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Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites
CARTAS DOS PRIMOS LADRÕES
Primo rural - Como está meu irmão, isto é, meu primo? Eu estou mal aqui na aldeia Julius Nyerere, as coisas tornaram-se muito difíceis para os ladrões de gado. Sabe o que faz a população? Pega no ladrão, mete num saco e afoga-lhe no rio Limpopo! Estamos cheios de medo, primo. Até já escrevemos para a Alice Mabote, essa senhora que Liga para os Direitos Humanos...
Primo urbano - Eh pá, isso está feio por ai. Eu lhe dou um conselho, caro primo: venha para a cidade. Nós, os ladrões urbanos, estamos numa boa. Ai, no campo, eles afogam o ladrão que roubou o boi. Aqui afogam é o boi. Vocês, pobres criminosos, andam com medo da população. Aqui, em Maputo, é o contrario. Que venha, caro primo! Aqui eu o enquadrarei.
Primo urbano - Lhe digo e redigo meu primo-irmão: junte-se aos bons, isto é, aos maus. Aqui está bem acompanhado-filhos de gente grande e alguns próprios grandões. Se for preso sai logo no dia seguinte. Se demorar a sair agora até há bons advogados que aparecem logo a defender-nos. Não é que tudo seja bom. Por exemplo, a concorrência com ladrões de fora. Isso não está correcto, até já falamos às autoridades policiais. Começam a aparecer criminosos nigerianos, tanzanianos, malawianos, sul-africanos. Eh pá! Então onde está a protecção do empresariado nacional? Então isto é assim - nigerianos da droga já tem lojas e empreendimentos em Maputo. Dão licença sem nos contactarem a nós?
Primo rural - Já tomei decisão - vou para Maputo, juntar-me a si.
Primo urbano - Óptimo. Cá lhe espero. Só lhe dou um conselho - evite vir de chapa. É a única coisa que um ladrão pode temer nesta bela cidade moderna! Rouba uma boa viatura e venha.
chapa - transportes semi-colectivos de Maputo. Entrar enquanto houver lugar, se não houver lugar, empurra.
Mia Couto
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