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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


ESPERA / Juliana Dantas
ESPERA / Juliana Dantas

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Vocês conhecem minha história com o Leão de Wall Street. Eu era aquela destrambelhada Emma Jones, que implorou por dez minutos com Liam Hunter acreditando que seria só mais uma entrevista, sem ter a menor noção de que aqueles dez minutos mudariam toda sua vida.
Poucos meses depois, contrariando todas as expectativas, estava me casando com o Leão de Wall Street e havia até um bebê a caminho.
Parecia o final perfeito, não é?
Só que tem algo que não contei a vocês...
Talvez fosse esperar demais que o caminho fosse fácil assim.
Tudo começou a ruir no dia de Ação de Graças. Iríamos viajar no jato de Liam, levando Ethan e Eric a tiracolo até a casa do meu pai, em Washington, onde minha mãe também estaria acompanhada de seu novo marido. O que poderia ser considerado um milagre de natal antecipado, já que Margô e Tom não passavam um feriado juntos desde que se divorciaram há mais de quinze anos.
E o único problema que eu esperava ter, além de evitar que Margô e Tom se matassem com as facas da cozinha, era convencê-los de que o natal seria na minha casa.
Em vez disto estava sozinha no meu quarto, com o rosto inchado de tanto chorar, sem fazer ideia de onde Liam tinha se metido depois de termos a pior briga de nossa vida de casados.
Eu devia saber que não poderia guardar segredos do Leão de Wall Street.

 


 


Eu o observo do outro lado da sala vazia.

Os movimentos inquietantes dos dedos longos castigando os cabelos acobreados, o som angustiado de sua respiração fazendo subir e descer o peito perfeito.

Como chegamos àquele momento?

Em todas as nossas crises, sempre encontrei uma saída. Sempre encontrei um jeito de voltarmos para nosso lugar.

Juntos.

No entanto não sei como resolver esta. Eu não sei.

– Liam – meus lábios trêmulos o chamam mais uma vez.

Por favor, por favor. Olhe para mim. Volte para mim.

Quero que ele olhe em meus olhos e acredite. Mas será que eu acredito?

Houve um dia em que acreditei que éramos invencíveis. Inquebráveis. Imortais.

E agora havia somente a incerteza.

Finalmente Liam me encara e deixo de respirar ao ver em seus olhos o que mais temia.

Ele não acredita.

– Como pôde tomar uma decisão tão séria sozinha? Como pôde pensar que eu iria concordar com a possibilidade de perder você?

Suas palavras quebram meu coração.

Como foi que chegamos a aquele momento?

Se tudo começou com perfeição...


Capítulo 1

 

Três meses antes

Oito semanas de gravidez

 

Nunca havia sonhado com o dia do meu casamento. Certamente, nem se tivesse dedicado todas as minhas horas sonhando acordada com este dia, como Zoe, teria imaginado que estaria no Plaza Hotel dançando com um dos caras mais ricos do país, com meus pés (um deles engessado!), firmemente alocados em cima dos seus enquanto ele me guiava através dos rostos sorridentes dos convidados que vieram testemunhar o casamento do Leão de Wall Street.

– Posso saber o que está se passando em sua cabeça, senhora Hunter?

Faço uma careta ao ouvi-lo me chamar de senhora Hunter. Aparentemente não haveria mais senhorita Jones. Iria sentir falta.

Sorrio, embrenhando os dedos em seus cabelos.

– Pensando que sentirei falta de ser chamada de senhorita Jones. Senhora Hunter parece tão... formal.

Liam sorri, me girando. É realmente irritante que ele seja tão bom dançarino, além de todas as coisas nas quais é perfeito.

Se eu não tivesse a desculpa do pé engessado, estaria passando vergonha na presença dos convidados, tropeçando na barra do vestido e caindo de boca no chão na melhor das hipóteses.

– Estou adorando chamá-la de senhora Hunter.

– Hum, não consigo imaginá-lo me chamando de senhora Hunter quando quiser me punir...

Liam fica sério.

– Nada mais de punições para você, baby. Já conversamos a esse respeito.

Reviro os olhos, decepcionada.

– Como se já não bastasse este gesso maldito!

Liam ri e beija meu rosto.

– Não seja reclamona.

– Ah, ainda não viu nada. Não sabe que os hormônios deixam as grávidas loucas?

– Não acho que possa piorar ainda mais sua personalidade, baby.

– Vou fingir que não ouvi em respeito ao dia do nosso casamento, quero que tudo seja perfeito – esboço um sorriso que reflete toda a felicidade que estou sentindo naquele momento.

Mesmo com Zoe me puxando momentos depois com a desculpa de que tenho que jogar o buquê, deixando bem claro que devo jogar em sua direção (o que não obedeço jogando para Amanda, que fica muito vermelha ao lado de Eric). Meus pais discutindo como sempre, dessa vez para ver quem iria ganhar a mais nova disputa “Aonde Liam e Emma irão jantar no dia de Ação de Graças”, apesar de ainda faltarem três meses para o feriado. Ou a porcaria do gesso no meu pé, que fazia eu me sentir uma inválida, sendo carregada de um lado para o outro por Liam ou Ethan.

No entanto ainda era o dia do meu casamento com Liam Hunter. O que significava que era o primeiro dia do nosso para sempre.

E para sempre era apenas o começo.


– Cansada? – Liam me carrega para dentro do apartamento silencioso naquele fim de noite e suspiro encostando a cabeço em seu ombro.

– Um tanto aliviada porque finalmente acabou. Se ouvisse a voz de Zoe exigindo minha presença mais uma vez iria enlouquecer e quebrar este gesso na cara dela.

– A gnomo se superou, devo reconhecer.

– Ah, um elogio? Vou contar a Zoe que ela está conquistando você.

– Não exagere. Sua amiga pode ser chata, porém sabe organizar um evento.

– É verdade.

– Neste momento estou muito feliz por ter terminado e, por sermos somente eu e você, senhora Hunter – Liam me beija, enquanto adentra no quarto e, por um momento, me deixo levar pelo gosto dos seus lábios, que hoje recende a champanhe caro e esqueço de minha mais recente resolução até que ele me coloca sobre a cama.

Aí eu me lembro e o afasto.

– Não, Liam, pare.

– Por quê? – Seus dedos rápidos já estão no botão do meu vestido.

– Porque não quero que a nossa noite de núpcias seja assim...

– Assim como? – Suas mãos espalmam a pele nua das minhas costas. Como ele podia ser tão rápido e preciso?

– Sério Liam – fecho os olhos e tento afastar o arrepio que trespassa minha espinha com seu toque quente, ao mesmo tempo que sinto o ar da noite de outono que entra pelas janelas enrijecer meus mamilos mal cobertos pela lingerie de renda branca.

Como? Cadê o vestido?

Arregalo os olhos para ver os cabelos de Liam deslizando por minha barriga, enquanto o vestido desaparece sob meus pés.

Que porra?

– Hum, baby, isto é muito sexy – escuto sua voz rouca contra minha coxa, onde a meia sete oitavos termina soltando um gemido quando sinto seus lábios bem ali. E subindo.

Respiro fundo, afastando a vontade de puxar seus lábios um pouquinho mais para cima.

– Liam, me escuta, não vou transar com você assim! – Digo firmemente. E ele finalmente me encara, confuso.

– Como é?

– Você escutou! Não foi desse jeito que sonhei que seria minha noite de núpcias!

– Porra, Emma – ele dá um murro na cama – eu falei que podia fazer o que quisesse, que podíamos ir para a suíte do hotel mais caro, você disse que não queria nada disto...

– Sim, não queria porque hoje não vai rolar nada!

– Por que porra não?

Aponto impaciente para meu pé engessado.

– O que o gesso tem a ver?

– Tudo! Quero que nossa primeira noite depois de casados seja perfeita!

– Estava sendo perfeita até você começar com estes absurdos.

– Não são absurdos! E qual o problema de esperar? Daqui a três dias, vou tirar esta merda e...

– Três dias? Faz uma semana que a gente não transa, você quis que esperássemos pelo casamento.

– Eu sei, já que esperamos até agora, podemos esperar mais alguns dias! Por favor, Liam, por favor! – Imploro, torcendo para não estar pedindo demais.

Inferno, eu podia não ser lá a garota mais sonhadora do mundo, mas seria pedir demais ter uma noite de sexo perfeito com meu marido sem aquela coisa ridícula no pé que me fazia sentir tão sexy quanto uma múmia num sarcófago?

– Tudo bem, senhora Hunter, vamos esperar – Liam resmunga e sorrio satisfeita.

Quer dizer, satisfação talvez não fosse a palavra certa no momento, ainda mais quando ele se afasta e não tenho mais o seu bem vindo peso sobre mim.

– Obrigada, marido! – Brinco e estendo o braço – agora pode me ajudar a tirar este vestido e entrar na banheira? Ninguém me contou que as grávidas ficavam cansadas tão facilmente.


Capítulo 2

 

Dois meses antes

Doze semanas de gravidez

 

– Você não pode contar nada hein? – Escuto a risada de Liam do outro lado da linha e faço cara feia – é sério. Ethan é muito cagão! Não pode contar nada para ele.

–Tudo bem baby.

– Sei que não escondem nada um do outro como se fossem duas universitárias de irmandade ou algo assim! – A risada de Liam fica mais alta.

– Prometi que não contaria. E sei que Ethan seria um cuzão como sempre se soubesse de seus planos.

– Muito bem. É bom mesmo manter a boca fechada, senão será punido, senhor Hunter.

– Punido?

– O quê? Talvez eu esteja cansada de sexo baunilha e resolva dar um jeito – sorrio, me ajeitando na cama pegando a caderneta onde estou anotando as ideias para o jantar que darei quando Liam voltar de viagem. Será meu primeiro jantar como casada e, se isto não fosse motivo suficiente para ficar nervosa, também estou apreensiva porque pretendo convidar Nicole Zorn, a garota do Ethan. Ou melhor, a garota pela qual Ethan é apaixonado há tempos e não tem coragem de convidar para sair.

– Baunilha? De onde tirou este palavreado?

– Não é assim que falam? – Não consigo deixar de ser irônica.

– Emma, já conversamos sobre...

– Eu sei, estava brincando. Gosto de sexo baunilha, baby – abaixo o tom de voz e escuto Liam respirar fundo.

– Antes que comece com a conversa sacana, preciso avisar que entro numa reunião em cinco minutos.

– Droga, nada de sexo por telefone hoje? – Reclamo, lamentando mais uma vez que Liam esteja viajando.

Nós havíamos planejado que eu viajaria com ele sempre que possível, porém, o problema nos investimentos de Liam numa empresa em Toronto, surgiu de repente não houve tempo para me preparar para acompanhá-lo desta vez.

– Não hoje.

– Estou com saudade.

– Volto em breve, baby.

– Eu poderia ir me encontrar com você.

– Estou trabalhando, Emma. Prefiro saber que está em casa tomando suas vitaminas e se cuidando.

Reviro os olhos.

Às vezes sentia saudade do Liam frio que só queria sexo. Aquele Liam superprotetor era um pé no saco quando tudo o que eu queria era pegar o primeiro avião e encontrá-lo como fiz em Paris. Ah, os bons tempos...

– Tudo bem. Tenho mesmo que cuidar do jantar de debutante do Ethan.

Liam ri com vontade.

– Ah, já ia me esquecendo, convide também Emiliano Colombo e sua esposa.

– Quem diabos são esses?

– Ele é um novo rico, dono de uma rede de restaurantes espalhadas pelo mundo entre outras coisas e estamos fazendo negócios.

– Ok, e como faço pra encontrá-los?

– Veja com a Sarah. Agora preciso realmente desligar, baby.

– Ok, vá trabalhar Senhor Leão.

– Eu te amo.

Sorrio.

– Eu também.

Desligo e olho para a caderneta.

Não consigo pensar em nada realmente interessante. Talvez seja melhor dar o braço a torcer e pedir que Eric decida o cardápio.

Entediada, pego de novo o celular e passo uma mensagem para Zoe, convidando-a pra jantar comigo naquela noite. Era muito ruim ficar sozinha. Sei que ela está trabalhando e pode demorar pra responder, então decido tomar um banho.

No banheiro, tiro a blusa e olho minha imagem no espelho. Passo a mão por meu ventre. Não tem quase nada. Apenas uma leve saliência.

Como será quando estiver enorme? Isto ainda me assusta pra caramba.

Mordo os lábios tentando conter a ansiedade enquanto retiro o resto das roupas, é quando vejo a mancha na minha calcinha.

Vermelha.

Sangue.


***


– Síndrome do Anticorpo Antifosfolípede.

Franzi a testa ao ouvir aquelas palavras que não significavam nada para mim.

Eu tinha estado relativamente calma desde que saí do consultório do Dr. Cameron há quatro dias depois de ele dizer que estava tudo bem com o bebê. Os exames seriam apenas para cobrirmos todas as possibilidades, então fiquei tranquila. Se o bebê estava bem, não havia motivos para preocupação.

Agora o que ele estava dizendo com aquele olhar grave?

– Não entendi? O que significa?

– Foi o que descobrimos em seu exame, Senhora Hunter.

– O senhor falou que estava tudo bem com o bebê!

– Não há nada de errado com seu bebê. É um problema com a gestante.

– O que significa? Estou doente?

— Síndrome do Anticorpo Antifosfolípede é um distúrbio de coagulação onde a gestante corre um risco elevado de derrame, infarto e embolia pulmonar, podendo levar à óbito se não for tratada.

Por um momento não consigo entender totalmente o que o médico diz.

– Continuo não entendendo.

O Dr. Cameron retira os óculos, me encarando com cuidado.

– Senhora Hunter, significa que corre muito risco se mantiver a gravidez.

Sinto dificuldade de respirar.

– Está dizendo que... que... – não consigo formular as palavras.

– Nestes casos, o mais aconselhável é interromper a gestação.

– Não! – A negativa sai da minha boca sem que eu consiga me conter.

– Senhora Hunter, sei que é inesperado, porém, sempre que a mãe corre risco, por qualquer motivo, o obstetra tem a opção de interromper a gravidez.

Levo as mãos à barriga, num gesto protetor.

– Não! Não pode me obrigar! Vou ter meu bebê!

– A senhora precisa entender o risco que está correndo. Preciso alertá-la. Se prosseguir a possibilidade de que sofra algo como um derrame, infarto ou embolia pulmonar é muito grande, como já disse, pode não sobreviver.

– Você quer dizer que posso morrer a qualquer momento? – Pergunto, sentindo algo se partindo dentro de mim.

– Ainda podemos interromper a gravidez...

– E se eu optar por interromper? Poderei tentar de novo?

– Não é aconselhável.

– Então não poderei engravidar novamente? – Minha voz não passava de um murmúrio. – E se eu não quiser interromper? Não há nada que possa ser feito?

– A senhora tem a decisão final, claro. Caso decida prosseguir, há um tratamento. Durante toda a gestação terá que fazer uso de injeções de heparina anticoagulante, para que os riscos diminuam. Deve começar a tomá-la imediatamente. Mesmo assim, não há uma garantia de cem por cento. E, depois do parto não deve tomar anticoncepcional. Na verdade, a senhora nem deveria ter tomado pílulas tendo este problema, teve sorte de não ter ocorrido nenhuma complicação.

Não consegui falar mais nada. Minha garganta estava fechada.

– Senhora Hunter, vá para casa. Converse com seu marido. Sei que é algo repentino e grave. Porém precisa tomar uma decisão e rápido.


Capítulo 3

 

Dois meses antes

Treze semanas de gravidez

 

Liam está chegando.

Finalmente, depois de vários dias, ele estará de volta, ao alcance dos meus olhos. Das minhas mãos.

Eu deveria estar radiante. Deveria estar ansiosa.

Em qualquer outra circunstância estaria pensando somente em todas as maneiras que ele poderia me foder com força e acabar com a dor que sua ausência causa em mim.

Não hoje.

Hoje, junto com a saudade há o medo. A incerteza.

Faz apenas uma semana que o médico me deu o ultimato. Pareciam anos. Séculos.

Eu não dormi. Mal comi.

Apenas me questionava o que tinha feito de errado para chegar àquele ponto. Nunca pensei em ser mãe antes de descobrir que estava grávida. Agora a simples ideia de interromper aquela pequena vida que crescia dentro de mim, já fazia minha própria vida perder o significado.

Como poderia tirá-lo? Meu leãozinho?

Conforme as horas passavam e o momento de estar com Liam de novo ia chegando, me perguntava como iria contar a ele.

Tinha medo de contar.

Porque bem no fundo, sabia que, por mais que Liam também já amasse nosso bebê, não hesitaria em pedir que eu o abortasse. E nós nunca mais teríamos um filho. Nunca mais.

Fecho os olhos com força, lutando contra a vontade de gritar.

Queria poder voltar no tempo. Um tempo em que não existiam incertezas. Um tempo em que eu era apenas uma garota esperando para ser caçada pelo Leão de Wall Street.

Ainda queria ser esta garota quando a porta se abre e deixo os pensamentos sombrios de lado, pulando em seu colo. Travando meus braços em volta do seu pescoço, embrenhando meus dedos em seus cabelos e atacando-o com meus lábios ansiosos.

Liam me aperta com força, levando embora com sua presença toda a preocupação. Só existimos nós dois no mundo nesse momento e a saudade que sinto de sua risada em meu ouvido, enquanto me carrega para dentro, só parando quando estamos sobre nossa cama, num emaranhado muito familiar de braços, pernas e beijos saudosos.

Dedos subitamente calmos retiram os fios desordenados de cabelo do meu rosto vermelho e não posso evitar o suspiro vindo do fundo do meu coração ao vê-lo sorrindo pra mim.

Tão lindo.

Tão meu.

A saudade que sentia dele doía em meus ossos. Nunca iria me acostumar com sua ausência. Era meu limite.

– Ei, baby – sua voz como sempre faz arrepios percorrerem minha pele.

– Ei – murmuro, erguendo a mão para tocar seus cabelos bagunçados puxando-o de volta para mim.

Liam me impede, segurando minhas mãos acima da cabeça.

– Não tão rápido Senhora Hunter – ele ri maldosamente, quando luto para me soltar. Sua mão livre viaja até meu ventre quase plano – não me disse como foram os exames.

Engulo em seco. Havia lhe contado sobre meu pequeno sangramento e o deixado bem preocupado. Tentei tranquilizá-lo com as garantias do médico de que estava tudo bem com o bebê e que os exames seriam apenas rotina.

Agora ele queria uma resposta.

Que eu não queria dar. Não podia.

– Como disse tudo ok – minto descaradamente, ondulando meu quadril contra o seu. – Pode me foder agora Senhor Hunter?

Seu gemido faz meu corpo acender como pisca-pisca natalino e regozijo quando finalmente me beija com força.

Não demora para estarmos ocupados retirando as roupas do caminho, numa bagunça de mãos afoitas, toques saudosos e gemidos sufocados.


– Mais força – sussurro em seu ouvido.

– Porra, baby – Liam rosna, aumentando a intensidade de suas estocadas.

É sempre perfeito quando estamos nos movendo juntos, respirando juntos. Apenas o prazer crescendo numa espiral de sensações que se espalham como larva quente por nossas peles transbordando em gemidos, arranhões e suor.

Fecho os olhos deixando meu corpo dominar minha mente.

Não quero nada além de sentir que tudo está do jeito que sempre foi.


***


– Vou conseguir?

Encaro minha imagem pálida no espelho e repito a pergunta que venho me fazendo desde que fui jogada naquele dilema sobre manter ou não a gravidez.

O que iria decidir? Coloco a mão na minha barriga ainda quase plana e sinto meu peito apertar com uma dorzinha que já está se tornando companheira desde que soube que para vê-la crescer terei que colocar minha própria vida em risco permanente.

Tento não pensar em como tudo aquilo é injusto. Em como é triste precisar escolher entre mim e meu filho.

– Baby, venha aqui – a voz de Liam faz meu peito se apertar ainda mais. Sei que deveria lhe contar tudo para decidirmos juntos o que fazer, no entanto temo que este dilema seja mais fácil de ser resolvido para ele do que para mim.

Meu temor é que Liam não hesite em pedir para eu interromper a gestação. E simplesmente não sei se estou preparada para fazer isto.

Como é que se fica pronta para algo assim, porra!

– Baby, vou ter que te buscar? – Repete com a voz cheia de impaciência e meus lábios se distendem num sorriso divertido. Depois que fizemos amor, Liam disse que havia uma surpresa na mala para mim. Resmunguei dizendo que ele sabia muito bem que eu odiava presentes, então Liam havia deixado a cama com um sorriso travesso garantindo que deste eu iria gostar. Rolei os olhos aproveitando para ir ao banheiro quando ele saiu para resgatar a mala na sala.

Foi fácil esquecer todo o drama que se desenrolava em minha vida enquanto estava me deixando consumir pela saudade de Liam, rolando com ele em nossa cama. Agora não poderia mais fugir da realidade. O sorriso do meu rosto se desfaz e respiro fundo saindo do banheiro.

– Liam preciso te contar uma coisa... – interrompo minha frase e arregalo os olhos ao ver Liam sentado sobre a cama e a sua volta uma profusão confusa de cores pastéis, enquanto suas mãos tiram mais coisas da mala aberta. – O que é isto? – Me aproximo e reconheço a confusão. São minúsculas roupas de bebê.

– Como disse, não são presentes para você. – Liam me puxa para me sentar na cama também, enquanto termina de espalhar os pequenos tecidos diante de nós – passei em frente a uma destas lojas em Toronto e pensei em lhe fazer uma surpresa. A ideia era comprar apenas uma roupinha, então pensei por que parar? – Ele me brinda com sorriso culpado.

– Liam...? – Um nó se fecha minha garganta e levo a mão à boca. Seu sorriso se desfaz.

– Ei, o que foi? Não vai me dizer que está puta? São coisas para o bebê, Emma. E nem é tanta coisa assim... queria ter comprado bem mais, o Ethan me impediu, dizendo que nem que a criança trocasse de roupa sete vezes ao dia conseguiria usar tudo que eu pretendia levar. Além do mais parece que elas crescem bem rápido também e perderia a maior parte. Ou você não gostou? Podemos devolver e comprar outras. Talvez seja uma boa ideia a gente sair amanhã e comprar...

– Liam, pare – peço incapaz de continuar ouvindo-o falar com tanta empolgação de algo que pode nem acontecer.

– Porra, está mesmo brava? – Ele franze a testa e percebo que sua mente já se prepara para uma negociação, não consigo me impedir de sorrir.

– Não estou brava, eu... – pego um macacão creme com um ursinho marrom bordado na frente e mordo os lábios para não chorar. – Achei lindo. Tudo – fungo.

– Então por que está chorando, merda?

Era agora. Eu poderia falar. Revelar a Liam que não seria tão fácil a gente ver nosso bebê usando aquelas roupas.

Ou talvez...

Talvez Liam pudesse. Ele poderia ver nosso leãozinho que seria todo parecido com ele que me encara com seus cabelos numa linda bagunça e seu olhar feroz pronto para briga.

Só que havia uma grande possibilidade de eu não ver.

– Ainda são a porra dos hormônios? – Ele ri divertido.

Por um momento imagino as fatídicas palavras que revelarão o horrível diagnóstico saindo da minha boca. Imagino seu divertimento se transformando numa preocupação devastadora.

Conheço Liam suficientemente bem para saber que, apesar de toda sua surpreendente empolgação com minha gravidez, não hesitará em exigir que eu me desfaça dela caso coloque minha vida em risco.

E, enquanto meus dedos ainda seguram a roupinha do meu bebê, decido que não posso deixar acontecer.

Há algo mais importante do que a minha vida agora.

Então sorrio e dou de ombros.

– Até consigo imaginá-lo usando essas roupas – murmuro e o sorriso lindo de Liam se alarga, fazendo meu coração aquecer.

– Sim, baby. Também imagino.

Nós sorrimos um para o outro e simplesmente sei que tomei a decisão certa.

Decidi pelo meu bebê.


Capítulo 4


Quatorze semanas

 

– Emma, vai dar tudo certo, pare de se preocupar e curta seu jantar – Eric diz quando volto à cozinha pela enésima vez perguntando se está tudo bem com o menu.

– Preciso que pelo menos a comida esteja boa para que algo se salve neste maldito jantar! – Me abano, querendo ter vestido algo mais leve do que aquele vestido de veludo preto Balenciaga escolhido por Zoe.

Eric ri, retirando algo do forno.

– A tal modelo continua hostilizando o Ethan?

Bufo.

– Não sei o que ele viu naquela chata! O coitado até está tentando, ela só dá patada nele!

– Vai ver ela realmente não está a fim dele.

– Como alguém pode não gostar do Ethan? Ele é lindo, gostoso, engraçado e um doce!

– Não aguento quando chama Ethan de doce! – Eric diz divertido.

– Ele é! E aquela bruxa descobriria se desse uma chance!

– Se ela é uma bruxa como diz, o melhor seria deixá-lo esquecer. Que tal apresentar outras garotas a ele?

– Duvido que dê certo! Ele está caído por ela! Precisa ver a cara dele quando a viu entrando, Eric. Achei que fosse gozar nas calças!

Eric ri alto.

– Imagino. Ela é muito gata. Até eu ficaria caído se não tivesse namorada. Que a Amanda não me ouça!

– Que eu não ouça o quê? – Amanda entra na cozinha naquele momento e Eric fica vermelho feito o pimentão que jogava na salada.

Deixo que ele se explique e volto para a sala.

Liam e o tal Emiliano parecem na mesma discussão animada sobre política que eu tinha tentado entender antes de ir para cozinha. Zoe está conversando com Ariana Colombo, que gesticula com a mão falando muito alto sobre uma viagem de compras que fez a Paris.

Sinceramente estes Colombos são dois malucos. Italianos, Ethan havia explicado, quando me assustei com os gritos de Emiliano. Ok, ele era um cara até bem gato, alto, moreno e forte, assim como sua esposa, que poderia ser facilmente uma destas modelos brasileiras, cheias de curvas e peitão com um cabelo armado cheio de laquê.

Suspiro procurando por Nicole e Ethan. Ela está num sofá mexendo em seu celular e Ethan ao lado dela, bebendo cerveja, praticamente babando em cima e sendo ostensivamente ignorado.

Qual o problema daquela garota?

Sinto-me tensa e de repente me preocupo por estar exagerando nas emoções. Não pode ser bom para mim. O que me faz lembrar que ainda não tive coragem de aplicar as malditas injeções.

Aproveitando que todos estão distraídos me esgueiro para o banheiro, abro o armário pegando a seringa e o medicamento com as mãos trêmulas. Como vou conseguir? Sinto tontura só de imaginar.

– Oh, me desculpe – me assusto ao ouvir a voz altiva na porta do banheiro e subo o olhar para encontrar Ariana Colombo me encarando – estava procurando o banheiro – seu olhar curioso recai em minhas mãos, ainda segurando a seringa. – Precisa de ajuda? – Me surpreendo ao ouvir sua pergunta.

Tento achar uma explicação plausível e nada me vem à mente.

– Fiz seis meses de um curso de enfermagem antes de conhecer Emiliano e, graças a Deus, poder me casar com um homem rico – ela ri como se fosse muito engraçado. – Tenho o estômago forte para estas coisas – ela dá de ombros – ou a frieza, alguns diriam.

– É, eu... eu gostaria de poder dizer o mesmo – murmuro com um sorriso sem graça.

Sem hesitar, Ariana entra no banheiro, fechando a porta atrás de si. Se aproximando com seus saltos ridiculamente altos batendo no chão, estende a mão com unhas pintadas de vermelho em minha direção.

Vacilo por alguns segundos, analisando a situação surreal, aquela mulher que mais parecia saída de um episódio das Real Housewives de New Jersey querendo me ajudar em algo tão peculiar.

Como realmente precisava de ajuda, passo a ela o medicamento e a seringa, observando fascinada a facilidade com que ela prepara a injeção e me encara com um olhar decidido.

Eu não sabia se estava com medo daquela mulher ou deslumbrada.

– Onde aplico?

– O médico disse que pode ser na barriga – respondo incerta.

– Certo, vamos lá.

Meio vermelha, abro o zíper do vestido, até que minha barriga esteja à mostra e, como uma enfermeira profissional, Ariana enfia a agulha na minha pele. Gemo levemente, com a dor da picada que felizmente dura menos tempo do que eu imaginava, até que ela dá o serviço por terminado e me encara.

– Pronto. Está feito.

– Obrigada – ela joga tudo no lixo e lava as mãos enquanto eu arrumo o vestido.

– Por que precisa tomar estas injeções de heparina anticoagulante? Sua gravidez é de risco?

– Como sabe...?

Ela dá de ombros.

– Pode não até parecer, mas eu era uma boa aluna. Estudei um bocado, achando que conseguiria estudar medicina. Eu era realmente inteligente para tanto, só não tinha dinheiro suficiente, então entrei na faculdade comunitária de enfermagem. Por isto reconheci o medicamento. Não sei de todos os detalhes só que está grávida, então imagino que seja algo relacionado à gravidez.

– Sim é.

– E ficará tudo bem se tomar estas injeções? Deve tomar todos os dias? Não é assim que funciona?

– Sim. Todos os malditos dias e nem sei como vou conseguir.

– Posso ajudá-la. Moro aqui perto – se prontifica e arregalo meus olhos.

Aquela mulher não ia parar de me surpreender?

– Não posso aceitar...

– Por que não? Pelo que percebi ou eu faço ou terá que pedir ao seu marido para ajudá-la.

– Não! – nego veementemente, o que faz Ariana levantar uma sobrancelha – Liam não sabe que preciso tomar estas injeções.

– Oh... Entendo. Acho.

Fico mais vermelha ainda.

– Não é nada demais – minto e não sei se ela está acreditando, então continuo – Liam é ridiculamente superprotetor, achei melhor não envolvê-lo.

– Sua amiga Zoe não poderia te ajudar?

– Ela não sabe também.

– Alguém sabe?

– Ninguém – confesso implorando com meus olhos que não faça mais perguntas.

– Sei... hum, enfim, minha oferta está de pé.

– Por favor, não conte a ninguém.

– Por que eu contaria?

– Só não quero preocupá-los.

– Tudo bem. Eu tenho uma filha. Sei que faria a mesma coisa que você está fazendo por ela – sorri se virando para sair, mas para na porta.

– Ah, aquela loira magrela foi embora.

Gemo desalentada.

– Que merda!

– O seu guarda-costas gostoso ficou bem chateado...

– Pois é. Ele está a fim dela, por isto a convidei. Começo a achar que não vai dar em nada. Que... vadia!

Ariana ri alto.

– Ele é solteiro? Com todo aquele tamanho? Imagina o tamanho do...

– Sim, é solteiro – eu a corto – e é tão legal, só queria que tivesse alguém, sabe?

– Quer saber? Tenho a mulher perfeita para ele! É minha irmã de criação. Ela é incrível! Tenho certeza que formariam um casal maravilhoso!

– Eu não sei... tentei juntá-lo com a tal Nicole e veja no que deu... Acho melhor aposentar minhas habilidades de cupido.

– Tudo bem. A oferta continua de pé!

Retoco a maquiagem e volto à sala. Zoe me aborda curiosa.

– Onde se meteu? Já ia te procurar, a Nicole foi embora! Até tentei segurá-la, ela simplesmente me deu um gelo, disse que estava de saco cheio e desapareceu.

– Fiquei sabendo. Ela é uma vaca mesmo.

– Que droga hein? Tadinho do Ethan está todo caidinho.

– Vou falar com ele.

Eu me aproximo de Ethan com um sorriso culpado

– E aí tagarela. Cada vez mais gorda hein?

– Me desculpe pela Nicole.

Ele ri, tomando um longo gole de cerveja.

– Não se culpe. Ela é uma vadia.

– Mas você gosta dela.

– Porque sou um idiota. Quer saber, deixa pra lá.

Toco seu ombro.

– Tenho certeza que em algum lugar desta cidade existe alguém feita pra você.

– Ah, eu só quero uma boa foda, tagarela. Esta coisa de amor não é pra mim.

Rolo os olhos.

– Homens!


Capítulo 5


Vinte semanas

 

Abro os olhos para ver o outro lado da cama vazio e meu coração se aperta. Lembro-me de outra época. De quando ele me deixava constantemente sozinha. Nunca dormia do meu lado. Nunca acordava comigo.

Parecia outra vida.

Suspiro, jogando as cobertas para o lado, apuro o ouvido quando me levanto e encosto minha testa na parede de vidro. Nada. Apenas o silêncio e a neve caindo lá fora, transformando o verde majestoso do Central Park num branco triste.

Tudo parece triste hoje. Nem parecia Ação de Graças.

Uma lágrima quente escorre por meu rosto frio. Sinto frio mesmo com a lareira de aço aquecendo o quarto. Seu calor não chega até meu peito.

Só uma coisa me aqueceria e não sei como fazê-lo vir até mim.

Não depois de ontem a noite.

Eu estraguei tudo.

Meu ventre se contrai, mordo os lábios com força levando a mão automaticamente para sentir seus movimentos e uma parte da dor se esvai.

Eu não tinha estragado tudo.

Tinha feito tudo por ele.

Não havia arrependimento dentro de mim. Não havia opções pra mim.

Liam não entendia.

Respiro fundo e enxugo as lágrimas em meu rosto aflito, uma resolução quase tranquila guia meus passos quando saio do quarto e o procuro pela casa silenciosa.

Eu deveria saber que não estaria em nenhum lugar.

Pego meu celular e digito a mensagem. Para a única pessoa que me pode me ajudar nesse momento.

Uns cinco minutos depois ouço a campainha, seu olhar está sombrio quando me fita.

– Sinto muito – sua voz quase sempre altiva é baixa, receosa. Carregada de pena.

Sorrio de leve.

– Não sinta. Foi minha escolha – respondo caminhando para o banheiro e ela me segue sem questionar.

Era nossa rotina fazia algumas semanas. Nosso pequeno segredo.

Entro no banheiro grata por sua praticidade e quase frieza para fazer o que é necessário. Eu nunca fui capaz de fazer. E hoje não seria diferente.

Observo-a lavar as mãos. Suas unhas hoje estão rosa escuro. Tão perfeitas quanto suas roupas.

– Acha que sou horrível?

Ela me encara, pegando o material dentro do armário.

– Não. Você é uma mãe – Ariana é sempre direta nas palavras. Enquanto alguns dão voltas, preocupados em ferir sentimentos, ser educados, ou algo do tipo, ela simplesmente diz na lata o que está pensando. Gosto disto nela. – Como ele descobriu?

– Ontem a noite ele encontrou o envelope que escondi na biblioteca.

– Burra – seu olhar é acusador. Ela não ia facilitar.

– Foi horrível – respiro com dificuldade ao me lembrar da briga terrível.

– E agora?

Dou de ombros.

Como poderia saber?

– Sinto muito, Emma – ela toca minha mão por um momento e aperto seus dedos. Luto contra a vontade de chorar. Não ia adiantar nada.

– Obrigada – murmuro, quando ela se abaixa na minha frente e miro seus cabelos escuros perfeitamente armados.

Ariana me fita com seus grandes olhos verdes. Ela era deslumbrante e sabia disto. Eu podia bem ver porque tinha conquistado um cara como Emiliano Colombo.

Porém ela era mais do que um lindo rosto. Foi num momento no qual não tinha ninguém em quem confiar que descobri que, aquela garota aparentemente fútil, podia guardar meu maior segredo. E ficar do meu lado.

– Apenas faça – peço fechando os olhos. A fisgada da agulha me faz perder o fôlego, escuto outro fôlego se extinguindo e abro os olhos assustada.

Liam nos observa na porta do banheiro.

Está ali olhando fixamente para o ponto em que Ariana aplica a injeção.

Vejo vários sentimentos refletidos em sua expressão. Raiva, medo, dor. E corta meu coração.

Assim, como o olhar acusador quando ele finalmente me fita.

Vi todos estes sentimentos em seus olhos ontem a noite, quando não pude mais esconder a verdade.

A verdade que lutei para manter escondida por todo aquele tempo. Justamente para não ver esta expressão de desolação misturada à fúria em seu semblante.

Agora é tarde.

E me pergunto se não foi sempre assim.

Ariana finalmente percebe Liam, quando termina sua missão e se levanta. Tenho que admirá-la. Consegue manter a expressão neutra, como se a tensão no recinto não pudesse ser cortada com uma faca.

Não sei o que dizer. É como se todas as minhas palavras tivessem sido roubadas da minha boca. Minhas mãos que descem a blusa sobre o ventre estão trêmulas. Talvez Liam também não soubesse o que dizer. Ou não quisesse dizer nada. A impressão que tenho é que ele iria começar a gritar a qualquer momento.

– Oi Liam – Ariana finalmente quebra o silêncio enquanto joga a seringa no lixo e lava as mãos.

– Ariana – ele pronuncia o nome dela naquele tom. Aquele que era quase um rugido feroz. O tom do Leão de Wall Street.

Qualquer outra pessoa fugiria correndo, menos Ariana.

Ela termina de secar a mão calmamente.

– Acho que não vai perguntar o que estou fazendo, porque é bastante óbvio, não é?

– Não tão óbvio assim – Liam continua no mesmo tom. Ou um pouco pior. Olhando diretamente pra mim. Quem quer correr agora sou eu.

Ariana cruza os braços em frente ao peito.

– Vai querer uma explanação?

– Não é você que me deve explicações.

Oh Deus!

– Liam – finalmente busco algum resquício de coragem dentro de mim para falar.

A coragem de enfrentar o temido leão, adquirida a duras penas ao longo de nosso relacionamento, quase havia se extinguido depois da noite passada. Quando percebi que deveria ter mantido minha promessa de não mais mentir para ele.

Eu deveria saber desde que tomei aquela decisão que, se Liam descobrisse, não me perdoaria.

Agora estava pagando o preço.

– Bem, preciso ir buscar minha filha na casa da minha irmã. E ainda tenho um jantar de Ação de Graças para coordenar.

Ariana passa por Liam e escuto seus passos se distanciando, louca para chamá-la de volta. Sei que não posso.

Tenho que sair sozinha da enrascada em que me meti.

– Há quanto tempo vem acontecendo? – Liam pergunta friamente.

– Desde que eu soube – respondo respirando fundo, tentando encontrar as palavras certas para explicar – Liam, eu...

– Vista-se! Vamos sair – ele me corta e entra no banheiro, começando a tirar as roupas.

Eu o observo sem me mexer, ainda desnorteada.

Ele está horrível. As roupas descartadas são as mesmas da noite passada, os cabelos uma bagunça desordenada de fios acobreados e há olheiras escuras em seus olhos atormentados.

Tenho vontade de me aproximar e tocá-lo embora saiba que não serei bem vinda. Então permaneço estática, enquanto ele desaparece boxe adentro e liga o chuveiro.

Assim, que está fora da minha vista deixo cair os ombros tensos e cato as roupas do chão jogando-as no cesto, enxugando uma lágrima fortuita.

Não quero chorar. Não ia adiantar nada.

Volto para o quarto e me visto, perguntando-me onde estamos indo.

Quero questioná-lo, no entanto, sinceramente? Discutir com Liam neste estado de nervos não é a melhor opção. E quero evitar mais dissabores.

Se é que é algo possível.

Volto para o quarto, já arrumada, quando ele passa por mim e entra no closet, vestindo-se quase com fúria.

– Aonde vamos? – Pergunto tentando demonstrar uma calma que estou longe de sentir.

– À clínica.

– Clínica? Liam é dia de Ação de Graças! Não há ninguém lá!

– O seu médico estará.

– O Doutor Cameron está na Flórida para o feriado!

– Não mais – rosna e mordo os lábios com força, lamentando pelo pobre doutor Cameron sendo obrigado a interromper suas férias com a família.

Eu gostava do doutor Jared Cameron. Foi o terceiro médico a me atender no começo da gravidez e já estava achando que nunca ia achar um em quem confiasse. Primeiro optei por uma médica. A doutora Carmen Castillo parecia ser centrada e amigável. Até eu descobrir que podia ser amigável até demais quando Liam foi a uma consulta comigo e ela se mostrou mais preocupada em flertar com meu marido do que em prestar atenção em mim. Depois foi o Doutor Stefan, um sexagenário que deveria ter se aposentado há muito tempo e me dava arrepios. O Doutor Cameron, um médico de trinta e tantos anos, foi quem me atendeu naquela fatídica tarde em que descobri um sangramento.

Estava apavorada e ele havia me acalmado, dizendo que era normal algum sangramento no começo da gravidez, que faríamos todos os exames para nos certificar de que estava tudo bem com o bebê.

O que eu não imaginava era que, quatro dias depois, iria descobrir que o problema não estava no bebê.

Era comigo.

Estou aguardando Liam na sala quando Ethan entra.

– Ei, todos prontos?

Seus olhos não encontram os meus.

Eu me levanto, aproximando-me e tocando seu peito.

– Olhe pra mim, Ethan.

Ele finalmente me encara e vejo algo que nunca vi.

Ethan está bravo comigo.

– Você me odeia também? – Não posso aguentar que Ethan tenha raiva de mim. Não ele.

Então algo mais surpreendente ainda acontece. O gigante brincalhão desmorona.

– Odiar você? Estou apavorado, ok? – Sinto seu peito tremer debaixo de minhas mãos e sua voz engasgar, fito incrédula as lágrimas em seus olhos – de todas as merdas que fez esta foi a pior de todas, Emma!

– Eu não podia fazer de outro jeito – murmuro, querendo que ele entendesse. Ele sempre me entendeu. Ele tem que entender. Ficar do meu lado.

– Ele não vai te perdoar. Sabe disto, não é?

É a minha vez de engasgar então escuto os passos de Liam se aproximando.

– Ethan, precisa ser forte. Por ele. Por mim. Por favor. Por favor – imploro baixinho, o vejo respirar fundo algumas vezes e colocar os óculos escuros, ocultando a dor em seus olhos.

Quando Liam aparece na sala Ethan está recomposto.

Eu disfarço minhas emoções.

Tenho feito isto muito bem nos últimos dois meses.


***


O silêncio no carro é sepulcral.

Liam não olha para mim e isto machuca.

– Realmente acho desnecessário, Liam, te contei ontem...

Ele finalmente me encara e talvez preferisse que não o tivesse feito. Seu olhar é tão feroz que me faz encolher.

– Estou farto de você achar desnecessário me informar sobre uma doença que pode tirar sua vida.

O carro para em frente a clínica e nós saltamos.

Lanço um olhar de desculpas ao Dr. Cameron quando entramos no consultório. Não faço ideia do que Liam fez para convencê-lo a voltar a Nova York em pleno feriado, certamente, assim como a maioria das pessoas no mundo, ele foi incapaz de dizer não ao Leão de Wall Street.

– Senhor Hunter, Senhora Hunter, sentem-se, por favor – o médico diz solícito e me sinto mais culpada ainda.

– Obrigada por nos receber, Dr. Cameron, sei que estava em viagem...

– Preciso que me explique tudo sobre o problema da minha esposa. – Liam me corta e mordo os lábios com força.

O médico olha para mim e fico vermelha. Eu não havia mentido apenas para Liam. O Dr. Cameron acreditava que, certamente, meu marido tinha conhecimento do meu diagnóstico.

Ele não emite nenhuma opinião sobre minha omissão quando começa a repetir exatamente o que me havia dito antes.

Liam escuta tudo em silêncio e, para mim, ouvir novamente meu terrível diagnóstico só causa mais dor.

Finalmente o médico termina o relato e Liam me encara.

– O senhor está me dizendo que alertou minha esposa sobre a possibilidade de interromper a gravidez?

Estremeço com o tom ameaçador de sua voz.

Havia contado a ele ontem sobre o que se tratava o exame que eu tinha cuidadosamente escondido. Contei que era uma doença que me deixava vulnerável, contei sobre os riscos.

Só havia deixado de fora a parte em que poderia ter acabado com tudo.

O Dr. Cameron acena positivamente.

– Sempre há a possibilidade de interromper a gestação em caso de riscos para a mãe.

Liam me encara. Se eu achava que estava furioso antes, não tinha ideia de como poderia ficar pior.

– Eu não podia

Liam, precisa entender. É nosso bebê, simplesmente não podia...

Ele se volta para o médico.

– E o que podemos fazer agora?

– A senhora Hunter está tomando as injeções. É a única coisa que pode amenizar os sintomas. Como disse antes, o risco ainda existe.

Sinto a tensão em Liam e toco seu braço, ele me afasta.

– Espere lá fora.

– Liam...

– Não discuta – rosna e me levanto, saindo do consultório.

Na sala de espera, pego meu celular. Há várias mensagens de Ariana. Respondo apenas que Liam está conversando com o médico. E me pergunto o que estariam falando.

Cansada de esperar, volto para o carro onde Ethan nos aguarda.

– Cadê o Liam?

– Conversando com o médico.

Ethan sacode a cabeça com um sorriso triste, antes que possa dizer alguma coisa, Liam ressurge e nós entramos no carro.

Ele está mais furioso do que nunca e não fala comigo.

– Liam, sinto muito...

Ele crava seu olhar dardejante em mim.

– Por que não me contou?

– Porque sabia que iria pedir para eu abortar.

– Sim, eu pediria, inferno – sua mão soca a divisória fechada – acha mesmo que a deixaria passar por isto? Que iria deixá-la morrer?

– Não vou morrer – afirmo – você viu as injeções. Está tudo sob controle.

Repito as palavras que venho dizendo a mim mesma há dois meses.

— Vou conseguir.


Capítulo 6

 

A guerra fria que Liam declarou a mim continua a todo vapor. Quando chegamos em casa ele simplesmente se tranca no escritório ignorando minha presença.

Ontem eu estava cheia de esperança hoje tudo é incerteza.

Como se sentisse meu desânimo o bebê chuta minha barriga e sorrio, mesmo com o coração carregado de tristeza. Eu precisava me lembrar que havia um motivo para todo aquele sofrimento. Aquele pequeno ser dentro de mim precisava que eu fosse forte. Eu estava ali por ele. Liam ainda não entendia, mas era a única coisa que importava. Me manter forte até que meu bebê pudesse conhecer o mundo.

Com passos inseguros, apesar de firme em minha convicção, rumo para minha biblioteca e me deito sobre um divã. Fecho os olhos e forço minha respiração a se acalmar, assim como a ansiedade. Pouco a pouco sinto a paz voltar, o bebê se acalma e resvalo para um sono repleto de sonhos com momentos mais felizes.

– Emma, precisa acordar – a voz persistente de Ariana me tira da imobilidade tranquila dos sonhos e abro os olhos sonolentos para perceber que a luz do dia foi substituída pelas sombras do crepúsculo.

– O que está fazendo aqui?

– Fiquei preocupada com você.

– Ah, Ariana, não precisava.

– Você almoçou?

– Não, dormi a tarde inteira.

– Sabe que não pode pular refeições, não é?

– Nem percebi que dormi tanto, só deitei para relaxar um pouco. Deus sabe o quanto estava precisando!

– Sei bem! Não é desculpa para se descuidar! Mulheres grávidas realmente dormem demais, deveriam ter te acordado e cuidado de você! – Ela lança o olhar irado para algo atrás dela, enquanto me apoio em seu braço para conseguir levantar e estaco ao ver Liam sentado em uma poltrona com cara de poucos amigos.

Há quanto tempo ele estava ali?

– Já que tem gente que prefere ser um idiota a cuidar de você, vou preparar algo para você comer!

— Ariana! – Encaro Liam, esperando que ele dê uma resposta irritada a ela, ele apenas passa a mão nervosa pelos cabelos encarando-a com uma fria placidez.

– Fique à vontade Ariana. Preciso mesmo conversar com a Emma. Em particular, claro – sua voz ganha um tom de ironia no final, Ariana dá de ombros e desaparece porta a fora. Quero pedir que volte e seja meu escudo, porque sei que nenhuma conversa com Liam será fácil a partir de agora.

Aliso meus cabelos bagunçados e o encaro, esperando que comece a falar rezando para que seja algo agradável de ouvir. Algo tipo “eu sei que tomou a decisão certa ao optar por manter a gravidez”. No entanto, sei que é muito cedo para que Liam volte a pensar racionalmente.

Só me pergunto se este dia vai chegar. Preciso que chegue.

Se não por mim, pelo menos pelo bebê que vai nascer. Porque, por mais que eu torça e esteja fazendo tudo para sobreviver, ainda existe a cruel possibilidade de que algo possa dar errado.

E então meu leãozinho terá que contar apenas com aquele que agora me encara como se eu fosse a maior traidora do mundo.

– Pedi para seus pais virem.

Arregalo os olhos, surpresa.

– Por quê? Liam...

– Você sabe o porquê.

– Você contou a eles? – Sinto meu coração se encher de pesar ao imaginar meus pais desesperados com a revelação da verdade sobre minha gravidez.

– Você contou? – Liam devolve com ironia e ruborizo.

– Não, claro que não.

– Então se prepare para contar. Devem chegar amanhã à tarde – sem mais ele se levanta e sai da sala.

Inferno!

Eu tinha esperanças de manter meus pais de fora daquele problema. Agora teria que lidar não só com a consternação de Liam como a deles também.

Aborrecida, rumo para a cozinha, meu estômago roncando ao sentir o cheiro de algo que Ariana está cozinhando.

Eric havia sido dispensado por Liam, ao que parece. Acho que deve ter ficado feliz por poder passar o feriado com Amanda e a família dela.

Gostaria que ele estivesse ali. Assim como Zoe, que tinha viajado para a casa dos pais de Jackson. O que me faz lembrar que Zoe também não sabe do meu segredo.

Respiro fundo, me preparando para mais confrontos iminentes.


***


– E então? Liam já deixou de ser um cretino? – Ariana pergunta, enquanto lava as mãos depois de me aplicar a injeção.

Abaixo a blusa com um suspiro cansado e nossos olhares se encontram no espelho. Os de Ariana, límpidos e claros, margeados pela maquiagem impecável. Os meus escuros e atormentados, margeados por olheiras proeminentes de mais uma noite mal dormida.

– Ele não é cretino, Ariana – defendo e ela revira os olhos se virando para mim.

– Não o defenda!

– Ele está puto comigo e com razão – uso o argumento que venho repetindo a mim mesma desde que acordei e vi que Liam, de novo, não tinha dormido comigo.

Eric me informou, com a discrição que lhe é habitual, que Liam havia saído cedo para o trabalho quando perguntei a ele se sabia onde estava meu marido, tentando não parecer patética.

– E você está bem? – Perguntou cuidadosamente, servindo-me café e tentei sorrir.

– Acho que já sabe sobre a confusão que está rolando, não é?

– Sim, Ethan me atualizou.

– E você também acha que sou uma espécie de vilã de novela?

Ele sorriu tristemente.

– Não acho agiu certo ao esconder sua condição do Liam. Embora entenda que tenha escolhido proteger seu bebê.

– Só queria que Liam também entendesse.

– Ele vai. Está apenas com raiva e ferido.

– Espero que tenha razão – falei me forçando a comer os ovos mexidos.

Ariana me encara com uma expressão irritada de quem não aceita este argumento.

– Compreendo sua raiva, mas, até quando vai te tratar desse jeito?

– Ele está sofrendo...

– E você também! Só não o confronto porque Emiliano disse para eu ficar fora, senão...

– Seu marido tem razão. Confrontar Liam nesse momento de nada iria adiantar. Só preciso dar tempo ao tempo.

– Se você diz...


***


Naquela tarde recebo meus pais que me encaram confusos e cansados da viagem.

– Emma, querida, o que está acontecendo? – Minha mãe pergunta com um olhar preocupado.

– Sim, que diabos estão aprontando agora? – Meu pai pergunta impaciente – da última vez que vocês nos sequestraram deram a notícia que estava grávida! Isto depois de me garantirem que não estavam se casando por causa de uma gravidez!

– Tom não seja grosseiro com a Emma! – Margô reclama – embora deva dizer que é bem estranho! Não entendi porque cancelaram o jantar de Ação de Graças...

Olho para Liam. Ele está taciturno no canto da sala sei que espera que seja eu a dar as más notícias a meus pais.

– Sinto muito que tenham precisado vir assim de repente, tenho que contar algo a vocês – falo devagar.

– Vai finalmente o que aconteceu para cancelarem o jantar de Ação de Graças na minha casa? Tive que comer o peru sozinho! Estou comendo aquela merda até hoje! – Tom insiste.

– Querida, o que foi? – Margô percebe minha consternação – está me preocupando! O que de tão grave tem pra nos dizer...

– Grave? – Tom agora também está preocupado.

Fecho os olhos e respiro fundo, quando os abro, começo a contar sobre minha gravidez de risco.

Quando termino minha mãe está às lagrimas e Tom quase tão furioso quanto Liam ficou.

– Ah querida, como pôde nos esconder algo tão sério?

– Sim, o que passou pela sua cabeça oca ao achar que não era importante? – Tom grita.

– Eu sinto muito – murmuro me sentindo péssima – não queria preocupar ninguém...

– Somos seus pais, Emma, por Deus!

– Eu sei, mas...

– Liam você sabia? – Margô pergunta e Liam me lança um olhar acusador.

– Eu não sabia de nada até descobrir os exames.

– Meu Deus, Emma, até do seu marido você escondeu? – Tom agora está ainda mais zangado.

– Tive medo que ele me obrigasse a tirar o bebê!

– Era exatamente o que deveria fazer se fosse sensata!

Eu me encolho com as palavras duras do meu pai.

– Tom, não fale assim! – Margô se aproxima e segura minhas mãos – estamos falando de uma criança!

– E a Emma corre risco para tê-la!

– Chega! Não fale desse jeito! – Margô me abraça e me sinto horrível por toda preocupação que estou causando.

– Me desculpe mãe – sussurro e ela se afasta me encarando – só queria ter meu bebê.

– Não peça desculpas filha. Eu te entendo.

Saber que minha mãe estava comigo aliviava um pouco minha dor.

Tom parece concordar com Liam, a julgar pelo seu olhar furioso.

– Pai, sinto muito. Jamais quis causar qualquer sofrimento a vocês. Mas é do meu filho que estamos falando. Nunca iria abrir mão dele.

– Você perdeu a cabeça! – Ele grita e aponta Liam – posso ver que Liam não concorda com sua decisão! Não pensou nisso? Ele é o pai e seu marido, deveria ser parte ativa em suas decisões.

– A Emma sabe exatamente o que penso – Liam diz friamente – não posso concordar que coloque sua vida em risco.

– Ainda está em tempo de fazer alguma coisa? – Tom indaga e estremeço de horror.

– O quê? Não! – Levo a mão a minha barriga automaticamente encarando Liam. – Meu Deus Liam foi por isto que trouxe meus pais? Era este seu plano? Quer que eu me livre do bebê?

Ele desvia o olhar para o chão. Puxando os cabelos cheio de frustração e nem precisou dizer nada para eu obter minha resposta.

– Ah Meu Deus – balbucio sem forças.

Margô me envolve com seus braços.

– Vocês dois enlouqueceram? Não há mais tempo de tirar o bebê!

– Margô, ela pode morrer! Não podemos perder a nossa filha!

– É do meu filho que estamos falando! – Grito e encaro Liam – é do nosso filho! Como pode querer que eu me livre dele?

– Acha que estou tranquilo? Acha que não estou sofrendo? Sim, é do meu filho que estamos falando, mas não posso perder você!

– Não vai me perder, estou tomando as malditas injeções, estou bem até agora, faltam praticamente quatro meses para ele nascer. Você deveria estar feliz e ansioso como eu!

– Está pedindo que eu passe quatro meses em agonia, sem saber se você vai sobreviver? Como posso estar ansioso por isto? Como posso estar feliz? – Sua voz se alquebra num soluço seco e minha vontade é abraçá-lo e dizer que tudo vai ficar bem. Mas sei que ele não acredita em mim.

Terei que esperar e mostrar.

Terei que rezar para que minha esperança seja o suficiente para me manter viva no final de tudo.

Enxugo minhas próprias lágrimas e encaro as três pessoas que me são mais caras no mundo. Não é justo que eu tenha que escolher. Que para acrescentar mais uma pessoa importante a minha vida, tenha que causar tanto sofrimento a eles.

– Pai, sinto muito por decepcioná-lo. Sei que não compreende e que está furioso porque me ama e não quer me perder. Porém eu sou adulta agora e faço minhas próprias escolhas. E escolhi ter meu bebê apesar dos riscos. Não espero que me perdoe nesse momento, só torcer para que me perdoe um dia. – Então me viro para minha mãe – não quero que a senhora fique preocupada.

– Está pedindo algo impossível! – Sorrio tristemente. – Vou ficar aqui com você...

– Não. Você vai voltar para seu marido. Para sua vida e vai vivê-la normalmente.

– Mas, querida...

– Por favor. Faça isto por mim. Prometo que a chamarei se precisar. Tenho certeza que tudo vai dar certo – coloco uma segurança na minha voz que estou longe de sentir. Preciso tranquilizar minha mãe. – Estou tomando a medicação direitinho. Meu médico disse que tudo vai correr bem até o parto se continuar neste ritmo.

– Claro. Você sempre foi uma menina muito saudável.

– Vou pedir ao Ethan para levá-los de volta. Não há necessidade de permanecerem aqui.

Eu a abraço e também meu pai, que continua muito sério, embora me abrace forte.

Então quando eles se vão, encaro Liam.

Quero sentir raiva dele. Quero agredi-lo, quero gritar por ele sequer imaginar que conseguiria me convencer a me livrar do nosso bebê.

Não consigo. Entendo sua dor.

– Queria que tivesse um pouco mais de fé em mim – digo por fim.

– Você pode olhar nos meus olhos e dizer com certeza que tudo vai acabar bem? – Ele pede e sei que quer ouvir um sim.

Por outro lado sei que não posso mais mentir.

Estávamos naquele impasse porque eu havia mentido durante muito tempo.

Menti para ele porque sabia de todos os riscos. Não havia garantias. Esta era a verdade.

Eu estava dando um salto no escuro.

– Não, não posso. Estou agindo assim por algo maior, Liam. É nosso bebê. E ele merece viver.

– Você também merece viver, merda!

– Não me importo de morrer se for por ele – confesso e Liam solta um palavrão baixo.

– Não posso continuar, não posso... – ele diz por fim me encarando com os olhos cheios de dor antes de se afastar.

Quando sai toco meu ventre fazendo uma prece silenciosa para que Liam não tenha que me perder.

Nunca.


***


Naquela noite durmo sozinha novamente. Liam se trancou no escritório desde que meus pais foram embora e não ouso me aproximar.

Quando acordo na manhã seguinte, ele já partiu para o trabalho e Eric me dá bom dia com um sorriso triste.

Esta rotina se repete por dias seguidos.

Ariana aparece para as injeções e sempre tem algo ferino para proferir contra Liam na ponta da língua, depois de alguns dias peço rispidamente que ela pare.

Ela dá de ombros e não insiste.

A verdade é que estou começando a me cansar da atitude fria e distante de Liam. Eu o deixei se afastar. Deixei que remoesse sua raiva. Entendia sua fúria, sua frustração. Se fosse o contrário, se fosse a vida dele que estivesse em risco eu também perderia o chão.

Só que esperava que, mais dia menos dia, ele voltaria para mim. Que partilharia a minha fé no futuro, que também estaria preparado para aceitar que iríamos ter um bebê e que, se algo desse errado no final, nosso filho iria precisar de um pai.

Ele aparecia todas as noites muito tarde, eu ainda tentava me aproximar, a única reação que recebia dele eram olhares rancorosos, respostas frias e sua ausência.

Ele se trancava no escritório e eu ia dormir sem saber se ele viria para a cama ou não.

Ele nunca vinha. Perguntei-me se ele estava conseguindo dormir.

Até que numa noite, acordo e percebo seu lado da cama vazio. Olho o relógio e são três da madrugada. Esse fato me faz lembrar as primeiras noites que passei ali. Quando ele se recusava a dormir comigo, sempre acordado até tarde com a mente focada no trabalho. Ou dormindo e tendo pesadelos sobre seu passado.

Levanto da cama, caminho pelo apartamento silencioso e meu coração se aperta ao vê-lo deitado no sofá da sala.

O laptop ainda está ligado em seu colo, imagino que dormiu de pura exaustão.

Caminho até lá fecho o laptop, colocando-o sobre a mesa de centro. Liam resmunga algo em seu sono e me sento do seu lado. Ele parece agitado balbuciando coisas sem sentido. Estaria tendo um pesadelo? Toco seus cabelos com carinho.

Há quanto tempo não o tocava deste jeito? A sua distância dói em meus ossos.

– Shi, estou aqui – murmuro, me aproximando deitando sobre seu peito, sentindo seu cheiro único impregnar minha alma. Me aqueço com sua presença e suspiro, sentindo-me completa e quase em paz pela primeira vez em dias.

Liam ainda resmunga um pouco, então finalmente se acalma. Escuto seu ressonar profundo e cheio de paz também. Como se em seu subconsciente soubesse que não havia nada mais certo do que estarmos assim, grudados. Almas gêmeas.

Fui eu que causei nossa separação com minha mentira? Ou foi ele com sua incapacidade de me entender?

Fecho os olhos pedindo a Deus que aquela tempestade passe.

Quando acordo estou em nossa cama sozinha.

Espreguiço me perguntando a que horas teria acontecido.

Levanto-me e Ariana está na cozinha tomando café com Eric quando me aproximo.

– Bom dia, está se sentindo bem esta manhã?

– Sim... Eric, o Liam já saiu para o trabalho, presumo.

Os dois trocam um olhar e eu franzo a testa.

– O que foi?

– Liam e Ethan viajaram – Eric diz e sinto meu coração afundar.

– Para onde? Eu não fui informada de nada...

– Hum, não é de estranhar que o babaca do Liam não tenha te avisado, não é?

– E para onde foram?

– Ethan não me disse – Eric responde baixinho.

Solto um suspiro conformado.

Liam tinha fugido. Simples assim.

– Sinto muito, Emma – Ariana toca minha mão e sorrio tristemente.

–Tudo bem. Vou ficar bem – afirmo mais pra mim mesma.

– A Zoe ligou. Ela voltou de viagem. – Eric diz.

Faço uma careta. Teria que contar a Zoe. E também não seria algo fácil.


***


– Emma, como pôde me esconder algo tão grave? – Zoe grita em seu sofá, segurando a xícara de chá entre as mãos, depois que conto sobre meu estado de saúde.

– Me desculpe, não contei a ninguém...

– Contou a Ariana! Pensei que fôssemos melhores amigas!

Reviro os olhos. Era típico de Zoe se colocar como a principal prejudicada na história.

– Ela descobriu sem querer!

– Mesmo assim devia ter me contado!

– Não queria que ninguém soubesse! Ariana só me ajudou com as injeções.

– Aquela Barbie New Jersey bronzeada artificialmente, além de milionária é médica? Faça-me o favor!

– Enfermeira, estudou enfermagem. Até pensou em ser médica.

– Ah, que metida! Falando sério, Emma, não consigo aceitar que tenha confiado mais numa estranha do que em mim!

Bufo e me levanto do sofá, pegando minha bolsa.

– Ok Zoe, pense o que quiser! Só queria que soubesse de tudo agora que todo mundo já sabe. Se for ficar com picuinhas vou embora.

Eu me encaminho para porta, Zoe me chama.

– Emma!

Eu me viro, impaciente e me surpreendo ao vê-la chorando.

– Você vai morrer?

Mordo os lábios.

– Claro que não.

– Não quero que morra. É minha melhor amiga. Minha única amiga – ela soluça, me aproximo e a abraço.

– Shi, vai ficar tudo bem.

– Me desculpe por ser uma vaca – ela sussurra e eu rio.

– Não desculpo sempre?

Ela me encara fungando.

– Posso aprender a dar injeções também, ok?

Sorrio e enxugo suas lágrimas.

– Eu sei.


***


Cinco dias depois ainda não tive notícias de Liam quando chego a clínica para minha consulta mensal com o doutor Cameron.

Sento-me na sala de espera, aguardando para ser atendida e verifico meu celular. Há dias espero que Liam entre em contato. Nem que seja uma simples mensagem.

Hesito por um momento então digito uma mensagem com dedos trêmulos, apagando-a em seguida.

Repito o gesto algumas vezes, indecisa sobre o que dizer. Ser prática e perguntar onde ele está e quando volta? Mostrar que estou furiosa com sua fuga e lhe dizer poucas e boas?

Sim, eu deveria. A verdade é que estou farta. Quero dar a ele tempo e espaço, mas até quando?

Minha barriga cresce rapidamente. Tomo as malditas injeções todos os dias e espero que tudo continue bem. Que eu permaneça forte até o fim.

Mas estou sozinha nisto tudo.

– Senhora Hunter – a enfermeira chama meu nome, me desligo de minhas divagações e a acompanho até o consultório.

Ela me ajuda a deitar sobre a maca e diz que o Doutor Cameron já virá me atender.

Relaxo à espera do médico acariciando minha barriga, quando a porta se abre o doutor Cameron não está sozinho.

Arregalo os olhos surpresa ao ver Liam com ele.


Capítulo 7

 

– Liam!

Por dentro sou uma mistura confusa de sentimentos.

Estou aliviada por ele estar de volta. Estou feliz por ver seu rosto, mesmo tendo que encarar sua expressão carrancuda.

Estou com medo dos motivos de ele estar ali.

Ainda me lembro de sua sugestão afrontosa quando meus pais estavam na cidade. Ainda me lembro que ele preferiria que nosso bebê não existisse o que me deixaria a salvo.

Levo a mão à barriga automaticamente me preparando para brigar se fosse necessário.

– O que faz aqui?

– O Doutor Cameron me informou que faria um exame – é sua resposta simples.

Como é? Encaro o médico que sorri compassivo enquanto prepara os equipamentos para o ultrassom.

– O senhor Hunter pediu que o andamento de sua gestação lhe fosse informado.

Mordo os lábios tentando não ficar nervosa com aquela medida de controle da parte de Liam. Afinal, ele tinha o direito, não é?

O que me irritava é o fato de ele estar ali bancando o preocupado na frente do médico quando havia me deixado sozinha por uma semana sem a menor explicação.

Tive vontade de gritar e sacudi-lo exigindo respostas, me contive. O doutor Cameron não precisava presenciar nossos desentendimentos mais do que o necessário.

– Vamos lá, Senhora Hunter – o médico começa a ultrassonografia, passando o aparelho pela minha barriga.

Não consigo visualizar Liam que está em algum lugar atrás de mim, então me concentro no exame.

– A senhora está na vigésima primeira semana. Seu bebê está no tamanho correto para o período, que é aproximadamente 34 centímetros e o peso também está dentro do previsto, 1 kg.

Sorrio, animada.

– E está tudo bem com a Emma? – Escuto a voz de Liam e me irrito.

– O bebê está bem e é o que interessa. – corto.

– Você precisa estar bem para ele estar bem, não concorda? – Liam responde no mesmo tom.

– Verificarei a saúde de sua esposa assim que terminar o ultrassom, senhor Hunter. Fique tranquilo – o médico responde cordialmente ignorando a tensão entre Liam e eu. – Tudo está perfeitamente bem com seu bebê – ele termina o exame – agora vamos verificar se está tudo bem com a mamãe – sorri e eu continuo séria.

– Eu prefiro que ele saia – resmungo sem olhar pra Liam.

Estou com raiva dele neste momento. Estou irritada por ele estar ali, me recordando que não importa só o bebê estar bem.

– Não vou sair Emma – Liam responde, o encaro friamente.

– Se você não sair eu saio e não faço exame nenhum!

– Ei, tudo bem – o médico encara Liam com um olhar conciliador, apesar de firme – por favor, seria melhor que o senhor saísse senhor Hunter. Eu o informarei sobre os exames quando terminarmos.

Espero que Liam discuta, no entanto ele apenas solta um palavrão baixo e se afasta fechando a porta atrás de si.

– Pensei que ele fosse insistir

O médico sorri.

– Tenho conversado muito com o senhor Hunter e explicado a necessidade de ele tomar cuidado para não deixá-la nervosa.

Abro a boca surpresa.

– Ele está muito preocupado com o risco que você está correndo. Me colocou em contato com alguns especialistas, para saber se há algo mais que possamos fazer para diminuí-los.

– Sério? Quando aconteceu?

– Nesta última semana. Há um especialista nessa síndrome em Boston. O senhor Hunter cogitou a hipótese de levá-la até ele, nós chegamos à conclusão que não será necessário. Ele concorda comigo que as injeções são as únicas medidas que podemos tomar.

Deixo que o médico me examine e respondo a todas as suas perguntas com o pensamento longe.

Então era o que Liam estava fazendo? E, por que cargas d’água, não me contou?

– A senhora está muito bem. Mantenha as vitaminas e as injeções. E, por favor, tente não se irritar desnecessariamente.

– Estou tentando.

Saio da sala e encontro Liam no corredor.

O ignoro passando por ele sem dizer nada. Sei que vai entrar para conversar com o Doutor Cameron, só não sou obrigada a esperar. Sigo para o carro, esperando encontrar Owen, estaco ao ver Ethan.

– Cadê o Owen?

– Dispensado.

– Claro, se o chefe está aqui, o lacaio preferido também – dardejo e Ethan ri.

– Está me lembrando seus primeiros dias com Liam. Como era arisca!

– Eu devia ter previsto que uma vez cretino, sempre cretino! – Resmungo, entrando no carro quando Ethan abre a porta.

– Não acho que seja bom ficar nervosa deste jeito, hein?

– Vai se foder! – Bato a porta e ele dá a volta se sentando no banco do motorista ligando o som. Escutar minha música preferida da Sia não ajuda em nada.

– Quero ir embora.

– O Liam não deve demorar.

– Que se dane o Liam. Sou sua chefe também e quero ir embora agora!

– O Liam...

– Achei que a ideia era não me deixar nervosa!

Ethan suspira e liga o carro.

– O Liam sabe o caminho de casa – ele diz por fim e me leva.

Liam vai ficar furioso, não me importo nem um pouco.

Cansei de ficar pisando em ovos com ele, quando quem deveria ser o contrário.

Chego em casa e encontro Zoe me esperando.

– Zoe, o que faz aqui?

– Vim almoçar com você – sorri empolgada e me puxa pela mão –também trazer os presentes que comprei!

Ela me faz sentar no sofá da sala e arregalo os olhos ao ver um monte de sacolas que começa a remexer.

– Não faça esta cara, são coisas para o bebê!

Ela coloca em meu colo um macacão azul claro e não consigo evitar meu sorriso.

– Ah Zoe, é lindo, está exagerando! Esta criança já tem roupa demais nem sei como vai usar tudo!

– Eu sei, não pude resistir era tudo tão lindo! – Ela retira mais roupinhas das sacolas me explicando que é a última moda, eu sequer sabia que existia última moda para bebês, mesmo assim sorrio indulgente. Esta empolgação de Zoe me faz lembrar Liam fazendo a mesma coisa. Quando voltava de alguma viagem trazia algo para o bebê na mala, sempre com a mesma desculpa de que não conseguiu resistir.

Será que ele trouxe algum presente desta vez? Duvido muito, penso com tristeza.

– Garotas, o almoço está servido – Eric me salva dos delírios fashionistas de Zoe e ela se contenta em guardar tudo na sacola.

– Ah, preciso te contar uma novidade – ela mostra o dedo onde brilha um lindo solitário. – Estou noiva

– Que boa notícia, parabéns!

– Oi Liam! – Levanto a cabeça e o vejo entrando na cozinha.

Estudo sua expressão. Não é nada animadora, também não parece irritado.

Parece meio comedido na verdade.

– Oi Zoe, não sabia que tinha voltado de viagem.

– Cheguei ontem e estava com saudade da comida do seu chef! Você vai almoçar com a gente?

Vejo-o hesitar, então senta ao lado de Zoe e na minha frente, começando a se servir.

Zoe continua a tagarelar alheia à tensão.

– Estava contando a Emma que Jackson finalmente me pediu em casamento! Quero casar no próximo ano.

– Ah sim, e quando será o grande dia? – Pergunta educadamente. O que era esquisito de se ver. Liam nunca era educado com Zoe.

O Liam em seu estado normal a estaria alfinetando por mal ter voltado de viagem e já estar enfiada em nossa casa comendo da nossa comida.

– No máximo um ano. E é bom a Emma ir se preparando porque será minha madrinha! Já estou pensando em que vestido fabuloso vai usar e... – De repente ela para e coloca a mão na boca e crava em mim um olhar assustado – meu Deus, não parei para pensar que você pode não estar aqui.

Oh Deus!

Largo o garfo no prato, com dificuldade para engolir.

– É, quer dizer, eu... – Zoe começa a gaguejar – sou uma tola, claro que vai...

– Sim, tem razão, Zoe – Liam diz me encarando com aquele seu olhar acusador ao qual estava me acostumando – ela realmente pode não estar, não é?

A dor em sua voz me tira o ar.

Sinto lágrimas quentes tentando fugir dos meus olhos, faço um esforço enorme e as seguro.

O nó na minha garganta se intensifica quase me sufocando.

Quero gritar que eles não têm nenhuma razão. Que estarei presente daqui há um ano.

Porém, que certeza posso ter?

Mordendo os lábios com força para não explodir, empurro o prato e me levanto.

– Perdi a fome.

Saio da cozinha sem olhar para trás, ainda escuto a voz fina de Zoe.

– Me desculpe Liam, eu não deveria, eu...

Sua voz fica para trás quando chego à sala, respiro fundo várias vezes tentando me acalmar.

Olho para as sacolas e me sento no sofá pegando as roupinhas novamente o que começa a acalmar minha dor.

Não sei quanto tempo se passa até que escuto passos se aproximando.

– Você precisa comer.

Levanto o olhar e Liam está parado na minha frente.

– Zoe foi embora. Ela sente muito por deixar você nervosa.

Solto um riso sem humor, voltando a dobrar as roupinhas cuidadosamente.

– Não é a Zoe que me deixa nervosa.

Ouço um palavrão baixo.

– Porra, Emma, eu... – ele respira fundo – sinto muito.

Eu o encaro.

– Sente mesmo?

– Nunca foi minha intenção deixá-la mal. Inferno! Pensei que ficando fora do seu caminho...

– O quê? Pensou que você indo embora com sua raiva ia ficar tudo bem? – Percebo meu tom de voz aumentando e respiro fundo, me lembrando que não devo me alterar. Embora seja bem difícil. Olho para o casaquinho branco entre meus dedos. – Veja o que Zoe trouxe. Não são lindos? Me fez lembrar a quantidade de presentes que você trazia de suas viagens para o bebê. – Eu o encaro – trouxe algo desta vez?

Liam desvia o olhar para o chão, passando os dedos frustrados pelos cabelos e sei sua resposta.

– Como pode não amá-lo mais? – Questiono, as lágrimas que eu vinha tentando conter finalmente jorrando livres por meu rosto.

Liam se aproxima e vejo a dor em seu olhar. Vejo sua frustração quando se aproxima e toca minha barriga.

– Acha que é fácil para mim? Acha que não o amo? Eu quis este bebê tanto quanto você. E pensar que porque ele existe você pode me deixar. Não consigo lidar com isto, Emma...

Afasto sua mão, subitamente cansada de tudo aquilo.

– E eu não consigo mais lidar com você Liam! Para mim chega! Não posso ficar aqui aguentando sua raiva! Eu te dei tempo, esperei que caísse em si e entendesse que vou ter este bebê e que nada nem ninguém vai mudar minha decisão! Sei do risco e o escolhi mesmo assim!

– Sozinha quando deveríamos ter escolhidos juntos!

– Para você escolher se livrar do nosso filho?

– Não quero perder você.

– Está perdendo – digo me afastando e abrindo a porta.

– Emma, aonde vai? – Escuto a voz assustada de Liam e me volto.

– Agora se importa? Não tem mais este direito. – Bato a porta, deixando Liam e sua fúria para trás.


***


– Melhor?

Ethan pergunta do outro lado da mesa, depois de me servir um prato de macarrão.

Bati em sua porta depois de fugir da briga com Liam e Ethan me abraçou forte assim que viu meu estado.

– Deus do céu, o que está acontecendo, Emma?

– Deixei o Liam falando sozinho. Não aguento mais, Ethan.

– Ei, calma. Respire. Não pode ficar deste jeito, lembra?

– Vou ficar bem. Só precisava sair de lá. Estávamos almoçando e Zoe fez um comentário idiota, saí da mesa sem terminar de comer, depois eu e Liam discutimos de novo e...

– Calma. Uma coisa de cada vez. Venha, se não comeu, precisa alimentar este leãozinho. Depois me conta tudo.

Tento comer, mesmo não sentindo fome enquanto Ethan me encara de braços cruzados.

Me lembrando de quando bebi demais e ele cuidou de mim porque Liam estava com muita raiva por eu ter beijado outro cara.

Nossa, parece ter acontecido em outra vida.

– Não sei mais o que fazer – digo – Liam não consegue aceitar. Ainda está com raiva de mim e não acho que queira mais nosso filho.

– Está dizendo bobagens. Claro que Liam quer o filho de vocês.

– Ele acha que eu deveria ter abortado. Não entende minhas escolhas!

– Você deveria ter contado assim que soube sobre os riscos, Emma. Essa merda toda não estaria acontecendo agora.

– Se tivesse contado Liam teria me convencido a abortar. Eu não podia.

– Você não pode ter certeza. Liam estava tão feliz quanto você.

– Não está mais. E não posso mais lidar com isto. Preciso de paz. Preciso ficar bem, não dá para ficar bem naquela casa com Liam.

– Ele está sofrendo como nunca vi antes Emma.

– Eu sei! Por isto deixei que ele se afastasse. Que remoesse sua raiva, só não consigo mais!

– Entenda uma coisa, tagarela. Liam viu os pais morrerem na frente dele quanto tinha dez anos. Ele não amou mais ninguém depois. Nem Nora e David. Nem aquela vadia da Vanessa e nenhuma mulher.

– Nem você?

Ele ri.

– É diferente. Protegemos um ao outro. Mas Liam não precisa de mim. Ele nunca se permitiu precisar de ninguém, até você aparecer. E agora ele tem que encarar o fato de que você, assim como seus pais, pode ser tirada dele. Não está sabendo lidar com a situação. Está surtando.

– Está me afastando. O que não resolve nada, só piora tudo!

– É como se ele estivesse dessensibilizando. Blindando suas emoções, ficando imune ao sofrimento. É como sua mente funciona. Foi o que fez quando os pais morreram.

– Nunca quis que ele sofresse. Não quero deixá-lo também. Nada vai acontecer. Estou me cuidando. Vou conseguir.

– Só que ninguém tem certeza, não é?

Não consigo responder. Apenas volto a comer, tentando não pensar em como minha vida se encontra numa encruzilhada.

– Obrigada pela comida – digo quando termino e percebo que Ethan está digitando no celular imagino que esteja avisando Liam que estou com ele.

No entanto, não estou preparada para lidar com Liam ainda.

– Você pode me levar a um lugar?

– Não vai voltar para casa?

– Não posso, não agora.

– Vai ficar com Zoe?

– Não, Zoe não tem noção às vezes e só me deixaria mais nervosa.

– Pode ficar aqui se quiser...

– Não. Muito perto. Sei para onde quero ir.


***


– Tem certeza que posso ficar aqui? – Pergunto para Nora, segurando uma xícara de chá quente entre as mãos.

– Claro que sim – David responde com um olhar compreensivo.

Não sei bem o porquê de ter escolhido a casa dos pais adotivos de Liam como refúgio. Mas foi lá que pedi a Ethan para me levar.

Não fazia ideia do que eles sabiam sobre minha gravidez e, sabendo como Liam era meio reticente com os pais adotivos, não tinha certeza se contou sobre o meu problema.

Para minha surpresa, David me falou que Liam o havia procurado quando descobriu sobre os riscos da gestação pedindo conselhos.

– Ele estava muito preocupado. Perguntou se eu conhecia algum especialista, embora eu tenha lhe dito que o Doutor Cameron é um dos melhores médicos obstetras da cidade.

– Nós ficamos muito preocupados, querida – Nora explicou com um olhar maternal – pensei em visitá-la, David me convenceu a ficar de fora depois que tive uma discussão com Liam.

– Vocês brigaram?

– Sim. Eu disse a ele que entendia sua determinação para levar a gravidez até o fim em vez de fazer um aborto.

– Sim. Posso imaginar o motivo da briga...

– Sei que está sendo muito difícil querida – ela toca minha mão – mas tenho certeza que vai ficar tudo bem.

– Queria ter a sua confiança.

Ela sorri.

– Você tem. Não tem mantido o bebê seguro até agora?

Sorrio de volta.

Sim, tomei a decisão certa vindo ficar com Nora e David.

Eles estavam sendo muito compreensivos e sensatos, nunca me acusaram, se limitando a me manter calma e segura.

Era o que eu precisava nesse momento.

Nora me leva para o andar de cima e abre a porta do quarto de Jeremy.

– Se importa de ficar aqui? Nós temos um quarto de hóspedes, mas Jeremy o transformou numa academia.

– Não quero tirá-lo de seu quarto.

– Não se preocupe com ele. Adolescentes dormem em qualquer lugar. Eu ajeito uma cama para ele no escritório de David.

– E onde ele está? Não ficará bravo?

– Ele não vai se importar, tenho certeza. Está jogando na casa de um amigo, deve chegar para o jantar. Descanse um pouco. Me chame se precisar de algo.

– Obrigada Nora.

– Fique à vontade. Sabia que este quarto também foi do Liam?

Sorrio.

– Sério? É esquisito imaginá-lo aqui.

– Ele mudou muito, não é? Deve saber que a principal mudança dele ocorreu depois de conhecer você. Então fique tranquila, querida. Ele vai deixar a raiva de lado mais dia menos dia.

– Espero que não seja tarde demais – murmuro para mim mesma, depois que Nora se afasta fechando a porta atrás de si.

Permaneço no quarto, tentando dormir o resto da tarde, porém minha cabeça está cheia de pensamentos.

Será que Liam já sabe que estou aqui? Com certeza. Ethan deve ter lhe contado.

Me pergunto se virá me buscar. Se exigirá que eu volte para casa. Talvez não se importe. Ou prefira que eu fique longe. Deve ser o arranjo perfeito para sua maldita dessensibilização.

Longe dos olhos, longe do coração. Não é o que diz o ditado?

Se ele queria deixar de me amar para sofrer menos, eu havia tornado o processo mais fácil para ele. Este pensamento faz meu coração se apertar. Como posso viver com o fato de Liam não me amar mais?

Por outro lado, se eu realmente não conseguir sobreviver... não seria melhor? Ele tinha vivido bem sem mim, não é? Penso nas garotas que devem ter passado por aquele quarto. Garotas do tal colégio católico. Me recordo do dia em que eu mesma me vesti de estudante católica. Em como tínhamos nos divertido a nossa maneira nem um pouco ortodoxa.

Será que um dia voltaríamos a ser dois amantes despreocupados, focados apenas em jogos de prazer?

Ou ele continuaria se afastando cada vez mais até colocar outra garota em meu lugar, voltando a ser o Liam caçador de antes?

Nem quero pensar nessa possibilidade. Não posso imaginar outra mulher com Liam. Não consigo.

Mesmo assim... Existe aquela pequena parte dentro de mim que o ama tanto que deseja que ele volte a ser feliz. E talvez sua felicidade não vá mais depender de mim, se eu não estiver presente.

– Ei – abro os olhos ao ouvir a voz na porta e vejo Jeremy entrando – e aí, bem instalada?

– Oh, me desculpe Jeremy. Não queria roubar seu quarto.

– Devo dizer que até imaginei bastante você aí, só que não haveria esta barrigona, estaria com menos roupa e...

– Ei, acho que devia me poupar destas suas fantasias, ok? – Eu o interrompo.

– Está certo. Mesmo porque seu marido me encheria de porrada se soubesse.

– Não contarei a ele – afinal, eu nem teria como contar mesmo, não é?

Jeremy fica sério.

– A Nora me contou do problema com sua gravidez. Que merda hein?

– Pois é, acho que esta é a palavra correta.

– Vai ficar tudo bem, não vai?

Sorrio.

– Claro que sim.

– Ah, Nora pediu para te chamar para jantar.

– Obrigada, já vou descer.

Janto naquela noite com os Hunter que são muito cuidadosos e amorosos comigo. Até Jeremy, se esforça para me deixar a vontade, dizendo que posso acordá-lo de madrugada se eu sentir vontade de comer algo bizarro.

– Conheço todos os lugares que vendem comida de madrugada, posso dar um jeito!

– Manterei isto em mente.

– E se quiser jogar no meu Xbox, fique à vontade. Posso até te ensinar se quiser.

– Acho que vou passar...

– Deixe a Emma em paz, Jeremy – Nora pediu. – Acho que ela só quer ir dormir.

Bocejo.

– Sim, estou com sono.

– Aproveite enquanto ainda consegue dormir bem. No último trimestre vai ficando cada vez mais difícil – Nora avisa.

– Eu sei. Já sinto algumas dores nas costas.

– Ah, coloquei no quarto uma mala que a Ariana trouxe.

– Ela esteve aqui?

– Sim, veio trazer umas roupas para você. Disse que são roupas novas porque não queria ir a sua casa. Também avisou que virá amanhã cedo.

– Ah, obrigada.

Subo para o quarto, e abro a pequena mala, grata por Ariana tê-la trazido e visto o pijama, me deitando sob as cobertas.

Passo a mão pela barriga, o bebê está mexendo e sorrio.

– Durma meu amor. Você está seguro aí. Eu juro.

Como se entendesse, minha barriga se acalma e fecho os olhos.

Meu último pensamento é para Liam.

Penso em como sinto falta de seus braços a minha volta.

Será que voltarei a senti-los?


***


Estou sonhando. Com Liam.

Com seus braços me envolvendo.

Seu corpo morno grudado a minhas costas sua respiração regular em meu pescoço.

Meu coração se aquece. Não me movo, com medo de acordar. Com medo de o sonho terminar e a realidade fria e dura me envolver novamente.

– Você prometeu que nunca iria embora – abro os olhos quando escuto sua voz. Rouca, linda, inconfundível em meu ouvido.

Seus braços ainda estão a minha volta.

E meu coração falha uma batida quando percebo que não estou sonhando.

Liam realmente está ali.


Capítulo 8

 

Liam está aqui. A realidade invade meus sentidos aos poucos, como um rio que encontra finalmente o mar, se misturando a sua infindável beleza.

E aquela beleza se espalha por meus poros, meu corpo, minha alma. E, onde antes havia apenas vazio, agora existe a presença de Liam. Com seus braços a minha volta, seu cheiro em minhas narinas, sua voz em meu ouvido.

Fecho os olhos e deixo que sua presença leve embora a dor que sua ausência havia causado em mim.

– Você me deixou ir – afirmo, minha mão já está a caminho da sua, que repousa em minha barriga.

A barriga que tinha sido o começo de toda a discórdia. Lembrar faz a dor voltar a apertar meu coração.

Acho que Liam percebe minha inquietação, pois retira sua mão de mim, se afastando.

– Você tinha o direito de me odiar.

Eu me viro para encará-lo.

Mesmo com sua aparência cansada me parece tão lindo.

– Não te odeio Liam. Como poderia? – Toco seu rosto, puxo seus cabelos. – Eu te amo mais do que tudo.

– Você decidiu me deixar – sei que ele está falando da minha gravidez.

– Este bebê é seu. Como poderia não escolher tê-lo? Não existia outra opção.

Seu olhar é cheio de tormenta na semiescuridão do quarto, quando segura minha mão e beija meu pulso.

– Não posso mais perder ninguém, porra.

Tenho vontade de chorar.

– Não tenho como garantir que não vai acontecer – engulo o nó na minha garganta ao ver seu olhar se tornar ainda mais escuro. Não é o Leão de Wall Street que está ali na cama comigo. E sim um garotinho sozinho no mundo aos dez anos. – Também não posso mais ficar sozinha. Não quero estar sozinha Liam. Já me sinto morta só de não ter você perto de mim...

– Cale a boca, merda – rosna me puxando para junto de si, o rosto cheio de uma raiva angustiante. – Você não vai morrer!

Rio e fungo.

– É o que venho tentando te dizer, idiota... – minhas palavras são engolidas por sua boca.

Ah a sua boca. Fecho os olhos e me alimento do seu gosto.

Tem gosto de amor. Misturado com lágrimas. Minhas. Dele. Nossas.

E isto me deixa feliz. Posso lidar com qualquer coisa desde que estejamos juntos.

Quando o beijo termina estou sorrindo.

– Volte para casa – ele pede encostando a testa na minha.

– O fato de estar sorrindo não significa que estou feliz com você, senhor Hunter.

– Volte para casa – insiste.

– Pra você continuar sendo cretino?

Ele rosna e se afasta. Eu vou junto.

– Estou muito bem aqui, sabia? O Jeremy foi bastante gentil comigo. Disse inclusive que poderia buscar comida de madrugada se eu sentisse desejo.

– Não precisa daquele punheteiro para fazer nada para você.

– É, isto ele deve ser mesmo. Disse que teve fantasias comigo, quando me viu na cama dele.

– Aquele filho da puta devia respeitar mulheres grávidas.

– Ah, fique tranquilo. Nas suas fantasias ainda sou bem magrinha...

– Vai me dizer que me trocaria por aquele merdinha?

Dou de ombros.

– Ele é bonito. E todo musculoso. Reparou? E sabe que adolescentes são bem resistentes, aposto que ele consegue manter uma er...

Paro de falar e solto um pequeno grito de susto quando Liam me prensa na cama, com as mãos acima da minha cabeça, seu olhar furioso me devasta.

Porra. Estou grávida, não morta. Com o perdão do trocadilho.

Liam com aquela cara de Leão de Wall Street me deixava com um tesão dos infernos.

– Porra, não vou ficar ouvindo você falar do pinto pequeno daquele bombado.

Ah sim. Ah sim.

– Adoraria me punir, não é? – Pergunto e, instantaneamente, Liam entende o que se passa na minha mente suja.

Vejo a mudança em seu olhar por um átimo de segundo. Mas ele continua sério.

Eu já começo a desanimar. Típico.

– Se não estivesse grávida realmente te daria uma lição, Senhora Hunter.

Sorrio. Nós havíamos trocado o famigerado Senhorita Jones por Senhora Hunter sem problema algum. Muito pelo contrário.

– Sabe que não precisa se conter, não é Senhor Hunter? – Sussurro na minha melhor voz de travesseiro.

Então algo se move entre nós e prendo a respiração ao sentir o chute suave na minha costela.

Liam segue meu olhar, também com a respiração suspensa.

– O bebê está mexendo – sua voz sai estranha.

Suas mãos soltam as minhas.

Eu as levo até meu ventre.

– Ele costuma se mover cada vez com mais frequência agora. Saberia se dormisse comigo. Ou pelo menos ficasse perto de mim o suficiente. – Não consigo evitar o tom ressentido da minha voz.

Liam se senta, passando a mão pelos cabelos.

Ele ainda está todo vestido, reparo.

Eu me sento também.

– Precisamos falar sobre ele se quer que eu volte pra casa.

Percebo a luta em seu semblante. Ainda o machuca. Ainda o aterroriza.

Por outro lado, também sei que quer ficar comigo.

Ele está comigo agora não está?

– Eu entendo você, Liam. Entendo que esteja com medo. Também estou – puxo sua mão para minha barriga e ele não se afasta. Só tem outra vez aquele olhar de garoto perdido no rosto o que estraçalha meu coração. – Nunca vou poder voltar no tempo e escolher te contar. Ou mesmo para escolher não ter o bebê. No entanto, estamos aqui. E não sou mais só eu que preciso de você. Nosso filho também precisa.

Ele não diz nada por um momento. Apenas acaricia meu ventre com um carinho que não vejo desde que soube sobre os riscos que aquela gravidez trouxe para minha vida.

– Eu nunca pensei seriamente em ter um filho, porém, desde o dia em que soube que estava grávida, eu o quis. – Sua voz sai baixa como um rosnado ferido e mordo meus lábios para conter o nó se formando em minha garganta – contra todas as possibilidades quis ser um pai. Então descubro que, para que aconteça, corro o risco de perder você. – Seu olhar cruza com o meu e mal consigo respirar – nunca senti tanto ódio do mundo como naquele momento. Acho que nem quando meus pais foram tirados de mim. E eu imaginei por um instante o que teria feito se tivesse me contado antes.

Ele para, respirando com dificuldade.

– Se você tivesse me contado... naquela época... tem razão. Eu teria pedido para tirá-lo.

Ouvi-lo dizer, embora já soubesse, faz um novo buraco no meu peito.

– Isso faz de mim um monstro?

– Ah, Liam, você não é um monstro. É apenas humano. Também sinto raiva do mundo. Nada disto é justo.

– O que vamos fazer? – É estranho ouvir aquela pergunta vinda de Liam. Ele sempre foi o dono da maioria das respostas em nossa relação.

– Nós fazemos nossas escolhas com o melhor que temos e seguimos em frente.

– Você escolheu!

Sorrio tristemente.

– Sim, escolhi nosso bebê. Deveria ter feito esta pergunta meses atrás, mas estou fazendo agora. O que você escolhe?

Espero com a respiração presa na garganta. Sei que se Liam for contra minha decisão, será nosso fim. Não tem como ser diferente.

– Escolho o que você escolheu. – Diz por fim. Há resignação em sua voz. Também há convicção. Tudo misturado com um pouco de tristeza. – Escolho ficar com você. Escolho cuidar de você. Escolho o que tiver que ser, contanto que esteja com você. Seja qual for o fim.

Sorrio jogando meus braços a sua volta. Adorando senti-lo perto, me apertando.

– Só nunca mais vá embora. – Sua voz sai abafada contra meu pescoço.

– Nunca mais me deixe ir embora.

Permanecemos abraçados sem nos preocuparmos com o tempo. Apenas sentindo as batidas dos nossos corações se acalmando. No mesmo ritmo.

– Vai me levar pra casa agora? – Pergunto, quando começo a me sentir sonolenta.

– Não. Vamos dormir – ele se aconchega a mim na cama e boceja – estou um lixo depois de ficar sem dormir direito todos estes dias.

– Então durma. Na cama do Jeremy...

– Esta cama foi minha antes de ser dele.

– Fiquei sabendo... Era onde fodia as garotas católicas.

– Não comece com este papo sujo, baby. Vamos dormir.

– Ah, que pena. Podia me contar como era, talvez até me mostrar...

– Boa noite, baby – ele boceja de novo e desisto de provocá-lo porque também estou morrendo de sono.

Estou quase dormindo quando escuto sua voz sonolenta.

– Sinto muito por ter te deixado sozinha.

– Sinto muito por ter te deixado de fora.

– Somos dois idiotas, não é?

Solto uma risada, me aconchegando mais.

– Esse é o motivo de sermos perfeitos juntos.


Capítulo 9

 

– Bom dia, bonita – Jeremy pisca para mim com a boca cheia de cereal quando entro na cozinha pela manhã.

– Você parece bem, querida – Nora sorri. – Sente-se e tome café conosco.

– Sim, minha cama fez bem pra você hein? – Jeremy ri maliciosamente e rolo os olhos, servindo-me de uma xícara de chá.

– Sim, dormi muito bem. Sua cama é realmente ótima, Jeremy – sorrio com o mesmo jeito malicioso o que faz Jeremy corar. Rapidamente ele se recupera e incha o peito se inclinando em minha direção.

– É... você pode ficar com ela quanto tempo quiser...

– Saia de perto da minha mulher pirralho – o rosnado de Liam ao entrar na cozinha, faz meu sorriso se alargar e Jeremy se afastar na mesma hora olhando de mim para Liam surpreso.

– O que está fazendo aqui?

Liam pega a xícara de café que Nora lhe serve e beija sua testa antes de se aproximar e sentar do meu lado.

– Minha mulher dormiu aqui, onde mais eu estaria? – Ele segura minha mão, levando meu pulso aos lábios. Sorrio feito boba.

Jeremy relanceia o olhar de mim pra Liam e sua expressão de confusão vira uma careta.

– Argh, vocês transaram na minha cama?

– Jeremy! – Nora o repreende e solto uma gargalhada.

– Não é da sua conta, pentelho – Liam responde, não parece bravo.

E, por um momento, me regozijo com aquele Liam mansinho que não via há tanto tempo. Ontem acreditava que nunca mais iria vê-lo novamente. E agora ele está aqui. Entrelaçando os dedos nos meus, beijando meus cabelos, sorrindo pra mim como antes.

Antes de descobrir sobre minha mentira.

Antes de saber que minha vida poderia estar com os dias contados.

Esta lembrança incômoda tira um pouco do brilho dos meus olhos, porém continuo sorrindo, não querendo estragar aquela tão almejada trégua. Não agora que meu Liam estava de volta.

– Bom dia família – a voz estrondosa de Ethan interrompe o fluxo sombrio do meu pensamento e me viro para vê-lo entrando com Ariana na cozinha.

Ele está sorrindo animado, enquanto ataca o bolo sobre a mesa e imagino que Liam lhe contou que fizemos as pazes. Já Ariana parece não ter tanta certeza e nos lança um olhar cauteloso e desconfiado.

– Hum, isto é bom! – Ethan diz de boca cheia e Ariana faz cara de nojo.

– Ainda bem que não apresentei minha irmã pra você! Que mal educado!

– Nós estamos acostumados com ele, querida – Nora intervém – aliás, por que também não se senta e toma café conosco?

– Obrigada. Só vim ajudar a Emma com a injeção tenho que sair logo para levar minha filha ao balé.

– Não se preocupe, eu como a parte dela! – Ethan responde o que faz Ariana revirar os olhos.

– Vamos Emma?

– Vamos – me levanto e não consigo encarar Liam, antes de seguir Ariana até o banheiro.

– Obrigada por se lembrar de trazer meu medicamento. – Digo quando chegamos ao banheiro – aliás, obrigada por ter trazido roupas, também.

– Não precisa agradecer – ela prepara a seringa e me encara com um olhar curioso – então, está mesmo tudo bem? Seu marido parou de ser um babaca egoísta?

– Ariana, não fale assim!

– Deixe-a falar, era verdade – nós duas nos viramos para ver Liam na porta do banheiro e quase rio ao notar que Ariana ficou vermelha.

Sua expressão vai de sem graça a confusa quando Liam estende a mão.

– Deixe-me fazer.

– O quê?

– A injeção.

Agora nós duas estamos surpresas.

– Você vai aplicar injeção na Emma?

– Achei que você fosse uma mulher inteligente, Ariana. – Liam retruca impaciente – ouviu muito bem o que eu disse. Eu mesmo irei aplicar as injeções na minha esposa a partir de agora.

– Mas...

– Ethan está te esperando para levá-la – Liam continua com a mão estendida e Ariana me encara.

– Tudo bem, Ariana.

Ela dá de ombros vencida, entrega a seringa a Liam saindo do banheiro.

Liam fecha a porta atrás dela e me encara.

– Não precisa fazer isto.

– Devia ter contado comigo desde o começo – é sua resposta simples.

Eu não contesto. Um tanto sem graça, levanto a blusa e o vejo aplicar a injeção sem nenhuma hesitação.

– Você é bom.

– Sou bom em muitas coisas, baby – diz jogando a seringa no lixo.

– É, sei muito bem.

Ele estuda meu rosto.

– Você está bem?

– Sim, agora estou ótima – sorrio me aproximando até que esteja colada nele – o Ethan não teria que levá-lo ao trabalho também?

– Hoje não vou trabalhar.

Levanto a sobrancelha.

– Não? O que aconteceu com “o dinheiro nunca dorme”?

Ele sorri e abre a porta do banheiro.

– Acho que tenho que começar a me redimir por ter sido um babaca egoísta, não é?

Eu não discordo.


***


– Liam, que diabos estamos fazendo aqui? Armani, sério? – Olho espantada para a fachada da loja na Quinta Avenida, enquanto ele me puxa pra dentro.

Obviamente, uma vendedora muito educada se aproxima com um sorriso calculado.

– Senhor Hunter, em que posso ajudá-lo?

– Minha esposa e eu queremos ver roupas de bebê.

– Ah claro – finalmente a mulher parece me notar e sorri toda solícita – Por favor, venham comigo. Vou levá-los até a Armani Junior.

– Armani Junior? Nem sabia que existia – cochicho atrás de Liam.

Liam dispensa a vendedora quando chegamos ao departamento lotado de roupas de bebê que devem custar uma fortuna.

– Liam, nós não precisamos de mais roupas de bebê!

– Você ficou chateada quando não trouxe nenhum presente das minhas viagens.

– Ah, estava chateada com um monte de coisas. Realmente nem sei onde enfiar mais roupinhas! Teremos que arrumar um quarto extra!

– Pode ser uma boa ideia – Liam fala distraído enquanto verifica os cabides minúsculos. – Tenho certeza que Zoe adoraria arrumar.

– Nem tenha ideias! – Dou-me por vencida e me aproximo de uma prateleira cheia de roupas azuis, um sorriso se forma em meus lábios.

– Lembra quando descobrimos que seria um menino?

Ele sorri também. O que aquece meu coração.

Sei que está se lembrando de quando voltou de uma viagem de negócios depois que fiz o ultrassom em que pude ver o sexo do bebê e lhe contei que, diferentemente do que ele vivia dizendo aos quatro ventos, não teria que conviver com uma mini senhorita Jones. Ao contrário, eu que teria um leãozinho feroz para cuidar.

– Falei que da próxima vez seria uma senhorita Jones – ele relembra e então me encara sério – não haverá próxima vez, não é?

– Não – me sinto triste ao pensar que não poderia engravidar de novo. Neste momento só quero conseguir levar essa gravidez até o fim. Já seria uma dádiva. Então sorrio pegando um pequeno casaco azul e mudo de assunto – acho que um destes está bom por hoje. O que acha?

– Só?

– E já é muito.

– Não seja chata. Vamos levar este também – ele acrescenta um sapatinho branco e não discuto. Quando a vendedora volta para perguntar se precisamos de ajuda Liam já havia separado uma dúzia de roupinhas que provavelmente nunca seriam usadas.

Não me importo realmente. Estou tão feliz por termos voltado àquela espera ansiosa por nosso bebê.

– E o que gostaria de fazer agora? – Ele pergunta quando chegamos ao carro e Ethan, que havia trocado de posto com Owen depois de levar Ariana, abre a porta para nós.

– Hum, podemos ir pra casa? – Eu me aconchego a ele no carro.

– O que você quiser baby.

Ethan dá partida, liga o som e os acordes sombrios de Nine Inch Nails enchem o carro. Não reclamo. Naqueles meses de convivência com Liam havia aprendido a amar as músicas que ele gostava. Infelizmente, ainda não consegui fazê-lo ouvir Sia. Eu não perdia a esperança.


***


Surpreendo-me nos dias que seguem com a presença quase constante de Liam a meu redor.

No dia em que voltei pra casa, passou o dia inteiro comigo, deixando que eu ditasse o ritmo das horas. Escolhi simplesmente passar o dia encolhida com ele no sofá da sala de TV assistindo filmes bobos com finais felizes, ansiando intimamente que o meu final também fosse feliz.

Liam não reclamou nem uma vez, embora eu soubesse que não via a menor graça naqueles filmes. Ficou comigo, me abraçando, mexendo em meu cabelo e acariciando minha barriga quando o bebê se mexia fazendo-me gemer desconfortavelmente.

Nos dias que se seguiram, não ficou tão grudado em mim quanto eu gostaria, embora passasse a maior parte do tempo em casa, digitando furiosamente em seu laptop e falando ao telefone com algum pobre coitado do escritório de Wall Street.

Zoe aparecia constantemente para almoçar e sempre trazia coisas de bebê, não adiantando de nada minhas súplicas para que parasse com aquelas compras descontroladas e desnecessárias. Liam não ajudava em nada, dizendo que Zoe podia comprar o que quisesse, até deu um cartão de crédito a ela.

– Liam, é um absurdo! Não tem medo que ela gaste seu dinheiro com coisas para o casamento dela? Zoe é louca e é bem capaz de algo desse tipo!

– Não me importo. – respondeu ainda com a atenção na tela do computador. – Eu disse a ela que podia gastar no que quisesse, inclusive com o casamento. Sabia que ela quer realizar a cerimônia num castelo?

– Ah Deus! O que aconteceu com vocês? Antes se detestavam!

– Ainda a detesto – ele riu.

– Mas está dando dinheiro pra ela!

– É só dinheiro, baby e tenho um monte – respondeu simplesmente, fechando o laptop e se levantando da mesa. – E então o que quer para o jantar? Emiliano e Ariana virão também.

Sim, às vezes Liam dispensava Eric e fazia ele mesmo nossas refeições. Também parou de viajar a negócios.

– Não vou mais viajar até o bebê nascer. – Ele me disse quando perguntei depois de permanecer semanas em casa. Liam viajava praticamente todo mês antes – também tentarei diminuir as viagens depois que ele nascer.

Eu havia engolido em seco, pensando que seria bem útil se ele por acaso ficasse sozinho com o bebê.

Embora o medo persistisse, minha saúde continuava estável.

Liam aplicava as injeções religiosamente todos os dias e eu consultava toda semana, sempre acompanhada por ele.

O bebê continuava a crescer saudável e o médico dizia que se continuássemos naquele ritmo tudo daria certo até o final.

Eu rezava todas as noites para que o que ele dizia se concretizasse.

***


Capítulo 10

 

Não tenho muitas lembranças boas do natal.

Ter crescido com uma mãe com tendências hippies não contribuiu muito para que eu aproveitasse as festas natalinas como uma criança normal. Margô inventava uma religião a cada ano, além de ser contra entrar na “orgia consumista” como ela chamava. E eu sequer sabia o que significava uma orgia até os treze anos de idade, quando roubei um livro sobre sexo da biblioteca da escola.

E Tom era desligado demais para se importar. Depois de adulta costumava alternar passando-os, ora com Margô, ora com Tom, para que eles não brigassem. Quando estava com Margô, ela sempre comprava algum pacote de viagem para uma praia com muito sol, onde tomávamos margueritas e tentávamos ficar bronzeadas, o que era inútil dado o tom branco vampiro de nossas peles. Com Tom, tentava fazer alguma comida decente e depois assistíamos filmes natalinos antigos na TV, até ele dormir e eu ter que arrastá-lo para a cama.

Então cresci não me importando muito com os feriados de final de ano.

Até agora.

O que tinha tudo a ver com duas coisinhas que mudaram na minha vida no último ano.

Meu Leão de Wall Street e o leãozinho que crescia na minha barriga.

Com um sorriso, passeio os dedos por meu estômago dilatado enquanto olho a neve caindo através da parede de vidro da janela do meu quarto.

Tanta coisa havia mudado em tão pouco tempo, às vezes eu achava surreal que em menos de um ano eu tivesse me transformado da Emma universitária, sem namorado e sem grandes perspectivas, nesta Emma, casada com um dos homens mais ricos do país e grávida de seis meses.

Aquele ano foi especial. E eu queria que o natal fosse especial também.

No entanto... A incerteza aperta meu peito e fecho os olhos, soltando um suspiro. Não, não iria pensar em nada hoje a não ser na minha primeira ceia de natal.

O que já era preocupação suficiente.

– Toc, toc – sorrio ao escutar a voz de Zoe e me viro, vendo-a entrar no quarto batendo seus saltos Manolo Blahnik no chão.

– Ah meu Deus, você está enorme!

Reviro os olhos ao me levantar.

– E ainda faltam quase quatro meses!

– Nossa você vai explodir. Nem sei como entrou neste vestido. Quando escolhemos você estava bem menor – ela começa a medir minha cintura disforme com os dedos nervosos por cima do vestido vermelho Chanel.

– Pare! – Bato em suas mãos afastando-a.

– Ei, aonde vai? – Ela me segue quando saio do quarto. A casa resplandece com o aroma das comidas de natal e sorrio para Eric ao entrar na bagunça criativa que é a cozinha.

– Hum Eric, que cheiro bom!

Ele sorri maliciosamente, o sorriso não é para mim e sim para sua ajudante nesta noite, sua namorada Amanda que está retirando um peru do forno.

– Hoje tive uma ajuda.

– E eu falei que você é convidada, Amanda – reclamo roubando uma cereja de cima de um lindo bolo. Eric bate na mão de Zoe quando ela tenta fazer o mesmo.

– Ai, a Emma pegou uma e não apanhou!

– A Emma come por dois.

– Tudo agora é desculpa – Zoe reclama.

– Emma, eu gosto de ajudar o Eric, sabe muito bem. Aprendo muitas coisas – Amanda diz sorridente e eu pisco.

– Sei muito bem o que você aprende!

Amanda fica vermelha eu ia zoar mais um pouquinho, quando Ethan entra na cozinha.

– E aí tagarela, conseguimos subir o seu presente.

– Sério? – Corro no ritmo que me é permitido e salto animada quando vejo meu presente para Liam no canto da biblioteca.

– Uau! É lindo Emma – Nora se aproxima admirada, seguida de David.

– Acha que ele vai gostar? – Pergunto insegura, David aperta meus ombros em encorajamento.

– Claro que sim, querida.

– Tom, acho que já bebeu demais! – A voz da minha mãe desvia minha atenção e rumo para a sala. Não sei se rio ou fico brava vendo Margô e Tom discutindo diante do bar onde Sean prepara mais um Martini para meu pai.

– Deixe ele se divertir, amor – Sean tenta ser solidário e Tom ri.

– Olha só, seu marido parece ser mais simpático do que você. Um conselho amigo, não se deixe contaminar pela chatice desta mulher – Tom cochicha para o novo marido da minha mãe enquanto eu puxo Margô pelo braço, para evitar que perca as estribeiras com Tom.

– Mãe, por que não conta a Nora sobre seu curso de jardinagem? Nora também adora plantas e flores.

Deixo as duas conversando e relanceio os olhos para Zoe e Jackson conversando com Jeremy que, como sempre, parece bastante desconfortável usando um terno. Mais cedo eu havia elogiado seu novo corte de cabelo, bem curtinho e ele não perdeu a oportunidade de flertar comigo.

Vendo que tudo estava sob controle rumo para o escritório.

Somente Liam para inventar de trabalhar na véspera de natal, penso entre divertida e consternada ao parar na porta do escritório e observá-lo, os dedos nervosos massacrando as teclas do laptop, os olhos focados em alguma bolsa de valores.

– Vai ficar me stalkeando o dia todo?

Rolo os olhos.

– Já é noite e o jantar será servido. Estamos esperando você.

– Estou ganhando dinheiro, baby – estende a mão para mim e vou até ele.

Sempre vou.

– Será que já não tem dinheiro suficiente? – Meus dedos encontram os seus, se entrelaçando e me enrosco em seu colo.

– Tenho que pensar no leite das crianças agora – ele pisca e eu rio, envolvendo seu pescoço com meus braços.

– Criança no singular, baby – corrijo.

– Tem certeza que não são dois? – Sua mão acaricia minha barriga – pelo tamanho desta barriga poderia dizer que são três.

– Está me chamando de gorda, senhor Hunter?

– Só me certificando que não está escondendo mais nada de mim.

Desvio o olhar, um pouco de culpa afligindo meu íntimo.

Liam finalmente fecha o laptop se levantando também.

Fico na ponta dos pés e beijo seu queixo.

Sorrio com prazer, quando ouço um rosnado e suas mãos apertando minha bunda me puxando para que sua boca possa encontrar a minha.

– Não seja impertinente, baby – sussurra contra meus lábios, quando se afasta e suspiro.

– Sinto saudade de ser chamada de Senhorita Jones.

– Agora é a Senhora Hunter, esqueceu?

– Você sabe o que eu quis dizer! – Resmungo e Liam me solta.

– E você sabe que não adianta me provocar porque não vou punir você...

– Enquanto eu estiver grávida, tá, entendi!

Liam me puxa de novo, enquanto saímos do escritório.

– Paciência, baby, paciência...

Eric nos chama para jantar e como sempre é tudo perfeito.

Claro, se eu relevar Jeremy reclamando de como os adultos são chatos porque não o deixam ficar mexendo no celular, ou Margô e Tom discutindo por qualquer coisa, além de Zoe com seus papos fúteis sobre moda e as piadas idiotas de Ethan.

Mas aquela era minha família e meus amigos. Senti-me abençoada por tê-los em minha vida. Éramos perfeitos em nossas imperfeições.

Passo a mão em minha barriga, fazendo uma oração silenciosa para que tudo continuasse exatamente assim.

Depois do jantar nós vamos para a sala trocar presentes. Resolvemos fazer hoje porque amanhã Margô e Tom iriam viajar, Amanda levaria Eric para almoçar com seus pais, Zoe e Jackson viajariam para a casa dos pais dele.

Obviamente não poderiam faltar alguns presentes absurdamente caros de Liam, a surpresa de Eric para Amanda que, ao abrir seu presente, ficou sem fala ao ver um lindo anel de noivado. Fiquei emocionada por ela. Eric havia me contado no começo da semana que iria pedi-la e me chamou para ajudá-lo a escolher o anel.

Só depois que todos foram embora que finalmente levo Liam até a biblioteca para mostrar a ele o meu presente.

– Quando me disse que me mostraria meu presente mais tarde, imaginei outra coisa – ele ri atrás de mim, aliviando um pouco a tensão que eu sentia.

– Seu pervertido!

– Não era eu que estava reclamando por não levar umas palmadas há algumas horas...

Respiro fundo quando entramos na biblioteca e o encaro.

– Feliz natal!

Liam olha para o piano sem dizer nada por alguns instantes e fico com medo de ter errado feio. Ainda me lembro daquele Liam fechado e reticente sobre seu passado que me fez sofrer um bocado, até que finalmente se abriu. Fazia muitos meses que não via aquele Liam e achei que tivesse desaparecido pra sempre, porém, em se tratando de Liam, poderia esperar tudo.

– Você não gostou!

Ele se vira para mim sorrindo.

– Você é realmente muito boa com surpresas, baby.

Sorrio aliviada, Liam me puxa até o piano, sento-me ao seu lado e ele começa a tocar.

– É realmente uma droga que você seja bom em tudo o que faz senhor Hunter – digo quando a música termina e Liam sorri.

Tão lindo. Tão meu.

Faz meu coração se apertar de mil maneiras diferentes. Todas maravilhosas.

– Obrigado por estar aqui – murmura, de repente vejo um lampejo de tristeza em seu olhar. – Os natais... Sempre foram difíceis depois...

– Eu sei – aperto seus dedos beijando sua mão apertando-a contra minha barriga – agora eles serão mais fáceis.

O bebê se mexe.

– Fale com ele, Liam.

Na nossa última consulta o médico havia dito que neste estágio da gravidez o bebê já reconhece a voz do pai e da mãe.

– É esquisito falar com ele quando ainda nem temos um nome.

Nós nos debruçamos sobre os livros de nomes de bebês nas últimas semanas sem conseguir chegar a um consenso. Não ajudava que Zoe e todos os outros quisessem ter voz ativa na escolha.

Minha mãe me mandou um e-mail enorme cheio de nomes hippies bizarros, enquanto meu pai havia dito que ficaria muito honrado se tivesse o nome dele. Até parece!

– Não faz diferença! Ele só quer ouvir sua voz.

Liam acaricia minha barriga.

– Se ele pudesse me escutar eu pediria desculpas por ter dito que pediria para você desistir dele – diz baixinho fazendo meu coração se apertar.

– Liam, não... – seguro sua mão.

– Eu diria que o amo muito, embora me apavore pensar que você pode não estar aqui para criá-lo comigo.

Meus olhos se enchem de lágrimas, aperto sua mão, o nó em minha garganta me impedindo de falar.

– O que eu vou dizer a ele? O que vai sobrar para ele, Emma?

Toco seu rosto apreensivo.

– Eu estarei aqui. Eu não prometi? Nunca irei embora!

Ele segura meu rosto beijando minha boca com uma força que não existiu naqueles últimos meses. O Liam dos últimos tempos era só carinho e cuidado, nada dominador. Eu o provocava o quanto podia, mas ele dizia que sexo era só uma parte do que nós tínhamos e que naquele momento preferia me manter protegida. De nada adiantava eu falar que não havia nenhum perigo. No fim, já começava a me sentir muito cansada e dolorida para tentar ser sexy então desisti. Liam tinha razão. Haveria tempo.

Eu esperava ardorosamente que existisse um depois. Principalmente agora, quando ele me beijava com uma fome que revelava toda sua vulnerabilidade.

– Eu te amo – murmura em meus lábios e sorrio beijando-o uma última vez.

– Também te amo, baby.


Um pouco mais de drama do que vocês esperavam, não é? Pelo menos tudo acabou bem. Leo nasceu um mês antes do esperado e, como havia prometido a Liam, não fui a lugar nenhum. Apesar de todo medo e apreensão, eu era mais forte do que se esperava. Depois de três semanas na incubadora, como qualquer bebê prematuro, nosso pequeno leão veio para casa com a gente.

Aconteceu faz quase seis meses.

A vida não é perfeita, mas quem se importa? Sou casada com o Leão de Wall Street, porra!


Ps. Ainda não arranjei uma namorada para o Ethan, mas estou com bons pressentimentos. Lembram-se de Ariana Colombo? Ela parou de falar da tal irmã adotiva, mas nos indicou sua babá, Amy.

Amy é linda, ruiva e totalmente hipster! Ando vendo algumas faíscas entre ela e o Ursão...

Será?

Esta é uma história para outro livro...

 

 

                                                   Juliana Dantas         

 

 

 

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