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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


COMO ENLOUQUECER UM MARQUÊS / Tamara Gill
COMO ENLOUQUECER UM MARQUÊS / Tamara Gill

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Ela salvou a vida dele, mas pode salvá-lo dele mesmo?
Hunter, Marquês de Aaron, engana a sociedade. Externamente, ele é um cavalheiro de posição, com bons contatos, riqueza e charme.
Interiormente, ele é uma bagunça. Seu vício — beber até um estado de estupor quase todos os dias — quase o mata quando ele entra na frente de coche de aluguel. Sua salvadora, a pessoa mais improvável, é a imagem de um anjo, mas com uma língua mais afiada que a bengala-espada dele.
Cecilia Smith não gosta de ociosidade e desperdício. Se ela tivesse nascido homem, ela já estaria trabalhando para o escritório de advocacia do pai. Então, no dia em que ela estava atrasada para uma reunião importante sobre uma de suas muitas instituições de caridade, ela não ficou impressionada ao ter que intervir e salvar um cavalheiro embriagado e patife de ser atropelado.
Quando suas esferas sociais colidem, Hunter fica surpreso e deslumbrado com a bela, e capaz, Srta. Smith. Cecília, por outro lado, fica confusa e nem um pouco receosa de verbalizar suas suposições sobre o Marquês e seus demônios. É impossível determinar se estas duas pessoas que pertencem a mundos tão adversos podem formar um mundo só deles...

 

 

 


 

 

 


CAPÍTULO 1

Cecilia Smith estava na Rua Curzon e tentava conseguir um coche de aluguel. As ruas estavam cheias com carrinhos de carvão e as calçadas lotadas de transeuntes e casais em seus passeios vespertinos. Cecilia fechou o spencer quando uma brisa leve resfriou o ar, e acenou para outro coche que também passou trotando sem olhar para trás.

O que estava acontecendo? Eles não a viam? Tal possibilidade devia estar mais perto da verdade do que ela gostaria de admitir.

Aqui em Mayfair, usando o vestido monótono e típico da classe trabalhadora, não era de admirar que ninguém se desse ao trabalho de parar para pegá-la. A classe a que pertencia não recebia a prestigiada boa educação, e ela não deixou de notar que muitos daqueles que a rodeavam lançaram a ela olhares curiosos, se não irritados, por ela ter ousado entrar no reino particular deles daquela maneira.

Pelo canto do olho, um vislumbre de negro chamou sua atenção.

Virando-se para olhar melhor, ela observou quando um cavalheiro tropeçou em direção a um poste, encostando-se a ele como se fosse a única coisa que o manteria de pé.

Ele era um cavalheiro alto, as roupas de corte perfeito se encaixavam bem no corpo esbelto e musculoso, mas os olhos dele, e ela podia ver mesmo deste lado da rua, estavam bem avermelhados e com anéis escuros embaixo deles.

Ele estava doente, sofrendo uma apoplexia ou apenas bêbado?

Outro coche de aluguel entrou na rua e não mostrou sinais de desaceleração. Cecilia voltou a atenção para o cavalheiro e

observou com horror quando ele começou a cambalear na direção da rua movimentada.

Sem tempo para hesitação, ela se dirigiu a ele, e olhando na direção do veículo de aluguel, não teve certeza se ela conseguiria sair do caminho antes que fosse tarde demais. Que homem absurdo e que estupidez a dele por colocar a si, e agora a ela também, em perigo. Esses dândis de Mayfair não tinham nada na cabeça?

Ele tropeçou no momento em que ela chegou ao lado dele, e ela o empurrou com força no peito, fazendo-o voar para trás e para a segurança mínima do meio-fio. Infelizmente, ele estendeu a mão naquele exato momento e a levou com ele. A cabeça do homem fez um estalo alto ao atingir as pedras do calçamento.

O veículo passou sem cuidado algum com eles, e Cecilia se levantou, ficando de pé lado do homem, olhando para ele. O cheiro de álcool flutuava dele, quase como se ele tivesse mergulhado no líquido, e seus pés incertos e a tentativa estúpida de atravessar a rua sem cuidado tornaram-se claros. No entanto, ela não podia apenas deixá-lo lá, mesmo que vontade não faltasse. Como seria adorável poder dançar pela cidade ao meio-dia, bêbada e sem preocupações, como esse sujeito parecia fazer. Ele deve ser um daqueles nobres ricos que dançavam nos bailes e acreditavam que tudo o que era dito ou escrito sobre eles era verdade.

Se soubessem que a classe dela ria e zombava deles a cada passo. Se não fosse por aqueles da laia dela, Londres iria parar, não importava o que pensassem a aristocracia. Eles podiam até fazer as leis, empregar muitos, mas eram os como ela que mantinham a cidade funcionando, e os condados no interior também se pensassem bem.

Ele gemeu, e ela se ajoelhou ao lado dele, batendo de leve na bochecha dele. As roupas dele cheiravam a vinho velho, o hálito era

puro álcool de uma noite de exageros, sem mencionar que havia um leve odor de suor que permeava o ar. Quando ele não respondeu a outro estímulo gentil, ela deu um belo tabefe. Ele abriu os olhos, e esferas azuis escuras se arregalaram em choque antes de se estreitarem com irritação. Tão perto assim dele, Cecilia notou as maçãs do rosto definidas, um queixo forte e o nariz muito perfeito, talvez mais bonito que o dela.

— Quem pensa que é para me bater desta forma? Tenha cuidado, senhorita, senhorita, senhorita.

Ela se levantou e estendeu a mão.

Ele olhou para a mão dela confuso antes que ela suspirasse e se abaixasse de novo para pegar na mão dele.

— Levante-se, antes que você quase atropele outra carruagem.

E seja rápido. Já estou atrasada para a minha reunião.

Ele gemeu quando permitiu que ela o ajudasse. Cecilia o levou até o meio da calçada e garantiu que ele estivesse longe da rua antes que ela soltasse a mão dele.

— Sua casa fica por perto? Posso acompanhá-lo até lá para garantir que chegue em segurança, diferente do que teria a poucos instantes?

Ele franziu a testa e a esfregou.

— Eu estava no meio da rua?

— Sim, você estava. Quanto bebeu, Sir?

— Não sou nenhum Sir. — respondeu ele com uma inclinação arrogante de cabeça.

Cecilia respirou fundo para impedir-se de empurrar o imbecil de volta para a rua.

Sério. Não era um Sir?

— Por favor, diga-me, o que você é então? Tenho certeza de que é importante saber para que eu corrija meus modos equivocados.

— Está sendo sarcástica? — uma pequena curva fez-se nos lábios dele.

Cecilia percebeu que havia fixado o olhar naquele movimento e se irritou por ser tão patética a ponto de olhar para a boca dele num momento como aquele.

— Você é um espertinho, Sir.

— Gostaria que soubesse que sou o Marquês de Aaron, Hunter para os meus amigos. Hunt para os mais próximos ainda.

— Bem, não somos conhecidos. — Cecilia se afastou dele, tirando o pó que voou no vestido após a colisão. — Se estiver seguro e bem o suficiente para conseguir chegar em casa sem ser atropelado por outro veículo, vou deixá-lo sozinho agora.

Cecilia se virou e começou a descer a calçada. Ela deixou o marquês de pé atrás dela, a boca aberta a última lembrança que ela teria dele. Ela sorriu um pouco, imaginando que ele nunca deve ter sido interrompido durante a fala assim na vida. Não que ele não merecesse ter seu pedestal nivelado um pouco mais abaixo.

— Espere! — ele exigiu, e os passos dele apressaram-se para chegar ao lado dela. — A senhorita não me disse seu nome.

Como Sua Senhoria era tão exigente quanto aos títulos, Cecilia decidiu brincar um pouco com ele.

— Sou a filha do duque de Ormond. Herdeira de uma enorme fortuna e à procura de um marido.

Ele se assustou.

— Mesmo?

— Não. Na verdade não. Eu sou a Srta. Cecilia Smith. Meu pai é dono e administrador da J Smith & Filhos: Advogados, e eu moro em Cheapside, se deseja saber. Também estou atrasada para uma reunião de caridade. Então, se não se importa, vou deixá-lo em seu estupor e partir.

Ela seguiu em frente e ignorou a risada leve que ouviu atrás dela. Ele não a seguiu, mas ela sentiu o calor do olhar dele em suas costas. Era uma sensação agradável saber que ele a estava observando, não que ela algum disse fosse voltar a vê-lo. Suas esferas sociais eram distintas, e ele só teria olhos para as mulheres da camada social dela para torná-las amantes. Nunca casamento, a menos que fosse um mal necessário devido a problemas financeiros ou por algum outro motivo semelhante.

E, por mais que odiasse admitir, Cecilia ouvira falar do marquês de Aaron e das artimanhas selvagens e impertinentes pelas quais o almofadinha era conhecido em Londres. Se o que escreveram nos jornais sobre ele era preciso, ele era um homem que vivia com pompa e desperdício e deixava um bando de jovens moças desejando que ele se casasse com elas. Dizia-se que, se ele pedisse uma dança, elas se apaixonavam na mesma hora.

Cecilia revirou os olhos, nada impressionada com seu primeiro encontro com o cavalheiro. Acenando novamente para um coche que vinha em sua direção, ela suspirou de alívio quando este parou, e ela poderia viajar alguns quarteirões até seu destino. A carruagem parou na esquina da Rua Fleet com a Avenida St. Bride. Cecilia desceu da carruagem, pagou o condutor antes de voltar a pensar na reunião na Old Bell Tavern, em que ela faria mais pressão para que um novo orfanato e escola fosse criado na Rua Pilgrim, em Ludgate.

Lá havia um prédio enorme e desocupado. Seu pai havia prometido a ela os fundos, e agora tudo o que ela precisava fazer era convencer as mulheres na reunião, e então todos os seus planos chegariam a bom termo. Era a coisa certa a fazer, e ela estava certa de que não teria nenhum problema em fazê-las concordar.

Se ela conseguisse ter um papel decisivo na vida de ao menos uma das crianças órfãs de Londres, garantindo que tivesse um bom

emprego, estável, que permitisse que esta pessoa vivesse uma vida plena e feliz, seu trabalho na caridade teria valido a pena. O dia em que as crianças, muitas doentes e pobres, saíam e se tornavam empregadas domésticas e damas de companhia, algumas tornavam-se cozinheiras, se tivessem talento, era o melhor dia do mundo para ela. Os meninos se tornavam lacaios, cavalariços e aqueles que tinham talento com os números poderiam até chegar a administradores. Se alguém quisesse mudar, teria que trabalhar para chegar à meta e não acreditar que tudo iria cair em seus colos.

Com um caminhar revigorado, Cecilia abriu as portas da Old Bell Tavern e dirigiu-se ao salão privado, onde suas reuniões sempre eram conduzidas. A vida era excelente, e ela estava prestes a torná-

la ainda melhor, em especial para aqueles que moravam nas ruas sem perspectiva alguma. Ainda não pelo menos.


CAPÍTULO 2

H unter observou a megera desaparecer na rua. Ela produzia uma visão adorável por trás, o corte do vestido, mesmo liso e sem brilho, não escondia a cintura pequena, os seios abundantes e o belo bumbum que balançava um pouco a cada passo. A senhorita Smith era uma mulher alta, e o deixava imaginando quão lindas e longas as pernas dela seriam, e até onde a cintura dele iria durante um determinado exercício físico...

Ele piscou quando um ataque de tontura o atacou, e agarrou o poste de luz à sua frente para se reequilibrar. Maldição, ele precisava de uma bebida. A boca estava tão seca quanto o deserto egípcio. Uma matrona passou e olhou por cima do nariz com desgosto. Curvando-se, Hunter tentou alcançar o chapéu para cumprimentá-la, mas sua mão encontrou o vazio.

O que diabos aconteceu com o chapéu dele!

Ele havia deixado o White's tarde e subiu em uma carruagem, lembrava-se de encontrar um bom amigo tarde da noite perto do Parque St. James para um jogo de cartas. Ele pretendia terminar a noite no quarto da amante, mas, parece que nunca chegou lá.

Hunter franziu o cenho e passou a mão no queixo. Na verdade, não fazia ideia do que se passara durante a noite ou quanto havia perdido nas mesas.

Voltando a andar, ele olhou para a direção que a Srta. Cecilia Smith havia desaparecido. Ela se foi há bastante tempo, e uma pontada de arrependimento o perfurou por ele não poder revê-la.

Poucas mulheres demonstrariam de maneira tão aberta seu

desagrado pela aparência atual dele, incluindo o fato de ele ainda estar tão atordoado quanto na noite anterior.

Era uma coragem dela que não poderia deixar de ser admirada.

Ele supôs que encontrar uma mulher tão franca, quase grosseira, fosse mais comum na classe média, já que tantas delas precisavam trabalhar ao lado de seus maridos e pais. E aqui em Londres, havia muitas dessas mulheres.

Hunter pisou no meio-fio e fez sinal para um coche de aluguel.

Sem mais caminhadas, seu estômago revirava, e talvez fosse o melhor a se fazer para não deixar uma trilha de regurgitações por toda a rua. A carruagem parou e ele lançou uma moeda ao condutor, em seguida se acomodou nas almofadas. Ele voltaria para casa, tomaria banho e se retiraria para dormir. À noite, Lorde Stone seria o anfitrião de uma peculiar noite que contaria com dançarinas exóticas de...

Hunter fez uma careta, incapaz de se lembrar, mas sabia que elas seriam tão bonitas quanto abertas a afetuosidades. Ele sorriu e fechou os olhos, descansando por um momento. Que vida maravilhosa, decadente e indulgente ele levava. Que esta vida nunca terminasse.

Cecília ficou diante dos membros da Sociedade de Socorro de Londres e ficou zangada.

— Como assim, não podemos abrir um novo orfanato e escola na Pilgrim? O prédio está lá, vago e abandonado. Só precisamos descobrir quem é o dono e então comprar o maldito lugar.

— Senhoras, por favor. Permita que a senhorita Smith explique antes que descartemos essa nova ideia. — disse a duquesa de Athelby, encarando as poucas mulheres que discutiram com Cecilia nos últimos dez minutos. — Cecilia merece sua vez de falar.

A duquesa, uma mulher de grande importância na sociedade, era uma adição bem-vinda aos membros, e juntou-se pouco depois de se casar com o duque. Durante o ano anterior, elas se tornaram boas amigas. A duquesa era uma mulher disposta, de verdade, a ajudar os menos afortunados.

Sua amiga, Katherine Martin, cujo pai era um construtor conhecido e respeitado em Londres, levantou a mão, capturando a atenção de todas.

— Tudo o que Smith está tentando dizer é que não devemos desistir com tanta facilidade. Aquelas de nós aqui que são de famílias da classe trabalhadora sabem bem que quando as coisas ficam difíceis, simplesmente puxamos as mangas e vamos o trabalho. Não há diferença aqui. Nós podemos e faremos. Nós devemos.

Cecilia sorriu para a amiga que sempre a apoiava. Elas cresceram juntas, viviam lado a lado em Cheapside desde que Cecilia se lembrava.

— O prédio está muito degradado para abrigar crianças, e ainda acho que devemos direcionar fundos para as escolas que já temos.

— disse a Srta. Tapscott, com a boca pequena e arrogante se movendo e lembrando Cecilia da parte traseira de um cachorro.

Cecilia lutou para não revirar os olhos.

— Senhorita Tapscott, não podemos apenas ignorar a necessidade que prevalece em Ludgate, assim como, na verdade, acontece em muitos bairros de Londres. Concordo que o prédio precisa de reforma, mas temos familiares, pais que possuem e administram comércios variados em Londres e arredores. Se existe um grupo de mulheres que são capazes de transformar aquele prédio em uma escola e lar para os menos afortunados, capazes de mudar suas vidas e dar-lhes alguma chance, somos nós.

— Ela está certa, e senhorita Tapscott — disse Katherine, de pé.

—, seu pai é dono de um moinho. Decerto que você poderia convencê-lo a doar um pouco de madeira para reconstruir as partes do prédio que precisam de reparos.

— Tenho certeza de que poderia convencer meu pai a ajudar no suprimento de madeira. Ele tem muitos homens trabalhando para ele, sabe bem. Ele é muito bem-sucedido, mesmo que não venha muito a Londres. —disse a Srta. Tapscott, olhando de relance para Cecilia.

— Muito bem, e conversarei com meu pai para descobrir quem é o dono do prédio e daremos os passos necessários para fazer a compra. Tenho certeza de que, se encontrarmos o proprietário, que está claro que não usa ou deseja usar o edifício, seremos capazes de convencê-lo a vender. — Cecilia colocou as anotações na pequena bolsa de couro, anunciando o final da reunião. — Vamos nos reunir aqui na próxima semana, no mesmo horário. Nosso dever é descobrir que ajuda e assistência nossas famílias e amigos podem proporcionar para esta nova escola e lar de crianças carentes.

Estamos todas de acordo?

As sete damas presentes concordaram e, em poucos minutos, Cecilia e Katherine começaram a andar em direção à porta da taverna.

— Foi uma boa reunião hoje e estou muito satisfeita por termos conseguido conversar com as senhoras para ver os benefícios de ter uma nova escola instituída. O número de crianças que precisam de nossa ajuda aumenta a cada dia, e em Ludgate, não existe uma instalação como a nossa, e é extremamente necessária.

— Eu concordo. — disse Cecilia, abrindo a porta para a amiga antes de ir para o meio-fio e fazer sinal para um coche de aluguel.

— Papai me ajudará a rastrear os donos do edifício e, em seguida, poderemos avançar com nossos planos.

Um veículo parou a frente delas depois de muitos acenos.

Katherine subiu e bateu a porta da carruagem.

— Vamos assistir à ópera hoje à noite. Gostaria de saber se o Sr.

Elton estará presente.

— Tenho certeza de que ele estará, e você poderá se derreter por ele mais uma vez. Não que deva. Ele é um pouco velho para você.

— Ele tem apenas trinta anos, Cecilia. — Katherine sorriu e olhou pela janela. — Mas eu gosto dele. Que pena que ele corteje a senhorita Tapscott.

— Emily não é melhor que você em nada. — Cecilia suspirou pensando no esbarrão com o desagradável marquês de Aaron esta tarde. — Eu contei de quem tive a infeliz missão de salvar hoje?

Um pequeno arrepio percorreu sua pele ao pensar nele. De quão perto ele esteve de ser atingido pelo coche de aluguel. Que bêbado idiota ele era e como era uma pena por este ser o caso. Pois, se o marquês estivesse bem aprumado, sem demonstrar os desperdícios da noite anterior e da farra a que estivera presente, com certeza seria um homem muito bonito.

Oh, quem ela estava enganando?

Ele era bonito de qualquer maneira.

Katherine voltou toda a atenção para Cecilia.

— Quem? Você não chegou a mencionar ter encontrado alguém antes da reunião.

— Eu me atrasei, se você se lembra, e o motivo disso foi muito belo e muito arrogante Marquês de Aaron. Eu estava na Rua Fleet quando notei o homem tropeçando, e então o tolo teve a ideia de ir

para o meio da rua e tentar ser atropelado por uma carruagem. O

que mais eu deveria fazer, além de salvar o inconsequente?

Os olhos da amiga se arregalaram.

— E então?

— Então o quê? — Cecilia perguntou, franzindo a testa.

— O salvou!?

Ela riu.

— Ah, sim, tirei-o da rua sem causar danos à sua maravilhosa estrutura óssea. Mas eu realmente deveria ter deixado ele ser atingido. Nenhum homem deveria ser tão perfeito.

Katherine riu.

— Você ralhou com um marquês. Oh, que história para contar aos seus netos um dia. Ele é famoso por Londres. Todo mundo quer a amizade dele, ser parte de seu círculo social. Ele é conhecido por ser muito travesso e flerta com até as velhas matronas da sociedade. E você salvou a vida dele. Ele está em dívida com você.

— Ele não me deve nada. Com toda a honestidade, fiquei feliz por estar lá para ajudá-lo, pois não poderia estar mais bêbado.

— Sua Senhoria estava embriagado no meio do dia? —

Katherine suspirou, recostando-se nas almofadas. — Eu não deveria me surpreender considerando os boatos que já ouvi.

— Que boatos? — Cecilia desviou o olhar das ruas em que a carruagem serpenteava. Ruas bem menos vistosas do que as que agraciavam o bairro do marquês.

— Que ele está sempre embriagado. Que não houve um único evento este ano em que ele compareceu e que ao sair não estivesse deste jeito. É realmente uma pena que ele não consiga frequentar bailes e festas sem ficar tão bêbado. Sua Senhoria poderia vir a descobrir que é capaz de se divertir mais se não ficasse em tal estado, mas até hoje poucos o viram de outra forma.


Suponho que a vida rebelde que leva possa ser atribuída a seus pais.

Cecilia não gostou da ideia de o marquês ter tais demônios.

De fato, hoje, quando ela o salvou, já estava no meio da tarde. A maioria das pessoas daquela esfera dormia o dia inteiro, recuperando as forças para os entretenimentos da noite seguinte.

Mas não era o caso de Sua Senhoria. Ele ainda estava voltando para casa e só Deus sabe de onde. O cheiro dele decerto que não era agradável, como seria de esperar de um nobre. O que Katherine estava dizendo era verdade? Que terrível se fosse assim.

— Os pais dele? Como assim? — Cecilia perguntou.

Katherine encontrou seu olhar.

— Os pais dele, antes de virem a falecer, eram conhecidos por travar discussões a olhos vistos, tinham uma relação de amor e ódio intensa. — ela encolheu os ombros. — Embora nunca tenha sabido de Lorde Aaron comportando-se da mesma forma com uma mulher, à portas fechadas ele com certeza é como o pai.

— Como você sabe tanto sobre o marquês? Nunca ouvi você mencionar o nome dele antes de hoje.

— Leio o jornal, mas também porque minha dama de companhia tem uma irmã que trabalha para o marquês, na copa. Mesmo assim, as histórias que ela conta sobre Sua Senhoria, as festas que acontecem na casa dele, as companhias e no que se envolvem está tudo além do que podemos imaginar. Ainda falarão de Sua Senhoria por anos a fio, mesmo depois de sua morte.

O que não deve tardar caso ele mantenha o comportamento atual. Se jogar na frente de carruagens, por exemplo. Belo estúpido.

Mais tarde naquele dia, Hunter estava mergulhado na banheira quando um criado bateu à sua porta.

— Meu senhor, seu administrador gostaria de uma palavra com você lá embaixo na biblioteca quando estiver pronto. Ele está disposto a esperar.

— Diga para ele vir aqui e falar. Não vou tomar um banho apressado.

Por Deus, ele havia acabado de entrar na maldita banheira, e com alguma sorte a dor de cabeça que o assolava diminuiria um pouco na água quente e suave que cheirava a lavanda.

Hunter descansou a cabeça na banheira e encarou o teto ornamentado que mostrava querubins flutuando nas nuvens. Na verdade a pintura era horrenda, mas algo comum em sua casa.

A memória de outro ser com o bumbum redondo surgiu em sua mente. Senhorita Cecilia Smith. Um nome muito comum para uma mulher que era o completo oposto de comum. Ela era extremamente atraente para uma mulher de classe média, sem título, vinda de uma parte diferente de Londres, seus círculos sociais não podiam ser mais diferentes. Mas ela era de extraordinária beleza.

Suas madeixas douradas e etéreas estavam presas no topo da cabeça, pequenas mechas flutuavam em seu rosto junto aos mais impressionantes e inteligentes olhos azuis que ele já vira. Ela o salvou da morte e, nem que sua vida dependesse disso, ele conseguia recordar se chegara a agradecer.

E nem teria a chance agora, já que era improvável que ele a visse outra vez. Uma pena já que ele adoraria conhecê-la melhor.

Ele precisava encontrar uma nova amante, a atual era muito carente, havia se tornado uma coisinha chorona que não era mais divertida. Talvez uma mulher da classe da senhorita Smith aceitasse tal proposta dele.

Ele descartou a ideia assim que a teve, ela era filha de um advogado, teria familiares e amigos que esperavam que ela se casasse bem, ela não seria solícita a tornar-se amante dele, não importa o quão rica ele a tornasse.

Ele se assustou quando uma batida alta soou na porta do banheiro.

— Entre. — ele disse, suspirando quando seus pensamentos e ideias para a deliciosa Srta. Smith desvaneceram.

— Meu senhor, desculpe-me por interrompê-lo, mas tenho alguns assuntos comerciais urgentes que precisam ser discutidos.

— Que são? — ele perguntou, lançando um olhar para seu administrador, Sr. Marsh.

Seu funcionário era um cavalheiro alto, mas muito magro e de longe, parecia que uma boa refeição o mataria. Seus cabelos estavam lavados e afastados do rosto que contava com uma testa excessivamente larga. Ele era um homem inteligente, motivo pelo qual trabalhava para Hunter. Talvez fosse algo bom uma testa tão larga, e só assim era capaz de conter um cérebro tão potente.

— A propriedade desocupada na Rua Pilgrim recebeu uma oferta de compra. — ele vasculhou seus papéis. — Ah, a instituição de caridade chamada "Sociedade de Socorro de Londres". deseja uma reunião para discutir os valores.

Hunter sentou-se na banheira.

— Essa propriedade será o local de instalação de um Clube de Cavaleiros para a classe média. A reforma deve começar no próximo ano. Por que alguém a quereria? A propriedade foi retirada do mercado há meses.

Ele teve a ideia de um clube de cavalheiros para a classe média, para dar aos banqueiros, advogados ou juristas um lugar para desfrutar de um bom vinho, comida e companhia inteligente. Fora

uma de suas melhores ideias e estava nos estágios finais de planejamento e concepção.

— Creio, meu senhor, que desejam abrir uma escola para as crianças que precisam, um tipo de orfanato.

A localização fazia sentido, pois naquela parte da cidade havia centenas de crianças ao Deus dará, seus pais trabalhando horas a fio ou, em casos mais infelizes, mortos e incapazes de prover. Nesta parte de Londres, o mais proeminente, tal situação era deixada à margem. Ninguém mencionava o assunto que era ignorado de certo modo.

Hunter queria renovar um pouco a área, oferecer um pouco de luxo a quem morava e trabalhava lá. Montar um orfanato e uma escola não se encaixava nesse plano.

— Quanto eles ofereceram para o edifício em seu estado atual?

— Hunter perguntou, que nunca imaginou que alguém ficaria interessado no local.

— Duzentos e cinquenta libras, meu senhor.

Uma quantia excelente, mas ainda assim não é um clube de cavalheiros.

— E quando essa instituição de caridade deseja ter a reunião?

O administrador folheou os papéis mais uma vez.

— A reunião está marcada para amanhã, às quatro da tarde, em meu escritório na Rua Regent. A instituição comparecerá e fará uma oferta formal.

O que ele faria na noite seguinte...

Ah, havia um jogo de cartas no White's que ele queria participar.

Muitos cavalheiros que não jogavam tão bem quanto deveriam estariam presentes, e Hunter poderia sair com uma bolsa muito mais volumosa do que a que chegaria.

— Sabemos quem estará presente representando tal instituição?

— Hunter perguntou, a voz entediada até para seus próprios ouvidos.

Novamente, o Sr. Marsh folheou a papelada.

— Um Sr. John Smith e sua filha, Srta. Cecilia Smith. O Sr. Smith é o advogado-proprietário da J Smith e Filhos.

Hunter voltou a sentar-se ereto na banheira.

Senhorita Cecilia Smith.

Poderia ser a mesma que o salvou e ralhou com ele poucas horas atrás?

— Suponho que comparecerei para ouvir o que têm a dizer.

Embora não tenha intenção de vender, tenho outros negócios na Rua Regent e estarei na área. É justo que eu vá e notifique esta instituição de caridade dos meus planos para o local.

— Muito bem, meu senhor. Vejo você amanhã às quatro. —

disse o Sr. Marsh, curvando-se e deixando-o em paz.

Hunter fechou os olhos, deleitando-se com a água quente e perfumada. Amanhã ele compraria uma nova Faetonte. O barão Abram trouxe as carruagens para Londres de sua propriedade em Kent, e Hunter queria fazer parte deste negócio. Agora ele seria capaz de se divertir nas festas com as apostas realizadas nas corridas deste veículo.

Uma ideia impressionante, se é que ele tinha dessas.


CAPÍTULO 3

C ecilia Smith fechou a boca depressa quando o marquês de Aaron se sentou em frente a ela no escritório do Sr. Marsh na Rua Regent. Ela perdeu o fôlego por um breve instante em que seu estômago se revoltou. Isso não poderia estar acontecendo.

Fazia poucos dias que seus caminhos haviam se cruzado pela primeira vez, e agora, aqui estava ele de novo, encarando-a com tanto divertimento que a fez se arrepiar e as bochechas esquentarem.

Para ter certeza de que nada estava fora do lugar, Cecilia verificou seu traje e se satisfez que tudo estava bem, então encontrou o olhar dele. Ele não precisava saber que ela havia comido massa antes de vir aqui, e teria sido azar dela se houvesse manchas no vestido verde-garrafa dela.

O administrador do marquês começou a discutir os planos para o edifício, e foi suficiente para tirar Cecilia de suas reflexões sobre Sua Senhoria e se concentrar no trabalho em questão.

— Um clube de cavalheiros! Isso é um disparate! — ela disse, erguendo o queixo. — Não estamos falando de Mayfair ou Knightsbridge, e sim de Ludgate. Não queremos clubes de cavalheiros aqui. O que é necessário são mais lares para aqueles que têm menos sorte do que nós.

A boca do Sr. Marsh se apertou, e Cecilia sorriu para ele.

Ela não entraria no jogo deste poderoso lorde. Ele não faria a Sociedade de Socorro de Londres começar do zero e ter de encontrar outro lugar para comprar. Nas condições em que este edifício estava, duzentos e cinquenta libras era, talvez, mais do que

deveriam oferecer, mas era primordial em seus planos futuros, era imperativo para o destino das crianças daquela área e, portanto, ofereceram um pouco mais para tornar o negócio tentador para o atual dono. Nesse caso, porém, ela não havia pensado que o dono seria o marquês, um abutre faminto por dinheiro.

— A propriedade, mesmo em sua condição atual, possui mais valor do que o oferecido. Contudo, como afirmei antes, meu cliente irá reformar o prédio para se adequar a um clube de cavalheiros, não um orfanato.

Cecilia colocou a mão no braço do pai quando ele foi falar e, em vez disso, chamou a atenção do marquês.

— Talvez Sua Senhoria, considerando o fato de eu ter salvado a vida dele apenas alguns dias atrás, repense seus planos para o edifício. Se eu não tivesse impedido que sua pessoa embriagada se atirasse na frente de um coche de aluguel, o senhor nem estaria aqui hoje para aceitar ou rejeitar nossa oferta. Nem seria capaz de transformá-lo em um clube de cavalheiros, como está determinado a fazer.

Ele se recostou na cadeira, sorrindo, e o estômago de Cecilia tremeu ante a beleza extraordinária daquele rosto.

— Touchè, senhorita Smith, porém, não vou vender o prédio para você. Acreditei ser a coisa certa a fazer vir em pessoa explicar os meus planos à Instituição de Caridade e à senhorita, e não vim renegociar um valor.

Raiva e decepção correram nas veias dela.

— As crianças confiam em nós, crianças que nunca terão um teto sobre suas cabeças, a menos que eu o proporcione. O fato de você menosprezar as circunstâncias deles querendo criar um clube de cavalheiros frívolo e tedioso que promove um estilo de vida afluente que não ajuda ninguém, faz você parecer um idiota.

O administrador ofegou, e o pai apertou a mão dela, balançando a cabeça.

— Cecilia, peça logo desculpas a Sua Senhoria.

Ela ignorou todos eles.

— E enquanto estamos aqui, deixe-me lembrá-lo de que seu prédio pode ser o mais adequado, mas não é o único disponível na área. Podemos procurar em outro lugar, se for necessário, saiba bem disso.

Embora fosse o melhor de todos os que encontraram, e o mais barato no momento, ele não precisava saber disso. Vai saber se estivesse dificultando a compra para obter uma oferta mais alta.

O marquês recostou-se na cadeira e cruzou os braços sobre o peito.

A ação fez seus braços parecerem muito maiores do que ela se lembrava deles no dia anterior. De fato, hoje Sua Senhoria parecia quase normal. Com certeza não estava embriagado, nem parecia privado de sono como na tarde anterior. Na verdade, estava com um ar de inteligência que ela não havia acreditado que ele possuía.

— Se você tivesse apresentado a oferta há doze meses, eu poderia ter pensado no assunto, mas desde então pus em prática planos para a reforma e estruturação do uso do edifício. Então hoje, infelizmente, senhorita Smith, você está sem sorte.

— Parece que sim. — disse ela, levantando e colocando o bloco de notas de volta na maleta de couro que carregava para todos as reuniões de negócios. — Venha, papai, esta reunião terminou.

O marquês se levantou e estendeu a mão para ela.

Cecilia olhou para ele por um momento, debatendo consigo se realmente queria apertar a mão desse homem ou mesmo tocá-lo de alguma forma. Da última vez, quando o tocou, ela se viu um pouco perdida, fora de si. Não era algo a ser repetido.

Com um suspiro, ela apertou a mão dele de tal forma que ele estreitou os olhos. Bom, ela queria que ele soubesse que não era uma senhorita patética e chorona a quem ele poderia ludibriar. Ela era uma mulher educada e mundana que podia ler esse marquês como um livro. Ele pode estar rindo dela agora, pensando que ela é uma boba por tentar fazer negócios com um lorde, mas ela mostraria a ele a verdade. As negociações não terminariam aqui. E

ele não venceria esta guerra. Nem hoje nem nunca.

Ele arqueou uma sobrancelha, um sorriso levemente sardônico inclinando seus lábios.

— Que aperto de mão forte você tem, senhorita Smith. Quase masculino, de fato.

Ela riu, puxando-o para mais perto dela, para que apenas ele pudesse ouvir.

— Não entrarei nesse jogo, nem permitirei que crie seu clube de cavalheiros. Creio que deveria dedicar algum tempo para refletir sobre nossa oferta final. Não se esqueça, senhor, a classe a que pertenço é a mesma de que você pretende arrancar dinheiro, e meu pai é muito conhecido. Seu clube precisará de associados, sim? Se não o vender para mim, mesmo a contragosto, me certificarei de que ninguém do meu círculo social jamais ponha os pés em seu empreendimento.

Ele sorriu, segurando-a com força e não a deixando retirar a mão do aperto dele.

— Você é muito encantadora, senhorita Smith. Diga-me o que mais você planejou para o meu futuro. Estou muito extasiado.

Cecilia puxão a mão.

— Nada mais, milorde. Creio que já falei o bastante.

Respirando fundo, ela ajudou o pai a se levantar já que ficar sentado por tanto tempo o fazia ficar um pouco travado. Seguindo

para fora do local, eles logo chegaram na carruagem da família, para voltar ao escritório. Cecilia tirou as luvas, batendo-as nas saias.

— Esse homem é o mais irritante, arrogante, emproado que eu já conheci na minha vida. Sem mencionar que é um dos mais imbecis. Um clube de cavalheiros, para homens como você, papai.

Que absurdo.

— Você foi extremamente franca com o marquês. Ele poderia tornar sua vida difícil, e mesmo que nossa esfera social seja pequena, complicar suas chances de um bom casamento. Deve ter cuidado em como fala com as pessoas, minha querida. Não é do seu feitio.

— Humpft. Não me importo se não é coisa que se diga ou não, ele é um imbecil.

O pai dela franziu a testa e a estudou por um momento.

— O que você quis dizer quando mencionou que salvou a vida dele há dois dias? Você já se encontrou com o marquês antes?

Cecilia assentiu e olhou pela janela da carruagem, as ruas repletas de compradores e pessoas em busca de passeios ou para cumprir tarefas. Não ela, porém. Aos vinte e três anos, ela era uma solteirona convicta e sem perspectivas casamenteiras, como desejava que fosse. Tendo as amigas e sua caridade, ela nunca se sentia sozinha ou triste com suas circunstâncias. Pelo contrário, não ter marido a permitia passar mais tempo com os infelizes do mundo.

E preferia estar com eles, do que cuidar de um cônjuge, trancada em casa dia após dia, sem mais nada a fazer além de costurar e organizar festas.

— Eu estava atrasada para uma reunião da Sociedade de Socorro de Londres e vi esse homem vagueando, tropeçando até na rua. Ninguém parecia estar ciente do perigo que ele corria, e eu intervim. Impedi que ele fosse atropelado por uma carruagem que

passava. Eu deveria ter deixado que passasse por cima. Assim, eu teria conseguido meu prédio por duzentos e cinquenta libras. A propriedade dele teria sido vendida, e sem muita discussão.

O pai dela fez uma careta.

— Cecilia, você não deve falar coisas tão feias. Você é melhor que isso. Eu sei que tem um bom coração, e encontraremos outros edifícios. A negação e a teimosia dele serão benéficos para você, escreva minhas palavras.

A carruagem parou na frente de J Smith e Filhos, o escritório de seu pai.

Cecilia olhou para as portas de vidro do prédio com o nome do pai, que incluía 'e filhos'. Não que ela tivesse irmãos, um ponto que ele nunca mencionou, mas a decepção que ele sentia, às vezes, era palpável em sua casa. Se ao menos as mulheres pudessem ser advogadas, banqueiras e administradoras, daí o "E filhos", poderia ser substituído por "E Filha". Mas não era para ser. O pai dela escolhera quem assumiria a empresa depois de sua morte, e não era ela.

— Você gostaria de entrar e falar com o Sr. White? Eu sei que ele gostaria de revê-la.

O homem que seu pai tencionava para ela era o Sr. Justin White, um advogado pomposo que havia sido treinado por ele e agora ajudava a administrar a empresa. Cecilia não suportava o homem, ele era exigente e não tinha nem um pouco de empatia em seu corpo, certamente não pelas instituições de caridade dela. Por mais que o pai desejasse, ela nunca se casaria com o homem. Mesmo que ele acabasse herdando a empresa.

Se ela viesse a se casar, e este era um grande "Se", ela queria um homem que cuidasse daqueles que nasceram menos afortunados. Que doasse tempo e dinheiro às causas dela e

tentasse fazer algumas mudanças nas circunstâncias dessas pessoas. Um marido que não esperasse dela uma esposa reclusa e muda, uma mulher para ser vista e não ouvida. E certamente não um marido que não fazia nada além de passar a vida cometendo loucuras e vivendo sem rumo. Como um certo marquês em que ela conseguia pensar.

— Vou recusar desta vez, obrigada pai. Depois de hoje, desejo voltar para casa logo e tomar um banho longo e quente. Preciso lavar o fedor autocrático e obstinado de lorde Aaron.

O pai riu e a deixou sozinha na carruagem.

No restante da viagem, ela ficou olhando distraída para o lado de fora, pensando no marquês. Como ele ousava negar a oferta dela, assim sem nem pensar um pouco nos desafortunados. Ele era tão insensível por ignorar com tanta facilidade o que era necessário para a caridade dela, para as crianças e famílias que dependiam delas?

Ela torceu as luvas nas mãos.

Não importava o que ela dissesse ao administrador do cavalheiro ou a seu pai, o prédio era realmente a única opção. No momento, não havia mais nada no mercado, e o orçamento limitado para reformas ia no mesmo caminho. O prédio ao lado do que eles queriam, embora estivesse à venda, precisava de muito mais trabalho; portanto, a menos que pudessem obter mais fundos, o que era algo bem improvável, a propriedade de Sua Senhoria era a única alternativa. Era imperativo consegui-lo de alguma maneira. Se ao menos ela tivesse conseguido manter a compostura e não tivesse terminado a reunião de forma prematura. Às vezes, a irritação realmente atrapalhava o progresso dela.

Deveria ter uma forma de mudar a decisão dele. Talvez ela pudesse pedir de novo, levar algumas crianças infelizes para que


ele pudesse ver por que o prédio era tão importante para elas. Fazê-

lo enxergar as lutas travadas longe de sua preciosa Mayfair.

Cecilia apertou os lábios quando uma ideia maravilhosa surgiu em sua cabeça. Ah, sim, o marquês, caso ela executasse tal ideia, venderia o edifício para ela, e bem depressa, em especial pelo que ela teria a espera dele. Ela chamou o condutor, direcionando-o para Spitalfields, um orfanato e escola. Ela precisava de uma pequena ajuda de seus amigos lá. O pobre Lorde Aaron estaria batendo na porta dela para vender, e com bastante pressa, se dependesse de seus amigos, até antes do final da semana.

HUNTER desceu a rua St. James, sua bengala batendo contra a calçada de pedras de forma regular enquanto se dirigia para o White's. Depois de sua reunião com a senhorita Smith na semana anterior, ele descobriu que não tinha estômago para participar dos entretenimentos agendados e deixou dois bailes passarem, além de um piquenique em Richmond Park. Muito estranho e atípico da parte dele. A garota petulante o havia irritado muito, e nada do que ela havia dito havia incomodado sua consciência. Ele nunca ostentou a riqueza que possuía, sua capacidade de gastar o que quisesse, sempre que desejasse, sem se importar com mais ninguém. Ou ostentava?

Decerto que não.

Era apenas o seu modo de vida. Como ele cresceu. Com certeza, era a maneira que todos de sua esfera social vivia. Hunter fez uma pausa e se virou, certo de que estava sendo seguido. Duas vozes de crianças, meninos, vinham de trás dele, e ele se virou

novamente, desta vez pegando os dois malandros que pararam e fizeram uma tentativa óbvia de olhar para o céu.

— Há algo que gostariam de me pedir, meninos? — ele perguntou, caminhando até eles.

Os rostos deles estavam longe de serem considerados limpos, e as roupas não estavam bem conservadas. Manchas pontilhavam as peças, e era óbvio que haviam sido remendadas várias vezes. Um dos meninos estava com as calças altas nos tornozelos, pescando.

Os dois destoavam bastante nesta área de Londres.

Nesta semana, ele passou por vários episódios de crianças mendigando a ele. Na frente de casa, ele foi emboscado por um grupo de meninos, não mais que oito anos cada, implorando por dinheiro, os rostos sujos e os olhos suplicantes, o que o convenceu a enfiar as mãos nos bolsos para dar aos garotos o que pediam.

Ele considerara o incidente como isolado, mas estava errado. Ao voltar para casa, de um passeio no Hyde Park, ele foi abordado por uma jovem mulher, o vestido estava limpo, mas ela trazia um ar de pobreza que embotava suas bochechas e olhos. Ela pediu dinheiro para ajudar a pagar pela comida das crianças que ela mantinha sob seus cuidados. Mais uma vez, ele enfiou a mão no bolso e, com nada além de um soberano, entregou a moeda, concedendo-lhe um benefício que ela talvez nunca mais veria.

Os dias seguintes se passaram sem incidentes, mas agora, mais uma vez, aqui estavam pedindo por caridade. Nunca em sua vida ele havia sido alvo de tantas abordagens, o que começava a tornar-se absurdo. Não se viam mendigos em Mayfair e St. James.

— Bem, meninos? O que querem?

Embora ele pudesse adivinhar sem dificuldade.

Eles o encararam antes de trocar olhares.

— Estamos procurando por doações, milorde. Para ajudar com a nossa escola.

— Escola? Esta era uma palavra que não havia sido usada pelos outros pedintes, portanto, "escola" o intrigou.

— Você está sendo ensinado em algum lugar.

Hunter estreitou os olhos, curioso e começando a ver um padrão comum a todas as abordagens.

— Spitalfields, Orfanato e Escola. Estamos arrecadando fundos para comprar um novo prédio para crianças na área de Ludgate.

Nós, crianças, precisamos de muita ajuda, senhor. Ajuda de homens como você.

— Você, com certeza, foi bem ensinado, pela maneira como fala.

— uma sensação de reconhecimento se instalou nele. — Diga-me, quem é o patrono da sua escola. Dessa forma, saberei a quem enviar uma doação.

— Senhorita Cecília Smith, milorde.

O menino mais velho deu um tapa no mais novo, olhando-o furioso.

— Você não deveria contar nada ao almofadinha, era só para conseguir o dinheiro.

Por que isso não o surpreendia...

Hunter lutou para não revirar os olhos. A mulher era uma atrevida, uma intrometida que agora mandava os alunos para pedir fundos a um cavalheiro em Mayfair. Ele tirou do bolso uma moeda de ouro e a jogou no ar. Tão rápido quanto um raio, o menino mais velho esticou a mão e a agarrou.

— Certifique-se de que a Senhorita Smith receba a doação. E, por favor, diga a ela que é tudo o que ela receberá de mim, e que assim, ela pode parar de enviar seus tutelados para fazer o trabalho sujo por ela.

Os meninos fugiram, rindo e sorrindo, sem dúvida pela boa sorte de ganhar alguma coisa, exatamente como a patrona havia dito.

Hunter se virou e seguiu para o White's.

O livro de apostas sempre continha desafios interessantes para se arrecadar uns trocados, e esta seria sua única oportunidade de checar, pois deveria encontrar-se com alguns bons amigos no baile de Hamish Doherty, Conde de Leighton, esta noite.

Ele desacelerou os passos ao chegar na St. James, a Srta.

Smith monopolizando seus pensamentos. O que ela pensaria de como ele lidara com os truques dela? Ela ficaria furiosa, sentiria-se desafiada? As bochechas dela ficariam rosadas e seus olhos brilhariam com fúria justificada pela nova negativa dele?

De repente, e sem explicações, ele conseguiu imaginar como ela ficaria linda em um vestido da última moda. Um vestido que abraçaria seus seios e flutuaria sobre suas pernas longas e finas, provocando uma breve sugestão do que havia por baixo. Os cabelos seriam presos no alto, exibindo seu pescoço elegante e um rosto perfeito. Qualquer cor que não fosse o cinza monótono que ele havia visto nela até hoje ressaltaria a pele cremosa que parecia nunca ter sido beijada pelo sol. Uma parte dele esperava poder revê-la. Mesmo que ele precisasse aguentar outra reprimenda dela, mesmo que ela escolhesse bem as palavras e não perdesse a compostura.

Eu a quero.

Ele vacilou por um segundo ao tomar consciência. Se ele desejasse que ela fosse sua amante, talvez ele devesse ganhar alguns pontos visitando a instituição de caridade dela, vendo com os próprios olhos como ela ajudava, e o que mais fazia por esses infelizes de Londres.

Virando-se, ele olhou para onde os meninos haviam corrido, mas eles já haviam partido.

Como era mesmo o nome do lugar de onde eles disseram que eram?

Hunter virou-se para caminhar na direção de que vinha, e acenou para um coche de aluguel.

— Para Spitalfields, Orfanato e Escola. O mais depressa que puder.


CAPÍTULO 4

— N ão consigo encontrar a caixa com os quadros de giz novos, Darcy, você sabe onde Katherine os colocou? — Cecilia perguntou, tirando uma mecha de cabelo solta do rosto.

Durante todo o dia elas procuraram as lousas que faltavam para as crianças que haviam acabado de começar na escola, esta semana. E com Katherine fora, estava no interior com o pai lidando com uma obra, Cecilia não poderia perguntar a ela

— Lorde Aaron, o que traz o senhor aqui?

Cecilia parou, e olhou pelo vidro do armário que ficava atrás de um grande balcão de recepção onde Darcy, a duquesa de Athelby, também se encontrava. O marquês estava aqui? Ó, meu Deus, isso significa que ele descobriu que ela estava por trás das crianças que o importunaram pedindo dinheiro para a caridade.

Droga.

Ela se levantou e fez sua presença conhecida. A atenção do marquês voltou-se para ela, mas desta vez não havia diversão em seu olhar, apenas indiferença. Quão mutável o homem era.

— Conhece a Srta. Smith, duquesa? — ele perguntou, sem desviar o olhar de Cecilia.

Darcy se aproximou e pegou a mão de Cecilia, puxando-a para onde Sua Senhoria estava.

— Tornamo-nos amigas ao longo dos últimos doze meses. Assim que entrei para a Sociedade de Socorro de Londres, que é claro, Cecilia administra. Farei qualquer coisa, como sabe, para ajudar os menos afortunados.

Cecilia fez uma pequena reverência.

— Podemos ajudá-lo com alguma coisa, Lorde Aaron?

Ele apontou para uma porta que dava para a fachada do escritório em que estavam.

— Fui abordado na rua por dois pequenos patifes que vêm deste local. Pediram esmola na Rua St. James, a seu pedido. Acredito que essa foi a quarta instância desta semana. Vim sugerir que fique de olho naqueles que dizem estar sob seus cuidados e encargos.

Darcy sorriu e deu um tapinha no braço de Cecilia.

— Eu acho que vou deixar você lidar com nosso bom amigo. —

ela deu a volta na mesa e beijou a bochecha do marquês. — Venha jantar esta semana. Adoraríamos receber você.

Cecilia ignorou a pontada de ciúmes ao ver Darcy beijar um homem em quem ela começara a pensar mais do que deveria. Ao longo daquela semana ela passara horas intermináveis indagando-se se voltaria a vê-lo. Pensando se ele descobriria que era ela por trás das crianças implorando por ajuda, e viria procurá-la, exatamente como agora.

Cecilia, no início, esperava que ele estivesse tão irritado que quisesse se livrar dela, vender a propriedade e nunca mais voltar a vê-la, mas essa possibilidade a ressabiava. Pensar que não poderia travar uma disputa verbal com Lorde Aaron novamente a deixou um pouco perdida e decepcionada.

Ela deu alguns passos e parou diante dele, e novamente assimilou quão alto ele era. Ela não era uma mulher baixa, e costumava se destacar mesmo em meio a homens, por isso era bom, de uma maneira exasperante, que ele fosse ainda mais alto.

— Não vai responder a minha acusação, senhorita Smith?

— Eu não sei o que quer dizer. — respondeu ela, ignorando qualquer conhecimento. — Nenhum de nossos alunos ousaria interromper ou interferir nos assuntos de um marquês tão ocupado e

importante. Com certeza, não na rua St. James, onde o famoso White's está localizado. Que disparate que dois garotos impediram Sua Senhoria de fumar seus charutos e tomar um conhaque com homens de sua classe, onde você discutiria cavalos, dinheiro e, do que mais conversam? — ela alfinetou, forçando a expressão mais interessada que conseguia emular, considerando que, de uma maneira indireta, havia insultado o lorde.

Ele a encarou por um momento antes que seus olhos se estreitassem um pouco. Ela sorriu.

— Os meninos disseram que moravam e estudavam neste estabelecimento e, depois da nossa reunião de ontem, só posso supor que você queira me irritar com seus alunos até que eu ceda e venda o meu prédio.

— Você poderia doá-lo para nós. Seria ainda melhor.

— Srta. Smith, você é a mulher mais irritante que eu já conheci.

Não vou presentear você com um prédio, nem agora, nem nunca, posso prometer. Eu também gostaria de uma garantia de que seus pequenos patifes não me assediarão mais. — ele deu a volta no balcão e parou a não mais de um centímetro da pessoa dela. — Eu também notei que você é muito capaz de jogar insultos à minha esfera social. Sente ciúmes, por acaso? — Lorde Aaron perguntou.

— De você e seus amigos? Bem, é claro, milorde. Anseio pelo dia que uma mulher de classe baixa salvará minha lamentável pessoa de morrer porque estou bêbada demais para ver veículos que vêm em minha direção.

Ele tossiu de forma proposital, um pequeno músculo em sua mandíbula se destacou.

— É compreensível que ache minha classe um pouco intimidadora, já que em sua posição tão abaixo da minha, e as noites de entretenimento como as que eu frequento, seriam

inadequadas à você. É muito equivocada com seus julgamentos e, sem dúvida, considera tais entretenimentos tolos e fora de sua bússola moral. O que me surpreende é que saia do seu pedestal para conversar com a Duquesa de Athelby. Enfim, como consegue fazer isso?

Uma dor peculiar e bastante desconhecida perfurou seu coração.

— A duquesa é uma boa mulher e ajuda os necessitados, ao contrário de muitos dos aristocratas, inclusive você. Quanto ao seu comentário sobre sua esfera social, você está dizendo que eu não aguentaria participar de um dos bailes da sua Alta Sociedade?

Como ele ousa supor tal coisa? Ele a estava provocando, ela sabia, mas não mudava o fato de que as palavras dele feriram o orgulho dela. Ela já desejara poder participar de tais jantares e festas. Sua própria esfera era adorável, e ela gostava muito deles, mas um baile da alta classe, em que joias e vestidos da última moda podiam ser vistos, e todos eram livres de restrições de trabalho, bem, ela não podia deixar de querer conhecer. Se apenas uma vez.

Ele se inclinou ainda mais, e ela sentiu o cheiro de menta no hálito dele. Para a irritação dela, seus olhos foram a boca dele, seus lábios pareciam macios e bem cuidados, não irritados ou rachados por falta de boa comida e vida. Ele estendeu a mão e deslizou ao longo da mesa, prendendo-a parcialmente em seu abraço.

— Se o sapatinho serve, senhorita Smith.

Ela encontrou o olhar dele e o sustentou, mesmo que seu corpo tenha quase saído do controle no processo. Ele estava tão perto, era tão grande e tudo o que um cavalheiro de sua classe deveria ser. Forte, inteligente, impetuoso e espirituoso. Um cavalheiro que parecia ter um jeito misterioso de mexer com ela. Muitos não conseguiam, mas o marquês parecia ter tal habilidade.

Ela deu um passo para trás.

— Como está aqui, milorde, e foi muito generoso com as doações durante a semana, talvez queira fazer uma excursão.

Posso mostrar as salas de aula e o local em que as crianças dormem, se o senhor quiser. Talvez você descubra o órgão que fica dentro da parede torácica e venda o prédio para mim.

Ele olhou ao redor do vestíbulo, virou de relance para a escada, onde duas menininhas riram e fugiram quando vistas.

— Mostre o caminho, Srta. Smith. — disse ele, estendendo o braço para que ela a pegasse.

Bem, ela não desejava dar o braço a ele, e percebeu o erro cometido assim que o tocou. Um choque de consciência passou por ela, e ela respirou com calma, para acalmar o coração acelerado.

Cecilia fez o passeio o mais curto possível, mostrando as variadas salas de aula que elas separaram por ordem de idade, não de gênero. Quanto menos tempo ela tivesse que tocá-lo, melhor.

Subiram as escadas para até onde as crianças dormiam, as camas, filas após fileiras, mostrando quantas precisavam de ajuda.

— São tantas camas. — o marquês franziu o cenho, parando à porta de um quarto. — Quantas escolas como esta você dirige, Srta.

Smith?

— São três em Londres e uma no interior. É claro que o número de ajudados aumentaria se eu comprar um imóvel em Ludgate, conforme planejado.

Ele assentiu, mas não se aventurou a entrar no quarto.

— Eu não sabia que havia tantos necessitados.

Cecilia encontrou o olhar dele ao ouvir a surpresa na voz, ecoando verdade.

— Muitas pessoas não sabem, mas elas existem, como pode ver. Um problema crescente, e que eu temo que nunca seja resolvido.

Eles ficaram lá por alguns minutos, antes de voltar para o andar de baixo.

A duquesa entrou correndo na sala, carregando uma caixa, sem dúvida os quadros que faltavam que andaram procurando nas horas anteriores.

— Decidi convidar a Srta. Smith para o baile que o duque e eu daremos na semana que vem.

Cecilia caminhou para ficar atrás da recepção, o peito apertado com a ideia.

— Eu não posso assistir ao seu baile, Sua Graça. Não seria correto.

— Correto? Ah, metade dos presentes tem menos classe que você, minha querida, e eu não me importo com o que algum deles tenha a dizer. Você é minha amiga, fazemos trabalhos de caridade juntas e quero ter você ao meu lado. Não vou aceitar nenhuma resposta sua que não seja um sim.

O estômago de Cecilia se agitou com a ideia de todas aquelas pessoas, mulheres que poderiam acabar com sua reputação só por terem vontade, pessoas que a olhavam como cidadã de segunda classe pelo único fato de seu pai trabalhar para viver em vez de ter herdado uma fortuna como os demais que a rodeariam.

Mas, então, ela era amiga da duquesa e nunca se sentiu menosprezada ou desvalorizada quando estava com ela, portanto, talvez ela tivesse um pouco de preconceito contra a esfera social de Sua Senhoria. E ela não permitiria que o marquês pensasse que ela não poderia comparecer porque estava com medo de como seria tratada pelos demais membros da classe dele. Ela não precisava provar nada para eles, e se fosse feita uma análise, eles é que deveriam rever seus credos morais.

— Bem, então é um sim. — ela encontrou o olhar de Sua Senhoria. — Veja, Lorde Aaron, já que viu um pouco da minha vida, agora vou ver um pouco da sua. Estou ansiosa para vê-lo no baile.

Ele curvou-se e foi até a porta.

— Infelizmente, Srta. Smith, acredito que terei outro compromisso na noite em questão.

Cecilia olhou para as costas dele quando ele saiu pela porta. Ela não se deu ao trabalho de responder, apenas rasgou a caixa que continha os quadros e fingiu que era a cabeça de Sua Senhoria.


CAPÍTULO 5

A inda sofrendo pela observação rude e inapropriada de Lorde Aaron na semana anterior, Cecilia mergulhou em suas instituições de caridade e ajudou seu pai a se preparar para o tribunal. Sobrava pouco tempo para ela pensar nas palavras dele.

Como ela o convenceria a vender a propriedade se ele não comparecesse ao baile? A duquesa havia dito que ele iria sim, mas até Cecilia o ver com seus próprios olhos, a dúvida de que ele não compareceria não se dissiparia.

A jovem que ela contratou para ajudá-la com o cabelo colocou o último alfinete no penteado elegante e bonito. Para esta noite, seu cabelo estava completamente preso, mas os cachos eram grandes e de aparência suave. Um fio de pérolas de sua mãe estava entremeado em todo o volume. Não eram rubis ou diamantes, como muitas das mulheres da esfera social em que ela estava prestes a se inserir usavam, mas as pérolas eram lindas e, pelo menos, deram a ela um ar de riqueza, mesmo que o cheiro do comércio sobre suas sapatilhas de seda.

— Você está linda, minha querida. Levante-se e deixe-me olhar para você. — disse a mãe dela ao entrar no quarto, a senhora pegou suas mãos, fazendo-a se levantar.

Cecilia rodopiou e riu quando a mãe enxugou os olhos.

— É só um baile, mãe. Eu não vou me casar. Ela foi até a cama e vestiu as sapatilhas cor de rosa que combinavam com o vestido que ela teve a sorte de encontrar apenas alguns dias antes na rua Cannon. O vestido fora feito para uma mulher de recursos, mas quando ela foi buscar a roupa, não gostou do contraste das cores da

peça e da sua pele se recusando a levá-lo. A modista, Madame Perrin, ficou muito feliz em dar um pequeno desconto se Cecilia aceitasse o vestido, e, para sua sorte, o vestido combinava perfeitamente com sua pele e era adequado, sem ser muito extravagante.

— Mesmo assim, você está tão adorável. Que maravilha para a Duquesa de Athelby fazer de você uma convidada especial. Espero que você se lembre de ser educada e tente não deixar ninguém a irritar.

Cecilia vestiu as luvas de seda branca.

— Eu não vou fingir que não entendo o que você está dizendo, porque eu entendo sim. Mas prometo que vou me comportar e não permitirei que minha boca fale o que não deve e repreenda todos os nobres ricos ou, pelo menos, diga a eles o que realmente penso sobre a superficialidade deles. Isso basta, mamãe?

— Já, já, você não pode julgar a todos da mesma forma. Alguns dos presentes serão exatamente como você, não cheios de ares e graças, apenas estarão lá para desfrutar de boa comida, música e dança. Ah, espero conseguir ficar acordada para ouvir tudo que viu, mas, sem dúvida, você não voltará até altas horas da manhã.

— Acho que sim, mas não me espere mamãe. Vou contar tudo amanhã no café-da-manhã. — Cecilia vestiu a capa e foi para a porta. — Agora, eu devo partir. Acho que acabei de ouvir nossa carruagem parar.

— Divirta-se, minha querida!

Cecilia riu enquanto se dirigia para a carruagem.

Bem, se ela não se divertisse, pelo menos seria uma lembrança que ela poderia guardar pelo resto de sua vida. Ela poderia dizer aos filhos que uma vez dançou e se divertiu com a alta sociedade.

Nem todo mundo podia se gabar de tal triunfo.


HUNTER NINAVA UMA TAÇA DE UÍSQUE, o líquido âmbar saciou sua sede, mas seria apenas por um curto período. Ele precisava de muito mais esta noite para sobreviver. Sua inimiga, a Srta. Smith, estava ao lado do duque e da duquesa de Athelby e conversava com um colega que Hunter não via na cidade há dois anos ou mais.

O nome do cavalheiro fugira de sua mente no momento.

Quem era o maldito flertador?

Ele tomou outro bom gole e piscou para clarear os olhos. Ele não pretendia comparecer esta noite, com certeza não depois de ouvir a Srta. Smith ser convidada, mas o fascínio por um par de lindos olhos azuis mudou seus planos. A senhorita Smith estava, sem dúvidas, muito bela esta noite, o rosé de seu vestido combinava com a pele clara e as longas madeixas loiras, que estavam arrumadas em um penteado, todo o volume para cima. Ele precisava admitir que a atrevida quase parecia pertencer àquela esfera, mas de vez em quando alguma coisa chamava sua atenção, e o desdém que ela carregava pelos da classe dele era visível à inspeção dele.

Hunter suspirou e foi em direção à sala de jogos, mas seus pés, um pouco mais instáveis do que ele previra só foram até algumas cadeiras vazias e ele se sentou, gesticulando para um lacaio lhe trazer mais daquele delicioso líquido âmbar.

Quanto tempo ele ficou sentado lá, perdido em seus próprios pensamentos, era uma incógnita, então quando uma aparição em rosa parou ao seu lado, e ele ficou surpreso ao ouvir a voz dela.

— Você está bêbado, Lorde Aaron. Por favor, diga-me que não vou ter que resgatá-lo esta noite também. Não creio que essas sapatilhas de seda sobreviveriam às ruas de Londres.

Ele balbuciou.

— Eu não preciso de resgate, e muito menos de você.

Ele franziu o cenho ante próprias palavras cortantes, pois não queria ser tão abrupto. Mas a Srta. Smith tinha um jeito de irritá-lo muito acentuado, e o fato de que esta noite ela parecia mais incrível do que qualquer dama que ele já conhecera, só piorava a situação.

Ela era uma plebeia, pelo amor de Deus. Não é melhor do que as criadas de suas residências. Bem, talvez um pouco acima de seus funcionários, mas não muito. Ela cuidava de todos, sempre procurava melhorar a vida das pessoas, enquanto ele pensava em pouco mais que ele mesmo, em como aproveitar a vida o máximo que podia. Os pais dele decerto viveram dessa maneira, e nunca houve nenhum dano.

Uma pequena voz lembrou a Hunter que também não vinha nada de bom.

— Você fica bêbado assim o tempo todo, milorde?

O lacaio entregou a bebida, e ele tomou um gole.

— Sendo da Sociedade a que faz parte, perdoarei seu comportamento grosseiro e darei uma pequena lição de boas maneiras. Nunca, jamais se pergunta a um cavalheiro se ele fica embriagado em todos os eventos que ele atende. Nunca pergunte nada. Não é da conta de ninguém, a não ser da minha, e como não sou casado, nem sou noivo, farei o que diabos eu quiser.

Se ele esperava que as palavras a fizessem dar meia-volta, ele ficou muito decepcionado. A Srta . Irritante Smith simplesmente estreitou os olhos para ele e arrancou o copo de uísque de sua mão.

— Você está fazendo de si um espetáculo. Com essa, é a segunda vez que tive o infeliz prazer de vê-lo em tal estado. Não consegue ir a um baile e manter-se sóbrio? Sabe, se tentasse, talvez gostasse.

— Duvido muito. — disse ele, pegando o copo de volta e terminando de toma-lo. Os olhos dele lacrimejaram, e ele os esfregou, piscando um pouco para tentar clarear a visão.

A senhorita Smith estava começando a parecer um borrão rosa.

— O senhor percebe que se me vender o prédio, eu vou deixá-lo em paz? Prometo nunca mais entrar na sua preciosa esfera e nunca mais procurá-lo como fiz nesta noite. Então, o que diz? Está disposto a reconsiderar minha proposta?

Ele piscou outra vez, querendo vê-la com clareza.

Inferno, ela era bonita, quase etérea, seus traços suaves, delicados e perfeitamente estruturados. Até os olhos dela. Eles eram inteligentes, calculistas e neste momento, com certeza julgadores. Doeu, embora não devesse, pois ele não se importava com a opinião dela. Ou se importava? Hunter franziu a testa, sem entender a inquietação desconhecida que mexia com ele por dentro.

— Não importa o que você pensa de mim, senhorita Smith, saiba disso. Posso ser um lorde, mas gosto de negócios, como a compra e venda de cavalos, e das propriedades que herdei, mas não uso, sendo o prédio da Rua Pilgrim um deles. Mas neste caso, como expliquei, desejo transformá-lo em um clube de cavalheiros, não arruinar uma área que está valorizando e um imóvel que deve aumentar em valor. O valor será reduzido se for transformado em orfanato. Isso nunca equivaleria a bons negócios.

Ela se mexeu na cadeira ao lado dele e encontrou o olhar dele, as feições angelicais duras com ódio. Ódio por ele. Caramba, ele não gostou desse olhar nela. Ele queria que ela olhasse para ele com qualquer coisa, menos ódio. Doçura, calor, paixão, tudo menos desprezo.

— Você é uma vergonha para a sociedade, milorde. Pelo menos estou tentando melhorar o mundo para aqueles que têm menos

sorte. O que o senhor faz?

— Você é tão inteligente, por que não me conta? — ele disse, querendo zombar das palavras dela, pois, caramba, elas doíam.

As imagens das crianças carentes que pediram dinheiro bombardearam sua mente, e ele franziu o cenho. Ele era um constrangimento? Um indiferente, um almofadinha. Certamente que não, era simplesmente o modo de vida dele. Ele não negava àqueles que o imploraram e, ao longo dos anos, instruiu seu administrador a doar para instituições de caridade quando patrocínio fosse procurado.

— O senhor não faz nada além de se entorpecer e ganhar dinheiro com seus empreendimentos, e ainda assim, ao seu redor, as pessoas vivem na pobreza. Pelo menos eu posso dormir à noite sabendo que fiz o meu melhor. Você, meu estimado lorde, é um parasita.

Ela ficou de pé, e ele a observou partir.

A mandíbula doía e ele pediu outro copo de uísque para dissipar seu aborrecimento. O que ela sabia afinal? Quem era ela para criticá-lo por como ele levava a vida.

Hunter se levantou e foi para a sala de jogos. Ele dissiparia as frustrações em um jogo de cartas. Melhor que estrangular a Srta.

Classe média, a gentia íntegra, na frente de toda a Aristocracia.

A sala de jogos estava cheia de homens como ele, sem dúvida, tentavam escapar do sexo frágil ou procurando uma distração delas.

Ele viu o duque de Athelby, participando de um jogo, e sentou-se à mesa, disposto a esperar a oportunidade de entrar.

O duque, Cameron para os amigos, lançou um olhar divertido na direção dele.

— O que o deixou tão tristonho? Parece que dançou todas as músicas desde o início do baile.

Ele tinha a aparência de um boneco ventríloquo? Ele balançou a cabeça e convocou um lacaio que passava para pegar um copo de uísque.

— A mulher irritante que sua esposa trouxe, se quer tanto saber..

No momento, não tenho dúvida de que ela está contando à sua esposa que sou ganancioso e que não tenho coração, como sugeriu na minha cara há cinco minutos.

O duque se engasgou com o vinho, e Lorde Nash, sentado à frente de Hunter, soltou uma risada que, por Deus, chamou a atenção de todos para a mesa deles.

— Ela fez o quê? — Cameron perguntou, colocando as cartas de lado por um momento.

— Me disse que sou um parasita porque não ajudo instituições de caridade como a que ela administra, com a ajuda de sua esposa, devo acrescentar.

Cameron deu um sorrisinho.

— Darcy gosta dela. Ela a considera inteligente e gentil, mais do que muitos dos presentes esta noite. Sem ofensas, Lorde Nash, é claro. — disse o duque, sorrindo.

Lorde Nash assentiu, mas não comentou, apenas estudou as cartas.

Hunter tomou um longo gole de sua bebida.

— Mesmo assim, ela não se encaixa nesse ambiente. Ela não é uma de nós. Não se encaixa. Admita, Cameron, nem você se rebaixaria a falar com ela se sua esposa não o tivesse obrigado.

O duque franziu o cenho, desta vez colocando as cartas na mesa, e ergueu o olhar para Hunter.

— Conheço a senhorita Smith há alguns anos, a mais tempo do que conheço você, na verdade. A empresa do pai dela cuida de todos os meus assuntos legais. Podem ter manchas de tinta nos

dedos, mas são pessoas muito respeitáveis. E Cecilia é mais que inteligente, até Darcy admitiu outro dia que achava que Cecilia era mais inteligente que ela, e isso é uma raridade. — o duque riu, pegando as cartas. — A propósito, quão sóbrio você está no momento? Não quero uma vantagem injusta nas cartas. Eu sempre ganho em tais circunstâncias tediosas.

Hunter olhou para o copo vazio na mão e acenou para o lacaio em busca de outro.

— Não o suficiente, se vale alguma coisa. Não se eu tiver que aturar megeras de classe média que me chamam de parasita.

— Você não é um parasita, apenas não foi compreendido, talvez, ou até mesmo, não esteja ciente do que acontece fora de Mayfair.

Sei do trabalho de caridade de Darcy, e por ele me tornei mais conhecedor da pobreza em que as pessoas vivem. A Srta. Smith quer que você venda seu prédio para ela, e acredito que ela está sendo tão incisiva em relação aos pobres apenas para fazê-lo de ideia. Não acredito que ela queira ser áspera ou julgadora.

Hunter lutou para não zombar dele. A senhorita Smith era a mulher mais crítica que ele conhecia, não importa o que Cameron dissesse sobre o fato.

— Não sou cego para os pobres, apenas opto por viver sem que isso dite todos os meus movimentos.

O comentário pareceu insensível até para seus próprios ouvidos, e Hunter se encolheu.

— Você age como eu costumava ser, querido companheiro.

Como se o mundo devesse satisfazer todos os seus desejos e vontades. Que seja bonito e correto, não feio e pobre, áspero nas bordas. Nem todos em Londres têm a mesma sorte que nós. Como seres humanos, aceitamos isso e permanecemos educados, ajudamos quando podemos. Espero que tenha permanecido

educado com a senhorita Smith. Ela não merece palavras ríspidas de você.

Hunter pegou a bebida do lacaio e deleitou-se com o cheiro forte de conhaque.

— Eu fui honesto com ela.

— Você foi rude, admita. E agora terei Darcy reclamando comigo acerca de como um amigo meu foi rude com uma amiga dela.

— Darcy também é minha amiga.

— Ela não será depois desta noite se descobrir que você agiu como um idiota.

Hunter bebeu todo o líquido, e a sala girou por um momento.

— Houve um tempo em que você era muito bom.

— Apenas venda o prédio, e seus problemas com a senhorita Smith desaparecerão.

Hunter passou a mão pelos cabelos e recostou-se na cadeira, não queria mais jogar cartas. Não aqui, pelo menos. Talvez ele fosse ao White's mais tarde naquela noite, e a qualquer outro lugar que a noite o levasse.

— Tenho planos em andamento para um clube de cavalheiros, para banqueiros e advogados, homens desse calibre. A senhorita Smith acha minha ideia tola, mas discordo, acho que é um empreendimento em um nicho financeiro inexplorado, e quero começar o mais rápido possível. Um brilho rosa chamou sua atenção, e ele se virou para ver Darcy e a mulher que o irritava tanto se colocarem diante deles.

A senhorita Smith fez uma reverência ao duque e, com muito arrependimento, Hunter levantou-se para cumprimentá-las. O duque pegou a mão de Darcy e a colocou em seu braço, cobrindo-a com a dele enquanto se entreolharam. Um ano de casamento, e o casal ainda estava loucamente apaixonado. Por mais que Hunter

estivesse feliz por eles, também era um pouco confrontador. Ele cresceu em uma casa onde amor era loucura, divertimento e brincadeiras, e com seu cônjuge, nem sempre havia todo esse carinho e delicadeza. Hunter não sabia ao certo como levar, ou o fato de que o duque e a duquesa zombavam do casamento de seus pais todos os dias. Zombavam do que ele sempre achou normal em um casamento.

— Vim roubar meu marido para dançar.

Hunter olhou para a senhorita Smith e sentiu-se magoado ante o olhar de horror que atravessava o rosto da mulher. Sem dúvida, ficar sozinho com ele, e naquela esfera social, a deixou horrorizada.

— Lorde Aaron, faria a honra de dançar com a nossa convidada, senhorita Smith? Ficaríamos muito satisfeitos se você o fizesse. —

disse a duquesa, sorrindo para os dois.

— Não se sinta obrigado, Lorde Aaron. Acompanhei Sua Graça até aqui sem esperar encontrar um parceiro de dança. — ela se virou para o duque e a duquesa. — Voltarei ao salão e me encontro com vocês depois da valsa.

Antes que a duquesa tivesse chance de responder, a Srta. Smith deu meia-volta e voltou para de onde veio. Darcy voltou o olhar de aço para ele, e ele gemeu.

— Hunter, siga a Srta. Smith e peça para dançar com ela. —

disse a duquesa fuzilando-o.

— É óbvio que ela não quer dançar comigo. — ele pegou outro copo de uísque de um lacaio que passava. — Eu não desejo forçá-

la.

Tão rápido quanto ele reivindicou a bebida, Darcy a pegou de suas mãos.

— Acho que você já bebeu bastante esta noite. Agora vá, convide-a e seja gentil, ou terá que lidar comigo.

Ele ergueu a sobrancelha para a duquesa e, em vez de argumentar, decerto, ela teria um contra-argumento, ele foi ao salão para procurar a senhorita Smith.

Ele a viu aninhada em um dos cantos, sua altura tornando-a fácil de encontrar. Algumas matronas bastante grandes e barulhentas estavam diante dela e lançaram olhares desafiadores quando ele pediu para passar por elas.

Cecília também olhou para ele com desprezo, e ele escondeu o aborrecimento e estendeu a mão.

— Gostaria de dançar, senhorita Smith? Acredito que a próxima música será uma valsa.

— Não. — disse ela, cruzando os braços e olhando por cima do ombro dele.

Ele pegou a mão dela de qualquer maneira e a puxou para o salão de dança. Hunter se encolheu quando ela a apertou, cravando as unhas.

O que ela tinha nas luvas, pequenas facas?

— Isso dói, senhorita Smith.

Ela girou nos braços dele, encaixando-se como uma luva. Ele gostou do fato e, acima de tudo, gostou da sensação dela em seu abraço. O vestido de seda dela deslizava contra as palmas das mãos dele, a mão encaixou-se com perfeição na dele, a cintura era pequena e ainda denotava as deliciosas curvas femininas que ele adorava.

— Nunca faço nada sem um propósito, Lorde Aaron.

Ele riu e conduziu-os pelo salão.

— Acho que gostaremos mais da dança se sofrermos em silêncio. Concorda, senhorita Smith?

Os olhos cristalinos dela, que eram o avesso dos dele sempre enxergando um pouco embaçado na maioria das noites,


estreitaram-se ligeiramente.

— Eu não me importo se conversamos ou não, mas vou dizer algo, seu hálito cheira a uísque, e se você pisar em meus pés mais uma vez, vou retaliar na mesma moeda.

Ela era uma praga por insinuar que ele estava bêbado.

— Talvez você deva parar de respirar, então? Ele sorriu pelo choque dela e depois xingou quando o pé envolto em seda dela, à primeira vista tão delicado, desceu com vontade nos dedos dele.

Cecília parou no meio do salão e esperou que Lorde Aaron recuperasse a compostura. Cavalheiros eram pisados com frequência, as mulheres também, então por que ele a largou enquanto inspecionava o dedo machucado era simplesmente embaraçoso. E não para ela.

— Seu dedo está bem, milorde. Eu peço desculpas. Decerto que não quis ser tão desajeitada de propósito.

Cecilia sorriu para os aristocratas que os observavam, alguns por cima de um nariz pontudo, mas ela apenas permitiu que a censura se desenrolasse atrás dela. O que importava o que essas pessoas pensavam? Fora dessas paredes, a maioria deles não se preocupava com mais ninguém, exceto com a própria pessoa ou família. Cecilia podia contar, por um lado, quantos aqui ela sabia que contribuíram para sua instituição de caridade, ou aqueles que ajudavam outras instituições.

Eram poucos, uma coisa lamentável; e o dândi que se ajoelhava diante dela inspecionando o dedo do pé, e ela ficou surpresa que ele pudesse sentir por estar bêbado, era um disparate. Esta era a quarta vez que ela se via na companhia de Sua Senhoria, e a

segunda que via seus olhos vidrados e sem foco, sem mencionar a marcha instável, embora ele parecesse bastante apto a esconder isso na maior parte do tempo.

Mas ela não deixou de notar a lentidão dos passos para recuperar o equilíbrio, ou o aperto das mãos quando ele bebia, ou que o tremor cessou um pouco depois que ele engoliu o líquido. O

homem era um alcóolatra. Infelizmente, Cecilia já havia visto muitos como ele, pais, mães, cuidadores das crianças om quem lidava diariamente. Na maioria das vezes, as crianças optavam por permanecer nas instituições por conta própria, ao menos para permanecerem vivas.

Ele se levantou e a puxou para os braços, girando-os mais uma vez na multidão de dançarinos, como se nada estivesse errado.

Ninguém via esse homem? Ninguém sabia dos problemas que ele escondia abaixo da fachada?

— Está tudo bem de novo, milorde?

— Sim, deve ficar. — disse ele, lançando um olhar que falava mais de aborrecimento do que qualquer outra coisa.

— Enquanto eu tenho sua atenção, me diga, pensou um pouco mais na minha oferta? Espero que já tenha percebido que o valor que estamos dispostos a pagar é razoável, e que minha ideia para o prédio é mais adequada àquela parte de Londres.

— A propriedade não está à venda, senhorita Smith.

Seu tom estoico e sem sentido dizia mais do que tudo que ele estava farto das tentativas dela de fazê-lo vender.

— Não importa mais, de qualquer maneira. Encontramos outro prédio à venda, bem ao lado do seu. Portanto, mesmo que reforme seu prédio para ser um clube de cavalheiros, assegurarei que ninguém queira ir lá apenas por nos ter como vizinhos.

Ele não olhou para ela, apenas parecia entediado.

— Cavalheiros virão, não importa o quanto você tente me sabotar.

Ele era o homem mais irritante que ela já conhecera.

A dança continuou por mais alguns minutos, mas, quando chegou ao fim, Cecilia já estava farta, de verdade, de estar perto de lorde Aaron e de seus amigos. Ela agradeceu a dança, fez uma reverência e procurou a duquesa de Athelby. Já era hora de ela voltar para casa. Ela tinha um compromisso no almoço para examinar a papelada do novo local, e precisava ter uma boa noite de sono.

Ela encontrou o duque e a duquesa conversando em particular, mas Darcy como ela a chamava quando estavam sozinhas, sorriu quando Cecilia se aproximou e não rejeitou sua companhia.

— Você gostou da dança, Cecilia? — a duquesa perguntou, olhando para ela, sem dúvida tentando localizar Lorde Aaron que não estava em lugar algum. Por graça divina.

— Sim, obrigada, mas devo voltar para casa. Como sabe, vou visitar um novo prédio amanhã e quero estar em meu melhor para a reunião.

— Você gostaria que eu participasse? Admito que não sei muito sobre contratos e demais legalidades, mas ter uma duquesa pode ser benéfico se o vendedor começar a aumentar o preço ou algo desse tipo.

— Não, não será necessário. O parceiro de negócios de meu pai, o Sr. White, estará presente comigo e garantirá que tudo corra bem.

Os lábios da duquesa se apertaram.

— O Sr. White vai estar lá? Nesse caso, estarei presente.

— Por que minha querida? — o duque perguntou, olhando para a esposa, uma pequena linha entre as sobrancelhas perfeitas.

— O Sr. White deseja se casar com a Srta. Smith, meu amor.

Deixou claro há algum tempo. Uma acompanhante é necessária, acredito.

— Quem deseja se casar com a senhorita Smith? — Lorde Aaron perguntou, vindo se juntar a eles, com dois copos de uísque na mão.

Ele a pegou olhando para eles, e ela não deixou de notar a relutância dele ao entregar um dos copos ao duque. Como se não fosse o que ele queria fazer.

Rá.

Ele não queria se separar de nenhum dos bons vinhos ou bebidas destiladas se não precisasse.

— Sr. White, Hunter. Não que devêssemos discutir tais coisas aqui e tão abertamente. Peço desculpas, senhorita Smith.

Cecilia pôde sentir calor subir pelo pescoço e tentou pensar em outra coisa senão o fato de que eles estavam discutindo sua vida e que queriam fazer parte dela, se ela poderia frasear assim.

— Você vai se casar, senhorita Smith. Bem, você é uma raposa astuta, não é. Não me contou tão maravilhosas novidades.

— Não, milorde, não contei. E a única coisa por aqui que se assemelha a esse animal é você. Agora, se me der licença. — e se virou para o duque e a duquesa. — Boa noite, Suas Graças.

Eles se despediram, e ela ignorou o olhar fulminante que sentiu entre os ombros. Lorde Aaron poderia tentar intimidá-la o quanto quisesse, mas ela não permitiria que ele a vencesse. Infelizmente, ela teria que fazer concessões a Sua Senhoria, já que ele tinha um vício que parecia um tanto quanto solidificado nele. Um homem que, por infortúnio, ficava embriagado na maior parte do tempo, e não conseguia, nem tentava, manter o juízo. Um homem que aprendeu a não se importar com nada além de sua própria autoestima

Cecília esperou que o lacaio pegasse seu xale e chamasse a carruagem. Ela suspirou aliviada. Pelo menos, essa fora a última vez que ela teria que lidar com Lorde Aaron.


CAPÍTULO 6

A s salas da J Smith e Filhos estavam bem movimentadas hoje, havia muito trabalho de escritório a ser feito para os próximos processos judiciais. Cecilia entrou no escritório que seu pai havia destinado a ela, não apenas para que ela pudesse ajudá-

lo em assuntos relacionados à lei, mas para ter outro lugar além da casa deles para trabalhar com suas instituições de caridade.

O escritório contava com uma vista agradável da calçada do lado de fora, e ela sentou-se atrás da mesa por um momento, para apreciar a solidão e seu pequeno espaço. Ela sempre amou a sala e, acima de tudo, as estantes de livros que tomavam toda uma parede e que seu pai colocara ali para ela guardar qualquer coisa que ela quisesse.

Uma batida leve na porta soou, e o Sr. White espiou pelo limiar, sorrindo em boas-vindas.

Cecilia devolveu uma expressão educada e pediu que ele entrasse, não que ela quisesse revisar a papelada do novo local que eles haviam encontrado, e certamente não com ele. Houve uma época em que ela gostava do Sr. White, o considerava um amigo, mas não mais. Seus avanços desde que o pai dela o deixara cortejá-la por vezes foram além do aceitável, e ele parecia pensar que tinha o direito de tocar nela, agarrar a mão dela para colocar em seu braço ou tocar a parte inferior de suas costas. Nada do que ela queria que ele fizesse, agora ou nunca. Suas objeções não pareciam deter o homem, e isso diminuiu ainda mais sua estima quanto a ele.

— Senhor White, obrigada por me ajudar com esses contratos.

Por favor, sente-se. Vamos examiná-los antes de irmos para a Rua Pilgrim visitar o prédio junto ao vendedor.

Ele se sentou, os cabelos oleosos penteados para trás fazendo-o parecer um corvo. Pena que ele não era tão inteligente quanto tais pássaros, ao menos não quando se tratava de mulheres.

— O prazer é meu, Cecilia, e deixe-me dizer como você está atraente hoje. O vestido é novo?

Cecilia olhou para o vestido marrom sem graça que não tinha traços femininos além do fato de ser um vestido. Ela não gostava de usar seus melhores vestidos quando ia para o escritório, preferia se sentir confortável do que na moda.

— Obrigada pelo elogio, mas como estamos no trabalho, é preferível nos esquecermos nossas roupas e discutir o assunto em questão. A compra, lembra-se?

— Ah, sim, refleti o sobre o assunto. Seu pai me deu o contrato para examinar no fim de semana e, apesar de tudo parecer bom, não acredito que seja um bom investimento para sua instituição de caridade.

Ele recostou-se na cadeira, puxou um charuto do bolso do casaco e o acendeu usando a vela acesa na mesa dela.

— Por favor, me esclareça porque você chegou a essa conclusão?

O edifício era sólido, não apresentava danos, nem a de grandes reparos. O interior, é claro, precisava de reforma e modernização completas para abrigar a escola e os dormitórios das crianças, mas isso não era algo novo para elas, já haviam feito reformas parecidas em outras áreas de Londres.

— Uma mulher da sua idade deve procurar outras coisas para ocupar seu tempo. Como se casar, começar uma família, filhos, sem

se preocupar com os pobres de Londres. Pessoas que, devo acrescentar, tirarão proveito da sua caridade e depois continuarão a não fazer nada com a educação que você lhes der. Eu vejo essas despesas como uma perda de tempo.

Cecilia se levantou e caminhou até a porta, pegando o xale.

— Pegue os papéis na mesa e me siga. Não quero me atrasar para meu compromisso.

Ela saiu da sala, os dentes cerrados com força, para não virar e contar a esse palhaço exatamente o que pensava dele. Como ele ousava sugerir que ajudar os outros era uma perda de tempo. O tolo pomposo não tinha um pingo de empatia em seu corpo.

O que havia acontecido com os cavalheiros que ela conhecia?

Pareciam todos pensar que caridade era perda de tempo. Ela era a única que se importava, que tinha simpatia? Cecilia abriu a porta da carruagem e pulou para dentro, esperou o Sr. White. Ele logo a seguiu para dentro veículo, sentando-se ao lado dela em vez de se sentar do outro lado. Um alívio bem-vindo de ter que, ocasionalmente, olhar para ele durante a jornada.

— Não quis ofender você, Cecilia, mas andei conversando com seu pai, e ele concorda. Esse estilo de vida que você está levando não é adequado para uma dama. — ele fez uma pausa, puxando a gravata antes de encontrar o olhar dela. — Você já pensou mais na perspectiva de nos casarmos? Se você concordar, poderíamos nos casar dentro de um mês e pouco. Eu sei que eu desejo muito que isso aconteça.

Cecilia sustentou o olhar dele e, pelo que pareceu a centésima vez, escolheu as palavras com sabedoria, para não ofender o homem tolo que não entendia a palavra não.

— Sr. White, você é um senhor honrado, mas devo repetir o que já lhe disse. Não nos adequaríamos e, por mais que lamente

machucá-lo, minha resposta em relação à sua proposta é não. Por favor, não torne nosso convívio mais estranho do que já é ao me fazer esta pergunta outra vez.

Ele apertou a mão dela, beijando-a com uma quantidade absurda de pompa. Cecilia ficou rígida e tentou libertar a mão sem sucesso.

— Senhor White, solte minha mão.

— Case-se comigo, Cecilia. Não quero nada além de agradá-la de todas as maneiras. Deixe-me amar você como um marido deve amar uma esposa. Talvez se você se permitir que eu a beije, veja que eu sou o homem para você, que ficamos bem juntos.

Ela tentou se soltar, e foi como tentar puxar a mão da pedra.

— Peço desculpas, mas não o vejo de maneira romântica, senhor.

Ele investiu contra ela, emitiu um som ameaçador como nenhum outro, antes de empurrá-la contra as almofadas, prendendo-a ali. A boca nojenta e desleixada dele tomou a dela, e ela ofegou. A ação foi a pior coisa que ela poderia ter feito, pois ele se aproveitou do fato e a beijou profundamente, de forma mais íntima do que ela já havia sido beijada antes.

Vagamente, ela sentiu a carruagem parar, e o tempo todo lutou para tirá-lo de cima sua pessoa. Ela não conseguia respirar, e o pânico começou a crescer em seu estômago. E se ele não parasse.

E se ele...

Cecilia ouviu a porta da carruagem se abrir e viu o marquês de Aaron arrancar o Sr. White de cima dela, puxar o homem pela porta e jogá-lo, sem a menor cerimônia, na calçada.

Por um momento, ela ficou sentada, tentando recuperar a compostura. O som alto da corrente sanguínea dela retumbava em

seus ouvidos, a respiração irregular e sentando-se, apertou as mãos para impedir que tremessem.

— Srta. Smith, você está bem? — a voz, profunda, culta e cheia de preocupação, a afastou de seu choque. — Senhorita Smith? —

ele perguntou de novo.

Cecilia virou-se para Lorde Aaron, que a estudou de uma maneira que nunca tinha visto antes. Na verdade, ele aparentava genuína preocupação. Ela assentiu, e um cacho caiu ao lado de sua bochecha. Estendendo a mão, ela tentou arrumar os cabelos, que foram terrivelmente desgrenhados durante o ataque do Sr. White.

Oh, meu Deus, o que o marquês pensaria dela?

— Eu estou bem. — ela se virou para Sua Senhoria e viu o Sr.

White parado ao lado da duquesa com as bochechas vermelhas. —

Obrigada por remover, por me ajudar a remover...

— De nada, venha. — disse ele, estendendo a mão. — Estou acompanhando a duquesa hoje, pois ela insistiu em estar aqui para a inspeção, e o duque não pôde acompanhá-la. Eu diria que depois do que acabei de testemunhar, vir foi uma decisão muito boa.

Cecilia assentiu, dando a mão a Sua Senhoria, e ele a ajudou a descer.

— Você não está com raiva por estarmos inspecionando o prédio ao lado do seu, milorde? Espero que você não esteja aqui para cobrir minha oferta pela propriedade.

— Não estou aqui por isso, tenho uma razão alternativa para vir.

— Que é? — ela perguntou, sem ter certeza de que estava totalmente à vontade com o marquês cuidadoso e sóbrio. Quando ele estava assim, era agradável e mais bonito do que ela gostava de admitir.

— Me desculpar pelo tratamento que dei a você na outra noite.

Fui ríspida e cruel, e sinto muito por isso.

Sem ter palavras, Sua Senhoria colocou a mão dela no braço dele, gesticulando para a duquesa ir em direção ao local pretendido.

— Mas antes de prosseguirmos, precisamos resolver um assunto. — ele foi até onde o Sr. White estava e parou. — Srta.

Smith, vá na frente. Logo me juntarei a você e à duquesa.

Cecilia fez o que ele pediu e aproximou-se de Darcy, que pegou sua mão em apoio.

De onde elas estavam, Cecília não conseguia ouvir o que o marquês estava dizendo ao Sr. White, mas o que quer que fosse, as bochechas do homem ficavam mais escuras com cada palavra. O

marquês fez o Sr. White parecer pequeno, e o advogado era um homem alto. Cecilia não pôde deixar de ver a aparência do marquês e deleitar-se um pouco. Apesar de todos os seus vícios e opiniões, ele era incrivelmente bonito. Um patife assustador.

O Sr. White olhou para ela, fúria tomando seu olhar, e ela se recusou a ceder ao abuso e desviar o rosto. Como ele ousava tentar fazê-la sentir como se ela fosse quem tivesse feito algo errado?

Quando voltasse para casa, informaria o pai sobre sua conduta inadequada na carruagem e faria o sanguessuga ser demitido.

O marquês recuou, apontando para a carruagem, e o Sr. White entrou. Logo a carruagem se foi, e Cecilia e a duquesa foram deixadas com Sua Senhoria. Um cavalheiro vinha na direção deles na calçada e acenou quando chegou próximo.

— Srta. Smith, sinto muito por me atrasar. Fiquei preso no escritório. — ele estendeu a mão, e Cecilia a apertou.

— Este é o marquês de Aaron e a duquesa de Athelby, Sr.

Conners. Cecilia fez as apresentações e, numa cena cômica, a boca do homem mais velho se abriu e não conseguiu formar palavras por um momento. Ela supôs que não era todo dia que o advogado se encontrava pessoas das classes superiores.

O passeio pelo edifício foi breve, pois a maior parte do interior era a mesma, degradada e escura. Tinha potencial, mas custaria mais para reparar do que a primeira escolha de Cecilia. Havia muito espaço para alojamentos e era grande o suficiente para que a escola pudesse ser mantida separada dessas áreas. Cecilia cruzou as mãos diante dela, tentando conter o tremor. Ela não deixaria o conflito com o Sr. White diminuir a atenção dela na inspeção deste local.

A duquesa havia ido para outra área do edifício com o Sr.

Conners, e Cecília se viu sozinha com o marquês. Bastante sozinha e em uma salinha escura, talvez uma despensa. Ao contrário de quando ela estava presa na carruagem com o Sr. White, seu estômago não formou uma bola de desconforto dentro dela, se alguma coisa, ela se sentia protegida e segura. Que estranho, mas também a deixava em uma perplexidade maravilhosa.

— Ainda acho que meu prédio é uma opção muito melhor. —

disse o marquês antes de pegar um pequeno cantil de prata e dar um gole.

— Mudou de ideia? Eu o compraria se você não fosse um lordezinho ganancioso. — disse ela, sorrindo um pouco para amenizar as palavras.

Ele riu, e uma luz diabólica cintilou em seus olhos cor de cobalto.

— Não há nada de " inho" em mim, Senhorita Smith.

Ela revirou os olhos e lutou para não corar. O homem não tinha vergonha.

— Exaltar a si nunca é uma virtude, milorde. — Cecilia riu e caminhou até uma janela próxima, olhando a rua abaixo.

Os passos dele soaram atrás dela, e foram interrompidos bem próximos de onde ela estava.

— Ele machucou você?

Embora ele não desse nomes, ela entendeu a pergunta.

— Ele me beijou à força, não me deixou sair. Vou falar com meu pai sobre tal conduta. O Sr. White deseja se casar comigo, como sabe... Melhor refrasear, ou seja, ele acredita que vamos nos casar, que é apenas uma questão de tempo.

— Seu pai permitirá que o cavalheiro se afaste após tal insulto a sua pessoa? Deseja que eu fale com ele?

Cecilia se virou e encontrou seu olhar.

— Não, vai ficar tudo bem, tenho certeza de que meu pai vai lidar com o Sr. White de forma severa e assim que eu retornar.

— Ele já tentou beijar você antes?

O olhar de Sua Senhoria recaiu para a boca dela, e o mais delicioso arrepio se desenrolou dentro dela. O marquês também queria beijá-la? Era isso que ele estava pensando? Ó sim, por favor.

Ele poderia irritá-la a todo momento, mas ela preferia ter tal memória com ele do que com o Sr. White.

— Ele mostrou alguns poucos sinais de posse na frente de colegas de trabalho e do meu pai, mas nunca tentou me beijar antes. Mas então, nunca ficamos sozinhos.

— Como hoje.

Cecilia assentiu.

— Exatamente, mas acho que não tenho nada com que me preocupar, Lorde Aaron. Não somos o que você chamaria de amigos, muito menos um par.

— Não somos? — ele se aproximou ainda mais, e Cecilia sentiu o cheiro de sândalo.

Minha nossa, ele não era apenas um dos homens mais bonitos que conhecia, mas também era cheiroso como um deus. Eles trocaram um olhar que se sustentou. Um arrepio de expectativa a percorreu quando ele se inclinou para ela. Cecilia seguiu o exemplo

dele e, no último momento, antes que seus lábios se tocassem, ela fechou os olhos.

O som da voz da duquesa soou no corredor do lado de fora e, tão lento quanto um gato, Lorde Aaron se afastou como se nada, em particular, tivesse quase ocorrido entre eles. Cecilia respirou fundo, o sangue retumbando nos ouvidos.

O que ela estava pensando? Chegando a cogitar permitir que Sua Senhoria a beijasse? Ainda mais aqui, em que não estavam completamente sozinhos. Ela o observou, e ele lançou um rápido olhar em sua direção, e ela se sentiu inquieta com a necessidade não satisfeita que viu queimando dentro daquele olhar cor de cobalto.

— Acho que a instituição deve fazer uma oferta, Cecilia. Este será o local perfeito, e é grande o suficiente, precisa de pequenos consertos, se eu interpretei certo o relatório. Claro, a firma do seu pai deve examinar o contrato, mas acho que é perfeito. O que você diz?

Cecilia não podia concordar mais.

— Se meu pai aprovar o contrato, faremos uma oferta, Sr.

Conners. Entraremos em contato na próxima semana para que você saiba.

Com a conclusão da visita, eles seguiram para fora. Cecilia amaldiçoou o Sr. White, pois nem se preocupara em enviar a carruagem da empresa voltar. A carruagem com o emblema do marquês na porta estava estacionada ao lado do meio-fio, o condutor sentado no topo com um chicote grande na mão.

— Permita-nos acompanhá-la até em casa ou para a empresa, senhorita Smith.

— Obrigada, é muito gentil. — disse ela, pegando a mão de Sua Senhoria e subindo no veículo.

Uma vez sentados, eles se afastaram e a duquesa olhou para ela.

— Tenho um compromisso com o duque e não posso me atrasar.

Acha que pode me deixar primeiro, Lorde Aaron? Sei que não é o ideal, mas passamos mais tempo do que eu pensava no edifício, e agora estou prestes a me atrasar.

— Não será um problema, fique certa disso.

Lorde Aaron virou-se para onde o condutor estava sentado e abriu uma pequena janela, notificou o condutor da mudança de direção. Ao fechá-la, ele cruzou com o olhar de Cecilia, e ela sentiu a mesma sensação de antes, que só ele conseguia provocar nela.

— Sente-se confortável comigo a acompanhando até seu destino, senhorita Smith? Ficaremos desacompanhados por pelo menos alguns minutos. Não desejo ferir sua reputação.

— Ficaremos bem, milorde.

Pouco tempo depois, a carruagem parou em frente à casa da duquesa, e Cecilia não pôde deixar de olhar para a imensa e impressionante estrutura georgiana e se maravilhar com seu tamanho, com a riqueza e o poder opulentos que retratavam aos que a observavam.

E, no entanto, a duquesa era uma mulher gentil e honesta, que não via as pessoas pelas coisas materiais que possuíam. Não, ela tinha um código moral sólido e se cercou de pessoas que ajudaram os outros antes de si. Cecilia supunha que em algum lugar dentro do marquês, ele devia ter um coração bom e um senso mais comum do que ela considerara já que a duquesa o chamava de amigo.

Despediu-se da duquesa, e a carruagem recuou para o movimentado tráfego de Londres.

— Você gostaria de voltar para o escritório de seu pai ou prefere ir para casa, senhorita Smith?

— Na verdade, eu preferiria voltar para casa. Sinto muito, mas é em Cheapside, então a viagem durará duas vezes mais. Quero conversar com meu pai sobre o que aconteceu hoje com privacidade, e sem a possível interrupção do Sr. White.

O marquês avisou da mudança de direção e recostou-se nas almofadas. Ele pegou o cantil e tomou um pequeno gole antes de colocá-lo de volta no bolso do casaco.

— O cavalheiro que seu pai escolheu como sucessor não é nada cavalheiro. Basta pedir, e assegurarei que ele seja afastado da empresa de seu pai, e nunca mais poderá tocar em você.

Cecilia suspirou, se fosse assim tão fácil.

— Meu pai deseja que eu me case com ele, e suponho que, se ele conseguir, o Sr. White poderá me tocar quando quiser.

— Nunca diga essas palavras. Pensar naquele sujeito a tocando faz meu sangue gelar.

O sangue nas veias dela estava na temperatura oposta.

— Creio que sorveu demais o líquido que mantém em seu bolso, Lorde Aaron. — disse ela com um tom de diversão, mas a declaração dele foi tudo menos engraçada.

Sua Senhoria nunca a consideraria uma possível esposa, ela era muito mandona, muito opinativa e, acima de tudo, muito comum. Um homem como Lorde Aaron esperaria que ela se tornasse uma dama fadada ao entretenimento, que costurasse, pintasse e fica em casa para que outras damas de posição semelhante pudessem fazer visitas, e todas elas pudessem discutir as notícias mundanas da vida na Sociedade.

Mas, então, a duquesa não vivia tal existência, estava envolvida com muitas instituições de caridade, e Cecilia nunca a ouvira mencionar que precisava ir para casa para compromissos como


aqueles. Então talvez a vida possa ser diferente... Se ele parasse de beber, o que pela aparência não iria fazer tão cedo.

— Nada disso. Posso gostar da minha bebida, Srta. Smith, mas ainda mantenho minhas faculdades mentais intactas, pelo menos na maior parte do tempo, e posso assegurar para a senhorita que ver você se casando com o Sr. White não me agradaria.

— Mesmo? — disse ela, erguendo uma sobrancelha. — O que agradaria o senhor, milorde?

Ela realmente queria saber? O olhar dele encontrou o dela, e a intenção que ela leu nesses olhos azuis de aço a deixaria fraca dos joelhos se ela estivesse de pé.

HUNTER OBSERVOU A SENHORITA SMITH, Cecilia, morder o lábio inferior. Ele queria pegar o cantil, aliviar o desejo que sentia pela bebida quase todos os momentos do dia, mas não o fez. Outra fome o assolava, uma que precisava que ele beijasse com abandono a mulher que estava sentada à sua frente. Esmagar seus lábios contra os dele e provar a doçura que assombrava os sonhos dele há dias.

Ele se recostou nas almofadas.

— Que pergunta interessante, senhorita Smith. O que me agradaria? Deseja mesmo saber? Você pode não gostar do que eu tenho para dizer.

— Acho que sou capaz de lidar com sua resposta.

Ele mudou de lugar, sentou-se ao lado dela.

A senhorita Smith apenas levantou o queixo à sua frente, mas não se afastou.

— Última chance de negar.

Ela balançou a cabeça.

— Não, eu quero saber. Por favor, me conte. — ela disse sem fôlego.

— Eu quero... eu quero beijar você, remover todo vestígio daquele sujeito imprestável que estava molestando a senhorita quando eu abri a porta da carruagem. — ele ergueu a mão e traçou o lábio inferior dela com o polegar. — Tão macio.

A atenção dela se voltou para os lábios dele. Ele a tinha agora, e era bem possível que ela estivesse imaginando como seria beijá-lo.

— Você acha que seria uma boa ideia? Estamos no meio de Londres, qualquer um poderia nos ver e o que estávamos fazendo aqui.

Hunter desamarrou as cortinas da carruagem depressa e as deixou cair. Garantida a privacidade, ele ergueu as sobrancelhas, sorrindo.

— Melhor, Srta. Smith? Ou você está apavorada demais para me beijar?

— Eu não tenho medo de nada, muito menos de você. — disse ela, aproximando-se, segurando o queixo dele e beijando-o exatamente como ele esperava.

Por um momento, ele ficou surpreso por ela ter sido a pessoa a iniciar o beijo, por mais casto que fosse, mas quando ela se afastou, ele remediou a ação e a trouxe de volta. Fazia dias que ele queria beijá-la, e de jeito nenhum ele terminaria o dia de hoje sem prová-la.

Os lábios dela eram macios, suaves e o beijaram com a experiência de uma cortesã. Por um momento, ele se perguntou onde ela havia aprendido tais habilidades, mas o leve toque dos seios dela contra o peito dele o fez esquecer tal pensamento.

Ele ardia com a falta dela, algo que nunca havia experimentado antes, nem mesmo com as amantes que manteve no passado. A

mão dela deslizou em seus cabelos, puxou-o para mais perto ainda, e ele não a negou. A língua dele tocou a dela, hesitante a princípio, e em um momento ela o beijou com tanta necessidade, tanto entusiasmo quanto ele. Ele nunca se cansaria dela.

Os grampos dela se soltaram e seus longos cachos dourados caíram sobre os ombros. Ele queria se afastar, ver como ela ficava meio desarrumada, mas não conseguia, não importa o quanto tentasse.

A carruagem parou, e ela se afastou, as bochechas em um lindo tom de rosa, os olhos arregalados e reveladores.

— Espero que eu não tenha assustado você, senhorita Smith. —

ele conseguiu dizer, pigarreando quando a voz soou muito pesada de necessidade, muito profunda de desejo.

— Pelo contrário, Lorde Aaron, me deixou ainda mais curiosa.

Embora suas palavras soassem verdadeiras, a Srta. Smith saltou depressa da carruagem em direção à porta da frente, que se abriu enquanto ela subia as escadas. Hunter a assistiu subir, mesmo que o que queria era segui-la e ver aonde aquele beijo poderia levar. Ele pegou o cantil o cheiro do uísque pareceu menos tentador. Havia algo muito mais delicioso e, nossa, havia desaparecido casa adentro sem sequer olhar para trás.

Ele bateu com a bengala no telhado, e a carruagem se afastou.

Em que lugar ele conseguiria voltar a vê-la? Ou melhor ainda, como ele conseguiria se reunir a ela sem ser óbvio que ele a buscava? Ele escreveria para a duquesa assim que voltasse para casa e veria se ela planejava convidar a Srta. Smith para mais eventos. E se não, bem, ele teria que garantir que a encontrasse em algum lugar. E em breve.


CAPÍTULO 7

C ecilia estava sentada no escritório domiciliar do pai, observando incrédula enquanto ele a castigava pelo comportamento atroz que ela apresentara na carruagem no dia anterior. Por um momento, Cecilia pensou que ele soubesse do que havia acontecido entre ela e Lorde Aaron, mas o alívio foi breve porque ele estava, na verdade, falando do Sr. White.

— Eu não errei, papai. Ele me forçou a beijá-lo. Algo que eu nunca quis, que vou querer.

O pai dela se inclinou para a frente na mesa, apertando o topo do pergaminho que estava diante dele com as mãos.

— Ele é um bom partido para você, minha querida. Também vai assumir a empresa quando eu falecer. Eu preferiria que ele se casasse com alguém da família, apenas para manter o negócio em nossas mãos. Eu odiaria que se perdesse.

Cecilia se levantou e andou na frente das janelas.

— Pai, eu não o amo, nem o considero atraente e muito menos agora que ele teve a liberdade de me insultar quando não tinha o direito. Não vou tolerar isso dele, nem de ninguém, e não farei o que você me pede. Se quer que a empresa fique nas mãos da família, sugiro que tente ter outro menino com a mamãe, ou passe para mim.

— Cecilia, isso não é justo. — disse a mãe. — Você sabe que tentamos ter outros filhos, mas infelizmente, sem sucesso.

O rosto de seu pai estava cheio de raiva e, por um momento, Cecilia se perguntou se ela o havia pressionado demais com as palavras.

— Como você ousa, criança. Como ousa falar conosco dessa maneira! Sou o chefe desta casa e, sob nenhuma circunstância, você deve se dirigir a mim ou à sua mãe com tão pouca consideração ou cautela.

Cecilia respirou calmamente.

Como ela ousava? Como eles ousam tentar fazê-la se casar com um homem que a fazia ficar arrepiada.

— Eu posso ser sua filha, posso ser mulher e, com isso, ser considerada uma pessoa de menor valor em nossa Sociedade, mas sei que sou mais inteligente do que o Sr. White, e sou mais do que capaz de manter os homens que trabalham para você sob controle, motivados e sob minha autoridade. Você não precisa entregar seu negócio ao Sr. White simplesmente porque ele é um homem. Sabe no fundo, que o que estou dizendo é verdade, basta confiar em mim o suficiente, me amar o suficiente para ver que sou merecedora.

— Você é merecedora, querida, nunca pense que acreditamos em algo além disso. — disse a mãe, apertando as mãos.

O pai dela balançou a cabeça, uma linha profunda entre as sobrancelhas.

— Uma mulher não seria adequada, e seria apenas uma questão de tempo até que as pessoas parassem de procurar nossos serviços. Não posso arriscar o sustento da família, uma empresa que levei vinte anos para construir, arriscar perdê-la simplesmente para fazer minha filha feliz. Não. — disse ele, levantando-se e servindo-se de um copo de conhaque. — Você se casará com o Sr.

White e herdará a empresa através dele. É mais adequado e conveniente.

— Está dizendo que vai me forçar a me casar com ele?

O horror de tal pensamento a fez estender a mão e se apoiar na parede. Imaginar o Sr. White tocando-a outra vez, não apenas

beijando-a, mas dormindo ao lado dela na cama, tomando-a repetidas vezes. Ela sentiu o estômago embrulhar e cobriu a boca com medo de vomitar.

Sua mãe se aproximou e pegou a mão dela.

— O Sr. White não é tão ruim, minha querida. Ele é de uma família respeitável e não é cruel. Poderia ser pior.

— Embora eu não queira forçá-la, minha querida, eu o farei se você continuar entrando em conflito comigo por esse assunto. Você terá esta temporada para se acostumar com o Sr. White e seus modos. Conheça-o um pouco melhor. Ele não é tão ruim quanto você pensa, Cecilia.

Ele era pior.

Cecilia olhou pela janela e observou um carrinho de carvão passar. Ela se arruinaria antes de permitir que fosse casada com tal idiota. Ele era nojento.

Ela saiu da sala e não respondeu. Não havia mais nada a dizer.

Seus pais pareciam convictos e, a menos que ela encontrasse alguém mais adequado que o Sr. White, mais conectado e disposto a assumir a empresa de seu pai, ela acabaria casada com o homem.

Ela fez uma pausa ao pé da escada.

Como ela poderia suportar uma vida assim?

Ela não poderia. Ela não iria.

— Srta. Smith, uma carta da duquesa de Athelby para você.

Cecília pegou o pergaminho e quebrou o selo ducal. Após uma breve leitura descobriu se tratar de um convite para um baile de máscaras a ser realizado na propriedade londrina de um amigo da duquesa e do duque. Hamish Doherty, Conde de Leighton. A carta também dizia que ela poderia trazer um convidado.


Ela levaria Katherine com ela. A amiga iria adorar participar de um evento da Alta Sociedade, e seria uma noite que seu futuro com o Sr. White cairia em um breve esquecimento. Ela teria a temporada para convencer o pai. Caso contrário, precisaria resolver o assunto e sua vida com as próprias mãos e se afastar da família. Ela não se casaria apenas para garantir que a empresa de seu pai permanecesse na família. Esse arranjo não era nem justo, nem correto. Ela poderia se tornar professora em uma das escolas que abrira. Eles levantavam seus próprios fundos; e outros benfeitores ricos, como a duquesa de Athelby, poderiam estar dispostos a doar mais para substituir a perda do patrocínio do pai de Cecilia, que sem dúvidas, estaria perdido.

Viver com meios limitados, resultado da mudança de circunstâncias, era melhor do que se casar com um homem que ela não amava. Ela faria qualquer coisa, menos isso.

Uma semana se passou e, enfim era a noite do baile. O baile de máscaras era belo. A variedade de vestidos, joias, risadas e luzes de velas fazia o salão parecer um sonho brilhante e, Cecilia e Katherine, pararam na porta enquanto o duque e a duquesa de Athelby caminhavam à frente deles na multidão.

— Ó meu Deus, Cecilia. Que espetáculo magnífico!

Cecilia sorriu e entrelaçou o braço com o de Katherine, puxando-a para frente.

— É sim uma visão deslumbrante, que nunca mais voltaremos a ver. Prometa-me uma coisa esta noite, minha querida.

— Qualquer coisa. — disse Katherine, a atenção mudando de uma fantasia para outra. Eram tantas.

Os convidados se superavam com uma variedade de personagens presentes, coringas, piratas, criaturas míticas e outros, menos arrogantes, escolheram trajes noturnos como vestidos de seda acompanhados com máscaras que se destacavam com joias ou penas.

— Que nos esqueceremos de onde viemos, aproveitaremos a oportunidade para nos divertir, dançar e rir e nos esquecer de todo o resto.

— Parece o paraíso. — disse Katherine, sorrindo quando um cavalheiro se curvou diante dela de uma maneira florescente, muito exagerada, e a convidou para dançar. O traje do homem era quase inteiramente preto, agourento até, e sua máscara cobria todo o rosto, dando-lhe um ar de mistério.

Cecilia os observou desaparecer na multidão de dançarinos que já estavam no salão e seguiu atrás do duque e da duquesa.

Chegaram ao final do salão comprido, foram para perto das portas do terraço que estavam abertas. Muitos dos convidados estavam aproveitando a oportunidade para tomar ar. Os jardins estavam bem iluminados, e o exterior parecia tão bonito quanto o interior da casa.

Cecilia verificou seu traje. Naquela noite, ela usava um vestido de mangas curtas, cetim branco com uma capa verde presa em um dos ombros que se dobrava na frente, quase escondendo a cintura, mas não por completo. Estava presa ao quadril por um bonito cinto de diamantes que sua mãe emprestara para a noite. Uma única pluma verde estava incorporada em seus cabelos, e uma máscara prateada simples, apenas cobria os seus olhos completou o modelito.

— Lorde Leighton se esforçou bastante neste baile. Ele realiza um por ano?

— Sim. — disse a duquesa, pegando a taça de champanhe que seu marido passou e a entregou para Cecilia. — Lembro-me de que no ano passado, quando participei, meu marido, que na época não era meu marido, não aprovou.

O duque olhou para Darcy antes de sorrir.

— Eu o aprovo agora, minha querida.

Cecilia desviou o olhar, pois parecia que uma conversa particular entre marido e mulher estava acontecendo entre os dois, e ela não queria se intrometer.

— Acredito que lorde Aaron estará aqui esta noite.

— Quanto a isso, minha querida. — o duque examinou a multidão, franzindo a testa um pouco. — Hunter pode se atrasar.

— Acredito que ele trará um convidado. — disse a duquesa, lançando um olhar na direção de Cecilia.

— Quem?

Cecilia encontrou Lorde Aaron bem antes que o duque pudesse dizer mais alguma coisa, e ela viu que Sua Senhoria se dirigia a eles. Naquela noite, Lorde Aaron parecia um desastre, os cabelos despenteados e a barba por fazer quase não era coberta pela máscara que usava. A mulher que segurava o braço dele exalava berço e posição, e parecia deslumbrante no vestido estilo império vermelho, com flores bordadas em ouro na bainha.

Cecilia voltou sua atenção para os dançarinos e tentou ignorar o zumbido em seus ouvidos. A sala girou e, distante, ela ouviu o duque de Athelby xingar. Incapaz de se conter, voltou a olhar para o par que vinha na direção deles enquanto tentava não morrer de humilhação. Beijar mulheres dentro de carruagens e depois comparecer a bailes com uma amante diferente era um esporte dele? Não que ele devesse alguma coisa para ela. Ele, sem dúvidas, não havia se comprometido a cortejá-la, nem prometeu que

o beijo deles era o começo de algum compromisso, mas, mesmo assim, o que ele pretendia? Do jeito que estava, ele se parecia com o patife do dia em que se conheceram.

Lorde Aaron curvou-se diante deles, mal olhando na direção dela, e disse boa noite.

A duquesa sorriu para a mulher e apontou para Cecilia.

— Srta. Smith, gostaria de apresentá-la a Lady Henrietta Morton, recém-chegada de Bath, se a memória não me falha.

Lady Morton fez uma reverência.

Os olhos da mulher estavam vidrados e um pouco injetados de sangue, semelhantes aos de Lorde Aaron.


— Sua Graça, é adorável estar de volta à cidade. Bath, como sabe, é muito pequena, e quando Lorde Aaron me convidou para vir à cidade, bem, como poderia recusá-lo?

De fato, como...

— Você mora em Bath a maior parte do tempo, Sua Senhoria?

— Cecilia perguntou, não querendo parecer rude e desinteressada com a parceira de Lorde Aaron.

Ela respirou com calma e deu um sorriso tímido, mesmo que as mãos tremessem nas luvas de seda. Que tola havia sido. Ela havia sido um joguete bobo para Sua Senhoria, e agora a mais nova peça no tabuleiro dele sorria para ela.

— Desculpe, quem é você? — Lady Morton perguntou, inspecionando-a como se ela fosse um inseto.

Cecília lutou para não se remexer.

— Senhorita Cecilia Smith, Sua Senhoria.

Cecilia pegou um copo de ratafia de um lacaio que passava, qualquer coisa para ajudar a impedir que as mãos continuasse a se descontrolar.

— Você é parente dos Smith de Hampshire? Eles residem na Abadia de Woodrest.

— Ah, não. — disse Cecilia, tomando um gole da bebida. — Meu pai é advogado e administra a firma de advocacia J Smith e Filhos em Cheapside.

Sua Senhoria riu, e a duquesa olhou furiosa para a mulher, mas Lady Morton não prestou atenção ao aviso silencioso, apenas continuou rindo.

— E você está aqui, por quê? Não achei que tais eventos permitissem que pessoas da sua classe participassem.

Cecilia fez uma pequena reverência.

— O mesmo pode ser dito de você, Lady Morton, pois não tem educação e, portanto, não tem classe. Por favor, com licença. —

disse ela, dirigindo-se para a sala de descanso, odiando o fato de que as observações cortantes de Sua Senhoria a haviam afetado.

Ela precisava se afastar da mulher antes de dizer qualquer coisa que se assemelhasse às grosserias ditas por Sua Senhoria.

Entrando no vestíbulo, ela seguiu um pequeno grupo de mulheres que estavam conversando e caminhando em direção ao destino mútuo. Como Lady Morton ousava falar com ela daquela maneira, e como Lorde Aaron permitia isso? Ela podia ser de classe baixa, mas era amiga de uma duquesa, o que pelo menos deveria proporcionar um pouco de respeito.

Um braço surgiu em sua cintura e a puxou para uma pequena sala de estar em frente à sala de descanso em que ela estava prestes a entrar. Antes de se virar, Cecilia sabia quem estava atrás dela, e ela formou uma expressão neutra antes de encarar lorde Aaron. Ele jogou as cartas e mostrou seu valor, e ela não seria enganada novamente.

— O que faz aqui? A duquesa nunca me informou que o senhor viria esta noite. — Cecilia ergueu as sobrancelhas, perplexa.

— E ela tem que informá-la de tudo o que faz? Acho que não.

— Com licença. — disse ela, abrindo a porta.

Ele a puxou de volta, e ela sentiu o cheiro de uísque no hálito dele.

— Já está bêbado, milorde.

— Que original de sua parte. — Lorde Aaron engoliu, passando a mão pelo rosto e tirando a máscara. — Eu ia vê-la.

Ela estreitou os olhos, ignorando o burburinho em seu estômago.

— E por que faria tal coisa? Não somos amigos, nem frequentamos a mesma esfera social. Só estou aqui por convite da duquesa. E posso prometer que, depois desta, jamais voltarei a frequentar um baile com vocês.

Ela manteria contato com a duquesa, é claro, disso, mas todos os outros poderiam sumir.

— Lady Morton é uma velha amiga da família, uma mulher que foi destruída financeiramente pelo falecido marido. Como ele era o filho mais novo de um duque sem dinheiro, eles nunca tiveram muitos fundos. Ela apenas me pediu para ajudá-la a se restabelecer em Londres. Não há nada de romântico entre nós, se é isso que causou sua atitude agressiva para comigo.

Ela sufocou um arfar.

— Perdão, Lorde Aaron, mas não sou agressiva. E se fui rude com sua amiga, foi apenas porque ela foi muito indelicada. Não serei criticada por ninguém, muito menos por uma mulher que cheira tão forte à bebida quanto você.

Um músculo da mandíbula dele se contraiu.

— Gostaria de lembrá-la de que seus lembretes contínuos e observações maliciosas sobre minha ingestão de álcool não são

aceitáveis. Vindas de ninguém.

Ela deu de ombros.

— Não me importo com o que é ou o que não é aceitável. O

senhor, Lorde Aaron, está sempre caindo pelas tabelas, mal formulando palavras, e trazendo mulheres de moral questionável para bailes. Não vê como isso é inaceitável? Se seus amigos não tentarem ajudá-lo a encontrar um caminho melhor a seguir do que estar embriagado s o tempo todo, agindo com extrema insensatez, e gastando seu precioso dinheiro em coisas sem importância, então o farei. Não há nada a perder se não somos amigos.

Sua Senhoria parou na frente dela quando ela fez menção de fugir mais uma vez.

O que há com esse homem!

Ela olhou para ele.

— Saia do meu caminho.

— Nada a perder? Suas palavras são sinceras?

— Você continua a provar meu argumento. Nenhum homem em seu juízo faria tal pergunta a uma mulher. Praticamente me perguntou se eu gosto do senhor, e se estivesse sóbrio, nunca me faria esse questionamento.

— Eu não estou tão bêbado assim. — disse ele, balançando um pouco na direção dela.

Cecilia cruzou os braços.

O olhar dele desviou para os seios dela, que estava um pouco mais evidente devido à posição em que estava, então ela deixou cair os braços ao lado do corpo.

— Acredito que perderíamos uma grande oportunidade se você saísse da minha vida.

— Você me fez sentir como uma tola. Eu o beijei e você chega a um baile com outra mulher. Eu sei que não fez promessas para mim,


nem tenho expectativas; mas você deveria, pelo menos, como cavalheiro, agir com alguma sensibilidade. Agora, se me der licença, Lorde Aaron, desejo ir embora.

HUNTER engoliu o pânico que o percorreu com as palavras de Cecilia.

Ele não pensou que ela estaria no baile de máscaras de Lorde Leighton. Ele só trouxe Lady Morton esta noite para reintroduzi-la em uma sociedade que ficara ausente por alguns anos. Nenhum dano nisso.

Erro estúpido ao ver que a Srta. Smith estava presente, ficou parecendo que ele mantinha várias mulheres à sua disposição.

Levava-as para bailes e festas sem pensar nelas, ou pelo menos, em uma mulher que ele havia beijado com sofreguidão na semana passada.

— Pode até estar certa em dizer que bebo muito, mas saiba que eu não tenho envolvimento algum com Lady Morton. Admito que tive relações com ela enquanto era casada, e não é nada de que tenho orgulho, e não pretendo renovar essas relações tão cedo.

Hunter a pegou pelo queixo e virou aqueles olhos azuis cristalinos para olhá-lo de frente. Inferno, ela era bonita, com uma boca que implorava para ser beijada, e caramba, ele queria beijá-la mais uma vez. Não conseguiu pensar em mais nada desde a semana anterior.

— Se você precisa saber a verdade, penso em você. Em seu eu opinativo, nas suas conversas inteligentes e repertório espirituoso.

Sua beleza, tanto por dentro como por fora. Sua caridade que me

deixa com vergonha. Você é a única mulher que não se joga aos meus pés, o que me deixa seriamente distraído.

Ela olhou para ele então, os dentes perfeitamente retos apertando o lábio inferior e deixando-o ainda mais obcecado por sua pessoa.

— Eu penso em você o tempo todo. Eu penso em beijar você o tempo todo. — ele murmurou.

— Você deseja me beijar de novo, Lorde Aaron?

Ele assentiu antes que a cautela pudesse interromper sua resposta.

— Sim, quero. — disse ele, não querendo esconder mais os sentimentos em relação à mulher diante dele.

Não era um simples querer, se ele fosse honesto. Ela seria a amante perfeita, o manteria interessado e nunca entediado. Que tudo fosse pelos ares, ele queria saboreá-la mais uma vez se ela permitisse.

— Se quiser me beijar de novo, milorde, o preço que precisa pagar é o álcool de que gosta tanto. De qualquer forma, não toque em bebida até me ver de novo, e eu lhe darei essa dádiva.

Ele sentiu náusea ao pensar em não tomar um conhaque em frente da lareira em casa, ou um belo uísque envelhecido em eventos como esse.

— Posso tomar vinho?

— Não. Chá e café são aceitáveis, ou um ponche de frutas, desde que sem álcool. E se ainda estiver, milorde, interessado em beijar uma mulher com metade da sua posição social, uma solteirona convicta, e estiver sóbrio, então vou permitir que você me beije. — disse ela, com uma elevação teimosa do queixo.

— Você acha que eu só quero você porque estou embriagado? E

a propósito, eu gostaria de salientar, não estou tão bêbado.

Ele odiava que ela tivesse essa ideia dele. Não poderia estar mais longe da verdade. Houve muitas vezes que ele pensou nela, a desejou e não tomou nem um ml de bebida.

— Eu penso que sim.

Ele franziu o cenho.

— Bem, não pense, porque quando eu vencer esta guerra, e eu estiver diante de você sóbrio, você verá o quanto eu quero você, não por causa de qualquer coragem líquida. Depois disso, ele pediria que ela considerasse ser sua amante, que permitisse que cuidasse dela e a mimasse de uma maneira satisfatória aos dois.

A vida dele até o momento em que a conhecera foi repleta de pura autogratificação. Cecilia era uma alma pura, e o fazia querer ser um homem melhor. Devido à sua classe, ele nunca poderia olhar para ela como algo além de uma amante, mas não significava que ele não poderia tornar a vida dela mais doce, e fazer a própria vida valer mais do que nos dias de hoje. Com tal estilo de vida, ela poderia continuar com o trabalho de caridade e nunca ter que se preocupar em se casar com alguém para garantir um teto sobre a cabeça das crianças que ela gostava.

Ela olhou para ele, inocente e, no entanto, havia uma força e inteligência que espreitavam em suas esferas azuis, e ele queria tudo para si. Ele a queria em sua vida.

Hunter endireitou as costas e curvou-se.

— Vou garantir que seja convidado para o próximo evento que o duque e a duquesa comparecerem, e aí, Srta. Smith, você perderá essa aposta.

Ela estendeu a mão e apertou a mandíbula dele, e ele ficou imóvel com o toque dela. Em algum momento, ela tirou as luvas, e a mão macia estava quente e reconfortante, fazendo seu estômago apertar.


— Não, Lorde Aaron, não percebe? Eu hei de vencer esta aposta de uma maneira ou de outra.

— Dança comigo?

CECÍLIA ASSENTIU.

— Sim.

Eles voltaram ao salão de baile, e a orquestra tocava uma valsa.

Cecilia viu Katherine dançando com outro estranho mascarado, e o duque e a duquesa também participavam da dança ousada.

— Você gosta de dançar, senhorita Smith? — o marquês perguntou, girando-a rapidamente e fazendo-a rir.

— Sim, apesar de não sairmos tanto quanto costumávamos quando debutei. Se não percebeu, estou bem encalhada.

— Nunca quis se casar? — ele perguntou, olhando-a tão de perto que ela sentiu calor se espalhar por seu corpo.

Ele gostava do que via?

O interrogatório dele significava que ele queria conhecê-la melhor?

— Fui cortejada, mas nunca encontrei nenhum cavalheiro com quem me importasse o suficiente para me casar. Logo depois me engajei no trabalho de caridade e encontrei um novo amor: o das crianças que confiam em mim. Não me preocupo se eu nunca me casar, não importa o que meu pai possa pensar. Estou bastante satisfeita com a minha situação na vida.

Ele balançou a cabeça com as palavras dela.

— Você é tão confiante quanto a isso. Receio que eu sou o contrário. Suponho que pareço mesmo um idiota que não faz nada, além de gastar o que possui de forma imprudente.

A mão dele apertou a cintura dela durante uma curva, e ela sentiu o coração bater no peito com força. Ela engoliu em seco.

— Não precisa viver dessa maneira. É um lorde poderoso, pense em todas as coisas maravilhosas que poderia fazer se quisesse.

— Doar para caridade, você quer dizer? Em vez de construir o clube de cavalheiros. — ele perguntou sorrindo Ela riu.

— Não é só isso, você poderia procurar outros locais para ajudar, como entrar para a Câmara dos Lordes e buscar melhorias para os pobres. Impeça as crianças de trabalhar e envie-as para a escola. Melhor moradia para os pobres, melhor abastecimento de água, drenagem e aquecimento para suas casas.

Ele inclinou a cabeça.

— Estou impressionado com você, senhorita Smith. Acredito que nasceu antes do seu tempo. Nunca conheci alguém com opiniões tão determinadas e boas. Firmeza para tentar melhorar a vida dos outros. Eu fico envergonhado.

— Não. — disse ela, não querendo que ele pensasse dessa maneira. — Estou longe de ser perfeita, como você, tenho meus defeitos. Sou opinativa e crítica, como você já me apontou. Nem todo mundo tem o necessário para o trabalho que faço, e eu deveria entender melhor isso, e não tolerar e condenar.

— Às vezes, como comigo, é apropriado, mas eu sei que, com sua ajuda, posso mudar, talvez promover mudanças em minha vida e na de outras pessoas.

Cecilia sorriu, jamais imaginaria que ouviria Sua Senhoria dizer isso. Ele estava sempre tão cego para os outros que ela o considerou como sem esperanças.

— Eu sei que você consegue.


CAPÍTULO 8

N a semana seguinte, Cecilia sentou-se na biblioteca do pai para elaborar cartas para os clientes dele, com atualizações e progressos, seguindo as anotações dele. Era uma ocupação que ela gostava e, como sua caligrafia era mais legível, era algo que ele permitia que ela fizesse por ele.

Uma batida alta soou na porta, e Cecilia abaixou a pena enquanto uma voz acelerada e familiar, falava com o mordomo. A porta da biblioteca se abriu, e a duquesa de Athelby entrou na sala, o semblante geralmente sereno, avermelhado pelo esforço e marcado pela preocupação.

Cecilia se levantou.

— Sua graça, está tudo bem?

A duquesa parou diante da mesa, balançando a cabeça.

— Você deve vir comigo. O marquês de Aaron está em um estado deplorável. Agora, antes de dizer qualquer coisa, me ouça.

A duquesa fez uma pausa, e Cecilia assentiu com aprovação.

— Ele mencionou ao duque que fez uma aposta com você, uma que ele levou muito a sério nos últimos sete dias. Tão sério que ele está em péssimo estado.

Calor correu pelas veias dela ao ouvir que o marquês cumpriu com sua promessa. Isso significava que ele se importava com ela, talvez a visse como alguém com quem passar o resto da vida e ter uma família? Ele é alguém com quem ela gostaria de passar o resto da vida? Cecilia fez um gesto para a duquesa se sentar e sentou-se, descartando o pensamento. O marquês nunca havia declarado nada

desse tipo, além de querer beijá-la, ele não fez promessas. Ela não deveria se antecipar.

— Posso falar, Sua Graça? De forma franca se você permitir.

— Claro, mas isso não é tudo o que tenho para contar.

— Acho que sei quais serão as outras palavras, mas posso contar o que sei?

A duquesa assentiu, torcendo as mãos no colo:

— É claro.

— Por trabalhar com as instituições de caridade como fazemos, vemos semelhanças com pessoas que sofrem de diferentes aflições. Não sei se você está ciente, mas temo que o marquês de Aaron não consiga se controlar quando se trata de vinho ou uísque, bebidas dessa natureza. Sendo brutal, Vossa Graça, ele é um alcoólatra. Um que se veste e fala com primazia, mas um verdadeiro beberrão. Nossa aposta era que ele deixasse de beber, e agora ele está sofrendo as consequências de sua escolha. Não é agradável, e levará tempo, mas ele vai superar.

A duquesa olhou para ela um momento antes de dizer:

— Embora eu admita estar um pouco ciente dessa situação, o que está acontecendo com ele agora não é nada bom. Ele está muito mal e chama por você. Ele não permite que mais ninguém o veja. Cameron está doente de preocupação, e mesmo que eu esteja pedindo que você faça algo além do necessário, você vem comigo.

Ajude-me, ajude-o.

Cecilia se levantou, sem precisar que pedisse duas vezes.

Pensar em Hunter sofrendo fez seu estômago embrulhar.

— Claro, eu ajudarei. Deixe-me fazer uma pequena mala.

Quando vou visitar o orfanato no interior, sempre passo a noite. Vou deixar uma mensagem para o papai dizendo que é para lá que fui.

Ele não adivinhará que eu fui à casa do marquês.


A duquesa apertou a mão dela.

— Você é muito boa, e manteremos seu nome e sua visita à casa do marquês em segredo. Não permitiremos que ninguém saiba que você esteve lá.

Não demorou muito para que a carruagem, sem brasões, da duquesa chegasse à estrebaria nos fundos da casa do marquês, na Berkeley Square. Um cavalariço saiu e ajudou-as a descer, antes que atravessassem o quintal para garantir que não fossem vistos chegando e entrando em casa.

A casa não era o que Cecilia esperava. Por alguma razão, ela presumiu que a casa seria escura, misteriosa como o dono, mas, em vez disso, estava iluminada, velas de cera acesas em todos os cômodos e corredores. Havia tapetes bem conservados e tábuas no chão altamente polidas. A escada que ficava no centro do hall de entrada também estava bem iluminada e, da base da escada, Cecília pôde ver que o primeiro andar abrigava muitos retratos, talvez de membros da família.

— Vamos subir? — a duquesa perguntou, indo em direção à escada.

— É claro. Subo atrás de você.

Elas subiram as escadas, e o duque os encontrou no andar de cima.

— Ele ainda não me permite entrar. — o duque fez uma reverência. — Boa tarde, senhorita Smith. Peço desculpas por nossa intrusão em seu dia, mas não o teríamos feito se não o considerássemos o mais importante.

Cecilia fez uma reverência.

— Não se preocupe, Sua Graça. Foi minha aposta boba com o marquês que trouxe seus sintomas atuais; é justo que eu tente aliviá-los de alguma forma.

— Você é muito gentil. — disse a duquesa. — O quarto de Hunter é a terceira porta à esquerda. Vamos descer e pedir um chá.

Peça a um criado que nos procure se houver algo que possamos fazer para ajudar. Sempre há um parado à porta. Infelizmente, não somos nós que o marquês quer.

— Farei isso. — disse Cecilia, indo ao quarto e colocando a bolsa ao lado da porta.

Ela ficou lá sem fazer barulho enquanto observava o duque e a duquesa descerem as escadas. Respirando fundo, ela bateu forte duas vezes.

— Lorde Aaron, você me deixa entrar? É a senhorita Smith.

Nenhum som saiu da sala e, pouco antes de ela bater novamente, a fechadura girou e a porta se abriu. Ele estava pior do que Cecilia imaginara e, sem dizer uma palavra, entrou no quarto, deixando a porta entreaberta.

Tomando a mão de Sua Senhoria, ela o acompanhou até a lareira, que nesse momento só tinha carvão e sentou-o. Virando-se para a lareira, acrescentou mais um pouco de carvão, depois madeira, e soprou as brasas que ainda brilhavam um tom leve de vermelho, mas sem emitir calor. Ela se concentrou em sua tarefa, criando um ninho para o fogo e, felizmente, alguns pontos da madeira se acenderam, e o fogo começou a queimar.

— Você é a mulher mais talentosa que conheço. Pode até fazer fogo.

Ela riu, levantando-se e sentando-se em frente a ele.

— Quando crescemos, não tínhamos muitos empregados e, embora possamos pagar por eles agora, nem sempre foi assim. E

então sim, eu aprendi como fazer muitas coisas. Sei lavar roupas, cozinhar, tirar o pó e até acender uma lareira. Não é o que sua sociedade chamaria de moça prendada, mas acho que são excelentes habilidades para a vida que todos deveriam ter.

Ele a encarou, com os olhos vidrados e um tom escuro de cansaço. Seu cabelo estava emaranhado e parecia precisar de uma boa lavagem. Ele estava em melhor estado agora, e ela franziu a testa, a culpa atacando sua alma.

— Você sabe por que estou aqui, não sabe, milorde?

O marquês se encolheu, voltando a observar o fogo.

— Me chame de Hunter, por favor. Você está me vendo no meu pior momento, eu não mereço o nome de um cavalheiro nessa condição.

— Vou chamá-lo de Hunter, mas é digno do título, milorde. Sua condição não faz de você quem você é. É apenas um sintoma do que você causou a si.

Se alguém desenhasse um rosto para "despedaçado", o marquês seria um retrato fiel dele.

— Sinto-me como esterco de cavalo e peço perdão pelo uso dessa palavra, mas nunca me senti tão mal em minha vida. Mas, mesmo assim, meu desejo de ser digno de seu beijo anula minha miséria.

O coração de Cecília acelerou um pouco, e ela lutou para não ir até ele, envolvê-lo nos braços e dar o que ele queria. O que ela queria. Mas ainda não, primeiro eles precisavam derrotar esse demônio interior contra o qual ele lutava. A dor que ela percebeu nos olhos dele a fez questionar sua decisão, não de ajudar, mas de manter distância. Talvez ela fosse um vício melhor para ele do que aquele que o assolava agora.

Contra tudo o que ela pregava, ela se ajoelhou aos pés dele.

Apertando as bochechas ásperas pela barba, ela o puxou em sua direção, beijando-o de leve na boca. A sensação dele tão perto, o toque de sua respiração contra seus lábios a deixou ansiosa por mais. Mesmo naquele estado, tanto físico como mental, ela queria beijá-lo. Permitir que ele se perdesse nela, tudo, menos permitir a necessidade de mais do que ele estava absorvendo nos quantos anos que ele bebia.

— Você é digno, nunca pense o contrário. — disse ela em voz baixa.

Mesmo sem instrução na arte do amor, ela foi capaz de distinguir o desejo ardente que ele teve por ela quando a viu. E ela via agora, nas profundezas dos olhos dele, um desejo de ser livre, de se esquecer do que o afligia e se perder nela.

Cecilia o beijou mais uma vez, inclinando-se e pegando a boca dele da mesma maneira que ele a beijou na carruagem. Sem obstáculos, sem restrições e com uma necessidade que trazia à tona seus próprios desejos e vontades, enterrados há muito tempo.

Hunter, como ele agora queria que ela o chamasse, despertou todos os desejos enterrados nela, os sonhos de viver com um homem. Não apenas qualquer homem, como seu pai desejava, mas um homem que a excitasse, estimulasse sua mente e alma, a irritasse e enlouquecesse de todas as maneiras mais maravilhosas.

Uma vida com Lorde Aaron...

— Ansiei por você. Você me faz esquecer quem eu fui e ver o que posso me tornar. — a voz dele, áspera e profunda, fez o coração dela pular uma batida. Ela lutou para não o beijar de novo e fazê-los perder a noção de mundo. — Deixe-me amá-la. Deixe-me tê-la.

Cecilia se inclinou para trás e capturou seu olhar.

— Vou ficar com você, ajudá-lo da melhor maneira que sei, mas não posso permitir as liberdades que pede. Mas darei a você o máximo que puder.

— Sua alma é tão pura. A minha é tão escura quanto o próprio diabo.

Ela acariciou a barba por fazer dele.

— Então é uma sorte que minha mente não esteja vazia, pois não há lugar aqui para o trabalho do diabo. Isso eu prometo.


CAPÍTULO 9

N o final da noite, Lorde Aaron se contorcia na cama, a pele pegajosa e pingando suor. Sua Senhoria implorou o tempo inteiro por um gole de uísque, qualquer coisa, que alguém o ajudasse. Cecilia ordenou que o mordomo se livrasse de todo o álcool que ainda existisse na casa, também ordenou que a cozinheira escondesse qualquer coisa alcoólica que ela usasse na cozinha. Nada que Sua Senhoria pudesse beber em um momento de descuido de algum deles poderia permanecer na casa.

Cecilia sentou-se ao lado da cama dele, e segurou sua mão.

— Por favor, Lia, apenas um pouco de bebida. — disse ele, fazendo o apelido que ele havia dado a ela soar agradável, mesmo que fosse algo que ele só usou nas últimas horas. Era o nome que a mãe dela usava quando Cecilia era criança, e ela adorava, ainda mais, vindo dos lábios de Lorde Aaron.

Claro que ela não deveria gostar. Ele estava tão acima dela em classe, tinha demônios que nem ela sabia se poderiam ser vencidos, sem mencionar que se casar com um homem assim poderia limitar suas instituições de caridade ou pelo menos o número delas com as quais ela poderia se envolver. Ele pode ter afirmado que desejava mudar, ajudar aos outros, mas e se esse estilo de vida o entediasse? E se ele se cansasse dela...

Cecilia era péssima com bordados ou dar passeios aleatórios em parques apenas para ser vista; sempre se sentira deslocada em tais situações. Sem falar que o pai dela também contava com ela para ajudar com os casos dele e fazer a contabilidade. Não que o Sr.

White achasse que ela era útil, mas Cecilia sempre nutriu a ideia de

que, se pudesse provar a seu pai que era capaz, ele permitiria que ela herdasse a empresa.

Com o tempo, o marquês esperaria que ela se comportasse como um belo ornamento a tiracolo, fosse obediente e contivesse a língua. A vida com uma aristocrata não era para ela, por mais que Sua Senhoria fosse uma tentação para sua alma. O risco era grande, e ela não tinha certeza de que era capaz de tal aposta.

Mas ela o ajudaria como fazia com tantas pessoas necessitadas.

Ela o ajudaria a se reerguer, assim ele se casaria bem e, quem sabe, com amor e carinho. Fazer mais de sua vida do que a loucura sem sentido que ele estava mergulhado até hoje.

— Eu não posso dar a você o que quer, Hunter.

Ela limpou a testa dele com um pano úmido e tentou acalmá-lo com histórias sobre as instituições de caridade, fofocas, qualquer coisa para tirar a mente dele do que o corpo ansiava. As horas passavam e, ao amanhecer, o céu noturno se transformou em uma névoa dourada. Lorde Aaron piorava.

Ela foi para perto do duque, mordendo o lábio inferior enquanto pensava em como manter o marquês seguro, dele mesmo e dos outros.

— Precisamos amarrá-lo na cama. Ele é grande demais para ser controlado, e se ele surtar precisaríamos de muitos de nós para dominá-lo. A necessidade de álcool fará sua força dobrar.

— Como sabe tudo isso, senhorita Smith? — o duque perguntou, olhando para ela.

Ela franziu o cenho, encarando o marquês que estava deitado na cama, apertando o estômago.

— Como sabe, eu trabalho e administro instituições de caridade, em geral, para crianças, mas tenho uma pequena instituição que dá apoio aos pais das crianças que ajudo. Esses pais nunca tiveram

uma vida boa, nunca tiveram oportunidades e, a cada momento, sentem-se chutados e pisoteados pela vida e por aqueles que deveriam estar lá para guiá-los e ajudá-los a fazer as escolhas certas. Muitos desses pais têm problemas com bebida ou outros vícios. Os problemas que Lorde Aaron enfrenta agora demonstram que levará um mês para que ele se sinta bem outra vez. Mas ele nunca será de fato livre. Receio que essa luta seja para a vida inteira.

— Deus o ajude. E que Deus a abençoe por fazer tanta caridade.

Sei que minha duquesa fala muito bem de você e agora sei o porquê.

Cecilia assentiu, mas o medo e a preocupação que ela tinha pelo marquês diminuíram o orgulho que o duque despertou nela. O

marquês estava muito doente, talvez mais viciado do que ela imaginara.

— A duquesa tem sido um pilar de força e amizade para mim nos últimos doze meses. Não sou capaz de dizer o quanto agradeço a ajuda dela. Precisamos de mais ajuda deste tipo para melhorar os bairros de Londres e seus efeitos para os menos afortunados.

—Tenho certeza de que você sempre terá ajuda.

O marquês gritou e gemeu, e Cecilia caminhou até a cômoda alta e vasculhou as roupas dele até encontrar o que estava procurando.

— Pegue essas gravatas e amarre os braços na cabeceira da cama. É possível que o marquês precise ser contido pelos próximos dias.

Os criados que estavam no quarto pareciam horrorizados com as palavras dela, mas com um aceno de cabeça do duque, fizeram o que ela pediu. Ver o marquês em seu estado atual deixava um vazio no peito dele. Como ela odiava o fato de o amigo ter que lutar contra

esses demônios. Até então havia perdido a batalha contra eles, mas não mais. Ela o ajudaria, ela e os amigos não o deixariam falhar nesta provação.

O dia passou, e a duquesa ficou sentada com ela por algumas horas, em seguida Cecilia tirou um tempo para tomar banho e permitir que um criado de Hunter o banhasse. A noite se aproximou, e Cecilia ficou de pé junto às janelas do marquês, com vista para o quintal e olhando para a luz prateada da lua que banhava o jardim.

— Cecilia, venha se sentar comigo.

Ela se virou para ver o marquês olhando para ela por baixo das pálpebras, os olhos clareando aos poucos e ficando mais nítidos conforme o álcool deixava seu corpo. Andando até ele, ela se sentou na beira da cama, aproveitando a oportunidade para limpar sua testa e rosto. Ele era tão bonito que, mesmo em seu estado e desordem, ela precisava admitir que gostava dele, que se sentiu atraída por ele desde o primeiro momento em que o conheceu. Ela limpou do pescoço dele até a bainha da camisa dele.

Calor formigou a pele dela quando a imaginação correu solta. O

que estava errado com ela para estar pensando no que estaria debaixo da camisa de Sua Senhoria enquanto ele estava neste estado?

— Acho que vou vomitar, Cecilia. Por favor, me desamarre e me traga a tigela. Rápido. — ele disse.

Ela assentiu e só teve tempo de levar a tigela para a cama antes que ele regurgitasse. Ele continuou a esvaziar o estômago por mais um tempo, até que se deixou cair na cama, exausto.

Cecilia chamou um criado, pediu chá, e biscoitos de gengibre se a cozinheira tivesse alguns. Em seguida, ela começou a remover a camisa de Hunter, secando o corpo úmido dele, o tempo todo tentando não corar ou olhar boquiaberta para os músculos

tonificados com uma fina camada de pelos. Nos dias seguintes, o progresso de Sua Senhoria diminuiu e uma série de estágios se seguiu. Raiva, arrependimento, súplicas. Como havia ficado fora de casa por alguns dias, ela voltou a Cheapside, apenas para encontrar o pai esperando por ela na biblioteca.

— Gostaria de falar com você, Cecilia. Agora.

Seu tom não era um bom presságio, e uma pequena pontada de preocupação a atingiu. Ela entrou na biblioteca, expressão impassível, e encontrou o Sr. White sentado diante do pai, os traços viscosos dele sorrindo em sua direção.

—Bom dia, pai. Sr. White.

— Pelo que vejo, voltou do orfanato de Hampshire.

Ela sentou-se como ordenado e apertou as mãos no colo.

— Como você vê. Meu trabalho lá demorou alguns dias a mais do que eu esperava, e hoje ainda vou participar de uma reunião na Taverna Old Bell.

Seu pai a encarou com indiferença, e a preocupação que sentia, dobrou. Por que ele estava tão estranho? E por que o Sr. White estava aqui? Seu pai sabia que ela odiava o homem, especialmente depois que ele tomou liberdades não solicitadas na carruagem. O

canalha vil não tinha vergonha, e seu pai não acreditava nela ou não se importava.

Cecilia reprimiu a mágoa que o pensamento carregava e se preparou para o que temia que viria.

— Eu tive algum tempo nos últimos dois dias, e então aproveitei a oportunidade para visitá-la em Hampshire, mas imagine minha surpresa quando cheguei à escola e orfanato, e soube que a diretora não havia visto você, nem sabia nada de sua suposta visita.

Voltei para casa e descobri que você não estava aqui ou em nenhum dos orfanatos e escolas de Londres que você administra.

Então... — disse o pai, colocando as mãos embaixo do queixo, a testa franzida entre os olhos tão funda quanto o rio Tamisa. — Onde você estava, Cecilia?

Ela engoliu em seco e se recusou a olhar para o sorridente Sr.

White que, pela primeira vez em sua vida, parecia não ter opinião sobre seu desaparecimento.

— O pai de uma das crianças precisava de ajuda. Eu, junto com as pessoas que costumam me ajudar com esses tipos de problemas, ajudaram-me a cuidar dele, e ele agora está se recuperando em casa.

— Sério? Então explique por que o Sr. White viu você entrar na casa de Lorde Aaron. Um lugar que, nos últimos dias, você permaneceu?

Cecilia por fim olhou para o verme.

Como ela odiava o homem, sua ganância e natureza nada caridosa.

— Você me seguiu? Como se atreve?

Ele apenas riu antes que o golpe do pai na mesa interrompesse sua fúria contra o desgraçado.

— Como o Sr. White se atreve? Como se atreve você, Cecilia.

Você está louca, menina? Entrar na casa de um cavalheiro solteiro na calada da noite? O que você estava fazendo lá? Não, por favor, não responda. — ele disse ficando de pé e contornando a mesa na direção dela.

Ele a puxou para ficar de pé e, pela primeira vez em sua vida, ele a machucou, apertando seus braços:

— Como ousa colocar sua reputação em risco dessa maneira.

Deveria colocá-la para fora da minha casa.

Cecilia se soltou e deu um passo para longe do pai.

Nunca o vira tão zangado antes. Sua voz era calma, mas havia um tom definitivo de repugnância que ela nunca havia ouvido antes, e pânico se alojou em sua garganta que talvez tivesse passado dos limites.

— Peço desculpas por ajudar Lorde Aaron, mas foi a pedido do duque e duquesa de Athelby. Eles estavam lá o tempo todo, você mesmo pode perguntar. E se está preocupado que Lorde Aaron possa ter abusado de mim de alguma forma, você está enganado.

Estamos simplesmente tentando curá-lo.

— Bem, vou perguntar ao duque e à duquesa quem eles pensam que são para levar minha filha solteira e donzela para a casa de um canalha renomado. Pedirei que expliquem a decisão todo-poderosa de colocar sua reputação em risco. Você, Cecilia, deve prestar atenção a este aviso e fará o que eu digo a partir deste momento.

Seu olhar desviou para o Sr. White, que mais uma vez parecia muito satisfeito consigo.

— Como assim? E, quanto à minha reputação, posso garantir que é bastante sólida e não está em perigo, a menos que essas informações sejam vazadas para a Sociedade e o que venho fazendo nos últimos dias torne-se conhecimento público.

O pai dela ficou rígido.

— Você está insinuando que o Sr. White iria à imprensa com esses rumores?

— Se isso garantir que você não tenha outra opção a não ser fazer com que eu me torne esposa dele, então sim, acho que ele é capaz de maneiras tão dissimuladas.

O Sr. White fingiu choque, apertando o peito para drama adicional.

— Eu nunca faria isso, Sr. Smith. Posso garantir.

Cecilia zombou.

— Você não é um cavalheiro, senhor. Nenhum homem com algum valor moral ataca mulheres dentro de carruagens. E se o senhor meu pai acha que vou me casar com esse porco só porque ajudei Lorde Aaron, está enganado. Abro mão da minha vida aqui com o senhor, se você tentar me forçar e me obrigar a me casar com o Sr. White.

O rosto do pai foi tomado pela raiva.

— Você não tem escolha a não ser se casar com o Sr. White, pois, se não o fizer, pararei todo o financiamento para as instituições de caridade de que tanto gosta. Já está na hora de você sossegar e ter filhos que herdarão a empresa. O Sr. White está disposto a aceitar sua mão, mesmo que essas últimas notícias venham a público e sua reputação seja arruinada. Ele é inteligente, de uma família respeitável e ama você. Você vai obedecer, Cecilia. Essa é a minha palavra final.

Cecilia saiu da biblioteca, batendo a porta atrás de si. Lágrimas embaçaram sua visão enquanto ela subia as escadas. Como ele se atrevia a falar e exigir tais coisas dela? Ela não obedeceria, não poderia se entregar a um homem como ele.

Ela chegou ao quarto, passou o trinco na porta e foi para a janela. Centenas de crianças confiavam nela. Muitas, mas muitas famílias precisavam que ela lhes desse uma chance, que mantivesse os orfanatos e escolas funcionando para que seus filhos pudessem ter algum futuro. Ela não tinha dúvida de que seu pai seria tão vingativo quanto ameaçava e retiraria os fundos, portanto, a menos que ela tivesse um grande investidor disposto a arcar com as despesas, não havia nada que pudesse fazer. A duquesa de Athelby já doava uma quantia significativa, não podia pedir por mais, não seria justo.

Ou seria?

Cecilia passou o lábio inferior, antes de se sentar em sua mesa e puxar um pedaço de pergaminho. Ela nunca poderia se casar com um homem que ela não amava, então teria que pedir ajuda à duquesa. Seu orgulho precisaria ser posto de lado para que ela pudesse garantir seu outro grande amor, as crianças. Eles eram tudo o que importava.


CAPÍTULO 10

H unter apertou os olhos quando a luz do sol entrou em seu quarto. Ele olhou para o céu azul no alto e fez uma avaliação mental de como se sentia: bem. Melhor do que ele se sentia há um bom tempo. Semanas até, e ele sabia a quem precisava agradecer todos os cuidados. À mesma mulher que estava sentada ao lado da lareira, consertando um botão em uma de suas camisas, se ele não estivesse enganado.

A imagem lembrava tanto uma vida em família, casado, que ele sorriu. Gostava de tê-la aqui, conversando com ele, acalmando-o, em seu quarto como se fosse uma coisa comum e cotidiana na vida dela.

Mas não era.

Até ele sabia, em seu estado de delírio, que a Srta. Smith, Lia como ele a chamara, não deveria estar ali, mesmo que na companhia do duque e da duquesa de Athelby.

— Lia, poderia pedir um chá, por favor. Eu preciso de sustento.

Ela olhou para cima, os brilhantes olhos azuis provocando uma sensação em seu peito, que ele não queria pensar no momento, embora, agora que estava sentindo-se melhor, ele tivesse que admitir o que começara a sentir por ela. A Srta. Smith era, literalmente, a mulher que salvou sua vida.

Ele a adorava.

— Como você está se sentindo esta manhã? — disse ela, aproximando-se e se sentando na cama dele, como se fosse a coisa mais normal a se fazer.


Era um terreno perigoso este que estavam, Lia e ele. Se ela tivesse se sentado na cama dele quando ele estava na pior, não havia dúvida de que ele teria se inclinado e beijado aqueles lábios perfeitamente rosados e tentado seduzi-la.

— Pela primeira vez desde muito tempo, sinto-me bem. — o estômago dele roncou, Cecilia riu. — E estou com fome pelo que parece. — disse ele sorrindo.

— Vou pedir que tragam seu café-da-manhã assim que trouxerem o chá. — ela se levantou da cama e se sentou na cadeira ao lado dela, de repente repensando sua localização. — Pensei que poderíamos ir lá fora por um tempo hoje. Você está dentro de casa há quase um mês, e seria bom tomar fresco e um pouco de sol.

A ideia, por mais humilde e entediante que parecesse, o animou.

Seria delicioso sair do quarto, desde que ele tivesse a companhia de Cecilia. — Você vai se juntar a mim?

— Sim. Ficarei aqui até o almoço, e então a duquesa e o duque vão assumir o meu lugar. Temos um pequeno cronograma, como percebe.

Ela sorriu, um gesto sincero que ele não via com muita frequência na sociedade. Hunter a estudou, ela era uma garota maravilhosa e seria uma amante perfeita. Ele a mimaria com presentes e uma liberdade que ela nunca conhecera, desde que compartilhasse a cama com ele, e somente com ele.

TRÊS SEMANAS DEPOIS Hunter estava bem o suficiente para participar de sua primeira noite na cidade. O duque e a duquesa estavam sentados à sua frente no landau. Eles não verbalizaram, mas Hunter entendia por que eles estavam com ele. Estavam ali

para observar e garantir que ele não tivesse uma recaída na embriaguez e loucura em que se perdera antes.

A Srta. Smith estava sentada ao lado dele, seu olhar pensativo perdido nas ruas movimentadas do outro lado. Durante a última semana, ela esteve distante, afastando-se dele sempre que vinha fazer companhia, apenas garantia que ele não procurasse seu uísque.

Embora a criadagem tenha se desfeito de todo líquido que encontrou, Hunter mantinha o cantil escondido no quarto, e mesmo assim ele não o procurou. Era quase um teste autoimposto, uma aposta para ver se ele teria força de vontade para não o tocar.

Não que não tivesse sido difícil ignorá-lo, era uma tortura.

Ansiava pela sensação ardente do líquido dourado escorrendo pela garganta, deixando-o quente e confortado. Perder a capacidade de lidar com a bebida, não ser capaz de se refrescar no futuro era um desejo que ele lutava todos os dias para ignorar. Se não fosse por seus amigos, inclusive Lia, ele não teria chegado tão longe.

A beleza leve ao lado dele encontrou seu olhar como se soubesse de seus pensamentos. Ele a beijaria esta noite, escaparia com ela e faria o que ele queria por semanas.

A carruagem parou diante da casa de Sir Colten em Londres, e eles esperaram que um criado estivesse disponível para abrir a porta. Assim que entraram, eles cumprimentaram seus anfitriões e atravessaram multidão de convidados.

Alguns lançaram olhares estranhos à presença da Srta. Smith, uma mulher que não pertencia à sua esfera, e que aos olhos de alguns, não deveria estar presente. Mas com o duque e a duquesa de Athelby a apoiando, não ousavam falar uma palavra sobre isso.

Cecilia brilhava como um diamante em um mar de tons pasteis, e a tentação de dançar com ela cresceu. Hunter olhou para onde os

músicos estavam sentados, tocando músicas agradáveis para conversar. Outros convidados se reuniam no salão, e não demorou muito para que a dança começasse.

Eles pararam diante de uma das três lareiras do ambiente, e Hunter estendeu a mão para a Srta. Smith.

— Dança comigo?

Ela pegou a mão dele, assentindo levemente.

— Obrigada, sim.

Os acordes de uma valsa começaram a tocar, e Hunter poderia ter caído de joelhos em agradecimento. A dança perfeita para a sedução, para se ter uma conversa íntima.

— Você está muito bonita esta noite, Lia. — disse ele, absorvendo todas as nuances dela até mesmo uma pequena sarda sobre o lábio.

— Você está muito bonito.

Ela corou, e ele riu, puxando-a um pouco mais perto do que deveria.

— Você também tem um cheiro divino. Que perfume é esse?

— Jasmim. — ela inclinou a cabeça para o lado, olhando para ele. — Você está flertando comigo, Lorde Aaron.

— Não posso flertar com a mulher mais bonita no recinto?

O deslizar de seu vestido de seda contra a palma da mão dele o fez sentir uma onda de desejo. Ele a queria, que fosse dele por completo, agora e para sempre. Ele não sobreviveria sem ela, tinha certeza.

— E agora que estou melhor e sou vigiado, dia e noite, pelo meu condutor devido às instruções estritas do duque, você não poderá mais me visitar. Venha ao meu quarto e volte a cuidar da minha saúde. — disse ele, erguendo as sobrancelhas.

Cecilia riu.


Já estava na hora de rir um pouco, ela andou reservada e perturbada, uma carranca constante se formava entre seus olhos sempre que ela não achava que alguém estava vendo, mas ele estava.

— Está tudo bem, Lia. Você parece inquieta com alguma coisa.

— ela mordeu o lábio inferior, e ele a puxou para perto durante um giro. — Diga-me o que é. Quero ajudá-la se puder, assim como você me ajudou.

CECILIA TENTOU MANTER a atenção nos convidados que se alinhavam no salão de baile, e não em lorde Aaron, ou Hunter, como ele queria ser chamado. Se ela olhasse para ele, estaria perdida.

Ela suspirou.

Quem ela queria enganar, ela já estava perdida.

— Meu pai descobriu que eu estava ajudando você. Ele sabe que eu estive em seu quarto, e às vezes, sem um acompanhante.

Não sabe o que o afligiu, só que você teve uma doença que o duque e a duquesa de Athelby me pediram para ajudar.

— Por que ele não me chamou e exigiu que eu pedisse sua mão?

— O quê? — Cecilia abaixou o tom e encontrou o olhar do marquês. — Porque ele não quer que eu case com você.

— Como é? Como assim, ele não quer que eu me case com você? Eu sou um marquês, um aristocrata, eu poderia dar tudo o que você precisa e muito mais. Por que ele não veio até mim? Essa é a coisa mais absurda que eu já ouvi.

Cecilia não pôde deixar de rir com a autoestima de Hunter, e deu um tapinha no ombro dele para aliviar sua tensão.

— Há duas razões, uma é culpa minha, sinto dizer.

— E qual seria?

— Sempre critiquei aqueles que têm mais sorte do que a maioria. Por mais que eu goste da companhia do duque e da duquesa, e da sua, em especial agora que você está mais em si, e depois da sua doença, mas este não é o meu mundo. Eu não me encaixo aqui. Sou muito rude, muito disposta a arregaçar as mangas e me sujar, se necessário. Muitas vezes levo crianças doentes para casa e só as libero quando estão com saúde. Eu não poderia fazer nada disso como uma esposa da Aristocracia. Meu pai entende isso e não acredita que eu me adaptaria ao papel de esposa de um lorde.

— E a segunda razão?

— Meu pai anunciará meu noivado com o Sr. White na próxima sexta-feira. Ele ameaçou remover o patrocínio aos meus orfanatos e às escolas que eu trabalhei duro para construir. Ele ameaçou dar a empresa ao Sr. White, e não me deixar nada se eu não fizer o que mandou, especialmente agora que minha reputação está manchada, ou seria manchada, se minha visita à sua casa viesse à público.

— Não creio que ele chegou a tanto.

Um músculo se contraiu na mandíbula de Hunter e, olhando ao redor, ele a retirou da dança e a guiou até o terraço. Vendo uma série de casais, ele se afastou de todos e se dirigiu para as escadas, em uma das extremidade, que levava aos jardins.

O estômago de Cecilia embrulhou, e a linha forte e determinada da mandíbula de Hunter deixou sua boca seca. O que ele estava pensando? Ela até tinha um palpite acerca do que ele estava prestes a fazer, mas se ela pudesse desejar algo, seria beijá-lo novamente. Ter uma última lembrança dele antes que ela se

retirasse ainda mais para longe da esfera dele, e se tornasse professora em uma de suas escolas.

Como a duquesa havia dado sua palavra de que se tornaria a principal patrocinadora da instituição delas, era uma decisão segura, apesar do que seu pai viesse a decidir fazer.

Ele caminhou pela lateral da casa e, vendo um banco de pedra contra a parede, puxou-a para se sentar.

— Não vou permitir que você se case com o Sr. White. Para começar, ele é vil, e você não gosta dele.

— Não tenho intenção de me casar com o Sr. White. Garanti a segurança de minhas instituições de caridade nos próximos anos, mas, ao fazê-lo, negando os desejos de meu pai, sofrerei as consequências.

— Como assim, você sofrerá as consequências? — ele perguntou, suplicando que ela lhe dissesse a verdade.

— Quando eu disser a meu pai que não preciso mais da ajuda dele com minhas escolas, e quando eu contar a ele que não vou me casar com o "herdeiro" dele, não tenho dúvida de que ele me expulsará de casa. Talvez até me enxote. Vou me tornar professora e já preparei acomodações no orfanato de Spitalfields.

Ele franziu o cenho, se afastando.

— Uma professora, tutora, mas isso está abaixo de você, Cecilia.

Tenho certeza de que você não pensou em todas as suas opções.

Ela suspirou, tendo vasculhado a mente por dias tentando pensar em outras opções, mas cansara. Cecilia preferia, de longe, ser professora do que ter o Sr. White como marido. A única coisa que a fez sentir um pouco de remorso pela escolha era que o marquês nunca a consideraria como possível esposa após essa decisão. Agora, sem dúvida, ela estaria abaixo dele.

— Está feito, milorde. É definitivo.

Cecilia encontrou o olhar dele, esperando que fosse decepção que ela lia dentro das esferas azuis tempestuosas.

— Não vou negar que, mesmo com seus problemas e que não começamos como amigos, o considero o homem mais interessante e irritante que já conheci. Um homem que depois de um beijo me fez questionar minhas próprias regras, minhas opiniões acerca do que eu desejava na vida. Mas estou feliz com minha escolha e, embora minhas incursões em sua sociedade precisem chegar ao fim, não me arrependo do tempo que partilhamos ou da amizade que criamos. Espero sempre tê-la.

Ele segurou o rosto dela, e como se estivesse em transe, Cecilia observou Hunter diminuir a distância entre eles e a beijar. Na escuridão relativa, ela passou os braços em volta do pescoço dele e o beijou de volta, querendo aproveitar esse momento e guardar a memória para sempre.

Cecilia ofegou quando a língua dele deslizou contra a dela, uma sensação estranha, mas agradável, que gerou calor em seu núcleo.

Seus seios roçaram contra o vestido e, sem saber o porquê, ela empurrou contra ele, contra o corpo firme e quente, aliviando um pouco da necessidade que corria através de seu sangue.

— Você não pode me beijar assim, Lia, — ele disse, seus lábios beijando-a na garganta. — e se tornar uma professora, me deixe em paz em toda essa pompa e cerimônia. Podemos ser opostos, mas nisso somos iguais.

Ela apertou os cabelos dele, um suspiro escapando quando a língua dele correu contra a parte superior de seus seios, no decote do vestido.

— Apenas me beije, Hunter, e me faça esquecer de todo o resto.

Ele fez o que ela pediu, e desta vez não foi uma sedução lenta, mas uma conquista quente e enlouquecedora que a fez cambalear.

Ela nunca pensou que beijos poderiam ser tão perversos, tão tentadores para o mundo que ele esfregava diante dela, um de paixão e prazer.

Cecilia queria tanto ter um casamento repleto de emoções como as que Lorde Aaron provocou nela, e esta noite, talvez só nesta noite ela aceitaria o que ele quisesse. Ela não adentraria seu futuro de circunstâncias reduzidas sem conhecer o toque de um homem. E

não de qualquer homem, mas de Lorde Aaron.

Um cacho de cabelo fez cócegas em suas costas, e ela se afastou, estendendo a mão para fixar seu penteado.

— Devemos voltar ao baile antes que notem a nossa falta.

Hunter esfregou o polegar no lábio inferior dela.

Ela apertou a mão dele e beijou o polegar.

— Estou louco por você, Lia. Seja minha...

O som de alguém pigarreando soou a certa distância, e Cecilia se virou para ver quem os havia flagrado, e viu a duquesa de Athelby.

— Eu vim buscar a senhorita Smith. O pai dela chegou para buscá-la, e Cecilia, devo adverti-la, ele fez um espetáculo.

Medo se acumulou dentro dela.

— Ele sabe que eu viria ao baile de Sir Colten esta noite, não sei porque teria tal comportamento. — ela se levantou e lançou outro olhar para Hunter, que escancarava a fome crua e não saciada em seus olhos, mesmo com a notícia da chegada do pai dela. — É

melhor eu ir. Voltaremos a nos ver, Lorde Aaron. Boa noite.

Ele se levantou e curvou-se, e pegando no braço da duquesa, ela foi para dentro de casa. Elas não voltaram pelo salão. Em vez disso, a duquesa a levou até o vestíbulo por uma porta de serviço que dava para perto da horta.

— Embora eu não possa fingir não saber o que você estava fazendo lá fora com Lorde Aaron, como sua amiga, sinto que devo adverti-la, Cecilia.

Cecilia diminuiu os passos, franzindo a testa.

— Foi só um beijo, Sua Graça. Nada mais.

Cecilia sabia que era mentira assim que pronunciou as palavras.

Não foi apenas um beijo. Para ela, havia sido tudo, significava tudo.

Em algum lugar ao longo de suas loucas semanas com Sua Senhoria, ela se apaixonou pelo homem.

— Lorde Aaron é um patife. E por mais que eu o adore, ame-o como amigo, eu me preocupo que seu apego a ele seja maior que o de Sua Senhoria por você. Não quero que se machuque.

A duquesa era muito gentil por cuidar dela, mesmo que ela fosse amiga do marquês também. Cecilia balançou a cabeça.

— Por favor, não se preocupe. Estou mais do que ciente de que não tenho um futuro com o marquês.

A duquesa assentiu, continuando em direção ao vestíbulo.

— Seu pai não está satisfeito. Ele afirmou que não sabia que Lorde Aaron estaria presente esta noite e que o duque e eu estamos tentando manchar sua reputação fingindo ser amigos seus. Na verdade, não sendo amigos.

Ela suspirou.

Odiava que seu pai pudesse fazer uma coisa dessas com ela e com as duas pessoas da sociedade em que ela confiaria por toda a vida, sem mencionar Lorde Aaron, é claro.

— Sinto muito, Sua Graça. O homem com quem meu pai deseja que eu me case, sem dúvida, está observando os movimentos de Lorde Aaron e notificou meu pai. Espero que ainda possamos ser amigas depois que meu pai agiu de forma tão atroz.

A duquesa pegou a mão dela, apertando-a um pouco.

— Sempre seremos amigas, e nada que seu pai diga, ou faça, mudará isso. Mas acho que, considerando nossa localização atual, você deveria ir embora com ele sem dizer uma palavra. É melhor que a conversa aconteça quando estiverem na privacidade de sua própria casa.

Cecilia assentiu e entrou no vestíbulo, avistou o pai passeando no espaço como um leão enjaulado.

— Pai. — ela fez uma reverência, e pegou o xale de um lacaio que a esperava. — Vamos?

Ele bateu no chapéu e, sem dizer adeus à duquesa, a conduziu para longe do baile. Não foi até eles estarem na carruagem que seu gênio veio à tona.

— Como ousa, filha? Ir a um baile com um homem pelo qual expressei minha aversão. Você sabia que ele é um apostador, um homem com uma série de amantes da cidade? Os rumores que chegaram à minha mesa esta noite afirmam que a razão pela qual você está cuidando desse homem é porque ele não consegue manter a compostura ao beber?

— Quem contou isso para você? O sr. White? Não é a fonte mais confiável, pai.

O pai dela se contorceu no assento, um pequeno músculo em sua mandíbula saltou.

— Pouco importa quem me disse, pois é a realidade. E por que você não estava com a duquesa na hora em que cheguei? Onde você estava, filha? Você estava com ele? Sozinha?

— E daí se eu estivesse? Estou farta de homens como você dizendo às mulheres o que fazer. Você pode me ameaçar com seu dinheiro e ameaçar prejudicar minhas instituições de caridade, mas não preciso mais me curvar às suas regras. Encontrei outro patrocinador para minhas instituições de caridade e consegui um

emprego para mim, para que você não me fale dessa maneira. Se eu fosse um garoto, você não estaria sentado aqui, me dando uma palestra, me daria um tapa nas costas, me parabenizando pela minha loucura.

— Você se engalfinhou com Lorde Aaron! — o pai dela voltou a bater nas almofadas, apertando o peito. — Ah, a vergonha.

Cecilia engoliu em seco, imaginando até onde deveria ser verdadeira.

Ela decidiu pela cautela.

— Claro que não. Eu apenas estava em um salão de baile na hora que meu pai chegou para me arrastar como uma criança travessa e não como uma mulher que estava em um baile.

— Não há necessidade de você frequentar tais eventos, e chega dessa conversa de sair de casa e encontrar um emprego. Você vai se casar com o Sr. White. Os contratos foram elaborados, tanto o contrato de casamento quanto o contrato referente à herança da minha empresa. Os proclames serão anunciados, e em um mês, você será a Sra. White.

— Está me ouvindo, pai? Eu disse que não vou me casar com o Sr. White. Jamais.

O pai se inclinou para frente, apontando o dedo para o rosto dela.

— Você disse, durante anos, que Lorde Aaron e seu grupo não são uma vida que você gostaria de ter. Que você detestava a aristocracia e seus modos, o estilo de vida fofoqueiro e insano. O Sr.

White combina com você, e ele te ama, tenho certeza. Com o tempo, estou certo de que você terá um casamento feliz e me dará netos.

A carruagem parou diante de sua casa e, sem esperar um lacaio, Cecília pulou, correndo para dentro da casa. Ela podia ouvir o pai

atrás dela, e mesmo quando ele a chamou, enquanto ela subia as escadas, ela o ignorou. Assim como ele a ignorava, ignorava tudo o que ela era e tudo o que ela fazia.


CAPÍTULO 11

H unter estava deitado no sofá da biblioteca e fumava um charuto. Observou as chamas lamberem a madeira que estava na lareira, enquanto sua mente lutava com a ideia de Cecilia ser rechaçada pela família, tornar-se professora e se afastar ainda mais da esfera social dele. Nunca poderia ser assim, e imaginá-la vivendo em circunstâncias tão precárias, bem, não era algo que ele conseguiria suportar.

A porta da biblioteca se abriu, e ele suspirou fechando os olhos.

— Não precisarei mais de você esta noite, Thomas. Pode se retirar. — o tamborilar de passos não parou, e ele sentou-se, jogando o charuto no fogo. — Srta. Smith. — disse ele, não acreditando que ela estivesse ao lado dele, aqui, em sua biblioteca e sozinha. Completamente sozinha. — O que faz aqui?

— Posso me juntar a você?

Rubor floresceu nas bochechas dela, e ele saiu do sofá, e foi até ela antes que ela pudesse fugir.

— O que está dizendo?

Antes de tocar em qualquer centímetro dela, ele queria ouvir com as palavras dela o que ela queria. Não basta presumir. Como um homem que dormiu com muitas mulheres sob os efeitos da bebida, esta noite ele queria se lembrar de cada detalhe. Saber que ao amanhecer tocaria na roupa de cama, e o gesto traria à tona todos os deliciosos detalhes dele tornando Lia sua.

Cecilia corajosamente encontrou seu olhar.

— Estou dizendo que quero estar com você de todas as formas que um homem e uma mulher podem estar juntos.

Uma feroz explosão de necessidade queimou as veias dele. Ele queria tanto carregá-la em seus braços. Apertou as mãos ao lado do corpo para parar de tremer.

Embora ele a quisesse como amante, se ele só pudesse ter esse momento, essa bela lembrança de estar com ela, ele a aceitaria e a estimaria por toda esta vida e pela próxima. Sendo ela tão forte e independente, além dos ideais intelectuais, não havia certeza de que ela concordaria com os termos dele.

Hunter analisou o traje dela, uma capa escura e pesada cobria seu vestido, e um chapéu amarrado firme sob o queixo ajudava a esconder sua identidade, se alguém a tivesse visto entrar em sua casa. Ele caminhou até as janelas e fechou as cortinas, depois disse ao lacaio perto da porta de entrada para trancá-la e ir para a cama.

Voltando à biblioteca, ele fechou e trancou a porta. Cecilia havia tirado o chapéu e as luvas, mas a capa permanecia. Hunter não via problemas, permitiria que ele a arrancasse do corpo dela, seria como abrir um presente.

Ele caminhou até ela e envolveu o rosto dela, beijando-a profundamente. Ela não se esquivou do ataque de desejo dele por ela, talvez tenha até correspondido, aninhou-se em seu abraço e o beijou de volta. Sua inocência o atraía, e ele diminuiu o ímpeto de forma consciente, reprimiu a necessidade para ir devagar. Ela era virgem, afinal, não estava acostumada ao toque de um homem.

— Você é tão linda. — disse ele, puxando a fita que segurava a capa no pescoço. De forma lenta, o nó se soltou, e ele deslizou a capa sobre os ombros dela, deixando que fosse ao chão com um baque pesado.

Ele prendeu a respiração quando viu o que ela usava por baixo, ou melhor ainda, o que mal usava. Uma camisa de seda fina que pouco fez para esconder as curvas de Lia, graças em parte ao fogo

que ardia detrás dela, tornando o material quase translúcido.

Estendendo a mão, ele seguiu o delicado padrão bordado em seu peito até o ponto onde ele podia ver o mamilo rosado enrugando.

Ele a observou, devagar, traçando o pico circular, amando como se delineava ainda mais sob seu toque.

— Você disse no baile do Conde de Leighton que estava louco por mim. — ela ofegou, meio que gemeu.

Como ele amava esse som e queria ouvir mais.

— De fato. — ele murmurou, inclinando-se para beijar o ponto em que ele havia a provocado, precisava sentir aquele pequeno broto em sua boca, queria sentir toda ela, e de uma só vez só, se pudesse.

— Eu também estou louca por você. — ela sussurrou em seus cabelos. — Por favor, continue fazendo o que está fazendo.

Ó, ele continuaria, e faria mais ainda antes que a noite terminasse.

Os seios dela eram pesados, e logo a camisa de seda se tornou uma barreira com a qual ele não queria mais lidar. De pé diante dela, ele desamarrou, com sofreguidão, as fitas que corriam entre seus seios, a respiração dela era carregada, a pele corada de desejo.

Ele sonhara com essa visão. Queria isso para os dois há tanto tempo, talvez até desde o dia em que ela salvou a vida dele na rua, quando o tirou do caminho da carruagem. Não havia muitas pessoas, muito menos mulheres delicadas, que se arriscavam, como a Srta. Smith. Mas seu caráter generoso, seu apoio infalível e sua determinação em ajudar os outros era uma característica que ele passou a admirar nela e, é claro, salvar um bêbado, como ele, era apenas mais uma coisa lançada diante dela com a qual ela não teve opção além de lidar.

Ele agradecia a Deus que ela o tivesse feito.

A camisola ficou entreaberta na frente e, encontrando o olhar dela, ele deslizou o tecido por seus ombros, deixando-a tão nua quanto no dia em que ela nasceu. O desejo dele por ela fazia seu corpo doer, e ele puxou a própria camisa de dentro das calças, a arrancou e jogou a esmo no cômodo escuro.

Não querendo ficar ociosa, ela estendeu a mão e tocou o peito dele. A sensação dos dedos dela em seu corpo fez o sangue dele esquentar, e ele respirou fundo para se acalmar. Ele não era um garoto inexperiente em sua primeira noite com uma mulher, à essa altura já havia tido algumas oportunidades, mas hoje diante desta mulher, ele sentia-se como um navio afundando no mar.

— Eu nunca senti a pele de um homem antes. Você é mais duro do que eu imaginava.

Ele assentiu, incapaz de formar palavras enquanto a mão dela corria o peito e o estômago até parar na frente de suas calças.

Hunter não precisou olhar para baixo para saber que seu membro lutava contra a roupa íntima.

E, no entanto, ela não interrompeu a inspeção que fazia nele. Os dedos dela deslizaram pelas calças dele antes que a mão o segurasse completamente. Não havia como mascarar o gemido, nem havia chance de ele se negar por mais um minuto.

Ele a pegou, tomando os lábios dela em um beijo feroz antes de deixá-la cair no sofá, rindo quando ela saltou uma vez, os seios balançando com a ação.

Hunter se atrapalhou com as calças, rasgando o tecido íntimo, empurrando as peças para baixo e para longe dos pés. Ele ajoelhou-se e subiu pelo corpo dela para não a assustar com o tamanho dele. Quanto menos ela o visse lá embaixo, melhor. Ele não deixou de notar os olhos inquietos dela, que mostravam

desconforto com a decisão que acabara de tomar, mas ele não a machucaria, hoje à noite ela sentiria paixão, êxtase e carinho. Nada mais.

Os dedos dela deslizaram sobre os ombros dele e o puxaram para um beijo. Ele se deixou puxar feliz, o gosto dela nos lábios era como um elixir que ele nunca se cansava. Um leve aroma de jasmim vinha de seus cabelos, e a pele dela brilhava com o fogo, como um farol que revelava o que ele poderia ter, o que ele queria para si, a partir desta noite em diante.

Ele a beijou com o fervor do que sentia por ela, mas não conseguia expressar com palavras. Abaixando-se, ele puxou a perna dela para ficar apoiada em seu quadril e os pelos na região íntima dela pressionaram seu pênis inchado. Incapaz de negar-se, ele esfregou a carne quente e absorveu o momento.

— Por favor, Hunter. Eu não...

Ele não podia mais negar nada a ela, assim como não conseguia mais negar o que queria para si, e tomando-se na mão, guiou o pênis contra o núcleo quente e úmido dela. Quase morreu com o prazer que sentiu quando ela empurrou contra ele, de forma arbitrária e cheia de instinto, buscando sua própria libertação.

Porra, ela era apertada enquanto ele empurrava devagar dentro dela. Lia mordeu o lábio e o observou, apenas um mínimo lampejo de dor passou pelo rosto dela quando ele rompeu a barreira de sua inocência. Ele se retirou antes de a percorrer outra vez, alívio o dominando quando percebeu que não havia resistência, apenas uma doce aceitação. O prazer o perfurou quando ela colocou a outra perna sobre os quadris dele, segurando-o firme contra seu corpo.

— Isso é tão maravilhoso. — ela murmurou, arqueando as costas enquanto ele a tomava.


Hunter se forçou a não se liberar antes de que ela chegasse ao ápice. Ele nunca foi um amante egoísta e não iria começar a ser agora.

A união deles ficou frenética e apertando uma das nádegas dela, ele se firmou, tomando-a de forma implacável. Era óbvio que ele não deveria tratá-la dessa maneira, uma donzela, uma mulher sem nenhuma ideia prévia do que estava à sua frente, e, no entanto, ela não hesitava ao fazer amor com ele. Não pediu que ele parasse, quando na verdade, os sons dela provocavam, imploravam por mais do que ele fazia.

E foi o que ele fez.

— Hunter. — ela arfou os dedos pressionando com força os ombros dele. — Não pare, não pare.

— Nunca.

Ele empurrou uma vez, duas e ela ficou mole em seus braços, o sexo dela apertando o seu e com um grito, ele encontrou sua libertação. Ele não parou até que os dois estivessem exaustos, cada gota de prazer arrancada de seus corpos.

Hunter virou-se de lado, puxando-a para a dobra de seu braço.

Os dois respiraram fundo, e ele sorriu, incapaz de tirar o sorriso do rosto.

— Foi o que você imaginou?

Ele sentiu o sorriso dela contra o próprio peito enquanto ela o beijava ali e esticava a mão para envolver o rosto dele.

— Foi mais do que eu jamais poderia imaginar.

NA TARDE SEGUINTE, Cecilia tomou um gole de chá na sala de estar da mãe e tentou, sem sucesso, maneirar o tom de voz ao se

direcionar ao Sr. White.

— Sinto muito, mas você pode repetir o que acabou de dizer?

Ele estava sentado na espreguiçadeira ao lado dela, com os olhos brilhando de expectativa.

— Eu disse, senhorita Smith, que o primeiro de quatro proclames será divulgado hoje, tornando nosso noivado como oficial. Os documentos estão todos em ordem, e seu pai confirmou que você será minha esposa, portanto, está na hora de me demonstrar sua gratidão.

Cecilia cerrou os dentes.

— Minha gratidão? Admito que acredito que você é capaz de qualquer coisa, ainda mais depois do disparate de me atacar na carruagem, mas ouvir que meu pai prosseguiu com a ideia de entregar minha mão ao senhor, depois de tudo o que eu disse a ele, não me faria ter gratidão, Sir. Tal fato só me trará dor e miséria. Eu não me casarei com você.

A expressão dele endureceu.

— Está feito, minha querida. Se você criar caso, parecerá uma mulher de moral e caráter duvidosos. A vergonha de seu pai será demais para ele suportar e talvez prejudique a saúde dele.

Por mais que ela amasse os pais, esperava que eles quisessem o melhor para ela, contudo essa decisão deles provava que não.

— Eu não sou virgem, Sr. White. Dormi com outro homem e, neste momento, posso estar carregando o filho dele.

Se ela esperava que ele se levantasse, se despedisse e saísse correndo, ela estava enganada.

— Devido à sua idade, e ao fato de que não somos da alta sociedade, eu tinha minhas dúvidas se você permaneceria casta até o casamento, ou se já havia visitado o leito conjugal. Mas, caso tenha dito isto apenas para me afastar e cancelar os contratos, sinto

informar que é um ledo engano. Com você vem a firma de advocacia do seu pai, anos de clientes, famílias e dinheiro que trabalhei tão duro para conquistar, e não irei perdê-los por um último obstáculo. Você, minha querida, é esse obstáculo, e não me importo com seu estado. Significa apenas que seu corpo está disponível para o meu antes do casamento. Não precisamos esperar até a noite de núpcias.

Horror percorreu sua espinha, e ela estremeceu.

— Eu nunca vou dormir com você, Sr. White. Como ousa me dizer uma coisa dessas?

Os lábios dele se retorceram em um sorriso zombeteiro.

— Você não é uma dama, suas ações comprovam, e então não importa se me der liberdades também. Você logo será minha esposa.

— Eu nunca serei sua esposa.

Cecilia se levantou e foi embora, o coração soando forte nos ouvidos.

Ele a seguiu, apertou os braços dela tão forte que lágrimas se formaram.

— Me largue.

— Embora nossa conversa de hoje tenha sido muito esclarecedora, vim aqui para dizer, em nome de seu pai, que você irá à Ópera comigo esta noite. Há um novo cliente do qual seu pai deseja obter favores, e você vai estar lá como minha noiva. O que claro, você é.

Cecilia se libertou e foi até a lareira, esfregou os braços.

— Meu pai não mencionou nada disso para mim.

— A família acaba de chegar da cidade, estavam na propriedade rural, e ele conseguiu um camarote ao lado do deles. E assim... —

ele disse, inclinando-se na cadeira e pegando as luvas pretas. —

Você abrirá um grande sorriso e será muito simpática. Fingirá estar feliz e contente comigo, ou eu avisarei seu pai de sua desobediência. Duvido muito que ele aprecie descobrir que a filha dele se prostituiu.

— Você não tem coração. Saia.

Cecilia levantou o queixo, um arrepio atravessando seu corpo.

Ele investiu contra ela, apertou o queixo dela com força punitiva.

— Faça o que ordenam, senhorita Smith, ou você descobrirá, quando formos marido e mulher, que o dinheiro para suas instituições de caridade também irá sumir. Seja uma esposa obediente, fiel e prestativa e tudo ficará bem.

Cecilia tateou o parapeito em busca de apoio enquanto a porta se fechava atrás dele.

Ela compareceria hoje à noite à Ópera, por amor a seu pai, mas então, esta seria a última vez que ela seria obediente. O

financiamento de suas instituições de caridade estava garantido, assim como seu próprio emprego. Ela não precisava do Sr. White, de seu pai, nem mesmo de Lorde Aaron para resgatá-la. Depois desta noite, Cecilia começaria o futuro que ela escolhera para si e se regozijava com sua decisão. Nenhum homem a ameaçaria a ter uma vida de miséria. Nem agora, nem nunca.


CAPÍTULO 12

A Ópera do Teatro Royal, no Covent Garden, estava lotada pela Sociedade que fora apreciar a famosa Sarah Siddons interpretar Lady Macbeth. De fato, o camarote deles ficava ao lado do camarote da recém-chegada, estimada e rica família. Acabavam de retornar do exterior devido ao falecimento do Sr. Grant mais velho, e à enorme herança agora concedida ao seu homônimo.

Todas as palavras do Sr. White eram direcionadas ao Grants. De fato, ele pouco falou coisas que não fosse sobre eles. E quanto mais Cecilia aprendia sobre o homem que seu pai escolhera, mais ela percebia que ele era um trapaceiro, criador de intrigas e sem coração, procurando nada além de meios para encher seus bolsos de moedas.

— Eu acho que minha conversa com o Sr. Grant foi bem, o que você acha Cecilia? — o Sr. White perguntou, lançando outro olhar na direção do camarote do Sr. Grant e recebendo um aceno do cavalheiro.

— Sim, correu muito bem. Papai ficará feliz.

Cecilia manteve o sorriso colado na boca e, no entanto, foi preciso todo esforço para impedir que se desfizesse. Ela não queria nada além de partir.

O Sr. White continuava a falar, e ela ficou de olho no palco enquanto a principal atração da ópera subia envolta em uma salva de palmas. Não foi até a mão do Sr. White deslizar sobre a sua no colo que ela deixou suas próprias reflexões.

Com o sorriso firme no lugar, ela disse:

— Retire sua mão, senhor. Eu não anseio, nem gosto que me toque desta maneira.

Raiva cintilou nos olhos dele por um breve momento, então sua expressão suavizou-se, tomada de civilidade gelada.

— Estamos noivos, não há nada de errado em segurar a mão da minha noiva.

Ela se libertou, rindo como se ele tivesse dito algo engraçado enquanto o Sr. Grant, no camarote ao lado deles a observava.

Pensando na empresa de seu pai, ela entrelaçou o braço ao dele, inclinando-se como se quisesse sussurrar um segredo:

— Se você continuar se engraçando comigo, Sr. White, sairei do camarote, sem me importar que o cavalheiro que tanto quer impressionar me veja fugindo ou não. Entendido?

O Sr. White olhou furioso, mas sentou-se, voltando a atenção para a cantora de ópera.

— Você não tem poder nisso, Cecilia. Não me ameace, ou eu me casarei com outra, e você nunca herdará os preciosos negócios de seu pai.

Cecilia voltou-se para a linda Sarah desempenhando seu papel e ignorou o Sr. White pelo restante do primeiro ato. Ela perscrutou o teatro, mas não viu ninguém que conhecesse. Os funcionários foram para a plateia e começaram a acender as arandelas e notificar a todos que o jantar e bebidas estavam sendo servidos no foyer.

Eles desceram as escadas, o Sr. White aproveitando a oportunidade para continuar mantendo a mão dela sobre o braço dele, com firmeza.

— Você não precisa andar tão perto de mim, senhor.

— Desejo que todos vejam que estamos felizes e noivos. O que há de errado com isso?

— Nada estaria errado, se a mulher envolvida não tivesse sido forçada a estar nesta situação. Uma situação que não é da escolha ou gosto dela.

— Srta. Smith, boa noite.

Cecilia deu um pulo e se virou para ver o duque e a duquesa de Athelby sorrindo diante dela, embora seus olhares estivessem um pouco cautelosos.

Ela fez uma reverência.

— Posso apresentar o Sr. White? Ele é um advogado da firma de meu pai. Sr. White, deixe-me apresentar o duque e a duquesa de Athelby.

Ele se curvou.

— Suas Graças, um prazer conhecê-los. — o Sr. White descobriu a localização do Sr. Grant. — Se me derem licença, há alguém com quem preciso falar.

Cecilia mordeu o lábio, não gostando da careta da duquesa.

Estaria chateada com ela? Aconteceu algo a Hunter que ela não estava ciente?

— Cecilia, o que está acontecendo? — a duquesa sussurrou, inclinando-se para garantir privacidade.

— Uma pergunta que todos nós queremos uma resposta.

Ela ofegou, ao virar e ver Lorde Aaron impondo-se sobre ela. A dor que ela leu no olhar dele rasgou sua alma, e Cecilia não queria nada além de estender a mão e garantir que tudo estava bem. Que ela estar aqui esta noite não significava nada para ela, apenas para seus pais.

— Li a coisa mais estranha do jornal hoje de manhã. Era sobre casamento vindouro de uma Srta. Cecilia Smith com um Sr. White.

Na verdade, li duas vezes, talvez até mais, pois pensei que devia

estar errado. Estava errado? — ele perguntou, lançando um olhar para o Sr. White.

O duque e a duquesa se afastaram sem dizer uma palavra, e Cecilia puxou Lorde Aaron para um canto do salão, a uma pequena distância dos outros convidados. Garantia alguma privacidade, mas não muito.

— Você leu certo, mas...

— Isso é tudo que eu precisava saber.

Sua Senhoria virou-se para sair, e ela apertou o braço dele, ganhando a atenção de alguns olhares interessados a seu redor.

— Deixe-me explicar. Por favor.

— Você está noiva e se casará em quatro semanas. O que resta saber que não está escrito em preto e branco.

— Eu não o amo, Hunter.

— Então vai se jogar nele sem afeto. — ele recuou, o rosto estoico e duro, mas seus olhos eram uma poça de dor, e ela era a responsável por aquela dor. Pelo menos, o pai e o Sr. White eram, e ela fora covarde demais para fazer algo a respeito. Até agora.

— Meu pai queria que eu comparecesse aqui esta noite com o Sr. White por causa de um cliente em potencial.

— O que não explica o casamento marcado. — ele passou a mão na mandíbula. — Pensei que poderíamos ter um futuro. Parece que eu a entendi errado.

— Pensou? — ela perguntou, um pouco de esperança a atravessando. — Você nunca disse nada do gênero antes.

Ele olhou ao redor da sala, quebrando o contato visual com ela.

— Eu esperava torná-la minha amante. Para estar comigo sempre, poderíamos estar juntos sempre que quiséssemos. Queria que você fosse capaz de ter a independência que ansiava, sem me pertencer por lei.

Cecilia sentiu calor subir em seu rosto, e respirou calmamente quando a sala girou.

Amante.

A esperança que ela havia criado desmoronou a seus pés e não importava o que tentasse, não conseguiu conter as lágrimas que caíram despercebidas em suas bochechas.

Hunter estendeu a mão, antes de recuperar o controle e apertar as mãos atrás das costas.

— Por favor não chore. Não posso confortá-la aqui.

— Não, suponho que você não possa. Só quer me confortar na casa que decerto já montou para mim. Um lugarzinho onde você poderia me usar como sua prostituta, sempre que surgisse o desejo.

Os olhos dele arderam antes de a boca se apertar em uma linha fina.

— Não seria assim.

— Mesmo? Ser sua amante não seria como ser sua amante?

Sinto muito, Lorde Aaron, mas nunca serei sua prostituta particular.

— O que você quer? Casamento? — ele perguntou, franzindo a testa.

Cecilia balançou a cabeça, sem entender o rumo da conversa.

— Claro que casamento. Eu pensei que você era diferente desses que nos rodeiam. Pensei que gostasse de mim o bastante para ignorar meu berço. Parece que fui uma tola.

Ele verificou o paradeiro dos outros convidados, mas todos pareciam ocupados com o jantar e conversas.

— Sou o marquês de Aaron. Esperam que eu me case com uma mulher de classe e que seja adequada. Mas isso não significa que não podemos ficar juntos. Não quero perder você, Lia.

— Nunca mais me chame assim. — disse ela, encarando-o. —

Suas ações hoje à noite não são as de um cavalheiro, muito menos

dignas de mim ou do meu amor. Rejeito sua oferta, milorde.

Encontre outra para se deitar à sua espera.

Os olhos dele procuraram os dela um momento antes que ele se curvasse e saísse dali. Cecilia observou o duque e a duquesa seguirem Sua Senhoria. Decepção a inundou, e ela respirou fundo.

Ela não desmoronaria aqui, não mostraria à alta sociedade que o homem que amava havia destruído tudo o que ela esperou e sonhou quando estava envolvida nos braços dele.

No fundo, ela sabia que a posição contrária deles na Sociedade tornaria improvável um casamento, mesmo assim ela chegou a ansiar por tal desfecho, especialmente depois da maneira doce, mas feroz e apaixonada, com que fizeram amor. Engolindo em seco o rasgo de dor e decepção que a atravessou, ela se apressou, não querendo que ninguém aqui a visse tão magoada.

Aos tropeços do lado de fora, Cecilia chamou um coche de aluguel, queria voltar para casa o mais rápido possível. Deu instruções ao condutor, pulou na cabine, abraçando-se para conter o fluxo de lágrimas que queimavam seus olhos. Que idiota ela havia sido. Uma idiota ingênua e tola.

Deveria saber que Sua Senhoria nunca a consideraria como esposa, e que fora uma tola por ter cogitado a ideia. Lágrimas deslizaram por suas bochechas, e ela se engasgou tentando se acalmar. Não conseguiu, pois a dor venceu, e ela chorou de maneira incontrolável por todo o caminho de casa e pelo resto da noite.


CAPÍTULO 13

N a semana seguinte, Hunter se sentou na biblioteca em Yardley Hall, sua propriedade no interior e lutou com as próprias vontades. Vontade de fazer o que deveria e a vontade de fazer o que queria, ansiava, desejava.

Sua boca salivou pelo líquido âmbar depositado em um copo de cristal diante dele. O decantador cheio até a borda, e o cheiro forte e cortante o tentavam a experimentar. Apenas uma vez, um pequeno gole. Não faria mal. Ele só tomaria um.

Hunter lambeu os lábios e esticou a mão na direção copo antes de se jogar de volta na cadeira, esfregando a outra mão no rosto.

Na última semana, ele vivenciou um caleidoscópio de emoções.

Raiva, mágoa, ressentimento. Agora ele faria qualquer coisa para se desculpar com ela, dizer que se arrependia por tê-la insultado daquela maneira. Ele nunca desejou machucá-la.

Ele ficou de pé, ficou indo e voltando diante da garrafa de uísque, desejando que o líquido estivesse em sua boca. Como ele queria senti-lo queimar pela garganta, que a ingestão daquilo o jogasse na rota do esquecimento, onde ele não teria que pensar em Lia e no que a proposta dele significava. Que ela agora o odiava.

Sabia que ele era o patife que a sociedade sempre afirmou que ele era. Um homem que, mesmo sem palavras diretas, declarou que ela não era digna dele, não era boa o suficiente. Ele se sentou e pegou o copo, inspirou fundo para inalar o aroma amadeirado.

A bebida continha a tentação de dormência, um estado em que ele não sentiria mais dor. A dor de perder Cecilia era suficiente para rasgá-lo em dois. Com um grito alto, ele jogou o copo no fogo,


despedaçando-o em um milhão de estilhaços antes de tirar a garrafa da mesa e remover a tentação de voltar a cair no poço do inferno.

Ele lutou muito para evitar se perder, e a perda de Cecilia, mesmo que doesse agora, e que fosse continuar doendo por muitos meses. O empenho ferrenho dela para curá-lo não seria em vão.

Ele não falharia nisso também, nem permitiria que ela pensasse que ela só servia para ser uma amante. A semana que passou havia sido uma tortura, ele sentira muita falta dela e não permitiria que seu erro, ou sua classe fosse determinante de quem ele queria para ser sua esposa.

Havia apenas uma escolha correta quanto a quem deveria ser.

Hunter ficou de pé e correu para a porta. Não havia melhor hora que o presente para reconquistar a mulher que ele amava, a única que jamais amaria.

CECILIA sentou-se em sua cama no pequeno quarto do orfanato de Spitalfields e folheou documentos sobre a mais nova aluna da instituição. Ela havia sido deixada por sua mãe na noite anterior, uma mulher muito doente que afirmou não poder mais cuidar da filha de quatro anos de idade.

Cecilia havia assegurado que ela seria acomodada em um quarto próximo do dela, com algumas das meninas mais velhas que prometeram cuidar da menorzinha quando Cecilia não estivesse por perto. A semana anterior fora horrível, e sua mente ainda estava confusa e magoada pela proposta de Lorde Aaron.

Não que ela considerasse ser amante dele, mas o fato de que, durante todo o tempo em que ela levou para se apaixonar por Sua Senhoria, ele só pensou em encontrar formas de torná-la sua

amante. Nunca se sentira tão mortificada, nem mesmo quando toda Londres descobriu que o compromisso com o Sr. White havia sido cancelado, ou agora, que vivia em circunstâncias mais modestas.

Nada disso parecia importante quando o homem que ela amava a considerava insuficiente e indigna.

Uma batida leve soou na porta.

Ela colocou os papéis na pequena mesa de madeira que ficava diante de uma janela. Sendo uma cadeira, uma lareira e a cama os únicos móveis que o cômodo possuía. Era um espaço pequeno, mas bastante conveniente.

— Entre. — disse ela, pegando o xale e colocando-o sobre os ombros enquanto o visitante parava no batente da porta.

— Posso mesmo entrar? — Lorde Aaron perguntou, mexendo nas luvas nas mãos, torcendo e retorcendo-as.

O corpo dela formigou com o som da voz dele. Como ela havia desejado ouvi-lo outra vez, por mais tolo que fosse esse pensamento.

— Não, você pode sair. — Cecilia sentou-se em sua mesa, mexendo nos papéis.

Não havia nada mais a dizer para ele, nada de importante. Sua Senhoria deixou suas opiniões e posição muito claras na semana passada, e eles não precisavam repetir a conversa.

Ela o ouviu entrar e fechar a porta detrás dele.

— Sinto muito, Cecilia.

Cecilia manteve o olhar no lado de fora da janela, a raiva e a dor que ela havia empurrado para os confins de sua alma irromperam como um vulcão.

— Você sente muito? Eu acho que não. Se você tivesse se importado comigo em algum momento, mesmo que de maneira mínima, jamais teria me pedido para ser sua amante. Posso não ser

da sua classe, mas venho de uma boa família, com reputação.

Como você pôde me pedir uma coisa dessas?

Ele deu três passos para remover a distância entre eles e se ajoelhou aos pés dela, pegando suas mãos. Aquele olhar azul e penetrante, sério:

— Porque eu sou um tolo que não sabia que os sentimentos que eu tinha por você não eram apenas luxúria, mas muito mais. Na semana passada, saber que a machuquei, e a insultei de tal maneira me despedaçou. Não finjo ser um homem perfeito, por Deus, você sabe mais do que ninguém que não sou, mas ajoelho-me diante de você, neste dia de hoje, e digo que não desejo que você seja minha amante, mas minha esposa. Nada menos será o bastante.

Cecilia piscou para afastar as lágrimas e lutou para controlar suas emoções.

— Estou sem um tostão e, como você pode ver, me tornei uma mulher que não tem mais o apoio da família. Como um marquês aceitaria uma mulher dessas como esposa? Você vai se arrepender de sua escolha, e eu não quero um casamento assim. Não serei a decepção de ninguém.

Ele balançou a cabeça, apertando as mãos dela com mais força.

— Hoje, não posso provar a você que o que digo é verdade absoluta, mas que amarei, cuidarei e adorarei o chão em que você pisar pelo resto de nossas vidas. Tudo o que peço é que me permita provar com o tempo. Eu prometo que não falharei com você de novo. Nunca mais insultarei sua pessoa. Você me salvou de mim mesmo, e só por isso. eu já lhe devo minha vida, mas essa não é a única razão pela qual eu amo você. Sua compaixão, atenção e determinação infalível de melhorar a vida dos outros me deixam envergonhado. Fui muito egoísta em toda a minha vida, um traço


familiar que penso e que não desejo mais ter. Não posso viver sem você, nem desejo fazê-lo. Por favor, aceite minha proposta e se case comigo. Você é o amor da minha vida, senhorita Smith. Meu único amor.

Cecilia fungou, seu corpo tremia de felicidade.

Poderia ser verdade? Ele realmente falava sério?

Hunter enfiou a mão no bolso e tirou um pedaço de pergaminho, entregou a ela.

— O que é isto? — ela perguntou, abrindo-o com cuidado.

— Leia. — ele sorriu e esperou.

Cecilia perscrutou o documento, e o dobrou de volta ao fim da leitura.

— Está tentando comprar meu amor, milorde?

— Farei qualquer coisa, tentarei de tudo para ouvir você dizer sim à minha proposta.

— Pensei que você tivesse dito que nunca me daria o prédio da Rua Pilgrim.

Hunter levantou-se, pegando-a e colocando-a no colo.

— Parece que eu estava errado. Considere-o como um presente de casamento antecipado, se posso ser tão ousado.

Ela não conseguiu esconder o sorriso que brincou em seus lábios.

— Estou aberta a esse tipo de presente. E cogito aceitar sua proposta, se você de fato foi sincero.

— Sim, estou sendo mais sincero que jamais fui em minha vida.

Ela o segurou nas bochechas, travando seus olhares.

— Então, sim. Também falo sério.

Hunter a beijou de forma gentil, querendo dar continuidade, mas havia mais a ser dito.

— Comprarei e reformarei todos e quaisquer edifícios que você quiser. Vou renunciar a todo o dinheiro que eu tiver, que é mais do que jamais gastaremos com as crianças que você tanto ama, se me perdoar por magoá-la.

Ela o beijou de volta e, por um momento, Hunter perdeu o raciocínio na hora em que ela passou os braços pelo pescoço dele, beijando-o com mais paixão do que ele jamais sentira. O toque das mãos dela contra o peito dele, apertando seus ombros, os pequenos gemidos e grunhidos lançaram calor por seu corpo e seu pau endureceu. Ele havia se negado tudo na última semana, bebida, comida, cuidados pessoais, mas agora nada disso importava, ele se alimentaria dela.

Agarrando-a pela parte debaixo das pernas dela, ele a levantou e a sentou na pequena mesa, sem nunca interromper o beijo. O

vestido dela era pesado e feito para trabalhos manuais, e, baixando a mão, ele deslizou o tecido para cima da perna dela, aproveitando a oportunidade para sentir a carne macia daquelas pernas.

— Aqui, lorde Aaron? Isso é sábio? — ela perguntou, sorrindo para ele, os olhos brilhando de travessura.

— Não é nada sábio, mas faremos do mesmo jeito. — ele se atrapalhou com as calças, abriu só o suficiente para a tomar.

Ele precisava estar com ela de novo, saber que ela era dele, e ele era dela. O toque suave e hesitante de Lia o fez gemer e, tanto quanto ele queria reivindicá-la, ele permitiu que ela o acariciasse, sentisse e conhecesse seu corpo. Cacete, era bom. Muito bom e quando o polegar dela passou por cima do pênis dele, ele gemeu.

— Eu preciso de você, meu amor. — ele sussurrou, desejando-a com fervor.


Ela se aproximou mais dele na mesa, guiando-o para dentro dela, e o tempo todo mantendo os olhos fixos nos dele. Ao vê-la fechar a janela de sua alma com o prazer da união dos dois, um incêndio se instaurou, um que Hunter duvidava que fosse apagar.

Ele não queria nada além de fazer a mulher em seus braços feliz, sentir-se amada e estimada, e a partir desta noite era exatamente isso que ele faria.

CECILIA ENVOLVEU as costas de Hunter com as pernas e o abraçou. Ela se agarrou a ele enquanto ele a tomava, uma fera selvagem ao fazer amor. As mãos dele agarraram seus quadris e o traseiro com força, mantendo-a no lugar, incansável, com força e rapidez sobre a mesa. Foi a coisa mais emocionante e travessa que ela já fez em sua vida.

E ela adorou.

Todo o seu ser se concentrou no local da união, o crescente prazer, a tensão que aumentava a cada golpe, cada respiração ofegante contra sua orelha, cada beijo molhado e desesperado.

— Hunter... — ela gemeu, apertando o rosto dele para beijá-lo.

— Eu estou...

— Eu também. — ele ofegou.

Os golpes dele se tornaram frenéticos, mais profundos, de forma que se tornou incapaz de se dar o que ela ansiava, a tensão desenrolou-se a um ponto sem volta, e ela se deixou levar por ondas de prazer, uma infinita delicia encantadora da qual nunca se cansaria.

Hunter gemeu o nome dela, provocando arrepios na espinha quando ele também encontrou sua libertação, agarrando-a com

força contra ele enquanto os dois recuperavam o fôlego.

— Sei que já se passaram sete dias, mas esses sete dias foram os piores da minha vida. Eu pensei que havia perdido você por minha própria estupidez, por minha própria pretensão.

Cecilia riu, beijando-o.

— Eu também tenho minha parcela de culpa. Julguei sua classe sem realmente conhecê-los. Eu também tenho falhas que me esforçarei para remediar.

Ele levantou o queixo para mirar seu olhar.

— Vou mimar você e todas as crianças que entrarem em suas instituições de caridade, e se Deus quiser, as nossas. Eu amo você.

— ele disse, enxugando as lágrimas dela que não paravam de cair, por mais maravilhosas que fossem as palavras. Ela se tornou um verdadeiro regador.

— E eu te amo, Hunter, sempre. E para todo o sempre...


EPILOGUE

Seis meses depois...

C ecilia estava sentada no chão em círculo com as crianças do novo orfanato e escola da Rua Pilgrim. Com o prédio que os unira tantos meses atrás, e a compra do edifício ao lado antes do casamento, as duas construções foram unidas, reformadas e agora era um dos ambientes mais limpos e estruturados de aprendizado e amor que essas crianças já conheceram.

Hoje ela estava ensinando geografia aos mais jovens, também falava das maravilhas naturais do mundo que podiam ver e explorar.

O sinal tocou, e todas as crianças olharam para ela com expectativa, pois era hora do intervalo do meio da manhã.

— Lembrem-se de lavar as mãos antes de comer e brinquem em segurança e com justeza. Nos vemos amanhã.

Eles se despediram, e Cecilia foi até o vestíbulo, iria encontrar Hunter. Eles sairiam para almoçar hoje, mas o malandro irritante não dissera onde. Não que ela se importasse, ela permitiria que ele fizesse suas vontades, em especial, depois de tudo o que ele lhe dera, esbanjando caridade com o dinheiro dele, tudo e qualquer coisa para tornar a escola e o orfanato funcionais.

A campainha da porta tocou e seu marido entrou.

Estavam casados há seis meses e, mesmo depois de todo esse tempo, os pais dela se recusavam a se encontrar com ela. Era a única mácula no amor deles, mas Hunter estava cuidando dela e compreendendo sua dor, o que compensava muito da mágoa que ela escondia do mundo.

— Vamos querida? — ele estendeu a mão, ajudando-a na direção da carruagem.

— Eu já disse hoje o quanto eu te amo?

Ele riu, segurando a mão dela enquanto ela subia os degraus da carruagem.

— Você pode me amar mais depois da surpresa que tenho guardada para você.

Animação borbulhou dentro dela, e ela mal podia ficar parada enquanto iam pelas ruas de Londres até parar na frente da sorveteria Gunther.

— É aqui que vamos ficar?

— Esta é a primeira parada, tenho outra surpresa para você, mas a jornada levará algumas horas.

Ele era misterioso e maravilhoso, e os últimos seis meses foram os mais felizes da vida dela. Saindo da carruagem, ela pegou no braço dele, e entraram na loja. Outras mulheres sentavam-se ali tomando sorvete com as amigas, e a maioria lançava sorrisos calorosos de boas-vindas, mas o olhar de Cecilia estava fixo nas duas pessoas sentadas em uma mesa perto dos fundos da loja, sozinhos.

Os dois pararam diante do casal, que se levantou.

Um pequeno sorriso brincando nos lábios de sua mãe.

— Filha, você está linda hoje.

Uma onda de emoção a inundou, uma ocorrência comum que o médico disse que aconteceria às mulheres em sua condição, não porque os pais dela estivessem aqui. Pais que ela pensara ter perdido para sempre.

— O que estão fazendo aqui, mamãe, papai? Achei que não queriam mais me ver.

Eles ficaram tão terrivelmente magoados e com raiva depois que ela se casou com Hunter, sendo ele marquês ou não. Um escândalo que atravessou Londres por causa dos proclames que declaravam seu casamento com um homem, e ela, em seguida, casou-se, de fato, mas com outro. Certa conversa indiscreta decorreu. E, sem dúvida, houve danos à empresa de seu pai, mas ela não se desculparia pelo transtorno. Pois significaria que ela se arrependia por Hunter e pelo casamento, o que ela nunca se arrependeria.

— Estávamos errados, querida Cecília, e com o apoio do seu marido, ele prometeu uma audiência justa com você para tentarmos fazer as pazes. Sentimos muito por magoá-la, minha querida.

Acredito, de verdade, que não estávamos pensando de forma correta, nem com clareza. Nós a prejudicamos, e não posso dizer o quanto estou feliz por você ter seguido seu coração, por ter permanecido forte sob tamanha pressão, e mais que tudo, sei que não tínhamos o direito de dar sua mão sem conversar. Nós amamos você e queremos você de volta em nossas vidas, se assim quiser.

Cecilia entrou nos braços do pai e o abraçou com força, secando as lágrimas que pareciam desnecessárias.

— Claro que eu perdoo a vocês dois. Tudo o que desejo a partir de hoje é me esquecer de nossos problemas passados e recomeçar. O que você diz?

— Dizemos que sim. — disse o pai, beijando-a na bochecha e ajudando-a a se sentar.

— Suponho que agora é uma boa hora para contar nossas novidades para seus pais, Lia. — disse Hunter, e pediu sorvetes para os quatro.

— Que notícias são essas? - a mãe dela perguntou.

Lia sorriu para Hunter, antes de se virar para os pais.

— Vou ter um bebê. Vocês serão avós.

Seu pai riu, apertando a mão de Hunter e se inclinando para beijar Lia na bochecha mais uma vez. A mãe enxugou as lágrimas e cruzou a mão sobre a pequena mesa.

— Estou muito feliz por vocês dois. Você será a melhor mãe do mundo. Com sua natureza gentil e maneiras educadas, a criança não vai precisar de mais nada. — disse o pai, sorrindo.

— Espero que sim. — disse Lia, mergulhando uma colher no sorvete. — Mas acredito que ficaremos bem.

O encontro logo terminou, e os pais dela partiram, mas não querendo ir embora, Hunter pediu chá para eles.

— Eu esperaria até amanhã quando viajaremos para mostrar minha outra surpresa, mas me agrada contar agora.

— Mesmo? — ela disse, pegando a mão dele. — Conte-me. O

que é? Estou curiosa.

— Ouvi sua conversa na outra semana com a duquesa, acerca dos problemas que estão ocorrendo em Bath e no distrito circundante com crianças e instalações inadequadas para lidar com os problemas que a cidade enfrenta. Então, amanhã, você deve inspecionar um grande armazém que possamos converter para ajudar a corrigir esse déficit.

— Em Bath? — Cecilia perguntou, sem saber se era mesmo possível estar tão feliz quanto ela se sentia neste momento.

Ela pensou que o dia do casamento havia sido o melhor dia da sua vida, mas Hunter, com os presentes para os necessitados nos últimos meses... Ele a surpreendeu, ajudando-a a não ter mais certeza de qual era seu presente favorito.

— Você é muito bom, querido. Eu não te mereço.

— Você me merece, nunca diga isso. Eu amo você e adoro como você me ajudou e ajuda muitos outros que não tiveram o privilégio da educação que nós dois tivemos por puro acaso. Eu fui

tão egoísta por tantos anos, dei as costas não só para mim mesmo, mas também para o sofrimento a minha volta. Não serei mais essa pessoa. Não quero que esse seja meu legado. Você me inspira todos os dias, e sou eu que anseio por merecer você.

Cecilia se mexeu e se sentou no colo de Hunter, ignorando os choques ofegantes que soaram detrás deles.

— Você me merece, nunca duvide do meu amor. — disse ela, beijando-o. — Vamos para casa, milorde. Eu gostaria de ficar sozinha com você.

— Parece que eu também corrompi minha esposa linda e honrada. O que mais posso fazer?

Cecilia inclinou-se contra a orelha dele e sussurrou:

— O que você quiser.

 

 

                                                   S.D. Perry         

 

 

 

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