Eles são os Sentinelas. Três raças descendentes de antigos guardiões da humanidade, cada uma possuindo habilidades únicas em sua batalha para proteger a humanidade contra seus eternos inimigos: Os Synestryn. Agora a sobrevivência de um dos Sentinelas determinará o destino de todos eles.
Lexi Johns tem um único propósito: libertar sua melhor amiga das mãos dos Sentinelas. E Zach, o Sentinela de quem ela esteve fugindo durante meses, tem uma única meta: convencê-la de que o destino deles é ficarem juntos. Porque a magia que Zach absorveu poderá destruí-lo se ele não encontrar a mulher que possa canalizá-la para ela. E ele sabe que Lexi é a única.
Desde a mais tenra idade, Lexi foi ensinada a temer aos Sentinelas. E agora ela é agente de um grupo que planeja destruí-los. Assim quando Zach a encontra, é a oportunidade de Lexi dar o golpe de misericórdia no coração dos Sentinelas. Mas, quando Lexi vê a coragem de Zach, seu desprendimento, e honra, começa a duvidar de suas crenças – e terá que fazer uma dolorosa escolha.
Texas, 29 de Julho.
Depois de um tempo fugindo dos caçadores, Lexi Johns já não é uma presa.
É quem ataca.
Zack estava ali. Podia senti-lo perto, aproximando-se mais a cada pulsar de seu coração, como se de algum modo tivesse se convertido em parte dela. Ainda não estava preparada para se encontrar com ele. Necessitava de mais tempo para preparar-se para o que tinha que fazer e o que isso poderia lhe custar.
Os cabelos finos caíam ao longo de seus braços levantados e sentia um formigamento percorrendo sua pele. Havia sentido isso antes, na noite em que Zach marcou sua pele, e sabia o que significava. Zack estava se aproximando.
Lexi não tinha certeza de poder fazê-lo — mentir de maneira que ele viesse a ela — mas não tinha escolha. O destino de toda raça humana dependia de sua habilidade para enganá-lo, fazendo-o pensar que precisava de sua ajuda, que acreditava na mentira que dizia, que era um dos mocinhos. Sabia melhor que ninguém. Sua mãe se assegurou disso.
No que a ela concernia, a maioria das pessoas não mereciam o problema que estava trazendo para si mesma, mas Helen Day sim. E os Sentinelas a tinham. Zack era seu único caminho para entrar no complexo onde Helen era mantida prisioneira, sua única maneira de ajudar Helen a fugir.
As mãos de Lexi tremeram enquanto limpava as mesas de madeira. O bar onde trabalhava tinha acabado de fechar e estava quase vazio. O único homem que restava, estava limpando a pequena cozinha. Podia ouvi-lo cantando em espanhol enquanto trabalhava. Gus, o proprietário do bar, estava no caixa, fazendo a recontagem dos lucros da noite. Pelo sorriso em sua cara e a maneira que seus pés e costas doíam, tinha certeza que estava tendo um lucro terrível.
O volume das gorjetas no bolso de seu avental não era tão grande quanto esperava que fosse. As pessoas já não pagavam tanto em dinheiro como costumavam fazer, e Gus gostava de agarrar-se ao dinheiro tanto quanto pudesse, assim não veria aquelas gorjetas até o dia de pagamento. Não que fosse ficar ali o suficiente para pegá-lo. Tinha certeza que Zack a encontraria antes.
A ideia fez que sua pele se aquecesse e sua boca secasse; ele a fazia tremer de medo e algo mais, algo quente e ilusório que não podia nomear.
Era uma pena. Era hora de aceitar isso. Helen precisava dela. Lexi tinha que libertar sua amiga e encontrar uma maneira para desfazer qualquer lavagem cerebral que Helen tivesse sofrido. Graças a Deus tinha os Defensores da Humanidade do seu lado. Aqueles rapazes enormes e rudes pareciam saber o que estavam fazendo, mesmo sendo um pouco… Exagerados a respeito disso. Se alguém podia desprogramar Helen, esses seriam os Defensores.
Lexi virou as cadeiras em cima da mesa de modo que pudesse varrer e passar o rodo. Justo quando acabou de virar a última cadeira sentiu o formigamento na pele, na parte de trás de seu pescoço, ante a intensa sensação de ser observada. Olhou por cima do ombro para ver quem estava olhando para ela. A cabeça de Gus estava inclinada sobre uma calculadora. O espelho detrás dele refletia a sala na penumbra. Captou o brilho dos claros olhos verdes no espelho e congelou de pânico durante uma fração de segundo, seu coração pulsando como se urgisse seus membros a se moverem. Então percebeu que não era Zach. Eram só os olhos da tatuagem de leopardo em seu ombro que a olhava fixamente por debaixo da borda de sua camiseta velha.
Zach ainda não estava ali. Ainda tinha tempo para fazer uma pausa.
O alívio a fez dobrar-se contra a mesa. Ia ter que encontrar uma maneira para controlar-se antes que ele aparecesse realmente. E baseando-se no formigamento de sua pele onde a marca dele brilhava sob a tatuagem, não estava muito longe. Desta vez quando ele aparecesse, não fugiria.
Lexi passou a maior parte de sua vida fugindo, e estava cansada disso. Queria um lar real com uma cama de verdade, não o assento de trás de seu carro e uma parada no banheiro, ou talvez um quarto em um motel barato se tivesse sorte. Se não podia ter uma casa de verdade, então o mínimo que podia fazer era conseguir que os Sentinelas sofressem tanto quanto eles a fizeram sofrer. Depois do que fizeram a sua mãe, Helen e a muitas outras, mereciam tudo o que receberiam. E algo mais.
Lexi se virou para pegar o rodo da cozinha e captou outra vez aqueles olhos verdes de leopardo, só que desta vez, não estava olhando fixamente sua tatuagem.
Zach estava ali. Contemplando-a.
Lexi congelou, incapaz de mover-se, ou mesmo respirar.
Não estava preparada. Ainda não estava forte o suficiente para enfrentá-lo. A urgência de começar a correr aumentou nela, e lutou contra o pânico desesperado, apertando os dentes e os punhos.
Zach não fez nenhum movimento para atacá-la. Em vez disso, permaneceu na soleira da porta, com o ombro largo apoiado displicentemente contra o batente da porta. Olhava-a com a misteriosa calma de um predador. Sua pele bronzeada se misturava com as sombras que caíam sobre os painéis da parede, fazendo que os brilhantes olhos se destacassem ainda mais.
O coração de Lexi vacilou, embora não tivesse certeza se era porque a surpreendeu ou porque isso era tudo o que ele estava fazendo. Inclusive, em seus sonhos, tinha a habilidade de fazê-la suar com seu olhar ardente.
Era maior do que ela se lembrava, ou talvez, tenha sido aquela lembrança equivocada, a única maneira de sua mente ajudá-la a enfrentá-lo, tornando-o menos ameaçador. Seus cabelos pretos e lisos estavam diferentes do modo que estiveram na última vez que o viu — amarrados para trás, como se estivesse preparado para entrar em uma batalha.
Talvez estivesse. Lexi não tinha nem ideia do que esperar agora. Por tudo o que sabia, estava ali para matá-la apesar de suas palavras encantadoras, e todos os planos que havia feito com os Defensores poderiam não servir para nada.
Preciso de você, carinho. Disse a ela há dois dias. Disse isso de uma forma que dissolveu sua resolução.
Tinha que permanecer calma e agir normalmente. Mover-se lentamente. Ele era como animal selvagem e predador e ela tinha medo de que se ela se movesse muito rápido, ele a atacaria repentinamente.
Lexi o olhou fixamente, deixando-o saber que o tinha visto. Fingindo que não estava assustada.
Zach sorriu, mostrando seus brilhantes dentes brancos. Aquilo não era um sorriso de saudação. Era um sorriso de conquista. Vitória.
Lexi engoliu com dificuldade, tentando levar um pouco de umidade de novo a sua boca.
— Gus, vou sair cedo. — disse a seu chefe, mantendo os olhos fixos em Zach, procurando movimentos repentinos.
— Infernos que o fará. Não até que limpe o piso.
— Sinto muito. Tenho que ir. — disse. — Emergência familiar.
— Você não tem família alguma.
— Agora ela tem. — respondeu Zach.
Com seu belo tom de barítono afundando-se em sua pele, fazendo-a tremer.
— Quem diabos é você? — perguntou Gus. — E como entrou aqui? As portas estão fechadas.
Zach não respondeu. Em vez disso afastou-se da parede com um poderoso agrupamento de músculos e caminhou diretamente para ela. Lexi se manteve firme no chão à base de força de vontade. Não fugiria. Desta vez não.
— Relaxe. — disse Zach. — Agora está a salvo.
Seus olhos verdes ainda sustentando-a, cativando-a como se fosse alguma espécie de presa, um tímido coelhinho congelado de medo. A imagem a aborreceu o bastante para fazê-la deixar um pouco de lado esse medo.
Agora ele estava perto. Muito perto. A respiração de Lexi se tornou mais rápida até o ponto de dar voltas em sua cabeça, e tinha certeza que ela permanecia quieta.
— Precisa de ajuda, Alex? — Perguntou Gus.
— Alex? — perguntou Zach, elevando uma sobrancelha marrom como que perguntando.
Lexi tentou dar um indiferente dar de ombros para ele, mas sua coluna parecia rígida e enferrujada.
— Nova cidade, novo nome.
— E também um novo visual. — disse, seus olhos vagando por seu corpo como se o território lhe pertencesse. — Eu gostei.
Ela tinha os cabelos loiros e arrepiados quando o conheceu. Depois tornou a pintar os cabelos de volta a sua cor natural — um tom castanho médio comum. Também os usava longos, caindo sobre a nuca, finos como os de um bebê e completamente longos.
— Você parece… Suave. — disse ele como se isso fosse algo bom, e Lexi repentinamente desejou não ter tirado as pontas dos cabelos. Ao menos poderia os usar para tirar um olho dele caso se aproximasse muito.
O que estava fazendo agora.
— Alex? — perguntou Gus novamente, desta vez com mais força. Tinha uma arma na parte de trás do balcão e não tinha medo de utilizá-la. O típico texano.
— Estou bem. — disse a Gus, mentindo através de seus dentes cerrados. — É apenas um velho amigo.
O sorriso de Zach se alargou.
— Vim unicamente para recuperar os velhos tempos.
Estendeu a mão para ela, e Lexi sabia que não podia saltar para um lado. Gus saberia que algo estava acontecendo, e embora Gus não fosse exatamente o cara mais encantador sobre a superfície do planeta, tinha dado um trabalho a ela quando ninguém mais o tinha feito. Não podia lhe pagar com problemas. E Zach era definitivamente isso. Um problema andante e falante de mais de um metro e oitenta e três de altura e noventa e dois quilos.
A longa mão rodeou seu pulso, e puxou-a para ele. Lexi foi, assegurando-se que a arma de Gus se mantivesse segura em um lugar afastado. Deixou Zach envolvê-la em seus braços. Não tinha certeza de que ele ia fazer. Estrangulá-la? Agarrá-la e jogar seu traseiro pela porta? O céu sabia que ele era grande o bastante para jogá-la em seu ombro e sair correndo antes que qualquer um pudesse detê-lo.
Mas não fez nada disso. Tudo o que fez foi devorá-la em um abraço.
A mente de Lexi atrapalhou-se, tentando buscar sentido para sua ação. Seus braços caíam curiosamente em seus flancos. Não podia nem mesmo encontrar a presença de espírito para afastá-lo. Tentou convencer a si mesma que isso era porque não queria que Gus saísse ferido, mas parte dela sabia melhor. Tanto quanto temia o que Zach poderia fazer a ela, tanto quanto odiava a ele e aos de sua espécie por arruinar sua vida e as vidas de muitas outras pessoas, ainda havia algo nele que a atraía, algo que acalmava os desenfreados cantos de sua alma. Talvez fosse apenas seu belo rosto ou seu corpo que lhe dava água na boca. Ou talvez já tivesse lavando seu cérebro e não sabia. Era assim que funcionava a lavagem cerebral, não é mesmo?
Suas mãos vagaram por suas costas e desceram pelos braços nus. Sua pele estava quente contra a dela, cheia de calos e completamente máscula. Estava pressionada fortemente contra ele, consciente de cada devastadora polegada dos músculos de seu peito, abdômen e coxas. Suas mãos formigavam para esticar-se e ver se seria tão bom senti-lo sob seus dedos quanto era senti-lo contra seu corpo, mas se conteve.
Ele era seu inimigo. Lexi não podia esquecer isso. O problema era, que nesse momento era fácil se esquecer disso. Não conseguia se lembrar da última vez que foi abraçada, mas tinha certeza que não tinha sido nada parecido a isto.
Sua essência a envolveu, deslizando dentro dela a cada respiração que tomava. Sentiu seu corpo relaxar e soube que isto devia ser algum tipo de truque que os Sentinela utilizavam para subjugar sua presa. Uma arma química. Uma que funcionava igual a um encantamento.
Contra seu melhor julgamento, sua face descansou sobre o peito dele e pôde ouvir o forte e constante batimento de seu coração. O brilhante colar que ele usava pulsava colorido, redemoinhando em um compasso quase hipnótico. Os braços eram fortes e duras faixas que a sustentavam no lugar, prendendo-a contra ele, mas não estava machucando-a, como tinha temido. De fato era justamente o oposto. Podia sentir uma sutil vibração correndo através de seus membros, como se ele estivesse tendo cuidado para não amassá-la.
Lexi recuou, esperando pôr fim ao abraço, mas Zach não a deixou ir. Seu aperto era desesperado. Inquebrável.
Enterrou o nariz em seus cabelos e respirou profundamente.
— Está bem. — sussurrou como se tivesse se preocupado com ela. — Não cheguei muito tarde.
Aquelas não eram as palavras de um assassino lunático, mas Lexi tinha um melhor critério para ser enganada.
— Helen também está bem? — perguntou a ele.
Zach se afastou então, apenas o suficiente para baixar seus olhos para ela.
— Está bem. Feliz. Como você ficará, quando eu a levar para casa.
Meu Deus, estava virtualmente admitindo que ia lavar seu cérebro. Não podia deixar que isso acontecesse. Helen precisava dela.
— Diga-me o que aconteceu. — disse Zach. — Quando a ligação foi cortada a semana passada. Tive certeza que estava morta, certeza que chegaria muito tarde.
Lexi rogou que não pudesse ver o rubor de culpa que podia sentir espalhando-se por seu rosto. Aquela ligação telefônica da semana anterior tinha sido totalmente uma fraude, planejada pelos Defensores para fazer Zach vir correndo. Fingiu estar em apuros, pedindo ajuda. Sua voz aterrorizada, as batidas na porta de seu quarto no motel, a maneira que ela cortou a ligação. Tinha sido tudo uma mentira cuidadosamente planejada para atrair Zach para ela.
E isso funcionou igual a um encantamento.
Passou as mãos ao longo de seus braços como se verificando se estavam feridos, ou talvez tentando se convencer que ela estava bem.
Não sabia o que fazer com ele, e isto a deixou totalmente confusa.
— Atacaram você? Está ferida? — ele perguntou.
Lexi sabia que ele faria perguntas, e tinha ensaiado a mentira uma e outra vez, mas com suas mãos correndo sobre ela, tão cálidas e carinhosas, dificilmente podia recordar a linha.
— Não. Eu estava em um quarto barato de motel. Era só um bêbado procurando sua namorada. Não deveria ter ligado e incomodado você, mas estava assustada.
Os olhos de Zach se abriram com alivio por um breve momento, e viu como movia a boca como se oferecesse uma silenciosa prece de agradecimento.
— Desculpem-me. — disse Gus. — Odeio interromper sua pequena reunião, mas este chão não vai se limpar sozinho.
— Sinto muito, senhor. — disse Zach. — Mas os dias de Lexi — Alex — passar o rodo terminaram. Ela vai para casa comigo.
Gus entrecerrou os olhos com suspeita.
— Isso é verdade? — perguntou a ela. — Vai com este cara?
Melhor sair dali rápido antes que alguém pudesse sair ferido. Quanto mais adiasse o inevitável, pior seria.
— Sim, Gus. Vou com ele.
— Você estava fugindo de algo. — disse Gus. — Era dele?
— Não. — mentiu. — Ficarei bem.
Zach ainda não a tinha soltado. Sua mão estava estendida cruzando a parte inferior de suas costas, sustentando-a perto de seu calor. Baixou os olhos para ela e seus felinos olhos verdes virtualmente brilharam de antecipação.
— Hora de ir, carinho.
Carinho. Sempre a chamava assim, como se ele se importasse com ela. Como se não estivesse planejando lavar seu cérebro e matá-la por seu sangue.
Então novamente, Lexi imaginou a mudança radical no jogo. Sua caminhonete estava equipada com explosivos, graças ao plano dos Defensores. Quando Zack a levasse de volta à comunidade onde vivia, e tirasse Helen, ia detonar todo o C-4 e matar todos os Sentinelas que pudesse. Incluindo Zach.
Lexi estava a salvo. Zach mal podia acreditar nisso, mesmo ela estando ali, bem na frente dele, tão bonita que fazia seus olhos arderem. Quase tinha paralisado de alívio quando chegou à entrada do bar e a viu sã e salva. A esquadria da porta impediu que caísse, e permaneceu ali durante um minuto completo, apenas observando-a mover-se, aliviando-se ao vê-la inteira e a salvo. Qualquer que fosse o apuro em que esteve, o que quer que tivesse ouvido na semana passada por telefone, não a tinha machucado.
Ele a tinha encontrado a tempo.
Zach levou outro minuto completo para estabilizar sua respiração e conseguir o controle suficiente sobre suas emoções para sequer pensar em aproximar-se dela. Não podia estragar tudo agora. Não podia assustá-la e fazê-la fugir. Outra vez não.
Quando teve certeza que não a machucaria com seu desespero por tê-la em seus braços, finalmente se permitiu ir para ela. E agora estava ali, pressionada contra ele, exatamente aonde pertencia.
Ele acariciou seus braços, tentando afastar os calafrios que percorriam sua pele. Não tinha certeza se esses calafrios vinham do frio ou do medo, mas de qualquer maneira, ia se encarregar disso por ela. Qualquer coisa que ela quisesse, qualquer coisa que precisasse, tudo que estivesse em seu poder para lhe dar seria dela.
Era bom senti-la sob suas mãos. Talvez demasiadamente bom. Seus dedos se fecharam ao redor de seus braços magros e teve que recordar a si mesmo ser cuidadoso. Ir lentamente. Não assustá-la de modo que fugisse outra vez.
Zach tinha planejado este momento durante semanas — todos os dias desde que a conheceu em 27 de junho, um dia que sempre celebraria como o começo de sua salvação. Tinha pensado em seu reencontro uma e outra vez — um milhão de diferentes situações encheu seu cérebro até que se afogou com as possibilidades. Em todas elas, ela tinha permanecido ao seu lado porque isso era o que ele queria.
Baseando-se na maneira que ela se mantinha imóvel em seus braços, aparentemente, a realidade não ia ser tão fácil.
Ele a tinha perdido uma vez. Ela tinha fugido. A marca de sangue que ele deixou não tinha funcionado corretamente e não tinha podido encontrá-la. Embora se pensasse que isso era impossível, ela tinha conseguido encontrar uma maneira de esconder-se dele. Isso podia acontecer outra vez se não tomasse cuidado.
Zach planejava ser muito cuidadoso.
— Comprei algo para você. — disse a ela.
Ele remexeu em seu bolso traseiro e tirou uma pequena bolsa aveludada. Demorou algum tempo para conseguir para abrir a coisa com apenas uma mão, mas não ia deixá-la sair de sua outra mão. Se dependesse dele, nunca deixaria de tocá-la outra vez.
Tirou uma delicada corrente de ouro da bolsinha e a balançou na frente dela. As luzes de néon do bar cintilaram nos elos, dando-lhes um tom brilhante.
— O que é isso? — perguntou ela.
— Um presente. Para você.
Um que podia garantir a ele que não a perderia de novo.
— Não posso aceitá-lo. — disse Lexi.
Seus olhos escuros se fecharam sobre a coisa como se fosse uma serpente venenosa.
— Claro que pode. Foi feita só para você. Não quer ferir meus sentimentos, não é mesmo?
Ela levantou o queixo e o olhou. Aqueles agridoces olhos chocolate estavam cheios de perguntas e mais que um pouco apreensivos, mas Zach se ocuparia disso muito em breve. Tudo o que precisava era um pouco de tempo a sós com ela para lhe explicar e tudo ficaria bem.
Tinha que ficar. Zach já estava quase fora de tempo.
— Por favor, Lexi. Apenas me deixe colocá-lo em você. Se você não gostar, obterei outra coisa.
Ela olhou novamente para o bracelete, lambendo os lábios e os puxando em uma forte respiração. Seu peito vibrou com silencioso temor.
Ela estava com medo.
Zach lutou ante a urgência agasalhá-la em seus braços outra vez e sustentá-la até que se acostumasse a ele e soubesse que nunca a machucaria. Infelizmente, essa não era a forma que as coisas funcionavam. Ela necessitava de tempo. Necessitava que demonstrasse a ela que não só não a feriria, mas também mataria a qualquer um ou qualquer coisa que o tentasse.
Se as coisas funcionassem, teria uma vida para lhe mostrar o que ela significava para ele. Várias, de fato.
A dor atormentava seu corpo, e a necessidade de proclamar sua reclamação gritava que ele agisse, mas se conteve. Ainda tinha mais alguns dias — os suficientes para fazer isso corretamente. Já tinha vivido com a dor durante décadas, podia viver com isso mais alguns dias. Lexi merecia isso.
Lentamente, ela estendeu seu braço. Seus braços tremiam, mas Zach fingiu não notar. Ela era uma mulher pequena — de apenas um metro e meio de altura — mas sua independência era tudo menos pequena. Lexi era uma lutadora, e ele ainda tinha cicatrizes que provavam isso.
Todas as vezes que via a pequena cicatriz do ferimento em seu braço, o fazia sorrir. Quando a acalmasse e mostrasse a ela como usar seu poder, ia ser incansável. Uma feroz mulher guerreira. Lexi, A Vingadora. Material para as lendas.
Zach segurou o bracelete ao redor de seu pulso, adorando a sensação de sua pele acetinada roçando contra as pontas de seus dedos. Tinha ossos delicados, embora nunca se atrevesse a dizer isso em sua cara por medo de mais cicatrizes.
Fez que o joalheiro a fizesse duas vezes de modo que se ajustasse a ela perfeitamente. E ele o tinha feito. Estava bastante folgada para ser confortável, mas não pendurava para que a tirasse dessa maneira. Mais importante ainda, não era bastante folgada para que deslizasse de sua mão.
Fingiu ajustá-la, puxando as duas extremidades que se conectavam enquanto extraía pequenas gotas de poder do ar que os rodeava. Doía como o inferno absorver mais energia, mas não tinha escolha. Precisava ativar a magia que Gilda tinha imbuído no bracelete — a magia que tornaria impossível Lexi fugir dele.
Com um clique sutil, sentiu o poder que dormia dentro das extremidades de ouro ganhado vida, enviando uma cascata de brilhos subindo por seu braço e descendo por sua coluna.
Assim como também o fez Lexi.
Seus olhos escuros se abriram desmesuradamente e lutou contra ele, tentando se afastar.
— O que está fazendo comigo? — exigiu.
O barman elevou os olhos de sua correspondência. Seu rosto duro e sombrio e seu corpo esticando-se. Estava procurando a arma detrás do balcão.
— É hora de ir, carinho. — disse Zach.
Pegou-a pelo pulso e puxo-a para a porta.
— Fique onde está. — disse o barman. — Ela não vai a nenhum lugar com você a menos que seja isso o que ela queira.
— Mantenha-se fora disto, Gus. — disse Lexi. — Só conseguirá que o machuque.
— Eu o ensinarei o que é ferir.
O homem moveu a escopeta em suas mãos, parecendo tão confortável com aquela coisa que provavelmente dormia com ela à noite. Não era um bom sinal. Um disparo a queima-roupa doía como o diabo, e um tiro pelas costas poderia arrancar seu braço ou pior. Zach não podia dar-se ao luxo de ficar incapacitado agora. Especialmente quando isso queria dizer que seu sangue seria derramado, o aroma atrairia todos os demônios Synestryn a milhas em volta, deixando Lexi desprotegida.
Isso não ia acontecer.
Moveu Lexi para trás dele e levantou as mãos.
— Calma, agora. — disse ele. — Eu não vou machucá-la.
— Alex, volte aqui. — ordenou Gus.
— Estou bem. — disse Lexi. — Realmente. Ficarei bem.
— Basta ligarmos para o xerife e deixarmos que ele resolva isto. — disse Gus. — Nós nos certificaremos aqui que, seu galã, não tem nenhuma história desagradável.
Envolver a polícia humana só ia tornar as coisas mais sujas. E, certamente, ele não tinha tempo para sentar-se na prisão enquanto as folhas de sua marca de vida murchavam e morriam.
— Estamos com um pouquinho de pressa. — disse Zach.
Gus se esticou para o telefone, nenhuma só vez afastou os olhos de Zach.
— Sinto ouvir isso.
— Não faça isso, Gus. — disse Lexi. — Apenas deixe-o ir.
— Ele é um cara enorme, Alex. Eu não gosto da ideia de você ficar sozinha com ele.
— Eu não vou machucá-la. — disse Zach através dos dentes cerrados. — Morreria antes de deixar que algo acontecesse com ela.
— Eu quero ficar a sós com ele. — a empática[1] declaração de Lexi fez o coração de Zach cantar.
Não tinha certeza se era isso que ela queria dizer ou se estava agindo por causa de Gus, mas de qualquer forma, era válido para ele.
— Tem certeza? — perguntou Gus.
Lexi deu um duro empurrão em Zach, afastando-o para um lado, de modo que pudesse passar para frente dele. Zach mal manteve as mãos para si mesmo. Então viu a tatuagem de um leopardo sobre o ombro dela e se acalmou instantaneamente pela surpresa. Cipós e folhas estilizadas começavam no ponto onde ele tinha colocado sua marca de sangue em seu bíceps direito e subia por seu braço e sobre seu ombro. O leopardo observava fixamente da folhagem, olhando diretamente para ele por debaixo da alça de sua camiseta.
Zach tinha visto seu reflexo no espelho vezes suficiente para reconhecer seus próprios olhos quando os via.
Era estranho vê-los no crânio de um animal — igual a algum valente tipo de caçador. O que era mais estranho ainda era o fato de Lexi marcar-se permanentemente com uma imagem que lembrava a ele. A última vez que a viu, ela tentou matá-lo.
Gostava de pensar que as poucas conversas que tiveram por telefone, desde então, a convenceram a abandonar seus impulsos violentos, mas tinha certeza de não ter sido tão doce falando com ela para algo como isso.
— Tenho certeza, Gus. — disse Lexi. — Apenas nos deixe ir em paz. Não o incomodaremos mais.
Agora era ela quem falava. Queria beijá-la por desarmar a situação antes que as coisas pudessem estender-se e complicar ainda mais.
Infernos, queria beijá-la, constantemente.
Infelizmente, isso teria que esperar até que a tirasse dali. Ao menos, até que a tivesse em sua caminhonete.
— Tem meu número de telefone? — perguntou Gus a Lexi.
— Sim.
— Use-o. Ligue se precisar de mim. Estarei aqui à noite toda.
— Obrigado, Gus. Desculpe-me pelo piso. Fique com o que me deve.
Os olhos de Gus se entrecerraram e olhou com cenho franzindo para Zach.
— Você fala como se não fosse voltar.
Lexi olhou para Zach e houve uma profunda tristeza sombreando seus olhos. Queria afastá-la, destruí-la de modo que não pudesse voltar a espreitá-la nunca mais. O problema era que estava convencido de que a maior parte daquela tristeza era de algum jeito sua culpa.
— Eu não vou. Adeus. — disse Lexi, então levou Zach através da porta entrando na noite.
O ar noturno era quente e espesso, e encheu os pulmões de Zach com o aroma da terra e do asfalto. Duas luzes velhas se elevavam sobre sua cabeça desenhando uma nuvem de insetos e iluminando o estacionamento deteriorado o suficiente para destruir sua visão noturna e criar profundos poços de sombra ao redor dos poucos carros que restavam.
Lexi se dirigiu para seu Honda e Zach se apressou em seus calcanhares. Não tinha esquecido o bonito traseiro que ela tinha, ou como sua boca enchia de água com a necessidade de sentir suas mãos cobrindo suas bochechas enquanto a beijava até deixá-la sem sentidos. Mesmo odiando, arrancou os olhos de tão encantadora visão e fez uma varredura da área e dos arredores em busca de Synestryn. Não ia deixar que um só daqueles asquerosos os pegassem de surpresa e estragassem sua chance de satisfazer cada uma de suas fantasias com Lexi.
E depois de tantas semanas, tinha um montão delas. Agora tudo o que tinha que fazer era conseguir que ela concordasse com seus planos.
— Não vou subir no carro com você. — anunciou ela caminhado para seu carro.
Ela não sabia que o bracelete que usava agora impediria que se afastasse mais que poucos metros dele, mas não acreditava que fosse diplomático dizer isso a ela ainda. Se tentasse fugir, saberia. E se tentasse fugir, merecia descobrir da maneira difícil.
— Por que não? — perguntou a ela.
— Não confio em você.
Suas palavras o feriram, mas ignorou a dor. Estava acostumado.
— Por que não?
— Você sabe por quê.
Zach segurou seu braço e puxou-a gentilmente para que parasse.
— Não. Não sei.
Ela ficou olhando-o durante um longo tempo. Com raiva apertava a boca, fazendo que ele quisesse beijá-la para afastá-la.
Enfiou um dedo em seu peito. Com força.
— Marcou-me e me perseguiu por todo país, tornando quase impossível para mim ficar em um único lugar tempo suficiente para encontrar um trabalho. Tem ideia de quanto custa o combustível? Tive que gastar quase tudo o que possuía para manter meu carro em movimento para que você não pudesse me pegar.
Pensar nela sofrendo dessa maneira o adoeceu. Essa não era sua intenção. Ela fugiu; ele a seguiu. Como não ia segui-la quando necessitava tanto dela?
— Por que fugiu?
Essa era uma pergunta que esteve morrendo de vontade de fazer. Por que estava com tanto medo dele? Nunca a tinha machucado.
— Por que fugi? Fala sério?
Zach assentiu.
— Sequestrou Helen. E a Senhorita Mabel. Não queria ser a seguinte.
— Sequestrar? — bom, pensando bem, Zach imaginou que provavelmente pareceu isso. — Drake necessitava Helen. E não podíamos deixar a Senhorita Mabel para trás para que se arrumasse sozinha uma vez que os Synestryn apareceram.
— Eles apareceram por sua culpa. — disse ela, apontando outra vez para ele.
Neste ritmo, ia feri-lo.
— Bem, sim, mas não é como se pudesse evitar isso.
Ela revirou os olhos e colocou a mão no bolso de seu avental para pegar as chaves.
— O que seja. Só me diga aonde vamos e o seguirei.
— Isso não vai funcionar
— Estou doente e cansada de fugir, Zach. Acabou. Você ganhou. Rendo-me.
Ele foi até ela, querendo aliviar a dor que via nas linhas de seu rosto. A fadiga. Na penumbra do bar, não foi capaz de ver o quanto parecia cansada, mas agora o fazia. Tinha círculos escuros debaixo dos olhos e estavam vermelhos, como se ela não tivesse dormido há dias.
Zach sabia como ela se sentia. Ele nem sequer podia recordar a última vez que tinha dormido. Esteve muito ocupado procurando Lexi desde aquela aterrorizante chamada telefônica.
Antes que pudesse tocá-la, ela se afastou e deu um grande passo para trás, batendo em seu carro.
— Pegue o quiser trazer com você e o porei em meu carro. — disse ele.
— Não. Eu conduzirei.
Zach não ia lutar com ela. Agora eles eram uma equipe — ou ao menos seriam quando ficasse a sós com Lexi e explicasse tudo. Certamente ela não se negaria a ele. Necessitava muito dela inclusive para considerar essa possibilidade.
— Seu carro parece preste a se despedaçar.
Ela baixou a cabeça e olhou fixamente para o asfalto rachado.
— É minha casa. — sussurrou ela.
Zach olhou para dentro da janela escura e viu um travesseiro e lençóis. Aninhado na janela de trás estava um esfarrapado urso de pelúcia ao qual faltava um olho. Grudadas na parte de trás do assento do passageiro havia meia dúzia de fotos de uma mulher que Zach supôs ser sua mãe. Lexi estava em alguma delas, jovem e sorridente. Sua mãe não estava sorrindo em nenhuma das fotos.
Ela havia dito isso literalmente. Vivia em seu carro.
O coração de Zach se partiu. Há quanto tempo estava vivendo dessa maneira? E quanto disso era sua culpa por não tê-la encontrado antes?
Não havia lugar para que ela se afastasse dele agora com o carro a suas costas. Ele poderia tê-la abraçado e dado consolo, mas se preocupou que isto só ferisse seu orgulho. Assim, fingiu que não se importava e disse:
— Tudo bem. Você conduz. Eu irei com você.
Seu coração disparou e lhe dedicou um cético cenho franzido.
— Fará isso?
Zach deu de ombros.
— Claro. Não me importo. Não me matará deixar meu carro aqui por uma noite.
O carro de Lexi não quis dar a partida. Usou cada truque que conhecia e nenhum funcionou. Doze anos e quase duzentas mil milhas[2] e aquela era a primeira vez que seu confiável Honda tinha falhado quando mais precisava dele.
Talvez a coisa soubesse que estava planejando explodi-lo.
Lexi apertou a palma da mão contra o volante e deixou escapar um grunhido frustrado.
— Tudo bem, carinho. — disse Zach, sua profunda voz constante e calma. Estendeu a mão sobre o assento do copiloto e apertou seu ombro, acariciando-a com quentes e suaves círculos sobre sua nua pele. — Procurarei alguém que o reboque de volta a casa. Tenho um amigo que sabe como arrumar toda maldita coisa. Você o terá em pé e ronronando outra vez em pouco tempo. Você vai ver.
Ele estava tentando fazê-la se sentir melhor. Por que estava sendo tão amável quando ela estava planejando matá-lo eventualmente? Isso não tinha nenhum sentido e fazia Lexi querer gritar.
— Não deixarei meu carro. — teimou ela.
— Ele ficará bem. Não se preocupe.
Lexi tinha muito C-4 no carro para não se preocupar. Repetiu, desta vez mais enfática.
— Não vou deixar meu carro.
— Bem, não está se movendo e eu não vou deixar você dormir nele. Não é seguro.
Girou a cabeça de repente e o fulminou com os olhos, agradecendo uma razão para estar zangada — para expressar um pouco de sua frustração e medo para ele.
— Não vai me dizer o que tenho que fazer. Dormirei em meu carro se me der vontade e não há nada que possa fazer para me deter.
Zach deixou escapar um resignado suspiro e assentiu mais uma vez.
— Posso ver que não vai facilitar as coisas, certo?
Lexi o fulminou com os olhos.
— Certo, tudo bem. Façamos da sua maneira. Não posso dizer exatamente que esteja surpreso.
Ele saiu do carro e foi direto para um pequeno carro escuro estacionado a poucos metros deles.
Quando estava a uns três metros, Lexi começou a inquietar-se. Sentia-se agitada e nervosa. Queria sair dali e ir atrás dele, embora não tivesse ideia do por quê. Talvez fosse seu senso de dever que a instigava — se ela não fosse com ele, não poderia conduzi-la ao complexo dos Sentinelas. Nunca encontraria Helen para resgatá-la.
No momento em que ele ficou a uns seis metros de distância, ela sentiu como se seu interior estivesse coberto de picadas de mosquitos e estava sendo difícil respirar. Coçava em todos os lugares, mas não podia imaginar onde coçar para fazer parar. Seus olhos continuaram seguindo Zach e suas longas e poderosa passadas.
Tinha que segui-lo. Manter-se perto.
Aos nove metros, Lexi parou de se preocupar sobre por que precisava ir até ele e simplesmente foi. Saltou para fora do carro e pegou sua mala no piso do assento de trás. Cada passo que dava para ele afastava com facilidade um pouco do desassossego que ardia em seu interior.
Olhou para o bracelete de ouro que resplandecia sobre seu pulso e franziu o cenho. Ele tinha feito outra vez. Tinha marcado-a, só que desta vez, não havia como cobrir com uma tatuagem para mascarar seu poder, da maneira que sua mãe sempre a ensinou a fazer.
Lexi tentou tirar a coisa, mas não conseguia abri-lo — como se tivesse sido soldado. Puxou-o, mas tudo o que conseguiu foi arranhar a pele. Maldição!
Zach esperava em seu carro, sustentando a porta de passageiros aberta para ela. Ele sabia que isso aconteceria. Podia ver a satisfação brilhando em seus olhos.
— Fez algo comigo, não é mesmo? — exigiu ela.
— Não me deu outra opção.
— Podia ter parado de me perseguir.
Seus dedos fortes tiraram a mala da mão dela e a colocou no piso da caminhonete. Quando ele se inclinou mais, ela captou o aroma de sua pele, quente pelo ar noturno. Tinha um cheiro picante e completamente delicioso. Sua cabeça deu voltas e ela resistiu ao impulso de segurar em seus enormes ombros para estabilizar-se.
— Não. Não podia fazer isso. — disse ele.
— Mentiroso. — disparou ela de volta.
Isso foi um grande erro.
Zach se virou e pegou-a pela cintura. Elevou-a sobre o assento alto e não a deixou sair. Ele manteve seu domínio sobre ela, suas enormes mãos quase envolvendo sua cintura. Seus dedos curvados em sua pele e seus olhos verdes brilhando com raiva e algo que ela não podia nomear. Algo sombrio e desesperado.
— Preciso de você, Lexi. E não estou querendo dizer no sentido de precisar de você para não ficar sozinho ou alguma merda como essa. Preciso de você para viver. Preciso que me ajude a manter o restante de minha gente com vida. Estou ficando sem tempo, e você é a única que pode me salvar de converter-me em um monstro. Não vou dar nenhuma chance para você se afastar de novo, mesmo que isso signifique encadear você a mim.
Caramba. Certo. Não estava preparada para aquele tipo de confissão. Nem estava preparada para a maneira que a fazia sentir-se… Importante. Necessária. Não tinha família e poucos amigos, e sempre se assegurou de desaparecer sem que ninguém notasse realmente. Talvez estivesse equivocada.
Então, outra vez, talvez aquela fosse a forma que os Sentinelas pegavam suas vítimas, dizendo a elas o que queriam ouvir.
Lexi endireitou a coluna e reforçou sua resolução de permanecer imune aos seus encantos. Levantou o pulso e a dourada conexão brilhou sob a luz de segurança.
— Já me encadeou.
Sua boca se elevou em um leve sorriso cheio de desejo explícito.
— Nem de perto tão estreitamente como quero fazê-lo. Estou tentando dar tempo para você se acostumar à ideia, mas que fique bem claro. Planejo fazê-la minha. Planejo amarrá-la a mim tão perto quanto uma mulher pode estar. Não estou brincando e não aceitarei um “não” como resposta.
— Escravidão. Mamãe tinha razão sobre vocês. Escravizam humanas e as obrigam a fazer sua vontade.
Ele deu uma risada rouca.
— Dificilmente. Você esteve escutando muitas histórias na hora de dormir.
— Sei o que é, Zach. Não pode me enganar.
Ele deslizou as mãos ao longo de sua coluna e se inclinou mais perto. Rodeou-a com seu calor e sua força, e pela primeira vez em muito tempo, ela se sentiu a salvo. E totalmente confusa.
Sua boca estava nivelada com a dela e ela não pôde deixar de notar o quanto parecia suave. Aquela louca parte sua, a que ele já devia ter feito uma lavagem cerebral, queria que a beijasse. A parte sã estava gritando que fugisse antes que fosse muito tarde.
— O que pensa que sou, carinho? — perguntou a ela.
— Um assassino.
Que a fazia sentir-se a salvo, embora soubesse que isso era apenas um truque.
— Isso é bastante correto. — admitiu. — Mas tento ser seletivo sobre as coisas que mato.
— Está me dizendo que só mata humanos maus?
— Nunca. Nunca feriria de propósito um humano, Lexi. Não enquanto permanecer sendo eu mesmo.
Ela não tinha certeza do que ele queria dizer com isso, e estava muito distraída pela sensação de seus dedos quentes acariciando sua nuca para imaginar. Cada vez que a tocava, era tão bom. Se não tomasse cuidado, ia perder-se. Esquecer sua missão.
Tinha que levar seu carro para o complexo onde ele vivia. Não se atrevia a pegar os explosivos de seu carro por medo que ele imaginasse o que eram e arruinasse seus planos.
— Permanecer sendo você mesmo? O quê, você é como Jekyll e Hyde[3] ou algo assim?
Ele ficou olhando para sua boca e lambeu os lábios. Tinha certeza que estava pensando em beijá-la. E Deus a ajudasse, agora ela também estava pensando nisso.
— Algo parecido com isso. — disse ele. — É hora de ir. Não é seguro ficar aqui fora em plena vista. Sinto como se estivessem nos observando.
Os Defensores. Quase tinha se esquecido deles. Provavelmente estavam vigiando-os agora, certificando-se que ela havia dito o previsto. Certificando-se que não teriam que matá-la também. Eles a advertiram sobre o que aconteceria se ela se virasse contra eles… Se os Sentinelas também lavassem seu cérebro.
— Aonde vamos? — perguntou ela.
— Para um lugar seguro. Onde possamos ficar a sós.
A sós com Zach. A sós com sua beijável boca e seu corpo sexy. A sós com sua causal força e mentiras tentadoras.
Lexi estava bem fodida.
Jake Morrow observou Lexi afastar-se com o Sentinela, deixando seu carro e todos os explosivos cuidadosamente preparados para trás. Seu pai não ia ficar feliz.
Jake se retesou enquanto esperava o explosivo temperamento de seu pai. Depois de quase trinta anos de vigilância, aprendendo quando se esquivar dos golpes, Jake sabia que este não demoraria a chegar.
Héctor Morrow contemplou os homens reunidos na pequena casa do outro lado da rua do bar onde Lexi estava trabalhando. Suas sobrancelhas grisalhas se uniram e Jake se conteve antes que desse um involuntário passo para trás. Desde que sua irmã, Mindy, foi assassinada pelos Sentinelas, seu pai tinha sido um filho da puta, mas Jake já não era o menino que permitia ser golpeado pelo capricho de seu pai. Era um homem adulto e sabia como devolver o golpe. Com força.
Os homens moveram-se incomodamente sob o duro cenho de Héctor. A maioria deles eram jovens e ambiciosos, os filhos de homens que tinham sido membros dos Defensores da Humanidade durante anos.
— Qual de vocês era responsável por manter o carro dela em funcionamento? — perguntou Héctor em um seco tom de sargento.
Os homens olharam uns aos outros, sem que nenhum falasse.
Jake deu um passo para frente.
— Troquei seu óleo há dois dias. Se algo saiu errado, não é minha culpa se não pegou.
A pele de Héctor se obscureceu com fúria, e Jake ergueu o corpo em toda sua altura — cinco centímetros mais alto que o homem que o havia fecundado. Cinco centímetros mais alto e uns bons dois quilogramas de músculo mais pesado. Jake estava muito seguro de que a seu pai não tinha escapado essa notícia.
— Todo nosso plano foi para o inferno porque não pôde manter em funcionamento um carro sujo?
Jake cruzou os braços sobre seu peito amplo.
— Lexi é inteligente. Encontrará uma maneira de entrar em contato conosco. Corrigiremos isso.
— Acredita realmente que ela é inteligente? É tão tolo assim, filho?
— Aparentemente sim. Acho que teremos que esperar algum tempo para ver quem é o idiota, não?
Héctor esfregou a cabeça raspada. Os cabelos grisalhos e fortes estavam cortados com tal precisão que poderiam ter sido calibrados com laser.
— Esta era nossa única chance de localizar o complexo dos Sentinelas. Se você a houver estragado, pagará indo ao inferno.
A história da vida de Jake. A estas alturas já estava acostumado a pagar pelas consequências de suas ações.
— Lexi encontrará uma maneira de entrar em contato conosco e nos informará aonde ele a leva.
— Melhor pedir a Deus que isso seja verdade, filho. De outra maneira, vou encontrar outro segundo em comando. Nunca estivemos tão perto de fazer aqueles bastados pagarem pelo que fizeram a sua irmã. Não tolerarei falhas.
— Quero vingança tanto quanto você. Não vamos falhar.
Jake tinha certeza que Lexi ia se encarregar disso. Ela odiava os Sentinelas tanto quanto eles, embora por diferentes razões que as colheitas arruinadas e a terra envenenada que eles deixavam em seu rastro. Os Sentinelas mataram sua mãe do mesmo modo que mataram Mindy — enviando seus mascotes para despedaçá-las.
Pensar na morte de sua irmã mais velha ainda tinha o poder de mantê-lo acordado à noite. Tinha apenas cinco anos, mas ainda recordava de olhar através das frestas da porta do armário do dormitório onde ela o escondeu para mantê-lo a salvo. Ela segurava o rifle que tinha recebido no natal em suas mãos, mantendo-o estável. Tinha esperado até o último segundo para disparar, sabendo que um disparo a queima-roupa era a melhor chance que tinha de derrubar o enorme monstro. Mas aquele cuidado não fez nada contra o enorme monstro de presas que a destroçou. Se Héctor não tivesse entrado com mais poder de fogo, Jake teria sido o seguinte.
Jake sabia que seu pai o culpava pela morte de sua irmã tanto quanto ele condenava os Sentinelas por enviar a criatura que a matou. E ia fazer justamente isso. Jake era o único que ficava brincando no pátio de fora depois que anoitecia mesmo sendo consciente do que isso significava.
Ele era o culpado por aquele monstro tê-los encontrado.
— Não, não vamos falhar, — disse Héctor — mas você talvez sim. Não pense que darei a você qualquer chance de vadiar só porque é meu filho.
Uma afiada faixa de dor apertou-se ao redor do coração de Jake, apesar do fato dele já saber que isso não era bom.
— Não, Papai. Esse pensamento nem sequer passou por minha cabeça.
Joseph Rayd olhou em torno de sua escrivaninha para os homens em quem mais confiava.
Eles não iam gostar do que ele tinha que lhes dizer. Mas, de novo, aquela era a bela história de suas vidas durante aqueles dias.
Como os únicos Theronai vinculados próximos, Angus, Drake e Paul eram os homens mais estáveis no grupo. A dor deles tinha acabado, e confiava neles para pensar corretamente e certificar-se que ele não corresse nenhum risco desnecessário. Os três tinham muito a perder para permitir que Joseph fizesse algo estúpido. Os outros não tinham tanta sorte. Nicholas Brand estava aguentando muito bem. Tinha passado por algumas lutas asquerosas, o que podiam testemunhar as múltiplas cicatrizes que cruzavam seu rosto. Mas mesmo assim, parecia estar mantendo-se inteiro. Talvez fosse os quebra-cabeças de todos aqueles artefatos tecnológicos que adorava o que o ajudava a bloquear a dor.
Iain Terra era outra história completamente diferente. Joseph não tinha nenhuma pista do que havia por trás daqueles olhos escuros, mas sabia que cada vez que precisou dele, Iain esteve lá, espada na mão. O homem era mais que letal. Fazia assassinar parecer bonito — algum tipo de arte exótica. Quando sua marca de vida ficasse estéril, todos eles estariam em apuros. Necessitavam muito dele para perdê-lo.
E, depois, ali estava Tynan — um Sanguinar. Como todos os membros de sua raça, era belamente constituído. Alto e magro, com olhos frios que Joseph tinha o cuidado de não olhar durante muito tempo. Apenas por precaução. Joseph não confiava em Tynan como fazia com os outros na sala, mas estava confiante que ele manteria sua verdadeira forma.
Tynan olhava por si mesmo, e por causa disso — porque todos eles estavam em perigo — Joseph precisava dele a bordo.
— Vai levar muito tempo? — perguntou Drake. — Tenho que voltar para Helen.
— Como ela está? — perguntou Joseph.
— Exausta. Ela e Gilda estiveram trabalhando na reparação do muro durante quase uma semana até agora e estão perdendo o ímpeto.
— Isso é verdade. — disse Angus, o marido de Gilda. — Terminamos apenas a metade da seção destroçada e o progresso se torna mais lento a cada dia. As mulheres não conseguem recuperar as forças rápido o bastante para manter a marcha desta maneira.
— E Andra? — perguntou Joseph, olhando para Paul.
Paul sacudiu a cabeça. Parecia que ele tinha passado as mãos por seus cabelos, fazendo uma bagunça.
— Andra é fantástica se você quiser explodir algo, mas não é boa unindo de novo as coisas. Ainda é nova com seus poderes, e embora tenha tentando, todo esse trabalho de reparação só faz frustrá-la e deixá-la exausta.
— Tudo bem. — disse Joseph. — Tire-a do muro. Ponha ela para vigiar o perímetro com os homens. Se algo vier para nós antes que o muro esteja levantado, poderá explodir tudo o que ela quiser.
— Obrigado. Isso ajudará. Dessa maneira talvez seja capaz de passar mais tempo com Nika.
Nika era a irmã mais nova de Andra. Durante um ataque quando era criança, a consciência de Nika foi fragmentada e posta nas mentes de dúzias de sgath, criaturas que os Synestryn utilizavam para caçar suas presas. Nenhum dos Sanguinar tinha visto nada igual a isso antes e não sabiam como curá-la. O que sabiam era que ela era capaz de salvar a vida de um de seus homens. Só que não tinham adivinhado qual. Todos os homens livres dali tinham ido para o lado de sua cama e procurado um sinal de que talvez ela fosse compatível com eles. Nenhum tinha visto ou sentido nada. Joseph olhou para Tynan, que era um dos curadores mais talentosos que tinham.
— Como está Nika?
— Ainda não recuperou a consciência. — disse Tynan. — Mas já não parece estar debilitando-se. Se encontrarmos seu Theronai, é possível que ele ajude sua mente a sarar o suficiente para que possa despertar.
Se o encontrassem. Até agora, não tinham tido sorte. Ele rogava que um dos Theronai de fora daquelas paredes pudesse salvá-la. Necessitavam desesperadamente que ela deixasse de dormir.
— Estamos procurando. — disse Joseph. — Mandei avisar que ela está aqui à todos os homens. É só uma questão de tempo antes que os Theronai comecem a aparecer em massa.
—Diga a eles que se apressem — disse Tynan. — Não sei quanto tempo mais poderei manter seu corpo vivo com sua mente em seu atual estado.
Joseph não gostava da ideia de um bando de homens estranhos entrando em massa no quarto de Nika, mas se essa era a forma que tinham para salvá-la, então o fariam. Ele ainda tinha homens em campo que não puderam voltar ainda para ver se Nika podia salvar algum deles. Queria que eles tivessem primeiro sua chance antes que começassem a chegar Theronai de outros países. Se nenhum deles fosse compatível, então enviaria o aviso além dos mares para as fortalezas dali.
— Grace esteve nos ajudando a vigiá-la e está fazendo um grande trabalho. — disse Paul.
— Enquanto isso, — disse Joseph — tendo em conta a advertência de Tynan, darei ordens a todos os Theronai que rastreiem os sgath e os matem. Se parte de sua mente está nos sgath, matá-los pode ajudar a libertá-la.
— Madoc esteve fazendo isso durante dias até agora e parece estar ajudando. — disse Tynan. — O tempo o dirá.
Joseph queria fazer mais perguntas. Queria ir até Nika para ver se ela poderia salvá-lo, mas não se atrevia. Ele era o líder dos Theronai. Suas necessidades vinham por último, depois das de todos os seus homens. Prometeu a si mesmo que antes de chamar os líderes do além-mar, iria a ela.
— E os que foram feridos no ataque? — perguntou Joseph, esperando distrair-se com o trabalho.
Os olhos de Tynan se iluminaram com um gélido brilho durante um rápido segundo — tão breve que Joseph não tinha certeza de tê-lo visto.
— Cain ainda está inconsciente. Logan, Alexander e eu estamos fazendo tudo o que podemos, mas não estamos otimistas. Há alguns humanos feridos, todos se recuperarão. Mas perdemos dois. Rosemary e Dylan morreram protegendo seu filho.
O peso daquela perda pesava com força no coração de Joseph. Acreditava-se que Dabyr era um lugar seguro e de refúgio. Tinha prometido a todos aqueles humanos que estariam a salvo ali.
Equivocou-se, o que o fazia se perguntar em que mais estaria se equivocando. Quantos outros erros teria cometido? E quantos desses erros iriam significar o sofrimento e a morte daqueles que ele tinha nascido para proteger?
— Se necessitar de algo, faça-me saber. — disse Joseph.
Tynan lhe deu um formal assentimento de cabeça.
— É óbvio.
— Agora, sobre o porquê reuni todos vocês aqui. Não são boas notícias.
Drake revirou os olhos e bufou.
— Quando são?
Joseph odiava pronunciar as palavras, mas não tinha escolha.
— Todos nós acreditamos que nossos muros eram seguros, que os Synestryn não poderiam acessá-los a menos que viessem pela ponte na frente. Obviamente, estávamos equivocados.
Os homens se moveram incômodos. Exceto Iain, que se sentava imóvel, seu rosto sem expressão.
Joseph sabia que todos eles estavam pensando o mesmo. Não havia como manter os humanos a salvo ali se aquelas paredes não resistissem. Não havia suficientes deles para deixar de guarda e ainda guerrear. Se os muros caíssem, não teriam como manter o juramento — proteger os humanos, ou matar os Synestryn e proteger a porta.
— A boa notícia é que o muro não caiu por ser fraco ou porque a magia que o impregna falhou.
— Então por quê? — perguntou Drake.
Um amargo sabor flutuou na boca de Joseph.
— Alguém dentro de Dabyr os deixou entrar. Sabotaram as pedras protetoras e criaram uma abertura.
Um espesso e sufocante silêncio encheu a sala. Joseph tinha levado quatro horas para digerir as notícias que Nicholas lhe deu. Imaginou que devia aos seus homens ao menos alguns segundos.
— Quem? — perguntou Iain, enfatizando a pergunta com o som sibilante de aço contra aço quando tirou sua espada.
Joseph levantou uma mão retendo-o.
— Acalme-se, Iain. Não sabemos. Ainda.
— Como descobriu? — perguntou Angus.
As linhas de seu rosto se aprofundaram com temor. Ele tinha mais a perder que todos eles – ambas, uma esposa e uma filha. A única criança Theronai que lhes deixaram.
Joseph olhou para Nicholas e lhe deu um leve assentimento.
Nicholas levantou-se graciosamente.
— Revisei o vídeo de vigilância do ataque. A brecha aconteceu em um ponto coberto por duas câmaras. Ambas tinham sido desabilitadas.
— Tem certeza que não foi algum tipo de problema técnico? — perguntou Paul.
— Sim. Voltei através do vídeo ao ponto onde as câmaras deixaram de funcionar. Foram desativadas uma a uma. Quem quer que tenha feito isso teria sido visível para alguma das câmaras ocultas, mas sabiam o bastante sobre a nossa segurança para manter o rosto afastado.
— Quem era? — perguntou Iain em uma voz tranquila.
— Não posso lhe dizer isso. Era um homem que vestia uma camisa de trabalho com capuz. Consegui captar algumas imagens da parte de atrás de sua cabeça.
— Mostre-me. — disse isso Ian.
Nicholas lançou um olhar nervoso para Joseph. A espada de Iain ainda estava desembainhada, brilhando com letal intenção.
— Baixe a espada, Iain. — ordenou Joseph.
— Vou matá-lo. — disse Ian.
Sua voz mais fria e tranquila, igual aos seus olhos escuros.
— Ninguém vai matar ninguém até que tenhamos certeza quem é e os interroguemos. Agora, baixe a espada.
Iain embainhou sua espada.
Nicholas abriu seu notebook e digitou alguns comandos.
Girou o aparelho virando-o de modo que o restante da sala pudesse ver as imagens captadas pelo vídeo.
A imagem era clara, mas não havia muito sobre o que ir — só alguns flashes da parte de atrás da cabeça encapuzada de um homem. Um vislumbre de uma mão enluvada.
— Alguém o reconhece? — perguntou Nicholas.
Ninguém falou.
— Tem certeza que é alguém que vive aqui? — Perguntou Paul. — Poderia ter sido um intruso?
Nicholas sacudiu a cabeça.
— É possível, mas verifiquei todos que entraram pela porta da frente durante os dez dias me encaminhando para o ataque e não se encaixa com nenhuma das pessoas que vieram.
— Poderia ser um humano. — disse Iain.
— Talvez. É difícil dizer só por sua constituição embaixo da folgada camiseta de trabalho, mas poderia ter se disfarçado, fazendo-se parecer maior de modo que pensássemos que era um dos nossos.
Tynan tinha ficado em silêncio até então, mas Joseph viu o leve cenho danificando seu sobrecenho.
— No que está pensando, Tynan? — perguntou Joseph.
— Posso averiguar se algum dos humanos sabe a respeito disto. Tudo o que tenho que fazer é alimentar-me deles e procurar em suas lembranças.
— Isso talvez pareça suspeito. — disse Nicholas.
— Não agora. Não quando há tantos feridos ainda precisando de assistência. Inteire-os de uma chamada por sangue, e isso ajudará a mascarar nossa verdadeira tarefa.
— Não quero que ninguém mais nos ajude com isto. Não quero que ninguém fora desta sala saiba o que está acontecendo.
A boca de Tynan se estreitou.
— Então sugiro a vocês que não deixem que nenhum dos outros Sanguinar os cure. Se necessitarem, basta me chamar, ou os outros descobrirão o que está tentando esconder.
Joseph não gostava disso nem um pouco. Nem tampouco nenhum de seus homens, a julgar por seus olhares de desgosto.
— Não temos privacidade com esses chupa sangues por perto. — disse Iain.
— Mas as dúzias de câmaras e fechaduras eletrônicas que rastreiam nossas idas e vindas são agradáveis? — perguntou Tynan.
— Essas não fodem nossas cabeças. — disse Nicholas.
Tynan levantou as mãos. Seus dedos eram longos e elegantes, como se tivesse nascido para ser um artista ou cirurgião.
— Tudo o que quero dizer é que um segredo como esse não permanecerá oculto por muito tempo. Não em um lugar como este. Temos que descobrir quem é esse homem rapidamente ou ele irá embora antes que possamos fazer isso. Caso já não tenha feito isso.
— Concordo. — disse Joseph. — Nicholas, quero que recolha tudo o que puder desse cara.
— Já fiz isso. Também estou trabalhando em um programa que tentará identificá-lo baseando-se em suas aparições comparando seus movimentos neste vídeo com imagens atuais que as câmeras tenham recolhido.
— Pode fazer isso? — perguntou Angus.
— Claro. Não é cem por cento, mas ajudará a reduzir o número de pessoas que possivelmente não poderiam ser nosso cara. Imagino que se eu puder reduzir nossa lista para duas dúzias de prováveis, tornará as coisas muito mais fáceis.
— Bem. — disse Joseph. — Enquanto isso, quero que mantenham seus olhos e ouvidos abertos e suas bocas fechadas. Angus, Paul e Drake, tentem esconder isto das mulheres, se puderem. Elas têm bastante em seus pratos nesse momento sem ter que se preocupar com isso também.
Os três Theronai vinculados assentiram concordando.
— E quando o encontrarmos, — disse Iain em um frio tom sem emoção — todos vocês poderão se divertir com ele e lhe fazer as perguntas que quiserem, mas quando tiverem feito isso, ele é meu para matá-lo.
Zach não levou Lexi para o complexo como ela tinha esperado. Em vez disso, jogou-se no caminho de uma modesta granja ao norte da fronteira entre o Texas e Oklahoma, bem afastado do caminho conhecido.
— O que estamos fazendo aqui? — perguntou, olhando para a casa.
O interior estava escuro, mas a luz da varanda da frente queimava brilhando como que dando boas-vindas. Não havia como aquilo ser grande o suficiente para ser o complexo que ela e os Defensores estavam atrás.
Supunha-se que haveria dúzias daqueles caras vigiando os arredores.
— Esta é uma de nossas casas Gerai. Aqui estamos a salvo assim poderemos descansar um pouco. — disse Zach. — Não sei você, mas eu estou moído.
Estava cansada, mas só porque trabalhou todos os momentos disponíveis durante a última semana. Sabia que depois de sua ligação telefônica para Zach, não teria muito tempo, e precisava de bastante dinheiro para manter a ela e a Helen a salvo quando estivessem livres.
— Posso revezar dirigindo. Apenas me diga para onde ir.
Zach lhe lançou um olhar de suspeita.
— Quer minhas chaves de modo que possa fugir outra vez?
Ela levantou o bracelete e o moveu ante ele.
— Como posso fugir quando uso esta coisa?
— Não sei, mas se alguém pode encontrar uma maneira, essa é você. Não duvido que roa sua própria mão se isso fosse tudo o que lhe custaria.
— Não confia em mim, não é mesmo?
— Infernos, não. Passei muitas semanas caçando você para cometer o mesmo engano duas vezes. Mas caso encontre uma maneira, quero que tenha isto. — tirou a carteira do bolso de trás e entregou um maço grosso de notas.
Notas de cem dólares.
Lexi contemplou o dinheiro, olhando-o fixamente. Ali devia ter aproximadamente dois mil dólares. Que demônios?
— Se você for embora de novo — se algo me acontecer — não quero que tenha que pegar um trabalho em um lugar sórdido como aquele. Aposto que homens como aqueles tomam muitas liberdades com seu traseiro e, simplesmente, não posso suportar isso.
Não sabia o que dizer. Nunca tinha tido tanto dinheiro em toda sua vida.
— Não posso aceitar. — conseguiu finalmente balbuciar.
Estendeu o dinheiro para ele.
Zach pegou-o, dobrou-o no meio e o colocou no bolso da frente de seu avental.
— Talvez necessite dele. Eu não. Basta considerá-lo como pagamento por toda gasolina que fiz você queimar para se afastar de mim.
Antes que pudesse encontrar uma resposta para isso, ele saiu do veículo e pegou sua maleta da parte de trás. Lexi o observou colocar as chaves profundamente no bolso da frente da calça. Queria saber onde estavam para o caso de ter que sair daquela confusão. Não que isso fosse provável. A menos que houvesse uma tesoura mecânica ou cortador de arame naquela casa. O ouro era tão fino que talvez pudesse conseguir até mesmo uma tesoura robusta em algum lugar.
E mesmo que ela conseguisse se libertar, e depois? Esta era sua chance de salvar Helen — para derrubar um punhado de maníacos perigosos antes que pudessem sequestrar alguém mais. Ela não fugiria. Não podia deixar Helen se virar sozinha.
Zach abriu a porta para ela e ofereceu uma mão para que descesse. Tinha mãos encantadoras. Mãos fortes e grandes, ásperas apenas o bastante para tornar sua pele mais sensível quando a tocava.
Quando. Não se. Esteve com ele por três horas completas e já tinha perdido isso. A este passo, estaria beijando seu traseiro ao amanhecer.
O que não parecia uma coisa completamente ruim. Se seu traseiro fosse tão agradável sob o jeans como parecia, realmente poderia desfrutar disso.
Lexi respirou profundamente, procurando sua resolução — sua maldita prudência. Não podia deixar que ele a conseguisse, não importa o quanto a tentasse sua ereção.
Não podia deixar que ele a abraçasse nunca mais. Não podia deixar que a tocasse. Não podia deixá-lo fazer coisas que ela sabia que não eram reais.
Helen era real. O perigo era real. O restante daquilo — as emaranhadas sensações que tinha quando ele a tocava — era apenas fingimento. Um truque da mente.
Ignorou a mão que ele lhe oferecia e saltou da caminhonete, aterrissando sobre os dedos dos pés. Ele nem sequer piscou. Em vez disso, deu um sorriso conhecedor para ela.
— Eu estou conseguindo, carinho? Talvez arranhando a veia de sua independência?
— Não sabe nada ao meu respeito. Não finja que sabe.
Ele a seguiu até a porta, alcançando a luz da varanda e tirando uma pequena caixa magnética que continha uma chave.
— Conheço você abundantemente. Helen me disse tudo a seu respeito.
— Helen não me conhece tão bem. Só a conheço há poucos meses.
— Não diria isso pela forma que fala. Juro que age como se tivessem crescido juntas.
Zach abriu a porta e olhou atentamente para dentro antes de deixar Lexi entrar.
— Ela se preocupa muito com você, sabia?
Lexi se negou a deixar ele ver o quanto isso a incomodava. Helen era quem estava em apuros, e ainda se preocupava com Lexi? Não havia uma pessoa mais carinhosa sobre a face do planeta, e se sentia honrada por ter conhecido Helen, mesmo que por um breve período de tempo como o que tiveram. Com um pouco de sorte, teriam muito tempo para chegarem a conhecer realmente uma à outra.
— Deveria ligar para ela e lhe dizer que estou chegando. Melhor ainda, deixe-me usar seu telefone e eu mesma direi.
Zach a contemplou durante um longo tempo, fazendo-a querer retorcer-se sob seus olhos claros.
— Não faça gracinhas. — ele advertiu.
— Como o quê?
— Como ligar para polícia. Não tenho tempo para lidar com eles, e juro que se fizer isso, porei você sobre meus joelhos e a açoitarei.
Lexi riu. Não pôde evitar. Ele estava louco se pensava que ela ia deixar que isso acontecesse. Ela o mataria antes.
— Poderia tentar. Mas prometo a você que não tentaria isso uma segunda vez.
— Uma coisinha pequena como você me machucar? Não posso acreditar nisso.
— Deveríamos comprovar a teoria? — desafiou-o.
Ele sorriu e picou o olho para ela.
— Talvez mais tarde. Depois que tiver comido. Tenho o pressentimento de que precisarei conservar minhas forças com você, não é verdade?
— Definitivamente.
Zach deixou a sala, acendendo as luzes enquanto se dirigia a cozinha. Lexi esperou até que ele colocou sua cabeça na geladeira antes de discar o número de Helen.
— Encontrou-a, Zach? — respondeu Helen. Sua voz vacilante de cansaço, fazendo que Lexi se perguntasse pelo que ela estava passando. — Ela está a salvo?
— Ei, olá, Helen. Sou eu, Lexi.
A exalação de alívio de Helen encheu a linha.
— Graças a Deus, você está bem. O que aconteceu?
Zach não estava prestando atenção nela, mas deveria estar escutando cada palavra que ela dizia. Realmente não podia dizer a Helen que o telefonema apavorado que havia feito na semana passada tinha sido um ardil — uma maneira de fazer Zach vir atrás dela.
E funcionou. Melhor do que esperava.
— Direi isso depois a você. — disse Lexi. — Tudo o que precisa saber agora é que estou indo para você.
— Isso é fantástico! Realmente senti saudades de você. E a Senhorita Mabel também.
— Ela também está aí?
— Sim. Os Sentinelas não puderam eliminar suas lembranças o suficiente para fazer que fosse seguro devolvê-la a sua casa, assim a trouxeram para cá. Até mesmo conseguiram curar um pouco de sua artrite assim já não precisa de um andador. Incrível, não é?
Lexi ficou muda. Tinham curado a Senhorita Mabel? Por que fariam isso? Era muito velha para brigar contra qualquer coisa que eles quisessem fazer com ela. Poderiam ter se alimentado dela, bebido todo seu sangue e deixá-la morrer em sua casa. Ninguém nem sequer saberia quem a tinha assassinado.
— Lexi? Está ainda aí?
Lexi pigarreou.
— Sim, estou aqui.
— Está bem?
— Bem. Só… Entendendo algumas coisas.
Helen baixou a voz.
— Zach está bem? Não estava suportando isso muito bem na última vez que falamos.
Lexi olhou para a cozinha. Ele estava cortando uma maçã. Olhando para ela.
Virou-se e se afastou da soleira da porta, descendo pelo corredor estreito.
— Ele está bem.
— Então deve ter razão.
— Sobre o quê?
— Ele é seu Drake.
— O quê?
— Na realidade é uma longa história, mas juro que tem um grande final. Apenas escute os seus instintos e ficará bem. Ambos ficarão.
— O que você está dizendo não tem nenhum sentido, Helen.
Ali estava de novo, por que deveria? Tinham lavado o cérebro dela.
— Talvez agora não, mas terá com um pouco de tempo. Ele é um bom homem. Merece ser feliz. Todos eles merecem.
Feliz? Claramente, a Helen que Lexi tinha conhecido se foi. Tinham a transformado completamente, lavando seu cérebro para que acreditasse no que estava dizendo. Lexi precisou de cada grama de força para não deixar que as lágrimas caíssem de seus olhos. Era muito tarde para ela. Mesmo que tirasse Helen dali, não tinha certeza de poder salvá-la.
Os Defensores a advertiram que isso poderia acontecer, mas até agora, Lexi não tinha querido acreditar nisso.
— Se houver alguma coisa aí da qual não possa se separar, empacote-a e fique preparada para partir. — disse Lexi. Sua voz embargada, mas reprimiu as lágrimas. — Faça a Senhorita Mabel fazer o mesmo. — não tinha ideia de como ia libertar as duas, mas tinha que tentar. Não podia deixar a Senhorita Mabel para trás.
— O quê? Por quê?
— Agora não posso falar. Contarei tudo a você quando estiver aí. — encarregar-se-ia de pensar como conseguir afastar Helen de seu raptor o tempo suficiente para falar em particular.
— Não sei do que está falando, mas não vou deixar Drake. Eu o amo.
Lexi já estava preparada para sua resistência. Sabia que não seria fácil tirar Helen de seus raptores.
— Não faria isso a você. — mentiu Lexi. — Não se preocupe.
— O que está maquinando? — perguntou Helen. — Sei que está planejando algo. Posso ouvir as engrenagens de sua cabeça girar daqui.
— Não estou planejando nada. — outra mentira, mas uma necessária. — Esqueça o que eu disse.
— Sei que não confia nestes caras, mas verá quando chegar aqui o quanto está equivocada. Não são os monstros que você pensa. Juro. Eu estava equivocada a respeito de minha visão. A respeito de Drake. Nunca ficou lá de pé me observando morrer.
É óbvio que isso era o que ela diria. Provavelmente tinham enganado Helen para que acreditasse que sua visão de morte não era real. Eles a fizeram acreditar nisto, como a fizeram acreditar que a Senhorita Mabel estava viva e bem quando provavelmente estava morta, estendida sobre o chão de sua casa, no Kansas.
— Tenho certeza que você está bem. — disse Lexi, só para apaziguar Helen. — Eu tenho muito a aprender.
— Não se preocupe. Drake é um grande professor. Tenho certeza que Zach também será.
Só por cima do cadáver de Lexi.
Sentiu o olhar de Zach deslizando sobre ela um momento antes que o calor de seu corpo penetrasse em sua pele. Não tinha ouvido ele se aproximar, mas estava bem atrás dela, quase a tocando.
Durante quanto tempo? O que tinha ouvido?
— Tenho que ir, Helen. Verei você logo. — Lexi desligou o telefone e o devolveu.
Ele estava perto. Muito perto. E parecia zangado.
— Vai vê-la, Lexi? — perguntou a ela. — Ou está planejando fazer algo mais?
— Acho que isso depende de você.
— O que é que isso quer disser?
— Quer dizer que se você me deixa viver o tempo suficiente, então sim, vou ver Helen.
— Se eu a deixar viver o suficiente? — Zach passou uma mão pelo rosto frustrado. — Quantas vezes tenho que dizer a você que não vou lhe fazer mal?
Ele poderia dizer isso até que o sol sitiasse e ainda não acreditaria nele.
— O que restar de mim enterre junto a minha mãe no Santo Antônio. Ela é a única família que tenho. Eu gostaria de ser enterrada ao seu lado se isso não causar muito problema.
Seu rosto se sombreou, e ela ouviu como rangia os dentes.
— Ninguém vai enterrar você em nenhum lugar. Não enquanto eu ainda respire.
— Sim. Isso também foi o que os Sentinelas disseram a minha mãe.
— Merda. — murmurou Zach. — Realmente você passou pelo inferno, não é?
Lexi não podia nem sequer se obrigar a assentir. Ele sabia a verdade. Provavelmente fez parte da tortura que sua mãe atravessou — parte da razão pela qual Lexi foi arrastada de um lugar a outro desde que podia se lembrar.
A raiva se misturou com suas feições e ele segurou o lado de seu rosto na mão. A preocupação contraindo sua testa morena e um brilho iluminando seus olhos claros, tornando-os brilhantes. Seu polegar roçou ligeiramente o osso de sua face, acariciando sua pele até que vibrou.
Era muito bom para ser real. Tentou lembrar-se disso, mas, custava-lhe cada grama de vontade que tinha não inclinar-se para seu toque. Não perder-se na agradável calidez de sua carícia.
Ele sussurrou:
— Sinto muito, carinho. Sei que passou por muito. Tudo o que posso dizer é que essa parte de sua vida agora acabou. Não vou deixar que ninguém volte a fazer mal a você.
Lexi deixou que a força de sua resolução a banhasse. Suas palavras eram uma promessa dada por um homem com poderes sobrenaturais. O diário de sua mãe dizia que isso queria dizer que ele tinha que manter essa promessa.
Mas de novo, talvez isso fosse apenas mais uma mentira que tinham inventado para tornar os humanos confiáveis e manejáveis.
— Isso você não sabe. — disse a ele.
Queria ter posto mais calor em suas palavras, mas elas tinham saído como um sussurro sem ar.
Ele mudou de posição, diminuindo a distância entre eles. O viciante calor de seu corpo penetrava através de suas roupas e entrava em sua pele. Sua essência de especiarias se abrigava ao seu redor, fazendo sua cabeça dar voltas. Tilintantes faíscas de energia saíam de sua mão onde segurava seu rosto. A urgência de esfregar-se contra ele para absorver mais daquela energia a estava enlouquecendo.
Não podia pensar corretamente quando ele usava aquelas armas contra ela.
Tudo em que podia pensar era no quanto ele estava perto.
Lexi lambeu os lábios secos. Os olhos de Zach seguiram esse pequeno movimento. Suas pupilas dilatadas, engoliam o verde claro até que só restou uma fina borda da cor. Parecia faminto, como o predador que era, mas Lexi não podia nem sequer se preocupar.
Seus dedos se fecharam ao redor de músculos duros, e até então, não tinha percebido que tinha se aproximado dele. Tinha segurado seus braços, agarrando seus bíceps como a um salva-vidas. Ele estava vibrando de tensão sob as pontas de seus dedos. Sentiu seus músculos avolumar-se e inchar-se e então seu braço estava rodeando seu corpo, puxando-a para perto.
Não tentou lutar com ele. Não o empurrou para afastá-lo. E não sabia por que.
Sua cabeça baixou até que seu nariz ficou a apenas poucos centímetros do dela.
A respiração de Lexi se acelerou e seu coração pulsou mais depressa. Ia beijá-la e ela ia deixar que ele fizesse isso. Deus a ajudasse, precisava que ele a beijasse. Já não lhe importava de forma alguma que aquilo fosse um truque. Desejava-o muito para se preocupar.
A mão dele deslizou por seu rosto até a parte de trás de sua cabeça. Ele a inclinou para ter um melhor ângulo. Podia sentir seu enorme corpo tremendo de necessidade. Ou talvez ela fosse a única a criar todo o tremor. Não podia ter certeza.
— Sabe que vou beijar você agora, não é verdade? — perguntou ele, sua voz profunda baixou na casa silenciosa.
Lexi não podia falar. Deu um leve assentimento de cabeça. Não só sabia, desejava isso.
Zach diminuiu a distância um centímetro em outra fração de minuto. Lexi fechou os olhos e se entregou. Ele era seu inimigo, mas isso dificilmente parecia lhe importar agora. Se fosse condenada, queria ser daquela maneira — beijando um homem que fazia seu sangue ferver e derretia seu corpo.
— Bem, está equivocada. — disse ele. — Como está equivocada em todo o resto.
Com isso, deixou-a ir e deu um passo para trás.
Lexi teve que segurar-se na parede para estabilizar-se. Sua cabeça dava voltas e o corpo doía pela perda de seu toque. Abriu os olhos bem a tempo de vê-lo fechar a porta de um quarto atrás dele. Ela deslizou para baixo pela parede até que se sentou sobre o tapete desbotado, abraçando os joelhos.
Ele não voltou a sair. Não a atacou. Não fez nada.
Só ficou atrás daquela porta trancada.
Lexi esperou em agonia. Tremia de frio e confusão. Por que não a beijou? Teria o deixado fazer isso. Demônios, teria o deixado fazer muito mais que apenas beijá-la.
E o que ele quis dizer a respeito dela estar equivocada em todo o resto?
Quando a névoa da luxúria desapareceu de sua mente, percebeu que isso era uma coisa boa. Não queria que ele a beijasse ou fizesse nada. Era o inimigo. Ela queria matá-lo.
Certo?
Lexi cobriu o rosto com as mãos e deixou escapar um gemido frustrado.
Ele havia feito isso de propósito. Estava utilizando sua diabólica magia para confundi-la. Para manipulá-la.
Essa era a maneira que os Sentinelas faziam. Eles enganavam sua presa com a cumplicidade. Utilizavam-nas e então as matavam.
O diário de sua mãe tinha sido claro nisso.
Então, por que ele tinha parado? Zach a teve onde queria. Por que se deteve ali?
Lexi se endireitou sobre suas pernas bambas. Tinha que pensar — afastar-se dele o bastante para esclarecer a cabeça. Não podia fugir porque tinha que acabar sua missão e resgatar Helen, mas podia pôr bastante espaço entre ela e Zach de modo que seu cérebro começasse a trabalhar outra vez.
Virou-se para achar algo que pudesse cortar o bracelete de seu pulso quando ouviu um profundo gemido de dor vindo de trás da porta de Zach. Este parou como se tivesse sido cortado de repente; então houve um barulho surdo como o de algo pesado caindo no chão. Talvez um homem de mais de noventa quilos?
E se ele estivesse ferido?
Lexi estava estendendo a mão para a maçaneta da porta antes que percebesse que provavelmente aquilo era outro truque. Assombrá-la, então fazer que ela fosse correndo para ele.
Isso não ia funcionar. Não ia cair em uma armadilha assim.
Sua mãe a ensinou bem, e era hora de Lexi começar a escutá-la.
Ouviu outro gemido através da porta e teve que cobrir as orelhas. De repente, sentiu os pés pesados e seu estômago se embrulhou com náuseas, mas conseguiu afastar-se de Zach sem olhar para trás.
Zach estava morrendo.
Seu corpo se arqueou sob outra onda de dor tão intensa que o cegou.
O suor empapou suas roupas e o tecido se aderiu à pele até que teve certeza que estava sangrando. Tentou arrastar-se para o banheiro, para lavar o sangue, de modo que este não pudesse atrair os Synestryn para Lexi, mas estava muito fraco.
Seus membros tremiam e até mesmo tomar outra respiração o deixou exausto.
Era tão estúpido. Nunca deveria ter se afastado dela daquela maneira. Esteve tão perto de beijá-la — tão perto de reclamá-la para si mesmo — mas algo o fez retroceder.
Ela não confiava nele. Ele queria provar que ela podia, e a única maneira que pensou que podia fazer isso era mostrando sua contenção.
Plano ruim.
E agora estava pagando o preço. Teve a chance de saborear sua doce boca e se afastou, e isto o estava matando. Literalmente.
Outra esmigalhante onda de dor caiu sobre ele e obrigou o ar a sair de seus pulmões. As lágrimas derramavam-se por seu rosto, refrescando sua pele quente. Cada músculo de seu corpo vibrava sob a força de resistir à agonia de seu excesso de poder. Enormes punhos de energia palpitavam em seu interior, exigindo que fosse até Lexi e a obrigasse a deixá-los sair. Fazer que a dor parasse. Mas era muito tarde para isso. Não podia ir até ela agora. Nem sequer podia levantar a cabeça. Tudo o que podia fazer era deitar-se ali e escutar os lamentosos sons de dor que saiam de sua garganta.
Estava bastante seguro que isso seria a última coisa que ouviria.
Lexi ficou parada na varanda da frente. Era o mais longe que podia chegar sem sentir aquela persistente coceira que o bracelete provocava quando se afastava de Zach.
Queria esclarecer a cabeça, mas tudo em que podia pensar era nos ruídos que tinha ouvido saindo de seu quarto.
Ele estava sofrendo.
Disse a si mesma que não se importava. Disse-se que ele merecia isso por todas as vidas que tinha arruinado.
Bem, você está equivocada. Como se equivoca sobre todo o resto.
O que ele quis dizer com isso? No que estava equivocada? Era só outra armadilha?
Poderia tê-la beijado. Poderia ter usado a influência maléfica de seus olhos para escravizá-la, justo ali, na sala e ela não poderia ter feito nada para detê-lo. Mas ele não fez isso.
Maldição. Era tudo muito confuso. Ele havia virado seu mundo pelo avesso, fazendo-a questionar o que tinham ensinado a ela durante toda sua vida.
Bem, havia uma maneira de descobrir se ele estava brincando com ela e o ia desmascarar.
Lexi retornou a casa, encontrou uma boa e afiada faca na cozinha, e abriu a porta de Zack de repente.
O quarto estava escuro. Acendeu a luz.
A princípio pensou que ele nunca esteve lá porque não o viu. Então, escutou um som vindo do outro lado da cama, um gorgolejo[4] como se ele estivesse se asfixiando.
Lexi se apressou em rodear a cama e o encontrou deitado sobre seu flanco, enrolado sobre si mesmo. Estava suando e tremendo, e seus olhos estavam virados como se estivesse tendo algum tipo de ataque ou algo assim.
O pânico percorreu seus membros, assumindo o controle. Deixou a faca cair e se ajoelhou ao seu lado. Suas mãos se moveram sobre os braços dele até chegar ao seu rosto. Não tinha nem ideia do que fazer para ajudá-lo, mas lembrou-se de ter escutado em algum lugar a respeito de pessoas que se asfixiaram com sua própria língua.
Moveu sua cabeça para poder ver sua boca, mas no instante em que seus dedos tocaram a face dele, o som gorgolejante parou. Inspirou com força estremecendo e seu corpo parou de tremer.
Os olhos de Zach giravam como se estivessem soltos dentro de seu crânio, mas aparentemente podia ver que ela estava ali.
— Lexi. — suspirou, com a voz rouca e áspera como se tivesse gritado durante horas.
— Estou aqui. — disse a ele, totalmente perdida.
Suas mãos tatearam seu corpo até que encontrou seus braços nus, e então a puxou para ele. Lexi não resistiu. Seja lá o que fosse que estava acontecendo com ele, parecia melhor agora, e não pensava em estragar isso por mais estúpido que parecesse.
Deixou-o mover seu corpo até que ficou deitada ao seu lado, de costas para ele. Ele se enroscou ao seu redor e a segurou com força. Alguns segundos mais tarde, sentiu a parte de baixo de sua camisa sendo puxada até que a parte baixa de suas costas ficou nua, e depois que ele subia sua própria camisa. Lexi tentou recolocar a roupa, mas ele frustrou suas tentativas e puxou-a de novo até que ficaram pele contra pele.
Sua pele estava quente e úmida, firme sobre seus músculos bem definidos, e uma corrente de energia correu por sua medula minando sua vontade de me mover-se. Era muito bom para lutar contra ele. Estava totalmente fora de seu elemento ali e não havia nada no diário de mamãe que dissesse algo sobre sentir-se assim. Era como tocar a felicidade. Uma maravilhosa satisfação.
O peito de Zack vibrou com um gemido de satisfação e soube que ele se sentia igual. Fosse o que fosse que havia entre eles, era bom. Talvez fosse apenas mais outro artifício destinado a escravizá-la, mas realmente não se importava. Estava muito entorpecida para se importar.
Daria dez minutos a ele. Depois sairia. Já estaria melhor então e poderia deixá-la encontrar sua compostura. Tinha lido o diário da mãe e lembrava-se por que devia permanecer afastada dele, por que não devia permitir que ele a tocasse.
Seriam apenas dez minutos. Tinha certeza de que essa pequena quantidade de tempo não lhe faria mal.
Nika observou Madoc através das árvores. Seu corpo poderoso estava protegido por uma pesada jaqueta de couro que não conseguia esconder o montão de músculos estupendos quando cortou o sgath que cruzou seu caminho.
Em um pequeno recanto da mente do monstro que agora ela ocupava, a tristeza e a raiva cresceram pela morte de seus irmãos. Queria investir contra Madoc e destroçar sua garganta. Queria beber seu sangue rico e fazer um banquete com sua carne até que não restassem mais que ossos.
Nika reuniu coragem e obrigou o monstro a permanecer quieto enquanto se acostumava a ela. Ignorou sua necessidade de matar e observou enquanto Madoc cortava outro sgath em dois.
Movia-se de uma forma tão bonita... Uma graça mortal e fluída que a fazia sentir-se protegida só por saber que ele estava perto. Se seu corpo humano não fosse tão fraco, teria ido até ele e dito o quanto precisava dele, lhe perguntaria por que já não ia tocar sua mão.
A boca do sgath que tinha olhado se moveu e percebeu que ele estava tentando falar com ela. Certamente, nenhuma palavra humana saiu de seu focinho, e tudo o que ela pôde fazer foi soltar um grunhido baixo.
A cabeça de Madoc se virou para ela. O sangue negro gotejava de sua espada e ele tinha que passar sobre os corpos peludos dos monstros que matou para se aproximar.
Moveu-se com cautela, seus olhos estreitando-se na escuridão do bosque. Um grunhido torceu seus traços rudes quando diminuiu a distância entre eles. Só estava a metros dela e um estremecimento percorreu o corpo emprestado de Nika.
Queria que ele a tocasse. Que a sustentasse.
Tentou dize isso a ele, mas de novo as palavras não surgiram. Como ia entra em contato com ele?
— Estou vendo você, peludo filho da puta. — disse Madoc. — Não conseguirá escapar.
Ele ia matá-la. Ou ao menos, ia matar o corpo que agora ocupava. Apesar de odiar que Madoc a atacasse, também sabia que seria mais seguro para ele se ela permanecesse na mente do sgath até que ele golpeasse, evitando que o monstro o atacasse.
Nika não podia olhar. Fechou os olhos do sgath e se congelou no lugar. A dentada da lâmina atravessando seu ombro à fez retroceder e ouviu a si mesma lançando um horrível uivo de dor. Outra quente rajada de dor atravessou seu peito, e desta vez sentiu seu coração desintegrar-se quando o sangue escorreu dele umedecendo sua pelagem.
Abriu os olhos, esperando que Madoc visse algo dela dentro do sgath, mas em vez disso, viu um pesado e enorme monstro nas árvores sobre sua cabeça. Tinha seis olhos e todos estavam cravados em Madoc, brilhando com um fogo faminto.
O sgath estava quase morto e ela saiu de sua mente antes que ele a levasse com ele.
Ao passar junto a Madoc, tentou sussurrar em seu ouvido que estava em perigo, mas não fez nenhum som. Tentou acariciar sua pele e avisá-lo, mas ele não sentiu nada. Ela era menos que ar e tão leve que estava sendo arrastada de volta ao seu destroçado corpo humano.
Não podia ajudá-lo ali. Tinha que voltar à noite e encontrar um modo de lhe dizer que estava sendo caçado.
Os verdadeiros olhos de Nika se abriram e ela viu-se em um quarto que mal reconhecia. Não estava no hospital, e sim na nova casa de Andra.
A doce mulher que esteve cuidando de seu corpo estava sentada no canto, fazendo tricô. Tinha um halo de cachos escuros e tristes olhos castanhos. Seus dedos se moviam rápidos e seguros, deixando em seu rastro um ponto após o outro.
Grace. Esse era seu nome. Grace a ajudaria.
— Madoc. — disse Nika, e sua voz era fraca e partida, quase inaudível no quarto silencioso.
Grace levantou a cabeça e seus olhos se encontraram com os de Nika. Abriram-se completamente pela surpresa, e então ela se levantou da cadeira para ir para perto de Nika, deixando seu tricô cair no tapete.
— Shh. — disse Grace. — Não tente falar ainda. Deixe-me trazer um pouco de água para você antes.
— Não há tempo. Madoc está em perigo.
Grace verteu água em um copo de plástico e aproximou a borda dos lábios de Nika.
— Tome um gole.
Nika bebeu o suficiente para que a mulher a escutasse.
— Ligue para Madoc.
— Sinto muito, minha senhora. Não sei seu número. Deixe-me ir procurar sua irmã.
Andra a tinha escutado antes. Faria isso de novo. Grace discou um número.
— Nika despertou. Quer ligar para Madoc.
Nika ouviu o zumbido tênue da voz de Andra através do plástico.
Grace olhou para Nika.
— O que quer que lhe digam?
— Que olhe para cima, para as árvores. Sobre ele.
Apesar de parecer confusa, Grace repetiu o que Nika havia dito a Andra.
— Certo, eu direi.
Desligou e se sentou na beira da cama. Seus dedos acariciaram o dorso da mão de Nika, o primeiro contato real que tinha sentido em muito tempo.
— Andra está a caminho. Está ligando para Madoc agora mesmo e não quer que você se preocupe.
Como Nika podia não se preocupar? Madoc estava sozinho lá fora. Se algo acontecesse com ele...
— Tome outro gole de água. — pediu Grace.
Seus lábios estavam secos e seu corpo estava tão fraco que mal podia engolir, mas fez o que ela disse.
— Como se sente? — perguntou Grace.
— Preciso voltar lá fora com Madoc. Ele precisa de mim. — um desenfreado sentimento de perda se apoderou dela, esmagando-a.
Não podia perdê-lo.
— Tenho certeza que ele está bem. É um guerreiro hábil e experiente.
Grace não entendia. Ninguém exceto Andra, e ela só a escutava às vezes.
— Tenho que voltar a dormir... Tenho que encontrá-lo.
—Não faça isso, por favor. — disse Grace. — Fique acordada até que Andra chegue. Deixe-a falar com você.
Os olhos de Nika pesavam. Ficar acordada era difícil. Sentia-se muito só quando não estava com ele.
A porta se abriu e Andra irrompeu, respirando com força e com o rosto corado pelo exercício.
— Nika, bebê. — ofegou. — Está acordada.
Andra atravessou o quarto e Grace se afastou.
— Falou com Madoc?
— Sim. Ele está bem.
— Disse a ele sobre o monstro da árvore?
— Ele já o tinha encontrado e, quando eu liguei, já o tinha matado.
O alívio percorreu Nika como água fresca, levando o pânico. Agarrou-se à mão de Andra.
— Obrigado.
Andra sorriu para ela quase chorando.
— Como se sente?
— Cansada. Quero estar com ele.
— Ele? — perguntou Andra
— Madoc.
— Precisa ficar aqui, bebê. Ainda não está forte o suficiente para viajar.
— Não necessitarei de meu corpo. — explicou Nika.
Andra franziu o cenho e acariciou seus cabelos. Do canto onde estava Grace se ouviu:
— Quer que avise Tynan?
— Sim. Diga a ele que Nika despertou.
— Não quero Tynan. Quero Madoc.
Ninguém a escutou e Nika começou a se perguntar se sua boca naquele corpo funcionava bem.
Estava adormecendo de novo, incapaz de impedir que sua mente fosse levada para longe. Queria permanecer acordada para vê-lo, mas isso já não seria possível. Estava muito fraca até mesmo para procurar um dos sgath.
— Certo. — acalmou-a Andra. — Eu o trarei aqui. O que você quiser.
— Quero Madoc. — disse Nika enquanto se afastava à deriva no mundo.
Zach estava morto. Sabia que tinha que estar, porque esteve vivo durante séculos e nada que tinha experimentado antes tinha sido tão bom.
Abriu os olhos só para ver a cabeça de Lexi. Seus suaves cabelos castanhos estavam um completo desastre, como se ele tivesse esfregado seu rosto sobre os fios finos durante horas, revolvendo-os com sua barba de três dias. Baseando-se na brilhante luz do dia que entrava por entre as cortinas, esse devia ter sido o caso.
Seu corpo estava curvado sobre o dela, tocando em tantos lugares quanto lhe era possível. Ela era quente e flexível, e a sensação de ter seu doce traseiro pressionado contra seu membro rígido era suficiente para fazê-lo acreditar no céu. Seu braço estava enrolado ao seu redor, mantendo-a no lugar, e seus dedos penetraram sob sua camisa para pousar-se sobre suas costelas, exatamente sob seu seio. A sensação da pele nua de Lexi sob sua mão era muito boa para ser verdade. Tinha que estar morto, ou sonhando.
Lentamente, a névoa que enchia sua cabeça começou a dissipar-se o suficiente para reconhecer o que o rodeava. Não estava morto. Estava deitado no chão da casa Gerai com apenas o antiquado tapete para amortecer seus corpos. Não era suficientemente suave para Lexi, mas não tinha muita certeza de como solucionar isso. Seu cérebro ainda estava embotado e seu sangue fervia com uma lenta chama de excitação sexual.
Não fizeram sexo. Sabia com certeza porque não havia como ele ter esquecido algo assim. Além disso, ambos ainda estavam vestidos e no chão. Zach gostava de pensar que era forte o suficiente para colocá-la na cama antes de possuí-la.
Assim, se não a seduziu, como a levou para lá?
A última coisa que se lembrava era a dor. Montanhas de dor esmagando-o, espremendo sua vida. Não tinha certeza de como tinha sobrevivido, mas tampouco se importava. Desde que ela estivesse lá, em seus braços, valia a pena sofrer.
Lexi se moveu dormindo, apalpando como se estivesse procurando um travesseiro. Zach moveu seu braço para que servisse de almofada para sua face, e ela voltou a dormir.
Ela disse que não confiava nele. O brilho de uma grande faca aos seus pés demonstrava que o dizia a sério. Então, por que estava ali deitada com ele?
Zach não questionou sua boa sorte. Ela estava lá e isso era suficiente.
Bocejou, preparando-se para passar mais algumas horas descansando com a mulher de seus sonhos. A expansão de seu peito pressionou-o ainda mais contra as costas dela, e ela ficou rígida em seus braços.
Merda. Ele a acordou.
— Sinto muito. — sussurrou sobre seus cabelos. — Não queria acordar você. Volte a dormir, carinho.
Aparentemente, Lexi tinha outros planos. Impulsionou-se para cima e Zach a deixou ir. Era muito cedo para um combate de luta livre, e todos os músculos de seu corpo ainda doíam por causa do que quer que fosse que lhe tinha acontecido na noite passada.
Ela se mexeu afastando-se dele até que ficou esmagada contra a parede. Instantaneamente, o corpo dele se retesou em uma onda de dor. Aspirou ofegando e tentou relaxar, deixar que passasse através dele. Sabia como lidar com a dor. Podia fazê-lo.
Em uma tentativa para distrair-se, olhou para Lexi. Seus cabelos estavam um desastre e seus olhos estavam inchados por dormir, mas ainda era a coisa mais linda que ele já tinha visto. Poderia despertar com uma visão como aquela todos os dias durante o resto da eternidade e ainda não teria suficiente.
Ela esfregou os olhos e o olhou da cabeça aos pés. Seu olhar se deteve, e seus olhos se abriram e se retiraram ao ver sua ereção. Mas não havia nada que ele pudesse fazer a respeito. Assim ela saberia que ele a queria. Não era exatamente um grande segredo.
Uma ruga franziu sua testa e ela esfregou o ponto sob o seio onde a mão dele esteve enquanto dormiam.
— O que fez comigo? — perguntou.
Seus músculos se imobilizaram, tensos e doloridos, e seu membro estava ainda pior. Mas podia administrar tudo isso. O que não podia administrar era o olhar de medo que Lexi exibia.
— Não fiz nada. — disse — Ainda está vestindo sua calça, não?
Ela engoliu e seus dedos se moveram até o cós de seu jeans, que ainda estava abotoado. Merda, ainda estava com aquele avental curto e cheio de bolsos de seu trabalho. Várias das moedas tinham caído no tapete enquanto dormia, assim Zach as recolheu e as estendeu para ela.
Lexi não as pegou. Olhou sua mão e ficou quieta, pondo ainda mais distância entre eles.
Genial. De volta à primeira base.
— Lexi, não, por favor. — disse ele.
Havia um indício de súplica em sua voz e ele o odiou. Nunca tinha suplicado por nada em sua vida.
— Poderia ter feito qualquer uma das coisas horríveis que você me acredita capaz esta noite se quisesse, mas não fiz. Isso não demonstra a você que não vou machucá-la?
— É uma armadilha. Sua pele é venenosa. Narcótica. Por isso é tão bom.
Zach agarrou-se a parte de fazê-la sentir-se bem durante um segundo mais do que deveria. A ideia de que poder fazer isso a ela fazia seu sangue ferver. Involuntariamente ela lhe contou como chegar a ela, e tinha toda a intenção de explorar essa fraqueza.
Acreditava que Lexi era dele, e agora também sabia como convencê-la que isso era verdade.
Tentou esconder seu sorriso vitorioso, mas considerando o modo que seus olhos se abriram, teve certeza que não tinha conseguido.
— Não é veneno, carinho. É química. Você e eu estamos destinados a ficar juntos e essa sensação é o modo que a natureza tem de nos fazer saber.
— Mentiroso.
Zach ignorou o insulto e se sentou. Ela moveu os quadris, prevenindo-o de sua intenção de correr, mas ele se moveu rapidamente para bloqueá-la. Estava presa entre a parede e seu corpo, e ele não a deixaria partir.
Enjaulou-a com um braço enquanto deslizava o dedo com suavidade por sua face. Era muito suave para ser real, e seus olhos se fecharam para poder absorver mais dela. Pequenas faíscas de energia saltaram entre eles, expelindo uma diminuta porção de energia que se agitava dentro de Zach. Parte da dor se foi com elas. Seu dedo deslizou para baixo até que ele fez seu caminho para a garganta, onde sua luceria logo estaria.
Lexi deixou escapar um suave gemido, embora ele não soubesse dizer se era de prazer ou de medo. Podia escutar sua respiração agitada, e sentia a tensão endurecendo seus membros. Suas mãos se abriram sobre o pescoço dela até que pôde sentir os delicados cumes de suas clavículas sob seus dedos.
Mais faíscas se retorceram para seu corpo, e ela ofegou agitada.
Zach baixou os olhos para ela. Sua pele morena destacava-se em um marcante contraste contra a brancura dela. Mesmo na tênue luz, Zack seria capaz de ver suas próprias mãos deslizando pelo corpo dela, lhe dando prazer.
Com muita dificuldade podia esperar.
Sua cabeça estava inclinada para um lado, e suas mãos estavam com os punhos fechados. Seu corpo vibrava ao compasso da fraca corrente de poder que gotejava da palma de sua mão até ela.
Queria beijá-la, mas os instintos lhe diziam que o controle era a melhor maneira de conseguir seu objetivo final. Quando ela fosse dele, teria a eternidade para beijá-la, para tocá-la.
— Você ainda pensa que eu estou mentindo? — perguntou Zack.
Seus olhos eram da cor do chocolate meio amargo, quando levantou os olhos para ele apenas por um momento, pensou que tinha visto um brilho de insegurança.
— Pare, por favor. — sussurrou ela. — Não posso fazer isso.
— Fazer o que, carinho?
Lexi rodeou seu pulso com os dedos. Suas mãos eram pequenas, mas seus dedos eram graciosos e fortes. Tentou puxar sua mão e afastá-la, mas Zach não cedeu.
— Não posso deixar que me seduza. — disse ela.
— Por que não? Vamos ficar melhor juntos. Vou me assegurar de que não se arrependa.
Ela fechou os olhos e negou com a cabeça.
— Não.
Zach se inclinou sobre ela e aproximou os lábios a seu ouvido.
— Oh, sim. Você e eu fomos feitos um para o outro. Quanto mais rápido você aceitar isso, mais tempo terei para fazê-la desfrutar. Você quer isso, ou não?
Ele enfatizou a pergunta com um impulso de energia tão poderoso que pôde ouvi-lo crepitar.
— Oh, Deus.
Ela mordeu o lábio inferior, e ele podia sentir o coração batendo com força sob sua mão.
— Não lute contra mim. Deixe-me mostrar a você o quanto pode ser bom para nós.
Deslizou a língua pela curva de sua orelha, fazendo-a tremer.
— É isso. — ele a animou. — Deixe-me levá-la.
— Eu... Tenho que ir ao banheiro.
Era uma tática de fuga e ele sabia. Devia saber que ela não ia tornar as coisas fáceis para ele.
Zach suspirou e afastou-se a contra gosto. Lexi fugiu de seus braços, tropeçando a caminho do banheiro.
Seu membro doía de necessidade, mas ia ter que continuar doendo no momento.
Quase a tinha. Tinha certeza disso. Havia sentido sua determinação desmoronar-se. De fato, estava surpreso por ela ter sido capaz de afastar-se. Estava seguro como o inferno que ele não iria a nenhum lugar durante um momento. Não até que se controlasse.
Ouviu o barulho no banheiro, a torneira se abriu e fechou de novo. Mas ela ainda não tinha saído.
Zach suspirou. Aparentemente, sua perseguição não tinha chegado ao fim. Parte dele estava animado com a ideia de persegui-la, mas o restante estava simplesmente exausto e muito dolorido para querer continuar com isso.
Esfregou o peito. A única folha de sua marca vital tinha murchado ainda mais desde ontem. Era hora dela parar de fugir.
Parou em frente à porta e cruzou os braços sobre o peito. Não havia janelas ali. Nenhuma outra saída além da que ela tinha entrado.
Não podia ficar lá para sempre e, quando saísse, ele estaria esperando-a.
Lexi pressionou o tecido úmido contra o rosto, esperando refrescar sua pele febril.
Em que demônios estava pensando para permitir que ele a tocasse assim? Estava louca?
Sim. Sem dúvida. Estava comprovado.
Esfregou com violência a orelha, tentando tirar dela a sensação da língua cálida dele revoando sobre sua pele. Só lembrar fazia que seus joelhos fraquejassem tanto que teve que firmá-los para permanecer erguida. Qualquer que fosse a magia que Zach estava utilizando nela, era algo poderoso. Não tinha certeza de como ia ser capaz de resistir o tempo suficiente para resgatar Helen, mas teria que encontrar a forma.
Os Defensores a preveniram que seria difícil, mas até agora tinha imaginado que eles não a conheciam bem o suficiente. Porque era pequena, as pessoas a viam como alguém fraco e frágil. E era justamente o contrário.
Exceto ao que se referia a Zach.
Lexi gemeu de frustração, abrindo a água fria para colocar a cabeça sob a torneira. O frio extraiu o ar de seus pulmões, mas ao menos a ajudou a limpar a cabeça da névoa com que Zach a tinha enchido.
Tinha que pensar. Estabelecer um plano. Não era como se tivesse que resistir a ele durante todo um ano ou nada parecido. Só o suficiente para que a levasse ao recinto. Os Defensores tinham certeza que ficava em algum lugar no Meio Oeste, assim não teria que ir para muito longe com Zach. Talvez um dia de carro.
Apenas um dia. Podia manter a língua dele fora de suas orelhas, ou de qualquer outro lugar, durante esse tempo.
— Precisa que alguém esfregue suas costas, carinho? — ouviu a voz profunda de Zach através da porta.
Até mesmo sua voz fazia seu corpo se suavizar igual a sua determinação. Precisava amordaçá-lo, ou talvez tampar os ouvidos. E definitivamente precisava vestir mais roupa. Quanto menos pele nua houvesse ao alcance de suas mãos, melhor.
— Vá embora. — disse ela.
— Isso não vai acontecer. Há algo mais que possa fazer por você?
Ter uma calcinha seca seria uma boa ideia, mas não estava disposta a dizer isso a ele.
— Minha mala.
— É claro, carinho. Volto logo.
Não ficou muito tempo fora antes que ela ouvisse seus dedos fortes batendo na porta.
— Aqui está.
— Basta deixá-la do lado de fora da porta.
Uma constrangedora diversão ressoou em sua voz.
— Tem medo que o grande lobo mau a coma?
Oxalá tivesse essa sorte. Tinha passado muito tempo desde que ela esteve com um homem, e o que Zach acabou de lhe fazer a lembrou o quanto estava perdendo. Mesmo a ideia de tê-lo beijando-a e lambendo-a era suficiente para atordoá-la.
Lexi se agarrou a pia disposta a manter o equilíbrio contra o bombardeio de imagens que ele tinha posto em sua cabeça. Tinha certeza que se tivesse chegado a despi-la, teria se sentido a mulher viva mais sortuda do mundo, justo até que ele a matasse.
— Vá se foder. — disse ela, mas soou mais como uma fraca pergunta que como um insulto.
— O que você quiser. Basta abrir a porta e me deixar com o resto.
— Nem sonhe, Zach.
Seu tom de voz baixou tanto que ela teve que se esforçar para escutá-lo.
— É só uma questão de tempo, carinho. Pode lutar contra mim o quanto quiser, mas nós dois sabemos como serão as coisas no final.
Sim, ele e todos seus amiguinhos iriam ser pequenos fragmentos de carne sanguinolenta tingindo a paisagem.
Por alguma razão, aquele plano não parecia tão bom quanto tinha sido na noite anterior.
Zach observava Lexi comer. Ver sua boca mover-se sobre o garfo era a coisa mais excitante que já tinha visto. Por outro lado, não havia muito nela que não fosse sexy. Seu doce e compacto corpo e o assassino traseiro o enlouqueciam. Os vislumbres que continuou captando da tatuagem na base de sua coluna acabariam levando-o ao manicômio se não conseguisse ver até onde chegava debaixo de sua calça jeans. E o contraste entre a personagem de menina má com os cabelos arrepiados que usava quando a conheceu, e o lado mais suave, mais vulnerável da mulher que estava vendo agora era o tipo de coisa que alimentava as fantasias de um homem. Era todos os tipos de mulheres que alguma vez tinha querido, tudo em uma. Até mesmo aquela veia independente dela o excitava.
Todos os Theronai sem companheira em Dabyr iriam querê-la. Não podia correr o risco de que ela gostasse de um deles. Devia se arriscar a reclamá-la antes de levá-la para sua casa e conseguir que ela colocasse sua luceria assim todos os homens saberiam que ela estava fora de seus limites.
Colocou outra panqueca em seu prato com a esperança que ela o deixasse vê-la comer um pouco mais.
Lexi limpou a boca com um guardanapo e se recostou em sua cadeira.
— Quanto tempo levaremos para voltar para sua casa? — perguntou.
Zach considerou mentir para ela, fazendo que pensasse que teria mais tempo para passar a sós com ela, mas não era assim que queria que as coisas começassem entre eles. A honestidade era importante para ele. Se a queria dela, lhe parecia justo oferecê-la em primeiro lugar.
— Aproximadamente nove horas, mas não estou preparado para ir ainda.
— Por que não?
Ele tomou um gole de café para ganhar tempo para pensar. Não queria estragar tudo. Lexi já tinha algumas ideias equivocadas a respeito de seu mundo, e não tinha certeza de quão bem aceitaria o que tinha a dizer.
Por último, lhe ocorreu:
— Não quero compartilhar.
— Hmm. Está bem. Compartilhar o quê?
— Você.
Lexi piscou rapidamente algumas vezes, fora isso, seu rosto estava estoico.
— Por favor, me diga que significa algo diferente do que eu acredito que significa.
— Os outros homens em minha casa, Dabyr, todos a quererão.
Seus dedos retorceram o guardanapo de papel até esmigalhá-lo.
— Para quê?
Ela estava com medo. Tinha visto o olhar suficientes vezes para saber que, apesar de sua coluna ereta e o queixo erguido, estava tremendo por dentro.
— Nunca machucaríamos você, Lexi. Nenhum dos homens o faria, não importa o que possa pensar. Todos nós queremos o mesmo, ter você ao nosso lado por um longo tempo.
Ela resmungou, mas pareceu mais de alívio que de confiança.
— Não acredito. E mesmo se este fosse o caso, não estou procurando nenhuma… Relação este momento.
— Não a estava procurando, mas uma a encontrou.
— Que é que isso significa?
Zach tentou alcançar sua mão, querendo tocá-la, mas ela se afastou antes que ele pudesse fazer isso. Cruzou as mãos sobre o colo, tentando demonstrar que não tinha acabado de rejeitá-lo.
A decepção o golpeou, mas a deixou ir. Agora não era o momento de pressionar. A delicadeza o levaria muito mais longe.
— Preciso de você, Lexi. Nunca escondi esse fato de você. Mesmo depois que me apunhalou.
— Acreditei que era uma loucura temporária, — disse — ou que simplesmente estava mentindo.
— Cada palavra que já disse a você é a nua e honesta verdade. Preciso de você, e não vou compartilhá-la.
Ela levantou a xícara de café, e Zach viu o líquido escuro vibrar sob seus dedos trêmulos. Genial. Tinha a assustado ainda mais ou a irritado. Supôs que assustado, já que se a tivesse irritado, provavelmente ela teria jogado o café quente em sua cara.
— Muito bem. Vou começar desde o começo. Pare-me se você se perder.
Lexi assentiu com a cabeça, mas não o olhou. Definitivamente assustada.
— Não estou certo de quanto você sabe sobre os Theronai.
— Não muito. Só o que minha mamãe me disse, e o que escreveu em seu diário.
Ao menos isso era algo.
— Somos uma das raças dos Sentinelas. Ouviu falar dos Sentinelas?
— Sim. Desde antes que pudesse andar.
— Bem, então posso omitir a parte onde fazemos todo o possível para salvar a humanidade e proteger o portal de acesso a outro mundo. Isto é o que talvez não saiba. O casal Theronai forma uma equipe de um homem e uma mulher. O homem pode recolher a energia do ar e a armazenar, e a mulher tem a habilidade de canalizar esse poder, mas não pode armazená-lo por sua conta. Compreendeu-me até agora?
— Acredito que sim.
Não estava seguro do que isso significava, mas seguiu adiante, com a esperança de acabar com aquilo o mais rápido possível.
— Nós formamos casais, mas quando fazemos isso, é uma espécie de união permanente.
— Igual ao casamento?
— Às vezes, mas nem sempre. Houve raros casos em nosso passado, quando membros da mesma família se emparelhavam, mas para que funcione, tem que haver algum tipo de vínculo íntimo. Quanto mais tempo um casal está junto, mais fortes se tornam.
— É por isso que Drake queria Helen, não é verdade? Porque ele é uma dessas mulheres?
Ele assentiu com a cabeça.
— E você também.
Seus olhos escuros se entrecerraram em uma espécie de cólera rebelde estreitou sua boca.
— Não, não sou.
Portanto, não gostava da ideia. Fantástico. Isso tornaria as coisas muito mais difíceis, e não tinha tempo para isso. Até mesmo com a destilação de energia que ela tinha absorvido através de seu contato, Zach continuava sofrendo. Tinha uma gigantesca onda de pressão esperando para sair, e não muito tempo para que ocorresse.
Tinha verificado sua folha mais cedo e estava murcha e marrom, mal se aderia à sua árvore.
— Posso provar isso a você. — disse.
Zach envolveu seus dedos ao redor do pulso dela. Ela se sentiu tão bem com seu toque que quase se esqueceu do que estava fazendo. Muitos redemoinhos azuis e verdes se moviam dentro da faixa ao redor de seu dedo.
— Vê como as cores em meu anel mudam quando eu a toco?
Lexi lambeu os lábios e assentiu.
— Há mais verde e azul que qualquer outra cor. Além disso, sente essas pequenas faíscas de energia arqueando-se entre nós, não é verdade?
Mais uma vez, ela assentiu com a cabeça, embora não afastasse os olhos do anel.
— Esses são sinais de que é como eu. É uma Theronai.
— Não. Não sou. — havia mais que uma veemente negativa em sua voz.
Havia algo mais, uma espécie de desespero frenético, como se ele tivesse dito que ela só tinha uma semana de vida.
Não podia aceitar o que era ainda, mas ele entendia isso. Como Helen e Andra, foi criada como um ser humano. Quando lhe mostrasse seu mundo, ela o aceitaria em breve, como as outras mulheres tinham feito.
Lexi tentou puxar a mão, mas Zach apertou seu agarre. Necessitava que esse contato o recordasse que ainda havia esperança. Que ainda havia tempo.
Fez sua voz soar casual quando continuou.
— Portanto, esta conexão que temos permite que o poder flua entre nós. Quanto mais longa e mais forte for esta conexão, mais poder fluirá de uma vez.
— Não se esgota? — perguntou.
— Pode baixar o nível, com certeza, mas há mais a nosso redor, no ar, na terra, em todas as partes. Impregna meu interior quer eu queira ou não, é por isso que preciso de você. Já absorvi mais energia do que posso conter. Está me matando.
Ela continuava olhando para o seu anel e o movimento hipnótico das cores em seu interior.
— E acredita que posso deter isso?
— Pode desviar o suficiente para reduzir a pressão. O suficiente para me manter vivo. É por isso que preciso de você.
Ela ficou em silêncio por um momento, e ele lhe deu o tempo para assimilar o que havia dito.
— E se eu não cooperar? — perguntou.
— Então morrerei, ou ao menos minha alma. Nunca mais serei um dos mocinhos. Não me preocuparei com o bem ou o mal, só pelo que quiser.
Sua voz era apenas um sussurro.
— Nunca ouvi falar disso antes.
— Não é algo que ensinem nas escolas.
— Sim, bom, nunca fui à escola. Minha educação foi um pouco mais… Prática que a da maioria. Aprendi tudo sobre os Sentinelas e nunca escutei nada disto.
Isso o fez se perguntar o que tinham ensinado a ela e quanto daquilo era uma completa merda.
— Não estou mentindo para você, carinho. Não estou escondendo nada. Quero que saiba o que estou lhe pedindo.
— E o que exatamente você está pedindo?
Ele colocou o dedo sob seu queixo e levantou seu rosto até que ela o olhou. Queria que soubesse que estava falando sério.
— Quero que ponha minha luceria. Quero que seja minha companheira. Para sempre.
Sua cabeça se moveu ligeiramente. Zach não tinha certeza nem sequer que ela sabia o que fazia.
— Mal o conheço.
— Entendo isso. Entendo que isto é alarmante para você. Tudo é novo e estranho, mas não é um acordo totalmente unilateral. Conseguirá alguns benefícios adicionais.
— Não me importo.
— Diz isso porque não sabe o que está perdendo. Se concordar em fazer isto, terá a capacidade de usar a magia.
Ela puxou sua mão e moveu sua cadeira para trás para ficar fora de seu alcance. Nem sequer teve a cortesia olhar para ele.
— Não quero. Não quero fazer parte de seu mundo.
Zach ignorou o insulto e continuou.
— Quase não envelhecerá com a passagem dos séculos. Vivemos um tempo muito longo, a menos que morramos em combate.
— Não quero brigar.
Bom, tampouco o entusiasmava essa parte, mas era necessário. Pelo menos tinha um propósito.
Espremeu o cérebro, com a esperança de encontrar algo que ela gostasse, algo para convencê-la a salvá-lo.
— Nunca ficará sozinha de novo. Terá uma família. Um lar.
Com suas últimas palavras, seus olhos saíram em disparada para o seu rosto como se estivesse procurando algum tipo de ardil.
— O que o faz pensar que eu gostaria de fazer parte de sua família?
— Não acredita em mim. — podia vê isso em seus olhos, no modo que se entrecerravam com desconfiança.
— Não sei em que acreditar.
— Não tem que decidir neste exato segundo. — ele queria isso, queria que a dor demolidora desaparecesse, mas podia esperar até que ela tivesse certeza. — É uma grande decisão. Pergunte-me o que quiser e eu lhe direi a pura verdade.
— Foi isso que Helen fez?
— Sim.
— Está a salvo?
— Mais a salvo que antes de estar com Drake. Nosso trabalho é perigoso, mas cuidamos de nossas mulheres. Vocês são raras e tomamos todas as precauções para mantê-las fora de perigo.
— Assim as mimam?
— Não. Helen vai para a batalha contra os Synestryn junto com os homens. Necessitamos dela ali, mas nos asseguramos de que haja um montão de espadas entre ela e os dentes e garras. Isso é tudo.
— E acredita que sou como ela?
— Sei que é.
— Vamos supor que eu sou. Se eu fizer isto, disse que era permanente, não?
— Algo assim. A intenção é ser permanente. Você me faz uma promessa, que tradicionalmente significa que uma mulher lutará ao lado de seu homem para sempre. Mas não tem que ser por tanto tempo.
— Se não for assim?
— Quando a promessa for cumprida, a luceria cai e volta para onde estava antes.
— E você também?
Odiava lhe contar essa parte, mas tinha prometido a ela dizer a verdade, por isso o faria.
— Se não nos unimos por completo, sim.
— O que acontece se o fizermos?
— Então estarei fora.
— Morrerá. — ela supôs através de seu eufemismo.
— Sim.
— Quer me dar o poder de matá-lo?
— Não. O poder para me salvar.
Ele tinha as mãos estendidas sobre a mesa, onde as esteve mantendo a vista para não assustá-la mais. Não queria que ela tivesse medo dele. Não queria que ela tivesse medo, e ponto.
Seus olhos voltaram para seu anel, que, sem o contato com ela, tinha voltado para um redemoinho lento de reluzente irisação[5].
— O que acontecerá se eu disser que não? — perguntou.
Merda. Ali estava a parte problemática. Tinha que tomar o cuidado de ser honesto sem afugentá-la com suas intenções. Independentemente do que acontecesse entre eles, não a deixaria ir.
— Se você se negar a me ajudar, levarei você de volta a Dabyr e verei se há outros homens compatíveis com você, homens que você poderia salvar. Pode escolher, é óbvio, presumindo que haja outros como eu.
— O que acontecerá com você?
— Tenho mais alguns dias na melhor das hipóteses. Depois irei para minha batalha final.
— Quer dizer que você se deixará matar?
— Em vez de me transformar naquilo com quem luto? Sim. Mas me deixe ser claro, Lexi. Não é o que quero. Quero viver. Com você.
— Nem sequer me conhece.
Zach deu de ombros.
— Teremos anos para chegar a nos conhecer. Eu já gosto de você. Com o tempo, chegarei a lhe amar.
— Não sei. Não pode predizer a quem amará.
— Claro que posso. Vi isso acontecer dezenas de vezes em minha vida. Não acredita que há uma razão para que nem todas as mulheres Theronai sejam compatíveis com todos os homens? Imagino que a magia utilizada para alimentar a luceria seja inteligente o suficiente para saber quais serão os companheiros adequados e quais não. — lentamente, assim certamente o ouviria, disse — Você e eu fomos destinados a ficar juntos.
Desejava tocá-la de novo, mas ela tinha se colocado fora de seu alcance e estava fazendo todo o possível para respeitar suas escolhas nesse momento. Chegaria o momento que não poderia deixá-la escolher, quando a vida de sua família teria prioridade e a obrigaria a voltar para casa com ele, mas ainda não tinha chegado a esse ponto.
— Não posso fazer isto agora. Não posso me decidir.
A decepção quase o esmagou, dificultando sua respiração. Em todas suas fantasias, ela sempre o quis. Ela ia para os seus braços e reclamava seu lugar junto a ele voluntariamente. Nunca parou para pensar que ela não o queria até agora.
Zach queria pressionar, mas era uma decisão muito importante para ela. Tinha que fazê-la com os olhos abertos. Sem enganos. Sem mentiras.
Se Zach lhe desse toda a verdade, e ela ainda não o quisesse, encontraria uma forma de enfrentar isso. Que ela estivesse a salvo em Dabyr, teria que ser suficiente para satisfazê-lo.
— Darei a você todo o tempo que puder.
Dois dias, talvez três. Não era muito tempo para convencer uma mulher a passar o resto de sua vida com ele, mas tinha que tentar.
— Pensarei melhor no carro. Deveríamos nos pôr em movimento.
Para o Dabyr e todos os outros homens dali que, sem dúvida, também a quereriam. Nunca tinha desejado nenhum mal a seus irmãos, e o fato do pensamento cruzar sua mente, inclusive agora, mostrou-lhe o pouco tempo que restava.
Lexi sabia quase de cor os diários de sua mãe e não havia nenhuma só palavra neles que apoiasse nada do que Zach havia dito.
Os Sentinelas querem seu sangue. Usam-no para alimentar sua magia. Alimentam suas mascotes.
Entretanto, tinha passado a noite com Zach, esteve completamente vulnerável, e ele não derramou nenhuma gota. Talvez estivesse enganando-a, acalmando-a com uma falsa sensação de segurança, mas não se sentia dessa maneira.
É óbvio, seus instintos sempre estiveram obstruídos quando se referia a Zach. Nada novo. Desde o momento em que ele a tocou naquela noite no Restaurante de Gertie, seu mundo virou pelo avesso, e nada tinha sentido.
Esteve dirigindo durante horas e ainda não sabia o que pensar a respeito de sua proposta. Passar a eternidade com ele. Nunca envelhecer. Nunca estar sozinha.
Teria um lar. Depois de tantos anos correndo, poderia parar. Teria sua própria cama, talvez, até pudesse colecionar algumas coisas que não fossem as simplesmente necessárias. Parecia muito bom para ser verdade, e isso era realmente o que mais a preocupava. Algo que era muito bom para ser verdade, provavelmente não era verdade.
Lexi observava a paisagem pela janela enquanto se dirigiam para o norte. Tinham dormido até tarde, e não tinham saído para a estrada até depois do meio-dia. Agora o sol começava a se pôr. Muito em breve, os monstros que os Sentinelas mantinham como mascotes sairiam para participar do jogar.
Ao menos tinha dormido muito, estava bem descansada e em melhor forma para enfrentá-los do que esteve nas últimas semanas. Isso era algo pelo qual se alegrar.
— Quer comer algo? — perguntou Zach. — Estamos nos aproximando de Wichita[6] e há muito para escolher.
— Claro que sim. Está bem.
— Há algo que lhe apeteça?
Qualquer lugar com muita gente e luzes brilhantes.
— Qualquer coisa será bom.
Zach suspirou.
— Realmente a assustei, não é mesmo?
— Um pouco. — era o eufemismo do ano.
Ele riu e o som se envolveu ao redor de seus ouvidos, fazendo-a sorrir, até que ele disse:
— Não há nada mais sexy que uma mulher que pode me fazer rir. Só pensei que você deveria saber disso.
— Vamos esclarecer algo agora mesmo. — ela disse. — Mesmo que eu decida ajudar você, e estou bastante segura que não o farei, não haverá questões sexuais de nenhum tipo entre nós.
Ele lhe lançou um breve e divertido olhar.
— Por que não?
— Porque não me deito com homens em quem não confio.
— Poderia aprender a confiar em mim se quisesse.
Quando o inferno congelasse, talvez.
— Nem em sonhos.
Envolveu sua mão ao redor da dela, segurando-a contra sua coxa. Uma infinidade de formigamentos elétricos deslizou para seu interior, fazendo seu corpo zumbir. Sua cabeça caiu para trás contra o encosto da cabeça e deixou que a vertiginosa sensação a varresse.
— Teremos que trabalhar nisso. — disse ele, mas ela mal podia dar sentido às palavras. — Tenho uma meta agora, e sou o tipo de homem muito determinado a realizar meus objetivos.
Ela apostava que era. Duvidava que ele houvesse deixado muitas coisas que queria pelo caminho, e agora, era à ela. Uma parte escandalosa e louca dela estava animada com a notícia, por isso se calou mandando-a ao inferno.
Lexi necessitava de uma distração. Algo, qualquer coisa, para se impedir de imaginar que tipo de amante ele seria. Determinado em um objetivo, de fato. Era suficiente para fazê-la se retorcer em seu assento.
— O que aconteceu a meu carro? Correr e o afastar de minhas mãos não é a melhor forma de me fazer confiar em você.
Um lento sorriso aqueceu o rosto de Zach. Era muito bonito quando sorria. Muito tentador.
— Já se encarregaram dele. Deixei suas chaves na casa Gerai, e agora, provavelmente nossos homens poderão reparar o motor. Quando terminarem, o conduzirão a Dabyr e você recuperará seu carro.
A menos que encontrem os explosivos escondidos em seu porta-malas.
Não estavam à vista, e alguém teria que procurar em seus escassos pertences para encontrar a caixa fechada cheia de C-4. E então teriam que quebrar a fechadura para ver o que havia dentro.
A boa notícia era que se fizessem isso, ela saberia que os Sentinelas não eram tão confiantes e serviçais como Zach a induziu a acreditar. Saberia com segurança que não estavam de seu lado, e não teria nenhum problema em fazer todos eles voarem para o inferno se tivesse a chance.
Ao menos isso era o que dizia a si mesma.
Zach lhe deu um olhar divertido.
— O quê? Não é isso o que queria?
— Sim.
— Então por que de repente parece doente?
— Não estou doente. Tenho fome. Quero um bife. — exclamou, com a esperança de distraí-lo.
— O quê?
— Quero um bife. — não tinha comido um há anos, e graças a ele, ainda tinha o dinheiro suficiente para pagar por uma boa refeição.
Lexi se negou firmemente a pensar nela como sua última comida. Ia sair daquela confusão vivinha e abanando o rabo, arrastando Helen e a senhorita Mabel.
Ele entrelaçou seus dedos grossos com os dela e disse:
— Então será bife. Conheço exatamente um lugar. Está um pouco fora do caminho, mas a viagem vale a pena.
Quando chegassem lá, ela ligaria para Jake Morrow, seu contato nos Defensores, e o informaria que não tinha abandonado a missão.
Joseph levantou os olhos de sua escrivaninha para ver Iain Terra enchendo o batente da porta. Seus olhos negros resplandeciam sob as luzes brilhantes do escritório, mas seu rosto era uma máscara em branco, impassível. Esperava em silêncio, mesmo depois de Joseph tê-lo notado.
— Precisa de algo? — perguntou Joseph.
Seus olhos ardiam, e sabia que não ia dormir de novo naquela noite. Havia muitas coisas para fazer e muitos sonhos para atormentá-lo quando fechava os olhos.
Todo mundo o considerava um grande líder. Será que todos não sabiam que ele era só um homem? Um não mais capaz de manter seu povo vivo que qualquer outro Theronai?
Pelo que parecia ser a milionésima vez, amaldiçoou sua posição mesmo a aceitando. Não fracassaria. As vidas de inúmeras almas dependiam dele.
— Ouvi um rumor. — disse Iain.
Sua voz profunda era sossegada, mas chegava facilmente através do escritório.
— Parece que há muitos desses dando voltas estes dias.
— Não como este.
Genial. Mais problemas.
— Cospe-o, Iain. Estou ocupado.
— Há Synestryn com rostos de crianças humanas?
Sem rodeios ali. Infeliz, também. Joseph não estava disposto a reconhecer publicamente o giro que as notícias tinham dado à guerra. Ele ainda não estava completamente certo de que os Sentinelas já não tivessem perdido e simplesmente não quisessem saber disso ainda. Entre, o muro quebrado e as lentas reparações, as notícias que a fortaleza europeia estava desmoronando pela política interna, e a constante e forte dor na cabeça que estava tornado difícil para ele se concentrar no melhor dos dias, as coisas pareciam bastante sombrias.
— Sim. É verdade, — disse Joseph — mas realmente eu gostaria muito que você não ajudasse a difundir o rumor mais longe do que já o tem feito.
— Onde? — perguntou Iain.
— Onde o quê?
— Onde encontraram essas coisas?
— Só havia uma. — disse Joseph.
— Vou me assegurar que não haja mais.
— Não quero deixá-lo ir. Necessito de você aqui, ao menos até que o muro seja levantado.
— Se esperar, será muito tarde. — disse Iain.
— Muito tarde para quê? Gilda e Angus já se encarregaram da ameaça.
— Sabe tão bem quanto eu que os Synestryn não pararam em um. Vou averiguar como estão fazendo isto e detê-los.
Joseph esfregou as têmporas, respirando profundamente enquanto a dor piorava.
— Sozinho?
— É melhor assim. A maioria dos homens aqui se negaria quando vissem o que teriam que destruir.
— E você não?
— Não. Eu não.
— Então, vai simplesmente partir para um ninho e começar a matar coisas que se parecem com nossos filhos?
— Não são nossos filhos. Serei capaz de me lembrar disso quando alguém como você não poderia.
Talvez ele tivesse razão. Joseph não tinha certeza de poder obrigar-se a fazer o que era necessário, mas Iain parecia que sim. Ninguém mais se ofereceu como voluntário para o trabalho.
— Tudo bem. Verifique você mesmo. Fale com Angus se necessitar de mais detalhes. Ele estava lá. — Joseph desenrolou o mapa dos ninhos e ataques Synestryn conhecidos.
Iain se aproximou da mesa e olhou para onde Joseph apontava. O ponto que identificava aquele incidente era bastante fácil de detectar. Era o único no mapa de cor rosa bebê.
Malditamente conveniente.
Joseph afastou os olhos do mapa. Havia muitos pontos para contar, e estavam se aproximando mais de Dabyr a cada noite.
Aquilo tinha que parar. Tinha que fazer algo, elaborar um grande plano, ou nada mais que fizesse ia importar.
Quinhentas e trinta e sete pessoas. Esses era o numero de pessoas que estavam contando com ele, exatamente ali sob seu próprio teto. Isso não incluía os humanos fora daqueles muros que eram vítimas de perseguição todas as noites, ou os outros Sentinelas espalhados por todo o planeta. Não incluía aqueles que sabiam quantas pessoas estavam em Athanasia agora que não tinham nem ideia do quanto os Sentinelas estavam perto de perder a guerra. A porta de entrada para seu mundo protegia, mas só enquanto ele e seus homens a guardassem e a mantivessem a salvo. Quando eles se fossem, não restaria nada para impedir os Synestryn de invadir aquele mundo, também, nada para impedi-los de matar a todos e dirigir-se ao planeta seguinte.
Sem pressão.
Iain deu meia volta para partir sem dizer uma palavra. Joseph se sentiu obrigado a dizer algo, mas não tinha ideia do quê. O homem ia fazer algo que Joseph sabia que nunca poderia fazer. Ia capturar a maior arma que os Synestryn já tinham criado, monstros com rostos de crianças. E depois ia matá-los.
— Tome cuidado. — foi tudo o que ocorreu a Joseph para lhe dizer.
Iain se deteve na porta e se virou.
— Isto não é sobre ser cuidadoso e sabe.
— Não. É sobre ter estômago forte e recordar o que está em jogo.
— Não se preocupe. Sou seu homem.
Algo no modo que Iain disse isso incomodou Joseph. Pareceu vazio. Oco. Sem emoção.
Talvez o tempo de Iain tivesse acabado, e esse fosse seu último ato heroico. Joseph não se atreveu a perguntar. Não queria dizer adeus ao seu velho amigo.
— Está dizendo que pode fazer isto e ainda dormir no fim do dia?
— Quem disse que eu durmo? — disse Iain, depois que saiu.
Joseph nem sequer podia escutar seus passos fortes ressoando no corredor silencioso.
Lexi tinha suas dúvidas quando pararam no estacionamento de cascalho do deteriorado restaurante. Estava no final de um longo caminho de terra, a quilômetros da estrada, e completamente sem acesso, mas o estacionamento estava cheio pela rapidez do jantar, o que tinha que significar algo naquela parte quase deserta do mundo.
— Vou usar o banheiro das senhoras. — disse Lexi.
Ele olhou para seu pulso para se assegurar que o bracelete ainda estava em seu lugar, encadeando-a a ele. Quando viu que ela não tinha encontrado uma maneira de tirá-lo disse:
— Vou conseguir uma mesa para gente. Não demore.
Lexi voltou pela porta que conduzia aos banheiros e ao telefone público. Tinha um montão de moedas em seu bolso pelas gorjetas da noite passada, e começou a colocá-las no telefone. Discou o número de Jake Morrow, que sabia de cor, rezando que ele estivesse para não ter que deixar uma mensagem.
— Olá. — disse ele, parecendo desconfiado com apenas essa palavra de saudação.
— Sou Lexi. Não tenho tempo.
— Está bem?
— Sim. Bom. Só queria informar você onde deixar meu carro. Zach vai mandar consertá-lo e trazê-lo para mim quando chegar ao complexo.
— Estivemos vigiando-o, e alguém o guinchou para uma oficina hoje cedo. Falei com o dono e ele disse que tudo foi pago adiantado, tudo o que precisava ser feito. Supõe-se que ligará quando estiver arrumado.
— Zach já deve ter seus homens nisso. — Lexi se inclinou, e olhou pela porta, verificado para assegurar-se que Zach não se dirigia para lá.
Não viu nem sinal dele.
— Tem certeza que ficará bem com isto? — perguntou Jake.
Parecia preocupado, e ela queria abraçá-lo por sua preocupação. De todos os Defensores, era o único que parecia se preocupar com o que ia acontecer com ela. Os outros, tudo o que viam nela era uma espécie de ferramenta para ser usada e desprezada segundo fosse necessário.
— É óbvio. Tentarei ligar de novo quando puder, mas este foi o primeiro telefone a que tive acesso que não pertencia a Zach. Não quero que seja capaz de rastrear seu número.
— Se estiver em apuros, não se preocupe com isso, ok? Apenas me ligue.
— Tenho que ir antes que ele venha me buscar. Fique tranquilo, eu entrarei em contato.
— Tome cuidado, Lexi. Mantenha-se a salvo.
— Obrigado, Jake. Você, também. — Lexi desligou e foi encontrar sua mesa.
À medida que se aproximava, Zach sorria para ela, como se estivesse feliz de vê-la. Como se fosse seu amigo.
O estômago de Lexi se retorceu de vergonha. Ele não tinha nem ideia do que ela estava planejando. É óbvio, esse era o ponto, mas de algum modo dizer isso a se mesma não a fazia sentir-se nada melhor que uma cadela mentirosa.
Eles tentam enganar você. Usam poderes mentais para atraí-la. Então consomem seu corpo até deixá-lo seco e deixam seu cadáver se decompor.
As palavras de advertência de mamãe. Havia centenas de outros como eles, também. Lexi tinha que recordar isso e se endurecer contra qualquer culpa que pudesse sentir. Aquilo era um trabalho. Estava fazendo o correto, salvando inúmeras vidas humanas. Se gostava ou não do trabalho era irrelevante. Alguém tinha que fazê-lo, e ela era a melhor candidata.
Assim, afastou qualquer culpa residual e fingiu que tudo estava bem. Queria estar ali, tendo um almoço agradável com Zach. Queria que ele a levasse para casa. Queria que fossem amigos.
Fingir era mais fácil se esquecesse por que o estava fazendo, assim foi isso que fez. Noventa minutos depois, estava cheia e mais à vontade com Zach do que teria pensado possível.
Ele não a importunou falando sobre sua decisão de transformá-la em sua companheira, ou falou de nada sério durante o jantar. Em vez disso, falou sobre coisas pequenas, como a forma que tinha encontrado aquele lugar tão longe da estrada utilizada uma noite quando seu carro se quebrou, e como ele, e seus amigos, faziam um concurso para encontrar os melhores lugares para comer no país.
Disse que era o campeão reinante, e Lexi tinha que concordar.
Mas quando saíram pela porta do restaurante, sua encantadora atitude quase brincalhona mudou de repente. Seus olhos claros estavam brilhantes e atentos e conduziu casualmente Lexi de forma a ficar entre ela e as terras de cultivo abertas ao seu redor.
Zach se aproximou o suficiente para que ela pudesse sentir o calor de sua pele fluindo entre eles, a tensão envolvendo seu corpo musculoso. Ele tomou uma profunda inspiração pelo nariz, como se estivesse farejando o ar.
— Tudo bem? — perguntou Lexi.
A ansiedade secou sua boca, e teve certeza que definitivamente algo não estava bem.
— Não. — disse Zach enquanto a segurava pelo braço e a puxava para a caminhonete, quase a levando para apressá-la.
Estava estacionada no lado oposto do estacionamento. A hora do jantar tinha terminado e todos os carros que ocupavam o estacionamento antes tinha ido embora agora, deixando o lugar quase deserto. O ar fresco da noite de repente pareceu gelado contra sua pele, e só o calor dos dedos fortes de Zach ao redor de seu braço a impedia de tremer.
— Acredito que podemos ter visitantes. — disse Zach com a voz tensa.
— Visitantes?
— Synestryn.
— Suas mascotes estão aqui? — gritou ela antes de poder deter-se.
Zach deu um olhar aguçado.
— Não são nossas mascotes, Lexi. Não sei onde você ouviu isso, mas os Synestryn são um pouco menos amistosos que os leais cães. São nossos inimigos, e nos matarão se nos encontrar. Não posso pôr você em risco assim.
Não podia pô-la em risco? O que acontecia a ele?
Abriu a caminhonete e a empurrou sobre o assento do motorista.
— Tome as chaves. — disse. — Preciso manter as mãos livres para lutar.
Pegou seu braço, o que levava o bracelete de correte de ouro, e fechou os olhos durante um breve segundo. Uma quente faísca de poder disparou-se através de seu pulso e o bracelete se abriu. Ele o pegou e guardou no bolso.
Lexi fez um gesto interrogativo para ele.
— Não quero que fique presa ao meu lado se as coisas ficarem feias. — disse ele.
O medo entrou girando dentro de seu ventre, ameaçando empurrar sua comida para fora todo o caminho.
— Feias?
Um horripilante uivo quebrou a noite, silenciando os grilos nas proximidades.
— Há um mapa no porta-luvas. Nele há um ponto de tinta vermelha ao nordeste da cidade do Kansas. Isso é Dabyr. Vá para lá. Diga a eles quem é e eles a deixarão entrar. Eu me encontrarei com você.
— Quer que eu o deixe aqui? — perguntou ela.
Sentada na alta caminhonete, tinha uma boa vista do milharal. Os altos caules do milho se separaram enquanto algo grande se aproximava. Vários algo.
— Não posso deixar estas pessoas aqui a sua própria sorte. Tenho que ficar e lutar.
— Você sozinho?
Ele piscou um olho para ela.
— Não está disposta a me ajudar, entretanto desejaria como o inferno que o fizesse. Vá agora. Não há mais tempo.
Zach a fechou dentro da caminhonete e tirou uma espada que tinha sido invisível há apenas um momento. Afastou-se, em direção ao limite do milharal, seus passos seguros e estáveis.
A mão de Lexi tateou as chaves, tentando separar a que necessitava do restante. Enfiou-a na ignição na terceira tentativa, e a caminhonete arrancou facilmente. Nada a ver com seu antigo Honda.
O que quer que estivesse lá fora no milharal se aproximava rapidamente, estava a apenas uns quarenta e cinco metros de distância agora. Zach tinha se movido até a borda dos caules altos, colocando-se entre as pessoas do restaurante e o que quer que se dirigisse em sua direção. Ele levantou a mão preparando-se, e ficou lá, esperando.
Lexi não queria deixá-lo ali sozinho. Ele disse que aquelas coisas não eram suas mascotes. A forma que agia demonstrava que não mentia.
Outro profundo uivo fez Lexi saltar. Um espesso e oleoso medo se fechou ao redor de sua garganta até que só pôde respirar entrecortada e superficialmente.
Tinha que sair dali. Zach poderia cuidar de si mesmo. Não ficaria ali sozinho se não pudesse. Poderia?
Seus pés não conseguiam tocar nos pedais, assim deslizou para frente no assento. O primeiro Synestryn irrompeu no campo, entrando em seu campo de visão.
Era um monstro enorme e descomunal, tão largo quanto alto. Longas presas irrompiam de sua mandíbula, jorrando saliva. Tinha um focinho largo e coberto de longos espinhos de cima a baixo. Sua pele espinhosa brilhava úmida na penumbra, e todos aqueles espinhos se sacudiram à medida que a coisa pousava os olhos sobre Zach.
O corpo de Lexi se imobilizou de terror. Nunca tinha visto algo assim antes.
Um som alto e sibilante saiu da coisa, e Zach caiu no chão, caindo contra a terra seca. Dezenas de espinhos foram disparados pela pele do monstro e alguns deles se incrustaram em uma árvore próxima. Só uma fração de centímetros dos longos espinhos se sobressaíam da casca dura.
Lexi não queria pensar no que teria acontecido ao corpo de Zach se tivesse sido nele. Era duro, mas um inferno muito mais brando que aquela árvore.
Antes que ela tivesse tempo ao menos para dar sentido ao que estava vendo, Zach estava de novo de pé, espada na mão, aproximando-se do monstro. Sua espada brilhava enquanto ele atacava, mas Lexi não o viu. Um movimento mais distante no campo exigiu sua atenção.
Havia mais três coisas se aproximando rapidamente. Não sabia se eram iguais a coisa com quem Zach estava brigando ou não, mas estava bastante segura que não importava realmente. Quatro contra um não era o tipo de probabilidade contra a qual um homem sobrevivia.
Tentou se auto-convencer de que não se importava se ele sobrevivia. Não precisava mais dele. Tinha sua caminhonete, dinheiro, um mapa, a Helen e seu carro a caminho. Tinha tudo o que precisava para chegar a Dabyr e arrebentá-lo. Ele até mesmo a desencadeou, libertando-a para que fugisse sem adoecer.
Por que havia feito isso? Porque não queria machucá-la? Ou porque sabia que ia morrer?
Lexi não sabia. Não compreendia por que a tinha libertado quando ficou claro que tinha a intenção de aprisioná-la por toda vida.
O que sabia era, até que separasse a verdade das mentiras, ela não podia deixar Zach morrer.
Ligou a caminhonete e pisou no acelerador. O cascalho voou das rodas, mas a caminhonete começou a andar velozmente. Foi em direção ao campo, e se dirigiu para os dois monstros que estavam no meio do milho seco. Eram os dois únicos perto o suficiente para poder chegar aos dois de uma vez.
Um rápido olhar em direção a Zach lhe disse que ele se ocupou do primeiro monstro, deixando-o em pedaços sangrentos no chão. Um segundo saltou do milharal, disparando seus espinhos ao passar. O corpo de Zach se arqueou enquanto ele se esquivava da orvalhada, mas seu ombro se moveu para trás quando uma das pontas agudas bateu no alvo.
Oh, merda. Isso não podia ser bom.
Lexi lançou-se para trás conduzindo exatamente quando o para-choque dianteiro golpeou o primeiro monstro, seguido de perto pelo segundo. A caminhonete saltou no ar quase um metro, e ouviu um som agudo do estouro de pelo menos dois pneus quando os espinhos os furaram.
Um forte ruído, como granizo batendo no teto da caminhonete, ricocheteou de baixo. Três daqueles desagradáveis espinhos foram disparados através das placas do piso a apenas alguns centímetros de seus pés, passando perto dela e alojando-se no teto da caminhonete.
Lexi gritou, e instintivamente se afastou do ataque. Sem seu pé sobre o acelerador, a caminhonete desacelerou rapidamente, varrendo um amplo setor dos pés de milho a baixo.
Olhou pelo espelho retrovisor, procurando sinais de movimento dos dois a quem tinha esmagado. Estavam caídos em úmidos montões, retorcendo-se, mas não se levantando.
Empurrou o acelerador, puxando com força o volante, virando a caminhonete para outra passagem. Freneticamente, examinou a área onde tinha visto Zach pela última vez e não viu nada, nem sequer o movimento no milho ou a ponta da lâmina brilhando sobre os caules.
O pânico se apoderou dela, esvaziando-a, como se estivesse flutuando acima de seu corpo. Parecia que tinha demorado uma eternidade pôr à caminhonete no caminho correto.
Zach estava ferido? Morto?
A ideia a deixou gelada e tremendo.
Armou-se de coragem contra o que ia fazer a seguir enquanto os pneus murchos rangiam sobre os corpos dos monstros. Se eles se levantassem agora, sabia que era o momento de correr.
Lexi parou a caminhonete, preocupada que Zach estivesse escondido no milharal. Estendido no chão, ferido e sangrando. Se batesse nele, nunca seria capaz de viver consigo mesma.
Saiu da caminhonete ligada saltando da cabine. Um úmido som gotejante saiu de debaixo da caminhonete, mas disse a si mesma que era só condensação do ar condicionado, não pedacinhos moles de tripas de monstro.
Desarmada e desesperada, Lexi fez o caminho de volta para onde tinha visto Zach pela última vez. Os cadáveres de dois monstros jaziam ali, gotejando lentamente espesso sangue negro sobre o chão.
Zach não estava em nenhum lugar.
— Zach! — gritou.
Nem sequer se importava que alguma das pessoas que permaneciam na churrascaria a ouvisse. Os Defensores e sua mãe sempre lhe disseram que tinham que manter todo aquele assunto de monstros em silêncio, mas isso não lhe importava de forma alguma agora. Precisava encontrar Zach.
Chamou seu nome outra vez, mas não obteve resposta. Então pensou ter ouvido algo. Um profundo gemido.
Lexi parou repentinamente, deixando os sussurros das plantas ao seu redor parar.
Ali estava de novo. Definitivamente um gemido.
Foi em direção dele, gritando o nome de Zach, rogando que estivesse bem, melhor do que parecia.
Não estava. Seu grande corpo estava estendido no chão, sua espada caída a poucos metros de distância. O sangue gotejava do ombro da camiseta. Não podia ver o espinho, e não sabia se estava incrustada nele, ou se o havia travessado. Sua pele morena estava brilhando de suor, mesmo quando seu corpo estremecia com calafrios.
— Zach. — suspirou enquanto ia para seu lado.
Ele abriu os olhos e suas pupilas eram pequenos pontinhos de cor negra. Não era um bom sinal.
— Vá embora, Lexi. Podem sentir o cheiro de meu sangue. Virão mais.
— Está louco se acredita que vou deixá-lo aqui. Vamos juntos.
Ela puxou seu braço saudável, tentando levantá-lo e pô-lo de pé. Cara, era pesado, mas conseguiu pôr seu ombro debaixo do dele e, com sua ajuda, levantou-o. Estava trêmulo e ela cerrou os dentes contra a dor de mantê-lo levantado. O homem estava cheio de fortes músculos e provavelmente pesava o dobro dela.
Se não o enfiasse na caminhonete enquanto ele ainda podia ajudar, nunca o faria.
— Espada. — disse ele, parecendo quase em pânico.
— Deixe-a. Pode conseguir outra.
— Não! — virou-se para a coisa e Lexi não teve outra escolha se não o ajudar a chegar até ali ou deixá-lo cair.
Aparentemente era muito importante para deixá-la para trás.
Sustentou-o com uma mão enquanto pegava a arma, mas não tinha onde pô-la. Frustrada, colocou-a embaixo do braço, prendendo-a ao seu flanco, rezando para não cortar a um deles com a perversa lâmina.
Satisfeito, Zach cooperou de novo com ela e se dirigiram para a caminhonete.
— Isso. — disse ofegando sob seu peso, agradecida de não ser mole. — Quase chegamos.
— Não vou durar muito mais tempo. — disse a ela. — Veneno.
— Infernos que não. Apenas me diga o que fazer.
Chegaram à caminhonete e o apoiou contra ela enquanto manuseava para abrir a porta do acompanhante. Conseguiu abri-la, ele entrou de cabeça, desabando contra o assento, mas era bom o suficiente.
Lexi jogou a espada no piso aos seus pés, fechou a porta e correu em volta da caminhonete. Ia dirigir com os aros, mas isso era muito ruim. De maneira nenhuma ia ficar o tempo suficiente para arrumar os pneus e ver quem mais se apresentava.
— Fita adesiva. — sussurrou Zach.
Não tinha nem ideia do por que a queria, mas não parou para fazer perguntas estúpidas.
— Onde está?
— Caixa. Sob o assento.
Ela a encontrou e já estava puxando a ponta.
— O que faço com ela?
— Cubra meu ferimento. Jogue a camiseta fora como distração. O sangue.
Correto. Eles podiam cheirá-lo.
Lexi ficou de joelhos sobre o assento e puxou com força a camiseta de Zach. Ele gemeu de dor, revolvendo seu estômago, mas ela não parou ou tentou ser mais suave. Agora não era o momento de ser suave. Ou lenta.
A camiseta caiu, ensopada de sangue e suor. Ela a usou para limpar o fiozinho de sangue que saia do ferimento enrugado. Não conseguiu ver se o espinho o transpassou ou não, mas precisava deter o sangramento, assim usou uma tira da fita para enfaixá-lo, cobrindo tanto a parte de trás como a parte da frente de seu ombro. Ia doer como o inferno quando a tirasse, mas lidariam com isso mais tarde. Supondo que ele vivesse o suficiente.
— Jogue a camiseta pela janela. Se não for ela, me jogue.
Lexi esmagou a onda de pânico que crescia dentro de dela.
— Isso não vai acontecer.
Ele estendeu a mão para o trinco, mas Lexi bateu no botão que a bloqueava para que não se abrisse. Ele tentou acionar o interruptor de seu lado, mas seus dedos estavam tremendo tanto, que ele não conseguia fazê-lo funcionar. Deixou-se cair no assento e seu braço caiu flácido ao seu lado.
Lexi pôs a caminhonete em movimento e se dirigiu à estrada. A camiseta de Zach estava ao alcance de sua mão, preparada para ser jogada, mas não ia fazer isso tão perto do restaurante. Não queria atrair mais monstros para as pessoas agradáveis e indefesas.
Os dois pneus dianteiros estavam lisos e ela tinha problemas de direção, mas conseguiu levar mais de quatro quilômetros e meio caminho abaixo. Jogou a camiseta pela janela e seguiu adiante.
Zach estava fazendo ruídos baixos de dor, mas não havia dito uma palavra em vários minutos. Estava caído languidamente no assento, deslizando cada vez que ela fazia uma curva. Aproximou-se e pressionou uma mão contra sua testa.
Estava queimando.
Um medo doentio e desamparado levantou-se em seu interior. Isso era como quando a mãe tinha morrido. Ela a encontrou muito tarde. Não havia nada que pudesse fazer. Lexi tinha sido uma adolescente, perdida, sozinha e assustada.
Não podia passar por isso outra vez. Dessa vez, tinha que fazer algo para deter aquilo.
Mantendo um olho sobre a estrada, tateou a pele quente de Zach até que encontrou seu cinturão e o celular enganchado nele. Sabia o número de Helen de cor. Discou-o enquanto verificava o indicador da gasolina. Só restava um quarto do tanque e não estava fazendo um bom tempo. O motor estava rugindo, mas os pneus estavam realmente diminuindo a velocidade, tornado difícil o avanço, mesmo com a direção hidráulica.
Helen atendeu após vários toques.
— Alô. — parecia sem fôlego e sua voz estava fraca pela fadiga.
— Helen. Zach está em apuros. Foi envenenado.
— Oh, não.
— O que faço?
Ouviu-se um ruído na linha.
Uma voz de homem saiu pelo telefone, forte e confiante. Drake.
— Lexi, está a salvo?
A pergunta a surpreendeu. Não esperava falar com Drake, nem teria pensado que sua segurança fosse ser a primeira coisa em sua mente.
— Sim, mas Zach não.
— Diga-me o que aconteceu.
Zach deixou escapar um profundo gemido e Lexi apertou mais o volante.
— Foi algum tipo de coisa porco-espinho. Um espinho atravessou o ombro de Zach.
— Só um? — perguntou Drake.
— Acredito que sim.
— Está consciente?
Lexi engoliu com dificuldade para aliviar o aperto na garganta.
— Na realidade não. Está suando e tremendo.
— Não se assuste, certo? Vamos arrumar isso, mas preciso que você detenha a hemorragia.
— Já fiz isso. Ele me fez colocar fita adesiva sobre o ferimento.
— Isso funcionará. — disse Drake. — Onde está?
— Kansas. Em sua caminhonete.
— Que cidade?
— Não sei. Ele me levou para uma churrascaria no meio do nada. — não conseguia recordar o nome e entrou em pânico de novo.
Drake devia ter percebido isso em sua voz.
— Tudo bem, Lexi. Conheço o lugar, mas você não pode ficar parada. Tem que se manter em movimento.
— Estou, mas os dois pneus dianteiros de sua caminhonete estão furados, e estamos quase sem gasolina.
Ela o ouviu pronunciar uma maldição vil, mas abafada, como se ele tivesse coberto o fone, não querendo que ela a ouvisse.
— Ficará tudo bem. Deve ter alguém por perto que possa ajudar. Basta ficar fora das estradas principais para que a polícia não a pare, certo?
— Sim. Posso fazer isso. — esperava. — Pode adivinhar onde fica o hospital mais próximo?
— Os médicos humanos não podem ajudá-lo, mas me dê dois minutos e encontrarei alguém que possa.
Antes que ela pudesse responder, a voz de Helen voltou para a linha, cheia de alegria fingida.
— Ei, Lexi. Drake foi encontrar ajuda para você, mas nós nos poremos em dia como nos velhos tempos enquanto ele está trabalhando nisso.
Era difícil manter o telefone na orelha enquanto dirigia a caminhonete, mas Lexi necessitava do apoio da voz de sua amiga para manter o equilíbrio. Muita coisa estava acontecendo muito rápido.
— Que tal começar me dizendo por que parecia tão cansada quando eu liguei. Não deixam você dormir?
— Estou ajudando a reconstruir o muro. É exaustivo, mas necessário.
— Pensei que havia muitos homens robustos aí. Que eles façam o trabalho pesado.
— Não estou construindo-o fisicamente. Estou empurrando um montão de magia nele para torná-lo mais forte. Muito pretensioso, não é?
Lexi não tinha certeza de que pretensioso fosse a palavra que usaria, mas não queria entrar em uma discussão sobre sua opinião agora.
— Se você está dizendo. Fez as malas como eu lhe disse?
— Não. Lexi, eu…
— Se não puder falar, eu entendo. Apenas me diga algo mundano e pegarei.
— Não é isso. Sou livre para dizer o que quiser. Só acredito que você pode ter adquirido algumas ideias equivocadas a respeito destas pessoas em algum momento.
— Estão fazendo você dizer isso, não é verdade?
— Não. — Helen deixou escapar um suspiro. — Escute, seria mais fácil falar disso pessoalmente quando estiver aqui.
— Supondo que eu chegue tão longe.
— Fará. — disse Helen. — Estou vendo o líder dos Sentinelas cruzar o pátio. Já está com seu telefone, chamando provavelmente os homens de todas as partes para virem ajudá-la. Não a desapontarão.
A ideia de um punhado de homens como Zach aproximando-se dela era mais que um pouco desalentadora. Mal podia manter a cabeça com um grande e sexy Sentinela. Mais de um ia ser muito difícil de controlar.
— Não. Não quero um punhado de gente me caçando.
— Não vão caçar você, Lexi. Vão ajudá-la.
Lexi ainda não estava convencida. Ao menos se soubesse o que estava a caminho, podia deixar Zach em algum lugar onde sua gente o salvasse. Não tinha que ficar.
— Oh, espere um segundo. — disse Helen. — Drake voltou.
Ele voltou para a linha, sua voz profunda enchendo seu ouvido de serena confiança.
— Ronan vai se encontrar com você em uma casa Gerai perto de onde está. É como um médico. Pode ajudar Zach, certo?
Lexi não tinha certeza de confiar em nada que Drake dissesse, e tinha menos certeza ainda de querer esse Ronan perto dela. A boa notícia era que era apenas um homem, Lexi não teria problemas para ir embora enquanto ele estivesse ocupado ajudando Zach. Ia encontrar uma maneira de tirar as chaves do homem e dirigir-se a Dabyr por si mesma.
Lexi endireitou a coluna, e esperou não estar cometendo um enorme erro.
— Basta me dizer aonde ir.
Grace mal conseguira levar a pesada bandeja através da porta da suíte sem derrubá-la. Havia bastante comida para alimentar ao menos três Theronai, mas ela só estava preocupada em conseguir que um deles comesse.
Torr.
Ele tinha deixado de comer há mais de uma semana e, nem apelar à lógica nem implorar a ele, tinha servido para que mudasse de opinião. Ia empenhar-se inteiramente. De forma alguma ela iria observá-lo morrer de fome só porque queria morrer.
Grace não estava preparada para isso ainda, e provavelmente nunca estaria.
Joseph Rayd, o líder dos Sentinelas, estava ali com ele quando ela entrou, falando em voz baixa. Nenhum dos homens notou sua entrada.
— Não. — disse Joseph, sua voz dura e inflexível. — É muito cedo.
— É minha vida. Minha escolha. Se minhas pernas ainda funcionassem, teria respeitado meus desejos. — a raiva de Torr fazia que o estômago de Grace se encolhesse com força.
— Não vou enviar você para os Caçadores para ser assassinado. Ainda tem muitas folhas para ficar dois ou três anos.
— Dois ou três anos inúteis. Não posso brigar. Estou drenando recursos preciosos que não temos para esbanjar. Tem ideia de quanto sangue os Sanguinar desperdiçaram em mim?
— Não é um desperdício, maldição. Encontrarão uma cura para esta coisa. Apenas lhes dê mais tempo.
Torr ficou em silêncio durante um longo tempo.
— Estou muito ferido, Joseph. Acha que porque estou paralisado isto já não dói, mas a pressão continua se construindo dentro de mim, nem sequer posso me exercitar o bastante para aliviá-la.
— E a meditação? — perguntou Joseph.
— Tentei isso. Já não ajuda.
Grace ouviu a dor batendo contra ele do outro lado do quarto e teve que morder o lábio para se impedir de correr para ele e oferecer qualquer comodidade que pudesse lhe dar.
— Enviarei Tynan. — disse Joseph. — Ele pode injetar seu sangue em você e ajudar a diminuir a dor, só por um momento.
Torr sacudiu ligeiramente a cabeça.
— Não. Não posso ir por esse caminho. Vou morrer sóbrio para que todo mundo saiba que estou com minhas faculdades mentais perfeitas.
— Você não vai morrer de forma alguma. Ordeno a você que coma até que encontremos uma cura.
Torr forçou uma risada mordaz.
— É realmente insistente, cara. Deixe disso. Eu tenho isso.
Joseph colocou uma mão sobre o ombro de Torr, embora Torr não pudesse sentir isso.
— Não vou me render contigo. Precisa saber isso.
Grace decidiu que esse era o momento para fazê-los notar sua presença antes que ouvisse algo que não deveria.
— Eu tampouco vou me render com ele.
Joseph olhou para ela e se apressou a ajudá-la com a porta. Ao Torr, disse:
— Vê, já não sou o único que pensa em seu bem-estar. — dedicou a ela uma galante inclinação de cabeça. — Boa tarde, Grace.
Grace viu seus olhos, sentindo a repentina urgência de fazer uma reverência. É óbvio, se tivesse feito, teria derrubado a bandeja repleta de comida, assim inclinou a cabeça.
— Senhor Rayd.
— Joseph. Pode me chamar de Joseph como todo mundo.
Não, não podia. O homem tinha ganhado um lugar como líder de todo aquele poderoso grupo de pessoas. Se alguém merecia respeito, esse era ele.
— Obrigado. — sussurrou ela, mantendo os olhos baixos, olhando para suas mãos.
Sabia que ele nunca bateria nela, mas alguns hábitos eram mais difíceis de interromper que outros.
Aprender a se esquivar de punhos era um deles.
Joseph sustentou a porta enquanto ela entrava, para sair por ela.
— Já que você está aqui, vou fazer meu trabalho. Obrigado por cuidar dele.
— De nada. — disse Grace.
Joseph partiu, deixando Grace a sós com Torr.
— Como está esta noite? — perguntou ela.
— Vá embora. — veio a voz brusca dele da sala de estar.
Estava de costas para ela. Estava olhando para a noite, observando o lento processo de reconstrução do muro em ruínas à distância.
— Trouxe o seu jantar. — ela disse, mantendo a voz cuidadosamente neutra.
— Foda-se.
Grace ignorou a rudeza dele e pegou uma mesinha portátil para pôr a comida.
Ele nem sequer se dignou a dar uma olhada nela.
Ela foi para frente de sua cadeira de rodas e cruzou os braços sobre o peito. Seu longo corpo estava amarrado com correias, segurando-o erguido. Não parecia saudável de forma alguma. Estava um pouco magro, é óbvio, mas isso não era nada que a preocupasse. Eram os círculos escuros sob os olhos e a fraqueza de sua pele e cabelos que a preocupavam. Ele não estava assim de manhã, quando tinha vindo dar uma olhada nele antes de ir trabalhar. Realmente ele tinha desistido da vida.
Seus olhos âmbar deslizaram sobre seu corpo da cabeça aos pés. Todo lugar que seu olhar tocava se esquentava um pouco. Tanto quanto odiava admitir isso, gostava da maneira que ele a olhava como se fosse algo para mergulhar no chocolate e lamber até limpar.
Vindo de outro homem, isso possivelmente a teria intimidado, mas não de Torr. Ele não podia feri-la. Nem sequer podia mover-se, e se sentia completamente a salvo com ele.
— Lasanha, frango Alfredo ou pizza de pepperoni? — perguntou a ele.
Ele tinha um fraco pela comida Italiana e Grace não hesitou em utilizar aquela debilidade descaradamente.
Ele não disse nada, mas seus olhos deslizaram por ela, dispensando-a para irem olhar pela janela outra vez. Um resto de barba sombreava sua mandíbula e ela fez uma nota mental de barbeá-lo antes de sair. A ideia de ter uma razão para tocá-lo era muito difícil de resistir.
Um suspiro impaciente se construiu em seu peito, mas se negou a deixá-lo sair e deixá-lo saber que a afetava. Paciência e teimosia era a chave ali e Grace estava armada em abundância de ambas.
Alcançou uma cadeira em frente a ele e levantou a tampa do primeiro prato. O vapor da lasanha flutuou pelo ar, enchendo a sala com o aroma fresco do alho assado. Ela pegou uma porção com o garfo, mas em vez de levar aos lábios dele como em incontáveis ocasiões anteriores, comeu-a ela mesma.
Torr piscou surpreso, mas não disse nada. Ela ouviu seu estômago roncar sob sua pele frouxa e isso foi tudo o que pôde fazer para não chorar.
Ele estava deixando-se morrer — o único homem que a fez sentir-se a salvo. Uma raridade como ele não aparecia mais de uma vez na vida, e não ia deixá-lo partir sem lutar.
— Algo novo sobre a reconstrução do muro? — perguntou para quebrar o silêncio, então deu outra dentada.
— Não. Embora já devessem tê-lo feito.
— Não há bastante poder masculino. Ou poder feminino, como pode ser o caso. Só podem ir tão rápido quanto Helen e Gilda são capazes.
A boca de Torr se esticou e sua mandíbula se apertou. Ela quase podia senti-lo doendo-se para ir ajudar seus irmãos e desejava que houvesse algo que pudesse fazer para tornar isso mais fácil. Não importava quanto tempo ou com que força pensasse nisso, nada lhe ocorria. Não podia curar sua coluna, ou fazer que voltasse a caminhar, e essa era a única coisa que ele queria.
Deu outra dentada, embora engolir fosse o difícil. Sua garganta estava fechada, e tinha que lutar com as lágrimas que pareciam emergir cada vez que via a dor de Torr.
Ele olhou para a bandeja, então lhe deu lhe dedicou um olhar conhecedor.
— Isso não vai funcionar. Tomei minha decisão. Joseph não vai me dar uma morte honrosa, assim escolhi uma.
— Está se rendendo muito cedo, — disse ela. — passaram só algumas semanas.
— Se os Sanguinar fossem encontrar uma cura para mim, a estas alturas já o teriam feito. Tudo o que estou fazendo é esbanjar o valioso sangue quando é necessário em outros lugares. Ofereci-me para que Tynan bebesse de mim até me drenar, assim ao menos teria alguma utilidade, mas ele se negou.
— Vale à pena salvar você.
Desta vez, não conseguiu segurar as lágrimas que queimavam em seus olhos. Virou-se de modo que Torr não pudesse ver sua fraqueza.
— Já tive o suficiente, Grace.
Seu nome em seus lábios enviou um arrepio através dela. Sua voz era baixa e gentil, desprovida da cólera mordaz a que se acostumou.
— Mas o que acontece ao restante de nós? Não estamos preparados para deixá-lo partir.
— Alguma vez estariam? É mais fácil ter esperança quando não é o único acorrentado a esta cadeira dia e noite. Não sabe o que é isto.
— Não, mas ocuparia seu lugar se pudesse.
Sua voz se endureceu com raiva.
— Não permitiria isso. Ninguém merece esse destino. Especialmente você.
Grace sorveu o muco do nariz silenciosamente e tentou limpar sutilmente os olhos com a manga. Tinha que se recompor. Só estava tornando as coisas mais difíceis para ele e não queria isso. Ele já tinha que aguentar muita coisa.
Foi até ele e se ajoelhou em frente de sua cadeira.
— Por favor, Torr. Dê-se um pouco mais de tempo.
Ele baixou os olhos para ela, seus olhos deslizando sobre o rosto dela de uma maneira quase palpável.
— Eu vivi muito mais tempo que você. Passei minha vida lutando contra o mal e sendo útil. É hora de desistir.
— Mas lá fora pode haver uma mulher que pode salvá-lo, uma como Helen ou Andra.
Só a ideia era suficiente para fazer que o estômago de Grace desse um nó de ciúmes, mas ignorou aquela ação egoísta. Ela queria que ele ficasse melhor, até mesmo se isso significasse não vê-lo nunca mais.
— Se estiver lá, nunca a encontrarei. E mesmo se fizesse isso, quem disse que isso me faria algum bem? Fui envenenado, Grace. Minha medula espinhal praticamente se derreteu aonde aquele slug se uniu. Simplesmente não se conserta algo como isso.
— Você não sabe. Apenas supõe.
Sua boca se transformou em uma linha.
—Por que se importa tanto?
Grace teve que afastar o olhar. Não podia deixar que ele visse a verdade em seu rosto. Como tinha se apaixonado facilmente por ele. O quanto o amava.
— Ajudou a salvar minha vida.
— Não a vejo vagueando ao redor de Iain ou Alexander, e ambos estavam lá também naquela noite.
— Mas eles não precisam de mim. — sussurrou ela.
— Nem eu tampouco, Grace. — suas palavras a golpearam como um punho e ela mal ouviu o restante do que ele dizia. — Eu já não necessito de ninguém. Tudo o que quero agora é que me deixem morrer em paz.
Ela agarrou sua mão e a pressionou contra sua face. Estava fria, inerte e sem vida, mas a sustentou ali, necessitando que ele a tocasse, mesmo ele não conseguindo sentir.
— Dê-se apenas outras poucas semanas. Por mim.
Ela o viu engolir, sua garganta movendo-se como se repentinamente tivesse ficado seca.
— Não precisa se sentir culpada. Meus ferimentos não são culpa sua.
— São, ao menos em parte. Se não tivesse salvado a mim e a meu irmão, nunca teria estado em posição de ser envenenado por aquela coisa.
— Eu não a culpo.
— É óbvio que não. É bom, um homem nobre. É melhor que isso.
— Não sou tão nobre quanto pensa que sou. — disse ele.
Ela não acreditou nem por um segundo.
— Continue dizendo isso a si mesmo se quiser, mas não vai me convencer.
— Maldição, Grace! Não sou nenhum herói.
Ela se sobressaltou ante seu tom áspero, mas se manteve no lugar.
— Sim, é.
Sua face se sombreou e seus olhos se iluminaram com algo que ela nunca tinha visto antes, algo perigoso e hipnótico.
— Não, não sou. E se pudesse me mover, de fato, saberia por que já teria tido você em minha cama.
A surpresa encheu seus pulmões, fazendo-a ficar tonta. Agarrou-se a seus joelhos para estabilizar-se e levantou os olhos para ele, sacudindo-se para ancorar-se à realidade.
— Quer dizer… — não pôde acabar a frase.
A ideia de que ele a desejava era muito ridícula para sequer considerá-la.
— Sexo. Quero dizer sexo, Grace. Teria utilizado seu conveniente caso de adoração por seu herói para conseguir me colocar entre suas pernas. Teria transado com você e teria ido combater uma nova batalha — para encontrar a próxima conquista — antes mesmo que você tivesse tido tempo de despertar e saber que eu tinha partido.
Ela sacudiu a cabeça, fazendo seus cachos se espalharem ao redor de seu rosto.
— Não acredito em você. Só diz isso para me assustar e ir embora, deixando-o sozinho.
— Quer apostar? — perguntou ele. — Já não sou um homem de verdade, mas aposto que se formos criativos, ainda posso fazer você gozar só com minha boca. Isso talvez seja a única coisa que resta de valor.
Oh, Deus. O interior de Grace vibrou e sua pele parecia que tinha sido destruída por uma corrente elétrica. Tinha que manter-se afastada, pôr um pouco de distância entre eles.
Estava no meio da porta quando percebeu o que ele tinha feito, e parou repentinamente. Estava tentando assustá-la para que partisse. Queria que ela fugisse e quase tinha conseguido.
Grace fechou os olhos e suplicou em busca de força. Não sabia se ele queria dizer o que havia dito, ou se tinha sido tudo um jogo, mas ia engolir sua lábia.
Fechou a porta e passou o ferrolho, de modo que ninguém pudesse entrar, então cruzou a sala e puxou as cortinas sobre os trilhos.
— O que está fazendo? — perguntou Torr.
Seu corpo estava tremendo por dentro, e uma camada fina de suor havia aparecido sobre suas costas, mas ia fazer isso. Não podia deixá-lo morrer.
Seus dedos foram para os botões de sua camiseta.
— Vou dar o que você quer. — disse, orgulhosa de como sua voz soava segura e estável.
— Que diabos se supõe que isso quer dizer?
O primeiro botão se soltou e ela viu como os olhos dele se fechavam sobre suas mãos.
— Quer dizer que vou deixar você… Fazer isso comigo. — nem sequer podia pronunciá-lo. Não era forte o bastante. — tirarei uma peça de roupa por cada bocado de comida que cama.
— O que é isto, algum tipo de brincadeira de mau gosto?
— Não é uma brincadeira.
— Pare, Grace.
Outro botão aberto.
— Não quer brincar? — tinha tentado parecer sedutora, mas não tinha nem ideia se estava conseguindo.
Nunca tinha se despido para um homem antes.
— Não. — foi fraco e menos enfático que antes.
Suas mãos hesitaram.
— Isso significa que não quer me ver nua? — perguntou.
Ele apertou sua mandíbula, mas não afastou os olhos. Nem tampouco negou.
Grace deslizou os dedos descendo para o botão seguinte. Este se abriu e ela abriu a camiseta o suficiente para que ele pudesse ver a borda de seu sutiã. Não era enfeitado ou de renda, mas Torr não parecia se importar. Parecia estar mais interessado no que ele cobria.
Ela se aproximou mais e se inclinou para frente. Seus seios não eram enormes, mas eram bastante grandes como os que os homens costumavam olhar. Nunca tinha gostado tanto deles como agora, vendo como as pupilas de Torr se expandiam e sua face se obscurecia de desejo.
Ele estava entrando no papel, e o céu a ajudasse, Grace também. Ela sentiu um pouco de poder atravessando-a, mas mais que isso, era uma sensação de vitória. Podia ver em sua cara. Ela tinha ganhado.
— Uma dentada e o restante da camiseta se vai. — coagiu ela.
— Foda-se. — grunhiu Torr. — Não pode fazer isso comigo.
— Eu posso e farei. — partiu um pouco de lasanha e a levou aos lábios dele. — Abra.
Ele lhe lançou outro olhar furioso antes que seus olhos deslizassem de volta ao “v” de sua camiseta. Então abriu a boca e comeu a comida que ela lhe oferecia.
Fiel a sua palavra, Grace abriu os restante dos botões e deslizou o tecido por seus ombros.
Pensou que isso a faria sentir-se suja, ou algum tipo de prostituta, mas em vez disso, tudo o que sentiu foi alívio. Tinha conseguido que ele comesse e isso era o que realmente importava.
Torr a observou mover-se, seu rosto uma mescla de raiva e luxúria, e algum tipo de fome desesperada que ela nunca tinha visto antes.
Indicou com um gesto do queixo a bandeja de comida e então fixou seus olhos sobre ela.
— Mais Grace. Quero mais.
Grace tinha ficado só de sutiã e calcinha quando Torr finalmente entrou em razão. Não foi fácil, no entanto, porque ela era constituída igual ao seu sonho úmido favorito. Seus seios eram cheios e redondos, assim como seus quadris, contudo, tinha ainda uma cintura fina que fazia ele desejar que suas mãos funcionassem só o suficiente para sentir sua pele. Todas aquelas curvas suaves o recordaram a mulher que tinha desejado em sua juventude, há séculos, antes que as revistas ditassem como acreditavam que deveria parecer uma mulher. Suas pernas não eram muito longas, mas eram do tamanho exato para rodear seus quadris e sustentá-lo firmemente enquanto ele se enterrava dentro dela.
Não que fosse ter essa sorte. Ela estava quase nua, de pé em frente dele e seu membro não parecia nem sequer notar, muito menos reagir. Sua mente estava totalmente embotada e preparada para ir, mas seu corpo imprestável apenas permanecia ali, zombando de sua incapacidade de agir.
A ira o golpeou com força, e desejou tanto que sua fantasia funcionasse —deixar que ela acabasse o que tinha começado e fazê-lo sentir-se igual, ou mesmo uma fração, do homem que tinha sido uma vez.
Mas não podia fazer isso com ela. Ela era muito doce e terna. Não merecia se tornar sua prostituta.
E isso era exatamente o que estava fazendo com ela. Estava obrigando-a a despir-se, pagando-a com pobres bocados de comida. Tudo porque ela não queria que ele morresse.
— Basta. — disse quando ela se esticou para trás para soltar o sutiã. — Pare.
Grace parou naquela embaraçosa posição.
— Não vou voltar a trás em minha palavra, Torr.
— Eu sei. Quero que pare.
Um belo rubor moveu-se por sua pele, subindo para suas bochechas. Ela tentou cobrir-se com os braços, como se de repente estivesse envergonhada por sua beleza.
— Por quê?
— Não posso deixar você fazer isto por um sentimento de dever. — disse ele. — Não é justo para você.
— Dever?
— Você se sente como se devesse isso a mim. Não é assim. Por favor, volte a pôr sua roupa. Comerei.
Torr nunca tinha visto ninguém vestir-se tão rápido como ela havia feito. Se ele tinha alguma dúvida se ela queria ou não ter feito aquilo, agora sabia que não era assim. Não que o surpreendesse. Por que demônios alguém ia querer se despir para um infeliz como ele? Grace merecia um homem de verdade — um que pudesse dar a ela tudo o que necessitava. Um que pudesse mantê-la a salvo dos Synestryn que queriam seu sangue.
Ela se sentou entre ele e a bandeja de comida. Ainda estava ruborizada e não o olhava nos olhos. Não que a culpasse depois de humilhá-la daquela maneira.
— O que você gostaria a seguir? — perguntou ela em tom vacilante.
— Sorvete. — disse.
Sabia que não tinha nenhum na bandeja e queria dar a ela uma desculpa para sair. Supôs, também, que não retornaria. Enviaria outra pessoa e ele não voltaria a vê-la.
Isso talvez fosse o melhor. Se ela voltasse a andar ao seu redor, não seria capaz de pensar em nada exceto no quanto estava bonita em frente a ele, quase nua. Pensaria nisso, e ela o veria, e voltaria a se envergonhar. Tudo o que deixaria entre eles seria desconforto e não queria isso para ela.
De uma maneira ou outra, não ia viver muito tempo. Eventualmente, Joseph veria que não havia esperança e lhe entregaria a sua morte. Quanto menos Torr estivesse ligado a Grace quando morresse, melhor seria para ela.
— Tudo bem. — disse ela. — Eu, uh, voltarei logo.
— Estarei aqui. — disse Torr, sabendo que ela não tinha intenção de voltar outra vez.
O homem que Drake tinha enviado para curar Zach estava esperando Lexi quando ela saiu da diminuta casa. Se Drake não estivesse com ela ao telefone, lhe dando indicações de para onde ir, nunca saberia que alguém vivia naquela granja longe da estrada.
A casa era de um andar, diminuta, talvez cada parede tivesse seis metros de comprimento e já muito bem iluminada. Ao lado, havia uma caminhonete preta e, sobre os degraus de cimento que dirigiam a casa, um homem alto e magro. Quando Lexi fez a curva, e as luzes da caminhonete iluminaram seu rosto, deu uma boa olhada nele.
Era maravilhoso — o tipo de homem que fazia uma mulher deixar de pensar e começar a despir-se. Seus olhos claros pareciam lançar pedaços gelados de luz azul quando os faróis o alcançaram. Seus cabelos castanhos estavam afastados de sua testa ampla por uma engenhosa onda, e seu longo casaco de couro preto se balançava lentamente na brisa de verão. Ele se dirigiu a caminhonete antes que ela acabasse de estacionar, e seus movimentos eram espontâneos, quase elegantes.
Lexi mal tinha desligado o motor quando ele abriu a porta de Zach.
— Sou Ronan. — anunciou, quando pressionou sua mão pálida sobre a cabeça de Zach e outra contra seu peito nu. A tatuagem da árvore que cobria Zach do ombro esquerdo a algum lugar bem debaixo de seu cinturão se balançava enquanto ele respirava. Os ramos estavam nus pelo que Lexi podia ver, e o diário de sua mãe a tinha advertido que tomasse cuidado com os homens marcados daquela maneira. Eles eram perigosos predadores — assassinos que caminhavam com aparência humana.
— Sou Lexi. — disse a Ronan quando desceu da caminhonete para ajudar.
Tão como era pesado Zach, Ronan ia precisar de sua ajuda agora que ele estava totalmente inconsciente.
Ronan deslizou o corpo de Zach para a borda do assento.
— Drake disse que o Synestryn que o feriu tinha espinhos. Foi assim?
— Sim.
— Sabe quantas vezes o golpeou?
— Só uma, acredito. Não sei se isto ainda está lá dentro.
Ronan assentiu.
— Vamos levá-lo para dentro e verificaremos.
Então, tirou Zach da caminhonete como se ele não pesasse nada.
O medo doentio subiu pela garganta de Lexi, fazendo-a ofegar. Ronan não era humano.
Aquelas pessoas não eram seus amigos. Eles haviam matado sua mãe. Tinham sequestrado Helen. Queriam seu sangue.
Ronan arqueou uma sobrancelha perfeita ante ela.
— Abre a porta para mim? — pediu ele.
Lexi sacudiu a si mesma e assentiu. Tinha que seguir seu jogo. Fingir ser a presa simpática e confiante. Até o exato momento em que apertasse o detonador.
Então, outra vez, talvez só tirar Helen e a senhorita Mabel fosse suficiente. Lexi não era uma assassina ou um soldado. Não queria participar daquela guerra. Tudo o que queria era que a deixassem em paz.
É óbvio, para conseguir essa paz — para ganhá-la para todos aqueles humanos lá de fora que não tinham nem ideia do que estava acontecendo realmente — teria que matar aqueles que a caçavam. Se quisesse ser livre e parar de fugir, teria que aguentar. Não deveria importar que seus inimigos fossem homens maravilhosos que fingiam querer mantê-la a salvo. Isso era apenas uma farsa.
E se não fosse?
Eu acho que você talvez tenha algumas ideias equivocadas das pessoas daí de fora sobre este lado da linha.
Isso foi o que Helen lhe disse. Ela parecia ter certeza de que Lexi era a única que estava equivocada, e estava vivendo com eles a mais de um mês.
Mas, e o que transmitia o diário de mamãe? E todas aquelas lições a respeito de como os Sentinelas utilizavam os humanos por esporte e comida? A mãe também parecia ter certeza disso.
Lexi desejou poder dizer o mesmo.
— Você é sensível? — perguntou Ronan.
Ele tinha voz profunda, rica e culta, como se tivesse sido criado fora dos Estados Unidos, ou em algum colégio exclusivo.
— Não particularmente.
— Bem. Vou precisar de sua ajuda. — estendeu Zach sobre a única cama da casa.
— Claro. Quer que eu traga algo de seu caminhão para você? O equipamento médico? — perguntou ela.
Tudo o que precisava era de suas chaves e sairia dali.
Ronan a olhou, seu olhar tão intenso que sentiu como se tivesse segurando seu rosto e não a deixasse ir.
— Você realmente pensa que eu sou tolo?
— Porque estou me oferecendo para ajudar você?
Ele se levantou, pairando sobre ela. Lexi estava acostumada a isso e se negava a sentir-se intimidada. No que a ela concernia, ser mais baixa só queria dizer que era mais fácil alcançar e retorcer suas bolas, deixando-o em um montão sobre o chão.
— Sei quem é, Lexi Johns. Todo mundo sabe. Zach a perseguiu durante semanas. Não vou deixar que vá embora e o ter atrás de mim quando despertar.
Interrompido. Hora do plano B. Tudo o que tinha que fazer vinha com ele.
— Assim ele despertará.
— Isso depende.
— Do quê?
— Se foi um ou dois espinhos que bateram nele.
Essa notícia deixou Lexi cambaleante.
— Está dizendo que essa é toda a diferença para que ele viva ou mora?
— Isso, e minha intervenção.
— Então que diabos está esperando? Atenda-o já.
— Não até que saiba que ficará enquanto faço isso. — ele lhe deu um pequeno sorriso, um que o tornava tão atraente, que ela se esqueceu de respirar. — Eu a amarro fisicamente ou prefere me jurar que ficará aqui?
Lexi deu um passo para trás involuntariamente. A ideia de que ele a amarasse e prendesse em um armário a adoecia.
— Não deixarei que me toque.
— Então, me dê sua palavra de que ficará aqui até que eu tenha ido, e não tentará fugir.
— Claro. — mentiu ela, só para livra-se dele. — Ficarei.
Quando sentiu uma repentina pressão cair de uma vez sobre seu corpo, fixando-a no lugar, percebeu seu erro.
Nunca faça nenhuma promessa a eles. Podem amarrá-la a sua vontade.
Sua mãe a advertiu e ela não lhe deu ouvidos. Agora era muito tarde.
O sorriso de Ronan se ampliou.
— É a primeira vez que faz uma promessa a um de nós? — perguntou.
Lexi não podia responder. Sentia-se presa e indefesa. Ela não era como eles. Era humana.
— Não se preocupe. — disse Ronan. — Será fácil.
Lexi realmente duvidava.
— Cure-o. — disse ela entre os dentes.
Ele lhe deu uma formal inclinação de cabeça.
— É óbvio, minha senhora.
Madoc desejava estar em qualquer outro lugar que junto à cama da Nika. Não tinha nada para fazer ali, mas Andra alegou que Nika tinha pedido por ele.
Ela o chamou e ele praticamente quebrou o recorde de velocidade na terra para voltar para seu lado.
Isso era tudo a respeito de suas boas intenções de manter distância. Madoc ficou ali, rígido e incômodo, inseguro do que fazer agora que estava lá. Nunca deveria ter vindo.
Nika estava encolhida feito uma bola na cama. Seus cabelos brancos foram lavados e escovados até que brilhassem, e se estendiam como um leque ao redor de sua cabeça. Estava magra, frágil, quase etérea. Quebrável. Se ele se aproximasse muito, tinha certeza que poderia machucá-la acidentalmente.
Andra o olhou expectante, como se ele tivesse todas as respostas.
— Que porra você quer que eu faça? — perguntou.
— Não sei. Apenas que se sente com ela e pegue sua mão, acredito.
— Não vou tocá-la. — disse a Andra.
— Bem. Então, apenas sente seu traseiro aí até que ela desperte outra vez.
Oh, não. Não tinha deixado de fazer o que estava fazendo para transformar-se em babá. Tinha sgaths para matar. Já tinha matado setenta e dois durante a semana. Se tivesse que dizer algo a respeito, seria que teria exterminados os filhos da puta da face da terra antes do fim do ano.
Talvez então Nika ficasse boa.
— Só posso ficar alguns minutos. — disse Madoc.
Andra apertou a mandíbula e sua boca se esticou como se não quisesse cuspir as palavras.
— Sua segurança foi a primeira coisa na mente dela depois de estar inconsciente durante mais de uma semana. E acredito que você poderia ser um pouco mais cuidadoso.
Não, não podia. O cuidado era para os homens com almas. Ele estava temeroso. Apenas o rígido anel preto que usava impedia que a última folha de sua marca de vida completasse sua queda. A folha pendurava em uma suspensão temporal de suas funções sobre suas costelas, congelada como em meados do outono. Sua marca de vida estava nua. Sua alma estava tão bem como morta. Nada mais lhe importava a não ser matar e transar. E Nika não era boa para nenhuma das duas coisas.
Entretanto, tinha feito um juramento como um dos Bando dos Áridos, o grupo secreto, só para convidados, dos Theronai que se mantinham com suas árvores nuas como ele, que se fossem descobertos seriam enviados à morte. Ele tinha prometido fazer de conta que ainda continuava sendo um dos mocinhos, assim nenhum deles seria descoberto. Se um do bando fosse revelado, sabia que todos os Theronai a salvo procurariam sinais de traição. As folhas falsas tatuadas em sua marca de vida não enganariam ninguém que olhasse de perto. Por agora tinha que desempenhar seu papel como tinha prometido a Iain que faria. Tinha que agir como antes de sua alma ter morrido.
Era isso, ou deixar que o enviassem aos caçadores para que eles o assassinassem, junto com todos os outros irmãos do bando.
Não havia nenhuma maldita chance.
Madoc deixou escapar um longo suspiro, e se deixou cair na beira da cama. O corpo de Nika se deslocou para a depressão no colchão.
Ficou tenso, preocupado que ela pudesse bater casualmente nele e conseguir lhe tocar ou algo assim. Mas ela não o fez. Nem sequer o tocou, que era o melhor. Ao menos foi isso o que tentou dizer a si mesmo.
Andra olhou para seu relógio.
— Joseph disse que outros três Theronai avisavam que vem ver Nika. Devem estar aqui logo.
— Pois bem. Deixe que um deles brinque de babá.
Andra deixou seu longo corpo cair em uma cadeira e cobriu o rosto com as mãos. Parecia cansada, e Madoc por uma fração de segundo se preocupou com ela. Estranho.
— Espero em Deus que um deles seja compatível com ela. Tynan diz que isso poderia salvá-la, restaurar sua prudência.
O estômago de Madoc se contraiu contra o golpe do ciúme. Não queria nenhum outro Theronai perto dela, mesmo sendo muito estúpido. Queria ser o único a salvá-la, o que era completamente ridículo. Esteve perto dela o tempo suficiente para saber que isso nunca aconteceria.
De fato, baseando-se na velocidade que seu anel estava perdendo a cor, sua vida, estava fora de tempo para os milagres de qualquer tipo. Mesmo se uma mulher compatível entrasse pela porta agora, talvez não fosse rápido o suficiente. Quando as cores se fossem, não seria capaz de se vincular a ninguém, compatível ou não. Estava danificado, uma concha vazia do que tinha nascido para ser.
— O quê? Não vai dizer palavras vazias de esperança? — perguntou Andra.
Tinha os olhos fechados, como se estivesse muito cansada para se incomodar de mantê-los abertos.
— A esperança é para as pessoas que não tiraram a cabeça do traseiro o suficiente para ver a realidade. — disse Madoc.
— Ah. Um otimista. Encantador. — deixou escapar um longo bocejo.
Madoc soltou um suspiro.
— Vá tirar um cochilo. Ficarei até que os outros cheguem.
Uma batina soou na porta principal da suíte de Paul e Andra.
— Parece que você se livrou. — disse Andra. — Eles estão aqui.
Ela saiu do quarto e demorou mais do que ele esperava. Talvez estivesse entrevistando-os, ou algo parecido.
Eventualmente, retornou trazendo três Theronai atrás dela. Cada um tinha uma mancha de sangue em sua camisa no lugar onde tinham dado a Nika seu juramento de protegê-la.
Ela estava um pouco verde, e mais que um pouco inquieta quando se afastou e deixou que os homens vissem Nika.
Madoc sabia tudo deles, é óbvio. Esteve lutando ao lado deles lá fora durante vários séculos. Isso não significava que confiava neles. Não perto de Nika. Ia ficar lá até que eles se fossem.
Ou até que um de seus anéis começasse a reagir a ela.
Só pensar era mais do que seu estômago podia suportar. Apertou os punhos e se levantou da cama. Não queria uma visão próxima do espetáculo por vir.
Nika deixou escapar um pequeno gemido, tão baixo que não tinha certeza se Andra o tinha escutado. E se assim foi, ela não mostrou nenhuma reação.
Madoc franziu o cenho e se felicitou por impedir-se de ir verificar como estava. Embora pudesse ver a subida e descida de sua respiração dali. Isso tinha que ser bom o suficiente.
— Cavalheiros, — disse Andra. — esta é minha irmã, Nika.
Os olhos esperançosos, reverentes em seus rostos, fizeram Madoc querer golpear algo com os punhos. Como se atreviam a olhá-la como se… Como se já fosse deles?
Neal avançou primeiro. Ainda vestia sua jaqueta de couro, provavelmente da caçada recente. Seus cabelos pretos estavam cheios de pó e havia uma mancha de sujeira em sua face. Não tinha se incomodado de tomar um maldito banho antes de ir para lá.
Bastardo.
Olhou para ela com olhos que brilhavam com inteligência. Uma linha de riso aprofundava o canto de sua boca enquanto sorria. Estendeu a mão para a de Nika, frágil e ossuda, e foi tudo o que Madoc pôde fazer para manter-se em seu lado do quarto.
Queria arrastar Nika para seus braços e levá-la para longe de tudo aquilo. Estava muito fraca para ter esses homens sondando-a.
Neal observava o seu anel enquanto pegava a mão flácida dela na sua. Madoc observou também.
Não aconteceu nada. Seu anel colorido permaneceu fixo.
Nika gemeu e puxou a mão para longe.
Madoc deixou escapar um longo suspiro de alívio e os olhos perspicazes de Andra se encontraram com os seus.
— Problemas? — ela perguntou.
— Não. — resmungou Madoc, franzindo o cenho para ela.
— Alguma coisa? — perguntou ela a Neal.
O rosto do homem caiu, eliminando todos os vestígios do sorriso em seu rosto.
— Nada.
Andra assentiu com a cabeça uma vez, e indicou que o homem seguinte se adiantasse. Esse era Morgan Valens, um eminente mulherengo. Ele não perdeu tempo, simplesmente se aproximou e acariciou com a mão de pele escura, a face de Nika.
Madoc ia ter que matar o filho da puta por tocá-la tão intimamente. Tinha a mão sobre a espada, disposto a fazer exatamente isso quando Morgan deu um passo para trás, quase se jogando para longe dela.
Os olhos de Nika se abriram de repente e olhou para Morgan com horror. Um alto e dolorido som saiu de sua garganta, e Madoc cruzou o espaço até seu lado. Antes que percebesse o que estava fazendo, estava sentado na cama e praticamente havia arrastado Nika para seu colo.
Ela o viu e seus olhos azuis claros se encheram de lágrimas.
— Voltou. — disse, e enterrou o rosto contra seu pescoço.
Morgan negou com a cabeça, olhando como se tivesse visto um fantasma ou algo assim.
— Não sei o que essa mulher é, mas não é para mim.
— Como pode ter certeza? — perguntou Andra. — Ela teve um tipo de reação a seu toque.
— Não uma boa. Acredite em mim.
Andra pôs a mão sobre o braço de Nika.
—Nika, neném você está bem?
Os braços de Nika se levantaram e rodearam o pescoço de Madoc se agarrando mais forte a ele. Quando ela não respondeu, Andra disse a Madoc.
— Examine-a e certifique-se que não está ferida.
Como se ele fosse um médico. Caralho.
Madoc não sabia como remover Nika sem tocá-la, e se a tocasse, poderia machucá-la também.
Com tanto cuidado quanto podia, afastou-a de seu pescoço e verificou seu rosto marcado pelo dano.
— Esse filho da puta a machucou? — ele perguntou.
O rosto de Nika estava vermelho e uma bolha se levantou onde Morgan a havia tocado. Ela assentiu com a cabeça, seus olhos brilhando com lágrimas.
— Sim.
Madoc ia ter que matá-lo. Simplesmente, não havia nenhuma maneira que pudesse evitar isso.
O sorriso habitual de Morgan não se via em nenhum lugar.
— Sinto muito por ter ferido você, Nika. Na verdade. Não vou tocar em você de novo. — saiu do quarto como se estivesse em chamas e Madoc se alegrou de vê-lo ir.
Neal deu um último olhar nostálgico para Nika, e depois saiu logo atrás de Morgan.
Samuel Larsten deu um passo para frente, com os olhos fixos em Nika. Madoc teve que sufocar o impulso de enrolar o corpo ao redor dela e escondê-la de vista.
— Talvez eu possa ajudar. — disse Samuel em uma voz suave e tranquila. — Eu gostaria muito de ajudar você, Nika.
Seu corpo estremecia contra Madoc. Podia sentir seus ossos apontando em qualquer lugar que se tocavam. Ela estava fraca. Frágil. Ele queria que ela descansasse e curasse.
Apesar do que Madoc queria, Nika precisava encontrar o homem que estava destinado a protegê-la. Por tudo que sabia, esse homem poderia ser Samuel.
Estendeu a mão para ela. Sua mão esquerda estava coberta por cicatrizes de queimaduras, por isso seu anel resplandecia limpo e antigo em contraste.
Nika olhou para a mão dele e respirou fundo.
— Feio, não é? — perguntou Samuel com um sorriso tímido. — Eu sinto muito por isso.
— Não quero que me machuque. — disse a ele.
— Não quero isso. Se quiser, posso voltar mais tarde. — disse Samuel.
A garganta de Nika se movia enquanto engolia nervosamente. Seus dedos encontraram a mão de Madoc e ela apertou com força. A pele onde Neal a havia tocado estava vermelha também, e ele pensou que podia ver a formação de pequenas bolhas espalhando-se por sua pele delicada.
Samuel olhou para além de Nika, para Madoc.
— Seu toque não parece feri-la. Tem certeza que ela não é sua?
Madoc não disse nada. Em vez disso, levantou a mão esquerda, mostrando a Samuel seu anel descolorido.
O rosto de Samuel empalideceu, e lhe deu um curto assentimento com a cabeça.
— Estou vendo.
Viu que Madoc já estava fora de tempo, no entanto, não se regozijou nem mostrou o menor sinal de alívio por isso. Uma faísca de respeito pelo homem se acendeu dentro de Madoc. Se Nika ia acabar com alguém que não fosse ele mesmo, queria que fosse com um homem como Samuel.
— Dê sua mão a ele, Nika. — pediu Madoc.
— Não. — enrolou as pernas debaixo dele e escorregou mais em seu colo.
— Ele não vai machucar você.
— Os outros o fizeram. — disse Nika.
Andra olhou de Samuel para Nika com o mesmo tipo de esperança que tinha visto nos homens. Madoc não estava a par de tudo o que Tynan havia dito a Andra a respeito da condição de Nika, mas estava claro que ela pensava que isso era o melhor para ela, o que significava que provavelmente era.
A voz de Andra era suave e tranquila.
— Precisamos saber se ele pode ajudar você.
— Não quero sua ajuda. — disse Nika.
— Mas precisa dela, carinho.
— Não quero forçar você. — disse Samuel. —Voltarei um pouco mais tarde, está bem?
— Não, não, não. — disse Nika. — Mais tarde não. Faça logo isso.
Nika estendeu a mão para ele e retesou o corpo, encolhendo-se contra a dor que sabia que estava por chegar.
Samuel roçou a ponta do dedo sobre sua mão e Nika recuou. Sua boca se torceu em uma careta resignada. Enquanto isso, observaram a pele de Nika escurecer e tornar-se de uma brilhante e furiosa cor vermelha. Daquela vez as bolhas chegaram rápido, borbulharam ao longo de sua pele como se tivesse sido queimada.
Então disse a Nika:
— Acho que não vou poder ajudar você. Estou realmente arrependido pela dor que lhe causei, minha senhora.
Não tanto quanto Madoc se arrependia. Sabia que isso era apenas o começo de seu sofrimento. Mais homens viriam a cada dia, agora que sabiam que ela estava ali. Tudo o que eles quereriam seria tocá-la. Machucá-la.
— Isto não vai funcionar. — disse Madoc a Andra.
Ela assentiu tensa.
— Parece que não. Vou falar com Tynan. Pode ficar aqui com ela?
— Tenho coisas para fazer.
— Coisas mais importantes que se certificar que Nika não tente vagar por aí?
— Eu pensei que não confiava em mim. — disse Madoc.
— Não o faço. Mas Nika sim.
— Não vou deixar que você me abandone de novo. — disse Nika. Parecia cansada, desgastada por sua terrível experiência com os homens. Não queria choramingar ou suplicar, simplesmente disse a ele: — Preciso de você.
Caralho. Como podia dizer não a isso?
— Bem. — disse Madoc a Andra. — Ficarei, mas só por um momento. Volte depressa para cá, ou consiga Grace.
Ele sentiu o sorriso de Nika contra seu pescoço, a suave pele de sua face acariciando sua pele, sua luceria. Andra fechou a porta, prendendo os dois juntos no quarto.
Madoc tentou não entrar em pânico. Não ia machucar Nika. Ia ter muito cuidado e se asseguraria de não cometer nenhum erro. Tudo o que tinha que fazer era sentar-se ali e deixar que ela se agarrasse a ele até adormecer.
Não passou muito tempo. Seu corpo relaxou e ele recostou suas costas debaixo das cobertas, exatamente onde ela devia estar. Depois arrastou uma cadeira até o canto mais longínquo do quarto e deixou cair seu traseiro lá.
Morria de vontade de voltar para junto dela, mas não se atrevia. Estava mais segura com todo aquele espaço entre eles. Quanto mais longe ficasse de Nika, melhor seria para os dois.
Passou quase uma hora para que Ronan terminasse o que quer que estivesse fazendo a Zach. Tinha mandado Lexi queimar todas as fitas e bandagens ensanguentadas, e quando ela retornou, percebeu que Ronan tinha bebido o sangue de Zach.
Uma espécie estranha de repulsa e deslumbramento a manteve em seu lugar. Ficou de pé na entrada, olhando. Ronan separou a boca do pulso de Zach e lá não havia sangue, mas havia algo diferente em Ronan agora. Sua pele tinha uma cor saudável e seu rosto já não parecia tão magro como antes.
Ronan tirou o casaco pesado de seu corpo e arregaçou a camisa. Pegou uma seringa de sua maleta de médico e enfiou a agulha em sua veia.
— Zach é o doente aqui. — disse Lexi.
Ronan puxou o êmbolo e a seringa vazia se encheu de um líquido amarelo claro. Aquilo brilhava.
— Deus do céu! Que diabos você é? — perguntou antes que pudesse pensar duas vezes nisso.
Ronan deu um sorriso divertido para ela.
— Um Sanguinar.
Vampiro. O diário de sua mamãe tinha dúzias de páginas cheias de detalhes a respeito do quanto os Sanguinar eram perigosos. Podiam hipnotizar sua presa com um simples olhar e drenar seu sangue em uma questão de segundos. Tinham garras longas e filiadas, e se alimentavam com a dor de suas vítimas.
E Lexi estava presa naquela casa com um deles.
Seu coração bateu forte e ela se inclinou para trás, batendo a cabeça contra o marco da porta.
— Sugiro que controle-se, pequena menina. — repreendeu-a Ronan. — Zach não tem tempo para que você tenha medo.
— Não tenho medo de você. — mentiu.
Ronan revirou os olhos.
— Não minta para mim. Posso ouvir seu coração acelerado.
Podia ler seus pensamentos, também. Sua mãe havia dito isso.
Oh, Deus. E se ele soubesse o que ela estava planejando, que ia fugir deles? Ela estava morta.
— Venha aqui Lexi. Preciso que você me ajude a mantê-lo deitado.
— Por quê? — perguntou, com a esperança de ganhar tempo para calcular uma maneira de sair daquele desastre.
— Porque quando eu conseguir injetar o antídoto para o veneno nele, ele não vai gostar. É doloroso.
— Não sentiu dor quando estava dentro de você.
Ele atravessou o quarto com dois passos. Seus olhos azuis claros brilhavam de raiva.
— Sim, doeu. E me deixou um pouco mais que irritado, assim sugiro a você que comece a cooperar.
Pegou-a pelo braço e puxou seu corpo de volta para a cama, empurrou-a para baixo de modo que se sentasse sobre as pernas de Zach.
— Tente mantê-lo quieto aí. — disse Ronan.
Depois injetou aquela coisa brilhante de cor amarela no braço de Zach.
A reação foi imediata. Zach se agitou e um grito de dor escapou de seus lábios. O coração de Lexi subiu para a garganta e ela mordeu os lábios para não chorar em resposta à dor dele.
Zach esperneou, e ela lutou consigo mesma para manter sua posição de modo que ele não pudesse machucar-se com seu corpo poderoso. Ronan praticamente subiu sobre o torso coberto de Zach e parecia mantê-lo ali sem muito esforço. Lexi não teve tanta sorte.
Protegeu Zach para que ele não fizesse mal a qualquer dos dois, mas isso foi tudo. Suas costelas iam ser golpeadas por sua luta.
Depois do que lhe pareceu quase a metade de um ano, a reação violenta cedeu e Zach se recostou sobre a cama. Estava suando e tremendo e fazia sons lastimosos e agonizantes, o que fez seu estômago se contrair em simpatia.
— Não pode fazer algo por ele? — perguntou ela.
Ronan recolheu o casaco de onde o deixou cair no chão e o colocou.
— Já fiz tudo o que podia. Não estou forte o suficiente para acabar com sua dor, também.
Ele agia tão casualmente a respeito. Lexi queria gritar.
— Tem que haver algo que possa fazer por ele.
Ronan mudou, seu olhar brilhante e faminto.
— Só há uma maneira. Você poderia me dar de seu sangue. Isso me daria a força necessária para aliviar a dor dele.
Ele queria seu sangue. Exatamente como sua mãe lhe tinha dito. O medo se fechou em torno dela, enchendo o ar com seu fedor. Tinha que fugir antes que fosse muito tarde.
Lexi retrocedeu, tropeçando no pé da cama.
— De nenhuma maldita maneira, rapaz vampiro. Fique longe!
Ronan levantou as mãos, com as palmas para fora.
— Como desejar. Deixe-o sofrer. Não me importo.
— Pensei que era seu amigo.
Um incomparável e condescendente sorriso brincou no canto de sua boca.
— Os Sanguinar não têm amigos. Seria bom se lembrar disso.
— Então, por que o ajudou?
— Porque necessito dele para sobreviver. Exatamente como você o necessita, jovem Theronai.
Lexi se negou a acreditar que era um deles. Esse era um truque que usavam para capturar os humanos inocentes. Era mais inteligente que isso. Sabia de tudo.
— Está equivocado.
Um segundo estava no outro lado do quarto; no seguinte, exatamente em frente a ela, segurando seu rosto entre suas mãos frias. Seu toque era suave, mas ela sentia sua força contida vibrando através de seu braço. Temia que ele quebrasse seu pescoço, se apenas estremecesse.
Seus olhos brilharam com uma rajada de luz, e Lexi se sentiu cair. Ele era tão bonito. Poderia olhá-lo para sempre.
— É verdade. — murmurou ele. — Basta deixar-se ir. Tenho você.
Ela não queria fazer isso. Era perigoso; simplesmente não sabia por quê.
De algum lugar longínquo, ouviu Zach gemer de dor.
— Ele precisa de você, menina. — disse Ronan. — Tem que ir até ele agora. Console-o. Se sobreviver à noite, se recuperará por completo. Deve ajudá-lo.
Sim. Zach precisava dela.
— Não sei como.
— Sua presença. Seu toque. Pele nua contra pele nua.
Ela poderia fazer isso. Ainda mais, queria fazer isso.
— Pode tocar nele o quanto quiser. Onde quiser. — disse Ronan.
Só a ideia foi suficiente para que suas entranhas se transformassem em líquido com a necessidade. Zach estava deitado ali para seu prazer. Poderia passar suas mãos sobre ele todo e ninguém nunca saberia.
— Perfeito. — ronronou Ronan. — É uma boa garota.
Seu elogio a excitou e a fez sentir-se enjoada. Algo não estava bem ali, fosse o que fosse, não podia ser importante. Nada era mais importante que escutar Ronan e olhar fixamente para os seus olhos. E certamente, nada era tão importante quanto colocar suas mãos sobre Zach.
— Ficará aqui e me chamará se ele piorar, não é mesmo?
A urgência de assentir concordando era forte, mas ela se conteve. Não podia ficar. Tinha que correr. Não sabia por que, mas sabia que era importante.
— Não. Tenho que ir embora.
— Não esta noite. É seguro aqui esta noite.
Lexi não tinha certeza, mas certamente Ronan não mentiria para ela.
— É seguro?
O polegar dele acariciou um lado de seu rosto e a luz em seus olhos brilhou mais forte por um momento.
— Sim, estará com Zach e então poderá tocá-lo.
Seguro e tocar Zach. Isso soava bem.
Ronan teve que abandonar a casa antes que tomasse o sangue de Lexi contra sua vontade. Ela cheirava tão doce, tão pura. Tinha certeza que o zumbido de poder que percorreria suas veias seria rico e embriagador.
E necessitava tão desesperadamente daquela força. Estava cansado. Faminto. Seu interior girava contra o vazio que nenhuma comida normal podia aliviar.
Precisava de sangue. E muito. Precisava de uma fonte rica com a qual pudesse substituir a força que a cura de Zach tinha drenado dele. Uma fonte como a mulher dentro daquela casinha velha, a quem hipnotizou com os olhos com tanta facilidade.
Ela teria lhe dado qualquer coisa que pedisse se tivesse permanecido mais tempo com ela. Podia ter tido seu sangue, assim como seu corpo. Era tão bonita, quase como uma fada-mulher, a ideia era mais que um pouco tentadora.
Pena que Lexi não era humana. Se fosse, teria se alimentado dela sem considerar seus desejos. Mas ela acreditando nele ou não, era uma Theronai. Protegida. E se ele se alimentasse dela contra sua vontade, praticamente estaria declarando guerra contra seu povo.
Isso não podia acontecer. Os Sanguinar necessitavam muito do sangue dos Theronai para correr o risco de irritá-los.
Mas não por muito tempo.
O Projeto Lullaby[7] ia bem. Era só uma questão de tempo antes que os Sanguinar fossem livres outra vez para fazer o que quisessem, como antes, quando eles eram os mais fortes de todos os Sentinelas.
Ronan não tinha certeza se devia esperar esse dia, ou temê-lo.
A fome retorceu o ventre de Connal. Podia sentir o cheiro de sua comida perto, cheirar o medo de sua presa de onde ela estava escondida na escuridão.
O beco onde Zillah tinha escolhido para se encontrar com ele era um trecho de asfalto sujo e cheio de buracos no centro da cidade do Kansas, que fedia a excrementos humano e gordurosas poças de água. A maioria das luzes dali tinha recebido um disparo, deixando convenientemente profundas sombras escuras. Não era que a luz fizesse falta a Connal. Mesmo tão fraco como estava, ainda podia ver através da escuridão asfixiante, onde Zillah o esperava.
— Aproxime-se. — sibilou, suas cordas vocais vibrando como um apertado arame farpado.
— Não até que saiba o que quer de mim. — disse Connal.
Estava muito faminto para os jogos de Zillah, quase cambaleante sobre seus pés por sua necessidade de sangue.
Zillah empurrou a mulher para frente dele, sem ter mais cuidado com sua comodidade do que teria com um jornal usado. Ela tropeçou, mas Zillah a manteve em pé com mãos de ferro.
Era jovem, talvez de dez anos de idade. Tinha os cabelos sujos pendurados ao redor de seu rosto macilento, duro e emaranhado. Não sabia que cor teriam se estivem limpos, mas agora eram de um aborrecido e sujo castanho, caindo quase até os quadris. Seus braços e pescoço estavam cheios de furiosas marcas onde outros se alimentaram dela sem sequer se incomodar de curar as feridas. Um cristalino e selvagem olhar enchia seus olhos, embora ela nunca tivesse olhado nos olhos de Connal.
Há quanto tempo era prisioneira dos Synestryn? Tinha conhecido alguma vez a liberdade? Ou tinha nascido em suas mãos?
Não que Connal se importasse. Desde que suas veias estivessem cheias, nada mais importava.
Moveu-se para frente, deslizando pelo piso áspero, esperando que ela o olhasse só por um momento. Isso era tudo o que necessitava para apanhá-la, capturar seus olhos.
— Fez bem. — disse Zillah. — O muro que rodeava a Dabyr desmoronou como disse que faria.
— E Sybil ainda permanece conosco. Falhou em capturá-la. — após as oportunidades que Connal lhes deu, aquele pedaço de fracasso desgastava muito sua escassa paciência.
Zillah deu de ombros e seu movimento sacudiu a frágil mulher.
— Haverá outras oportunidades. Somos pacientes.
Mas Connal não era. Precisava alimentar-se. Precisava sentir o sangue daquela mulher deslizando por sua garganta, enchendo seu ventre, banhando-o com seu poder. Não ia chegar ao pôr do sol sem ela, a espera pela permissão necessária de Zillah já o estava enlouquecendo de impaciência.
— Seu guarda-costas ainda está inconsciente.
— Talvez você devesse se encarregar dele. Alimente-se dele e termine o que começamos.
— Não posso agir tão abertamente. Você sabe. Se fosse descoberto, não me matariam simplesmente. Despedaçariam minha mente para encontrar sua identidade.
— Ainda não estou preparado para que isso aconteça. — disse Zillah, como se tivesse considerado permitir que isso realmente acontecesse. — Tenho outra tarefa para você.
— Não, não até que me deixe tê-la. Tenho que me alimentar.
A mulher ficou indiferente dentro do agarre de Zillah. Mesmo quando Connal falou em beber seu sangue, como evidentemente muitos outros tinha feito, ela não mostrou nenhuma reação.
Zillah a empurrou bruscamente para Connal, e se ele não a tivesse apanhado, ela simplesmente teria caído sobre a rua como se fosse lixo.
Agarrou-a pelos ombros, sentindo os ossos frágeis sob suas mãos, sentido o fedor de seu corpo sujo. Olhou-o então, e ele pôde ver que já não havia vida em seus olhos cor avelã, só uma sombria aceitação. Tudo o que restou do que tinha sido em outro tempo, era agora uma casca de ovo vazia.
Connal queria sentir pena dela. Queria ser o tipo de homem que brigaria por ela e a salvaria. Mas não era. Estava muito desesperado para isso. Muito faminto.
Entrelaçou os dedos em seus cabelos emaranhados, puxou sua cabeça para trás para expor seu pescoço e mordeu profundamente.
Doce, o perfeito poder fluía sobre sua língua, fazendo o monstro faminto em seu interior rugir em sinal de triunfo. Seu pulso pulsava em seus ouvidos, contra seus lábios, um contraste constante com o som frenético elevando-se de sua garganta enquanto engolia.
Sua comida lutou fracamente, mas ainda assim ele a manteve, enchendo-se dela, sabendo que nunca seria suficiente embora a drenasse deixando-a seca.
— Basta. — escutou o sibilo de Zillah, muito perto para sua segurança. —Vai prejudicar o menino.
— Menino?
O alimento de Connal foi arrancado de seus braços, desperdiçando preciosas gotas de sangue que se derramaram por seu pescoço e queixo. Ele limpou a bagunça com seus dedos e os lambeu.
Zillah passou seu dedo muito longo sobre a ferida aberta e sua pele se fechou sob seu toque, interrompendo o fluxo.
Connal se sacudiu, tentando esclarecer a neblina de poder que nublava seus pensamentos. O poder atravessava seu corpo, queimando-o de dentro para fora.
A raiva brotou dentro de seu peito. Queria esmagar algo no chão, reduzi-lo sob seus pés até que não restasse nada. A necessidade de violência se retorcia dentro dele, até que avançou para a mulher, para Zillah.
— Alto. — foi tudo o que ele disse.
E essa única ordem, quase um sussurro, congelou Connal em seu lugar.
Um lento e constante sorriso deixou a mostra os dentes afiados de Zillah.
— Vejo que nossas mutações funcionaram.
— Que mutações? O que fez comigo? — perguntou Connal.
Zillah estendeu a mão sobre o ventre da mulher. Sua pele esticada sobre seus dedos, dando uma articulação extra a cada dedo mortífero.
— Ela carrega meu filho. Minha arma. E você bebeu seu sangue. Agora é meu.
— Estava fazendo o que você queria. Não tinha que recorrer a isto.
— Não? Podia sentir o cheiro de sua simpatia pela mulher a um quilômetro de distância. Só era questão de tempo antes que cometesse uma imprudência. Agora já não terei que me preocupar com isso.
Connal tentou mover-se, mas seu corpo se negou a responder. Era como se fosse um brinquedo e só Zillah tivesse o controle remoto.
— Só me diga o que quer e me deixe ir.
— Há algo. — disse Zillah. — Conseguirá uma caixa de Dabyr para mim.
— O que há na caixa?
Zillah sorriu.
— A morte dos Theronai. Esta pequena e adorável criatura poderia caçar e incapacitar suas mulheres, fazendo que elas pareçam mortas. Você poderia declará-las mortas e trazer seus corpos para mim.
— Poderia ser apanhado e assassinado.
— Então não será de nenhuma utilidade para mim e estará melhor morto.
Isso significava que Zillah o mataria. Ou pior, que se alimentaria dele.
O pânico se apoderou de Connal, fazendo que suas palavras saíssem aceleradas e ofegantes.
— Vou encontrar uma maneira.
Zillah sorriu abertamente, mostrando seus dentes afiados.
— Para o seu bem, espero que assim seja.
Lexi se sacudiu tentando desfazer-se da sensação de estar drogada que nublava seu cérebro. Ronan havia feito algo com ela. Tinha certeza.
A cólera resplandecia em suas entranhas, consumindo o restante da névoa que a infectava.
Aquele bastardo. Ia matá-lo por invadir sua mente daquela maneira, ou ao menos retorceria seus testículos até que ele desejasse estar morto. Então o obrigaria a desfazer isso. O que quer que tenha feito.
Saiu apressada do salão e atravessou a porta principal bem a tempo de vê-lo ficar ao volante de sua caminhonete e afastar-se. Chegou até o último degrau antes que a mesma repugnante e irritante sensação que tinha com o bracelete se lançasse sobre ela, fazendo-a deslizar para deter-se. Seu intestino se retorceu e ela apertou o estômago com força em um esforço para adivinhar onde coçar. Nada ajudou.
Derrotada, Lexi fechou a porta e apoiou a cabeça contra o interior da madeira fria.
Não era páreo para aquele homem. Não tinha poderes mágicos e mal conhecia o que ele era capaz. Tinha ficado claro como o cristal quando Ronan a enganou para que prometesse ficar ali.
Só até que Ronan se fosse, o que havia feito agora.
Podia ir embora. Ao menos acreditava que podia fazer isso.
Lexi olhou com atenção para a janela, procurando algum sinal que Ronan estivesse por perto. Estava escuro, mas não viu nenhum reflexo das luzes dianteiras na distância ou uma coluna de poeira de sua passagem sobre as estradas de cascalho.
Foi-se. Ela podia ir embora agora ou sua promessa ainda à mantinha cativa?
Lexi abriu a porta e deu um passo para fora, preparando-se para sentir aquela horrível sensação. Não chegou. Deu outro passo e ainda não chegou. Estava a meio caminho da caminhonete e se sentia bem.
Podia ir embora agora e ser livre. As chaves estavam em seu bolso. O dinheiro que Zach lhe deu estava em sua mala. Podia fazer que ele durasse muito tempo, escondendo-se onde Zach não pudesse encontrá-la. Podia esbanjar um pouco em uma nova tatuagem que cobrisse o marcador de sangue que tinha atrasado o seu regresso, e ele jamais seria capaz de encontrá-la. Podia devolver aos Defensores o mapa que revelava a localização do recinto dos Sentinelas e deixar que eles tratassem do resgate de Helen. O céu sabia que eles estavam mais bem equipados do que ela para ligar com algo como aquilo.
Mas o que aconteceria com Zach?
Nem sequer tinha certeza de que ele sobreviveria à noite, e embora tivesse planejado assassiná-lo ontem, algo tinha mudado. Não podia deixá-lo ali para morrer. Não se houvesse algo que pudesse fazer.
Então… O que faria agora? Ia remendá-lo outra vez para que assim os Defensores pudessem assassiná-lo? Ela poderia?
Lexi esfregou as mãos sobre o rosto frustrada. Se Zach fosse como Ronan, toda aquela confusão seria muito mais simples. Mas não era. Ele tinha sido amável.
Tinha dado dinheiro a ela, assim poderia sobreviver em sua fuga. Tinha tirado o bracelete de seu pulso, libertando-a para que pudesse fugir com segurança sem ele. Tinha saído para enfrentar os monstros em vez de deixar que atacassem as pessoas do restaurante.
Aquelas não eram as ações de um assassino perverso. Aquelas eram as ações de um homem compassivo e protetor.
Talvez Zach fosse um Sentinela que merecia ser salvo. Lexi tivesse que seguir seus instintos e arriscar-se a errar. Não seria capaz de viver consigo mesma se ao menos não tentasse salvá-lo agora e assim poder averiguar se ele mentia.
É óbvio, nada no diário de sua mãe a ajudava quando tentava lidar com o envenenamento de monstros.
Pele nua contra pele nua.
Provavelmente era algum tipo de truque que Ronan utilizou sobre ela, aproveitando-se de sua ignorância. Mas com que propósito? Não tinha ficado por perto para rir dela quando ela caísse em sua armadilha.
Lexi voltou para a casa e ficou de pé perto de Zach. Seu corpo estava suado; seu peito estava nu exceto pela grande árvore tatuada. Inclusive dali, podia ver os ramos balançando-se em alguns momentos com o vento lá fora. O ferimento de seu ombro havia se fechado, mas ainda era uma ruga furiosamente vermelha que danificava sua suave pele morena.
Mesmo com o ferimento, seu corpo era bonito. Tocar nele não seria incômodo.
Ele mudou de posição na cama e um profundo som de dor brotou de dentro de seus lábios. Estava sofrendo e ela tinha que parar isso.
Pele nua contra pele nua.
Talvez não fosse uma piada, e sim uma forma de conseguir continuar qualquer plano perverso que eles tivessem. Se fosse assim, provavelmente ia funcionar. A ideia de ficar parada ali enquanto ele sofria a adoecia.
Lexi molhou um pano na pia e foi até Zach. Não tinha certeza se estava equivocada com ele ou não, mas tinha certeza de que não poderia sentar-se para observar e não fazer nada.
Sentou-se no canto da cama e pressionou o tecido em seu rosto, limpando o suor. Ele aspirou sobressaltado e seus olhos se abriram.
Com um olhar de alívio tão intenso que ela pôde senti-lo aquecer sua pele através de seu rosto. Ele estendeu uma mão trêmula para cima e tocou sua face.
— Está a salvo. — suspirou.
Lexi tentou dar um sorriso reconfortante para ele.
— Totalmente a salvo. E assim você estará quando descansar um pouco. Ronan o curou.
Sua mão desceu para seu peito como se estivesse muito exausto para segurá-la acima.
— Diga-me que não deu seu sangue a ele.
— Não. Conservo-o todo.
Seus olhos se fecharam outra vez e deixou sair um longo suspiro.
— Bom. Está a salvo.
Só então, voltou a dormir, deixando Lexi absorta em pensamentos. Ele não tinha perguntado se ia ficar bom. Sua única preocupação tinha sido para ela.
Esse tipo de altruísmos não era igual a nenhuma versão de maldade que já tinha encontrado. De fato, mesmo pessoas boas e decentes teriam ao menos perguntado por sua condição. Mas Zach não.
Talvez Helen tivesse razão e Lexi estivesse equivocada todos aqueles anos. Ou talvez sua preocupação fosse algum tipo de ato com a intenção de confundi-la.
Lexi já não sabia o que pensar. Estava cansada de se preocupar. Cansada de estar confusa e sozinha. De uma forma ou de outra, ia chegar ao fundo de tudo aquilo ou morrer tentando.
Com um profundo suspiro para animar-se, deitou-se ao lado de Zach e pressionou seu corpo ao longo do dele. Levantou a frente da camiseta para que assim sua barriga nua o tocasse de lado, e envolveu os braços ao redor de seu peito.
Um leve calor abateu-se sobre sua pele, dando a sensação de satisfação absoluta. Seja lá o que fosse que ele tinha que fazia suas entranhas cantar, estava funcionando, e estava contente pelo desvio momentâneo da realidade.
Seu estômago estava cheio, ninguém a perseguia e tinha um esplêndido homem entre seus braços. No que lhe dizia respeito, isso era o mais perto do céu na terra que conseguiria estar.
Zach se conscientizou de uma necessidade tão intensa que mal podia respirar. Sua pele parecia apertada, quebradiça, como se fosse se rasgar se ele se atrevesse a encher seus pulmões. Seu corpo ardia, seu sangue pulsava quente e forte através de seus membros. Seu pênis pulsava, louco para sentir o deslizamento do corpo de Lexi enquanto a enchia. Só ela podia aliviá-lo, mas nunca o faria.
Havia sonhando com ela outra vez. Sonhos ardentes, febris, que o deixavam estremecendo e suando, a beira do paraíso, mas sem nunca alcançá-lo. Não podia tocá-la em seus sonhos. Zombava dele, movendo os quadris e lhe enviando beijos enquanto se afastava. Não conseguia pegá-la embora soubesse que ela corria para o perigo.
Chamava-a, mas o som não saía de seus pulmões, só o calor, desesperadas exalações de ar quente que deixavam seu peito rugindo sob a necessidade de mais oxigênio.
Zach esfregou os olhos, tentando livrar-se da pesada sonolência que o incomodava. Seu cotovelo roçou contra algo suave enroscado ao seu redor.
Lexi.
Estava aconchegada ao seu lado. Não precisava abrir os olhos para saber disso. Podia sentir o cheiro doce e fresco do aroma de seu corpo e sentir a suave almofadinha de seus cabelos em seu peito. Sua pele estava fria contra a sua, extraindo um pouco do calor que fervia em seu interior.
Seus braços estavam fracos, mas os forçou a curvar-se ao redor dela e segurá-la mais perto. Não podia deixá-la partir. Jamais.
Ela bocejou e se afastou de seu corpo, tirando o refrescante conforto de sua pele. Ele tentou detê-la, mas não estava forte o suficiente. O veneno o deixou desvalido e dolorido.
Lexi pressionou o pulso em sua testa.
— Ainda está quente. Deixe-me trazer uma aspirina para você.
— Não ajudará.
— Tampouco pode prejudicá-lo.
— Por favor, apenas volte aqui. — disse por entre os dentes cerrados.
— Então, ao menos, deixe ir buscar um pano frio. Não pode ser saudável para você estar tão quente.
Começou a mover-se para fora da cama, mas Zach segurou seu pulso e a deteve.
— Não. Fique.
Ela franziu o cenho e então disse:
— Só será um segundo.
Não podia deixá-la ir, nem sequer por esse tempo.
Precisava sentir sua pele na dele. Ela toda. Seu toque era a única coisa que podia esfriar seu sangue.
Zach utilizou um arranque de força para empurrá-la sobre a cama, então a imobilizou embaixo dele. O esforço o deixou ofegando de esgotamento, mas ao menos a tinha onde a queria, onde a necessitava.
— Solte-me, Zach. — seu tom era duro e frio.
Ele não escutou. Em vez disso, empurrou sua camiseta para cima sobre seus seios e pressionou seu peito nu contra seu corpo. Seu sutiã o irritava, mas não tinha certeza se ela o deixaria tirá-lo também. De fato, o modo que estava se retorcendo embaixo dele, fazia que não tivesse certeza que ela ficaria quieta durante muito tempo.
— É tão bom senti-la. — disse. — Sua pele é tão fresca e suave.
Pressionou a face na dela e não pôde resistir à necessidade de deslizar as mãos por seus flancos. Sentiu o delicado contorno de suas costelas, a estreita faixa de sua cintura, e por último, o gentil volume de seus quadris que estavam nus devido ao jeans de cintura baixa. Em qualquer lugar que tocasse, quentes faixas de poder escapavam de seu corpo afundando no dela. Era tão bom, sua cabeça girou e ele começou a estremecer.
Lexi ainda estava debaixo dele e sua voz estava cheia de inquietação.
— O que está fazendo?
— Só preciso tocar em você. — sussurrou.
Enterrou o nariz em seu pescoço e encheu seus pulmões com seu aroma. Doce. Limpo. Dele.
Tinha que sentir o gosto dela. Só um pouco.
A ponta da língua de Zach deslizou para fora, mal roçando sua pele, mas foi suficiente para chegar a sua cabeça. Tinha sabor de salvação, de mulher e de algo mais que não conseguia nomear. Algo poderoso e indescritível que pertencia só a ela.
Lexi estremeceu embaixo dele e seus braços se arrastaram ao redor de sua cintura e se agarraram as suas costas.
— Que diabos está acontecendo? — perguntou ela em um tom suave, quase temeroso.
Estava a machucando?
Zach levantou a cabeça para poder olhar seu rosto e se certificar. Não acreditava que sobreviveria se tivesse que se afastar dela, seus braços se agitavam como loucos, mas se ele estivesse lhe fazendo mal, encontraria uma forma de afastar-se dela.
Não viu sinais de dor em seu rosto. Seus olhos estavam fechados e seus lábios estavam separados. Sua cabeça estava inclinada para um lado, dando um melhor acesso ao seu pescoço. Um profundo rubor coloria sua pele de rosa e podia ver seu pulso correndo em sua garganta.
— O que sente? — perguntou ele.
— Está tão quente. Está... Deslizando dentro de mim e não posso detê-lo.
— Acredito que não deve tentar fazer isso. — disse.
— Mas é tão bom. Tem que ser algum tipo de truque.
— Não há truque. Basta deixa-se ir. — estava duro e dolorido, sua ereção pressionava dolorosamente contra as limitações de sua roupa.
Queria que os dois estivessem nus, despojados de todas as barreiras que os separavam, assim poderia possuí-la adequadamente e lhe dar o tipo de prazer que poderia amarrá-la a ele para sempre. Mas ainda não estava forte o suficiente para impedi-la de escapar, e se tentasse despi-la, sua assustadiça Lexi definitivamente escaparia.
Cada instante que passava tocando-a se tornava mais forte, mesmo quando o levava mais perto de perder o controle. Se pudesse manter-se acordado só mais alguns minutos, poderia ter tudo o que queria.
Uma onda de calor se misturou com seu poder crescente dentro dele e os envolveu. Lexi deu um suspiro trêmulo, pressionando o peito contra o dele. Sua respiração saiu como um gemido de prazer baixo e Zach quase gozou só de escutá-lo.
— É tão adequada. — disse. — Tão suave.
Acariciou o contorno de seu rosto, mas suas mãos estavam torpes e teve medo de enfiar um dedo no olho dela. Em vez disso, decidiu estender os dedos através de seus cabelos suaves.
— Não deveria deixar você fazer isto. — disse ela. — Não está certo. — sua voz oscilava com incerteza.
— Preciso de você, Lexi. — todas as palavras estavam deformadas.
Estava ficando com tanto sono que mal podia suportar seu peso o suficiente para não esmagar as costelas dela, assim girou para ficar de lado, de frente um do outro, seu braço preso firmemente ao seu redor.
Ela lambeu os lábios.
— Precisa de um médico.
— Preciso de seu toque.
— Pele nua com pele nua. — sussurrou. — Foi isso que Ronan disse.
— Para expelir o calor. — ele se deu conta.
— Não funciona rápido o suficiente.
— Funcionará. — disse Zach, embora sentisse que estava se extenuado rapidamente.
Tinha sido envenenado anteriormente, e levava um tempo para se recuperar. Isso era tudo. Negava-se a morrer e deixar Lexi só e desprotegida.
Mal podia manter os olhos abertos por mais tempo, apesar de amar vê-la tão perto dele. Podia ver a dispersão das sardas sobre suas bochechas e a forma que a pele entre suas sobrancelhas se enrugava quando ele dizia algo que ela não queria ouvir.
— Tem certeza? — perguntou ela, olhando-o finalmente nos olhos.
Era tão bonita que ele acreditou que seu coração sairia a golpes de seu peito. Nunca se cansaria de olhá-la, não se tivesse a sorte de tê-la ao seu lado durante milênios.
— Sim.
— Como pode ter certeza?
— Porque não vou morrer até que consiga beijá-la.
Lexi viu os olhos de Zach se fecharem enquanto ele perdia a batalha contra o sonho. Tinha pensado que ele não a ter olhado como se fosse sua salvação a ajudaria a relaxar, mas não o fazia. Seu corpo estava tenso, zumbindo com um estranho tipo de energia que não nunca antes havia sentido, como se estivesse injetando um Red Bull ou algo assim.
Alisou os cabelos dele para o lado de seu rosto, desfrutando da sedosa sensação que deslizava por seus dedos. Era um homem tão bonito, de uma forma rude, sombria, nada parecido com o menino bonito Ronan. Uma barba incipiente sombreava seu queixo largo, que se apertava com dor, mesmo enquanto dormia. Seus dedos pálidos brilhavam contra a pele morena dele enquanto movia a ponta dos dedos sobre sua face e por seus lábios.
Zach gemeu profundamente em sua garganta, e o braço que matinha envolto ao redor dela se apertou. Provavelmente devia baixar a camiseta, mas sentir seu corpo sobre o dela era muito bom para resistir. Onde quer que sua pele tocasse a dela, sentia seu calor e seu poder impregnando-se nela. Era quase inebriante.
Talvez estivesse drogando-a, tornando-a tolerante a seus planos. Se era isso, não tinha certeza de se importar. Nunca havia se sentido tão viva. Mais necessária.
Era algo potente ser necessária. Esteve sozinha durante sete anos, perambulando pelo país, pensando apenas em si mesma. Antes disso, eram apenas ela e sua mãe, e Lexi era a que necessitava.
Mas as cartas tinham mudado e agora era importante para alguém. Crucial. Não estava só movendo-se agitadamente ao redor do país, deixando os anos transcorrerem enquanto se mantinha escondida e sozinha.
De fato, muita gente precisava dela. Não só Zach, mas também todos os defensores contavam com ela.
Para assassinar.
O estômago de Lexi deu um forte impulso de náusea e ela engatinhou para fora da cama para o banheiro. Conseguiu chegar ao vaso sanitário, mas não saiu nada. Ajoelhou-se ali, no chão frio, tentando não pensar no que tinha concordado fazer.
Parecia uma ideia tão boa. Uma honesta cruzada para matar o dragão.
Mas agora o dragão dormia em um quarto a só alguns passos, deixando sair gemidos baixos de dor porque ela se afastou dele. Não era o monstro terrível que ela acreditava que seria. Era um homem, ou ao menos se parecia suficientemente com um para que não pudesse ver muitas diferenças.
A confusão e a indecisão nunca tinham sido problema para ela antes. Precisava estabilizar-se, para recordar o que era importante e no que acreditava. O que era real.
O diário da mãe. Lexi precisava relê-lo, reagrupar e decidir por si mesma o caminho que escolheria, tudo isso enquanto permanecia perto o suficiente de Zach para aliviar sua febre, apenas para o caso dele ser o que parecia.
Com um pouco de sorte, encontraria alguma pista naquelas páginas, como por que Zach não parecia o monstro que uma vez ela acreditou que era. E se não...
Se não, então Lexi teria que assimilar isso e vestir uma pele mais dura. Não podia deixar que os Sentinelas continuassem a assassinar pessoas e arruinar seus meios de vida, não importava o quanto um deles a fizesse sentir-se bem.
Nika lutou contra a atração dos monstros, forjando sua mente contra a força de sua chamada. Não queria estar com eles naquela noite. Queria ficar com Madoc, em seu verdadeiro corpo, e deleitar-se com a intrepidez que o rodeava.
Quando estava perto dele, não tinha medo. Sentia-se quase normal. Madoc a confortava com sua presença.
Mas ele não queria ficar com ela. Tinha deixado isso claro quando a deixou enquanto dormia. Foi embora e não retornou.
A ideia de dormir sozinha a assustou. Necessitava que ele a libertasse dos monstros que a atraiam para separá-la enquanto dormia. Por que ele não entendia isso?
Andra entrou no quarto de Nika enquanto ela terminava de passar um grande suéter por sua cabeça. O suéter que tinha pedido emprestado a Andra pendurava em seus quadris ossudos e se agrupava ao redor de seus tornozelos, mas a ajudava a manter-se aquecida contra o ar condicionado moderadamente frio do interior de Dabyr.
Sentia-se mais forte, faminta pela primeira vez em anos. Já tinha feito três refeições desde que despertou, mas estava preparada para outra.
— Está na hora. — disse Andra. — Os homens estão esperando.
Nika tinha recuperado a consciência há apenas algumas horas, mas após isso, sete Theronai tinham vindo vê-la. Para tocá-la.
Tentou não ter medo, mas sem Madoc ali, não era fácil combater a dor e o pânico de tantos desconhecidos manuseando-a.
— Não vou deixar que me toquem. — disse a sua irmã. — Dói. — as bolhas do último lote ainda não tinham curado.
Andra apertou os lábios.
— Sei que dói, mas é a única maneira de termos certeza. São homens bons, Nika. Não têm intenção de machucar você. De fato, um deles pode ser capaz de ajudar você.
— Não quero a ajuda deles.
Não eram Madoc.
Andra a olhou de sua altura imponente, dando a Nika aquele olhar de preocupação desesperada que ela tinha chegado a conhecer tão bem durante os últimos oito anos.
— Sei, mas não há outra maneira.
— Por favor, não me faça fazer isto.
O pânico começou a derramar-se em seu estômago, afugentando a fome sob seu peso esmagador. Nika não podia suportar as mãos dos homens nela. Todos queriam algo dela e sentia seu desespero afundando ainda mais nela a cada toque. Tinha acabado de recuperar sua mente o suficiente para estar começando a sentir de novo e, em seguida, chegaram todos aqueles homens, cada um deles desejando pegar um pedacinho dela.
Eles deixavam fragmentos de sua necessidade e dor nela, empurrando-os em sua pele como agulhas, tão profundas que ela não podia tirá-las.
Andra se sentou na cama junto de Nika e pegou sua mão. Os dedos de Andra eram longos, fortes e capazes, diferentes dos de Nika, que eram débeis.
Desejava tanto ser forte como Andra. Para saber o que era real e o que não era. Para poder permanecer dentro de sua mente e não ser lançada através do espaço para monstros sedentos de sangue, até que já não soubesse quem era.
Andra acariciou o dorso de sua mão em um círculo calmante.
— Odeio fazer isto a você, carinho. Realmente o sinto, mas Tynan está convencido de que o melhor para você é encontrar o seu Theronai. Quando fizer isso, ele poderá ajudar você a se curar.
— Madoc está ajudando. — disse Nika.
A mandíbula de Andra se retesou.
— Eu sei. Esteve lá fora matando a torto e a direito os sgaths e isso é genial, mas não é suficiente.
— Como sabe?
Andra olhou para o outro lado, para a porta por onde ela desejava poder escapar. Seus olhos escureceram até se tornarem da mesma cor safira da luceria ao redor de seu pescoço.
A mão de Nika foi até sua própria garganta, que estava nua e ossuda, e ela sentiu uma sensação de perda.
— Madoc verificou e fez uma segunda verificação. Não é compatível. — disse Andra.
— Como ele pode ter certeza? — perguntou.
— Acredite em mim, carinho. É o que ele quer, também. Todos os homens querem que você seja a única capaz de salvá-los, mas isso não significa que possa ser.
Nika se negou a acreditar nela.
— Se Madoc não deseja ser meu, por que me aproximei dele? Por que ele é a única pessoa além de você que faz eu me sentir segura?
Andra acariciou os cabelos de Nika afastando-os de seu rosto e um hesitante brilho de lágrimas cintilou em seus olhos.
— É um truque de sua mente, neném. Igual a todos os outros.
— E as bolhas? São um truque de minha mente, também?
— Não sei. Talvez. Mas não quero que se preocupe. Encontraremos alguém que possa ajudar você.
Nika não tinha tanta certeza. Ela estava quebrada. Nunca poderia encontrar o homem que pudesse lhe dar o dom da magia.
E se esse homem não era Madoc, nem sequer queria tentar.
— Estarei junto de você. — disse Andra. — Há apenas dois homens neste momento, por isso não tomará muito tempo.
— Não quero fazer isso. — disse Nika.
Parecia uma criança teimosa, mas não se importava. Estava cansada de fazer coisas que não gostava. Cansada de não ter escolha. Todo mundo lhe dizia o que tinha que fazer. Tinha quase vinte e um anos e tinha idade suficiente para tomar suas próprias decisões.
— Podemos esperar até manhã se quiser. Não gostarão, mas esperarão por você. Vou dizer a eles que você não se sente bem o bastante para vê-los.
— Não. — disse Nika. Se quisesse que as pessoas começassem a tratá-la como adulta, ia ter que agir como tal. Fazendo coisas difíceis. — Vamos acabar com isto.
E depois, quando a dor se apaziguasse, sairia de seu corpo e iria procurar Madoc. Ele não saberia que ela estava lá, observando-o caçar, assim não poderia fugir. Não seria tão bom quanto sentir seu corpo, sólido e forte contra o dela, mas se era o único modo que podia ficar com ele, então tomaria o que pudesse.
Angus atendeu a hesitante batida em sua porta, esperando que fosse Joseph, em busca de um relatório sobre os progressos na barreira. Não que houvesse muito a informar. As mulheres estavam esgotadas e o progresso tinha diminuído até quase parar. Neste ritmo, estariam lá fora em pleno inverno, construindo a maldita coisa de proteção.
Mas, em vez de Joseph, era Tynan, com seu belo e magro rosto oprimido pela fome e fadiga.
Já estava quase amanhecendo e por seu aspecto geral, não se tratava de uma visita social.
Genial. Justo o que Angus precisava para acabar seu dia de merda. Mais merda.
— Precisa algo? — perguntou a Tynan, mantendo-se firme na porta para que o homem soubesse que não era bem-vindo lá dentro.
— Gilda ainda está acordada? — perguntou Tynan.
— Não. Terá que falar com ela amanhã.
— Não quero falar com ela. Preciso falar com você. A sós.
Angus escondeu sua surpresa.
— Por quê?
A garganta de Tynan se balançou enquanto ele engolia. Sua mão magra agarrou a porta como se fosse perder o equilíbrio.
— Por favor. É importante.
Angus não estava disposto a acordar Gilda depois do dia que tinha tido, por isso saiu para o corredor deserto e, em silêncio, fechou a porta atrás dele.
— Muito bem, fale.
— Acredito que posso ter feito isso. — disse Tynan. — Acho que encontrei uma maneira de curar a infertilidade de seu povo.
A esperança flamejou dentro de Angus, mas segurou fortemente a emoção antes que pudesse despertar Gilda. Não só ela necessitava dormir, mas também ele sabia, sem dúvida alguma, que ela não compartilharia de sua felicidade com esta notícia.
— Tem certeza? — perguntou, ouvindo sua voz vacilar com uma mistura de alívio e emoção.
Tynan sacudiu sua escura cabeça e seus olhos se fecharam como se o movimento tivesse deixado ele tonto.
— Não, não tenho. Tenho que testar minha teoria em alguém.
— Em mim. Quer testá-la em mim, não é verdade?
— Parecia a opção lógica. Os outros homens estão recém-emparelhados e podem ter problemas com um filho tão cedo.
Mas ele e Gilda sempre estiveram juntos. Tempo suficiente para que Angus soubesse como ela se sentiria a respeito de ter mais filhos. Seus filhos foram assassinados em combate e embora Sibyl estivesse a salvo, não era normal. E Maura…
Um nó de culpa e dor obstruiu a garganta de Angus, por isso sua voz saiu apenas como um sussurro.
— Não sei. Faz tanto tempo.
— Gilda ainda é fértil.
— Esse não é o ponto. Quero dizer, eu nem sequer tenho certeza se ela concordaria em ter mais filhos.
— Certamente, ela vê a necessidade de repovoar nossas fileiras.
— Você nunca teve um filho. Não entende o que é perder um. Ou mais.
Mesmo depois de todos aqueles anos, Angus ainda mantinha aberta a ferida em sua alma pela morte dos filhos que tinha deixado para trás. Podia pensar neles agora e recordar os bons tempos que tinham compartilhado, mas tinha demorado décadas para chegar a esse ponto.
E depois de quase ter perdido Sibyl há menos de uma semana, o medo de que isso pudesse ocorrer de novo era fresco e cru.
— Por favor, Angus. Pelo menos, pense nisso. Irei a Drake ou a Paul se tiver que fazê-lo, mas nem sequer temos certeza de onde vieram suas mulheres. Minha cura pode não funcionar com suas uniões.
— Então por que não começar com uma delas? Parece que faz mais sentido, considerando que há duas delas enquanto que eu sou só um.
— Não entende. Dediquei décadas de trabalho a esta cura. Mudá-la agora nos custaria um tempo precioso que não temos.
— As coisas não são tão negras. — disse Angus.
Tynan cambaleou e se agarrou à parede. Angus se aproximou para sustentá-lo, mas Tynan sacudiu a cabeça.
— Meu povo escondeu o quanto as coisas estão ruins. Não há sangue suficiente. Estamos todos morrendo. Se não encontrarmos logo a cura, é só uma questão de tempo antes que todos nós morramos e não reste ninguém para curar seus ferimentos. Seu povo também morrerá.
Angus sentiu o peso de tantas vidas pressionando-o.
— Mesmo que Gilda concordasse em ter outro filho, certamente não concordaria em deixar que você sangrasse o bebê.
— Não durante anos, mas eventualmente, a criança crescerá e nos concederá o sangue que necessitamos.
— Nem todas as crianças crescem. — disse Angus antes que pudesse deter-se.
Sibyl, sua filha, não tinha crescido desde que tinha oito anos. Não desde a noite que seu irmão mais novo, seu último filho, tinha morrido.
Angus deixou a lembrança de lado antes que ela pudesse consumi-lo. Precisava pensar com o cérebro e não com seu coração.
— Sei que isto é uma decisão importante para você, mas há pouco tempo para que decida. Estou ficando sem tempo. Devo dormir.
Referia-se a dormir, como ir dormir durante anos já que era o costume de seu povo. Era como conservavam o sangue quando não havia suficiente para sustentar todo mundo.
— Quanto tempo tem?
— Dias. Semanas no máximo.
Angus passou a mão pelo rosto, sentindo as profundas linhas que os séculos gravaram ali. A preocupação, o perigo e o riso estragaram sua pele e deixaram sua indelével marca. Parecia que estava a ponto de obter mais algumas rugas.
— Muito bem. Deixe-me falar com Gilda. Irei procurar você amanhã com minha decisão.
— Faça a coisa certa, Angus. Por favor. — então, Tynan se virou e se afastou, usando a parede para manter-se em pé.
Entretanto, por mais dor e tristeza que Angus tivesse tido em sua vida, ao menos não estava sozinho como Tynan. Tinha Gilda. Tinha amor. Tinha esperança.
Tynan não tinha nada para seguir adiante, exceto o esquecimento do sono — um meio para fugir de sua fome. Em algum lugar do caminho, Angus tinha se esquecido do que se sentia ao estar tão desesperado como Tynan estava. Ou talvez, nunca tivesse ficado tão desesperado. Sua vida tinha sido dura, mas também cheia de bênçãos.
Era a hora de reforçar e retribuir um pouco das coisas boas que a vida tinha lhe dado.
De uma forma ou de outra, tinha que convencer Gilda a renunciar sua dor e seguir adiante. Talvez, ao fazer isso, ela fosse capaz de curar e perdoar a si mesma pelas coisas que não podia mudar.
Talvez Gilda ainda recordasse como sorrir de novo.
Zach acordou pouco antes do amanhecer. Seu corpo doía, mas já não estava afetado pelo calor ardente do veneno.
Ia viver.
Uma onda de alegria circulou por ele, e sentiu a necessidade de correr e encontrar Lexi para poder celebrar com ela. Só que não tinha um longo caminho para percorrer. Ela estava deitada na cama, dormindo com a cabeça apoiada em um livro aberto e sua mão pálida estendida sobre seu peito moreno.
Zach sorriu para ela, deixando que a visão de sua beleza o enchesse com um profundo sentimento de satisfação.
Ela não o havia deixado. Ficou ao seu lado apesar dele ter tirado o bracelete de seu pulso, permitindo que ela fosse.
Não tinha nem ideia do quanto ela tinha conseguido dormir na noite anterior, por isso não quis acordá-la, mas não parecia confortável, assim que afastou o livro de debaixo de sua bochecha e colocou um travesseiro em seu lugar.
Lexi fez bonitos e sonolentos sons, mas não acordou. Cobriu-a completamente e se foi procurar um pouco de café para ajudar a limpar o resto de inércia de sua cabeça que o veneno tinha deixado atrás.
Tinham um grande dia pela frente. Com um pouco de sorte, hoje seria o dia que Lexi concordaria em usar sua luceria. Afinal, ela não o deixou. Isso devia significar que se preocupava com ele, não é verdade? E se ela se importava, não o deixaria sozinho para sofrer. Sabia que ela não faria isso.
Zach deixou o livro no balcão da cozinha, marcando seu lugar com um guardanapo sobre as páginas abertas. Vasculhou os armários até que encontrou uma cafeteira e preparou café que deixou na cozinha, e depois foi para o banheiro, tomou um banho rápido, vestiu-se e retornou quando as últimas gotas estavam fazendo ondas sobre a escura superfície do café.
Serviu-se uma xícara, acrescentou uma tonelada de açúcar e se sentou para entreter-se com sua emoção.
O livro ainda estava aberto na página que Lexi estava lendo quando adormeceu. Era escrito à mão, a caligrafia apertada e quase minúscula, tão pequena que ele pensou que era de imprensa quando o viu pela primeira vez. Quando voltou a olhar mais de perto, viu que certas palavras estavam sublinhadas ou circuladas. Rabiscos frenéticos enchiam as margens, com flechas apontando para diferentes passagens.
Não era dado a bisbilhotar, mas se este era o diário de Lexi, não ia ser capaz de resistir. Poderia entrar em sua mente assim que se unissem, assim realmente não estava bisbilhotando, de qualquer maneira. Estava simplesmente antecipando o que ia ver em breve.
Zach começou a ler a anotação, que estava perto do início do livro. Era datado de vinte e três anos.
Quase nos encontraram hoje. Escondemo-nos em um depósito de lixo e o fedor do lixo podre mascarou nosso cheiro. Seu cheiro, Alexandra. Aquele cheiro doce de bebê que parece atrair os monstros para nós.
Foi um bom bebê, também. Não chorou. Apenas agarrou meu dedo com sua mão gordinha como se soubesse que os monstros me assustavam. Como podia saber? Nem sequer tinha um ano de idade ainda.
Você é especial, Alexandra. Seu papai me disse que seria na noite em que a concebemos. Disse-me que tinha que proteger você. Esconder você.
Se algo acontecer comigo, precisa saber que os Sentinelas a quererão por causa de seu sangue. Não pode parar de fugir nunca. Eles a encontrarão e a enganarão, e quando a tiverem convencido de que não são caras malvados, sugarão todo seu sangue por causa de sua magia.
Não pode deixar que isso aconteça nunca. Tem que continuar fugindo.
O corpo de Zach ficou dormente. Lexi era muito pequena para escrever há vinte e três anos. Era um bebê. Aquele não era o diário de Lexi.
Aquele era o diário de sua mãe. Alexandra era Lexi.
Não era de estranhar que Lexi não confiasse nele, que o tivesse apunhalado e saído correndo quando a conheceu. Tinham ensinado a ela que os Sentinelas queriam matá-la, que queriam seu sangue.
O que, teve que admitir, era parcialmente correto. Os Sanguinar iam querer seu sangue, não que ele tivesse os deixado tomar nada dela. E embora eles o obtivessem, não iam querer matá-la. Ela não poderia alimentá-los se estivesse morta.
Zach virou a página e continuou lendo. Era mais do mesmo. Página após página descrevia os Sentinelas como maus e quantas vezes tinham tentado matar sua mãe e Lexi. O livro entrava em detalhes sobre como pareciam os monstros e como evitá-los. Zach reconheceu as descrições como os Synestryn não como os Sentinelas. É óbvio, Lexi não necessariamente conhecia a diferença.
Ela pensava que o Synestryn que os atacou na noite anterior era sua mascote. Não conhecia nada mais, o que levantava a questão, que mais tinham ensinado a ela que estava totalmente equivocado?
Zach fechou o livro e se levantou de sua cadeira. A ira pulsava nele por sua mãe a ter corrompido com mentiras como aquelas, mas a manteve distante. Não tinha como saber por que sua mãe tinha feito isso, e o mais importante, a mulher manteve Lexi viva todos aqueles anos, protegendo-a quando ele não podia.
Lexi não necessitava de sua ira. Necessitava dele para corrigir seu mau. Enquanto tivesse todas aquelas ideias enredadas em sua cabeça, ela estaria em perigo, fugindo das únicas pessoas que poderiam mantê-la a salvo.
Virou-se, e ela estava de pé na porta da cozinha. Estava com os olhos inchados de sono e suas roupas estavam amassadas além do reparo. Os cabelos ao redor de seu rosto estavam úmidos, como se tivesse acabado de lavá-los. Ela o olhou, depois ao livro e outra vez para ele, e nesse tempo, toda a cor de seu rosto desapareceu. Seus olhos escuros se arregalaram de medo e começou a correr para a porta de saída.
Zach correu atrás dela, não estava disposto a deixá-la ir. Fosse o que fosse que estivesse passando por sua cabeça estava equivocado. Não era culpa dela, mas não podia deixar que ela continuasse pensando que aquelas mentiras eram verdadeiras.
Agarrou-a pela cintura exatamente quando ela saltava para sua caminhonete. Seus braços e pernas se agitaram violentamente, mas Zach conseguiu impedir que ela se machucasse nas bordas duras de metal da porta. Afastou-a da caminhonete e se sentaram na grama úmida, segurando-a enquanto ela se cansava.
— Não vou machucar você. — disse alto o suficiente para que ela pudesse ouvi-lo acima de sua gritaria enfurecida.
— Deixe-me ir!
Lexi arranhou seus braços, mas ele a manteve. O sol tinha acabado de sair no horizonte e ele teria horas para reparar os cortes antes que o sangue pudesse chamar a qualquer mostro.
Pouco a pouco, foi parando de lutar e se acomodou no círculo de seus braços, ofegando. Zach não se atreveu a soltá-la. Não acreditava que ela não tentasse fugir de novo.
— Não é verdade. — disse ele, mantendo a voz baixa e firme. Não queria que ela pensasse que estava zangado com ela, ou lhe dar alguma razão para acreditar que ele tinha intenção de machucá-la. — Aquele era o diário de sua mãe, não é mesmo?
— Ela sabia tudo a respeito de você, porém isso não salvou sua vida.
O corpo de Lexi se sacudiu com força em um silencioso soluço que quebrou o coração de Zach.
— O que aconteceu? — perguntou ele.
— Não seguiu seu próprio conselho. Baixou a guarda. Não correu rápido o suficiente. Uma noite suas mascotes a apanharam, quando eu fui à mercearia. Voltei para motel e tudo o que restava eram… Pedaços.
Ela estremeceu com a lembrança, os braços de Zach se apertaram ao redor dela e acariciou seus cabelos com a face. O conforto que ele oferecia era pouco, mas não sabia que mais fazer. Era sensato o bastante para pensar que poderia solucionar aquele problema para ela. Sua mãe tinha morrido. Ninguém poderia arrumar isso.
— Peguei seu diário, minha mala e parti. Graças a Deus que tinha acabado de tirar minha carteira de motorista e tinha idade suficiente para fazer isso.
Que medo ela devia ter passado. Tão jovem, só e fugindo. Se soubesse a verdade, então, poderia ter ido viver em Dabyr. Poderia ter cuidado dela e ajudado-a a deixar para trás o assassinato de sua mãe. Poderia ter ensinado a verdade a ela pouco a pouco, enquanto ainda tinha tempo de ser paciente com ela.
Mas ela não conhecia a verdade e não foi para Dabyr. Tudo o que teve para guiá-la foi aquele diário cheio de mentiras.
Zach queria estar zangado com a mãe dela por enganar Lexi, mas não pôde. Ela podia está equivocada, mas fez o que acreditou necessário para proteger Lexi. E de certo modo, tinha funcionado. Lexi estava em seus braços, sã e salva, e estava malditamente bem se permanecesse desse modo.
— Acredito que temos de falar sobre o diário. — disse suavemente. — Li um pouco e há muitas coisas que, simplesmente, não são verdade.
— É claro que você diria isso. — cuspiu Lexi.
Ele ignorou de seu veneno.
— Vamos começar com a parte que diz que os Synestryn são nossas mascotes. Isso é totalmente incorreto. São nossos inimigos. Monstros.
Podia sentir que ela o escutava. Seu corpo ainda estava imóvel e virou sua cabeça para ouvi-lo melhor.
— Seja o que for que matou sua mãe, não foi um dos Sentinelas, nem isso foi feito por ordem nossas. Não fazemos mal aos humanos. Nós os protegemos.
— Isso é fácil de dizer.
— Mas nem sempre é fácil de fazer, eu sei. Às vezes não conseguimos, como o que aconteceu com sua mãe. Não posso dizer a você o quanto eu sinto, mas juro a você que se soubesse que alguma das duas existia, faria tudo o que fosse necessário para mantê-las a salvo.
— Você teria nos sequestrado, como fizeram com Helen.
— É isso o que pensa?
Como podia estar tão equivocada? Quem tinha dito aquelas mentiras a sua mãe? Com certeza não os Synestryn. Poucos de sua espécie podiam sequer falar, e os que podiam eram tão monstruosos que nenhuma pessoa sensata conseguiria se aproximar deles o suficiente para manter uma conversa longa o suficiente.
Então, de onde vinham tantas mentiras?
— Helen está a salvo em casa. Verá que ela é feliz quando estivermos lá.
— Só porque a drogam, como o que tenta fazer comigo quando me toca. Sua pele é algum tipo de arma.
Um lento sorriso puxou a boca de Zach.
— Sente-se drogada quando a toco?
— Sim.
— É bom?
— Não. — disse ela, mas ele podia ouvir a mentira na forma que sua voz tremia.
Gostou de saber que podia fazê-la sentir-se bem com seu toque. Gostou muito. De fato, teve que impedir-se de deslizar as mãos sobre seus braços nus. Por mais que a desejasse, tinha coisas mais importantes em que pensar — como esclarecer as mentiras entre eles.
— Não é uma droga, Lexi. Estive tentado dizer isso a você desde que a conheci. Estamos destinados a ficar juntos. Tudo o que tem que fazer é usar minha luceria e verá a verdade. Não vou esconder nada de você.
— Não quero sua gargantilha em mim.
Zach rangeu os dentes pela frustração. Sabia que apenas se ela olhasse dentro de sua mente, veria a verdade, mas não estava conseguindo levá-la a confiar nele o suficiente para fazer isso. Tinha mais de vinte anos de mentiras para apagar — mentiras que estavam ligadas a Lexi por laços de lealdade a sua mãe. Ela não cederia facilmente. Ia ter que ser paciente, mas não sabia quanto tempo ia ser capaz de aguentar.
Desde que tinha ido para perto dela, desde que ela começou a absorver pequenas correntes de seu poder ao tocá-lo, ele não sofreu nenhum dano, nem muito menos. Não tinha certeza se isso iria diminuir a velocidade que sua folha morria ou não, mas sabia que quando ela se fosse, facilmente poderia converter-se no monstro que ela acreditava que ele era.
E então, o que faria? Ou, o mais importante, o que não faria?
— Como posso demonstrar a você que não estou mentindo? — perguntou ele.
A cabeça de Lexi caiu para trás sobre seu ombro derrotada.
— Não sei, Zach. Quero acreditar em você, mas não é desse modo que o diabo trabalha? Dizendo belas mentiras em que você quer acreditar? Não posso fazer isso à mamãe.
— Vai tentar fugir de novo?
Ainda tinha o bracelete no bolso. Poderia utilizá-lo para mantê-la perto caso ele quisesse.
Não faria isso. Queria que ela ficasse junto dele por vontade própria.
A cabeça dela se moveu em seu ombro enquanto ela a sacudia.
— Não. — disse em voz baixa. — Já parei de fugir. Isto termina agora, de uma maneira ou outra.
Zach odiou o tom de derrota em sua voz, mas acreditava que o dizia a sério. Não fugiria mais.
— Bom. Porque se você se unir a mim, há uma única maneira que as coisas acontecerão. Verá a verdade, e nós seremos felizes um com o outro para o resto de nossas vidas.
— Belas mentiras. — murmurou.
— Nenhuma mentira, Lexi. Vou levar você para casa e provar isso. Vamos. O Gerai nos trouxe um carro novo e só estamos a quatro horas de distância da verdade.
Odiava levá-la para o Dabyr antes que a tivesse reclamado como sua dama. Podia muito bem haver outros Theronai em sua casa que também fossem compatíveis com ela, e não queria deixá-la escapar de novo. Mas o que queria não era tão importante quanto teria sido há apenas vinte minutos. Tinha que proteger Lexi de si mesmo, assim como dos Synestryn, e se isso significava que terminaria com outro homem, teria de suportar. Ao menos ela estaria a salvo. Isso era o que realmente importava.
De qualquer forma, se ela escolhesse outro homem, não era como se ele tivesse muito tempo para sofrer.
Lexi fez uma nota mental da localização da fortaleza dos Sentinelas, apenas para o caso de precisar dar aos Defensores o endereço pelo telefone. Foi edificada na parte de trás de uma área isolada e densamente arborizada do Missouri, bem afastada das estradas principais. Poucas casas e granjas salpicavam os arredores, mas a fortaleza em si estava protegida da vista por uma camada de folhagem densa.
A residência tinha um muro de pedra alto ao seu redor. Ou pelo menos pensava que provavelmente o tinha. Não podia ver a parede por completo por causa de todas as árvores que a escondiam, bem como o monumental edifício e as pequenas estruturas. O edifício principal era feito de uma pedra rosa acinzentada que brilhava sob a luz do sol do verão tardio. Enormes alas, como braços dando boas-vindas, estendiam-se de cada lado da estrutura.
Embora fosse um refúgio para demônios e assassinos, ainda assim era um lugar bonito.
Passaram por uma porta de ferro que se abriu para Zach só depois que ele se identificou e falou com alguém do outro lado da câmara. O caminho era pavimentado, fácil, com 804,65 quilômetros de comprimento, e se dirigia a uma garagem gigantesca repleta de lugares numerados para estacionar.
Zach estacionou em um, e por um segundo, Lexi acreditou que sua fiel Honda estava junto deles. É óbvio, sua fiel Honda ainda estava na oficina do Texas, mas lhe dirigiu um olhar nostálgico, devido a saudade que tinha de seu amado conjunto de rodas. Seu lar.
— Parece que eles ganharam de nós aqui. — disse Zach.
— Quem?
— Vance e Slade. Seu automóvel não deve ter necessitado de tanto trabalho.
Lexi olhou para o Honda de novo. Quase todo cinza, muito enferrujado, inclusive mais sujo. Sim, aquele era seu carro, bem.
— É o meu! — gritou ela, saltando da caminhonete.
Lexi pegou as chaves do assento dianteiro e foi para trás do volante. Ligou o motor, e ele começou um suave ronrono que não tinha estado ali por anos. De fato, provavelmente nunca tinha arrancado tão bem desde que o tinha.
— Pelo som, Nicholas pôs suas mãos sujas em cima dele. — disse Zach. — Esse homem tem algo com as coisas móveis.
Tinham arrumado seu carro. Aquelas pessoas, que supostamente eram seus inimigos, tinham consertado seu lar e o trouxeram para ela. Não valia muito, de fato, provavelmente tinham investido mais dinheiro no conserto do que ela teria podido ganhar vendendo-o, mas era a única coisa constante em sua vida e ela o amava.
Sua visão se nublou e ela teve que piscar para conter as lágrimas antes que caíssem.
— Obrigado. — disse a Zach sem olhá-lo.
Não queria que ele visse o quanto aquele presente a afetou. O quanto se sentia vulnerável sem motivos para fugir como esteve fazendo por toda sua vida.
Aqueles dias tinham terminado, quis dizer isso quando disse a Zach que tinha parado de fugir, mas saber que podia fazer isso se as coisas se tornassem feias a fazia sentir-se muito mais segura. Como se a vida voltasse à normalidade.
E então se lembrou dos explosivos no furgão e todos aqueles sentimentos de segurança e normalidade desapareceram.
— Eu não o arrumei. — disse Zach. — Que tal se nós entrarmos e procuramos o Nicholas. Você mesma pode agradecer a ele.
Lexi assentiu. Não conseguia falar agora, não com o nó de apreensão alojado na garganta. Tudo o que tinha que fazer era conectar dois fios e pressionar um botão para detonar o C-4. Os Defensores a fizeram praticar como fazer isso várias vezes até que levou menos de trinta segundos realizar todo o processo.
E isso incluía arrombar a fechadura de seu baú, o que era uma rotina no melhor dos dias.
Os dedos de Zach pousaram em seu ombro. Estavam quentes, fortes e reconfortantes, o que era ridículo. Não deveria estar reconfortando-a quando ela tinha a intenção de destruir seu lar e sua família. Isso estava simplesmente errado.
— Preparada? — perguntou ele.
Lexi deu um assentimento tenso.
— Claro. Deixe apenas eu pegar minha mala.
Zach deixou-a perplexa. Pendurou a mochila de lona dela sobre o ombro, pegou a alça de sua mala, e ofereceu seu braço livre a ela. Todo o tempo, levando um sorriso orgulhoso, como se quisesse impressioná-la.
Um doentio sentimento de culpa se incrustou em seu interior. Era estúpido. Era seu inimigo, assim planejar fazer voar aquele lugar não era uma traição. A verdadeira traição era forma como vacilava em realizar um trabalho que havia resolvido fazer.
Os Defensores se ocuparam dela e de sua mamãe desde que era uma menina. Sempre que as coisas davam errado, sua mãe corria para eles. Nenhuma delas gostava de ficar. Héctor Morrow, o líder dos Defensores, era um bastado furioso, mas era melhor que os monstros que as caçavam. Ficavam o suficiente para estar de novo sobre seus pés e a mãe partia fugindo de novo.
Lexi não tinha muito que fazer com eles depois que cresceu. Foi só depois que Zach começou a caçá-la que se desesperou o bastante para ir procurá-los. Eles a receberam e lhe deram boas-vindas como se ela nunca tivesse partido, como se fosse um deles. Tinham conseguido o trabalho com Gus para ela e se certificaram que tivesse um salário e um lugar onde dormir todas as noites. Era mais do que tinha tido em um longo tempo, e até mesmo o fato de está pensando em não fazer o que tinha prometido a eles, era o pior tipo de traição.
Eles a avisaram a respeito do quanto seria fácil para eles influenciá-la. Sua mãe a advertiu a respeito dos poderes de lavar o cérebro que os Sentinelas possuíam. Conhecia esse risco, no entanto, ainda questionava seu objetivo.
Lexi segurou o braço que Zach oferecia a ela, gozando da confortável calidez que fluía entre eles. Dois dias atrás, haveria simplesmente o apunhalado assim que houvesse tocado nela, e agora parecia não ter o suficiente dele.
Era tudo muito confuso. Odiava aquela incerteza, a debilidade dentro dela a fazia questionar o que era bom e o que era mau. Mesmo sabendo que essa confusão era parte da estratégia dos Sentinelas, ainda assim não podia desfazer-se dela.
Era fraca. Esse era o verdadeiro problema ali. Nunca tinha pensado nela daquela maneira até agora. Sempre acreditou que seria imune a seus encantos, mas agora sabia a verdade. Isso não era algo que podia ignorar. Não era de admirar que Helen tenha sido enganada tão facilmente. Nem sequer tinha tido o benefício de uma mãe que sabia o resultado.
Lexi tinha tido, no entanto estava caindo diretamente em sua armadilha.
— Vamos colocar estas coisas em minha suíte. Depois a levarei para ver Helen enquanto me registro e encontro Nicholas. — disse Zach.
Lexi assentiu, desejando ser uma pessoa mais forte. Como ia fazer para salvar Helen se ela mesma estava sendo enrolada?
— Está bem? — perguntou Zach.
Ela elevou os olhos, estampou um sorriso em seu rosto. Os olhos dele brilharam de preocupação, sua sobrancelha escura se arqueou.
— Bem. — disse. — Só um pouco aflita.
— Este lugar faz isso com você. Acho que estou acostumado.
Passaram por um corredor que conduzia a uma área aberta extremamente grande. O teto dali era de vidro e tão alto que um cometa poderia subir lá dentro. Havia vegetações verdes e pequenas árvores crescendo por toda parte, fazendo a sala parecer uma porção do exterior.
Dúzias de pessoas estavam sentadas às mesas, almoçando, conversando como se estivessem passando o dia em um shopping. Também havia mulheres e crianças ali. Lexi não esperava ver crianças.
Parou ali mesmo e absorveu tudo.
— Quem são todas estas pessoas? — perguntou.
— Humanos, em sua maioria. Pessoas que salvamos dos Synestryn, mas que não podem voltar para casa.
Não tinham a aparência de prisioneiros. Pareciam… Felizes. Crianças se ajeitavam em sofás na parte mais afastada da sala, vendo TV ou jogando videogames. Um grupo de mulheres estava jogando cartas em uma das mesas mais longas. Através da porta de vidro a sua esquerda, podia ver um punhado de pessoas lá fora, se exercitando em todo tipo de equipamento de ginástica.
Nenhum usava correntes ou uniformize da prisão. Nenhum parecia doente ou como se estivesse faminto. De fato, o aroma proveniente da área da cantina estava fazendo seu estômago roncar de antecipação.
O que deixou somente uma única conclusão.
— Mantêm os humanos como mascotes? — perguntou, horrorizada ante a ideia.
Zach soltou uma gargalhada.
— Está brincando, não é mesmo? E quanto a você e essa obsessão com as mascotes? Se quiséssemos mascotes, teríamos gatos e cães como qualquer um, embora a maioria de nós fique fora muito tempo para tê-las.
— Então, por que estas pessoas estão aqui?
— Porque não podemos limpar o suficiente suas memórias para que voltem para mundo de forma segura. Vários deles têm pequenos pedaços dos Synestryn em suas cabeças, e isso atrai os demônios como um farol. Se não déssemos a eles um lugar seguro para viver, seriam caçados como alimento.
A mente de Lexi dava voltas, tentando juntar essa nova peça de informação ao que já sabia. Tentava como podia, mas simplesmente não encaixava, o que queria dizer que ele estava mentindo ou que outra coisa que ela pensava que era verdade era uma mentira.
Tinha que descobrir isso logo. Não podia ficar congelada na indecisão para sempre. Tinha que continuar seu plano ou voltar para fora e certificar-se que os Defensores soubessem o quanto estavam equivocados a respeito de tudo aquilo.
— Preciso ver Helen. — disse Lexi.
Talvez falar com ela a ajudasse a esclarecer as coisas.
Zach dirigiu a ela um olhar estranho, meio curioso, meio de suspeita.
— Claro, carinho. O que quiser.
Ele colocou as mochilas no chão, e marcou um número em seu celular.
— Helen, Lexi está aqui e quer ver você. Onde está? Está bem, estaremos aí em breve. — desligou e disse. — Está em sua suíte. Levarei você lá.
Andaram por vários corredores compridos até que chegaram a uma porta que parecia igual às outras. Lexi memorizou o número do quarto, esperando poder recordar como chegar lá.
Helen abriu a porta antes que Zach tivesse acabado de bater. Não estava acorrentada, faminta ou ferida. Parecia… Bem. Lexi ficou parada ali confusa, tentando acrescentar essa nova peça de informação ao quebra-cabeça.
Helen não esperou que Lexi se aproximasse. Em vez disso, correu atravessando a porta, passando junto de Zach e puxou Lexi para um forte abraço.
Lexi devolveu o abraço. Depois de um mês de preocupação, finalmente tinha encontrado Helen, a melhor amiga que já teve. Era triste constatar que uma mulher a quem serviu o jantar algumas noites na semana ali no Gertie´s Dinner por um total de três meses estava mais próxima dela que qualquer outra pessoa desde sua mãe, mas assim era. Simples e sinceramente. Tinha sentido tantas saudades de Helen, e agora estavam juntas de novo.
Só quando sentiu as linhas frias em seu rosto foi que Lexi percebeu que estava chorando. Afastou-se e enxugou as lágrimas com o dorso da mão. Helen fez o mesmo, embora dirigisse a Lexi um sorriso lacrimoso.
— Estou tão feliz por você está aqui. — disse Helen. — Estávamos tão preocupados com você.
— Preocupados comigo? Você foi quem foi sequestrada por um grupo de homens atemorizantes.
Zach pigarreou.
— Vou deixar vocês duas para que coloquem a conversa em dia. Se precisar de mim, Helen sabe meu número. Do contrário, encontrarei você depois.
Helen agarrou Zach pelo pescoço e o aproximou para dar um abraço nele também. Ela beijou sua face morena e disse:
— Obrigado por trazê-la sã e salva para casa. Devo isso a você.
— Então pare de me beijar antes que Drake veja e corte algo meu que eu gosto.
Helen riu, de batidinhas no peito de Zach e segurou o braço de Lexi.
— Não quero ver você por ao menos duas horas, entendeu?
— Sim, minha senhora. — disse Zach, sua voz aquecida por seu sorriso. Ele tocou o lado do rosto de Lexi, mal roçando sua pele. Felizes arrepios deslizaram por sua garganta e se localizaram em seu estômago. — Depois que terminar de falar com Helen, depois que você esclarecer as coisas, então você e eu vamos ter alguns assuntos nossos para discutir.
Lexi não tinha certeza se era uma promessa ou uma ameaça, mas se encontrou esperando ficar a sós com Zach de novo. O que a enlouquecia.
— Não comemos, assim farei que preparem o almoço para as duas. — ele disse.
— O café da manhã para mim, por favor. — disse Helen. — Foi uma noite longa.
— O muro?
Helen assentiu.
— Sim. Infelizmente.
— Bem. — disse Zach. — O café da manhã será. —depois pegou as mochilas e voltou para corredor pelo que vieram.
Lexi o observou partir, desfrutando da vista de suas longas e fluídas passadas, a maneira que seus músculos se flexionavam debaixo do jeans apertado. Era tão bem constituído que ainda era difícil acreditar que fosse real, muito menos que desejasse ter algo a ver com ela.
— Essa é uma vista impressionante. — sussurrou Helen.
— Concordo. — disse Lexi.
Zach desapareceu ao virar a esquina, e Lexi finalmente ficou livre de sua atração. Deu-se uma boa sacudida mental e disse:
— Está bem, vamos entrar e veremos se podemos desfazer qualquer lavagem cerebral que estes Sentinelas têm feito em você.
— Lavagem cerebral?
Helen deu um longo olhar para Lexi conforme entravam na suíte. Claramente, Lexi tinha alguns assuntos que precisava esclarecer. Ao menos estava ali, sã e salva, e Helen era capaz de fazer aquele esclarecimento.
— Lindo lugar. — disse Lexi. — Há mais alguém aqui?
Helen olhou ao redor da sala. Na realidade era bastante simples, porém limpa e arrumada. Estava vivendo ali há poucas semanas, e tinha intenção de redecorar o lugar, talvez repintar alguns cômodos, mas não tinha tido tempo. Qualquer excesso de energia que tinha, foi colocado naquele muro horripilante, imbuindo as pedras com o poder para mantê-las unidas contra qualquer coisa que os Synestryn lhes jogassem pela frente.
Quem sabia que a magia podia ser tão exaustiva?
— Não, estamos somente nós. Drake está em uma reunião com alguns dos homens.
— Ah. O clube dos meninos.
Helen revirou os olhos.
— Eu podia ficar. Participei uma vez e meus olhos se mantiveram abertos por aproximadamente trinta segundos. Podem continuar falando por horas de mapas, estratégia e sobre qualquer coisa relacionada. Tudo o que preciso saber é onde estão os monstros que querem que eu incendeie.
Lexi soltou um assobio baixo.
— Você? Incendeia coisas?
Certamente Lexi não acreditava. Quando se conheceram, Helen ficava aterrorizada com isqueiros. Que o céu proibisse que alguém pusesse uma vela de aniversário em sua torta. Assustou-se mais de uma vez por ver uma chama, mas agora as coisas eram diferentes.
Agora, o fogo era sua escolha de arma.
Ela abriu a palma da mão e criou uma pequena chama, usando a invisível corrente de poder fluindo dentro dela vinda de Drake. A chama alaranjada do fogo oscilava sobre sua palma, apenas cálida contra sua pele.
— As coisas mudaram. — disse Lexi. — Para melhor.
Os joelhos de Lexi vacilaram e ela se afundou estupefata na poltrona, seus olhos totalmente abertos.
— Nossa. Está bem. Não era nada do que eu esperava.
— Imagino que vai haver muito disso para você por um tempo. Ainda estou me acostumando a tudo isto. Algumas coisas são realmente pouco convencionais. Tem que ver aquela senhora, Gilda, em uma luta. É como assistir uma audaz série animada ou algo.
— Quantas mulheres como você há aqui?
— Poucas. Eu, Gilda, Andra e sua irmã, Nika, embora ela não se encontre bem. Todos nos esperamos que ela sobreviva.
— E a senhorita Mabel está aqui, também, não é mesmo?
— Claro. — disse Helen, deixando que a chama em sua mão se dissipasse em uma nuvem de fumaça ao unir-se a Lexi na poltrona. — Podemos ir visitá-la daqui a pouco, mas primeiro, me conte o que aconteceu com você. Por que está preocupada de que tenham lavado meu cérebro?
— Provavelmente não acredita que tenham feito isso com você, mas tudo bem. Ainda assim, nós podemos desfazer isso.
— Nós?
— Refiro-me a mim. Posso reverter isso.
Helen não acreditou nela. Lexi estava escondendo algo.
— Nós quem, Lexi?
— Não se preocupe com isso. De verdade. Basta ter em mente que você e eu não estamos sozinhas. Seremos capazes de tirar todos em segurança.
— Todos quem? Tirar de onde? Não sei do que está falando.
— Tirar daqui.
— Este é meu lar. Não tenho intenção de deixá-lo.
Lexi deixou escapar um longo suspiro como se tentasse reunir paciência.
— Está bem. Estupendo. Não há problema.
Helen foi até a geladeira, pegou duas latas de refrigerante e entregou uma a sua amiga.
— Escute, precisa entender algumas coisas. Primeiro, estou feliz aqui.
— Foi sequestrada. É a Síndrome de Estocolmo.
— Não, não é. Sou feliz. Amo Drake. Ele me ama.
Helen podia ver que Lexi não estava acreditando em nenhuma palavra que ela dizia, mas eventualmente, faria isso. Só precisava de um pouco de tempo.
— Segundo, está a salvo aqui. Ninguém vai machucar você.
— Isso é o que Zach continua dizendo.
— Está dizendo a verdade. Deveria escutá-lo.
A boca de Lexi se aplanou em uma teimosa linha.
Helen a ignorou.
— E terceiro, Zach precisa de você. Pode estar cheio de orgulho para lhe dizer isso, mas está morrendo.
Um olhar de culpa cruzou o rosto de Lexi, mas o cobriu tomando um grande gole da lata.
— Mencionou algo sobre disso.
— Bem, então é mais franco do que Drake foi. Isso é bom.
— Não para ele. — disse isso como se já tivesse decidido deixar Zach morrer.
— Diga-me que ao menos está pensando em ajudá-lo. — Helen tinha que conseguir que Lexi salvasse Zach.
Tinha tomado carinho por ele desde que se mudou para lá, e agora que fazia parte daquela guerra, sabia simplesmente o quanto podia ser importante que Lexi ajudasse na luta para salvar o mundo da invasão Synestryn. Não acreditava que começar contando a Lexi que estaria lutando em uma guerra, fosse uma grande estratégia para obter sua cooperação, porém conectando-a com Zach... Esse era seu tipo de atração. Helen amava o marido, mas isso não queria dizer que não pudesse ver o quanto Zach era atraente.
Lexi virou a cabeça e olhou fixamente para as janelas.
— Honestamente, não sei o que pensar.
— Não mentiria para você. Sabe disso, não é mesmo?
Lexi deu de ombros.
— Sei que nunca mentiria para mim intencionadamente. O que me preocupa é que já nem sequer saiba qual é a verdade.
— Acredita que lavaram meu cérebro. É o que disse antes.
— Sim, a ideia passou por minha mente.
— Por que pensa isso? Quem foi que deu essa ideia a você?
— O diário de minha mãe. Um grupo chamado de Defensores da Humanidade.
Helen tinha ouvido uma única menção a esse grupo em algum lugar recentemente.
— Está falando dos homens que usam rifles e acreditam que os Sentinelas têm a intenção de arruinar suas terras e lavouras?
— É mais que isso. Estão cansados de ter uma guerra travada em seus quintais. Estão cansados de verem suas terras serem destruídas e suas famílias assustadas. Ficaram nos arredores por algum tempo. Sabem que os Sentinelas não se uniram para nenhum bem. Também sabem como detê-los.
Um arrepio frio de terror percorreu Helen.
— O que quer dizer? Como vão deter-nos?
Lexis apertou a boca e não disse nada.
— Aqueles homens são um grupo de granjeiros, Lexi. Não sabem o que realmente está acontecendo. Vão terminar conseguindo que os firam. Ou matem.
— Disseram-me que você diria isso. E que se fizesse isso, não haveria nada que pudesse fazer para salvá-la.
Isso estava saindo de seu controle rapidamente. Helen se inclinou para frente e pegou a mão de Lexi.
— Preciso que você me escute, está bem? Seja o que for que lhe disseram não é verdade. Não são pessoas más, só não conhecem a história completa.
— E se eles conhecerem? — perguntou Lexi, elevando seu queixo pontudo. — E se quem tiver razão forem eles?
— Não são.
— Como pode ter tanta certeza?
— Porque estou vinculada a Drake de tal forma que posso ver sua mente. Saberia se estivesse mentindo para mim a respeito de algo grande.
— Como saberia?
Helen deixou sair um suspiro de frustração.
— É como tentar explicar o conceito de cor a alguém que nasceu cego. Vai ter que aceitar minha palavra nisso. Ou ir até Zach e colocar sua luceria. Então vai entender. Prometo.
— E se for assim que chegam a você? Essa pode ser a forma que eles lavam o cérebro de forma permanente.
— Não lavaram meu cérebro! — Helen gritou isso e teve que conter-se para controlar o temperamento.
Simplesmente estava muito cansada por causa do trabalho extra. Não estava conseguindo descansar o suficiente, e isso a estava deixando mal-humorada e irritável. Lexi merecia mais, merecia sua paciência. Todo aquilo era muito para qualquer um assimilar.
Com um voz calma, disse:
— Há um montão de pessoas aqui que não usa uma luceria. Fale com eles se não acredita em mim. Fale com os adolescentes. Se alguém fosse lutar contra uma lavagem cerebral em massa, seria algum deles. E é óbvio, tem a senhorita Mabel, e sabe o quanto ela pode chegar a ser teimosa. Fale com qualquer deles. Ninguém a impedirá.
— Poderiam.
— Não, não o farão. É livre para fazer o que quiser aqui desde que não esteja planejando ferir ninguém.
Lexi se moveu em seu assento e seus olhos se separaram dos de Helen.
— Não está planejando ferir ninguém, não é verdade, Lexi?
Em uma voz baixa, ela replicou,
— Não quero fazer isso.
— O que quer dizer? Se não quer, não tem que fazê-lo. Ninguém pode obrigar você a fazer algo que não queira fazer.
Lexi pressionou os polegares contra as têmporas como se sua cabeça estivesse doendo.
— Apenas necessito de um tempo para pensar. Isso é tudo.
Helen não acreditava que isso fosse tudo. Nem por um segundo. Lexi tinha algo na manga, e por mais que Helen a amasse, não podia deixar que sua amiga machucasse alguém dali. Aquelas pessoas eram sua família, e tinha jurado protegê-las, exatamente como Drake fazia.
Mas, em vez de forçar o tema, Helen o deixou ir. Informaria aos homens que Lexi poderia ser um perigo, e que todos deviam manter um olho nela. Quando ficasse ali por alguns dias teria a chance de ver por si mesma que não era o que ela suspeitava, seria mais razoável.
Helen só esperava que Zach tivesse esse tempo para esperar que Lexi acreditasse na verdade.
Lexi testou a teoria de Helen de que teria liberdade de perambular ao redor, fazendo-o. Depois de um almoço tenso em que mal tinha conseguido engolir, Lexi deixou a suíte de Helen e passeou pelos corredores até que se encontrou de novo na grande sala com teto de vidro.
Agora, a multidão tinha diminuído e a área da TV não tinha crianças. Poucas pessoas estavam sentadas às mesas, bebendo café ou terminando de almoçarem. A senhorita Mabel estava sentada em uma extremidade da área da cantina, lendo um gigante e antigo livro. A cada poucos segundos, levantava os olhos para os meninos próximos, como se precisasse manter os olhos sobre eles. Depois de ensinar em uma escola pública por tanto tempo, Lexi supôs que era mais um hábito que qualquer outra coisa.
Puxou uma cadeira e se sentou em diagonal à mulher. A senhorita Mabel levantou os olhos e sorriu amplamente para ela.
— Lexi! Como estou viva e respirando. O que está fazendo aqui?
Parecia mais jovem, como se algumas de suas rugas tivessem sido apagadas de seu rosto. Ainda usava o mesmo batom chamativo e o coque branco em sua cabeça ainda era sustentado em seu lugar por um lápis amarelo número dois, mas todo o restante dela parecia… Diferente.
— Lembra-se daqueles homens grosseiros do restaurante? — perguntou Lexi.
— É óbvio.
— Um deles me encontrou.
— Ah. Zach. Aquele pobre rapaz esteve suspirando por você desde que fugiu. Estou contente de que finalmente tenha a alcançado.
— Contente? Eles sequestraram você e Helen e as trouxeram para cá contra sua vontade. Como pode ficar de seu lado?
Os olhos da senhorita Mabel se estreitaram e apontou um dedo nodoso dedo para Lexi.
— Não banque a petulante comigo. Talvez condene seus métodos, mas se não fosse por eles, estaria morta agora. E Helen também estaria.
— Isso é o que eles dizem. Não pode ter certeza.
— Sim, posso. Falei com crianças daqui o suficiente para saber o que ocorre com aqueles que os Theronai não conseguem encontrar a tempo. Tantos deles perderam os pais, a suas famílias. Os Synestryn fazem coisas horríveis que nem sequer se aproxima do pecado de forçar alguém a estar a salvo contra sua vontade.
— Como sabe que as crianças não estão mentindo? — perguntou Lexi.
A senhorita Mabel elevou uma sobrancelha branca.
— Trinta anos de experiência. É assim que eu sei.
— Como sabe que não lavaram seus cérebros? Como sabe que seus pais não estão lá fora, procurando seus filhos perdidos?
A mulher idosa negou com a cabeça, franzindo o cenho.
— É uma menina teimosa e provavelmente só acreditará quando vir com seus próprios olhos, mas quando tiver passado aqui o tempo suficiente, saberá o que eu sei. Verá um grande e forte homem carregar uma criança ensanguentada através daquelas portas, uma que estará chorando e agarrando-se a ele como se sua vida dependesse disso. Lerá os jornais e verá fotos dos pais brutalmente assassinados, reduzidos a pedaços por monstros. Só então saberá a verdade, bem no fundo, como eu sei.
— Como sabe que não são aqueles grandes e fortes homens que matam os pais? Eles sim carregam espadas, sabe?
— É realmente tão cega? — perguntou a senhorita Mabel. — Pode realmente olhar ao redor deste lugar de refúgio e ver tanta maldade? Porque se puder, então terei que me perguntar o que é que está errado com você.
E essa era a essência do problema. Desde que chegou ali, não viu nem um só sinal de tortura ou mau trato. Todos pareciam contentes, a salvo.
A senhorita Mabel ficou de pé, sem a ajuda do andador, sem nem sequer reclinar-se na mesa em busca de apoio. Embora não chegasse a metro e meio de altura, já não se encontrava curvada pela idade. Girou em círculo, seus movimentos suaves e fluídos.
— Aqui não se faz lavagens cerebrais, menina. Os Sentinelas não tinham que tirar minha dor ou me libertar daquele maldito andador, mas o fizeram. E sob um custo muito grande, também. Nunca tive uma fascinação pelos vampiros como os jovenzinhos têm, mas o que me curou quase adoeceu fazendo isso. Foram necessários três Theronais dispostos a abrir suas veias e sangrar por mim para conseguir isso, também. Estes homens podem ser grandes, brutos e grosseiros, mas são bons, grandes, brutos e grosseiros. Odiaria pensar onde estaria o mundo sem eles. Talvez devesse passar mais tempo pensando nisso.
— Tenho feito isso. Acredite em mim. Nada parece claro agora.
— Então, eu diria que precisa dá uma olhada ao redor. Ver isso por si mesma.
— Isso foi o que Helen disse.
A senhorita Mabel voltou a sentar-se e se despediu de Lexi com um gesto de sua mão.
— Ande. Tenho trabalho a fazer. Aqui há uma estante repleta de livros que ainda não li e simplesmente não posso suportar isso. — voltou para sua leitura, despedindo-se de Lexi.
Com um suspiro de fadiga e confusão, Lexi se retirou. Em tudo em que podia pensar era que se os Sentinelas quisessem manter a senhorita Mabel prisioneira, a última coisa que teriam feito era lhe dar a capacidade de fugir mais facilmente.
Como tantas outras coisas que testemunhou, aquela não tinha nenhum sentido.
A luz do sol lá fora clamava por ela. Talvez um pouco de ar fresco a ajudasse a compreender. E se não fizesse isso, ao menos caminhando liberaria o excesso de energia que arranhava seu interior, tornando-a ansiosa.
A área de exercícios ao ar livre estava repleta de homens musculosos, sem camiseta e brilhando como se soubessem que ela estava se aproximando e quisessem lhe dar um show fantástico.
A maioria dos homens eram Theronai, podia dizer por suas tatuagens de árvores. Alguns humanos se misturavam com eles, suando e levantando pesos, embora nem tanto. Aparentemente, os Theronai eram super-fortes. Ou talvez estivessem levantando pesos por mais tempo.
Lexi desfrutou da vista ao sair pelas portas e caminhar até a metade da área como se fosse a proprietária do lugar.
Estava bastante segura que eles não permitiriam que ela passasse, porém mais que algumas olhares interessados, algo a que estava acostumada, ninguém se moveu para interceptá-la.
Até agora, tudo bem.
Seguiu um caminho para a direita, e viu água brilhando à distância, era um lago ou um açude muito grande. A grama era espessa e abundante, e as flores foram plantadas em vários pequenos grupos alinhados junto ao caminho. Ao passar pela esquina de uma ala, viu uma área cercada e ouviu os gritos divertidos de crianças pequenas. Atrás dessa cerca de ferro e das sebes ao longo de um lado, encontrou aproximadamente uma dúzia de crianças pré-escolares brincando. Alguns deles escalavam o firme tobogã de plástico, ou corriam para a pequena casa de jogos. Dois meninos estavam fazendo uma bola rodar entre eles, suas pontarias eram tão ruins que tinham que correr atrás da bola, o que aparentemente fazia parte do jogo, baseando-se na forma que riam enquanto o faziam. Três meninas em uma caixa de areia gigante construíam um castelo de areia torto.
Lexi apoiou os braços no corrimão superior e simplesmente os contemplou, ignorando os olhares dos adultos que mantinham um olho sobre as travessas crianças. Não esperava ver crianças ali, e certamente não tantas.
Pareciam felizes. Saudáveis. Como podia ser isso quando elas estavam sendo criadas junto a monstros?
A menos, é claro, que Helen e Zach estivessem dizendo a verdade todo aquele tempo, e fosse a mãe de Lexi e os Defensores que estivessem equivocados.
Aquele era seu lar. De forma alguma ela destruiria aquilo, e certamente não havia como levar todos em segurança.
O que queria dizer que não só não podia fazer voar aquele lugar, nem tão pouco podia deixar que os Defensores o fizessem. Estava tão claro quanto a água. Tinha que procurar uma maneira de entrar em contato com eles e informá-los que havia crianças ali.
Afastou-se do parque e retornou pelo mesmo caminho que tinha vindo. Só que dessa vez, quando tentou passar pela área de exercícios, quatro altos Theronai se interpuseram em seu caminho.
— Deixem-me passar. — disse a eles, esticando a cabeça para olhá-los nos olhos.
O que tinha uma cicatriz no rosto disse:
— Não até que a toquemos.
Lexi recuou e bateu contra outro homem. Ele a segurou pelos antebraços e o pânico deslizou por ela por meio segundo antes que seu corpo se tranquilizasse, e toda preparação que havia feito aparecesse.
Isso era o que estava esperando todo o tempo e sabia muito bem como lidar com isso.
Nika estava estendida sobre Madoc como uma manta quando ele acordou. Por um momento, pensou que estava sonhando outra vez, mas em seus sonhos não sofria, assim tinha que estar acordado.
O relógio da mesinha lhe disse que eram quase duas da tarde. Tinha dormido mais que o normal, mesmo levando em conta o quanto estava exausto na noite anterior.
A cabeça de Nika estava acomodada debaixo de seu queixo e podia sentir sua respiração saindo de seus pulmões, fazendo cócegas nele quando passava rapidamente pelos cabelos de seu peito. Uma de suas mãos estava presa em sua cintura e a outra segurando seu traseiro. Suas pernas magras haviam se reacomodado entre suas coxas, e seu membro rígido pulsava contra seu ventre.
Ele não tinha nem ideia de como ela havia entrado em seu quarto, ou o que no inferno a havia possuído para vir, mas tudo aquilo era insignificante agora. Nika estava ali, em sua cama, e tudo dentro dele gritava por causa disso, era sua para tomar.
O suor salpicava sua pele e começou a tremer contra a necessidade de jogá-la debaixo dele e fodê-la, entrar em seu corpo até que um pouco da dor fosse removida e ele pudesse pensar corretamente.
Não tinha pedido a ela que viesse a ele. Devia estar ali porque isso era o que ela queria fazer, certo?
Havia algo nessa linha de pensamento que estava errada, Madoc manteve-se quieto, lutando contra si mesmo até poder averiguar de que se tratava. Tentou recordar o que havia feito antes que sua alma começasse a morrer, antes que tivesse passado de um homem nobre àquele assassino sedento de sangue que era agora.
Nika estava doente. Frágil. Completamente louca. A garota não sabia o que queria. Talvez fosse por isso que precisava manter-se distante.
Seus dedos se enroscaram contra seu peito nu e deixou escapar um suspiro. O sangue de Madoc pulsava com força através dele, feroz e duramente.
Por que diabos estava ali?
Para transar? Ou por que necessitava dele? Talvez tivesse vindo ali em busca de ajuda e ficou muito cansada para voltar para seu quarto. Tinha mais sentido que qualquer outra coisa.
Pouco a pouco, para não acordá-la, Madoc girou o corpo sobre o colchão. Embalou sua cabeça na mão, mantendo-a firme enquanto mudava seu peso leve. A garota já tinha muita coisa em seu cérebro para que lhe fizesse mais dano pressionando sua cabeça, mas a parte dele que costumava ser boa o recordou que ele devia ser cuidadoso com ela. Ela poderia ser capaz de salvar um de seus irmãos.
Seus cabelos brancos se derramaram sobre os lençóis, misturando-se com seus cílios escuros, os lábios rosados eram visíveis na tênue luz de seu dormitório. A camisola clara que vestia caía quase até os tornozelos e escondia os ossudos contornos do corpo consumido.
Madoc não gostava dos pintinhos fracos e ossudos. Nika não deveria ter feito nada por ele, embora seu membro pensasse de outra maneira. Não que pudesse escutar seu conselho, a coisa tinha mente própria.
Antes que pudesse deter-se, olhou para o anel em seu dedo, esperando um sinal de que ela poderia salvá-lo. Como sempre, não viu nada no fundo claro da faixa, nenhum pulsar de cor ou luz de esperança.
Madoc nem sequer pôde encontrar a força para se lamentar pelo que poderia ter sido. Estava vazio. Oco. Vazio de tudo exceto de dor e ira.
Mais esses fiéis companheiros tinham lhe servido bem na noite passada enquanto caçava. Mais dezesseis sgaths tinham caído por sua espada. Não sabia se algum deles tinha roubado partes da mente de Nika, mas se tivessem feito isso, hoje quando acordasse ela estaria muito mais restaurada.
Matar era tudo o que tinha para oferecer a ela, por mais que desejasse que fosse diferente.
Com um último olhar, Madoc deslizou para fora da cama para vestir-se para por algumas horas puxar ferro no pátio de treinamento. Depois disso, iria procurar uma prostituta ou três para foder, depois sairia para matar mais alguns sgaths ao cair à noite. Mesma vida, mesma rotina. Pelo menos agora que tinham achado o que estava flagelando Nika, tinha uma razão para levantar-se da cama todos os dias.
— Madoc. — a voz fraca de Nika flutuou da cama.
Ele congelou-se, sabendo que se ele se virasse agora, poderia mudar de opinião a respeito das putas e usá-la em lugar delas. Estava ali, e ele sofria como o inferno. Poderia encontrar um pouco de alivio dentro de seu corpo, fraco ou não, embora fosse só por um tempo.
— Vi você ontem à noite. — disse. — Caçando.
Se o tinha visto, então, um fragmento de sua mente estava nos monstros que ele tinha matado. Pelo menos tinha encontrado o sgath correto. Isso era algo.
— Como foi minha técnica? — perguntou sem virar-se.
Ouviu um movimento do tecido, o leve ranger da cama quando ela se moveu sob seu pouco peso. Aproximava-se dele. Podia sentir a tensão de seus músculos, a percepção do calor de sua pele.
Sua parte sem alma a desafiou a tocá-lo. Que tentasse tocá-lo. Era toda a desculpa que necessitava para deitá-la e usá-la. Se o tocasse, então devia querer que a possuísse. Não teria mais motivos para conter-se. Poderia ceder a essa perversa parte dele que queria a liberação que podia conseguir dentro de uma mulher. Tudo o que ela tinha que fazer era pôr um só dedo em seu corpo e seria dele. Madoc se afastou, fora do alcance da cama.
— Tem medo de mim? — perguntou.
Não quis dizer isso como uma zombaria, mas o sangue de Madoc corria quente, e essa foi a impressão que teve, de todos os modos. Ele virou-se, sem sequer se incomodar em esconder a grossa ereção de sua vista, como teria feito antes de ter perdido sua alma. Sua honra.
Ela parecia quase etérea, muito pálida e resplandecente na escuridão. Estava ajoelhada na cama, e o vestido branco amontoado em torno de seus joelhos, escondendo o corpo de sua vista.
Madoc quis despojá-la dele e vê-la nua. Mantê-la desse modo. Nem sequer se importava se ela era ossuda e fraca. Ia encontrar uma maneira de arrumá-la e torná-la saudável o suficiente para o tipo de tratamento que ele tinha para lhe oferecer.
Quando falou, sua voz era áspera pela excitação.
— Não, mas você deveria ter medo de mim. Que diabos estava pensando ao entrar em meu quarto? Em minha cama?
Nika franziu o cenho confusa.
— Dormi aqui todos os dias e você não se queixou.
— Como diabos fez isso?! — cuspiu Madoc. — Acredito que eu me lembraria se tivesse uma mulher em minha cama.
Embora tivesse dormido como um tronco há alguns dias, assim talvez estivesse errado. Não seria genial saber que tinha cometido um deslize durante tanto tempo que nem sequer podia manter-se a salvo de quem quisesse entrar?
Olhou para baixo, fazendo que seus cabelos escorregassem de seu ombro.
— Oh. Tem razão. Hoje estou usando meu corpo. Isso o torna diferente.
Madoc não tinha nenhuma fodida pista do que isso significava.
— E você não o usou antes?
— Não. Estava muito fraco para chegar comigo. Estou melhor agora.
Fechou os olhos e deslizou as mãos pelo corpo. Obviamente estava examinando a si mesma procurando algo, e não tinha a intenção de dar a Madoc um show erótico tocando-se, mas o fez assim mesmo.
A visão o fez tremer de necessidade. Quis que aquelas fossem suas mãos, ou ao menos que fizesse isso mesmo nua. Ela estava zombando dele, e ele não gostou nem um pouquinho. Demonstraria a ela o que acontecia com as mulheres que brincavam com ele.
Seu membro se contraiu violentamente contra os limites de sua cueca boxer, e mal pôde conter-se a tempo, para evitar tentar alcançá-la. Necessitou de cada pedaço de força para fixar os pés em seu lugar. Se a tocasse agora, sabia como terminaria. Ela estaria nua, debaixo dele, e para ele não importaria de forma alguma se ela o queria. Se gostava ou não.
Fechou os olhos, e isso o ajudou a recuperar a força de vontade suficiente para falar.
— Não venha aqui outra vez. — ordenou.
— Mas preciso de você, Madoc.
Suas palavras o atingiram como um soco no estômago. Tirando ar de seus pulmões e o deixando cambaleante por controle. Ele passou séculos com a esperança de ouvir aquelas palavras de uma mulher Theronai, mas já era muito tarde. Ela não podia salvá-lo.
A confusão nublou seus olhos azuis. Não estava lúcida. Não entendia o que Madoc queria fazer com ela, o que fazia com ele, e tinha que deixar de esperar que ela fosse capaz de fazer isso.
Reuniu a pouca paciência que pôde encontrar e obrigou sua voz a ser suave, embora a dor desenfreada dentro dele fosse justamente o contrário.
— Nika, você precisa de mim para matar os sgaths que mantêm sua mente cativa. Isso é tudo.
Ela moveu-se na cama, mais veloz do que era possível para ela em seu estado de debilidade. Ele não esperava, e não foi rápido o suficiente para evitar que ela o segurasse. Ela pressionou a mão sobre sua marca de vida. Sua palma sobre sua pele nua estava quente, mas isso foi tudo. Madoc se encontrou esperando em vão para sentir algo, qualquer coisa, mesmo a mais leve mudança dos ramos de sua árvore.
A única folha congelada no meio do caminho em seu tronco, parecia morta sob sua mão. E, claro, as outras folhas falsas que teve que tatuar no peito permaneciam imóveis e sem vida.
Não era dele. Ele sabia. Soube desde a primeira noite, quando a resgatou de um hospital psiquiátrico. Já era hora de seguir adiante e deixar de permitir que ela o torturasse.
— Está equivocado. — disse ela. — Preciso de você. Por favor, não me expulse.
Ele quis chegar a um acordo. Quis dar tudo o que ela alguma vez tivesse querido, mas tinha melhor critério. Não era capaz de lhe dar outra coisa que dor e tristeza.
— Não posso confiar em mim mesmo para não machucá-la.
— Eu confio em você.
Sentiu seus lábios se franzindo de auto-repugnância.
— Então é uma garotinha tola que merece tudo o que receber. — afastou a mão dela de sua pele, deixou-a cair, e depois virou as costas para ela. — Não volte outra vez. Se o fizer, me assegurarei de que o lamente.
Zach viu o alvoroço no pátio de treinamento e foi ver o que acontecia. Pensou em ignorá-lo assim poderia retornar mais rápido para Lexi, mas seu sentido de dever não permitiu que ele se afastasse de seus irmãos. Com o muro vulnerável, não queria correr nenhum risco de que o que estava acontecendo não fosse mais que uma escaramuça impulsionada pela testosterona.
Quando afastou as portas de vidro, viu Nicholas, Neal e Morgan retrocedendo de alguém. Seus corpos grandes se desviaram o suficiente e teve uma visão de quem era esse alguém.
Lexi.
Ela usava uma barra de levantar pesos nas mãos, brandindo-a como se fosse um bastão, com aquela mesma expressão feroz que tinha quando ele a conheceu, na noite que o apunhalou. Lexi, A Vingadora.
Samuel Larsten estava no chão, segurando sua mão com cicatrizes contra a cabeça para diminuir o sangramento. Nicholas levantou as mãos, como o fez Neal e Morgan, embora Morgan estivesse sorrindo como um idiota.
— É enérgica. — disse. — Eu gosto disso.
Um primitivo pau de ciúmes golpeou a cabeça de Zach, e ele estava movendo-se para diante antes que tivesse a chance de pensar duas vezes sobre o que pensava fazer. Com um poderoso empurrão de suas mãos contra os ombros dos homens, Morgan e Neal saíram voando em direções opostas.
Nicholas esquivou-se de seus amigos voadores e deu um passo para frente de Lexi, para protegê-la. De Zach.
— Saia do caminho. — grunhiu Zach.
— Não até que tenha se acalmado, homem. — disse Nicholas.
Uma fúria possessiva martelou Zach, aquecendo seu sangue o fazendo ficar vermelho de ira.
— É minha.
— Talvez sim. Talvez não. Tudo o que estou dizendo é que não se aproximará dela a menos que se acalme o suficiente.
O som do metal batendo no cimento soou por trás de Nicolas quando a barra caiu das mãos de Lexi. Em um abrir e fechar de olhos, correu apressadamente, seus tênis batendo contra o chão.
Zach não estava disposto a deixá-la fugir. Não desta vez.
Chocou-se contra Nicolas com toda a força de seu peso, balançando o homem sobre seus calcanhares. Foi todo o espaço que Zach necessitou para adiantar-se e se lançou em uma corrida de morte, seguindo Lexi sobre a esplêndida grama.
A emoção da caçada corria por ele, fazendo o sangue cantar em suas veias. O poder inundou seus membros e um sorriso selvagem estirou seus lábios. Podia correr assim durante horas e nunca cansar-se. Não, quando perseguia uma presa com um traseiro tão bonito como o de Lexi.
Ouviu alguns passos atrás dele, provavelmente seus irmãos que vinham salvá-la do lobo grande e mau, mas não diminuiu o ritmo.
Ela dirigiu-se à fileira de árvores que protegiam várias cabanas. Nem todos os Sentinelas gostavam da vida em comunidade e preferiam ter sua própria casa sem que ninguém os incomodasse. Na atualidade, só duas daquelas cabanas estavam ocupadas.
Seguiu-a por entre as árvores, mantendo uma distância ampla o suficiente para que ela pudesse pensar que podia fugir realmente.
Nicolas se aproximou correndo ao seu lado, finalmente o alcançando.
— Não posso deixar que você a machuque. — disse.
— Não vou fazer isso.
— Você tem que recuar.
— Não. É hora de acabar com isto. Estou fora de tempo e a reclamarei enquanto ainda tenho o suficiente de mim mesmo para ser cortês sobre isso. — disse Zach.
— Tem certeza que vai ser cortês quando sua cabeça está em outro lugar?
Zach estava mantendo os olhos atentos sobre Lexi, mas deu um rápido olhar para Nicholas. As cicatrizes no rosto do homem estavam franzidas pela preocupação. Zach sentiu uma onda de gratidão, sabendo que seu amigo nunca deixaria que ele fizesse algo estúpido que pudesse machucá-la.
— Tenho certeza.
Nicolas assentiu com a cabeça, mantendo o ritmo.
— Nenhum de nós era compatível. Acredito que ela é toda sua. Você entende que eu não posso ficar para assistir, não é mesmo?
Ver Zach conseguir o que todo homem congregado ali queria mais que tudo, uma mulher que pudesse salvá-los e permiti-lhes continuar lutando contra os Synestryn. Tinha sido duro ver Drake encontrar Helen, vê-los felizes juntos, de mãos dadas e sorrindo. Amava Drake como a um irmão, mas o ciúme desesperado que sentiu não foi muito divertido de sofrer. Não desejava infligir isso a ninguém.
— Sim. Retorne e diga aos homens que ela está a salvo. E que nos deem algum tempo a sós.
Nicholas desapareceu entre as árvores e Zach acelerou, diminuindo a distância com o Lexi. Quando a teve à vista, ela virou à esquerda da cabana de lan, Zach a seguiu. Suas longas pernas comeram o chão enquanto seu corpo ansiava por recuperá-la aonde pertencia, ao seu lado, para sempre.
A próxima vez que ela olhou por cima do ombro, ele estava ao alcance do braço. Seus olhos cor de chocolate se arregalaram e ela tropeçou na raiz de uma árvore.
Zach segurou a parte de trás de sua camiseta interrompendo a queda, depois, segurou-a em seus braços. Não a deixou mover-se. Manteve-a presa em seus braços e seguiu para a próxima cabana desocupada. Não era tão elegante quanto as suítes do edifício principal, mas tinha um colchão na cama que serviria de travesseiro para o traseiro de Lexi e isso era o que realmente importava.
— Pensei que tinha parado de fugir. — disse ele.
Sua voz era áspera e mais dura do que ele tinha previsto.
— Solte-me. — ofegava.
Sua face estava ruborizada e os seios subiam e desciam, pressionando-se deliciosamente contra ele.
Zach chutou a porta da cabana abrindo-a e a bateu quando entraram. As portas eram fechadas por dentro com grossas e fortes vigas de madeira sobre suportes de ferro. Bateu nela com o cotovelo e a viga caiu no suporte, trancando-os.
O lugar cheirava um pouco a umidade, mas o aroma de pinheiro o tornava tolerável. Estava escuro lá dentro, em comparação com o exterior, com apenas um pálido raio de luz que se filtrava deslizando-se por entre as árvores passando através das janelas empoeiradas. A cabana era pequena, talvez de 18 metros quadrados. Uma cama encostada a uma parede e ao longo da parede da frente havia uma lareira e uma mesa com duas cadeiras. No quarto, havia um banheiro com todo o equipamento necessário, embora nada disso fosse luxuoso. Além de comida, ali eles tinham tudo o necessário.
— Ponha-me no chão, Zach.
A voz de Lexi tremia já não soava como a de uma mulher suficientemente segura de si mesma para enfrentar um grupo de homens grandes armada só com um bastão de metal.
Zach fez o que ela disse e a colocou no colchão nu. Antes que ela pudesse tentar qualquer coisa, arrastou-se para cima dela e a enjaulou com seu corpo. Manteve seu peso sobre as mãos e joelhos, conservando a maior distância entre seus corpos que podia. Não confiava suficientemente em si mesmo para pressionar completamente o corpo sobre o dela e manter o controle. Mesmo assim, seu membro estava duro e seu sangue exigia que fixasse uma reclamação física em seu corpo e ao inferno com a luceria. Queria ela nua e úmida e aberta para seu prazer. Só pensar em deslizar as mãos sobre sua pele nua foi suficiente para fazê-lo tremer.
Mas tinha que fazer isso bem. Um passo de cada vez, e isso significava manter suas mãos quietas e seu membro dentro do jeans, muito a seu pesar.
— Temos que conversar. — disse.
— Eu só quero sair, certo?
— É muito tarde para isso. Não tenho tempo para encontrá-la outra vez.
Podia sentir sua última folha quase solta do ramo. Estava seca e murcha, e ele tinha certeza que não ia durar até amanhã. Não sem Lexi lhe dando o que necessitava.
Zach passou um dedo sobre sua garganta. Podia sentir seu pulso deslizando-se sob seu dedo. Sua pele estava quente e tão suave e sedosa que teve que fechar os olhos e desfrutar da sensação, perdendo-se por completo naquele toque único por um bom tempo.
— Está me assustando. — sussurrou.
Zach não queria isso. Queria fazê-la feliz. Para fazer que se sentisse bem.
Ela havia dito que se sentia bem quando ele a tocava, por isso Zach estendeu a mão sobre sua garganta, deleitando-se com o contraste de sua pele mais escura contra a dela, a calosidade de sua mão contra a perfeita suavidade de seu pescoço. Enviou uma onda de energia através de seu braço, deixando que a faísca entre eles, se expandisse em um milhão de pequenos fragmentos de sensação.
Os olhos de Lexi se agitaram fechando-se e deixou escapar um suave som de prazer.
— Ainda com medo? — perguntou, forçando seu tom a permanecer suave apesar da necessidade de reclamá-la que rugia através dele ser tudo menos suave.
Ela pegou seu pulso, envolvendo ambas as mãos ao seu redor. Não o afastou, simplesmente se agarrou, tremendo de indecisão.
Seu lábio inferior tremia, e ele quis beijá-lo e afastar a preocupação que escutou em sua voz.
— Helen diz que estou equivocada. A senhorita Mabel diz que estou equivocada. Você diz que estou equivocada. Todos vocês dizem que os Sentinelas são bons. Como pode minha vida inteira ser uma mentira?
Zach não queria falar. Queria pedir a ela que lhe desse o que necessitava, tanto seu corpo quanto sua promessa de permanecer a seu lado para toda a eternidade. Sabia o que isso significava, que ambos seriam felizes se ela tivesse se despojado das mentiras de sua educação humana e o deixasse lhe mostrar a verdade de sua raça. Sua raça, também.
Deslumbrou-o com um olhar de desespero, tão forte que ele soube que tinha que reduzir a velocidade. Ela necessitava que ele falasse com ela, acalmasse-a, e afinal, ele não poderia lhe negar nada.
Zach conteve a luxúria e desejo que o golpeava insistentemente para si mesmo para falar.
— Ninguém pode obrigar você a acreditar. Tudo o que posso fazer é oferecer a você um meio para que conheça a verdade por si mesma.
Seus olhos se moveram para sua garganta. Para sua luceria.
— Eu… Não posso.
— Por que não? — essa pergunta lhe custou outra preciosa lasca de controle, apesar disso a ofereceu.
— Se mamãe estava certa, então uma vez eu coloque isso em mim será muito tarde. Estarei presa.
— Não é dessa forma que funciona. Não posso obrigar você a usá-la, acredite em mim. Se pudesse, já seria minha dama.
— Outra mentira? — perguntou com uma inflexão de desafio na voz, levantando o queixo.
Zach sorriu. Adorava isso dela. Ali estava, presa debaixo dele, trancada em uma cabana dentro de um complexo do qual não poderia fugir facilmente, e ainda assim, não se dava por vencida. Sua Lexi era uma lutadora até a medula, e ele era um homem de sorte por tê-la encontrado.
— Há uma maneira de averiguar isso. — ele zombou. — A menos que esteja com medo.
As faíscas de rebelião iluminaram seus olhos.
— Supere isso. Você não é horripilante o suficiente para me colocar medo. Passei a vida fugindo de monstros mais temíveis que você. Quando crescerem algumas garras ou dentes ou algo em você, conversaremos.
— Então, o que a detém? — inclinou o queixo, expondo a garganta. — Pegue. O tempo que decidir usá-la depende de você.
Levantou a mão e o corpo de Zach se retesou de antecipação. Apesar do que dizia, tinha medo. Podia sentir isso pela forma que seu braço tremia, a forma que suas pupilas se reduziram a pequenos pontos pretos. Mas mesmo com aquele medo, não recuou. Passou o dedo ao longo da faixa e Zach sentiu deslizar por ele esse único toque, como um relâmpago, faiscando até a ponta de seus pés. Seu pênis o impulsionou para a liberação e um zumbido quente de desejo se abrigou ao redor de suas veias.
— Não sei o que fazer.
— Só tem que pegá-la.
Zach estava ofegando, aspirando o ar suficiente para manter o controle.
Ela envolveu seus dedos finos em torno da luceria e lhe deu um leve puxão. Abriu-se e ela ofegou, deixando-a cair, como se fosse uma serpente viva, mas a luceria não se importou. Caiu em seu pescoço, travando-se em seu lugar como se estivesse esperando toda sua existência por este momento único no tempo.
Os olhos de Lexi se arregalaram e ela empurrou com força contra Zach. Ele moveu-se o suficiente para deixá-la sentar-se, mas ainda se mantinha escarranchado sobre suas pernas, assegurando-se de que ela não fosse a lugar algum. Não até que isto se tornasse. Permanente.
Zach sorriu para ela. Não pôde evitar.
— Nunca vi nada mais bonito em minha vida que você nesse momento.
Ela puxou a luceria.
— Não cairá.
Zach capturou suas mãos antes que ela pudesse se machucar.
— Ainda não me deste seu juramento.
— Não sei o que dizer.
Zach a queria para sempre. Mas para conseguir o que queria, tinha que ser inteligente, agir com cautela. Se ela continuasse lhe vendo como seu inimigo, nunca ia aprender a confiar nele, e se isso ocorresse, seu vínculo não funcionaria bem. A confiança era vital para o fluxo de poder entre eles.
Apesar de odiar a ideia, sabia o que tinha que fazer. Se queria sua confiança, tinha que oferecer a ela a sua.
— Prometa usá-la até que mude de opinião. Dessa maneira, se vir algo que não esteja bem e você já não queira ficar comigo, poderá ir.
— O que será de você?
— Vivi muito tempo. Não se preocupe comigo.
— Acreditando ou não em você, não quero matá-lo, Zach.
— Não o fará. Mesmo se você decidir partir, minha morte não será sua culpa. Dirijo-me a ela rapidamente de qualquer forma. Qualquer tempo adicional que me dê será uma dádiva, que estenderá minha vida natural.
Ele simplesmente não estava preparado para que se acabasse ainda. Não, se Lexi podia ser parte dela.
Com muita sorte e paciência, ela veria a verdade e nunca tiraria a luceria. Encontraria uma maneira de fazer que isso acontecesse.
Zach se levantou da cama e se ajoelhou junto dela. Tirou a camisa pela cabeça, desembainhou a espada e fez um pequeno corte sobre seu coração.
— Minha vida pela sua, Lexi. Para sempre.
Ela negou com a cabeça, franzindo o cenho.
— Eu não gosto disso. Faça-me um juramento diferente.
Um lado de sua boca se inclinou em um sorriso.
— Sinto muito, carinho. Esse é o que você recebe. É sua vez.
Pressionou uma gota de sangue sobre a luceria, fazendo-a ganhar vida. Ela encolheu encaixando-se em sua garganta esbelta. Ela engoliu saliva e o movimento fez a luceria brilhar em um redemoinho de fitas de cor verde.
Depois de tomar uma respiração profunda, disse:
— Comprometo-me a usar esta gargantilha todo o tempo que quiser. Assim que eu não quiser usá-la, cairá em seguida.
O juramento surtiu efeito. Sentiu o sutil poder daquilo pesando sobre ele. A luz no quarto se expandiu até que se pressionou contra ele como uma manta, selando seu juramento dentro dele.
Era dele. Ele ia se assegurar que permanecesse dessa maneira.
Seu mundo se inclinou e caiu à medida que a luceria revelava a ele uma parte estimada de Lexi que queria que ele visse. Zach conteve a respiração e deixou que a visão passasse sobre ele. Luzes e cores passaram velozmente e conseguiu parar à porta de um restaurante ao longo de um trecho de estrada. Lexi estava ali de pé, com os cabelos presos em dois rabos-de-cavalo. Teria cinco ou seis anos, mas reconheceu seu delicado queixo e o desafiante conjunto de seus ombros. Era tão bonita, tão pequena e vulnerável, que fez seu peito se apertar com a necessidade de protegê-la.
Sua mãe, a quem reconheceu pelas fotos no Honda de Lexi, inclinou-se para que ela pudesse ouvi-la por cima do ruído intermitente de caminhoneiros que passavam a toda velocidade.
— Lembra-se de seu nome? — perguntou a Lexi.
— Lucy James.
— Bom. E de onde viemos?
Mordeu o lábio um instante e depois disse:
— Minnia plis.
— Minneapolis. Fica em Minnesota. Faz frio lá.
— Eu não gosto do frio. — queixou-se Lexi.
— Eu sei. Certifique-se de dizer isso às pessoas. É uma boa razão para termos partido.
— Mas e os monstros? Pensei que estávamos partindo por causa dos monstros.
— Não pode dizer nada sobre os monstros a ninguém. Lembra-se?
Lexi assentiu com a cabeça. Seus cabelos eram mais claros então, mas finos como os de um bebê como agora e balançado ao redor de seu rosto doce.
— Se contamos isso a alguém, os monstros os comerão como querem nos comer.
— Exatamente. É nosso segredo, certo?
Lexi assentiu de novo e as cores em torno de Zach começaram a apagar-se mais uma vez quando a visão mudou. Desta vez, Lexi era alguns anos mais velha. Estava no carro com sua mãe, olhando pela janela enquanto passavam por uma escola. Um montão de crianças de sua idade saia através das portas, rindo e ansiosos para sair dali.
— Por que não posso ir à escola? — perguntou a sua mamãe.
— Não é seguro. Eu ensino a você tudo o que precisa saber, Ali.
Lexi cruzou os braços sobre o peito, deslizou mais para baixo do assento e franziu os lábios.
— Eu não gosto desse nome.
— Muito bem. Pode escolher seu nome na próxima cidade.
— Alexandra Johnson.
— Não. Não pode usar seu nome real. Já sabe.
— Não é justo. Estou cansada de me mudar, mamãe. Eu só quero ser normal.
Sua mãe suspirou como se estivesse se preparando para repetir algo pela milésima vez.
— Nunca, nunca será normal, Ali. Os Sentinelas querem seu sangue. Se ficarmos em um lugar durante muito tempo, encontrarão você e a matarão. Não vou deixar que isso aconteça.
— Nunca vimos sequer um dos Sentinelas, só seus mascotes. — se queixou Lexi.
— Eu os vi. Eles parecem com os homens com árvores crescendo em seu peito, mas por dentro, são vermes e carne podre.
— Não acredito em você. Está tentando me assustar.
O carro se sacudiu até que parou derrapando e as pessoas detrás delas buzinaram. A mãe de Lexi os ignorou e se virou em seu assento, com os olhos azuis ardendo de fúria.
— Deve ter medo. Só os estúpidos não o têm. Quero que pare com essa tolice ou vamos ter que ir ver os Defensores de novo.
O medo fez a cor de Lexi mudar.
— Não, mamãe. Por favor.
— Então, Lembra-se das lições que lhe ensinaram?
— Sim.
— E o que lhe ensinaram?
As lágrimas brilhavam nos olhos escuros de Lexi.
— As meninas más morrem gritando.
Zach estendeu a mão para tomá-la em seus braços e consolá-la, mas antes que pudesse, a visão mudou de novo, derretendo a imagem da face chorosa de Lexi em um banho de cor.
Desta vez, quando a visão parou, Lexi dirigia. Era inverno e a neve caía com tanta força que só havia leves sinais do caminho diante dela. Os limpadores do para-brisas do Honda estavam batendo de um lado a outro a tanta velocidade, que deixavam tênues listras de gelo para trás.
O corpo de Lexi estava inclinando pelo cansaço e seus olhos estavam vermelhos como se não tivesse dormido em dias. Ou talvez estivesse chorando. A cada poucos segundos, verificava seu espelho retrovisor e agarrava o volante com mais força nas mão enluvadas.
Um sinal cheio de neve indicava uma área de descanso mais adiante e Lexi tomou a rampa. Estacionou o carro o mais perto do banheiro que pôde, mas não saiu. Em vez disso, se arrastou para o assento traseiro, desenrolou um saco de dormir e deslizou em seu interior, com sapatos e tudo. Fechou o zíper até encima e colocou uma touca de meia até as orelhas. Assim, a neve cobriu as janelas do carro, quase bloqueando a luz em cima de seu carro.
Pegou uma fotografia de sua mãe com a ponta de um dedo enluvado.
— Boa noite, mamãe. Sinto saudades de você.
Sua respiração saiu como uma prateada nevoa de gelo. Mesmo dentro do carro estava congelando.
Lexi se aconchegou no interior do saco de dormir, tanto quanto pôde e cobriu a cabeça. Mesmo na penumbra, podia ver o tecido brilhante do saco de dormir tremer com seus estremecimentos.
Zach desejava ir até ela, esquentá-la. Mas não podia. Não estava realmente ali, isto estava tudo em seu passado, e não havia nada que pudesse fazer exceto observar e retorcer-se de frustração.
Quantas noites ela tinha dormido no carro? Quantas noites foram mais frias que aquela? Mesmo sem a ameaça dos Synestryn, ainda estava se pondo em perigo dormindo em uma área de descanso na estrada. Qualquer louco poderia ter entrado pela janela e a roubado, ou simplesmente tê-la matado.
O fato de ela ter sobrevivido apesar das probabilidades a fazia muito mais que um milagre. Seu milagre.
Finalmente, a visão desvaneceu-se, e embora só tivessem transcorrido alguns breves segundos, esses segundos tinham mudado Zach. Tinham dado uma pequena parte de Lexi e de algum jeito o fez sentir-se mais inteiro.
Quando a realidade retornou, recolocando-o dentro da cabana empoeirada, Zach pôde finalmente tocá-la. Estendeu a mão para ela, percebeu que ainda segurava a espada e a deixou cair. Limpou o sangue do corte, que já estava se fechando, em sua camisa e foi para junto dela na cama.
Lexi olhava fixamente com olhos cegos, presenciando algo que a luceria queria lhe mostrar. Ele esperava que o que ela visse fosse algo bom, alguma ação corajosa, nobre que houvesse feito pelo caminho. Não queria que ela visse o quanto tinha sofrido ao longo de sua vida. Ela merecia ver só as partes boas, para não se sentir oprimida pela simpatia por ele.
Lexi fez um ruído de dor e oscilou. Zach a puxou contra ele para estabilizá-la, deleitando-se com a sensação dela tão sólida e cálida em seus braços. Tão viva e segura. Apoiou a face contra seu ombro e ele pôde sentir a rajada de ar de seus pulmões varrendo sua pele.
Era dele. Mesmo enquanto seu pulso se estabilizava, a dor que esteve com ele durante tanto tempo começou a desaparecer. Em seu lugar sentia uma sensação de satisfação e propósito. Totalmente correto.
— Está bem? — perguntou a ela.
Assentiu com a cabeça trêmula.
— Espero que sim. Isso foi…
— O que viu?
— Batalhas. Você e Drake e uma centena de homens lutando contra outros monstros. Século após século.
— Os Synestryn. — disse, dando o nome de seus inimigos.
Sua respiração se igualou, mas sua cor ainda não estava bem. Estava pálida e trêmula, mas mesmo assim, estava forte o suficiente para empurrá-lo para que pudesse montar escarranchada sobre seu estômago e o olhar nos olhos.
Lexi segurou seu rosto entre as mãos e o toque de seus dedos magros em sua pele reavivou uma parte daquela luxúria que ele pensou que a visão tinha apagado. Sua expressão era séria e seus olhos escuros deslizaram sobre suas feições, estudando-as.
Já estava pensando em abandoná-lo? Armazenava as lembranças dele como se fossem as fotos de sua mãe?
— Por que faz isso? — perguntou.
— Faço o quê?
— Continua lutando? Mantendo-se vivo quando tudo o que está para acontecer é mais batalhas e derramamento de sangue?
Não entendia por que ela fazia todas aquelas perguntas, mas deu as respostas que ela necessitava, a verdade.
— Porque prometemos que faríamos isso. Porque não há mais ninguém que possa fazer isso.
— Você não é quem eu acreditava que fosse. — disse em voz baixa. — Não é o vilão que minha mãe pensou, tampouco.
O alívio o atravessou como uma brisa fresca.
— Então, acredita em mim agora?
Ela vacilou e ele soube que o alívio tinha chegado cedo demais.
— Quero acreditar em você.
— Então acredite.
— E se for um truque? Se for uma parte do processo de lavagem cerebral?
Zach se debatia entre sentir-se insultado por sua falta de confiança e sua vontade de consolá-la e afastar todas as dúvidas que lhe causasse medo. Devia ser difícil para ela estar tão perto dele quando não tinha certeza se ele estava ou não tentando transformá-la em uma espécie de zumbi controlado mentalmente, ou qualquer outra ideia ridícula que tivesse em sua cabeça.
— Como posso demonstrar que não é? Quero dizer, nada que eu diga a convencerá porque pensará que é parte de meu diabólico plano para transformá-la em minha escrava com a lavagem cerebral, não?
Ela teve a cortesia de ruborizar, ao ouvir suas ideias expostas em termos tão ridículos.
— Tudo o que posso fazer é mostrar a você como usar meu poder. Talvez quando se der conta do que pode fazer agora, perceberá que nenhuma pessoa sensata jamais consentiria a um escravo o tipo de magia que você possui agora.
Lexi desceu da cama e deu um passo para trás.
— Não estou preparada para nada mais agora. Isto já é demais.
— Isto simplesmente é muito ruim. Não vou deixar que você saia daqui acreditando que tenho a intenção de machucá-la de alguma forma.
— Não pode fazer nada comigo.
Ele levantou-se da cama e depois a segurou pela cintura. Era bom senti-la sob suas mãos, suave e magra. Envolveu sua cintura com as mãos e teve que impedir-se de abraçá-la fortemente também.
— Quer apostar?
Ela levantou seu queixo rapidamente quando o olhou.
— Assim tudo isto era só uma maneira de conseguir que eu fizesse o que você queria?
— Não, é uma maneira de você conseguir o que quer. É uma maneira de ensiná-la a se proteger no caso de você decidir fugir de mim outra vez. Não que eu a deixasse ir muito longe, já que é muito preciosa para correr riscos, mesmo que seja por um momento.
— E se eu quiser me afastar de você?
Zach sentiu um sorriso de vitória curvando sua boca e aumentou o aperto em seu corpo.
— Tente. Vá em frente. Eu desafio você.
Lexi estava bastante segura de que estava sendo servida em um montão de merda. Queria acreditar que ele tinha lhe dado uma espécie de poder mágico, mas esse era o problema. Queria acreditar.
— Não acredito.
— É claro que não. Já sei que não vai acreditar em nada que eu diga até que veja por si mesma. É por isso que quero que faça isto, assim terá a prova.
— Muito bem. O que devo fazer?
— Pode sentir a luceria?
— Sim.
— Como a sente?
— É quente. Zumbe.
— Feche os olhos. — insistiu. — Talvez se sinta melhor se fechar os olhos.
Depois de um momento de teima, Lexi o fez.
— A luceria conecta você a mim, a meu poder. Lembra-se de todas aquelas pequenas faíscas que saltam de mim quando nos tocamos?
Cara, ela lembrava. Lexi assentiu a contra gosto com a cabeça.
— É como isso, só que muito mais. Mais forte.
Lexi podia sentir algo lá, mas não conseguia alcançá-lo. Havia algo premente no calor etéreo em sua mente, mas não havia nada em que se agarrar, nada sólido ou real.
Fosse o que fosse, estava morrendo de vontade de possuí-lo, como se, de alguma forma, lhe pertencesse, um brinquedo favorito que tinham tirado dela antes que tivesse a oportunidade de brincar com ele.
Tentou com mais afinco, estendendo as mãos até que tremeram. De fato, tela toda estava tremendo.
Lexi recuou quando já não pôde mais, antes que aquela coisa, seja lá o que fosse, a atraísse e não a deixasse ir nunca. Imediatamente, todo aquele calor ardente se desvaneceu, desaparecendo de seu alcance, deixando-a cambaleante.
Seu mundo inteiro se transtornou no espaço de poucos minutos, e ainda estava dando voltas, procurando algo em que se agarrar para não cair.
Ao que parecia, aquela coisa era Zach. Não conseguia parar de tocá-lo. A massa sólida de seu corpo parecia ser a única coisa real que podia encontrar neste momento e se agarrou a ele como um salva-vidas.
Sua pele era suave e firme sob seus dedos. A massa de poder que quase havia tocado provocou um ataque que só agora começava a desvanecer-se. Deixou para trás um núcleo vibrante de energia que a aqueceu de dentro para fora. A luceria ao redor de seu pescoço pulsava com mais daquele poder embriagador, mas Lexi não se atreveu a alcançá-lo. Não queria saber que algo tão belo era mentira.
Seus dedos deslizaram subindo pela coluna de Zach até sua nuca. Ele deixou escapar um profundo ronrono de prazer e aquele som abalou até seus Nikes[8].
Podia fazê-la sentir-se bem, o que era outro tipo de ataque de completo poder. Lexi teve alguns amantes no passado, mas nunca duraram muito tempo porque ela nunca ficava em um lugar durante mais que algumas semanas. E nenhum daqueles homens teria querido recolher sua vida em uma mala e sair para a estrada só para ficar com ela.
Não que os culpasse. A vida na estrada não era divertida, e Lexi não ia despejar esse tipo de problemas em ninguém.
Mas com Zach, não tinha que fazer isso. Ou ele estava dizendo a verdade e ela finalmente tinha encontrado uma maneira de lutar contra os monstros que queriam lhe fazer mal para que já não tivesse que continuar correndo, ou era mentira e ela estava presa, sendo muito tarde para correr.
Lexi sabia qual dessas opções esperava que fosse verdade, mas também sabia que não devia manter essas esperanças muito elevadas.
Sua garganta se apertou ao redor de um pedaço de desejo. Queria acreditar que Zach era o tipo de homem que tinha visto nas visões que a luceria lhe mostrou. Aquele homem era amável, abnegado e dedicado. Aquele homem brincava com as crianças e os ensinava como lutar para que pudessem se defender. Aquele homem acolhia as crianças, mantendo-as e assegurando-se de que nunca tivessem que utilizar as habilidades mortais que ele lhes ensinava.
E as mulheres de sua vida foram as pessoas mais sortudas sobre a face da Terra. Lexi viu como ele havia feito amor com elas. Viu como ele tinha tido o cuidado de lhes dar prazer, em vez de limitar-se a tomar o seu. Viu como ele tinha sido amável e doce com cada uma delas, garantindo sua segurança, até mesmo depois que tinha deixado suas camas.
Lexi passou grande parte de sua vida desejando ter o que os outros tinham por certo, uma casa, uma família, uma vida normal, uma sensação de segurança, mas nunca antes havia sentido o mesmo tipo de ciúme selvagem que experimentou ao ver Zach fazer amor com as inúmeras mulheres que entraram e saíram de sua vida durante séculos.
Tentou dizer que não o queria realmente, que era apenas uma parte de todo o esquema de lavagem cerebral, mas ela sabia que era uma mentira. Havia algo dentro dela que se levantou e gritou que ele pertencia a ela, não a essas outras mulheres.
À medida que suas mãos percorriam as belas costas, conseguindo mais sons eróticos de seu peito largo, Lexi soube a verdade. Inimigo ou não, ia encontrar um modo de ter o que todas as outras mulheres tinham tido. Pela primeira vez, ia ser imprudente e pegaria o que queria da vida, apesar do perigo.
Zach era dela e ela ia tê-lo.
Lexi se inclinou e beijou suavemente seu ombro. Seu corpo se retesou e seus músculos se inflaram em duras cordilheiras.
— Cuidado. — ele a advertiu. — Beijar-me é a melhor maneira de obter mais do que está pedindo.
Lexi ignorou a advertência, empurrou-o para baixo sobre a cama, sentou-se escarranchada sobre ele, e o beijou outra vez. Desta vez, mudou-se para o lado de seu pescoço e deslizou a ponta da língua sobre sua pele salgada.
— Lexi?
Não tinha certeza se ele queria formular uma pergunta, mas sabia a resposta.
— Sim.
Zach a olhou. Seus olhos verdes lançavam um brilho primitivo de desejo que deslizou sobre seu corpo, gravitando sobre sua garganta e seus seios o tempo suficiente para fazê-la estremecer.
— O que quer? — ele perguntou.
— A você.
Ele fechou os olhos com força, para bloquear sua visão e disse:
— Seja mais clara, carinho. Tenho todos os tipos de fantasias ocorrendo aqui.
Lexi nunca foi tímida sobre o sexo, e não ia começar agora. Não quando tinha tanto a perder.
Estendeu-se ao seu lado na cama para que seu rosto estivesse nivelado com o dele. Segurou-o pela nuca e o manteve ali até que fechou a distância entre eles. A necessidade de beijá-lo a fez tremer, mas se controlou durante mais um momento, para dar as palavras que ele queria.
— Quero você nu. Quero você duro. Quero você dentro de mim. Fui bastante clara?
Ele abriu os olhos e lhe deu um olhar tão quente e cheio de potente luxúria masculina que ela começou a suar.
— Oh, sim. Cristalina. — disse.
Sentiu os músculos dele se agrupar e se enrijecer ao redor de seu corpo, e a próxima coisa que soube, foi que estava debaixo dele, olhando sua boca cheia, tentadora. Ainda segurava firmemente seu pescoço e o puxou para ela. Seus lábios eram suaves contra os dela e tão ansiosos que ela soube que não estava sozinha na loucura de sua necessidade por ele. Ele também a queria. Podia sentir essa necessidade dura e grossa contra seu montículo, movendo-se em um lento e constante movimento que fez seu corpo tornar-se fluido e flexível.
Sua língua como uma pena contra seu lábio superior, procurando a entrada e Lexi o deixou entrar. O sabor dele em sua boca a enlouquecia. O hábil deslizamento de sua língua através de sua delicada pele indo para dentro de seus lábios a fez desejar mais. Podia sentir o cheiro de sal em sua pele e um sutil e mundano aroma de excitação masculina no ar ao seu redor. Seu corpo estava vazio, dolorido e em chamas. Sua pele parecia esticar-se, mas era muito pequena para conter toda a necessidade que se retorcia em seu interior. Nem sequer tinha certeza do que necessitava, só tinha certeza que Zach era a única pessoa que podia lhe dar.
Uma fina camada de suor cobriu seu corpo, mas não fez nada para acalmá-la. A boca de Zach comeu na sua, bebendo todos os sons frenéticos que ela não conseguia parar de fazer. Suas mãos se agarraram às costas rígidas, tentando aproximá-lo ainda mais quando não havia espaço suficiente entre eles.
Zach deslizou a mão por seu lado e a apoiou, abrindo o caminho por debaixo de sua camisa para que as mãos quentes acariciassem sua pele nua. Lexi se retorceu, tentando lhe dizer que queria mais. Queria sentir sua mão envolvendo seu seio, a palma da mão roçando seu mamilo. Talvez isso aliviasse a dor aguda em seu interior.
Mas ele não lhe deu o que queria. Apenas a acariciava como se estivesse concentrado em sentir sua pele, sem nenhuma pressa de ir mais rápido.
Lexi ia ter que fazer isso por si mesma.
Suas mãos se moveram por suas costas, acariciando a pele que se aquecia e tencionava onde ela tocava. O jeans era justo, mas não tão apertados que não pudesse deslizar uma mão por debaixo do cinto, sob a malha de algodão de sua boxer. Sentir seu suave e firme traseiro em sua mão fez seu sangue esquentar e aquela piscina de calor descer lentamente para seu ventre.
Zach tomou fôlego sobressaltado e seus quadris entraram em contato com os dela em um suave círculo. A pressão do movimento esfregou a costura do jeans contra seu clitóris e enviou uma centelha de sensação que faiscou através dela. Lexi deixou escapar um grito suave e desesperada por mais, mas em vez de dar o que ela queria, seu corpo ainda estava encima do dela.
Abriu as pernas, dando dado espaço para seu corpo grande entre suas coxas. Ele encaixava perfeitamente contra ela, gravitando sobre ela, mantendo o resto do mundo distante. Não existia nada, exceto a sensação de seu peso em cima dela, o calor de sua respiração enquanto ela o aspirava para seus próprios pulmões, o percurso de sua mão por suas costelas e o sabor dele em sua língua.
Rodeava-a e ainda assim não era suficiente.
Lexi pressionou beijos quentes em sua mandíbula e laterais do pescoço musculoso. Grunhiu, emitindo um áspero e rude som animal de prazer e mudou de posição. Um momento depois, seus longos dedos deslizaram entre seus seios e na clavícula, o braço puxando a camisa a sua passagem. Ele acariciou a luceria ao redor de sua garganta, afiados e quentes picos de energia correram por ela.
— Abra-se para mim. — murmurou contra seus cabelos.
Não tinha nem ideia do que ele queria. Já tinha aberto suas pernas tão amplamente quanto podia. De fato, estava se esfregando contra ele, tentando em vão encontrar o doce ponto que ele havia tocado antes.
Outro empurrão de energia a atravessou, fazendo-a gritar ofegante. O calor daquilo deslizava por sua pele, chamuscando-a até que teve certeza que queimaria. Era quase doloroso, mas não muito, e muito intenso para ser chamado de prazer.
— Vamos, carinho. — sussurrou persuasivamente. — Deixe-me entrar
— Tenho que baixar minha calça. — disse. Estava ofegante, quase incongruente.
— Faremos isso. É óbvio. Mas não foi isso o que eu quis dizer. Deixe-me entrar aqui. — passou o dedo sobre sua têmpora, através de sua testa até a outra têmpora.
Lexi não entendia, mas estava tentando averiguar isso. Quando os dois estivessem nus, tudo ficaria bem. Tinha certeza disso, assim foi para o botão de seu jeans, tentando abri-lo.
— Oh, não, não. — ele disse. — Ainda não. Vamos fazer isto direito.
— Isso. Agora mesmo. Qual é a diferença? Está me matando.
Um sorriso arrogante inclinou sua boca. Como podia sorrir quando ela estava a ponto de arder em chamas? Aquela necessidade perturbadora em seu interior estava crescendo, como uma criatura faminta. Se não a alimentasse logo, tinha certeza que a consumiria.
Nunca havia sentido algo como aquilo antes. Quanto mais tinha, mais necessitava.
Lexi tentou abrir aquele botão de novo, mas Zach juntou suas mãos e as apertou contra seu peito quente. Os músculos estavam rígidos e vibrando com a tensão.
Ele fechou os olhos e disparou outra descarga de energia nela, formando um arco de onde o anel tocava o dorso de sua mão, até o braço, indo para a luceria ao redor de sua garganta. Ouviu a pequena explosão de energia e a crepitação na tranquila cabana, depois rasgou por sua coluna e a única coisa que escutou foi seu próprio grito de surpresa.
O desejo faminto dentro dela se lançou sobre aquele poder, consumindo-o e crescendo enquanto o fazia. Bateu em sua mente, exigindo entrar, mas Lexi resistiu, mantendo as portas fechadas e travadas, como a mãe tinha ensinado.
A pressão se construiu dentro de sua cabeça até que se tornou dolorosa. Não conseguia respirar direito.
Algo estava errado, terrivelmente errado.
Zach se separou dela, e Lexi deixou escapar um grito desesperado, tentando puxá-lo para ela. Precisava dele para eliminar aquela fome em seu interior. Para enchê-la. Mas ele não se moveu.
— Eh! Carinho. Devagar. Reduza a velocidade.
Lexi não podia. Devagar não ia solucionar aquela necessidade que arranhava seu interior, a pressão que ameaçava dividi-la em duas.
Um cenho franzindo enrugava a face morena de Zach.
— Lexi? O que está acontecendo com você?
— Necessito… — não sabia o que necessitava, só sabia que ele o tinha. — Algo.
Sua longa mão afastou os cabelos de sua testa suada.
— Shh. Relaxe. Está bem.
— Não me sinto bem.
— Opõe-se a isso. Não lute contra isso.
Estava lutando para não romper-se.
— De que diabos está falando?
— É a luceria tentando nos unir. Não resista. Simplesmente pare de empurrar.
— Se soubesse como, eu faria.
— Eu posso mostrar isso a você. Deixe que eu entre em sua mente, apenas um pouco, certo?
Dentro de sua mente? De forma alguma. Havia muitos segredos. Não podia deixar que ele os visse.
Demorou um segundo para perceber que era disso que ele estava falando o tempo todo, dizendo a ela para deixá-lo entrar. Ele havia tentando derrubar suas defesas mentais e não um monstro imaginário.
— Ainda não confia em mim. — não foi uma pergunta. Sua voz era suave, com desilusão e ressentimento. — Merda.
Virou-se e cobriu os olhos com o antebraço. Agora que não a tocava, uma parte daquele desespero que a golpeava começou a perder um pouco de sua intensidade.
Tomou uma profunda respiração. Outra. Pouco a pouco, a sensação incomoda em sua pele diminuiu.
Lexi arriscou-se a olhar para ele. Seu belo peito subindo e descendo com sua respiração agitada. O brilho do suor reluzia em seus músculos rígidos e os ramos nus da árvore estremeciam e se inclinavam como se eles estivessem se esforçando para se aproximarem dela. Todo seu corpo estava tenso, ressoando ao mesmo tempo com sua própria necessidade sexual selvagem, e sua rígida ereção contra a parte da frente de seu jeans.
Ficou olhando aquela grossa protuberância por tanto tempo que sua boca começou a babar. Quis retroceder e retomar de onde o tinham deixado, sem todos os jogos mentais.
— Por que fez isso? — perguntou ela. — Por que tentou mexer em minha cabeça quando eu estava mais que feliz em deixar que entrasse em meu corpo?
— É a forma que suponho que deve ser. Pelo menos entre as pessoas que confiam uma na outra.
— Não tive a intenção de enganar você. — disse. —Sinto muito.
Sua voz era profunda e áspera com luxúria insatisfeita.
— Não tanto quanto eu sinto.
Precisava pôr um pouco de espaço entre eles e pensar. Deitar ali, olhando seu corpo, não estava ajudando em nada para esclarecer sua cabeça. Sua presença não deixava lugar para o pensamento racional. Era muito grande. Ocupava toda sua atenção quando estava perto dele.
— Vou dar um passeio. — disse Lexi.
Sentou-se na beira da cama, deixando que sua cabeça atordoada se assentasse.
Ele se deslocou se sentado ao seu lado e embora tivesse a mandíbula apertada, seu tom de voz era suave.
— Eu gostaria que ficasse.
— Assim poderemos nos frustrar mais? — assim poderia ver que ela esteve planejando matá-lo? — Não, obrigado.
— Agimos rápido demais, isso é tudo. Você só precisa de um pouco de tempo para ver que pode confiar em mim.
Ela engoliu saliva, tentando aliviar o aperto na garganta.
— Zach, tenho que ser completamente honesta. Nunca vou confiar em alguém o suficiente para deixar que rebusque dentro de minha cabeça.
— Você só precisa se acostumar à ideia. Dê-lhe tempo para que cresça em você.
— Não. Estou falando sério. Poderíamos ficar juntos por uma dúzia de séculos e nem assim eu poderia dar a você esse tipo de poder sobre mim.
— Do que está falando? Que poder?
— Fala a sério? Você não acha que ser capaz de ver dentro de minha mente é como a última viagem de poder? Quem sabe o que poderia fazer quando estivesse lá dentro?
— Esse é o ponto. Se você confia em alguém o suficiente para deixá-lo entrar, acredita que ele não a foderá mais.
— Não tenho esse tipo de confiança. — disse Lexi.
Zach endireitou os ombros.
— Então, eu irei primeiro. Vá em frente. Dê uma olhada dentro de mim e veja o que quiser. Não tenho nada a esconder.
Lexi estava tentada. O breve vislumbre das imagens que recebeu quando colocou sua luceria a tinha intrigado. Morria de vontade de ver mais, mas não era justo. Não podia invadi-lo dessa maneira.
— Sinto muito.
Sua mão cobriu a dela e uma onda de calor reconfortante emanou até seu braço.
— Você só precisa de mais tempo. Tenho que encontrar a paciência para lhe dar isso.
Ela não acreditava que o tempo fosse a solução de tudo aquilo, mas manteve a boca fechada. Talvez depois que tivesse um pouco de espaço para ficar sozinha e pensar, pudesse encontrar a maneira de gerir as expectativas extravagantes de Zach.
— Não acredito que alguma vez possa me acostumar a todas estas… Sensações.
— Talvez você devesse falar com Helen sobre isso. Ela passou por tudo isto.
— Helen é muito mais confiante que eu.
Zach suspirou.
— Talvez. Mas não se preocupe. Vamos resolver isso, carinho. Vamos fazer que funcione.
Lexi apertou os dentes contra as lágrimas que ardiam em seus olhos.
— E se não pudermos?
— Faremos isso. — uma total confiança radiava dele. — Não permitiremos que aconteça de outra maneira.
Lamentou não poder acreditar nele, mas tinha mais discernimento. Mesmo que sua fantasia fosse verdade, e Zach fosse tudo o que aparentava ser, ela o havia traído. Tinha planejado matar a ele e ao seu povo, e depois de ver como ele havia matado as criaturas que tentaram fazer o mesmo, não tinha certeza se ele algum dia seria capaz de perdoá-la. Claro, talvez pudesse passar por cima disso se ele se mantivesse vivo, mas não era o tipo de vida que Lexi queria. Queria uma casa. Um lugar ao qual pertencesse. Não um lugar que tolerasse sua existência porque Zach necessitava dela para continuar vivo.
É claro, que o que ela queria nunca tinha importado realmente no grande esquema de sua vida.
Lexi foi até a porta e levantou a pesada barra.
— Voltarei mais tarde. — disse.
Não se atreveu a virar-se por medo de ver o olhar de decepção em seu rosto. Isso não era algo que ela não pudesse enfrentar neste momento. Não acima de todo o resto.
Lexi fechou a porta detrás dela e sentiu uma arrebatadora onda de desejo desesperado transpassando-a. Estava a dez metros de distância antes que percebesse que o que sentia não vinha dela. Tinha chegado de Zach. Tinha sentido o que ele estava sentindo.
Parou bruscamente e deslizou o polegar sob o peso escorregadio da luceria. Estava quente contra seu corpo, talvez até mais que quente. Frenéticas vibrações de energia pulsaram ao seu redor, como se implorassem serem usadas.
Lexi estava convencida de que tinha cometido um terrível erro ao colocar a gargantilha, mas já era muito tarde. Sustentava a vida de Zach completamente em suas mãos, e não ia decepcioná-lo.
Ao menos ainda não.
Talvez não fosse do tipo crédulo, e talvez nunca deixasse que ele examinasse seus pensamentos e invadisse sua privacidade, mas não era uma completa inútil.
Havia poder no interior da faixa ao redor de seu pescoço, e estava mais que disposta a aprender como usá-lo.
Zach vigiava Lexi, mantendo-se atrás longe o suficiente para acreditar que ela não o veria. Queria lhe dar um pouco de espaço, mas não tanto para que corresse perigo.
O sol ainda não tinha se posto, assim Lexi estava a salvo, mas Zach não correria nenhum risco. Não ia correr o risco dela deixá-lo outra vez.
Agora que ela usava sua luceria, sua alma tinha parado de morrer. Ele podia sentir que a decomposição de sua marca de vida tinha parado, e embora a pressão do poder abrigado dentro dele ainda fosse forte, já não sentia dor. Lexi o havia salvado.
Zach esperava como o inferno que isso fosse suficiente... Que não tivesse que pedir mais. Mas tinha que fazê-lo. Necessitava de tudo dela, não apenas da parte que ela queria dar. Não apenas de seu corpo, e sim de sua confiança.
Talvez levasse anos, mas Zach jurou que encontraria um jeito de demonstrar a ela que era digno de um presente tão precioso.
— O que você faz escondendo-se atrás das árvores? — Drake perguntou por trás dele.
— Não estou me escondendo. Vigio Lexi.
Drake olhou para a garganta de Zach, então arregalou os olhos. Um sorriso dividiu seu rosto e seus olhos se fecharam por um momento de alívio.
— Ela fez.
— Sim. — disse Zach simplesmente.
— Parabéns, cara. Essas notícias são fantásticas. Helen vai ficar extasiada.
— Você poderia querer demorar a dizer a ela. Não estou certo de quanto tempo vai durar.
A boca de Drake se apertou.
— Quanto tempo ela deu a você?
Zach deu de ombros, sentindo-se rígido e nervoso. Olhou de novo para Lexi, observando-a enquanto ela arrastava a mão ao longo do muro de pedra que rodeava a Dabyr.
— Até que ela se farte de mim. Até que eu a afugente.
A voz de Drake tinha uma ponta de aço quando falou.
— Não a deixaremos ir embora. Virá visitar.
— Vamos ver.
Zach se moveu através das árvores, avançando em sincronia com o progresso de Lexi. Drake era uma sombra ao seu lado.
— Ela não quer criar nenhum tipo de conexão mental comigo. — disse Zach. Não tinha certeza do por que tinha compartilhado aquela informação, mas era muito tarde agora.
— Que quer dizer?
— Quero dizer que ela me bloqueia. Não me deixa entrar.
— Deveria falar com Gilda.
— Não, obrigado. Na realidade prefiro não espalhar nossos problemas por aí. Especialmente se for comprovado que alguns dos outros homens são compatíveis com ela.
— Certo. Grande segredo. Entendo.
Lexi olhou em direção a eles e ambos os homens ficaram quietos, escondendo sua posição. Depois de alguns segundos, ela continuou seu passeio, ignorando-os.
Drake recolheu uma lata de soda descartada para poder continuar seu caminho no bosque.
— Sabe, — ele disse. — sua resistência pode ter algo a ver com o que Helen me disse.
— O quê?
— Ela disse que Lexi veio aqui pensando em ajudá-la a fugir.
O coração de Zach se retorceu fortemente e o sabor amargo da traição encheu sua boca.
— Não é de admirar que Lexi tenha me deixado encontrá-la. Ela queria que eu a trouxesse para cá.
— Sinto muito, cara.
Zach observou-a desacelerar até parar, então apertou a mão contra o peito. Ela se inclinou para frente, e repentinamente ele compreendeu que Lexi estava lhe sentindo agora mesmo... Sentindo o que ele sofria.
Parte dele quis ir até ela e consolá-la, mas outra parte queria gritar para ela que ela tinha exatamente o que merecia. Como se atreveu a enganá-lo assim? Como se atreveu a fazer intrigas em suas costas para roubar a esposa de seu irmão?
Zach segurou com força a conexão esquálida que fluía entre eles. De qualquer forma era completamente unilateral. Qual era a razão de mantê-la aberta?
— Ela está me usando. — dizendo essas palavras fez seus punhos endurecerem-se em bolas letais. Queria dar um golpe forte e bater em algo até que afugentasse a dor e a humilhação que a traição dela lhe tinha causado.
— Talvez, mas olhe onde está metido. Ela está usando sua luceria. Tem a possibilidade de fazer que isto funcione.
— Não sem sua cooperação. — Zach disse. Suas palavras eram duras, e frias como cubos de gelo.
— Então a obrigue a cooperar. Encontre a forma dentro de suas defesas. Engane-a se tiver que fazê-lo.
— Ela, sem dúvida alguma, não teve nenhum problema para me enganar.
A mão de Drake foi se aproximando do braço de Zach. Ele não tinha percebido até então, que tinha começado a caminhar em direção a ela, furioso.
— Acalme-se, Zach. Precisa parar e pensar antes de agir. Ponha-se no lugar dela, e se não puder fazer isso, então vá passar um pouco de tempo de qualidade com o saco de areia antes de ir até ela.
Zach engoliu um pouco de sua fúria e deu um rígido aceno com a cabeça.
— Ela não compreende nosso mundo.
— Helen tampouco o fazia.
— Lexi é pior, porque não só não o compreende... Como tem todas aquelas ideias equivocadas que sua mãe colocou em sua cabeça. Na verdade acreditava que os Synestryn eram nossos mascotes.
— Está falando sério?
Zach assentiu com a cabeça.
— Não sei se algum dia eu a obrigarei a confiar em mim.
— Certamente não o fará se for atrás dela com esse olhar letal adornando seu rosto. Você precisa de um plano.
Zach não tinha certeza de que algo tão racional como planejar fosse funcionar agora. Tudo o que ele queria fazer era desafogar sua ira, jogando seu peso em torno, e obrigar Lexi a ser o que ele necessitava que ela fosse.
— Há alguma brecha em suas defesas? — Drake perguntou. — Algo que possa lhe mostrar ou possa ajudá-lo a ganhar sua confiança?
— Estive tentando fazer isso desde que a conheci. Nada funcionou.
Zach puxou sua memória, tentando esclarecer onde estavam os botões de Lexi. Havia química sexual entre eles, é claro, mas ele não estava completamente certo que essa forma fosse funcionar. O que aconteceria se eles se deitassem juntos e ela se arrependesse? Poderia ser um enorme retrocesso.
A única vez que ele tinha visto qualquer emoção real fluindo dela foi sobre seu carro.
Sua casa.
Era isso. Zach soube o que precisava fazer.
— Tem algumas horas que possa me dar para trabalhar em algo?
Drake fez para ele uma expressão desconcertada.
— Claro. Helen está tirando uma soneca, consegui que descansasse um pouco mais para o trabalho no muro esta noite. O que você precisa?
— De mais quatro homens, alguns levantadores de pesos, e uma boa dose de sorte.
Connal protegeu o corpo dos raios solares que restavam no entardecer com um manto pesado e levou a caixa para Zillah, no bosque atrás de Dabyr.
Através das árvores, podia ver a nova mulher caminhando ao longo do muro, arrastando os dedos sobre a pedra. Ele ainda não a tinha conhecido, o que era uma pequena bênção. Era mais fácil soltar o monstro de Zillah em uma mulher que não conhecia.
Seja o que fosse que estivesse ali esteve arranhando e sibilando, aranhava a caixa de madeira sem parar. Nunca dormiu, nunca descansou. Só isso era suficiente para alarmar Connal, pior ainda era o fato de que há algum tempo, uma das garras pretas da criatura finalmente tinha atravessado a gaiola de madeira.
Connal podia senti-lo o observando. Podia sentir a compulsão que Zillah de algum jeito tinha infundido no sangue de sua mulher, obrigando-o a obedecer. Ele já não podia lutar com ela. Tinha que deixar a criatura sair.
Não que Connal desejasse fazer qualquer dano aos Theronai... Ele simplesmente não podia aguentar mais a tortura da fome constante. Zillah o alimentava. Os Theronais se recusavam. Para Connal, isso delineava sua lealdade com mais clareza do que a honra alguma vez poderia.
E agora os Theronai iam pagar o preço por sua mesquinharia. Qualquer coisa que estivesse na caixa caçaria as poucas mulheres lá embaixo e as incapacitaria. Tudo o que tinha que fazer era segui-la e beber até encher-se antes de levar seus corpos para Zillah.
Lexi fez todo o trajeto ao redor do muro gigante até que retornou ao lugar onde tinha começado. O buraco aberto na pedra era de três metros de largura e ela podia ver a diferença sutil na construção... A variação nas fendas entre as rochas... Onde outros três metros de muro tinham sido reparados.
Seja o que for que abriu aquela passagem ali tinha preparado um golpe infernal.
E aquele lugar ainda permanecia em pé.
Um sorriso ridículo puxou sua boca. Se aquele tipo de poder que podia fazer tanto dano não derrubou aquele lugar, alguns tijolos de C-4 em seu porta-malas nem sequer iriam rachá-lo.
Não que ela alguma vez fosse usá-los. Não agora que tinha visto todos os homens, mulheres e crianças humanas ali. Não havia nenhuma maneira de que pudesse explodir aquele lugar, mesmo se pensasse que era correto fazer isso. O que não acreditava. Não mais. Dabyr era um lugar de proteção e refúgio. Era um lar para centenas de pessoas. Ela não poderia destruir isso de forma alguma. Um lar era um lugar sagrado. Não poderia destruí-lo da mesma forma que não poderia salpicar tinta sobre a Mona Lisa.
A mão de Lexi correu sobre as pedras brutas onde o reparo tinha sido feito. Podia sentir uma vibração baixa gotejando para fora da rocha. Era quente e limpa, como a luz do sol no meio do inverno, e havia algo mais ali... Algo poderoso e fugaz que ela quase podia tocar.
Ela fechou os olhos e pressionou ambas as mãos contra a seção que foi reparada do muro. Fadiga. Cansaço. A parede estava cansada.
Lexi se afastou, sentindo seu coração bater contra suas costelas. Como diabos ela podia sentir isso? E como diabos uma parede podia estar cansada? Tinha pouco sentido.
No entanto, poucas coisas tinham sentido naquele lugar. Especialmente Zach. Ele não queria fazer sexo, mas queria ler sua mente? Que porra de lógica isso tinha?
Esteve se perguntando isso por horas e ainda não tinha nenhuma resposta. Tudo o que tinha era o começo de uma dor de cabeça e um estômago roncando. Precisava jantar.
Começou a voltar para dentro para onde ela tinha visto o refeitório, e pela primeira vez notou que não era a única.
Vários homens grandes montavam guarda perto da abertura na parede. Não estavam ali antes, mas o sol começava a se pôr, e ela apostaria um bom dinheiro que eles deviam estar ali para manter os monstros do lado de fora.
Um deles virou-se para ela, e ela viu sua luceria vibrar, brilhando ao redor de seu pescoço. Ele tinha olhos azuis profundos e uma constituição alta, magra. Seu rosto era fino, mas de aparência agradável, e tinha uma forma de mover-se que era quase hipnótica.
Quando ele a viu, deu um passo em sua direção, fazendo o corpo de Lexi se retesar. Não queria outra repetição do que tinha ocorrido na área de exercícios quando todos aqueles homens foram se aproximando dela, fazendo-a engasgar de pânico. Ela estava desarmada, e Zach não se encontrava em nenhum lugar.
O homem devia ter visto sua ansiedade, porque parou de andar e manteve as mãos para o alto. Sua voz foi tão suave quanto a luz do dia desaparecendo.
— Não tive a intenção de assustá-la, minha senhora. Só queria lhe dar meu voto.
Lexi não soube o que ele queria dizer, mas era uma daquelas coisas que provavelmente seria melhor não saber.
— Não, obrigado. Estou bem.
Ele a olhou com o cenho franzindo.
— Prefere esperar a cerimônia?
— Sim, eu realmente não me envolvo muito em cerimônias, mas tenho certeza que você passará um bom momento sem mim.
Um meio sorriso levantou um lado de sua boca.
— A cerimônia é para você, minha senhora.
Por que ele continuava chamando-a de "senhora"? Ele devia ser da idade de Zach, e não tinha conhecimento da forma como as pessoas modernas falavam.
— Não há necessidade de armar uma confusão.
Ele deu um passo mais para perto sem parecer ter se movido. Seu corpo moveu-se apenas com um suave deslizar sobre o chão.
Os outros homens observavam agora, e também se aproximaram, suas expressões intensas e sua linguagem corporal ameaçadora, mostrando muito interesse nela para a tranquilidade de seu espírito.
Uma onda de ansiedade revoou abaixo de sua coluna vertebral.
— Preciso ir. Nós nos vemos mais tarde.
Ela recuou até está fora de alcance, então caminhou tão rápido quanto pôde sem que parecesse que estava fugindo. Escondeu-se nas árvores e olhou furtivamente por cima do ombro para se assegurar que nenhum deles a seguia.
Caminhou uns trinta metros no bosque, de volta para onde as cabanas estavam protegidas pelas árvores, separadas do restante do terreno.
O vento mudou, e repentinamente Lexi teve a impressão que estava sendo observada. As últimas semanas superando Zach tinham ensinado bem aquela sensação. Mas aquilo era diferente. Era mais… Malévolo, como se o que a estivesse observando, a odiasse.
Nunca antes tinha experimentado nada parecido, e isso a deixou sentindo-se ansiosa e nervosa. Especialmente agora que o sol tinha se posto e a escuridão chegava velozmente dentro da vegetação espessa.
Olhou por cima do ombro, olhando com atenção por entre as árvores, varrendo as sombras profundas em busca de algo que pudesse estar ali. Não viu ninguém. Nem sequer um movimento além do ocasional balanço das folhas pela brisa.
Tanto quanto queria dizer que estava sendo estúpida, Lexi tinha aprendido a escutar seus instintos. Alguém ou algo estava lá fora, e a observava. Era hora de voltar para dentro.
Lexi se virou para retornar ao edifício principal quando algo se moveu em alta velocidade das árvores e se lançou sobre ela.
Seus instintos aguçados por anos de esquivar-se de comida derramada e evitar colisões com as demais garçonetes permitiram que ela se esquivasse da listra preta.
Ela bateu no chão com força, mas uma profunda sensação de pânico explodiu dentro dela, adormecendo seu corpo e tornado-a mais rápida. Engatinhou depressa para entrar na vegetação espessa.
Um grunhido baixo vibrou nas folhas, muito profundo para ter vindo de algo do tamanho de um gato doméstico. Aquela sensação de ser observada se intensificou até que tremeu por sua malevolência.
Aquela coisa... O que quer que fosse... Queria matá-la.
Lexi ficou de pé e recuou tão rápido quanto pôde sem tropeçar. Não queria lhe virar as costas nem por um segundo. Era muito mais rápido para que ela ganhasse.
Nesse momento, teria dado qualquer coisa para que Zach estivesse ali com aquela letal espada na mão, parado entre ela e o monstro.
De algum lugar distante, ouviu um rugido de indignação. Ecoou em sua mente, forte e desafiante.
A listra preta em movimento saiu disparada de seu esconderijo, direto para seu rosto. Lexi jogou-se no chão, mas sentiu um puxão em sua manga. Olhou para baixo e viu o corte preciso de um bisturi em sua blusa.
Se houvesse batido em sua pele...
Ela não ia esperar para ver o que aconteceria então. Pegou uma vara jogada no chão e ficou de pé.
Desta vez, não perdeu tempo vigiando suas costas. Apenas correu.
Um sibilante sussurro no ar a advertiu um milésimo de segundo antes que o ataque seguinte chegasse. Ela se esquivou para a esquerda, aterrissando duramente no ombro. A vara se sacudiu com força para trás e bateu em sua cabeça, chocando-a por uma fração de segundo.
Um grunhido feroz soou perto. Muito perto. Sua pobre aterrissagem a abalou, tornando difícil dizer para onde a coisa tinha ido.
Antes que pudesse conseguir parar completamente, a listra se lançou com fúria contra ela outra vez. Seus instintos a fizeram levantar a vara em seu caminho e a madeira se partiu ao meio, fazendo a parte de cima de sua arma voar.
Agora tudo o que tinha era trinta centímetros de madeira, e se aquela coisa se aproximasse o suficiente para golpeá-la, estaria com sérios problemas.
Lexi nem sequer tinha se colocado sobre suas mãos e joelhos ainda, quando aquele monstro a atacou novamente, sibilando em sua direção. Ela ergueu sua arma débil, encolhendo-se contra o golpe que sabia que não poderia evitar.
O som de metal contra metal encheu seus ouvidos, e antes que pudesse abrir os olhos para ver o que era, Zach saltou entre ela e o monstro.
Sua espada estava nua. Sua posição era violenta em sua determinação.
Lexi se apressou a levantar-se, ficando perto de Zach. Nem sequer se incomodou de sacudir o pó e a grama de sua roupa.
— Viu para onde foi? — ela perguntou.
— Não. — essa única palavra estava carregada de fúria. Seu corpo vibrava de tensão.
— O que é aquilo?
— Algo morto. Assim que eu o veja.
Lexi examinou a área circundante, tentando ver através da escuridão crescente o suficiente para localizar a coisa.
Aquele arrepiante e sibilante grunhido se elevou por trás dele. Lexi se virou rapidamente. Zach a afastou com um empurrão, pondo-a atrás de seu corpo com uma mão.
Uma onda de movimento explodiu da vegetação, atirando fragmentos de folhas para fora quando a coisa disparou em direção deles.
A espada de Zach cortou o ar e um grito de dor ecoou em seus ouvidos, muito alto e metálico para ser humano. Algo úmido caiu no chão a sua direita.
A criatura tinha sido cortada em duas, e cada metade já tinha começado a dissolver-se em uma pilha de vermes pretos se contorcendo. Retorciam-se, escavando a terra.
O estômago de Lexi subiu.
As batidas pesadas de botas ecoaram perto, tornando-se mais forte. Lexi não podia afastar os olhos da horrível cena. Fosse o que fosse, queria matá-la. Se Zach não tivesse aparecido...
— Termine, Andra. — ordenou Zach com um voz rígida.
— Cubram seus ouvidos. — ela advertiu.
Lexi ainda estava muito chocada para mover-se, mas mãos fortes e quentes curvaram-se sobre seus ouvidos, protegendo-os do estrondo da magia de Andra.
Sujeira e partículas pretas e moles se levantaram, salpicando a parte de baixo de uma bolha invisível. Aquela bolha cheia de sujeira se elevou, deixando uma cratera semicircular no chão.
Lexi observou como Andra de algum jeito moveu todo aquele peso sobre o muro várias centenas de metros antes de deixá-lo cair.
— Acredito que isso servirá. — ela disse, tirando o pó das mãos. — Mas estarei por aí, por precaução...
— Obrigado, Andra. — disse Zach, um pouco alto demais, como se o estrondo tivesse danificado sua audição.
Lexi se virou para ele, deixando o alívio inundá-la. Agarrou firmemente sua camisa, enterrando o nariz contra seu peito. Ele cheirava a especiarias, calor e segurança. Ela inalou, deixando seu aroma reconfortante acalmar seus nervos destroçados.
Suas longas mãos deslizaram ao redor de seu corpo, movendo-se para cima e para baixo por suas costas em um ritmo reconfortante.
— Está bem? — ele perguntou. Sua boca se moveu contra seus cabelos. Sua respiração quente e úmida em seu couro cabeludo, aliviando os últimos resquícios de medo que restavam dentro dela.
— Sim. — respondeu. Porque ele a salvou. — E você?
Ele estava tenso, rígido.
— Nunca deveria ter deixado você sozinha.
— Não estrague toda esta boa vontade que sinto por você tornando-se um troglodita.
Ele a abraçou mais apertado. As vozes se desvaneceram enquanto os homens os deixavam para procurar mais monstros por todos os lugares.
Lexi não queria fazer parte daquela caçada. Ainda estava tremendo e precisava relaxar.
— Podemos entrar agora? Sinto-me um pouco vulnerável aqui fora na escuridão.
— Tudo que você quiser, querida.
Ele se afastou o suficiente para poder baixar os olhos para ela. Seus olhos verdes claros estavam iluminados de preocupação, lhe dando uma necessária distração. Era um homem tão belo com uma boca bonita. Os músculos debaixo da palma de sua mão a chamavam, fazendo-a querer tocar o corpo dele até que o conhecesse melhor que o seu. Queria absorvê-lo, absorver toda aquela força e confiança.
Ele disse algo, mas ela não escutou as palavras. Estava muito ocupada lutando contra o desejo de beijá-lo e continuar de onde pararam na cabana. Tudo nele a atraia em um nível profundamente feminino. Se alguma vez conseguisse tirar aquele jeans dele, sabia que seriam bons juntos, completamente explosivos.
Um sorriso afetuoso curvou sua boca e Lexi se esticou para cima para passar o dedo sobre seu lábio inferior. Ele pegou sua mão e pressionou um suave e quente beijo em sua palma.
— Quando me olha assim, não me importo que não esteja me escutando.
— Escutando o quê? — ela perguntou, ouvindo o zumbido aturdido em sua voz.
— Eu disse que tenho uma surpresa para você. Quer vê-la?
Contra sua vontade, seus olhos deslizaram para baixo por seu corpo até sua entre perna.
Zach soltou uma gargalhada, e levantou o queixo dela com a mão.
— Você me mata, mulher. Vamos.
Ele entrelaçou seus dedos com os dela e a conduziu por um caminho sinuoso entre as árvores. Saíram em uma clareira, e dali, podiam ver a parede de trás do edifício principal e uma febril atividade na área de exercício.
Ela se retesou e Zach apertou sua mão.
— Ninguém aqui vai machucar você. É só que todos estão ansiosos para conhecer a garota nova, isso é tudo.
Aspirou profundamente e exalou com força. Não estava acostumada a estar perto de tantas pessoas, especialmente uns tão volumosos e poderosos como os homens sem camisa levantando pesos a apenas alguns metros de distância.
Zach a conduziu através do grupo sem nenhum percalço, mas ela podia sentir os olhares intensos de muitos olhos sobre ela. Sentia-se como uma presa quando a observavam assim, e ela não pôde impedir-se de sofrer um arranque de pânico que a instigava a correr e esconder-se. Esteve fazendo isso toda sua vida, e manter sua posição agora tinha sido mais difícil do que jamais imaginou.
Dedos fortes e reconfortantes deslizaram para cima e para baixo por seu antebraço. A voz baixa e tranquilizadora de Zach deslizou em seu ouvido.
— Só mais um pouco.
Entretanto, quando atravessaram as portas de vidro, ela ainda estava tinha certeza que a observavam. Não precisava olhar para trás para verificar.
— Está com fome? — perguntou.
Estava antes do ataque, mas agora nem tanto. Seu estômago se contraiu, fazendo a fome escapar.
— Não posso me sentar aqui e deixá-los me observar comer.
— Estava pensando em algo um pouco mais privado. Um jantar para dois.
Lexi assentiu com a cabeça. Faria qualquer coisa para afastar-se de todos aqueles olhos.
— Tudo bem.
— Bom. É parte de sua surpresa.
Zach conduziu-a para um corredor, e o barulho das pessoas na área do refeitório desapareceu atrás deles. Lexi tomou uma longa respiração, e depois outra. Finalmente, pôde encher seus pulmões e exalar uma parte da tensão dentro dela.
Ela concentrou-se nas portas na frente das quais eles passavam, contando-a enquanto passavam por elas. Provavelmente deveria ter prestado mais atenção às voltas no caminho, mas seus nervos estavam muito em carne viva para algo tão complicado.
Zach levou-a e parou em frente a uma entrada e apontou para sua direita.
— A suíte de Drake e Helen fica a duas portas para baixo. Eu achei que você poderia querer estar junto dela. — ele pegou sua mão e colocou um cartão chave de plástico na palma de sua mão. — Isto é para você.
Lexi olhou para chave. Não havia marcas nela, simplesmente plástico branco com uma faixa magnética larga correndo ao longo de um lado.
— Vá em frente. — disse, sorrindo abertamente. — Abra-a.
Lexi passou a chave, e a luz mudou de vermelho para verde. Abriu a porta e entrou.
A primeira coisa que chamou sua atenção foi o aroma de pão recém-assado. Aspirou o aroma para seus pulmões, gemendo enquanto a fome voltava novamente com força total.
Zach estava bem atrás dela, tão perto que podia sentir o calor de seu corpo. Lexi deu sua chave a ele e foi procurar aquele pão. Antes que pudesse sair, ele segurou seu pulso e devolveu a chave a sua mão.
— É sua, Lexi. Esta suíte inteira é sua.
Ela pestanejou para ele, esperando que o sonho se desvanecesse, um sonho muito bom para ser verdade.
— O quê?
— Este é seu novo lar. — Zach dobrou os dedos frouxos ao redor do cartão e lhe dirigiu um sorriso tão doce que se sentiu rasgada.
— Lar? — ela repetiu a palavra, tentando envolver sua mente em torno do conceito. Nunca teve um lar sem rodas antes.
Seu braço fez uma varredura, abrangendo o que estava atrás dela.
— O que você acha?
Aturdida pelo impacto, e com uma espessa camada de suspeita para protegê-la, Lexi se virou. Deu três passos pelo pequeno hall de entrada até que pôde ver o lugar todo. A sala era enorme, com teto alto e janelas de altura imponente emoldurando um caminho de árvores que delineavam a resplandecente borda do lago. As paredes eram pintadas com um verde relaxante que combinava perfeitamente com o mobiliário de couro de aspecto confortável. Uma TV gigante pendurada na parede e as prateleiras vazias estavam lá, esperando ser preenchidas de livros e quinquilharias.
Nada que Lexi possuísse.
Uma cozinha em miniatura estava disposta em um canto, já abastecida com uma cafeteira e uma mesa para dois. Velas ardiam entre dois pratos cobertos de comida, e um vinho tinto de um vermelho profundo resplandecia dentro de delicadas taças de cristal.
Sobre suas pernas fracas, moveu-se para frente para onde estavam os dormitórios. Dois deles. Cada um com um banheiro privado e armários grandes o suficiente para que ela estacionasse o carro dentro.
— Dois? — ela perguntou incrédula.
— Para o caso de você querer que um convidado fique. — disse Zach. — Ou pode usá-lo como escritório ou sala de informática ou algo do estilo. Qualquer coisa que você goste. São seus para fazer com eles o que lhe agrade.
Dela. Ela ainda não conseguia entender o conceito.
Ambos os dormitórios estavam completamente mobiliados com camas King size, com edredons grossos em cima e montanhas de travesseiros supérfluos, resplandecendo em tecidos sedosos para os quais ela não tinha nome. Um deles foi decorado em um rico e profundo azul e o outro foi feito em um tom amarelo manteiga claro.
Ambos eram mais belos e luxuosos do que qualquer coisa que ela já tivesse visto na vida real.
— Pode escolher qualquer um que você goste, ou passar a noite em ambos. A decisão é sua.
Lexi se apressou a entrar, alcançando os banheiros. Um deles tinha uma banheira gigante, grande o suficiente para dois, e o outro ostentava um grande boxe com ducha com jatos para o corpo com saídas suficientes para lhe dar a impressão de que estava em um lava jato.
— Uau. — ela não conseguia formar as palavras. Nem sequer podia pensar corretamente.
Estava lá, no quarto amarelo, tremendo. Zach veio até ela, com um cálido sorriso em seu rosto. Pegou seus ombros em suas mãos e perguntou.
— Você gostou?
Lexi abriu a boca, percebendo que estava impossibilitada de falar, e fechou-a outra vez.
Seu polegar limpou as lágrimas de debaixo de seus olhos. Não tinha percebido que estava chorando até agora, mas parecia que não poderia parar o fluxo.
Ela engoliu em seco e inalou o ar. Sabia como falar. Só tinha que reunir a força para fazê-lo.
— É... Maravilhoso.
O sorriso de Zach se alargou.
— Mas não posso aceitar.
Seu sorriso vacilou e ele a puxou um pouco mais para perto de seu calor. Suas coxas roçaram as dele e suas mãos eram suaves contra seu rosto.
— Por que não, querida?
— É muito, Zach. Muito.
— É só uma suíte. — ele disse com indiferença.
Não. Era muito mais que isso. Um lar... Um lugar de refúgio, de esperanças e sonhos. Um conceito mítico que, até agora, Lexi nunca se atreveu sequer a esperar obter. E Zach tinha acabado de lhe dar isso.
O desejo de aceitar seu presente era quase irresistível. Isto era o que ela queria mais que qualquer outra coisa. Afastar-se disso ia destroçá-la.
— Sinto muito.
— Mas por quê? Todo mundo aqui recebe seu próprio lar, por que não deveria ter um, também?
— Não posso pagar por ele.
— Não precisamos de dinheiro. Precisamos de você. Eu preciso de você. Acredite em mim, ganhará seu sustento e até mais quando eu a ensinar como usar sua magia. Basta perguntar a Helen.
— Helen não tem seu próprio lugar. Ela mora com Drake.
— Porque ela quer, não porque tenha que fazer isso. Além disso, temos todas estas suítes vazias, simplesmente desocupadas. Não quer que sejam desperdiçadas, não é mesmo?
— Desocupadas? Completamente mobiliadas e decoradas? — ela perguntou com incredulidade.
Zach dirigiu a ela um olhar tímido.
— Bom, não. Pegamos as melhores coisas de várias suítes diferentes e as colocamos aqui para você, mas esse não é o ponto.
— O ponto é que, mesmo querendo muito aceitar seu generoso presente, não posso fazer isso. Nem mesmo sabemos se esta coisa entre nós vai funcionar.
A mandíbula dele se apertou com um impulso de raiva, mas então desapareceu como se ele a tivesse expulsado.
— Tenho que acreditar que funcionará, Lexi.
Precisava dela para sobreviver. No fundo, Lexi sabia que nunca o deixaria morrer. Ficando com ele, ou não, ela usaria a luceria e o manteria vivo até que fosse sua vez de partir, ou até que ele encontrasse outra mulher para tomar seu lugar.
Outra mulher. Uma onda profunda e feroz de ciúmes se levantou dentro dela, deixando-a cega por um breve momento. Ela não queria que ele encontrasse outra mulher. Tão egoísta como isso era, queria ser a única em sua vida... A única que poderia salvá-lo.
Isso os vinculava, os tornava quase como uma família. Ela não renunciaria a isso sem lutar. Mas tampouco podia induzi-lo a pensar que algum dia poderia ser o tipo de mulher que ele queria. O nível de confiança que ele pedia simplesmente não fazia parte de seu caráter. Lexi acreditava que nem mesmo em sua mãe confiaria o suficiente para deixar que vagasse em sua mente.
Pegou a mão áspera de Zach nas dela, celebrando a força e o poder que irradiava de seu corpo.
— Também quero que as coisas deem certo, mas mesmo assim, este é um presente muito grande para aceitar.
Ela pôde ver uma sombra cruzar seu rosto e contrair suas sobrancelhas escuras. Tinha machucado seus sentimentos, mas isso não podia ser evitado. Tinha mentido para ele por tanto tempo que lhe devia tanta honestidade quanto fosse capaz de dar.
— Pois bem. Não o aceite ainda, mas tampouco o rejeite. Basta ficar aqui por enquanto. Se quiser conservá-lo, é seu. Se não, sem pressão. Está bem?
Lexi se virou para olhar o luxo e o conforto que aquele lugar tinha para oferecer. Viver ali ia ser fácil. Não se apaixonar por aquele lugar ia ser difícil.
— Está bem. Ficarei, mas somente por enquanto. Ainda temos um montão de coisas que precisamos resolver entre nós.
Ele acariciou seu rosto, seus dedos dolorosamente gentis enquanto escorregavam sobre sua pele, como se ela fosse feita de vidro soprado fino como o papel.
— Eu sei. Mas nós conseguimos tempo. Por enquanto, nos permita apenas compartilhar uma refeição tranquila. Você precisa de um pouco de tempo para se ajustar, e eu estou com muita fome.
Lexi precisava de mais que apenas tempo. Precisava de coragem. Sabia que tinha que contar a ele sobre os Defensores e sua conspiração com eles para explodir aquele lugar. Eventualmente, ele se inteiraria, e ia ser mais fácil para ambos se ela agisse como adulta e se justificasse.
Não tinha certeza de como ele reagiria, mas sabia que não a machucaria. Pelo menos nisso acreditava, embora fosse apenas porque ele precisava dela para sobreviver.
Mas os outros homens dali... Os que a olhavam com olhos famintos... Ela tinha bastante certeza que realmente não seriam tão compreensivos.
Zach procurou encher Lexi de comida, esperando que isso a ajudasse a relaxar. Ela tinha razão a respeito de que tinham um montão de coisas para resolver, e a maior parte delas era melhor lidar com um estômago cheio.
Acendeu algumas velas que tinha encontrado mais cedo, e elas transmitiram uma sensação de bem-estar à sala de Lexi. Zach não era designer de interiores, mas achava que ela tinha gostado das coisas suaves e confortáveis que ele tinha colocado em sua casa. A forma que seus olhos se iluminavam cada vez que olhava ao redor, o convenceu disso.
Ele tinha lhe dado um lar. Ele a fez chorar, mas por uma coisa boa. Agora tudo o que tinha que fazer era obrigá-la a ficar ali. Talvez ela o deixasse compartilhar a morada com ela. Depois de duas noites com ela em seus braços, não acreditava que fosse capaz de enfrentar uma cama vazia.
Ele se assegurou que ambas as camas em sua suíte fossem grandes o suficiente para conter os dois, por precaução. Prometeu a si mesmo que não a pressionaria, mas a ideia de despi-la e fazê-la sentir-se bem estava se tornando uma obsessão velozmente.
Ela deslizou o último bocado de bolo de chocolate para fora de seu garfo e se recostou com um suspiro satisfeito.
— Isso esteve fabuloso, Zach. Obrigado.
— Não sou um cozinheiro muito bom, mas eu mesmo fiz o pedido na cozinha.
Seus olhos resplandeceram com o sorriso que ele tinha posto ali, fazendo seu peito se aquecer de satisfação.
— Deixei todos os números importantes na geladeira para você, caso você precise de alguém, ou não goste de comer no refeitório.
— Sim, não estou tão certa sobre isso. Todos aqueles homens me olhando é um pouco estranho.
Zach parou e estendeu a mão para ela.
— Eles se acostumarão com você, assim como estão acostumados a Helen agora. Simplesmente lhes dê alguns dias.
Lexi pôs sua pequena mão na dele, e parecia perfeita ali, rodeada por ele, protegida.
— E os pratos? — ela perguntou.
— Eu os colocarei nas bandejas no vestíbulo mais tarde. Não há pressa.
— Mas... — ela olhou dos pratos a sua pia e de volta outra vez. — Não quero deixar tudo bagunçado.
Em sua casa nova. Ela não havia dito essa parte, mas ele podia sentir isso no ar, pairando sobre seus lábios.
— Quer lavá-los?
Ela sorriu e assentiu com a cabeça, como uma criança perguntada se queria entrar na loja de brinquedos.
Zach deu de ombros.
— Qualquer coisa que a faça feliz, querida. — ele teve que conseguir que alguém lhes trouxesse um pouco de sabão e panos de pratos... Tinha esquecido de adquirir essas coisas para ela... Mas pouco tempo depois, tinham terminado a tarefa domestica e Lexi estava radiante.
Quem teria pensado que algo tão simples como lavar uma pia cheia de pratos poderia fazê-la feliz? Ele se encontrou olhando ao redor, procurando algo diferente que pudesse fazê-la sorrir.
— Assim, e agora? — ela perguntou. — Está escuro. Vai caçar monstros?
— Normalmente. Joseph me deu alguns dias de folga para ajudar você a se estabelecer. Terei que revisar o horário, mas eu acho que isso significa que eu devo estar em guarda na próxima semana. Temos mais homens no trabalho aqui porque os reparos no muro ainda não terminam.
Zach a levou ao confortável sofá de couro, e afundaram em sua macia profundidade. Lexi saltou para cima e para baixo algumas vezes, sorrindo, e depois se sentou ao lado dele. Ela não tinha puxando a mão da sua. De fato, tinha entrelaçado os dedos, fechando-os juntos.
— Terei um emprego, também? Se ficar, quero dizer.
Ele não a deixaria ir embora, mas decidiu que era melhor manter as coisas leves e não bancar o troglodita com ela. Se ela tentasse ir embora, então ele esclareceria as coisas.
— Nós seremos uma equipe. — ele disse. — Joseph Rayd... Nosso líder... Atribuirá nossos deveres assim que você puder canalizar meu poder de forma consistente.
— Sim, estive pensando a respeito disso, e quero praticar um pouco mais.
— Ótimo. Sairemos para o pátio de treinamento e tentaremos algumas coisas. Veremos o que funciona para você.
— Que tipo de coisas?
— O fogo é bom. Mata montões de snarlies. Helen chuta traseiros lançando fogo para todos os lados.
Lexi negou com a cabeça, fazendo seus cabelos finos se balançarem.
— Nunca teria acreditado se eu mesma não tivesse visto.
— Provavelmente vai haver muitas coisas que terá que ver para acreditar no princípio. Prometo que se acostumará.
— Sou dura. Vou dar um jeito nisso. — disse ela. — Que mais?
— Aprender a se proteger é vital. Esse é meu trabalho, mas sou apenas um, e quero que esteja bem a salvo, por precaução. Andra é boa em criar escudos, assim, ela pode dar algumas indicações a você. Também é realmente boa em explodir coisas.
A cor sumiu do rosto de Lexi e sua mão começou a suar.
— Acredito que deixarei isso passar. Só por enquanto.
Zach fez uma nota mental de que a ideia a amedrontou. Poderia ser um sinal do que viria a ser sua especialidade, se o medo inicial do fogo de Helen fosse qualquer indicação. Ele a convenceria a tentar algo mais tarde, mas agora não era o momento. Queria ela relaxada e confortável para que não notasse quando ele se movesse furtivamente dentro das paredes mentais dela. Quando estivesse lá, e ela soubesse que ele não representava nenhuma ameaça, então se ocupariam do resto.
— Claro. A decisão é sua. Não entraremos no campo até que você esteja confortável.
Ela lhe deu um sorriso brincalhão.
— Posso voar?
— Talvez. Todo mundo é diferente. Gilda... Outra mulher aqui como você... Pode saltar tão alto que é quase como voar, mas esteve fazendo isto por séculos, assim ela teve um pouco de tempo para preparar o terreno para isso.
— Acho que vou deixar isso para depois, também. Não quero descobrir da forma mais difícil que não posso voar.
Seus dedos relaxaram outra vez, e seus ombros já não estavam erguidos junto a seus ouvidos. Zach puxou sua mão com força, pedindo que ela se aproximasse.
Ela tirou os sapatos, dobrou as pernas debaixo dela e moldou seu corpo contra o dele. O ombro dela estava debaixo de seu braço e sua cabeça encostada em seu peito.
Uma sensação de completa perfeição o encheu, fazendo-o resplandecer por dentro. Ele envolveu o braço ao redor dela, sua mão descansando sobre seu delicioso quadril. O anel em seu dedo vibrou feliz. De fato, tudo nele estava feliz e satisfeito.
Todos os seus planos para ganhar a confiança dela e quebrar suas defesas se tornaram pó e o vento os levou. Eram insignificantes comparados com a satisfação monumental que sentia agora.
Zach podia ter oferecido a ela algumas paredes e um teto sobre sua cabeça, mas foi ela quem lhe deu um lar. Lexi era seu lar. Simplesmente ele não tinha percebido o que esteve perdendo toda sua vida.
Seus dedos magros deslizaram sobre o peito dele até que alcançaram a pele nua de sua garganta. A faixa que esteve ali por tanto tempo, cobrindo sua pele, se foi, sensibilizando sua pele ao toque. Lexi o acariciou, como se soubesse que esse era o caso, e o corpo de Zach começou a se aquecer com uma dose previsível de luxúria. A mulher foi direto para sua cabeça.
— Sua pele esta muito mais clara aqui. — ela disse.
— Faminta de luz solar desde que nasci. — Zach tremeu e seus músculos se retesaram. Sangue quente correu para sua virilha, deixando-o rígido tão rápido que foi doloroso.
— Machuquei você?
— Não meu pescoço. — disse entre os dentes cerrados.
Ela se moveu para poder ver seu rosto. Seus olhos da cor do chocolate meio amargo deslizaram sobre ele, procurando a fonte de seu desconforto. Inevitavelmente, viu sua ereção e seus cílios desceram, cobrindo uma labareda de avidez feminina. Um sorriso suave aqueceu sua boca, tornando-a quase irresistível.
— Quer que eu o beije e a faça melhorar? — ela perguntou.
Um soco de desejo cru golpeou suas entranhas, fazendo-o grunhir contra a força dele.
— Está tentando me matar, não é?
Lexi negou com a cabeça.
— Não. Quero você, Zach. Mas o quero sem os jogos mentais. Acredita que pode fazer isso?
Ele não tinha certeza, mas sabia que tentaria isso como o demônio. Faria quase qualquer maldita coisa para dar o que ela queria, querendo apenas ela em troca.
Ele assentiu com a cabeça.
— Apenas sexo. — disse, lambendo os lábios.
Não era o que ele queria, não era como supôs que seriam as coisas entre eles, mas sabia que tomaria o que pudesse conseguir. Especialmente se isso significava ter Lexi nua só para ele.
Zach pretendia concordar, mas suas cordas vocais estavam fixas, apertadas dentro de sua garganta. Acomodou-se para a ação em vez das palavras, tomando a boca dela em um beijo suave.
Lexi deixou escapar um gemido de satisfação e aprofundou o beijo, deslizando sua doce língua contra a dele. Ela segurou sua cabeça e estendeu os dedos por entre seus cabelos, segurando-o enquanto bebia até se satisfazer.
Zach tentou deixá-la marcar o ritmo, mas não conseguiu manter suas mãos para si mesmo. Ele não era tão forte. Agarrou os quadris dela com as sua mão e pressionou-a para baixo contra sua ereção esticando-se. O contato, mesmo através de todas aquelas camadas de roupa, disparou faíscas ao longo de sua coluna vertebral e arrancou um som animal de luxúria de sua garganta.
Todas suas boas intenções de fazer a corte a ela, fazer que ela confiasse nele, deslizaram por entre seus dedos, perdidas e esquecidas. Perderam a importância em comparação com o fogo resplandecente da necessidade que arranhava suas entranhas.
Os dedos de Lexi deslizaram para baixo em seu corpo e puxaram a bainha de sua camisa sobre sua cabeça, deixando seu peito descoberto. Interromper o beijo o desgostou e ele a deitou sobre o sofá onde podia mantê-la exatamente onde a queria.
Seus lábios estavam vermelhos, úmidos e inchados e seus olhos resplandeciam de antecipação. Ela estendeu suas mãos sobre seu peito e Zach sentiu sua marca de vida oscilar, os ramos nus arqueando-se sob seu toque.
Antes que se esquecesse de si mesmo e terminasse machucando a um deles, Zach desabotoou seu cinturão de couro para pegar a espada e colocá-la ao alcance de sua mão. Piscou ante a visibilidade, o padrão da lâmina de prata que adornava o punho e a bainha resplandecendo na luz amarelada das velas que ainda queimavam na cozinha.
Ele queria ver a pele de Lexi sob essa luz cálida. Ela toda.
— Tire a blusa. — disse, relutando em confiar em si mesmo para fazer o trabalho sem arrancá-la de seu corpo. Sua voz saiu pesada e sombria, quase sinistra, mas não havia nada que ele pudesse fazer a respeito. Não agora, enquanto sua necessidade por ela o golpeava.
Lexi não o ouviu. Seus olhos estavam fechados enquanto ela deslizava suas mãos sobre o peito dele. O suor tentava corajosamente esfriar sua pele superaquecida, mas não conseguiu obter êxito na tarefa, não enquanto Lexi estivesse lhe tocando.
O olhar absorto e de prazer total em seu rosto era humilhante. A ideia de que podia agradá-la com algo tão simples como seu peito nu o fez sentir-se poderoso, dando-lhe mais esperanças para seu futuro do que ele acreditou ser possível.
Sua luceria brilhou sutilmente ao redor da garganta dela, resplandecendo como uma plumagem clara e luminosa de jade e verdes esmeraldas.
Uma rajada de possessividade explodiu dentro dele. Ele não a deixaria partir. Não a deixaria esconder-se dele. Queria todas as partes dela. Seu corpo, sua mente, sua alma. Tudo. Para sempre.
Lexi respirou ofegante e seus olhos se abriram desmesuradamente. Tremeu debaixo dele e seus dedos se cravaram em seus ombros.
— O que foi isso? — ela perguntou com voz desesperada.
Zach não sabia o que ela quis dizer, e não ia desperdiçar o pouco pensamento racional que lhe restava para esclarecer isso. Necessitava dele para recordar como despi-los. Agora.
Ele deslizou suas mãos para baixo de sua blusa, esfregando os nódulos de seus dedos pela pele nua de seu ventre. Faíscas de poder saíram torrencialmente dele, entrando nela onde quer que a tocasse. Seus músculos tremiam sob seus dedos e ele sentiu sua respiração se acelerar, viu seus mamilos ficarem túrgidos sob sua roupa.
O desejo de sentir aqueles pontos rígidos contra sua língua o afligiu, e ele empurrou a blusa dela para cima de seus braços. Não conseguia se lembrar como remover seu sutiã, mas derrubou o pedacinho de tecido de renda e o que queria estava exatamente ali, firme, ansioso e implorando por ele.
Zach segurou o seio suave em sua mão e o cobriu com sua boca. Ela se levantou do sofá em um arco poderoso. O movimento amassou sua coxa contra o pênis dele, e ele quase gozou no mesmo instante. Necessitou de várias inalações pelo nariz para acalmar-se, mas não conseguiu resignar-se a mover sua boca. O mamilo estava rígido contra sua língua e o sabor de mulher de sua pele o encheu e deixou mais faminto ao mesmo tempo.
Lexi segurou seus cabelos em seus punhos e os sustentou com força, fazendo barulhos eróticos de encorajamento. Seus quadris se balançaram debaixo dele, esfregando-se nele com perfeição. Muito perfeitamente. Ele não queria gozar ainda e terminar a prazerosa tortura. Suspenso à beira da loucura se sentia muito bem e a queria exatamente ali com ele quando caísse.
De alguma forma, conseguiu abrir sua calça jeans e seus dedos deslizaram para baixo de sua calcinha até que sentiu seu calor escorregadio. Ela estava molhada e pronta para ele tão rapidamente que ele quis cair de joelhos em agradecimento. Não tinha certeza de pensar com clareza suficiente para fazer isto bem, e ele realmente queria que fosse adequado para ela.
Ela levantou a cabeça e cobriu sua boca com um beijo ardente. Sons ansiosos, carentes, encheram seus pulmões e ele os bebeu de um gole, morrendo de vontade de ouvir mais.
— Preciso de você. — disse.
As palavras o levaram além do possível.
Ela se afastou, tirando a blusa e o sutiã em um tempo recorde. De algum modo, saiu de debaixo dele e se ajoelhou na frente dele no sofá, esforçando-se para tirar o jeans.
A terra e o mundo de Zach pararam. As chamas das velas cintilaram sobre sua pele nua e ruborizada percorrendo-a lentamente em uma preguiçosa carícia de calor e luz. Seus seios estavam brilhantes e distendidos pela sucção e umidade de sua boca. Seus seios pálidos lançaram sombras carinhosas sobre suas costelas. A curva suave de seu ventre brilhava de suor. Lentamente, tão devagar que ele pensou que perderia a razão, Lexi empurrou o jeans e a calcinha para baixo, despindo-se ante ele até que ficou ajoelhada ali, gloriosamente nua, oferecendo-se para ele.
Um presente que ele não poderia recusar.
Ela se inclinou para frente até que sua boca ficou nivelada com o peito dele e pressionou um beijo contra sua marca de vida. Um zumbido encheu sua cabeça e sua árvore estremeceu debaixo da boca dela.
A respiração dela varreu seu peito e ela o contemplou por debaixo dos longos cílios. Era o tipo de olhar que um homem sonhava ver uma só vez em sua vida, cheio de desejo e luxúria e calor suficiente para incendiar sua alma. Mesmo sem poder ver dentro de sua mente, ele sabia sem dúvida alguma que o que estava acontecendo entre eles era exatamente o que Lexi queria.
Os dedos dela foram para sua calça jeans e desta vez, ele não a impediu de abrir o botão. Ela queria apenas sexo, assim isso seria o que ele lhe daria. O suficiente para fazê-la gritar de prazer. O suficiente para deixá-la doída por mais, porque ele tinha certeza que nunca conseguiria o suficiente dela. Se esta era a única parte dela que lhe permitiria ter, iria usá-la para sua completa satisfação.
Ele a ajudou a livrar-se das roupas e dos sapatos, então apertou a mãos em punhos em seus flancos enquanto seus olhos escuros vagavam por seu corpo nu em uma incerta avaliação.
— É um homem atraente, Zach.
— Deite-se. — as palavras soaram cortantes e mordazes, mas ao menos saíram. Era mais do que ele esperava.
Lexi sacudiu a cabeça e engatinhou para longe em um alvoroço de pernas e braços flexíveis. Disse algo enquanto saía, mas Zach não a ouviu. Seu sangue martelava em seus ouvidos, seu pulso um retumbante tambor de necessidade.
Ela o havia deixado. Outra vez.
Zach observou seu belo traseiro rebolando enquanto ela caminhava. A tatuagem de leopardo em seu ombro devolveu seu olhar, zombando dele com seus olhos verdes. Ela tinha as duas covinhas mais sensuais que ele já tinha visto na base de sua coluna vertebral. De algum modo, isso não deixou a visão dela o deixando mais fácil de suportar. Todas aquelas noites de desespero sem esperança... Noites que passou procurando-a enquanto sofria horríveis espasmos dolorosos... Regressaram para ele.
Ela não ia deixá-lo. Não agora. Nunca mais.
O instinto animal... A necessidade de reclamar sua companheira assumiu o controle e ele saltou de repente. Ele não tinha certeza de como cruzou a sala, mas o fez, e Lexi estava imobilizada debaixo dele sobre a toalha da mesa, seus olhos arregalados de apreensão.
Zach não se importou. Ela tinha tentado deixá-lo outra vez, como se ele fosse lixo jogado na rua. Não ia deixá-la fazer isso. Não desta vez.
Ele empurrou suas coxas abrindo-as, empurrando seu joelho entre elas. Seu pênis deslizou ao longo de suas dobras escorregadias, pulsando, grosso e quente. Sua respiração se acelerou e seus dedos se apertaram contra seu seio. Ele matinha seus braços imobilizados para que ela não pudesse mover-se, mas isso era uma transa rude. Ela tinha tentado fugir. Ela precisava saber que ele não ia consentir isso.
— Zach. — seu nome foi uma prece rasgada por algo que ele não podia decifrar.
Estava tão molhada, tão preparada para ele. Zach abriu passagem, deslizando dentro de seu corpo facilmente, empurrando a cabeça de seu membro dentro dela. Lexi era confortável, ardente e o desejo de empurrar seu membro nela até gozar era quase angustiante.
Mas ele se conteve, embora não estivesse certo do por quê.
Seus olhos piscaram e fecharam e um rubor rosa escuro se estendeu sobre sua face. Quentes faixas de poder emanaram dele, aliviando um pouco da pressão em seu interior, ajudando a esclarecer sua cabeça.
Sua boca estava aberta, sua respiração quente enchendo o espaço entre eles. Seus seios eram macios contra seu peito úmido, contra seus mamilos duros apunhalando-o.
Ele empurrou seus quadris para frente, precisando estar totalmente dentro dela, enchendo-a, reclamando-a.
Lexi ficou tensa e ele sentiu seu corpo travando seu membro rígido.
— Deixe-me entrar. — ele ordenou.
Ela não respondeu. Não relaxou. Ele não queria machucá-la, mas tampouco podia parar. Não agora que estava tão perto de ser parte dela.
Zach não soube mais o que fazer, assim cobriu a garganta dela com a mão, unindo as duas partes da luceria. O poder se levantou nele, agitando-se e borbulhando.
Ele canalizou esse poder através de seu vínculo e o forçou a deslizar bem dentro dela.
Ela ofegou e se arqueou saindo do chão, alojando-o mais profundamente dentro de seu corpo apertado. Faíscas de energia azuis brilhantes saíram de sua pele, afundando-se no tapete macio. Ela tremeu, seus músculos se retesaram e ela apertou seus olhos firmemente.
Estava machucando-a.
Zach entrou em pânico e ficou paralisado ali, fixando seu corpo no lugar. Ele a machucou, mas não podia retroceder, não podia parar. Não podia deixá-la ir.
Encontrou forças suficientes para dizer.
— Sinto muito. — lamentava machucá-la. Lamentava não poder parar.
O corpo de Lexi não lhe pertencia. Era uma coisa estranha, carente e desesperada, cheio com tantas faíscas de energia que dificilmente poderia encontrar espaço para respirar. A altura de Zach a mantinha no chão, negando a ela um lugar para o qual fugir. Sua grossa ereção estava posicionada em sua entrada, esticando-a tanto que quase doía. Não estava preparada para isto. Tampouco estava preparada para o calor daqueles ressoantes laços de energia afundando em seu interior.
Pele nua sobre pele nua.
E ele definitivamente estava nu. Suave e rígido, deslizando dentro dela. O pensamento a incomodou, provocando uma centelha de preocupação nela, mas não podia concentrar-se nisso o bastante para descobrir o porquê. Tudo o que podia fazer era estremecer sob a força de sua presença, a intensidade daqueles olhos verdes contemplando-a.
— Não a deixarei ir. — rosnou ele, sua voz vibrava em seu peito maciço e as pontas de seus mamilos se apertavam contra este.
Tudo ia bem até o momento que ela se afastou para entrar em um quarto. Foi aí que ele a pegou vindo por trás dela como uma espécie de animal selvagem. Aquele olhar feroz ainda estava lá. Sua mandíbula apertada. O suor delineando suas sobrancelhas. Ela podia sentir os grossos cordões de seus músculos enquanto ele tentava se controlar e os batimentos fortes de seu coração. Não tinha certeza de quanto tempo resistiria.
A necessidade de acalmá-lo aumentou dentro dela. Ela não tinha certeza se isso era porque estava com medo do que ele fazia, ou se temia que ele pudesse parar de fazer.
— Não vou deixar você. Só queria acabar em uma das camas.
— Camas? — disse ele como se não reconhecesse a palavra.
Lexi conseguiu soltar os braços e Zach fez mais pressão sobre seu corpo, dando-lhe uma alta advertência com a garganta. Nunca tinha ouvido um homem fazer um som assim, e teve que lutar contra os fragmentos de medo que ameaçavam entrar dentro dela.
Não havia lugar para o medo. Ela já tinha quebrado as costuras com mais sensações do que podia suportar.
Ela fez seus músculos relaxarem sob ele, dizendo a ele com seu corpo que não ia tentar fugir.
Um pouco da tensão em sua mandíbula sumiu e ela percebeu nesse momento de que ele estava agindo assim por medo, não por raiva. Tinha medo que ela fugisse outra vez. E por que não ia ter? Já havia feito isso antes.
— Não vou a lugar algum. — disse. Acariciou seu rosto deslizando suavemente a ponta dos dedos por sua testa, face e boca. — Estou exatamente onde quero estar.
E essa era a verdade. Não havia nenhum outro lugar em que quisesse estar mais que com aquele homem, deleitando-se no prazer que sua simples presença lhe dava.
Puxou a cabeça dele para baixo, de modo que pudesse beijá-lo, dizendo a ele com seus lábios e língua que se rendia. Que era dele.
Seu corpo se suavizou, relaxando-se ao redor da ereção dele, facilitando sua entrada para que empurrasse profundamente dentro dela. Ele era grande, e tinha passado muito tempo desde que ela esteve com um homem — nenhum dos quais poderia tê-la preparado para isto, de qualquer maneira.
Zach a esticou até os limites, alcançando terminações nervosas que ela não sabia nem que existiam até que ganharam vida. Estava tremendo, vibrando sob a pressão de tal sensação. Com um lento e doloroso progresso, combinou seus corpos até que não houve lugar que ele deixasse sem encher.
Ele pressionou a testa contra a dela, seu corpo ainda se aprofundando. Sua respiração saía em quentes ofegos, misturando-se com a dela. Sua ereção se movia dentro dela, pulsando com o calor.
Lexi gemeu, surpreendendo-se com o som da necessidade que ressoava tão claramente em sua voz.
— Dói? — ele pronunciou a palavra em uma voz desolada.
— Não.
Uma chama de satisfação iluminou seus olhos; então ele passou seus braços ao redor dela, unindo o corpo contra o dela e começando a mover-se. A fácil e escorregadia sensação dele deixando seu corpo vazio, a fez doer-se. Ela se agarrou aos seus ombros e arqueou os quadris para ele quando ele voltou a deslizar nela em uma impetuosa investida.
O forte calor correu ao longo de sua coluna e encheu sua cabeça. Um som de prazer intenso encheu o espaço entre eles, mas não podia dizer quem o fez. Talvez ambos. Seus baços grossos a embalavam, segurando-a firmemente enquanto impunha um ritmo lento e profundo. Brilhantes globos de luz dançavam em seus olhos e, quando se esclareceram, tudo o que ela via eram as brilhantes conexões de poder fluindo dentro dela. Então estavam conectados, unidos com certeza sem nenhuma chance de escapar.
Não que ela quisesse alguma. Tudo o que queria estava exatamente ali, dentro daquele abraço, e tudo isso era um presente de Zach.
A boca dele cobriu seu mamilo, sugando-o com mais ardor. Arcos de prazer saltaram para seu útero, fazendo que ela se apertasse em torno de sua ereção.
Zach grunhiu contra a carne, a vibração provocando uma nova convulsão de prazer concentrando-se profundamente dentro dela.
O poder de seu corpo a assombrava. Os fluidos viscosos e a liberação de seus músculos a empurraram mais alto a cada batida de seu coração. O calor fluía deles, fazendo que o ar ao seu redor explodisse e faiscasse. Zach dobrou o joelho dela contra seu corpo, dando espaço para que sua mão serpenteasse entre eles.
A mudança de posição fazia que ele atingisse um ponto novo e mais sensível. Ele deslizou os dedos através dos cachos que cobriam seu montículo até que ela sentiu as pontas ásperas de seus dedos abrindo passagem através de suas dobras escorregadias. Com precisão infalível, embalou seus clitóris entre dois dedos grossos. O balanço de seu corpo moveu sua mão o suficiente para fazer que seu interior se contraísse como um enrolado casulo. A deliciosa pressão de sua mão era perfeitamente calculada para obrigá-la a ir onde ele queria.
Lexi não teve outra escolha senão reder-se. Estava muito cansada de lutar, tão cansada de que nada em sua vida fosse fácil. Até aquele exato momento.
Zach cobriu a boca dela com a sua justamente quando o clímax se abateu sobre ela. Toda a tensão dentro dela explodiu em uma descarga de luz e sensações. Esta foi drenada apenas uma fração de segundo antes de deslizar para fora dela outra vez.
Foi muito repentino. Ele a dominava, destruía e a completava.
Seus gritos abafados de liberação encheram seus ouvidos e sentiu como os braços se Zach se apertavam ao redor dela. Outra trêmula onda de prazer irradiou dela justo quando sua ereção aumentou e pulsou dentro dela. O último eco de seu suave orgasmo se estendeu por ela, fazendo-a apertar-se em torno de Zach enquanto ele grunhia nas profundezas de sua culminação.
Sua respiração se normalizou enquanto o suor refrescava seus corpos. A boca de Zach estava em sua garganta, mordiscando-a, sugando-a com beijos que deixariam marcas.
Um sorriso satisfeito estendeu sua boca. Deixaria que ele a marcasse. Não se importava. Era muito bom para ela se importar com nada além do que o confortável peso de seu corpo sobre o dela e o protetor círculo de seus braços, ainda ancorados em seus quadris, mantendo-os unidos.
Zach se moveu, deixando espaço para ela respirar, mas não muito. Apoiou-se sobre o cotovelo e acariciou seus cabelos afastando-os da testa suada. Um olhar estranho e quase vulnerável sombreava seu rosto.
Ela queria consolá-lo, dar-lhe quaisquer palavras que precisasse. Mas no fundo, sabia que o que ele precisava dela não eram palavras. Eram ações. Queria que ela se abrisse e o deixasse entrar. Não só em seu corpo, mas também em sua mente.
Como poderia fazer isso? Como poderia colocar esse tipo de confiança nas mãos de um homem que ela tinha acreditado ser seu inimigo durante tanto tempo?
Então de novo, depois do que tinham compartilhado, como não poderia?
Aquilo não tinha sido apenas sexo. Isso era o que ela queria que fosse, mas foi mais que isso. Tinha visto o quanto ele precisava dela — o quanto era realmente vulnerável aos seus caprichos. Ela tinha o poder de esmagá-lo, destruir seu mundo apenas com um pensamento — que a luceria caísse de seu pescoço e isto o mataria — com tudo isso, no entanto, sua confiança não foi suficiente.
Esse tipo de confiança era humilhante. Mudava vidas.
— Está pensando demais. — disse ele. — Não devo ter feito um bom trabalho se ainda é capaz de pensar corretamente.
Lexi sorriu para ele e beijou a ponta de seu nariz.
— Se houvesse feito melhor, teria me matado.
Um sorriso arrogante se estendeu por sua boca, fazendo seus dentes brancos brilharem na luz tênue.
— Poderíamos dar uma chance a essa teoria?
Não podia aceitar mais intensidade agora. Sentia-se muito delicada. Muito frágil.
— Podemos deixar isso para outra hora?
— Para quando você quiser, carinho. Basta dizer.
A generosidade dele fazia suas defesas se quebrarem mais a cada ato de bondade. Não tinha certeza de como ele sabia que armas esgrimir contra ela para fazê-la derreter-se aos seus pés, mas parecia ter um instinto para isso.
Ele se retirou de seu corpo, ainda tão grosso e rígido quanto se não tivesse gozado. Mas ela sabia que o tinha feito. Podia sentir o sêmen gotejando de seu corpo, vê-lo brilhando na cabeça escura de seu pênis.
Não tinham usado preservativo. Foi isso que tinha se esquecido antes.
As ramificações disso bateram contra ela, uma em cima de outra até que não pôde fazer nada além de olhá-lo.
Lexi nunca tinha pensando em ter um filho. Nunca arrastaria uma criança pelo país, vivendo na parte de trás de seu Honda, colocando-a em risco constante de ser atacada e assassinada pelos monstros. Ou pior, que a levassem igual a tantas das histórias que ouviu ao longo dos anos.
Mas as coisas agora eram diferentes. Tinha uma casa e, embora ainda não tivesse aceitado completamente em sua mente, em seu coração, seu lugar era ali. Aquele era seguro. Podia criar uma criança ali sem se preocupar, sabendo que haveria outros iguais a ele ou ela. Seu filho se sentiria normal. Seu filho poderia ir ao colégio e brincar com outras crianças e ter uma vida de verdade.
Uma família.
Ela começou a tremer quando os fundamentos de toda sua vida e seus planos para o futuro desmoronaram sobre ela.
— O que está acontecendo? — perguntou Zach, o pânico ecoando em suas palavras.
— Não tomo nada para o controle de natalidade.
Sua mão deslizou sobre seus cabelos em uma carícia tranquilizadora.
— Tudo bem. Não tem que se preocupar. Não posso deixá-la grávida.
— Não pode?
Os sonhos brilhantes se desfizeram e se dissolveram antes mesmo que acabassem de formar-se.
— Não. Nossos homens são estéreis. Algo que os Synestryn nos fizeram. — apesar da gentileza de sua mão, suas palavras foram secas e cortantes. Amargas.
— Sinto muito.
E o fazia, mas não só por ele.
— Sim. Eu também, mas é uma velha história. — ele se levantou e estendeu uma mão para ela. — O que acha de provarmos nossa ducha nova?
Lexi assentiu. Uma ducha parecia bom. Distrairia. Tinha muitas coisas movendo-se em sua cabeça agora. Muitas perguntas. Muita confusão. Jogar algumas delas pelo ralo pareceu uma ideia maravilhosa.
Angus encontrou Gilda na Sala dos Caídos. Um fogo baixo ardia na lareira, aquecendo a sala, fazendo as espadas polidas dos guerreiros mortos brilharem na escuridão.
Gilda estava sentada em uma cadeira de couro com uma espada em seu colo. A seda cinza de seu vestido brilhava a luz do fogo, abraçando seu corpo e deixando-o dolorido para deslizar as mãos por suas curvas sensuais. Tinha passado muito tempo desde a última vez que a sustentou em seus braços e fez amor com ela — quase uma semana. Ela estava distante ultimamente, e não importava quão arduamente ele tentasse, parecia não poder trazer de volta o sorriso aos seus lábios.
O fracasso pesava sobre seus nervos, roubando sua paciência geralmente tranquila e férreo controle. Se ela não dissesse o que ele podia fazer para agradá-la, ia encontrar sua própria maneira de ajudá-la — uma que ele estava absolutamente certo que ela não aprovaria.
A enorme cadeira de couro parecia engolir seu corpo pequeno, fazendo-a parecer fraca e vulnerável. Aguçados instintos protetores de mais de cem anos vieram facilmente à superfície, acelerando os passos de Angus.
Seus dedos magros percorriam amorosamente a lâmina. A espada de seu filho — Angus a reconheceu agora que estava perto. Conhecia cada fenda e arranhão sobre aquela lâmina, cada lugar gasto pelo aperto de seu filho.
Os olhos escuros de Gilda piscaram rapidamente fechando-se quando ela extraiu uma lembrança das profundidades espelhadas do aço, revivendo um momento do passado de seu valente filho. Uma única lágrima deslizou por sua face e ela ofegou em um soluço.
— Gilda. — disse suavemente, para não sobressaltá-la.
Ela levantou a cabeça e a força de sua beleza golpeou-o com a força de um martelo pneumático. Todas as linhas de seu rosto eram perfeitas, todas as curvas deliciosas. Até mesmo as insondáveis profundidades de seus olhos pretos o atraíam e faziam tremer contra a necessidade de tocá-la, consolá-la.
O tempo não havia alterado muito sua aparência ao longo dos séculos. Havia maturidade nela, embora não tivesse uma só ruga. A sabedoria brilhava em cada movimento dela, embora nenhum fio de seus cabelos tivesse ficado grisalho como os dele haviam feito. Ela era uma beleza intemporal[9] e de lealdade infalível.
Angus a amava muito, algumas vezes tinha certeza que seu coração se abriria rachando seu peito.
— Não deveria estar aqui. — disse. — Não é saudável para você mexer nestas recordações.
— Isso é tudo o que resta dele. Uma recordação de meus erros.
Ele pegou a espada de suas mãos e a pendurou de volta em seu lugar de honra.
— Nem todos os erros de nossa gente são seus.
— Nossos filhos morreram e não há ali nenhuma culpa exceto a minha. — disse ela.
— Sibyl ainda está viva. E Maura.
Gilda apertou a mandíbula.
— Não. Maura está morta. Apenas seu corpo está vivo.
Angus não concordava, mas agora não era momento para esse velho argumento. Ambos sabiam muito bem.
— E quanto a Sibyl? Ela voltou para casa conosco. A salvo.
— Por quanto tempo? — perguntou Gilda olhando para o fogo.
— O muro está sendo erguido tão rápido quanto podemos repará-lo.
A raiva esticou sua boca cheia e Angus não pôde se recordar da última vez que a viu sorrir.
— O muro não a protegeu antes. Não o fará agora, não mais do que você ou eu podemos fazer. Seu rapto provou isso, sem deixar nenhuma dúvida.
— A esperança não está perdida. Não vê?
Ela se levantou e se virou, suas saias cinza girando em um arco furioso.
— Acredita que só porque algumas fêmeas Theronai atravessaram nossas portas tudo vai ficar bem? Realmente é tão estúpido?
O comentário mordaz o feriu, mas aceitou a dor sem se queixar, perdoando-a por isso mesmo quando tinha deixado sua boca. Ele sabia sob quanta pressão ela estava. Não era ela mesma — não a mesma mulher a quem cresceu amando ao longo dos anos, embora não pudesse amá-la menos, mesmo se tentasse.
— Acredito, — disse ele cuidadosamente. — que as coisas estão mudando para melhor. Prefiro viver com esperança que morrer no desespero. — respirou fundo, blindando-se contra a reação que sabia que ela teria ante suas próximas palavras. — E por isso que vou permitir que Tynan tente restaurar minha fertilidade. Ele acha que tem uma cura.
Seu corpo ficou tenso e só seus olhos se moveram. Estes se entrecerraram perigosamente, fervendo com uma emoção muito forte para que ele a nomeasse. Angus estendeu a mão para a luceria, conexão que os vinculava, procurando sentir o que ia além daqueles olhos, mas encontrou um muro sólido.
Ela o estava bloqueando. Rejeitando-o.
Angus escondeu a surpresa. Ela nunca, nenhuma só vez, tinha rejeitado ele desse modo. Nem sequer quando estava zangada. Naturalmente, ele havia sentido a retirada de suas emoções e ela filtrar as coisas que não queria que ele sentisse, mas nunca havia se negado a ele tão completamente, nenhuma só vez, tinha fechado a porta daquela maneira em sua cara.
A fúria e a solidão bateram contra ele, mas ele se negou a render-se.
— Sabia que minha decisão a chatearia, mas não tinha ideia do quanto.
— Chatear-me? — respondeu em um tom de voz baixo e depreciativo. — Tomou uma decisão como essa sem nem sequer pedir minha opinião, e acredita que estou simplesmente chateada?
— Furiosa, então. Se não me deixa entrar em seus pensamentos, não serei capaz de dizer, não acha?
Ela ignorou o insulto e seus punhos se fecharam em sua saia, amassando o tecido delicado.
— Não darei luz à outra criança. Nem sequer por você.
— Tampouco perguntei a você. Conheço seus sentimentos sobre esse assunto.
— E mesmo assim permitirá que Tynan o cure?
— Sim, desse modo descobrirá como curar aos outros homens. Você pode não querer filhos, mas e as outras mulheres que temos conosco?
— Suponho que nenhuma delas vai querer ver seus filhos massacrados como eu tive que ver os meus. Estará fazendo um favor a elas ao rejeitar Tynan. — disse Gilda.
Angus respirou fundo, procurando paciência. A dor profunda de Gilda pela morte de seus filhos não conhecia limites. Não tinha curado como era natural, como ele tinha curado. Sua dor não tinha se diluído ao longo das décadas. De algum modo, todo medo, cólera e perda tinham ulcerado o interior de Gilda, tornando-se maior e mais sombrio com o passar do tempo.
Deveria ter percebido isso antes. Deveria ter procurado ajudá-la antes, mas não tinha feito isso e agora temia que aquela angústia que ela sofria fosse muito grande e profunda para ser curada.
Exceto, talvez, pelo nascimento de outra criança. Uma que protegeriam e manteriam a salvo de danos. Uma que salvaria a mãe de sua dor.
A alma de Angus doía por sustentar um bebê em seus braços, por ouvir o som de seu riso e sentir o orgulho de vê-lo crescer forte, valente e amável. Apreciava todos seus filhos, inclusive aqueles que fizeram más escolhas. Sentia saudades, e sempre haveria um vazio em seu coração por não poder segurá-los e falar com eles, mas esse vazio não o tinha destruído. Isso não tinha tirado sua vontade de viver ou sua capacidade de ver a alegria que os rodeava. Isto não tinha empanado o orgulho que ele tinha em trabalhar para manter tantos humanos em segurança.
— Não vou virar as costas para minhas responsabilidades. — disse Angus, referindo-se não só as suas responsabilidades para com seus homens.
Gilda também precisava dele, embora duvidasse que ela estivesse de acordo.
— Não, em vez disso, você está virando as costas para mim.
Ele estendeu a mão para ela, mas ela o evitou, e ele deixou que sua mão caísse ao lado.
— Isso nunca, amor. Você é agora e sempre foi, o centro de meu mundo. Faria qualquer coisa por você.
— Qualquer coisa exceto dizer não a Tynan? — ela abriu suas mãos e seu rosto estava impassível. — Faça isso. Não o deterei, mas entenda: enquanto houver a menor possibilidade de que seja fértil, não permitirei que vá para cama comigo.
Angus quase riu ante a absurda declaração até que viu a centelha de letal hostilidade brilhando em seus olhos. O riso que borbulhava em seu interior morreu e ele apertou os lábios para calar outro som desastroso.
— Isso é o que você diz. Fizemos amor durante mais dias que séculos, sem permitir que nada se interpusesse entre nós. Como pode sequer dizer isso?
— Não trarei outra criança a este mundo.
— Nem mesmo se for isso o que eu queira?
Ela lhe deu um olhar grave.
— Amo você. Tentei dar a você tudo o que quis, mas isto não pode ser negociado. Não o amo o bastante para ver outro de meus filhos morrer.
— Não seremos capazes de resistir um ao outro. — disse Angus com completa confiança.
—Para evitar a morte de outra criança, farei. Acredite em mim.
Angus não duvidava de sua sinceridade, mas já não podia recuar. Tinha que encontrar uma maneira de curar a todos eles, trazer as crianças de volta a suas vidas.
— Tenho que fazer isso, Gilda. Os homens precisam de mim. Mas se você insistir, poderemos utilizar os métodos anticoncepcionais humanos.
— Não. — a palavra foi direta, final e repelente. — Se você fizer isso, não me tocará.
Uma pesada sensação de derrota caiu sobre Angus, fazendo-o sentir-se velho e cansado. Ele e Gilda tinham passado por muitas coisas e sempre tinham saído do outro lado mais fortes e mais unidos que antes. Desta vez, pela primeira vez, Angus questionava essa possibilidade.
Ela tinha fechado os seus pensamentos. Nunca antes havia feito isso. Nunca havia virado as costas para ele.
Angus não podia ficar ali, vendo-a daquela maneira, incapaz de encontrar uma maneira de ajudá-la e pouco disposto a lhe dar o que ela pensava que queria. Tinha que agir de acordo com sua consciência e rezar para que, finalmente, Gilda visse que era o correto. Era a única coisa que podia fazer.
Virou-se, deixando a Sala dos Caídos e Gilda para trás.
Quando o som abafado de suas botas ecoou ao longo do corredor, Angus sofreu em silenciosa frustração. Tinha que fazer isso. Tinha que dar a sua gente a esperança de algum tipo de futuro. Se os cálculos de Tynan estivessem errados e as possibilidades de cura não fossem boas, Angus seria o único a sofrer.
E se tivesse êxito, aquelas paredes ressoariam novamente com o som de felicidade das crianças. Crianças Theronai.
Angus foi preenchido por um renovado sentido de propósito. Ia ajudar seus homens.
Se algum dia tivesse outro filho, jurou que faria o que fosse necessário para ver que seus homens também os tivessem. Reconstruiriam suas fileiras e a esperança se restauraria. Angus não permitiria nenhum resultado menor.
Gilda estava ferida agora. Fraca por seus esforços para restaurar o muro. Certamente, reagiria mal a um pedido tão sensível. Dificilmente era por sua culpa que sofria assim, e a perdoaria. Infernos, já tinha perdoado. Mas isso não queria dizer que fosse deixar que ela continuasse se destruindo.
Ainda não tinham feito. Não havia a mais remota possibilidade. Ela o tinha calado, mas Angus se negava a ficar de braços cruzados. Ela estava muito ferida para que ele o fizesse. Se dando conta ou não, ela precisava dele e se isso significava que teria que enganá-la, então era isso que faria. Sua mulher era obstinada, e algumas vezes, a única maneira de conseguir entrar naquela sua cabeça dura era com força de vontade — o tipo de força que um homem como Angus era mais que equipado.
Ele a seduziria. Ela não seria capaz de resistir a ele. Nunca o tinha feito.
E quando seu filho crescesse dentro dela, encontraria a felicidade novamente. Ela se abrandaria e veria que ele só queria o melhor para ela — o melhor para todos eles.
Gilda observou Angus sair, mantendo os joelhos fechados até que finalmente ele ficou fora de vista. Quando a porta de madeira esculpida bateu, deixou-se cair no chão. Seu corpo estava fraco e inútil, mas ela se certificou que a barreira que colocou entre eles ainda estava segura em seu lugar.
As lágrimas molhavam sua face, mas as ignorou. Estava muito fraca para contê-las, muito cansada para se importar que alguém as visse ou não.
Fisicamente, o stress de usar tanta magia dia pós dia estava cobrando seu preço. Seu corpo tremia, mal era capaz de manter o esforço de mover-se como se nada tivesse acontecendo. Mentalmente, estava despedaçada. Bloquear Angus tinha tomado até a última de suas reservas, e só podia esperar que aquela barreira se mantivesse segura no lugar até que o murro estivesse restaurado e ela tivesse a chance de descansar.
Mas não tinha escolha. Aquela barreira era necessária.
Gilda não podia deixar que Angus descobrisse a verdade. Não foram os Synestryn que roubaram de Angus sua capacidade de ter filhos. Tinha sido Gilda. Ela tinha esterilizado todos os homens Theronai em um arrebatamento de raiva e dor na noite em que seu filho mais novo morreu.
De pé sobre pedaço sangrento de grama que tinha sido a única coisa que restou de seu filho, soube que nunca mais poderia ver outro filho morrer. E a única maneira de assegurar-se disso era nunca ter outro filho.
Não tinha querido utilizar sua magia além de em Angus. Não tinha querido fazer isso quando colocou tanto poder no feitiço, fazendo que este se estendesse e esterilizasse todos os homens, assegurando que ela não pudesse ser fecundada por nenhum deles. Não tinha querido permitir que sua dor se ligasse a esse poder, lhe dando força bastante para fazê-lo irreversível. Ao menos para ela.
Talvez Tynan tivesse encontrado uma maneira onde ela não tinha podido.
Mas ela tinha privado os homens de algo tão fundamental que não parou para pensar se isso importava ou não.
Se Angus algum dia descobrisse o que ela tinha feito — se algum dos homens o fizesse — tinha certeza de que a desprezariam e a rejeitariam. Ou pior. Eles a Desterrariam. Enviando-a para os Caçadores como faziam com um homem cuja marca de vida tinha morrido, deixando que aqueles monstros fizessem com ela o que quisessem.
A morte viria, mas não rapidamente. Gilda tinha ouvido histórias que os Caçadores mantinham mulheres prisioneiras.
Não podia deixar que isso acontecesse com ela. Mais importante, não podia deixar que isso acontecesse a Angus.
Seus destinos estavam unidos. Se ela morresse, ele morreria com ela, e Gilda o amava muito para deixar que ele testemunhasse sua violação e assassinato. Seria mais amável terminar com sua própria vida ou mesmo matá-lo primeiro, antes de ter que passar por isso, indefesa para evitá-lo.
Gilda tentou se levantar, mas seus braços estavam muito fracos. Normalmente, Angus sentiria sua fraqueza e estaria ao seu lado, levantando-a em seus braços fortes e cuidando dela até que a fraqueza diminuísse.
Mas isto não era normal. Angus não podia sentir sua fraqueza. Não podia sentir nada. Nem sequer a dor que queimava tão brilhante em seu interior que tinha certeza que iria queimar sua pele.
Gilda cobriu o rosto com as mãos, desejando ter feito coisas diferentes.
Desejar não mudava nada. Certamente, ninguém tinha décadas para investir toda sua força para encontrar uma maneira de reverter a magia que tinha criado. Nada do que havia feito tinha ajudado. Quanto mais tempo os homens permaneciam estéreis, mais forte parecia tornar-se a magia. Tinha tentado tudo o que sabia, exceto contar a alguém o que tinha feito.
Talvez fosse a hora de confessar, ou ao menos dizer a Tynan o que tinha feito. Tinha protegido tanto seu segredo, Sempre preocupada que um dos Sanguinar o descobrisse. Negou-se a deixar que qualquer um exceto Logan se alimentasse dela, e só quando era vital. Angus, muito provavelmente, lhe daria seu próprio sangue antes de permitir que a tocassem, e Gilda tinha aceitado sua proteção, sabendo que sem querer escondia seu segredo com sua bondade.
Angus era um homem muito bom para ela. Gilda sabia, mas isso não mudava nada. Não ia deixá-la ir, mesmo se houvesse centenas de mulheres compatíveis esperando em fila.
E não ia deixá-lo morrer com ela. A possibilidade de que Tynan pudesse encontrar um modo de reverter sua magia era muito arriscada.
Perder Maura quase a havia matado. Que Sibyl se negasse a falar com ela era igual a morrer um pouco a cada dia. O tempo não tinha apagado a dor que a rejeição de sua última filha viva lhe causava.
Mas Gilda merecia o que tinha. Tudo aquilo. Era sua culpa que nenhum dos homens pudesse ter filhos, como o era que sua filha nunca se tornasse uma mulher.
Gilda ficou olhando para o fogo enquanto esperava que as lágrimas parassem de cair, enquanto aguardava que o tremor de seus membros parasse o suficiente para lhe permitir ficar em pé.
Agora estava sozinha. Seus erros tinham matado todos aqueles a quem amava e tinha afugentado ao resto. Tudo o que restava dela era dor e desconsolo, e nenhuma delas ia ajudá-la a ficar em pé. Estava sozinha nisto. Era hora de endurecer.
Lexi saiu da ducha gigante antes que Zach pudesse distraí-la com seu corpo delicioso. Um olhar para sua ereção ricocheteando contra seu musculoso abdômen e tudo o que queria fazer era ajoelhar-se e chupá-lo, sentindo-o explodir contra sua língua.
Infelizmente, isso não ia conseguir aproximá-la para confessar sobre a bomba que havia em sua caminhonete, assim manteve os olhos em seu queixo, conseguindo lavar-se e secar-se tão rapidamente quanto pôde.
Mal tinha acabado de se vestir quando ele entrou no quarto, usando apenas uma toalha úmida ao redor de seus quadris estreitos. Sua ereção tinha diminuído e ela se encontrou perguntando-se se ele teria se encarregado de si mesmo sem ela antes de sair da ducha.
A estranha sensação de ressentimento endireitou sua coluna e deixou que a sensação passasse. Se ele ia gozar, queria ser a única a provocar isso.
— Se não para de olhar fixamente para mim, não vou caber em meu jeans. — disse ele.
Lexi manteve os olhos fechados e voltou correndo para o banheiro em busca de sua escova para os cabelos. Quando saiu, Zach estava vestido, sentado sobre a beira da cama, calçando as botas pesadas.
— Pensei que poderíamos sair e tentar algumas coisas para ver como lida com meu poder. — disse ele.
— Há algo que tenho que dizer a você primeiro. — sua voz tremeu com apreensão e os olhos de Zach subiram de repente para seu rosto, entrecerrando-se de preocupação.
— Pode me dizer o que quiser, carinho. Não há necessidade de ter medo. —deu batidinha na cama junto a ele, mas Lexi sabia que se ela se aproximasse, perderia momentaneamente o equilíbrio emocional.
Ela começou a andar de um lado para o outro, mantendo-se ao alcance de um braço.
— Já sabe que fui criada para não confiar em vocês, não é verdade?
— Sim.
— E que eu realmente acreditava que eram os caras maus.
— E foi por isso que você continuou fugindo.
— Correto. — disse.
— Entendo, carinho. Não vou utilizar isso contra você. Pode relaxar.
Talvez não utilizasse sua educação contra ela, mas como ia receber seu plano para fazê-lo voar pelos ares?
— Não é apenas eu, Zach. Um montão de gente pensa que vocês são os caras maus.
— Refere-se aos Defensores.
Ela assentiu.
— Minha mãe era muito próxima deles.
Zach deu de ombros, atraindo seus olhos para impressionante largura de seus ombros. O impulso de passar os dedos por sua pele macia e nos músculos que haviam debaixo lhe davam água na boca, mas resistiu. Tinha que passar por isso.
— Tampouco posso dizer exatamente que sou próxima deles. Embora pensasse que eram decentes, agradáveis de um modo sentimental, mas no fim, antes que me encontrasse…
Zach ficou em pé e deu um passo para ela. Lexi levantou as mãos, lhe dizendo que se mantivesse afastado.
Seus olhos verdes se entrecerraram.
— No fim, o que, Lexi?
Lexi, não carinho. Isso não era um bom presságio.
— Estava desesperada. Não tinha dinheiro. Não conseguia encontrar trabalho. Conseguir um número do Seguro Social falso tornou-se muito mais difícil recentemente, e não tinha nenhuma espécie de dinheiro para adquirir uma nova identidade.
— Deveria ter ligado para mim. — disse Zach. — Odeio a ideia de que tenha sofrido desse modo.
Ela deu um sorriso envergonhado para ele.
— Sim, bem, em primeiro lugar você foi precisamente a razão pela qual necessitava de uma nova identidade. Estava bastante certa que você seria capaz de me rastrear.
— Tentei. Não foi fácil encontrá-la.
Eles tinham apagado as pistas.
— De qualquer forma, estava desesperada, assim fui procurar esses caras com quem minha mãe costumava ficar quando as coisas davam errado.
— Os Defensores. — sugeriu Zach.
— Sim. Acolheram-me como se eu fosse uma deles. Seu líder, Héctor Morrow, até mesmo se lembrava de mim quando era criança. — e eu também me lembrava dele.
— Fico feliz de que tenha tido um lugar para onde ir.
— Não vai ficar feliz quando ouvir o resto.
Zach deu outro passo para ela, dessa vez ignorando seu desejo de ajudá-la à distância. Cobriu seus ombros com as mãos, e passou as mãos por seus braços. O contato de sua pele com a dela fazia sua cabeça dá voltas, e a envolvia em um casulo de conforto.
Cara, ia sentir falta disso. De forma alguma ele ia tocá-la daquela forma quando ouvisse verdade.
— Enquanto você estiver a salvo, estarei bem. Acabe sua história.
— Não é uma história. É uma explicação. Quero que entenda por que fiz o que fiz.
— E o que fez?
— Ainda não. Deixe-me acabar.
Zach assentiu e Lexi tomou uma respiração para ganhar forças.
— Os Defensores me deram um trabalho naquele bar. Deram-me um lugar para dormir. Alimentaram-me. Prometeram-me que não deixariam que você me encontrasse.
A mandíbula dele se endureceu então, e um brilho de raiva iluminou seus olhos.
— Nenhum deles teria me detido. Sabe, não é mesmo?
Lexi engoliu um repentino nó de nervosismo.
— Alegro-me que não tenhamos chegado a isso, para ser honesta. Aqueles homens não eram maus.
— Não faria diferença se fossem Santos se tentassem impedir que eu a encontrasse.
— Bom, não tiveram a chance. Em vez disso, nós… Elaboramos um plano.
Os dedos de Zach se apertaram levemente ao redor de seus braços e sua voz endureceu.
— Que tipo de plano?
Lexi não podia olhá-lo nos olhos. Estava tão envergonhada do que tinha feito.
— Não é agradável, Zach.
— Basta. Diga-me.
Era hora de enfrentá-lo.
Lexi levantou o queixo, endireitou os ombros e o olhou diretamente nos olhos.
— Os Defensores tinham tentado encontrar sua casa durante muito tempo. Quando souberam que estava me procurando, disseram-me que eu seria uma grande isca. Eu concordei.
— Assim você queria que eu a encontrasse. Já sei. — disse Zach.
— Sim. Por isso liguei para Helen. Tinha certeza que tinham lavado seu cérebro. Sabia que ela diria a você onde eu estava.
— Assim, naquela noite a ligação e que pareceu tão assustada..?
— Era um truque. Eu sabia que você viria se pensasse que eu estava em apuros, embora, ao mesmo tempo, pensasse que era porque você mesmo queria ter o prazer de me matar.
Ele apertou a mandíbula com raiva; a garganta dele trabalhou como se estivesse tentando engolir suas palavras. Uma veia palpitava em sua têmpora.
Lexi estava ficando sem tempo para acabar a confissão. Tinha que conseguir soltar tudo antes que ele pudesse ser bom e estar de saco cheio, tudo ao mesmo tempo. Não tinha certeza de ter coragem de enfrentá-lo dessa maneira outra vez.
— Assim liguei para você. Você veio, exatamente como planejamos. Presumimos que eu o traria em meu carro e nos dirigiríamos para cá, mas meu carro quebrou.
Um olhar de suspeita mortal cruzou seu rosto. Tinha certeza de que aquele era o olhar que os Synestryn viam exatamente antes que ele os partisse ao meio.
— Por que seu carro?
— Porque era onde estavam os explosivos. Tenho uma caminhonete de C-4 e os Defensores me ensinaram como utilizá-los. — negou-se a tremer. — Fui enviada para cá para fazer este lugar voar, junto com tudo o que houvesse nele.
Lexi esteve planejando matá-lo.
O choque nem sequer começava a cobrir o que estava sentindo agora. A traição veio de perto, mas não perto o suficiente. Seu corpo se sacudiu com raiva e uma dor tão profunda que não sabia que tinha terminações nervosas ali até agora. Anos de sofrimento não o prepararam para um golpe como aquele.
Lexi, a mulher com quem acreditava que passaria sua vida, amaria e defenderia, tinha planejado matá-lo.
E a todo mundo ali, todas aquelas almas inocentes que ele tinha jurado proteger.
Zach não podia conceber algo assim. Talvez nunca pudesse ser capaz, mas haveria tempo para que tentasse depois; agora, tinha que se encarregar daquela crise e se certificar que ninguém saísse ferido. Incluindo Lexi.
Os Theronai não iriam aceitar sua traição tão facilmente.
— Há algum risco que essa merda escape? — exigiu ele.
— Não. É seguro. Tenho que ligar tudo ao C-4 antes que haja uma ameaça.
— Tem certeza?
— Não estaria aqui se não fosse. Há crianças ao redor. Nunca me arriscaria a machucá-las. Acredita em mim, não é mesmo?
Ele não tinha outra escolha se não acreditar nela, por enquanto, até que tivesse tempo para verificar por si mesmo.
— Você me usou. — ele se sufocou, incapaz de formar as palavras.
A dor da traição corria profundamente, mais profundo do que ele tinha considerado possível em seu breve período de tempo juntos.
— Usei você. Não espero que me perdoe, mas não sabia o que estava fazendo.
— E agora sabe? Agora sabe o quanto o plano de vocês era imoral?
Seus olhos escuros se mantiveram imóveis, pedindo que ele acreditasse nela. Que confiasse nela.
— Eu realmente sinto muito, Zach, nunca faria mal as pessoas daqui. Sabe disso, não é mesmo?
Ele queria acreditar nela, mas as vidas de muitas pessoas estavam em jogo.
— Há apenas uma maneira de que eu possa ter certeza disso, Lexi.
— Como? Quero resolver isso. Eu realmente quero. É por isso que estou aqui fazendo das tripas coração. — parecia sincera.
Sustentou seu olhar e não se retorceu quando ele a fulminou ao olhá-la. Parecia que ela não estava tentando mentir.
Para ninguém mais.
Ainda assim, o fato de ter mentido a tornava suspeita. Zach conhecia uma única maneira de provar sua inocência.
— Você vai me deixar entrar em sua mente. Vai me deixar ver seus pensamentos.
— Não, Zach. Isso é muito assustador. Muito invasivo.
— Invasivo uma merda. Você se colocou nesta confusão mentindo, e a única maneira de esclarecer isso é essa. Vou ter que dizer a Joseph o que você fez. Talvez não possa testemunhar em seu favor se não me deixa fazer isto.
— Tem que haver outra maneira.
— Não há.
Lexi recuou, batendo na parede atrás dela.
— Sou uma pessoa reservada.
Zach a seguiu, procurando qualquer sinal de que ela pudesse tentar fugir.
— Já não. Vamos fazer isso, Lexi. De uma maneira ou de outra. Tenho que manter o juramento que fiz a essas pessoas.
— E o juramento que fez a mim?
— Darei minha vida para protegê-la, mesmo estando tão furioso como estou, mas o que vou fazer de maneira nenhuma violará isso. — e ia fazer isso. Mesmo se tivesse que obrigá-la.
Não seria agradável, mas seria infinitamente melhor do que o que Joseph talvez se visse forçado a fazer para obter a verdade dela. Talvez chamasse um dos Sanguinar, e Zach não ia deixar um daqueles parasitas vasculhar sua mente.
— Não quero isso.
— Não me importo. Estou falando sério.
— Eu também. — disse, levantando o queixo.
Droga. Ele sabia muito bem que se ela brigasse com ele por causa disso, talvez acabasse machucada. No entanto, tinha que fazer isso. Tinha que ter certeza, sem sombra de dúvidas, que ela não havia escondido nada dele. Muitas vidas estavam em jogo para ele se equivocar.
— Esta é a única maneira em que posso protegê-la, Lexi. Se não fizermos isto, alguém mais o fará, e não serão tão cuidadosos com você como eu serei.
Ela ficou olhando-o durante um tempo. Suas pupilas tinham diminuído para gelados pontos de pretos. Toda a cor de sua face tinha desaparecido, deixando para trás a cinzenta palidez do medo.
Zach não podia suportar vê-la assim. Tinha um trabalho a fazer, e ia fazê-lo, mas isso não queria dizer que não pudesse torná-lo tão fácil quanto fosse possível para ela. Ninguém mais sabia. Ainda tinha tempo para ir com calma. Torná-lo fácil.
Ele acariciou seus cabelos, finos como os de um bebê, afastando-os da testa. Ainda estavam úmidos da ducha e se grudavam aos seus dedos, enlaçando-os.
— Preciso que você me deixe fazer isso. Se me obrigar a utilizar a força, se machucará.
Sua cabeça caiu contra a parede e ele viu como engolia nervosamente.
— Sim. Claro. Eu me coloquei nisto. Aceitarei meu castigo como uma adulta.
— Isto não é um castigo. — Embora talvez fosse isso o que ainda estava rondando por sua cabeça.
— Mas com certeza parece.
— Basta fechar os olhos e relaxar. Eu farei o resto.
Lexi fez como Zach disse e tentou não cair doente aos seus pés.
Não podia acreditar que ia deixar que alguém interviesse dentro de sua cabeça. Se soubesse o custo de pactuar com os Defensores antes, teria decidido passar fome.
Zach estendeu a mão sobre sua garganta, e ela sentiu o colar se levantar até que este entrou em contato com o anel dele. As duas faixas se uniram igual a ímãs, e um lento jorro de energia cálida penetrou em sua pele, irradiando do colar.
Os pelos de seu corpo se arrepiaram, e um forte arrepio a percorreu, despertando cada terminação nervosa.
Lexi deixou escapar um gemido baixo de prazer. Não pôde evitá-lo. Seja lá o que fosse que ele estava fazendo era muito bom, quase igual a um narcótico atravessando como um raio seu sistema.
Seus ossos amoleceram e seu corpo deslizou pela parede. O forte braço de Zach aliviou sua queda, evitando que caísse com força. Ela acabou em uma pilha no chão com a camiseta erguida nas costas, deixando-a exposta contra a parede dura e fria.
— Isso é bom. — ele sussurrou. — Apenas relaxe.
Realmente não tinha outra escolha, não que estivesse cooperando. Se soubesse que estar arruinando a mente de alguém era tão bom, talvez o tivesse deixado fazer isso antes.
Mal abria os olhos, só o suficiente para poder ver o rosto moreno de Zach descendo sobre ela. Era tão bonito, tão másculo. Aquela dele boca era cheia e suave, ao contrário do resto de seu corpo que era rígido e magro, e ele sabia como utilizá-lo para fazê-la sentir-se bem. Só os beijos já eram melhor que o pacote completo de sexo com os outros homens. Não tinha certeza como funcionava, mas tinha certeza que se passasse algum tempo estudando-o, compreenderia.
Lexi se estendeu para ele, seus braços indo rodear o pescoço dele em um descuidado passar de dedos. Não podia encontrar a força para segurá-lo, e suas mãos deslizaram para seu colo. Tentou outra vez, mas Zach segurou seus pulsos com sua mão livre e os manteve no lugar.
— Apenas relaxe. — ele disse.
Se ela relaxasse ainda mais, ia afundar no tapete, tornando-se uma poça de água. Talvez fosse isso o que ele queria. Pensou que poderia fazer isso se assim fosse.
— Você está fazendo isso muito bem, céu.
Céu. Ele não a chamaria assim se a odiasse, não é mesmo?
Lexi se concentrou naquela ideia e a reteve. Não queria que ele a odiasse. Queria que a amasse.
Amor. O pensamento a impressionou acalmando-a. Por que quereria que ele a amasse? Isso só complicaria as coisas. Não tinha decidido nem mesmo se a vida que ele levava ia funcionar ou não para ela. Claro, ele havia feito um longo caminho para convencê-la a ficar. Tinha dado uma casa a ela, a fez sentir-se como uma rainha. Fazendo-a sentir-se importante. Necessária.
Que garota não se acostumaria a algo assim? Isso só demonstrava que ela estava lúcida.
Mas o amor era um grande problema. Isso mudava as coisas. Tornava-as mais difíceis. Mais complicadas.
Melhores.
Uma pressão chata atrás de seus olhos a fez fazer uma careta, distraindo-a de sua linha de pensamentos.
— Não lute contra isso. — disse Zach.
Lexi não queria lutar com nada, mas sua boca não estava funcionando tão bem para dizer isso a ele.
A pressão aumentou até tornar-se dolorosa. Um gemido escapou de seus lábios e a dor aliviou um pouco, mas não desapareceu.
— Está lutando comigo, carinho. Tem que baixar a guarda.
— Não sei como. — ouviu-se dizendo.
Ele ficou em silêncio durante um momento, e ela sentiu uma tensão sutil passando por sua mão. Um simples impulso de medo deslizou através dela e ela pôde dizer instantaneamente que não era dela. Era uma sensação diferente. Uma forma diferente, mais irregular e áspero que o seu.
Era o medo de Zach. Tinha medo. Por ela.
Algo estava errado, mas Lexi não conseguia entender.
— Tudo bem. Tentaremos isso de novo. Desta vez, quero que você imagine um muro de tijolos em sua cabeça. Pode fazer isso?
Ela deu um pequeno assentimento e o muro ganhou vida dentro de sua mente.
— Bom. Agora jogue essa parede para baixo, tijolo a tijolo. Já não precisa dela. Está a salvo comigo.
A salvo. Isso era agradável.
Lexi fez como lhe dizia, derrubando a parede, só que nunca alcançava o fundo. Sempre havia mais tijolos, como se estivessem crescendo dos que caíam na terra como uma construção contínua dentro de sua cabeça.
Negando-se a render-se, continuou fazendo o que ele havia dito enquanto a pressão atrás de seus olhos começava a aumentar novamente. O calor cresceu dentro de sua cabeça, fazendo-a tremer. A parede continuava crescendo, evitando todas as tentativas que ela fazia para derrubá-la.
A dor se irradiou, enchendo seu crânio de forma explosiva. Um ruído apareceu em algum lugar distante: um grito agudo de dor e barulho seco e continuado de uma respiração agitada. As duras faixas se apertaram sobre seus pulsos e um frágil ponto de calor em seu pescoço.
Isso estava errado. Mesmo sem nenhuma experiência naquele tipo de coisa, sabia em sua alma que algo estava terrivelmente errado.
A parede de tijolo aumentou, espessando-se à medida que crescia. Mais alta que o pé de feijão de João[10] e mais amplo do que podia ver, a coisa continuou crescendo e inchando, lutando contra a pressão de sua cabeça.
Um zumbido tapou seus ouvidos. Seu sangue queimava enquanto se apressava por suas veias, chamuscando-a de dentro para fora. Não havia nenhum lugar para fugir para que aquilo parasse. Nada que pudesse fazer.
Fracamente, sentiu uma explosão dentro de sua cabeça, igual a pequenas descargas de eletricidade estática iniciadas pelo oxigênio. A cada faísca que explodia, sentia menos o mundo ao seu redor. A audição foi desaparecendo. A agradável pressão da parede contra a parte baixa de suas costas se converteu em uma lembrança. A sensação das mãos de Zach ao redor de seus pulsos desapareceu, junto com a sensação dos próprios pulsos. A consciência de seu corpo se dissipou como a névoa sob o sol até que não restou nada exceto a parede de tijolo e um incessante tamborilar atrás dela.
Então de repente o tamborilar parou. Ou talvez não tivesse parado, mas já não podia senti-lo de forma alguma. Tudo exceto a parede se esfumaçou e Lexi deixou que tudo se fosse. Já não precisava de nada daquilo. Tudo o que precisava era deixar-se ir.
Lexi estava mole nos braços de Zach. O suor escorria por sua têmpora, zombando de sua dor de cabeça aguda. Ele estava tremendo como se tivesse acabado, depois de três dias de batalha sem água, e exigia toda sua força manter-se erguido na posição sentada. O que era triste, considerando que a parede fazia quase todo o trabalho.
Tinha falhado. Nada do que tinha tentado parecia ter funcionado. Lexi era muito forte, suas defesas impenetráveis.
Ela não confiava nele. Lá no fundo, onde mais importava, ela não confiava nele. Sabia que era por isso que tinha falhado.
Zach esperou que a fraqueza desaparecesse o bastante para poder mover-se; então moveu a cabeça de Lexi de modo que ela descansasse mais confortavelmente, procurando um ângulo sobre seu ombro. A luceria brilhava sob as luzes do quarto, mostrando um furioso redemoinho de verdes e talvez um pouco de azul.
O azul não estava lá antes, e com uma doentia sensação de medo, Zach percebeu que o que quer que tivesse acabado de acontecer havia realmente invertido o processo de vinculá-los.
Merda.
Uma frustração violenta o roeu por dentro. Queria repartir golpes a torto e a direito e expressar um pouco de sua cólera, mas não havia ninguém por perto merecedor daquele tipo de tratamento. A fonte da desconfiança de Lexi eram os ensinamentos de sua mãe e tinha certeza de que a mulher tinha feito isso pensando unicamente em proteger a filha.
Zach se negou a manter isso contra ela. Tinha mantido Lexi a salvo durante todos aqueles anos quando ele não pôde e devia respeito a ela, não ressentimento.
Sacudiu Lexi levemente.
— Está bem? — perguntou.
Ela não respondeu. Sua respiração se nivelou e seu pulso estava estável e forte, mas ela não tinha despertado.
E se ele a tivesse machucado?
Um sentimento doentio de pânico o atravessou e ele tirou seu celular. Não tinha certeza se Logan estava em Dabyr ou não, mas ele era o único Sanguinar em quem Zach confiava o bastante para deixar tocá-la.
— Está em casa? — perguntou assim que Logan atendeu.
— Acabei de sair. Por quê?
— Preciso de você. É Lexi.
— Irei agora mesmo.
Agora a parte difícil. Zach discou o número de Joseph Rayd, o líder dos Theronai. Por mais que odiasse fazer isso, Zach tinha que falar com Joseph sobre os explosivos.
Joseph respondeu ao sexto toque; sua voz tensa. Cansada.
— Sim.
— Preciso que venha ao quarto de Lexi. — disse Zach.
— Seja o que for, pode esperar. Estou ocupado. — parecia mais que somente ocupado. Sua voz estava tensa, como se tivesse a garganta tão apertada que fosse difícil até mesmo formar as palavras, rasgando-as. — Agora não é um bom momento.
Zach baixou os olhos para a forma inerte de Lexi.
— Vai ter que ser. Temos uma… Situação.
Uma maldição abafada chegou do outro lado da linha, e soube que Joseph estava prestando atenção.
Zach não tinha ideia do que queria dizer, mas podia imaginar. Estava acontecendo algo, e não era bom.
— Dê-me um segundo. — disse Joseph. — Estarei aí.
Zach colocou de lado sua fraqueza e conseguiu colocar Lexi confortavelmente na cama. Seus braços tremeram, assim ajudou-a a levantar-se e empurrou alguns travesseiros macios atrás de suas costas.
Lexi esfregou as têmporas e piscou. Olhou-o, e embora não tivesse nem ideia do que estava olhando em seu rosto, devia ter ser ruim, baseando-se na maneira que seus olhos se arregalaram e ele se jogou como se estivesse a ponto de cair em um precipício.
— Está bem? — perguntou ela.
Seus olhos se fecharam sobre a luceria em sua garganta. Definitivamente havia muito mais azul agora. Tinha perdido terreno com ela.
— Bem. — a palavra saiu dura e entrecortada.
— Parece como se fosse vomitar. Aconteceu algo enquanto estava inconsciente?
— Só ficou inconsciente alguns segundos.
— Então o que aconteceu? — perguntou ela.
— Isso é o que eu gostaria de saber. — disse Joseph da entrada do dormitório Seu enorme e pesado corpo enchendo o espaço e seu rosto formado por ângulos rígidos. — Melhor que seja malditamente importante.
— É. — disse Zach. — Temos um problema.
— Fantástico. Justo o que este lugar precisa. Outro problema. — Joseph deixou escapar um suspiro cansado e cruzou os braços sobre o peito amplo. — Vá em frente. Não tenho o dia todo.
Zach sentiu que Lexi ficava mais tensa a cada segundo que passava. O ar ao redor dela parecia haver se congelado e estava perfumado com o forte cheiro do pânico.
— Está tudo bem. — disse Zach a ela. — Joseph não fará mal a você.
Uma expressão de indignado desprezo cruzou o rosto de Joseph.
— É obvio que não vou machucá-la. Que diabos está acontecendo?
Zach encontrou a mão de Lexi e lhe deu um aperto de encorajamento. Abriu a boca para falar, mas ela o golpeou com força.
— O problema é meu. Eu direi. — disse ela.
Zach assentiu, e uma sensação de orgulho o envolveu. Ela talvez estivesse assustada, mas não ia deixar que isso a impedisse de fazer o correto.
Ele amava isso dela.
Lexi se endireitou e balançou as pernas sobre a beira da cama.
— Suponho que não devo fazer rodeios.
— Isso seria bom. — concordou Joseph. — Sou um homem ocupado.
— Originalmente, vim para cá para fazer este lugar voar pelos ares. O C-4 está em minha caminhonete.
Joseph ficou imóvel durante um tempo; então se afastou lentamente do batente da porta, seu rosto ficando mais e mais sombrio a cada segundo que passava.
Zach moveu seu corpo de modo a ficar entre Joseph e Lexi, e pôs a mão sobre a espada.
— Fique onde está. — advertiu Joseph.
Aqueles olhos furiosos viram-se até caírem sobre Zach.
— Trouxe-a para cá.
— Fiz isso.
— Ele não sabia. — disse Lexi. Ela estava ao seu lado, tentando passar por Zach, mas ele não se movia. — Não é culpa de Zach.
As palavras de Joseph saíram igual a blocos de gelo, frias e pesadas.
— Você cometeu um ato de guerra.
— Não, planejou um. Realmente não chegou a cometê-lo.
— Besteiras. — grunhiu Joseph. — Ela trouxe explosivos para dentro de nossa propriedade, para nossos lares. Há humanos aqui. Crianças.
— Eu sei. — disse Lexi — E foi por isso que não segui adiante. Nunca machucaria as crianças. Pensei que todos vocês fossem monstros. Agora vejo que estava equivocada. Sinto muito.
— Sentir muito não significa nada, garotinha. Sua ação é castigada com a morte.
— Só por cima de meu maldito cadáver. — disse Zach.
Tirou a espada e sustentou a lâmina nua com a ponta apontando para o coração de Joseph.
Zach captou um movimento na soleira da porta, mas não se virou.
— Aparentemente, cheguei bem a tempo. — Logan arrastou as palavras da soleira. — Alguém se importaria de me explicar isso?
— Zach acabou de selar seu destino por estar ao lado do inimigo. — disse Joseph.
Lexi saiu de trás dele e envolveu sua mão ao redor do aço muito afiado. Se Zach tão somente respirasse com força, este deslizaria através de sua delicada pele.
— Pare já com esta merda machista. — ordenou ela. — Está piorando as coisas.
Raiva e um medo doentio circularam em seu interior, deixando-o tenso. Não podia deixar que Joseph a ferisse, não importando o quanto ela tivesse arruinado as coisas.
Lexi se virou para Logan, mantendo a mão sobre a borda afiado da espada.
— Eu cometi um erro. Um enorme. Joseph saltou, o que era totalmente compreensível, e agora estes dois estão vazando testosterona por toda parte em minha casa nova.
— Talvez devêssemos começar afastando as armas. — sugeriu Logan.
Joseph apertou a mandíbula, mas levantou as mãos, com as palmas para fora, e deu um longo passo para trás.
— Não vou machucá-la. Ainda. Ela merece uma chance de falar.
Zach reuniu cada grama de controle que pôde encontrar e puxou com força. Lexi o olhou nos olhos, seus olhos suplicantes, embora o que, ele não tinha certeza. Baixar a arma? Tirá-la daquela confusão? Voltar o tempo atrás de modo que nunca se conhecessem?
— Merda. — cuspiu ele. — Tire a mão de minha espada e eu a baixarei.
Lexi fez isso e Zach embainhou a espada.
Seus instintos protetores ainda estavam correndo rapidamente, palpitando através dele igual a um martelo perfurador. Não tinha certeza de ser capaz de controlar-se o suficiente para pensar racionalmente, mas tentaria. Por Lexi.
— Bem... — disse Logan. — Este é um bom começo. Agora, minha senhora, por gentileza, poderia me dar mais alguns detalhes?
— Trouxe uma caminhonete cheia de explosivos para cá para fazer todos voarem para o inferno. Não preciso dizer que mudei de ideia. Na realidade, não sou grande fã do assassinato, assim para mim não funcionou.
— Por que queria matar todos nós? — perguntou Logan com apenas um mínimo interesse dissimulado em sua voz estudada.
— Porque pensei que vocês fossem os caras maus.
Logan assentiu.
— Dada a maneira que esses dois estavam agindo exatamente agora, dificilmente poderia culpá-la.
— Ela está cometendo um ato de guerra. — clamou Joseph. — Ia matar as crianças.
A voz de Logan caiu como água fria sobre a terra chamuscada.
— Entendo o quanto isso deve ter incomodado você, Joseph, mas acredito que podemos fazer uma exceção, considerando as circunstâncias. Necessitamos dela, e ela confessou.
— Isso não faz que tudo esteja bem. Longe disso. Nem sequer sabemos se está mentindo. — disse Joseph.
— Zach sabe. Estão vinculados. Ele é capaz de ver se ela está mentindo. — Logan se virou para Zach. — Não é verdade?
— Não. — disse Zach, sentindo-se um traidor ante a única mulher que poderia salvar seu lastimoso traseiro. — Tentei entrar em sua cabeça, mas não deu muito certo.
Os olhos de Logan se entrecerraram com suspeita e ele virou a cabeça para Lexi.
— É verdade? — perguntou a ela.
Lexi levantou o queixo e olhou Logan diretamente nos olhos.
— Sou muito estúpida, eu acho.
— Você esteve bloqueando-o. Mantendo-o fora. — disse Joseph.
— Não quis dizer isso.
— Ela tentou me deixar entrar, mas não funcionou. — disse Zach. — Erigiu muitas defesas mentais ou algo assim.
— Qualquer que seja a defesa que tenha, não influirá em mim. — disse Logan se aproximando. Seus lábios se levantaram uma fração de centímetros, suficiente para que Zach visse o brilho perolado de suas presas.
Os instintos se reuniram dentro de Zach, enchendo-o com uma raiva potente e feroz. Lexi era dele. Ele tinha jurado protegê-la e pretendia fazer justamente isso. Não importava a quem tivesse que despedaçar para fazer isso.
— De nenhuma maldita maneira. — grunhiu Zach empurrando Logan para trás. — Não vai tomar seu sangue.
— É a única maneira de termos certeza. — disse Logan.
— Então você terá que continuar a lhe fazer perguntas, porque ninguém vai tomar seu sangue.
— Do que está falando, Zach? — perguntou Lexi, sua voz marcada com um toque de medo.
Ela estava ao seu lado e se aproximou meio passo.
— Logan quer sugar seu sangue e dar um passeio por sua cabeça.
— Deixe-o. — ordenou Joseph. — É a única maneira de sair disto com vida.
A mão de Lexi se fechou ao redor de seus bíceps. Seus dedos estavam frios e trêmulos.
— Tem que haver outra maneira.
Joseph avançou, pairando sobre ela, o que o fez parecer maior e importante do que Zach já tinha visto. Geralmente era um homem razoável, amável, mas tudo isso tinha desaparecido quando seu rosto desceu sobre o de Lexi.
— Não há, e não vou correr o risco que você fira meu povo. Ou faz isso ou eu mesmo a matarei.
— Terá que matar a mim também. — disse Zach. — Você esteve afastado dos campos de batalha por muito tempo, provavelmente será a última coisa que fará.
— Basta! — gritou Logan. — Ninguém vai morrer aqui esta noite. Há uma forma simples de resolver isto.
— Uma que implica que você sugue seu sangue, sanguessuga? — disse Zach.
Os olhos claros de Logan flamejaram ficando mais brilhantes durante um segundo, emitindo um brilho misterioso.
— Eu pensei que éramos amigos, Zach. Esperava que confiasse que não machucaria sua mulher.
Não o fazia. Não confiava em ninguém o bastante para deixar que sangrasse Lexi.
O corpo de Zach ficou tenso e ele estendeu sua mão outra vez para a espada. Ia ter que abrir caminho para sair dali.
Ia ter que matar seus amigos.
Quando se moveu para fazer isso, Lexi colocou uma mão firmemente sobre seu braço.
— Não faça isso. — disse suavemente. — Sei o que está pensando e não pode. Deixarei que ele tome meu sangue.
— Não.
Lexi deu um passo para frente. Seus olhos vagaram pelo rosto dele e lhe ofereceu um sorriso corajoso.
— Ficarei bem. Fui a única a tomar a decisão de vir para cá sob falsos pretextos. Fui a única a concordou em matar pessoas antes de ter todos os fatos. Serei a única em lidar com as consequências.
— Ficará perfeitamente a salvo. — disse Logan.
Ele colocou a mão sobre seu ombro e ela estremeceu ligeiramente antes de permitir o contato.
Zach odiava isto, mas que escolha tinha? Ela tinha concordado. Tinha selado seu destino.
Zach deu a Logan um olhar duro, cheio de promessas de vingança.
— Será melhor que esteja.
Logan decidiu que seu melhor curso de ação ia ser fazer isto tão rápido quanto fosse possível.
Zach fervia de raiva mal contida. Joseph tinha manobrado de modo que pudesse conter Zach ser fosse necessário, e Lexi — que valente menina ela era — tinha enquadrado os ombros e esperava olhando para Logan diretamente nos olhos.
— Isto não doerá. — ele assegurou enquanto levava seu pulso à boca.
Nem em sonhos tentaria o destino pondo os lábios em sua garganta. Logan não estava completamente certo de que Joseph fosse forte o suficiente para conter Zach se as coisas ficassem difíceis.
— Apenas faça. — resmungou ela.
Uma coisinha linda. Seu queixo fino erguido e seus olhos escuros fixos em matar. Era completamente possível que ela ainda estivesse planejando destruí-los, mas dado que tinha aceitado aquele tratamento, Logan duvidava.
Segurou-a firmemente e se aproximou de modo que ela não tivesse outra escolha senão olhá-lo nos olhos. Logan reuniu o pouco poder que restava e deixou que inundasse seus olhos, sugando-a. Capturando-a.
Seus olhos deslumbrantes desapareceram e um sonolento peso baixou suas pálpebras. Demorou apenas um breve segundo para apanhá-la, mas podia senti-la começando a lutar contra ele como se percebesse o que estava acontecendo.
Antes que ela pudesse reagir, mordeu a delicada pele de seu pulso, perfurando a veia. Sangue doce e quente jorrou sobre sua língua como a chuva mais pura. Ela nunca tinha sido sangrada. Logan era o primeiro para ela, e o poder que o enchia era uma mistura inebriante de inocência e força.
O monstro faminto em seu interior ganhou vida, assumindo seu corpo. Não se moveu de seu pulso, sorvendo o poder com enormes goles. Não perdeu tempo respirando. Cada segundo contava, e em algum lugar no fundo de sua mente, sabia que Zach não ia permanecer de braços cruzados e permitindo que ele se alimentasse por mais tempo.
Os batimentos de seu coração roçavam sua língua enquanto se tornava uma parte dele. A onde quer que ela fosse, enquanto vivesse, ele seria capaz de encontrá-la de novo, de modo que pudesse se alimentar dela.
Sentiu que ela estava enfraquecendo e envolveu seu braço em torno de sua cintura, sustentando-a em pé. Ela lutou, mas ele não se abrandou. Ele precisava de mais. Muito mais.
— Basta. — ouviu ao longe, mas ignorou a exigência daquela voz.
Tudo o que importava era a calidez do sangue dela o atravessando, enchendo todos os buracos vazios em seu ventre.
A cabeça de Logan virou quando seu poder retornou. Seu corpo queimou e sua pele formigou quando foi restaurada sua verdadeira forma, não aquele corpo frágil, faminto e descarnado que tinha que utilizar.
Os músculos inflaram e seus ossos se endureceram. A constante e desagradável fome que o incomodava se dissipou com cada gole.
O peso da mulher em seus braços aumentava à medida que ela enfraquecia, mas isso não importava.
Logan agora estava forte, era capaz de suportar facilmente seu peso insignificante.
Os batimentos de seu coração oscilaram e a cabeça de Logan começou a girar.
Ainda não tinha começado a respirar e seus pulmões estavam queimando por oxigênio.
— Pare! — o grito imperioso o fez voltar a si.
Supunha que estava fazendo algo — algo importante.
Traição. Supunha-se que devia estar investigando dentro da mulher, procurando sinais de traição.
Antes que perdesse a chance, Logan penetrou em sua mente, golpeando os formidáveis escudos que ela tinha construído. Estes eram grossos e fortes, mas Logan era muito mais forte agora, graças a seu sangue. Não teve problemas para quebrar o que ela tinha levado anos para erigir.
Ela estava aterrorizada. Fraca.
Logan a estava matando e ele não tinha percebido o que esteve fazendo.
Imediatamente, fechou o ferimento de seu braço, lambendo o restante do sangue que deixou para trás. Rastreou a mente dela, averiguando rapidamente, antes que fosse muito tarde.
Viu flashes de sua vida — breves flashes de pessoas e lugares que ela tinha visto. Sentiu alguns momentos de triunfo e pânico, dor e alegria. Sua vida era como a de muitas outras, cheia de uma brilhante mistura de sentimentos, lembranças e esperanças.
Logan encontrou o que queria e passeou por eles. Ela estava desvanecendo-se rapidamente, mergulhando na inconsciência.
Custou-lhe um pouco do grande poder que ela tinha lhe dado, mas ela o deixou voltar a infiltrar-se nela através do agarre em seu braço. Se ela desmaiasse, tinha certeza que Zach o despedaçaria.
Uma frágil lembrança o incomodou. Ele tinha provado um sangue como o dela antes; só que não conseguia recordar onde ou quando.
Concentre-se. Precisava se concentrar na parte dos planos que tinha para destruir seu lar.
Logan investigou aqueles pensamentos, viu uma colagem de rostos masculinos que não reconheceu, então selecionou o que precisava.
Lexi estava dizendo a verdade. Não tinha intenção de matá-los. Não, desde que tinha descobriu que eles não eram os monstros que tinha acreditado.
Logan se esforçou para achar sua voz, e quando o fez, esta saiu áspera e seca.
— É como ela disse. — disse a Joseph.
Ambos os homens relaxaram visivelmente aliviados, e Zach correu para tirar o corpo mole de Lexi dos de braços de Logan. Deixou-a sobre a cama com um cuidado extremo, como se seu corpo fosse de cristal soprado.
— Ela precisa de líquidos. — disse Logan.
Zach deu um olhar feroz para Logan.
— Tomou muito.
— Suas defesas são formidáveis. Era necessário. — isso era uma mentira, mas uma que sentia que Zach aceitaria.
A última coisa que precisava era chatear Zach o suficiente para que ele o partisse ao meio e ele perdesse todo o precioso poder que fluía em suas veias.
Aquele poder era necessário em outro lugar. O Projeto Lullaby estava alcançando seu estado crítico, e todos seus parentes que dormiam embaixo da terra tinham que ser alimentados.
— Dentro de algumas horas estará bem. — disse Logan.
— Melhor rezar para que esse seja o caso, sanguessuga.
Joseph deu a Logan um formal assentimento de cabeça.
— Obrigado por seus serviços.
Essa era uma despedida e Logan sabia.
Bom. Tinha coisas melhores para fazer, de qualquer forma, e o rico sangue que o enchia ia tornar todas elas possíveis.
Alexander era uma daquelas poucas pessoas que realmente adoravam os hospitais. Via esperança onde os outros só viam enfermidade e desespero. Era dentro das paredes dos hospitais como aquele onde encontrava a chance de salvar sua raça da extinção.
O aroma estéril, combinado com o dos fracos corpos humanos, encheu seu nariz enquanto ele passava ao longo dos baixos corredores. Era muito tarde, bem depois da hora das visitas, mas ninguém questionou sua presença. De fato, poucos sequer notaram que ele passou. Não era mais que um borrão de movimento, uma rajada de ar morno deslizando sobre sua pele.
Com seus sentidos em alerta máximo, Alexander se moveu com exatidão infalível para seu objetivo. Empurrou a porta de madeira e entrou, passando despercebido pelas enfermeiras na escrivaninha próxima.
O quarto estava escuro. Tranquilo. Não havia televisão que preenchesse o silêncio, só fraco sussurro da respiração entrando e saindo do corpo da mulher, o ruído seco e continuado da respiração trabalhosa de um homem muito mais rápida que a dela. Ela fedia a dor e desespero, mas Alexander corrigiria isso em breve. Tinha aprendido há muito tempo que a esperança de sua raça — os Sanguinar — estava estreitamente ligada a frágil esperança de certas espécies humanas especiais, aquele com sangue forte correndo por suas veias, o sangue do próprio Solarc.
Alexander inalou profundamente pelo nariz, detectando a riqueza das especiarias daquele sangue. A fome roia seu ventre, mas tinha vivido com ela o bastante para manter o impulso de alimentar-se de lado durante o tempo que necessitasse. Sua tarefa era mais importante que sua fome, porque se esta funcionasse, um dia sua gente já não sentiria mais o vazio constante da fome.
Moveu-se lentamente de modo a não assustá-la, afastando a cortina de tecido que impedia a visão da cama da porta. Ali estava deitado um homem, imóvel e abatido. Parecia ter cerca de sessenta, embora Alexander supusesse que era uma década mais jovem. Sua pele estava amarelada pela enfermidade e pendurava flácida de seu corpo. Uma sonda fina e clara em seu nariz lhe subministrava oxigênio e uma grossa sonda de drenagem serpenteava ao seu lado presente de uma cirurgia recente.
Alexander verificou o histórico. Câncer. Quase sempre era câncer.
Isso o satisfez. Tinha aperfeiçoado bem suas habilidades e combater aquelas células vorazes era quase uma segunda natureza para ele.
A mulher estava sentada em uma cadeira dura, adormecida sobre a cama. Seus cabelos loiros e curtos estavam despenteados, como se não o penteasse há dias e um brilhante rubor avermelhava suas bochechas.
Alexander pressionou a mão contra sua testa, sentindo o calor de sua febre alcançar seu braço. Tinha passado bastante tempo ao lado do homem para também adoecer um pouco, provavelmente porque não esteve cuidando de si mesma.
Por um momento, Alexander duvidou que ela fosse uma boa candidata, mas rejeitou isso no mesmo momento. Alguém que se dedicava a amar a alguém até o ponto de sacrificar-se ia ser uma valiosa adição para seus planos.
A mulher se mexeu ante seu contato, despertando. Olhou-o com seus grandes olhos castanhos e afastou sua mão.
— Está doente. — disse em voz baixa.
Ela piscou algumas vezes e passou as mãos pelos cabelos como se quisesse arrumá-los.
Alexander reprimiu um sorriso conhecedor. Os de sua espécie eram atraentes e sempre pareciam ter efeito sobre os humanos. Era uma pena que tivessem passado décadas desde que Alexander havia sentido a necessidade imediata de ter sexo. Estava muito faminto para pensar muito nisso, e muito fraco para agir mesmo que o pensamento cruzasse sua mente.
— Estou bem. — disse ela. — Como está papai?
Ah, assim aquele era seu pai. E ela pensava que ele era um médico.
Alexander manteve a falsa premissa e olhou enigmático para seu pai. Sabia bastante a respeito da medicina humana para ver o padrão da morte pendurando por todo aquele homem.
— Está fraco. Morrendo.
O aroma da dor se tornou forte, quase sufocando Alexander. Este era um aroma enjoativo, como os das velhas pétalas de uma flor a ponto de decair.
— Não há nada que possa fazer?
Essa era sua oportunidade, dada a grande facilidade que quase retrocedeu antes de aceitá-la.
— Qual é seu nome? — perguntou ele.
— Meghan Clark. — As lágrimas fizeram suas palavras tremerem em desespero.
— Meghan. — repetiu ele, usando o poder de seu nome para atrair sua atenção para ele. — Há uma coisa que sei que talvez funcione, mas você não vai querer fazê-la.
Nunca o faziam. No início.
— Algo experimental? Se ele está morrendo, o que poderia ser perigoso para ele?
— Isto não é perigoso para ele. — disse Alexander, cobrindo suas palavras com uma indireta do que ele estava escondendo, desespero. Fome.
Meghan se reclinou em sua cadeira, pondo mais espaço entre ambos. Seus olhos voaram para o botão da enfermeira, mas este estava do outro lado da cama, bem fora de seu alcance.
— Quem é você?
— Tudo o que precisa saber é o que posso oferecer: esperança.
Sua garganta se moveu quando ela engoliu nervosamente, e os olhos de Alexander deslizaram ao longo da coluna de carne, osso e sangue. Podia ver seu pulso pulsando, seu coração bombeando o sangue através de suas veias.
Seu estômago se contraiu dolorosamente, e teve que apertar os dentes para manter a compostura e não saltar sobre ela. Alimentar-se dela até que só restasse uma bonita e feminina casca vazia.
Isso não o levaria a lugar algum, a longo prazo. Descendo por esse caminho de fome.
— Que tipo de esperança?
— Ofereço a você uma troca. Eu posso salvar seu pai, em troca, quero algo de você.
— Você não é médico, não é mesmo?
— Não. Como você os conhece, não.
Ela se levantou lentamente, endireitando a coluna e movendo-se de forma que ele já não pudesse ver seu pai.
A pequena Meghan Clark — que mal chegava ao seu ombro, a quem poderia matar com um simples pensamento — estava protegendo seu pai.
O humor da situação o fez sorrir, mas não tentou descobrir suas presas. Não queria que ela armasse uma cena.
— Não vou deixar que toque nele. — disse ela.
— Como poderei curá-lo se não puder tocá-lo?
— Não acredito que possa. Não sei que tipo de brincadeira doentia está jogando, mas quero que vá embora. — balançou-se um pouco sobre os pés.
Talvez a febre e o cansaço estivessem lhe cobrando um preço mais alto do que ele tinha pensado.
— Relaxe. — disse ele, imbuindo a palavra com o restante de seu poder decadente.
Meghan Clark cambaleou e Alexander a segurou antes que pudesse cair. O calor de sua pele entrou nele, fazendo-o tremer. Ele estava frio o tempo todo, mesmo quando se alimentava. Acostumou-se tanto a isso que tinha esquecido o que era estar quente.
— Não vou machucar você ou seu pai. Simplesmente estou oferecendo um acordo.
— Que tipo de acordo?
— Salvarei a vida dele em troca de outra.
Seus olhos se arregalaram e ela lutou contra seu agarre. Alexander apertou seu agarre, tomando cuidado para não machucá-la.
— Pare de lutar contra mim. — ordenou ele.
— Nunca mataria alguém, nem sequer para salvar meu pai. — a fúria endurecia suas palavras, e quando ela as lançou, ele sentiu cada uma delas.
Estava tão cansado da desconfiança. Tão cansado de lutar por cada pequeno pingo de força que necessitava para sobreviver.
Estava cansado, e ponto. Talvez fosse hora de ir dormir nas câmaras debaixo de Dabyr, deixar que outro ocupasse seu lugar, só durante alguns anos. Não que houvesse algum de sua espécie a quem deixar que tivesse o nível de habilidades que ele tinha.
Se fosse dormir, certamente nunca voltaria a despertar. O fato de ter que decidir se essa era ou não sua melhor opção o assustava.
— Não estou pedindo a você que mate ninguém. Tudo o que quero de você é que faça uma viagem. Que vá para Minnesota.
Ela parou de lutar e o olhou como se ele estivesse louco.
— Minnesota? Não entendo.
— Lá há um homem. Se eu curar seu pai, então quero que vá para lá. Para se encontrar com ele.
Seus olhos se entrecerraram de suspeita.
— Por quê?
Porque ele era o homem cujo sangue melhor se misturaria com o dela. Ele era o homem que Alexander queria que gerasse seus filhos. É óbvio, dizer isso só a assustaria. Tinha aprendido isso da maneira mais difícil.
Tynan preferia uma aproximação mais direta, mas Alexander preferia a sutileza. Gostava de deixar que as pessoas pensassem que não estavam sendo manipuladas. Acreditava que isto tornava os vínculos entre eles mais fortes, mais puros — o sangue de seus filhos mais rico.
— Importa o porquê? — perguntou ele. — Tudo o que quero de você é este pequeno favor. É pedir muito em troca da vida de seu pai?
Meghan sacudiu a cabeça.
— Não sei nada sobre isto. Provavelmente é algum tipo de sonho induzido pela febre.
— Então que mal há em aceitar? Se seu pai não se recuperar, você não me deverá nada.
Ela se soltou de seu agarre e ele a deixou ir, mantendo uma mão em seu cotovelo para o caso dela começar a cair outra vez. Ela virou a cabeça e ficou olhando a forma enferma de seu pai.
— Isso é tudo? Só tenho que fazer uma viagem se… Quando ele ficar melhor?
— Isso é tudo.
Meghan levantou os olhos outra vez para Alexander e lhe deu um leve assentimento.
— Está bem. Trato feito.
O poder de sua promessa se vinculou ao redor dele, lhe dando esperança que era quase cálida, não o suficiente.
— Há mais uma coisa. — disse ele.
— O quê?
Alexander a segurou em seus braços e ativou sua magia, vendo a tênue e luz azul cruzar seu rosto — um brilho que vinha de seus próprios olhos. Enrolá-la foi bastante fácil; custou-lhe apenas energia, o qual era bom, considerando que tinha tão pouca.
— Vou precisar de um pouco de seu sangue.
— Sangue? — perguntou ela em um tênue sussurro.
Ela estava mais a frente do medo agora, flutuando em um leve transe onde as inibições normais não significavam nada.
— Só um pouco. — disse ele, baixando a boca para seu pescoço frágil. — Só o suficiente para afugentar sua enfermidade. Preciso de você bem e saudável para sua viagem.
Nika vagou pelos corredores de Dabyr, seguindo o fraco vestígio de poder deixado pelo rastro de Madoc.
Ele a estava evitando, mas não se importava. Precisava dele. Era a única coisa que mantinha o Sgath longe de seu caminho, fora de seu corpo. Certamente não a deixaria sem ao menos lhe dizer adeus.
Então, novamente, talvez não houvesse dito com sua voz o quanto precisava dele. Algumas vezes misturava as coisas que dizia com aquelas que pensava, assim não podia ter certeza.
Onde ele estava? Precisava encontrá-lo antes que fosse muito tarde e ele a deixasse sozinha.
Nika não queria ficar essa noite com o Sgath; não queria que eles a arrancassem de seu corpo e a jogassem na escuridão. Toda vez que ficava com eles a faziam adoecer, e não queria vomitar a comida que tinha conseguido ingerir antes. Queria ficar forte, saudável, como sua irmã Andra.
Essa era a única maneira de ir encontrar sua irmã, Tori. A verdadeira Tori, não aqueles estranhos ossos que Andra tinha enterrado.
Mas a saúde e a força estavam longe dela. Seu corpo era frágil, seus ossos débeis. Levaria tempo para reconstituir sua força, e o único momento em que isso era possível era quando Madoc estava lá para afastar as coisas sombrias o bastante para que ela pudesse comer.
Uma onda de fraqueza a golpeou e ela cambaleou batendo na parede. O Sgath caçando lá fora puxava sua mente, agarrando-a, ameaçando despedaçá-la em pequenos pedaços sangrentos. Queriam que fosse caçar com eles, para alimentar-se da carne e sangue de quantos humanos encontrassem.
Costumava utilizá-la para se comunicarem uns com os outros. Tinha certeza disso.
Havia menos deles agora, graças a Madoc e aos outros Theronai, que tinham feito a caça deles sua principal prioridade. Mas os Sgaths que restavam eram os mais fortes. Mais inteligentes. Mais altos. Tinha dificuldades para resistir a sua chamada.
Nika não podia suportar a ideia de ir com eles naquela noite. Precisava de Madoc, assim impeliu-se a seguir a pulsante corrente de poder que ele tinha deixado para trás quando ele vagava pelos corredores silenciosos de Dabyr.
O rastro acabou em uma porta igual a todas as outras portas daquele corredor. Nika girou a maçaneta, encontrando-a sem chave e empurrou abrindo-a.
A suíte estava escura, mas um retângulo de luz bruxuleante brilhava sobre o tapete, caindo da porta aberta de um dos quartos.
O rastro de Madoc conduzia ali, assim que o seguiu entrando na luz.
Uma enorme cama enchia o quarto, e sobre esta estava um homem enorme. Era bonito de uma forma áspera, e uma barba de vários dias escurecia sua mandíbula. Uma bandagem cobria suas têmporas e vários ferimentos marcavam seu rosto com verdes e amarelos doentios. Suas mãos eram enormes, estendidas aos lados, e Sibyl estava sentada perto da cama com sua mão diminuta envolvendo dois dedos grossos do homem. Em seu outro braço, carregava uma boneca de porcelana que se parecia com ela, usando um belo laço azul em seus cabelos.
Os olhos de vidro preto da boneca se abriram e olharam para Nika. A malevolência flutuou daquela coisa, fazendo que Nika desse um vacilante passo para trás.
Um segundo depois, Sibyl levantou os olhos lentamente. Seus cachos loiros deslizavam sobre seus ombros e uma leve sombra obscurecia seus brilhantes olhos azuis. Estava assustada.
A menina não mostrou surpresa ante a chegada de Nika, como se a tivesse esperando todo o tempo.
— Venha sentar-se comigo. — disse Sibyl.
Nika hesitou. Madoc não estava ali. Podia sentir o vazio daquele lugar sem ele, e a necessidade de procurá-lo se tornava mais forte a cada passo que dava.
Contudo, ele esteve ali. Talvez aquele homem fosse importante para ele. Talvez fossem amigos.
— Quem é ele? — perguntou Nika.
A voz de Sibyl se partiu como se não a tivesse utilizado durante dias.
— Cain. Meu guarda-costas.
— Está doente? — perguntou.
— Foi ferido na noite em que me raptaram. Os Sanguinar fizeram tudo o que podiam.
— Andra me disse que você podia ver o futuro. Não sabia que isto ia acontecer?
A dor estrangulava suas palavras, fazendo que se descolorissem quando saíram.
— Não a Cain. E foi por isso que eu permiti que ele entrasse em minha vida. Ele era… Tranquilo.
As pernas fracas de Nika começaram a tremer de fraqueza agora que já não estava caminhando. Avançou e se deixou cair sobre a cama, procurando não tocar no homem deitado ali. Não podia suportar o contato de nenhum outro homem exceto Madoc.
— Ele esteve antes aqui, vendo Cain. — disse Sibyl, como se lesse sua mente. —Acabou de partir para caçar.
— Disse quando voltaria?
— Não.
Durante um breve instante, Nika pensou em perguntar a vidente quando ele voltaria para casa, mas pôs a ideia de lado. Ficou claro que Sibyl estava sofrendo, padecendo pelo homem deitado na cama.
Nika ia ter que responder a chamada dos sgath e encontrar Madoc ela mesma.
— Há quanto tempo está assim? — perguntou a menina.
— Quase duas semanas. Fica mais fraco a cada dia. Não consigo parar isso.
— Você pensa que deveria ser capaz de parar isso?
Sibyl deu de ombros, mudando a boneca em seus braços. A coisa ainda contemplava Nika, e seu estômago revirou.
— Se estivesse com alguém mais, sei que o faria, mesmo se soubesse que era hora de deixá-lo ir.
— Você acha que isso é o que ele quereria? O que o deixasse ir?
— No fundo Cain é um lutador. Não suportaria me ver sofrer. É um bom homem. — as lágrimas flutuaram nos olhos de Sibyl durante um breve segundo antes de desaparecer.
— Quer que eu pergunte?
Sibyl inclinou a cabeça e durante um segundo, Nika pensou ver os olhos da boneca entrecerrar-se. Outro truque de sua mente, não havia dúvida.
— Como faria isso? — perguntou Sibyl.
Nika baixou os olhos para o homem deitado, vendo o poder que uma vez tinha tido em seus fortes membros e peito amplo. Mesmo inconsciente, tinha um ar de força nele que diminuía a energia vespertina de Nika.
Lá fora havia tantas coisas aterrorizantes, e necessitavam de todos os guerreiros que pudessem encontrar para lutar contra elas. Se houvesse uma chance de que Nika pudesse ajudar, tinha que tentar.
— Só tenho que abandonar meu corpo e entrar no dele.
— Pode fazer isso?
Nika assentiu.
— Acredito que sim. Quer que tente?
— É seguro?
Para Cain, sim. Para Nika… Não havia como ter certeza. Toda vez que deixava seu corpo havia uma chance de que não pudesse voltar atrás, mas isso era a única coisa que ela enfrentaria. Se sua casca morresse, procuraria Madoc e se tornaria parte dele. Não teria que se afastar nunca mais dele, mesmo se ele não soubesse que ela estava ali.
— É seguro. — disse Nika.
Sibyl segurou a boneca com mais força e lhe deu um simples assentimento.
— Quer que lhe diga algo?
A menina pequena mordeu o lábio como se existisse uma grande lista e estivesse escolhendo o que era mais importante.
— Diga que eu preciso dele. — engoliu em seco e olhou Nika nos olhos. O medo surgiu em seus brilhantes olhos, fazendo-os brilhar. — Diga a ele que não quero ficar sozinha.
Nesse momento, Nika percebeu que tinha muito mais em comum com aquela menina do que tinha com qualquer outra pessoa, incluindo sua irmã. Talvez essa fosse uma triste análise sobre a vida excessivamente complicada de Nika, mas ao mesmo tempo, ia fazer tudo que pudesse para aliviar os medos de Sibyl.
Nika se deitou ao lado de Cain, estendendo seu corpo ao lado do dele. Sentia-se tão pequena perto dele, como se pudesse afundar nos cobertores e ninguém notar sua falta.
Cerrando os dentes, Nika entrelaçou os dedos com os de Cain. Seu estômago se rebelou ante o toque, mas engoliu até que teve certeza que sua comida ficaria no seu lugar. Se quisesse ficar melhor, teria que aprender a se controlar. Aquele era um lugar tão bom quanto qualquer outro para começar.
Nika fechou os olhos e se transportou deslizando através de seu braço para entrar no de Cain. Era assustadoramente fácil como seu espírito deixava sua casca, como se esse desejasse a chance de ser libertado daquele fraco saco de pele que o prendia.
Atravessou como um raio o músculo poderoso e a solida ossatura até que pôde deslizar seu espírito dentro da mente de Cain.
Estava preso em um pesadelo. Nika esqueceu porque estava ali ao enfrentar tanto sangue e dor. Viu Cain cair sob os golpes de três diferentes espécies de demônios. Seu enorme corpo voou através do quarto como se fosse uma boneca de pano. O sangue cobriu as paredes, gotejando como galões de tinta. De forma alguma ele poderia ter sobrevivido a isso, mas aparentemente, tinha feito. Ou talvez isso não fosse o que tinha acontecido com ele, e sim algo que sua mente havia feito para repetir uma e outra vez dentro de seus sonhos.
Os gritos de uma menina ecoavam em sua cabeça, tornando-se mais fracos a cada segundo.
— Sibyl!
A palavra ressoou, agitando o espírito de Nika com sua ferocidade.
Ele imaginava que isso era o que estava acontecendo com ela. Ele a via sendo despedaçada por oleosas garras negras. Via os focinhos sangrentos dos Sgath quando se alimentavam de suas vísceras. Via suas potentes mandíbulas rasgando os membros de seu corpo enquanto se afastavam correndo para limpar a comida de seus ossos iguais a cães.
A Sibyl não tinha acontecido nada disso, mas Cain não sabia.
— Ela está a salvo. — disse Nika, esperando acalmar a massa de imagens que faiscavam em sua cabeça.
Uma consciência poderosa se apressou em sua direção e ela pôde ouvir seus pensamentos pulsando através de sua frágil essência, ameaçando destroçá-la.
— Quem é?
— Nika. Sibyl me enviou.
— Sibyl está morta.
— Não. Ela está com você agora. Sustentando sua mão. Não pode senti-la?
Imagens do corpo esquartejado de Sibyl e os olhos azuis sem vida se levantaram, empurrando Nika até que quase a expulsaram de sua mente.
— Parem! — ordenou, lançando tanta força de vontade quanto podia em sua ordem.
As imagens se detiveram, e a mente de Cain se acalmou. Um vislumbre de esperança floresceu dentro dele, a cor da primavera nascente. O aroma do solo fresco e rico cultivado novamente flutuou pelo ar ao seu redor, embora não tivesse ideia de como podia ver sem olhos ou cheirar sem nariz.
— Está viva? — perguntou.
— Pediu-me que desse um recado a você. Precisa de você. Não quer ficar sozinha.
— Sozinha. — a palavra brilhou com emoção. Culpa, mais do que qualquer coisa. — Deixei-a sozinha.
— Volte para ela. — disse Nika. — Não a deixe sofrer mais.
A paisagem mudou, e de repente Cain estava de pé ante ela. Nika não percebeu até então que tinha construído uma forma física para sua consciência. Parecida como ela, ou ao menos como pensava que deveria ser. Seus cabelos eram pretos e seu corpo forte e ágil, não magro e debilitado.
— Quem é você? —perguntou a ela.
— Nika.
Ele avançou e a terra sob seus pés se encheu com relva macia, com flores florescendo. O ar estava quente e flutuava ao redor de seus tornozelos.
Havia feito isso para ela, mudado a composição de modo que se sentisse mais confortável. Nika podia sentir sua necessidade inata de zelar por seu conforto, embora não tivesse ideia do por que ele se importava.
— Nika. — repetiu ele. — Pode me ajudar?
— Ajudar você a fazer o quê?
— Conseguir voltar para Sibyl. Não sei como encontrá-la.
Nika assentiu.
— Pegue minha mão.
Preparou a si mesma para o toque, fortalecendo-se contra a sensação desagradável sobre sua pele. Mas isso não aconteceu. Ele segurou sua mão e não doeu.
— Siga-me. — disse ela. Não tinha certeza do que estava fazendo, mas seus instintos eram fortes, assim os escutou. — Feche os olhos.
Cain fez isso, e Nika saltou, levando-o com ela. Conduziu-o para fora das partes mais profundas de sua mente, para a superfície. Quanto mais longe iam, mais difícil se tornava, mas Nika continuou puxando.
À distância, podia ver a superfície brilhante de sua consciência, como se estivesse olhando do fundo de uma piscina. Viu Sibyl sentada ao lado de Cain, e sua própria forma esquelética deitada perto dele. A boneca de Sibyl ainda a observava, como se pudesse ver seu espírito deslizando pelo corpo de Cain.
Talvez pudesse.
O cansaço a arrastou, igual a garras ao redor de seus tornozelos, puxando-a para baixo. Nika deu um chute rápido, e finalmente, a cabeça de Cain rompeu a superfície.
Ouviu sua respiração ofegante, sentiu seu poderoso corpo estremecer enquanto ofegava por ar. Mas ali não havia nada para ela. Nika ainda tinha que encontrar o modo de retornar ao seu próprio corpo, e essa era uma longa viagem.
Tão cansada como estava, tão rápido quanto suas forças estavam sumindo, não tinha certeza de que fosse capaz de fazer toda a viagem.
Ao menos tinha despertado Cain e o havia devolvido a Sibyl.
Madoc não podia livrar-se da urgente necessidade de voltar para Cain. Esteve lá há apenas alguns minutos, mas tudo dentro dele gritava que voltasse.
Talvez seu amigo tivesse piorado.
A dor agarrou Madoc pela garganta e ele lutou para respirar enquanto os passos de suas pesadas botas ecoavam pelos corredores. Recordou o amor por seu irmão, mesmo que já não pudesse sentir como corria para ele, dando-lhe forças. Tudo o que sentia agora era medo de perderem um grande guerreiro.
Ele empurrou a porta da nova suíte de Cain, abrindo-a e atravessou a sala de estar escura, indo para seu quarto. Ele não era um grande fã de Sibyl, mas suportaria o olhar arrepiante da menina estranha o suficiente para dar uma olhada no amigo.
A primeira coisa que viu foi que Cain estava acordado. Estava sentado na cama e os braços magros de Sibyl rodeavam seu pescoço em um apertado abraço. O homem a abraçou durante um único segundo, antes de soltar delicadamente suas mãos.
A segunda coisa que viu foi o doentio olhar de medo nos traços austeros de Cain. E já que Madoc não conseguia se lembra da última vez que tinha visto Cain assustado, deixou-o alucinado.
Por uma boa razão.
Nika estava em sua cama. Deitada perto do filho da puta. Estava branca como o gelo e o mais estranho de todos os modos, era que sua mão esquerda estava vermelha e com bolhas.
A raiva se estilhaçou dentro de Madoc, golpeando suas costelas até que ele teve certeza que se quebrariam. Não podia perdê-la. Tinha lutado muito para libertá-la de cada Sgath sobre o qual podia pôr as mãos em cima, e seguro como o inferno que não havia feito isso para que ela pudesse morrer agora sobre ele.
— O que fez a ela? — sua voz saiu cortante e fria.
Os olhos verdes de Cain encontraram os de Madoc e se arregalaram. Ele tentou falar, mas não saiu nada. O homem esteve inconsciente durante dias e sua garganta era igual a um rolo de papel de lixa.
— Ele não fez nada. — disse Sibyl. — Nika se ofereceu para ajudar.
Ela subiu na cama e deu um copo de água para ele.
— Ajudar? Como? Mal é forte o suficiente para manter a si mesma.
Madoc foi para o lado de Nika e pressionou os dedos contra seu pequeno pescoço. Um pulso fraco pulsava sob a superfície de pele magra como o papel.
Estava viva.
Queria sentir alívio, mas tudo o que sentia era a necessidade de esmurrar Cain com os punhos até que ela despertasse.
Mas isso também não ajudava.
Madoc tinha medo de tocá-la mais do que o necessário. Ela era tão frágil. Quebrável. Mas o impulso de sentir o calor de sua pele sob seus dedos era demais para resistir. Afastou os cabelos brancos de seu rosto, mostrando as finas linhas azuis de suas veias que corriam ao longo de suas têmporas.
— Ela me trouxe de volta. — sussurrou Cain. Sua voz eram partes rasgadas de som, mas conseguiu para manter seu ponto. — Senti que se tornava mais fraca. Empurrou-me para a superfície e afundou de novo. Tentei segurá-la, mas já se foi.
Foi.
Essa palavra ecoou na cabeça de Madoc como um disparo de canhão.
Foi.
De nenhuma maldita maneira.
— Saiam daqui. — vociferou ele.
Cain deu um estranho olhar para ele, mas deslizou para fora da cama, colocando seu corpo entre Madoc e Sibyl quando a conduziu para fora do quarto. Arrastava os pés, mal era capaz de sustentar-se, mas isso foi apenas muito ruim. Ele mereceu por fazer aquilo a Nika.
A porta se fechou atrás deles com um clique, deixando-o só no quarto com Nika.
Madoc queria tomá-la em seus braços, mas não se atreveu. Estava tremendo tanto que certamente a quebraria.
— Nika. Acorde.
Ela tomou uma respiração, mas isso foi tudo.
— Maldição, Nika. — sua voz soou muito alta no quarto silencioso. Muito dura. Contudo, não podia se controlar. Estava muito desesperado para corrigir isso. Para fazer que ficasse bem. Envolvê-la e mantê-la a salvo pela eternidade. — Acorde merda!
Suas pálpebras vibraram e Madoc conteve a respiração. Lentamente, seus olhos se abriram, revelando o céu azul claro de inverno. Tão malditamente bonitos que partiu seu coração.
— Voltou. — disse ela em um débil sopro de ar.
— Nunca fui. — embora tivesse estado a ponto de ir.
Quanto menos estivesse ao redor dela, melhor. Desejava-a muito para continuar resistindo a ela, especialmente quando despertava com ela sobre ele, como se fosse um cobertor quente e vivo.
— Cain está bem?
— Malditamente bem. Em que diabos estava pensando, usando um truque como esse? Enfiando-se na cama de outro homem?
— Sibyl necessitava dele.
Uma frase tão simples, mas dizia muito dela para a paz mental de Madoc. Nika não parou para pensar no que lhe custaria fazer o que porra ela tivesse feito. Sibyl precisava de Cain, portanto Nika o tinha despertado.
Quem mais ia necessitar de algo que talvez conseguisse matá-la?
Seus dedos ossudos se fecharam ao redor do pulso dele e ela puxou seu braço para o peito. Seus seios eram pequenos, quase inexistentes, mas ele os sentiu do mesmo jeito, suaves e quentes contra seu antebraço.
O sangue se reuniu em seu membro, fazendo que ele inchasse e palpitasse. Não deveria ter se excitado por aquela figura esquelética de menina, mas o tinha feito. Não importava com quanta força tentasse, não podia tirá-la da cabeça.
Talvez se ele tomasse o que inconscientemente ela lhe oferecia e desse uma agradável e dura cavalgada nela, conseguisse tirá-la de seu sistema.
Sim, e talvez também a matasse no processo. Não era um homem delicado. Se transasse com ela, ela sentiria. E depois os outros.
Era malditamente frágil. Não tinha nada que fazer tão perto, deixar que ela o tocasse.
— Não quero que saia outra vez com algo como isso, entendeu?
Nika não respondeu. Adormeceu, sua respiração profunda e suave. Era um sono natural. Pobre menina, esgotou-se salvando Cain.
Madoc lhe devia uma por isso. Todos os Theronai deviam. Precisavam de todos os guerreiros que tivessem, e Cain era um dos melhores.
E por que Madoc devia a ela por seu sacrifício, libertou o pulso de apertão dela, virou-se e saiu do quarto sem olhar para trás.
Quanto mais longe dela se mantivesse, mais segura ela estaria. Tudo o que ela precisava dele era o sangue de um Sgath em sua espada, tantos e com tanta frequência quanto fosse possível.
Era hora de ir caçar.
— E agora? — perguntou Lexi.
Tanto Zach como Joseph estavam olhando para ela como se esperassem que fizesse algum número de circo.
— Agora você nos contará tudo o que souber sobre estes Defensores. — disse Joseph.
Poderia jurar que não confiava nela pela rigidez de seus ombros e o brilho frio de seus olhos cor avelã, não importando o quanto Logan tivesse garantido isso.
Bem. Não precisava sua confiança. Enquanto Zach acreditasse nela, seria mais que suficiente.
Lexi deixou escapar um forte suspiro.
— Não sei muito mais além do fato de quererem se desfazer dos Sentinelas.
— São dorjan. — afirmou Joseph com uma retorcida careta de asco.
— O que é um dorjan?
A boca de Zach parecia tensa quando falou.
— São humanos que trabalham para os Synestryn em troca de algo que desejam. Dinheiro, poder... Esse tipo de coisas.
Lexi negou com a cabeça.
— Eles não parecem esse tipo de pessoas. Sabem a respeito dos Synestryn, mas com certeza que não trabalham para eles.
Joseph deixou escapar um bufo de incredulidade.
— E por que iam querer nos matar a menos que estivessem trabalhando para os Synestryn?
— Porque destruíram suas terras com suas batalhas. Não voltará a crescer nada naquelas terras banhadas de sangue por sua guerra. Eles sabem que não são fortes o suficiente para enfrentar seus mascotes assim acreditam que se vocês, os Sentinelas, se forem então os Synestryn irão também e a terra voltará a ser um lugar seguro.
Ambos os homens a olharam como se necessitasse de uma camisa de força.
Zach se recuperou primeiro.
— Está nos dizendo que esses Defensores realmente acreditam que os Synestryn irão embora se não restar nenhum de nós para mantê-los sob controle.
— Sim. — olhou de um homem para o outro, sentindo-se mais e mais desconfortável pelo seu silêncio. — O quê? Estão equivocados?
— Estão totalmente equivocados. — disse Joseph. — Não são nossos mascotes. Não podemos controlá-los. Se nós desaparecermos, não restará nada que impeça os Synestryn de invadir o planeta. Converterão tudo em uma gigantesca fazenda e sangrarão todos os humanos para se alimentarem.
— Oh. — isso não parecia bom. — Temos que dizer aos Defensores o quanto estão equivocados.
Zach negou com a cabeça.
— Os homens como eles não escutam. Tentamos no passado com outros grupos. Normalmente, com o tempo, desaparecem até que alguém encontra casualmente um diário com os desvarios de algum louco.
Um diário como o de sua mãe. Lexi fez uma careta de dor quando a dolorosa verdade a golpeou. Sua mãe foi uma daquelas lunáticas e tinha educado Lexi para seguir seus passos. Não tinha visto isso com seus próprios olhos, mas ela ainda estaria convencida de que aqueles homens eram o mal encarnado.
— Que mais sabe sobre eles? — perguntou Joseph.
— São liderados por um homem chamado Héctor Morrow. Ele vive no norte de Dallas. Sua filha foi assassinada há anos e ele culpa vocês.
— Como o conheceu? — perguntou Zach.
— Minha mãe ficou com ele às vezes enquanto eu estava crescendo. Quando ficávamos sem dinheiro ou ela pensava que os monstros nos espreitavam. Ele nos acolhia e dava trabalho à mamãe, e ficávamos durante algumas semanas. O suficiente para voltar para a estrada.
Omitiu a parte sobre as lições que Héctor dava as crianças que estavam em sua esfera de influência. Aquele homem tinha lhe provocado mais pesadelos com as histórias da morte de sua filha do que nenhum monstro de verdade jamais tinha feito. A única coisa que aprendeu com ele foi que, se não se comportasse bem, os monstros a encontrariam e a comeriam. Se fosse má, morreria gritando de dor, como sua filha tinha feito.
— Ele pediu que você fizesse algo mais? — perguntou Joseph.
—Quer dizer além de mandar seu recinto a merda? Não. Não que eu me lembre.
Olhou de um home ao outro. Joseph estava do outro lado do quarto, com um de seus maciços ombros apoiado contra a parede. Zach estava sentado na cama com ela, com seu corpo entre eles. Lexi estava mais que certa de que não era por acaso.
Claramente Zach ainda não confiava na presença de Joseph perto dela.
Uma estranha sensação de paz desabrochou em seu interior. Zach estava lhe protegendo. Ninguém tinha se preocupado tanto com ela para protegê-la desde que sua mãe tinha morrido. Era agradável sentir isso de novo. Um consolo.
Lexi não ia fazê-lo se arrepender por esse presente. Ia ficar em pé e fazer o que fosse necessário para corrigir isso.
— Preciso ir procurar o C-4 e tirá-lo daqui para que não ocorra nada de ruim por acidente.
Joseph apertou a mandíbula.
— Não vai se aproximar daqueles explosivos, garota. Tenho um homem cuidando disso.
—Um que sabe lidar com explosivos?
Ele elevou uma sobrancelha escura e zombadora.
— Vivemos vários séculos. Acredito que sabemos manejá-los.
— É algo relativamente seguro desde que os detonadores não estejam conectados. Coisa que não estão.
— Como você ia iniciar o dispositivo? — perguntou Zach.
— Um temporizador. Teria dez minutos para sair daqui. — disse Lexi, sentindo-se mais e mais culpada enquanto revelava seus planos.
— E se não fosse suficiente? — perguntou Joseph.
Lexi deu de ombros, mas suas articulações ainda pareciam enferrujadas e rígidas. Fosse o que fosse que Logan tinha feito com ela ainda não havia se dissipado.
— Acredito que teria tido que me ver com o restante de vocês.
Zach amaldiçoou, cuspindo uma palavra violenta. Joseph mal o olhou.
— Teria morrido? Voluntariamente?
— Não era minha primeira escolha, não, mas estava cansada de fugir. Cansada de ter medo o tempo todo.
Zach pegou sua mão e a envolveu entre as suas, esquentando seus dedos frios.
— Não precisa fugir nunca mais.
Lexi olhou para Joseph.
— Não tenho certeza disso, Zach. Parece-me que seu audaz líder aqui presente prefere que eu volte para a estrada.
— E uma merda. — disse Zach.
— Não vai a lugar nenhum. — ordenou Joseph. — Quero-a exatamente onde possa ter um olho sobre você.
— Então agora sou uma prisioneira? — perguntou ela.
O rosto moreno de Zach se endureceu com um cenho pétreo ao olhar para Joseph.
— Não é, não é mesmo?
— Não quero que ela abandone o recinto. Não quero que faça nenhuma ligação. Está claro?
— Tenho que ligar para os Defensores para que saibam que vocês são os mocinhos.
Joseph se separou da parede com um empurrão enganosamente preguiçoso.
— Isso não vai acontecer. Deixemos que pensem que a descobrimos e a matamos.
— Tentarão de novo. Alguém precisa convencê-los de que não são os monstros que eles pensam.
Joseph negou com a cabeça.
— Não há como raciocinar com homens como eles. Deixaremos que tentem de novo. Estaremos preparados.
— O que você vai fazer? — perguntou Zach.
Os ombros de Joseph pareceram se curvar ligeiramente como se alguém tivesse colocado um peso sobre eles.
— A única coisa que podemos fazer. Eliminar a ameaça.
Zach se levantou da cama tão rápido que pareceu ter sido lançado por uma catapulta.
— Não pretende matá-los, não é? — perguntou com incredulidade.
— Quando não eram mais que um incomodo, cruzando nosso caminho? Não. Mas agora? — negou com a cabeça com pesar, embora seus olhos fossem duros como rocha. — Pretendem matar a todos nós. Querem matar as crianças. E tentarão de novo. Não posso deixar que esse crime fique sem resposta.
— Não pode se usar de represálias, Joseph. São humanos.
— Não posso deixar que isso me importe. Nunca mais. Isto é um ato de guerra. Vou me certificar que não ocorra de novo.
Os olhos de Joseph se voltaram para Lexi e ela sentiu um calafrio percorrer suas costas. Não havia misericórdia dentro daquele homem. Não havia compaixão.
— Quero uma lista de nomes. De todas as pessoas que conheça que sejam relacionadas com os Defensores.
— Não darei isso a você. — disse a ele. — Não ajudarei a matá-los. Estão errados, mas isso não significa que não possamos arrumar as coisas. Traga-os para cá, deixe que eles vejam o que eu vi e eles entenderão.
— É muito tarde para isso. Você me dará a lista.
— Não, não darei.
— Então darei ordens a Logan para que tire a informação de você. — disse Joseph enquanto se virava para sair do quarto. — Não será tão agradável para você, mas será igualmente eficaz.
Lexi ouviu a porta da suíte fechar-se de repente, fazendo-a saltar.
— Nunca o tinha visto assim. — disse Zach.
— Fala sério?
— Cada palavra.
— Onde isso nos deixa? — perguntou.
Zach negou com a cabeça.
— Algo está errado. Ele não é assim. Dê-me alguns minutos para verificar algo e volto em seguida, de acordo?
Lexi assentiu.
— Certamente. Faça o que tiver que fazer.
Ele tomou seu rosto em sua grande mão e Lexi se recostou procurando o contato.
— Estará aqui quando eu voltar, não é mesmo?
— Prometo.
Lexi sentiu o peso da promessa abatendo-se sobre ela, fixando-a a cama.
— Descanse um pouco. Serei rápido. Ligue para mim em meu celular se precisar de mim.
Com isso, se foi. Lexi não tinha certeza do que ele ia fazer, mas se havia algo de que tinha bastante certeza era de que não queria saber de nada.
Quando Zach encontrou Drake, ele estava lá fora ajudando Helen a reparar uma parte quebrada do muro. Helen estava ajoelhada no chão, suas mãos esbeltas em uma pedra do tamanho de sua cabeça. Os dedos de Drake rodeavam sua nuca, claramente visíveis entre as duas tranças que prendiam seus cabelos escuros. Cabelos da mesma cor castanha suave que os de Lexi, agora que já não os tingia.
Zach estava ansioso para voltar para o lado de Lexi e confortá-la, certificar-se que ela soubesse que seu erro não era algo imperdoável, mas ainda não podia fazer isso. Não até que soubesse com certeza que seu líder estava em seu juízo perfeito.
Um sutil zumbido de poder vibrou no ar em torno de Drake e Helen quando ela verteu uma corrente de magia protetora dentro da rocha, fortalecendo-a contra ataques. O suor escorria de sua testa, e as costas de sua camiseta vermelha estava escura e se grudava a sua coluna.
Zach parou de andar a alguns metros e os olhou. Ele tinha sua dama, sua Lexi, mas não tinha o mesmo que Drake: sua união, sua conexão.
Lexi disse que confiava nele, mas ainda não o suficiente para permitir que ele se aproximasse o suficiente para completar seu propósito. Não para deixar que ele visse seus pensamentos ou conhecesse seus sentimentos. Mesmo depois de Logan ter aberto passagem, quando Zach quis alcançá-la, tudo o que sentiu foi uma parede fria e dura. Não havia calor de vida, nem boas-vindas.
Talvez sua educação tivesse deixado cicatrizes, e eles nunca teriam o mesmo que Drake e Helen.
Quando uma ponta de dor cresceu em seu interior, Zach a afastou. Negava-se a deixar as coisas assim. Teriam uma vida plena. Ambos mereciam isso. Especialmente Lexi, depois de tudo o que tinha sofrido. Merecia um lar e uma família, e Zach queria ser tudo isso para ela. Sempre.
Amava-a muito para não lutar por algo que sabia que podiam ter juntos. Ela era tudo o que ele sempre quis, e ele ia fazer o que fosse preciso para fazê-la feliz.
Tudo o que tinha que fazer era lhe dar tempo para que confiasse nele, para que ele demonstrasse a cada dia que era digno daquele presente. Em algum momento entraria na cabeça teimosa dela e a faria ver o que ele via. Que pertenciam um ao outro.
Mas antes que pudesse voltar para ela e trabalhar em seus planos, tinha um trabalho a fazer. Voltou a andar e foi até Drake.
— Tem um segundo?
Drake devia ter visto algo na expressão de Zach porque o olhar de orgulho e adoração que mantinha enquanto olhava para Helen desapareceu, e tudo o que restou foi sua cara de jogo sério.
— Volto logo. — disse a Helen. — Fique e descanse um minuto.
Ela assentiu e se deitou de lado na relva sem prestar atenção à sujeira ou aos insetos. Aparentemente, reconstruir aquele muro estava cobrando seu preço a ela. Gilda estava desaparecida, e ela era a Thenorai mais forte do recinto.
Angus trabalhava sozinho do lado mais afastado da área de construção, transportando as rochas com sua força bruta. A única coisa que devia manter Gilda longe dele era a exaustão absoluta.
Bem. Isso significava que Angus também podia dar uma mão. Iriam necessitar de toda ajuda que pudessem reunir.
Zach levou Drake naquela direção. Quando Angus os viu se aproximando, deixou a rocha cair, limpou as mãos e se aproximou para receber os dois.
— Algo está errado? — perguntou Angus com voz áspera.
Zach fez um rápido exame para se assegurar de que não havia ninguém nos arredores e falou.
— Sim. Acredito que temos um problema.
Fez uma rápida recapitulação do que tinha acontecido com Lexi e Joseph, assegurando-se de que ambos soubessem sobre a traição dela. A história viria a ser conhecida em breve, e era melhor que eles soubessem por ele antes que os rumores corressem.
— Ele realmente disse que ia matar os Defensores? — perguntou Drake com total incredulidade.
— Sim. — disse Zach. — Tenho medo que Joseph tenha ficado sem tempo.
— Sua marca de vida. — conjeturou Angus, esfregando a mão contra seus rosto anguloso. — Acredita que está vazia.
— Isso explicaria o modo como está agindo com Lexi.
Drake suspirou, seus olhos se sombreando de aflição.
— Temos que averiguar isso. E eu preciso dizer a Helen o que está acontecendo com Lexi. Dê-me dois minutos para lhe explicar as coisas e volto em seguida.
Drake se afastou tranquilamente, como se tivesse todo o tempo do mundo. Ninguém que o visse jamais poderia imaginar o que estava acontecendo.
— Podemos pedir a Nicholas que faça uma verificação com seus olhos eletrônicos. — disse Zach a Angus. — Ou podemos fazer o trabalho nós mesmos. Agora.
Angus pareceu mais velho de repente, mais desgastado. A passagem dos séculos tinha sido indulgente com ele, deixando apenas alguns cabelos grisalhos e rugas. Mas de um segundo para o outro, começou a parecer um homem velho.
— Faremos isso agora. Acalme-se, porque se tivermos que enviá-lo para os Caçadores, então o faremos esta noite antes que alguém saiba.
Enviá-lo para os Caçadores. As leis antigas exigiam que eliminassem qualquer Thenorai que tivesse perdido sua alma. Podiam ser malvados, perigosos. Já que os Caçadores eram os Sentinelas mais antigos, eram os responsáveis pelas leis que criaram. Com uma naturalidade brutal.
Não importava que suas raças tivessem se envolvido em uma guerra estagnada. Não importava que os Caçadores tivessem sido criados com os humanos até chegar ao ponto de já não serem as criaturas temíveis que um dia foram. Tudo o que importava é que se ocupassem das leis.
Se a árvore de Joseph estivesse sem folhas, os Caçadores o executariam.
As pernas de Helen tremiam enquanto ela corria pelos corredores para a nova casa de Lexi. E não só porque estivessem fisicamente exausta.
Lexi tinha planejado matá-los. A sua família. A seu marido.
Helen ainda tinha dificuldades para acreditar nisso. Como podia ter se enganado tanto com a mulher a quem considerava uma amiga?
Bateu na porta de Lexi e, quando ela se abriu, Lexi a olhou com o nariz vermelho e os olhos brilhantes. Esteve chorando, e não tinham sido lágrimas de uma criança, precisamente. Pelo tamanho do maço de lenços de papel ensopados em sua mão, tinham sido grandes lágrimas de culpa.
Todos os pensamentos de Helen sobre estar equivocada com Lexi desapareceram. Quaisquer que tivessem sido as escolhas de Lexi desde que seus caminhos se separaram, estava arrependida delas. Não havia nenhuma dúvida na mente de Helen.
A necessidade de consolá-la cresceu em seu interior e passou os braços ao redor da mulher pequena, segurando-a com força.
Lexi soluçou, sua voz abafada contra o ombro de Helen.
— Disseram a você, não é verdade?
Helen assentiu contra a cabeça de Lexi. Seus cabelos estavam mais escuros agora, mais suaves. Não tinha mais as deslumbrantes pontas loiras. Mas essa era uma boa aparência para ela, mesmo a fazendo parecer mais vulnerável, mais humana.
— Tudo vai ficar bem. — disse Helen.
Lexi se afastou do abraço e Helen a deixou ir à contra gosto, fechando a porta da frente.
— Não tenho certeza disso. Pela maneira que Zach deixou a casa, com tanta pressa, tenho certeza de que nada vai bem. Está acontecendo algo, não é mesmo?
— Vamos sentar. Tomar um chá. Não devemos enfrentar tudo isto sem algumas comodidades básicas, concorda?
Era uma técnica evasiva e Helen sabia; só que ainda não estava preparada para enfrentar o pior. Apesar de ser triste, embora só se conhecessem há poucos meses, Lexi era a amiga mais próxima de Helen sem contar com Drake. Não podia acreditar que tivesse tido tão pouco discernimento para torna-se amiga de alguém que estava disposta a matar inocentes.
Lexi foi em silêncio para a cozinha, procurando para localizar as coisas no novo espaço. Seus movimentos eram desajeitados, e seus dedos tremiam quando puxaram os lenços e lavou as mãos.
— Ia resgatar você. — disse Lexi. — Tinha certeza que tinham lavado seu cérebro para que acreditasse que eles eram bons. Acho que no fim era eu que tinha a cabeça cheia de ideias absurdas, hein?
— Não posso culpar você por agir de acordo com o que considerava correto.
— Mesmo não sendo? — o remorso fez a voz de Lexi soar fraca e difícil de ouvir.
— Eu também estive equivocada sobre Drake no início. Todo este mundo é tão irreal que é necessário um pouco de tempo para se acostumar.
— Você me odeia? — perguntou Lexi com um fio de voz.
— Não. É óbvio que não.
Lexi colocou duas xícaras de água no micro-ondas, dando a Helen um olhar sombrio sobre o ombro.
— Ia matar Drake. Já sabia, não é mesmo?
Helen assentiu, com a garganta muito seca para falar. Nem sequer podia pensar em perder Drake. Era parte dela. Se algo acontecesse com ele, tinha certeza de que isso acabaria com ela.
— E mesmo assim não me odeia?
— Não. Nunca teria feito isso. — disse Helen.
— Teria feito. Se não fosse por Zach e a maneira que me tratou, teria feito.
— Você usa sua luceria. Isso está bastante longe de odiar alguém o bastante para matá-lo.
Lexi deu de ombros.
— Não queria que ele morresse. Se usar esta coisa o mantém vivo, então a usarei. É o mínimo que posso fazer.
— E a parte da magia também é muito legal, hein?
— Não sei. Não funciona comigo.
Lexi se manteve de costas para Helen o tempo todo, assim ela a segurou pelo braço e a obrigou a virar-se. Um notável rubor de vergonha fazia que seu rosto estivesse tão vermelho quanto seu nariz.
Com voz amável, Helen lhe perguntou:
— O que você quer dizer com não funciona com você?
— Quero dizer que estou danificada. — puxou a luceria e esta pulsou com verdes e azuis vívidos. — Esta coisa não funciona comigo da maneira que se acredita que tinha que fazer.
— Dê-lhe tempo. Levei um tempo pegar o jeito de usar o fogo.
— Sim, Zach me disse que você é uma Provocadora de Fogo. Difícil de acreditar.
— Para mim também. Acreditei que nunca amaria alguém mais do que temia o fogo, mas estava errada.
— Então, você o ama? — perguntou Lexi.
Seus olhos escuros baixaram para o chão como se não pudesse suportar olhar para Helen.
— Amo. E muito.
Depois de um breve silêncio, Lexi disse:
— Alegro-me por você, Helen. De verdade que sim.
O alarme sonoro do micro-ondas soou, dando a Lexi a desculpa de dedicar sua atenção a qualquer outra coisa.
Helen não ia deixá-la escapar tão facilmente.
— Eu acho que meu medo do fogo me impedia de usá-lo, talvez você tenha medos próprios para enfrentar.
Lexi bufou e jogou os saquinhos de chá nas xícaras.
— Muitos para contá-los. Acredito que esse é o problema.
— Solucionará isso.
— Como pode estar tão tranquila? Tão segura? Nem sequer nos conhecemos. Não realmente. E você acabou de saber que eu estava tentando matar o homem a quem você ama.
— Sei que não foi ideia sua. Não é do tipo violento.
Lexi levou as xícaras fumegantes para a sala.
— Você se esqueceu do episódio no Gertie's Diner? Apunhalei Zach. Isso é bastante violento.
— Estava sendo muito severa. Ele merecia um aviso de que não podia maltratar as mulheres.
Lexi negou com a cabeça, sorrindo ligeiramente para Helen.
— Não tenho certeza de que ele concordaria com isso.
— Ele não guarda rancor, ou guarda?
— Não. O homem não se zanga. Não tenho nem ideia do porque continua me perdoando por cada merda que faço.
— Precisa de você, Lexi. Todos nós precisamos. Se tivermos que fazer vista grossa para alguns enganos, isso é o que faremos.
— Eu não diria que cometi um engano. É mais grave que isso.
— Sente-se culpada. Bem. Você deve, mas temos que seguir em frente. Estamos... Desesperados.
— O quanto estão desesperados?
Helen não tinha certeza de quanto deveria contar a Lexi. Era óbvio que ela ainda estava se acostumando a sua nova vida, e Helen sabia por experiência própria o difícil e o agradável que poderia ser a transição. Mas se Lexi não estivesse preparada para se comprometer com a luta, não queria assustá-la mais. Precisavam muito dela.
Helen se conformou lhe dizendo:
— Estão desesperado o suficiente para que Zach e o restante dos Thenorai estejam dispostos a dar a você o benefício da dúvida. Não é a única aqui que teve impressões equivocadas sobre os Sentinelas e o que são. Por outro lado, necessitamos de toda ajuda que pudermos reunir.
A última parte saiu quase em um ofego de esgotamento, apesar dos esforços de Helen para permanecer em pé.
A expressão de Lexi se endureceu e faíscas de raiva brilharam em seus olhos.
— Mantiveram você trabalhando muito duro, não é mesmo?
— Venho trabalhando duro. É a minha escolha. Temos que levantar aquele muro. É importante.
— Importante o suficiente para que esteja se matando para fazê-lo?
Helen fez um gesto de desdém com a mão, mas sua mão estava muito pesada para aparentar a serenidade que ela tinha pretendido.
— Não seja tão melodramática. Não estou me matando.
Mas estava bastante perto. Não conseguia dormir o suficiente para afastar o cansaço que a perseguia. Cada dia se levantava mais cansada que o anterior. Se não acontecesse algo logo, ia adoecer. Talvez queimasse viva.
— Não pode descansar? — perguntou Lexi.
— Não de tudo. Os dias se tornam cada vez mais curtos, e as noites mais longas, o que significa que há mais chances de um ataque a cada dia. O muro é a única coisa que mantém os Synestryn fora. Já tivemos que enfrentar duas tentativas de arrombamento na semana passada. Ficará pior à medida que o inverno se aproxime.
— Acredita que eu posso ajudar?
— Eu espero que sim. Precisamos de tudo que possamos conseguir. Há muita gente que depende de nós, muitas crianças que não têm para onde mais ir. Se este lugar desabar...
Lexi levantou as mãos para impedir Helen de dizer algo mais.
— Entendi. Este lugar não pode sucumbir.
Ela aspirou o ar profundamente e o deixou sair lentamente.
— Certo, me conte apenas o que eu preciso saber.
— Primeiro, precisamos nos desfazer de tudo o que se cruze nosso caminho. Tudo que a impede de usar o poder de Zach.
— Acredita que o problema está em onde termina?
Tendo estado onde Lexi estava, estava mais que certa disso; mas em vez disso, disse:
— Averiguaremos isso. É um lugar tão bom quanto qualquer outro para começar.
— Bem. Estou no jogo. Tenho muito que compensar e farei tudo o que for necessário.
Helen não era uma perita, mas tinha algumas ideias do que podia estar errado e inclusive mais ideias de como solucionar isso. Lexi ia desfrutar até a última delas, e Zach ia desfrutar ainda mais.
Zach se aproximou do escritório de Joseph com o coração pesaroso. Rezou para estar equivocado, que a alma de Joseph ainda estivesse em boas condições, mas não podia pensar em nenhuma outra razão pela qual seu irmão se afastasse de seu caminho escolhido até agora o suficiente para estar disposto a matar os Defensores.
Com Angus de um lado e Drake do outro, formavam um trio formidável enquanto entravam no escritório de Joseph sem bater. Se confronto ficasse feio, iriam necessitar, no mínimo, de muita ajuda para submeter o homem a quem tinham escolhido para guiá-los.
Joseph olhou para cima de sua escrivaninha com os olhos turvos. Seus cabelos estavam desarrumados e o crescente número de fios brancos em suas têmporas brilhava sob a luz. Os papéis abarrotavam o lugar e os mapas foram fixados sobre três paredes. Centrada em frente dele havia uma pilha de fotos. Zach não conseguia distingui-las devido o reflexo que cruzava sua superfície brilhante, mas tinha coisas mais importantes com que se preocupar.
— O que é isto? — perguntou Joseph. — Não parece que estão aqui para uma visita de cortesia.
Melhor ir direto ao ponto.
— Mostre-nos seu peito. — disse Zach.
Joseph ficou tenso e de pé em toda sua alta e dominante altura.
— Perdão? — perguntou em uma voz fria e baixa.
— Acredito que sua marca de vida está nua. Acredito que por isso você virou as costas para os humanos.
Joseph apertou a mandíbula três vezes antes de ser capaz de pronunciar as palavras.
— Não virei às costas para ninguém. A quem diabos você acredita que estou tentando proteger?
— Disse que estava disposto a matar os Defensores.
— Estou. Mas só porque isso irá salvar vidas a longo prazo. — Joseph olhou para Drake, depois para Angus. — Você disse tudo a eles? Disse que Lexi tinha a intenção de nos massacrar? Que estava trabalhando para esses Defensores?
— Lexi não é o assunto. — disse Zach.
— Ele nos disse. — disse Angus, sua voz tão tranquila e uniforme quanto um lago calmo. — A garota estava confusa. Aposto que estes Defensores também estão. Não podemos sair massacrando a cada grupo que esteja nisto por nós. Não há tanto tempo no dia.
— Sugeri isso? Não. Não fiz isso. E antes que façam uma busca me despindo, olhem isto. — pegou as fotos e as jogou para eles na escrivaninha.
Escombros. Toneladas deles. Muros quebrados, piso destroçados, tetos estilhaçados. Cimento esmagado como se alguém tivesse deixado cair um asteroide sobre o que quer que aquele edifício tenha sido algum dia.
— O que é isto? — perguntou Zach.
— Nossa fortaleza africana. Ou ao menos, o que restou dela. — disse Joseph.
Zach passou as fotos até que viu fileira de corpos ensanguentados e despedaçados estendidos. Dúzias deles. Dúzias de crianças, seus olhos escuros congelados na morte.
Angus levantou os olhos, mas Zach não podia afastar a vista das fotos.
— Quem fez isto?
— Os Defensores, ou seu equivalente africano, colocaram um homem em surdina. Usou explosivos como Lexi tinha planejado fazer. Destruiu o lugar no meio do dia.
— Havia Sanguinar lá? — perguntou Zach, sentindo uma sensação de medo doentio revirar suas entranhas.
Os Sanguinar foram amaldiçoados a viver sempre na escuridão. Se algum deles se atrevesse a deixar o sol tocar sua pele, convocariam os guerreiros Solarc a este mundo, e se isso acontecesse, esses guerreiros, os Vigilantes, matariam qualquer um em seu caminho.
Joseph assentiu, confirmando os temores de Zach.
— Os Vigilantes chegaram e mataram todos aqueles que não morreram na explosão.
— Quantos? — perguntou Drake.
— Quarenta e três Sentinelas. Trezentos e dezessete humanos, a maioria deles crianças. Doze pessoas sobreviveram. Doze malditas pessoas. E só fizeram isso porque não estavam lá. Estavam a caminho daqui para ver se Nika era compatível com eles.
Incrível. Mesmo vendo as fotos, era difícil para Zach aceitar isso como verdade.
—Portanto, quando digo que estou disposto a eliminar estes Defensores, homens que estão planejando fazer isso com pessoas sob meu teto, sob minha proteção, não estou fazendo porque não tenho alma. Estou fazendo porque não tenho outra escolha. — e para demonstrar isso, Joseph abriu a camisa com um puxão, fazendo os botões voarem e baterem nas paredes.
Ficou ali de pé, deixando o peito musculoso descoberto, mostrando um pequeno, mas saudável agrupamento de folhas ainda agarradas a sua marca de vida.
— Satisfeitos? — perguntou, mas saiu mais como uma provocação.
Zach não estava. Longe disso. As coisas deram um giro para pior, e nada daquilo o satisfazia.
— O que você pensa fazer? — perguntou Angus, ainda tão tranquilo quanto se estivessem falando sobre a melhor maneira de limpar suas espadas.
— Vou usar Lexi para atraí-los para fora de seu esconderijo, e vou me certificar de que nunca tenham outra chance de fazer algo assim com alguém de meu povo.
— Ela não o ajudará a matá-los. — Zach sabia em seu coração que era verdade.
Ela tinha crescido com aquela gente, e não importava o quanto estivessem errados, Lexi não ia ajudar Joseph a abatê-los.
— Sim. Ela fará isso. — sua voz soou com uma autoridade absoluta.
— Como pode ter tanta certeza? — perguntou Drake, fazendo eco a pergunta que Zach não pôde fazer.
— Porque não vou lhe dar escolha. Sugiro a você que comece a tentar convencê-la agora. Economizará a Logan o problema de tirar a informação dela mais tarde.
Uma ira perigosa e letal cresceu dentro de Zach. Já estava lançando-se sobre Joseph quando Drake e Angus o agarraram pelos braços para imobilizá-lo.
— Não vou deixar que ele a machuque. — resmungou Zach, mal reconhecendo sua própria voz.
— Logan não a ferirá. Fará ela se sentir bem.
E ele também poderia. Logan poderia fazê-la gozar apenas olhando-a nos olhos se quisesse.
Uma neblina vermelha caiu sobre os olhos de Zach e seus músculos se retesaram, doendo-se por dá um murro na mandíbula de Joseph. Joseph não poderia ordenar a Logan que a tocasse se não pudesse falar.
Lançou-se de novo contra Joseph, mas os homens ao seu lado o contiveram.
— É hora de ir embora. — disse Drake.
Angus deu um grunhido de reconhecimento para ele, e eles levantaram e tiraram Zach para fora da sala. Zach lutou contra o controle deles, mas eram rápidos e fortes como o inferno, e o tiraram pela porta em dois segundos.
Deu um violento golpe nas costelas de Drake e se encontrou contra a parede do corredor, mantido ali por quatro mãos fortes. Seus pés mal tocavam o chão, o que não lhe dava nenhuma vantagem.
A respiração entrecortada de Zach entrava e saía de seus pulmões, fazendo-o arder de fúria. Devia que ter vindo por sua própria conta. Teria derrubado Joseph e ninguém poderia tê-lo impedido.
— Já basta! — ladrou Drake, à direita do rosto de Zach.
O tom de seu companheiro atravessou a névoa e o ajudou a recuperar a prudência o suficiente para parar de tentar golpear suas costelas.
Zach empurrou fortemente sua ira, tentando afastá-la, mas tudo o que podia pensar era na boca de Logan sobre o pescoço de sua mulher, tomando seu precioso sangue, drenando-a, fazendo-a gozar.
— Não vou deixar Logan se aproximar dela.
— É óbvio que não. — tranquilizou-o Angus. — Você vai levar seu traseiro de volta para sua casa e vai convencê-la a jogar limpo para que Logan não tenha que fazer isso.
A incredulidade expulsou o ar do peito de Zach.
— Concorda com Joseph? Acha que devemos matar esses homens?
Angus ficou calado durante um tempo como se estivesse escolhendo as palavras.
— Não vou deixar que Gilda ou Sibyl terminem como um dos corpos naquelas fotos, estendidas no barro. Assim que os Defensores começaram a fazer planos para matar minha família, renunciaram ao direito de continuar respirando.
— E o que tem a dizer de Lexi? — exigiu Zach. — Ela também os ajudou a fazer planos.
— A diferença é que já não é uma ameaça. — disse Angus. —Aqueles homens lá de fora são. Não vou tolerar isso. De uma maneira ou outra.
Nada disso parecia correto para Zach. Preferia o mundo em branco e preto onde sabia exatamente o que fazer. Todos aqueles tons de cinza o incomodavam.
— Então está dizendo que se já não forem uma ameaça, deixará eles viverem?
Os azuis olhos de Angus cravaram Zach onde estava. Ardiam com uma espécie de sabedoria que só séculos de dor e angustiam originavam. Zach não tinha nada a não ser respeito por aquele homem que o tinha treinado para ser o guerreiro em que se transformou. Todo seu treinamento entrou com facilidade, despertando o reflexo onde Angus falava e Zach escutava.
Em um tom tão cheio de serena razão que Zach não teve outra escolha se não aceitar, Angus disse:
— O que estou dizendo é que a única pessoa que pode salvar seus lamentáveis traseiros é Lexi. Obtenha sua cooperação. Talvez tenhamos sorte e encontremos uma forma de manter os caipiras respirando.
— Vale à pena tentar. — concordou Drake.
É claro que ele tinha razão. Angus sempre a tinha.
Toda ira que Zach tinha construído diminuiu, fazendo-o sentir-se cansado.
— Ótimo. Agora tudo o que tenho que fazer é encontrar a forma de impedir que ela vomite as vísceras quando pensar que vamos usar essa informação para matar as pessoas que abrigaram ela e sua mãe quando passaram por tempos difíceis. Não há problema.
Lexi não estava completamente convencida de que Helen soubesse o que estava falando — como derrubar a barreira entre Zach e ela — mas as sugestões eram mais que um pouco intrigantes. Todas envolviam uma grande quantidade de contato e pele nua, e só pensar nisso era suficiente para acelerar um pouco mais os batimentos cardíacos de Lexi de antecipação.
Helen a tinha deixado há poucos minutos, e agora que o lugar estava tranquilo, Lexi estava sozinha com seus pensamentos. Seus temores.
E se não pudesse fazer o que aquelas pessoas precisavam que fizesse? E se não pudesse ser como Helen?
Nem sequer era uma questão do que ela queria ou não. Já não era assim. Estava em dívida com aquelas pessoas por sua traição, e encontraria uma forma de reparar isso. Mas o mais importante, ela estava em dívida com os Defensores por todas as vezes que tinham protegido ela e sua mãe. Não podia simplesmente afastar-se deles sem ao menos tentar arrumar aquela confusão.
Tinha que haver uma maneira de conseguir que os antigos mocinhos vissem as coisas da maneira que ela as via agora. E talvez, se ela conseguisse obter todo aquele poder que havia dentro de Zach, pudesse encontrá-la. Tudo o que tinha que fazer era fazê-los ver o que ela tinha visto, como uma espécie de passe de slides mentais. Estava convencida de que se fizesse isso, eles acreditariam e todos poderiam viver felizes para sempre.
Sim, claro. Mesmo ela era inteligente o suficiente para saber que as chances eram poucas. Entretanto, isso não significava que não devia tentar.
Mas primeiro, tinha que passar por sua própria maldita obstinação e aproveitar toda a força de Zach para ter uma chance de lutar. Pelo que Helen havia dito, era como nadar em luz do sol, tudo quente e feliz.
Lexi precisava de uma boa dose de felicidade agora.
Aconchegou-se no sofá, colocando as pernas debaixo dela, e olhou para a porta. Não estava fechada com chave. Não tinha certeza se Zach tinha uma chave, e queria que ele fosse capaz de entrar se ela adormecesse. O que era uma possibilidade real.
Logan tinha tomado sangue suficiente para deixá-la sentindo enjoo caso se levantasse muito rápido. Esperava que beber líquidos a ajudasse a se recuperar mais rápido, mas o que precisava eram de aproximadamente doze horas completas de sono. Talvez mas tarde, depois que as vidas de tantas pessoas não estivessem descansando sobre seus ombros, conseguisse isso.
Enquanto esperava, Lexi tentou alcançar Zach através da luceria como Helen a ensinou. Acreditava-se que ia haver uma conexão entre eles que os manteria unidos mesmo quando não estivesse perto um do outro.
Fechou os olhos e se concentrou no anel de pele onde a faixa a tocava, em busca daquela conexão.
Estava quente, como se tivesse calor vital próprio, e podia sentir o mais leve zumbido procedente da coisa de vez em quando. Imaginou um fio de prata de ligando ela e Zach. Tudo o que tinha que fazer agora era obter um sinal que viajasse através dele.
Lexi tentou empurrar um pensamento através da conexão, dizendo a Zach que voltasse rapidamente para ela. Não aconteceu nada. Era como tentar empurrar uma corda para cima.
Então, talvez devesse tentar puxar.
Com os olhos fechados, e o fio de prata firmemente em mente, Lexi puxou. No início, não acreditou que estivesse funcionando, mas então sentiu uma estranha sensação rodear seu pescoço e deslizar por suas costas. Tomou ar e o conteve.
Puxou com mais força, e em sua mente, fez o fio engrossar.
A raiva bateu contra ela, provocando um rugido em seus pulmões.
Zach estava zangado. Podia sentir isso com tanta clareza quanto se fosse sua própria fúria golpeando-a. De fato, levou alguns segundos para separar os dois sentimentos para não começar a destroçar sua nova casa para descarregar algumas das selvagens emoções.
Embora os tivesse separado em sua mente, ainda estava tremendo pela força daquilo, doida de vontade de ir até ele e tirá-lo do inferno batendo em quem o chateou.
Encontrou-se andando de um lado para o outro, olhando para o tapete em um esforço para queimar um pouco da raiva. Claro, podia ter se retirado para não senti-lo mais, mas queria senti-lo. Queria dizer que tinha tido êxito. Como uma criança que deseja novas sensações, não podia parar de puxar mais forte, procurando mais.
Pouco a pouco, a ira desapareceu e em seu lugar havia uma melancólica aceitação. Resignação.
Seja o que for que tenha acontecido, não tinha acabado. O formigamento em sua marca de sangue nas costas lhe dizia que ele estava se aproximando. Voltando para ela.
A necessidade de consolá-lo era forte, cada vez mais forte a cada passo que ele dava. Havia uma profunda tristeza derramando-se dentro dele, derramando lágrimas que ele nunca permitia cair. E em torno de toda aquela vulnerabilidade havia uma forte necessidade de mantê-la a salvo.
Do que, ela não tinha nem ideia, mas se alegrava por ter conseguido fazer esta pequena conexão com ele, contente de saber que, sem nenhuma dúvida, ele faria tudo o possível para sua segurança.
Era humilhante sentir a força de sua necessidade de protegê-la. Humildade e exaltação. Sentia-se como se pudesse caminhar por um precipício sem se preocupar. Zach a seguraria.
Ele abriu a porta e a fechou atrás dele. Seu corpo estava tenso, os músculos de seus braços e ombros rígidos com seu firme controle.
Lexi ficou olhando-o, absorvendo-o. Era um homem tão poderoso, enchendo o hall de entrada com seu poder. Estava com os pés separados e uma expressão muito estranha em seu rosto. Sua pele macia e morena estava contraída em uma careta, como se ele realmente temesse o que tinha que fazer agora. Mas seus olhos claros brilhavam confiantes, assegurando a ela que tudo sairia bem. Não a deixaria cair.
Lexi se aproximou dele, precisando acalmá-lo, querendo tocá-lo. Morrendo de vontade de experimentar algumas das coisas que Helen lhe tinha contado.
Passou as mãos em seu peito musculoso e fechou os dedos em volta da parte de trás de seu pescoço.
Zach fechou os olhos e inalou profundamente. Aquilo os deixou ainda mais próximos, achatando os seios dela contra suas costelas. Lexi sentiu que seus mamilos se endureciam sob a fina faixa de seu sutiã.
O mesmo acontecia com Zach.
Ele soltou um gemido quase inaudível de necessidade e a segurou pelos quadris com suas mãos grandes.
— Temos que conversar. — disse a ela.
— Faremos isso. Depois.
Helen disse que fazer a conexão com Zach seria mais fácil durante o sexo. A intimidade e a confiança ajudavam a facilitar o fluxo de poder ou algo assim. Lexi realmente não compreendia, mas estava disposta a fazer um bom uso da lição de Helen.
Ficou nas pontas dos pés e puxou Zach para baixo para poder beijá-lo. O primeiro toque de seus lábios contra os dela extraiu um gemido de prazer de seu corpo, mas isto não estava nem perto de ser suficiente. Precisava saboreá-lo, senti-lo deslizar sua língua contra a dela.
Zach não a fez esperar. Inclinou a cabeça para baixo e aprofundou o beijo, separando-lhe os lábios para poder saborear seu calor, sua necessidade por ela. Como um homem esfomeado, alimentou-se de sua boca, segurando-a tão forte que ela pôde sentir a força contida em seus braços.
Quando ela ficou sem fôlego, ele se afastou apenas o suficiente para olhá-la. O desejo iluminava seus olhos, tornando-os de um verde luminoso. Ela não tinha soltado aquela corda de prata e através dela, um único pulso de necessidade física palpitava entre eles. Nem sequer tinha que se concentrar. Apenas acontecia.
Estava funcionando.
Ela umedeceu os lábios e deu um sorriso vitorioso para ele.
Os olhos de Zach se concentraram em sua boca e ela viu suas pupilas dilatarem-se, sentiu ele se apoiar mais sobre ela.
— Cama, — disse ele. — antes que me esqueça de usar uma.
Lexi assentiu e Zach a levantou até que a colocou com as pernas abertas sobre seus quadris. Ela sentiu o calor da espessura dele contra ela, queimando-a através de sua calça jeans. Enquanto a levava de volta ao quarto, cada passo enviava uma sensação de estremecimento através dela, fazendo seu corpo ficar tenso.
Zach a baixou e desabotoou o cinturão da espada. A espada piscou tornando-se visível, brilhando a luz da sala. Não tinham se incomodado de acender a luz do quarto, e ela considerou brevemente acender o abajur, até que ele tirou a camisa pela cabeça.
Então Lexi não pensou em nada que não fosse a beleza de seu peito, a largura de seus ombros e os contornos sombreados de seu estômago. A árvore de seu peito se balançava ligeiramente e Lexi ficou de joelhos sobre a cama. Pressionou as mãos contra a carne quente, amando o contorno suave e rígido de seu corpo. Não se cansava. Poderia passar um ano tocando-o e ainda não saciar a necessidade de sentir sua pele sob as mãos.
Zach ficou ali, rígido e imóvel, enquanto ela o tocava, passando os dedos pelos galhos emaranhados, descendo pelo tronco grosso até que o jeans dele barrou seu caminho.
Ela o olhou enquanto seus dedos faziam um trabalho rápido com o botão e o zíper. Suas costelas se expandiam e contraíram como se ele tivesse acabado de terminar uma longa corrida. Um brilho de suor reluzia ao longo de sua testa e sua mandíbula estava fortemente apertada.
Lexi deu um beijo sobre seu umbigo, girando a língua contra sua pele. Os músculos de seu estômago se contraíram e um incerto sorriso de satisfação feminina estendeu sua boca.
Ele era muito homem, e era todo dela.
Baixar o jeans apertado pelos quadris estreitos foi mais difícil do que seria sem a pesada ereção ocupando tanto espaço, mas não se importou com o esforço extra. Valeu mais que a pena. Não parou para ajudá-lo a tirar as botas. Não podia esperar tanto para conseguir o que queria.
Lexi envolveu os dedos ao redor de seu pênis, deleitando-se com a suave rigidez de seu corpo, o contraste de sua pele clara contra a pele bronzeada dele. Mesmo na escuridão, era fácil ver sua mão deslizando sobre ele. E mesmo se fosse cega, assim que tivesse ouvido seu gemido baixo de prazer, saberia que tinha feito com perfeição.
A concentração era difícil, mas Lexi estava decidida a fazê-lo funcionar. Encontrou aquele fio de prata ali, esquecido em sua mente, e deu um forte puxão nele.
Uma onda forte de luxúria a encheu, fazendo-a aspirar uma forte baforada de ar. A luxúria dele, pura e potente, era tão feroz que ela não tinha nem ideia de como ele podia suportar. A cabeça de Lexi caiu sobre o abdômen dele e ela fechou os olhos, tentando encontrar prudência o suficiente para se lembra do que estava fazendo. Era importante. Tinha tido algum tipo de plano, só que não tinha certeza do que era.
Sentiu o cheiro do desejo masculino em sua pele, o almíscar de sua necessidade por ela. Dentro de seu controle férreo, a ereção de Zach palpitou, fazendo-a molhar-se. O fio de prata entre eles brilhava.
Poder. Estava tentando alcançar o poder de Zach. O sexo ajudava. A intimidade ajudava ainda mais.
Certo. Lexi lembrava agora. Podia fazê-lo. De fato, nunca tinha querido tanto fazer algo em sua vida como queria fazer isto.
— Deite-se. — disse a ela.
Não fazia parte de seu plano. Lexi sacudiu a cabeça, deixando que seus cabelos passassem por cima do quadril dele.
— Ainda não.
Ela sentiu sua ereção aumentar e soube que estava a ponto de perder o controle sobre seu plano cuidadosamente coreografado. Antes que ele pudesse assumir o controle, Lexi tomou sua ereção na boca, afundando-se profundamente.
Zach gemeu de prazer e seu corpo inteiro se retesou. Suas mãos envolveram a cabeça dela, deslizando os dedos convulsivamente sobre seu couro cabeludo.
Ela puxou de volta, quase o deixando livre. Sua boca encheu de água enquanto girava a língua em cima dele, tirando um suspiro de seu corpo poderoso. Tinha um gosto bom. Excitante, masculino, uma combinação viciante de necessidade e fome que só ela podia satisfazer.
Seu próprio corpo se arqueou, mas o que ela queria era mais importante que o prazer. Queria esperança, a promessa de ser o que Zach mais necessitava. Uma companheira.
A luceria vibrava ao redor de sua garganta, aquecendo-se mais a cada movimento de seus lábios e língua sobre a carne rígida dele. Podia sentir algo maravilhoso surgindo, porém fora de seu alcance, a um fio de cabelo de distância. Esse algo brilhava e pulsava, inundando sua visão de luz e cor. Belo verde jade, como os olhos de Zach, tão cheios de promessas que quase podia prová-las.
Lexi o alcançou, lutando para manter a concentração.
Sua cabeça girou e o rico sabor do corpo de Zach desapareceu. Ouviu um som de algo se rasgando. O ar frio bateu em sua pele e quando ela abriu os olhos para averiguar o que estava errado, encontrou-se sobre as costas, sua camisa rasgada na frente e os dedos frenéticos dedos de Zach desfazendo-se de seu jeans.
Isso não era de forma alguma o que tinha planejado.
— Zach, espere. — disse.
Ele parou e a olhou, com o rosto tenso de luxúria insatisfeita. Ela viu sua boca mover-se como se estivesse tentando encontrar as palavras, mas nenhuma saiu. Em vez disso, ela sentiu a luceria tremer, então se encheu com um desejo tão dilacerado e forte que explodiu em seu interior, fazendo-a gritar pela força do mesmo.
Seu corpo estremeceu e ele revirou os olhos. Puro e incremente prazer rasgou seu corpo, reunindo-se em seu seio, empurrando-a até a beira do orgasmo. Não era grande o suficiente grande para conter tanta sensação. Não lhe dava espaço para respirar.
E ela não se importava.
Antes de ter tempo de se adaptar a tantas sensações, Zach lhe deu mais. Ela sentiu sua conexão se estender, fazendo a luceria aquecer-se sob a tensão. E então, todos os pensamentos de planos e conexões foram expulsos de sua mente quando uma bolha de prazer explodiu em seu interior, fazendo-a gozar.
Ela cavalgou as ondas da sensação, deixando que a arrastassem, levando-a onde quisessem. Pensou que o poder poderia rasgá-la, mas em vez disso, embalava-a e facilitava seu regresso à realidade, quando esta a golpeou.
Estava com as pálpebras pesadas, mas se obrigou a abri-las. Zach estava sobre ela, apoiando seu peso de maneira que os músculos se destacavam em seus braços. Sentiu a cabeça de seu membro pressionar contra seu centro e estava tão suave e escorregadia que deslizou com facilidade. Seu corpo se esticou para aceitá-lo sem queixa. De fato, cada centímetro de terreno que ele ganhava fazia seus membros se retorcessem com um novo tremor de desejo.
A respiração de Lexi nem sequer havia se normalizado por seu orgasmo, e ele já a levava a outro. Se não agisse rápido, ia perder a chance de fortalecer seu vínculo.
Zach se moveu dentro dela, estabelecendo-se profundamente. Ela pôde sentir as batidas de seu coração pulsando em sua ereção, vê-las golpeando a veia ao longo de seu pescoço. Ele estava com os olhos abertos, de um verde sexy, sonolento, olhando-a. Viu sua garganta mover-se como se estivesse tentando falar, então, no meio de sua violenta luxúria, sentiu um sutil vibração de preocupação deslizar para ela.
Estava preocupado com ela.
Ofereceu a ele o que esperava que fosse um sorriso encorajador e disse:
— Estou bem. Melhor que bem.
Ele assentiu satisfeito e fechou os olhos de alívio. Sem hesitar mais, seus poderosos músculos se agruparam e flexionaram enquanto ele estabelecia um ritmo constante.
Lexi cerrou os dentes, tentando permanecer concentrada em sua tarefa, mas era quase impossível. Sua necessidade fluía como água, o corpo dele a preenchia, conduzindo-a mais alto. Não podia concentrar-se ou recordar-se do que Helen havia dito que fizesse. Não mais. Tinha muitas sensações em seu interior para deixar qualquer espaço para pensar.
Derrotada, mas da forma mais doce imaginável, Lexi se deu por vencida e se deixou ir. Levou os dedos aos cabelos sedosos de Zach e puxou sua cabeça para ela. Beijou sua boca, a mandíbula, descendo por seu pescoço. Cada toque de seus lábios contra a pele dele era recompensado por um profundo som de prazer. Cada girou de sua língua a enchia com seu sabor inebriante.
Seu homem. Todo dela.
Zach manuseou seu seio, beliscando seu mamilo entre dois dedos. Correntes eróticas atravessaram seu corpo, fazendo-a arquear os quadris entre os embates.
Seu corpo tremia, fraco pelo estresse e perda de sangue, mas Lexi ignorou os tremores. O corpo de Zach ficou tenso e ele acelerou o ritmo, trocando-o pelo que a cada embate golpeava somente nos pontos corretos. Seu mundo girou no espaço de minutos entre seus corpos apertados e faiscantes vibrações de eletricidade que formavam um arco entre eles.
Um profundo retumbar sacudiu o peito de Zach, ecoando dentro de Lexi. Ele envolveu o braço em torno de seus quadris, mantendo-a imóvel e entrando profunda e duramente dentro dela. Sentiu sua ereção inchar-se e pulsar, sentiu o calor de sua liberação enquanto pequenas faíscas dançavam por seus membros.
Era muito. Não podia aguentar mais nenhuma sensação. Todas aquelas aspirais de tensão giraram livremente e ricocheteando dentro de seu corpo enquanto o clímax a rasgava.
A luz dançou em seus olhos e ela sentiu o calor da luz do sol engoli-la, arrastando-a.
Minutos mais tarde, embora não tivesse ideia de quantos, encontrou força suficiente para abrir os olhos. Zach a cobria, com a respiração diminuindo o ritmo. O suor esfriava seu corpo onde as correntes de ar a tocavam. Em todos outros estava quente e completamente contente.
Zach parecia não ter pressa de mover-se, e ela gostava dele ali. Ele tomava cuidado para que seu peso não a esmagasse, mas era sólido o suficiente para sentir-se protegida debaixo dele. A articulação de seu quadril tinha sido empurrada até seu limite, dando espaço para o grande corpo entre suas coxas, mas mesmo essa dor era muito agradável.
Sua cabeça ainda estava girando, mas tinha clareado o suficiente para lembrar a meta de sua sedução, tal como era. Zach não tinha sido exatamente um desafio.
Pensar que ele fosse tão fácil, que a desejasse tanto, a fez sorrir.
No silêncio do quarto escuro, com os corpos saciados e felizes, Lexi se deitou, esforçando-se para acessar o poder de Zach. Até agora, supôs como tirar sentimentos dele, mas não tinha sido capaz de enviá-los de volta, nem tinha sido capaz de encontrar a fita de energia que Helen descrevia. Era como se a conexão entre ambos estivesse interrompida.
Ou talvez, só fosse diferente.
Uma película fina, como a pele de uma bolha, flutuava entre eles. Lexi entrou nela, esperando rompê-la, mas ela se manteve firme. Empurrou mais forte ainda e não aconteceu nada.
Zach apoiou o corpo sobre um cotovelo. Seu rosto brilhava de emoção.
— Senti essa… Pressão. Tente isso de novo.
Lexi fez isso. Empurrou a barreira até que ficou tonta, mas ela não se rompeu.
Exausta, deixou escapar um suspiro de frustração.
— Sinto muito.
Zach alisou os cabelo de sua testa úmida e lhe deu um sorriso alentador.
— Não se preocupe. Virá. Só precisa de um pouco de descanso. E talvez, um pouco mais de prática.
Ainda estava semirrígido dentro dela, a parte “semi” transformando-se rapidamente em uma lembrança. Mas, em vez de aproveitar isso, Zach se retirou e se deitou de lado. Colocou um lençol sobre seu corpo úmido e passou um dedo pela luceria. Seus olhos se escureceram enquanto observava o jogo de seu dedo como se a visão o excitasse. Talvez o fizesse.
— Espero que seja suficiente. — disse ela.
— Será. — sua voz soou confiante. — Mas, agora, precisa recuperar suas forças. Fazer um pouco de sangue novo. Maldito sanguessuga bastardo. — um cenho sombreou sua testa morena.
Lexi o alisou com o polegar.
— Estou bem. Sério.
— Vire-se e me deixe acariciar você. — sua voz estava rouca, mas Lexi se não importou.
Sentiu que ele simplesmente não queria que ela visse as emoções transparecerem em seu rosto. Se ele se sentia culpado, ou simplesmente não queria que ela se preocupasse, não tinha certeza, mas seguiu seu jogo e girou ficando sobre o estômago.
A mão grande e quente de Zach deslizou ao longo de sua espinha dorsal, afastando o lençol por onde passava. Entretanto, o ar frio não a tocava. Não com Zach a suas costas, radiando calor como um forno.
Lexi fechou os olhos e desfrutou da sensação dele acariciando-a. Pequenas faíscas saltaram em sua pele, mas estava se acostumando a isso agora, e era quase como uma minimassagem.
Ele passou um dedo por sua tatuagem de leopardo, seguindo as curvas sinuosas das videiras que rodeavam o animal.
— Por que fez isto? — perguntou.
— Para evitar que me encontrasse. Mamãe estava convencida de que minha marca de nascimento atraía os monstros para mim, então costumava cobri-la com maquiagem. Quando fiquei mais velha, tatuei-me.
Sua mão se moveu até a base de sua coluna vertebral onde as espirais de filigranas pelas quais ela se apaixonou com quinze anos estavam incrustadas em sua pele. Sentiu-o mover-se, baixando seu corpo, sentindo sua respiração quente roçar ao longo de seu traseiro enquanto ele se movia para uma inspeção de perto.
— Aqui. — disse ele, tocando um ponto à direita de sua coluna. — Vejo-o. O anel que a marca como Theronai.
— Sim. Isso. Mamãe dizia que era perigoso, por isso tínhamos que cobri-lo. Quando vi aquela marca em mim quando você lançou sobre mim no Gertie’s Diner, soube que eram más notícias. Imaginei que se a cobrisse, talvez o impedisse de me seguir.
— E assim foi. É curioso como nenhum de nós sabia que funcionaria assim. Como pôde sua mãe saber disso?
Lexi encolheu seu ombro tatuado, vendo Zach sobre seu corpo com a imagem de seus olhos no corpo do leopardo.
—Não tenho certeza. O cara que engravidou minha mãe deu a ela todos os tipos de instruções sobre como me manter segura, e um monte de advertências sobre o quanto era importante que ela me mantivesse escondida até que eu crescesse. Acho que mamãe prestou atenção nele.
— Eu gostaria de agradecer a ela por ter cuidado de você.
Uma dor profunda e antiga, desgastada e com bordas suavizadas pelo tempo, cresceu dentro de Lexi. Sentia falta da mamãe todos os dias, desejava poder compartilhar sua vida com ela agora que as coisas estavam melhores. Mais seguras.
A mãe teria gostado de Zach. Depois que tivesse parado de tentar matá-lo, é óbvio.
— Por que um leopardo? — perguntou Zach.
— Foi pela forma que você se movia. Como um predador. O jeito que me olhava como se estivesse faminto, fazendo eu me sentir caçada.
— Estava caçando você. E quanto à ideia de comê-la inteira… Eu prometi isso.
Um lânguido calor se enroscou em seu interior.
— Todas as vezes que quiser.
Zach grunhiu baixo em sua garganta, mas se afastou.
— Precisa descansar. Se eu começar agora, não vai dormir por horas.
A fadiga pesava sobre ela, puxando-a para a terra dos sonhos. Tanto quanto queria Zach, sabia que se deixaria seduzir sem esforço se estivesse por perto. O homem era irresistível, mesmo quando não estava tentando ser.
— Não tenho certeza de que possa durar muito.
Ele deu um rápido beijo em seu ombro e se levantou da cama.
—Por isso vou sair por um momento. Lexi, nua é muito tentadora para resistir, e estou determinado a ser um bom menino e permitir que durma. Se você acha que pode.
— Eu acho que gostaria de tentar. Há um monte de coisas em minha cabeça agora.
Zach assentiu.
— Sim. Um monte disso por aqui.
— Quer falar disso?
— Agora não. Logo amanhecerá. Descanse um pouco. Vou sair e ver se posso dar uma mão com o muro. A menos que prefira que eu fique.
Lexi necessitava de um pouco de tempo para pensar, e tinha certeza como o inferno que não ia dormir se o corpo varonil dele estivesse ali, distraindo-a com a forma como foi delicioso.
— Não, vá. Precisam de sua ajuda. Helen disse que não estavam indo bem.
— Não, mas chegaremos lá. Sempre o fazemos.
Lexi observou enquanto ele cobria seu traseiro firme com o jeans descartado, bloqueando a bela vista.
— Desmancha prazeres. — brincou ela.
Zach soltou uma gargalhada, sacudindo a cabeça.
— Deixe de tentar me fazer ruborizar, mulher. Poderia retaliar.
— Parece divertido.
Ele afivelou o cinturão da espada ao redor dos quadris e a coisa brilhou antes de desaparecer de vista.
— Não está apta para mais diversão. — ele se inclinou e beijou a ponta de seu nariz. — Durma. Então veremos se podemos encontrar algo para divertir você.
Estava fechando a porta do quarto quando Lexi o deteve.
— Zach? O que acontecerá se eu não puder fazer isso? Se nunca conseguir recorrer a seu poder?
Ele ficou imóvel com a mão sobre a maçaneta e deu um sorriso tão cheio de confiança para ela que quase a fez acreditar em milagres.
— Pode.
— Mas, o que acontecerá se eu não puder?
Ele a olhou nos olhos e disse:
— Amarei você mesmo assim.
Zach estava se arrependendo de sua confissão de amor ao chegar ao pátio de treinamento. Continuava tateando ao seu redor, tentando se conectar com Lexi, procurando algum tipo de reação a sua declaração. Mas a única coisa que sentiu foi uma abismal lacuna de nada se estendendo entre eles.
Merda.
Sabia que ela estava tentando. Não podia culpá-la por isso, mas ainda o incomodava que as coisas não estivessem funcionando entre eles como deviam.
Porque ela ainda não confiava nele. Devia ser esse o problema.
A frustração aumentava enquanto ele se aproximava das ruínas do muro desmoronado. Olhou para seus celular para se certificar que ele estava ligado e assim Lexi pudesse entrar em contato com ele, depois se entregou por completo ao trabalho duro. Levantar rochas era isso e inclusive mais.
Uma hora depois que Zach saiu, Lexi tinha se convencido que na realidade ele não quis dizer que amava. Era só uma maneira de falar. Uma expressão que seu povo usava ou algo assim.
Amarei você mesmo assim.
Queria tanto que fosse verdade que seu coração doía. Ninguém a tinha amado desde sua mãe, e se encontrou morrendo por mais, desejando-o como o respirar.
O que era totalmente injusto de sua parte. Ali estava ela querendo o amor dele quando ainda não estava em condições de lhe corresponder. Não que Zach não fosse adorável. Diabos, nunca tinha conhecido um homem que fizesse sua alma cantar da forma que ele fazia. Tinha certeza que podia chegar a amá-lo.
Caso se permitisse acreditar que tudo aquilo era real e que ele era o que parecia.
Ainda havia uma ponta de dúvida alojada profundamente em seu interior de que talvez tudo o que tinha visto e sentido desde a noite em que Zach a encontrou no bar do Gus tinha sido algum tipo de truque. Uma alucinação provocada pelos monumentais poderes que os Sentinelas tinham.
E não importava quantas vezes dissesse a si mesma que aquilo tinha que ser real, a ponta de dúvida ainda a feria e assediava, voltando uma e outra vez a sua mente. Queria que tudo aquilo fosse verdade tão desesperadamente que tinha certeza que ficaria devastada. Alguém levantaria uma cortina e mostraria a realidade, e todas suas esperanças e sonhos se dissolveriam como um cubo de açúcar jogado dentro de água quente.
No fundo, Lexi sentia que era este último pedacinho de dúvida o que a segurava no fundo, mas não sabia como removê-la. Era a única coisa que a protegia, e não importa o quanto se sentia segura nos braços de Zach, sabia que também podia ser parte da ilusão. Sua verdadeira segurança estava no apego a essa dúvida, mantendo-a perto de seu coração para que ao menos essa parte fosse invulnerável.
Se tudo aquilo fosse uma mentira, e a cortina se abrisse, pelo menos Lexi saberia que tinha mantido a parte mais importante de si mesma. Poderiam despojá-la de seu orgulho e humilhá-la, poderiam rir da mulher tola que caiu sob seu feitiço tão facilmente, poderiam até mesmo matá-la, mas ao menos não morreria com o coração destroçado.
Era um triste consolo.
Lexi afastou as cobertas, encontrou algumas roupas novas que não estavam rasgadas ao meio, tomou banho e se vestiu.
Seu primeiro impulso foi sair para procurar Helen e falar com ela, mas estaria ocupada no muro, ou se não estivesse, provavelmente estaria dormindo. Já que Lexi era inútil quando se tratava de dar uma mão mágica, o mínimo que podia fazer era manter-se fora do caminho e não atrapalhar aos outros.
Só havia uma coisa que Lexi podia fazer para ajudar: obrigar os Defensores a verem a realidade e colocá-los do lado dos Sentinelas. Havia centenas deles, talvez até alguns milhares, dispersos por todo o país. Se eles se aliassem com os Sentinelas e ajudassem a combater os Synestryn, talvez ajudasse a igualar o jogo.
Claro, eram apenas humanos sem poderes mágicos, mas estavam fortemente armados e dedicados por completo à humanidade. Mesmo se só concordassem em oferecer olhos e ouvidos, poderiam ajudar a inclinar a balança a favor dos Sentinelas.
Valia à pena tentar.
Além disso, se conseguisse convencer os Defensores de tudo o que esperava que fosse verdade, então teria percorrido um longo caminho para arrancar aquela última ponta de dúvida.
E se não pudesse convencê-los? Bom, não tinha certeza do que faria a seguir, mas tinha que tentar.
Lexi não era tão estúpida para encontrar-se com eles cara a cara, mas uma ligação telefônica não lhe faria mal. Já sabiam onde estava, e uma vez que a bomba não tinha sido detonada, provavelmente também saberiam que tinha sido comprometida.
Acreditava poder obter uma linha externa, e ligaria para Jake Morrow, filho de Héctor. Era quebrar a cadeia de comando, mas Jake era um homem muito mais razoável que seu pai. Se alguém ia escutar sua versão dos fatos, seria ele.
Zach olhou por cima do muro partido, dando-se conta pela primeira vez do quanto eram vulneráveis na realidade. E quanto tempo iam permanecer assim.
Tinham trabalhado toda a noite e só tinha acrescentaram meio metro à estrutura. Todas as rochas estavam amontoadas, preparadas para serem utilizadas, mas só podiam ser colocadas depois de que uma das mulheres tivesse tecido magia defensiva através das moléculas da pedra. Do contrário, a única coisa que manteriam fora seriam os humanos e os animais.
O amanhecer se aproximava e a maioria dos Theronai tinha entrado para procurar seu descanso. Não havia nada mais que pudessem fazer agora que Helen e Gilda tinham ido dormir lá dentro, nenhuma forte o suficiente para manter-se em pé sem ajuda.
Drake tinha tido que levar Helen nos braços, e embora Gilda tivesse aceitado o apoio de Angus, não o permitiu fazer o mesmo. Havia uma espécie de distanciamento estranho entre eles que Zach não entendia, mas que esperava como o demônio que corrigissem logo. Aquele lugar precisava deles fortes, funcionando como uma equipe.
Precisava dele e de Lexi fazendo o mesmo.
As costas de Zach doíam, mas ele a ignorou, preferindo a monotonia do trabalho autômato às preocupações que o carcomiam.
O que ocorreria se os temores de Lexi fossem verdadeiros e ela nunca conseguisse ter acesso a seu poder? Tinha certeza de que o fracasso a esmagaria, sem mencionar o fato de que não tinha nem ideia do que significaria para ele. Sua marca de vida não estava morrendo, mas tampouco se renovava. Não havia folhas novas formando-se, nenhum broto.
Paciência. Tinha que deixar de se preocupar e ter um pouco de fé. Tinham passado apenas alguns dias. Tinha que dar tempo a Lexi para resolver as coisas. O céu sabia que ela estava tentando.
Um caloroso sorriso estendeu-se em sua boca. Mal podia esperar que tentasse novamente.
O som baixo de um gemido chegou aos seus ouvidos, quase inaudível. Zach se acalmou e conteve a respiração, escutando. Chegou de novo, um pouco mais forte daquela vez, dos arbustos do outro lado do muro. Parecia um animal ferido.
Ou uma criança.
O medo o golpeou com força, fazendo o corpo de Zach entrar em ação. E se uma das crianças humanas tivesse passado pela abertura e sofrido algum dano? Havia tanto caos ao redor do mudo desabado que isso poderia ter acontecido.
O som se repetiu, o som de um lamento baixo de dor e medo. Definitivamente não era um animal.
Zach gritou para o homem mais próximo.
— Neal, venha aqui. Ajude-me.
O céu estava claro o suficiente quando os refletores que iluminavam a área de trabalho se apagaram. De qualquer forma, todos os humanos que necessitavam da iluminação tinha ido para dentro para comer.
As sombras profundas deixavam buracos escuros sobre a paisagem, mas Zach tinha servido bastante no perímetro e conhecia a área muito bem não tendo nenhum problema para detectar as depressões e sulcos na penumbra.
Neal estava com o torso nu. Pegou a camiseta do cós da calça e limpou o pó e o suor do rosto.
— O que aconteceu? — perguntou Neal. Sua voz era enganosamente preguiçosa quando chegou junto de Zach, movendo-se com tanta discrição, que era difícil vê-lo.
— Acho que ouvi algo. Como uma criança.
— Duvido... — Neal arrastou as palavras enquanto deixava a camiseta cair e tirava a espada.
Zach tinha formado uma equipe com Neal com frequência suficiente para saber que apesar de sua maneira casual, o homem poderia passar do zero a assassino em cerca de três segundos.
— Sim, eu também. Acho que logo veremos. — Zach verificou o céu. — Seja o que for, não pode ser ruim por muito tempo. O sol quase se levantou.
O som lastimoso chegou do fundo de um barranco pouco profundo a uns quinze metros de distância.
— Sem dúvida alguma parece humano. — disse Neal, mas não afastou sua espada.
Chegaram à borda, e Zach viu um movimento nos arbustos abaixo. Vestindo algo azul claro.
— Ajude-me. — disse o menino, e era definitivamente um menino. — Estou preso.
Os dois homens deslizaram pelo lado do barranco, que talvez tivesse uns dois metros de profundidade e uns seis de largura. Durante a temporada das chuvas a água corria pela fenda, mas agora, estava cheia de arbustos secos, barro e vegetação.
Neal embainhou a espada enquanto Zach abria passagem entre a vegetação em direção ao menino. Era um menino pequeno, talvez de dez anos. Vestia jeans desbotados e perto dele havia uma vara de pescar e uma caixa de pesca. Seus pés afundaram na lama até as panturrilhas e ele havia caído de costas, afundando os braços e o traseiro na lama espessa também.
Zach não reconheceu o menino, mas havia um monte de meninos em Dabyr, o tempo todo.
— Como se chama, filho? — perguntou Zach, enquanto procurava uma maneira de chegar ao menino sem ficar preso.
— Clay.
— Está ferido, Clay?
— Torci meu tornozelo.
Fungou e parecia que desejava poder secar as lágrimas de seu rosto antes que Zach estivesse perto o bastante para vê-las. Sua visão noturna era boa o bastante para que não tivesse problemas para divisar as brilhantes listras no rosto do menino.
— Não se preocupe. Tiraremos você daqui.
Sua voz tremia de medo genuíno.
— Vai dizer a minha mãe?
É óbvio, mas não fazia sentido assustar a criança. Tinha que aprender o quanto era perigoso sai para o outro lado do muro, que aprendesse suficientemente bem para não voltar a fazer de novo.
— Não se preocupe com isso agora. Vamos nos concentrar em tirar você daqui.
Atrás dele, Zach ouviu o estalo metálico de uma arma sendo carregada. Virou-se para ver o que estava acontecendo, embora já soubesse que era ruim.
Um homem corpulento com um macacão de mescla estava no declive de trás e acima de Neal com uma pistola preta apontada para a cabeça do Theronai.
— Mova-se e eu farei seus miolos voarem. — disse o desconhecido.
Zach ficou na frente do menino para protegê-lo de balas perdidas.
A mão de Neal se moveu para sua espada.
— Eu não faria isso. — disse outro homem atrás de Zach.
Zach se virou e viu um humano magro com uma barba desleixada, do outro lado do barranco. Em suas mãos carregava uma escopeta, e apontava para o menino.
A indignação de Zach aumentou. Tudo aquilo tinha sido uma armadilha com o menino servido de isca.
— Não vai matá-lo. — disse Zach. — Este menino é um dos seus.
— Não é meu filho. — disse o magro, com a voz fria de indiferença. — Vá em frente. E veremos se estou blefando.
Os olhos do menino transbordaram de lágrimas e seu nariz começou a gotejar.
— Disse que íamos pescar.
— Cale-se. — ladrou o magro.
— O que quer? — perguntou Zach.
— Você e seu amigo virão conosco.
— Como o inferno. — disse Neal, lenta e pesadamente.
E depois se movendo tão rápido que parecia um borrão cortou a mão da arma do homem no pulso, enviando-a girando pelo ar.
O homem gritou, sustentando o pulso sangrento contra o corpo.
Zach não esperou para ver o que Neal faria a seguir. Em vez disso, lançou-se sobre o menino e o arrancou do barro. Virou-se, ficando de costas para a escopeta, contendo a respiração à espera da detonação.
Nenhuma chegou. Zach jogou o menino em alguns arbustos próximos para amortecer sua queda e tirou a espada.
— Corra! — ordenou ao menino.
Um segundo depois, uma dor ardente floresceu em suas costas quando o poder o inundou, esticando suas entranhas até que pensou que explodiria.
Ele urrou de cólera e se virou em um arco desajeitado, batendo o punho contra o homem atrás dele. O homem cambaleou para trás, revelando dois homens agachados na vegetação.
Zach tirou sua espada e atacou.
Um dos homens levantou algum tipo de arma e disparou. Um som crepitante rompeu o ar, e um instante depois, outro golpe de dor atingiu o peito de Zach.
O segundo homem apontou e disparou.
Os músculos de Zach se retesaram, completamente fora de seu controle. Os galhos de sua marca de vida estremeciam de dor, e um grito alto saiu sua garganta contra sua vontade.
Caiu no chão, aterrissando de lado, ficando sem fôlego, tentando piscar para esclarecer a visão. Quando esta clareou, ele estava olhando para um par de botas de trabalho gastas. Tentou mover-se, mas não conseguiu. Uma daquelas botas retrocedeu e bateu contra sua cabeça, jogando-o de costas. Olhou para cima e viu um velho cujo rosto estava sombreado por chapéu de cowboy segurando uma espécie de pistola elétrica na mão.
Os fios se arrastavam para fora do instrumento, diretamente até Zach.
Era isso o que tinham utilizado? Armas elétricas?
— Funcionou às mil maravilhas. — disse o homem. — Exatamente como aquele horripilante sócio prometeu.
Zach teve problemas para dar sentido ao que o homem havia dito, mas não perdeu tempo pensando nisso. Ao longe, viu Neal desabando no chão, com a cabeça sangrando muito, com dois cabos de transmissão em seu peito nu. Enquanto Zach observava, várias folhas de sua marca de vida caíram enquanto ele jazia ali, com convulsões.
A adição de tanta energia ao corpo de Neal de forma tão rápida e sem nenhuma forma de expulsá-la ia matá-lo. Zach tinha a vantagem de estar conectado a Lexi, mas Neal não tinha tanta sorte.
O magro levantou outra pistola paralisante de seu cinturão e apontou para Neal. Zach não acreditava que seu amigo sobrevivesse a outra descarga.
Zach tentou chegar a sua espada para matar aquele bastardo antes que ele pudesse matar Neal, mas não conseguia mover-se. Nem sequer podia encontrar fôlego suficiente para pedir ajuda.
Se não fizesse algo, ambos acabariam mortos. Talvez o menino junto com eles.
Esse foi o pensamento que o queimou através da paralisia e conseguiu pôr seu corpo em movimento outra vez. Encontrou o punho de sua espada e puxou para tirá-la da bainha.
— Oh, não, não fará isso. — disse uma voz áspera.
O choque fez o corpo de Zach adormecer, e um segundo depois, deu-se conta que tinha sido chutado na cabeça outra vez. Era curioso, mas não doeu.
Tentou reagir, mas nada parecia funcionar bem. Perdeu o controle sobre sua espada enquanto seus dedos frouxos se desprendiam inutilmente. Nem mesmo o pescoço ele conseguia mover. Não conseguia virar a cabeça para olhar para seus atacantes e defender-se.
Outro golpe sacudiu seu corpo. Estava perdendo os sentidos. Tentou alcançar a mente de Lexi, tentando enviar um aviso a ela: Dabyr está sendo atacada. Não tinha certeza se conseguiu enviá-la ou não, mas enquanto sua visão desaparecia, soube que era muito tarde para ele e Neal. Não havia nada que se pudesse fazer a tempo para salvá-los.
Jake Morrow respondeu a ligação de Lexi ao primeiro toque, apesar de não ser nem seis horas da manhã. Não parecia sonolento, o que a fez se perguntar se ele também teria passado a noite sem dormir.
— Alô? — perguntou.
— É Lexi.
— Graças a Deus. — respirou com alívio. — Acreditávamos tinham matado você.
— Estou bem. De fato, melhor que bem. Nós nos equivocamos a respeito dos Sentinelas, Jake. E não sou nenhum tipo de orador com o cérebro lavado, tampouco.
Esperou.
O silêncio caiu sobre a linha por um momento.
— Está sozinha? — perguntou.
— Sim, por quê?
— Só queria me assegurar de que podia falar livremente.
— Posso. Sou eu, Jake. Não tenho certeza onde minha mamãe conseguiu todas aquelas ideias que mantinha em sua cabeça, mas todas estavam erradas. Estes homens são bons. Estão dando suas vidas para proteger os humanos dos Synestryn.
Outra longa pausa que a deixou nervosa.
— Quero saber o que você sabe. Pode se encontrar comigo para que possamos falar sobre isso?
Encontrar-nos. Só havia uma razão para que ele quisesse fazer isso em vez de falar por telefone.
— Não acredita em mim. Acredita que lavaram meu cérebro, não é mesmo?
— Só quero ter certeza, Alex. A única maneira de fazer isso e tirando você daí. Longe de qualquer controle que possam ter sobre você.
— É Lexi, não Alex. Não voltarei mais para a clandestinidade.
— Talvez devesse fazer isso. Vamos nos reunir apenas por alguns minutos, e deixe que eu julgue por mim mesmo se realmente é você quem fala.
Não foi inteligente. Ela sabia como eles trabalhavam. Se acreditassem que tinham lavado o cérebro dela, deixariam de confiar nela, ou pior ainda, a veriam como inimiga.
— Não posso. Sinto muito, Jake, mas não confio que não cometa alguma imprudência.
— Eles sabem a respeito do C-4?
Lexi fechou os olhos em sinal de frustração. Desejava tanto que Jake visse o que ela tinha visto, mas não sabia como fazê-lo abrir os olhos.
— Sim. Eu disse a ele.
Ouviu o som de um sibilante que poderia ter sido Jake proferindo uma maldição, mas não tinha certeza.
— Isso não foi uma boa ideia. Eles nos farão pagar isso.
— São pessoas razoáveis, Jake. Tudo o que precisamos fazer é nos sentar juntos e falar sobre as coisas. Deixe-os mostrarem isso a você, verá todas as crianças que salvaram, e saberá que não são os monstros que minha mãe e seu pai acreditam.
— Há crianças aí?
— Muitas.
— Merda. Não me admito que não tenha ativado o detonador.
— Sim, mesmo se fossem os bandidos, não poderia ter feito isso. — Outro longo trecho de silêncio fez Lexi segurar o telefone com força. — Jake? Está aí?
Jake baixou a voz como se estivesse tentando esconder a conversa.
— Escute, Lexi. Só tenho alguns segundos. Tem que sair daí. Tire todas as crianças. Agora mesmo.
Uma sensação de fatalidade pesava sobre ela, deslizando por sua garganta até que se assentou pesadamente em seu estômago.
— Por quê?
— Precisa perguntar isso de verdade? Apenas faça isso.
Os Defensores estavam atacando. Lexi não havia feito o que tinha vindo fazer ali, estão eles estavam assumindo o controle.
Houve um ruído forte e um gemido de dor. Não tinha nem a menor ideia do que era o ruído, mas o pânico fluiu para dentro de Lexi, fazendo que seus estômago se revirasse.
Desesperada, disse:
— Cancele isso, Jake. Faça seu pai cancelar.
Mas não foi a voz de Jake que voltou para a linha. Foi a de Héctor. O som profundo de sua ira era inconfundível.
— É muito tarde para isso, menina. Temos seu homem.
Justamente quando ele dizia essas palavras, a cabeça de Lexi se encheu com o som do grito desesperado de Zach. Lexi! Estamos sendo atacados!
Oh, Deus. Já era muito tarde. Tinham Zach.
Fez um som de asfixia e quase deixou o telefone cair. Seu corpo todo estava intumescido com incredulidade quando tentou alcançar Zach, precisando estar junto dele. Como sempre, a única coisa que a saudou foi o silêncio. Não conseguia senti-lo.
Héctor continuou como se seu mundo não tivesse fora de controle.
— Você tem duas opções. Pode dar o alarme, e o mataremos junto com seu amigo neste momento, ou pode caminhar tranquilamente através daquela ruptura no muro, e o deixaremos viver. Tudo depende de você. O que vai fazer?
— Não façam mal a ele. — disse para ganhar aqueles preciosos segundos para pensar.
Sua mente voou através de suas opções enquanto falava. Um plano esquemático se formava em sua cabeça, lhe dando uma ideia de como podia proteger as pessoas em Dabyr.
— Deixe-me falar com Zach.
— Não pode. O homem apagou como uma luz, sangrando por todo o maldito lugar.
Oh, Deus. Zach.
Lexi fechou os olhos e engoliu a saliva, tentando limpar a cabeça da imagem de seu corpo estropiado prostrado para os caprichos de Héctor.
Não ia deixar Zach morrer. Seu povo necessitava muito dele.
Ela necessitava muito dele.
Lexi não podia permitir que matassem Zach e ao que estava com ele, mas sabia que se simplesmente ficasse sem avisar a alguém haveria uma boa chance de mais pessoas morrerem.
— Por que quer que eu saia? Por que não me mata com todos os outros? —Perguntou, orgulhosa do fato de poder realmente formar as palavras no meio da mistura caótica de pânico e medo revolvendo-se em seu interior.
— Prometi a sua mãe que cuidaria de você. Sou um homem de palavra.
Havia mais que isso, podia ouvir isso em sua voz, mas Lexi não perdeu tempo tentando descobrir.
— O que será, moça? Sai ou eu o mato agora e deixo que escute como cospe seu último suspiro?
— Vou. — sussurrou ela.
— Boa garota. Imaginei que veria as coisas de nossa maneira.
— O que vai fazer comigo? — perguntou.
— Você está pensando que nós a machucaremos? É uma de nós. O que fizeram com você não é sua culpa. — a compreensão soou estranha vinda dos lábios de Héctor. Não era do tipo compreensivo. — Esclareceremos suas dúvidas e então nos explicará o que sabe sobre esse lugar. Será uma aliada muito valiosa.
Isso era tudo? Queriam informação?
Algo sobre aquilo não parecia estar certo, mas seu tempo estava acabando e não lhe ocorria nenhuma nova opção.
— E você promete que não fará mal a Zach?
— Não, deixaremos que você faça as honras de matar a ele e seu amigo quando tiver recuperado sua sanidade. Tenho que admitir que vou desfrutar do espetáculo. Vi o quanto pode ser feroz quando está zangada. E quando eles não controlarem mais seus pensamentos, definitivamente estará zangada.
— Como o encontrarei? — Perguntou.
— Não se preocupe. Encontraremos você. Simplesmente saia, e nós faremos o resto.
Lexi nunca faria mal a Zach. Nunca. Mas Héctor não tinha por que saber disso. Seguiria seu jogo e faria todo o possível para manter as pessoas dali segura e depois salvaria Zach.
Claro, não tinha nem ideia de como ia conseguir isso, mas era boa pensando rápido. Tinha conseguido um pouco mais que os dez ou quinze minutos que necessitaria para cruzar o murro desmoronado.
Sim, claro.
Antes que perdesse o equilíbrio emocional, Lexi discou o número do celular de Helen.
Drake atendeu em um tom mal-humorado.
— O quê?
— É Lexi. Posso falar com Helen?
— Está dormindo.
Genial. Agora teria que lidar com um homem a quem mal conhecia, em quem não confiava, ao menos não como confiava em Zach.
— Temos um problema. Os Defensores estão planejando atacar Dabyr.
— Quando? — perguntou, a palavra foi uma ponta forte de gelo em seu ouvido.
— Agora. Necessito que todo mundo desocupe o lugar, mas faça isso em silêncio. Podem ter alguma forma de nos vigiar. Se souberem o que está fazendo, é possível que se movam mais rápido.
— Sabia disto o tempo todo, não? — exigiu ele.
—Não. Juro isso a você. — não havia tempo para convencê-lo, estão não se incomodou de tentar. — Há alguma saída secreta deste lugar? Um quarto seguro onde as pessoas possam se esconder ou algo assim?
— Eu não penso em dizer isso a você. Acha que sou um idiota?
— Apenas faça isso, Drake. Leve todo mudo para um lugar seguro.
— Há outra bomba? — perguntou.
— Não sei o que estão planejando, mas tenho certeza que têm algo sob a manga. E acredito que estão perto. — Lexi aspirou profundamente e deixou sair uma confissão. — Eles têm Zach e a alguém mais. Não sei de quem se trata.
Um rugido selvagem de raiva vibrou na linha.
— Onde estão, Lexi?
— Não sei, mas vou descobrir. Estão vindo me buscar.
— Não pode ir sozinha.
— Se alguém vier comigo, Zach é um homem morto.
— Droga. — cuspiu, e ao fundo, Lexi ouviu a quase inaudível e inquisitiva voz de Helen. — O que vai fazer?
— Terei que resolver isso quando chegar a hora.
— Não é um bom plano. Há muito em risco.
O coração de Lexi batia com força. Tinha começado a tremer, graças a uma boa dose de adrenalina. Continuar falando com Drake não resolveria nada.
— Não tenho mais tempo para discutir com você. Tire as crianças, maldito seja!
Desligou o telefone, pegou uma faca afiada da cozinha, a única arma que conseguiu encontrar, e se dirigiu a porta.
Embora não ouvisse as sirenes, as luzes do edifício começaram a conectar o fluxo elétrico enquanto ela corria pela relva molhada de orvalho. Drake tinha dado o alarme.
Só rezava para que o houvesse feito a tempo.
Grace correu através dos corredores para a suíte de Torr, seu coração pulsava com força por causa do medo. Há menos de um minuto, seu telefone tinha tocado, despertando-a de um sono profundo. Joseph gravou a mensagem dizendo que estavam em perigo iminente de ataque e que fossem imediatamente para um lugar seguro, embaixo da ala dos corredores da parte em Dabyr que pertencia aos humanos.
Ela tinha enviado seu meio-irmão com outra família, mas não podia ir ainda. Tinha que encontrar Torr e colocá-lo em segurança. Os Theronai estavam muito ocupados cuidando das crianças, e ela não podia correr o risco dele ser esquecido no caos.
Grudou-se à parede, evitando o monte de gente que fluía passando junto a ela. Após algumas voltas, passou a multidão. Correu descendo pelo corredor em direção a Torr parando abruptamente à sua porta. Essa estava aberta como de costume, e quando ela entrou, Torr estava em sua cama, a qual estava levantada para que ele pudesse olhar além da esplanada como gostava de fazer.
O sol mal havia começado a iluminar o horizonte com um belo brilho rosado. Tudo parecia normal, embora soubesse que esse não era o caso. A outra única vez que se deu um alarme como esse foi na noite em que o muro caiu.
— Temos que ir. — disse ela, sua voz agitada enquanto corria para sua cama.
— O que está acontecendo?
— Há algum tipo de ataque. Não conheço todos os detalhes.
Sua mandíbula se esticou e um olhar de fúria cruzou suas feições.
— Não deveria ter vindo até mim. Tem que ir lá para baixo com os outros humanos.
Ela amarrou as correias à grua que costumava utilizar para levantá-lo.
— Não vou sem você.
— Isto é uma estupidez. Não há nada que eles possam fazer a mim.
— Poderiam matá-lo.
— Já estou morto, e ambos sabemos.
— Ainda não, não está e tampouco vou deixar que isso aconteça esta noite.
— Não valho o risco, Grace. Por favor, vá para baixo para que eu saiba que está a salvo. Agora.
Ignorou sua ordem e continuou nivelando a cama de modo que pudesse levantá-lo até sua cadeira. Seu corpo estava flácido quando a máquina o levantou da cama até sua cadeira de rodas. Seus olhos ardiam com cólera, e ela quase podia ouvi-lo apertando os dentes.
— Tem alguma ideia do que isto vai fazer comigo se você morrer tentando me salvar? — exigiu ele.
— Não vamos descobrir isso.
— Nem sequer sabe sob que ameaça estamos. Os Synestryn podem estar marchando pelos corredores enquanto nós falamos.
O pensamento a fez estremecer, mas não parou de mover-se. Não o deixaria.
— Mais uma razão para levá-lo comigo. Temos tempo para chegar a um lugar seguro. Ambos.
Ela hesitou só por um momento antes de levar um tempo apertando rapidamente as correias que mantinham seu corpo no lugar. Tinha pouco tempo, mas se ele deslizasse de sua cadeira, nunca seria capaz de levantá-lo de novo sem ajuda.
Fechou a última das fivelas e o olhou nos olhos. Ela estava perto o bastante para sentir sua respiração passando junto a sua face. Queria beijá-lo com tanto desespero que seu corpo tremia com o esforço de conter-se.
Além disso, agora não havia tempo para isso. Depois, haveria. Prometeu a si mesma que seria corajosa o suficiente para beijá-lo. Logo.
Sua voz estava grossa por causa do desejo.
— Está me matando, Grace.
— Não, estou salvando você.
— Se eu perder… — caiu, sua garganta fechando-se.
Ela acariciou sua face, sentindo o calor de sua pele sob seus dedos frios.
— É exatamente assim como eu me sinto. Tampouco posso perder você.
Ele afastou os olhos enquanto os fechava.
— Por favor. Não podemos fazer isto. Não pode fazer isto a si mesma.
Sabia que ele estava falando sobre seu relacionamento, mas decidiu entendê-lo mal de propósito.
— Não estou fazendo nada que não queira fazer. Necessito que esteja a salvo.
Antes de perder mais tempo, o fez girar para a porta, para a entrada do túnel.
Se algo acontecesse a Torr, não sabia se sobreviveria. Já tinha perdido muito no ataque dos Synestryn a sua família. Não podia perdê-lo também.
Quando Zach recuperou a consciência, estava deitado de lado, amarrado com tanta força que as cordas entravam em sua pele com força suficiente para cortar sua circulação. Olhou ao redor, tentando descobrir onde estava, mas os limites apertados do espaço escuro não lhe deram nenhuma pista. Todas as janelas estavam cobertas, e sua prisão estava em movimento. Podia sentir as vibrações embaixo dele, ouvir o zumbido dos pneus na estrada.
Ao seu lado, Neal estava amarrado, sua cabeça ensanguentada deixava uma poça escura sob ele. Seu peito se movia quando respirava, mas não muito. Não o suficiente para um homem de seu tamanho.
Um pouco de luz entrava no pequeno espaço, mas era o suficiente para dizer a Zach que lá fora era de dia. Ao menos todo o sangue que tinham derramado não levaria os Synestryn ao jogo.
Sua cabeça pulsava e seus músculos estavam rígidos por todas as convulsões, mas, além disso, dificilmente podia sentir algo. Seus braços e pernas estavam dormentes pela perda da circulação. Quando se moveu, percebeu que estava sobre uma superfície macia, parecida com um colchão. Sentou-se e deu uma olhada ao redor o suficiente para supor que estava na parte de trás de um trailer, deitado em uma cama. A porta da cabine principal tinha a abertura de 30, 48 centímetros, e através dela, ele podia ver várias formas imprecisas movendo-se.
Imprecisas? Fantástico. Deviam ter batido nele com mais força do que pensava.
O trailer parou. Ele ouviu passos, sentiu como a coisa se movia com a adição de um novo peso. Entraram várias pessoas, fechando a porta atrás deles. Começaram a se mover novamente, dirigindo-se para a estrada.
— Onde está Zach? — era a voz de Lexi, clara e exigente.
O coração de Zach deu um salto, aliviado ante o doce som de sua voz. Então seu cérebro nebuloso se deu conta do que significava ela estar ali.
Lexi também tinha sido sequestrada por aqueles filhos da puta.
O ar dos pulmões de Zach congelou, fazendo-o conter a respiração. Esticou-se para chegar a sua espada, mas não só sua mão não se movia; tinha certeza que tinham tirado sua arma antes de levá-lo até ali.
Todavia cada instinto protetor que possuía se levantou sobre suas pernas trêmulas e uivou. Zach tentou gritar uma advertência, mas tudo o que saiu foi um som abafado de derrota. Tinham tapado sua boca, amordaçando-o e atordoado como estava não tinha percebido até agora. Não era bom sinal que tudo fosse escada acima.
Zach se esforçou para mover-se, obrigando seu corpo dormente a obedecê-lo. Tinha que chegar até ela. Protegê-la. Salvá-la.
— Está na parte de atrás. — disse o homem.
— Vou vê-lo. — sua voz era firme, mas hesitante pelo medo.
— Tudo bem. — disse o homem. — Mas que seja rápida. Temos um espetáculo para representar. As pessoas esperam.
Um segundo depois, o rosto de Lexi apareceu, aproximando-se cada vez mais até que já não era um borrão. Seus olhos castanhos chocolate brilhavam com lágrimas de preocupação que não tinha deixado cair. Seus dedos tremiam quando os deslizou por seu rosto. Quando os retirou, estavam machados com sangue.
— Poderia tê-lo matado. — acusou Lexi, virando-se para o homem de pé atrás dela.
Ele era alto, corpulento tanto com gordura como com músculo. Tinha um ar de autoridade nele tão grande que os outros homens no trailer se mantiveram vários passos para trás como se não quisessem ter que estar sob aquele peso.
Talvez tivessem medo dele.
— Os rapazes são resistentes. — disse o homem. — Tiveram que golpeá-los bem e com força para submetê-los. Essas pistolas atordoantes funcionaram como um feitiço. Definitivamente acrescentaremos essas ao nosso arsenal.
Lexi puxou a ponta da fita da boca de Zach. Sua boca ardeu, mas ele congratulou-se com a dor. Isso queria dizer que estava vivo. Que ainda havia uma chance de lutar.
— Você está bem? — perguntou com voz tensa, como se mal pudesse se conter.
Assim que sua boca ficou livre, ele disse:
— Sai daqui.
Ela lhe deu um sorriso triste e trêmulo.
— Não sem você.
— Chega de reuniões. — disse o homem enorme atrás dela. — Temos coisas a discutir.
Lexi se virou, a exasperação vibrando ao longo de suas costas.
— Não lavaram meu cérebro, Héctor. Todos vocês estão cometendo um erro.
— Deixe-a ir. — disse Zach. — Você já tem Neal e a mim. Não precisa dela.
Héctor empurrou Lexi para um lado e pairou sobre Zach. O ódio brilhava em seus olhos, fazendo-os inchar.
— Aí é onde se equivoca, garoto. Lexi é parte do plano principal. E você… bom, a moça sente carinho por você, o que o torna muito útil.
Útil. Ou merda. Ele era a alavanca de acionamento.
Tinha que sair daquelas cordas, mas não podia sentir os dedos para que afrouxassem os nós soltando-os.
— Apenas vá, Lexi. — implorou Zach.
Héctor deu um sorriso frio para ele.
— Ela fará isso. Não se preocupe. Só precisamos que detone primeiro.
Um medo doentio pousou no estômago de Zach. Detonar. Aquilo não soava nada bem.
Quando Héctor cruzou o pequeno espaço indo até um armário minúsculo armário e tirou um colete coberto com fios e blocos de explosivos de uso militar, Zach soube o quanto seria ruim.
O colete era muito pequeno para que um dos homens presente o usasse. Era do tamanho de Lexi.
Lexi ficou olhando para o colete, e o medo caiu sobre ela igual a uma avalanche, deixando-a aterrorizada e sufocada. Apertou os joelhos para manter-se em pé, mas sua visão se escureceu.
— Isso é para mim, não é mesmo? — perguntou a Héctor.
— Feito sob medida por minhas próprias mãos. — disse ele. — Rapazes.
Dois homens atrás dela agarraram seus braços. Estava muito chocada até mesmo para pensar em lutar. Mas agora que eles a tinham imobilizado apertando com força, seus instintos de sobrevivência a golpearam e ela voltou a lutar, distribuindo golpes a torto e a direito com pés e punhos. Tinha conseguido dar vários golpes, mas os homens que a seguravam eram muito fortes, enormes sacos humanos acostumados a golpes mais duros.
Afinal eles trabalhavam para Héctor.
— Parem seus chutes e segurem-na. — disse Héctor enquanto começava a passar seus braços através dos buracos com mais que um pouco de ajuda dos homens que a seguravam. — Temos um horário a cumprir.
Zach deixou escapar um grito de pura raiva e se retorceu até que caiu no chão. Seu corpo estava amarrado com força, envolvido com uma corda forte e fina. Não havia como ele se soltar sem ajuda.
Lexi estava furiosa, morrendo de vontade de fazer algo para evitar que isso acontecesse. Sabia que o poder para fazer isso estava ali, bem em sua garganta, pairando sobre a luceria, e o alcançou, lançando-se contra a barreira que os separava.
Zach a olhou nos olhos e seu corpo se aquietou, como se sentisse sua tentativa. Seus olhos cravados nos dela, e lhe deu um simples assentimento.
Tinha funcionado? Lexi não sentia nenhum poder, nenhuma energia fluindo como Helen descreveu. Empurrou outra vez, mas a barreira ainda estava no lugar, interceptando-a.
O fracasso destruiu seu corpo, fazendo-a escapar do apresamento dos dois homens. Ainda não podia alcançá-lo. Ele estava ali, disposto e preparado para compartilhar com ela tudo o que precisava para salvar a ele, ao Neal e a si mesma, mas ela não conseguia alcançá-lo.
— Está na hora. —disse Héctor. — Antes que os Sentinelas descubram que todos vocês desapareceram. — ele pegou um casaco e o colocou nela como se ela tivesse dois anos.
E como alguém de dois anos, ela queria lutar com ele a cada passo do caminho. Só o fato de ter uma arma com ela a impedia de fazer algo assim.
— Não quero fazer isto. — sussurrou Lexi. — Seja o que for que você queira, não o farei.
— Sim, fará. Vai dirigir seu traseiro diretamente de volta ao interior daquele complexo e ficar no meio como uma boa menina até apertar o detonador.
— Como um inferno que o farei. — disse Lexi.
— Fará, ou começaremos a tirar pedaços de seu amante aqui, um a um. É a sua vida ou a dele.
— Vá embora, Lexi. — disse Zach. — Pode tirar essa coisa presa a você quando sair daqui.
Héctor sorriu abertamente
— Você acha que eu já não tinha pensado nisso? — apontou com o dedo polegar uma série de discos de metal que se agrupavam na frente do colete, amarrados a fios que a rodeavam por completo. — Conectores magnéticos. Rompa o circuito e a coisa fará “boom”. A única maneira de que nossa garota sair deste colete é em pequenos pedaços.
Oh, Deus. Seu estômago revirou e ela teve que engolir para evitar vomitar tudo sobre os fios. Quem sabe se isso também o faria explodir.
Héctor deve ter visto como sua pele tinha ficado verde, porque subiu o zíper do casaco, protegendo o artefato da vista e o desastre gastrointestinal.
Zach resmungou como se derrotado e se virou para Héctor. Héctor chutou suas costelas com força com o bico da bota, fazendo Zach ofegar de dor.
Lexi estremeceu e um grito de angústia escapou de seus lábios, traindo seus sentimentos por Zach a Héctor.
Sua vida pela dela.
Não. Ambos iriam morrer, e Lexi sabia. Estavam unidos. Se ela morresse, ele também o faria. E mesmo se isso não fosse verdade, de forma alguma Héctor libertaria Zach após Lexi fazer o que ele queria. Seu ódio era muito forte. Sua necessidade de vingar a filha morta há mais de vinte anos tinha dizimado toda a piedade dele.
— Isto não trará Mindy de volta. — disse Lexi. — Há meninas humanas lá iguais a ela. Também quer matá-las?
O rosto de Héctor se obscureceu a um profundo e lívido arroxeado.
— Não se atreva a falar sobre isso. — advertiu. — Não é boa o suficiente nem sequer para pronunciar seu nome. Agora é uma deles.
— Não há nós e eles. Somos todos iguais. Todos nós queremos o mesmo, destruir os Synestryn para que eles nunca mais possam nos machucar de novo.
— Não somos iguais. Somos melhores que vocês. Este é nosso planeta. Nosso!
Os homens de Héctor começaram a recuar, seus rostos pálidos de medo. Lexi sabia tão bem quanto eles qual seria a próxima coisa que aconteceria. Héctor começaria a atacar qualquer coisa ou quem estivesse por perto.
Lexi permaneceu de pé, mantendo o queixo erguido.
— Não faça isso, Lexi. — a voz de Zach estava tensa, e ela podia sentir seu medo por ela batendo naquela barreira entre eles.
Estava gritando que ela fugisse, mas se fizesse isso, Héctor ficaria para trás e tentaria de novo.
Sua única chance de detê-lo era fazê-lo cair ali mesmo, agora mesmo. Tinha-lhe dado a arma, amarrada fortemente contra seu corpo, tudo o que tinha que fazer agora era encontrar coragem para utilizá-la.
Lexi olhou para Zach. Seus cabelos estavam emaranhados com sangue. Mais sangue deslizou entre seus olhos, aqueles belos olhos verdes de leopardo que sempre a tinham intrigado, mesmo quando a tinham apavorado. Olhos que imploravam a ela que fugisse agora. Que se salvasse.
Nesse momento, soube a verdade. Não havia mais perguntas sobre lavagens cerebrais, não havia mais pontadas de dúvida interpondo-se em seu caminho. Ele não a enganou ou coagiu como Héctor fazia agora.
Zach não tinha sido outra coisa senão honesto com ela desde o começo. Não tinha escondido nada dela, nem mesmo que precisava dela, nem mesmo o poder que ela tinha sobre ele.
Um único pensamento e a luceria cairia de seu pescoço. Seria livre, mas ele morreria. Ele tinha depositado a vida dele em suas mãos. Sua confiança.
Só poderia recompensá-lo de uma maneira e essa ia matar a ambos.
Lexi queria ter descoberto a verdade muito antes. Queria tê-lo conhecido há anos, que tivessem tido mais tempo juntos que agora.
Queria ter podido amá-lo por mais tempo.
— Está disposto a morrer por sua gente? — ela perguntou.
— Sim. — disse ele sem vacilação.
— Como eu também estou. Este é o único caminho.
Os olhos de Zach se arregalaram ligeiramente ao entender, então se fecharam com pesar. O fim. Absoluto. Ele lhe deu um assentimento quase imperceptível, consentido que ela continuasse com seu plano.
Alguém novo entrou no trailer, mas Lexi não se separou de Zach para ver quem era.
— Estão preparados. — ouviu Jake dizer por trás dela.
— Chega disso. — rugiu Héctor. — Mova seu traseiro lá para fora. As pessoas estão esperando.
Lexi arrancou seus olhos de Zach e os fixou em Héctor.
— Vai me dar tempo para lhe dizer adeus. — disse ela.
— Não, eu não vou.
— Que mal isso pode fazer, pai? — disse Jake. — Não há nada que ela possa fazer para impedir isto. Dê um minuto a ela com o homem por quem morrerá para salvar.
Então Lexi olhou para ele, surpreendida pelo inesperado apoio. O olho esquerdo de Jake estava fechado e inchado, e um escuro hematoma estava se formando em seu rosto. Então aquele foi o som que ouviu pelo telefone. Héctor havia batido nele quando encontrou Jake lhe dizendo que evacuasse os edifícios.
Héctor cruzou os braços sobre o peito amplo.
— Um minuto. E não vou sair daqui. Diga o que tiver para dizer com audiência ou não o faça.
Lexi assentiu e correu para frente, ajoelhando-se sobre o chão ao lado de Zach. Enquanto estava abaixada, tirou a faca de cozinha de seu sapato, seus movimentos escondidos pelas volumosas pregas do casaco.
Estendeu-se ao redor dele, abraçando-o com força, e enfiou a faca entre suas roupas. Não tinha tempo para ser cuidadosa e a preocupava a possibilidade de tê-lo cortado, mas isso era tudo o que podia fazer. Não havia muita escolha, mas ao menos era algo.
Os olhos de Zach brilharam de emoção enquanto a olhava. O calor flutuou nela através do vínculo, consolando-a.
— Amo você. — disse ele. — A morte não mudará isso.
As lágrimas que estava contendo desde que os homens a apanharam fora dos muros de Dabyr se liberaram e deslizaram por sua face, batendo no casaco militar com um suave repico.
— Também o amo. — disse ela, querendo dizer mais do que era capaz de expressar nos breves segundos que os deixaram juntos.
Mais que tudo, Lexi queria que a barreira entre eles não estivesse ali, assim ele poderia sentir seu amor por ele da maneira que ela sentia o dele. Queria banhá-lo nele, assegurar que suas palavras eram verdadeiras.
— Posso tirar a luceria. Se para você for mais fácil dessa maneira. — não tinha certeza de quanto mais ele viveria depois que a tirasse, mas talvez desse a ele mais alguns dias, ou mesmo horas.
Não queria lhe roubar nenhum deles.
— Não. Não quero que fique sozinha. Estarei lá com você até o fim.
Quando morresse. Não havia dito isso, mas ambos sabiam que era isso o que ele quis dizer.
Embora ele não pudesse senti-la através da coisa, ela podia senti-lo. Podia sentir seu amor, seu consolo.
— Não quero ficar sozinha, nunca mais.
— Estamos destinados a ficar juntos. — sussurrou em tom fervoroso. — Ainda acredito. Encontrarei você. De algum jeito, encontrarei você.
Lexi acreditava nele. Era um homem muito poderoso para deixar que algo tão ínfimo como a morte se interpusesse em seu caminho.
— Esperarei por você. — disse ela; então o beijou.
A boca dele era quente e suave, tão gentil contra a sua que ela se perguntou como algum dia pôde ter pensado que ele queria machucá-la. Deixou fluir cada fragmento de seu amor por ele naquele beijo, lhe dizendo o que as palavras não podiam.
— Basta. — disse Héctor. — Está na hora de ir.
Héctor guiou Lexi para o centro da caravana, a maioria das caminhonetes tinha placa do Texas. O tamanho da reunião a deixou atônita. Nunca tinha visto tantos deles juntos em um só lugar.
— Estão todos aqui para o espetáculo. — disse Héctor enquanto a guiava pelo braço para o grupo de pessoas esperando. — Seremos capazes de ver os foguetes do topo dali. Vai ser um espetáculo e tanto.
— Está equivocado com aquelas pessoas, Héctor. Não desejam fazer nenhum mau a vocês. — no entanto Lexi com certeza o fazia. Enviaria o traseiro deles ao inferno. — Você vai se arrepender por ser muito estúpido para escutar a razão.
— É a lavagem cerebral falando. Não se preocupe. Não terá que suportá-la muito mais.
Não. Não teria. Embora ainda tivesse alguns minutos para ajudá-los a ver a verdade. A menos que um punhado de cavalheiros brancos entrasse, essa era a única chance que teria para salvá-los.
— Há crianças humanas lá dentro. Jake lhe disse isso?
— Disse. Não importa. Todos estão sob o enfeitiço dos Sentinelas. Não posso fazer nada por eles exceto tirá-los de sua miséria.
— Eu pensei que você estava tentando ajudar aquelas pessoas a fugir da influência deles. Era isso o que ia fazer com Helen.
Héctor deu de ombros.
— Contei a você o que queria ouvir para conseguir que fizesse as coisas certas. Você acha que se eu tivesse contado que sua amiga era um caso perdido teria cooperado?
— Então você esteve me usando desde o começo.
Ele soltou uma gargalhada horrível.
— Diabos, garota. Comecei a usar você antes mesmo que nascesse. Sua mãe era de natureza sugestionável. Acreditava em tudo o que eu lhe contava. Até mesmo escreveu o que eu disse.
Então era dali que tinham vindo todas as entradas do diário de mamãe. Não era de admirar que parecessem tão loucas. Héctor estava louco. Qualquer objetivo nobre que tivesse tido, presumindo que tivesse havido algum, havia se perdido ao longo do caminho.
— Mamãe confiava em você. — disse Lexi.
A raiva e o ressentimento ardiam brilhantes em seu interior, mas os manteve oculto.
— Sempre o fazem. Que pena que Jake não tenha o talento de fazer que as pessoas confiem nele da forma que eu faço. Não é mesmo, Jake?
Atrás dela, Jake não disse nada. Manteve o rosto maltratado baixo, olhando fixamente para o chão. Seu corpo estava tenso e ela podia sentir sua ira fervendo sob a superfície.
— Ao menos Jake escuta. — disse Lexi.
— Só que ele está convencido, como sua mãe. Meu filho é uma grande decepção. — disse Héctor para Lexi enquanto o filho não estava por perto.
Jake estremeceu, então parou de caminhar por completo e caiu para trás.
Héctor nem sequer se incomodou de olhá-lo. Que tipo de pai machucaria o filho daquela maneira e não se importaria?
Lexi percebeu que estava desperdiçando seu fôlego tentando fazê-lo ver a verdade. Mesmo se vivesse cem anos, não haveria tempo suficiente para fazer Héctor Morrow mudar de ideia.
Ia morrer ignorante, e não havia nada que Lexi pudesse fazer mudar isso.
Portanto, ao invés de gastar os últimos segundos de sua vida tentando, Lexi calou a boca e se concentrou em Zach. Podia sentir sua presença, rondando dentro dela, segurando-a perto, embora estivesse a quilômetros de distância. Também podia sentir sua determinação de libertar-se. Não tinha certeza se ele tinha encontrado a faca que ela deixou para trás, ou mesmo se foi capaz de utilizá-la, mas ainda não tinha se rendido.
Talvez se ele se libertasse a tempo… Não. Havia muitos deles, todos armados. Mesmo Zach seria incapaz de encarregar-se de centenas de texanos armados.
O peso dos explosivos amarrado ao seu peito parecia estar se aproximando dela. A realidade a tinha dormente, com a aceitação. Não estava lutando contra seu destino da forma que Zach fazia. A única maneira de impedir Héctor e seus homens de tentarem ferir as pessoas em Dabyr era matando-o.
Lexi arrastou um braço para dentro do enorme casaco. Tudo o que tinha que fazer era abrir repentinamente um daqueles ímãs e tudo terminaria. Não haveria mais ameaças. Não haveria mais Defensores.
Ao menos Helen estaria a salvo. Dabyr estaria a salvo.
Lexi presumiu que era a última coisa que podia fazer depois de sua intenção de fazer voar todo o lugar.
Héctor empurrou-a para detê-la dentro do círculo de veículos estacionados na clareira. Elevou sua voz para fazer-se ouvir pela multidão. Lexi não escutava suas palavras. Estava muito ocupada contando, fazendo a conta do número de vidas que ela iria acabar hoje. Cento e doze.
Perguntou-se se aqueles homens eram tão cruéis quanto Héctor. Se vivessem, se encarregariam de continuar de onde ele o deixasse? Eles se assustariam e voltariam para suas famílias para viverem uma vida agradável e tranquila? E o que aconteceria com os defensores que não estavam ali hoje? Como reagiriam ao que ela ia fazer? Seu desejo de acabar com os Sentinelas aumentaria por terem sofrido uma grande perda? Ou restaria um número suficiente deles para recolher os pedaços e continuar no lugar de Héctor?
De repente Lexi sentiu o peso de sua decisão oprimindo-a. Uma coisa era pensar em fazer aqueles homens voarem pelos ares. E outra era olhá-los nos olhos e fazer isso. Aqueles homens tinham esposas, filhos. Pessoas que os amavam. Como poderia acabar com suas vidas sem saber nada a respeito deles exceto que tinham caído sob a influência de Héctor da mesma maneira que sua mãe havia feito?
Estou aqui. Era Zach, reconfortando-a.
Ela havia sentido sua indecisão? Seu sentimento de culpa?
Lexi se estendeu para ele, querendo sustentá-lo em sua mente como ele fazia. Reconfortá-lo. A barreira ondulou contra seu toque, mas não se quebrou. Empurrou mais forte, mas quanto mais ela empurrava, mais ela parecia fortalecer-se.
Não deixarei você, amor.
Havia amor em suas palavras. Tanto que fez seus olhos arderem pelas lágrimas.
Lexi fechou os olhos e deixou que o amor dele crescesse dentro dela, enchendo-a de calor e luz. Zach estava com ela e ela não se preocuparia mais. Sabia exatamente o que tinha que fazer.
Amo você, disse a ele, e dessa vez, sentiu sua mensagem atravessar a barreira.
Tinha feito! Sentiu a surpresa de Zach, sua euforia por ter sido capaz de alcançá-lo.
Os homens que a rodeavam aclamaram como se soubessem o que tinha acontecido. Héctor levantou o punho em sinal de vitória.
— Hoje, nossos inimigos cairão! — gritou.
Mais aplausos irromperam.
— Está na hora. — disse Héctor a Lexi. — Um dos homens levará você de volta ao muro e ligará uma câmera assim eu saberei quando apertar o botão. E saberei que não está tentando nada engraçado. Vá como uma boa menina e deixarei que seu homem viva.
Era mentira, mas Lexi deixou isso passar. Tinha preocupações maiores que as últimas mentiras de Héctor Morrow.
Estou chegando, carinho. Espere.
Não! Tentou dizer a ele, mas não tinha certeza que sua mensagem tinha passado. Era muito perigoso. Aqueles homens o abateriam a tiros.
Héctor tirou um dispositivo de seu bolso. Um controle remoto que detonaria a bomba. O plástico negro reluzia sob a luz do sol da manhã. Um diodo[11] verde piscava alegremente, indicando que tudo estava bem.
Por um momento, ficou capturada pela luz que piscava, desejando que seu trabalho fosse feito. Todo seu corpo tremia de ansiedade, sobre tudo seus dedos, agarrados firmemente a um par de discos magnéticos.
— Posso falar? — perguntou ela. — Se vou morrer, tenho permissão para umas últimas palavras, não?
Héctor estreitou os olhos, então uma sorriso calculista curvou seus lábios carnudos.
— Vá em frente. Diga o que quiser. Todos estes homens sabem que é um peão dos Sentinelas. Você apenas vai provar minha causa.
Ele levantou a mão e os homens que a rodeavam se calaram.
— A garota tem algo a dizer.
Os homens riram como se ele tivesse contado uma piada. Depois outra vez, talvez seu bate-papo nesse ponto fosse divertido. Ridículo.
— Sei que todos pensam que meu cérebro foi lavado, mas não é assim. — Eles riram mais alto, mas Lexi os ignorou. — Estive dentro daqueles muros e sei que tipo de pessoas são os Sentinelas. Eles são o tipo de pessoas que acolhem crianças órfãs. O tipo de pessoas que colocam em perigo suas vidas todas as noites para que todos vocês possam dormir mais seguros em suas camas. — as risadas dos homens morreram. — E embora cada um de vocês aqui os matasse antes de falar com eles e conhecerem a verdade, se um de seus filhos estivesse em perigo, um de seus filhos estivesse órfão, eles o acolheriam e o manteria a salvo. Sem ressentimentos. Sem rancores.
Os homens começaram a olhar uns aos outros com nervosismo, trocando seu peso de um pé para o outro. Ela baixou a voz e olhou como aqueles homens se moviam para ela, esforçando-se para escutar o que ela tinha para dizer em seus últimos momentos.
— Temos inimigos. Precisamos lutar, mas estão lutando na guerra errada. Os Synestryn são nossos inimigos reais. São eles que querem nosso sangue. O sangue de nossas crianças.
Eles estavam próximos o bastante agora.
Seus dedos seguraram os discos de metal frios que forravam o frente de seu colete. Empurrou uma unha entre dois deles, sentido a força magnética que os mantinha travados, unidos estreitamente. Tudo o que tinha que fazer era girar sua unha e empurrar, e tudo acabaria. Levaria todos aqueles homens com ela, libertando os Sentinelas e aqueles a quem protegiam da ameaça que os Defensores representavam.
Amo você, Zach. Tinha que dizer-lhe mais uma vez. Assegurar que ele soubesse.
Suas palavras passaram facilmente através da barreira daquela vez, derretendo-a. O poder rugiu em seu corpo como uma onda gigantesca, fazendo-a balançar-se sobre seus pés. Seu corpo parecia preparado para fazer isso, desejando-o ardentemente. Suas células o absorveram, fazendo-a sentir-se mais forte no decorrer de cada batimento cardíaco.
Não havia lugar dentro dela para o medo ou a indecisão. Sabia exatamente o que precisava fazer, e graças ao amor de Zach, tinha o poder para fazê-lo.
Sentiu o amor de Zach envolvendo-se ao seu redor, aquecendo-a, deslizando sobre sua pele como uma carícia. O calor formigante a impregnou por dentro e ela tinha certeza de que se olhasse, estaria brilhando.
Sua voz se elevou, alta e forte, ressoando com a energia que pulsava em seu interior. Respirou fundo, rezando para poder canalizar aquele poder e controlá-lo.
— Cada um dos Sentinelas sacrificaria sua vida para salvar um de vocês. —examinou a multidão, olhando nos olhos de cada homem. — E eu sou um deles. Lembrem-se disto quando contarem aos seus filhos o que viram aqui hoje. Lembrem-se que um Sentinela um dia teve o poder sobre sua vida ou morte. E os deixou viver.
Com isso, utilizou seu poder recém-adquirido para criar uma parede forte o suficiente para conter a força da explosão, para canalizá-la ao céu. Então separou os ímãs, detonando a bomba amarrada ao seu peito.
Zach finalmente conseguiu libertar-se das cordas, pegou sua espada na cabine principal do trailer, e correu para Lexi quando sentiu que a barreira entre eles se derretia. O poder saiu dele, obrigando-o a ficar de joelhos em estado de choque. As pedras feriram sua carne, enfiando-se em suas articulações, mas mal as sentiu. Seu corpo ainda estava entorpecido e formigando por ter ficado amarrado tanto tempo, e mesmo tendo quase arrancado a pele de seus antebraços ao escapar das cordas, não sentia dor.
Em vez disso, ele foi rodeado por um calor calmante como se Lexi o segurasse entre os braços.
— Amo você, Zach. — sussurrou ela em sua mente.
As palavras estavam revestidas de resignação por sua decisão. Uma valente resignação.
Zach sentiu suas emoções correrem através dele e soube o que isso significava. Ela ia detonar o dispositivo logo. Levando com ela tantos Defensores quanto pudesse. Tinha visto seu plano brilhando em seus olhos, tinha o ouvido em sua voz quando perguntou a Héctor se ele estaria disposto a morrer por sua gente.
Eu estaria.
Zach tentou enviar uma mensagem avisando que escapado e que ia buscá-la, mas era muito tarde. A luz relampejou iluminando o céu da manhã e o trovão se estendeu sobre a terra.
— Não! — gritou Zach enquanto corria para ela, em direção ao último lugar em que sentiu todo aquele amor fluir.
Uma coluna de fumaça e fogo subia como se toda a energia da explosão tivesse sido empurrada dentro de um túnel invisível.
Estendeu-se com sua mente enquanto seus pés voavam sobre o chão molhado de orvalho. O eco de seu amor que flutuava através da luceria ainda não tinha acabado, mas era tudo o que restava: um eco vazio morrendo em um silêncio mórbido enquanto ele corria.
Zach subiu até a borda onde podia ver os homens reunidos lá embaixo.
A raiva e a dor o varreram, não deixando espaço para ele respirar. Ela tinha partido. Sua doce Lexi se foi.
Seus membros estavam pesados e trôpegos quando ele subiu, sua raiva frenética palpitava com força em suas veias até que vibrou em seus ossos. O sangue escorreu por sua pele, tornando as rochas escorregadias.
O único consolo que tinha era que logo se uniria a ela. Quaisquer vidas que tivessem depois de deixar esse mundo iriam passá-la juntos.
Mas primeiro, Zach mataria todos aqueles filhos da puta por lhe arrebatarem[12] Lexi. Não tinha certeza de quanto teria antes que seu tempo acabasse, mas ia se certificar de que fosse o suficiente para fazer o trabalho.
Com sua espada na mão ensanguentada, Zach deu uma olhada pela borda, o sabor metálico da vingança na sua língua. Os Defensores estavam ao redor dela, contemplando a terra chamuscada e a cratera que embalava seu corpo.
Seu corpo? Certamente depois de uma explosão como aquela não haveria nenhum.
A urgência de reunir o que restava dela em seus braços ardia com força dentro dele, mas não tão forte quanto sua necessidade de sangue. Queria sentir o sangue daqueles homens salpicando em seu rosto, ainda quente com a vida que ele lhes cerceava. Queria senti-la quando ensopasse seus braços até que gotejasse deles. Queria observar como se empoçava no chão, molhando a terra com sua raiva e dor.
Os Defensores não tinham percebido sua aproximação. Um sorriso satisfeito esticou seus lábios e descobriu seus dentes.
— Zach, não! — por um segundo, Zach pensou que era Lexi o chamando, e seus passos vacilaram quando se virou para encontrá-la.
Mas não era Lexi. Era Helen. Estava agarrando-se ao braço de Drake, arrastando os pés de fadiga.
Ela e Drake caminhavam para os Defensores, que agora os olhava com os olhos arregalados, assustados.
Zach calibrou sua lâmina e se preparou para as balas que ele não duvidava que golpeassem sua pele a qualquer momento. Mas em vez de disparar suas armas, os Defensores começaram a se dispersar como formas de geada a luz do sol.
— Não! — gritou Zach.
Não ia ser capaz de alcançar a todos.
Helen levantou a mão e um anel de fogo surgiu da terra, prendendo-os em um quente e estreito abraço. Mesmo com a barreira evitando a fuga, todos conseguiram permanecer fora do alcance de Zach.
Ele caminhou majestosamente para eles, faminto por seu sangue, e correu para uma parede invisível.
A raiva surgiu dentro dele e ele cortou o obstáculo, fazendo que aquilo vacilasse e brilhasse no ar.
— Não vai passar. — disse Andra.
Seus pés firmemente ancorados no chão, seu corpo longo e magro coberto por couro e denim[13].
Paul se mantinha ao seu lado, sem armas, seus olhos sobre o corpo de Lexi.
— Talvez também prefira conservar sua força.
De onde Andra tinha saído? Zach não a viu se aproximar. Ou Paul.
— Deixe-me passar. — ordenou com os dentes cerrados.
— Não. — disse ela. — Isso não vai acontecer.
Paul se aproximou de Lexi, e Zach sentiu uma ardente possessividade escaldar seu interior. Correu para ela, pouco disposto a deixar que outro homem a tocasse. Paul se ajoelhou ao lado dela, estendendo a mão.
— Não! — gritou Zach quando chegou ao lado de Paul, empurrando o outro homem para longe dela. — Não toque nela.
Paul levantou as mãos.
— Só estava verificando se ela tinha pulso.
Pulso? Por que deveria ter pulso?
Houve um estridente som metálico que Zach sabia que significava perigo, mas o ignorou. Lexi absorvia tudo dele. Sua atenção, suas emoções, suas esperanças e sonhos.
Era tudo para ele, e tinha partido.
Deveria ter encontrado uma maneira de salvá-la. Seu trabalho era mantê-la a salvo, protegida. Deveria ser o único deitado ali em uma cratera enegrecida. Deveria ser o único cujos cabelos estivessem chamuscados e sua carne queimada.
— Tire as armas ou perderá um testículo. — disse Andra em um tom de advertência.
Que eles lhes desse ou não um tiro não preocupava Zach. Até mesmo sua necessidade de vingança tinha desaparecido, perdendo a importância à medida que o corpo de Lexi esfriava.
A urgência de mantê-la quente enquanto pudesse o atravessou, assumindo aquele papel. Recolheu o corpo inerte em seus braços e a embalou em seu colo. A cabeça dela pousou em seu ombro, cobrindo sua roupa de fuligem e cinza. Suas sobrancelhas era o que estava mais queimado, seus cílios um pouco derretidos. Seu queixo altivo já não se levantava desafiante, mas estava enterrado em seu peito.
Os dedos de Zach traçaram seu rosto, memorizando as curvas suaves e linhas gentis. A fuligem enegrecia sua mão, fazendo o redemoinho verde jade de seu anel contrastar com ela.
Movimento? Se ela tivesse partido, não haveria nenhum movimento na cor. Teria se definido no momento de sua morte. Sem mover-se.
Um fraco sopro de esperança derramou-se sobre sua pele. Zach pressionou os dedos em seu pescoço. Sua pele estava quente, um pouco quente demais inclusive. E sob a pele macia o débil movimento de vida pulsava em suas veias.
Lexi estava viva!
A alegria o atravessou em uma onda vibrante de luz e cor. Sua cabeça girou com o assombro e um grito de júbilo radiante se elevou de sua alma, ecoando no ar da manhã. Beijou seus lábios, e mesmo ela não correspondendo, a respiração encheu seus pulmões. Ele a absorveu dentro dele, apreciando a prova de vida que se expandia nele, cálida, doce e perfeita.
Havia algum tipo de comoção ao seu redor, mas Zach a ignorou. Sua atenção totalmente voltada para Lexi, para o minuto que seus cílios curtos e grossos vibraram quando ela tentou levantar as pálpebras, no gesto sutil de sua boca como se houvesse sentido seu beijo, nos sulcos claros na pele onde suas lágrimas lavaram a fuligem que cobria seu belo rosto.
Deus, ele a amava. Tanto que pensou que a ferocidade daquilo pudesse despedaçá-lo e, no entanto não fazia isso. De algum modo, o tornava completo.
— Acorde, carinho. — ele a adulou.
Sua voz oprimida pela emoção, sufocada pelas lágrimas.
Afastou os cabelos de seu rosto, sentindo os pedaços grossos das mechas queimadas quebrarem-se na palma de sua mão, deixando para trás apenas suavidade.
Gilda se ajoelhou a seu lado, sem se importar que a cinza enegrecesse seu vestido cinza. Estendeu-se para Lexi, mas Zach a moveu, protegendo-a com seu corpo. Ninguém podia tocá-la. Só ele.
— Não vou machucá-la. — disse a Dama Cinza, sua voz tranquila e calma. — Quero simplesmente oferecer minha ajuda, já que os Sanguinar não podem ajudá-la aqui, sob o sol.
— Minha. — foi tudo o que Zach conseguiu passar por sua garganta apertada.
— É claro que é. — acalmou-o Gilda. — Posso tocá-la?
Uma mão pequena e pálida se estendeu para Lexi. Nenhuma ameaça. Apenas Gilda.
Zach relaxou seu agarre e deu a Gilda um leve assentimento.
Angus deu um passo para ela, uma espada em suas mãos. Os instintos protetores de Zach se elevaram e um profundo grunhido de advertência encheu seu peito.
— Mantenha-se afastado, Angus. — disse Gilda.
— Você está fraca. — replicou ele, seu tom acentuado.
— Não estou precisando de você agora. — disse ela.
O corpo de Angus ficou tenso como se tivesse recebido um golpe físico, mas se afastou, permitindo Zach tomar uma profunda baforada de ar.
Gilda colocou a mão sobre a cabeça de Lexi e uma luz branca clara e aquosa se derramou de sua palma. Os olhos de Lexi se abriram e ela se esticou como se quisesse tirar a mão de Gilda.
— Chega! — disse Zach. — Pare!
Sua ordem foi áspera e completamente fora do lugar. Ouviu que os sons ao seu redor morreram como se seu arrebatamento tivesse captado a atenção.
Gilda afastou a mão e o zumbindo fraco de atividade ao redor de Zach e Lexi voltou. Zach não se incomodou de olhar o que eles estavam fazendo. Não se importava. Nada que não fosse o tesouro que sustentava em seus braços significava algo para ele. O resto do mundo podia desaparecer e Zach não sentiria falta.
Tinha Lexi e não precisava de mais nada.
Lexi levou alguns dias para recuperar suas forças. Flutuava entrando e saindo da inconsciência, lutando no pântano cinzento que a puxava, sugando-a, afastando-a da realidade para introduzi-la em um mundo caótico de sonhos e alucinações. Durante esse tempo, só havia uma constante, a única coisa que sabia que era real e sólida.
Zach.
Ele não a deixou nenhuma só vez. Nem sequer quando o calor da explosão se apinhou ao seu redor, sugando o oxigênio de seus pulmões. Ele estava lá, firme e forte, segurando-a dentro da segurança de seu vasto poder, protegendo seu corpo.
Ainda estava ao seu lado, o corpo forte estendido ao seu lado, o braço atravessado em seu peito com a palma da mão aberta sobre seu coração como se estivesse verificando o pulso.
Lexi se sentou na cama, lançando seu braço grosso braço em seu colo. Ele despertou instantaneamente, seus olhos injetados de sangue explorando seu corpo, percorrendo-a como havia feito outras vezes em que tinha saído à superfície nos dias anteriores. Seu peito estava nu, e centenas de folhas claras e brilhantes tinham brotado dos ramos de sua marca de vida.
— Você está bem? — perguntou ele, sua voz era um som áspero fragmentado.
Ela assentiu, não acreditava que a fala passasse pela estreiteza de sua garganta seca.
Zach estendeu a mão para a mesinha de cabeceira e pegou um copo com água. Segurou o canudo em seus lábios e ela bebeu, sentindo a água fria descer todo o caminho. Era bom, mas não tão bom quanto ver Zach inteiro e a salvo ao seu lado.
— Está com fome? — perguntou ele. — Precisa ir ao banheiro?
— Não. — respondeu. — Só quero olhar para você.
Examinou seu rosto, tão belo para ela. Especialmente seus olhos. Eles brilhavam com amor. Por ela.
— Amo você, Zach.
Seu corpo enorme estremeceu de prazer e ele colocou os braços ao redor dela, envolvendo-a com seu calor.
Lexi suspirou de prazer, recordando a sensação de seu abraço protetor quando isso a protegeu daquela explosão.
— Obrigado. — disse contra seu ombro.
— Por quê? — perguntou.
— Por me salvar.
Zach inclinou-se para trás, observando-a com uma expressão angustiada de autorrecriminação.
— Não a salvei, carinho, embora quisesse muito ter feito isso. Você fez tudo sozinha.
— Não. — disse. — Senti seus braços em volta de mim, me protegendo.
Ele segurou a face dela e ela se inclinou para o seu toque.
— Eu não estava lá. Mal tinha acabado de me libertar de três das cordas, e corri para você quando a bomba explodiu. — ele engoliu com força, então em um tom angustiado disse. — Eu não estava lá para você.
— Estava lá. Seu poder estava. Deslizou sobre minha pele e evitou o peso esmagador do calor.
— Você é a única pessoa que pode usar meu poder.
Ela sacudiu a cabeça.
— É ai que você se engana. Não tenho nem ideia de como usá-lo. E mesmo se tivesse feito isso, você é o único que me abastece de poder, o único que me mostrou o que fazer. Vi você em minha cabeça, me segurando perto e a salvo. E no que a mim concerne, isso o faz meu herói.
— Não estou certo de concordar, mas neste momento está muito fraca para uma boa discussão.
Ele tinha razão. Estava fraca, mas sentia que sua força aumentava a cada minuto.
— O que aconteceu ao homem que estava com você?
— Neil está se recuperando, embora o ataque tenha lhe custado caro. Precisa encontrar sua dama logo ou ficará sem tempo. A energia daquela maldita pistola foi adicionada ao poder crescente dentro dele de um modo que nunca tínhamos considerado.
— Sinto muito, Zach. Sinto ter deixado cair tudo isto sobre você.
— Não culpo você. Nem sequer os outros. Não podia controlar as ações dos Defensores.
— O que aconteceu com eles? — perguntou, não muito segura de querer saber.
— Vários de nossos homens tiveram um encantador e longo bate-papo com eles. Não acredito que nos incomodem mais. Sei que Héctor não o fará. Joseph o tomou sob custódia para responder pelos crimes daqueles que dirigia.
— O que farão com ele?
— Um dos Sanguinar porá um vínculo de paz sobre ele. Então o deixarão ir. —Zach não parecia feliz nessa parte.
— Um vínculo de paz?
— É uma maneira de impedir que alguém decida nos fazer mal. No momento que tentar nos machucar, machuca a si mesmo. Geralmente não é letal, mas é efetivo e muito mais do que ele merece. Deveria ser executado pelo que fez a você.
Lexi deu de ombros.
— Deixe-o ir. Não vale nosso tempo. Exceto, talvez só o suficiente para ver como reage a essa coisa de vínculo de paz. Eu gostaria de ver isso.
Zach sorriu ferozmente.
— Eu me certificarei de que consiga, carinho.
Ela sufocou um bocejo.
— Com Héctor fora do mapa, os Defensores necessitarão de um novo líder, alguém que queira nos ajudar a lutar contra os Synestryn. Talvez pudéssemos convencer Jake a aceitar o trabalho.
— Por que ele?
— Não é de forma alguma como o pai. É razoável e amável. Eu gostaria de falar com ele, trazê-lo aqui, deixá-lo ver o que eu vi.
A boca de Zach se esticou.
— Não estou certo de que seja uma boa ideia.
— Talvez sejamos capazes de fazer dele e do restante dos Defensores um aliado. Eles já estão lá fora. Sabem sobre os monstros. Talvez você também possa utilizar seus olhos e ouvidos. Além disso, a maioria deles são homens orgulhosos. Permitir que eles nos ajudem talvez seja a única chance que tenhamos de protegê-los.
— Falaremos disto com Joseph quando estiver melhor para ver se ele permite.
— Fui sozinha muito tempo. Não vou começar a pedir permissão para me dirigir às pessoas. Diabos, falarei com quem eu quiser, quando quiser.
Zach deu um sorriso preguiçoso para ela.
— Voltou a levantar o queixo.
— O quê? — perguntou.
Ele tocou em seu queixo com o dedo indicador.
— Sempre que faz algo teimoso como isso, realmente afunda seus calcanhares e levanta o queixo.
Ela o elevou ainda mais, fazendo-o rir. O som alegre flutuou sobre ela, aliviando os dores de seu corpo, reparando as contusões em seu espírito causadas por sofrer todo aquele medo. Ia levar bastante tempo para superar um medo daqueles, mas sabia que Zach estaria com ela, ajudando-a a atravessá-lo.
Lucien cerrou os dentes contra a dor de viajar para a Terra. O vapor se levantava de sua pele e ele manteve sua concentração até que a porta brilhante se fechou atrás dele.
A Pedra Sentinela era suave e sólida sob seus dedos, sua escultura irregular ferindo seu flanco quando seu peso caiu contra ela. Quando a última luz do portal desapareceu, Lucien se soltou e deslizou para a relva suave aos seus pés.
Era noite, é óbvio. Eles só podiam ir lá à noite. A luz solar se rendia às ordens do Solarc, e manifestar-se-ia contra a entrada de um filho errante como ele, tão certo como se estivessem de pé no mesmo quarto. Apenas o cálculo e o planejamento cuidadoso garantiam que nenhum dos homens que viajavam para lá com Lucien fizessem o Solarc olhar para baixo.
Quando os sentidos de Lucien começaram a funcionar outra vez, captou o cheiro da poeira e da grama fresca. Ouviu vozes à distância, embora não pudesse dizer se eram humanos ou Sentinelas. O céu estava escuro, as estrelas escondidas pelo brilho próximo da iluminação humana.
Lucien entortou os olhos para concentrar seu enfoque e reconheceu as linhas fortes de Dabyr surgindo a apenas alguns metros de distância.
Seus cálculos foram corretos. Tinha entrado através da Pedra Sentinela correta. Agora tudo o que tinha a fazer era descobrir exatamente quando tinha chegado.
Aquelas vozes se elevavam, as palavras guturais em inglês perfuravam seus ouvidos. Lucien ficou em pé a tempo de ver que uma multidão de Theronai armados se dirigia diretamente para ele.
Sabendo que isso podia acabar mal para todos os envolvidos, Lucien levantou as mãos, mostrando que estava sem armas.
Os homens se reuniram ao redor dele, suas espadas brilhando sob a luz da lua simples.
— Quem é? — exigiu o homem da frente.
Tinha um rosto bronzeado e brilhantes olhos azuis sombreados pela dor.
— Sou o Príncipe Lucien, filho do Solarc. — disse, sua boca entorpecida pelos tons agudos de sua linguagem.
Uma grande quantidade de olhos que o olhavam com suspeita se fechou nele.
— Como chegou aqui? — perguntou o homem.
— Cheguei através da Pedra Sentinela.
Os corpos dos homens se dividiram, permitindo a passagem de uma mulher. Ela tinha logos cabelos pretos e vestia um vestido cinza. Embora fosse pequena, sua presença enchia o espaço aberto quando seus olhos negros caíram sobre ele. A luceria ao redor de sua garganta brilhava, marcando-a como uma das criações de seu pai.
Lucien inclinou a cabeça.
— Minha senhora. — disse, impregnando seu tom com respeito.
O homem que estava interrogando Lucien deu um passo se aproximando da mulher para protegê-la, obviamente era sua companheira.
— Por que está aqui? — exigiu ela.
Muitas razões para nomeá-las, assim Lucien se enfocou na mais importante em sua mente.
— Senti que minhas filhas estavam aqui. Tinha a esperança de poder colocar os olhos sobre elas.
A mulher abriu os lábios chocada.
— Filhas?
— Sim. Estão aqui? — perguntou Lucien.
— Eu sou Gilda, a Dama Cinza. — disse a mulher. — Se suas filhas estiverem aqui, pode vê-las. Quais são seus nomes?
Os estranhos nomes humanos vieram facilmente aos seus lábios, embora nunca os houvesse dito em voz alta em sua própria casa por medo que seu pai os ouvisse.
— Jackie, Helen e Alexandra.
Um ofego feminino se elevou da parte de trás do grupo, e uma mulher deu um passo para frente. Seus cabelos recolhidos em duas tranças sobre os ombros e a suave curva de sua face, tão parecida com a de sua mãe, fez que seus dedos doessem de vontade de se estenderem e tocá-la para ver se ela era real. A luceria em sua garganta era de um vermelho vivo e ardente.
Lucien nunca a tinha visto antes, mas soube nesse instante que era de seu sangue. Sua filha.
— Sou Helen. — disse ela, com voz suave vacilante com a emoção.
Lucien cambaleou para frente, seu corpo desajeitado pelo pedágio físico que a viagem tinha cobrado.
Um homem moreno ao lado de Helen levantou a espada e interpôs seu corpo de modo a defender o de Helen.
— Para trás. — advertiu, sua boca tensa com a raiva.
— Perdoem minha falta de boas maneiras. — rogou ele. — Não tinha intenção de assustar ninguém.
— Deixe-me ir, Drake. — disse Helen. — Ele não vai me machucar.
A multidão em volta dele começou a crescer, e vozes sussurrantes repetiam aos recém chegados o que tinha acontecido.
Helen estendeu a mão e Lucien viu que tremia.
— De onde vem? — perguntou ela.
— Athanasia.
Gilda assobiou e retirou a mão de Helen.
— Mentiroso. A porta está fechada.
— Não para mim. Nem para nenhum de meus irmãos que já passaram por este mundo.
Gilda não acreditava nele. Podia ver sua desconfiança brilhando em seu rosto.
— Por que veio agora? — perguntou ela.
— Vocês estão perdendo a guerra contra os Synestryn. A cólera de meu pai excluiu o portal fechando-o, mas alguns de nós sabemos a insensatez disso. Sabemos que se os Sentinelas caírem, não restará nada entre nós e os Synestryn. Nós nos tornamos em nossa decadência. Eles nos destruiriam.
A voz de Gilda tremia de raiva.
— Então, veio aqui para nos pedir ajuda? Para levantar nosso moral de modo que briguemos com mais força? Realmente acredita que queremos nos sacrificar mais em favor de vocês que nos rejeitam?
O coração de Lucien doeu ao ouvir a amargura que vomitava aquela mulher. Só uma perda profunda gerava uma raiva como a dela. Uma perda que Lucien conhecia muito bem.
— Quantos filhos seus morreram? — perguntou ele com voz terna.
Gilda apertou a mandíbula, mas ele viu o brilho das lágrimas iluminando seus negros olhos por um mero segundo antes que a cólera os queimasse.
— Volte por onde veio. Não precisamos de você aqui.
— Mas o fazem. — disse Lucien, olhando para os homens desesperados reunidos ao seu redor. — Seus homens estão morrendo, e meus irmãos e eu estivemos trabalhando durante muito tempo para salvá-los.
O homem vinculado a Gilda captou primeiro.
— Vieram aqui e se deitaram com mulheres humanas, não é mesmo?
Lucien assentiu.
— Concebemos filhas. É difícil saber quantas já que não podemos viajar para cá com frequência, e o tempo passa muito mais rápido aqui na Terra.
—Minha mãe — sussurrou Helen. — Teve uma aventura de uma noite com ela?
Lucien franziu o cenho ante o termo, sem entendê-lo.
— Estive com sua mãe, se foi isso o que quis dizer. E vendo você aqui, uma mulher adulta… Encontrei-me com ela há apenas alguns meses. Se tivesse nascido em meu mundo, ainda seria um bebê.
Helen olhou para o marido, então se virou de novo para Lucien.
— Pensei que você tinha nos abandonado.
— Nunca. Se eu pudesse, estaria com você todos os dias. Mas isto é… Impossível.
Helen se adiantou e tomou Lucien em seus braços. Ele ficou ali de pé, rígido em seu abraço, não sabendo ao certo o que fazer. Não a conhecia, não a tinha visto crescer, e ainda assim a amava. Como podia ser? Como tanto amor podia fluir dele e ainda permanecer intacto?
Lucien não sabia, mas agora, nesse momento, não se importava. Helen estava ali e a salvo. Tinha encontrado seu lugar entre aquelas pessoas.
Ela se inclinou para trás, sorvendo as lágrimas.
— Disse que havia outras. Tenho irmãs?
Lucien assentiu.
— Duas. Jackie e Alexandra. Estão aqui?
Gilda sacudiu a cabeça.
— Não. Mas as encontraremos. Supondo que ainda estejam vivas.
— Espere. — disse o marido de Helen. — Alexandra talvez seja Lexi.
Os olhos da Helen se arregalaram e procurou por algo em seu bolso. Mexeu naquilo por um momento.
— Lexi. Qual é seu nome verdadeiro?
A filha de Lucien sorriu e foi a coisa mais bonita que ele tinha visto em sua longa, longa vida.
— Você deve vir aqui para fora. — disse ela. — Temos uma surpresa para você.
Lexi e Zach saíram correndo em direção ao tumulto no pátio de treinamento. O corpo de Lexi ainda estava fraco e Zach estava bem ali, ao seu lado, com o braço forte em seu cotovelo, sustentando-a.
Uma multidão de pessoas se reunia ao redor da rocha entalhada no campo de treinamento, e no centro da agitação havia um homem que Lexi nunca tinha visto antes.
Ele tinha olhos estranhos de ouro líquido, e cabelos escuros e abundantes. Era bonito, da mesma forma que os Sanguinar eram, como se tivesse sido esculpido para ser colocado sobre uma prateleira e admirá-lo. Mas não tinha as feições pálidas e magras.
Parecia saudável. Robusto, como os Theronai.
Helen ficou ao lado da multidão, trocando seu peso de uma perna para a outra ansiosamente enquanto esperava que Lexi se aproximasse. Parecia mais jovem, e brilhava com uma alegria infantil.
Só ver sua amiga tão feliz fazia que o coração de Lexi se aquecesse.
— O que é? — perguntou.
— Nunca vai acreditar. — disse Helen. Apertou os lábios fechando-os como se estivesse contendo um segredo, então soltou. — Nosso pai está aqui. Veio do outro mundo de onde todos os Sentinelas vieram. Quer nos conhecer.
— Conhecer-nos? A nós?
A importância das palavras finais de Helen caiu sobre ela e Lexi teve que agarrar-se ao braço de Zach para não afundar-se no chão.
— Somos irmãs?
Helen assentiu, fazendo as tranças balançarem, depois abraçou Lexi fortemente pelo pescoço.
— Não é de admirar que desabafasse com você quando mal a conhecia. Acho que até então tínhamos uma ligação.
Lexi estava muito chocada para falar. Era demais para acreditar. Seu pai era uma espécie de alienígena. E estava ali.
— Calma. — sussurrou Zach.
O agarre em seu braço se apertou e ele deslizou seu braço ao redor dela para estabilizá-la. Ela não percebeu até então que quase tinha caído sobre o traseiro.
— Quero vê-lo. — disse Lexi.
Helen a conduziu para o homem dos estranhos e inquietantes olhos de cor ouro. Lexi levantou os olhos para ele, olhando-o realmente. Ele ficou em silêncio, deixando-a estudá-lo, sem sequer pestanejar, embora seus olhos estivessem úmidos de emoção.
— Então, você é o cara? — perguntou.
Ele franziu o cenho um instante, depois assentiu.
— Eu queria ter encontrado você antes. — disse ele.
— Também teria gostado.
Ele estremeceu e Lexi quis se retratar suas palavras.
— Ele não podia estar aqui, Lexi — disse Helen. — Em nosso planeta.
— Tenho vinte e seis anos. Acredito que ele poderia ter encontrado tempo em algum lugar para fazer a viagem. Ou ao menos para enviar um cartão postal.
— O tempo é diferente lá. Além disso, tem que ser cuidadoso. Se seu pai descobrir que está aqui, será executado.
O pai de Lexi estendeu a mão.
— Não, ela tem razão. Devia ter encontrado um modo. Sinto muito, Alexandra.
— Lexi. — disse. — Sou Lexi agora.
Ele assentiu, e ela observou como ele formava a palavra em sua boca silenciosamente, como se estivesse memorizando-a.
— Sou Lucien.
Os dedos de Zach deslizaram por seu braço, acalmando-a. Lexi não tinha certeza de como sentir-se a respeito de tudo aquilo, mas uma coisa era certa: a vida era muito curta para guardar rancores. Quaisquer que fossem suas razões para não ter estado em sua vida, estava ali agora. Não queria perder o tempo que estivessem juntos ficando zangada.
Lexi ignorou sua mão estendida, e o abraçou. Ele envolveu-a em seus braços, e embora não parecesse velho o suficiente para ser seu pai, soube nesse instante que ele era. Sentiu o amor dele surgindo através dela, preenchendo todos os espaços vazios que seu passado tinha deixado.
— Mamãe morreu. — sussurrou.
— Sinto muito.
— Era uma boa mulher. — E então, Lexi soube que era verdade.
Claro, sua mãe estava equivocada sobre muitas coisas, mas fez bem as grandes coisas. Ensinou Lexi a ser forte, a ficar de pé por si mesma, e a cuidar das pessoas ao seu redor. Deu-lhe seu amor e ensinou as coisas importantes, como entesourar cada dia e jamais render-se. Ensinou Lexi como amar incondicionalmente.
E agora, de pé diante daquele homem que não conhecia, Lexi pôs em prática aquela lição. Ia amar aquele homem, seu pai, independentemente de suas faltas. Ele não tinha estado ali para ela ao longo de sua vida, mas estava ali agora. E tinha lhe dado Helen. Tinha lhe dado uma família.
— Quanto tempo você pode ficar? — perguntou.
— Não muito. Só até o amanhecer.
As esperanças de Lexi foram destruídas.
— Isso são apenas algumas horas.
Ele deu um sorriso triste para ela.
— Eu sei, mas é assim que deve ser. Se Solarc souber que estive aqui, sua vida e a vida de suas irmãs estarão em perigo.
— Irmãs? No plural?
— Jackie não está aqui. — disse. — Devem encontrá-la. — levantou a cabeça e se dirigiu aos homens. — Ela pode ser capaz de salvar um de vocês. E há outras. Filhas de meus irmãos e primos.
— Quantas? — perguntou Joseph.
— Mais de duas vintenas, mas não sabemos se todas estão vivas.
— E você vai ter mais filhos? — perguntou um dos Sanguinar que Lexi ainda não tinha conhecido.
Os olhos de Lucien se ofuscaram pela tristeza.
— Eu não, não posso voltar. Muitas viagens através do portal nos enfraquecem. É difícil esconder nossa passagem, e devemos evitar a detecção acima de tudo.
— Mas, outros virão? — perguntou o Sanguinar.
— Sim, mais se unem a nossa causa a cada dia. Sabemos que todos vocês estão lutando. Sofrendo. Tentamos ajudá-los de todas as formas que podemos.
— Estamos morrendo de fome. — disse o Sanguinar. — Necessitamos de mais sangue.
— Eu sei, fazemos o que podemos, mas não nos arriscaremos a ser apanhados. Antes que eu vá, terão um pouco de meu sangue. Manterá vocês por um tempo.
Os olhos do Sanguinar brilharam com um estranho prateado, e Lexi sentiu um calafrio de repulsão percorrer o corpo de seu pai.
Lucien procurou dentro de sua camisa e tirou uma foto.
— Aqui há mais três mulheres que devem encontrar. Filhas de meu irmão, Eron.
Ao lado de Lexi, Helen ofegou.
— Essa é de Andra e Nika quando eram jovens.
Andra se adiantou e pegou a foto da mão de Lexi.
— É. Foi tirada pouco antes de Tori ser assassinada.
— Tori? — perguntou Lucien.
A boca de Andra ficou tensa.
— Nossa irmã mais nova.
Lucien estendeu a mão para recuperar a foto.
— Pedirei a você que me deixe devolver esta espécie de lembrança a seu pai. Terei o maior prazer em transmitir a ele uma mensagem de sua parte se esse for seu desejo.
Andra assentiu rigidamente.
— Diga a ele que estou bem, como pode ver. Nika está viva e Tori está morta.
Os olhos de Lucien se fecharam, e ela ouviu uma série de palavras fluidas e elegantes sair de seus lábios.
— Eu sinto sua perda.
— Ao menos nos tivemos uma à outra enquanto crescíamos. — disse Andra. — Pode agradecer a ele por isso.
— Posso ver Nika? Falar com ela?
— Não. — disse Andra. — Está muito… Fraca para isso.
— Há algo que possa fazer por ela?
— É um curador?
— Infelizmente, não.
— Envie um. — pediu Andra. — Se algum de vocês que puder curar sua mente, então pode enviá-lo para cá.
— Tentarei. — disse Lucien. — Prometo.
Os joelhos de Andra se dobraram e Paul a pegou pelo braço.
— É hora de irmos. — disse Angus em uma voz ensurdecedora. — Vamos dar a Helen e Lexi um tempo a sós com o pai.
A multidão partiu, mas não se afastou muito. Não que Lexi os culpasse. Não era como se um aliem viesse visitá-los todos os dias.
— Contem-me suas vidas. — disse Lucien. — Eu gostaria de ter retalhos e pedaços de vocês para levar comigo e aquecer meus pensamentos.
Apesar de difícil no início, Lexi encontrou pedaçinhos brilhantes de sua vida para compartilhar com o pai que nunca tinha conhecido. Quando Helen e ela compartilharam as histórias, fluiu com mais naturalidade, e Lexi percebeu que sua vida não tinha sido tão triste quanto tinha imaginado. Houve muitos bons momentos, e esse, sentado sob as estrelas em torno de sua recém-descoberta família, ia estar incluído entre eles agora.
Lentamente, o sol deslizou em direção ao horizonte, indicando que seu tempo tinha terminado. Helen e Lexi se despediram de Lucien com desajeitados e lacrimosos abraços. Zach encontrou uma câmera digital e tirou fotos deles juntos, imprimindo uma para que seu pai levasse com ele.
Lucien a sustentou contra o coração e chorou. Aquelas lágrimas continuaram caindo quando ele levantou a mão e convocou um anel de luz brilhante.
Lexi sustentou a mão de Helen quando ele entrou naquela luz e desapareceu.
— Acredita que algum dia voltaremos a vê-lo? — perguntou Helen.
— Ele disse que não podia retornar.
— Talvez as coisas mudem. Talvez o idiota do Solarc deixe de ser um idiota.
— Devia ter perguntado a Lucien se isso era possível. — disse Lexi.
Helen ruborizou.
— Nunca falaria dessa maneira na frente de meu pai. Está brincando?
Lexi olhou para Helen e deu uma gargalhada.
Elas se agarraram uma à outra, rindo e chorando enquanto o sol nascia.
Lexi não podia suportar a ideia de voltar para dentro agora. Era tão bom sentir o ar da manhã sobre sua pele, frio, claro e perfumado com o orvalho. E Zach. Estava ao seu lado, sua sombra silenciosa, lhe dando o tempo que necessitava para absorver tudo o que tinha ocorrido com ela em poucos dias.
Ela tinha um pai. Uma irmã. Um lar.
Era mais do que jamais tinha esperado, e o que o tornava mais doce era que tinha Zach para compartilhar sua alegria.
— Deve voltar para dentro e descansar. — disse ele.
— Em alguns minutos. Só quero sentir o sol no rosto durante um momento.
Ele assentiu com a cabeça e deslizou os dedos sobre ela. Seu anel emitiu um zumbido feliz, e ela sentiu uma corrente de energia percorrer seu braço, aquecendo-a.
Lexi passou a mão pela parede de pedra que rodeava Dabyr, traçando-a com o dedo enquanto se aproximava da parte quebrada. Tinham colocado alguns Theronai a postos guardando a abertura, mas a maior parte da atividade foi reduzida. Sem Helen e Gilda, era pouco o que podiam fazer. Ao que parece, cada pedra só podia ser colocada depois que as mulheres houvessem feito sua magia.
Lexi podia sentir que a magia percorria a rocha pelas pontas dos dedos. Era antiga e um dia tinha sido poderosa, e aquele poder se cansou com o tempo, permitindo que pequenas fissuras se formassem em sua armadura. Essas fissuras a atraíram, rogando que as cobrisse. Quase podia ouvir seu rangido áspero.
Uma pequena porção de poder se agitou em uma onda através dela, e pela primeira vez, Lexi soube o que Helen queria dizer. Aquele poder estava lá, fluindo facilmente pela ponta dos dedos de Lexi, obedecendo a sua vontade.
Ela queria que Dabyr fosse um lugar seguro para todos os que viviam lá. Queria que as crianças fossem para cama à noite sem se preocupar que os monstros os encontrassem. Queria que brincassem e rissem e soubessem em seus corações que se permanecessem dentro daquelas paredes, nada poderia machucá-los.
Tudo o que queriam, tudo o que necessitavam, deslizava para fora de Lexi, viajando através de seus dedos para dentro das partes de pedra debaixo deles.
Sutis fissuras ao longo da superfície unida e outras mais profundas, que só podia ver em sua mente, fecharam-se. Uma profunda e estridente vibração se propagou pela parede, longe da abertura. Lexi observou como se movia entre as árvores, lançando os pássaros que estavam descansando ao ar. Viu que se formavam ondas na superfície do lago, ouviu o grito de medo das pessoas próximas ao edifício principal.
— Lexi? — disse Zach em voz baixa, em tom de pergunta. — O que está fazendo?
— Reparando o muro.
Continuou vertendo poder na tarefa, sentindo o fluxo através dela como água, líquido e fácil. As moléculas da rocha se deslocavam, fechando-se completamente até que a superfície da pedra brilhava como uma casca dura.
Homens armados chegavam correndo pelo caminho e os poucos guardas auxiliando ali se viraram assombrados para ela.
— Estou fazendo algo errado? — perguntou a Zach.
— Não, é só... Surpreendente. Isso é tudo. Está fazendo em segundos o que os outros têm tentado fazer há dias.
— Devo parar? Não quero ferir os sentimentos de ninguém.
Ele sorriu para ela, seus olhos verdes brilhavam com amor e orgulho.
— Não pare. Isto é bom, Lexi. Muito bom.
Depois de uma breve explicação de Zach, os homens começaram a levar as rochas para a abertura em forma de escada. Lexi tocou cada pedra colocada, ligando-a com o poder vivente que sobreviveria até muito depois que ela morresse e se fosse. Tornou-se mais difícil à medida que avançava, mas não perdeu a calma nenhuma só vez ou sentiu a necessidade de parar.
Zach e ela estavam cobertos de poeira e suor quando Helen os encontrou.
— Uau, Lexi! Você é boa[14].
Lexi grunhiu ante o trocadilho ruim.
Helen estudou o trabalho, que estava quase completo.
— Como fez isso?
Lexi deu de ombros.
— Não sei.
— É seu dom. — disse Zach. — A proteção é o dom de Lexi, da mesma forma que o fogo é o seu, Helen. Foi assim que sobreviveu à bomba. Eu simplesmente não entendi até que vi isto.
— Genial — disse Helen. —Pergunto-me qual será o dom de nossa outra irmã.
Zach sorriu.
—Não sei, mas se estiver por aí, nossos homens a encontrarão e a trarão de volta. Não terão que esperar muito.
— E então poderemos ser uma família. — disse Lexi enquanto se agarrava ao braço de Zach para ganhar sua atenção. — Todos nós.
Zach sorriu e passou um braço ao redor de sua cintura.
— Você acha que eu quero fazer parte de uma família maluca como a sua?
— Eu sei.
— Como sabe? — zombou.
Lexi deixou que ele soubesse. Abriu as comportas que havia interposto entre eles durante muito tempo, fazendo-o experimentar tudo o que sentia por ele. Tocou-o com sua mente através de um rápido movimento, desde seu medo inicial, passando por sua desconfiança, pela esperança vacilante, até o final. Um amor ardente e brilhante que ela tinha certeza que nunca desapareceria ou se desgastaria.
Zach pressionou os dedos em sua cintura e fechou os olhos. Um profundo gemido de prazer se elevou de seu peito e se converteu em um suspiro de alegria.
Quando ele abriu os olhos, brilhavam de felicidade.
— Deus, amo você, Lexi.
— Você diz isso porque meu pai é um príncipe.
Ele soltou uma gargalhada e levantou o queixo dela com os dedos.
— Diga que me ama também. Aqui. Na presença de testemunhas.
— Por quê? — perguntou, sentindo o quanto isso era importante para ele.
— Porque quero que todo mundo saiba o quanto sou sortudo.
Lexi se ajoelhou e o beijou, sem se importar que houvesse uma plateia que começou a aplaudir. Os gritos de alegria de Helen eram os mais ruidosos.
Irmãs. Por Deus!
— Amo você. — disse a ele. — E será melhor que não me faça lamentar por isso.
Zach correspondeu ao seu sorriso.
— Sem promessas.
[1] Empática – que se identifica totalmente com a do outro.
[2] Aproximadamente 321.868,80 quilômetros.
[3] O estranho caso do Dr. Jekyll e do Sr. Hyde. Em Jekyll, há I kill (eu mato, em inglês). Esta tendência humana pecaminosa estaria oculta por Jekyll e viria a manifestar-se em Hyde (hidden — oculto em inglês). Quando Hyde surge, atos como o de assassinar surgem também. O protagonista deve lidar com os seus dois "eus": um inclinado para o bem (Jekyll), e outro para o mal (Hyde). Hyde sofre por ser reprimido por normas de conduta baseadas em ética e moral, princípios e valores, aceitos por Jekyll; já Jekyll sofre pelo remorso de ter praticado o mal, ação de Hyde. Logo, existe uma dualidade na pessoa: uma propensa ao bem e outra ao mal. O ideal seria que cada uma das partes da alma fosse independente uma da outra.
[4] Produzir o ruído do gargarejo; gorgolar.
[5] Irisar – dar as cores do arco-íris, ou tomá-las; matizar-se. (Aurélio)
[6] Cidade do Estado do Texas.
[7] “Canção de Ninar” em inglês.
[8] Nike – marca de tênis.
[9] Intemporal – que escapa ao tempo; perene; espiritual.
[10] Faz menção a fábula infantil de João e o Pé de Feijão.
[11] Diodo – dispositivo eletrônico que permite a passagem de corrente elétrica somente numa direção. (Aurélio)
[12] Arrebatar – tirar com violência, força; arrancar. (Aurélio)
[13] Denim é um tipo de tecido de algodão em que somente os fios do urdume (longitudinal) são tingidos com corante índigo, normalmente com ligamento sarja. É a matéria-prima para a fabricação de artigos Jeans.
[14] No original utilizam a palavra “rock”, que se pode traduzir como rocha ou boa ou dura. Por isso Helen faz o trocadilho.
Shannon K Butcher
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