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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


Midnight Breed
Midnight Breed

 

  

 

 

 

 

 

 

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

Capítulo 24

O pânico invadiu como ácido as veias de Rio.

O som da arma ecoou novamente, quebrando o silêncio da noite. Os estouros em staccato vinham de algum lugar próximo. Para Rio, aquilo soava como tiros de canhão e o barulho – misturado ao choque do ataque repentino – corria por todos seus sentidos, preenchendo sua mente com uma espessa neblina que engolia o aqui e o agora.

Dylan, ele pensou ferozmente. Ele tinha de mantê-la a salvo.

Rio mal estava consciente de suas ações quando a segurou pelos ombros e a lançou contra a grama. O grito de desespero de Dylan foi mais sentido do que ouvido enquanto o guerreiro cobria o corpo dela com o dele, disposto a se sacrificar por ela.

Protegê-la era tudo que importava.

No entanto, quando eles caíram juntos contra o chão, Rio sentiu sua mente girar. Passado e presente começaram a se misturar, a se enredarem... a se transformarem em uma confusão embaçada de pensamento e lógica esmagada.

De repente, ele estava de volta no armazém. Lucan, Nikolai e os outros guerreiros estavam em busca de um covil de Renegados em Boston. Rio observava as vigas que sustentavam a construção abandonada, percebendo o movimento dos inimigos em meio à escuridão.

Vendo o brilho prateado de um equipamento eletrônico nas mãos daquele maldito. Escutando Niko avisar que a bomba estava prestes a explodir. Ah, droga!

Rio rugiu ao se lembrar da dor que explodiu em sua cabeça, e que percorreu cada centímetro de seu corpo. Sentia-se como se estivesse pegando fogo, como se sua carne queimasse, como se suas narinas se enchessem com o fedor de pele e cabelos chamuscados.

Mãos frias aproximaram-se de seu rosto, mas ele estava longe demais para saber o que era real e o que era um pesadelo de seu passado recente.

– Rio?

Ele ouviu aquela voz leve, sentiu aquelas mãos macias correrem por seu rosto.

E, de algum ponto não muito distante, ouviu gritos e gargalhadas de vários jovens humanos. Risadas que vinham acompanhadas de pancadas de tênis contra o chão – tudo cada vez mais distante agora.

– Rio. Você está bem?

Ele conhecia aquela voz. Uma voz que era filtrada através da fúria e da loucura que o envolviam, uma corda salva-vidas que lhe era lançada na escuridão de sua mente. E ele tentou agarrar-se àquela corda, sentindo a voz daquela mulher lhe oferecer um porto seguro quando nada mais seria capaz de fazer isso.

– Dylan... – ele conseguiu fazer a palavra passar secamente por sua garganta. – Não quero que você se machuque...

– Eu estou bem. Eram apenas fogos de artifício – ela passou os dedos pela testa fria e suada de Rio. – Aqueles garotos estouraram rojões ali perto da cerca. Está tudo bem agora.

É claro que estava.

Rio sentiu um de seus apagões se aproximando, e se aproximando rapidamente. Ele rolou para longe de Dylan, gemendo.

– Merda... Minha cabeça está doendo... Não consigo pensar direito.


Ela deve ter se inclinado sobre Rio, pois ele sentiu o hálito de Dylan bater contra suas bochechas quando ela xingou em voz baixa.

– Seus olhos, Rio. Merda. Eles estão se transformando... Estão ficando âmbar.

Ele sabia que seus olhos deviam estar assim. Suas presas já batiam contra sua língua, sua pele já se repuxava ao longo de seu corpo conforme a fúria e a dor o transformavam... Rio estava em seu estado mais mortal; sua mente já não lhe pertencia. Suas manos del diablo estavam em seu estado mais imprevisível, e mais poderoso.

– Temos que ir a algum lugar com menos gente – disse Dylan. Então, ela deslizou as mãos por sobre os ombros dele. – Segure-se em mim. Vou ajudá-lo a se levantar.

– Não.

– Como assim, não!?

– Me deixe – ele alertou com um tom áspero.

Dylan fechou uma carranca.

– Não vou deixá-lo. Não, mesmo! Você não pode ficar deitado aqui, no meio de Manhattan, e esperar não ser notado. Agora vamos! Levante-se!

– Não posso... Não quero tocar em você. Não quero feri-la, Dylan.

– Então, não faça isso – disse ela, tomando para si, mesmo assim, a tarefa de forçá-lo a se levantar. Rio não teve outra opção que não fosse colocar suas mãos sobre os ombros de Dylan para se equilibrar conforme a neblina em sua mente se tornava mais pesada, engolindo sua visão. Rio tentou evitar o desmaio ao máximo, sabendo que Dylan estaria mais segura se ele se mantivesse lúcido.

– Apoie-se em mim, caramba! – ela ordenou. – Eu vou ajudar você.

Dylan se enfiou sob o braço de Rio e segurou o pulso dele, sustentando o máximo do peso que conseguia enquanto tentava encontrar algum lugar privado para que ele pudesse enfrentar o choque que se seguiu ao ataque. Ela o levou para fora da passarela ao lado do rio, até uma rua de mão única, onde havia menos trânsito e menos pessoas para se aproximarem e ver a transformação de Rio.

– Ainda está tudo bem? – ela perguntou, apressando-se em direção a uma antiga igreja que lançava uma enorme sombra. – Você consegue andar um pouco mais?

Ele assentiu e grunhiu. No entanto, cada passo de Rio era mais lento do que o anterior.

– Estou... desmaiando...

– Sim, eu imagino – disse ela. – Está bem, Rio. Aguente comigo mais um minuto, você consegue?

Dessa vez, porém, Dylan não recebeu resposta. No entanto, ela podia sentir Rio se esforçando para continuar de pé e andando. Lutando para permanecer lúcido a ponto de ela poder ajudá-lo.

– Você está se saindo bem – disse ela. – Estamos quase lá.

Ela o levou até os fundos escuros da construção. Guiou-o até um canto perto de uma porta enferrujada e fechada com um cadeado. Usando a parede para apoiar as costas de Rio, Dylan cuidadosamente colocou-o sentado no chão. Lançou olhares para todos os lados e se sentiu aliviada ao perceber que eles estavam escondidos da rua e daqueles que por ali passavam. Agora eles estavam seguros.

– Diga-me o que fazer, Rio. Do que você precisa para fazer isso passar?

Rio não respondeu. Talvez ele não conseguisse. Dylan empurrou os cabelos escuros e macios para fora do rosto dele e olhou-o nos olhos em busca de algo que indicasse que ele ainda estava consciente. Aquelas pupilas, finas e verticais, sempre a deixavam impressionada, mas não mais do que a explosão âmbar que as envolvia. Os olhos de Rio ardiam como brasas presas em seu crânio. Qualquer um que passasse por perto daquela igreja teria de estar cego para não perceber aquele brilho de outro mundo.

Dylan olhou para a velha porta e sua aparência decrépita. Ela tinha visto Rio acender luzes e abrir as torneiras com a mente. Portanto, estourar um cadeado e invadir uma construção não devia ser grande coisa. Todavia, parecia claro que Rio não estava em condições de arriscar aquilo. Sua cabeça se soltou sobre o peito e, com um gemido de dor, Rio começou a se inclinar para o lado.

– Merda! – sussurrou Dylan.

Ela o deixou só pelo tempo suficiente para procurar algo pesado naquele local mal iluminado. Quando retornou, trazia nas mãos um pedaço de bloco de concreto que era usado para manter fechada a tampa de uma caçamba de lixo. O concreto era pesado e estalou e emitiu uma faísca quando ela o bateu contra o velho cadeado na porta da igreja. Foram necessárias mais duas ou três pancadas antes de a peça finalmente ceder, emitindo um forte estrondo ao cair no chão.

– Rio... – ela sussurrou apressadamente enquanto o levantava, segurando-o por aqueles ombros largos e pesados. – Rio, você está me ouvindo? Temos que entrar. Você consegue se levantar?

Ela levantou o queixo dele e encarou aqueles olhos que agora pareciam não enxergar, mas que eram apenas buracos pegando fogo.

– Maldição! – murmurou. Em seguida, fez uma careta por ter dito aquela palavra. Afinal, ela estava prestes a levar uma criatura da noite inconsciente para um santuário sagrado, buscando proteção.

Dylan abriu a porta da igreja e escutou para verificar se havia alguém lá dentro. Tudo estava silencioso, não havia luz alguma acesa na pequena antessala, nem na área principal da nave mais adiante.

– Muito bem, vamos lá – disse em voz baixa enquanto dava a volta pelo corpo de Rio, indo na direção da cabeça para puxá-lo pelos braços e fazê-lo passar pela porta.

Aquele homem era extremamente pesado, certamente tinha mais de noventa quilos de músculos e ossos que não cooperavam nem um pouco com ela – não naquela situação. Dylan o puxou e o arrastou até a escuridão e, em seguida, fechou a porta.

Não demorou muito para que ela encontrasse algumas velas e uma caixa de fósforos nos armários. Então, acendeu algumas das velas e voltou até o lado de fora para pegar o bloco de concreto e usá-lo como base. Colocou as velas nos buracos cilíndricos dos tijolos unidos por cimento e logo foi verificar como estava Rio.

– Ei... – ela chamou em voz baixa, inclinando-se sobre aquele corpo espalhado, que não apresentava resposta alguma. Os olhos de Rio estavam fechados, mas inquietos ainda atrás das pálpebras. Um músculo de sua mandíbula se repuxou. Seus membros não se moviam, mas estavam tensos por conta de uma energia que Dylan podia sentir à medida que se aproximava dele.

Ela acariciou o rosto de Rio com um toque tão leve quanto uma pluma, correndo as costas dos dedos sobre a bochecha perfeita que o tornava tão lindo a ponto de deixar qualquer mulher boquiaberta. O outro lado, todavia, fazia o coração de Dylan se partir. Quem poderia esperar esses últimos dias, e todas as experiências pelas quais ela passou? Quem poderia tê-la preparado para conhecer aquele homem tão complicado e, ao mesmo tempo, tão incrível?

Será que ela poderia chegar a esquecê-lo completamente, mesmo se ele apagasse sua memória, como planejava fazer?

Dylan duvidava disso. Mesmo se sua mente fosse forçada a esquecê-lo, ela achava que seu coração não o esqueceria. Inclinou o corpo sobre o dele e pressionou seus lábios contra aquela boca bem desenhada.

Os olhos de Rio se abriram de repente e suas mãos se prenderam em volta da garganta dela tão rapidamente que ela sequer teve tempo de tomar fôlego para gritar.


Capítulo 25

Rio não sabia o que havia lhe puxado com força para fora da neblina mortal de sua mente: a sensação daqueles lábios suaves contra sua boca, ou a percepção de que havia uma garganta em suas mãos. Ele apertava com força e a fúria gerada por aquela confusão do blecaute que ele enfrentava concentrava-se diretamente na ponta de seus dedos. E ele apertava o pescoço delicado de uma mulher com a intenção de matá-la.

Não conseguia soltá-la.

Rio estava com os olhos abertos, mas não conseguia concentrá-los no rosto em sua frente. Ouviu o ofegar de alguém sendo sufocado, um gemido vibrando contra os polegares.

Mas nada daquilo o tirou da pesada escuridão.

Foi somente quando ele sentiu mãos suaves tocarem seu rosto – suas cicatrizes – que o primeiro sinal de clareza surgiu.

Dylan.

Madre de Dios... Ele a estava ferindo.

Com um rugido, Rio se jogou para longe dela, soltando-a assim que percebeu o que estava fazendo. Cambaleou pela escuridão daquele lugar desconhecido, horrorizado pelo que tinha feito.

Que inferno!... Que porcaria ele poderia ter causado se a tivesse segurado por mais tempo?

Rio ouviu os golpes de uma respiração rápida atrás dele. Esperava para ouvir os passos desesperados daquela mulher enquanto ela corria para longe. Ele não a culparia por isso. Tampouco a seguiria. Nem mesmo com a intenção de apagar sua mente para proteger a Raça e os segredos que haviam sido libertados daquela caverna na Boêmia.

Se ela corresse agora, estaria completamente livre dele.

– Vá, Dylan. Afaste-se de mim... Por favor.

Ele ouviu um farfalhar quando ela se levantou. Fechou os olhos, pronto para deixá-la ir embora. Rezando para que ela fosse embora.

No entanto, ela se aproximou. Rio estremeceu ao sentir a mão de Dylan pousar suavemente sobre sua cabeça e, em seguida, correr por seus cabelos.

– Vá embora! – ele ordenou com uma voz áspera. – Antes que perca minha maldita cabeça outra vez e faça algo ainda pior. Cacete! Eu podia ter matado você ainda há pouco.

Ele ofegava enquanto ela se ajoelhava ao seu lado no chão. Dizendo um leve elogio, ela inclinou a cabeça de Rio de modo que ele a olhasse nos olhos.

– Eu estou bem, como você pode ver. Você me assustou um pouco, mas isso é tudo. Meu Deus, Rio... Com que frequência isso acontece com você? – Rio franziu a testa e sacudiu a cabeça, deixando claro que não queria conversar naquele momento. – Como você supera isso? – ela insistiu. – Eu gostaria de ajudar...

– Você não pode.

Ele não conseguia parar de olhar para o pescoço dela enquanto dizia aquelas palavras. Por mais que tentasse, não conseguia desviar seu olhar daquela coluna graciosa formada pelo pescoço de Dylan. Rio não a tinha ferido – o que era um pequeno milagre –, mas até agora podia sentir aquela pele aveludada contra a palma de sua mão e o calor daquela pele ainda fazia seus dedos formigarem.

E justo ali, perto da base daquela garganta, um pulso forte e tentador golpeava selvagem e deliciosamente convidativo.

– Você precisa de sangue, não precisa? – disse ela, inteligente demais para não perceber a fraqueza que ele não conseguia esconder. – Seria melhor você se alimentar, não?

– Não posso me alimentar de você.

– Por que não, se você precisa?

Rio esbravejou. Sua cabeça ainda martelava por conta dos efeitos prolongados de seu apagão.

– Seu sangue em meu corpo vai criar uma ligação duradoura e inquebrável entre nós. Eu sempre vou sentir você, sempre vou estar atraído por você, durante todo o tempo que você viver.

– Ah... – ela disse em voz baixa. – E nós definitivamente não queremos que isso aconteça. Não quando você prefere se sentir isolado e sozinho.

Rio fez uma cara de reprovação.

– Você não sabe como me sinto.

– Quando você começou a se odiar? – perguntou Dylan, inalterada pelo fogo que ele lançava com aquele olhar apertado. – Foi depois da traição de Eva, ou muito antes disso? Ainda na sua casa na floresta, na Espanha?

Rio grunhiu, distanciando-se de Dylan antes que ela fizesse sua ira se tornar ainda maior. Naquele estado, ele era imprevisível, um predador mortal à beira da loucura.

Esse era outro motivo pelo qual ele devia acalmar sua besta. Antes de voltar a ferir alguém. Antes de se permitir pensar que o futuro poderia ter algo digno para lhe oferecer.

E, droga, antes de considerar já por tanto tempo a oferta insensata de Dylan.

– Minha mãe está lutando para viver há quase um ano. E você mal pode esperar para acabar com a sua vida.

– O que você acha que estaria fazendo se me permitisse beber de você agora? – ele perguntou com uma voz grosseira, agressiva. Até mesmo um pouco desesperada. – Eu sou a última coisa de que você precisa, Dylan. Se você se render a essa armadilha para me salvar, não posso prometer que não vou arrancar seu braço no processo.

– Você não vai me ferir.

Rio grunhiu, um som grosseiro, animalesco.

– Como sabe que eu não vou te ferir?

– Porque eu vou confiar em você.

Ele cometeu um grave erro quando virou o rosto e olhou para ela. Agora com os olhares se cruzando, Dylan afastou os cabelos para trás de um ombro e se aproximou até que seu pescoço estivesse perto da boca de Rio. Ele encarou aquela pele clara exposta. Seu olhar parou no pulso forte sob a pele macia.

Ele grunhiu alguns palavrões bastante violentos.

Em seguida, afastou os lábios e enterrou suas presas enormes e afiadas no pescoço de Dylan.


Ah... Deus.

Todo corpo de Dylan estremeceu no instante em que as presas de Rio penetraram sua pele. Ela sentiu um golpe de uma dor causticante e, em seguida... êxtase.

O calor tomou conta do corpo de Dylan enquanto os lábios de Rio se apertavam na ferida e sua língua sugava o sangue que começava a fluir para sua boca. Ele bebia dela com a intensidade de alguém que realmente necessitava daquilo. Suas presas se esfregavam contra a pele de Dylan, a língua criando uma fricção exigente e deliciosa com cada sucção forte e molhada.

– Rio... – ela sussurrou. O ar passava por sua boca como um suspiro preguiçoso e demorado.

Um ruído profundo saiu pela garganta de Rio, um rugido abafado que vibrava na pele e nos ossos de Dylan conforme ele a levava até o chão. Seus braços fortes e musculosos a ampararam, o calor no corpo dela aumentava conforme ele se ajeitava sobre ela.

Dylan se derreteu, entregando-se completamente para ele, perdendo-se no prazer estonteante do beijo sombriamente sensual de Rio. Ela estava queimando por dentro. O corpo dela se retorcia sob aqueles músculos e um desejo completamente erótico a invadia conforme ele a puxava mais para perto e bebia mais de seu sangue.

Ele também estava ardendo.

Dylan conseguia sentir a linha rija do pênis de Rio pressionando seu quadril enquanto ele estava sobre ela. A coxa grossa dele estava entre suas pernas, mantendo-as entreabertas. E naquele momento ela desejou estar nua com ele. Queria senti-lo entrando nela enquanto bebia de seu pescoço. Aquela necessidade crescente a fez gemer ainda mais, a fez agarrar as coxas de Rio.

– Rio... Eu quero... Ah, preciso ter você dentro de mim.

Ele soltou um gemido áspero. Sua pélvis se movimentava quando ele empurrou seu pênis ereto mais forte contra ela... Mas, na região da garganta, Dylan sentiu a sucção mais fraca agora, adotando um ritmo mais calmo. Mais calmo, enquanto Dylan queria sentir mais daquele fogo. Ela sentiu a língua dele correr sobre a mordida, criando um formigamento que correu como eletricidade por todo seu corpo. Rio levantou a cabeça e Dylan gemeu por não ter mais aquela boca deliciosa contra sua pele.

– Não pare, não quero que você pare – ela disse, estendendo a mão na direção dele. – Não pare!

Ele a olhou e disse algo em espanhol. Algo que soava furioso e profano.

Dylan olhou fixamente para aqueles olhos âmbar, agora em chamas.

– Agora você também me odeia, não é mesmo?

– Não – ele rosnou. Suas presas brilhavam contra a fraca luz das velas.

Rio tirou um braço de debaixo dela e tocou-lhe o rosto. Os dedos dele estavam trêmulos, mas, ao mesmo tempo, ofereciam-lhe um toque tão delicado quanto seda. Ele tirou os cabelos da testa de Dylan e lentamente deixou sua mão vagar por sua bochecha, seu queixo e pela linha de seu ombro. Dylan inspirou enquanto ele acariciava seus seios. Depois, Rio desabotoou rapidamente a blusa dela. E depois o sutiã.

– Você é tão macia – murmurou Rio enquanto sua mão vagava pela pele nua.

Ele desceu e beijou-lhe o mamilo, sugando com o calor de sua boca o bico daquele seio suave como uma pétala. Dylan arqueou o corpo com o golpe súbito de prazer que a invadiu. Seu desejo se tornava cada vez mais intenso.

Rio subiu novamente para beijar-lhe a boca enquanto abria o botão e o zíper da calça jeans de Dylan e deslizava a mão para dentro de sua calcinha. O sabor picante do sangue dela em sua língua não deveria deixá-la tão quente, mas saber que tinha se alimentado dela – saber que ele tinha tomado aquela força e aquele conforto do corpo dela de uma forma tão primitiva e tão íntima – era o mais intenso afrodisíaco que ela já conhecera.

E o que Rio estava fazendo com os dedos quase a fez gozar na mão dele.

Ela gritou, quase perdendo o controle:

– Rio, por favor...

Ele tirou a camisa e as calças. Em seguida, também tirou as calças dela. Depois, tirou-lhe a calcinha lentamente, beijando cada centímetro de pele entre a coxa e o tornozelo enquanto descia a peça de cetim pela perna de Dylan e a deixava de lado.

Rio sentou-se com os joelhos dobrados, gloriosamente nu.

– Venha para perto de mim, Dylan.

Ela até queria explorar mais a beleza e a força dos músculos do corpo de Rio, mas a necessidade de senti-lo dentro de si era ainda mais imediata. Ele a pegou pela mão e a trouxe até seu colo. Seu pênis estava ereto, uma espessa lança de carne rija. A enorme cabeça brilhava, úmida e quente, tão tentadoramente pronta que Dylan não conseguiu resistir por muito mais: inclinou o corpo e o sugou profundamente em sua boca.

– Oh! – ele rangeu enquanto ela esfregava a língua em seu pênis.

Rio entrelaçou os dedos nos cabelos de Dylan enquanto ela o provocava, subindo e descendo lentamente por aquele rígido, grosso e longo pênis. Quando ela levantou sua cabeça, os olhos de Rio queimavam em sua direção. Suas presas pareciam imensas agora; seu rosto, retesado.

Ele beijou-lhe os seios, o ombro, a garganta, a boca.

– O que você fez comigo? – disse Rio com uma voz rouca, jogando a cabeça para trás enquanto ela segurava seu pênis e o guiava até a entrada de seu sexo. – Caramba... Dylan...

Ela sentou-se sobre ele e lentamente deixou ser penetrada por aquela enorme espada.

Ah... Como era bom!

Rio a preencheu com um calor que ela nunca tinha sentido. Em um primeiro momento, Dylan somente conseguiu se sustentar ali, parada, sentindo o paraíso perfeito formado por aqueles dois corpos unidos. Rio a envolveu em seus braços fortes quando ela deu início a um ritmo lento e trêmulo. Ele se movimentava com ela e os dois corpos realizavam uma sincronia perfeita conforme o pênis ereto dele adentrava mais e mais fundo a cada movimento sinuoso do quadril dela.

Não demoraria muito para que Dylan chegasse ao orgasmo. Ela já tinha percorrido mais da metade do caminho antes mesmo de eles começarem a transa. Cada terminação nervosa de seu corpo estava acesa e preenchida por aquela deliciosa sensação e Dylan estava cada vez mais próxima de gozar. Ela mexia-se com mais força, segurando-se naqueles ombros largos e fortes enquanto a primeira onda de seu orgasmo inundava seu corpo como um tsunami. Ela gritou com o prazer, estremeceu, dividiu-se em um milhão de pedaços.

O grunhido possessivo de Rio enquanto ela gozava a fez sorrir. Ele prendeu seus braços sob os dela e a guiou até o chão. Seus corpos estavam agora mais unidos do que nunca. Rio empurrou seu pênis ainda mais forte dentro de Dylan. Seu ritmo era urgente, feroz, cheio de uma força selvagem que ele quase não conseguia conter.

Dylan segurou o pênis de Rio enquanto ele fazia movimentos contínuos, e se entregou completamente àquela sensação maravilhosa dos músculos dele se esfregando e se apertando contra suas mãos. Um pouco acima, as velas lançavam sombras sensuais no teto. O brilho das chamas se tornava mais intenso conforme Rio fazia investidas mais fortes e mais rápidas até finalmente gritar com a força de seu orgasmo.

Enquanto Dylan acariciava as costas largas e musculosas de Rio, ela sentiu vontade de chorar por conta da profundidade do prazer que acabara de experimentar com ele...

E sentia vontade de chorar também por conta da voz que ecoava em sua mente, avisando-lhe que ela seria uma completa idiota caso se apaixonasse por ele.

Mas já era inevitável. E ela teve de admitir: estava apaixonada.


Capítulo 26

Se estivesse preocupado em cometer mais erros, particularmente quando o assunto era Dylan, Rio tinha de admitir que acabara de cruzar uma linha sem volta.

Tomar da veia dela, como ele tinha feito, era ruim o suficiente; os homens da Raça, mesmo aqueles com apenas um pingo de honra, jamais se alimentariam de uma Companheira de Raça para benefício próprio. Até chegar àquele sabor delicioso do sangue de Dylan, Rio enfrentara horas de angústias e um apagão que o deixaria vulnerável a ser descoberto por humanos, por outros vampiros... Merda. Vulnerável em mais sentidos do que ele pretendia avaliar.

No entanto, independentemente de ele estar ou não precisando se alimentar, tomar o sangue de Dylan tinha sido um erro. Muito embora ela lhe tivesse oferecido aquele néctar sem querer nada em troca, ela não entendia o que estava fazendo – ligando-se a ele. E por quê? Caridade. Talvez até mesmo por pena.

Pensar que ele tinha sido fraco demais para recusar fazia-o queimar. Ele de fato queria o que ela estava oferecendo – tudo o que ela estava oferecendo. E era tarde demais para desfazer qualquer coisa. O que ele tinha feito era irrevogável. Ele sabia. E talvez instintivamente ela também soubesse, já que tinha ficado tão quieta enquanto descansava nos braços dele.

Ele agora estava ligado a ela por um nó que não podia mais ser desfeito. Agora que o sangue de Dylan nadava no corpo de Rio, nas células de Rio, ela era irreversivelmente parte dele. Até que a morte levasse um deles, Rio sentiria a presença de Dylan, seu estado emocional – a mais pura essência dela –, não importaria o quanto o futuro pudesse separá-los.

Enquanto acariciava a curva extremamente macia do ombro nu de Dylan, com ela ali, deitada em seus braços, Rio se perguntava se o laço de sangue era, de alguma forma, incidental à atração profunda que ele estava sentindo por aquela mulher. Ele sentira uma ligação se formando com ela desde o início, desde que ela entrou naquela caverna e ele escutou sua voz pela primeira vez na escuridão.

Fazer amor com Dylan talvez tivesse sido um erro tão grave quanto beber dela: agora que ele tinha provado a paixão daquela mulher, ele apenas queria mais. Rio era egoísta e ganancioso, e já havia provado para si mesmo que não podia contar com sua honra para se controlar.

Ele se concentrou nela – na respiração rasa, no silêncio cuidadoso... havia um peso naquela mulher que não tinha nada a ver com a série de erros que havia ocorrido entre eles.

Ela estava lamentando outra coisa.

– Quão ruim é a situação dela... de sua mãe?

Dylan engoliu em seco. Seus cabelos dançaram sobre seus seios rijos quando ela balançou vagamente a cabeça.

– Ela não está bem. Está cada vez mais fraca. – A voz de Dylan se tornava cada vez mais fraca. – Não sei quanto tempo mais ela pode lutar contra isso. Para dizer a verdade, não sei por quanto tempo mais ela vai continuar tentando.

– Sinto muito – disse Rio, acariciando as costas de Dylan e sabendo que ele somente podia oferecer-lhe palavras gentis.

Ele não queria que Dylan sofresse, mas sabia que ela estava enfrentando uma dor profunda. Não era necessário um laço de sangue para se dar conta disso. E ele era extremamente idiota e ridículo por ter feito o que tinha feito com ela ali, naquela noite.

– Não podemos ficar aqui – disse ele, desejando que suas palavras não saíssem como um rosnado. – Nós precisamos ir.

Ele se mexeu desconfortavelmente debaixo dela, gemendo quando só conseguiu ficar em uma posição ainda mais desajeitada. E, então, murmurou um palavrão em espanhol.

– Você está bem? – Dylan perguntou. Ela ergueu a cabeça e olhou para ele, franzindo a testa, preocupada. – A dor está voltando? Como você está se sentindo?

A frustração subiu-lhe pela garganta, mas ele franziu a testa e engoliu-a de volta. Então, estendeu a mão para acariciar a bochecha de Dylan:

– Você sempre cuidou de todos à sua volta mais do que de você?

A testa de Dylan, já franzida, ficou ainda mais enrugada.

– Eu não preciso de cuidados. Não preciso de cuidados há algum tempo.

– Há quanto tempo, Dylan?

– Desde sempre.

Enquanto ela disse isso, seu queixo se levantou um pouco, e Rio logo imaginou Dylan como uma garotinha com o rosto sardento se recusando a aceitar ajuda, independente de quanto precisasse. Agora, já mulher, ela continuava agindo da mesma forma. Desafiadora, orgulhosa. Com tanto medo de se ferir.

Ele conhecia pessoalmente esse tipo de medo. Rio tinha passado por um caminho parecido durante sua infância. Uma infância solitária a ponto de quase impedi-lo de sobreviver. Mas Dylan era, de muitas formas, mais forte do que ele. Apenas agora Rio começava a perceber como ela era forte.

E também era apenas agora que ele começava a perceber como ela era solitária.

Ele se recordou que Dylan tinha mencionado rapidamente que tinha irmãos – dois, ambos com nome de estrelas do rock. No entanto, ele nunca a ouvira falar de seu pai. Aliás, o único membro da família que ela parecia realmente ter em sua vida era a mulher que atualmente estava na ala de oncologia do hospital no final daquela rua.

A família que ela provavelmente ia perder dentro de pouco tempo.

– São somente vocês duas já há algum tempo? – ele perguntou.

Dylan confirmou:

– Na verdade, meu pai foi embora quando eu era pequena. Eles se divorciaram pouco depois e minha mãe nunca se casou outra vez. E não foi por falta de interesse. – Dylan riu e aquela risada saiu carregada por um humor melancólico. – Minha mãe sempre foi um espírito livre, sempre se apaixonava por um homem novo e jurava para mim que aquele seria o cara. Acho que ela é apaixonada por estar apaixonada. Agora mesmo, ela está interessada no dono do abrigo onde ela trabalha. Deus, ela ainda tem tanto amor para dar, mesmo quando o câncer está tomando conta dela...

Rio correu os dedos pelo braço de Dylan enquanto ela tentava evitar a oscilação em sua voz.

– E quanto ao seu pai? – ele perguntou. – Você entrou em contato com ele para dizer o que está acontecendo?

Ela franziu a testa ferozmente.

– Ele não daria a mínima, mesmo se eu soubesse onde ele está e se ele estivesse sóbrio o suficiente para me escutar. Para ele, a família só tinha valor quando nós o tirávamos de problemas ou o ajudávamos a conseguir mais bebidas e drogas.

– Ele parece ser um verdadeiro idiota – disse Rio, furioso por ver a dor de Dylan. – É uma pena que ele se foi. Eu gostaria de conhecer o filho da mãe.

– Quer saber por que ele se foi?

Rio acariciou os cabelos suaves de Dylan enquanto assistia a luz das velas brincarem com aquelas ondas reluzentes.

– Só se você quiser me contar.

– Foi por causa de meu dom, como você o chama. Minha estranha habilidade de ver os mortos. – Dylan corria a ponta do dedo delicadamente por um dos dermoglifos de Rio enquanto falava, lembrando-se de como tinha sido enfrentar aqueles momentos difíceis. – Quando eu era pequena, ainda no primário, ou talvez antes disso, meus pais não prestavam muita atenção ao fato de eu ocasionalmente conversar com pessoas invisíveis. Não é raro ver crianças com amigos imaginários, então acho que eles simplesmente ignoraram aquilo. E mais, com todas as discussões e problemas em nossa casa, eles não ouviam muito do que eu dizia, de qualquer forma. Bem, não até alguns anos mais tarde. Em uns de seus raros momentos de sobriedade, meu pai encontrou meu diário. Eu andava escrevendo sobre ver mulheres mortas de tempos em tempos, e sobre o fato de elas conversarem comigo. Eu estava tentando entender por que aquilo acontecia. Tentando entender qual era o significado daquilo, sabe? Mas ele viu nisso uma oportunidade de tirar proveito de mim e fazer dinheiro com aquilo.

– Madre de Dios. – Rio detestava aquele homem mais e mais a cada minuto. – Tirar proveito de você? Como?

– Ele nunca parava em um emprego por muito tempo, e estava sempre procurando maneiras de fazer dinheiro rapidamente. Então, ele pensou que se cobrasse das pessoas para conversarem comigo, sabe, pessoas que perderam seus entes queridos e quisessem entrar em contato com eles de alguma forma, então ele poderia simplesmente ficar sentado e contando o dinheiro que entrava. – Dylan mexeu a cabeça lentamente. – Eu tentei explicar para ele que não era assim que minhas visões funcionavam. Eu não podia trazer as mortas usando um comando. Eu nunca sabia quando poderia vê-las e, mesmo quando elas apareciam, eu muitas vezes não conseguia conversar com elas. As mulheres mortas que eu vejo falam comigo, dizem coisas que querem que eu sabia, ou que querem que eu faça, mas é só isso. Ninguém conversa sobre quem está saindo com quem lá no outro lado, ou qualquer outro assunto como se vê na televisão. Mas meu pai não me ouvia. Ele exigia que eu descobrisse uma forma de usar minha habilidade... Então, por algum tempo, eu dissimulei. Não durou muito. Uma das famílias que meu pai tentou extorquir ameaçou denunciá-lo. E, então, ele parou com aquilo e foi embora. Foi a última vez que nós o vimos ou que tivemos notícias dele.

Foi bom se libertar – pensou Rio instintivamente. Mas ele podia entender como esse tipo de abandono deve ter marcado a criança que Dylan foi.

– E os seus irmãos? – ele perguntou. – Não eram adultos o suficiente para fazer alguma coisa a respeito do seu pai?

– Nessa época, ambos já tinham saído de casa – a voz de Dylan soava bastante baixa, mais dolorida do que quando ela revivia a traição de seu pai. – Eu tinha só sete anos quando Morrison morreu em um acidente de automóvel. Na mesma semana em que ele recebeu a licença para dirigir, com dezesseis anos. Meu pai o levou para celebrar e acabou deixando Morrie bêbado. E, é claro, meu pai estava em condições ainda piores, então deu a chave para ele dirigir até nossa casa. Meu irmão não viu e acabou jogando o carro contra uma cabine telefônica. Meu pai saiu com uma contusão e com a clavícula quebrada, mas Morrie... entrou em coma e morreu três dias depois.

Rio não conseguiu conter o rugido de fúria que fervia em sua garganta. O impulso de matar, de vingar e proteger aquela mulher em seus braços era feroz, um fogo ardendo em suas veias.

– Eu realmente preciso encontrar esse homem, se é que podemos chamá-lo assim, e fazê-lo ver o que é dor de verdade – ele murmurou. – Me diga que seu outro irmão ao menos deu algumas porradas no seu pai até deixá-lo quase sem sua vida inútil.


– Não – respondeu Dylan. – Lennon era um ano e meio mais velho que Morrie. Enquanto Morrie era agitado e extrovertido, Len era tranquilo e reservado. Eu me lembro de quando olhei nos olhos dele, quando minha mãe chegou do hospital com a notícia de que Morrie tinha morrido e de que nosso pai passaria alguns dias na cadeia quando saísse do hospital. Len somente... ouviu. Calado. Eu vi algo também morrer nele naquele dia. Ele saiu de casa e foi direto ao serviço de recrutamento militar. Ele mal conseguia esperar para se livrar... de nós, de tudo aquilo. E nunca olhou para trás. Alguns de seus amigos disseram que ele foi enviado para Beirute, mas eu não sei ao certo. Ele nunca escreveu ou telefonou. Lennon simplesmente... desapareceu. Eu só espero que ele esteja feliz, seja lá para onde que a vida o tenha levado. Ele merece ser feliz.

– Você também merece, Dylan. Você e sua mãe... Vocês duas merecem mais do que a vida lhes deu até agora.

Ela levantou a cabeça e virou-se para encarar Rio. Os olhos dele estavam brilhantes e marejados. Rio envolveu aquele lindo rosto nas mãos e a trouxe mais perto, encostando os lábios no mais leve e doce dos beijos. Ela o envolveu em seus braços e, enquanto eles se abraçavam, ele se perguntava se existia alguma forma de dar a Dylan um pouco de esperança... um pouco de felicidade para ela e para a mãe que ela tanto amava.

Rio pensou em Tess – a Companheira de Raça de Dante – e na incrível habilidade que ela tinha de curar por meio do toque. Tess tinha ajudado Rio a curar algumas de suas lesões. E ele tinha testemunhado mais de uma vez como ela podia acabar com ferimentos e de fazer ossos se juntarem novamente. Ela havia dito que sua habilidade estava fraca agora que ela estava grávida, mas, e se houvesse uma chance... mesmo que muito pequena?

Quando a mente de Rio começou a estudar as possibilidades, seu celular tocou.

Ele puxou o aparelho para fora do bolso da jaqueta e o abriu.

– Merda. É o Niko – disse, apertando o botão para atender. – Alô?

– Onde você está, cara?

Rio lançou um olhar para Dylan, tão deliciosamente nua sob o brilho da luz de velas.

– Eu estou em Midtown. Estou com Dylan.

– Em Midtown com Dylan...? – Niko repetiu com uma pontada de sarcasmo na voz. – Acho que isso explica por que o Range Rover está estacionado e a casa dela está vazia. Vocês dois decidiram ir a um show ou algo assim? O que está acontecendo entre você e essa mulher, cara?

Rio não teve vontade de explicar naquele momento.

– Está tudo bem por aqui. Você e Kade encontraram algum problema?

– Nada. Localizamos todos os quatro indivíduos e apagamos suavemente as memórias da caverna – Niko riu. – Está bem, talvez não tão gentilmente naquele idiota para quem ela trabalha no jornal. O cara era um idiota de primeira classe. Só ficou faltando a mãe dela. Tentei o endereço da casa dela e o abrigo onde trabalha, mas não tive sorte em nenhum dos dois locais. Você tem alguma ideia de onde ela poderia estar?

– Ah... Sim – disse Rio. – Mas não se preocupe com isso. A situação está sob controle. Pode deixar que eu mesmo cuido disso.

Um momento de silêncio se instalou no outro lado da linha.

– Está bem. Depois que você tiver, hum, cuidado da situação, quer que Kade e eu passemos aí para pegar vocês? Não temos muito tempo se quisermos voltar a Boston antes de o sol nascer.

– Sim, eu preciso de uma carona – respondeu Rio. Em seguida, ele explicou onde estava. – A gente se vê em vinte minutos?

– Ei, cara.

– O quê?

– Vamos pegar apenas você ou devemos esperar companhia em nosso retorno a Boston?

Rio lançou um olhar para Dylan, observou-a enquanto ela se vestia. Ele não queria dizer adeus a ela, mas levá-la de volta para o complexo não seria a melhor coisa a fazer. Ele já a havia arrastado longe o suficiente nesta noite – primeiro bebendo de seu sangue, depois, seduzindo-a e fazendo amor com ela. Se ele a levasse de volta agora, o que poderia tentar fazer depois?

No entanto, havia uma parte dele que queria abraçá-la, que queria desesperadamente estar perto dela. Mesmo sabendo que ela poderia – e deveria – conseguir alguém melhor do que ele. Rio tinha tão pouco a oferecer a Dylan e, mesmo assim, queria poder lhe oferecer o mundo.

– Me ligue quando vocês chegarem aqui – disse a Niko. – Estarei esperando por vocês.


Capítulo 27

Dylan terminou de se vestir enquanto Rio fazia seus planos com Nikolai pelo telefone. Ele voltaria a Boston naquela noite. E, ao que parecia, Rio partiria assim que os outros guerreiros viessem buscá-lo. Vinte minutos, tinha dito. Não muito tempo.

E, até agora, não tinha ficado decidido – não tinha, de modo algum, sido esclarecido – que sequência seria dada à situação entre os dois.

Dylan disse não sentir dor, mas sentiu. Ela queria receber qualquer sinal de que o que havia acontecido entre eles naquela noite tinha algum significado também para ele. No entanto, ele permaneceu em silêncio atrás dela, naquela saleta no fundo da igreja enquanto fechou o celular e se vestiu.

– Nancy e os outros estão bem?

– Sim – disse ele de algum lugar atrás dela. – Estão todos bem. Niko e Kade não os feriram. E o processo de apagar a memória não causa dor.

– Que bom. – Ela inclinou o corpo sobre duas velas já derretidas até a metade e assoprou. Na escuridão, encontrou a coragem necessária para verbalizar a pergunta que havia pairado sobre eles durante toda a noite. – E agora, Rio? Quando você vai apagar minha memória?

Ela não escutou Rio se mover, mas sentiu a agitação no ar quando ele aproximou de suas costas aquelas mãos fortes, enormes e aquecidas, descansando-as suavemente sobre os ombros dela.

– Não quero fazer isso, Dylan. Por você, e talvez por mim, eu deveria me apagar da sua memória, mas não quero fazer isso. Acho que eu não conseguiria.

Dylan fechou os olhos enquanto processava cada uma daquelas palavras tão carregadas de afeto e ternura.

– Então... Para onde vamos agora?

Lentamente, ele a girou para olhá-la de frente. Beijou-lhe docemente a boca carnuda. Em seguida, apoiou sua testa na dela.

– Não sei. Só sei que não estou pronto para dizer adeus para você agora.

– Seus amigos devem chegar aqui em poucos minutos.

– Sim.

– Não vá com eles.

Rio inclinou o queixo e apertou seus lábios contra a testa de Dylan.

– Eu tenho que ir.

Em seu coração, mesmo antes de ele dizer, Dylan sabia que Rio tinha de retornar. O mundo dele estava na Ordem. E, apesar da marca de nascença que lhe garantia um lugar especial entre os da Raça, ela sabia que tinha de ficar com sua mãe.

Ela enterrou a bochecha no peito musculoso de Rio, escutando o ritmo forte de seu coração. Não tinha certeza se conseguiria deixá-lo ir, não sabia se conseguiria deixá-lo sair de seus braços.

– Você vem comigo de volta ao hospital? Quero vê-la mais uma vez esta noite.

– É claro – respondeu Rio, soltando-se dos braços de Dylan e segurando sua mão.

Eles deixaram o abrigo improvisado na igreja e caminharam de mãos dadas até o hospital. O horário de visita tinha acabado de chegar ao fim, mas o segurança que ficava ali na porta parecia acostumado a fazer exceções para familiares de pacientes internados na ala de oncologia, de modo que acompanhou Dylan e Rio até o elevador que os levaria ao décimo andar.

Rio esperou do lado de fora do quarto enquanto Dylan colocava as luvas e abria a porta. Sharon estava dormindo, então Dylan sentou-se na cadeira ao lado da cama e só ficou ali, observando sua mãe respirar.

Havia tanto que Dylan queria dizer àquela mulher, especialmente a experiência de ter conhecido um homem extraordinário. Que estava empolgada e amedrontada e cheia de uma esperança desesperada por conta de tudo que o futuro poderia reservar para ela ao lado do homem que a aguardava do lado de fora do quarto.

Dylan queria que sua mãe soubesse que ela estava se apaixonando loucamente por Eleuterio de la Noche Atanacio – um homem completamente diferente de todos aqueles que ela conhecera antes.

Mas Dylan não podia dizer isso. Havia segredos que tinham de ser guardados, pelo menos por enquanto.

Para sempre, talvez.

Ela estendeu a mão e acariciou os cabelos da mãe, puxou cuidadosamente a manta que a cobria até abaixo do queixo. Ah, como Dylan desejava que sua mãe tivesse conhecido o amor verdadeiro e profundo em sua vida... Parecia tão injusto o fato de ela ter feito tantas escolhas ruins, amado tantos homens ruins, quando, na verdade, Sharon merecia alguém decente e bom.

– Ah, mamãe... – sussurrou Dylan. – Isso é tão, tão injusto.

As lágrimas caíram de seus olhos. Talvez ela tivesse passado toda uma vida sem chorar preparando-se para aquele momento, mas agora era impossível conter o pranto. Dylan até tentava secar as lágrimas, mas era inútil: elas continuavam derramando-se copiosamente. Lágrimas demais para que pudesse secar com aquelas mãos cobertas pelas luvas de látex. Ela se levantou para pegar um lenço da caixa na bandeja com rodinhas ao lado da cama de sua mãe. Enquanto secava os olhos, percebeu que havia um pacote com um laço na mesa do outro lado do pequeno quarto. Foi até lá e viu que eram chocolates. A caixa estava fechada, e a julgar pela aparência, parecia ser algo consideravelmente caro. Curiosa, Dylan pegou o pequeno cartão branco enfiado sob a fita de cetim.

Leu: Para Sharon. Volte logo para mim. Seu G. F.

Dylan pensou por um instante naquelas iniciais e percebeu que elas representavam o nome do dono do abrigo, o senhor Fasso. Gordon, como sua mãe o chamara mais cedo. Ele devia ter vindo visitá-la depois que Dylan tinha saído. E a mensagem no cartão parecia um pouco mais íntima do que os desejos de melhoras que uma pessoa receberia de seu chefe...

Meu Deus, será que ali havia algo mais do que as muitas paixões desastrosas de sua mãe?

Dylan não sabia se sorria de felicidade ou se chorava ainda mais com a ideia de sua mãe poder ter finalmente encontrado um homem decente. É claro que Dylan não conhecia Gordon Fasso, exceto por sua reputação de homem de negócios rico, caridoso, e, de certa forma, excêntrico. Mas, a julgar pelo gosto de sua mãe quando o assunto era homens, ela sabia que a mãe já tinha feito escolhas muito piores.

Ela não pode me ouvir.

Dylan ficou paralisada ao ouvir repentinamente uma voz feminina no quarto.

Não era a voz de sua mãe.

Não era, de forma alguma, uma voz terrena, Dylan se deu conta uma fração de segundo antes de processar o sussurro carregado de estática. Então, virou-se e viu o espírito de uma mulher jovem.

Tentei contar para ela, mas ela não consegue me ouvir. Você consegue... me ouvir?

Os lábios do fantasma não se moviam, mas Dylan a ouvia tão claramente quanto todos os outros espectros que seu dom de Companheira de Raça lhe permitia ver. O espírito carregava o rosto entristecido de uma garota morta que parecia não ter mais do que vinte anos.

Dylan percebeu uma semelhança distante com alguém ao ver as roupas góticas e as tranças que caíam pelos ombros da garota. Elas já tinham se visto no abrigo. A garota era Toni, uma das preferidas de Sharon. A garota nunca apareceu no emprego que a mãe de Dylan tinha lhe arrumado. Sharon estava muito decepcionada quando contou para Dylan que tinha perdido Toni para as ruas. Agora, aqui, a pobre garota estava finalmente fazendo contato, mas diretamente do além-túmulo. E estava longe demais para que alguém pudesse ajudá-la.

Então, por que ela estava tentando se comunicar com Dylan?

Em ocasiões passadas, talvez ela tivesse tentado ignorar a aparição, ou negar sua habilidade de enxergá-la. Mas agora, não. Agora, não mais. Dylan assentiu quando o fantasma perguntou outra vez se suas palavras estavam sendo ouvidas.

É tarde demais para mim, disse, ainda sem mover os lábios. Mas não para elas. Elas precisam de você.

– Precisam de mim para quê? – perguntou Dylan silenciosamente, mesmo sabendo que sua voz nunca chegariam ao outro lado. – Quem precisa de mim?

Existem outras como eu... suas irmãs.

A jovem inclinou a cabeça, mostrando a parte inferior de seu queixo. Em sua pele delgada e etérea estava a marca de nascença que Dylan conhecia tão bem.

– Você é uma Companheira de Raça! – disse Dylan, agora boquiaberta.

Merda!

Será que todas elas eram Companheiras de Raça? Todos os fantasmas que Dylan tinha visto eram mulheres, sempre jovens, sempre com aparência saudável. Teriam todas elas nascido com a mesma lua crescente e a lágrima que ela tinha?

É tarde demais para mim, disse o fantasma de Toni.

Suas formas começavam a se dividir, acendendo-se e apagando-se como um holograma enfraquecido. Toni estava ficando cada vez mais transparente, um pouco mais fraca do que o crepitar da eletricidade no ar. Agora, sua voz era mais fraca do que um sussurro, e tornava-se mais fraca conforme sua imagem dissolvia-se e desaparecia.

Mas Dylan escutou o que Toni disse, e aquelas palavras fizeram-na congelar: Não deixe ele matar mais nenhuma de nós...

 

O rosto de Dylan estava pálido quando ela saiu do quarto de sua mãe.

– O que aconteceu? Ela está bem? – perguntou Rio com o coração apertado só de pensar que Dylan talvez tivesse de enfrentar sozinha a perda da mãe. – Alguma coisa...

Dylan negou com a cabeça:

– Não, minha mãe está bem. Ela está dormindo. Mas uma... Ah, meu Deus, Rio... – Ela baixou a voz e o levou a um canto isolado no corredor. – Acabei de ver o fantasma de uma Companheira de Raça.

– Onde?

– No quarto de minha mãe. A garota era uma das refugiadas do abrigo, uma garota que ficou bem próxima de minha mãe, mas que acabou desaparecendo recentemente. Ela se chamava Toni, e ela... – Dylan se conteve, envolvendo-se com os braços. – Rio, ela me disse que foi assassinada, e que não está sozinha. Disse que há outras como ela. Toni me mostrou a marca de Companheira de Raça e me pediu para não deixar outras das minhas irmãs serem assassinadas também.

Meu... Deus!

O pavor fez o estômago de Rio virar enquanto Dylan transmitia a mensagem de advertência vinda do outro mundo. Ele instantaneamente pensou no filho corrupto de Dragos, e na possibilidade de aquele maldito ter libertado o Antigo da cripta, exatamente como a Ordem temia. Ele podia estar fazendo a criatura se reproduzir naquele exato momento, criando vários novos vampiros de Primeira Geração usando para isso várias mulheres, várias Companheiras de Raça.

Pelo amor de Deus, o filho de Dragos podia estar sequestrando Companheiras de Raça em todos os cantos do mundo para fazer exatamente isso!

– Ela disse “não deixe ele matar mais nenhuma de nós”, como se eu também estivesse em perigo.

A pele de Rio se apertou com aquele agouro.

– Você tem certeza de que foi isso que viu? De que foi isso que escutou?

– Sim.

– Me mostre. – Ele deu um passo na direção do quarto. – Preciso ver com meus próprios olhos. O fantasma ainda está lá dentro?

Dylan negou com a cabeça:

– Não, ela já se foi. As aparições são como uma espécie de névoa... Não ficam visíveis por muito tempo.

– Você perguntou para ela onde as outras poderiam estar, ou quem fez isso com ela?

– Não. Infelizmente as coisas não funcionam assim. Elas conseguem falar, mas não acho que conseguem me ouvir. Eu já tentei, mas nunca dá certo. – Dylan o observou fixamente por um longo instante. – Rio, acredito que todas essas visitas que eu recebi em minha vida, desde a primeira, quando eu ainda era criança, são espíritos de Companheiras de Raça que morreram. Sempre achei estranho o fato de eu só ver mulheres, mulheres jovens que deviam ter plena saúde. Quando vi a marca sob o queixo de Toni, tudo fez sentido para mim. Rio, agora eu entendo... Eu acho que estou começando a entender tudo agora. Todas elas são – eram – Companheiras de Raça.


Rio passou uma mão por seus cabelos, deixando palavras afiadas passarem por seus dentes:

– Preciso ligar para Boston e informá-los sobre isso.

Dylan assentiu, olhando-o fixamente nos olhos. Quando finalmente falou, sua voz estava bastante instável:

– Rio, estou com medo.

Ele a puxou para perto, sabendo quanto era difícil para ela admitir aquilo, até mesmo para ele.

– Não tenha medo. Eu vou protegê-la. Mas não posso deixar você aqui esta noite, Dylan. Você vai voltar comigo para o complexo.

Ela franziu a testa:

– Mas minha mãe...

– Se puder ajudar sua mãe, também vou ajudá-la – disse ele, agora disposto a fazer tudo o que fosse necessário, tudo o que estivesse ao seu alcance, para proteger aquela mulher. – Mas primeiro preciso garantir a sua segurança.

Os olhos de Dylan estavam suplicantes quando ela finalmente assentiu de forma bastante rápida com a cabeça:

– Está bem, Rio. Voltarei para Boston com você.


Capítulo 28

Rio não induziu Dylan ao estado de transe no caminho de volta para Boston.

Apesar dos olhares tortos de Nikolai e de Kade nos bancos da frente do SUV, que sugeriam que ele era um idiota por não cumprir aquele protocolo, Rio não podia tratar Dylan com nada diferente da confiança total. Ele sabia que estava apostando todas as suas fichas no fato de que ela poderia saber a localização da sede da Ordem, muito embora ele não estivesse certo de quanto tempo, ou em que condições, ela ficaria com ele lá. Mesmo assim, ele confiava nela.

Caramba! Mais do que isso, ele estava totalmente seguro de que a amava.

No entanto, ele guardou isso consigo, e via que Dylan estava claramente ansiosa por ter deixado sua mãe sozinha em Nova York. A cada quilômetro que eles se aproximavam de Boston, ele sentia o coração dela bater um pouco mais rápido. Ele não precisaria ter um laço de sangue com ela para sentir a indecisão vibrar naquele corpo enquanto ela descansava silenciosamente em seus braços no banco traseiro. O olhar de Dylan estava fixo na mancha formada pela paisagem que passava.

Ela não queria estar ali.

Rio não duvidava de que ela sentisse certa afeição por ele. Depois daquela noite, ele sabia que ela sentia. E ele tinha de acreditar que, em circunstâncias diferentes, ela não sentiria tanta vontade de deixar aquele veículo e voltar correndo para Nova York.

– Ei – ele murmurou no ouvido dela enquanto Niko avançava com a Rover pelo caminho do portão do complexo. – Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem?

Ela lhe ofereceu um leve sorriso, mas seus olhos estavam tristes.

– Só me abrace, Rio.

Ele a abraçou ainda mais apertado e encostou seus lábios sobre os dela; um beijo suave.

– Não vou deixar que nada de ruim aconteça. Eu prometo.

Rio não sabia exatamente como poderia manter uma promessa tão grande como aquela, mas, vendo a esperança nos olhos de Dylan quando ela inclinou a cabeça para cima... Caramba! Ele transformaria aquela promessa em sua missão de vida, independente do quanto isso lhe custasse.

O SUV continuou em movimento e seguiu em direção à garagem segura da Ordem. Rio detestou ter de soltar Dylan quando o carro finalmente estacionou.

– Lar, doce lar – disse Kade arrastando as palavras, abrindo a porta do passageiro e pulando para fora do veículo.

Nikolai virou o rosto para trás e lançou um olhar para Rio.

– Nós vamos direto para o laboratório. Devemos dizer a Lucan e aos outros que você estará por lá em breve?

Rio assentiu.

– Sim, eu vou logo depois. Me dê dez minutos.

– Tudo bem – Niko olhou para Dylan. – Escute, eu realmente sinto muito por sua mãe. Deve ser difícil, não é? Não tenho palavras, sabe?

– Eu sei – ela murmurou. – Mas obrigada, Nikolai.

Niko manteve-se olhando nos olhos de Dylan por um instante. Em seguida, bateu a mão no encosto do assento.


– Está bem. A gente se vê lá embaixo, meu amigo.

– Diga a Lucan que irei com Dylan à reunião.

Dylan e Niko lançaram um olhar de surpresa na direção de Rio. Do lado de fora da Rover, Kade disse algumas palavras irônicas e começou a rir baixinho, como se Rio tivesse perdido a cabeça.

– Você quer levar uma civil a uma reunião com Lucan? – disse Niko. – Uma civil que ele esperava que você tivesse apagado a memória esta noite, como ele disse para fazer.

– Dylan viu uma coisa esta noite – disse Rio. – Acredito que a Ordem deveria escutar o que ela tem a dizer.

Nikolai considerou em silêncio por um longo instante o que Rio tinha dito. Em seguida, assentiu, como se pudesse ver que Rio não mudaria de opinião. Rio percebeu que seu velho amigo tinha notado que Dylan não era uma mera civil, ou que aquela tinha sido uma missão que Rio não tinha conseguido executar. Rio podia perceber no brilho, azul como o inverno, dos olhos do guerreiro que Niko tinha entendido o quanto Dylan tinha se tornado importante para ele. Ele havia entendido e, a julgar pelo belo sorriso que se formava no canto de sua boca, ele aprovava.

– Que merda, cara. Sim. Vou dizer para ele o que você me pediu.

Enquanto Niko e Kade seguiam juntos para o elevador do complexo, Rio e Dylan saíram do SUV e, alguns minutos mais tarde, seguiram o mesmo caminho. De mãos dadas, os dois tomaram o elevador e desceram os mais de noventa metros para, finalmente, chegarem à sede da Ordem.

Era estranho caminhar pelo labirinto de corredores seguros e não se sentir como ele se sentia durante os longos meses que se seguiram à explosão: uma besta abandonada que vaga em seu território sem um destino ou um propósito.

Agora, ele tinha ambos. E tudo podia ser resumido em uma palavra: Dylan.

– Você vai se sentir confortável falando sobre o que você viu no quarto daquele hospital esta noite? – perguntou Rio enquanto eles caminhavam pelo corredor. – Porque, se preferir não falar, posso falar por...

– Não. Tudo bem. Se você achar que posso ajudar, quero ajudar.

Ele a parou na longa extensão do corredor coberto de mármore, não longe das paredes de vidro do laboratório de tecnologia onde seus irmãos da Raça estariam esperando.

– Dylan, o que você fez por mim esta noite... Me dar o seu sangue, ficar comigo quando tinha todo o direito de ir embora sem nunca olhar para trás... tudo o que aconteceu entre nós... Quero que você saiba que isso significou muito para mim. Eu estou...

Ele queria lhe dizer que estava se apaixonando por ela, mas não dizia essas palavras há tanto tempo... Achou que nunca mais as diria com sinceridade, imagine então com essa sinceridade profunda e brutal com a qual ele queria dizê-las agora. Ele tropeçou em seus pensamentos e aquela pausa desconfortável fez o abismo parecer ainda maior.

– Eu estou... agradecido – limitou-se a dizer, optando por expressar a outra emoção que lhe enchia o coração quando ele a olhava. – Não sei se algum dia vou poder lhe retribuir tudo o que você me deu esta noite.

Um pouco da luz dos olhos de Dylan parecia se apagar enquanto ela o ouvia.

– Você acha mesmo que eu pediria algo em troca? – ela negou suavemente com a cabeça. – Sin problemas. Você não me deve nada, Rio.

Ele começou a dizer mais alguma coisa... outra tentativa de tentar dizer o que ela significava para ele. Mas Dylan já estava andando na frente dele.

– Droga! – ele sussurrou, correndo a mão pelos cabelos. Em seguida, ele a alcançou alguns passos à frente no corredor, exatamente no momento em que ouviu a voz de Lucan explodir através do vidro que cercava o laboratório de tecnologia.

– Que merda ele quis dizer com essa história de trazer aquela mulher com ele? É melhor ele ter um motivo muito bom para ter trazido essa jornalista de volta para a Ordem.


Qualquer irritação que Dylan tivesse sentido por Rio devido a sua educada gratidão foi substituída pelo temor que correu frio em suas veias por conta daquela demonstração de fúria do líder da Ordem. Ela não queria pensar que necessitava ser protegida por Rio, mas a única coisa que fez seus joelhos não cederem foi a presença daquela enorme mão na parte inferior de suas costas enquanto eles entravam na sala de reuniões ocupada por oito homens grandes e carrancudos, por oito guerreiros vampiros vestidos para o combate.

Os olhos de Dylan analisaram rapidamente a ameaça que estava diante dela: Lucan, o vampiro com cabelos negros que estava no comando, era óbvio. Ele tinha estado com Rio mais cedo hoje, dando instruções claras de que ela deveria ser levada de volta para a casa dela e que sua mente (assim como a de sua mãe, de seu chefe e de suas amigas) deveriam ser apagadas.

Ao lado de Lucan, em um impressionante centro de comando com mais de meia dúzia de computadores e duas vezes mais monitores, estava um vampiro da Raça com cabelos loiros que pareciam terem sido colocados de modo totalmente anárquico sobre sua cabeça. Ele lançou um olhar para Dylan por sobre seus óculos finos e retangulares, com lentes de um azul pálido como o céu. De todos os guerreiros ali reunidos, aquele parecia ser o menos ameaçador, muito embora tivesse facilmente mais do que um metro e oitenta de altura e um corpo tão em forma e musculoso quanto o dos demais.

– Esta é Dylan Alexander – anunciou Rio para o grupo. – Tenho certeza de que, a essa altura, todos vocês já ouviram sobre o que aconteceu em Jicín, sobre a caverna e as fotos que Dylan tirou do que havia lá dentro.

Lucan cruzou os braços sobre o peito musculoso e bem desenhado.

– O que eu gostaria de saber é por que você parece ter ignorado as instruções da missão e trouxe essa mulher de volta com você esta noite. Ela pode ser uma Companheira de Raça, mas é uma civil, Rio. Uma civil que tem contatos na mídia, caramba!

– Não mais – intrometeu-se Dylan, falando antes que Rio se visse forçado a defendê-la. – Meu contato com a mídia já era. E, mesmo se eu não o tivesse perdido, vocês têm minha palavra de que jamais divulgaria premeditadamente qualquer coisa que sei ao mundo lá fora. Se eu pudesse voltar no tempo, jamais teria tirado aquelas fotos ou escrito aquela matéria. Eu realmente sinto muito por qualquer coisa que eu possa ter feito e colocado a Raça sob o risco de ser exposta.

Se eles acreditaram no que ela disse, nenhum mostrou qualquer sinal disso. Os demais membros da Ordem sentados em uma enorme mesa de conferências olhavam-na como um júri avaliando um condenado. Niko e Kade estavam lá, sentados ao lado de um guerreiro negro com crânio e ombros mais largos do que os de um zagueiro de futebol americano. No entanto, se aquele cara parecia ameaçador, o que estava do outro lado da mesa intimidava ainda mais. Com cabelos acobreados na altura dos ombros e olhos verdes e atentos, o guerreiro parecia já ter (e provavelmente já tinha) visto de tudo... e um pouco mais.

Ele olhou Dylan com olhos estreitos e atentos, assim como o fizeram os demais homens na sala – um guerreiro com aparência de arrogante polia um par de adagas curvadas – um tipo militar, com cabelos raspados, queixo e maçã do rosto bem esculpidos e olhos azuis sombrios.

Rio passou o braço pelos ombros de Dylan – um abraço leve que a fez sentir-se segura, como se não estivesse sozinha diante daquele grupo perigoso de guerreiros treinados para o combate. Rio lhe deu apoio, talvez seu único aliado naquela sala.

Ele confiava nela. Dylan conseguia sentir essa confiança no calor do corpo de Rio e no modo carinhoso com que ele olhava para ela enquanto falava com seus irmãos.

– Todos estão cientes do que Dylan encontrou na caverna oculta na montanha, mas vocês não ouviram como exatamente ela encontrou aquilo. – Rio limpou a garganta. – Foi Eva quem lhe mostrou o caminho.

Suspiros de incredulidade – e também de clara hostilidade – espalharam-se pela sala. Mas foi a voz de Lucan que se elevou acima de tudo:

– Agora você está nos dizendo que essa mulher está de alguma forma ligada com aquela vadia traidora? Como isso é possível, se Eva está nos quintos dos infernos há um ano?

– Dylan viu o fantasma de Eva naquele dia na montanha – explicou Rio. – Essa é a habilidade especial de Dylan, ver e ouvir os mortos. Eva apareceu para ela e a guiou até mim, na caverna.

Dylan assistiu aos guerreiros absorverem a notícia. Ela podia ver em cada uma daquelas expressões duras que Eva não tinha nenhum amigo por ali. E isso não a impressionava, considerando o que Eva tinha feito a Rio. O que tinha feito a todos eles com aquela traição.

– Esta noite, Dylan viu outra mulher morta – continuou Rio. – Na verdade, ela viu outra Companheira de Raça. Dessa vez, a aparição veio no quarto do hospital onde está a mãe de Dylan. A garota morta disse algo que acredito que vocês devam escutar.

Ele se virou para Dylan e assentiu, para que ela continuasse a explicação. Dylan ficou séria e repetiu cuidadosamente tudo o que o espírito de Toni lhe havia dito, linha por linha, recordando cada palavra para tentar ajudá-los a entender o aviso vindo do outro lado.

– Jesus Cristo! – exclamou o guerreiro sentado diante dos computadores quando Dylan terminou de falar. Ele passou os dedos pelos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. – Rio, me recorde sobre o que você disse outro dia sobre alguém talvez estar criando outra população de vampiros da primeira geração da Raça?

Rio assentiu. O olhar sombrio em seu rosto fez a espinha de Dylan gelar.

– Se o Antigo tiver sido despertado corretamente de sua hibernação, quem nos garante que ele não está procriando? Ou que já tenha procriado?

Enquanto Dylan os ouvia falar, as peças de um quebra-cabeça que ela vinha montando durante os últimos dias, desde que pisara naquela caverna, agora se juntavam em sua mente. A cripta escondida tinha, lá dentro, uma tumba aberta. Havia aqueles símbolos estranhos nas paredes. O inconfundível sentimento do mal que saturava o ar naquele lugar escuro, muito embora seu ocupante verdadeiro tivesse desaparecido...

A caverna era um tanque de armazenamento – uma câmara de hibernação, como Rio inadvertidamente tinha lhe dito. E a criatura perigosa que dormia lá dentro agora estava solta em algum lugar.

Reproduzindo-se.

Assassinando.

Ah, Deus!

Do outro lado da enorme mesa, Nikolai franziu a testa em direção a Rio.

– Com o último desses alienígenas selvagens de volta à procriação, a pergunta que fica é há quanto tempo isso está sendo feito.

– E com quantas Companheiras de Raça – acrescentou Lucan com uma voz bastante sóbria. – Se realmente tivermos um cenário em que as Companheiras de Raça estão sendo sequestradas e mantidas em algum lugar, e, pelo menos em alguns casos, assassinadas, então eu não quero nem pensar onde isso tudo pode parar. Gideon, faça uma verificação nos arquivos do Refúgio Secreto para ver se há algum registro de Companheira de Raça desaparecida nos últimos dez anos.

– É pra já – respondeu Gideon, golpeando o teclado, reunindo o que parecia ser múltiplas buscas em múltiplos computadores.

O guerreiro na mesa de conferências, que parecia ter saído de um filme de guerra, foi o próximo a falar:

– Bem, pode parecer um milagre, mas o diretor regional da Agência concordou em fazer uma reunião esta noite. Querem que eu mencione essa notícia da morte das Companheiras de Raça para o diretor Starkn?

Lucan pareceu considerar a ideia. Então, negou vagamente com a cabeça:

– Vamos esperar um pouco, Chase. Ainda não sabemos o que exatamente estamos procurando e acabaremos causando muito furor quando dissermos que achamos que os poucos Primeira Geração existentes estão sendo alvo de assassinatos.

Chase concordou.

Quando os membros do grupo começaram a conversar entre si, Lucan foi falar com Rio e Dylan em particular.

– Agradeço pela informação – ele disse a ela. – Mas, por mais valiosa que ela possa provar ser, este complexo não é lugar para civis – ele olhou para Rio. Aqueles olhos acinzentados o estudavam atentamente. – Ela teve uma escolha e tomou sua decisão. Você sabe que não podemos permitir que ela fique aqui. Não como civil.

– Sim – disse Rio. – Eu sei.

Lucan esperou, claramente percebendo que algo íntimo havia acontecido entre os dois. Então, limpou a garganta e disse:

– Então, se você tiver algo a me dizer, meu caro...

Durante o longo silêncio que serviu como resposta, Dylan inconscientemente segurou a respiração. Ela não sabia o que esperava que Rio dissesse: Que ele estava preparado para desafiar a regra expressada por Lucan? Que a amava e que lutaria para ficar ao seu lado, independentemente do que o resto da Ordem pensasse dela?

No entanto, ele não disse nada desse tipo.

– Preciso falar com Dante. – Foi o que ele disse a Lucan. – E preciso falar com Tess. Há algo muito importante que preciso pedir para ela.

Lucan o estudou com os olhos estreitos.

– Você sabe o que eu espero, Rio. Avise-me se alguma coisa mudar.

– Sim – respondeu Rio.

Quando Lucan deu meia-volta e caminhou para conversar com Gideon, Rio levantou o queixo de Dylan com a mão.

– Prometi que ia tentar ajudar a sua mãe – ele a lembrou com uma voz suave. Quando Dylan assentiu, ele continuou:

– Não sei se isso pode ser feito, mas antes de conversarmos sobre eu e você, essa pergunta precisa ser respondida. Sei que não posso pedir para você ficar comigo quando você claramente sente uma vontade quase dolorida de estar perto da sua família. Eu não lhe pediria isso.

A esperança se acendeu no peito de Dylan:

– Mas você... quer me pedir para ficar em sua companhia?

Rio acariciou a bochecha de Dylan, empurrando delicadamente os cabelos dela para trás da orelha.

– Meu deus, como quero! Eu quero isso, Dylan. Quero muito.

Rio abaixou a cabeça e a beijou, bem ali, na frente dos outros guerreiros. Um beijo breve, mas tão, tão doce... Quando ele se afastou, Dylan sentiu os olhos dos membros da Ordem sobre ela... sobre eles. Mas eram os olhos de Rio que a mantinham enfeitiçada. Eles estavam aquecidos com desejo e afeto. As enormes íris brilhavam como faíscas de luz âmbar.

– Deixe-me levá-la de volta para os meus aposentos e arrumar algo para você comer. Preciso conversar com Dante e Tess, mas não vou demorar.


Capítulo 29

Os aposentos de Rio estavam tranquilos quando ele voltou para lá, alguns minutos depois. Ele ainda conseguia sentir o cheiro das outras Companheiras de Raça que tinham estado ali não muito tempo atrás para trazer comida e fazer companhia para Dylan, mas foi a essência de pinho e mel que o fez caminhar pelos cômodos vazios em direção à suíte. O chuveiro estava ligado no banheiro ao lado, e Rio não precisou de muito para imaginar a água quente lavando o belo corpo de Dylan. Aproximou-se da porta aberta e descobriu que a imagem real era ainda melhor do que a criada pela sua imaginação.

Dylan estava debaixo da enorme ducha, com as mãos apoiadas nos azulejos e as costas arqueadas graciosamente para receber as pancadas de água. Seu queixo estava inclinado para trás; seus olhos, fechados. Seus cabelos flamejantes estavam ensopados, com uma cor que parecia uma mistura de cobre escuro e dourado, caindo contra aquela pele macia e molhada enquanto ela passava o condicionador até as pontas dos fios.

A espuma, branca e cremosa, corria-lhe pelas costas sensuais... Meu Deus, e continuava descendo, até a fenda formada por seus glúteos. E depois por suas pernas longas e finas.

Rio passou a língua languidamente pelos lábios, sua boca de repente secou. Sentiu a dor em suas presas, cada vez maiores, e o latejar imediato em seu pênis cada vez maior e mais rijo conforme a fome por aquela mulher crescia.

Sua mulher, disse a si em um impulso totalmente masculino, totalmente da Raça.

Ele a queria. Ele a desejava, molhada e quente debaixo dele. E pensou que não conseguiria esperar muito para tê-la.

Rio deve ter feito algum barulho, pois a cabeça de Dylan virou-se diretamente para ele. Os olhos dela se abriram de repente e, em seguida, ela sorriu para ele através do vidro... um sorriso lento e sedutor que o levou a desejar estar nu naquele momento, pronto para estar debaixo da água com ela.

No entanto, fazer amor na escuridão de uma saleta de igreja era muito diferente que fazer amor frente a frente, corpo a corpo, na luz clara e amarelada e no espaço coberto por espelhos em que eles estavam agora. Aqui, não havia nenhum lugar onde ele pudesse se esconder. Dylan o veria por inteiro, veria todas as cicatrizes que ela talvez não tivesse conseguido enxergar enquanto eles estavam no escuro, horas atrás.

A vergonha fez Rio querer apagar todas as luzes do teto. Ele lançou um olhar irritado para cima, mas a voz de Dylan o levou a desviar seus pensamentos.

– Rio... Venha aqui comigo.

Madre de Dios! O som daquele convite, feito com uma voz rouca, era quase suficiente para desviar completamente os pensamentos dele... Exceto o raciocínio necessário para tirar a roupa e fazer o que ela estava mandando, entregar-lhe o que ela estava pedindo.

Os olhares se encontraram através do vidro na porta do box. Os olhos de Rio agora ostentavam pálpebras pesadas e certamente estavam sendo invadidos pelo âmbar que transformava suas pupilas em finas linhas negras.

– Quero você aqui comigo – disse Dylan. Ela continuava olhando para ele enquanto corria as palmas de suas mãos por sua barriga formosa e sobre seus seios volumosos. – Venha aqui comigo... Quero sentir suas mãos em mim... em todo o meu corpo.

Santo... Deus!

A mandíbula de Rio se contraiu com tanta força que ele quase sentiu seus molares quebrarem. Era tão difícil duvidar de si ou sentir vergonha quando a única mulher que ele queria – a mulher que queria mais do que quisera qualquer coisa antes – olhava-o como se quisesse devorá-lo.

Rio tirou os sapatos e as meias. Depois, tirou a camisa, as calças e a cueca. Ele ficou ali, parado, nu, seu grande e espesso pênis totalmente ereto, seus dermoglifos pulsando com todas as cores em consequência de seu desejo. Com as mãos fechadas na lateral do corpo, ele deixou Dylan observá-lo demoradamente. Aquilo era excruciante – aqueles primeiros segundos enquanto os olhos dela desciam por seu corpo e o analisavam.

Ele sabia que ela o estava vendo. Demônios! Ele mesmo conseguia ver: seu torso destruído, com aquela pele brilhante e retorcida em alguns pontos e grosseira em outros, onde ele ainda carregava estilhaços enterrados a várias camadas sob sua pele. E, mais para baixo, estava a enorme cicatriz vermelha que corria pela extensão de sua coxa esquerda, uma ferida que quase lhe custara toda a perna.

Dylan estava vendo toda aquela feiura agora.

Ele esperou até que o olhar dela se levantasse. Esperou encontrar a pena estampada naquele rosto. Temia encontrar repulsa.

– Rio – ela murmurou com uma voz profunda.

Dylan ergueu a cabeça lentamente, e seus olhos se encontraram com os dele. Aqueles olhos esverdeados ostentavam a cor de uma floresta durante a noite; as pupilas, dilatadas sob as enormes franjas formadas pelos cílios. Não havia sinal de pena. Não havia nada que não fosse um desejo intenso e inteiramente feminino. O desejo de uma mulher por um homem.

Rio queria deixar sua cabeça cair para trás e gritar aliviado, mas ver os lábios de Dylan, aqueles olhos famintos que o consumiam tão brutalmente, roubou sua voz.

Ela abriu a porta de vidro do box.

– Entre aqui – convidou com uma boca curvada que estampava o mais sexy dos sorrisos. – Entre aqui... agora.

Ele sorriu e atendeu ao pedido, unindo-se a ela sob a água quente.

– Assim é melhor – Dylan ronronou enquanto o envolvia em seus braços e o fazia mergulhar em um beijo profundo e molhado.

Ela se sentia tão bem com ele, contra aquela pele quente, contra todas aquelas curvas deliciosas. Rio a abraçou mais apertado, enterrando seus dedos naqueles cabelos molhados, sentindo o calor do palpitar no corpo de Dylan enquanto os pulsos dele descansavam contra o pescoço macio dela.

– Quero sentir o seu sabor – disse ela, já deixando a boca dele descer por seu pescoço e, em seguida, pela linha dos ombros. Dylan continuou deslizando seu rosto mais abaixo, brincando com a língua naquele tórax musculoso, provocando os mamilos daquele homem forte. – Seu gosto é uma delícia, Rio. Eu poderia devorar você.

Ele gemia enquanto ela deixava sua boca passear pelo tórax, dando algumas mordiscadas pelo caminho. Seus beijos se tornaram menos acelerados quando ela partiu para a lateral marcada por cicatrizes.

Rio segurou a respiração.

– Não – murmurou enquanto um pânico desajeitado tomou conta de seu corpo, quando ele percebeu que ela estava se aproximando daquelas marcas asquerosas. Dylan olhou para Rio, confusa, e ele queria morrer de vergonha. – Tudo bem, você não precisa...

– Você sente dor se eu tocar? – ela perguntou suavemente enquanto seus dedos deslizavam com cuidado sobre a pele arruinada. – Você sente dor, Rio?

Ele conseguiu negar ligeiramente com a cabeça.

Não doía. O pouco que ele conseguia sentir com aqueles toques nas terminações nervosas arruinadas e nas cicatrizes era bom.

Cristo en cielo. Como era bom ser tocado pela boca macia de Dylan.

– Isso dói? – ela perguntou, dando o mais leve e carinhoso beijo na parte mais feia do corpo dele. – O que você sente, Rio?

– É gostoso – ele ofegou. Sua garganta se tornava cada vez mais apertada, não apenas por causa daquele prazer maravilhoso que era ter a boca de Dylan em seu corpo. Aquele presente carinhoso – aquele beijo doce de aceitação – tocou-o tão profundamente a ponto de fazê-lo esquecer-se de que havia muito tempo que se sentia morto – Dylan... Você é... Nossa! Você é a mulher mais incrível que conheci. Estou dizendo isso sinceramente.

Ela abriu um sorriso, agora radiante.

– Bem, então se prepare, porque estou apenas começando.

Ajoelhada, Dylan beijou a pélvis e as coxas de Rio, lambeu as linhas de água que escorriam pelo corpo dele. A cada movimento da boca perto do pênis, ele ficava mais e mais ereto, mais e mais rígido. Quando ela o segurou em suas mãos pequenas e molhadas, Rio achou que fosse gozar.

– Você gosta? – ela perguntou enquanto o acariciava desde os testículos até a cabeça de seu pênis com movimentos repetidos e deliciosamente delicados. O ar sacana nos olhos de Dylan dizia a Rio que ela sabia exatamente como ele devia estar se sentindo.

Ótimo, pois ele era incapaz de falar enquanto ela lançava uma atenção tão lenta e rítmica para ele.

E, se aquilo não fosse bom o suficiente, a língua de Dylan também entrou na festa. Ela a deslizou por aquela espada e, então, envolveu a cabeça do membro com os lábios e começou a sugá-lo, levando-o mais e mais profundamente em sua boca.

Rio deixou escapar um gemido rouco, já que isso era tudo que ele podia fazer para manter o equilíbrio enquanto ela engolia ainda mais dele. Ele estremeceu enquanto ela passava a língua pela parte inferior de seu pênis, aquela boca que subia e descia, aumentando a pressão que já se formava na base da coluna de Rio. Um orgasmo selvagem e intenso estava prestes a explodir pelo pênis de Rio.

Ah, caramba! Se ele não a fizesse parar ele iria...

Com um grunhido animalesco, Dylan deixou o enorme pênis palpitante.

– Agora é minha vez – disse Rio com uma voz profunda, quase de outro mundo.

Ela ofegou quando ele a pressionou contra os azulejos e a beijou com o mesmo tormento que ela o tinha beijado. Ele desceu com a boca pelo pescoço e entre os seios, onde o palpitar forte do coração dançou contra a língua dele. Então, beijou aqueles mamilos perfeitamente rosados, usando levemente apenas a ponta de suas presas para mordiscá-la conforme descia até o umbigo e, então, até a bela curva do quadril.

– Você também tem um gosto delicioso – disse-lhe com uma voz forte, deixando que ela visse completamente as presas. Os olhos de Dylan se arregalaram, mas não de medo. O guerreiro a ouviu inspirar profundamente quando ele inclinou a cabeça e sorveu suavemente entre suas coxas. – Hummm – ele gemeu contra aquela pele macia. – Você é muito, muito deliciosa.

Ela gritou ao sentir a primeira pressão da boca de Rio contra seu sexo quente e úmido. Então, derreteu-se em gemidos lentos e abafados conforme aquela língua deslizava pelas curvas suaves de sua vagina. Ele era implacável, querendo ouvi-la gritar por conta do prazer que estava causando. Afundou-se ainda mais entre aquelas coxas suaves, deixando que Dylan segurasse fortemente seus cabelos e o puxasse para mais perto, trêmula enquanto ele a conduzia ao orgasmo.

– Ah, meu Deus! – ela sussurrou entre os dentes. Sua respiração era trêmula. – Ahh, isso, Rio! Assim!

Ela disse seu nome outra vez. Não apenas o apelido pelo qual todos o chamavam, mas seu verdadeiro nome. Aquele nome que soava tão certo nos lábios dela. Dylan gritou o nome de Rio quando o orgasmo tomou conta do seu corpo – e aquilo foi a coisa mais linda que ele tinha visto na vida.

Rio queria abraçá-la, mas sua necessidade era grande demais agora. Seu pênis estava a ponto de explodir, e ele queria estar dentro dela – precisava estar dentro dela, da mesma forma que precisava de ar e sangue para viver. Levantou-se e afastou os cabelos molhados de seu rosto.

– Vire-se – ofegou. – Coloque suas mãos nos azulejos e incline as costas, como você estava quando eu cheguei aqui.

Com um sorriso de prazer, ela obedeceu, apoiando as mãos abertas na parede e inclinando suas lindas costas bem na frente dele. Rio acariciou aquela pele perfeita, deixando seus dedos correrem pela fenda entre aquelas nádegas perfeitamente redondas e, em seguida, pelas pétalas umedecidas de seu sexo. Ela inspirou enquanto ele a abria e passava o pênis contra os lábios volumosos de seu sexo.

– Era isso que eu queria fazer quando a vi aqui, Dylan.

– Isso! – ela murmurou, estremecendo enquanto ele a acariciava tão intimamente.

Rio penetrou-lhe e pôde sentir as paredes quentes da vagina de Dylan se agarrarem ao seu membro ereto e retesado. Em seguida, retirou o pênis, estremecendo em meio a tanto prazer. Caramba! Ele não conseguiria aguentar por muito tempo. E nem se importava. Ele precisava gozar dentro do calor de Dylan, entregar tudo o que tinha para ela. Porque no fundo ele sabia que o tempo deles juntos estava chegando ao fim.

Em breve ela voltaria ao mundo dela, enquanto ele permaneceria no dele.

Rio envolveu o corpo de Dylan em seus braços fortes, segurando-a o mais perto que conseguia enquanto o orgasmo começava a tomar conta de seu corpo. Ele gritou com a explosão repentina.

E, mesmo depois de gozar, ele manteve os braços em volta da mulher que sabia que não poderia ter.


Capítulo 30

Dylan não sabia exatamente quantas horas tinham se passado desde que Rio a levara para a cama dele. Eles tinham se secado e feito amor novamente, dessa vez mais lentamente, como se desejassem memorizar cada nuança daquele momento e mantê-las imortalizadas em suas mentes.

Por mais que não quisesse pensar nisso, Dylan sabia que não podia permanecer com Rio por muito mais tempo. Ela tinha uma vida em Nova York, e não estar perto de sua mãe durante o momento em que ela mais precisava da filha era o que mais a rasgava por dentro. Mas, Deus! Que bom era deitar-se nos braços fortes de Rio, como naquele momento, com a lateral de seu rosto descansando contra aquele musculoso peito nu. Dylan acariciou a pele suave de Rio, correndo os dedos por um daqueles lindos e brilhantes dermoglifos. As marcas agora estavam apenas um tom mais escuro do que a pele oliva. No entanto, conforme Dylan as tocava, as cores começavam a infundir os traços intrincados, fazendo-os tomar uma cor que, conforme ela estava descobrindo, deixava claro que Rio estava começando a ficar excitado.

Mais um indicador do interesse dele também começava a florescer, encostando-se rijo contra sua barriga.

– Continue fazendo isso e pode ser que você nunca mais saia desta cama – ele rosnou. A voz profunda de Rio vibrou contra a bochecha dela.


– Eu não sei se quero sair dessa cama tão cedo – ela respondeu. Quando ela levantou o olhar na direção dele, Rio estava com os olhos fechados. Sua boca, sensual e habilidosa, estava curvada, formando um sorriso de satisfação. – Não me lembro de ter me sentido tão feliz, Rio. Estar assim, com você, parece um sonho. Eu sei que vou ter que acordar em algum momento, mas não quero acordar.

As pálpebras de Rio se ergueram, e Dylan se afundou no calor daqueles olhos topázio escuro.

– O que está acontecendo entre nós foi... muito inesperado, Dylan. Antes de você entrar naquela caverna, eu pensei que minha vida tinha chegado ao fim porque estava me preparando para colocar um ponto final nela. Aliás, exatamente naquela noite.

– Rio... – sussurrou Dylan, com o coração apertado só de pensar naquilo.

– Nikolai me deixou com uma carga de explosivos quando a Ordem descobriu aquela cripta oculta, em fevereiro. Todos eles voltaram a Boston, mas eu fiquei para trás. Eu devia fechar a caverna para que ninguém mais conseguisse encontrá-la. Prometi que a fecharia e disse a Niko que iria passar algum tempo na Espanha assim que eu tivesse cumprido a missão. – Rio suspirou levemente. – Nunca tive a intenção de deixar aquela montanha. Tudo que eu tinha de fazer era preparar o C-4 e detoná-lo enquanto eu estivesse lá dentro...

– Você ia se fechar lá dentro? – perguntou Dylan, horrorizada. – Meu Deus, Rio. Isso seria uma maneira longa, terrível e solitária de morrer.

Rio deu de ombros.

– Eu não me importava. Aliás, acreditava que seria melhor do que viver como eu vivia.

– Mas você estava lá por muitos meses antes de eu encontrar a caverna. Deve ter encontrado alguma esperança para continuar vivendo em vez de simplesmente executar seu plano.

O riso amargurado de Rio parecia raspar o fundo de sua garganta.

– No início, atrasei porque não tinha coragem de fazer aquilo. Depois, minhas dores de cabeça e desmaios começaram outra vez, com tanta força a ponto de eu achar que estava ficando louco.

– Seus desmaios... Você está falando daqueles apagões como o que você teve ontem à noite perto do rio?

– Sim. Eles podem ser terríveis. Naquela época, na caverna, eu não estava me alimentando, então a fome só fez as coisas ficarem ainda piores. Em certo momento, perdi até a noção do tempo.

– E então eu apareci...

Ele sorriu.

– Então você apareceu. – Rio levantou a mão de Dylan e beijou a palma. Em seguida, beijou-lhe o pulso palpitante. – Você foi algo tão inesperado, Dylan. E me trouxe uma felicidade que eu nunca tinha conhecido.

– Nunca? Nem mesmo... antes, com Eva? – Dylan detestava pedir para ele compará-las, mas ainda sentia que realmente precisava saber a resposta. Quando Rio ficou em silêncio por um momento, o coração dela começou a se afundar. – Sinto muito. Você não precisa responder. Não quero tornar a situação desconfortável.

Ele negou com a cabeça, uniu as sobrancelhas.

– Eva era sensual e boa de cama. Era uma mulher muito bonita. Todos os homens que viam-na sentiam desejo por ela, tanto os humanos como os da Raça. Eu me surpreendi quando ela se interessou por mim. E ainda mais quando ela deixou claro que queria ser minha companheira. Ela me perseguiu e meu ego acabou me cegando. As coisas esfriaram entre nós um pouco depois que eu entrei para a Ordem. Eva se incomodou por ter que me dividir com o chamado para me tornar um guerreiro.

Dylan escutava, tomada por um uma sensação desconfortante por conta daquilo que chegava aos seus ouvidos. E sentia por causar aqueles sentimentos a si depois de tê-lo forçado a falar sobre a mulher que tinha amado antes.

– Depois do desastre de tudo aquilo que aconteceu com Eva – ele continuou –, eu não queria me abrir para outra mulher. Mas você, Dylan... – ele segurou uma mecha dos cabelos dela – você é fogo puro. Eu toquei você e me senti em chamas. Quando eu a beijo, sinto meu corpo arder ainda mais. Você me consome... Como nenhuma mulher fez antes e, tenho certeza, jamais fará.

Ela se levantou e o beijou, segurando o rosto dele entre as mãos. Quando Dylan se afastou, não conseguiu esconder o quanto aquilo significava para ela.

– Eu amo você, Rio. E morro de medo de dizer isso em voz alta, mas é verdade. Eu te amo.

– Ah, Dios – ele sussurrou com uma voz áspera. – Dylan, eu me apaixonei por você desde o início. Mas não sei como você consegue me amar... Do jeito como eu sou agora... Eu não sei como você consegue...

– Do jeito que você é agora... – disse Dylan, lentamente negando com a cabeça, impressionada. – O jeito que você olha para mim. O jeito como você me toca... Como eu poderia não amá-lo? Você, Rio. Exatamente como você é agora.

Ela o acariciou com toda a emoção que sentia por ele, deixando seus dedos correrem gentilmente pelo lado cicatrizado daquele rosto lindo para o qual ela nunca cansaria de olhar.

Ela mal notava as cicatrizes agora. Ah... tragicamente, não havia como reverter aquilo. A evidência do inferno ao qual ele tinha sobrevivido estaria sempre ali, estampado em seu rosto e em seu corpo. No entanto, quando Dylan olhava Rio, ela enxergava coragem e força. Via sua honra. E, para os olhos dela, aquele era o homem mais lindo que ela já vira na vida.

– Eu te amo, Eleuterio de la Noche Atanacio. Com todo o meu coração.

O semblante de Rio se acendeu com um brilho doce e suave.

Com o som apertado que se formou em sua garganta, ele puxou-a contra seu corpo e simplesmente segurou-a ali.

– Mais do que qualquer coisa, eu quero a sua felicidade – ele sussurrou no ouvido dela. – Sei que sua família, o bem estar da sua mãe, significa tudo para você. Sei que precisa estar com ela.

– É verdade – sussurrou Dylan. Ela se separou daquele abraço e olhou em seus olhos. – Não posso deixar minha mãe agora, Rio. Eu realmente... não posso.

Rio assentiu.

– Eu sei. Entendo que você precisa estar lá por ela, Dylan. Mas há um lado egoísta em mim que tentaria convencê-la de que você pertence a este lugar agora. Comigo, ligada pelo sangue, como uma Companheira de Raça.

Ah, ela gostou de ouvir aquilo. Ela se lembrava vividamente quão incrível tinha sido sentir Rio se alimentar de sua veia. Ela queria mais daquilo... agora, quando o amor que ela sentia por ele inundava seu coração.

Mas ela não podia ficar.

– Não vou pedir isso de você agora, Dylan. Mas quero que saiba que é o que eu quero. Estar com você, sempre. E estou disposto a esperar por isso.

A alegria explodiu quando ela ouviu aquelas palavras ditas com tanta doçura.

– Você vai esperar...

– Pelo tempo que for necessário, eu vou esperar por você, Dylan. – ele afastou outra mecha de cabelo da bochecha de Dylan, colocando delicadamente os fios atrás da orelha. – Você se lembra de quando eu disse que tentaria encontrar uma forma de ajudar sua mãe quando voltássemos aqui para o complexo?

– Sim.

– Era justamente sobre isso que eu precisava falar com Tess, a Companheira de Raça de Dante.

Dylan assentiu.

– Ela me ajudou a limpar e a fazer um curativo em minha bochecha naquele dia.

– Ela tem o poder da cura. Antes de estar grávida, Tess tinha a habilidade de curar feridas abertas com apenas um toque. Ela também já curou doenças internas. Há um cachorrinho correndo pelo complexo que só está vivo porque Tess conseguiu curar meia dúzia de problemas que o afligia. Incluindo o câncer, Dylan. Eu não queria dizer nada a respeito disso para você antes de conseguir conversar com Tess e Dante.

Dylan não respirava. Ela olhava surpresa para Rio, sem saber se tinha realmente ouvido direito.

– Tess pode curar o câncer? Mas só em animais, não? Quer dizer... Você não está dizendo que talvez ela possa ajudar...

– O dom de Tess não parece ser limitado aos animais, mas há uma complicação. Desde sua gravidez, suas habilidades estão mais fracas. Tess não tem certeza de que pode curar sua mãe, mas ela me disse que está disposta a tentar...

Dylan não deixou Rio terminar de falar. Uma esperança tão clara a ponto de cegar explodiu dentro dela. Foi quando ela se lançou nos braços de Rio, dando-lhe um abraço selvagem e deliciosamente apertado.

– Ah, meu Deus! Obrigada!

Ele a afastou com um toque suave.

– Nada é garantido. Aliás, a possibilidade é bem pequena, mesmo sendo otimista. As chances de Tess não poder ajudar são enormes.

Dylan assentiu, aceitando a ideia de que a possibilidade era pequena. Mas ainda estava eufórica, mesmo com o fato de as chances de salvar sua mãe serem remotas.

– Sua mãe teria de ser trazida para cá, para a mansão. Dante não pode arriscar deixar Tess viajar agora que ela está esperando um filho. E nós não podemos deixar sua mãe saber onde estamos ou o que foi feito com ela. Portanto, isso significa apagar tudo da memória dela quando as coisas chegarem ao fim. E, ainda assim, repito: não há garantia de que o câncer seja curado.

– Mas é uma possibilidade – disse Dylan. – É mais do que minha mãe tem nesse momento. Sem essa possiblidade, ela provavelmente só terá mais alguns meses. E, se Tess puder ajudá-la...

Então esse milagre provavelmente daria à sua mãe anos, talvez décadas de vida. Aos 64 e com boa saúde, não seria impossível para sua mãe viver outros 25 ou 30 anos.

Até que ponto Dylan estaria disposta a abandonar sua mãe para viver a própria felicidade ao lado de Rio?

Dylan olhou para Rio e viu que ele também já estava considerando aquela mesma pergunta. Ele estava disposto a tentar ajudar a mãe de Dylan porque sabia que Dylan não suportaria perdê-la, muito embora ele soubesse que aquilo também pudesse significar estar empurrando o que ele queria para fora de seu alcance.

– Rio...

– Eu espero – ele declarou solenemente. – Até você estar pronta, esperarei por você.

Ela fechou os olhos e sentiu o amor de Rio se derramar por ela como um bálsamo. O fato de ele estar lhe dando um presente tão desinteressado – a esperança – fez com que Dylan o adorasse ainda mais. Ela o beijou com todo o amor que sentia em seu coração, precisando estar mais perto dele... senti-lo dentro dela, de todas as formas possíveis.

Ela pensou na ligação que ele havia mencionado – o vínculo de sangue, algo que ele compartilharia com sua Companheira. Ela queria aquilo. Precisava sentir-se ligada daquela forma primordial que somente os da Raça conheciam.

– Faça-me sua – ela murmurou contra a boca dele. – Agora, Rio... Quero que você me faça sua pelo sangue. Quero estar ligada a você. Não quero esperar por isso.

O grunhido baixo de aprovação a fez estremecer de desejo.

– É inquebrável. Uma vez feito, não pode ser desfeito.

– Melhor ainda.

Ela mordeu o lábio inferior de Rio e foi recompensada por um roçar daquelas presas enquanto ele rolava para cima dela e a apertava sob seu corpo naquela cama. Faíscas âmbar brotaram em meio àquele topázio esfumaçado das íris dele. Suas pupilas estavam finas como lâminas, fixas nela, cheias de desejo. Rio a beijou, e Dylan deixou sua língua brincar com a ponta daquelas presas, morrendo de desejo de senti-las perfurar a pele macia de seu pescoço.

Mas Rio se afastou, apoiando-se sobre ela com os punhos. Ele parecia tão forte e tão preparado sobre ela. Tão deliciosamente másculo, ali, lindo e nu.

– Você não deveria fazer isso – ele disse com uma voz suave e reverente. – Se você tomar meu sangue, Dylan, eu serei para sempre parte de você... Mesmo que você decida viver sem mim. Você sempre me sentirá em suas veias, querendo ou não. Eu devia dar a você mais liberdade do que isso.

Dylan levantou o olhar, olhando para ele com apenas um minúsculo sinal de reserva.

– Eu quero isso, Rio. Quero que você seja uma parte de mim, sempre. Meu coração o conhecerá para sempre, mesmo se não criarmos um laço de sangue agora.

Ele disse um palavrão em voz baixa, negando com a cabeça.

– Você tem certeza de que é isso que você quer? Tem certeza de que... me quer dentro de você?

– Para sempre – ela respondeu. – Nunca tive tanta certeza de uma coisa em minha vida.

Bruscamente, o ar deixou os pulmões de Rio enquanto ele se colocou sobre a cintura dela, sentando-se apoiado nos próprios joelhos. Ele levou seus punhos até a boca. Com seu olhar âmbar flamejante, olhou-a nos olhos. Então, afastou os lábios e enterrou suas presas contra a própria carne.

O sangue começou a correr pelo antebraço de Rio, os dois pontos feitos com suas presas pulsavam com cada batida dura de seu coração. Muito suavemente, ele levantou a cabeça e os ombros de Dylan do travesseiro e mostrou a ferida para ela.

– Beba de mim, meu amor.

Ela sentiu o líquido quente e úmido contra seus lábios, sentiu o cheiro apimentado do sangue de Rio enquanto inspirava e cobria a ferida com a boca.

O primeiro contato de sua língua com aquela veia aberta foi elétrico. E essa eletricidade fez todo o corpo de Dylan estremecer já no primeiro gole. Ela sentiu seus membros formigarem, seus dedos dos pés e das mãos queimarem com um calor estranhamente agradável. E o calor se espaçou até seu peito e sua barriga, e logo tomou conta de todo o seu corpo. Ela estava se derretendo com a intensidade daquilo, um desejo intenso queimava em seu coração. E Deus! O sabor de Rio era tão bom!

Dylan se afastou dele, perdida no calor pulsante que ele tinha lhe dado por meio daquela veia. Ela olhou para cima e o viu observando-a. O olhar de Rio era cru, cheio de um orgulho masculino. Seu pênis permanecia ereto, maior que nunca.

Dylan estendeu a mão e começou a acariciá-lo enquanto continuava sugando daquele pulso. Quando abriu suas coxas e se movimentou na direção dela, Rio jogou a cabeça para trás e gemeu. As veias em seu pescoço estavam tão saltadas que pareciam cabos de aço. Então, ele deixou sua cabeça cair para baixo e ela se entregou ao âmbar daqueles olhos cheios de paixão.

Ele só precisou flexionar levemente o quadril para estar dentro de Dylan. E penetrou-lhe com um impulso forte e másculo digno do guerreiro que era, abrindo suas pernas com as dela enquanto a cobria com seu enorme e musculoso corpo.

– Agora você é minha, Dylan.

A voz de Rio era grossa. Não era exatamente como a voz que ele usava normalmente, mas era extremamente sexy. Ele investia contra ela enquanto ela bebia dele. E o clímax já começava a gritar para Dylan.

Ela se derreteu debaixo dele em um piscar de olhos. Rio, então, enterrou seu rosto no pescoço de Dylan e mordeu sua veia.


Capítulo 31

Era extremamente difícil ver Dylan tomar banho e se vestir na manhã seguinte. Saber que ela iria embora...

No entanto, Rio não tentou detê-la. Dylan iria a um lugar onde ele não poderia acompanhá-la, em um mundo banhado pela luz do sol que provavelmente a manteria longe dele mais tempo do que queria admitir. Talvez até mesmo por mais tempo do que poderia suportar.

As horas que tinham passado juntos em sua cama, criando um vínculo por meio da mistura dos sangues e das promessas de que aquilo não era realmente um adeus tinham que ser suficientes para ele. Pelo menos por enquanto.

Rio não podia evitar que ela seguisse em direção à vida que a esperava lá fora, por mais que o caminho até o elevador do complexo e a longa caminhada até a garagem da Ordem estivessem lhe matando.

Eles pararam juntos quando saíram do elevador. Rio estendeu a mão com as chaves de um de seus carros. Não um dos conversíveis esportivos com motores que quase eram ilegais, mas sim de um sedan belo e seguro. Caramba! Ele tinha vontade de colocá-la em um tanque blindado, se tivesse um para oferecer. Apertou um botão no controle remoto e os cinco carros responderam com um leve chiado.

– Ligue-me a cada hora para me avisar que está tudo bem – ele pediu, colocando as chaves e o celular na mão dela. – O número codificado que coloquei no seu telefone faz com que ele chame direto o meu número. Quero que você me ligue a cada hora para eu saber que está tudo bem.

– Quer que me arrisque a tomar uma multa por dirigir e falar ao celular ao mesmo tempo? – Ela sorriu e arqueou uma sobrancelha para ele. – Talvez você também queira colocar um GPS em mim antes de eu ir?

– O carro já está equipado com um GPS – ele respondeu, feliz por ela não ter se enervado. – Se você esperar aqui por mais um segundo, tenho certeza de que Gideon ou Niko também vão aparecer com alguma coisa para você.

A risada tranquila de Dylan parecia um pouco triste. Ela estendeu a mão e acariciou a nuca de Rio.

– Sabe, deixar você aqui também está me matando. Já estou com saudade.

Ele a puxou para perto, abraçou-a e a beijou.

– Eu sei. Mas nós vamos resolver isso, encontraremos uma saída. Mas eu não estava brincando quando pedi que me telefone a cada hora enquanto estiver na estrada. Quero saber onde você está e garantir que você volte segura para cá.

– Eu vou ficar bem. – Ela mexeu a cabeça e sorriu. – Eu telefono quando chegar ao hospital.

– Está bem – ele respondeu, ciente de que não estava sendo nada racional. De que estava se preocupando demais à toa. De que estava apenas criando mais e mais desculpas ridículas para encobrir a necessidade que sentia de tê-la por perto e mantê-la ali. Rio soltou a mão de Dylan e deu um passo para trás, enfiando as mãos nos bolsos da calça jeans larga. – Está bem. Telefone quando chegar lá.

Dylan ficou na ponta dos pés e o beijou mais uma vez. Quando ela tentou se afastar, ele não conseguiu resistir e abraçou-a novamente.

– Ah, inferno! – disse duramente. – Saia daqui antes que eu a leve de volta para o meu quarto e a amarre na cama.

– Isso poderia ser interessante.

– Lembre-me disso depois... – disse ele. – Quando você voltar.

Ela assentiu.

– Tenho que ir.

– Sim.

– Eu te amo – disse ela, dando um beijo suave na bochecha dele. – Eu telefonarei.

– Vou ficar esperando.

Rio ficou ali, empurrando seus punhos nos bolsos enquanto a observava entrar no carro.

Ela entrou no veículo e deu a partida. Então, lentamente tirou o carro do estacionamento no hangar. Acenou rapidamente com a mão, mostrando-se esperta demais para abrir o vidro e dar a ele mais tempo para tentar convencê-la a não sair.

Ele apertou o botão pra fechar o portão automático do hangar, e precisou proteger os olhos da luz rosada do amanhecer que entrava através das enormes árvores que cercavam a propriedade. Dylan saiu em direção à luz do dia. Rio queria esperar até que as luzes traseiras do carro saíssem da propriedade, mas o brilho dos raios ultravioleta era forte demais, mesmo para olhos antigos como os dele...

Ele apertou o botão novamente, e a enorme porta se fechou.

Quando Rio saiu do elevador, de volta ao complexo, Nikolai estava atravessando o corredor, vindo do campo de tiros em velocidade aceleradíssima. Rio praticamente podia ver a fumaça saindo das orelhas do vampiro. Ele realmente estava furioso.

– O que está acontecendo? – perguntou Rio, olhando para aqueles olhos azuis frios.

– Acabou de rolar algo foda – respondeu Niko, e evidentemente o termo não era usado no bom sentido.

– Como assim?

– Starkn – respondeu Niko entre os dentes. – No fim das contas, o diretor da Agência Regional estava mentindo. Quando Chase e eu nos encontramos com o cara ontem à noite e dissemos que suspeitávamos de que aqueles eram alvos, ele nos assegurou que diria a todos os Primeira Geração. Bem, adivinhe o que ele não fez?!

Rio fechou uma carranca.

– Expôs a informação a todos os Primeira Geração conhecidos?

– Exatamente – disse Niko. – Um contato meu de Primeira Geração, Sergei Yakut, disse não ter ouvido merda nenhuma da Agência em Montreal, onde ele vive agora. E a mesma coisa com os outros Primeira Geração que ele conhece. Para melhorar tudo, hoje de manhã soubemos, por meio de Denver, de outro assassinato. Outro Primeira Geração decapitado, Rio. Essa porcaria está ficando cada vez mais fedorenta. Alguma coisa grande está acontecendo.

– Você acha que, de alguma forma, pode ter a mão de Starkn no meio disso?

Os olhos perspicazes de Nikolai pareciam gelados por conta da suspeita.

– Sim, eu acho. Meu instinto me diz que esse filho da mãe joga sujo.

Rio assentiu, feliz por aquela distração evitar que ele se sentisse triste por conta da saudade de Dylan e por colocá-lo de volta nos assuntos da Ordem. Seus assuntos, seu mundo.

Quando Niko seguiu para o laboratório de alta tecnologia, Rio o seguiu. Exatamente como nos velhos tempos.


Dylan levou aproximadamente cinco horas para ir de Boston a Manhattan, o que a fez chegar ao hospital por volta das treze horas. Ela telefonou para Rio do carro enquanto esperava o manobrista. Assegurou-lhe de que estava bem e, em seguida, seguiu para o saguão para pegar um elevador que a levaria até o setor de oncologia.

Deus, pensar que este poderia ser um dos últimos dias que sua mãe passaria naquele lugar... Dylan queria tanto isso que quase desmaiou ao entrar no décimo andar e passar pelas portas duplas que levavam à área onde sua mãe estava.

As enfermeiras estavam tentando resolver algum problema na impressora, então ela simplesmente passou pela recepção sem parar para perguntar sobre notícias ou sobre o resultado da biopsia. Dylan parou diante da porta do quarto da sua mãe, prestes a higienizar as mãos quando viu uma enfermeira saindo de lá, trazendo uma série de bolsas intravenosas quase vazias. Quando ela viu Dylan, acenou levemente com a cabeça e lançou um sorriso entristecido.

– O que está acontecendo? – perguntou Dylan quando a enfermeira deu os primeiros passos no corredor.

– Estamos retirando os medicamentos e os líquidos. Não deve demorar mais do que meia hora antes de ela receber alta.

– Alta? – Dylan franziu a testa, totalmente confusa. – O que aconteceu? Chegaram os resultados da biópsia ou algo assim?

Um leve assentimento com a cabeça.

– Nós os recebemos esta manhã, sim.

E, com base naquele tom de voz apático, os resultados não eram nada bons. Ainda assim, Dylan precisou perguntar, pois não queria imaginar o pior.

– Acho que não estou entendendo... Se você está retirando os líquidos e os medicamentos, isso significa que ela vai ficar bem?

A expressão da enfermeira se tornou um pouco mais entristecida.

– Você ainda não falou com ela...

Dylan olhou para trás, em direção ao quarto. Sua mãe estava sentada na beirada da cama, olhando para a janela, usando uma jaqueta azul celeste. Estava completamente vestida, com os cabelos penteados. Parecia pronta para sair do hospital a qualquer momento.

– Por que minha mãe vai receber alta?

A enfermeira limpou a garganta:

– Eu... É... Eu realmente acho que você precisa conversar com ela sobre isso, está bem?

Enquanto a mulher saía, Dylan esfregou as mãos com o álcool em gel e entrou.

– Mãe?

Sharon virou o rosto e abriu um sorriso enorme e feliz.

– Ah, Dylan! Eu não esperava vê-la de volta aqui tão cedo, querida. Eu iria telefonar para você mais tarde.

– Foi bom eu ter vindo agora. Acabei de ficar sabendo que eles vão deixá-la ir para casa em alguns minutos.

– Sim – ela respondeu. – E já era hora. Não quero mais ficar aqui.

Dylan não gostava da resignação na voz de sua mãe. Aquela voz soava leve demais, conformista demais.

Aliviada demais.

– A enfermeira acabou de me dizer que os resultados da biópsia chegaram de manhã.

– Não vamos falar disso. – Sharon acenou, como se quisesse deixar o assunto de lado e, em seguida, caminhou até a mesa onde agora havia uma caixa aberta de chocolates. Ela pegou um dos doces e o deu para Dylan. – Experimente uma dessas trufas. São deliciosas! Gordon trouxe para mim ontem à noite. Aliás, ele passou por aqui poucos minutos depois que você saiu. Eu queria que você tivesse ficado um pouco mais para conhecê-lo. Ele quer conhecer você, Dylan; e ficou bastante interessado quando eu disse que você precisaria de um novo emprego...

– Ah, mãe... Você não fez isso! – rosnou Dylan. O fato de Sharon ter contado a seu chefe sobre a matéria de Dylan já era ruim o suficiente, mas vê-la tentando arrumar um emprego para Dylan enquanto ainda estava naquela cama de hospital era exagero.

– Gordon tem contato com muitas pessoas importantes na cidade. Ele pode ajudar, querida. Não seria maravilhoso se ele pudesse ajudá-la a conseguir algo em uma das grandes agências de notícias?

– Mãe! – disse Dylan, dessa vez com uma voz mais incisiva. – Não quero falar de trabalho, de Gordon Fasso ou de qualquer outra coisa. Tudo que quero saber é o que está acontecendo com você. Obviamente os resultados não foram bons. Por que, então, você está recebendo alta hoje?

– Porque é isso que eu quero – ela suspirou e se aproximou de Dylan. – Não quero ficar mais aqui. Não quero mais exames, tubos ou agulhas. Estou cansada. E só quero ir pra casa.

– O que os médicos disseram? Podemos conversar com eles sobre os resultados da biopsia?

– Eles não podem fazer mais nada, querida. Nada além de retardar o inevitável, e só por algum tempo.

Dylan baixou a voz até quase sussurrar.

– E se eu disser que conheço alguém que poderia ser capaz de curá-la?

– Não quero mais tratamentos. Já chega...

– Não é nada como isto aqui. É uma espécie de... cura alternativa. Uma coisa que você não teria em um hospital. Não é nada garantido, mas há uma chance de cura completa. Acho que pode ser uma oportunidade boa, mãe. Acho que pode ser a única...

Sharon sorriu gentilmente enquanto colocava seus dedos frios contra a bochecha de Dylan.

– Sei que deve ser difícil para você, minha querida. Sei, mesmo. Mas a decisão é minha, e devo tomá-la sozinha. Eu tive uma vida plena. E não espero um milagre agora.

– E quanto a mim? – A voz de Dylan era pesada. – Você tentaria... por mim?

No longo silêncio que obteve como resposta, Dylan tentou desesperadamente conter o pranto que afogava sua garganta. Seu coração estava em pedaços, mas ela podia ver que sua mãe já tinha tomado uma decisão. Uma decisão que provavelmente tinha sido tomada bem antes daquele momento.

– Está bem – disse Dylan finalmente. – Bem, então... Diga-me o que você quer que eu faça, mãe.

– Leve-me para casa. Vamos almoçar juntas, tomar um chá e conversar. Isso é o que eu realmente quero agora. Mais do que qualquer coisa.


Capítulo 32

Rio não voltou a receber notícias de Dylan até o final daquela tarde. Quando seu telefone tocou em seu bolso, ele estava no laboratório com Lucan, Gideon, Niko, e Chase. Eles discutiam o trabalho aparentemente duvidoso de Gerard Starkn e como a Ordem poderia controlar melhor a situação dos Primeira Geração. Rio pediu licença e atendeu o telefonema de Dylan no corredor.

– O que há de errado? – Aquilo não era exatamente um cumprimento, mas Rio conseguia perceber que ela estava chateada do outro lado da linha. Assim que atendeu, ele sentiu aquela energia atingi-lo como se fosse um choque elétrico. – Você está bem?

Uma pausa se instalou e, em seguida:

– Estou bem, sim. Vou ficar bem no final, acredito.

– Como está sua mãe?

– Cansada – disse Dylan, que, diga-se de passagem, também soava bastante cansada. – Ah, Rio... Estive com ela toda a tarde no apartamento dela, no Queens. Ela quis sair do hospital e agora está recusando qualquer outro tratamento. Ela não... Ela não quer mais viver, Rio. E está decidida quanto a isso.

Ele disse um palavrão em voz baixa, sentindo a angústia de Dylan como se fosse sua própria.

– Você disse a ela sobre Tess?

– Eu tentei, mas ela não quis ouvir. Isso está me matando, mas se é o que ela realmente quer, então sei que vou ter de deixá-la ir.

– Ah, meu amor. Eu não sei o que dizer.

– Tudo bem. Eu nem sei o que eu preciso ouvir agora. – Dylan deu alguns soluços, mas estava se mantendo sob controle com uma coragem admirável. – Passamos o dia conversando, algo que não conseguíamos fazer havia muito tempo. Foi legal. Falei sobre você, disse que conheci um homem muito especial e que eu o amo muito. Ela quer conhecê-lo em algum momento.

Rio sorriu, desejando poder estar em Nova York agora.

– Tenho certeza de que podemos combinar alguma coisa.

– Falei com o médico dela quando estávamos deixando o hospital. Ele disse que, sendo realista, sem tratamento é provável que minha mãe só viva algumas semanas... talvez alguns meses. Eles vão lhe dar medicamento para a dor, mas nos avisaram que o tempo que ela ainda tem de vida não vai ser fácil.

– Que droga, Dylan. Quer que eu vá até aí para passar a noite com você? O sol já vai se pôr logo. Se você precisar de mim, posso sair ao anoitecer e chegarei aí por volta das onze horas.

– E quanto à Ordem? Tenho certeza de que você tem outras coisas para fazer.

– Não foi isso que eu perguntei. – De fato, ele deveria participar de uma missão naquela noite, mas que se dane! Se Dylan o queria com ela, Lucan teria de nomear outra pessoa para participar da patrulha. – Você precisa de mim esta noite, Dylan?

Ela suspirou.

– Eu adoraria vê-lo. Você sabe que eu nunca recusaria isso, Rio. Você realmente quer vir aqui?

– Seria impossível não querer – ele respondeu, sentindo a empolgação de Dylan do outro lado da linha. No fundo da ligação, ele ouviu um caminhão buzinar. – Você está dirigindo?

– Estou. Estou indo pegar algumas coisas da minha mãe no abrigo. Telefonamos para alguns amigos dela quando saímos do hospital, para contar as notícias. Todos estão muito preocupados, como você pode imaginar. E acho que alguns dos clientes e crianças do abrigo fizeram um cartão especial para ela.

– Ela vai gostar.

– Sim – disse Dylan. – Vou levar comida para o jantar no apartamento dela. Ela quer costelas, batata doce e broa de milho. Ah! E uma garrafa de algum champanhe requintado para, como ela disse, celebrar meu novo amor.

– Parece que vocês planejaram uma boa noite.

Dylan ficou em silêncio por um momento.

– É tão bom vê-la sorrir, Rio. Quero que ela aproveite o máximo possível as próximas semanas.

Rio entendia, obviamente. E, quando Dylan concluiu a conversa e prometeu que telefonaria quando estivesse de volta ao apartamento de sua mãe, ele se perguntou como ele passaria as semanas, talvez os meses, em que ficaria longe dela. Não era muito tempo, certamente não para os padrões da Raça. No entanto, para um homem longe de sua companheira, aquilo parecia infinito.

Ele tinha de estar ao lado de Dylan durante esse período.

E sabia que ela também precisava dele.

Quando Rio desligou o telefone, encontrou Lucan fora da porta do laboratório de tecnologia. Rio havia lhe contado antes a respeito da mãe de Dylan, e também tinha lhe dito o que aquela mulher significava para ele, que ele tinha se apaixonado por ela. Rio disse tudo a Lucan – desde o fato de que ele e Dylan agora tinham laços de sangue, até a oferta que tinha feito de usar as habilidades de Tess.

Rio não sabia há quanto tempo Lucan estava parado ali, mas os olhos acinzentados e sagazes pareciam plenamente conscientes de que as coisas não estavam nada bem do outro lado da linha.

– Como Dylan está enfrentando tudo?

Rio assentiu:

– Ela é forte. Vai dar conta disso.

– E você, meu amigo?

Rio ia começar a dizer que estava bem, mas o olhar de Lucan o estraçalhou antes que as palavras passassem por sua boca.

– Eu disse a ela que estaria lá esta noite – disse Rio ao líder da Ordem. – Preciso me encontrar com ela, Lucan. Para que eu possa manter minha sanidade, no mínimo. Se eu ficar aqui, não sei se eu faria algum bem, para dizer a verdade. Ela é a única coisa que me manteve bem, a única coisa que me fez bem desde muito tempo. Estou totalmente apaixonado por essa mulher, meu amigo. Ela me tem agora.

– Mais do que a Ordem?

Rio fez uma pausa, refletiu sobre o que lhe estava sendo perguntado.

– Eu morreria pela Ordem, por você, Lucan, e por qualquer um dos meus irmãos. Você sabe disso.

– Sim, eu sei que sim – respondeu Lucan. – Afinal, você quase morreu. E mais de uma vez.

– Eu morreria para servir a Ordem, mas Dylan... Madre de Dios. Essa mulher, mais do que qualquer coisa que veio antes, ela me dá um motivo para viver. Tenho que estar com ela agora, Lucan.

Lucan assentiu sobriamente.

– Vou colocar um dos outros caras na patrulha dessa noite. Faça o que tem que fazer.

– Lucan. – Rio olhou fixamente nos olhos do líder da Ordem – Tenho que estar com Dylan até que ela enfrente essa dura provação com sua mãe. Pode levar semanas, talvez meses.

– Então, o que você está me dizendo?

Rio xingou em voz baixa.

– Estou dizendo que estou saindo para ficar com ela. Pelo tempo necessário. Estou deixando a Ordem, Lucan. E vou para Nova York hoje à noite.


– Aqui está uma caixa para colocar essas coisas, querida. – Janet entrou no escritório da mãe de Dylan trazendo uma caixa de papelão vazia. – Esta caixa é forte e bonita. E tem tampa, também.

– Obrigada. – Após agradecer, Dylan colocou a caixa na mesa bagunçada. – Mamãe adora esses papéis, não?

Janet riu.

– Ah, querida! Aquela mulher não se desfaz de uma nota, um cartão de felicitação ou de uma fotografia desde que eu a conheci. Guarda tudo como se fosse ouro. Que Deus a abençoe. – Janet correu os olhos cheios de lágrimas pela sala. – Certamente, vamos sentir falta de Sharon por aqui. Ela tinha um jeito todo especial de tratar as garotas. Todo mundo a adorava. Inclusive, o senhor Fasso foi cativado por ela, e ele não é um homem fácil de impressionar. Acredito que o espírito livre da sua mãe cativava as pessoas.

Dylan sorriu com aquelas palavras doces, mas foi muito difícil ouvir sobre sua mãe no tempo passado.

– Obrigada pela caixa, Janet.

– Ah, sem problemas, querida. Você quer que eu a ajude com as coisas aqui?

– Não, obrigada. Já estou quase terminando.

Dylan esperou Janet sair e logo retomou sua tarefa. Era difícil discernir o que poderia ser importante para sua mãe e o que podia ser jogado fora. Então, Dylan finalmente começou a recolher os papéis e as fotos antigas e a colocá-los na caixa.

Parou por alguns instantes para olhar algumas fotos – sua mãe com os braços em volta de duas garotas do abrigo, com aqueles cabelos horríveis dos anos 1980, tops e shorts realmente curtos; outra fotografia trazia sua mãe sorrindo atrás do balcão de uma sorveteria, ao lado da placa de “Funcionária do mês” que uma garota ao seu lado segurava como se fosse um prêmio.

Sua mãe tinha se tornado amiga de quase todas as jovens problemáticas que passaram por aquele lugar e investia sinceramente na possibilidade de elas se tornarem bem-sucedidas e vencerem os problemas que as tinham feito fugir de casa ou sentirem-se como se não pudessem fazer parte da sociedade. Sua mãe tinha tentado fazer a diferença. E, em muitos casos, tivera sucesso.

Dylan secou as lágrimas de orgulho que brotaram em seus olhos. Procurou um lenço de papel em meio à bagunça, mas não conseguiu encontrar nenhum. Aquilo era exatamente o que ela não precisava: estar sentada no escritório de sua mãe, chorando como um bebê na frente da equipe que agora fazia seu turno.

– Merda.

Ela se lembrou de ter visto algumas toalhas de papel soltas em uma das gavetas do armário. Deu meia-volta na cadeira de sua mãe, empurrou-a pelo carpete desgastado e deu início a uma busca rápida.

Ah! Sucesso!

Enxugando os olhos e o rosto úmidos, girou a cadeira novamente e quase caiu no cão.

Ali, de pé diante dela, no outro lado do escritório, surgiu a aparição de um fantasma. Duas jovens juntas, ambas cintilando – ora visível, ora invisível. Em seguida, outra moça apareceu, e outra. E então, finalmente, Toni, a jovem que Dylan tinha visto no quarto de sua mãe naquela noite.

– Ah, meu Deus – Dylan ficou boquiaberta, levemente consciente de que os funcionários do abrigo estavam realizando suas tarefas lá fora, completamente alheios àquela reunião de fantasmas.

– Vocês todas estão aqui por causa da minha mãe?

O grupo de garotas a olhou com um silêncio assustador. As imagens tremeluziam como chamas de velas contra uma brisa instável.

Ajude-as, disse uma daquelas bocas imóveis. Elas precisam da sua ajuda.

Que inferno! Dylan não tinha tempo para isso agora. Ela não estava no estado de espírito adequado para aquilo.

No entanto, mesmo assim ela sentiu um formigamento interno. Alguma coisa que lhe dizia para ouvir.

Ela tinha de fazer alguma coisa.

Ele não vai parar de feri-las, disse outra voz fantasmagórica. Não vai parar de matá-las.

Dylan pegou um pedaço de papel e um lápis e começou a escrever o que estava ouvindo. Talvez a Ordem e Rio pudessem ajudá-la a entender, se ela não conseguisse.

Estão debaixo da terra.

Na escuridão.

Gritando.

Morrendo.

Dylan ouvia dor e medo naqueles sussurros enquanto as Companheiras de Raça mortas tentavam se comunicar com ela. Sentia certa familiaridade com cada uma delas, e também com aquelas que elas diziam estarem vivas, mas diante de um perigo terrível.

– Me diga quem – disse em voz baixa, tentando não ser ouvida do outro lado da porta. – Não posso ajudar se vocês não me derem algo além disso. Por favor, me escutem. Digam quem está ferindo as outras como nós.

Dragos.

Ela não sabia qual delas tinha falado, nem se – ou como – aquela mulher tinha ouvido através da barreira que separa os vivos dos mortos. No entanto, a mente de Dylan reconheceu a palavra em um instante.

Era um nome.

Dragos.

– Onde ele está? – perguntou Dylan, tentando descobrir mais. – Vocês podem me dizer um pouco mais?

Porém, o grupo de fantasmas já estava desaparecendo. Uma a uma, elas se dissiparam... desapareceram, transformando-se em nada.

– Quase me esquecei de dar isso a você, querida. – A voz cantarolada de Janet fez Dylan ficar boquiaberta, assustada. – Ah, sinto muito! Eu não quis assustá-la.

– Tudo bem. – Dylan sacudiu a cabeça, ainda aturdida pelo encontro com aquelas mulheres. – O que você tem aí?

– Algumas fotos que tirei do cruzeiro que o senhor Fasso realizou no início dessa semana. Acredito que a sua mamãe gostaria de tê-las. – Janet entrou e colocou algumas fotos impressas em cores na mesa. – Ela não está linda neste vestido azul? Essas garotas na mesa com ela são algumas das que ela cuidava. Ah, e este aqui é o senhor Fasso, no fundo da sala. Quase não dá para vê-lo, mas esse é o rosto dele de perfil. Ele não é lindo?

Na verdade, ele era. E era mais jovem do que Dylan o imaginava. Devia ser cerca de vinte anos mais jovem do que sua mãe. Devia ter no máximo cinquenta anos, e provavelmente menos do que isso.

– Você pode entregá-las à sua mãe por mim, querida?

– É claro. – Dylan sorriu, esperando não parecer tão agitada quanto se sentia.

Quando Janet finalmente saiu, Dylan olhou as fotos com atenção. Com muita atenção.

– Jesus Cristo!

Uma das garotas sentadas à mesa com sua mamãe naquele cruzeiro pelo rio, realizado havia poucos dias, estava no grupo de Companheiras de Raça mortas que acabara de aparecer no escritório.

Dylan pegou uma pilha de fotografias antigas da caixa em que as tinha colocado e correu os olhos pelas imagens. Sentiu seu coração afundar. Nas imagens, ela encontrou outra das jovens que tinha visto em forma espectral um minuto atrás.

Meu Deus!

Dylan sentiu seu estômago se retorcer quando saiu do escritório e caminhou até o banheiro. De lá, telefonou para Rio e mal deu a ele a chance de dizer qualquer coisa antes de vomitar tudo o que tinha acontecido.

– Uma delas disse o nome Dragos – contou Dylan com uma voz frenética. – Esse nome diz alguma coisa para você?

O silêncio repentino de Rio fez o nó no estômago de Dylan se dilatar ainda mais.

– Sim – respondeu Rio. – Filho da mãe! Eu conheço esse nome.

– Quem é ele, Rio?

– Dragos é quem criou a câmara de hibernação naquela caverna. O filho dele libertou a criatura que dormia lá. Ele é mau, Dylan. É uma criatura da pior espécie.


Capítulo 33

Sharon Alexander estava fazendo outro bule de chá quando ouviu o bater na porta de seu apartamento no décimo segundo andar.

– Está aberta, querida – ela gritou da cozinha. – O que aconteceu? Você esqueceu a chave?

– Nunca tive uma chave.

Sharon estremeceu ao ouvir aquela voz masculina profunda e inesperada. Reconheceu aquele barítono obscuro, mas ouvi-lo ali, em seu apartamento – sem ser anunciado e depois do escurecer – deixou-a impressionada.

– Ah, olá, Gordon. – Sharon conscientemente agarrou sua jaqueta, desejando que estivesse usando algo mais vivo, mais interessante para um homem sofisticado como Gordon Fasso. – Eu estou... bem. Meu Deus! Que surpresa!

O olhar frio do homem correu por todo o pequeno apartamento – um apartamento constrangedoramente bagunçado.

– Cheguei na hora errada?

– Não. É claro que não – ela sorriu, mas ele não devolveu o sorriso. – Eu estava fazendo chá. Você aceita um pouco?

– Não. Na verdade, eu não suporto chá. – Agora ele sorriu, mas aquele sorriso que se abria lentamente não a fez se sentir mais à vontade. – Passei pelo hospital, mas a enfermeira me disse que você tinha recebido alta. Então imaginei que sua filha a tivesse trazido para casa.

– Sim – respondeu Sharon, observando-o caminhar tranquilamente por sua sala de estar. Ela passou a mão pelos cabelos, desejando não parecer um completo desastre. – Adorei os chocolates que você levou para mim. Mas você não precisava levar nada...

– Onde ela está?

– Quem?

– Sua filha – disse ele com dureza. – Onde está Dylan?

Por um segundo, o instinto maternal insistiu para que Sharon mentisse e dissesse que Dylan não estava em casa e que não voltaria tão cedo. Mas isso seria ridículo, não?

Sharon não tinha nenhuma razão para temer o senhor Fasso. Gordon, ela lembrou a si, tentando ver o cavalheiro charmoso que ele tinha mostrado ser recentemente.

– Eu posso sentir o cheiro dela, Sharon.

A declaração era um tanto estranha e deixou Sharon completamente desconcertada.

– Você pode... o quê?

– Sei que esteve por aqui. – Ele a olhou com olhos de gelo – Onde ela está e quando vai voltar? Essas não são perguntas difíceis de serem respondidas.

Um arrepiou frio tomou conta de Sharon enquanto ela olhava para aquele homem sobre quem claramente conhecia tão pouco.

Uma palavra brotou em sua mente enquanto ela se movimentava na direção dele: MAU.

– Eu disse que queria conhecer sua filha – ele insistiu. E, enquanto falava, alguma coisa muito estranha acontecia em seus olhos. A cor gelada naquelas órbitas estavam mudando, tornando-se uma luz âmbar incandescente. – Estou cansado de esperar, Sharon. Preciso ver aquela vadia. E preciso vê-la agora.

Sharon começou a murmurar uma prece. Ela se afastava enquanto ele se aproximava, mas tinha poucos lugares aonde ir. As paredes logo a cercariam, e a porta de correr da sala de estar dava para uma pequena sacada diante de uma queda de doze andares até a rua lá embaixo.

Uma brisa aquecida entrava pela tela na porta e trazia consigo o ruído do tráfego intenso na Queens Boulevard.

– O que... o que você quer com Dylan?

Ele sorriu, e Sharon quase desmaiou ao ver aqueles dentes grotescamente longos.

Não, ela pensou, ainda sem compreender. Aquilo não eram dentes.

Presas.

– Preciso da sua filha, Sharon. Ela é uma mulher incomum, que pode me ajudar a dar à luz o futuro. Meu futuro.

– Ah, meu Deus... Você está louco, não está? Está doente. – Sharon avançou lentamente para um pouco mais longe dele. O pânico tomava conta de seu peito. – Que diabos você é realmente?

Ele riu. Um som baixo e ameaçador.

– Eu sou seu mestre, Sharon. Você só não sabia ainda. Agora vou fazer você sangrar, e você vai me dizer tudo que eu quero saber. Vai me ajudar a encontrar Dylan. E eu vou transformá-la em minha escrava, para você entregar sua filha diretamente nas minhas mãos. E aí, fazer de Dylan minha cadelinha, aquela vadia!

Ele mostrou aquelas presas enormes e assustadoras, e então sibilou como uma víbora prestes a atacar.

Sharon sabia o que a estava consumindo, além do medo do que aquele homem – aquela terrível criatura – poderia fazer com sua filha. Não duvidou por um segundo que ele poderia fazer o que tinha ameaçado. E foi essa certeza que a levou até a porta de tela.

Gordon Fasso riu quando a viu tatear em busca do trinco. Sharon abriu a porta.

– O que você acha que vai fazer, Sharon?

Ela foi até a sacada, mas ele a seguiu. Aqueles ombros largos cobertos por um casaco cobriram o espaço da porta, Sharon sentiu o corrimão da sacada bater contra suas costas. Lá embaixo, muito abaixo, buzinas soavam e motores gritavam em meio ao trânsito intenso.

– Não vou deixar você me usar para chegar a ela – disse Sharon, deixando o ar raspar seus lábios conforme ela pronunciava as palavras.

Ela não olhou para baixo. Em vez disso, manteve seus olhos fixos nas cinzas do olhar do monstro bem diante dela. E sentiu um leve formigamento de satisfação quando ele rugiu e estendeu a mão para tentar segurá-la...

Tarde demais.

Sharon caiu por sobre a grade, em direção à calçada lá embaixo.


O trânsito na rua em frente ao edifício se estendia por dois quarteirões. Mais adiante na escuridão, luzes de emergência piscavam. E a polícia mandava veículos seguirem um caminho alternativo para Queens Boulevard. Dylan tentou olhar pela lateral da minivan à sua frente. Tentava ver o que parecia ser algo bem parecido com uma cena de crime. Faixas amarelas isolavam a área embaixo do prédio de sua mãe.

Dylan bateu a mão contra o volante e lançou um olhar na direção do cadáver que agora esfriava. E ela estava mais atrasada do que pretendia. O episódio no abrigo para fugitivos a tinha feito se atrasar aproximadamente uma hora, e todas as ligações para o apartamento de sua mãe tinham caído na secretária eletrônica. Sua mãe provavelmente estava descansando, pensando em que diabos tinha acontecido com seu jantarzinho de celebração.

Dylan tentou ligar novamente para a casa, e mais uma vez a ligação caiu na secretária eletrônica.

– Merda!

Alguns garotos passaram caminhando pela calçada, vindo do local onde tudo tinha acontecido. Dylan abriu o vidro do carro.

– Ei. O que está acontecendo lá? Eles vão deixar os carros voltarem a passar?

Um dos jovens negou com a cabeça.

– Uma senhora caiu da sacada. Os policiais estão tentando tirar o corpo do local.

O medo pesou como uma pedra no estômago de Dylan.

– Você sabe em qual edifício isso aconteceu?

– Não exatamente. Em algum daqueles prédios da rua 108.

Caramba! Ah, Jesus Cristo!

Dylan saiu do carro sem sequer desligar o motor. Tinha seu celular em mãos e ligava para sua mãe enquanto corria o mais rápido que podia pela calçada, seguindo para toda aquela comoção perto do cruzamento alguns quarteirões adiante. Conforme se aproximava, cortando em meio à multidão, seus pés pareciam diminuir a velocidade por vontade própria.

Ela sabia.

Ela simplesmente... sabia.

Sua mãe estava morta.

E então, seu telefone começou a tocar desesperadamente, como se fosse o alarme de um banco sendo roubado. Ela olhou para a tela e viu o número do celular de sua mãe...

– Mamãe – gritou ao atender a ligação.

Silêncio do outro lado da linha.

– Mamãe? Mãe, é você?

Uma mão pesada pousou em seu ombro. Ela olhou desesperadamente para trás e se viu olhando nos olhos cruéis de um homem que ela tinha visto recentemente naquela fotografia no escritório de sua mãe.

Gordon Fasso estava com o telefone celular cor-de-rosa de sua mãe na outra mão. Ele sorriu, exibindo a ponta de suas presas. Quando aquela criatura falou, Dylan sentiu sua voz profunda vibrar em seus ouvidos e nas palmas de suas mãos. As palavras eram transmitidas do celular de sua mãe até seu próprio celular.

– Olá, Dylan. É um prazer finalmente conhecê-la.


Capítulo 34

Em algum lugar em Connecticut, a algumas horas dirigindo da Ordem em Boston ao apartamento da mãe de Dylan em Nova York, Rio sentiu como se seu peito tivesse sido aberto por mãos frias, congeladas. Ele estava no viva-voz com a Ordem, tentando averiguar se Gideon tinha conseguido descobrir algo a respeito do que Dylan informara-lhes sobre as Companheiras de Raça mortas que vira no abrigo. A Ordem tinha as fotos que Dylon havia enviado de seu telefone celular, e Gideon estava procurando por informações sobre mais pessoas desaparecidas nos Refúgios e nas populações humanas.

Rio ouvia o outro guerreiro lhe falar, mas as palavras não entravam em sua mente.

– Ah, merda – queixou-se, esfregando a mão na testa como se a forte explosão de frio que sentira há pouco tivesse se transferido para região de seu coração.

– O que está acontecendo? – perguntou Gideon. – Rio? Rio, você está comigo? Está me ouvindo?

– Sim. Mas... Há algo errado.

Dylan.

Algo estava muito errado com Dylan. Rio podia sentir seu medo, e uma dor tão profunda que quase lhe cegou – o que, afinal, não é uma boa coisa quando se está acelerando a quase 180 quilômetros por hora.

– Estou com um mau pressentimento, Gideon. Preciso estar com Dylan agora.

– Claro. Estarei aqui quando você tiver terminado.

Rio interrompeu a chamada e discou o número de Dylan. A ligação caiu na caixa postal. Várias vezes. E aquela sensação ruim piorava a cada segundo, aumentava exponencialmente. Ela estava em perigo real – Rio sabia disso pelo repentino ritmo frenético que seu pulso tomou. Sim, seu vínculo de sangue com ela estava lhe dizendo que algo terrível estava acontecendo.

Exatamente agora, quando ela estava a três horas de distância dele.

– Maldição! – ele grunhiu, pisando no acelerador.

Acelerou e chamou novamente o número de Gideon.

– Conseguiu falar com ela?

– Não. – Um profundo calafrio apoderou-se do enorme guerreiro. – Ela está com problemas, Gid. Ela está sofrendo em algum lugar. Maldição! Eu nunca devia tê-la perdido de vista!

– Está bem – disse Gideon com calma. – Vou procurar uma pista no GPS do carro e procurar por seu telefone celular também. Vamos localizá-la, Rio.

Rio ouviu o barulho do teclado no outro lado da linha, mas o medo lhe dizia que nenhum dos dispositivos do amigo guerreiro poderia levá-lo a Dylan. E, é obvio, Gideon voltou um segundo depois com más notícias.

– O carro está estacionado na Jewel Avenue, no Queens, e o telefone celular dá sinal de localização a uma quadra depois. Não há nenhum movimento vindo de nenhum deles.

Rio amaldiçoou, ouviu a voz do Nikolai no fundo, quase inaudível no alto-falante. Algo sobre o diretor Starkn e uma das fotografias que Dylan lhes enviara.

– O que foi que disse? – perguntou Rio. – Coloque Niko na linha. Quero saber o que ele acabou de dizer.

A voz de Gideon era hesitante... E o xingamento que soltou um instante mais tarde não tranquilizou Rio em nada.

– Maldição, o que ele disse? – perguntou novamente.

– Niko só me perguntou o que Starkn estava fazendo no fundo de uma das fotos enviadas por Dylan.

– Qual foto? – Rio perguntou.

– Aquela do cruzeiro de caridade de que a mãe dela participou. Aquela foto que Dylan identificou como do fundador do abrigo, Gordon Fasso.

– Não pode ser – disse Rio, embora uma voz vinda de dentro de si dizia-lhe exatamente o contrário. – Coloque Niko na linha.

– Ei, cara – disse Nikolai um segundo depois. – Estou lhe dizendo, cara. Eu vi Starkn com meus próprios olhos. Eu o reconheceria até no inferno, aquele desgraçado filho da mãe. O cara de pé no fundo dessa foto que Dylan nos enviou é o diretor regional da Agência, o maldito Gerard Starkn.

Aquele nome afundou como ácido no cérebro de Rio enquanto ele ultrapassava um reboque lento e acelerava pela pista vazia.

Gerard Starkn.

Que porcaria de tipo de nome é esse?

Gordon Fasso.

Outra ortografia estranha.

E ainda tinha Dragos, e seu filho traidor. Rio não podia se esquecer daquele outro filho da mãe. Ele certamente também estava metido nisso tudo de alguma forma, Rio estava seguro disso. Será que Gordon Fasso e Gerard Starkn estavam envolvidos com o filho de Dragos?

Madre de Dios!

Gordon Fasso. Son of Dragos. Filho de Dragos.

As letras começaram a se misturar na mente de Rio. E então viu tão claro quanto a explosão de luzes vermelhas que se estendia diante dele por meio quilômetro.

– Niko – disse inexpressivo. – Gordon Fasso é o filho de Dragos. Gordon Fasso não é um nome. É uma merda de anagrama. Son of Dragos.

– Jesus Cristo – Nikolai respondeu. – Mas que merda. Se você misturar as letras de Gerard Starkn, tem outro maldito anagrama: Dark Stranger.

– Dylan está com ele – Rio estacionou no encostamento e deu um murro no painel. – O filho de Dragos está com Dylan, Niko.

Ela estava viva, disso o guerreiro estava seguro, e aquilo foi o suficiente para evitar que ele perdesse completamente a cabeça. Mas seu inimigo estava com a mulher que ele amava, e Rio não tinha como saber para onde ele a levaria.

E mesmo se não tivesse aquele engarrafamento bloqueando todas as saídas, Rio ainda estava algumas horas de cruzar a fronteira do estado de Nova York. Ele poderia estar perdendo Dylan para sempre... E isso podia estar acontecendo naquele momento.


Dylan despertou no assento traseiro e escuro de um veículo em movimento. Sua cabeça estava pesada; seus sentidos, aturdidos. Ela conhecia bem aquele sentimento de cerração: ela tinha estado em transe durante certo tempo, e agora, de alguma maneira, estava saindo dele. Através do manto psíquico que tinha sido jogado sobre sua mente, Dylan sentiu outra força alcançar-lhe.

Rio.

Ela o sentia correndo em suas veias. Ela o sentia no poder de sua conexão de sangue e dentro de seu coração. Era Rio passando através do transe que Fasso lhe impusera para lhe dar força, animando-a a aguentar firme. A manter-se viva.

Ah, Santo Deus.

Rio.

Encontre-me.

O leve zumbido da estrada sob as rodas do veículo vibrava em seus ouvidos. Ela tentou ver para onde estava sendo levada, mas através da fresta de suas pálpebras a única coisa que vislumbrava era escuridão fora das janelas correndo por grupos de árvores enegrecidas contra o céu noturno.

Seu rosto doía por causa do golpe que Gordon Fasso lhe dera quando ela tentou lutar para que não fosse capturada. Tinha tentado gritar, escapar, mas ele e o guarda que o acompanhava tinham demonstrado ser muito fortes para ela.

Somente Fasso já teria sido forte o suficiente.

Afinal, ele não era apenas um homem, um homem comum, mas sim um vampiro.

E Dylan tinha a sensação muito forte de que aquele homem sequer era Gordon Fasso, se é que Gordon Fasso alguma vez tenha existido.

O monstro que agora a tinha nas mãos fora também o maldito que matara sua mãe. Ela não tinha que ver o corpo destroçado de sua mãe para saber que tinha sido Gordon Fasso quem a assassinara, seja empurrando-a da sacada do décimo segundo andar, seja assustando-a de tal forma que ela saltasse para sua própria morte em uma tentativa de escapar de suas garras, de suas presas.

Talvez a mulher tenha feito aquilo por Dylan, um pensamento que tornou ainda mais difícil a dor de sua perda.

Mas ela poderia chorar por sua mãe em outro momento, e o faria, certamente. Agora, no entanto, Dylan tinha de estar alerta e tentar encontrar uma saída para aquela terrível situação em que se encontrava.

Afinal, se seu sequestrador conseguisse levá-la aonde quer que queria, Dylan sabia que não haveria forma de escapar.

Tudo o que lhe esperava ao final daquele tenebroso e escuro caminho era dor e morte.


Em algum momento em Connecticut, Rio se deu conta de que não importava o quão rápido dirigisse, não havia possibilidade de encontrar Dylan. Não em Nova York, sem dúvida. Ele ainda estava a algumas horas de distância, e não sabia onde ela estava, ou mesmo se ainda estava em Nova York.

Ele a estava perdendo.

Ela estava tão perto que podia senti-la. Todavia, estava muito longe para apoderar-se dela.

– Maldição!

O medo impregnava cada uma das células e dos músculos do enorme corpo de Rio, e combinava-se com uma dor tão profunda que ele sentia que estava sendo rasgado pelo lado de dentro. Estava transtornado, sangrando... Atormentado pela ira, inútil naquele momento, naquele ponto em que a situação chegara. Sua visão mergulhou em uma névoa conforme sua raiva aumentava mais e mais e seu crânio gritava enquanto o apagão começou a tomar conta de seus sentidos.

– Não! – grunhiu, pisando no acelerador.

Esfregou os olhos, ordenando-lhes que se concentrassem. Não podia permitir que sua debilidade se apoderasse dele agora. Não, ele não podia falhar com Dylan, não assim, não agora. Não, mesmo.

– Não, maldito seja. Tenho que chegar a ela. Ah, Cristo – disse, afogando um soluço entrecortado que ficou preso em sua garganta. – Não posso perdê-la.

Vá ao reservatório.

Rio ouviu o sussurro cheio de estática, mas a princípio não o tinha registrado.

Reservatório Croton.

Ele virou a cabeça para o assento de passageiros e teve uma rápida visão de olhos escuros e cabelos negros. A imagem era quase transparente, e era um rosto que ele conhecia muito bem; mais do que podia acreditar.

Eva.

Ele grunhiu e cortou a alucinação fantasmal. Até agora, só tinha visto Eva na escuridão de seus sonhos. Suas desculpas falsas e a insistência de lágrimas que queria ajudá-lo tinham sido apenas ilusões, truques de sua mente despedaçada. Talvez dessa vez fosse a mesma coisa.

A vida de Dylan estava em uma corda bamba. E ele estaria condenado antes de deixar a sua própria loucura afastá-lo dela.

Rio, escute-me. Deixe-me ajudar.

A voz de Eva soava como um fraco sinal de rádio, mas seu tom era inconfundível e enfático. Rio sentiu um frio tocar seu pulso e, quando olhou para baixo, viu a luz espectral da mão da ex-companheira ali, segurando-o. Ele queria se desfazer daquele contato venenoso, negava-se a permitir que Eva o traísse novamente. Mas quando olhou para o outro lado do carro, o fantasma de sua velha inimiga estava chorando, e suas pálidas bochechas brilhavam umedecidas pelas lágrimas espectrais.

Você ainda não a perdeu, disse com lábios imóveis que tinham mentido tão facilmente no passado. Ainda há tempo. Reservatório Croton...

Rio observou enquanto a forma de Eva começou a enfraquecer e desaparecer. Ele poderia acreditar nela? O que Eva lhe disse poderia ser confiável, mesmo ela estando daquela forma? Ele a odiava por tudo o que tinha lhe tirado, portanto, como ela poderia pensar por um segundo que fosse que ele pudesse acreditar em sua palavra agora?

Perdoe-me, sussurrou.

E com um último brilho... desapareceu.

– Merda – grunhiu Rio.

Então, olhou para o caminho sem fim em sua frente. Ele tinha poucas e preciosas opções. Um passo em falso e Dylan estaria morta. Ele tinha de estar seguro. Tinha de fazer a escolha certa ou não seria mais capaz de viver se falhasse agora.

Com uma oração murmurada, Rio golpeou a discagem rápida de seu telefone celular.

– Gideon. Preciso saber onde fica o reservatório Croton. Agora.

Houve um ruído de resposta de dedos voando sobre um teclado. Em seguida:

– Fica no estado de Nova York... Condado de Westchester, perto da Rota 129. O reservatório é parte de uma antiga represa.

Rio lançou um rápido olhar para a placa na estrada de Connecticut que mostrava uma distância de meio quilômetro.

– Qual a distância de Waterbury?

– Ah... cerca de uma hora se você for pela I-84 Oeste. – Gideon fez uma pausa. – O que está acontecendo, Rio? Você está com algum pressentimento sobre esse reservatório?

– Uma coisa assim – respondeu Rio. Depois, murmurou um agradecimento a Gideon pela informação e terminou a chamada. Pisou no acelerador, e virou para a saída.


Capítulo 35

Rio dirigiu como um morcego saído diretamente do inferno.

O guerreiro colocou toda a sua energia mental na tentativa de chegar a Dylan, de fazê-la ver que podia contar com ele, siempre. E ele ia encontrá-la, de qualquer forma. Era isso ou morrer tentando.

Ele corria pela Rota 129, na esperança de estar se aproximando. Rio podia sentir em seu sangue que não estava longe de Dylan agora. Seu vínculo o chamava, animando-o com uma certeza de que não passaria muito tempo antes que ele finalmente a encontrasse.

E então, quando um sedan escuro apareceu voando pela estrada na direção oposta, as veias de Rio acenderam-se como fogos de artifício.

Madre de Dios.

Dylan estava nesse automóvel.

Com um duro giro do volante, ele jogou seu carro para o lado de modo a bloquear a estrada. Sim, Rio estava disposto a lutar até a morte por Dylan. Os freios do sedan que vinham de frente chiaram, os pneus fizeram fumaça na estrada. O carro freou e sacolejou, então o motorista – um ser humano, pelo aspecto do grande homem ao volante – fez uma perspicaz manobra e enfiou o carro na escura via de acesso ladeada por árvores.

Expelindo uma maldição, Rio deu marcha ré e seguiu o sedan.

Mais adiante, o sedan fez uma parada brusca, mas não conseguiu evitar o choque contra uma barreira temporária que havia na estrada. Duas pessoas saíram do assento traseiro – Dylan e o vampiro que a segurava. O filho da mãe estava empunhando uma arma bem debaixo do queixo de Dylan enquanto a arrastava até a vazia estrada banhada pela escuridão.

Rio freou e saltou do banco. Tirou sua própria arma do coldre e apontou para a cabeça do maldito que estava com Dylan. Mas não pôde disparar. A probabilidade de acertar sua amada era muito grande. Muito maior do que estava disposto a arriscar.

Não que Rio tivesse tido muito tempo para considerar globalmente essa probabilidade.

O enorme capanga que estava no volante deu a volta e começou a abrir fogo contra Rio. Uma bala atingiu seu ombro, causando-lhe uma dor aguda e quente. O maldito continuou atirando contra Rio, tratando de afastá-lo com uma incessante chuva de disparos.

Rio esquivou-se do ataque e saltou, utilizando todo o seu poder da Raça. Caiu sobre o humano – um Escravo, percebeu enquanto olhava aqueles olhos mortos. O guerreiro da Raça então agarrou-o pelo pescoço, colocando, em seguida, sua outra mão na testa do homem. Rio enviou toda a sua fúria para a ponta dos dedos e drenou a vida do Escravo com um toque breve e simples.

Deixou o cadáver no meio da estrada e foi ao encontro de sua amada Dylan.


Dylan tropeçou com seu sequestrador, sentindo o toque frio e duro da boca de uma arma de fogo colocada sob o queixo. Quase não podia ver para onde estava indo – para onde estava sendo levada –, mas em algum lugar, não muito longe, a água corrente rugia como um trovão.

E então houve os disparos.

– Não! – gritou ao ouvir as explosões atrás dela na escuridão. Sentiu uma espetada de dor e sabia que Rio tinha sido ferido. Mas ele ainda respirava. Graças a Deus, ainda estava vivo. Ainda chegava a ela por meio do calor que corria em seu sangue.

Um sádico puxão em sua cabeça trouxe-lhe de volta. O vampiro que a capturara forçou Dylan a correr com ele até um estreito pavimento mais próximo à fonte da água que caía em algum lugar.

Antes que ela se desse conta, eles estavam indo para uma ponte. De um lado, um reservatório cuja extensão parecia ser de quilômetros e cujas águas escuras e espumosas refletiam a luz da lua. Do outro, uma queda que facilmente tinha cerca de duzentos metros.

O desaguadouro abaixo era branco por causa da força da cascata que caía e havia grandes rochas que se estendiam até o rio revolto que se formava no fundo. Dylan olhou por cima da barra metálica da ponte, e percebeu a face da morte estampada naquelas furiosas águas.

– Dragos.

A voz de Rio atravessou a escuridão na entrada da ponte.

– Deixe-a ir.

O sequestrador de Dylan sacudiu-a com força e se deteve, fazendo-lhe girar com a arma ainda – sempre – pressionando seu queixo. Sua risada vibrava baixa e maliciosa.

– Deixá-la ir? Acho que não. Venha pegá-la.

Rio deu um passo na direção dos dois e a parte dianteira da arma na garganta de Dylan pressionou ainda mais forte.

– Largue sua arma, guerreiro. Largue sua arma ou ela morrerá aqui mesmo.

Rio olhou com raiva, com aquela cor âmbar relampejando ainda mais vibrante em seus olhos.

– Eu mandei você deixá-la ir, maldição.

– Baixe a arma – disse o sequestrador. – Faça isso agora. Ou prefere ver como rasgarei a garganta dessa vadia?

O olhar de Rio dirigiu-se para Dylan. Ele estava com a mandíbula apertada, sua tensão era visível, mesmo no meio de toda aquela escuridão. Com um xingamento desferido por entre os dentes, o guerreiro lentamente abaixou-se e colocou a arma no chão, depois levantou-se novamente.

– Está bem – disse cautelosamente. – Agora vamos acabar logo com isso, você e eu. Deixe-a ir, Dragos. – Parou. – Ou eu deveria chamá-lo de Gerard Starkn? Gordon Fasso, talvez? Qual você prefere?

O vampiro riu entre dentes, claramente achando aquilo engraçado.

– Meu pequeno truque chegou ao fim, não é mesmo? Que se dane. Não importa. Você chegou muito tarde, meu caro. Estive muito ocupado. O que meu pai começou, eu estou finalmente terminando. Enquanto a Ordem esteve perseguindo seu próprio traseiro e matando Renegados como se isso fosse fazer alguma diferença no mundo, eu estive semeando as sementes do futuro. Um grande número de sementes. Hoje você me chama de Dragos, mas logo o mundo me chamará de Mestre.

Rio avançou pouco a pouco e o sequestrador de Dylan desviou a arma de seu alvo, apontando-a para o guerreiro. Dylan sentiu a flexão dos músculos do vampiro quando ele se preparava para apertar o gatilho e aproveitou a única oportunidade que tinha. Juntou o punho e golpeou fortemente o braço do maldito, fazendo a bala ricochetear na proteção de ferro da ponte.

Ela não viu o golpe que se seguiu.

Seu sequestrador levantou o outro braço e fez voar o punho, acertando um lado da cabeça de Dylan. Ela cambaleou, chocando-se com força no chão.

– Não! – gritou Rio.

Com uma velocidade e agilidade que ainda a atemorizava, Rio saltou no ar. Dragos respondeu ao desafio com um rugido de outro mundo e os dois fortes e poderosos machos da Raça chocaram-se e começaram uma feroz luta corpo a corpo.


Rio se enganchou com Dragos com uma fúria maníaca em estado puro. Os dois se golpeavam, cada um lutando pela oportunidade de matar o outro. Com um bramido, o vampiro girou Rio e levou-o ao corrimão metálico da ponte. Rio rugiu, volteando Dragos e mandando o filho da mãe para o outro lado da estreita passagem no topo da ponte.

Ele não sabia quanto ia durar a batalha. Tampouco estava disposto a deter-se até que o outro estivesse morto. Os dois vampiros agora estavam totalmente transformados, com suas enormes presas expostas e vibrantes sob a noite iluminada pelo brilho de dois pares de olhos cor âmbar.

De algum modo, Dragos soltou-se e saltou no corrimão. Rio o seguiu, finalmente alcançando o bastardo. Dragos cambaleou e quase perdeu o equilíbrio. Depois, ele se lançou de cabeça contra o abdômen de Rio.

Rio sentiu seus pés escorregando pelo corrimão e tentou a todo custo manter o equilíbrio, mas logo caiu.

– Rio! – Dylan gritou de acima da ponte. – Jesus Cristo! Não!

Nem sequer meio segundo depois, Dragos cometeu o mesmo erro. Como Rio, todavia, ele também conseguiu agarrar-se na estrutura de metal evitando se chocar com as pedras e com a corrente d’água.

A luta continuou abaixo da ponte, ambos sustentando-se nas vigas com uma mão enquanto golpeavam e feriam-se mutuamente com a outra. O ombro de Rio estava ferido e queimava por causa do tiro que levara. A dor o estava consumindo, mas ele se negava a senti-la, tentando a todo custo concentrar toda a sua raiva – toda a sua dor e todo o medo que sentira ao simples pensamento de perder Dylan – na tarefa de pôr um fim a Dragos de uma vez por todas.

E ele podia sentir Dylan lhe dando forças.

Ela estava em sua mente e em seu sangue, em seu coração e em sua alma, emprestando-lhe sua persistente determinação. Rio absorvia tudo e usava toda a força que o vínculo com Dylan lhe proporcionava quando golpeava Dragos. Eles continuaram açoitando um ao outro, expelindo gritos másculos que desenhavam toda a fúria da batalha.

Até que um disparo ecoou por cima de suas cabeças.

Os dois olharam para cima e lá estava Dylan, segurando bravamente uma pistola. Ela apontou a arma para Dragos.

– Isto é por minha mãe, seu maldito – disse antes de disparar. Mas Dragos era da Raça, e era mais rápido do que ela esperava. No último momento, ele conseguiu agarrar-se mais no corrimão. Dylan o seguiu com os olhos, mantendo seu objetivo no alvo. Quando voltou a disparar, uma das mãos de Dragos se elevou e puxou seu tornozelo.

Ela caiu para trás, golpeando fortemente a ponte. Rio ouviu o ar sair rapidamente pelos pulmões de Dylan e olhou horrorizado quando ela estava de repente sendo arrastada para o corrimão pelas fortes mãos de Dragos agarradas em sua perna.

Em um instante, Rio se lançou por cima do corrimão. Agarrou o braço de Dylan com uma de suas mãos e a arma com a outra.

– Solte-a – ordenou o guerreiro a Dragos enquanto apontava a arma para a cabeça do vampiro. Era difícil matar um da Raça, mas uma bala no cérebro geralmente era suficiente.

– Você acha que terminou, guerreiro? – Dragos zombou, e suas presas brilhavam. – Isto é apenas o começo.

Com estas palavras, ele se soltou de Dylan e deixou-se cair tão rápido como uma pedra nas turbulentas águas que corriam abaixo da ponte. A represa o tragou rapidamente e a escuridão das águas não permitia que se visse mais nada.

Dragos tinha sumido.

Rio agarrou Dylan e tomou-lhe em seus braços fortes. Ele a abraçou, e estava tão aliviado que conseguia sentir o calor que os corpos de ambos produziam. Beijou-a, limpou o sangue de sua testa e acariciou seu lindo rosto.

– Acabou – sussurrou Rio, beijando-a de novo. Depois, olhou para as águas escuras que corriam abaixo da ponte, mas não viu sinal de Dragos. Nada. – Você está segura comigo, Dylan. Agora tudo terminou.

Ela assentiu e envolveu os braços ao redor do corpo do guerreiro.

– Leve-me para casa, Rio.


Capítulo 36

Quase uma semana havia se passado desde que Rio levara Dylan consigo de volta ao complexo da Ordem em Boston – de volta para a casa que ele esperava transformar na casa deles, para sempre.

A ferida causada pela bala em seu ombro ainda estava se curando. Tess havia tentado acelerar a reparação de sua pele depois de a bala ter sido extraída, mas, como ela temia, o poder de seu toque curativo estava bloqueado quase que completamente em virtude do bebê crescendo em seu útero. Ela não foi capaz de ajudar Rio, assim como teria sido incapaz de ajudar a mãe de Dylan.

O funeral para Sharon Alexander ocorrera no Queens havia dois dias. Rio tinha retornado a Nova York com Dylan na noite anterior, assim como o resto da Ordem e suas Companheiras de Raça, em uma demonstração de apoio ao novo casal de companheiros.

Rio sentiu muito por não poder ter estado ao lado de Dylan quando sua mãe foi colocada para descansar naquela ensolarada tarde de verão, mas ele ficou feliz ao saber que Tess, Gabrielle, Savannah e Elise puderam estar em seu lugar.

Dylan havia sido aceita na Ordem como se sempre tivesse pertencido ao lugar. As outras Companheiras de Raça a adoravam e, quanto aos guerreiros, até mesmo Lucan estava impressionado com a boa vontade da mulher em arregaçar suas mangas e oferecer ajuda à Ordem. Ela havia passado a maior parte do dia no laboratório de tecnologia com Gideon, que estudava minuciosamente os registros do Banco Internacional de Dados e os informes de desaparecimentos dos Refúgios Secretos em um esforço para identificar as Companheiras de Raça que tinham aparecido para Dylan depois de mortas.

Agora, como a tarde se aproximava do fim e a Ordem estava a ponto de sair em patrulhas, todos os residentes do complexo estavam reunidos ao redor da longa mesa nos aposentos de Rio. Enquanto as mulheres compartilhavam a comida, os guerreiros discutiam negócios da Ordem e planejavam as missões da noite. Nikolai logo iria para o exterior para encontrar-se com o Primeira Geração que conhecia, na esperança de conseguir a ajuda dele para detectar a fonte dos recentes assassinatos.

Quanto a Gerard Starkn, a Ordem não ficou surpresa ao encontrar sua residência em Nova York completamente vazia algumas noites atrás. O bastardo havia limpado tudo completamente, não deixando nenhuma pista sobre a vida dupla que levava como Gordon Fasso – o filho de Dragos – e nenhum rastro ou sinal de qualquer lugar para onde ele poderia ter fugido depois da luta com Rio no reservatório Croton. Uma busca na área próxima ao reservatório não teve resultado algum, mas Rio e os outros não estavam a ponto de render-se.

Havia muito por fazer na Ordem para estancar o mal que Dragos estava semeando, mas Rio não podia pensar em ninguém melhor para ter a seu lado do que o grupo sentado com ele agora. Lançou um olhar ao redor dos rostos de seus irmãos e companheiros – sua família – e sentiu uma onda de orgulho e de profunda (e humilde) gratidão por ser novamente parte deles. Para sempre.

Deu a volta para olhar Dylan e seu coração se apertou como se tivesse sido pego repentinamente por uma mão forte e quente.

Fora ela quem o trouxera de volta. Fora ela quem o havia arrancado de um abismo do qual ele pensou que nunca escaparia. Fora o sangue nutritivo dela que lhe dera força. Mas era o presente sem limites de seu amor que na verdade fizera tudo.

Rio alcançou a mão de Dylan. Ela sorriu quando ele levantou seus dedos até sua boca e os beijou, com os olhos sempre encerrados nos seus. Rio a amava tão profundamente que lhe custava ficar longe agora que ela estava com ele. E saber que toda noite ela o esperava retornar da patrulha, nua em sua cama, era uma tortura doce como um bálsamo.

– Seja cuidadoso – sussurrou quando ele e os outros guerreiros preparavam os trajes para sair em suas missões.

Rio assentiu, depois puxou-a para seus braços e beijou-a profundamente.

– Jesus Cristo – Nikolai disse em meio a uma risada torcida, quando todos os outros começaram a se dispersar. – Vão para o quarto, pelo menos.

– Ainda está parado aí? – disparou Rio, ainda agarrando Dylan em seus braços musculosos. – Quanto tempo temos antes de sairmos?

Niko encolheu os ombros.

– Aproximadamente vinte minutos, eu suponho.

– Tempo suficiente – disse Rio, voltando um olhar faminto à sua mulher.

Ela sorriu e até ruborizou um pouco, mas ali estava uma faísca definitiva de interesse em seus olhos.

Quando Nikolai saiu e fechou a porta em suas costas, Rio tomou Dylan pela mão.

– Somente vinte minutos – disse, sacudindo ligeiramente a cabeça. – Não tenho certeza de por onde devo começar.

Dylan arqueou uma sobrancelha quando começou a mover-se pouco a pouco para o quarto.

– Ah, mas eu tenho certeza de que você descobrirá.

Dylan ficou impressionada – positivamente – com a forma como Rio conseguiu usar completamente aqueles vinte minutos. E, quando voltou das patrulhas muito mais tarde naquela noite, ele estava pronto para mais.

Ele havia feito amor com ela durante horas, e depois a havia abrigado em seus braços fortes enquanto ela suavemente era levada pelo sono.

Ela não estava muito segura de quando Rio tinha saído da cama, mas foi sua ausência que a despertou aproximadamente uma hora antes da alvorada. Ela colocou um roupão de tecido grosso e saiu do quarto, seguindo o zumbido em suas veias que a conduziriam inevitavelmente a seu companheiro de sangue.

Ele não estava nem no complexo subterrâneo, nem na mansão que se assentava no nível da terra. Rio estava do lado de fora, no pátio do jardim atrás da propriedade. Vestido somente com um par de calças pretas de ginástica, Rio estava sentado sobre os grandes bancos de mármore que se estendiam na grama, olhando uma pequena fogueira sobre a grama a alguns metros dali. Ao lado dele, havia uma caixa de fotografias emolduradas e um par das brilhantes pinturas abstratas retiradas das paredes de seu quarto.

Dylan olhou no fogo e viu as distorcidas formas de outros pertences que estavam no quarto sendo lentamente consumidos pelas chamas.

– Oi – disse ele, obviamente sentindo-a quando ela se aproximou. Ele não olhou para ela, somente estirou seu braço, esperando que ela tomasse sua mão.

– Desculpe tê-la acordado.

– Está tudo bem. – Dylan juntou os dedos ao redor dos dele. – Não me importa levantar. Senti saudade de seu calor.

Quando ela disse isso, ele a puxou, colocando-a delicadamente a seu lado. Ele abraçou as coxas dela com um de seus braços fortes e musculosos e simplesmente a sustentou ali, ainda mantendo seu olhar fixo no fogo. Dylan lançou um olhar para baixo, para a caixa ao lado de Rio, e vislumbrou as fotos de Eva, algumas deles dois juntos nos tempos mais felizes do casal. O material estava em uma caixa com algumas roupas.

– Despertei há algum tempo e compreendi que precisava limpar umas coisas que não pertenciam mais à minha vida – disse ele.

Sua voz estava tranquila, não havia resquício de aborrecimento ou amargura. Somente... tranquilidade.

Rio parecia estar em um estado de verdadeira paz; e essa paz estava completamente registrada em suas veias quando ele abraçou Dylan em silêncio, olhando a dança do fogo sobre a grama.

– Faz um ano que eu tenho nutrido ódio por ela – disse ele. – Com cada respiração de meu corpo, eu desejei que ela estivesse queimando no inferno pelo que me fez. Acho que meu ódio por Eva foi a única coisa que me manteve vivo. Durante muito tempo, isso era a única coisa que eu podia sentir.

– Entendo – disse Dylan brandamente. Ela afundou os dedos nos cabelos espessos do guerreiro, acariciando-lhe a cabeça enquanto ele descansava a bochecha contra seu quadril. – Mas foi Eva quem me conduziu naquela montanha. Ela se preocupava com você, Rio. Acho que, à sua maneira equivocada, ela o amou muito. Em vida, ela cometeu alguns terríveis enganos para tentar tê-lo apenas para ela. Ela fez algumas coisas terríveis, mas eu acho que ela quis corrigi-las depois.

Rio levantou-se vagarosamente.

– Não posso odiá-la mais, porque ela trouxe você de volta para mim. E não somente naquele dia lá na caverna. Eva apareceu em meu carro na noite em que Dragos sequestrou você.

Dylan franziu a testa.

– Você a viu?

– Eu estava a horas de Nova York e sabia que se Dragos estivesse com você eu nunca poderia encontrá-los a tempo. Cristo, o medo que senti só de pensar nisso... – Ele puxou Dylan para mais perto de si. – Eu estava na estrada dirigindo tão rápido quanto eu podia, rezando por algum tipo de milagre. Por alguma coisa que me desse esperança de que eu não iria perdê-la para sempre. Foi quando escutei uma voz ao meu lado. Olhei e lá estava ela, Eva, no carro, comigo. Ela me contou para onde Dragos tinha levado você. Ela me informou sobre o reservatório, disse-me que confiasse nela. Não sabia se poderia confiar... não outra vez... mas eu sabia também que aquela poderia ser minha única esperança de encontrar você. Sem ela, eu a teria perdido, Dylan. Ela poderia ter dito que eu encontraria você no meio do inferno, e eu teria ido até lá. Ela podia me trair de novo, me levar para outra emboscada, e eu teria ido, só pela esperança de encontrar você com vida.

– Mas ela não fez isso – Dylan disse. – Ela disse a verdade.

– Sim. Gracias a Dios.

– Ah, Rio... – Dylan descansou o rosto contra o peito musculoso do guerreiro, escutando o pesado som de seu coração como se fosse o dela. Ela sentiu o amor dele fluir através dela tão quente como a luz do sol, um amor que lhe causou um arrepio nas costas. – Amo tanto você.

– Eu também te amo – disse ele, inclinando o queixo dela e beijando-a, longa, lenta e docemente. – E eu vou te amar sempre, Dylan. Se você me aceitar, quero passar cada dia e noite de minha vida te amando.

– Claro que eu quero você – disse, deslizando as pontas de seu dedo sobre sua bochecha. Ela sorriu devagar e com uma promessa sedutora. – Quero você cada dia e cada noite de minha vida... e de todas as formas possíveis.

Rio grunhiu profundamente, uma pequena faísca de luz âmbar em seu olhar fixo.

– É bom ouvir isso.

– Que bom – ela riu, olhando para o rosto de Rio, um rosto maravilhoso para o qual ela nunca se cansaria de olhar, especialmente quando ele a olhava com tanta devoção em seus olhos, deixando-a sem fôlego.

Ela lançou um olhar para a caixa dos objetos pessoais de Eva e, em seguida, para a fogueira.

– Você sabe que não tem que fazer isso. Não por mim.

Rio balançou sua cabeça.

– Estou fazendo por nós dois. Provavelmente faço por ela também. É tempo de deixar ir tudo o que aconteceu antes. Estou preparado para fazer isso agora... por você. Pelo futuro que eu vejo contigo. Não quero mais olhar para trás.

Dylan assentiu brandamente.

– Está bem.

Rio pegou a caixa e arrastou-a até o fogo. Eles caminharam juntos, silenciosos enquanto se aproximavam das chamas ondulantes.

Com um suave impulso, Rio atirou a caixa cheia de fotos, quadros e roupas no meio da fogueira. Um rugido de vida espalhou-se por um breve momento, lançando uma explosão de faíscas e fazendo subir fumaça para o céu escuro.

Em um silêncio contemplativo, Dylan e Rio olharam o fogo queimar por um momento até que as chamas ficaram menos famintas e seu combustível se esgotou. Quando restavam apenas fumaça e rescaldos, Rio virou-se para Dylan e puxou-a para seus braços. Ele abraçou-a enquanto sussurrava uma oração de gratidão ao pé de seu ouvido.

E no meio da fumaça da fogueira agonizante atrás dele, Dylan olhou por cima do ombro largo de Rio e viu uma silhueta etérea, feminina, tomar forma entre a agitação da cinza flutuante.

Eva.

Ela sorriu um pouco triste quando olhou os dois abraçados. Mas, então, fez um suave gesto com a cabeça para Dylan e gradualmente desvaneceu.

Dylan fechou os olhos enquanto envolvia os braços ao redor de Rio e enterrava o rosto no calor sólido de seu peito. Depois de um momento, sua bochecha retumbou com a vibração de sua voz.

– Sobre essa coisa de ter-me de todas as formas possíveis... – disse ele, limpando sua garganta. – Quer me explicar um pouco melhor o que você tinha em mente?

Dylan levantou o rosto para ele e sorriu, seu coração preenchido com amor.

– Que tal eu mostrar em vez de dizer?

Ele riu deliciosamente enquanto as pontas de suas presas já começavam a surgir.

– Já estava achando que você nunca perguntaria.


A seguir, uma prévia de O véu da meia-noite, próximo romance da série:

No cenário de um cavernoso clube de jazz subterrâneo em Montreal, uma cantora com lábios vermelhos arrastava ao microfone palavras sobre a crueldade do amor. Embora a sedutora voz fosse muito encantadora e a letra falasse com clara sinceridade sobre sangue, dor e prazer, Nikolai não estava ouvindo. Ele se perguntava se a mulher sabia – se algum daqueles poucos humanos ali ao menos imaginavam – que havia vampiros naquele mesmo espaço.

As duas jovens que tomavam martínis rosé no canto escuro do bar certamente não sabiam.

Elas estavam cercadas por quatro indivíduos, um grupo de homens alcoolizados vestidos de motoqueiros que conversavam e tentavam disfarçar, sem muito êxito, os olhos sedentos por sangue, permanentemente fixos nas jugulares das mulheres durante os últimos quinze minutos. Embora fosse claro que os vampiros estavam negociando insistentemente para que as humanas saíssem do clube com eles, não estavam obtendo muito progresso com suas respectivas Anfitriãs de Sangue em potencial.

Nikolai riu baixo.

Amadores.

Pagou a cerveja que tinha deixado intacta no bar e dirigiu-se para uma mesa no canto. Enquanto se aproximava, olhou para as duas humanas, que escapavam do balcão cambaleando. Foram rindo juntas para o banheiro, desaparecendo por um estreito corredor abarrotado de gente que dava no salão principal.

Nikolai sentou-se à mesa de forma descontraída.

– Boa tarde, senhoritas.

Os quatro vampiros olharam-no fixamente em silêncio, instantaneamente reconhecendo-o como um de sua espécie. Niko elevou até o nariz uma das taças de martíni, manchada de batom, e farejou os sedimentos com aroma de fruta. Estremeceu, empurrando a asquerosa bebida de lado.

– Humanos – disse em voz baixa. – Como podem beber essa porcaria?

Um circunspecto silêncio caiu sobre a mesa enquanto o olhar de Nikolai viajava entre os obviamente jovens – e civis – da Raça. O maior dos quatro limpou a garganta enquanto olhava Niko; seus instintos não tiveram dúvida alguma de que ele não era dali. Tampouco havia dúvida de que não era um civil.

O jovem fez algo que provavelmente ele pensou ser um olhar duro e moveu o queixo para o corredor onde estavam os banheiros.

– Nós as vimos primeiro – murmurou ele. – As mulheres. Nós as vimos primeiro.

Ele limpou novamente a garganta enquanto esperava que seus amigos lhe dessem retaguarda. Entretanto, nenhum o fez.

– Nós chegamos aqui primeiro. Quando as mulheres voltarem para a mesa, elas vão embora conosco.

Nikolai riu diante da tentativa do jovem em reclamar seu território.

– Você acha mesmo que haveria alguma disputa se eu estivesse aqui para caçar? Relaxe, cara. Não estou interessado nisso. Estou procurando uma informação.

Ele já havia passado por uma situação similar duas vezes naquela noite em outros clubes, procurando os lugares onde os membros da Raça tendiam a reunir-se e caçar sangue – procurando por alguém que pudesse levá-lo a um vampiro mais velho chamado Sergei Yakut.

Não era fácil achar alguém que não queria ser encontrado, especialmente um homem reservado e peregrino como Yakut. Ele estava em Montreal, disso Nikolai tinha certeza. O guerreiro tinha falado com o vampiro recluso por telefone algumas semanas antes, quando o rastreara para informar-lhe a respeito de uma ameaça que parecia dirigida aos membros mais raros e mais poderosos da Raça – os vinte e poucos indivíduos ainda vivos que tinham nascido da primeira geração.

Alguém estava se concentrando na extinção dos Primeira Geração. Vários haviam sido dados como mortos durante o mês anterior e, para Niko e seus irmãos da Raça em Boston – um pequeno grupo de guerreiros altamente preparados e altamente letais conhecidos como a Ordem –, a erradicação e a prisão dos assassinos dos Primeira Geração era uma missão crítica. Por isso a Ordem decidira entrar em contato com todos os Primeira Geração conhecidos e conseguir sua cooperação.

Sergei Yakut fora o menos disposto a se comprometer. Ele não temia ninguém e tinha seu próprio clã para protegê-lo. Recusara o convite da Ordem para ir a Boston e conversar, de modo que Nikolai fora enviado a Montreal para persuadi-lo. Quando Yakut ficasse consciente do alcance da atual ameaça – a crua verdade contra a qual a Ordem e toda a Raça estavam lutando –, Nikolai estava seguro de que o Primeira Geração estaria disposto a ajudá-los.

Contudo, primeiro era preciso encontrar o ardiloso filho da puta.

Até aquele momento, as investigações na cidade não tinham dado em nada. A paciência não era exatamente o forte de Niko, mas ele tinha toda a noite e seguiria buscando. Mais cedo ou mais tarde, alguém poderia dar-lhe a resposta pela qual estava procurando. E se ele seguisse atuando de forma dura, talvez perguntando bastante, Sergei Yakut viria lhe procurar.

– Preciso encontrar alguém – disse Nikolai aos quatro jovens da Raça. – Um vampiro estrangeiro, da Rússia. Da Sibéria, para ser mais exato.

– Você também é de lá? – perguntou o líder do grupo. Ele havia evidentemente captado o ligeiro sotaque que Nikolai não tinha perdido durante os longos anos que viveu nos Estados Unidos com a Ordem.

Niko deixou que seus olhos azuis glaciais falassem de suas próprias origens.

– Conhece esse homem?

– Não. Não o conheço.

Outras duas cabeças agitaram-se em imediata negativa, mas o último dos quatro, o antissocial que estava com os braços apoiados sobre o balcão, lançou um olhar ansioso para Nikolai do outro lado da mesa.

Niko captou aquele olhar e concentrou-se nele.

– E você? Alguma ideia do que estou falando?

A princípio, não achava que o vampiro fosse responder. Os olhos encobertos encararam os seus em silêncio até que o jovem finalmente se moveu e exalou uma maldição.

– Sergei Yakut – murmurou.

O nome foi quase inaudível, mas Nikolai o ouviu. E com o canto dos olhos, percebeu que uma mulher de cabelos cor de ébano sentada no bar perto deles também ouvira. O guerreiro podia perceber tudo sobre ela, desde a súbita rigidez descendo pela espinha, por baixo de seu top preto de mangas longas, até a maneira como sua cabeça inclinava-se levemente para o lado, graças ao poder daquele simples nome.

– Você o conhece? – perguntou Nikolai ao jovem da Raça sem desviar os olhos um segundo sequer daquela morena no bar.

– Ouvi falar dele, isso é tudo. Ele não vive nos Refúgios – disse o jovem, referindo-se às comunidades seguras que recebiam a maioria das populações civilizadas da Raça por toda a América do Norte e Europa. – O cara é bem desagradável, pelo que ouvi.

E ele realmente era, Nikolai admitiu para si.


– Alguma ideia de onde eu poderia encontrá-lo?

– Não.

– Tem certeza? – perguntou Niko, observando a mulher no bar deslizar de sua banqueta, preparando-se para partir. Ela ainda tinha mais de meia taça cheia, mas, com a menção do nome de Yakut, parecia subitamente ter pressa em sair daquele lugar.

O jovem da Raça agitou sua cabeça.

– Não sei onde você pode encontrar esse cara. Não sei por que alguém estaria disposto a procurá-lo, a menos que tenha vontade de morrer.

Nikolai olhou por cima de seu ombro enquanto a mulher alta e morena começava a andar no meio da pequena multidão reunida perto do balcão. Por impulso, ela voltou-se para olhá-lo; então, os olhos verdes como jade apareceram por entre a franja do cabelo negro e o brilho de seu queixo magro e agitado. Havia uma nota de medo em seus olhos enquanto ela devolvia fixamente o olhar, um medo nu que ela nem sequer tentava ocultar.

– Estarei condenado – murmurou Niko.

Ela sabia algo sobre Sergei Yakut.

Algo além de um simples conhecimento passageiro, Niko supôs. Aquele olhar assustado e cheio de pânico, enquanto ela se virava e procurava uma saída, dizia tudo.

Nikolai foi atrás dela. Abriu caminho pela confusão de humanos que enchiam o clube, seus olhos seguiam o sedoso e negro cabelo de sua presa. A mulher era rápida e ágil como uma gazela, suas roupas e cabelo escuros permitiam-lhe praticamente desaparecer pelos arredores.

Mas Niko pertencia à Raça, e não existia humano que pudesse deixar para trás um de sua espécie. Ela evitou a porta do clube e fez um giro rápido para a rua. Nikolai a seguiu. Ela deve ter sentido a presença dele logo atrás, pois olhou ao redor para avaliar sua perseguição, os pálidos olhos verdes fechando-se sobre o seu perseguidor como lasers.


Ela corria mais rápido agora, dobrando a esquina no final da rua. Dois segundos mais tarde, Niko estava ali também. Sorriu enquanto avistava a moça apenas a alguns metros à sua frente. O beco em que ela entrou, entre dois altos edifícios, era estreito e escuro – no fim, o beco estava fechado por um contêiner de metal pontudo e uma cerca de uns três metros de altura.

A mulher girou o corpo sobre os saltos de suas botas pretas, ofegando forte, seus olhos sobre Niko, observando cada um de seus movimentos.

Nikolai deu poucos passos para o mal iluminado beco, depois parou, suas mãos sustentavam-se benevolamente pelas laterais do corpo.

– Está tudo bem – ele disse. – Não precisa correr. Só quero conversar.

Ela olhou-o em silêncio.

– Quero te perguntar sobre Sergei Yakut.

A mulher engoliu em seco visivelmente, seu doce estômago se contorcia.

– Você o conhece, não é mesmo?

O canto da boca da mulher arqueou-se levemente, mas o suficiente para dizer ao guerreiro da Raça que ele tinha razão – ela conhecia o Primeira Geração. Se poderia levá-lo até ele, isso já era outro assunto. Mas, agora, aquela mulher era sua melhor – possivelmente única – esperança.

– Me conte onde ele está. Preciso encontrá-lo.

Ela estava com as mãos apoiadas nos quadris, de punhos fechados. Os pés estavam ligeiramente separados, como se estivesse preparada para sair correndo. Niko viu a mulher sutilmente lançar o olhar para uma maltratada porta à esquerda.

Ela avançou rumo à porta.

Niko soltou uma maldição e voou atrás dela com toda a velocidade que tinha. No momento em que ela abriu a porta, sob os rangidos das dobradiças, ele já estava em sua frente, na soleira, bloqueando a passagem para a escuridão do outro lado. Ele riu com a facilidade do ato.

– Eu disse que não precisa correr – disse, dando de ombros ligeiramente enquanto ela retrocedia um passo, afastando-se. Ele deixou que a porta se fechasse enquanto seguia o lento retrocesso da mulher para o beco.

Jesus, ela era estonteante. Ele só tinha conseguido vislumbrá-la no clube, mas, agora, a poucos metros de distância, Niko se dava conta de que ela era absolutamente sensacional. Alta e magra, esbelta sob sua roupa negra, com uma irrepreensível pele branca como o leite e luminosos olhos de amêndoas selvagens. Seu rosto com a forma de um coração era uma combinação cativante de fortaleza e suavidade, sua beleza igualava partes claras e obscuras. Nikolai sabia que estava ofegando, mas pro inferno! Não podia evitar.

– Me diga... – disse ele. – Me diga seu nome.

Ele estendeu o braço para a mulher, um movimento simples e nada ameaçador de sua mão. Sentiu uma onda de adrenalina disparando em sua corrente sanguínea – na verdade, pôde perceber o penetrante aroma cítrico no ar – mas não viu o golpe chegando até que o afiado salto da bota o atingisse em cheio no peito.

Maldita seja.

Ele caiu para trás, mais surpreso que desacordado.

Era o tempo de que ela precisava. A mulher saltou pela porta de novo, desta vez conseguindo desaparecer no escuro edifício antes que Niko pudesse dar a volta e impedi-la. Ele a perseguiu, amaldiçoando-a.

O lugar estava vazio, muito cimento cru sob seus pés, tijolos à vista e vigas expostas ao redor. Um sentido fugaz de premonição ardeu-lhe pela nuca enquanto corria entrando mais na escuridão, mas toda sua atenção estava centrada na mulher que permanecia no centro do espaço vazio. Ela olhou-o com expectativa conforme ele se aproximava, cada músculo de seu magro corpo parecia tenso, preparado para atacar.

Nikolai sustentava um afiado olhar enquanto se colocava em frente dela.

– Não vou te fazer mal.

– Eu sei – ela sorriu, marcando uma ligeira curva em seus lábios. – Você não terá essa oportunidade.

Sua voz era brandamente aveludada, mas o brilho de seus olhos era de um matiz frio.

Sem avisar, Niko sentiu uma súbita tensão que deixou sua cabeça em pedacinhos. Um som de alta frequência explodiu em suas orelhas, mais alto do que podia suportar. E, depois, ainda mais alto. Sentiu as pernas cederem. Caiu de joelhos, sua visão estava à deriva enquanto a cabeça estava a ponto de explodir.

Registrou o som de botas chegando, à distância – vários pares, pertencentes a homens, todos vampiros. Vozes apagadas zumbiam sobre ele enquanto sofria um repentino e extenuante ataque.

Era uma armadilha.

A vadia o havia guiado até ali deliberadamente, sabendo que ele a seguiria.

– Bom trabalho, Renata – disse um dos membros da Raça que tinha entrado no local. – Pode soltá-lo agora.

A dor de cabeça de Nikolai diminuiu àquela ordem. Elevou os olhos a tempo de ver o belo rosto de sua atacante olhando para ele, próximo aos seus pés.

– Tirem-lhe as armas – disse ela a seus companheiros. – Precisamos removê-lo daqui antes que recupere as forças.

Nikolai cuspiu várias outras maldições para a mulher, mas sua voz se afogou na garganta: ela já estava longe, as pontas magras de seus saltos percutindo o chão de concreto frio em que ele estava deitado.

 

 

                                                                                                    Lara Adrian

 

 

 

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