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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


HERÓI À FORÇA / Artur Azevedo
HERÓI À FORÇA / Artur Azevedo

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                   

 

 

Artur Azevedo

 

 

 

 

PERSONAGENS: LUISINHA  VALENTIM BRAGA (latoeiro) JORGE BRAGA (capitão) GREGÓRIO (sargento) MATIAS DE ALBUQUERQUE (Governador de Pernambuco) PANTALEÃO DE ARAGÃO (capitão de navio) VICENTE UM AJUDANTE DE ORDENS UM SOLDADO OUTROS UM REPOSTEIRO UM CAPELÃO UMA NOIVA Latoeiros: mulheres, crianças, oficiais, soldados, banda marcial, convidados de ambos os sexos.
A ação passa-se em Pernambuco, no século XVII, durante a guerra dos holandeses; o primeiro ato no Recife, o segundo em Jaboatão, e o terceiro em Olinda, no palácio do Governador Matias de Albuquerque.

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ATO I Interior de uma oficina de latoeiro. Por toda parte artefatos de folha-deflandres. Bancos. Porta à esquerda. Portão ao fundo, com sineta. Esse portão diz para um pátio.
 
CENA I Vicente, que entra da esquerda e vai tanger a sineta; os latoeiros, que entram do fundo, em confusão; depois Valentim.
 
CORO DOS LATOEIROS Ao som da sineta Corramos depressa! São horas! Começa Nossa obrigação! De folha-de-flandres Mil coisas façamos, E aos anjos peçamos Que as venda o patrão. No fim das semanas As férias não falham, Pois aos que trabalham Protege o Senhor. Portanto, rapazes, Vá lá! Mãos à obra! Vá lá! que nos sobra Vontade e vigor!
 
VICENTE  Vocês têm razão.
 
CORO  Bons dias!
 
VICENTE Rapazes, razão lhes dou... Deus fez o mundo em seis dias,
 
No sétimo descansou; Portanto, a Deus imitemos: A semana trabalhemos E ao domingo descansemos! Descanse quem trabalhou.
 
CORO Não apoiado!  Qual descansar!  Fez-se o domingo Para bailar,  Folgar, Brincar! No fim das semanas, etc.
 
(Dispõem-se todos para trabalhar; Valentim entra da esquerda)
 
VALENTIM  Alto lá! Alto lá!... Hoje aqui ninguém trabalha  Em casa de Valentim!
 
CORO  Como assim? Diga lá!
 
VALENTIM (trazendo por um gesto todos ao proscênio)
 
COPLAS
 
I Um grandioso, audaz projeto  Eu concebi; Por isso vai hoje sueto  Haver aqui. Para vós todos prontamente  Ver folgazões,
 
Eu vou distribuir contente  Uns patacões!
 
(Distribuindo moedas de prata de um saco que traz na mão)
 
CORO Aqui está!  Tomem lá Patacões!... Venham lá,  Venham já Patacões!...
 
II VALENTIM  Qual o projeto, só mais tarde Hão de saber; Aquele que em desejos arde De o conhecer Pode dar tratos ao bestunto. Não é capaz De adivinhar que grande assunto Aqui me traz! Aqui está, etc...
 
CORO  Venham lá, etc...
 
VICENTE  Patrão querido, Vossa Mercê Esse projeto Diga qual é.
 
CORO  Diga qual é!
 
VALENTIM  Vão vestir os seus fatos domingueiros, E voltem prazenteiros, Trazendo cada qual sua mulher.
 
VICENTE  Manda o patrão! É obedecer!
 
CORO É obedecer! é obedecer!  No fim das semanas, etc...
 
(Saem os latoeiros pelo fundo)
 
 
CENA II Valentim, Vicente.
 
VICENTE Mas diga-me cá, patrão. Qual é o motivo de tanta alegria? Dar-se-á caso que Vossa Mercê tenha recebido alguma herança?
 
VALENTIM  E que te importa? Come como um frade, bebe como um holandês, dança como um índio, ri como um doido, e não queiras saber mais nada.
 
VICENTE Qual não queiras, nem qual carapuça! Não se me dava saber por que a gente vai ser obrigada a andar hoje de cara alegre!
 
VALENTIM Vais saber... É que... Nada! és um tagarela, podes dar com a língua nos dentes. A seu tempo tudo saberás. Olha, vai à taverna do Leonardo, ali no Corpo Santo, e diz-lhe que mande a vinhaça a tempo. O jantar é às três em ponto.
 
VICENTE E são muitos os convidados?
 
VALENTIM Os rapazes, as mulheres... hão de ser para aí quarenta pessoas... Quarenta e uma! Sim, porque também há de vir meu irmão Jorge... Escrevi-lhe anteontem à tardinha. Há que tempos o não vejo! Que queres? Um oficial não pode deixar o seu posto, principalmente em tempo de guerra! Agora, que está tão perto daqui, talvez possa arranjar uma licença, e vir jantar com a gente. Malditos holandeses! Têm-nos dado água pela barba!
 
VICENTE É certo que Vossa Mercê parece-se tanto com seu irmão, que até se confundem?
 
VALENTIM Homem, eu mesmo não sei se sou eu que me pareço com ele, ou é ele que se parece comigo. O que te afianço é que somos o retrato um do outro, e isso não admira, porque somos gêmeos. (Outro tom) Mas, vamos! Vai, faze o que te disse, e não dês à língua, se queres dar aos dentes!
 
VICENTE Cá vou, patrão, cá vou. (Saindo pelo fundo)
 
 
CENA III
 
VALENTIM Sempre quero ver a cara que farão quando souberem! Também não disse nada à Luisinha... Como ficou admirada, fitando-me com os seus formosos olhos negros e rasgados, quando lhe pedi que deixasse a costura, dizendo-lhe que hoje era dia de festa na oficina... que seria conveniente vestir o seu melhor vestido e adornar-se com os seus melhores enfeites... e, se alguma coisa faltasse, que a mandasse buscar ao melhor mascate de Olinda. Pobre pequena!
 
Ficou tão atônita, que nem sequer se atreveu a perguntar-me... (Luisinha entra da esquerda) Ela aí vem! Como é bonita! Benza-a Deus!
 
 
CENA IV Valentim, Luisinha.
 
LUISINHA Ah! estava aí, Senhor Valentim? Diga-me: estou a seu gosto?
 
VALENTIM Estás, meu anjo! Aproxima-te; quero ver-te mais de perto. Como és linda!
 
LUISINHA Ora...
 
VALENTIM Mas quem te deu esta fatiota? Nunca te vi tão bem vestida!
 
LUISINHA Faça-se de novas! Julga que não o vejo todos os domingos, quando Vossa Mercê vai pé ante pé deitar-me no cesto da costura um dobrão de ouro, e em seguida foge, como se praticasse um grave delito?
 
VALENTIM Pois sim, pois sim, não falemos mais nisso...
 
LUISINHA Pelo contrário, falemos. É preciso pôr cobro a semelhante procedimento. Estou envergonhada de tantos benefícios, visto nada ter feito por merecê-los. A Vossa Mercê devo eu este luxo... Sou aqui tratada como uma fidalga.
 
VALENTIM Ora, qual! Isso não vale nada... Eu é que sou um ingrato... Se fosse a pagar, como devia, os benefícios que recebi do teu bom pai, que Deus haja!...
 
LUISINHA Meu pai cumpria as suas obrigações. Era o mestre da oficina. Esforçava-se por bem servir ao seu amo.
 
VALENTIM Teu pai era alguma coisa mais do que o mestre da funilaria: era um amigo, um verdadeiro amigo. Se aos trinta anos de idade estou senhor deste estabelecimento e quase rico, a quem devo? A ele, à sua atividade, à sua indústria e, sobretudo, aos seus conselhos. Pôsse à testa da oficina, e por tal forma a acreditou, que hoje está no pé de prosperidade em que a vemos! E não havia eu de me interessar por ti, que ficaste órfã aos treze anos, desamparada neste mundo, sem outros bens que não fossem a tua virtude, a tua inocência e esse rosto de fada, capaz de causar inveja aos próprios anjos do céu?! Vamos lá! Disse e repito: Fui ingrato!
 
LUISINHA Exagera...
 
VALENTIM Não falemos mais nisto, senão entro a comover-me, e hoje não é dia para tristezas... Anda cá, Luisinha; não adivinhaste ainda a causa destes preparativos de festa?
 
LUISINHA Não... ninguém faz anos hoje...
 
VALENTIM Pois ouve lá. Sabes que pela Páscoa completei trinta anos? Começo a enfastiar-me de estar solteiro. Quando dão avemarias, e despeço os oficiais, fico em completa solidão. Entro a passear pelo meu quarto, da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, com as mãos nas algibeiras, perguntando a mim mesmo por que não me hei de eu rodear de meia dúzia de rapazes que corram, gritem, saltem, besuntando-me o fato, beliscando-me a barriga das pernas, divertindo-me, enfim!
 
LUISINHA Pensou em casar?
 
VALENTIM Rapazes... não é difícil arranjá-los... O busilis está em deitar a mão numa mulherzinha bonita, amável e ajuizada... (Luisinha baixa os olhos) Mas como o casamento é uma espécie de jogo da cabra-cega, o melhor é a gente confiar-se à sorte; fechar os olhos e agarrar uma. Foi o que fiz, e quer me parecer que encontrei o que desejava.
 
LUISINHA (contente)  Encontrou?
 
VALENTIM Encontrei. (Pausa) Um pouco longe daqui...
 
LUISINHA (despeitada)  Ah!
 
VALENTIM Uma guapa rapariga... boa... amável... discreta...
 
LUISINHA (esforçando-se por disfarçar a perturbação)  Será bom... Senhor Valentim... não se fiar muito nas aparências...
 
VALENTIM Descansa. Trata-se da filha do Barbalho, o proprietário daquela quinta de Apipucos que fornece capim para o nosso macho.
 
LUISINHA Não conheço.
 
VALENTIM Olha, aqui tens tu a carta do Barbalho. (Tira um papel do bolso e finge que lê) "Meu amigo. Em resposta à sua carta de dezesseis, participolhe que amanhã..." (Declamando) É hoje. (Continuando...) que amanhã, dia de remessa de capim aos meus fregueses da cidade, remeto-lhe minha filha e três feixes do dito, da melhor qualidade. Espero que tudo chegue fresco e sem avaria. De seu amigo — Barbalho". (Declamando e guardando a carta) Como vês, a minha noiva chega hoje mesmo. Quero recebê-la com todos os ff e rr. Farás favor, Luisinha, de cuidar em que nada falte. Eu vou sair; tenho ainda que dar algumas voltas. (Pega no chapéu) Dize-me cá: não gostaste de saber que me caso?
 
LUISINHA (com um esforço supremo)  Eu... sim... gostei...
 
VALENTIM Muito bem! Até logo, Luisinha, até logo... não me demoro. (Sai pelo fundo)
 
 
CENA V LUISINHA (mal se vê só, rebentam-lhe as lágrimas e os soluços, e cai num banco, chorando abundantemente. Pausa)  E eu, que me levantei tão alegre esta manhã! Bem longe estava de pensar que... Quem tal diria? Pobre de mim!
 
ROMANÇA
 
Chora a minha alma sentida, Padece o meu coração! Vejo pra sempre perdida A minha doce ilusão! (Erguendo-se) Oh! que destino bárbaro! Que desgraçada sorte! A vida ser-me-á déspota, Benevolente a morte!
 
Louca esperança, pérfida, Em fumo se desfez... Do pranto meu as pérolas Deslizem-me no rosto! Mas, ah! não sanam lágrimas O meu fatal desgosto: Sossego só no túmulo Hei de encontrar talvez!
 
Chora a minha alma sentida, Padece o meu coração! Vejo pra sempre perdida A minha doce ilusão!
 
CENA VI Luisinha, Vicente.
 
VICENTE (entrando do fundo)  Está tudo pronto, não falta nada! Ora muito bons dias tenha a menina Luisinha. Oh! mas, ou eu sou cego, ou a menina esteve a chorar!
 
LUISINHA Eu? Engana-se!
 
VICENTE Qual engana-se, nem qual carapuça! Diga-me: quem lhe fez mal? Diga-me quem foi, e verá como o arraso!
 
LUISINHA Sossegue... Tratemos antes de combinar o modo por que havemos de receber a noiva do Senhor Valentim.
 
VICENTE A noiva do Senhor Valentim? Pois o patrão casa-se?
 
LUISINHA É verdade, Vicente.
 
VICENTE Pois o patrão casa-se, e não é com a menina?
 
LUISINHA Comigo? Que está dizendo, Vicente? Pois eu sou lá digna de seu patrão? Eu?! Sem família...
 
VICENTE Qual família, nem qual carapuça! O patrão faz um grande disparate! Eu digo-lho, digo-lho nas bochechas! Quantas vezes, cá na oficina, temos dito uns para os outros: o patrão faz muito mal em não se casar com a menina Luisinha!
 
LUISINHA Que queres tu? Ele não me ama.
 
VICENTE Qual não ama, nem qual carapuça! Ama sim, senhora! Tinha que ver se a não amasse! Todos aqui a amam. E, senão, olhe... aí vêm os rapazes... Pergunte-lhes.
 
 
CENA VII Os mesmos, os latoeiros, de braço dado a suas mulheres, algumas das quais trazem crianças pela mão; depois Valentim. Estão todos em trajos de festa.
 
CORO Trazemos o riso nos lábios,  Trazemos alegres semblantes; Roupas galantes  De ver a Deus! Pois em domingo alegre o sábado  Quer o patrão que se transforme! Isto é conforme  Fazem judeus.
 
A razão do júbilo Aqui ninguém vê!  (Com um movimento de dança) Dançamos, cantamos, Saltamos, brincamos. Sem saber por quê!  (Dançam)
 
VICENTE  Assim, rapazes, assim! Quer o Senhor Valentim Completa satisfação!
 
TODOS Viva o patrão!
 
VALENTIM (que tem entrado) Saibam, amigos meus: todos estes mistérios São porque vou entrar No rol dos homens sérios!
 
TODOS Vai casar! vai casar!...
 
VICENTE  Qual é a noiva? Não nos dirá?
 
TODOS Qual é a noiva? Diga-nos já!
 
VALENTIM  A bela esposa minha Outra não pode ser, senão...
 
TODOS (ansiosos) 
 
Quem?!
 
VALENTIM Luisinha!
 
TODOS Luisinha!
 
LUISINHA  Oh! que ventura suprema! E a outra, de quem falou?
 
VALENTIM  Foi um belo estratagema, Que um belo efeito causou.
 
(Sinais de alegria em todos)
 
CONCERTANTE
 
LUISINHA  Oh! que ventura! Que felicidade! Sou, na verdade, Ditosa enfim! Vou, finalmente, Viver folgado, Passar ao lado De Valentim!
 
VALENTIM  Oh! que ventura! Que felicidade! Sou, na verdade, Ditoso enfim! Vou felizmente Viver folgado,
 
Passar ao lado De um serafim!
 
VICENTE e CORO  Que felicidade! É, na verdade, Ditosa enfim! Vai felizmente Viver folgado, Passar ao lado  De um querubim.
 
VALENTIM  Enquanto esperamos o instante, que aspiro, De nos fazermos à matriz,  Vão pela quinta dar um giro.
 
TODOS Muito bem diz! A razão do júbilo Aqui já se vê! (Vicente e os coros saem com um movimento de dança) Dançamos, cantamos,  Saltamos, brincamos,  Sabendo por quê!
 
 
CENA VIII Luisinha, Valentim.
 
LUISINHA Fizeste-me sofrer horrores durante dez minutos!
 
VALENTIM Foi uma experiência.
 
LUISINHA Mau! E aquela carta?
 
VALENTIM Aquela carta? (Tirando-a) Vê!
 
LUISINHA O rol da roupa. (Deita-o fora)
 
VALENTIM E o Barbalho nunca teve filhos.
 
LUISINHA Que prazer egoísta o de amargurar os outros!
 
VALENTIM Coitada! Ainda não tinha eu dado dez passos, e rebentavam-te as lágrimas. Ó abençoadas lágrimas!! (Beija-lhe os olhos)
 
LUISINHA Parece-me isto um sonho! Dize-me outra vez que vou ser tua esposa!
 
VALENTIM Dentro de uma hora iremos à matriz. A papelada está pronta.
 
LUISINHA Mas por que tanto mistério?
 
VALENTIM O segredo é o tempero mais saboroso deste, acepipe que se chama amor. Amar-nos-emos sempre, não é assim?
 
LUISINHA Sempre.
 
VALENTIM A minha satisfação seria mais completa se pudesse ter a meu lado meu irmão Jorge...
 
LUISINHA Tenho tanta vontade de o conhecer...
 
VALENTIM Convidei-o, mas não sei se poderá deixar o exército. O pobre rapaz tem andado numa dobadoura! Veio da Paraíba por terra, por uns caminhos impossíveis, e não teve tempo ainda de aparecer no Recife. E até certo ponto é bom que não apareça.
 
LUISINHA Por quê!
 
VALENTIM Por quê? Pois não tenho já contado quantas me sucederam em rapaz, pela maldita casualidade de nos parecermos tanto um com o outro? Eu era uma pombinha sem fel, e bastante medroso, moléstia de que ainda hoje padeço... Em vendo qualquer perigo, logo me dá vontade de fugir! Meu irmão era o contrário: bulhento, endiabrado, provocador! Toda a vizinhança tinha-me raiva. Cortava as orelhas ao cão de Fulano... pintava de verde o gato de Beltrano. Queixavamse a minha mãe: Jorge dizia que tinha sido eu; os queixosos confirmavam, e o resultado era uma tunda!
 
LUISINHA Pobre Valentim!
 
VALENTIM Quando ficamos taludos, as diabruras eram de outra espécie. Quantas vezes Jorge se aproveitou da nossa semelhança para ir em meu lugar a certas entrevistas; quantas!
 
LUISINHA Mas que tem isso para não quereres que ele venha?
 
VALENTIM Que tem isso? Nada! é uma brincadeira! Meu irmão ainda é o mesmo: valente, honrado, diga-se a verdade, mas também galanteador, sedutor e... E se quiser divertir-se à minha custa...
 
LUISINHA Ora cala-te! não digas heresias!
 
VALENTIM É que talvez não nos diferençasses!
 
LUISINHA Acreditas que o meu coração possa enganar-se?
 
VALENTIM Por que não? Fazes lá ideia como nos parecemos! A mesma estatura, a mesma cara, a mesma voz!
 
LUISINHA Já começo também a ter cuidados!
 
VALENTIM Se te estou a dizer que o caso é sério! Ainda se os holandeses o fizessem coxo ou maneta...
 
LUISINHA Deus o livre, coitado!
 
VALENTIM Tens razão, Deus o livre! Ah! espera! Se ele vier, podemos adotar este meio: Quando eu for eu... quero dizer: quando ele for ele... sim, quando eu não for ele... isto é... eu me explico. Quando for eu, Valentim, teu marido, que se aproxime de ti, direi qualquer coisa... Ego sum qui sum, por exemplo, mesmo em latim, não faz mal... E dou-te um beijo. Deste modo, conheces-me logo e evitas algum troca.
 
LUISINHA Está dito. VALENTIM Mas toma cuidado, que se eu me aproximar e não disser nada, é que não sou eu... e então, pelo amor de Deus!
 
LUISINHA Cala-te, deixa-te de tolices!
 
DUETO
 
VALENTIM  Vamos fazer um ensaio?
 
LUISINHA  Um ensaio? Vamos lá!
 
VALENTIM  Eu primeiramente saio...
 
LUISINHA  Ficarei sozinha cá.
 
VALENTIM  Ao voltar, tu me recebes Conforme o que eu cá fizer.
 
LUISINHA  Eu já estou pronta.
 
VALENTIM  Percebes?
 
LUISINHA  Muito bem.
 
VALENTIM  É o que se quer. 
 
(Saída falsa pelo fundo)
 
LUISINHA (só)  Espera lá! Vou te fazer  Enraivecer!
 
(Valentim entra gravemente e faz uma mesura cerimoniosa a Luisinha, que se lhe lança nos braços, com ímpeto amoroso)
 
LUISINHA  Valentim querido, Aos meus braços vem! Aos meus braços vem! És o meu marido, E eu te quero bem!
 
VALENTIM (desesperado) Então? Então?! Assim recebes meu irmão? Eu não te havia dito nada...
 
LUISINHA  É que fiquei atrapalhada E não prestei muita atenção...
 
JUNTOS  É perigoso Pudera não! Ter um marido Ser um marido Tão parecido Com seu irmão! Com meu irmão! Com estes manos
 
Toda atenção, Pois dos enganos Vive o escrivão!
 
VALENTIM  Fazer vamos novo ensaio?
 
LUISINHA  E há de ser melhor talvez.
 
VALENTIM  Da oficina outra vez saio.
 
LUISINHA  Fico só mais uma vez.
 
VALENTIM  Vê lá se o caldo entornamos!
 
LUISINHA  Hás de ver que não vou mal!
 
VALENTIM  O ensaio que fazer vamos É um ensaio geral.
 
LUISINHA  Eu já estou pronta.
 
VALENTIM  Vejamos.
 
LUISINHA  Atenção!
 
VALENTIM  É o principal! 
 
(Saída falsa pelos fundos)
 
LUISINHA (só) Espera lá! Vou te fazer  Enraivecer!
 
(Valentim volta muito alegre, chega-se a Luisinha, dá-lhe um beijo no pescoço e declama: Ego sum qui sum)
 
LUISINHA (fingindo-se zangada) Que petulante  Sujeito audaz!  Toma, tratante,  Que te dou, zás!  (Dá-lhe uma bofetada)
 
VALENTIM (desesperado) Então? Então? Pois tu farás tal recepção  A teu marido, ó desastrada?
 
LUISINHA  É que fiquei atrapalhada  E não prestei muita atenção.
 
JUNTOS  É perigoso, etc...
 
LUISINHA Mas, querido meu, descansa... (Tomando-o pelo braço e como em segredo) Apesar da semelhança, Não haverá confusão! Pois se os olhos meus se iludem, Não se engana o coração...
 
JUNTOS  Apesar da semelhança, etc...
 
VALENTIM Já são horas de irmos para a matriz! Vamos procurar os rapazes. Depois viremos jantar! E a noite o bailarico!
 
(Nisto, Gregório precipita-se em cena, vindo do fundo. Dá com os olhos de Valentim, julga reconhecê-lo, e abraça-o com ímpeto)
 
 
CENA IX Luisinha, Valentim, Gregório.
 
GREGÓRIO (abraçando a Valentim)  Ah! meu capitão, meu bravo capitão? Eu logo vi que o havia de encontrar!
 
VALENTIM (à parte)  Ai, que é maluco!
 
GREGÓRIO (contemplando-o)  Ora, meu capitão! Mas que ideia foi esta de deixar o acampamento e vir para o Recife encafuar-se em casa de seu irmão?
 
VALENTIM Ah! já percebo... É a semelhança de que falávamos ainda agora, Luisinha. O camarada toma-me por Jorge!
 
GREGÓRIO (atônito)  Pois eu não estou em presença do meu capitão?
 
LUISINHA Está em presença do Senhor Valentim Braga. 
 
GREGÓRIO O irmão?! Com todos os diabos! O patrão já me havia falado em Vossa Mercê, mas nunca supus que a semelhança fosse tão perfeita! Olhe que não lhe falta nada, com mil raios! Pois, senhor, eu sou o sargento Gregório, vulgo Vomita pragas, e pertenço à companhia de seu irmão, que vinha procurar aqui.
 
VALENTIM Quem? Meu irmão? Aqui? Não está nem nunca esteve! O sargento não sabe que meu irmão nunca veio ao Recife?
 
GREGÓRIO Como? Pois não está cá?
 
VALENTIM Não, senhor, mas não importa, sargento: saberá que me caso hoje...
 
LUISINHA Que nos casamos hoje...
 
VALENTIM E teremos ambos muito prazer em que um camarada de meu irmão nos acompanhe ao jantar e às bodas.
 
GREGÓRIO Com mil buchas! estamos mesmo bons para gavotas e sarabandas!
 
LUISINHA Que tem, sargento?
 
VALENTIM Assusta-me! Que há de novo?
 
GREGÓRIO Que há de novo? Uma desgraça!
 
VALENTIM Não brinque!
 
GREGÓRIO Se até amanhã ao meio-dia o Capitão Jorge Braga não se apresentar no acampamento...
 
VALENTIM e LUISINHA Que lhe farão?
 
GREGÓRIO Que lhe farão? Sentenciá-lo-ão à morte, e pum! com seiscentas bombas!
 
VALENTIM e LUISINHA (horrorizados)  Oh!
 
GREGÓRIO Então julgam que isto de ser militar é comer filhoses? Diabo leve quem inventou os conselhos de guerra! Má raios o partam, fome o persiga, um estupor que lhe dê o inferno!...
 
VALENTIM e LUISINHA (benzendo-se)  Credo!
 
COPLAS
 
I GREGÓRIO  O militar durante a guerra, Deve andar pronto como um fuso: Fútil delito ou leve abuso Deita a perder um militar! Pra que lhe deem cabo da pele Não é mister uma batalha, Pois por dá cá aquela palha Podem mandá-lo fuzilar! Embora seja um valentão, Embora seja um fracalhão, Seis negras balas o farão 
 
Cair morto no chão! Pum!... pum!... pum!...  Pum!
 
II Se tem dois olhos, o soldado Ponha um no padre e outro na missa; Mesmo o valor, no ardor da liça, Deita a perder um militar! O militar, durante a guerra, Tanto perigo corre, em suma, Que sem ter feito coisa alguma, Podem mandá-lo fuzilar! Embora seja um valentão, etc...
 
Seu irmão ausentou-se com licença; mas há quatro dias que ela findou. O regimento está a poucas léguas daqui, em Jaboatão, preparado para atacar um reduto holandês. De um momento para outro estaremos a contas com o inimigo, e o meu capitão estará à frente de sua companhia! Isto é o que me faz desesperar, com seiscentas mil baionetas!
 
VALENTIM O inimigo! batalhas! baionetas! Ai, Virgem do Livramento, já não sei de que freguesia sou! Malditos holandeses, que vieram agitar esta terra, dantes tão sossegada! Olhe, sargento Vomita-pragas, matem-se, matem-se à vontade! Eu é que não me meto nesses assados!
 
GREGÓRIO Mas com mil raios! (Bate com a coronha da arma no chão)
 
VALENTIM (assustando-se)  Ai, credo! Julguei que fosse um tiro! Não brinque!
 
GREGÓRIO Tem certeza de que seu irmão não apareceu por cá?
 
VALENTIM Não, senhor; mas pode ser que se salve, porque os chefes...
 
GREGÓRIO Os chefes estimam-no, não há dúvida! mas já têm sido por demais tolerantes. Não fosse ele o Capitão Jorge Braga, e a estas horas estaria sentenciado e morto!
 
VALENTIM (chorando)  Meu pobre irmão! Vão-no fuzilar!
 
GREGÓRIO Isto é o menos!
 
VALENTIM Hein?
 
GREGÓRIO Uma dúzia de balas no coração! Que isso é? Um pau por um olho! Mas o pior é que será exautorado, desonrado!
 
VALENTIM Desonrado!
 
GREGÓRIO Desonrado sim, com mil demônios do inferno! Desonrado!
 
VALENTIM Pai do céu, que poderemos fazer? Lembre-se de alguma coisa, sargento!
 
LUISINHA Lembrem-se ambos. Talvez se possa arranjar tudo...
 
GREGÓRIO Choremos na cama, que é lugar quente. Eu volto para o acampamento, e Vossas Mercês casem-se com todos os diabos!...
 
VALENTIM Casarmo-nos! Numa situação como esta!
 
LUISINHA Isso nunca!
 
VALENTIM Ah! que dei no vinte! Eu soube, por portas travessas, de um namorico de Jorge com a filha de um senhor de engenho na Ipojuca.
 
GREGÓRIO E que tem Judas com as almas dos pobres? 
 
VALENTIM A apostar em como está lá com a pequena, sem se lembrar de que há holandeses em Pernambuco! Vamos lá! Daqui a Ipojuca são poucas léguas!
 
LUISINHA Eu também vou, e o Senhor sargento também.
 
VALENTIM Tenho um pressentimento de que ali encontraremos aquele escaldafavais. Na carreta chegaremos lá num instante. (Indo à porta) Ó Vicente, manda atrelar o macho à carreta! (A Luisinha) Em breve estaremos de volta, e então celebraremos as bodas. Vamos, Vicente, despacha-te! Eu vou buscar o capote e algum dinheiro.
 
LUISINHA Vou também preparar-me.
 
GREGÓRIO Vamos! Aviem-se, com quatrocentas mil granadas! 
 
(Valentim e Luisinha saem pela esquerda)
 
 
CENA X Gregório, latoeiros, mulheres, crianças, depois Valentim, Luisinha, Vicente.
 
FINAL
 
CORO  Onde o noivo está metido?  E a Luisinha onde é que está? Nosso bom patrão querido,  Sendo em breve seu marido,  Felicíssimo será!
 
GREGÓRIO Calem a boca!
 
CORO Por quê? Por quê?
 
GREGÓRIO Façam-me pouca  Bulha!
 
CORO Por quê? Não dirá Vossa Mercê?
 
GREGÓRIO O prazer que os embriaga  Triste caso perturbou: O Capitão Jorge Braga...
 
CORO O irmão  Do patrão?
 
GREGÓRIO  Do batalhão se ausentou!
 
CORO Que horror, ó Cristo! Jesus! que horror!  Isto é deveras  Constristador!
 
GREGÓRIO  Feroz conselho de guerra Vai julgá-lo em Jaboatão! Hão de deitá-lo por terra...
 
CORO  Que nos diz?! Infeliz!...
 
GREGÓRIO  Seis balas no coração!
 
CORO  Que horror, ó Cristo! etc...
 
VALENTIM (entrando com Luisinha) Amigos, vou partir!
 
CORO  Partir!
 
VALENTIM (a Vicente, que entra do fundo, onde aparece a carreta aparelhada)  Entrego-te a oficina.  Brevemente,  De volta estou.
 
GREGÓRIO Partamos!
 
VALENTIM e LUISINHA Vamos!
 
GREGÓRIO, VALENTIM e LUISINHA Partamos, partamos, Sem mais demorar! Corramos, corramos! E a quem procurarmos Havemos de achar! Adeus! Adeus!
 
(Entram os três na carreta. Vicente e os coristas acenam com os lenços, enquanto a carreta se põe em movimento e desaparece)
 
GREGÓRIO, VALENTIM e LUISINHA Adeus, amigos! Adeus! Adeus! E dos perigos Livrai-nos Deus! Adeus! Adeus!
 
CORO  Adeus, amigos! Adeus! Adeus! E dos perigos Que os livre Deus! Adeus! Adeus!
 
 
ATO II Acampamento em Jaboatão, Barracas. Armas ensarilhadas. Os soldados, dispostos em grupo, aqui e ali, bebem e jogam.
 
CENA I Soldados, depois Gregório.
 
CORO  Enquanto o rebate Não chama ao combate, Não é disparate Beber e jogar! Mulheres, filhinhos, Perdidos carinhos, Os jogos e os vinhos Não fazem lembrar!
 
UM SOLDADO  O pior é que não há nem novas nem mandados Do nosso Capitão!
 
OUTRO  O sargento aí vem... Toda atenção, soldados!
 
CORO  Soldados, atenção!
 
TODOS (a Gregório, que entra muito triste, de braços cruzados) Então? Então? Consigo traz o Capitão?
 
GREGÓRIO  Não!... Com quatrocentos mil cartuchos!  Não vem comigo  O Capitão!...
 
CORO Oh! que aflição! Não traz consigo o Capitão!
 
GREGÓRIO  Andei, corri por ceca e meca, 
 
Por olivais de Santarém...  Desde o Recife a Muribeca Não vi ninguém!
 
CORO  Não vi ninguém!
 
GREGÓRIO  O Conselho de guerra Lá se vai reunir! Está tudo por terra... Só lhe resta fugir...
 
CORO  Vamos ver, A tremer! O conselho de guerra, etc.
 
(Saída geral)
 
 
CENA II
 
GREGÓRIO Onde estará metido aquele diabo, com seiscentas bombas! Tínhamos certeza de encontrá-lo na Ipojuca, mas qual histórias, nem sombras! Em que dará tudo isto?
 
A VOZ DE VALENTIM Devagarinho... Cautela, Luisinha... Desce... apoia-te ao meu braço... assim...
 
GREGÓRIO Aí temos o funileiro e a noiva. É preciso afastá-los daqui. Ao ouvir ler a sentença, cada um deles é capaz de ter o seu faniquito, e eu não tenho jeito para tratar de mulheres nem de medrosos!
 
CENA III Gregório, Valentim, Luisinha.
 
VALENTIM (dando o braço a Luisinha)  E eu digo-te que deve estar aqui (Vendo Gregório) Olha, ali o tens. Bons dias, sargento; demoram-nos um pouco, mas não se queixe de mim: queixe-se do jumento, com sua licença.
 
GREGÓRIO (à parte)  Ora são bem cá precisos!
 
VALENTIM Julguei que chegasse tarde; por isso vim por esses caminhos vendendo azeite às canadas. Não sei o que tinha o maldito jumento! Por mais que eu lhe batesse e lhe dissesse: — Corre, meu velho, corre, que querem dar cabo de meu irmão! Corre, que tu também és quase da família! — nada! Cada vez andava mais devagar!
 
LUISINHA Mas, afinal, cá estamos. Diga-nos, sargento: podemos falar ao general?
 
VALENTIM Imediatamente?
 
GREGÓRIO Não é possível. Agora ninguém lhe pode falar. Está reunido o conselho de guerra e formada a tropa.
 
VALENTIM Por isso não encontramos um único soldado a quem perguntássemos por Vossa Mercê... Vinha eu dizendo à Luisinha: — Vamo-nos perder por aí... e, afinal de contas, andar assim ao deusdará... no meio do acampamento... Vem uma bala sem subscrito, e manda uma pessoa desta para melhor vida enquanto o diabo esfrega um olho! — Aqui sempre estamos melhor, pois não estamos? Esperamos aqui que termine o tal conselho, e depois iremos todos falar ao general. Que lhe parece, sargento?
 
GREGÓRIO Com cinquenta milhões de Satanases! pois são Vossas Mercês tão pouco espertos, que me não conheçam, na cara, não haver esperança possível?
 
LUISINHA e VALENTIM Hein?
 
GREGÓRIO Ao general ninguém fala. Já eu lhe quis falar e não consegui.
 
VALENTIM Valha-nos Deus! e eu, que contava alcançar alguns dias de espera!
 
GREGÓRIO Julga que o general é de folha-de-flandres? Aquilo é duro como uma rocha!
 
LUISINHA Nesse caso a nossa viagem é completamente baldada?
 
GREGÓRIO Completamente!
 
VALENTIM (animando-se)  É o que havemos de ver! É o que havemos de ver! Ah! ah!... Hei de mostrar para quanto sirvo! É que me não conhecem! É que não sabem quem aqui está!
 
GREGÓRIO (admirado)  Que é isto?
 
LUISINHA Nunca o vi assim!
 
COPLAS
 
I VALENTIM  Hei de o conselho de guerra ver; Nele o bedelho Quero meter! Se não consigo Lá penetrar, Não mais comigo Podem contar! Das sentinelas Dou cabo até! Nenhuma delas Fica de pé! Que, em tais alturas, Eu sou capaz De cem loucuras Fazer: zás! trás! Que espalhafato! Que irmão audaz! Degolo e mato Vão ver! zás! trás!
 
GREGÓRIO e LUISINHA  Diz o gabola Que tudo faz! Mata, degola! Zás! trás! Zás! trás!
 
II VALENTIM Não desespero  Mil vezes não! Salvá-lo quero, Que é meu irmão!
 
Pra quanto presto Vão todos ver! C'um simples gesto Faço tremer! Foram-se as nicas! Do sangue a voz Faz dum maricas Tigre feroz! Que espalhafato! Que irmão audaz! Degolo a mato! Vão ver! Zás trás! Diz o gabola
 
GREGÓRIO e LUISINHA  Que tudo faz! Mata, degola! Zás! trás! Zás! trás!
 
LUISINHA Ah, Valentim! quero dar-lhe um abraço! Quanto gosto de o ouvir falar assim!
 
VALENTIM Deixem acabar o tal conselho, e verão!
 
LUISINHA Diz o sargento que não é possível!
 
GREGÓRIO Não se perde nada com experimentar. Talvez que se possa fazer alguma coisa, com mil canhões!
 
VALENTIM Ó sargento, diga-me cá: a Luisinha pode descansar numa destas barracas? Coitadinha! Deve estar moída!
 
GREGÓRIO Ali tem... naquela barraca é que se alojava seu irmão... (Chorando) Então? não estou eu a chorar, com cem... Então?
 
VALENTIM (chorando)  Era ali?... (Abrindo a porta da barraca) Sim... cá está a mala... o leito... o uniforme e a espada! Só falta ali o meu pobre Jorge!
 
LUISINHA (que também chorou)  Vamos, não há que desanimar! Pode ser que esteja de volta antes do meio-dia!
 
VALENTIM (limpando as lágrimas) Nossa Senhora do Livramento te ouça! Senhor sargento, espere um pouco, que eu já volto para darmos princípio à nossa obra!
 
GREGÓRIO Vá, que o avisarei quando for ocasião.
 
VALENTIM Vamos, Luisinha! (Entra com Luisinha na barraca)
 
 
CENA IV Gregório, só; depois, Pantaleão De Aragão.
 
GREGÓRIO Pobre gente! Tem esperanças, e eu nenhuma! Vamos, Gregário, meia volta à direita! Ordinário! Marche! (Vai a sair; encontra-se com Pantaleão)
 
PANTALEÃO Alto a banca! Faz favor de me dar dois minutos de atenção!
 
GREGÓRIO Não posso! (Vai saindo)
 
PANTALEÃO (deitando-lhe a mão)  Ouça-me, que é negócio importante!
 
GREGÓRIO Não bata no púlpito, com seiscentas bombas! Vou em serviço... tenho pressa... Passe bem!
 
PANTALEÃO Não o demoro, camarada.
 
GREGÓRIO Sargento.
 
PANTALEÃO São só duas palavras.
 
GREGÓRIO Diga lá.
 
PANTALEÃO Conhece este retrato? (Dá-lhe uma miniatura)
 
GREGÓRIO O meu Capitão!
 
PANTALEÃO Hein? Pois é este o seu Capitão?
 
GREGÓRIO Jorge Braga!
 
PANTALEÃO Jorge Braga, é ele mesmo! (À parte) Desta vez não me escapará!
 
GREGÓRIO Com a breca! Traz notícias dele? Onde se meteu? Onde o puseram? Onde para? Corre perigo?... Responda, com trinta milhões de baionetas!
 
PANTALEÃO Abaixe a voz, Senhor sargento! Olhe, que eu cá também sei largar cutelos e varredoras, e praguejar quando é preciso, com todos os demônios do inferno!
 
GREGÓRIO E eu não tenho medo de caretas, com todos e mais alguns!
 
PANTALEÃO Calma... Calma... O tal Capitão não está no acampamento?
 
GREGÓRIO Se aqui estivesse, eu não lhe perguntava por ele!
 
PANTALEÃO Ah! não está!
 
GREGÓRIO e PANTALEÃO (juntos) Não está com todos os diabos, com cem mil bombas, e seiscentos raios!
 
PANTALEÃO Mas ele não pertence a esta divisão, companhia ou que demônio que seja? Como é que não está cá?
 
GREGÓRIO Desapareceu, já lhe disse! Ninguém sabe por onde anda! E se dentro de uma hora não se apresentar, reúnem o conselho, julgam-no, sentenciam-no, matam-no, fuzilam-no, com mil raios!
 
PANTALEÃO Fuzilam-no! (À parte) Não era essa a morte que eu lhe desejava! (Alto) Então não está no acampamento, hein? Isto só no inferno!...
 
GREGÓRIO Nem no inferno!
 
PANTALEÃO Se eu tivesse a certeza de o encontrar lá!...
 
GREGÓRIO Lá onde?
 
PANTALEÃO No inferno, com mil diabos! Lá mesmo seria capaz de ir procurá-lo!
 
(Juntos)
 
PANTALEÃO Com todos os diabos! com cem mil raios! com seiscentas borrascas (Sai)
 
GREGÓRIO Pois vá, com seiscentas bombas, com cem mil raios, e todos os diabos!
 
(Pantaleão vai saindo a proporção que pragueja)
 
GREGÓRIO (só, muito calmo)  Está penalizado, como todos nós.
 
 
CENA V Gregório, o ajudante-de-ordens, oficiais, soldados, depois Valentim, depois Luisinha.
 
GREGÓRIO (durante a entrada dos militares) 
 
Aí vem o ajudante de ordens. Que terá sucedido?
 
O AJUDANTE (a Gregório)  Não lhe vejo remédio. É verdade que o general mandou esperar até o meio-dia. Mas se até lá não se apresentar o Capitão, será dada a sentença.
 
VALENTIM (entrando)  Parece que já terminou o conselho. Vejamos se encontro o sargento para irmos ao general. (Dirige-se a Gregório. O ajudante repara nele) 
 
CONCERTANTE
 
AJUDANTE  Que vejo? É ele!... O Capitão!...
 
CORO  O Capitão!
 
AJUDANTE O Capitão!
 
CORO  É o Capitão!
 
AJUDANTE  Oh, que perigo Correu, amigo! Oh, que imprudência, Capitão! Se se demora Mais uma hora, Não tinha mais apelação!
 
CORO  Se se demora Mais uma hora,  Não tinha mais apelação!
 
AJUDANTE  Mas... a que vem este disfarce? Este disfarce?... (À parte)  Já entendo... Já compreendo: É a maldita parecença!
 
GREGÓRIO (baixo, a Valentim) Há de calar-se,  Se em salvar seu mano...
 
LUISINHA (que tem entrado e ouvido tudo) Ai, meu Deus, ai, como tremo!  Eis-me quase a desmaiar!  Enviúvo, ó Deus supremo,  Antes mesmo de casar!
 
VALENTIM  Ai, meu Deus, ai, como tremo! Meu irmão vim cá salvar, Mas não vão, ó Deus supremo, Fuzilar-me em seu lugar!
 
GREGÓRIO  Ele treme, eu também tremo, Pois o caso é singular... É decerto um meio extremo Pelo irmão aqui passar!
 
OS OUTROS Entre nós de novo o vemos!  Pôde em tempo ainda voltar! A amizade que lhe temos  Nos fazia recear.
 
AJUDANTE (a Valentim) Comunicar sua presença Vou neste instante ao general; Mas — antes disso — com licença; Venha um abraço fraternal. 
 
(Abraçam-se)
 
CORO  Oh! que perigo Correu amigo! Oh, que imprudência, Capitão! Se se demora Mais uma hora,  Não tinha mais apelação!
 
TODOS Viva o Capitão Jorge Braga! Viva!
 
GREGÓRIO (baixo)  Agradeça.
 
VALENTIM (cumprimentando com acanhamento)  Senhores, muito obrigado... muitíssimo obrigado... O meu coração... o meu reconhecimento...
 
GREGÓRIO (baixo)  Bom, é melhor estar calado.
 
AJUDANTE  Outro abraço, Capitão... e até logo! (Sai com os oficiais)
 
GREGÓRIO Agora, Capitão, vá mudar de fato! Vá vestir seu uniforme.
 
VALENTIM O uniforme?!... Ah, sim! Diz muito bem... Vou pôr o uniforme... (À parte) Que bonita figura hei de eu fazer com o tal uniforme!
 
GREGÓRIO Vamos! não se demore! Lembre-se de seu irmão!
 
VALENTIM Senhores, vou vestir o meu uniforme. (A Gregório) Veja lá em que assados me mete Vossa Mercê!
 
GREGÓRIO (aos soldados)  Agora, rapazes, vão anunciar à companhia a volta do Capitão!
 
TODOS OS SOLDADOS  Viva o Capitão! Viva! 
 
(Saem, repetindo um motivo do último coro)
 
 
CENA VI Gregório, Luisinha.
 
LUISINHA O Senhor sargento não se zangue com o que eu vou lhe dizer; mas parece-me que esta troca...
 
GREGÓRIO Xiu! Silêncio!... as paredes têm ouvidos! Deste modo ganhamos tempo, que é o principal. Quando o capitão chegar, o Senhor Valentim despe-se... O Capitão enverga a farda, e ei-los depois cada um no seu natural. O Capitão aqui, e o Senhor Valentim lá na funilaria. 
 
LUISINHA Mas Vossa Mercê não imagina! O Valentim é um maricas! Que irá ele fazer com uma farda às costas? Nunca me hei de esquecer de uma noite em que quase morreu de susto por causa de um gato que andava pelo mirante!
 
GREGÓRIO Eu o farei espertar! Aqui, o mais urgente é evitar a sentença; depois...
 
LUISINHA Depois... Veremos! Mas duvido que o resultado seja bom.
 
 
CENA VII Os mesmos, Valentim.
 
VALENTIM (com o uniforme ridiculamente vestido)  Que tal estou? Olhem pra isto!
 
GREGÓRIO Oh, com os diabos! Como arranjou isso?
 
LUISINHA Que lhe dizia eu? Olhe para aquela figura!
 
VALENTIM Então eu não me pareço agora com meu irmão?
 
GREGÓRIO Na cara parece-se: no feitio é que há grande diferença! Vamos, arreganho! É um recruta sem tirar nem pôr! (Arranjando-lhe a farda) A farda veste-se assim!
 
VALENTIM Olhe, que me afoga!
 
GREGÓRIO Essa espada não se traz aqui na frente. Isto põe-se atrás! Assim! (Faz o que diz)
 
VALENTIM Nada, essa agora é nova! A espada estava perfeitamente onde estava! Assim mete-se-me por entre as pernas! (Tropeçando na espada) Vê? Depois, quando quiser tirar a espada, tenho de voltar as costas... a mim mesmo?! Não posso perceber!
 
GREGÓRIO E o chapéu? Parece que nunca pôs um chapéu?!
 
VALENTIM Destes é a primeira vez, sargento.
 
GREGÓRIO Assim! (Põe-lhe o chapéu) Agora já parece outro!
 
VALENTIM Olhe que não vejo senão de um olho!
 
GREGÓRIO Não faz mal! Vamos! Esse corpo perfilado! Gesto arrogante! Passo firme!
 
VALENTIM Assim?
 
GREGÓRIO Não, homem de Deus! parece-me um velho!
 
TERCETO
 
VALENTIM  Faça favor de dar-me uma lição: Quero aprender!
 
GREGÓRIO (indo ao fundo)  Vai ver! 
 
(Descendo a marchar com todo o garbo) Rataplã! rataplã! rataplã! Plá! plá! plá!  Rataplã! plá! plá!
 
VALENTIM  Agora eu!  (A Luisinha)  Vê lá como me saio  Deste ensaio! (Faz o mesmo que Gregório, mas desaleitadamente)  Rataplã! rataplã! rataplã! etc...
 
LUISINHA  Não! não! Faça como eu faço! Comigo aprenda! Acerte o passo! (Marcha ainda com mais galhardia que Gregório) Rataplã! rataplã! rataplã!
 
GREGÓRIO Muito bem!
 
VALENTIM (a Luisinha) Quem te ensinou?
 
LUISINHA  Ninguém! Muito fácil é! Intuitivo até! É ver, é ver,  E aprender!
 
GREGÓRIO Agora os três!
 
(Vão todos ao fundo, e fazem diversas manobras, marchando de um lado para outro lado)
 
OS TRÊS Rataplã! rataplã! rataplã! etc...
 
GREGÓRIO Devo advertir-lhe que é preciso praguejar, rogar pragas, falar no diabo! Seu irmão está sempre a fazer tremer o mundo!
 
LUISINHA Aprendeu com o sargento.
 
VALENTIM Mas eu, palavra de honra! eu sou uma pomba sem fel... Nunca me zango!... Eu posso lá praguejar!
 
GREGÓRIO Há de praguejar por força! Assim! (Furibundo) Má raios te partam, diabo! Maldito sejas! Vá para os infernos, com trezentas granadas!
 
(Valentim repete todas essas pragas num tom suave)
 
LUISINHA Isso não é assim! Parece uma menina! Com mais alma! Assim: Má raios te partam! Maldito sejas! Vai para os infernos, com trezentas granadas!...
 
GREGÓRIO Belo! Belo! Muito bem!...
 
VALENTIM Que talento de mulher!
 
GREGÓRIO É uma joia! Era capaz de comandar a companhia melhor que Vossa Mercê!
 
VALENTIM Melhor do que eu, qualquer. Enfim, veremos como me saio desta... O que me ensinaram até agora, passe... mas fiquem na certeza de que lá coisa de pólvora... é que não vai nada! (Entra o ajudante de ordens) Bom, ei-los comigo!
 
 
CENA VIII Os mesmos, o ajudante-de-ordens.
 
O AJUDANTE  Capitão Jorge Braga, acaba de ser dissolvido o conselho de guerra que O havia de julgar.
 
VALENTIM (baixo a Luisinha)  Que fortuna! Salvei meu irmão!
 
AJUDANTE  E venho dizer-lhe...
 
VALENTIM Ai, Jesus! o quê?
 
GREGÓRIO (à parte)  Tremo!
 
AJUDANTE  O general resolveu castigá-lo pela sua prolongada ausência. Ordena que se recolha à sua barraca!
 
GREGÓRIO (à parte)  Oh, que afronta para o meu pobre capitão!
 
VALENTIM (à parte)  Se é só isso... (Alto) Pois diga ao general que estimo muito!
 
GREGÓRIO (baixo)  Ó diabo, é o contrário! Mostre-se sentido!
 
VALENTIM (emendando)  Sim, que estimo muito vê-lo bom... Mas que esta afronta é muito... é... Má raios te partam, diabo! Maldito sejas! Vai para os infernos, com trezentas granadas!
 
AJUDANTE  Compreendo que isto o aflija! A um valente e brioso militar muito custa a detenção em dia de batalha!
 
VALENTIM Ah! vai haver hoje batalha? (Contentíssimo) Pois então...
 
GREGÓRIO (baixo)  Mostre-se sentido, com todos os demônios!
 
VALENTIM (noutro tom)  Com que então, vai havei hoje batalha? Com trezentos milheiros de diabos! E não irei à frente de minha companhia! E não sentirei o zunir da pólvora, nem ouvirei o cheiro das balas! Não me acharei entre metralhas e granadas!... rodeado de mortos... Ah! sangue! sangue!... E eu, que gosto tanto de ver sangue!
 
AJUDANTE Capitão, entregue-me a espada!
 
VALENTIM Pois quer só a espada? E então a bainha? 
 
GREGÓRIO (baixo)  Cala-te, animal! (À parte) Desonrado! Desonrado o meu capitão!...
 
VALENTIM Diga ao general que muito me custa separar-me dela! Enquanto à palavra de não ir à batalha, dou-lha com muito pra... (Gregório puxalhe a farda...) com muito pesar. Mas fique certo de que a cumprirei religiosamente.
 
AJUDANTE  Bem, Capitão! Talvez que o general, em vista do seu arrependimento, lhe mande dar a liberdade!
 
VALENTIM Não, meu amigo, isso é que não! O castigo é grande certamente, mas eu o mereço, oh! se mereço! É duro, bem sei, mas — vamos lá! — é preciso um grande exemplo!
 
AJUDANTE As suas ordens. (Sai)
 
 
CENA IX Valentim, Gregório, Luisinha.
 
VALENTIM Louvada seja Nossa Senhora do Livramento! Meu irmão está salvo!
 
LUISINHA Preso num dia de batalha! Vai tudo às mil maravilhas!...
 
GREGÓRIO Maravilhas! Chamam-lhe maravilhas!... Não sabem que; um militar prefere morrer a ficar de braços cruzados num dia de combate!
 
VALENTIM Mas eu cá não sou militar...
 
GREGÓRIO Vossa Mercê agora não é Vossa Mercê; é seu irmão! Vou arranjar este negócio!
 
VALENTIM Que negócio! Olá sargento! não se meta onde não é chamado!
 
GREGÓRIO Volto já. Tudo há de se arranjar. (Sai)
 
VALENTIM Que diabo será?... Entra ali, Luisinha... vou ver o que faz aquele espirra-canivetes.
 
LUISINHA Veja lá, Valentim, não vá fazer asneiras! (Entra na barraca)
 
VALENTIM Descansa. (Dirige-se para o fundo; encontra-se com Pantaleão de Aragão)
 
 
CENA X Valentim, Pantaleão.
 
PANTALEÃO (à parte)  É ele! (Alto) Alto a banca, Capitão: eu sou Pantaleão Beltrão de Aragão!
 
VALENTIM Estimo muito. (À parte) Ão, ão, ão! É um cão que ladra!
 
PANTALEÃO Sou capitão da escuna Conceição; cheguei do reino há cinco dias!
 
VALENTIM Estimo ainda mais.
 
PANTALEÃO Sou irmão de Dona Guiomar Beltrão de Aragão, e filho do finado Capitão-mor Elesbão Romão de Aragão, senhor de engenho que foi na Ipojuca.
 
VALENTIM Que o seja Vossa Mercê por muitos anos e bons. (À parte) É uma família onomatopaica.
 
PANTALEÃO Portanto, já deve saber o que pretendo.
 
VALENTIM Por ora, não, senhor.
 
PANTALEÃO Como?! Com seiscentos jacarés! Pois nega ter, durante a minha ausência, seduzido minha irmã, Dona Guiomar Beltrão de Aragão?!
 
VALENTIM Eu?! — Ó homem, isso não são brincadeiras!
 
PANTALEÃO (mostrando-lhe um maço de cartas)  Conquanto não estejam assinadas, negará que estas cartas sejam suas?
 
VALENTIM (à parte)  A letra do meu irmão!...
 
PANTALEÃO Vejo que ficou desmaestreado! Estas cartas não me permitem, com trezentos tubarões! duvidar da desonra de minha irmã, Dona Guiomar Beltrão...
 
VALENTIM De Aragão, já sei... é que... (À parte) O maroto de meu irmão meteume em bons lençóis...
 
PANTALEÃO Capitão, uma reparação, ou morre pela minha mão, como um cão!
 
VALENTIM (afetando sangue frio) 
 
Entendamo-nos, Senhor Aragão... que diabo! Vamos ver se nós entendemos!...
 
PANTALEÃO Uma reparação, com mil burrajonas!
 
VALENTIM Faça favor de atender-me, e não me fale em armas de fogo. (À parte, sentando-se) Ganhemos tempo, até que apareça meu irmão, para se entender com ele... (Alto) Enquanto ao dar a minha mão de esposo a sua mana, não digo que não... porque enfim... ela é moça... bonita... (À parte) Será?... (Alto) Bem-educada... modesta... Em posição, podemos perfeitamente medir-nos: Vossa Mercê é capitão de navio; eu sou capitão do exército: não há diferença nenhuma. O senhor seu pai também era capitão, com a diferença de que era capitão-mor... Os nossos gênios é que não se combinam... Enfim, para a semana que vem, falaremos... Sou um seu criado! (Quer retirar-se)
 
PANTALEÃO (furioso)  Com mil raios! Pensa que sou homem que se contenta com uma simples palavra, quando se trata da honra de sua família? Aqui tem este documento, que o senhor há de assinar! E, se o não fizer, deito fogo ao paiol da pólvora!
 
VALENTIM (depois de ler)  O quê? Uma promessa formal de casamento?
 
PANTALEÃO Justamente. Tomamos, em conselho de família, a resolução de apresentar-lhe este documento! E eu, como mais velho, é que lhe venho dar abordagem.
 
VALENTIM (à parte)  Escapo do conselho de guerra, para cair no conselho de família...
 
PANTALEÃO Assina ou não?
 
VALENTIM Isto... sim, isto da gente casar é negócio muito sério... É preciso meditar...
 
PANTALEÃO (tirando duas pistolas)  Aqui estão duas pistolas! Proponho-lhe um duelo! Saiamos!...
 
VALENTIM (a tremer)  Um duelo... (À parte) Ui! e eu que não me lembrava que estava detido... (Alto) Pois bem! Saiamos!
 
PANTALEÃO Ora graças a Deus!...
 
VALENTIM E desde já o previno que há de ser um duelo a valer!
 
PANTALEÃO Como?!
 
VALENTIM Não dou quartel!
 
PANTALEÃO Nem eu, com mil tempestades!
 
VALENTIM Um de nós há de ficar morto!
 
PANTALEÃO Certamente.
 
VALENTIM E o outro vivo. — Marchemos! (Parando de repente) Má raios te partam, diabo! Maldito sejas! Vai para os infernos, com trezentas granadas!
 
PANTALEÃO Que é lá isso?
 
VALENTIM Não posso sair!
 
PANTALEÃO Por quê?
 
VALENTIM Estou detido aqui! Bem vê... não tenho espada... Desgraçado de mim! Não tenho espada!
 
 
CENA XI Os mesmos, Gregório.
 
GREGÓRIO (entrando a correr, com a espada de Valentim na mão)  Vitória! Vitória, meu capitão!... O general já lhe concedeu perdão, e manda restituí-lo à liberdade. Aqui tem a espada!
 
VALENTIM (à parte)  O que tu queres é matar-me, assassino!
 
PANTALEÃO Já não há obstáculos que nos interponha.
 
VALENTIM Engana-se redondamente. Eu sou um oficial experimentado, sei a minha obrigação, e aqui não sairei sem uma licença assinada pelo general! Pois quê! Porque um sargento vem dizer-me isto, hei de lhe dar crédito? Eu não sou nenhum soldado de chumbo! Não recebo ordens de meus inferiores! Daqui não saio sem o preto no branco! Nada... não saio!... Quer uma ordem assinada?... Já lha trago! (Sai precipitadamente)
 
CENA XII Valentim, Gregório, Luisinha.
 
VALENTIM Vossa Mercê meteu-me em boas!
 
GREGÓRIO Hein?
 
LUISINHA (entrando)  Que foi fazer, sargento?
 
GREGÓRIO Por quê?
 
VALENTIM Nada, uma brincadeira! Pelo que vejo, meu irmão seduziu a irmã deste Aragão Furacão que acaba de sair!
 
LUISINHA Este homem quer à viva força bater-se com Valentim, julgando que é o irmão. Ouvi tudo dali... Tremia de medo!
 
GREGÓRIO Então ainda se queixa de mim por ter salvo a honra de seu irmão? Alcancei-lhe a entrega da espada e o comando da companhia indicada para marchar primeiro e tomar o reduto ao inimigo!
 
VALENTIM (horrorizado)  Um reduto?! Misericórdia!!...
 
LUISINHA Isso é que não consinto.
 
GREGÓRIO Esteja calada, faça favor.
 
LUISINHA Valentim, proíbo-lhe que tenha coragem!
 
VALENTIM Por esse lado, fica descansada. — Não me faltava mais nada! Que diabo, ou não sou soldado, sou funileiro! Não faço proezas, faço canecas. Sou muito amigo de meu irmão, mas isto assim já passa de amizade! Já fiz bastante por sua causa!
 
GREGÓRIO Agora é pegar-lhe com um trapo quente! Se descobrem que não é o capitão, fuzilam-no!
 
VALENTIM Onde me vim meter, meu Deus?!
 
GREGÓRIO Faça de conta que embarcou. Não há remédio senão esperar a borrasca! Se tem amor a seu irmão, é marchar para a frente, com mil diabos! Nem todos que entram em campanha morrem! Aqui estou eu que sempre saí são e salvo!
 
VALENTIM Vossa Mercê está habituado. As balas já o conhecem e não lhe fazem mal. Mas eu...
 
LUISINHA (chorando)  Valentim, se vais bater-te, nunca mais te verei!
 
VALENTIM Disso é que eu tenho medo, Luisinha. Eu, metido numa batalha, sem entender nada daquilo... Dão-me cabo do canastro com toda a certeza!
 
GREGÓRIO Cobri-lo-ei com meu corpo...
 
VALENTIM Sim, mas, se o atravessarem, a mim também me há de tocar alguma coisa... Nada! É impossível... Vou fugir!
 
LUISINHA Isso! isso!
 
GREGÓRIO Pois bem! Fuja, com trinta milhões de granadas! Mas saiba que é a Vossa Mercê que seu irmão vai dever a sentença de morte!
 
VALENTIM Ai, Jesus! que farei? Não haverá algum remédio para ser valente sem correr perigo? (Ouvem-se descargas de fuzil) Ai!
 
GREGÓRIO Ouve? Já começam as guerrilhas!
 
VALENTIM Nossa Senhora do Livramento me acuda!
 
GREGÓRIO (tomando-lhe o braço)  Vamos! Valor! Um homem é um homem! (Música na orquestra) Olhe, aí vem a companhia formada! Que prazer terá seu irmão quando souber que foi ele quem tomou o reduto! 
 
(A orquestra toca com toda a força. Aparece a companhia em ordem de marcha)
 
 
CENA XIII Os mesmos, o ajudante-de-ordens, soldados.
 
CANTO
 
O AJUDANTE  A companhia espera o Capitão.
 
GREGÓRIO (a dois soldados) Vão buscar o cavalo! 
 
(Os dois soldados saem)
 
VALENTIM Que grande abalo! Que comoção! Foram buscar o cavalo... Ai, que triste situação! Já não me posso Nas pernas ter! Tenho medo, que me coço! Vou de medo aqui morrer!
 
(Os dois soldados voltam, trazendo pela rédea um magnífico cavalo, perfeitamente ajaezado)
 
CORO  O cavalo! o cavalo!
 
GREGÓRIO  Eis o cavalo ardido Do grande Jorge Braga, O militar indômito Que nunca fraquejou! Que o leve à guerra intrépido! Que triunfante o traga! Cavalo assim tão trêfego Nunca ninguém montou!
 
CORO  Eis o cavalo ardido, etc...
 
GREGÓRIO (a um soldado, depois de agarrar em Valentim, que treme)
 
Queira ajudar-me a pô-lo em cima. (À parte) O desgraçado não se anima!
 
(Conseguem a muito custo fazer com que Valentim monte a cavalo)
 
VALENTIM (montado) Adeus, ó Luisinha! Adeus, amores meus! Adeus, querida minha! Talvez pra sempre adeus!
 
VALENTIM e LUISINHA (clamando) Adeus, adeus! adeus!
 
CORO  Viva e reviva o Capitão! De exemplo sirva ao fracalhão!
 
(Sai Valentim à frente de toda companhia. Segue-os o ajudante de ordens)
 
 
CENA XIV Luisinha (só).
 
LUISINHA Valentim, meu marido! Levam-no!... e eu não tenho forças para acompanhá-lo! Infeliz! Que vai ele fazer no meio de uma batalha? Se não morrer de uma bala, morre de susto com toda a certeza! (Ouvem-se descargas) Virgem Santa! (Tapa os ouvidos) Agora é que ele morre! (Cai de joelhos)
 
PRECE Virgem puríssima, Virgem das Dores, Ai, compadece-te, Virgem, de mim! Roubam-me os cândidos,
 
Castos amores! Resgatem lágrimas Meu Valentim!
 
 
CENA XV Luisinha, Pantaleão.
 
PANTALEÃO Senhor Capitão Jorge Braga, aqui tem a ordem!
 
LUISINHA (erguendo-se)  Quem é? Quem procura? Traz notícias dele? Mataram-no?
 
PANTALEÃO Mataram-no? A quem?
 
LUISINHA Ao Capitão, a meu marido!
 
PANTALEÃO Que diz, minha senhora? O Capitão é casado?
 
LUISINHA Quase. Devíamos casar ontem. Mas alguns contratempos houve, e só amanhã seremos marido e mulher!
 
PANTALEÃO Ah! infame! Já agora compreendo por que ele andava a bordejar... bordejar!... Mas hei de encontrá-lo! Quero beber-lhe o sangue, com mil diabos!...
 
LUISINHA Também este! Toda a gente quer matá-lo, coitado!
 
PANTALEÃO Ele onde está?
 
LUISINHA A estas horas, no outro mundo. Não ouve as descargas? Foi com os soldados tomar um reduto. Matam-no sem compaixão!
 
PANTALEÃO Há um Deus para os velhacos! Morrerá com honra, como morrem os heróis!
 
LUISINHA Mas por que deseja que morra o meu Valentim?
 
PANTALEÃO Valentim!? Quem lhe fala em Valentim? Refiro-me ao Capitão Jorge Braga! Esse monstro desonrou a família Beltrão de Aragão!
 
LUISINHA Ah! é o tal capitão de navio! Se o Valentim escapar às balas dos holandeses, virá com certeza morrer às mãos deste Ferrabrás! 
 
(Ouvem-se aclamações)
 
PANTALEÃO Vozes...
 
VOZES  Viva o Capitão Jorge Braga! Viva!
 
PANTALEÃO O Capitão Jorge Braga! Aclamam-no!
 
LUISINHA (contente)  Será possível?
 
 
CENA XVI Os mesmos, Valentim, Gregório, oficiais, soldados, depois o ajudante de ordens.
 
(Valentim entra triunfalmente, a cavalo, trazendo algumas bandeiras holandesas. Gregório vem a seu lado)
 
MARCHA e CORO  Vitória! vitória! Saiu vencedor! Cobriu-se de glória, De brio e valor! É coisa notória Que um bravo aqui está! Direito pra história Daqui marchará!
 
GREGÓRIO (a Valentim) Ânimo! Já não há perigo!
 
LUISINHA Como te foste, ó meu amigo?
 
VALENTIM  O meu cavalo é que deu jeito: Não quero fama sem proveito.
 
AJUDANTE  Senhores, em paga De tanto valor, Vai o Senhor Jorge Braga, Por ordem superior, Ser elevado a major!
 
CORO  Viva o major!
 
VALENTIM (à parte) Se eu sou major,  Deve o cavalo  Ser coronel...
 
AJUDANTE  O general quer abraçá-lo: Vamos ao quartel!
 
CORO  Vamos ao quartel!
 
PANTALEÃO (à parte) Hei de ir também...
 
VALENTIM (a Luisinha) Comigo vem...
 
CORO  Vitória! vitória! etc...
 
 
ATO III Sala no palácio do Governador, comunicando ao fundo com a capela do palácio por uma larga porta, na qual pende longo reposteiro. À esquerda, 2o plano, a porta da entrada principal. À direita, na mesma direção, uma porta dizendo para os aposentos do Governador. A esquerda, 1o plano, pequena porta. À direita, uma mesa com instrumentos de matemáticas e de um mapa geográfico.
 
CENA I Convidados (cavalheiros e senhoras), depois Valentim, da porta principal, trazendo consigo as bandeiras do segundo ato, acompanhado pelo ajudante de ordens e outros oficiais; depois Gregório e Luisinha; depois um reposteiro.
 
CORO DE CONVIDADOS Que esplêndido sarau! que lindo baile fúlgido! Do dia o grande herói merece muito mais! Matias de Albuquerque está satisfeitíssimo, E honra destarte a flor de seus oficiais
 
(Ouvem-se aclamações) Ei-lo aí vem! Que Deus o traga!  É o valoroso Jorge Braga!
 
VALENTIM (entrando e declamando)  Obrigado, meus senhores, muito obrigado!
 
CORO  Tu que pra glória vais e da vitória vens, Mais uma vez recebe os nossos parabéns.
 
(Grandes mesuras)
 
VALENTIM Minhas senhoras... meus senhores... confundem-me tantos cumprimentos. Creiam que nada fiz, nada, absolutamente nada. Outro qualquer faria o mesmo.
 
O AJUDANTE  O Major é a modéstia personificada!
 
VALENTIM (à parte)  Quantas honras estou usurpando ao meu cavalo! (Vendo Gregório e Luisinha, que entram e se aproximam timidamente) Ah! estão aqui? Meu amigo, endoideço, não há que ver! Tenho que ir à presença do Governador; verá que não digo palavra e faço asneira!
 
LUISINHA Cautela!
 
GREGÓRIO Não esqueça a lição, e fale o menos que puder.
 
O REPOSTEIRO (aparecendo a porta dos aposentos do Governador)  O Senhor Governador recebe o Senhor Major Jorge Braga, e os demais senhores oficiais que o acompanharem.
 
VALENTIM Agora é que são elas!
 
GREGÓRIO Ânimo!
 
LUISINHA Coragem!
 
AJUDANTE  Vamos!
 
(Valentim e os militares entram nos aposentos do Governador; os demais convidados espalham-se e saem por diversas direções. Só ficam em cena Gregório e Luisinha)
 
 
CENA II Gregório, Luisinha.
 
LUISINHA Diga-me, Senhor Gregório, nós ficamos aqui?
 
GREGÓRIO Esteja tranquila, ninguém nos mandará sair. Hoje é dia de sarau... e o jardim do palácio está aberto ao público.
 
LUISINHA Isso é o jardim; mas nós estamos...
 
GREGÓRIO Dentro de casa; que tem isso? Ai, que a menina está me saindo mais medrosa que o trangalhadanças do seu noivo! Ontem, no campo, parecia outra, com seiscentas bombas!
 
LUISINHA Era para dar-lhe coragem. Hoje, confesso que o que mais me preocupa é o tal Pantaleão de Aragão.
 
GREGÓRIO Ora, esqueça-se disso!
 
LUISINHA Tenho muito medo que ele mate o meu pobre Valentim...
 
GREGÓRIO (impaciente)  E que importa?
 
LUISINHA Que importa? É boa!
 
GREGÓRIO Não é isso o que me inquieta. Receio que o latoeiro faça alguma em presença do Governador... e Matias de Albuquerque não é para graças. Queira Deus lhe aproveite a lição que lhe dei hoje pela manhã. Vai Vossa Mercê, disse-lhe eu, vai Vossa Mercê, coloca-se diante do Governador, e diz-lhe: — "Aqui tem Vossa Senhoria as bandeiras que eu tomei ao inimigo: onde quer que as ponha?" — Ah! fosse a coisa comigo, com seis mil bacamartes!... Mas o seu noivo é um maricas, o que aliás não impede que seja um grande herói.
 
LUISINHA Um grande herói?
 
GREGÓRIO Herói à força, é verdade, mas herói! Não foi o primeiro nem será o último!
 
COPLAS
 
I
De pimpão ganha fama um soldado Que, em ouvindo o troar do canhão, Cai sem forças no chão desmaiado, Se das tripas não faz coração. Mas no campo, no ardor da peleja, Capacita-se o grande poltrão Que, se morre o que mais esbraveja, Também morre o que é menos pimpão...  Isto dói! Isto dói! Faz-se à força um grandíssimo herói!
 
II Sem que um tipo à vitória se arroje, Acontece ficar vencedor; Muitas vezes, pensando que foge, Vai prodígios obrar de valor! Deste modo um poltrão, que não sente Sem tremer um rufar de tambor, Ganha reputação de valente E vai postos galgando a vapor! Isto dói! Isto dói! Faz-se à força um grandíssimo herói!
 
LUISINHA (prestando ouvidos)  Sargento não ouve?
 
GREGÓRIO Nada!
 
LUISINHA (indo à porta dos aposentos do governador)  Não me engano...
 
GREGÓRIO Que é?
 
LUISINHA Um falatório...
 
GREGÓRIO Sim, tem razão, agora ouço. Não há que ver: seu noivo entornou o caldo.
 
LUISINHA Estou mais morta que viva! Vá ver o que foi, sargento.
 
GREGÓRIO (entreabrindo a porta e espreitando)  Não se engana a menina, com mil raios! veja lá... no fundo do corredor... ao pé da escada... formam-se grupos de oficiais... parecem todos inquietos. Que aconteceria, com cem mil buchas?!
 
LUISINHA Naturalmente deram pelo embuste. Matam-no com toda a certeza!
 
GREGÓRIO (sempre espreitando)  É ele... vem descendo a escada...
 
LUISINHA Preso?
 
GREGÓRIO Não — livre; mas pálido, desfeito... Já me viu... Dirige-se para este lado... Vamos saber tudo!...
 
LUISINHA Sargento, parece-me que vou perder os sentidos.
 
GREGÓRIO Irra! transfira o seu faniquito para amanhã, com todos os diabos!...
 
 
CENA III Os mesmos, Valentim, que entra amedrontado.
 
TERCETINO E COPLAS
 
GREGÓRIO (tomando-o pelo braço) Que aconteceu?
 
LUISINHA (tocando-o pelo outro braço) Que sucedeu?
 
VALENTIM  Tudo perdido está!
 
LUISINHA  Meu Deus!
 
GREGÓRIO  Explique-se!
 
VALENTIM  Vá lá!
 
I Passei pelo corredor; Entrei num grande salão; E o nosso Governador, Ao ver-me estendeu-me a mão;  Dei-lhe as bandeiras Que ao inimigo Eu... Jorge, digo... Ontem ganhou; E ele, contente, C'um forte abraço Meu espinhaço Quase quebrou!
 
OS TRÊS E ele, contente,
 
C'um forte abraço Meu espinhaço Seu espinhaço Quase quebrou!
 
II Nisto, um velho militar Entra também no salão, E ao governador vai dar Um papel que traz na mão... Ergue-se em fúria, Todo irascível, Esse terrível Governador! Levar a breca Na flor da idade É, na verdade, Constristador!
 
OS TRÊS  Levar a breca, etc...
 
GREGÓRIO Mas, afinal de contas, que dizia o tal papel? 
 
VALENTIM Não sei, mas suponho que era uma denúncia anônima. O Governador abriu-o, leu-o, amarrotou-o encolerizado, e, olhando fixamente para mim, disse-me: — "Ordeno-lhe, senhor, que não saia do palácio sem minha ordem." — Sim, senhor, respondi eu sem saber o que dizia nem de que freguesia era.
 
LUISINHA O Governador sabe de tudo! Meu pobre Valentim!
 
GREGÓRIO Meu pobre Capitão! Mas quem seria o patife que nos traiu? Se eu soubesse! ai, que se eu o soubesse, com trinta mil raios que o partam!...
 
VALENTIM Vem gente... chegou a minha última hora.
 
GREGÓRIO Vamos! calma... dignidade... Pense na farda que traz vestida.
 
VALENTIM Isto não é uma farda: é uma camisa de onze varas. 
 
(O Governador Matias de Albuquerque aparece a direita)
 
 
CENA IV Os mesmos, Matias de Albuquerque.
 
O GOVERNADOR  Ah! está ali...
 
OS TRÊS (à parte)  O Governador!...
 
GOVERNADOR (falando para dentro)  Não quero que interrompais a conversação que vou ter com o Major Braga. Durante esse tempo diverti-vos; por enquanto não há motivo para tristezas... Dançai um minuete... (A Valentim) Temos que conversar. (Vendo Gregório e Luisinha) Que gente é esta?
 
GREGÓRIO (com uma continência)  Sargento Gregório, meu Governador.
 
VALENTIM (imitando-o) Sargento Gregório, meu Governador.
 
GOVERNADOR  Conheço-te de nome... és um bom soldado.
 
GREGÓRIO É favor.
 
VALENTIM É favor.
 
GOVERNADOR  E esta menina?
 
VALENTIM Esta menina é... é uma menina... minha cunhada, mulher de meu irmão... que é latoeiro... não quis nunca separar-se de mim...
 
GOVERNADOR Compreendo... no meio de tantos perigos...
 
VALENTIM (à parte)  Está a zombar de mim.
 
GOVERNADOR Sargento, manda transportar para aquele quarto a bagagem do Major; entrarás pela escada secreta que dá para o quintal. Aí encontrarás quem te encaminhe.
 
VALENTIM (admirado)  A minha bagagem!
 
GOVERNADOR (tomando Valentim à parte)  Sim, eu quero tê-lo à mão.
 
VALENTIM (à parte)  Ai! à mão!...
 
GOVERNADOR  Deixem-nos!
 
LUISINHA (a Valentim, desesperada)  Deixar-te... numa ocasião destas...
 
VALENTIM Queira desculpá-la, meu Governador...
 
GOVERNADOR  Esta apreensão é natural. (Indicando a pequena porta da esquerda) A menina pode dispor daquela alcova durante algumas horas.
 
VALENTIM (baixo a Luisinha)  Algumas horas, ouves? Parece que a coisa não se demorará muito!
 
GOVERNADOR (a Valentim)  A separação parecer-lhe-á depois menos penosa.
 
VALENTIM A separação, ouves?
 
GREGÓRIO (baixo a Valentim)  Tenha coragem, com mil infernos! (Baixo a Luisinha) Venha!
 
LUISINHA Que irão fazer-lhe, meu Deus!
 
VALENTIM Adeus, Luisinha, adeus! (Abraça-a e beija-a às escondidas do Governador. Gregório separa-os e leva Luisinha; saem pela pequena porta da esquerda)
 
 
CENA V Valentim, o Governador.
 
GOVERNADOR  Estamos sós... ouça-me...
 
VALENTIM (esforçando-se por se mostrar tranquilo)  Às ordens do meu Governador.
 
GOVERNADOR  Recebi, em sua presença, uma comunicação que me encheu de cólera!
 
VALENTIM (suplicante)  Mas...
 
GOVERNADOR  Passou, felizmente. Estou agora perfeitamente tranquilo. Mas imagine que nesse papel me participavam que os holandeses atacaram a povoação de Serinhaém!
 
VALENTIM Hein? Como? (À parte) E eu temia! Agora respiro! (Alto) Com que então, os Senhores holandeses?
 
GOVERNADOR (com mistério)  Ocuparam a povoação, apoderaram-se do tenente-coronel Rodovalho, que comandava a guarnição ali destacada e fuzilaramno!
 
VALENTIM Fuzilaram o Tenente-coronel Rodovalho? aquele excelente Rodovalho?... (À parte) Nunca o vi mais gordo...
 
GOVERNADOR (com ímpeto)  Guerra! guerra sem tréguas nem piedade!
 
VALENTIM (procurando animar-se)  Sem piedade! 
 
GOVERNADOR  Guerra terrível! O sangue pede sangue! 
 
VALENTIM Pois demos-lho! (Pragueja como no segundo ato)
 
GOVERNADOR (andando de um lado para o outro)  Ah! corja de infiéis! assassinais cobardemente um homem que não vos poderia oferecer resistência? Pois bem! não vos enviaremos um parlamentário que vos obrigue a abaixar humildemente a cabeça: enviar-vos-emos um terrível guerreiro, um herói que não conhece perigos nem hesitações! (Parando em frente de Valentim e pondo-lhe a mão no ombro) Esse herói, ei-lo!
 
VALENTIM (caindo numa cadeira)  Ai!
 
GOVERNADOR (sem dar atenção a Valentim e indo examinar o mapa geográfico que está sobre a mesa)  Nada de piedade, Major, nada de comiseração! A coragem, quase sobre-humana, que ontem mostrou, assegura-nos o sucesso de nossas armas. Não consulte o seu coração; consulte unicamente a sua espada! 
 
(Valentim, sem poder falar, tem respondido por gestos a tudo isto)
 
VALENTIM (à parte)  Eu estouro! Precisava sangrar-me!
 
GOVERNADOR  Partirá daqui a três horas.
 
VALENTIM (balbuciando)  Daqui a três horas? (Ergue-se) Mas, meu Senhor, eu não estou preparado...
 
GOVERNADOR  Compreendo... Quer combinar comigo o plano de campanha. É muito acertado! Reconheço nisso um bom militar. Aqui temos o mapa de Pernambuco. (Vai sentar-se à mesa) Sente-se diante de mim.
 
VALENTIM (à parte, aproximando uma cadeira...)  Antes uma dúzia de redutos! (Senta-se)
 
GOVERNADOR  Marquemos os pontos estratégicos... pare... os holandeses estão aqui... cá está o ponto atacado. As nossas tropas estão divididas em dois troços, um aqui, em Jaboatão... outro no Recife. Que fará o Major?
 
VALENTIM (depois de ter por muito tempo examinado a carta)  Eu?
 
GOVERNADOR  Sim, vejamos...
 
VALENTIM E Vossa senhoria?
 
GOVERNADOR (com modéstia)  Eu ia por aqui... pelo Cabo... pois, como sabe, aqui, por Nossa Senhora do Ó, não há estrada que preste.
 
VALENTIM É justamente a minha opinião.
 
GOVERNADOR  Mas se o inimigo se dividisse, e atacasse a vanguarda pelo Rio Formoso, e a retaguarda pela Gameleira, como Vossa Mercê salvaria o centro?
 
VALENTIM O centro? o centro? Vossa Senhoria compreende muito bem que o centro é o que se deve salvar em primeiro lugar, porque o centro...
 
sim, que diabo! o centro... é tão importante!... O Governador naturalmente tem lá sua ideia...
 
GOVERNADOR  Eu atravessaria o Rio Serinhaém e ocultava-me no mato.
 
VALENTIM Pois eu, salvo melhor aviso... eu atravessaria o rio e ocultava-me no mato aqui. (Aponta no mapa)
 
GOVERNADOR  Mas é justamente o que eu acabo de dizer.
 
VALENTIM Nesse caso, somos da mesma opinião... Eu julguei que Vossa Senhoria preferisse...
 
GOVERNADOR  Quê? Vir por mar e entrar na Barra das Jangadas? Nunca!
 
VALENTIM Nunca! nunca! É preciso atravessar o mato e ocultar-se no rio... não! quero dizer... atravessar o rio e ocultar-se no mato.
 
GOVERNADOR (erguendo-se)  Muito bem, Major, estamos perfeitamente entendidos... É preciso que em cinco ou seis dias se decida esta campanha; os holandeses desejam internar-se, e convém frustrar-lhes os planos. O Major vai arriscar os seus dias; mas os homens de sua têmpera não fazem caso da vida.
 
VALENTIM (encolhendo os ombros com ar de pouco caso)  Oh! (Arrependido) Entretanto, confesso que esta comissão causa-me sérios transtornos... Depois da guerra, a gente pensa em descansar... Eu estou com um casamento meio tratado...
 
GOVERNADOR  Que está dizendo? Não tem o direito de recusar!...
 
VALENTIM Bom... se não tenho direito...
 
GOVERNADOR  E eu terei muito prazer em recomendá-lo à proteção de el-rei Dom Filipe III. (Sai pela direita)
 
 
CENA VI Valentim, depois Pantaleão.
 
VALENTIM Bonito! lá vou eu para Serinhaém, um lugar onde fuzilam os tenente-coronéis! Que me farão eles a mim, que sou um simples major? Que farei? Dizer que não quero? Fugir? Então pagará tudo meu irmão! Estou bem arranjado!
 
COPLAS
 
I Sou, por mal dos meus pecados  Neste mundo perpetrados, O mais bravo dos soldados  E o beijinho dos heróis!  Eu não gosto de ver fardas,  Tenho horror às espingardas!  'Stou metido em calças pardas!  'Stou metido em maus lençóis!
 
Que destino traiçoeiro!  Na batalha vai morrer O funileiro Menos guerreiro Que pode haver!
 
II Se uma bala vem perdida Que em dois homens me divida, Perco logo a bela vida, Não a perde meu irmão! Mas, se escapo (o que duvido) Sem sequer ficar ferido, Meu irmão é promovido E eu não tenho promoção! Que destino traiçoeiro, etc.
 
PANTALEÃO (entrando) Andava a dar-lhe caça, senhor!
 
VALENTIM (à parte)  Ai, ai! agora este! Era só o que me faltava!
 
PANTALEÃO Segui-o desde Jaboatão só para o provocar de novo. Agora venho com tenção diversa. Cedi às súplicas e ao pranto de minha irmã... jurei que ferrava o pano... bem vê: estou em calmaria podre... nem sequer praguejo, com um milhão de jacarés! Aqui tem as suas cartas e o seu retrato; faça o favor de restituir-me também as cartas de minha irmã.
 
VALENTIM (balbuciando)  As cartas... sim... quer as cartas, não é isso?
 
PANTALEÃO É preciso que não fique uma só em seu poder; entende?
 
VALENTIM Entendo. Mas é que eu não as tenho comigo. 
 
PANTALEÃO Com seiscentos milhões de diabos! não espero nem mais um minuto! As cartas!
 
VALENTIM Preciso ir buscá-las... e não me dão tempo para isso. Parto para Serinhaém agora mesmo... Não sabem que fuzilaram o Rodovalho? Não pude obter que transferissem a viagem... nem mesmo alegando eu negócios de família... o meu casamento...
 
PANTALEÃO O seu casamento?
 
VALENTIM (à parte)  Escapuliu-me!
 
PANTALEÃO Pois casa-se, e não é com Dona Guiomar Beltrão de Aragão?
 
VALENTIM Não há meio de conversar com este homem! E quem lhe disse que não é com Dona Guiomar Beltrão de Aragão que me caso?
 
PANTALEÃO Que ouço! Será possível?!
 
VALENTIM Já se vê que é possível.
 
PANTALEÃO Bem! vejo que é honrado... como um marinheiro! Recusou uma reparação à minha violência... e agora vem conceder-me de motu proprio! Bravo!
 
VALENTIM (à parte)  De motu proprio, ladrão!
 
PANTALEÃO Mas dizia então que lhe não foi possível obter transferência da viagem?
 
VALENTIM Debalde fiz eu que isto de ir a Serinhaém tanto podia ser hoje como amanhã; não me atenderam!
 
PANTALEÃO Pois hão de atender-me a mim!
 
VALENTIM (à parte)  Alcançará ele?
 
PANTALEÃO Tive ocasião de prestar um dia um grande serviço a Matias de Albuquerque, e ele prometeu satisfazer o primeiro pedido que eu lhe dirigisse.
 
VALENTIM Pois peça-lho, peça-lho, meu bom cunhado!
 
PANTALEÃO (tomando a mão de Valentim)  Oh! essas palavras tornam-me feliz, com mil diabos! Que alegria vai ter minha irmã, que está aqui, no palácio, à minha espera, lá embaixo! Jorge, dou-lhe a minha palavra de honra que não partirá solteiro! (Sai apressado pela direita)
 
 
CENA VII Valentim, depois Luisinha.
 
VALENTIM Uma transferência! Estou salvo!
 
LUISINHA (aparecendo com precaução)  Ainda estás vivo?
 
VALENTIM Creio que sim. O Governador não sabe de nada.
 
LUISINHA Respiro.
 
VALENTIM Mas, sabes? queriam mandar-me atacar, holandeses em Serinhaém!
 
LUISINHA Meu Deus!
 
VALENTIM Mas já não vou; fico.
 
LUISINHA Deveras?
 
VALENTIM O pior é que o Aragão Furacão voltou.
 
LUISINHA (assustada)  Voltou?!
 
VALENTIM Enviado pelo céu. Ele é que faz com que eu não vá para a guerra.
 
LUISINHA Como assim?
 
VALENTIM Porque deseja a todo o transe casar-me com a irmã, e eu...
 
LUISINHA E tu?
 
VALENTIM Prometi casar-me.
 
LUISINHA (estupefata) 
 
Prometeu casar-se! E então eu?!
 
VALENTIM Não te aflijas... o principal era ganhar tempo. Que diabo! um casamento nunca se faz assim do pé pra mão... Eu levo a remanchar, a remanchar... o Jorge volta, toma o seu lugar, nós regressamos às nossas canecas e aos nossos funis, casamo-nos e...
 
LUISINHA Já lhe perdi as esperanças! Valentim; serás obrigado a casar com essa mulher! (Chora)
 
VALENTIM Oh! não chores!
 
DUETO
 
VALENTIM Não te aflijas, que ainda espero Nos ver felizes!  Nos teus olhos ver não quero Dois chafarizes!  Um casório não é cousa Que assim se faça!
 
LUISINHA
 
Não mais serei tua esposa! Oh! que desgraça. (Chora)
 
VALENTIM  Não chores, meu amor!
 
LUISINHA  Eu choro, sim, senhor! Por que não descobre tudo? Por que assim me sacrifica?
 
VALENTIM  Pois não sabes, minha rica, Que...
 
LUISINHA  Que o quê, seu cabeçudo? Que...
 
VALENTIM  Pum! pum! pum! Podem mandar-me fuzilar?!
 
LUISINHA  Pum! Pum! pum! Pois deixá-lo estar! (Chora)
 
VALENTIM  Não chores!
 
LUISINHA Eu choro 'Té mais não poder!  Perdi meu tesouro! Não me posso conter! Ai! ai! ai!  Meu Valentim casar-se vai!
 
JUNTOS
 
LUISINHA Eu choro, sim, choro,  'Té mais não poder  Perdi meu tesouro!  Não me posso conter! Ai! ai! ai!  Meu Valentim casar-se vai!
VALENTIM Suspende esse choro! Reviva o prazer! 'Stá aqui teu tesouro! Não te podes conter! Ai! ai! ai! Teu Valentim casar não vai!
 
CENA VIII Os mesmos, o Governador, acompanhado por dois oficiais, a quem dá ordens em voz baixa.
 
GOVERNADOR  Major, o seu desejo vai ser satisfeito. Aprovo o seu casamento com Dona Guiomar de Aragão.
 
VALENTIM (baixo a Luisinha, com alegria)  Vês? Não vou a Serinhaém!
 
GOVERNADOR  Mas, como não desejo que este casamento retarde a expedição de que há pouco falamos, receberão a bênção nupcial agora mesmo, ali, na capela do palácio. Já mandei prevenir a noiva e o meu capelão.
 
VALENTIM Agora mesmo!
 
GOVERNADOR  Assistirei à cerimônia. Só amanhã partirá para Serinhaém.
 
VALENTIM Amanhã...
 
GOVERNADOR (dando um rolo de papel a Valentim)  E aqui tem o meu presente de noivado. A sua promoção a tenentecoronel; faltava-lhe esse posto para substituir o infeliz Rodovalho.
 
VALENTIM (à parte)  E morrer fuzilado!
 
GOVERNADOR (aos oficiais)  Acompanhem-me, senhores. (Sai pela direita, acompanhado pelos oficiais)
 
 
CENA IX Valentim, Luisinha, depois Gregório.
 
VALENTIM Casado!
 
LUISINHA Casado! Ah! (Cai desmaiada numa cadeira)
 
VALENTIM Luisinha! Luisinha! Perdeu os sentidos! Volta a ti... Olha, vou descobrir tudo! Ora adeus! sim, vou descobrir tudo, aconteça O que acontecer!
 
GREGÓRIO (entrando agitado pela portinha da esquerda a Valentim)  Vamos! Depressa! Entrem! Trago uma grande notícia!
 
VALENTIM (a ver se Luisinha volta a si)  Sargento, estamos perdidos!
 
GREGÓRIO Estamos salvos!
 
VALENTIM Hein?
 
GREGÓRIO É preciso que o não vejam aqui. Entre, com mil raios!
 
VALENTIM E Luisinha?
 
GREGÓRIO Eu cuidarei dela. Mas entre! (Empurra-o para dentro e volta a Luisinha) Pobre pequena! que alegria há de ter quando souber!
 
CENA X Luisinha, desmaiada, Gregório, Pantaleão, depois Jorge, depois o Governador, a noiva, o capelão, oficiais, convidados.
 
PANTALEÃO (entrando encolerizado)  Isto é demais! isto é demais! Vem ou não vem este maldito Major Braga?
 
JORGE (aparecendo pela portinha da esquerda com dignidade)  Aqui estou, meu querido cunhado, e pronto a acompanhá-lo.
 
PANTALEÃO Venha depressa. O Governador espera-nos. 
 
(Correm os reposteiros do fundo e vê-se a capela, brilhantemente iluminada. O Governador, os oficiais, os soldados e as damas formam grupos; Jorge cumprimenta o governador, e vai buscar pela mão a irmã de Pantaleão, que está vestida de noiva. Durante o coro, o capelão celebra o casamento no altar, ao fundo. Luisinha volta a si aos poucos, ajudada por Gregório. Olha em roda de si estupefata; depois vê Jorge e tudo quanto se passa ao fundo)
 
CORO Sejam virtuosos Estes dois esposos; Gozos e mais gozos Lhes depare amor! No seu lar contente Vingue eternamente Vivida e virente Da alegria a flor!
 
LUISINHA (desesperada enquanto continua a cerimônia)  Meu Deus! que vejo! Valentim! (Quer precipitar-se para o fundo; Gregório impede-a)
 
VALENTIM (aparecendo pela portinha da esquerda, vestido como no primeiro ato)  Enfim!
 
LUISINHA Ah! (Lança-se nos braços dele)
 
VALENTIM (olhando para o fundo, onde se vê Jorge, de costas, a casar-se)  O meu querido irmão lá está!
 
LUISINHA Onde ele estava? Digam lá!
 
GREGÓRIO  É longa história, que depois Hão de saber os dois!
 
OS TRÊS  Oh! que ventura! Até pela manhã Desejara cantar o rataplã...  Rataplã! Rataplã!
 
CORO (a meia voz, na capela) Sejam venturosos, etc.
 
(Jorge, a noiva, o capelão, o Governador e Pantaleão retiram-se pelo fundo. Os demais personagens descem ao proscênio, entoando o rataplã)

 

 

                                                                  Artur Azevedo

 

 

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