lady X era a prova disso, mas também, no dia em que eles jogaram bilhar, ela não agiu como a dama afetada que não conseguiria participar de um jogo que apenas homens costumavam participavam. Não só ela havia participado da competição, como mostrara-se uma jogadora excepcional e parecia encantadora debruçada sobre a mesa.
Lizzie tinha um objetivo para o futuro. Se isso incluía um marido, era uma incógnita, mas algo lhe dizia que ela seria perfeitamente capaz de viver a vida de uma solteirona e gostar bastante. A senhorita Fox nunca foi muito especial para ele, ela demonstrou tanto interesse nele quanto ele nela, e isso lhe fez reticente.
Lizzie mostrou a ele que poderia haver muito mais entre marido e mulher, o que uma sensação de lar, o que ele gostaria que seu casamento tivesse, que parecesse com os pares românticos de seus amigos. Ele precisava beijá-la novamente, mesmo que apenas uma vez, para saber se o desejo que nutria por ela era apenas uma emoção pontual ou se a cada vez que eles se beijassem, ele iria querer nada mais do que repetir.
Se o que ele suspeitava fosse verdade, e Lizzie se adequasse à sua natureza muito melhor do que a Srta. Fox, ele pediria ao seu tio que renunciasse à herança que deveria ser revertida para ele no final de julho. Com certeza o amor que o tio tinha pela irmã e pelo filho dela superaria sua necessidade de dinheiro.
Hugo bateu a aldrava na porta da frente que se abriu sem demora. Ele entrou, parou no foyer e entregou ao lacaio seu casaco e luvas. Um mordomo idoso deu um passo à frente e fez uma reverência.
— Lorde Wakely, se você tiver a gentileza de me seguir, a reunião está sendo realizada hoje na sala de estar da frente.
Hugo seguiu o ancião, preparando-se para uma série de suspiros e fofocas quando entrou na sala. O mordomo o anunciou, e Hugo parou logo depois do limiar quando um exército de olhos femininos assustados, bocas abertas e expressões divertidas encontraram sua pessoa. Ele entrou na sala, procurando a senhorita Doherty, e se encolheu por dentro ao ver a mãe dela sentada ao seu lado.
Quando ela voltou para a cidade?
Hugo fortaleceu sua determinação. Ele havia enfrentado piores desafios em sua vida; uma sala cheia de mulheres e uma mãe atormentada não era motivo para pavor.
A senhora Doherty se levantou e fez uma reverência.
— Lorde Wakely, seja bem-vindo. Por favor, venha se sentar conosco. — disse ela, gesticulando para uma cadeira vazia diante delas.
Hugo fez o que ela pediu, dando boas-vindas a uma xícara de chá que a Srta. Doherty lhe entregou, o pequeno sorriso de boas-vindas dela aquecendo o sangue dele.
— Estamos muito felizes que tenha decidido se juntar a nós esta tarde, não estamos, Lizzie? — a senhora Doherty disse, sentando-se e sorrindo para os dois.
Lizzie tomou um gole de chá.
— O senhor é muito bem-vindo, Lorde Wakely.
As boas-vindas dela foram bastante benignas, mas Hugo podia ouvir que ela realmente quis dizer suas palavras, que estava feliz em vê-lo. Um pequeno alarme em sua mente dizia que ele estava brincando com ela, criando falsas esperanças onde poderia não haver nenhuma, e ainda assim ele não conseguia ficar longe dela.
Ele nunca reagiu a ninguém da maneira que reagia à senhorita Doherty. Mesmo com as possíveis consequências, ele precisava ver se a química deles era uma invenção de sua imaginação ou algo que ele poderia discutir com o tio, suplicando que ele deixasse Hugo com os fundos que deveriam ser seus por direito, em todo caso. Se o tio permitisse que ele escolhesse uma esposa por quem Hugo nutrisse afeição, porém que não tivesse fortuna, ele se casaria com Lizzie antes do final do mês.
— Você gostou do baile ontem à noite, senhorita Doherty? Soube hoje de manhã que terminou depois do amanhecer.
Lizzie riu, e seus olhos brilharam com diversão.
— Gostei sim, meu senhor, e posso garantir, que como fui uma das últimas a deixar o entretenimento, realmente terminou quando o sol beijou o céu da manhã.
— Você não ficou, Lorde Wakely? — a senhora Doherty perguntou.
Hugo balançou a cabeça.
— Infelizmente não, eu era esperado em outro evento.
E não um que ele desejasse elaborar aqui e agora, ou nunca, se fosse honesto. Lady Leighton se aproximou e ficou atrás da cadeira de Lizzie, juntando-se à conversa deles.
— Você compareceu à festa da senhorita Fox, pelo que sei. — disse ela, as palavras tingidas com uma ponta de reprovação.
Hugo sorriu, tomando um gole de chá.
— Isso mesmo, e o evento estava superlotado. Não fiquei muito tempo. Apenas o tempo suficiente para dançar com a Srta. Fox e depois partir.
Lady Leighton o observou, e ele lutou para lembrar se ela estivera presente. Ela sabia que ele dançara com a Srta. Fox? Ele era um canalha por manter suas opções em aberto dessa maneira. Pânico o rasgou por dentro antes a possibilidade de que o que ele estava fazendo estava errado. Não apenas para Lizzie, mas também para a Srta. Fox, e ele não podia continuar nessa linha de mentiras. Se ele contasse a Lizzie sua situação, ela entenderia? Se ele pudesse afastá-la daqui, conversar com ela em particular.
— Se me derem licença. Minha amiga Sally acabou de chegar e preciso falar com ela.
Hugo ficou de pé quando Lizzie levantou e, curvando-se, observou-a deixá-lo com a mãe e a prima em casamento. Ele largou a xícara de chá, não desejando ficar se Lizzie estivesse ocupada em outro lugar.
— Está na hora de eu partir também. Obrigado pelo chá, senhora Doherty, Lady Leighton. Eu saio sozinho.
— Boa tarde, Lorde Wakely. — disse Sua senhoria, seu tom não era mais amistoso do que antes.
Hugo saiu e, quase na porta, encontrou Lorde Leighton parado pela escada.
— Hugo. — disse ele, aproximando-se e apertando a mão dele. — É bom vê-lo aqui. Venha, eu preciso falar com você. Podemos conversar na minha biblioteca.
— Claro.
Hugo o seguiu, imaginando se a atitude fria da esposa de seu amigo em relação a ele era o motivo para essa conversa repentina. Hamish fez um gesto para ele se sentar, e Hugo se acomodou. Felizmente, em vez de chá, Hamish serviu a ele um copo de conhaque antes de se sentar detrás da mesa.
— Não medirei minhas palavras, pois tenho certeza de que você está ciente do motivo pelo qual pedi para conversar com você hoje.
Hugo tomou um gole, não disposto a ceder com tanta facilidade, embora Hamish fosse um de seus amigos mais antigos, portanto não iria dissimular por demasiado tempo. Ele não perderia a amizade pela situação em que seu pai o colocara.
— Você já foi visto algumas vezes rodeando Lizzie, e sua vinda aqui hoje me faz pensar do que se trata seu súbito interesse. Você a está cortejando?
Hugo passou a mão pelos cabelos, procurando a melhor forma de se explicar.
— Com toda a honestidade, não sei por que estou aqui. E me desculpe se isso o ofende, não tenciono desrespeitá-lo, mas quando se trata da senhorita Doherty, não consigo me afastar. Mesmo que um casamento entre nós possa ser impossível.
O conde recostou-se na cadeira, o rosto estoico revelando pouco além de aborrecimento.
— E seria impossível por quê?
Hugo suspirou, odiando o pai mais do que nunca em sua vida, e havia muitas vezes que odiava o homem terrivelmente. Seu pai nunca passou tempo com ele quando criança. Sempre rígido em todas coisas, ele forçou Hugo a fazer o que fez. É claro que Hugo nunca se comportou como seu pai, se tornara uma espírito livre como a mãe, que havia morrido, tornara-se um rebelde. Tanto que seu pai venceu a batalha final e arrancou a herança dele em seu ato derradeiro, já na sepultura.
— Você sabe que meu tio está a caminho de Londres. Bem, todos na cidade acreditam que é para que ele possa comparecer ao meu casamento com a Srta. Fox, a quem dizem vou propor casamento muito em breve. Esse não é o caso. Ele vem para assumir o controle do dinheiro que minha mãe trouxe como dote no casamento com meu pai. A última facada de meu pai em mim foi estipular, em seu testamento, que eu deveria me casar em no máximo doze meses com uma herdeira, dona de um dote de no mínimo trinta mil libras. Caso contrário, o dinheiro será devolvido à família de minha mãe. Só tenho algumas semanas antes do prazo final e, como ainda não me casei, meu tio deve presumir que o casamento não ocorrerá, daí a chegada dele.
Lorde Leighton soltou um assobio, os olhos arregalados de choque.
Hugo assentiu.
— Então, veja bem, eu não deveria estar aqui, contudo não consigo ficar longe.
— Lizzie é minha prima e está sob minha responsabilidade sempre que a mãe sai da cidade. Katherine e eu nos importamos muito com ela, cuidamos dela como se fosse nossa própria filha. Você sabe que ela não tem dote e, portanto, não pode atender à cláusula do testamento de seu pai. — Lorde Leighton se levantou, contornando a mesa e pegando seu copo. Ele encheu os dois antes de lhe dar as costas. — Por mais que eu simpatize com sua situação, não posso permitir que você continue cortejando Lizzie, ou lhe dando qualquer esperança. Ela merece um casamento de amor e não a casarei com ninguém, nem mesmo você, meu amigo, se não houver carinho. Você pode ser como sempre foi: um amigo distante, agir como alguém da mesma esfera, mas não se aventure mais longe dessas regras. Eu ficaria muito descontente se você o fizesse.
O fio de aço na voz do amigo não deixava espaço para contrapontos. Hugo conseguia entender. Inferno, se ele estivesse na situação de Hamish agora, ele diria exatamente a mesma coisa. Mas o mero cogitar em se afastar de Lizzie e cortejar a Srta. Fox para entrar em um casamento de conveniência não era o que ele queria.
Não mais.
— Claro, farei o que você mandou. Permita-me um pouco de graça ao me afastar da senhorita Doherty. Ela é inocente em tudo isso, e se eu puder, tentarei limitar a mágoa que possa causar com a interrupção de meu interesse. A ideia de não estar perto dela deixou um vazio em seu interior.
— Claro. Eu não esperaria nada menos. Agora... — disse o conde, sorvendo o líquido em seu copo. — É melhor eu aparecer ao lado da minha esposa ou serei enviado para dormir na casa do cachorro.
Hugo levantou-se, colocando o copo de cristal sobre a mesa.
— Eu conheço a saída.
Ele saiu e subiu na carruagem que estava esperando na frente da casa. Era o mais correto a fazer. Lorde Leighton estava certo, e ele estivera errado ao se aproximar de Lizzie Doherty. Era um conforto frio saber que ele nunca mais a seguraria em seus braços.
Uma semana se passou, e Lizzie não ouvira nem vira nada de Lorde Wakely. Desde que ela o viu deixar a casa do primo com feições de quem havia sido pego por uma tempestade sem ter para onde ir. Katherine deixou escapar que o visconde falara com Hamish antes de partir, e não pela primeira vez se perguntou sobre o que seria aquela conversa.
Eles eram amigos, portanto poderia ter sido sobre qualquer coisa, mas algo a fazia suspeitar que seu nome esteve na conversa. E o que quer que o primo dela tenha dito fez com que Lorde Wakely saísse muito mais cabisbaixo do que quando ele chegou.
Esta noite ela estava no baile anual dos Duncannon. Do outro lado do salão, ela vislumbrou sua amiga Sally, que acenou e veio em sua direção, tecendo entre os que estavam no caminho.
— Lizzie, que prazer revê-la. Eu esperava que você estivesse aqui. As fofocas em Londres são sobre Lorde Wakely e sua ida repentina a reunião de Lady Leighton na semana passada. Ele saiu assim que cheguei. Quanto tempo ele ficou?
— Ouvi dizer que sou o mais novo alvo dele mas, na verdade, ele não ficou tempo suficiente para causar todo esse drama. E desde a partida dele, nunca mais o vimos. — disse Lizzie, esperando deixar de lado qualquer fofoca, embora pelos olhares curiosos que ela estava ganhando dos presentes esta noite, seu desejo não parecia estar se concretizando.
— Venha e sente-se, será mais confortável um pouco longe dessa multidão terrível. — Sally puxou-a em direção a duas cadeiras vagas e sentou-se, batendo na cadeira para Lizzie fazer o mesmo. — Ouvi dizer que o visconde veio falar com você e mais ninguém, e que depois foi visto entrando na biblioteca de Lorde Leighton. Você acha que ele foi pedir sua mão?
Sally apertou a mão da amiga, animada demais com a perspectiva de Lorde Wakely pedir que Lizzie se casasse com ele.
— Sally, preciso lhe contar uma coisa, mas você deve prometer não contar a vivalma. Jamais. Se você falar uma palavra do que estou prestes a contar, estarei arruinada na sociedade para sempre.
Os olhos de Sally se arregalaram e, por um momento, ela não disse uma palavra antes de cruzar os dedos.
— Eu nunca direi a ninguém. Não que eu precise prometer uma coisa dessas, pois nunca quebraria minha confiança com você, mas pode ter certeza de que prometo nunca contar a vivalma.
Satisfeita, Lizzie garantiu que estivessem sozinhas antes de contar à amiga tudo o que havia acontecido na propriedade de Lady X, como ela chegou lá e o que aconteceu nos dias seguintes. Nunca havia visto sua amiga sem palavras, mas parece que depois de ouvir todos os pequenos detalhes, Sally Darwin ficou totalmente muda.
— Diga alguma coisa, por favor, qualquer coisa. Seu silêncio me preocupa.
Sally soltou um suspiro antes de dizer:
— E agora que você voltou a Londres, o que seria isso que há entre vocês? Com certeza, ele a procura, mas você sabe que ele ainda está sendo visto na companhia da Srta. Fox? Não preciso lhe dizer que Lorde Wakely é conhecido dentro da sociedade como um libertino, que se aproveita e não é o mais confiável quando se trata do sexo feminino.
— Lorde Wakely e eu decidimos continuar amigos, e isso é tudo. Sou ciente da reputação dele, não se desespere, não sou cega. Especialmente ciente do fato de ele ter cortejado a Srta. Fox, e que foi bastante ardente antes do que aconteceu entre nós no interior. Fico me perguntando se ele precisa de fundos.
— Ele é rico, minha querida, então essa não pode ser a razão. Ele quer mais moedas para adicionar aos seus cofres, ou talvez ele tenha algum carinho por ela. — Sally franziu o cenho para os dançarinos e convidados que passavam por elas. — Ou há algo que não sabemos, e que ele não contou a ninguém. Dizem que o tio dele vem de Nova York. Talvez algo esteja acontecendo na família.
Lizzie não pôde deixar de rir de Sally e de sua imaginação rebelde. Ela sempre se mostrou bem criativa e via possibilidades de coisas em que Lizzie não via nenhuma.
— Seja o que for, não tenho dote e, embora meu primo seja intitulado, minha própria linhagem familiar não é. A menos que alguém se apaixone por mim, eu não vou me casar.
E quando alguém especial se apaixonasse por ela, só então descobririam o quão rica ela era. Caso contrário, ela compraria sua própria casa na cidade, pegaria qualquer gato vadio que precisasse de um lar e ficaria bastante feliz e contente com a situação.
— O que quer que tenha acontecido entre vocês, seja no campo ou agora na cidade, a única pergunta que deve se fazer é se você gosta dele o suficiente para tentar ajudá-lo. Trazer a atenção dele totalmente para você, para que ele esqueça a Srta. Fox e sua fortuna e a queira. Já aconteceu antes... pode acontecer novamente.
Lizzie duvidava que isso se tornasse verdade, mas a ideia chegou a passar por sua mente. Como ela gostaria que Lorde Wakely acordasse ao lado todas as manhãs, ser o centro de todos os afetos dele.
Ela suspirou.
— E se eu me jogar nele e mesmo assim ele se casar com a senhorita Fox? E aí? Bem, então ficaria provado que ela não serve para casar.
O risco de estar nos braços de Lorde Wakely novamente valia a pena?
Sally apertou a mão dela, ganhando sua atenção.
— Ninguém precisa saber que você optou por esse caminho. Não se você for cuidadosa. Lorde Wakely pode ser a outra metade da sua alma. Não acha que ver se isso é verdade vale o risco?
Lizzie não sabia o que fazer. Era uma aposta tão grande. Ela poderia encorajar Sua Senhoria a beijá-la de novo, tornarem-se mais do que o acordado, mais do que amigos? Lembrando-se dos dias que passaram na casa de Lady X e o reencontro, na carruagem com ela na cidade, algo dizia a ela que não seria muito difícil.
— Dizem que ele virá esta noite. A oportunidade perfeita para colocar seu plano em ação.
— Seu plano. — disse Lizzie, sorrindo. Esperança cresceu dentro dela, e emoção vibrou em suas veias ao pensar em revê-lo. — Quer saber, Sally? Acho que deixarei a cautela de lado e verei o que pode acontecer. Estou cansada de ficar sentada esperando meu verdadeiro amor me encontrar. Talvez ele precise de uma ajudinha. Um pequeno empurrão.
Sally assentiu.
— Concordo. E se não me engano, sua missão acabou de entrar.
Lizzie mordeu o lábio, olhando para as portas do salão.
Lorde Wakely estava parado no limiar, cumprimentando os anfitriões, e tudo o que ela podia fazer era apreciar sua beleza gloriosa. Sua aparência sombria e perversa, sua altura impressionante e seu traje de noite imaculado. Ela sentiu o estômago revirar de animação. Uma coisa era beijar um homem atrás de uma máscara, pensando que ninguém a reconheceria, mas outra era beijá-lo sem qualquer defesa. Mas se significava que ela beijaria Lorde Wakely e talvez descobrisse que ele era o homem perfeito para ela, ela o faria. Era um sacrifício agradável que ela estava disposta a cometer, e esta noite mesmo talvez.
Hugo examinou o salão de baile dos Duncannon e avistou a causa única de sua atenção e ruína, sentada ao lado da melhor amiga. As duas mulheres pareciam estar gostando do baile, mas a conversa parecia mantê-las alheias a todos os outros e, se ele fosse arriscar, parecia um assunto meio secreto.
Hugo se viu sorrindo e caminhando determinado pelo salão. Ele foi na direção de Lizzie, queria revê-la, não importava que apenas alguns dias antes ele tivesse prometido a Hamish que ficaria longe. Mas esta noite Lorde Leighton estava em outro baile e, portanto, não saberia que Hugo estava prestes a pedir sua prima para dançar com ele. Ele fez uma reverência diante de Lizzie e da Srta. Darwin, e as duas se levantaram e retribuíram o cumprimento.
— Boa noite, senhorita Doherty, senhorita Darwin. Pensei em convidar a Srta. Doherty para dançar. A próxima dança é uma valsa.
Hugo estendeu a mão, esperando Lizzie pegá-la.
Ela olhou por um tempo, os olhos arregalados, antes de colocar a mão na dele, permitindo que ele a guiasse até o centro do salão. O local estava bem cheio e, em vez de sair para dançar, ele levou Lizzie em direção às portas do terraço. Com tantos presentes, pouquíssimos prestaram atenção na direção que estavam seguindo.
Antes que alguém pudesse notar, ele levou a srta. Doherty para fora, para passear pelo pátio de ladrilhos. O ar da noite estava quente, e ao longe os sons de Londres e sua vida ecoavam pela noite. Outros casais também passeavam, e Hugo levou Lizzie para longe deles para garantir a privacidade.
— Não vejo você há alguns dias e peço desculpas por isso. Meu tempo não foi meu com a chegada prevista do meu tio em algum momento nos próximos dias. Há outras coisas que tomaram meu tempo, mas precisava revê-la.
Como ele desejava poder contar o porquê de não poder estar diante dela, já que a desejava tanto. Ele lutou para não levantar a mão e afastar um pequeno fio de cabelo encostado na bochecha. Ele queria tocá-la, beijá-la, torná-la dele.
— A temporada o deixou ocupado, não precisa me explicar nada.
Ela deu alguns passos para longe e estudou o jardim sombreado diante deles. Um pássaro murmurou no escuro, e um pequeno sorriso levantou os lábios dele.
Como ela era linda.
Como ele nunca havia reparado? Se ele não estivesse tão envolvido em satisfazer seus próprios prazeres, poderia ter feito de Lizzie sua esposa anos atrás, e seu pai nunca teria feito o que fez.
— Eu quero beijar você. — ele deixou escapar, incapaz de impedir as próprias palavras. Mas ele não queria impedir.
Eram a verdade. Ele a queria e, assim que seu tio chegasse, imploraria que ele ignorasse a vontade de seu pai, que permitisse que Hugo mantivesse a herança e se casasse com a senhorita Doherty, que não tinha um centavo em seu nome. Ela não se virou para olhá-lo e a forte determinação dela o fez a adorar ainda mais.
— Eu também quero beijar você. De fato, pensei em pouco além desse desejo desde que deixei a festa campestre.
As palavras dela foram como um golpe físico, e ele se aproximou, deslizando a mão pela balaustrada até o ponto em que eles quase se tocaram. No momento em que seu dedo tocou o dela, disparou um raio de saudade tão forte e feroz que ameaçou derrubá-lo.
Hugo olhou para trás e notou que havia menos casais do que antes, mas as portas do terraço continuavam abertas e centenas de pessoas estavam a poucos metros de onde os dois estavam. Qualquer um poderia sair, a qualquer momento e, no entanto, ele precisava sentir o gosto dela. Seu corpo impedia que muitos convidados vissem Lizzie. Talvez um beijo casto fosse possível, se os dois desejassem.
— Beije-me. — ele disse ao colocar a mão em cima da dela, unindo seus dedos. — Ninguém vai ver.
Lizzie olhou para trás e então, quando ele pensou que ela havia pensado melhor, ela se inclinou e em silêncio e rapidez, o beijou. O toque casto de seus lábios não era suficiente, e ele tentou aprofundar o abraço, mas ela se afastou, novamente verificando se alguém via. A falta de gritos apontando o escândalo disse a Hugo que ninguém havia testemunhado a troca de afeto.
— Diga-me algo, qualquer coisa, para me impedir de arruinar a nós dois e tomá-la em meus braços na frente de toda a Sociedade. — Hugo se endireitou, os braços atrás das costas.
— O que você gostaria de saber? — ela perguntou, inclinando a cabeça para o lado.
— Tudo o que eu ainda não sei.
Ela se virou e encostou-se na balaustrada, observando-o.
— Bem... eu estou me tornando uma solteirona, mas você já sabe disso. Tenho vinte e três anos e muito pouco a oferecer além de mim mesma. Gosto de andar a cavalo e viajar, e sou voluntária na Sociedade de Socorro de Londres junto à Duquesa de Athelby e seu grupo. Não tenho irmãos, e minha mãe é controladora e agressiva. Não que eu deva falar sobre um genitor dessa maneira, mas é verdade. Eu amo gatos e tolero cães.
Hugo deu uma risada.
— Como pode apenas tolerar cães? Eles são os melhores companheiros. Eles nunca julgam e dão amor incondicional.
— Hm. — ela encolheu os ombros. — Mas são demasiado carentes. Sempre querem carinho e reafirmação de que são um bom menino ou menina. Enquanto os gatos, bem, são independentes, fortes, obstinados e não se importam com o que os demais pensem. Suponho que me esforço para ser muito semelhante à espécie. Não quero mais me importar com o que alguém pensa de mim.
— Sério? — Hugo ergueu as sobrancelhas. — Verdade? Alguns, se souberem que estamos do lado de fora tendo uma conversa indiscreta, teriam muito a dizer sobre você. Na verdade, é bem capaz de que terminasse sendo citada na teia de fofocas que alimentarão a sociedade na próxima semana.
— Estou disposta a arriscar tudo, se significar que eu conseguirei o que quero. — ela encontrou o olhar dele, e a determinação sombria naquelas esferas azuis ferveu o sangue dele.
Ela queria dizer ele? Ela queria lutar por ele?
As palavras dela reforçaram sua determinação em implorar ao tio que desistisse do dinheiro de sua mãe para que ele pudesse se casar com ela. A ideia de começar uma vida com uma mulher que não apenas estimulava sua mente, mas seu corpo acalmava sua alma.
— Meus cavalos precisam de uma boa corrida. Vou levá-los para um passeio amanhã, passarei algumas horas no interior para exercitá-los. Você gostaria de me acompanhar?
— Somente nós dois? — ela perguntou.
Ele assentiu.
— Se sua mãe permitir.
— Não há impedimentos se você tiver um condutor e um cavalariço nos acompanhando. Mamãe aprovará esse passeio.
— Às onze então. — disse ele, observando enquanto ela se afastava da balaustrada e voltava para o salão de baile. Ele acompanhou o progresso dela, gostando do que viu. No dia seguinte, ele a teria sozinha por algumas horas, e poderiam conversar com liberdade, talvez continuar o delicioso beijo que os unira desde o início.
Capítulo Onze
Lizzie acordou assustada e, ao levantar-se, pulou da cama. Já era a manhã da viagem ao interior com Lorde Wakely, e ela mal podia esperar para vê-lo novamente.
Na noite anterior, depois de beijá-lo, por mais casto que o ato tenha sido, ela se viu desejosa de mais, e percebeu que não estava disposta a permitir que a Sua Senhoria se casasse com mais ninguém além dela. A sensação incontrolável de flutuar sempre que ela estava próximo dele, o desejo de ver seus olhos escurecerem de desejo, era algo que ela não estava disposta a perder. Não para uma Srta. Fox e suas milhares de libras, de qualquer forma. Aquela mulher podia se casar com quem quisesse, e para Lizzie não era nada agradável que ela se casasse com Lorde Wakely.
Na hora marcada, ela caminhou pelo corredor da casa de Lorde Leighton, atenta à chegada do Gig de Sua Senhoria. Na hora certa, o condutor dele, acompanhado de um cavalariço parou diante dos degraus com quatro cavalos emparelhados. A carruagem gig não era um veículo comum, lembrava uma caleche semiaberta de quatro cavalos.
Depois de ajudá-la a subir, ele lhe deu um pequeno cobertor para colocar sobre as pernas dela, e logo eles estavam saindo de Londres pela grande estrada norte. Se eles continuassem na estrada, poderiam viajar até Gretna Green.
Que aventura deliciosa seria essa!
— Você está bem, Lizzie? — ele perguntou com um pequeno sorriso.
Ela estendeu a mão para segurar o chapéu.
— Estou muito bem, obrigada. Também estou muito animada com o nosso passeio hoje. Obrigado por me convidar.
— Eu que agradeço. — afirmou ele, encontrando os olhos dela.
— Então, para onde estamos indo hoje? Existe um plano?
No banco oposto a eles, havia uma cesta, e ela esperava que fizessem um piquenique. Que maravilhoso se ele tivesse pensado em fazer uma coisa dessas. Ela nunca foi a um piquenique com um cavalheiro.
— Vamos dirigir um pouco, para que eu veja como meu par usual de cavalos se comporta sob a orientação do outro, e se encontrarmos um bom lugar para parar, faremos um piquenique. Espero que você não seja avessa a comer ao ar livre.
Lizzie balançou a cabeça.
— Pelo contrário, adoro fazer coisas assim. — ela observou por um tempo, antes de dizer: — Você está ansioso com a chegada de seu tio? Você disse que ele deveria chegar a qualquer dia.
Ele não respondeu a princípio, mas manteve a atenção no cenário. Então ele disse:
— Com toda a verdade, a chegada do meu tio não é uma perspectiva feliz. Ele está aqui para me arruinar, preciso ser sincero com você.
Lizzie ofegou, não esperando tal resposta. Ele realmente quis dizer o que ela acha que ele disse? Seu tio estava vindo para arruiná-lo? O que isso significava?
— Eu não entendo, meu senhor. Por que ele desejaria fazer isso? Ele não era o único irmão de sua mãe?
Lorde Wakely suspirou, esfregando a mandíbula, que Lizzie notou ter uma leve sombra de barba por fazer. A mão dela coçava ao senti-lo, para ver se iria pinicar sua palma, mas não o fez. Primeiro, ela queria saber o que estava acontecendo.
— Ele é tudo o que me resta da família, mas não é culpa dele que ele queira me arruinar. — Sua Senhoria se interrompeu por um momento, a linha entre sua sobrancelha profunda e franzida. — Meu pai, como você deve se lembrar, faleceu há menos de doze meses. Quando vivo, não era segredo na sociedade que discordávamos sobre muitas coisas, uma das quais era o meu estilo de vida. Eu não era o mais bem comportado dos cavalheiros de Londres.
Ele o olhou meio perdido, e Lizzie riu, já que ela mesma havia presenciado situações que levariam a tais discussões. Ela também adorava observar Lorde Wakely de longe enquanto ele desfrutava ao máximo sua vida, muitas vezes sonhando que ela era a escolhida, a presa a ser seduzida e alvo de seu flerte.
— Eu ouvi algumas de suas estripulias.
Ele se virou e sorriu para ela antes de olhar de volta para o condutor que manobrava a carruagem para o lado da estrada para permitir que uma diligência postal passasse na direção oposta. O condutor deles gritou uma saudação ao colega e depois se afastou no centro da estrada.
— O que eu não sabia era que meu pai me daria um último golpe, do túmulo. Ele determinou em seu testamento que eu deveria me casar dentro de doze meses após sua morte, com uma herdeira que venha com um mínimo de trinta mil libras. Caso contrário, o dinheiro que minha mãe trouxe para a família após o casamento seria devolvido para o irmão dela que vive em Nova York. E, como você pode ver... — disse Sua Senhoria, gesticulando para si. — não me casei ainda e meu tempo está quase acabando, daí a chegada iminente do meu tio.
De todas as histórias que Lizzie já ouvira, ela não esperava essa. Lorde Wakely não teria um tostão a menos que se casasse com uma herdeira, e no entanto, continuaria a ter dificuldade em manter seu estilo de vida atual sem vender algumas de suas propriedades. Bem, pelo menos, explicava por que ele cortejara a Srta. Fox nos últimos meses, mesmo que esporadicamente. E por que ele estava relutante com ela, apenas disposto a permanecer seu amigo e nada mais.
Deve haver muitas pessoas dependentes de Lorde Wakely para viver, não apenas os criados que trabalhavam em suas casas, mas também aqueles que trabalhavam em suas terras. A perda do dinheiro de sua mãe seria devastadora para muitos. No entanto, Lizzie era uma herdeira, não uma pobretona sem um tostão. Mas Lorde Wakely não conhecia o segredo dela, então caso ele a escolhesse à luz de sua situação atual, só poderia significar uma coisa. Ele se importava com ela. E bastante.
— Então, por que estamos juntos nesse passeio, Lorde Wakely? Você não deveria estar com a Srta. Fox? Afinal, ela atende ao último desejo de seu pai. — Lizzie manteve os olhos na estrada, imaginando o que ele diria em resposta a sua alfinetada.
— Eu deveria. Sim, é verdade, mas não estou; e há uma razão simples para que seja assim.
Com isso, ela não conseguiu continuar olhando para longe. Olhando para cima, ela encontrou as orbes cinzentas de Hugo e se perdeu em suas profundezas.
— E qual seria?
— Eu não quero a senhorita Fox.
As palavras dele a abalaram, e ela apertou o assento para se firmar no momento em que uma grande gota de chuva caiu e se espalhou em sua bochecha. A pequena gota solitária foi logo seguida por um dilúvio.
— Ó meu Deus, Lorde Wakely, está chovendo.
Lizzie riu, pois logo estavam encharcados, os cabelos dela, perfeitamente penteados agora caídos sobre os ombros, seu vestido de musselina azul claro encharcado e agarrado a ela como uma segunda pele. O motorista parou embaixo de algumas árvores, e Lorde Wakely pediu ao cavalariço que o ajudasse com o capô dobrável da carruagem. Ele xingou quando a coisa maldita não se mexeu.
— Está preso. — disse ele, procurando outro abrigo.
Lizzie segurou o xale sobre a cabeça, que também logo ficou encharcado e sem utilidade.
— Lá. — ele gritou através da chuva. — Eu vejo um celeiro. — Lorde Wakely virou-se para o condutor e para o cavalariço enquanto abria a porta da carruagem. — Vou levar a senhorita Doherty até o celeiro para se abrigar da tempestade.
— Sim, senhor. — disse o condutor com um leve aceno.
O celeiro era um grande edifício de madeira com duas portas duplas de correr na frente. Lá dentro, havia pilhas de feno da safra do ano passado. Alguns pombos voaram quando ela entrou, mas fora isso, o espaço estava livre de animais.
Lorde Wakely se juntou a ela, tirando o casaco e pendurando-o em um prego que encontrou na parede.
— Ficaremos aqui até a chuva passar e depois voltarei para a cidade. Sua mãe não ficará satisfeita por você voltar toda molhada.
Ele fechou as portas, fechando-os no espaço seco.
Lizzie riu.
— Molhada? Estou encharcada até os ossos. — ela foi até onde o feno estava empilhado, tirou as botinas e meias e as colocou para secar. — A tempestade deve ter vindo do sul. Não vi nenhum indicativo de que estava vindo.
— Não. — disse ele, sentando-se ao lado dela, aproveitando a oportunidade para tirar as botas e as meias também. — Você vai me chamar de Hugo como antes, quando estivermos a sós? Acho bem melhor que Senhor ou Lorde Wakely.
Apesar de gelada, ela sentiu o corpo todo esquentar com o pedido dele.
— Eu gostaria disso. Você pode me chamar de Lizzie.
Ele estendeu a mão e puxou um pedaço de feno do cabelo dela, jogando-o fora. Seus olhares se fixaram, e não importa o quanto ela tentasse, Lizzie não conseguia desviar o olhar. Ao contrário da primeira vez que eles se beijaram, o avanço deste pareceu excruciante e lento.
Hugo se inclinou e, tomando-a pela mandíbula, a beijou. Os lábios dele eram macios e, embora estivessem frios pela chuva lá fora, um toque apenas varreu qualquer traço de frio. Lizzie se ajoelhou, passando as mãos pelos ombros dele para abraçá-lo envolvendo as costas. Ela o beijou de volta com tudo o que tinha, mostrando a ele, com um toque, que ela era o complemento dele em todos os sentidos.
Ele aprofundou o beijo, e Lizzie correspondeu a seu desejo. Como ela desejou estar com ele assim de novo, noite após noite ela ficou acordada com imagens de estar em seus braços, com a boca quente e apaixonada contra a dela.
A pele dela esquentou, as roupas úmidas já esquecidas quando as mãos dele deslizaram por suas costas.
— Toque-me. — ela ofegou através do beijo.
Ele a puxou com força contra ele e, ainda se beijando, eles caíram no feno. Hugo estava deitado ao lado dela, com a mão correndo sobre a cintura e para baixo sobre o quadril, deslizando para agarrar seu bumbum.
Lizzie ofegou quando ele levantou a perna dela e a colocou sobre a dele, colocando-o muito perto de seu núcleo dolorido. Querendo senti-lo, todo ele, ela se aproximou e a linha dura de seu desejo pressionou contra seu abdômen, tão sólida e grande que ela não pôde deixar de se perguntar como tudo isso funcionava. Queria saber com um desespero que correspondia ao seu desejo.
Ele apertou a mão dela e a levou para baixo, colocando-a sobre ele, seus olhos escuros e enevoados a observando. A necessidade que a percorria era viciante, e naquele exato momento Lizzie entendeu o que Lorde Wakely era para ela. Somente com ele ela confiava o suficiente para tais beijos, toques. Nunca ela havia reagido a qualquer cavalheiro da maneira que reagia a ele.
— Toque-me também. — ele implorou com a voz rouca de necessidade.
Ela fez o que ele pediu, pegando seu membro duro através do tecido das calças e sentindo seu comprimento. Ele se empurrou contra a mão dela, gemendo contra seus lábios enquanto a beijava com uma ferocidade que a deixou sem fôlego.
— Você gosta disso, meu senhor?
Ele rosnou, mordiscando o lábio dela.
— Você pode ver que sim.
Ela sentiu calor se acumular entre suas pernas e, seguindo o exemplo dele, ela apertou o braço dele que segurava a perna dela e a pressionou contra seu ponto mais privado. Um lugar que ninguém além dele poderia tocar. Ela sentia dor por causa da necessidade dele, de acariciar e deslizar a mão dele, de ele dar-lhe prazer como fez na festa de Lady X.
Ele subiu o vestido dela, juntando-o acima da barriga dela e, sem hesitar, sem cautela, pôs a mão contra seu sexo. Lizzie fechou os olhos quando um prazer insuportável a percorreu. Ele acariciou sua carne, provocando-a com um toque hesitante que não era suficiente. Ela precisava de mais, algo que ela não compreendia.
— Toque-me como você fez na festa, Hugo. — ela passou a mão sobre o membro dele, apertando um pouco, e ele ofegou. — Faça-me sentir o que me mostrou antes.
— Eu quero você. Eu quero tanto você. — ele disse, deslizando a mão entre as dobras molhadas dela, circulando o polegar em um ponto que fez o sangue dela se transformar em lava derretida.
Ela gemeu, beijando-o, intensificando o próprio toque nele. Ela se afastou para olhar para as calças dele, então, arrancando os botões que os separavam, alcançou e tocou o membro dele. A pele era tão macia, como veludo, e ele era dela. Por inteiro. Dela. Uma quantidade ínfima de líquido se acumulou na ponta do falo dele, e ela o limpou com o polegar.
Os dedos dele ondularam contra seu núcleo e ela gemeu, querendo mais. A pele queimava sob o vestido molhado. Seus seios doíam, sua respiração tornou-se hesitante enquanto ele continuava a provocá-la.
— Isso não é suficiente. — ele ofegou, empurrando-a de costas e ajoelhando-se entre as pernas dela.
Lizzie lambeu os lábios, querendo-o com uma necessidade que a assustava. Ela não queria pensar no fato de que poderia perdê-lo se ele decidisse que o dinheiro era mais importante que seus sentimentos, e ainda assim ela não poderia afastá-lo.
— Eu não vou arruiná-la. Eu prometo. Apenas confie em mim.
Lizzie observou quando ele empurrou as calças para baixo. Sua masculinidade sobressaiu, longa e grossa, e ela engoliu em seco. Uma parte dela queria fugir, fugir de tal visão, e outra parte dela não queria nada além de descobrir o que ele faria a partir dali.
Ele desceu sobre ela, colocando-se contra sua carne, e então deslizou, fazendo com que estrelas se formassem diante dos olhos dela. A pequena gota de umidade que ela sentiu antes se misturou com seu próprio desejo, jogando os dois em direção ao clímax que ela desejava sentir novamente.
Como isso era tão agradável? Ela abriu bem as pernas e, envolvendo os braços nos ombros dele, beijou-o profundamente. Ele gemeu, e querendo mais ela empurrou contra ele, ondulando e buscando sua gratificação.
— Ah, sim, Hugo. — ela ofegou quando espasmos de prazer percorreram seu núcleo e todo o corpo.
A cada empurrão contra sua carne, outra onda de satisfação passava por ela, e ela gemia. O beijo ficou escaldante, e Lizzie não se esquivou de seu estado frenético. Ela queria que ele fosse louco por ela, que a quisesse tanto quanto ela sempre o quis. Ele ofegou, chamando o nome dela quando calor atravessou sua barriga.
Eles ficaram juntos no feno por algum tempo, com a respiração ofegante enquanto tentavam recuperar o equilíbrio. Hugo se deixou cair ao lado dela e depois de um tempo tirou um lenço, limpando o sêmen. Ele puxou o tecido do vestido, ajeitando-o sobre as pernas dela.
— É oficial, agora sou um canalha de marca maior.
Sua voz não tinha divertimento. Lizzie virou-se para ele, observando seu perfil enquanto olhava para o telhado do celeiro.
— Não sei nada quanto a isso. Não houve nada de ruim no que acabamos de fazer. Se muito, me faz querer fazer de novo.
Até para os próprios ouvidos a voz dela soava sonolenta e satisfeita. E ela estava as duas coisas, não queria nada além de se aconchegar ao lado dele, acalmar a respiração e dormir.
Ele fechou os olhos.
— Por favor, perdoe-me, Lizzie. Eu nunca deveria ter feito isso com você.
Pensar nele fazendo isso com mais alguém a irritou, e ela o puxou para olhá-la.
— Eu não sou uma criança, Hugo. Posso ser inexperiente, mas não sou tão ingênua para não saber o que fizemos foi algo normal e agradável que muitos casais fazem. Embora eu saiba que não somos um casal, e que permiti privilégios que significam ruína aos olhos da sociedade. Você não me arruinou. Não há risco. Então, por favor, não estrague o que aconteceu entre nós, porque se acha que estou chateada ou me sinto violada de alguma forma, não estou.
— Eu sei que você não é ingênua, mas não quero magoá-la. — ele se inclinou e a beijou. — Não posso prometer nada a você no momento e, portanto, não deveria ter tocado um fio de cabelo em seu corpo.
— E ainda assim, estou muito feliz que tenha feito. — Lizzie sorriu, agarrando-o pelo queixo e passando a mão pela barba crescendo. — Você nunca me disse o que faria quando seu tio chegar. Você vai falar com ele sobre o testamento?
— Vou. — disse ele, pegando a mão dela e enchendo a palma com beijos. — Vou pedir a ele que reconsidere o recebimento dos fundos que permita deixá-los onde estão, de modo que eu possa me casar com quem eu escolher.
— Acha que ele vai concordar?
E se não concordar, o que isso significava para ela? Com pouquíssimas palavras, ela poderia aliviar Hugo de todos os seus problemas, especialmente porque parecia que ele queria a ela, e não a Srta. Fox. As palavras pairaram na ponta da língua, quase dizendo que ela era uma herdeira, que se ele se casasse com ela todos os problemas financeiros dele seriam história, mas não o fez.
Contar a Hugo seu segredo seria quebrar uma promessa feita a Lorde Leighton, seu primo e, antes de mais nada, o homem que permitiria que seu futuro fosse tão seguro. Ele a fez prometer não deixar ninguém saber de sua mudança de sorte. Ele queria garantir que, caso ela se casasse, o homem fosse digno e apaixonado.
Mas não foi só por causa do primo que Lizzie permaneceu quieta. O casamento de seus pais não foi feliz, muitas vezes atormentado por discussões frequentes e aversão espontânea. Se ela se casasse com Lorde Wakely depois de contar sobre a herança, como ela realmente saberia que ele se casou com ela porque a amava e não porque ela era mais atrativa do que a Srta. Fox?
A escolha dele não era fácil, e ela desejou poder ajudá-lo, mas essa era uma decisão que ele teria que tomar por conta própria.
— Isso eu não posso dizer, mas por Deus eu espero que ele me atenda. Eu não aguentaria...
Perder você.
Ele não precisava terminar o que estava dizendo para Lizzie ouvir as palavras não ditas. Não era pedir muito, e se estivesse escrito que eles ficariam juntos, ela precisava ser paciente e esperar, permitir que Lorde Wakely percebesse que uma vida sem amor não era vida. Não se podia comprar a felicidade e, como a autora de Razão e Sensibilidade a aconselhou, a felicidade de uma caderneta de poupança não deve superar a felicidade do coração.
Capítulo Doze
Hugo estava sentado em um lado da mesa da J. Smith & Filhos, ouvindo a leitura final do testamento de seu pai ser lida para ele mais uma vez. Hoje na presença de seu tio, seu único parente vivo remanescente. Não que o homem se importasse com sentimentos; ele foi frio desde o momento em que chegou, e isso não era um bom presságio para a estratégia de Hugo.
Na aparência, seu tio era a versão masculina de sua mãe, o que fazia com que ele sentisse certa nostalgia. Sem mencionar que ela ficaria horrorizada que o marido tivesse feito tal coisa com o único filho deles. Depois de hoje, caso seu tio não recusasse a herança, Hugo teria muito pouco para viver ou manter suas três propriedades em funcionamento. Seu pai não refletiu sobre as consequências de seu golpe final? Ser tão imprudente com a vida de seus inquilinos e funcionários era repreensível.
Hugo balançou a cabeça enquanto a cláusula que o ordenava a se casar com uma herdeira era lida em voz alta. Ele deveria ter se casado assim que ouviu o testamento quase um ano atrás. Se tivesse feito isso, ele não estaria sentado aqui hoje, à beira de perder tudo, exceto seu título. Seu pai poderia ter estipulado que ele se casasse, mas Hugo havia desperdiçado o ano passado com imprudência e diversão sem fim. Era tanto culpa dele quanto de qualquer outra pessoa.
O Sr. Thompson tirou seu pincenê e o colocou na mesa de mogno.
— Agora que ouviram o testamento e as estipulações, podemos prosseguir.
O tio de Hugo recostou-se na cadeira, juntando os dedos.
— Sinto muito que seu pai tenha colocado você nessa posição, Hugo, sinto mesmo. Mas sua família do outro lado do Atlântico também precisa desesperadamente de dinheiro. Eu pensei que você já teria se casado e minha viagem até aqui não seria necessária, mas não posso negar que estou feliz por você não ter se casado. Cumprirei a cláusula e reivindicarei o dinheiro que Elizabeth trouxe como dote para o casamento com seu pai.
O golpe foi como um rápido cruzado no nariz. Ele lutou para não vomitar ali mesmo ante a percepção do que estava prestes a acontecer.
— Tio, por favor. Há muitos que trabalham em minhas propriedades, como criados e arrendatários, e suas famílias. Se você acatar que a cláusula de meu pai, se você a cumprir, meu sofrimento não será nada comparado ao deles. Eles vão perder tudo.
Seu tio cortou a ponta do charuto e acendeu, soltando grandes baforadas de fumaça, e encolheu os ombros.
— E sinto muito por eles, mas devo pensar na minha família e nas pessoas que trabalham para mim.
— Podemos chegar a um meio-termo? — sugeriu o Sr. Thompson. — Receber apenas metade dos fundos para que Lorde Wakely possa continuar administrando as propriedades?
— Não. — disse o tio, balançando a cabeça. — Não estou disposto a me comprometer. Sinto muito, Hugo, mas você teve doze meses. Seu pai me escreveu explicando o que havia feito e, embora não seja justo, seu estilo de vida tem sido frívolo, para dizer o mínimo. Um ponto provado mais uma vez pelo fato de você ter tido quase um ano para se casar e anular esta cláusula e não o ter feito ainda. Você já encontrou uma mulher de quem gostaria como esposa? Chegou ao menos a procurar?
Hugo recostou-se na cadeira. Ele sentiu seu humor oscilar e respirou fundo algumas vezes para se acalmar.
— Acho que você está se esquecendo da cláusula de que eu só posso me casar com uma herdeira.
— Não há muitas dessas na cidade? — seu tio apagou o charuto. — Tenho certeza de que você pode se casar com uma garota que esteja atrás de uma coroa e pode oferecer riqueza em troca.
A imagem da Srta. Fox veio à mente, a mulher que poderia fazer exatamente isso. Tal pensamento deixou Hugo frio. Ele não queria a senhorita Fox. Na verdade, ele não queria se casar com uma mulher apenas por ela ter dinheiro.
— É claro que existem mulheres na cidade assim.
Mas ele não queria nenhuma delas. Inferno, ele se resignara a fazer exatamente isso para poder salvar seus inquilinos e funcionários, um nobre sacrifício, mas depois que beijou Lizzie Doherty, e ela abriu os olhos dele para o sacrifício que suas ações requeriam. Ele queria se casar com uma mulher gentil, apaixonada e carinhosa. Uma com quem ele poderia conversar e rir livremente. Alguém com quem ele pudesse se unir a nível pessoal.
Ele a queria.
O tio dele se levantou.
— Sinto muito, meu garoto, eu sei que você queria que a reunião de hoje fosse de uma maneira diferente, mas infelizmente não. Não vou mudar de ideia, por isso sugiro que se case com uma rica debutante mais cedo ou mais tarde, pois você só tem uma semana antes de reivindicar o dinheiro. Se precisar de alguma coisa, vou ficar no Grand Hotel em Covent Garden até o primeiro dia do mês, quando embarco de volta para casa. Hugo observou-o partir e levar todas as suas esperanças junto com ele.
— Bem, isso põe fim à conversa. — disse Thompson, o olhar de seu advogado repleto de pena, o que o fez odiar o homem. — Sinto muito, Lorde Wakely. Eu sei que não era isso que você queria ouvir.
— Não, não era. — ele passou a mão na mandíbula.
O que ele faria? Como administraria as propriedades sem dinheiro suficiente? Sem fundos, seria impossível manter as propriedades e sustentar os inquilinos e funcionários. E como as casas eram vinculadas ao título, ele não poderia vendê-las. Com o tempo, simplesmente apodreceriam.
— Posso ser ousado, e perguntar se você considerou alguma herdeira? Um casamento pode ser organizado em menos de uma semana, se necessário. Pode vencer seu tio e manter o dinheiro cumprindo a demanda de seu pai.
— Ao me casar com uma herdeira, perderei a mulher a quem amo. Uma mulher que merece muito mais do que eu dei.
Ele marcou de se encontrar com Lizzie amanhã, e só de pensar em contar a ela o resultado da reunião de hoje deixava um gosto desagradável em sua boca. Embora eles não tivessem falado em casamento, o carinho que ele sentia por ela, as dicas que ele dera a ela, sem dúvida a alertaram de que ele queria mais. E agora ele não podia dar nada a ela, pois estava arruinado. Ela merecia muito mais que ele.
Hugo levantou-se, pegou as luvas e a bengala de um funcionário que o esperava.
— Obrigado por sua ajuda hoje, Sr. Thompson. Eu conheço a saída.
Ele saiu e, chegando à rua, ficou um momento no sol quente da tarde. Ainda assim, ele estava gelado. O que ele faria? Poderia colocar Lizzie na frente de todos que confiavam nele para sobreviver? Ela se casaria com ele sabendo tudo o que ele estava perdendo?
Ele fez sinal para um coche de aluguel e passou seu endereço. Ele precisava de tempo para pensar em tudo, para descobrir qual seria seu melhor curso de ação. Seu administrador também viria hoje para discutir as finanças de suas propriedades. Quando tal reunião estivesse concluída, ele saberia o melhor caminho a seguir, mas se o melhor caminho para as propriedades também seria o melhor caminho para ele ainda era uma incógnita.
Lizzie sentou-se em cima da égua branca, observava em silêncio os outros cavaleiros em Rotten Row. Alguns desfrutavam de um galope lento, enquanto outros, como ela, estavam apenas sentados sobre seus cavalos, assistindo, esperando... Ela avistou o cavalariço esperando pacientemente um pouco longe dela e franziu o cenho.
Onde ele estava? Ela se virou mais uma vez para o parque, mas não conseguia ver Lorde Wakely se aproximando a pé ou a cavalo. Ela verificou a hora mais uma vez e sentiu um nó se formando no estômago. Lorde Wakely enviou uma missiva para encontrá-lo aqui. Teria algo acontecido com ele? Ele já estava duas horas atrasado.
Ela virou a égua em direção ao portão norte. Ela voltaria para casa. Talvez houvesse uma missiva esperando por ela. Uma razão para ele não ter vindo.
Desprezo deliberado foi uma ideia que passou em sua mente por um breve instante. Ela não queria pensar assim. Não era útil nem agradável, e até que ela soubesse com certeza, era bobagem se preocupar. Mas, ao voltar para casa e não encontrar nenhum bilhete, ela não pôde deixar de supor que a reunião dele com o tio e o advogado no dia anterior não correra bem. O que significava que Lorde Wakely tinha uma decisão a tomar. Casar-se com a Srta. Fox e suas milhares de libras, um casamento de conveniência e pouco carinho, se é que haveria. Ou, ele poderia se casar com ela, uma mulher que ele acreditava não ter dote, mas o amaria incondicionalmente até o dia em que ela morresse. Se ao menos ele provasse seu valor e a escolhesse.
Mais uma vez, ela pensou que deveria contar a ele que ela possuía sim um dote considerável que satisfaria a demanda do pai dele, portanto, nenhum dinheiro de sua propriedade seria perdido para seu tio. Hugo realmente se importava muito com ela, e talvez mais do que ela pensava. Ele não estaria sofrendo tanto com a escolha se não se importasse. Talvez ela devesse falar com o primo, Lorde Leighton, e procurar o conselho dele. Ver se ele achava que era hora de Lorde Wakely saber a verdade, em especial porque ele estava à beira de perder sua herança.
Deve haver tantas pessoas dependentes de Lorde Wakely em suas propriedades. No total, ele teria centenas de pessoas, e centenas mais se adicionasse suas famílias, que precisavam de emprego e que sofreriam se perdessem suas posições. Sabendo de tudo isso, certamente Lorde Leighton reconsideraria sua decisão de manter em segredo a condição financeira dela. A última coisa que Lizzie queria era ser a causa do sofrimento de tantas pessoas tendo ela os meios de interromper tal ruína.
Ela relembrou os momentos que passaram juntos.
Além de não aparecer hoje, ele não fez nada que lhe desse qualquer motivo para alarme. Ele foi atencioso e confiável. Com certeza, saber que ela era uma herdeira não seria a única razão pela qual ele proporia casamento. Em geral, ela conseguia ter um bom entendimento do caráter das pessoas, e o de Lorde Wakely, apesar de todo o seu passado canalha, era um homem de bom coração e honestidade.
Pouco depois naquela tarde, Lizzie sentou-se diante do primo, Lorde Leighton, na biblioteca dele. Ele folheou alguns papéis, e ela esperou com parcimônia, sua mente um zumbido de pensamentos sobre como proceder para explicar a situação, para convencê-lo a mudar de ideia com relação ao sigilo de seu dote. Ele colocou os papéis em uma pasta e, pousando as mãos na mesa, deu-lhe toda a atenção:
— Desculpe, Lizzie. Eu só precisava finalizar um assunto. Agora, sobre o que você queria conversar comigo?
Ela sentiu calafrios e decidiu ignorá-los. O primo veria a razão dela, ele era um bom homem. Ela tinha certeza disso.
— Eu queria falar com você sobre um cavalheiro com quem acredito que gostaria de me casar. E antes que eu diga quem é, preciso que me prometa que não ficará bravo comigo. Talvez não seja quem você imaginou que eu consideraria para meu marido.
Lorde Leighton recostou-se na cadeira, cruzando os braços. Lizzie ignorou o fato de ser uma postura defensiva e, em vez disso, preparou-se para manter a calma e discutir a situação como os adultos que ambos eram.
— Quem é esse cavalheiro? — ele perguntou, a voz demonstrando cansaço.
— O cavalheiro é Lorde Wakely.
À menção do nome de Hugo, Lorde Leighton ajeitou-se na cadeira, os olhos arregalados de choque.
— Hugo? Você não pode estar falando sério. O que diabos faz você acreditar que ele está procurando uma esposa? Ele não é exatamente o cavalheiro mais bem resolvido de Londres. De qualquer forma, ele é um libertino.
— Eu sei tudo sobre o passado dele. Você é amigo dele há anos, e eu não sou cega. Mas ele está procurando uma esposa, e acredito que caso soubesse da minha situação financeira, ele proporia casamento para mim.
— Você quer dizer que ele se casaria com você se soubesse que é rica. Absolutamente não. — as palavras dele não deixavam espaço para argumentação.
Lizzie respirou fundo.
— Escute, há mais na história do que isso. Deixe-me explicar.
— Bem, certamente espero que explique, pois, no momento, minha resposta é não concordar com o que quer me pedir.
Lizzie deu um olhar sufocante ao primo e continuou:
— A razão do tio dele estar aqui é por causa do testamento do pai. O pai de Lorde Wakely incluiu uma cláusula em que Lorde Wakely deveria se casar dentro de doze meses após sua morte, mas com uma herdeira de não menos que trinta mil libras. Caso contrário, o dinheiro do dote de sua mãe seria revertido para a família americana. Mas veja você... — ela continuou. — ele está me cortejando mesmo acreditando que eu não tenho dote, e agora ele está em conflito. Eu poderia remover esse conflito da vida dele. Se eu contasse a ele acerca da minha fortuna, ele não sofreria tanto para tomar uma decisão, acredito que ele iria me escolher...
— Em detrimento da Srta. Fox, eu entendo, se a conversa que circula a sociedade tem algum fundo de verdade.
Lizzie assentiu.
— Sim, isso mesmo. Lorde Wakely possui muitas pessoas que dependem dele, funcionários e suas famílias. Se ele perdesse a herança, com o que ele administraria as propriedades? Se ele se casasse comigo, seguiria a cláusula e, portanto, nenhum dinheiro seria perdido. Eu quero contar a ele, Hamish. Você me dá permissão?
Lorde Leighton esfregou o queixo enquanto pesava o pedido dela.
— Por mais que eu queira dizer sim, Lizzie, não posso. Conheço muito bem Lorde Wakely e, se ele realmente quisesse se casar com você, encontraria outra maneira de conseguir o dinheiro necessário para administrar as propriedades dele. Casar-se com uma herdeira decerto que não é sua única opção.
Lizzie franziu a testa, imaginando se ele havia considerado outras maneiras.
— Mesmo que houvesse outra maneira, ele está ficando sem tempo. Ele deve se casar antes do final do mês. E se ele não estiver casado, ele perde o dinheiro. Eu poderia evitar.
— Mas por que você deveria ser a salvadora dele? Ele está nessa situação por causa da maneira como viveu a vida até então, um estilo que ele sabia que o pai odiava. Por mais que eu goste de Lorde Wakely e o ajudaria se pudesse, não posso permitir que você seja a razão para ele continuar sendo um dos homens mais ricos da Inglaterra. Lorde Wakely deveria ter outros meios de renda: investimentos, arte, qualquer coisa que não seja vinculado ao título para ajudá-lo a se casar com quem ele quisesse.
Lizzie reprimiu as lágrimas que ameaçavam rolar quando seu futuro com Lorde Wakely desapareceu diante de seus olhos. Ela fungou, e Hamish se mexeu na cadeira dele.
— Vamos fazer o seguinte, vou falar com ele, ver o que pode ser feito. Talvez ele não tenha tentado outras opções ou não tenha pensado nelas. Eu quero um bom casamento para você, minha querida. Já presenciei minha cota de casamentos tóxicos e nada civilizados nesta nossa sociedade. O casamento dos seus pais foi um deles, como se eu precisasse lembrá-la disso. Katherine e eu amamos você e queremos que o homem com quem vier a se casar a ame de forma incondicional, não por causa de quanto dinheiro ele vier a ganhar com a união.
Lizzie pegou um lenço e enxugou o nariz.
— Só porque Lorde Wakely se casaria comigo porque eu tinha uma fortuna, não significa que ele não se importe comigo. Que até me ame. Ele é responsável por muitos. A escolha não é fácil. Acho que se você estivesse na mesma situação com Katherine, também teria vacilado. Eu sei o quanto você se importa com seus arrendatários, seus funcionários. Você pode ser honesto em dizer que não se casaria por dinheiro para manter todo esse lado da sua vida seguro?
Ele se encolheu, encontrando o olhar dela.
— Você esquece que me casei com uma mulher que não era minha igual perante a sociedade. Eu quebrei todas as regras para ter Katherine ao meu lado e faria tudo de novo. Mas, como um homem de negócios com propriedades como eu e Lorde Wakely, tais propriedades são empresas, lares confiados são aos nossos cuidados até que a próxima geração assuma. Foi esperado de mim que administrasse essas propriedades, implementasse investimentos seguros e tivesse os melhores administradores, de modo que nunca precisasse me casar com uma herdeira para manter tudo seguro. Lorde Wakely não fez isso e agora está pagando o preço. Você disse que ele teve doze meses. Por favor, diga-me, o que ele fez nesse tempo para sustentar as propriedades e pudesse perder o dinheiro da mãe e ainda se casar com você?
Lizzie olhou para o primo, a mente em conflito sobre o que fazer.
— Acho que ele não fez nada, milorde.
Toda a esperança dela se desfez. Não achou que pudesse se sentir mais desanimada do que naquele momento.
— Nem eu. — Lorde Leighton se levantou e deu a volta na mesa, puxando-a para ficar de pé. — Prometi a você, seis anos atrás, que garantiria que se casasse com um homem que a amasse e cuidasse para sempre. Vou falar com Lorde Wakely, ver se ele é digno de você. Talvez ele tenha outros planos que você não conhece. Se ele tiver, eu darei meu consentimento. Se não, desculpe-me Lizzie, mas não posso deixar que entre nessa vida. Não liberarei sua herança só para encher os bolsos de um homem.
Capítulo Treze
Mais tarde naquela noite, Lizzie pediu um banho e depois recusou o convite de acompanhar Lorde Leighton e Katherine, que iriam a um jantar íntimo. Ao longo da noite ela dispensou sua criada, queria tomar um banho na banheira e planejar. Como ela poderia mostrar a Lorde Wakely que eles eram perfeitos um para o outro?
Depois da conversa desta tarde com o primo, toda a esperança de uma vida com Hugo parecia ter desaparecido. Mas isso não significava que ela não poderia tentar uma última vez que ele propusesse casamento a ela, mesmo sem um tostão como ele pensava. Ela não podia dizer a verdade, Lorde Leighton não havia permitido que revelasse seu dote, mas talvez, se ele estivesse com ela novamente, ele contaria seus planos para garantir a renda das propriedades e daqueles que confiam nele que não incluíssem uma herdeira.
Seus dedos bateram na lateral da banheira e, sabendo o que faria, ela se levantou e se secou rapidamente. Ela escolheu um vestido simples com botões na frente, um que podia ser colocado sem o auxílio da criada, e vestiu a capa mais escura que possuía.
Abrindo a porta do quarto, ela vasculhou o ambiente para ver se haviam criados ali e, como não viu nenhum, correu pelo corredor até as escadas, parando novamente para verificar quem estava por perto. Não ouvindo ninguém e presumindo que os funcionários estavam jantando, ela desceu as escadas e foi para os fundos da casa. A sala dos fundos possuía portas que davam para o quintal e um portão lateral que ela podia usar para escapar.
Não demorou muito tempo para chegar à casa de Lorde Wakely, pois ficava a alguns quarteirões e, nesta parte de Londres, com muitos casais caminhando como ela, Lizzie se sentia razoavelmente segura. Assim como a casa do primo, a de Lorde Wakely tinha um corredor lateral pelo qual se podia acessar o quintal. Chegando ao portão de madeira, ela verificou o entorno e o abriu, fechando-o rapidamente atrás dela.
A casa estava escura, exceto por duas lâmpadas acesas nos cômodos do andar de cima. O movimento atrás de uma porta que dava para uma pequena varanda e a silhueta que Lizzie reconheceria em qualquer lugar diziam que era Sua Senhoria.
Ela apertou os lábios, examinando a casa.
Não havia como ela subir até lá pelo lado de fora, então ela teria que encontrar uma maneira de entrar na casa por baixo mesmo. Puxando a capa com mais força pelo pescoço e garantindo que cobrisse os cabelos, ela avançou pelo jardim, em direção à entrada dos fundos, de duas portas. Uma delas dava na cozinha, se o som de panelas e conversas altas fosse alguma indicação. Lizzie se arriscou na outra porta e alívio a tomou quando girou a maçaneta e a encontrou destrancada.
Entrando em uma passagem escura, uma porta bateu em algum lugar próximo. Ela congelou quando o pânico tomou conta de que seria pega. O som foi seguido por silêncio, sem passos apressados ou funcionários conversando entre si, então ela continuou.
Caminhando depressa pelo corredor, ela chegou às escadas de serviço e correu por elas em direção ao primeiro andar. Saindo por uma porta, ela chegou a um salão sombrio e pouco iluminado. Ela tentou analisar onde estava, com base do que absorveu da casa no lado de fora.
Não era fácil, pois a maioria das portas dos quartos estava fechada, exceto uma que estava um pouco entreaberta e com a mais leve tremulação de luz de velas aparecendo. Ela se arriscou e caminhou na ponta dos pés até a porta, com o estômago revirando pelo que estava prestes a fazer, pelo que estava prestes a oferecer a Lorde Wakely.
Ou ele a mandaria embora? Ele a pegaria nos braços e diria que sua ausência hoje foi um erro? Ela não tinha certeza de qual seria a reação dele. Chegando à porta, ela espiou pela abertura e viu Sua Senhoria sem camisa, usava apenas calças beges. Ele estava sentado na beira da cama, folheando algum documento. Ele estava completamente perdido em seus próprios pensamentos, as rugas entre as sobrancelhas indicando que o que ele estava lendo era complicado ou perturbador. Sua necessidade de ir até ele dobrou.
Ela nunca o viu parecer tão miserável, e se pudesse, acabaria com isso esta noite. Ela entrou no quarto e fechou a porta depressa, o trinco fazendo um som alto no espaço tranquilo. O choque no rosto de Hugo foi cômico, e os lábios dela tremeram.
— O que você está fazendo aqui? — ele perguntou, os papéis em suas mãos caindo aos seus pés enquanto ele se levantava.
Lizzie engoliu em seco, lutando para trazer toda a determinação que sentiu vindo aqui. Esta noite ela teria Lorde Wakely se ele permitisse, e com alguma sorte ele perceberia que o que havia entre eles não era como nada que ele já tivesse vivido. Ao menos, era assim para Lizzie, e ela estava disposta a arriscar sua reputação ao estar com Hugo se significasse que ela poderia ganhá-lo.
Nunca desejara algo tanto quanto desejava o homem que estava diante dela, a boca aberta, o peito subindo e descendo rapidamente a cada respiração. Se ela não ganhasse o coração dele, não seria por falta de tentativa, e ela não conseguiria outra chance depois desta noite. Se Lorde Wakely a rejeitasse, ela esperaria o necessário, aceitaria sua fortuna e deixaria Londres. Viajar pelo mundo, ir para a Itália, comprar uma fazenda de oliveiras e adotar gatos vadios só porque podia.
— Você não veio para o nosso passeio de hoje. Fiquei preocupada.
Ele se encolheu.
— Sinto muito, Lizzie. A reunião com meu advogado não correu bem, e eu me esqueci. Você me perdoa?
Ela caminhou até ele e o empurrou de volta para a cama. Ele balançou, seus olhos se arregalando de surpresa. Ela assumiu o comando e, ajeitando as costas, subiu na cama e o montou.
— Não há nada a perdoar. E quanto ao que estou realmente fazendo aqui, bem... — disse ela, deslizando as mãos sobre os ombros musculosos e apreciando a sensação da pele dele sob as palmas das mãos. — Estou seduzindo você, milorde.
Se alguma vez ela o chocara, em nada se comparava ao que acontecia agora. Totalmente perplexo e sem palavras, ele olhou para ela, antes que seu rosto escurecesse de desejo e ele a virasse, prendendo-a na cama.
Ela gritou, sem esperar a mudança, e seu interior se apertou em deliciosos tremores. Desde o primeiro beijo ela sonhava estar com ele. Em tocá-lo, beijá-lo, e sem a ameaça de interrupção.
— Você não tem ideia de quanto quis você embaixo de mim, bem como está agora. — ele se abaixou e a beijou, uma doce e suave fusão de lábios que a fez se erguer na direção dele quando ele se afastou. Querendo mais do mesmo, não menos. Nunca menos. — Antes de prosseguirmos, me diga por que você está aqui. Eu preciso ouvir.
Lizzie estremeceu com a necessidade profunda e refreada que ela sentiu na voz dele. Ela queria quebrar esse controle, ver como ele era em sua completa e selvagem glória.
— Estou aqui porque quero estar com você. Eu quero que você faça amor comigo. Me ame como eu o amo.
Ela sentiu as bochechas esquentarem e mordeu o lábio, esperando que ele não a afastasse. Que ela não estava errada no que sabia haver entre eles. Ele se inclinou para trás, passando o dedo sobre a capa dela, desatando-a do pescoço e empurrando-a para o lado, deixando-a como um halo em torno dela.
— Eu não deveria permitir isso. Você é donzela. Eu seria o pior ladino a andar na terra se a comprometesse assim.
Lizzie o estudou por um momento, esperando a escolha dele. Tinha que ser escolha dele. Ela não imploraria.
Ele franziu a testa, fechando os olhos.
— Droga, Lizzie, mas eu não consigo me afastar. — ele deslizou uma das mãos pelas pernas dela e agarrou a bainha do vestido, puxando o tecido até a cintura. — Quero você nua debaixo de mim. Eu quero ver tudo o que você é. No entanto, vou permitir que suas meias de seda permaneçam. — ele disse com um sorriso malicioso.
Calor se acumulou em seu núcleo, e ela se contorceu, precisava que ele a tocasse.
— Que delicadeza sua, milorde.
— Hugo, por favor. Nenhum título entre nós. Nunca mais.
Lizzie estava muito disposta a fazer o que ele pedia e, em uma onda de movimento, ele a havia despojado das duas peças de roupa. As roupas estavam por toda cama, e Lizzie riu quando ele voltou por cima dela, o cabelo torto, os olhos brilhando de expectativa.
Ela lutou para controlar seu corpo, que não parecia mais seu. Os toques que ele deu enquanto a despia a deixaram latejando, e não pela primeira vez ela apertou as coxas apenas para se aliviar um pouco.
Os pelos do peito dele faziam cócegas, a pele das costas era quente e lisa, e ele tinha o cheiro mais intoxicante de sândalo e outra coisa que era exclusivamente Hugo. Ele a beijou com vontade, seduzindo-a com a boca, e ela deu lugar às sensações, ao desejo que tinha por ele.
Esta era a razão para a esposa de seu primo sempre olhar para o marido com tanto amor e reverência. Por que o casamento deles era amoroso e obviamente apaixonado. Hugo abaixou a cabeça no peito dela, tomando um mamilo entre os lábios antes de lambê-lo com provocações doces. Ela gemeu, os dedos cravados nos cabelos dele para segurá-lo contra ela.
— Isto é perverso, Hugo.
Ele soprou o mamilo que havia enrugado com o frio, antes de lambê-lo mais uma vez.
— Eu quero tanto você que dói. Desde o primeiro momento em que vi você entrar no salão de Lady X, sabia que precisava ter você. Que eu queria você e nunca permitiria que outro tocasse num fio de cabelo em sua linda cabeça. — ele deu um beijo suave nos lábios dela. — Mas você tem certeza, Lizzie? Não há retorno desta ação, caso sigamos em frente. Você não será mais virgem.
Ela envolveu a bochecha dele, o pinicar de sua barba por fazer contra a palma da mão.
— Eu não me importo mais com a minha virgindade. Eu também quero isso há tanto tempo, muito mais tempo do que você jamais saberá, e não há nada no mundo que me impeça do que estamos prestes a fazer.
— Você me quer há muito tempo? — ele se balançou contra seu núcleo, atiçando a necessidade por todo o corpo.
— Ó, sim. — ela ofegou, não inteiramente em resposta à pergunta dele, mas também devido a suas ações. — Eu notei você muito antes de você me notar.
— Hm, você pode estar errada quanto a isso.
Ela passou a mão na nuca e puxou-o para ela.
— Mesmo? Diga-me quando.
Ele a encarou um momento antes de um sorriso malicioso torcer seus lábios.
— A única razão pela qual eu não agi antes foi devido à minha amizade com Lorde Leighton. De todas as pessoas da sociedade, ele é quem conhece mais meu passado, minhas indiscrições. Eu sabia que ele não veria com bons olhos se eu a cortejasse. Mas quando eu vi você na casa de Lady X, todo o cuidado saiu pela janela.
Lizzie levantou a perna para se acomodar contra o quadril dele. A ação o aproximou dela, e desejo correu pelo olhar dele. Seu núcleo ficava cada vez mais quente, e ela desejou que continuassem o que haviam começado.
— Ele gosta de você, apesar de suas tendências resolutas.
Um músculo se moveu no queixo dele, e ele a encarou por um instante.
— Lorde Leighton nunca vai me perdoar pelo que estamos prestes a fazer.
— Ele nunca saberá. — disse ela, deslizando as mãos pelas costas dele para agarrá-lo pelo bumbum.
Ela o puxou contra ela, ajudando a dispersar algumas de suas necessidades. Ele xingou, um suspiro assustado.
— Verdade. — ele conseguiu dizer.
E com essas palavras ele terminou de se acomodar contra ela, guiando-se com cuidado para dentro dela. A sensação foi estranha, mas não totalmente desagradável. Sua mãe falara de dor lancinante e aborrecimento tedioso até que uma criança fosse gerada. Mas isso, com Hugo, era tudo menos tedioso, tudo menos doloroso.
Delicioso.
Respirando fundo, Lizzie tentou relaxar e entender a plenitude, as sensações que fervilharam através de seu corpo. Hugo não se apressou. Com cuidado perfeito, ele permitiu que ela se acostumasse ao seu tamanho antes de se afastar um pouco, apenas para depois empurrar-se de volta para dentro dela.
A dança a fez desejá-lo ainda mais, e ela logo se viu se movendo com ele. Ele a beijou o tempo todo, e ela ofegou quando prazer pulsou em seu âmago.
— Eu não quero machucar você, Lizzie. — a voz dele soou tensa, e ela balançou a cabeça, as palavras a iludindo por um momento.
— Você não está me machucando. — ela o beijou com perdição e por um longo tempo, deslizando a língua contra a dele, o caleidoscópio de sentimentos que ele trouxe quase demais para conter. — Continue. Nunca pare.
Ele empurrou mais fundo, e ela gemeu, seu corpo sem fôlego, um leve brilho de suor gelando a pele. Os movimentos dele se tornaram frenéticos, mais duros, mais exigentes e, no entanto, faltava algo. Era como se um pico estivesse fora de seu alcance, provocando-a antes de flutuar para longe.
— Eu sinto... eu quero... minha nossa, eu não sei o que eu quero. — ela ofegou enquanto ele continuava o ataque à suas emoções.
Ele se inclinou, beijando sua orelha.
— Você deseja prazer. Não que saiba o que é isso ainda, mas estou prestes a mostrar a você. — ele deslizou a mão entre eles e tocou-a.
A cada impulso, ele empurrava sua carne. Ele a possuía. Nesse exato momento, Lizzie permitiria que ele fizesse qualquer coisa que quisesse, desde que nunca parasse.
O que ele estava fazendo com ela?
Esse ato de amor era mais intenso, as sensações mais vívidas do que quando estiveram juntos na festa de Lady X. Era como se ela pudesse se estilhaçar em um milhão de pedaços e ainda assim permanecer inteira. Com um último movimento, ele empurrou-a com força, e o pico escalou, mas não atacou o cume. Ela caiu em um prazer inimaginável, dizendo o nome dele quando onda após onda fluiu através dela.
Não havia palavras para os deliciosos tremores e pulsares que dominaram seu corpo. Hugo se engasgou com o nome dela, beijando-a quando seus impulsos, duros e constantes, atingiram seu corpo. Mas antes da libertação dele, ele se afastou, acariciando-se acima da barriga dela. Lizzie observou encantada quando ele encontrou seu prazer fora dela, e ela não conseguiu evitar de estender a mão e tocá-lo, deslizando sobre seu eixo e ajudando-o a encontrar prazer.
Seus olhos se encontraram e ali se fixaram, e com essa troca, Lizzie se apaixonou por ele. Nunca haveria mais ninguém além de Hugo para ela. Eles eram apenas perfeitos um para o outro.
Ele caiu ao lado dela, e estendeu a mão para a mesa da cabeceira, pegou uma gravata descartada e limpou a barriga dela.
— Peço desculpas, pode ser um ato caótico.
Ela não se importava com nada disso. Tudo o que ela se importava era quando eles se encontrariam uma segunda vez. Hugo parecia estar pensando o mesmo.
— Quando posso vê-la de novo? Acho que não posso passar um dia sem estar perto de você. — afirmou, jogando a gravata no chão.
Lizzie rolou e se aconchegou contra seu peito. O braço dele circulou seu ombro e a manteve perto.
— Vou ao baile de máscaras dos Ramsay daqui a duas noites. Me vestirei como a Rainha Elizabeth, com uma máscara de cetim azul, se você quiser me procurar.
— Eu vou encontrá-la.
Seu coração esquentou com as palavras dele e, quando o relógio bateu certa hora tardia, ela suspirou, sentando-se.
— Preciso ir antes que minha ausência seja notada. Pode me ajudar a me vestir?
Ele deslizou a mão pelas costas nuas dela, seguindo a linha da coluna e fazendo-a tremer.
— Eu gostaria que você ficasse.
Lizzie virou-se para olhá-lo e sorriu.
— Acho que nós dois sabemos que isso não pode acontecer, mas voltaremos a nos encontrar. Em dois dias, reservarei a primeira valsa a você, se desejar.
Hugo sentou-se, empurrando os cabelos dela por cima do ombro para antes de beijar sua nuca.
— Não deixarei de ir por nada no mundo.
Capítulo Quatorze
Se Lorde Wakely era um patife, Lizzie com certeza era rápida. Ela sorriu e continuou seu passeio pelo Hyde Park, sua dama de companhia a uma curta distância imersa em um livreto sobre as diferentes espécies de plantas encontradas na Inglaterra. Lizzie olhou entre as folhas verdes das árvores e respirou fundo o ar fresco e acolheu a quente luz do sol. Desde o momento em que deixou a cama de Hugo na outra noite, o mundo parecia mais brilhante de alguma forma, mais vivo e vívido.
E ela era uma mulher arruinada, completa e para sempre, e por alguma razão ilógica, estava satisfeita apesar de tal ciência. Talvez porque depois do que viveram juntos, eles tornaram-se mais afins em seu conhecimento mútuo. O fato de ela o ter seduzido, no final, também tirou a escolha das mãos dele. Alcançar o que ela queria com tanta satisfação trouxe orgulho à sua alma. Nunca havia sido tão ousada ou determinada, e agora que se deitara com Hugo, não queria nada além de fazê-lo novamente.
Para o inferno com as consequências.
— Boa tarde, Srta. Doherty. Que providencial encontrar você aqui no parque.
Ela sentiu seu corpo vibrar e apertou o abdômen para acalmar os nervos.
— Lorde Wakely. — disse ela, mergulhando em uma reverência. — É adorável revê-lo.
Embora fossem se ver esta noite no baile de máscaras, os últimos dois dias pareceram intermináveis. Lizzie havia debatido consigo se deveria procurá-lo mais uma vez, mas no final decidiu não o fazer. Mesmo que fossem amantes, ela não queria que ele pensasse que ela estava tão desesperada por seu toque que mal conseguia esperar trinta e seis horas. Ela precisava que ele a quisesse tanto quanto ela o queria. Era ele quem precisava se apaixonar por ela, pedir a mão dela em casamento e, de alguma forma, elaborar um plano que resolvesse seus problemas financeiros sem ter que se casar com uma herdeira.
— Você está ansioso para o baile hoje à noite, meu senhor?
Um brilho perverso passou nos olhos do visconde, e Lizzie riu.
— Estou. Muito. Muito. — eles seguiram em frente, e o sorriso de Hugo dizia a Lizzie que ele entendia o que ela quis dizer.
Ela se inclinou para perto dele para garantir privacidade:
— Onde nos encontraremos?
Os olhos dele se aqueceram com apreciação e desejo. Ele colocou a mão dela em cima do braço e continuaram a passear.
— A casa de Sir Ramsay possui duas escadas de serviço. Use a mais próxima ao salão de baile. Se for na direção do saguão de entrada, como se fosse entrar lá, e virar para a parte de trás da casa, a escada estará à sua direita. Vou esperá-la lá.
— E então o quê? — Lizzie encontrou os olhos de Hugo, e o calor que ela viu neles a deixou segura do que fariam ao se encontrar. Embora ela gostasse de ouvir da boca dele.
— Levarei você a um dos quartos de hóspedes, onde tirarei todas as peças de roupa de sua pessoa. Vou beijar cada centímetro do seu corpo e levá-la ao prazer usando nada além da minha boca. — ele sussurrou contra seu ouvido, o sopro de suas palavras a fazendo tremer.
As bochechas começaram a queimar, mas ela descartou o constrangimento, muito encantada com o pensamento do que ele ia fazer.
O que seria exatamente?
Ela pensou nas palavras dele por um momento e não conseguiu entender o que significava, mas, mesmo assim, seria uma noite deliciosa se ele a fizesse sentir algo parecido com o que se passou há duas vidas.
— O que você está dizendo é possível? — ela precisava saber, queria um visual para rememorar até esta noite.
E lorde Wakely sabia beijar muito bem, sua boca era muito talentosa, então era bem capaz de poder fazer o que prometera se fosse determinado.
— Será uma grata surpresa para você descobrir o que minha boca pode fazer com a ajuda da minha língua.
Nossa...
— E, em troca, você deve me agradar com a sua, se quiser.
Lizzie fechou a boca com um estalo quando uma miríade de ideias entrou em sua mente. E se seus pensamentos estavam corretos, eram bem escandalosos. Tendo vivido em um casulo até então, não podia imaginar o que poderia acontecer entre um casal.
Ela verificou a localização de sua criada, suspirando de alívio quando a encontrou absorvida em seu livro e a uma distância segura deles.
— Como isso é possível? — ela sussurrou, intrigada.
— Pense nisso, e hoje à noite você pode me contar se descobriu. — Hugo deu um passo para trás e curvou-se. — Até esta noite, senhorita Doherty
Lizzie fez uma reverência.
— Tenha um bom dia, Lorde Wakely
Ela o observou se afastar, um pouco irritada com a recusa dele em dizer o que ela queria saber. Ele olhou para ela e sorriu por cima do ombro, e emoção zumbiu correndo pelo sangue dela. A noite de hoje parecia não chegar nunca. Virando-se, ela chamou sua criada para voltar para casa. Ela precisava tomar um banho e se arrumar. E talvez se esgueirar até a biblioteca e tentar descobrir por si o que Hugo sugeriu acerca do prazer que uma mulher poderia dar a um homem usando a boca. Tinha que haver algo para explicar sua provocação enigmática.
Quando Hugo chegou, o baile estava a pleno vapor, o salão estava cheio. As centenas de velas de cera erguidas em torno do cômodo estavam cercadas por uma névoa de fumaça, resultado dos charutos que os homens desfrutavam enquanto discutiam política ou cavalos e observavam os dançarinos e a sociedade interagindo.
Ser sociável não estava na mente de Hugo esta noite, mas sim estar com Lizzie novamente. Era tudo o que ele conseguia pensar nos últimos dois dias. Depois de vê-la esta tarde, ele percebeu ter a certeza de que mais ninguém importava mais que ela em sua vida. Ele desejava conversar com ela, passear como fizeram no parque, confiar e contar com ela, não a queria apenas aquecendo sua cama.
Mas quanto a se casar com ela, ele ainda estava indeciso. Tanta coisa dependia de sua decisão. Agora só faltavam poucos dias ante de ele perder a fortuna da mãe o que o deixaria com pouquíssimo para administrar as propriedades.
A senhorita Fox passou por ele, seu vestido e a máscara de seda preta combinavam com sua natureza sombria. Ela assentiu com a cabeça em cumprimento, e ele se curvou, observando-a. Se ele se casasse com a Srta. Fox, todos os seus problemas terminariam. Ele manteria sua fortuna, e suas propriedades estariam em segurança. Mas Lize estaria perdida para ele.
Ele passou a mão na mandíbula. Tinha que haver outra maneira de manter suas propriedades à tona. Mas como? Nunca em sua vida ele odiou seu pai tanto quanto o odiava agora.
Ele espiou sua fonte de inspiração em um vestido cor de safira, o azul da máscara dela destacava a cor dos olhos. A grande gola ornamentada e os cabelos ruivos tornavam fácil descobrir que ele havia encontrado sua rainha. Ela estava ao lado de sua mãe, que obviamente havia decidido não usar uma fantasia.
A pequena curva que os lábios de Lizzie fez diziam que ela o vira também, e ele sentiu o sangue aquecer. Sem demora, ele foi na direção dela.
Ele se curvou diante delas.
— Boa noite, senhora Doherty, senhorita Doherty. — disse ele. — Srta. Doherty, se quiser dançar, acredito que a próxima música será uma valsa.
— Eu adoraria dançar, obrigada, Lorde Wakely. — Lizzie pegou o braço dele, sem nem olhar para a mãe enquanto ele a levava para o centro do salão.
Ele a girou em seus braços, assim que a música começou, ela riu juntos aos giros que davam. Lizzie era a criatura mais deliciosa que ele já conhecera, despreocupada e honesta. Pânico tomou conta dele ao pensar no quanto ele a adorava e, no entanto, talvez não pudesse mantê-la para si. Não se ele não conseguisse encontrar uma solução para o seu problema.
Eles se davam tão bem, de muitas maneiras, que ele não podia deixar de se perguntar por que nunca a havia notado antes da morte de seu pai. Caso tivesse notado e se casado com ela, seu pai nunca teria posto uma cláusula tão horrenda no testamento. Ele ficaria feliz por Hugo, feliz por o título ter um futuro e a possibilidade de herdeiros. Na verdade, a razão pela qual ele estava nessa situação se devia exclusivamente ao seu egoísmo e recusa em crescer.
— Alguém já lhe disse, Lorde Wakely, que você dança divinamente?
Ele os manobrou entre os outros participantes com facilidade.
— Talvez, mas sua opinião é a primeira a que dou ouvidos.
— Você me lisonjeia, meu senhor. — ela sorriu para ele. Algo em seu peito doía, e ele não pôde deixar de sorrir de volta para a pequena atrevida. — Eu o elogio porque você merece ser lisonjeado. Esta noite, amanhã e todos os dias que se seguem.
A expressão de surpresa que surgiu no rosto dela o deixou tão surpreso quanto. Era possível que ela estivesse tão inconsciente de suas próprias palavras. Em seguida, citaria poesia e escreveria sonetos de amor para ela. A ideia não o enojava completamente, e isso por si só era revelador.
Merda.
Ele se importava com Lizzie, mais do que jamais se importou com alguém. A enorme necessidade de saber que ela estava bem, feliz e segura, anulava todas as outras preocupações dele, mesmo quanto às suas propriedades e inquilinos. Como ele a abandonaria simplesmente para manter sua fortuna?
— Você não deve dizer essas coisas, ou eu vou começar a pensar que você é um romântico como Lorde Byron.
Ele a puxou para mais perto do que deveria, lutando contra o desejo de pressioná-la com força contra o peito e nunca a deixar ir.
— Nunca serei tão ruim quanto Lorde Byron.
Lizzie se movia em sintonia perfeita com ele, e a sensação de seu vestido de seda deslizando sob a mão dele o lembrou da noite de paixão que tiveram. A mão enluvada em seu ombro se apertou um pouco, e ele encontrou seu olhar, desejando poder se afogar em seus profundos olhos azuis.
— Podemos concordar que após o próximo conjunto nos reuniremos no local previamente acordado? — ela sussurrou, os olhos mostrando travessura.
Hugo pigarreou quando luxúria rugiu através dele.
— Eu... sim...
Ela quase ronronou nos braços dele, e saber que dentro de uma hora eles estariam se dando prazer fez os curtos sessenta minutos parecerem muito distantes. Ele diminuiu a velocidade enquanto giravam no fundo do salão, para então seguirem pelo outro lado.
— Acredito que ainda não falei o quanto está bonita esta noite.
— Você acabou de falar. —.Lizzie riu, um som gutural e sedutor que o fez endurecer em um instante.
— Antes que eu tenha vontade de colocá-la por sobre os ombros e tirá-la daqui como se eu fosse um homem das cavernas, me diga o que você tem feito nos últimos dois dias, além do tempo que passamos no parque, é claro. Espero que seus dias tenham sido um pouco mais produtivos do que os meus. Tive problemas para ter pensamentos coerentes desde que você saiu do meu quarto.
— Esta é a sua maneira de me dizer que sentiu minha falta, meu senhor? Sabe que, para um homem de sua reputação, é um risco dizer tais coisas. Alguém pensaria que você está ansioso para me ver de novo. Que você se importa.
Quão verdadeiro isso era.
Lizzie era a única coisa que ocupava sua mente nos últimos dois dias. De fato, antes que ele a visse no parque, ele considerara pedir aos criados dos estábulos que aprontassem dois cavalos, para que eles pudessem cavalgar. Foi uma sorte tê-la encontrado no Hyde Park.
Ele a observou enquanto dançavam, e a ideia de ela se casar com outro cavalheiro o fez se sentir nauseado. Ela nunca seria feliz com mais ninguém, já que se encaixava tão perfeitamente com ele. E, no entanto, enquanto ele desejava que ela pudesse ser dele, se tornassem o arranjo oficial, ele perderia tudo. Seus inquilinos perderiam tudo.
Ele emitiu um som zombeteiro e puxou-os em um giro rápido, sabendo o quão injusto e egoísta ele estava sendo. Dar esperança, onde não havia, não restava nada que ele pudesse fazer e, no entanto, não conseguia se conter. Ele não queria desistir dela. Não queria estar nessa posição.
— Qual o motivo da careta, meu senhor? Você parece estar com muita raiva no momento.
Hugo afastou seus pensamentos e suavizou a expressão.
— Conte-me mais sobre você. Eu quero saber tudo.
Ela suspirou, possivelmente aliviada, e se jogou no novo tópico.
— Bem. — ela disse, franzindo a testa um pouco. — Eu gosto de cavalos e de cavalgar mais do que gosto de estar na sociedade. Estar aqui em Londres sempre foi ideia de mamãe, que quer que eu encontre um bom marido. Eu odeio frutos do mar, mas amo doces. Gosto de fazer compras e de participar de corridas de cavalos. Como você sabe, quero viajar para a Itália um dia, talvez até morar lá por um tempo.
— Estive em Roma. É uma cidade maravilhosa, cheia de história, e as ruas cheiram a azeitonas e ervas.
Ela riu.
— Não cheira assim, você inventou isso.
Agora era a vez dele de rir.
— Sim, inventei, não é dos melhores cheiros, cheira a velho. Antigo de fato. Você vai adorar quando chegar lá, o que não tenho dúvida de que fará um dia.
— O que mais você pode me dizer? Eu adoraria saber.
Durante o restante da dança, Hugo contou a Lizzie tudo sobre sua viagem ao exterior e sobre as pessoas maravilhosas que conhecera pelo caminho. Ele falou das ruínas do Circus Maximus, do Coliseu e dos ataques de gladiadores que ocorreram lá, como durante seus dias de glória deve ter proporcionado maravilhas inacreditáveis. Das belas vilas e casas de banho, algumas das quais ainda funcionam hoje.
Enquanto conversavam, a discussão se voltou para outros assuntos, para os livros e quais autores eles gostaram, incluindo um em particular com o qual não concordaram.
— Ela não escreve uma história sensata. Duvido muito que as irmãs Bennett conseguissem, na vida real, se casar com pessoas tão mais acima socialmente e bem conectados.
— Não tenho título, embora tenha um cavalheiro como pai, que ele descanse em paz, e um primo com título, ainda estou aqui conversando com um visconde. E... — ela acrescentou olhando entre eles. — pelos olhares irritados que recebo de algumas das moças presentes, posso apenas supor que elas estão chateadas comigo, por ocupar tanto o tempo de um homem elegível.
— Você merece toda a minha atenção. — Hugo precisou de todo o controle para não se inclinar e beijá-la. Calor se espalhou por seu peito, e ele mal podia esperar para tê-la sozinha.
Tudo o que Lizzie e ele haviam falado era inteligente e digno de nota. Eles não haviam concordado com tudo, e ela não se esquivou de falar a própria opinião, ou quando pensou que a dele era extraviada.
Hugo nunca foi capaz de aceitar a ideia de uma esposa que não tivesse as próprias ideias. Ele duvidava que a Srta. Fox se importasse com a opinião dele ou com a dela. O interesse dela por ele nunca fora outra coisa senão uma aliança, um contrato.
Nas semanas desde que voltaram da festa na casa de Lady X, Lizzie se tornou uma mulher que exigia seu respeito e admiração. A dança chegou ao fim e, pegando a mão dela e colocando-a no braço dele, eles fizeram o caminho até a mãe dela.
— São onze horas. Em quinze minutos, encontre-me na escada, como planejado.
Ela assentiu, mas não respondeu, simplesmente fez uma reverência e se juntou à mãe. Hugo permaneceu no salão por alguns minutos antes de ir para onde iriam se encontrar. Excitação vibrou através de seu sangue por tê-la a sós, sozinha e longe da sociedade e seus olhos curiosos. Muito, muito sozinhos, onde eles pudessem se conhecer um pouco mais, no sentido bíblico.
Lizzie vagou lentamente em direção às portas do salão de baile e, quando estava certa de que ninguém a observava, saiu do salão, caminhou depressa em direção à escada de serviço, onde Hugo disse que estaria esperando.
Encontrando a porta que mais parecia uma parede, ela a abriu e passou, fechando-a rapidamente e permanecendo ali por um momento para ajustar a visão ao espaço escuro.
Ela abafou um grito quando ele saiu das sombras e passou o braço pela cintura dela, aproveitando a oportunidade para beijá-la de leve. Lizzie se jogou contra ele, seu corpo tenso e ansiando por mais. Pareciam ter passado semanas desde que ela esteve com ele no âmbito mais íntimo e não apenas alguns dias. O homem era viciante, e ela sofria com seu desejo intenso quando não estava perto dele.
— Para onde daqui? — ela sussurrou quando ele enfim se afastou.
Ele a puxou em direção à escada.
— Me siga. — eles subiram dois lances de escada antes que Hugo espiasse pelo corredor e, vendo tudo vazio, a puxou para uma sala do outro lado do corredor, e trancou a porta.
Era um quarto de hóspedes, limpo, mas sem muita mobília. Um edredom esmeralda estava sobre a cama, e as cortinas da mesma cor pendiam das duas janelas que davam para a praça. Havia uma espreguiçadeira diante da lareira apagada.
— Venha aqui. — disse Hugo, sua voz profunda, seus olhos quentes e convidativos.
O corpo de Lizzie não parecia mais seu, e ao se aproximar dele, ela vibrou de excitação reprimida e passou os braços em volta do pescoço dele.
— O que você planeja fazer comigo, Lorde Wakely? — ela perguntou, embora tivesse uma boa ideia do que seria, e mal podia esperar pelo prazer disso.
— Quero que você deite na cama e levante esse lindo vestido para que eu possa beijá-la até que chegue ao clímax.
Nossa...
Sem demora, Lizzie fez o que ele pediu. Seu vestido era pesado, mas com a ajuda de Hugo, ela logo o enrolou na cintura. O ar fresco da noite beijou sua pele, e ela estremeceu. Ele se ajoelhou, depois colocou as mãos grandes em ambos os lados das pernas dela e as abriu, os olhos escuros com necessidade e admiração. Nunca ficara tão exposta, tão vulnerável, mas, mesmo assim, confiava nele, sabia que ele nunca faria nada que ela não quisesse.
Ele a puxou em sua direção, colocando-a diante da boca.
— Você é tão bonita. — disse ele, passando o dedo sobre a carne dela, com certa atenção ao botão que ela agora sabia que existia por conta dos encontros anteriores, e sabia quanto prazer essa parte do corpo poderia proporcionar.
— Pare de me provocar, meu senhor. Não aguento mais um segundo.
Se ele não a tocasse logo, ela expiraria. E então o hálito quente dele subiu pela coxa com ternura lenta antes que seus lábios a beijassem.
Ah...
Lizzie respirou fundo, sem saber o que estava sentindo, o que a fazia estar como estava. A sensação era estranha, mas quando ele a invadiu com a língua, ela não conseguiu conter o gemido que escapou. Sentiu as bochechas esquentarem e fechou os olhos. Se permitiu apenas apreciar, esquecer o constrangimento de estar tão aberta a ele e sob seu controle total, e simplesmente cedeu ao que a boca tão esperta dele poderia fazer.
As mãos dela cravaram nos cabelos dele, e ela se viu ondulando sob seu toque. Como ela viveria sem um contato tão cru de um homem depois de experimentar prazeres tão ricos? Pensar em Lorde Wakely fazendo isso com outra mulher a deixou emocionalmente gasta, e ela afastou a visão. Ele era dela, ela tinha certeza disso. Essa paixão e alegria certamente eram incomuns, só aconteciam entre casais que compartilhavam sentimentos profundos.
O ritmo dele e a ardente resposta entre as pernas dela aumentaram, e ela fechou os olhos mais uma vez, deleitando-se com o toque.
— Hugo. — ela ofegou quando ele deslizou um dedo longo e forte em seu calor. A sensação de pele e língua era demais, e ela se despedaçou sob seu toque, permitindo que o prazer a atravessasse repetidas vezes enquanto ele beijava e sugava cada gota de seu corpo.
Ele se aproximou dela, seu olhar sério. Embaixo dele, os ossos de Lizzie pareciam geleia, e ela não queria nada além de dormir, se aconchegar nos braços dele e ficar com ele assim para sempre.
Ela estendeu a mão e traçou os lábios dele com o dedo.
— Um homem tão perverso e com uma boca tão sábia.
Ele caiu ao lado dela, apoiando-se em um cotovelo. O som de vozes chegou a eles vindo do corredor, e Lizzie ficou rígida. Hugo sentou-se, puxando as saias dela rapidamente e ajeitou a gravata.
— Vi Lizzie vir por aqui, senhora Doherty. Por favor, me siga.
Ela encontrou os olhos de Hugo, todos os traços de prazer ausentes.
— Era Lady Leighton e sua mãe. Você deve retornar ao baile e dizer que saiu para o terraço para respirar. Diga a elas que estava se sentindo mal e precisou de algum tempo longe da multidão.
Lizzie assentiu, levantando-se e ajeitando o vestido um pouco mais antes de verificar se o cabelo estava no lugar.
— Me desculpe, eu não podia ... De qualquer forma, boa noite, Hugo.
Ele a interceptou quando ela deu um passo em direção à porta e, segurando sua bochecha, ele a beijou:
— Boa noite, Lizzie. Voltaremos a nos ver.
Ela assentiu e se afastou, voltando ao baile do jeito que havia escapado.
Ah sim, com certeza, voltariam a se ver.
Várias vezes se ele a escolhesse.
Capítulo Quinze
Hugo sentou-se em sua mesa e olhou para Lorde Leighton, um de seus amigos mais antigos e íntimos. Mas esta amizade estaria em cheque depois deste dia, em especial depois do que ele acabara de dizer. Hugo teria sorte se o homem não o espancasse.
— Katherine viu você, e se não fosse pelo raciocínio rápido dela, a mãe de Lizzie teria entrado naquele quarto e visto sabe-se lá o quê. Como você se atreve a me desobedecer depois que eu avisar que se mantivesse longe da minha prima?
Hugo nunca vira Hamish tão zangado e, caso se encontrasse na situação de Lorde Leighton entenderia sua reação. No entanto, Hugo não conseguia evitar de sentir o que sentia por Lizzie. Mal podia ficar longe dela, assim como o mar não podia se distanciar da areia. Era impossível.
— Você a ama? — Hamish perguntou, seus olhos tão duros quanto seu tom.
Hugo se mexeu na cadeira, não havia pensado ainda se o que sentia por Lizzie era amor. Decerto que gostava muito dela, queria nada menos que o melhor para ela, mas seria amor? Isso ele não sabia dizer.
— Não sei o que sinto por ela, mas o que sei é que tenho uma decisão nada fácil a tomar. Eu me importo com Lizzie, mais do que pensei que poderia me importar com alguém no mundo, mas não acredito que seja amor. As palavras ditas em voz alta soaram um alarme em sua mente, e ele franziu o cenho. Negar o sentimento parecia errado, não parecia ser contundente, e seu estômago revirou.
— Então, hoje à noite, no nosso baile, você anunciará seu noivado com a senhorita Fox. Ela estará presente e deve ser o local perfeito para anunciar para a sociedade. Lizzie sem dúvida ficará chateada, mas pelo menos poderá se retirar para seus aposentos, longe de olhares indiscretos e línguas fofoqueiras.
— Eu não farei isso com ela de forma tão pública. Como pôde me pedir uma coisa dessas? Não se importa com os sentimentos de sua própria prima?
A fúria no rosto de Hamish fez Hugo ressabiar-se, e ele se perguntou se havia ido longe demais com o conde.
— Amo minha prima e me importo muito com ela, cuido dela nos últimos seis anos. Se você não fosse um tolo cego, poderia tê-la visto ao longo de todos esses anos, mas esteve muito ocupado vadiando pela cidade e agora é tarde demais. Você me contou a situação financeira em que se encontra. — o conde fez uma pausa, acalmando a respiração. — Você teve doze meses para procurar outras formas de proteger suas propriedades. Tais ações poderiam ter dado a si a capacidade de se casar com qualquer pessoa que desejasse, e quando quisesse. Diga-me, o que você fez com o tempo que tinha, Hugo? Porque, para mim, parece que você vem sendo um visconde desleixado.
— Agi de forma tola, eu sei disso agora. Deveria ter feito mais do que decidir me casar com uma herdeira para resolver meus problemas. Mas nunca acreditei que Lizzie fosse tão maravilhosa quanto é. Para tê-la, preciso perder tudo e, no entanto, também não quero tomar essa decisão.
— Lizzie não pode ajudá-lo com suas dificuldades financeiras, portanto você precisa escolher. Ou você propõe casamento à Srta. Fox e suas milhares de libras ou propõe à minha prima. Mas não vou mais permitir que você brinque com as emoções dela. Ela merece que um homem a escolha, ame-a por quem ela é. Você é esse homem, Hugo? Está disposto a arriscar tudo o que tem para tê-la em sua vida?
Hugo engoliu em seco, sem saber o que queria. Ora, quem ele estava enganando? Ele queria Lizzie e de todas as maneiras que um homem quer uma mulher, e um marido quer uma esposa. Mas, ao fazê-lo, seus inquilinos e os funcionários dessas propriedades no interior ficariam desempregados da noite para o dia. Seus meios de subsistência desapareceriam sem aviso prévio. Ele também não podia fazer isso. Hamish havia dito que ele era um visconde desleixado. Bem, pelo menos nesse quesito ele poderia consertar seus erros.
Lizzie merecia mais do que ele poderia dar. Ele poderia lhe dar carinho, paixão, mas pouco mais. Eles seriam obrigados a viver em Londres, sem propriedades rurais, festas e sua vida seria regrada, os criados da cidade teriam que ser mínimos. Ele não poderia fazer isso com ela. Ela merecia ser cercada com coisas bonitas, tratada e mimada como a deusa que ela era.
— Vou dizer a ela que não podemos nos casar.
Desapontamento cruzou o rosto de Hamish, e Hugo desviou o olhar. Não queria ver refletido nos olhos de seu amigo a insatisfação que ele próprio sentia.
— Não, você não vai. Você escreverá uma carta agora, e eu entregarei a ela. Se conheço minha prima, e conheço muito bem, ela tentará convencê-lo do contrário, caso não faça o pedido. Não posso permitir que ela chegue a esse ponto. O homem que se casar com ela, se ela se casar, será digno. Você, Lorde Wakely, não é.
Hugo assentiu.
Não havia sentido em tentar dissuadir o conde. Ele pegou um pedaço de pergaminho e rabiscou o melhor que pôde uma nota para Lizzie. Uma nota que ele sabia que partiria o coração dela quando lesse. Ele assinou, dobrou e selou com cera.
— Diga a ela que sinto muito.
Hamish pegou o bilhete da mão dele e caminhou até a porta.
— Pensando bem, você não está convidado para o baile esta noite. Acredito que levará muitos anos até voltarmos a sermos amigos. Passar bem.
Hugo olhou para a porta por algum tempo depois que ela se fechou. O que ele fez? Ele se sentiu nauseado pela ideia de que logo Lizzie leria seu bilhete e que seria devastada por suas palavras. Ele se levantou e se serviu de um conhaque. Ele era um desgraçado. Ela nunca o perdoaria. Ela nunca voltaria a estar com ele, e com razão.
Como ele poderia sobreviver a isso? Ele não sabia, e, naquele exato momento, desejou que não sobrevivesse. A morte era melhor do que essa emoção infeliz e abominável que agora passava por seu sangue. A Sociedade sempre o considerou um patife, e agora ele realmente era digno desse adjetivo.
Pela primeira vez em sua vida, era verdade.
Lizzie sentou-se na carruagem que rimbombava em direção à casa de Lorde Wakely. Depois de ler o bilhete apressado, ela amassou o pergaminho e o jogou no fogo. Se ele fosse partir o coração dela, ele poderia muito bem olhá-la nos olhos ao fazê-lo. Não se esconder atrás de uma carta e pedir ao primo que entregasse por ele.
A carruagem parou, e ela pulou para fora sem esperar pelo condutor. Sem bater, ela abriu a porta da frente e entrou. O mordomo, a caminho de receber o a visita do visconde, se assustou com a intromissão dela e murmurou algo sobre ela não perturbar o visconde, pois ele não estava recebendo visitas, mas ela abriu a porta da biblioteca e bateu com força no rosto dele sem se importar.
— Que diabos você pensa que está fazendo, Hugo? Você acha que pode me escrever uma carta, e eu vou fugir como uma garotinha?
Com os olhos arregalados, ele ergueu os olhos da cadeira em que sentava diante do fogo, e Lizzie pôde dizer pelos olhos injetados de sangue que ele havia sucumbido ao conhaque.
— Lizzie. Eu...
— Não me venha com "Lizzie". Como ousa me tratar com tão pouco respeito? Acredito que depois de tudo o que fizemos, tudo o que pensei que sentíamos um pelo outro, mereço mais do que apenas algumas linhas.
Ela respirou fundo para não perder o controle de suas emoções, embora isso pudesse acontecer de qualquer maneira, pois seus olhos já ardiam com a ameaça das lágrimas.
— Seu primo não me permitiu vê-la.
— Você não tem o direito de culpar Hamish. Ele não tem nada a ver com isso. Você poderia ter dito não. Você poderia ter dito que queria falar comigo. Explique-me por que você iria dormir com uma mulher, abrir seu coração para ela, apenas para descartá-la sem olhar para trás.
Hugo levantou-se, aproximando-se dela. Ele fez menção de pegar em suas mãos, e ela lhe deu um tapa forte. Ele cambaleou, e ela engoliu em seco, o latejar da palma da mão não era nada perto das lágrimas formando-se nos olhos.
— Eu te amei. — ela balançou a cabeça, não acreditando no que estava acontecendo. — Pensei que você me amava também.
— Lizzie, não posso me casar com você. Eu perco tudo, as pessoas que confiam em mim perdem tudo. Eu não me importaria de ficar sem nada, mas não quero isso para você. Quanto aos meus funcionários, eles não merecem sofrer por causa do despeito de meu pai e da minha incapacidade de seguir as regras. Preciso desistir de você, porque não tenho nada. Estarei amaldiçoado se o fizer, mas também se não o fizer.
— Você demonstrou falta de caráter quando era mais necessário. Nunca vou perdoá-lo por isso.
— Lizzie, por favor. — ele implorou, dando um passo em sua direção.
Ela levantou a mão, detendo-o.
— Você nem me quer o suficiente para tentar encontrar outra solução. Sabe desta cláusula há um ano e, no entanto, tudo o que fez foi tomar o caminho mais fácil. Não pense, nem por um momento, que não entendo o quão importante são suas propriedades e as pessoas que trabalham na terra e suas famílias, porque eu entendo. As pessoas precisam de emprego, um lugar seguro para morar. No entanto, também acredito que lutar pelo amor é importante. Eu nunca havia amado ninguém, nunca permiti intimidades a ninguém antes na minha vida, como com você. Você é o homem com quem eu queria me casar, ter filhos, amar e cuidar pelo resto da minha vida. Mas você não está disposto a lutar por nenhuma dessas coisas. Em vez disso, você escolheu a fria e distante Srta. Fox e suas trinta mil libras.
Hugo a encarou, sem oferecer palavras, desculpas ou alternativas de como poderiam mudar tudo. Lizzie balançou a cabeça, incapaz de acreditar que, depois de tudo o que haviam compartilhado, eles estavam nessa situação.
— Caso eu venha escolher ter um marido, quero que ele lute, não apenas por mim, mas por suas responsabilidades. Um homem de verdade teria estudado todas as possibilidades que pudesse para garantir suas propriedades, em vez de passar os doze meses restantes atrás de qualquer pessoa que pudesse aquecer sua cama. Só tenho vergonha de ter me permitido ser uma de suas meretrizes.
Ela se virou, e ele não tentou detê-la.
Ela endireitou as costas, não querendo saber o que aquilo significava. Supôs que significava que havia acabado de fato, que ele se casaria com a Srta. Fox, e ela voltaria para casa.
— Sinto muito. — ele sussurrou.
— Vá para o inferno, seu desgraçado.
Lizzie voltou para o quarto na casa do primo antes de desmoronar. Em algum momento, Katherine trouxe chá e bolinhos, mas Lizzie não queria nada daquilo. Tudo o que ela queria estava perdido, e alguma herdeira reivindicaria o prêmio.
Ela esperou, rezou para que Lorde Wakely visse valor nela, não o que valia a pena para um casamento. Quão errada ela estava. Ela arriscou tudo, arruinou-se dormindo com ele, apenas para que ele a descartasse devido à sua falta de fortuna.
Ela jogou um travesseiro no chão. Era óbvio o motivo para ele ter escolhido a Srta. Fox. Ser responsável por tantos e ter a ameaça de eles ficarem ao Deus dará não era algo que nem mesmo ela permitiria. Mas por que ele não pensou em outra maneira? Como Lorde Leighton sugerira, por que não procurou outras opções para não ficar com apenas uma: a Srta. Fox?
Lizzie não achava que poderia odiar alguém em sua vida, mas naquele momento ela odiava Lorde Wakely. Bem, ela mostraria a ele. Se ele acreditava que ela se esquivaria de Londres por causa de um coração partido, ele estava errado.
Por dentro, ela poderia estar despedaçada, mas por fora ela seria uma haste de aço: forte, inflexível e dura. E nenhum homem, nem Lorde Wakely ou qualquer outro, jamais a quebraria de novo.
Capítulo Dezesseis
Hugo não tinha certeza do que havia acontecido com ele, mas depois de ver a mágoa que causara a Lizzie, ele começou a consertar, nos últimos dois dias, os erros cometidos pelos últimos doze meses. Isso incluiu uma visita a seus advogados e uma convocação apressada aos três administradores que cuidavam de suas várias propriedades.
O baile dos Keppell seria na noite seguinte, onde pela primeira vez desde que Lizzie saiu de sua vida, ambos estariam presentes no mesmo lugar.
— Diga-me mais uma vez o que não está vinculado ao título e, portanto, pode ser vendido. Sei que as propriedades estão, é claro, mas dentro delas, o que posso me livrar? Se eu quiser me casar com Lizzie Doherty, mesmo sem que ela tenha um tostão, então preciso de todos os fundos que puder conseguir.
Thompson vasculhou seus papéis e tirou uma lista.
— Entre mim e seus administradores, você pode alugar o Solar Bellside e Neverton Hall, deixando Bolton Abbey como sua única propriedade no campo. Pelo menos pelos próximos dez anos; com a renda que essas propriedades trariam, e se você desse aos cavalheiros que alugarem cada propriedade um contrato de moradia longo, as propriedades seriam mantidas e não cairiam em desordem.
O que também o faria economizar dinheiro.
— E as pinturas? Quais podem ser vendidas a colecionadores ou museus?
Em todas as suas propriedades, havia numerosas pinturas, pelo menos algumas deveriam ter um valor alto. Ele ficaria triste em vê-las partir, mas não tão triste quanto ao ver Lizzie sair de sua vida para sempre.
A lembrança de seus traços devastados pela dor o assombrava e não se dissipava. Ele afastou os pensamentos. Ele resolveria esse problema. O que ele não conseguiu remediar em doze meses, ele consertaria em dois dias.
— Pudemos encontrar seis pinturas: dois grandes clássicos de Ticiano, um Botticelli, um par de Canaletto de Veneza, e um retrato de Rafael. Eu os listei para serem leiloados em particular e, se vendidos pelo valor estimado, quase o colocarão de volta aos trilhos em termos financeiros, como se nunca tivesse perdido a fortuna de sua mãe.
— Nunca perdi a fortuna dela, meu pai simplesmente a deu. — ele lembrou ao administrador. — E a casa de Londres? Precisarei arrendá-la também? — Hugo perguntou.
— Examinamos as quantias e; se você concordar em arrendar temporada sim, temporada não; colocaria o senhor em uma posição mais sólida. Há quatorze veículos nas três propriedades que podem ser vendidos, além claro dos cavalos. Caso esteja disposto a se separar deles.
— Mantenha tração o suficiente para as carruagens e criados usarem, minha montaria pessoal, é claro, e o último veículo que comprei; fora isso, leiloe os cavalos em Tattersalls e venda todo o resto. Não precisamos de todos. — disse Hugo, um alívio diferente de qualquer um que ele já conheceu fluindo sobre ele.
Ele conquistaria Lizzie de volta, e agora ele poderia propor casamento sem o fardo de sua criadagem e funcionários perderem seus cargos, já não havia impedimento moral para ele pedir a mão dela.
Desculpe, pai, mas você não vai ganhar essa partida.
Hugo ficou de pé, apertou a mão de seu advogado e dos administradores.
— Devo pedir desculpas a todos pela saia justa que os coloquei ao ter que reunir tais dados em um prazo tão apertado. Serei um senhorio mais atento no futuro, melhor do que agora em qualquer caso. Pretendo ser mais atento como neste instante. Um visconde em nome e em caráter.
— Muito bem, meu senhor. — disse Thompson, sorrindo.
Hugo assentiu e os deixou trabalhar.
Agora ele estava pronto para o baile dos Keppell. Havia apenas mais uma tarefa a ser cumprida antes da noite. Mais uma ponta solta para amarrar.
Lizzie estava de pé ao lado do salão de baile no baile dos Keppell, Sally ao lado dela, o olhar estrondoso de sua amiga preso no visconde Wakely e sua parceira de dança, a Srta. Fox.
Eles formavam um belo par, e Lizzie esperava que ambos tropeçassem e caíssem. Com esse pensamento tão baixo, ela estudou as feições de ambos e sorriu para Katherine, que havia parado um pouco distante dela, mas sempre com um olhar atento a Lizzie.
O prazo imposto pelo pai para o casamento de Lorde Wakely estava próximo, e havia boatos de que o noivado seria anunciado naquela noite. Afinal, o final de julho estava a apenas alguns dias.
— Eu não posso acreditar que ele a tratou tão mal e ainda tem a audácia de mostrar o rosto em público.
Lizzie passou o braço por Sally e a abraçou um pouco.
— Fui eu quem me tratei com tão pouco respeito. Eu nunca deveria ter feito o que fiz.
Não que ela tivesse contado a Sally tudo o que havia ocorrido entre ela e Lorde Wakely. Nem mesmo Katherine saberia até onde Lizzie havia ido. Mesmo assim, ela agira como uma tola. Fora ela quem se esgueirou casa adentro, o seduziu.
Ela balançou a cabeça, odiando o fato de que ela havia se passado por uma tola desesperada. Se ela pudesse dizer a todos que ela era uma herdeira, uma mulher que a partir de agora faria suas próprias escolhas, principalmente a de ser uma solteirona. Uma senhora dos gatos que se mudaria para Roma, como ela sonhava.
Quando a dança terminou, ela cruzou com o olhar de Lorde Wakely. Ela desviou a atenção e lutou para não olhar de volta, e ver se o desejo que lia nas esferas escuras dele era uma invenção de sua imaginação ou estava realmente presente.
— Veja como Lorde Wakely é simpático com os pais da senhorita Fox. Que doentio. Juro que, se não fossem parentes distantes do duque e da duquesa de Athelby, a sociedade lhes daria as costas.
Lizzie não se incomodou em olhar. Ela não queria presenciar aquilo de jeito algum. Quanto às alegações de sua amiga, ela duvidava que ocorresse. Tanto quanto a sociedade sabia, nada de desagradável havia ocorrido entre ela e Lorde Wakely. Não havia motivo para tanto e, mesmo que soubessem, era ela quem se tornaria o escândalo. Ela seria a única evitada e excluída para sempre e mais uns anos.
A dança seguinte começou, e Lizzie pegou uma taça de champanhe de um lacaio que passava. Talvez se ela bebesse um pouco mais, esta noite não seria tão dolorosa. Os dançarinos começaram a quadrilha, mas então um distúrbio os fez parar e, em um momento, a orquestra parou e todos os olhos se voltaram para o que acontecia no meio do salão.
A visão de Lorde Wakely parado no meio do salão, sem a Srta. Fox à vista, fez com que Lizzie se ressaltasse. O que ele estava fazendo? Ela franziu a testa quando logo ficou óbvio para todos que a atenção dele estava concentrada nela e em mais ninguém.
O peso de mil olhos se voltando para ela a atingiu como um taco, e ela ergueu o queixo, não querendo sucumbir à histeria acerca de seja lá o que Lorde Wakely estava prestes a fazer.
— Se eu puder ter sua atenção, senhoras e senhores. — ele gritou acima da exuberância dos convidados. — Há algo que desejo declarar diante de todos vocês.
— Ó, meu Deus. — Sally murmurou ao lado dela, e Lizzie concordou completamente com suas palavras.
O que diabos ele estava fazendo?
— Há algumas semanas, conheci uma mulher que personificava tudo o que eu quero em uma esposa. Uma mulher de caráter e essência fortes. Uma mulher que me fez querer ser um homem melhor. E, em um momento em que eu precisava provar o meu valor, eu a decepcionei. As palavras podem não ter sido ditas, mas eu quebrei uma promessa para ela e para mim mesmo.
Lizzie sentiu a mão reconfortante de Katherine que veio para seu lado. Lizzie não conseguia se mexer, não conseguia formar palavras, embora sua mente corresse com a realidade chocante do que Lorde Wakely estava fazendo.
— Muitos de vocês conheciam meu pai e sabem que nos últimos anos dele e eu não nos demos nada bem. Tanto que, em seu testamento, ele exigiu que eu me casasse com uma herdeira dentro de doze meses após sua morte ou perderia a fortuna de minha mãe, que hoje mantém minhas propriedades funcionando. Ainda não cumpri essa exigência, nem irei cumprir.
O silêncio foi substituído logo foi substituído por suspiros.
A atenção da Sociedade voltou-se para onde a Srta. Fox esteve, mas agora o espaço estava vazio. Teria ido para casa? Lizzie voltou-se para Hugo, sem vontade de esperar, e ainda assim seu corpo vibrava com a possibilidade de ele estar prestes a escolhê-la.
Ela... em vez de fortuna ...
Seus olhos ardiam, e ela respirou fundo.
— Sinto muito, Lizzie Doherty, mas não posso viver sem você. E se isso significar que viveremos sem luxo, sem grandes propriedades e viagens ao exterior, é isso que eu quero. Pois, eu quero você. Só você e mais nada.
Lizzie soltou a mão de Katherine e caminhou com o máximo de firmeza que suas pernas trêmulas permitiriam. Ela parou diante dele, encontrando seu olhar, incapaz de acreditar que ele estava dizendo a verdade. Era maravilhoso demais. Muito.
— Você está falando sério? Sério mesmo?
Ele assentiu, segurando as bochechas dela.
— Encontrei outra maneira de podermos nos casar. Suas palavras para mim há dois dias me envergonharam, e você estava certa em fazê-lo. Eu não estava pensando e tomei o caminho mais fácil. Mas não era o único caminho.
Lizzie limpou o nó na garganta.
— E a Srta. Fox? O que acontece com ela?
— Falei com Edwina e, como suspeitava, ela não era favorável à nossa união. Ela me liberou, embora tenha afirmado que, como nunca houve um pedido formal, não sabia ao certo por que a opinião dela importava sobre minha escolha.
— Aprecio sua decisão em falar com ela, e fico feliz que tenha sido assim. Era a coisa certa a se fazer.
O polegar dele roçou o queijo dela que se inclinou rumo ao toque dele, tendo sentido saudades terríveis.
— Eu te amo, Lizzie. Amo você e mais ninguém. — ele parou, pegando uma das mãos dela e beijando-a. — Case-se comigo, meu coração. Seja minha.
Lizzie assentiu em meio a uma enxurrada de lágrimas, depois riu quando ele se curvou e a beijou, a Sociedade e os suspiros assustados todos esquecidos enquanto selavam seu destino diante de todos. Ele a pegou, abraçando-a perto.
— Eu amo você. Sinto muito, meu amor. Por favor, diga que me perdoa.
— Eu perdoo. — ela o abraçou ainda mais forte. — Eu também o amo. Muito.
Hugo a desceu devagar, depois a puxou em direção a Hamish e Katherine, que estavam junto de Sally. O sorriso no rosto de seu primo dizia que ela não precisaria discutir com ele em relação ao casamento com Hugo.
— Antes de celebrarmos com minha família, há algo que você deve me prometer. — afirmou Lizzie, puxando Hugo para uma parada.
— Qualquer coisa. Eu prometo a você qualquer coisa. — ele disse ardentemente e sem hesitação.
— É tudo que eu quero. Sua promessa para qualquer coisa.
— Você está sendo muito misteriosa, Lizzie querida. — disse ele, beijando a mão dela mais uma vez.
Ela encolheu os ombros.
— Tudo a seu tempo, Lorde Wakely. Coisas boas vêm para aqueles que esperam. E acho que nós dois esperamos o suficiente.
Epilogue
Lizzie respirou fundo, sentindo o calor seco e o ar fresco e quente. Sob o sol da Toscana, ela estava deitada em um cobertor, Hugo estava ao seu lado e colocava uma azeitona na língua dela, de vez em quando, enquanto lia o jornal.
Eles compraram o pequeno chateau durante a lua de mel, que foi passada principalmente no exterior. E agora, sempre que o clima frio e úmido inglês ficava muito monótono e gelado, eles viajavam para a residência na Toscana e desfrutavam de tudo o que a localização tinha para oferecer.
— Vejo que a senhorita Fox é viúva apenas dois anos depois de se casar com aquele decrépito duque.
Lizzie sorriu, rolando para se apoiar nas pernas de Hugo e usá-las como travesseiro.
— Katherine escreveu para dizer que a Srta. Fox não ficou nem um pouco desolada com a morte dele e, com um herdeiro garantido, está desfrutando muito bem da viuvez.
— Creio que estaria bem, e como alguém poderia culpá-la? O duque tinha idade suficiente para ser avô dela.
Lizzie estremeceu e rolou para montar no colo de Hugo.
— Você parece muito interessado no que a senhorita Fox faz. Você se arrepende da sua escolha?
Hugo jogou o jornal de lado e a puxou com força contra ele.
— Me arrepender? Me arrepender de escolher a mulher que amo, mesmo que ela tenha mentido para mim quanto a ser uma herdeira?
Ela riu, lembrando-se do rosto do pobre Hugo na biblioteca de Lorde Leighton na tarde seguinte ao baile em que ele se declarou publicamente. O choque mudo que se seguiu à declaração de quanto ela valia. Valeu a pena esperar, ele dissera, e ela esperava que ele estivesse certo, pois com certeza valia a pena lutar por ele.
— Estou tão feliz, Hugo. Se eu morresse agora, saberia que vivi bem e amei com todo o meu coração.
Ele a beijou e ela colocou os braços em volta do pescoço dele, não querendo soltá-lo nunca.
— Eu também te amo. — disse ele quando enfim se separaram.
— Não acredito que tenha dito que te amo antes, mas se você insistir, também te amo. Vamos voltar para dentro, marido?
Ele balançou as sobrancelhas, e ela sorriu.
— Você vai me amar mais se eu disser sim? — ele perguntou.
— Talvez. Você terá que descobrir.
Nesse momento eles escutaram o miar de um de seus filhos, e Lizzie se abaixou para pegar Bichano, o gatinho todo preto que havia entrado no quintal algumas semanas antes e que logo se tornou parte da família deles. Ela beijou a adorável bola de pelos, sorrindo para o ronronar que era tão alto quanto seu miado.
— Já são quantos agora? — Hugo perguntou, dando um tapinha no gatinho.
— Sete no total, mas eles são bons em pegar ratos e não causam problemas. Você não se importa, não é querido?
Ele balançou a cabeça.
— Eu não me importo, não. Você se esquece que me contou sobre seus planos de se tornar uma senhorita solteira com montes de gatos. Posso tolerar as pequenas bolas de pelos, se é o que você quer, e eu tenho você em vez da solidão.
— Acho que foi mesmo uma boa barganha me casar com você, Lorde Wakely. Consegui meus gatos, tenho meu céu italiano e tenho você. Não quero mais nada.
— Eu também não. — ele a beijou novamente, e ela suspirou quando ele aprofundou o abraço antes que uma pequena pata negra tocasse suas bochechas.
Eles se afastaram, ambos olhando para o culpado que não gostava de não ser o centro das atenções. Ah, sim, a vida era positivamente perfeita.
E amanhã, quando Lizzie se sentasse para redigir suas cartas mensais para Londres, escreveria para Lady X e para Sally e contaria todas as notícias, incluindo a surpresa que faria para Lorde Wakely esta noite, de outra adição à família, mas desta vez , uma que viria sem pelos.
S.D. Perry
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