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Artur Azevedo
Diálogo cômico entre as senhoritas Leonor e Teresa, que entram, uma da esquerda, outra da direita, ambas tristes e lacrimosas.
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CENA I
LEONOR Teresa, por que estás triste?
TERESA Por que estás triste, Leonor?
LEONOR Essa mágoa em que consiste?
TERESA Em que consiste essa dor?
LEONOR Suspiras constantemente!
TERESA Estás sempre a suspirar!
LEONOR Tu, que eras tão sorridente!
TERESA Tu, que cu nunca vi chorar!
LEONOR As tuas mágoas, Teresa,
Confia ao meu coração.
TERESA As causas dessa tristeza, Leonor, dize-me quais são.
LEONOR Repetes o que te digo, E não respondes, bem vês!
TERESA Mas eu também não consigo Que uma resposta me dês!
LEONOR Perguntas por que estou triste, E estás mais triste do que eu!
TERESA Do meu enfado inquiriste, E o teu é maior que o meu!
LEONOR Por que por um mal indagas Que não te é dado sanar?
CENA II
TERESA Por que queres ver as chagas Que tu não podes curar?
LEONOR Quem sabe se um lenitivo Às tuas dores trarei?
TERESA Ao menos um paliativo Às tuas mágoas darei!
LEONOR São minhas mágoas daquelas Que paliativos não têm!
TERESA E as minhas dores são elas Inconsoláveis também!
LEONOR Não querem talvez levar-te Ao baile do dia um...
TERESA Não! — eu vou a toda a parte; Não falto a baile nenhum. — Teu pai não foi convidado Para esse baile, talvez...
LEONOR Um convite delicado Tivemos há mais de um mês, — Mas para o baile, faceira, Toilette nova não tens?
TERESA Já lá está na costureira.
LEONOR Aceita os meus parabéns. — Um vestido te negaram? Essa é a causa do teu mal?
TERESA Pelo contrário: mandaram Fazê-lo ao Palais Royal.
LEONOR Mas algum outro capricho Contrariado, não é?
TERESA Não acertaste no bicho? No bicho perdeste a fé? — Caprichos I pois disso trato?
LEONOR Tenho palpites de truz: Anteontem ganhei no gato, Ontem ganhei no avestruz!
TERESA Nesse caso, não percebo " Dessa tristeza a razão!
LEONOR O motivo não concebo De tão estranha aflição! Conta-me a tua tristeza!
TERESA Confia-me a tua dor!
LEONOR Sou tua amiga, Teresa!
TERESA Sou tua amiga, Leonor!
LEONOR Se eu te disser o que sinto...
TERESA Si o que sofro eu te disser...
LEONOR Julgarás talvez que minto!...
TERESA Não suspeitarás sequer!... (Depois de se certificar de que estão sozinhas) Toda a discrição reclamo.
LEONOR Guarda segredo.
TERESA Pois bem: Eu amo!
LEONOR Também eu amo!
TERESA E sou amada!
LEONOR Eu também!
TERESA Eu amo um bonito moço!
LEONOR Eu amo um belo rapaz!
TERESA Amo-o com todo o alvoroço
De que minh'alma é capaz! Ele é tão inteligente!
LEONOR Tanto talento ele tem.
TERESA É de tal modo eloquente!
LEONOR Sabe exprimir-se tão bem! TERESA Alto, moreno, bem feito...
LEONOR Os mesmos sinais te dou...
TERESA Formou-se há pouco em direito.
LEONOR Ha pouco o meu se formou.
TERESA Que coincidência! Ora essa!
LEONOR Amamos dois bacharéis!
TERESA. Seu nome? Dize depressa!
LEONOR Chama-se Alberto Vergéis.
TERESA Vergéis! Alberto! É lá possível! Mentes! É o meu amado, ouviste? E se há pouco me visto Contendo as minhas lágrimas ardentes, Desesperada, lacrimosa e triste, Foi por ter recebido ainda agora A notícia de que ele foi nomeado Juiz municipal aí p'ra fora,
E vai partir mais dia menos dia!
LEONOR Queres zombar de mim? O meu amado. Ar que respiro, sol que me alumia, Meu noivo, meu futuro. Também Vergéis se chama, afirmo e juro! E se estou triste assim, é que ele deve Para o destino seu partir em breve, Pois é juiz municipal na roça!
TERESA Que situação a nossa! Leonor, uma de nós vive iludida!
LEONOR Teresa, uma de nós anda enganada!
TERESA Tenho certeza de que sou querida!
LEONOR Tenho certeza de que sou amada!
TERESA De um impostor és vítima!
LEONOR Não creio; Se uma vítima existe, és tu, suponho!
TERESA Não será isto um sonho?
LEONOR Um pesadelo não será?
TERESA Receio, Pois que tão novas, tão ingénuas somos, Que tanto eu como tu logradas fomos!
LEONOR Ah! eu tenho comigo Um documento real de quanto digo!
TERESA E eu tenho aqui também, por felicidade. Uma prova de que falei verdade. (Cada uma delas tira uma fotografia do bolso) É o seu retrato!
LEONOR (comparando-os) Iguais!
TERESA Iguais! É certo!
LEONOR Quem to mandou?
TERESA Foi ele, o próprio Alberto.
LEONOR Das suas mãos o recebi.
TERESA Das suas? Eu vejo que iludida Não fui eu só, nem tu: fomos as duas.
LEONOR É o desgosto maior da minha vida!
TERESA. Lê a dedicatória.
LEONOR Conta-nos, com certeza, a mesma história. (Lendo) Á minha noiva Teresa...
LEONOR (lendo) À minha noiva Leonor...
TERESA (lendo) Penhor da minha firmeza...
LEONOR (lendo) Protesto de meu amor.
TERESA Dedicatórias e fotografias Sio dos mesmos clichês. (Ri-se) Oh! não te rias!
LEONOR O tratante jurou que meu marido Seria quando fosse promovido...
TERESA A juiz de direito. Igual promessa Me fez a mim!
LEONOR Que logração!
TERESA Que peça! Mas não nos agastemos, Que o coisa ruim não vale tais extremos, Mandemos-lhe uma dúzia de ironias Em carta que ambas assignar devemos.
LEONOR E devolvamos as fotografias.
TERESA E procuremos outros namorados! É a vingança melhor! Valeu?
LEONOR Valeu; Porém tenhamos todos os cuidados: Que o meu seja meu só e o teu só teu.
Artur Azevedo
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