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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


Mais uma noite / Robyn Donald
Mais uma noite / Robyn Donald

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

Mais uma noite

 

Então, tudo se consumiu em uma necessidade quase agonizada. Antes que a jovem pudesse demonstrar rejeição, Hawke a beijou novamente. O beijo era tão intenso que a moça mergulhou em um mundo que nunca experimentara — um lugar de paixão violenta que paralisava tudo, exceto o desejo de perder-se naquele sentimento. Pela primeira vez, Melissa compreendeu o que era o desejo.

Tudo diminuía, focando apenas naquele homem e nas sensações quentes e perigosas que os beijos dele provocaram no ansioso corpo feminino dela. Não poderia ter resistido, mesmo que quisesse. E a única coisa que queria era ficar presa nos braços de Hawke.

Mas o empresário ergueu a cabeça. O som da respiração forte de Hawke se misturava ao dela, como se ambos tivessem participado de uma maratona. Determinado, Hawke disse:

— Se não pararmos com isso agora, vou cometer um grande erro...

 

CAPITULO UM

A louça no carrinho balançou um pouco quando Melissa Considine o empurrou pelo largo corredor que dava acesso à suíte presidencial. Mordendo os lábios, a moça diminuiu o ritmo, esperando que o hóspede, não fosse aficcionado por pontualidade.

A maioria dos hóspedes que a jovem conhecera, desde que começara o estágio no hotel, localizado nos Alpes do Sul da Nova Zelândia, havia sido muito agradável. Mas a moça descobriu também que as pes­soas podiam ser esnobes e mal-educadas. E que os funcionários que os serviam tinham que aceitar tudo.

— Embora haja uma sutil diferença entre descor­tesia e insulto, neozelandeses têm bom senso com re­lação à própria dignidade. Não aceitem insultos de ninguém mesmo o de um hóspede importante! — ex­plicou o gerente durante o treinamento.

Melissa esboçou um sorriso. A mãe dela sempre incentivou os filhos a se orgulharem do prestígio que vinha com o famoso nome de Considine, ligado ao governo da Ilíria por mais ou menos mil anos, mas também ensinara a eles boas maneiras. Teria ficado chocada com algumas das histórias que a filha ouvira na sala dos funcionários do hotel.

No entanto, a moça estava cinco minutos atrasada. Então, se o hóspede da suíte presidencial reclamasse, a jovem pediria desculpas com educação, mesmo que tivesse que morder a língua. A moça parou e bateu à porta.

— Entre — disse uma voz masculina, do outro lado.

De repente, Melissa gelou. A jovem conhecia aquela voz. A ordem foi repetida. Dessa vez, com um tom de impaciência.

— Entre!

Melissa pegou a chave e, finalmente, abriu a porta. Empurrou o carrinho para dentro do quarto e parou, o coração saltitando de nervoso. Nada aconteceu. Após alguns minutos de desconforto, a moça ergueu o olhar.

Imponente, a silhueta do homem contra as janelas não se mexeu. A penumbra da noite tingira o lago e as montanhas de sombras sutis de azul e cinza, mas o hóspede se concentrava nos papéis que estavam nas mãos dele.

Era Hawke Kennedy — a moça o reconheceria em qualquer lugar! Melissa procurou conter a ansiedade. O homem colocou os papéis dentro de uma pasta na mesa ao lado. Depois, levantou os olhos também.

O rosto firme, com ar de arrogância, não se alte­rou. Mas a jovem registrou a surpresa dele no momento em que Kennedy a reconheceu. Era uma estupidez, mas a moça ficou satisfeita. Provavelmente, Hawke não encontrara muitas mulheres tão altas quanto ele para fitá-lo nos olhos — exceto uma be­líssima modelo com a qual tinha sido visto recente­mente.

Sabendo estar longe de ser fascinante, Melissa en­direitou os ombros e disse:

— Jantar, senhor.

— Melissa Considine! Não, princesa Melissa Considine da Ilíria, a única irmã do grã-duque da Ilíria! O que está fazendo aqui, empurrando um carri­nho, nesse fim de mundo?

— Sou estagiária aqui — respondeu, um pouco en­vergonhada.

Como Kennedy sabia que Gabe, o irmão mais ve­lho, tivera o direito ao título dos ancestrais confirma­do pelo primo, o príncipe regente? Ilíria era um pe­queno reino na costa do Mediterrâneo e a cerimônia fora particular.

— Está fazendo estágio para servir hóspedes de um hotel? O que os seus irmãos pensam disso? — perguntou Hawke, em tom zombeteiro.

— Estou fazendo faculdade de administração. E isso faz parte do curso.

Não era da conta de Kennedy o que ela fazia ali, droga!

— Servir hóspedes?

— É bom saber como as coisas funcionam do ou­tro lado... — disse a moça sorrindo, irônica.

Claro que Kennedy compreendeu a crítica. O sem­blante do homem tornou-se sério e ameaçador. A rea­ção de Melissa foi ficar vermelha. Mas logo ela lem­brou que Hawke era um hóspede, acrescentou:

— Isso não faz parte do meu trabalho. Estou subs­tituindo uma pessoa que está doente.

— Entendo.

Kennedy colocou uma das mãos no bolso e tirou de lá alguns trocados.

— Obrigado.

— Não é preciso dar gorjeta na Nova Zelândia, se­nhor, a menos que o garçom tenha feito algo extraor­dinário — disse Melissa, com prazer.

Percebeu, tarde demais, que Hawke era neozelan­dês. A gorjeta deve ter sido uma tentativa de humi­lhação. Não, estava sendo paranóica. Por que Kenne­dy faria isso? Mal a conhecia. Provavelmente, estava procurando o lenço dele!

— Bem... obrigado, Melissa — ou devo chamá-la de Sua Alteza?

— Não. O título é de Gabe, não meu.

— Mas, oficialmente, você é princesa da Ilíria.

— É somente um título de cortesia porque sou irmã de Gabe. A verdadeira princesa da Ilíria é Ianthe, porque é nossa prima, e esposa de Alex. Hum... Você se importaria em não dizer nada sobre isso a ninguém daqui?

— Se não quer que saibam, não vou dizer nada a ninguém. Mas os neozelandeses são tranqüilos quan­to à realeza estrangeira.

— Não faço parte da realeza. Hawke ignorou o comentário.

— Me diga: o que uma princesa da Ilíria — mesmo uma se graduando em administração — está fazendo trabalhando no Shipwreck Bay Lodge, na Nova Zelândia?

— Muitas princesas trabalham para se susten­tarem.

— Não aquela que pode se gabar por pertencer a uma linhagem européia tão antiga quanto a sua. E com dois irmãos que têm poder e dinheiro para prote­gê-la. Então, por que não está desfrutando de tudo o que a riqueza e o privilégio podem lhe oferecer?

O tom cínico na voz dele perturbou a jovem. Me­lissa conhecia a história de Hawke Kennedy. Logo que saíra da escola, trabalhou no ramo da construção por alguns anos. Então, fez fortuna construindo pré­dios, além de comprar e vender terrenos no Pacífico.

— Porque não gosto de tédio.

Se a jovem dissesse que não estava interessada em uma vida sem objetivos, fazendo tudo o que quisesse, pareceria presunçosa.

— Muito digno. Mas administrar um hotel? Pensei que você escolheria uma carreira que tivesse mais a ver com a sua posição social, e que lhe desse mais tempo livre para festas e viagens.

— Até o mês passado, eu não tinha posição na so­ciedade. Meu avô foi o grã-duque da Ilíria, mas tanto ele quanto o príncipe regente foram mortos lutando contra o usurpador. A primeira coisa que o ditador fez assim que assumiu o poder foi abolir os títulos e retirar a cidadania dos que tentassem escapar. Os Es­tados Unidos deram ao meu pai a condição de refu­giado. Então, ele viveu e morreu como o Senhor Considine. Nasci Melissa Considine e é quem ainda sou.

— Entretanto, agora, seus irmãos são cidadãos da Ilíria e Gabe é o grã-duque — o terceiro em impor­tância para o príncipe Alex depois do filho pequeno.

— Assim que Alex foi coroado, persuadiu todos nós para renovarmos nossas cidadanias. Então, con­venceu Gabe a aceitar o título de grã-duque, o que fez de Marco um príncipe e de mim uma princesa. Isso não significa nada para ninguém, exceto para o povo da Ilíria.

— Não duvido que se sairá muito bem.

— Isso não muda quem eu sou ou o que sou.

— Então, me conte o motivo da irmã dos dois mais respeitados homens do mundo dos negócios almejar uma carreira no ramo hoteleiro.

Embora a prudência a avisasse para ser discreta, a jovem optou pela verdade. Principalmente, porque queria que Hawke a compreendesse logo.

— Assim como Alex e meus irmãos, pretendo aju­dar a Ilíria a recuperar a prosperidade e a paz. Podemos ter aceitação no estrangeiro através do turismo, mas essa indústria terá que ser dirigida com muito cuidado de forma a que a Ilíria não perca o seu encanto.

— Hotéis nas montanhas?

— Sim.

— Isso faz sentido. E, claro, com os seus irmãos para lhe dar suporte, o sucesso é garantido.

Ao longo dos anos, Melissa aprendeu a esconder a timidez. Mas, por alguma razão, bastava Hawke olhá-la para tirar-lhe a compostura. No entanto, a princesa não deixaria que Kennedy insinuasse que a jovem não era capaz de levar adiante os próprios planos.

— Com trabalho árduo e um pouco de sorte, assim espero. Há mais alguma coisa de que precise?

— Não, por enquanto, não.

— Espero que goste do jantar — disse Melissa, an­tes de escapar para o corredor.

Na metade do caminho para a cozinha, a moça de­sacelerou o passo. Em frente a uma das grandes jane­las com vista para o lago, a princesa parou para acal­mar-se. Suspirou. De todas as coincidências no mun­do, essa tinha que ser a mais incrível! Não soubera nada de Hawke por anos. Era um amigo do irmão mais velho, Gabe —, embora não achasse que os dois se vissem muito ultimamente. A beleza e a presença de Kennedy sempre a impressionaram muito, mas seu sexto sentido lhe dizia para manter distância. Na primeira vez em que vira aqueles olhos verdes enig­máticos, a jovem soubera que não seria páreo para Kennedy.

E Hawke a tratara com um tipo de amizade que a fizera sentir-se muito jovem e incapaz de atrair al­gum homem. O que a moça era, se comparada à mo­delo com a qual Kennedy andava? E a encantadora Danielle Sinclair parecia não se importar com as rápidas aventuras amorosas do empresário com outras mulheres. A princesa não tinha ilusões com relação à própria aparência.

Um ano atrás, Melissa dançara com Hawke no ca­samento de um dos primos franceses. Aceitara o con­vite apenas porque a recusa seria uma grosseria. Al­guns meses antes, Kennedy arrasara com o coração de uma jovem atriz, descartando-a depois, para reatar com uma ex-amante. A pobre mulher tentara o suicí­dio. E, por algumas semanas, o belo e trágico rosto estivera estampado em todos os jornais. Hawke per­manecera em silêncio sobre o caso. O estardalhaço cessou, mas deixou um gosto amargo na boca de Me­lissa. A princesa detestava homens mulherengos.

A moça ficara surpresa ao sentir uma atração es­tranha por Hawke quando ele a conduziu à pista de dança. Melissa se esquivara das irônicas observações do empresário e mantivera o olhar desviado daquele homem. Claro que a dança parecera um sonho. Kennedy a abraçava de modo que a jovem roçasse contra o seu corpo esguio e forte.

Na suíte presidencial, a mesma coisa acontecera. A moça percebera que a sensual música que dança­ram naquela noite romântica voltara a tocar na mente dela. Melissa piscou, forçando-se a tirar do pensa­mento as lembranças do salão de baile do castelo. Fe­chou os olhos. Depois, voltou a abri-los.

— Tudo bem, Hawke é magnífico — a moça mur­murou. Depois, respirou fundo. — E é mais alto que você, o que é um bônus.

Não muitos homens eram. E magnífico não era a palavra certa para descrevê-lo. Kennedy era agradá­vel ao olhar, mas as feições na verdade eram mais intimidadoras do que belas.

O forte impacto de Kennedy tinha a ver com a sua altura e a sua presença poderosa e atlética, porém era mais do que isso. A princesa conhecera outros ho­mens tão altos quanto. Melissa estremeceu, relem­brando a romântica valsa que compartilharam.

Pela primeira vez, sentira-se sexy e bonita — cer­tamente por causa da champanhe. E quando fitara o rosto inflexível, percebera que os olhos dele eram de um verde-escuro perturbador.

Isso tinha sido há um ano. Ainda assim, a princesa se lembrava de tudo. O que era terrível porque, quan­do a dança acabou, Hawke sorrira devolvendo-a ao grupo e conversando por alguns instantes.

A próxima dança foi anunciada e Kennedy os dei­xou. Cinco minutos mais tarde, a moça o vira com uma exuberante americana divorciada. O empresário sorria de novo, mas era um sorriso bem diferente...

A inveja a consumiu e a moça desviou o olhar. Claro que tentou esquecê-lo. Entretanto, o efeito que Kennedy lhe causara não desaparecera. Às ve­zes, a princesa chegava a sonhar com ele. Quanta es­tupidez!

Sobressaltada, Melissa percebeu que ainda estava em pé em frente à janela. Embora a escuridão tivesse envolvido as montanhas, a luz das estrelas resplande­cia nas águas do lago. E, detrás dos picos, um brilho suave anunciava a lua iminente. Uma noite perfeita para os que se amavam, pensou desolada.

Hawke estava fora do alcance dela. Era uma moça inexperiente! Se a beijasse, desmaiaria. O tipo que o atraía não era de mulheres inocentes. E, sim, Danielle Sinclair, uma ruiva maravilhosa, sensual, confiante, assim como as outras mulheres às quais se ligara, in­cluindo a atriz — agora, uma estrela menor — Lucy St. James.

A jovem deveria voltar ao trabalho! Sentindo-se culpada, Melissa saiu apressada em direção à cozinha barulhenta, deixando que os cheiros e os sons e a intensa atividade tomassem conta de sua cabeça.

Ao deitar-se, acendeu a luz para ler. Mas as pala­vras no livro dançavam aos olhos dela, recusando-se a fazer sentido. Então, apagou a luz e permaneceu ali até adormecer horas mais tarde.

E acordou com alguém à porta.

— Ei, Mel, quer café da manhã?

— Estarei lá em dez minutos — disse depois de olhar, horrorizada, o despertador.

Ainda tentava recuperar o tempo perdido quando o gerente entrou no salão de café e pediu que fosse ao escritório dele. Melissa terminou logo a refeição e procurou parecer serena ao se apresentar para o chefe.

— Sente-se. Acredito que conheça Hawke Kennedy.

— Já o encontrei antes. Não diria que o conheço. .Isso tem importância?

— Se não tem importância para você, então, está para mim. E, certamente, você pode jantar com o sr. Kennedy. Lynne já se recuperou do resfriado. Não vai precisar substituí-la novamente.

Melissa estranhou. Jantar com Hawke Kennedy?

— Oh, certo. Vou retornar ao trabalho, então — a resposta contida foi o melhor a fazer.

— A propósito, acabei de ler seu parecer sobre a gruta dos vaga-lumes. Você está certa. É algo de va­lioso que ignoramos. Ainda não sei qual a graça de andar debaixo da terra, em uma caverna escura e úmi­das, mas...

— Há uma sensação de aventura — a jovem inter­rompeu. — E se você organizasse uma expedição le­vando os hóspedes ao lago e servindo-lhes coque­téis? Depois, poderia lhes mostrar a gruta e servir um jantar no barco. Isso seria maravilhoso. Principal­mente, se houvesse lua.

O gerente riu.

— Tudo bem, faça um projeto. Mantenha o custo o mais baixo possível. Queremos que os hóspedes sin­tam que nenhuma despesa é poupada, mas os conta­dores do Escritório Central vão passar o pente fino em tudo.

O telefone de Melissa tocou quando a princesa abriu a porta da saleta que lhe deram como escritório.

— Melissa falando.

— Aqui é Hawke.

— Olá...

— Jante comigo esta noite.

Por quê? Delicadeza da parte dele? Não queria cortesia, só fogo! Teve que conter o instinto de recu­sar. Afinal, Kennedy era um hóspede. Mantendo a voz firme, a moça retrucou:

— Já fui avisada que vou jantar com você.

Depois, ficou vermelha porque parecera petulante como se quisesse que isso fosse um encontro real! Claro que não era. Hawke estava apenas sendo edu­cado com a irmã de um de seus amigos. E a moça ti­nha que aceitar o pedido pela mesma razão.

— Me desculpe se o convite a ofendeu. Falei com o gerente primeiro para me certificar de que isso não causaria problemas.

— Seria ótimo, obrigada.

— Vejo você às oito.

— Tudo bem.

— Não vou tomar muito do seu tempo livre. — E desligou o telefone.

A jovem recolocou o fone no gancho. Gostava de estar ali, em Shipwreck Bay. Ninguém esperara que a moça fosse outra coisa a não ser o que era — simples­mente Melissa Considine.

Embora os amasse, às vezes, ter dois belos irmãos era uma cruz para a moça carregar. As pessoas espe­ravam outra Considine fantástica, e se surpreendiam quando viam uma mulher magricela, de feições for­tes e cabelo castanho. Tirando a altura da jovem, não havia nada de interessante com relação a Melissa. Nem herdara os famosos olhos azuis dos Considines, os dela eram castanhos, nem a aparência dos irmãos.

Hawke também tinha isso — aquele pulso de auto­ridade e confiança, como se não houvesse nada no mundo com que não pudesse lidar.

O que a moça vestiria para o jantar? Há um ano, te­ria pedido um conselho à noiva de Gabe. A cunhada tinha muito gosto. No entanto, o noivado se rompera. E a jovem não vira mais Sara.

É apenas uma obrigação, Melissa advertia a si mesma. Use o vestido preto curto que comprou em Paris. Foi difícil manter a cabeça fria durante aquele dia interminável.

Finalmente, estava pronta. O vestido preto podia ser sofisticado, mas consumia-lhe a cor da pele de forma que o blush que colocara parecia duas listras de tinta nas maçãs do rosto.

Por que nunca notara antes? Porque isso nunca ti­vera importância. Sob a tutela de uma mãe refinada, uma francesa de aparência e roupas esplêndidas, a jo­vem aprendera a minimizar a própria altura e a ficar em segundo plano. Até hoje à noite, não quisera im­pressionar nenhum homem o suficiente para se preo­cupar se uma cor lhe caía bem ou não. Ou se parecia sexy.

Irritada consigo mesma por preocupar-se tanto com a opinião de Hawke — um homem que nunca lhe dera motivo para essa estúpida reação adolescen­te — a moça despiu o vestido e retirou o blush. Exa­minou o armário antes de escolher uma blusa marrom de seda e umas bijuterias douradas. Sara lhe dera aquela blusa junto com uma calça jeans da mesma cor. Melissa nunca as usara. Somente colocara a roupa na mala porque lhe disseram que os neozelandeses eram conhecidos pela informalidade. Então, tinha que ser informal com Kennedy.

Melissa pôs a roupa e olhou para os pés. Nenhum dos pares de sapatos que tinha combinava com os jeans. Finalmente, calçou um par de botas pretas de salto alto.

A mãe teria dito que o traje era vulgar. Bem, não se importava. Ao menos, parecia um pouco mais viva com aquela roupa.

Franzindo as sobrancelhas, a moça se mirava no espelho. Nada de base, pensou. A pele estava muito boa. Que batom? O favorito, o de pêssego, não com­binava com o tom bronze das roupas. Deu uma olha­da no gloss rosa acobreado. Se usasse aquilo talvez ficasse bem. E ficou.

Olhos? Deu uma pesquisada na palheta de som­bras. Geralmente, usava tons de verde. Mas, hoje à noite, o melhor era usar um marrom dourado.

— Nada mal — disse, após dar "uma geral" em si mesma.

A cor acentuou-lhe o formato amendoado dos olhos e lhes deu um ar sensual que a deixou espanta­da. E o brilho suave dos lábios parecia... bem, um pouco, provocante.

Ou será que se transformara em uma palhaça? Será que Hawke a olharia com cinismo e perceberia que a jovem tivera muito trabalho para lhe passar uma boa impressão?

A voz da mãe ecoou nos ouvidos da moça. Essa cor é muito escandalosa para você, Melissa. Isso faz com que pareça uma qualquer. Prefira sempre as co­res clássicas. Com a sua altura, precisa ser sutil, não espalhafatosa. Melissa respirou fundo. Embora a mãe raramente comentasse sobre a falta de beleza da filha, a moça sabia que sempre fora um desgosto.

A jovem arrumou o cabelo, puxando-o para trás e o prendeu. Isso mostraria a Hawke que não tentara ser sedutora.

Porém, à porta, virou-se. Não podia sair vestida daquela forma. Só levaria dez minutos para trocar-se e voltar ao vestido preto... Uma olhadela no relógio lhe disse que estava atrasada. Por um segundo, hesi­tou. Mas, depois, ergueu o queixo.

Não conseguiria atravessar o hotel e o longo corre­dor que conduzia à suíte. Em vez disso, a moça to­mou o caminho à beira do lago, esperando que a sere­nidade da água e das montanhas a acalmasse.

 

CAPÍTULO DOIS

Da janela Hawke viu Melissa caminhar, ágil e con­fiante, feito uma jovem deusa; os ombros largos emoldurando as graciosas curvas dos seios e dos qua­dris. A luz do sol, que se punha, brilhava pelo cabelo da jovem, cor de mel escuro, e revelara os contornos exóticos do rosto.

Uma deusa austera, mais Minerva do que Vênus. Mas o empresário sempre preferira o desafio da inte­ligência à sexualidade impaciente. Kennedy ignorou o instinto de predador que o pegara de surpresa. O de­sejo podia ser inconveniente mas, ao longo dos anos, aprendera a controlá-lo.

Soubera desde o primeiro encontro dos dois, há quatro anos, que Melissa não era boa candidata a um caso rápido. Tirando o fato de Gabe ser um bom ami­go, a moça não era o tipo dele. A jovem exalava uma inocência simples que sugeria uma encantadora falta de experiência.

Porém, como Hawke nunca levava ninguém a sé­rio, a investigou durante o dia. E a pesquisa se mos­trara intensamente. Talvez aquela inocência fosse real. Ou talvez não, notando o sutil e sexy vaivém dos quadris da moça ao virar-se para olhar as montanhas.

Kennedy poderia ter entrado em contato com o chefe da Segurança que, provavelmente, teria apura­do mais coisas. Mas ele não quis. Ainda assim, des­cobrira algo.

O empresário marcava os itens da lista enquanto observava Melissa vindo na direção dele. O pai mor­rera quando a moça tinha nove anos. A aristocrática mãe francesa falecera cinco anos depois. A garota fora estudar em um dos melhores internatos da Ingla­terra. Depois, em uma escola de preparo para a vida social, na Suíça. Com excelentes notas em marke­ting, a jovem agora estudava em uma universidade americana de grande prestígio. Era inteligente.

A jovem abaixou-se para pegar algo. O desejo to­mou conta de Hawke quando Melissa endireitou-se e uma leve brisa moldou-lhe o tecido fino da roupa, contornando os belos seios da moça. Droga! Ele esta­va se envolvendo!

Isso era difícil. A jovem tinha apenas 23 anos, dez a menos do que Hawke. Não deveria tê-la convidado para jantar. A única experiência com uma mulher in­gênua o ensinara a não acreditar em ninguém à pri­meira vista. Isso acontecera com uma atriz novata que se enrabichara pelo empresário, sem nenhum tipo de encorajamento da parte dele. E o aborrecera ao romper com ela da forma mais gentil que podia.

Lucy St James não pensava em nada a não ser cho­rar em todos os jornais sobre um romance que nunca acontecera. Hawke gostava de amantes experientes e sofisticadas, que não exigissem nada além de uma aventura. Assim, quando se separavam, ninguém se machucava.

Somente há pouco tempo pensara que era hora de se casar. Mas não com alguém a quem convidara para jantar apenas por cortesia.

Mentira. O convite resultará da dança que compar­tilharam há um ano. Até então, a moça era a irmã mais nova de Gabe, notável apenas pela altura e o jei­to reservado.

Mas não se esqueceu dos olhos dela, dos cílios longos... E da boca que fez com que Kennedy quises­se saber se a moça já deixara os lábios caírem em sen­sualidade... A pele era como pétalas de rosa...

Por alguma razão, a imagem da moça ficara plan­tada na memória de Hawke. Aquela dança em Provence ainda estava tão viva que parecia ter aconteci­do ontem. Provavelmente, porque nunca dançara com alguém que ficasse em silêncio, que não fizesse truques. Alguém que apenas o seguisse, enquanto era conduzida, como se estivesse enfeitiçada!

Também não quis falar, para as palavras não aca­barem com o encantamento que os rodeava aquela noite. Satisfeito por dançar a valsa com Melissa, o empresário viu o rosto grave e compenetrado da jo­vem, a boca suave como um sonho.

Foi uma experiência tão comovente que Kennedy não voltou a se aproximar dela o resto da noite. Mes­mo assim, o empresário percebeu quando a moça e os irmãos deixaram o salão de baile.

Hawke caminhou até o terraço de pedra, intrigado pelo prazer que a imagem da jovem lhe causava. De repente, Melissa apareceu na sua frente.

Kennedy respirou fundo. O pensamento anterior de que a moça parecia uma deusa do passado voltou. A mulher era só brilho.

— Boa noite. Estou feliz que tenha vindo — disse ele.

— Obrigada.

Já dentro do hotel, o empresário indagou:

— Posso tirar sua jaqueta?

— Sim, obrigada.

Lá fora, o ar era frio. Mas a sala estava quente. En­tretanto, a moça relutara em retirar a jaqueta. A blusa de seda era fina e transparente demais, as jóias falsas e baratas.

Apesar disso, pareceria uma total idiota se usasse a jaqueta a noite inteira. E Hawke parecia não estar nem um pouco interessado no que havia ali debaixo.

O toque suave das mãos de Kennedy nos ombros da jovem ao lhe tirar a peça de roupa fez com Melissa se arrepiasse. Um cheiro masculino perturbador au­mentou a pulsação da moça.

Calma! Calma! Ele estava apenas sendo gentil. E a moça estava se comportando feito uma idiota de 15 anos!

Kennedy pendurou a jaqueta de Melissa em uma cadeira. A jovem se afastou e tentou recuperar o fôle­go, conferindo a mesa. Toalha bege com flores da Ilha do Norte — rosas-chá e brancas, com um perfu­me suave. Taças de vinho cintilavam à luz de velas, a prataria brilhava.

— Espero que esteja gostando daqui — disse a moça.

— Muito — respondeu o empresário.

— Acredito que tenha ido esquiar hoje.

— Sim. E adorei.

O guia que acompanhara Kennedy contara à prin­cesa que não havia nada a ensinar ao empresário so­bre esquiar.

— Parece um profissional. — comentara Bart, ad­mirado. Melissa não se surpreendera. Hawke exalava competência em tudo.

— Cara legal, também — Bart continuou. — Boa companhia, embora não tenha muita paciência. De­veria tê-lo escutado repreendendo um garoto que an­dava de snowboard, pensando que podia passar a frente de todo mundo. Kennedy não ergueu o tom de voz. Mas, de agora em diante, a criança vai lembrar-se de ter modos.

Melissa observou Hawke ir em direção a uma ban­deja em cima da mesa. O empresário se movimentava com a graciosidade de um atleta, o corpo forte e sexy.

A jovem sentiu algo selvagem se contorcendo dentro dela. Afastou o olhar e começou a falar de for­ma que soasse bem claro. Para surpresa da moça, cada palavra saía em um tom rouco.

— Teve sorte com a neve. A primavera já chegou. Os meteorologistas estão dizendo que essa vai ser a última neve da estação.

— É quase certo que sim. Pedi champanhe, mas você gostaria de beber outra coisa?

— Não, obrigada.

Já tonta somente por estar ali, a moça viu o homem abrir a garrafa e servir a bebida em duas taças de cris­tal. Dando-lhe uma delas, o empresário disse sor­rindo:

— Aos encontros!

Pare de fantasiar, ordenou Melissa a si mesma. Hawke não está paquerando você. Se estiver, prova­velmente, faz isso com todas, inclusive velhinhas.

A moça ergueu a taça.

— Aos encontros...

— Sente-se e me conte como está se saindo aqui. As chamas crepitavam na enorme lareira de pedra enquanto a jovem se acomodava em uma cadeira e Hawke em outra no lado oposto. Encostou-se feito um rei no trono, olhando-a, sério. Melissa sentia o corpo queimar.

— Bem, obrigada — respondeu a moça.

Mas logo a jovem já estava lhe contando sobre a experiência dela no hotel, fazendo-o rir. Na meia hora seguinte, ela ficou mais tranqüila, estimulada pelo pensamento vivo e a vasta sabedoria do empre­sário. Surpreendeu-se ao ver-se rindo. Descobriu que ambos compartilhavam de um senso de humor si­milar.

O toque da campainha interrompeu a conversa.

— O jantar... — deduziu Hawke, levantando-se.

Espantada, a jovem percebeu que bebera quase toda a taça de champanhe. Não que atribuísse à bebi­da a responsabilidade pelos sentidos exaltados. Po­rém quando ouviu a voz de Hawke, enquanto o em­presário falava com quem lhe entregara o jantar, a moça sentiu um aperto no peito. Além, é claro, do fogo que ardia cada vez com mais intensidade.

Essa atração incontrolável baseava-se apenas na aparência do empresário. A jovem não tinha a menor idéia do real caráter dele. Pelo que lera nos jornais, parecia ser um homem de negócios brilhante, cabeça-dura, que gostava de mulheres bonitas e que despeda­çava diversos corações.

Hawke era mais do que um homem bonito. A moça tentou clarear a mente, livrando-se da névoa que pairava sobre a sua cabeça. O som da porta se fe­chando redirecionou o foco dos pensamentos da prin­cesa. Melissa percebeu que, enquanto conversavam, a noite caíra lá fora.

— Vou puxar as cortinas — Hawke disse. Melissa respirou fundo e levantou-se.

— Não precisa puxá-las. Veja, há um botão perto da porta. Basta pressioná-lo e as cortinas vão se fe­char automaticamente.

O empresário encontrou o botão e as cortinas se fecharam, enchendo a sala com um calor e uma inti­midade que, de repente, pareciam intensos demais. Melissa sentiu-se viva como se a última meia hora a modificasse de alguma forma. Que bobabem! É uma paixonite feito a que teve por aquele astro francês.

Como presente de aniversário, o irmão Marco ar­ranjara um encontro da princesa com o tal cantor. O rapaz era cerca de 15 centímetros mais baixo e se res­sentia daquela diferença. A moça, encantada com o ídolo, mal foi capaz de articular algumas palavras, mas o olhar zombeteiro dele a atormentara. O cantor só foi educado porque Marco tinha muitas ações na gravadora que detinha o contrato do artista.

Depois, xingou uma fã que se aproximara com um caderninho de autógrafos. E, mais tarde, Melissa o escutou descrevendo-a para um amigo.

— Uma girafa desengonçada. Mas alguém tem que ser educado com os homens ricos — e com suas irmãs esquisitonas!

Agora, conseguia rir. Mas, na hora, ficou muito magoada. Talvez devesse ter esperado isso; só perce­bia as coisas depois dos outros. A maioria das amigas já saíra dos primeiros romances e embarcara em ou­tros melhores, enquanto a moça tinha sido cautelosa demais para deixar que alguém se aproximasse dela. A mãe a prevenira contra os aproveitadores que po­deriam fazer vista grossa à altura e à falta de beleza da filha, para ter acesso fácil aos irmãos Considine.

A princesa tinha auto-estima suficiente para certi­ficar-se de que isso não aconteceria! O fato de nunca ter se apaixonado era porque não encontrara ninguém que chegasse aos padrões dos irmãos. Agora, deseja­va saber se tinha encontrado.

— Venha e coma — Hawke a convidou. O empre­sário serviu-lhe uma deliciosa sopa de ervilhas.

— O chef vai ficar satisfeito que tenha pedido isso — é uma das especialidades dele.

— Desculpe eu nem ter lhe consultado sobre o que gostaria de comer, mas é que eu sabia que estaria com fome depois de um dia nas montanhas. Então, quis uma refeição bem nutritiva.

Quando Melissa sorria, uma covinha surgia ao lado da boca, chamando a atenção para os lábios da moça. O empresário desafiava qualquer homem a olhar para aquela boca e não imaginar como seria senti-la no próprio corpo. Kennedy reagiu a esse pen­samento com um olhar lânguido. Era possível que a princesa tivesse notado porque a covinha desaparece­ra e a moça disse:

— O hotel tem por especialidade refeições vigoro­sas porque muitos dos hóspedes passam os dias nas montanhas ou pescando no rio. Mas como, geralmen­te, trazem as esposas, isso também supre o apetite da­queles que decidem passar o dia no spa.

A sopa estava deliciosa, mas o empresário mal a saboreara. Estava ocupado demais apreciando a jo­vem comer. Será que aquele apetite era igual em rela­ção ao sexo?

A moça parecia que nunca fora tocada. No ano an­terior, mesmo durante a Confusão, quando o rompimento do noivado de Gabe Considine ocupou as pri­meiras páginas de todos os jornais do mundo, pouco foi dito sobre a princesa. Então, será que... nada de namorados?

— Quanto tempo pretende ficar aqui? — pergun­tou Kennedy.

— Vou embora no fim da semana.

— Eu também.

O coração de Melissa deu um pulo. Provavelmen­te, era parte do charme dele, mas a princesa achou isso inebriante.

A segurança da moça aflorou com o interesse dele. A jovem bebeu muito pouco do maravilhoso Riesling que Kennedy lhe serviu para acompanhar o próximo prato, carne com especiarias orientais, mas uma certa excitação a consumia, queimando cada célula do corpo.

Sob a luz das velas, o empresário se recostava à ca­deira e a observava com um certo cinismo.

— Então, onde quer estar daqui a cinco anos? A princesa riu.

— Pretendo trabalhar em alguma cadeia hoteleira para adquirir a experiência que vou precisar para transformar em sucesso a idéia de Gabe.

— Sonha alto. Deverá estar em algum cargo exe­cutivo, ou dirigindo seu próprio empreendimento de turismo, em Ilíria. Pensei que fosse idéia sua, não dos seus irmãos.

Sem hesitar, a princesa respondeu:

— Bem, na verdade, a idéia foi minha. Acho que Gabe não acredita muito que eu vá torná-la real, mas irei.

Sim, a moça iria, o empresário pensou, notando a determinação estampada no rosto dela.

— Teria pensado em fazer carreira nessa área se não fosse por Ilíria?

Melissa deu de ombros.

— Não sei. Fomos educados para acreditarmos que era nossa obrigação ajudar o principado da forma que pudéssemos. Meu pai nunca se perdoou por estar fora de Ilíria quando o príncipe foi derrubado. Duran­te toda a vida dele, fez tudo o que podia pelo país e pelo povo.

Será que isso incluía casar-se com uma herdeira meio-francesa, meio-americana, para manter o estilo ao qual estava acostumado? Hawke se questionava. Não que fosse uma combinação perfeita. Embora nunca tenha havido qualquer rumor de divórcio, era do conhecimento de todos que a mãe da princesa ti­vera diversos amantes.

Kennedy observou Melissa beber o vinho aos golinhos. A jovem tinha sido educada em um meio no qual os pais ficaram juntos procurando a felicidade em romances discretos. Será que a srta. Considine ti­nha esse mesmo ponto de vista?

A moça levantou a cabeça e percebeu que ele a ob­servava. Ficou corada e os olhos dourados tornaram-se sombrios. Hawke surpreendeu-se ao sentir uma certa satisfação ao ver os olhos da jovem piscarem inquietos de nervoso.

Quando a fitou com aqueles olhos verdes, a mente de Melissa parou. Imitando a mãe no que dizia res­peito ao trato social, a princesa perguntou:

— Você cresceu nessa parte da Nova Zelândia?

— Não. Sou do norte de Auckland.

A moça prosseguiu perguntando sobre o norte do país. Ao final da noite, aqueles momentos tensos ti­nham desaparecido, embora Melissa soubesse que nunca os esqueceria. Hawke a fascinava. A inteligên­cia daquele homem a estimulava tanto que era quase impossível terminar aquela conversa! Porém, a prin­cesa aproveitou a primeira chance para escapar, di­zendo:

— Bem, a noite foi ótima, mas devo ir embora.

O empresário não tentou dissuadi-la e levantou-se rapidamente.

— Vou acompanhá-la até o quarto.

— Não precisa. Não é longe. Fica no alojamento dos funcionários do outro lado do prédio. É só atra­vessar o hotel para chegar lá.

— Então... — disse Kennedy, sorrindo. O desejo incendiou o corpo de Melissa. Como não confiava no próprio taco, a moça contentou-se em acenar com a cabeça, concordando.

O toque do telefone assustou os dois. Kennedy franziu as sobrancelhas.

— Com licença. Deve ser uma emergência.

— Vou esperar lá fora.

— Quem deve ser a essa hora?

A jovem dirigiu-se ao corredor e ficou observando as montanhas enquanto esperava. Hawke voltou em menos de um minuto, entregando a jaqueta à moça.

— Desculpe-me — o magnata falou com um olhar indecifrável.

— Espero que não tenha sido mesmo uma emer­gência.

— Só o tempo irá dizer — respondeu o empresá­rio, dando de ombros.

Em vez de lhe dar a jaqueta, Kennedy a ajudou a vesti-la. A princesa ficou corada e agradeceu aos céus pela fraca iluminação do ambiente. Quantas outras mulheres estremeceriam de prazer diante de uma cortesia tão íntima? Muitas, pensou.

— Está com frio? Gostaria de andar lá fora em vez de ir por dentro do hotel?

Assim não seriam vistos? Pare com isso agora mesmo, a moça ordenou a si mesma. O empresário ti­nha sido cortês a noite inteira e agora só estava agin­do assim porque é um perfeito cavalheiro.

— Não estou com o menor frio — respondeu a jo­vem.

Juntos, caminharam lá fora. Assustada ao ver Hawke inspecionando o local, Melissa protestou:

— Aqui é seguro.

— Nenhum lugar é seguro — retrucou o empresá­rio pegando em um dos braços da moça. — O mundo está cheio de predadores.

A jovem estremeceu. Em parte, porque o toque da­quele homem incendiava cada pedacinho dela. Mas também porque sabia que Kennedy estava certo. Em­bora nunca tivesse sido forçada a tolerar a presença constante de um guarda-costas, depois que Gabe e Sara cancelaram o noivado, a vida dela se tornou um inferno, repleta de repórteres e fotógrafos chatos, toda vez que saía da universidade. A princesa adora­va o anonimato naquele canto distante do mundo.

— A segurança aqui é excelente — reafirmou a moça.

— Deve ser... — Kennedy rebateu.

Caminharam em silêncio margeando o lago até ela apontar para as árvores que escondiam os alojamen­tos dos funcionários do hotel.

— Minha casa temporária. Obrigada pela ótima noite.

Uma brisa passou pelo local. Melissa estremeceu.

— Está com frio? — perguntou Hawke, soltando-a de forma que pudesse tirar o próprio casaco e jogá-lo ao redor dos ombros da princesa.

— Não. A distância é curta. Vou ficar bem.

— Não seja boba.

— Mas você vai ficar com frio. E você que é o hós­pede aqui!

— Sob esse céu, isso não importa. Para as monta­nhas, sou apenas um homem. E você é uma mulher.

Melissa congelou. Ainda incrédula, a princesa o viu abaixar a cabeça. Quando teve certeza de que Hawke ia beijá-la, fechou os olhos. A boca do empre­sário era quente e sedutora. Incapaz de pensar, a moça segurou a respiração, os lábios ficando suaves, sem vontade, sob a leve pressão dos dele.

Mais tarde, a moça pensou que nenhum dos dois se mexera durante aqueles segundos iniciais. Melissa sentiu um turbilhão de coisas — o conforto da jaque­ta do empresário nos ombros dela; o calor da boca de Kennedy; o desejo no sangue da jovem.

E, então, tudo se consumiu rapidamente. Hawke ergueu a boca, mas apenas por uma fração de segundo. Antes que a jovem pudesse demonstrar rejeição, o empresário a beijou de novo. O beijo era tão intenso que a moça mergulhou em um mundo que nunca ex­perimentara — um lugar de paixão violenta que para­lisava tudo, exceto a vontade de perder-se naquele sentimento. Pela primeira vez, Melissa compreendeu o que era desespero.

Tudo parecia rodar. À sua volta, só existiam aque­le homem e as ardentes sensações que os beijos dele provocavam naquele corpo feminino ansioso. Não poderia ter resistido mesmo que quisesse. E a única coisa que queria era ficar presa nos braços de Hawke.

Mas o empresário levantou a cabeça. O som da respiração forte de Kennedy se misturava ao dela, como se ambos tivessem participado de uma marato­na. Determinado, Hawke disse:

— Se não pararmos com isso agora, vou cometer um grande erro.

 

CAPÍTULO TRÊS

Atordoada, Melissa fitou Hawke. Sentiu medo. Pela primeira vez, compreendera o poder da própria femi­nilidade. Logo aquele medo foi trocado por uma sa­tisfação porque o deixara daquela forma.

Claro que Kennedy notou. Os olhos ficaram pe­quenos, mas o empresário já não a segurava mais com tanta força junto ao corpo excitado. Entretanto, também não a soltou por completo. Respirou fundo e confessou:

— Princesa, você tem um efeito devastador sobre mim!

Aquela voz rouca, foi a coisa mais erótica jamais dita em qualquer língua. E nos braços dele, Melissa sentia-se perigosamente segura. Nada no mundo po­deria machucá-la de novo.

Porém o orgulho fez com que a moça colocasse as idéias em ordem. Ou quase isso.

— Você também...

— É melhor entrar. Está tremendo. — Mas não era de frio! No entanto, a moça não protestou quando o empresário soltou os braços, embora sentisse como se algo precioso lhe tivesse sido arrancado.

Assustada, a moça forçou-se a afastar-se do em­presário e ir em direção à porta do alojamento. Con­centre-se apenas em chegar lá, dizia a si mesma. Agora, você precisa fechar a porta na cara dele.

Embora tenham sido os beijos mais sensuais que a moça experimentara, podia ver que não foram nada empolgantes para Hawke. Mas, apesar da inexperiên­cia, Melissa sabia que a maioria dos homens reagia fisicamente ao corpo quente de uma mulher.

Cada sentido estava aguçado ao extremo. Ouvia o barulho das águas à beira do lago. E a pele formigava diante do vento suave no rosto. Melissa ainda estava com o gosto de Hawke em seus lábios. O corpo quen­te e faminto; cada nervo latejando de ansiedade.

— Estou indo embora amanhã — informou o em­presário, no vão da porta.

A jovem entrou em pânico. Conteve-se e apenas comentou:

— Não por minha causa, espero.

— Não. O telefonema que recebi antes de sairmos. Uma desculpa, mas muito bem dada.

— Sei o que são essas emergências. Meus irmãos Gabe e Marco passam muito tempo lidando com isso.

A moça estendeu-lhe a mão e disse:

— Espero que não seja nada demais. Hawke cumprimentou-a, respondendo:

— É o que eu espero.

Assim, puxou-a para os braços dele. Por um se­gundo, fitou aquele rosto surpreso. Os olhos do empresário brilhavam. Kennedy abaixou a cabeça e a beijou novamente, sugando a boca de Melissa com uma possessividade intensa e ardente. Depois, er­gueu a cabeça e lançou-lhe um malicioso olhar.

— Isso não é uma despedida, Melissa.

A jovem o fitava e sentiu o coração repleto de ale­gria porque Hawke queria vê-la de novo.

— Tenha uma boa viagem — disse a moça.

— Vou telefonar para você em breve.

O bom senso, enfim, voltou. A moça devolveu a jaqueta dele. Sabia, lá no fundinho do coração, que essa promessa vaga não significava nada. Por mais que o empresário tivesse gostado daqueles beijos, a princesa não era o tipo de mulher de quem Hawke correria atrás.

Quando o empresário pegou o casaco, a jovem es­boçou um sorriso e se despediu. Depois, virou-se, en­trando rápido. Se ficasse, Kennedy poderia ver a tris­teza nos olhos dela.

 

Durante o resto da semana, Melissa esperou que Hawke voltasse, porém isso não aconteceu. Após dias de silêncio, a princesa convenceu-se que era me­lhor assim.

O coração não estava despedaçado — só ligeira­mente fissurado, mas ainda intacto. Entregar-se ao desespero, feito uma donzela vitoriana, era ridículo para uma mulher do século XXI. E os sonhos eróticos que a atormentavam à noite não passavam de meras fantasias. Deveria ficar contente por ter aprendido algo mais sobre a complexidade dos relacionamentos entre homens e mulheres.

Após dar uma última olhadela nas montanhas, a jovem acomodou-se na poltrona do avião. Dali a meia hora, teria deixado para trás o tempo que ficara no hotel, com as lembranças de um trabalho do qual gostara e de um homem de quem nunca se esquece­ria. Pensou que agora compreendia o que levara o ir­mão Gabe àquele romance catastrófico com Sara Milton. Tinha a ver com sexo!

O avião decolou rumo à Ilha Norte. Melissa fe­chou os olhos e tentou se esquecer dos beijos de Hawke. Isso era algo idiota. A princesa mergulharia na própria vida e não pensaria nele novamente. Mas, antes, passaria uma semana na Ilha Norte, lugar de areias brancas e escaldantes.

— Por quê? — Gabe perguntara quando a irmã lhe telefonara na noite anterior.

— Você consegue trabalhar vinte e quatro horas por dia, sete dias na semana, mas eu não. Estou me dando um tempo para analisar as anotações para a monografia que estou escrevendo sobre o estágio, en­quanto toda a experiência está fresca na minha mente.

— Poderia ir para a nossa casa em Honolulu.

— Quero conhecer um pouco mais da Nova Zelân­dia. Me disseram que o norte é tão formidável quanto a religião dos lagos do sul.

— É. Onde vai ficar? Melissa lhe deu o nome do lugar.

— É um albergue? — perguntou o irmão.

— É, mas de alto nível. Reservei um quarto só para mim.

— Se precisar de dinheiro... A princesa o interrompeu.

— Foi você quem disse que eu deveria viver da minha mesada. E estava certo. Estou bem, não se preocupe.

— Bom, a Nova Zelândia é bastante segura. Assim espero... Mas tome cuidado, hein?

— Sempre faço isso... — respondeu a princesa, sorrindo.

— Me mande um e-mail com o endereço de lá. E o número do quarto.

— Sim, senhor!

— Tudo bem, sei que é uma garota crescida agora. Divirta-se.

Às vezes, irmãos mais velhos eram bem chatos. Porém, embora a mania de proteger deles a irritasse, nem Gabe nem Marco mudariam.

A pequena cidade de Russel, na Baía das Ilhas, es­tava cheia de turistas atraídos àquela região por sua história e beleza. Construída ao longo de uma praia, as pequenas casas de madeira se espremiam pelos morros cobertos por uma densa floresta. Nem a vege­tação nem o cenário, nada a fazia lembrar-se de Hawke Kennedy.

No pequeno quarto, Melissa colocou o laptop em cima da escrivaninha e preparou-se para trabalhar. Nos dois dias seguintes, resistiu aos cruzeiros com golfinhos, visitas aos pontos turísticos da cidade e outros passeios. Todo fim de tarde, a moça caminha­va pela praia. E toda noite, ficava acordada na cama olhando a escuridão.

Em breve, superaria essa paixonite. Era apenas uma questão de tempo. A jovem estava sendo obses­siva, estúpida. Mas, pelo menos, ninguém sabia o quanto era tola.

A terceira manhã nasceu resplandescendo suavi­dade e frescor, num sol de céu azul. Porém ao se mo­lhar um pouco no mar, convenceu-se de que estava frio demais para nadar. Então, a princesa comemorou o tempo bom com um café da manhã em uma lancho­nete na estrada e concentrou-se em suas anotações. Por volta de meio-dia, a moça deixou o trabalho de lado e levantou-se para se esticar.

— Preciso de uma caminhada antes do almoço.

Desejava ficar só. No entanto, encontrou uma fa­mília na praia — um sorridente grupo que não se des­grudou dela após a moça salvar uma das filhas peque­nas, de uma onda turbulenta. Turistas do Peru — um casal de meia-idade, o belo filho chamado Jorge, e a filha com o marido e duas menininhas encantadoras.

Melissa sabia que não estava nos seus melhores dias. Diferentemente das mulheres sul-americanas, não se preocupara com a maquiagem naquela manhã e saíra sem trocar a camiseta e os jeans. Não que isso parecesse ter importância. Jorge sorriu e colocou-se ao lado dela quando começaram a andar pela praia. Ao terminarem a caminhada, o rapaz a convidou para almoçarem todos juntos em um restaurante, um con­vite reforçado pela mãe. O primeiro instinto foi recu­sar, mas por que não? Estava cansada de pensar só em Hawke. Essa família alegre, barulhenta, manteria longe as lembranças inúteis por alguns momentos. — Parece um convite encantador, obrigada — aceitou, enfim.

Eles não deixaram a jovem trocar de roupa e vestir algo mais elegante.

— Aqui é tudo casual. Todos usamos roupas de praia — confortou a sra. Lopez.

Melissa conteve o riso. As tais roupas de praia ti­nham sido compradas nas lojas mais elegantes de Lima. Perto deles, a princesa parecia uma campo­nesa.

O almoço demorou, mas foi ótimo. Ao final, as crianças até já cochilavam. Melissa também estava pronta para dormir à tarde, assim como o resto da fa­mília.

— Os Lopez insistiram em acompanhá-la de volta ao albergue. Depois, despediram-se e marcharam em di­reção ao hotel. O filho se demorou.

— Gostaria de jantar conosco também? — suge­riu, fitando-a com tanto interesse e prazer que a moça ficou corada.

Melissa ia recusar, com jeito, o convite quando al­guém por detrás dela disse:

— Acho que não vai ser possível.

Melissa não acreditou. Era Hawke! Uma onda de felicidade tomou conta dela.

O rapaz peruano desviou o olhar do rosto de Me­lissa para o de Kennedy. E, educadamente, disse:

— Tudo bem. Foi um prazer conhecê-la. Melissa tentou manter a calma e comentou:

— Não tinha o direito de recusar um convite por mim!

— Então, vá atrás dele — retrucou Hawke.

— Não vou! — respondeu, desejando saber se o empresário estava com ciúme ou se era uma demons­tração de possessividade.

— Estava prestes a recusar o convite por mim mesma. E essa é a segunda vez que passa por cima da minha autoridade.

O silêncio era cruel para os dois, repleto de emo­ções não verbalizadas.

Hawke resolveu quebrar o gelo.

— Em Shipwreck Bay, consultei o gerente antes de convidá-la para jantar porque pensei que estivesse trabalhando naquela noite. Assim como hoje mas está certa, não tinha o direito de responder por você. Me desculpe.

— Deveria pensar nisso. Não que seja da sua con­ta, mas conheci toda a família de Jorge hoje cedo e al­moçamos todos juntos. O que está fazendo aqui?

— Vim atrás de você. Por que deixou Shipwreck Bay?

— Eu disse que iria embora ao final da semana.

— E eu disse que voltaria. Por que não esperou?

— Não me pediu isso. Como me encontrou?

— Se não tivesse feito a reserva lá, talvez não a en­contrasse.

— Sei que o dinheiro pode comprar qualquer um, mas pensei que o pessoal de lá fosse leal.

— E o pessoal é. Eu sou o dono de Shipwreck Bay.

— Você o quê?

— Pensei que soubesse.

— Não sabia.

Será que Hawke acreditara? Ou será que pensava que a moça quisera que o empresário corresse atrás dela? Era impossível dizer, a fisionomia dele não re­velava nada. Kennedy era especialista em esconder as emoções.

E o que será que Hawke queria da princesa? Melis­sa não sabia nem por onde começar. Mas resolveu fa­zer uma pergunta para entender melhor aquilo.

— Também é o dono aqui?

— Não. Tenho uma casa a alguns quilômetros da­qui. Está gostando.

— É maravilhoso. Mas acho que você prefere as montanhas — comentou ela, olhando meio de lado.

Hawke queria saber se Melissa tinha alguma idéia do quanto era provocante com aqueles olhares de soslaio. O empresário presumia que a moça não sou­besse. Teve que se controlar para conter a raiva que sentira ao vê-la sorrindo para aquele peruano. Quis agarrá-lo pelo pescoço — uma reação que deixara Kennedy horrorizado.

— Porque sou rude?

A pergunta fez Melissa rir.

— Não pensei dessa forma. Mas sim porque as montanhas representam algo de desafio.

Embora mantendo as emoções sob controle, sentiu o orgulho ferido porque, de alguma forma, aquela mulher tinha o poder de balançá-lo. Antes de conhe­cê-la, esperava ver a versão feminina dos irmãos dela — mais jovem, claro, mas confiante, serena, segura. Em vez disso, a moça era reservada, quase tímida, mesmo não tendo percebido nenhum sinal disso quando a viu conversando com o tal de Jorge.

Será que estava jogando com o empresário? Podia compreender a maioria das mulheres, mas aquela era um enigma. E o fato dela tê-lo beijado, em uma mis­tura tentadora de anjo e demônio, o confundia ainda mais. Quando Hawke voltou a Shipwreck Bay e des­cobriu que a princesa tinha ido embora, ele ficou fu­rioso e decidiu descobrir o que fez Melissa agir da­quela forma.

— A praia pode parecer bela e tranqüila, mas pode ser tão perigosa quanto as montanhas.

O tom da voz dele aguçou a atenção da moça. Era um aviso?

— Eu bem sei — disse a moça. — Há um enorme lago em Ilíria e as tempestades lá são temíveis. O que são esses arbustos com esse cheiro forte?

— Manuka — a planta do chá, é assim que as cha­mamos desde que os primeiros colonizadores euro­peus começaram a preparar chá das folhas. As mais altas, com folhas menores e em maior número, são as árvores kanuka, da mesma família.

— Ah, sim! E aquelas grandes que crescem ao lon­go da praia, em formato de cúpula?

— Pohutukawa. No verão, antes do Natal, ficam cobertas de flores. Parecem casquinhas vermelhas de sorvete.

— Tão romântico... — zombou a princesa.

— Não sou romântico.

— Nem eu — concordou, mantendo os olhos na pohutukawa. — Essas árvores crescem apenas no norte? Não as notei na Ilha do Sul.

— Precisam de calor. Não florescem muito no sul e gostam de ter as raízes no mar.

— Qual é mesmo o nome dessa árvore?

— Pohutukawa.

Melissa tentou repetir e riu quando não conseguiu.

— Maori é uma língua muito musical, mas algu­mas palavras são difíceis.

— De modo algum. Os sons das vogais são os mesmos do italiano.

— Po-hu-tu-ka-wa — pronunciou a princesa le­vantando a cabeça na direção de Hawke em busca de aprovação. Viu o olhar fixo do empresário nos lábios dela. A moça ficou arrepiada com aquilo. Os olhos de Kennedy eram como pedras preciosas verdes, bri­lhantes.

A boca de Melissa ressecou. Ela quis passar a lín­gua nos lábios. Mas, o instinto a avisou de que, se fi­zesse isso, estaria propondo um convite ao qual o em­presário não recusaria.

— É assim que se fala?

— Perfeito — respondeu Kennedy.

Melissa ficou desapontada ao ver uma mulher pas­sar por eles. Baixa e magra, a moça era tudo o que a princesa não era. Bela, graciosa e bem-vestida.

A moça deu uma olhadela em Melissa antes de se fixar em Hawke. Quem quer que fosse a desconheci­da, deixou claro seu interesse com um olhar e um sor­riso provocante.

— Boa-tarde — cumprimentou a recém-chegada, com uma voz rouca, sensual, enquanto passava, com os quadris se requebrando, o cabelo louro balan­çando.

Pálida, Melissa controlou a inveja e fitou Hawke. Como sempre, o rosto dele nada expressava.

— Muitas pessoas aqui, não? — comentou o em­presário. — Vamos embora.

— Ir? Para onde?

— Vou lhe mostrar minha casa. Aquele é o meu carro.

— Está me convidando?

— Sim, princesa.

Melissa sabia que devia dizer não, mas concordou e entrou no carro. Hawke Kennedy podia ter qualquer mulher no mundo. Então, por que escolheria alguém como ela se tinha magníficas sereias a seus pés?

— Quais são seus planos para agora? — por um instante a pergunta a assustou.

Claro que Kennedy não estava perguntando o que a princesa queria do tempo deles juntos. Melissa ex­plicou:

— Estou juntando as minhas anotações para a mo­nografia que estou escrevendo.

— Qual é a premissa?

A jovem lhe contou, esperando não mais do que um interesse superficial. Mas Hawke lhe fez uma pergunta que a fez pensar. E, quando chegaram a um portão, estavam imersos em uma discussão.

Os portões se abriram e Hawke entrou. Melissa fi­cou em silêncio, perguntando a si mesma o que esta­va fazendo ali. E por que viera? O nervoso aumentou quando o veículo chegou a um pátio asfaltado. Haw­ke estacionou o carro embaixo de uma outra árvore enorme, e saiu. Melissa também desceu e examinou a casa. Larga e baixa, situada em meio a arbustos. Ain­da assim, a princesa podia sentir a maresia e ouvir as ondas batendo.

— Café? — perguntou Kennedy enquanto entra­vam.

— Não, obrigada, mas um copo d'água seria mara­vilhoso.

— Acho que posso fazer melhor do que isso — disse ele, ao abrir uma porta que dava para uma sala espaçosa.

— Vou pegar um pouco de suco para você.

As portas de vidro da sala estavam abertas. No ter­raço, nada além da vista do mar e do céu.

— Oh! — suspirou Melissa, encantada.

 

CAPITULO QUATRO

— Vá lá fora e veja — encorajou Hawke. — Vou pegar sua bebida.

A casa tinha sido construída no pé de uma ladeira íngreme, que terminava em uma praia. Melissa reco­nheceu uma árvore como sendo uma pohutukawa. Havia mais espalhadas pelo declive, mas diferente­mente do albergue, a casa de Hawke não dava vista para as ilhas. Em vez disso, um mar turquesa sombreava o horizonte.

Melissa virou-se ao pressentir a chegada de Hawke.

— É lindo aqui — comentou a moça. — Um azul perfeito...

— A mesma cor dos olhos dos Considines... — O empresário lhe deu o copo de suco e a encarou. — Por que não tem olhos azuis?

Embaraçada pelo jeito de Hawke observá-la, a jo­vem respondeu:

— São uma particularidade dos filhos. As mulhe­res têm mais opções com relação às cores dos olhos.

— Acredito que seja a única mulher Considine que tenha restado...

— Talvez. O usurpador que dominou a Ilíria e ma­tou nossos avós era um Considine, um primo distan­te. Há boatos de que ele se casou e teve duas meninas.

— O que aconteceu às garotas?

— Ninguém sabe. Se existiram, provavelmente, estão mortas. As pessoas do círculo íntimo dele ten­diam a não viver muito.

A moça mudou de assunto e voltou ao cenário.

— Não há nada entre esse lugar e os países latinos, há?

— Nada. Já esteve lá?

— Só fui até o México, que amei. A maioria das minhas viagens foi com a minha mãe e ela não era aventureira. Só gostava de lugares que considerava civilizados — revelou a jovem tomando um gole do suco. — E como a idéia dela de civilização significa­va Europa e a parte leste dos Estados Unidos, era isso que eu conhecia.

— Há algum lugar em particular que gostaria de conhecer? Algo na América do Sul, por exemplo?

— Machu Picchu e as Cataratas do Iguaçu. Hawke estivera em ambos os lugares e, enquanto bebiam o suco, o empresário lhe contou sobre essas viagens.

— Parecem uma maravilha — comentou a moça.

— Mas você pode ir aonde quiser agora — disse o empresário.

— Tenho andado ocupada desde que saí da escola. Passei um ano maravilhoso na Tailândia, ensinando inglês em uma escola. Tinha bons feriados com os amigos em vários lugares, mas trabalhei nas férias para meus irmãos.

O empresário recostou-se à balaustrada e, com olhos frios, examinou o rosto da moça.

— A maldição de um monopólio financeiro lucra­tivo e dois irmãos superprotetores...

— Não tenho dinheiro meu. Marco e Gabe me dão uma mesada.

— Isso me parece antiquado.

— Meus pais sabiam que meus irmãos tomariam conta de mim se eu precisasse.

— Mas, enquanto isso, depende deles?

— Até eu começar a ganhar o meu próprio dinhei­ro, sim.

Ninguém notaria, pelo tom de voz da princesa, que Melissa achava aquela dependência humilhante, ou a atitude dos irmãos um pouco inconveniente. Mas fos­se o que fosse, Gabe era assim. Marco estava mais in­clinado a deixá-la agir por conta própria.

E a jovem estava reagindo bem. O interesse de Hawke nela não era monetário — não como muitos outros homens que pensavam que a moça tinha muito dinheiro. Entretanto, os irmãos exerciam um enorme poder sob a parte financeira. Deveria haver outras ra­zões para que o empresário ficasse no encalço dela.

A verdade doía, mas Melissa tinha que enfrentá-la. Uma vez, a mãe lhe disse que os homens não se apai­xonariam por ela. Não que fosse grata ao pragmatis­mo brutal da mãe, mas agira assim desde então. A única tentativa de amor morrera, antes mesmo de co­meçar, quando a princesa descobriu que o homem es­tava apaixonado era pela perspectiva de se aproximar dos irmãos Considine. Herdeiro de uma família aristocrática, o rapaz vira isso como uma forma rápida de recuperar a fortuna que os ancestrais desperdiçaram.

Será que a princesa achava Hawke tão atraente porque não procurava dinheiro ou influência? Um olhar dispersou aquela idéia maluca. O sol reluzia no cabelo negro dele, iluminando-lhe o rosto. A moça lembrou-se da textura da pele do empresário, sexy com uma barba rala. Aquela lembrança sensual, o co­ração da jovem deu um pulo.

Melissa o desejava com ardor. Era cautelosa, mas tinha poucas defesas contra a atração poderosa que sentia por Hawke. Se o empresário acendesse aquele calor da moça, a princesa suspeitava que se derreteria nos braços dele.

Hawke ergueu o copo na direção da moça e brin­dou:

— A um bom diploma e à independência!

— Isso mesmo! — concordou a princesa. Quando acabou de beber, a jovem colocou o copo em cima de uma mesa. Depois, comentou:

— Não vou conseguir nenhum dos dois, se não voltar ao trabalho. Planejou algo para essa tarde? Sem chances de esquiar, mas um grupo lá do alber­gue estava animado para voar de parapente.

— Também vou trabalhar. Se quiser, podemos jantar aqui. Se não, há restaurantes excelentes. Isso se quiser jantar comigo...

Melissa não podia dizer o que Kennedy estava pensando, mas notou um certo brilho nos olhos dele. Será que realmente queria jantar com ela? Ou apenas disfarçava a situação agora que a moça lhe dissera que não seria um joguete naquela brincadeira?

O amor era uma emoção muito perigosa e não ou­sava deixar-se aberta a esse tipo de sentimento. Claro que podia jantar com Hawke sem perder o próprio coração.

— Adoraria... — disse a moça, levantando-se. — O suco estava uma delícia, obrigada. E esse lugar é lindo.

— Fico feliz que goste.

— Me lembra um pouco a Grécia, sem o peso es­magador da história. Claro que a Nova Zelândia é tão antiga quanto a Grécia, mas parece mais nova, ino­cente.

— Acho que nenhum lugar com gente está livre do peso da história, mas sei o que quer dizer. Sempre en­tendi por que os exploradores europeus se sentiam tão atraídos pelas ilhas do Pacífico. No Mediterrâneo, não dá para escapar do legado do passado, enquanto aqui há apenas mil anos de morte, traição e desgraça.

— Amor e felicidade também. Nem toda história é ruim.

— Não acha que há uma mistura de alegria e tris­teza com relação à felicidade passada? Embora eu su­ponha que a sua herança a tenha acostumado a agar­rar-se ao passado.

— Suponho que sim — concordou a moça, andan­do ao lado dele em direção à casa.

— De alguma forma, aceitamos isso como verda­de. Alex está certo de que o povo da Ilíria vai decidir tornar-se uma república em breve, mas eu não acho. O pessoal de lá o adora e, quando o filho dele nasceu, houve festa.

A moça relaxou, ficando à vontade demais e, ao en­trar na casa, bateu com a ponta da sandália em um de­grau e tropeçou. Antes que caísse, Hawke a segurou.

— Você está bem? — perguntou, virando-a de for­ma que pudesse olhá-la de frente.

— Sim, me desculpe, sou desastrada. Não vi o de­grau. Melissa ficou em silêncio. A tensão crescia en­tre ambos quando a princesa viu os olhos de Hawke iluminados de fogo.

O olhar do empresário desceu até a boca da jovem e a princesa se consumiu por um desejo tão intenso que todos os pensamentos fugiram-lhe da mente. De­vagar, Kennedy a puxou para perto dele. Melissa er­gueu o rosto em uma súplica inocente e sorriu.

Hawke disse o nome dela e a abraçou. Mas, embo­ra a jovem quisesse muito, o empresário não a beijou. Em vez disso, Kennedy a encarou como se procuras­se uma resposta para tudo aquilo.

— Princesa, você me incendeia—Kennedy não se conteve.

E a beijou. O corpo dela exalava a uma paixão afoita. Era um fogo de chamas vibrantes.

Enlançando o pescoço dele, Melissa rendeu-se ao desejo e ao prazer quando Hawke a beijou. A excitação aumentou. Quando o empresário levantou a boca, a moça escutou um gemido e percebeu que era dela. E o soluço que veio em seguida, ao receber um beijo na nuca também era da princesa. O toque dis­parou uma carga erótica pelo do corpo de Melissa. E o instinto que até então dormia agora estava enlou­quecido.

O empresário tinha gosto de sal e cheiro de almíscar, um calor masculino delicioso; a pele era fina, macia e firme. A princesa o saboreou como se fosse um dos vinhos mais finos, encantada com a liberdade de ser capaz de tocá-lo.

Kennedy riu e moveu uma das mãos que estava nas costas da moça para os seios dela. Melissa ficou com a respiração presa na garganta. Reclinou-se um pouco para facilitar-lhe o acesso e o empresário bei­jou-a no pescoço.

Hawke tocou no bico de um dos seios, uma carícia que aumentou o desejo que a moça sentia. Algo sur­gia dentro dela, com a proximidade de Kennedy. E a jovem cederia para experimentar e saber como o em­presário fazia amor.

Hawke levantou a blusa da princesa, acariciando-a na barriga. Uma lassidão deliciosa sugou as ener­gias da moça. Melissa estremeceu e o empresário perguntou:

— Está com frio?

— Sim.

— O que podemos fazer?

Melissa encostou a testa em um dos ombros de Hawke e reuniu coragem para deslizar as mãos por baixo da camisa dele, tocando-o da mesma forma como o empresário a tocava, sem pressa, com sen­sualidade, as pontas dos dedos deleitando-se com aquele prazer.

— Você sabe o que está fazendo, não é, Melissa? — certificou-se Hawke.

— Sim. Estamos fazendo amor — a moça confir­mou, o corpo cheio de alegria.

— Então é isso, claro! — Hawke disse, rindo. Melissa riu também e o beijou em um dos ombros, quando o empresário a pegou no colo. A cabeça da jovem rodou.

— O quê...?

— Shh... — A boca de Kennedy deteve qualquer outro protesto. Beijando-a, atravessou a sala. Levan­tou a cabeça quando chegou a uma porta e abriu pas­sagem.

Embora nunca tivesse se sentido tão pequena, tão leve, a moça protestou:

— Sou muito pesada...

— Você é alta, mas não é pesada. É como uma ár­vore nova, esguia e graciosa.

O empresário parou e a colocou no chão. Com as mãos no rosto dela, fitou-a.

— Ou uma jovem deusa, ainda não inteiramente certa do próprio poder.

Encantada, adorou aquelas palavras. Claro que não acreditava nelas, mas pensou que pudesse amar Hawke por tê-las dito.

— Ao passo que você tem plena consciência do seu — respondeu a princesa.

— Tive dez anos extras para conhecer limites. Melissa o estava perdendo. Sem pensar, a jovem aproximou-se e começou a desabotoar a camisa dele. Confiante, Melissa inclinou-se para a frente, abrin­do-lhe a camisa de forma a revelar os músculos do homem. Hawke era grande, perfeito. Aproveitou para beijá-lo no pescoço e acariciar o tórax definido. Melissa registrou cada pedacinho da pele macia e do cabelo encaracolado de Hawke, o tênue cheiro de homem e o som da respiração dela quase no mesmo ritmo da batida do coração. Kennedy segurou-lhe a mão.

— Tire a blusa.

— Tire você mesmo. É o justo.

— Certamente. Levante seus braços.

A moça obedeceu. O empresário despiu-a, tirando-lhe a blusa pela cabeça, mas ficou onde estava, tão perto que a moça pensou ser capaz de ouvir o coração dele palpitar.

— Agora, termine de me despir — ordenou Hawke com suavidade.

O fino tecido de algodão grudou nos ombros de Hawke e a princesa teve que se aproximar para con­seguir tirar a camisa. A garganta secou quando os seios dela tocaram o peito do empresário, mas a moça perseverou até a roupa cair no chão.

— Olhe para mim — disse Hawke.

Trêmula, a moça levantou a cabeça. E, naquele momento, perdeu-se nos olhos do empresário. Ken­nedy sorriu.

— Você é sensível... — percebeu ele, abaixando as alças do sutiã, soltando-o.

Assustada, Melissa o viu fitá-la com olhos som­brios. A princesa prestou atenção e notou a boca de Hawke se retesando e os músculos do torso dobrando-se sutilmente. O empresário a pegou nos braços e a jovem entregou-se a Kennedy em um beijo que era, ao mesmo tempo, rendição e aceitação.

A princesa não notara que estavam em um quarto, mas o beijo que compartilharam tirou-lhe a surpresa quando o empresário desviou as cobertas e a deitou na cama. A mente, os olhos, o coração de Melissa es­tavam repletos de Hawke, de forma que a moça não se preocupou onde estavam.

O empresário deitou-se ao lado dela e começou a explorar-lhe o corpo com as pontas dos dedos, fazen­do com que a moça sentisse como se nada mais im­portasse a não ser aquele intenso prazer. As carícias passavam pelas coxas da jovem, pela cintura fina, pe­los seios, deixando-a em brasa.

Atordoada com a própria reação, a princesa lutou contra o impulso de puxá-lo e colocá-lo em cima dela. E deslizou uma das mãos por um dos ombros do empresário, descendo, passando pelos quadris e as coxas grossas.

— Você é lindo! — exclamou ela, ficando verme­lha logo depois por causa da banalidade das palavras.

Mas o sorriso dele não foi indelicado. Tornara-se feroz, dominado pelo instinto apaixonado de tomá-la. Apesar da vulnerabilidade, o desejo de Melissa baniu qualquer apreensão.

Como se o empresário rompesse alguma barreira, beijou-a, arrebatando-lhe a alma do corpo. Depois, beijou-a pescoço abaixo, passando pelo peito.

Quando os lábios a tocaram em um dos seios, a moça gemeu. Kennedy intensificou as carícias. Exci­tada, o corpo da princesa se arqueou.

— Ainda não, princesa... — Hawke a acalmou.

O que se seguiu foi uma calma sedução que se transformou em pura necessidade. E, depois, Melissa parou de pensar e deixou-se levar pelo êxtase de fa­zer amor com Hawke.

Perdida no brilho afoito dos olhos dele, a moça o seguiu até a beira da paixão. Finalmente, o empresá­rio acomodou-se àquele corpo feminino. Ao sentir-se invadida, tomada por algo maior do que si mes­ma, a jovem conteve a respiração. Devagar, a cada impulso daquele corpo másculo, o desejo dentro dela crescia, elevando-a a uma dimensão que nunca pensara existir.

Melissa segurou-se, apertando os ombros de Haw­ke, as unhas cravadas na pele dele. Seguindo-o ritma­da, a princesa o tomava, segurava-o, soltava-o, so­mente para que o empresário voltasse e recomeçasse.

Kennedy manteve aquele ritmo enlouquecedor até que a jovem gritou e agarrou-se ao empresário, cada músculo retesando-se ao redor daquele homem em uma tentativa apaixonada de ele continuar dentro dela.

O ritmo acelerou. O rosto de Kennedy endureceu e os olhos brilhavam. O desejo de Melissa igualou-se ao do empresário. Ondas se agitavam rumo ao êxtase, em uma agonia de prazer. A moça gritou o nome dele e caiu em um enlevo descuidado e indefeso.

A mesma sensação de plenitude surpreendeu Hawke. A moça forçou-se a ficar de olhos abertos e viu quando o empresário também alcançou o clímax. Melissa sabia que guardaria aquela lembrança pelo resto da vida. Relaxando, deixou-se envolver na paz da plenitude, com o peso daquele corpo masculino em cima do dela.

Quando saiu de cima da princesa, Melissa pro­testou.

— Sou muito pesado. — brincou Hawke.

— Não é.

O empresário riu silenciosamente, mas deitou-se de costas. Melissa não teve tempo de sentir falta do contato. Um dos braços a aproximou do corpo dele, segurando-a de forma que a cabeça da moça repou­sasse no ombro de Kennedy.

A jovem estava contente por ter esperado, embora o medo a tivesse mantido virgem por tanto tempo. Sem ter certeza da própria atração para arriscar-se a aceitar razões erradas, a moça preferira manter-se se­gura de vínculos emocionais.

Sentindo frio, a moça tentou esvaziar a mente de tudo. Nenhum dos dois falou. Melissa pensou que até dormiu por um momento, perguntando-se se Hawke também. Não podia imaginar um homem tão ativo, poderoso, cochilando. O empresário demonstrava muita noção do que acontecia ao redor dele, estava muito alerta, era um predador. Será que a moça era uma presa?

Pare de drama, ordenou a si mesma. Esse momen­to é especial para você porque é a sua primeira vez. Mas Hawke nem percebeu isso. Talvez nunca tivesse feito amor com uma virgem antes.

Não importava. Tinha sido uma experiência maravilhosa, mas não deveria deixar que isso assumisse muita importância porque não era relevante para o empresário. Hawke poderia ter gostado de fazer amor com ela, mas voltaria para Danielle, a amante fiel, que não reclamava de nada.

A moça se contorceu em vez de esticar-se, que era o que queria fazer.

— Desconfortável? — Kennedy indagou.

— Não.

— Eu estou — murmurou Hawke, começando a acariciar-lhe os seios novamente, o toque daquele ho­mem espalhando calafrios pelo corpo da jovem. — Muito desconfortável...

Não poderia fazer isso tão cedo, certo? A princesa lera em algum lugar que os homens precisavam de um tempo entre uma relação e outra. A moça abaixou a cabeça para olhar os corpos dos dois e percebeu que quem quer que tenha escrito aquilo estava errado. Ou não conhecia Hawke.

— Me diga para parar se quiser — o empresário avisou. A respiração dele em um dos ouvidos da moça enviava sinais para o corpo sensível, esquen­tando aquela parte feminina que acabara de descobrir o quão forte o desejo sexual podia ser. A jovem ficou assustada ao dar-se conta de que não tinha defesas contra Kennedy.

— Não... — disse a moça, lutando contra um medo que lhe dizia que avançara muito em um território proibido.

— Não o quê?

— Não pare.

— Ah, bom!

Dessa vez, foi rápido e voraz, uma combinação de dois corpos em uma paixão que consumia com tanta força que, quando acabou, Melissa só podia tremer, extasiada. Depois, Hawke levou frutas e suco para a moça. Aí, deitou-se ao lado dela abraçando-a en­quanto a princesa dormia. Quando a jovem acordou, sentiu-se desorientada.

— O quê... — falou, tentando livrar-se do intruso na cama.

— Está tudo bem.

Hawke foi gentil, mas não a deixou ir.

— Você está a salvo.

Foi então que a princesa percebeu onde estava. Fi­cou mais uma vez vermelha.

— Qual o problema?

— Não sabia onde estava — a jovem murmurou, enterrando o rosto em um dos ombros dele de forma que não pudesse ver-lhe a fisionomia.

— Espero que queira estar aqui mesmo.

— Sim.

Algumas mulheres eram capazes de fingir um orgasmo. Mas Hawke sabia que, nos braços dele, ai princesa transformou-se em uma mulher que somente podia sentir. E que gostara do que o empresário a fizera sentir.

— Então, por que está corada?

— Nem o conheço!

— O que você vê é o que você tem. Sou saudável, controlo meus próprios vícios e não há mais ninguém na minha vida.

A princesa teve que morder a língua para não per­guntar o que acontecera à raiva que o acompanhava há anos. Se indicasse que sabia sobre Danielle Sin­clair, isso diria a Hawke que, desde aquela dança no casamento do primo dela, a moça se interessava pelas aventuras amorosas do empresário.

— Eu também... — Melissa murmurou.

 

CAPÍTULO CINCO

Melissa continuou a conversa, envergonhada:

— Não sei se tenho o controle dos meus vícios.

— Me fale sobre eles — pediu o empresário.

— Não, você terá que descobri-los.

— Será um prazer... — respondeu Kennedy, beijando-a na testa.

Melissa permaneceu deitada com os braços do em­presário ao redor dela e tentou relaxar, ouvindo o som das ondas na praia, além da batida compassada do coração de Hawke. A jovem sentia-se cansada, ainda assim, estimulada, o corpo em paz. Infelizmen­te, pensamentos dispararam na mente da princesa, preocupando-a.

— Qual o problema? — Hawke questionou.

— Tenho que voltar para trabalhar.

— Poderia trabalhar daqui — sugeriu ele.

— Aqui? — estranhou Melissa.

— Aqui. Parece ser bem mais confortável que o al­bergue e eu gostaria que ficasse comigo até ir embo­ra. Assim como você, tenho projetos. Então, pode­mos trabalhar ao mesmo tempo quando não estiver­mos fazendo outras coisas.

Melissa ficou indecisa. Algo lhe avisava de que, se concordasse, estaria dando muito mais do que uma semana do tempo dela. O empresário queria que fos­sem amantes, ao menos durante o tempo em que a moça estivesse ali. Será que podia fazer isso e depois ir embora? Ou será que o empresário estava propon­do algo mais permanente do que uma semana passada na cama?

Melissa mordeu os lábios, desejando ter mais ex­periência nessa coisa de homem-mulher. O bom senso retornou à moça para deixá-la saber que estava brincando com fogo. Mas um espírito muito mais forte e destemido sussurrou que, se a princesa dissesse não, poderia lamentar isso pelo resto da vida.

— Tudo bem — concordou Melissa.

O empresário sorriu, beijando-a com delicadeza, mas cheio de boas intenções. Um beijo que a lançou para dentro do mundo sensual de Hawke fazendo amor. No entanto, o empresário recuou e levantou-se.

— Acho que já teve o suficiente por agora. Vamos descer e pegar suas coisas no albergue.

Melissa virou a face corada porque algo no tom de voz dele lhe dizia que o empresário suspeitava que a moça fosse virgem. Ou, ao menos, muito inexpe­riente.

De volta ao albergue, a jovem disse:

— Não entre — ordenou assim que o carro parou em frente ao pequeno hotel. Melissa sentia-se estranha, ciente de que a mulher que saíra há algumas ho­ras não era a mesma que voltara.

Em vez de tentar dizer a si mesma que fazer amor com Hawke não podia mudá-la, a jovem suspeitava que isso já acontecera. Ao pairar nas alturas, devido ao êxtase que sentia nos braços dele, uma nova ver­são de Melissa Considine havia sido criada.

— Tudo bem — respondeu Hawke. Entretanto, quando a moça apareceu na entrada da hospedaria, o empresário saiu do carro e encami­nhou-se rumo à princesa, franzindo as sobrancelhas. Pegando a mochila que estava com Melissa, Kennedy disse:

— Os seus irmãos não acham que você está levan­do longe demais essa coisa de estudante pobre?

— Às vezes. Mas sou estudante. E tento, com afin­co, ser o mais independente que posso.

O empresário lançou-lhe um olhar antes de guar­dar a mochila.

— Não se preocupam com a sua segurança?

— Às vezes, me ameaçam com um guarda-costas, mas não aqui. A Nova Zelândia é um dos países mais seguros no mundo e não sou idiota.

— Infelizmente, temos nossos vilões — rebateu ele, abrindo-lhe a porta do passageiro.

— Bem, espero que não peça carona — comentou ele, atrás do volante.

— Disse que não era idiota. Não peço carona.

Kennedy virou a chave, ligando o motor.

— Há outros perigos.

— Estou consciente de que algumas pessoas esperam influenciar meus irmãos através de mim. Claro, a maioria das pessoas não sabe que eles são meus ir­mãos, mas sempre há essa possibilidade.

— Estava pensando em seqüestro.

— Isso não costuma acontecer aqui. Não saio por aí usando uma placa que diz "Sim, sou uma Considine. Possíveis seqüestradores façam fila aqui". Até você chegar em Shipwreck Bay Lodge, ninguém ha­via descoberto quem eu sou.

— Tem certeza de que está segura comigo?

— Está me perguntando se confio em você?

— Sim. O que sabe a meu respeito? Posso sujeitá-la a indecências inacreditáveis.

— Duvido. Você tem uma excelente reputação — severa, porém, honesta. E não tentou fazer com que eu me apaixonasse repentinamente por você. Tinha certeza de que podia pará-lo a qualquer momento.

— Tem mais certeza do que eu — disse o empre­sário, dirigindo com habilidade por uma curva fe­chada.

Hawke lançou-lhe um olhadela.

— Você dirige?

— Dirigi na pista de Le Mans. Bem devagar. Mas sou boa motorista. Gabe me ensinou a dirigir com segurança e Marco me ensinou a dirigir rápido.

Ao parar o carro em frente à sua casa, o empresário disse:

— Seus irmãos deveriam ter lhe dito que há vezes em que você não deve esperar que um homem pare.

Melissa levou um momento para compreender que Hawke não estava se referindo a dirigir, mas à con­versa anterior que tiveram.

— Fizeram isso, acredite em mim. Mas, se eu ti­vesse pedido, você teria, não?

— Não sei. Espero que sim. Sou um homem co­mum, princesa, não um super-homem. Não me colo­que em um pedestal.

— Tenho dois irmãos. Sei o que é isso!

— Irmãos mais velhos tendem a ser heróis vene­rados.

— Não desde que eu tinha dez anos.

— Quer dividir o quarto comigo? — convidou Kennedy, já dentro da casa.

— Depende de você — a moça respondeu.

— A decisão é sua.

Hawke não dissera nada sobre levarem o relacio­namento adiante. Então, embora desejasse passar as noites com o empresário, a princesa decidiu:

— Vou querer um quarto separado. Kennedy não demonstrou desapontamento.

— Por aqui... — disse.

E depois de lhe mostrar um quarto maravilhoso que dava vista para o mar, o empresário avisou:

— Vejo você dentro de uma hora. Quando Kennedy foi embora, a princesa pensou que não deveria estar ali. Hawke era perigoso, mas ninguém a fizera sentir-se da forma como a moça se sentia quando o via.

Forçando-se a desfazer a mochila, a moça admitiu que lhe queria tanto que estava preparada para arris­car a perder o próprio coração. A princesa olhava pela janela, sem nada ver. Kennedy fazia amor como um deus, a jovem sonhava...

A moça, então, mexeu-se para voltar à vida. Com o rosto vermelho e os olhos pesados, terminou de ar­rumar as coisas com mais rapidez do que cuidado. Depois, pegou o laptop e o abriu.

Após uma hora, com o sol já se pondo, a jovem trocou de roupa, vestindo a calça jeans que usara em Shipwreck Bay. Como ali estava muito mais quente, vestiu uma blusa canela sem mangas. A seda sussur­rava contra a pele delicada.

Depois de um minuto hesitando dentro do quarto, a princesa tomou coragem para abrir a porta e sair. O coração batia forte porque Hawke estava a dois pas­sos. O empresário a fitou, uma luz se acendeu nos olhos dele. E, de repente, a timidez da jovem desapa­receu. Melissa sentiu-se travessa, sedutora e mais confiante do que nunca.

— Conseguiu fazer muita coisa? — perguntou Hawke, sorrindo.

— Menos do que deveria — admitiu a jovem. O sorriso transformou-se em uma risada.

— Eu também — murmurou, pegando uma das mãos da moça, entrelaçando aqueles dedos femini­nos aos dele.

— Minha mente estava em outro mundo. Vamos jantar?

— Vou logo avisando que não sou boa cozinheira — disse ela, enquanto caminhavam pela sala de estar.

— Não?

— Não. Não fui encorajada a ir à cozinha e, como gosto de ovos, bife e saladas, me viro com essas coi­sas.

— Não sou muito ruim na cozinha, mas a empre­gada deixou uma refeição para nós.

— Há quanto tempo tem esta casa?

— Cresci aqui. Minha mãe era quem cuidava da casa na maior parte do tempo, além da empregada quando o dono vinha aqui nos feriados. Quando pude pagar, comprei a casa, demoli a velha e construí essa aqui para a mamãe.

Algo no tom de voz indicava haver mais coisa na­quela história, e não apenas o que o empresário lhe contara. Aquilo atiçou a curiosidade dela, mas não sondou mais além.

— Sua mãe ainda vive aqui?

— Não. Morreu há vários anos.

— Lamento. É difícil perder a mãe. Eu tinha 14 anos quando a minha morreu.

— Não era uma boa hora.

— E alguma hora é boa?

— Não... — E mudou de assunto.

Enquanto anoitecia, os dois bebericavam o cham­panhe que o empresário insistira em abrir. E conver­saram até o sol se pôr e a escuridão começar a des­pontar no horizonte. Então, Hawke levantou-se da cadeira e estendeu uma das mãos à jovem:

—Venha para dentro, vai ficar com frio.

— Não, depois de Shipwreck Bay — lembrou a moça.

Porém levantou-se e o seguiu, encantada pela con­sideração dele.

— É tão mais quente aqui que quase parece impos­sível que estejamos no mesmo país, já que é pequeno.

— A Nova Zelândia se estende cerca de 1.600 qui­lômetros do norte ao sul.

— Alguém me disse que não há lugar que fique a mais de 120 quilômetros do mar.

— É verdade.

— Não é de se admirar que seja uma nação do mar. A empregada era uma excelente cozinheira e foi divertido ouvir os palpites de Hawke enquanto davam os toques finais à deliciosa refeição. Quando acabaram de jantar, beberam café e conversaram bas­tante. Melissa gostava da inteligência de Kennedy. O empresário era astuto e pensava rápido, com lampe­jos de compaixão que aliviavam a visão cínica dele sobre o mundo.

Nenhum dos dois falou nada sobre o motivo da jo­vem estar ali. Mas, durante a conversa, ardia a fogo lento o impetuoso clamor do sexo, doce, abrasador e imprudente, esquentando o corpo de Melissa e a pre­parando para o desfecho inevitável da noite. Por al­guma razão obscura, ao mesmo tempo em que a moça sentia pavor, também desejava aquilo, retardando o momento até que um bocejo a tomou de surpresa.

— Cama! — disse Hawke, levantando-se.

A princesa hesitou um momento, depois, o seguiu. Mas o empresário notara. À porta do quarto, Kenne­dy perguntou:

— Muito cansada?

A voz dele acariciara a princesa e uma onda de adrenalina a encheu de desejo.

— Não.

Hawke riu, beijando-lhe as mãos. Melissa estre­meceu. Depois, arfou quando o empresário, gentil­mente, mordiscou o polegar da jovem. Algo selva­gem a flechou.

O neozelandês manteve a mão da moça no rosto dele, olhos verdes encontrando os da princesa em um forte desejo. Hawke se barbeara, mas a fricção eróti­ca da barba na palma da mão da jovem a excitava.

— Agora você sabe o porquê daquela parte da mão ser chamada o Monte de Vênus — Kennedy ex­plicou.

Era um insulto? Difícil dizer. Mas aquelas pala­vras deixavam claro que o empresário sabia o quanto a moça era inexperiente.

— Sim — respondeu Melissa.

— Funciona com você também? Hawke estendeu-lhe uma das mãos.

— Tente... — convidou-a.

A jovem pegou a mão dele e a examinou. Dedos longos, fortes e perversamente habilidosos na pele da princesa... Melissa beijou-lhe a palma, passando também a língua no local que beijara.

Os dedos dele se contorceram como se proteges­sem o lugar que os lábios da moça tocaram. Melissa esperou alguns segundos. Depois, imitou Hawke, su­gando delicadamente o polegar dele.

— Se quiser dormir sozinha essa noite, é melhor ir para trás daquela porta. E trancá-la! — falou o em­presário.

— Não quero! — disse a moça, com doçura, cami­nhando em direção aos braços dele.

Kennedy não a beijou. Em vez disso, encarou-a.

— Você continua a me surpreender.

— Não sei o porquê.

— Tentação, ingenuidade, atrevimento... É uma combinação atormentadora.

— Não é de propósito.

— Eu sei. É isso que torna essa combinação fasci­nante — explicou o empresário, beijando-a.

Muito depois, sozinha na cama, relembrando os momentos de amor dos dois, Melissa se perguntava o porquê das lágrimas. Deveria estar ali deitada com um sorriso nos lábios. Hawke tinha sido tudo o que uma mulher precisava em um amante — selvagem quando desejava ferocidade, carinhoso quando ela queria ternura, generoso e paciente e, depois, exci­tante, inquieto.

Então, por que a tristeza? Não porque ele a deixara sozinha depois. Quis acautelar-se ao pedir por um quarto em separado. E, em vez de desejar passar a noite com o empresário, a moça não ousara. Hawke era irresistível! O carisma daquele homem era tão po­tente que a princesa corria o risco de ficar submersa nele.

Mas adormecera com os cílios molhados e quando acordou de manhã estava chovendo.

— É típico na primavera — informou Hawke, du­rante o café da manhã. — E a estação mais chuvosa aqui.

— Gosto de chuva — comentou a princesa.

— Temos que trabalhar bastante essa manhã por­que devemos relaxar depois do almoço. Quer visitar algum lugar turístico essa tarde?

— Qual a alternativa?

— Podemos ficar em casa, mas é uma pena perder o que a Ilha do Norte tem a oferecer. E sempre há a noite.

— Tem certeza?

— Sim, princesa.

— Então, não vamos perder nada.

Os dois trabalharam durante a manhã. E, à tarde, o empresário a levou para dar uma volta. Visitaram o berço da colonização européia na Nova Zelândia — uma pequena casa em Kerikeri, ladeada por um muro de pedra. Ambas tinham ficado sob a proteção de um forte maori ali perto.

— Chamado de forte pai — Hawke lhe contou. — Uma arquitetura militar surpreendente. Vê as encos­tas das colinas? Já tiveram estacas como muros de defesa.

— Aparenta ser antigo, mas as casas parecem tão recentes! Menos de 200 anos, eu acho.

— É um país novo. Qual é a construção mais anti­ga em Ilíria?

— O castelo de Gabe tem mais de 600 anos, mas lá em cima nas montanhas há um menir, uma pedra enorme que foi arrastada do leito de um antigo glaciar, possivelmente, há 4 mil anos, e passou a demar­car a trilha e o equinócio de verão.

O pescoço ficou tenso porque, como tudo no país dos ancestrais, o menir tinha a própria lenda, uma intimamente ligada à família da princesa. Um conto so­bre morte e derramamento de sangue, além de um duende cruel que protegia uma fabulosa jóia.

— Que diferença... — Kennedy comentou, come­çando a lhe contar sobre a cultura dos antigos coloni­zadores da Nova Zelândia, o pessoal que saía em ca­noas para cruzar o Pacífico e conquistá-lo.

Melissa estava fascinada. Era fácil imaginá-lo como um soldado, com uma armadura de bronze e brilhando enquanto lutava por tudo o que amava.

Tiraram folga no dia seguinte para irem ao extre­mo norte do país — uma península longa, estreita, a algumas milhas dali, onde um farol alcançava a linha de encontro dentre dois mares. Hawke lhe mostrou a trilha pelo penhasco, tomada pelas almas dos maoris mortos no caminho para a vida após a morte, e a anti­ga árvore pohutukawa que era o último vínculo com o domínio terrestre.

Comeram o delicioso prato de frutos do mar do norte, admiraram enormes árvores kauri. E, em uma tarde, o empresário a levou para ver os golfinhos, as baleias e a ilha de Piercy, uma passagem em arco, de pedra, no mar.

E toda noite, Hawke a conduzia a um paraíso sen­sual naqueles braços másculos. Depois, a deixava no quarto dela sozinha, onde a moça permanecia desejando-o ardentemente. O empresário não dissera nada sobre encontrá-la de novo, quando aquela semana acabasse. Era apenas um encontro nas vidas dos dois.

— Você me faz sentir velho e cansado — disse Kennedy à jovem ao final de um piquenique na praia, embaixo da casa dele.

Melissa gelou por um segundo. O que Hawke que­ria dizer?

Hawke estava deitado, usando apenas uma sunga. A água secava na pele bronzeada pelo sol, um corpo esbelto e forte. A moça engoliu em seco, presa a um desejo tão intenso que teve que fechar os olhos.

— Qual o problema? — o empresário indagou.

A princesa balançou a cabeça e Kennedy abra­çou-a

— Fala para mim — ordenou.

— Tudo tem sido perfeito — murmurou a moça, lutando para dar o tom certo de desapontamento e prazer. A aventura amorosa não significava muito para o empresário. Hawke gostava dela e lhe queria, mas não prometera nada e dera mais do que Melissa esperara. Não era culpa do empresário se a jovem se apaixonara.

O coração se comprimia no peito da princesa, difi­cultando a respiração. Apaixonada? Mesmo com as palavras se formando na mente, a princesa as rejeita­va. Não amava Hawke. O empresário lhe mostrara que o sexo poderia ser maravilhoso e, claro, a moça sentiria falta dele. Ele era um homem completo, fascinante e, por trás daquela figura austera que se apre­sentava ao mundo, havia um homem íntegro. Porém, a moça não estava apaixonada.

— Mmm... — disse Hawke, beijando-a na cabeça. — Perfeito...

A princesa deslizou os braços ao redor do empre­sário e ergueu o próprio rosto em um convite mudo. Hawke a beijou nos lábios, depois em outros lugares. E fizeram amor novamente.

Melissa dormiu nos braços dele, mas acordou so­zinha. Hawke estava à beira d'água. A princesa respi­rou fundo e vestiu-se. No dia seguinte, o empresário a levaria ao aeroporto local em Kerikeri e a moça via­jaria para Auckland e, depois, para Ilíria, onde passa­ria uma semana com Gabe.

Tinha vinte e quatro horas de vôo para aceitar que aquele romance acabara. Quando Hawke voltou, a princesa estava vestida e a cesta do piquenique arru­mada.

— Pronta para ir? — o empresário indagou.

— Não. Se quiser ficar, tudo bem.

— Não me tente. Estou esperando um telefonema. É melhor voltarmos.

— Passei momentos tão agradáveis. Esse lugar é lindo. Não é de admirar que seus pais tenham esco­lhido viver aqui. — Melissa parou de falar. Percebeu que tocara em um assunto delicado.

— Minha mãe vivia aqui — embora não nesse lu­gar em particular. Cresci em uma casa pequena e ve­lha na vila. Meu pai não apareceu na minha vida até os meus 14 anos. Meus pais tiveram uma aventura quando a minha mãe tinha 19 anos. E orgulhosa demais, não falou para ele, ao descobrir que estava grá­vida.

— Lamento, não sabia...

— Tudo bem. Todo mundo sabe disso aqui. Minha mãe entrou em contato com ele quando comecei a me meter em problemas. Sendo justo com o meu pai, ele aceitou a responsabilidade assim que soube. Man­dou-me para um internato, comprou a casa e arranjou um trabalho para ela como zeladora e governanta.

O empresário pegou a cesta e subiu a colina. A ca­minhada era íngreme e não dava para conversar. Melissa o seguiu, com o coração aflito pelo garoto que crescera sem pai. Os pais dela não tinham sido felizes juntos, mas estiveram sempre lá...

No terraço, a princesa virou-se e olhou a areia ro­sada da praia, marcada apenas pelas pegadas dos dois. Lágrimas embaçaram-lhe a visão. Em seis ho­ras, aquelas marcas na areia desapareceriam com a chegada da maré, assim como a moça seria apagada da vida dele.

 

CAPÍTULO SEIS

Mais tarde, quando pudesse suportar, Melissa se lembraria de cada cheiro, do som do mar, do jeito como as folhas do pohutukawa balançavam à brisa, da areia na pele dela...

Retalhos de felicidade, pensou, talhando consigo mesma por ser sentimental, romântica e... estúpida. Foi uma aventura apenas, uma semana apaixonante de sexo e conversa inteligente. Não significava nada mais para Hawke. E a princesa evitaria que isso sig­nificasse algo para si também.

— Vou descarregar a cesta — avisou a jovem, já dentro da casa.

— Vamos fazer isso juntos — respondeu o empre­sário.

— O quê... — Ele empurrou Melissa para que fi­casse atrás dele, em um gesto tão automático quanto protetor.

A moça gelou porque também ouvira algo — um leve barulho que indicava que alguém caminhava pelo corredor. A porta se abriu e uma voz feminina, sexy e um pouco cansada disse:

— Querido, graças a Deus...

— Danielle... — interrompeu Hawke, a voz fria. — Que diabos está fazendo aqui?

Pálida, Melissa engoliu em seco e saiu de detrás dele. Danielle Sinclair, a amante de tanto tempo, es­tava em pé, à porta que dava para os quartos, o cabelo ruivo molhado sobre os ombros, pernas longas em evidência.

Danielle desviou o olhar do rosto impassível de Hawke para o de Melissa, que tentava manter-se se­rena enquanto o coração se estilhaçava.

— Oh, me desculpe! — disse a recém-chegada. Kennedy as apresentou. Danielle como uma velha amiga. E Melissa apenas pelo nome que, evidente­mente, significava algo para a outra mulher. A mode­lo ficou pálida. Depois, balançou a cabeça e sorriu, com ironia.

— Querido, sempre estou um dia ou mais adianta­da. Não imaginava que tivesse visitas.

— Somente uma — Hawke explicou.

— Como vai, Melissa? — A outra mulher a olhou de cima a baixo.

Envergonhada, a princesa sentiu cada grão de areia no corpo e no cabelo. No entanto, esboçou um sorriso.

— Bem e você?

— Vou embora amanhã, Hawke — disse a moça. — Mas, se for inconveniente, posso ir agora.

— Claro que não vai — Hawke protestou.

— Vou pedir à sra. Farr para arrumar a cama para você, Danielle.

— Não seja idiota. Eu mesma posso fazer isso. Qual é o quarto?

— Vou lhe mostrar — respondeu o empresário. Melissa indicou a cesta de piquenique e comentou:

— E eu vou arrumar isso.

— Obrigado — disse Hawke, olhando para ela.

A moça descarregou a cesta. Estava tão concentra­da em jogar as coisas fora que deu um pulo quando a empregada chegou.

— Deixe que eu faço isso, srta. Considine. Deve estar querendo tomar um bom banho. — A princesa deu uma resposta qualquer e escapou para o quarto.

A jovem acreditara quando Hawke lhe disse que não tinha nenhum relacionamento, mas Danielle pa­recia estar em casa ali. E, obviamente, o empresário a esperava nos próximos dias. E, embora a modelo dis­farçasse bem, ela parecera chocada ao ouvir o nome de Melissa. Será que Kennedy mentira?

Aborrecida, a princesa livrou-se do sal, da areia e do toque de Hawke, lavando o corpo como se remo­vesse a pele. Mesmo fazendo isso, a moça sabia que, qualquer que fosse a relação dele com a linda Daniel­le, Melissa nunca seria capaz de tirá-lo da memória.

Pegou a primeira roupa que encontrou no armário, mas depois que vestiu os jeans e a camiseta, sabia que não podia deixar transparecer a própria dor. Acabou escolhendo uma calça de tecido macio e uma blusa de algodão. Prendeu o cabelo e usou alguns cosméticos para dar alguma vida aos lábios e à pele pálida. De­pois, saiu do quarto.

Hawke a esperava na sala de estar, a fisionomia distante e controlada. — Lamento, mas Danielle é uma velha amiga.

— Tudo bem — respondeu Melissa.

— Ela está comendo no quarto. Conversaram sobre outras coisas, mas o elo que as havia unido se evaporara. Melissa precisou se esfor­çar para manter-se ali. E suspeitava que Hawke dese­java que a moça estivesse em qualquer lugar, exceto na casa dele.

Depois de uma refeição bem formal, a princesa disse:

— É melhor eu arrumar as minhas coisas. Não vou sair do quarto novamente. Nunca consigo dormir em aviões. Vou tomar um sedativo e espero ter uma boa noite de sono.

Hawke aceitou a decisão da jovem. Mas, na porta do quarto dela, o empresário deu um beijo furioso na moça, usando da experiência, do conhecimento do que a excitava para forçar uma reação que ela não queria ter. Irritada consigo e com o homem, Melissa ainda se derretia, perdendo-se por alguns segundos no calor da paixão que incendiava os dois. Até que Kennedy a afastou.

— Pense nisso no avião — disse ele.

A princesa dormiu mal. Na manhã seguinte, acor­dou com olheiras. Recompôs-se com uma força que desconhecia possuir.

Hawke a levou ao aeroporto. A despedida foi edu­cada e sem choradeira. No último momento, porém, o empresário pediu:

— Me telefone quando chegar em casa. Ainda es­tarei aqui.

— Ok.

Com um alívio tão intenso como se fosse o primei­ro sabor de liberdade depois de um longo aprisionamento, a jovem sentou-se na poltrona do pequeno avião que a deixaria em Auckland dentro de uma hora. Com o olhar fixo no jornal que comprara, em­bora não estivesse lendo nada, a princesa quis tirar a imagem do empresário da sua mente.

A moça olhou pela janela e viu uma figura alta em pé, ao lado de um veículo, no estacionamento. Ken­nedy não se mexeu e a jovem não acenou, mas o ob­servou enquanto o avião decolava, indo em direção às águas brilhantes da Baía das Ilhas e ao mundo real.

A princesa, então, abriu o jornal. E lá estava Da­nielle Sinclair, o sorriso de lábios e dentes perfeitos. A manchete era discreta — "Modelo neozelandesa retorna" — mas o artigo abaixo indicava que Daniel­le ia visitar o amante, o magnata Hawke Kennedy.

Mordendo os lábios, Melissa dobrou as páginas e as colocou no compartimento da poltrona em frente. Procurou olhar a paisagem verde lá embaixo.

— Lissa? — Gabe a chamou, abraçando a irmã. A moça sentiu a garganta secar ao ouvir o apelido de infância.

— Estou bem.

— Não está com problemas?

— Nada sério — respondeu ela, sorrindo para con­firmar o que dissera. — Só um problema emocional. Vou superar isso. O irmão não ficou satisfeito. Mas, após um mo­mento, balançou a cabeça, concordando.

— Imagino que tivesse que acontecer cedo ou tarde.

— O quê?

— Problemas do coração. Se houver alguma coisa que eu possa fazer.

Em outras palavras, Gabe ia respeitá-la como uma adulta e deixá-la lidar com aquilo sozinha. A irmã também o abraçou.

Embora adorasse Gabe, o escudo de auto-suficiência do irmão sempre a impedira de se aproximar mui­to dele. Tanta responsabilidade em uma idade tão nova! A moça desejava que ele conseguisse encon­trar a felicidade que merecia.

— Quer ir a Bangcoc comigo? — o irmão per­guntou.

— Não, vou ficar aqui, obrigada.

— Não vai ficar entediada?

— Tudo bem. Qual é o motivo da tristeza? — per­guntou Gabe.

Melissa sorriu.

— Nenhum problema.

— Não costumava mentir.

Ela fitava a pequena torre que dava para a piscina.

Gabe esperava impaciente, mas era determinado. Logo, descobriria o que era.

— Bom, há mesmo um problema, mas é meu, não seu — disse a irmã.

E como Gabe permaneceu em silêncio, a princesa continuou:

— E já passei da fase de correr para você, confian­te de que fará o melhor por mim. Isso é algo com que tenho de lidar.

Gabe veio por trás da irmã e deslizou um dos braços pelos ombros dela, segurando-a quando a moça tentou escapar.

— Hum... Conheço isso. Você está bem?

A jovem manteve o olhar nas telhas do pombal. Na noite antes de deixar a Baía das Ilhas, havia ficado menstruada. Apesar de estranho, a princesa chorara. Mas, ao menos, não havia a possibilidade de uma gravidez para se preocupar.

— Nem um pouco. Vou passar a semana descan­sando na piscina e andando a cavalo por aí.

A Toca do Lobo, o ancestral castelo dos grã-duques da Ilíria, guardava um vale encantador, mas Melissa teve saudades de outras montanhas, nos lugares mais longínquos da Terra. Da enseada rosa brilhando sob o céu azul... Sentia tanta falta de Hawke, e as emoções eram tão profundas, que isso a assustava.

— Cavalgue até a pedra. É um bom lugar, e é espe­cial para a sua família. Diga à rainha, sua avó, o que se passa no seu coração. Ela vai ajudá-la — a criada do castelo sugerira.

A rainha à qual se referira figurava em contos nar­rados pelos camponeses, através das gerações, para explicar a fundação da casa real de Considine e o pas­sado da jóia feita de rubis, de valor incalculável — o Sangue da Rainha — que, de alguma forma simbóli­ca, reforçava o governo. A rainha tentou levar o colar para Ilíria, afetada pela guerra, mas foi morta por bandidos aos pés da maravilhosa pedra. Transformara-se na divindade do local, guardando o precioso tesouro até que o primeiro Considine aparecera caval­gando, à caça do bando de mercenários, pelo desfila­deiro e descendo rumo ao Mediterrâneo.

Para testá-lo, a rainha se apresentara como um ve­lha bruxa, oferecendo-lhe os rubis e um bom futuro no vale destruído pela guerra, se o rapaz se casasse com ela. Como era um homem pragmático, aceitou casar-se e construiu o castelo.

E, para surpresa dele, o amor fizera milagres, dan­do ao duende a juventude e a beleza de volta. Juntos, fundaram uma dinastia e, desde então, os Considines mantiveram o vale em segurança, falhando ape­nas uma vez — quando o ditador usurpara o trono da Ilíria.

— Duvido que a rainha se preocupe comigo — disse Melissa à criada.

— É a mãe da sua casa — claro que se preocupa! — Marya protestou, escandalizada. Como todas as camponesas no vale, acreditava nas velhas histórias.

— Vá, está um dia lindo, e você precisa tirar essa tristeza do coração. Vou preparar-lhe um bom al­moço.

A velha mulher era uma relíquia dos velhos dias antes do regime do ditador que imprimira sua marca de repressão cruel ao pequeno principado. De fato, Marya era a única pessoa que soubera onde o avô de Melissa, o então grã-duque, escondera o Sangue da Rainha. Com a morte do usurpador, a criada conse­guira encontrar Gabe e lhe mostrou onde estava o colar.

Melissa aceitou o almoço e levou o cavalo rumo ao velho caminho para o desfiladeiro onde uma grande pedra, arredondada pela erosão, marcava os limites da propriedade. Sempre achara o local assustador. Era fácil acreditar que o espírito de uma velha rainha ainda pairava no cenário da própria morte.

No meio de um pequeno vale nas montanhas, a pe­dra ficava localizada sobre um riacho que cruzava o gramado. Então, encrespava-se por entre árvores an­tes de se lançar vale abaixo.

Depois do cavalo beber água e de amarrá-lo, a princesa sentou-se na grama, fitando a pedra. Tudo estava calmo. Melissa estremeceu, tentando livrar-se da noção de que estava a espera de algo horrível acontecer...

— São apenas velhas histórias criadas para expli­car coisas — disse a jovem em voz alta. A princesa também disse a si mesma que não era supersticiosa, então era uma estupidez deixar que um lugar a pertur­basse.

A sugestão de Marya, para que Melissa contasse ao espírito do lugar o que se passava no coração dela, fez a moça sorrir. Mas a jovem precisa quebrar o si­lêncio opressivo ao redor. E falar alto o problema que a atormentava talvez ajudasse a fazer com que a prin­cesa confrontasse a própria insensatez. Então, gritou:

— Me apaixonei!

Não, não! Vamos lá! De novo!

— Tive uma aventura amorosa com esse homem. Suponho que uma semana seja um caso. Ao menos, não foi apenas uma noite. E ele me disse que não havia mais ninguém, mas a namorada dele apareceu de repente. É uma mulher alta, bonita, com uma pele e um cabelo vermelho maravilhosos. Obviamente, não posso competir. Pensei que fosse honesto. Mas ele sabia que Danielle estava vindo — deve ter arranjado isso. Me sinto suja. Principalmente porque sabia que ele sempre volta para ela. Pensei que fosse especial, mas vi que não sou.

A princesa parou. Não ouviu nada. Entretanto, sentia que as palavras ainda estavam ali, congeladas no tempo.

— Oh, pelo amor de Deus! — murmurou, levan­tando-se com tanta pressa que tropeçou e caiu contra a pedra.

O granito estava gelado, porém, ainda assim, uma onda de calor percorreu-lhe o corpo. Arfando, a prin­cesa afastou-se, esfregando as mãos enquanto olhava a pedra.

A moça ouviu um helicóptero ao longe. Gabe, tal­vez, embora tivesse planejado passar uma semana fora. Então, devia ser Marco. Não importava. Melis­sa queria ir embora dali, para longe do peso daquele trágico tempo. De volta ao castelo, na presença de um dos irmãos, a princesa seria capaz de convencer a si mesma de que aquela sensação que a dividira não era nada além do choque da pedra fria contra a pele.

Melissa levou meia hora para descer a montanha, cavalgando. Ainda tensa, a moça deixou o cavalo no estábulo e atravessou os jardins. Dentro do castelo, Marya a encontrou, e sorria.

— Eu disse que a rainha ajudaria. Ela lhe enviou o desejo do seu coração.

— Ela o quê...? — A moça gelou, incrédula, quando Hawke surgiu no corredor, vindo em direção à moça.

— Oi, princesa — cumprimentou o empresário.

Melissa não era supersticiosa, mas o coração ace­lerou. O fato de que o helicóptero chegou ao vale no momento em que a princesa tocou a pedra era pura coincidência. Mas a moça ouviu de algum lugar os ecos de uma suave risada feminina.

— Olá, Hawke. Que surpresa — disse a princesa, orgulhosa.

— Certamente que não — retrucou ele.

O que será que queria? Vendo o interesse da criada na conversa, Melissa manteve a calma e disse:

— Marya, pode nos servir um pouco de chá, na sala de visitas?

Era no outro andar, mas a perspectiva de compar­tilhar o elevador com aquele homem era intimidante. A jovem mudou de direção, indo rumo às escadas.

— Por aqui.

Será que viera atrás da princesa para reivindicá-la como sendo dele? Caia na real, Melissa advertia a si mesma. Isso era o tipo de coisa romântica que os homens faziam, mas Hawke lhe dissera que não era assim. Podia ser sexy, porém um homem com duas na­moradas não era nem um pouco romântico.

— Notei que o povoado está bem, ao sobrevoar o vale. Gabe deve estar bastante ocupado.

— Está determinado a prover os camponeses daqui com tudo que o governante anterior lhes negou — re­trucou a moça. — Sofreram muito porque eram fiéis à nossa família. E justo que retribuamos essa lealdade.

— Imaginei algo assim.

No topo da escada, a princesa o conduziu à peque­na sala.

— Foi por isso que meu irmão concordou em assu­mir o título — o povo daqui queria isso. Acho que Gabe também sentiu-se na obrigação, em memória ao nosso pai — explicou.

O que quer que fosse que o empresário estivesse fazendo ali, Melissa tinha que se proteger. Hawke era sedutor. A moça já suportara uma semana longe. Se o deixasse aproximar-se novamente, passaria por todo o processo mais uma vez. Não permitira que isso acontecesse. Mas o coração dela batia forte ar e a jo­vem tinha que parar de procurar o rosto de Kennedy, de tocar aquelas mãos másculas...

Hawke deu uma olhadela na sala. Algo no jeito dele deixou a princesa inquieta e Melissa voltou a falar.

— Por que está aqui ?

— Vim para ver você.

— E como vai a srta. Sinclair?

Marya trouxe a bandeja com o chá naquele mo­mento. O empresário esperou até que a mulher saísse para responder à pergunta.

— Danielle está bem e mandou-lhe lembranças.

— Retribua, mandando-lhe as minhas também — disse a princesa, educadamente, servindo o chá.

— Danielle não é minha amante.

— Claro que não. Que palavra tão fora de moda, não? E estou certa de que a modelo tem uma carreira muito bem-sucedida para precisar de alguém que a sustente.

— Não é minha namorada. Nunca foi. É uma velha amiga.

— Problema seu.

— Pare de ser boba, Melissa. Você e eu somos na­morados.

— Fomos por alguns dias.

— Eu vi o que você estava pensando, mas não podia mandá-la embora. As coisas não vão bem na vida pes­soal dela, então veio até mim em busca de proteção.

A moça estava alerta. Provavelmente, o empresário mentia. Assim como quando disse que ele e Danielle não eram namorados. Melissa reconhecera a aflição no rosto da modelo ao ver a princesa. Parece­ra uma mulher traída.

— Espero que tudo esteja bem agora — comentou a princesa.

— Também espero. Acredita em mim?

— Claro...

E era verdade. A vida pessoal de Danielle não es­tava bem porque o homem a quem a modelo amava acabara de passar uma semana com outra mulher!

— Não acho que acredite, embora não a culpe por suspeitar. Sei das fofocas que nos perseguem há anos. E não posso provar que não fomos namorados. Assim como não pode provar que o homem que a tem acompanhado nos últimos três meses não é seu na­morado.

O ataque a deixou aflita e a princesa perdeu a com­postura.

— Otto?

— Se você se refere a Otto Deauville, sim.

— Otto é gay.

— É bi. Não sabia?

— Não. E não é da minha conta. É um amigo, nada mais.

— Acredito em você.

— Oh, obrigada! — disse Melissa, com ironia, oferecendo-lhe um doce típico da Ilíria, bolo de ameixa.

As duas situações eram incomparáveis. Otto não escondia sua orientação sexual, enquanto a princesa vira Danielle à vontade na casa de Hawke. E os olhos ciumentos notaram os sinais que denunciavam inti­midade.

Melissa voltou a perguntar:

— Por que veio aqui, Hawke? Quando nos despe­dimos, sabíamos que era o fim.

— Vi que você pensou que Danielle e eu éramos namorados. Por isso, vim aqui lhe dizer que não somos.

— Não sei por que é tão importante para você, mas não esperava nada mais do que a semana que passai mos juntos, se é isso que você...

— Não é. Sinto sua falta, princesa. Vim para ver se você também sente falta de mim.

 

CAPÍTULO SETE

A alegria tomou conta de Melissa.

— Sim, sinto a sua falta — ela admitiu.

— Comecei a fazer as coisas da forma errada — disse Kennedy sorrindo.

O sorriso do empresário tocou fundo Melissa, mas não deixaria que Hawke assumisse a culpa.

— Nós dois fomos rápido demais — comentou a princesa.

— Muita cobiça. Você merece mais do que isso. Eu lamento.

— Você lamenta?

— Como posso lamentar quando foi magnífico? Assim como eu sabia que seria. Na verdade, depois daquele primeiro beijo, voltei para Auckland para terminar um relacionamento com uma mulher de lá. Não fomos namorados, mas senti que lhe devia algu­ma explicação. E, mesmo não sabendo se havia algu­ma chance com você, eu tentaria.

Isso seria o início de um relacionamento? As ho­ras de êxtase que passara nos braços dele ficariam com a jovem para o resto da vida. Mas, ao menos, a moça aceitara que queria mais do empresário, um en­volvimento que transcendesse o físico.

Antes que a princesa tivesse uma oportunidade de responder, Marya abriu a porta, preocupada, franzin­do as sobrancelhas.

— Telefone para você — disse a Melissa, no idio­ma local. — De sua Excelência. Quer que atenda no gabinete dele.

— Muito bem! — respondeu a princesa, amaldi­çoando a interrupção.

Passando a falar em inglês, disse a Hawke:

— Me desculpe, mas Gabe ligou para o telefone comercial, o que significa que deve ser importante.

— Vá atender — respondeu ele, com um sorriso e um brilho nos olhos.

O gabinete de Gabe era uma charmosa sala cheias de estantes que o grã-duque usava mais como sala de estar. O escritório, que zumbia com computadores e outros equipamentos modernos, tinha sido instalado fora do pátio central. Melissa entrou apressada e atendeu as telefone.

— Gabe? — perguntou, ansiosa.

— Me desculpe, Lissa, mas preciso de um docu­mento. Pode abrir o cofre? — O irmão lhe deu a com­binação.

— Abri — disse após alguns segundos.

— Do que precisa? — Melissa perguntou.

— O envelope escrito "Papéis Pessoais".

— Peguei.

— Tudo bem veja minha certidão de nascimento.

Melissa tirou de dentro do envelope o documento solicitado.

— Peguei.

— Boa garota.

Uma mulher falou algo do outro lado e deu para perceber a satisfação na voz de Gabe.

— Lissa, mande a certidão para o escritório de Londres, por favor, aos cuidados da minha secretária.

— Farei isso agora.

— Obrigado. Está tudo bem?

— Tudo em ordem.

Mas ao colocar o fone no gancho e o papel em um envelope, a princesa se perguntava o porquê de Gabe precisar da certidão de nascimento — e com quem estava o irmão. Talvez alguém estivesse ocu­pando o lugar no coração de Gabe que Sara Milton deixara...

Ansiosa para voltar ao encontro de Hawke, escre­veu rápido um pequeno bilhete para ir com a certi­dão, e o endereço no envelope antes de colocar o do­cumento lá dentro. Precisava de um descanso porque suspeitava que Hawke ia sugerir a retomada do ro­mance dos dois e a princesa não tinha a menor idéia do que lhe diria.

Melissa não aceitava o tipo de relacionamento que o empresário parecia ter com Danielle Sinclair. De alguma forma, precisava fazê-lo entender que não gostava daquilo. E se Hawke se recusasse a aceitar, teria que encontrar forças para mandá-lo embora. Marya apareceu à porta.

— Está tudo bem? — perguntou ela, ansiosa.

— Sim, Gabe só precisa de um documento em Londres.

Melissa entregou-lhe o envelope.

— Pode selar e enviar isso, por favor?

A empregada deu uma olhadela no envelope e sorriu.

— Claro.

Com a mente agitada por causa da mistura de espe­rança e temor, Melissa pegou o arquivo para guardá-lo. Uma fotografia caiu lá de dentro, virada para cima. A princesa abaixou-se e a pegou. Atordoada, quase caiu ao ver a imagem.

Hawke e Sara, a mulher com quem Gabe planejara casar-se. Melissa sentiu uma vertigem, ficou mal, teve frio. Ainda assim, não conseguiu conter as lágri­mas. Ambos nus. O empresário olhando o adorável rosto da moça, com desejo. E atrás, uma cama dossel com uma colcha vinho. Na parte inferior da foto, es­tavam impressas a hora — duas da manhã — e a data.

A foto caiu das mãos da princesa em cima da escri­vaninha. Melissa a pegou e a guardou no bolso. En­goliu em seco. Depois, colocou o arquivo de volta ao cofre e bateu a porta, com raiva.

Não era de se admirar que Gabe tivesse rompido o noivado com Sara. Como Hawke podia ter dormido com a noiva do amigo? Isso era nojento, uma traição! Mas o que mais a magoava era dar-se conta de que a foto tinha sido tirada no castelo de Hawke, horas de­pois de ela ter dançado com o empresário no baile de casamento de Marie-Claire.

— Burra! — murmurou

Agarrou-se às costas de uma cadeira e forçou-se a ficar em pé.

— Está sendo idiota.

Aquela dança não significara nada. Não tinha o di­reito de sentir-se traída. Mas o casamento tinha sido duas semanas após o anúncio do noivado de Gabe e Sara. A notícia deixara os colunistas de fofocas em polvorosa.

Hawke fora convidado para o casamento e se ofe­recera para hospedar Gabe e Sara, que passaram a véspera do casamento lá. Porém, o irmão de Melissa teve que deixar o sul da França naquela noite. Então, a cunhada ficou sozinha. Bem, não exatamente.

A princesa queria gritar, mas forçou-se a pensar. Como o irmão conseguira a foto? Deve ter sido tirada por um dos paparazzi que perseguira a família por algumas semanas depois do anúncio do noivado de Gabe com uma desconhecida decoradora. Em vez de publicar a foto, mandou-a para o grã-duque.

Chantagem? Não. O irmão não era o tipo de ho­mem a ser chantageado. E, se alguém quisera fazer isso, então, Sara era o alvo — tinha muito mais a perder. Mas quem quer que seja que tenha tirado aquela foto, sabia que o grã-duque pagaria para manter a imagem longe dos jornais.

— Oh, Gabe! — sussurrou, sentindo pena do ir­mão. Ele mantivera o orgulho, mas apenas a família sabia a que preço.

A princesa balançou a cabeça, tentando clarear a mente. A ex-cunhada era uma depravada idiota. Gabe realmente a amava. Estranho, quando Sara passou o mês seguinte ao escândalo do rompimento do noiva­do na propriedade de Hawke, na Inglaterra, Melissa pensara que o empresário tinha sido cortês com uma mulher indefesa com a imprensa que a seguia por to­dos os lugares.

Fechando os olhos, a princesa pensou em como foi inocente! Não havia dúvida de que Kennedy e Sara riram de como controlaram facilmente a situação...

Respirando fundo, a moça caminhou em direção à porta. Gabe colocara um ponto final no relaciona­mento dele com Sara, de forma bem clara. E a prince­sa tinha que fazer a mesma coisa — fazer com que Hawke entendesse que não havia lugar para o empre­sário na vida da jovem, não como namorado, nem mesmo como amigo. A lealdade a Gabe — e ao pró­prio orgulho — a deixara sem outro recurso.

Endireitou-se e ergueu a cabeça. No coração, era uma Considine, e merecia um homem no qual pudes­se confiar.

Tinha que tirá-lo do castelo. Gabe descobriria que o homem que fizera amor com a noiva dele estivera ali!

Precisou de todo o poder de resolução que possuía para atravessar o corredor, passar pelos retratos dos ancestrais, pelo grande vaso com flores que a moça colocara ali ontem quando pensara que não podia ser mais infeliz. Bem, estivera errada.

Do lado de fora da pequena sala de estar, a jovem parou e respirou fundo mais uma vez, rezando por co­ragem. Então, abriu a porta e entrou no recinto.

Hawke estava em pé, perto de uma das janelas, olhando para o pátio. Virou-se e a encarou.

— O que aconteceu? O que há de errado?

Melissa detestava a idéia de o empresário conhe­cê-la bem o suficiente para ser capaz de imaginar que o mundo estava caindo em cima dela.

— Nada. Só algo que Gabe esqueceu.

A voz da princesa soava monótona e cansada. Hawke atravessou a sala em silêncio, pegando as mãos frias de Melissa para confortá-la. Muito assus­tada para resistir, a moça sentiu-se aquecida quando o empresário a puxou para os braços dele e, gentil­mente, a manteve encostada ao corpo másculo.

O controle que a mantivera em pé havia acabado. Aquele homem era uma droga tão potente que lhe roubara as forças.

— Me diga — Kennedy pediu.

— Não há nada a dizer. Estou bem e Gabe tam­bém.

A princesa afastou-se, mas o empresário manteve as mãos nos ombros da jovem. Os olhares dos dois se encontraram, a tensão dentro dela crescia de tal modo que a jovem não conseguia se conter.

— Me diga e eu resolvo. O que quer que seja.

— Não há problema. Me deixe em paz, por favor! Hawke deixou depois que a sentou em uma ca­deira.

— Você precisa de alguma coisa — conhaque? — perguntou o milionário.

Como a moça deu de ombros, o empresário pegou o bule de chá.

— Mais chá, então — disse.

— Não ponho açúcar — a jovem comentou.

— Você precisa de algo que contenha o choque.

— Não estou em choque.

— Não parece.

Entregou-lhe a xícara. Melissa pegou o chá e fez uma careta por causa da doçura da bebida.

— Sei que está ruim, mas beba o máximo que pu­der. Parece que vai desmaiar a qualquer minuto.

— Isso não vai acontecer.

— Beba — Hawke ordenou.

E a moça obedeceu. Ele estava certo. Quando ter­minou de beber, a sensação pavorosa desaparecera. Afinal, por que deveria ficar tão estarrecida? Soubera o que Kennedy era quando deixara a Nova Zelândia. Não era nada de extraordinário.

Conhecera outros homens que pareciam acreditar que as mulheres eram lindas peças de decoração, não pessoas que podiam se machucar. Geralmente, usa­vam e descartavam amantes, mantendo a fachada de um casamento de conveniência. Os irmãos dela eram diferentes — mas talvez não, pensou. Talvez pensas­se que eram diferentes porque os amava. Talvez os dois também procurassem nada mais do que di­versão...

— Gostaria de saber em que está pensando — Hawke disse.

— Só estou pensando que esse chá está horrível — respondeu a princesa.

Que diabos acontecera? A moça estava calma an­tes do telefonema. Não acreditara no empresário quando este lhe disse que ele e Danielle eram apenas amigos. Mas algo acontecera enquanto a princesa estivera atendendo ao telefonema de Gabe. Algo que a despedaçara, sugando-lhe a cor da pele.

Hawke ficou assustado diante da própria reação de querer protegê-la tão intensamente. O empresário queria pegá-la ao colo e mantê-la segura, certificar-se de que nada daquilo acontecesse de novo.

A jovem ergueu a cabeça e os olhares de ambos se encontraram. A princesa estava furiosa. Que dia­bos o irmão lhe dissera? Não adiantava lidar com isso de forma sutil. Então, o empresário se aproxi­maria à força.

— O que Gabe lhe disse que a chocou tanto? — perguntou Hawke.

— Nada. Lamento quase ter caído em cima de você. Dormi mal a noite passada e devo estar mais cansada do que pensei, mas estou bem agora.

Melissa esboçou um sorriso irônico.

— Não se preocupe. Vou ficar com a taxa de açú­car alta o resto do dia.

A princesa se escondia atrás da armadura de corte­sia. Hawke lutou contra a tentação de estraçalhar aquilo tudo.

O que quer que fosse que tivesse mudado, aquilo não acabara. Por alguns segundos, a jovem ficara nos braços dele de forma tão doce, como se Hawke fosse tudo o que a princesa ansiasse. E ao sentir aquele per­fume feminino, percebera que o corpo se retesara com um perigoso desejo.

O empresário estava indo fundo demais. A semana que passaram juntos apenas afiara o desejo que Haw­ke sentia pela princesa, não o satisfizera. E, então, isso o acertara. Deveria haver outra razão para o des­maio.

— Está grávida? — indagou ele, sem qualquer de­licadeza.

— Não.

— Não estava tomando pílula...

— Usamos camisinha. De qualquer forma, não era a hora certa.

— Sabe que não há hora segura. E os preservativos falham.

— Não dessa vez.

— Se estiver grávida, me diga agora.

A princesa levantou-se, agora tranqüila.

— Não estou grávida. Obrigada por ter vindo me ver, mas não era necessário. Nós dois sabíamos que a semana que passamos juntos seria apenas um agradá­vel romance passageiro.

— Passageiro? É um comentário indelicado. Me faz sentir um idiota, pois gostei muito de você. E você deve ser uma excelente atriz porque, pela sua reação, presumi que também gostou.

Melissa voltou a ficar corada, mas manteve o olhar preso ao dele sem vacilar.

— Gostei. Foi apenas uma fantasia. Essa é a vida real. Não posso acreditar que esperasse que durasse. Essas coisas nunca duram.

— Pela encantadora "inocência", presumo que não seja a primeira vez que se entregou a um caso.

Hawke sabia que estava sendo intolerante. Uma parte do cérebro lhe pedia cautela, desejando saber se a razão para tanta raiva era porque estava sendo rejei­tado.

A princesa deu de ombros e desviou o olhar.

— O meu passado não é da sua conta, assim como não tenho nada a ver com o seu. Aceite isso, Hawke: acabou.

A jovem fez uma pausa. E como o empresário não respondeu, Melissa continuou:

— Presumo que esteja indo para a capital, para a reunião com Alex.

— Tenho negócios com o príncipe, mas não ime­diatamente. Gostaria de falar com Gabe enquanto es­tivesse aqui.

— Meu irmão não vai voltar antes de uma semana. Melissa o encarou. Algo dentro dela se incendiou.

O empresário viu o esforço da princesa para conter aquele desejo. Ela estava mentindo. Sabia disso. Ou a jovem estava grávida ou suspeitava estar. E embora tenha tentado, não conseguira convencê-lo de que lhe era indiferente.

— Normalmente, eu lhe pediria para ficar, mas vou embora amanhã — disse Melissa, com voz rouca.

Recuperou-se rápido, Kennedy pensou. O empre­sário queria beijá-la, senti-la nos braços dele. Mas, embora pudesse se render, isso não mudaria nada. Fi­cou frustrado com a intransigência da jovem.

— Nesse caso, claro, vou embora — despediu-se Hawke.

Melissa deveria sentir-se aliviada. Mas as palavras do empresário golpearam o coração da princesa. An­tes que desse uma resposta qualquer, Hawke pergun­tou:

— Tem alguém para cuidar de você caso passe mal novamente?

— Claro, há médicos no vale agora. E isso não vai acontecer de novo.

Porque a causa da fraqueza temporária estava ali em pé, na frente dela. Quando o empresário deixasse o castelo, a princesa ficaria melhor.

Ao mesmo tempo que queria que aquele homem fosse embora, lutava contra o desejo de que o empre­sário ficasse. Mais do que tudo no mundo, Melissa queria que Hawke a convencesse de que as coisas fi­cariam bem, de que nunca dormira com Sara. Ou com Danielle Sinclair. Ou com a bela atriz Lucy St James, que tinha sido infeliz o suficiente para tentar o suicí­dio quando Kennedy a deixou.

Mas esse tipo de coisa só acontecia nos contos de fada. Nada podia alterar a foto, assim como nada po­dia mudar o fato de que a princesa tinha ido contra todos os avisos, o próprio instinto, e se deixara seduzir por Hawke. O que isso fez dela? Uma perfeita idiota!

— Direi a Gabe que ligou — prometeu Melissa.

— Obrigado.

— Vou descer com você — disse a moça, indicando-lhe a porta.

— Não se incomode. Devo pedir para a empregada vir vê-la?

— Não, obrigada. Estou bem — respondeu, irrita­da. Pelo menos, o empresário aceitara a afirmaçãodela de que não estava grávida. Então, a princesa imaginou o filho deles — um pequeno garoto com o mesmo corpo forte do pai, pernas longas, pedalando um triciclo vermelho... Atônita, a moça piscou, e a imagem se desfez como se nunca tivesse existido.

Hawke a agarrou, perguntando:

— Que diabos você...?

Sacudiu-a de leve. Depois, quando a princesa o fi­tou como se estivesse desorientada, o empresário pe­gou-a ao colo è a carregou ate um sofá.

— Não vou embora até que venha um médico aqui.

— Não estou doente.

— Há algo errado com você.

Melissa fechou os olhos para impedir que o em­presário compartilhasse dos pensamentos dela. Po­rém, não podia ignorar os outros sinais que atacavam-lhe o corpo — o perfume inebriante, o calor do corpo, a força dos músculos que se dobravam contra a moça quando Hawke se mexia.

— Me deixe ir. Estou bem.

— Você tem duas escolhas. Ou Marya a coloca na cama ou eu faço isso. Decida.

— Não vai me dizer o que fazer na minha própria casa!

— Castelo. E não apenas vou lhe dizer, mas você vai fazer — avisou o empresário, levantando-se com a princesa ainda nos braços.

— Tudo bem! — Melissa sabia quando perdia. Se não deixasse Marya colocá-la na cama, o neozelan­dês faria isso. E a princesa não confiava nela mesma para ficar a menos de dez metros de uma cama com Hawke.

— Agora, me coloque no chão. Vai parecer um idiota andando pelos corredores à procura do meu quarto.

Kennedy sorriu e a beijou.

— Por que eu faria isso?

Colocou-a no chão, embora mantivesse um dos braços ao redor dos ombros da moça.

— Chamaria a criada e lhe diria para me levar lá.

— Marya não faria isso.

Mas a princesa suspeitava que a governanta, de­pois de olhar para Hawke, faria qualquer coisa que o empresário quisesse.

— Quer apostar?

Hawke puxou a sineta usada nos tempos dos avós de Melissa. A criada devia estar rondando por ali por­que apareceu logo à porta, os olhos negros interessa­dos ao ver Hawke abraçando a princesa. Não que pa­recesse surpresa. Às vezes, Melissa desejava saber se Marya era desse mundo.

Sem levantar a voz, Kennedy falou devagar em in­glês.

— A princesa está indisposta. Precisa descansar. Marya reverenciou o empresário e virou-se para Melissa.

— Pode andar? — perguntou a senhora à princesa, no idioma local.

— Claro que posso — respondeu a moça, desespe­rada para livrar-se de Hawke.

Mas não teve chance. Kennedy voltou a pegá-la nos braços. Marya sorriu, conduzindo-o para fora da sala, encaminhando-o ao elevador que os levaria até o quarto da princesa, na torre.

Uma vez lá, o empresário colocou a jovem no chão, examinou-lhe o rosto e, depois, o quarto.

— Encantador. Foi você quem o decorou?

— Não — respondeu Melissa. Marya interveio:

— Sua Excelência fez isso no aniversário da prin­cesa.

— Quem quer que tenha feito a conhecia. Combi­na com você — comentou Hawke.

Melissa adorava o quarto, mas o achava romântico demais para a sua prosaica alma.

— Longe disso. Meu irmão chamou um decorador que veio de Londres.

A princesa forçou-se a olhar Hawke. Mesmo di­zendo palavras de pouca importância, o patético cé­rebro da jovem estava memorizando tudo sobre o em­presário, desde os olhos verdes até a sensual boca.

— Mas, bem, obrigada. Lamento que a visita tenha sido improdutiva. Direi a Gabe que queria vê-lo.

— Não se preocupe. Vamos nos encontrar em ou­tra oportunidade conveniente para nós.

Hawke acenou com a cabeça e encaminhou-se para ir embora. Marya começou a segui-lo, mas o empresário lhe avisou:

— Cuide de Melissa. Posso encontrar a saída so­zinho.

— Vá — disse a moça, no idioma local, enquanto o empresário saía. — O sr. Kennedy vai se perder — avisou a princesa à governanta.

Marya sorriu e o seguiu. A jovem ficou no quarto, escutando o som de um helicóptero levando-o para fora da vida dela para sempre.

 

CAPÍTULO OITO

Ao som dos motores do helicóptero, Melissa deixou-se relaxar, não tentando enxugar as lágrimas.

— O Senhor Kennedy vai voltar — disse Marya, no idioma da Ilíria, por detrás da porta.

— Não dessa vez.

A governanta se aproximou.

— Por que o mandou embora?—Marya perguntou. Melissa teve que se conter ao lembrar-se daquela maldita foto. Sentira-se mal. Um fotógrafo idiota manchou todos os sonhos dela. O que era ridículo porque, na verdade Hawke e Sara é que fizeram aquilo.

— Ele não foi honesto — disse a princesa. Marya observou o rosto da jovem.

— Mas você o ama.

— Eu lhe quero. Vou superar isso. Não conte a Gabe.

— Que o sr. Kennedy veio?

— Eu mesma contarei ao meu irmão.

— Mas não que o ama e o mandou embora? Melissa balançou a cabeça, concordando. Melhor deixá-la pensar que era um romance que dera errado, em vez de uma semana de paixão que agora se trans­formara em um caso sórdido.

— Não direi ao seu irmão porque não é da conta dele — prometeu a governanta.

Melissa sorriu.

— Conhece Gabe, faria com que fosse assunto dele. — E já sofrerá o suficiente nas mãos de Hawke.

A velha senhora comentou:

— Seus irmãos e esse homem são fortes. Melissa desejou saber se a força de Gabe já havia sido usada contra uma mulher. Sempre se refugiara no irmão. Ainda assim, sentia que Gabe podia ma­chucar tanto quanto proteger.

Ao menos não tinha o caráter falho de Hawke, a princesa pensou, engolindo as lágrimas ameaçado­ras. Tirando o fracassado noivado com Sara, Gabe nunca tinha se envolvido em um escândalo. Tivera romances, mas parecia ter jeito para permanecer ami­go das amantes.

A foto de Sara nos braços de Hawke queimava nas retinas da jovem. Quando fechava os olhos, podia vê-la tão claramente que receava nunca ser capaz de li­vrar-se dela.

— Tenha cuidado — disse Marya. — O Senhor Kennedy está acostumado a conseguir as coisas do jei­to dele e não creio que se renda a qualquer contestação.

Melissa sentiu um frio na espinha.

— Não será um problema.

Afinal, nunca dissera nada sobre amá-la. O cora­ção dele estava armado contra tal emoção. Sexo era algo diferente. E se o interpretara mál, o orgulho o deteria. Não voltaria depois de ser dispensado pela princesa. Hawke podia ter mulheres lindas, ricas e in­teligentes. Por que se incomodaria com Melissa?

A menos que a rendição da princesa satisfizesse algum desejo doentio dele em dormir com a mulher de um homem que via como um inimigo. Mas por quê? Será que Gabe o vencera em alguma batalha co­mercial?

— Vou lhe trazer uma bebida quente. Sente-se e recomponha-se — ordenou a governanta.

— Obrigada.

Sozinha novamente, Melissa ouviu o barulho do helicóptero. Será que o romance deles tinha sido uma questão de vingança? Será que Gabe ganhara de Hawke em alguma transação comercial? E será que Hawke era o tipo de homem que usaria a irmã de um inimigo para dar o troco?

— Não — disse em voz alta. Provavelmente não. O coração se contraía de dor enquanto os motores do helicóptero rugiam, ganhan­do força para a decolagem. Da janela estreita, a prin­cesa viu o helicóptero voar em direção ao céu azul, levando consigo toda a alegria e o prazer.

— Bons ventos o levem — Melissa murmurou. — E você não está apaixonada por aquele homem.

O amor precisava de tempo para crescer, amadure­cer, estabelecer laços entre duas pessoas — tempo que não tiveram.

Percebera que seria perigoso revelar-se demais para o empresário. O bom senso pedia para ela se proteger. Mas, em vez disso, a jovem deixara que a atração entre os dois a convencesse de que Kennedy era um homem honrado e íntegro. Será que ao reco­nhecer essa dor no coração, como um desejo mera­mente sexual, logo afastaria aquela sensação?

Naquela noite, a moça ficou acordada até tarde, fingindo que lia, para resistir à vontade de ir olhar a foto novamente à procura de sinais de falsificação. Permanecia escondida na gaveta da cômoda.

Os olhos dela não a enganaram. Os dois amantes eram Hawke e Sara. E Gabe teria contratado especia­listas para analisarem a foto. Se precisasse de mais provas, bastava lembrar-se de que Sara ficara com Hawke depois do noivado arruinado.

Indo para a cama, Melissa disse:

— Isso apenas mostra o quanto você foi imatura. Mais inocente do que uma colegial — e estúpida! Agora, teria que aprender a viver com a própria in­sensatez.

Melissa acordou no dia seguinte com dor de cabe­ça. E, relutante, concordou em tomar o café da manhã na cama. Sabia que Marya se preocuparia.

Depois que a princesa comera uma torrada e bebera duas xícaras de café, Marya apareceu à porta.

— Está se sentindo melhor?

— Vou me sentir se tomar ar fresco. Vou andar a cavalo.

— Boa idéia! — aprovou a governanta.

Levou um tempo, mas antes de deixar os campos do vale e seguir pela trilha rumo às montanhas, a palpitação diminuíra.

O badalar distante de sinos de igreja a lembrava de que era domingo. A jovem parou a égua, para ouvir, o alegre dobre dos sinos.

A moça olhou o castelo, desafiador no escarpado acima da terra fértil. As últimas folhas de parreira que cobriam as paredes de pedra tinham se transfor­mado em espectros amarronzados e esvoaçavam até o chão. Logo seria inverno. A neve cobriria os cam­pos e os céus queimariam em um azul tão brilhante que faria os olhos da princesa se encherem d'água. Antes, nevascas longas fechariam a passagem nas montanhas que conduzia ao resto da Europa.

Pelo menos, ninguém receava morrer de fome agora. Todos sabiam que Alex, Gabe e Marco iriam se certificar de que ninguém passasse necessidade. E tinham maquinário para aumentar a produção de ali­mentos nos campos, um hospital para cuidar dos doentes e estradas melhores.

E esse era o futuro dela; não chorar feito uma don­zela vitoriana por causa de um cafajeste que a seduzi­ra e a traíra. Tinha um trabalho a fazer ali, uma dívida a pagar àquelas pessoas cuja lealdade lhes custara tanto.

O turismo mudaria a vida de todos. A princesa es­perava que fosse para melhor, promovendo empre­gos, habilidades e opções que as pessoas dali nunca tiveram. Mas, com a crescente sofisticação, também perderiam algo.

Esperando que os ganhos superassem as perdas, Melissa puxou de leve a rédea. Não deixaria que a es­tupidez comandasse a vida dela. Tudo bem, tivera um romance com um homem que mostrara não ter valor. Então, tinha que superar isso.

— O que foi, garota, qual o problema? — pergun­tou, inclinando-se para afagar o pescoço da égua. O animal estava agitado e sacudiu a cabeça. Depois, deu alguns passos pela trilha rumo ao menir.

Os sinos da igreja pararam. E o silêncio reinava em volta. Melissa sentiu-se desconfortável, mas não cederia àquele medo irracional.

Muitas vezes, ouvira o pai descrever a sensação de isolamento na trilha, contando-lhe que isso se devia ao fato de que um ancestral, a rainha, guardava o ve­lho caminho, ainda observando em espírito o vale e os descendentes dela. Talvez estivesse certo. Marya pensava isso também.

— Então, se me trouxe aqui, talvez pudesse me mostrar agora como esquecer esse homem! — disse a princesa em voz alta.

Melissa conteve a respiração. Mas, claro, nada aconteceu — nenhuma luz, nenhuma visão como a que tivera ontem — a pequena imagem do filho de Hawke.

O empresário, talvez, nunca fosse dela. E, por al­guns segundos, a princesa lamentou por uma criança que nunca seria concebida. Essa queixa piegas não a ajudaria a esquecer Hawke!

A égua continuou, subindo a trilha como se tivesse um objetivo em mente — a fonte na clareira onde o menir mantinha a antiga vigilância. Depois de beber água e comer um pouco de grama, o animal permane­ceu quieto quando Melissa o amarrou a uma árvore.

Dessa vez, a princesa certificou-se de que não to­caria o menir, mas as palavras de Hawke sobre o peso da história soavam nos ouvidos dela. Quem arrastara aquela pedra até ali durante todos os milhares de anos? Que cerimônias misteriosas tinham sido reali­zadas ao redor do monumento? E por que uma rainha tinha se aventurado por ali com um tesouro de rubis? Somente para encontrar a morte naquele local?

Melissa desejava paz. Em vez disso, sentiu como se estivesse enfrentando o maior desafio de sua vida.

Ficou em alerta. Mal conseguia respirar. Nervosa, sentiu um nó na garganta.

Devagar, virou-se, e lá estava Hawke — ao lado da égua, uma das mãos no pescoço do animal — observando-a. Nenhum músculo se mexia no rosto do ho­mem. E o olhar dele se fixou na princesa. Melissa sa­bia que se corresse, Kennedy a pegaria.

O empresário veio na direção da jovem.

— Princesa!

— O que faz aqui? — perguntou a moça.

— Esperando por você.

O coração de Melissa acelerou. Hawke falara sé­rio. A princesa podia ver isso na expressão resoluta do empresário.

— Por quê?

Parando bem em frente à moça, Hawke respondeu:

— Porque não acredito que tenha dito a verdade. Vou levá-la para a França para me certificar se você está grávida ou não.

— Mas eu lhe disse que a minha menstruação veio há três semanas! E não tenho que lhe provar nada. E mesmo que não tivesse certeza de que não estou grá­vida, que importância tem isso?

O empresário a olhou com desprezo. A carga do menir contra as costas da princesa a gelou, deixando-a em choque antes que a moça se mexesse e se sentis­se livre.

Hawke a agarrou. Por um momento, Melissa pen­sou que o empresário a sacudiria, mas os dedos dele afrouxaram e Kennedy a soltou.

— Tem importância. Se você está carregando um filho meu, quero participar do futuro dele.

— Não estou grávida! Que coisa!

— Então, por que está assim?

Melissa não diria por nada como o menir a afetara. Hawke pensaria que a princesa estava louca. Contu­do, naquele momento, isso até que não seria uma coi­sa ruim. Furiosa, a jovem disse:

— Não estou nada! Você me assustou, aparecendo feito um demônio de dentro da floresta!

Depois, amedrontada porque a proximidade da­quele homem afetava-lhe os sentidos, a moça falou:

— Hawke, me ouça, por que eu mentiria para você?

— Porque sabe que a sua gravidez é algo no qual me sinto envolvido — explicou.

A princesa gritou.

— Que diabos...! — O empresário também explo­diu.

— Meu cavalo! Foi embora! — A jovem disse por trás dele.

O empresário virou-se e segurou-lhe um dos bra­ços.

— Já está no caminho de volta à casa.

— Você soltou a égua?

— Sim.

Melissa tentou puxar o braço, mas o empresário a levou para perto das árvores. A princesa protestou:

— Nem todos os animais encontram o caminho de casa. A égua pode parar em qualquer lugar!

— Esse encontra.

— Como sabe?

— Vai se sentir melhor se eu sobrevoar a trilha de forma que possa ver por si mesma?

— Voar?

— Não pretendo forçá-la a caminhar pela monta­nha. O helicóptero está ali, no meio das árvores.

— Isso é loucura! Nunca vou perdoá-lo. Gabe e Marco também não. E, se eu estiver grávida, vou lhe contar.

— Não confio em você.

Era isso. O empresário não confiava nela, então, decidira raptá-la.

— Você é um canalha arrogante — disse a moça, rangendo os dentes.

— Tão arrogante quanto você.

Desconcertada, a jovem o olhava com ar ameaça­dor. A moça não sabia como lidar com aquele ho­mem. Deveria estar amedrontada, porém sentia que Hawke não lhe faria mal.

A mente lhe dizia que o comportamento dele era ultrajante. Entretanto, era impossível render-se à indignação quando todas as células do corpo reagiam a uma atração perigosa, à força de tanta masculinidade.

— Não sei o que espera ganhar com isso — res­pondeu a princesa.

Hawke deu de ombros e a conduziu a uma clareira, onde um helicóptero estava pousado. Melissa procu­rou pelo piloto, mas não havia ninguém mais ali.

— Você está pilotando o helicóptero? — indagou a jovem.

— Sim.

— Se eu não voltar, Marya vai entrar em contato com Gabe.

— Ela sabe onde você está. Arrumou suas coisas.

— O quê?

— Ela acha uma boa idéia.

— E eu suponho que Marya lhe disse que eu tinha vindo para cá. Deve ter ficado louca.

— Me pareceu uma mulher muito astuta.

Ao menos, alguém sabia onde a princesa estava. E Gabe estaria de volta em uma semana. Assim que chegasse à Toca do Lobo, o irmão a traria de volta.

Melissa viu a oportunidade de fugir quando o em­presário a deixou para que pudesse abrir a porta do helicóptero. A moça esperou até que Hawke ficasse de costas. Então, virou-se e correu em direção às ár­vores.

O grito dele parecia perto demais. Com o coração batendo forte, a princesa aumentou a velocidade, forçando as pernas a correrem mais rápido. À frente, viu uma claridade. Tarde demais. Lembrou-se do roche­do íngreme e da cachoeira.

Braços fortes a laçaram e a levaram ao chão. Por algum milagre, Hawke conseguiu ficar por baixo da jovem, rolando de costas para que a queda só o atin­gisse, mas a moça permanecia arfando, enrolada nele.

Com a pulsação acelerada, a princesa ouviu a bati­da forte do coração do empresário contra o rosto dela. Os braços daquele homem estavam tão apertados ao redor da jovem que Melissa mal podia respirar. E, embora soubesse que Hawke estava furioso, nunca se sentira tão segura.

— Idiota! Que diabos pensou que estava fazendo? Há um penhasco cerca de 20 metros à frente.

— Eu esqueci.

O empresário sentou-se, protegendo-a.

— Eu a assustei tanto assim?

— Não. Estou irritada. Não tem o direito de voar até aqui e me arrastar para certificar-se de que não es­tou grávida!

A moça ficou com a boca seca ao perceber que o olhar do empresário queimava.

— Não tem o direito! — repetiu. — Que droga! Com o olhar preso ao dela, o empresário balançou a cabeça como se quisesse clarear as idéias.

— Não tive a intenção...

Melissa mexeu-se e o corpo de Hawke se contraiu. Depois, o empresário gemeu. Então, abaixou a cabe­ça e a beijou, a boca quente e determinada. Melissa o beijava com fervor. Os lábios de Hawke percorreram o pescoço da jovem.

— Me diga para parar — disse a ela.

Confusa com as sensações tumultuadas que cla­mavam pelo corpo, a moça disse com a voz entrecortada:

— Pare!

Mas poderia ter implorado.

— Por favor...

O tom da voz a traiu, transformando aquelas palavras em um apelo. Kennedy ergueu a cabeça e a fitou. Ele compreendeu que a última coisa que a moça que­ria era que parasse.

— Por favor, para beijar você? Fazer amor? — perguntou Hawke.

A princesa balançou a cabeça, concordando, por­que se o empresário não fizesse amor com ela agora, a jovem morreria frustrada. Hawke tirou a blusa da princesa, deixando-a apenas de sutiã. Melissa estre­meceu; as mãos dela ocuparam-se com os botões da camisa do milionário. Depois, beijou-o no pescoço, acariciando-o com a língua.

O corpo do empresário se enrijeceu. Hawke bei­jou-lhe um dos mamilos por cima do sutiã. Um prazer louco a fez arfar e se agarrar a Hawke, o corpo arqueado em direção ao calor e ao poder daquele ho­mem.

Melissa ansiava pelo êxtase que o empresário lhe proporcionaria. E, embora o cérebro protestasse, o corpo assumia o comando. A moça deslizou as mãos por baixo da parte da frente da camisa aberta e pu­xou-o para que os quadris do homem tivessem um contato mais íntimo com os dela. Uma sensação deli­ciosa tomou conta de Melissa diante da pressão do corpo dele contra a parte mais sensível da anatomia feminina.

Sempre havia antes uma gentileza que a moça que­ria acreditar ser ternura — um momento de uma lon­ga e tentadora sedução. Mas, dessa vez, isso não aconteceu. Como conseqüência do perigo que corre­ram, ambos se comportaram como selvagens, rasgan­do a roupa no desespero de ficarem livres até que, fi­nalmente, se uniram em uma paixão afoita.

Melissa logo arqueou o corpo. O grito rouco a sur­preendeu quando o êxtase a inundou, lançando-a cada vez mais alto até que a jovem gemeu, cheia de plenitude.

Hawke a seguiu na direção daquele lugar de êxta­se. E, depois, voltaram à doce sensação de liberdade.

— Me desculpe — disse a princesa.

O magnata sabia o porquê do pedido de desculpas.

— Eu também peço desculpas. Não teria gritado se soubesse que você iria correr ainda mais rápido. Por que não representa a Ilíria nas Olimpíadas?

Os braços dele a apertaram, mas apenas por um se­gundo. Afastando-se, rolou por cima da cama feita com as roupas dos dois no chão e olhou para os ga­lhos escuros das árvores acima deles.

— E agora, fizemos amor sem camisinha. Naquele momento, a princesa não se importou com isso. O corpo dela estava satisfeito demais, rela­xado, com um prazer apaixonante.

— Não é o período certo do mês.

— Talvez. Porém, isso resolve — disse o empresá­rio, virando a cabeça para fitá-la com um olhar frio, distante.

— Resolve o quê? — indagou a princesa.

— Você vem comigo para a França e vai ficar até que tenhamos certeza.

— Acredite em mim. Se estiver grávida, deixarei que saiba. Não é preciso isso.

— Vista-se — ordenou o milionário.

 

CAPITULO NOVE

Melissa teve que dizer.

— Há a pílula do dia seguinte.

— É isso que quer? — perguntou Hawke.

— Não. Me desculpe, mas...

A jovem fechou os olhos, desejando ser guiada pelo instinto. Mas não era assim. Tinha que viver com os resultados das próprias ações, fora irrespon­sável. Apesar disso, não tolerava o pensamento de re­jeitar uma criança. A princesa concluiu:

— Não gostaria.

— Isso, não é problema.

O empresário sentou-se e pegou a camisa.

— Vamos. E se tentar correr novamente, vou amarrá-la.

— Não tenho força.

— Moleza é outro sintoma de gravidez.

— Não estou grávida.

— Está tomando pílula?

— Não.

— Então, é bem possível que esteja, por causa do que aconteceu minutos atrás. Vista-se ou farei isso por você.

Sem vontade, a moça se rendeu. Já estavam perto do helicóptero quando a princesa perguntou:

— O que pretende fazer se houver algum... pro­blema?

— Veremos o que fazer se isso acontecer. Mas lhe digo que não tenho a intenção de ser um pai ausente. Sendo possível, crianças devem viver com ambos os pais.

Pelo menos, Melissa entendeu o porquê de Hawke estar agindo daquela forma. Não pela princesa, nem por uma possível criança que viesse. Mas para satis­fazer o garotinho que crescera na Baía das Ilhas, es­perando pelo pai que aparecera tarde demais.

— Entendo — disse a moça.

Até então, a jovem esperara que o empresário ti­vesse sido incapaz de viver sem a princesa. Que, em algum lugar, sob ó glorioso brilho e o fogo da paixão, houvesse algo que servisse de base para o amor.

Em vez disso, o milionário apenas se certificava de que nenhum filho seu seria criado como ele, an­siando por um pai. A princesa entendia a necessidade de Hawke em assumir a responsabilidade por um fi­lho dele, mas será que não via a contradição? A mãe tinha sido abandonada depois de um romance rápido, mesmo assim o neozelandês não parecia importar-se com os corações que quebrara.

Apesar disso, aquela imagem do menininho a impediu de qualquer protesto. Em breve, dentro de alguns dias, a moça seria capaz de provar-lhe que não estava grávida. Tudo o que tinha a fazer era agüentar alguns dias.

Hawke pilotava o helicóptero com a habilidade e a confiança de quem tinha uma longa experiência, voando acima do penhasco de forma que o vale pare­cia um desenho de um livro de contos de fada. Um momento mais tarde, o empresário tocou em um dos braços da princesa, mostrando-lhe a égua marchando em direção ao castelo. Um dos cavalariços saíra de dentro dos estábulos e, enquanto o observavam, o passo do animal acelerou.

— É surpreendente quanto poder torrões de açúcar têm sobre os cavalos.

Mesmo com os fones de ouvido, o tom de voz seco de Hawke fez Melissa sorrir enquanto o helicóptero girava e subia a montanha. Somente na fronteira, os dois se transferiram para um jatinho particular — pi­lotado por um profissional.

Enquanto isso, pensou na foto que encontrara nos arquivos de Gabe. Isso a aborreceu, machucando-a pelo erotismo explícito. Não se permitiria amar um homem que dormira com a noiva do irmão. Ainda as­sim, acabara de transar com o empresário, e fora ótimo.

Será que essa confusão era pelo fato de Hawke ser o seu primeiro amor? Assim, não tinha nada com o que comparar?

A boca relaxou em um sorriso sensual que logo de­sapareceu. Claro, era a especialidade de Hawke arra­sar corações e por isso mesmo foi um amante per­feito.

Ao pensar nele e na noiva de Gabe juntos, a moça sentiu náusea. Ainda assim, tinha que admitir que o empresário a fez sentir-se uma mulher bem-amada. E a levara a alturas que pensara existir somente nos livros.

Julgando pelas experiências das amigas, isso era uma coisa rara. A moça queria saber se era por isso que o achava tão irresistível. Pela primeira vez, sen­tia-se apaixonada. Olhando a paisagem que mudava abaixo, a princesa tentava colocar em ordem os pen­samentos confusos.

— Em que está pensando? — O perguntou Hawke.

— Nada — a princesa respondeu, automatica­mente.

— Espero que não esteja preparando mais uma fuga. Não terá oportunidade.

— Espero que não planeje me manter prisioneira.

— Na verdade, pretendo sim. Vai passar a próxi­ma semana tão perto de mim que nada vai nos sepa­rar. Vai comer, nadar, velejar, cavalgar e dormir co­migo até que possa me mostrar que não está grávida.

Seria uma tortura forçá-la a uma intimidade tão grande com aquele homem, sabendo o tempo todo que Hawke fora amante de Sara. Melissa engoliu em seco e comentou:

— Prefiro que me tranque no calabouço.

— Esse tipo de coisa acabou na época da Revolu­ção Francesa. Não sou um déspota medieval.

— Se insistir em um contato tão próximo, vai fazer com que eu acabe grávida.

A jovem ficou vermelha e virou á cabeça, fixando o olhar na paisagem abaixo. O empresário ficou em silêncio por tanto tempo que a moça pensou que Kennedy tivesse decidido ignorá-la. Ao final, o empresá­rio admitiu:

— Você está certa. Dormirá sozinha. A moça mordeu os lábios.

— Por que não acredita em mim?

— Princesa, você não é tola. Então, não finja que é. Na Nova Zelândia, você era o símbolo da boa saú­de. Sua palidez no castelo me alertou de que algo acontecera. E mesmo que não estivesse grávida, mi­nha perda de controle na montanha aumentou as chances.

Melissa manteve o rosto virado para a janela de forma que Hawke não pudesse ver a fisionomia sobressaltada dela. O tom de desprezo na voz do ho­mem revirou o estômago da jovem.

Inesperadamente, o empresário acrescentou:

— Descobri que alguns instintos vão além da ra­zão. Me desculpe.

— Não foi inteiramente responsável — retrucou a princesa.

Em uma situação similar, será que teria feito amor com qualquer mulher? Provavelmente. Tinha que continuar dizendo a si mesma que não o conhecia. O homem que a fascinara na Nova Zelândia não era o real Hawke Kennedy. O verdadeiro era um mulhe­rengo.

O que quer que fosse, não haveria futuro para os dois. Apesar de amar muito Hawke, não poderia se casar com alguém em quem não confiava.

E, depois de ver aquela foto, como poderia acredi­tar nele? Melhor cortar tudo já. Mas, antes, tinha que ficar alguns dias perto de Hawke até provar que não carregava nenhum filho dele. Sem dúvida, a princesa seria capaz de fazer um teste de gravidez assim que chegassem ao castelo. E, hoje em dia, os testes eram tão precisos que podiam dar a resposta poucos dias após a concepção.

Depois, a princesa iria embora e voltaria à vida normal. As últimas semanas tinham sido uma aberra­ção, um conto de fadas maluco, cheio de sexo, drama e emoções fortes. Certamente, um dia, a jovem seria capaz de ver a foto de Hawke no jornal sem sentir esse desejo incontrolável.

O avião pousou no aeroporto de Cannes. Hawke era uma celebridade ali. Não ficou surpresa quando apresentou o passaporte da princesa com o dele. O empresário também falava francês muito bem. Assim como os irmãos, a jovem era fluente em três línguas — inglês, francês e o idioma da Ilíria. Também con­seguia se fazer entender em espanhol e em alemão. Mas esperava que Hawke fosse como muitos falantes de inglês, incapazes de conversar em qualquer outro idioma a não ser o próprio. Bem, se equivocara sobre isso, assim como em muita coisa em relação ao em­presário.

Lá fora, uma limusine os aguardava. Melissa nun­ca estivera no castelo de Hawke embora tivesse visto fotos — uma série de pedras, cor de mel, do século XVI, em meio a jardins repletos de flores. Mas agora, conforme se dirigiam ao castelo, a princesa percebeu que as fotos falharam por completo pois não transmi­tiam a idéia de como o local era realmente. As pare­des de pedra podiam ser um sonho à beira do azul do Mediterrâneo, mas tinham sido construídas para de­fesa. No passado, o castelo repelira salteadores e ini­migos. Assim como a Toca do Lobo.

— Mora aqui? — indagou a princesa.

— Durante três meses no ano, sim. Mas sou neoze­landês. Passo o máximo de tempo que posso em casa.

O carro passou por portões flanqueados por torres de pedra. Embora não houvesse segurança pessoal ao redor, a moça sabia que a chegada deles fora observa­da e sufocou um certo desapontamento por não ter a liberdade de que desfrutara quando estivera na Nova Zelândia.

— Bem-vinda — disse Hawke, conforme subiam as escadas rumo à porta da frente.

A princesa ia responder quando a porta se abriu e um homem se encaminhou majestosamente em dire­ção aos dois. A vestimenta e o jeito indicavam que se tratava do mordomo.

Juntos, entraram no luxuoso castelo. A sobriedade original do lugar era escondida por painéis e chãos de parquete, candelabros e tetos magnificamente mol­dados. Melissa avistou a monumental escadaria em mármore no corredor principal.

Então, tinha sido ali que Sara ficara — com Gabe, na véspera do casamento de Marie-Claire, e com Hawke na noite seguinte. Mantendo os olhos longe do homem ao lado dela, a princesa desejava ter sabi­do da foto antes de concordar em passar aquela sema­na na casa de praia do neozelandês. Se soubesse, teria deixado a Baía das Ilhas no dia em que o magnata chegara e nada daquilo teria acontecido. Com o tem­po, esqueceria que se incendiava quando aquela boca cínica, amoral, tomava a dela...

O mordomo mencionou que havia mensagens ur­gentes para o amo. Hawke franziu as sobrancelhas. Depois, virou-se para Melissa e disse:

— Não vou me demorar, Seu quarto a espera. Tal­vez queira descansar.

— Obrigada — respondeu a princesa.

Hawke se afastou rapidamente.

— Por aqui, Sua Alteza — murmurou o mordomo à princesa.

Sua Alteza! A moça achava que ninguém, além do povo da Ilíria, estaria interessado no novo status da jovem. Estava errada de novo. Esticando a coluna, subiu a esplêndida escadaria do século XVIII junto com o mordomo.

O quarto era grande e suntuosamente bem decora­do, com uma combinação perfeita de peças modernas e antigüidades de valor incalculável. Melissa olhou em volta. Na parede oposta à janela, havia um qua­dro, uma pintura de um dos mestres impressionistas. A jovem a reconheceu imediatamente. E não preci­sou ver a coberta vinho, em cima da cama, para saber que estava no quarto onde Sara dormira.

Um desespero ultrajante tomou conta da princesa. Será que esse era o quarto reservado às amantes? Será que Danielle dormira ali também? Melissa teve que se conter para não fugir. Só a idéia de tentar ex­plicar ao mordomo o horror que sentira já a detivera. Pensou! Para ganhar tempo, caminhou até a janela. Sentiu um certo alívio ao ver as montanhas. Virando-se, a princesa disse, com doçura:

— Oh, que pena! As montanhas são maravilhosas, claro, mas esperava ver o mar.

O mordomo abriu bem os olhos.

— Certamente. Se Sua Alteza esperar aqui um mo­mento, vou lhe mandar o chá e ter outro quarto prepa­rado.

A jovem bebia o chá aos golinhos quando Hawke entrou.

— Lamento que não tenha gostado do quarto. A jovem pousou a xícara e comentou:

— Só mencionei que gostaria de ter vista para o mar.

— Pensei que as montanhas pudessem lembrá-la da sua casa.

— Se for inconveniente, então...

— Não é inconveniente.

Sentiu-se aliviada embora estivesse tentada a con­frontá-lo, a lhe dizer que sabia tudo sobre ele e Sara. Mas a lealdade a Gabe a proibia.

— Não reajo bem a ameaças — respondeu ela.

— Ameaças?

— Você ameaçou me prender aqui.

Hawke suspeitou que a princesa o estivesse provo­cando. Seria uma punição por aqueles loucos mo­mentos nos braços dele em Ilíria?

Ao crescer com um pai cuja inteligência quase em­parelhava com a falta de disciplina, fizera com que Hawke tivesse um vigoroso desprezo por qualquer pessoa incapaz de controlar-se. Ainda assim, a prince­sa Melissa Considine o tirava do sério, toda vez que sorria. Ou que caminhava, com aquele sedutor vaivém dos quadris. Ou quando dizia algo com aquela voz que se tornava rouca e ansiosa quando excitada...

Mesmo agora, com a possibilidade de uma gravi­dez, o empresário podia sentir a tensão sensual ar­dendo entre os dois. Tinha que se conter para não atravessar o quarto e arrastá-la daquela cadeira e lhe dar um beijo selvagem. Kennedy a desejava muito.

— Pedi um teste de gravidez — disse ele.

— Obrigada — agradeceu a princesa. O mordomo apareceu à porta.

— O quarto da madame está pronto. Melissa levantou-se.

— Obrigada — disse, sorrindo para o mordomo, que a reverenciou e saiu do quarto depois de um ace­no de cabeça do patrão, dispensando-o.

— Vou levá-la até lá — avisou Hawke.

O novo quarto era na parte velha do castelo. Obe­diente à desculpa que usara para solicitar a troca de quarto, Melissa foi à janela e viu o mar abaixo.

— É lindo.

— Fico contente que goste.

O empresário deu uma olhadela no relógio.

— Tenho uma reunião que não pode esperar. Mas vou me encontrar com você dentro de uma hora. Aí, poderemos caminhar pelos jardins. Se quiser tomar uma chuveirada, o banheiro fica atrás daquela porta ali. Uma criada vai desfazer sua bagagem.

— Tudo bem — assentiu a princesa.

O pequeno banheiro, fora do quarto, era de már­more rosa e creme. Melissa suspirou aliviada, deixando que os músculos relaxassem da tensão que consumira ambos desde que a princesa o vira à espera dela, na montanha. A moça passou um bom tempo embaixo do chuveiro, lavando-se até se sentir livre do toque, do domínio que aquele homem exercia so­bre as emoções e os sentidos dela.

De volta ao quarto, a bagagem desaparecera. A moça abriu a porta de um armário e inspecionou as roupas que Marya colocara na mala para a princesa. Tudo o que podia precisar para uma semana. A prin­cesa, então, pegou a bolsa de mão para ver se tinha dinheiro.

Encolheu-se ao sentir as pontas dos dedos tocarem uma superfície lustrosa — a foto, pensou. Bem, na próxima vez que Hawke a tocasse, a jovem se lem­braria disso e o desejo se transformaria em repulsa.

A princesa escolheu uma calça branca e uma blusa de tecido fino ocre. Sandálias da mesma cor comple­taram o traje. Mirou-se no espelho e decidiu que nin­guém podia acusá-la de vestir-se para seduzir.

Afastando-se do espelho, a moça permaneceu in­decisa. O olhar percorreu a parede do quarto, as pe­dras antigas quase cobertas por uma esplêndida tape­çaria. Esse quarto era mobiliado de forma mais anti­ga do que o anterior que a princesa rejeitara. Aquele cômodo a fazia lembrar-se do castelo em Ilíria.

Depois de observar a magnífica cama, Melissa franziu as sobrancelhas ao perceber o contorno de uma porta no painel de madeira. Um closet?  Não pa­recia. O armário era grande o suficiente para abrigar um guarda-roupa inteiro.

A jovem atravessou o quarto e tentou puxar a ma­çaneta. A porta se abriu. Conduzia a outro cômodo. Franziu as sobrancelhas ao olhar a cama, um comple­mento da que estava no quarto dela, e a pedra curva da parede em frente. O coração da moça acelerou.

Melissa gelou ao ver Hawke com uma toalha enro­lada nos quadris. O brilho de umidade nos ombros largos indicava que o empresário também tomara uma chuveirada.

A princesa deve ter feito algum movimento invo­luntário porque o magnata virou-se e a viu à porta.

— Entre se quiser — disse, jogando a toalha com uma insolência casual.

Sempre estivera tão deslumbrada que nunca apre­ciara o esplendor físico daquele homem. A moça sen­tiu a boca seca e teve que desviar os olhos antes de ser capaz de perguntar:

— O que faz aqui?

— Você quis trocar de quarto. Jacques presumiu que você iria preferir ficar perto de mim. Provavel­mente, pensa que a ajudou com as suas fantasias se­cretas.

— Deveria ter me dito que você estaria na porta ao lado!

— Por quê?

A moça ouviu o barulho que o empresário fazia J vestindo a roupa. Resistindo à tentação de dar uma olhadela, Melissa manteve os olhos fixos na tapeçaria na parede.

— O seu quarto é o único com vista para o mar. Acho que o tiro saiu pela culatra. Pode parar agora de admirar a tapeçaria. Estou decente.

Dali em diante, a jovem teria na mente a imagem de Hawke andando feito um poderoso deus pagão, o tipo de divindade do Mediterrâneo que seduzia qual­quer mulher que lhe agradasse. Um calor brotou den­tro dela em resposta àquela visão.

Sentindo-se uma idiota, deixou os olhos observa­rem ao redor. O empresário vestira jeans e uma ca­miseta. Melissa desviou o olhar, a boca estava tão seca que mal a podia articular, mas era perigoso de­mais deixar que aquela imagem se demorasse em sua mente.

— Espero que essa porta tenha uma fechadura — comentou a princesa.

— Não, mas prometo que não vou abri-la.

— Ótimo.

A moça recuou. Mas, quando ia fechar a porta, Hawke disse com sarcasmo:

— Claro que, se quiser abri-la, sempre será bem-vinda.

As palavras dele a excitaram. A princesa fechou a porta devagar. Mordendo os lábios, respirou fundo.

Embora isso não a acalmasse, a moça sentiu-se mais controlada quando Hawke atravessou a porta que dava para o corredor.

Entretanto, a forma como o empresário a olhava estilhaçara com ò pequeno progresso que a jovem fi­zera.

— Gosto do seu cabelo assim, solto. Por que o prende, puxando para trás?

— Cai nos meus olhos — respondeu, juntando-se ao magnata.

E, enquanto Hawke fechava a porta, a princesa fa­lou:

— Acho que vou cortá-lo.

— Não Melissa.

A jovem mantivera o cabelo comprido porque, uma vez, a mãe lhe dissera um pouco irritada:

— Não, Melissa! Você alta desse jeito, de cabelo curto, vai parecer que sua cabeça é muito pequena.

A moça deu uma olhadela no cabelo negro de Hawke e desejou saber por que era tão sexy para um homem ser alto, ter ombros largos e pernas longas ao passo que, para as mulheres, era o contrário. Exceto para as maravilhosas modelos que conseguiam pare­cer esbeltas em vez de magricelas!

E se continuasse reagindo àquele homem, a prin­cesa enlouqueceria. A única forma de passar por isso com alguma dignidade era fingir que se tratava de uma simples visita a um castelo.

A conversa seria social enquanto desciam a esca­daria.

— Uma vez, você disse que a Nova Zelândia sem­pre será a sua casa. Então, por que comprou esse lu­gar?

— Gostava da idéia de ter um castelo perto do mar. Além disso, estava prestes a ser demolido. Talvez porque eu venha de um país com mil anos de história, não queria ver isso aqui em ruínas.

— Parece maravilhoso agora. — Comentou a jo­vem ao passarem por uma porta que os conduzia a um pátio.

Perambularam por ali.

— Que lindo! — suspirou Melissa.

Uma parede de gesso, pintada em tom de vinho, era enfeitada por uma parreira. Flores rasas e púrpuras resplandeciam junto a ela. Num canto, vasos de gerânios contrastavam com as ervas de folhas cor de bronze.

Melissa encontrou em outro lado um tronco fino que continha diversos tufos de folhas amarronzadas.

— Não vi algo parecido na Nova Zelândia, perto dos riachos? Apenas eram maiores e verdes — co­mentou a princesa.

— Sim, é um tipo de repolho.

— Então, plantou repolho aqui para lembrar-se de casa. E eu que pensava que você não era nem um pou­co sentimental!

— Ah, pode-se tirar um neozelandês do seu país, mas não se pode tirar a Nova Zelândia de um neoze­landês. Também tenho uma árvore pohutukawa cres­cendo no terraço que dá para o mar. Ainda se lembra como pronuncia essa palavra?

— Claro!

 

CAPÍTULO DEZ

Melissa fechou os olhos para concentrar-se em repe­tir o nome da planta. Com cuidado, imitava a forma como Hawke pronunciara as sílabas.

— Brilhante. Tem praticado? — perguntou o em­presário, zombando.

— Não. Mas se você pode aprender a falar francês perfeitamente, posso me esforçar para pronunciar uma palavra maori de forma correta.

— Na verdade, não aprendi francês dessa forma. A minha babá era uma senhora francesa que passara a vida viajando com o marido, em um iate pelo Pacífi­co. Quando ficaram idosos demais para esse tipo de vida, vieram para a Baía das Ilhas. Ela cuidava de mim enquanto minha mãe trabalhava. Como ela e o marido falavam francês, cresci bilíngüe. Devo aos dois mais do que uma boa pronúncia em francês. Ele foi o único pai que tive.

Hawke conduziu a princesa para o terraço.

— Venha e diga olá para a pohutukawa.

Será que foi por isso que oferecera abrigo a Sara — senso de responsabilidade, para se certificar de que a moça não estava grávida dele? Hawke podia não ter moral quando o assunto era sexo. Mas por trás do homem arrogante havia um garotinho que cresce­ra sentindo falta de um pai.

Plantas baixas beiravam o rochedo que caía no mar. Preso a uma parede do castelo, um arco coberto de parreira verde protegia uma grande área sombria, com espreguiçadeiras, mesas e cadeiras. A pohutuka­wa ficava no outro lado.

— E um cenário lindo — encantou-se Melissa.

— Tão bonito quanto a casa de praia?

— Uma beleza diferente.

— Estou pensando em vender esse lugar.

— Por quê?

— Cada vez mais, meus negócios se baseiam na Ásia e na América do Norte. E, se preciso passar um tempo na Europa, tenho uma casa em Londres.

A princesa quis saber se o empresário se arrepen­dera do romance com Sara. Vender o castelo seria uma forma de lavar as mãos e livrar-se do passado? Vergonha? A jovem deu uma olhadela no perfil do neozelandês. Não, era impossível imaginá-lo sentin­do isso.

— Faz sentido, eu acho... — disse a princesa e, sem lhe dar tempo para responder, mudou de assunto, fazendo perguntas sobre as plantas.

Era surpreendente, mas o empresário era um pro­fundo conhecedor do assunto.

— Minha mãe era jardineira. Devo ter aprendido com ela sem perceber — contou Kennedy.

— As plantas aqui parecem muito com as do jar­dim da casa de Baía das Ilhas.

— Sim. E o clima é semelhante se você ignorar os ciclones que, às vezes, atingem o norte da Nova Ze­lândia. Venha e sente-se. Daqui, a vista para o mar é perfeita.

Kennedy a conduziu a um assento na sombra. Uma roseira coberta de flores exalava um perfume exótico no ar. Melissa sorriu quando uma pétala flutuou cain­do no rosto dela e ergueu uma das mãos para tirá-la dali.

Os dedos da jovem colidiram com os de Hawke. Os olhares se encontraram. O empresário retirou a pétala, mas os dedos retornaram à pele da princesa, acariciando-a. O prazer percorreu o corpo de Me­lissa.

De repente, o empresário se virou, a expressão dis­tante.

— O que meu pai não contou à minha mãe, quando namoraram, foi que ele era casado com uma mulher com dinheiro suficiente para mantê-lo com o estilo de vida ao qual se acostumara. Acho que amava a mi­nha mãe, mas era muito preguiçoso, dependente do dinheiro da esposa, para separar-se dela.

Melissa conteve a raiva. Talvez o pai dele não qui­sesse. Será que Hawke herdara do pai essa atitude descuidada com relação às mulheres? Não, pensou a moça. Deve ter sentido alguma afeição pelo pai. Mas o desprezava também. Então, por que seguia os pas­sos dele?

— Se as lembranças do lugar não são felizes, estou surpresa que ainda mantenha a casa.

— A esposa dele nunca apareceu lá. E minha mãe viveu à espera do meu pai. Então, quando ele morreu, comprei o lugar para a mamãe. Além disso, devo muita coisa ao meu pai e ele adorava aquele lugar também.

— Deve ao seu pai?

— Meu pai esperava menos de mim do que dos fi­lhos legítimos. Isso me fez provar que eu poderia ser capaz. Então, meu sucesso se deve ao meu pai.

— Duvido. Você é como Gabe e Marco — um lí­der nato.

— Obrigado.

— Os pais têm muita responsabilidade, mas acho que as pessoas nascem com as próprias personalida­des já fixadas. Embora meus pais se amassem, não era um casamento convencional. Eu era muito nova para entender, mas minha mãe tinha alguns casos — era tão bonita que deixava os homens malucos — e isso magoava o meu pai. Ainda assim, quando papai morreu, mamãe ficou inconsolável. E tenho certeza de que foi isso que lhe causou o câncer. Não tinha co­ração nem força para lutar.

— Uma vez, comentou que sua mãe deixou todo o dinheiro para os seus irmãos e nada para você. Por quê?

— Na verdade, não havia muito dinheiro no final, mas minha mãe esperava que meus irmãos cuidassem de mim. E, uma vez, me disse que meu pai se casara por causa do dinheiro dela. Meu pai tinha muito pou­co depois que foi forçado a deixar a Ilíria. Mamãe não queria o mesmo para mim.

Era estranho e ao mesmo tempo bom estar falando sobre as famílias dos dois, o passado de ambos. A paixão estava sempre ali, mas isso era outra coisa. O coração da jovem estava sendo tão teimoso que Me­lissa tinha que ficar relembrando a si mesma de que Hawke era um amoral no que se referia a sexo.

— Acha que os romances dela eram um tipo de pu­nição?

— Devem ter sido. Coitada da mamãe.

— Apesar disso, ela foi injusta com você.

— Era um pouco antiquada — os homens deviam cuidar das mulheres, e só.

— Muito antiquada — concordou o empresário com um tom de voz que fez a princesa se questionar se Kennedy concordava com a mãe dela.

— Eu não era o tipo de filha que ela queria. — Droga! Isso escapara. A princesa tentou consertar. — Acho que minha mãe queria uma filha com gostos similares aos dela, alguém como Marie-Claire — as duas tinham muito em comum.

— A maravilhosa noiva do ano passado? Sim, sua prima é uma criatura linda, sofisticada, mas superfi­cial.

Ao lembrar-se do romântico casamento um ano atrás, Melissa perguntou a si mesma se Hawke fizera amor com Marie-Claire também.

— Pode ser, mas o que a minha mãe tinha era uma criança tímida que passava a maior parte do tempo com o nariz em um livro. Foi um choque ainda maior quando comecei a crescer, por volta dos 12 anos, e fi­quei mais alta do que ela em menos de um ano.

Hawke sentou-se ao lado da princesa.

— Sua mãe não imaginava que você se tornaria tão bonita?

Melissa ficou constrangida, não gostava de baju­lação.

— Sei que não sou. E se falei de maneira que mi­nha mãe parecesse indelicada, ela não era. Fez o me­lhor que pôde por mim. Tentou me ensinar a tirar pro­veito do bom gosto dela, mas não "consegui". Sem­pre soube que nunca seria como mamãe.

O empresário franziu as sobrancelhas.

— Quer dizer que ela a criticava o tempo todo?

— Não! Minha mãe tentava me ajudar, me trans­mitindo sabedoria para me tornar o tipo de mulher que ela era.

— Sua mãe sabia que estava morrendo?

— Sim. Mamãe contou a Gabe e a Marco, mas os proibiu de me dizerem. Ela me mandou para um internato inglês. Só soube sobre a doença quando Mar­co veio me contar que mamãe morrera.

— Provavelmente, sua mãe pensou que seria mais fácil para você do que ficar em casa e vê-la morrer.

— Não me deu escolha... — disse Melissa.

Ao longo dos anos, o sentimento de rejeição den­tro da princesa se transformara em aceitação, porém as palavras de Hawke a atingiram em cheio.

— Sempre pensei que ela amava muito mais os meus irmãos do que a mim. Eles eram tudo o que mi­nha mãe admirava em um homem — altos, bonitos, inteligentes e muito másculos. Mamãe os adorava.

— Você disse que sua mãe era conservadora. Não deve ter lhe ocorrido deixar que uma criança influen­ciasse a vida dela. Sabendo que não viveria muito e que os seus irmãos eram homens ocupados, quis co­locá-la em uma boa escola para lhe dar certa estabili­dade.

A princesa o encarou. Pela primeira vez, viu a mãe através da ótica de um adulto — uma mulher enfren­tando a morte, sabendo que Melissa ficaria sozinha no mundo, a não ser pelos irmãos. Para a mãe dela, aparências e roupas eram muito importantes. Não percebera que cada comentário para a filha adolescente — sobre a altura e a total falta de graciosidade — quebrava-lhe a auto-estima.

Se a mãe ainda estivesse viva, talvez chegassem a um entendimento. A princesa piscou, lutando para conter as lágrimas. Hawke cobriu as mãos da jovem com as dele e falou:

— Você é linda.

Os dedos do empresário sobre os lábios da jovem deteve a imediata objeção da princesa. Ofegante, de­vido às sensações que se espalhavam pelo corpo, Me­lissa ouviu a batida acelerada do próprio coração, pensando em como amava aquele homem. Mas amar não era suficiente. Precisava ser capaz de confiar nele.

— Sua herança está estampada no rosto. Essas ma­çãs salientes foram transmitidas por algum cavaleiro das estepes, cavalgando sem destino pela Europa. E os seus olhos, provavelmente, vieram do Cáucaso. Será que alguma princesa das montanhas os trouxe para a sua família?

— A lenda diz que são uma herança da primeira dona do Sangue da Rainha.

— Ah, os famosos rubis, tão raros e delicados! Talvez as únicas pedras para combinar com os seus olhos fossem os diamantes da Austrália. E suspeito que esse queixo determinado seja uma herança direta do primeiro Considine da sua casa e que herdou dele essa fantástica teimosia, assim como a coragem e a força de vontade.

Hawke sabia como seduzir! Quantas vezes será que não disse coisas semelhantes às mulheres com as quais fizera amor? Ainda assim, quando a princesa o olhou, vendo aqueles olhos verdes, tudo o que queria era que o empresário a beijasse...

— Assim como a sua boca. Sua mãe não conside­rou o fato de que é, ao mesmo tempo, inocente, apai­xonada, ávida e viciante...

O ar ficou preso nos pulmões de Melissa. A moça se afogou em ondas quentes de desejo, via as palavras se formarem nos lábios dele e ansiava para bei­já-los, silenciando-os, de forma que pudesse ignorar a parte do cérebro que a avisava para ter cuidado. Mas o empresário não diminuiu os poucos centíme­tros que os afastavam.

— Não, mães de adolescentes não querem pensar que, um dia, elas podem crescer. Aí, vão encontrar o amor e construir um futuro longe da família.

O coração de Melissa disparou de vez. A moça procurou pelo rosto do empresário quando este se le­vantou e caminhou em direção à luz do sol do Medi­terrâneo. Será que Hawke estava insinuando um pe­dido de casamento? Claro que não!

Provavelmente, o neozelandês estava se lembran­do de que, há algumas horas, fizeram amor sem camisinha, sem ao menos pensarem nos riscos. E se, por acaso, a jovem estivesse grávida, o maldito senso de responsabilidade dele dizia que estaria atrelado à princesa.

— Gostaria de nadar? — indagou Hawke.

— Não, obrigada.

— Teve um dia difícil. Quer entrar e descansar?

— Estou bem. Só gostaria de ver um pouco mais dos jardins do castelo.

— Claro!

Os jardins eram lindos. E, quando chegaram a um campo de petanque, uma espécie de jogo de bocha francesa, o empresário a desafiou para uma partida.

— Eu jogo para ganhar hein! — avisou a princesa. Hawke abriu um largo sorriso.

— Então, a batalha vai começar.

Assim como os irmãos, o neozelandês não fez con­cessões, nem Melissa. O empresário a venceu, mas foi justo.

— Você é boa. Hora para uma bebida. Venha e sente-se embaixo daquela árvore — pediu o empre­sário.

Tomaram suco. Em momento nenhum, o empresá­rio lhe ofereceu vinho ou algo parecido. A decisão de não beber álcool tornou a possibilidade de gravidez algo mais próximo. E, naquela noite, Hawke a deixou à porta do quarto.

Não haveria mais dúvida, a princesa descobriu mais tarde, no banheiro. Enquanto jantavam no terra­ço, um pacote fora deixado no quarto. A moça leu as instruções. No dia seguinte, saberia se carregava ou não um filho de Hawke.

Melissa ficou deitada por horas até que a inquieta­ção a fez atravessar o quarto escuro em direção à ja­nela. No mar, luzes piscavam. Talvez, pescadores. Ou um dos magníficos iates próximos a Mônaco, transportando ricaços.

Um movimento chamou a atenção da princesa. Melissa gelou, agradecida por não ter acendido a luz ao lado da cama. Hawke caminhava na praia, a cabe­ça ligeiramente abaixada como se contemplasse uma questão difícil.

O que o empresário faria se o resultado do teste fosse positivo? Melissa já sabia que ficaria com a criança, mas o que Hawke iria querer? O passado dele a deixou inquieta. O homem esperava participar da criação do filho.

E embora o coração saltasse ao pensar em manter contato com o empresário, a princesa sabia que uma aproximação forçada seria um inferno. Melissa pu­xou as cortinas e virou-se, tirando a figura de Hawke do pensamento.

A jovem pegou a fotografia na bolsa e sentou-se na cama. Será que poderia ser falsa? Observou a foto e não encontrou sinais de falsificação via computador. De qualquer forma, Gabe teria mandado a foto ser analisada por especialistas. E, em algum lugar, a princesa lera que era quase impossível falsificar uma foto de forma que não se pudesse descobrir.

Gabe aceitara aquela foto como genuína. E, uma semana depois, rompera o noivado com Sara. Melis­sa entendia o motivo. Observou os rostos. Os braços de Hawke seguravam Sara. O empresário tinha uma expressão que a princesa nunca vira — carinhosa e gentil. E a cunhada o olhava, o rosto implorando por sexo.

A princesa ficou enojada e provou o gosto amargo da traição. E isso era ridículo porque o empresário não lhe fizera promessas... Toda vez que Hawke che­gasse perto demais, a jovem se lembraria disso. E conseguiria desprezá-lo a tempo. Mas, ao voltar para a cama, as mãos de Melissa pousaram sobre a barri­ga, em uma carícia involuntária.

 

CAPÍTULO ONZE

Melissa olhou o pequeno bastão com a tira azul e foi atacada por uma dor tão intensa que não conseguiu conter um gemido, ao sentar-se na cadeira ao lado da banheira.

Nada. Não havia criança, nenhuma desculpa para manter contato com Hawke. A princesa podia voltar para a Toca do Lobo, retomar os estudos e a vida dela.

Uma batida à porta a fez levantar-se.

— Entre.

Quando Hawke entrou, a moça logo falou!

— Não estou grávida.

Ao ver o alívio nos olhos do empresário, a prince­sa teve vontade de gritar. Mas, pelo menos, aquela era uma reação honesta. Antes que ele dissesse algo, a jovem se adiantou:

— Vou embora para casa agora.

Kennedy continuou sem nada falar. Será que que­ria uma prova? A princesa acenou o bastão na frente dele.

— Veja você mesmo.

— Não vou dizer que lamento.

Aquela resposta doeu tanto que a princesa não conseguiu pronunciar uma só palavra. Hawke continuou:

— Estou contente que não esteja grávida porque não é a forma certa de se começar um casamento.

O olhar estupefato da jovem chocou-se com o dele. Desconcertada, a princesa indagou:

— O que quer dizer?

— Estou pedindo que se case comigo.

Ela não estava acreditando. Kennedy não queria casamento. Só se sentia na obrigação de lhe propor isso porque a moça era uma Considine.

Dividida por uma mistura de raiva, desgosto e an­gústia, a jovem respirou fundo e respondeu:

— Já lhe disse, não precisa pensar em casamento. Não há nenhum bebê. — De qualquer forma, não me casaria com você nem que fosse o último homem na face da Terra.

— Espero ser capaz de fazê-la mudar de idéia.

A princesa tentou evitá-lo, mas o empresário a to­mou nos braços e a beijou. Primeiro, com ardor. De­pois, com ternura. E, para o horror de Melissa, a moça perdeu o controle, debulhando-se em lágrimas.

Hawke parou de beijá-la.

— Querida, não chore, por favor...

A vontade de Melissa era de sair correndo. Não ti­nha resistência para viver assim. Melhor que a sepa­ração fosse agora.

— Tenho uma coisa para lhe mostrar. Me deixe ir — disse a princesa.

Relutante, Hawke deixou, esperando enquanto a jovem cruzava o quarto, indo em direção à escrivani­nha. A princesa remexeu a gaveta, encontrando a fo­tografia. Apesar de tensa, a moça lhe entregou a foto. No rosto, uma máscara de orgulho.

Hawke pegou o retrato, mas não olhou imediata­mente.

— O que é isso?

A moça precisou de toda a calma do mundo para falar.

— Dê uma olhada — pediu a princesa. Finalmente, o empresário abaixou o olhar.

O rosto do neozelandês assumiu um ar ameaçador. Ergueu o olhar e com a voz fria, mal controlando a raiva, indagou:

— Que droga é essa?

— Uma foto sua e de Sara Milton.

— Sei quem ela é.

O empresário voltou a olhar o retrato novamente.

— Então, foi por isso que não quis ficar naquele quarto?

— Sim. Veja a hora e a data.

O empresário obedeceu. A princesa procurou por um traço de vergonha no rosto dele, mas não havia nada. Em vez disso, a raiva que Hawke sentia parecia transformar-se em determinação.

Melissa estremeceu. O neozelandês a fitava como se a moça fosse uma presa, um olhar perigoso.

— Foi tirada na noite do casamento de Marie-Claire — continuou a moça. Senti náuseas só de pensar em dormir na cama em que você fez amor com a noi­va do meu irmão.

— Antes que isso vá mais longe, devo lhe dizer que essa porcaria é falsa — informou o empresário.

— Ah, sim. E suponho que você também não en­trou no quarto de Sara.

— Entrei. A criada dela descobrira que o Sangue da Rainha desaparecera do cofre. Sara estava descon­trolada. Deve lembrar-se que a sua cunhada usara os rubis no baile de Marie-Claire naquela noite.

— Boa tentativa, mas não acredito em você. Se os rubis tivessem desaparecido, eu teria sabido. O San­gue da Rainha contínua no castelo.

— O colar desapareceu — e apenas Sara e a criada sabiam da combinação. Só confortei Sara. Apenas isso. Eu lhe dei um abraço fraternal e disse que en­contraríamos a jóia.

— E, claro, o paparazzi tirou a foto justamente nesse momento.

— Essa foto é falsa. Uma montagem bem habili­dosa, admito. Mas nenhum de nós estava nu e as ex­pressões dos rostos foram alteradas. Estou começan­do a me questionar se isso não foi um truque. Será que Gabe não quis se livrar dela de uma forma que a mantivesse calada e, assim, tivesse certeza de que a moça não o levaria aos tribunais por ser abandonada? Sara veio com uma criada — que é agora a governan­ta do castelo. Qual o nome dela...?

— Marya... e é honesta — respondeu Melissa, chocada pela forma cruel como a mente dele traba­lhava.

— Tenho certeza que sim. Assim como tenho cer­teza de que é fiel ao seu irmão. Você mesma me disse que as pessoas do vale são fiéis aos seus dirigentes. Marya faria qualquer coisa por Gabe, até mesmo es­conder os rubis e vir correndo até mim, sabendo que eu iria com ela para ver o que poderia fazer. Seu ir­mão poderia ter contratado alguém para ficar com uma teleobjetiva olhando para a janela e fotografar qualquer movimento suspeito.

— Não, Gabe nunca faria isso.

— Então, não há mais nada a dizer porque sei que isso é mentira. — Hawke jogou a foto no chão e olhou para a princesa. — Mas está convencida de que eu não me importaria em dormir com a noiva de um amigo. Então, vou providenciar sua volta para Ilíria.

O milionário deu uma olhadela no relógio.

— Esteja pronta em uma hora.

Melissa viu a porta se fechar e tentou dizer a si mesma que era o melhor a acontecer. Pegou a foto e a examinou. Não havia sinais de falsificação. De qual­quer forma, se por alguma chance remota, o empresário estivesse certo e fosse uma mentira, havia ainda a atriz e Danielle, a tal boa amiga...

Melissa ergueu o queixo. A infidelidade dele a matava. Ainda assim, Hawke tinha uma reputação por sua integridade...

— Nos negócios — disse a princesa em voz alta. Melissa voltaria para a vida dela e o esqueceria. Hawke podia lhe querer, mas querer era algo fácil. Amor era muito mais difícil, exigia muito.

E, apesar das palavras adocicadas do neozelandês, a moça não era tão bonita quanto Sara ou Danielle. O que tinha a oferecer a não ser um corpo que se rendia toda vez que o empresário se aproximava dela?

Qualquer outro homem que a cortejasse, a jovem suspeitaria que fosse para aproximar-se dos irmãos dela. Mas Hawke não precisava disso. Era dono de si mesmo, emparelhava com os irmãos em poder e in­fluência.

— Pena que não se igualava a eles em honestidade...

Hawke se despediu da princesa ao lado do carro que a levaria ao aeroporto. O empresário foi breve e formal ao lhe desejar boa viagem. A fisionomia dele era controlada.

Após o habitual agradecimento pela hospitalidade, Melissa entrou no carro. Não olhou para trás à medi­da que o veículo se afastava do castelo. A postura rí­gida, nem um pouco natural, manteve-se até a princesa estar sozinha no quarto, de volta à Toca do Lobo, onde ficaria de agora em diante, pelo resto da vida.

Até então, a jovem ignorara a atenção exagerada de Marya e conseguira disciplinar as próprias emo­ções. A princesa dormiu. Mas, no meio da noite, acordou, chorando.

Finalmente, a exaustão a silenciou. Mas, por ho­ras, ficou deitada observando a lua se pôr acima das montanhas, os olhos queimavam e o coração parecia pequeno. Nunca mais veria Hawke e não teria mais o frágil sonho do filho dele para confortá-la.

Pare com isso, ordenou a si mesma. Você não é a primeira pessoa a se apaixonar e se dar mal, e não será a última. Mas por que Hawke estava tão deter­minado com relação à jovem? Porque era uma mu­lher desejável?

Não. Todas as amantes anteriores eram belas.

Relembrou da atração que teve quando dançaram juntos no casamento de Marie-Claire. A moça não compreendera aquela excitação, mas o empresário sim. E decidira não agir.

Mas quando a jovem se mostrara disponível na Nova Zelândia, o empresário não foi capaz de conter-se. A memória traiçoeira a lembrou da paixão dele, tão intensa...

Por longos minutos, a princesa deixou o pensa­mento solto, o corpo esquentando à medida que se re­cordava do jeito como Hawke lhe acariciava os seios, a voz de quando lhe disse que era bonita. E a sensibi­lidade dele toda vez que faziam amor...

Hawke lhe quisera. Pode não ter feito mais nada por Melissa, mas lhe ensinara que tinha algo dentro de si que atraía os homens. Mas isso ainda não era amor. E a princesa não se contentaria com menos.

A jovem enxugou as lágrimas. Se não visse aquela foto, o que teria feito? Se o empresário a pedisse em casamento, Melissa teria aceitado. Enterrou o rosto no travesseiro. Tinha que admitir. Ela o amava.

Tremendo, a princesa levantou-se e vestiu o rou­pão antes de cruzar o quarto em direção à janela para olhar o vale. As montanhas avultavam em um céu co­berto de estrelas. Mas a mente trapaceira da princesa lhe impusera uma outra cadeia de montanhas — mais selvagens, primitivas, ao redor de um lago.

Melissa desejava nunca ter visto Shipwreck Bay, nem Hawke novamente, nem nunca ter descoberto a própria natureza apaixonada. Nem nunca ter perdido o coração de forma tão avassaladora. Embora fosse superar aquela agonia, Melissa sabia que não seria capaz de amar ninguém da mesma forma outra vez.

No dia seguinte, a princesa colocou a foto de volta nos arquivos de Gabe. O que teria acontecido se ti­vesse aceitado o pedido de casamento de Hawke? Será que Gabe lhe teria contado sobre a traição de Sara? O irmão era uma pessoa muito discreta.

— Isso não vai acontecer. Então, por que se preo­cupar? Esqueça isso!

Mas, nos dias seguintes, enquanto se dedicava à monografia sobre o estágio em Shipwreck Bay, a mente da princesa continuava enganando-a com as lembranças de Hawke — o jeito terno, a forma como a fazia rir, a inteligência fascinante...

— Se é forte o bastante para lidar com a tentação, por que está atormentada por causa dele? — pergun­tou, em voz alta, olhando pela janela.

A primeira neve brilhava como diamantes nos to­pos das montanhas. Igual a Shipwreck Bay, a moça pensou, os dedos hesitando no teclado do computa­dor conforme as lembranças voltavam.

Irritada, a princesa piscou, contendo as lágrimas. Mas, embora pudesse livrar-se das lembranças du­rante o dia, à noite tudo voltava de forma tão vivida que a moça ficava deitada na cama até que a exaustão a vencesse.

Na manhã seguinte, ao ler uma revista, um artigo chamou-lhe a atenção — uma entrevista com a atriz que tentara o suicídio depois que Hawke a deixara. Era exatamente do que precisava — algo que a lem­brasse o quão insensível o empresário podia ser.

Melissa começou a ler a matéria. Após alguns mo­mentos, deixou a revista cair.

— Não! — Lucy St James dava a entender que, dessa vez, quem lhe quebrara o coração tinha sido Marco Considine.

— Não acredito! — gritou Melissa, furiosa, conti­nuando a ler.

Ao terminar o texto, a princesa o releu. Tinha sido muito bem escrito, repleto de floreios, mas nada que pudesse ser verdade, exceto uma referência trancada sobre um encontro de Páscoa.

— Mentira! — Melissa se exaltou. Tirando alguns dias com Alex, Ianthe e a família, na casa de campo, Marco, a princesa e Gabe tinham passado a Páscoa no castelo, trabalhando em um pro­jeto para a Ilíria.

Melissa jogou a revista no chão e cobriu os olhos. Será que a atriz mentira sobre Hawke? Depois de um momento de indecisão, a princesa telefonou para Marco.

— Não tive nenhum caso com Lucy. Eu a encon­trei diversas vezes e recusei todos os sutis convites dela, mas é danada de ambiciosa. Acho que precisa de publicidade para o novo filme.

— O que vai fazer? — questionou a irmã.

— Nada. Isso acontece o tempo todo. E não posso me incomodar em lhe dar mais espaço em páginas de jornal.

Quando desligou o telefone, a princesa levantou-se e foi à janela. A atriz dissera que Hawke partira o coração dela logo depois de participar de um filme. Foi a grande oportunidade dela.

Então, inventara uma história para atrair a aten­ção? Parecia que sim. Melissa não sabia o que fazer.

Pouco antes de voltar à universidade, a prima fran­cesa telefonou.

— Melissa querida! Estou sozinha, chateada e grá­vida! E doente! Venha e fique comigo até que tenha que voltar para os seus estudos.

— Onde você está? — perguntou a princesa.

— Em casa, claro!

Marie-Claire e o marido viviam em um casarão, nas montanhas, em Nice.

— Venha, prima. Meus pais estão na índia e o meu querido está em São Francisco, a negócios.

Melissa não iria a lugar nenhum perto da Riviera. Era perto demais de Hawke! Quando ia se desculpar, Marie-Claire insistiu:

— Estou tão sozinha...

Hawke deveria estar de volta à Nova Zelândia agora. Então, a princesa concordou. Porém Marie-Claire não parecia doente, solitária ou grávida. Ra­diante como sempre, a prima a abraçou e aceitou os parabéns com um belo sorriso.

— Venha. O que aconteceu com você? Parece en­cantadora! E andou comprando roupas! Deve estar apaixonada! — comentou a prima.

— Achei que já era hora de me vestir como adulta — explicou Melissa, já lamentando o impulso que a fez parar o carro em frente a uma das mais chiques lo­jas da Riviera.

Gastara boa parte da mesada em uma calça cobre que lhe revelava as pernas longas e os quadris estrei­tos, além de uma blusa branca meio escandalosa que revelava mais do que a princesa se sentia confortável.

Conduzindo a prima a uma sala pequena, Marie-Claire comentou:

— Essas sandálias ficam divinas em você! É tão sexy!

— Fico contente em saber que gosta — respondeu Melissa.

— Mas sei que não as comprou por minha causa. E, certamente, não foi para usá-las na faculdade! Ah... Lembrei de uma coisa — tenho que fazer isso agora. Vá lá fora e me espere no terraço.

Marie-Claire fechou a porta. Melissa, desnortea­da, foi para o terraço. Uma figura alta, de cabelos ne­gros, saiu das sombras debaixo da parreira e veio em direção à luz.

 

CAPÍTULO DOZE

Melissa gelou, a pulsação acelerou. Logo soube quem era. E ficou contente por ter comprado roupas novas.

Depois de olhar o rosto implacável de Hawke, a princesa perguntou:

— O que faz aqui?

— Encontrando-a em um lugar neutro — o empre­sário respondeu.

— Vou matar Marie-Claire!

— Não a culpe. Eu teria arranjado esse encontro de qualquer forma. Não há lugar ao qual você possa ir que eu não a encontre. Ouça o que tenho a dizer. Se achar que não acredita em mim, nunca mais vou inco­modá-la.

— Tudo bem — concordou Melissa, relutante.

— Fique calma. Não vou tocá-la.

— Anda logo com isso.

O empresário virou a cabeça e um homem se ma­terializou, saindo da sombra de uma árvore.

— Esse é Brent Thomas, é um fotógrafo — apre­sentou Hawke.

— Estou vendo — disse a princesa.

— Suponho que sim — comentou Brent, abaixan­do a cabeça. — Eu tirei a foto do sr. Kennedy e da sra. Milton no castelo dele — explicou o fotógrafo.

Brent entregou-lhe uma foto. Melissa a pegou. Ao examiná-la, o coração acelerou. Era parecida e, ainda assim, tão diferente da foto nos arquivos de Gabe! Sara e Hawke estavam na mesma posição — os bra­ços dele ao redor da moça, o rosto da cunhada ergui­do em direção ao do empresário. Mas ambos estavam vestidos. O empresário trajava calça e camiseta. A moça usava um agasalho.

E os rostos tinham sido alterados. Em vez de olha­rem um para o outro com desejo, Hawke parecia preocupado e Sara tentava conter as lágrimas.

— Essa não é a verdadeira! — afirmou a moça.

— Essa é a verdadeira — Brent esclareceu.

— Não acredito... — duvidou a princesa.

— Bem, eu fiz um ótimo trabalho — disse Brent. Hawke o interrompeu, dizendo:

— Vamos, desembucha!

O fotógrafo perguntou a ela algo contundente.

— Apenas pense, srta. Considine — qual das duas iria me dar mais dinheiro?

A princesa voltou a olhar a foto.

— Alguém pode lhe ter pago para alterá-la — co­mentou Melissa.

Brent sorriu.

— Não exatamente. O seu irmão me pagou porque não queria parecer um idiota nas revistas — Brent respondeu.

O rosto do fotógrafo tornou-se sombrio.

— Não se preocupe. Certificou-se de que eu não trabalharia nunca mais. Gabe Considine joga duro — disse Brent.

— Se essa foto foi mesmo alterada, você mereceu isso — respondeu a princesa.

— O que sabe? Nunca teve que trabalhar na vida!

— Basta! — Hawke interveio. O fotógrafo aquietou-se.

— Tudo bem.

Brent olhou para o rosto intimidante de Hawke, passando ao de Melissa.

— O sr. Kennedy não me pagou um centavo. Só ameaçou me entregar à polícia — Brent contou.

O fotógrafo engoliu em seco e Melissa percebeu que, sob a rispidez, existia um homem com medo.

— Continue... — pediu a moça.

— Essa história toda me ensinou uma lição: não fazer sujeira com os ricos. Eles não gostam. Vocês acham que os paparazzi são ralé? Bem, talvez, use­mos de certa pressão, mas posso lhe dizer que não saímos por aí ameaçando as pessoas e mexendo os pauzinhos para que outros percam seus empregos.

— Vender fotos é uma coisa. Alterá-las para usá-las como chantagem é outra. Não tem idéia da desgraça que causou. Por que fez isso? — perguntou Hawke.

— Não tive escolha. Minha filha estava doente. Precisava de tratamento e eu não tinha dinheiro.

— Por quê?

— Perdi dinheiro no jogo. Mas não sabia que mi­nha filha estava doente. A mãe dela me deixou.

— Você escolheu um homem rico e esperava ser capaz de extorqui-lo sem ser pego? — Não espere compreensão de nenhum de nós. Antes de sair daqui, o que mais tem a dizer?

Brent murmurou:

— Somente que lamento por qualquer dor que causei a vocês.

Melissa ficou com pena.

— Como está a sua menininha agora? O fotógrafo lançou-lhe um olhar espantado, de­pois, ficou vermelho.

— Ela está bem, até agora. O tumor era benigno, mas pode crescer novamente apesar do cirurgião di­zer que removeu tudo. Era no cérebro dela, entende?

Melissa sensibilizou-se, porém Hawke invalidou a compaixão da princesa, expulsando-o sem a menor sutileza:

— Saia já daqui. Se tentar qualquer coisa como essa novamente, vai acabar na cadeia, com criança doente ou não. De agora em diante, tenha cuidado.

O fotógrafo se virou e foi embora. Melissa viu quando um outro homem, um segurança, o acompa­nhou para fora dali. A princesa olhou a foto e per­guntou:

— Então, era tudo verdade? O Sangue da Rainha foi mesmo roubado?

— Foi verdade — respondeu Hawke. — Mas pare­ce que já foi achado.

A princesa teve que respirar fundo.

— Entendo... — comentou, pálida. — Lamento tanto...

— Não tem nada do que se desculpar.

Hawke parecia distante e cansado de tudo aquilo. Melissa tentou pensar em palavras que o convences­sem do arrependimento dela. Mas bastou olhar o ros­to tenso para saber que o esforço seria em vão.

— Entendo que Brent estivesse desesperado, mas me pergunto se ele tem algum remorso por todo o mal que fez.

— Muito pouco. E o desespero foi inteiramente culpa dele. Ninguém o forçou a apostar no jogo o sa­lário. Brent nos vê como vítimas em potencial. Te­mos dinheiro, poder, influência — tudo o que ele gostaria de ter, mas não quer trabalhar para conse­guir. Não tenha pena desse homem.

Bem, sempre soubera que o neozelandês era rude. Mas não tanto!

— Temos que contar a Gabe que Brent falsificou as fotos! Espero que não seja tarde demais para que meu irmão reate com Sara!

Quando Hawke riu, a princesa foi até o empresário e segurou-lhe um dos braços, sacudindo-o, indig­nada.

— Não viu meu irmão depois que ele terminou com a noiva. Temos que lhe contar isso!

— Acho que Gabe já sabe — disse Hawke. Depois, tirou de dentro de um dos bolsos um peda­ço de jornal amassado.

— Pegue.

Desnorteada demais para fazer qualquer coisa a não ser obedecer, a moça desdobrou o papel. Era uma foto de duas pessoas caminhando de mãos dadas ao longo de uma praia tropical. Gabe e...

— Sara! — gritou Melissa.

— Leia... — sugeriu Hawke.

— Juntos de novo? — Era o que dizia a manchete.

O príncipe Gabriel Considine, grã-duque da Ilíria, caminha ao longo de uma praia tropical com a ex-noiva Sara Milton. Parece que a desavença foi temporária. Outro casamento, em breve, na Ilíria?

Incapaz de acreditar no que via, Melissa desviou o olhar do jornal para o rosto de Hawke, que demons­trava satisfação.

— Como conseguiu isso? — perguntou.

— Foi publicado em um dos tablóides dessa ma­nhã. Minha secretária fez questão que eu lesse isso. Estão em uma ilha chamada Falaisi, no Pacífico.

— Sara passou a infância lá. — Melissa sorriu, fe­liz por Sara e Gabe. — Oh, que maravilha! Eu gosta­va tanto dela!

— Bom... — disse Hawke, abraçando-a e beijando-a. Melissa se derreteu e o beijou com fogo e pai­xão, com todo o desejo e amor que tinha. — Tudo bem. Já basta dessa história toda. Vou lhe pedir ape­nas mais uma vez para se casar comigo.

A felicidade explodiu dentro da princesa como fo­gos de artifício. Mas ainda havia algumas nuvens no céu do seu pensamento. Libertando-se do milionário, a moça perguntou:

— Por que me pediu em casamento quando soube que não havia nenhum bebê?

— Porque não me contive. Não queria que houves­se um bebê. Mas teria ficado feliz se descobrisse que você estava grávida! Sabia que nunca se casaria co­migo apenas por estar grávida. E um casamento as­sim não era o que eu queria para nós.

— Você está certo — concordou a princesa, rela­xando um pouco.

— Mas... e a srta. Sinclair?

— O que tem Danielle? Pensei que a tivesse con­vencido...

— Ela ficou magoada quando me encontrou na sua casa.

— Não magoada, mas chocada. E, lamento, mas não posso lhe dizer o porquê. Prometi que não conta­ria, e não volto atrás nas minhas promessas. Isso se aplica aos votos que pretendo fazer no nosso casa­mento. Não posso provar que nunca fomos amantes. Você deve decidir se acredita em mim ou não quando digo que nunca lhe serei infiel.

Melissa sentiu como se estivesse à beira de um precipício, aterrorizada e incapaz de mexer-se. Ainda assim, tinha que cair ou voar. Acreditar nele era um ato de confiança. Será que podia fazer isso?

— Você não dispensou Lucy St James, não é? — perguntou a princesa.

— Isso também? Não. Só nos encontramos apenas algumas vezes.

Um nó se apertou dentro do peito de Melissa.

— Acho que só acreditei nisso porque pensei que ficaria segura assim. Fiquei tão assustada por me apaixonar por você...

Hawke deu uma risada.

— Nós dois. Acha que eu queria me apaixonar por você? É jovem demais. Eu pensava em casar, mas queria algo mais seguro. Nada pensei que fosse ficar apaixonado por você.

— Sim, sem nenhuma segurança. É aterrorizante — Melissa concordou.

— E esplêndido. Deus, você me levou ao inferno!

— A sensação foi mútua — respondeu a princesa.

— Haverá momentos em que estaremos separa­dos. Haverá momentos em que a mídia vai publicar fofocas. Quero me casar com você, mas tenho que sa­ber que confia em mim porque o veneno da descon­fiança destrói o amor, mata o desejo. Se não conse­gue confiar em mim, então, me diga agora e vamos acabar com isso. Não posso forçar nada. Você tem que decidir.

A princesa fixou o olhar naquele rosto querido e viu a verdade. Hawke a fitava com um prazer tão ar­dente que dilacerou o seu coração.

Melissa lançou-lhe um olhar furtivo.

— Me peça em casamento de novo. Oh, você disse que não faria isso!

— Sempre mantenho minhas promessas. Mas te­nho certeza de que posso encontrar um jeito interes­sante de extrair uma resposta sua sem, de fato, pedir por isso...

Os olhos da princesa pareciam diamantes doura­dos cintilando travessura. O empresário viu a jovem pegando a bainha de um imaginário vestido de baile e fazer-lhe, majestosamente, uma reverência que ter­minava com a moça curvando-se graciosa, quase até o chão. Melissa fez uma pausa por alguns segundos, depois, levantou-se. Com a expressão séria, a jovem disse:

— Desejo tanto isso. Case-se comigo, por favor!

—Sim.

— Só isso? Será que preciso persuadi-lo?

— Não preciso nem pensar.

O empresário a puxou para os braços dele e a fitou com um olhar quente.

— Você é um tormento! Não pensei em mais nada durante semanas. Na verdade, foi depois de encontrá-la no casamento de Marie-Claire que decidi que era hora de procurar por uma esposa. Não que admitisse isso! Mas revê-la em Shipwreck Bay parecia um pre­sente dos deuses. Vou amá-la pelo resto da vida.

— Também vou amá-lo — disse Melissa.

— Vai mesmo, heim? — brincou ele, abraçando-a contra o excitado corpo dele.

O empresário ergueu o queixo da princesa e a fi­tou.

— Devo ter me apaixonado por você quando dan­çamos juntos no casamento de Marie-Claire, mas acho que eu não acreditava no amor até então. Pelo menos, não em amor à primeira vista. Mas me vi comprando diamantes da mesma cor do brilho doura­do dos seus olhos.

— Me apaixonei por você, mas foi tão rápido, tão... tão forte!

A princesa recostou-se, aqueles olhos dourados devoravam o rosto do empresário, o coração cheio de amor.

— Mas li a seu respeito, sobre as suas amantes. E, aparentemente, Danielle sempre esperava por você. E, depois, sobre a tentativa de suicídio de Lucy St Ja­mes.

— Suposta tentativa de suicídio — consertou Hawke. — Acredita que Danielle e eu nunca tivemos nada?

— Sim.

— Não posso lhe dizer o porquê dela ter vindo ao meu encontro lá em casa, mas posso lhe dizer que é filha de uma velha amiga da minha mãe. Há razões pelas quais Danielle não quer que o passado dela ve­nha à tona. Não posso lhe contar.

Melissa o fitou e viu apenas uma expressão de in­tegridade no rosto do empresário.

— Tudo bem. Provavelmente, teria acreditado em você se eu não encontrasse a fotografia.

— Entendo... — disse Hawke, beijando-a em se­guida.

Logo depois continuou:

— Você a encontrou quando estive na Toca do Lobo, certo?

Melissa balançou a cabeça, concordando. A prin­cesa explicou como encontrara a foto.

— Sua lealdade a Gabe a torna uma mulher honra­da — afirmou o empresário.

— Não era só isso. Doía pensar que você tivesse feito amor com a noiva do meu irmão. Eu o amo tanto que, só de imaginar você com outra pessoa, me mor­do de ciúme. Não agüentaria um marido infiel. Isso me mataria. Então, pensei que estava me salvando de um sofrimento futuro ao rejeitá-lo.

O empresário a soltou, apenas para cobrir-lhe o rosto com as mãos e manter o olhar da princesa preso ao dele.

— Amo você com todo o meu coração e a minha alma — disse Hawke. — Não há espaço no meu co­ração para mais ninguém. Não vou traí-la. Mas preci­so que faça o mesmo. Preciso que confie em mim as­sim como confio em você.

— Prometo.

— Deus sabe, como tentei manter a calma, sem de­monstrar minhas emoções, mas não consigo. Estou completamente apaixonado por você e passarei o res­to da minha vida fazendo-a feliz.

Hawke disse aquelas palavras em tom de promes­sa. Era uma afirmação solene, calma, profunda, in­tensa, que satisfez o ávido coração da princesa.

— Vou fazê-lo feliz, prometo — disse Melissa também.

O empresário olhou para ela e a beijou, selando o compromisso de ambos. Quando Marie-Claire veio à porta espiar, os dois ainda estavam presos aos braços um do outro.

— Então, vocês dois estão felizes agora? Vão se casar? — perguntou a princesa, com um ar travesso.

Os dois sorriram e responderam:

— Sim.

De repente, séria, Marie-Claire, comentou:

— Então, temos planos a fazer. Hawke, esse não será um casamento simples. Alex deve ser avisado. Mas, antes, você precisa falar com Gabe e pedir-lhe permissão para dirigir-se à irmã dele.

— Oh, Marie-Claire, isso não é necessário! — Melissa ficou vermelha.

— Está falando de um casamento oficial? — per­guntou Hawke.

Marie-Claire riu.

— Claro! Acho que o príncipe Alex vai resolver celebrá-lo com toda a pompa e cerimônia que puder. O pobre povo da Ilíria teve pouca coisa a comemorar nos últimos 50 anos. Casamentos são uma alegria universal.

— Receio que minha prima esteja certa — disse a princesa.

Marie-Claire sorriu.

— Melissa é uma princesa da Ilíria. Então, tudo deve ser feito como o povo de lá merece.

Pela primeira vez, Hawke compreendeu que sem­pre dividiria a princesa com o povo da Ilíria. Controlando o desejo de mandar todos os compatriotas dela para o inferno e casar-se com Melissa imediatamen­te, o empresário indagou:

— E quanto tempo leva para se organizar um casa­mento oficial?

Marie-Claire respondeu:

— Mais ou menos o mesmo tempo que se leva para organizar qualquer casamento grande. Pelo me­nos, um ano.

Hawke ficou aflito. Olhou para Melissa, tão ner­vosa quanto o empresário, e disse:

— Tudo bem, vamos fazer isso.

— Claro, esse é o casamento oficial — continou a prima. E decidi agora me juntar ao meu marido por alguns dias. Então, o casarão é de vocês.

Mais tarde naquela noite, quase adormecida, Me­lissa murmurou:

— Como vamos esperar um ano? Não poderemos viver juntos, você sabe. O povo da Ilíria é muito rígi­do com relação à moral.

— Vou negociar e reduzir a espera para seis meses — respondeu Hawke. — Mas, na Nova Zelândia, po­demos nos casar em três dias...

A princesa o observou, adorando a oportunidade de mostrar abertamente os sentimentos. O empresá­rio estava esparramado nos lençóis brancos, feito um predador saciado, relaxado como a jovem nunca o vira antes. E quando o fogo começou a queimar novamente nos olhos dele, a moça percebeu o quanto o empresário a amava.

Agradecendo aos deuses que lhe deram isso, Melissa beijou o peito musculoso do futuro marido.

— Um casamento particular na praia?

— Adoraria se pudéssemos fazer isso. Mas nada importa agora que sei que me ama. Vamos ajeitar as coisas. Apenas...

— Apenas? — Hawke instigou-a.

— Você se importa que eu prossiga com a faculda­de? Tenho que trabalhar no projeto de turismo para a Ilíria.

O empresário levou uma das mãos da princesa aos lábios dele e beijou-lhe os dedos e a palma.

— A sua lealdade é uma das coisas que mais amo em você. Fará o que quiser. Temos responsabilidades e compromissos a cumprir.

Melissa voltou a beijá-lo.

— Eu o amo tanto!

— E eu amo você para sempre...

A princesa abaixou-se e ouviu a batida compassa­da do coração de Hawke. De agora em diante, os dois estavam seguros, felizes um com o outro.

 

                                                                                            Robyn Donald

 

 

Carlos Cunha        Arte & Produção Visual

 

 

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