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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


DOMINADOR E APAIXONADO / Carole Mortimer
DOMINADOR E APAIXONADO / Carole Mortimer

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT

 

 

 

 

Ela fora contratada para distraí-lo, mas foi ele quem a distraiu...

Lucan St. Claire se recusava a assumir o maldito título de duque de Stourbridge. Ele não tinha inte­resse nenhum nessa herança, incluindo a magnífica casa no campo. Ao ser forçado a retornar para a propriedade de sua família, levou também Lexie Hamilton, sua nova e bela assistente pessoal, para se distrair um pouquinho... Mas ele não fazia idéia de que Lexie não era bem quem parecia ser... E quando descobriu, já era tarde demais!

 

 

 

 

— Feliz Ano-Novo, sr. St. Claire!

Lucan St. Claire estava de pé diante da enorme ja­nela do seu escritório, no décimo andar da St. Claire Corporation. Ainda não passavam das 8:30 de uma fria manhã de inverno, mas ele trabalhara desde as seis para resolver algumas questões acumuladas durante os fe­riados natalinos. Pelo menos, justificara assim o horá­rio em que viera trabalhar. Na verdade, estava apenas aliviado por retomar a rotina, depois de passar o Natal em Edimburgo com a mãe e os dois irmãos mais novos, e de todos voltarem rapidamente — não tanto quan­to desejou — para Mulberry Hall, a casa da família em Gloucestershire, onde seria realizado o casamento de um de seus irmãos, na noite de Ano-Novo. Lucan compreendia o desejo de Jordan e de Stephanie, de se casarem no lugar onde haviam se conhecido, mas, as­sim que encontrara uma oportunidade, arranjara uma desculpa e fora para Klosters, onde passara três dias esquiando.

De rosto contraído e constrangido, Lucan se voltou para a moça que entrava pela porta da sala da sua assistente, ao lado, e viu entrar alguém que não conhecia. A moça de­veria ter 20 e poucos anos, era esguia e não muito alta. O terninho preto e a blusa imaculadamente branca que ela vestia em nada diminuíam o efeito exótico dos longos ca­belos negros que lhe desciam pelas costas. Suas sobran­celhas negras se arqueavam sobre cintilantes olhos azuis emoldurados por longas pestanas, e o seu nariz delicado apontava para lábios extremamente atraentes e sensuais. Lábios que, de imediato e surpreendentemente, fizeram o corpo de Lucan reagir, e ele começou a fantasiar o en­contro de cobertas e corpos nus, entrelaçados no calor da paixão. Era surpreendente porque todos sabiam que o bem-sucedido empresário Lucan St. Claire costumava ser implacável, tanto nos negócios quanto nas rápidas relações que mantinha com as mulheres. Ele, entretanto, não se sen­tia nada indiferente ao olhar para aquela beleza selvagem!

— Quem é você? — perguntou com um tom de de­sagrado.

Lexie quase sentiria pena por Lucan St. Claire fazer aquela cara desagradavelmente surpresa, não fosse pelo fato de ele próprio ter provocado aquela situação. Se não fosse tão centrado em si mesmo, tão arrogante a ponto de não notar as pessoas que trabalhavam com e para ele, talvez sua assistente não tivesse resolvido ir embora sem avisá-lo, na véspera de Natal. Talvez. Lexie desconfiava que o interesse de Jessica Brown por Lucan St. Claire não se limitava ao campo estritamente profissional, e que a falta de retri­buição ou a incapacidade que ele tinha de sentir fora o mo­tivo para que a moça o deixasse tão abruptamente... Parou diante da mesa, consciente do poder que parecia irradiar de Lucan St. Claire, da elegância com que ele usava o terno grafite bem cortado, a camisa de seda e a gravata cinza com um nó impecável. Lucan não era apenas um homem orgu­lhoso e bem-vestido, mas também muito bonito, admitiu a contragosto. Embora achasse que ele deveria usar os cabe­los pretos um pouco mais longos. Além disso, o belo rosto — de lindos e enigmáticos olhos negros, nariz altivo e boca bem traçada sobre um queixo forte — estampava um ar de arrogância que ela não considerava nada atraente. Não era provável que ela, Lexie, achasse algum membro da família St. Claire atraente! Ela deu um sorriso desdenhoso.

— Meu nome é Lexie Hamilton, sr. St. Claire. Sou sua assistente particular temporária, temporariamente.

Ele franziu a testa com desagrado e falou friamente: — Para mim é novidade que eu precise de uma assistente temporária, ainda mais, uma temporária temporariamente...

— Sua ex-assistente ligou para minha agência na vés­pera de Natal e pediu que lhe arranjassem uma substituta temporária, até que o senhor contrate uma assistente definitiva. Infelizmente, a pessoa mais qualificada para o cargo só estará disponível daqui a três dias.

Lucan St. Claire se admirou com a explicação. Tanto quanto lhe seria possível... Lexie resolvera, antes de che­gar, que a curiosidade que sempre sentira pela família St. Claire teria um limite. Três dias seriam suficientes para que ela confirmasse tudo de ruim que pensava ou que ouvira falar a respeito deles. Como sempre, exagerara: três minutos na companhia daquele homem frio e orgu­lhoso foram suficientes para que percebesse que ele se considerava superior a todo mundo!

— Por que e quando Jennifer tomou esta decisão? — Ele parecia ter ficado mais que aborrecido.

Foi a vez de Lexie franzir a testa.

— Pensei que o nome da sua assistente fosse Jessica...?

— Jennifer, Jessica — Lucan falou com indiferen­ça. — O nome é irrelevante se, como você diz, ela saiu do emprego.

Lexie deu um sorriso de pena.

— Se você tivesse se dado ao trabalho de lembrar apenas o nome, talvez ela não tivesse sentido necessidade de sair tão de repente...

Lucan a encarou com olhares que pareciam lâminas de aço.

— Quando eu quiser sua opinião, srta. Hamilton, com certeza vou pedi-la.

— Eu só comentei...

— Creio que não seja da conta de uma assistente tem­porária temporária — Lucan interrompeu secamente.

— Creio que não — ela admitiu com um sorriso contrito. Aborrecido, Lucan percebeu a falta de sinceridade do que deveria parecer uma desculpa.

— Por que Jen... Jéssica — ele corrigiu com irritação — agiu de maneira tão pouco profissional?

Lexie deu de ombros.

— Ela disse a alguém da agência que a última gota foi você não ter lhe dado sequer um cartão de Natal, quanto mais algum presente...

— Ela recebeu um bônus de Natal no contracheque do mês passado, como todos os meus empregados.

— Um presente pessoal — Lexie Hamilton esclareceu.

— E por que eu lhe daria um? — Lucan estava real­mente perplexo com a acusação.

— Creio que o chefe direto costuma... Veja, deixe para lá — disse a bela morena ao perceber a impaci­ência que causava. — Não sabia que você estava na sala... Acabo de receber um telefonema que exige a sua atenção imediata. Anotei os detalhes para lhe pas­sar. — Ela estendeu uma folha de papel. Lucan leu a mensagem escrita com capricho, antes de amassá-la.

John Barton, o administrador de Mulberry Hall, co­municava alguns estragos na galeria oeste da casa, cau­sados pelo rápido degelo que ocorrera nos dois últimos dias. John achava que Lucan deveria verificar os estra­gos pessoalmente.

Sendo o mais velho dos três irmãos St. Claire, herda­ra Mulberry Hall depois que seu pai morrera, oito anos antes, mas, desde que seus pais haviam se divorciado há 25 anos, Lucan raramente visitava a propriedade e não tinha intenção de revê-la tão cedo, após a última visita.

Durante 11 dos seus 36 anos, Lucan vivera alegre­mente em Mulberry Hall com seus pais. Os três irmãos desconheciam totalmente o caso que o pai mantinha com uma viúva que vivia com uma filha já crescida, em um dos chalés da cidade, assim como ignoravam a infelici­dade que este caso causava à sua mãe. Uma infelicida­de que explodira há 25 anos e que resultara na volta de Molly para a Escócia, levando consigo os três filhos.

Uma semana antes, da mesma forma que Gideon e sua mãe, Lucan se forçara a voltar a Mulberry Hall para o casamento de Jordan e Stephanie. Para ele era inad­missível que lhe pedissem para voltar lá novamente.

Barton dizia que o problema ocorrera na galeria oeste...

Tratava-se da longa galeria de quadros, onde estava pendurado o majestoso retrato de seu pai, Alexander St. Claire, duque de Stourbridge.

O retrato mostrava que, dos três irmãos St. Claire, Lu­can era o que mais se parecia com o pai, pelos cabelos escuros, olhar implacável e... Adúltero!

— O sr. Barton falou como se fosse urgente — dizia Lexie Hamilton, olhando a mensagem que escreva com tanto cuidado e que ele amassava na mão.

— Isto quem resolve sou eu, não acha? — ele disse em voz macia.

— Acho que é tarde para cancelar o seu encontro das 10h — ela disse, ignorando-o. — Posso cancelar o resto dos seus compromissos para os próximos dois dias, se você precisar...

— Creia, srta. Hamilton, você não vai querer saber o que eu preciso — ele declarou secamente. — A minha prioridade é ter uma conversa com o responsável pela sua agência.

— Por quê?

Lucan franziu a testa.

— Não estou habituado a questionamentos sobre mi­nhas atitudes.

E muito menos a ser questionado por uma empregada temporária, Lexie compreendeu imediatamente. Entre­tanto, no momento ela mesma era a diretora da agência. Seus pais, donos da Premier Personnel, haviam embar­cado num cruzeiro de três semanas logo após o Natal, para comemorar seus 25 anos de casamento.

Nada sabiam a respeito do telefonema que haviam re­cebido da assistente de Lucan St. Claire.

Lexie justificava o fato de não ter lhes contado, dizendo a si mesma que quisera evitar que a menção ao nome dos St. Claire perturbasse a animação dos dois com a viagem.

De início, ficara tão admirada com o telefonema que apenas anotara os detalhes e garantira a Jessica Brown que não precisava se preocupar: a Premier Personnel re­solveria o seu problema. Só depois que havia desliga­do, percebera a oportunidade que aquele telefonema lhe oferecia. Era qualificada para o cargo, e o movimento na agência costumava diminuir em janeiro. Seriam apenas três dias. Três dias em que ela poderia observar Lucan St. Claire, o todo-poderoso e implacável dono da St. Claire Corporation. Até agora, Lucan provara ser tudo o que imaginara!

Lexie se empertigou toda em cima dos saltos altos.

— Garanto que sou qualificada para ocupar o cargo por três dias, sr. St. Claire.

— Não questionei a sua qualificação... Lexie ficou corada de raiva.

— Mesmo assim, percebi a insinuação.

— É mesmo? — Lucan se apoiou na ponta da mesa e se inclinou até que seus olhos ficassem no mesmo nível dos olhos azuis indignados de Lexie Hamilton, e que ele pudesse perceber a perfeição de sua pele, o queixo firme sob os lábios altamente sensuais...

Lábios como aqueles, úmidos, cheios, aveludados e levemente amuados, poderiam levar um homem à loucu­ra, se tocassem certa parte da sua anatomia...

Lucan se afastou bruscamente, aborrecido com os pensamentos inconvenientes que aquela mulher mal educada lhe provocava, e com a reação daquela mesma certa parte de sua própria anatomia!

— Qual é o nome de sua agência? — ele perguntou asperamente.

— Premier Personnel — respondeu Lexie irritada. — Antes você não gostaria que eu telefonasse para o sr. Barton? Ele deu a impressão que o assunto era urgente...

— Sou perfeitamente capaz de priorizar a minha so­brecarga de trabalho, Lexie — Lucan falou com desdém.

— Claro — ela concordou de repente, franzindo a testa, virando-se e saindo rapidamente da sala, e dando a ele a chance de apreciar mais uma vez a longa cascata dos seus cabelos negros. Como também deu a Lucan a visão provocante do balanço de suas nádegas perfeitas e de suas pernas bem torneadas, que lhe diziam que ela estava tão qualificada para ir para a cama com ele quanto para ser, temporariamente, sua assistente particular temporária!

— Jemima mudou a cor dos cabelos?

Lucan se voltou lentamente para o irmão, Gideon, pa­rado na soleira da porta que dava para o corredor. O rapaz olhava para a porta fechada entre os dois escritórios e tinha a mesma expressão perplexa que ele mesmo fizera, 15 minutos antes, ao ver Lexie Hamilton entrar em sua sala.

Lucan ficou satisfeito ao perceber que o irmão tam­bém não sabia o nome da sua assistente. Ex-assistente, ele sé corrigiu irritado.

Era inacreditável que Jen... Jessica o abandonasse sem dizer uma palavra. E era ainda mais irritante que a sua substituta duas vezes temporária fosse a linda Lexie Hamilton.

Lucan sacudiu a cabeça com impaciência e sentou-se à sua mesa.

— Parece que o nome era Jessica! E aquela não era ela — disse Lucan friamente.

— Não? — perguntou Gideon admirado, entrando na sala. Dois anos mais moço que Lucan, Gideon tinha 34 anos, era alto e louro, olhos escuros e muito bonito. — Eu não soube que você pretendia substituí-la.

— Não pretendia — Lucan falou irritado, lembrando-se dos motivos que Lexie dera para que Jessica Brown o deixasse daquela maneira tão repentina. Du­vidava que Lexie Hamilton fosse deixar sua presença passar despercebida, ainda que fosse pelos três dias que pretendia trabalhar para ele...

— Não? — Gideon perguntou surpreso. — Então, quem era aquela?

— Uma temporária — Lucan explicou impaciente. — Uma temporária... temporária!

— Ah — Gideon exclamou. — Ela me pareceu vaga­mente familiar...

Lucan ficou imediatamente interessado.

— Como assim?

— Não sei. — Gideon deu um sorriso debochado. — A situação fica triste quando as moças bonitas que você conhece começam a se tornar parecidas, Lucan!

No que dizia respeito a Lucan, Lexie não se parecia ou se comportava como nenhuma mulher que ele já co­nhecera! E isto o intrigava.

— O que posso fazer por você, Gideon? — Ele mudou de assunto porque não queria falar mais sobre Lexie com o irmão nem queria que este percebesse a instantânea e incrível atração que sentira por sua beleza de cigana.

Lucan costumava namorar atrizes e modelos, embo­ra a palavra "namorar" fosse um tanto exagerada. Ele costumava levá-las para jantar, ou, como no último caso, acompanhá-las a alguma estreia, e tudo acabava invariavelmente na cama. Lindas mulheres, elegantes e sofisticadas. Mulheres que não esperavam se envolver seriamente com ele e que se satisfaziam em desfilar ao lado do rico é poderoso Lucan St. Claire.

Com certeza, nunca estivera interessado em se envol­ver com alguma de suas funcionárias, o que era atestado pelo fato de ele não saber direito o nome da própria assistente. E, com certeza, não seria uma boa idéia fazer de Lexie Hamilton uma exceção!

Gideon olhou surpreso para o irmão.

— Não me diga que você esqueceu que me pediu para chegar às 9h para discutirmos os contratos antes da che­gada de Andrew Proctor, às 10h. — Como representante legal da St. Claire Corporation, Gideon ocupava uma sala no mesmo andar, além de manter um escritório par­ticular na cidade.

Lucan esquecera que Gideon viria naquela manhã, algo que nunca lhe acontecera. Para ele, os negócios estavam sempre em primeiro lugar, e também se esten­diam do segundo até o último.

— A srta. seja lá qual for o seu nome deveria partici­par. Proctor vai ficar tão distraído com ela que não vai saber o que está assinando!

— O nome dela é Lexie Hamilton — informou Lucan secamente. — E prefiro que Proctor saiba exatamente o que está assinando. Também não acho apropriado que você faça este tipo de comentário pessoal a respeito dos empregados, Gideon — ele acrescentou com severidade.

— Não cheguei a tempo de lhe ver o rosto, mas ne­nhum homem com sangue nas veias deixaria de reparar naquele traseiro! — Gideon falou com ironia.

Lucan franziu as sobrancelhas ao perceber que não se sentia à vontade para falar sobre a sensual temporária naqueles termos, mesmo que fosse com Gideon.

— Talvez ela seja perturbadora demais. Gideon fez uma cara de zombaria.

— Perturbadora demais...? Lucan ficou agitado e se levantou.

— Não para mim, claro — ele disse rispidamente.

— Não?

A irritação de Lucan aumentou.

— Não!

— Então, não existe nenhum problema para que participe da reunião, existe? — Gideon perguntou com displicência.

Não, a não ser pelo fato de que Lucan soubesse que Lexie iria perturbá-lo, assim como a todo mundo!

— Esta manhã recebi um telefonema, de John Barton a respeito de alguns consertos que precisam ser feitos em Mulberry Hall — disse Lucan, mudando de assunto. — Suponho que você gostaria de voltar a Gloucestershire por alguns dias...?

— Acho que não — Gideon respondeu com firmeza, de acordo com o que Lucan esperava.

 

Quinze minutos depois, Lexie estava bem consciente da presença de Lucan St. Claire, que aparecera na porta en­tre as duas salas e parara, observando-a pensativamente. Ela se sentia tão cônscia da sua presença que resolveu ignorá-lo e continuar a trabalhar no laptop, até terminar de digitar e de enviar um e-mail para Brenda, no escritó­rio da Premier Personnel. Brenda lhe mandara uma men­sagem, dizendo que garantira a Lucan St. Claire que ela, Lexie Hamilton, era de fato uma empregada temporária, enviada pela agência.

Lexie quase entrara em pânico quando Lucan lhe dissera que pretendia telefonar pessoalmente para a Pre­mier Personnel. Ela correra de volta à sua sala e liga­ra para Brenda, contando o que acontecera e marcando um encontro para depois do expediente, naquela tarde, quando teria mais tempo para lhe expor a situação deta­lhadamente, embora tivesse dificuldades para explicar a situação até para ela mesma.

Agira por impulso e, ao mesmo tempo, por curiosida­de! E já se arrependia. Não esperava gostar do poderoso Lucan St. Claire, e não gostara. Bastara a breve conversa daquela manhã para que decidisse que a sua reputação de ser frio e arrogante era merecida. Não havia dúvida de que ele era muito bonito, muito... O tom de pele, seus traços, os cabelos escuros, os olhos negros, eram os mes­mos do pai, Alexander...

Lexie olhou para Lucan calmamente.

— Algum problema com o interfone, sr. St. Claire? Lucan apertou os lábios ao perceber o tom sarcástico.

— Reconheço que tivemos um mau começo, srta. Hamilton, mas vamos esclarecer as coisas, certo? — Ele a olhou friamente. — Ou seja, que, por enquanto, eu sou o patrão, e você, a empregada!

Lexie franziu as sobrancelhas e fez cara de inocente.

— Sou?

— Por enquanto, sim — ele repetiu. Lexie deu de ombros.

— Pelo visto, posso concluir que a Premier Person­nel confirmou que a minha substituta chegará dentro de três dias?

— Pode. Parece que até lá vamos ter que nos agüentar.

— Meus pêsames — disse Lexie com um sorriso. Lucan fez uma careta.

— Diga, Lexie. Esta tendência para ser desrespeitosa com os seus chefes é que faz com que você ache mais fácil trabalhar para uma agência em vez de procurar um emprego permanente?

Ela ficou vermelha de raiva.

— Meus motivos não são da sua conta, sr. St. Claire! Ele sacudiu os ombros vigorosamente.

— Eu estava apenas curioso, nada mais.

Assim como Lexie sempre estivera curiosa a respeito da família St. Claire...

— Garanto que não há nada na minha vida que possa lhe interessar, sr. St. Claire — ela falou com um ar de desafio.

— Você parece estar muito certa disto.

— Estou. — O que aquele homem diria se soubesse que sua avó era Sian Thomas, a viúva por quem Alexander St. Claire se apaixonara há 25 anos? A mesma mu­lher que a família St. Claire tratara com extremo despre­zo durante todos aqueles anos? Se Lucan percebesse que o seu nome completo, Alexandra, fora escolhido em ho­menagem ao "vovô Alex", como ela costumava chamar o pai dele durante os primeiros 16 dos seus 24 anos...!

 

Durante a maior parte de sua infância, Lexie ignorara a identidade de Alex: ele fora apenas seu avô. Quando chegara à adolescência, sua mãe calmamente lhe expli­cara a situação. Ficara sabendo que Alexander St. Claire na verdade era o duque de Stourbridge e que fora repu­diado pelos três filhos, após se divorciar de Molly St. Claire.

Lexie imediatamente resolvera que os irmãos St. Claire haviam tratado o pai de maneira abominável, simplesmente porque ele se apaixonara por sua bela e gentil avó, a quem nenhum deles se dera ao trabalho de conhecer. Se a tivessem conhecido, saberiam que Sian nada tinha da mulher fatal que acreditavam que ela fos­se. Também teriam percebido o quanto ela amava seu pai, e o quanto ele a amava. Embora o pai deles fosse o seu "vovô Alex", Lexie jamais conhecera algum dos irmãos St. Claire até a morte de Alexander, 8 anos antes, quando eles haviam providenciado o seu sepultamento e comparecido ao seu funeral na igreja de Stourbridge.

Lexie também fora ao funeral, revoltada pelo fato de que haviam deixado claro que a presença de sua avó não seria bem-vinda. Resolvera representar a família e ficara no fundo da igreja, sem ser percebida, chorando a perda de seu avô Alex. Depois de passar alguns anos procu­rando fotografias em revistas de negócios e jornais, ela facilmente reconhecera o frio e distante Lucan St. Clai­re. Também reconhecera seu irmão mais moço, o lindo e indiferente ator, Jordan St. Claire, o que fizera com que ela concluísse que o sério e atraente louro ao lado dele seria seu irmão gêmeo, Gideon. A avó de Lexie, a mu­lher que Alexander St. Claire amara e com quem vivera durante os últimos 17 anos de sua vida, não pudera ir ao funeral. Bastaria este motivo para que Lexie jamais perdoasse a família St. Claire. Principalmente, o chefe da família, Lucan, o homem que, com a morte do pai, se tornara o 15° duque de Stourbridge. Lucan jamais usara o seu título. Talvez, como uma forma de insulto ao pai que ele rejeitara há 25 anos.

O ressentimento brilhou nos olhos de Lexie, enquanto olhava para Lucan St. Claire.

— Posso ajudá-lo em algo mais, sr. St. Claire...?

Lucan não se enganava. Reconhecia que era frio e, às vezes, implacável, e que, a não ser com sua família, cos­tumava ser distante. Também tinha consciência de que sua fortuna e poder atraíam atrizes e modelos, indepen­dentemente da atração pessoal que ele pudesse ou não exercer. Sendo assim, a atitude indiferente de Lexie e o seu desprezo constituíam algo que ele nunca encontrara numa mulher. Muito intrigante.

— Você é sempre tão desrespeitosa? — ele perguntou irritado.

— Meus pais me ensinaram que o respeito não é dado: é algo que se conquista.

Lucan resmungou alguma coisa ininteligível.

— Quero que você participe da reunião das 10h e ano­te tudo.

— Bem, é para isso que você me paga — ela respon­deu com sarcasmo.

A pouca paciência de Lucan estava no fim.

— Se você mantiver esta atitude, só me restará ligar para a sua agência e explicar o quanto você é inadequa­da para este cargo ou para qualquer outro emprego — ele avisou friamente. Lexie reconheceu que estava deixando que o seu ressentimento por ele a dominasse. Afinal, ele era Lucan St. Claire, empresário mundialmente conheci­do, um homem tão rico quanto Creso e ainda mais pode­roso que este. A última coisa que Lexie desejava era que seus pais voltassem do cruzeiro e descobrissem que a reputação da Premier Personnel, que haviam solidifica­do ao longo de 20 anos de trabalho árduo, fora destruída nos poucos dias em que ela assumira a direção!

— Antes disso, você me daria algumas horas para pro­var que sou eficiente? — ela perguntou simplesmente.

Mesmo quando dizia as coisas certas, Lexie ain­da dava um jeito de parecer desafiá-lo, pensou Lucan.

Como se estivesse predisposta a não gostar dele... Ape­nas por achar que ele fora insensível com Jessica Brown? Ou seria por algum motivo inteiramente diferente? Con­siderando que Lexie Hamilton, sequer conhecera a sua assistente, o primeiro motivo não lhe parecia plausível. Talvez não fosse pessoal, e ela fosse espinhosa e dire­ta com todo mundo? Se conseguisse suportá-la durante três dias, talvez descobrisse. E ainda precisava resolver o que faria a respeito do telefonema de John Barton, co­municando o estrago em Mulberry Hall...

 

— Há algo de errado, sr. St. Claire? — Lexie perguntou duas horas depois, assim que Gideon saiu da sala para levar Andrew Proctor e seu advogado até o elevador.

— O que poderia haver de errado? — Lucan retru­cou com impaciência. Um nervo pulsava no seu queixo contraído. Ele deu a volta na mesa, olhando-a friamente. Lexie balançou a cabeça.

— Pensei que você levaria o sr. Proctor para almoçar, depois de assinarem os contratos.

— Proctor gostaria muito mais de almoçar com você do que comigo.

— Comigo? — Lexie repetiu espantada.

— Não se faça de inocente, Lexie. Você sabe muito bem o efeito que causou em Andrew Proctor — ele res­mungou.

— Admito que ri várias vezes das piadas do sr. Proctor...

— Riu inadequadamente de todas as piadas — Lucan corrigiu, irritado só de pensar na reunião que acabara.

Andrew Proctor era um simpático quarentão, proprie­tário de uma grande empresa de transportes que Lucan desejava anexar à St. Claire Corporation. O advogado de Proctor e Gideon já tiveram várias reuniões para negociar os detalhes da venda, e Lucan esperava que o encontro daquela manhã, durante o qual assinariam o contrato, iria transcorrer sem problemas. Claro que, ao fazer esta supo­sição, não levara em conta a presença de Lexie! Bastara Andrew Proctor dar uma olhada para a assistente de Lucan para mudar o tom da reunião. O homem começara a flertar com ela e esquecera a discussão do contrato que estava preparado para assinar. A situação em nada melhorara, quando Lucan percebera o interesse de Gideon por Lexie.

— Maldição! Só faltou você ir para a cama com aque­le homem!

Lexie arregalou os olhos, indignada.

— Creia, sr. St. Claire: quando eu vou para a cama com um homem, não é na frente de uma platéia!

Lucan conteve o fôlego diante da visão que a resposta lhe provocou. Lexie era clara como o marfim, e ele não duvidava que o seu corpo esguio deveria ser igualmente quase translúcido. Sua pele deveria ser macia e suave. Os seios empinados deveriam ser arrematados por mamilos rosados. O triângulo de pelos entre suas pernas de­veriam ter o mesmo tom escuros dos... Santo Deus! Ele perdera a cabeça? Natal na Escócia; casamento em Mul­berry Hall; o telefonema de Barton, de Gloucestershire. Tudo isso fora perturbador, mas não o bastante para con­fundir sua cabeça e fazer com que ele tivesse aqueles pensamentos eróticos em torno de Lexie. Confundir a cabeça? Era outra parte da sua anatomia que reagia à beleza exótica de Lexie.

— Não me interessa saber o que você faz ou não faz ao ir para a cama com alguém — ele respondeu severa­mente, mas não com completa sinceridade. — Só estou tentando sublinhar que seu comportamento amigável com Andrew Proctor tornou o que deveria ser uma reu­nião de negócios num completo fiasco.

Constrangida, Lexie percebeu que, em parte, Lucan tinha razão. Esperava-se que ela participasse discre­tamente da reunião, e não que deixasse que Andrew Proctor a envolvesse na conversa. E era o que teria feito, se não tivesse percebido o quanto Lucan ficava aborre­cido, toda vez que Andrew se dirigia a ela. Ela fez uma cara arrependida.

— Sinto muito ter me comportado de maneira pouco profissional esta manhã.

Lucan ficou admirado.

— O que foi que você disse?

— Acho que acabo de me desculpar — ela repetiu impaciente, concordando exatamente com o que Lucan pensava.

Aquilo fora inesperado. Tão inesperado que ele não sabia o que dizer ou fazer. Normalmente, não poderia ser acusado de ficar indeciso. O que havia de errado com ele, naquela manhã? Do ponto de vista profissional, Lu­can sabia que deveria telefonar para a agência e pedir que a substituíssem imediatamente ou procurar outra

agência. Mas, pessoalmente, queria fazer algo bem dife­rente... Ele tentou relaxar um pouco.

— É quase uma hora. Acho que seria melhor nós dois irmos almoçar...

— Juntos? — Lexie perguntou espantada.

— Sim, juntos — ele falou com ironia. — Talvez pos­samos estabelecer uma trégua enquanto comemos?

Seria pouco dizer que Lexie estava chocada com a sugestão. A não ser que Lucan estivesse lhe dando um ultimato, e não fazendo um convite... Isso poderia signi­ficar que faziam uma trégua ou ele cumpriria a ameaça de substituí-la, acabando com a reputação da Premier Personnel. Pessoalmente, Lexie ficaria mais que feliz em ir embora. Já fizera o que viera fazer ali: conhecer Lucan St. Claire e confirmar tudo o que achava a seu res­peito, incluindo algumas coisas que jamais haviam lhe ocorrido... Ou seja, que ele era perigosamente atraente... Infelizmente, se ele a mandasse embora, as repercussões não seriam nada favoráveis à Premier Personnel, e isto era algo que ela deveria ter considerado antes de agir im­pulsivamente e ter se aproximado da família St. Claire. Apesar de reconhecer que o belo e louro Gideon não era tão desagradável quanto Lucan. Gideon compartilhava a fama de frieza e de arrogância com o irmão, e ela es­perava que a tratasse com a mesma indiferença durante a reunião, mas ele fora encantador e demonstrara clara­mente o seu interesse por ela...

— Você geralmente demora tanto para responder a um convite para almoçar? — Lucan perguntou impaciente.

— Não, claro que não — disse Lexie ressentida, corando ao perceber que ele a olhava com um ar de zombaria. — Mas dificilmente isto foi um convite, não é? Foi mais como: está na hora do almoço, vamos almoçar!

Lucan ficou irritado. Ela precisava discutir tudo?

— Não vejo nada de errado. Está na hora do almoço, e nós precisamos comer.

— Não necessariamente juntos... — ela falou com firmeza.

Lucan fitou-a com um olhar ameaçador.

— Diga: esta antipatia é pessoal ou você trata todos os seus patrões com o mesmo desprezo?

Lexie ficou abalada. Uma coisa era tratar Lucan St. Claire com o desprezo que ela achava que ele merecia; outra era fazer com que ele ficasse curioso a respeito do motivo pelo qual ela o tratava daquele jeito, fazendo com que ele desconfiasse e acabasse descobrindo exata­mente quem era ela...

— Não é nada pessoal, sr. St. Claire...

— Lucan.

— O que disse?

— Estou lhe dizendo que pode me chamar de Lucan, Lexie — ele declarou. — Não me diga que isto tam­bém seria um problema...? — Ele franziu a testa ao vê-la olhando pára ele.

Claro que seria um problema! A última coisa que Lexie queria era se relacionar com qualquer pessoa da família St. Claire usando o primeiro nome!

— Prefiro manter o nosso relacionamento num nível estritamente profissional — ela disse secamente.

— E nos tratarmos pelo primeiro nome não seria fazer isto? — ele perguntou.

— Você sabe que não. Assim como eu almoçar com você.

Lucan ficou impaciente.

— Não vejo por que não.

Lexie olhou para ele, frustrada.

— Porque você está sendo deliberadamente irrespon­sável... — Ela calou a boca quando ele deu uma risada que afugentou toda a austeridade da sua expressão e ilu­minou os olhos escuros e sérios, suavizando a rigidez de seu queixo e revelando uma fissura do lado esquerdo do rosto. Ou seja, tudo que Lexie não queria ver quando se tratava daquele homem. Ela o olhou com um ar de cen­sura. — Não vejo nada de engraçado.

— Parece que, mesmo quando você tenta ser educada, acaba sendo grosseira.

Lexie se arrepiou toda.

— E você acha isto engraçado?

— Na verdade, não. — Ele balançou a cabeça. — Nunca conheci ninguém como você.

Lexie não sabia se ficava sossegada com o tom bran­do com que ele falara ou com o jeito pensativo com que ele a olhava. Um jeito muito masculino de avaliá-la. A avaliação de um homem bonito que olhava para uma mulher que ele achava atraente... De jeito nenhum! Sem essa! Lucan St. Claire e seus irmãos haviam abandonado o próprio pai, depois que este se separara de sua mãe. Haviam se recusado a conhecer a mulher que seu pai amara e com quem passara o resto de sua vida. Le­xie reconhecia que o divórcio dos pais deveria ter sido muito difícil para os três meninos. Mas, justamente por serem jovens, eles não deveriam conhecer todos os detalhes da situação. Não mais do que ela, que ain­da nem havia nascido naquela ocasião. Não, ela não queria saber. Toda a família St. Claire tratara o avô Alex e sua avó de maneira abominável, e, por isto, to­dos mereciam ser desprezados. Seria melhor que ela continuasse a pensar daquele jeito. O problema é que naquela manhã ela percebera que Lucan St. Claire era perigosamente bonito e atraente.

Lucan observara as emoções se sucederem no rosto expressivo de Lexie. Vira, mas não entendera, o que não parecia nada extraordinário, já que ele não compreendia quase nada a respeito daquela mulher. Por alguma razão inexplicável, sentia-se atraído por ela. Sua beleza exte­rior era inegável, mas era o que ele não sabia sobre ela, as coisas que não entendia, que o deixavam intrigado. E, para ser totalmente sincero, Lucan reconhecia que este fora o motivo pelo qual ficara tão irritado ao ver Andrew Proctor flertar com Lexie. Ele se empertigou abruptamente.

— Pelo que entendi, você prefere não almoçar?

— Não é bem isto, eu só não quero...

— Almoçar comigo? — ele adivinhou facilmente.

— É.

Lucan precisou conter o riso. Nenhuma mulher o de­sarmava com a facilidade de Lexie. E os golpes que ela lhe dava o deixavam mais animado do que aborrecido, por saírem dos seus lábios sensuais...

— Pensei que você gostaria de almoçar antes de par­tirmos, mas, se você prefere, podemos comer mais tarde.

— Antes de partirmos para onde? — Lexie perguntou desconfiada, não gostando nada do brilho de satisfação que via nos olhos de Lucan, olhos que a fitavam com irônica inocência.

— Eu esqueci de mencionar que vamos sair da cidade por dois dias?

Depois de participar da reunião e de observar a preci­são com que ele tratava seus negócios, lembrando-se de cada quantia ou detalhe sem consultar um papel, Lexie duvidava que ele esquecesse algo. Também deixara de acreditar que ele não se lembrava do nome da ex-assistente. A explicação mais lógica para o seu esquecimento é que moça deveria ser tão insignificante para Lucan que ele não se dera ao trabalho de aprender o seu nome. E ele não parecia ter o mesmo problema com ela.

— Esqueceu — Lexie murmurou.

— Consegui falar com Barton e, depois de pensar um pouco, resolvi que deveria ir a Gloucestershire para re­solver o problema pessoalmente.

Lexie sentiu o coração se encolher.

— E o que eu tenho a ver com isso? Lucan olhou para ela com satisfação.

— Pensei que seria óbvio, Lexie.

— Explique-me, sr. St. Claire — ela falou, trincando os dentes. Ele sacudiu os ombros.

— Durante os próximos três dias, você trabalha para mim. Preciso ficar em Gloucestershire durante este tem­po para verificar os danos e providenciar o conserto da casa. É óbvio que eu espero que a minha AP temporária temporária... ou seja, você... me acompanhe.

Lexie ficou muito pálida e olhou para ele admirada. Lucan queria que ela o acompanhasse a Gloucestershire? A Mulberry Hall? Ao ducado dos St. Claire, em Stourbridge? Ao lugar onde sua avó ainda morava?

 

Lucan não pôde deixar de notar a reação de Lexie quando ele lhe contou o plano de passarem dois dias em Gloucestershire. Seu olhar se tornara sombrio, assustado e ela ficara muito pálida. Era evidente que sentia aver­são à propriedade da família, motivo pelo qual resolvera levar consigo aquela mulher intrigante. Mas ele não via por que ela parecia sentir o mesmo. A não ser que tivesse algum compromisso pessoal com um namorado ou um amante, que a obrigasse a permanecer na cidade.

— Seria um problema para você? — ele perguntou secamente.

Se isto seria um problema? Lexie mal podia enume­rar os problemas que teria ao ir para Stourbridge com Lucan, o chefe da desprezível família St. Claire. Claro que visitara o condado de Stourbridge durante muitos anos, para ver a avó e o avô Alex. Enquanto criança, sempre fora com os pais. Mais tarde, acostumara-se a ir sozinha. O condado era um lugar encantador, forma­do por chalés cheios de charme, e ela sempre gostara de passar algum tempo com sua avó. Isto fazia sentido. Mas chegar perto de Stourbridge, um vilarejo onde qua­se todos a conheciam desde pequena, junto com Lucan St. Claire, seria pedir para ter problemas. Ah, em que confusão se metera... E a confusão se tornara maior do que Lexie imaginara ao ceder à própria curiosidade! Tentou engolir, mas teve dificuldades e evitou olhar di­retamente para Lucan, fitando um ponto acima do seu ombro.

— Não posso simplesmente sair de Londres de re­pente...

— Eu já chequei com a sua agência. Um item do seu contrato estabelece que você concorda em acompanhar o seu chefe durante viagens de negócios — Lucan decla­rou friamente.

Lexie trabalhara com os pais na agência durante os últimos três anos e sabia exatamente o que o contrato da Premier Personnel dizia em relação às exigências dos empregadores. Como filha dos donos da agência, aquele era um contrato que ela não assinara, mas claro que não poderia deixar que Lucan soubesse.

— Seus motivos para ir a Gloucestershire parecem ser mais pessoais que profissionais — ela falou com firmeza.

— Corrija-me se eu estiver errado — ele falou num tom paciente que demonstrava exatamente o contrário. — Creio que AP significa Assistente Particular...?

— Sim, mas...

— Neste caso, como você é minha AP, espero que me acompanhe a Gloucestershire.

— Eu discordo...

— E você acha que a sua opinião é relevante para mim? — Lucan interrompeu com grosseria.

Lexie olhou para ele e viu que os seus olhos chispavam, o seu queixo estava rijo e que ele apertava os lábios.

— Não — ela admitiu com esforço. — Mas certamen­te esta viagem pode esperar até que a minha substituta chegue, na quinta-feira...? — ela disse alegremente.

— Não pretendo mudar os meus planos para satisfazê-la, Lexie — ele respondeu. — Se isso a faz sentir melhor, pretendo levar uma pasta cheia de trabalho.

— Ah. — Ela fez uma cara de desânimo. Lucan deu um sorriso seco e falou em tom altivo.

— Espero você aqui, dentro de uma hora, de malas prontas.

Lexie entrou em pânico. Não podia ir com ele. Sim­plesmente não podia! O chalé de sua avó ficava apenas 800 metros distante de Mulberry Hall, a majestosa man­são do ducado dos St. Claire. Quando criança, ela brin­cara em seu bosque, percorrera as redondezas com sua avó e com o avô Alex, nadara na piscina coberta, nos fundos da casa.

Nunca estivera abertamente em Mulberry Hall. Sua avó sempre se recusara a viver lá com Alexander, mes­mo depois que ele se divorciara. Entretanto, bastaria uma escorregadela, um comentário que revelasse que ela entrara na casa ou no terreno, para que Lucan lhe pedisse uma explicação que ela não tinha a intenção de lhe dar. Lexie se sentia presa numa teia de aço embaraçada, es­perando que ela se fechasse à sua volta.

— Realmente preferia não ir com você a Gloucestershire...

— Neste caso — ele interrompeu —, estou certo de que, para sua própria segurança, a Premier Personnel não terá escolha a não ser dispensá-la de seus serviços.

— Está me ameaçando, sr. St. Claire? — Lexie re­trucou, sabendo o que isto significava. Aquele homem tinha poder e influência para arruinar a reputação da Premier Personnel no mundo dos negócios com poucas palavras. Deveria ter pensado nisso antes.

— Ainda não comecei a ameaçá-la, Lexie — ele ga­rantiu sucintamente.

Não havia como se iludir com o olhar implacável de Lucan — um indício de que ele estava resolvido a obter o que queria. Lexie só não entendia por quê. Por que ele estava tão decidido a levá-la a Gloucestershire, quando era evidente que não queria ir? Talvez este fos­se exatamente o motivo para ele insistir em levá-la?

Era um homem duro, frio, implacável. Um homem acostumado a que as pessoas fizessem tudo que ele de­sejava. Um homem insistente, convincente. Lexie não tinha dúvidas de que estava fazendo com que Lucan se tornasse mais determinado em submetê-la à sua vonta­de de ferro. Fora muito tola ao se colocar — e à Pre­mier Personnel — numa situação em que nada podia fazer para detê-lo.

Ela olhou para ele com um brilho aborrecido nos olhos.

— Uma hora. Foi o que você disse?

Lucan não sentiu nenhum prazer por tê-la submetido à sua vontade. Ele não conseguia imaginar o que Lexie havia pensado enquanto decidia se iria ou não fazer o que ele exigia, mas, fosse como fosse, não parecia ter sido nada agradável.

Não conseguia entendê-la, o que era raro: todas as mulheres que conhecia queriam dormir com ele ou le­vá-lo para o altar, geralmente de olho no poder e na for­tuna que ele amealhara nos últimos dez anos.

Lexie Hamilton não se comportava como se estivesse impressionada com ele nem com sua fortuna. Ou seja, ela o tratava com um profundo desprezo que, ao con­trário do que claramente esperava, só fizera aumentar o seu interesse. E isto o levara a desejar a sua companhia, mesmo que de má vontade, durante a sua segunda visita forçada a Mulberry Hill, em poucos dias.

— Uma hora — ele confirmou bruscamente.

— Você quer que eu confirme os horários de trem?

— Pretendo ir de carro — Lucas respondeu. — Nor­malmente usaria o helicóptero da empresa, mas ele está ocupado no momento.

Os St. Claire realmente formavam uma classe espe­cial, Lexie concluiu. Super-ricos e superpoderosos. Ela se perguntou como sua avó, tão simples e gentil, havia se apaixonado pelo chefe da poderosa família!

— Como eu sou boba!

— Você deve levar agasalhos e...

— Creio que sou inteligente o bastante para saber — ela interrompeu irritada.

— Não creio haver lhe dado motivo para pensar que acho que lhe falta inteligência, Lexie — Lucan garantiu secamente.

— Até agora — ela desafiou.

— Isto nunca — ele a corrigiu.

Lexie o olhou desconfiada e um tanto nervosa pelo seu tom de voz e pelo que via nos seus olhos. Deus do céu! Viajaria com ele por dois dias e estaria constante­mente em sua companhia...!

— Estarei de volta dentro de uma hora — ela decla­rou. Antes ela deveria passar no escritório da Premier Personnel e explicar a situação a Brenda. Explicar uma situação que não conseguia explicar a si mesma...

 

— Coloque seu cinto de segurança — Lucan advertiu ao ligar o motor do seu Range Rover preto. Ao voltar para o escritório uma hora antes, carregando um casaco com­prido de lã e uma mala, Lexie parecia perturbadoramente atraente. Vestia um suéter azul no mesmo tom de seus olhos e uma calça jeans que se colava às suas nádegas e pernas, antes de sumir dentro de um par de botas de couro, de cano longo. Prendera os longos cabelos negros numa trança que lhe descia pelas costas, revelando os brincos de pérolas pendurados em suas orelhas. Um me­dalhão de ouro brilhava sobre o suéter.

Confinado dentro do carro com Lexie, Lucan estava bem consciente do seu perfume sutil, que se misturava com um aroma ainda mais sutil e provocante de mulher. Aquela figura frágil e extremamente feminina ao seu lado seria, como ele esperava que fosse, uma distração para o fato de ele estar indo para Mulberry Hall.

No entanto, Lucan sabia que nada, nem ninguém, fa­ria com que ele se sentisse relaxado ao voltar à casa onde passara onze anos de sua vida.

Durante o casamento de Jordan há quase uma semana, Lucan havia percebido que a casa mudara muito pouco, desde a última vez que ele estivera ali. E não havia razão para que ela tivesse mudado. Os móveis e as cortinas eram antigos, o piso do primeiro andar era de mármore e os quadros pendurados eram originais, assim como as estátuas e os imponentes lustres de cristal veneziano.

Não havia dúvida que Mulberry Hall era uma linda casa, acolhedora. Uma casa adequada para o duque de Stourbridge, o título que atualmente carregava.

E isto era outra coisa em que ele evitara pensar duran­te os últimos 8 anos.

Como filho mais velho de um casamento desfeito, Lu­can achara fácil culpar Mulberry Hall e todas as exigências que o título de duque acarretava, assim como o caso de seu pai com Sian Thomas, pela separação de seus pais e pelo abismo que se abrira em sua vida e na de seus irmãos. Ele resolvera evitar Mulberry Hall, seu pai, o título de duque e, acima de tudo, Sian Thomas, a mulher que Alexander amara tanto e por quem sacrificara toda a família...

Depois que as coisas haviam se acalmado e que o di­vórcio fora assinado, Alexander tentara fazer com que seus filhos conhecessem Sian Thomas. Seus esforços haviam sido em vão, e eles haviam se recusado a conhe­cer a mulher que fora responsável pela separação e pelo divórcio de seus pais. Maldição!

Lucan não voltaria àquele lugar se John Barton não tivesse declarado claramente que ele deveria ver pesso­almente os estragos.

Insistira que Lexie Hamilton viesse com ele, na espe­rança de que a sua língua afiada servisse para distraí-lo de pensamentos amargos e perturbadores, pelo menos até que estivessem em Gloucestershire e não houvesse mais como evitá-los.

Lucan olhou para Lexie e viu que ela olhava pela janela enquanto saíam de Londres. Provavelmente deveria estar apreciando a maravilhosa brancura que cobrira a Inglaterra depois da última nevasca, dois dias antes. As estradas esta­vam limpas, mas o campo se encontrava coberto por uma grossa e bela camada prateada. Quando Lexie se voltou para ele, os seus lindos olhos azuis brilhavam de prazer.

— Tudo parece tão lindo coberto de neve, não acha?

— É como esconder os buracos da vida e esperar que ninguém note — ele falou com ironia.

Lexie franziu a testa ao perceber que ele estava tenso.

— Não precisa ser assim.

— Não me diga que você é uma daquelas pessoas que sempre vê o copo meio cheio, nunca meio vazio — ele falou com um suspiro. Ela percebeu o deboche e corou.

— É melhor do que ser cínico!

— Prefiro pensar que sou realista — ele resmungou.

— O que é um jeito mais gentil de dizer que você é cínico.

— Não acredito que a gentileza seja seu forte, Lexie!

— Nem o seu! — ela retrucou acidamente.

— Tem razão — Lucan murmurou gentilmente.

— Não me diga que concordamos em algo...?

— É incrível, mas parece que sim — ele disse em tom áspero.

— Uau!

— É, uau. — Lucan repetiu. — Será uma longa via­gem, Lexie. Por que não ocupa o tempo me contando algo a seu respeito?

Lexie ficou assustada. Lucan queria que falasse o quê? Sobre quem eram seus pais? Sua avó? Toda a sua vida era um campo minado de fatos que, se revelados, fariam com que ele parasse e a jogasse para fora do car­ro, em plena estrada! O que, considerando as circunstân­cias, não seria uma má idéia... Ela umedeceu os lábios.

— Em vez disso, por que você não me fala sobre você?

— Talvez devêssemos apenas ouvir uma música.

Lexie respirou aliviada ao ver que Lucan não iria in­sistir no assunto, mas achou interessante que ele se mos­trasse tão relutante para falar sobre sua vida quanto ela. Ela se perguntou qual seria o motivo. A vida de Lucan St. Claire, empresário milionário, deveria ser um livro aberto... E talvez a sua vida profissional realmente fosse, mas quando se tratava da sua vida pessoal, preferia man­ter certas coisas em segredo. Ela imaginou que coisas seriam: talvez uma mulher...?

Observou-o disfarçadamente. Realmente ficaria me­lhor se usasse os cabelos pretos mais compridos, e o bri­lho dos seus olhos ao fitar a estrada era desconcertante, mas isto não invalidava o fato de que ele tinha um rosto atraente e bonito. Quanto à firmeza do seu corpo... Ah, por favor! Lexie se encolheu com terror. Ela só queria conhecer Lucan St. Claire. Ver pessoalmente como ele era frio e implacável. Sentir-se atraída por ele não fazia parte do seu plano, assim como acompanhá-lo até Mulberry Hall.

: Que tipo de música você gosta?

Lexie pestanejou antes de conseguir encará-lo.

— Principalmente, clássica. Ele levantou as sobrancelhas.

— É mesmo?

— Sim, é mesmo — ela confirmou secamente. — Você imaginou que eu iria gostar de rock ou algo assim? — ela perguntou ofendida.

— Não. Só estou surpreso por gostarmos do mesmo tipo de música. — Ele ligou o rádio e o carro foi invadi­do pelo som de Mozart.

Tinha que ser Mozart, o compositor favorito de sua avó. Quando era pequena, Lexie costumava passar as férias de verão com a vovó Sian, enquanto seus pais trabalhavam. Durante aquelas semanas, Mozart não parava de tocar no CD player que sua avó mantinha na cozinha. Na cozinha do chalé onde ainda vivia, a 800m de Mulberry Hall... Lexie começou a se sentir enjoada.

— Quando chegarmos a Gloucestershire, talvez você descubra que os estragos não são tão grandes quanto o sr. Barton pensa, e nós poderemos voltar à cidade ama­nhã...? — ela perguntou esperançosa.

Lucan olhou para ela, intrigado ao sentir que havia algo de desesperado em sua voz. Talvez fosse porque ela não quisesse passar dois dias em Gloucestershire com ele? Talvez ela precisasse voltar para algo ou alguém em Londres, o mais rápido possível? Para ele, as duas expli­cações não eram satisfatórias.

— E talvez eu descubra que é pior do que eu pensava e que nós vamos precisar ficar a semana inteira — ele falou com ironia. Lexie arregalou os olhos, desanimada, mas logo se controlou. — Você tem algum compromisso pessoal que a impeça de sair da cidade?

— Compromisso pessoal?

— Um marido, um amante, um namorado?

— Claro que não — Lexie respondeu irritada. Lucan relaxou um pouco.

— Tenho certeza de que você já deve ter viajado a trabalho com algum patrão.

— Bem... Eu... Claro. — Ela parecia constrangida. — É que... Eu deveria trabalhar para você durante apenas três dias.

— Estou certo de que a sua agência vai entender se houver algum motivo que atrase nossa volta — ele res­mungou de má vontade.

— Duvido que eu entenda! — ela disse revoltada.

Lucan ficou irritado com as reclamações de Lexie. Maldição, o seu ano novo já começara mal o suficiente, sem que... Ele reconheceu que precisava redirecionar a sua raiva. Não que Lexie não fosse irritante, mas sabia que o seu mau humor se devia à própria frustração e ao aborrecimento de ter que voltar a Mulberry Hall. Não fosse isso e já teria colocado aquela mulher em seu lu­gar, sem piedade, friamente. O problema é que Lucan não sabia muito bem qual seria o lugar de Lexie. Talvez, esticada em sua cama, nua, com os gloriosos cabelos es­palhados sobre os travesseiros, enquanto ele lhe explora­va o corpo macio com as mãos e os lábios. Aquele era o melhor lugar onde ele conseguia imaginá-la...

Lucan se remexeu no assento ao sentir que ficava ex­citado só de se imaginar beijando cada pedacinho macio do corpo de Lexie.

— Como creio ter deixado claro várias vezes, suas necessidades não me importam neste caso.

Lexie fungou e balançou a cabeça, desgostosa.

— Com uma atitude tão egoísta como esta, não sei por que você ficou surpreso por Jessica Brown ter ido embora sem avisar!

Lucan deu um sorriso fingido.

— Que pena que você não esteja em posição de fazer o mesmo...

— Não é? — Lexie retrucou em voz doce. Aquele homem era odioso, arrogante, frio, zombeteiro. E tão diabolicamente atraente que a fazia perder o fôlego... O que não iria ajudá-la a enfrentar os próximos dois dias...

 

— Bem — disse Lucan depois de sair do carro, vestir um pesado casaco e de dar a volta para abrir a porta para Lexie. Ela saiu lentamente do carro, com o coração batendo como um tambor, e observou a grandeza de Mulberry Hall, que se destacava contra o terreno coberto de neve de Stourbridge. Uma casa e um terreno que ela conhecia muito mais do que queria que ele soubesse. Lexie se vol­tou para Lucan bruscamente.

— Bem o quê?

Ele levantou as sobrancelhas com ironia.

— Pela minha experiência desde que a conheci, você sempre tem algo a dizer a respeito de tudo...

Lexie manteve uma expressão indiferente e olhou no­vamente para a casa.

— Aposto que a conta de luz é altíssima!

Lucan soltou uma gargalhada absolutamente espon­tânea, o que surpreendente-mente ocorrera várias vezes enquanto estava com ela e que ele reconhecia ser algo raro para um homem conhecido mais por sua frieza que por seu senso de humor. E era ainda mais raro que Lexie não tivesse feito algum comentário incisivo sobre a evidente e exclusiva grandiosidade de Mulberry Hall...

— Não deveríamos entrar? — ela perguntou.

— Está na hora de avaliar os danos — Lucan concor­dou. Ele a segurou firmemente pelo braço e olhou para o encerado que havia sido colocado temporariamente sobre o telhado da ala oeste da casa. — Não quero que você caia e quebre uma perna — ele disse com ironia ao vê-la fazer uma careta.

— Eu poderia processá-lo? — ela provocou.

— Do jeito que este ano começou, seria uma possibi­lidade. — Lucan a segurou, quando Lexie escorregou no degrau congelado da entrada. O movimento fez com que ela se voltasse e se amparasse no seu peito.

Lexie conteve o fôlego ao sentir o calor dos braços de Lucan em torno do seu corpo. Sentiu a firmeza do seu peito contra os seios, e a força dos músculos de suas pernas contra os de suas próprias pernas, mais suaves. O tempo pareceu parar em torno deles. No dia anterior houvera uma nevasca que cobrira o jardim e que parecia envolvê-los num silêncio sobrenatural.

Lexie levantou a cabeça e se arrependeu imediata­mente ao se sentir prisioneira do olhar intenso de Lucan. O ar em torno deles se tornou carregado, tempestuoso, e ela não conseguia desviar os olhos. De perto, ela podia ver a profundidade dos olhos cor de chocolate amargo, cercados por um halo negro.

Olhos escuros e irresistíveis. Olhos onde ela sabia que poderia se afogar. Olhos que se tornaram cor de chocola­te derretido enquanto ela continuava a fitá-los. Olhos que de repente se aproximaram, quando ele inclinou a cabe­ça, aproximando a boca firme e sensual de seus lábios.

Lexie se inclinou para trás bruscamente, antes de sol­tar o braço da mão de Lucan.

— Você realmente não deve fazer isto! — ela avisou.

— Não devo?

— Não — ela retrucou, apoiando-se na parede ao sentir-se escorregar novamente.

Lexie podia ter todos os motivos para desprezar Lucan St. Claire, mas não tinha nenhuma dúvida de que, se ele a beijasse, ou seja, se beijasse a neta da detestada Sian Thomas, ele teria motivos para se odiar também. Pensou que seria uma ironia se ele se sentisse atraído pela única mulher do mundo por quem jamais deveria ficar interessado.

— Acha que pode abrir a porta para sairmos do frio? — ela perguntou com impaciência.

Lucan soltou um suspiro, percebendo que respirava pela primeira vez, depois de vários minutos. Durante o tempo em que tivera o corpo macio de Lexie colado ao seu...

Os seios firmes sob o suéter lhe pressionando o peito, os quadris apertados nos jeans colando-se à evidência da sua excitação. A boca de Lexie, de lábios provocantes e úmidos, entreaberta num convite provocante. Um con­vite que ele teria ficado feliz em aceitar... E aceitaria se Lexie não tivesse se afastado tão abruptamente!

Por alguns momentos foi agradável pensar em passar os próximos dias — e noites — dedicando-se ao apetite que Lexie lhe despertara, em vez de lidar com o motivo real que os levara até ali. Não havia como escapar do fato de que Mulberry Hall estava diante dele, com toda a sua imponência.

— Claro — disse Lucan, subindo os dois últimos de­graus. Ele hesitou e respirou profundamente, antes de abrir a porta.

Da entrada, observou o piso de mármore do saguão e sentiu um leve cheiro de mofo que não existia na se­mana anterior, o que indicava que o dano causado pela água, visível no telhado, também afetara o interior da casa, exatamente como John Barton relatara. Para ser mais preciso, afetara a ala oeste, onde estava pendurado o maldito retrato de seu pai. Com alguma sorte, o quadro seria uma das coisas que haviam se estragado!

— Lucan...? — Lexie balbuciou ao vê-lo parado na porta, aparentemente tão relutante quanto ela em entrar.

— Desculpe. — Ele se afastou para lhe dar passagem. Dentro de casa estava mais quente, mas só um pouco.

— Realmente, alguém ainda mora aqui? — Lexie per­guntou, tremendo de frio e se encolhendo dentro do casaco.

— Há muitos anos que não — ele disse sem entona­ção, por detrás dela e fechando a porta. — Espere por mim aqui, vou até os fundos para ligar o aquecimento. — Sem esperar resposta, virou-se e saiu do saguão.

Lexie não pretendia mesmo responder. Estava tão ner­vosa quanto Lucan parecia estar por voltar a Mulberry Hall. Ela se envolveu no casaco e examinou o ambiente familiar. Não ia até Mulberry Hall desde que o avô Alex morrera há 8 anos. Nada parecia ter mudado desde então.

O enorme candelabro veneziano ainda estava pendura­do no teto, e as duas portas que davam para o saguão se abriam, uma para a linda sala de estar e outra para a espa­çosa sala de jantar e a mesa de carvalho para doze pessoas.

A porta oposta à entrada dava para o que já fora um salão de baile todo espelhado, grande o bastante para acomodar cem convidados, mas que se transformara em salão de jo­gos e de ginástica. Naquela sala, o avô Alex ensinara a pe­quena Lexie, de 9 anos, a jogar pingue-pongue e bilhar, en­quanto uma indulgente vovó Sian os observava comovida...

Lexie sentiu um nó na garganta e uma pontada de triste­za lhe atingiu o peito, enquanto ela recordava as risadas que enchiam a casa naquela época. As mesmas risadas e o mes­mo amor sempre presentes quando o vovô Alex e a vovó Sian estavam juntos. A mesma harmonia da qual Lucan St. Claire e sua família jamais haviam desejado participar.

O mesmo Lucan St. Claire que, minutos antes, estivera a ponto de beijá-la. Ela, a neta da mulher que ele e sua família tanto detestavam... Mais uma vez, Lexie estreme­ceu. Não tinha dúvidas a respeito do ódio que Lucan sen­tiria se soubesse quem era ela.

— Logo estará mais quente — disse Lucan voltando ao saguão. Ele contraiu a testa ao ver que Lexie se sobressaltara e que tinha um brilho assustado nos olhos. — Que eu saiba, não temos nenhum fantasma na família — ele zombou.

— Muito engraçado! — ela falou em tom ácido.

— Acho que eu jamais fui reconhecido por meu senso de humor, Lexie.

— Imagino por que não! Existe algum chá ou café na cozinha que possa nos aquecer?

Lucan olhou para ela com ironia.

— Tem certeza que fazer bebidas quentes faz parte das funções de uma AP temporária temporária?

— Provavelmente não — disse Lexie secamente. — Mas estou disposta a conceder uma exceção.

— É muito gentil de sua parte — disse Lucan, con­tendo uma risada.

— Também acho.

Lucan não pôde deixar de admirar a atitude de Lexie. Embora a família tivesse passado vários dias ali no fi­nal do ano, havia muito tempo ninguém morava na casa. Como conseqüência, não era nada acolhedora. Não havia empregados. Apenas o administrador e sua esposa, que de vez em quando vinham verificar se estava tudo bem. Muitas mulheres — a maioria das que Lucan conhecera nos últimos 10 anos — achariam o ambiente inadequado, ou mesmo precário, e pediriam para serem levadas para um hotel. Lexie evidentemente era de outra natureza.

— Com certeza há café e chá, mas não leite — ele disse.

— Café puro será ótimo — Lexie garantiu friamente, caminhando na direção dos fundos da casa. De repente, percebeu o seu erro e parou. — Eu... Ah. Presumo que a cozinha seja nos fundos?

— É a porta no fundo do corredor — Lucan informou, seguindo-a.

Enquanto preparava o café, Lexie estava bem cons­ciente de que ele estava atrás dela, assim como estava consciente de que quase se beijaram, de que, por alguns segundos, ela quis que ele a beijasse. Admita, Lexie, Lu­can é diferente de qualquer homem que você conhece. Arrogante, seguro, extremamente bonito e, acima de tudo, poderoso. Por Deus, ele era um duque. Só este era um afrodisíaco mais poderoso que todos os outros...

Os movimentos de Lexie eram tão controlados e ten­sos que ela reparou que se perdera em pensamentos e não notara que Lucan a observava com os olhos semicerrados enquanto ela abaixava para pegar o café no armário, abria uma gaveta para pegar uma colher e enchia o coador. Porque ali sempre estiveram o café e os talheres...

— Vai demorar alguns minutos. Se você tiver outra coisa para fazer... — Lexie sinceramente esperava que o ditado "a melhor defesa é o ataque" estivesse certo.

Lucan ficou admirado ao perceber que gostara de acompanhar os movimentos das mãos finas e delicadas de Lexie ao preparar o café, imaginando o intenso pra­zer que ele próprio sentiria ao ser acariciado por elas. Inferno! Seria a melhor descrição do constante estado de excitação em que estava!

— Vou buscar a bagagem no carro. — Ele esperava que o gelo não apenas esfriasse sua excitação, mas que também o livrasse das imagens eróticas que teimavam cm lhe surgir na cabeça.

Lexie esperou que ele saísse da cozinha e o barulho da porta da frente se fechando, para fechar os olhos e se apoiar em um dos armários. Não era muito boa em fin­gir. Estavam havia poucos minutos em Mulberry Hall, e ela já escorregara duas vezes: sabia onde era a cozinha e onde estava o que havia dentro dela.

Talvez fosse bom ela nunca ter morado ali realmen­te. Os quartos e as salas do andar de cima seriam um completo mistério! Só de pensar nos quartos lembrava o quanto desejara que Lucan a beijasse poucos minu­tos antes. Não deveria estar atraída por ele. Não deveria. Não podia estar atraída por ele!

Lucan era um St. Claire. Pior, era o chefe da famí­lia. Da mesma família que magoara e rejeitara a sua amada avó Sian havia tantos anos, e definitivamente havia 8 anos, quando tinham deixado bem claro que ela não deveria pensar em comparecer ao funeral do avô Alex.

Lexie endireitou o corpo, de forças renovadas. Odia­va toda a família St. Claire pelo modo como havia trata­do sua avó. E isto incluía Lucan. Principalmente, o frio e arrogante Lucan! Só que ele nada tivera de frio ao olhar para ela fixamente. Quando Lexie fitara aqueles olhos intensos, sentira-se à beira de um vulcão e soubera que, se caísse em suas profundezas fumacentas, o calor pode­ria queimá-la, envolvê-la completamente.

Ainda sentia os seios endurecidos e sensíveis, os mamilos intumescidos e doloridos, dentro do macio sutiã. Ainda sentia um calor entre as pernas, uma queimação.

Imaginou o que sentiria se ele lhe sugasse os seios com aquela boca firme e bem-feita.

— Brr, está um gelo lá fora... Desculpe, pensei que fosse Lucan! — O homem que acabara de entrar pela porta dos fundos balbuciou uma desculpa embaraçada ao dar de cara com Lexie. Não era difícil adivinhar que o homem alto, grisalho, de cinqüenta e poucos anos, deveria ser John Barton, o administrador de Mulberry Hall. O mesmo homem que falava com um leve sotaque escocês, e com quem ela conversara pelo telefone, na­quela manhã. Um homem que ela não reconhecia, e que, graças a Deus, também não a reconheceria!

— É compreensível, já que nos parecemos tanto — ela brincou enquanto ele colocava uma caixa que trou­xera sobre um dos balcões da cozinha. Ele deu um sor­riso maroto, olhou-a com amigáveis olhos azuis e abriu o casaco.

— Lucan não disse que traria mais alguém... — Ele a olhou com curiosidade. — Sou John Barton, o adminis­trador — ele falou, estendo a mão.

— Lexie — disse ela, cumprimentando-o e sendo propositalmente resumida. Quanto menos pessoas sou­bessem que Lexie Hamilton viera com Lucan até Mul­berry Hall, mais segura ela estaria. — Sou Assistente Particular do sr. St. Claire — ela disse com displicên­cia. — Temporariamente — acrescentou com firmeza e sem necessidade. De alguma forma precisava se sentir mais segura, depois do que acabava de pensar a respei­to de Lucan, depois de ter imaginado como seria ser acariciada por seus lábios, por sua boca... Pare, Lexie!, ordenou a si mesma. Pare agora mesmo! — Estou fa­zendo café, mas, se quiser encontrá-lo, o sr. St. Claire foi lá fora buscar nossa bagagem. — A curiosidade que via nos olhos de John Barton dizia que ele preferia ficar na cozinha e saber algo sobre ela em vez de procurar seu patrão. O homem sorriu.

— Minha esposa mandou alguns mantimentos para vocês. — Ele apontou para a caixa sobre o balcão. — Leite, pão e manteiga, queijo, coisas assim. Teria trazi­do mais cedo, mas Lucan não me disse a que horas iria chegar.

— Que surpresa! — Lexie resmungou secamente, cruzando a cozinha para examinar a caixa. Além dos mantimentos que John mencionara, também havia uma travessa coberta de plástico e com uma aparência apetitosa, que parecia ser algum tipo de ensopado de carne. Os olhos de Lexie brilhavam quando ela se voltou para John Barton. — Por favor, agradeça à sua esposa...

— Cathy — informou John Barton.

Lexie fizera amizade com uma garota chamada Cathy, quando era criança e morava no vilarejo. Não fora o tipo ,de amizade que as levara a manter contato depois que haviam ido para a universidade, aos 18 anos, mas fora o suficiente para que sua avó tivesse lhe mandado uma carta, no ano anterior, informando que Cathy se casa­ra. Entretanto, não havia motivo para pensar que seria a mesma Cathy. Com certeza, a esposa de John Barton seria tão escocesa quanto ele...

— Vocês dois são daqui? — Lexie perguntou casual­mente enquanto tirava os mantimentos da caixa.

— É evidente que eu vim da Escócia — disse John Barton sorrindo. — Cathy nasceu aqui mesmo, no vi­larejo — ele acrescentou todo feliz. — Espero que ela possa vir cumprimentá-los amanhã...

— Não creio que o sr. St. Claire pretenda ficar por muito tempo — Lexie interrompeu rapidamente. Santo Deus, pelo visto, era a mesma Cathy! A moça loura, de olhos verdes, que Lexie sabia que seria uma adorável esposa para John Barton, assim com ele deveria ser um ótimo marido para ela.

— Disse que provavelmente passaríamos dois dias aqui, Lexie.

Ela se voltou bruscamente e engoliu em seco ao ver Lucas parado na porta, encarando-a com um olhar de desafio.

— O sr. Barton gentilmente nos trouxe leite e outros mantimentos.

— Apenas o básico — explicou o homem, atravessan­do a cozinha. — Sinto muito que esse problema o tenha feito voltar tão cedo, Lucan.

— Não faz mal, John — Lucan mentiu, apertando a mão de John Barton. — Pensei em levar Lexie para jantar no Rose and Crown. Espero que eles ainda estejam servindo refeições... ?

— A esposa do sr. Barton fez a gentileza de nos man­dar um ensopado para o jantar — Lexie explicou de­pressa. O Rose and Crown era um pub do vilarejo que ela não pretendia visitar. Os donos, Bill e Mary Collins, sabiam exatamente qual era o seu parentesco com Sian Thomas. Lexie sabia de uma coisa: deveria ir até o vi­larejo para visitar sua avó, antes que ela soubesse, por outra pessoa, que sua neta estava em Mulberry Hall, na companhia de Lucan St. Claire!

 

— Não pensei que preparar o jantar fizesse parte da descrição do cargo de uma AP — Lucan falou gentil­mente ao retornar à cozinha quase uma hora mais tarde, depois de levar John Barton até a porta e de subir para se trocar. O aroma da casserole de carne que esquen­tava no forno enchia a cozinha. Lexie estava sentada à velha mesa de carvalho, tomando café, e olhou para ele irritada.

— Tecnicamente, quem preparou o jantar foi Cathy Barton. Eu só o pus no forno para esquentar.

— Mesmo assim...

— Ah, deixe de ser pedante, Lucan! — Ela levantou para servir outra xícara de café.

— Pedante...? — Lucan repetiu espantado.

— Sim, pedante! — Lexie enfiou a xícara na mão dele.

— O açúcar e o leite estão sobre a mesa. — Ela sentou novamente e ficou olhando a xícara de café. Lucan ficou observando e bebendo seu café preto e sem açúcar, por­que era assim que gostava. Evidentemente sua ausência em nada melhorara o humor de Lexie. Ela não o olhava e não falava, o que já era algo extremamente incomum! Ele puxou a cadeira do lado oposto da mesa e sentou, esticando as longas pernas.

— O que você estaria fazendo se estivesse em Londres?

Lexie olhou para ele por sob as pestanas e notou que ele trocara de roupa e que parecia estar mais à vontade. E mais devastadoramente atraente, vestindo um suéter preto e um jeans.

— Provavelmente, resolvendo se pediria comida chi­nesa ou indiana.

— A gente pode tirar a garota da cidade, mas não pode tirar a cidade da garota, hum? — ele brincou.

— O que quer dizer com isto? — ela perguntou toda eriçada.

Lucan notou que algumas mechas dos seus cabelos gloriosamente negros se soltavam da trança e davam uma aparência mais vulnerável a seu rosto em forma de coração. Entretanto, ele sabia que Lexie Hamilton era tão vulnerável quanto um gato selvagem!

— Só estava tentando conversar — ele disse, sacudin­do os ombros.

— Você já resolveu o que vai fazer a respeito dos es­tragos no telhado?

— Arranjei um empreiteiro para dar uma olhada ama­nhã de manhã.

— E quando podemos ir embora? — ela perguntou esperançosa.

— Só vou saber depois que o empreiteiro avaliar o estrago. — Ele franziu a testa ao vê-la desanimada. — Sei que as acomodações não são confortáveis. Você se sentiria melhor se eu reservasse dois quartos para nós no pub do vilarejo?

— Não! Quer dizer... Não será necessário. — Lexie tentou falar com calma ao ver que ele se surpreendera com a veemência da sua reação. — A casa já está aque­cida, e temos o ensopado de Cathy Barton para o jantar...

— Sim... — Lucan admitiu hesitante. Estaria des­confiado?

Lexie não podia culpá-lo por desconfiar ao vê-la pular por qualquer coisa que dissesse. Mas ela não conseguia evitar, sabia que a qualquer momento seu parentesco com Sian Thomas poderia ser descoberto. Principalmente pelo fato de que o administrador de Lucan fosse casado com Cathy Wilson, que sabia muito bem quem ela era.

Talvez devesse contar a verdade e acabar com aquele tormento? Ah, sim, e sem dúvida, seria jogada na masmorra. Lexie ficara entre horrorizada e fascinada quan­do, há alguns anos, conseguira convencer o vovô Alex a lhe mostrar a masmorra escondida sob a adega, no porão, era uma pequena cela recoberta de pedras com paredes muito grossas. Um dos lados era formado por uma porta de ferro fincada solidamente no chão de pedra.

Olhando para o lugar inexpugnável, ela havia imagi­nado o que os ocupantes da cela de pedra e metal haviam feito para merecerem ser jogados naquela prisão sem luz e sem ar. Ela se perguntou se enganar deliberadamente o atual duque de Stourbridge seria considerado um crime... Sim, ela podia optar por contar a Lucan quem era, mas a revelação faria com que o desprezo que ele demonstrara por ela ao acreditar que seu comportamen­to com Andrew Proctor fora nada profissional parecesse brincadeira.

Lexie pensou que talvez, em parte, desejasse que Lu­can soubesse quem era. De algum jeito, talvez ela qui­sesse surpreendê-lo e vê-lo se encolher, como alguém que vê um mágico tirar um coelho da cartola. Porém não sentia mais essa necessidade. Algumas horas na compa­nhia de Lucan haviam sido suficientes para que ela per­cebesse que se daria mal assim que ele soubesse do seu parentesco com Sian Thomas.

Levantou abruptamente, atravessou a cozinha e parou ao lado do forno. Queria estar o mais longe possível de Lucan, no ambiente confinado da cozinha, que parecia diminuir a cada segundo...

— O que você estaria fazendo agora se estivesse em Londres? Saindo com uma linda mulher, jantando em algum restaurante caro, com certeza? — ela falou com desdém.

Lucan fitou o rosto corado e desafiador de Lexie por alguns segundos. Algo na maneira como ela evitava en­cará-lo e no tom ríspido de sua voz lhe dizia que não era aquilo que ela pretendia dizer: estava tentando irritá-lo de propósito.

— Estou com uma linda mulher — ele disse gentil­mente. — E o ensopado de Cathy é melhor perfumado do que qualquer coisa que eu poderia comer num restau­rante... Fosse caro ou barato — acrescentou com ar contrito, cortando o comentário desagradável que esperava ouvir da boca sexy de Lexie ao perceber o elogio. Tudo que ela dissesse depois do último comentário iria soar como um insulto à gentileza de Cathy Barton.

Lexie se voltou para o armário e começou a pegar os pratos e talheres que precisariam para comer.

— O ensopado está quente. Eu só estava esperando por você.

Lucan levantou.

— Gostaria de um vinho tinto para acompanhá-lo?

— Não o bastante para que você se dê ao trabalho de descer até o porão e... — Ela calou a boca e se virou para ele com os olhos arregalados. — Presumo que seja lá que você guarda o vinho?

— Alguns. — Lucan olhou fixamente para o rosto pá­lido de Lexie. — Deve haver uma ou duas garrafas de vinho tinto na despensa.

— Você não vem muitas vezes aqui, não é? — Mais uma vez, Lexie resolvera que o ataque era a melhor ma­neira de distrair a atenção de Lucan para o fato de que ela escorregara ao revelar que sabia da existência de um porão em Mulberry Hall.

— Na verdade, estive aqui há uma semana, durante o casamento do meu irmão — disse. — E se isto foi uma tirada para me provocar, você não se saiu muito bem... — acrescentou um ar debochado.

Bem que ele queria! Só uma mulher que quisesse brin­car com fogo pensaria em provocar Lucan St, Claire. E era estranho que pensasse assim, já que, de início, achara que ele fosse frio...

O problema é que ela estava com dificuldades para vê-lo do mesmo jeito. Como poderia achá-lo frio se ain­da sentia o calor que emanara de seu corpo mais cedo? Como poderia esquecer a sensação de estar à beira de um vulcão que ameaçava explodir e envolvê-la no seu fogo?

Por fora, não havia dúvida que Lucan era frio e arro­gante, mas Lexie percebera que sob sua frieza havia uma chama poderosa e intensa, que a atraía como um imã. E não queria ser atraída por Lucan. Sentia muito bem o perigo daquela atração.

— Não tenho uma "tirada provocante", sr. St. Claire. E se tivesse, não iria usá-la com você. — falou com des­dém, arrependendo-se imediatamente porque, em vez de aliviar a tensão entre eles, de repente o clima se tornara mais pesado, quase palpável.

Lucan olhou-a com curiosidade.

— Por que não?

Lexie engoliu em seco e arregalou os olhos ao vê-lo atravessar a cozinha com a leveza de uma pantera.

— Por que não o quê? — ela tentou disfarçar.

— Por que não usar uma tirada provocante comigo?

Lucan estava tão perto que ela podia sentir o calor do seu hálito arrepiando-lhe os cabelos. Ela umedeceu os lábios antes de falar.

— Para começar, uma das minhas regras é nunca me envolver com pessoas para quem trabalho. — A intenção de Lexie fora falar com desdém, mas ela pareceu apenas ansiosa.

— Esta é uma regra antiga ou nova?

— Nova, muito nova — ela garantiu.

— Entendo...

— Entende?

— Acho que sim — murmurou Lucan. — E esta regra se aplica se o patrão for temporariamente temporário?

— Especialmente neste caso — ela afirmou irritada.

Provocar Lexie começara como um jogo para Lu­can: um meio de atiçar sua franqueza e desafiar sua autoconfiança, mas deixara de ser um jogo no instante cm que ela demonstrara não se interessar por ele, de maneira tão arbitrária.

Lucan não chegara aos 36 anos sem saber quando uma mulher estava atraída por ele. E naquela tarde, nos degraus da entrada, Lexie desejara tanto beijá-lo quan­to ele desejara beijá-la. Olhou para os lábios sensuais entreabertos de Lexie, que ela naquele momento umedecia com a língua, e desejou fazer o mesmo...

— Não! — Lexie balbuciou, recuando ao perceber a intenção de Lucan. Com isto, ela se viu encurralada con­tra um dos balcões da cozinha. — Isto não é uma boa ideia, Lucan! — Ela estendeu as mãos para afastá-lo, mas elas ficaram presas entre os dois, quando ele se aproxi­mou de uma maneira a deixar seus corpos colados dos ombros até os quadris. Incendiados. Ansiosos.

— Para mim parece uma ótima idéia — disse Lucan, estendendo os braços sobre o balcão e prendendo-a. Lexie sentiu o calor de seu corpo aquecendo-lhe todas as curvas e a potência de sua ereção contra o ventre. — Não lhe parece uma boa idéia, Lexie? — ele insistiu em voz rouca.

Lexie não conseguia respirar enquanto olhava para ele e se sentia afogar naqueles olhos escuros e hipnotizantes e na ânsia de sentir os lábios de Lucan sobre os seus. Os lábios de Lucan St. Claire! Porque era dele que se tratava, pensou desesperada. Lucan St. Claire, o filho mais velho e herdeiro do querido vovô Alex. O mesmo homem que, junto com o resto da família, exilara sua avó por tantos anos. Ela sentiu o sangue congelar nas veias e endureceu o corpo.

— Afaste-se de mim, Lucan — Lexie falou em tom gélido, empurrando-o com força. Lucan franziu a testa e resistiu facilmente, mantendo-a presa dentro de seus braços.

— Seus lábios dizem uma coisa, mas seu corpo diz o contrário — Olhava significativamente para os seios de Lexie, cujos mamilos despontavam sob o suéter.

— Estou com frio — ela disse com sarcasmo. — Olhe, Lucan. Sei que há muitas mulheres que estariam felizes por dormir com o duque de Stourbridge... Temporária-mente! Mas eu não sou uma delas!

Lucan fechou os olhos e se afastou bruscamente.

— Não me lembro de ter mencionado que sou o du­que de Stourbridge — ele disse friamente.

Ela escorregara de novo, Lexie pensou arrasada, por­que estava agitada. Lucan tinha razão. A fala e o corpo não concordavam! Racionalmente sabia que não deveria se sentir atraída por Lucan, mas visceralmente desobe­decia a razão e instintivamente exigia o toque dele. Ela respirou fundo.

— Foi John Barton quem me disse... — Ele bem po­dia ter mencionado. — Imagine minha surpresa quando ele se referiu a você como "Sua Graça".

— Prefiro não usar o título — disse Lucan, enfiando as mãos nos bolsos.

— Por que não? — Lexie perguntou com ironia. — Pense no número de mulheres que você iria atrair se sou­bessem que você é um duque!

Lucan olhou para ela aborrecido.

— Disse que prefiro não usar o título!

— E perguntei por quê.

— É uma longa história — ele disse, apertando os lábios.

— Eu me satisfaço com uma versão resumida — Le­xie insistiu.

— Não existe versão resumida — ele disse irritado.

— Ora, vamos, Lucan...

— Por favor, esqueça, Lexie.

Lexie sentiu um arrepio ao ver o brilho frio nos olhos de Lucan, seu queixo contraído e um ricto de impaciên­cia em sua boca.

— Ok... Está bem. Talvez agora possamos comer?

Lucan respirou profundamente, tentando controlar a onda de raiva que sentia ao se lembrar de quem era e do que estava fazendo em Mulberry Hall. Durante a maior parte do tempo que estava em Londres, esquecia com­pletamente que existia um duque de Stourbridge e da influência que o título poderia exercer em sua vida.

Para ele, não fazia diferença. O título, Mulberry Hall e todo o maldito ducado poderiam desaparecer. Não deveria ter voltado tão cedo, depois do casamento de Jordan e Stephanie. Deveria ter recusado a sugestão de John Barton de que fosse a Gloucestershire para ver pes­soalmente os estragos na casa. Então, por que...?

Porque, Lucan percebeu de repente, a idéia de ficar sozinho por alguns dias com a bela e rabugenta Lexie Hamilton espicaçara um lado seu que tinha dificuldades para controlar. O lado sensual da sua personalidade, tão parecido com o de seu pai e que causara tanta infelicida­de a toda a família.

Fazia muito tempo, Lucan havia decidido que não deixaria nenhuma mulher controlá-lo por certa parte de sua anatomia; que nunca iria querer ou desejar tanto uma mulher a ponto de causar o dano e a destruição que seu pai causara à sua família, há 25 anos, quando se apaixo­nara por outra mulher.

— Lucan...?

Levou um susto ao ver que Lexie colocara o ensopa­do no centro da mesa e que se sentava, olhando-o com curiosidade.

— Acho que estou sem apetite.

Lexie fez uma cara de preocupação.

— Pelo que eu sei, você não comeu nada o dia inteiro... Lucan fez uma expressão de desdém.

— E você se incomoda com isso porque...?

— Não me incomodo.

— Foi o que pensei — Lucan disse secamente. Lexie deu um suspiro de impaciência.

— Os Barton não sabiam que eu estaria aqui. É óbvio que Cathy Barton preparou esta comida para você.

— Está tentando fazer com que eu me sinta culpado por não comer, Lexie?

— Você está sendo infantil! — ela respondeu corando.

Lucan costumava ser muito racional e controlado. Tal­vez até demais. Mas, por algum motivo, não conseguiu conter a fúria que o fez atravessar a cozinha em dois passos, puxar Lexie da cadeira e apertá-la em seus braços.

— Isto parece infantil para você? — ele resmungou.

Lexie não conseguiu desgrudar os olhos da expressão selvagem de Lucan ao agarrá-la: os olhos escuros e implacáveis, o rosto contraído, a boca apertada, e aquele músculo que novamente lhe pulsava no queixo. Pulsava no mesmo ritmo do que percebia também pulsar contra seu ventre...

Fosse o que ela tivesse dito ou feito, Lexie sabia que o levara longe demais e que, no momento, Lucan ultrapassava a capacidade de raciocinar enquanto lhe esmagava os lábios num beijo. Ele a beijou avidamente, sabore­ando a delicadeza de seus lábios enquanto a abraçava, puxando-a pelos quadris, levantando-a levemente do chão e encaixando-a no seu corpo até encontrar o que estava procurando. Lexie gemeu baixinho ao sentir que ele se movimentava ritmicamente entre suas coxas e cor­respondeu ao beijo, sentindo que se derretia, sentindo o calor que lhe percorria o corpo, seus seios intumescerem e seus mamilos despontarem.

Santo Deus, ela o desejava... Ela queria Lucan. Que­ria o prazer que ele seria capaz de lhe proporcionar. O prazer que já estava lhe dando ao levantar seu suéter e lhe cobrir o mamilo com o calor da boca. Lexie arqueou o corpo e agarrou-o pelos cabelos enquanto ele a sugava e lhe acariciava o outro seio com a ponta dos dedos.

Ela se sentia incendiar. Sua pele toda se tornara sen­sível, quente, úmida. Nada mais importava naquele mo­mento, a não ser Lucan e o extremo prazer que ele lhe dava! Ela desejou acariciá-lo também. Queria sentir sua pele sob as mãos.

— Ah, Deus... Sim! — Lucan gemeu ao sentir as mãos de Lexie sob a sua camisa. Aquelas mãos delicadas, lin­das e sensuais lhe acariciavam as costas, os músculos tensos dos ombros, a extremidade inferior de sua coluna, fazendo-o ferver, estremecer de desejo que ela descesse ainda mais. — Envolva-me com as pernas, Lexie — ele mandou enquanto a levantava pelas nádegas e a descia de novo sobre o seu corpo.

Ele a beijou novamente, enquanto se movimentava lenta e ritmicamente contra seu corpo. Ela era tão perfei­ta, tão delicadamente linda, e tinha gosto de mel, morno e doce, Lucan pensou enquanto passava a língua nos lá­bios de Lexie e lhe explorava a boca. Lexie abraçou-o pelo pescoço, enfiou os dedos em seus cabelos e corres­pondeu ao beijo e ao ritmo com que ele se movia sobre seu corpo. Lucan sabia que nunca ficara tão excitado, nunca sentira tanta necessidade de possuir, de tomar posse de...

Não!

Lexie gemeu de ansiedade e de desejo quando ele descolou os lábios dos seus, colocou-a de volta no chão e recuou. O desejo parecia ter morrido, acabado, e ela sentiu que suas pernas tremiam enquanto via um brilho de raiva nos olhos de Lucan.

De raiva não: ele a olhava como se a odiasse...!

 

Talvez ele a odiasse, Lexie pensou entristecida ao per­ceber que ele fazia uma cara de desagrado: seus olhos haviam se tornado negros como o ônix e ele franzira a boca com desprezo. Ela inalou o ar com dificuldade.

— Lucan...

— Você tinha razão. Beijá-la foi um tremendo erro. Lexie umedeceu os lábios inchados.

— O que eu disse é que não seria uma boa idéia.

— E isto não dá no mesmo?

— De jeito nenhum. — Lexie sentiu raiva e vergonha pela intimidade que permitira. Ele, Lucan St. Claire! — Eu só lhe dei um aviso... Quando um homem que aca­bou de me beijar daquele jeito diz que foi um "tremendo erro", isto é um insulto!

Lucan olhou para ela e a sua irritação diminuiu ao perce­ber, pelo rosto corado, pelo queixo levantado e pelo brilho magoado em seus olhos, que estava realmente ofendida.

Não estava furiosa por ele tê-la beijado, nem embara­çada pelo fato de ter colocado a boca em seus seios, nem ofendida por ele ter esfregado o corpo entre suas pernas até deixá-la gemendo de desejo. Ah, não. Seria muito es­perar que a incomparável Lexie Hamilton reagisse nor­malmente à intimidade que acabavam de compartilhar!

Enquanto, ele, maldição, ele era um homem que sempre mantinha o autocontrole, que sempre preferia o conforto de uma cama para fazer amor. Mas, aparentemente, não com ela. Ah, não. Com ela, ele quase fizera amor na co­zinha de Mulberry Hall. Se não tivesse parado, provavel­mente acabariam fazendo sexo no chão, ou sobre a mesa.

Lucan sacudiu a cabeça, confuso. Lexie era diferente de qualquer mulher que conhecia e que desejara conhe­cer! Seus longos cabelos negros haviam se soltado e se espalhado sobre os ombros. Sua boca deliciosa e sensu­al esta levemente inchada e avermelhada por causa dos beijos. Lucan ficou sério e passou o dedo de leve em volta dos lábios de Lexie.

— Acho que preciso me barbear — ele murmurou.

Lexie arregalou os olhos, indignada. Acabara de bei­já-la até quase fazê-la perder os sentidos, depois a insul­tara, e tudo que dizia agora era "preciso fazer a barba"?

— Nada de pedir desculpas ou de dizer que não vai acontecer novamente? — ela perguntou furiosa. E ele ainda a olhava de nariz empinado, com arrogância...

— Não preciso me desculpar por algo que lhe deu tanto prazer a você quanto a mim. Também não acredito em fazer promessas que não sei se vou poder cumprir.

Lexie ficou por longo tempo olhando para ele, perple­xa, antes de explodir.

— Você é convencido, pomposo e folgado. — Estava zangada demais para encontrar uma palavra que descre­vesse o seu comportamento. — Idiota! — Lexie arrema­tou furiosa, e se afastou.

— Muito original — Lucan falou secamente.

— Duvido que entendesse a palavra que eu realmente queria usar!

Lucan sacudiu a cabeça com desdém.

— Não pode ser pior do que as que eu costumo usar para chamar a mim mesmo. Lexie olhou para ele, frustrada.

— Creia, se houvesse um jeito de eu ir embora esta noite, eu iria. Como não há... Vou subir e me deitar. — Lexie pegou a mala que estava numa cadeira. — Existe algum quarto que você prefere que eu use? Afora a suíte ducal, é claro...

— Sinta-se à vontade para usar qualquer um, inclusi­ve a suíte ducal — ele respondeu friamente.

— Só porque nos beijamos, não significa que eu quei­ra dormir com você...

— Não pretendo chegar perto da suíte ducal hoje nem em qualquer outra noite — Lucan garantiu em tom ten­so. — Com ou sem você.

— Por que não? — Lexie perguntou surpresa. Lucan se afastou, irritado.

— Poderia parar de fazer tantas perguntas e ir se deitar, Lexie?

Uma vez que as emoções pareciam estar à flor da pele, seria o melhor a fazer, mas quando se tratava daquele homem, Lexie nada tinha de razoável nem cuidadosa.

— Você não usa seu título. Evidentemente, vem aqui o menos possível. Desde que John Barton telefonou, hoje cedo, ficou claro que você não queria vir.

— Existe algum sentido nesses comentários? — Ele perguntou em tom ameaçador. Lexie deu de ombros.

— E uma casa tão bonita...

— Um maldito mausoléu! — interrompeu Lucan.

— Então, mude.

— Mudar a decoração e a mobília não vai fazer com que Mulberry Hall se transforme num lugar onde eu queira morar de novo — ele resmungou. — Se pudesse, mandaria derrubá-lo e deixaria que o mato o escondesse!

— Não entendo... — Lexie falou, sacudindo a cabeça.

— Não é para você entender — afirmou irritado. — Alguns beijos não lhe dão nenhum direito sobre mim. — Lucan jamais discutia seus motivos e emoções com al­guém — nem mesmo com seus irmãos, a quem era muito afeiçoado. Não pretendia fazer confidencias a Lexie e se Sujeitar a ouvir uma lenga-lenga pseudopsicológica so­bre a sua falta de, habilidade para lidar com a sensação do abandono que começara a sentir depois que seu pai deixara a família por outra mulher. — Vá dormir, Lexie — advertiu aborrecido. — Eu arrumo a cozinha.

Lexie não precisou ouvir duas vezes. Pela expres­so de Lucan, sabia que havia ultrapassado os limites e se metera num assunto que ele não tinha a intenção de discutir, mas isto não diminuía sua curiosidade sobre a aversão que Lucan sentia por Mulberry Hall e tudo que ela representava.

 

— Estava imaginando por onde você andaria...

Lexie voltou-se assustada — ou culpada? — e viu Lucan entrar na galeria oeste, onde ela estava olhando para o último quadro que enfeitava a parede: um retra­to de Alexander St. Claire, o 14° duque de Stourbridge, seu adorado vovô Alex e pai de Lucan.

Olhando do retrato para ele, Lexie percebeu o quan­to eram parecidos. O retrato de Alexander sem dúvida fora pintado quando ele deveria ter a idade aproxima­da que seu filho deveria ter agora. Seus cabelos ainda estavam escuros, e não grisalhos como quando ela o conhecera, e a semelhança da postura aristocrática e da severidade do olhar de pai e filho era inconfundível. Ela forçou um sorriso provocador.

— Você achou que eu havia resolvido ir embora, hoje de manhã...?

Fora o que ele pensara ao entrar na cozinha, desco­brir café fresco na cafeteira e ver indícios de que alguém comera uma torrada, mas não a encontrara. Por acaso, fora até a galeria para dar mais uma olhada no estrago, antes que o empreiteiro chegasse. Lexie deixara os cabe­los soltos, e eles lhe emolduravam o rosto delicado antes de descerem por suas costas, fazendo contraste com um suéter vermelho. Suas calças jeans muito justas revelavam a curva provocativa do seu traseiro...

— Seu pai? — ela perguntou. Lucan contraiu o quei­xo e tirou os olhos daquela parte deliciosa da anatomia de Lexie, olhando para o retrato de Alexander, que infe­lizmente escapara ileso.

— É.

— Vocês se parecem muito.

— Somente na aparência — Lucan informou muito tenso.

— Parece que você não gostava muito do seu pai.

Lucan fitou o retrato de Alexander, pintado há 40 anos. Quase poderia ser seu retrato. Quase!

— Não o conheci o suficiente para gostar ou não gos­tar — ele falou friamente.

— Eu...

— Podemos falar de outro assunto, Lexie? — Deu as costas ao retrato do pai e olhou para ela com um ar de ironia. — Você dormiu bem?

Lexie não dormira bem. Em parte, por estar cônscia de sua posição precária naquele lugar: a qualquer mo­mento, alguém poderia reconhecê-la, como, por exem­plo, Cathy Barton, se viesse visitar Mulberry Hall.

Não conseguira dormir principalmente por causa do incidente com Lucan. Incidente? Fora muito mais que isto. Nunca reagira a um homem daquela maneira selva­gem e descontrolada com que havia se comportado com Lucan na noite anterior. Nunca ficara tão excitada nem perdera a cabeça de um jeito que nada mais lhe impor­tava: nem quem ela ou Lucan fossem, nem quem fosse sua avó!

Ela só pensara nisso mais tarde enquanto se revirava na cama, revivendo as sensações intensas que Lucan lhe provocara e que ainda parecia sentir. Descobrira que não poderia mais negar a atração que sentia por ele, nem o desejo de que fizessem amor.

Naquele momento, Lexie olhava para os cabelos es­curos de Lucan, para os seus traços geralmente frios e arrogantes, para os músculos firmes de seu peito sob o suéter cor de chocolate e para seus quadris e suas longas pernas, moldados pelo jeans, sabendo que ele podia se excitar, contrair-se todo de desejo, e isso fazia com que ela estremecesse ao recordar o próprio desejo por um homem que iria odiar o ar que ela respirava se soubesse que era neta de Sian Thomas!

— Nunca durmo bem na primeira noite em uma cama estranha — ela falou simplesmente.

— Isso deve ser desagradável para você — ele debo­chou.

— Não muito — retrucou, sabendo o que ele sugeria. O que Lucan iria dizer se soubesse que, a não ser por al­gumas carícias desajeitadas com um homem que ela namorara durante os dois últimos anos, não tinha nenhuma experiência sexual? Que a intimidade que demonstrara com ele na noite passada fora algo de inusitado na sua vida? — Estou curiosa a respeito de quem seriam esses quadros... — ela disse, afastando-se para olhar um retra­to na parede oposta.

Lucan estava bem ciente da maneira com que Lexie olhara para ele havia poucos segundos. Vira o desejo nos seus olhos. A paixão. Logo escondida e com ela suas emoções. Sabiamente. Convenientemente.

Lucan sabia que não era nada conveniente, e muito menos sábio, sentir-se atraído por Lexie Hamilton, uma mulher tão diferente das mulheres sofisticadas com quem geralmente dormia. Lexie parecia dizer sempre o que lhe vinha à cabeça, sem se importar se seria ou não adequa­do. Cutucava e abria feridas que Lucan não costumava mostrar a ninguém. E a maneira como reagira na noite anterior, quando a beijara e a acariciara, com aqueles ge­midos entusiasmados e torturantes de prazer... Era muito espontânea, muito sincera. Viciante...

Todo isso era muito perigoso para um homem que nun­ca se importara com alguma mulher a ponto de se arrepen­der depois de terminar a relação. E não seria com a impul­siva e franca Lexie Hamilton que começaria a se arriscar!

— O homem que está no centro é Hawk, o 10° duque de Stourbridge. Os outros três são seus irmãos: Sebastían, Lucian e Arabella — Lucan respondeu secamente.

— Seu nome seria um derivativo de Lucian? — ela perguntou curiosa.

— É provável — falou tenso. — Gideon também é um nome muito usado na família.

Lexie sabia que Alexander também era um nome co­mum na família. Fora o nome do pai de Lucan e também de seu bisavô.

— Acho que o nome Gideon entrou na família quan­do Lady Arabella o deu a seu filho, em homenagem ao homem que lhe salvou a vida.

— E como ele fez isso? — perguntou Lexie espantada.

— Não tenho ideia — disse Lucan desinteressado. — Acho que deveríamos descer agora. O empreiteiro deve chegar a qualquer momento.

— Claro. — Lexie acompanhou-o, levemente desa­pontada por Lucan se recusar a lhe contar a história in­teressante de Lady Arabella. — Tudo bem se eu der uma caminhada pela propriedade enquanto você conversa com o empreiteiro? — ela perguntou em tom indiferen­te, porque não queria que Lucan soubesse o quanto seria importante aquela caminhada: considerava imprescindí­vel uma visita à casa de sua avó. Em seguida, esperava que Lucan resolvesse voltar a Londres, depois de falar com o empreiteiro. Depois do que acontecera na noite passada, Lexie não achava uma boa ideia passarem outra noite juntos em Mulberry Hall!

— Vai nevar — Lucan avisou, franzindo a testa.

— Como é que você sabe? — Lexie perguntou com ironia.

— Sei porque ouvi a previsão do tempo no rádio da cozinha, há poucos minutos! — ele falou irritado.

— Não precisa ficar de mau humor!

— Não estou... — Lucan parou de falar e deu um pro­fundo suspiro. — Você adora me irritar, não é? — Ele fran­ziu a testa ao ver o brilho malicioso nos olhos de Lexie.

— Adoro — ela admitiu sem compaixão.

— Porque sou um idiota convencido, pomposo e abu­sado? — ele perguntou em tom áspero.

Lexie ficou vermelha ao se lembrar do que o chamara.

— Você se lembra de cada palavra!

— De certa forma, são únicas — ele disse sorrindo.

— Ou seja: ninguém falou com você desse jeito antes.

— Ou seja: ninguém falou comigo desse jeito antes — repetiu, debochando.

— Que pena!

Lucan riu novamente. Não conseguia se controlar diante da aberta franqueza de Lexie.

— Você podia tentar disfarçar sua satisfação consigo mesma.

Lexie levantou as sobrancelhas.

— De que adiantaria se é isto exatamente o que eu sinto? Lucan sacudiu a cabeça e parou para lhe dar passa­gem à entrada da cozinha.

— Você sempre diz o que lhe vem à cabeça?

— Geralmente. — Nem sempre, Lexie admitiu. Preci­sava aprender a ser cautelosa quando estivesse com ele. E isto era algo que gostava cada vez menos...

Fora divertido implicar com Lucan e ouvi-lo rir, esque­cendo, por alguns minutos, quem eram os dois. Santo Deus! Não poderia estar interessada em manter um relacionamen­to com Lucan, poderia...? Já fizera muitas bobagens em sua vida, e uma delas fora substituir a AP de Lucan durante três dias, mas seria uma completa loucura alimentar a atração que sentia, a ânsia por seus beijos e carícias. Esta loucura não iria cometer! Lexie o olhou com um ar de desafio.

— Por exemplo: no momento quero dizer que realmen­te preciso sair desta atmosfera abafada e pegar um pouco de ar fresco!

— É a casa que a asfixia ou sou eu...? — Lucan perguntou.

— Isto é você quem deve resolver! — disse acida-mente, antes de pegar o casaco e sair, sem lhe dar uma chance de responder.

Lucan não iria realmente responder. Nunca correra atrás de alguma mulher, e não iria começar agora, mas, em parte, sentia vontade de...

 

Lexie percorreu um caminho coberto de neve que atra­vessada o bosque de Mulberry Hall e conduzia à casa de sua avó, no limite do vilarejo. Um caminho que, no pas­sado, fora muito usado por Alexander St. Claire quando ia ver a mulher a quem amava.

O chalé de sua avó parecia o mesmo de sempre. Lexie parou numa clareira, nos fundos da pequena casa pinta­da de branco. As janelas brilhavam e, quando ela olhou para a fumaça acolhedora que saía da chaminé, reparou que o telhado parecia ser novo.

Ela hesitou diante da porta e respirou profundamente, sabendo que, assim que entrasse, teria muito a explicar. Lexie também sabia que o que acontecera na noite pas­sada entre ela e Lucan, a atração que tentava desesperadamente combater, não faria parte da conversa que teria com sua avó...!

 

— Onde diabos você esteve? — Lucan perguntou furioso.

Ao parar na porta da cozinha para sacudir a neve do chapéu e do casaco, ela o ouvira arrastar a cadeira e le­vantar, com uma cara nada agradável.

— O quê...? — ela falou alegremente enquanto fecha­va a porta. Lucan não se deixou enganar por sua cara de inocência.

— Você me deu a impressão que sairia para dar uma volta e ficou fora por duas horas!

Lexie franziu as sobrancelhas.

—Você tinha algum trabalho que queria que eu fizesse?

— Claro que não. Estive conversando com o em­preiteiro.

— Então, não vejo problema...

— O problema é que começou a nevar logo depois que você saiu! — ele disse, olhando para os cabelos de Lexie, umedecidos pela neve que derretia.

— Você não estava preocupado comigo, estava? — ela perguntou friamente.

Estava sim. Lucan ficara preocupado com sua longa ausência. Não apenas porque lá fora estivesse gelado, mas também porque a neve caíra pesadamente e for­mara uma grossa camada sobre o solo, logo depois que ela, saíra.

— Não se trata de ficar preocupado ou não, Lexie. Você não conhece a região — ele falou zangado. — Po­deria ter caído num buraco de gelo, no lago, e poderia ter se afogado.

— Haveria um lado positivo, Lucan. Pelo menos não estaria mais aqui, aborrecendo você — ela disse brus­camente, tirando o casaco ensopado e colocando-o para secar, nas costas de uma cadeira.

Lucan sentiu um arrepio ao imaginar o corpo de Lexie boiando sob a camada de gelo que se formara sobre o lago, nos fundos de Mulberry Hall.

— Droga! Não tem graça, Lexie!

— Não era para ter — ela retrucou, impaciente com aquela conversa. — Assim como você, não estou acos­tumada a questionarem as minhas ações.

— Enquanto estiver aqui comigo, é melhor que você se acostume! — Lucan declarou secamente.

— Acho que não — ela falou, enrijecendo o corpo. A raiva em seus olhos contrastava com a calma em sua voz.

Aquele aviso Lucan não pretendia dar atenção. Não se preocupara quando começara a nevar, pensando que os primeiros flocos de neve iriam fazer com que Lexie voltasse para casa. Quando os minutos começaram a passar e completaram uma hora, vestira o casaco para ir atrás dela.

Infelizmente, o terreno de Mulbeny Hall era muito grande e não conseguira encontrá-la. Também não conse­guira ver suas pegadas na neve, indicando a direção que tomara. Depois de vinte metros de uma busca inútil, vol­tara e se sentara na cozinha, esperando por ela. Seu gênio piorara a cada minuto, e, considerando que aquela preocu­pação lhe era desconhecida até conhecer Lexie Hamilton, pesava muito no resultado da presente discussão.

— Acho que sim — ele resmungou.

— Você pode achar o que quiser, Lucan, mas isto não vai fazer com que aconteça.

— Onde você estava durante as últimas duas horas? — Ele voltou friamente à questão original.

Uma questão que Lexie não pretendia responder sin­ceramente porque não podia. Sua avó ficara surpresa, mas contente ao vê-la novamente tão depressa, depois que haviam passado o Natal em família, em Londres. No entanto, não ficara tão satisfeita ao saber como e por que Lexie estava ali...

Não fora uma conversa agradável. A avó desaprovara totalmente o subterfúgio que usara para conhecer Lucan. E ficara preocupada pela maneira como as coisas haviam se voltado contra ela, forçando-a a acompanhá-lo até Mulberry Hall. Também advertira sobre a reação de Lucan, caso descobrisse a verdade.

Um aviso desnecessário, porque Lexie já sabia o quanto Lucan ficaria furioso ao saber que era neta de Sian Thomas e o quanto iria odiá-la, e a si próprio, por tê-la beijado... Lexie evitou encará-lo.

— Eu disse. Estava caminhando...

— Caminhando onde? — olhou-a desconfiado, ima­ginando porque ela fugira da resposta. Pelo tanto que sabia, Lexie nunca estivera em Gloucestershire e não conhecia a região. Então, qual seria o problema de ela dizer onde estivera?

— Por aí — ela disse despreocupada, servindo-se de café. — Você também quer? — Ela lhe ofereceu a xícara.

— Não. — Ele estava longe de se satisfazer com a resposta de Lexie. — O que quero é saber onde você esteve durante todo esse tempo.

— Pelo amor de Deus, Lucan. Não sou uma criança: sou adulta. — Ela recolocou o bule na cafeteira com im­paciência e se voltou para encará-lo.

Lucan apertou os lábios, atravessou a cozinha e parou na frente dela, bloqueando qualquer tentativa de fuga.

— Nem você, nem seu casaco me parecem muito mo­lhados. Portanto, você deve ter se abrigado em algum lugar...

— E você certamente se lembrou da sua vocação para ser bisbilhoteiro! — ela zombou.

Lucan contraiu os punhos e tentou controlar a res­piração.

— Você é a mulher mais irritante, impossível e teimosa que eu já tive a infelicidade de conhecer.

Lexie fez uma careta.

— O que me torna o par ideal para um idiota conven­cido e pomposo, não acha?

Ela conseguiu outra vez, Lucan pensou ao sentir sua fúria evaporar. A tensão dos seus ombros começou a abrandar e ele sorriu.

— Você é realmente impossível, sabia?

— Sabia — ela concordou friamente. — Pela quanti­dade de vezes que levei meus pais à loucura quando era criança. Talvez por isso eu seja filha única.

Lucan se deu conta de que era a primeira informação pessoal que ela lhe dava.

— E como é? Cresci com dois irmãos dois anos mais moços que eu, e não posso imaginar o que seja um filho único!

— De vez em quando é muito solitário — Lexie ad­mitiu com cuidado. Não pretendia fornecer mais deta­lhes de sua vida. — É claro que sobrevivi... — Ela sa­cudiu o corpo. — Então, o que vamos fazer pelo resto do dia? Você quer se dedicar ao trabalho que trouxemos ou vamos voltar a Londres agora, antes que a neve fique mais espessa? — ela perguntou, olhando pela janela e observando a neve que caía. Com certeza, não queria ficar presa por causa da neve durante muitos dias — e noites — em Mulberry Hall, com Lucan! — Pense um pouco, Lucan — ela disse em tom encorajador. — Em algumas horas você estaria livre de mim.

Lucan reconheceu que seria uma boa idéia tentar vol­tar a Londres. E não apenas por causa da neve! Ficar ali com Lexie, uma mulher que o fazia rir quando isto era a última coisa que desejava, poderia ser um tremendo erro. Porém... Aí é que estava o problema.

Depois de passar anos evitando chegar perto de Mulberry Hall e de tudo que ela representava, relutava em partir. Não porque quisesse ficar na casa, mas porque tinha a certeza de que, assim que voltassem para Lon­dres, Lexie iria pedir à agência para ser imediatamente substituída no cargo de assistente particular.

Não fora isto que também resolvera na noite passada, depois que Lexie o deixara na cozinha e fora dormir? Afastá-la de sua vida? Nunca mais voltar a vê-la? Que voltaria a se esconder por trás da barreira de fria indi­ferença que não deixava ninguém atravessar? Fora isso que ele decidira! Porém...

— Você está demorando muito para decidir, Lucan — Lexie interrompeu suas reflexões com ironia.

— Por mais que eu queira voltar a Londres, não quero por em risco a sua segurança e a minha. Neste caso, va­mos esperar algumas horas e ver se para de nevar.

— E se em vez disso piorar? — ela perguntou assus­tada.

— Então estaremos presos aqui por mais uma noite, Lexie.

Era exatamente o que ela queria evitar. O que ga­rantira à avô que não iria acontecer. A avó Sian ficara preocupada, assim como com Lucan St. Claire. Sabia o quanto a família St. Claire a odiava e, por extensão, a todos que lhe eram ligados. A única coisa que acalmara sua ansiedade fora Lexie lhe dar sua palavra de que acabaria com aquela situação assim que voltassem a Londres. Infelizmente, quando fizera a promessa ela não contara com a possibilidade de a nevasca prendê-los ali por vários dias!

— Acho que deveríamos partir agora — ela disse.

Lucan olhou para ela com um ar zombeteiro. Viu um brilho determinado em seus olhos e a teimosia com que ola franzia os lábios.

— Caso não tenha notado, Lexie, estamos numa di­tadura, não numa democracia! Como proprietário do único veículo disponível, resolvi que as condições para viajar agora não são seguras.

Lexie franziu a testa.

— É para isto que você tem um carro com tração nas quatro rodas, droga!

— Mesmo assim, não quero me arriscar. Então, o que temos para o almoço? — ele perguntou.

— Como você é o ditador e eu a pobre plebéia opri­mida, sugiro que você decida. E depois de decidir, sugiro que você prepare. Vou subir e arrumar minha mala. Es­tarei pronta quando pudermos ir embora! — Ela se virou e saiu da cozinha.

Lucan fez uma cara feroz e apreciou o balanço pro­vocante dos quadris de Lexie, enquanto saía da cozi­nha o batia a porta. Lexie Hamilton podia ser irritante, Impossível e teimosa como uma mula, mas também era a mulher mais sexy e feminina que ele já conhece­ra, e perigosa...

— E então?

Lucan recostou na cadeira e olhou para Lexie, que aparecera na porta da cozinha.

— Então o quê? — ele perguntou. E continuou calma­mente sentado, comendo uma torrada.

— Caso não tenha notado, parou de nevar. — Do lado de fora havia apenas alguns centímetros de neve que não seriam suficientes para deter o carro.

— Eu notei.

— E?

— E...

— Se você disser "e o quê?" novamente, eu vou so­cá-lo — Lexie avisou, trincando os dentes, irritada com a calma de Lucan. Estava tão agitada que realmente po­deria bater em algo ou alguém! A visita à avó apenas enfatizara a possibilidade de descobrirem, a qualquer minuto, que era neta de Sian Thomas. Se isto aconteces­se, Lucan faria com que não apenas ela sofresse conse­qüências, mas também a Premier Personnel...

— Ia perguntar o que há em Londres, que faz com que você queira voltar correndo...?

— Civilização? — ela falou em tom mordaz.

Lucan se viu rindo de mais uma das tiradas de Le­xie, do jeito como ela não tentava se impedir de dizer o que lhe vinha à cabeça. Era algo revigorante para um homem que sempre pensava muito antes de falar, prin­cipalmente porque, além de ser seu jeito, milhões de libras e milhares de empregos dependiam do que ele iria dizer.

— Ainda vai estar lá amanhã. — Ele sacudiu a cabeça.

— Quero voltar hoje!

— "Eu quero" nem sempre funciona. — Ele deu de ombros.

— Você está sendo ridículo...

— Não, Lexie. Neste momento, você está nesse papel — ele disse secamente.

— Não sou eu quem está tendo problemas para ir embora.

— John me disse que há algumas coisas que ele pre­cisa discutir comigo antes que eu volte a Londres — ele explicou friamente.

— Negócios da propriedade?

— Acho que sim. — Lucan assentiu.

— Ah. — Lexie se sentiu esvaziar como um balão ao perceber que ele não estava apenas sendo teimoso. Tinha um motivo plausível para ficar um pouco mais.

Por que Lucan precisava rir daquele jeito espontâneo? O riso mudava a sua aparência, levava calor ao seu olhar, revelava as linhas em torno de sua boca e a covinha na bo­checha esquerda. Uma covinha muito sexy. Uma covinha sexy que fazia com que desejasse chegar perto e lambê-la...

Santo Deus! Por que ficar perto dele fazia com que ela pensasse em sexo? A respeito de fazer sexo? Não. Fazer sexo não: fazer amor. O sexo pelo sexo nunca atraíra Lexie. Provavelmente por isto ainda era virgem aos 24 anos!

E sabia, com certeza, que a pessoa com quem queria fazer amor era Lucan, e apenas com ele. Seria aquela mesma armadilha emocional onde caíra sua avó ao conhecer Alexander? Lexie imaginava se Lucan teria o mesmo encanto sobre ela, que o pai tivera sobre a avó Sian. O tipo de encanto que era capaz de fazer com que uma mulher sensível e racional esquecesse tudo, exceto ele. Se fosse assim, preferia não aceitar!

— Se são assuntos a respeito da propriedade... — ela concordou bruscamente, percebendo o quanto Lucan es­tava próximo.

— Você é muito compreensiva — ele murmurou.

— Concordo. — Lexie não conseguia desgrudar os olhos do olhar sedutor de Lucan. Sentia o calor que ema­nava do próprio corpo e do dele. Um calor que dobrou, triplicou quando ele lhe acariciou o rosto. — O que está fazendo? — ela perguntou ofegante. Ele sorriu de leve.

— Você parece... um pouco afogueada — ele disse. Ela estava mais do que corada... E não apenas por fora. Sentia o fogo que se tornara familiar queimar o vértice de suas coxas. Lucan levantou uma das sobrancelhas. — Você não vai ficar doente, vai?

Sua doença era ele. Lexie precisava dizer ou fazer algo que quebrasse o encanto que parecia puxá-la para ele.

— Você sempre usa o cabelo tão curto?

— Você não gosta? — Ele passou a mão na cabeça e falou em voz baixa.

— Deixa você parecendo...

— Mais velho? — ele sugeriu.

— Eu ia dizer mais sério — ela corrigiu friamente. Ele deu um sorriso irônico.

— Eu sou sério, Lexie.

Não o tempo todo! De fato, estando tão perto dele, com o calor dos seus corpos se misturando, se fundindo, Lexie achava cada vez mais difícil vê-lo como o arro­gante e distante Lucan St. Claire. E não era surpresa, porque o que desejava fazer naquele momento era lhe rasgar as roupas e provar cada pedacinho do seu corpo musculoso. Socorro...! Lexie definitivamente precisava de ajuda, de algo que lhe desse forças e vontade para combater a crescente atração que sentia por Lucan. Onde estavam os relâmpagos quando ela mais precisava?

 

Lucan estava ciente da tensão que envolvia o ambien­te. Uma tensão sensual que os rodeava como uma névoa transparente e inebriante. Mergulhou nos olhos azuis de Lexie, antes de abaixar a cabeça e procurar os seus lá­bios. Lábios sedutores que se entreabriram como se es­perassem pelo seu beijo. O rosto de Lexie parecia veludo sob seus dedos, e Lucan se lembrou de ter tido a mesma sensação ao lhe tocar os seios, na noite anterior. Aquilo o levou a desejar tocá-la e saboreá-la novamente...

— Lexie... — gemeu, afastando-se ao mesmo tempo cm que se ouvia uma batida na porta e ela se abria, mostrando a silhueta de John Barton.

O administrador tremia de frio e entrou depressa, pa­rando de repente ao ver Lucan e Lexie na cozinha, tão próximos que quase se tocavam...

 

— Estou interrompendo alguma coisa, não estou? — disse John Barton hesitante, parado perto da porta.

Interrompendo algo! Lexie nem queria pensar no que John Barton quase chegara a interromper. Virou-se e se afastou da sedução e do calor de Lucan. Do outro lado da cozinha, respirou mais facilmente e até conseguiu dar um sorriso para John Barton, que parecia sem graça, mas curioso.

— Está nevando novamente? — ela perguntou desa­nimada ao vê-lo coberto de neve.

— Receio que sim. — Ele sacudiu os ombros e se voltou para Lucan.

Lucan endireitou o corpo bruscamente. Apenas o bri­lho em seus olhos revelava — pelo menos para Lexie — o quanto ele estava aborrecido com a chegada de John Barton. Ou talvez seu aborrecimento fosse com ela? O queixo contraído e o olhar frio com que ele a fitava não davam a impressão que ela escapara ao seu aborrecimen­to. E. ficou ainda mais irritada. Droga, não fora ela que começara, que tentara seduzi-lo para ser beijada. E que o teria feito, não fosse John Barton tê-los interrompido!

— Vamos conversar no meu escritório, John — Lucan declarou friamente, ao ver que ela estava irritada. — Le­xie quer voltar a Londres assim que for possível — ele acrescentou. Havia reparado como ela ficara desanimada ao saber que nevava outra vez e que havia a possibilidade de adiarem a partida, algo que, obviamente, ela não que­ria que acontecesse.

Lucan não podia dizer que estava totalmente feliz por ficarem ali por mais tempo. Ao pensar em trazer Lexie junto com ele, imaginava que seria uma distração, um jeito de estar em Mulberry Hall sem sentir a costumei­ra aversão. Em vez disso, Lexie o fizera esquecer toda a prudência, todas as barreiras que construíra cuidado­samente em torno de suas emoções, e ele só conseguia pensar em tocá-la, beijá-la, em fazer amor com ela. Se John Barton não tivesse chegado, ele teria...

— Só disse que, se não quisermos ficar presos pela neve, devemos ir embora hoje — disse Lexie em tom de desafio. Lucan olhou pela janela e viu que a neve caía pesadamente.

— Acho que é tarde demais... Lexie também olhou pela janela e se encolheu ao ver os enormes flocos de neve que caíam. Ela se voltou para ele com um olhar de acusação.

Se tivéssemos ido embora quando sugeri...

— Estaríamos exatamente no meio da nevasca — Lu­can falou impaciente. — Sem dúvida, os limpadores de neve irão manter as estradas principais desimpedidas, mas duvido que as estradas secundárias que precisamos percorrer antes estarão do mesmo jeito.

Claro, ele tinha razão, Lexie reconheceu. Como sempre...

— Vou deixá-los à vontade para conversar...

— Primeiro você precisa comer alguma coisa — Lu­can interrompeu. Lexie corou ao perceber que John Barton acompanhava a conversa com atenção.

— Não estou com fome...

— Fique aqui e coma! — Lucan insistiu.

O que Le­xie precisava e o que queria eram duas coisas diferentes. Provavelmente precisa comer algo, mas queria se afastar de Lucan o máximo possível. Mas como ele lhe dissera mais cedo... "Eu quero" nem sempre funcionava...

— Está bem — concordou, olhando para ele com um ar de advertência. Se ele não entendesse, John Barton estando presente ou não, acabaria dizendo algo de que todos se arrependeriam mais tarde.

— Cathy está ansiosa para vir cumprimentá-los — disse Barton com um largo sorriso.

— Ah? — Lexie ficou vermelha só de pensar. Poderia não ser a Cathy que ela conhecera, mas, do jeito que estava com sorte, deveria ser.

— Achei que vir hoje, com este tempo, não seria uma boa idéia. Está esperando nosso primeiro filho para da­qui a três meses — ele explicou todo feliz.

— Parabéns! Talvez em outra ocasião... — disse Le­xie, sabendo que não existiria "outra ocasião" para ela em Mulberry Hall. Não se pudesse escolher. Lucan a olhou friamente, antes de sair da cozinha com John Bar­ton, mostrando que ela não conseguira esconder o pâni­co ao saber que Cathy pretendia visitá-los.

 

— Então, qual é o problema em conhecer Cathy Bar­ton? — Lucan perguntou ao encontrá-la na cozinha após a partida do administrador.

— Como assim? — Ela fez uma cara de inocente. De­mais para que Lucan acreditasse...

— Você pareceu constrangida com a idéia de conhe­cer Cathy Barton.

— Não seja bobo, Lucan. Fiquei preocupada em pen­sar que uma mulher grávida de seis meses iria se aventu­rar a vir aqui com este tempo.

O caso é que Lucan sabia que John Barton não men­cionara que sua mulher estava grávida até bem depois que Lexie se apavorara ao saber que Cathy queria conhecê-la.

— Sua preocupação é admirável — ele falou secamen­te. — Então, você não faz nenhuma objeção a conhecê-la?

— Acabo de dizer que não — Lexie respondeu deva­gar, receosa e nada contente com a atitude provocadora de Lucan.

— Neste caso, não vejo problema em ter aceitado um convite de Barton para jantarmos com eles esta noite.

A única reação visível de Lexie foi crispar os punhos. Apertou as mãos com tanta força que suas unhas lhe machucaram a pele. Jantar com os Barton? Com Cathy Barton, uma mulher que cada vez mais ela achava ser a Cathy Wilson que conhecera e de quem fora amiga havia muitos anos? Lexie engoliu em seco.

— É uma boa idéia sairmos com este tempo?

— Acho que vamos precisar se quisermos comer ou­tra coisa além de torradas. — Lucan sacudiu os ombros, indicando o prato cheio de migalhas diante de Lexie.

— Ainda temos a casserole que Cathy nos mandou ontem à noite — Lexie lembrou. Lucan fez uma careta.

— Duvido que esteja apetitosa, depois de ter sido aquecida e ter esfriado...

Lexie se sentia pisando em areia movediça, e não na neve.

— Podíamos ir ao pub do vilarejo — Lucan disse. — Mas seria ofensivo depois de aceitar o convite de John. — Ele levantou as sobrancelhas.

— Por que você não vai? — Lexie tentou encora­já-lo. — Não estou mesmo com fome, depois que comi as torradas. Além disso, estou cansada, depois da cami­nhada desta manhã. Vou ler um pouco e dormir cedo.

— Dormir cedo seria bom.

E, aparentemente, perigoso, Lexie pensou receosa ao ouvir o tom sensual com que Lucan falara. Olhou-o certa de que seus olhos escondiam uma risada. Estaria brin­cando com ela? Se estava, escolhera a mulher errada!

— Você deve ir jantar com os Barton, Lucan — ela insistiu. — Seria grosseiro que nenhum de nós dois apa­recesse depois de você aceitar o convite.

— Nunca me incomodei por me acharem grosseiro.

— Sou testemunha disso — Lexie resmungou abor­recida.

— E continuo a não me incomodar. — Lucan falou secamente. — Mas se a incomoda...

— Não — ela garantiu depressa.

— Então, vou telefonar e apresentar nossas desculpas...

— Isto não é justo. Cathy provavelmente já preparou o jantar para você — Lexie protestou com impaciência.

— Para nós — ele corrigiu.

— O importante é você — ela argumentou. — Afinal, não passo de uma insignificante AP... E uma AP tempo­rária enquanto você é a celebridade local: o ilustre duque de Stourbridge.

Lucan sacudiu a cabeça com energia.

— AP temporária ou não, não há nada de insignifican­te em você, Lexie.

— Você sabe o que eu quis dizer! — ela respondeu irritada.

Sim, Lucan sabia exatamente onde queria chegar...

— Também não há nada de ilustre no título de duque de Stourbridge! — ele falou com amargura.

— Ha?

— Ah — ele ecoou com tristeza, sem intenção de sa­tisfazer a curiosidade de Lexie a respeito daquela casa de marimbondos. — Como eu lhe disse, o título não me interessa.

— Quer você escolha usá-lo ou não, é assim que o povo de Stourbridge o vê — ela falou com desdém.

— E como você iria saber como o povo de Stourbridge me vê...?

Mais uma escorregada, Lexie percebeu desgostosa. Realmente não era muito boa naquilo. Droga! Era tarde demais para reconhecer que deveria ter se recusado a vir até ali e se arriscado a provocar a ira de Lucan contra a Premier Personnel.

— E evidente que John Barton reverencia você. — Ela deu de ombros. — Além disso, todos sabem que as cidades pequenas vivem de fofocas, não vivem?

— Vivem?

— Ah, pare de se fazer de difícil, Lucan! Se você ti­vesse me consultado antes de aceitar o convite, saberia que eu não estou com disposição para me fazer de hu­milde serva de um duque arrogante em público!

Lucan deu um profundo suspiro, sabendo que, ao mencionar seu título novamente, tentava irritá-lo de propósito. E não lhe daria aquela satisfação. Sabia que havia algo de errado no comportamento de Lexie, mas não conseguia saber o quê. Talvez tivesse a ver com a recusa em dizer onde estivera durante a caminhada da­quela manhã. A relutância em ir jantar com os Barton. A relutância em jantar no pub da cidade. Naquele momen­to, tudo que Lucan sabia é que havia algo estranho no comportamento de Lexie, desde que eles haviam chega­do a Mulberry Hall...

— Você está com disposição para quê? Lexie estremeceu e olhou para ele receosa.

— Eu já disse. Para dormir cedo.

— E eu disse que achava uma boa idéia.

Lucan não se afastara do fogão, mas Lexie se colocou lia defensiva e recuou alguns passos, afastando-se do peri­go que ele representava. Ela umedeceu os lábios, nervosa.

— Não tenho a menor idéia da relação costumeira que você tem com sua AP, Lucan, mas garanto que eu...

— Ah, acho que a minha "relação costumeira" com minha AP é mais que óbvia, como atesta o fato de a últi­ma ter me abandonado sem aviso prévio, antes do Natal, o de eu não saber seu nome até ontem. Não acha?

Sim, Lexie estava mais convencida que nunca do motivo fundamental para que Jessica Brown tivesse deixado o em­prego na St. Claire Corporation fora o fato de que ela não conseguira manter um relacionamento pessoal com Lucan.

Então, por que, sem tentar, em seu caso acontecera exatamente o contrário? Se ela o encorajasse, sabia que logo estaria em seus braços, em sua cama... Talvez fosse o calor que ela sentia quando ele a olhava daquele jeito, dos pés à cabeça, lentamente.

Talvez fosse o formato sensual de sua boca. Talvez fos­se porque ele estava novamente muito próximo, olhando fixamente para seus lábios... Como ela não poderia notar o jeito como ele atravessara a cozinha e chegara perto dela com a sutileza de um gato? Desta vez, ela não tinha para onde fugir. Já estava encostada em um dos armários. Le­xie arregalou os olhos.

— Olhe, eu sei que este é o lugar mais quente da casa, mas isto não lhe dá o direito de tentar fazer amor comigo a cada vez que estamos aqui.

— Tentar fazer amor com você, Lexie? — ele pergun­tou baixinho.

— Você não tem alguma norma a respeito de não se envolver com seus empregados?

Lucan sorriu com desdém.

— No nosso caso, acho que é um pouco tarde para se preocupar, não acha?

Porque ele já a beijara e acariciara de uma maneira mais íntima que outro homem qualquer!

— Além disso — Lucan continuou secamente —, sabemos que você não pretende continuar a ser minha funcionária, assim que voltarmos a Londres.

— Sabemos?

— Ah, sim... — Ele deu um sorriso sensual. — O que significa que não há motivo que nos impeça... de mantermos um relacionamento neste momento.

— Mantermos um relacionamento? — Lexie repetiu debilmente, com a voz esganiçada.

Lucan ficou impaciente com o que considerava ser uma ingenuidade forçada. Ela não poderia ignorar a atração que existia entre os dois nem a maneira como o ar parecia se encher de eletricidade quando os dois ficavam juntos.

Depois de decidir, na noite passada, que Lexie não faria parte de sua vida, ele passara uma hora no escri­tório pensando nela, e principalmente em como ela o deixava excitado, mal ouvia o que John Barton dizia. O mais lógico seria continuar combatendo aquela atração até que voltassem a Londres e Lexie saísse de sua vida, mas o fato de ele não ter ouvido uma palavra do que John Barton dissera mostrava que era tarde demais para isto. Precisava tirar Lexie da cabeça, e o único jeito de fazê-lo seria dar mais um passo naquele relacionamento. Assim que a caçada terminava e ele fazia sexo com uma mulher — qualquer uma —, Lucan costumava per­der o interesse. Com Lexie não seria — não poderia ser --- diferente... Além disso, ele não costumava fugir dos problemas, e ela estava se tornando cada vez mais um problema.

— Ora, vamos, Lexie — ele repreendeu em voz rou­ca. — Somos adultos. Sabemos exatamente o que está acontecendo...

— Não está acontecendo nada! — ela interrompeu com voz firme. — Por favor, afaste-se de mim. — Ela estendeu as mãos e o empurrou.

Lucan sentiu o calor de suas mãos no peito. Suas mãos macias e delicadas. Mãos que ele queria sentir acariciando cada centímetro de seu corpo excitado! Ele olhou para Lexie e segurou as mãos dela contra o peito, fazendo-a sentir as batidas do seu coração, que acompa­nhavam o ritmo da sua crescente excitação. Ela arrega­lou os olhos e corou intensamente.

— Você ainda acha que não está acontecendo nada, Lexie?

Claro que sabia, algo estava sim acontecendo. Podia ser inexperiente, mas não era estúpida. Sabia que havia algo entre os dois desde o momento em que o conhecera. O problema é que Lexie pensara ser antipatia, quando na verdade fora o oposto. Ou simplesmente... Desejo. O olhar de Lucan lhe dizia que ele queria ir mais além. Ela balançou a cabeça.

— Não costumo ter relações casuais com os meus patrões.

— Isto não tem nada de casual — ele garantiu.

— O quê? — O coração de Lexie batia tão forte e alto que Lucan deveria estar percebendo. Assim como deveria estar sentindo o calor e o cheiro de excitação que emanava do seu corpo...

— Em vez de voltar a Londres e nos encontrarmos ocasionalmente, poderíamos ficar aqui por vários dias e acabar com isto.

— Até o amargo fim, com certeza? — ela perguntou perplexa. Lucan deu um sorriso cínico e sacudiu a ca­beça.

— Não precisa ser deste jeito.

— Creia, com nós dois seria assim. — Lexie tinha bons motivos para saber,

— Você não sabe...

— Geralmente, quanto tempo duram seus casos, Lu­can? Duas semanas? Um mês? E depois? Uma jóia cara e espalhafatosa como pagamento por serviços presta­dos? Um gesto caro para garantir que não haja mágoas? — ela torceu os lábios com desprezo. Lucan contraiu o rosto.

— Em geral, minhas mulheres não saem magoadas.

— Não. Elas saem com uma jóia cara! — Lexie bufou sem nenhuma elegância. — Duvido que eu seja seu tipo de mulher, Lucan!

Não era, Lucan reconheceu com impaciência. E por isso resolvera que seria melhor que ficassem ali até que ele eliminasse aquela atração inexplicável da cabeça. Deveria saber que não seria fácil. Afinal, tratava-se de Lexie, a mulher mais frustrante — em todos os senti­dos — que ele já conhecera. A mulher cujas únicas jóias eram um par de brincos de pérolas e um medalhão de ouro pendurado no pescoço. Lucan observou a caixinha oval sobre seus seios.

— De quem é a fotografia que você tem dentro deste medalhão, Lexie?

— O quê? — Ela ficou assustada quando ele tocou o medalhão. — Não toque nisto! — Ela bateu na mão de Lucan e ele instintivamente a fechou, notando que ela ficara pálida e apavorada.

— Quem é, Lexie? — ele repetiu secamente. — Algum antigo amante de quem você sente saudades? Algum na­morado atual? Alguém cuja foto você carrega perto do coração?

— E se for? — ela perguntou, desafiando-o.

Lexie tentou fazê-lo soltar o medalhão, mas ele o segurou com firmeza. Depois de alguns segundos, a corrente onde ele estava pendurado se partiu. Sem acreditar, ela olhou para a corrente solta nos dedos de Lucan. A corrente e o medalhão haviam sido o presente que ela ganhara da avó Sian e do vovô Alex ao fazer 16 anos. O último presente que eles lhe haviam dado juntos. O avô Alex morrera duas semanas mais tarde. Dentro da jóia, juntos para sempre, havia as fotografias sorridentes dos dois.

 

— Não! — Lexie falou sufocada. — O que você fez?

O que ele estava pensando? Lucan se perguntou abor­recido ao vê-la olhar com os olhos cheios de lágrimas para a corrente arrebentada e para o medalhão ainda fechado em sua mão. A verdade é que ele não estava pensando, apenas reagindo. Reagindo de um jeito que nunca reagira antes, perdido numa onda de... O quê? Ele ficou chocado com o próprio comportamento e evitou encontrar a resposta.

— Desculpe-me, Lexie...

— Desculpas? — ela repetiu elevando a voz. — Des­culpas? Você se comportou como um neandertal. Conse­guiu arrebentar a minha corrente e tudo que consegue é pedir desculpas? — Ela sacudiu a cabeça com tristeza. — Dê-me isto. — Ela agarrou o medalhão assim que ele abriu os dedos.

— Vou lhe comprar uma corrente nova quando...

— Não quero outra corrente! — Ela exclamou re­voltada.

— Então, vou mandar que consertem esta...

— Muito obrigada, mas eu mesma vou mandar! — Ela concluiu gelidamente.

Lucan não deixou de notar a maneira como ela agar­rava o medalhão. Protetoramente? Com adoração...?

— Fui responsável por ela ter se partido. Eu devia...

— Você já fez o suficiente, Lucan — ela garantiu. — Agora, vou subir para meu quarto e ler um pouco antes de dormir. E você pode fazer o que quiser!

As lágrimas nos olhos de Lexie contrastavam com a agressividade de seu tom. Não que Lucan não mereces­se sua cólera. Ele se comportara como um idiota havia poucos minutos. Um irracional e selvagem neandertal, como ela assinalara. O que estaria pensando ou sentindo quando lhe perguntara de quem era a fotografia que ela carregava? Droga! Não admira que não percebesse ime­diatamente o que ela sentira, porque ele também jamais sentira o que sentira naquele momento!

Ciúmes. O puro e simples monstro de olhos verdes. Uma emoção que Lucan considerava totalmente irracio­nal e que, com certeza, jamais sentira por causa de uma mulher. E ainda o sentia. As lágrimas nos olhos de Lexie pareciam confirmar que o medalhão escondia a fotogra­fia de alguém que ela amara. E que talvez ainda amasse.

E daí? Por que deveria se preocupar se era com ele que Lexie se mostrava tão apaixonada? A paixão e o desejo eram os únicos sentimentos que Lucan estava preparado para aceitar. Há muito tempo, decidira que o amor era para os tolos que permitiam que as emoções comandassem a sua vida.

Isso incluía Jordan e Stephanie? Ele sentia pena dos dois por se amarem e estarem apaixonados? Claro que não. Era diferente. Jordan era diferente dele. Parecia não se lembrar da destruição da família, que resultara do fato de Alexander se apaixonar por outra mulher. Se isso era o que o amor fazia, fazendo você de tolo, Lucan nada queria com o amor.

— Certo. Apresentarei suas desculpas aos Barton.

— Faça isso — disse Lexie ainda perturbada pela cena que acabara de ocorrer. Uma cena perturbadora e exalta­da que culminara com a quebra de sua preciosa corrente, como se Lucan soubesse quem lhe dera o medalhão e quisesse destruí-lo e a tudo que ele representava...

Mas ele não tinha como saber que o pai dele e sua avó haviam lhe dado de presente, no 16° aniversário. Então, por que ficara tão furioso? Tão diferente? O que estavam discutindo, antes que ele pegasse o seu colar?

— Posso crer que a discussão sobre nós termos um re­lacionamento chegou ao fim? — ela perguntou amarga.

— Acredito que ela nem começou — Lucan disse friamente.

— Não. — Lucan não poderia querer, mais que ela, esquecer a conversa que tiveram! Algumas mulheres teriam ficado vaidosas com a sugestão que os dois fi­cassem ali alguns dias e tivessem um caso. E não importava a palavra que Lucan usasse para descrever, seria exatamente isto: um caso. Lexie se sentia insultada. E talvez, um tanto cheia de si...? Só um pouco. Ela co­nhecia Lucan apenas há dois dias, mas sabia que ele era um homem que não admitia fraquezas. Admitir seu de­sejo por ela fora uma fraqueza para o homem cujo ar de completa indiferença proclamava que ele não precisava de ninguém e de nada. Ele não precisava dela. Lucan a queria, desejava-a, queria levá-la para a cama, mas não precisava dela. Lexie ergueu o queixo e olhou para ele com uni ar de desafio. — Não está na hora de você ir para a casa dos Barton?

— Eles estão nos esperando para daqui a uma hora.

— Então você achou que poderia dar uma rapidinha antes de sair? — ela debochou.

Ele apertou os olhos, com um ar ameaçador.

— Alguém deveria ter lavado sua boca com sabão! — ele rosnou. — E só para que você saiba, Lexie... Se algum dia eu levá-la para a cama, não será para uma "rapidinha"!

Lexie sentiu o rosto queimar, seus seios intumescerem e o calor atingir o vértice de suas coxas.

— Felizmente para nós, isto sempre foi um enorme "se" — ela retrucou secamente.

— Felizmente, sim — ele concordou bruscamente. Lexie percebeu que não iriam a nenhum lugar com aquela conversa.

— Vou subir, esquecer tudo isso e ler. — Ela apertou a corrente quebrada contra o peito. — Se eu descer de novo, espero que você já tenha ido embora.

Lucan se arrependia amargamente de ter sugerido que os dois fizessem algo a respeito do desejo que parecia vi­brar entre eles. Tudo o que precisava agora era convencer o próprio corpo da estupidez que fora aquela sugestão!

— Espero que sim. Se você mudar de idéia a respeito de me deixar consertar o colar...

— Não vou mudar de idéia — ela garantiu depressa. A maneira como ela segurava a jóia, como se esperasse que ele fosse arrancá-la de suas mãos só serviu para que Lucan se convencesse que o colar tinha um significado sentimental para ela, a ponto de não querer que ele o to­casse — quanto mais que o tirasse de suas mãos...

— Meus negócios aqui estão terminados. Você ficará feliz em saber que, se o tempo permitir, poderemos ir embora amanhã cedo.

— Estou completamente extasiada.

Lucan concluiu que nada mais havia a dizer. Nada que ele pudesse fazer. O fato de ele ter admitido seu desejo por ela, a ponto de sugerir que ficassem ali por alguns dias, era mais do que ele pretendia, quando se tratava de Lexie...

 

Quando Lucan voltou da casa dos Barton duas horas depois. Com exceção da luz da cozinha, a casa estava às escuras, o que mostrava que, durante sua ausência, Lexie fora se deitar. Antes ou depois de jantar? Que lhe importava se ela havia ou não se alimentado? Era adulta e perfeitamente capaz de se cuidar. Ele não tinha culpa se ela recusara o convite para jantar com os Barton. Fora o que ela resolvera, antes mesmo da conversa que a deixara tão zangada e resultara no incidente com o colar que tanto estimava.

Apesar de tudo isso, Lucan subiu, passou pelo quarto que resolvera ocupar enquanto estavam ali e parou dian­te do quarto de Lexie. No corredor escuro, viu que havia luz brilhando sob a porta. Ela ainda estava acordada. Lendo, como dissera que iria fazer? Ou talvez, sentada, imaginando um meio de ir embora?

Ele franziu a testa ao ouvi-la se movimentar: uma porta se fechava devagar — possivelmente, a do banhei­ro —, e depois, o ruído abafado de pés descalços sobre o chão acarpetado. Ela estaria apenas sem sapatos? Teria tomado um banho antes de dormir e estaria completa­mente nua do outro lado da porta?

Ao pensar na imagem de Lexie completamente nua, nos seios empinados, no ventre firme e liso, na curva de seus quadris sobre o triângulo de pelos entre suas coxas e nas lindas pernas, Lucan retesou o corpo e crispou os punhos.

Santo Deus! Ele sacudiu a cabeça para se livrar da imagem sedutora, esperando, precisando, conter a própria excitação. Não conseguiu e percebeu que estava tendo uma ereção que se apertava quase dolorosamente dentro do jeans. Deveria voltar para seu quarto. Agora! Afastar-se da tentação de saber que Lexie estava do ou­tro lado da porta... Talvez, nua...

 

Lexie se surpreendeu ao ouvir alguém bater na porta um segundo antes de abri-la. Ela viu a silhueta de Lucan desenhada na obscuridade do corredor. Claro que era ele.

Só havia os dois na casa! Além disso, quem mais teria a arrogância para entrar no quarto dos outros como se fosse seu? E era dele, disse uma voz na cabeça de Lexie. Lucan era dono de Mulberry Hall!

Ah, cale-se, disse Lexie para a voz zombeteira. O im­portante é que ele entrara no seu quarto sem ser con­vidado! Lexie estivera arrumando as roupas que usara naquele dia, dentro da mala.

Ao vê-lo, ela endireitou o corpo: não queria que ele soubesse o quanto se sentia exposta vestindo apenas uma camiseta sem-mangas e as calças do pijama. Não achava que suas roupas fossem perturbá-lo. Com certe­za, as mulheres com quem ele costumava dormir deviam usar seda e rendas, e, mesmo assim, minúsculas.

— O que você quer, Lucan? — ela falou, olhando-o diretamente e sentando-se na beirada da cama coberta de brocado. Podia estar se sentindo vulnerável conversando com um homem, só de pijamas, mas não iria se enfiar sob as cobertas, como se fosse uma virgem apavorada! À luz do abajur, ela notou que ele ainda usava o jeans desbota­do e o suéter escuro que vestira antes de sair para a casa dos Barton e que havia uma ruga profunda em sua testa.

— Você acha que podemos dar uma trégua às hostilidades, Lexie?

Todo o corpo de Lexie, cada nervo, cada músculo e reentrância se colocaram em alerta, dizendo que ela e Lu­can eram incapazes de manter uma conversa civilizada.

— Por que faríamos isto? — ela perguntou desconfiada.

— Porque hoje cedo eu cometi um erro, Lexie. E peço desculpas — ele resmungou.

— E assim conserta tudo?

— Não sei mais o que você quer de mim — ele falou exasperado.

O que Lexie queria de Lucan? Algo que ela sabia que não poderia ter. Jamais. Não apenas porque ele demons­trara ser um homem que não se permitia ter sentimentos profundos por qualquer pessoa, mas também porque ele era Lucan St. Claire, e ela, Lexie Hamilton, a neta da odiada Sian Thomas...

— Por qual erro você está se desculpando, Lucan? — ela perguntou. — Por sugerir que tivéssemos um caso? Ou por quebrar meu colar quando eu o recusei? — A voz dela se tornou áspera ao recordar a sensação do cordão se partindo em sua garganta e o choque de vê-lo nas mãos de Lucan.

— Eu não... — O rosto dele ficou sombrio. — Droga! Você não acredita que eu tenha feito de propósito!

— Não — ela concedeu. — Mas o fato de que tenha ocorrido é uma indicação do quanto é destrutiva esta atração que existe entre nós.

— Destrutiva...? — ele repetiu devagar.

-- Sim. Nós magoamos um ao outro, Lucan. Às ve­zes, sem querer; às vezes, não. De uma forma ou de ou­tra, é isto que fazemos desde que nos conhecemos.

Lucan pensou que batera na porta de Lexie para acertar as coisas entre os dois. Bem... Aquele não fora o úni­co motivo, ele admitiu. Mas certamente entrara na equação. A brecha que se abrira entre os dois não lhe saíra da cabeça o tempo todo que estivera na casa dos Barton.

— Por favor, vá embora, Lucan — Lexie pediu. — Vol­te para seu quarto e me deixe em paz. Desta forma, ama­nhã poderemos ir embora sem nenhum arrependimento.

Lucan contraiu o queixo, impaciente. Nunca se senti­ra tão frustrado na sua vida, tão impotente para consertar uma situação.

O fato de que Lexie parecesse tão deliciosa, sentada de pernas cruzadas em cima da cama, iluminada pela luz dourada do abajur, com os cabelos negros espalhados em torno do rosto e dos ombros, também não ajudava.

O contorno tentador de seus seios e de seus mamilos aparecia visivelmente sob a camiseta fina. Lucan olhou para ela e deu um passo para dentro do quarto. E depois outro. Lexie não fez objeção. Ele deu mais um passo, e outro, até chegar ao lado dela.

— Você realmente quer que eu vá embora, Lexie? — ele perguntou em voz rouca.

Ela queria? Queria que ele virasse as costas e fosse embora, deixando-a sozinha? Sozinha e angustiada? Não. Claro que ela não queria que ele fosse. Mas sabia que deveria ir. Para a tranqüilidade dos dois.

A casa parecera estranhamente vazia depois que ele .saíra, e isto lhe dera tempo para pensar, para avaliar o quanto estava atraída por ele. O quanto queria mais de Lucan, e que ele não tinha capacidade de lhe dar. Lexie percebera que não se tratava apenas dela, mas de qual­quer outra mulher.

Ela não sabia o motivo. Talvez, um caso de amor que dera errado durante sua juventude, ou a separação dos pais, mas tinha certeza de que, em algum momento, Lucan re­solvera se fechar para qualquer emoção. Porém, ela o vira rir várias vezes, durante os últimos dois dias. Geralmente, de algo que ela dissera ou fizera, mas não com ela. Mesmo assim, aqueles momentos de bom humor haviam lhe mos­trado um outro lado de Lucan: um lado solto e leve que podia ser altamente atrativo, até mesmo irresistível.

Lexie não queria sentir-se atraída por Lucan. Não queria achá-lo irresistível. Queria continuar a vê-lo como o homem frio e implacável que pensara antes de conhecê-lo, mas não conseguia. Toda vez que tentava recolocá-lo na imagem antipática, alguma lembrança vinha destruí-la. Lucan implicando com ela; rindo roucamente. Lucan com os olhos brilhando mais de tristeza que de raiva ao fitar o retrato de seu pai na galeria. E, acima de tudo, Lexie não conseguia apagar a lembrança de Lucan quase fazendo amor com ela...

Ele era muitas coisas que ela imaginara: arrogante, autoritário e inatingível sendo apenas três, dentre várias. Mas bastava recordar a paixão que explodira entre os dois na tarde anterior e naquele dia para saber que ele não era apenas frio e implacável. E também para saber que a maneira com que ela reagia a ele, com um desejo totalmente descontrolado, fugia de qualquer padrão es­tabelecido nos seus mornos relacionamentos anteriores.

— Você está demorando muito para responder, Lexie — disse Lucan.

Sabia que deveria insistir para que ele fosse embora. Que ele deveria sair de seu quarto, antes que cometesse o maior erro de sua vida. Mas não conseguia! Assim como não conseguia se imaginar voltando para Londres na ma­nhã seguinte e nunca mais vê-lo. Lexie engoliu em seco.

— Você passou uma noite agradável na casa de John e Cathy?

Lucan franziu a testa ao vê-la mudar de assunto.

— Muito agradável. Eles sentiram muito ao saber que você não pôde ir por causa de uma terrível dor de cabeça — ele falou secamente.

— Foi esta a desculpa que você deu para minha au­sência? — Ela sorriu com ironia.

— Seria difícil dizer a verdade, não acha? Que você foi se deitar porque fui tremendamente ofensivo e você não suportava a idéia de passar a noite em minha companhia?

— Isto não é verdade! — Lexie protestou.

— Não é? — Lucan sentou na cama, ao lado dela, e lhe acariciou o rosto. — Existe algo em você que me faz fazer e dizer coisas cruéis... que eu normalmente não faria ou diria. — Ele balançou a cabeça, desgostoso.

— Talvez seja por eu ser irritante, impossível e teimo­sa? — ela sugeriu.

Lucan desejou que isto fosse tudo o que achava dela. Infelizmente, ela também se mostrara leal — no caso, com a Premier Personnel, ao concordar em acompa­nhá-lo a Mulberry Hall —, corajosa diante de seu de­sagrado, que,costumava sacudir homens maduros e, além disso, inteligente, esperta, divertida e tão boni­ta que só de olhar para ela ele ficava dolorosamente excitado.

— Não — ele disse, pegando-lhe o rosto e afastando-lhe os cabelos que caíam sobre a face. — É porque eu quero tanto fazer amor com você que não consigo raciocinar.

— Você quer...? — Lexie umedeceu o lábio. Ele con­cordou.

— Quero, Lexie... Preciso tanto fazer amor com você que não consigo pensar em mais nada.

O coração de Lexie disparou ao ouvi-lo admitir, e ela sentiu que sua pele se incendiava e ficava sensível ao calor das mãos de Lucan, que lhe acariciavam os cabe­los. Ela viu seu rosto tenso e o brilho de desejo em seus olhos ecoava o desejo que ela também sentia e que era mais forte que a certeza de que fazer amor com Lucan era exatamente o que ela deveria evitar.

 

— Diga alguma coisa, Lexie...! — ele resmungou.

— Shh — ela sussurrou, tocando o rosto de Lucan e sentindo um arrepio de calor lhe percorrer o braço e descer por suas costas. Seus seios formigaram quando ela imagi­nou as mãos e os lábios de Lucan sobre eles. Seus mamilos despontaram, e ela sentiu um calor úmido entre as pernas. Queria que Lucan fizesse amor com ela. Queria fazer amor com ele. Queria acariciá-lo, tocá-lo, provar cada centímetro de sua pele!

Lexie olhou para ele fixamente, ajoelhou-se na cama e, colocou as mãos em seu peito, aproximando-se. Che­gou tão perto que sentiu o calor que emanava de seu corpo e as batidas rápidas de seu coração sob o suéter. E ainda não era suficiente. Queria tocar sua pele, sentir sua carne estremecer sob suas mãos, sob seus lábios. Lexie continuou a olhar para Lucan enquanto puxava seu suéter para cima bem devagar.

— Lexie? — Lucan exclamou em tom abafado.

— Por favor, não fale, Lucan — ela falou, tocando-lhe os lábios. — Sempre acabamos discutindo e um de nós acaba dizendo algo que não deve. — Ela voltou a aten­ção para os pelos que desciam pelo peito de Lucan e que sumiam sob o jeans. O peito musculoso sob seus dedos mostrava que ele não se dedicava apenas ao trabalho! Ela lhe tocou os mamilos e Lucan respirou ofegante. — Você gostou...?

— Ah, sim!... — ele respondeu, corando, contraindo o queixo, e observando-a por sob as pálpebras semicerradas. Lexie baixou a cabeça e lhe lambeu o peito. Ele arqueou o corpo e fechou os olhos, segurando-a pela ca­beça. O ar frio que atingia os lugares que ela acabara de lamber o excitava. Lucan tirou o suéter e jogou-o no chão. Seu corpo se incendiou quando Lexie o abraçou pela cintura e lhe acariciou os ombros e as costas en­quanto continuava a percorrer seu peito com a língua. Ele também queria acariciá-la... Lexie gemeu roucamente quando ele lhe agarrou o seio e lhe acariciou o mamilo através da camiseta, causando-lhe ondas de prazer pelo corpo. Lucan se afastou um pouco, ofegante. — Deixe-me olhar para você...

Lexie sentou sobre os joelhos e tirou a camiseta. Ela corou ao ver que ele a olhava de olhos famintos. Seus seios se enrijeceram e seus mamilos se tornaram duros e rosados como framboesas maduras sobre a pele clara, pedindo para serem devoradas.

— Você é tão bonita, Lexie... — ele disse, pegando-lhe os seios e percorrendo-os com a língua. Enlouquecida, Lexie agarrou-o pelos ombros e o calor que lhe percorria o corpo se concentrou entre suas coxas. Enquanto ele a sugava, levando-a a se incendiar de prazer, ela concluiu que não poderia mais esperar.

— Lucan...! — ela gemeu, puxando-o pelos cabelos, arqueando o corpo, empinando os seios. Lucan des­ceu a mão pelo seu ventre, afastou as calças do pijama e tocou o vértice de suas pernas, acariciando-a lenta e repetidamente. Lexie perdeu o fôlego e começou a ge­mer baixinho enquanto chegava cada vez mais perto de explodir de prazer, mas não o suficiente. — Lucan, por favor! — Ela sentiu que o seu corpo tremia e arqueou os quadris, entreabrindo as pernas. Lucan soltou seu seio e percorreu com beijos o caminho que ia até seu pescoço, e depois sua boca. Enfiou os dedos em seus cabelos e manteve sua cabeça firme enquanto sorvia um grito de prazer em seus lábios.

Lexie mal se recuperara do êxtase, quando sentiu os dedos de Lucan dentro de seu corpo. Ela contraiu os músculos, segurando-os, enquanto ele os movimentava lentamente. Ele voltou a lhe cobrir o seio com a boca, mandando-a novamente às alturas.

— Ah, Deus... Ah... Deus! — Lexie encostou a cabe­ça no ombro de Lucan e se pendurou em seus ombros enquanto o prazer lhe sacudia o corpo. Ele lhe beijou o queixo e lhe mordeu o lóbulo da orelha e voltou a acariciá-la. Lexie estremeceu, suas costas se esticaram e ela não pôde mais se agüentar.

— Lucan, eu não posso...

— Pode — ele murmurou gentilmente, afastando-se um pouco para deixar que ela caísse sobre as cobertas, e tirou-lhe as calças do pijama, jogando-as no chão. Nua, banhada pela luz dourada, Lexie mais sentiu do que viu o olhar com que ele a observava lentamente, de cima a baixo. Ele parecia um Deus pagão ao se ajoelhar junto dela com os cabelos caindo sobre a testa, um olhar apai­xonado, uma expressão sensual, o corpo musculoso.

— Tire os jeans, Lucan — ela pediu em voz rouca.

— Tire-os para mim — ele provocou.

Lexie engoliu em seco e sentou na cama, sem con­seguir deixar de olhar. Desabotoou o fecho do jeans e sentiu que os músculos de Lucan se contraíam ao serem tocados inadvertidamente por seus dedos enquanto ela abria o zíper. Ela percebeu que não conseguiria livrá-los das calças sem ajuda, mas talvez ainda não precisasse tirá-las completamente... E mordeu os lábios ao ver o volume que havia sob o calção. Ela o envolveu em seus dedos e o acariciou. Ele se tornou mais rijo e começou u pulsar.

— Ah, sim, Lexie. Preciso sentir suas mãos na minha pele!

— Deite-se — ela ordenou, ajoelhando-se ao lado dele. Lucan deixou que ela o despisse e Lexie se pôs a observá-lo. Sim, era muito bonito, um deus grego em carne e osso: bem proporcionado, de ombros e peito largos, cintura estreita, pernas longas e perfeitas, e a sua ereção parecia um convite. Um convite ao qual ela não conseguia resistir, pensou Lexie, umedecendo os lábios.

Lucan parecia ter morrido e ido para o céu. O que mais ele poderia achar quando Lexie fazia exatamente o que ele a imaginara fazendo no dia em que a conhe­cera? Talvez não estivesse no céu. Talvez simplesmente tivesse enlouquecido! Se isto era loucura, ficaria feliz por ser louco pelo resto da vida! Ele gemeu ao senti-la acariciá-lo e prova-lo delicadamente.

— Você também gosta disto...?

Se ele gostava? Mal conseguia raciocinar!

— Se eu disser "mais" estarei respondendo a sua pergunta?

— Ah, sim — Lexie riu de mansinho, corando e vol­tando a acariciá-lo. Lucan agarrou a colcha ao ver o jei­to como ela o olhava e a maneira com que seu próprio corpo reagia. Ela estava adorando lhe dar prazer, e ele estava adorando receber...

— Quero estar dentro de seu corpo quando atingir o êxtase, Lexie — ele disse, puxando-a e abraçando-a.

Lucan queria estar dentro do seu corpo... A atmosfera sensual pareceu se dissolver na cabeça de Lexie. Não porque ela não quisesse senti-lo dentro do corpo — an­siava por isto. Sua súbita insegurança tinha outro moti­vo. Lexie costumava ler muito. Adorava ler romances e, em cada livro que lera, quando o herói só percebia a inexperiência da mocinha depois de tirar sua virgindade, podia ter dois tipos de reação: acusá-la, por suspeitar que ela lhe montara uma armadilha; ou tornar-se sentimental por ser seu primeiro amante e estar apaixonado por ela. Lexie sabia que Lucan não estava apaixonado por ela, o que a deixaria apenas com as acusações...

— Lexie?

Ela umedeceu os lábios e franziu a testa ao encará-lo.

— Acho que eu deveria perguntar como você se sente a respeito de ser o primeiro amante de uma mulher. Lucan olhou para ela, admirado.

— Seu primeiro amante? — ele disse depois de algum tempo.

— Sim.

Como Lucan se sentia em relação a ser o primeiro amante de Lexie? Como se sentiria qualquer homem ao pensar em ser o primeiro amante daquela linda mulher? Provavelmente, do mesmo jeito que ele se sentia: honra­do. E um tanto surpreso.

— Eu não tinha idéia — ele murmurou. — Você é tão extrovertida, confiante, nunca me ocorreu que você nunca tivesse levado um homem para a sua cama.

— Bem... Eu... — Lexie ficou corada. — Tecnica­mente, esta cama não é minha.

— No momento, é.

— Achei que deveria lhe contar antes... Bem... Antes de irmos mais longe. Toda mulher precisa começar em algum momento, certo? — Ela se animou. — Melhor que seja com um homem que saiba o que está fazendo.

— Bem melhor — Lucan resmungou com medo de não conseguir deixar de rir do comentário típico de Lexie. Ele se deu conta de que ninguém fizera amor com ela do jeito que ele fizera e que pretendia fazer. Lexie nunca acariciara outro homem do jeito íntimo que o acariciara. Só de pensar, recomeçava a se sentir excitado.

— E prefiro que você não se torne zangado nem sen­timental a respeito deste fato... — ela advertiu.

— Zangado ou sentimental? — Lucan repetiu curioso.

— Bem... Certo. Sendo você quem é, não é provável que se torne sentimental. Mas eu não queria me arriscar. — Ela deu de ombros. Lucan olhou para ela, intrigado.

— Sendo eu quem sou?

— Olhe, Lucan, esta conversa seria mais rápida se você não ficasse repetindo tudo o que eu digo! — Lexie censurou.

Impossível. Lucan não conseguiu mais conter o riso. Deveria estar aborrecido com o "sendo você quem é", mas a verdade é que estava alegre demais para se abor­recer com qualquer coisa que ela dissesse. Para Lucan, fazer amor sempre fora assunto sério, algo mutuamente satisfatório, mas sem nenhum sentimento, a não ser a satisfação que um parceiro proporcionava ao outro. Somente Lexie, uma mulher como nenhuma outra que conhecera, conseguira sacudi-lo e fazê-lo rir enquanto faziam sexo.

— E não quero que você ria de mim! — Lexie falou ofendida.

— Não estou rindo de você, Lexie — ele disse, abraçando-a. — Estou rindo com você!

Ela reconheceu que era uma mudança. E uma mudança muito agradável, uma vez que ele já sabia que era virgem.

— Você é uma mulher extraordinária, Lexie Haminton — ele murmurou.

— Isto é outra coisa em que concordamos! — ela dis­se alegremente, recuperando a confiança.

— Não. Você tinha razão quando disse que acabamos sempre brigando! — Ele sorriu. — Respondendo a sua pergunta, eu gostaria muito de ser seu primeiro amante.

— Gostaria? — Ela arregalou os olhos.

— E muito.

De repente, Lexie pensou que era muito engraçado que estivesse nua e sentada na companhia de um homem também despido, conversando a respeito de continuarem a fazer amor ou não. E lhe pareceu muito ridículo.

— Lexie...? — Lucan exclamou com indulgência ao ouvi-la dar uma risada.

— Desculpe, eu só... É... — Ela começou a rir, e ima­ginou que deveria ser de alívio, diante da inesperada, mas bem-vinda reação de Lucan ao fato de que ela ainda fosse virgem. Fosse qual fosse o motivo, ela não conseguia parar de rir, e, segundos depois, sentiu o peito de Lucas sacudir e percebeu que ele também começara a rir.

 

— O que acha de descermos para comer alguma coisa? — Lucan estava deitado, e Lexie estava com a cabeça encostada em seu ombro, com o braço apoiado sobre seu peito. Depois que os dois haviam conseguido parar de rir, ele a puxara para seu lado. Não consegui­ra fazer justiça ao delicioso jantar que Cathy Barton prepara porque perdera o apetite depois da briga que tivera com Lexie e sabia que ela também não deveria ter comido nada naquela noite. Além disso, queria sa­borear por mais tempo o fato de que seria seu primeiro amante...

— O que...? — Lexie olhou para ele admirada.

— Você comeu algo depois que eu saí esta noite? — ele perguntou gentilmente.

— Não, mas... você não queria...? Quer dizer, eu che­guei lá várias vezes, mas você...

Lucan rolou na cama e colocou-a sobre os travesseiros.

— Se você está tentando dizer, com seu estilo inigualá­vel, que teve orgasmos múltiplos e eu não tive nenhum...

— Lucan! — Ela escondeu o rosto no ombro de Lucan, envergonhada. E adorável, ele pensou com indulgência.

— Está? — ele provocou, sendo recompensado com um "sim" abafado em seu peito. — Não há pressa, Le­xie. Temos a noite toda — ele garantiu em voz rouca. Ela o olhou admirada.

— A noite toda...?

— Agora quem é que está repetindo tudo que eu digo? — ele brincou.

— Bem, sim... mas... a noite inteira, Lucan? — ela falou num tom admirado e, ao mesmo tempo, animado.

— Não vejo por que não, contanto que você me man­tenha alimentado para conservar minhas forças.

— Então, vamos descer e comer! — Ela se remexeu nos braços de Lucan e sentou. A visão dos seios empinados de Lexie fez com que Lucan reconsiderasse a ideia de precisar comer naquele momento. Poderiam facilmente adiar a refeição por 15 minutos. Talvez por meia hora... Uma hora...

Era tarde demais. Lexie já levantava da cama e lhe dava as costas, envergonhada, cobrindo-se com um roupão. Sua timidez fora do comum lembrou a Lucan que, apesar de sua decantada confiança, Lexie não era uma das mulheres sofisticadas com quem ele geral­mente dormia. E eles teriam a noite inteira...

 

Dez minutos depois, sentada no calor da cozinha junto com Lucan, comendo queijo e biscoitos que Cathy Barton mandara dentro da caixa de mantimentos no dia an­terior, e bebendo café, Lexie se espantava por sentir-se tão relaxada.

Lucan não parecia mais o homem todo poderoso que conhecera, e sim o homem que estava prestes a se tornar seu primeiro amante... Talvez fosse por causa dos cabelos negros que lhe caíam sobre a testa em vez de estarem penteados no usual estilo severo. Talvez fosse o jeans e o agasalho que ele vestira antes de descer. Ou a maneira à vontade com que ele servira a comida è o café há alguns minutos. Ou o sorriso caloroso que lhe curvava os cantos da boca, toda vez que olhava para ela. Qualquer que fosse o motivo, Lexie se sentia à vontade em sua companhia.

— Isto é ótimo.

— Sim, é mesmo — ele concordou.

— Não precisa parecer tão surpreso! — disse Lexie rindo.

Lucan estava surpreso com o quanto era agradável simplesmente sentar ali e fazer um lanche com Lexie, simplesmente estar com ela e não fazer nada. Sentia-se totalmente relaxado, uma comodidade rara em sua vida muito agitada, sem tempo para sentar e "apreciar a pai­sagem", como sua mãe dissera na última vez que haviam se encontrado, advertindo-o sobre a necessidade de tra­balhar menos e relaxar.

Considerando a tensão que se formara entre eles desde que haviam se conhecido, Lexie Hamilton seria a última pessoa com quem ele pensaria poder ficar à vontade. E, dentre todos os lugares, em Mulberry Hall!

— É muito bom, Lexie — ele garantiu roucamente. Ela olhou para ele com um ar questionador.

— Você está surpreso?

— Você sempre me surpreende, Lexie — Lucan de­clarou com sinceridade, reconhecendo que provavel­mente isto fazia parte da atração que ela exercia. Ele nunca sabia o que Lexie iria fazer ou dizer em seguida!

— De que maneira?

— De todas as maneiras!

— Então... — Ela olhou para ele por entre as pestanas abaixadas. — Vou ser a sua primeira virgem?

Lucan olhou para ela, incrédulo, e soltou uma gar­galhada.

— Você vai ser...? — Ele sacudiu a cabeça. — Nunca conheci alguém como você, Lexie.

— Isto é bom, não é?

Lucan não tinha certeza se "bom" seria a palavra exata para descrever aquela experiência. Sem dúvida, para ele era uma novidade poder conversar de maneira franca e aberta com uma mulher com quem pretendia fazer amor muitas vezes, antes que a noite terminasse. E também no dia seguinte, se ele conseguisse persuadi-la a mudar de idéia quanto a ir embora.

— Realmente, é diferente — admitiu.

— Diferente bom ou ruim?

— Acho que bom. — Ele franziu a testa.

— Mas você não tem certeza? — ela perguntou com um olhar risonho.

— Acho que não tenho certeza de nada, desde que conheci você — ele reconheceu com tristeza. — Obvia­mente, você não estava na fila quando distribuíram o gene da discrição.

— Ah, provavelmente estava escondida atrás da porta — ela falou com displicência.

— Exato. — Lucan se endireitou na cadeira. — Por­tanto, sim, Lexie. Você será minha primeira virgem.

— E como você se sente a respeito? — ela perguntou, inclinando a cabeça para o lado.

— Nervoso.

— O quê? — Ela olhou para ele perplexa, absoluta­mente admirada que Lucan admitisse estar nervoso. A primeira coisa que ela notara a seu respeito fora a aura de poder, que ele usava como se fosse um manto. Uma autoconfiança inata que dizia que ele sabia quem era e que desafiava qualquer um que ousasse ignorá-la. Lucan deu um sorriso desdenhoso.

— Tente ver as coisas do meu ponto de vista, Lexie. Você tem... O quê? Vinte e poucos anos?

— Vinte e quatro.

— Hum. E, sem dúvida, nesses 24 anos leu alguns livros e viu filmes que mostram o sexo como uma expe­riência maravilhosa e incontrolável?

— Sem dúvida — ela falou, corando.

— E se a realidade não corresponder ao que estava escrito nos livros e ao que foi mostrado nos filmes?

— Até agora, correspondeu! Lucan sorriu.

— Você está fazendo maravilhas pelo meu ego, Lexie.

— Seu ego não precisa ser inflado!

— Você parece ter muita certeza disto.

Claro que Lexie tinha certeza. Bastava olhar para ele, sentado do outro lado da mesa, tão relaxado e seguro de si como um gato sonolento — da variedade mais selvagem, claro. Lucan St. Claire era totalmente independente e sempre seria um homem que se permitia manter relações sexuais sem se envolver emocionalmente. E isto era con­veniente para Lexie. Passariam uma noite juntos e nunca mais se encontrariam. Poderia mesmo nunca mais encon­trá-lo, depois que voltassem para Londres no dia seguinte.

— Alguma de suas outras mulheres já teve motivos para reclamar? — ela provocou. Lucan franziu as so­brancelhas.

— Lexie...

— Não me diga... Não fica bem falar sobre outras mu­lheres com quem você dormiu?

Lucan pareceu se divertir.

— Creia, nunca aconteceu o que me aconteceu com você...

— É mesmo? — Lexie mordeu o lábio, levantou, deu a volta na mesa, levantou o roupão até os quadris, apoiou-se nos ombros de Lucan e montou em seu colo.

— Agora, não é meu ego que você está inflando, Le­xie — Lucan disse quando ela começou a se movimentar lentamente sobre sua ereção sob o jeans.

— Não? — Ela deu um sorriso malicioso e sensual e continuou a se movimentar ritmicamente. Os olhos de Lucan escureceram e ele lhe abriu o roupão, desnudando-lhe os seios.

— Você é linda, Lexie — ele falou, beijando-lhe os mamilos, antes de se concentrar em um deles. Lexie per­deu o fôlego.

— Preciso que você faça amor comigo, Lucan — ela balbuciou, enfiando os dedos nos cabelos de Lucan.

— Aqui?

— Em qualquer lugar!

Lucan nunca conhecera uma mulher.como Lexie, tão direta, tão honesta a respeito de si própria e de seus de­sejos. O mesmo desejo que rugia dentro dele desde que a conhecera. Desejo no qual os dois se perdiam enquanto se beijavam e se, tocavam. Apaixonadamente, incontrolavelmente. Lábios e mãos que procuravam e encontra­vam cada ponto de prazer. Cada toque, cada carícia fazia com que a paixão aumentasse cada vez mais, numa es­piral incontrolável.

Lucan segurou Lexie pelas nádegas e a levantou. Ela se agarrou aos seus ombros e lhe envolveu a cintura com as pernas, enquanto ele saía da cozinha e a carregava peja escada, levando-a para o quarto, onde a colocou gentilmente sobre a cama.

Lexie tirou o roupão enquanto o via tirar as roupas e juntar-se a ela na cama, colocando-se entre suas pernas e observando-a fascinado.

— Deus, como você é linda, Lexie... — ele gemeu, acariciando-lhe a pele e inclinando a cabeça. — Tão linda — ele disse, deixando que seu hálito aquecesse o ponto mais sensível de Lexie.

Lexie engasgou ao sentir o primeiro contato da boca de Lucan sobre seu corpo. Ele a provocou com a lín­gua, e a sensação e o prazer eram diferentes de tudo que ela já sentira: mais profundos, mais fortes do que sentiu mais cedo. Lexie afundou a cabeça no travesseiro e o seu corpo foi atravessado por um orgasmo que parecia queimá-la e nunca acabar, enquanto Lucan sorvia todo vestígio do gozo, antes de abraçá-la.

— Deixe que entre em você, Lexie, antes que eu perca a cabeça.

Lexie não precisou ser encorajada e o guiou para dentro de seu corpo, abrindo-se para ele, até que ele atravessasse a barreira de sua virgindade. Lucan ofegava pesadamente. Estava determinado a manter o controle, garantindo que ela gostasse de sua primeira experiência. Mas não era fá­cil. O seu corpo pulsava, na ânsia de se apossar do que já era seu! Ele se apoiou nos cotovelos e olhou para ela.

— Eu não quero machucá-la! — ele disse.

— E não vai. — Ela disse com um olhar confiante. Lucan encostou a testa suada na testa de Lexie e respirou profundamente.

— Posso...

— Não vai — ela repetiu com certeza. Lucan encheu o peito diante da confiança de Lexie na sua habilidade para não machucá-la.

— Segure-se nos meus ombros — ele disse, afastan­do-se um pouco, antes de investir contra o corpo de Lexie e eliminar a barreira de sua virgindade. Ele ouviu-a ge­mer e contrair o corpo, enfiando as unhas em seus om­bros, antes de relaxar e deixar que ele ocupasse o espaço quente e macio como o veludo. Lucan segurou-a pelos quadris e a beijou, começando a se movimentar ritmicamente, dentro do corpo de Lexie. Seu prazer aumentava a cada nova investida, mergulhando-o num êxtase nunca experimentado. Ele sentiu a tensão do corpo aumentar, crescer cada vez mais, e os pequenos gritos de prazer que ela soltava mostravam que ela se aproximava do clímax. Ela o envolveu com as pernas e contraiu todo o corpo em espasmos que o levaram junto com ela. Ele sentiu que explodia dentro de Lexie, num prazer interminável.

 

— Uau... — Lexie falou, bem mais tarde, em tom débil e ofegante, depois de recuperar o fôlego e se sentir capaz de falar. Ela acariciou as costas de Lucan, que ainda estava dentro do seu corpo, deitado sobre ela. Ele deu uma risada.

— Isso foi...

— Por favor, não acabe com minha felicidade dizen­do que fui péssima! — ela resmungou.

— Incrível! — ele disse, levantando a cabeça para olhar para ela. — Você é incrível, Lexie — ele garantiu com sinceridade e muito sério, pegando-lhe o rosto. — Eu machuquei você?

— Não —, Lexie sentira apenas uma pequena pontada de dor que logo fora esquecida quando ela sentira o prazer de ter Lucan dentro de seu corpo. Ele não pareceu se convencer.

— Você provavelmente está um pouco dolorida? Lexie se sentia completamente ocupada e preenchida por Lucan, mas certamente a sensação não era dolorida. De fato, era o contrário, e os seus músculos continuavam a ter espasmos em torno dele.

— Nem um pouco. — Ela acariciou a sobrancelha de Lucan. — Na verdade, assim que você for capaz, gosta­ria de fazer tudo outra vez!

— Menina gulosa — ele murmurou admirado.

— Hum... — Lexie apertou as pernas que rodeavam a cintura de Lucan. — Pretendo mantê-lo exatamente onde está pelo resto da noite! — Ela não iria desperdi­çar um minuto, um segundo, da única noite que passaria com Lucan. Ele balançou a cabeça.

— Sua honestidade é impressionante.

Lexie ficou paralisada. A honestidade...? Fora total­mente honesta a respeito de seu prazer ao fazerem amor, mas e quanto a tudo mais? Não fora honesta com Lucan a respeito de qualquer outro fato da sua vida! Não traba­lhava como temporária para a Premier Personnel. Ajuda­va os pais a administrarem a empresa. Não era verdade que não houvesse outra temporária disponível para ser mandada à St. Claire Corporation. Lexie deliberadamente resolvera que ocuparia o lugar pessoalmente durante três dias para satisfazer a antiga curiosidade que tinha a respeito da família St. Claire. Principalmente a respeito do chefe da família, Lucan St. Claire.

Bem, fizera mais que satisfazer a curiosidade a res­peito de Lucan. Muito, muito mais.

— Lexie...? — Uma profunda ruga se formou na testa de Lucan, quando ela deslizou as pernas por seus quadris e esticou-as sobre a cama. Lexie soltou o braço sobre o colchão. — Você está arrependida?

Não era o tipo de arrependimento que Lucan imagi­nava, mas sim, Lexie se arrependia de várias coisas. De muitas. Principalmente, de ter começado aquela farsa porque, se Lucan descobrisse quem era exatamente, se soubesse de seu parentesco com Sian Thomas, iria real­mente odiá-la. Lexie não queria que a odiasse. E não o odiava mais...

Como pudera pensar em fazer amor com Lucan, apos­sar-se do que ele tinha para dar fisicamente — o prazer que vislumbrara em todas as ocasiões que a abraçara e beijara —, e ir embora como se não houvesse conseqü­ências? Como pudera ser tão ingênua? Como fora tão estúpida ao não perceber que se apaixonara...?

 

— O que há de errado, Lexie? — Lucan franziu a testa ao vê-la olhar apavorada. — Fale comigo, droga! — Ele a pegou pelos ombros e sacudiu-a.

Falar com ele? Lexie não sabia se seria capaz de falar com ele outra vez, e, muito menos, de maneira coerente. Estava apaixonada por ele! Apaixonara-se por Lucan St. Claire, o homem que sempre odiara. O único homem que acreditava ter todos os motivos para desprezar sua família. Lexie ouvira dizer que existe uma linha muito tênue entre o amor e o ódio... Como isto acontecera? Por quê? Que Deus vingativo e louco — ou deusa — lhe lançara aquele feitiço?

— Lucan... Você poderia se afastar? — Lexie pediu desesperada, sentindo que o que comera mais cedo lhe subia amargamente até a garganta. A sensação piorou e ela se sentiu sufocar pela proximidade de Lucan, pelo fato de seu corpo ainda estar intimamente ligado ao dela.

— Depressa, Lucan! — ela implorou. — Acho que... Acho que vou vomitar!

Lucan mal teve tempo de se soltar e rolar de lado na cama, antes que Lexie levantasse e corresse nua para o banheiro. Ela bateu a porta e, segundos depois, ele a ou­viu vomitar violentamente.

Lucan caiu sobre o travesseiro e olhou para o teto, sentindo-se um tanto nauseado consigo próprio ao pen­sar que Lexie podia estar passando mal por terem feito amor. Talvez ele a tivesse magoado? Ela podia estar tão magoada a ponto de se sentir fisicamente mal? Ou seria outra coisa? Provavelmente, a consciência do que aca­bara de acontecer entre os dois a afetara profundamente? Lucan sentou na cama e parou bruscamente, sentin­do uma fisgada no peito ao ver uma mancha de sangue no lençol: a evidência da inocência de Lexie. Com uma expressão resoluta, ele levantou e vestiu o jeans, cami­nhou descalço até o banheiro, bateu na porta e girou a maçaneta.

— Lexie...

— Não entre aqui! — Lexie gritou, desesperada ao ver o que ele pretendia. Não era suficiente que Lucan soubes­se que ela estava ali, vomitando a comida e a bebida que ingerira mais cedo, e ela ainda teria que sofrer a humilha­ção de ele vê-la nua, agachada ao lado do vaso? — Vá embora, Lucan — ela disse irritada. Ela o viu parado do outro lado da porta entreaberta. Podia vê-lo. Claro que ele também a enxergava!

— Você precisa de ajuda...?

— Para vomitar? — ela zombou. — Acho que não, muito obrigada! Vá embora e me deixe em paz — ela falou impaciente.

— Não posso...

— Claro que pode. — Lexie pegou uma toalha na prateleira e enrolou-a em volta do corpo, antes de levan­tar. — É fácil, Lucan: feche a maldita porta, dê meia-volta e vá embora!

— Não.

— O que quer dizer com "não"? — Lexie deu a des­carga no vaso, antes de atravessar o banheiro, abrir a porta e encará-lo. Lucan, tão sexy e atraente, vestindo o jeans desbotado, que ela sentiu os joelhos fracos só de olhar!

Seu peito era tão musculoso e largo, o abdômen tão fir­me, e os jeans colados aos quadris estreitos e às pernas musculosas e longas... Olhar para seu rosto também não ajudava, com os cabelos ainda despenteados e caindo sen­sualmente sobre a testa; os olhos escuros cheios de preocu­pação e a boca firme que pedia para ser beijada.

Bem, pedindo para ser beijada se Lexie não estivesse com um gosto desagradável na boca, depois de vomitar o jantar! Ela voltou para dentro do banheiro, foi até a pia e escovou os dentes.

— Quero dizer "não", Lexie — Lucan repetiu clara­mente atrás dela. — Precisamos conversar.

— Não precisamos fazer nada deste tipo! — Ela enxaguou a boca com água e se voltou para encará-lo. — É óbvio que comi algo que me fez mal...

— Queijo e biscoitos? — Lucan perguntou em tom cético.

— Alguma coisa! — Lexie passou por ele, entrou no quarto e pegou o roupão que jogara mais cedo no chão.

Lucan se apoiou na porta do banheiro e se pôs a obser­vá-la. A confusão dos cabelos negros apenas acentuara a palidez de seu rosto, mas isto em nada diminuía a sensu­alidade de Lexie, enrolada apenas numa toalha, deixando entrever os seios e as pernas bem torneadas. Lucan sentiu uma onda de excitação quando ela enfiou os braços nas mangas do roupão, antes de se livrar da toalha, e apertou a faixa em torno da cintura, fazendo com que o tecido macio acentuasse os contornos de seus seios. Ele se afas­tou da porta, reprovando-se pela inconveniente ereção.

— O que aconteceu, Lexie?

— Eu lhe disse... — Ela ergueu o queixo.

— Não se tem uma intoxicação comendo queijo e bis­coitos — ele disse com convicção.

Lexie desejou que ele estivesse mais vestido. Era desconcertante conversar com um homem de aparência tão sexy quanto a de Lucan naquele momento. Um homem cuja ereção inegável se mostrava sob as calças apertadas. Um homem por quem havia poucos minutos descobrira estar apaixonada... Lexie enfiou as mãos que tremiam nos bolsos do roupão.

— Eu tenho — ela afirmou com teimosia.

— É claro. — Ele sacudiu a cabeça. — Não foi a co­mida que lhe fez mal.

— Então, o que foi, doutor St. Claire? — ela desafiou.

— Esperava que você me dissesse.

— Ah, não... — ela falou com ironia. — É você quem parece pensar que tem todas as respostas!

Lucan respirou profundamente pelo nariz. Não pre­tendia deixar que Lexie o fizesse perder a paciência, como ela evidentemente tinha intenção de fazer.

— Talvez você esteja arrependida do que acaba de acontecer?

— Eu já lhe disse que não.

— Logo antes de vomitar violentamente! — Lucan disse asperamente, sabendo que Lexie mentia... Que a honestidade que ele mencionara mais cedo lhe faltava naquele momento. Ele só não sabia por quê.

— E óbvio que comer queijo no meio da noite não me faz bem.

— Já descartei este motivo, Lexie.

— Mas eu não! — Os olhos de Lexie brilhavam de raiva. — Será que você pode simplesmente ir embora, Lucan? — ela perguntou aborrecida. — Não estou me sentindo bem e gostaria de ir para a cama.

— Sozinha?

— Claro que sozinha! A não ser que você tenha o es­tranho desejo de fazer amor com uma mulher doente?

O desejo de Lucan nada possuía de estranho. Parecia apenas ser permanente. Um desejo que não acabava e que não chegara perto de ser esgotado pelo fato de terem feito amor. E que talvez nunca fosse completamente sa­tisfeito, por mais que ele fizesse amor com aquela mu­lher em particular...

Lucan contraiu o rosto.

— Talvez eu deva dormir aqui, parar o caso de você passar mal durante a noite.

— Não deixei bem claro que não gosto de ter público enquanto estou vomitando?

Lucan balançou a cabeça enfaticamente.

— Assim como antes deixou bem claro que mal podia esperar para fazermos amor novamente.

Lexie suspirou. Fora o que dissera, não é mesmo? An­tes de perceber o que sentia por ele. Antes de perceber que estava apaixonada por Lucan St. Claire, 15° duque de Stourbridge, um homem que sempre considerara ser seu pior inimigo, assim como ele deveria considerá-la e a toda a sua família...

— Foi a euforia de depois... — ela falou com displi­cência, olhando para outro lado. Olhar para Lucan era o bastante para desejar reviver o prazer de antes, de durante e de depois de fazerem amor! — Você sabe: é como sa­borear um delicioso pedaço de bolo de chocolate e ansiar pelo próximo, sabendo que não vai lhe fazer bem.

Lucan sorriu friamente.

— É um eufemismo interessante.

Lexie retribuiu o sorriso frio com um sorriso lumino­so e sem sentido.

— Eu também acho.

— Você sabia que o chocolate pode viciar?

— Somente quando é puro — disse Lexie com impertinência.

— Acabamos de fazer amor, Lexie, e foi realmente ótimo. Então, por que estamos brigando?

Realmente, tinha sido ótimo, Lexie reconheceu entris­tecida. Para ela, fora mais que ótimo: fora mágico. Fora além de tudo que poderia imaginar, até que ela se dera conta de que o motivo pelo qual se tornara mágico, ma­ravilhoso, era o fato de ela estar apaixonada por Lucan...

— Foi o que eu lhe disse. Acabamos brigando toda vez que conversamos. Desta vez, vamos colocar a culpa no fato de que sou extremamente desagradável quando estou doente. — Ela deu de ombros. Lucan olhou para ela por algum tempo. Um tempo em que o olhar desafia­dor de Lexie não conseguiu lhe escapar.

— Não aceito isto como desculpa.

— Tenho uma novidade para você, Lucan: não dou a mínima para o que você aceita ou não. Eu não nego que tivemos um momento maravilhoso, mas este não é o caso agora. Sendo assim, daria para você aceitar que quero que você vá embora?

Lucan olhou para Lexie frustrado, sabendo, pela ma­neira como ela o olhava, que nada iriam resolver aquela noite se continuassem com aquela conversa.

— Está certo. Vou embora — ele concordou abrupta­mente. — Amanhã, voltamos a conversar.

— Amanhã vou embora. Com ou sem você! — ela declarou com firmeza.

A impaciência de Lucan aumentou.

— Sou eu que tenho um carro, Lexie. Não sei se vou estar pronto para partir de manhã. — Ele não pretendia ir a lugar algum até que os dois parassem de discutir o su­ficiente para que ele entendesse o que havia acontecido.

— Pego um trem para casa.

— E se não houver nenhum?

— Sempre há — ela garantiu satisfeita. Lucan franziu os olhos.

— Como é que você sabe?

Lexie percebeu tarde demais que caíra novamente na armadilha, revelando o que sabia, falando além do que deveria.

— Consultei os horários de trem, antes de virmos para cá. — Ela ergueu o queixo enquanto mentia. As visitas constantes à avó faziam com que ela há anos conhecesse muito bem os horários de trem para Stourbridge. — Para o caso de eu resolver ir embora — ela acrescentou.

— Você é realmente incrível! — disse Lucan, sacu­dindo a cabeça e dando um sorriso forçado.

Lexie começou a se sentir mal outra vez.

— Boa noite, Lucan — ela disse em tom firme. Lucan respirou fundo e engoliu a frustração.

— Eu não sou assim tão fácil de dispensar!

Lexie sentiu um arrepio nas costas ao notar o tom de advertência com que ele falara.

— Como não é provável que eu veja você, depois de amanhã, não é preciso que eu saiba disso, não acha?

— Como disse, não sou fácil de dispensar. — Lucan sacudiu os ombros.

— Acabou de ser!

Ele deu um sorriso contrafeito.

— Boa noite, Lexie. — Lucan pegou o agasalho que jogara no chão e caminhou lentamente para a porta. — Vamos conversar de manhã.

— Talvez eu não esteja aqui de manhã. Ele se voltou.

— Então, vou procurá-la quando voltar a Londres — ele informou calmamente.

Calmo demais. E com um tom intencional demais para que Lexie se sentisse sossegada.

— O arrogante e esquivo Lucan St. Claire, caçando uma mulher? — ela provocou. — E depois?

Os olhos de Lucan escureceram e brilharam como o ônix.

— Creia, Lexie, se você me der o trabalho de ir atrás de você, não vai gostar do que vai acontecer em seguida.

— Você está me ameaçando? — ela perguntou, arre­galando os olhos.

— Só estou estabelecendo um fato.

— Não podemos deixar as coisas do jeito que estão? — ela perguntou com um suspiro de impaciência.

— Não.

— Pressenti que era isto que você iria dizer.

— Então, você não ficou desapontada, não é? — ele falou com antipatia. — Durma bem, Lexie — ele acres­centou asperamente, antes de sair e fechar a porta.

Tentando resistir à tentação de correr atrás de Lucan, Lexie enfiou as unhas nas palmas das mãos que estavam dentro dos bolsos do roupão. Queria pedir que ficasse, pedir que a abraçasse e nunca mais a soltasse... Mas era ridículo esperar que Lucan, um homem que nunca quise­ra ficar com uma mulher, quisesse ficar com ela, a neta de Sian Thomas. Era quase tão ridículo quanto o fato de ela ter se apaixonado por ele...

 

— É meio-dia, dorminhoca. Hora de levantar.

Lexie manteve os olhos firmemente fechados. Pela proximidade da voz de Lucan, adivinhou que estava ao lado da cama onde ela estava deitada, com o rosto afun­dado no travesseiro.

Ela não se importava com a hora. Não queria que Lu­can soubesse que estava acordada. Não queria olhar de novo para ele. Não queria continuar a discussão da noite anterior.

Lexie não conseguira dormir depois que Lucan saíra do quarto. Sentira-se aborrecida, emocionalmente sensí­vel demais para parar de pensar, relaxar e dormir. Como poderia relaxar, quando fora estúpida o suficiente para se apaixonar por Lucan? Só de pensar, sentia-se enjoada outra vez!

Lucan olhou para Lexie, frustrado. Tinha certeza de que estava acordada e resolvera ignorá-lo. Depois da noite insone que passara, não estava disposto a agra­dá-la. Em vez disso, resolveu abrir as cortinas, deixan­do que a claridade invadisse instantaneamente o quarto.

— O! Ei! Isto é maldade! — Lexie sentou abrupta­mente na cama, apertando os olhos para fugir à claridade, com os cabelos arrepiados. Parecia um porco-espinho zangado. Lucan teve dificuldade para conter um sorriso. — É melhor que esta caneca esteja cheia de café. Do con­trário, você é um homem morto! — ela avisou indignada.

— Café, leite e dois cubos de açúcar, como você gosta — Lucan informou com ironia, voltando para o lado da cama e lhe entregando a caneca que fumegava, e que ele trouxera como oferta de paz. — Vejo que você não é do tipo matinal?

— Não me provoque, Lucan! — ela protestou, tiran­do os cabelos do rosto. — E, pelo que você me disse, a manhã já passou. — Ela segurou a caneca quente com as duas mãos e bebeu um gole.

Um lindo porco-espinho indignado, Lucan se corri­giu. Mesmo com os cabelos arrepiados, sem maquia­gem e com algumas marcas do travesseiro no rosto, Lexie era capaz de excitá-lo. Maldição! Ele cruzou os braços.

— Você quer primeiro ir ao banheiro ou vamos acabar a nossa conversa agora?

Lexie olhou para ele por entre as pestanas.

— Você é persistente, não é? Ele deu de ombros.

— Prefiro pensar que sou obstinado.

— Humm...

— Isto é um "sim Lucan, primeiro vou ao banheiro", ou um "está certo, vamos conversar agora"...?

— Nenhum dos dois. — Lexie sacudiu a cabeça. — Foi um "por favor, vá embora até que eu acabe de acordar"!

— Isto não é delicado, uma vez que eu lhe trouxe café — Lucan advertiu.

Lexie ficou ainda mais descontente.

— Há quanto tempo você levantou?

— Há mais ou menos cinco horas. Consegui fazer quase todo o trabalho que trouxe enquanto você passa­va a manhã dormindo. — Trabalhar também o ajudara a ficar ocupado enquanto esperava que Lexie acordasse. Até que ele se cansara de esperar e resolvera acordá-la pessoalmente.

— Que bom — ela disse distraída. — Fico contente por você. Agora, poderia embora e me deixar sossegada tomando café?

Lucan não sabia como e por que quando aquela mu­lher o irritava, aborrecia e frustrava daquele jeito tam­bém conseguia fazê-lo rir.

— Não me diga... — Lexie disse, olhando para ele ao ouvi-lo rir. As poucas horas que ela conseguira dormir não haviam sido o bastante quando ela sabia que teria de enfrentá-lo de novo naquele dia. — As pessoas não costumam falar com você desta maneira desrespeitosa.

— Não, não costumam. — Ele ainda sorria. — Acho que posso me acostumar... — ele disse com um ar enigmático.

Lexie endireitou o corpo, nervosa por Lucan estar mais próximo da cama do que seria desejável. Seu pulso acelerou e ela se sentiu totalmente consciente do quan­to ele parecia sério e poderoso, vestindo um jeans e um suéter pretos.

— Que sorte que você não vai precisar!

— Não?

— Não... Droga! — Lexie exclamou irritada quan­do, ao colocar a caneca vazia na mesinha de cabeceira, ouviu o barulho de algo que caía no chão. — O quê...? — Ela ficou apavorada quando se inclinou para verifi­car e percebeu o que era. Naquele instante, tudo para Lexie pareceu estar suspenso: seus movimentos, sua res­piração... Até seu coração parecia ter parado de bater, enquanto ela fitava a corrente quebrada e o medalhão, caídos sobre o carpete. — Não! — ela exclamou ao ver que Lucan se abaixava para pegá-lo.

— O que há com você e com este maldito meda­lhão? — Lucan perguntou irritado. Ele apanhou a jóia e recuou quando Lexie tentou tirá-la de sua mão. — Talvez você realmente esconda a foto de algum aman­te secreto aqui dentro? — Ele fez uma cara feia. — Talvez eu devesse dar uma olhada...

— Não! — Enquanto protestava, Lexie afastava desesperadamente as cobertas e se levantava. Mas era tarde demais. Lucan já abrira o fecho do medalhão e, perple­xo, olhava as fotografias que estavam dentro dele.

Longos segundos se passaram... Um minuto. Não ha­via um som no quarto, a não ser o som ofegante da res­piração de Lexie. Lucan mal respirava.

Por fim, ele levantou os olhos. Estava mortalmente pálido. A pele de seu rosto se esticara sobre os ossos. Sua boca se apertara, formando uma linha fina. Um músculo pulsava em seu queixo contraído. E seus olhos, que há um minuto eram maliciosos e provocantes, haviam se tornado frios e duros como o ônix. Ele olhou para ela com um ar ameaçador.

— Afinal, quem diabos é você?

 

— Dê-me o medalhão, Lucan — Lexie pediu apavora­da, estendendo a mão.

Em vez de obedecer, Lucan instintivamente fechou a mão sobre a jóia, sem se importar com o fecho aberto que o machucava. O conteúdo do medalhão estava cla­ramente gravado, impresso, em sua mente, enquanto ele se afastava do alcance das mãos de Lexie.

Dentro do medalhão havia duas fotografias. Uma, de um homem grisalho que aparentava ter mais de 60 anos, embora ainda fosse bonito e sorrisse simpaticamente para a pessoa que havia tirado a fotografia. O rosto forte e aristocrático logo fora reconhecido por Lucan, como sendo de seu pai, Alexander.

A outra fotografia era de uma mulher. Só as mechas grisalhas nos cabelos negros que desciam até os ombros deixavam perceber sua idade. Seu rosto era jovem e sem rugas, e ela também sorria alegremente para a câmera. Ela possuía um lindo rosto: rosado, com grandes olhos azuis, um nariz arrebitado e uma boca sorridente. Traços que lem­bravam muito a mulher que Lucan tinha à frente, mostran­do que as duas inegavelmente pertenciam à mesma família.

— Perguntei quem você é... — Lucan repetiu gentil­mente em tom frio.

Lexie engoliu em seco. Respirava com dificuldade e sentia a cabeça levemente vazia enquanto fitava o estra­nho pálido e arrogante que surgira diante dela. O Lucan que ela amava desaparecera. O Lucan brincalhão tam­bém sumira. Em seu lugar surgira um homem que exa­lava uma frieza e uma raiva tão implacável que quase podia estender a mão e tocar. Lexie balançou a cabeça.

— Posso explicar, Lucan...

— É melhor que você o faça! Imediatamente — ele disse em tom áspero. — Seria melhor começar me di­zendo o nome da mulher na fotografia.

Ao perceber a força da raiva incontida de Lucan, Lexie cambaleou e sentou na beirada da cama, sentin­do que corria o risco de cair. Ela só pretendia trabalhar durante três dias na St. Claire Corporation, satisfazer sua curiosidade a respeito da família St. Claire e de­pois ir embora. Desde que conhecera Lucan, percebera o quanto seria perigoso que ele soubesse que era neta de Sian Thomas. Tão perigoso quanto ela se apaixonar... Por Lucan, que agora a olhava com tanto desgosto e desprezo, provocando arrepios gelados que lhe desciam pelas costas.

— Diga, maldição! — ele vociferou.

Lexie umedeceu os lábios ressecados.

— O nome dela é Sian Thomas...

— Mais alto, Lexie — Lucan interrompeu friamente. Lexie ergueu a cabeça.

— O nome dela é Sian Thomas. Ela é minha avó — ela informou calmamente enquanto lágrimas amargas lhe subiam aos olhos.

Lucan inalou o ar com um assobio. Ele sabia, claro. Adivinhara que a mulher do medalhão só poderia ser uma: a mulher que seu pai amara. A mesma mulher que fora responsável pela destruição de sua família há 25 anos: Sian Thomas. Inacreditável! Avó de Lexie!

Lucan sabia que, quando seu pai conhecera Sian Tho­mas, ela era viúva e tinha uma filha de 19 anos. Mas nunca lhe ocorrera que esta filha poderia ter se casado e ter tido uma filha... Ele se voltou, caminhou até a janela e parou, dando as costas a Lexie. Sem olhar para fora, tentou se con­trolar, abriu a mão e olhou novamente para o medalhão.

Santo Deus, as fotografias distintas de seu pai grisa­lho e da bela avó de Lexie poderiam ser dele mesmo e de Lexie dentro de 30 anos! A semelhança era inegável!

— Lucan...

— Não diga mais nada agora, Lexie — ele advertiu, trincando os dentes.

— Alexandra.

Lucan se voltou imediatamente.

— O quê?

Lexie ficou ofegante ao ver a expressão de Lucan e suas mãos crispadas ao longo do corpo.

— O meu nome completo é Alexandra Claire Hamil­ton. O meu nome foi escolhido em homenagem ao meu avô — ela explicou sem ser necessário.

Lucan olhou para ela friamente.

— Pelo que sei, meu pai nunca se casou com sua avó.

— Não — Lexie concordou, sabendo que ele preten­dera ser ofensivo. — Mas minha mãe o chamava de pa­pai Alex, e eu o chamava de vovô Alex.

— Meu pai era duque de Stourbridge! — disse Lucan furioso.

— Você está dizendo que é por isso que os dois nunca se casaram? — ela perguntou espantada.

— E qual seria o outro motivo? — ele debochou. — Nunca iria funcionar: o ilustre duque de Stourbridge ca­sado com uma...

— Não ouse insultar minha avó! — Lexie disse exaltada. — Não ouse, Lucan! — Os olhos dela chispavam. — Fosse ou não casado com minha avó, seu pai era meu avô Alex — ela falou com um tom de desafio.

— E quando você pretendia me contar este pequeno detalhe?

Lexie estremeceu, preocupada ao perceber a dimen­são da fúria de Lucan.

— Eu não pretendia — ela garantiu.

— Não acredito em você — ele disse. Lexie sacudiu a cabeça.

— Não planejei nada disso, Lucan. Apenas... Acon­teceu.

Ele deu uma risada sarcástica.

— Você não espera que acredite que não sabia quem eu era no dia em que foi trabalhar para mim?

— Não foi isto que eu disse — ela falou com impa­ciência. — Claro que sabia quem era você. Eu só... não pretendia que você soubesse de meu parentesco com Sian Thomas... — ela se lamentou. — Estava curiosa, OK? — Lexie se colocou na defensiva ao ver que Lucan con­tinuava a olhar para ela com o nariz empinado, como se ela fosse algum tipo de inseto desagradável que surgira em seu campo de visão. — Nem sabia que você existia até eu fazer 14 anos e minha mãe me explicar a situação.

— Sem dúvida, a versão de sua mãe para o que acon­teceu há 25 anos difere completamente da minha — Lucan falou com desdém. Lexie pulou da cama.

— Você tinha apenas 11 anos quando aconteceu, Lucan.

— E você só soube aos 14. Você acha seriamente que uns poucos anos a mais... 15 anos após o fato... a deixam melhor equipada para saber, para comentar o que acon­teceu ou deixou de acontecer? — ele ironizou.

Claro que não. Na verdade, nos últimos dias Lexie percebera o quanto ignorava a respeito dos "como" e "por que" da relação entre sua avó e Alexander St. Claire, 25 anos antes.

Quando sua mãe lhe contara, ela estava na puberdade, tinha apenas 14 anos. A história de amor entre sua avó e o vovô Alex lhe parecera muito romântica, uma tragédia grega com um final feliz. Desde que Lexie chegara a Mulberry Hall com Lucan e testemunhara sua amargura e sua tristeza ao olhar para o retrato do pai, na galeria oeste, soubera que não houvera final feliz para Lucan e para o resto da sua família...

— Talvez você devesse ter uma conversa com a mi­nha avó...

— Você está louca? — Lucan exclamou perplexo.

— Ela é a única pessoa que restou para lhe contar o que realmente aconteceu.

— Eu estava lá, Lexie. Eu sei o que realmente acon­teceu! — ele declarou em tom frio. Lexie balançou a cabeça.

— Acho que não sabe. Conheço minha avó, Lucan — ela insistiu quando o viu fungar. — Ela não é o tipo de mulher que magoaria alguém por vontade própria.

— É o que você está predisposta a acreditar, Lexie.. — Olhou-a com compaixão. — É óbvio que você a ama e, a seus olhos, ela nada faria de errado — ele completou com desdém.

— Você deve ter amado seu pai. E durante todos esses anos pareceu bem disposto a acreditar no pior a respeito dele! — ela acusou.

Lucan não se mexeu. Sim, amara o pai. Acreditara que fosse onipotente e o tivera como exemplo, achando que nunca faria nada de errado. E sofrerá uma enorme decepção!

— Não pretendo discutir o que sentia por meu pai com você, Lexie — ele declarou. — No momento, es­tou mais interessado em saber exatamente o que você achou que estava fazendo, o que esperava quando dor­miu comigo.

— O que eu esperava...? — ela gaguejou.

— Sim — ele interrompeu rispidamente. — Você dis­se que foi trabalhar para mim porque sentia curiosidade. Curiosidade sobre o que exatamente?

— Sobre você, sobre sua família — Lexie tentou ex­plicar. — Estava lá no dia do enterro do vovô Alex. Fi­quei no fundo da igreja, observando vocês três: Gideon, Jordan e Lucan St. Claire, sentados no primeiro banco, lamentando publicamente um homem que haviam pes­soalmente evitado durante 25 anos. — Ela balançou a cabeça e firmou a voz. — Enquanto minha avó, a mu­lher que o amara e que fora amada por ele durante os mesmo 25 anos, ficava sentada em casa, chorando sua perda. Bastou este motivo para que eu sempre odiasse você!

— Eu?

— Sim, você. — Ela olhou para ele com um ar de acusação. — O poderoso e soberbo 15° duque de Stour­bridge...

— Eu já lhe disse que não uso o título! — Um múscu­lo pulsava no rosto tenso de Lucan.

— Tenho certeza de que o usou quando proibiu a mi­nha avó de ir ao enterro de seu pai! — Lexie falou com sarcasmo.

— Não sei do que você está falando.

— Não minta para mim, por favor, Lucan. — Ela sol­tou um suspiro. — Pelo menos agora, vamos ser sinceros.

— Sinceros? — ele repetiu espantado. — Você tem a coragem de me falar em sinceridade quando, desde que nos conhecemos, tudo o que disse foi mentira? — ele falou ressentido. — Deus sabe como você manobrou a Premier Personnel para conseguir trabalhar para mim...

— Meus pais são proprietários da empresa.

— Seus...!

— Estão num cruzeiro e me deixaram em seu lugar — ela disse envergonhada.

— E a pobre tola da Jessica lhe deu exatamente a oportunidade que você precisava!

— Reconheço que o que fiz foi errado...

— Porque você foi descoberta? Ou porque você re­almente admite que tudo isso não é da sua conta? — Lucan ainda estava com dificuldade para acreditar que Lexie fosse neta de Sian Thomas, mas estava com a prova incontestável em sua mão. E, claro, Lexie con­fessara...

— Não é da minha conta? — ela repetiu totalmente indignada. — Diga, Lucan. Você sabia que a minha avó ainda mora na cidade, no mesmo chalé que ela com­prou há 25 anos?

Ele ficou impressionado.

— Em Stourbridge?

— Sim, em Stourbridge — ela confirmou secamente.

— Que ela comprou? — ele protestou. — Ou que lhe foi dado por meu pai, de modo que ele pudesse manter a amante sempre perto enquanto continuava a viver uma mentira aqui, com sua esposa e seus filhos?

— Sabe, Lucan. Se você não fosse tão arrogante, che­garia a ter pena de você — Lexie falou, olhando-o com um ar entristecido — Só para sua informação: minha avó só veio morar em Stourbridge depois que os seus pais se divorciaram.

Lucan conteve a impaciência e suspirou.

— Não vejo como isto tenha a ver com...

— Você não está ouvindo! — disse Lexie exaspera­da. — Não que seja da sua conta, mas minha avó com­prou o chalé com o dinheiro que meu avô verdadeiro lhe deixou quando morreu. Não é isso que é importante. Você tem alguma idéia de por que ela ainda mora aqui, em Stourbridge, Lucan? Por que ela continua sozinha na cidade? A despeito das fofocas que ainda circulam sobre ela e seu pai? A despeito da insistência de meus pais para que ela se mude para Londres e more com eles?

— Sem dúvida, você vai me explicar — ele falou de­sinteressado.

— Ela fica aqui por amor, Lucan — Lexie disse com orgulho. — Ela não tolera a idéia de deixar o lugar onde foi tão feliz com o avô Alex, o lugar onde ele está en­terrado. — A voz de Lexie tremeu de emoção. — Já se passaram 8 anos, Lucan, e ela ainda visita a tumba do seu pai várias vezes por semana. Alguém de sua família poderia dizer o mesmo?

— Nós moramos em Londres...

— Eu também. E toda vez que visito minha avó, co­loco flores frescas na tumba do avô Alex, o que costumo fazer mais ou menos de dois em dois meses. Ontem de manhã, fomos juntas até lá. Lucan arregalou os olhos.

— Foi por isso que você sumiu durante mais de duas horas...?

— Foi. — Lexie suspirou. Lucan fitou-a com frieza.

— Como se sente sua avó a respeito de você estar aqui comigo?

Lexie mordeu o lábio.

— Naturalmente, ficou preocupada quando soube que você não tinha idéia de quem eu fosse.

— E o fato de você ser quem é teve algo a ver com você não querer ir ao jantar dos Barton, ontem à noi­te? John não a reconheceu, mas Cathy talvez a tivesse reconhecido...?

Lexie assentiu.

— Acho que ela pode ser alguém que conheci na cida­de, quando era mais jovem.

Lucan deu uma risada irônica.

— E fui idiota o bastante para achar que era porque eu a tinha aborrecido!

— Você me aborreceu...

— Obviamente, não o suficiente!

— Você deve querer saber que, ontem de manhã, a minha avó teve uma conversa com o vovô Alex a seu respeito. Ela contou a ele que você estava em Mulberry Hall, falou a respeito do seu sucesso, disse que ele deve­ria se orgulhar de você, de todos os filhos.

Lucan retorceu a boca com desdém.

— Isto é mesmo muito tocante, Lexie...

— Não ouse dizer nada insultante a respeito do amor que minha avó e o vovô Alex sentiam um pelo outro! — ela avisou exaltada. — Não ouse!

Lucan suspirou.

— Está bem, Lexie. Não vou dizer nada. Vou deixar seu mundinho de sonho intacto.

— Não sou ingênua, Lucan. Sei que outras pessoas foram magoadas por eles terem se apaixonado um pelo outro...

— Magoadas? Minha família foi destruída por cau­sa disso. Quanto a minha mãe...! Foram 25 anos, Le­xie. Vinte e cinco! A minha mãe tinha apenas 32 anos naquela época, e era muito bonita. Ela nunca mais se casou. Que eu saiba, nunca mais deixou que outro ho­mem entrasse na sua vida. Ela ainda é bonita e jovem o suficiente para ter uma vida com outra pessoa, mas por causa do que meu pai fez a ela, traindo-a com sua avó...

— Você precisa parar com isso, Lucan! — Lexie ex­clamou. — É tanta amargura...! Não vê como isso tudo é destrutivo? O dano já não foi suficiente para que você estrague sua vida deste jeito?

Lucan fitou-a com um olhar implacável.

— Você não acha que foi amargo e destrutivo dor­mir comigo por causa de uma necessidade distorcida de vingança?

— Vingança? — Lexie repetiu, absolutamente pasma. Ele teria enlouquecido? — Que tipo de vingança eu iria conseguir indo para a cama com você?

— E como diabos eu iria saber? — ele retrucou. — Talvez você esperasse que me apaixonasse por você e fosse rir na minha cara quando lhe dissesse o que estaria sentindo...?

Lexie começou a rir. Não dele, mas da ironia de que tivesse se apaixonado por ele, e não o contrário!

— Cinco minutos com você... Não! Um minuto seria suficiente para que qualquer mulher soubesse que você não sabe o significado da palavra amor e muito menos é capaz de ter qualquer sentimento!

— É mesmo? — Lucan ficou frio e mortalmente cal­mo: o tipo de atitude fria e implacável que serviria de aviso a qualquer pessoa com um mínimo de bom-senso e de instinto de preservação. Lexie podia ter sido impru­dente ao se aproximar de Lucan. Podia ter cometido o erro imperdoável de se apaixonar por ele. Não era total­mente isenta de senso de preservação.

— Acho que está na hora de ir embora, Lucan.

— De volta a Londres? Ela abanou a cabeça.

— Não. Ao chalé de minha avó. Preciso vê-la antes de ir embora... Garantir que está tudo bem. — Ainda que não estivesse... — Mais tarde pego um trem para Londres.

— Como você disse, está totalmente familiarizada com os horários de trem.

— É verdade.

— Espero que me perdoe por não estar na plataforma para lhe dar adeus — ele declarou abruptamente.

Os corações realmente se partiam? Até aquele mo­mento, Lexie sempre achara que não, mas, se não se partiam, por que ela estaria sentindo aquela dor insu­portável dentro do peito ao pensar que nunca mais veria Lucan? Ao saber que estaria em algum lugar do mundo, odiando-a...? Ela deu um sorriso trêmulo.

— Eu o perdôo, Lucan.

— E eu não perdôo você — ele respondeu acidamente. Sim, os corações se partiam, Lexie concluiu desolada.

Na verdade, eles se despedaçavam.

— Adeus, Lucan.

Lucan olhou para ela com um olhar frio e penetrante por longos segundos, antes de se voltar e sair do quarto. Lexie voltou a sentar na beirada da cama, escondeu o rosto nas mãos trêmulas e por fim deixou que as lágri­mas escaldantes lhe escorressem pelas faces. Só muito tempo mais tarde, depois que visitara sua avó e já estava sentada no trem que a levaria de volta a Londres, Lexie percebeu que Lucan não lhe devolvera a corrente e o seu medalhão...

 

— Sei que é tarde, Lexie, mas há alguém que deseja vê-la...

— Tudo bem... Brenda, não é? Disse que posso entrar sozinho — disse uma voz conhecida e dolorosamente familiar, antes que Lexie tivesse tempo de tirar os olhos do trabalho que estava sobre a mesa e que ela tentava terminar antes do final do expediente.

Lexie levantou a cabeça imediatamente e ficou muito pálida ao ver Lucan por detrás de Brenda, que parará na porta para impedir sua entrada. Estava devastadora-mente atraente, vestido num terno escuro, com uma camisa bran­ca e um casacão de lã que ia até a altura dos tornozelos.

Havia cinco dias que os dois haviam se despedido em Gloucestershire. Cinco dias longos e atormentados em que ela oscilara entre a vontade de vê-lo novamente e a certeza de que reencontrá-lo só aumentaria seu so­frimento. Lexie o olhou, procurando em sua expressão austera algum sinal que lhe dissesse o motivo pelo qual ele estava ali. Percebeu que ele não sorria e que a olhava fixamente, como se a desafiasse. Desviou os olhos e sor­riu para a secretária.

— Pode ir para casa, Brenda — disse Lexie, levantan­do. — Provavelmente o sr. St. Claire deve ter vindo dis­cutir sua conta. — Ela duvidava que a palavra "conta" pudesse descrever a fatura que enviara à St. Claire Cor­poration há dois dias, em nome da Premier Personnel. Assim que Brenda saiu, despedindo-se com um sorriso de simpatia, Lexie parou diante de sua mesa. Estava ali­viada por ter se vestido no estilo profissional. Usava um terninho azul escuro e uma blusa azul clara por debaixo do casaco, e prendera os cabelos num coque alto.

— Existe algum problema na sua conta, sr. St. Claire? — ela perguntou com indiferença.

Lucan entrou no escritório e deixou-a nervosa ao trancar a porta e se voltar para encará-la com um olhar impenetrável.

— A não ser que esteja enganado, o valor da fatura da Premier Personnel foi zero?

Lexie se apoiou na mesa.

— Está certo. — Mandar uma fatura para Lucan, co­brando pelos dois dias que supostamente trabalhara para ele, seria como cobrar por serviços prestados, e ela já se sentia mal o suficiente sem este detalhe, mas Lexie jamais esperara que a conta o fizesse vir até ali pesso­almente. Ou esperara...? — Mais alguma coisa, sr. St. Claire?

Lucan caminhou até ela, mais uma vez lembrando o gingado de uma pantera espreitando sua presa. Seus pas­sos pareciam cautelosos e perigosos e seu olhar parecia hipnotizá-la.

— Por que não cobrou, Lexie? Afinal, você trabalhou dois dias para mim.

— Não de fato. — Ela balançou a cabeça e apoiou as mãos na mesa para disfarçar o tremor que sentia por estar tão perto dele novamente. — Eu... Achei que seria o mais adequado.

— Para quem?

— Para todos os envolvidos — disse ela.

— Hum... — Lucan assentiu lentamente. — Gostaria de sair para jantar?

Lexie ficou surpresa.

— Sair para jantar...? — Ela umedeceu os lábios, ner­vosa. Ele deu um sorriso desprovido de humor.

— Não vamos começar a repetir as palavras um do outro, hum...?

Lexie estava admirada demais com o convite para di­zer algo coerente. Vê-lo ali já fora um choque grande demais, e, ainda por cima, um convite para jantar! En­goliu em seco.

— Não estou certa de ter entendido.

Pela expressão chocada que Lexie fizera ao vê-lo e pela cautela que via em seus olhos, Lucan sabia que a úl­tima coisa que esperava era um convite para jantar. De­pois da maneira como os dois haviam se separado cinco dias atrás, e pela reação que tivera ao descobrir que era neta de Sian Thomas, era natural. Lexie parecia muito profissional, vestida num terno escuro e com os cabelos negros presos para trás. Nem parecia Lexie!

— Creio que ainda existem algumas coisas que preci­samos conversar — garantiu severamente. Lexie olhou para ele com cautela, percebendo que Lucan estava a apenas alguns centímetros de distância.

— E pensei que havíamos concordado que discordá­vamos quanto ao caso entre seu pai e minha avó?

Lucan enfiou as mãos nos bolsos do casaco para resis­tir ao impulso de tirar o pregador dos cabelos de Lexie e deixar que eles lhe descessem em cascata sobre os om­bros, como ela costumava usar. Seus dedos se fecharam em torno da caixinha retangular, no bolso do lado direi­to. Ele tirou a caixa de veludo do bolso e olhou-a, antes de estendê-la para Lexie.

— Você esqueceu isto ao ir embora...

A expressão de Lexie tornou-se ainda mais cautelosa, e ela olhou para a caixa como se visse uma cobra prestes a dar um bote mortal.

— É apenas seu medalhão, Lexie — disse Lucan.

— Ah — ela suspirou, pegando a caixinha com cui­dado, como se temesse que seus dedos fizessem contato com a mão de Lucan. Ela abriu a caixa e olhou.

— Você mandou consertar... — Ela olhou para ele com um ar quase de reprovação. Lucan contraiu os lábios.

— Seria bobagem não consertar, uma vez que eu já conhecia seu conteúdo.

Realmente, Lexie reconheceu, passando o dedo com carinho sobre o medalhão. A corrente estava novamente íntegra.

— A não ser que você tivesse algum outro motivo para que eu não mandasse consertá-lo...? — Lucan falou.

Lexie olhou para ele, muito consciente de sua proxi­midade, do perfume da sua loção de barbear, do calor do seu corpo...

— Eu... Não... Nenhuma razão — ela garantiu aspe­ramente.

— De acordo com minha mãe, a corrente e o meda­lhão pertenceram à avó de meu pai, uma senhora a quem ele era muito afeiçoado.

Lexie se ouriçou.

— Se você está tentando dizer que isto é uma espécie de jóia de família e que quer que eu devolva...

— Não estou... — Lucan falou impaciente. — Por que você sempre pensa o pior a meu respeito, Lexie?

Lexie escolheu não responder à pergunta e, em vez disso, fazer outra mais urgente e que a incomodava.

— Você mostrou meu medalhão a sua mãe? Lucan concordou com a cabeça.

— Ela acha que meu pai deve tê-la amado muito para ter lhe dado algo que significava tanto para ele.

Lexie não tinha dúvida do quanto o vovô Alex a amara. Do quanto ele amara a família de sua adorada Sian.

— Você mostrou meu medalhão para sua mãe? — ela repetiu espantada.

— Você está se repetindo, Lexie — ele falou sor­rindo. — Prefere que eu a chame de Alexandra? — ele perguntou, levantando as sobrancelhas.

— Não. Não prefiro que você me chame de Alexan­dra! — ela exclamou, afastando-se resolutamente da sensual letargia e da sensação de calor que a proximi­dade de Lucan lhe provocava, depois de ter sentido frio por tanto tempo.

— Porque é assim que sua família a chama?

Lexie guardou o estojo na bolsa, do outro lado da mesa, antes de responder desconfiada.

— Como é que você sabe como minha família me chama?

Lucan deu de ombros.

— Esta é uma das coisas que eu queria discutir com você durante o jantar.

— Eu não quero jantar — ela respondeu, abanando a cabeça.

— Comigo ou de jeito nenhum?

— De jeito nenhum. — Ela não tinha apetite desde que voltara de Gloucestershire. De fato, só de pensar em comida sentia-se enjoada, a ponto de já ter perdido vá­rios quilos naqueles últimos dias. — Não acredito que você tenha mostrado meu colar para sua mãe! — ela res­mungou novamente.

— Parece que você se fixou neste fato.

— Claro que me "fixei neste fato"! Você não tinha esse direito, Lucan — ela falou exaltada. — Nenhum direito.

Lucan deu um sorriso zombeteiro.

— Depois que você foi embora de Mulberry Hall há cinco dias, eu segui seu conselho, Lexie.

— Meu conselho? — ela repetiu surpresa. — Tenho certeza de que naquele dia eu não disse nada a respeito de levar meu medalhão para mostrar a sua mãe! — Tudo que ela se lembrava era da cruel devastação ao perceber que se apaixonara por aquele homem. Ver Lucan nova­mente, estar perto dele, só servia para mostrar quanto ela o amava e o quanto desejava que as coisas pudessem ser diferentes: que os dois se sentissem livres para manter um relacionamento, mesmo que fosse apenas por alguns dias ou algumas semanas. Em vez disso, apaixonara-se pelo único homem que jamais iria amá-la...

— Não — Lucan admitiu secamente. — Você suge­riu que eu conversasse com sua avó — ele acrescentou docemente.

Lexie olhou para ele com os olhos arregalados.

— Eu... Você...

— Acho que você deveria se sentar antes de cair, Le­xie! — Lucan disse com ironia.

Sim, talvez devesse sentar. Talvez, não. Ela precisava sentar, Lexie reconheceu, sentindo as pernas começarem a tremer. Ela caiu sobre a cadeira do outro lado da mesa.

— Você conversou com minha avó...?

— Longamente — Lucan confirmou amavelmente. — Quer mudar de idéia quanto a jantar comigo? — ele per­guntou com ironia.

 

— Isto é muito melhor que ir jantar num restaurante

— Lucan admitiu com aprovação, uma hora depois, en­quanto ele e Lexie sentavam frente a frente no balcão da cozinha do apartamento de Lexie.

A conversa fora adiada enquanto Lucan dirigia do es­critório da Premier Personnel até lá, depois de fazerem uma curta parada para comprar queijos e frutas numa delicatessen, e uma garrafa de vinho tinto, na loja que ficava ao lado. O cenário formado pelos dois sentados na cozinha, com a comida espalhada sobre o balcão, fa­zia com que Lucan lembrasse claramente da última noite que tinham passado juntos em Mulberry Hall, quando comeram queijo e biscoitos, antes de fazerem amor...

Principalmente, porque Lexie parecia ter voltado a ser ela mesma. Assim que haviam chegado, ela sumira no quarto e voltara em dez minutos, vestindo uma blusa de lã creme e um jeans muito justo. E soltara os cabelos, que caíam livres sobre os ombros.

— Estou certa de que, assim como eu, você não iria que­rer fazer uma cena em público — disse Lexie com ironia.

— Uma cena? — Lucan repetiu devagar. — Espero que não cheguemos a isso!

— Acho que você vai ficar na esperança! — Ela be­beu um gole de vinho.

— É possível. — Lucan admitiu com secura. — Você precisa comer alguma coisa, Lexie. Você está muito abatida.

— Estamos muito ocupados no escritório — ela disse com os olhos brilhando.

— Não estava insinuando outra coisa...

Lexie deu um profundo suspiro, sabendo que exage­rara diante de um comentário inocente. Estava realmente abatida e precisava comer, porém, mais que nunca sentia que a comida lhe faria mal!

Seus nervos em frangalhos em nada eram ajudados pelo fato de Lucan ter tirado o casaco e o paletó enquan­to ela estivera no quarto trocando de roupa. Ele também tirara a gravata e abrira o colarinho, mostrando um atra­ente pedaço de seu peito musculoso, recoberto de pelos...

— Desculpe — ela disse, fazendo uma careta. — Nos últimos dias, com a viagem de meus pais, as coisas têm estado meio confusas. — Embora tivesse garantido o contrário ao desaparecer do escritório na semana ante­rior... — Suponho que você esteja me mostrando que não pretende manchar a reputação da Premier Personnel por causa do que aconteceu na semana passada... — ela acrescentou sem convicção.

Lucan franziu o cenho.

— O que aconteceu entre nós foi pessoal, Lexie, não tem nada a ver com trabalho.

— É muita bondade sua dizer isso.

— Inesperado? — ele adivinhou em tom frio.

— Talvez — ela respondeu com cautela.

— Custa muito você admitir que eu seja capaz de fa­zer algo decente, não é?

— Não é isso — Lexie protestou. — Depois da ma­neira como me comportei, você tem todo direito de que­rer causar problemas à Premier Personnel.

Lucan olhou para ela com um ar provocador.

— Lembro-me de você ter dito que a Premier Personnel pertence a seus pais. Não tenho nenhum motivo para que­rer prejudicá-los.

Não. Só a ela, pensou Lexie entristecida. Ela se comportara muito mal na semana anterior. Mais que mal.

Fora totalmente estúpida ao se aproximar da família St. Claire. O que fizera fora revolver um passado que deve­ria ficar esquecido.

— Obrigada — ela disse gentilmente. Lucan recostou na cadeira do outro lado do balcão.

— Sabe, Lexie, não sei o que fazer com tanto mar­tírio! — Ele sacudiu a cabeça energicamente. — Onde está a mulher que disse que não dava a mínima para o que eu dizia ou fazia? A mulher que não hesitou em dizer o que pensava de mim?

Lexie sorriu sem convicção.

— Ela amadureceu.

— Que pena! — Lucan disse. Lexie arregalou os olhos.

— Você preferia que eu voltasse a ser grosseira e direta?

— Claro que sim! — Lucan garantiu sem hesitar. — Pelo menos eu teria uma desculpa para calá-la com um beijo.

Lexie olhou para ele e seus lábios formaram um "O" de surpresa que congelou em sua boca. Ela estava intei­ramente admirada. Lucan acabara de dizer que queria um motivo para beijá-la...? Ela sentiu a boca ficar seca, assim como seus lábios.

— Você precisa de uma desculpa?

— Na verdade, não — ele disse. — Mas seria útil po­der usá-la como defesa quando depois você se voltasse contra mim como um gato selvagem!

— Eu não entendo... — disse Lexie, sacudindo a cabeça,

Lucan fez uma careta, sabendo que havia muitas coi­sas que precisava explicar a Lexie, antes de poderem falar a respeito de um relacionamento — um provável relacionamento. Estava ali naquele momento porque de­via lhe contar a verdade. Lucan não tinha motivo para acreditar que ela fosse querer diferente, depois que ele lhe contasse.

— Não. Acho que você não entende. — Ele suspi­rou e bebeu um gole de vinho, antes de continuar. — Pelo que lhe disse antes, você deve ter concluído que, depois que nos separamos, eu conversei com sua avó e com minha mãe.

— Sim — disse Lexie receosa.

— O que não lhe expliquei é que as duas se encontra­ram e que estão tendo uma conversa.

Lexie engasgou.

— Vovó Sian e sua mãe? — As mãos dela tremiam ao soltar o copo sobre o balcão.

— Ontem, minha mãe voou comigo de Edimburgo a Gloucestershire.

— No helicóptero da família? — ela perguntou.

— Na verdade, sim.

— Que você pilotou?

— Novamente, sim... Existe algum problema?

— Nenhum — Lexie assegurou. Aquilo só servia para lembrar as diferenças sociais e financeiras que existiam entre os dois, assim como as emocionais. — Então, neste momento sua mãe está em Gloucestershire falando com minha avó Sian — ela disse, admirada de que aquilo pu­desse estar acontecendo.

— Falando, não. Conversando com sua avó Sian — Lucan corrigiu.

— Por quê? — Lexie levantou, agitada. — O que as duas podem ter para conversar, depois de todos esses anos?

— Eu apenas juntei as duas, Lexie. Cabe a elas resol­ver sobre o que desejam falar.

— Por que você faria isso? — ela resmungou surpre­sa. — Todos vocês odeiam minha avó! — Os olhos de Lexie brilharam de raiva. — Se sua mãe disser ou fizer algo que a magoe...

— Assim é melhor — Lucan falou satisfeito, levan­tando e dando a impressão de que ela e a cozinha tinham diminuído de tamanho. — O que mais posso dizer ou fazer que a deixe furiosa ou aborrecida?

— Já estou furiosa o suficiente... Uf! — Lexie excla­mou, soltando o ar, quando ele a puxou com força contra o peito e a abraçou. — Lucan, você... — O protesto se calou e desapareceu quando Lucan abaixou a cabeça e beijou-a. Intensa e avidamente. E continuou a abraçá-la e beijá-la, até que se recuperasse do choque e o abra­çasse pela cintura, correspondendo a seus beijos com a mesma intensidade. Beijos profundos, incendiários, que lhe sugavam toda a energia. Por fim, Lucan se afastou um pouco e encostou a cabeça em sua testa.

— Nem eu, nem minha mãe temos a intenção de magoar sua avó Sian, Lexie — ele garantiu em voz rouca. — O que fiz... O que estou tentando fazer... É consertar as coisas depois de todos esses anos. Re­solver a situação para que uma parte da mágoa possa desaparecer.

— Mas... por quê? — ela perguntou.

Boa pergunta, Lucan reconheceu com ironia. Ainda não sabia como responder... Ele pegou Lexie pelo braço e afastou-a com firmeza.

— Ainda temos muito que resolver, Lexie. Primeiro: ao contrário do que você acha, não proibi sua avó de assistir ao funeral de meu pai.

— Mas...

— A decisão foi de sua avó, Lexie. Não minha. Ela me garantiu que foi o que resolveu, para não magoar ain­da mais minha mãe e o resto da família.

— Sua mãe não estava no funeral...

— Não. Não estava. Mas sua avó não sabia disso — ele esclareceu amavelmente. — Também foi por achar que muito sofrimento já fora causado pelo fato de ela e meu pai terem se apaixonado que ela sempre se recusou a aceitar seus pedidos de casamento.

— O quê?

— É verdade, Lexie — ele garantiu calmamente. — Se você não acredita, pode telefonar para sua avó assim que acabarmos de conversar, e garanto que ela vai con­firmar tudo o que vou lhe dizer... Certo?

Lexie sentiu como se estivesse pisando numa super­fície que se movimentava, deslizando sob seus pés. Era como se todas as suas convicções se desmanchassem lentamente e sumissem. O que Lucan estava dizendo seria verdade? Insistia que sim, sabendo que poderia telefonar para sua avó a qualquer momento daquela conversa...

— Certo — Lexie concordou de repente.

— Vamos sentar e beber nosso vinho, Lexie — Lu­can sugeriu, puxando a cadeira para ela; — Ainda tenho muita coisa a lhe dizer, e é melhor se estivermos nos sen­tindo confortáveis — ele acrescentou ao vê-la hesitar.

Lexie sentia a boca intumescida pelos beijos de Lucan, e sua cabeça estava zonza com as coisas que ele lhe contava.

— Tudo bem. — Ela sentou e observou atentamente enquanto ele sentava do outro lado da mesa. — Minha avó se recusou a casar com seu pai...?

— Muitas e muitas vezes. — Ele sorriu.

— Foi o que ela lhe disse?

— Sim.

— E você acreditou?

— Sim.

Lexie bebeu um gole de vinho antes de falar.

— Estou mais confusa que nunca...

— Porque ela recusou ou porque eu acreditei? — Lu­can perguntou.

— Os dois!

— Sim, ela ainda está aí! — Ele abriu um grande sorriso.

— Quem ainda está ai? — Lexie perguntou confusa.

— Ainda não chegamos nesta parte da nossa con­versa — disse Lucan, sacudindo a cabeça.

— Às vezes você é incrivelmente irritante, Lucan! — ela o censurou.

— E verdade — ele admitiu com um sorriso imper­doável. — Sua avó me contou muitas outras coisas que eu não sabia. — Ele se inclinou para a frente, na ca­deira. — Por exemplo: você sabia que ela e meu pai se conheciam e se amavam havia muitos anos, antes que ele conhecesse minha mãe?

— Isto não pode ser verdade — Lexie falou, abanan­do a cabeça devagar. — Vovó Sian se casou e ficou viú­va. Teve uma filha... A minha mãe...

— Os dois se conheceram antes que Sian se casasse com seu avô biológico, Lexie.

Ela arregalou os olhos.

— Eu... Como?

— Os dois cresceram juntos em Mulberry Hall. Alexander era filho e herdeiro do duque de Stourbridge. Sua avó era filha da cozinheira. Não precisa dizer que o meu avô não via este relacionamento com bons olhos. A tal ponto que resolveu separar os dois... — Lucan explicou com uma careta.

Lexie teve a terrível sensação de saber exatamente onde iria parar aquela história...

— Alexander foi para a Universidade de Oxford e, depois de alguns dias, meu avô deu um jeito de mandar a cozinheira e sua filha para um emprego, na casa de alguns amigos em Norfolk — Lucan continuou som­briamente. — Sian e Alexander haviam concordado que ele escreveria para ela assim que tivesse um endereço definitivo, e que os dois iriam continuar a se corres­ponder até que ele voltasse para casa, no Natal, quando novamente iriam tentar mostrar ao duque o quanto eles se amavam. — Lucan sacudiu a cabeça, desgostoso. — Acho que você pode adivinhar o que aconteceu em seguida...?

Lexie fez uma expressão de tristeza.

— As cartas de Alexander eram interceptadas pelo duque, assim que chegavam a Mulberry Hall?

Lucan contraiu o queixo.

— Interceptadas e destruídas, em vez de encaminhadas para Sian, em Norfolk — ele disse em tom áspero. — As­sim como as cartas de Sian para Alexander, despachadas através de Mulberry Hall, também eram interceptadas e destruídas.

— Levando Sian a acreditar que Alexander a esquece­ra assim que chegara à universidade... — Lexie percebeu entristecida.

— Inacreditável, não é? — Agitado, Lucan levantou novamente, com uma expressão amarga. Lexie balançou a cabeça.

— Há quase 50 anos, não tínhamos a mesma tecnolo­gia que temos agora. Não havia celular, nem e-mail. As cartas eram o único meio de comunicação que Alexander e Sian tinham disponível.

Lucan concordou, muito tenso.

— E nenhum dos dois as recebeu, por intervenção do meu avô. Quando Alexander voltou para casa no Natal, o meu avô o informou que a cozinheira e sua fi­lha haviam pedido demissão e ido embora. Disse que Alexander deveria aceitar que, no que se referia a Sian, a relação dos dois estava terminada, e que ele deveria esquecê-la e seguir sua vida.

— É tudo tão inacreditável que só pode ser verdade! — Lexie disse penalizada.

— Sim — disse Lucan, respirando fundo. — Sian acabou se casando com um rapaz de Norfolk e teve sua mãe. Meu pai terminou a faculdade a tempo de assu­mir o ducado quando meu avô morreu de repente, de infarto. Sabendo o que eu sei agora, acho que o velho sequer tinha um coração que pudesse sofrer um infar­to! — acrescentou com desgosto, andando agitadamente pela pequena cozinha.

— O que ele fez foi maldoso e cruel — Lexie con­cordou. — Talvez ele estivesse fazendo o que achava ser melhor...

— Sua avó tentou defendê-lo da mesma forma — Lu­can interrompeu revoltado. — Mas ele foi apenas mal­doso e cruel e totalmente desonesto — ele insistiu. — Não fosse essa interferência, meu pai e Sian poderiam ter se casado um com o outro e teriam ficado juntos muito anos antes do que de fato aconteceu!

— E então, nem você e seus irmãos, e nem eu, terí­amos nascido... — As coisas que Lucan lhe contara... Parecia uma tragédia grega que nunca imaginara. Incrí­vel e muito triste. Mesmo que fosse egoísmo, amando Lucan como ela amava, parecia impossível imaginar um mundo em que os dois não existissem.

— Meu avô deliberadamente arruinou a vida de duas pessoas com suas maquinações — disse Lucan, sacudin­do a cabeça. — Sua avó garantiu que foi feliz com seu avô e que o amava, embora não da mesma maneira que amava Alexander. Por outro lado, meu pai dedicou todas as suas energias a administrar o ducado e acabou se casando apenas pela necessidade de ter um herdeiro. Ele tinha 30 anos e a minha mãe 19 quando se conheceram e casaram. Conversei com minha mãe a este respeito, e ela me garantiu que a relação entre os dois sempre foi, no mínimo, muito frágil, e que se desfez no momento em que meu pai se reencontrou com Sian, durante uma festa na casa de alguns amigos que eles tinham em comum e não sabiam.

— Nunca tiveram um caso, Lucan — Lexie insistiu com certeza. — Certamente, que os dois percebessem que ainda se amavam depois de tantos anos, foi errado. Muito errado, já que Alexander estava casado. Mas eu sei que não ficaram juntos até depois de seu pai se divor­ciar de sua mãe.

— Eu também sei.

— Foi a minha avó que lhe disse? — Lexie perguntou admirada. — Imagino a surpresa que você foi para ela! Você se parece muito com o avô Alex — ela explicou ao vê-lo olhar para ela intrigado. Lucan concordou.

— Assim como você se parece muito com sua avó... Lexie corou.

— É estranho, não é?

— Nem um pouco — disse Lucan, sacudindo a cabeça. Agora que Lucan havia lhe contado tudo, Lexie não sabia o que dizer e escondeu os olhos.

— Ainda não entendi por que, Lucan...

— Por que o quê?

— Por que você se deu ao trabalho de falar com mi­nha avó e com sua mãe...

Lucan olhou para ela com um olhar estranho.

— Você acredita em destino, Lexie?

— Em que contexto? — ela perguntou desconfiada. Ele riu.

— No contexto de que, quase 50 anos depois de Ale­xander ter se apaixonado por Sian, contra todas as pro­babilidades, contra a razão, seu filho mais velho tenha se apaixonado pela neta de Sian...!

 

Lucan não sabia que reação esperava de Lexie diante de sua declaração de amor. Certamente não fora o silêncio absoluto que ela manteve, olhando para ele com aqueles imensos olhos azuis e uma expressão de choque, mais do que qualquer outra coisa. Enfiou as mãos nos bolsos das calças.

— Não fique tão assustada, Lexie — ele disse com ironia. — Não estou esperando que você anuncie sole­nemente que também está apaixonada por mim. Eu só... Por causa do divórcio de meus pais, nunca acreditei em amor e estava resolvido a nunca senti-lo por alguma mu­lher. E então conheci você... — A expressão de Lucan pareceu se suavizar. — Desde o primeiro instante, per­cebi que você era diferente.

— Você não gostou de mim...

— Ah, gostei de você sim — ele garantiu. — Pas­sei a maior parte daquela manhã imaginando que fazia amor com você. Em cima da mesa, no chão, encostado na parede... — Ele sacudiu a cabeça. — Totalmente in­conveniente! E também fiquei cheio de ciúmes ao vê-la totalmente à vontade, brincando e rindo com Andrew Proctor! — recordou amargamente.

— Verdade? — Lexie perguntou baixinho.

— Ah, sim — Lucan concordou com desgosto. — Gideon achou muito engraçado ao ver que eu me retor­cia de ciúme.

— Seu irmão sabia o que você estava sentindo?

— Acho que adivinhou. Você me desafiou, Lexie, e me atraiu de um jeito que nunca senti. — Ele fez uma care­ta. — Pela intensidade do desejo que sentia por você, sabia que não era uma boa idéia levá-la comigo para Mulberry Hall. Não conseguia me controlar. Era torturante estar so­zinho com você, mas, ao mesmo tempo, eu me senti vivo e senti mais emoções do que jamais me permitira sentir.

— E você não odeia mais seu pai?

— Não sei se um dia cheguei a odiá-lo. — Lucan sol­tou um profundo suspiro. — Ele me decepcionou. Doeu quando nos deixou, mas, diabos, se amava Sian como eu amo você, só posso sentir compaixão pelo sofrimen­to e pela tristeza que deve ter sentido quando a perdeu! A alegria que deve ter tido ao reencontrá-la e, depois que os dois descobriram o que acontecera no passado, saber que ainda se amavam... — ele falou comovido. — Você quer saber por que conversei com sua avó e fui pro­curar minha mãe, e por que as duas estão em Mulberry Hall neste momento, tentando estabelecer uma trégua?

Lexie engoliu em seco e umedeceu os lábios.

— Por quê?

Lucan deu um sorriso brincalhão.

— Porque eu não queria que houvesse alguma barreira entre nós enquanto tentava convencê-la a se apaixonar por mim. Porque quero casar com você. E até conseguir vou persegui-la, Lexie — ele disse exaltado. — Vou me assegurar de que não haja espaço para algum mal entendido entre nós. Vou me tornar um aborrecimento a. ponto de você não conseguir se virar sem me ver.

Lexie não conseguia imaginar que o amor de Lucan pudesse ser um aborrecimento para alguma mulher. Cer­tamente, não para ela! Lucan a amava. Lucan queria se casar com ela.

— Eu não... Você... — Ela gaguejava como uma idiota. Talvez porque se sentisse uma idiota gaguejante! Durante os últimos cinco dias, seu coração estivera em pedaços. Agora, Lucan lhe oferecia o paraíso.

Preocupado, ele pegou as mãos de Lexie.

— Eu amo você, Lexie. Loucamente. Não quero que isso a amedronte...

— Não estou amedrontada, Lucan. — Ela apertou as mãos dele. — Estou perplexa. Espantada, mas não as­sustada — ela garantiu comovida.

— Espantada? — ele repetiu inseguro.

Uma insegurança que Lexie não admitiria que duras­se nem mais um segundo. O Lucan que ela amava era arrogante, confiante, e não inseguro!

— Eu já amo você, Lucan — ela disse alegremen­te. — Também me apaixonei por você enquanto está­vamos em Mulberry Hall. Contra todas as probabili­dades. Contra a razão. — Ela repetiu de propósito o que ele havia dito. — Amo você, Lucan! — ela falou radiante.

Lucan soltou o ar como se precisasse esvaziar o peito. Não conseguia formar um pensamento coerente: só con­seguia olhar para Lexie encantado, absolutamente mara­vilhado, por aquela linda mulher, a mulher que amava, ter acabado de dizer que também o amava. Lexie sorriu para ele com um ar provocante.

— Nunca pensei que este dia chegaria!

— Que dia? — Ele perguntou em voz trêmula.

— O dia em que eu iria deixar o arrogante e seguro Lucan St. Claire sem fala! — ela disse sem pudor. — Diga... Isto vai acontecer toda vez que disser que amo você?

Ela estava de volta. A mulher direta e corajosa, por quem se apaixonara e caíra de cabeça, estava de volta!

— Não — ele resmungou, abraçando-a. — Isto é o que vai acontecer toda vez que você disser que me ama! — Ele abaixou a cabeça e a beijou, mostrando exatamente o quanto a amava e o quanto sempre iria amá-la.

 

Um mês depois...

— Por que você está sorrindo com essa cara de gato que roubou o canário? — Lexie perguntou a Lucan, que ria disfarçadamente.

Era o dia em que os dois haviam se casado. Um dia em que as famílias dos dois haviam se unido em Mulber­ry Hall para celebrar o amor que sentiam, um pelo outro. Um dia pelo qual Lexie ansiara, desde o momento em que Lucan declarara amá-la tanto quanto ela o amava. Lucan lhe sorriu, enquanto os dois dançavam durante a recepção do casamento, no salão de baile de Mulberry Hall. Estava muito mais relaxado e à vontade que o ho­mem frio e distante que Lexie conhecera há apenas cinco semanas. O amor que sentiam brilhava claramente em seus olhos. Lucan balançou a cabeça.

— Gideon riu de mim durante as últimas cinco sema­nas, por causa do quanto a amo. Estava apenas sabore­ando o momento porque acho que agora ele vai provar do próprio veneno!

Lexie olhou para um canto da sala, onde o cunhado fitava Lucan com um olhar de acusação.

— O que você fez, Lucan? — ela perguntou ao mari­do em tom de censura.

— Não importa o que fiz — disse Lucan, dando-lhe um piparote na ponta do nariz. — Concentre-se no que vamos fazer depois — ele disse com um sorriso mali­cioso e faminto. Lexie se sentiu derreter pelo calor do desejo que via nos seus olhos.

— Você se tornou um homem muito malicioso, Lucan St. Claire — ela falou em tom indulgente.

— Minha duquesa tem uma péssima influência sobre mim — ele respondeu em voz rouca.

Sua duquesa. Lexie se tornara, inacreditavelmente, a duquesa de Stourbridge! E, mais importante que tudo: era a mulher que Lucan amava com loucura. E ele era o homem que ela amava com todo o seu coração. Lexie não tinha dúvida de que o profundo amor que sentiam um pelo outro duraria pelo resto da vida.

 

 

                                                                  Carole Mortimer

 

 

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