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ERNESTINA, AS SETE FASES DO AMOR / Stendhal
ERNESTINA, AS SETE FASES DO AMOR / Stendhal

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

ERNESTINA

As Sete Fases do Amor 

 

Quando em 1799, com 16 anos, Henri Beyle, zangado com o pai, sai de Grenoble para, como tantos outros provinciais de então, ir à conquista de Paris, onde já Bonaparte reinava, tem em mente três objectivos: completar a formação do seu próprio carácter, fazer uma carreira brilhante e ter aventuras femininas. Assim escrevia no seu diário um sanguíneo, de compleição sobretudo atarracada, imbuído das ideias filosóficas dos "ideólogos" da Revolução Francesa - Destutt de Tracy, Condillac, Cabanis, Maine de Biran e outros - que lera e adaptara às suas próprias finalidades.

A sua vida só aparentemente não foi a concretização desses objectivos, já que falhou uns e se ultrapassou largamente noutros.

Calhou-lhe em sorte uma época espantosamente movimentada. Nos seus cinquenta e nove anos de vida, conheceu o Antigo Regime, a Revolução, o Império, a Restauração e a Monarquia de Julho. Mais um pouco, e teria conhecido a Revolução de 1848!

Este jovem que vemos desembarcar em Paris e que não sabe ainda que se tornará um viajante infatigável e um observador arguto dos homens, dos sentimentos e das situações; este moço imberbe que ignora ainda que nunca há-de casar e que a sua vida será feita de um rosário de ligações mais ou menos tumultuosas, em que o sexo, como virá a confessar, não foi a melhor parte; este jovem, dizíamos, não tinha então, entre os seus objectivos, tornar-se um grande escritor. E se lho tivessem predito, não teria acreditado. Foi, no entanto, ao exercício desse "ofício" que acabou por ser levado pelo seu temperamento e pelas circunstâncias, apesar de o praticar a coberto de um pseudónimo, e à margem dos meios literários dominantes do seu tempo, e de sempre, por isso, se ter sentido inseguro quanto ao valor do que ia escrevendo; mas foi por ele, e só através dele, que encontrou o meio de influenciar a época que lhe coube em sorte, e de realizar, por estranhas vias, o sonho de deixar a sua marca no futuro que se mostrava então tão pleno de possíveis.

Vem, pois, para Paris, no ano em que nasce Balzac, para se inscrever na Politécnica. Tem uma depressão, e desiste do concurso de entrada nessa escola. Arranjam-lhe emprego no Ministério da Guerra e, com 17 anos, alista-se no exército reservista de Bonaparte, seu ídolo, e parte para a campanha de Itália, onde permanecerá dois anos. Em andas e bolandas com o exército, conhece o norte de Itália. Apaixona-se pela música e pela ópera. Nunca mais esquecerá as paisagens Italianas. Chega à conclusão de que a vida militar não lhe convém. Demite-se do exército, volta a Paris, participa na boémia. Toma-se de amores por Mélanie Guilbert, actriz.

Em 1804, nasce Saint-Beuve, e Bonaparte torna-se Napoleão.

No ano seguinte, vitória em Ulm e em Áusterlitz; desenha-se o mapa da Europa, parecendo que o Império de Carlos Magno se reconstitui, como a Revolução parecera reconstituir a república romana.

Com 23 anos, Henri Beyle retoma o activo no exército, mas, agora, num posto administrativo. Parte para a Alemanha, no ano em que Napoleão entra em Berlim para submeter os prussianos, aliados dos ingleses. com Guilhermina Griesheim, que encontra perto de uma pequena cidade chamada Stendal, que lhe inspirou o seu pseudónimo literário, procura aprender a língua e a filosofia alemã, que não parara em Kant. Hegel e Hõlderlin. Tinham 36 anos: este, definitivamente embrenhado na sua loucura, e aquele já descrente das intenções de Napoleão quanto ao projecto da libertação dos povos e do restabelecimento da cidadania universal.

Em 1807, os russos são vencidos em Friedland e é proclamado o bloqueio continental ao comércio inglês.

com 25 anos, volta a Paris, depois parte de novo para Itália ao serviço do Exército onde se liga a Angela Pietragrua, enquanto Napoleão se ocupa de espanhóis e portugueses e já projecta a invasão da Rússia, para daí atingir a índia e ferir, na sua fonte de abastecimento, o empório comercial inglês. Em 1809, Napoleão vence em Wagram e desfaz mais uma das coligações organizadas contra o seu projecto político.

Em 1812, Henri Beyle parte para a Rússia, onde assiste à carnificina de Borodino, voltando à Alemanha e ao Delfinado, no ano seguinte.

Em 1814, Napoleão é afastado do poder e, um ano depois, é definitivamente vencido em Waterloo.

Stendhal tem trinta e um anos, vividos e viajados, num continente que se faz e se desfaz, onde se assiste ao maior contacto inter-regional de que há memória, desde o Império Romano, e de onde sai vencida uma ideia política liberal e republicana, à escala de um continente. Mas Henri Beyle não esquecerá.

Sobe ao poder Luís XVIII, inicia-se a Restauração. Por fases sucessivas e crescentemente, desenha-se o retorno ao Antigo Regime. Henri Beyle não colabora, e parte para Itália, depois de ter publicado A Vida de Haydn, Mozart e Metastaso.

De regresso a Paris, em 1817 e até 1830, onde volta a retomar o activo, publica A História da Pintura em Itália e, pela primeira vez, com o seu pseudónimo, Roma, Nápoles e Florença. Nestes treze anos, ora em frança, ora em Itália, Stendhal vai ver, sentir e observar a sociedade que se reconstitui depois da primeira tormenta revolucionária (a que outras se seguirão), identifica as paisagens onde mais tarde plantará os cenários da sua obra, constrói o núcleo duro do seu texto, procura reconstituir a sua linhagem intelectual, moral e estética. Em 1820, com trinta e sete anos, começa a escrever Sobre o Amor que publicará dois anos depois.

Em 1821, nascem Flaubert e Baudelaire, e Wagner, em 1823; em 1827, morre Beethoven. Publica então a primeira parte de Racine e Shakespeare, e A Vida de Rossini. Encontra-se em Itália com Lamartine e escreve Armance. Várias vezes, suspeito de pertencer à Carbonária, é expulso de Itália pelos austríacos.

Em 1830, a Restauração dá de si: o retorno ao Antigo Regime revela-se inviável como já não fora possível reconstituir o império dos francos, nem refazer a república romana; e a Monarquia de Julho também não conseguirá estabilizar a sociedade num retorno ao momento termidoriano da Revolução. O futuro continuará, hesitante, à procura de si próprio. Regime monárquico, igreja, corpos do Estado, industrialização, cidades, vias de comunicação, actividade agrícola, mentalidades - nada se aguenta firme.

Os intelectuais, depois de um eclipse de trinta anos, voltam ao activo, por toda a parte, na Europa. Dir-se-ia que "o conceito precisa-se", após o espantoso maelstrom criado pelos práticos.

Começa, então, a última fase da sua vida. É nomeado cônsul em Itália, inicia, aos quarenta e sete anos, uma ligação com Júlia Rinieri, publica Vanina Vanini, O Vermelho e o Negro, A Cartuxa de Parma, Lamiel e começa a escrever Luciano Leuwen. O grande crítico francês Saint-Beuve não consegue compreender a sua obra, mas Balzac, no auge da sua trajectória, reconhece-o.

Em 22 de Março de 1842, às duas da manhã, morre, em Paris, em plena rua, com um ataque de coração. Morte fulminante, como desejara. Ia fazer sessenta anos.

Previra que só por volta de 1880 começaria a ser compreendido. E, de facto, data desse momento o reconhecimento intelectual do valor e alcance do que escrevera, à medida que nomes como Balzac, Hugo e Flaubert vão perdendo um pouco da aura que tinham tido em vida.

Como foi possível a um outsider tomar um dos lugares cimeiros da literatura francesa e europeia, e construir textos poderosos que continuam a soar justo?

Marginal ao meio literário e às suas correntes, de que só muito gradualmente veio a fazer parte, Stendhal, nome germânico debruçado sobre o Sul, aplicou à crónica e ao romance, às biografias e aos livros de viagem o ponto de vista que desenvolvera, durante a primeira parte da sua vida, ou seja, as teorias dos "materialistas" que lera na juventude.

Também tratados por "ideólogos", no decorrer da Revolução Francesa, grupo de amigos, trocando entre si saberes e experiências, muito influenciados por Condillac, republicanos de antes da Revolução, geralmente ateus tornaram-se, no decorrer desta, os seus filósofos e pensadores. Comportaram-se com imensa coragem política, com determinação, e demonstraram um enorme sentido prático. A eles se ficou a dever, nomeadamente, a criação da Escola Normal e do Instituto.

Pensavam, e Henri Beyle não esqueceu a lição, que o homem não tem nada a ganhar em alargar a sua reflexão aos fins últimos, por natureza, incognoscíveis. São matéria de fé, que o afastam da prossecução consciente e voluntariosa da sua própria felicidade, e separam-no dos outros homens, de que se torna inimigo. Deve o homem antes saber como funciona, conhecer o seu corpo, a origem dos seus impulsos, a razão do prazer e do desprazer que está sentindo. Deve procurar sabê-lo experimental e criticamente, partindo do princípio de que o sólido ponto de partida da sua realidade própria, da sua consciência de existir, é a sua própria sensibilidade. Quando o criticaram por falta de objectividade, Beyle respondeu numa nota do seu Roma, Nápoles e Florença, que não pretendia dizer como eram as coisas, mas transmitir as sensações que lhe provocavam.

Orientaram-se, consequentemente, para o cultivo de saberes pragmáticos, e não especulativos, tais como a medicina, a pedagogia, a moral social, a antropologia, a lógica, a gramática, a estética, etc. Um ponto comum a todos eles é a reflexão fundamental sobre a linguagem (estão, aliás, na origem da linguística moderna) e sobre o movimento vivo. Sem este não há sensação, sem aquela a sensação não se pode transformar em ideia, nem é possível a constituição do eu. Acabam assim por acentuar as noções essenciais de duração, de resistência, que se experimentam na extensão dos corpos, e de esforço, sem descurar uma escuta atenta do homem interior, no centro do qual reina o instinto, entendido como memória acumulada de sensações não trabalhadas pela linguagem, e, pois, faculdade que permite ao vivente encontrar por si, intuitivamente, uma adequação justa ao meio e à sua circunstância.

A obra literária, sob o prisma do "encanto", deve, assim, obedecer ao realismo histórico (em que texto e intriga tendem a identificar-se), oferecer um quadro da civilização e do estado dos costumes, expor lealmente os dados de um raciocínio e de uma intriga, mostrar a progressão dos caracteres, analisar com clareza o substracto psicológico das acções, de modo que o leitor, na sua maioria, pouco instruído, possa compreender motivada e auto-reflexivamente, de que realidade é feito o mundo. Verá em si próprio que é o ódio implacável, resultante da procura de um lugar ao sol, que move a roda do mundo, mas verá também que esse sol é um erro semântico, pois que o que todos procuram é um encontro com o amor. A grande interrogação sendo "porque é que essa aspiração cai sistematicamente no mesmo erro semântico, e por que é que a história é uma intriga de terror, contada por um louco a ouvintes surdos, que lêem nos lábios das personagens as réplicas que gostariam de ser eles a dizer, se a coragem não lhes faltasse."

Esta interrogação levou Stendhal a inflectir o cerne das teorias dos "materialistas": onde estes punham como motor da realidade, a resistência e o esforço, colocou ele o prazer cénico do amante, a famosa cristalização, que mais não é do que a construção da figura do ser amado. A exemplo dos seus mestres, que procuravam analisar detalhadamente a realidade, definiu as sete fases da progressão cénica amorosa.

Stendhal pegou neste motor, e instalou-o no texto, os personagens ganharam vida e motivação, a intriga adquiriu velocidade, a realidade tornou-se móvel e, sem se mostrar seguro dos seus efeitos, conseguiu vislumbrar, no incerto, o futuro provável: o futuro que viria, fossem quais fossem as voltas que a história desse, seria liberal, individualista, urbano, sem grande confiança no Estado e na política; os indivíduos não mais abandonariam a procura da felicidade, que entenderiam como prazer próprio, específico e duradouro; este futuro não teria passado na história da humanidade.

Ao abordarmos o trajecto deste homem, no meio do tumulto de uma época, ficamos com a sensação de que houve ali uma ambição desmedida, inadequada aos meios de que, à partida, dispunha; a de um homem, manso e sensual, fora do sítio, e de um tempo em que o futuro parecia uma lotaria concebida para caloteiros que sabiam como levantar a rifa, sem terem de a pagar. Ora, Henri Beyle foi um homem de carácter, um lento que demorou a conhecer-se. Como sanguíneo e corpulento que era, a natureza pedia-lhe que saboreasse a vida com calma e quase a sós, aconselhava-lhe prazeres estáveis, mas foi entre rapaces, prontos a colher o que lhes passasse ao alcance das mãos, que iniciou a vida. E, no caso vertente, esses rapaces chegaram a ter, nessas mesmas mãos, o futuro da Europa.

Temos, assim, a primeira imagem: a de um bom, superiormente inteligente, que erigira por norma ter carácter no gosto, para quem era essencial saborear com calma e demoradamente, preferindo amar a ser amado, por haver neste último estado qualquer coisa de incómodo, de importúnio. Quem ama, como ele gostava de amar, constrói in petto o seu amor, contempla-o sem reptos, deixando que a energia dos impulsos reflua em construções erótico-imaginárias, em vez de desaguar, inteiro e pouco trabalhado, no corpo amado. Num corpo assim feito, é o futuro que vem, o corpo não lhe corre atrás.

A segunda imagem que aparece é a de que o futuro parecia pertencer aos audaciosos.

Quando aos dezasseis anos, Henri Beyle chega a Paris, todos os futuros eram possíveis, inclusivamente o retorno dos Bourbons ao trono absoluto. Nada estava ainda decidido. A imagem com que se fica é a de que todos esses futuros discutiam entre si; havia tumulto, as fronteiras entre nações deslocavam-se ao sabor de guerras relâmpagos, falava-se em libertar os povos do jugo do absolutismo, um mundo velho ruía, discutia-se o novo.

Mas as linhas de fuga do futuro, que acabaria por ser o futuro, ninguém as sabia, nem qual fosse o mais possível, entre os possíveis, nem se haveria um passado a perpetuar. Para que o futuro não se fizesse sozinho e porque não há cenas exteriores na história, a pena ou a espada teriam de intervir. Talvez Beyle Stendhal tivesse encontrado, viajando sozinho, o caminho que Bonaparte Napoleão andara procurando, arrastando multidões armadas e morte, atrás de si.

 

Uma ocasião, ouvi uma senhora com muito chiste e com alguma experiência afirmar que, contrariamente ao que se diz, o amor não é de geração rápida e espontânea.

- Parece-me, dizia ela, poder detectar sete fases distintas no nascimento do amor.

E, para provar o que defendia, contou o episódio que se segue. Estávamos no campo, chovia que Deus a dava, sabia-nos bem ouvi-la.

Numa alma perfeitamente virgem, uma rapariga nova morando num castelo isolado, perdido na província, a mais pequena surpresa excita profundamente a atenção. Por exemplo, um rapaz novo que anda a caçar e que ela, inesperadamente, vislumbra no bosque, perto do castelo. Foi com um acontecimento deste género que começaram os dissabores de Ernestina de S... O castelo que ela habitava então sozinha, na companhia do seu velho tio, o conde de S..., mandado construir na Idade Média, perto das margens do Drac, sobre um dos enormes rochedos que comprimem o curso dessa torrente, dominava um dos mais belos lugares do Delfinado. Ernestina achou um aspecto nobre ao jovem caçador, levado ali pelo destino para que fosse visto. A sua imagem veio-lhe várias vezes ao espírito; porque sobre quê pensar naquela mansão antiga? Vivia ali no meio duma espécie de magnificência; dirigia uma numerosa criadagem; mas desde há vinte anos que tudo se fazia com o mesmo horário de sempre; o Senhor e o pessoal eram já de idade; a conversa começava invariavelmente por criticar tudo o que fora feito, e até as coisas mais simples a tornavam deprimente. Numa tarde de primavera, com o dia a chegar ao fim, Ernestina foi até à janela; olhou para o pequeno lago e para o bosque que lhe ficava mais além; a extrema beleza dessa paisagem contribuía talvez para a fazer mergulhar num devaneio sombrio. De repente, voltou a ver o jovem caçador que vira alguns dias antes; lá estava ele no pequeno bosque para lá do lago; tinha na mão um ramo de flores; parou como se olhasse para ela; viu-o dar um beijo no ramo e, em seguida, depô-lo com uma espécie de respeito terno, na cavidade vazia de um grande carvalho à beira do lago.

Que revoada de pensamentos foi capaz de levantar esta simples acção!, e pensamentos fortemente motivados, se comparados com as sensações monótonas que, até então, haviam ocupado a vida de Ernestina! Uma nova existência principiava ali; teria coragem para ir ver o ramo? "Meu Deus!, que imprudência, disse para si, sobressaltada; e se, justamente no momento em que eu me estivesse a aproximar do grande carvalho, o jovem caçador fosse a sair das matas vizinhas! Que vergonha! com que ideia ficaria de mim?" E, no entanto, essa bela árvore era a finalidade habitual dos seus passeios solitários; ia sentar-se muitas vezes sobre as suas raizes gigantescas, que se elevam acima da relva e formam, à volta do tronco, como que assentos naturais protegidos pela sua vasta sombra.

À noite, Ernestina teve dificuldade em adormecer; no dia seguinte, mal a aurora despontou, por volta das cinco da manhã, sobe ao sótão do castelo. Procura com os olhos o grande carvalho para além do lago; mal o viu, estacou, com a respiração presa. A felicidade alvoroçada das paixões segue-se à alegria sem objecto e quase maquinal, própria da primeira juventude.

Passam dez dias. Ernestina conta os dias! Só viu uma vez o jovem caçador; ele tinha-se aproximado da árvore querida, com um ramo de flores que deixou lá, como fizera com o primeiro. O velho conde de S... observa como ela passa os dias a reparar um viveiro de pássaros que colocou nas águas-furtadas do castelo; o facto é que sentada ao pé de uma pequena janela, com as persianas fechadas, domina dali toda a extensão do bosque para lá do lago. Tem a certeza de que o seu desconhecido não a pode ver, e é nesses momentos que pensa nele sem constrangimento. Vem-lhe uma ideia que a atormenta. Se ele pensar que ninguém repara nos seus ramos, concluirá que as suas homenagens são desprezadas, e como, tudo somado, não passam de mera cortesia, basta que tenha um coração bem formado, para desaparecer de vez. Passam mais quatro dias, mas com que lentidão! Ao quinto dia, a rapariga, a bem dizer donzela, passando por acaso perto do grande carvalho, não resistiu à tentação de lançar um olhar para dentro da pequena concavidade, onde vira depor os ramos. Estava acompanhada pela sua governanta e não tinha nada a temer. Ernestina esperava unicamente encontrar flores murchas; com uma alegria inexprimível, vê um ramo de flores raras e das mais bonitas; com uma frescura deslumbrante; não há uma pétala murcha, mesmo nas flores mais delicadas. Mal se tinha apercebido de tudo, e já, num relance, e sem perder de vista a sua governanta, varre com a ligeireza de uma gazela a zona do bosque compreendida num raio de cem passos. Não vê ninguém; certa de que não estaria a ser observada, volta ao grande carvalho, ousa olhar deliciada o ramo encantador. Ó céus!, há um bilhetinho que mal se nota, preso ao nó do ramo.

- Que tem, minha Ernestina?, diz a governanta, alarmada pelo gritinho que acompanha esta descoberta.

- Nada, minha boa amiga, é uma perdiz que levantou voo, mesmo aos meus pés.

Ainda há quinze dias, não lhe teria passado pela cabeça mentir. Ernestina abeira-se cada vez mais do ramo encantador; inclina a cabeça, e corando toda, sem ousar tocar-lhe, lê no bilhetinho:

"Há já um mês que todas as manhãs trago um ramo; conhecerá este a felicidade de não passar desapercebido?"

Tudo é deslumbrante nesse bonito recado; a caligrafia inglesa que traçou essas palavras da maneira mais elegante. Há quatro anos que deixou Paris, e saiu do convento mais em moda do faubourg Saint-Germain, e até agora Ernestina não viu nada de tão bonito. Subitamente, fica toda corada, aproxima-se da sua governanta e pede-lhe que regressem. Para chegar mais depressa, em vez de percorrer todo o pequeno vale e de dar a volta ao lago, como é costume, Ernestina toma o carreiro da pequena ponte que vai directamente dar ao castelo. Está pensativa, promete a si mesma não voltar mais àquele sítio; porque, enfim, acaba de descobrir que alguém ousou dirigir-lhe pessoalmente uma espécie de mensagem. O bilhetinho, é certo, não estava fechado, murmurou ela para si mesma. A contar desse instante, a sua vida é agitada por uma terrível ansiedade. Pois então!, não pode ela, mesmo de longe, ir ver a árvore querida? O sentimento do dever diz-lhe que o não faça. "Se eu for ao outro lado do lago, diz-se ela, não poderei voltar a confiar nas promessas que fizer a mim mesma." Quando, às oito horas, ouviu o porteiro fechar a grade da pequena ponte, esse ruído que lhe tirava toda a esperança, pareceu libertá-la também do peso enorme que lhe pesava sobre o peito; já não podia faltar ao dever, mesmo que agora tivesse a fraqueza de consentir nessa falta.

No dia seguinte, nada a pôde tirar dum sombrio devaneio; está abatida, pálida; o seu tio apercebe-se; manda atrelar os cavalos à antiga berlinda, percorrem-se os arredores, vai-se até à avenida do castelo da Sra. Dayssin, a três léguas dali. À volta, o conde de S... dá ordens para parar no pequeno bosque, no outro lado do lago; a berlinda roda sobre o relvado, ele deseja ver o carvalho imenso a que só sabe chamar o contemporâneo de Carlos Magno.

- Esse grande imperador pode tê-lo visto, disse ele, ao atravessar as nossas montanhas para ir à Lombardia vencer o rei Didier.

E este pensamento duma tão longa vida parece rejuvenescer um velho quase octogenário. Ernestina está longe de acompanhar o tio nos seus raciocínios; o rosto arde-lhe; vai estar de novo, mais uma vez ainda, junto do velho carvalho; prometeu a si mesma não voltar a olhar para o pequeno esconderijo. Impelida por um movimento instintivo, sem reparar no que faz, lança os olhos para a concavidade, vê nela um ramo, e empalidece. Um ramo formado de rosas debruadas a negro.

"Sou um infeliz, devo afastar-me para sempre. Aquela que eu amo não se digna aperceber-se da homenagem que lhe dirijo."

São estas as palavras que estão escritas no pequeno cartão preso ao ramo. Ernestina leu-as, mesmo antes de ter tempo de, a si mesma, proibir de olhar. Sente-se tão frágil que é obrigada a encostar-se à árvore; e, num ápice, desfaz-se em lágrimas. À noite, a si própria confessa: "Ele vai-se embora para sempre, e não voltarei a vê-lo!"

No dia seguinte, em pleno dia, sob um sol de Agosto, estando a passear-se com o seu tio, na alameda de plátanos, à beira do lago, vê na outra margem o rapaz aproximar-se do grande carvalho; agarra no seu ramo, atira-o ao lago e desaparece. Ernestina ficou com a impressão de que havia despeito no seu gesto; rapidamente se convenceu de que havia. Admira-se até como por breves instantes pôde duvidar; é óbvio que, vendo-se desprezado, se vai embora; nunca mais o verá.

Nesse dia, vive-se um ambiente de grande inquietação no castelo, e só ela espalha um pouco de boa disposição. O seu tio afirma que ela está decididamente doente; uma palidez mortal, uma certa contracção nas feições, transtornaram aquele rosto ingénuo, onde anteriormente se desenhavam as sensações tão tranquilas da primeira juventude. Ao entardecer, quando foi de novo hora de passeio, Ernestina não se opôs a que o seu tio a levasse para o relvado da outra margem do lago. Ela olha de passagem, e com um olhar baço, onde a custo retém as lágrimas, para o pequeno esconderijo, a três pés acima do solo, convencida de que não iria encontrar o que quer que fosse; ela viu muito bem atirar o ramo para o lago. Mas, divina surpresa!, ela enxerga um outro:

"Por piedade para com a minha atroz infelicidade dignai-vos aceitar esta rosa branca."

Enquanto relia estas espantosas palavras, a sua mão, sem que desse por isso, pegou na rosa branca que ocupa o centro do ramo. "Como ele é infeliz", diz-se ela. Nesse momento, o seu tio chama-a, segue-o, mas está feliz. Guarda a sua rosa branca no seu lenço de cambraia, e a cambraia de linho é tão fina, que enquanto dura o passeio ela pode vislumbrar a cor da rosa através do tecido ligeiro. Agarra no lenço de maneira a não ferir aquela rosa amada.

Mal chegou a casa, sobe a correr a escadaria rápida que leva à sua pequena torre, no ângulo do castelo. Ousa enfim contemplar à vontade aquela rosa dourada e encher todo o seu olhar com ela, através das doces lágrimas que se lhe escapam dos olhos.

Que significa esse pranto?. Ernestina não o sabe. Se ela pudesse adivinhar o sentimento que o provoca, teria certamente a coragem de sacrificar a rosa que, com tanto carinho, acaba de pôr no seu copo de cristal, sobre a pequena mesa de mogno. Mas basta que o leitor sinta a pequena mágoa de já não ter vinte anos, para adivinhar que aquelas lágrimas, longe de serem de dor, são as companheiras inseparáveis do pressentimento inesperado de uma extrema felicidade; elas significam: "Como é doce ser amado!". É no momento em que o abalo da primeira felicidade desencaminhava o seu bom senso que Ernestina cometeu o erro de pegar naquela flor. Mas ela ainda não está em condições de ver e de se recriminar por esta inconsequência.

Nós, que temos menos ilusões, identificamos com facilidade a terceira fase do nascimento do amor: o aparecimento da esperança. Ernestina ignora que, ao olhar aquela rosa, o seu coração está a dizer: "Agora, tenho a certeza que ele me ama."

Mas será realista dizer-se que Ernestina está à beira de amar? A maneira como nela se manifestam estes sentimentos não contraria todas as regras do simples bom senso? Vejamos!, ela só viu três vezes o homem que, neste preciso momento, a faz chorar lágrimas abrasadoras! E acrescente-se que só o viu através do lago, a uma grande distância, aí uns quinhentos passos talvez. Mais ainda, se o visse sem espingarda e sem o fato de caça, talvez nem o reconhecesse. Não sabe como se chama, o que faz na vida e contudo passa os seus dias a alimentar sentimentos apaixonados, de que me vejo obrigado a resumir a expressão, por falta de espaço para escrever um romance. Todos esses sentimentos são variantes desta ideia: "Que felicidade sentir-se amada por alguém!" Ou então, ela examina essa outra questão bem mais importante: "Posso esperar vir a ser verdadeiramente amada? Não será para se divertir que ele me diz que me ama?" Apesar de morar num castelo construído por Lesdiguières, e de pertencer à família de um dos mais valentes companheiros do célebre condestável, Ernestina nem sequer apresentou a si própria esta outra objecção: "Talvez seja filho de um camponês da vizinhança." E por quê? Porque vivia numa profunda solidão.

É evidente que Ernestina estava longe de identificar a natureza dos sentimentos que reinavam sobre o seu coração. Se ela tivesse podido prever para onde a conduziam, poderia ter talvez escapado à sua dominação. Uma jovem Alemã, uma Inglesa, uma Italiana teriam reconhecido o amor; a nossa sensata educação, ao tomar o partido de esconder das raparigas a existência do sentimento amoroso, fez com que Ernestina só muito remotamente se inquietasse com o que lhe ia no coração; quando reflectia profundamente nos seus sentimentos, só detectava neles uma simples amizade. Se pegara numa simples rosa, era porque temera, agindo diferentemente, afligir o seu novo amigo e acabar por o perder. "E, aliás, dizia-se ela, após ter pensado muito sobre o assunto, não devemos faltar à boa educação."

O coração de Ernestina está agitado pelos sentimentos mais violentos. Durante quatro dias, que mais parecem quatro séculos à jovem solitária, sente-se peada por um receio indefinível; não sai do castelo. Ao quinto dia, o seu tio, cada vez mais inquieto com a sua saúde, força-a a acompanhá-lo até ao pequeno bosque; está perto da árvore fatal; ela lê sobre o pequeno fragmento de papel escondido no ramo:

"Se se dignar aceitar esta camélia variegada, irei domingo à igreja da sua aldeia."

Ernestina viu na igreja um homem vestido com uma extrema simplicidade, e que podia ter os seus trinta e cinco anos. Reparou que não trazia uma cruz sequer. Estava a ler e, pegando, duma certa maneira, no livro de orações, nem um só momento tirou os olhos dela. Ou seja, durante toda a cerimónia, Ernestina foi incapaz de pensar no que quer que fosse.

Deixou tombar o seu livro de orações, ao sair do antigo banco senhorial, e quase ia caindo ao tentar recuperá-lo. Ficou muito corada por se ter mostrado desajeitada. "Ter-me-á achado tão sem jeito, disse logo a si mesma, que terá vergonha de se interessar por mim." E, com efeito, a partir do momento em que se deu este pequeno incidente, perdeu de vista o estrangeiro. Não lhe serviu de nada, depois de subir para a berlinda, ter parado para distribuir algumas moedas aos rapazotes da aldeia; no meio dos grupos de camponeses que tagarelavam, não enxergou nem réstia da pessoa que, durante a missa, não ousara sequer olhar. Ernestina que, até então, tinha sido a sinceridade em pessoa, pretendeu ter-se esquecido do lenço. Um criado remexeu na igreja e procurou durante muito tempo no banco do Senhor esse lenço que não conseguia encontrar. Mas o atraso que resultou deste expediente não serviu de nada, porque não voltou a ver o caçador. "É evidente, disse para si mesma; uma vez, a Menina de C... afiançou-me que eu não era bonita e que no meu olhar havia qualquer coisa de imperioso que criava distância; só me faltava ser desajeitada; sem dúvida alguma, despreza-me agora."

Os tristes pensamentos agitaram-na durante as duas ou três visitas que fez o tio, antes de regressarem ao castelo.

Mal tinha regressado, por volta das quatro horas, pôs-se a correr pela alameda dos plátanos, à beira do lago. A grade da passagem estava fechada, porque era domingo; felizmente, viu o jardineiro; chamou-o, e pediu-lhe que pusesse o barco a flutuar e a conduzisse à outra margem do lago. Desembarcou a uns cem passos do grande carvalho. O barco estava atracado e suficientemente próximo para a sossegar. Os troncos baixos e quase horizontais do imenso carvalho por pouco não se estendiam até ao lago. Numa passada decidida, e com uma espécie de sangue-frio melancólico e resoluto, como se estivesse a caminhar para a morte, aproximou-se da árvore. Tinha a certeza de não ir encontrar nada no esconderijo; com efeito, só deparou com uma flor murcha que pertencera ao ramo da véspera: - "Se estivesse contente comigo, disse para si, não teria deixado de me agradecer com um ramo."

Fez-se reconduzir ao castelo, subiu a correr para o seu esconderijo e, aí chegada, certa de que não seria surpreendida, desfez-se em lágrimas. "A Menina C... tinha perfeitamente razão, concluiu para si própria; para me achar bonita, é preciso ver-me a quinhentos passos de distância. Como neste país de liberais, o meu tio não vê ninguém, a não ser camponeses e padres, os meus modos devem ter adquirido qualquer coisa de rude, até de grosseiro talvez. Daí que tenha no olhar uma expressão imperiosa e detestável." Aproxima-se do espelho para observar esse olhar, vê uns olhos de um azul sombrio banhados em lágrimas. "De momento, devo abandonar este ar imperioso que nunca me deixará agradar a ninguém."

Tocou para o jantar; teve muita dificuldade em secar as lágrimas. Finalmente, apareceu no salão; foi aí encontrar o Sr. Villars, velho conhecedor de botânica, que, todos os anos, vinha passar oito dias com o Sr. de S..., para grande tristeza da sua criada, erigida em governanta, que, durante esse tempo, perdia o seu lugar à mesa do Sr. Conde. Tudo correu lindamente até à altura do champanhe; trouxeram o balde para ao pé de Ernestina. Há muito que o gelo se derretera. Chamou um criado, e disse-lhe:

- Mudem esta água e metam-lhe gelo dentro, depressa.

- Ora aí está um pequenino tom imperioso que te fica muito bem, disse a rir o bom do seu tio-avô.

À palavra imperioso, as lágrimas inundaram de tal modo os olhos de Ernestina, que lhe foi impossível escondê-las; sentiu-se forçada a sair do salão e, como fosse a fechar a porta, ouviam-se distintamente os soluços que a sufocavam. Os velhotes ficaram totalmente boquiabertos.

Dois dias depois, voltou a passar perto do grande carvalho; aproximou-se e olhou para dentro do esconderijo, como para rever os lugares onde fora feliz. Qual não foi o seu extasiamento ao dar com dois ramos de flores! Agarrou-os com os papelinhos, meteu-os no seu lenço, e partiu a correr para o castelo, sem se incomodar em saber se o desconhecido, escondido no bosque, observara os seus movimentos, precaução que até ao momento presente nunca a tinha abandonado. Esfalfada e não conseguindo continuar a correr, viu-se obrigada a parar no meio da calçada. Mal recuperou um pouco o fôlego, pôs-se de novo a correr com toda a rapidez de que se sentia capaz. Finalmente, encontrou-se no seu pequeno quarto; tirou os ramos do seu lenço e, deixando para depois a leitura dos bilhetinhos, começou efusivamente a dar beijos nos ramos de flores, gesto que a fez corar quando se apercebeu do que estava a fazer. "Ah!, nunca mais vou mostrar o meu ar imperioso, disse para si própria, vou emendar-me."

Por fim, quando sentiu que já tinha manifestado toda a sua ternura àqueles ramos compostos das mais raras flores, leu os bilhetinhos. (Um homem teria começado por aí.) O primeiro, o que estava datado de domingo, às cinco horas, dizia :

"Neguei a mim próprio o prazer de vos ver, a seguir à cerimónia; eu não podia estar sozinho; tinha medo que se lesse nos meus olhos o amor em que ardo por si...".

Releu três vezes estas palavras, o amor em que ardo por si, depois levantou-se para ir ver no seu psyché se estava com um ar imperioso; e prosseguiu :

"... o amor em que ardo por si. Se o seu coração não está ainda comprometido, queira pegar neste bilhete, que poderia comprometer-nos."

O segundo bilhete, o de segunda-feira, estava escrito a lápis, e até mesmo mal escrito; mas Ernestina já tinha passado a fase em que a linda caligrafia inglesa do seu desconhecido era só por si um encanto para os seus olhos; tinha assuntos bem mais relevantes do que prestar atenção a esses detalhes.

"Eu vim. Sentia-me feliz por alguém ter falado de si à minha frente. Disseram-me que ontem atravessou o lago. Vejo que não se dignou levar o bilhete que eu tinha deixado. É ele que vai decidir o meu destino. Você está apaixonada, mas não é por mim. Na minha idade, foi um disparate apaixonar-me por uma rapariga da sua. Adeus para sempre. Não acrescentarei a infelicidade de a ter importunado à infelicidade de a ter longamente ocupado com uma paixão, talvez ridícula, a seus olhos."

"Com uma paixão!", disse Ernestina, levantando os olhos ao céu.

Esse momento foi doce, de verdade. Esta jovem, de uma beleza notável, e na flor da juventude, exclamou extasiada: "Ele digna-se amar-me; ah!, meu Deus!, como me sinto feliz!" Caiu de joelhos diante de uma encantadora madona de Carlo Dolci, trazida de Itália por um dos seus antepassados. "Ah!, sim, serei boa e virtuosa!, exclamou ela, de lágrimas nos olhos. Meu Deus, dignai-vos somente mostrar-me os meus defeitos, para que eu os possa corrigir; agora, tudo está ao meu alcance."

Levantou-se para reler os bilhetes vinte vezes. O segundo, sobretudo, lançou-a num arrebatamento de felicidade. Em breve, atentou numa verdade estabelecida há muito no seu coração: é que nunca poderia apaixonar-se por um homem que tivesse menos de quarenta anos. (O desconhecido referia-se à sua idade.) Lembrou-se de que, na igreja, como era ligeiramente calvo, lhe havia parecido que ele teria uma idade compreendida entre trinta e quatro e trinta e cinco anos. Mas não estava segura da sua avaliação; quase nem ousara olhar para ele!, e encontrava-se tão perturbada! Durante a noite, não conseguiu dormir. Em toda a sua vida, não imaginara que pudesse existir uma tal felicidade. Levantou-se para escrever, em inglês, no seu livro de orações: "Nunca ser imperiosa. Faço este voto a 30 de Setembro de 18...".

Durante essa noite, convenceu-se cada vez mais desta verdade: é impossível amar um homem que não tenha quarenta anos. À força de sonhar com as excelentes qualidades do seu desconhecido, veio-lhe ao espírito que, além da vantagem de ter quarenta anos, teria provavelmente ainda a de ser pobre. Na igreja estava vestido duma maneira tão sóbria, que seria pobre, de certeza. Nada podia igualar a alegria que sentiu ao chegar a esta conclusão. "Nunca terá o ar estúpido e enfatuado dos nossos amigos, os Senhores tal e tal, quando vêm, na festa de Santo Humberto, dar a honra, ao meu tio, de matar os seus cabritos-monteses, e que à mesa, sem que ninguém os solicite, contam as suas aventuras de juventude.

"Terei eu a sorte de ele ser pobre, meu Deus!. Se assim for, a minha felicidade será completa!" Levanta-se uma segunda vez para alumiar a sua vela na lamparina, e procurar o montante aproximado da sua fortuna que, em tempos, um dos seus primos escrevera num dos seus livros. Encontrou dezassete mil libras de renda ao casar-se e, daí para a frente, quarenta ou cinquenta. Enquanto estava meditando sobre este número, bateram as quatro horas; assustou-se. "Talvez já tenha clareado o suficiente para que eu possa ver a minha querida árvore." Abriu as persianas; e, com efeito, viu o grande carvalho, e a sua ramagem escura; mas, graças ao luar que fazia, e não com a ajuda dos primeiros clarões da aurora, que ainda vinha longe.

Ao vestir-se, pela manhã, disse para si própria: "Não convém que a amiga de um homem de quarenta anos se vista como uma criança." E, durante uma hora, procurou nos armários um vestido, um chapéu, um cinto para a cintura, que compuseram um conjunto tão original que, quando fez a sua aparição, na sala de jantar, o seu tio, a sua governanta e o velho botânico não puderam conter uma gargalhada geral.

- Chega aqui, disse o velho conde de S..., antigo cavaleiro de São Luís, ferido em Quiberon; chega aqui, minha Ernestina; estás vestida, esta manhã, como se quisesses disfarçar-te em mulher de quarenta anos.

Corou ao ouvir estas palavras, e uma felicidade muito viva transpareceu nas suas feições.

- Deus me perdoe!, disse o bom do tio, no fim da refeição, ao velho botânico. É um palpite; não é da opinião, Senhor, que a Menina Ernestina tem, esta manhã, todo o ar de uma mulher de trinta anos? Reparou no pequenino ar paternal que tem sobretudo com os criados? Encantou-me pelo seu ridículo; pu-la duas ou três vezes à prova, só para me assegurar da minha apreciação.

Esta observação redobrou a felicidade de Ernestina, se nos podemos servir desta palavra para falar de uma felicidade que já estava ao rubro.

Foi com dificuldade que conseguiu livrar-se da companhia, após o pequeno-almoço. O seu tio e o amigo botânico não se cansavam de se meter com ela devido ao seu arzinho envelhecido. Foi para o seu esconderijo, e olhou para o carvalho. Pela primeira vez, desde há umas vinte horas, uma nuvem veio obscurecer a sua felicidade, mas sem que ela se apercebesse dessa súbita mudança. O que diminuiu o arrebatamento a que se entregara desde a altura em que, na véspera, mergulhada no desespero, encontrara os ramos de flores na árvore, foi esta pergunta que dirigiu-se a si própria: "Como vou comportar-me com o meu amigo para que me considere? Um homem de tanto espírito e, ainda por cima, de quarenta anos, deve ser muito severo. A estima que me tiver esfumar-se-á, se eu der um passo em falso."

Estando Ernestina entregue a este monólogo, na situação mais propícia às meditações sérias duma jovem diante do seu psyché, notou, com um espanto mesclado de horror, que tinha preso à cintura um gancho de ouro com pequenas cadeias que prendiam o dedal, a tesoura e o seu pequeno estojo, jóia encantadora que ela, ainda na véspera, não se cansava de admirar, e que o seu tio lhe tinha oferecido no seu dia de anos, não havia ainda quinze dias. O que a fez olhar essa jóia com repulsa e tirá-la com tanta pressa, foi ter-se lembrado que a criada lhe dissera que custara oitocentos e cinquenta francos, e que fora comprada no mais famoso ourives de Paris, que se chamava Laurençot: "Que iria pensar de mim o meu amigo, ele que tem a honra de ser pobre, se me visse com uma jóia de um preço tão ridículo? Haverá algo de mais absurdo que expor assim os gostos duma boa dona de casa?; porque é isso mesmo que significam esta tesoura, este estojo, este dedal, que trazemos continuamente connosco; e uma boa dona de casa não pensa que esta jóia valha, em cada ano, os juros do seu preço." Pôs-se seriamente a fazer cálculos e concluiu que aquela jóia custava perto de cinquenta francos por ano.

Esta bela reflexão de economia doméstica, que Ernestina devia à educação aprofundada que recebera de um conspirador que, durante muitos anos, vivera escondido no castelo do seu tio, esta reflexão, como ia dizendo, mais não fez que adiar a dificuldade. Logo que fechou na sua cómoda a jóia dum preço ridículo, teve que voltar à questão embaraçosa: Que fazer para não perder a estima de um tão grande espírito?

As meditações de Ernestina (que o leitor terá talvez identificado muito simplesmente como sendo a quinta fase do nascimento do amor) levar-nos-iam muito longe. Esta jovem rapariga possuía um espírito justo, penetrante, vivo como o ar das suas montanhas. O seu tio que, outrora, também fora um homem de espírito, e que ainda o era sobre os dois ou três assuntos que, há muito, levava a peito, já tinha notado como ela atingia espontaneamente todas as consequências de uma ideia. O bom do velhote tinha a mania, quando estava nos seus dias, e a governanta já notara que esta piada era o sinal indubitável disso mesmo, tinha a mania, dizia eu, de brincar com o que apelidava golpe de vista militar da sua Ernestina. Foi talvez esta qualidade que, mais tarde, quando começou a frequentar a sociedade e a não ter medo de falar em público, lhe permitiu desempenhar nela um papel tão brilhante. Mas, na época que estamos tratando, Ernestina, apesar da sua inteligência, embrulhou-se totalmente nos seus raciocínios. Vinte vezes esteve à beira de não ir passear para os lados da árvore. "Uma só leviandade, dizia-se ela, dando mostras de infantilidade própria de uma rapariguinha, pode levar a perder-me no conceito do meu amigo." Mas, apesar dos argumentos extremamente subtis, e em que ela empregava toda a força da sua cabeça, não possuía ainda a arte tão difícil de dominar, com o espírito, as suas paixões. O amor por que a pobre da rapariga, sem o saber, se sentia transportada falseava todos os seus raciocínios e levou-a bem cedo, para seu bem, a tomar o caminho da árvore fatal. Após muito ter hesitado, deu consigo ao pé da árvore, em companhia da sua criada de quarto, por volta da uma hora. Afastou-se da mulher e abeirou-se da árvore, incendiada de alegria, a pobre pequena! Mais parecia voar que caminhar sobre a relva. Como ela se afastava deles a correr, o velho botânico que saíra a passear com elas, levou a criada a atentar no facto.

Toda a felicidade de Ernestina se esfumou, num abrir e fechar de olhos. Não por não ter encontrado um ramo no buraco da árvore; era encantador e muito viçoso, o que começou por lhe provocar um prazer muito vivo. Não fora, pois, há muito, que, tal como ela, tinha ali estado o seu amigo. Procurou na relva indícios das suas pegadas; o que a encantou ainda é que, em vez de um simples bocado de papel escrito, havia um bilhete, e um longo bilhete. Percorreu-o logo com os olhos, à procura da assinatura; precisava de conhecer o seu nome de baptismo. Leu; a carta caiu-lhe das mãos, assim como o ramo. Um calafrio mortal apoderou-se dela. Lera no fim da carta o nome de Philippe Astézan. Ora o Sr. Astézan era conhecido no castelo do conde de S... como amante da Sra. Dayssin, mulher de Paris muito rica, muito elegante, que vinha todos os anos escandalizar a província, ousando passar quatro meses sozinha, no seu castelo, com um homem que não era seu marido. Para cúmulo da infelicidade, era viúva, jovem, linda, e podia casar com o Sr. Astézan. Todas estas tristes coisas, que tais como nós acabámos de as contar, eram verdadeiras, adquiriam um carácter bem mais venenoso na boca dos personagens tristes e grandes inimigos da juventude, que vinham por vezes em visita à antiga mansão do tio-avô de Ernestina. Nunca, em tão poucos segundos, uma felicidade tão pura e tão viva, era o primeiro amor da sua vida, se viu substituída por uma infelicidade pungente e desesperada. "O cruel!, quis brincar comigo, disse para si Ernestina; quis encontrar um objectivo para as suas caçadas, dar a volta à cabeça duma rapariguinha, talvez com a intenção de distrair com isso a Sra. Dayssin. E eu que pensava casar com ele!. Que infantilidade!, que espantosa humilhação!". Como estivesse a ter estes tristes pensamentos, Ernestina caiu desmaiada ao lado da árvore fatal que, desde há três meses, olhara tantas vezes. Pelo menos, foi aí que, meia hora depois, a criada de quarto e o velho botânico a foram encontrar inerte. E, como se tudo isto não bastasse, quando Ernestina foi chamada à vida apercebeu-se que a carta de Astézan estava a seus pés, aberta do lado da assinatura, e de maneira a poder ser lida. Levantou-se, rápida como um raio, e pôs o pé sobre a carta.

Explicou-se sobre o incidente e conseguiu, sem ser observada, recuperar a carta fatal. Durante muito tempo, não lhe foi possível lê-la, porque a sua governanta mandou-a sentar-se, e não a largou mais. O botânico chamou um jardineiro ocupado nos trabalhos do campo que foi ao castelo procurar um meio de transporte. Ernestina, para não ter que responder a comentários sobre o seu acidente, simulou não poder falar; uma terrível dor de cabeça serviu-lhe de pretexto para guardar o seu lenço sobre os olhos. A caleche chegou. Mais entregue a si própria, uma vez instalada no carro, não seria possível descrever a dor lancinante que lhe ia penetrando na alma, o tempo todo que levou o carro a chegar ao castelo. O que havia de mais horroroso no seu estado é que se via obrigada a desprezar-se a si própria. A carta fatal que sentia no lenço queimava-lhe a mão. A noite desceu enquanto a conduziam ao castelo; pôde abrir os olhos, sem que a estivessem a observar. A vista das estrelas intensamente brilhantes, durante uma bela noite do Sul da França, consolou-a um pouco. Apesar de sentir os efeitos desses movimentos da paixão, a simplicidade da sua idade estava longe de poder apreender a amplitude do que se passava. E Ernestina teve, no primeiro momento de pausa, após duas horas duma dor moral das mais atrozes, de decidir-se a tomar uma resolução corajosa. "Não lerei esta carta de que só vi a assinatura; vou queimá-la", disse de si para si, ao chegar ao castelo. Ela pôde então considerar-se, pelo menos, como sendo corajosa, porque o partido do amor, apesar de aparentemente vencido, não deixara de modestamente insinuar que aquela carta talvez explicasse de uma maneira satisfatória as relações do Sr. Astézan com a Sra. Dayssin.

Ao entrar no salão, Ernestina atirou a carta para o lume. No dia seguinte, logo às oito da manhã, sentou-se a trabalhar ao piano, que descurara muitíssimo nos últimos dois meses. Retomou a colecção de Memórias sobre a História de França, publicadas pelo Petitot, e recomeçou a fazer longos extractos das Memórias do sanguinário Montluc. Teve a habilidade de fazer com que o velho botânico lhe oferecesse mais um curso de história natural. Ao fim de quinze dias, o bom homem, simples como as suas plantas, não conseguiu calar-se sobre o empenho espantoso que notava na sua aluna; estava encantado. Quanto a ela, tudo lhe era indiferente; todas as ideias a conduziam por igual ao desespero. O seu tio estava realmente inquieto: Ernestina emagrecia, a olhos vistos. Como teve, por acaso, uma pequena constipação, o bom do velho que, contra o habitual nas pessoas da sua idade, não concentrara sobre si todo o interesse que podia ter pelas coisas da vida, imaginou que ela estava atacada do peito. Ernestina também acreditou nesse diagnóstico, e ficou-lhe a dever os únicos momentos suportáveis que teve nessa altura; a esperança de uma morte próxima fez-lhe suportar a vida sem mostras de impaciência.

Durante todo um longo mês, não teve outro sentimento que não fosse o de uma profunda dor, tanto mais profunda porque nascia do desprezo que sentia por si mesma; como não tinha nenhuma experiência de vida, não podia consolar-se; dizia para si própria que ninguém era capaz de suspeitar o que se passava no seu coração, e que provavelmente o homem cruel, que tanto a ocupara, não adivinharia sequer um centésimo que fosse do que havia sentido por ele. No meio da sua infelicidade, não lhe faltava coragem; não lhe custara nada deitar ao fogo, sem sequer as ter lido, duas cartas em cujo endereço reconhecera a funesta caligrafia inglesa.

Tinha prometido a si própria não mais olhar para o relvado do outro lado do lago; no salão, nunca levantava os olhos para as janelas que davam para esse lado. Um dia, umas seis semanas depois daquele em que lera o nome de Philippe Astézan, o seu professor de história natural, o bom do Sr. Villars, teve a ideia de lhe dar uma lição sobre as plantas aquáticas; meteu-se num barco com ela e fez-se conduzir à parte do lago por onde subia o pequeno vale. Como Ernestina entrasse no barco, um olhar de lado e quase involuntário assegurou-a de que não havia ninguém próximo do grande carvalho; quase nem reparava que um pedaço da casca da árvore era de um cinzento mais claro que a restante. Duas horas mais tarde, quando, depois da lição, voltou a passar perto do grande carvalho, estremeceu ao reconhecer que o que havia tomado por uma alteração na casca da árvore era, na realidade, a cor da jaqueta de caça de Philippe Astézan que, sentado, todo esse tempo, numa das raizes do carvalho, aí permanecera imóvel como se estivesse morto. Ao fazer para si mesma esta comparação, o espírito de Ernestina serviu-se igualmente dessa palavra: como se estivesse morto; e essa expressão surpreendeu-a. "Se está morto, não há inconveniente em que me ocupe tanto dele." Durante alguns minutos esta suposição foi um pretexto para se entregar a um amor tornado todo poderoso à simples vista do objecto amado.

Esta descoberta perturbou-a imenso. No dia seguinte, ao serão, um padre da vizinhança, que estava de visita ao castelo, pediu ao conde de S...que lhe emprestasse o Moniteur. E, enquanto o velho criado de quarto ia à biblioteca buscar a colecção dos Moniteurs do mês:

- Mas padre, disse o conde, parece que este ano a sua curiosidade se esfumou; é a primeira vez que me pede o Moniteur!

- Senhor conde, respondeu o padre, a Sra. Dayssin, a minha vizinha, emprestou-mo enquanto cá esteve; mas já fez quinze dias que partiu.

Esta palavra tão anódina provocou uma tal perturbação em Ernestina, que ela pensou que lhe ia dar um xelique; sentiu o seu coração estremecer com as palavras do padre, o que muito a humilhou. "Vejam só, disse para si, como consegui esquecê-lo!"

Essa noite, pela primeira vez desde há muito, aconteceu-lhe sorrir. E pensou: "Apesar de tudo, ele ficou, aqui, na província, a cento e cinquenta léguas de Paris; deixou a Sra. Dayssin partir sozinha." A imobilidade em que o vira sobre as raizes do carvalho, veio-lhe ao espírito, e ficou magoada por o seu pensamento se ter fixado nessa imagem. Toda a sua felicidade, há um mês a esta parte, consistia em persuadir-se de que sofria do peito; no dia seguinte, ficou surpreendida por estar a pensar que, como a neve começava a cobrir os cumes das montanhas, à noite fazia muitas vezes frio; e pensou que seria prudente vestir roupas mais quentes. Uma alma vulgar teria tomado as mesmíssimas precauções; mas Ernestina só pensou em tomá-las, depois do que ouviu ao padre.

A festa de Santo Humberto aproximava-se e com ela a época do único grande jantar que, ao longo do ano, era dado no castelo. Trouxe-se para o salão o piano de Ernestina. Ao abri-lo, no dia seguinte, achou sobre as teclas um pedaço de papel contendo estas linhas:

"Não grite, quando me vir."

Era de tal modo curto, que teve tempo de o ler todo, antes de reconhecer a mão que o havia escrito: a caligrafia estava disfarçada. Como Ernestina devia ao acaso, ou talvez ao ar das montanhas do Delfinado, o ter uma alma forte, de certeza que, se o tivesse lido antes do que ouvira ao padre sobre a partida da Sra. Dayssin, teria ido, de imediato, fechar-se no seu quarto, para só reaparecer depois da festa.

Dois dias depois, teve lugar esse grande jantar anual da festa de Santo Humberto. À mesa, Ernestina fez as honras da casa, sentada em frente do seu tio; estava vestida com muita elegância. A mesa apresentava a colecção mais ou menos completa dos padres e dos presidentes das câmaras municipais dos arredores, a que se vieram juntar mais uns cinco ou seis enfatuados de província, que falaram deles e sobre os seus feitos na guerra, na caça e até no amor, e sobretudo sobre a antiguidade da sua raça. Nunca, como nesse jantar, tiveram a mágoa de não produzir o menor efeito sobre a herdeira do castelo. A extrema palidez de Ernestina, aliada à beleza das suas feições, chegou ao ponto de lhe conferir um ar de desdém. Os enfatuados que com ela procuravam entabular conversa sentiam-se intimidados ao dirigirem-lhe a palavra. Não contassem com ela para se rebaixar a pensar neles.

Toda a primeira parte do jantar se passou sem que ela notasse algo de extraordinário; começava a respirar, quando perto do fim da refeição, ao levantar os olhos, encontrou, face aos seus, os de um camponês, já de idade madura, que parecia ser o criado do presidente dum município sito nas margens do Drac. Sentiu no peito esse movimento singular que já experimentara, quando das palavras do padre; contudo, não tinha nenhuma certeza. O campónio não se parecia nada com Philippe. Ousou olhar uma segunda vez; deixou de ter a menor dúvida, era ele. Tinha-se mascarado de maneira a parecer muito feio.

Já é tempo de falarmos um pouco de Philippe Astézan, porque se encontra ali a praticar uma acção de homem apaixonado, e talvez porque a sua história nos dê a oportunidade de verificarmos a teoria das sete fases do amor.

Quando, cinco meses antes, chegou ao castelo de Laffrey, acompanhando a Sra. Dayssin, um dos padres que ela recebia em sua casa, maneira de fazer a sua reverência ao clero, repetiu uma frase muito bonita. Philippe, admirado por ver uma manifestação de espírito na boca de um tal homem, perguntou-lhe quem era o seu autor.

"É a sobrinha do conde de S..., respondeu o padre, uma rapariga que será bastante rica, mas a quem deram uma péssima educação. Não passa um ano que não receba de Paris uma caixa de livros. Temo que venha a ter um fim desastrado e que acabe por nem sequer casar. Quem quererá sobrecarregar-se com uma mulher daquelas?" etc., etc.

Philippe fez mais algumas perguntas, e o padre não se coibiu de deplorar a rara beleza de Ernestina, que, muito certamente, a levaria à perdição; descreveu com tanto realismo o género de vida fastidioso que se levava no castelo, que a Sra. Dayssin exclamou:

- Ah! por favor, pare, Senhor padre, acabará por me fazer odiar as belas montanhas que tendes aqui.

- Não se pode deixar de amar uma terra onde se tem feito tanto bem, replicou o padre, e o dinheiro que a Senhora deu para nos ajudar a comprar o terceiro sino da nossa Igreja assegura-lhe...

Philippe deixou de o ouvir, pensava em Ernestina e no que devia passar-se no coração de uma jovem rapariga relegada para um castelo que, mesmo aos olhos de um padre da província, parecia fastidioso. "Está a precisar que eu a distraia, disse para si mesmo; vou cortejá-la no estilo romanesco; tal lhe trará alguns novos pensamentos." No outro dia, foi caçar para os lados do castelo do conde e não lhe escapou a situação do bosque, separado do castelo pelo pequeno lago. Teve a ideia de a homenagear com um ramo de flores; já sabemos o que fez com os ramos e estamos ao corrente dos bilhetes. Quando ia caçar para aquelas bandas, ele próprio se encarregava de os colocar; nos outros dias, enviava um seu criado. Philippe procedia deste jeito por mera filantropia, nem sequer pensava em ver Ernestina; não teria sido fácil, além de muito cansativo, fazer-se introduzir no círculo de relações do tio. Quando Philippe a viu na igreja, a sua primeira reacção foi pensar que era demasiado velho para agradar a uma jovem rapariga de dezoito ou vinte anos. Foi tocado pela beleza das suas feições e, sobretudo, por uma espécie de nobre simplicidade que compunha o carácter da sua fisionomia. "Há ingenuidade neste carácter", foi o que pensou para consigo. Um instante depois já lhe pareceu encantadora. Quando a viu deixar cair o seu livro de orações, ao sair do banco senhorial, e procurar apanhá-lo com uma falta de jeito tão amável, pensou em amá-la, porque ele ficara à espera. Ficou na igreja depois de ela ter saído; meditava sobre um assunto pouco animador para um homem que começa a estar apaixonado: já estava com trinta e cinco anos e com um começo de rarefacção nos cabelos, que talvez lhe compusesse uma bela testa à maneira do Dr. Gall, mas que certamente acrescentaria mais três ou quatro anos à sua idade. «Se, à primeira vista, a minha avançada idade não deitou tudo a perder, pensou ele, impõe-se que passe a duvidar dos meus sentimentos, para se esquecer da minha idade."

Abeirou-se duma janela gótica que dava para a praça, viu Ernestina subir para a caleche, e achou-lhe a cintura e o pé encantadores; ela distribuía esmolas; pareceu-lhe que procurava alguém com os olhos. "Por que motivo, perguntou-se ele, os seus olhos olham para longe, enquanto distribui umas moedazitas, mesmo ao pé do carro? Será que lhe terei inspirado algum interesse?"

Reparou que Ernestina dava um recado a um lacaio; enquanto isto, enebriava-se com a sua beleza. Viu-a corar, os seus olhos encontravam-se muito perto dela: o carro achava-se, no máximo, a uns dez passos da pequena janela gótica; assistiu ao criado a entrar na igreja e a andar à procura de qualquer coisa no banco do Senhor. Foi durante a ausência do criado que teve a certeza que os olhos de Ernestina olhavam muito para além do ajuntamento que a rodeava, e que, por conseguinte, procuravam alguém; mas esse alguém podia muito bem não ser o Philippe Astézan que, aos olhos da jovem, tinha talvez cinquenta anos, sessenta anos, vá-se lá saber? com aquela idade e com a fortuna que tinha, não haveria um pretendente entre os fidalgotes da vizinhança? "E, no entanto, é verdade que não vi ninguém durante a missa."

Logo que o carro do conde se foi embora, Astézan montou no cavalo, fez um desvio pelo bosque para evitar encontrar-se com ela, e foi ter rapidamente ao relvado. Para seu inexprimível prazer, conseguiu chegar ao grande carvalho antes que Ernestina tivesse visto o ramo e o bilhetinho que mandara lá pôr de manhã; tirou esse ramo, e embrenhou-se no bosque, prendeu o cavalo a uma árvore, e foi dar uma volta por ali. Estava num estado de grande agitação; lembrou-se de se agachar por detrás de um outeiro arborizado, a cem passos do lago. Desse esconderijo, que o escondia de todos os olhares, e graças a uma clareira aberta no bosque, podia enxergar o grande carvalho e o lago.

Qual não foi o seu profundo encanto quando, pouco tempo decorrido, viu a barcaça de Ernestina progredir sobre as águas límpidas que a brisa do meio-dia agitava quase imperceptivelmente! Esse instante foi determinante; a imagem daquele lago e a imagem de Ernestina, que ainda agora vira tão bela na igreja, gravaram-se-lhe profundamente no coração. A contar desse instante, Ernestina passou a ter, como mulher, algo que, a seus olhos, a distinguia de todas as outras; a Philippe, só uma coisa lhe faltava ainda: a esperança, para a poder loucamente amar. Viu-a aproximar-se, com urgência, da árvore; viu-lhe a dor de aí não ter deparado com um ramo. Este momento foi de tal modo delicioso e vivo que, quando Ernestina se foi embora a correr, Philippe imaginou ter-se equivocado, pensando ter visto dor na expressão do seu rosto, desiludida por não ter encontrado um ramo na árvore. Todo o destino do seu amor assentava sobre esta circunstância. Ele dizia-se: "Ela já vinha com um ar triste ao descer do barco, e mesmo ao aproximar-se da árvore. Mas, - retorquia o partido da esperança -, ela não estava triste na igreja; pelo contrário, vi-a brilhando de frescura, de beleza, de juventude e um pouco perturbada; o mais vivo do espírito animava-lhe o olhar."

Logo que, pelo olhar, Philippe Astézan deixou de poder seguir Ernestina que desembarcara na alameda dos plátanos, na outra margem do lago, o homem que emergia do esconderijo era muito diferente do que para lá entrara. Ao voltar a galope para o castelo da Sra. Dayssin, só tinha duas ideias em mente: "Terá ficado triste por não ter encontrado um ramo na árvore? Essa tristeza não terá sido provocada simplesmente por uma vaidade desiludida?" Esta última suposição, sendo a mais provável, acabou por tomar conta do seu espírito e trouxe-o de volta às ideias razoáveis de um homem de trinta e cinco anos. Tinha ficado muito sério.

Encontrou muita gente em casa da Sra. Dayssin; no decorrer do serão, ela brincou com a sua gravidade e com o seu ar enfatuado. Tinha de deixar de olhar-se, dizia-lhe ela, cada vez que passava diante dum espelho. "Sinto horror, dizia a Sra. Dayssin, dessa mania que têm os jovens que estão na moda. É uma graça que você não tem; procure desfazer-se dela, ou prego-lhe a partida de mandar esconder todos os espelhos." Philippe não se sentia muito à vontade; não sabia ainda como ocultar uma ausência que projectava. Aliás, era verdade que procurava ver ao espelho se possuia, ou não, um ar envelhecido.

No outro dia, voltou à pequena encosta, para retomar a posição a que já nos referimos, e de onde podia muitíssimo bem ver o lago; encontrou maneira de se anichar aí, munido de um bom binóculo, e só de lá saiu, "noite fechada", como sói dizer-se na região.

No dia seguinte, levou um livro; simplesmente, só muito a custo conseguiria dizer o que havia nas páginas que lera; mas, se não tivesse tido consigo um livro, teria desejado ter um. Finalmente, para seu inexprimível prazer, viu, por volta das três horas, Ernestina que caminhava lentamente na direcção da alameda dos plátanos, nas margens do lago; viu-a dirigir-se para a calçada com um grande chapéu de palha de Itália na cabeça. Aproximou-se da árvore fatal; parecia ter um aspecto abatido. Servindo-se do binóculo, confirmou perfeitamente esse ar abatido. Viu-a pegar nos dois ramos que ele colocara de manhã no esconderijo, metê-los no seu lenço e desaparecer correndo à velocidade dum raio. Este simples facto acabou por conquistar definitivamente o seu coração. A acção desenrolou-se de uma maneira tão viva, tão rápida, que não lhe sobrou tempo para ver se Ernestina ainda conservava o ar triste ou se era alegria que lhe brilhava nos olhos. Que devia ele pensar desta singular maneira de proceder?. Iria ela mostrar os dois ramos à governanta? Nesse caso, Ernestina não passava de uma criança; mas ele era ainda mais criança do que ela, por se entreter a este ponto com uma rapariguinha. "Felizmente, pensou para si, ela ignora o meu nome; só eu sei a loucura em que me meti, e já me perdoei muitas."

Foi com um aspecto frio que Philippe abandonou o seu refúgio e igualmente foi, todo pensativo, buscar o cavalo que deixara num camponês, a meia légua dali. "Tenho de concordar que continuo a ser um grande maluco!", disse para si, ao descer da montada no pátio do castelo da Sra. Dayssin. Ao entrar no salão, vinha com um ar impassível, atónito, gelado. Tinha deixado de amar.

No dia seguinte, ao pôr a gravata, achou-se muito envelhecido. Para começar, não lhe apetecia palmilhar três léguas para se ir anichar num matagal, com o intuito de ficar a olhar para uma árvore; mas não desejava ir a mais lado nenhum. "Tudo isto é ridículo", disse para si mesmo. Sim, mas ridículo aos olhos de quem? Aliás, nunca se deve falhar o encontro com a fortuna. Pôs-se a escrever uma carta muitíssimo bem feita, na qual, como um outro Lindor, declarava o seu nome e as suas qualidades. Essa carta primorosamente escrita teve, como o leitor estará talvez lembrado, a infelicidade de ser queimada antes de ser lida por alguém. Das palavras da carta que o nosso herói escreveu; e nas quais menos atentou, as da assinatura, Philippe Astézan, foram as únicas que tiveram honras de leitura. Apesar dos belíssimos raciocínios, não foi isso que impediu o nosso homem de estar, sensatamente, escondido, no seu habitual refúgio, e no preciso momento em que o seu nome produzia o efeito que se sabe; assistiu ao desmaio de Ernestina ao abrir a carta; não há palavras que descrevam o enorme espanto que sentiu.

Um dia depois, viu-se obrigado a confessar a si próprio que estava apaixonado; as suas acções eram prova disso mesmo. Voltou todos os dias ao pequeno bosque, onde experimentara tão vivas emoções. A Sra. Dayssin devia regressar em breve a Paris, Philippe escreveu uma carta a si próprio e anunciou que ia sair do Delfinado para passar quinze dias na Borgonha, na companhia dum seu tio doente. Tomou a diligência, e organizou-se tão bem que, seguindo o caminho por uma outra estrada, só esteve um dia ausente do pequeno bosque. Estabeleceu-se a duas léguas do castelo do conde de S..., na solidão de Crossey, do lado oposto ao castelo da Sra. Dayssin, e daí vinha, todos os dias, postar-se à beira do pequeno lago. Aí foi trinta e três dias seguidos sem conseguir ver Ernestina; deixara de ir à igreja; a missa era dita no castelo, de onde procurou aproximar-se, disfarçado, e, por duas vezes, teve a felicidade de ver Ernestina. Parecia-lhe que nada conseguiria igualar a expressão, a um tempo, nobre e ingénua das suas feições. Dizia a si mesmo: "Junto de uma tal mulher, nunca conhecerei a saciedade." O que mais emocionava Astézan era a sua extrema palidez e o seu ar sofredor. Poderia escrever dez volumes como Richardson, se o meu objectivo fosse tomar nota dos modos, de todos os modos, de que se servia um homem, a quem não faltava nem sensatez, nem experiência, para explicar o desmaio e a tristeza de Ernestina.

Por fim, acabou por se decidir a ter com ela uma explicação e, com essa finalidade, a entrar no castelo. A timidez, ser tímido aos trinta e cinco anos!

Fora a timidez que, até à data, o impedira de entrar em contacto com ela. com toda a inteligência possível tomou as suas medidas e, contudo, sem a ajuda do acaso, que pôs na boca dum quidam qualquer o anúncio da partida da Sra. Dayssin, toda a perícia de Philippe teria sido inútil ou, pelo menos, só, na sua vertente colérica, teria contemplado o amor de Ernestina. Provavelmente explicaria essa cólera, atribuindo-a à surpresa de se ver amada por um homem de mais idade. Philippe ter-se-ia sentido desprezado e, para apagar esse penoso sentimento, recorreria ao jogo e aos bastidores da ópera, tornando-se ainda mais egoísta e mais duro, e pensando que, no seu caso, a fase da juventude estava definitivamente acabada.

Um meio-Senhor, como se diz na região, mas dum concelho de montanha e camarada de Philippe, na caça à cabra montês, consentiu em levá-lo, disfarçado de criado, ao grande jantar do castelo de S..., onde foi reconhecido por Ernestina.

Ernestina, sentindo-se a corar incrivelmente, teve uma ideia horrível: "Ele vai pensar que, sem sequer o conhecer, estou levianamente apaixonada por ele; tomar-me-á por uma criança e desprezar-me-á como mulher, ir-se-á embora para Paris, para junto da sua Sra. Dayssin; não o voltarei a ver." Esta ideia cruel deu-lhe coragem para se levantar e recolher aos seus aposentos. Havia dois minutos que aí se encontrava, quando ouviu abrir-se a porta da antecâmara. Pensou que era a governanta, e levantou-se, procurando um pretexto para a mandar embora. Quando ela caminhava para a porta do quarto, esta abriu-se. Philippe está a seus pés.

- Em nome de Deus, perdoai-me a minha maneira de agir, diz-lhe ele; ando há dois meses desesperado; quereis-me para vosso esposo ?

Este foi um momento delicioso para Ernestina. «Ele está a pedir-me em casamento, disse para si própria, não devo mais ter medo da Sra. Dayssin." Procurou uma resposta severa e, apesar dos seus incríveis esforços, talvez não tivesse encontrado nada. Estavam varridos dois meses de desespero; encontrava-se no auge da felicidade. Afortunadamente, nesse instante, ouviu-se abrir a porta da antecâmera. Ernestina disse-lhe:

- Estais-me a desonrar.

- Não confesseis nada!, exclamou Philippe numa voz contida e, com imenso jeito, deslizou entre a parede e a bonita cama de Ernestina, branco e rosa.

Era a governanta, muito inquieta com a saúde da sua pupila, e o estado em que a ia encontrar era de molde a aumentar as suas inquietações. A mulher demorou a recambiar. Enquanto a governanta esteve no quarto, Ernestina teve tempo de se acostumar à sua felicidade; pôde recuperar o sangue-frio. Deu uma resposta soberba a Philippe quando, depois de a governanta ter saído, este se arriscou a reaparecer.

Ernestina estava tão bela, tal como a viu, a expressão das suas feições era de tal modo severa, que a primeira palavra da resposta que deu deixou Philippe com a ideia de que tudo o que pensara até aí era pura ilusão, e de que não fora minimamente correspondido. A sua fisionomia mudou de repente, e o que veio ao de cima foi a aparência de um homem totalmente desesperado. Ernestina, comovida até ao fundo da alma, pelo desespero que via espelhado nele, teve, contudo, a força de o mandar embora. A única lembrança que guardou desse encontro singular foi quando ele suplicou que lhe permitisse pedir-lhe a sua mão, ter-lhe dado como resposta que os seus negócios, e assim como os seus afectos, o reclamavam em Paris. Ele exclamara então que o único negócio que tinha em mãos era o de merecer o coração de Ernestina, que, a seus pés, lhe jurava não deixar o Delfinado enquanto ela ali permanecesse, e que nunca mais havia de voltar ao castelo onde vivera, antes de a ter conhecido.

Ernestina atingiu quase o cume da felicidade.

No dia seguinte, voltou ao grande carvalho, mas bem escoltada pela governanta e pelo velho botânico. Aí se encontrava à sua espera um ramo e, sobretudo, um bilhete. Ao fim de oito dias, Astézan tinha-a quase decidido a responder às suas cartas quando, uma semana depois, soube que a Sra. Dayssin, vinda de Paris, havia voltado ao Delfinado. Uma viva inquietação substituiu todos os outros sentimentos no coração de Ernestina. As comadres da aldeia vizinha que, nesta conjuntura, sem o saberem, decidiam o destino da sua vida, e não perdendo ela nenhuma ocasião de as fazer falar, disseram-lhe finalmente que a Sra. Dayssin, cheia de cólera e de ciúme, viera buscar o seu amante, Philippe Astézan que, dizia-se, ficara na região com a intenção de entrar na Cartuxa. Para se habituar às austeridades da ordem, retirara-se para a solidão de Crossey. Acrescentava-se que a Sra. Dayssin estava desesperada.

Alguns dias depois, Ernestina soube que a dita senhora não conseguira nunca falar com Philippe, e que voltara furibunda para Paris. Enquanto ela procurava ver confirmada esta doce certeza, Philippe estava desesperado; amava apaixonadamente, e julgava não ser de todo em todo correspondido. Procurou encontrar-se com ela várias vezes e, por diversas vezes, foi-lhe dado a entender, pelo modo como era recebido, que tais iniciativas irritavam o orgulho da sua jovem dona. Por duas vezes, partiu para Paris, e percorridas que eram umas vinte léguas, voltara para trás, para a sua cabana, nas rochas de Crossey. Depois de se ter sentido lisonjeado com esperanças que agora considerava levianamente concebidas, procurava desprender-se do amor, todos os outros prazeres da vida estando como mortos para ele.

Ernestina, mais feliz, era amada, e amava. O amor reinava naquela alma que nós vimos passar sucessivamente pelas sete diferentes fases que separam a indiferença da paixão, lá, onde o vulgo só vê uma única mudança, e mesmo dessa não sabendo explicar a natureza.

Quanto a Philippe Astézan, para o punir de ter abandonado uma antiga amiga à beira do que poderíamos chamar a época do envelhecimento para as mulheres, nós o abandonamos a um dos estados mais cruéis em que pode cair uma alma humana. Foi amado por Ernestina, mas não pôde obter a sua mão. Casaram-na no ano seguinte com um velho-tenente general muito rico e cavaleiro de várias ordens.

 

                                                                                Stendhal  

 

                      

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