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TOBRUK - A Chave do Egito
TOBRUK - A Chave do Egito

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

RELATOS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

TOBRUK - A Chave do Egito

 

                  

 

A guarnição de Tobruk, auxiliada pela RAF, pela Marinha Real e pelas colunas móveis de blindados, salvou a Campanha da África, em 1941. À sua heróica resistência, de 242 dias de duração, deveu-se a série de grandes vitórias conquistadas ali pelos Aliados.

 

No azul

 

Mesmo no setor dos tanques, nem tudo na guerra no deserto combate. A gente passava a maioria dos dias procurando contornar a hostilidade do meio e tornar familiares os problemas que tínhamos de enfrentar. Os desconfortos eram aceitos e esquecidos e aprendíamos a passar sem muitas coisas a que estávamos acostumados, como água ilimitada, frutas e legumes frescos, camas, cerveja, a companhia de mulheres e o luxo de, ao anoitecer, poder fugir um pouco ao convívio daqueles com quem havíamos passado todo o dia. Vivíamos na algibeira uns dos outros e inventávamos regras para não nos trucidarmos mutuamente.

 

Os velhos Ratos do deserto que lerem este livro verão que ele constitui uma verdadeira fonte de lembranças: o círculo amplo e perfeito do horizonte; o céu azul sempre a nos cobrir, durante o dia; em noites sem lua, um pálio negro perfurado por centenas de pontos brilhantes; os amarelos, os marrons, os cinzas; a touceira de sal; o espinho de camelo e a grama rija que brotava esparsa, dando a impressão de que os camelos estavam pastando areia. Os nossos sentidos recordam o abençoado alívio da tensão nervosa que vinha quando o khamsin finalmente parava de soprar; o frescor da brisa, noturna depois da fornalha do dia; o frio penetrante das horas que precedem o amanhecer; as canções, “Saída Bint”, “Lili Marlene” (que os veteranos sempre cantavam em alemão) e a irreverente “Rainha Farida”, berrada com a melodia do hino nacional egípcio; o gosto de carne enlatada, quase sempre muito gordurosa, de batata e repolho desidratados, reconstituídos com água salobra misturada com cloro, de “biscoito burger”, uma mistura de biscoito do exército, partido, leite enlatado e xarope dourado aquecida numa caneca e, raramente, os deliciosos artigos de luxo enlatados capturados aos italianos, ou o pão preto, sardinha e queijo beneficiado que constituíam a alimentação do Afrika Korps.

 

Nós que vivíamos “no azul”, como chamávamos o deserto, num reconhecimento semiconsciente da sua semelhança com o mar, sentíamos-nos tão fora de contato com o mundo, quanto os marinheiros ao singrarem o mar alto. Nossos lares, os caminhões, meias-lagartas, carros blindados ou tanques, eram auto-suficientes, como os navios, e transportávamos conosco nosso abrigo e nossas provisões. As batalhas, breves e intensas, travadas com forças inimigas encontradas, de repente, em lugares inesperados eram importantes não pelo terreno conquistado, como na guerra terrestre, mas, pela redução das forças do inimigo, como nas batalhas navais. A luta que entre 1940 e 1942 teve lugar no deserto norte-africano tem sido descrita freqüentemente como guerra naval em terra, pois a mobilidade possibilitada pelos veículos de lagartas e pneus próprios para o deserto permitia que as forças fossem empenhadas em combate de modo muito parecido com as esquadras de alto-mar. A relativa vastidão do deserto significava que, como o mar, ele podia ser limpo, mas não conservado; os oásis eram ilhas; os trechos de intransponível areia fofa ou repletos de rochas eram os baixios e recifes e os portos ao longo do Mediterrâneo serviam à mesma finalidade, exceto que as forças chegavam até eles por terra e muitas vezes os canhões da marinha funcionavam como parte das baterias de terra. Tudo isto fez que o Chefe do Estado-Maior Geral Imperial (CIGS). Sir John Dill dissesse, pouco antes do reinício da luta, em março de 1941, que “a esquadra mais forte vencerá”.

 

Na época do ataque alemão à Cirenaica, os dois contendores demonstravam possuir mentalidade fortemente defensiva. O General Wavell enviara a maior parte da sua infantaria e dos seus blindados para a Grécia e estava defendendo a vasta área que tomara aos italianos com uma força ridiculamente pequena. O Marechal Graziani, ainda sob o efeito da humilhante derrota sofrida por seu grande e bem equipado exército para uma força de certo modo fraca, estava inteiramente preocupado com a ameaça de um avanço britânico para Trípole. A princípio, o General Rommel concordou com o planejamento feito por Graziani e prudentemente estabeleceu uma forte linha defensiva a cerca de 32 km da posição avançada britânica em El Agheila. Era seu objetivo estabelecer ali uma defesa móvel e agressiva e fazer com que os britânicos pensassem duas vezes antes de invadir a Tripolitânia. Mas seu bem treinado serviço de reconhecimento logo descobriu que a infantaria australiana era escassa na área avançada e fraco o corpo de blindados de apoio disposto em torno de Antelat. Pelo meado de março, Rommel admitiu que os britânicos provavelmente recuariam para posições mais facilmente defensáveis, se atacados com vigor.

 

Até mesmo Rommel, o mais otimista dos comandantes alemães, ficou surpreso com a rapidez do sucesso que obteve. Ele não sabia que os britânicos haviam decidido não se preocuparem com a manutenção do terreno, nem mesmo com a própria Benghazi que, segundo Wavell dissera ao General Neame, tinha valor como propaganda, não como objetivo militar.

 

No contexto, porém, dos objetivos alemães no Egito, Tobruk era de grande importância militar. Surpreendentemente, isto não foi compreendido por Wavell, que deu como resposta ao cabograma em que Churchill lhe falava sobre a necessidade de se defender Tobruk não era uma boa posição defensiva. Irritado, Churchill ordenou-lhe então que defendesse Tobruk.

 

Se a cidade tivesse sido abandonada, provavelmente Hitler teria mudado de idéia sobre a inviabilidade de uma ofensiva contra o Egito e teria reforçado o Afrika Korps para que desfechasse uma blitzkrieg contra o Cairo e o Canal. No começo da primavera de 1941, aos britânicos não seria possível conter tal ataque.

 

Foi a guarnição de Tobruk, ajudada pela RAF, pela Marinha Real e pelas colunas blindadas do deserto, que salvou o nordeste da África em 1941 e deu aos Aliados o tempo de que precisavam para se prepararem para colher as grandes vitórias que se seguiriam.

 

Prelúdio da guerra no deserto

 

O interesse colonial italiano na África do Norte começou em 1912 quando, ao fim da guerra ítalo-turca, a Tripolitânia e a Cirenaica foram cedidas à Itália. Na Cirenaica, os italianos preferiram ocupar apenas as cidades de Benghazi, Derna e Tobruk, deixando o deserto e os oásis aos senussitas indígenas. Essa divisão do país foi regularizada por um acordo celebrado em 1917, do qual a Grã-Bretanha fez parte, dando todo o país aos senussitas, excetuando-se as cidades ocupadas pelos italianos. Pelo Acordo de Ar-Rajma, assinado em 1920, os italianos, tendo conferido o título de “Amir” ou “Príncipe”, juntamente com um subsídio financeiro, ao líder senussi Mohammed Idris, receberam deste o reconhecimento do controle da área costeira, com sua população muçulmana principalmente estática, enquanto que os italianos, de sua parte, reconheciam a administração autônoma do Amir dos oásis e dos povos beduínos nômades.

 

Com a subida ao poder, na Itália, do governo fascista, o acordo foi revogado e as relações entre italianos e senussitas, nunca muito estáveis, deterioraram a tal ponto que os senussitas começaram a travar guerra de guerrilha contra os colonos italianos.  Como resultado das represálias que isso provocou, a população beduína foi consideravelmente reduzida, por morte ou emigração forçada. Os italianos, com seu novo líder fascista, Benito Mussolini, anelando a criação de um novo Império Romano, tratavam as populações dos países africanos que procuravam submeter de modo desapiedado e cruel e as governavam com cínico desrespeito pelos seus direitos legais.

 

Na Cirenaica, as terras de beduínos e as propriedades dos senussitas que os italianos precisavam controlar, se quisessem obter êxito na tentativa de colonizar o Jebel Akhdar, foram por eles sumariamente seqüestradas e só ofereceram compensação nos casos em que não puderam obter nenhuma condenação por “rebelião” contra o antigo dono. Por volta de 1940, cerca de 50.000 colonos camponeses italianos estavam ocupados no cultivo de cereais e na plantação de videiras e árvores frutíferas várias nas áreas setentrionais da região, num esforço por estabelecer ali uma província italiana.

 

Desde o começo, os italianos haviam ocupado a pequena cidade costeira de Tobruk. Com sua baía natural, abençoada com águas profundas e protegida por terras altas, ela proporcionava um ancoradouro seguro, acessível a grandes navios. A baía é formada por uma enseada que se projeta na direção norte da linha costeira cirenaica, com sua entrada voltada para leste. A cidade de Tobruk foi construída na margem norte da enseada e, em 1940, ocupava cerca de 1.600 m dos seus 4 km de extensão.

 

Com o correr dos anos, os italianos haviam-na transformado numa base de guarnição modesta mas agradável. Embora a maioria dos soldados vivesse em bairros próximos, os oficiais graduados e os funcionários civis tinham casas na cidade, na maioria agrupadas em torno de uma praça pomposamente batizada de Piazza Vittorio Emmanuele. A maior parte das casas e prédios militares italianos apresentava certa uniformidade regimental, mas havia prédios de aspecto mais sofisticado e com maior distinção arquitetônica. Neste grupo de prédios incluíam-se a prefeitura e o banco, simbolizando a solidez administrativa e comercial do novo Império, e uma bela escola, que ostentava o nome daquele que, em poucos anos, levaria seu país, destituído de todas as possessões coloniais, à rendição ignominiosa: Benito Mussolini.

 

Entre as comodidades que Tobruk garantia a seus habitantes relacionava-se o “Grande Hotel” e duas outras hospedarias; um restaurante cabaré, que oferecia diversão aos civis e militares; um hospital, para cuidar do bem-estar físico da população; e uma igreja e uma mesquita, para atender às necessidades espirituais dos católicos romanos e dos muçulmanos. A eletricidade era produzida por uma usina construída à beira do mar. Nas proximidades dela erguia-se um grande frigorífico, que conservava carne fresca em quantidade suficiente para satisfazer às necessidades da guarnição. A água, sempre escassa nas áridas vastidões do deserto líbio, vinha de poços subartesianos cuja produção era aumentada por uma usina destiladora de água. A água salobra dos poços não agradava aos italianos como bebida; eles preferiam as águas minerais “Rocoaro”, importadas em grandes quantidades da Itália.

 

Numa elevação que dominava as águas azuis da baía erguia-se o edifício mais importante de Tobruk, o QG naval. Um grande prédio de três andares, de concreto, que dominava toda a cidade. Embora ainda inacabado no momento da eclosão da guerra, era de construção tão sólida, que resistiu ao impacto de uma bomba de 250 kg quando a cidade foi, mais tarde, submetida a ataques aéreos.

 

Os italianos haviam tomado providências contra a possibilidade de ataque por terra ou bombardeio naval ou aéreo, construindo túneis profundos na rocha sólida do promontório, para fazer abrigos à prova de granadas e bombas, para armazenar combustível, munição e suprimentos para a guarnição.

 

Esta era, pois, a modesta e até então desconhecida cidade cujo nome se tornaria familiar ao mundo inteiro durante as campanhas do deserto, travadas de 1940 a 1942, em idas e vindas desde El Agheila, nas fronteiras da Tripolitânia, até El Alamein, já bem dentro da fronteira egípcia. Ao longo dessa fronteira, durante o verão e outono de 1940, um grande exército italiano reuniu-se e preparou-se para um ataque rumo leste, Egito adentro, contra uma força britânica relativamente fraca.

 

No final dos anos 30, à medida que as nações européias se moviam inexoravelmente para uma nova guerra, o ditador italiano, confiante em que podia zombar do poder da Grã-Bretanha e da França (pois nenhuma das duas nada fez para impedir que ele promovesse a anexação implacável da Etiópia, em 1935), aproximou-se ainda mais de Adolf Hitler e selou com ele a aliança do Eixo. A Liga das Nações reagiu à agressão italiana na Etiópia impondo sanções econômicas à Itália, medida que não fez mais que irritar os seus dirigentes e encorajar a aproximação dos regimes fascista e nazista, afinal de contas.

 

O sucesso das armas italianas na Etiópia e o apoio e adulação do povo ao líder fascista tiveram o efeito lamentável de aumentar nele a crença de que a Itália era uma enormíssima potência militar, capaz de vencer rapidamente quem quer que visse a enfrentar. Essa euforia militar, somada à suposição de que os britânicos estavam em decadência, convenceu-o de que a Itália seria capaz de ampliar ainda mais seu império no Mediterrâneo, às custas da Grã-Bretanha.

 

Tudo quanto se registrou nos anos que precederam a guerra concorreu para sustentar essa convicção: a atitude pusilânime da liga diante das ambições territoriais de Hitler, que haviam começado com a reocupação da zona desmilitarizada da Renânia; a política de não-intervenção adotada pelas potências ocidentais enquanto Franco introduzia um regime fascista na Espanha, abertamente ajudado pela Itália e pela Alemanha; a anexação da Áustria, que o Führer concretizou em março de 1938, seguida de perto, em setembro do mesmo ano, da reunião de Munique, na qual Mussolini experimentou a atitude de apaziguamento do Primeiro-Ministro britânico em primeira mão.

 

Apesar, porém, dessa grande quantidade de fatos comprobatórios, apesar do tom belicoso dos seus discursos, entremeados de gestos dramáticos e agressivos, Mussolini não tomou imediatamente das armas quando seu colega do Eixo invadiu a Polônia. Esperou por mais nove meses, quando então a França e os Países Baixos já haviam sido reduzidos à impotência pela rapidez e poder da Blitzkrieg alemã, para finalmente declarar guerra à Grã-Bretanha e à França, a 10 de junho de 1940, pouco antes de os franceses pedirem a paz.

 

Assinado o armistício com a França, os italianos não tinham mais que temer as forças coloniais francesas na África do Norte, nas fronteiras ocidentais da Tripolitânia. Estavam livres para concentrar avassaladoramente todo o seu poderio contra os britânicos.

 

O Marechal Graziani tinha à disposição forças consideráveis para atacar os britânicos no Egito. Por toda a Cirenaica e a Tripolitânia, os italianos possuíam quase 250.000 homens organizados em dois exércitos; o 10o Exército, alinhado na Cirenaica, era formado de um corpo regular e um de Camisas Pretas, cada qual composto de duas divisões italianas; havia ainda duas divisões líbias de askaris; o restante, conhecido como 5o Exército, estava na Tripolitânia. Toda essa enorme tropa encontrava-se sob o comando do QG Supremo da África do Norte, de Graziani. Afastada a ameaça representada pelos franceses, na fronteira da Tunísia, pela rendição da França, o marechal podia tranqüilamente colocar o grosso das forças existentes na Tripolitânia em reforço do 10o Exército, se necessário, embora o 10o Exército sozinho superasse bastante em volume de tropa o contingente britânico que os italianos tinham pela frente.

 

Em meados de setembro, Graziani começou a avançar – cautelosamente, apesar da sua superioridade numérica avassaladora – para o interior do Egito. Foi um começo moderado, tendo em vista a grandiloqüente estratégia concebida pelo Duce para o Oriente Médio, destinada a aumentar radicalmente o tamanho do Império Africano da Itália, melhorar sua imagem perante o povo italiano e obrigar Hitler a reconhece-lo como um parceiro de igual valor na aliança do Eixo. Diante de uma retirada habilmente conduzida pelos comandantes britânicos, prejudicados pelos campos minados, bombardeados pela RAF e continuamente hostilizados pela artilharia britânica, os italianos levaram quatro dias para chegar a Sidi Barrani, 104 km distante do ponto em que partiram.

 

Esse laborioso avanço foi saudado como uma grande vitória pela Rádio de Roma e Mussolini começou a pressionar o seu comandante para que continuasse atacando para oeste. Mas Graziani não revelava muita pressa. Enquanto seu exército se empenhava em fortalecer as linhas de comunicações contra a ameaça de ação britânica e a entrincheirar-se e construir posições defensivas, o Marechal respondia às incitações de Roma com um fluxo constante de queixas sobre a má qualidade do equipamento, dos blindados e da artilharia de que dispunha. A tenaz resistência britânica enervava o italiano.

 

Apesar de não ter sido obrigado a enfrentar nenhuma posição firmemente preparada durante o avanço que fez, Graziani não esperava pela contínua hostilização a que suas colunas haviam sido submetidas. Em cada crista do terreno, uma contestação a anular, e até mesmo à noite, quando já recolhidos aos acampamentos, os italianos eram bombardeados com grande precisão, devido ao hábito, sem dúvida proveniente do nervosismo da tropa, de iluminar com holofotes a área situada em torno de suas posições.

 

Graziani e seu exército não mostravam grande inclinação para continuar avançando, parecendo satisfeitos com as posições defensivas que ocupavam em torno de Sidi Barrani. Enquanto isso, a guerra estava parada e a iniciativa fugira às mãos dos italianos. Os soldados realizavam apenas uma pequena adaptação à vida no deserto, permanecendo praticamente como estranhos naquelas inóspitas paragens.

 

A atitude dos britânicos que defendiam o Egito fazia um contraste muito forte com a dos hesitantes construtores de império de Mussolini.

 

O General Sir Archibald Wavell fora nomeado Comandante Geral a 2 de agosto de 1939, com as forças terrestres do Sudão, Egito, Palestina, Transjordânia e Chipre sob seu comando. Quando do começo da guerra, ampliou-se a sua área de responsabilidade para incluir a Somália Britânica, Aden, Iraque e as costas do Golfo Pérsico. Durante o período em que os italianos ficaram como espectadores das façanhas de seu aliado alemão, Wavell fez o que pôde, dentro das rígidas restrições que lhe foram impostas, para se preparar para a luta inevitável no Oriente Médio. Essas restrições foram eliminadas quando Winston Churchill se tornou chefe de um governo de coalizão cujo objetivo era levar a guerra, independente do que viesse a custar, à vitória final. Wavell concordava plenamente com essa nova e agressiva política.

 

Apenas três dias antes que a Itália declarasse guerra à Grã-Bretanha e França, o Major-General Richard O’Connor assumiu o comando da Frota do Deserto Ocidental, instalando seu QG em Mersa Matruh, com a tarefa de proteger o Egito contra a invasão italiana. Para isto, ele tinha a 7a Divisão Blindada, menos uma brigada, dois regimentos da Real Artilharia e dois batalhões motorizados; era verdadeiramente um Davi britânico diante de um Golias italiano. O’Connor, porém, logo de saída adotou uma política ativamente agressiva que estabeleceu uma tradição de ascendência moral dentro da Frota do Deserto Ocidental. O exército italiano, que era menos ativo, desenvolveu, ao contrário, um sentimento de inferioridade que afetaria o seu desempenho durante a campanha do deserto, mesmo depois da chegada de forças alemãs à África do Norte.

 

O volume das tropas à disposição de Wavell no Egito, no começo das hostilidades, atingia cerca de 36.000 homens. Integravam-nas a 7a Divisão Blindada, comandada pelo Major-General O’Moore Creagh; a 4a Divisão Indiana, sob o Major-General Noel Beresford-Pierse; a Divisão Neozelandesa, comandada pelo Major-General Bernard Freyburg; 14 batalhões de infantaria britânicos e dois regimentos de artilharia. Essas divisões estavam todas abaixo dos seus efetivos e careciam tristemente de equipamento, artilharia, blindados e transporte motorizado. Para compensar até certo ponto essas deficiências, Wavell insistira, durante o período que precedeu o governo de Churchill, período decepcionante do ponto de vista militar, para que suas formações atingissem elevado padrão de treinamento, o que foi feito com a máxima eficiência.

 

Em agosto de 1940, Wavell visitou Londres e, após consultas com Churchill e com o Chefe do Estado-Maior Geral Imperial, General Sir John Dill, retornou ao Oriente Médio alentado pela promessa de que receberia reforços de tanques, artilharia, armas automáticas e munição. Nessa época a própria Grã-Bretanha estava sofrendo violentos ataques aéreos e vivia a ameaça de invasão. Grande parte do equipamento que a Força Expedicionária Britânica havia levado para a França tinha sido abandonada do lado errado do Canal da Mancha, quando os britânicos foram evacuados em Dunquerque, e o exército alemão começou a reunir barcaças de invasão nos portos do Canal com a nítida intenção de pular para as Ilhas Britânicas. Nessas circunstâncias, a decisão de reforçar o Exército do Nilo era desassombrada e previdente.

 

Encorajado pelo apoio de Churchill e pela relutância de Graziani em deixar as posições que mantinha em torno de Sidi Barrani, Wavell começou a planejar a ofensiva que entrara em sua cogitação desde o momento em que os italianos declararam guerra. Esses planos foram feitos em segredo, pois ele queria criar a impressão, com seus movimentos iniciais, de que objetivava apenas uma incursão de cinco dias, com grande número de soldados. O comboio da Inglaterra que trazia os prometidos reforços chegou ao Egito em meados de setembro e começaram de pronto os preparativos para o ataque que se iniciaria em princípios de dezembro. Durante o período de relativa calma que se seguiu à movimentação dos italianos para Sidi Barrani, os homens da Força do Deserto Ocidental aclimataram-se às condições em que teriam de lutar.

 

Entre El Alamein, no Egito, e El Agheila, na fronteira da Tripolitânia, o deserto se estende por cerca de 800 km, cobrindo toda a largura da Cirenaica. As poucas áreas habitadas nesse ermo árido estão todas situadas numa estreita faixa que acompanha a costa, assim como as estradas e, onde existe, a ferrovia. Ao sul do cinturão costeiro, o deserto se estende ininterrupto por centenas de quilômetros, vazio, exceto quanto aos oásis de Jalo e Jarabub, na Cirenaica, e Siwa, no Egito. Nessa vasta arena de areia e pedra travou-se a guerra do deserto.

 

Alimento, água, combustível para veículos, munição para armas, tudo tinha de ser transportado por caminhões. A guerra no deserto era eminentemente móvel. Os tanques e a infantaria motorizada constituíam as armas de maior eficácia. A infantaria sem veículos, de uso limitado, era empregada nas lutas de sítio, nos momentos defensivos. Mas os infantes, mesmo quando móveis, tinham de ser protegidos por blindados e artilharia, pois os tanques soltos entre os soldados de infantaria e veículos “sem blindagem” no deserto aberto eram como lobos num aprisco. O tanque tornou-se o senhor do campo de batalha no deserto, embora sua operação fosse atribulada por dificuldades. Foi o general alemão Ravenstein que mais tarde resumiu sucintamente os problemas das batalhas blindadas nesse teatro de guerra: “Os tanques no deserto”, disse ele, “são um paraíso para o tático e um inferno para o oficial de intendência”.

 

O soldados britânicos, tradicionalmente adaptável, cuidou de tornar a vida tolerável nesse mundo de grandes contrastes. Durante os meses de verão, os dias ensolarados se sucedem numa seqüência contínua e monótona; pelo meio-dia, o revestimento metálico dos veículos ficava tão quente que não se podia tocar nele, ao passo que à noite, a temperatura, caindo rapidamente, gelava os corpos. Vez por outra, essa seqüência era interrompida, quando caíam tempestades de areia, tão fortes que ocultavam o sol. O vento levantava a superfície pulverizada do deserto, revolvida pela passagem de muitos veículos de rodas e lagartas, e fazia penetrar em cada escaninho do equipamento e dos instrumentos, em cada dobra da roupa e em todas as partes do corpo. Quando esse vento  era o Khamsin, sopro quente e seco tocado do sul ou sudeste, era como se as portas do inferno se escancarassem, lançando uma ventania que levantava a areia para queimar e sufocar todas as coisas vivas pelo caminho.

 

Quando os elementos de manutenção da vida se reduziam ao essencial, certas coisas assumiam extraordinária importância. No deserto, o chá era uma dessas coisas. Era tido como o principal antídoto do tédio e das dificuldades diárias. Até mesmo o ritual do seu preparo ganhava propriedades quase terapêuticas, devido à rotina de sua realização. Para fazer chá no deserto, uma lata de gasolina de 20 litros era cortada ao meio. Uma metade era cheia de areia e cascalho, ensopada em gasolina e acesa; a outra metade era usada para aquecer a água e, quando esta fervia, acrescentava-se chá açúcar e leite, mexendo-se vigorosamente toda essa mistura. O resultado era uma bebida forte, doce e estimulante – um restaurador de energia e um refrigério para o moral submetido ao stress.

 

As rações distribuídas aos soldados variavam muito pouco. A carne enlatada era o alimento principal e, provavelmente, o favorito de todos. Em seu preparo entravam muitas idéias e muita engenhosidade, num esforço por obter certa variedade de sabor. O bacon eram muitas vezes de qualidade medíocre, mas a carne enlatada e o ensopado de legumes forneciam uma refeição relativamente satisfatória. Qualquer outra coisa poderia ser escassa, mas biscoito não faltava. O exército distribuía-o numa variedade infinita de sabores e texturas, que os soldados comiam com margarina, geléia ou marmelada.

 

A idéia que os que não a viveram faz da vida no deserto é em geral errada, mas no tocante à água, todas as opiniões são concordes – era de fato escassa, quase inexistente. Numa comunidade civilizada, onde se pode obter água na qualidade desejada, é difícil imaginar as aflições que da sua inexistência decorrem. No deserto, a água, como tudo o mais, tinha de ser transportada até os soldados. Oficialmente, a ração diária era de 4 litros por homem, mas para os que estavam distantes dos pontos de abastecimento, a ração muitas vezes era de apenas a metade, quase nunca de mais de três litros. Para ir-se remediando com tão magra quantidade, os soldados eram obrigados a adotar um sistema rígido de consumo.

 

Uma ração de 2 litros seria distribuída da seguinte maneira: meio litro para um meio banho e barba; a água consumida nisso era, depois de filtrada, acumulada até fazer o suficiente para um banho geral. Depois de mais outra filtragem, era usada para lavar roupas; novamente filtrada, ia abastecer os veículos da unidade. Um segundo meio litro reservava-se ao cantil individual do soldado e o litro restante era destinado ao preparo do chá ou das refeições. O soldado do deserto criou um jeito todo seu de usar o material obtenível na região. Por exemplo, o aparelho de filtragem era feito da onipresente lata de gasolina de 20 litros, perfurada no fundo e cheia de camadas alternadas de areia e cascalho.

 

Assim, nos meses de relativa calma permitida pelo malogro do Marechal Graziani em avançar, o exército britânico transformou-se numa força apta a enfrentar os problemas do deserto, aprendendo a navegar com precisão pelas imensidões informes utilizando da melhor maneira possível seu equipamento e suas armas. Esse treinamento e aclimatação seriam úteis aos britânicos quando eles passassem à ofensiva, compensando com determinação e habilidade a vantagem que os italianos levavam em quantidade de soldado e de equipamentos.

 

De Sidi Barrani a Tobruk

 

A ofensiva de Wavell, chamada “Operação Bússola”, foi planejada sob a proteção de um véu de segredo raramente tão espesso. O General O’Connor não estava no conhecimento de que, se sua Força do Deserto Ocidental fosse bem sucedida na primeira fase do ataque, lhe seria dada permissão para continuar na ofensiva, de ir até onde lhe permitissem os recursos de que dispunha. Para que se mantivesse no maior sigilo o que planejavam, os britânicos fizeram espalhar que, longe de estarem pensando em ação agressiva no deserto, o mais provável é que houvesse novas retiradas, pois haviam sido muito enfraquecidas suas forças com a necessidade de desviar tropas para lutar na Grécia.

 

A 26 de novembro, sob o disfarce de Exercício de Treinamento nº 1, realizou-se o ensaio da operação. Os soldados que participaram dele sabiam apenas que se empenhariam em outra manobra, o Exercício de Treinamento nº2, durante a segunda semana de dezembro.

 

A 7 de dezembro, as forças de ataque estavam em suas posições. Movimentando-se no dia 6, registraram-se apenas as reclamações comumente feitas contra os planos de treinamento, embora alguns veteranos do deserto que já haviam viajado naquela direção desconfiassem de que estivesse em curso uma aproximação da linha defensiva italiana. Na manhã seguinte, bem cedo, depois de passarem a noite num bivaque, todos foram instruídos sobre a batalha iminente.

 

Os italianos ocupavam vários campos fortificados, construídos para bloquear as aproximações da estrada costeira, que estava sendo melhorada entre Sidi Barrani e Bardia, colocados para cobrir todos os possíveis caminhos de ataque. Havia campos fortificados a leste da própria Sidi Barrani e no lado norte da estrada costeira, a uns 32 km de distância, em Maktila. Ao sul de Maktila e da estrada havia outro campo fortificado, num lugar conhecido como Ponto 90. Maktila e o Ponto 90 serviam para proteger Sidi Barrani contra arremetida feita ao longo da estrada, vinda de Mersa Matruh.

 

Em Tummar, outra concentração de tropa protegeria o sul do Ponto 90 e, também ao sul de Tummar, o Campo Nibeiwa vigiava as escarpas de Bir Enba. Os campos fortificados restantes, em Rabia e Sofaffi, a sudoeste de Nibeiwa, procurariam barrar qualquer movimento de flanco na direção de Buq Buq, a oeste de Sidi Barrani.

 

Em geral, esses campos distavam não mais de 8 km uns dos outros, mas entre Nibeiwa e Rabia, a brecha era de quase 48 km de deserto inteiramente plano. Nos meses que sucederam o avanço italiano para Sidi Barrani, os britânicos mantiveram os campos fortificados sob constante observação, para avaliar seus efetivos; fizeram incursões para, através dos prisioneiros que conseguissem pegar, obter informações. De modo geral, dominavam o deserto em torno deles, estabelecendo, desse modo, uma ascendência moral sobre o adversário, que se revelava muito defensivista.

 

As forças italianas que O’Connor teria que enfrentar eram bastante volumosas. Espalhadas pelos campos fortificados e pelas imediações de Sidi Barrani havia duas divisões líbias, a 4a Divisão de Camisas Pretas, e uma unidade, denominada “Grupo do General Maletti”, com efetivos de divisão. Esta formação ocupava o campo de Nibeiwa. Nos campos de Sofaffi e Rabia e ao longo do lado sul da escarpa postava-se outra divisão e, mais para trás, uma divisão fora posicionada entre Sidi Barrani e Buq Buq, com duas outras no triângulo formado por Forte Capuzzo, Sollum e Sidi Omar.

 

A Força do Deserto Ocidental se propunha atacar com a 7a Divisão Blindada, a 4a Divisão Italiana e a  “Força de Selby”, uma formação comandada pelo Brigadeiro A. R. Selby e integrada por três colunas móveis de infantaria, uma tropa de carros blindados e uns poucos canhões antiaéreos e canhões de campanha, leves. Toda a força de ataque de O’Connor não chegava a somar 30.000 homens, só que eram excepcionalmente bem treinados e cheios de confiança.

 

Há tantos imponderáveis na guerra que nenhuma batalha segue fielmente o plano preparado, por mais bem ponderado e ensaiado. Mas a “Operação Bússola” quase foi uma exceção à regra. Para começar, a força atacante aproximara-se sem ser descoberta até as posições que os italianos ocupavam a 7 de dezembro, apesar da massa de tropas e veículos envolvidos e do terreno, inteiramente aberto. E quando, no dia 8 de dezembro, domingo, ela fez a aproximação das posições de pré-ataque, nuvens baixas proporcionaram a cobertura de que precisava para não ser descoberta pelos aviões de reconhecimento italianos.

 

Durante a noite de 8 de dezembro, as duas divisões se separaram, a 4a Indiana para fazer os primeiros ataques à área fortificada de Nibeiwa e Tummar, e a 7a Divisão Blindada, fletindo para oeste, dirigiu-se para trás do campo de defesa da estrada Sidi Barrani-Buq Buq. A Força Selby, deixando Mersa Matruh a 9 de dezembro, dirigir-se-ia para oeste, ao longo da estrada costeira, encarregada de manter a guarnição de Maktila ocupada, depois do que avançaria para a própria Sidi Barrani.

 

Durante toda a noite de 8 de dezembro, a RAF e a Marinha Real promoveram apoio à Força do Deserto Ocidental. Sidi Barrani e os aeródromos situados a oeste foram bombardeados, enquanto que o monitor Terror, apoiado pelas canhoneiras Aphis e Lady-Bird, bombardeavam Maktila e Sidi Barrani. Para as tropas que no deserto aguardavam o começo do ataque, a expectativa do momento da luta foi suportada com dificuldade, em vista do desconforto físico e da excitação nervosa. Como de hábito, a tensão da vigília do pré-ataque foi quebrada pelos artilheiros. Às 07:15h os canhões da artilharia divisionária abriram fogo contra Nibeiwa e trovejaram um bombardeio breve mas intenso.

 

Mais cedo, às 05:00h, um batalhão da 4a Divisão Indiana, deslocando-se do setor oriental em que se encontrava a Divisão, disparou rápida série de tiros, silenciando a seguir, estratagema calculado para induzir apreensão dentro das defesas. Também a barragem de artilharia foi desfechada do lado oriental do campo fortificado, mas quando, uns dez minutos mais tarde, o ataque começou, foi dirigido contra o ângulo noroeste.

 

A ponta-de-lança do ataque era composta de tanques Mark II da infantaria – Matildas, lentos mas fortemente armados – do 7o do Real Regimento de Tanques, que penetraram as defesas de Nibeiwa, eliminando logo de saída cerca de 25 tanques leves e médios italianos que estavam estacionados fora das linhas de defesa. Quando os Matildas entraram em combate com a artilharia e a infantaria inimigas, a pequena distância, a infantaria britânica do 1/6o Fuzileiros Rajputanos e do 2o Cameron Highlanders, seguindo logo atrás, fez a limpeza dos bolsões de resistência mais tenazes. No começo do ataque, o comandante de grupo italiano “General Maletti” foi morto por uma rajada de fogo de metralhadora de um ataque quando deixava sua trincheira, mas, apesar desse revés para o moral italiano e do elemento surpresa conseguido pelo ataque feito pela “porta dos fundos”, foram precisas duas horas de luta árdua até que Nibeiwa caísse inteiramente em mãos britânicas.

 

Enquanto a ação se desenrolava, uma força  formada da 5a Brigada Indiana – 1o Real de Fuzileiros, 3/10 Regimento do Punjab, 4/6o Fuzileiros Rajputanos – e um regimento de artilharia de campanha fizeram um deslocamento em arco pelo oeste de Nibeiwa, para ficar em posição de atacar o acampamento de Tummar. Fazendo um círculo ainda maior para oeste, a 7a Divisão Blindada, com a 4a Brigada Blindada à frente, preparava-se para cortar a estrada costeira entre Buq Buq e Sidi Barrani.

 

Os tanques e veículos que percorriam o deserto aberto forneciam uma visão esplêndida: cada veículo deixava atrás de si uma leve nuvem de poeira que se contorcia na clara luz do sol da manhã; os estandartes presos às antenas de rádio dos tanques destacavam-se, esticados ao vento produzido por seu rápido deslocamento. A cena lembrava a guerra no mar, com a qual a guerra no deserto muito se assemelha. Por volta das 10:00h, a estrada costeira havia sido cortada e o resto do dia foi dedicado à captura e destruição de veículos italianos que topavam confiantemente os obstáculos erguidos sobre suas linhas de comunicação.

 

Entrementes, depois de concluir o reconhecimento de Tummar, a 5a Brigada Indiana montou seu ataque durante a tarde. Este seguiu o mesmo padrão tão bem sucedido do ataque a Nibeiwa, mas com menos tanques e sem o elemento surpresa. Contudo, o resultado foi o mesmo. O forte foi tomado ao anoitecer, embora os britânicos sofressem mais baixas do que em Nibeiwa.

 

Mais ao norte, na faixa costeira, a “Força Selby” se esforçara para impedir que a guarnição italiana do forte Maktila escapasse. Infelizmente, seus esforços foram frustrados por grossa tempestade de areia que se levantou e, remoinhando na retaguarda dos italianos em retirada, permitiu-lhes recuar para posições a cerca de 10 km a oeste.

 

Apesar do desapontamento por não terem podido impedir a fuga dos defensores de Maktila, no fim do dia era evidente que as coisas tinham saído muito bem na “Operação Bússola”. Em Nibeiwa, o número de prisioneiros passou dos 2.000, além de vários tanques e canhões. Em Tummar, o resultado do ataque foi igualmente bom. A barricada que a 7a Divisão Blindada ergueu na estrada costeira redundara em cerca de 300 prisioneiros, grande quantidade de veículos capturados e número ainda maior de destruídos. Em suma, o começo da ofensiva foi bastante satisfatório, mas o General Wavell considerou prudente incluir uma nota de cautela no comunicado que dirigiu a Londres narrando as ocorrências que acabavam de se verificar. Embora pretendesse levar a ofensiva até onde pudesse, havia ainda um longo caminho a percorrer e Wavell era um homem que não gostava de celebrar vitórias antes de tê-las inteiramente conquistado.

 

A tempestade de areia que interferira nos planos da “Força Selby” de isolar a guarnição italiana de Maktila foi o prelúdio de um período de mau tempo. Os dias eram frescos e as noites, penetrantemente frias; ventos fortes reuniam a areia e a impulsionavam em nuvens densas e abrasivas que varriam a face do deserto, reduzindo a visibilidade a uns poucos metros e tornando desgraçadamente dura a vida dos soldados que tentavam manter o impulso da ofensiva. Para aumentar as dificuldades, fortes chuvas caíram quando o vento cessou.

 

No dia 10 de dezembro, duas brigadas da 4a Divisão Indiana abriam caminho, lutando forte, na direção de Sidi Barrani; eram a 5a Indiana, que estivera em ação em Tummar, e a 16a  Britânica, que permanecera na reserva no começo da luta. Apesar do mau tempo, que impossibilitava operações coordenadas de tanques e infantaria, e da vigorosa resistência dos italianos, o primeiro batalhão da 16a Brigada Britânica chegou à estrada em Alam el Dab. Por volta das 13:30h, as brigadas haviam alcançado os objetivos que buscavam.

 

Desejando manter a pressão sobre os italianos, o Major-General Beresford-Pierse ordenou que a 16a Brigada, com tantos Matildas quantos podiam ser postos em serviço, atacasse Sidi Barrani às 16:00h. Chegaram também para o apoio a 4a Brigada Blindada, que fora a ponta-de-lança do rápido avanço da 7a Divisão Blindada pelo deserto, para cortar as linhas de comunicação italianas, e todos os efetivos da artilharia divisional. Sidi Barrani foi tomada e ultrapassada em meia hora. Recebendo a adição da “Força Selby”, a 16a Brigada Britânica conseguiu enredar os remanescentes de duas divisões líbias e de uma Divisão Camisas Pretas antes do anoitecer.

 

Enquanto essa luta se desenrolava, a 7a Divisão Blindada permanecera disponível no deserto, ao sul da estrada costeira e a oeste da trilha que vai de Sidi Barrani a Bir Enba; mas, à noite, com Sidi Barrani tomada, o Major-General O’Connor deu ordens para que a divisão avançasse sobre Buq Buq.

 

Nessa conjuntura, tendo planejado com sucesso o colapso total das forças italianas na área de Sidi Barrani, O’Connor foi repentinamente confrontado com a perda da 4a Divisão Indiana. Wavell havia inicialmente destacado essa divisão para atuar no Sudão, juntamente com a 5a Divisão Indiana, na campanha do leste africano, contra a Eritréia e a Etiópia ocupadas pelos italianos, assim que a primeira fase da “Operação Bússola” fosse concluída. Navios mercantes estavam já disponíveis e a 11 de dezembro O’Connor recebeu ordem para devolver a formação, altamente treinada, menos a 16a Brigada Britânica, embora isso, indubitavelmente, freasse a ofensiva. Para substituí-la, ele recebeu a 6a Divisão Australiana que, na época, tinha apenas uma brigada na área do deserto e em geral carente de transporte e equipamento; além disso, haveria uma defasagem, enquanto os australianos se aprontavam para a luta e se adaptavam à vida no deserto, tal como acontecera com a Divisão Indiana.

 

Contudo, nesse estágio, o General O’Connor tinha, a consolar-lhe o pesar de não poder prosseguir, o resultado das lutas dos últimos dias, o que era uma satisfação. Quatro divisões italianas haviam sido destruídas e duas outras tinham sido seriamente maltratadas. No processo, cerca de 38.000 soldados italianos e líbios haviam parado, não totalmente a contragosto, nas gaiolas de prisioneiros. Setenta e três tanques e 237 peças de artilharia tinham sido capturados, além de considerável número de veículos motorizados, que, numa campanha em que era essencial, se constituíam numa aquisição bem-vinda.

 

Mas O’Connor, homem de ação por natureza, não era de se contentar com louros de feitos passados; com o restante das suas forças, ele continuou a hostilizar e perseguir os italianos, atacando bolsões de resistência e avançando bem para oeste. Era sabido que Graziani pretendia defender Bardia e Tobruk e que Mussolini apoiava firmemente essas intenções, de modo que como a necessidade de infantaria se fazia urgente, os australianos foram levados para o deserto o mais rápido possível.

 

Entrementes, a violência da luta se abateu sobre a 7a Divisão Blindada. Pelo meio-dia de 15 de dezembro, a 4a Divisão Blindada estava de volta ao trabalho de isolar a estrada entre Bardia e Tobruk, tendo tomado anteriormente Sidi Azeiz. A 17 de dezembro, Sido Omar foi capturada e, pelo dia 20, Capuzzo e Sollum estavam em mãos britânicas; embora a captura de Sidi Omar tivesse elevado o número de prisioneiros italianos para mais de 1.000, em Capuzzo e Sollum os britânicos não tiveram efetivos suficientes para impedir que grande quantidade de soldados de infantaria e artilharia pudessem fugir para engrossar a guarnição de Bardia, tornando, desse modo, a captura daquela cidade empreitada mais difícil.

 

Bardia apresentava ao atacante mais dificuldades do que qualquer das posições fortificadas já acossadas. O perímetro defensivo da cidade, de cerca de 27 km de extensão, consistia de uma trincheira antitanque contínua, obstáculos de arame farpado e fortins de concreto colocados para cobrir com fogo esses obstáculos. Dentro do perímetro havia cerca de 45.000 homens e mais de 400 canhões.

 

A 21 de dezembro, o Major-General Iven Mackay assumiu o comando da área de Sollum. O comandante da 6a Divisão Australiana era um soldado e acadêmico, tendo passado vinte anos de sua vida como catedrático universitário e diretor de escola. Como comandante de companhia em Gallipoli, durante a Primeira Guerra Mundial, ele se distinguira como líder combatente e passara a comandar um batalhão aos 34 anos e uma brigada aos 36 anos de idade. Seus méritos de comandante corajoso e determinado foram ainda reconhecidos com a concessão da DSO (Ordem de Serviços Distintos).

 

Na 6a Divisão Australiana havia homens, muitos deles, que correram a apresentarem-se como voluntários quando da eclosão da guerra e ansiavam por justificar a reputação adquirida pelos seus antepassados do Anzac (Corpo Australiano e Neozelandês) na luta sangrenta de Gallipoli e na Frente Ocidental durante a guerra de 1914-1918. Eles haviam treinado arduamente na Palestina, o moral da tropa era elevado e os oficiais que a comandavam, embora em geral individualistas ferrenhos e homens de personalidade forte, haviam sido fundidos numa equipe pelos esforços do seu comandante de divisão. Infelizmente, o equipamento de que dispunha não se identificava com os padrões de eficiência da tropa.

 

A divisão carecia de canhões, carretas transportadoras de metralhadoras Bren (Pau para toda obra do soldado de infantaria), de sobressalentes para o transporte e, além disso, grande parte do equipamento que possuía era obsoleta. Apesar dessas desvantagens, a divisão se preparou com entusiasmo para a primeira batalha.

 

Os generais O’Connor e Mackay decidiram iniciar o ataque a Bardia despachando um batalhão de infantaria para tomar uma cabeça-de-ponte sobre a trincheira e a cerca de arame antitanques. Quando a trincheira fosse transposta e eliminados o arame farpado e as minas, os tanques do 7o do Real Regimento de Tanques entrariam no perímetro e começariam o ataque, conduzindo mais de dois batalhões de infantaria. Enquanto essa operação se realizava, num ponto situado ao centro das defesas ocidentais, a 7a Divisão Blindada se colocaria em posição para cortar a retirada da guarnição, a norte e a noroeste da cidade. O grupo de Apoio, consistindo de três batalhões de infantaria, um regimento de artilharia, um regimento de carros blindados e um esquadrão de tanques, observaria o perímetro defensivo da cidade e, se se apresentasse a oportunidade, procuraria penetrá-lo.

 

O início do ataque foi finalmente fixado para as 05:30h de 3 de janeiro de 1941,após um atraso de 24 horas porque a munição necessária não chegara. Apesar desse problema, o ataque, uma vez iniciado, prosseguiu com um desembaraço que desmentia a falta de experiência de combate da infantaria australiana. Por volta das 07:00h, os tanques estavam entrando na cabeça-de-ponte sobre a trincheira antitanques e passando por brechas abertas nos campos minados. Por volta do meio-dia, muitos dos membros da guarnição, demonstrando estarem saturados da guerra, começaram a entregar-se. A combinação dos tanques Matildas, de blindagem pesada, com a valentia da 6a Divisão Australiana, mais os pesados canhões do Warspite, Barham e Valiant da Marinha Real, convenceram-nos de que a batalha de Bardia estava perdida. Mas nem todos os soldados italianos cederam com tanta facilidade. Os dois dias seguintes foram gastos na limpeza dos bolsões de resistência mais tenazes, até que, a 5 de janeiro, a fortaleza se rendeu.

 

O comandante italiano em Bardia, General Bergonzoli – conhecido dos soldados britânicos como “Barba Elétrica”- não estava entre os 38.000 soldados que acabavam de deixar o serviço de Duce para passar o resto da guerra em campos de prisioneiros: a mais vistosa barba do exército italiano, varando a rede que os britânicos estenderam em torno da cidade, tomara o rumo de Tobruk. Mas, como consolação pela perda do general-comandante, os britânicos foram bem recompensados na quantidade de material bélico que tomaram. Além das peças de artilharia de costa  e de canhões médios, capturaram ainda mais de 200 canhões de campanha, 26 canhões antiaéreos, alguns canhões de infantaria de 40 mm e 16 canhões antitanques. Outra boa colheita foi feita na forma de tanques e veículos de transporte. A primeira ação dos australianos fora lucrativa, bastante lucrativa mesmo.

 

Ainda assim, o General O’Connor instava junto às tropas para que avançassem. A Força do Deserto Ocidental fora rebatizada a 1o de janeiro; passou a chamar-se 13o Corpo e pôs-se rapidamente a adquirir reputação sob seu novo título. No dia em que Bardia caiu, a 7a Brigada Blindada avançou célere para El Adem, que era o principal aeródromo italiano na Líbia e, no dia seguinte, deslocou-se para cortar Tobruk pelo oeste. Nesse dia 6, o 19o Grupo de Brigada Australiano deixou Bardia e, na manhã de 7 de janeiro, tomou posição diante do setor oriental das defesas de Tobruk. O anel de forças britânicas em torno do porto fechou-se com a chegada da 16a Brigada Britânica, da 4a Brigada Blindada, que passou a ocupar posição de ataque ao perímetro de defesa da parte ocidental da cidade.

 

Imediatamente foram feitos preparativos para derrubar a segunda das duas fortalezas que Mussolini ordenara fossem defendidas a qualquer preço.

 

Tobruk: a tomada

 

Não se pode descrever, mesmo num esforço de imaginação, Tobruk como uma fortaleza natural. A linha de proteção do porto era um semicírculo que tinha início na costa, a mais ou menos 13 km a leste da cidade, avançava pelo deserto aberto, ao sul de Tobruk, e retornava à costa, fixando-se o seu término a cerca de 15 km a oeste. Essas defesas consistiam de uma série de pontos fortificados de concreto, construídos rente ao chão, praticamente invisíveis para os que se aproximavam pelo deserto. O comprimento dessa linha de defesa era de uns 48 km. À frente desses pontos fortificados os italianos haviam erguido uma dupla cerca de arame farpado e, fora desta, haviam começado a cavar uma trincheira antitanque.

 

A construção da trincheira foi um verdadeiro trabalho de Hércules, pois em muitos lugares ela teve de ser talhada na rocha sólida, mas nunca foi inteiramente terminada. Segundo as especificações, a trincheira deveria ter 6 m de largura e 3,60 m de profundidade, mas numa extensão de mais ou menos 7 km para leste do ponto em que a estrada de El Adem entrava nas defesas, ela estava apenas parcialmente completada e era muito rasa. O setor ocidental não tinha trincheira antitanques, mas ali existe um wadi profundo que constitui um obstáculo natural e os italianos dispuseram em suas laterais vários pontos fortificados. Onde a trincheira era ineficaz ou inexistente, eles procuraram defender com campos minados, preparados de tal forma que fosse extremamente difícil a qualquer atacante que avançasse protegido pela escuridão desarmar as minas.

 

Dentro da área coberta pela linha de defesa, o terreno tinha três patamares acima do nível do deserto circundante, o mais alto dos quais elevava-se à altura dos rochedos costeiros. Os patamares eram separados por uma faixa de terra plana de mais ou menos 1.600 metros. As escarpas que formavam os pés desses degraus era protegidas, aqui e ali, por wadis – cursos de água secos – o que lhes aumentava a segurança. Também nos rochedos costeiros viam-se numerosos wadis, nalguns dos quais havia poços e algumas palmeiras que corriam para as praias de areia muito clara, formando um contraste agradável com a terra comum, nua, marrom e calcinada pelo sol, com seus afloramentos rochosos e o enfezado espinho de camelo.

 

Embora os pontos da linha de defesa fossem quase invisíveis, qualquer força que se dirigisse para Tobruk caía na observação dos defensores ainda a boa distância do alvo.

 

As defesas da área eram arranjadas em duas linhas curvas concêntricas. A linha externa corria logo atrás da primeira cerca de arame e a interna situava-se a uns 500 metros à retaguarda, com seus postos posicionados de forma a cobrir as lacunas deixadas entre os pontos fortificados externos. Cada posto tinha sua cerca individual de arame farpado, enquanto que os avançados tinham a proteção adicional de uma trincheira antitanque circular.

 

Não havia trincheira de ligação entre os pontos fortificados, mas eles se sustentavam mutuamente e seus campos de tiro se sobrepunham para cobrir a cerca de arame farpado e a trincheira antitanque ou o campo minado, bem como varriam o deserto descoberto e as áreas de aproximação. Além disso, o atacante seria obrigado a passar pela zona de fogo dos canhões de campanha e médios situados mais atrás, que os defensores podiam facilmente assestar contra ele.

 

As armas à disposição dos homens que guarneciam os postos variavam, mas uma distribuição mínima seria de duas ou três metralhadoras, um canhão antitanque ou canhão de campanha leve, e possivelmente um morteiro. Essas armas focavam em embasamentos circulares, com pisos e paredes de concreto e posicionados a uns 18 m de distância uns dos outros. Os soldados podiam passar de um embasamento para outro através de profundas trincheiras interligadas, junto das quais havia dormitórios e depósitos de munição. As casamatas e as trincheiras não eram cobertas, mas os abrigos junto das trincheiras eram à prova de tudo, exceto de um tiro direto, de uma bomba pesada ou de uma granada de grande calibre. Tudo aquilo permitia à guarnição proteger-se bem do fogo de artilharia, permanecendo no interior das trincheiras, abaixo do nível do chão.

 

A força italiana disponível para a defesa de Tobruk era, no entanto, mal distribuída. Totalizando uns 30.000 homens, era fraca em infantaria e forte em artilharia. Com tal força, era impossível estabelecer uma defesa em profundidade; portanto, a esperança dos defensores residia na artilharia e numa pequena força defensiva móvel de tanques e infantaria. Dentro do anel protetor da cidade havia poucos pontos fortificados e os que existiam tinham sido colocados somente em entroncamentos rodoviários, para proteger as principais posições de canhão, embora tivessem sido suplementados pela colocação de tanques entrincheirados, para servir de casamatas, que eram protegidos por campos minados e armadilhas.

 

Apesar disso, um ataque a Tobruk era algo que podia ser tentado levianamente, embora houvesse fracassado a tentativa feita pelo restante das forças italianas que se encontravam na Cirenaica no sentido de desviar os britânicos do caminho da cidade. A guarnição de Tobruk foi largada à própria sorte.

 

Tendo em mente, sem dúvida, o bem sucedido ataque a Bardia, o General O’Connor decidiu deixar a responsabilidade do planejamento e execução do ataque a Tobruk ao Major-General Mackay e sua 6a Divisão Australiana. Mackay planejou iniciar seu ataque com brigadas de infantaria, apoiadas por blindados e artilharia. A 16a Brigada Australiana avançaria antes do amanhecer, para estabelecer uma cabeça-de-ponte no perímetro de defesa a cerca de 5 km a leste do ponto em que a estrada de El Adem entrava nas linhas de defesa e onde a trincheira antitanques, por inacabada, oferecia um obstáculo menor. Essa brigada tentaria então avançar para leste e oeste, ao longo da área de defesa, capturando pontos armados e devastando a artilharia de campanha situada próximo deles, até que conseguisse criar uma brecha de uns 10 km de largura nas defesas externas de Tobruk. Por essa abertura, a 19a Brigada Australiana penetraria, rumando na direção noroeste, para a junção das estradas El Adem e Bardia e mais além.

 

A terceira brigada que Mackay tinha disponível para o ataque deveria, nesse momento, estar preparada para engajar no assalto. De início, a 17a Brigada Australiana seria empregada para fazer uma demonstração a leste do ponto designado para o ataque, o mesmo acontecendo com unidades da 7a Divisão Blindada, para oeste. Além disso, a Marinha Real e a RAF apoiariam os dois esforços diversivos e a operação principal, bombardeando alvos situados no perímetro de defesa durante as horas noturnas. Embora o plano relacionasse os objetivos do primeiro dia do ataque, ele não era de modo algum restritivo, pois, ao contrário, todos teriam liberdade de explorar plenamente o sucesso que viesse a obter. O General Mackay não duvidava de que suas forças poderiam tomar Tobruk. O que o preocupava era conseguir o máximo em rapidez e o mínimo em baixas. Quanto mais rapidamente fosse capturada a cidade, menos tempo os italianos teriam para realizar demolições, não se reduzindo muito, conseqüentemente, o número de prédios que os britânicos poderiam usar.

 

Antes de ser feito o ataque, era necessário reconhecer minuciosamente um setor considerável da linha defensiva, para descobrir o melhor ponto de entrada e, escolhido esse ponto, obter detalhes das defesas existentes nas vizinhanças. Era essencial que os italianos não desconfiassem das intenções dos britânicos, para minimizar os perigos para os atacantes. A intensa atividade das patrulhas, necessária para atender às exigências do planejamento, teve de ser realizada com grande cuidado. No ponto finalmente escolhido, a trincheira antitanque só tinha 1,20 m de profundidade, o que poderia permitir, com um ligeiro esforço, a passagem de tanques e veículos.

 

Os engenheiros inspecionaram cuidadosamente os campos minados italianos e suas armadilhas protetoras, encontrando meios de neutralizar as armadilhas e remover as espoletas e detonadores das minas. A técnica que recomendaram foi transmitida à infantaria, para que praticassem antes do ataque. Foram construídos modelos exatos das defesas italianas e feitas experiências com torpedos Bangalore de fabricação caseira, feitos de pedaços de cano de água, de 3,50 mm de comprimento por 3 polegadas de espessura, entupidos de explosivo, para testar sua eficiência na abertura de buracos na cerca de arame farpado. Não se poupou esforço para fazer que a penetração inicial fosse feita de maneira mais rápida e segura possível.

 

A tarefa da artilharia de apoio era dupla: primeiro, calar as armas italianas existentes na área imediata da penetração, e, depois, proporcionar apoio cerrado à infantaria, que faria recuar as defesas a leste e oeste da área do ataque inicial para reduzir as atividades da artilharia defensiva dos italianos. Na realização da segunda dessas tarefas é que se encontrava o maior problema.

 

Era essencial demarcar com precisão as posições das baterias italianas. Isto foi possibilitado pelos mapas recolhidos por ocasião da captura de Bardia e pelas informações fornecidas por aviões de observação da RAF. Os aviões usados nesse trabalho, Westland Lysanders, lentos e pesadões, voavam por consideráveis períodos, a pequena altura e diante de violento fogo antiaéreo, para verificarem se as posições das baterias estavam demarcadas com precisão e se os canhões vistos nos embasamentos eram reais. A artilharia não tinha intenção de desperdiçar suas preciosas granadas, trazidas com muito custo e esforço, em canhões falsos.

 

Colocando vários observadores para traçar os clarões dos disparos da artilharia italiana e a queda das granadas, foi possível verificar quais os canhões que estariam disparando na área do ataque quando este começasse. Estes canhões foram marcados como alvos prioritários para a artilharia britânica. Como os canhões britânicos estavam na maioria nas proximidades da estrada de Bardia, tinham de ser transportados para a área ao sul do ponto de ataque, para dar-lhe apoio. Dispará-los prematuramente seria indicar aos italianos o setor onde deveriam esperar o ataque, de modo que teve de ser modificada a maneira de ajustar os canhões aos seus alvos, em geral feita por determinação do ângulo de tiro. Em vez disso, o ajustamento teve de ser feito através de cálculos matemáticos.

 

O ataque estava marcado para começar às 05:40h de terça-feira, 21 de janeiro, e seria precedido de um bombardeio feito pela artilharia, por navios da Marinha Real e por aviões da RAF. Assim, não se daria aviso aos italianos, o mesmo programa de bombardeio como o que seria levado a cabo à véspera do ataque, foi realizado nas noites de sexta-feira, sábado e domingo anteriores. Em muitos lugares, ao longo do perímetro de defesa, os postos de resistência foram submetidos a fogo intenso, por patrulhas que se aproximavam muito, e buracos foram abertos no arame farpado com torpedos Bangalore. Esse estratagema manteve os italianos em constante apreensão, mas ao mesmo tempo acostumavam-nos a noites barulhentas provocadas pela atividade agressiva dos britânicos. Esperava-se que isso tornasse mais difícil aos italianos reconhecerem o ataque real quando este começasse, adiando assim a organização de contramedidas.

 

Até o último momento,  a área de reunião para o ataque foi mantida o mais limpa possível. Depois de escurecer, quando os navios da Marinha Real se aproximaram e abriram fogo contra os alvos determinados, no deserto, tanques e veículos deslocaram-se para as posições de pré-ataque, com o som dos seus motores abafado pelo troar de granadas dos canhões navais que explodiam. Por volta da meia noite, quando os navios suspenderam o bombardeio e se fizeram novamente ao largo, tudo estava pronto; os canhões haviam sido colocados em seus lugares e tanques e transportadores permaneciam silenciosos, na expectativa, com suas guarnições nas proximidades.

 

A infantaria de assalto já estava pronta há algum tempo. De acordo com a ordem de batalha, a tropa teve reduzido o equipamento, para que pudesse carregar maior quantidade de munição. Os soldados haviam feito uma refeição quente quando escureceu e bebido um gole de rum, para fortalecer o espírito e combater o frio intenso da noite de janeiro. Enquanto os navios martelavam as posições italianas e suas armas de apoio estavam tomando posição, os soldados de infantaria permaneciam enrolados em seus cobertores, tentando tirar uma pestana. Bem longe dos que esperavam no deserto, nos aeródromos do Egito, as tripulações dos bombardeiros, já abastecidos e carregados de bombas, eram instruídas para a ofensiva a ser feita assim que o dia amanhecesse.

 

Ia ter início a batalha de Tobruk. Para alguns, atividade febril, com o tempo correndo: para outros, a cansativa espera, com o tempo parado, com os segundos parecendo minutos, e as horas, uma eternidade.

 

Mas havia alguns homens que já estavam cumprindo a sua parte na batalha antes mesmo que esta começasse. Não viviam a excitação nervosa do avanço, atrás de uma barragem de artilharia, ou o frenesi apavorante do combate corpo a corpo, quando por efeito do calor da ação silenciava momentaneamente o medo natural. Para eles havia uma tarefa que exigia nervos firmes e habilidade manual. Eram os integrantes do Grupamento de Engenharia, que se haviam aproximado sorrateiramente durante a noite de 20 de janeiro para desarmar as armadilhas que protegiam os campos minados. Eles trabalhavam em silêncio, as mãos entorpecidas pelo vento frio, quedando-se inertes à passagem das patrulhas italianas, numa batalha contra o tempo, pois tudo deveria estar pronto antes do nascer da lua.

 

Às 02:30h de 21 de janeiro, foi servida outra refeição quente aos soldados: ninguém sabia quanto tempo se passaria até que pudessem comer novamente alimentos cozidos. Às 03:30h ouviu-se o ronco de aviões, quando os Wellington e Blenheims, vindos do Egito, deram início ao ataque. Ao explodirem as primeiras bombas sobre as defesas internas de Tobruk, a infantaria avançou para a linha de partida.

 

Às 05:30h o bombardeio parou e o deserto tornou-se de novo silente; depois do barulho do ataque aéreo, o silêncio parecia quase palpável, como a calma que precede a tempestade, que se desencadeou exatamente às 05:40h, quando, a escuridão foi espancada pelos brilhantes clarões acesos pela barragem de artilharia e granadas de canhões de campanha, médios e pesados. Uma vez mais, a Marinha Real prestou apoio à operação terrestre. No mar, mais de 20 navios contribuíram com o peso da sua artilharia para a considerável concentração de fogo que se estabeleceu, disparando granadas de até 15 polegadas de calibre sobre as defesas italianas.

 

Iniciada a barragem de fogo, a primeira leva de soldados de infantaria avançou pelo deserto aberto, acompanhada de sapadores, que portavam o rompedor de cerca, o torpedo Bangalore. Não encontrou muita resistência da artilharia italiana, embora se registrassem entre eles algumas baixas. Os soldados de infantaria avançaram por sobre o campo minado, já livre de armadilhas, cruzando as minas em segurança, pois não mais estavam armadas para detonar com o peso de um homem. As tropas de vanguarda, o 2/30 Batalhão da 16a Brigada de Infantaria, chegaram à trincheira antitanques às 05:55h e ali se protegeram por uns dez minutos, enquanto os dois postos de defesa italianos que se encontravam no caminho da penetração eram submetidos a um martelamento intenso pelos canhões.

 

Entrementes, o Grupamento de Engenharia preparava o caminho através do campo minado para a passagem da força motorizada, deslocando-se em seguida para a parte mais rasa da trincheira antitanques, onde formaram rampas para possibilitar-lhe o avanço.

 

Assim que suspenso o fogo sobre os dois postos avançados italianos, cujos números eram 55 e 57, os sapadores com a infantaria de assalto, avançaram céleres para a cerca de arame farpado, levando os incômodos torpedos Bangalores. Vários homens foram atingidos pelos disparos feitos dos postos e pelas granadas que voavam de vários pontos. Por volta das 06:15h, cinco brechas haviam sido feitas na cinta de arame para a infantaria passar. Agora, era uma corrida contra o tempo, pois restavam só 30 minutos de escuridão protetora e os cinco postos defensivos tinham de ser capturados antes de clarear o dia – três avançados e dois de apoio.

 

Nos 25 minutos seguintes estabeleceu-se luta violenta e confusa. Na escuridão e nos remoinhos de areia e fumaça do fogo de artilharia, crescia o risco de os próprios companheiros se matarem uns aos outros. As Companhias “D” e “C” do 2/3o Batalhão, destacadas para capturar os postos, sofreram baixas provocadas pelo violento fogo defensivo dos italianos. Por volta das 06:40h os cinco postos haviam caído e a Companhia “B” tomou posição defensiva a uns 1.000 m para o norte, ao longo da borda de uma escarpa, pronta para repelir qualquer contramovimento dos italianos. Havia já uma cabeça-de-ponte no perímetro de defesa da cidade, de cerca de 1.500 m de largura e outro tanto de profundidade.

 

Os Matildas do 7o/Real Regimento de Tanques, as carretas transportadoras de metralhadoras pesadas, as Bren, e demais veículos começaram a dirigir-se para a brecha, com suas silhuetas tornando-se mais nítidas à medida que as trevas se dissipavam e uma aurora cinzenta e sombria de janeiro vinha tomar-lhe o lugar. Em pouco o tráfego pelos trechos abertos na linha de defesa dos italianos passou a ser feito nos dois sentidos, quando começaram a ser levados para trás das linhas dos britânicos os prisioneiros feitos entre os defensores. Para eles a guerra terminara, mas não sabiam quando veriam novamente seus lares, na Itália. Não obstante, estavam felizes por não se encontrarem entre os que aguardavam, em macas, remoção para o hospital, ou entre os que jaziam em silêncio espalhados pela areia do deserto.

 

O 2/1o Batalhão da 6a Brigada de Infantaria ganhou também a cabeça-de-ponte e voltou-se para leste, atrás de três Matildas, para começar a operação de “recuo das defesas inimigas”; enquanto isso, o 2/3o Batalhão abria para oeste, arrastando para trás a defesa inimiga, na direção da estrada El Adem. A tarefa  do 2/2o, que penetrou o perímetro de defesa logo depois do 2/3o, era atacar as baterias situadas no flanco norte do 2/1o e do 2/3o, com ajuda de 9 tanques. Os três batalhões fizeram bom progresso. Tanques e infantaria avançavam atrás da barragem de artilharia, o mais perto possível. Suspensa a barragem de fogo, se ainda havia sinais de resistência por parte da guarnição dos postos, os tanques davam-lhe combate enquanto a infantaria se aproximava para, finalmente, subjuga-los com granadas de mão e baioneta calada.

 

O 2/3o Batalhão foi finalmente retido na vizinhança do posto 45, perto da estrada El Adem. Com seus três Matildas fora de combate, por defeito mecânico ou danos de batalha, a infantaria foi obrigada a esperar até que chegassem reforços. Mais para leste, o 2/1o avançou com boa rapidez e chegou à estrada de Bardia às 09:00h. Esse batalhão evitara certos postos de defesa, para manter a velocidade do avanço, deixando-os a cargo do 2/6o Batalhão da 17a Brigada de Infantaria, que lhe servia de apoio. Chegando à estrada de Bardia, o 2/1o Batalhão perdeu o apoio da artilharia, que se deslocara para ajudar o ataque da 19a Brigada de Infantaria. Sem artilharia, o 2/1o ficou retido ao norte da estrada de Bardia até ser reforçado pelo 2/7o Batalhão, também da 17a Brigada, que rompera a linha de defesa próximo do posto 65, depois de haver “recuado” a sua guarnição.

 

A seção do terreno situada entre o ponto onde as defesas italianas haviam sido rompidas inicialmente e o local escolhido para a linha de partida da 19a Brigada havia sido limpa por uma força mista, formada de carretas Bren da 6a Cavalaria Divisionária, metralhadores do 1o/Fuzileiros de Northumberland, e canhões antitanques do 3o/Real Artilharia. Eles haviam chegado ao objetivo por volta das 08:00h, cerca de 3.500 m dentro da linha defensiva, tendo vencido várias posições de artilharia italianas; dali começaria a segunda fase do ataque.

 

Os três batalhões da 19a Brigada de Infantaria começaram o assalto às 08:40h, assumindo a seguinte formação: 2/4o no centro, 2/11o à direita e o 2/8o à esquerda. O batalhão do centro rumou na direção norte, para capturar o QG do setor oriental, a cerca de 1.500 m além da estrada de Bardia; o batalhão da direita devia limpar o wadi daquele flanco e encontrar-se com o 2/6o ao longo da estrada de Bardia; o batalhão da esquerda avançou para a junção fortemente defendida das estradas El Adem e Bardia. Os três batalhões contavam com o apoio dos transportadores da 6a Cavalaria Divisional e de tanques italianos capturados, recuperados e postos em serviço pelos soldados de cavalaria.

 

A 19a Brigada avançou atrás de uma barragem de fogo móvel, disparada por canhões de 25 libras, correndo a infantaria riscos consideráveis por seguir o mais perto possível as granadas que explodiam. Os batalhões conseguiram manter-se bem desde o estágio inicial do avanço e, passada uma hora, o 2/4o havia tomado seu objetivo. Tudo correu bem também com o 2/11o, à direita, mas o 2/8o, depois de uma aproximação fácil, topou com as defesas da junção rodoviária, que, embora não estivessem completas, eram, não obstante, formidáveis. Os embasamentos de metralhadoras eram protegidos por campos minados, armadilhas e artilharia, mas o que deu mais trabalho à infantaria foi o número de tanques que haviam sido entrincheirados à guisa de casamatas.

 

Já então o apoio blindado se havia reduzido a um tanque, porque, apesar dos esforços dos cavalarianos em mantê-los em funcionamento, os tanques italianos recusaram-se a funcionar adequadamente com os novos donos e abandonaram a batalha um a um, apresentando enorme variedade de defeitos mecânicos. As carretas transportadoras de metralhadora Bren, agressivamente usadas, fizeram o melhor possível para ajudar os soldados de infantaria e o único tanque restante.

 

Era em situações como esta que os australianos demonstravam suas grandes qualidades de soldado. Sempre dispostos a tomar a iniciativa, independente do posto, eles empregavam uma variedade de métodos para subjugar os pontos forte italianos. Às vezes, os soldados de infantaria mostravam-se capazes de varar os tanques com seus fuzis antitanques Boyes; em outras circunstâncias, aproximavam-se dos tanques para disparar à queima-roupa, com as Brens, por qualquer abertura que vissem na blindagem. Não logrando êxito com esses métodos, um ou dois soldados se aproximavam correndo, subiam no tanque e tentavam lançar granadas dentro dele, pela torre. Naquele dia, muitos foram os atos de heroísmos individual, pois os australianos estavam decididos a não deixar que nenhum posto de defesa prejudicasse o ímpeto desenfreado do ataque.

 

Ao meio-dia, os batalhões atacantes se haviam estabelecido nos seguintes pontos: na junção rodoviária El Adem-Bardia estava o 2/8o, com os 2/4o, 2/11o, 2/6o e 2/7o movendo-se na direção leste e procurando alinhar-se ao longo da estrada de Bardia. Na estrada de El Adem encontravam-se duas companhias dos Reais Fuzileiros de Northumberland, uma companhia do 2/2o, com todo o 2/3o Batalhão. A essas unidades se juntariam o 2/1o Batalhão e o restante do 2/2o, que se deslocavam pelo deserto, deixando as posições que haviam capturado na estrada de Bardia, adjacentes à parte oriental do perímetro defensivo.

 

O comandante da 19a Brigada de Infantaria, Brigadeiro Robertson, estava decidido a manter o ímpeto do ataque e esperava capturar o QG da guarnição de Tobruk que, segundo acreditava, estava situado num velho forte, em Solaro, a aproximadamente 5 km nor-noroeste da junção rodoviária El Adem-Bardia. O brigadeiro fora advertido por aviões de reconhecimento da RAF (a RAF vinha apoiando o ataque com incursões de bombardeio e observando os canhões) que as forças italianas estavam-se reunindo num lugar chamado Forte Pilastrino com a finalidade de montar um contra-ataque, Pilastrino ficava a uns 6 km da junção rodoviária, ligeiramente ao sul e oeste de Solaro. Apesar da ameaça de contramedidas italianas, Robertson despachou o 2/4o Batalhão para Solaro, enquanto o 2/8o recebeu ordens de mover-se, ao longo da parte superior da escarpa, até Forte Pilastrino. Para proteger o flanco direito do 2/4o, o 2/11o foi despachado para o norte, para a costa sul da baía de Tobruk.

 

A tarde seria momentosa para o 2/8o Batalhão. Primeiro, havia tanques entrincheirados a silenciar, o que sugeria maior quantidade de baixas; depois, a Companhia “C” encontrou-se frontalmente com o contra-ataque italiano. Reforçada por homens da Companhia do QG, a Companhia “C” confrontou-se com várias centenas de soldados de infantaria italianos, apoiados por mais de 12 tanques M13. Foi bom que os blindados italianos não fossem mais potentes que o M13, pois os australianos já estavam sentindo o efeito das deficiências do seu equipamento; mesmo esses tanques lentos, com velocidade de apenas 11 km/h, apresentavam problemas para a infantaria de apoio. Os australianos, atacando com fuzis antitanques Boyes, que eram apenas adequados, e granadas, conseguiram causar várias baixas antes de receberem ajuda. Esta veio na forma de um canhão antitanque italiano capturado e que a infantaria pusera em uso. A esta arma em breve se juntariam mais dois canhões antitanques do 3o/Real Artilharia, e abriu-se fogo rápido contra os italianos. Quando dois Matildas apareceram, os M13 decidiram retirar-se, evitando um confronto direto com os fortemente blindados tanques britânicos.

 

Mas as dificuldades do batalhão ainda não tinham terminado, pois à medida que continuou avançando, após a dispersão do contra-ataque italiano, ele foi submetido a violento fogo de artilharia, disparado por quatro canhões antiaéreos que lançavam rajadas de ar sobre a cabeça dos soldados de infantaria. Esses canhões foram finalmente postos fora de ação pelos tiros precisos da Real Artilharia e os australianos continuaram avançando, embora ainda sob o fogo de metralhadoras e morteiros de Pilastrino.

 

Com os canhões antitanques silenciados, o 2/8o apertou o passo e, pelo anoitecer, estava perto do forte. Já cansados, os soldados tinham ainda que enfrentar vários postos de metralhadoras e defesas de arame farpado, de modo que a limpeza final de Pilastrino só se completou após o anoitecer. Por volta das 21:30h, o QG do Batalhão fora instalado dentro do forte e o 2/8o ganhou o direito a uma pausa durante a qual seria dado um balanço nos feitos conseguidos pelo batalhão e nas baixas por ele sofridas.

 

Como o 2/8o recebera o contra-ataque italiano frontalmente, o caminho para o ataque a Solaro do 2/4o fora facilitado. A infantaria avançara com muita rapidez e o fogo de metralhadora italiano nada fez para detê-la. Vários tanques italianos que permaneciam timidamente próximos do flanco esquerdo do batalhão foram rechaçados por canhões antitanques da Real Artilharia que vinham dando apoio às companhias de infantaria de vanguarda. Os australianos conquistaram uma pequena colina em que havia um forte que resistiu por 16 horas. O monte de escombros que coroava o topo da colina já não merecia o nome de “forte” com que os italianos o haviam dignificado. Debaixo desses escombros, os soldados descobriram vários túneis – mas nenhum sinal do QG da fortaleza de Tobruk.

 

A companhia de vanguarda encontrou pesada oposição por parte de vários postos de defesa próximos do Pilastrino, na estrada de Tobruk; depois de capturados e quando os prisioneiros estavam sendo arrebanhados, descobriu-se que o General Manella, o comandante italiano de Tobruk, encontrava-se entre eles. Nas últimas horas de luta, cerca de 1.600 italianos renderam-se ao batalhão.

 

Durante a tarde, o 2/11o Batalhão não encontrara oposição tão rija quanto os seus camaradas dos 2/8o e 2/4o. Chegando às 16:00h ao topo da última escarpa que dominava Tobruk, experimentaram a sensação de ver a cidade e a baía estender-se aos seus pés. Encalhados na costa sul havia dois navios italianos; o de carreira, Marco Pólo, de 15.000 toneladas, e o Ligúria, um cargueiro; ambos ardiam furiosamente. Na costa norte encontrava-se o cruzador San Giorgio, com seus canhões salientes. Ele fora bombardeado pela RAF no terceiro dia da guerra e ficara tão seriamente danificado que teve de ser encalhado; desde então, era usado como posto de defesa antiaérea pelos italianos.

 

Olhando lá de cima a cidade, os soldados podiam ver as nuvens de fumaça que contavam a história das demolições que os italianos estavam fazendo. A cada minuto, o estalar seco das detonações chegava aos ouvidos dos que se encontravam no alto da escarpa, e outro rolo de fumaça negra juntava-se aos que, contorcendo-se, dançavam sobre a cidade.

 

Os atacantes estavam particularmente preocupados com a usina de destilação de água, situada numa elevação próxima da costa sul da baía e a menos de 1 km das unidades avançadas do 2/11o. Um pelotão foi despachado com ordens de abrir caminho até a usina o mais rápido possível, para tentar impedir que os italianos a destruíssem. Ele foi bem sucedido na empreitada, surpreendendo os italianos quando faziam uma refeição; os homens capturados foram despachados para engrossar o fluxo sempre crescente de prisioneiros que se moviam para a retaguarda, enquanto os captores acabavam rapidamente a refeição preparada pelos italianos.

 

O 2/3o Batalhão enfrentara muita luta árdua durante o primeiro dia. Lembremo-nos de que ele fora detido durante a manhã e obrigado a aguardar reforços. Depois de esperar cerca de quatro horas e meia, um grupo de Matildas do 7o/Real Regimento de Tanques apareceu. Apoiados pelo fogo dos canhões de 25 libras e das metralhadoras Vickers dos Reais Fuzileiros de Northumberland, o 2/3o e os tanques reiniciaram o ataque por volta das 13:30h. Vários postos foram capturados após uma luta que continuou mesmo depois que os tanques tiveram de recuar para restabelecer-se. O batalhão continuou em ação até o anoitecer.

 

A maioria dos batalhões atacantes pôde desfrutar de uma noite calma, embora a atividade não cessasse de todo. As patrulhas que foram despachadas capturaram ainda dois postos de defesa italianos. Durante toda a noite, pelo ruído das explosões que vinha da cidade, os atacantes sentiam que os italianos ainda estavam atarefadamente empenhados na orgia da destruição. A batalha de Tobruk estava, porém, para todos os fins, terminada.

 

O General Mackay ordenou o prosseguimento da operação na quarta-feira: a 19a Brigada deveria ocupar a cidade de Tobruk e o promontório que fica por trás dela. A 17a Brigada foi encarregada da limpeza da área situada entre a estrada de Bardia e o mar, no setor oriental, e a 16a Brigada deveria fazer o mesmo no setor ocidental. Mas antes do início do avanço, na manhã de quarta-feira, dois grupos de carretas Bren foram despachados, na frente do 2/4o Batalhão, para Tobruk e chegou ao centro da cidade virtualmente sem incidentes. Ali foram recebidos por um oficial italiano que os informou de que o almirante os aguardava no edifício do QG Naval, junto da baía, para render-se formalmente. Uma mensagem foi logo despachada para o Brigadeiro Robertson, comandante da 19a Brigada, que sem demora chegou à cidade, acompanhado de pequeno séquito que incluía vários correspondentes de guerra ávidos por estarem presentes no momento decisivo.

 

O Almirante Massimiliano Vietina desejava render os 1.500 oficiais e soldados da guarnição naval e o Brigadeiro Robertson aceitou. Imediatamente realizou-se breve cerimônia; um oficial foi incumbido de, no pátio da base naval, disparar meia dúzia de foguetes Very lights para o céu, indicando o fim da resistência dentro da cidade. Essa pequena demonstração pirotécnica marcou o encerramento da campanha por Tobruk, embora talvez o que mais simbolizasse a vitória, que era sobretudo australiana, foi o hasteamento do chapéu desabado no topo do mastro que havia no centro da base naval.

 

Fazia parte do grupo de oficiais que acompanharam o Brigadeiro Robertson à cidade para aceitar a rendição do Almirante um certo Brigadeiro Morshead, recém-chegado ao Oriente Médio e presente ao ataque a Tobruk como observador. Enquanto assistia ao ato que assinalava o fim da ocupação italiana da cidade, ele não podia imaginar que, em futuro próximo, estaria comandando a guarnição do pequeno porto cirenaico durante o sítio que tornaria famosos a cidade e seus defensores.

 

Nos últimos estágios da campanha da Líbia os italianos eram considerados oposição de segunda classe, uma espécie de força contra a qual a obtenção de sucesso não era coisa difícil, resultando daí certo esvaziamento do feito dos britânicos e australianos desde o início da “Operação Bússola” à chegada a El Agheila, na fronteira da Tripolitânia. Talvez seja verdade que a guarnição italiana não se tivesse empenhado com a determinação ou fanatismo dos soldados alemães, mas a campanha, é de justiça que se diga, não teve como nota dominante a fraqueza dos defensores da cidade, mas a eficiência dos atacantes.

 

O planejamento e a execução de todos os pormenores da campanha foram um desmentido à fama de “amadoristas” que muitos oficiais da 6a Divisão Australiana carregavam e permitiram uma perfeita avaliação das qualidades de soldado e do preparo técnico dos que a integravam. A perícia com que se houveram os sapadores, os artilheiros e os membros das armas de apoio foi tal, que conferiu à campanha por Tobruk a falsa aparência de coisa fácil.

 

Uma vez mais, a leva de prisioneiros foi imensa. Apesar da atividade das turmas de demolição dos italianos, não lhes foi possível destruir os grandes estoques de munição que haviam sido armazenados em Tobruk. Numerosos canhões foram destruídos por ação de explosivos, enquanto que dos outros se retiraram, para silenciá-los, peças essenciais ao seu funcionamento.

 

A outrora elegante cidade de Tobruk estava agora desfigurada pelas horríveis cicatrizes da guerra; objetos de uso doméstico enchiam as ruas, despejados dos prédios destruídos, e muitos incêndios ainda ardiam, engrossando o manto de fumaça que recobria a cidade e que só lentamente o vento desfazia. Os soldados, momentaneamente livres dos perigos da batalha, cozinhavam suas refeições em prédios que davam bem a medida da prosperidade do novo Império Italiano.

 

Na baía, jaziam os destroços de talvez uns 12 navios, alguns mostrando apenas a parte superior das chaminés e dos mastros; de todos, o óleo vertido punha no mar ondulações pesadas, vagarosas.

 

De Tobruk a El Agheila – e de volta

 

A 21 de janeiro, dia do início do ataque a Tobruk, Wavell havia sido informado pelos Chefes de Estado-Maior de que a captura de Benghazi era considerada de grande importância. Embora o 13o Corpo tivesse estado em contínua ação ofensiva durante um mês, não havia tempo para descansar. Homens e máquinas, exigidos bastante por tanto tempo, tinham de prosseguir no encalço do exército italiano. Encorajados pelos sucessos colhidos e pela possibilidade de continuar avançando pela Cirenaica – possibilidade que se tornava cada vez mais provável a cada quilômetro percorrido – os soldados redobravam esforços.

 

O General O’Connor, comandante do 13o Corpo, planejara fazer avançar a 7a Divisão Blindada ao longo da costa, até Derna, enquanto que a 4a Brigada Australiana se deslocaria mais para o interior, na direção de Mechili. Na noite de 22 de janeiro a 7a Blindada encontrava-se a apenas 32 km de Derna, e os australianos haviam levado suas patrulhas para além das trilhas que se irradiam de Mechili na direção oeste, sul e sudeste. Os britânicos ganharam a região da Cirenaica que leva ao Mediterrâneo, banhada na sua parte oeste pelas águas do Golfo de Bomba e, a oeste, pelo Golfo de Sidra. Ali, as intermináveis ondulações rochosas do deserto terminam e o terreno eleva-se para a área conhecida como Jebel Akhdar – as “Montanhas Verdes” – onde algumas das colinas ultrapassam 600 m de altura. O Jebel havia atraído numerosos colonos italianos que, com o passar dos anos, chegaram a criar uma comunidade agrícola mais ou menos grande em seus férteis terrenos elevados. Na extremidade ocidental do Jebel fica a cidade portuária de Benghazi, que na época tinha uma população de 65.000 habitantes, um terço da qual era italiano.

 

Duas estradas de grande significação tática penetram pelo leste da região. A primeira acompanha a costa e, depois de deixar Tobruk, passa por Gazala, Tmimi, Martuba e Derna. Voltando para oeste-sudoeste, ela cruza os ricos altiplanos de Barce e Benina e se dirige para Benghazi. A segunda estrada corre de El Adem, ao sul de Tobruk, até Mechili, onde dobra para sudoeste, na direção de Msus, Antelat, Agedabia e El Agheila. Um desvio que parte dessa estrada passa por Solluch e une-se à estrada costeira de Benghazi e Agedabia.

 

A 7a Divisão Blindada empenhou-se numa das primeiras batalhas de tanques de guerra no deserto em Mechili, a 24 de janeiro. Oito tanques médios italianos foram destruídos e um capturado; os britânicos perderam um tanque cruzador e seis leves. O’Connor esperava travar uma batalha decisiva nessa área, de modo que, deixando duas brigadas da 6a Divisão Australiana para conter os italianos em Derna, mandou a terceira juntar-se à 7a Divisão Blindada e o Grupo de Apoio, com ordens de impedir que os italianos saíssem de Mechili. Essas instruções foram dadas a 25 de janeiro, mas já então os britânicos sofriam os efeitos do rápido avanço que haviam realizado de modo que não houve gasolina suficiente para completar os movimentos necessários até amanhã de 27. Entrementes, para aflição de O’Connor, os italianos escaparam de Mechili para o norte. A 4a Brigada Blindada os perseguiu e a RAF atacou as colunas italianas com bombas e fogo de metralhadora, mas depois de dois dias de perseguição a 4a Blindada foi obrigada a parar, em virtude do mau tempo, das dificuldades naturais do caminho, da escassez de combustível e por número cada vez maior de enguiços mecânicos.

 

Os australianos entraram em Derna a 30 de janeiro, A princípio pareceu que os italianos talvez tentassem uma batalha defensiva nas terras altas de Jebel Akhdar, mas à medida que fraquejava a oposição ao golpe dos australianos, tornou-se evidente que o exército italiano estava em franca retirada. Os informes de reconhecimento davam conta de que os italianos começavam a abandonar os aeródromos ali existentes; longas colunas de veículos retornavam a Barce e, na estação de Barce, podiam-se ver tanques sendo embarcados em vagões ferroviários. Numa conferência realizada a 31 de janeiro, com a presença do Brigadeiro John Harding, oficial do Estado-Maior de O’Connor, e do General O’Moore Creagh, O’Connor afirmou que estava no convencimento de que, à vista do que vinha ocorrendo, os italianos iam-se retirar da Cirenaica. Se isto fosse verdade, então os britânicos teriam de prosseguir rapidamente e, o que era mais importante, deveriam esforçar-se por cortar a retirada deles.

 

O oficial-de-ligação do General Wavell, Brigadeiro Eric Dorman-Smith, que também estivera presente à conferência, retornou ao Cairo, de avião, para obter dele o beneplácito para essa movimentação. Ao retornar ao QG de O’Connor com a concordância e votos de êxito de Wavell, Dorman-Smith verificou que a 7a Divisão Blindada já estava em movimento. A 4 de fevereiro, o próprio Wavell voou através do deserto para ver pessoalmente como as coisas estavam indo e, na noite daquele dia, comunicou ao Chefe do Estado-Maior-Geral Imperial que a muito reduzida 7a Divisão Blindada, com o Grupo de Apoio, poderia chegar a Msus ao amanhecer. Na verdade, os carros blindados britânicos passaram a ocupa-la naquele dia, mas a 7a Blindada só ao alvorecer do dia 5 pôde comunicar haver chegado a uma posição situada a leste de Msus.

 

A perseguição continuou durante todo o dia. Os homens receberam rações para dois dias e os tanques foram carregados com munição suficiente para suas necessidades, esperava-se; a questão crítica era, entretanto, saber se o combustível daria para cumprir a jornada distribuída à força motorizada. No fim do dia, os britânicos moviam-se livremente pelo sul e oeste da Cirenaica, e a 4a Brigada Blindada começava a aproximar-se de Beda Fomm, entre Agedabia e Solluch. Para que se tenha uma idéia das dificuldades que o 13o Corpo teve de superar, acompanhemos o deslocamento dessa brigada para cortar a retirada italiana.

 

A brigada partiu ao amanhecer de 4 de fevereiro, à frente da divisão. Os tanques moveram-se pelo deserto bem espalhados, para retirar a máxima vantagem das facilidades que o caminho tornou-se repleto de grandes rochedos por entre os quais tinham de passar, obrigando a muito cuidado, por parte dos condutores, para evitar o risco de perderem uma lagarta. Os comandantes de tropa foram instalados pelos comandantes de esquadrão, que por sua vez o foram pelos comandantes de regimento, e assim sucessivamente, hierarquia acima, a imprimir à marcha a maior velocidade possível. Depois de todo esforço desenvolvido na perseguição, a perspectiva de o exército italiano, expulso de Benghazi para o sul pelos australianos, vir a escapar à armadilha, tão rápido era o recuo que fazia, inquietava os homens da 7a Divisão Blindada.

 

O dia arrastava-se. As tripulações dos tanques mantinham-se atentas a qualquer coisa que pudesse representar perigo para seus veículos já bastante exigidos, escolhendo cuidadosamente os caminhos por essa região incrível. Onde a superfície do deserto permitia, a velocidade era aumentada ao máximo, fazendo sacudir no interior daquelas caixas de aço, desconfortáveis e barulhentas, os que nelas viajavam. Quando, como acontecia com freqüência, eles passavam pelos trechos juncados de grandes pedras, os comandantes dos tanques e seus motoristas tinham de dominar firmemente a impaciência e conduzir os veículos por entre as rochas com o cuidado com que os navegadores conduzem as embarcações através de estreitos traiçoeiros e desconhecidos. A velocidade média mantida durante a viagem provavelmente era pouco maior do que uma caminhada.

 

Os blindados capturaram o Forte Msus, após rápida luta, e aprisionaram a sua guarnição. Anoitecia quando a 4a brigada Blindada reencetou a marcha. À medida que se fazia noite, a temperatura começava a cair e o frio intenso e constante durante as horas de escuro fazia enregelar o rosto dos comandantes de tanques, que tinham por imposição do cargo de viajar com a cabeça fora dos veículos. Dentro do tanque, o motorista espiava por um visor estreito e o artilheiro observava o mundo exterior pelo telescópio da sua arma, com a face comprimida contra a almofada de borracha que protegia o visor. O operador de rádio, que durante as batalhas de incumbia do canhão, fazia a viagem sempre atento ao painel fracamente iluminado pela luz do aparelho de rádio, suportando o ruído produzido pela estática.

 

Às primeiras horas da manhã deteve-se o avanço. A lua já se pusera e, evidentemente, era impossível continuar a marcha sem que se fizesse a manutenção rotineira dos tanques e, se necessário, a substituição das peças gastas. Apesar do frio, não havia possibilidade de qualquer refeição quente, pois não se podia acender fogo. Os soldados tinham de passar com a alimentação fria, desagradável, engolida com a ajuda de água salobra. Para piorar as coisas, o vento cortante trouxe consigo uma chuva forte e, apesar da fadiga, poucos homens conseguiram dormir mais que alguns instantes do que restava da noite.

 

Ao amanhecer, a divisão foi dividida em três grupos. O grupo Um, formado com metade dos carros blindados, um batalhão de infantaria motorizada com duas baterias de artilharia, tinha ordens de avançar o mais rápido possível para cortar a estrada principal ao sul de Benghazi. O Grupo Dois – a 4a Brigada Blindada – foi instruído a ir na direção da costa. O Grupo Três – a 7a Brigada Blindada com o resto do grupo de Apoio – se dirigiria para Benghazi propriamente dita. Uma vez mais, os tanques e veículos reiniciaram o avanço; para as cansadas tripulações, era como se jamais tivessem conhecido outra existência que não essa demorada perseguição pelo deserto.

 

Às 12:30h, os Grupos Dois e Três souberam pelo rádio que o grupo Um fora bem sucedido na tentativa de cortar a estrada, no ponto em que ela se bifurca com a pequena trilha bem próxima da costa marítima. Os britânicos haviam chegado a tempo, pois enquanto tomavam posição ali, foi avistada a vanguarda da força italiana que se retirava. A ala de bloqueio abriu fogo com tal efeito que os italianos que vinham na frente, acreditando estarem confrontados por uma gigantesca formação, renderam-se prontamente. A 4a Brigada Blindada, que ao anoitecer não havia ainda chegado à estrada, recebeu ordens para que acampassem onde se encontrava e que aguardasse até que a barricada tivesse sido claramente estabelecida.

 

Depois de uma noite de descanso, a 4a Brigada Blindada aproximou-se mais da estrada costeira na área de Beda Fomm. Mensagens radiofônicas deixaram claro que o Grupo Um estava tendo dificuldades em manter a barricada e que os italianos tentavam desesperadamente escapar aos seus perseguidores. Era evidente que, a menos que se exercesse maior pressão sobre o flanco italiano, era apenas uma questão de tempo até que a força de bloqueio, relativamente fraca, cedesse ante efetivos esmagadores. Portanto, o grupo Dois avançou com a maior velocidade possível para oeste e, atingido o topo de uma crista a uns 3 km aquém da estrada, viu uma cena que lembrava os engarrafamentos de tráfegos das estradas em dias de feriados. Para o sul, o som de fogo de artilharia e as explosões de granadas indicavam a presença da barricada, mas no local distante da luta tudo era calmo, com os italianos esperando pacientemente que o tráfego recomeçasse a mover.

 

Os tanques britânicos avançaram sistematicamente para a estrada apinhada, aproximando-se o máximo possível, de modo que a coluna estava dentro do alcance das suas metralhadoras. Vários tanques italianos que passavam pelos veículos parados, a caminho para atacar a barricada, desviaram-se para enfrentar esse novo agressor e abriram fogo com seu armamento  principal. O som da batalha no flanco da coluna atraiu a atenção da artilharia italiana, que reagiu rapidamente e logo estava disparando com rapidez contra os blindados britânicos que os atacavam, em apoio dos seus próprios tanques. A luta espalhou-se ainda mais, estendendo-se para o norte, ao longo da coluna, como uma chama que corre lentamente por um palito de fósforo, à medida que mais esquadrões de tanques britânicos chegavam à estrada e entravam imediatamente em ação. O troar profundo da artilharia soava ao longo de uns 24 km da estrada costeira, pontilhado pelos estalos secos e em estacato dos canhões de tanque e antitanque de alta velocidade.

 

Qualquer que fosse sua folha de serviço na luta anterior, as formações italianas que enfrentavam os ataques britânicos lutavam agora com uma coragem nascida do desespero, cônscias de que, para poderem escapar, tinham de romper a linha de bloqueio colocada entre elas e a liberdade. Para este fim, vários ataques foram feitos contra o cordão britânico, especialmente no ponto da junção com a força que bloqueava a estrada. Os tanques M13 italianos alinharam fora do alcance dos canhões dos tanques britânicos e seu ataque foi precedido de intenso fogo da artilharia desferido contra as posições britânicas. À medida que os M13 avançavam, na sua lenta velocidade, eram empenhados em combater pela artilharia britânica, que disparava bem e com precisão, e depois pelos canhões de duas libras montados dos tanques. Repetidamente, os ataques dos tanques italianos foram contidos. Às vezes os britânicos esperavam até que os italianos estivessem próximos da sua linha e despachavam vários tanques de uma posição um pouco distante da linha principal de ataque e assaltavam o flanco, estratagema que fez os italianos retirar-se em desordem.

 

A batalha prosseguiu durante todo o dia. Nos momentos em que os britânicos tinham de retirar os tanques da linha de batalha para reabastecê-los de munição e gasolina, as tripulações, cansadas, esforçavam-se por arranjar algo para comer e desfrutar um rápido chá; freqüentemente, porém, as exigências da batalha obrigavam-nas a correr para seus tanques antes que pudessem acabar a refeição improvisada. Com o passar das horas, os homens ficaram desesperadamente cansados. As exigências físicas feitas pela marcha por terreno acidentado, e a concentração contínua, tão necessária na batalha, levou-os aos limites da sua resistência. Os estômagos estavam vazios e a boca amargava por causa da fumaça acre dos canhões. Quando os ataques dos tanques italianos começavam a perder um pouco da determinação inicial, os britânicos fizeram ataques fustigantes, com seus blindados, contra a coluna italiana. Para muitos soldados essa foi a gota de água e, com o dia terminando, depuseram as armas e se renderam. À chegada da noite, os remanescentes da força britânica atacante retiraram-se, exaustos, para o acampamento; tripulações desceram enrijecidas dos seus tanques, com os corpos pedindo desesperadamente uma noite de sono. Antes do repouso, porém, miríades de tarefas necessárias para tornar os tanques aptos para combate no dia seguinte tinham se ser realizadas.

 

Uma vez mais, houve pouca oportunidade para descanso. Com os italianos tão perto e em tão grandes números, havia sempre a possibilidade de um ataque noturno para romper o frágil cordão de soldados britânicos, que era tudo o que se erguia entre os italianos e a liberdade. Mas o pouco que restava da noite, após o término dos reparos que o apronto dos tanques exigia, passou tranqüilamente. Antes do amanhecer, os soldados estavam em movimento, preparando-se para a luta do dia, de modo que, quando os primeiros raios de luz apareceram no horizonte, já os tanques estavam novamente em posição ao longo da estrada.

 

Durante toda a noite, os britânicos exerceram contínua pressão sobre a coluna que tinha que ficar presa à estrada. Patrulhas de infantaria cuidaram para que os italianos não dormissem e a artilharia continuou disparando durante as horas de escuridão. Ao amanhecer, tudo indicava que houvesse mais um dia de luta árdua. Os italianos montaram vigoroso ataque de tanques contra a barricada. O ataque foi repelido, mas uma avaliação dos efetivos de sitiados e sitiantes não augurava vitória britânica. Extremamente cansados pelas lutas dos dias anteriores e pelos esforços de muitos dias de viagem contínua, sem reservas e com os suprimentos acabando, os britânicos não estavam em condições de resistir a uma tentativa decidida de escapar.

 

Os observadores postados nas dunas estavam cônscios do estado de fraqueza da tropa e do provável resultado da batalha, mas em dado momento suas apreensões foram esquecidas, pois a coluna rompeu-se repentinamente em grandes quantidades de bandeiras brancas. Os italianos rendiam-se em massa. Diante da surpreendente decisão do adversário, os britânicos correram para recolher a enorme quantidade de equipamento italiano abandonado no campo de batalha. Havia milhares de prisioneiros para serem reunidos em colunas e levados em longa jornada para os campos de prisioneiros; veículos foram recolhidos para substituir os caminhões britânicos, quase destruídos pelas exigências da perseguição prolongada. Os tanques M13 italianos capturados tinham de ser postos em uso, pois já então o equipamento da 7a Divisão Blindada estava em péssimas condições.

 

Entrementes, a 6a Divisão Australiana avançara ao longo da estrada principal de Barce e Benghazi e daí para Ghermines, a noroeste de Solluch, completando assim o cerco do exército italiano. Foi uma vitória total para os britânicos e que o General O’Connor gostaria de explorar até o fim, continuando a avançar para Trípoli. Nunca se saberá se ele teria tido sucesso, pois não lhe deram a oportunidade de tentar. Recebendo ordens de voltar ao Cairo, ele assumiu o posto de Comandante-geral das Tropas Britânicas no Egito; seus soldados, vitoriosos mas cansados da batalha, seriam retirados e substituídos por novas formações; somente uma força de cobertura ficou ali para proteger a imensa área de território recém-capturado. Com os italianos totalmente expulsos da Cirenaica, a crise que se desenvolvia na Grécia tornou-se o ponto focal da atenção, mas já se preparavam movimentos que recolocariam o teatro de guerra da África do Norte nas manchetes e recomeçariam toda uma série de árduas campanhas no deserto.

 

Adolf Hitler não ficara satisfeito com o desempenho do seu aliado na África do Norte. A 5 de fevereiro, o primeiro dia da Batalha de Beda Fomm, ele escreveu a Mussolini expressando-lhe desagrado e ofereceu-se, com a condição de que os italianos se mantivessem firmes e não recuassem para Trípoli, para mandar uma Divisão Panzer alemã para ajuda-los. Cinco dias depois, Mussolini comunicou-lhe a aceitação da oferta e, a 11 de fevereiro de 1941, o Tenente-General Erwin Rommel chegou a Roma, onde lhe asseguraram que a primeira linha de defesa italiana estaria em Sirte. Logo depois chegaram a Trípoli os primeiros elementos da prometida contribuição de Hitler no sentido de reforçar o vacilante exército italiano. Era uma força destinada a mudar radicalmente o panorama da guerra no deserto.

 

De todos os comandantes do Eixo que combateram os Aliados Ocidentais, Erwin Rommel é sem dúvida o mais conhecido. Sua reputação como líder atingiria tais proporções que se constituiu numa ameaça ao moral dos que o deveriam enfrentar na África do Norte, sendo preciso tomar providências positivas para combater o crescimento da lenda de Rommel. Na época em que assumiu o comando das Forças Alemãs na África do Norte, ele já tinha feito uma distinta carreira militar, embora não fosse ainda muito conhecido fora do seu país.

 

Nascido em 1891, em Heidenheim, no Wurtemburgo, filho de um diretor de escola, recebeu sua patente de segundo-tenente em janeiro de 1912. Durante a Primeira Guerra Mundial, serviu na França, Romênia e desempenhou papel importante em Caporetto, na Itália, recebendo a mais alta condecoração da Alemanha imperial, a Pour le Mérite, por sua coragem e capacidade de líder. Entre as guerras, ele serviu na Academia Militar de Dantzig e escreveu um livro, Ataques de Infantaria. Foi este livro que chamou para si a atenção do Führer. Promovido ao posto de Major-General, Rommel serviu no estado-maior de Hitler durante a campanha-relâmpago da Polônia. Quando do ataque à França e aos Países Baixos, ele comandava a 7a Divisão Panzer, à frente da qual demonstrou novamente as suas qualidades de líder vigoroso. Depois de consignar vários triunfos na França, foi assumir diretamente o comando do Afrika Korps.

 

Além de hábil comandante, Rommel era também muito bom escritor e um estudioso da história militar. Assim é que procurava pôr em prática as lições aprendidas no estudo atento das campanhas dos grandes generais do passado, relatando sempre as experiências colhidas nas ações de que participava, para que pudessem servir aos futuros comandantes. Nas narrativas das suas campanhas, ele resiste com mais vigor que muitos generais transformados em escritores à tentação de justificar as atitudes tomadas, por se interessar mais pelo valor acadêmico das mesmas. É interessante o registrou sobre a campanha de Wavell. Essa campanha, tendo começos modestos, transformara-se numa fuga em grande escala do exército italiano na Cirenaica e levara a força britânica, relativamente pequena, quase até a fronteira da Tripolitânia, em El Agheila.

 

Na opinião de Rommel, a ofensiva de Wavell fora soberbamente planejada e executada, mas ficou aquém do seu potencial. Em sua convicção, o sucesso deveria ser sempre plenamente explorado, e a exploração da gigantesca vitória de Wavell significava uma continuação do avanço até Trípoli; para Rommel, era erro fundamental os comandantes aceitarem objetivos estratégicos por demais limitados. Ele não podia saber que o avanço fora detido não por Wavell, mas pelo governo britânico, visando a retirar tropas para uma força expedicionária a ser enviada para a Grécia. Sem esse conhecimento, Rommel supunha que a parada fora feita por insistência dos “Oficiais de Intendência”, em contradição com seu próprio preceito, vigorosamente formulado, de que o próprio comandante deve classificar a capacidade da sua organização de abastecimento em prover suas necessidades, obrigando, desse modo, a organização a fazer esforços maiores do que teria feito em outras circunstâncias. Pelos seus comentários, é evidente que Rommel não subestimava a capacidade de Wavell como general.

 

O comandante do Afrika Korps voou até Trípoli a 12 de fevereiro de 1941, para uma conferência com o Comandante-Chefe italiano, General Gariboldi – o Marechal Graziani havia passado o comando a Gariboldi, seu Ex-chefe de Estado-Maior. Rommel achou o italiano desanimado e pessimista quanto aos planos para a defesa da Tripolitânia baseada em Sirtre. O alemão partiu num vôo de reconhecimento da área, para estudar pessoalmente seu potencial defensivo. Nada do que viu durante o vôo lhe deu razões para mudar de idéia e, na reunião seguinte, o General Gariboldi não fez outras objeções, tendo, entrementes, recebido uma diretiva do Duce pondo em vigor as medidas concertadas no acordo celebrado entre os dois ditadores do Eixo.

 

Essas medidas colocavam as forças motorizadas italianas que se encontravam na África do Norte sob o comando de Rommel, e este – teoricamente – sob o comando do Comandante-Chefe italiano. Depois de fazer uma avaliação das possibilidades do comando italiano, Rommel decidiu exceder os limites das instruções que tinha recebido, que eram para que se limitasse a um reconhecimento, e assumir o comando na frente o mais breve possível, por certo o mais tardar quando da chegada dos primeiros soldados alemães. Rommel mencionara essa decisão ao General von Rintelen, adido militar alemão em Roma, que o advertiu vigorosamente contra essa atitude.

 

No dia em que seu comandante voou até Trípoli, os elementos avançados do Afrika Korps estavam no mar e deveriam aportar a 14 de fevereiro. Os soldados restantes das duas divisões viriam depois, para completar a concentração da 5a Divisão Ligeira em meados de abril e da 15a Divisão Panzer pelo final de maio. O Afrika Korps seria apoiado por pequeno contingente aéreo da Luftwaffe e, além disso, poderia recorrer aos serviços de bombardeiros médios da Sicília. Infelizmente, do ponto de vista de Rommel, seu comando não era inteiramente integrado, pois a força aérea não estava diretamente sob seu controle, como seria do seu agrado. A estreita coordenação da RAF, da Marinha Real e do Exército britânico, durante a “Operação Bússola”, causou-lhe muita admiração.

 

À medida que a vanguarda da força alemã chegava à África do Norte, não se perdia tempo em pô-la em ação. Os carros blindados pertencentes ao 3o Batalhão de Reconhecimento, descarregados em Trípoli a 14 de fevereiro, estavam em ação contra forças britânicas já no dia 24, em Nofilia, a 120 km a leste de Sirte. Um estudo da reação britânica às incursões montadas pelo 3o Batalhão de Reconhecimento levou Rommel a concluir que seus adversários não tinham qualquer intenção de atacar. Aliás, ele estava convencido de que o inimigo se encontrava em condições de ser atacado, por haver enfraquecido perigosamente sua linha de defesa. Contudo, tendo ido a Berlim para apresentar suas propostas, ele ficou algo desencorajado quando lhe disseram que não fazia parte do plano estratégico geral um grande ataque na África do Norte. Mas obteve permissão para montar um ataque a El Agheila em fins de maio, com a advertência de que não esperasse recursos maiores do que os já designados para o seu setor.

 

Rommel atacou em El Agheila a 24 de março, obtendo sucesso comprovadamente fácil. A 31 de março, ele atacou as posições britânicas em Mersa Brega com a 5a Divisão Ligeira. Ali, uma brecha de 13 km de largura, entre o mar e os pântanos salgados, no interior, foi fechada pelo Grupo de Apoio da 2a Divisão Blindada britânica, uma formação consistente de um batalhão de infantaria, um regimento de artilharia de campanha e um regimento  de canhões antitanques. Situada à retaguarda do grupo de Apoio estava a 3a Brigada Blindada da 2a Divisão Blindada, encarregada de contra-atacar qualquer penetração das defesas do grupo de Apoio. Durante todo o dia a batalha prosseguiu e, como não houve nenhum contra-ataque, a 5a Ligeira reuniu-se para um esforço final e rechaçou os britânicos das posições que ocupavam.

 

Seguindo a linha costeira, Rommel chegou a Agedabia a 2 de abril, abrindo a seguir seu avanço em três direções. Para oeste, ele se manteve junto à costa, rumando para Benghazi; no centro, ele atacou por Antelat e Msus, na direção de Mechili; no leste, fez um círculo pelo deserto, para se aproximar de Tengeder pelo sul, prosseguindo até Mechili, para juntar-se novamente à linha central de avanço.

 

Era a vez de Rommel impulsionar implacavelmente suas forças através do deserto, decidido que estava a superar toda oposição, quer dos seus inimigos, os britânicos, quer do seu aliado, na pessoa do General Gariboldi. O general italiano, preocupado com o fato de Rommel começar a estender-se muito para dentro da Cirenaica Ocidental, protestou, quando foi então informado, da maneira a mais incisiva, de que o comandante do Afrika Korps pretendia não abrir mão do conceito de que não se deve deixar passar uma boa oportunidade. Rommel tampouco se deixaria deter pelos empecilhos do pensamento do “Oficial de Intendência”. Quando o General Streich, comandante da 5a Divisão Ligeira, lhe informou que precisaria de quatro dias para transportar combustível suficiente para continuar seu avanço, Rommel lhe disse, de forma a não permitir discussão, que ele tinha de descarregar todos os seus veículos, despacha-los para reabastecimento e estar novamente em marcha dentro de 24 horas.

 

Tampouco os comandantes subordinados estavam a salvo do arrocho de Rommel quando nas vastidões do deserto. Perdidos, ou simplesmente não se deslocando com a rapidez suficiente para satisfazer o exigente comandante, era provável que recebessem dele uma visita, que se realizava com a aparência de um raio caído do céu, pois ele se acostumara a voar pelo deserto em seu avião particular, um Fieseler Storch. O monoplano de asa alta, com seu trem de aterrissagem fixo, sobrevoava a coluna errante e procurava um ponto adequado no deserto para pousar. Então de acordo com as circunstâncias, o comandante da coluna ou era repreendido pela lentidão da marcha ou teria o rumo corrigido, com talvez um relatório de tudo quanto estivesse acontecendo à sua frente. O Afrika Korps começava a conscientizar-se de que somente o melhor era aceitável para seu general.

 

No dia 4 de abril o 3o Batalhão de Reconhecimento entrou desimpedido em Benghazi, encontrando em chamas as provisões que os britânicos haviam transportado laboriosamente pelo deserto. Voltando para leste, os alemães avançaram sobre Er Regima, onde foram sem cerimoniosamente detidos por um batalhão de infantaria da 9a Divisão Australiana – que substituíra a 6a Divisão, despachada para lutar na Grécia – apoiado por canhões de campanha de 25 libras. Por volta de 5 de abril, a mais oriental das três penetrações de Rommel alcançou Tengeder e, no dia seguinte, Mechili, onde chegou antes da coluna central, que sofreu atraso causado por escassez de combustível. Cada coluna era uma unidade auto-suficiente, formada de tanques, canhões e infantaria; esses grupos de batalha, altamente móveis, eram suficientemente fortes para cuidar de si próprios. Na composição desses grupos não  entravam apenas tropas alemãs, pois havia elementos da divisão blindada italiana “Ariete” na coluna de Schwerin – que escaparam por Tengeder – e as tropas de “acompanhamento” eram da infantaria da Divisão “Brescia”.

 

O 3o Batalhão de Reconhecimento, apoiado por infantaria da Divisão “Brescia”, manteve uma pressão contínua sobre a 9a Divisão Australiana, que batia disciplinadamente em retirada. Os alemães, em seu avanço, encontraram muitas provas do péssimo estado dos blindados britânicos; tanques britânicos que haviam enguiçado e não puderam ser recuperados a tempo e, mais comumente, os escombros calcinados de tanques italianos que os britânicos haviam utilizado, mas que, por serem acionados a óleo diesel, não tinham podido abastecê-los. Enquanto as colunas alemãs se concentravam em torno de Mechili, a 6 de abril, um destacamento comandado pelo Coronel Ponath foi despachado para cortar a estrada costeira, perto de Derna, e a linha de retirada das forças britânicas que ainda estavam na Cirenaica Ocidental. Ponath não pode impedir a retirada da 9a Divisão Australiana, que escapou à armadilha alemã e retornou a Tmimi.

 

Embora não conseguisse impedir a retirada dos australianos, Rommel fez uma boa colheita de oficiais superiores britânicos, entre os quais se encontravam o Brigadeiro Rimington, comandante da 3a Brigada Blindada; o Tenente-General Philip Neame, o comandante britânico; e, o mais importante de todos, o General O’Connor, que retornara do Cairo para tentar salvar a situação na Cirenaica Ocidental. As formações dos dois exércitos já então estavam dispersadas e o próprio Rommel por pouco não foi capturado pelos britânicos, quando quase pousou junto a uma coluna de veículos que julgara pertencer ao seu grupo de batalha central entre Msus e Mechili.

 

Por volta de 7 de abril, os alemães haviam cercado o Major-General Gambier-Parry, comandante da 2a Divisão Blindada Britânica, com os remanescentes da sua divisão e da 3a Brigada Indiana, em Mechili. Por duas vezes, naquele dia, Rommel conclamou os britânicos a renderem-se. Ao amanhecer de 8 de abril, os britânicos tentaram escapar, mas apenas umas poucas unidades conseguiram pôr-se a salvo. Gambier-Parry juntou-se aos oficiais graduados que haviam sido feitos prisioneiros de guerra.

 

Os alemães colheram aí uma vitória realmente expressiva, mas Rommel não se mostrava inclinado a deitar-se sobre os louros e começou a planejar uma decisão definitiva sobre as forças britânicas que restavam na Cirenaica, para, a seguir, penetrar no Egito. Assim, pensando, ele colocou o General von Prittwitz – comandante da 15a Divisão Panzer, que ainda não chegara à frente de batalha – no comando de um grupo misto de batalha, cujo componente principal era o 3o Batalhão de Reconhecimento. Essa formação foi encarregada de avançar o mais depressa possível para tomar Tobruk.

 

Enquanto Rommel se esforçava por impulsionar cada vez mais rapidamente suas tropas, para que as vacilantes forças britânicas não tivessem tempo de se reequilibrar, a tensão do longo avanço pela Cirenaica começou a se fazer sentir sobre homens e veículos. Era sabido que os britânicos, certos de que Rommel carregaria sobre Tobruk, estavam despachando apressadamente todas as forças disponíveis para defende-la. Rommel não desejava desprezar as facilidades que o porto daquela cidade lhe poderia oferecer, pois quanto mais avançasse para leste, mais se distanciaria do centro de abastecimento de suas tropas, que era Benghazi. Tampouco podia ele tolerar a presença de um enclave britânico na sua retaguarda enquanto se estivesse encaminhando para além das fronteiras do Egito, por representar tal bolsão hostil uma ameaça constante à sua segurança.

 

Foram essas considerações, importantes sem dúvida, que o levaram à carga sobre Tobruk, sem dar conta de que os britânicos também consideravam vital a manutenção daquele porto e por ele se bateriam até o desespero. Durante os dias 10 e 11 de abril, o 3o Batalhão de Reconhecimento, a 5a Divisão Ligeira e as Divisões “Brescia” e “Ariete” chegaram às proximidades das defesas externas de Tobruk. Os movimentos descoordenados dessas unidades, andando às apalpadelas ao redor do perímetro como quem procura uma porta num aposento mergulhado na mais completa escuridão, levaram a várias escaramuças com os defensores. Num desses encontros breves e violentos, o General von Prittwitz foi morto. Como disse o próprio Rommel, “a situação era muito confusa”.

 

A maré da guerra retornara ao perímetro de Tobruk, menos de três meses depois que o bem sucedido ataque dos australianos alcançara seu objetivo em apenas 29 horas. O período intermediário testemunhara a virtual destruição de um exército italiano, o enfraquecimento das vitoriosas forças britânicas e a entrada, na poeirenta arena do deserto, de um exército novo e bem treinado, conduzido por um general talentoso. Num tempo ridiculamente breve, esse recém-chegado conseguiu levar de volta os britânicos à fronteira egípcia, criando para os alemães a oportunidade de tomar o Canal de Suez. Mas, antes que se pudesse concretizar tal ambição, Rommel tinha de conquistar Tobruk.

 

Olhando de dentro para fora

 

A 9a Divisão Australiana e seu comandante, Major-General Leslie Morsched, haviam gasto um tempo cansativo e decepcionante “competindo” no evento variadamente conhecido como “Derby de Tobruk” ou “Handicap de Benghazi”. Quando a 9a Divisão substituiu a 6a Divisão Australiana – a conquistadora de Tobruk – para que esta fosse prestar serviço na campanha grega, veio desfalcada de duas das suas brigadas, também transferidas para a Grécia, recebendo em troca duas brigadas da 7a Divisão Australiana. Como se fosse considerado improvável que o Eixo montasse um contra-ataque na Cirenaica nessa época, não parecia muito importante que a 9a Divisão, tal como estava constituída, se encontrasse carente de treinamento e de muito equipamento essencial.

 

Quando Rommel e seu Afrika Korps começara, céleres pela Cirenaica Ocidental, duas brigadas da 9a Divisão estavam em posição próximas de Er Regima, mais ou menos a 50 km a leste de Benghazi. Uma outra brigada, a 24a, encontrava-se em Tobruk, treinando e trabalhando nas velhas defesas italianas. À medida que a situação se deteriorava, decidiram os britânicos retirar a 9a Divisão para Barce, deixando o 2/13o Batalhão da 20a Brigada para defender a escarpa em Er Regima como força de cobertura. Às 16:30h de 4 de abril de 1941, as primeiras tropas alemãs chegaram ao alcance das armas do 2/13o Batalhão, tendo início o primeiro choque entre o exército alemão e uma unidade da Força Australiana Imperial, na Segunda Guerra Mundial.

 

A batalha foi rápida e furiosamente travada. Os soldados de infantaria australianos ocupavam sangars – palavra da língua pushtu designativa de parapeito construído de pedra – à prova de tiros de fuzil e metralhadora, mas facilmente destruídos por canhões de tanques. Estavam, porém, os australianos inadequadamente armados para enfrentar os tanques e carros blindados alemães despachados contra eles, apesar de contarem com certo apoio de artilharia. Gradativamente, os australianos foram sendo repelidos, mantendo no entanto coesão contra os violentos ataques da infantaria alemã, apoiada por blindados, que continuaram até o escurecer. Recuando gradualmente, pela estrada, para Barce, eles verificaram que os alemães se haviam infiltrado em sua retaguarda e estavam cobrindo a estrada com fogo de metralhadora. Essa ameaça foi eliminada com baioneta calada e a estrada ficou livre. Às 23:00h, o transporte do batalhão chegou e os australianos começaram a ser levados para Barce sem maiores incidentes.

 

A retirada prosseguia. Eram grandes a confusão e a ansiedade, pois ninguém sabia exatamente onde os alemães apareciam em seguida. Toda a sorte de boatos corria entre as unidades em retirada, com seu habitual efeito demolidor. A 9a Divisão travou várias ações de resistência, recusando-se a ser levada ao pânico pelas forças alemãs que a hostilizavam, enquanto se retirava pelos lugares com os quais se familiarizara quando avançara para oeste – Derna, Martuba, Tmimi, Gazala e, finalmente, Tobruk.

 

No dia 7 de abril novas tropas britânicas começaram a ser levadas às pressas para o deserto, para repor as perdas sofridas durante a retirada. Uma brigada de infantaria australiana – a 18a Brigada da 7a Divisão Australiana – e alguns tanques estavam no mar, a caminho de Tobruk; enquanto isso, por terra, o 11o de Hussardos e a infantaria da 22a brigada de Guardas chegaram para fortalecer as formações mais ou menos provisórias que se preparavam para defender a fronteira egípcia. Todos os esforços estavam sendo feitos nas oficinas egípcias no sentido de enviar o mais rápido possível para o deserto o equipamento que se encontrasse já recuperado.

 

A 8 de abril, debaixo de cegante tempestade de poeira, o General Wavell, acompanhado do Major-General J. D. Lavarack – comandante da 7a Divisão Australiana – chegou a Tobruk de avião. Dois dias antes, por decisão da cúpula do comando britânico, o porto deveria ser defendido, se tal fosse praticável. Wavell ainda nutria a esperança de poder estancar o avanço alemão ao longo da linha Tobruk-El Adem, de modo que pudesse manter comunicações terrestres com o Egito. Os dois generais reuniram-se com o Major General Morshead e, com este, planejaram a defesa da cidade. Lavarack foi nomeado comandante na Cirenaica, em substituição ao General Neame, que caíra prisioneiro de guerra, e recebeu as instruções a serem seguidas.

 

Entre outras coisas, tais instruções ressaltavam a máxima importância de ser defendida Tobruk, a fim de ganhar tempo enquanto se reuniam reforços para a defesa do Egito. Estabeleciam que talvez fosse necessária resistir durante dois meses, mas, não obstante, Lavarack foi instruído para que preparasse um plano para a evacuação da cidade por terra e mar. Finalmente, como que para salientar que o plano de retirada seria apenas de contingência, disseram-lhe para aproveitar todas as oportunidades para realizar operações ofensivas contra os alemães. Em circunstância alguma a defesa de Tobruk se basearia apenas na contenção do ataque do adversário.

 

O General Wavell levantou vôo no fim da mesma tarde, deixando os dois australianos a estabelecer os detalhes da defesa e quase sofreu um desastre quando seu avião fez uma aterrissagem forçada no deserto. Ele foi encontrado por soldados britânicos, mas, estando a área tão convulsionada, poderia tê-lo sido facilmente pelos alemães, indo juntar-se, no cativeiro, aos vários oficiais graduados presos nas últimas semanas.  Lavarack não perdeu tempo em realizar uma inspeção das velhas defesas italianas, organizando Estados-Maiores improvisados para suas defesas blindadas, de artilharia e antiaéreas e, finalmente, dando ordens para que o general Morshead trouxesse o restante da 9a Divisão para o interior do perímetro defensivo na noite seguinte.

 

Uma vez dentro de Tobruk, Morshead assumiu o comando do perímetro e imediatamente aumentou o número de homens que se incumbiam da restauração das velhas linhas italianas. A 24a Brigada, que ficara para trás enquanto o resto da divisão estivera na Cirenaica Ocidental, já realizara um trabalho considerável sob as ordens do General Neame e, embora a situação dentro da guarnição de Tobruk não inspirasse confiança ao seu novo comandante, ela era talvez melhor do que se poderia esperar. Havia em estoque razoável quantidade de alimento, de água e de munição e o Almirante Cunningham, Comandante-Chefe do Mediterrâneo, estava decidido a fazer o máximo para manter o fluxo de suprimentos por mar, apesar do bloqueio que os alemães pudessem impor com submarinos e aviões.

 

Dentro do perímetro encontravam-se então quatro brigadas de infantaria australianas, os remanescentes maltratados da 3a Brigada Blindada, com 23 tanques cruzadores e vários tanques leves, e quatro regimentos de canhões de campanha de 25 libras. As defesas antiaéreas da guarnição estavam dispostas principalmente em torno da baía, porquanto era ali que os britânicos esperavam que os alemães concentrassem seu bombardeio, para impedir que os defensores fossem reabastecidos.

 

O problema que os britânicos enfrentavam era exatamente o mesmo que em janeiro os italianos tiveram pela frente: Como criar uma defesa em profundidade com recursos limitados de infantaria? O perímetro de 48 km, com seus numerosos postos de defesa, consumia uma quantidade enorme do potencial humano, deixando muito pouco como reserva. Uma solução seria encurtar a linha a ser defendida, criando outro perímetro dentro do existente, de talvez metade do comprimento do original. Contra isto se opunha o fato de que não existia então uma linha interna, e não havia tempo para construí-la antes do início do ataque alemão. Portanto, o General Morshead não tinha outra alternativa senão usar o velho perímetro italiano. A cerca de arame farpado, a trincheira e os campos minados ainda estavam no lugar e, embora as minas italianas originais tivessem sido desativadas, não tomaria muito tempo o trabalho de rearmar as que ainda estavam em posição e de acrescentar novas minas.

 

As virtudes das velhas defesas italianas, já descritas, seriam uma vantagem com que contariam os novos ocupantes, mas as suas fraquezas intrínsecas ainda permaneciam. Era evidente que não seria possível impedir um atacante de infiltrar-se por entre os postos largamente espaçados, de modo que era imperioso que houvesse reserva disponível para cobrir imediatamente qualquer setor do perímetro que fosse rompido. Portanto, dos 13 batalhões de infantaria existentes dentro da guarnição, apenas 7 foram usados para guarnecer os postos da linha de frente. Cada batalhão tinha uma companhia de reserva, colocada em posição estrategicamente preparada, a uns 800 m atrás dos pontos fortes existentes. Esta combinação da linha original com as novas posições de reserva, conhecida como a “Linha Vermelha”, era guarnecida por quantidade de homens menor do que a empregada pelos italianos. A deficiência em número de soldados era compensada por um sensível aumento no potencial de fogo; enquanto que, anteriormente, um ponto forte de concreto era guarnecido por um grupo de 25 a 50 homens, os britânicos o defendiam com apenas 10 a 15. Mas, colocando em serviço as muitas armas capturadas e as que possuíam, o peso do fogo que os novos atacantes iriam receber era bem maior do que aquele que os britânicos tiveram que enfrentar.

 

Além disso, o antigo sistema defensivo fora melhorado com a construção de novas posições de tiro nos postos existentes e com a abertura de novos abrigos para armas onde os pontos fortes originais eram muito afastados uns dos outros. Finalmente, um novo sistema de defesas foi construído a mais ou menos 3 km atrás da “Linha Vermelha”, consistindo de um cinturão contínuo de campos minados e arame farpado, com canhões antitanques e metralhadoras entrincheirados em pontos fortes. Este novo sistema era conhecido como a “Linha Azul”, e cada brigada avançada mantinha dois batalhões na “Linha Vermelha” e um na “Linha Azul”. Na área situada entre as linhas foram colocadas minas; na verdade, os campos minados em Tobruk se espalhavam como mato num jardim maltratado, e a tal ponto que até mesmo os sapadores da guarnição não sabiam mais onde se situavam. Os canhões antitanques foram divididos entre as duas linhas, e vários tanques, já incapacitados, foram entrincheirados para suplementar seu fogo. Atrás da “Linha Azul” posicionaram-se os canhões de campanha e, atrás destes, estava a reserva móvel.

 

Esta reserva compunha-se de uma brigada de infantaria motorizada, que desenvolvia os seus batalhões pelos três principais cruzamentos do perímetro, cada qual num cruzamento, que eram o de El Adem, o de Pilastrino e o da junção das estradas de Derna e Pilastrino. A reserva também possuía 24 canhões antitanques em reparos automóveis (carretas). Atrás de tudo estendia-se a reserva blindada que, além dos tanques cruzadores e leves já mencionados, tinha 4 Matildas. Havia mais uma força móvel, equipada com carros blindados e carretas transportadoras de metralhadoras Bren.

 

As defesas assim descritas levaram meses para ficar prontas, mas em sua construção os britânicos trabalharam continuamente, desde o momento em que souberam que finalmente teriam que resistir ao máximo. A retirada prolongada solapara o moral da tropa. A maioria das unidades havia sofrido ataques constantes de artilharia e aviões, e nisso se registraram muitas baixas, e não tivera oportunidade de revidar. Agora, embora a situação não fosse invejável, embora as experiências recentes lhes tivessem ensinado a não subestimar a força e a determinação dos alemães, era infinitamente mais aceitável para os soldados do que a fuga desenfreada. Chegando ao fim a indignidade da retirada constante, eles se preparavam alegremente para a batalha que se avizinhava.

 

A primeira luta em torno do perímetro, a 10 e 11 de abril, havia sido um grande estímulo para o moral dos defensores. Os ataques alemães tinham sido descoordenados e virtualmente sem planejamento, produto do desejo avassalador de Rommel de manter pressão constante sobre as desagregadas forças britânicas e de não lhes dar tempo de se reorganizarem. Formações da 5a Ligeira e do 5o Regimento Panzer alemães haviam sido seriamente maltratadas em seus primeiros contatos com a guarnição de Tobruk, enquanto que ataques tíbios da Divisão “Brescia” ao setor ocidental do perímetro haviam sido rechaçados com relativa facilidade. Nesse estágio, muitas das armas que as tropas que guarneciam a “Linha Vermelha” precisavam para lhes dar o potencial de fogo necessário ainda não haviam sido distribuídas, mas a ação agressiva de infantaria australiana e o fogo certeiro da artilharia foram suficientes para repelir os ataques mal organizados das tropas do Eixo.

 

Sábado, 12 de abril, testemunhou um aumento sistemático da atividade alemã. Isto era particularmente válido quanto à Luftwaffe, que realizou vôos de reconhecimento sobre a área de Tobruk e bombardeios contra posições de canhões, navios ancorados na baía e instalações portuárias. Os aviões alemães foram atacados por Hurricanes do 73o Esquadrão, que na época ocupava uma pista dentro do perímetro. Panfletos  lançados pelos alemães sobre toda a área da guarnição conclamavam os defensores a renderem-se e afirmavam que Tobruk estava completamente cercada por poderosas forças alemãs. Bombardeiros de mergulho, que se mostraram muito eficientes nas campanhas alemãs anteriores, dizia o texto dos panfletos, seriam usados para esmagar a resistência e impedir que os navios de abastecimento trouxessem ajuda à guarnição. Os panfletos não conseguiram reduzir o ânimo dos defensores. Ao contrário, reforçaram neles a decisão de resistir.

 

Durante todo o Domingo de Páscoa, os soldados que guarneciam os postos do perímetro defensivo observaram que se realizava intensa atividade no seio das forças de terra alemãs – prelúdio evidente de ataque. Esses preparativos foram vistos por instantes através das nuvens turbilhonantes de uma tempestade de areia que impedia a observação precisa da área, mas permitia vislumbres atormentadores de uma concentração de tropas e veículos. A artilharia britânica abriu fogo sobre os alemães e os postos avançados da “Linha Vermelha” foram alvo de granadas disparadas em represália pelas baterias alemãs. O ponto da concentração dos alemães ficava a oeste da estrada El Adem, adjacente ao Posto 33, um dos pontos fortes do perímetro de defesa original, agora defendido pelo 2/17o Batalhão da 20a Brigada.

 

Pelo final da tarde, os australianos se encontravam debaixo de ataque realizado por poderosa força alemã. Ao contrário dos italianos, que abandonaram a guarnição sem tentar desviar a atenção dos atacantes, hostilizando-os de outros pontos do front, o Brigadeiro Gott, com o grupo de Apoio da 7a Divisão Blindada, dava combate aos alemães na área da fronteira, num esforço por desviar parte das tropas do Eixo da investida contra Tobruk. Apesar, porém, desses esforços, os informes dos aviões de reconhecimento da RAF, que estavam voando apesar da precária visibilidade, davam conta de que poderosas formações blindadas alemãs e italianas rumavam para o perímetro de Tobruk.

 

Por volta das 22:00h daquela noite, os postos da “Linha Vermelha” situados defronte à área de concentração alemã foram submetidos a intenso fogo de morteiros e metralhadoras. Esse fogo saturante perdurou por cerca de uma hora, depois do que soldados alemães atravessaram a cerca de arame a leste do Posto 33. As tropas que guarneciam os postos adjacentes ao ponto de penetração abriram fogo sobre os infiltradores, que responderam com disparos de uns dois canhões de campanha leves, metralhadoras e morteiros. Tornou-se logo evidente que os alemães não seriam repelidos apenas com armas de pequeno calibre, e se lhes fosse permitido ficar na posição em que se encontravam, eles se constituiriam num pé atravessado na porta de entrada das defesas de Tobruk, através da qual penetraria o inevitável ataque blindado.

 

Neste ponto, como aconteceria com freqüência nos meses subseqüentes de luta, um simples tenente agiu pronta e corajosamente por iniciativa própria. O comandante do pelotão no Posto 33 era o tenente Austin Mackell que, compreendendo a situação, saiu com um cabo e cinco soldados para arrancar os alemães da posição por eles ocupada. Os australianos descreveram um círculo ao deixar a proteção do seu posto para acossar os alemães pelo flanco. A progressão que realizaram foi feita debaixo de fogo, rastejando e correndo, nos breves momentos de silêncio das armas inimigas.

 

Enquanto Mackay e seus comandados, ainda deitados no chão, se preparavam para o último lance de corrida, removeram o pino das duas granadas que cada um deles levava e, num salto, voaram contra a posição em que se encontravam os alemães, lançando contra eles as granadas já prestes a explodir. Os sete homens, com baionetas armadas, meteram-se no meio dos alemães, tendo coberto os últimos metros debaixo de fogo concentrado. Seguiu-se sangrento corpo-a-corpo que redundou na fuga dos alemães, abandonando à fúria das compridas baionetas dos australianos as armas que tinham consigo, além do campo que ocupavam.

 

Foi pelo que realizou nessa incursão que o Cabo Jack Edmonson recebeu a Victoria Cross. Atingido no estômago por uma rajada de metralhadora, ele conseguiu chegar à posição inimiga, onde matou a baioneta pelo menos dois alemães e ainda encontrou forças para ajudar seu comandante de pelotão. Terminada a luta, ele desmaiou e foi levado por seus companheiros de volta ao Posto 33, onde, na manhã seguinte, faleceu.

 

Duas patrulhas do 2/17o Batalhão, despachadas a seguir, travaram combate com grupos alemães que se aproximavam do perímetro e conseguiram rechaça-los. O comandante do batalhão colocou sua companhia de reserva imediatamente atrás do Posto 32, em prontidão para contra-atacar ao amanhecer. Embora prejudicados pela ação agressiva dos australianos, os alemães voltaram a atacar às 02:15h, quando uns 200 soldados da infantaria alemã atravessaram a cerca e estabeleceram uma cabeça-de-ponte de várias centenas de metros de profundidade dentro da linha de defesa da cidade. O posto australiano mais próximo manteve sob fogo intenso os atacantes e também atraiu para si o fogo da artilharia adversária. Apesar das baixas que sofreram, desta vez os alemães se mantiveram tenazmente firmes na brecha aberta nas defesas.

 

Cerca de meia hora antes que a aurora iluminasse o céu oriental, os soldados de infantaria que guarneciam a “Linha Vermelha” ouviram o agourento som de motores e o clangor metálico dos blindados alemães que se aproximavam. Os tanques passaram pela área limpa pelos sapadores alemães e voltaram-se para a cidade de Tobruk. A artilharia britânica ainda estava atirando, lançando granadas na brecha pela qual os tanques se infiltravam, mas a infantaria australiana, nos pontos fortes, obedecendo ordens, não atiraram contra os tanques. Soldados de infantaria alemães haviam acompanhado os blindados pela abertura feita nas defesas, alguns a pé, outros sobre os tanques. Uma vez penetrada a área de defesa, estes soldados organizaram-se para consolidar a cabeça-de-ponte, para que o restante da força atacante pudesse passar.

 

O batalhão de tanques que penetrara o perímetro de defesa começou a organizar-se na tradicional formação de falange que os alemães verificaram ser tão eficaz como ponta-de-lança de um ataque. Do lado de fora da cerca de arame, outro batalhão de tanques, apoiado por canhões e infantaria, aproximava-se da brecha pronto para explorar os ganhos do outro batalhão. Eram mais ou menos 05:45h quando os artilheiros do 1o/Real Artilharia conseguiram avistar as nuvens de poeira levantadas pelos tanques em manobra, na frouxa claridade que o alvorecer ia colocando no campo de batalha. Os canhões de 25 libras estavam posicionados atrás da ainda incompleta “Linha Azul’ e disparavam sobre a brecha criada pelos alemães nas defesas externas. O ponto em que os tanques se agrupavam para o ataque, cerca de 1.200 m dentro do perímetro, passou a ser alvo dos artilheiros, que aceleraram a cadência de tiro. Os canhões antitanques do 3o/Real Artilharia, situados um pouco à frente dos canhões de 25 libras, também abriram fogo contra os tanques alemães, mas ainda estava escuro demais para que tivessem muita chance de êxito.

 

A batalha travada dentro da cerca de arame farpado tornou-se um duelo entre os tanques alemães e a artilharia britânica. A falange de tanques, mantendo fogo intenso, prosseguia atacando. Alguns dos tanques eram PzKw IV, cujo armamento principal, de 75 mm, só disparava quando parado o veículo, momento em que seus artilheiros visavam na direção dos clarões dos canhões britânicos. Os artilheiros britânicos perceberam que os tanques alemães se comportavam de acordo com um sistema: quando alguns tanques paravam para dar ao artilheiro uma plataforma firme, outros continuavam movendo-se. As metralhadoras dos tanques disparavam quase que ininterruptamente. A escuridão era cruzada por miríades de rastros brilhantes produzidos pelas balas traçadoras; granadas traçadoras, disparadas pelos canhões dos tanques, cortavam o céu do deserto como pequenos e brilhantes meteoros; as granadas dos canhões de 25 libras explodiam com enormes jatos de chamas; à luz ardente dos clarões da boca dos canhões, um tanque ou um canhão sobressaía por instantes em nítida silhueta, desaparecendo novamente na escuridão quando o clarão morria.

 

Com o aumento da visibilidade, a precisão dos tiros britânicos melhorou. Muitos artilheiros estavam disparando com miras abertas para distâncias de 500 a 600 metros, à medida que os tanques alemães se esforçavam por abrir caminho pelas defesas britânicas. Já então, os tanques haviam penetrado cerca de 3 km do perímetro, mas o número deles estava diminuindo. Alguns foram completamente destruídos, fazendo aumentar, as vívidas línguas de fogo que deles saíam, a luz cada vez mais fortes da manhã. Outros retornaram claudicantes à brecha por onde entraram, todos com alguma avaria causada pelo persistente fogo de artilharia.

 

Os tanques ainda aptos voltaram-se para leste, tentando encontrar um caminho para trás dos imovíveis canhões de campanha, mas toparam com os canhões antitanques de um regimento australiano. Frustrados, os alemães começaram a retirar-se, sempre hostilizados pelos canhões antitanques de 2 libras sobre reparos automóveis pertencentes ao 3o/Real Artilharia. Esses canhões, transportados em caminhões leves, eram manobrados com grande destreza por suas guarnições. Dirigidos contra os tanques alemães a grande velocidade, aproximaram-se deles o mais possível e, dando meia volta, dispararam vários tiros e se retiraram rapidamente. Os alemães reagiram com vigor a esses ataques sem blindagem e vários dos caminhões foram atingidos.

 

Mais ou menos na metade da distância que separava a “Linha Vermelha” da “Azul”, os tanques alemães tentaram novamente formar-se em falange, preparando-se para montar novo ataque. Os artilheiros britânicos, atentos a todos os seus movimentos, não lhes deram trégua, e os tanques, sem o apoio de canhões antitanques e de campanha e da infantaria, estavam relativamente indefesos. Esse apoio, tão necessário à perfeita execução da blitzkrieg clássica estava agora ausente. Isto porque os australianos haviam adotado táticas cuidadosamente ponderadas para impedir o desenvolvimento desse tipo de assalto.

 

Quando os tanques alemães passaram pelas defesas da linha de frente, a infantaria que guarnecia os postos não abriu fogo. Assim que os tanques desapareceram na direção de Tobruk, os australianos abriram fogo fulminante contra a infantaria alemã. Como ainda estivesse escuro, vários soldados alemães conseguiram passar por entre os postos da “Linha Vermelha”, mas a maioria foi obrigada a refugiar-se na trincheira antitanque do lado de fora da cerca. À medida que clareava, os alemães eram vistos arrastando canhões antitanque e de campanha, mas sem o manto da escuridão estavam fadados ao fracasso. Já suficientemente claro, os soldados alemães não puderam passar pelos atiradores australianos; as guarnições dos canhões não demoraram a ficar espalhadas inertes na poeira do deserto.

 

Enquanto a artilharia britânica disparava contra a concentração de reforços que se fazia fora do perímetro, a infantaria australiana cuidava dos alemães que tinham conseguido infiltrar-se na “Linha Vermelha” durante as horas de escuridão. Houve alguma luta, porém, mais ou menos às 06:30 h, a ameaça estava eliminada. Sem qualquer apoio dos canhões e da infantaria, os tanques alemães acharam prudente retirar-se. Quando, no entanto, o sol já inteiramente de fora, os tanques alemães se esforçavam por se reorganizarem para tentar novo ataque, os tanques cruzadores britânicos, que haviam sido trazidos durante a noite e esperado, a leste da estrada El Adem, para desfechar um ataque de flanco no momento psicológico, caíram-lhe em cima, sempre em grupos de seis tanques cada um e colocados de forma que o sol permanecesse em sua retaguarda, para dificultar a visão do artilheiro adversário.

 

A batalha que se seguia foi, como a maioria delas, confusa e sem ordem aparente. Era difícil ver os tanques alemães, pois estavam ocultos por nuvens de poeira e fumaça, de modo que os cruzadores britânicos disparavam salva após salva de tiros contra a mancha marrom, sabendo que seus alvos tinham de estar em algum ponto dentro daquela mancha. Gradativamente tornou-se evidente que o centro do duelo se deslocava mais e mais para as proximidades da abertura de acesso ao perímetro de defesa. Quando quatro Matildas chegaram para reforçar os cruzadores, vários dos quais já obrigados a abandonar a luta, por motivo de avarias, o movimento na direção da saída do perímetro tornou-se mais pronunciado, até que ficou claro que os alemães estavam em acelerada marcha à ré.

 

Quando os alemães ultrapassaram a brecha, dirigindo-se agrupados para a segurança do deserto aberto, de ambos os lados da saída os aguardavam canhões antitanques, que dispararam contra suas fileiras. Uma vez mais, o temido chicotear da explosão dos canhões de alta velocidade atingiu os ouvidos das tripulações dos tanques alemães, quando foram submetidas a mais outro ataque de flanco. Já então a retirada dos tanques se transformara em fuga desenfreada e eles desapareceram para o sul, felizes por saírem do alcance dos canhões que os haviam martelado implacavelmente desde o início da ação, às primeiras horas da manhã.

 

Entre o ponto de penetração do perímetro de defesa e o de maior penetração dos alemães estavam agora 17 tanques destroçados, em mudo testemunho do fracasso do ataque. Havia muitos corpos espalhados pela trincheira antitanques e dentro da “Linha Vermelha”, onde a infantaria alemã tentara manter a cabeça-de-ponte; além disso, mais de 250 soldados alemães estavam sendo levados para a zona de prisioneiros, desolados pela derrota.

 

Nem toda a ação, no entanto, se deu em terra. Às 07:30h, mais ou menos, quando os tanques alemães decidiram dar o máximo contra a guarnição de Tobruk, 40 Junkers 87 e Messerschmitts atacaram a baía. Pelo sincronismo da incursão, parece que os alemães haviam calculado que o ataque terrestre estaria bem adiantado e que este seria um golpe decisivo. Sua experiência anterior mostrara que um ataque de Stuka, em conjunção com ataque tipo “corrente em expansão”, desmoralizava à oposição e levava a uma vitória rápida e barata. Mas, assim como a Wehrmacht fora seriamente maltratada em terra, o mesmo aconteceu, no ar, com a Luftwaffe. Os canhões antiaéreos colocados em torno da baía lançaram poderosa barragem e os Hurricanes do 73o Esquadrão atacaram vigorosamente a formação alemã. Durante o dia, cerca de 12 aviões alemães foram destruídos.

 

Os britânicos não saíram completamente ilesos desse primeiro teste na Batalha de Tobruk. Vários de seus tanques foram atingidos, assim como um dos poucos Hurricanes que restavam. Houve baixas entre a infantaria e os artilheiros, e vários canhões foram postos fora de combate durante o violento duelo com os tanques alemães. Mas, sem dúvida o resultado final da luta que se feriu na Segunda-Feira de Páscoa, foi uma vitória britânica. O sucesso levou o General Lavarack a emitir uma ordem do dia de congratulações com os defensores de Tobruk, mas ele teria cortada a sua ligação com a guarnição sitiada e retornaria ao Egito. Seu sucessor natural era o Major-General Morshead.

 

O dia 15 de abril chegou com renovada atividade, tanto na fronteira como ao longo do perímetro de Tobruk. A força do Brigadeiro Gott, depois de receber alguns reforços, continuou em seus esforços para distrair a atenção dos alemães. Com este objetivo, atacou Capuzzo com uma coluna móvel enquanto que, ao mesmo tempo, outras colunas ameaçavam Halfaya e Sollum. Um arremedo de ataque, montado por tropas italianas contra um setor das defesas de Tobruk guarnecido pelo 2o/48o Batalhão da 26a Brigada, foi repelido.

 

No dia 16, os italianos estiveram, embora sem grande ânimo, pelo perímetro de defesa da cidade. Durante a manhã, pelo menos duas patrulhas de infantaria australianas saíram e retornaram com vários prisioneiros. Mas, à tarde, houve um ataque italiano mais forte e, de início, mais determinado. Os homens do 2o/48o se viram diante  de um batalhão blindado da Divisão “Ariete”, consistindo de 6 tanques médios e 12 leves, juntamente com um batalhão de infantaria do 62o Regimento “Trento”. A artilharia britânica abriu uma barragem de fogo intensa e logo dispersou os tanques. Os canhões então concentraram fogo atrás da infantaria italiana, para impedir-lhe a retirada. Os australianos despacharam patrulhas a pé e transportadas, as quais voltaram com grande número de prisioneiros.

 

O dia 17 de abril testemunhou um ataque mais bem organizado, desfechado contra a guarnição australiana que defendia uma pequena proeminência conhecida como Ras el Madauuar, ou Cota 209, no ângulo sudoeste do perímetro. A colina tinha apenas 30 m de altura, mas ficava situada numa região que dominava considerável área do deserto. O ataque se iniciou com fogo de metralhadora e morteiro dirigido contra as posições australianas. Mais tarde, enquanto a colina era submetida a uma barragem de artilharia, tanques e blindados surgiram por trás de outra elevação, a Colina (Cota) Carrier, mais para oeste, e se dirigiram contra o perímetro. Imediatamente, a artilharia britânica abriu fogo, mas a infantaria italiana desceu dos veículos e seguiu sob a proteção dos tanques na direção das Ras el Madauuar

 

Alguns tanques atacaram os postos situados no alto da colina, com resultado insignificante. Eles não receberam a concentração de fogo que os britânicos dirigiram contra a infantaria italiana que os seguia, que se tornou incapaz de continuar avançando pela suave encosta. Encontrando-se sozinhos na crista da colina e sem causar dano, quase, aos postos de defesa e sangars, os tanques retiraram-se. Outros tanques tinham ido da Cota 209 e continuaram rumando para leste; rompendo as frágeis defesas das posições da reserva do 2/48o, eles prosseguiram por mais 1.800 m. Não havia campos minados para detê-los e as defesas de arame farpado não eram suficientemente fortes para fazer parar um tanque; contudo, a artilharia britânica estava ativa, e tendo percorrido uns 3 km dentro do perímetro, os italianos deram a volta e retornaram pelo mesmo caminho. Vários deles haviam sido postos fora de ação na colina e durante a penetração para além dela. A tripulação de um tanque que os australianos aprisionaram revelou, quando interrogada, que tinha ordens de tomar a colina mapeada como Cota 209. As defesas nessa área já haviam sido fortalecidas devido à concentração de forças nas cercanias do perímetro. Com essa nova indicação das intenções do Eixo, intensificou-se o trabalho de minar o terreno entre as linhas “Vermelha” e “Azul”, na parte posterior da Cota 209 e nas próprias posições da “Linha Azul”.

 

Depois de repelido o ataque de 17 de abril, pouca ou nenhuma atividade agressiva houve por parte das forças de terra. A aviação inimiga, no entanto, intensificou a atividade. Grandes formações de aviões alemãs atacaram a baía, as instalações portuárias e os postos de canhões antiaéreos. A batalha entre estes e os bombardeiros de mergulho alemães foi violenta e subseqüentemente à ação no Ras el Madauuar podia-se afirmar que os canhões haviam levado vantagem sobre os aviões, porquanto não tinham estes conseguido impedir o desembarque de suprimentos e reforços para a guarnição, reforços que incluíam 8 novos tanques Matildas.

 

Durante a calmaria em que entrou a atividade terrestre, os defensores observaram que os italianos estavam atarefados na construção de uma série de postos defensivos, defronte ao setor ocidental do perímetro, que se estendiam de um ponto ao norte da estrada de Derna até o sul da Colina Carrier. Além disso, várias baterias de artilharia foram trazidas. O fato de os italianos terem deixado a Colina Carrier fora das linhas de defesa de Tobruk permitia aos atacantes certa facilidade para preparar-se para o assalto sem ser vistos pelos defensores, facilidade em geral negada em outro local, fora do perímetro. Os australianos acreditavam que era precisamente isto que os atacantes faziam e decidiram montar uma incursão relativamente grande para frustrar esses preparativos. A tomada e a defesa da colina estavam além dos limites praticáveis, pois a guarnição da cidade não dispunha de meios para desviar homens e armas para tal empreendimento. Mas a destruição do material bélico ali oculto seria um inconveniente para o Eixo e estaria de acordo com a recomendação de Wavell, isto é, agredir também, em vez de só defender.

 

Assim é que o Brigadeiro Tovell, comandante da 26a Brigada, destacou o 2/48o Batalhão para atacar a Colina Carrier e o 2/23o Batalhão para montar incursão simultânea contra as posições e baterias alinhadas ao longo da estrada de Derna. O ataque à Colina Carrier foi feito por 90 homens do 2/48o, apoiados por 3 Matildas do 7o/Real Regimento de Tanques, canhões antitanques e várias metralhadoras pesadas, Bren, montadas em carretas. A incursão foi um êxito completo.

 

Descendo pelo lado ocidental da colina ao alvorecer de 22 de abril, os incursores surpreenderam os italianos. Embora tivessem perdido contato com os Matildas, a infantaria australiana e os artilheiros atacaram com tal energia, que apesar do pesado fogo de metralhadora e morteiro dominaram rapidamente a posição. Dezesseis oficiais e 354 soldados italianos foram capturados; armas, motocicletas e veículos outros, igualmente tomados, foram levados para serem usados na defesa da cidade. No breve espaço de tempo consumido no ataque, os incursores destruíram ou incapacitaram temporariamente os canhões que não puderam levar consigo. Essa pequena e bem sucedida ação custou aos australianos 2 mortos e 7 feridos.

 

A surtida do 2/23o contra a estrada de Derna transformou-se em duas, realizadas por 2 oficiais e 44 homens. Os dois grupos pretendiam flanquear as posições italianas na estrada de Derna, uma ao norte e outra ao sul, penetrar juntos na estrada e atacar na direção do deserto, fazendo recuar as defesas inimigas. Tendo-se frustrado esses ataques por fogo muito intenso, os australianos se viram obrigados a limitar seus objetivos, depois de haverem sofrido baixas consideráveis na luta violenta que tiveram que sustentar. Contudo, apesar de não completarem as tarefas de que tinham sido encarregados, os dois grupos incursores infligiram pesadas baixas aos italianos e fizeram vários prisioneiros. Tobruk estava criando a reputação de centro de tenaz ação ofensiva.

 

Essas incursões faziam bem o moral dos defensores e ajudavam a aliviar a sensação natural de estarem “encurralados”, isolados como estavam do resto das forças britânicas. Mas Morshead advertiu quanto aos perigos do excesso de confiança resultante desses êxitos, a maioria dos quais, observou ele, obtida contra os italianos que, por sua vez, não conseguiam esconder a falta de confiança com que engajavam nos combates, como ficou evidenciado na ação travada, também na chamada Cota 209, dois dias após as incursões australianas.

 

Ao amanhecer do dia 24, um pelotão de infantaria australiano foi atacado por um grupo de italianos que se infiltrara pelo alambrado durante a escuridão e se estabelecera mais ou menos entre dois postos da “Linha Vermelha”. Os australianos reagiram vigorosamente, resultando disso uma troca de tiros que durou cerca de quinze minutos, ao fim dos quais os italianos, dando-se por satisfeitos, os que não tinham sido mortos, renderam-se. Mais tarde, naquele mesmo dia, observou-se a presença de infantaria alemã nesse setor pela primeira vez. O aparecimento ali do soldado alemão parecia ser outra prova de que a área havia sido escolhida para o grande esforço do Eixo no sentido de penetrar no perímetro. O reforço das defesas que os britânicos já haviam realizado era reflexo da interpretação correta das intenções do Eixo.

 

Durante o período da relativa calma que sucedeu às escaramuças verificadas em torno das defesas, os grupos de trabalho estiveram atarefados, melhorando, robustecendo os postos avançados; ampliaram-se os campos minados e em novos trechos colocaram-se minas; praças de canhões foram reforçadas e camufladas, e próximo a eles, disposta em posição conveniente, a munição necessária para que o poder de fogo da guarnição fosse o melhor possível.

 

A cada melhoramento nas defesas, as tentativas de tomar a cidade tornavam-se mais e mais fortes e perigosas. Porém, a 24 de abril deu-se um acontecimento que inevitavelmente facilitou a tarefa das forças do Eixo que investiam contra Tobruk. Nesse dia, os Hurricanes restantes do 73o Esquadrão da RAF decolaram dali pela última vez, de volta ao Egito. A permanência do Esquadrão ali, infelizmente para a guarnição da cidade, tornara-se impossível. Nessa época, os efetivos de caça da RAF no Oriente Médio estavam muito reduzidos. Os pedidos de caças feitos às fábricas na Inglaterra superavam muito a capacidade de produção que tinham, de modo que, sempre que os alemães atacavam, desfrutavam da supremacia aérea, simplesmente porque a RAF não dispunha de aviões suficientes para combatê-los com eficiência. Todos os caças disponíveis haviam sido enviados para a Grécia, numa tentativa de dar à força expedicionária, que estava em sérias dificuldades, algum tipo de cobertura aérea. Com a RAF estendida aos seus limites, seria rematada loucura deixar os Hurricanes do 73o Esquadrão em Tobruk para serem inevitavelmente destruídos.

 

Como em todos os teatros da guerra onde a RAF fora obrigada a lutar contra vantagens esmagadoras, o 73o Esquadrão obtivera sucessos totalmente desproporcionais aos efetivos que possuía. Muitos pilotos seus foram derrubados repetidas vezes. Devido à superioridade numérica com que contava, os alemães podiam manter caças sobre Tobruk todo o tempo e atacar os Hurricanes no momento em que estes estavam mais vulneráveis, ao decolar, quando se esforçavam por ganhar altura, ou ao pousar, já quase sem gasolina e munição. Gradativamente, os efetivos do esquadrão foram diminuindo, até que, a 26 de abril, ele finalmente desistiu da luta desigual. Os soldados da guarnição foram ver os poucos remanescentes do grupo partir. Quando os aviões desapareceram no céu azul, os soldados que estavam em terra sentiram momentaneamente intensificar-se a sensação de estarem isolados. A falta da RAF, para os artilheiros antiaéreos, significava encargo redobrado.

 

O peso dos ataques aéreos da Luftwaffe aumentou. Tornaram-se freqüentes os ataques contra a baía, às praças de canhões antiaéreos e de campanha e aos postos da “Linha Vermelha”. Os postos mais persistentemente visados eram os que ficavam numa colina que nos mapas figurava como Cota 209 e em seus arredores – outro indicador de ataque iminente à guarnição. Os aviões que desfechavam esses ataques eram Junkers 87, o infame Stuka, arma de terror e o gume da Blitzkrieg. Os aviões de asas de gaivota, com seus trens de aterrissagem fixos e com polainas, faziam mergulhos abruptos contra o alvo, para melhor dirigir as bombas que o piloto lançava. Ser alvo de um Stuka era uma experiência aterradora, fato que os alemães compreendiam muito bem. Para arrancar a máxima vantagem psicológica da arma, eles instalavam no avião sereias que emitiam um silvo de arrepiar durante o ataque. Confrontados pelos modernos caças, os Junkers 87 tornaram-se presas fáceis, mas dada a superioridade aérea alemã, esses aviões se mantinham como arma de grande eficácia.

 

As formações de bombardeiros de mergulho alemães chegavam à área do alvo e então, escolhendo seus objetivos individuais, inclinavam o focinho e entravam em mergulho quase vertical. Durante o mergulho, o ruído do motor aumentava a as sereias intensificavam o barulho já aterrador, com seu lamento fantasmagórico. Era preciso ter nervos bons para continuar disparando um canhão antiaéreo quando alvo da atenção de um Ju 87.

 

Quando o ataque alemão parecia iminente, os britânicos já tinham perdido Sollum e Halfaya, além da fronteira egípcia; a força que fora ajudar os gregos, que se encontravam em sérias dificuldades, havia sido repelida para o mar e evacuada pela Marinha Real, deixando para trás tanques e armas que no deserto eram muito reclamados. A situação no teatro de guerra do Mediterrâneo parecia decididamente negra para os britânicos; com pouca esperança de ajuda, ainda que indireta, por meio de ataques diversivos, a situação da guarnição de Tobruk parecia mais negra ainda.

 

A Cota 209

 

Que as forças que investiam contra Tobruk pretendiam penetrar o perímetro em Ras el Madauuar logo ficou claramente confirmado. Um mapa recolhido num avião alemão derrubado estava nitidamente marcado com uma seta em vermelho-forte. Partindo de Acroma, a seta atravessava a Cota 209, indo sua ponta encravar-se no centro de Tobruk. Os oficiais do Serviço de Inteligência, ao estudar o documento capturado, com suas marcas nítidas, poderiam muito bem ter pensado na importância dessa declaração, de intenções do Eixo. A seta vermelha simbolizava a sombria realidade do poderio esmagador dos Panzer, do poder dos Stukas e da comprovada obstinação do soldado alemão, elementos que, reunidos, compunham a até então irresistível Blitzkrieg. “Torrente em expansão”, este o nome que lhe deu Liddell Hart. De que maneira as defesas de Tobruk poderiam resistir a tal torrente, impedir que atravessasse as não muito fortes barreiras das linhas “Vermelha” e “Azul’, avassalando a reserva móvel, levando tudo de roldão para, finalmente, engolfar a pequena Tobruk?

 

Esses oficiais estavam, mais do que ninguém certos de que a força com que Rommel ia atacar era mais poderosa que as anteriormente lançadas contra as linhas de defesa da cidade. Sabiam também que os êxitos obtidos pelos defensores não se repetiriam com facilidade. A RAF fora obrigada a retirar seus aviões; era quase nenhuma a possibilidade de vir a aliviar a pressão a que seria submetida a cidade o que quer que os britânicos fizessem em outros locais, pelo menos no futuro imediato. Além disso, predominavam os alemães na mistura de forças que se concentravam fora do perímetro. Por fim, e nisto residia uma mudança muito importante, o próximo ataque seria planejado com muito mais cuidado que os anteriores.

 

A 30 de abril de 1941, o trecho do deserto situado entre Acroma e a Cota 209 cobriu-se de nuvens sufocantes de areia, levantadas pelos movimentos de tanques e veículos. Os observadores, colocados nos postos da colina e adjacências, já estavam experimentados na leitura de tais fenômenos. Como todo movimento no deserto provocava essas reveladoras nuvens de areia, a habilidade estava em julgar o que se verificava através da densidade e duração dessas nuvens. Naquele dia, todos os sinais indicavam ataque iminente.

 

A concentração de forças que os alemães faziam vinha sendo observada pelos soldados que guarneciam os postos avançados. Agora, viam-se soldados de infantaria desembarcando dos caminhões que os tinham trazido, e tanques e canhões se agrupavam ao longo da estrada de Acroma. Embora a artilharia britânica disparasse salvas periódicas sobre o grosso da concentração, o efeito disso sobre as atividades das formações do Eixo foi quase nenhum. Os postos na Cota 209 e adjacências passaram a ser alvo de violento fogo de artilharia durante a tarde e da atenção dos bombardeiros de mergulho alemães. Com o passar do dia, os homens da linha de frente sentiam que os alemães não demorariam a atacar, pois o bombardeio crescia de intensidade gradativamente.

 

Os Stukas voltaram quando o sol descambava para o horizonte.Depois de mergulhar e lançar suas bombas, os aviões começavam a fazer vôos rasantes, metralhando os postos de defesa. Mal a primeira leva gastou a munição que trazia, a segunda apareceu, mergulhando do céu que escurecia. Os ataques duraram 50 minutos e os australianos notaram que, embora as metralhadoras fossem assestadas contra eles, as bombas tinham sido lançadas sobre o arame farpado. O 2/24o Batalhão da 26a Brigada, que defendia a colina e os postos situados em suas duas laterais, preparou-se para enfrentar um ataque terrestre.

 

Antes que o barulho dos aviões sumissem na distância, abafou-o o estrondear da barragem de artilharia que estava chegando e era assestada contra as posições do 2/24o. Os batalhões que se encontravam em ambos os lados do setor eram: à direita, o 2/23o e à esquerda, o 2/15o. Atrás deles, guarnecendo os postos da “Linha Azul”, estava o 2/48o e, no apoio, o 51o Regimento de Campanha, com seus canhões de campanha e as metralhadoras Vickers dos Fuzileiros de Northumberland. A artilharia antitanques era proporcionada pelo 3o/Real Artilharia, suplementado pelas 24a e 26a Companhias Antitanques australianas.

 

O fogo alemão era tão intenso – tanto da artilharia como das metralhadoras – que a eficiência dos postos avançados foi consideravelmente reduzida, agravando-se a situação ainda mais com o anoitecer. Não era preciso muito esforço de imaginação para que a infantaria australiana da linha de frente percebesse o que os alemães tramavam sob a proteção da sombra da noite e da barragem de fogo. Eles sabiam que os sapadores alemães estavam desarmando as minas fora do perímetro e rompendo a cerca de arame para a infantaria entrar. Pelas 20:30h, as comunicações entre a companhia na colina e o QG do 2/24o haviam sido cortadas. O comandante do batalhão, Tenente-Coronel Spowers, só podia deduzir que a infantaria alemã estava atacando suas posições na 209, porque aí pelas 21:00h os observadores do QG viram um foguete luminoso correr o céu noturno, lançado da colina, e dirigir-se na direção das linhas alemães, onde desapareceu. O fogo de artilharia alemão contra as posições australianas cessou imediatamente; isto só podia significar que a infantaria alemã estava pronta para iniciar seu ataque.

 

Quinze minutos depois, a companhia de reserva do 2/24o, situado a 1.600 m para dentro da “Linha Vermelha”, foi alvo do fogo de metralhadora. A situação era confusa. A Companhia “B” – a reserva – despachou patrulhas de combate com instruções para cuidar primeiro dos intrusos alemães e depois restabelecer contato, se possível, com os postos na Cota 209. As patrulhas travaram combate, em meio à escuridão, com os alemães, para faze-los recuar, conseguindo êxito. Fizeram vários prisioneiros, mas não conseguiram cumprir a segunda parte das ordens que levaram, porque não puderam encontrar os postos na escuridão da noite. A situação permaneceu confusa.

 

Não havia outra coisa a fazer senão esperar que clareasse o dia para descobrir o que acontecera com as defesas de Ras el Medauuar. Mas o alvorecer não lhes trouxe logo a resposta, porque uma névoa espessa e baixa cobria toda a colina mapeada como Cota 209, até o calor do sol a dissipou. Observadores ansiosos, nas linhas australianas, esperavam impacientes enquanto a névoa cedia irritante lentidão ao calor dos raios solares. Quando, por fim, clareou, os australianos viram que os alemães se tinham apossado da colina e dos postos de ambos os lados dela. Sete pontos fortificados do perímetro tinham sido capturados. É difícil saber que o destino tiveram os homens que os tinham guarnecido, embora alguns afirmassem ter visto vários soldados australianos sendo levados para o cativeiro.

 

Era evidente que os alemães tinham aprendido as lições das batalhas da Páscoa e estavam decididos a capturar uma cabeça-de-ponte no perímetro por onde lançariam seus tanques. Quando a névoa se dissipou – aí pelas 07:30h – eles ainda estavam consolidando suas posições na colina capturada; era possível ver que tanques, canhões e soldados de infantaria estavam sendo levados para a cabeça-de-ponte. O melhor método de explorar os sucessos das horas de escuridão seria, para os alemães, montar um ataque matinal, mas provavelmente não conseguiram completar os preparativos a tempo; isto só podia significar que seu programa fora seriamente perturbado pela resistência dos australianos que guarneciam os postos agora conquistados.

 

Eram 08:00h quando tanques alemães, cerca de 40, foram vistos dirigindo-se para as posições de reserva do 2/24o. Não demorou para que a Companhia “B” se visse debaixo dos disparos dos tanques,  que usavam seu armamento principal e as metralhadoras. Ao longo da estrada de Acroma, a 24a Companhia Antitanques australiana estava agora em posição de abrir fogo, o que fez com certo êxito, mas foi incapaz de impedir que os tanques prosseguissem rumo à reserva do batalhão. Três dos canhões antitanques foram postos fora de ação durante a troca de tiros havida. A artilharia britânica também disparou contra os tanques alemães que avançavam, mas seus canhões de campanha não tiveram mais êxito do que os antitanques em desviar os alemães das posições da Companhia “B”. Quando parecia que nada impediria que a companhia de reserva fosse vencida, os tanques entraram num campo minado, que fora preparado para reforçar esse setor das defesas após os primeiros ataques à área. Em pouco, vários deles estavam em dificuldades, a maioria com lagartas avariadas. Este teria sido o momento certo para destruí-los com canhões antitanques, mas os que lhes poderiam causar danos já estavam fora de combate. A infantaria australiana abriu fogo contra os tanques, com fuzis Boyers e metralhadoras Bren, sem causar qualquer problema. Canhões de campanha dispararam granadas de alto explosivo contra os alemães, mas relutaram em lançar uma barragem muito  intensa, temendo fazer explodir as minas, abrindo assim passagem para que eles prosseguissem em seu avanço.

 

Os alemães enviaram esforços, durante a manhã, para recuperar seus tanques avariados. A recuperação de veículos passíveis de reparos era trabalho que os alemães realizavam normalmente na guerra no deserto. Passou-se algum tempo para que os britânicos viessem a fazer o mesmo com sucesso. Os tanques que conseguiram escapar às minas e não apresentavam problemas de recuperação, ou retornaram para a frente do perímetro ou se dirigiam para o lado oeste do campo minado. Os que retornaram para as imediações do perímetro foram continuamente atacados pela artilharia de campanha e, depois, por alguns canhões da 26a Companhia Antitanques, que estavam embasados numa posição de flanco. Os artilheiros combateram os tanques com entusiasmo e esse último obstáculo pareceu ser demais para os alemães que restavam, pois também estes deram a volta e se dirigiram para a frente do perímetro.

 

O tempo, no entanto, resolveu participar da batalha e, nessa ocasião, decidiu aliar-se aos alemães. Um vento forte começou a soprar e provocou a costumeira tempestade de areia. As turbilhonantes nuvens de areia ocultaram os tanques alemães em retirada, mas os artilheiros continuaram a disparar o mais rápido que podiam, causando, provavelmente, algum dano e, de qualquer modo, apressando a retirada. Embora os alemães tivessem conseguido abrir uma brecha na “Linha Vermelha”, na Cota 209, sua primeira tentativa de penetração blindada na cidade de Tobruk acabou por fracassar diante do campo minado, diante das posições de reserva do 2/24o.

 

Infelizmente, não tiraram os britânicos a vantagem que podiam da impotência dos tanques alemães, temporariamente incapacitados pelas  minas; teria sido para eles bastante difícil defenderem-se dos tanques e canhões antitanques móveis britânicos, mas houve razão para que deixassem passar a oportunidade. O General Morshead não podia saber, no momento, se o ataque à Cota 209 era de fato o principal esforço alemão. Os comandantes têm sempre de estar alerta contra possíveis ataques diversivos, que os levam às vezes a empenhar neles suas reservas, ficando à mercê de poderoso ataque em outro local. Como os alemães não tinham esforçado por disfarçar a direção do ataque, isto naturalmente despertou as suspeitas do comandante australiano. Além disso, seus oficiais do Serviço de Inteligência haviam interrogado um alemão capturado por uma patrulha do 2/13o Batalhão, perto da estrada de El Adem, e este lhes informara que pertencia o caminho para um ataque blindado, declaração que a qualidade do equipamento abandonado por seus camaradas quando se retiraram para suas linhas parecia confirmar. Incluíam-se nesse equipamento torpedos Bangalore e explosivos.

 

Como fizera nas batalhas anteriores, o General Morshead procurou conter o ataque blindado alemão com a artilharia, engajando suas reservas apenas no último instante. Os canhões de campanha britânicos foram submetidos a intenso ataque aéreo durante a manhã, numa tentativa de lhes anular a eficiência após o fracasso da penetração blindada alemã para além da Cota 209. A direção do ataque alemão então mudou. No ataque noturno que haviam feito ao Ras el Madauuar os alemães capturaram alguns postos e passaram ao ataque dos que lhes ficavam ao sul, utilizando em conjunto tanque e infantaria. Os australianos que guarneciam esses postos foram obrigados a se proteger do intenso fogo dos tanques alemães enquanto a infantaria se aproximava para o ataque final.

 

Os canhões antitanques entrincheirados à retaguarda dos pontos fortes da “Linha Vermelha” também receberam tratamento especial dos alemães. Quando os tanques alemães avançaram para eles, os artilheiros foram submetidos a fogo de metralhadoras que haviam sido instaladas durante a noite por infantes que se tinham infiltrado nas defesas e se colocaram atrás dos canhões. A luta ao longo desse setor da frente foi feroz. Nem a infantaria australiana nos pontos fortes, nem os artilheiros antitanques britânicos – os canhões pertenciam ao 3o/Real Artilharia – cederam até que foram completamente dominados.

 

Ao norte do Ras el Madauuar, os postos estavam sendo atacados por uma força menor de tanques alemães, apoiados por infantaria italiana.

 

Na parte da manhã, os tanques alemães empenhados em subjugar os postos ao sul da Cota 209 se haviam destacado da batalha e rumado para sudeste, dentro do perímetro, para se juntarem à formação de 25 tanques que tentavam abrir caminho pela extremidade sul do campo minado. A artilharia britânica vinha mantendo essa força sob fogo constante, sem, na realidade, poder detê-la. Compreendendo que não podia permitir que os tanques alemães continuassem avançando, Morshead pôs em ação seus cruzadores do 1o/Real Regimento de Tanques para contra-atacá-los. De início os britânicos conseguiram certo êxito, porque cerca de 20 das unidades blindadas alemãs eram tanques leves, não se constituindo em adversários para os cruzadores. Depois de receberem o reforço, os alemães passaram a contar com 34 tanques do tipo dos que os britânicos tinham no setor, que eram 14, diante do que a batalha, que se desenvolvia em área de mais ou menos 800 m de raio, passou a pender favoravelmente para eles.

 

A luta continuou por cerca de uma hora, não conseguindo os alemães sucesso no ataque. Apesar de terem destruído um cruzador e danificado outro, perdendo um tanque médio e 2 leves, decidiram-se eles por uma retirada, feita sob a proteção de uma cortina de fumaça. Durante todo o combate, a artilharia britânica não deixou de manter os tanques alemães sob fogo, contribuindo muito para o sucesso dos cruzadores que, apesar da inferioridade numérica, detiveram o ataque de sondagem alemão.

 

No começo da tarde, os ataques aos postos ao sul da Cota 209 foram renovados. Mas, antes que estes recomeçassem, os canhões de campanha britânicos foram alvo de bombardeio de mergulho, enquanto que os postos do perímetro eram violentamente metralhados. Contudo, assim que os alemães reiniciaram o ataque, a artilharia britânica os martelou, insensível ao castigo desencadeado pelos Stukas. Os canhões pareciam estar levando a melhor. Todo ataque alemão era violentamente bombardeado e os reforços e suprimentos que deslocavam para a cabeça-de-ponte recebiam o mesmo tratamento. É de duvidar que os alemães esperassem encontrar resistência tão tenaz por parte dos postos da “Linha Vermelha”. Com o passar da tarde, começaram a surgir sinais de que os alemães iam perdendo o entusiasmo por essa batalha.

 

Nessa conjuntura, os britânicos decidiram usar novamente os blindados. O ataque não foi bem sucedido. Superados em número pelos alemães, os tanques britânicos sofreram baixas muito maiores do que tinham infligido e foram obrigados a retirar-se. Ao que tudo levava a crer, não foi realmente sensato empenhar-se nesses contra-ataques, em número tão pequeno, os blindados britânicos. Que o General Morshead tinha de conservar cuidadosamente sua pequena força blindada é indiscutível; ele tinha de dispersá-lo para enfrentar qualquer penetração profunda em suas defesas, porquanto ela era sua última reserva, mas, usada ofensivamente, seria melhor concentra-la para um golpe mais poderoso contra os tanques alemães, o que lhe teria sido mais lucrativo.

 

Mas os blindados alemães não perseguiram os tanques britânicos durante a retirada, voltando-se para ajudar a sua infantaria, ainda mais empenhada em acirrada luta com os australianos que guarneciam os postos R6 e R7, ao sul do bolsão. O R6 foi obrigado a render-se, depois de uma batalha prolongada e sangrenta, durante a qual os alemães usaram tanques e lança-chamas; mas o R7 ainda estava resistindo quando a noite tombou. Apesar do vigor do seu ataque, ao anoitecer os alemães só tinham avançado 1.500 m ao sul do Ras el Madauuar, subjugando cinco postos da “Linha Vermelha”.

 

Ao norte da colina, o progresso havia sido mais limitado. Durante toda uma manhã de luta, apenas três postos foram capturados pela força mista de italianos e alemães, além dos capturados durante o ataque inicial à Cota 209; isto representava um avanço de apenas mil metros. Os três postos seguintes, numerados S8, S9 e S10, conseguiram resistir até o anoitecer, quando foram auxiliados por uma companhia do 2/23o Batalhão. Esta fora despachada para restabelecer contato porque não se tivera notícia alguma dos três postos durante todo o dia.

 

No fim do dia, aproximadamente 5 km do perímetro estavam em mãos alemãs e um total de 15 postos havia sido capturado. Os alemães dificilmente poderiam considerar esses ganhos um sucesso esmagador, sobretudo quando medido contra o esforço despendido. A tenaz resistência da infantaria australiana que guarnecia as defesas impediu que o ataque alemão realmente desenvolvesse qualquer impulso; os disparos da artilharia tinham sido tão precisos e persistentes que nem os tanques alemães nem sua infantaria puderam conseguir qualquer redução no seu fogo de profundidade. Por fim, os tanques britânicos tinham conseguido deter o assalto matinal alemão no momento psicológico, e embora o conta-ataque blindado feito ao fim da tarde não infligisse qualquer dano real aos alemães, ele os impediu de montar ataques de tanques/infantaria contra os postos da “Linha vermelha” durante breve período, dando assim aos australianos certa trégua.

 

As alemães passaram então a entrincheirar-se, na expectativa de provável contra-ataque. O 2/48o Batalhão, que guarnecia as defesas da “Linha Azul” atrás do 2/24o – o batalhão que suportara o peso do primeiro assalto alemão – recebeu ordens de atacar a Cota 209 naquela noite. O oficial-comandante do 2/48o, Tenente-Coronel Windeyer, teria preferido fazer o ataque ao amanhecer de 2 de maio, mas o General Morshead insistiu num ataque noturno. Embora sentisse que o prazo era curto, dando pouco tempo para providenciar apoio de artilharia e nenhum tempo para fazer reconhecimento, Morshead encontrava-se diante de uma situação perigosa na extremidade do avanço alemão, a sudeste do Ras el Madauuar. Ele precisava de tempo para construir um desvio, a oeste, através da brecha, entre os postos da “Linha Vermelha” e o campo minado, para bloquear a continuação do ataque alemão, que teria de ocorrer ou durante a noite ou no dia seguinte. Nessas circunstâncias, ele tinha de correr o risco de lançar um contra-ataque sem preparativos adequados.

 

O assalto foi marcado para começar às 19:15h, mas, por vários motivos ele teve início vinte minutos mais tarde. Aviões alemães comunicaram às forças de terra os preparativos feitos pelos australianos, que foram submetidos a intenso fogo de artilharia. Por se deslocar tardiamente, o 2/48o ficou muito para trás do seu próprio fogo de artilharia e, como não houve oportunidade de fazer o reconhecimento das posições dos alemães na Cota 209, o batalhão avançava “às cegas”. Já então a visibilidade era ruim; a luz desaparecia rapidamente e o vento estava começando a agitar a areia do deserto, que era levantada pelas explosões de granadas, soprando-a sobre as posições alemãs e ocultando-as dos australianos que avançavam.

 

O ataque foi feito ao longo da linha da estrada de Acroma, que corria ao norte da Cota 209. A Companhia “D” estava à direita da estrada; a Companhia “A”, à sua esquerda, avançando diretamente contra a elevação do Ras el Madauuar. A Companhia “B” do 2/24o, que estivera em posições de reserva, avançou entre as duas companhias do seu batalhão irmão logo ao sul da estrada de Acroma. A Companhia “D” avançou cerca de 1.600 m antes de ser detida, verificando então haver perdido contato com a Companhia “B” na estrada de Acroma. Esta sofrera pesadas baixas durante o avanço e foi detida por três tanques alemães e metralhadoras fortemente embasadas. A Companhia “A” do 2/48o também enfrentou tanques e metralhadoras a pouca distância da Cota 209, o que impediu qualquer progresso.

 

As três companhias foram retiradas e repostas em suas posições originais antes da meia-noite. Era evidente que o contra-ataque não havia conseguido realizar a tarefa básica que objetivava. Contudo, conseguira um pouco da preciosa mercadoria militar chamada tempo.

 

Tempo para posicionar canhões antitanques e infantaria descansada no flanco sul do bolsão que os alemães haviam criado nas defesas de Tobruk; tempo para consolidar, de igual modo, a linha em seu flanco norte; tempo para que os infantes que guarneciam os postos mais próximos dos alemães descansassem um pouco e se preparassem para o reinício inevitável da batalha no dia seguinte. O ataque também serviu para interferir em quaisquer planos que os alemães possam ter tido de avançar sorrateiramente, protegidos pela escuridão, para desarmar as minas que tinham feito frustrar o seu ataque matinal.

 

Depois do malogrado contra-ataque, o 2/48o Batalhão se retirara para Bianca, a oeste do campo minado, e a Companhia “B” do 2/24o recuara de onde se havia colocado na reserva. Havia somente o campo minado entre os alemães e Bianca. Ninguém dentro de Tobruk duvidava de que os alemães retomariam o ataque tão logo clareasse o dia 2 de maio, porém, uma vez mais, o tempo resolveu participar da batalha, dessa vez para favorecer os britânicos. Como de costume, o mau tempo foi na forma de um vento forte que cobriu Tobruk com uma nuvem turbilhonante de areia, transformando o lançamento de qualquer ataque sério numa operação perigosa e mesmo insensata. Pequenos grupos de alemães realizaram operações de sondagem, mas sem causar muitas preocupações aos defensores. Uma vez mais, o General Morshead ganhara tempo e prontamente pôs-se a utilizá-lo da melhor maneira possível. As defesas para conter o bolsão foram reforçadas e canhões antitanques e de campanha, posicionados para protegê-las.

 

Durante o dia, no decurso desse trabalho, a artilharia britânica bombardeou continuamente as posições alemãs.

 

A cada movimento feito pelos alemães correspondia uma barragem de granadas dos canhões de campanha britânicos. Evidentemente, a barragem interferia nas operações limitadas que os alemães tinham resolvido fazer durante o mau tempo. Grupos de infantes alemães infiltraram-se até que os canhões de Bianca estivessem ao alcance de suas armas e abriram fogo sobre eles com metralhadoras. Os artilheiros defenderam-se com fuzis e metralhadoras pesadas, Bren, mas continuaram guarnecendo os canhões. Durante a tarde, houve violento ataque aéreo contra as posições dos canhões enquanto a artilharia alemã abria fogo de contra-bateria. Mais tarde, outros soldados alemães aproximaram-se para atirar contra os canhões de campanha e, depois do anoitecer, alguns dos canhões mais avançados foram repostos em posição. Os sucessivos ataques à artilharia britânica mostravam até que ponto ela interferia nos movimentos dos alemães, perturbando-os.

 

Na manhã de 3 de maio, a guarnição esperava nova ofensiva alemã. Se a tempestade amainasse, o que aconteceu no decorrer da manhã, os alemães por certo continuariam de onde haviam parado. Com a melhora da visibilidade, os observadores britânicos podiam ver grande concentração de tanques e veículos alemães a leste do Ras el Madauuar, próximo da extremidade ocidental do campo minado. No transcurso do dia anterior, os artilheiros haviam sido prejudicados pela tempestade de areia, mas agora agiam resolutamente. Em torno dos veículos alemães erguiam-se grandes jatos de areia, quando as granadas dos canhões britânicos explodiam entre eles. Os veículos sem blindagem não perderam tempo em recuar do ponto visado por eles. Tão intenso foi o bombardeio que os tanques não demoraram a fazer o que haviam feito os comandantes dos sem-blindagem, deslocando-se para a proteção da Cota 209. O resto do dia 3 de maio passou-se sem outras ações agressivas por parte das forças de terra alemãs.

 

Uma vez mais, terminada a ação, os defensores de Tobruk tiveram mais do lado do crédito do que seus atacantes alemães. É verdade que os alemães haviam feito incursões para além da “Linha Vermelha”,  mas somente em Bianca é que tinham alcançado a “Linha Azul”. É verdade também que eles infligiram pesadas baixas à infantaria australiana que guarnecia os postos da linha de frente, sobretudo ao 2/14o Batalhão, que suportara o peso do ataque; mas também os alemães haviam sofrido tantas baixas que Rommel foi obrigado a concluir que não tinha, no momento, forças suficientes para montar o ataque que pudesse redundar na tomada da fortaleza.

 

As baixas alemãs foram tais, que obrigaram o comandante do Afrika Korps a refletir sobre as diferenças básicas entre a guerra posicional e a guerra móvel. Neste último tipo de luta, os sucessos são analisados em termos de material inutilizado e uma força móvel pode ser neutralizada pela destruição dos seus ataques e veículos, ainda que não se registrem muitas baixas entre seu pessoal. A guerra posicional é, ao contrário, essencialmente uma luta pela destruição de homens. Contanto que bem defendidos dos blindados inimigos, os defensores de qualquer posição têm como principal objetivo a eliminação da infantaria atacante. O resultado – grandes baixas em potencial humano.

 

Nessa batalha, os blindados alemães haviam sido uma vez mais, seriamente maltratados – experiência que lhes era estranha e, como resultado, duplamente desagradável. Os tanques que haviam sido destruídos ou avariados foram, na maioria, vítimas de minas e canhões; poucos tiveram como causa de sua eliminação o combate dos blindados britânicos. Nisto residia uma lição para a conduta da guerra blindada no deserto. Pena é que os britânicos não se tivessem lembrado de aplicá-la nas campanhas subseqüentes realizadas na África do Norte, quando o resultado de muitas que lhes foram favoráveis teria sido diferente.

 

Tendo em mente a recomendação de Wavell e de acordo com o que pensava sobre a guerra puramente defensiva, o General Morshead não podia concordar com a permanência do bolsão alemão projetando-se nas suas defesas, no Ras el Madauuar. O primeiro contra-ataque montado ao anoitecer de 1o de maio fora um fracasso, mas tinha sido feito sem reconhecimento prévio e foi mais uma reação reflexa ao ataque alemão. Para o ataque seguinte, Morshead propunha usar a 18a Brigada, comandada pelo Brigadeiro G. F. Wooten, cujos batalhões tinham os números 2/9o, 2/10o e 2/12o. Quando discutido pela primeira vez o ataque, a 2 de maio, havia um ar geral de incerteza sobre as possíveis intenções alemãs. Será que eles montariam outro ataque quando a tempestade de areia se abatesse? Se o fizessem, então se precisaria da 16a Brigada para repeli-lo: além disso, a má visibilidade impossibilitava a observação precisa das posições que os alemães ocupavam na cota 209 e Morshead relutava em desfechar seu novo ataque “às cegas”. Em igualdade de condições, decidiu-se montar a operação na noite de 3 de maio.

 

O plano para o ataque da brigada era clássico e visava a cortar o bolsão em sua base e isolar as tropas na sua cabeceira. Para fazer isto, o 2/12o Batalhão atacaria do norte para recuperar os postos S6 e S7 na “Linha Vermelha”, enquanto que o 2/29o faria seu assalto pelo sudeste, contra os postos R6 e R7. Depois de tomar os postos, os dois batalhões assaltariam a colina da cota. Entrementes, o 2/10o Batalhão faria uma incursão profunda até o coração do bolsão. O ataque estava programado para começar ao anoitecer, mas foi atrasado devido ao intenso fogo de artilharia alemão. Com os alemães se defendendo do alto da elevação, era virtualmente impossível os australianos fazerem qualquer movimento sem serem observados. Quando os dois batalhões que deveriam realizar os ataques de pinças se dirigiram para suas posições de partida, durante a tarde, os alemães que se encontravam na elevação pediram que se desfechasse fogo de morteiros e artilharia contra eles. O momento do ataque foi adiado para as 20:45h.

 

Já era noite fechada quando a artilharia britânica disparou uma cortina de fogo para cobrir o avanço do 2/12o na direção dos postos S6 e S7. O ataque foi recebido por intenso fogo de metralhadoras, o que não era de surpreender; foguetes luminosos descreviam parábolas sobre as linhas alemãs, explodiam e lançavam seu brilho pálido sobre o setor que estava sendo atacado. Morteiros e artilharia alemães faziam chover granadas e bombas sobre os australianos em avanço. O fogo alemão conseguiu separar os soldados de infantaria australianos da sua própria barragem e quando os canhões britânicos suspenderam o fogo, a ação fulminante das metralhadoras posicionadas nos postos S6 e S7, ou em suas imediações, deteve o avanço do 2/12o.

 

O ataque ao ressalto sul do bolsão foi mais bem sucedido. O 2/9o Batalhão também fora alvo da artilharia alemã antes mesmo de iniciado o avanço. Quando a barragem de fogo britânica começou, os australianos fizeram um ataque decidido, embora prejudicado pela escuridão da noite. Estava tão escuro que o pelotão destacado para capturar o R8 não conseguiu achá-lo, mas chocou-se com algumas posições alemãs recém-construídas, das quais seus ocupantes foram expulsos. Esse pelotão também destruiu alguns tanques italianos leves pelo simples processo de lançar granadas dentro das torres. Finalmente o pelotão encontrou uma posição mais fortemente entrincheirada e, reduzido pelas baixas e apenas meia dúzia de homens, decidiu recuar. No caminho de volta, encontraram o R8, que estava desocupado.

 

O R7 foi um osso duro de roer. Embora a Companhia “D” tivesse atacado vigorosamente o posto e aberto caminho lutando até  a trincheira antitanques que o cercava, foi repelida pelos alemães com auxílio de lança-chamas. Outro ataque da companhia conseguiu tomar o posto, mas o triunfo foi breve porque, quase que imediatamente, os alemães contra-atacaram vigorosamente, apoiados por tanques e lança-chamas, e os australianos foram obrigados a abandonar o R7. A confusão e a luta virulenta prosseguiram noite adentro, embora se tornasse cada vez mais difícil distinguir amigo do inimigo. Às 03:00h, o General Morshead, não querendo colocar seus soldados em risco de serem surpreendidos em posições expostas ao clarear o dia, ordenou a retirada.

 

Entrementes, o 2/10o Batalhão realizara incursões profundas no bolsão, pelo flanco norte, de acordo com as ordens de Morshead. Vários postos foram atacados, sendo infligidas baixas aos alemães numa série de ações de modo geral bem sucedidas. Por certo não se podia dizer o mesmo da operação como um todo. Evidentemente, o ataque não conseguira o intento de isolar o bolsão; num flanco, o objetivo básico não chegou a ser alcançado e, no outro, fora alcançado, mas perdido logo depois. Os britânicos no entanto conseguiram alguns ganhos com o assalto; o dividendo mais importante foi o número de baixas causadas aos alemães, além de levarem as tropas do Eixo que defendiam o bolsão a pensar defensivamente e perder tempo no trabalho de fortalecer suas posições.

 

Fazendo um balanço das batalhas travadas na Cota 209 e arredores desde a noite de 30 de abril, poder-se-ia afirmar com justiça que os britânicos haviam levado a melhor, ainda que limitadamente. Que tanto Wavell como Churchill pensavam assim é que evidenciado pelos comunicados elogiosos que enviaram ao General Morshead; a intrépida defesa de Tobruk estava cumprindo a sua parte no contexto da batalha pelo Egito.

 

“Brevidade” “Acha-d’arma” e “Cruzado”

 

Quando o anel de tropas do Eixo se fechou em torno de Tobruk, cortando todas as comunicações terrestres com o Egito, somente um profeta muito arrojado poderia prever que a fortaleza resistiria ao sítio por 242 dias. Quando se decidiram os britânicos pela defesa de Tobruk, o Almirante Cunningham prometera fazer o máximo para manter a guarnição abastecida pelo mar. Pelo que tudo indicava, porém, não permitiriam alemães e italianos se cumprisse tal promessa. O poderio naval já se havia estendido ao máximo e, com as exigências da guerra na Grécia e a subseqüente campanha de Creta, alcançava já, segundo parecia, o ponto de ruptura.

 

A Marinha Real, depois de amargas lições sobre o emprego tático do poderio aéreo convincentemente ministradas pela Luftwaffe, via-se constantemente obrigada a operar fora da cobertura da RAF, ou em áreas onde a RAF era incapaz, por uma razão ou por outra, de operar. Depois de 24 de abril, quando os Hurricanes do 73o Esquadrão foram retirados da guarnição de Tobruk, os navios incumbidos de abastecê-la ficavam na dependência exclusiva de seu próprio armamento defensivo por largo trecho de mar, assim que ultrapassavam os limites da proteção dos caças baseados no Egito.

 

Durante todo o tempo de duração da “Operação Bússola”, do General Wavell, a Marinha Real dera apoio ao exército e, em janeiro de 1941, formara o Esquadrão de Terra para esse fim, comandado pelo Capitão H. Hickling, RN. Esse esquadrão era composto de uma mistura heterogênea de navios – monitores, canhoneiras, vapores armados,  vasos italianos capturados, caça-minas, barcos de patrulha e os destróieres que eventualmente pudessem ser retirados de outros pontos. Quando Tobruk foi sitiada, o comando do esquadrão passara ao Capitão A. L. Poland, DSC, RN. Foram esses pequenos navios do Esquadrão de Terra que suportaram o peso da tentativa decidida de Rommel de cortar a rota de abastecimento marítima para a guarnição.

 

O bloqueio de Tobruk era para as forças alemãs e italianas que tentavam o rompimento das linhas de defesa da cidade de tal modo importante, que nenhum esforço foi poupado no sentido de atacar os navios que estivessem “a caminho” ou ancorados na baía e para destruir as suas instalações portuárias. A baía estava sob constante ataque de aviões e da artilharia alemães e italianos; na verdade, os soldados incumbidos dos trabalhos do porto eram submetidos a fogo quase tão freqüentemente quanto os que se encontravam nas linhas de defesa.

 

Os navios da Marinha Real eram tripulados por homens cujo trabalho era lutar; mas muitos dos pequenos navios que transportavam suprimentos de Alexandria e Mersa Matruh para Tobruk pertenciam à marinha mercante. Esses navios eram tripulados por marinheiros mercantes de muitas nacionalidades que aceitavam prazerosamente os riscos da guerra, além dos considerados normais no exercício da profissão. A tripulação de um navio que transportasse gasolina ou munição sabia que a possibilidade de sobrevivência era quase nenhuma, se atingido por bomba, por torpedo ou por qualquer das muitas minas distribuídas em profusão pelas águas costeiras. A maioria das viagens era feita à noite, sem o benefício de qualquer auxílio à navegação até que o navio chegava à entrada de Tobruk, marcada com uma luz verde. Uma vez lá dentro, aos capitães cabia, em meio à escuridão e por entre cascos de navios afundados, achar o caminho do ancoradouro; os navios eram descarregados sem iluminação e o mais depressa possível, e depois enfrentavam a arriscada viagem de volta. Durante maio e junho, a maioria dos suprimentos da guarnição foi transportada por destróieres e barcaças de desembarque de tanques – Batelões “A” – que valiam das horas de escuro para desembarcar a carga que transportavam e retornar ao ponto de origem, para que a luz do dia não os expusesse aos bombardeiros alemães.

 

O Esquadrão de Terra sofreu muitas perdas. As viagens diurnas eram evidentemente as que saíam mais caras. Por vezes os esforços dos alemães por impedir a entrega de suprimentos a Tobruk eram tão intensos, que as viagens tinham de ser restritas às noites sem lua. Três navios-hospitais foram atingidos por bombardeiros de mergulho e deixaram de ser usados; os feridos evacuados da cidade sitiada eram transportados por destróieres. Os destróieres usados nas operações de Tobruk pertenciam sobretudo à flotilha australiana comandada pelo Capitão H. M. L. Waller, RAN, embora navios de outras flotilhas do Mediterrâneo fossem postos em uso, desde que estivessem em disponibilidade. As tripulações dos destróieres fizeram muito poucas viagens durante aquele período atribulado.

 

Como dependiam da Marinha para o recebimento do material necessário à manutenção de Tobruk, os elementos da guarnição da cidade passaram a conhecer os navios pelo nome e a interessar-se pela sua sorte. Notabilizaram-se no trabalho de auxílio a Tobruk o Hero, o Decoy, o Hotspur, o Hasty, além de outros, como, por exemplo, o Waterhen e as canhoneiras Aphis, Lady-Bird, Gnat e Cricket. Fazendo que os australianos da guarnição se lembrassem de casa, havia as chalupas antiaéreas Auckland e Parramatta. Num estágio posterior do sítio, os navios australianos da 10a Flotilha foram substituídos pelos destróieres das 7a e 14a Flotilhas, mais modernos.

 

Não é possível relacionar aqui todos os navios que lutaram com bravura para sustentar de pé a fortaleza de Tobruk; navios cujas guarnições arrostaram o perigo das lanchas torpedeiras, dos submarinos, dos bombardeiros de mergulho e das minas ocultas. Mas nenhum relato do que fez a Marinha na defesa de Tobruk estaria completo sem uma menção ao Maria Giovanna.

 

O Maria Giovanna era uma escuna italiana de 400 toneladas, capturada em janeiro, ao largo da costa da África do Norte, pela Marinha Real. Ele ingressou no Esquadrão de Terra sob o comando do Tenente Alfred Palmer, RNR, mais conhecido como “Mascate”. Esse pequeno e elegante navio operava regularmente entre Mersa Matruh e Tobruk, e tal era o espírito de lealdade e companheirismo que o australiano que o comandava fez nascer no seio da tripulação, que ele só precisava ameaçar com dispensa do navio para evitar qualquer “infração”. Armado com uma coleção heterogênea de armas antiaéreas, ele revidou ferozmente quando foi atacado por bombardeiros do Eixo e afirmou ter derrubado três dos seus atacantes. Sobreviveu a todos os perigos do mar e a todas as tentativas feitas pelos alemães para afundá-lo, embora não sem sofrer danos, até cair vítima de um estratagema. Os alemães colocaram luzes a leste da baía de Tobruk, levando a tripulação do navio a pensar que havia chegado ao seu destino; e rumaram para a costa e encalharam violentamente. O “Mascate” e sua tripulação foram capturados quando tentavam repor o navio a flutuar.

 

Os feitos do Maria Giovanna sintetizam o espírito de todos os pequenos navios, empenhados na tarefa de manter Tobruk na batalha, mas o preço que pagaram foi alto. Quando a cidade foi salva, a Marinha Real havia perdido 34 navios de vários tipos.

 

Entrementes, os soldados mantidos pelos esforços do Esquadrão de Terra continuavam a se defender tão agressivamente quanto o General Wavell desejava. Houve ações ferozes, principalmente em torno do bolsão do Ras el Madauua. Às vezes tornava-se difícil dizer quem era o atacante e quem era o atacado, pois os australianos desejavam que se fixasse bem na lembrança dos soldados do Eixo a exortação de Churchill: fazer que Tobruk se transforme numa misteriosa porta de saída de ataques aos agressores.

 

O duelo era diário e feroz, entre aviões alemães e as defesas antiaéreas. Dois dos aeródromos usados pelos bombardeiros alemães, em El Adem e Acroma, ficavam a apenas 16 km dos seus alvos e era possível ouvir-se os motores dos aviões entrar em funcionamento antes de qualquer incursão. Gradativa, mas inexoravelmente, a cidade de Tobruk reduzia-se, por efeito dos altos explosivos, a um monte de escombros. Os elegantes prédios coloniais italianos foram arrasados, enchendo de entulho as ruas outrora limpas.

 

Ao se decidirem pela defesa de Tobruk, os britânicos não podiam deixar de levar em conta a ajuda a lhe ser dada. Os defensores da cidade, com sua heróica resistência, deram ao 13o Corpo, repelido para além da fronteira egípcia, o tempo de que necessitava para estabilizar suas defesas e aumentar seus efetivos.

 

Contudo o mês de maio de 1941 foi um período de escalada de problemas para o General Wavell. Grécia, Creta, Iraque e Síria, todos faziam suas exigências; forças retiradas da bem sucedida campanha da África Oriental, e que poderiam ter sido empregadas no deserto, tornaram-se vítimas das exigências das várias crises no Oriente Médio. Winston Churchill estava particularmente preocupado com a situação em Malta. Tão intensos tinham sido os ataques aéreos do Eixo contra a ilha, durante o mês de abril, que o seu funcionamento como base para ataques à linha marítima de abastecimento das forças de Rommel havia sido em grande parte neutralizado.

 

Portanto, era imperioso recapturar bases na África do Norte, ocupadas pelo Eixo, para ajudar a manter abertas as rotas marítimas até a ilha sitiada. Sem reforços, era evidente que Wavell não teria condições de montar um grande ataque. Churchill decidira mandar-lhe esses reforços. O Primeiro-Ministro determinou que um comboio zarpasse diretamente de Gibraltar para Alexandria, carregado de tanques e caças. Desnecessário comentar sobre os riscos que tal decisão envolvia. Se o comboio tivesse sido destruído, o resultado disso para os britânicos no Oriente Médio teria sido desastroso. Com o poderio aéreo que o Eixo mantinha no Mediterrâneo, isto era o mesmo que provocar o leão em seu covil.

 

Quando o General Wavell soube dos reforços a serem despachados nesse comboio – de codinome “Tigre” - decidiu montar uma operação limitada, para melhorar a posição britânica na fronteira, chamada adequadamente “Brevidade”. O Brigadeiro W. E. H. Gott, experiente soldado do deserto, ao receber o comando da operação, foi orientado para que procurasse capturar os pontos fortes em torno do Forte Capuzzo e Sollum, levando a seguir suas forças mistas de blindados e infantaria para o mais perto possível de Tobruk. Para tentar isso, ele recebeu todos os tanques então disponíveis que, considerando-se o péssimo estado do equipamento britânico depois de satisfeitas todas as exigências, dificilmente lhe poderiam dar um poderio esmagador.

 

A operação começou a 15 de maio, com um ataque de três pontas desfechado contra o Passo de Halfaya, o Forte Capuzzo e as forças estacionadas no flanco do deserto desses dois objetivos. De início, os ataques correram bem. As posições alemãs no Passo de Halfaya foram subjugadas. Depois de luta árdua, o grupo de centro capturou o Forte Capuzzo, mas, ao fazê-lo, sofrera baixas suficientes para dissuadir Gott de tentar continuar avançando para Bardia. Entrementes, a força de flanco do deserto progredira sem muita dificuldade, estabelecendo-se na área de Sidi Azeiz. Gott sabia que reforços Panzer se aproximavam da área da batalha, vindos de Tobruk, e ordenou que os cruzadores da força de flanco se afastassem, durante a noite, por considerar bem mais fortes as formações alemãs que vinham chegando. Alemães e britânicos passaram despercebidos uns pelos outros na escuridão e, quando clareou, ficaram surpresos ao se encontrarem num vazio. Embora os britânicos não pudessem sabê-lo, quando os Panzer de Tobruk chegaram a Sidi Azeiz, tinham ido além do que seria prudente, pelos seus suprimentos de gasolina. Mas a “Operação Brevidade” fracassara; o único território que os britânicos conseguiram foi o Passo de Halfaya.

 

É de surpreender que os britânicos não se tivessem mostrado capazes de perceber como reagiria Rommel diante da perda de Halfaya. Se não, teriam reforçado bem a defesa, dobrando o volume da força que dela se incumbiria, na expectativa de vigorosas tentativas do comandante alemão no sentido de recuperar o controle daquela praça, por ele considerada ponto de partida para ataques britânicos na direção de Tobruk. Os defensores do Passo receberam ordens de se retirar a 27 de maio, para não serem isolados por um pesado ataque alemão desfechado da cabeceira do Passo e em torno do flanco britânico.

 

Com a perda do último dos ganhos da “Brevidade”, a frente se aquietou. A experiência vivida pelos alemães no transcurso dessa operação influiria na conduta da grande ação que se travaria na fronteira. Os encontros entre tanques alemães e britânicos havidos ao redor de Capuzzo produziram enorme desânimo nas tripulações dos tanques alemães, pois tinham visto a pesada blindagem dos tanques Matilda resistir aos seus tiros, ao passo que os tiros de 2 libras disparados pelos britânicos muito freqüentemente penetravam os tanques alemães. Isto fez que as tripulações alemãs relutassem em pegar-se em batalha de tanques com os britânicos. Estes, embora com suas máquinas já desgastadas pela luta e pelas viagens, encontraram dificuldades em fazer os alemães agir.

 

Para alívio e satisfação de Churchill, o comboio “Tigre” aportara em Alexandria a 12 de maio. Apenas um navio fora afundado durante a extremamente perigosa viagem pelo Mediterrâneo. Os britânicos passaram a desfrutar de situação bem melhor, com a chegada de 238 tanques e 43 caças Hurricanes. Pelo menos quatro semanas seriam gastas no preparo dos tanques para as operações no deserto, mas o Primeiro-Ministro britânico estava ansioso por ver os ganhos do seu arriscado jogo capitalizados sem mais delongas. O mais cedo que esses reforços poderiam estar prontos era 7 de junho, e mesmo então, era remota a possibilidade de que as tripulações dos tanques estivessem treinadas para usá-los.

 

Wavell estava às voltas com um dilema. Por um lado, ele relutava em empenhar em luta seus novos tanques, obtidos com tão terrível risco, até que eles e suas tripulações estivessem prontos; por outro lado, estava dolorosamente cônscio de que já não desfrutava da plena confiança de Churchill e que suas relações com ele se estavam deteriorando com rapidez. A 19 de maio, o Primeiro-Ministro disse a Sir John Dill, Chefe do estado-Maior Geral Imperial, que a situação no Oriente Médio melhoraria se Wavell trocasse de posto com o General Auchinleck, Comandante-Chefe na Índia. O General Dill era favorável à mudança, mas a situação extremamente complexa no Oriente Médio permitiu que Wavell fosse mantido temporariamente no posto. Churchill, porém, não lhe deu tréguas, no fluxo constante de exortações que dele partiam.

 

O Primeiro-Ministro queria uma batalha. Nem Dill nem Wavell conseguiram causar-lhe qualquer impressão com o projeto de empenhar o 13o Corpo numa nova operação. O General Wavell obedeceu às ordens e, a 28 de maio, despachou instruções para a “Operação Acha-d’Arma”, mas ao mesmo tempo deu ao CEMGI amplas razões para admitir que a operação não teria muito sucesso.

 

Os principais componentes do 13o Corpo eram a 4a Divisão de Infantaria Indiana (Major-General Messervy), com apenas uma das suas brigadas de infantaria, a 22a Brigada de Infantaria de Guardas, motorizada, e a 7a Divisão Blindada, comandada pelo Major-General O’Moore Creagh. O corpo tinha no comando o Tenente-General Sir Noel Beresford-Peirse. Sua infantaria era de confiança e possuía experiência em combate, mas a 7a Divisão Blindada não era a mesma formação que conseguira enorme reputação na batalha de Beda Fomm. As duas brigadas blindadas tinham apenas dois regimentos de tanques cada uma, em lugar dos três que deveriam conter. A 4a Brigada Blindada era equipada com tanques Matilda ao passo que a 7a Brigada Blindada tinha cruzadores. Um dos regimentos de cruzadores fora reequipada havia pouco com o novo tanque Crusader (“Cruzador”) ainda não submetido à prova e com o qual as tripulações não tiveram tempo suficiente para se familiarizarem.

 

O Crusader era uma máquina de aparência elegante, armada de um canhão de 2 libras e duas metralhadoras Besa 7.92 mm, que, dada a urgência com que foram despachadas para o Oriente Médio, não tiveram removidos os possíveis defeitos que pudessem apresentar. Nada disso era bom augúrio para o resultado da batalha iminente.

 

O primeiro objetivo da “Acha-d’Arma” era a captura do Passo de Halfaya e ganhar o controle da área Bardia-Sollum-Capuzzo-Sidi Azeiz antes que fosse feita qualquer tentativa para libertar Tobruk e avançar mais para oeste. A guarnição da fortaleza sitiada recebeu instruções para apoiar o 13o Corpo com ação agressiva. A 11a Brigada Indiana, com um esquadrão e metade dos Matildas da 4a Brigada Blindada, deveria tomar Halfaya. O restante da 4a Brigada Blindada, a 22a brigada de Guardas e a artilharia da 4a Divisão Indiana deveriam desviar-se para o deserto antes de rumar para o Forte Capuzzo e continuar até Sollum. Flanqueando essas forças do lado do deserto, embora ainda a apenas 13 km da costa, estava a 7a Brigada Blindada e as colunas móveis do grupo de apoio da divisão blindada. As formações de flanco foram dirigidas para a Crista de Hafid, a sudoeste do Forte Capuzzo, com o objetivo de travar combate com os blindados alemães.

 

As forças britânicas que deviam fazer o ataque começaram a avançar durante a tarde de 14 de junho; ao amanhecer do dia seguinte, iniciou-se o assalto a Halfaya, enquanto as outras formações se dirigiam para seus objetivos. Os atacantes que se aproximaram de Halfaya pela estrada costeira logo se viram sem seus tanques, pois estes haviam sofrido desastres nos campos minados. Mais para o interior, a infantaria indiana tentou avançar o apoio de sua artilharia motorizada, que encontrara dificuldades no terreno acidentado. O destino do esquadrão de tanques acompanhante demonstrou o domínio do canhão antitanque entrincheirado, sobre blindados equipados apenas com armamento principal de alta velocidade.

 

Os britânicos verificaram que Rommel, considerando acertadamente que a área de Sollum era vital para os seus objetivos, tratou de fortificar Halfaya vigorosamente desde que a capturara, a 27 de maio. Entre as suas defesas principais estava o canhão antiaéreo de 88 mm. O “88” alemão era uma arma formidável. Projetado originariamente como canhão antiaéreo pesado, verificou-se que ele tinha maravilhoso poder de penetração quando usado contra tanques. Vários desses “88” tinham sido entrincheirados em Halfaya, de modo que mal se viam suas bocas acima do nível do chão – eles podiam penetrar facilmente a espessa blindagem dos, até então, quase invulneráveis Matildas. Os soldados de infantaria que se encontravam em Halfaya, privados da sua artilharia e dos seus blindados, protegeram-se da melhor maneira possível; sozinhos, não tinham esperanças de tomar o passo.

 

Em outros locais, a 15 de junho, os britânicos tiveram certa dose de êxito, embora por preço elevado. A penetração central, que visava ao Forte Capuzzo, encontrou grandes dificuldades para subjugar a artilharia e infantaria alemãs, num lugar conhecido como “Ponto 206”, ao sul do forte. A luta prosseguiu durante todo o dia e só ao anoitecer é que finalmente se superou a resistência no “Ponto 206”. Na Crista de Hafid, que a 7a Brigada Blindada alcançou por volta das 09:00 h, houve um duelo entre os tanques britânicos e os canhões, bem embasados. Uma vez mais, as deficiências dos canhões de alta velocidade, quando usados contra artilharia entrincheirada, ficaram demonstradas. Os tanques britânicos foram obrigados a fazer incursões rápidas contra os embasamentos, num esforço por se colocarem em condições de poder usar suas metralhadoras. Naquele dia não houve nenhuma batalha de tanques contra tanques em Hafid, embora os tanques alemães surgissem durante a noite e ambos os lados abrissem fogo a longa distância.

 

O êxito obtido em Capuzzo foi mais generoso. Os Matildas, agindo como “Rainhas do Campo de Batalha”. Título que lhes havia sido tirado, em outro local, pelo “88”, tinham limpo a área e repelido um contra-ataque enquanto a Brigada de Guardas estabelecia posições defensivas. Estas foram suficientemente fortes para rechaçar facilmente um segundo contra-ataque, montado durante a noite. Planejara-se que, no dia seguinte, seria feito outro ataque à Crista de Hafid, desta vez usando os Matildas da 4a Brigada Blindada, que passaria a contar com a proteção dos Cruzadores da 7a Brigada Blindada. Em Capuzzo, a posição seria defendida enquanto um assalto na direção de Sollum se realizava.

 

 Os britânicos, no entanto, perderam a iniciativa. Forças alemãs apareceram de ambos os lados de Capuzzo, enquanto outras desciam pelo flanco do deserto, com a nítida intenção de dobrar para leste em Sidi Omar, atravessando a retaguarda britânica. O fato de Rommel ter dirigido sempre suas formações com um toque tão seguro devia-se em grande parte ao costume dos britânicos de se comunicarem claramente (sem código) pelo rádio; um eficiente serviço de interceptação mantido pelos germânicos transmitia a informação colhida diretamente na fonte ao comandante, que punha logo em prática a medida correta.

 

Os Matildas da 4a Brigada Blindada, em lugar de fazerem o assalto planejado à Crista de Hafid, foram dirigidos contra os alemães que ameaçavam Capuzzo. Ali, violenta luta teve lugar, com inversão da posição do dia anterior. Agora, os alemães que tinham de avançar pelo deserto aberto, diante da artilharia e do fogo dos canhões antitanques britânicos, e sofreram pesadas baixas em tanques. Mas no flanco do deserto houve um tipo diferente de batalha.

 

Ali, a 7a Brigada Blindada e o grupo de Apoio entraram em combate com a 5a Divisão Ligeira alemã. Seguiu-se uma “batalha em movimento”, travada com grande violência, durante a qual os britânicos, dentro das suas limitações, procuraram fazer o melhor possível. Com o cair da noite, os alemães foram detidos em Sidi Omar. Mas, na manhã seguinte, os planos britânicos de juntar as 4a e 7a Brigadas Blindadas em Sidi Omar, para apresentar uma frente combinada aos blindados alemães, foram frustrados. A muito reduzida 7a Brigada Blindada teve de retirar-se para além da fronteira, a fim de se reabastecer de gasolina e munição, deixando o caminho aberto à 5a Divisão Ligeira para avançar pela retaguarda britânica na direção de Halfaya. Quando, às 04:30 h de 17 de junho, os britânicos perceberam que os tanques alemães que haviam lutado em Capuzzo estavam sendo despachados para juntar-se à 5a Ligeira, todo o perigo da situação em que se encontravam tornou-se evidente.

 

O General Messervy deu ordens para que as tropas em Capuzzo se retirassem e transmitiu a O’Moore Creagh, pelo rádio, a decisão tomada. Estabeleceu-se então uma corrida entre a 5a Divisão Ligeira alemã, reforçada, esforçando-se para alcançar Halfaya e cortar os britânicos, e as forças britânicas, retirando-se o mais depressa possível, antes que os alemães lhes fechassem a porta de saída. Quem mantinha a porta aberta era a 4a Brigada Blindada, travando hábil e corajosamente batalha contra os poderosos blindados alemães, que desta vez não contavam com o apoio dos “88”. Quando as forças alemãs chegaram a Halfaya e dobraram para o norte, na direção de Capuzzo, descobriram que os britânicos haviam escapado à armadilha.

 

A “Operação Acha-d’Arma” redundara em fracasso. Os britânicos haviam sofrido perdas incapacitadoras em tanques – tanques que haviam sido levados ao Oriente Médio debaixo de enorme risco.

 

Os novos cruzadores chamados “Cruzados”(Crusaders) muito sujeitos a enguiços mecânicos, apresentaram performance deficiente, além do que o serviço de recuperação de veículos blindados mostrara-se aquém da capacidade necessária, diante de tão grande número de tanques imobilizados pela batalha e por enguiços. Churchill finalmente decidiu que o General Wavell tinha de ser substituído.

 

A 22 de junho de 1941, Wavell e Auchinleck foram informados de que trocariam de postos.

 

Assim que assumiu a direção de seu novo posto, Auchinleck procurou de imediato fazer um balanço das possibilidades das várias unidades do seu amplo comando, dando ênfase especial ao preparo de uma ofensiva para expulsar os alemães da Cirenaica. Depois de estudar exaustivamente as complexidades dos problemas existentes com os outros dois comandantes-chefes de forças armadas, decidiu ele não ser prático montar nova ofensiva no deserto Ocidental antes da primeira quinzena de novembro. Mas, para que o planejamento da operação, que receberia o codinome de “Cruzado’, pudesse começar, criou-se o QG do 8o Exército, sob o comando do Tenente-General Sir Alan Cunningham.

 

Nesse meio tempo, em Tobruk, a guarnição continuou mantendo suas atividades agressivas contra as forças do Eixo que atacavam a fortaleza. Em agosto, porém, para aumentar seus problemas, o Primeiro-Ministro britânico começou a receber exigências importunas do governo australiano para que substituísse as tropas australianas da guarnição, coisa que, naquele momento, envolvia enorme dificuldade. Como primeiro estágio, decidiu-se trazer o Grupo da Brigada Polonesa Independente e retirar a 18a Brigada da 7a Divisão de Infantaria australiana. Os navios lança-minas Abdiel e Latona fariam o transporte dos soldados para Tobruk, alternando-se nessas viagens, cada um deles acompanhado por três destróieres; mantimentos e gasolina seriam transportados pelo navio Lesbos e pelo petroleiro Pass of Balmaha. O Lesbos foi danificado por bombas, sendo substituído pelo Wolborough e pelo Maria Giovanna.

 

Entre os dias 19 e 29 de agosto, 6.120 poloneses e 1.400 toneladas de mantimentos foram levados para a cidade sitiada, enquanto 5.000 australianos, inclusive os feridos, foram dela retirados. Desnecessário dizer que a troca não se realizou sem a interferência dos alemães, que submeteram os navios a ataques aéreos e de artilharia. Infelizmente, a retirada de uma brigada não satisfez o Sr. Fadden, o Primeiro-Ministro australiano, que receoso de que os problemas de saúde pudessem reduzir a eficiência da infantaria australiana, tornando-a impotente diante de qualquer outro ataque do Eixo, insistiu na retirada dos restantes. Não há prova de que em Tobruk os soldados partilhassem da preocupação do seu governo sobre o restante da guarnição. Eles não mostravam vontade de ser retirados, embora houvesse por parte de todos o desejo natural de trocar os riscos constantes da linha de frente por algo menos extenuante.

 

A troca prosseguiu durante o mês de setembro, com unidades britânicas chegando como substitutas para os australianos que se retiravam. Dessa vez, 6.000 soldados, 2.100 toneladas de mantimentos e 40 tanques entraram no porto de Tobruk, enquanto que 6.000 dos que haviam ajudado a frustrar as tentativas de Rommel de tomar a fortaleza zarparam. No mês de outubro verificaram o término da operação e a transferência do comando da guarnição para o Major-General R. B. Scobie, comandante da 70a Divisão Britânica, que viera substituir os australianos. As perdas de navios continuaram, com o afundamento do lança-minas Latona, do petroleiro Pass Of Balmaha e do Samos.

 

Entre o fim da “Operação Acha-d’Arma” e o começo da “Cruzado”, houve considerável modificação na estrutura das forças britânicas no Deserto Ocidental. O 13o Corpo, aumentado e transformado no 8o Exército, passou a compor-se de dois Corpos – o novo 13o e o 30o; de um Grupo de Brigada Independente, a 29a Indiana; da guarnição de Tobruk e de uma divisão de reserva, a 2a Sul-Africana. O novo 13o Corpo era comandado pelo Tenente-General W.H. E. Godwin-Austen e consistia da Divisão Neozelandesa, da 4a Divisão Indiana e da 5a Brigada de Tanques do Exército. O 30o Corpo, sob o Tenente-General C. W. M. Norrie, reunia a 7a Divisão Blindada, a 1a Divisão Sul-Africana (duas brigadas) e a 22a Brigada de Guardas. Dentro de Tobruk, além da 70a Divisão de Scobie e dos poloneses (o Grupo de Brigada dos Cárpatos), encontrava-se a 32a Brigada de Tanques do Exército, com cerca de 130 máquinas de vários tipos.

 

Os relatórios do Serviço de Inteligência davam conta de que também entre os alemães se processavam modificações. Rommel foi nomeado comandante do Grupo Panzer Afrika e o General Cruewell assumiu o comando do Afrika Korps. A 5a Divisão Ligeira transformou-se na 21a Divisão Panzer, criou-se a 90a Divisão Ligeira, formada de várias unidades especiais, que, embora não dispusesse de tanques, era forte em potencial de fogo e extremamente móvel. Incluídas no Grupo Panzer Afrika estavam a esplêndida divisão blindada italiana “Aríete”, a divisão motorizada “Trieste”, e quatro divisões de infantaria.

 

A tarefa distribuída ao 8o Exército foi formulada de maneira-simples – recapturar a Cirenaica. E Cunningham pretendia faze-lo da seguinte maneira: o 30o Corpo cruzaria a fronteira ao sul de Sidi Omar e avançaria para Gabr Saleh, onde travaria combate com os blindados alemães e ficaria bem colocado para outros movimentos para norte  ou nordeste, dependendo da reação dos alemães.

 

O 13o Corpo conteria as defesas alemãs entre Sidi Omar e a costa, envolvendo-as subseqüentemente pelo sul. Mais tarde, ele avançaria para Tobruk, eliminando a resistência que encontrasse no trajeto entre Bardia e a fortaleza. A proteção do flanco esquerdo do Corpo seria da responsabilidade do 30o Corpo.

 

Naturalmente, esperava-se que as forças da guarnição de Tobruk cumprissem sua parte na “operação Cruzado”, embora se considerasse desaconselhável que fizesse surtidas antes de rompido o poderio sobre o momento de sua saída seria o General Norrie, Comandante do 30o Corpo, quando então a guarnição passaria ao seu comando. O Objetivo tático do 30o Corpo seria a crista de Sidi Rezegh, enquanto que o da guarnição seria a crista de El Duda; esses dois lugares ficavam a sudeste de Tobruk.

 

Além disso, uma força integrada pelo 29o Grupo da Brigada de Infantaria Indiana e pelo 6o Regimento de Carros Blindados Sul-Africano atacaria na direção do deserto, passando por Jarabub, para tomar o oásis de Jalo. Essa formação, conhecida como “força do Oásis”, se responsabilizaria pela proteção da Pista de Pouso (Landing Ground) 125 a noroeste de Jalo, e faria movimentações na direção oeste, simulando um avanço nessa área. Em essência, era este o plano de Cunningham, aprovado pelo General Auchinleck a 3 de outubro.

 

Por volta de 18 de novembro de 1941, a 7a Divisão Blindada, com seu Grupo de Apoio, avançara sem qualquer interferência dos alemães até Gabr Saleh, a cerca de 50 km a oeste de Sidi Omar. Ao amanhecer do dia seguinte, o General Gott, comandante da 7a Divisão Blindada, mandou a 22a Brigada Blindada para a área de Bir el Gubi, enquanto a 7a Brigada Blindada avançava para o norte, rumo a Sidi Rezegh. A 4a Brigada Blindada foi encarregada de proteger o flanco direito das duas outras brigadas blindadas e o flanco esquerdo do 13o Corpo.

 

Ao meio-dia de 19 de novembro, a 22a Brigada Blindada encontrou-se com a Divisão “Aríete” e não pôde prosseguir; no fim do dia, essa brigada já havia perdido mais de um terço dos seus efetivos em tanques. Ao contrário disso, a 7a Brigada Blindada teve um dia muito bem sucedido. Ela avançara com tal rapidez que pôde tomar o aeródromo de Sidi Rezegh, capturando 19 aviões italianos, surpreendidos em terra, juntamente com vários prisioneiros e transportes. Esse rápido deslocamento colocou a brigada a apenas 16 km do perímetro de Tobruk.

 

A 4a Brigada Blindada foi atacada durante a tarde, primeiro pelos bombardeiros de mergulho da Luftwaffe e, logo após, por mais de 80 tanques. As perdas da Brigada em tanques, nesse dia, foram consideráveis. Para reforçar o sucesso registrado no centro, dois batalhões do grupo de Apoio, cada qual reforçado de uma companhia de canhões antitanques e de campanha, foram despachados para a 7a Brigada Blindada, em Sidi Rezegh. Além disso, a 1a Divisão Sul-Africana destacou uma brigada para Sidi Rezegh antes de avançar para Bir el Gubi, para conter a Divisão “Aríete”, enquanto que a 22a Brigada Blindada operava ao norte dos sul-africanos. A 4a Brigada Blindada recebeu instruções para ficar na área de Gabr Saleh.

 

Também a 19 de novembro, o 13o Corpo iniciou com êxito as operações na região de Sidi Omar.

 

A maneira como o General Gott via a situação no fim do dia 19 de novembro levou-o a crer que houvesse chegado o momento de a 70a Divisão fazer sua saída de Tobruk. Assim sendo, recomendou ele que a surtida fosse marcada para a manhã do dia 21, embora isso implicasse mudança no plano original. O General Cunningham aprovou-a no dia 20. Entrementes, também no dia 20, a 22a Brigada Blindada foi despachada para reforçar a 4a brigada Blindada no trabalho de proteção de flanco em Gabr Saleh, onde chegou no fim da tarde, verificando de pronto que a 4a Blindada estava levando a pior no encontro com formações fortemente blindadas do Afrika Korps do General Cruewell.

 

Na manhã seguinte, as duas brigadas blindadas britânicas, constatando que as divisões Panzer de Cruewell se dirigiam para noroeste, rumo a Sidi Rezegh, tentaram atacar imediatamente. A retaguarda alemã, fortemente equipada com os famosos antiaéreos de 88 mm e canhões antitanques Pak 50 mm, tornou a medida extremamente perigosa e impediu que os blindados britânicos realmente se empenhassem em combate com os tanques alemães em retirada. Enquanto essa ação era travada, a 70a Divisão saiu de Tobruk e, em Sidi Rezegh, a 7a Brigada Blindada e o grupo de Apoio prepararam-se para capturar a crista assinalada no plano original.

 

Antes que o ataque se iniciasse, chegaram informes de que as 15a e 21a Panzer se aproximavam da área de Gabr Saleh. O grupo de Apoio ficou para atacar a crista, enquanto que os dois regimentos de tanques faziam um círculo para enfrentar a ameaça das divisões blindadas alemãs. Dizer que o estado da batalha, nesse momento, era “confuso” é simplificar demasiado a coisa. A 70a Divisão saía do perímetro de Tobruk fortemente combatida pelas tropas do Eixo, que por sua vez sofriam o assédio, pelo sul, da 7a Brigada Blindada e do Grupo de Apoio. Ao mesmo tempo, a 7a Blindada encontrava-se sob o ataque de duas divisões Panzer do Afrika Korps que avançavam do sudeste e que, por seu turno, vinham sendo perseguidas pelas 4a e 22a Brigadas Blindadas.

 

Pelo anoitecer de 21 de novembro, após um dia de luta caótica e virulenta, a infantaria britânica chegara aos seus objetivos, na escarpa de Sidi Rezegh. Contudo, o 6o/Real Regimento de Tanques, ao tentar avançar para juntar-se às forças da guarnição em El Duda, foi detido e sofreu pesadas baixas. Também a 7a Brigada Blindada sofrera sensível redução em seus efetivos de tanques, embora, à força de violenta luta, tivesse detido o ataque blindado alemão do sudeste. A 7a Divisão, que conseguira estabelecer um bolsão fora do perímetro de Tobruk, organizara-se defensivamente, para aguardar que a situação em Sidi Rezegh ficasse mais clara.

 

Das formações do 13o Corpo, a 6a Brigada da Divisão Neozelandesa avançara e postara-se a oeste de Sidi Azeiz; a 5a Brigada estava em Capuzzo e a 4a Brigada, numa elevação a oeste de Bardia; a 4a Divisão Indiana preparava-se para capturar Sidi Omar.

 

À tarde de 22 de novembro, a batalha recomeçou em Sidi Rezegh com a mesma fúria. Um ataque feito pela 5a Brigada Sul-Africana, recém-chegada à área, contra a parte sul da cidade foi rechaçado, resultando disso pesadas baixas para a brigada. A 22a Brigada Blindada, a muito enfraquecida 7a Brigada Blindada e o grupo de Apoio tiveram de enfrentar um ataque-frontal da 21a Divisão Panzer. Essa batalha blindada oferecia a quem a observasse uma cena de completa confusão. Areia, fumaça e explosões de granadas, em rica profusão, obscureciam o campo de batalha, enquanto que o ruído forte dos motores dos tanques e o trovejar contínuo dos canhões de alta velocidade faziam um acompanhamento dissonante do espetáculo de certo modo primitivo dos tanques em guerra. No fim do dia, ambos os lados haviam sofrido, mas todas as honras couberam aos alemães. Os blindados britânicos retiraram-se na direção das posições para as quais a 5a Brigada Sul-Africana se retirara após seu fracassado ataque.

 

A noite não trouxe trégua para a 4a Brigada Blindada. Mal os soldados, exaustos, se preparavam para acampar, foram repentinamente assediados por tanques alemães da 15a Divisão Panzer que, aparentemente, iam reforçar a 21a Panzer no aeródromo de Sidi Rezegh. Sob o brilho pálido e frio dos foguetes, a 4a Blindada foi dispersada pela violência do ataque desferido pela infantaria e blindados alemães, perdendo muito equipamento e grande número de soldados, feitos prisioneiros. Por efeito dessa dispersão inesperada, durante as 24 horas seguintes a 4a Brigada Blindada deixou de ser uma formação combatente coesa.

 

Felizmente, a situação era bem melhor no setor de operações controlado pelo 13o Corpo. A 7a Brigada de Infantaria Indiana saía-se bem em Sidi Omar, enquanto que a Divisão Neozelandesa tomara Forte Capuzzo e ameaçava Bardia e Sollum. Nesse momento, o General Cunningham ignorava o péssimo estado dos blindados britânicos e, portanto, não via razão para introduzir modificações nas ordens dadas ao 30o Corpo, de prosseguir na tentativa de destruir as forças de tanques do Eixo. Ao 13o Corpo cabia ainda conter as defesas fronteiriças alemãs e, com a Divisão Neozelandesa na vanguarda, avançar na direção de Tobruk.

 

No dia seguinte, 23 de novembro, Cunningham nomeou o General Godwin-Austen comandante das operações de infantaria contra Tobruk e, também, da 70a Divisão. A nomeação entrou em vigor no dia 24. Já então a notícia da ocorrência de pesadas baixas britânicas em tanques começava a chegar ao QG do 8o Exército, o que levou o General Cunningham a pensar se continuava ou não com a ofensiva “Cruzado”. A decisão, no entanto, cabia ao Comandante Chefe, Auchinleck, que, ao se inteirar de todos os fatos, decidiu prontamente manter o ataque.

 

O 13o Corpo continuou saindo-se bem nesse dia, tendo a Divisão Neozelandesa tomado o quartel de Sollum e parte da escarpa de Sidi Rezegh, a apenas 9 km do aeródromo. Contudo, para o 30o Corpo, as desventuras se multiplicavam. A 5a Brigada Sul-Africana foi eliminada numa batalha travada ferozmente com os blindados alemães, perdendo todo o equipamento e dois terços dos homens que a integravam. O General Cunningham decidiu que o 30o Corpo deveria reequipar-se e manter-se na proteção da Divisão Neozelandesa contra ataque blindado, ordenando também ao General Godwin-Austen para que assumisse o comando de todas as operações contra as forças do Eixo em torno de Tobruk.

 

A 24 de novembro, informes alarmantes sobre o movimento de tropas alemãs na retaguarda das forças britânicas causaram muita apreensão. Durante a tarde, estes informes davam conta de movimentos rápidos de blindados alemães pelo Trigh el Abd e, aí pelas 17:00 h, informava-se que os alemães estavam ao sul de Sidi Omar, onde logo depois se chocaram britânicos e alemães, aparentemente num emaranhado inextricável. Sucesso notável dos britânicos, durante esse período caótico, foi o da 7a Brigada de Infantaria Indiana.

 

Atacada por uma formação blindada alemã, pertencente ao 5o Regimento Panzer da 21a Divisão Panzer, a Brigada, oculta nas defesas construídas pelos soldados do Eixo e protegida pelo arame farpado e pelos campos minados, rechaçou os tanques alemães principalmente pelos disparos precisos da sua artilharia. Pelo final do dia, 18 tanques inimigos tinham sido destruídos.

 

A Força Aérea do Deserto também esteve ocupada, tentando divisar as colunas alemãs na confusão generalizada em que a batalha se transformara. Do alto, não era fácil distinguir quem era amigo, quem era inimigo, pois as áreas ocupadas pelos exércitos em choque já não estavam definidas com clareza. Para complicar ainda mais o problema da identificação, os dois adversários usavam transportes e equipamentos tomados uns dos outros. Apesar disso, a Força Aérea do Deserto hostilizou continuamente as forças do Eixo, sobretudo as que haviam cruzado a fronteira egípcia.

 

Nesse estágio crítico da batalha, Auchinleck tinha diante de si um problema que, embora delicado, não podia dar-se ao luxo de adiar a sua solução. Convencido do acerto de continuar a ofensiva, ele não podia mais permitir que o General Cunningham continuasse no comando do 8o Exército, uma vez que no seu entender era muito defensivo o procedimento de seu comandante de exército. Quem, no entanto, deveria nomear para substituí-lo A escolha óbvia seria Norrie ou Godwin-Austen, seus dois comandantes de Corpo; mas esses dois oficiais estavam profundamente concentrados nas operações, e a retirada de qualquer deles da frente de suas tropas poderia pôr em perigo a conduta da batalha. Auchinleck entregou então o comando do 8o Exército ao General Ritchie, Subchefe de seu Estado-Maior. Ritchie,  era mais jovem que os comandantes de Corpo e de graduação inferior. Perfeito oficial de Estado-Maior, mas com limitada experiência de comando de tropas. Sua nomeação entrou em vigor a 26 de novembro.

 

Nesse dia, a Divisão Neozelandesa tomara Belhamed e Sidi Rezegh; e a 70a Divisão dominara El Duda. Foi ali que as duas divisões travaram contato entre si, embora a posição permanecesse precária, com poderosas forças alemãs ameaçando os neozelandeses, que estavam ficando sem suprimentos. Naquela noite, o QG do 13o Corpo mudou-se para a área de guarnição de Tobruk, efetuando tecnicamente, desse modo, a ajuda à fortaleza sitiada e proporcionando uma ligação, ainda que tênue, com as forças principais.

 

Lutas intensas prosseguiram na área de El Duda-Sidi Rezegh-Belhamed, sofrendo os dois lados pesadas baixas. A 1o de dezembro, o General Freyburg, comandante da Divisão Neozelandesa, achou prudente retirar as duas maltratadas brigadas que haviam suportado o peso dos ataques alemães ao sul de Tobruk, para que pudessem ser reorganizadas. Completada essa retirada, a fortaleza ficou novamente isolada. O General Ritchie, partilhando da determinação de Auchinleck de manter a ofensiva, planejou um ataque contra El Adem.

 

Apesar das sérias perdas sofridas durante as várias batalhas da “Operação Cruzado”, a situação geral do 8o Exército tornava-se mais encorajadora com o passar dos dias. Mais formações britânicas estavam chegando ao Egito; a 2a Divisão Sul-Africana preparava-se para substituir a 4a Divisão Indiana na fronteira, libertando assim os indianos para outras operações ofensivas com o 30o Corpo. Além disso, relatórios cheios de confiança chegavam da parte do General Godwin-Austen, em Tobruk. Contudo, ainda haveria reveses.

 

Um ataque feito pela 11a brigada Indiana, contra um ponto forte alemão situado a 10 km ao norte de Bir el Gubi, no dia 3 de dezembro foi repelido. Embora a infantaria tivesse sido apoiada por artilharia e blindados, não conseguiu desalojar os alemães de suas posições, sofrendo seriamente na tentativa. Esse fracasso foi, no entanto, compensado pelo sucesso da 5a Brigada Neozelandesa e por elementos da 4a Divisão Indiana. Essas duas formações conseguiram impor-se às colunas alemãs que tentavam manter abertas as comunicações com suas tropas que defendiam a fronteira, isoladas pelos movimentos das forças britânicas.

 

Os ataques dos alemães a El Duda, no dia 4 de dezembro, foram rechaçados e o avanço sobre as forças britânicas, em Bir el Gubi, a ser feito no dia seguinte, não se realizou. Não há dúvida de que as forças alemãs, embora em retirada, ainda se conservavam capazes de muita luta. Tampouco seria lícito considerar o fim dessa fase da operação como mais que a primeira etapa do esforço pela conquista de um grande objetivo – a retomada da Cirenaica. Todavia, o fim do sítio de 8 meses de Tobruk, a 7 de dezembro, assinalou um momento de triunfo inebriante do 8o Exército.

 

A imprevisível dança da sorte ora favorecia um contendor, ora outro, sofrendo ambos duros golpes nos instantes de adversidade. Não há dúvida de que um líder menos decidido que Auchinleck teria encontrado razões para justificar uma retirada do turbilhão infernal em que se transformaram as batalhas de blindados e de infantaria. Houve momentos de tão grande dificuldade para os britânicos, de perdas tão perturbadoras, que tomou conta de muitos a sensação de que sustentar a ofensiva era um ato de insensatez, quando outra derrota teria representado deixar o Egito aberto a um ataque do arrojado e decidido Rommel.

 

Depois da batalha

 

Os primeiros a chegar a Tobruk, terminado o sítio, impressionaram-se com a ausência de qualquer demonstração de exuberância por parte da guarnição. Talvez, depois de meses de paciente resistência, não lhe houvesse sobrado tempo para perceber plenamente que a tensão perpétua, a constante ameaça de ataque terrestre e o perigo sempre presente dos bombardeiros de mergulho haviam terminado. Encontravam-se todos entregues a suas tarefas rotineiras, do mesmo modo calmo e metódico com que realizaram os procedimentos impostos pelos 242 dias de isolamento do restante das forças terrestres britânicas. Os que permaneceram em Tobruk durante o período do sítio pareciam haver desenvolvido forte afinidade com o deserto, onde por tanto tempo tiveram que viver.

 

Por toda a parte viam-se evidências da fúria da batalha. A areia estava repleta de estilhaços das incontáveis explosões de bombas e granadas. A área contida no perímetro de defesa estava tão repleta de minas que os homens tinham de andar cautelosamente, para evitar a morte que os espreitava sob a superfície de cada metro de chão. Até mesmo os sapadores da guarnição não sabiam mais que tamanho tinham os campos minados que haviam crescido tão profundamente durante o período de sítio. A baía se transformara num verdadeiro cemitério de navios; as destroçadas superestruturas de muitos deles projetava-se acima do nível das águas, como a testemunhar o elevado preço pago pela manutenção da linha vital de abastecimento da fortaleza sitiada.

 

Ao contrário de outros sítios famosos, nos quais a guarnição teve de subsistir e defender-se com recursos armazenados dentro dos limites da área defendida, Tobruk sempre esteve ligada a uma fonte de reabastecimento pelo cordão umbilical mantido pela Marinha Real, que continuara trazendo munição e alimentos apesar dos mais duros ataques da força aérea e da marinha do Eixo. O fato de não se ter nunca cessado o fluxo de reforços para a guarnição da cidade prova que, nessa batalha aeroterrestre, a vitória coube aos canhões. O êxito que a Marinha Real conquistou ao trocar a maior parte da infantaria australiana pelo Grupo de Brigada Polonês e a 70a Divisão britânica deve ter sido uma pílula muito amarga para o comando alemão, além das derrotas que suas forças sofreram no ataque direto à fortaleza.

 

Rommel decidira capturar Tobruk. Depois de haver deslocado os britânicos da fronteira da Tripolitânia com tanta facilidade, não há dúvida de que, para ele, as vitoriosas forças germânicas dobrariam sem grandes problemas a guarnição de Tobruk. Mesmo depois de suas primeiras e mal planejadas tentativas haverem fracassado, ele se conservou na certeza de que uma operação planejada teria êxito em romper, em poucas horas, a faixa externa das defesas. As páginas de seu diário mostram até que ponto a captura de Tobruk se transformara numa obsessão para ele.

 

O início da “Operação Cruzado” impediu, por poucas horas, outra tentativa do Eixo de assaltar a fortaleza, e fez com que as forças que ele havia reunido para o assalto fossem transferidas para outro local, para enfrentar as ameaças britânicas. Para os soldados e aviadores alemães que participaram das primeiras ações em torno do perímetro, o fracasso em conseguir mais que um bolsão relativamente pequeno nas defesas de Tobruk foi uma surpresa desagradável. Naquele estágio da guerra, as forças alemãs, acostumadas ao sucesso, ainda estavam por viver a experiência amarga e desmoralizante da derrota, exceto numas poucas ações insignificantes. O poder aterrador do Stuka ditava sempre o rumo dos acontecimentos onde não havia caças modernos para enfrenta-lo. Tobruk mostrou a ambos os lados que a vitoriosa Wehrmacht podia ser detida.

 

E quanto aos homens que defenderam Tobruk? Na época em que os alemães estavam fazendo seus esforços mais decididos para penetrara, uma divisão aproximada da guarnição constituía-se da infantaria australiana; a artilharia, blindados e a maioria das armas de apoio eram britânicos. Rommel escreveu, depois de ver e admirar um grupo de prisioneiros australianos que eram levados para o cativeiro, que esses homens... “sem dúvida representavam uma formação de elite do Império Britânico, fato este também evidente no combate”. Era um grande elogio, partindo de um homem cujos planos eles haviam ajudado a frustrar. Os australianos da 7a e 9a Divisões contribuíram para aumentar a considerável reputação de combatentes vigorosos que seus pais haviam criado em Anzac Cove  e Gallipoli durante a Primeira Guerra Mundial.

 

Havia forte sinal de “amadorismo” no comportamento dos comandantes australianos, como se houvessem na Austrália desenvolvido a técnica de selecionar entre os que tinham feito carreira na vida civil os oficiais que comandariam a tropa. O baixo conceito que os australianos faziam da disciplina e o desprezo que revelavam pela ortodoxia militar eram de provocar espanto nos exércitos mais profissionais, assim como a todos espantava a extraordinária capacidade de luta por eles revelada.

 

Os artilheiros desempenharam um grande papel na defesa de Tobruk. Hostilizaram continuamente as forças do Eixo e não lhes deram trégua durante todos os ataques feitos ao perímetro. A Luftwaffe fez o possível para apoiar os ataques de terra do Eixo, atacando furiosamente os embasamentos dos canhões, pois os alemães reconheciam acertadamente o fato de que, com os campos minados, a artilharia britânica representava o obstáculo principal para os seus tanques.

 

A chegada da esplêndida e aguerrida Brigada Polonesa trouxera um espírito de “espadachins” e “bucaneiros” para as confinadas defesas da “Linha Vermelha”, mas, nas posições expostas em torno do bolsão, esses dedicados combatentes se viram obrigados a imitar o comportamento de seus antecessores australianos, com tréguas extra-oficiais sem as quais a vida nessas regiões inóspitas teria sido intolerável para ambos os lados. A 70a Divisão, durante o período em que esteve na guarnição, embora não tivesse enfrentado ataques do peso dos que foram desencadeados na Páscoa ou no ataque ao Ras el Madauuar, cumpriu plenamente a sua função na feroz luta que se verificou no momento em que saiu da cidade, em coordenação com a “Operação Cruzado”.

 

Do exame do temperamento do soldado britânico e australiano ressaltam duas características bastante distintas. Enquanto o britânico é por natureza tenaz, difícil de deslocar, quando na defesa, o australiano prefere levar a luta ao inimigo. Em Tobruk, qualquer ataque do Eixo ao perímetro provocava sempre a retruca, e as concentrações de forças do Eixo fora do perímetro não estavam nunca livres de ser atacadas pela infantaria australiana, nas freqüentes incursões que empreendia. Isso fazia da fortaleza uma perpétua fonte de ansiedade para o Eixo, cujos comandantes sentiam que o assalto direto a ela significava perdas insuportáveis, em homens e materiais, e sua existência atrás de suas linhas era uma ameaça constante.

 

Se o porto tivesse caído, especialmente ante os primeiros ataques, o Egito sem dúvida estaria em sério perigo. Até onde poderia então ser levado Rommel suas forças, já meio esgotadas pela cansativa corrida pela Cirenaica, é uma questão de conjetura. Se ele tivesse conseguido avançar para além da fronteira, ameaçando Alexandria, é bem provável que o Alto Comando alemão se convencesse da necessidade de reforçar o sucesso obtido.

 

Qualquer que seja o resultado de uma ação militar, há sempre a tentação de especular sobre o que poderia ter acontecido se...? Mais tarde, Tobruk caiu e o Eixo foi detido em El Alamein, mas já então a situação militar e política no Oriente Médio mudara. Como vimos, os reveses que os alemães sofreram em Tobruk interromperam a série de vitórias que vinham somando e macularam a imagem de invencíveis que refletiam. A extraordinária jornada de Tobruk, em que os britânicos se demitiram do rol dos “bons perdedores”, levou, quem sabe, a pensar melhor vários países que estavam prestes a se alinharem do lado da Alemanha de Hitler.

 

Mas, independente do efeito que possa ter alcançado o resultado da batalha, real ou imaginário, “Tobruk” seria um galardão de primeira ordem para ser bordado na bandeira das mais orgulhosas unidades combatentes.

                                                                                      

 

                      

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